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SÃO PAULO
2017
MAYARA AMARAL DOS SANTOS
SÃO PAULO
2017
307.76098161
55 f. : il. ; 30 cm.
de São Paulo.
55 f. : il. ; 30 cm.
de São Paulo.
Professor(a):
Assinatura: _______________________________________
[…]
Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem;
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.
[…](Eduardo Alves da Costa – No caminho, com Maiakoviski)
Pela rigorosa apuração destes crimes!
Pelo fim da cultura da violência, do medo e da omissão!
Pelo fim do extermínio de jovens!
Vida Viva!
Viva a Vida!1
No Morro da Brasilândia
Avisa que eu vivi a vida
E cada tijolo à vista
Avista um futuro feliz
(Tiaraju Pablo)
1
Manifesto contra a chacina de 2014. Disponível em: http://www.cantareira.org/noticias/periferia-
brasilandia-manifesto-chacina-2014
2
Foto: Samba do Bowl. Agosto 2016
Este trabalho é dedicado a todos os
moradores do Distrito da Brasilândia e a todas e todos que
dedicam o precioso tempo de suas vidas à luta por justiça e
superação deste sistema capitalista que oprime e exclui vidas
em todos os becos e vielas das favelas do mundo.
Resumo
Ao longo dos últimos dez anos a violência acirra-se nas periferias de São Paulo, a Praça
7 Jovens – A Praça da Paz é fruto de uma chacina no Jardim Elisa Maria no período de
2007. Este trabalho tem por foco os jovens promotores culturais da periferia no Jardim
Elisa Maria, no distrito da Brasilândia em São Paulo. Procura-se descrever e analisar o
modo como esses jovens lidam diariamente com os diversos dispositivos de poder
presentes no local para conseguir realizar atividades culturais no bairro e ocupar o
espaço público. A partir de um estudo de caso na Brasilândia, realizado a partir de uma
etnografia, e entrevistas com jovens promotores culturais e moradores mais antigos do
bairro busco entender o processo de inserção de jovens na política cultural local e como
este processo promove uma formação em política e, em alguns casos, contribui para o
desenvolvimento de carreiras políticas em nível local.
Palavras-chave: violência, periferia, juventude, cultura, política
Abstract
Over the last ten years, violence has raged in the outskirts of São Paulo, Praça 7 Jovens
- Praça da Paz is the result of a massacre at Jardim Elisa Maria in the period of 2006.
This research focuses on young cultural promoters from the periphery Jardim Elisa
Maria, in the district of Brasilândia in São Paulo, and how these young people deal daily
with the diverse devices of power present in the place to be able to carry out cultural
activities in the neighborhood and occupy the public space. Through this case study in
Brasilândia, based on an ethnography, and interviews with young cultural promoters
and older residents of the neighborhood, I try to understand the process of insertion of
young people in local cultural politics and how this process promotes informal
education in politics and, in some cases, contributes towards the development of careers
in local level politics.
Keywords: violence, periphery, youth, culture, politic
SUMÁRIO
3 A BRASILÂNDIA ..................................................................................................... 35
4 A CHACINA DE 2007...............................................................................................41
6 O SARAU DA BRASA..............................................................................................48
INTRODUÇÃO
“Era por volta das 15h, no meio do mês de agosto de 2015, o dia estava
ensolarado e na Praça 7 Jovens a juventude jogava bola, fumava e conversava na praça.
Eis que do outro lado da rua, dois meninos negros de aproximadamente 15 anos
estavam parados conversando próximo a um bar, e então um carro preto quase os
atropela. O carro não tinha identificação, cantou os pneus pra cima deles. De dentro do
carro saíram dois policiais militares fardados, que revistaram os meninos, deram um
enquadro, passaram a mão por todo o corpo dos meninos. Os meninos só respondiam
“Não, Senhor.”; “Sim, Senhor”. De cima, uma câmera apontava para os PMs, era uma
moradora filmando o ato dos policiais, ela estava na janela do sobrado atrás de uma
plantinha. Um policial olhou para o alto e perguntou “Já está filmando, senhora?” e a
senhora respondeu “Não, senhor. Imagina.”
Eu, do banco da praça, observava toda a cena, estava esperando o Tiago
para gravar um documentário sobre LGBTs periféricos. Ninguém na praça falou nada,
todos olham, mas ninguém fala nada, é a rotina, e não há o que se fazer. Jovens e
crianças presenciam essa cena todos os dias, as mães já são espertas e gravam a ação
dos policiais.
Os policiais após revistarem os meninos continuaram observando a praça
do outro lado da rua. Eu estava gravando o documentário com o jovem Tiago3, de 19
anos, homossexual, morador do Peri Alto, bairro vizinho ao Elisa Maria. Durante a
filmagem nós nos deslocamos pela praça para pegar diferentes ângulos, porém em certo
momento os policiais perceberam que estavam sendo filmados por uma câmera
profissional e a todo o momento desviam do foco da câmera, eu os seguia com a
filmagem e percebi o quão ficaram irritados”. (Dados de meu caderno de campo)
O subdistrito da Brasilândia é uma região da cidade com alta taxa de
vulnerabilidade juvenil e violência, como apresentarei em dados mais à frente nessa
pesquisa. Porém, não é uma região com muitos equipamentos culturais. Propus-me a
fazer esta pesquisa porque acredito que seja uma necessidade do local: demonstrar a
violência presente no bairro principalmente com o público jovem, que são agredidos e
ameaçados pela polícia como expus com essas anotações de meu caderno de campo,
sendo também sujeitos ao tráfico de drogas presente na região.
3
Nome fictício
12
Esses jovens não são vistos como cidadãos comuns, é criada uma
imagem deles na mídia e na sociedade em geral, que estes são o suspeito padrão, aquele
sujeito que irá assaltar a sua família ou você. Esse sujeito para a sociedade e para a
polícia é um sujeito que tem um padrão, um padrão de cor, normalmente pardos e
pretos, são homens e jovens, e são assassinados pela polícia nas periferias de São Paulo.
Nas páginas a seguir apresento uma discussão acerca dos temas
violência, juventudes e cultura, tendo em vista sua pertinência para o desenvolvimento
desta monografia.
A violência
Conversei com um policial uma vez e este dava formação para a Polícia
Militar de São Paulo, ele me disse que o coronel Telhada era a inspiração dele, e dizia
que se ele não matasse os “bandidos”, esse mesmo “bandido” o mataria e a família dele
ficaria desamparada. A seguir, um trecho do ex-coronel Telhada em uma entrevista
pública.
O vereador Paulo Telhada, ex-coronel da Rota (Rondas Ostensivas
Tobias de Aguiar), ocupa seu cargo na Câmara dos Vereadores há
mais de um ano. Eleito com 89.053 votos, ele recebeu a Revista
Vaidapé e, sobre o assunto, respondeu: “A Polícia Militar matou 76
em janeiro? Foi pouco. Quanto mais bandido for para o saco, melhor,
porque é menos gente para me encher o saco”, disse. Na hora, os olhos
de seu assessor de imprensa, Davi Denis Lobão, brilharam. 4
4
Disponível em: https://www.brasildefato.com.br/node/28183/ Data da publicação desta reportagem
5
Segundo Caldeira (2002) (Chevigny 1995: 46,67)
13
6
Disponível em: https://anistia.org.br/campanhas/jovemnegrovivo/
7
Volto a discutir este termo utilizado por D’Andrea à página 23 do presente trabalho.
8
Disponível em: https://anistia.org.br/campanhas/jovemnegrovivo/.Data: 2012
14
Butler (2011) reflete sobre o sofrimento causado pela guerra e como essa
manipulação do discurso busca relacionar narrativas para construção de uma história na
qual nem sempre se diz a verdade, por vezes, suspende-se a real precariedade da vida.
O processo de esvaziamento do humano feito pela mídia por meio da
imagem deve ser entendido, no entanto, nos termos do problema mais
amplo de que esquemas normativos de inteligibilidade estabelecem
aquilo que será e não será humano, o que será uma vida habitável, o
que será uma morte passível de ser lamentada. Esses esquemas
normativos operam não apenas produzindo ideais do humano que
fazem diferença entre aqueles que são mais e os que são menos
humanos. Às vezes eles produzem imagens do menos que humano, à
guisa do humano, a fim de mostrar como o menos humano se disfarça
e ameaça humano ali naquele rosto. Mas muitas vezes esses esquemas
normativos funcionam precisamente sem fornecer nenhuma imagem,
nenhum nome, nenhuma narrativa, de forma que ali nunca houve
morte tampouco houve vida. [...] (p. 28-29)
Trago este texto para reflexão, pois acredito que no Brasil os jovens
negros, por serem construídos em sua imagem como um sujeito suspeito padrão, a “cor
padrão”, estão vulneráveis à manipulação da mídia em novelas e em programas
sensacionalistas como “Datena” ou “Cidade Alerta”, em que sempre são mostrados
como jovens negros ou pardos, moradores das favelas, sendo bandidos, assassinos. Isso
contribui para o imaginário brasileiro do ser humano possível de ser executado e, por
isso, muitas vezes não há nenhuma, ou pouca, comoção com as chacinas dos jovens
periféricos, pois estes são corpos que já não importam, ou seja, segundo Butler, menos
humanos.
Continuando a reflexão sobre corpos menos humanos, ou passíveis de
morte, no texto “A guerra das mães: dor e política em situações de violência
institucional”, (VIANNA & FARIAS, 2011), podemos refletir sobre como é a luta das
mães por justiça no julgamento dos policiais que assassinaram seus filhos. Para Butler
(2004, p.21-23) a perda instaura uma dúvida primordial sobre quem é esse “eu” que
passa a existir sem “você”. O luto como senso de comunidade. A solidariedade é
compartilhada apenas entre aqueles que sentem a mesma dor e se compreendem.
Pessoas que não são familiares ou amigos, que não partilham aquela comunidade, como
as pesquisadoras Adriana Vianna e Juliana Farias, não são vistas da mesma forma.
Nos julgamentos dos policiais que assassinam os jovens nas periferias, há
a disputa política pelos termos usados para se referir aos momentos das mortes desses
jovens, as mães militantes utilizam chacina, enquanto os que defendem as forças do
Estado (a Polícia) apelam para morte em confronto, ou os autos de resistência.
15
Assim também acontece no movimento Mães de Maio, promovido por mães que
perderam seus filhos em Maio de 2006, quando em resposta a morte de 40
policiais mortos pelo PCC a polícia de São Paulo matou mais de 493 pessoas
em bairros periféricos.
9
Disponível em: https://anistia.org.br/wp-content/uploads/2015/07/Voce-matou-meu-filho_Anistia-Internacional-
2015.pdf
16
. Até hoje os casos não foram julgados e houve uma queima de arquivo
nos documentos de Segurança Pública de São Paulo, na época alegou-se uma falha no
sistema, porém essa falha aconteceu apenas uma vez.
10
Disponível em: http://brasil.elpais.com/brasil/2017/01/02/politica/1483358892_477027.html
11Disponível em: http://g1.globo.com/rr/roraima/noticia/2017/01/mortos-em-presidio-de-roraima-nao-eram-de-
nenhuma-faccao-diz-governo.html
17
Deixar essa Europa que nunca acaba de falar do Homem, mas mata
homens onde quer que os encontre, na esquina de cada uma de suas
próprias ruas, em todas as esquinas do globo... essa mesma Europa
onde eles nunca acabam de falar do Homem, e onde nunca pararam
de proclamar que estavam ansiosos pelo bem estar do Homem: hoje
sabemos com que sofrimento a humanidade pagou por cada um de
seus triunfos da mente.
(FANON, F. The Wretched ofthe Earth. London, Penguin, 1967,
p.251.)12
As Juventudes
12
Trecho retirado do texto Diferença, Diversidade, Diferenciação. (Avtar Brah, 1996)
18
estudo sobre a adolescência em Samoa. Mead procura mostrar que em Samoa, onde
realizou pesquisa etnográfica, a adolescência não é uma fase de rebeldia ou turbulência.
Os jovens lá são tratados com respeito e ouvidos desde crianças, sendo tidos como
pequenos adultos. Sendo assim, Mead chega à conclusão que os adolescentes sob
diferentes condições, apresenta diferentes circunstâncias, ou seja, Mead observa em
Samoa que a passagem da infância para a adolescência não apresentava as dificuldades
emocionais, psicológicas, e confusões que eram observadas nos adolescentes dos
Estados Unidos.
Continuando a refletir que os jovens não estão sujeitos apenas a sua
condição natural, proponho uma reflexão embasada no texto Não faz mal pensar que
não se está só, de Ragina Fachini (2011), em que podemos observar como jovens
mulheres se articulam em torno de um movimento autônomo, em que as jovens
dominam o uso das tecnologias, além do uso do lúdico e do cultural para obter o diálogo
com o público mais jovem, tratando do feminismo nas relações cotidianas.
Segundo Helena Abramo (1994), a luta por espaços e sentidos no meio
cultural trava-se por meio do estilo. Então roupas, música, ocupação do espaço público,
são formas de comunicação em que o estilo está presente em um “espaço de
sociabilidade e elaboração de uma identidade relativa à sua condição juvenil e aos
problemas nela encontrados” (p.159)
Facchini aponta para o fato da estética ser transgressora e operar as
diferenças. Facchini trabalha com o conceito de marcadores sociais da diferença entre
os quais se incluem cor/raça, sexualidade, gênero e classe . Esses marcadores tendem a
hierarquizar relações de poder entre os sujeitos (Brah, 2006).
O estilo contribui para que estes sujeitos encenem seus dramas sociais,
fazendo com que essa cultura que é vista como subalterna, se desloque e produz
questionamentos às normas sociais vigentes. Segundo Facchini: “(...) os sujeitos são
constituídos no processo de citar e deslocar normas sociais, e isso pode se dar no
processo de composição ou de encenação de determinado(s) drama(s) por meio do
estilo” (FACCHINI:2011:146.)
Outra perspectiva que abordo é a interseccionalidade13, termo cunhado
por Kimberlé Crenshaw (1992) que define a interseccionalidade como “formas de
capturar as consequências da interação entre duas ou mais formas de subordinação:
13
Interseccionalidade é um campo de estudo que aponta para a articulação das opressões através de
marcadores sociais da diferença como gênero, raça, sexualidade e geração.
20
A cultura
José Guilherme Magnani (2000) começou a estudar o lazer na periferia e
sofreu uma série de questionamentos:
entre o bairro e o Estado, não estariam contribuindo para formas de gestão social, para
formas de controle e contenção do conflito social?
Neste trabalho busquei compreender como violência, juventude e
cultura articulam-se no contexto da periferia, mais especificamente dos jovens
promotores culturais do distrito da Brasilândia.
Objetivos
Objetivo Geral: Ao analisar a articulação de jovens moradores de um
bairro periférico em torno da política cultural e do uso do espaço público para atividades
artísticas, busco compreender como esses jovens se formam por meio de suas
experiências, tornando-se mediadores da política em nível local. Procuro mostrar como
aprendem a se posicionar frente às diversas demandas do bairro e como aprendem a
lidar com as diversas formas de violência que se explicitam no bairro: as manifestações
de violência do Estado por meio da polícia e a relação com o mundo do crime.
Objetivos específicos: Explicitar suas relações históricas com outros
movimentos sociais, com o Estado e com o mundo do crime dentro do bairro.
Quais as mudanças urbanas que ocorrem no bairro e qual o papel
desempenhado por jovens artistas e promotores culturais locais nestas transformações
de um dos espaços públicos do bairro – a Praça 7 Jovens - e em seu uso?
Qual o processo de inserção destes jovens na política em nível local?
Quais as diversas formas de enfrentamento com a violência de Estado e
do mundo do crime neste processo de atuação política cultural?
Metodologia
Em função dos objetivos e da natureza desta pesquisa, optei por
desenvolvê-la no bairro onde moro, pois frequento os saraus da Brasilândia, sou
próxima aos jovens que residem no bairro e também, porque trabalhei na área da cultura
como Jovem Monitora Cultural no Centro Cultural da Juventude, acredito já fazer parte
do circuito cultural da região, o que me facilitou obter entrevistas com os protagonistas
da cena local.
Utilizei predominantemente a observação participante, pois ao mesmo
tempo em que atuei como pesquisadora, sou também moradora do local. Realizei
entrevistas semiestruturadas e informais com oito jovens do bairro e com duas
lideranças mais antigas do bairro, que inspiraram esses jovens.
25
15
Espaços da praça:
Quadra de futebol de barro;
Banquinhos;
Quadra de basquete;
Quadra de basquete e futebol;
Pista de Skate Bowl;
Parquinho das crianças;
Quadra de futebol de grama sintética.
SAMU
Escola Coronel Herminio Rodrigues
O que pude notar também é que os moradores acham que os jovens que
ficam na praça são drogados, bandidos e vagabundos, e estes também ligam para a
polícia quando se sentem incomodados com os jovens na praça. Diversos moradores
15
Imagem do Google da Praça 7 Jovens de cima
29
acreditam que bases policiais e mais delegacias fariam com que o bairro se tornasse
mais seguro, prevenindo roubos e assaltos. A questão que fica é: mais “seguro” para
quem? Se nós não somos os alvos da polícia, não somos o suspeito padrão. O grupo
LGBT está presente na Praça em seu dia-a-dia e também no Samba do Bowl. Estes são
jovens LGBTs, algumas meninas também compõem o grupo, mas em sua maioria são
homens. Em uma conversa com esses jovens, eles relataram como é difícil a
convivência na praça devido a eles serem uma minoria LGBT. A praça é um território
divido em pedaços (conceito do Magnani, em Na Metrópole) que seria o espaço social
que se situa entre o espaço da casa e da rua. Esse grupo dentro da Praça 7 Jovens,
recorrentemente fica na quadra de basquete, junto com os jovens alternativos que
gostam de Rock e Pop (estilos de música). Esses jovens relatam que se eles
frequentarem a pista de skate, que é o local onde os funkeiros ficam, eles são
desrespeitados.
Quando o espaço - ou um segmento dele - assim demarcado torna-se
ponto de referência para distinguir determinado grupo de
frequentadores como pertencentes a uma rede de relações, recebe o
nome de "pedaço”. (p.13)
16 Tiago, 19 anos, aponta que para ficar com seu namorado Rodrigo, eles preferem ir para a Praça Roosevelt, no
centro da cidade, pois lá, além de se sentirem livres para se relacionar, eles também frequentam a Vieira de Carvalho,
uma rua próxima ao Largo do Arouche, bairro conhecido pelos frequentadores como um pedaço LGBT.
30
jovem Gustavo disse que é preciso pagar para jogar nesse campo, em média uma
camiseta do time custa R$ 100,00. Porém, também há uma quadra em que se pode
observar mais jovens jogando e crianças, ali não se paga para jogar.
A parte do skate é composta em sua maioria por homens, jovens,
héteros, que andam de skate. Quando perguntados sobre a convivência entre os grupos
da praça, os skatistas responderam que há uma grande harmonia entre eles, ao contrário
do grupo LGBT, que identifica diversos conflitos.
Dentro do Bowl acontece o Samba do Bowl e o Sarau 7 Jovens, sendo
que essa confraternização acontece atualmente de 15 em 15 dias. No Samba do Bowl
estão presentes homens, mulheres e crianças, famílias brasileiras e bolivianas habitantes
do bairro do Jardim Elisa Maria, sendo a maioria dos frequentadores, jovens. Na Praça,
o jovem Lucas também realizou, em parceria com a Prefeitura e a Secretaria de Direitos
Humanos, a exibição de filmes do Festival Entre Todos, no mês de setembro de 2015.
Lucas, em conjunto com outros jovens da Brasilândia, conseguiu que a reforma da
Praça 7 Jovens acontecesse neste ano de 2015. Primeiro reformaram uma metade da
Praça, e depois a outra, para que os Jovens não ficassem sem espaço de convivência. A
reforma continua em processo, mais adiante, no capítulo 7, vou descrever e analisar
como Lucas e os outros jovens da Praça conquistaram esta vitória.
Formatado: Fonte: (Padrão) Times New Roman, 12 pt
31
“Em luta pela melhora da nossa quebrada e nossa Praça Sete Jovens ....
hoje estivemos em reunião com o sub prefeito Sr. Alexandre que nos recebeu muito
bem, a quebrada agradece...” (Renan – jovem negro – Praça 7 Jovens)17
A reforma continua em processo, desde quando a Praça foi aberta em
2008, os jovens falam que o mais difícil seria na verdade manter o local bem cuidado.
Os jovens juntam dinheiro para comprar cimento, areia, e outros materiais para fazer a
reforma da pista de skate. Vão a subprefeitura para conversar com o subprefeito sobre
como anda o planejamento da reforma da praça. Envolvem-se em editais, como uma
forma de gerir o espaço público. Atuam junto ao poder público na gestão desta praça de
forma participativa.
Quando acontecem atividades culturais, os conflitos segregacionistas dos
grupos se dissipam, e os skatistas, funkeiros, LGBTs, sambistas, grafiteiros, todos
passam a conviver em um mesmo espaço físico, o Bowl. Acredito que seja devido a
ocorrer dentro do Bowl um momento de interação entre os grupos, por meio da música
e das poesias.
A partir da chacina de 2014 e suas repercussões no bairro, a vida da praça
mudou, hoje é um lugar em que habitam rodas de samba, grupos de rap e grafite, os
jovens jogam futebol e andam de skate. Alguns jovens que cresceram no bairro, como
Lucas, sempre estão em articulações políticas para conseguir melhorias para a praça, por
exemplo, este ano de 2016 conseguiram a reforma da praça junto a subprefeitura, com
novos brinquedos para o parquinho das crianças, além de uma quadra de futebol com
gramado e a reforma da pista de skate.
A Praça 7 Jovens tem todas as suas paredes grafitadas, relembrando
principalmente os sete jovens que foram assassinados na Rua Olga Benário, antes da
praça existir no bairro. Os grafites são feitos pelos próprios frequentadores da praça. A
prefeitura às vezes fornece tintas e sprays para o pessoal fazer os grafites.
A seguir falarei sobre as personagens da cena cultural desse território da
Brasilândia, sua formação política, influências culturais e das militâncias mais antigas
do bairro que os inspiraram, Maria e Luiz.
Sarau da Brasa
17
Texto retirado da legenda da foto de uma rede social
32
Samba do Bowl
Lucas – Lucas é o jovem grafiteiro da Praça 7 Jovens, ele é o
responsável pelo samba do Bowl. Lucas possui o sonho de cursar filosofia ou artes em
uma faculdade. Lucas é grafiteiro e ministra oficinas de grafite nos Centros Culturais.
Seu estilo é alternativo, possui diversas tatuagens pelo corpo, e pinta seus tênis com
spray. Ele enxerga em Luiz um grande formador, que proporcionou a eles a experiência
de ser um protagonista político. Lucas trabalhou na prefeitura no programa “De Braços
Abertos”, um programa da área da assistência social, que atuava com a população em
situação de rua, na Cracolândia, na região do bairro da Luz, em São Paulo.
33
“E aí a gente foi, a ABC Palmares (organização da qual o Luiz faz parte) era ali na rua
da feira, eu depois da minha campanha eu mantive o lugar, eu pagava o aluguel com o
meu salário, a Dona Marta cobrava R$ 250,00 por mês, e aí eu mantive lá como espaço
de organização, de fazer os eventos, de organizar grupos populares, enfim eu tentei de
tudo, nessa coisa de fazer a revolução. Achava que era isso que precisava, formar
34
lideranças, tem que formar mais lideranças, não adianta “vote em mim que eu vou
resolver o problema de vocês” eu nunca acreditei nisso.” Luiz
Rádio Cantareira
Pedro – Pedro, jovem, pardo, 31 anos, nascido na Freguesia do Ó,
atualmente mora no Jd. Carumbé, Distrito da Brasilândia. Não possui orientação
religiosa, mas segue uma tradição cristã. É graduado bacharel em Ciências Sociais.
Começou a trabalhar na área gráfica com 19 anos, durante 7 anos.
Pedro, em seu estilo, possui dreads e barba. Sempre está com sandálias
de couro.
Participou do programa Jovens Urbanos, do Itaú Social, onde adquiriu
uma nova perspectiva, expandido seus conhecimentos que tivera adquirido na rádio
Cantareira.
Relembra que quando ingressou na faculdade teve dificuldade em
continuar em um trabalho de 9 horas por dia, decidindo ir para área da cultura. Porém,
relata a falta de estabilidade financeira na área.
Em 2010 começou a ser educador na rádio Cantareira. Esta rádio possui
outorga da Anatel, porém existe há 15 anos como rádio pirata. Pedro trabalha com arte
educação. Considera que no período de 2015 e 2016 foi um grande período de grande
militância política e muito importante para sua formação profissional.
Atuou no Centro e Desenvolvimento Social Produtivo, de 2015, a maio
de 2016. E atualmente trabalha no Centro de Convivência É de Lei. Trabalha em 3
projetos para formar uma grade de 40h semanais, mais ou menos.
Pedro começa a atuar politicamente no bairro da Brasilândia devido sua
participação em uma igreja, participa da Rede Ecumênica de esquerda, que é onde inicia
sua militância em 2010. Em 2011 entra no – Organização de Esquerda de Juventude , e
inicia uma célula (grupo) na Brasilândia, essa célula não possui muito êxito, mas
houveram algumas ações como em 2013, com a eleição municipal, em que houve um
debate em Taipas, que foi promovido pela igreja católica, e eles levaram um manifesto
da juventude fazendo uma intervenção no meio do debate, dizendo que a juventude não
quer só comida, mas também diversão e arte. Pedro acha que não foram ouvidos nesse
dia.
35
Junto a uma rede de esquerda religiosa, inicia um cine debate sobre temas
como raça, gênero, no Elisa Maria. Ele dá início ao cursinho popular em 2008, com sua
irmã e seu irmão: um cursinho pré-vestibulinho.
A BRASILÂNDIA
18
19
Na Brasilândia dos anos 1970, como ainda hoje, as crianças mais velhas
cuidavam de seus irmãos mais novos para que seus pais pudessem ir trabalhar.
Os terrenos eram minúsculos, as ruas estreitas e sem praças públicas. O
território do distrito de Brasilândia é de 31,5 Km². Seus principais bairros são:
Brasilândia, Jardim Guarani, Vila Penteado, Jardim Paulistano, Jardim Elisa Maria. O
distrito da Brasilândia, comparado a outros bairros de São Paulo, até mesmo com a
Freguesia do Ó, apresenta altos riscos de vulnerabilidade social, além do alto índice de
violência.
18
Crianças lavando roupas no rio das Pedras, Parque Pedroso, atrás do Circo Escola. 1970. Foto: Sonia
Bischain
19
Vila Penteado. Brasilândia. 1970. Foto: Sonia Bischain
37
20
21
20
Brasilândia. 1982. Foto: Sonia Bischain
21
Disponível em:
http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/subprefeituras/subprefeituras/mapa/index.php?p=1489
4
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22
22
Destaque para o distrito de Freguesia do Ó/ Brasilândia. Disponível em:
http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/subprefeituras/freguesia_brasilandia/mapas/index.php?
p=143
23
Índice Paulista de Vulnerabilidade Social. ROSA (2016). Disponível em: http://indices-
ilp.al.sp.gov.br/view/index.php#
39
24
Índices acima de 65 pontos são indicativos de alta vulnerabilidade
40
anos não frequentam a escola e mais de 50% não concluíram o ensino médio na
Brasilândia.
Na Brasilândia temos o registro dos primeiro terreiros de São Paulo e
também o nascimento da Escola de Samba Rosas de Ouro, que hoje encontra-se
próxima a ponte da Freguesia do Ó.
Formação étnica
Índios, brancos, negros
Iniciaram a evolução
E seus nomes e seus feitos
A nossa história contarão
Segura o negro
Esse negro
Quer fugir pro quilombo dos palmares
Onde está o rei zumbi26
25
Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Rosas_de_Ouro. Acesso em: 20 de janeiro de 2017
26
Disponível em: http://www.letras.com.br/samba-enredo/rosas-de-ouro-samba-enredo-1973. Acesso em:
20 de janeiro de 2017.
41
A letra desse samba nos traz a reflexão sobre a importância das questões
raciais no bairro, sua intensa composição negra e a reflexão sobre o passado escravista
do Brasil, formando assim zonas autônomas como os quilombos. Contemporaneamente,
os espaços urbanos de maior composição negra são as favelas, regiões afastadas do
centro, com maiores situações de vulnerabilidade social e pobreza.
Durante as entrevistas, Joaquim, outro jovem promotor cultural, afirma
que a resistência de hoje é fruto da resistência dos primeiros moradores que estavam lá e
faziam essa resistência por meio do samba e dos terreiros. E hoje os jovens perpetuam
essa resistência negra na Brasilândia.
A CHACINA DE 2007
“Tinha 7 jovens ali na Rua Olga Benário, ali perto do escadão, de repente
chegou um carro tipo Gol, com os vidros escuros tal, e desceram uns caras encapuzados,
‘polícia, polícia, mão na cabeça, virado pro muro’ e eles começaram a dar tiro nos 7
jovens, os caras são tão covardes que eles conseguiram matar seis e um eles… [silêncio]
O menininho ficou cego de um olho e está vivendo em outro Estado, os outros seis
morreram. E dois desses seis eram irmãos. Na época, a mídia, a imprensa e os
moradores aqui da região, inclusive instituições da região, inclusive ONGs da região,
“Ah! é tretas de jovens envolvidos com o tráfico…“
27
Disponível em: http://negrobelchior.cartacapital.com.br/mais-uma-chacina-de-jovens-ate-quando/.
Acesso: 27 de janeiro de 2017
42
anos. Estes seis foram assassinados e um jovem ainda está vivo: Leandro Siqueira, o
Mineirinho, com 19 anos na época.
Uma das chacinas que o coronel investigava era a chacina dos 7 jovens,
retratada neste trabalho, ocorrida na Rua Olga Benário, em fevereiro de 2007. Sete das
treze chacinas que ocorreram na cidade de São Paulo em 2007, foram na Zona Norte.
Ao menos 34 pessoas morreram na região, sendo na cidade, ao todo, 58 mortes. Dessas
chacinas que ocorreram na Zona Norte, quatro foram esclarecidas em uma investigação
com a participação da Corregedoria da PM e do comando regional. Em todas havia
participação de PMs que foram presos.28
A Operação Saturação
28 Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2008/01/364408-coronel-morto-em-sp-investigava-
atuacao-de-seus-subordinados-em-chacinas.shtml. Folha de S.Paulo da Folha Online.17/01/2008-10h44
29
Disponível em: http://www.cantareira.org/noticias/periferia-brasilandia-manifesto-chacina-2014.
Acesso em: 24 de janeiro de 2017
30
Disponível em: http://www.saopaulo.sp.gov.br/spnoticias/lenoticia.php?id=87524. Data: 06/09/2007.
Acesso em: 24 de janeiro de 2017
43
uma operação para “pacificação” das favelas. Além dessa operação, houve também a
realização da “Virada Social”, realizada em uma parceria entre Governo do Estado,
Prefeitura e Sociedade Civil. A região do Elisa Maria foi escolhida, pois no início do
ano de 2007 aconteceram 3 chacinas.
Ao longo de 81 dias, 600 PMs, com 160 viaturas, realizaram a operação
saturação nos bairros do distrito da Brasilândia, incluindo o Jardim Elisa Maria, onde
fica hoje a Praça 7 Jovens, e onde ocorreu a chacina de 2007.
Segue a descrição desta operação da perspectiva de um dos antigos
moradores do bairro:
“Só que nessa fita, decorrência da morte desses jovens, um
mês depois, o Governo do Estado, óbvio, montou a operação
saturação que é um grande palco, botaram, sei lá, uns 500
policiais aqui, aqueles caminhão grandão, os cara ficava aqui no
morro. Você passava todo dia pela mesma rua, os cara pedia a
sua identidade, os cara já sabia, mas ele tinha lá a meta de pedir
identificação para não sei quantas pessoas.
Porque eles vieram com o discurso que aquilo lá foi uma treta
das pessoas daqui e que, portanto, deveriam fazer uma
pacificação da quebrada. O problema era aqui” Luiz
Como podemos observar na fala do senhor Luiz, na Operação Saturação
ocorre o que Feltran (2011) chama de homogeneização da periferia, em que
trabalhadores e bandidos são tratados como suspeitos, na mesma categoria. Em sua fala,
Luiz apresenta o desrespeito que os moradores da periferia sofrem, relata como eles
apesar de pagarem seus impostos, não são tratados como cidadãos, mas como suspeitos,
em que há a necessidade de se mostrar o RG, uma forma de controle e coerção dos
corpos periféricos.
A PRAÇA 7 JOVENS
31
Disponível em: http://www.soudapaz.org/o-que-fazemos/video/moradores-contam-como-foi-a-
participacao-da-comunidade-no-projeto. Acesso em: 27 de janeiro de 2017
45
prefeitura, o banco Sul América e o Instituto Sou da Paz. O projeto da praça foi
construído conjuntamente com a comunidade. Valdir Assef Junior, da ONG, diz que
“existe um movimento interessante, as pessoas começaram a participar, o que representa
um indicativo de mudança”.
Durante o evento foi contada a história do bairro, como surgiu, como foi
construído, de que modo as famílias vieram para a região, a história o loteamento, entre
outras narrativas. É muito interessante pensar que em 2008 houve esse resgate que
talvez as pessoas mais jovens não soubessem.
Em 1984, foi lançado o loteamento do Jardim Tereza. A recém-criada
comunidade do Jardim Tereza começou então a se organizar e acabou fundando a
SAJAT, Sociedade de Amigos do Jardim Tereza, presidida pelo finado Teófilo, morador
da Rua 10, hoje Rua Carlos Marighella. No ano de 1987, na casa do Teófilo, diversas
pessoas definiram os nomes das ruas do Bairro, que homenageiam heróis populares do
Brasil e do mundo. Olga Benário, Pedro Pomar, Carlos Lamarca, Patrice Lumumba,
Carlos Marighella, Steve Biko, Joaquim Câmara Ferreira, Augusto Cesar Sandino,
Rubens Paiva e Carlos Mattiz são alguns exemplos. Além dos nomes das ruas, foram
conquistadas condições básicas, como água, luz, esgoto, asfalto, enfim, a urbanização
do bairro. Essas melhorias aconteceram no então recém-eleito governo de Luiza
Erundina, em 1989. Mas o local não era iluminado, o mato crescia e o local oferecia
pouco lazer. A segurança pública passou então a ser um dos problemas vividos pela
comunidade.
Essa Praça foi construída em conjunto entre o Sou da Paz e o Sul
América, Luiz cita e agradece no palco os grupos e pessoas que ajudaram a financiar a
construção da Praça. Primeiramente pedem uma salva de palmas para os moradores que
ajudaram a fazer e a pensar como seria a praça, agradeceram os trabalhadores e
trabalhadoras anônimos (destaco o fato de Luiz ter citado primeiro os trabalhadores
anônimos, dando ênfase ao trabalho conjunto dos moradores do bairro). O arquiteto
Alexandre, a EMETEC, empresa que gerenciou a obra e ao DEPAV que forneceu mudas
das árvores, ao Guilherme Petrella – paisagista – e ao Vitor Castro, que acompanhou a
obra da pista de skate junto ao mano Vras, o Valmir.
Agradeceram também a Coordenadoria de Obras da Subprefeitura e a
ILUME, que trouxe iluminação à praça. Além da Sudeste Construtora, o Instituto Sou
da Paz, a SulAmérica e a Agência de Cultura.
“E queremos aproveitar para agradecer a todas as pessoas de nossa
comunidade que vem contribuindo para a realização de mais um sonho em nossa
quebrada.” (Luiz)
48
SARAU DA BRASA
32
Nome fictício
49
33
33
Foto do Sarau da Brasa, 18 de fevereiro de 2016, por Fernando Bischain. Disponível em:
https://www.facebook.com/photo.php?fbid=138584709861350&set=a.138585836527904.1073741827.10001129465
8068&type=3&theater
50
foi lançado no Sarau da Brasa e no Samba do Bowl. Há muitas pessoas em comum que
frequentam os dois saraus, por serem próximos um do outro.
da Polícia Militar, o fechamento das escolas públicas pelo Governo do Estado de São
Paulo, entre outros problemas.
A CHACINA DE 2014
A chacina de 2014
34 Disponível em:
https://www.google.com.br/search?q=chacina+2007+olga+benario&espv=2&biw=1366&bih=613&source=lnms&tb
m=isch&sa=X&ved=0ahUKEwjji-Pss8fRAhVGH5AKHVCkB3wQ_AUIBigB#imgrc=ylGpiOhthWgP3M%3A
52
Eberton Silva de Castro foi levado por seus familiares ao hospital, havia
sido gravemente ferido por coronhadas, murros e pontapés na cabeça.
A ocorrência foi registrada no 72º distrito policial de Vila Penteado. A
perícia ocorreu de forma suspeita, sendo extremamente rápida e no escuro da noite. No
dia seguinte os jovens que estavam no local foram ameaçados por policiais, e no dia 17
de abril de 2014, quando colocavam faixas de protesto na Praça, também foram
ameaçados por um motoqueiro (alguns policiais ouviram e nada falaram).35 Podemos
observar nesses relatos evidentes violações dos Direitos Humanos, após serem coagidos
e agredidos, os jovens ainda são ameaçados, ou seja, o controle mais uma vez se
instaura na periferia, os sujeitos periféricos são vistos como suspeitos padrão que não
tem direito sequer a um julgamento, são sujeitos vistos pelo Estado como menos
humanos, sujeitos que são passíveis de morte.
35
Disponível em: http://negrobelchior.cartacapital.com.br/mais-uma-chacina-de-jovens-ate-quando/.
Acesso: 27 de janeiro de 2017
53
Esse manifesto foi lido no palco no dia desse show com o intuito de
divulgar o que estava acontecendo para a população daquela região, e o meio
encontrado foi ler esse manifesto escrito pelo jovem Pedro, da Rádio Cantareira, em
conjunto ao Observátório da Juventude do CCJ, e outras organizações da esquerda. Os
jovens estenderam uma faixa no palco durante o show, leram o manifesto e fizeram uma
fala contra o genocídio da juventude pobre, preta e periférica.
36
Este manifesto diz que a Praça foi inaugurada em 2011, mas segundo Luiz e outros moradores, a
inauguração ocorreu em 2008.
55
37
Disponível em: sp.levante.org.br/2014/05/manifesto-contra-as-chacinas-jovens.html. Acesso em julho de 2016.
56
38
Lucas conta que o samba foi invadido por policiais que não permitiram
que o samba acontecesse. No manifesto divulgado pela Rádio Cantareira, também é
relatado o fato do samba ser interrompido pela polícia.
Como podemos ler nesse trecho, essas vidas menos humanas são negadas
do direito à informação também. Há um grande silêncio até mesmo nos bairros que
ocorrem chacinas, não se fala sobre isso, não é registrada uma memória, e essa violência
torna-se rotina, acaba sendo normal. Não há questionamento dos grandes intelectuais
brasileiros, políticos, juízes, sociedade, etc. O que está acontecendo com a vida desses
jovens? Por que é proibido o direito a livre manifestação? Por que são perseguidos
quando tentam articular-se para lutar contra a violência que mata seus amigos e
parentes? Não sabemos. O Estado Brasileiro continua a arquivar e manter sobre segredo
de justiça casos como esse, que caem no esquecimento da população em geral.
38
Foto da Praça 7 Jovens, no local onde aconteceu a chacina de 2014, no dia seguinte.
39
Disponível em: http://www.cantareira.org/noticias/periferia-brasilandia-manifesto-chacina-2014
57
Luiz relata que estava com o joelho machucado neste dia, e que por isso
não se colocou a frente da manifestação, foram as famílias dos jovens e os amigos que
se envolveram e realizaram a manifestação na Avenida Cantídio Sampaio. O objetivo
era chamar atenção da população para a chacina acontecida.
encarcerados pela polícia, subiam os escadões correndo, a polícia batia e atirava balas
de borracha nos jovens, crianças e adultos sem dó. Foi um dia de extrema repressão
policial, mais uma vez a periferia foi calada pelo Estado. Não houve direito a livre
manifestação.
40
40
Perifa Livre fotos do álbum "Repressão policial na caminhada contra chacina jovens".
Data: 29 de maio de 2014 ·
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Disponível em: https://www.facebook.com/PeriferiaemMovimento/posts/712668275460392
60
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Nessa foto podemos observar uma placa que diz “Fora Temer”. Esta
placa se refere a Michel Temer, atual presidente do Brasil, que entrou após o
impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores.
As mulheres no sarau
42
Essa foto é de 09 de agosto de 2016, um sarau que aconteceu na Praça 7 Jovens, em que o Sarau da Brasa, as Mães
de Maio e o Coletivo Perifatividade realizaram um encontro e um sarau em conjunto.
43
Foto do Samba do Bowl
62
da Brasilândia são mães dos 14 aos 17 anos, o que priva as mulheres negras de ocupar
esses espaços.
Ainda há a disputa com os meninos, os homens, que reproduzem o
machismo e se colocam em todos os espaços como os protagonistas dos poemas,
músicas, rodas de samba. Porém, as mulheres buscam outra forma, outros espaços, para
expressarem sua voz.
Servi Elas - Surgiu da necessidade de dar visibilidade para as
mulheres dentro das cenas do saraus. A gente enxergava muito a
questão da invisibilidade, não que a gente não tivesse voz, o problema
é que às vezes a gente não tinha ouvido. Mas sempre tem a balança,
como é na sociedade mesmo né. O homem sempre tá ali, com toda a
voz todo mundo sempre vai escutar ele. Ele pode dizer o que ele
quiser, que ele vai ser ouvido e a mulher não. A mulher foi reclamar
de alguma coisa aí ela é chata. Ela é feminista né. Feminazi né. A
mulher é tudo, então aí a gente formou Servir Elas, e a gente via muito
machismo dentro das cenas do Sarau. E aí a gente lançou uma tag que
era #eunãopoetizomachismo. E aí foi crescendo né, o Servir Elas
cresceu como “as chata”, “As feminazi”, que aterroriza a vida dos
artistas dentro das cenas dos saraus. Estamos na luta assim né, uma
ajudando a outra e se unindo. (Ariane – entrevistada)
44
Disponível em: http://globofilmes.globo.com/filme/antonia/
63
de pesquisadora), que falava em sua música sobre sua trajetória no RAP, contava que
ser preto estava na moda e que ele sofria preconceito por ser branco (isso foi relatado na
música “O Lobo Solitário”). Ao redor, observei que as pessoas, em sua maioria negra,
estavam ficando revoltadas com essa letra da música. Logo após sua apresentação,
Ariane45, mulher jovem e negra, educadora social e poetiza, respondeu ao RAP “Lobo
Solitário” com uma poesia sobre a mulher negra e como o povo negro lutou desde a
escravidão para que hoje mulheres negras possam andar nas ruas com seus cabelos
crespos sem alisar. Ela também ressaltou que ser negro não é moda, ser negro é um
processo de autoafirmação de sua identidade e luta.
45
Nome fictício
65
equiparado entre os mais ricos e os mais pobres, e não fornece o mínimo para um
Estado de bem estar social, que coloca o Estado como provedor da cidadania, ou seja, os
sub-cidadãos das periferias não são vistos pelo Estado como os que moram em regiões
centrais, e o Estado não fornece o mínimo para que seja possível uma vida neste local,
como saúde, educação, transporte, trabalho, entre outros direitos.
Ariane, que participa do Samba do Bowl, vê que nesse momento há uma
ampliação dos saraus em São Paulo e que as quebradas se ajudam na construção de
saraus, cada dia a quebrada mostra mais que é “nois por nois”, que se não há pressão da
periferia não sai edital, fomento nenhum, e onde não há cultura a violência vira
espetáculo.
Lucas conta que quando a polícia chegou às 7h da manhã, disse que não
haveria negociação, mesmo eles não possuindo mandado de prisão para os jovens:
1) Lucas relata como foi o tratamento durante a prisão. Os menores de idade foram
liberados, pois seus pais foram buscá-los e tiveram que assinar sua liberação.
Porém houve presos, inclusive o próprio Lucas, que ficaram contidos por 36
horas. O jovem retrata maus tratos, humilhação, ameaças e ficaram presos junto
a outros presos comuns. Lucas diz que ele e os outros jovens possuíram apoio de
advogados ligados a ONGs que defendem os direitos humanos. Nesse dia
algumas personalidades estavam presentes como Mano Brow e Eduardo
Suplicy.
e traz de volta para ele a esperança na luta por uma vida mais digna. Joaquim diz que
apoiou esses jovens cedendo o espaço do Sarau da Brasa para que eles se organizassem,
e que o Sarau da Brasa encontra-se disposto a colaborar com os jovens das ocupações,
tanto das escolas públicas, como das casas de cultura.
Essa forma de articulação se mostra como esperança na fala dos
moradores, esse apoio da luta, recebido por artistas como o Mano Brown, símbolo do
RAP em São Paulo e da luta das periferias no Capão Redondo, advogados ativistas que
asseguram o lado jurídico da Lei do qual os moradores estão desprovidos. A força vinda
de outra comunidade e esse vínculo de identidade que faz com que a luta da zona sul e
da zona norte tornem-se uma só: a luta por direitos dos sujeitos periféricos.
Apesar de a comunidade ainda não ser articulada na Brasilândia como é
no Capão Redondo, as atividades como Sarau da Brasa, Samba do Bowl, Sarau 7
Jovens, as ocupações de escolas ocorridas em 2015 e 2016, a ocupação da Fábrica de
Cultura, a transformação do “Pastão” em Praça 7 Jovens, todos esses acontecimentos
demonstram que os jovens promotores culturais vêm se articulando e inspirando-se em
outros bairros que estão em outro nível de progresso político e consciente em suas
localidades.
71
CONSIDERAÇÕES FINAIS
foram tidos como mercadorias e até hoje sofrem a discriminação devido a sua cor e suas
identidades, como o funk e religiões de matrizes africanas.
O Samba do Bowl e o Sarau do Brasa se colocam em manifestações,
articulações na internet nas redes sociais, organizam-se divulgando os atos. Por
exemplo, o ato ocorrido em 2014, mesmo que não possam comparecer porque estão em
horário de trabalho, mas durante a pesquisa e as entrevistas observei na fala de todos os
entrevistados uma imensa preocupação com a violência presente no bairro e a esperança
que o espaço da arte e da cultura seja um espaço de combate a essa opressão presente no
espaço da periferia. Nos saraus, uma forma de vínculo é instaurada e assim começa uma
formação política desses jovens em que eles começam a atuar junto a outros jovens para
lutar pelos seus direitos de cidadãos em seus bairros.
Alguns jovens se sentem ameaçados pela polícia, como Lucas e Gustavo,
durante o ato de 2014. Os jovens da Praça 7 Jovens tiveram até que passar um tempo
afastados de seu território, devido ameaças sofridas pela polícia. O que causa, em minha
análise, um certo enfraquecimento das articulações locais, devido a ameaças e ao medo.
Para ocupar o espaço público, esses jovens também precisaram negociar
com o tráfico de drogas na região, usando de sua retórica para convencê-los da
importância de um espaço de lazer, sem violência não só para outros moradores do
bairro, como para as próprias famílias dos traficantes. O que fez com que o acordo
obtivesse sucesso.
Os 7 jovens mortos, e que são lembrados nesta monografia, são a
semente que o Estado buscou matar, mas que continua a florescer nos diversos saraus,
ocupações de escolas, de fábricas de cultura, de resistência, resistência esta vinda da
força dos sobreviventes de um país que nasce com nome de comodite, ou seja, nasce
como colônia para ser vendido, porém todos continuam a enfrentar esse Estado opressor
de direitos.
74
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
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brasileiros, 2013.
Disponível em: https://issuu.com/participatorio/docs/agenda_juventude_brasil_-
_pesquisa_. Acesso em: 20 de janeiro de 2017
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crimes cometidos contra a vida de jovens brasileiros. PUC. São Paulo. 2017
ALESSI, GIL. Bairro com nomes de revolucionários sofre com violência da PM de SP. Disponível
em:http://brasil.elpais.com/brasil/2015/01/15/politica/1421338657_543399.html. Acesso
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FACCHINI, Regina. “Não faz mal pensar que não se está só”: estilo, produção cultural
e feminismo entre as minas do rock em São Paulo. Cadernos Pagu. São Paulo, 2011
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VIANNA, Adriana; FARIAS, Juliana. A guerra das mães: dor e política em situações
de violência institucional. Cadernos Pagu (37), julho-dezembro de 2011:79-116.
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