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histórias para
inspirar sua jornada
empreendedora
Um exemplo para chamar de seu
50 histórias para inspirar sua jornada empreendedora . Um exemplo para chamar de seu introdução

INTRODUÇÃO
Empreender, para muitos, é um sonho que nunca se realiza. Para A melhor definição de empreender, para mim, é: independente-
outros, uma opção – ou a falta dela. E para outros, poucos, é voca- mente de tamanho, a capacidade que se tem de realizar o máximo
ção. A Endeavor, ao longo dos seus mais de quinze anos e mais de com o mínimo. É por acreditar nisso que tenho a certeza de que,
1.800 empreendedores apoiados, junto ao Sebrae e seus mais de somado à educação, não existe meio de transformação social mais
quarenta anos de experiência apoiando empreendedores do norte poderoso que o empreendedorismo.
ao sul do Brasil, vem conseguindo fomentar o empreendedorismo
de maneira legítima. São histórias como as que você lê a seguir, com seus “homens e
mulheres incríveis” que ajudam a fazer do mundo um lugar melhor.
Assim que comecei a ler as histórias escritas neste e-book, me
veio à cabeça o título de um filme antigo: “Esses homens magní-
ficos e suas máquinas voadoras”. Porque me veio à mente a ima-
gem de homens e mulheres entusiasmados com suas inspirações
e suas equipes.
Mario Chady
Gente que constrói cultura, que sonha e realiza junto e, acima de Fundador do Grupo Trigo
tudo, constrói uma sociedade mais inclusiva e justa. Empreendedor Endeavor desde 2003
capítulo 01 | SENTI NA PELE
Empreendedores que usaram a experiência
de vida para mudar grandes mercados

Conexão Profunda 10
A História de Roberto Nogueira, da Brisanet

sumário
50 histórias para
Construtores de Sonhos 15
A História de Expedito Arena e Altino Cristofoletti, da Casa do Construtor
Felicidade Acima de Tudo 18
A História de Cris, Guarany, Bruno e Fernando, da Confiance Medical
inspirar sua jornada
empreendedora. A Sorte Persegue a Ousadia 21
A História de Felix da Silva, Empreendedor da Escola24Horas
Um exemplo para
chamar de seu Lições da Escola da Vida 27
Conheça o Day1 de Edivan Costa, da SEDI
Se o Negócio Quebra, Começa de Novo 28
A História de Wilson Poit
Um Pouco de Todo Mundo 33
O Day1 de Sofia Esteves
Levar Luz Para Onde Falta 34
A História de Darci Roberto Schneid, da Sirtec
A revolução Digital Começou 39
A História de Eric Santos, Guilherme Lopes, Bruno Ghisi e André
Siqueira, cofundadores da Resultados Digitais
capítulo 02 | EMPREENDEDOR DESDE CRIANCINHA
Ter um emprego estável e salário certo?
Isso passou longe dos sonhos deles.

sumário
É Melhor Devolver do Que Receber 42
A História de Ofli Guimarães e Israel Salmen, do Méliuz
Empoderar o Consumidor 46
50 histórias para A História de Juliana Freitas, Marcelo Filho e José Neto, da FortBrasil
inspirar sua jornada Um Escritório de 1,5 m x 2 m 49
empreendedora. A História de Brian Requarth, da VivaReal
Um exemplo para Os Conselhos Que Eu Não Segui 55
chamar de seu Conheça o Day1 de Salim Mattar, Fundador da Localiza
Amigas, Colegas, Sócias 56
A História de Luciana Guimarães e Vanessa Vazquez, da Íntegra Medical
A Busca Por Um Negócio Perene 62
A História de Lito Rodriguez, da DryWash
Uma História De Superação 67
A História de Eloi D’Avila, Fundador da Flytour
Nascidos Para Empreender 68
A História de Albert Deweik e Roy Nasser, da Neoassist
capítulo 03 | Comece Pequeno, Sonhe Grande
Um carro, uma linha telefônica, algumas economias
suadas: esses empreendedores começaram com quase nada.
Mas compensaram na vontade de realizar

Se Meu Fusca Falasse 72

sumário
50 histórias para
A História de Lisabeth Braun, Fundadora da Dermage
Acredite Em Você, Sempre 75
Conehça o Day1 de Robinson Shiba, fundador do China in Box
Comecei do Negativo 76
inspirar sua jornada A História de Maristela Mafie, do Grupo Máquina
empreendedora.
Um exemplo para
Não Desista Nunca 80
O Day1 de Ozires Silva, Fundador da Embraer
chamar de seu
Sair da Negação e Aceitar a Mudança 81
A História de Fabiana Salles, da Gesto
Fechar as Portas. Abrir Outras 87
A História de Thiago Fiorin, da LojasKD
Mar Calmo Não Faz Bom Marinheiro 90
A História de Jaime de Paula, da Neoway
Inovação Segura 95
A História de Silvio Aragão e Eduardo Ferreira Lima, da Avantia
Louca é Elogio 101
Conheça o Day1 de Linda Rottenberg , Cofundadora da Endeavor
Empreender é Construir 102
Conheça o Day1 de Alexandre Ostrowiecki, Dono da Multilaser
A Coragem de Fazer Acontecer 103
A História de Roberto Alcântara, da Angelus
2 Irmãos e 1 Sonho 106
A História de Marcus e Alexandre, Fundadores da Arizona

sumário
50 histórias para
capítulo 04 | LARGUEI TUDO E FUI VIVER MEU SONHO
Empreendedores deixam empregos consolidados em busca de
inspirar sua jornada uma causa maior: transformar mercados e a si mesmos
empreendedora.
Um exemplo para
Macgyver Do Próprio Negócio 113
A História de Vitor Torres e Fabio Bacarin, da Contabilizei
chamar de seu
A Fórmula Para Ensinar é Não Ter Fórmula 117
A História de Claudio Sassaki e Eduardo Bontemop, da Geekie
A Força do Tombo 121
A História de Alencar de Carvalho e Fabio Piastrelli, fundadores da Gera
Um Centro Médico Para Cada Brasileiro 125
A História de Thomaz e Guilherme, do Dr.Consulta
Máquina De Economia 128
A História de Thiago Alvarez e Benjamin Gleason, do GuiaBolso
Salvar Vidas Mudo Afora 132
A História de Tatsuo Suzuki, Wataru Ueda e Toru Kinjo, da Magnamed
Impressão de Impacto 138
A História de Mate Pencz e Florian
Nas Nuvens, com o Pé no Chão 144
A História de Bruno, Gustavo, Flavio e Felipe, da ZUP
Empreendedorismo é Contagioso 148
A História de Carlos Henrique Alves e Luis Gustavo Milani, da Oilcheck

sumário
50 histórias para
capítulo 05 | Dei a Volta por Cima
Empreendedores que quase quebraram (ou quebraram mesmo)
inspirar sua jornada
empreendedora. Quebrei na Pessoa Física para Salvar a Empresa 153
Um exemplo para A História de Alex Serodio, do Beleza na Web
chamar de seu Todos os Sonhos do Mundo 158
Veja o Day1 de Alphonse Voigt, Cofundador do Ebanx
O que Não Mata, Fortalece 160
A História de Osvaldo e Carla, Fundadores da Gigalink
Admitir a Queda e Se Reerguer 166
A História de Rogério Gabriel, Fundador do Grupo Prepara
O que Não se Aprende em Harvard 169
Conheça o Day1 e o Lado Pouco Conhecido da História de Jorge Paulo Lemann
Reconstruindo um sonho 170
A História de José Rizzo, Empreendedor da Pollux
capítulo 06 | Empreender na Universidade
A faculdade é um momento marcante na vida de grande
parte das pessoas. Na vida desses empreendedores, o sonho

sumário
50 histórias para
grande surgiu ali

4 Anos Sem Vender 176


A História de Igor Santiago, Ronaldo Silva e Danilo Halla, da I.Systems
inspirar sua jornada Acredite no Impossível 180
empreendedora. Conheça o Day1 de Romero Rodrigues, Fundador do Buscapé
Um exemplo para De Recife para o Mundo 181
chamar de seu Conheça a História da In Loco Media
Revolucionar Eventos 188
A História de Gabriel Benarrós e Marcelo Bissuh, da Ingresse
As Conexões que Movem a Vida 192
Conheça o Day1 de Marcelo Sales, Fundador da Movile e da
Aceleradora de Negócios 21212
Desentortando os Pregos 194
A história de Caio Bonatto, Beto Justus e Lucas Maceno, da Tecverde
SENTI
NA PELE
Como empreendedores
usaram a própria
experiência de vida para
mudar grandes mercados

01
senti na pele

CONEXÃO
PROFUNDa
Conheça a história de Roberto Nogueira e da Brisanet, que estão
levando internet por fibra ótica a cidades do interior nordestino.

José Roberto Nogueira nasceu em ro, a apenas alguns quilômetros de


1965 em uma zona rural de Pereiro, distância, que Roberto empreende a
cidade cearense que na época tinha Brisanet, empresa que permite que
apenas 5.000 habitantes, em uma moradores de 115 mil residências de
casa sem vizinhos: ali na região só 150 cidades de Ceará, Rio Grande
moravam ele, os pais e os dez irmãos. do Norte e Paraíba se conectem ao
A família vivia isolada, sem energia mundo em alta velocidade – em 95
elétrica, e cultivava o próprio alimen- mil delas, o acesso a Netflix, YouTu-
to – se não houvesse safra, passava- be e o que for que os olhos queiram
se fome. Uma vida sem conexão. ver, é por fibra óptica, tecnologia que
Roberto Nogueira, ainda está se disseminando mesmo
fundador da Brisanet
51 anos depois, é na mesma Perei- em grandes capitais.
011_senti na pele CONEXÃO PROFUNDA

O empreendedor até se foi do semi- Uma bicicleta motorizada acessíveis para a população, a partir
árido cearense por uns tempos, mas Aos 15, ele começou a fazer um curso de de R$ 59,90 por mês.
sempre quis voltar. “Eu nasci comen- eletrônica por correspondência no Ins-
do o milho e o feijão que a gente plan- tituto Universal Brasileiro. Passou a fa- Entre os 15 e os 16 anos, duas tecnolo-
tava ali. Meus átomos saíram daque- zer pequenos consertos em forrageiros gias transformadoras chegaram che-
la terra”, conta ele. “Quando você sai (cortadores de capim), rádios, motores, garam à casa da família de Roberto: a
da sua cidade com uma certa idade, eletrodomésticos….Mas sem remunera- energia elétrica e a televisão. Ele ado-
conhece o mundo por outro ângulo ção: o que valia era o aprendizado. rava os programas que falavam de ci-
/ e tem vontade de voltar e resolver o ência, um em especial: Cosmos, exi-
problema da sua região. E gerar ne- Uma bicicleta usada (pela qual ele eco- bido no Brasil pela Rede Globo. Nele,
Uma bicicleta gócio.” nomizou por seis anos) ganhou as hé- o cientista Carl Sagan falava de uma
usada (pela lices de um pequeno motor. Assim, ele ampla gama de temas, como a origem
qual ele De resolver problemas, ele entende. não precisava pedalar. da vida, astronomia e o nosso lugar no
E se a questão envolver algo elétrico Universo. “Isso consolidou minha von-
economizou ou eletrônico, melhor ainda. Um co- Essa paixão pelo funcionamento de tade de estudar eletrônica”, conta o
por seis anos) nhecimento que é resultado de déca- “geringonças” traz resultados até empreendedor.
ganhou as das de curiosidade e estudo: quando hoje: foi o empreendedor quem pro-
tinha 13 anos, o pai comprou um rá- jetou e construiu torres e antenas que Também pela TV ele soube da existên-
hélices de um dio para a família (de pilha, porque a Brisanet usa para levar internet via cia da Embraer e nutriu a vontade de
pequeno motor. a energia elétrica não havia chega- rádio, o modelo inicial da empresa, trabalhar na empresa (fabricar aviões
Assim, ele do ainda). Roberto foi logo abrindo o às casas do sertão. Os equipamen- não era o mesmo que criar naves que
equipamento para entender como ele tos de tecnologia e fabricação própria pudessem levar ao espaço extraterres-
não precisava funcionava – afinal, quem é que esta- permitem que a Brisanet ofereça co- tre, retratado por Segan na série, mas já
pedalar. va falando dentro do aparelho? nexão em cidades afastadas a custos era uma bela viagem).
012_senti na pele CONEXÃO PROFUNDA

Aos 21 anos, Roberto vendeu a bicicleta motori- um negócio formal. Em 1989, ele abriu uma loja O empreendedor conseguiu convencer prefeitos
zada, comprou uma passagem de ônibus e partiu de PCs que também fazia manutenção. Depois, de várias cidades a mandar pessoas para fazer o
rumo a São José dos Campos, sede da Embraer, passou a desenvolver antenas parabólicas e má- treinamento, sob a justificativa de que essa mão
a mais de 2.700 km de distância, mas já pensava quinas para fabricá-las. de obra seria importante no futuro.
em voltar. O sonho: juntar dinheiro para montar
uma oficina de conserto de rádio e televisão em Esse estabelecimento foi de fundamental impor- Conexão iniciada
Pereiro. tância para a Brisanet: dava tanto faturamento Em 1996, a internet começou a operar de forma
que financiou por muitos anos o negócio de in- comercial no Brasil. Roberto se animou rapida-
Ao chegar, foi vender roupa porta a porta para ternet no Nordeste, que levou alguns anos até mente. Primeiro, se associou a um colega que ti-
sobreviver e matriculou-se em um curso técni- andar com as próprias pernas. Afinal, era preciso nha um provedor de internet discada para ofe-
co de eletrônica para ter um diploma — no fim, abrir um mercado, um trabalho que já dura mais recer o serviço em São José dos Campos, mas
achou que não valeu muito a pena do ponto de de duas décadas. sempre tendo Pereiro em mente: queria levar a
vista do conhecimento. “Como eu estudei muito rede para lá: mas como fazer isso, já que na épo-
tempo sozinho, já sabia muito”, conta. Mas a cer- Roberto tentou vender apenas um computador ca o sistema disponível era o de conexão disca-
tificação deu frutos: um ano depois, lá estava ele em sua região-natal em 1991. Nada feito: não ha- da. Na região, pouquíssimas casas tinham linha
trabalhando na Embraer. via ninguém interessado na máquina no raio de telefônica.
300 km que ele visitou. No ano seguinte, voltou
Uma loja de computadores com 30 PCs. A ideia era criar uma escola de infor- Foi aí que o empreendedor colocou novamen-
Lá, seu trabalho principal era instalar painéis em mática para preparar a população para usá-los. te sua versão “professor Pardal” para funcionar:
aviões. Mas, para juntar dinheiro, passou a ven- pegou placas de rádio e as instalou nas antenas
der equipamentos eletrônicos para os colegas e A cidade escolhida para instalar foi Pau dos Fer- que ele fabricava para o sistema de televisão.
começou a ser procurado por gente que estava ros, no Rio Grande do Norte, distante 40 km de Assim, era possível transmitir o sinal de inter-
interessado em computadores, que ele também Pereiro e com uma população maior (hoje, 30 mil net a longas distâncias. Foi testando o sistema
começou a oferecer. O bico deu tão certo virou habitantes), além de ser pólo na região. em São José e conseguindo fazer a rede chegar
013_senti na pele CONEXÃO PROFUNDA

Primeira antena da brisanet, em


1998, ano da sua fundação

cada vez mais longe. O negócio ia bem na ci- “O maior desafio foi fazer a expansão
dade paulista, já tinha clientes, mas um grande sem muitos recursos. o dinheiro que a
player chegou à região para oferecer algo pare- gente tinha era o da loja de informá-
cido, com milhões para investir. Roberto tinha tica e também um pouco de recurso
os recursos vindos da loja de informática. dos irmãos sócios. a brisanet teve de
crescer organicamente”, conta o em-
Inicialmente, o plano era levar o negócio de in- preendedor.
ternet para o sertão no ano 2000, mas a che-
gada do concorrente e um encontro um tanto Ele foi administrando o negócio a distância,
inesperado o fizeram apressar o passo. Ele foi ou na ponte aérea São José-Pereiro até 2007,
visitar em uma feira de informática na cidade quando o negócio estava maduro o suficiente.
de São Paulo e topou com uma pessoa que di-
zia ter planos bem parecidos com os seus. Era Deu certo: em 2010, a Brisanet já era a maior
hora de acelerar a conexão. operadora de internet a rádio do Brasil, com
30 mil clientes em 150 cidades. Dava até para
Durante muito tempo, Roberto trazia morado- se acomodar, certo? Nada disso. O empreen-
res de Pereiro para São José dos Campos para dedor sabia que, com o crescimento para mais
treinar mão de obra na loja de computadores. regiões, e mais antenas distribuídas entre elas,
Resolveu, então, sugerir que alguns voltassem poderia começar a haver problemas de interfe-
para o Nordeste para montar a operação da rência. Para suportar o expansão da empresa,
Brisanet. Irmãos dele também deram um gás à era preciso ir atrás de uma tecnologia melhor.
parte comercial e se tornaram sócios. Em 1998, Pesquisando com fornecedores, chegaram à fi-
o sistema começou a funcionar. bra óptica.
014_senti na pele CONEXÃO PROFUNDA

Hoje, a Brisanet leva esses cabos tecnológicos para a


frente de milhares de casas na região. Ao todo, é uma
rede de mais de 18 mil quilômetros. Ela se conecta a ca-
bos submarinos que chegam à Praia do Futuro, em Forta-
leza, e permitem que os clientes tenham acesso à inter-
net a ótimas velocidades, além de TV a cabo e telefone.

“O semiárido tem uma necessidade extre-


ma da internet. não tem cinema, shopping,
mas tem internet. queremos ser a principal
operadora do nordeste fora das capitais,
inovando sempre.”

Roberto conseguiu realizar seu sonho de gerar em


impacto em Pereiro. A Brisanet emprega, apenas na
cidade, de 16 mil habitantes, mais de 400 pessoas –
são outras 900 nas outras regiões em que a empresa
atua. Uma mão de obra treinada especialmente pela
companhia para realizar seu trabalho.

Como alguém pode sair de tão pouco para tanto?


Roberto tem um palpite. “Nascer e viver no meio do
nada foi de grande vantagem para mim. Se tivesse em Sede da Brisanet em Pereiro, muito perto
conforto, não teria desenvolvido tantas habilidades.” de onde Roberto Nasceu
015_senti na pele construtores de sonho

CONSTRUTORES Expedito Arena e Altino Cristofoletti já eram sócios na vida


antes de empreenderem juntos. Conheça a história e o legado

DE SONHO dos fundadores da Casa do Construtor!

Expedito sonha grande desde os 7 fessores juntos, mas a economia do


anos de idade. Era ajudante do seu país estava tão descontrolada que
pai, pedreiro, mas queria mesmo faltava emprego.
era ser chefe. Em uma comunida-
de da igreja em Rio Claro, conheceu A inflação pode estar mal agora,
Altino, um menino também de fa- mas ruim mesmo eram os 2.500%
mília humilde. Os dois descobriram da época.
a vontade em comum de ser enge-
nheiro, o que, para quem não tinha E o cenário era especialmente des-
muitos recursos, parecia impossível. motivante no setor de construção:
“Eles falam em década perdida,
Mas impossível nunca foi muito mas eram duas décadas perdidas.
uma barreira para eles. Expedito é A última grande obra que o Brasil
5 anos mais velho, por isso foi na tinha feito foi a usina de Itaipu, o
frente: trabalhou como técnico em resto estava todo parado”.
Expedito (à esquerda) e Altino, edificações para bancar a faculda-
fundadores da Casa do Construtor
de, enquanto Altino fazia o curso A solução era criar o próprio em-
técnico. Depois os dois foram pro- prego. Os dois amigos há tempos
016_senti na pele construtores de sonho

queriam fazer algo juntos e, nesse momento, viram cio era pouco escalável e exigia sempre capital intensivo.
que não tinham nada a perder. “Acho que o fato de a Então, se você não tem crédito nem pode comprar de
gente não perspectiva nenhuma fez a gente se atirar, fábricas, apenas de distribuidores, o que você faz?
fazer qualquer coisa”, diz Expedito. A oportunidade
de ouro estava na falta de equipamentos para cons- Criando uma rede exemplar
trução no país, principalmente os que podiam dar Altino correu atrás de se capacitar e teve, aí, a grande
mais produtividade ao processo. E lá atrás, se você sacada: encontrar franqueados. Dividindo os gastos e
quisesse uma máquina, você tinha que comprar. Não aumentando o volume de compra, havia mais margem
existia cultura de alugar nada. para negociar. Afinal, vende bem quem compra bem.

Expedito e Altino resolveram criar essa cultura. Colo- Os sócios passaram todos os dias, por 2 anos, escre-
caram alguns equipamentos à disposição, dentro de vendo os manuais dos franqueados, que abordavam
uma loja em que eles vendiam material de constru- do atendimento ao conserto das máquinas. Foram
ção, num terreno “lá no fim do mundo”. O aluguel das também muito criteriosos na escolha e no treina- Acima, Gráfico e
Primeiro Manual
máquinas começou a dar bem mais resultado finan- mento deles.“Às vezes o cara vai abrir franquia e Comercial da
ceiro que outras atividades. Mas não eram grandes contrata um grande nome do franchising, já entra de empresa, feitos
empreiteiras que alugavam, eram pessoas comuns tapete vermelho no mercado”, diz Expedito. em 1997 .
Ao lado, Anotações
- uma dona de casa que precisava de uma furadeira, Expedito nos
ou um garoto querendo uma betoneira para um obra “Se eu fosse começar hoje, eu também primeiros anos da
em casa. Mudaram de ponto para chegarem mais contrataria um grande nome do fran- empresa
perto do público e fizeram questão de deixar o lugar chising. Mas nós entramos sem tapete
bem apresentado para todo tipo de cliente. vermelho, sem nada. Era amassar barro
e fazer toda a estrutura.”
Só que havia um problema grave: se você tem 10 beto-
neiras e aluga as 10 betoneiras, para dobrar seu fatura- Não à toa, um dos grandes diferenciais da Casa do Cons-
mento, você precisa de 20. Em outras palavras, o negó- trutor é ter uma rede de excelência, referência no meio.
017_senti na pele construtores de sonho

Esse é também um dos maiores orgulhos de Expe- entraram cantando (e cantando e cantando) “...a No início, a Casa do Construtor podia ser apenas
dito e Altino, que mantêm uma humildade impres- beleza de ser um eterno aprendiz”. Eles têm esse uma forma de dois amigos criarem seus próprios
sionante frente ao sucesso que alcançaram. Quan- verso como lema desde então: “Isso a gente traz empregos e colocarem um dinheirinho dentro de
do eles ganharam o prêmio de melhor franquia do para a nossa vida, né, a gente quer sempre ser um casa. Hoje, aquele ajudante de pedreiro e seu co-
Brasil em 2010, pela Pequenas Empresas Grandes eterno aprendiz e, não só isso, compartilhar com lega da igreja geram empregos para mais de 2 mil
Negócios, Expedito conta que sua filha não pôde os outros o que a gente aprende”. Uma regra da pessoas. E o impossível? Continua pequeno para o
participar por causa de uma prova. Saindo da ceri- Casa do Construtor, por exemplo, é que todos te- tamanho do sonho.
mônia, ele recebeu um e-mail dela: “Pai, fico super nham um “diário de bordo” para mostrar aos ou-
orgulhosa porque sei que esse prêmio é fruto do tros as novidades e lições de suas viagens. Assista à história
seu trabalho e da sua dedicação e do Altino, sem
nunca ter passado ninguém para trás”. São nessas viagens que Expedito percebe o impac-
to do que ele e Altino fizeram. “É muito legal você
Sonho que se sonha junto estar em algum lado do país e passar por uma loja
Mas foi só em 2010 também que eles começaram com sua cara, com o nome que você construiu.
a estruturar a expansão. Faltava arrojo, segundo Poxa, você não esperava estar no Nordeste, mas
Expedito. De 2010 a 2015, o número de lojas mais você está lá. E tem alguém continuando sua men-
que dobrou e o faturamento mais que triplicou: de sagem, engajado com sua bandeira”.
100 para 220, de R$ 48 milhões para R$ 180 mi-
lhões. “Foi fantástico, mas talvez a gente já esti- Para eles, isso não significa apenas os números
vesse nessa escala antes, se tivesse um DNA um de alcance do negócio, mas seu poder de trans-
pouco mais arrojado. A gente pode continuar não formação. Quando o franqueado decide abrir uma
sendo tão arrojado quanto poderia, mas continua franquia, é um casamento, um compromisso: “Ele
fazendo a lição de casa certinho”, diz. bota ali, às vezes, o dinheiro que levou a vida intei-
ra para juntar, que vai demorar para dar retorno,
Naquele mesmo ano, Expedito e Altino viram uma mas conversando com a gente ele sabe que é um
apresentação dos Meninos do Morumbi, em que bom negócio e que vai ter apoio”.
018_senti na pele felicidade acima de tudo

FELICIDADE
ACIMA DE TUDO Esses empreendedores querem acabar com a cicatriz no
mundo – mas tendo sempre a felicidade como meta

Cristiano, Fernando e Guarany não co- O ano era 2002 e os três amigos tinham
meçaram assim com tanta sorte. Na hora acabado de pedir demissão de seus em-
de encontrar um escritório bacana para pregos em uma empresa de equipamen-
montar o primeiro negócio, quando eles tos médicos. Fernando tinha um perfil
foram assinar o contrato, a realidade ba- mais técnico; Cris e Guarany eram os
teu à porta: “Bom, apareceu uma psicó- caras do comercial e do administrativo.
loga aqui querendo o imóvel, sabe como Com 4 meses de operação, contrataram
é, né… vocês são jovens, não tenho ga- o primeiro estagiário, Bruno, que fazia
rantia de que vão pagar, então optei por engenharia eletrônica.
alugar para ela”, disse o corretor.
Começaram com manutenção e revenda
Esse foi só o primeiro choque do que de máquinas para endoscopia e laparos-
acontece quando não acreditam em copia, mas Fernando e Bruno assumiram
Empreendedores da Cofiance. Da esquerda para
você. Mas eles sempre acreditaram, in- a responsa: “Nós também somos capa-
direita: Cristiano, Bruno, Guarany e Fernando clusive conseguiram um lugar para ser a zes de fazer esses equipamentos”. Fo-
casa da Confiance Medical logo depois. ram de produtos de valor agregado mais
019_senti na pele felicidade acima de tudo

Ao lado, convite da
formatura da faculdade
do Cris, em 98. Abaixo,
time da Confiance

baixo até aqueles mais complexos, que só tivesse certo, Cristiano reconhece. Cada
se faziam no exterior. Com isso, natural- produto lançado era uma expectativa. Uns
mente, a concorrência mudou de nome. davam certo, outros não tanto, mas a ener-
Quando resolveram abrir mão do modelo gia do pessoal que trabalhava na Confian-
anterior e exclusivamente fabricar apare- ce – os chamados confiantes – deram o gás
lhos para vídeo-laparoscopia, em 2009, para que revertessem a situação. “A gente
passaram a competir com multinacionais estava ferrado, mas continuava feliz”, ele
que extrapolavam as dezenas de bilhão diz. E parece que positividade e trabalho
em faturamento. duro dão certo, porque no ano seguinte, o
jogo virou.
Fundo do poço tem mola pra
quem quer Em 2011, pela primeira vez, a especifica-
Aquela história de acreditar ficou ainda ção técnica dos equipamentos se equi-
mais importante para eles seguirem em parou à dos importados. Mais ou menos
frente. Em 2010, o que geravam de EBIT- nessa época também, Bruno, aquele que
DA não era suficiente nem para pagar os tinha começado como estagiário, virou
juros da empresa. Tinham uma dívida de sócio. E tendo ampliado a experiência em
R$ 1,2 milhão, com um faturamento anual produção, o quarteto tirou dessa história
de R$ 2 milhões. uma grande lição: não descansar nunca,
principalmente se você é pequeno e com-
Talvez o coro de “vocês estão loucos” es- pra briga com gigantes. Atrelando essa
020_senti na pele felicidade acima de tudo

busca incansável pela qualidade ao turbulência, e esses 4 empreende- Assista à história


excelente atendimento, emplaca- dores sabem bem disso. Tanto que
ram algumas vendas no setor pú- dinheiro nunca foi o objetivo final
blico e começaram a construir sua deles:
reputação.
“Se você for por dinheiro, uma hora
Felicidade acima de tudo a sua energia acaba. Trabalhar 12
Na história de Cristiano e da Con- horas no que você gosta não é can-
fiance, o sonho foi o combustível sativo, cansativo é trabalhar 1 hora
de tudo. “Se a gente tivesse come- no que você não gosta”.
çado fazendo um plano de negó-
cios bonitinho, a gente percebe- Foi isso que fez com que eles con-
ria que o mercado médico é muito tinuassem firmes em todos os per-
mais tradicional do que a gente po- rengues. Segundo Cristiano, quan-
deria imaginar. Se nós não tivésse- do estavam desanimados, só com
mos esse sonho tão grande, talvez conta para pagar, ver o brilho nos
a gente caísse na real de que seria olhos dos seus funcionários foi fun-
muito difícil”, ele conta. damental. “A gente conseguiu fazer
com que pessoas vivessem nosso
Claro, empreender não vai ser um sonho, e conseguiu fazer com que
céu de brigadeiro o tempo todo. pessoas vivessem felizes no am-
Pelo contrário, vai ser um céu mui- biente de trabalho deles. Isso eu
to carregado, com rajadas, com acho muito mágico”.
senti na pele

A SORTE
PERSEGUE A
OUSADIA
O ex-office boy que recusou 3 fundos de investimento e
hoje impacta 5 milhões de alunos — conheça a desafiadora
jornada de Felix da Silva, empreendedor da Escola24Horas

Toda vez que está em seu escritó- sa: “Não reclama, Felix, já foi pior.”
rio lamentando as dificuldades de Pior como? Bom, vamos cortar para
tocar seu próprio negócio, Severino o ano de 2003. Ainda no início da
(Felix) da Silva olha para o quadro Escola24Horas, depois de três
em frente à sua mesa. Na parede, anos de curvas ascendentes, os re-
emoldurada, está a camisa que era sultados da empresa foram dando
Severino Felix da Silva, seu uniforme de office boy. E pen- sinais de retração. O negócio tinha
presidente da Escola24horas
022_senti na pele a sorte persegue a ousadia

foco em fornecer apoio a estudantes 24 fazer”, ele conta. Conversando com di- Serra Redonda, um distrito de Ingá do
horas por dia, 7 dias por semana, com versos stakeholders em busca de ideias Bacamarte, no interior da Paraíba. “Mas
conteúdo e professores de plantão para para se reinventar, percebeu uma neces- por questão de status, digo que foi em
tirar dúvidas online em poucos minutos. sária mudança no modelo do negócio. Ingá do Bacamarte”, brinca. Na década
de 50, por conta de uma história de que
Só que a bolha da internet tinha acabado Antes, a Escola24Horas fazia apenas ven- plantação em terra roxa no Paraná esta-
de estourar. Com o mercado de tecno- das para seus consumidores finais, em um va crescendo, foram todos se aventurar
logia até então imaturo e a concorrên- modelo B2C. A proposta sempre foi ser por lá. Durante 10 anos o caçula morou
cia apertando, as projeções que tinham uma extensão da escola na vida do aluno no norte do estado, até que recebeu a
feito não se realizaram. e dos pais. Essa essência não mudou, mas visita de uma tia: “Vamos para o Rio de
Felix procurou mirar também nas vendas Janeiro, lá tem mais oportunidades.”
Com números negativos, Felix chegou a B2B — permitindo, por exemplo, que em-
cogitar fechar a empresa. presas clientes oferecessem o apoio esco- Felix vendeu sua bicicleta e conseguiu
lar a filhos de funcionários, como parte do autorização da mãe e do juizado de me-
Sócios estavam perdendo a vontade de pacote de benefícios. nores para, aos 15 anos, se mudar. Du-
continuar lutando pelo negócio. Depois rante todo o caminho para a Cidade Ma-
de algumas negociações bastante des- A virada de chave foi primordial para ravilhosa, foi decorando o endereço da
/ gastantes, chegaram a um acordo em que a empresa retomasse sua curva de tia para que o taxista pensasse que ele
Com números que o empreendedor compraria a parte crescimento alguns anos depois. Mas conhecia o Rio.
deles. Assumindo, claro, uma grande dí- desde o início de tudo, o caminho nun-
negativos, vida. Para sair do limbo, só existia uma ca foi fácil. No domingo de sua chegada, falou:
Felix chegou a alternativa: a revolução.
cogitar fechar a O sertão vai virar mar - Tia, preciso trabalhar para trazer mi-
“Fui para a rua, que é o que mais gosto de Mais novo de 9 irmãos, Felix nasceu em nha mãe e minha irmã.
empresa.
023_senti na pele a sorte persegue a ousadia

Entrevista sobre a Entrevista sobre a Entrevista sobre a Entrevista sobre o aporte


Escola24horas na Escola24horas Escola24horas na do Banco Mundial na
Exame, em 2000 na Revista Forbes, em 2002 Forbes, em 2000 Escola24horas, em 2000
024_senti na pele a sorte persegue a ousadia

- Ok, então você precisa ser office-boy. Melhor pedir perdão que pedir Uma ou duas paixões
- Tá ótimo! Mas primeiro me explica o que é licença descobertas
isso? Passando um dia pela sala de seu diretor, Felix Quando se formou, quis buscar novos ares. Aca-
viu alguns contratos sobre a mesa que tinham bou sendo contratado como gerente financei-
Na segunda-feira, Felix foi para o centro da ci- sido feitos de modo errado. Aproveitando que ro de uma editora de livros técnico-científicos.
dade procurar emprego. Naquele mesmo dia, o chefe tinha ido viajar, o garoto foi explorar os Lá, teve clareza de seu propósito: trabalhar com
foi contratado como auxiliar de arquivista. Ele papéis para tentar corrigi-los. educação.
também não sabia o que era auxiliar, tampouco
arquivista, mas aceitou o desafio. “Eu estava tomando risco em dobro: fazendo algo Felix convenceu os acionistas da empresa a criar
que não tinha nada a ver comigo e, ainda por cima, um braço de treinamentos, o qual ele passou a
Só que não durou 3 dias. O chefe tinha uma ma- na sala do meu diretor, sem autorização”, ele diz. tocar, como uma spin-off. Em dois anos, ela já ti-
nia de tratar seus funcionários de forma des- Só que Felix se empolgou e ficou, até as 5h da ma- nha uma receita superior à da editora.
respeitosa, e Felix resolveu que não deveria se nhã, trabalhando nos contratos.
submeter a isso. “Tudo que eu tinha era minha Dessa experiência, ficou o gostinho:
auto-estima e uma vontade enorme de poder Quando o patrão voltou, perguntou quem o ha-
oferecer uma vida melhor para a minha família”, via ajudado. “Ninguém, eu fui fazendo aqui nas “E se eu criasse algo do zero, um negócio que
conta. horas vagas”, Felix inventou. fosse só meu?”

Decisão acertada, porque seus dois empregos A impressão causada foi tão positiva que ele ga- Felix já estava casado e tinha um filho quando
seguintes — dessa vez como office boy — o en- nhou uma promoção. Virou gestor e, por conse- pediu demissão para empreender. A incerteza
sinaram muitas das competências que lhe fo- quência, gerou curiosidade em toda a empresa. foi o primeiro desafio, por isso logo veio o se-
ram úteis como empreendedor. Entre elas, a de O aumento de salário, aliás, mudou substancial- gundo, que estava em buscar investidores. Mas
cultivar relacionamentos e a de tomar riscos. mente a qualidade de vida de Felix, que, nessa como ele mesmo diz:
época, fazia faculdade de economia à noite.
025_senti na pele a sorte persegue a ousadia

“A sorte persegue a ousadia” e analisar a empresa para um possível investimento.


Em abril do ano 2000, sem esperar, Felix recebeu
uma ligação de um repórter do jornal francês Libéra- Impulso
tion. O jornalista estava no Rio de Janeiro para cobrir Nessa época, outros três fundos de investimento es-
a comemoração dos 500 anos do Brasil e alguém tavam interessados no negócio de Felix. Mas quando
havia falado com ele sobre a Escola24Horas. souberam do interesse do Banco Mundial, a panela
de pressão apitou.
Felix topou uma entrevista, mas sem grandes expec-
tativas e tomado por uma angústia típica de empre- “Você está preparado para dar uma resposta em 24
endedor: horas?”, um dos fundos insistia. “Estou, porque não
vou tomar nenhuma decisão tão importante assim
“Meu Deus, preciso conversar com fundos, arrumar em 24 horas, então a resposta é não”, ele dispensou.
dinheiro, e estou perdendo meu dia aqui. Vai sair uma
matéria pequenininha lá fora e eu nem vou ver.” Os outros dois ameaçavam ainda desistir de Felix e
iniciar negociações com os concorrentes. A decisão
No fim das contas, uma página inteira foi dedicada do IFC ainda levaria pelo menos três meses, e Felix já
ao negócio e à inovação que ele trazia. Um executivo estava gastando o que não tinha. Se ele recusasse os
do Banco Mundial — que morava nos EUA, mas es- fundos e o retorno do Banco Mundial também fosse
tava de férias na França — leu a matéria e pediu que desfavorável, além de ficar sem investidor, ele ficaria
entrassem em contato com quem quer que estives- também no vermelho.
se por trás daquilo tudo.
Mais uma vez, ele resolveu arriscar e trocar três pás-
Outra ligação inesperada. Uma representante do IFC saros na mão por um voando.
Matéria sobre o aporte
(sigla em inglês para Corporação Financeira Interna- financeiro na Escola24horas,
cional), membro do Banco Mundial, queria visitá-lo “Mas a resposta do Banco Mundial veio. E lá vou eu, em 2009
026_senti na pele a sorte persegue a ousadia

o Severino de Ingá do Bacamarte, para Washington, Mas se as coisas apertarem, o uniforme está lá na pa-
assinar o contrato.” O aporte dos novos acionistas fez rede para não deixar esquecer: “Não reclama, Felix, já
muito bem para a empresa — US$3,5 milhões por 25% foi pior.”
de participação.

Quando as coisas desaceleraram, no entanto, Felix per- assista à história


cebeu que precisava, ele mesmo, tomar as rédeas do
negócio. Mesmo que isso significasse ter que se en-
dividar. Foi preciso coragem. O advogado aconselha-
va manter o Banco Mundial como sócio simplesmente
para evitar o risco de quebrar, mas prevaleceu a trans-
parência. E mesmo que a dívida tenha levado alguns
anos para ser quitada, ela valeu a pena.

Nesse momento, Felix destaca a importância de ter hu-


mildade para transformar deslizes em aprendizados,
que foram postos em prática para retomar o crescimen-
to da Escola24Horas. Hoje, a empresa tem mais de 5
milhões de alunos atendidos e a tecnologia e o modelo
de negócio já foram implantados no México e no Chile.

Não quer dizer, claro, que desafios não voltem a surgir.


027_senti na pele lições da escola da vida

DAY 1

LIÇÕES DA
ESCOLA DA VIDA
Fazer rir e chorar é com ele mesmo. Edivan Costa, dono da SEDI, empresa
líder no ramo de regularizações, tem uma trajetória de superação inspira-
dora. Ex-jogador de futebol do Palmeiras, office boy e, enfim, empreende-
dor. Mesmo com todos os obstáculos que a vida colocou em seu caminho
nesta odisseia, ele nunca desistiu de sonhar grande.
senti na pele

SE O NEGÓCIO
QUEBRA, COMEÇA
DE NOVO
Depois de “andar de lado” por muito tempo, Wilson Poit criou
um negócio maior do que ele mesmo imaginava

Todo dia, Wilson e seu irmão cami- A mãe, além de trabalhar na plan-
nhavam 4 km até a escola. Estilin- tação de café com o marido, tam-
gue no pescoço, iam encontrando bém era cabeleireira e costureira.
os colegas pelas porteiras, na re- Ela mesma fazia as roupas da fa-
gião rural de Osvaldo Cruz, no in- mília, às vezes desmanchando um
terior de São Paulo. Chegando do vestido para transformá-lo em duas
Wilson Poit, fundador colégio, deixavam a bolsa de lado e bermudas, sempre otimizando re-
da Poit Energia iam para a roça encontrar os pais. cursos. Moravam todos em uma
029_senti na pele se o negócio quebra, começa de novo

casa de tábua, sem forro e sem eletricidade. se desfazer do sítio. Trocou por uma máquina de ferramentas de Rinópolis para continuar fa-
Em vez de assistir TV, reuniam-se no quintal de benefício de arroz e iniciou um pequeno co- zendo pequenos consertos.
com lampiões para compartilharem histórias, mércio em uma cidade vizinha chamada Rinó-
até a hora em que dava sono. polis. Wilson tinha 11 anos quando dormiu pela “Fez uma diferença enorme para mim, a vonta-
primeira vez com barulho de carros. de de sempre trabalhar por conta própria”, diz
Com o preço do café piorando a cada ano, a fa- Wilson. Não à toa, foi a base do que o menino
mília começou a passar dificuldades — apesar Todo mundo em volta do menino era de alguma da roça se tornou: empreendedor.
Wilson quandro de as crianças não sentirem a diferença. O pai forma exemplo de autonomia e determinação.
criança contraiu uma dívida com o banco e precisou Conforme ia entrando na adolescência, ia fican- Serial
do mais comum que ele trabalhasse para ganhar Ele tinha 40 anos quando teve a ideia do negó-
algum dinheiro. Sábado tinha muito movimento cio que realmente mudou sua vida. A Poit Ener-
na cidade, então Wilson saía para vender sor- gia surgiu para fornecer um serviço completo no
vete e poder, assim, comprar sua primeira bici- aluguel de geradores — do cabeamento aos pro-
cleta. Na época de finados, se metia a vender fissionais de plantão, além das máquinas. Antes
jabuticabas. Prontamente aprendeu a consertar disso, no entanto, Wilson já havia iniciado (e dado
fogões para aproveitar a clientela do pai, que fim a) alguns projetos. Cinco, para ser exato.
além do arroz também vendia botijões de gás.
O primeiro deles foi uma empresa de instalações
O gosto pelo trabalho se estendeu até a época elétricas, que abriu com um sócio, aos 26 anos.
de faculdade. Como o curso de engenharia elé- Em paralelo, começou também uma loja de ma-
trica na FEI, em São Bernardo do Campo, era terial elétrico e hidráulico no bairro da Bela Vista,
em horário integral, não podia ter um emprego em São Paulo. Faltou planejamento, e as vendas
fixo. Arranjava “bicos”. Chegou a corrigir 3 mil foram mal: precisou passar o ponto, vendeu as
provas por final de semana e trouxe sua caixa prateleiras para um, o estoque para outro…
030_senti na pele se o negócio quebra, começa de novo

Por pouco tempo tocou ainda uma


transportadora, na Vila Maria, tam-
bém na capital paulista. E como
todo rapaz do interior, Wilson tinha
o sonho de ter um sítio na cidade
em que nasceu.

Assim que pôde, comprou uma pro-


priedade por lá e virou fruticultor.
Viu o preço da manga nos grandes
centros e pensou que o negócio não
/ tinha como dar errado. Chegou a ter
No fim das 400 pés de manga e só depois foi
contas, não descobrir a diferença do preço do
que o produtor vende até chegar ao
acabou a luz. consumidor. “Foi uma grande ale-
Wilson pagou o gria quando comprei o sítio e duas Acho que faço melhor o caminhão era sujo, barulhento, e Wilson na frente
de um de seus
quando vendi”, brinca. Wilson foi contratado, nos anos 90, Wilson ainda precisou se encarre-
fornecedor, deu gar de outras etapas do serviço para
caminhões
para ser o engenheiro eletricista do
tudo certo, mas A cada iniciativa, novos show da banda Double You. Na vés- garantir uma apresentação sem in-
ficou com aquela aprendizados se acumula- pera do evento, precisou de um for- terrupções técnicas.
coceirinha: “Acho vam. Quando uma brecha necedor de caminhão com gerador,
surgiu, ele estava mais prepa- para o caso de haver queda de ener- No fim das contas, não acabou a
que faço melhor rado para encará-la como gia. Além do serviço caro, difícil de luz. Wilson pagou o fornecedor,
que esse cara.” oportunidade. encontrar, e do mau atendimento, deu tudo certo, mas ficou com
031_senti na pele se o negócio quebra, começa de novo

aquela coceirinha: “Acho que faço melhor que da. “Eu preciso de 10 geradores para colocar em grandes mentores para seguir nessa curva as-
esse cara.” torres de celulares, você tem?”. A resposta nun- cendente. Ao mesmo tempo, se empenhava em
ca era “não”. deixar a casa arrumada para quando chegasse a
Não esperou muito para fazer acontecer. “Sem- hora certa.
pre tem alguém pra desencorajar, então se de- Logo, a Poit Energia estava maior do que o pró-
morar muito, você desiste”, conta. “A diferença prio empreendedor pensou que um dia estaria. Depois do apagão, no entanto, veio uma ressa-
entre um empreendedor e um louco é que o em- O sonho ia sendo renovado no ritmo em que a ca de mercado. Entre 2004 e 2005, a empresa
preendedor convence os outros da sua loucura.” empresa crescia. Firmou ótimos contratos du- sofreu com a baixa ocupação. Mesmo enfren-
rante o bug do milênio — quando começaram a tando dificuldades, as propostas continuavam a
Foi ao salão do automóvel, encontrou um cami- achar que os computadores entrariam em pane aparecer.
nhão em oferta e pôs um gerador em cima. Co- na virada do século. Na época do apagão ener-
meçou a imprimir panfletos, encaminhar fax, e gético, em 2001, ganhou a mídia. Ali estava a Nessa época, combatendo a solidão do empre-
disso saíram os primeiros clientes. Tudo estava solução para os nossos problemas. endedor em tomar decisões, Wilson montou
no posicionamento. Alugar gerador, muita em- seu conselho consultivo: “Felizmente encontrei
presa alugava. Mas a Poit Energia era uma for- Com toda essa atenção, Wilson começou a ser pessoas que me orientaram, me deram exemplo
necedora de infraestrutura elétrica completa assediado com propostas para que ele vendesse para chegarmos até esse ponto da empresa”.
temporária. a empresa. A tentação era grande, mas o conse-
lho dos mais experientes era de não ceder. “Você A venda acabou acontecendo apenas em 2012,
Sonho cada vez maior ainda vai abrir capital na Bolsa, ter filial no Brasil quando a Aggreko, líder mundial do setor, ad-
O marketing boca a boca levou a Poit a prestar todo”, encorajavam. quiriu 100% da Poit Energia.
serviços até para a Rede Globo, cobrindo a Fór-
mula 1. Wilson ia comprando mais caminhões e Poit acreditou e segurou a onda para focar no Sem parar
geradores à medida em que o dinheiro entrava. crescimento. Em 2002, foi selecionado como Quando concluiu seus deveres como CEO, Wil-
E o negócio ia crescendo junto com a deman- Empreendedor Endeavor e passou a contar com son prometeu à família que ia sossegar. Ter uma
032_senti na pele se o negócio quebra, começa de novo

agenda menos “de galinha”, como ha- Gostou. Estava tão animado em ver as assista à história
via sido por 30 anos, e mais “de águia”. mudanças acontecendo que recebeu
Passou a ser conselheiro de algumas outro convite. Dessa vez, para presidir
empresas, viajou com esposa e filhos. a SP Turis, secretaria de turismo, ape-
Mas é lógico que não ia parar por aí. nas 7 meses antes da Copa do Mundo.

Toca o telefone. “Poit, o Assumiu as duas funções, depois de


que você está fazendo? O “picado pela mosquinha do impacto
[Fernando] Haddad ganhou social”, como ele mesmo diz. No se-
a eleição em São Paulo e está tor público, encontrou uma oportuni-
querendo alguns secretários dade de continuar causando um im-
da equipe dele que não pacto positivo. “É que nem reunião de
sejam partidários, sejam condomínio, a gente reclama o tempo
empresários”. todo, mas não vai nem na reunião”, co-
menta.
Wilson foi ao gabinete do recém-eleito
prefeito e, passadas algumas semanas Para 2017, Wilson Poit foi convidado
de conversas, aceitou o convite para se e acaba de ser empossado como se-
tornar presidente da SP Negócios, uma cretário de Desestatização e Parcerias
instituição focada em promover inves- da cidade de São Paulo, no governo de
timentos, estruturar Projetos de Con- João Doria Jr., além de continuar sen-
cessão e Parcerias Público-Privadas e do conselheiro e mentor de outros em-
melhorar o ambiente de negócios para preendedores. E não para.
o desenvolvimento da cidade.
33_senti na pele um pouco de todo mundo

DAY 1

UM POUCO DE
TODO MUNDO
Conheça e se emocione com a história de Sofia Esteves, uma
mulher empreendedora que fundou um dos maiores grupos de
Recursos Humanos do Brasil
senti na pele

LEVAR LUZ PARA


ONDE FALTA
Darci Roberto Schneid lutou para poder estudar e seguir sua
vocação de empreendedor. Hoje, a Sirtec é uma das melhores
empresas para se trabalhar da região sul.

Não faz muito tempo, a Sirtec fe- diferença para eles. Se o lucro fi-
chou um ano com um lucro de R$ casse todo para você, aí sim faria
3 milhões. Darci ficou tão satisfeito diferença.”
que resolveu dividir parte do mon-
tante com seus 1.300 funcionários. Mas sobre o dinheiro, Darci estava
Quando compartilhou o plano com decidido:
seus conhecidos, a reação da maio-
ria era controversa: “Ele não é só meu.”

Darci Roberto, “Você está louco, Darci. Vai dar R$ O episódio acaba sendo um refle-
fundador da Sirtec
2 mil para cada um, não vai fazer xo da preocupação de Darci com o
35_senti na pele levar luz para onde falta

bem-estar das pessoas, um valor que aju- plo. Picolé? Só no inverno. O truque era fa-
dou a Sirtec — uma empresa que constrói zer o suco de limão e deixar do lado de fora
e mantém redes elétricas em locais rurais e da casa em uma caneca de alumínio. Se ti-
urbanos — a dar um grande salto. vesse geada à noite, na manhã seguinte a
guloseima era certa.
Entre o lápis e a enxada
Darci não tinha tantas referências empreen- Em São Lourenço, quandos as crianças con-
dedoras em São Lourenço do Sul, área rural cluíam a 4ª série, se quisessem continuar,
do Rio Grande do Sul, onde nasceu. Tinha, precisavam ir até uma cidade próxima. Darci
no entanto, um tio dono de uma marcena- foi morar na casa de outra família para po-
ria, que sempre o provocava: der estudar, mas nesse meio tempo sua mãe
adoeceu e faleceu. Ele tinha apenas 10 anos
“Se você só fizer o que os outros manda- e teve que decidir se saía ou não da escola
rem, você não vai fazer nada de relevante para ajudar em casa.
na vida.”
/ Apesar do momento difícil, não retornou. Pelo
“Se você só fizer Por essas e outras, desde muito novo, sem- menos não até terminar o que, na época, era Darci com a
família, em 71
o que os outros pre fez questão de estudar. Darci cresceu na a 8ª série. De volta à chácara, plantava feijão,
roça, em uma região de colônia. Aprendeu soja, milho, mas queria mesmo era continu-
mandarem, alemão antes do português — tradição do ar sua formação. Tinha o sonho de fazer um
você não vai bisavô, que também passou valores éticos curso técnico, só que a escola era em Pelotas,
fazer nada de muito fortes de geração em geração. onde também era o exame de admissão. Para
o pai, Darci já havia estudado o suficiente.
relevante na Não havia energia elétrica por lá, então não
vida.” era comum armazenar comida, por exem- Toda manhã, quando acordavam para cuidar
36_senti na pele levar luz para onde falta

da lavoura, o menino insistia em pedir para ir sor um ponto que faltava para não bombar. mo que não concordasse com alguma ativi-
à cidade para fazer a inscrição, mas o pai nem dade, ele tinha que fazer. Logo lembrou das
dava resposta. Os dias iam passando, o prazo “Nem que faltasse só um décimo eu daria. palavras de seu tio:
se aproximando, e nada. Darci nunca tinha ido a Você pisou na bola e vai ter que aprender com
Pelotas, mas sabia que o ônibus passava às 11h. isso”, foi a resposta. “Se você só fizer o que os outros mandarem,
você não vai fazer nada de relevante na vida.”
Às 9h de uma quarta-feira, último dia para ins- Darci aprendeu e retomou um valor que já
crição, seu pai largou a enxada de lado: “Então havia herdado de seus pais: sempre fazer por Bom, se algo está ruim, o jeito é mudar — mes-
tá, guri, vai lá tomar um banho e vamos para a merecer. mo que aos poucos. Com uma moto e um fus-
cidade”. ca, Darci começou fazendo projetos aos fins
Demanda pela autonomia de semana em municípios próximos, mais ou
Chegando lá, pegou carona com um caminho- As primeiras obras elétricas que Darci realizou menos no mesmo modelo que deu certo na
neiro que o explicou onde tinha que ir. O sota- foram ainda na escola técnica. Como parte de escola técnica, com mutirões. O sucesso se /
que alemão era tão forte que ficou difícil se virar. um projeto de pesquisa, ele e o professor visita- repetiu, mas ele tinha apenas 23 anos e a in-
vam regiões afastadas e mobilizavam mutirões segurança de deixar seu emprego era alta. “Darci, se tu
Anos depois, seu pai admitiu que só concor- de moradores para montar e instalar as redes. continuar
dou em levá-lo porque pensava que não seria Recorreu a pessoas que admirasse para pedir trabaiando
aprovado. Mas Darci não só passou no exa- Por conta desse conhecimento, Darci foi estagiar conselho. Entre elas, estava o Seu João, prefei-
me, como recebeu o apoio do pai, que arru- na Prefeitura de Pelotas e logo depois foi procu- to de uma cidade vizinha que havia acabado de direitin, como
mou uma pensão para o filho ficar. Só que ra- rado pela de São Borja, uma cidade na fronteira se emancipar. Seu João era um homem muito tu sempre
pidamente o garoto fez amigos, passou a focar com a Argentina que tinha a missão de eletrifi- simples, mas de uma enorme sabedoria: trabaiô, tu
mais em se divertir que em se aplicar aos es- car o campo para desenvolver o agronegócio.
tudos e o comportamento de bom aluno que “Darci, se tu continuar trabaiando direitin, vai conseguir
sempre teve começou a deixar a desejar. No Só que, na prefeitura, sentia que não tinha li- como tu sempre trabaiô, tu vai conseguir che- chegar onde
4º semestre, precisou negociar com o profes- berdade suficiente ou grandes desafios. Mes- gar onde tu quer.” tu quer.”
37_senti na pele levar luz para onde falta

Darci sabia o que ele queria dizer com “direitinho”: ternativas mais fáceis que empreender, poderia
valores éticos e princípios como os que seus pais ter desistido. “Um pouco vinha da minha de-
e avós o ensinaram. Ali, ele confirmou que isso terminação de fazer acontecer, um pouco era
guiaria toda a sua carreira empreendedora. ‘agora fica feio eu voltar atrás’.”

Quando pediu demissão, o garoto já tinha um Menos de um ano depois da abertura da Sirtec,
caminhão velho — carinhosamente apelidado Darci organizou um churrasco para seus funcio-
de Azulão —, que comprou como sucata de um nários e pediu para que levassem suas famílias.
concorrente, e foi atrás de clientes para a Sirtec. Uma foto foi tirada e revelada dias depois.
“Eu contei todo mundo que estava na foto e
Revelando um sonho grande dava 17 pessoas”, conta. De repente, veio uma
Para o empreendedor, aquela era uma tentativa de epifania: “Poxa vida, se der errado o problema
um trabalho que pudesse trazer maior realização. não é só mais meu. Todas essas pessoas estão
No entanto, como não tinha esposa, filhos nem nin- contando comigo.”
guém que dependesse de sua renda, o sentimento
era de “se não der certo, o problema é meu”. A partir desse dia, Darci passou a encarar seu
negócio com outros olhos. Talvez aquela pode-
Nada foi planejado. “Eu tinha apenas muita von- ria ser uma empresa grande.
tade, mas nenhum capital”, diz. Ninguém achava Darci e os primeiros colaboradores,
na primeira Sede da Sirtec
que ia dar certo, já que por alguns meses esteve Decisões de risco
tudo nas mãos de Darci. “Trabalhei muito. Fazia No início, o único recurso disponível para de-
projeto, subia no poste, atendia cliente, fechava senvolvimento empreendedor em São Borja era
contrato. Trabalhar nunca me assustou.” o Sebrae. Qualquer curso que aparecia por lá,
ele ia — até decoração de vitrine entrou para a
Apesar disso, Darci confessa que, se tivesse al- lista. Corria atrás dos professores para tirar um
38_senti na pele levar luz para onde falta

pouco mais de conhecimento deles e devo- Quando identificou a demanda para ex- mundo e o pessoal confia em mim por isso”.
rava todos os livros aos quais tinha acesso. pandir a Sirtec para o Nordeste, de novo
encontrou as vozes que o chamavam de Toda semana, por exemplo, Darci prepa-
Um dos aprendizados dele, nesse meio tem- louco. Darci, no entanto, preferia pensar no ra um café da manhã em todas as bases
po, foi que, para vender bem, é preciso com- impacto que poderia causar: “Eu sabia que da operação. Não tem convocação, não se
prar bem. “Tinha um fornecedor que me di- teria dificuldades, mas não consigo pensar fala de trabalho. Vai quem quer. “Também
“Pode ser que ele zia: ‘Você é o cara que mais me dá problema ‘lá não é bom, lá não vou’. Se tem oportu- nunca atrasamos o pagamento de salário
na hora de vender, mas pelo menos não me nidade, o desafio não me abala.” de ninguém. Em uma empresa de mão de
esteja salvando dá problema depois. Tem gente para quem obra, isso faz muita diferença”, conta.
uma senhora que eu vendo fácil, mas depois não recebo.” O crescimento, por sinal, é parte da estra-
está precisando de tégia de perpetuidade da Sirtec. “O negó- Não à toa, pela 3ª vez a Sirtec está entre as
E se o negócio começou sem planejamen- cio não é mais meu, tem que continuar. Te- melhores empresas para se trabalhar do país.
seu respirador, ou to, para crescer, passou a depender de sis- mos obrigação de crescer.”, explica.
ajudando o dono temas, operação e liderança fortes. Às ve- Além disso, é uma preocupação também
de um pequeno zes, essas lições vinham acompanhadas Feita para pessoas conectar cada um à missão da empresa.
de decisões bastante difíceis. Por falar em fazer o bem, como mostra a Às vezes, o eletricista precisa sair de ma-
restaurante que história que abre esse texto, a atenção às drugada, na chuva, para subir em um pos-
está perdendo Na hora de implementar um ERP, por exem- pessoas começa dentro da empresa. Darci te. Darci os convida sempre a olhar para
toda a comida que plo, Darci precisou colocar na balança os diz que conseguiu chamar pra perto pes- dentro da casa que está sem luz.
custos e os resultados. Isso porque o custo soas boas, mas muito da cultura da Sirtec
tem no estoque. do sistema era equivalente ao lucro da em- vem de seu próprio exemplo e abertura. “Pode ser que ele esteja salvando uma se-
Quanto melhor presa nos 18 meses anteriores. Muita gente nhora que está precisando de seu respirador,
fornecemos, mais desaconselhava, mas ou a Sirtec se torna- Para garantir um bom ambiente de trabalho, ou ajudando o dono de um pequeno restau-
va mais robusta e tecnológica, ou estagna- o empreendedor aposta na transparência e rante que está perdendo toda a comida que
a gente faz o bem ria. “Entre arriscar perder e arriscar acertar, na simplicidade que carrega desde a infân- tem no estoque. Quanto melhor fornecemos,
para as pessoas.” sempre vou arriscar acertar.” cia. “Me sinto bem estando no meio de todo mais a gente faz o bem para as pessoas.”
039_senti na pele felicidade acima de tudo

A REVOLUÇÃO
DIGITAL COMEÇOU Conheça a história da empresa que está ajudando empreendedores a
vencerem a batalha com o mundo do marketing digital

Vender é sempre um desafio. Não im- success no dicionário não encontraria


porta se sua empresa quer anunciar um nenhuma resposta. Hoje em dia, muitas
serviço ou produto ou saber com quem empresas têm seu sucesso ditado por
falar; entender como fazer essa comu- essas duas palavrinhas. E nesse tempo
nicação chegar, da melhor maneira, ao não foi só o marketing que conquistou
público que realmente interessa é o que seu espaço, os consumidores também
mantém muitos empreendedores acor- firmaram sua presença. Com a inter-
dados à noite. Na verdade, foi dessa di- net, as ferramentas de busca e as mídias
ficuldade que surgiu a Resultados Di- sociais, os clientes, mais do que nunca,
gitais, uma empresa focada em ajudar têm mais independência e acesso fácil e
empresas de todos os portes a elaborar rápido a todas as opções disponíveis no
e colher os frutos de uma boa estratégia mercado.
de Marketing Digital.
Da esquerda para diretira Bruno Ghisi, Pedro
Bachiega, Eric-Santos, Guilherme Lopes e André
Mas o que isso significa na prática? É fá-
Siqueira, os sócios da RD Há 15 anos, se você procurasse as ex- cil: as marcas precisam repensar a forma
pressões inbound marketing e customer como interagem com seus consumido-
res e expõem suas soluções. Não há mais espaço para A Praesto tem um papel fundamental na história de NADA COMO SENTIR NA PELE E CONTINUAR
interromper e bombardear ninguém com propagandas: Eric, porque foi lá que a história dos 4 sonhadores co- EMPREENDENDO PARA RESOLVER UMA DOR
o caminho agora é ser encontrado quando o cliente pro- meçou. Guilherme, Bruno, Pedro e André, atuais sócios QUE TAMBÉM ATORMENTAVA MUITOS OUTROS
cura por uma solução e construir relacionamentos para da RD, trabalharam na Praesto. Mais do que isso, eles EMPREENDEDORES
ganhar credibilidade. eram intraempreendedores que colocavam a mão na
massa e faziam muita diferença dentro da empresa. E Por trás da máquina de vendas
À frente da RD, estão os mais novos Empreendedores foi por isso que quando Eric decidiu mudar de rumo e Para conseguir ajudar empresas a acelerarem sua ven-
Endeavor Eric Santos, Guilherme Lopes, Bruno Ghisi e se aventurar em novos mares ele escolheu os 4 para o das, a Resultados Digitais desenvolveu um software
André Siqueira. A empresa recebeu em novembro de acompanhar na jornada. robusto que permite que pequenas e médias empre-
2016 um investimento de US$ 19,2 milhões liderado sas gerenciem em uma única plataforma todas as ati-
pelo fundo TPG Growth. Participam também da rodada Encantados com a ideia por trás da RD, eles se juntaram vidades essenciais de execução e automação de uma
series C a Redpoint eventures, o Endeavor Catalyst e a ao Eric nesse novo empreendimento sem nem pensar estratégia de Marketing Online. O RD Station é uma
DGF Investimentos. duas vezes. O começo do negócio foi turbulento, mas solução simples e intuitiva, e se você empreendedor
os empreendedores nunca deixaram de acreditar e não está sentindo essas dores…é só dar uma olhada na
Mas a história dos 4 começa bem antes dessa aventura. mediam esforços para dar forma ao negócio. plataforma aqui. Além disso, a empresa tem iniciativas
como uma série de conteúdos gratuitos, bem como o
Juntando gente boa Uma dor sentida na pele maior evento de marketing digital da américa latina, o
Quando saiu da faculdade de engenharia, Eric fundou Em 2005, quando Eric fundou a Praesto, sofreu na pele RD Summit.
seu primeiro negócio, a Praesto, uma empresa de desen- com as dificuldades de promover o negócio devido aos
volvimento de soluções mobile inspirada por uma série altos custos e ineficiências do marketing tradicional. A Resultados Digitais é um dos maiores cases de sof-
de viagens ao exterior e pelo tempo em que trabalhou Cansado dessa realidade, ele começou a se capacitar e tware as a service no Brasil, construída por empreende-
na Fundação Certi, referência em inovação e desenvol- procurar formas inovadoras e inteligentes de anunciar dores protagonistas dessa nova geração de empresas
vimento de tecnologia. Ao entrar de cabeça nesse uni- seus produtos. Nessa procura, ele descobriu as técnicas de tecnologia no país. Temos muito orgulho em tê-los
verso, Eric descobriu o movimento das Lean Startups, de inbound marketing para promover sua empresa na como Empreendedores Endeavor.
um conhecimento que, depois de algum tempo, duran- web e percebeu o tamanho da oportunidade de auxiliar
te a conStrução da Resultados Digitais, foi muito útil. empresas a reinventarem suas estratégias de marketing.
EMPREENDEDOR
DESDE
CRIANCINHA
Ter um emprego
estável e salário certo?
Isso passou longe dos
sonhos deles.

02
empreendedor desde criancinha

É MELHOR
DEVOLVER DO
QUE RECEBER
Enquanto alguns adolescentes estavam planejando seus finais
de semana, Ofli Guimarães e Israel Salmen estavam planejando
seus próximos negócios. Veja a história desses dois jovens
mineiros à frente da plataforma de cash-back Méliuz.

Israel começou bem cedo: com 14 de Governador Valadares (MG) e


anos, aprendeu sozinho a progra- passou a faturar com a venda de
mar e já se aventurava como de- patrocínios. O que pode parecer,
Israel à direita e Ofli à esquerda, senvolvedor. Criou um site de fotos hoje, um mercado nichado demais,
fundadores do Meliuz
voltado para a comunidade gospel rendeu frutos e o levou a trabalhar
43_empreendedor desde criancinha É melhor devolver do que receber

com eventos evangélicos. Ofli, por outro lado, Ofli e Israel venderam o negócio e começaram, Primeiros passos e tropeços
não tinha um público tão definido. Dos 17 aos do zero, um novo conceito. A inspiração esta- No comecinho, a meta era ter pelo menos 10
25 anos, foram 8 negócios iniciados, que iam va nos “ame-ou-odeie” programas de fidelida- lojas virtuais parceiras, mas eles já começa-
de marca de camisetas a aluguel de maquiná- de. No caso de Ofli, estava mais para “odeie”, já ram superando expectativas, com 16. Entre
rio de construção. que os pontos que ele juntava expiravam mais elas, nomes grandes como Americanas, Giu-
rapidamente que a oportunidade que ele teria liana Flores e Ingresso.com.
Espírito empreendedor aguçado? Bem óbvio de usá-los. Para ele, os programas não geravam
que sim. Mas se é no fracasso que mais se um valor tangível nem beneficiavam o usuário Só que, apesar do aparente sucesso, Ofli e Is-
aprende, os dois já estavam com bastante ex- como poderiam. Ao levar essa frustração até Is- rael fizeram o caminho inverso. Como conse-
periência acumulada para fundar o Méliuz. rael, descobriram que ela era compartilhada por guiram um investimento antes mesmo de ter
mais pessoas e começaram a pensar em um o negócio estabelecido, ficaram ansiosos para
Uma ideia milionária modelo ganha-ganha-ganha. Foi assim que che- lançar a plataforma.
A história começa na Universidade Federal garam à ideia de cash-back para o e-commerce.
de Minas Gerais. Pouco depois de se conhe- “O dinheiro tirou nosso foco”, diz Israel.
cerem, na faculdade de economia, resolve- A proposta era simples: anunciante anuncia
ram montar juntos uma gestora de investi- loja; cliente compra da loja; anunciante ganha “Sem dinheiro, a gente teria corrido mais atrás
mentos. A empresa ia bem, mas as falhas de comissão da compra; anunciante divide co- de boas pessoas para o time, que ajudassem
percurso foram várias. Em certa altura, nem missão com cliente; cliente recebe parte do a gente a errar mais rápido, e de uma base de
eles nem o time estavam muito engajados. dinheiro da compra de volta. Cha-ching! Bom clientes apaixonados, que ajudassem a gente
Dessa empreitada, tiraram duas das lições para todo mundo. a errar menos”.
mais importantes sobre seus objetivos: pres-
tar muita atenção no caminho até eles e que Tão bom que as primeiras vendas acontece- O que aconteceu foi que estudaram pouco
nunca sejam reduzidos a fazer dinheiro. Era ram logo no dia seguinte do lançamento do sobre onde investir e demoraram até validar
hora de buscar novos ares. site, em setembro de 2011. o modelo. Nisso, a grana começou a minguar.
44_empreendedor desde criancinha É melhor devolver do que receber

Em 2012, o Méliuz foi selecionado para


participar do Startup Chile, progra-
ma de aceleração no qual receberam
mais de US$ 40mil de capital semen-
te, mentorias e contato com uma rede
de empreendedores do mundo todo —
só ali onde trabalhavam, estavam mais
de 100 startups. Além disso, novos de-
senvolvedores entraram para o time e
solidificaram o produto como um todo,
tudo em apenas seis meses.
/
O que aconteceu Ganha-ganha-ganha
foi que Quando Ofli e Israel voltaram para o
Brasil, eles já tinham atingido o breake-
estudaram ven, construído uma equipe de 6 pes-
pouco sobre soas e montado seu primeiro escritório, trar e poder comprar o que está bus- por encontrar preços mais competiti- Time da
em um pequeno apartamento em Belo Meliuz
onde investir cando, como a sensação de estar sendo vos no Méliuz. Sem saber o que fazer em novo
Horizonte. Começava a se comprovar a recompensado com um valor que você com o dinheiro que recebia depois das escritório
e demoraram escolha do nome. Méliuz, em latim, sig- pode usar onde quiser. compras, ela teve a ideia de juntar tudo
até validar o nifica “melhor”. E sendo, de fato, o me- em uma caderneta de poupança para
modelo. Nisso, a lhor programa de recompensa, o Méliuz Julia é uma cliente que tirou bastante a filha: “Compro as coisas que ela pre-
cumpriria seu papel de criar momentos vantagem disso. Quando estava grá- cisa com desconto e ainda junto uma
grana começou mágicos na jornada do consumidor. Ou vida, ela passou a comprar os itens graninha para o futuro dela”. Como a
a minguar. seja, não só há a experiência de encon- para o enxoval da bebê pela internet, plataforma também dá bônus em di-
45_empreendedor desde criancinha É melhor devolver do que receber

nheiro por indicações, Julia compartilhou seu o aumento foi de 190%. Eles não só geraram uma startup recebeu o prêmio de R$ 50mil e
caso nas redes sociais e, até onde se tem no- fidelidade, como a base de clientes do Wal- cinco meses de mentoria.
tícia, conseguiu juntar mais de R$1.200,00 - mart também se renovou.
que não expiram. Se tem uma característica do Méliuz que se
Cash-back & Giveback sobressai é aquele espírito empreendedor
Por histórias assim, o Méliuz devolve mais Com tanto caso para contar em apenas cinco aguçado que Ofli e Israel carregam, citado no
de R$ 28 milhões em cash-back. Mas lembra anos de existência, o Méliuz já virou destaque início deste texto. Está no sangue. Israel afir-
que é bom para todo mundo? Vale para os e- em São Pedro Valley - o Vale do Silício mineiro. ma que “escutar as pessoas que já fizeram
commerces que participam também. Inclusi- antes de você vale ouro”. Enquanto ele e Ofli
ve, 100% dos clientes que resgatam dinheiro Hoje com mais de um milhão de cadastros, terão a oportunidade de escutar, terão tam-
na plataforma voltam a comprar na mesma aquelas iniciais 16 lojas parceiras já viraram bém a chance de falar e inspirar futuras gera-
loja por meio do Méliuz. Às vezes, também mais de 2.000. O time de seis pessoas vi- ções de empreendedores, como os verdadei-
é mais estratégico para as lojas darem cash rou um time de mais de quarenta. O pequeno ros exemplos que são.
-back que descontos. apartamento que comportava o escritório vi-
rou um espaço de três andares. E a cada ano,
O Walmart, por exemplo, precisava aumen- os números crescem exponencialmente.
tar seu volume de vendas de uma forma mais
eficiente. No aniversário do Méliuz, a vare- Da experiência no Startup Chile, surgiu ainda a
jista aumentou o cash-back oferecido de 3% cultura de giveback dos empreendedores. Ou
para 7%, durante uma semana, e para 10%, seja, reconhecendo a ajuda que receberam e
numa campanha especial durante os três dias os fez crescer, resolveram também devolver
seguintes. As vendas aumentaram 83% na à sociedade. Em 2014, o Desafio Méliuz foi
campanha de aniversário, em comparação a lançado para incentivar projetos inovadores
uma semana normal. Na campanha especial, a também progredirem. Dos 650 avaliados,
46_empreendedor desde criancinha empoderar o consumidor

EMPODERAR O A FortBrasil, dos empreendedores Juliana Freitas, Marcelo


Filho e José Neto, oferece produtos financeiros para as classes

CONSUMIDOR
C e D e transaciona R$ 650 milhões por ano; para chegar lá,
eles tiveram de ultrapassar barreiras como a inadimplência.
Conheça a história deles.

Quando criança, Juliana Freitas concorrentes”, diz Marcelo. “O en-


adorava brincar de ser dona de um tusiasmo que o fazia acordar cedo
negócio. Criava loja de roupas, su- todo dia e trabalhar nos fins de se-
permercado, cabeleireiro e o que mana chamava minha atenção.”
mais a imaginação inventasse. A
vocação empreendedora vem de E foi bom ter esse exemplo bem
berço. Tanto é que seu irmão mais próximo, porque mais tarde os
velho, Marcelo Filho, também se- dois irmãos se tornariam os sócios
guiu por esse caminho. à frente da FortBrasil, uma fintech
que oferece produtos financeiros
As pegadas que os guiavam eram desenhados para pessoas das clas-
do pai, um homem sem formação ses C e D, ao mesmo tempo em que
acadêmica, mas que construiu uma atende a necessidade de médios
Da esquerda para a direita: Marcelo, empresa de alcance nacional indo varejistas de fidelizar seus clientes
Juliana e José, fundadores da FortBrasil
atrás de um sonho. “Ele era admira- por meio de um cartão de crédito
do por clientes, fornecedores e até com sua marca.
47_empreendedor desde criancinha empoderar o consumidor

Logo a dupla virou um trio, com a adição de José Neto Com isso, aquele primeiro pensamento de ter uma for- Um chamado familiar
à sociedade. O resultado, os números mostram: há mação mais acadêmica ficou para trás e Juliana mer- Enquanto uma parte da família estava concentrada
mais de uma década, a empresa cresce pelo menos gulhou de cabeça no negócio: “Eu adaptei meu sonho.” em desenvolver a empresa, Marcelo desenvolvia seu
50% a cada ano. lado mais social e humanitário. Por 16 anos viajou por
O funcionário que virou sócio entre áreas vulneráveis de Ceará, Sergipe e Bahia para
Adaptando o sonho José teve vários pontos em comum com Juliana, em ter- desenvolver projetos relacionados a desenvolvimento
Por falar em números, Juliana gosta bastante deles. mos de formação. Ele foi contratado para trabalhar na e ensino de adultos.
Sempre foi estudiosa, principalmente quando o as- FortBrasil em 2002, mas ser funcionário não era bem
sunto era matemática. E, apesar da veia empreende- seu propósito. Marcelo assumiu a liderança de diversas frentes nessas
dora, durante a escola ela sonhava em aproveitar seu regiões, como de uma estação de rádio e de um centro
bom desempenho acadêmico para eventualmente Sua família sempre enfatizou muito a importância dos de formação para jovens voluntários.
estudar em Harvard e se tornar uma executiva inter- estudos como único caminho para “ser alguém na vida”.
nacional. Desde pequeno ele viveu em um ambiente meritocráti- Ele empreendia o tempo todo, mesmo que não
co e entendeu que seu esforço levaria a resultados no fu- se reconhecesse ainda como empreendedor.
Acabou passando em primeiro lugar no vestibular, na turo. Ao mesmo tempo, descobriu um lado competitivo
Universidade Federal do Ceará, onde cursou adminis- e também colaborativo praticando esportes e jogando Em 2001, morava na Itália, onde cursou ciências da edu-
tração. Enquanto se decidia sobre seu futuro, topou jogos de estratégia como War ou Banco Imobiliário. cação e esteve empenhado no trabalho junto à comu-
o convite de seus irmãos para montar uma factoring nidades de baixa renda. Até que recebeu o chamado da
— um mecanismo de fomento mercantil que permite Por escutar sempre o pai, economista, falar de finanças, irmã e decidiu fazer a diferença mais perto de casa.
empresas negociarem seus créditos. Ela tinha apenas negócios e política em casa, José também afiou seu ins-
20 anos e já tocava a operação. tinto para entender como funciona o mercado. Acabou Com a capacidade da equipe que já formava a FortBra-
seguindo esse caminho na faculdade, por conta de uma sil e com o reforço que chegava, o factoring cresceu ra-
“Quando comecei a viver o dia a dia de vontade de saber como construir uma empresa bem su- pidamente – chegou a ser o maior do Nordeste.
montar a empresa, comecei a me apaixonar cedida. José queria mesmo era empreender. Em pouco
de verdade por empreendedorismo”, conta. tempo, ele já havia conquistado seu lugar como sócio. Nesse ínterim, tiveram também uma experiência com
48_empreendedor desde criancinha empoderar o consumidor

microcrédito para pessoa física. Só que nem factoring No ímpeto, na loucura, o crescimento foi gigante, mas extremamente sofisticada de análise de risco, mais pre-
nem microcrédito eram negócios escaláveis. “Ganha- a inadimplência foi maior ainda. Como faltou planeja- cisa que a de muitas corporações de grande porte.
mos dinheiro, crescemos, mas eu não via muito futu- mento, faltou também pensar na gestão de risco.
ro. Dava uma grande ansiedade.”, diz Juliana. Desde então, mantiveram um crescimento de pelo me-
“A gente fez uma coisa afobada, sem entender. Mas é da nos 50% ao ano.
Mudança de foco minha natureza olhar para número, para métrica, então
O desconforto da CEO casou com um comportamento comecei a aprofundar no problema.”, lembra Juliana. Por “Essa vida de empreendedor tem desafios diferentes
do mercado que vinha colocando a FortBrasil em uma isso, ele foi identificado (e solucionado) rapidamente. todo ano. O primeiro grande susto foi o episódio da
posição desfavorável, com a entrada de grandes ban- inadimplência. Depois que a gente aprendeu, os desa-
cos no mercado de factoring. Além disso, o cheque es- Desacelerando fios foram mudando”, diz. Isso porque o sonho é gran-
tava desaparecendo e aumentava o uso de cartão de A medida mais prudente nesse momento era colocar o de: a FortBrasil não quer impactar somente o Nordeste,
crédito. Viram ali uma oportunidade. pé no freio. E não só isso: entender de fato que merca- como o Brasil inteiro.
do era aquele em que eles haviam se metido.
Só havia um detalhe: eles entendiam pouco ou quase Hoje, a empresa transaciona R$ 650 milhões a cada ano
nada do segmento de cartão de crédito. “No ímpeto, na Por dois anos, os três sócios correram atrás de todo o e está no ranking do Great Place to Work desde 2011.
loucura, fomos fazer esse negócio”, conta Juliana. conhecimento que puderam. Buscaram mentorias com Em 2014, o prêmio os reconheceu como uma das me-
especialistas, contrataram uma consultoria para lhes lhores empresas para se trabalhar da América Latina.
Começaram com cartões de crédito private label — ou ensinar processos, trouxeram um conselheiro experien-
seja, com a marca do parceiro — primeiro para uma te. No início de 2010, sentiam segurança para ajustar o “Nós vamos fazendo as coisas e não paramos para co-
rede de farmácias e depois para times de futebol do produto e pivotar o negócio. memorar, mas tem muita coisa para nos orgulharmos”,
Ceará. Colocaram vários promotores na rua, com es- conta a CEO. “A gente está empoderando — e acho que
tandes em frente a lojas todos os dias, fazendo cente- As atividades de factoring continuavam ativas, mas foram isso é um grande orgulho — classes emergentes de con-
nas de cadastros de clientes interessados em adquirir perdendo força dentro da empresa conforme as opera- sumo. Hoje temos 1,2 milhão de clientes. São pessoas
os cartões. ções de cartão de crédito aumentavam, até que viraram que não tinham acesso a crédito. Hoje, podem comprar
o core business da FortBrasil. Eles criaram uma estrutura e compram.”
empreendedor desde criancinha

UM ESCRITÓRIO
DE 1,5 M x 2 M
Empreendedor serial desde criancinha, Brian Requarth não
se deixou intimidar pelos grandes players que já existiam no
mercado. A VivaReal é, hoje, o maior deles.

Norte da Califórnia, década de 90. viu o exemplo de que era possível


Brian ainda tinha seus 8 ou 9 anos crescer e não ter um chefe.
de idade, mas já formava muito cla-
ra a ideia de ser dono do seu des- Entre a infância e a adolescência,
tino. Seu pai fundou uma empresa se meteu em diversos tipos de ini-
que fazia pavimentação para esta- ciativa. Se não estava alugando sua
cionamentos e outros projetos de jaqueta do Michael Jordan para os
construção civil. Sua mãe, psicólo- amigos da escola, estaria vendendo
Brian Requarth, ga, atendia pacientes em um con- doces, relógios, ou dando aulas de
empreendedor da Viva Real sultório próprio. Neles, o menino natação. Chegando a até 90 alunos
50_empreendedor desde criancinha UM ESCRITÓRIO DE 1,5 M x 2 M

na piscina de casa durante o verão, ele Durou 7 anos no total, dos quais só
conseguia gerar US$1.500 por sema- um estava planejado. A Patagônia nem
na - descontados os 15% de aluguel do aconteceu, parou no meio do caminho.
quintal, claro, pago aos seus pais. Oficializaram a união alguns anos de-
pois, com um casamento colombiano e
Todas as “brincadeiras” de empreender um norte-americano.
sempre tiveram um propósito adulto. E
em todas elas, o olho para negócios só Para se manter no país, o empreen-
foi ficando mais apurado. Na Colôm- dedor desenvolveu algumas ideias. A
/ bia, por exemplo, foram mais 4 empre- primeira foi uma escola de inglês, que
sas iniciadas. dava aulas para grupos em empresas.
Para se manter
no país, o Como assim, Colômbia? Eis que, um dia, Brian se vê com o visto
empreendedor Outro incentivo que Brian recebeu dos vencido. As implicações não eram graves,
pais foram as viagens que a família fa- mas a multa era inevitável. Na fila da imi-
desenvolveu zia. Sempre encantado por outras cul- gração para quitar sua dívida, percebeu, tros assuntos e para a descoberta de Brian em
algumas ideias. turas, acabou se graduando em espa- próximo a ele, um rapaz alto, de cabelos um interesse comum por tecnologia, time de
nhol na Universidade de San Diego. castanhos, com um passaporte alemão ele e Thomas Floracks trocaram con- esportes
A primeira foi nas mãos. Logo lembrou de um executivo tatos. Brian não ganhou um professor
enquanto
criança
uma escola Lá, se apaixonou por Andrea. Passada a colombiano, seu cliente do curso, que es- dessa vez, mas ganhou um sócio.
de inglês, que formatura, ela precisou voltar para casa, tava buscando aprender o idioma.
dava aulas em Bogotá. Brian pegou o carro e resol- Juntos, fundaram a ColConnect, ver-
veu que faria uma viagem pela América “Ei, você não se interessaria em ensi- são curta para Colomba Connect (“um
para grupos em do Sul até a Patagônia, eventualmen- nar alemão por um dinheiro extra?”, nome horrível para uma empresa”,
empresas. te parando para visitá-la. Visita longa! Brian puxou a conversa. Dali para ou- brinca Brian), que construía sites para
51_empreendedor desde criancinha UM ESCRITÓRIO DE 1,5 M x 2 M

outras organizações. O primeiro trabalho Agora o desafio não era só como, mas onde. convidaram Diego para passar um mês
foi para uma “fazenda de árvores” — co- Decidiram apostar em três mercados po- com eles na Colômbia.
muns nos EUA para produção de madei- tenciais: Colômbia, México e Brasil.
ra e venda de pinheiros no Natal — onde Com uma estratégia definida, apertaram as
Brian fazia bicos de papai Noel quando No final de dezembro de 2008, indo de Bue- mãos e o mandaram de volta para o Brasil
mais novo. Então, se especializaram em si- nos Aires para o Rio de Janeiro para passar com US$ 20 mil. Sem contrato nem nada.
tes para corretores imobiliários e expandi- o Réveillon, Brian recebe uma solicitação de Diego começou a operação em um quarti-
ram bastante a cartela de clientes. contato no LinkedIn. A mensagem dizia algo nho em São Paulo e trabalhou sozinho por
como “Olá, estudamos juntos na Argentina aqui por dois anos.
Só que veio a crise de 2008, e com isso em 2002, estou me reconectando”.
uma evasão da clientela. O tombo foi gran- Melhor pedir desculpas que
de, mas foram ágeis em perceber que o ne- Diego Simon, brasileiro, foi seu colega de pedir permissão
gócio não iria para frente. classe em um intercâmbio. Brian zomba da De uma lista de 10 caminhos importantes
situação dizendo que ele provavelmente só para seguir, priorizaram 3: incluir imóveis /
O MercadoLivre dos imóveis buscou uma lista antiga de nomes e saiu no site, gerar audiência e conquistar clien-
Sentado com seu computador em um café, adicionando todo mundo. “Mas como eu tes buscando imóveis. Por mais que fossem Pouco tempo
Brian se deparou com um estudo de caso estava em Buenos Aires naquele momen- interdependentes, teriam que começar pe- depois, os dois
de Harvard trazendo a argentina Mercado- to e já havia decidido abrir um negócio no las imobiliárias. Diego fez mais de 1.000 sócios logo
Livre, que havia realizado seu IPO no ano Brasil, achei uma coincidência interessan- visitas no primeiro ano, mas o início foi so-
anterior. Estudando um pouco mais sobre te. Aceitei o contato e respondi a ele”, diz. frido. “Por que nós anunciaríamos com vo- convidaram
o modelo de marketplace e refletindo so- “Falei da nossa ideia e também contei que cês? Vocês não têm nenhuma propriedade Diego para
bre a experiência de encontrar imóveis na não conhecia ninguém por lá. Perguntei se no site”, eles contestavam. passar um mês
América Latina, teve um grande insight: ele não topava bater um papo.”
ser a plataforma que pode solucionar esse Para enfrentar a resistência, a alternativa com eles na
problema. Pouco tempo depois, os dois sócios logo seria incluir os imóveis mesmo assim. Fo- Colômbia.
52_empreendedor desde criancinha UM ESCRITÓRIO DE 1,5 M x 2 M

ram bombardeados de ligações com ame- Se mudaram com tudo para um peque- “Fiquei fisicamente doente. Senti que era o
aças de processo e contrataram um estagi- no escritório na rua Frei Caneca e foram - fim. Eu já tinha investido todo o meu dinhei-
ário para gerir a crise. Ele explicava que os Brian, Andrea e Thomas - dormir no sofá ro e o de vários familiares”, conta Brian.
corretores não precisavam se preocupar, do Diego por alguns meses.
que o VivaReal geraria contatos para eles. O fracasso estava mesmo muito próximo.
Assim, essas empresas raivosas se torna- Balança ma$ não cai Mas, aos 45 do segundo tempo, um anjo
ram seus primeiros clientes. Apesar de sempre ter recebido olhares (literalmente) apareceu. Simon Baker era
atentos de investidores, dinheiro não veio um dos maiores especialistas do mercado
A partir disso, Diego encontrou as melho- tão fácil para sustentar os primeiros pas- imobiliário no mundo e ex-CEO de uma
res formas de conquistar novas imobiliáras: sos da VivaReal. Inclusive, por conta de das gigantes do setor. Enfim, fecharam
/ 1º, colocando o Brian para fazer ligações. custos imprevistos, Brian precisou ven- uma rodada de investimento que não só
A operação Quando atendentes escutavam um gringo der seu apartamento e pedir dinheiro em- salvou a empresa financeiramente, como
brasileira na linha, facilmente passavam a chamada prestado da família e de amigos mais pró- agregou um conhecimento extraordinário.
para a direção. 2º, oferecendo uma fase de ximos, no início. Mas não seria a primeira
cresceu e teste gratuito, sem nenhum compromisso bronca com verba que ele precisaria en- Vale destacar, por 3 anos Brian insistiu
os números ou esforço por parte do potencial cliente. frentar. que Simon investisse na VivaReal. Foi só
convenceram os Com alto investimento em tráfego orgâni- quando ele veio a um evento — organiza-
co, ele pôde atrair compradores e garantir Já instalados no Brasil, com aproximada- do pelos três sócios no Brasil em apenas
sócios. Em 2011, que os anunciantes em trial fossem con- mente 25 funcionários, o caixa foi min- cinco dias — que ele percebeu o potencial
concentraram vertidos em clientes pagantes. guando. Em junho de 2011, faltando dez do time e do negócio. Foi também quando
todos os seus dias para terminar o mês, sobravam ape- os fundadores perceberam a relevância
A operação brasileira cresceu e os núme- nas 87 dólares na conta. Eles tinham ins- de investir em conteúdo, um dos segre-
esforços no ros convenceram os sócios. Em 2011, con- tituído uma regra de sempre pagar os sa- dos para o enorme número de visitantes
Brasil. centraram todos os seus esforços no Brasil. lários no prazo, mas dessa vez não ia dar. da plataforma atualmente.
53_empreendedor desde criancinha UM ESCRITÓRIO DE 1,5 M x 2 M

Power to the people! A missão, como a parede do es-


O “modelo Simon Baker” de preços bai- critório mostra em letras bem
xos de entrada, planos ilimitados e sim- grandes, é ajudar as pessoas a
plicidade foi introduzido e, com muito encontrarem o imóvel de seus
trabalho duro, o negócio disparou. Mes- sonhos. “Power to the people”
mo com players mais antigos e consoli- é, aliás, um mote para Brian.
dados no mercado, o VivaReal tomou a
liderança e recebeu injeção de capital de “Tornando processos mais transparen- Espaços de
vários outros anjos e fundos. tes, elas assumem o comando no pro- convivência no
escirtório do Viva
cesso de decisão e são empoderadas Real. Abaixo,
Hoje com 4 milhões de imóveis ativos e para melhorarem suas próprias vidas”, colaboradora
afirma. Na parede estão também os va- fazendo carinho
15 milhões de visitantes por mês, o Viva- na Dalila
Real é o maior marketplace que conecta lores da empresa, que os próprios fun-
corretores e imobiliárias com quem bus- cionários reformularam coletivamente.
ca propriedades para alugar ou comprar. Mesmo com porte de PME, a cultura de
A estrutura ocupa um prédio de onze an- Por falar em coletivo, as áreas de con- startup nunca se perdeu. Aliás, quando
dares na Bela Cintra, em São Paulo, que vivência agregam mesas de ping-pong, o assunto é essência, nada se perde. No
comporta 400 colaboradores, além de pufes, grama sintética e até a presença 9º andar, tem até a réplica do primeiro
outras startups selecionadas, às quais a da cachorrinha Dalila, que todo fim de escritório do Diego, de 1,5m x 2m. A his-
empresa cede o espaço por tempo de- semana vai para a casa de algum funcio- tória da empresa é contada com fotos
terminado. Outros 140 colaboradores nário (a lista de espera é de três meses!). e texto em biombos, para que ninguém
estão espalhados nos outros escritórios Tudo como manda o figurino das empre- esqueça do trabalho que deu e do longo
pelo país. sas mais queridas do Vale do Silício. caminho ainda a percorrer.
54_empreendedor desde criancinha UM ESCRITÓRIO DE 1,5 M x 2 M

O poder do exemplo o sonho nos últimos anos, mas falan-


É fácil perceber, por sua trajetória e do da empresa, um sonho é que a Vi-
energia, que Brian é altamente in- vaReal seja sinônimo de imóveis. Ain-
quieto. Admite que ultimamente, da estamos bem longe disso. O fato
Time do Viva com dois filhos, tem se esforçado de ter milhões de usuários é demais,
Real. Abaixo, mas queremos nos tornar essenciais,
imagem do
para dosar esse lado e chegar em
9o andar da casa mais cedo. Mas um espírito ajudar todo mundo a tomar uma boa
empresa, empreendedor incansável e a von- decisão com total transparência.”
com a minuta
do primeiro tade de genuína de deixar um lega-
escritório do que fez com que ele seguisse em O outro sonho é pessoal. Afinal, se
frente nos momentos mais difíceis e os pais de Brian tiveram tanta culpa
levasse a VivaReal a um crescimen- pelo grande empreendedor que ele
to de quase 100% ao ano. se tornou, é natural que ele passe
isso adiante. “Quero ser o melhor pai
Perguntado sobre o sonho daqui para possível, ser um exemplo para meus
frente, Brian diz que é injusto falar de filhos”. Tudo indica que ele está no
um só. “Eu diria que já estou vivendo caminho certo.
55_empreendedor desde criancinha os sonhos que eu não segui

DAY 1

OS CONSELHOS
QUE EU NÃO SEGUI
Abrir uma empresa nem sempre crescer, abrir um comércio pra
foi o sonho de Salim. Quando pe- você, ganhar dinheiro, comprar
queno, encantado pelos sons do uma radiola e todos os discos de
piano que um amigo sempre toca- pianistas que quiser”.
va, ele queria ser pianista. O sonho
não foi muito longe depois que Sa- Desde então, toda vez o pai de Sa-
lim contou para sua família o que lim perguntava “o que você vai fa-
ele queria ser quando crescesse. zer quando crescer?”, ao que ele
“Meu pai ficou tão bravo que me sempre respondia: “vou abrir um
olhou nos olhos e disse: você vai comércio pra mim”.
empreendedor desde criancinha

AMIGAS,
COLEGAS, SÓCIAS
“Se faz sentir, faz sentido”: conheça a história de Luciana
Guimarães e Vanessa Vazquez, da Íntegra Medical

Quem nunca torceu o nariz para o bom humor da Vanessa conquis-


a namorada nova do irmão? Não tou a Luciana. O namoro terminou,
precisa nem de um motivo espe- mas as duas seguiram firmes como
cífico, às vezes é o santo que não amigas de faculdade, colegas de
bate mesmo. Bom, Luciana não ia trabalho e sócias na parceria mais
com a cara da cunhada, Vanessa. desafiadora de todas: a de empre-
Fez o que podia para separá-los, ender juntas.
mas vendo que não ia conseguir,
começou a despertar para o que ti- Esse é o improvável caso de Lucia-
Luciana à direita e Vanessa nham em comum, em vez do que na Guimarães e Vanessa Vazquez.
à esquerda, empreendedoras era divergente. Elas tinham apenas Improvável porque o ditado, “ami-
da Íntegra Medical
15 anos de idade e, eventualmente, gos, amigos, negócios à parte”, é
057_empreendedor desde criancinha amigas, colegas, socias

ditado por um motivo. Só que ele não se apli- Líder desde menina a futura empreendedora. O pai de Luciana sem-
ca a quem compartilha dos mesmos valores e A trajetória de Luciana começa cedo. Paulista- pre deu duro para garantir o conforto dos três:
princípios, a quem tem visões semelhantes de na da zona oeste de SP, ela sempre se mostrou dela, do irmão e da mãe. Farmacêutico, trabalhou
negócio e a quem o ato de empreender está re- curiosa e inquieta – o que até contrasta com a por muitos anos no departamento comercial de
lacionado a um sentido. fala pausada e calma por meio da qual se ex- indústrias do setor até que, ao lado de amigos,
pressa. Mostrou também, desde menina, duas resolveu abrir a própria empresa – a Oncomed,
Pois é, o sentido as responsáveis pela Íntegra características marcantes da empreendedora primeira distribuidora de medicamentos onco-
Medical jamais deixaram de buscar. A história que ela viria a ser: o espírito coletivo e a postura lógicos do país.
delas tem a ver com a tal da zona de conforto, de liderar.
onde se encontraram em diferentes momentos Esse fato a influenciou profundamente. Embo-
de suas carreiras e onde nunca deixaram de fa- Na escola estadual em que estudou a vida in- ra o pai fosse sócio minoritário e tivesse per-
zer certas perguntinhas, tão cruciais quanto es- teira, costumava tomar a dianteira. “Nas festas fil mais conservador, Luciana reconhece a im-
pinhosas: e nos eventos, eu sempre ajudava a organizar”. portância da decisão que ele tomou na época.
Era assim no esporte, também: quando come- “Dentro das possibilidades, meu pai empreen-
“Para onde isso vai me levar? qual é o sentido çou a jogar vôlei, logo se tornou a capitã do time. deu. Ele não era sócio-investidor, tinha só uma
do que estou fazendo?”. pequena porcentagem. Mas começou algo que
Mas ela não queria ocupar uma posição de des- depois foi longe”.
As respostas, como você pode imaginar, fizeram taque. Era mais uma dedicação inata à classe,
com que se reinventassem. Que tomassem deci- ao time que pertencesse. Ela sentia prazer em A empresa do pai a influenciava no próprio dia
sões importantes – algumas bem difíceis, como articular e movimentar grupos. A liderança vi- a dia. Ao sair da escola, de tarde, ia para lá. Pre-
veremos – e que, mais de uma vez, saíssem da- nha naturalmente, como consequência dessa feria aquele ambiente movimentado ao sosse-
quela região tão nociva ao ato de empreender. tomada de iniciativa. go do lar e tentava participar da forma que fos-
Que as levaram a construir, ainda jovens, uma se possível, geralmente atendendo ao telefone,
notável trajetória empreendedora, que merece Em casa de ferreiro, espeto é de ferro que não podia ouvir tocar. Na época, mal tinha
ser compartilhada. Os exemplos dentro de casa também marcaram completado quinze anos.
058_empreendedor desde criancinha amigas, colegas, socias

Vocação para cuidar da infância, da curiosidade e da busca, me Amigas, colegas e, a partir


de pessoas levou àquele lugar. Você ter paixão pelo de agora, sócias
Alguns anos depois, essa participação au- que faz, você acreditar que está numa cau- A percepção foi compartilhada com Va-
mentou. Ao lado do irmão e da mãe, Luciana sa que faz sentido, é fundamental.” nessa Vazquez, que à época já era amiga
/ foi se envolvendo cada vez mais com a em- de longa data e colega de trabalho. A pró-
presa do pai. A família o ajudou a reorientar as Essa paixão durou bastante. Onze anos, pria Vanessa resume bem a relação:
“Eu vi, naquele operações, dando mais atenção às pessoas. para sermos mais exatos, durante os quais
momento, que Luciana participou ativamente da gestão da “Eu e a Lu temos uma sintonia de alma.
Como consequência dessa mudança de po- empresa da família. Ao longo desse perío- Algo difícil de explicar. Respeito, admira-
aquela veia da do, foi reunindo uma bagagem administra-
sicionamento, o negócio começou a pros- ção, orgulho, alegria e bondade são os pi-
infância, da perar. A tal ponto que, no quarto ano de tiva considerável. Até que a Oncomed foi lares da nossa relação, e os nossos valores
curiosidade e da atividades, deu-se o primeiro movimento vendida para a Audifar, uma das líderes do são os mesmos”.
importante para a futura carreira: a com- segmento. E, quando a nova gestão assu-
busca, me levou miu, ela entrou em contato com uma área
pra da participação dos outros sócios do Prova disso é o fato de que ela concordou
àquele lugar. pai por parte da família. que até então desconhecia: a hospitalar. plenamente com Luciana. Também tinha a
você ter paixão impressão de que a indústria farmacêutica
Luciana embarcou para valer na jornada. Foi quando tudo começou a mudar. Esta- enfrentava dificuldades para se relacionar
pelo que faz, mos em 2005, e o contato próximo com
Até porque, naquele momento, viu sentido com pacientes, especialmente no trata-
você acreditar no que fazia. Era ali que queria estar: aju- pacientes fez aflorar outra característica mento de doenças complexas.
que está numa dando na gestão, dedicando-se a liderar a particular de Luciana: o cuidado. Ela sem-
equipe de funcionários e se comprometen- pre se relacionou com pacientes na em- Na época, as duas compartilhavam tam-
causa que presa do pai, é verdade; mas, ao lidar com
do com as pessoas que atendia. bém o sonho grande de empreender. Mas
faz sentido, é aqueles em hospitais, percebeu que havia em quê, exatamente? Havia a percepção
fundamental.” “Eu vi, naquele momento, que aquela veia uma enorme carência de atendimento. de que o setor farmacêutico carecia de
059_empreendedor desde criancinha amigas, colegas, socias

programas de relacionamento para os pacien- Com capital inicial de aproximadamente R$ 120 com informações sobre um tratamento”, diziam
tes, é verdade. Mas como viabilizar isso? Que mil, alugaram e reformaram uma casa na Lapa, em alguns especialistas; “um site onde pacientes
produto ou serviço oferecer? De que forma São Paulo, para sediar a nova empresa. possam se informar sobre algum processo es-
atender essa demanda? pecífico”, diziam outros; “algum canal de orien-
O valor da pesquisa, tação para os pacientes”, diziam todos.
Mas… e a Audifar? mesmo que informal
Certo, certo, avançamos um pouco. O fato é Havia o espaço, havia o investimento, mas havia Com as respostas, as duas começaram a deline-
que, com a mudança de gestão, Luciana já não aquelas dúvidas ali de cima. E para respondê-las, ar o plano de negócios do futuro empreendimen-
via mais tanto propósito nas funções que exer- Luciana e Vanessa foram bater perna. Cada uma to. Eram os primórdios da Íntegra Medical, que
cia na nova empresa. Vanessa tampouco. Logo partiu para um lado para ouvir o que pensavam depois se tornou a primeira empresa a oferecer
perceberam que não conseguiriam implementar médicos, pacientes, associações de paciente, serviços de desenvolvimento de programas de
as novas ideias na Audifar. Já estavam em pro- planos de saúde etc. Pesquisas informais, mes- relacionamento com pacientes para a indústria
cesso de desconexão de algo que não fazia mais mo: elas aproveitavam os contatos que tinham farmacêutica
tanto sentido. com profissionais da saúde e marcavam reuni- .
ões e consultas para conhecer as principais de- Grávida e empreendendo?
“Desde o momento em que a Oncomed mandas. Pois é, a questão gravidez versus empreen-
foi vendida, já nos deparamos com dimento foi um dos momentos mais difíceis
diferenças de valores. E já sabíamos Na época, Luciana estava grávida de sua filha. da vida de Luciana. Um dilema doloroso, por-
que iríamos montar algo nosso”, Super grávida. E acabava por se beneficiar do que o início das operações da Íntegra Medical
conta vanessa. barrigão nas salas de espera dos médicos que coincidiu com o nascimento da filha e, naque-
visitava. Uma vez lá dentro, soltava na lata: “dou- les tempos, a empresa exigia intensa dedica-
E quando a janela da oportunidade se abriu, as tor, que tipo de serviço falta pro seu paciente?”. ção dela. Não estar tão presente na primeira
duas não hesitaram em aproveitá-la. Luciana pe- infância da criança foi algo que a marcou pro-
diu demissão primeiro, e Vanessa pouco depois. “Um 0800 para onde eu possa encaminhá-lo fundamente.
060_empreendedor desde criancinha amigas, colegas, socias

Mas isso tinha a ver, também naquele “Eu tenho uma crença muito forte na outro lado da linha, Lázaro Oliveira, de
momento, com a busca pelo sentido, vida, que sempre funcionou: se você uma grande farmacêutica. Ele disse que
com fazer algo maior que ela mesma. A não sabe o que fazer, circule!” tinha uma ideia para um projeto e que
própria Luciana o reconhece: “Quando as duas poderiam ajudá-lo.
você deixa seu filho com outra pessoa, Luciana passou a visitar empresas do se-
tem que ser por algo que valha muito a tor farmacêutico para apresentar o pro- Consistia em auxiliar pacientes porta-
pena, a realização de um sonho”. Pelo grama de apoio aos pacientes que vinham doras de câncer de mama que haviam
menos ela pôde compartilhar essas do- desenvolvendo, com uma série de solu- passado pela cirurgia. A função da Ínte-
res com Vanessa, que também é mãe. ções integradas: call center, tecnologia, gra Medical seria a de criar meios que
publicidade etc. Saía às vezes bastante incentivassem as pacientes a tomar
Hoje, Luciana tem plena consciência de confiante, mas o telefone não tocava. os medicamentos de forma adequada,
que é um modelo para a filha. A peque- para que não sofressem recaídas.
na tem a idade da Íntegra e, assim como As duas se olhavam apreensivas: ti- /
a mãe, quer botar a mão na massa o nham uma bela oferta para um pedaço Embora se tratasse de assumir um ris-
quanto antes. “Ela falou que já quer co- específico do mercado, na qual acredi- co, claro que as duas toparam na hora. “Eu tenho uma
meçar a trabalhar. Eu respondi que era tavam fortemente, mas não sabiam de E Luciana se lembra com muito carinho crença muito
cedo, que ela só tem onze anos, mas ela que forma acessar esse mercado. Nem desse momento, que considera o pon- forte na vida,
disse que quer assim mesmo”. os amigos do meio davam notícias. tapé inicial da empresa. “Foi o primei-
ro projeto, que deixou uma marquinha que sempre
O silêncio do telefone O primeiro cliente para sempre”. funcionou: se
Além dos dilemas pessoais, os dilemas e o nome profético você não sabe
de negócios também eram grandes. Até que, numa tarde ensolarada e an- Foi uma aposta, também: “No final, aca-
Qual seria o melhor caminho? O jeito siosa, 2 meses depois do início dessas bamos pagando para trabalhar. ou me- o que fazer,
foi ir pra rua e descobrir. visitas, soa o tão esperado trinado. Do lhor, para aprender”. circule!”
061_empreendedor desde criancinha amigas, colegas, socias

O título do projeto? “Vitoriosas”. O re- somos provas de que sempre tem saí- sem dúvidas faremos juntas”.
sultado foi de fato uma vitória; o cliente da”, afirma Luciana.
ficou satisfeito e outros vieram. Lucia- O sucesso da Íntegra garantiu uma São palavras de Vanessa, mas poderiam
na e Vanessa foram ampliando a ofer- ótima saída, inclusive, sendo recente- tranquilamente ser de Luciana. Afinal, o
ta de serviços e aprimorando a gestão mente adquirida por um grupo estran- sentido de empreender é o mesmo para
para consolidar o negócio; enfim, par- geiro: “vendi para uma empresa ame- as duas. E a história mostra que elas
tiram “para as cabeças”, nas palavras ricana sem nem falar inglês fluente. Às não terão medo nenhum de continuar a
da primeira. vezes a gente acha que algo é limitador buscá-lo.
e não é”, conta.
A partir desse momento, a empresa só
cresceu. As duas se mantiveram na gestão, mas
se ocupando de áreas diferentes da-
O que esperar do futuro? quelas anteriores. E você acha que elas
Que continue fazendo se acomodaram nessa nova “zona de
/ sentido conforto”? Ledo engano! Tanto Luciana
Foi uma aposta, Em 2016, a Íntegra Medical completou quanto Vanessa estão de antenas bem
também: “No 11 anos – uma história movimentada, acionadas, sempre em busca de opor-
é verdade, mas sem dúvida bem-suce- tunidades que possam surgir e prontas
final, acabamos dida. As duas se sentem muito gratas para aproveitá-las.
pagando para pelos aprendizados da jornada.
trabalhar. ou “Sei que vou empreender novamente.
“Empreender é uma montanha-russa, Eu tenho muito prazer em fazer o bem
melhor, para tem altos e baixos. Vão acontecer os e gerar empregos. Isso alimenta minha
aprender”. erros, haverá os dias difíceis. Mas nós alma. Ainda não sei o que será, mas
empreendedor desde criancinha

A BUSCA POR UM
NEGÓCIO PERENE
Sem dinheiro e sem experiência, mas com convicção e um sonho
grande: a história de Lito Rodriguez e a criação da DryWash

Todos os dias, o jovem Lito Rodri- sionalização e, nesse processo, Lito


guez olhava para o relógio por vol- foi mandado embora.
ta das 15h. Ainda faltavam duas
horas e meia até dar o horário de Poderia ter sido um evento traumá-
ir para a faculdade, mas ele já não tico na vida do garoto, mas ele saiu
aguentava mais ficar no escritório. dali com uma única convicção: a de
Só não se demitia porque não que- que ele nasceu para empreender.
ria deixar seu pai na mão, por mais
que detestasse trabalhar na área Até ali, a experiência de Lito havia
Lito Rodriguez, Diretor financeira da empresa da família. sido bastante rica, mas aos poucos
Presidente da DryWash Até que ela passou por uma profis- foi se tornando um cara triste. Via-
63_empreendedor desde criancinha a busca por um negócio perene

se obrigado a passar dias inteiros lidando ou refletiu sobre os riscos envolvidos. Foi não está legal, saia. Se uma relação não
com a pressão dos bancos, buscando di- um movimento inato, tão natural quanto se está boa, saia. Realize o prejuízo que tiver
nheiro e realizando transações. A demis- alimentar ou fazer aniversário. Afinal, es- que realizar e pule fora.”
são foi o primeiro tombo significativo da tamos falando de alguém para quem “em-
carreira dele, um tanto agravado pelo fato preender sempre foi a única opção”. O fato é que, mesmo enquanto trabalhava
de que seu casamento seria dali a dois me- na empresa do pai, já estava empreendendo.
ses. Mas não passou por sua cabeça pro- “Como o ar que eu respiro” Alguns anos antes, Lito se tornara sócio de
curar outro emprego. Sempre que procura racionalizar esta vo- uma loja de móveis. Tinha mais dois amigos
cação, ele acaba desistindo. Conclui que na sociedade, que entraram como investido-
Seu pai, que não havia tido muita instrução está mais para um instinto. res – um deles também era o operador.
formal, sempre sonhou que o filho se dedi-
casse aos estudos. “Mas era o sonho dele, “Não cheguei aqui porque preciso empre- Mas os compromissos com o emprego e
/ não meu”, conta Lito. A influência paterna ender por motivos A, B ou C. Empreendo os estudos o impediram de se dedicar ao
“Não cheguei acabou vindo bem mais do exemplo, já que porque é natural, porque faz parte.” empreendimento. Então, dois anos depois,
desde pequeno ele acompanhou as aven- acabou vendendo sua parte para os sócios.
aqui porque turas na criação e na condução da fábri- A fábrica do pai tinha crescido um boca- Uma quantia pequena, na época, mas sim-
preciso ca de móveis. Também nunca considerou do – se tornou a maior da América Latina. bolicamente significativa. “Era um dinhei-
empreender por trabalhar no mercado financeiro ou no fun- Trabalhar lá foi uma experiência transfor- ro muito importante pra mim. Eu não tinha
cionalismo público, como era comum en- madora para Lito, em especial por conta de nada, então era uma fortuna”.
motivos A, B ou tre seus amigos. Abriu o primeiro negócio uma grande lição: a de não postergar algo
C. Empreendo próprio bem cedo, quando mal tinha com- que não seja bom. Com o montante – e com o que recebeu
porque é pletado 20 anos. pela rescisão com a empresa do pai –, deu
“Foi a minha primeira grande lição: sair o o segundo passo na trajetória empreende-
natural, porque Naquele momento, Lito não premeditou mais rápido possível. Se você perceber que dora. Em direção a um ramo bem diferente.
faz parte.”
64_empreendedor desde criancinha a busca por um negócio perene

Um negócio literalmente heavy Entre lavar carros e consertar No final, sobraram duas possibilidades: abrir um la-
metal eletrodomésticos va-rápido ou uma assistência técnica para eletro-
Na época, um conhecido de Lito tinha uma fábrica que Até então, Lito sabia muito bem onde não queria es- domésticos. Eram segmentos pulverizados e pouco
produzia soldas de estanho para terminais elétricos, tar; mas não sabia exatamente para onde ir. Percebeu profissionais, que careciam de marcas de referência,
calhas de telhado etc. Mas ele queria começar a fun- que só descobriria se parasse, analisasse as possibili- confiáveis. E após constatar que a carência era mais
dir o metal. Tinha a ideia de transformá-lo diretamen- dades e planejasse os próximos passos. aguda no mercado de lavagem automotiva, acabou
te a partir da cassiterita. E para isso precisava de um optando por ele.
investidor. Foi o que fez. Passou cerca de três meses observando
o mercado e refletindo sobre as próprias motivações. “Eu não tinha dinheiro, não tinha qualificação, mas
Lito topou embarcar no empreendimento. No entan- E, partindo das experiências anteriores, chegou àquela queria criar uma marca que fosse referência. Era mes-
to, após menos de um ano na operação, percebeu que que considera uma das mais importantes conclusões mo um sonho grande.”
aquela não era muito a dele. Havia desavenças em re- de sua trajetória: perpetuidade acima de tudo.
lação ao modelo de gestão do sócio, e a desconexão Hoje, Lito percebe que também iniciava uma busca
com a atividade era evidente. Lito simplesmente não “Entendi que não queria montar uma em- por um oceano azul. Sobretudo em termos de opor-
se adaptou. Mas não demorou a agir. A lição anterior presa para deixar pros filhos, para eles tunidade de marca e de branding.
fora bem aprendida: herdarem, nada disso. Eu queria criar uma
empresa que de fato tivesse valores que se Se Maomé não vai à montanha...
“Eu saí. Com uma mão na frente e outra atrás, mas saí. perpetuassem.” O ano era 1994. Na época, o segmento de lava-rápi-
E rápido. Não fiquei enrolando.” dos era mesmo caótico, quase marginal. Não havia
Lito concluiu também que atuaria em um setor em compromisso algum, por parte dos empresários, de
Tinha, então, por volta de 25 anos, uma esposa e ne- que pudesse fazer a diferença. Mas, sem dinheiro melhorar as práticas. “As pessoas montavam lava-rá-
nhum capital. O dinheiro levantado com a venda da nem experiência significativa, teve que quebrar e pidos para ganhar dinheiro por um período curto, e
loja de móveis e o FGTS ficaram no último empreen- requebrar a cabeça para encontrar a oportunidade depois mudavam de ramo”. Era precisamente nesse
dimento. adequada. campo de abandono que Lito queria atuar, criando
65_empreendedor desde criancinha a busca por um negócio perene

uma marca que mudasse essa percepção. solidada. A mídia passou a dar mais espaço às histórias ginal do empreendedor. Não havia práticas de gover-
de micro e pequenos empreendedores. E a questão do nança, de atração e retenção de talentos, de pesqui-
Algumas decisões tomadas naquele começo ajudam uso consciente da água também começava a chamar sas de desenvolvimento, nada. Estava claro que Lito
a entender o sucesso. Lito logo percebeu que ficar no a atenção dos grandes veículos. Lito, claro, acabou se se afastava daquele caminho original de criar algo que
balcão esperando pelos clientes não era uma boa es- beneficiando dessa tendência. se tornasse referência e que permanecesse.
tratégia. Então, decidiu ir aonde os veículos estavam:
garagens de condomínios residenciais e comerciais. “Demos uma sorte tremenda. Era todo um contexto “Eu descobri que estava proibido de mor-
Priorizaria a conveniência. muito favorável. Então, de 98 a 2000, 2001, nós cres- rer. A companhia dependia muito de mim. E
cemos muito, e muito rápido”. se eu morresse, ela acabava”.
Mas havia um – ou melhor, dois poréns: a água e o
esgoto. Lito atuaria em locais onde não havia a possi- Melhor cenário possível, não? Nem tanto, na verdade. A Ele sentiu, então, necessidade de dar autonomia à
bilidade de esgotamento, e teria que utilizar um bem DryWash só fazia muito dinheiro naquela época porque própria empresa. De trazer pessoas melhores do que
comum dos condomínios. Por exemplo: se lavasse o os investimentos em processos, em tecnologia e em gen- ele próprio para a gestão. O foco se deslocou do cres-
carro do Seu Tavares, do primeiro andar, a Dona Dirce, te eram baixos. O capital que entrava era quase que total- cimento a qualquer custo para o crescimento estrutu-
do quinto, podia reclamar do uso da água pela qual mente usado para financiar crescimento. “Só olhávamos o rado, planejado.
também pagava. curtíssimo prazo. Não pensávamos no médio e no longo”.
Lito conseguiu fazer com que a empresa fosse menos
Ele passou, então, a buscar uma solução. E chegou Dando um passo pra trás dependente dele. Mas não significa que ele se doasse
à formula da Lavagem a Seco DryWash, sem utilizar Na época, Lito vivia uma baita contradição. Porque, se menos. Passou sete, oito anos trabalhando por cerca
uma gotinha de água sequer. Mal sabia que ficava mais como pessoa física a vida havia melhorado — podia de 18 horas diárias, sem férias. E a conta chegou. Após
próximo daquele objetivo de perpetuar uma ideia. comprar carro, apartamento etc —, ele tinha a impres- sofrer um grave evento de estresse, foi fazer terapia
são de que aquele modelo da DryWash não duraria holística, o que o ajudou muito.
Sorte também vale muito. De que não se perpetuaria.
Quando a onda do empreendedorismo começou a ga- O evento também mostrou como as férias devem ser
nhar força no Brasil, em 1998, a DryWash já estava con- O modus operandi de então ia contra a motivação ori- aproveitadas. Todos os anos. E não de forma “picada”,
66_empreendedor desde criancinha a busca por um negócio perene

só uma semana e depois de volta ao baten- O maior destes esforços, sem dúvida, cou- bem, obrigado(a) – assim como a DryWa-
te: os 21 dias corridos. “Quando eu passei be ao próprio criador da DryWash. sh, que tem mantido o crescimento, mes-
a sair por 21 dias, era sempre assim: na pri- mo durante a crise.
meira semana eu tava ligado, na segunda “Tive tinha que dar total autonomia pra
eu começava a desligar, e na terceira sen- ele, e me afastei do negócio. Eu pratica- Com relação a Lito, nenhuma outra per-
tia uma saudade louca de voltar a traba- mente não trabalhava, não podia inven- gunta foi tão fácil de responder quanto “e
lhar. Você limpa, você reseta e foca naquilo tar nada. Tive que ficar muito quieto. E foi o futuro?”: “Empreender, é claro. Quero ser
que é mais importante.” triste, muito triste. Eu ia caminhar no Ibi- um empreendedor serial, continuar inven-
rapuera às 10:30 da manhã e, do nada, eu tando coisas. O sonho grande está sempre
Sempre que voltava, Lito conseguia achar chorava.” relacionado a poder continuar empreen-
soluções de maneira mais simples. Chega- dendo”.
va com novas visões, e isso passou a ser Foram praticamente dois anos de suplício,
extremamente benéfico para a gestão. mas que deram grandes resultados. Quan- Hoje ele também sabe que tem muito a ver
do reassumiu o comando, Lito encontrou com o impacto social causado pelo em-
Regando a grama do uma estrutura muito mais enxuta. E na- preendedorismo. Ele se encanta quando
/ Ibirapuera com lágrimas quele momento, foram plantadas várias percebe que funcionários ou franqueados
O maior Mas o assunto “afastamento” traz lembran- sementes que hoje já estão dando bons estão progredindo, aumentando as rendas
destes ças doloridas a Lito. Referem-se aos idos de frutos. de suas famílias. E vibra ao constatar que a
2005 e 2006: na época, a DryWash tinha marca que criou de fato se tornou referên-
esforços, sem “muitas frentes abertas”, mas pouco ou ne- “Deixar gente rica é a minha cia em qualidade, em inovação e em cons-
dúvida, coube nhum dinheiro para levá-las adiante. Era uma cachaça” ciência ambiental.
ao próprio situação perigosa, e ele teve que contratar Uma dessas sementes é a Via Indicadores,
uma pessoa para ajudar a repensar a gestão. spin-off de um Centro de Serviço Com- É. Pensando bem, é mesmo um legado que
criador da Um profissional altamente qualificado, e cuja partilhado da DryWash. É outra das “in- vale a pena se perpetuar.
DryWash. retenção exigiu esforços consideráveis. venções” de Lito e que até agora vai muito
67_empreendedor desde criancinha UMA HISTÓria de superação

DAY 1

UMA HISTÓRIA
DE SUPERAÇÃO
Eloi D’Avila, fundador da Flytour, e chegou a ter três empregos si-
não frequentou a escola, passou multâneos para juntar dinheiro e
fome, dormiu na rua e dependeu alimentar seu sonho de empreen-
da ajuda de desconhecidos para der. Se todo esse sacrifício se pa-
sobreviver. Começou vendendo gou, é porque não era um sonho
pastéis até os 8 anos de idade, qualquer: era um sonho grande.
empreendedor desde criancinha

NASCIDOS PARA
EMPREENDER
Albert Deweik e Roy Nasser escolheram o difícil caminho de
provar, para eles mesmos e para a família, que nasceram para
empreender. E não foi de primeira.

Quando as famílias Deweik e Nasser, gócio de soluções tecnológicas. A in-


ambas de origem judaica, migraram fluência foi tamanha que, desde pe-
da Síria e do Líbano para o Brasil nos quenos, Albert e Roy se coçavam por
anos 40, os pais de Albert e de Roy oportunidades de seguir os mesmos
viraram melhores amigos. Deles, os passos e começar a fazer dinheiro por
filhos herdaram não só o gosto por conta própria. Nunca foi fácil conquis-
empreender, como o companheiris- tar a confiança dos pais nesse senti-
mo que os tornou sócios. do. A cada novo negócio, os garotos
precisavam driblar as inquietações:
Da direita para esquerda:
Isaac Deweik era dono de uma em- “quando vocês vão começar a ganhar
Albert e Roy, fundadores da presa na área têxtil; Jacques Nasser dinheiro?” era a grande questão dos
Neoassist fundou a Compugraf, um grande ne- almoços de família.
69_empreendedor desde criancinha nascidos para empreender

Isaac e Jacques não deixaram de apoiar – inclusive fi- Muitas outras aventuras em negócios de tecnologia A primeira crise a gente nunca esquece
nanceiramente – as aventuras dos meninos, mas dar er- vieram depois dessas. Até que surgiu a primeira ideia Eis que veio o estouro da bolha da internet. O preço
rado não era uma opção. Só que antes de revolucionar que poderia significar o início de uma carreira empre- do produto que o Jarbas oferecia para anunciantes, de
o atendimento ao cliente com a Neoassist, Albert e Roy endedora, de fato. R$60, caiu para R$1. Roy compartilha a angústia:
bateram na trave várias vezes antes de marcar o gol.
Passos firmes “A gente vivia no mês a mês, não tinha
Homens meninos de negócios Na era pré-Google, era muito difícil e trabalhoso en- caixa para bancar uma crise ou se
Quando tinham, respectivamente, 14 e 9 anos de idade, contrar qualquer coisa na internet. Inspirados pela reinventar”
veio a primeira ideia. Criaram uma BBS – uma rede de tro- preguiça de fazer essas pesquisas, os dois amigos re-
ca de mensagens pelo computador – antes mesmo do solveram criar, em 1997, um buscador. Decidiram ba- O primeiro impulso seria reduzir o quadro de funcioná-
surgimento da internet. Na época, Roy morava fora com tizá-lo de Jarbas, como um mordomo virtual que en- rios. No entanto, o time que poderia, eventualmente,
a família: “Começamos já como multinacional, fomos os tregaria o que você precisasse de bandeja. ser cortado era justamente o que era mais estratégico
primeiros a ter uma filial no Brasil e uma nos EUA”, brinca. para o sucesso da plataforma: o atendimento. Adiaram
Por pouco mais de um ano, a empresa rodou de forma ao máximo a decisão, mas bem, o problema ainda exis-
Quando a internet chegou de verdade, em 1995, o bem caseira, até que Isaac e Jacques provocaram: “Está tia. Foi quando Roy percebeu que poderia automatizar
maior desejo dos meninos era ter uma página na web. todo mundo ficando rico com internet, menos vocês”. E esse atendimento e correu para desenvolver a solução.
Dessa vontade, nasceu o segundo empreendimento: como um empurrãozinho do bem, investiram no Jarbas
uma companhia de hosting. Jacques, pai de Roy, se para que se profissionalizasse. Enquanto Roy desenvol- Vamos dominar o mundo
empolgou e bancou o primeiro servidor. O problema via o produto, Albert vendia publicidade: Um dia, Roy chegou ao escritório e indicou que Albert
é que o computador ainda não era assim tão popular, entrasse na página de ajuda do Jarbas. Em vez de en-
então querer ter um site próprio não era tão comum “Fui dar a cara a tapa nas agências e foi desastroso”, contrar um FAQ, como era de costume, encontrou um
quanto pensavam. ele diz. Mas apesar do sufoco, a empresa ia bem. Che- campo onde ele poderia digitar sua dúvida. “Eu come-
garam a ter 25 mil buscas por dia, com um grande di- cei a brincar ali e, para tudo que eu perguntava, ele me
“O mercado não estava maduro ain- ferencial de assistência, concentrado em uma equipe dava uma resposta satisfatória”, diz Albert.
da, não era a gente que era muito exclusiva para tirar dúvidas dos usuários com curto
novo”, Albert comenta. tempo de resposta. Eles testaram a ferramenta e, na primeira semana, o vo-
70_empreendedor desde criancinha nascidos para empreender

lume de e-mails de assistência foi reduzido em tempo se passou, mas a essa altura, o mais novo “Aquilo foi meu gás, meu Day1.
50%. “Talvez essa não seja uma solução só para dos dois tinha acabado de completar 18 anos. Não desaceleramos desde então”,
o Jarbas”, concordaram, “talvez seja uma solução Enfim, eles cederam – acreditaram que precisa- diz Albert
para muitas empresas”. vam seguir novos rumos.
Hoje, a Neoassist tem mais de 200 clientes e cer-
Depois de alguns meses trancados definindo Roy foi fazer faculdade fora do país. Não gostou, ca de 55 colaboradores empenhados em realizar o
as bases da Neoassist, foram ao mercado. Es- abandonou o curso e voltou ao Brasil. Albert en- sonho de melhorar o relacionamento entre empre-
tavam determinados a tornar o atendimento e trou de sócio em um negócio. A sociedade deu sas e consumidores. Tudo por conta da coragem
o relacionamento com o cliente mais inteligen- errado, ele se endividou e deixou a posição de de dois empreendedores em escolher o caminho
te por meio da tecnologia, integrando diversos executivo. Quaisquer que fossem as empreita- mais difícil. Mas afinal, qual é a alternativa se o ca-
canais. Com o primeiro grande case de suces- das em que se metessem, nada era tão realiza- minho mais fácil não os faz feliz?
so, tendo a Gradiente como cliente, a confiança dor quanto estar à frente da Neoassist.
foi nas alturas: assista à história
Foi preciso que os recursos se esgotassem e que
“PENSAMOS QUE ÍAMOS DOMINAR O a infelicidade se instaurasse para que eles se
MUNDO. PARECIA QUE IA SER FÁCIL” dessem conta do que deveriam estar fazendo:
empreendendo.
Só que, em 2001, o atendimento ao cliente ain-
da era conduzido majoritariamente por telefone O gás da virada
e carta. Em quatro anos, a Neoassist tinha ape- Resolvido: Albert e Roy estavam de volta. Por mais
nas 5 bons clientes. que estivessem ainda cicatrizando os anos ante-
riores, reestruturaram toda a empresa e reassumi-
Caminhos opostos ram o controle. Na primeira ligação que fez, Albert
Mais uma vez, veio a pressão da família. Dessa conseguiu marcar uma reunião no Rio de Janeiro.
vez, de Isaac: “Internet é furada, meu filho, está Na semana seguinte embarcaram e, dois dias de-
na hora de ganhar dinheiro”. Parece que muito pois, a proposta comercial chegou assinada.
COMECE
PEQUENO,
SONHE GRANDE
Um carro, uma linha telefônica, algumas
economias suadas: esses empreendedores
começaram com quase nada. Mas compensaram
na vontade de realizar

03
comece pequeno, sonhe grande

SE MEU FUSCA
FALASSE
Lisabeth Braun queria novos ares profissionais e criou a
primeira farmácia de manipulação do Brasil, nos anos 70. A
empresa cresceu e se transformou na Dermage, uma indústria
de dermocosméticos que produz centenas de itens pensados
para o consumidor brasileiro.

O fusca era verde abacate, carro da para uma jovem daquele tempo,
da moda no final dos anos 70. A quando era incomum ver mulheres
motorista era farmacêutica e fun- empresárias, menos ainda de um
cionária pública, mas sonhava com negócio novo e praticamente des-
novos horizontes profissionais. Se o conhecido no mercado nacional.
Ilana à esquerda e
Lisa à direita, sócias fusca de Lisabeth Braun falasse, ele
da Dermage contaria uma história bem inusita- Mas o carro só saberia o começo
73_comece pequeno, sonhe grande se meu fusca falasse

de tudo, porque a primeira coisa que ela fez foi vender pediu demissão e alugou uma pequena sala comer- era mais familiar e menos inóspito para mulheres. Di-
seu carro para investir na primeira farmácia de mani- cial, onde, com uma sócia, deu seus primeiros passos fícil mesmo foi explicar a novidade para o mercado,
pulação do país, no Rio de Janeiro. Lá se foi o fusca em como empreendedora. Fase em que ela fazia literal- porque a proposta era realmente começar tudo de
busca de outras histórias para contar, e então come- mente um pouco de tudo, do plano de negócios ao novo, com um novo nome (Dermage), logotipo, enfim
çou o que seria uma jornada de grande sucesso, que atendimento no balcão, do contato com os médicos à uma nova empresa.
resultou na criação da Dermage. manipulação das fórmulas.
Ela fez questão inovar e fazer diferente, mas sempre
De farmacêutica a empreendedora Da pequena sala, onde ela via as pessoas chegarem, seguindo os valores que sempre nortearam seu traba-
Lisabeth trabalhava em um hospital público no Rio de sem acreditar em quantos pedidos recebia, o negócio lho, marcado pela dedicação, honestidade e credibili-
Janeiro. O emprego parecia perfeito, com jornada re- foi crescendo e logo a farmácia teve que mudar para dade junto à classe médica. Por isso, “acabou sendo
duzida em um ambiente de ponta. Mas ela começou uma casa maior. Em seguida vieram outras três lojas. mais fácil do que eu imaginava”, diz ela.
a sentir um grande desânimo quando percebeu que as Ao mesmo tempo Lisabeth vivia o cotidiano agitado E aí surgiu uma grande ideia: por que não industriali-
pessoas, com vinte anos de formadas, continuavam a de toda mulher que trabalha: “Era a idade em que eu zar as fórmulas de sucesso e transformar a empresa
fazer as mesmas coisas. queria ter filhos, ter minha família, tudo acontecendo em uma marca de dermocosmético? Esse foi o grande
ao mesmo tempo, tinha que me dividir para que tudo diferencial da Dermage, que logo foi reconhecido pela
Foi quando ela viajou para Buenos Aires e conheceu desse certo”. classe médica.
uma farmácia de manipulação, coisa inédita no Brasil,
e a visão empreendedora da família se manifestou. Li- E deu certo, tão certo que ela começou a sonhar cada Outra escolha acertada foi cercar-se de pessoas com
sabeth e Walter Braun, seu marido, são descendentes vez mais alto. Depois de alguns anos, Lisa, como é habilidades complementares e de profissionais das
de imigrantes que chegaram ao Brasil sem recursos, chamada, e sua sócia resolveram se separar para se- áreas administrativa e financeira muito qualificados,
fugidos da 2ª Guerra Mundial e também empreende- guir com novos planos. que se dedicaram à gestão de um negócio preparado
ram e montaram seus negócios. para realizar os sonhos grandes de sua idealizadora.
Duas vezes empreendedora
Empolgada com as novas perspectivas e com total Começou então uma nova jornada empreendedora Mesmo assim foram – e ainda são – muitos os percal-
apoio do marido, a farmacêutica bioquímica Lisabeth para Lisa. O ano era 1990, e o mundo empresarial já ços enfrentados num país que atravessou várias cri-
74_comece pequeno, sonhe grande se meu fusca falasse

ses e planos econômicos. Nessa jornada, foram mui- da Endeavor e se cercou de mentores que mostraram Enfim, o legado para a próxima geração já está de-
tas noites sem dormir, pensando em como seria o dia novas frentes de atuação. finido em uma cultura enraizada na transparência e,
seguinte e muita resiliência também para atravessar como Lisabeth faz questão de enfatizar, “fazer dermo-
tantos obstáculos. Mas desde o início Lisa mantém a “Foi muito importante porque abriu um leque de pes- cosméticos com alta eficácia e resultados verdadei-
mesma garra e otimismo: soas que podiam nos apoiar e mostrar os caminhos. O ros, desenvolvidos por brasileiros e para o clima e a
empreendedor às vezes se sente muito solitário, tem pele dos consumidores (também) brasileiros”.
“Você tem que ter um estofo emocional que tomar as decisões, mas está muito sozinho, sem
muito grande para conseguir, você saber o que fazer”. Lisabeth Braun Universo feminino
tem que estar sempre bem, porque a sua As mulheres são o público-alvo da Dermage, e elas
motivação, o seu trabalho, é modelo para Com formação e experiência em finanças, Ilana as- também compõem 90% da equipe de colaboradores
os outros que estão à sua volta”. sumiu, trazendo novas perspectivas de crescimento da empresa. Lisabeth conta que gosta de trabalhar
e desenvolvimento. Algum tempo depois, assumiu o com mulheres porque elas sabem, como usuárias, o
Apesar desse cenário de dificuldades de toda ordem, cargo de CEO. Com esse suporte essencial na gestão que as outras querem. Ela também valoriza as habili-
que para muitos seria desanimador, Lisabeth sempre da empresa, Lisabeth pôde manter o foco na inovação dades femininas em todos os campos: “Existe muito
investiu na Dermage. A empresa cresceu, o marido, e desenvolvimento de produtos, uma área estratégica preconceito, mas a gente é tão capaz, tão capaz que
Walter, engenheiro, assumiu a diretoria de produção para os planos futuros. consegue levar uma vida dupla e tomar conta de uma
e juntos eles criaram uma empresa inovadora no mer- família, de casa e trabalhar e ser efetiva em todos.”
cado de dermocosméticos. Unida, a família aumentou o portfólio da marca – que
conta com mais de 300 itens, entre produtos para ca-
Sucessão familiar belo, rosto, corpo, maquiagem, spa e nutricosméticos;
Depois de passar as férias trabalhando na empresa da aumentou os canais de distribuição (entre lojas pró-
família, Ilana Braun, filha de Lisa, se empolgou com prias, franquias e drogarias, espalhados por diversos
as oportunidades de fazer algo muito maior, largou o pontos do Brasil); ganhou credibilidade na classe mé-
emprego no mercado financeiro e passou a empreen- dica; prêmios em congressos internacionais e é res-
der junto com seus pais. Logo no início se aproximou peitada por consumidores.
75_comece pequeno, sonhe grande acredite em você, sempre

DAY 1

ACREDITE EM
VOCÊ, SEMPRE
Robinson Shiba, fundador do Chi- vezes determinação e coragem
na in Box, conta como superou são os mais importantes ingre-
obstáculos e fez da sua história dientes de um plano de negócios
uma trajetória de superação e de sucesso. Acredite em você,
perseverança. Descubra que às sempre! Atitude é tudo!
comece pequeno, sonhe grande

COMECEI DO
NEGATIVO
Como Maristela Mafei saiu de um escritório alugado com
o dinheiro da venda de uma linha telefônica para ser a
empreendedora por trás de uma das principais empresas de
comunicação corporativa do país

Quando Maristela Mafei tomou a tinha seguro – não sobrou muita


decisão de abrir seu próprio negó- coisa que ela pudesse arriscar.
cio, parecia que havia uma conspi-
ração para que ela desse meia volta “O Universo gritava ‘não
e desistisse. Depois de deixar seu abra!’. mas eu segui em frente.”
cargo de repórter no Jornal Folha de
S. Paulo, ela sacou US$ 800 dólares A única alternativa foi vender sua
do FGTS para investir na empresa. linha de telefone residencial. Em
Foi roubada. Um dia antes, tinham 1995, ela valia aproximadamente
Maristela Mafei
levado também seu carro, que não US$ 2 mil dólares, o suficiente para
77_comece pequeno, sonhe grande comecei do negativo

alugar uma salinha de 6m2 e colocar o negócio ço na redação e reputação fora dela. Com isso, Foi combinando sua experiência prévia, o am-
para rodar até ele começar a gerar receita. No veio um convite: tornar-se gerente de comuni- biente propício e a oportunidade de já começar
escritório ou na rua, ela fazia de tudo, do café ao cação da Parmalat, que, na época, estava se ex- com a Parmalat como cliente que Maristela en-
release de imprensa. pandindo no Brasil. Mas em vez de dizer “sim”, controu, nesse mercado, um enorme potencial
ela compartilhou uma preocupação: em uma para empreender. Mudou de lado do balcão –
Com muita garra, Maristela aprendeu bastante, grande empresa, deixaria de fazer um pouco o passou de uma caçadora de informação para
cresceu com o negócio e foi selecionada como que gosta e de ser parte do core business. “Por uma provedora de informação e abriu sua pe-
uma das primeiras Empreendedoras Endeavor. que então você não abre sua própria empresa quena assessoria de imprensa.
Transformou a Máquina da Notícia em Grupo e passa a ser nossa fornecedora?”, sugeriu um
Máquina, e desde 2016, em Máquina Cohn & gestor da Parmalat. E ela não começou apenas com um grande
Wolfe, com a recente associação à WPP, líder cliente, mas também com um grande mentor.
mundial em publicidade e relações públicas. Maristela considerou. Lembrou como ficava ir- Quando pediu demissão da Folha de S. Paulo, o
Inspire-se com essa história! ritada, como repórter, com o grau de atenção e falecido Sr. Octavio Frias, na época dono do ve-
profissionalismo das assessorias de imprensa ículo, a fez prometer que ela voltaria uma vez
“Você é uma máquina!” com as quais conversava. Em 1995, a abertura por mês para lhe contar tudo sobre o novo ne-
Quando assinou sua primeira matéria de capa política e econômica estava só começando e o gócio.
de jornal, sua mãe recortou a reportagem e mos- Brasil passava por um processo de privatização.
trou para todos os vizinhos. Criada no interior de Ele a aconselhava sobre custos, tributação, ges-
São Paulo, Maristela Mafei sonhava em ser re- Havia um novo Código de Defesa do Consumi- tão, e ainda se envolvia na parte comercial: “Eu
pórter de um jornal de grande circulação. Dava dor, uma nova Constituição e as barreiras para a mostrava alguma proposta que o cliente tinha
brilho nos olhos essa ideia de sair avidamente entrada de produtos estrangeiros haviam caído. achado caro e ele pedia para ver quem era”,
correndo atrás da informação. Cresceu a demanda de empresas que precisa- conta Maristela. E ele incentivava: “Eu conheço!
vam se comunicar com todos os seus públicos Pode fazer seu preço porque ele tem problemas,
Logo Maristela começou a conquistar seu espa- e, principalmente, com a mídia. vai precisar de você”.
78_comece pequeno, sonhe grande comecei do negativo

Foi também Frias que ajudou a batizar Enquanto possa ter sido um momento para outra empresa, queriam ser aten-
o negócio: “Você é uma máquina, tem de muita dificuldade, Maristela assu- didos pela Máquina. O crescimento foi
que ter ‘máquina’ no nome”. me que esse foi também um período natural, mas o mundo dos negócios
engraçado, já que sempre recorriam não é assim tão cor-de-rosa, e, natu-
Sem vergonha a um improviso aqui ou ali. Os clien- ralmente, vieram também os primei-
Maristela conta que, na época em que tes começaram a demandar produtos ros tombos.
fez faculdade, o bonito das aulas de – um clipping de imprensa, por exem-
jornalismo era mandar o aluno ir para plo – mas não havia dinheiro nenhum O mais forte deles talvez tenha sido
a rua e voltar com uma reportagem para investir. Quem resolvia era Uziel, logo no terceiro ano da empresa, quan-
feita. Ela não tinha ideia do que era o office boy (que está na Máquina até do a Máquina enfrentou um problema
/ um ambiente corporativo, de como se hoje, com outro cargo), que descia sério de inadimplência. Foi também
Foi também comportavam nele. para a banca de jornais, comprava to- quando Maristela sentiu o impacto de
dos os impressos, lia tudo e recortava ter dado tanta informalidade ao negó-
Frias que Segundo ela, o sucesso inicial da Má- as matérias em que o cliente aparecia. cio – bom para a cultura interna, mas
ajudou a quina se deve a um fator muito básico: E assim a empresa geria seus recursos ruim para os relacionamentos comer-
batizar o nunca ter vergonha de pedir ajuda. – claro que não de forma ideal, mas ciais: “Eu conseguia resolver os proble-
ninguém ficava insatisfeito. mas dos clientes, entregar o que eles
negócio: “Eu visitava algum cliente e aprovei- queriam, mas tinha muita dificuldade
“Você é uma tava a conversa: ‘Olha, me desculpe, Por causa desse cuidado em atender de fazer cobranças, por exemplo”.
máquina, mas eu estou começando a contratar (ou superar) expectativas, a enorme
mais funcionários e queria te pergun- maioria dos clientes seguintes fechou Por não saber que era
tem que ter tar: como você estruturou o RH da acordo por meio de indicação. Os pró- impossível, foi lá e fez
‘máquina’ no sua empresa?’. E eles gostavam dis- prios gerentes de comunicação da Par- Ao mesmo tempo, toda a falta de pla-
nome”. so”, diz. malat, quando faziam uma transição nejamento fez bastante bem para a
79_comece pequeno, sonhe grande comecei do negativo

Máquina da Notícia, que aos pou- fora do país, fizemos cursos, viaja- gócios internacionais, como devem
cos ia se tornando o Grupo Máqui- mos, fomos ver o que é o que o mun- atrair outros pela América Latina.
na. Maristela conta que muito ia do estava fazendo. Isso nos trouxe Nós vamos continuar oferecendo o
aprendendo e fazendo com os de- horizontes inacreditáveis”, ela con- melhor da nossa cultura, mas ago-
safios da rotina, no bom estilo “ma- ta. Entre esses clientes, por exem- ra associados a uma das maiores
tando um leão por dia”. plo, estão EY, Carrefour, BRMalls e agências do mundo! Eu não pode-
outras gigantes, incluindo também ria estar mais orgulhosa das con- /
“Eu não sabia que era ‘impossível’ grandes empreendedores e execu- quistas do nosso time e do trabalho “Eu não sabia que
fazer muita coisa”. Foi assim que ela tivos, como Jorge Paulo Lemann. que fizemos pelos nossos clientes”, era ‘impossível’
estruturou uma agência 360º, com conta Maristela. Que venham os
áreas que vão de digital a relações Com mais de 20 anos de estrada, próximos 20 anos! fazer muita coisa”.
governamentais, passando por as- Maristela conquistou em 2016 mais Foi assim que ela
sessoria financeira e núcleo de per- motivos para celebrar. Isso porque estruturou uma
sonalidades. toda a estratégia integrada, a exce-
lência da entrega e a cultura do ne- agência 360º, com
Maristela sempre acompanhou as gócio atraíram também olhares de áreas que vão de
novidades do mercado, soube se fora: a Máquina passou a fazer par- digital a relações
antecipar e implementar uma cul- te da Cohn & Wolfe, subsidiária da
tura de inquietude intelectual mui- WPP, líder mundial de publicidade governamentais,
to forte: e relações públicas. passando por
assessoria
“Aprendemos muito com os execu- “Essa parceria vai trazer forças glo-
tivos das empresas clientes, fomos bais sem precedentes, que não só financeira e núcleo
buscar referências de reputação fortalecem nossos clientes com ne- de personalidades.
80_comece pequeno, sonhe grande comecei do negativo

DAY 1

NÃO DESISTA
NUNCA
Com 20 e poucos anos, na cidade criado ITA e continuou nadando
de Bauru, no interior de São Paulo, contra a maré. As críticas e dúvidas
Oziris Silva já sonhava em construir agregavam ainda mais energia ao
aviões no Brasil, afinal, nascera no seu sonho. A oportunidade de ouro
país natal de Santos Dumont. Des- surgiu quando conseguiu falar com
de a década de 1940, Ozires Silva o presidente da República e o con-
não se conformava com o fato de venceu de que a Embraer era viá-
que, no Aeroclube de Bauru, todos vel, um sonho possível, e que pode-
os modelos tinham fabricação in- ria crescer. E cresceu, muito: hoje, a
ternacional. companhia fabrica e opera em mais
de 90 países, com engenheiros bra-
Formou-se engenheiro no recém- sileiros, formados no país.
comece pequeno, sonhe grande

SAIR DA NEGAÇÃO
E ACEITAR A
MUDANÇA
Fabiana Salles sempre foi uma empreendedora em movimento.
E hoje, à frente da Gesto, quer ser bússola para uma nova
gestão de saúde privada no Brasil.

Em 17 anos de vida, a Gesto já fez modelo de negócio parece grande,


de tudo: vendeu um sistema de vale a pena entender o que levou
eletrocardiogramas por telefone, a cada mudança de rota ao longo
já fez mapeamento de risco para dos anos. Na direção, apontando
funcionários, ofereceu serviços o caminho, está Fabiana Salles,
médicos e hoje, na sua versão mais empreendedora paulista que tem
atual, é pioneira no uso de inteli- o sonho de transformar a saúde
Fabiana Salles, gência de dados na área de saú- privada do Brasil em um sistema
empreendedora da Gesto
de privada do país. Se o salto de sustentável.
82_comece pequeno, sonhe grande sair da negação e aceitar a mudança

O desafio parece grande, mas Fabiana tem do a minha tribo, me senti incluída.” aparelho e os estudantes já estavam pron-
caminhado fortemente para vencê-lo, mes- tos para prototipar o novo negócio. Conver-
mo que isso signifique reinventar a empre- Saiu de lá sabendo, enfim, fazer um plano sando em casa sobre o projeto, o cunhado
sa de tempos em tempos. de negócios — e despertando tantas ou- de Fabiana contou que já existia uma em-
tras competências empreendedoras. Ago- presa no Brasil fazendo isso: a Telecardio.
Aquecendo os motores ra era questão de encontrar uma oportuni- Ela foi conversar com o empreendedor da
Era o último ano no curso de engenharia dade de mercado. empresa, Dr. Bento de Toledo e, no mesmo
elétrica, e Fabiana decidiu transformar dia, acabou sendo contratada como esta-
seu TCC em um projeto de empreende- Antes de 1999, Fabiana viu sua mãe fazen- giária dele.
dorismo. Ela sabia que precisava criar do um exame de eletrocardiograma com
um plano de negócios, apesar de não fa- gravação por fita cassete e sempre achou O que ela não sabia é que, logo depois,
zer ideia de como construir um. Para en- o procedimento demorado e desconfortá- Bento se tornaria também seu sócio.
tender melhor sobre esse universo, se vel. Seria muito mais eficiente se pudesse
/ inscreveu no Empretec, curso realizado ser digital: assim, o paciente ficaria mais Primeira mudança de rota
pelo Sebrae para despertar o potencial tempo com o aparelho e depois manda- Além dos hospitais, o Dr. Bento via uma
“Foi ali que empreendedor de quem quer ter o seu ria por telefone, sem precisar voltar ao oportunidade de vender o eletrocardiogra-
eu entendi o negócio. O curso não dava folga: era sá- laboratório para entregar a fita. O resul- ma também dentro das empresas que já
que era ser bado, domingo, segunda, terça…Como a tado gravado na memória em looping e possuem um ambulatório médico. Com o
vida de empreendedor costuma ser. E Fa- por som era enviado para uma central de pitch bem redondo da venda e os aparelhos
empreendedora. biana ficava estudando muitas vezes das atendimento e logo chegava nas mãos do na maleta, Fabiana e ele saiam para vender
era como se eu oito à meia-noite, sem parar, encantada médico para avaliar se existia algum pro- os produtos. O problema é que o aparelho
tivesse achado a com tudo o que aprendia. blema cardíaco. não vendia de jeito nenhum. Os médicos
diziam quase sempre a mesma coisa: “Se
minha tribo, me “Foi ali que eu entendi o que era ser em- Na época, o pai de um colega do grupo que eu não sei nem quantos diabéticos, hiper-
senti incluída.” preendedora. era como se eu tivesse acha- era médico tinha validado a ideia de criar o tensos ou cardiopatas tenho aqui no time
83_comece pequeno, sonhe grande sair da negação e aceitar a mudança

de funcionários, como vou justificar a com- ter tido a carteira de trabalho preenchida, ro para Fabiana, a Gesto entrou no Cietec,
pra de um aparelho desses?” topou! Ali nasceu a Gesto Saúde. a incubadora de novos negócios da USP,
mas, apesar dos esforços, os dois sócios
Era preciso dar um passo para trás, antes Assumindo a direção não conseguiam tirar este modelo de ne-
de dar dois para frente. Criaram, então, um Um dos primeiros clientes de mapeamen- gócios do papel. “Falar em Business Intelli-
mapa de risco para ser aplicado entre os to de risco era uma operadora de saúde: gence em 2003 era absurdo, as empresas
funcionários da empresa, assim o médico a InterClínicas. Nesse trabalho, Fabiana se não sabiam do que a gente falava; as ferra-
do ambulatório teria mais clareza do perfil deparou com um volume enorme de da- mentas e a mão de obra eram mais caras; /
de risco com que lidava. Junto com o apare- dos disponíveis dos pacientes, o banco de os dados eram desestruturados e mais de-
lho original, o mapa era vendido dentro de atestados médicos, os exames já feitos, sorganizados.” Não tinha como
um pacote. As empresas gostaram tanto os remédios consumidos. Ela começava a negar, os pedidos
desse mapeamento do perfil de risco que pensar, como a engenheira eletricista que Era cedo demais para falar sobre Inteligên- estavam falando
compravam o pacote, mas não queriam o era, que faria mais sentido cruzar as res- cia Artificial para saúde no Brasil.
eletrocardiograma. postas do questionário com o histórico do alto com os dois
hospital para uma gestão mais eficiente. Nesse momento, estar dentro de uma in- empreendedores
Não tinha como negar, os pedidos estavam cubadora fez toda diferença. O ambiente e era só questão
falando alto com os dois empreendedores “Isso nos abriu um mar de possibilidades. era acolhedor e um dos poucos lugares
e era só questão de ouvir: no mercado cor- Ficou claro para nós que a gesto seria uma abertos para empresas de tecnologia. Os de ouvir:
porativo, o mapeamento de riscos era o empresa em que a tecnologia e a inteligên- outros empreendedores da Cietec diziam no mercado
grande negócio. cia de dados seriam o grande diferencial.” que era parte da trajetória empreendedo- corporativo,
ra, quando a sua ideia se desencontra com
Foi aí que o Dr. Bento percebeu que tinha A estrada certa no quilôme- as demandas do momento. o mapeamento
um grande negócio e convidou Fabiana tro errado de riscos era o
para empreender com ele. Ela, sem nunca Em 2003, quando esse caminho ficou cla- “Você muda e se adapta para o que o mer- grande negócio.
84_comece pequeno, sonhe grande sair da negação e aceitar a mudança

cado precisa. Não vejo como um fracasso, mas a pedir mais inteligência e uso de dados na toma- De volta para pista
sim como uma necessidade que o mercado ainda da de decisão dos planos médicos para economi- Para tirar a ideia do SaaS do papel, seria preci-
não tinha naquela época. Foi aí que falamos: va- zar recursos e oferecer aos funcionários o melhor so mudar por completo a rota da empresa. Era
mos entender, então, o que o mercado precisa!” acesso a saúde possível por um preço justo. necessário montar um time novo, com compe-
tências de Business Intelligence, reposicionar a
Então, a Gesto começou aos poucos. Se ainda “Foi um momento difícil de escolher: continuar marca, fazer a transição dos contratos conforme
não dava para viver só de informação e inteli- no modelo de serviços que já funcionava ou ex- iam vencendo e prospectar novos clientes.
gência, a Gesto passou a agregar também al- perimentar um novo, bastante incerto. Não da-
guns serviços. Durante sete anos, o carro-chefe ria para fazer os dois ao mesmo tempo. A gente “Se a gente veio até aqui, vamos em frente re-
foram os serviços médicos, como a gestão de teria que focar para colocar o pé no acelerador mando. Mesmo no meio da rebentação tem que
ambulatórios em empresas, a medicina do tra- em um deles!” remar para frente. Hoje, sempre que passamos
balho e gestão de planos médicos. por uma situação difícil, lembro daquela fase e
A empreendedora sabia que não dava mais para digo: vamos remar!”
Fabiana tinha certeza de que o caminho era crescer oferecendo apenas serviços. “Eu pensa-
aquele e que estava cada vez mais perto de al- va: esse modelo [de serviços médicos] não vai Passada a rebentação, em janeiro de 2011,
cançar o seu propósito, só precisava deixar a fazer o sonho grande de ninguém porque eu só chegou o primeiro cliente de SaaS. A partir de
casa arrumada para quando o mercado esti- consigo atender um número limitado de empre- então, a Gesto usa os dados para escolher os
vesse pronto. sas. O modelo de SaaS [Software as a Service] melhores planos de saúde, negociar melhores
parece mais adequado porque a gente vai entre- taxas e prazos, além de gerenciar o custo que
Uma empresa de Software gar com mais inteligência, de maneira escalável as empresas têm com a saúde dos funcioná-
as a Service e para muita gente.” rios –isso reduz de 8% a 25% o segundo maior
Em 2010, a demanda bateu na porta. Hoje, 70% custo delas. Além disso, a Gesto se propõe a
dos gastos da população com saúde privada são A decisão tinha sido tomada, mas cuidar melhor da saúde dos profissionais, ga-
financiados pelas empresas, por meio de planos será que a Gesto teria fôlego para rantindo que, quando eles precisarem, sejam
de saúde. Com isso, os empregadores começaram pivotar o negócio mais uma vez? atendidos da melhor maneira.
85_comece pequeno, sonhe grande sair da negação e aceitar a mudança

E neste ano Fabiana já está propondo uma Toda a pivotagem, segundo a empreende- O exercício da conversa, de sair do escritó-
expansão na atuação da Gesto: trabalhar dora, passa por três fases: a negação, a ne- rio, de sair da rotina e se lançar para falar
também com modelo de remuneração por gociação e a aceitação. “Muitas empresas com gente mais experiente é fundamental.
corretagem. ficam na negação a vida inteira, sem acei-
tar que precisam mudar o modelo, a fonte O primeiro mentor que ela teve foi o Dr.
“Nós tínhamos uma proposta de valor me- de receita e o modelo de negócio.” Bento, sócio da Gesto há 18 anos. Depois,
lhor do que o mercado, mas percebemos quando a Gesto passou de produto para
que estávamos deixando uma enorme fatia “Precisamos revisitar isso com frequên- serviço, o suporte do Cietec foi muito im-
do mercado desatendida. Se queríamos que cia. Eu gosto de fazer esse exercício: o portante. Tanto que, mesmo depois de sair
/ nossa solução resolvesse o problema de que ainda pode fazer mais sentido para o da incubadora, a empreendedora continu-
sustentabilidade do sistema de saúde brasi- meu negócio? O que é um valor que agre- ava se aconselhando com um advisor —
E neste ano leiro, tínhamos de expandir nossa atuação.” ga e o que é aquilo que muda totalmente que acabou se apaixonando pela Gesto e
Fabiana já o rumo?” hoje é um dos sócios.
está propondo “Fomos do eletrocardiograma para serviço; Depois disso, veio a Endeavor. “Na Ende-
de serviço para dados; e agora, dos dados Se o caminho é difícil, sempre avor, eu tenho dois mentores fixos que fo-
uma expansão para a gestão inteligente de benefícios.” existe alguém para sentar no ram muito importantes: Silvio Genesini e o
na atuação banco de carona Maurício Vergani. Mas todas as mentorias
da Gesto: Para Fabiana, o segredo de uma empre- A melhor forma de garantir que esse exer- que já fiz foram muito valiosas.”
sa que permanece sólida mesmo depois cício seja constante é conversando com
trabalhar de tantas mudanças é um só. “Catequizar outros empreendedores. Fabiana conta que Na prática, Fabiana trabalha com uma pi-
também com todo o time para o novo posicionamento, elegendo mentores para conversar você vai râmide de três andares:
modelo de fazendo com que isso faça sentido para os ouvir as opiniões mais diversas, se subme-
funcionários, para o mercado e, principal- ter a uma série de sabatinas, provocações A primeira é a atividade física. Se a Gesto
remuneração mente, para o seu coração — senão você e questionamentos, mas vai descobrir que é uma empresa que está sempre em mo-
por corretagem. não consegue mudar.” esse exercício é bastante terapêutico. vimento, muito se deve à própria rotina da
86_comece pequeno, sonhe grande sair da negação e aceitar a mudança

empreendedora. “Eu gosto de me me- Se a vontade e determinação de Fabiana funcionário tenha um plano de saúde de
xer, de correr, nadar, levantar peso, fazer são grandes, o problema que ela se pro- qualidade, com acesso à saúde.
musculação, esporte de aventura, ir para põe a resolver é maior ainda. Ela conta
o meio do mato…Me ajuda muito gastar que daqui 10 ou 20 anos, as projeções “Quero ser lembrada como uma das pri-
energia pela manhã para modular meu indicam que a população brasileira es- meiras pessoas que despertou o debate
humor durante o dia.” tará completamente à deriva em termos e levantou a bola de um modelo de ne-
/ de assistência média. gócios diferente e disruptivo para trans-
Já, quando chega a noite, é o momento formar a área da saúde. E que não pen-
O exercício da ioga e da meditação. “Faço há 7 anos Hoje, 56% dos recursos na área de saú- sou só em rentabilidade, mas também
da conversa, porque me ajuda a equilibrar o sono, as de estão concentrados no setor privado, em propósito. Mas, por favor, não quero
de sair do emoções e a limpar a mente, para estar que atende apenas 25% da população. ser a única!”
de novo zero bala no dia seguinte. Se não E quem paga a conta são as empresas.
escritório, tenho essa prática, nem consigo dormir.” O problema é que elas não aguentam
de sair da Por último, o terceiro andar da pirâmide é mais pagar pelos benefícios dos planos
rotina e se a terapia. A empreendedora acredita que de saúde, com tantos desperdícios de
o autoconhecimento é um dos maiores in- recursos na conta.
lançar para vestimentos de alguém que está lideran-
falar com do um negócio porque afeta a si mesmo, Por isso, o primeiro objetivo da Gesto é
gente mais mas, principalmente, o seu time. “Não dar sustentabilidade para a saúde pri-
precisa fazer sempre, nem para sempre, vada dando fôlego para as empresas —
experiente é mas é importante ter hábitos que te aju- que acabam pagando a conta no final
fundamental. dam a se conhecer melhor.” do dia. Garantindo também que aquele
comece pequeno, sonhe grande

FECHAR AS
PORTAS. ABRIR
OUTRAS
O boom da internet foi herói para uns e vilão para outros.
A LojasKD aproveitou a oportunidade e deu adeus às suas
lojas físicas.

Margaret Silva é uma blogueira e teiro qualificado perto dela, que


dona de casa de uma cidade pe- terminasse o projeto em algumas
quena na Bahia. Em 2013, ela teve visitas. Além disso, se você já pre-
a ideia de converter um quarto va- cisou comprar móveis, você sabe:
zio de sua casa em um closet de é 8 ou 80. De um lado, designers
Thiago Fiorin, roupas, mas não conseguia, de jei- com itens limitados, às vezes bem
empreendedor da LojasKD
to nenhum, encontrar um carpin- caros; de outro, grandes varejistas
88_comece pequeno, sonhe grande fechar as portas. abrir outras

onde você dificilmente encontra o Um giro que todos agora assumem o negócio
que quer. Lá de Curitiba, é como se 2012 foi o ano de pivotar o negócio como próprio, com envolvimento e
Thiago Fiorin tivesse previsto tudo, para um modelo exclusivamente de participação”.
dez anos antes. e-commerce. Foi também quando
Thiago e seus sócios liquidaram a em- Só que para ser uma grande sacada,
Em 2003, as 4 lojas de móveis de presa anterior, na época com 60 fun- não bastaria só transformar uma ati-
Nelso, primo de Thiago, estavam en- cionários. Os dois primos, então, se vidade tradicional – o varejo de mó-
frentando dificuldades. O mercado reuniram com um investidor e deci- veis – em um novo modelo de negó-
crescia devagar, a margem de lucro diram que Thiago seria a pessoa ideal cios, quando as pessoas ainda tinham
era baixa. Thiago prometeu que a in- para liderar o futuro do negócio, assu- pavor de colocar número de cartão de
ternet impulsionaria o negócio e o mindo a posição de COO e fazendo a crédito em site.
convenceu a transformar a LojasKD LojasKD crescer, em média, 35% nos
/ em um e-commerce – o primeiro de últimos 3 anos. O primeiro pulo do gato foi reprodu-
O primeiro móveis do Brasil –, por meio da pla- zir, no virtual, a experiência da loja fí-
pulo do gato taforma de gestão de vendas de- Em pouco tempo, a empresa se viu sica da forma mais fiel possível.
senvolvimento que o próprio Thiago transformando em uma startup. Em
foi reproduzir, empreendeu com alguns colegas de entrevista à Gazeta do Povo, Thiago Por exemplo: todo mundo abre ar-
no virtual, a faculdade. Sim, ele estava converten- explicou: “A antiga organização, de mário para ver as divisórias, quando
experiência da do um novo cliente. E sim, deu certo. dono e funcionários, foi substituída está comprando pessoalmente. No
pela administração similar às em- e-commerce, então, tem que ter foto
loja física da Em 5 anos, as vendas online se tor- presas digitais, com departamentos da parte de dentro. As pessoas não
forma mais fiel naram a principal fonte de renda da e gestores, com remuneração variá- levam trena para ver se o móvel vai
possível. lojaskd. Em 9, a única. vel e mudança da cultura interna, em caber no espaço? Na descrição do
89_comece pequeno, sonhe grande fechar as portas. abrir outras

produto, as medidas têm que estar na pode se aventurar como decorador. São opera num sistema de cross docking,
cara. E isso fez com que a indústria se casos como o da Margaret, lá em cima que dá a ela mais flexibilidade e agili-
mexesse junto. – uma cliente real – que conseguiu visu- dade, comparado à maioria dos concor-
alizar seu closet dos sonhos, selecionar rentes.
Mas nada foi tão inovador quanto apre- seus itens e materiais favoritos, inserir
sentar os itens em ambientes de casa já as dimensões do espaço e receber tudo
decorados. em 15 dias úteis para montar com seu
marido – só eles dois e o manual de ins-
Todo mundo é um pouco truções.
decorador
Hoje, a LojasKD é a única plataforma de- Do ponto de vista do negócio, esse é um
dicada inteiramente a móveis para casa. incentivo para a compra de mais de um
O mecanismo de busca para ambientes item na jornada do consumidor. Dá cer-
decorados permite aos clientes navega- to: mais de 50% compram itens de um
rem por 5 mil interiores montados, que ambiente decorado, em vez de móveis
passam por uma curadoria cuidado- individuais. O foco online da LojasKD
sa para garantir que clientes imaginem também os permite oferecer mais va-
como seus cômodos podem ficar – da riedade – são mais de 25 mil produtos.
suíte de casal à área de serviço.
Eis que vem a cereja do bolo: esse volu-
Do ponto de vista do cliente, é a inspi- me todo, sem se preocupar com despe-
ração que confirma que qualquer um sas de estoque. Isso porque a empresa
comece pequeno, sonhe grande

MAR CALMO
NÃO FAZ BOM
MARINHEIRO
Ele é capitão de seu próprio destino: conheça mais da história
de Jaime de Paula, empreendedor da Neoway.

Empreender tem muito de navegar. não é de se estranhar, já que o obje-


Arrumar o próprio barco, recrutar a tivo de ambas é desbravar territórios
tripulação mais preparada, saborear o em busca de novas oportunidades.
vento, ajustar as velas e deixar o por-
to seguro rumo ao desconhecido; são Para o incansável Jaime de Paula,
Jaime de Paula, inúmeras as analogias que podem ser não sobra muito tempo para refle-
fundador da Neoway
feitas entre as duas atividades. O que tir sobre essas semelhanças.
91_comece pequeno, sonhe grande mar calmo não faz bom marinheiro

Mas, quando conhecemos a história do homem de ciência da computação e TI sequer existiam na O salto do robô
no comando da Neoway – uma empresa que pra- época). Foram os resultados dessa pesquisa acadêmi-
ticamente inaugurou o nicho de mercado em que ca que o levaram ao primeiro grande salto. Em
atua –, é impossível não pensar naqueles que se Logo no segundo ano de estudos, Jaime já fazia parceria com a Secretaria de Segurança Pública
aventuram no mar. Na verdade, o próprio Jaime parte da equipe de desenvolvimento de softwa- de São Paulo, Jaime e seus colegas aplicavam
faz a associação, já que se refere à organização res de uma empresa pública de processamento modelos de integração entre diversas bases de
como “uma frota de barcos viking”. E a história a de dados. O futuro era imensamente promissor dados. Desse processo, nasceu um produto ba-
seguir mostra como a comparação é oportuna. – tão vasto quanto o campo de tecnologia da in- tizado “investigador virtual”, um robô que con-
formação que o mercado estava apenas come- seguia ler todos os relatórios de um sistema e
Os feitiços da Ilha da Magia çando a explorar. A carreira se provou meteóri- identificar padrões entre as ocorrências – o que
A relação entre Jaime e o mar vem de longa ca, e não demorou para que ele fosse de marujo ajudava a encontrar criminosos.
data. Começa em Florianópolis – coincidente- a imediato: em poucos anos, ocupava o posto
mente, hoje considerada a cidade mais empre- de Chief Information Officer (CIO) de grandes Mas o salto, na verdade, começou
endedora do país; terra-natal do empreendedor, empresas, como Perdigão e Cecrisa. com um pulo nos eua, onde a polícia de
a Ilha da Magia parece ter feito valer o apelido. Nova York realizava um intercâmbio
Lançou desde cedo seus encantamentos sobre A paixão por tecnologia não se restringia à de ideias com a de São Paulo.
um jovem inquieto e de olhar obstinado, que área profissional. Aproveitando-se do fato de
vasculhava o oceano e o horizonte em busca que, desde aquela época, a UFSC já estimulava O ano era 2002; Jaime e sua equipe receberam
de algo além das belas paisagens naturais da a aproximação entre conhecimento e prática, um convite para apresentar o investigador vir-
cidade. Jaime empreendeu primeiro um mestrado, e tual no evento. E, como não é raro acontecer
depois um doutorado, na área de Mídia e Co- nestes casos, as conversas durante o cafezinho
No centro dessa busca, a tecnologia. “Em minha nhecimento. Naquele momento, a pesquisa or- mudaram tudo.
vida e minha carreira, sempre segui na área tec- bitava conceitos como Data Warehouse e Data
nológica”, afirma, convicto. Assim, ingressou em Market; a ideia de Big Data nem dava sinais de Pois foi durante uma delas que ele travou con-
1979 no curso de engenharia elétrica da UFSC (os aparecer. tato com James Onalfo. Neste experiente exe-
92_comece pequeno, sonhe grande mar calmo não faz bom marinheiro

cutivo da área de TI, Jaime descobriu afinidades “Onde existe mercado? Onde o mercado está Em 2009, procuraram Jaime com uma deman-
que iam além do nome – Onalfo havia sido CIO crescendo, e onde está diminuindo? Quais são da específica: realizar uma análise aprofundada
da Kraft Foods, do mesmo ramo da Perdigão. E as variações?”; era a perguntas como essas, fei- do mercado de longo prazo. A partir de então, a
acabou por ouvir um desses conselhos inesti- tas por dez entre dez empresários, que Jaime Neoway passou a mapear obras pelo país para
máveis, que podem revolucionar a vida de um queria responder com a plataforma que estava que a empresa pudesse planejar vendas com
empreendedor – desde que ele esteja com o ra- desenvolvendo – de forma mais ágil, barata e mais precisão. E os resultados foram incontes-
dar ativado. eficiente do que pesquisas e outros métodos de táveis: tanto a área de engenharia quanto a de
análise. varejo apresentaram crescimento expressivo
“Jaime, você quer crescer de verdade?”, disse (respectivamente, 40% e 30%). “Foi um pas-
Onalfo, aproximando-se e baixando a voz. “En- Era um tremendo desafio. Mas aí entra a dispo- so muito importante para a consolidação da
tão saia da área de segurança. O Brasil é um país sição que é indispensável às grandes façanhas Neoway”, afirma.
continental, e tem muita gente querendo inves- do empreendedorismo. Dedicando-se pessoal,
tir lá. Mas vocês não têm uma base de infor- profissional e academicamente ao trabalho, Jai- As tempestades pelo caminho
mações como a que existe aqui nos EUA”. Nem me resolveu fazer disso um negócio. E acabou Não foi uma navegação tranquila. Jaime de Pau-
teria sido preciso concluir a frase; Jaime imedia- criando a Neoway, ainda em 2002. O propósi- la explorava novas regiões, onde nem tudo eram
tamente identificou a oportunidade. to era claro: combinar inteligência tecnológica mar manso e céu de brigadeiro. Havia tormentas,
e inteligência de mercado em soluções que me- ventanias, ondas gigantescas e outros perigos.
Desbravando o Big Data lhorassem o desempenho econômico e organi-
De volta ao Brasil, resolveu arriscar. Reorientou zacional. Um dos maiores era o recrutamento. Afinal,
a pesquisa de seu doutorado e, em consequên- como costuma acontecer nessas jornadas rumo
cia, a própria carreira, ao se aventurar por um “Terra à vista!” ao desconhecido, não é fácil encontrar quem es-
novo oceano: o do Big Data. Passou a esquadri- O pitch da Neoway era inédito por estes trópi- teja à altura da tarefa. Principalmente em mea-
nhar todas as bases públicas existentes no país, cos e, por isso, logo chamou a atenção de gran- dos de 2009, quando novos clientes passaram a
de modo a dar uso inteligente aos milhões e mi- des corporações. A primeira delas foi a maior bater na porta da Neoway em busca de soluções
lhões de dados disponibilizados diariamente. empresa de cerâmica do país, a Portobello. para melhorar a gestão de suas informações.
93_comece pequeno, sonhe grande mar calmo não faz bom marinheiro

“Se nós precisássemos de um profissional preparados para vender as soluções da fazer’, que aparece sempre alguém para
sênior, não adiantava”, revela Jaime, não Neoway, mas dispostos a “entrar na es- resolver. Pode ser que fique três finais de
sem alguma aflição, “Não encontrávamos. teira já a 15 quilômetros por hora”, como semana trancado numa sala, mas entrega
A saída era contratar um trainee e formá Jaime define o ritmo da empresa. “Tem pronto, todo feliz”.
-lo”. O empreendedor se lembra de como, que pular e correr, se não vai cair.”
na época, suava sangue para montar uma Na companhia de quem
equipe de meia dúzia de pessoas – não ha- O desafio qualificado como conhece o mar
veria a menor possibilidade de encontrar motivação Superados os gargalos iniciais, a Neoway
um sétimo componente, caso necessário. A saída para compor o time passou por passou a crescer exponencialmente. Em
uma estratégia central: investir na forma- 2012, Jaime se tornou Empreendedor En-
Outro desafio era o próprio perfil do ca- ção de jovens talentos. Com um mode- deavor – acontecimento que ele considera
pitão da Neoway. Engenheiro nato, Jaime lo de gestão inovador, baseado em me- como outro importante passo em sua tra-
sempre dedicou atenção total ao desen- ritocracia e remuneração variável, Jaime jetória. Até pela forma como aconteceu: na
volvimento das soluções da empresa, e conseguiu formar uma tripulação com as hora de apresentar o projeto no processo de
nem tanto à forma como seriam vendidas. qualidades que queria a bordo. Alguém aí seleção, o empreendedor quebrou o proto-
pensou em disposição e superação? Pois colo – em vez de um arquivo em Powerpoint,
/ A plataforma funcionava maravilhosa- é, tudo isso, combinado com obsessão apresentou o próprio software da empresa.
A plataforma mente, mas ninguém, ou quase ninguém por novidades e desafios.
sabia disso. Os conselheiros presentes, então, enche-
funcionava O desafio qualificado, aliás, é o que man- ram-no de perguntas sobre o funciona-
maravilhosamente, Ou seja, em dado momento, o empreende- tém a moçada na pilha – e o barco a todo mento da solução. Logo ficou claro que
mas ninguém, ou dor percebeu que precisava urgentemen- vapor. “Aqui, ninguém pode reclamar de eles queriam usá-la em suas próprias em-
te de uma área comercial. E mais uma vez monotonia”, diz, satisfeito. A psicologia presas e se tornarem clientes da Neoway.
quase ninguém sabia esbarrou na questão de gente. Era muito reversa faz maravilhas na Neoway. “É só Até que Laércio Cosentino, da Totvs, pa-
disso. difícil encontrar não apenas profissionais dizer: ‘isso aqui ninguém vai conseguir rou, pensou e concluiu:
94_comece pequeno, sonhe grande mar calmo não faz bom marinheiro

“Bom, parece que você está aprovado, não?” sonhar grande. “Hoje, temos nove barcos vikin- ne de comando: “Vou para Miami jogar golfe”.
gs navegando em conjunto. Cada um com suas Deixou um Chief Operating Officer no timão, e
O próprio Laércio foi o escolhido por Jaime como próprias missões, mas todos conectados, rumo partiu.
mentor, ao lado de Martin Escobari, executivo aos mesmos objetivos”.
da Gerenal Atlantic LLC. Os dois se sentaram Voltou duas semanas depois,
com o empreendedor durante longas reuniões Quais objetivos? “A América Latina. Temos cin- cansado da aposentadoria.
– nove horas no total, ele calcula – para ajudá-lo co clientes, em cinco países, que viabilizaram
a contornar outro obstáculo: o plano comercial. esses planos. E abriu também uma janela nos Pudera. Porque, embora responsável por um
“Isso não tem preço. Como é que você vai con- Estados Unidos. Vamos desembarcar lá para ver notável case de sucesso – ou talvez por isso
tratar um mentor chamado Laércio Cosentino o que acontece”, diz, com o mesmo olhar que ia mesmo – Jaime continua exatamente o mes-
ou Martin Escobari?”. longe e atravessava as belezas de Floripa. mo. A disposição, a inquietação e a superação
de anos atrás não retrocederam um milímetro
Hoje, a área comercial deixou de ser um proble- Mas isso é para agora. Porque, para o médio pra- sequer. Pelo contrário: cercado por uma tripu-
ma para se transformar em propulsora do cres- zo, o sonho grande é um IPO – a abertura de ca- lação incansável e estimulada (a média de ida-
cimento da empresa, com canais de venda pela pital da empresa por meio de ações negociadas de na Neoway é de 26 anos), e sempre atento
internet, estratégias de upselling, e outras ini- na bolsa. às oportunidades no horizonte, o empreende-
ciativas. dor conduz a frota em um ritmo de crescimen-
Aposentadoria relâmpago to médio de 50% ao ano.
A frota viking rumo a Quando perguntado sobre eventuais planos
novos continentes para se aposentar, Jaime é categórico: “Isso não Ou seja, segue firme na cabine de comando,
Por falar em crescimento, o mundo (não) é o li- é para mim. Não tenho cabeça de aposentado”. rumo ao seu próprio destino. E não dá sinal al-
mite. No comando de cerca de 300 funcionários gum de que vá baixar a âncora.
e mais de 150 engenheiros de software, Jaime E ele afirma com propriedade, já que, não faz
estruturou uma dinâmica interna baseada em muito tempo, constatou que a Neoway estava
sinergia e motivação. Com isso, pode sonhar, e bem encaminhada e resolveu se retirar da cabi-
95_comece pequeno, sonhe grande inovação segura

INOVAÇÃO
SEGURA
Se empreender já é coisa de herói, quem dirá empreender combatendo
o crime. Veja como Silvio Aragão e Eduardo Ferreira Lima estão usando
inovação para encarar de frente o problema da segurança no Brasil.

Pelas ruas escuras da cidade, um sujeito Por trás desse negócio, estão dois ami-
mal intencionado mira seu alvo. Ao mesmo gos de infância que a vida reuniu no em-
tempo, a câmera da Avantia mira o sujeito. preendedorismo. Conheça a história de
Do centro de controle, um especialista em Silvio Aragão e Eduardo Ferreira Lima.
monitoramento acompanha a movimenta-
ção e aciona a polícia, que chega ao local Sem medo
antes que algo mais grave aconteça e cap- Quem passa pela rua e vê um homem
tura o meliante. Santa eficiência, Batman! correndo não imagina que ele seja mara-
tonista, muito menos o quanto ele já trei-
Poderia ser Gotham City, mas é Recife. nou nas correrias dessa vida. Também não
Desde que o sistema de segurança da pensa que possa ser um empreendedor
Avantia foi implementado por lá, a capital que usa a corrida justamente para desa-
pernambucana observou uma queda de celerar. Irônico, né? Mas a paixão de Sil-
assassinatos de 60,8%, entre 04/2007 vio Aragão pelo esporte começou cedo.
Eduardo à esquerda e Silvio à e 12/2013. E a solução serve não só para A propensão ao risco também – vide as
direita, fundadores da Avantia
espaços públicos, como para estabeleci- aventuras do jovem surfista no mar de
mentos privados também. Recife, cheio de tubarões. Ótimo ensaio
96_comece pequeno, sonhe grande inovação segura

para quem resolveu mergulhar de cabeça Quando era criança e alguém pergunta- foi aprender a gerir um banco, e sim abrir
no mundo dos negócios. va “o que você vai ser quando crescer?”, uma empresa de engenharia.
a resposta estava pronta: “Eu vou ser en-
Aos 14 anos, Silvio já era office-boy no genheiro!”. Não deu outra. Já no científico Fecha negócio,
Banco do Brasil. Não precisa nem falar, (equivalente ao Ensino Médio), decidiu fa- abre negócio
“trabalho” é uma palavra que não assus- zer Engenharia Elétrica. Quase no fim da faculdade, o objetivo se
tava o garoto. Só que um ano depois, o pai realizou e Silvio abriu o primeiro negócio
perguntou o que ele já tinha construído e Logo que entrou na faculdade, Silvio pas- com um colega. Era bancário durante o dia,
a maior conquista era ter juntado dinheiro sou no concurso de escriturário do Banco estudante à noite e empreendedor nas ho-
para um aparelho de som no quarto. Levou do Brasil. Em seguida, foi promovido a as- ras vagas. Às vezes, trabalhava até depois
uma bronca: sistente da gerência. Agora o turno era de das aulas na empresa, que fazia instala-
8 horas e, com a faculdade à noite e as prá- ções elétricas prediais e de pequenas su-
“A essa altura, você já deveria ter um fitei- ticas indispensáveis do tênis e do ciclismo, bestações.
ro para vender balas na porta do colégio, tinha acabado o tempo livre.
/ algum negócio seu.” Quando concluiu a faculdade, passou a
Foi o primeiro Deu certo por um tempo: era coerente com atuar no Departamento de Engenharia do
incentivo de Silvio Foi o primeiro incentivo de Silvio para se a personalidade inquieta e dedicada de Sil- banco, onde viu uma boa oportunidade
tornar um empreendedor. Aquilo ali ficou vio. Mas quando o novo cargo começou a de crescer dentro de sua área de atuação.
para se tornar reverberando em sua cabeça. exigir que ele saísse cada vez mais tarde, Dessa vez, ele preferiu investir no conhe-
um empreendedor. foi preciso fazer uma escolha para não afe- cimento técnico e, para dar conta da res-
Aquilo ali ficou O pai tinha emprego fixo, mas sempre foi tar a faculdade. Para espanto de todos, ele ponsabilidade, precisou dar um tempo da
comerciante. Silvio seguia o exemplo de pediu para sair do cargo comissionado e própria empresa. Não que o foco tivesse
reverberando em casa, vendendo sanduíches e camisas no voltou a ser escriturário, ganhando menos. mudado: esses aprendizados, ele levaria
sua cabeça. Colégio Marista, onde estudava. O curso era puxado, afinal, e o foco nunca para a próxima fase.
97_comece pequeno, sonhe grande inovação segura

Essa fase, no entanto, poderia ser an- “Meu filho, você é um homem traba-
tecipada pelo próprio banco. Quando lhador, estudioso. Não tem como dar
lançaram um programa de demissão errado não. Saia e monte seu negó-
voluntária, a premiação para quem cio, que vai dar certo”. silvio escutou.
aderisse era bastante atraente. Claro
que não era fácil aderir. Aos 25 anos, Quis aprender mais sobre gerir em-
Silvio já tinha um cargo de gerência presas e buscou uma bolsa de mes-
e havia construído uma carreira de trado em administração. Foi sele-
onze anos lá dentro. Tinha o emprego cionado na Universidade Federal de
dos sonhos de todas as famílias nes- Pernambuco. Durante o curso, ainda
/ sa época: bom salário, estabilidade fazia alguns trabalhos como autôno-
“Meu filho, você e prestígio. Só que esse era o sonho mo. Quando concluiu, em 1998, abriu empreendedor cuidava de tudo, da Antiga fachada
da Avantia
dos outros, não o dele. a Aragão Engenharia. compra de materiais à folha de paga-
é um homem mento, e acompanhava a equipe du-
trabalhador, Silvio conversou com muitas pessoas, Mão amiga para dar rante a noite e aos finais de semana.
estudioso. Não mas até seu pai, que sempre foi seu equilíbrio
grande incentivo para empreender, A Aragão começou pequena, com um “Ralei e ralei muito – trabalhava de
tem como dar ficou na dúvida. Era hora de buscar eletricista e um ajudante. No início, fa- domingo a domingo. No ano em que
errado não. outras opiniões. “Fui conversar com zia instalações de automação indus- casei, minha mulher falava: ‘eu acor-
Saia e monte seu meu avô, um homem muito sábio. Ele trial e bancária e instalações elétricas do, você saiu; eu vou dormir, você
era escritor, historiador e jornalista. industriais, áreas que Silvio domina- não chegou’. Foi quando eu, de fato,
negócio, que vai Contei meu dilema e meu sonho e ele va muito bem. Mas tinha que se virar comecei a dividir o tempo e a gestão
dar certo”. silvio não piscou duas vezes antes de res- onde não era tão bom também: como da empresa com um sócio e a ter um
escutou. ponder: em qualquer empresa incipiente, o cuidado maior com minha família”.
98_comece pequeno, sonhe grande inovação segura

Silvio trouxe então o primeiro parceiro, o amigo Ha- rias línguas e se qualificou para entrar no mercado
milton Valentim, que abraçou a causa e continua na de trabalho e conquistar o máximo de experiência
empresa até hoje. Seis anos depois, veio o segundo que pudesse. Tudo era parte de um plano.
sócio, Marcelo Poncel, e os negócios expandiram
fortemente no mercado de infraestrutura de TI. Logo Quando terminou a faculdade, Eduardo começou a
viria o terceiro sócio, o amigo de infância, Eduardo. trabalhar no Lloyds Bank. Aos 24 anos, surpreendi-
do pelo fechamento do banco, teve a primeira inicia-
Candidato a empreendedor tiva empreendedora. Com o começo do plano real,
Nascido em uma família de políticos, o menino Edu- o mercado oferecia uma boa oportunidade: “tinha
ardo Ferreira Lima sempre soube o que não queria inflação de primeiro mundo com juros de tercei-
fazer: política. Seu pai, deputado federal perseguido ro mundo e não havia cultura de banco dar crédito
pela ditadura, se mudou para a Argélia, onde já esta- para pequena e média empresa. Abri uma factoring Da direita para a
va o amigo Miguel Arraes, três vezes governador de voltada para esse nicho”. esquerda: Marcelo,
Silvio e Hamilton
Pernambuco. A mãe, arquiteta, conseguiu trabalho em comemora-
na equipe de Oscar Niemeyer, figura que também Para viabilizar o negócio, Eduardo precisava de um ção dos 10 anos.
morou por lá, durante o regime militar. capital de R$ 400 mil. Como já tinha os R$ 30 mil Ao lado, Eduardo
na escola, quando
da rescisão, foi buscar um sócio para completar “só morava na Argélia
A família viveu onze anos no exílio, onde Eduardo a pequena parte que faltava, os R$ 370 mil”, ele diz
nasceu. Voltou para o Brasil com oito anos de ida- brincando. Procurou um grupo que foi cliente no
de. Com doze, conheceu o amigo Silvio Aragão, mas banco e mostrou os planos. “Eles acreditaram em
seus caminhos demorariam a se cruzar novamente. mim e começamos juntos o negócio. Essa empresa
Desde muito jovem, Eduardo vinha se preparando existe até hoje.”
para empreender, mas não tinha nem capital nem
uma empresa para herdar. Como gostava muito de Eduardo começou a investir em atividades bastante
estudar, fez mestrado, fez curso fora, aprendeu vá- ecléticas, entre elas concessionárias de motocicletas,
99_comece pequeno, sonhe grande inovação segura

loteamento de casas populares e plantação de grãos no “É melhor ser uma parte de um negócio maior do que ser
centro-oeste. Como ele não pode ser especialista em tudo, sozinho num negócio menor”
ressalta que, para garantir o sucesso, é importante ter al-
guém no negócio que já entenda do mercado. Seus grandes aprendizados estão na construção de con-
Primeira sensos, no respeito à posição e à ideia do outro. “Quan-
Fachada O reencontro com Silvio foi acontecer quando ambos fa- do entrei na Avantia, era o quarto sócio. Se todo mundo
Aragão
Engenharia. ziam MBA. O amigo já empreendia e Eduardo agora pos- está cacarejando, você não pode chegar latindo. Tem que
Abaixo, suía capital suficiente para apostar em boas ideias. Foi chegar com humildade, respeitando o que foi feito. Se você
Eduardo em quando, juntamente com sua esposa, Maria, fez a pro- achou interessante entrar, é porque a empresa teve suces-
Harvard, em
2016 posta de comprar 40% da Aragão Engenharia e impul- so e você deve agregar no que pode trazer de novo”.
sionar o crescimento da empresa. Como parte do acor-
do, ele assumiria a área comercial. Começar pequeno e inovar sempre
Em 2002, Silvio e Eduardo vislumbraram novas oportu-
Nesse processo de expansão, também rebatizaram o ne- nidades quando o mercado de segurança começou a mi-
gócio: Avantia, um nome marcante, que dá ideia de avanço grar do mundo analógico para um mais tecnológico. Silvio
e que teria um melhor encaixe com o setor de tecnologia. fez um curso de segurança digital, comprou algumas câ-
meras IPs, montou um kit de demonstração e foi oferecer
Amigos, amigos, negócios à parte ao mercado o novo modelo baseado em uma tecnologia
A famosa frase acima não encontra eco na vida de Edu- inovadora.
ardo. As pessoas costumam brincar que, nas suas festas
de aniversário, tem mais sócio que parente. O segredo, A iniciativa de empreender dentro da própria empresa
diz, é saber escolher. Para Eduardo, sociedade é como teve sucesso e eles foram convidados para participar do
um casamento. E ele recomenda para todo mundo, não primeiro projeto de videomonitoramento público de Reci-
só para contribuir na captação, mas para ter alguém que fe. Com a melhor solução, a Avantia executou toda a par-
ajude a tomar decisões: te de fibra ótica e instalação de equipamentos e ganhou
100_comece pequeno, sonhe grande inovação segura

uma grande credibilidade. Melhor ainda, e pretendem repetir a experiência.


iniciou uma nova fase de crescimento no
setor de tecnologia de segurança. Silvio afirma que o melhor conceito de
inovação é ter uma solução para um
Não pararam de se reinventar desde en- problema real da sociedade: “Um país
tão. Hoje, a Avantia aposta em desenvol- com uma diversidade de problemas é
ver soluções inovadoras que levem seus um verdadeiro mar de oportunidades
clientes a reduzir custos. Para isso, tem para quem quer empreender”.
analistas de sistemas para desenvolver
aplicativos e é uma das poucas empre- Avantia, de avante
sas desse mercado com uma área de Eduardo fala que, na indústria de tecno-
P&D dentro da companhia. logia, as pessoas têm que estar sempre
antecipando tendências. “Quando o cara
A busca por novas tecnologias também diz ‘to correndo atrás’ eu digo: ‘está atra-
levou a Avantia a participar do Porto Di- sado, tem que correr na frente’”. Planos arrojados sempre fizeram parte da Eduardo conhe-
/ gital de Recife, o que energiza a equipe trajetória desses dois nordestinos deter- cendo soluções
de segurança em
“É melhor ser para uma cultura de inovação. A ado- O investimento em novos setores foi um minados, que começaram suas jornadas Israel
uma parte de ção de uma filosofia de “corporate ga- passo decisivo para o sucesso da Avan- muito cedo, investiram continuamente
rage” é a mais recente delas. Um bom tia. Hoje, o negócio conta com 400 fun- no aprendizado e trabalham duro. O va-
um negócio exemplo foi a compra de 50% de uma cionários, mas ainda é pouco, para o so- lor disso tudo a gente não vê só nos nú-
maior do que startup do Porto Digital, que desenvol- nho e o impacto que pretendem alcançar. meros, mas na esperança de uma melhor
ser sozinho veu uma solução de detecção de áudio, Silvio diz querer transformar a Avantia qualidade de vida para todos.
com sensores em postes acoplados a numa empresa de bilhão, empregar de 3
num negócio uma câmera. Com a aquisição, eles le- a 4 vezes mais pessoas e ajudar o país a Num país onde heróis às vezes fazem
menor” varam a startup para dentro da Avantia desenvolver mais empreendedores. falta, Silvio e Eduardo fazem a diferença.
101_comece pequeno, sonhe grande louca é elogio

DAY 1

LOUCA
É ELOGIO
Cofundadora da Endeavor, Linda e também não sabia o que era em-
Rottenberg teve o seu momento “a- preendedorismo, ela teve a ideia
ha” como o mais comum dos seres: de encontrar e apoiar empreende-
em uma corrida de táxi. A partir da dores nos mercados emergentes e
história do motorista argentino, um contar as suas histórias para inspi-
engenheiro que não atuava na área rar e motivar os outros.
102_comece pequeno, sonhe grande empreender é construir

DAY 1

EMPREENDER
É CONSTRUIR
Alguns eventos podem causar mu- sumir o controle: em um gesto sim-
danças de rumo importantes na tra- bólico, trocou a mesa do escritório do
jetória de um empreendedor. Mas pai pela sua, reuniu os funcionários e
sempre há aquele dia, memorável e explicou a transição. Foi um momen-
determinante, o que parece ser o pri- to significativo, mas Alexandre desco-
meiro do resto da sua vida. Alexan- briria que seu Day 1 ainda estava por
dre Ostrowiecki, dono da Multilaser, vir, em forma de uma sociedade. En-
achou que seu Day 1 seria o dia em tendeu que seria difícil segurar a bar-
que voltou da Costa Rica, depois de ra sozinho e convidou Renato Feder,
passar 10 dias participando das bus- amigo de infância, para tocar com ele
cas por seu pai, que desapareceu em a empresa, que na época fazia apenas
uma atividade de mergulho. reciclagem de cartuchos de impresso-
ra. Juntos, os dois fizeram a empresa
Israel Ostrowiecki era fundador da decolar e realizaram outros diversos
Multilaser e Alexandre precisou as- projetos de cunho político e social.
comece pequeno, sonhe grande

A CORAGEM DE
FAZER O SONHO
ACONTECER
Uma vantagem sobre empreender no setor odontológico: ser
dentista. Uma desvantagem: ser dentista. Veja como Roberto
e Sonia correram atrás de capacitação e parcerias para criar a
Angelus e fazer o sonho acontecer.

IN-VI-Á-VEL. Foram essas as síla- letrinhas no monitor azul que que-


bas que formaram o primeiro fee- ria destruir seu sonho, o empreen-
dback sobre o negócio de Roberto dedor ficou bravo. Afinal, sua ideia
Alcântara. Ainda em 1994, um sof- era genial.
tware analisou seus números com-
Roberto Alcântara, parado ao seu segmento e logo Não deixa de ser verdade, a ideia
fundador da Angelus
deu o duro veredito. Encarando as era mesmo muito boa: fabricar e
104_comece pequeno, sonhe grande a coragem de fazer o sonho acontecer

vender produtos odontológicos –como Tudo sob controle Dom Cabral, Fundação Getulio Var-
pinos e coronárias pré-fabricados– em O casal resolveu então que não deixaria gas… os sócios passaram a se comple-
alta escala e com preço mais baixo que a sorte tomar decisões por eles. Sonia, mentar ainda mais. Ela, com toda a ha-
a média do mercado. Tanto Roberto que inclusive já havia passado por um bilidade administrativa; ele, buscando
quanto Sonia, sua esposa, eram den- episódio de falência na família, sabia da inovação. Sim, porque com a implan-
tistas e conheciam bem os desafios da importância de estarem bem prepara- tação de processos e inteligência de
profissão. Mas enquanto tinham a van- dos. Quando iniciaram o negócio, dado gestão, o desafio deixou de ser o fatu-
tagem técnica de resolver problemas o trauma de infância, ela foi contra: “Ro- ramento.
conhecidos, tinham a desvantagem de berto, eu conheço essa história, eu vivi
não entender praticamente nada de essa história. Me deixe fora dessa”. Só que se, como empreendedor, você
negócios. não tem a experiência com tecnologia
Não é para menos: Eles tinham, na para desenvolver seu produto, o que
Por conta disso, por alguns anos, a An- odontologia, uma segurança excelen- você faz?
gelus caminhou a passos lentos. Ain- te, com clientela formada. “Não tinha
da que vendessem bastante, com bai- por que inventar nada, até que surgiu Indo atrás de quem sabe
/ xo valor agregado aos seus produtos, a oportunidade”, conta Roberto. Com Na época com um Fiat Mille, Roberto
“EU SONHAVA também tinham baixo faturamento. o tempo –e por conta do sangue árabe, rodou mais de 100 mil km visitando
Na época, os empreendedores não di- ele brinca–, a esposa entrou de cabeça. universidades pelo país, que pudes-
TODOS OS DIAS vidiam as finanças pessoais do caixa, e E quando chegou o momento de fazer sem realizar estudos e agregar co-
QUE EU PODERIA o dia em que daria tudo errado poderia aquela ideia ganhar força, ela deixou nhecimento ao portfólio da empresa.
AMANHECER vir sem aviso prévio. seu consultório e investiu em capaci- O ano era 1998 e não era comum a
tação empreendedora. mentalidade de que instituições de
QUEBRADO”, “Eu sonhava todos os dias que eu poderia ensino e negócios pudessem cami-
CONTA ROBERTO. amanhecer quebrado”, conta Roberto. Sonia passou por Sebrae, Fundação nhar juntos.
105_comece pequeno, sonhe grande a coragem de fazer o sonho acontecer

O resultado? Muita porta na cara. De mais Como a odontologia no Brasil é bastante daquele software 12 anos atrás e estão tra-
de 100 universidades, apenas três fecha- dependente da fabricação estrangeira, o balhando duro para ressignificar negócios
ram parceria com a Angelus. Mas tudo bem, sonho de Roberto é substituir importados e brasileiros mundo afora: não apenas viá-
porque era o que precisavam. Do lado deles, se solidificar também em mercados exter- veis, como inovadores.
estavam o Centro Tecnológico da Aeronáu- nos, tornando-se uma referência global. Já
tica (CTA), a Universidade Federal de São são mais de 100 países em 5 continentes ASSISTA À HISTÓRIA
Carlos (UFSCar) e o Instituto de Pesquisas consumindo seus produtos.
Tecnológicas (IPT).
Sem moleza
De braços dados com a tecnologia, a em- Parece até que agora está tudo encaminha-
presa pôde dar um grande salto de perfor- do, não? Longe disso. Além do desafio de
mance e atrelar esse crescimento a uma se tornar uma empresa de grande porte, o
maior maturidade na gestão. Em 2004, a futuro também traz algumas dores pesso-
casa estava em ordem para que pudessem ais. Por exemplo, o momento de deixar de
aproveitar a Lei da Inovação brasileira, que ser empreendedor:
facilitou as negociações com centros tec-
nológicos e permitiu acesso a recursos para “Jamais vou ser feliz em uma aposentado-
investimento em P&D. ria. Mas um dia vou morrer e vou deixar um
projeto inacabado. Essa é minha maior dor.”
Hoje, a angelus tem patentes
próprias, equipe de pesquisadores, Não quer dizer, claro, que Roberto e Sonia
um portfólio robusto e cerca de não deixarão um legado. No fim das con-
100 funcionários. tas, se capacitaram, redimiram o veredito
106_comece pequeno, sonhe grande 2 irmãos e 1 sonho

2 IRMÃOS E 1 SONHO Os irmãos que abriram mão de um negócio de sucesso para


começar tudo de novo e ir mais longe

Atingida por um tiro em guerra na re- Gerações depois, Marcus e Ale-


gião da Síria no início do século pas- xandre seguiam os passos corajo-
sado, com apenas uma perna, pegou sos de seus ancestrais. Juntos des-
o filho nos braços e embarcou em um de o início do negócio, quando era
navio rumo aos EUA. Como não pu- apenas uma gráfica muito simples,
deram entrar no país, a embarcação eles transformaram a Arizona em
teve de desviar a rota e acabou vindo uma empresa de tecnologia inte-
para o Brasil. Aqui, ela precisou pa- grada para gestão de comunicação
vimentar seu próprio caminho para e marketing entre agências e anun-
garantir o sustento da família. ciantes, com mais de 300 colabo-
radores e atuação internacional.
A mulher era a bisavó de Marcus e
Alexandre Hadade, que herdaram Exemplos em casa
características comuns a muitas Quando o avô de Marcus e Alexan-
famílias de imigrantes, como cora- dre (aquele, que também estava no
gem, ousadia e determinação. Não navio) se mudou para São Paulo, ele
por acaso, as mesmas que impul- tinha 17 anos e nada no bolso. Até
Da esquerda para direita- Marcus e Alexandre
Abdo Hadadde, fundadores da Arizona
sionam os empreendedores — afi- então só havia trabalhado na roça e
nal, dos dois lados, desbravar e começou uma vida empreendedora
construir faz parte da essência. como mascate, indo vender produ-
107_comece pequeno, sonhe grande 2 irmãos e 1 sonho

tos no interior. Todo dia guardava dinheiro para mas participavam de tudo e trabalhavam como cos. Mas o sangue empreendedor ansiava por
fazer um curso de eletrônica. O curso era por vendedores porta a porta. Assim que Marcus novos horizontes e, depois de trabalharem na
correspondência e em alemão, mas ele não fa- saiu do Exército, seu pai lhe disse: “A partir de empresa da família, eles tomaram a decisão
lava nem o português direito. Conseguiu estu- segunda, você vai abrir a filial de vendas de de construir a própria história.
dar com a ajuda de um amigo e montou a pri- consórcio”. Foi o que ele fez.
meira lojinha de consertos de vitrola. Em 1998, seu Abdo havia comprado duas má-
Mesmo tendo tido oportunidade de concluir quinas gráficas usadas, por meio de um anún-
Depois de casado, foi morar com a esposa nos uma faculdade de administração e de fazer cio nos classificados, para imprimir os carnês
fundos da loja. Em vez de fogão, usava uma cursos nos EUA e na Suíça, o que Marcus mais do consórcio e os manuais da Cineral. Era um
lata de tinta para cozinhar. Em vez de berço, valoriza como sua verdadeira formação é a es- volume grande de impressos, mas faltava mão
pregou uma prateleira de madeira e colocou cola da família, com o exemplo do avô e do pai, de obra especializada, e as máquinas estavam
um colchãozinho para o filho, Abdo Antonio e as experiências da vida real: “Toda decisão entrando em desuso.
Hadade, dormir. importante que meu pai ia tomar, ele sempre
me chamava na sala. Sempre chamava para es- Para evitar que Abdo se desfizesse delas, Ale-
Com 9 anos, Abdo começou a buscar os rá- cutar a negociação. Eu escutava, anotava tudo xandre e sua mãe, Jaqueline, as puseram para
dios e entregar os produtos de bicicleta para e depois ele ia me explicando a estratégia de funcionar em uma pequena gráfica. Marcus
ajudar o pai. Com 18 anos, a veia empreende- negociação, porque ele tomou tal decisão. Foi entrou logo depois como reforço comercial.
dora se manifestou e ele assumiu a pequena um aprendizado muito valioso.”
oficina. Transformou-a na loja de eletrônicos “Quando começou, a gráfica era super tosca”,
Cineral e começou a crescer. Abriu outro ne- Outra saga se apresenta: conta Alexandre. Ela tinha 4 colaboradores e
gócio de consórcios para a venda de carros e a gráfica assumia pedidos que não tinha nem condição
eletrônicos. Havia grande expectativa da família de que de imprimir, porque as máquinas eram velhas
Marcus e Alexandre assumissem os negócios, demais: “A gente mandava imprimir fora, fa-
Marcus e Alexandre ainda eram pequenos, até então focados no setor de eletroeletrôni- zia o acabamento e entregava.”
108_comece pequeno, sonhe grande 2 irmãos e 1 sonho

Só que os três foram tomando gosto pelo tra- atingir a qualidade esperada. Os irmãos pagavam a semestralidade da dívi-
balho. A Arizona era uma folha em branco e da em euro, enquanto a receita da produção
eles podiam pintar ali o que quisessem. Foi quando a ousadia e criatividade dos ir- era em reais. Estava indo bem, até que o real
mãos definiu os rumos da empresa. Convida- sofreu uma maxidesvalorização e o euro tri-
Tudo começou a mudar quando eles fizeram ram todos os caras dessas indústrias — que plicou de valor. “De repente a receita conti-
um plano de negócios e detectaram um nicho ia do papel e da tinta às máquinas de acaba- nuou a mesma e a dívida ficou estratosférica.
de mercado no qual faltavam gráficas para im- mento — para almoçar num restaurante bom. A gente falou: ‘Ferrou, não tem como pagar’.
pressão de alta qualidade. Havia apenas um Lá, apresentaram o projeto Soma, que sugeria Daí a gente perdeu o sono”, diz Alexandre.
obstáculo óbvio para conquistar esses clien- uma parceria entre todos e a Arizona e que
tes: equipamento, já que máquinas novas cus- poderia servir como um showroom para eles, Por sorte, o fabricante alemão que fez o finan-
tariam quase 1 milhão de euros. O patrimônio já que teriam a oportunidade de expor a efici- ciamento flexibilizou os prazos. Foi empur-
dos irmãos era de um carro cada um. ência de seus produtos e máquinas por meio rando para frente e, no fim, deu tudo certo.
das peças de comunicação de grandes anun- “Mas a gente passou um período bem tenso”,
Eles começaram a visitar fabricantes de equi- ciantes. complementa Marcus. “Dificuldade a gente
pamentos importados para correr atrás de tem um milhão aqui, mas essa foi a mais im-
uma solução. E encontraram. “Pedimos subsídios, treinamento, crédito e portante e a mais difícil de vencer. Para quem
facilidade, porque a gente não tinha condi- teve uma criação muito rígida, ver que você
Em dívida ção de comprar as máquinas. Conseguimos o não vai conseguir honrar uma dívida é muito
Conversando com os grandes fabricantes, ok de todos e eles entraram no projeto”, con- forte.”
Marcus e Alexandre descobriram que eles ta Marcus. Com um financiamento de cinco
não tinham um lugar para mostrar a qualida- anos mais um de carência, Marcus e Alexan- Novos cenários pedem mudan-
de dos seus produtos. Os irmãos, por outro dre montaram a indústria gráfica que foi refe- ças de rumo
lado, não tinham capacidade de comprar os rência no setor, com uma proposta “premium Como o trabalho que faziam era de excelência
materiais de todos esses fornecedores para price” para um trabalho super sofisticado. em todo o processo, algum tempo depois ou-
109_comece pequeno, sonhe grande 2 irmãos e 1 sonho

tras gráficas começaram a contratar a Arizona desafiava era mudar de negócio”, conta Ale- então, vendê-la — 99% das pessoas que eles
para fazer também a preparação de arquivos, xandre. consultaram os desaconselharam. Até clien-
o trabalho de pré-impressão. Foi quando per- tes prometiam: “Não saiam do negócio, a gen-
ceberam novas oportunidades no mercado, Mas para enxergar o contexto de mudanças te vai por mais trabalho aí”.
que já passava por grandes alterações. que se apresentava, era preciso desenhar ce-
nários. Marcus resgatou sua experiência no A exceção foi um mentor da dupla, especia-
Até então, a Arizona produzia trabalhos mui- Exército: lista em private equity e bastante experiente:
to qualificados de baixa tiragem. Os clientes, “Não sei o que vocês estão esperando”. Foi a
da área de marketing e agências, pagavam “Se vier de um lado o inimigo e do outro en- gota d’água, mas uma gota d’água do bem. A
mais caro para ter um produto melhor com contro um rio, ou uma ponte quebrada, o que virada de chave que faltava. Cha-ching! A grá-
um nível de exigência maior. Quando a toma- eu faço? Você não espera as coisas aconte- fica foi adquirida por um dos maiores grupos
da de decisão dos grandes anunciantes sobre cerem para pensar o que vai fazer, você traça do setor no mundo.
a contratação de material gráfico começou a cenários para estar preparado para realizar),
migrar da área de marketing para a área de já pensando nos desdobramentos conforme Pacote completo
compras, eles perceberam que estavam mi- as coisas vão acontecendo. No mundo dos Com os recursos da venda, os irmãos passa-
grando de um cliente que priorizava qualida- negócios, na realidade do Brasil, é muito di- ram a investir em tecnologia para melhorar
de para outro que priorizava preço. fícil fazer um planejamento de dois ou três ainda mais as entregas de produção. Era o mo-
anos, então você começa a traçar cenários mento da transição do mundo analógico para
Para atender às novas demandas, teriam que que o ajudem a ter agilidade na tomada de o digital, então os anunciantes e as agências
ter volume. A gráfica era uma butique e eles decisão.” precisavam se organizar para armazenar, pre-
precisariam investir um valor absurdo para parar e enviar arquivos também para anúncios
crescer. Havia dois caminhos: ou se transfor- Como primeiro negócio dos irmãos Hadade, online, redes sociais e e-commerce.
mavam numa grande indústria ou mudavam o a gráfica foi um mega sucesso, com prêmios
modelo de negócio. “Obviamente, o que nos e crescimento a todo vapor. Parecia loucura, Para um de seus maiores (e primeiros) clien-
110_comece pequeno, sonhe grande 2 irmãos e 1 sonho

tes, a Natura, por exemplo, a Arizona conse- viam grande benefício em ter seus ativos digi- indo, qual é o novo oeste a conquistar”, diz
guiu garantir a unidade da marca nos milhões tais organizados. Alexandre.
de catálogos impressos todo mês em diferen-
tes países. Com isso, 30% menos clientes de- Atentos a isso, os irmãos estudaram como Por isso, a Arizona está constantemente se
volveram produtos por conta de disparidade eram os processos de marketing nas empre- reinventando. Além da produtora multicanal
na cor do produto real em relação à foto,, fora sas e que tecnologias suportavam isso. Perce- e da plataforma de tecnologia para gestão de
a economia de gastos. beram um gap, e portanto uma grande opor- processos de marketing, eles agora também
tunidade, e se focaram em desenvolver uma têm usado big data para traçar perfis de pú-
Observando mais essa tendência, eles se plataforma responsável por gerenciar todo o blico para anúncios e se propõem a ser a única
posicionaram num ponto estratégico, entre processo de produção de conteúdos de pro- fonte da verdade dos conteúdos de produtos
a criação e a entrega da peça para cada tipo duto e de campanhas de marketing. Era mais e marcas. Abrem, assim, um nicho de mer-
de mídia, desonerando as agências de pu- uma disrupção no negócio. cado até então inexplorado, onde a Arizona
blicidade deste trabalho operacional e au- gerencia todo o ecossistema de conteúdos de
mentando a qualidade final percebida pelo Inovando o tempo todo. produtos, desde a produção de fotos e vídeos
cliente. Mais do que isso, desenvolveram Internamente, Marcus e Alexandre também até a entrega destas informações ao consu-
uma plataforma de tecnologia que permitia reconhecem o valor da equipe e investem em midor final.
o armazenamento e reaproveitamento de um time com talentos diversos para criar um
ativos (como fotos, vídeos e informações caldo de cultura propício à a inovação. Meditação e equilíbrio na
sobre produtos) e seu posterior envio para vida pessoal
veiculação nas mídias. “Você não escolhe o dia. Você não fala ‘vou Se você pensa que Marcus e Alexandre tra-
ter a grande idéia’ e tem. Só existe inovação balham muito, você está certo(a). Mas para
Essa tecnologia, pensada inicialmente para em um ambiente que não seja hostil à falha, Marcus, essa vida louca de ficar “morando no
resolver os problemas internos da empresa, para que as pessoas tragam ideias novas. A escritório”, virando a noite e os fins de sema-
começou a chamar atenção dos clientes, que gente está sempre discutindo para onde está na, ficou no passado. Ele começou a sentir a
111_comece pequeno, sonhe grande 2 irmãos e 1 sonho

diferença depois que casou e teve filhos: mesmo: “Em nenhum lugar do mundo você Paulo, tem filiais no Rio de Janeiro e em Bue-
aprende a lidar com pessoas —, nem em casa nos Aires e atende clientes no Chile, Bélgica
“Quando você não tem mais 20 anos, tem nem na faculdade —, mas estamos o tempo e Inglaterra. Mas enquanto você estiver len-
uma preocupação maior com sua saúde e todo lidando com elas. A meditação ajuda do isso, pode ser que novas parcerias estejam
bem-estar. Eu procuro ter uma convivência muito a desenvolver nossas habilidades de li- acontecendo. Afinal, estamos todos em per-
de qualidade com os filhos, do tipo que faz a dar conosco e com os outros – isso é auto-co- manente evolução.
diferença: conversar, participar da vida, das nhecimento”.
reuniões da escola, fazer junto o material que
será vendido no bazar de natal.” Arizona hoje
Making Marketing Flow. Making Content flow.
A rotina saudável inclui exercícios diários, yoga Making...flow. O slogan dinâmico, que altera
e meditação. Com Alexandre não é diferente: palavras, mostra bem a fluidez que a empre-
ele também pratica esportes diariamente e sa pretende oferecer e que adota na forma de
já correu corridas de aventuras e ultramara- conduzir mudanças.
tonas. Hoje, mantém a saúde jogando tênis e
meditando. Animado com a prática, Alexan- Hoje a Arizona funciona como um hub que
dre montou um grupo na empresa que, toda armazena e distribui conteúdos de marcas e
semana, se reúne com um monge para medi- produtos, utilizando tecnologia e processos
tar e discutir espiritualidade. próprios, que garantem agilidade e contro-
le das ações de marketing. A Arizona atende
O grande benefício, segundo ele, é acalmar a grandes agências e 70 dos 300 maiores anun-
mente, que vive ligada nos 220 v, e estabe- ciantes do país.
lecer uma relação melhor com as pessoas, a
partir do aprendizado de se conectar consigo Com mais de 300 funcionários e sede em São
LARGUEI TUDO
E FUI VIVER
MEU SONHO
Empreendedores deixam empregos consolidados
em busca de uma causa maior: transformar
mercados e a si mesmos

04
larguei tudo e fui viver meu sonho

MACGYVER
DO PRÓPRIO
NEGÓCIO
Como Vitor Torres e Fabio Bacarin conseguiram fazer uma
disrupção no mercado de contabilidade, com a Contabilizei.

Fabio Bacarin tinha uma ideia: digi- e Vitor ficou impressionado.


talizar menus de restaurantes. Ins-
creveu seu plano de negócios na Assim nasceu não só uma amizade,
aceleradora de Vitor Torres, mas foi como uma sociedade que tem dado
logo rejeitado. Não que a ideia fosse certo desde 2012 e que deu origem
ruim – pelo contrário, a startup to- a uma plataforma disruptiva de con-
mou forma! O problema era que a tabilidade para micro e pequenas
aceleradora não tinha nenhuma ex- empresas. Mas antes de falarmos
Da esquerda para a direita Fabio e Vitor, pertise no meio. Apesar disso, Fabio da Contabilizei, precisamos falar de
fundadores da Contabilizei
tinha um brilho nos olhos diferente quem está por trás de tudo.
114_larguei tudo e fui viver meu sonho macgayver do próprio negócio

Da lama ao escritório mesmo quando decidiu que iria empreender. De


Volta a fita. O ano é 1990 e Vitor é um menino de volta à sua cidade natal, Porto Alegre, fundou uma
apenas 8 anos que adorava assistir ao MacGyver empresa de educação corporativa e consultoria
na TV. Em sua imaginação, corria por trilhas cheias em liderança, a Mind On. Apesar do sucesso, ele
de lama, numa Land Rover verde oliva equipada já sabia que queria iniciar um negócio de tecnolo-
de mantimentos e kits de sobrevivência. Sua mãe gia. De mudança para Curitiba, fundou a Superno-
sempre perguntava: va, primeira aceleradora do Paraná, que o expôs à
cena empreendedora tech no Brasil.
- Filho, o que você vai ser quando crescer?
- Eu vou ser aventureiro Startupeiro de formação
Enquanto isso, Fabio se graduava em ciência da
Talvez por isso ele tenha ido rastejar na lama 10 computação na Universidade de Maringá. Foi da
anos depois, quando atingiu a maioridade, nos faculdade para a Celepar, uma empresa pública de Vitor na formatura
treinamentos do Exército Brasileiro. Vitor foi Ofi- Tecnologia da Informação, onde trabalhou como do colégio, em 99. Ao
cial por três anos, servindo como segundo tenente desenvolvedor por quase 7 anos. lado, evento de Startup
durante o início da
no Rio Grande do Sul. Enquanto isso, concluía a Contabilizei
faculdade de administração. Antes de sair, no entanto, Fabio já tinha sido conta-
giado pelo vírus do empreendedorismo. Começou
Por mais três anos, atuou como analista e consul- duas empresas: a primeira foi a 3WMobile, que de-
tor de negócios em consultorias internacionais em senvolvia soluções em Android e IOS para empresas.
São Paulo. Depois de passar por vários estados A segunda foi a MenuRápido (o caso lá do início),
brasileiros, foi buscar experiência fora do país. Em uma plataforma online para transformar cardápios
Londres, trabalhou por dois anos em sua área, no em aplicativos móveis com poucos cliques.
International Golf & Resort Management.
A época em que Fabio deixou a Celepar e a MenuRápi-
Mas a realização do sonho de aventura começou do coincide justamente com o período em que a Con-
115_larguei tudo e fui viver meu sonho macgayver do próprio negócio

tabilizei começou a ganhar corpo, em que os dois quece isso”, de várias pessoas, mas ele sabia
entraram totalmente de cabeça. O convite veio de onde queria chegar. Só precisava de gente que
Vitor depois de mais de um ano de pesquisas. topasse a aventura com ele.

Pessoas certas e… dinheiro Errou nessa escolha duas vezes, até se unir a
no bolso? Fabio, que comprou a ideia com muito entu-
Vitor sempre viu a dificuldade das empresas siasmo. “Encontrar um desenvolvedor é fácil,
lidarem com a parte contábil, quando con- mas o mais importante é encontrar um sócio
sultor. Na Mind On, os desafios ficaram ain- desenvolvedor. E, aqui, está a grande diferença:
da mais claros, quando sentiu a burocracia na sócio! Não digo na questão societária apenas,
pele. As altas taxas e as etapas longas o frus- mas no comprometimento, na paixão pelo pro-
travam por serem quase estritamente manu- duto e em mudar a vida de milhares de micro e
ais e offline, o que permitia mínimo controle. pequenos empresários no Brasil”, ele conta.

Percebendo a oportunidade de Por muito tempo, a Contabilizei sobreviveu com


automatizar um processo arcaico, se as economias da família. Vitor havia vendido sua
enfurnou na firma de contabilidade parte da Mind On e seguiu em frente sem nenhu- nal – cuja contratação é obrigatória segundo Vitor iniciando o
de um amigo por um mês para ma remuneração. Foram mais de 12 meses sem projeto Contabilizei,
a legislação brasileira -, mas na nuvem e com em 2012
observar a dinâmica do setor. dinheiro nenhum entrar, até receberem um in- maior transparência.
vestimento da Curitiba Angels em 2014. Foi só a
Mas Vitor não era especialista nem em conta- cereja do bolo para o negócio começar a decolar. Os clientes têm acesso em tempo real a re-
bilidade, nem em sistemas. Também não tinha latórios e balanços e contam com suporte de
capital para dar os primeiros passos, quanto Um modelo campeão contadores e especialistas, além de gerar guias
mais casado, com uma filha de 10 anos, e a se- O modelo apostou em fornecer todos os servi- de impostos online, notas fiscais eletrônicas
gunda a caminho. Escutou muitos “não” e “es- ços de um escritório de contabilidade tradicio- e enviar alertas sobre datas de vencimentos.
116_larguei tudo e fui viver meu sonho macgayver do próprio negócio

E como tudo é digital, os planos também são Crise? de 100 colaboradores permitiu que pequenas e
bastante acessíveis: “conseguimos repassar o Por falar em crescimento, não tem nada que Vi- médias empresas em 30 cidades economizassem
ganho que temos em redução de custos para o tor e Fabio têm feito além disso. Depois de um mais de R$ 25 milhões em serviços contábeis.
cliente e democratizar o serviço”, conta Vitor. teste beta bem sucedido e o lançamento oficial
da plataforma no início de 2014, a dupla aumen- A trajetória do negócio e de Vitor e
Assinatura Com isso, a Contabilizei consegue atender até tou a base de clientes em 1.200% em pouquís- Fabio acabou chamando a atenção
do primeiro 60 vezes mais MPEs que uma firma comum e simo tempo. No ano seguinte, o faturamento dos criadores do Mercado Livre,
investimento gerar uma economia de até 90% em serviços também fundadores da Kaszek
com a Curiti-
subiu mais de 700%.
ba Angels, em contábeis, facilitando a vida de empreendedo- Ventures, que entraram como sócias.
julho de 2014. res. Dessa forma, eles mantêm suas empresas Mas não pense que o trabalho é fácil, ou que a
Vitor e Fabio
no centro da
regularizadas, mas ainda têm tempo de focar vida dos dois ficou mais tranquila quando veio Novas aventuras
foto no que importa: fazê-las crescerem! o sucesso. A rotina de Vitor começa às 4h da Não há dúvidas de que Vitor e Fabio estejam
manhã, quando todos em casa estã dormindo. revolucionando o mundo dos negócios. Mes-
Foi a forma que ele encontrou de equilibrar o mo com uma crise em curso, eles conseguiram
trabalho e a convivência com a família. provar que a disrupção tem espaço no Brasil e
que vencer essa aventura é viável – quem sabe
Além disso, para lidar com a guinada e os re- até usando os obstáculos de um sistema buro-
cursos limitados, eles precisaram ser os “Mac- crático a seu favor, não é mesmo?
Gyvers do próprio negócio”, brincam. Vitor, por
exemplo, aprendeu a desenvolver sites com tu- Como em qualquer jornada desbravadora, de-
toriais de internet, executar rotinas contábeis e safios sempre vão surgir. Mas Vitor e Fabio
realizar o atendimento aos clientes, dado o vo- nunca pensaram em desistir, nem mostram si-
lume da demanda. nais de que a Contabilizei será qualquer coisa
menor que gigante. Afinal, quando que o Mac-
Em menos de dois anos, a contabilizei e seus mais Gyver achou alguma coisa impossível?
larguei tudo e fui viver meu sonho

A FÓRMULA PARA
ENSINAR é NÃO
TER FÓRMULA
Se o modelo tradicional de educação é o GPS, é como se a
Geekie fosse o Waze. Conheça a história de Claudio Sassaki e
Eduardo Bontempo e veja como eles estão recalculando a rota
para uma educação brasileira de qualidade.

“Eu vi o quanto meu pai conseguiu cação. Descendente de imigrantes


transformar não só a vida dele, italianos, seu avô era sapateiro e
como de todos nós, por causa do não teve muita instrução. Seu pai
estudo.” foi o primeiro da família, até então,
Da direita para esquerda Claudio a cursar uma faculdade. Bontempo
Sassaki e Eduardo Bontempo, Essa é a explicação de Eduardo Bon- entendeu que esse era o caminho
fundadores da Geekie
tempo sobre sua paixão por edu- para conquistar o que quisesse.
118_larguei tudo e fui viver meu sonho a fórmula para ensinar é não ter fórmula

Claudio Sassaki herdou esses mesmos valores que ele se bancasse durante toda a faculdade Stanford, junto com um mestrado em educação.
e sempre foi bom aluno, muito por influência de de arquitetura. Igualmente buscando uma fon- Bontempo foi também fazer um MBA no Ins-
sua família e da cultura japonesa. No ensino mé- te de renda, Bontempo também tinha sua vida tituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT).
dio, começou a se dedicar mais à natação e ao paralela de professor ou monitor de cursinho. Numa visita ao Brasil, encontrou Sassaki. Eles
tênis e acabou ficando muito ausente por conta Os dois só se encontrariam anos depois, mas decidiram que era a hora de aplicar tudo que
dos campeonatos em que participava. Quando descobriram, do mesmo jeito, uma paixão por vinham aprendendo sobre práticas inovadoras
o vestibular começou a se aproximar, precisou ajudar pessoas a desenvolverem seu potencial. de ensino. Bontempo não quis nem voltar para
tirar o atraso. Resultado? Foi aprovado em duas os EUA para terminar o curso: os dois caíram
das melhores universidades do país e passou a Encontro de geeks de cabeça no mundo empreendedor.
dividir seu tempo entre elas: engenharia na USP Fazia sentido Bontempo ir parar no mercado fi-
e administração de empresas na FGV. nanceiro, afinal ele tinha um diploma de admi- Os primórdios da Geekie
nistração na FGV. Mas Sassaki? Sassaki é ar- A ideia começava com um problema: apenas
Em pouco tempo, no entanto, Sassaki perce- quiteto de formação. Ainda assim, por 10 anos metade dos alunos que ingressam no ensino
beu que aquilo não era para ele. Não da forma esteve no Credit Suisse, chegando a trabalhar médio conclui os estudos. Dos que concluem,
que o conteúdo era passado. O pai não gos- nos Estados Unidos como vice-presidente. Foi 80% têm desempenho abaixo do esperado em
tou nada da decisão do filho em prestar um lá, inclusive, que eles se conheceram. matemática e português.
novo vestibular, quanto mais para arquitetura
/ e urbanismo. Para seguir nesse caminho, o jo- Papo vai, papo vem, e descobriram uma forte sin- O diagnóstico tem a ver com a forma que o
Se duas vem precisaria dar um jeito de se sustentar. tonia, assim como um grande incômodo em co- conteúdo é passado nas escolas, que às ve-
pessoas não O resultado da FUVEST, uma das provas mais mum. De ambos os lados, eles se perguntavam zes mais parecem fábricas: a divisão é feita de
concorridas do Brasil, acabaria facilitando se aquela era uma carreira que fazia sentido dian- acordo com data de fabricação e o processo é
aprendem da esse desafio: ele ficou no primeiro lugar geral. te seus propósitos. A conclusão foi que não, não todo padronizado, para que depois passem por
mesma forma, fazia. O propósito era ajudar as pessoas a desen- uma prova. Só que cada aluno tem seu próprio
por que Com o currículo incrementado, Sassaki foi dar volverem seu potencial – e por alguns anos, os ritmo, suas próprias fraquezas e vantagens.
aulas particulares. Ensinava tudo, de matemá- dois foram trocando ideias sobre como realizá-lo.
ensinamos da tica a ilustração, complementando ainda como Se duas pessoas não aprendem da mesma for-
mesma forma? instrutor de tênis aos sábados, o que permitiu Eventualmente, Sassaki foi fazer um MBA em ma, por que ensinamos da mesma forma?
119_larguei tudo e fui viver meu sonho a fórmula para ensinar é não ter fórmula

A proposta da Geekie é que, em vez do aluno rando do próprio bolso para investir. Mas a grana Um modelo inclusivo
precisar se encaixar no currículo, o currículo pos- também não dura pra sempre, e em um ano já Se o modelo tradicional de educação é o GPS, é
sa se moldar às suas necessidades. Com base começou a ficar muito difícil fechar a conta. Uma como se a Geekie fosse o Waze.
no conceito de ensino adaptativo, eles criariam decisão, no entanto, foi bastante acertada: não
uma tecnologia que utiliza big data, sistemas de deixariam de pagar salários a ninguém, muito Em vez de apenas dar a rota, ela quer entender o
auto-aprendizagem – ou seja, que observam pa- menos fazer cortes que prejudicassem o time. contexto, o sonho do aluno, identificar os bura-
drões para “ensinar melhor” – e uma plataforma cos e redesenhar a rota com os retornos que fo-
web que pudesse personalizar o processo para Começaram a se preparar para uma rodada de rem necessários para depois seguir adiante com
cada estudante. captação, mas enquanto o dinheiro não entra- maior facilidade.
va, o risco de ficar sem caixa era enorme. “Teve
Para isso, em 2011, logo no início, Sassaki e Bon- uma reunião em que a gente colocou na parede Para cumprir essa promessa, a Geekie tem três
tempo convenceram 5 dos melhores engenhei- os custos que a gente tinha, foi um pouco preo- produtos, que podem ser acessados por admi-
ros do ITA a rejeitarem ofertas de emprego no cupante. A gente arrumou dinheiro de onde não nistradores, professores e alunos, do computa-
Facebook e no Google e a comprarem o sonho tinha, vendendo coisas, o que fosse, para a folha dor ou do celular, da escola ou de casa.
da Geekie. Usando as próprias economias da de pagamento daquele mês. O próximo passo
época de banco de investimento, eles podiam foi ligar para os fornecedores e pedir desculpas, O primeiro deles, vendido para escolas, é o Ge-
pagar salários competitivos e alugar um escri- porque a gente só ia poder honrar nossos com- ekie Test, um simulado que usa tecnologia predi-
tório onde o primeiro produto começaria a ser promissos no mês seguinte“, lembra Bontempo. tiva para gerar um relatório imediato para o aluno
desenvolvido. Em apenas 3 meses, a Geekie já sobre seu desempenho. O resultado dá uma pro-
tinha seu primeiro cliente, uma das melhores Apesar do susto, a rodada de captação foi um jeção de qual seria sua nota no ENEM, que pon-
escolas de São Paulo. sucesso. Além disso, naquele mesmo ano, ou- tos seus são mais fortes ou fracos, e um roteiro
tras 5 escolas também fecharam a compra do de estudos para melhorar sua performance.
No meio do caminho tinha uma pe- produto de teste de diagnóstico adaptado. Com
dra conta pra pagar o produto validado e investidores na roda, eles O Geekie Lab, também num modelo B2B, é uma
Foi um longo tempo em que os empreendedores poderiam contratar mais pessoas e começar a plataforma online que se integra a uma sala do
não só não recebiam nada, como continuavam ti- trabalhar em outros produtos. ensino médio. Uma parte do programa corrige
120_larguei tudo e fui viver meu sonho a fórmula para ensinar é não ter fórmula

automaticamente os deveres de casa dos alu- Mas uma das propostas da Geekie é tornar o te desafie a acordar e buscar o próximo de-
nos, para que o professor possa focar em inter- ensino de qualidade também mais acessível, e safio. Seguir em frente é transformar isso em
venções mais pontuais e personalizadas. Dessa por isso ninguém pode ficar para trás. algo que te faz andar mais rápido e aprender
forma, ele deixa de ser um simples transmissor mais”.
de informação e passa a ser um tutor, gerando Para cada escola particular que implementa
mais conhecimento e valor: “Essa sensibilidade um produto, a empresa oferece a mesma tec- “Você nunca vai saber o suficiente, por isso
você dificilmente terá uma máquina para fazer, nologia para uma escola pública. estar assessorado por pessoas que podem te
mas o professor faz muito bem.” ajudar a pensar e tomar decisões é o mais im-
/ “Seria incoerente focar apenas nas escolas portante”, diz Sassaki. Ele conta também que
Para cada Usando dados do Geekie Test e de avaliações particulares, porque no final das contas esta- o sonho de conseguir oferecer uma educação
internas, outra parte do Geekie Lab identifica as ríamos aumentando as diferenças. Eu preciso de qualidade para qualquer pessoa do país, in-
escola áreas de maior dificuldade de cada adolescente, fazer com que a Geekie chegue ao aluno que dependente de ela ter condições de pagar ou
particular que provendo material personalizado em vídeo, tex- mais precisa”, explica Sassaki. não, só aumentou:
implementa to, jogos, cartas e outros exercícios, permitindo
que seja usado o formato mais eficaz para cada Sonho grande não, “A gente percebeu que tem coisas que a gen-
um produto, um, no grau de dificuldade mais adequado. sonho enorme! te pode fazer pelas escolas que vão além de
a empresa O processo de revolucionar a educação bra- como elas são hoje. Podemos ajudá-las a in-
oferece Já o Geekie Games foi um teste feito para quem sileira não é tão fácil, principalmente do pon- corporar essa visão de uma educação que
está se preparando para o ENEM e oferece um to de vista do empreendedor. Nas palavras de prepara pra vida, que é menos memorização
a mesma plano de estudos especificamente para aquela Sassaki: “A maior dificuldade é lidar com os e mais desenvolver habilidades. O futuro tem
tecnologia pessoa. Em média, os alunos melhoram seus erros constantes e a sensação de que você carreiras que nem sabemos que vão existir. A
para uma resultados em 1,6 pontos, a cada lição comple- nunca está preparado para o desafio que vem gente tem um papel importante em levar essa
ta. Isso representa uma melhora em torno de pela frente. O sentimento de incompetência discussão adiante. Não é só memorizando
escola 35% no desempenho do estudante, a cada se- faz parte do dia a dia. É frustrante. Mas você coisas para o vestibular que a gente vai cons-
pública. mestre de estudo. aprender a lidar com isso e fazer com que isso truir o país que a gente gostaria”.
larguei tudo e fui viver meu sonho

A FORÇA
DO TOMBO
O dinheiro acabou e você não tem nenhum cliente.
Poupança vazia; limite do cheque especial estourado;
apartamento vendido. O que você faz?

Alencar de Carvalho também não nenhuma tinha fechado negócio.


sabia. Ele e seu sócio, Fabio Pias-
trelli, investiram praticamente tudo Nessas horas, o coração bate mais
que tinham na Gera. Estavam com forte, a respiração fica mais profunda
uma plataforma tecnológica pron- e o desespero se instala. Mas como
ta para gerenciar operações de em- dizem por aí: sorte é o encontro do
Da esquerda para direita - Alencar presas de vendas diretas e, apesar preparo com a oportunidade. Uma
e Fabio, fundadores da Gera de algumas estarem engatilhadas, hora, a sorte jogou a favor da Gera.
122_larguei tudo e fui viver meu sonho a força do tombo

Empreender de berço Só que por alguns anos esse espírito ficou ador- novos segmentos. Mas conforme ia aprenden-
Desde criança, Alencar era conhecido em Bauru, mecido, enquanto assumia um cargo de gerên- do sobre assuntos diversos dentro da compa-
no interior de São Paulo, como o filho da dona cia na Natura. Lá, ele conheceu Fabio. nhia, Fabio foi tomando gosto por abraçar desa-
Maria que vende roupas. Sua mãe começou indo fios cada vez maiores.
de porta em porta para complementar a renda Mudança de rota
da família, até transformar a atividade em negó- Fabio e seu irmão formam a primeira geração A primeira manifestação mais significativa foi
cio — uma boutique que fazia bastante sucesso de sua família que nasceu no Brasil e também quando, no ano 2000, ele, Alencar e mais dois
na cidade. que cursou faculdade. Seu pai, boliviano, busca- colegas se juntaram para surfar a onda da recém-
va oportunidades melhores e montou por aqui surgida internet. Seis meses depois, a bolha es-
A influência dentro de casa foi importante para uma assistência técnica eletrônica. A mãe dei- tourou e acabaram desistindo das ideias que es-
que Alencar começasse a trabalhar cedo, com xou a Itália ainda jovem, com os poucos perten- tavam bolando. O gostinho, no entanto, ficou.
13 anos. Foi professor de natação e trabalhou ces que cabiam na mala que se podia levar no
em uma pizzaria antes de seguir os passos em- navio de refugiados depois da Segunda Guerra. Primeiros passos
preendedores de dona Maria. “A gente é bom no que a gente faz, mas não é
Por conta desses exemplos, Fabio aprendeu a ba- isso que a gente quer fazer.” Esse era o senti-
Quando se mudou para São Paulo, estava sem- talhar para fazer as coisas acontecerem e criar um mento, segundo Alencar: a frustração de ser um
pre buscando oportunidades com algum amigo. patrimônio. Depois de se formar em engenharia empreendedor que não está empreendendo.
O auge, ele conta, foi quando compraram um fes- eletrônica, desenvolveu interesse pela área de
tival de reggae — shows ótimos, mas um fracas- negócios, ingressou na Natura como prestador Foram vasculhando oportunidades de resolver
so de bilheteria. Do prejuízo, que durou alguns de serviço até ser contratado como funcionário. o incômodo, até identificarem uma necessidade
anos, Alencar tirou sua primeira lição: “Saber a da própria Natura na gestão integrada de ven-
dor do tombo ajuda muito a olhar para frente e A intenção sempre foi seguir carreira em alguma das. A lâmpadazinha metafórica chega até a
tentar de novo.” empresa, crescendo nos cargos e conhecendo piscar. Só que antes de começar a desenvolver,
123_larguei tudo e fui viver meu sonho a força do tombo

de fato, uma solução tecnológica para Dores res colaboravam de Campinas. “Mas a
esse mercado, Alencar sentiu que de- Pouco tempo depois de Alencar, Fa- mesa foi crescendo. Põe gente aqui, ali,
veria se preparar melhor. bio também deixou seu cargo de exe- até nos mudarmos para outro escritó-
cutivo. Sua motivação foi a vontade rio, dividido com uma empresa de ar-
“Nas outras tentativas, eu de realizar mais do que os limites do quitetura”, complementa Alencar.
não tinha muito a perder. Era emprego fixo o permitiam. Ponderou A essa altura, Marco havia deixado a
solteiro, não tinha dívida, era bastante, mas como acreditou no mo- sociedade para perseguir outros so-
tudo uma grande aventura. delo e já confiava no Alencar, mergu- nhos. A dupla, então, trabalhou incan-
Dessa vez eu já estava casado, lhou de cabeça no desafio. Não quer savelmente na construção da platafor-
/ tinha um pequeno patrimô- dizer que não sentiu o impacto. ma, o que levou pelo menos três anos.
“É difícil perder nio”, conta.
o ‘sobrenome’. “É difícil perder o ‘sobrenome’. Eu não O investimento de capital próprio
Ainda trabalhando, foi fazer MBA e era mais o Fabio da Natura, era o Fabio também foi intensivo. “A gente gastou
Eu não era conheceu Marco, um empreendedor da Gera. As pessoas o recebem de ou- muito pra uma plataforma bancada
mais o Fabio da mais experiente, que o incentivava bas- tra forma”, lembra. por duas pessoas físicas”, diz Alencar.
Natura, era o tante a apostar no modelo de negócio O erro, segundo ele, foi a preocupa-
que estava sendo formatado. O pró- Se instalaram no escritório de webde- ção excessiva com cada detalhe téc-
Fabio da Gera. prio Marco apostou bastante — tanto sign de um amigo, onde ficaram por nico, o que, claro, exigia injetar mais
As pessoas o que virou sócio e passou a pagar, junto pouco mais de um ano. “A gente ba- capital: “Não sobrou nada para a área
recebem de com Fabio, um salário para que Alen- sicamente comprou uma mesa e duas comercial. Então no primeiro mês que
car pudesse se dedicar integralmente cadeiras”, conta Fabio. Na concepção efetivamente abri a Gera, tinha aca-
outra forma”, à Gera. do produto, dois ou três desenvolvedo- bado meu dinheiro.”
lembra.
124_larguei tudo e fui viver meu sonho a força do tombo

A impressão é de que o tinham atingido o breakeven. Nos assista à história


negócio ia acabar antes 9 anos que se seguiram, consegui-
mesmo de ter começado. ram dobrar de tamanho a cada ano.
Era uma sexta-feira de
agosto de 2005 quando Hoje, as maiores empresas de ven-
Alencar teve a sensação de da direta do Brasil e da América La-
derrota: tina confiam e dependem da plata-
forma da Gera para gerenciar mais
“Eu estava pronto para encarar de 1 milhão de revendedores e dis-
todo mundo na semana seguinte, tribuir mais de 70 milhões de pro-
dizer que não deu certo e ir pro- dutos por mês.
curar emprego.” Na segunda-feira,
uma boa notícia: o primeiro clien-
te estava pronto para fechar negó-
cio. O pagamento caiu na conta no
mesmo dia.

A venda foi emblemática e deu o


gás que eles precisavam. Muitos
clientes vieram depois desse e a
Gera despontou. Em 6 meses, já
larguei tudo e fui viver meu sonho

UM CENTRO
MÉDICO PARA
CADA BRASILEIRO
Mais rápido que o público, mais barato que o privado:
conheça o Dr. Consulta e os dois empreendedores que estão
trazendo mais eficiência para a saúde no Brasil.

Se você nunca precisou ficar na fila do Mas, às vezes, essa é a única saída
SUS, no mínimo já ouviu falar dela. O para os 75% de brasileiros que não
sistema público de saúde deixa a de- podem custear consultas privadas
sejar: um atendimento especializado ou planos de saúde. Thomaz Srougi
leva em média três meses para ser via essa realidade de perto quando
Da direita para esquerda temos marcado (muito mais, dependendo criança. Seu pai é urologista, traba-
Thomaz e Guilherme, fundadores da especialização) e um diagnóstico, lhava longas horas e ganhava pou-
do Dr.Consulta
um ano para ficar pronto. co. Thomaz fez questão de passar
126_larguei tudo e fui viver meu sonho um centro médico para cada brasileiro

longe da carreira de médico, mas já tinha experiência empreendedo-


a pulga ficava atrás da orelha: será ra, mas nunca satisfez seu desejo
que não tem um jeito melhor? de criar um negócio de impacto so-
cial. Quando os dois se reconecta-
Tinha. Afinal, de todo grande proble- ram, Guilherme já vinha estudando
ma, nascem oportunidades. Depois o mercado de saúde e como repli-
de anos em bancos de investimento, car boas ideias de fora. Ingressou
grandes empresas e depois como como COO do Dr. Consulta para,
/ sócio de um grande fundo, Thomaz juntos, formarem uma rede que
Em 2011, fez cursos na Universidade de Chi- oferecesse serviços primários de
cago e Harvard Business School, até saúde de alta qualidade e pudes-
o primeiro voltar ao Brasil preparado para en- se entregar diagnósticos 25 vezes
centro frentar o desafio da saúde no país. mais rápido que o sistema público,
médico do Sua solução era prover um serviço cobrando 60% a 90% menos que
que fosse tão ou mais eficiente que o sistema privado.
Dr. Consulta o sistema privado, porém acessível
estava à população de baixa renda. O modelo de negócios
operante, Naturalmente, quando chega o mo-
Em 2011, o primeiro centro médico mento do paciente ser atendido, o
validando do Dr. Consulta estava operante, custo de tratamento é mais alto do
seu modelo, validando seu modelo, na favela de que se ele tivesse visto o médico
na favela de Heliópois, em São Paulo. quando começou a ter sintomas –
isso com a esperança de que ele ain-
Heliópois, em É aí que entra Guilherme Azevedo, da possa ser curado. O Dr. Consulta Versão 2.0 da sala de espera, em São
Bernardo, após muitos acertos e erros com o
São Paulo. amigo de infância de Thomaz. Ele aposta em uma tecnologia que tor- primeiro centro médico de Heliópolis
127_larguei tudo e fui viver meu sonho um centro médico para cada brasileiro

na esse processo mais inteligente, logo “Um centro médico perto


menos custoso e com mais chances de de cada brasileiro”
eficácia para a saúde do paciente. Esse é o sonho grande de Thomaz e Gui-
lherme. Sua história empreendedora é
O sistema de agendamento, resultados e única e inspiradora, já que são poucos os
acompanhamento é todo automatizado que realmente se dispõem a tentar re-
e online. A empresa tem uma quantida- solver os problemas sociais mas crôni-
de significativa de dados de seus mais de cos do país. São menos ainda os que se
200 mil pacientes – informações que po- saem bem.
dem ser usadas para prevenir doenças, se
comunicar com pacientes e facilitar con- Assim, é fácil entrar nesse sonho com
sultas virtuais. eles. Mas sonho sozinho não muda o
Brasil: por isso, o plano de médio prazo
Estão disponíveis atendimento de clí- é que o número de centros médicos em
nico-geral em mais 40 especialidades, São Paulo chegue a 100, com capacida-
mais de 100 opções de exames e 30 es- de para atender 3 milhões de pacientes
pecialidades cirúrgicas de baixa com- anualmente, até 2018.
plexidade. Os procedimentos menos
complexos saem por preços entre R$90 A dinâmica do Dr. Consulta tem o po-
e R$120 reais. E o modelo se provou, afi- tencial de transformar as interações e
nal! Os sócios chegaram ao breakeven operações médicas para pacientes bra-
point em 2 anos e meio e os 32 centros sileiros de baixa renda, mas, além disso,
Primeiro escritório, com
quadros nas parades com
médicos do Dr. Consulta atendem pelo de influenciar a forma que consultas são
as metas e KPIs menos 100 mil pessoas por mês. conduzidas em muitos outros países.
larguei tudo e fui viver meu sonho

MÁQUINA DE
ECONOMIA
O aplicativo GuiaBolso ajuda as pessoas a serem mais
“donas” de seu dinheiro, sabendo onde estão os “ralos”
e como usar os recursos de modo mais inteligente.

Durante vários momentos de sua Wharton Business School e se mu-


carreira, o americano Benjamin dou para São Paulo para trabalhar
Gleason esteve conectado à Amé- na McKinsey&Co.
rica Latina. Fosse tirando seu diplo-
ma de língua espanhola junto com Em seu primeiro dia na consultoria,
o de economia na universidade ou conheceu Thiago Alvarez, que tinha
gerindo projetos ligados ao Bra- deixado a ONG Alfabetização Soli-
Da esquerda para direita temos sil, essas experiências fatalmen- dária. Entre um projeto e outro, Ben
Thiago e Benjamin, fundadores do te o levariam ao ano de 2007. Ben e Thiago descobriram um interesse
GuiaBolso
concluiu seu MBA na renomada comum por empreendedorismo e
129_larguei tudo e fui viver meu sonho máquina de ecônomia

impacto social. Ficaram tão amigos que de crédito também aumentava. E come- foram mais de dois anos de
mantiveram contato mesmo depois que çava a se transformar em inadimplência. trabalho.
Benjamin deixou a empresa, dois anos
depois. Oportunidade de mercado Os investidores não compraram a ideia
Thiago observava a mesma tendência de de primeira. Tudo aquilo era muito novo,
Ben foi voluntário em uma ONG no Rio endividamento da população conforme as startups de tecnologia não estavam
de Janeiro e morou por 3 meses na co- prestava consultoria. Conversando com ainda tão em alta quanto hoje, assim
munidade da Rocinha. Logo em segui- amigos, o motivo parecia simples de- como o apetite dos investidores para
da, voltou para os EUA e cofundou uma mais: a falta de planejamento financeiro. assumir o risco de um projeto bem in-
startup de pagamentos mobile, a Sales- Tão simples que poderia ser resolvido. certo.
Vu. Mas o crescimento inicial era lento e
ele queria mesmo era estar no Brasil. Foi A dupla descobriu, por exemplo, que só “No começo não havia muita certeza
/ quando um dos fundadores do Groupon 2% das pessoas que ao menos criam pla- sobre o que a gente estava fazendo, não
O dinheiro foi Brasil — Florian, que ele havia conhecido nilhas financeiras conseguem mantê-las havia muitas referências. E o mercado
praticamente na McKinsey&Co — o convidou para se atualizadas. Como seria possível criar um financeiro no brasil é dominado por pou-
juntar como diretor aos dois sócios. processo automático onde as pessoas cos players, então houve muito ceticis-
todo para o pudessem visualizar e entender as evi- mo por parte dos fundos”, conta thiago.
desenvolvimento Ben logo assumiu também a posição de dências por trás de seus gastos? Como
da plataforma. CFO América Latina e pôde acompanhar estimular o brasileiro a ser mais dono do Mesmo assim havia quem acreditasse
de perto momentos empolgantes como próprio dinheiro? neles e na ideia: além dos próprios Ben
Contrataram o do IPO da empresa. O ano era 2011 e o e Thiago, que colocaram em torno de R$
três funcionários negócio de compras coletivas estava es- Concordaram que estavana 150 mil cada um, um ex-colega de tra-
e começaram a tourando por aqui. Com esse movimento, hora de deixar a vida corpora- balho assinou um cheque de R$ 60 mil.
veio uma sacada: milhões de brasileiros tiva e colocar o chapéu de em-
trabalhar de começavam a adquirir produtos online preendedor. Mas, entre a con- O dinheiro foi praticamente todo para o
casa. pela primeira vez. Enquanto isso, a oferta cepção e a plataforma pronta, desenvolvimento da plataforma. Con-
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trataram três funcionários e começa- download em celulares. De um jeito que Por depender da sincronização com os
ram a trabalhar de casa. ao fim de dezembro, eram mais de 400 bancos, um grande desafio inicial dos
mil pessoas ativas usando o app. fundadores foi conquistar a confiança do
Mas, por mais irônico que possa pare- usuário. Segurança sempre foi um dos
cer, uma empresa de tecnologia para Com o que você gasta? principais focos de atenção — os dados
finanças também teve de superar difi- O Guiabolso é um aplicativo gratuito são criptografados, apenas o dono da
culdades financeiras iniciais. Mesmo feito pras pessoas organizarem suas fi- conta tem acesso e não é possível reali-
depois de eles conseguirem fechar com nanças de forma muito simples e, as- zar nenhuma movimentação do dinhei-
/ fundos de investimento, houve momen- sim, tomarem melhores decisões so- ro pela plataforma.
Aos poucos, foram tos de apreensão. “Era época de Natal bre que fazer com seu dinheiro. Pelo
e a gente estava ficando sem caixa. A GuiaBolso, o usuário pode planejar Aos poucos, foram entendendo a me-
entendendo a gente ia ficar sem dinheiro para pagar suas finanças pessoais, estabelecendo lhor forma de comunicar isso e tran-
melhor forma de salário se não caísse logo o dinheiro do metas e visualizando suas transações quilizar os usuários. Deu certo. A base
comunicar isso fundo”, diz o empreendedor. bancárias em um só lugar. Ao conectar de clientes cresceu e hoje o Guiabolso
suas contas bancárias, o aplicativo au- já ultrapassou a marca de 3 milhões de
e tranquilizar Em abril de 2014, foi lançada a primei- tomaticamente reconhece, categoriza pessoas
os usuários. Deu ra versão do GuiaBolso, no início apenas e organiza as informações referentes a
certo. A base de para computador. Com algo mais con- gastos e investimentos (incluindo car- O número não para de crescer. Os níveis
creto na mão, os empreendedores con- tão de crédito). de satisfação são bem acima da média
clientes cresceu e seguiram levantar uma rodada de capi- do setor, e o marketing mais eficaz tem
hoje o Guiabolso tal e partiram pro desenvolvimento do É possível também editar e adicionar sido o boca a boca. Isso porque o uso do
já ultrapassou a aplicativo, lançado em julho. A meta era transações manualmente (para gastos aplicativo provou ser uma forma efetiva
atingir 50 mil usuários até o fim do ano, em espécie, por exemplo), estabelecer de melhorar a saúde financeira dos usu-
marca de 3 milhões mas a coisa engatou mesmo quando o metas de economia e receber alertas ários. Dados do Guiabolso estimam que
de pessoas aplicativo passou a estar disponível para caso algo esteja fora do planejado. a economia feita por quem utiliza o apli-
131_larguei tudo e fui viver meu sonho máquina de ecônomia

cativo superou os 200 milhões de reais ta, pelo menos 26% das pessoas ca- exemplo, que em uma startup de tec-
em 2015. E o boom começou antes mes- dastradas usavam esse recurso todos nologia, é preciso testar hipóteses e se
mo de monetizarem o aplicativo. os meses. Nos últimos anos, a taxa já adaptar ao mercado muito rapidamen-
caiu para 19%, mas ainda é alta. No fu- te. Por esse e outros, os dois fundado-
Modelo de negócio turo, a plataforma pode apoiar o usuá- res já deram muita mentoria, mas já
A prioridade de Ben e Thiago, até o rio a também tomar decisões melhores receberam também.
anopassado, tinha sido garantir a fun- sobre onde investir suas economias.
cionalidade do GuiaBolso para alcançar
/ o maior número de pessoas possível e O propósito é transformar a relação do
garantir que eles mantivessem um alto brasileiro com o dinheiro. Empoderá-lo
O propósito é nível de engajamento e satisfação, me- e oferecer transparência e informação
transformar lhorando de fato sua saúde financeira. para a tomada de decisão.
a relação do Tanto que apenas em 2016 eles apro- Parece que estão no caminho certo: em
fundaram os estudos sobre como ge- apenas 4 meses, usuários já estavam
brasileiro com rar receita. A ideia é oferecer serviços poupando 2,5 vezes mais. Em 2015, o
o dinheiro. financeiros de instituições parceiras e valor total poupado a mais foi de r$ 247
Empoderá- indicar aos usuários opções de crédito milhões. além disso, o guiabolso man-
pessoal que tenham juros mais baixos, tém um blog para democratizar ainda
lo e oferecer que sejam adequados ao que cada um mais o acesso ao conhecimento sobre
transparência precisa. gestão financeira.
e informação
Um dos pontos de partida foi a forma Ajuda mútua
para a tomada com que o brasileiro lida com o cheque Em 4 anos, o GuiaBolso trouxe muitos
de decisão. especial. Quando lançaram a ferramen- aprendizados para Ben e Thiago. Por
132_larguei tudo e fui viver meu sonho salvar vidas mundo afora

SALVAR VIDAS “Você não pode ser simplesmente alguém que nasceu,

MUNDO AFORA
trabalhou e morreu. Tem que deixar alguma coisa.”
Conheça a história de Tatsuo Suzuki, Wataru Ueda e Toru
Kinjo, empreendedores da Magnamed.

Muitos sonhos embarcaram com dificuldades enfrentadas. Também


as famílias japonesas nos navios motivados por devolver algo valio-
que as trouxeram para o Brasil. Tal- so ao país que os acolheu e onde
vez nenhum deles imaginasse que puderam estudar e se formar, eles
seus descendentes criariam um resolveram investir tempo, conhe-
produto que cruzaria de novo os cimento e recursos para criar uma
mesmos mares, salvando milhões empresa de ponta no setor de equi-
de vidas mundo afora. pamentos médicos, a Magnamed.

Filhos e netos de imigrantes japone- Como imigrantes da própria carrei-


ses, os amigos Wataru Ueda, Tat- ra, deixaram uma vida profissional
suo Suzuki e Toru Kinjo seguiram estável e bem resolvida, se aventu-
Da esquerda para a direita: um dos fundamentos da cultura do raram no mundo do empreendedo-
Tatsuo, Toru e Wataru, seu povo, que valoriza a educação rismo para começar tudo de novo e
fundadores da Magnamed como base para tudo, e se forma- acabaram realizando um verdadei-
ram engenheiros apesar de todas as ro salto para o futuro.
133_larguei tudo e fui viver meu sonho salvar vidas mundo afora

Da lavoura para o ITA tou um respirador. A partir desse dia, lhar em uma fundação que desenvolve
Tatsuo Suzuki cresceu nas lavouras ele decidiu fazer o mesmo. Mas cursar equipamentos médicos para cardio-
do interior paulista. Trabalhou muitos medicina e ser inventor de aparelhos logia. Foi quando o destino trouxe de
dias de sol a sol e só aprendeu a falar médicos não tinha muita lógica, né? volta uma feliz coincidência e ele foi
português aos oito anos. Sempre quis Melhor era virar engenheiro. convidado para trabalhar justamente
ser médico, inspirado pelo avô, que na empresa do médico inventor. Sim,
veio para o Brasil quando estava quase Ainda adolescente, depois de traba- aquele cuja notícia, mostrada pela sua
se formando em medicina. Não con- lhar como lavrador, pedreiro e marce- mãe, inspirou toda a sua carreira.
seguiu completar o curso, mas trouxe neiro, saiu do campo para estudar em
/ São Paulo, onde trabalhou como relo- Nos quinze anos que trabalhou lá, de-
os conhecimentos adquiridos e aten-
“A minha dia os imigrantes da colônia japonesa: joeiro enquanto fazia o cursinho. En- senvolveu inovações importantes jun-
mãe sempre “Ele tinha uns cadernos em que anota- trou no ITA e, depois de se formar em tamente com Wataru e Toru e todos se
va o nome dos remédios em japonês e engenharia mecânica, fez um curso de tornaram amigos. Mas o dono da em-
falava: ‘Você engenharia biomédica e mestrado no presa limitava as melhorias e, com mui-
em português para ajudar os pacien-
não pode ser tes. Recebia pagamento em porco, ca- COPPE, no Rio de Janeiro. tas ideias que não podiam executar, um
simplesmente brito, mas às vezes nem cobrava”. Ele propósito na vida e muita experiência
sempre falava para o neto: “você vai “A minha mãe sempre falava: ‘Você acumulada, eles resolveram sair e se
alguém que não pode ser simplesmente alguém uniram para criar a Magnamed.
ser médico”.
nasceu, que nasceu, trabalhou e morreu; tem
trabalhou e Quando Tatsuo tinha 14 anos, sua mãe, que deixar alguma coisa.’” “Estudamos em escola pública,
que sempre incentivou os estudos, fizemos o ITA e temos que fazer
morreu; tem que Tatsuo fez sua tese de mestrado no alguma coisa para retribuir
mostrou ao filho um artigo em um jor-
deixar alguma nal japonês editado no Brasil sobre um Incor, onde ficou dez anos e saiu como para o país que ajudou a gente
coisa.’” médico filho de imigrantes que inven- diretor de bioengenharia para traba- a se formar.”
134_larguei tudo e fui viver meu sonho salvar vidas mundo afora

A grande sacada foi perceber o quanto no negócio de assistência técnica. Des- Noruega e pôde conhecer também outros
os funcionários sofriam para montar os de cedo reconheceu quanto o esforço países como a Itália, Alemanha, Holanda
equipamentos. Por que não agilizar as da família o proporcionou um estudo de e Suécia: “Isso também contribuiu para
coisas e ainda fazer um bem para a so- qualidade e experiências que o desen- que eu tivesse essa visão de internacio-
ciedade? volveram seu perfil de liderança: nalização e fizesse as coisas para o mun-
do e não só para o Brasil”.
Sempre alerta “Embora meu pai nunca tivesse fala-
Na escola japonesa Shohaku Gakkuen, do, eu via por meio do exemplo que ele Formado em engenharia pelo ITA, Wa-
onde Wataru Ueda estudou desde os dava que ele sempre quis que eu fosse taru foi para o Itautec, onde participou
cinco anos, o principal objetivo, além de empreendedor.” da criação dos primeiros PCs no país.
ensinar o japonês, era a formação do ca- Fez ainda um estágio no Japão, que
ráter. Foi onde ele desenvolveu o senso Aos 14 anos, Wataru foi para o Japão, já era uma grande vitrine da tecnolo-
de equipe e moldou o espírito de lide- em um programa de intercâmbio da gia, e assumiu um cargo de direção na /
rança com experiências muito positivas, escola brasileira com outra escola em Takaoka, que era líder em fabricação de “Embora meu
que o ajudaram a se tornar empreende- Obitsu, na província de Chiba. Uma equipamentos para anestesia no Brasil
dor. Os alunos tinham que organizar os experiência marcante que permitiu co- e na época enfrentava os desafios da pai nunca
jogos e a premiação do evento esporti- nhecer uma cultura nova, jeito de pen- abertura de mercado. tivesse falado,
vo japonês Undokai e ele cresceu nesse sar diferente. De uma certa forma, o eu via por meio
meio, em que a professora os incenti- ajudou a olhar o mundo como sendo a “Tive uma carreira rápida, sempre em-
vava a organizar desde as competições casa de todos, em vez de um globo di- preendendo dentro das empresas, para do exemplo que
até bazares e festas de formatura, sem vidido por países. que elas pudessem crescer rapidamen- ele dava que
esperar que a escola fizesse tudo. te. Mas sempre com aquela vontade ele sempre quis
O mesmo aprendeu como escoteiro. Par- de fazer algo próprio.” Foi quando, na
Wataru cresceu observando o pai e seu ticipou de Jamboree (acampamentos na- Takaoka, Wataru entrou na equipe de que eu fosse
espírito empreendedor com um peque- cionais e internacionais periódicos) na Tatsuo. empreendedor.”
135_larguei tudo e fui viver meu sonho salvar vidas mundo afora

Seis meses na garagem meçaram a conversar até dar o passo requer mais que coragem. O empreen-
da mãe para pedir demissão, demoraram seis dedor precisa se preparar e ter o apoio
Wataru conta que foi Tatsuo quem en- meses. Depois, na luta até empacotar da família.
sinou o que eram os equipamentos e o primeiro produto, foram três anos.
o mercado de aparelhos médicos, por- Wataru teve todo o suporte da espo-
que ele sempre trabalhou nessa área: “No começo, a gente não tinha um lugar sa e reconhece que, sem ela, não seria
/ “logo que eu entrei na Takaoka, pensei para ficar. Não dava para começarmos possível. Por algum tempo, ela prati-
Do momento em que esse seria o cara para conversar, com o Tatsuo na casa dele e eu na mi- camente sustentou a família com seu
trocar ideias, inovar”. nha casa. Minha mãe morava sozinha, salário: “Numa fase madura, realmen-
que os sócios eu sabia que tinha um espaço na casa te a parte financeira preocupa bastan-
começaram a Já Tatsuo elogia a inteligência do amigo dela e fomos para a garagem. A gente te. Ela teve que ser muito forte, porque
conversar até e conta que sempre pensou em empre- ainda estava pequenininho em 2005, não é fácil iniciar – a despesa é alta, o
ender, mas “foi Wataru quem fortaleceu mas já com o objetivo de construir algo investimento é alto – mas a gente já
dar o passo para essa idéia”. importante na área da saúde.” tinha preparado um bom pé de meia
pedir demissão, para essa aventura”. Ele também se
demoraram Quando decidiram seguir novos cami- Os sócios sabiam que era importan- preparou para ter seu próprio negócio
nhos, planejaram o negócio e pensa- te construir um sistema de gestão da com cursos de gestão empresarial.
seis meses. ram em como dar suporte para a família, qualidade sólido e convidaram o ami-
Depois, na luta como seria a situação financeira. Não po- go Toru Kinjo para atuar na área ele- Já para Tatsuo, não seria a primeira
até empacotar deriam simplesmente abandonar o em- trônica. vez. Quando era estudante, montou
prego, sem antes traçar as metas para um pequeno negócio que não deu cer-
o primeiro construir a nova empresa. Empreender na maturidade to. Tirou como lição dessa experiência
produto, foram Deixar um emprego estável, com uma a importância de se planejar e juntar
três anos. Do momento em que os sócios co- carreira de sucesso e começar de novo um dinheiro antes de começar. A famí-
136_larguei tudo e fui viver meu sonho salvar vidas mundo afora

lia também ajudou e seu filho já estava saíram para criar a Magnamed, já ti- e Fiatec. O dinheiro para inovação foi
formado: nham a ideia de fazer um aparelho essencial no desenvolvimento da em-
com mais qualidade e mais fácil de presa e o resultado do investimento
“Esperei esse momento para montar. Começaram pelos ventilado- precisou ser comprovado, mas com a /
poder arriscar porque já res pulmonares, que oferecem supor- vantagem de virem a fundo perdido.
não tinha muita gente te mecânico ao sistema respiratório. Saíram da
dependendo de mim.” Saíram da incubadora para um galpão incubadora
Acabaram criando uma plataforma alugado, para obter o aval da Anvisa e para um galpão
Os sócios sabiam que investir na área tecnológica nova, num bloco único. fabricar o produto que estavam desen-
da saúde exige muitos recursos, dedi- Eles desenvolveram um equipamen- volvendo, mas só depois de dois anos alugado, para
cação e conhecimento das exigências to mais compacto, mais seguro, com conseguiram certificar a fábrica. obter o aval da
regulatórias, mas uma vantagem era custo menor de produção e, justa- Anvisa e fabricar
certa: a bagagem da experiência pro- mente por isso, conseguiram fabricar O passo seguinte seria aprovar o novo
fissional de muitos anos. Para Wata- um equipamento mais confiável e com produto na Anvisa, em outro proces- o produto
ru, a maturidade cai bem nesse setor: preço mais baixo. so demorado. Mas eles conseguiram o que estavam
“Não dá para simplesmente dizer ‘hoje registro da Comunidade Européia an- desenvolvendo,
eu vou fazer um equipamento para a Depois de passar seis meses na gara- tes, e a saída foi começar o negócio já
área da saúde’. É muito conhecimento gem, a empresa começou a desenvol- exportando – o que não foi problema, mas só depois
prévio para adquirir antes de encarar ver o projeto no CIETEC, incubadora já que o produto foi desenvolvido para de dois anos
um desafio desses”. da USP. No início, os sócios aportaram competir com o mundo. Ganharam conseguiram
os recursos financeiros na empresa. uma concorrência grande na África do
Da incubadora para o mundo Só depois conseguiram atrair recursos Sul e venderam mais de 200 ventila- certificar a
Em 2005, quando Wataru e Tatsuo dos fundos da Fapesp, Finep, CNPQ dores de transporte. fábrica.
137_larguei tudo e fui viver meu sonho salvar vidas mundo afora

Como começaram buscando o mundo, logo ga- tante difícil, de não ter nem perto do suficien- terço do faturamento e os produtos da Mag-
nharam um aval dentro do mercado interno. Wa- te”. Resolveram recorrer aos fundos de inves- named estão em mais de 40 países do Oriente
taru explica essa conquista estratégica: “muito timento: Médio, Ásia e América Latina.
do medo de ir para fora é porque a pessoa não
conhece o mundo. Quando logo novinho eu co- “Às vezes a gente acha que dividir é ruim, mas Confirmando a expectativa inicial dos sócios,
mecei a andar pelo mundo, vi que aqui é igual a pensamos: é melhor ter 100% de um bolinho a empresa continua sendo referência de ino-
tudo quanto é lugar”. pequenininho ou um pedaço de um bolo gran- vação na área de equipamentos médicos. Wa-
dão?” taru e Tatsuo compartilham o sonho grande de
Fermentando as fatias perenizar a Magnamed como uma indústria
do bolo Da garagem para a incubadora com 50 m2 da brasileira de impacto mundial: “queremos ser a
Quando estavam praticamente encerrando o USP, a Magnamed hoje tem uma fábrica de Embraer dos equipamentos médicos, continu-
período na incubadora e tinham que montar a 3.000 m2 com potencial para expandir sua ar produzindo alta tecnologia médica aqui no
fábrica para obter o aval Anvisa, os sócios já es- produção até 2019. O futuro é promissor: a Brasil e preservar o máximo de vidas possível,
tavam havia dois anos sem rendimento nenhum previsão de crescimento é de pelo menos 50% como o primeiro ventilador que fizemos, que
e precisavam investir por mais dois anos até ob- ao ano, chegando em 2018 faturando cerca de ajuda a preservar 1 milhão de vidas por ano”.
ter a certificação. Nesse período, ainda teriam R$ 150 milhões – dez vezes o que faturou em
que pagar os salários e os recursos dos fundos 2014. Em pouco tempo, provavelmente terão E ele mesmo se assusta com o número de vi-
de incentivo não cobriam todos os custos. que a procurar outro local para instalar uma das salvas: “Caramba é tudo isso mesmo?”
fábrica maior.
Tatsuo lembra que tinham que manter a em-
presa operacional sem receita e sem quebrar Com 100 funcionários e mais de 2.000 unida-
totalmente: “Chegamos a uma situação bas- des vendidas, as exportações representam um
larguei tudo e fui viver meu sonho

IMPRESSÃO
DE IMPACTO
De sonho em sonho, eles dobram de tamanho a cada ano.
Conheça a história de Mate Pencz e Florian Hagenbuch, da Printi.

Dizer que o Brasil oferece inúmeras um caminho árduo. É o que mos-


oportunidades é chover no molhado. tram os protagonistas desta his-
Mesmo em tempos mais turbulen- tória. Assim como tantos outros
tos – ou talvez principalmente nes- da mesma geração, Mate Pencz e
ses tempos –, um país continental Florian Hagenbuch se formaram
como o nosso não deixa de propor- em universidades de ponta, e logo
cionar chances preciosas a empre- conseguiram empregos em gran-
endedores que se mantêm alertas. des corporações do mercado fi-
nanceiro. Daí em diante, o caminho
Da esquerda para direita Mate Mas, entre aqueles que chegam era mais do que conhecido: traba-
Pencz e Florian Hagenbuch, lá e os que ficam para trás, há um lho, viagens, trabalho, promoções,
fundadores da Printi
sonho grande, muita preparação e mais trabalho, e por aí vai.
139_larguei tudo e fui viver meu sonho IMPRESSÃO de impacto

Não demorou muito para que os dois concluís- genbuch, executivo de uma multinacional alemã tância – na Universidade da Pensilvânia, onde
sem que não era bem essa vida que queriam le- do mercado gráfico, fora transferido para o Bra- cursava Finanças e Relações Internacionais em
var. Vieram parar em São Paulo, onde montaram sil, e levou junto seu filho. Enquanto Mate estava Wharton.
a primeira gráfica online do país a oferecer produ- chegando, Florian estava de saída para viver em
tos de alta qualidade com preços competitivos. terras tupiniquins. Mas foi só no verão de 2008 que os dois final-
mente se conheceram. O encontro aconteceu
Mas para que você entenda melhor o que está Dos 4 aos 18 anos, estiveram a um durante um summer internship – um estágio
por trás dessa reviravolta, é preciso retroceder oceano de distância. Enquanto de curta duração em um grande banco norte
um par de décadas e atravessar alguns milhares Florian ganhava, sem saber, -americano. Mate e Florian logo descobriram
de quilômetros, até o continente europeu. Alema- experiências determinantes para seu afinidades que iam além das carreiras e das
nha, década de 90: é lá que essa história começa. futuro empreendedor, Mate também origens – a principal delas, sem dúvida, era a
crescia no velho mundo. ambição de fazer mais. O encontro se repetiu
Tão próximos, tão distantes no ano seguinte, quando os dois se encontra-
Logo após a queda do muro de Berlim, a família Tornava-se um rapaz de olhar confiante e sere- ram em Londres para um novo summer job.
Pencz deixava a Hungria para se instalar em Stut- no – um curioso contraste com a inquietude e o
tgart, numa Alemanha recém unificada. O enge- espírito aventureiro que já o marcavam. Desde O primeiro plano: de fuga
nheiro Josef, pai de Mate, havia recebido uma cedo independente, ele viajou muito, sobretudo Em 2010, já formados, os dois partiram defini-
oferta de trabalho no país, e lá morou o garoto ao longo dos últimos anos do ensino médio, por tivamente para a capital inglesa. Conseguiram
durante sua infância e adolescência. conta de competições esportivas. Japão, Nova empregos em grandes instituições do mercado
Zelândia, Inglaterra foram apenas alguns dos financeiro e resolveram montar uma república.
Florian estava a poucos quilômetros dali: Stut- países pelos quais passou na época. E, ainda que trabalhassem por quase cem ho-
tgart era também a cidade natal da família Ha- ras semanais, arranjavam tempo para compar-
genbuch. Os dois tinham praticamente a mesma Acabou por atracar em Boston, na Universidade tilhar as impressões – quase sempre desani-
idade e, caso o destino quisesse, poderiam ter se de Harvard, onde cursou economia. Florian, por madas – sobre a vida profissional que acabara
tornado melhores amigos logo ali. Mas Kai Ha- sua vez, estava de novo a poucas horas de dis- de começar.
140_larguei tudo e fui viver meu sonho IMPRESSÃO de impacto

As conversas costumavam acontecer a sem os motivos para permanecerem nelas, Para Mate, só faltava um (pequeno) deta-
partir da meia-noite, quando Mate e Flo- o desconforto falava mais alto. Florian com- lhe: conhecer o país. Ele só ouvia o amigo
rian chegavam do trabalho. Abriam uma partilhava do desejo de aventuras de Mate, falar daqui. Então, pouco antes de se de-
/ cerveja e, pouco depois, os corações: o que e também sonhava com desafios maiores. mitir do banco em que trabalhava em Lon-
“Saber quais mais os incomodava era a sensação de que dres, fez uma rápida viagem para sondar o
eram os poderiam fazer muito mais do que vinham Onde as oportunidades mercado. Completou a marca de 35 reuni-
fazendo. “A gente se sentia subaproveita- estão de braços abertos ões em uma semana e voltou muito bem
próximos do”, revela mate. De que aquele não era o caminho, os dois logo impressionado com a receptividade local.
passos era tiveram certeza. Empreender era a saída. Mas, Aí, não restaram dúvidas: era para cá que
desconfortável, Conhecer as próximas etapas também não para onde ir? “Para algum país emergente”, os dois viriam.
ajudava em nada. Sabiam que, se continu- afirmavam convictos. Ambos já haviam tido
e foi naquela assem fazendo tudo certinho, seriam pro- experiências de longa duração na China, em Colchão no chão e confiança
época que movidos, até chegarem a sócios da em- Cingapura e em outros países da Ásia, e con- dos investidores
começamos a presa; e isso afastava qualquer emoção do cordavam quanto às oportunidades criadas Por ter se desligado do emprego um pouco
caminho. Deixava-o previsível e entedian- por economias em desenvolvimento. antes de Florian, Mate chegou sozinho por
experimentar te. Era tudo o que não queriam. aqui. Instalou-se em um casarão com ou-
com essa ideia Foi quando Florian propôs que conside- tros “dez caras” – a maioria de estrangei-
de empreender”, “Saber quais eram os próximos passos era rassem o país em que crescera, e do qual ros que também chegavam ao Brasil para
desconfortável, e foi naquela época que co- guardava ótimas lembranças. Além dis- empreender. “Eu ficava no terceiro andar,
diz Mate, com meçamos a experimentar com essa ideia de so, o ano era 2012; não custa lembrar que, e nem era um quarto. Era um colchãozinho
um leve brilho empreender”, diz Mate, com um leve brilho como eles próprios afirmam, naquela épo- no chão, com mais três ou quatro gringos
nos olhos, “de nos olhos, “de trilhar nossa própria vida”. ca “o Brasil estava bombando na percep- em volta”.
ção do exterior”. Mantendo a sinergia, os
trilhar nossa Afinal, por bem encaminhadas que estives- dois concordaram que aqui seria um desti- Na época, muita gente de fora também
própria vida”. sem as carreiras, e por sedutores que fos- no promissor para empreender. queria investir no país. Mate não perdeu
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tempo: montou um arquivo de Powerpoint com Quando realizaram suas pesquisas, Mate e Flo- ge. Seria preciso ajustar algumas coordenadas.
oito páginas e, após uma rodada de investimen- rian constataram que, embora gráficas de gran- A primeira decisão foi fazer uma expansão ho-
tos que durou só uma semana, levantou cerca de porte dessem conta de atender empresas do rizontal – ou seja, diversificar; ampliar a linha de
de 1,5 milhão de dólares. Detalhe: a ideia de uma mesmo tamanho, o atendimento a pequenas e produtos oferecidos e o atendimento: pessoas
gráfica online ainda não existia. médias demandas não era lá essas coisas. Na ver- físicas também passaram a ser atendidas.
dade, era bem deficitário, no geral, já que ficava a
Tudo aconteceu com base na rede de contatos e cargo de gráficas menores, que muitas vezes não Não importava se fossem dez mil cartazes para o
nas reputações exemplares de Mate e Florian. E tinham muito compromisso com a qualidade. Subway ou duzentos cartões de visita para uma
com uma condição: que os dois se dedicassem psicóloga: a Printi garantia a produção, o preço
integralmente ao empreendimento. Foi exatamente nesta lacuna que resolveram atu- competitivo e, mais importante, a distribuição.
ar. Combinando inovação tecnológica a produtos Isso porque, desde o começo, os amigos – ago-
Uma lacuna do tamanhoda Printi de alta qualidade, decidiram atender às fatias ra sócios – traçaram o plano de atender o país
Ao mesmo tempo, os futuros empreendedores de mercado que, consideravam, não eram bem inteiro. Montaram um esquema de distribuição
trocavam ideias com Kai, pai de Florian. Profun- atendidas. Foi então que se materializou a ousa- com operadores de logística, e colocaram mais
do conhecedor da indústria gráfica brasileira, dia desses dois estrangeiros de 24 anos: a Printi. esse plano em prática.
ele emitia opiniões de um lugar privilegiado: o
de alguém que sabia o quanto esse setor pode- Um plano maior O desafio da verticalização
ria se desenvolver por aqui. O ano ainda era 2012, e as coisas, bem diferentes A expansão vertical, por sua vez, aconteceu pou-
do que são hoje. No começo, a Printi só atendia co depois e constituiu um dos grandes desafios
“É um mercado imenso e pulverizado”, afirma- empresas e não tinha produção própria – traba- enfrentados pela Printi. “A gente suou bastante”,
va Kai. “Mas, em termos de tecnologia e ino- lhava com a terceirização de todos os produtos afirma Mate.
vação, ainda precisa avançar muito”. Ele se re- que oferecia em sua plataforma online.
feria sobretudo a questões como e-commerce A decisão foi tomada em um período de muitos
de produtos gráficos, que já avançava em ou- Mas não demorou para que Mate e Florian per- conflitos com os fornecedores. Problemas nos
tros países. cebessem que seria possível ir ainda mais lon- prazos de entrega e no acabamento dos produ-
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tos, que muitas vezes tinham que ser tro- “O desafio de montar um negócio aqui no commerce proposto pela Printi. Os vícios de
cados, foram azedando a relação. “Na épo- Brasil é isso: descobrir como as coisas fun- comportamento eram antigos. Não foi nada
ca, éramos 30 pessoas em um escritório, cionam”. fácil quebrar a rebentação de certos para-
terceirizando tudo. E achávamos que a cul- digmas de um mercado que estava adapta-
tura dos parceiros iria mudar, que o com- Mas, no final, o sacrifício da verticaliza- do à ineficiência de toda uma cadeia.
promisso mudaria”. ção valeu a pena. Hoje, o impressionante
maquinário da Printi ocupa um gigantesco “Essa mudança do comportamento dos
Não foi bem assim. Por isso, tiveram que galpão na Vila Leopoldina, em São Paulo, e consumidores foi um desafio constante”,
elaborar mais um plano – este, bem ex- dá conta de 80% dos pedidos que chegam confessa Mate. A saída foi investir conti-
presso: o de montar uma fábrica própria. à empresa. Do manuseio à distribuição, nuamente em marketing e em branding –
tudo é realizado ali dentro, sob o comando e contar com alguns importantes fatores
Só que, durante o processo, a burocracia atento de Mate e Florian. “extra-campo”. O principal, por incrível
os pegou de surpresa e em cheio. Todo o que pareça, é a crise atual.
/ equipamento era importado, e os dois não A barreira cultural
tinham ideia da dificuldade de se liberar Por mais que os planos andassem bem, ou- A crise bem-vinda
Não foi bem uma impressora no Porto de Santos, por tros desafios foram surgindo. Talvez o maior O aperto financeiro vem forçando o mer-
assim. Por isso, exemplo. deles fosse o de comportamento – não só de cado a mudar de percepção: cada vez mais
tiveram que fornecedores, mas de consumidores tam- gente está trocando a gráfica da rua de bai-
“Conseguir o radar [habilitação para im- bém. Afinal, Mate e Florian estavam inves- xo pelo modelo (e pelos preços mais com-
elaborar mais portar] para as máquinas, achar um des- tindo em uma área que funcionava da mes- petitivos) da Printi.
um plano – este, pachante que ajudasse a trazê-las para a ma forma fazia muito tempo.
bem expresso: o fábrica, lidar com a Receita Federal… fo- Mate acompanha o movimento com muito
ram muitas complexidades”, lamentam. Os clientes menores, acostumados à rela- otimismo: “todo mundo está querendo fa-
de montar uma Em cada departamento se dança uma mú- ção pessoal com as gráficas locais, olha- zer mais com menos. A crise está tirando
fábrica própria. sica, e isso espantou os empreendedores. vam com desconfiança para o modelo de e- muita gente da zona de conforto”.
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E ele não se refere só aos clientes menores. Os números comprovam que a apos- De sonho grande em sonho grande, Mate e Flo-
Grandes corporações também estão experi- ta vem dando certo. Com 205 funcio- rian vão elaborando os planos para chegarem
mentando a Printi, já que, com orçamentos nários, a Printi vem crescendo a um lá. O maior de todos, sem dúvida, é o de conti-
mais enxutos, as tiragens de impressões tam- ritmo acima de 100%, todos os anos. nuar quebrando paradigmas, experimentando
bém caem. “Se antes a pessoa fazia um milhão Mas, para eles, isto é só o começo. o novo. E para isso, ainda resta um mundo in-
de flyers, hoje faz 50, 100 mil. E é mais provável teiro de oportunidades.
que essa tiragem caia no nosso colo, em vez de Sempre em sinergia, os dois acreditam que ain-
ir para as grandes gráficas”. da há um mercado gigante a ser aproveitado, o
que vai levar a novas expansões, tanto verti-
Para o futuro? Planos, é claro! cais quanto horizontais. Já existe até um proje-
Depois de quase quatro anos de Brasil, Mate e to para dobrar o tamanho da fábrica.
Florian ficaram cascudos. Hoje, com 30 anos,
eles têm seus nomes estampados na lista da Mas a contribuição de Mate e Florian para o
Forbes de 30 empreendedores de destaque empreendedorismo brasileiro extrapola os li-
com menos de 30 anos de idade. Longe das mites até da própria empresa – o que não é
famílias, que estão na Alemanha, os dois se de se estranhar, já que limite nunca foi muito
adaptaram ao modus operandi de fazer negó- a praia dos dois. Empreendedores Endeavor
cios por aqui – mas sem deixar de lado o pro- desde 2014 e empenhados em criar um ciclo
pósito de, aos poucos, transformar esse mo- virtuoso capaz de desenvolver o país por meio
dus, torná-lo mais transparente por meio da da tecnologia, eles ainda mentoram e investem
inovação. em startups próximos a essa causa.
larguei tudo e fui viver meu sonho

NAS NUVENS, COM


O PÉ NO CHÃO
Uma verdadeira revolução: Bruno, Gustavo, Flavio e Felipe estão
disparando a eficiência com que a inovação chega até nós

Bruno Pierobon já estava sonhando Suponhamos que estão em uma


com a nuvem enquanto todos esta- mesma sala: um brasileiro, um chi-
vam com os pés no chão. Antes de nês, um russo e um senegalês. Você
qualquer um ouvir falar no Kindle, quer que eles conversem, só que
ele trabalhava com Pesquisa & De- a barreira do idioma é muito forte.
senvolvimento para eBooks. Aos 27 Mas e se entrasse um tradutor que
anos, como head de inovação da gi- falasse todas essas línguas e permi-
gante das telecomunicações Algar, tisse uma integração? A ZUP funcio-
Bruno era responsável por introdu- na mais ou menos como o tradutor:
zir novas tecnologias. Uma delas, as linguagens de programação são
Fundadores da ZUP. Gustavo a depois de ser recusada pela empre- inúmeras, cada software tem a sua
frente, Felipe à direita e Flavio à sa, acabou se provando uma genial e cada empresa usa vários softwa-
esquerda, Bruno ao fundo
oportunidade de negócio. res. O que a tecnologia da ZUP faz
145_larguei tudo e fui viver meu sonho nas nuvens, com o pé no chão

é possibilitar que eles se comuni- três anos em um projeto que você


quem em uma única plataforma. tem certeza que revolucionaria sua
empresa, mas que nunca deu total-
A ideia era bastante ousada, para um mente certo. Um belo dia, alguém
/ mercado que ainda dava os primei- chega até você com aquela solução
Foi quando Bruno, ros passos no Brasil. Por isso, Bruno de bandeja. Pois é, o pessoal do Bus-
Gustavo e Flavio foi buscar ajuda. Um dos mais reco- capé ficou estarrecido: a ZUP era
nhecidos engenheiros na Algar era exatamente o que eles buscavam
perceberam que Gustavo Debs, que tinha um talento e não encontravam dentro de casa.
eles criaram excepcional para a programação. Na Com a ZUP, eles não seriam “ape-
mais que uma área de vendas, Flavio Zago se des- nas” um dos maiores comparado-
tacava pelo carisma e a grande ex- res de preços da América Latina. O
plataforma para periência adquirida em algumas das Buscapé poderia também vender
o e-commerce, mas maiores empresas de mídia do país. os produtos de outros e-commer-
uma ferramenta Os três perfis formavam um time ces dentro de seu próprio site.
totalmente complementar. Com o
de integração MVP pronto para ser implementa- Foi quando Bruno, Gustavo e Fla-
de sistemas do no mercado de e-commerce, fo- vio perceberam que eles criaram
que poderia ser ram bater na porta do Buscapé para mais que uma plataforma para o
vender a plataforma. e-commerce, mas uma ferramenta
adaptada para de integração de sistemas que po-
diferentes tipos de Os primeiros clientes deria ser adaptada para diferentes Felipe e Gustavo recebendo
o prêmio de startup mais
negócio. Imagine investir suor e dinheiro por tipos de negócio. promissora de Stanford, em 2014
146_larguei tudo e fui viver meu sonho nas nuvens, com o pé no chão

A ZUP acabou formando uma joint de TI dessas empresas vão para


venture com o Buscapé e decidi- plataformas que agreguem todos
ram vender sua tecnologia para esses aplicativos com diferentes
grandes empresas, com alto nível linguagens de programação e ban-
de complexidade de integração. cos de dados sem fim.
Em uma dessas vendas, conhece-
ram Felipe Almeida, que, impres- A ZUP faz o contrário: oferece uma
sionado pelo potencial da ZUP, única e mais simples plataforma de
resolveu deixar a agência em que integração. Ela ajuda seus clientes
trabalhava e se juntar ao grupo a aumentarem a eficiência de seus
como diretor de marketing. departamentos de TI, diminuindo o
tempo que levaria até colocar novas
Novo escritório da ZUP, O modelo de negócios inovações no mercado e agilizando
em São Paulo, inaugura-
do em 2017 80% mais tempo e 50% menos seus processos internos – sem es-
custo: é assim que a ZUP acom- quecer de protocolos de segurança
panha empresas à era digital e re- que protegem dados e informações
duz a complexidade da integração sensíveis das empresas.
de seus softwares. Isso porque o
mercado usa hoje uma grande va- Some a isso serviços exclusivos de
riedade de aplicativos, que fazem implantação e customização, e o
desde interação com fornecedo- resultado é uma mudança drástica,
res até cobrança de consumidores que permite aos engenheiros e de-
finais. Quase 40% do orçamento senvolvedores ocuparem suas pre-
147_larguei tudo e fui viver meu sonho nas nuvens, com o pé no chão

ciosas horas com projetos inovadores, Além da Natura e da própria Algar, onde Por aqui, não temos dúvida de que a pró-
em vez de operações complexas. nasceu a ideia, a base de clientes da ZUP pria ZUP é uma empresa do futuro. Não
já inclui empresas como Estadão, Vivo e só do tipo que evolui com a tecnologia,
30 meses em 5 Santander. mas que permite que todo o país evolua
Não entendeu? Damos um exemplo: em junto – trabalhando na nuvem, mas com
2013, a Natura tinha mais de 1,4 milhões Sonho Grande os pés no chão.
de consultores de vendas, supervisiona- Com base em Uberlândia e 40 engenhei-
dos por 900 gestores, responsáveis por ros de alta performance, a ZUP tem com-
acompanhar as informações do processo batido a fuga de cérebros e diversificado
de vendas. Todas deveriam ser transferi- a economia fora do eixo Rio-São Paulo.
das manualmente para o sistema, o que Seguindo adiante, o objetivo é transitar
significava várias horas desses gestores de um modelo B2B para B2C: a empre-
gastas em input e revisão de dados. sa quer tornar sua plataforma acessível
a qualquer desenvolvedor pelo mundo,
A ZUP recebeu o desafio de construir independente se estão programando
uma estratégia mobile que simplificas- de escritórios apertados ou do porão de
se esses processos e tornasse possível a suas casas.
coleta e inserção de dados digitalmente.
Para solucionar o problema, a empresa Os sócios acreditam que
conectou mais de 20 softwares com lin- empresas do futuro serão
guagens de programação diferentes. O aquelas capazes de navegar
que, cotado por consultorias de TI, era pelo novo ambiente digital
previsto como um projeto de 30 meses, com elegância.
durou apenas 5 meses.
larguei tudo e fui viver meu sonho

EMPREENDEDORISMO
É CONTAGIOSO
Quando um quer, dois empreendem. Veja como duas
personalidades opostas deram origem à Oilcheck, 2ª maior
empresa de seu setor

Uma mesa de bar em Minas Ge- emprego. Num guardanapo de pa-


rais. De um lado, Carlos Henrique pel, começaram a rabiscar.
Alves — de perfil extremamente
técnico, estudou com afinco a vida Nascia ali a Oilcheck. Os empreende-
toda pensando em ter um bom em- dores desenvolveram um sistema de
prego e se aposentar nele. Morria análise preditiva do óleo para cuidar
de medo de empreender. Do ou- do bom funcionamento das máqui-
tro, Luis Gustavo Milani: um pouco nas — não muito diferente do exame
mais ousado, ele sempre quis ser de sangue que nós fazemos para cui-
e sempre foi empreendedor. Feliz- dar da nossa saúde. O resultado é que,
Da esquerda para direita Luis
Millani e Carlos Henrique, mente, o sonho de um encontrou a em 7 anos de existência, a Oilcheck já
fundadores da Oilcheck desilusão do outro com o próprio é a 2ª maior do mercado.
149_larguei tudo e fui viver meu sonho empreendedorismo é contagioso

Empreendedor de si mesmo Com 16 anos, ele já era campeão brasileiro. A essa altura, com pelo menos 15 anos de
Luis tinha apenas seis anos quando acom- Com o esporte vieram também outras opor- experiência empreendedora, procurou o
panhava o irmão com asma na escola de tunidades. Por exemplo, uma bolsa de estudos maior laboratório de análise de óleo do país
natação. Não queria entrar na água porque para concluir o ensino médio nos EUA. Sem para provar a efetividade da microfiltragem
em Porto Alegre, onde cresceu, fazia muito saber uma palavra de inglês, seguiu o conse- como argumento de venda. O laboratório
frio. Até que um dia resolveu arriscar — com lho do professor americano: “Se você aprender era o Sotreq, braço da Caterpillar. E o profis-
12 anos, tornou-se campeão e ganhou a pri- mais de 2.000 palavras, sabe falar o idioma”. sional que o atendia? Carlos.
meira remuneração pelo esporte. Luis mergulhou no dicionário. Foi estudando e
contando as palavras, até que, ao completar a Entre as trocas técnicas, os dois acabaram
Para Luis, começava ali uma vida empreen- meta, começou a sonhar em inglês. amigos, mas seus projetos de vida profissio-
/ dedora. Foi no esporte profissional que o jo- nal eram muito diferentes.
vem aprendeu logo cedo que poderia aplicar De volta ao Brasil, chegou a cursar comér-
Quando no mundo dos negócios a mesma garra, dis- cio exterior, mas deixou a faculdade para ser 9 to 5
conheceu a ciplina e resiliência que usava para obter suas representante comercial de um frigorífico, De origem humilde, Carlos sempre estudou
tecnologia de vitórias na piscina. abrindo uma distribuidora de alimentos em em escola pública e estava sempre buscando
Belo Horizonte. Vale dizer: Luis tinha apenas se capacitar. A mãe, mesmo sem ter tido estu-
microfiltragem Luis lembra que a mãe sempre foi muito 21 anos. Ele nunca teve carteira assinada na do, foi o grande pilar de sustentação, em todos
patenteada por presente, levando-o aos treinos, apoian- vida. Anos depois, por causa da esposa, se os sentidos, na vida de Carlos: “Eu nem traba-
uma empresa do financeiramente e incentivando moral- mudou para a Austrália e abriu uma empre- lhava, só estudava. Foi ela que realmente fez
mente também. “O crescimento no esporte sa que importava e comercializava higieni- a diferença na minha vida e, se não fosse essa
australiana, profissional é bem o que dizem: ‘no pain, zadores de ambiente para asmáticos. base, eu não teria chegado onde cheguei.”
ficou louco no gain’ [sem dor, sem ganhos]. É difícil ir
para levar a lá e fazer na prática, é quase um autoflage- Quando conheceu a tecnologia de microfil- Carlos foi um dos únicos dois alunos da es-
lo”, ele conta. Qualquer semelhança com a tragem patenteada por uma empresa aus- cola que passou no curso técnico de mecâ-
tecnologia para vida de empreendedor não é mera coinci- traliana, ficou louco para levar a tecnologia nica. O destino certo de todos os colegas
o Brasil. dência. para o Brasil. era cursar engenharia, mas Carlos decidiu ir
150_larguei tudo e fui viver meu sonho empreendedorismo é contagioso

para o curso de tecnologia e normalização foi muito grosseira, e o superior disse que ele mento, e cada um ajudou de uma forma. Com
em qualidade. Com uma carreira técnica nunca teria uma oportunidade de crescer lá esse desafio superado, faltava gerar receita.
bem-sucedida, participou de vários treina- dentro. Carlos ficou devastado. Ligou para o
mentos fora do Brasil para se qualificar cada Luis e eles foram conversar em um bar. Como Carlos já tinha uma boa reputação na So-
vez mais, como faz até hoje. treq, a expectativa era de que os clientes viriam
- “Eu só sei mexer com laboratório”, disse Carlos facilmente. Errado. Muita sola de sapato foi gas-
Quando ele e Luis ficaram amigos, o segundo - “Então vamos montar o laboratório!”, res- ta, mas o que fez diferença, segundo Carlos, era
sempre chamava o primeiro para montarem pondeu Luis. a maneira como eles mesmos se enxergavam e
/ algo juntos. “E eu dizendo que não, que não, se colocavam frente a um potencial cliente:
“A gente sempre que não”, conta Carlos. Isso porque, nessas Carlos pegou um guardanapo e foi colocan-
se mostrou horas, Carlos só lembrava do pai, que sem- do os itens e os valores que achava que pre- “A gente sempre se mostrou grande. desde
pre foi empregado e prezou pela segurança: cisariam. No final, a soma deu R$ 500 mil. o primeiro dia, achavam que a gente era uma
grande. desde “A gente achou que era fácil, que os amigos megaempresa. Mesmo sendo pequeno, a
o primeiro dia, “Você segue a referência que você dele que tinham dinheiro emprestariam, gente sabia que podia entregar um produto
achavam que a tem, e o que eu tinha era isso: ser mas não. Amigo não empresta dinheiro pra de qualidade.”
um excelente funcionário, a empre- ninguém, é mentira”, brinca.
gente era uma sa o reconhece, você trabalha di- Para Luis, todo o aprendizado do mercado foi
megaempresa. reito e fica lá até se aposentar.” Mas se R$ 500 mil já ia ser complicado de ar- outro grande desafio: “Quando migrei para o
Mesmo sendo ranjar, imagina quando perceberam que a con- ramo de análise de óleo, eu não conhecia nada.”
E, afinal de contas, Carlos estava bem em seu ta real dava R$ 3 milhões. Aí começou o dile- Desde o início, quando começou a trabalhar
pequeno, a cargo de coordenação. Por que mexer em time ma de todo empreendedor: como conseguir com filtros na Austrália, precisou estudar mui-
gente sabia que que está ganhando? os recursos? Fizeram um plano de negócios to. “Para migrar de segmento, tem que enten-
podia entregar em outubro de 2008 para começar a empresa dê-lo muito rapidamente e profundamente.”
A hora da virada em junho de 2009. Não atraíram investidores,
um produto de Tudo mudou no dia em que Carlos foi pedir mas Carlos conseguiu apoio de três fornece- Aperto e crescimento
qualidade.” uma oportunidade para seu chefe. A reação dores, com quem já mantinha bom relaciona- Na época, havia duas grandes empresas no
151_larguei tudo e fui viver meu sonho empreendedorismo é contagioso

mercado, mas elas faziam a mesma coisa há rem voltaram a vender. “Foram quatro meses Por isso a perseverança é chave para qualquer
muito tempo. A inovação da Oilcheck estava na de aperto, mas a reserva de casa estava sepa- empreendedor. Hoje, a Oilcheck tem 54 fun-
forma de atendimento e suporte ao cliente. rada. Não dá para misturar pessoal com profis- cionários e sede em Contagem, na região me-
sional, é o erro de muito empreendedor.” tropolitana de Belo Horizonte, atuando nos
Luis explica que “algumas empresas agem mercados de construção, máquinas agrícolas
como os médicos que prescrevem a receita e Para Luis, o aprendizado foi claro: diversificar e indústria. O plano de expansão foi desenha-
nem o farmacêutico consegue ler”. Isso a con- os segmentos e mercados para sofrer menor do em um novo modelo, e a empresa vai atu-
corrência fazia muito, segundo eles, quando impacto em situações adversas. Em outras pa- ar como uma agência que presta serviços de
/ deixavam de mostrar ao cliente o que fazer, lavras, dividir os ovos entre várias cestas. “Em suporte e vendas, com parceiros locais. Com
“Se o Luis não com procedimentos claros: “Eles não davam uma crise, deve-se ter muitas portas abertas e o investimento, a expectativa é fechar 2016
diretrizes nem suporte. A gente não entrega só com oportunidades sólidas”, ele complementa. com um crescimento de 26% em relação ao
tivesse me um número, a gente entrega a solução.” Outro ano passado.
chamado, não grande diferencial foi a agilidade: o diagnóstico Depois disso, não pararam mais de crescer.
ia empreender completo poderia ser feito em até 24 horas. Com novos clientes e mais visibilidade, os só- Carlos não teria vivido isso tudo se lá em 2008
cios focaram na área comercial e conquista- seu chefe tivesse reagido de forma diferente.
jamais. Se o Mas quando tudo parecia ir bem, um susto. ram grandes empresas que permanecem no Ele mesmo admite: “Se o Luis não tivesse me
cara falasse Em 2010, por um reflexo da crise global no portfólio até hoje. chamado, não ia empreender jamais. Se o cara
‘vou te dar mercado, o faturamento da Oilcheck teve uma falasse ‘vou te dar um aumento, te botar num
um aumento, queda de 50%. Não havia recursos, nem linha “Objetivo é tudo” cargo melhor’, eu teria ficado lá.”
de crédito nos bancos, para cobrir o caixa. A “Tento sempre buscar um diferencial do que tem
te botar empresa quase faliu. no mercado e nunca desistir, mas nunca mesmo. Mas há males que vêm para o bem, e Carlos
num cargo Tem dias que você volta para casa e dá vontade tomou gosto pela coisa. “Hoje já tenho pelo
Carlos relembra o sufoco: “Tinha folha para pa- de quase morrer. No outro dia de manhã, tem que menos dois projetos para outros negócios, que
melhor’, eu gar e nenhum dinheiro.” Eles pegaram os carros estar acordado zero, pulando e correndo atrás de não têm nada a ver com o nosso atual. Do mes-
teria ficado da empresa, refinanciaram, e com R$ 100 mil novo do objetivo. O objetivo é tudo. Ainda bem mo jeito que o Luis me ajudou, eu acho que te-
lá.” deu para se virar por um tempo, até consegui- que eu não perdi isso ainda”, diz Luis. nho obrigação de ajudar outras pessoas.”
DEI A VOLTA
POR CIMA
Empreendedores que quase quebraram
(ou quebraram mesmo) mostram por que
vale a pena aprender com o erro, levantar
e tentar a segunda, terceira… vez

05
dei a volta por cima

QUEBREI NA
PESSOA FÍSICA
PARA SALVAR A
EMPRESA
Portas fechadas e desafios nunca tornaram a carreira
empreendedora menos bela para Alex – que sempre correu
atrás do que fazia seu coração bater mais forte. Nesse caso, o
Beleza na Web.

Ao contrário da maiora dos me- entrou na Avon para trabalhar na


ninos, Alexandre Serodio rece- contabilidade e acabou ficando 26
Alex Serodio, fundador do beu conselhos de beleza não de anos, até chegar à presidência para
Beleza na Web
sua mãe, mas de seu pai. Ademar a América Latina. O filho sempre
154_dei a volta por cima quebrei na pessoa física para salvar a empresa

o acompanhava nas viagens de negó- lhante no mundo corporativo: geren- catástrofe: não deu duas semanas, eles
cios e se maravilhava com as histórias te de marketing de multinacional aos já estavam sendo despejados do local.
sobre vender cosméticos. 23 anos, diretor de marketing aos 26… Só que a família já havia provocado Alex
Alex estava em cargo executivo na Ja- sobre a decisão e ele não estava dispos-
Alex não só recebeu as dicas do setor, fra, uma gigante do mercado de cosmé- to a dar o braço a torcer: “Eu tinha que
como o sólido exemplo de uma pessoa ticos, quando surgiu a oportunidade de fazer aquilo funcionar”.
/ que sempre pensou grande, empreen- integrar um grupo que compraria boa
Alex não só deu dentro da empresa e foi responsável parte das ações da empresa. Além de prover serviços de cabeleirei-
pelo próprio crescimento. ro, o salão também vendia produtos
recebeu as dicas O vislumbre de ter mais autonomia para por telefone e os entregava na casa dos
do setor, como o Seguindo os passos do pai, começou construir um negócio de referência fez clientes. Como essa era uma boa fon-
sólido exemplo cedo a vender ostras na praia. Na escola, o coração bater mais forte. Mas o dólar, te de receita, ele decidiu que investiria
acabou se engajando em projeto de mi- que estava alto, caiu; o cenário, que es- nela, mas precisava deixar esse proces-
de uma pessoa niempresa, Modelo das Nações Unidas tava fraco, acelerou; e os investidores, so mais escalável. E como a venda onli-
que sempre e chegou até a administrar a cantina. Já que iam vender, deram para trás. ne ainda era ignorada pelas gigantes do
pensou grande, saiu do ensino médio se coçando para setor, a internet seria o meio escolhido.
entrar no mercado de trabalho. Seu pri- Foi um balde de água fria que deixou o
empreendeu meiro emprego foi ainda aos 18 anos, na gostinho de fazer algo novo. Criaram o piloto do site, que ficou bem
dentro da Câmara de Comércio Americana (Am- aquém das expectativas. Todo mundo
empresa e foi cham), onde era promovido todo ano, Mas você vai largar tudo?! que estava no barco desanimou e Alex
enquanto cursava economia na PUC do Na época, Alex namorava uma menina acabou tocando tudo sozinho, do zero.
responsável Rio de Janeiro. cujo irmão tinha um salão de beleza. Ele Contratou um motoboy, Washington,
pelo próprio entrou como sócio, mas logo percebeu que corria pela cidade atrás dos produ-
crescimento. A carreira dava sinal de um futuro bri- que o negócio estava quebrado. Foi uma tos que eram pedidos pela sua platafor-
155_dei a volta por cima quebrei na pessoa física para salvar a empresa

ma. No escritório alugado, embalavam está criando um filho. E se você só tem rejeição da indústria, também correram
e despachavam tudo. um pedaço de comida, você fica com a atrás de conversar com os profissionais
comida pra você ou você alimenta seu fi- da área.
O início foi bastante complicado. Para lho? É grande o sacrifício, mas se você
piorar, a indústria era contra. Várias quebra a empresa, você quebra a vida de Foram muitas portas fechadas no iní- /
marcas se recusaram a vender para eles, muita gente.” cio, por isso a esposa de Alex chegava “Quando você
dizendo que esses produtos não pode- a ir de salão em salão fazendo amizade
riam ser comercializados online, apenas Para Alex, só tem um jeito de levan- com eles. Aproveitava, claro, para ex- cria uma empresa,
por salões. Alex precisou recorrer a dis- tar: trabalhando. Se preparar, apren- plicar que a intenção não era compe- você está criando
tribuidoras, mas o caixa estava vazio e der com quem sabe fazer melhor. Foi tir, e sim dar prestígio a eles e trabalhar um filho. E se você
ele não poderia estocar nada. aí que implementaram o grande dife- junto. A confiança foi-se construindo e
rencial. O que impulsionava as vendas Alex passou a contratar cabeleireiros e só tem um pedaço
Eu até quebro; minha dos produtos (principalmente os mais maquiadores famosos para apresenta- de comida, você
empresa, não caros) no salão era a possibilidade que rem, no YouTube, cosméticos à venda fica com a comida
Com o fluxo de caixa desfavorável, Alex o cliente tinha de cheirar, testar, apren- no Beleza na Web.
teve que injetar mais dinheiro. “Eu era der a aplicar antes de comprá-lo. Ele pra você ou você
meu próprio investidor-anjo e já tinha teria que levar essa dinâmica para o e- Nesse meio tempo, Alex foi apresenta- alimenta seu
colocado quase todo meu dinheiro no commerce. do por um fornecedor a Lucas e Felipe. filho? É grande
salão. Tudo que restou eu coloquei no Com ótimos currículos, um dos quais
Beleza Na Web”, ele diz. A disparada incluía até o Goldman Sachs, os dois o sacrifício, mas
Categorizaram e organizaram tudo de haviam fundado uma empresa que as- se você quebra
O resultado? Alex quebrou na pessoa forma que as clientes recebessem diag- sumia a venda física dos salões de be- a empresa, você
física: nóstico e recomendação dos itens que leza, mas que não estava indo tão bem.
fossem mais adequados a seu cabelo e Em troca de uma parte das ações, Alex quebra a vida de
“Quando você cria uma empresa, você seu corpo. Para entender e amenizar a ganhou novos sócios. muita gente.”
156_dei a volta por cima quebrei na pessoa física para salvar a empresa

Tudo era feito em casa, do ERP ao merchandi- caram de repente e o EBITDA ficou negativo. tavam comprometidas o suficiente”, conta. Os
sing. Com isso, começaram a ganhar nome e a Lucro? Já não tinha mais. Para completar, os dois sócios, que tinham entrado apenas alguns
crescer bastante rápido. concorrentes, que antes mal faziam cócegas, anos antes, também acabaram saindo.
iam gerando um incômodo.
No segundo ano, o site já dava lucro – feito ra- Com metade do time que começou aquele ano
ríssimo para o setor de e-commerce no Brasil. Antes uma empresa de donos, o beleza na web – aproximadamente 60 pessoas -, mas com
acabou ficando inchado. era preciso um cho- muita garra, conseguiram corrigir seus erros.
Em três meses, foram de 8 para 50 funcioná- que de cultura e muito foco em execução. go Em uma virada impressionantemente rápida,
rios. O faturamento também aumentava expo- big or go home. puderam tornar o EBITDA novamente positivo
nencialmente: 1 milhão, 2 milhões, 7 milhões… no ano seguinte.
Era 2012 e a Tiger Global – um fundo que tam- Alex chamou todo mundo e bateu o martelo:
bém investe em empresas como o Netshoes – 2014 vai ser rentável! Se não está pronto para Cultura forte, expansão plena
entrou no jogo. Junto veio a Kaszek Ventures, ser o maior, melhor pular fora. Dois anos depois, o Beleza na Web continua
co-fundada por Hernan Kazah, empreendedor numa crescente. Mais de 16 mil produtos dife-
do Mercado Livre. Alguns pularam mesmo. Outros, infelizmente, rentes estão disponíveis a um clique das mais
foram “pulados”. de 50 milhões de pessoas que visitam o site
Mas então veio 2013. anualmente.
“Para a gente foi muito duro, mas foi importan-
O desafio é permanente te. Precisávamos resgatar alguns pontos cultu- Em 2016, o time se mudou para um galpão três
Qualquer um na posição de Alex estaria can- rais e valores indispensáveis. O trabalho nunca vezes maior em São Paulo, que agora concen-
tando vitória. Só que o crescimento era tanto pode ser para você, tem que ser para o seu time tra as operações do Brasil inteiro (antes dividi-
que a velocidade estava ficando incontrolável. e para o seu cliente. Parte do pessoal estava das com o Tocantins). No centro de distribui-
Com tanta gente nova no time, a cultura se fazendo para si. Havia pessoas extraordinaria- ção, operadores manuseiam os produtos em
perdeu. Os gastos com marketing digital tripli- mente inteligentes e éticas ali, mas que não es- perfeita sintonia. Escada acima, a entrada do
157_dei a volta por cima quebrei na pessoa física para salvar a empresa

escritório conduz a um novo universo Pode parecer que ele é só perfeccionis- to, empregar mais pessoas e mudar a
de espelhos com luzes, catálogos edi- ta, mas o cuidado vem de um respeito vida de muita gente para melhor. Mas
toriais e estantes com dezenas de per- pelo coletivo. É essa atenção que ele sem nunca esquecer o principal, que é
fumes e cosméticos. procura passar também para o time, de recomendar as aspirações de beleza de
200 pessoas, que tem a missão de en- nossos clientes.
Mas o que chama a atenção está ao gajar os clientes desde a primeira inte-
fundo: uma réplica daquele primeiro ração e cultivar o relacionamento com “Quando a gente perde o sonho, a gente
escritório alugado, com um iMac G3, eles: “precisamos honrar a confiança anda de lado. quando ele é resgatado, a
da época em que a logo da Apple ain- que as pessoas nos dão ao comprar gente cresce.”
da era colorida, em cima de sua mesa com a gente”.
original, um tanto descascada. Era nela Se cresce! Em taxas de pelo menos
que Alex e Washington organizavam os Um longo caminho 60%, aliás. Mas Alex não canta vitó-
primeiros pedidos. “Gosto mais de ficar Com o vento contra em tantos momen- ria. Na verdade, mesmo com todo esse
/ aqui que na minha sala”, confessa Alex. tos, o sucesso do Beleza na Web é fruto chão percorrido, ele lembra quanto tra-
“Quando a de um trabalho incansável. Para Alex, balho tem pela frente: “A nossa história
gente perde Seguindo mais alguns passos, decora- ficou claro que não existe sucesso sem está só começando”.
ção moderna, salas com móveis modu- sacrifício: “Não tem jeito, precisa dar a
o sonho, a lares para reuniões mais dinâmicas e cara a tapa e reconhecer quando pre-
gente anda TVs com painéis de dados para gestão cisa de ajuda.”
de lado. à vista. Diga-se de passagem, o novo
espaço não teve dedo de nenhum ar- Seu sonho é assumir a liderança da
quando ele é quiteto. E ali também não se vê sujeira venda direta no Brasil. Com isso, vêm
resgatado, a no chão. Antes que caia um papel que as consequências: se tornar referên-
gente cresce.” seja, Alex cata. cia, chegar a R$ 1 bilhão de faturamen-
dei a volta por cima

TODOS OS SONHOS
DO MUNDO
Alphonse Voigt, cofundador do Ebanx, resolveu se meter em aven-
turas empreendedoras para custear outros sonhos e aventuras (in-
cluindo o paraquedismo. A trilha, entretanto, foi cheia de quebras.

A vida de Alphonse mudou de um fluência do pai. Só que, quando tinha


momento para o outro. Uma fra- 5 anos, a família começou a passar
ção de segundos mesmo, entre cair por maus bocados financeiros e a
no chão e escutar o “crec“. Quando vontade de ir andar de moto e kart
abriu os olhos, deitado na grama, viu precisou ser adiada. Alphonse dei-
o céu claro e uma corrente de pesso- xou o aventureiro adormecido até
as em sua volta. Tocou suas pernas e o momento em que viu “Caçadores
não sentiu nada. de Emoções” no cinema.

Mas vamos primeiro entender o co- No filme, os personagens surfavam


meço dessa história. Acontece que ondas gigantes, pulavam de para-
Alphonse Voigt, desde criança o empreendedor tem quedas e roubavam bancos. Na
cofundador do Ebanx
gosto por adrenalina, muito por in- época ainda adolescente, foi ins-
159_dei a volta por cima todos os sonhos do mundo

pirado a praticar os dois primeiros, mas roubar de saltos que ele havia feito. Só que, por uma de- E é por isso que termina seu Day1 em alto estilo,
bancos era loucura além da conta. Como preci- satenção, no final de tudo, mesmo com o para- com citação de Fernando Pessoa: “Não sou nada,
sava financiar esse (nada barato) estilo de vida, quedas aberto e em pleno estado, Alphonse não nunca serei nada, não posso querer ser nada. À
encontraria alguma forma de gerar sua própria conseguiu amortecer o pouso. Caiu, a 120km/h. parte isso, tenho em mim todos os sonhos do
renda. mundo”.
“Crec”.
Esse foi o Day1 de Alphonse: o momen- Uma fratura na coluna e logo estava o empreen- assista à história
to em que resolveu se meter em aven- dedor em um helicóptero a caminho do hospital,
turas empreendedoras para custear onde os médicos diriam que ele nunca mais vol-
outras aventuras. Ele só não pensava taria a andar.
que tomaria gosto real pela coisa.
Mas nenhum sonho quebrado. “Paraplégico” era
Entre muitos sucessos e fracassos, um episódio uma palavra que não entrava em sua cabeça. Em
foi avassalador: pronto para lançar um grande vez de fazer terapia 2 vezes por semana, como
negócio de bingos, o governo brasileiro decide recomendado, ele fazia 5 vezes por dia. Funcio-
proibir o jogo. “Quebrei, mas quebrei quebrado”, nou: em um ano, Alphonse já podia pelo menos
ele conta. Para tentar se recuperar, organizou um ficar de pé.
grande show que teve apenas 1/3 dos ingressos
vendidos. Perdeu mais dinheiro. Para completar, Com a recuperação, nada mais o impedia de cor-
seu pai entrou em depressão assim que se sepa- rer atrás do sonho grande. Tentou encontrá-lo
rou da mãe de Alphonse. aqui e ali, mas ele só tomou forma mesmo quan-
do convenceu os amigos a montarem o Ebanx –
A situação não era fácil. Na tentativa de aliviar uma empresa de processamento de pagamen-
a tensão, decidiu fazer um salto de paraquedas tos estrangeiros que tem clientes como Alibaba,
comum, tão comum quanto as outras centenas Spotify e Airbnb.
dei a volta por cima

O QUE NÃO MATA,


FORTALECE
Da dívida de R$ 300 mil ao faturamento de R$ 15 milhões.
A história do Osvaldo e da Carla, fundadores da Gigalink, nos
mostra que importante mesmo é continuar de pé.

O menino inquieto, que não gosta- Ele conquistou o mestre com uma in-
va muito de estudar, ainda iria so- venção muito simples. Juntou madei-
frer muito nas aulas de química do ra, dois tubos de ensaio, alguns elás-
Colégio Jesuíta em Nova Friburgo. ticos e montou uma centrífuga que
Mas o dever imposto aos alunos resolveu o problema do laboratório
que ficaram de recuperação, fazer da escola. Era um protótipo bem pri-
um projeto de química, acabou vi- mitivo, mas impressionou o professor
rando uma oportunidade e tanto temido por todos. Além dos elogios e
Osvaldo e Carla, para Osvaldo Antonio Lucho Ju- da nota 10, o projeto rendeu um con-
fundadores da Gigalink nior. vite para ser monitor de química.
161_dei a volta por cima o que não mata, fortalece

1972
Osvaldo aos 6 1996
anos Nos EUA, levando primeira
leva de material para envio ao
Brasil por conteiner

1999
Feira de informática Solutec

1988
Ainda na
faculdade, em 2016
matéria com Sede da Gigalink,
Lucélia Santos em Nova Friburgo
162_dei a volta por cima o que não mata, fortalece

Osvaldo no 2o ano do Ensino Médio, durante


a criação do projeto ciêntifico

gramar e virou “micreiro”. Já fazia alguns se conhecerem. O tal encontro acabou acon-
projetos quando entrou para a faculdade de tecendo em um parque, debaixo da ponte
engenharia eletrônica na Federal e na PUC que liga Brasil e Uruguai. Daí para o namoro
do Rio de Janeiro. “Sempre tive uma persis- a distância e o casamento, foi tudo muito rá-
tência muito grande. Eram 8 turmas de Cál- pido. Osvaldo passou a dar menos atenção à
culo 1 e, no segundo semestre, eram duas graduação e mais atenção às viagens a Porto
turmas, porque as outras desistiram”. Alegre, onde ela estudava arquitetura.

Só que no meio do curso, a faculdade ga- “Naquele ano, só passei em duas matérias.
nhou uma concorrente: Carla. Chegamos à conclusão de que precisáva-
mos morar juntos.”
Um amor embaixo da ponte
O reconhecimento acabou despertando o Quando o pai de Osvaldo se aposentou, Carla transferiu a faculdade e foi de mala e
/ prazer pelo estudo e motivou um envolvi- passou a cuidar da fazenda da família, bem cuia – literalmente, como boa gaúcha – para
“Naquele ano, mento muito maior do jovem com a esco- no interior do Rio Grande do Sul. Nas férias o Rio de Janeiro. A jornada empreendedora,
só passei em la. Tanto que Osvaldo acabou fazendo dois de verão de 1987, o garoto se ofereceu para a partir de então, passou a ser em dupla.
cursos profissionalizantes ao mesmo tem- administrar a propriedade para que o pai
duas matérias. po: um de eletricidade e outro de química. pudesse viajar. Era gado e ovelha durante a Empreender, quebrar, reco-
Chegamos à Esse foi apenas o começo de uma histó- semana e balada no sábado. Mas quando meçar – Já viu esse filme?
conclusão de que ria marcada por descobertas dignas de um viu a jovem Carla em frente à casa de seu Desde criança, Osvaldo já demonstrava um
professor Pardal, com desafios vencidos avô, foi paixão à primeira vista. espírito empreendedor: “Com 8 anos eu
precisávamos pela inovação. Numa época em que poucos gostava muito de gibi, não tinha muito aces-
morar juntos.” tinham um computador, ele começou a pro- Os primos organizaram um churrasco para so a grana e montei uma banca de revistas
163_dei a volta por cima o que não mata, fortalece

na frente de casa. Vendia os gibis que com 22 anos, abriu a primeira empre- manda de clientes querendo internet
eu lia para comprar outros”. Esse tino sa. Mas, em dois anos, deu tudo erra- de banda larga e a lâmpada acendeu
comercial aliado à criatividade ainda do: dos quatro sócios, só dois traba- de novo.
renderia um bom negócio. E foi ape- lhavam. A esposa entrou como sócia,
nas uma questão de tempo. os outros três saíram. No começo até Osvaldo teve a idéia de montar uma
funcionou, mas a rentabilidade foi rede de fibra óptica na cidade. Era o
O único emprego que Osvaldo teve caindo e eles não perceberam. embrião da Gigalink.
na vida foi um estágio de eletrônica
na Remington. Depois, com uma bol- Osvaldo lembra que tirava até 200 pe- O Plano A: banda larga
sa do CNPQ e o empréstimo de uma didos em feiras de informática e movi- barata e com qualidade
vizinha, conseguiu comprar o primeiro mentava muito dinheiro, mas não gera- Quando começou a desenhar seu
PC. Mas o disco rígido veio com defei- va lucro. Quebrou. Resolveram migrar novo negócio, os amigos já reagiram:
to três vezes e, por ter que consertar a do varejo para o atacado, mas o negó- “Lá vem você com mais uma idéia mi-
máquina sozinho, acabou aprendendo cio continuava pouco rentável. Que- rabolante. Vai quebrar de novo”.
a montar um computador. Nem che- brou pela segunda vez. O ano era 1998.
gou a usar, porque o professor de física Mas ele não se abateu. Do outro lado,
fez uma oferta irrecusável e Osvaldo Foi quando ele decidiu sair da ativida- o pai sempre incentivava, mas já apre-
lucrou na venda praticamente 100% de comercial e voltar para Nova Fribur- sentava um plano B: “Qualquer coisa
em cima do valor que tinha gasto com go. Assim surgiu um novo negócio de você vai cuidar da fazenda no Sul”. Só
a compra. prestação de serviços, que começou que gado e ovelha não seria plano B,
montando CPDs (Centros de Proces- nem C, nem Z. Seu sonho era outro e
Osvaldo aos 8 anos com seus gibis A lâmpada acendeu: montando de 4 a samento de Dados) para empresas. O Osvaldo ainda lutaria muito por ele.
5 computadores por mês, ele conse- reposicionamento rendeu seus frutos
guiria pagar a faculdade e se manter. e todas as dívidas foram pagas. A em- O primeiro passo foi uma reunião com
Deu tão certo que ainda estudante, presa também começou a ter uma de- um fabricante e um técnico, na qual ele
164_dei a volta por cima o que não mata, fortalece

mostrou o mapa da cidade com a rede de cante, em quatro meses eles já tinham o Novos mercados, novos
fibra óptica. O investimento inicial seria de primeiro cabo de rede metálico e susten- horizontes
R$ 500 mil e Osvaldo só tinha R$ 30 mil. O tável, patenteado em 2004. Depois de conquistar o mercado em cinco
fabricante acreditou no projeto e quis ban- cidades do Rio de Janeiro, a Gigalink pas-
car tudo. Mas a esposa e sócia se assustou Essa ideia permitiu atender às demandas sou a ser cobiçada por outras empresas.
com o valor: “Você é louco, saiu da lama e do mercado com muito mais qualidade e Mas Osvaldo já tinha seus mentores no
vai entrar na lama de novo”. por um valor bem inferior ao praticado pe- Rotary Club e foi aconselhado a procurar
los concorrentes. a Endeavor e a Criatec. Foi quando a em-
Ele voltou para o fabricante, contou que ti- presa passou a focar na gestão do negó-
nha quebrado mais de uma vez e reduziu o Os clientes faziam fila na porta. a empresa cio e Osvaldo participou de vários cursos
/ projeto para um crédito equivalente aos seus acabou cumprindo uma importante função de imersão em Stanford e Harvard. Hoje
Essa ideia recursos disponíveis. Em dois anos, já tinha social, ao ampliar a inclusão digital em áre- ele afirma que o conhecimento é essencial
alcançado seu objetivo inicial e, com essa as que tinham acesso, mas limitado. Esse para crescer, investe cada vez mais em Re-
permitiu atender postura mais cautelosa, nunca mais quebrou. propósito passou a ser traduzido na missão cursos Humanos e constrói as bases do fu-
às demandas comum a todos os colaboradores: compar- turo com muito mais segurança.
do mercado Mesmo assim, o espírito inventivo con- tilhar acesso digital com qualidade, inova-
tinuava assoprando novas aventuras e ção e sustentabilidade. “Sabe aquela coisa do técnico
com muito mais Osvaldo começou a repensar o negócio. que só pensa em solução
qualidade e Como a fibra óptica era muito cara, eles “Esse propósito de compartilhar o acesso já técnica? A venda era passiva,
por um valor conseguiam atender apenas o merca- vinha desde que eu me entendo como pro- não tinha marketing, não tinha
do corporativo. Para alcançar o varejo, a fissional da área de informática. A gente não indicadores. Antes a gente
bem inferior ao grande aposta de crescimento, teria que quer só ficar rico, quer ficar rico trazendo o crescia como um grande pastel
praticado pelos desenvolver algo novo, um cabo mais ba- bem para as pessoas, tornando o mundo me- de vento. Em mais alguns anos,
concorrentes. rato. Novamente com o apoio do fabri- lhor com o acesso democrático à internet”. poderia dar em mais uma quebra.”
165_dei a volta por cima o que não mata, fortalece

Osvaldo faz questão de destacar que deve nômico, Ambiental e Social da região. Lá conhe- Gigalink: um sonho do
o sucesso da empresa à contribuição de ceu criadores de truta, que precisavam se orga- tamanho do mundo
várias outras pessoas. Todas as inovações nizar e incentivar a produção ambiental. No início, eram três funcionários e o casal de
da Gigalink, inclusive, foram desenvolvidas empreendedores. Hoje, a Gigalink tem 150
dentro de casa. Hoje, acredita que está Osvaldo se envolveu com a causa e acabou colaboradores. De uma dívida que chegou a
vivendo um momento muito positivo de comprando uma truticultura também. Hoje, é um total de R$ 300 mil, fechou 2015 com um
compartilhamento de sonho. Um dos presidente da Cooperativa dos Criadores de faturamento de R$ 15,8 milhões. Em 2016, o
exemplos foi um dia inteiro de homenagens Pescado da região serrana fluminense.Mas se faturamento foi de R$ 16,8 milhões e a pre-
criativas e comoventes, organizado pela você acha que ele só é truticultor por hobby, se visão para 2017 é de R$ 20,1 milhões, com
equipe em seu aniversário de 50 anos. engana. O lazer acabou virando um novo em- crise e tudo.
preendimento:
“O caminhar, o dar errado, o aprender e co- Os planos continuam ousados e o mercado
meçar a dar certo é um exercício que o ser “Existem dois negócios que mais crescem no parece promissor. “Pensa só”, ele diz, “de 7 bi-
humano tem que fazer para ser uma pessoa mundo, a internet e a aquicultura. Estou nos lhões de habitantes no mundo, 60% têm aces- /
melhor. Acredito muito na frase ‘o que não dois!” so a banda larga e, desses 60%, apenas 30%
destrói fortalece’. Em alguns momentos, a têm acesso a banda larga fixa no planeta. Tem “Existem dois
gente tem que olhar pra cima e se perguntar: Nas poucas horas vagas entre a Gigalink e o pelo menos 5 bilhões de pessoas que ainda po- negócios que
o que eu tenho pra me virar hoje?” Sitio Gaia, das trutas, Osvaldo gosta de correr, dem ser clientes Gigalink”. mais crescem
tomar um bom vinho e fazer um bom churras-
Que truta é essa? co gaúcho de fim de semana. Seu passatempo Um sonho grande, que começa por outros no mundo, a
Quando você acha que está diante de um en- predileto, no entanto, é brincar de professor estados do Brasil, depois alcança a América internet e a
genheiro que só pensa em tecnologia, Osvaldo Pardal na oficina de eletrônica. Sim, como um Latina e outros continentes. Nada mal para aquicultura.
pode surpreendê-lo. Tudo começou quando ele nerd de startup, ele se diverte em sua “oficina quem começou a empreender vendendo gi-
foi convidado pelo ex-prefeito de Nova Friburgo de garagem”. Quem sabe ali ainda surge ou- bis na porta de casa. Estou nos
a assumir o Instituto de Desenvolvimento Eco- tro negócio inovador? dois!”
dei a volta por cima

ADMITIR A QUEDA
E SE REERGUER
Levanta, sacode a poeira e… empreende de novo. Rogério
Gabriel, fundador do Grupo Prepara, reagiu ao fracasso de sua
rede de produtos de computação e teve forças para recomeçar

Nos anos 80, em seu primeiro tra- A inspiração veio primeiro do avô.
balho como trainee, Rogério Gabriel Descendente direto de italianos anal-
teve um chefe sensacional. Conver- fabetos que imigraram para trabalhar
sando um dia com sua namorada – na lavoura, foi o único dos 11 irmãos
hoje esposa – compartilhou: “O cara que deixou o campo para trabalhar
é tão bom que, quando eu tiver mi- na cidade, como mascate. Seu filho
nha empresa, vou contratá-lo”. seguiu caminho parecido, compran-
do café do produtor e vendendo para
Sim, ele admite que tinha ali um quê de o torrefador. Por toda a vida, os dois
jovem sonhador. Mas é verdade tam- foram sócios e levavam o pequeno
Rogério Gabriel, fundador bém que, desde muito antes do episó- Rogério, na época com 9 ou 10 anos,
do Grupo Prepara
dio, Rogério já queria empreender. para acompanhar as negociações.
167_dei a volta por cima admitir a queda e se reerguer

“Não sei por que, mas isso me en- que passaria apenas um período de tavam as melhores marcas no Brasil
cantava… partiam de um preço, en- aprendizado para poder construir sua e estavam entre as 100 melhores e
travam em divergência, de repente própria história. Foi parar em uma in- maiores empresas do segmento.
saíam do assunto, começavam a fa- dústria de suco de laranja, em um pro-
lar da família e voltavam a negociar. jeto de transição de um sistema da Até que aparece a
Com certeza isso me influenciou na época para a plataforma de PC. A re- correnteza
trajetória empreendedora.” dução de custos da indústria com essa Você pode ser um excelente empre-
transição foi tão significativa que a lan- endedor, mas nunca vai poder con-
Rogério na época Um caminho de precisão terninha acendeu: decidiu que seu ne- trolar tudo. Antecipar, talvez, mas
de Faculdade.
Ao lado, primeira Na faculdade, Rogério optou por ma- gócio seria vender computadores. controlar jamais. O mercado, por
loja Precisão temática e computação. Da Univer- exemplo, sofreu mudanças que atin-
sidade Estadual de Campinas, foi di- A Precisão Informática surgiu em giram a Precisão em cheio.
reto para o mercado, trabalhar como 1990, em São José do Rio Preto, ci-
trainee em São Paulo. Só que o con- dade escolhida por conta da menor Muito rapidamente, o computador
forto começou a incomodar: concorrência. Rogério se inspirou virou commodity, enquanto os e-
em grandes cadeias de lojas norte commerces surgiam, impondo uma
“Estou muito bem aqui, então me de- -americanas, como a BestBuy, para concorrência forte ao varejo físico.
/ mito”, avisou ao chefe, “minha hora de aproximar do público um equipa-
“Estou muito bem aqui, arriscar é agora”. mento que era distante, “coisa de “Lembro quando começou
nerd”, ele brinca. a chegar cliente na
então me demito”, Preferiu arriscar no interior do Estado, loja perguntando ‘mas
avisou ao chefe, “minha mas não sem antes ter mais uma ex- Aproveitou até a lua de mel em Miami vocês fazem que nem as
hora de arriscar é periência como funcionário. Ainda as- para fazer benchmark nas lojas grin- pontocom, com preço mais
sim, tinha o tempo todo a clareza de gas. Em pouco tempo, já represen- baixo e em 10x sem juros?’”
agora”.
168_dei a volta por cima admitir a queda e se reerguer

Rogério e sua equipe entravam em uma curva mória do empreendedor porque era a forma dela mento) se tornou franqueado. Hoje, o Grupo Pre-
descendente. Para completar, a alta do dólar e ajudá-lo a recuperar a autoestima, que naquelas para tem mais 600 unidades em mais de 400
outras questões macroeconômicas agiram como horas estava em baixa. municípios brasileiros e possui cerca de 200 mil
a correnteza em um mar que já estava agitado. alunos.
A autoconfiança do empreendedor afundou jun- Algumas vezes, Rogério pensou
to. Ele já havia tentado de tudo e mesmo assim em jogar o sonho para o alto. Assista à história
não conseguia aceitar que aquele negócio não Como tinha boa formação, seria
podia ser salvo. “A BMW eu vendi sem remorso relativamente fácil arranjar um
algum. A dor mesmo era a de estar perdendo a emprego. Começou a escrever o
empresa que eu havia construído.” currículo e caiu a ficha: aquilo não
o deixaria feliz.
Admitir a queda para se reerguer
Rogério conta que o sentimento de incompetên- Depois de um processo doloroso de aceitação,
cia veio acompanhado também do orgulho. Seu estava determinado a encontrar sua próxima
pai poderia ter-lhe ajudado, mas não ficou sa- grande oportunidade. Sem saber, estava debai-
bendo de nada. Toda vez que perguntava ao fi- xo do seu nariz. Apostou em um dos braços da
lho onde estava o carro, escutava uma história Precisão, dedicada a treinamentos, e criou dela a
inventada qualquer. Prepara Cursos, que acabou virando Grupo Pre-
para, uma rede que engloba cursos profissiona-
“Mas mãe é mãe, né?”, complementa, “Por mais lizantes, complemento escolar e ensino de idio-
que não tivesse muito estudo, tinha uma inteligên- mas com uso de tecnologia.
cia emocional apuradíssima.” Mesmo sem ter cer-
teza do que estava acontecendo, ela presenteava E aquele chefe que Rogério tanto admirava? Não
Rogério com livros. O gesto ficou marcado na me- foi contratado, mas (além de padrinho de casa-
169_dei a volta por cima o que não se aprende em harvard

DAY 1

O QUE NÃO
SE APRENDE EM
HARVARD
Aprende-se um monte em uma universidade Ivy League,
mas para Jorge Paulo Lemann, tem coisa que “só
apanhando muito”. Conheça um lado pouco conhecido de
sua história
dei a volta por cima

Reconstruindo
um sonho
“Sem nunca ter demitido uma única pessoa sequer, cheguei
na empresa com a missão de mandar 60 embora” — conheça
a história de José Rizzo, empreendedor da Pollux

Numa segunda-feira de manhã, um - Então vamos dar uma 4ª e deixar


diretor apresentou a José Rizzo uma nossa expectativa mais clara do que
lista de dez nomes. Aquelas eram as nunca.
pessoas com nível de desempenho
abaixo do resto da equipe, as que O empreendedor sabe que a ma-
estavam na mira do RH. “Vocês já nobra vai contra os ensinamentos
deram uma 2ª chance a elas?”, Riz- de gestão. Sabe que, em tempos de
zo fez questão de perguntar. incerteza econômica, não se pode
perder tempo. Mas sabe, tam-
José Rizzo, empreendedor - Sim, até 3 chances. Elas precisam bém, quão difícil é ter que demitir
da Pollux
ser desligadas da empresa. alguém — principalmente para o
171_dei a volta por cima Reconstruindo um sonho

funcionário e enquanto o país passa por uma crise era alto, mas que ela poderia ajudá-lo a fazer um
de emprego. Isso porque Rizzo viveu outra situação mestrado depois que ele se formasse no Brasil.
em que precisou mandar gente embora, anos atrás,
em maior escala. Na época, no entanto, ele não ti- “Não, Dona Carmem, essa decisão eu já tomei. Di-
nha opção. nheiro a gente faz.”

Se virando na gringa Rizzo deu aulas de linguagem de programação durante


“Eu nasci no Rio de Janeiro, num domingo de sol em um ano para, com ajuda da Dona Carmem, conseguir
que o Bangu deu de 3x0 no Flamengo e foi campeão tirar o visto. Chegando lá, percebeu que seria mais difí-
estadual. Tem como imaginar um melhor início de cil que imaginava. Se estudar engenharia já é um desa-
vida?”. Rizzo torce pelo Fluminense, por isso a brin- fio, ter aulas em inglês e continuar trabalhando todos
cadeira e rivalidade comum entre os cariocas. Mas os dias para cobrir as despesas não facilitava em nada.
apesar do orgulho de sua cidade (e de seu time de fu-
tebol), Rizzo escolheu morar, trabalhar e empreender O então estudante foi de garçom a estagiário do de-
em Santa Catarina. partamento de energia do governo norte-americano.
E não perdia nenhuma oportunidade de tirar uma gra-
Antes mesmo de fundar a Pollux — uma empresa ninha: chegou a organizar um carnaval para mil pesso-
que oferece soluções de automação, robótica e ou- as em um clima de -30ºC e a vender brigadeiro, entre
tros para aumentar a produtividade da indústria –, outros “bicos”.
Rizzo já tinha atitudes empreendedoras. Quando
chegou a hora de entrar na faculdade e seguir os Foi o período em que ele mais aprendeu sobre a au-
passos da família de engenheiros, o garoto decidiu tonomia de ser empreendedor.
que queria estudar nos EUA. No dia seguinte da de-
Rizzo vendendo Brazilian
cisão, foi ao consulado descobrir o que era preciso. Uma cerveja com Patel Brigadeiros para pagar as
Dona Carmem, que o atendeu, explicou que o custo No último ano da faculdade de engenharia mecânica contas nos EUA
172_dei a volta por cima Reconstruindo um sonho

Quatro anos depois, ele voltou aos EUA


a trabalho e reencontrou Patel. Des-
sa vez com mais bagagem, sentiram a
confiança de retomar planos antigos.

De trás pra frente


Ficou apenas mais 7 meses na Embra-
co, assumindo o chapéu de empreen-
dedor à noite e aos finais de sema-
na. Mais ou menos na mesma época,
a empresa de seu pai faliu e o pouco
que Rizzo havia economizado foi jun-
to. Eventualmente, pediu as contas e
vendeu seu carro.

com especialização em economia, na Iowa Em 1992, Rizzo desceu de beca do avião “Acho que comecei do jeito mais erra-
State University, Rizzo conheceu Hitendra no Brasil, para a alegria dos pais, que do possível. Eu não tinha um problema
Patel, um zambiano com quem frequente- não puderam ir à formatura. Logo foi tra- para resolver ou um produto para ven-
mente trocava ideias de negócios. balhar na Embraco, em Joinville, onde der, mas a vontade de empreender era
instalou o 1º link não acadêmico para tão grande que inverti a sequência das
Debatiam seus futuros empreendimentos internet do país. “Trabalhei lá bastan- coisas.”
na mesa de bar, mas nada saía do papel, te tempo, mas sempre querendo abrir
Rizzo na sua formatura de Engenharia, até porque sabiam que precisariam se ca- minha própria empresa e muito atento E se Rizzo já parecia louco de mergulhar
na Iowa State. Ao lado, Rizzo com seus
primeiros sócios da Pollux pacitar antes de assumir um risco. Adia- a qualquer oportunidade de aprendiza- assim de cabeça sem uma visão muito
ram os planos, mas mantiveram contato. do”, conta. clara, mais loucos ainda foram os cinco
173_dei a volta por cima Reconstruindo um sonho

Rizzo na incubadora. Abaixo, Rizzo recebendo o prêmio


FINEP, em 2001, nas mãos de FHC

amigos que conseguiu convencer a pedirem demissão tico. Com 5 anos de operação, já tinham uma equipe
para entrarem como sócios daquele não-negócio. robusta e processos bem definidos. O próximo passo
seria captar investimento para inclinar ainda mais a
No entanto, já na primeira reunião, no quarto do apar- curva de crescimento.
tamento de Rizzo, concordaram sobre a necessidade
de aumentar a produtividade nas fábricas. Com o tem- Cortando um sonho pela metade
po, formataram um produto e saíram para vender. Depois que levantaram capital, a empresa passou por
um ano de muitas contratações e muita preparação.
Preparar, apontar, fogo Rizzo estava montando o time dos sonhos para arra-
Dos 5 sócios, dois não quiseram ficar sem salário sar em campo.
e abandonaram o barco. O irmão de um dos 3 que
restaram emprestava o Fiat Uno e eles rodavam São “Quando a gente entrou no gramado, os
Paulo visitando potenciais clientes. Em uma dessas refletores apagaram.”
viagens, dessa vez para o Rio de Janeiro, o time de
empreendedores fechou um contrato de 250 mil dó- O ano era 2002. Em meio a mudanças políticas, o dó-
lares com uma multinacional farmacêutica. lar disparou, os clientes pararam de comprar e a Pollux
entrou na fase mais difícil de sua história. A equipe es-
“Esse foi o gatilho para tudo que veio tava pronta para um volume de vendas que não vinha.
logo em seguida: receita, competência e Passou-se janeiro, fevereiro, março, e a situação come-
referência”, diz Rizzo. çou a ficar preocupante.

A partir dessa oportunidade, a Pollux cresceu rapi- Com custo fixo alto e muita gente ociosa, Rizzo fez as
damente e passou a atender todo o setor farmacêu- contas e concluiu: essa empresa vai quebrar.
174_dei a volta por cima Reconstruindo um sonho

Infelizmente, a solução era óbvia. O único gas- ver um sistema de Robot as a Service, para levar Em 1969, foi isso que os EUA fizeram. Recente-
to grande era a folha de pagamento. Rizzo pre- mais inteligência para suprir lacunas da indústria mente em viagem, Rizzo foi conhecer a apertada
cisou decidir entre reduzir significativamente o no Brasil. cápsula na qual os astronautas se lançaram ao
quadro de funcionários ou continuar na luta com espaço, e se espantou com a coragem daqueles
o time completo, com risco de não dar certo e Hoje, a maioria dos competidores da Pollux são de que, por um sonho, se submeteram a esse risco.
todo mundo ficar sem trabalho. fora do país. Patel, aliás, continua sendo sócio de E completa: “Onde há vontade, há um caminho.”
Rizzo, apesar de morar nos EUA, e sua atuação é
“Optei por fazer um corte mais agressivo para somente como diretor do conselho. Com mais de Assista à história
não criar um clima de alguém ser demitido 140 colaboradores, tiveram um crescimento mé-
toda semana. Melhor pecar pelo excesso para dio de 95% nos últimos dois anos.
ganhar fôlego e dar uma chance da empresa
sobreviver”, conta Rizzo. “Sempre me perguntam ‘E aí, Rizzo, como você se
sente 20 anos depois, com uma empresa sólida e
Ele nunca havia mandado uma única pessoa segura?’. Eu respondo que eu sinto tudo, menos
embora. De repente, precisou demitir 60 — e que a empresa é sólida e segura”, ele conta, rin-
até hoje se emociona ao lembrar do dia que do. “A tecnologia muda muito rápido, o que hoje
teve que comunicar o corte. Apesar de ter sido acho que é certo, amanhã pode não fazer mais
um enorme desafio pessoal, foi isso que salvou sentido.”
a Pollux da falência.
Por isso, ele reforça também a necessidade de
Como um astronauta desbravar novas oportunidades para alcançar
A recuperação levou pelo menos mais 5 anos e um objetivo. “Em 1961, os EUA estavam perden-
exigiu uma revisão de todo o modelo de negócio do a corrida espacial e o ex-presidente Kennedy
da Pollux. A necessidade de gerar receita recor- falou que, até o final da década, eles colocariam
rente, por exemplo, levou a empresa a desenvol- um homem na lua”.
EMPREENDER NA
UNIVERSIDADE
A faculdade é um momento marcante na vida
de grande parte das pessoas. Na vida desses
empreendedores, o sonho grande surgiu ali

06
176_empreender na universidade 4 anos sem vender

4 ANOS SEM Por muito tempo, Igor Santiago, Ronaldo Silva e Danilo
Halla viveram uma escassez de clientes. Hoje, a I.Systems

VENDER dobra de tamanho a cada ano.

Na fábrica de envase da Coca-Cola A promessa brilhou os olhinhos da


em Jundiaí (SP), a afinação da produ- Coca-Cola FEMSA, que topou a par-
ção é milimétrica. Claro, se você tem ceria com Igor, Danilo e Ronaldo para
um mercado consumidor de mais de o desenvolvimento de um produto ca-
70 milhões de brasileiros, qualquer paz de cumprir essas promessas, com
desvio pode ser uma grande perda. curto tempo de implantação e que não
Não entrou líquido suficiente na gar- dependesse de equipamentos.
rafa? Não passa na qualidade. En-
trou rápido demais e o refrigerante Controlando a estabilidade de um
borbulhou? Descartado. equipamento que enchia 2 garrafas
por segundo, o produto — batizado
Até que um trio de jovens foi bater de Leaf – garantia que a quantida-
à porta deles, em 2006. e se existis- de certa de líquido em uma pressão
se uma solução para diminuir a in- exata seria dispensada em cada en-
Da esquerda para direita: Igor, Ronaldo consistência das máquinas, reduzir vase. Com isso, foram salvos mais
e Danilo, fundadores da I.Systems o desperdício e, com isso, economi- de 500 mil litros de refrigerante e
zar recursos? 100 mil garrafas plásticas. E depois
177_empreender na universidade 4 anos sem vender

de 4 anos de trabalho duro, a I.Systems vando a responsabilidade de se formar, ender dentro de alguma corporação. Na
não só teve sua validação, como ganhou mas sem sentir tanto prazer pelos estu- época, conta, não havia essa onda de lean
seu primeiro cliente. dos ou alcançar um desempenho aca- startup, Steve Blank, nada disso… mas o
dêmico excepcional. Até que iniciou impulso veio de uma reflexão mais pro-
Inteligência Artificial uma matéria sobre algoritmos genéti- funda. Pensava:
Desde adolescente Igor Santiago que- cos. Tinha bem mais matemática que
ria ser cientista. Dizia pela escola que genética, mas o tema o inspirou pela “Eu aplicava menos de 5% do
criaria uma nova forma de gerar ener- abordagem, que apresentava uma for- que eu sabia nos projetos que
gia baseada no campo eletromagnético ma de dar criatividade ao computador. eu fazia. Será que eu não con-
da Terra. Seu professor de física acabou seguiria gerar algo onde eu
tendo que explicar por que o plano não Foi a primeira matéria de Inteligência Ar- poderia aplicar tudo?”
/ daria certo. O menino ficou desanima- tificial que Igor cursou. Depois dela, vie-
Foi a primeira do, mas nem por isso desistiu do cami- ram outras 12. “Me encontrei”, ele diz. Foi quando Igor fez um SWOT anali-
matéria de nho da ciência. sando onde poderia aplicar técnicas
Logo em seguida, foi estagiar em um de Inteligência Artificial que conhecia.
Inteligência Anos mais tarde, Igor acabou se mudan- instituto de pesquisa onde também tra- Vale dizer, antes da faculdade, ele pen-
Artificial do de Salvador para Campinas para cursar balhavam seus futuros sócios, Danilo e sava que AI só servia para criar robôs.
que Igor engenharia da computação na Unicamp. Ronaldo. Conversando com os dois amigos, con-
Apesar de reconhecer o alto nível da uni- cordaram desde o início que queriam
cursou. Depois versidade, as aulas não eram tão estimu- De ideia a produto, criar algo grande, que pudesse ter alto
dela, vieram lantes quanto ele esperava — considerou de produto a empresa impacto. Avaliaram diversos merca-
outras 12. “Me voltar para casa, mas o pai era categórico: Durante o estágio, abriu na Unicamp a dos, que iam desde reconstrução facial
“Você entrou, agora tem que sair”. matéria opcional de planos de negócios. a busca na internet — “porque era uma
encontrei”, ele Igor se inscreveu para tentar ser um in- ótima ideia concorrer com o Google”,
diz. De semestre em semestre, Igor foi le- traempreendedor, ou seja, para empre- Igor ironiza.
178_empreender na universidade 4 anos sem vender

Um fator importante na decisão sobre Já que estavam testando o negócio, por ativo apenas o projeto da Coca-Cola. O
qual segmento investir era que o mer- que não também testar a sociedade? “elefante na sala” estava ali para todos:
cado os permitisse avançar não pela Concluíram que se, por 4 anos, eles se “Se a gente não implantar alguma coi-
quantidade de marketing que faziam, aguentassem 24 horas por dia, não ha- sa até o primeiro semestre de 2011, não
mas pela qualidade do produto que veria por que não aguentar empreender vai dar certo”.
vendiam. Claro, dinheiro para espaço junto dali em diante.
em mídia eles também não tinham so- Para reverter a situação, o primeiro pas-
brando. Em meio às pesquisas, focaram Cadê os clientes? so foi tentar entender por que o cliente
a atenção na indústria. Foi preciso resiliência, claro, não só den- não via valor no produto. Com base nas /
tro de casa, como na rua. Apesar de a descobertas, foram ajustando os merca- “Quem são
No campo de processamento industrial, Coca-Cola FEMSA ter logo topado par- dos-alvo e afinando o discurso de ven-
há décadas não se via inovação. Além ticipar do processo, os empreendedo- da. “Foi um processo de busca, mas não vocês pra
dos já citados problemas com o tempo res passaram também 4 anos lidando estruturado”, comenta Igor, “se a gente fazer um
de implantação de sistemas e a depen- com centenas de afirmações negativas. tivesse planejado e aprendido mais rá- negócio
dência de equipamentos, todos os desa- pido com a interação com os clientes,
fios de desperdício de recursos também “Quem são vocês pra fazer um negócio não passaríamos esse sufoco”. melhor que
já eram conhecidos. Foram ao ataque melhor que a siemens?”, não paravam a siemens?”,
com o propósito de fazer com que as de escutar de terceiros, “eles têm mil Ainda assim, deu certo. Outros clientes não paravam
máquinas conseguissem replicar um co- doutores na alemanha.” entraram para o portfólio e a motivação
nhecimento humano, tomando decisões do trio deu uma guinada. Mas a virada de escutar
sozinhas e mais rapidamente para au- Essa descrença foi influenciando tam- de chave mesmo aconteceu em 2013. de terceiros,
mentar seu próprio desempenho. bém as vendas. Em 2009, os três sócios “eles têm mil
já estavam 100% dedicados à I.Sys- Investimento de alto
Para acelerar o desenvolvimento do sof- tems, mas ninguém se interessava em impacto doutores na
tware, os três resolveram morar juntos. comprar. No ano seguinte, mantinham Nos primeiros dois anos de existência alemanha.”
179_empreender na universidade 4 anos sem vender

do Fundo Pitanga, mais de 580 projetos 450. Queremos focar em ter uma equi- “A empresa de vocês vai ser
chegaram à mesa do responsável por pe de pessoas A+, de alta performan- do tamanho da ambição que
encontrar negócios nos quais investir. ce”, complementa Igor. Hoje, a I.Sys- vocês têm. “Até agora a gen-
Entre redes de cafés e novas platafor- tems tem quase 40 colaboradores e te continua com essa pegada
mas sociais, estava a I.Systems. vem apresentado um crescimento de de ser uma empresa brasileira
pelo menos 100% ao ano. com competitividade global”,
A empresa se tornou a primeira investida diz Igor.
/ do fundo. “Nós já éramos organizados, De Campinas para o mundo
Ainda assim, mas quando viramos S.A., montamos Desde a fundação da empresa em 2007, E completa com o exemplo de Fabricio,
deu certo. conselho, passamos a ser auditados… Igor destaca o papel fundamental de que também é baiano, ex-aluno da Uni-
subiu a barra da governança”, conta mentorias que tiveram que que ajuda- camp e que tem uma história de suces-
Outros clientes Igor. Os novos acionistas também de- ram a prepará-los para o crescimento. so que atravessa diversos países. “É um
entraram para ram força para amadurecer a gestão, Em especial, Fabricio Bloisi, fundador espelhamento. Se ele conseguiu, a gen-
o portfólio e a que passou a seguir critérios ISO 9001, da Movile, os inspirou a pensar global- te também é capaz.
solidificar os processos e aumentar o mente.
motivação do time.
trio deu uma No 66º Painel Internacional de Seleção
guinada. Mas Sobre esse último ponto, os empreen- (ISP) em Boston, EUA, Igor, Ronaldo e
dedores ressaltam a importância de dar Danilo foram aprovados como Empre-
a virada de atenção à cultura da empresa, antes de endedores Endeavor e instigados sobre
chave mesmo pensar em ampliar a equipe. “Não es- o mesmo tema: “Vocês têm um produto
aconteceu em tamos preocupados em passar de uma que pode ser aplicado em todo o mun-
equipe de 10 pessoas para 100, depois do”, diziam os avaliadores.
2013.
180_empreender na universidade acredite no impossível

DAY 1

ACREDITE NO
IMPOSSÍVEL
Quando dizem que algo é impossí- Dos tempos de startup ao primei-
vel, Romero Rodrigues vai atrás de ro investimento, até a consolida-
provar o contrário. O empreende- ção do negócio como um case de
dor que fundou o Buscapé conta, sucesso, Romero nunca deixou de
neste palestra inspiradora, como se acreditar no modelo do Buscapé. A
fortaleceu para enfrentar os obstá- companhia foi envolvida em uma
culos na sua trajetória. das maiores transações de empre-
sas digitais da história do Brasil.
181_empreender na universidade de recife para o mundo

DE RECIFE PARA
O MUNDO
Um projeto de faculdade que se transformou em um negócio
de tecnologia disruptiva: conheça a história da In Loco Media.

Seis amigos estavam na batcaver- que a gente nem se dê conta. O que


na, localizada embaixo da escada hoje a energia elétrica é para nós, a
do centro de informática da Uni- computação seria para o futuro.
versidade Federal de Pernambu-
co, discutindo um trabalho. André A pessoa entra no banco, e o apli-
Ferraz estava sentado em cima da cativo do internet banking abre
mesa assobiando quando, de re- automaticamente. Entra no sho-
pente, soltou uma ideia: e se a gen- pping e já recebe o mapa das lo-
te criasse uma plataforma ubíqua jas. Ou entra no restaurante, e o
de informação? cardápio abre automaticamente.
Assim, nessa plataforma, seria
André falava em dar vida a um con- possível capturar a geolocalização
ceito muito estudado por seu pai: o das pessoas e, a partir dela, servir
Fundadores da In Loco. Da esquerda para da computação ubíqua, que acredi- por meio do celular o melhor con-
a direita: Alan, André, Denyson e Lucas ta que a computação estará em to- teúdo ou serviço para aquele local
dos os lugares ao nosso redor, sem onde ela está.
182_empreender na universidade de recife para o mundo

Os cinco amigos olharam As inspirações de André a sua grande contribuição para o mun-
para ele embasbacados. Mas André cresceu ouvindo seu pai falar de um do, decidiu seguir o caminho esperado e
decidiram apostar na ideia. futuro em que a tecnologia é tão avança- fazer faculdade. Lá, conheceu cinco dos
da que chega a ser proativa, enquanto via seus futuros sócios.
Aquela ideia evoluiu e deu origem à In Loco na história de sua mãe a referência de tra-
Media, empresa de Recife que desenvol- balho e dedicação, de uma mulher que já Os oito cientistas
veu uma tecnologia inédita no mundo enfrentou uma situação de pobreza, tra- Airton Sampaio e Gabriel Falcone sempre
para localização em ambientes fechados balhou como feirante e que hoje é gerente foram do tipo que não para nunca, escre-
/ — onde passamos 80% do nosso tempo. de uma empresa de tecnologia. vendo quilômetros de linhas de código
Hoje, sete A partir dessa tecnologia, é possível deter- em um único dia. No caso de Airton, vale
minar a intenção do consumidor, os locais Viver uma infância com a presença de duas até usar o mouse com o pé para ganhar
anos depois que ele visitou e as marcas com quem se figuras tão fortes e inspiradoras é um bom tempo na digitação.
daquela relacionou para, então, oferecer a publici- jeito de começar sonhando grande des-
conversa na dade mais assertiva para o seu momento de pequeno. Principalmente quando você Alan Gomes é o engenheiro que carre-
de compra — e identificar se ele chegou a passa os dias assistindo ao Laboratório de ga a combinação única entre o pragma-
batcaverna, entrar na loja anunciada, por exemplo. Dexter, em que um pequeno cientista cria- tismo e o bom relacionamento com as
a In Loco va invenções malucas dentro do quarto. pessoas, responsável pela área de tec-
já impacta Hoje, sete anos depois daquela conversa nologia da In Loco e pelas disrupções
na batcaverna, a In Loco já impacta mais A soma dessas inspirações fez de An- que estão por vir. Já Lucas Queiroz é o
mais de 50 de 50 milhões de usuários com publici- dré uma criança muito agitada e inquie- Megamente do time, tão versátil que já
milhões de dade mobile. ta, que já sabia desde pequena que não fez parte dos times de tecnologia, admi-
usuários com conseguiria viver dentro das regras e dos nistrativo e financeiro — como CFO da
Como essa história se desenrolou de um padrões que existem por aí. Mas, como empresa — para agora partir para um
publicidade trabalho teórico para um negócio de alto ainda não tinha uma visão clara do que novo desafio: cuidar da segurança dos
mobile. crescimento? Vamos do início! faria, do que seria o seu rompimento e dados dos usuários.
183_empreender na universidade de recife para o mundo

Denyson Messias tem a visão de negó- Decidiram, então, focar nos shoppin- seis passaram dias e noites trabalhando,
cio, o único do grupo com experiência gs. De um lado, ofereciam um aplicati- de segunda a segunda, para desenvolver
profissional — 4 meses de estágio na vo com mapa e promoções das lojas e, a tecnologia que tanto sonhavam. Na
Motorola. Hoje, é o COO da In Loco. do outro, monetizavam o negócio com época, não tinham nem CNPJ.
a venda de relatórios com dados de uso
Em 2012, dois novos cofundadores en- para a administração do shopping. Eles “A vantagem de ter sete sócios
traram para a sociedade: Júlio Rangel e também ofereciam espaços publicitá- em uma startup é que você
Eduardo Martins, que tinham acabado rios para os lojistas no aplicativo. tem 6 pessoas trabalhando
de concluir uma pós-graduação em de- continuamente com muita
sign. Os dois toparam largar seus em- A grande sacada surgiu quando eles fo- garra e determinação sem
pregos para apostar no sonho dos seis ram atrás de uma tecnologia capaz de receber nada por meses.”
universitários e foram os responsáveis capturar com precisão a localização de
pela criação de toda a interface do apli- uma pessoa em ambientes fechados. Mesmo sem ter o produto validado,
cativo. Mas, adivinha? Não encontraram nada nem receita ou cliente pago, mas com
parecido com isso no mercado. Foi aí que uma ideia muito ambiciosa e uma tec-
Da computação ubíqua ao os seis descobriram uma oportunidade. nologia disruptiva nas mãos, era hora
aplicativo para shoppings da In Loco buscar investimento. Nesse
Quando os empreendedores chegaram O quarto de Dexter e período, entre 2011 e 2012, os meninos
ao quinto semestre da faculdade, aque- os oito CPFs empreendedores já participavam de
le trabalho apenas teórico — o conceito Se na história do Laboratório de Dexter uma série de competições de startups.
de computação ubíqua de que falavam as maiores invenções aconteciam dentro Essas aparições abriram para André
na batcaverna — teria que descer das do quarto dele, com a In Loco não foi di- uma porta na Universidade Stanford,
Airton mexendo no mouse com nuvens para o chão e se transformar em ferente. Mas a história é menos românti- para realizar um bootcamp em 2012.
o pé enquanto digita um negócio viável no Projetão, a cadei- ca do que parece. No quarto de Alan, em
ra de empreendedorismo da UFPE. um espaço de 25 metros quadrados, os Foi ele mesmo quem escreveu o relea-
184_empreender na universidade de recife para o mundo

Momento da assinatura do
contrato de investimento

lor que André pediu. Mas é como dizem: Os horizontes se ampliaram


mire na Lua porque, se você errar, ainda Com o primeiro investimento, começava
assim acertará as estrelas. O investidor uma nova fase da In Loco. Conversando
que entrou em contato com eles sabia do com várias startups, eles perceberam
potencial da tecnologia de geolocalização que se conseguissem inserir a tecnolo-
e viu a oportunidade de criar algo muito gia da In Loco dentro de aplicativos, em
grande e estratégico para o fundo. vez de ter um próprio, seria possível co-
letar um volume maior de dados e ven-
Negociações feitas. Os empreendedores der esses relatórios para os shoppings.
acabaram saindo de lá com uma propos-
ta de investimento fechada, e a startup Eles já tinham tudo nas mãos: um fun-
se para os jornalistas contando a histó- valendo um pouco menos do que André do que apoiava e cuidava da retaguarda,
/ ria, até que a notícia saiu no site Startupi. propôs, mas ainda sim sete vezes mais aplicativos com potencial de parceria e a
Eles já tinham tudo nas Quem viu a matéria foi um investidor co- do que a proposta inicial do fundo. tecnologia cada vez mais precisa.
mãos: um fundo que nhecido que chamou os seis para conver-
sar e propor uma parceria com o fundo Inacreditável, não é? O pessoal da Junta Co- Mas, mais uma vez, assim que o pro-
apoiava e cuidava da de investimentos que ele administrava. mercial de Recife também achou. Tanto que duto foi lançado, nada aconteceu. Não
retaguarda, aplicativos questionaram o valor do investimento vá- conseguiram vender para ninguém. Ali-
com potencial de No papo, veio a pergunta sobre o valor da rias vezes, sem aceitar que um grupo de oito ás, para não dizer que não conseguiram
startup. André não fazia a menor ideia. universitários tivesse uma empresa nesse nem um real, tinham sim um cliente.
parceria e a tecnologia Mandou uma proposta. O pessoal do fun- valor. O impasse foi tanto que o investimen- Um shopping que pagava R$ 150 por
cada vez mais precisa. do tinha imaginado dez vezes menos o va- to só caiu na conta em fevereiro de 2013. mês para obter os relatórios.
185_empreender na universidade de recife para o mundo

Fotos do
escritório

Mudando a perspectiva e o Foi aí que eles tiveram a grande sacada:


modelo de negócio criar uma inteligência em cima da geolo-
Nesse momento, o fundo ajudou mais calização de ambientes fechados. eles po-
uma vez. O relacionamento com os ou- dem gerar anúncios em aplicativos mobile
tros empreendedores investidos fez os e rastrear se a pessoa que viu o anúncio
sócios conhecerem mais o mercado de no celular, foi visitar a loja.
e-commerce. O que eles perceberam é
que a maior vantagem do comércio ele- Agora sim parecia certo, esse era o cami-
trônico em relação ao varejo físico é a nho para a In Loco virar um negócio ren-
capacidade de analisar o usuário. Que tável. Mas, para isso, primeiro eles teriam
sites ele visitou, quanto tempo passou que jogar tudo o que já tinha sido criado
visitando, em que itens clicou, etc. É isso fora e começar do zero.
que faz com que as lojas online sejam
mais assertivas em seus anúncios, com Prova de fogo: o time sob pres-
itens relacionados ao que o usuário já são e o CEO na fogueira
buscou. Lá se foram outros meses de trabalho du-
rante o ano de 2014, escrevendo o código
Essa possibilidade de rastreio não existe de uma tecnologia completamente nova,
no ambiente físico. Mesmo que o varejo que ainda não existia em nenhum lugar do
offline seja dez vezes maior que o online, mundo, e que seria lançada em setembro
não existia até então um jeito de saber do mesmo ano. Se o desafio do time pare-
se a publicidade levava, de fato, a pessoa cia grande, a batalha que André enfrenta-
para a loja. va era ainda maior.
186_empreender na universidade de recife para o mundo

Nesse período, aumentou a pressão do O ovo ou a galinha no, principalmente por ele ter um aplica-
fundo por geração de receita e lucro. Além de lidar com essa crise, André ti- tivo tão grande e formas restritas de mo-
Muitas startups foram fechadas, e An- nha mais uma preocupação: o famoso netizá-lo. Negócio fechado.
dré acompanhou de perto esse processo dilema do ovo ou da galinha. Ele sabia
com os outros empreendedores, saben- que só conseguiria vender publicidade Com o aplicativo parceiro e o primeiro
do que — mais cedo ou mais tarde — isso se tivesse um aplicativo parceiro com es- cliente conquistado — uma escola de in-
também atingiria a In Loco. paços para anúncios. Ao mesmo tempo, glês — os resultados foram imediatos: os
um aplicativo só seria seu parceiro se ele anúncios com geolocalização tinham dez
/ Os investidores acabaram exigindo que já tivesse anunciantes disponíveis. vezes mais taxa de abertura do que os
Os investidores o salário de todos os fundadores fosse anúncios de Google e Facebook. No se-
cortado, o time envolvido no projeto, de- Para resolver esse impasse, foi procurar gundo mês, a empresa que dava prejuízos
acabaram mitido, e o escritório da empresa, devol- ajuda. Começou a copiar e colar a mes- começou a lucrar — pela primeira vez.
exigindo que o vido. ma mensagem em grupos de desenvol-
salário de todos vimento mobile no LinkedIn, Facebook e Apesar do pouco tempo de operação, a
Mas André não aceitou e negociou até o diversos fóruns, até que um conhecido empresa já começa a colecionar boas his-
os fundadores fim com os investidores. Ele sabia que os indicou o dono de um aplicativo com 2 tórias. Em um trabalho para a Mondelez,
fosse cortado, resultados viriam assim que o novo pro- milhões de usuários. André conversou dona das marcas Oreo, Trident e Lacta, a
o time envolvido duto fosse lançado em setembro, mas com ele, mas o empreendedor parecia conversão na gôndola dos supermerca-
até lá, não mexeria em nada que pudes- desconfiado. Ele decidiu ir até lá. Pegou dos aumentou 30% entre os consumi-
no projeto, se afetar o trabalho do time. Para o em- um voo para Brasília e levou o empreen- dores impactados pelos anúncios da In
demitido, e preendedor, esse foi um dos momentos dedor para almoçar. Loco. Já para a Hyundai, a tecnologia da
o escritório mais difíceis na história da empresa, mas In Loco mapeou as pessoas que entra-
que, com certeza, definiu os pilares da No papo, o empreendedor vendeu a em- vam nas concessionárias de concorren-
da empresa, cultura de apoio e colaboração entre os presa como se estivesse falando com um tes e oferecia a elas um test drive gratui-
devolvido. sócios e todo time. investidor. Prometeu crescimento e retor- to na concessionária da Hyundai.
187_empreender na universidade de recife para o mundo

Planos para o novo presa. Começou com a vontade de criar


laboratório algo que não existia, sem nem mesmo
Hoje, 7 anos depois do projeto de facul- saber como. Agora, o objetivo é construir
dade, eles têm acesso a uma base com uma empresa global.
mais de 50 milhões de usuários e geram
um volume de dados valiosíssimos sobre Eles contam com uma equipe muito ca-
onde essas pessoas estão, que locais fre- pacitada para ampliar o impacto do ne-
quentam e que caminhos fazem. gócio e se tornar uma empresa global. O
cientista-chefe, primeiro funcionário da
As oportunidades que se abrem são tão In Loco, por exemplo, era uma grande re-
infinitas que os empreendedores decidi- ferência em Recife e tinha feito sua carrei-
ram criar uma plataforma colaborativa ra no Google, trabalhando na Califórnia.
em que outras empresas podem usar es- Cansado dessa rotina, decidiu voltar para
ses dados para criar novos negócios. Está a cidade para escrever romances. Mas foi
aí o efeito multiplicador. em um almoço com André que ele topou
se juntar aos oito cientistas. Talvez por-
Por trás desse sonho, existe uma vonta- que quisesse mesmo saber o que é tra-
de bem forte compartilhada pelos oito de balhar dentro do Laboratório de Dexter.
criar a maior empresa de tecnologia do
Recife, do Brasil e — por que não? — do
mundo.
In loco Media em premiação de
A história de desenvolvimento da tecno- Cannes. Ao lado, competição de
logia se confunde com a da própria em- tecnologia em Berlim
de recife para o mundo

REVOLUCIONAR
EVENTOS
A história de Gabriel Benarrós e Marcelo Bissuh com a
Ingresse é recente, mas cheia de aprendizados. Conheça os
empreendedores por trás dessa startup de alto impacto.

“De repente, eu não era mais o me- jantar logo nas primeiras semanas,
lhor da turma em nada”. Para Gabriel conversou com Mike Krieger sobre
Benarrós, acostumado a ter exce- um aplicativo que estava desenvol-
lente desempenho acadêmico des- vendo — um tal de Instagram. No
de criança, a realização veio como ano seguinte, conheceu Evan Spie-
um choque. De Stanford já tinham gel, cofundador do Snapchat. Até
saído empreendedores à frente de Zuckerberg ele viu passando, num
empresas como Google, Netflix e café da manhã.
PayPal. Até presidente dos EUA ti-
Gabriel à esquerda nha no hall da fama da faculdade. Em vez de colocar esse peso do su-
e Marcelo à direita, cesso sobre suas costas, Gabriel,
fundadores da Ingresse Era inevitável se comparar. Em um que deixou Manaus como bolsis-
189_empreender na universidade revolucionar eventos

ta da Fundação Estudar, usou o ambiente como triste porque sua namorada tinha viajado. Com colocar o negócio para andar em Manaus. Arras-
inspiração para criar a Ingresse, uma plataforma tudo comprado para a preparação, um grande tou junto o amigo Marcelo Bissuh, com quem já
tecnológica com a missão de facilitar a compra e grupo de convidados desistiu de comparecer. vinha trocando ideias, e que estava na metade do
venda de ingressos online e soluções de ponta a curso de ciências da computação na Universida-
ponta para qualquer tipo de evento. Teriam um prejuízo de US$ 5 mil — uma de Federal do Amazonas.
dor no bolso de qualquer univer-
Depois de enfrentarem desafios que vão de adap- sitário — até que tiveram a ideia de Grande aposta
tação da cultura até fraudes financeiras, ele e seu vender os ingressos pela internet. Em Os sócios se conheceram pouco tempo antes,
sócio, Marcelo, conseguiram estruturar uma em- poucas horas, estava tudo esgotado. quando Marcelo trabalhava na empresa de tec-
presa que cresce em uma média acima de 250% nologia do pai de Gabriel. Contratado como es-
por ano. A gambiarra deu tão certo que Gabriel a trans- tagiário, chegou a ser coordenador de produto e
formou em projeto. Depois de terminar a gradu- desenhava soluções para alguns dos maiores e-
Empreendedores em formação ação em economia e psicologia, engatou em um commerce da região.
Foi na própria faculdade que Gabriel decidiu se mestrado também em Stanford. No primeiro dia
dedicar a descobrir seu maior talento. Nesse pro- de aula, na disciplina de formação de empresas de Antes mesmo de entrar na faculdade, no entan-
cesso, desenvolveu habilidades que, mal sabia, tecnologia, formatou a ideia. Seu trabalho final do to, Marcelo já mostrava talento pra coisa. Aos
seriam muito úteis para a carreira empreendedo- curso era apresentar o negócio para investidores. 17 anos, desenvolveu o Audioteste, um softwa-
ra. Participou de diversas atividades extras, que Dessa apresentação, já saiu o primeiro cheque que re que usa inteligência artificial para permitir que
iam das aulas de improvisação teatral aos even- viria a compor um aporte de R$ 2,5 milhões para deficientes visuais completem exames e avalia-
tos que organizou como gestor da comunidade dar início à Ingresse. ções de forma autônoma. Hoje, ele é o arquiteto
da Casa Italiana, residência que dividia com ou- de toda a tecnologia da Ingresse.
tros 60 estudantes. Apesar da proximidade, Gabriel não cogitou co-
meçar no Vale do Silício. Foi incentivado pelo O primeiro escritório da dupla eram, na verdade,
Um dos eventos organizados por ele e os colegas próprio professor do mestrado — que também duas mesas no segundo andar de um posto de
foi uma festa para alegrar um amigo, que estava era seu investidor-anjo — a deixar os estudos e gasolina — espaço cedido pelo pai de Gabriel.
190_empreender na universidade revolucionar eventos

Depois de caçar vários contatos, os dois con- por alguns meses, enquanto recebiam men- lada que ele comprava por R$ 7. Comia uma
seguiram marcar uma reunião com o empre- torias de empreendedores de gigantes norte metade no almoço e outra no jantar, para
sário que estava trazendo Pitbull, artista nor- -americanas. economizar os gastos.
te-americano de hip-hop, a Manaus. Marcelo
conta que o início na capital do Amazonas De mudança pro Sudeste Já para Marcelo, o foco em resolver dores da
teve uma vantagem: a facilidade em conhe- Voltando com a bagagem de aprendizado ao empresa era tão direcionado que não sobra-
cer pessoas e testar hipóteses. Brasil, em 2013 Gabriel e Marcelo se mudaram va tempo para se preocupar com possíveis
para São Paulo. Nessa mudança, eles dizem dores da vida pessoal: “Não tenho amigos
“Nunca vi isso no Brasil, vamos fazer!”, foi a que o mais difícil foi montar o negócio em uma para sair? Vou trabalhar. Não sabia onde era
reação do empresário. cidade completamente nova — do aluguel do o cinema? Vou trabalhar.”
escritório às dificuldades de transporte. “Em
Começaram por uma página simples, que ven- Manaus a gente conhecia tudo. Aqui, precisa- E claro, o time todo ralou muito para che-
deu 2 mil ingressos para o evento em dois dias. mos explorar tudo de novo“, conta Marcelo. garem no modelo atual do negócio: do lado
Depois, o empresário fechou um acordo em que B2C, a Ingresse permite que consumidores
todas as entradas de sua casa de shows seriam A cultura também mudou. Apesar vasculhem festivais, shows, festas, entre ou-
vendidas pela Ingresse. Mas mais do que ven- de aproximadamente 10 pessoas do tros, paguem suas entradas e façam o check
der entradas, queriam que ela se tornasse uma time terem se realocado com eles, -in diretamente pelo aplicativo.
plataforma completa para promover, vender e precisaram recrutar bastante gen-
gerir eventos de todos os tipos, totalmente cen- te e entrar no ritmo da metrópole. Do lado B2B, organizadores e agências têm
/ trada na experiência do usuário. ferramentas para atrair seu público-alvo, além
“Nunca vi isso “A velocidade do trabalho, a forma de con- de um CRM com inteligência de dados sobre
no Brasil, E começou bem: logo de início, Gabriel e Mar- versar… tudo foi adaptado para São Paulo.” o comportamento dos clientes, que também
celo foram selecionados para participarem do Do ponto de vista pessoal, Gabriel e Marce- centraliza todas as atividades deles relaciona-
vamos fazer!”, programa de aceleração do fundo 500 Star- lo a transição teve seus soluços. Vários me- das ao evento em um só lugar. Todo o siste-
foi a reação tups. Essa sim, deu um empurrãozinho em ses Gabriel passou dormindo no sofá de um ma de gestão da Ingresse tem impulsionado a
do empresário. direção ao Vale do Silício. Montaram base lá amigo. Sobrevivia à base de lasanha gonge- venda de seus clientes em pelo menos 25%.
191_empreender na universidade revolucionar eventos

Casca grossa somos uma empresa muito mais calibrada e anos, emigrada do norte do país, a empresa
Chegar lá não foi fácil. Mas com o tempo, o preparada”, diz Marcelo. Mas ainda segun- já tem abrangência nacional, 47 funcionários
que era um problemão antes já não parece do ele, “o desafio maior sempre é empreen- e teve um crescimento médio de 266% nos
tão difícil assim. Pode ser ótimo por um lado, der. O resto são as microetapas pelas quais últimos 3 anos.
mas também significa que pepinos maiores a gente passa para alcançar nosso objetivo”.
estão por vir. Marcelo compartilha: Apesar dos números impressionantes, para
Potencial crescente Marcelo, eles não traduzem o trabalho que é
“Talvez este seja o maior desafio: se condicio- Muito mais gente viu valor na proposta: e.Bri- empreender no dia a dia:
nar a um ambiente sem status quo, se prepa- cks Early Stage, Qualcomm e DGF são inves-
rar mentalmente para o que é inevitável.” tidores. Isso porque, mesmo com uma com- “Tudo que fazemos é para obter resultados
petição alta, a Ingresse apresenta tecnologia de longo prazo. Estamos preocupados em
/ Foi assim com o último grande obstáculo proprietária, parceiros globais estratégicos e criar disruptura.”
“Talvez este que a dupla precisou enfrentar: fraude. No um time altamente experiente.
seja o maior Carnaval, o baque foi forte e a Ingresse aca- O sonho, já se vê, é grande. Além de mos-
bou assumindo prejuízo em vários eventos. Apesar de grande, o mercado de trar para empreendedores brasileiros que é
desafio: se Todo o planejamento financeiro anual foi eventos no Brasil continua ana- possível criar uma empresa de alto impac-
condicionar a prejudicado. Tiveram que falar com muita lógico e informal. Cerca de 70% to fazendo do jeito certo, querem se tornar
um ambiente gente, passar noites em claro pesquisando e dos consumidores ainda compram a plataforma tecnológica absoluta do mer-
desenvolvendo um produto que resolvesse seus ingressos offline. Ou seja, es- cado — assim como empresas icônicas do
sem status quo, o problema. No final, a situação os forçou a paço para crescer não falta. Vale do Silício. Marcelo esclarece: “O que é
se preparar criar novas soluções para o combate a fraude natural quando se quer buscar algo na in-
mentalmente usando machine learning. Gabriel diz que “se todo mundo se concen- ternet? Google. Usar rede social? Facebook.
trasse em gerar valor, ou seja, fazer 2 + 2 = 10, Pensar em evento? Ingresse.”
para o que é “Foi uma canseira. A gente parou de criar du- todos estaríamos em um lugar melhor”. Foi
inevitável.” rante sete meses para focar nisso, mas hoje nisso que eles se empenharam — em quatro
192_empreender na universidade as conexões que movem a vida

DAY 1

AS CONEXÕES
QUE MOVEM A
VIDA
Marcelo Sales é um empreende- Movile, Empreendedor Endeavor, e
dor, e um nerd, e tem muito orgulho fundador da aceleradora de negó-
disso. O primeiro negócio dele foi cios 21212. Sem dúvida, essa é uma
vender suco de uva na rua, e foi aí das histórias mais inspiradoras do
que as conexões começaram a mo- empreendedorismo brasileiro, con-
ver sua vida, até virar fundador da tada com maestria e bom-humor.
193_empreender na universidade as conexões que movem a vida

2000
Primerio Escritório
da nTime,
empresa que
originou a Movile,
com 10m2

2001 2013
Segundo 2002 Parte da equipe
Escritório, na Terceiro Escritório, da 21212 no 3o
incubadora já na Torre do Rio Demo Day
da PUC Sul e Primeiro
time e primeiros
investidores anjos,
em 2002
194_empreender na universidade de recife para o mundo

DESENTORTANDO
OS PREGOS A história de Caio Bonatto, Beto Justus e Lucas Maceno e o
sonho de revolucionar um setor com a Tecverde.

Como na música de Chico Buar- de Caio, tinha apenas uma mesa


que, as casas tradicionais no Bra- de cozinha, 3 cadeiras, um com-
sil tinham apenas “tijolo com tijolo putador para três pessoas, uma
num desenho lógico”. Mas os es- impressora e um scanner.
tudantes de engenharia Caio Bo-
natto, Beto Justus e Lucas Maceno Esse era o escritório da empresa que
pensavam em outro ritmo e que- pretendia revolucionar a construção
riam erguer “paredes mágicas”. civil, um dos setores mais conserva-
dores do país. Ali dentro, o que fa-
Com ideias inovadoras e sustentá- zia toda a diferença eram as mentes
veis, eles acabaram criando a Tec- brilhantes de jovens empenhados
verde, pioneira na construção de em realizar um sonho grande. Mas
casas com tecnologia wood frame no meio do caminho, estavam mui-
Da esquerda para a direita: Caio, no Brasil. O começo foi pratica- tas noites em claro, trabalho duro,
Lucas e Beto, fundadores da Tecverde mente em uma garagem - a sala broncas homéricas de parceiros e
improvisada, emprestada pelo pai até uma boa dose de sorte.
195_empreender na universidade desentortando os pregos

Reciclando pregos nas ria e teve um verdadeiro insight, que sur- que você precisa realizar para chegar lá.
obras do pai giu quando analisou a vivência de obra, Por fim, Ayrton Senna foi um ídolo desde
Filho de um empresário da construção a falta de padronização de processos, o a infância e representou uma inspiração
civil, Caio Bonatto acompanhava o pai excesso de prazos e de resíduos e a com- quase espiritual. “Ele tinha uma vontade
pelas obras: “Meu primeiro brinquedo plexidade da mão de obra. Juntou tudo implacável de ser campeão, não só de
foi um balde e um martelo, ia catando isso com a experiência na universidade ser bom”, diz Caio.
pregos no chão e depois ficava em casa e percebeu que poderia fazer diferente.
/ desentortando, colocando de novo no Inquietações compartilhadas
“Meus pais baldinho. Uma parte pregava na casa Caio conta que ninguém falou “vai que Incomodado com seus pensamentos e
mesmo e a outra voltava pra obra”. dá”, mas todos falaram “faça o melhor influenciado pelo contato com as formas
trouxeram que pode dar”. Teve três grandes inspi- mais sustentáveis de construir, que co-
uma bagagem A vida inteira Caio quis ser engenheiro rações. A primeira foi dentro de casa: nheceu na Nova Zelândia, Caio passou
de valores e, civil, mas, depois do segundo ano de fa- a conversar com os amigos na Universi-
culdade, sentia verdadeira aversão ao “Meus pais trouxeram uma bagagem de dade Federal do Paraná, que acabaram
quando você curso. Parou tudo e foi para a Nova Ze- valores e, quando você tem um negócio se tornando os sócios da Tecverde.
tem um negócio lândia. Lá, passou um ano trabalhando que tem uma causa, se não tiver valores,
que tem uma de barman a limpador de obras e esta não consegue engajar ninguém”. Beto Justus estudava na mesma classe
foi sua única experiência profissional an- e já era amigo de surf e futebol. O pai
causa, se não tes de empreender: “Nunca trabalhei na Seu pai também tinha métodos e conse- de Beto também tinha uma construtora.
tiver valores, construtora do meu pai, participava de guia realizar as coisas com planejamen- Desde os 5 anos de idade, ia nas obras.
não consegue reuniões, discutia projetos, ia em obra, to. Além deles, seu avô trouxe uma no- Nunca foi aquela criança que pretende
mas nada formal”. ção muito forte de disciplina e de nada ser jogador de futebol, ainda pequeno
engajar adianta você ter um sonho grande se já queria ser engenheiro. “Provavelmen-
ninguém”. Na volta, retomou o curso de engenha- não tiver comprometimento em tudo te trabalhar com meu pai e até tocar os
196_empreender na universidade desentortando os pregos

Em vez de engenheiro, quando criança, Lu- Amigos, amigos,


cas queria ser astronauta. Chegou a trocar negócios também
de escolas para estudar para o ITA. Desis- Com todo aquele amor que tinham pela
tiu da carreira quando foi estudar no Cana- construção civil, os sócios se perguntavam
dá: “Descobri que era muito medroso para por que no Brasil era tão arcaico, por que
ser astronauta”. Foi ao participar de uma ainda estavam empilhando tijolo e desper-
palestra na empresa canadense de enge- diçando tanto material. “A gente foi estu-
nharia de tráfego e se encantou com a área dando e a coisa foi acontecendo, como a
que decidiu cursar engenharia civil. O con- inovação acontece mesmo. Tudo começou
vite de Caio foi motivado porque o primo com uma pergunta”, relata Beto.
Caio e Beto apresentando negócios”, conta. Mas logo no início do era conhecido por ser muito inteligente.
sua primeira casa curso, os planos mudaram nas conversas Os garotos abriram mão de carreiras pro-
sobre novas tecnologias, quando viram as Fora o trio, Pedro Moreira estudava arqui- missoras e continuaram empenhados em
casas construídas em outros países. tetura, entrou na sinergia e acabou se tor- pesquisar sistemas construtivos no mundo
nando um dos sócios fundadores. Em co- todo. Lucas, por exemplo, deixou um está-
/ Já com Lucas Maceno, o encontro foi dife- mum, todos tinham a mesma inquietação gio duas semanas depois, calculando que
No último ano rente. “Eu tinha um primo chamado Caio de descobrir novos processos construti- em aproximadamente 3 meses o negócio
de faculdade, em que eu nunca tinha visto na vida”, conta Lu- vos. Alguns anos depois, José Márcio Fer- já daria retorno financeiro. Demorou pelo
cas. “Saí uma noite com outro amigo meu, nandes, ex-diretor de motores da Volvo, menos 3 anos. “Eu tive que pedir dinheiro
2009, abriram a que também era amigo dele, e a gente co- ingressou na sociedade e agregou a expe- emprestado, viver à base de dormir mais
empresa. meçou a se falar”. riência de produção industrial. cedo para não precisar jantar”.
197_empreender na universidade desentortando os pregos

Além de emprestar a sala, o pai do Caio ofereceu Beto comenta a reação dos professores quando
uma ajuda de custo para os meninos. “Se não fos- falavam em tornar o setor mais sustentável e
se isso, eu teria que ter desistido. Era o que me industrializado:
mantinha no final das contas, tive muita sorte
nesse aspecto e tanto meus pais como a namo- “Era visto como um bando de moleque louco.
rada tiveram muita compreensão”, conta Lucas, Sempre parecia que a gente estava fazendo
que, na ocasião, tinha apenas 21 anos de idade. algo que, se fosse dar certo, ou alguma em-
presa grande já teria feito ou uma empresa de
Diferente dos amigos, ele não tinha referências fora já teria vindo pra cá fazer. Diziam que eram
de empreendedorismo. Até conversar com Caio, muitas variáveis para adaptar à cultura do bra-
não tinha perspectiva nenhuma de ser empre- sileiro e desenvolver uma cadeia de insumos.
Equipe Tecverde, endedor. Para ele, foi importante não conhecer Não tivemos nenhum apoio na universidade,
em 2010 . tanto dos perigos pelo caminho. cada um apoiava o outro e botava a mão na
Ao lado,1o
escritório da massa”.
empresa “A gente foi um pouco sem noção. Se
fosse alguém mais calejado, talvez Quando se formaram, todos os amigos come-
nem tivesse começado.” çaram a trabalhar em grandes empresas e a ga-
nhar altos salários. Mas o sonho grande de Beto
Apesar de ser um construtor tradicional, o pai acabou se mostrando melhor que a encomen-
de Beto nunca fez pressão quando o filho re- da: “O máximo que eu pensava era em ter uma
solveu seguir novos caminhos, a família intei- empresa do porte do meu pai, em termos de
ra apoiou, mas o pai foi um verdadeiro espelho, volume de obra e de padrão de vida, mas isso
com quem ele trocou mais ideias e quem aca- tudo ficou secundário e a causa passou a ser
bou incentivando a ser empreendedor. muito maior”.
198_empreender na universidade desentortando os pregos

Pedro, Caio e Lucas


na montagem da
primeira casa

Do projeto ao telhado, mas brasileiras. Desenvolveram um


uma jornada de heróis plano de negócios, de fábrica e inova-
O grupo começou estudando tecnolo- ram também no processo de compra,
/ gias no mundo todo e os processos uti- com um sistema onde as pessoas po-
lizados na Nova Zelândia, Canadá, Es- diam comprar a casa pelo site, escolher
Nessa época, o tados Unidos e Alemanha. Finalmente, um modelo, personaliza-lo e sair com
investimento o que viabilizou a transferência de tec- um orçamento pronto. Uma verdadeira
mínimo que nologia para o Brasil foi uma parceria revolução no mercado. Daria certo?
com a Federação das Indústrias do Para-
se falava na ná (FIEP) e o Ministério da Economia do Uma fábrica de brinquedo?
Alemanha Estado alemão de Baden-Württemberg. Depois de um ano de estudos, captaram
para montar os recursos financeiros com a família e
Conseguir assinar esse acordo foi sig- amigos para montar a fábrica. Os for-
uma fábrica de nificativo, porque de todos que parti- necedores contribuíram com o primeiro
casas era de ciparam do projeto, eles eram os mais estoque, interessados em desenvolver
R$ 10 milhões a jovens, nunca tinham faturado nada e o mercado interno diante da crise ame-
eram a menor empresa. “A gente era só ricana que reduziu a exportação. O que
R$ 15 milhões, o CNPJ”, lembra Caio. faltava para começar, eles conseguiram
mas eles com um recurso de R$ 120 mil do Prê-
conseguiram Na Alemanha, conseguiram mostrar mio PRIME da FINEP.
que podiam ser o piloto e trabalharam
juntar apenas duro na adequação e transferência de Nessa época, o investimento mínimo
R$ 350 mil. tecnologia à realidade, cultura e nor- que se falava na Alemanha para mon-
199_empreender na universidade desentortando os pregos

tar uma fábrica de casas era de R$ 10 milhões so ponto de vista. E ele gritou ‘no, no, this is a “Não é preciso você ter um cenário ideal e as
a R$ 15 milhões, mas eles conseguiram juntar toy! Isso é um brinquedo, é um lixo! Oh my God, condições perfeitas para superar um desafio gi-
apenas R$ 350 mil. meu filho de cinco anos brinca com uma dessas’, gantesco. Não é preciso esperar ter todo o mer-
e esbravejava chutando o pé da máquina. Ele fi- cado pronto, ter todos os equipamentos, todos
Com recursos tão escassos, eles precisaram cou desesperado, porque pensou que a nossa os recursos financeiros e humanos para come-
cortar quase tudo. Veio uma única máquina da era melhor que a russa, mas a nossa era uma çar um novo projeto, para implantar uma nova
Alemanha, subsidiada pelo fornecedor apenas fábrica com equipamentos domésticos”. empresa, desenvolver uma inovação. É possível
para demonstrar a tecnologia. No mesmo dia começar com muito pouco”, conta Caio.
da inauguração, foram avisados que chegaria Para completar a história, das vinte pessoas
uma delegação alemã para fazer o treinamento contratadas, só cinco apareceram, porque era o As regras fecham portas,
da Tecverde e dar início à produção. Passaram “boom” da construção civil e as oportunidades mas a sorte mora ao lado
toda a madrugada finalizando a montagem das estavam pipocando. Então, sem equipe e com Depois de montar a fábrica e produzir a pri-
máquinas e, ainda sem dormir, foram buscar a um alemão furioso como treinador, o que eles meira casa, os sócios acharam que tudo estava
delegação no aeroporto. fizeram? Começaram a trabalhar, eles mesmos, resolvido, mas não conseguiam vender e des-
na linha de produção – sócios, mulher, namo- cobriram que o financiamento de casas com
Os alemães tinham acabado de visitar uma fá- rada, irmão… Um desafio gigantesco, que en- tecnologias inovadoras era proibido no Brasil.
brica na Rússia. Caio lembra bem da conversa frentaram varando madrugadas. Foi quando começaram um trabalho vital para
no caminho, em que diziam que “os russos são a sobrevivência. Bateram na porta de todos os
muito burros, amadores”. Mas Caio brinca que Hoje, eles têm orgulho de dizer que consegui- bancos, mas não conseguiram atenção.
esse conceito de estupidez mudou quando en- ram, com muito pouco, o que todos achavam
traram na fábrica deles: “O alemão viu a má- ser impossível. Implantaram a primeira fábrica “Com o mercado bombando, ninguém ia parar
quina mais cara que a gente tinha comprado e de wood frame no Brasil e produziram a pri- para ouvir a conversa de uns malucos, uns piá,
falou: ‘what is this?’. meira casa industrializada, não com o investi- como a gente fala em Curitiba”, lembra Caio.
mento esperado de R$ 10 milhões, mas com
Bom, aquela era a máquina imponente, do nos- os recursos que estavam disponíveis. Até que um dia, em um evento na Federação
200_empreender na universidade desentortando os pregos

das Indústrias do Paraná, a sorte nharam escala quando entraram no Mas o segredo, eles revelam, foi fo-
bateu à porta, ou melhor, sentou na Programa Minha Casa Minha Vida. car em gente e, desde o início, tra-
cadeira ao lado. zer pessoas que compartilhavam
Cada momento, um novo dos mesmos princípios que eles.
Caio começou uma conversa com desafio Podia faltar experiência, mas tive-
o vizinho de auditório. Contando Além de implantar um processo ram o mérito de reconhecer que
sobre a Tecverde e compartilhan- inovador num mercado tradicional e não tinham todas as competências
do seus desafios, ao final do papo, vencer as barreiras do financiamen- e investiram em uma equipe com-
descobriu e ele era o diretor de to, havia ainda o desafio de montar plementar, de engenheiros, arquite-
sustentabilidade do Banco Santan- uma empresa sem conhecer nada tos e profissionais da indústria au-
der, que foi praticamente coagido de gestão. tomobilística.
/
a marcar uma reunião na sede do Caio ressalta que
banco em São Paulo. No começo, eles fizeram de tudo. Caio ressalta que “o equilíbrio é im- “o equilíbrio é
Cada um passou por todas as áre- portante para ter um processo mais
Na visita, a conversa com os vice as para desenvolver os setores co- aberto à inovação, com pessoas ide-
importante para
-presidentes e diretores do banco, mercial, administrativo e financei- alistas e sonhadoras e pessoas que ter um processo
que deveria durar 5 minutos, demo- ro e fazer contatos com clientes e são referência nas suas áreas”. mais aberto à
rou horas. O Santander comprou a fornecedores. Aprenderam errando
briga. Conseguiram quebrar a re- e, quando mal haviam começado a Beto diz ainda que a certeza de estar
inovação, com
gulamentação que proibia o finan- pensar em governança, se tornaram no caminho certo veio quando co- pessoas idealistas
ciamento e este foi um divisor de os mais novos Empreendedores En- meçaram as entregas e perceberam e sonhadoras e
águas. Depois disso, começaram a deavor aprovados na época. Com a que estavam, de fato, levando algo
vender as casas com mais facilida- orientação de mentores, formaram melhor para a população. O impacto
pessoas que são
de, conseguiram a homologação da um Conselho e o suporte inicial su- aumentou ainda mais quando dei- referência nas
tecnologia para baixa renda e ga- priu a inexperiência em gestão. xaram de vender casas isoladas no suas áreas”.
201_empreender na universidade desentortando os pregos

modelo B2C e passaram para as vendas B2B, Planos arrojados para Olhando para trás, impressiona o que três
com obras em escala e um mínimo de padro- o futuro da Tecverde “piá” e mais algumas dezenas de pessoas fize-
nização. Enfim, 2014 foi um ano que faria aquele treina- ram em tão pouco tempo. Mas Lucas não nega
dor alemão orgulhoso. Implantaram uma fábri- a sorte que foi eles terem se encontrado para
Mas mudar o modelo de negócios tem seus ca com padrões altíssimos em Curitiba, a mais embarcar nessa aventura juntos. “Minha maior
imprevistos e Lucas lembra o susto inespera- automatizada da América Latina, com capaci- admiração eram meus próprios sócios, eu via
do, quando concentraram o faturamento em dade para produzir 3.000 casas por ano. Lu- o que eles iam fazendo e me inspirava a fazer
poucos clientes e um deles atrasou três me- cas, responsável pelas montagens e pela área mais ainda, via as coisas acontecerem e pen-
ses: “O cara falou ‘hoje eu pago vocês’. Tínha- operacional da empresa, se orgulha das vitó- sava ‘com esses caras aqui, vai dar certo’. Até
mos a folha dos funcionários para pagar e, de- rias: “Me deixa muito satisfeito o que a gen- hoje é assim”.
pois de 3 dias, não havíamos recebido ainda. te vai conquistando com solidez, como passar
de uma planta inicial com 300 m2 para a atual
Parece pouco tempo, mas dependíamos desse com 10.000 m2”.
dinheiro”. Mesmo com tudo planejado, eles as-
sumiram compromissos que não cumpriram e No final de 2015, a Tecverde recebeu um apor-
isso foi muito forte para o aprendizado empreen- te de R$ 20 milhões de um fundo americano,
dedor. No final das contas o cliente pagou, con- que permitiu potencializar ainda mais seu
seguiram colocar as contas em dia e ficou a lição. crescimento. Hoje, já foram mais de 90.000
m2 construídos que deixaram de gerar 9.000
“Diariamente você tem essas pancadas, às ve- toneladas de CO2 e 15.300 toneladas de resí-
zes acontece uma dessas e você tem que ter duos. Além disso, já são mais de 10mil pessoas
resiliência. você vai ganhando a casca de em- morando em casas sustentáveis, de qualidade
preendedor”, conta Lucas. e de melhor eficiência.
Sobre a
A Endeavor é uma das principais organizações de fomento
ao empreendedorismo no mundo. Atua na mobilização de
organizações públicas e privadas e no compartilhamento de

endeavor
conhecimento prático e de exemplos de empreendedores de
alto impacto para fortalecer a cultura empreendedora do país.
No Brasil desde 2000, já ajudou a gerar mais de R$ 2 bilhões
em receitas anualmente e mais de 20.000 de empregos
diretos através de programas de apoio a empreendedores; e a
capacitar mais de quatro milhões de brasileiros com programas
educacionais presenciais e a distância.

Mais informações e conteúdos para


empreendedores em http://endeavor.org.br/
O Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
(Sebrae) é uma entidade privada que promove a competitividade
e o desenvolvimento sustentável dos empreendimentos de
micro e pequeno porte.

Sobre 0
Há mais de 40 anos, atua com foco no fortalecimento do
empreendedorismo e na aceleração do processo de formalização
da economia por meio de parcerias com os setores público

sebrae
e privado, programas de capacitação, acesso ao crédito e à
inovação, estímulo ao associativismo, feiras e rodadas de
negócios.

Para garantir o atendimento aos pequenos negócios, o Sebrae


atua em todo o território nacional. Além da sede nacional, em
Brasília, a instituição conta com pontos de atendimento nas 27
Unidades da Federação, onde são oferecidos cursos, seminários,
consultorias e orientação técnica para pequenos negócios de
todos os setores.

Mais informações: www.sebrae.com.br


Cursos Online: www.ead.sebrae.com.br

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