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Sumário

Resumo ................................................................................................................................. 1
Introdução.............................................................................................................................. 2
1. Fracasso Escolar e Dificuldades de Aprendizagem ........................................................... 3
1.1 A Dificuldade de aprendizagem e possíveis causas ..................................................... 4
1.2 Dificuldades de aprendizagem e seu diagnóstico ......................................................... 7
1.3 Análise das razões do fracasso escolar no ensino fundamental ................................. 10
1.4 Analisando o fracasso escolar.................................................................................... 11
2. O Fracasso Escolar a Partir da Relação Professor-Aluno ................................................ 13
2.1. Refletindo a prática ................................................................................................... 19
2.2. Visão da prática docente ........................................................................................... 20
2.3 A construção interdisciplinar a partir da relação professor/aluno ................................ 21
2.4 Relação escola e família ............................................................................................ 22
3. Contribuições da Psicopedagogia no contexto do fracasso escolar ................................. 32
3.1 Dificuldades para a psicopedagogia ........................................................................... 35
3.2 A influência da prática pedagógica na produção do sucesso / fracasso escolar ......... 35
3.3. Conhecer para interagir............................................................................................. 37
Considerações Finais .......................................................................................................... 40
Referencias Bibliográficas.................................................................................................... 42
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FRACASSO ESCOLAR E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM

RESUMO

Este estudo tem como objetivo analisar os fatores que proporcionam o suces-
so/fracasso escolar dos alunos, bem como conceituar dificuldade de aprendizagem
na abordagem psicopedagógica. Simultaneamente bordar os fatores relevantes para
explicar as possíveis causas dessas deficiências dando um diagnostico, principal-
mente no ensino fundamental onde podem ser por diversas causas, começando pe-
las próprias condições físicas e psicológicas da criança, passando pelas condições
da escola e dos profissionais que nela atuam e culminando com a que é, talvez, a
mais fundamental de todas; as precárias condições em que vive a maioria das pes-
soas no país. Sabemos que a escola desempenha funções, não se limita apenas em
ser transmissora do conhecimento, isto porque a sociedade exige cada vez mais que
os indivíduos aprendam os conhecimentos necessários para transformar sua vida e
da sociedade.

Veremos também que os conteúdos escolares não podem continuar sendo


transmitidos como algo morto, estático, que favorece a aceitação passiva, mas que
sejam vistos como vivo, dinâmicos e, mais do que isso, sejam redescobertos e re-
construídos pelos alunos que, assim, sentir-se-ão sujeitos da própria educação e
estarão aprendendo a redescobrir a realidade do mundo em que vivem. Para tal a
escola precisa contar com a ajuda da família, pois é na família que ocorrem as pri-
meiras aprendizagens e experiências emocionais que são levadas para a vida, mos-
trando se verdadeiramente marcantes. É ela que oferece os ingredientes principais e
a base para formação da criança. Conclui-se que as razões do fracasso escolar são
diversas e que a comunidade escolar não tem como solucioná-las sozinha, é neces-
sário que haja uma articulação-interação comunidade-escola para alcançar uma
educação de qualidade para todos.

Palavras-chave: Educação - Família - Psicopedagogo - Aprendizagem - Fra-


casso
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INTRODUÇÃO

As dificuldades na aprendizagem podem, muitas vezes, ocasionar a retenção


continuada do educando chegando ate mesmo a evasão escolar. Naturalmente, tais
dificuldades podem decorrer de inúmeras ações pedagógicas. Neste contexto acre-
dita-se que uma postura partindo do pressuposto de que a educação é parte da pró-
pria experiência humana e que o ensino centrado nos interesses do educando ou do
grupo, seja uma proposta pedagógica mais favorável, à resolução do problema que
resulta da dificuldade de aprendizagem escolar.

A dificuldade de aprendizagem e o fracasso escolar tem sido tema nas mais


variadas conversas, em artigos de revistas e jornais, dentro ou fora das escolas. No
entanto, pouco tem sido feito na tentativa de amenizar este grave problema.

Uma das saídas para tentar amenizar esta dificuldade pode ser encontrada
através do relacionamento afetivo entre educadores e alunos, porém, a escola mui-
tas vezes ignora esta questão, preocupando-se apenas com os conteúdos e técni-
cas.

Na escola deve trabalhar no sentido de organização dos sistemas afetivos e


cognitivos. As relações conflituosas, enfrentadas no dia-a-dia do processo educacio-
nal, acabam interferindo na atividade intelectual, e isso pode ocasionar o baixo ren-
dimento escolar. O relacionamento afetivo pressupõe interação, respeito pelas
idéias, pelas opiniões do outro, dedicação, troca e vontade por parte dos envolvidos.

Conhecendo seus alunos, escolhendo a melhor forma de trabalhar com eles,


o educador propiciará excelentes oportunidades para elevar o rendimento escolar
dos educandos, elevando também o auto conceito destes, tornando a aprendizagem
mais agradável e produtiva.

Dessa forma essa pesquisa tem como um dos objetivos apresentar como o
educador, seja ele professor ou orientador educacional, pode influenciar para resol-
ver os problemas da dificuldade de aprendizagem que levam ao fracasso escolar.

Preocupa-se em também apontar as principais causas que podem contribuir


e/ ou propiciar o fracasso escolar; mostrar que o fracasso escolar é uma realidade
atual e está inserido no contexto das tendências pedagógicas; apresentar a amplitu-
de do fracasso escolar; identificar os principais problemas e principais causas do
fracasso escolar; e finalmente, analisar a contribuição da psicopedagogia para o
abrandamento do fracasso escolar.

Dentro desse contexto será dividida em capítulos onde no primeiro capítulo:


abordará a dificuldade de aprendizagem em seu conceito e possíveis causas; no
segundo capítulo: tentará definir o fracasso escolar a partir da relação professor-
aluno e de diversos segmentos da escola, e finalmente no terceiro capítulo: buscará
analisar a contribuição da psicopedagogia no contexto do fracasso escolar.
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1. FRACASSO ESCOLAR E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM

No ser humano a aprendizagem e a construção do conhecimento são proces-


sos naturais e espontâneos, pois desde muito cedo aprende a mamar, falar, andar,
pensar, garantindo assim, a sua sobrevivência. Com aproximadamente três anos, as
crianças são capazes de construir as primeiras hipóteses e já começam a questionar
sobre a existência. E igualmente a aprendizagem escolar é considerada um proces-
so natural, que resulta de uma complexa atividade mental, na qual o pensamento, a
percepção, as emoções, a memória, a motricidade e os conhecimentos prévios es-
tão envolvidos e onde a criança deva sentir o prazer em aprender.

As investigações sobre o processo de aprendizagem humana e suas dificul-


dades são desenvolvidas pela Psicopedagogia, levando-se em consideração as rea-
lidades interna e externa, utilizando-se de vários campos do conhecimento, inte-
grando-os e sintetizando-os. Procurando compreender de forma global e integrada
os processos cognitivos, emocionais, orgânicos, familiares, sociais e pedagógicos
que determinam à condição do sujeito e interferem no processo de aprendizagem,
possibilitando situações que resgatem a aprendizagem em sua totalidade de manei-
ra prazerosa.

Segundo Weiss (1989, p. 16, a aprendizagem normal dá-se de forma integra-


da no aluno (aprendente), no seu pensar, sentir, falar e agir. Quando começam a
aparecer “dissociações de campo” e sabe-se que o sujeito não tem danos orgânicos,
pode-se pensar que estão se instalando dificuldades na aprendizagem: algo vai mal
no pensar, na sua expressão, no agir sobre o mundo.

Atualmente, a política educacional prioriza a educação para todos e a inclu-


são de alunos que, há pouco tempo, eram excluídos do sistema escolar, por porta-
rem deficiências físicas ou cognitivas; porém, um grande número de alunos (crianças
e adolescentes), que ao longo do tempo apresentaram dificuldades de aprendiza-
gem e que estavam fadados ao fracasso escolar pôde freqüentar as escolas e eram
rotulados em geral, como alunos difíceis.

Os alunos difíceis que apresentavam dificuldades de aprendizagem, mas que


não tinha origens em quadros neurológicos, numa linguagem psicanalítica, não es-
truturam uma psicose ou neurose grave, que não podiam ser considerados portado-
res de deficiência mental, oscilavam na conduta e no humor e até dificuldades nos
processos simbólicos, que dificultam a organização do pensamento, que consequen-
temente interferem na alfabetização e no aprendizado dos processos lógico-
matemáticos, demonstram potencial cognitivo, podendo ser resgatados na sua
aprendizagem. (Weiss 1989).

Raramente as dificuldades de aprendizagem têm origens apenas cognitivas.


Atribuir ao próprio aluno o seu fracasso, considerando que haja algum comprometi-
mento no seu desenvolvimento psicomotor, cognitivo, lingüístico ou emocional (con-
versa muito, é lento, não faz a lição de casa, não tem assimilação, entre outros.),
desestruturação familiar, sem considerar, as condições de aprendizagem que a es-
cola oferece a este aluno e os outros fatores intra-escolares que favorecem a não
aprendizagem. (Weiss 1989)
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1.1 A Dificuldade de aprendizagem e possíveis causas

De acordo com os estudos efetuados em LUCKESI (1996), as dificuldades de


aprendizagem na escola podem ser consideradas uma das causas que podem con-
duzir o aluno ao fracasso escolar. Não podemos desconsiderar que o fracasso do
aluno também pode ser entendido como um fracasso da escola por não saber lidar
com a diversidade dos seus alunos. É preciso que o professor atente para as dife-
rentes formas de ensinar, pois, há muitas maneiras de aprender. O professor deve
ter consciência da importância de criar vínculos com os seus alunos através das ati-
vidades cotidianas, construindo e reconstruindo sempre novos vínculos, mais fortes
e positivos.

O aluno quando percebe que apresenta dificuldades em sua aprendizagem,


começa a apresentar desinteresse, desatenção, irresponsabilidade, agressividade,
ou seja, apresenta um quadro de transtorno no comportamento que atinge todas as
disciplinas, pois a dificuldade acarreta sofrimentos e nenhum aluno apresenta baixo
rendimento por vontade própria. De acordo com (SILVA. 2000), durante muitos anos
os alunos foram penalizados, responsabilizados pelo fracasso, sofriam punições e
críticas, mas, com o avanço da ciência, hoje não podemos nos limitar a acreditar,
que as dificuldades de aprendizagem, seja uma questão de vontade do aluno ou do
professor, é uma questão muito mais complexa, onde vários fatores podem interferir
na vida escolar, tais como os problemas de relacionamento professor-aluno, as
questões de metodologia de ensino e os conteúdos escolares.

Caso a dificuldade fosse apenas originada pelo aluno, por danos orgânicos ou
somente da sua inteligência, para solucioná-lo não teríamos a necessidade de acio-
narmos a família, e se o problema estivesse apenas relacionado ao ambiente famili-
ar, não haveria necessidade de recorremos ao aluno isoladamente.

A relação professor/aluno é uma faca de dois gumes na educação, pois ela


pode tornar o aluno capaz ou incapaz. Conforme (Silva 2000), se o professor tratá-lo
como incapaz, não será bem sucedido, não permitirá a sua aprendizagem e o seu
desenvolvimento. Se o professor mostrar-se despreparado para lidar com o proble-
ma apresentado, mais chance terá de transferir suas dificuldades para o aluno.

Os primeiros transmissores do conhecimento são os pais, com eles apren-


dem-se as primeiras interações e ao longo do desenvolvimento, aperfeiçoa. Estas
relações, já estão constituídas na criança, ao chegar à escola, que influenciará con-
sideravelmente no poder de produção deste sujeito. Para (Silva 2000), é preciso
uma dinâmica familiar saudável, uma relação positiva de cooperação, de alegria e
motivação. E que esta relação se espande quando a criança é inserida no ambiente
escolar para que não haja uma perda no processo de aquisição do conhecimento,
evitando assim o fracasso escolar.

O fracasso escolar é um tema que surgiu a partir de imensas inquietações a


cerca do assunto. Sabe-se que o fracasso escolar é hoje um grande problema para
o sistema educacional. E muito se fala sobre o fracasso escolar e a dificuldade de
aprendizagem, em artigos de revistas e jornais, dentro ou fora das escolas.
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No entanto o que se observa, é que pouco tem sido feito na tentativa de ame-
nizar este grave problema. E muitas vezes, para se livrar da responsabilidade deste
fracasso, busca-se culpado. Alguém que possa assumir sozinho esta situação. O
que ocorre muitas vezes é a busca pelos culpados de tal fracasso e, a partir daí per-
cebe-se um jogo onde ora se culpa a criança, ora a família, ora uma determinada
classe social, ora todo um sistema econômico, educacional, político e social. Mas
será que existe mesmo um culpado pela não aprendizagem? Se a aprendizagem
acontece em um vínculo, se ela é um processo que ocorre entre subjetividade, nun-
ca uma única pessoa poderá ser culpada.

Neste trabalho eles serão discutidos como um elemento resultante da integra-


ção de várias “forças” que englobam o espaço institucional (a escola), o espaço das
relações (vínculo do aluno e professor), a família e a sociedade em geral. Quando se
fala em fracasso, supõe-se algo que deveria ser atingido. De acordo com o dicioná-
rio Aurélio Fracasso é definido por um mau êxito, uma ruína. Mas mau êxito em quê?
Baseado em que parâmetro? E o que a sociedade define como sucesso?

Bem, os seres humanos, nascem com uma tendência hábil para a aprendiza-
gem. A criança está pronta para aprender quando ela apresenta um conjunto de
condições, capacidades, habilidades, e aptidões consideradas como pré-requisito
para o início de qualquer aprendizagem. De acordo com (OLIVEIRA, 1999) Pronti-
dão para aprender significa o conjunto de habilidades que a criança deverá desen-
volver de modo a tornar-se capaz de executar determinadas atividades.

Olds e Papalia, (2000), afirmam que para estabelecer se houve ou não


aprendizagem é preciso que as mudanças ocorridas sejam relativamente permanen-
tes. Existem pelo menos sete fatores fundamentais para que tal aprendizagem se
efetive, são eles: saúde física e mental, motivação, prévio domínio, amadurecimento,
inteligência, concentração ou atenção e memória. A falta de um desses fatores pode
ser a causa de insucessos e das dificuldades de aprendizagem.

O conceito de dificuldades de aprendizagem é abrangente e inclui problemas


decorrentes do sistema educacional, de características próprias do individuo e de
influências ambientais. Do mesmo modo, segundo Paín (1992) "os problemas de
aprendizagem são aqueles que se superpõem ao baixo nível intelectual, não permi-
tindo ao sujeito aproveitar as suas possibilidades".

Muitas são as crianças e os adolescentes que hoje, no contexto sócio-cultural


brasileiro, apresentam dificuldades no processo de aprendizagem. Tais dificuldades,
nas classes sociais menos favorecidas a questão se agrava ainda mais, pois o me-
nor já carrega desde muito cedo, o estigma de menos capaz ao contexto e às exi-
gências escolares, logo, ele é rotulado como deficiente, determinado pelas condi-
ções precárias de sua vida.

É bem remota a preocupação com a qualidade da educação no Brasil. Ribeiro


citado por Corrêa (2001) afirma que o problema da baixa qualidade da educação
brasileira não era tanto pelo índice de evasão escolar e mais pela a alta taxa de re-
provação.
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Logo, a questão da qualidade da educação é dada pelo índice da dificuldade


de aprendizagem. Os problemas vividos pelas crianças nessa situação são na maio-
ria das vezes vivenciados como situação de fracasso, pois, por não conseguirem
obter êxito nas demandas escolares, acabam por se sentirem incapazes, gerando
sentimentos de frustração e comportamento desestabilizado, entre outros. O fracas-
so decorrente de situações específicas possam se traduzir num fracasso geral, re-
sultando no próprio abandono da escola.

Visto que atualmente vive-se em uma sociedade que busca cada vez mais o
êxito profissional, a competência a qualquer custo e a escola também segue esta
concepção. Pois a escola nada mais é que um reflexo da sociedade. E aqueles que
não conseguem responder ás exigências da instituição podem sofrer com um pro-
blema de aprendizagem. E essa busca incansável e imediata pela perfeição leva à
rotulação daqueles que não se encaixam nos parâmetros impostos.

Tornando assim comum o surgimento em todas as instituições educativas de


"crianças problemas", de "crianças fracassadas", disléxicas, hiper-ativas, agressivas,
etc. Esses problemas tornam-se parte da identidade da criança. Perde-se o sujeito,
ele passa a ser sua dificuldade. Desta forma, ao passar pelo portão da escola, a cri-
ança assume o papel que lhe foi atribuído e tende a correspondê-lo.

Para Fernandez (2001), a sociedade do êxito educa e domestica. Seus valo-


res, mitos relativos à aprendizagem muitas vezes levam muitos ao fracasso. Em
nosso sistema educacional, o conhecimento é considerado conteúdo, uma informa-
ção a ser transmitida. As atividades visam à assimilação de conteúdos, impossibili-
tando assim o processo de autoria do pensamento.

É fácil para nós educador observar que este caráter informativo da educação
se manifesta até mesmo nos livros didáticos, nos quais o aluno é levado a memori-
zar conteúdos e não pensá-los; não ocorrendo de fato uma aprendizagem.

Para compreender melhor os inúmeros fatores envolvidos no complexo qua-


dro do fracasso escolar foi buscado referências teóricas em alguns autores como:
Claudius Ceccon (1991), Anny Cordié (1996), Magda Soares (1998), Maria Helena
Souza Patto (2000).

Para a autora Cordié (1996), a criança está em situação de fracasso escolar


quando não “acompanha" o que é proposto no programa escolar e os colegas da
classe. O que acaba por afetar a construção do sujeito em sua totalidade. Ele passa
a carregar consigo o estigma de "repetente", "atrasado", "lento", "incapaz", o que
pode levá-lo a acreditar no próprio fracasso. Os alunos que se enquadram neste per-
fil assumem o papel de fracassados e acabam por transpor isso para sua vida pes-
soal, os que podem a chegar a comprometer até mesmo o seu futuro. Assim, para a
autora o fracasso não é do aluno, mas da escola que não consegue atingir os alunos
que aprendem de forma diferenciada.
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1.2 Dificuldades de aprendizagem e seu diagnóstico

As dificuldades de aprendizagem, de acordo com Rogers (1978), podem sig-


nificar uma alteração no aprendizado específico da leitura e escrita, ou alterações
genéricas do processo de aprendizagem, onde outros aspectos, além da leitura e
escrita, podem estar comprometidos (orgânico, motor, intelectual, social e emocio-
nal).

Segundo Polity (1998, p.73), o termo Dificuldade de Aprendizagem é definido


pelo Instituto Nacional de Saúde Mental (EUA) da seguinte forma: Dificuldade de
Aprendizagem é uma desordem que afeta as habilidades pessoais do sujeito em
interpretar o que é visto, ouvido ou relacionar essas informações vindas de diferen-
tes partes do cérebro. Essas limitações podem aparecer de diferentes formas: difi-
culdades específicas no falar, no escrever, coordenação motora, autocontrole, ou
atenção. Essas dificuldades abrangem os trabalhos escolares e podem impedir o
aprendizado da leitura, da escrita ou da matemática. Essas manifestações podem
ocorrer durante toda a vida do sujeito, afetando várias facetas: trabalhos escolares,
rotina diária, vida familiar, amizades e diversões. Em algumas pessoas as manifes-
tações dessas desordens são aparentes. Em outras, aparece apenas um aspecto
isolado do problema, causando impacto em outras áreas da vida.

De acordo com a autora, esse termo é definido de várias maneiras, por dife-
rentes autores, diferindo-se quanto à origem: orgânica, intelectual/cognitiva e emoci-
onal (incluindo-se aí a familiar). O que se observa na maioria dos casos é um entre-
laçamento desses aspectos.

Para a compreensão das possíveis alterações no processo de aprendizagem


é necessário considerar-se tanto as condições internas do organismo quanto as
condições externas ao indivíduo. Fatores como linguagem, inteligência, dinâmica
familiar, afetividade, motivação e escolaridade, devem desenvolver-se de forma inte-
grada para que o processo se efetive (ROGERS, 1978).

Este trabalho refere-se ao papel da família no desenvolvimento da aprendiza-


gem da criança quanto ao aspecto psicológico, emocional, social e de estimulação
dos aspectos cognitivos.

Sabe-se que as crianças que apresentam dificuldades de aprendizagem, ge-


ralmente, possuem uma baixa auto-estima em função de seus fracassos e que es-
ses sentimentos podem estar vinculados aos comportamentos de desinteresse por
determinadas atividades, tempo de atenção diminuído, falta de concentração e ou-
tros. E a família, desconhecendo as necessidades da criança e a maneira apropria-
da de lidar com esses aspectos, muitas vezes, necessitam de orientações que lhe dê
suporte e lhe possibilite ajudar seu filho. Fatores como motivação, formas de comu-
nicação, estresses existentes no lar, influenciam o desempenho da criança no pro-
cesso de aprendizagem, e os psicopedagogos, muitas vezes, sentem-se limitados
quanto às orientações a serem dadas pela falta de conhecimento aprofundado sobre
os diversos aspectos familiares que podem contribuir para um resultado mais dese-
jável.
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Vários comportamentos manifestados pelas mães também levam a questionar


a respeito da influência familiar sobre a aprendizagem. Segundo Marturano (1999),
há mães que demonstram excessiva ansiedade quanto à superação da dificuldade
da criança; outras que se mostram impacientes quanto ao desempenho insatisfatório
que o filho apresenta; mães que atribuem todo o problema à criança e a caracteri-
zam como "preguiçosa", "lerda", "distraída"; mães que negam a dificuldade que a
criança demonstra; mães que não acompanham as atividades de seu filho e mães
que punem a criança pela seu fracasso nas atividades escolares.

Isso acontece pelo fato de os pais desconhecerem como ocorre a aprendiza-


gem e, portanto, necessitam de orientações específicas a esse respeito. Sabe-se,
também, que, muitas vezes, os conflitos familiares estão associados a essas mani-
festações e que as relações familiares são relevantes no desenvolvimento da crian-
ça, havendo, portanto, a necessidade de maior compreensão desse processo, por
parte dos profissionais, para que possam intervir de forma mais abrangente diante
da problemática.

Em muitos casos, em um trabalho especializado com crianças apresentando


dificuldade de aprendizagem, não é suficiente transmitir aos pais as atividades espe-
cíficas a serem realizadas; outros aspectos ligados à família, à escola ou relaciona-
dos a dificuldades em outras áreas do desenvolvimento também estão presentes, e
é necessário ouvir os pais, analisar a situação e buscar caminhos que facilitem o
desenvolvimento global da criança.

Alguns pais confiam seus filhos com dificuldade de aprendizagem aos profes-
sores acreditando que o mau desempenho da criança seja proveniente apenas de si
mesma, sem questionar sua possível participação nessas alterações.

A importância da participação da família no processo de aprendizagem é ine-


gável e a necessidade de se esclarecer e instrumentalizar os pais quanto as suas
possibilidades em ajudar seus filhos com dificuldades de aprendizagem é evidencia-
da ao manifestarem suas dúvidas, inseguranças e falta de conhecimento em como
fazê-lo.

Conforme Martins (2001, p.28), "essa problemática gera nos pais sentimentos
de angústia e ansiedade por se sentirem impossibilitados de lidar de maneira acer-
tada com a situação".

Acredita-se que um programa de intervenção familiar seja de fundamental im-


portância para o desenvolvimento e aprendizagem da criança. O relacionamento
familiar, a disponibilidade e interesse dos pais na orientação educacional de seus
filhos, são aspectos indispensáveis de ajuda à criança.

Em um trabalho de orientação a pais, de acordo com Polity (1998), é possível


despertar a sensibilidade dos mesmos para a importância destes aspectos, dando-
lhes a oportunidade de falar sobre seus sentimentos, expectativas, e esclarecendo-
lhes quanto às necessidades da criança e estratégias que facilitam o seu desenvol-
vimento.
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Através das experiências e relações interpessoais, a família pode promover o


desenvolvimento intelectual, emocional e social da criança. Ela pode criar situações
no dia-a-dia que estimularão esses aspectos, desde que esteja desperta para isso.
Além disso, a participação da criança nas atividades rotineiras do lar e a formação
de hábitos também são importantes na aquisição dos requisitos básicos para a
aprendizagem, pois estimulam a organização interna e a habilidade para o ‘fazer’, de
maneira geral (MARTURANO, 1998).

A família tem um papel central no desenvolvimento da criança, pois é dentro


dela que se realizam as aprendizagens básicas necessárias para o desenvolvimento
na sociedade, como a linguagem, sistema de valores, controle da impulsividade. As
características da criança também são determinadas pelos grupos sociais que fre-
qüenta e pelas características próprias, como temperamento.

As crianças possuem uma tendência natural, instintiva que as direciona ao


desenvolvimento de suas potencialidades. Os pais devem ter conhecimento desse
processo para que não dificultem ou impeçam o crescimento espontâneo da criança.
Pela falta de compreensão da natureza e necessidades básicas do ser humano, os
pais, muitas vezes, prejudicam a busca do próprio desenvolvimento, pela criança. O
modo como os pais lidam com seus filhos pode ajudá-los no desenvolvimento das
suas potencialidades e no relacionamento com o mundo, possibilitando-lhes o enri-
quecimento pessoal através das experiências que o meio lhes proporciona.

O processo educativo (desenvolvimento gradativo da capacidade física, inte-


lectual e moral do ser humano) familiar deve ser adequado para possibilitar à criança
o sucesso na aprendizagem, proporcionando-lhe a motivação, o interesse e a con-
centração necessária para a apreensão do conhecimento.

A adequação desse processo compreende o atendimento às necessidades da


criança quanto à presença dos pais compartilhando suas experiências e sentimen-
tos, orientação firme quanto aos comportamentos adequados, possibilidade de esco-
lhas, certa autonomia nas suas ações, organização da sua rotina, oportunidade
constante de aprendizagem e respeito e valorização como pessoa.

A criança necessita de equilíbrio entre condutas disciplinares e diálogo, com-


preensão e carinho. Num processo educativo os pais experiênciam a necessidade
de um trabalho de auto-análise, de reestruturação de seus comportamentos, cren-
ças, sentimentos e desejos. Os pais precisam conquistar, em relação a si mesmos,
primeiramente, o que querem que os filhos sejam: justos, disciplinados, honestos,
responsáveis (GRUNSPUN, 1985). Esse processo ocorre nas vivências do dia-a-dia,
na medida em que pais e filhos comunicam-se de maneira transparente e sincera,
falando de suas percepções, suas dúvidas, objetivos, emoções, aprendendo uns
com os outros.

Criar filhos não significa torná-los perfeitos, pois os pais têm muitas dúvidas e
estão sujeitos a muitas falhas; mas o que é necessário é tentar identificar os conflitos
e desfazê-los, aprendendo a conviver com essas situações. Através dos conflitos os
pais desenvolvem a percepção de si mesmos e de seus filhos.
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Essas situações estimulam pais e filhos a instalar um diálogo verdadeiro, ex-


pondo o entendimento e sentimento em relação às experiências cotidianas. Por ou-
tro lado, aspectos fundamentais do processo educativo revelam que os pais devem
ter respeito sobre o que o filho sente, mas cabe a eles negar com firmeza e determi-
nação as atitudes que possam contrariar o que desejam para a educação de seus
filhos (TIBA, 1999).

Dificuldades escolares apresentadas pelas crianças, relacionadas à falta de


concentração e indisciplina ocorrem e podem ser causadas pela ausência de limites.
A primeira geração educou os filhos de maneira patriarcal, isto é, os filhos eram
obrigados a cumprir as determinações que lhes eram impostas pelo pai. A geração
seguinte contestou esse sistema educacional e agiu de maneira oposta, através da
permissividade. Os jovens ficaram sem padrões de comportamentos e limites, for-
mando uma geração com mais liberdade do que responsabilidade.

Tanto na família quanto na escola, segundo Tiba (1999, p.45), há a necessi-


dade de orientação às crianças quanto às regras disciplinares, para que elas pos-
sam desenvolver a capacidade de concentração e de apreensão dos conceitos.

A aprendizagem se dá de maneira gradativa e não será possível sem a parti-


cipação ativa do aluno, de maneira disciplinada, orientada. Os pais devem preparar
os filhos para arcarem com suas responsabilidades. Na medida em que a criança vai
aprendendo a cuidar de si mesma, vai experimentando a sensação gratificante da
capacidade de enfrentar desafios. E cada realização é um aprendizado que servirá
de base para um novo aprendizado. Assim, realizando suas vontades e necessida-
des, a criança vai gostando de si mesma, desenvolvendo a auto-estima.

O relacionamento familiar também é fundamental no processo educativo. A


criança estará muito mais receptiva às instruções dos pais, se os membros da famí-
lia se respeitar entre si, procurando conversar e colaborar um com o outro. É impor-
tante a participação dos pais na vida dos filhos, numa convivência como companhei-
ros, compartilhando emoções, o que contribui muito para a disciplina.

Todos esses aspectos citados e muitos outros, são fundamentais para que o
desenvolvimento da criança se efetive. Portanto, a família necessita da ajuda dos
profissionais na aquisição desses conhecimentos básicos e essenciais para que
possa cumprir seu papel de facilitadora do processo de aprendizagem de seus filhos,
através de comportamentos mais adaptativos.

1.3 Análise das razões do fracasso escolar no ensino fundamental

As causas para o fracasso escolar são inúmeras e muitas delas já bastante


conhecidas através de publicações de autores consagrados que se dedicam ao as-
sunto. A questão é que as razões para o fracasso escolar não são poucas e não es-
tão isoladas umas das outras.
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Pode ser pelo aspecto pedagógico, apropriado ou não à criança, pelas políti-
cas educacionais que nem sempre tem a educação como meta principal, ou ainda
pela situação geral pela qual passa a economia do país, e como resultado, o ambi-
ente onde vivem milhares de crianças, inadequados para o seu desenvolvimento e
crescimento.

A escola conta com uma equipe que poderá estar atenta a problemas sociais
dos alunos. O supervisor pedagógico tem a função de auxiliar o professor orientan-
do-o em práticas pedagógicas que poderão superar o problema do fracasso escolar,
e uma ação que pode ser significativa é manter contato com a família do ‘aluno-
problema’ na busca de entender o porquê do ‘não aprender’. É fundamental no pro-
cesso aprendizagem conhecer o aluno e sua origem para escolher a melhor forma
de trabalhar com ele, neste sentido, o educador propiciará excelentes oportunidades
para elevar o rendimento escolar dos educando, elevando também o auto-conceito
deste, tornando a aprendizagem mais agradável.

De acordo com PATTO (2000), existem várias razões para o fracasso escolar,
assim como existem várias razões para se desenvolver um trabalho neste sentido. E
um dos motivos, é a preocupação dos educadores em geral em achar uma solução
cabível para amenizar o problema do fracasso escolar. Problemas este que se justi-
ficam pelas dificuldades encontradas pelos educadores em geral, em buscar a ino-
vação para auxiliá-los nas práticas pedagógicas, bem como pelo fato de ser um te-
ma muito polemico.

1.4 Analisando o fracasso escolar

É nas tramas do fazer e do viver o pedagógico quotidianamente nas escolas,


que se pode perceber as reais razões do fracasso escolar das crianças advindas dos
meios sócio-culturais mais pobres.

No desenrolar do processo de pesquisas para a construção deste trabalho, as


observações encontrado em artigos publicados reforça a afirmação de COLLARES
(1982. p. 25-26)

(...) de que se imputa o fracasso dessas crianças, oriundas das clas-


ses trabalhadoras, à desnutrição, às verminoses, enfim, a uma con-
dição adversa de saúde. Ignora-se o fato de que estas estudam em
escolas de periferia, onde se concentram todos os vícios e distorções
do sistema social e, especificamente, do educacional, e tenta-se en-
contrar nestas crianças, causas orgânicas, inerentes a elas, que justi-
fique o seu mau rendimento.

É notório que as crianças desnutridas que estão hoje freqüentando nossas


escolas, são aquelas portadoras de desnutrição leve, a chamada pelos especialistas
de desnutrição de primeiro grau. Não estamos aqui afirmando que este tipo de des-
nutrição não tem importância, ela a tem tanto que constantemente é apontada como
forte indicador da situação de penúria e miséria em que vive grande segmento de
nossa população.
12

Entretanto, de acordo com COLLARES (1982) o que se quer enfatizar é que


este grau de desnutrição (leve) não afeta o desenvolvimento do sistema nervoso
central, não o lesa irreversivelmente e, portanto, não torna a criança deficiente men-
tal, incapaz de aprender o que a escola tem a lhe ensinar.

A criança portadora de desnutrição leve apenas sacrifica o seu crescimento


físico para manter o seu metabolismo. Exames clínico e laboratorial indicam que a
criança é normal, com exceção de um déficit de peso e estatura em relação à sua
idade.

É necessário que se desmistifique as ‘famosas’ causas externas desse fra-


casso escolar, pela articulação àquelas existentes no próprio âmbito escolar, e que
tenhamos clareza dos fatores que as determinam e as articulam.
13

2. O FRACASSO ESCOLAR A PARTIR DA RELAÇÃO PROFESSOR-


ALUNO

O fracasso escolar é um assunto muito comentado ultimamente, porém, estu-


dos mostram que esse fenômeno tem raízes muito mais longínquas. "As classes
trabalhadoras nascentes não tinham senão a educação oral, transmitida de pai para
filho: só herdavam a cultura da luta pela sobrevivência..." (GADOTTI, 1994:55)

Este trecho demonstra que o fracasso escolar não diz respeito somente à
questão da evasão escolar ou seletividade, mas também a não possibilidade de se
estudar, a dificuldade de se conseguir educação.

Hoje, muitos alunos são colocados fora da escola por não conseguirem estu-
dar porque precisam trabalhar... "... os alunos que não permanecem na escola são
aqueles que precisam trabalhar para ajudar no sustento da família..." (PIMENTA,
1995:120).

Diante desta realidade, na visão de Pimenta (1995), é certo que cabe ao pro-
fessor rever posicionamentos endurecidos, questionar crenças arraigadas, confron-
tar posicionamentos imutáveis e isso implica na compreensão do "aluno-problema"
como um porta voz das relações estabelecidas em sala de aula. Pudemos perceber
claramente que muitas vezes, não é o aluno que não se encaixa no que nós profes-
sores oferecemos, somos nós que de certa forma não adequamos a suas possibili-
dades.

O professor, a escola precisa desidealizar o perfil de aluno, ou seja, devemos


abandonar a imagem do aluno ideal, de como deveria ser, quais hábitos deveria ter,
e trabalhar mais com o material humano concreto, os recursos disponíveis. O aluno,
tal como ele é, aquele aluno que carece de nós e de quem nós carecemos em ter-
mos profissionais.

Partindo da idéia de que uma escola não existe sem os alunos, os professo-
res, o corpo regente e o pessoal de apoio que a transformam em um organismo vivo,
e que são muito mais importantes que toda a infra-estrutura material de que ela pre-
cisa dispor para cumprir sua função. Tal função não deve ficar restrita ao mero ato
de ensinar os conteúdos necessários para que as pessoas se tornem profissional e
socialmente competentes, mas deve também abrir uma perspectiva de inclusão da-
queles seres em desenvolvimento, de tal forma que possam passar a usufruir dos
conhecimentos que se tornaram patrimônio da humanidade, ter acesso aos bens
culturais e se tornem cidadãos conscientes de seus direitos e deveres. Então nesse
ponto de vista é no capital humano que se deve efetivamente investir prioritariamen-
te, embora a necessidade de condições materiais facilitadoras do trabalho educativo
seja muito importante para um bom resultado.

Mas a temática aqui é a discussão sobre o fracasso escolar. Acredita-se que


a problemática aqui envolvida não é simples, nem uni - causal. É múltipla. Há um
dado importante, que tem que ser levado em conta e que consiste em que não se
pode atribuir as dificuldades de aprendizado dos alunos totalmente a déficits de inte-
ligência ou deficiências físicas.
14

Mas devemos olhar o fracasso escolar a partir da relação professor-aluno e


de diversos segmentos da escola, portanto a pergunta que se coloca para nós, en-
tão, é por que estas crianças, que aparentemente não têm nenhuma falha no seu
aparelho cognitivo, ou outras deficiências, não conseguem aprender?

Deve-se procurar entender as causas de tal processo. E para tal, toma-se por
base os estudos de Henri Paul Hyacinthe Wallon(1992), que na busca de compre-
ender o psiquismo humano volta sua atenção para a criança, já que somente através
desta que é possível ter acesso à gênese dos processos psíquicos.

Segundo o autor, o sujeito constrói-se nas suas interações com o meio. Desta
forma, propõe um estudo contextualizado, buscando compreender em cada fase do
desenvolvimento da criança, o sistema de relações estabelecidas entre esta e seu
ambiente. Para o estudioso, o estudo da criança tem dupla função, ou seja, é ins-
trumento de compreensão do psiquismo humano, como também serve de contribui-
ção à educação. Pois, a preocupação pedagógica está sempre presente em sua psi-
cologia.

Para Wallon, deveria haver uma relação de contribuição recíproca entre a psi-
cologia e a pedagogia. O autor via a escola, meio peculiar à infância e "obra funda-
mental da sociedade contemporânea", como um contexto privilegiado para o estudo
da criança (Galvão, 1999, p. 45). Sendo assim, a pedagogia oferecia campo de ob-
servação à psicologia e também questões para investigação. Da mesma forma, a
psicologia, ao construir conhecimentos sobre o desenvolvimento infantil, servia de
instrumento para a prática pedagógica.

Wallon buscava enfocar o ser humano por uma perspectiva global. Segundo a
psicogenética walloniana existem alguns campos que agrupam a diversidade das
funções psíquicas. A afetividade, a inteligência e o ato motor são "campos funcio-
nais" entre os quais se distribui a atividade infantil. Aparecem pouco diferenciadas
no início do desenvolvimento, mas aos poucos vão adquirindo independência um do
outro.

De acordo com Wallon, o estudo das emoções, em especial, é exemplar para


demonstrar a utilidade da dialética como método de análise para a psicologia. Para
ele, a emoção encontra-se "na origem da consciência, operando a passagem do
mundo orgânico para o social, do plano fisiológico para o psíquico". (Galvão, 2001,
p. 57)

Wallon revela que é na ação sobre o meio humano, e não sobre o meio físico
que deve ser buscado o significado das emoções. Já as funções intelectuais, na psi-
cogênese, vão adquirindo importância progressiva como forma de interação com o
meio. A atividade intelectual, que tem a linguagem como instrumento fundamental,
depende do coletivo.

Permitindo acesso à linguagem, podemos dizer que a emoção está na origem


da atividade intelectual. Pelas interações sociais que propicia, as emoções possibili-
tam o acesso ao universo simbólico da cultura. (GALVÃO, 2001, p. 66)
15

No entanto, segundo o autor, uma vez instaurada, a atividade intelectual man-


terá uma relação de antagonismo com as emoções, em decorrência da natureza pa-
radoxal desta última.

Na vida cotidiana escolar, podemos observar que a "elevação da temperatura


emocional" tende a baixar o desempenho intelectual e impedir a reflexão objetiva. O
poder subjetivador das emoções, que volta a atividade do sujeito para suas disposi-
ções íntimas, incompatibiliza-se com a necessária objetividade das operações inte-
lectuais; "é como se a emoção embaçasse a percepção do real, impregnando-lhe de
subjetividade e, portanto, dificultando reações intelectuais coerentes e bem adapta-
das". (GALVÃO, 2001, p.67)

O ato motor também se encontra ligado à atividade intelectual. As variações


tônicas refletem o curso do pensamento. Além disso, a função postural dá sustenta-
ção à atividade de reflexão mental. Entre ambas há uma relação de reciprocidade.
Dessa forma o aluno, ao ler um texto, confrontando-se com problemas difíceis de
serem resolvidos, e isto Wallon explica que, mudar de posição, levantar da cadeira
ou andar um pouco são recursos que podem ajudar a criança à "desobstruir o fluxo
mental".

O autor continua dizendo que é uma observação corrente de situações em


que a criança recorre ao gesto para complementar a expressão de seu pensamento.
Para ele, para tornar presente uma idéia, a criança precisa construir, por meio de
seus gestos e posturas, um cenário corporal – o gesto precede a palavra. É o que
Wallon chama de "mentalidade projetiva", onde o ato mental projeta-se em atos mo-
tores. No entanto, com o fortalecimento das funções intelectuais reduz-se o papel do
movimento na atividade cognitiva.

Os progressos da atividade cognitiva fazem com que o movimento se integre


à inteligência. O desenvolvimento da dimensão cognitiva do movimento torna a cri-
ança mais autônoma para agir sobre a realidade exterior.

De acordo com Wallon, na leitura de Galvão, as dificuldades da criança em


permanecer parada e concentrada como a escola exige testemunham que a conso-
lidação das disciplinas mentais é um processo lento e gradual, que depende não só
de condições neurológicas, mas também está estritamente ligada a fatores de ori-
gem social, como desenvolvimento da linguagem e aquisição de conhecimento. As-
sim, a escola tem um importante papel na consolidação das disciplinas mentais.
(GALVÃO, 2001, p.76)

O "não-aprender" nos moldes impostos pelo social vem sendo tratado como
distúrbios, fracassos e patologias em geral. O motivo pode ser a concentração do
processo pedagógico na "falta de talento" do sujeito, ou seja, o processo de aprendi-
zagem não estimula talentos distintos, centrando-se no esperado e moldado com
regras e valores. O diferente, nesse contexto, passa a ser em primeiro lugar negado,
e em seguida estigmatizado.

O sujeito sócio-psico-cognitivo não pode ser "bom" em todas as áreas num


mesmo tempo-espaço conforme o esperado pelas instituições educacionais.
16

Sendo assim o fracasso escolar pode vir a partir da relação professor-aluno e


dos diversos segmentos da escola, pois os seres humanos têm talentos diferentes,
muitas vezes sendo determinados por circunstâncias sociais locais, ou regionais.

Devido ao seu objeto e à sua abordagem, a psicologia genética de Wallon


serve a múltiplas leituras por parte de quem procura, nelas, subsídios para a reflexão
pedagógica. Fornece valioso material para a adequação da prática pedagógica ao
ensino da criança. Das idéias pedagógicas propostas por Wallon, destacam a que se
refere à necessidade de superação da dicotomia entre indivíduo e sociedade subja-
cente à maior parte dos sistemas de ensino. A educação tradicional, que tem por
objetivo transmitir aos alunos a herança dos antepassados e assegurar o domínio de
idéias e costumes que lhe permitiriam melhor à sociedade e prioriza a ação dos
adultos sobre a juventude e acena com a perpetuação da ordem social.

A idéia de uma personalidade que se forma isolada da sociedade é inconce-


bível para perspectiva walloniana uma vez que, segundo esta perspectiva, é na inte-
ração e no confronto com o outro que se forma o indivíduo. Portanto, a educação
deve, obrigatoriamente, integrar, à sua prática e aos seus objetivos, essas duas di-
mensões, social e a individual: deve, portanto, atender simultaneamente à formação
do indivíduo e à da sociedade. (GALVÃO, 2001, p. 91).

Segundo Galvão, de acordo com Wallon, a excessiva rigidez dos programas,


o ensino puramente livresco e o autoritarismo na relação professor-aluno dos méto-
dos tradicionais colocam a criança numa posição de passividade, impedem suas
livres investigações sobre o mundo e suas interações sociais, abafando sua espon-
taneidade e curiosidade natural.

A escola não assume seu papel na produção dos fracassados; os professores


desconhecem os processos pelos quais as crianças aprendem ou não aplicam o que
conhecem. A repetência está associada à bagunça, à indisciplina, ao não cumpri-
mento de regras escolares. Ou seja, a educação está mais associada à questão da
educação do que ao saber.

Essas crianças muitas vezes são vítimas de um sistema que desvaloriza a


singularidade e o tempo de cada indivíduo, trata o processo de educação como in-
formação a ser absorvida.

Ao contrário do que propõe a tradição intelectualista do ensino, a pedagogia


inspirada na psicogenética walloniana não considera o desenvolvimento intelectual
como meta máxima e exclusiva da educação. Considera-a meio para a meta maior
do desenvolvimento da pessoa, uma vez que a inteligência é apenas uma parte no
todo constituído pela pessoa.

O aluno pode não estar amadurecido o suficiente, pode não se interessar no


conteúdo, ou estar passando por algum momento difícil, por exemplo. Há de se res-
peitar o tempo de cada indivíduo, mas incentivando-o e motivando segundo suas
necessidades.
17

A psicogenética walloniana não resulta de uma pedagogia meramente con-


teudista, limitada a propiciar a passiva incorporação de elementos da cultura pelo
sujeito. Resulta de uma prática em que a dimensão estética da realidade é valoriza-
da e a expressividade do sujeito ocupa lugar de destaque. Afinal, o processo de
construção da personalidade que, em diferentes graus percorre toda a psicogênese,
traz como necessidade fundamental à expressão do eu. "Expressar-se significa exte-
riorizar-se, colocar-se em confronto com o outro, organizar-se". (Galvão, 2001,
p.100) Segundo Wallon, na escola, tal movimento de exteriorização pode ser propi-
ciado por atividades no campo da arte, por exemplo.

Wallon também atribui grande importância ao meio no desenvolvimento infan-


til. Em sua teoria, o meio inclui a dimensão das relações humanas, a dos objetos
físicos e a dos objetos de conhecimento, sendo todas elas inseridas dentro do con-
texto das culturas específicas, veja:

O meio é o campo sobre o qual a criança aplica as condutas de que dispõe,


ao mesmo tempo, é dele que retira os recursos para sua ação. Com o desenvolvi-
mento ampliam-se as possibilidades de acesso da criança ás várias dimensões do
meio. No início ela age diretamente sobre o meio humano e é por intermediário des-
te que tem acesso às outras dimensões de seu contexto social. Com os progressos
no campo da motricidade práxica, ganha autonomia para agir diretamente sobre o
mundo dos objetos e, com a aquisição da linguagem (oral e depois escrita) adquire
recursos cada vez mais sofisticados para interagir com o conjunto de técnicas e co-
nhecimentos de sua cultura. Cada etapa do desenvolvimento define um tipo de rela-
ção particular da criança com seu ambiente, o que implica dizer que a cada idade é
diferente o meio da criança. (GALVÃO, 2001, p. 101)

Então, de acordo com Galvão, transpondo esta reflexão para escola, perce-
bemos a necessidade de se planejar a estruturação do ambiente escolar, uma vez
que este desempenha papel fundamental na promoção do desenvolvimento infantil.
Em termos práticos, isto significa que o planejamento das atividades escolares vai
além do conteúdo de ensino e deve também atingir as várias dimensões que com-
põem o meio: o espaço em que será realizada a atividade, os matérias utilizados, o
objeto colocado ao alcance das crianças, a disposição do mobiliário, entre outros.
Deve também levar em consideração a organização do tempo, definindo a duração e
o movimento mais adequado para a realização da atividade. Por fim, deve conter
uma reflexão sobre as oportunidades de interações sociais oferecidas.

É bom lembrar que a escola, ao possibilitar uma vivência social diferente do


grupo familiar, desempenha um importante papel na formação da personalidade da
criança. Ao participar de grupos variados a criança assume papéis diferenciados e
obtém uma noção mais objetiva de si própria. Quanto maior a diversidade de grupos
de que participar, mais numerosos serão seus parâmetros de relações sociais, o que
tende a enriquecer sua personalidade. (GALVÃO, 2001, p.101)

Wallon também dá destaque em seus estudos às crises e conflitos que en-


contra no processo de desenvolvimento da criança.
18

A discussão da relação de contradição entra as emoções e a atividade inte-


lectual também nos serve para reflexão pedagógica. Na vida cotidiana escolar são
comuns os conflitos envolvendo professores e alunos: turbulência e agitação motora,
dispersão, crises emocionais, desentendimentos entre os próprios alunos e deste
com o professor, são alguns dos exemplos mais comuns.

Segundo Wallon, cada uma dessas situações só pode ser compreendida den-
tro de seu contexto. No entanto, é possível perceber alguns traços comuns dessas
interações conflituosas, como a elevação da temperatura emocional e a perda de
controle do professor sobre a situação. A análise da Wallon sobre as emoções facili-
ta a compreensão dessas dinâmicas. Para ele, quanto maior clareza o professor ti-
ver dos fatores que provocam os conflitos, maior possibilidade terá de controlar a
manifestação de suas reações emocionais e encontrar caminhos mais saudáveis
para solucioná-los.

Dessa forma, a atividade intelectual voltada para compreensão das causas de


uma emoção, tende a reduzir seus efeitos, fazendo com que o professor aja de for-
ma mais adequada. Ao invés de se deixar contagiar pelo descontrole emocional das
crianças, deve procurar contagiá-las com sua racionalidade, através de informações
teóricas do comportamento emocional da criança e utilizando sua capacidade de
análise reflexiva.

A escola ainda hoje, ignora as questões ligadas ao corpo e ao movimento, ou


seja, as dimensões do ato motor no desenvolvimento infantil. Dessa forma, é comum
a proposta de atividades em que a contenção do movimento é uma exigência cons-
tante. Em geral, a intensidade que a escola exige essas condutas é superior às pos-
sibilidades da idade da criança, o que propicia dispersão e impulsividade, uma vez
que o cansaço flexibiliza ainda mais o domínio da criança sobre sua atenção e suas
reações motoras. Além disso, existe uma visão academicista que considera que a
criança só aprende se estiver parada, sentada e concentrada.

Wallon faz lembrar que o movimento (sobretudo em sua dimensão tônico-


postural) mantém relação estreita com a atividade intelectual Dessa forma, a imposi-
ção de imobilidade por parte da escola pode ter efeito contrário sobre a aprendiza-
gem, funcionando como um obstáculo.

Para o autor, não há uma postura-padrão que garanta a atenção da criança


em uma atividade, a atitude corporal adequada varia de acordo com o tipo de ativi-
dade e do estímulo. Além disso, para Wallon, muitas vezes são justamente as varia-
ções na posição do corpo que permitem a manutenção da atenção na atividade rea-
lizada. Wallon procura instigar no professor, uma atitude crítica e de permanente
investigação sobre a prática escolar.

Inspira um professor que, diante dos conflitos, não se contenta com respos-
tas-padrão ou fórmulas estereotipadas e mecânicas, mas busca compreender-lhes o
significado desvelando a complexa trama dos fatores que os condicionam. (GAL-
VÃO, 2001, p. 114)
19

De acordo com ele, o professor deve ser capaz de usar sua capacidade in-
ventiva. Para Wallon conflitos escolares sempre vão existir, no entanto, é importante
superar aqueles que indicam inadequação e equívocos da escola em atender as ne-
cessidades e possibilidades da criança.

Em suas idéias pedagógicas, Wallon propõe que a escola reflita acerca de


suas dimensões sócio-políticas e aproprie-se de seu papel no movimento de trans-
formações da sociedade. Propõe uma escola engajada, inserida na sociedade e na
cultura e, ao mesmo tempo, uma escola comprometida com o desenvolvimento dos
indivíduos, numa prática que integre a dimensão social e individual. (Galvão, 2001,
p. 113)

A psicologia de Wallon pode ser otimizada como instrumento a serviço da re-


flexão pedagógica, oferece recursos para a construção de uma prática mais ade-
quada às necessidades e possibilidades de cada etapa do desenvolvimento infantil.
Para Wallon, a educação deve ter como meta não só o desenvolvimento intelectual,
mas a pessoa como um todo. A solução para esse impasse não atinge somente os
métodos pedagógicos, requer também, uma reflexão política sobre o papel da esco-
la na sociedade, e agindo sempre em conjunto em prol de evitar o fracasso escolar.

2.1. Refletindo a prática

Dentre os viabilizadores envolvidos no processo aprendizagem, o professor


deve-se ser enfatizado como o líder deste processo, levando os outros envolvidos
para reflexão coletiva contínua sobre a prática pedagógica, favorecendo esta relação
aluno/conhecimento.

Quando o professor dispõe-se a refletir sua prática, ele se abre para compre-
ender o aluno e seu mundo. Confronta o que descobre sobre seu aluno concreto e o
que aprendeu sobre aquele genérico em seu curso de formação, tornando-se mais
competente para ensinar.

A reflexão crítica é primordial sobre a prática, é a formação permanente. Pau-


lo Freire confirma-nos isto dizendo:

Por isso é que, na formação permanente dos professores o momento funda-


mental e o da reflexão crítica sobre a prática. É pensado criticamente a prática de
hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática. (FREIRE, 1996: p.43).

Nesta linha de pensamento, o ato de educar é sem dúvida uma ação preocu-
pante, pois refletir sobre a finalidade do ensino é pensar sobre o destino do homem,
nosso lugar na natureza e a relação com os nossos semelhantes. A complexidade
do ato de educar está na sua essência. Não é fácil ajudar os alunos a organizar in-
formações e as visões multiformes, a lutar contra algumas delas e tornar outras pro-
veitosas, e tudo isso tomando o cuidado de não impor o próprio ponto de vista. Pois,
isto poderia desencadear num processo onde o fracasso escolar tomaria proporções
a partir da relação professor-aluno envolvendo ainda diversos segmentos da escola.
20

É certo que o aluno aprende num determinado contexto amplo e em um es-


paço específico, porém a forma de construir o conhecimento e de assimilar o conhe-
cimento ensinado são formas peculiares. E ai é o momento do professor disponibili-
zar toda sua criatividade para transformar o ambiente escolar em um espaço de
construção, banindo o conhecimento que se reduz a um conjunto de informações já
construídas, cabendo ao professor transmiti-las e, aos alunos, memoriza-las. Conte-
údos descontextualizados, sem uma intencionalidade explícita e, muito menos, uma
articulação com a realidade do aluno.

Segundo Paulo Freire (1996: p.25) "Ensinar não é transferir conhecimento,


mas criar as possibilidades para sua produção ou sua construção”.

Então o educador, por definição, é um profissional multiqualificado, mas não é


o centralizador do processo ensino-aprendizagem, mas um fomentador deste.

Acredita-se que através da nossa prática pedagógica, do cotidiano escolar e


das vivências experimentadas, que isto é possível quando o educador assume esta
postura. Daí, a grande questão tem sido para nós, a de como transformar a cada dia
a nossa escola num espaço em que o aluno se sinta sujeito da sua própria história.
O professor depara-se com alguns desafios, entre eles, a demanda de cada um. Po-
rém, não perdemos de vista a formação do indivíduo que não seja dominado pelo
discurso ou pela vontade do outro.

Atualmente, neste turbilhão de informações lançada na mídia neste mundo


globalizado, uma das formas mais adequadas de trabalhar os conteúdos tem sido
através de projetos. São eles os responsáveis em trazer a comunidade para a nossa
escola. E também fazer com que o aluno seja o construtor de seu conhecimento e
conheça melhor a comunidade em que vive descobrindo formas de interagir com o
meio.

E quanto à aplicação desta prática pedagógica, deverá ser visando desenvol-


ver e criar métodos para detectar a realidade e gerar estratégias para a ação, deverá
desenvolver e adotar esquemas conceituais autóctones e não dependentes, diver-
sos de muitos daqueles que vêm sendo empregados como "modelo", pois um mode-
lo de supervisão não serve a todas as realidades.

2.2. Visão da prática docente

Por ser a escola uma instituição muito complexa, a sociedade exige cada vez
mais que os indivíduos freqüentem-na durante alguns anos e ali aprendam os co-
nhecimentos necessários para a vida posterior.

Sendo obrigatório o Ensino Fundamental, é gerada uma situação em que a


escola tem a obrigação de manter o aluno na instituição, enquanto este não tem in-
teresse nenhum pelo que se faz na escola, desta forma, abandona-a antes de cum-
prir o tempo obrigatório, em alguns casos, estimulado pelos pais, ou por razões so-
ciais.
21

Mas o que levaria o aluno a se interessar pela escola? Uma razão bem sim-
ples para no interessarmos por algo seria estarmos motivados para tal, mas infeliz-
mente a escola, de modo geral, não está estruturada para despertar no aluno o inte-
resse em estar nela.

Para Freire (1996)

(...) Há perguntas a serem feitas insistentemente por todos nós e que


nos fazem ver a impossibilidade de estudar por estudar. De estudar
descomprometida mente como se misteriosamente, de repente, nada
tivéssemos que ver com o mundo, um lá fora e distante mundo, alhe-
ado de nós e nós dele (p.86).

No ponto de vista do autor a prática docente deve estar sempre atrelada com
o mundo real do aluno. Ao ingressar na escola o aluno tem os seus conhecimentos
prévios que servirão de suporte para maiores conhecimentos.

A solução estaria em partir de problemas reais da própria criança e fazer com


que os conhecimentos adquiridos na escola, vinculem-se com sua vida, mostrando
como o conhecimento serve para resolver problemas. A partir de problemas da cri-
ança, apresentar outros problemas e colocações teóricas, a fim de mostrar que o
conhecimento é uma força para transformar a realidade.

Assim, de acordo com o autor, quando se fala do conhecimento transmitido


pela escola não se pode furtar em falar do professor, que é a figura central na for-
mação dos educandos. É ele quem forma no aluno o gosto ou desgosto pela escola;
a motivação ou não pelos estudos; o entendimento da significância ou insignificância
do conhecimento escolar; a percepção de sua capacidade de aprender, de seu valor
como pessoa, entre outros. Da qualidade do relacionamento interpessoal professor-
aluno, e que é de sua responsabilidade o ajustamento emocional do aluno na sala
de aula e na escola. Portanto, não é possível conceber a idéia de criar estratégias
para fazer com que o aluno se sinta motivado pela escola, sem a participação do
professor. É com ele que os alunos fazem contatos mais significativos.

Portanto é o professor que vai dentro da realidade local poder evitar o trans-
torno do fracasso escolar, e para tal ele conta com a participação de todo os segui-
mentos da escola.

2.3 A construção interdisciplinar a partir da relação professor/aluno

Hoje em dia, ensinar é muito mais aprender. O processo de ensino-


aprendizagem é hoje muito mais que um simples "repassar" de conteúdo disciplinar.
Pede-se e exige-se atualmente a interdisciplinaridade.

Por isso, há uma nova perspectiva em relação à educação e ao processo de


ensino-aprendizagem. Esses conceitos de ensino, relação professor/aluno devem
ser revistos, visando exterminar o fantasma do fracasso escolar.
22

Há, portanto, uma necessidade de rever as posturas adotadas no processo de


ensino-aprendizagem. Não é porque algo vem sendo feito a muito tempo do mesmo
modo que esta é a melhor maneira de fazê-lo. Assim, o mundo atual mudou e exige
mudanças por parte da educação escolar. O mundo está cada vez mais globalizado,
exige uma educação interdisciplinar, contextualizada. Busca-se a educação subjeti-
va, que eduque os sentidos, na qual seja possível descobrir novos aspectos da vida
concreta, cotidiana.

Nesta visão LIBÂNEO (1993) revela que a idéia de ensino foi alterada, con-
trapondo-se ao imobilismo e decretando a autonomia, pois é o aluno quem deve
conduzir seu próprio processo de conhecimento. O professor deve ter uma atitude
de espera, de orientação. Assim, ensinar é aprender, pesquisar, construir. Aprender
é, primeiramente, aprender em relação à própria vida.

De acordo com LIBÂNEO (1993) a relação professor/aluno deve ser democrá-


tica e não baseada em hierarquias, entretanto, deve se basear no respeito mútuo.
Para ele a palavra de ordem da atualidade é interdisciplinaridade na educação. Mas
poucos se arriscam mudar, preferindo repetir as ações já tão repetidas e seguras.
Deve-se esboçar perspectivas para explorar as possibilidades. A rigidez deve ser
abolida.

Para a educação do momento ser uma construção efetiva de produção de co-


nhecimento, é fundamental que o professor seja mestre, que saiba aprender com os
seus educandos, pois são mais criativos, inovadores. A tarefa dos mestres não é
fazer os alunos aprenderem passivamente, mas conduzirem o ensino.

Portanto o ensino-aprendizagem é um processo complexo, pois para alcançar


os seus objetivos, deve-se trabalhar com temas e disciplinas contextualizadas com o
mundo e coerente com a realidade em que cada aluno vive. O professor deve ser
flexível, motivador e democrático, cuja avaliação sirva de referência e orientação
para a auto-avaliação do aluno e também do trabalho do docente. Pode-se conse-
guir uma educação que realmente exerça sua função humanizadora e social, for-
mando cidadãos, sujeitos históricos, capazes de analisar, criticar as situações que
vêm ocorrendo no mundo e não só entendê-los e adaptá-los a elas, mas modificá-
las, construindo sua própria história, isso se a educação partir de uma ótica na qual
o aluno é o sujeito da sua aprendizagem e na qual os conteúdos são interdisciplina-
res, que vão servir-lhes não só para a teoria, mas também para a prática, contextua-
lizando os conteúdos com suas próprias situações da vida.

2.4 Relação escola e família

A escola é um fenômeno relativamente moderno na história da humanidade, a


nobreza européia não mandava seus filhos à escola, contratava sábios como tutores
para que os iniciassem no mundo das artes e da ciência da época. Com a ascensão
da burguesia, os ricos comerciantes também exigiram o direito à educação formal
para seus filhos, e os conhecimentos antes restritos aos “bem-nascidos” estende-
ram-se um pouco.
23

A instituição escolar somente surgiu como prática por causa das exigências
crescentes de um mundo mais industrializado. A produtividade demandava trabalha-
dores mais bem preparados para operar máquinas, consertar engrenagens e enten-
der de processos produtivos. Com isso, precisava-se de pessoas que dominassem
minimamente os conhecimentos necessários nas fábricas. A popularização dos co-
nhecimentos escolares, porém, não tirou da família sua função intransferível: a
transmissão de valores morais e éticos.

KALOUSTIAN (1988) diz que no século XX, a dedicação cada vez maior de
homens e mulheres ao trabalho fez com que as crianças passassem muito mais
tempo fora de casa, e o papel da escola na formação dos indivíduos passou a ser
maior.

E depois de um século de escola para todos, mesmo nos países ricos, o su-
cesso escolar não acontece para todos e a escolarização bem-sucedida não elimi-
nou a desigualdade social. Há duas histórias da educação relacionada à classe so-
cial e à interação família-escola (Carvalho, 2000).

Uma história é aquela de uma classe que criou o valor da escola de acordo
com uma concepção particular (utilitária) de educação: a escola como extensão da
família da classe média. Outra história é aquela em que a escola, um modo de edu-
cação não familiar, foi imposta a uma classe como meio de salvação via aculturação.
A primeira é a história do sistema escolar credencialista e dos investimentos familia-
res na competição dos jovens de classe média por diplomas, enquanto a última é a
história do fracasso escolar que legitima a exclusão socioeconômica e que continua
a alimentar as políticas compensatórias destinadas aos estudantes em situação de
risco (CRAVENS, 1993, p.18).

De acordo com o autor, pode-se observar que as relações família–escola na


atual política educacional: passou do modelo de delegação ao modelo de parceria. E
nos discursos educacional da globalização neoliberal não é sobre justiça social e
felicidade pessoal, mas sobre competitividade econômica, eficácia escolar (medida
por testes), e sucesso individual por meio do investimento da família no dever de
casa. Desde a década de 1990, a família está sendo chamada a participar na escola
(perspectiva positiva) e está sendo responsabilizada pelo sucesso ou fracasso esco-
lar (perspectiva negativa). (CRAVENS, 1993)

Recentemente, o MEC instituiu o Dia Nacional da Família na Escola e publi-


cou a cartilha Educar é uma tarefa de todos nós: um guia para a família participar, no
dia-a-dia, da educação de nossas crianças (Brasil, 2002), seguindo a tendência atual
da política educacional originada nos países hegemônicos, particularmente nos Es-
tados Unidos.

No passado, a política educacional (estatal, oficial) não englobava direta e


explicitamente a educação familiar, subordinando, como agora, a educação domésti-
ca ao currículo escolar via dever de casa. As famílias de classe média, todavia, têm
alinhado tradicionalmente a educação doméstica ao currículo escolar, sobretudo no
contexto das escolas privadas.
24

CRAVENS, (1993) diz que atualmente, porém, a política educacional está ex-
pandindo seu raio de ação para além da escola, formalizando as interações família e
escola de acordo com um modelo particular de participação dos pais/mães na esco-
la: o de classe média, baseado na divisão de gênero tradicional.

O que se vê hoje é a escola reclama da ausência da família no acompanha-


mento do desempenho escolar da criança, da falta de pulso dos pais para dar limites
aos filhos, da dificuldade que muitos deles encontram em transmitir valores éticos e
morais importantíssimos para a convivência em sociedade. Por outro lado, a família
reclama da excessiva cobrança da escola para que os pais se responsabilizem mais
pela aprendizagem da criança, da ausência de um currículo mais voltado para a
transmissão de valores e da preparação do aluno para os desafios não-acadêmicos
da sociedade e do mundo do trabalho. O ser humano aprende o tempo todo, o papel
da família é fundamental, pois é ela que decide, desde cedo, o quê seus filhos preci-
sam aprender, quais as instituições que devem freqüentar, o que é necessário sabe-
rem para tomarem as melhores decisões no futuro.

Estar atento ao projeto educativo e ao perfil disciplinar da instituição, auxilia a


optar por aquela cujos valores e fundamentos mais se assemelham aos da família
em termos de exigências, visão de mundo, e outros. Conhecer as dependências e
possibilidades da escola, seus diferenciais, bem como os profissionais que estarão
encarregados da educação de seu filho também é recomendado. (SAVIANI 1991)

A família e escola são fundamentais para a sustentação de todo ser humano


quanto maior é a parceria maior será a influência. A participação dos pais na educa-
ção formal dos filhos deve ser constante e consciente. A vida com a família e a vida
na escola e vice e versa uma depende da outra. É essencial que os pais, professo-
res e alunos troquem experiências do dia-a-dia, assim trabalham os conteúdos do
colégio em casa.

Pois segundo Kaloustian (1988), a família é o lugar indispensável para a ga-


rantia da sobrevivência e da proteção integral dos filhos e demais membros, inde-
pendentemente do arranjo familiar ou da forma como vêm se estruturando. É a famí-
lia que propicia os aportes afetivos e sobretudo materiais necessários ao desenvol-
vimento e bem-estar dos seus componentes. Ela desempenha um papel decisivo na
educação formal e informal, é em seu espaço que são absorvidos o valor ético e
humanitário, e onde se aprofundam os laços de solidariedade. É também em seu
interior que se constroem as marcas entre as gerações e são observados valores
culturais.

Gokhale (1980) acrescenta que a família não é somente o berço da cultura e


a base da sociedade futura, mas é também o centro da vida social, sendo que:

A educação bem sucedida da criança na família é que vai servir de apoio à


sua criatividade e ao seu comportamento produtivo quando for adulto [...]. A família
tem sido, é e será a influência mais poderosa para o desenvolvimento da personali-
dade e do caráter das pessoas. (GOKHALE, 1980, p.15)
25

O dever da família com o processo de escolaridade e a importância da sua


presença no contexto escolar é publicamente reconhecido na legislação nacional e
nas Diretrizes do Ministério da Educação aprovadas no decorrer dos anos 90.

Portanto cabe aos pais e à escola a tarefa de transformar a criança imatura e


inexperiente em cidadão maduro, participativo, atuante, consciente de seus deveres
e direitos.

De acordo com GOKHALE (1980), a escola é responsável pelo conhecimento


escolar é um espaço destinado ao trabalho pedagógico formal, seguindo regras,
mostrando valores importantes, exercitando a cidadania, a experimentação de sen-
timentos. Já a família é a base da formação das pessoas, é o ambiente em que a
criança entra em contato com o mundo, esse é seu mundo, seu referencial para a
vida e para os valores. Falta a proximidade entre família e a escola. Proximidade que
vai além de deixar a criança na porta da escola, e que encontra os familiares do alu-
no somente em dias de festividade ou de entrega de resultados. Ao contrário, uma
relação que garanta à criança e ao jovem estudante a certeza de que sua família e a
escola em que estudam consideram dos mesmos valores, apesar de, em certos
momentos, usarem meios diferentes para atingir a mesma finalidade.

A família revela isso permanentemente aos filhos, e a escola, trabalha para


que isso se concretize de várias maneiras na vida das pessoas. A família e a escola
devem ter um trabalho de união, de compromisso assumido em parceria e em prol
da educação dos filhos e alunos. São as diferentes formas de como a família vem se
reorganizando na sociedade que a escola terá de se adaptar. Professores e orienta-
dores não podem ficar dentro da escola, sentados, esperando aquela família consti-
tuída de forma ideal: pai e mãe juntos, com relacionamento excelente e disponível
para fazerem tudo. E os familiares não podem deixar de ir à escola e saber do de-
sempenho geral do seu filho, por pensar que, se ele está na escola, os professores
que atendam, pois, o que importa mesmo é que passe de ano. O mundo não pede
um cidadão que somente "passe de ano", e essa consciência, pais e educadores
necessitam ter. O mundo quer mais, a criança precisa de mais, o jovem pode ser
mais.

A escola e família devem se unir e entender, como a criança se desenvolve,


do que necessita para conseguir assimilar as informações recebidas diariamente por
tantos meios, do que não precisa, que caminhos necessita construir e como fazer
isso para ser mais participante. A família tem que perceber que a escola e seus edu-
cadores vão muito além dos conteúdos e do "passar de ano". A escola entra na vida
das pessoas, e a família pode contar com essa aliada. Quando a criança entra na
escola, ela começa a aprender a enfrentar a vida por conta própria. Se os pais insis-
tem em intervir nesse processo, só um sai perdendo: a criança ou o jovem. Pergun-
tar ao filho como foi o dia na escola é positivo, ajuda-o a sentir que a escola é impor-
tante para a família, porém, quando isto se torna uma cobrança, onde o filho é obri-
gado a falar sobre a escola, se transforma em um desrespeito.

Para GOKHALE (1980), é preciso que os pais entendam que a escola é o


primeiro lugar onde os seus filhos têm controle sobre uma situação que eles (pais)
não têm, é o primeiro sentimento de privacidade.
26

Devemos respeitar isto. A criança não querer comentar sobre a escola, não
significa que não goste da escola. Na escola, a criança compreenderá que os deve-
res de casa, os trabalhos escolares e as notas são questões entre ele e seus profes-
sores. Hoje existem inúmeras propostas e metodologias, cabe a cada família buscar
aquela que melhor irá complementar a formação que deseja para seus filhos, pois
seus comentários e principalmente suas ações influenciam diretamente na vida es-
colar de seus filhos.

2.4.1 A influência da família na aprendizagem escolar


A participação dos pais na vida escolar dos filhos representa um papel muito
importante em relação ao seu bom desempenho em sala de aula. Também o diálogo
entre a família e a escola favorece sobremaneira para a construção do conhecimen-
to por parte do aluno, o que denota que a criança e seus genitores mantêm entre si
e com a aprendizagem uma ligação muito íntima e profícua.

Não é possível deixar de lado o fato de que os professores são extrema i m-


portância no processo ensino aprendizagem e, portanto, das ações escolares, inclu-
indo aquelas relativas ao relacionamento escola família. Numa visão construtivista, o
aluno tem a sua relação com o objeto mediada pelo professor e com ele mantém
vínculos positivos, que impulsionam a aprendizagem, ou negativos, que proporcio-
nam um afastamento das situações de aprendizagem – fracasso escolar.

De acordo com (Bassedas, 1996), envolver a família na educação escolar dos


filhos pode significar, para os educadores, que eles tenham que conhecer melhor os
pais dos alunos e realizar um trabalho conjunto com eles para criar, entre outros fa-
tores, uma atmosfera que fortaleça o desenvolvimento e a aprendizagem das crian-
ças.

Quando escola e família têm uma linguagem comum e posicionamentos ado-


tados colaborativamente no trato de aspectos da educação das crianças e da sua
escolarização, é possível que os educandos consigam ter uma aprendizagem mais
significativa, um percurso acadêmico mais tranqüilo e um desenvolvimento intelectu-
al e emocional mais harmonioso, o que não pode ser desprezado. Assim, percebe-
se que a influência da família precisa ser bem recebida pela escola, sem preconcei-
tos, orientando suas falhas e aplaudindo seus acertos, enfim, construindo uma rela-
ção de parceria e cumplicidade visando o bem estar da criança.

A necessidade de se construir uma relação na instituição escola, e buscar


uma proposta de aproximação dela com a família, para “[...] planejar e estabelecer
compromissos e acordos mínimos, que levem ao fim do bloqueio criado nesta situa-
ção” (Bassedas, 1996, p.35), ou seja, construir uma parceria que possa substanciar
o papel da família no desempenho escolar dos filhos e o papel da escola na constru-
ção de personalidades autônomas moralmente e intelectualmente falando, conforme
declara Macedo (1996, p. 13), “a determinação conjunta em oferecer uma experiên-
cia construtiva, que torne a criança melhor, tanto em relação aos conhecimentos es-
colares, quanto aos valores e princípios que nortearão a sua conduta [...].”
27

Quanto à parceria, precisa ser entendida enquanto uma relação de coopera-


ção, e quando se fala em cooperação, o conceito de Piaget expresso pelas palavras
de Menin (1996, p. 52): “Cooperação para Piaget, é operar com [...] é estabelecer
trocas equilibradas com os outros, sejam estas trocas referentes a favores, informa-
ções materiais, influências entre outros”.

Idêntico ao sentido piagetiano, a relação escola-família prevê o respeito mú-


tuo, o que significa tornar paralelos os papéis de pais e professores, para que os
pais garantam as possibilidades de exporem suas opiniões, ouvirem os professores
sem receio de serem avaliados, criticados, trocarem pontos de vista.

Tal parceria implica em colocar-se no lugar do outro, e não apenas enquanto


troca de favores, mas “[...] a cooperação, em seu sentido mais prodigioso: o de su-
por afetos, permitir as escolhas, os desejos, o desenvolvimento moral como constru-
ção dos próprios sujeitos, um trabalho constante com estruturas lógicas e as rela-
ções de confiança”. (TOGNETTA, 2002, p.33)

Segundo o próprio Piaget, no seu livro Para onde vai a educação:

Uma ligação estreita e continuada entre os professores e os pais leva pois a


muita coisa mais que a uma informação mútua: este intercâmbio acaba resultando
em ajuda recíproca e, freqüentemente, em aperfeiçoamento real dos métodos. Ao
aproximar a escola da vida ou das preocupações profissionais dos pais, e ao propor-
cionar, reciprocamente, aos pais um interesse pelas coisas da escola, chega-se até
mesmo a uma divisão de responsabilidades [...]” (1972/2000, p.50)

Pensar neste tipo de parceria requer então aos professores inicialmente uma
tomada de consciência de que, as reuniões baseadas em temas teóricos e abstra-
tos, reuniões para chamar a atenção dos pais sobre a lista de problemas dos filhos,
sobre suas péssimas notas, reuniões muito extensas, sem planejamento adequado,
onde só o professor pode falar, não têm proporcionado sequer a abertura para o ini-
ciar de uma proposta de parceria, pois os pais faltam às reuniões, conversam parale-
lamente, parecem de fato não se interessarem pela vida escolar das crianças. No
entanto não basta legitimar a situação com queixas e lamentações. Verdadeiramen-
te, as famílias não se encontram preparadas sequer para enfrentar, quanto mais pa-
ra solucionar os problemas que os educadores de seus filhos lhes entregam e trans-
ferem nas reuniões de pais, e outros poucos momentos em que se encontram os
protagonistas desta relação.

Deste modo a construção dessa parceria é função inicial dos professores,


pois transferir essa função à família somente reforça sentimentos de ansiedade, ver-
gonha e incapacidade aos pais, uma vez que não são eles os especialistas em edu-
cação, não entendem de psicologia, desconhecem a didática, a sociologia, enfim, os
resultados desta postura já se conhecem muito bem: o afastamento da família e o
fracasso do aluno.

Assim sendo as famílias e as escolas são parceiros fundamentais no desen-


volvimento de ações que favoreçam o sucesso escolar e social das crianças e ado-
lescentes atendidos em programas e projetos educacionais.
28

2.4.2 Escola e família: a importância do diálogo entre pais, alunos e pro-


fessores

No mundo globalizado em que vive o pais, e de acordo com a diversidade de


exigência nos diversos campos profissionais onde cresce a expectativa do sistema
educacional, percebe se que a escola tem tido como função responsabilizar se pelo
percurso escolar dos indivíduos, favorecendo a aprendizagem de conhecimentos
sistematizados construídos pela humanidade e valorizados em um dado período his-
tórico. A aprendizagem dos conteúdos escolares de diferentes naturezas deveriam
se concretizar durante a permanência dos alunos na escola, independente do con-
texto social e familiar ao qual pertençam.

Neste contexto os professores são sujeitos fundamentais no processo ensino


aprendizagem e, portanto, das ações escolares que incluem aquelas relativas ao
relacionamento escola família.

De acordo com Winnicott (1982) numa visão construtivista, o aluno tem a sua
relação com o objeto mediada pelo professor e com ele mantém vínculos positivos,
que impulsionam a aprendizagem, ou negativos, que proporcionam um afastamento
da situação de aprendizagem. Envolver a família na educação escolar dos filhos po-
de significar, para os educadores, que eles tenham que conhecer melhor os pais dos
alunos e realizar um trabalho conjunto com eles para criar, entre outras fatores, uma
atmosfera que fortaleça o desenvolvimento e a aprendizagem das crianças.

Porém, mesmo garantindo se a especificidade dos papéis da escola e do go-


verno na educação das crianças e o respeito ao conhecimento especializado que
detêm os professores para desenvolverem o seu trabalho, o estreitamento das rela-
ções entre escola e família pode ajudar os professores a exercerem a sua profissão
com mais competência.

Com essa aproximação os educadores podem passar a ter maiores informa-


ções a respeito de quem são os seus alunos, suas famílias, sua cultura, sua vida
cotidiana, o que, em última instância, favorece a organização do trabalho a ser de-
senvolvido em benefício dos alunos e da comunidade.

E, por parte dos pais, relações mais estreitas com a escola sempre poderá
ajudá-los a compreender melhor o trabalho por ela realizado e a se envolverem, na
medida de suas possibilidades, no processo educacional dos filhos, trabalhando de
forma consoante com as necessidades educativas da vida e da participação no
mundo atual.

E segundo Winnicott (1982, p. 217), é importante que os pais reflitam sobre


certos aspectos que podem vir a favorecer a aprendizagem escolar de suas crian-
ças. Assim sendo é evidente que a participação dos pais na vida escolar dos filhos
representa um papel muito importante em relação ao seu bom desempenho em sala
de aula. De modo paralelo, também o diálogo entre a família e a escola favorece
sobremaneira à construção do conhecimento por parte do aluno, o que denota que a
criança e seus genitores mantêm entre si e com a aprendizagem uma ligação muito
íntima e profícua.
29

Mas as relações entre seres humanos nem sempre são fáceis. E, para inibir
casos em que situações desgastantes ocorram, devemos nos acercar de duas pode-
rosas armas: o diálogo e o respeito. Tanto alunos, os pais destes, professores e ou-
tros seguimentos como os funcionários que trabalham diariamente conosco são se-
res humanos, e sabemos perfeitamente que os dias para as pessoas não são todos
iguais: existem aqueles em que parece que nada do que fazemos dá certo, que nin-
guém nos entende, que ninguém nos ama, e que o mundo todo conspira contra nós
a fim de nos derrubar. Assim, é normal que homens, mulheres e crianças tenham
dias considerados ruins, onde a irritabilidade impera, sendo que esses momentos
precisam ser respeitados, como sublinha Winnicott (1982).

Desta forma, para que a escola não se torne um campo de batalha, o profes-
sor deve se conscientizar da importância de duas atitudes: conhecer a fundo as
emoções, controlando as sempre que for necessário, e entender os momentos de
fragilidade de quem com quem convive, procurando, desta maneira, evitar todo e
qualquer momento negativo.

Como diz Cury (2003, p. 76):

“Nos primeiros trinta segundos que estamos tensos, cometemos os


piores erros, nossas piores atrocidades. No calor da tensão, seja
amigo do silêncio, respire fundo”.

Nessa mesma direção Cury (2003) alerta que além de tudo isso, os educado-
res precisam parar momentaneamente suas atividades e refletir sobre as práticas
que mantêm, pois a construção do conhecimento se dá pela reflexão. A escola não
pode ser um lugar onde o erro não seja permitido e onde só é valorizado o aluno que
consegue tirar boas notas. Sabemos que se trata de um processo delicado e que
exige muitos cuidados, mas precisamos rever o que aprendemos em nossa forma-
ção, pois o mundo mudou e ainda vai continuar mudando.

Portanto, o professor também precisa mudar, nos contextualizando com es-


sas transformações diárias. O professor deve estar em um constante fazer e refazer,
propondo, questionando, avaliando, inovando... Porém, sua ação não pode dar se a
esmo, necessita ser planejada e refletida com esmero. Segundo Cury (2003, p. 17):
“Um excelente educador não é um ser humano perfeito, mas alguém que tem sere-
nidade para se esvaziar e sensibilidade de aprender”.

Já o aluno necessita de incentivos e estímulos. É necessário que conheça


sua situação em relação a si mesmo e em relação aos seus colegas e professores.
Por sua vez, as informações que os familiares do educando devem receber deverá
ter um caráter educativo: a partir desses dados os pais poderão estimular ainda mais
seus filhos em seu dia a dia escolar.

A referência básica necessita ser o processo pessoal do educando, a fim de


que se perceba claramente o que se poderá fazer para ajudá-lo, instaurando-se um
diálogo capaz de envolver família e escola.
30

Para LIBÂNEO (1993) em se tratando da administração do estabelecimento


de ensino, deve ser disponibilizada qualquer informação que solicitar, mas estas in-
formações deverão ser as mais complexas possíveis, ricas em detalhes e dados.
Seria extremamente incoerente se uma escola adotasse um ensino voltado à diver-
sidade, globalização, transversalidade, e outros, e ainda resumisse todas as infor-
mações acerca de um aluno em uma simples nota.

Um outro fato relevante com referência às informações sobre os alunos é a


sua privacidade. Estas informações necessitam ser usadas unicamente para contri-
buir para o progresso tanto do estudante como do professor: aos professores para
que possam adaptar o ensino às necessidades do aluno e para que valorizem seu
esforço, e ao aluno para que se conscientize de sua situação e analise seus pro-
gressos, retrocessos e envolvimento pessoal. Assim, não é justo e nem útil que esse
conhecimento se proclame indiscriminadamente aos quatro ventos, o que, com cer-
teza, não levaria a um diálogo construtivo.

Por exemplo, é costume sacramentado, as informações sobre a aprendiza-


gem dos alunos serem as mesmas tanto para eles, como para os professores, pais e
administração da escola, geralmente vindas em forma de boletins de notas. Para
Bozzetto (2005) uma escola que presta atenção à diversidade e que busca a forma-
ção integral da pessoa precisa propor formas diferentes de informação, cada qual
destinado a um segmento envolvido no processo educativo, onde o diálogo entre
pais, mestres e alunos é devidamente valorizado.

Assim, é conveniente que aos professores, sejam disponibilizados todos os


dados que permitem conhecer cada passo seguido pelo aluno em seu processo de
aprendizagem, visando determinar suas necessidades e, a partir daí, propor novas
medidas educativas. A equipe docente precisa ficar a par de tudo o que se refere a
cada aluno em particular, obtendo dados sobre o processo seguido, resultados obti-
dos, medidas específicas utilizadas e qualquer incidente significativo que ocorrer.
Desta forma, a escola poderá garantir a continuidade e a coerência no percurso do
aluno.

Segundo Bozzetto (2005a, p. 42):

Os registros de acompanhamento dos alunos necessitam ser cons-


truídos ao longo do processo de ensino e de aprendizagem, pois a
avaliação é integrante dos mesmos. A sua elaboração requer, por-
tanto, um processo contínuo e constante. É durante o processo que
o/a professor/a registrará as necessidades de cada aluno e o que fez
para auxiliá-lo a superá-las.

Além disso, de acordo com a autora, para que se instaure um clima de diálo-
go na escola e para bem realizar o seu trabalho ao longo do ano, é válido que o pro-
fessor sugira leituras específicas e adequadas, promova reuniões de estudo, organi-
ze momentos em que haja efetiva troca de idéias e experiências com colegas e com
o grupo em geral, estimulando e oportunizando o crescimento de todos, visando
manter a hegemonia de pensamentos e ações da comunidade escolar.
31

O professor precisa também se manter permanentemente atualizado, reali-


zando leituras da área educacional, bem como assuntos da contemporaneidade,
uma vez que suas ações e orientações não podem incorrer no campo do “achismo”
e de meias certezas. Desta forma, dialogando bem em seu próprio meio, a escola
terá maiores condições de dialogar com êxito com seus pais.

Infelizmente, o que se percebe é que ainda falta uma proximidade real entre
família e escola. Uma aproximação que vá além do ato de deixar a criança ficar na
porta do estabelecimento ou este encontrar os familiares do aluno somente em dias
de festividade ou entrega de resultados. Urge instaurar uma relação que garanta
verdadeiramente a criança e ao jovem estudante a certeza de que sua família e a
escola em que estudam comungam dos mesmos valores, apesar de, em certos mo-
mentos, usarem meios diferentes para atingir a mesma finalidade: a construção do
conhecimento por parte do educando.

De acordo com Freire (1997) ninguém educa ninguém, assim como ninguém
educa sozinho: alguém só aprende se existir uma pessoa que lhe deseje ensinar. Da
mesma forma, alguém só ensinará se houver um indivíduo predisposto a aprender, e
o aprender se tornará prazeroso na medida em que for significativo. Assim, no mun-
do complexo em que vivemos, a nossa missão é realmente desafiadora, pois temos
o compromisso de introduzir, de lançar nosso educando em um espaço público, em
um universo de muitas incertezas, onde, muitas vezes, nem sabemos o que está
certo ou o que está errado. Pensando desta forma, vemos que o conhecimento se
amplia e que cada aula dada por nós é uma grande oportunidade de crescimento,
tanto nosso como o de nossos alunos.

Mas, para que isso ocorra a contento, é necessário diálogo: o professor cons-
trói a sua história se comunicando, e é imprescindível que tenhamos essa capacida-
de de representar o mundo através de várias linguagens de expressão. Trata se de
uma caminhada árdua e cheia de obstáculos, mas ser educador é isso mesmo:
aquele que assume a força de suas idéias e não se abate diante das barreiras surgi-
das, aprimorando, constantemente, métodos para vencer estes desafios, dialogando
com seus alunos e com a família destes.
32

3. CONTRIBUIÇÕES DA PSICOPEDAGOGIA NO CONTEXTO DO


FRACASSO ESCOLAR

O atual modelo de competência confronta-se em uma ação humana criativa,


contextualizada, adequada à realidade, respaldada no conhecimento científico e rea-
lizada com muita maturidade emocional, pois as pessoas no seu dia a dias têm tare-
fas como: aprender a lidar com o desconhecido, com o conflito, com o inusitado, com
o erro, com a dificuldade, transformar informação em conhecimento, ser seletivo e
buscar na pesquisa as alternativas para resolverem os problemas que surgem, e a
escola, no cumprimento da sua função social, deverá desenvolver nas crianças e
jovens que nela confiam a sua formação, competências e habilidades para prepará-
los para agir conforme as exigências da contemporaneidade.

E por não ter como se distanciar desta realidade, todos os profissionais da


educação sentem a necessidade de refletir sobre suas ações pedagógicas no que
diz respeito a conhecer e reconhecer a importância do sujeito da aprendizagem, a
entender o que pode facilitar ou impedir que se aprenda.

Para auxiliar professores e todos aqueles envolvidos com a questão do


aprender, surgiu a Psicopedagogia, ciência nova que se destina a buscar as causas
dos fracassos escolares e resgatar o prazer de aprender numa visão multidisciplinar,
podendo orientar as instituições escolares e seus professores e atender a pais e
alunos na perspectiva de transformar as relações com o aprendizado.

Portanto a psicopedagogia veio trazer uma contribuição mais rica no enfoque


pedagógico. O procedimento de aprendizagem da criança é compreendido como um
processo abrangente, implicando componentes de vários eixos de estruturação: mo-
tores, cognitivos, sociais, afetivos, políticos, entre outros. Atualmente a causa do su-
cesso de aprendizagem, bem como de suas dificuldades, deixa de ser centrada so-
mente no aluno e no professor e passa a ser vista como um processo maior com
inúmeras variáveis que precisam ser apreendidas com bastante cuidado pelos pro-
fessores e psicopedagogos.

O professor já não se defronta com um processo linear de crescimento e de-


senvolvimento, tanto no desenvolvimento intrínseco como na expressão, mas com
um realizar-se descontínuo no qual, fases e períodos se entrecruzam, se opõem dia-
leticamente, oposições de que resulta uma nova estruturação. Visão esta que apon-
ta um deslocamento de uma vertente universalista atemporal para uma vertente par-
ticularista temporal.

Segundo Oliveira (1995), o fundamental "é perceber o aluno em toda a sua


singularidade, captá-lo em toda a sua especificidade em um programa direcionado a
atender as suas necessidades especiais". É a percepção desta singularidade que vai
comandar o processo e não um modelo universal de desenvolvimento. Isto porque o
uso do modelo universalista camufla normalmente uma concepção preestabelecida
do processo de desenvolvimento do sujeito. Na intervenção psicopedagógica deve-
se evitar as chamadas "profecias auto-realizadoras", isto é, prognósticos que o pro-
fessor lança a respeito do processo de desenvolvimento de seu aluno sem levar em
consideração o seu desempenho.
33

Mas é preciso que o psicopedagogo também altere a sua forma de conceber


o processo de ensino-aprendizagem. Ele não é um processo linear e contínuo que
se encaminha numa única direção, mas, sim, multifacetado, apresentando paradas,
saltos, transformações bruscas, entre outras.

O processo de ensino-aprendizagem inclui também a não-aprendizagem, ou


seja, não é uma exceção dentro do processo de ensino-aprendizagem, mas se en-
contra estreitamente vinculada a ele. O aluno pode se recusar a aprender em um
determinado momento.

Então o chamado fracasso escolar não é um processo excepcional que ocorre


no sentido contrário ao processo de ensino-aprendizagem. Constitui, sim, exatamen-
te a outra face da mesma moeda, o seu lado inverso. O saber e o não-saber estão
estreitamente vinculados. O não-saber se tece continuamente com o saber. Com
isto, pretende-se dizer que o processo de ensino-aprendizagem, do ponto de vista
psicopedagógico, apresenta sempre uma face dupla: de um lado, a aprendizagem, e
do outro, a não-aprendizagem. O desejo de saber faz um par dialético com o desejo
de não-saber.

De acordo com Fernández (1991, p.87):

O jogo do saber-não-saber, conhecer-desconhecer e suas diferentes


articulações, circulações e mobilidades, próprias de todo ser humano
ou seus particulares nós e travas presentes no sintoma, é o que nós
tratamos de decifrar no diagnóstico.

Nesta perspectiva, a aprendizagem põe em foco as diferentes dimensões do


aprendiz sob a ótica integradora dos aspectos cognitivo, afetivo, orgânico e social. O
"olhar" sobre estes aspectos, ao mesmo tempo em que relata a importância da esco-
la na aprendizagem, coloca em foco a importância de toda a reunião de fatores ex-
tra-classe que interferem no processo de construção do conhecimento e do papel de
aprendiz.

Em considerar a aprendizagem como um processo articulado ao momento do


aprendiz, a sua história e as suas possibilidades sob o aspecto cognitivo, afetivo e
social, a Psicopedagogia, segundo Silva (1998, p.59):

Rompe a ligação ensino-aprendizagem, porque, tanto o aprender


como processo quanto o processo de construção do conhecimento
não tem relação necessária com o ensinar e, finalmente, porque am-
bos os processos antecedem e ultrapassam o ensinar.

Sob este ponto de vista passa a existir a necessidade de o psicopedagogo in-


vestigar com profundidade os contextos do aprendiz e tentar reuni-los em uma sínte-
se que retrate o momento desse aprendiz, ao mesmo tempo em que viabiliza a
aprendizagem.

Para aprender, o aluno precisa estar apto a fazer um investimento pessoal no


sentido de renovar-se com o conhecimento.
34

Implica um movimento que envolve, tanto a utilização dos recursos cognitivos


mesclados com os processos internos, quanto com suas possibilidades sócio-
afetivas. Vale dizer que a aprendizagem vai acontecendo à medida que o educando
vai construindo uma série de significados que são resultados das interações que ele
fez e continua fazendo em seu contexto social.

Expandiu-se a visão de que não basta e nem é garantia de sucesso escolar


um ambiente doméstico favorável materialmente aos estudos, e uma professora inte-
ressada e competente para que a aprendizagem aconteça com sucesso. Assim sen-
do, trabalha-se com a possibilidade do modelo de aprendizagem não se caracterizar
como algo de cunho somente individual, mas também como um modelo desenvolvi-
do em uma rede de vínculos que se estabeleceu em família. E é a família que dará
noções de poder, autoridade, hierarquia, funções que têm diferentes níveis de poder
e onde aprendem habilidades diversas. Aprendem ainda a adaptar-se às diferentes
circunstâncias, a flexibilizar, a negociar. Por fim, desenvolverá o pertencimento da
criança ao seu núcleo familiar. À medida que a criança vive em família e se submete
aos seus rituais, processo e desenvolvimento, ela vai se individualizando, diferenci-
ando-se em seu sistema familiar.

Quanto mais as fronteiras entre os membros da família estiverem nítidas,


mais possibilidade de individualizar-se a criança terá. Se tiver irmãos, é a oportuni-
dade de experimentar relações com iguais.

Sendo neste cenário que a criança constrói o seu modelo de aprendiz e a


forma como ela se relaciona com o conhecimento. Para a família do aluno, a escola
tem uma simbologia e um significado que estará presente na forma de "ser aluno" e
na sua forma de participação nas atividades escolares. A maneira pela qual a crian-
ça se integra e se entrega ao seu processo de aprender está diretamente relaciona-
do à capacidade desenvolvida em família de viver o coletivo compactuado.

Para a escola do aprendiz, a família é a matriz indispensável para que o tra-


balho de construção do cidadão aconteça. Toda a riqueza do desenvolvimento da
criança se inicia na família e vai se fortificando à medida que esta vai estabelecendo
sua rede relacional que, na seqüência, acontece na escola e se expande para além
dela.

É em relação com seus pares e em um contexto democrático que a criança


consolida o seu papel social de cidadã. Porém, de uma forma geral, a escola não vê
com bons olhos interferências pedagógicas suscitadas pela família que, por sua vez,
nem sempre aceita orientações psicopedagógica de caráter formativo da escola.

Nesse jogo de forças quem perde são os alunos e, conseqüentemente, todos


os envolvidos. O sucesso está na unidade e na coerência de atitudes. Eis um desa-
fio constante que, sem dúvida, merece ser perseguido. Pois toda ajuda que possa vir
a resolver a questão do problema da evasão escolar é bem vindo e sabemos que
esta é uma das principais funções da psicopedagogia em visão do contexto do fra-
casso escolar.
35

3.1 Dificuldades para a psicopedagogia

O trabalho psicopedagógico, encontra dificuldades localizadas no desconhe-


cimento do processo de aprendizagem e na própria relação com o aprendiz. Na insti-
tuição escolar, o psicopedagogo, além dessas dificuldades, encontra outros tipos de
resistência, pois essa ação exige mudanças no sentido de avaliar as propostas de
ensino, a partir do acompanhamento do processo de aprendizagem do aluno.

E para a avaliação da situação, o psicopedagogo, no encontro inicial com o


sujeito aprendente e seus familiares, na anamnese, usa dois recursos importantíssi-
mos: o “olhar” e a “escuta” psicopedagógica, que o auxiliará a captar através do jo-
go, do silêncio, das expressões do sujeito, dados que possam explicar a causa do
não aprender.

Na composição do diagnóstico, o psicopedagogo considera os outros siste-


mas - escola, professor e família - que interferem positiva ou negativamente no pro-
cesso de aprendizagem. Em relação à escola, avalia-se a forma como está organi-
zada, inclusive a sua estruturação hierárquica, sua orientação de trabalho, os confli-
tos internos e o seu projeto pedagógico.

E na tradicional aceitação do rendimento do estudante, sem análise do seu


processo de elaboração e das condições para sua aprendizagem, cria um falso qua-
dro sobre a situação de escolarização (MASINI, 1994).

Nesse aspecto, os maus resultados são vistos, quase exclusivamente, como


de responsabilidade do aprendiz. Apontá-lo como lento, problemático, ou sem pré-
requisitos é um procedimento comum por parte das equipes educacionais, nas suas
várias instâncias.

Analisar o processo do aluno em situação de sala de aula, na relação com o


professor e os colegas ante as condições de ensino que lhe são oferecidas, constitui
uma drástica mudança no quadro da escolarização, exigindo dos educadores cons-
tante reflexão sobre sua ação. Isto não é fácil, pois envolve transformações de atitu-
des e do pensar dos educadores.

É preciso repensar o ato de aprender na instituição escolar utilizando uma


proposta viável em busca de uma aprendizagem significativa por parte do sujeito.

3.2 A influência da prática pedagógica na produção do sucesso /


fracasso escolar

Para evidenciar a importância das interações aluno/conhecimento e profes-


sor/aluno/conhecimento na construção do sucesso/fracasso escolar, é preciso re-
pensar muito sobre a escola e suas práticas pedagógicas. É preciso pensar a edu-
cação como trabalho de humanização e realização pessoal, tanto para os alunos
como para os educadores. E no decorrer das transformações ocorridas na socieda-
de, muitas vezes, a escola não consegue acompanhá-las, as atividades escolares
continuam semelhantes ao que se pratica desde tempos remotos.
36

Assim, a vida social, modifica-se rapidamente, sem que a educação seja ca-
paz de adaptar-se a essas mudanças. Consequentemente, toda esta falta de adap-
tação do processo de educação ao tipo de sociedade vigente, reflete na falta de inte-
resse do aluno ao ambiente escolar. Ao observarmos a história da educação brasilei-
ra, percebemos que sempre estiveram presentes problemas relacionados ao fracas-
so escolar.

Os problemas educacionais não podem ser reduzidos a problemas puramente


burocráticos. Existe preocupação com questões de carga horária, idade de escolari-
zação, avaliação do rendimento, entre outros. No entanto pouco se tem pensado no
que o aluno quer aprender e como aprender.

Conforme já mencionado, os seres humanos aprendem ao longo de suas vi-


das, uma enorme quantidade de coisas necessárias para sua sobrevivência, e isso
acontece sem muito esforço. Ao mesmo tempo, muitos passam anos nas instituições
escolares e pouca coisa consegue aprender. Enfoque que deve ser atribuído ao fato
da escola estabelecer uma oposição entre o conhecimento cotidiano e o conheci-
mento escolar.

Isto nos reflete aos estudos de Vygotsky (1984), ao enfatizar a natureza social
do conhecimento já apontava para a importância do ensino bem organizado no pro-
cesso de aprendizagem e conseqüente desenvolvimento do indivíduo.

Então o fracasso não pode ser atribuído único e exclusivamente às famílias


desestruturadas, às dificuldades econômicas e aos problemas cognitivos ou intelec-
tuais. E a escola? O que os educadores têm feito para melhor atender seus alunos,
especialmente aqueles que apresentam dificuldades de aprendizagem?

Às vezes a escola opera com princípio de que o problema está nos alunos e
que somente eles próprios poderão resolvê-los, levando-os a assumir sozinho a cul-
pa pelo seu fracasso, esquecendo que não existe um só culpado quando o aluno
fracassa, pode haver vários fatores que o levem a isto como por exemplo: a escola,
a metodologia utilizada e até mesmo o próprio sistema vigente, pois Vygotsky (1984)
já afirmava que todas as funções no desenvolvimento do indivíduo originam-se das
relações sociais reais entre indivíduos humanos, na mesma linha de pensamento,
Mortimer (1994) completa que: a diferentes realidades, pertencentes a contextos
sociais específicos, correspondem diferentes formas de conhecimento.

E pra solucionar este problema, as escolas precisam refletir e propor ações


junto à psicopedagogia, que provoquem mudanças nas práticas em sala de aula,
pois os alunos que fracassam se devem não somente a problemas pessoais, mas a
um conjunto de condições sócio-culturais e, sobretudo escolares que dificultam e até
impossibilitam a inserção dos alunos no processo de aprendizagem. Por esta razão,
é preciso planejar e assegurar a execução de prática pedagógicas significativas para
a vida do aluno. A prática da atitude de permitir iniciativas, sugerir, incentivar, de-
monstrar e inovar é fundamental no processo de comunicação e de liderança, de
relações interpessoais no processo educativo. É esta a influência que a prática pe-
dagógica deve ter na produção do sucesso evitando o fracasso escolar.
37

3.3. Conhecer para interagir

Ao longo de vidas, o ser humano se depara com situações que lhes permitem
conhecer-se um pouco mais, pois isto faz parte do processo-vida. Um processo ina-
cabado, que nos auxilia a "crescer" como pessoa, além da possibilidade da auto-
aceitação.

TRINDADE (2001), em uma de suas falas nos envereda para um momento de


reflexão:

A gente olha, mas não vê, a gente vê, mas não percebe, a gente percebe,
mas não sente, a gente sente, mas não ama e, se a gente não ama a criança, a vida
que ela representa, as grandes possibilidades de manifestação dessa vida que ela
traz, a gente não investe nessa vida, e se a gente não investe nessa vida, a gente
não educa e se a gente educa no espaço/tempo de educar, a gente mata, ou me-
lhor, não educa para a vida, a gente educa para as mortes das infinitas possibilida-
des (p.09).

Assim, conhecer o aluno significa criar situações para as manifestações de


suas possibilidades. Estão diante de nós, educadores, os desafios de considerar as
diferenças étnicas, culturais e as limitações de cada um, propiciando acolhimento,
sem perdermos de vista os nossos objetivos.

E diante de situações constrangedoras que vive a sociedade brasileira, da


acomodação, da alienação e da reprodução das desigualdades; estão presentes os
desejos, os interesses, frutos de uma pluralidade de vidas. E essa pluralidade muitas
vezes ignoradas pela escola, o aluno percebe que a escola não tem nada ver com
sua vida de todo dias, dentro dela não há espaço para seus problemas e preocupa-
ções. E é ai que começa a acarretar o fracasso escolar. Surge então a necessidade
de se pensar sobre o acolhimento e a socialização do aluno no ambiente escolar.

Pois dentre os fenômenos grupais, nós temos a percepção, e através da per-


cepção que temos dos outros, de suas características, de suas ações e das disposi-
ções que atribuímos, reagimos e entramos em interação com os outros. É preciso
perceber o aluno para interagir. Um dos grandes problemas enfrentado pela educa-
ção brasileira é manter o aluno na escola, e em função disso vários programas de
governos são implementados dentro da Política Educacional. Acreditamos porém
que, as causas da não permanência sejam múltiplas, cabe enfatizar entre elas a falta
de acolhimento dos alunos pela escola, uma vez que, de certo modo, esse fator
condiciona os outros.

Não conquistar essa interação professor/aluno acarreta o fracasso escolar, e


consequentemente efeitos na vida moral, social e afetiva que na maioria dos casos
acompanha o indivíduo durante toda a sua vida, podendo redundar em exclusão so-
cial.

Estudos a este respeito conforme citado anteriormente como o de Costa


(1993) demonstram o empenho dos familiares em contribuir para a reversão da situ-
ação de fracasso em que seus filhos se encontravam.
38

E o acolhimento dos alunos nas escolas, requer compromisso manifestado


em uma série de medidas concretas que, embora não sejam de responsabilidade
exclusiva do professor, precisam ser assumidas por ele. A postura de acolhimento
envolve tanto a valorização dos conhecimentos e da forma de expressão de cada
aluno como processo de socialização. Valorizar o conhecimento do aluno, conside-
rando suas dúvidas e inquietações, implica promover situações de aprendizagem
que façam sentido para ele. Exercer o convívio social no âmbito escolar favorece a
construção de uma identidade pessoal, pois a socialização se caracteriza por um
lado pela diferença individual e por outro pela construção de padrões de identidade
coletiva.

Contribuir para o processo de acolhimento dos alunos não é tarefa simples,


pois envolve lidar com emoções, motivações, valores e atitudes do sujeito em rela-
ção ao outro, suas responsabilidades e compromissos. E a escola, com todas as
suas contradições e limites, ocupa um espaço privilegiado na vida dos alunos, e in-
flui, intencionalmente ou não, na construção de suas identidades e projetos de vida,
entre outros aspectos.

A escola a qual desempenhamos a função educadora, está inserida em uma


comunidade que teve transformações políticas, econômicas e sociais, apesar de
ainda ser considerada inferior, no entanto percebemos que a escola não acompa-
nhou paralelamente estas transformações. Atualmente a escola já atende a esta
comunidade; existe um trabalho paralelo. Acredita-se, porém, que foi um processo
lento, e consideramos inacabados, pois este envolve algumas pessoas que depen-
dem de uma ação integrada, para conhecer e interagir.

Hoje, não na sua totalidade, a escola mais os pais, a comunidade entorno e


os funcionários se interessam pela escola e pela melhoria do processo pedagógico.
Através dessa ação integrada temos conquistado aos poucos a autonomia tão dese-
jada pela escola, que entre outra está a influência da prática pedagógica na produ-
ção do sucesso/fracasso escolar.

Investe-se numa gestão participativa, onde todos trabalham juntos com o ob-
jetivo de melhorar a qualidade do ambiente, criando condições necessárias para o
ensino e a aprendizagem mais eficaz, e identificando os pontos positivos e negativos
e sempre buscando a melhoria.

Cada aluno desenvolve uma auto-imagem de estudante, mais positiva ou ne-


gativa, construída nas relações do cotidiano escolar. Cada professor influencia essa
auto-imagem com o tipo de relação que estabelece e na forma como vê o seu aluno,
projetando diferentes expectativas sobre cada um deles.

Os critérios utilizados para atribuir maior ou menor competência quase sem-


pre se baseiam em aspectos aparentes, como no caso do aluno mal vestido; um
aluno desse estilo pode ser considerado como evidencia da falta de condições para
aprendizagem. Ao relacionar-se dessa forma com o aluno, o professor não lhe facili-
ta o envolvimento com aprendizagem e reforça uma auto-imagem negativa, de quem
nunca irá ter sucesso na escola e, talvez, na vida.
39

A reflexos dos padrões exigidos pela escola, alguns alunos aprendem a confi-
ar em si, aprendem que são capazes, enquanto outros aprendem que são incapa-
zes, sendo que muitos não aceitam o que a escola lhes faz crer e se tornam rebel-
des para não serem fracassados, acredito que isso ocorra de forma inconsciente.

FALCÃO (1985) afirma que alunos que se acreditam incapazes, ou pouco ca-
pazes, desenvolvem mais facilmente postura de submissão, restringem seu olhar ao
horizonte já conhecido e não encontram possibilidades de desenvolvimento de suas
capacidades, e futuramente vê suas possibilidades de participação social restringi-
das. Essa é talvez, uma das maiores violências cometidas pela escola.

Segundo Estebam (1992, p. 77) a ação do professor (inserido no espaço es-


colar) é indispensável para que as crianças atualizem suas possibilidade de suces-
so. Reconhecendo como legítimas, o que não significa inquestionáveis, as experiên-
cias do aluno vivenciadas nos mais diversos espaços – na família, na rua, no grupo
de amigos e também na escola tornando-se condição para estabelecer um diálogo
com os alunos o que, por sua vez, é condição para que o conhecimento escolar te-
nha sentido para eles.

Enfim, cada escola tem de ter claro quem são seus alunos para, a partir daí,
desenvolver um projeto educativo que tenha clareza sobre as questões mais impor-
tantes a serem trabalhadas. Diferenças de idade (comum em escola pública), carac-
terísticas sócio culturais, de características de local de moradia, entre outras, fazem
com que as questões enfrentadas pelos alunos variem significativamente, exigindo,
portanto, atenção diferenciada e projetos educativos também diferenciados. Com-
preender as diferenças no âmbito escolar também é estar atento às experiências
escolares dos alunos, para que as propostas de trabalho apresentadas sejam enri-
quecedoras e viáveis de serem executadas.

A escola pode proporcionar aos alunos, momentos de reflexão de qualidade


distinta daquela exercida no âmbito da família, da igreja e dos meios de comunica-
ção. Todos, inclusive a escola, buscam reafirmar projetos e valores significativos
para a criança. Mas a escola pode diferenciar-se das outras instituições organizan-
do-se para colaborar na vivência e clarificação dos momentos em que se encontram
seus alunos, contribuindo para que percebam e reflitam sobre os diferentes conhe-
cimentos e assim, estabeleçam os seus. Desta forma, a escola pode ser reconheci-
da pelos seus alunos como espaço que acolhe suas questões e contribui para que
encontrem respostas para sues questionamentos.

Trabalhar na perspectiva do diálogo com os alunos, tendo como referência as


peculiaridades dos mesmos, visando o desenvolvimento de suas capacidades e a
ampliação e o enriquecimento dos referenciais para a construção de identidades,
são formas de se interagir.

A escola precisa ter uma postura de acolhimento: pode até questionar, mas
respeitar as diferenças culturais e sociais de cada aluno, compreendendo sua impor-
tância para o processo de construção identidária dos alunos.
40

A escola precisa estruturar-se de maneira viva, dinâmica, estimulando os alu-


nos a se manifestarem das mais diferentes formas; a produzir e partilhar suas pro-
duções (de conhecimentos, de expressões artísticas e expositivas), também as pro-
duzidas fora do espaço escolar, com os demais.

Ao conceber a educação escolar como uma prática que tem a possibilidade


de criar condições para que todos os alunos desenvolvem suas capacidades, é pa-
pel da escola, ou seja, discutir como poderá atuar na educação da criança na pers-
pectiva da participação em relações sócias, políticas e culturais cada vez mais am-
plas, condições estas fundamentais para o exercício da cidadania na construção de
uma sociedade democrática e não excludente. Encontrando mecanismos práticos
para viabilizar interação entre professor/aluno/conhecimento/ comunidade escolar e
pais, com influência da prática pedagógica para atingir a produção do sucesso ou do
fracasso escolar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

De acordo com as pesquisas realizadas conclui-se que para o bom curso da


educação em nosso país há de se criar um projeto em grande escala em nível naci-
onal que contribua com a inovação educacional criando um ambiente favorável para
os projetos ligados ao estudo, ao ensino, proporcionando aos alunos estímulo, no-
vos desafios, incentivar suas habilidades e raciocínio integrando várias disciplinas,
bem como instigar seus hábitos de estudar para buscar mais conhecimento. Ofere-
cer ao aluno, meios que ajudem em sua auto-estima, não só encorajá-lo mas, mos-
trá-lo que consegue cumprir tarefas. Saber que habilidade e raciocínio ele desenvol-
ve e demonstra; conversar com os pais e pedir o apoio deles para que incentive os
filhos a estudar, pois a família tem suma importância na fase de aprendizado do es-
tudante.

É certo que nem a família, nem os demais problemas sócio-econômicos são


os principais causadores do fracasso escolar. No entanto, observa-se que a escola,
os professores, os procedimentos didáticos não tem sido capazes de intervir positi-
vamente para atingir o ideal de escolarização para todos, muitas vezes por não con-
seguirem avaliar com clareza os efeitos e estrutura social sobre o trabalho pedagó-
gico, dessa forma, as escolas e professores podem tornar-se mesmo sem saber,
cúmplice da discriminação e segregação das crianças, social e economicamente
desprovida. Tais considerações de diferentes dimensões ilustram os inúmeros fato-
res envolvidos no complexo quadro do fracasso escolar.

A pesquisa mostrou-me que a democratização do ensino é de grande impor-


tância para se obter as igualdades sociais no campo educacional e em outros, tanto
em uma direção quantitativa (com maior número de escolas), quanto na qualitativa
(aperfeiçoamento, reformas educacionais).

O que no leva a crer que a sala de aula é contexto privilegiado para o trabalho
com as diferenças, o microcosmo concreto onde a educação escolar acontece de
fato. É na sala de aula também que as dificuldades de aprendizagem têm de ser
administradas. É lá, e apenas lá, que se deve vencer os obstáculos escolares.
41

Portanto, cabe ao professor rever posicionamentos endurecidos, questionar


crenças arraigadas, confrontar posicionamentos imutáveis e isso implica na compre-
ensão do "aluno-problema" como um porta voz das relações estabelecidas em sala
de aula. Ficou claro que muitas vezes, não é o aluno que não se encaixa no que nós
professores oferecemos, somos nós que de certa forma não adequamos à suas
possibilidades.

O professor e a escola precisam desidealizar o perfil de aluno, ou seja, deve-


mos abandonar a imagem do aluno ideal, de como deveria ser, quais hábitos deveria
ter, e trabalhar mais com o material humano concreto, os recursos disponíveis. O
aluno, tal como ele é, aquele aluno que carece de nós e de quem nós carecemos em
termos profissionais.

É imprescindível que tenhamos clareza de nossa tarefa em sala de aula para


que o aluno possa ter clareza também da dele. Pois a visibilidade do aluno quanto
ao seu papel é diretamente proporcional à do professor quanto ao seu. A ação do
aluno é de certa forma, espelho da ação do professor. Portanto, se há fracasso, o
fracasso é de todos; e o mesmo com relação ao sucesso escolar.

Em síntese, uma escola é funcional quando conta com forte aliança entre a
comunidade, com a família, o corpo docente e o administrativo, os quais trabalham
os seus conflitos através da colaboração e diálogo. Esses elementos são flexíveis
em sua maneira de lidar com os conflitos, utilizando-se do conhecimento de várias
técnicas e métodos adequados. As decisões são tomadas em conjunto e a participa-
ção dos alunos é solicitada, mas sem ser igualitária. Cada membro do sistema esco-
lar tem seu papel determinado, por isto é importante a presença do psicopedagogo,
para observar e diagnosticar o sistema escolar e, então, cria condições favoráveis
para a resolução dos problemas que surgem, fazendo com que o ensinar e o apren-
der se torne comprometidos.

Sendo assim, a atuação do psicopedagogo dentro da escola exige algumas


características básicas, visto que acreditar que a dificuldade de aprendizagem é res-
ponsabilidade exclusiva do aluno, ou da família, ou somente da escola é, no mínimo,
uma atitude ingênua perante a grandiosidade que é a complexidade do aprender.
Procurar e achar um corpo que assuma a culpa do fracasso escolar dá-nos a sensa-
ção de que está tudo resolvido. A atitude do não aprender traz em si o subtexto da
denúncia de que algo deverá ser feito. E este feito não poderá jamais ser a duas
mãos.

Nesta perspectiva, a Psicopedagogia contribui significativamente com todos


os atores envolvidos no processo de aprendizagem, pois exerce seu trabalho de
forma multidisciplinar, numa visão sistêmica. Por isso, fica exposto aqui o pensa-
mento de que devemos exercer uma prática docente em parceria, em equipe, onde
todos deverão voltar seu “olhar” e sua “escuta” para o sujeito da aprendizagem.

Não há como refletirmos sobre nosso trabalho e buscarmos continuamente


agregar valores a nossa formação, resignificarmos os conteúdos e adotarmos novas
posturas avaliativas, se não conhecermos o ser que estamos educando e a grande
responsabilidade que é a de participarmos da sua formação.
42

Ao realizarmos nossa atuação docente elaborando vínculos afetivos com este


ser que aprende, mesmo que não deseje aprender naquele momento, por alguma
circunstância, certamente estaremos fazendo a parte que nos cabe: prepará-lo para
operar autonomamente seu futuro usando sua cabeça para pensar em alternativas
viáveis para os problemas da sua sociedade, seu coração para sentir as exigências
e apelos sociais e suas mãos para agir em prol do bem comum. Afinal, é para isso
que serve a educação.

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