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Direito Civil V PDF
Direito Civil V PDF
1ª edição
SESES
rio de janeiro 2017
Conselho editorial roberto paes e gisele lima
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida
por quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em
qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Editora. Copyright seses, 2017.
CDD 346.015
Prefácio 7
Direito de família 10
Conceito de Família e sua evolução 11
A Família como base da sociedade 14
A Família na Constituição Federal de 1988 15
Espécies de Família no ordenamento Jurídico Brasileiro 15
Direito de Família e sua localização no Código Civil 19
Importância atual do Direito de Família 20
Princípios de Direito de Família 20
Relações de parentesco 29
Agnátio e Cognátio 29
Conceito e espécies 29
Linhas e Graus 32
Efeitos jurídicos (artigos 1.591 a 1.595 do CC/02) 36
Parentesco por Afinidade 37
Igualdade de direitos dos filhos resultantes de
parentesco civil e natural 39
2. Do casamento 45
Introdução 46
Casamento 47
Conceito, natureza jurídica e características 47
Finalidades 49
Esponsais. Responsabilidade civil pelo arrependimento 49
Formalidades preliminares. Procedimento de habilitação 53
Casamento Civil e Religioso 55
Requisitos e pressupostos matrimoniais. Celebração.
Momento do casamento 57
Dissolução do casamento 97
Breve histórico 97
Emenda Constitucional nº 66/2010 98
Separação 100
Da Separação Judicial 101
Da Separação Consensual (procedimento administrativo) 101
Divórcio 102
Homologação de Sentença Estrangeira 105
Lei nº 12.874, de 29 de Outubro de 2013 – Separação e
Divórcio por Autoridades Consulares no Exterior 106
4. Filiação e reconhecimento de filhos,
poder familiar e guarda 109
Introdução 110
Guarda 127
Guarda Compartilhada 131
Guarda para fins exclusivamente previdenciários 132
Alimentos 141
Espécies de alimentos 141
Obrigação alimentar e direito a alimentos 143
Princípios 147
Da Prisão Civil 151
Prezados(as) alunos(as),
7
refletir sobre pontos da matéria e buscar mais fontes de pesquisa, a dialogar com
os seus colegas e professor.
É preciso ter em mente que o livro é a primeira oportunidade de aprendiza-
gem, serve como subsídio para acompanhar as aulas e traz um suporte mínimo in-
dispensável à compreensão do tema. Fazer uma leitura antes das aulas auxilia não
só a entender o conteúdo que será ministrado em sala pelo professor, mas também
serve para a formação crítica e construtiva, além de ajudar a esclarecer as dúvidas.
Antes e depois das aulas, aprofunde suas leituras e pesquisas jurisprudenciais,
busque colocar em prática o conhecimento que adquiriu.
Bons estudos!
8
1
Introdução ao
direito de família
Introdução ao direito de família
Introdução
OBJETIVOS
• Apresentar a importância social e jurídica da disciplina Direito Civil V;
• Introduzir a família como base da sociedade e sua caracterização na CF/88;
• Identificar as espécies de família do ordenamento jurídico brasileiro e as que se apresentam
na sociedade brasileira;
• Discorrer sobre os princípios constitucionais de Direito de Família, promovendo ao aluno a
compreensão de seu significado;
• Apresentar as relações de parentesco e suas espécies, as linhas e os graus, e sua
relevância para o instituto do casamento e o direito sucessório.
Direito de família
capítulo 1 • 10
relativamente incapaz e sem autonomia ou sem poder de administração dos interes-
ses da família, não havendo mais a desigualdade de direitos em relação ao homem.
Igualmente, no que tange aos filhos, há uma nova orientação, pois eles não
mais são vistos como objeto de domínio dos pais, mas alvo de sua proteção.
As pessoas, no seio da família, devem ser reciprocamente solidárias, não se
confundindo com caridade (ato unilateral), visto que solidariedade é bilateral, em
que as pessoas integrantes da família devem assistência mútua e que pode ser recla-
mada, inclusive, nos moldes constitucionais (exemplo: dever de prestar alimentos
mutuamente, sendo certo que esse dever só vai até o 2º grau de parentesco).
Se a família é o lócus privilegiado no qual a pessoa nasce inserida e mode-
la a sua personalidade, a proteção ao Direito de Família é dedicada às pessoas
e não à família em si própria, exigindo de todos os componentes tratarem-se
com solidariedade.
capítulo 1 • 11
mais essencial à caracterização da família), apresentando certa unidade de relações
jurídicas e de interesses, segundo o doutrinador Arnaldo Rizzardo. (2011, p.11)
Não se pode olvidar que a família e o Estado sempre sofreram uma forte in-
fluência da igreja, especialmente a católica, o que, durante muitos anos, acarretou
a manutenção de conceito fechado de família, não se admitindo como família as
uniões que não decorriam do casamento.
Na compreensão do Estado, família apenas surgia a partir do casamento, discri-
minando qualquer outra união, que, por não ser considerada família, não merecia
a proteção estatal. No entanto, aos poucos, a igreja católica foi perdendo influência
sobre o Estado, e esse passou a ver a família sob o enfoque social, iniciando a mudan-
ça da visão patrimonial para uma visão estruturada na afetividade e solidariedade.
Mudança importante que influenciou na alteração do conceito de família foi o
reconhecimento da capacidade da mulher quanto à sua condição de cônjuge: a condi-
ção jurídica da mulher é um dos mais ricos capítulos da história evolutiva do Direito,
passando a se imputar ao núcleo familiar a prioridade e valorização do ser humano.
A inseminação artificial foi outra responsável pela mudança no conceito de
família, pois, a partir do momento que a ciência biológica anuncia o processo
de inseminação artificial, passa a proporcionar a gestação sem o pressuposto
fisiológico das relações sexuais, ou seja, o conceito de família deixa a ótica do
pensamento de reprodução; assim como o advento da adoção plena, não sendo
poucas as modificações que o Direito de Família suporta em consequência das
mutações conceituais dos tempos modernos, algumas com impactos profundos
sobre os institutos tradicionais.
A Lei nº. 6.515/77 surgiu com o propósito básico de regular os casos de dis-
solução da sociedade conjugal e o vínculo do casamento, seus efeitos e respectivos
processos. Tudo isso veio para abraçar os anseios da sociedade, que há muito já
vivia um novo conceito de família de fato.
O Código Civil de 1916 era particularmente patrimonialista, fundamentado
numa visão patriarcal, hierarquizada e matrimonial, heteroparental e biológica,
refletindo a sociedade da época em que foi concebido. No entanto, a sociedade é
dinâmica e as leis necessitam acompanhá-la sob pena de se terem leis inaplicáveis
e substituídas pelos costumes.
Não há dúvidas de que a sociedade passou a enxergar o ser humano e suas
necessidades, valorizando a pessoa e suas relações afetivas.
A Carta das Nações Unidas, votada pela ONU em 10 de dezembro de 1948,
alude particularmente ao direito de "fundar uma família" sem quaisquer restrições
capítulo 1 • 12
étnicas ou religiosas. E acrescenta: "A família é o núcleo natural e fundamental da
sociedade e tem direito à proteção da sociedade e do Estado". (Carta das Nações
Unidas, artigo XVI, nº 3)
Seguindo a mesma linha dos Direitos Universais vêm as Constituições da
República do Brasil: "A família é constituída pelo casamento e terá direito à prote-
ção dos Poderes Públicos". (Emenda Constitucional nº 1, de 1969, artigo 175) "A
família, base da sociedade, tem proteção do Estado". (Constituição de 1988, artigo 226)
Há ainda leis recentes que trazem amplitude ao conceito de família, conforme
se depreende da leitura da Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006), segundo a
qual, em seu artigo 5.º, II, deve se entender como família a comunidade formada
por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais,
por afinidade ou por vontade expressa.
Na mesma toada, a Nova Lei da Adoção (Lei nº 12.010/2009) consagra
o conceito de família extensa ou ampliada, cujo conceito a estende para além
da unidade de pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes pró-
ximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de
afinidade e afetividade. (alteração do artigo 25 do Estatuto da Criança e do
Adolescente – Lei nº 8.069/1990)
Conclui, ainda, o doutrinador baiano Cristiano Chaves de Faria: “A entidade
familiar deve ser entendida hoje como grupo social fundado, essencialmente, por
laços de afetividade, pois a outra conclusão não se pode chegar à luz do texto cons-
titucional”. (FARIAS, 2004, p. 30)
Nota: paradigmas da família
capítulo 1 • 13
A Família como base da sociedade
NOTA
Fenômeno da “Função Social da Família” - é a sua adequação aos valores e às garantias
Constitucionais. Em que toda família tem uma finalidade: a de promover os valores da pessoa
humana. Assim sendo, dignidade da pessoa humana, liberdade, igualdade e solidariedade
estão ínsitas na família.
capítulo 1 • 14
A Família na Constituição Federal de 1988
capítulo 1 • 15
Casamento civil, sendo gratuita a sua celebração e tendo efeito civil o casamento
religioso, nos termos da lei (artigo 226, §§ 1.º e 2.º); União estável entre homem
e mulher, devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento (artigo 226, § 3.º).
A união estável está regulamentada nos artigos 1.723 a 1.727 do CC/2002, sem
prejuízo de outros dispositivos da atual codificação; Entidade monoparental, ou
seja, a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes (artigo
226, § 4.º). Não há qualquer regulamentação específica dessa entidade no Código
Civil ou em outra lei especial.
Sabe-se ainda que forças sociais, após o reconhecimento pelo Supremo
Tribunal Federal, em 2011, da união homoafetiva como entidade familiar,
passaram a buscar sua afirmação com vistas à admissibilidade da conversão
dessa em casamento.
Jurisprudência
TJRJ, 17ª Câmara Cível, Ap. nº 2005.001.20610, rel. Des. Camilo Ribeiro Ruliere: “Ação
de Reconhecimento de União Estável com Pedido de Alimentos. Sentença terminativa,
proferida por Juízo de Família, com base em impossibilidade jurídica da demanda. A
Constituição Federal, nos artigos 3º, inciso IV, e 5º, incisos I e X, veda qualquer tipo de
preconceito ou forma de discriminação, inclusive a concernente ao sexo, elevando à
categoria dos direitos e garantias fundamentais a igualdade de todos perante a lei. O
artigo 226 e seus parágrafos 3º e 4º da Magna Carta, ao estabelecerem que a família é
a base da sociedade e tem especial proteção do Estado, reconhecendo a união estável
entre o homem e a mulher como entidade familiar, bem como a comunidade formada
por qualquer dos pais e seus descendentes, não pretendeu excluir a existência e a
possibilidade de reconhecimento de uniões homoafetivas, sob pena de violação dos
preceitos constitucionais. O relacionamento entre dois homens ou entre duas mulheres
é fato social aceito e reconhecido por toda a sociedade, não sendo possível negar-
se a realidade que ocorre no país e no mundo [...]” J. em 19.10.2005. (FONTE: TJRJ.
Disponível em: <https://goo.gl/Lbne73>. Acesso em: 19 jan. 2017)
capítulo 1 • 16
Famílias para o seu Manual, assim como os juristas Cristiano Chaves de Farias e
Nelson Rosenvald.
capítulo 1 • 17
Quanto à questão de hierarquia, essa inexiste: o que existe são diferentes nú-
cleos, diferentes entidades familiares, mesmo porque Casamento (solene) e União
Estável (informal) não são a mesma coisa, tendo a União Estável tratamento jurí-
dico diferenciado, porém com igual proteção.
Sobre a inexistência de hierarquia entre as entidades familiares, diz Jones
Figueirêdo Alves:
CURIOSIDADE
Família ANAPARENTAL: “De origem grega, o prefixo ‘ana’ traduz ideia de privação. Por
exemplo, ‘anarquia’ significa ‘sem governo’. Esse prefixo permitiu criar o termo ‘anaparental’
para designar a família sem pais.” (BARROS, S. R. de. Direitos humanos e Direito de Família.
Disponível em: <http://migre.me/wFAGP>. Acesso em: 16 fev. 2016) Dois irmãos, por en-
tendimento do STJ, constituem família e são protegidos pelo Direito de Família. “Execução.
Bem de família. Ao imóvel que serve de morada as embargantes, irmãs e solteiras, estende-
-se a impenhorabilidade de que trata a Lei 8.009/1990.” (BRASIL. STJ, REsp 57.606/MG,
Rel. Min.Fontes de Alencar, 4.ª Turma, j. 11.04.1995, DJ 15.05.1995, p. 13.410)
Família EUDEMONISTA: A título de exemplo: um casal que convive sem levar em conta
a rigidez dos deveres do casamento previstos no art. 1.566 do CC.
COMENTÁRIO
Não menos importante, e igualmente digno de citação, é a existência do conceito de
família mosaico ou famílias pluriparentais, devendo ser considerada a família que de-
corre de diversos casamentos, uniões estáveis ou mesmo simples relacionamentos afetivos
capítulo 1 • 18
de seus membros, vindo os juristas a utilizarem o símbolo do mosaico, diante de suas várias
cores, que representam as diversas origens, sendo certo que, diante do vínculo de afeto
existente entre os membros que compõem a nova união, deve, sem dúvida, ser reconhecida
como entidade familiar.
Segundo Flavio Tartuce (2014, p. 121), a família mosaico ou famílias pluriparentais teve
sua abordagem em 2005, no V Congresso Brasileiro de Direito de Família, por Jussara Suzi
Assis Borges Nasser Ferreira, do Paraná (FERREIRA; RÖRHMANN, 2006, p. 507), sendo
também objeto de matéria em 2004 pela revista Veja. (Revista Veja, 2004, p. 28-30)
Família mosaico, também conhecida como Famílias Reconstituídas (as uniões recompos-
tas ou “Ensambladas”), quando pessoas originadas de outros núcleos familiares formam um
novo núcleo familiar.
É possível visualizar esse modelo de família no artigo 25 do Estatuto da Criança e do
Adolescente, com o parágrafo único acrescentado pela Lei nº 12.010 de 2009, que apresen-
tou o conceito de família ampliada ou extensa. Na mesma linha de entendimento temos a Lei
nº 11.924/09, conhecida como “Lei Clodovil”, que inovou ao permitir que o indivíduo receba
o nome de família do padrasto ou da madrasta.
LEITURA
• Jurisprudência Correlata: REsp. 1.183.378/RS; ADPF 132;RESPE-24564; REsp. 820475/
RJ; REsp. 220.059/SP; REsp. 36365/MG; REsp. 833.712/RS; REsp. 757.411/MG;
• Revista Veja, Editora Abril, Edição Especial nº 34, ano 37 (VEJA 1868), agosto de 2004.
Páginas 28 a 30, 25/08/2004. Disponível em: <https://goo.gl/z6Kyn7>;
• LÔBO, P. L. N. Entidades familiares constitucionalizadas: para além do numerusclausus.
Disponível em: <https://goo.gl/5sCvjG>.
capítulo 1 • 19
São considerados extrapatrimoniais os direitos e deveres que existem entre o
casal (seja cônjuge ou companheiro) e entre os pais e filhos. São patrimoniais os
direitos reais e obrigacionais que emanam das relações familiares (por exemplo, o
usufruto dos pais sobre os bens do filho menor, alimentos e os regimes de bens).
Podem-se, então dividir, em: • Normas que regulam relações pessoais entre os
cônjuges, ascendentes, descendentes e parentes em linha reta (Título I – artigos
1.511 a 1.638 do CC/02) – Direito Matrimonial e Parental; • Normas que disci-
plinam relações patrimoniais decorrentes de relações familiares (Título II – artigos
1.639 a 1.722 do CC/02); • Normas que disciplinam a união estável (Título III –
artigos 1.723 a 1.727 do CC/02) – Direito Convivencial; • Normas que assumem
a tutela de relações assistenciais (Título IV – artigos 1.728 a 1.783 do CC/02)
– Direito Assistencial.
Quanto à natureza jurídica, o Direito de Família deve ser considerado ramo
do Direito Privado, embora algumas tentativas mal sucedidas tenham o apresen-
tado como ramo de Direito Público devido ao grande número de normas impera-
tivas e de ordem pública que o compõem.
capítulo 1 • 20
Familiares (artigo 226, § 3º e 4º, CF); Da Isonomia entre os cônjuges (artigo 226,
§5º, CF) e da isonomia entre os filhos (artigo 227, § 6º, CF); Do Melhor Interesse
da Criança e do Adolescente (artigo 227, CF); Da Paternidade Responsável (ar-
tigo 226, § 7º, CF) e do Livre Planejamento Familiar (artigo 227, § 3º., 4º., 6º.,
CF); Da Monogamia (artigo 1.521, VI, CC); Princípio da afetividade.
A base de sustentação do ordenamento jurídico são os princípios, sendo, por-
tanto, de suma importância o seu reconhecimento e que eles sejam respeitados, ou
haverá a subversão dos valores fundamentais.
A Constituição Federal de 1988 é considerada um divisor de águas do Direito
de Família brasileiro, tendo ela definido o fim jurídico do sistema patriarcal de
família, determinando a adoção de um sistema igualitário e solidário.
Leciona Paulo Lôbo que:
capítulo 1 • 21
Segundo a formulação clássica de Immanuel Kant:
LEITURA
Sobre o princípio da dignidade da pessoa humana: SCHAEFER, F. A dignidade da
pessoa humana como valor-fonte do sistema constitucional brasileiro. Disponível em:
<http://migre.me/wFAKL>.
capítulo 1 • 22
pais assistência aos filhos menores e o dever desses de ajudar e amparar os pais na
velhice, carência ou enfermidade, enquanto filhos maiores.
Também no Código Civil de 2002 encontramos menção ao dever de solida-
riedade, estando tal princípio presente no artigo 1.694 ao estabelecer a obrigação
alimentar dos membros da família, assim como no artigo 1.511 ao dispor que a
plena comunhão de vidas é estabelecida pelo casamento com base na igualdade de
direitos e deveres dos cônjuges.
Podemos afirmar que, em decorrência desse princípio, algumas normas se im-
puseram no Direito Civil; entre elas, destacam-se: a) Responsabilidade objetiva
dos pais por atos dos filhos menores (artigo 932, I, CC); b) Comunhão de vida
instituída pela família (artigo 1.513, CC); c) Adoção como resultante do senti-
mento de solidariedade; d) Poder familiar reconhecido como um múnus (artigo
1.630, CC); e) Mútua assistência entre cônjuges e companheiros (artigos 1.566 e
1.724, CC); f ) Dever de prestar alimentos (artigo 1.694, CC).
NOTA
Pluralismo político é a possível e garantida existência de várias opiniões e ideias com
o respeito por cada uma delas. O pluralismo político, como base do Estado democrático
capítulo 1 • 23
de direito, aponta o reconhecimento de que a sociedade é formada por vários grupos.
(Disponível em: <http://migre.me/wFAM2>. Acesso em: 17 jan. 2017)
capítulo 1 • 24
É princípio que impõe a igualdade de qualificações entre os filhos (extinguin-
do-se as discriminatórias divisões: filhos legítimos e ilegítimos ou espúrios - esses
ainda qualificados como adulterinos e incestuosos) e, principalmente, estabele-
cendo-se a igualdade de direitos decorrentes da filiação e da sucessão. Sendo a
igualdade substancial, será uma igualdade existencial e patrimonial.
Segundo Paulo Lôbo (2011, p. 67), a igualdade não tem, no entanto, o condão
de apagar ou desconsiderar as diferenças naturais e culturais existentes. Homem
e mulher possuem suas diferenças; são diferentes os pais e filhos; existe diferença
entre a criança e o adulto; a família matrimonial, a monoparental, a união estável e
demais entidades familiares também possuem suas diferenças. Contudo, tais dife-
renças não podem ter o condão de legitimar qualquer tratamento jurídico desigual
no que tange à base comum dos direitos e deveres.
capítulo 1 • 25
Jurisprudência
Ementa: apelação cível. Destituição do poder familiar. Aplicabilidade ao caso do princípio
do melhor interesse da criança. Genitora que, desde a gravidez, negligentemente
deixou-o em estado de abandono e vulnerabilidade, aos cuidados de terceiros. Risco
à integridade psíquica e à saúde do infante. Prova testemunhal e relatórios da equipe
de apoio que corroboram com esse entendimento. Genitora que apresenta problemas
mentais. Decretação da perda do poder familiar como medida de proteção ao menor
que lhe possibilite uma vida saudável e promissora. Inteligência dos artigos 22, do ECA
e 1.638, II, III, IV, do CC. (TJPR - 11ª C.Cível - AC - 1546415-8 - Apucarana - Rel.:
Dalla Vecchia - Unânime - - J. 18.11.2016. Disponível em: <http://migre.me/wFAN4>.
Acesso em: 16 fev. 2017)
capítulo 1 • 26
PERGUNTA
A negativa de apoio Moral é ato ilícito? A doutrina diverge quanto ao tema: para uma
parte, a negativa de afeto é ato ilícito e gera indenização (omissão afetiva que gera indeni-
zação). Para quem é partidário dessa corrente, essa indenização tem natureza punitiva. Para
os adeptos dessa segunda corrente (minoritária), a falta de afeto não gera Ilicitude, visto que
afeto não é um valor jurídico exigível, não sendo ilicitude indenizável (dá amor quem pode).
Jurisprudência
TJ/RJ. 0024276-55.2012.8.19.0007 – APELAÇÃO. Des(a). Elisabete Filizzola
Assunção - julgamento: 26/08/2015 – Segunda Câmara Cível. [...] I) Conquanto
tradicionalmente refratária à ideia de compensação por dano moral decorrente de
abandono afetivo, a orientação pretoriana mais moderna vem, com espeque doutrinário,
expandindo tal fronteira jurídica, não sem antes alertar para a excepcionalidade da
hipótese, mediante criteriosa avaliação das circunstâncias dos casos concretos. II)
Com efeito, “o abandono afetivo pode gerar direito à reparação pelo dano causado”
(enunciado 8, IBDFAM), porquanto “comprovar que a imposição legal de cuidar da
prole foi descumprida implica em se reconhecer a ocorrência de ilicitude civil sob a
forma de omissão. Isso porque o ‘non facere’, que atinge um bem juridicamente
tutelado, leia-se, o necessário dever de criação, educação e companhia de cuidado
importa em vulneração da imposição legal, exsurgindo, daí, a possibilidade de se
pleitear compensação por danos morais por abandono psicológico”. (REsp 1.159.242/
SP) III) Possibilidade teórica que, contudo, não prescinde de cabais demonstrações
atinentes aos danos causados à vítima, a quem incumbe demonstrar, além do inequívoco
abandono afetivo, sequelas psicológicas ou quaisquer outras circunstâncias negativas
de sua vida atual que tenham decorrido diretamente da alegada omissão de seu genitor;
afinal, não há responsabilidade civil sem dano. [...] “Não é suficiente a falta da figura
paterna para caracterizar o pedido de danos morais por abandono afetivo. É necessária
a caracterização do abandono, da rejeição e dos danos à personalidade. As perícias
devem levantar, por meio de metodologia própria, a extensão dos danos sofridos em
função da falta da figura paterna”. Literatura especializada. RECURSO DESPROVIDO.
(Disponível em: <http://migre.me/wFANC>. Acesso em: 18 jan. 2017).
capítulo 1 • 27
CURIOSIDADE
Ruptura de noivado por si só não gera indenização, podendo ser indenizada pelos prejuí-
zos morais e materiais causados por esse ato, ou quando o agente atua de modo excessivo ou
violador do direito alheio. Violação da cláusula geral de boa-fé objetiva, segundo o STJ - AGRA-
VO EM RECURSO ESPECIAL: AREsp 664171 RJ 2015/0036714-1. Ver também decisão
do TJ-SP - Apelação: APL 03008601620098260000 SP 0300860-16.2009.8.26.0000.
Principio da Monogamia
Princípio da Afetividade
Embora não seja um princípio constitucional expresso, pode ser extraído dos
artigos 226, § 3º e 6º; 227, caput e § 1º, CF/88, que determina a todas as relações
familiares a affectio.
A realização pessoal da afetividade, no ambiente de convivência e solida-
riedade, tornou-se uma função básica da relação familiar de nossa época. As
antigas funções da família passaram a desempenhar um papel secundário, como
a econômica, a política, a religiosa e até mesmo a procracional, e em alguns
casos podemos mesmo afirmar que elas desapareceram, surgindo o conceito de
família socioafetiva.
Na relação paternofilial, o princípio aparece, por exemplo, no artigo 1.593
do CC/02, estabelecendo que o parentesco civil (p.ex., da adoção e da posse
do estado de filhos) tem por fundamento a relação de afeto (por isso, se diz
paternidade socioafetiva).
No casamento, é princípio que pode ser observado no artigo 1.511, e no
Estatuto da Criança e do Adolescente aparece, por exemplo, no artigo 28, § 2º,
pelo qual deve ser considerada a relação de afinidade e afetividade.
capítulo 1 • 28
Relações de parentesco
Agnátio e Cognátio
Conceito e espécies
capítulo 1 • 29
Ademais, é importante ressaltar que INEXISTE vínculo de parentesco de qual-
quer que seja a espécie entre os cônjuges ou os companheiros, sequer o vínculo
por afinidade, havendo, no entanto, outro tipo vínculo: o que se forma por meio
da comunhão de vida.
O parentesco consanguíneo ou natural facilmente pode ser detectado, pois
deriva da relação de consanguinidade, ou seja, do mesmo tronco comum que for-
ma a árvore genealógica do indivíduo.
Quanto ao parentesco por afinidade, ele se dá em virtude da lei, decorren-
do da relação que se forma entre o cônjuge ou companheiro (artigo 1.595 do
CC/02), inclusive na relação homoafetiva, e os parentes deles (tendo por limitação
descendentes, ascendentes e irmãos do consorte, conforme § 1º do artigo 1.595
do CC/02). O Superior Tribunal de Justiça, em fundamentação de acórdão, iden-
tificou a afinidade entre genro e sogra como parentesco.
Já o parentesco civil é aquele que advém de origem que não seja de sangue ou
afinidade, sendo o exemplo mais tradicional o do laço de adoção. O artigo 1.593
do CC/02 formaliza a existência desse vínculo e amplia a existência de outras es-
pécies de parentesco civil, hodiernamente cada vez mais presente nas famílias bra-
sileiras diante da nítida tendência de desbiologização do parentesco. Temos como
fontes de parentesco civil a parentalidade socioafetiva, pela qual se reconhece a
posse de estado de filho, e também a técnica de reprodução heteróloga, conforme
quadro anteriormente apresentado.
O doutrinador Flavio Tartuce, em sua obra, traz o seguinte quadro que repre-
senta as espécies de parentesco:
capítulo 1 • 30
• Parentesco consanguíneo ou natural - aquele existente entre pessoas que mantêm
entre si um vínculo biológico ou de sangue, por terem origem no mesmo tronco comum.
• Parentesco por afinidade - existente entre um cônjuge ou companheiro e os parentes
do outro cônjuge ou companheiro. Deve ser atentado o fato de que marido e mulher e
companheiros - inclusive homoafetivos não são parentes entre si, havendo outro tipo de
vínculo, decorrente da conjugalidade ou da convivência. Como novidade, o CC/2002
reconhece o parentesco de afinidade decorrente da união estável (art. 1.595 do CC). O
parentesco por afinidade limita-se aos ascendentes, aos descendentes e aos irmãos do
cônjuge ou compa¬nheiro (art. 1.595, § 1.°). Desse modo, há parentesco por afinidade
na linha reta ascendente em relação ao sogro, à sogra e seus ascendentes até o infinito.
Na linha reta descendente, em relação ao enteado e à enteada e assim sucessivamente
até o infinito. Na linha colateral, entre cunhados. Na linha reta, até o infinito, a afinida-
de não se extingue com a dissolução do casamento ou da união estável, havendo um
vínculo perpétuo (art. 1.595, § 2.°, do CC). Nessas últimas relações há impedimento
matrimonial, como visto (art. 1.521, II, do CC).
• Parentesco civil - aquele decorrente de outra origem, que não seja a consanguinidade ou
a afinidade, conforme consta do art. 1.593 do CC. Tradicionalmente, tem origem na ado-
ção. Todavia, a doutri¬na e a jurisprudência admitem duas outras formas de parentesco
civil. A primeira é decorrente da técnica de reprodução heteróloga, aquela efetivada com
material genético de terceiro. A segunda tem fundamento na parentalidade socioafetiva,
na posse de estado de filhos e no vínculo social de afeto. Nesse sentido, o Enuncia¬do
n. 103 do CJF/STJ, da I Jornada de Direito Civil: "o Código Civil reconhece, no art. 1.593,
outras espécies de parentesco civil além daquele decorrente da adoção, acolhendo, as-
sim, a noção de que há também parentesco civil no vínculo parental proveniente quer das
técnicas de reprodução assistida heteróloga relativamente ao pai (ou mãe) que não con-
tribuiu com seu material fecundante, quer da paternidade socioafetiva, fundada na posse
do estado de filho". Em complemento, o Enunciado n. 256 do CJF/STJ, da III Jornada de
Direito Civil: "A posse do estado de filho (parentalidade socioafetiva) constitui modalida-
de de parentesco civil". Na V Jornada de Direito Civil, de 2011, aprovou-se o seguinte
enunciado sobre o tema: "O reconhecimento judicial do vínculo de parentesco em virtude
de socioafetividade deve ocorrer a partir da relação entre pai(s) e filho(s), com base na
posse do estado de filho, para que produza efeitos pessoais e patrimoniais" (Enunciado n.
519). De lege ferenda, anote-se que o PL 470/2013 (Estatuto das Famílias, no plural, do
IBDFAM) pretende incluir expressamente na ordem legal brasileira a previsão de que o
parentesco resulta da consanguinidade, da socioafetividade ou da afinidade.
(Fonte: TARTUCE, F. Manual de Direito Civil. Editora: Método, 2016, p. 1366, 1367).
capítulo 1 • 31
Jurisprudência
STJ. REsp. nº 36365/MG, 5ª Turma, rel. Min. Edson Vidigal: CIVIL. Processual. Locação.
Retomada para uso pela sogra. Despejo. Recurso. 1. Sogra é parente, sim, por afinidade
em primeiro grau em linha reta. 2. A lei nº 6.649/79, art. 52, III, alcança para proteger
não só ascendentes e descendentes consanguíneos, mas igualmente os afins. 3.
recurso conhecido e provido para restabelecer a sentença de primeiro grau. (Disponível
em: <http://migre.me/wFARc>. Acesso em: 25 jan. 2017)
Linhas e Graus
capítulo 1 • 32
São parentes por laços de sangue ou civil: pai, mãe e filhos (primeiro grau);
irmãos, avós e netos (segundo grau); tios, sobrinhos, bisavós e bisnetos (terceiro
grau); primos, trisavós, trinetos, tios-avós e sobrinhos-netos (quarto grau).
Segundo Paulo Nader, dá-se da seguinte forma a contagem de graus em linha reta:
ATENÇÃO
De acordo com o artigo 1.595, § 2º do Código Civil de 2002, os vínculos em linha reta
são perpétuos, sejam eles decorrentes do parentesco consanguíneo, ou de afinidade, e ainda
que findo o casamento ou a união estável, eles não se extinguem.
A contagem se faz indo até o ascendente comum: por exemplo, o mesmo pai,
o mesmo avô.
capítulo 1 • 33
NOTA
ESCADA PARENTAL - A LINHA RETA é ilimitada, possui um progenitor comum,
contando-se o grau a cada geração. Para fins didáticos, vamos exemplificar com o per-
sonagem que será chamado de EU.
• Filho/Pais = 1º grau:
parentesco entre MIM e o meu PAI é de primeiro grau na linha reta ascendente;
parentesco entre MIM e o meu FILHO é de primeiro grau na linha reta descendente.
• Neto/Avós = 2º grau:
EU e o meu AVÔ é de segundo grau na linha reta ascendente;
EU e o meu NETO é de segundo grau na linha reta descendente.
• Bisneto/Bisavós = 3º grau:
EU e o meu BISAVÔ é de terceiro grau na linha reta ascendente;
EU e o meu BISNETO é de terceiro grau na linha reta descendente.
Ou seja, conta-se o intervalo entre uma geração e outra.
Na linha de colaterais, especial atenção é dada aos irmãos, que são os colaterais
de 2º grau, considerando a existência de IRMÃOS GERMANOS (bilaterais por
serem filhos do mesmo pai e da mesma mãe) e de IRMÃOS UNILATERAIS,
popularmente chamados de meio-irmãos. Sendo o pai o mesmo, os irmãos são
unilaterais consanguíneos; sendo mesma a mãe, os irmãos são unilaterais uterinos.
(DIAS, 2015, p. 383)
Maria Berenice Dias chega a dizer que o Código Civil brasileiro, em seu ar-
tigo 1.841, para efeitos de sucessão, faz distinção entre os irmãos germanos e os
irmãos unilaterais, já que os irmãos unilaterais, em caso de herança, herdariam do
“de cujus” a metade do que herdariam os irmãos bilaterais. Vale lembrar: sucessão
capítulo 1 • 34
colateral é aquela que decorre da lei e apenas é possível quando o falecido não
deixou descendentes, ascendentes, nem cônjuge sobrevivente.
A título de exemplo, temos a seguinte situação hipotética: José vem a falecer;
sendo ele solteiro, não deixa pais nem filhos, deixando apenas dois irmãos, Maria
e Sebastião. Maria é irmã bilateral (mesmo pai e mesma mãe). Sebastião, por outro
lado, é irmão unilateral, pois é filho do segundo casamento do pai de José, tendo,
portanto, os irmãos mães diferentes.
De acordo com o art. 1.841 do CC/02, tendo José deixado bens, sem que
tivesse deixado testamento, a herança passa aos colaterais, os irmãos Maria e
Sebastião, sendo dividida da seguinte forma: 1/3 para Sebastião e 2/3 para Maria,
recebendo o irmão unilateral a metade do que tem direito o bilateral.
capítulo 1 • 35
CURIOSIDADE
Os primos de 4º grau são conhecidos popularmente por "primo de primeiro grau", bem
como, partindo daí, os demais, como: de primos de 2º, 3º, 4º grau, entre outros, podendo
assim ser exemplificado: o filho do primo é chamado de primo-sobrinho, e o primo do pai é
chamado de primo-tio, sendo os dois filhos de dois primos diferentes primos de terceiro grau
entre si, e assim por diante. Mas, como visto, essa escalar popularmente conhecida, trata-se
apenas de um uso comum do povo, não existindo no mundo jurídico.
capítulo 1 • 36
De igual forma, há também efeitos jurídicos decorrentes do parentesco que
interferem no Direito Penal, pois, de acordo com o disposto no artigo 61, II,
do Código Penal, é circunstância agravante o crime cometido contra ascendente,
descendente, irmão ou cônjuge. Tem, por outro lado, a relação de parentesco, seja
natural ou civil, o condão de inocentar o acusado, conforme o artigo 181 do CP,
quando o crime contra o patrimônio for praticado por ascendente ou descendente.
O Direito Processual Civil gera para o magistrado o impedimento de atuar no
caso, conforme dispõe o artigo 144, IV, do CPC, e ainda o impedimento quanto
ao depoimento em produção de prova testemunhal, conforme artigo 447, § 2º, do
CPC. No Direito Eleitoral, de acordo com o artigo 14, § 7º, CF/88, pode a rela-
ção de parentesco gerar inelegibilidade eleitoral. Também traz reflexos no campo
do Direito Administrativo, sendo impeditivo para o nepotismo.
capítulo 1 • 37
matrimonial, da união estável. Nos casos de separação judicial, o parentesco por
afinidade não desaparece.
Feliz é a terminologia da língua inglesa que, pela figura da sogra, denomina
mother in law (mãe segundo a lei), e por brother in law (irmão segundo a lei) a
figura do cunhado.
Embora haja uma simetria entre a relação de parentesco consanguíneo e a por
afinidade, é certo que a ultima também não possui a amplitude de efeitos jurídicos
que decorrem do parentesco natural, ou seja, não alcança os direitos sucessórios,
abrangendo, por outro lado, o direito de visitação ampliado aos avós pelo Código
Civil, conforme já mencionado anteriormente.
O principal efeito jurídico é o impedimento matrimonial (artigo 1.521, III, do
CC/02), já que é vedado o casamento do ex-compenheiro ou do divorciado com os
pais ou com os filhos do ex-cônjuge ou ex-companheiro, visando a evitar que uma
pessoa possa tirar vantagem ou buscar direitos pela existência da aproximação anterior.
A doutrina brasileira entende que afinidade não gera afinidade, ou seja, os
afins de um cônjuge ou companheiro não são afins entre si.
Silvio de Salvo Venosa destaca “a afinidade é de ordem pessoal”. (VENOSA, .
de Salvo. Direito Civil – Direito de Família. São Paulo: Atlas, 2005, vol. VI. p. 241)
Figura 1.2 – (Fonte: Disponível em: <https://goo.gl/MFHSaU>. Acesso em: 30 jan. 2017)
capítulo 1 • 38
Segundo Maria Berenice Dias, o vínculo de afinidade se estende aos filhos de
um dos cônjuges ou companheiros, trazendo consigo seus efeitos jurídicos:
Vale dizer que, quando o vínculo de afinidade surge entre o cônjuge ou com-
panheiro e o enteado, passamos a ter uma nova modalidade de relação de paren-
tesco, ou seja, a relação socioafetiva, que vem ganhando espaço no ordenamento
jurídico brasileiro com o reconhecimento da paternidade ou maternidade (pa-
rentalidade) socioafetiva, que traz consigo seus efeitos jurídicos, com direitos e
deveres decorrentes da relação de parentesco, como alimentos, uso do patronímico
e efeitos sucessórios.
LEITURA
BARBOZA, H. H. Efeitos jurídicos do parentesco socioafetivo. In: Revista Brasileira
de Direito das Famílias e Sucessões. Porto Alegre: lBDFAM/Magister, n. 9, p. 25-34,
abril-maio 2009.
capítulo 1 • 39
considera-se nova origem de parentesco o fato de duas pessoas se relacionarem
como pai e filho, o que popularmente chamamos de filho de criação (enteado).
Com o amadurecimento do Direito, se passou a reconhecer, pelo ordenamen-
to jurídico brasileiro, o vínculo de parentesco afetivo aquele que advém do cari-
nho, do amor, da relação de fato. O art. 1.593 do CC/02 preceitua que o “paren-
tesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem”.
Dessa maneira, a lei reconhece a existência de outra forma de parentesco além da
biológica, admitindo o parentesco afetivo.
O enunciado 256 da Jornada de Direito Civil reconhece que a posse do estado
de filho constitui modalidade de parentesco civil. Afirma ainda o enunciado 519
do CJF (Conselho da Justiça Federal) da V Jornada de Direito Civil: “O reconheci-
mento judicial do vínculo de parentesco em virtude de socioafetividade deve ocorrer
a partir da relação entre pai(s) e filho(s), com base na posse do estado de filho, para
que produza efeitos pessoais e patrimoniais”. (FIGUEIREDO, 2015, p. 311)
Reforçando os elos socioafetivos, a Lei nº 11.924/09, também conhecida
como Lei Clodovil, por ter sido oriunda de projeto de lei do deputado, trouxe a
possibilidade do enteado ou enteada, judicialmente, e respeitando os requisitos
legais, incluir em seu nome o apelido de seu padrasto ou madrasta.
Assim, observa-se o surgimento do pai/mãe afetivo, que é aquele que se im-
porta com a criação do indivíduo, e não com os vínculos sanguíneos, não sendo o
que apenas disponibiliza o seu material genético, mas o que dá amor, cuidado, tem
o desejo de participar da criação, de educar e transmitir valores necessários para o
desenvolvimento de sua personalidade.
No que tange à adoção, ela é um ato jurídico solene pelo qual uma pessoa
estabelece um vínculo fictício de filiação.
A adoção é, portanto, um vínculo de parentesco civil, em linha reta, estabe-
lecendo entre adotante (ou adotantes) e o adotado um liame legal de paternidade
e filiação civil. Tal posição de filho será definitiva ou irrevogável para todos os
efeitos legais, uma vez que desliga o adotado de qualquer vínculo com os pais de
sangue, salvo os impedimentos para o casamento (CF, art. 227, § 5º e 6º), criando
verdadeiros laços de parentesco entre o adotado e a família do adotante (CC, art.
1.626). (DINIZ, 2010, p. 449)
A adoção origina um vínculo de filiação entre a criança ou o adolescente e sua
nova família, estabelecendo-se um novo vínculo de filiação com os pais adotivos,
em que o adotado assume, ainda, o nome da família, suprimindo o sobrenome
de sua família biológica. O prenome também poderá ser modificado, desde que
capítulo 1 • 40
seja ouvido o adotado, e apenas quando esse já possuir capacidade de entender
tal modificação.
No campo patrimonial, a adoção acarreta os direitos sucessórios e a prestação
de alimentos recíproca entre adotante e adotado, conforme estabelece o parágrafo
6º do art. 227 da Constituição Federal. De igual sorte, ocorre na relação de pa-
rentalidade socioafetiva.
O art. 227, § 6º, da CF/88, fixou a absoluta igualdade aos filhos, independen-
temente da origem, não mais sendo admitida a ultrapassada distinção que se fazia
entre filiação legítima/ilegítima. Hodiernamente, filhos são apenas filhos, sejam os
havidos no casamento ou fora dele, sejam os biológicos ou não biológicos, todos
com iguais direitos, deveres e uma qualificação: filhos - não sendo uma igualdade
formal, mas verdadeiramente material.
Não há que se olvidar que o direito de filiação traz relevantes direitos pessoais
e patrimoniais, como a existência das relações de parentesco, a utilização do nome
de família (mais forte com o advento da Lei nº 11.924/09), os impedimentos
matrimoniais, o direito aos alimentos, o direito sucessório e o poder familiar con-
ferido aos pais, entre outros.
ATIVIDADE
Questão objetiva: São regras que NÃO correspondem ao sistema de princípios consti-
tucionais vigentes para o Direito de Família:
I. A idade núbil diferenciada: para o homem, 18 anos; para a mulher, 16 anos.
II. A existência da classificação entre filhos legítimos e filhos ilegítimos ou espúrios (adul-
terinos e incestuosos).
III. A transformação do pátrio poder em poder familiar.
IV. A possibilidade de utilização do sobrenome familiar da mulher por parte do homem
que com ela se casar.
a) Apenas a assertiva I
b) Apenas a assertiva IV
c) As alternativas I e II
d) As alternativas III e IV
e) As alternativas I e IV
capítulo 1 • 41
GABARITO
Letra C - Princípio da igualdade: I. a idade núbil é única; II. Não há mais distinção entre
filhos havidos ou não no casamento.
RESUMO
Neste capítulo, você compreendeu a importância da família para a sociedade e como ela
vem ganhando novos contornos com a modernidade e a visão humanizada e constitucionali-
zada do Direito de Família, deixando para trás um conceito puramente patrimonial, para se ter
como base a solidariedade, afetividade e a igualdade no seio familiar. Também foi oportuniza-
da a aprendizagem dos tipos de família e de vínculo de parentesco, com uma noção objetiva
das linhas e graus de parentesco.
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capítulo 1 • 42
GAGLIANO, P. S.; PAMPLONA FILHO, R. Novo Curso de Direito Civil, Vol. VI. São Paulo:
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RIZZARDO, A. Direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2011.
TARTUCE, F. Manual de Direito Civil. São Paulo: Método, 2014.
_____. Manual de Direito Civil. São Paulo: Método, 2016.
VENOSA, S de S. Direito Civil – Direito de Família, v. VI. São Paulo: Atlas, 2005.
capítulo 1 • 43
capítulo 1 • 44
2
Do casamento
Do casamento
Introdução
OBJETIVOS
• Conceituar e identificar a natureza jurídica do casamento, bem como conhecer suas ca-
racterísticas;
• Distinguir o casamento civil do casamento religioso, sendo também necessário apontar os
efeitos de cada um e o momento em que se estabelece o vínculo conjugal;
• Conhecer conteúdo da habilitação para o casamento com os principais documentos que
devem ser apresentados para o procedimento;
• Identificar as causas impeditivas e suspensivas para o casamento, distinguindo ainda o
casamento inexistente, nulo e anulável;
• Conceituar o casamento putativo e conhecer os efeitos que poderá produzir;
• Identificar os requisitos necessários para a celebração do casamento e sua solenidade,
bem como os do momento da celebração, seus efeitos;
• Identificar a prova no casamento, bem como os direitos e deveres dos cônjuges em decor-
rência do casamento.
capítulo 2 • 46
Casamento
Nas mais diversas civilizações, o casamento, ao longo dos séculos, tem sido
uma forma de constituir família. As pessoas buscam o casamento por vários mo-
tivos: o mais comum seria para dar visibilidade à relação afetiva, já que se trata de
união entre duas pessoas.
Vale ressaltar que o legislador pátrio não trouxe qualquer definição de
casamento, limitando-se a estabelecer requisitos para sua celebração, regime
de bens e direitos e deveres dos cônjuges, cabendo à doutrina a tentativa de
conceituação de casamento.
Para Maria Helena Diniz (2010), "O casamento é o vínculo jurídico entre o
homem e a mulher, livres, que se unem, segundo as formalidades legais, para obter
o auxílio mútuo e espiritual, de modo que haja uma integração fisiopsíquica, e a
constituição de uma família". (DINIZ, 2010, p. 1.051)
Segundo Paulo Nader, trata-se de “negócio jurídico bilateral que oficializa,
solenemente, a união exclusiva e por tempo indeterminado de duas pessoas, para
uma plena comunhão de interesses e de vida”. (NADER, 2016, p. 119)
Apesar do conceito clássico de casamento fazer menção à união de pessoas de
sexos distintos, resta claro que a sociedade atual tem como tendência o reconheci-
mento do casamento homoafetivo.
A VII Jornada de Direito Civil, ocorrida em 2015 no Conselho da Justiça
Federal, da qual participaram os mais renomados juristas ligados ao Direito de
Família, aprovou o Enunciado nº 601: “É existente e válido o casamento entre
pessoas do mesmo sexo”. Sua justificativa transcreve-se em parte:
capítulo 2 • 47
A finalidade da lei não é tornar a vida imóvel e cristalizá-la, mas
sim permanecer em contato com ela, seguir sua evolução e a ela
se adaptar. O Direito tem um papel social a cumprir, exigindo que
este se adeque às novas situações que se apresentam. O novo
modelo da família funda-se sob os pilares da repersonalização, da
afetividade, da pluralidade e do eudemonismo, incorporando uma
nova roupagem axiológica ao Direito de Família. Sendo assim, visível
é a necessidade de interpretação extensiva do citado dispositivo
legal, tornando aplicável aos casais homoafetivos a celebração
do casamento e a formação do vínculo conjugal. (Disponível em:
<https://goo.gl/lkDr0I >. Acesso em: 30 jan. 2017)
capítulo 2 • 48
juristas como Caio Mario da Silva Pereira, Pontes de Miranda, Flávio Tartuce,
Eduardo de Oliveira Leite, Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Flávio
Augusto Monteiro de Barros e Roberto Senise Lisboa.
Após a abordagem da natureza jurídica do casamento, passa-se à análise das
características do casamento: ato pessoal, garantidas a liberdade de escolha e de
manifestação da vontade (art. 1.542, CC/02); ato solene, suas formalidades des-
tinam-se a dar maior segurança aos referidos atos para garantir a sua validade e en-
fatizar a sua seriedade, sob pena de sua inobservância tornar o ato inexistente; ato
civil que não admite termo ou condição (constitui, assim, negócio jurídico puro
e simples); suas normas são cogentes (não podem ser derrogadas por convenções
particulares) e visam dar a proteção deferida pela Constituição Federal; estabelece
comunhão plena de vida (art. 1.511, CC/02) que implica necessariamente na
exclusividade da união (art. 1.566, I, CC/02); representa união permanente com
fidelidade recíproca, o que não significa que seja indissolúvel.
Finalidades
capítulo 2 • 49
O Direito Civil brasileiro não conferiu especial importância aos esponsais,
sequer prevendo-os como requisito necessário à formação do casamento. Por isso,
pode a promessa ser rompida a qualquer tempo. Uma vez que lhe é conferida na-
tureza contratual, a polêmica se instala em torno do rompimento causar ou não o
direito à reparação por danos morais e materiais pelos prejuízos sofridos, valendo
salientar que, por não pertencer ao campo obrigacional, esse tipo de promessa não
gera a possibilidade de se exigir execução específica.
Entendeu a Jurisprudência Catarinense, ao decidir um conflito de competên-
cia, não se enquadrar no âmbito da vara de família o processamento de ação ver-
sando sobre o tema rompimento de noivado, em que pese haver afetividade. Nesse
caso, se entendeu que, se algum dano for apurado, deverá ser enquadrado como
de esfera cível, e não de âmbito familiar. (TJSC, Conflito de Competência nº
2012.017722-9, de Blumenau, rel. Des. Luiz Carlos Freyesleben, j. 19-07-2012)
Em julgado, o Tribunal de Justiça do Paraná entendeu:
capítulo 2 • 50
A jurisprudência dos Tribunais diverge quanto ao tema:
capítulo 2 • 51
9. Deu-se parcial provimento ao apelo, para condenar, com
fundamento no princípio da boa-fé objetiva, o recorrido ao pagamento
da metade das despesas realizadas para a celebração do casamento
e o início da vida conjugal pela apelante. [...]. No restante, manteve-se
incólume a r. sentença. (TJ-DF - APL: 118196920088070005 DF
0011819-69.2008.807.0005, Relator: FLAVIO ROSTIROLA, Data
de Julgamento: 10/03/2010, 1ª Turma Cível, Data de Publicação:
05/04/2010, DJ-e Pág. 99)
LEITURA
Não deixe de ler o acórdão que versa sobre a responsabilidade civil no arrependimento
dos esponsais - STJ - AREsp: 664171 RJ 2015/0036714-1, Relator: Ministro RICARDO
VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Publicação: DJ 25/03/2015.
capítulo 2 • 52
Formalidades preliminares. Procedimento de habilitação
NOTA
Posição mais avançada foi assumida, por maioria de votos, pela 4ª Turma do Superior
Tribunal de Justiça, em 25 de outubro de 2011, ao admitir a habilitação de pessoas de igual
sexo ao casamento civil (REsp. 1183378, em que foi relator o Ministro Luis Felipe Salomão).
capítulo 2 • 53
de impedimentos matrimoniais (art. 1.521 do CC) ou de causa suspensiva (art.
1.523 do CC), e a dar publicidade, por meio de editais, à pretensão manifestada
pelos noivos. (GONÇALVES, 2014, p. 58)
PERGUNTA
Com o advento da Lei 11.106, de 28 de março de 2005, que revogou os incisos VII e
VIII do art. 107 do CP, como resta o entendimento sobre o disposto no artigo 1.520 do CC?
Na visão de grande parte da doutrina, a revogação dos incisos VII e VIII acima descritos, a
princípio, teria importado na revogação parcial do art. 1.520, especificamente em relação à
parte em que é afastada a imposição ou cumprimento de pena criminal, sob a alegação de
que os incisos e o artigo em questão seriam conexos. Em suma, a partir da revogação desses
incisos, o casamento não mais seria uma forma de extinção da punibilidade no caso da práti-
ca do crime de estupro de vulnerável, encontrando-se o artigo civilista em comento revogado
parcialmente (restaria vigente apenas em relação à possibilidade de casamento de pessoa
que não alcançou a idade núbil no caso de gravidez).
LEITURA
Sobre o tema extinção da punibilidade e o advento da lei 11.106/2005, não deixe de
ler o importante julgado: RE 418376/MS, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ acórdão Min.
Joaquim Barbosa, 9.2.2006 (RE-418376).
É no cartório do local de domicilio dos noivos onde eles devem instaurar o pro-
cesso de habilitação, e, caso possuam domicílios distintas, podem optar pelo Registro
Civil de qualquer deles, entretanto os proclamas (edital) devem ser feitos em ambos.
Prevê o artigo 1.512 do Código Civil de 2002 que “o casamento é civil e gra-
tuita a sua celebração”, acrescentando o parágrafo único que “a habilitação para o
casamento, o registro e a primeira certidão serão isentos de selos, emolumentos e
custas, para as pessoas cuja pobreza for declarada, sob as penas da lei”. Ainda de
acordo com o art.1.527, parágrafo único, do CC, decorrido o prazo de 15 dias
a contar da afixação do edital em cartório, deverá ser entregue pelo oficial, aos
nubentes, certidão de habilitação pela qual estarão os noivos habilitados ao casa-
mento no prazo de 90 dias, sendo esse o período de sua eficácia (artigo 1.532 do
capítulo 2 • 54
CC), dando ciência aos nubentes que, ultrapassado esse prazo, nova habilitação se
fará necessária diante da possibilidade de surgimento de algum impedimento que
outrora era inexistente.
Para a habilitação, faz-se necessária a apresentação de certidão de nascimento
ou documento equivalente (certidão de casamento com averbação de divórcio,
por exemplo), de modo a comprovar o requisito da idade mínima para contrair
núpcias e máxima prevista no artigo 1.641, II, do CC/02, que diz respeito apenas
ao regime de bens a ser adotado, assim como a análise de existência ou não de
algum outro impedimento.
Documentos essenciais para a habilitação constam do rol do artigo 1.525 do CC/02.
Em que pese haver referência no CC/02, artigo 1.526, de que a habilitação
deve ser pessoal, o próprio artigo que o antecede prevê a possibilidade de o reque-
rimento ser feito por procurador com poderes especiais.
Além do requisito idade mínima no caso de não atingida a maioridade civil,
será necessária a autorização por escrito dos pais ou a decisão judicial que supre o
consentimento; quanto a eventual casamento anterior, é necessário que o mesmo
tenha sido desfeito, seja por meio de certidão de óbito (cônjuge falecido), seja por
decisão que reconheceu sua anulação, seja por meio de certidão com a averbação
do divórcio: fato é que não poderá casar-se novamente alguém que tenha penden-
te casamento anterior.
Por fim, não se pode esquecer que, para a habilitação, também deve haver a
juntada do termo de opção pelo regime da comunhão parcial ou do pacto ante-
nupcial, conforme previsto no parágrafo único do artigo 1.640 e no artigo 1.653,
ambos do CC/02.
Dispõe o art. 1.512, CC, que “o casamento é civil e gratuita a sua celebração”.
No entanto, o artigo 1.516, CC/02, autoriza o reconhecimento de efeitos civis
ao casamento religioso que preencher todas as exigências legais e for levado ao
respectivo registro (art. 1.515, CC/02).
Com o advento da Lei nº 181/1890, foi introduzido no Brasil o casamento
civil como o único capaz de gerar efeitos jurídicos e promover a constituição de
família. Como o efeito do decreto não foi sentido a curto prazo, em 1950 o legisla-
dor publicou a Lei nº 1.110 autorizando a concessão de efeitos civis ao casamento
religioso que preenchesse todos os requisitos legais, norma mantida pelo art. 226,
§2º., CF/88, e pelo Código Civil de 2002.
capítulo 2 • 55
A habilitação para o casamento pode ocorrer em dois momentos: 1- Habilitação
prévia: os nubentes se apresentam ao oficial do Registro Civil e realizam todo o
procedimento de habilitação no cartório. O certificado de habilitação deverá ser
apresentado ao ministro religioso que o arquivará. O registro do casamento reli-
gioso deve ocorrer até noventa dias após sua celebração (prazo decadencial) e pode
ser realizado por qualquer interessado; 2- Habilitação posterior: a cerimônia reli-
giosa é realizada antes da habilitação. O registro pode ser requerido apenas pelos
cônjuges a qualquer tempo.
Em qualquer das hipóteses, o registro do casamento gerará efeitos ex tunc a
partir da data de sua celebração religiosa. Deve-se ressaltar, por fim, que, se antes
do registro do casamento religioso um dos contraentes realizar casamento civil
com outra pessoa, o religioso não poderá ser registrado, haja vista o princípio da
monogamia, na forma do artigo 1.516, § 3º, do CC/02.
Cabe registrar que a hegemonia da Igreja Católica não prevaleceu, podendo
o casamento religioso ser o celebrado por qualquer seita, desde que reconhecida.
PERGUNTA
Em caso de morte de um dos nubentes após o casamento religioso e antes do registro
civil, é valido o casamento?
Segundo Paulo Nader (2016, p. 118), há de se avaliar algumas hipóteses:
1) se a habilitação de se deu antes do ato religioso, não há que se discutir a sua validade,
pois o registro já não dependeria mais de ato do falecido;
2) se o ato religioso foi anterior ao registro, mas os nubentes chegaram a assinar o
requerimento dirigido ao titular do cartório, dúvidas não quanto à possibilidade do registro;
3) se o ato religioso antecedeu o registro e um dos nubentes ainda não havia assinado
o requerimento, poderá haver a interpretação apenas pelos elementos linguístico e sistemá-
tico, e nesse caso será negativa a resposta, de acordo com o previsto no artigo 1.516, § 2º,
do CC/02, já que o requerimento deve ser firmado pelo casal, haja vista ser o casamento
negócio jurídico bilateral e solene; por outro lado, é possível uma interpretação lógica, pois,
tendo falecimento se dado após o ato religioso, nada mais razoável do que se presumir que o
proposito do falecido era casar-se também civilmente, salvo prova em contrário; caso contrá-
rio, a própria vontade do nubente falecido não seria levada em consideração.
Nessa última hipótese, havendo dúvida, o Oficial de Registro Civil deverá suscitá-la ao
juiz competente, que decidirá com critérios de equidade, autorizando ou não o registro.
capítulo 2 • 56
Requisitos e pressupostos matrimoniais. Celebração. Momento do casamento
capítulo 2 • 57
No ato de celebração do casamento, a autoridade que o estiver presidindo
deve perguntar aos nubentes se pretendem casar por livre e espontânea vontade,
devendo o ato ser consensual. Com a resposta positiva, ou seja, ouvido o “sim”, a
autoridade celebrante declara efetivado o casamento, sendo este o momento que
se entende por efetivamente realizado o casamento, quando cumpridos os dois re-
quisitos: manifestação livre de vontade dos nubentes e declaração pela autoridade
de que os noivos estão casados, na forma do artigo 1.514 do CC/02.
Decorrida a celebração do casamento, deve ser lavrado o assento no livro de
registro civil de pessoas naturais, que será assinado pelo presidente do ato, pelos
cônjuges, testemunhas e o oficial de registro. Pelo artigo 1.565, § 1º, do CC/02,
poderá qualquer dos nubentes acrescer o sobrenome do outro cônjuge, o que es-
pelha a efetivação do princípio da igualdade.
Não se pode deixar de analisar a capacidade para o casamento, sendo um
requisito essencial para se contrair matrimônio. Como não há regras específicas a
respeito da capacidade para o casamento, sempre foi necessário socorrer-se à Parte
Geral do CC/2002, alterada em julho de 2015, pela Lei nº 13.146, instituidora
do Estatuto da Pessoa com Deficiência. Além da Parte Geral do CC/02, a capaci-
dade para o casamento tem seu complemento no artigo 1.517 do CC/02.
Inicialmente, cabe esclarecer que não se pode confundir incapacidade para o
casamento com os impedimentos do matrimônio, pois esses atingem determina-
das pessoas em situações especificas, enquanto a incapacidade é geral, impedindo
o casamento com qualquer pessoa que seja.
Nos termos do Código Civil atual, os incapazes de contrair núpcias são
apenas os menores de 16 anos, nos termos do artigo 1.517 e do artigo 3º, com
a atualização da Lei 13.146/2015, que excluiu o enfermo mental e revogou
o artigo 1.548, I, do CC/02, valendo lembrar que o Estatuto da Pessoa com
Deficiência trouxe a inclusão familiar plena da pessoa com deficiência, preten-
dendo igualá-la para os atos existenciais.
Por outro lado, permanece cristalino que capacidade para o casamento
não depende exclusivamente da idade dos contraentes. É preciso ainda que
eles estejam em pleno gozo das faculdades mentais – requisito fundamental
à validade do consentimento, que deve ser livre e consciente, como na
generalidade dos negócios jurídicos.
Quanto à questão polêmica do art. 1.520 do CC/02, em relação à Lei
11.106/2005 e à Lei 12.015/2009, ela já foi tratada alhures.
capítulo 2 • 58
Por fim, deve-se observar que o Código Civil limita apenas a idade mínima para
o casamento; logo, não havendo um máximo, a idade, ainda que avançada, não
pode constituir impedimento. Estando o idoso em pleno gozo de suas faculdades
mentais, poderá casar-se livremente (a implicação é tão somente quanto ao Regime
de Bens – artigo 1.641, II, CC/02 – a ser tratado em capítulo próprio). Também não
constitui impedimento a diferença substancial de idade entre os nubentes.
Embora com frequência possa existir certa confusão no que tange ao plano da
existência, da validade e da eficácia do casamento, tecnicamente esses institutos e
suas consequências também não se confundem.
O casamento inexistente é visto pela doutrina em três hipóteses: casamento
entre pessoas do mesmo sexo (posicionamento que se tronou ultrapassado diante
da atual permissão para o casamento homoafetivo); ausência de vontade; casa-
mento celebrado por autoridade totalmente incompetente (ratione materiae).
Nessa toada, salienta Flavio Tartuce:
capítulo 2 • 59
Jurisprudência
O Tribunal do Rio de Janeiro julgou caso em que o nubente se encontrava em situação
de debilidade emocional no momento da celebração de casamento. (TJRJ, Acórdão
409111995, 6.ª Câmara Cível, Rel. Des. Pedro Ligiero, j. 24.09. 1996)
capítulo 2 • 60
Resumindo as diferenças entre os planos, Cristiano Chaves de Farias e
Nelson Rosenvald ensinam que podem ser identificadas as seguintes situações
com relação ao casamento:
capítulo 2 • 61
princípio da monogamia, não se aplicando tal entendimento à união estável se já
houver separação de fato. (artigo 1.723, § 2º, do CC/02)
PERGUNTA
Havendo a nulidade do primeiro casamento, autoriza-se a validação ‘ex tunc’ do segundo? Sim.
PERGUNTA
É possível que ocorra um casamento na fase de inquérito policial mesmo quando em
curso o processo criminal? Sim. No entanto, cabe lembrar que retroagirão os efeitos da con-
denação criminal, o que gerará a nulidade do casamento.
capítulo 2 • 62
chegando a ser tratadas como proibições; por isso, usa-se a expressão “não devem
casar”, enquanto no impedimento “não podem casar”.
Com o objetivo de se evitar a confusão patrimonial, protegendo a parti-
lha dos herdeiros, o inciso I do artigo 1.523 do CC/02 aconselha ao cônjuge
sobrevivente não contrair núpcias enquanto não forem feitos o inventário e
partilha dos bens do casal. A simples abertura do inventário não é motivo para
o afastamento da causa suspensiva.
O inciso II do artigo 1.523 do CC/02 se encontra ultrapassado, consideran-
do a existência e possibilidade de realização de exame de DNA, já que a ideia da
causa suspensiva era evitar a turbatio sanguinis (evitar dúvida sobre a paternidade),
afastando-se, ainda, a causa suspensiva com a comprovada inexistência de gravidez
ou com o nascimento do filho após o decurso, e de igual sorte há o afastamento da
causa se o casamento anterior tiver sido anulado por impotência.
Outra causa suspensiva de casamento é o inciso III; no entanto, se restar de-
monstrado que outro cônjuge não sofrerá prejuízo patrimonial, ao juiz é permiti-
da a dispensa da obrigatoriedade do regime de separação de bens.
A última causa suspensiva tem o condão de afastar eventual prejuízo patri-
monial aos tutelados ou curatelas, evitando o casamento do tutor ou curador,
seus ascendentes, descendentes ou colaterais com a pessoa tutelada ou curatela-
da, cessando a causa suspensiva com a extinção da tutela ou curatela e a devida
aprovação de contas.
A nomenclatura causa suspensiva pode causar uma ideia equivocada de que,
nessas hipóteses, a celebração do casamento não aconteceria; no entanto, em nada
impedem o casamento ou geram anulação ou nulidade: apenas impõem aos nu-
bentes o regime de separação de bens previsto no artigo 1.641, I, do CC/02, sendo
o casamento considerado regular; portanto, a consequência da causa suspensiva de
casamento recai apenas sobre o regime de bens que deve ser adotado.
As causas suspensivas apenas podem ser opostas pelas pessoas elencadas
no artigo 1.524 do CC/02, e até o momento da celebração do casamento
(artigos 1.529 e 1.530 do CC/02), sendo possível, após a celebração, o ma-
nejo de ação autônoma ou que sejam opostos de forma incidental em outras
ações (inventário, por exemplo).
capítulo 2 • 63
Casamento nulo e anulável
Não se pode confundir validade com eficácia. Para que se tenha um casamen-
to válido, é necessária a manifestação de vontade dos noivos no estabelecimento
do vínculo conjugal, bem como a declaração pelo celebrante de que os nubentes
contraíram matrimônio; já para ter eficácia, será necessário o preenchimento do
requisito próprio do registro público.
As causas de invalidade do casamento estão previstas nos artigos 1.548 e 1.550
do CC/02, a depender da natureza do vício que atinge o ato; logo, se for insanável,
gera a nulidade e, se sanável, leva à anulabilidade, sendo que, em ambas as hipóte-
ses, o casamento existe e depende de confirmação judicial para ser desconstituído.
No entanto, em ambas as hipóteses, reconhecido o vício, a sentença tem efeito
retroativo e o casamento desaparece do mundo jurídico.
O Código Civil de 1916, assim como o de 2002, considerava nulo o casamen-
to contraído por enfermo mental sem o necessário discernimento para os atos da
vida civil (art. 1.548, I); no entanto, conforme trabalhado alhures, o dispositivo
em comento foi revogado pela Lei nº 13.146/2015, que objetivou a plena inserção
da pessoa portadora de deficiência na sociedade e no âmbito familiar, restringin-
do, com isso, o rol taxativo das nulidades do casamento.
Há nulidade do casamento quando esse for realizado com afronta a qualquer
das causas de impedimento previstas no artigo 1.521 do CC/02, bem como quan-
do for alcançado por vício essencial, simulação, infração à ordem pública. A legiti-
midade para a propositura de ação objetivando ver declarado nulo o casamento é
do Ministério Público, bem como de qualquer interessado, possuindo a sentença
declaratória efeito extunc, ou seja, retroage à data da celebração do casamento.
capítulo 2 • 64
Na mesma toada, segue Flavio Tartuce ao mencionar os efeitos da sentença:
capítulo 2 • 65
numerusclausus, prevendo o inciso I a falta de idade mínima núbil (in casu, torna-
-se irrelevante a existência ou não de autorização do representante legal), e o inciso
II, quando não houver o necessário suprimento judicial, de acordo com os artigos
1.517 e 1.520 do CC/02. Por outro lado, não haverá anulação do casamento por
insuficiência de idade se do casamento resultar gravidez (art. 1.551 do CC/02),
em harmonia com o permissivo do artigo 1.520 do CC/02 autorizador do casa-
mento, em caso de gravidez, quando não se tiver atingido a idade núbil.
Vale salientar que os artigos 1.552 e 1.555, do mesmo diploma legal, estabe-
lecem os legitimados à propositura da ação de anulação do casamento. Ademais,
por se tratar de ato anulável, e acordo com o artigo 1.553 do CC/02, pode ser
ratificado por vontade das partes.
Ainda na esteira da anulação, o artigo 1.560, incisos e § 1º do CC/02, fixa
prazo para a propositura da ação, sob pena de convalidar no tempo, tratando-se
de prazo decadencial.
Pelo inciso III do artigo 1.550 do CC/02, pode o casamento ser anulado por
vício de vontade nos termos do artigo 1.556 a 1.558 do CC/02, sendo considera-
do vício de vontade o erro substancial quanto à pessoa do outro cônjuge (artigos.
1.556 e 1.557 do CC/02) e a coação moral (art. 1.558 do CC/02), ressalvado que
a causa se limita apenas à coação moral, pois, se alegada, a coação física será caso
de inexistência de casamento.
Tem-se por coação qualquer ameaça (grave, injusta e atual) ou a injusta pressão
exercida sobre alguém (seja em face do nubente ou de seus familiares), forçando-o
a casar-se. Já o erro, enumerado taxativamente no artigo 1.557 do CC/02, pode
ser considerado como uma falsa representação da realidade, devendo referir-se, tão
somente, à pessoa do outro cônjuge, existindo prazo para arguição do vício (artigo
1.560, III e IV, do CC/02), sendo o prazo de natureza decadencial. Ademais, é
necessário que o vício, se existente, e descoberto após a celebração do casamento,
venha a tornar insustentável o convívio dos nubentes.
Sob a ótica do artigo 1.556 do CC/02, o casamento pode ser anulado, haven-
do erro essencial quanto à pessoa do outro, vindo o artigo 1.557 do CC/02 a es-
clarecer o que o código considera por erro essencial sobre a pessoa. Observando o
disposto no inciso I, podemos dizer que a doutrina considera a identidade física e
a identidade civil, essa última também denominada identidade social. A primeira
refere-se ao erro de casar-se com uma pessoa acreditando tratar-se de outra; e, no
segundo, o erro está relacionado ao caráter e às qualidades da pessoa (honra e boa
fama), revelados apenas após o casamento.
capítulo 2 • 66
No entanto, cumpre destacar que no erro de identidade civil há de ser sobre-
maneira importante que o seu conhecimento torne insuportável a vida conjugal.
O que não se exige do erro de identidade física, já que o casamento seria insusce-
tível de sub-rogação pela sua natureza intuito personae.
CURIOSIDADES
• Um exemplo de erro de identidade física pode ser encontrado na Bíblia, em que Jacó se
casou com Lia acreditando estar casando-se com Raquel. (Gênesis 29:25)
• Nossos tribunais já decidiram que não possui potencial de erro essencial, capaz de levar à
nulidade, a descoberta de que o outro cônjuge: a) é fumante; b) professa religião distinta; c)
possui o hábito de bebidas alcoólicas; d) é pessoa nervosa; e) foi divorciado e não solteiro
como alegara; f) não possui curso superior; g) não exerce determinada profissão. Por outro
lado, já se reconheceu o erro essencial nos casos em que um dos cônjuges: a) viveu em con-
cubinato anteriormente e possui filho com outra pessoa; b) revela homossexualidade, seja
ativa (cyncedus) ou passiva (pathiens); c) possuiu amante; d) praticou adultério em casamen-
to anterior; e) recusou-se ao debitum conjugale após o casamento; f) é ladrão contumaz; g)
é pessoa mentirosa, que se fazia passar por militar, ostentando documento falso. Essa é uma
pequena amostra de centenas de situações consideradas em juízo. Há fatos que dividem as
opiniões, como o de se pertencer à religião diversa, ser nacional de outro país, negar-se logo
após o casamento a manter relações sexuais. (NADER, 2016, p. 276)
Ainda sobre o artigo 1.557 do CC/02, quanto ao inciso II, é necessário que o
crime cometido seja capaz de tornar insustentável a vida em comum. Geralmente
se trata dos crimes que causem repulsa e reprovação da sociedade: crimes contra a
vida, a liberdade sexual, assim como os contra o patrimônio: furto, roubo, latrocí-
nio e ainda o crime de tráfico de drogas.
O inciso III do artigo 1.557 prevê ainda duas outras hipóteses que configuram
o erro, defeito físico irremediável, que não caracterize deficiência ou moléstia gra-
ve e transmissível. No entanto, a própria jurisprudência diverge na classificação de
quais defeitos físicos e moléstias graves seriam passíveis de ensejar a anulação do
casamento, analisando-se caso a caso, e, em alguns, sendo essencial a prova pericial
do alegado, ademais, o defeito deve ser de tal ordem que prejudique as relações
inerentes ao casamento.
capítulo 2 • 67
Na forma do artigo 1.559 do CC/02, é limitada ao cônjuge, que incidiu em erro ou
que sofreu a coação, a legitimidade para a propositura da ação de anulação do casamento.
Seguindo para a análise do inciso IV do artigo 1.550 do CC/02, é ato anulável o
casamento de pessoa incapaz de consentir ou manifestar de modo inequívoco o seu
consentimento, sendo legitimados à propositura da ação os seus herdeiros, o próprio
incapaz, assim como os seus representantes legais, sendo a incapacidade relativa,
hipótese do artigo 4º do CC/02, tendo como prazo, de natureza decadencial, para a
propositura da ação, 180 dias, conforme previsão do artigo 1.560, I, CC/02.
Essa previsão continua a alcançar os ébrios habituais (alcoólatras) e os viciados
em tóxicos (art. 4.º, II, do CC/2002, atualizado pela Lei 13.146/2015), e aos que,
por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade (art. 4º, III,
do CC/02), como, por exemplo, a pessoa que se encontra em um profundo coma,
não incidindo, por outro lado, sobre as pessoas de discernimento mental reduzido
ou excepcional sem desenvolvimento completo, conforme Lei nº 13.146/2015.
O inciso V do artigo 1550, do CC/02, trata como causa de anulação a rea-
lização de casamento pelo mandatário, cujo prazo decadencial na previsto no
artigo 1.560, § 2º, CC/02.
A incompetência do celebrante (em razão da pessoa e em razão do lugar) tam-
bém é causa de anulação, de acordo com o artigo 1550, VI, sendo os legitimados
para a ação os próprios nubentes cujo prazo de decadencial para propositura da
ação é de dois anos, de acordo com o inciso II do artigo 1.560 do CC/02.
Deve-se ressaltar que, embora o inciso I do artigo 1.550 do CC/02 tenha sido
revogado pela lei 13.146/2015, é certo que permanece vigente o artigo 1.150, IV,
do CC/02, sendo hipótese de anulação de casamento quando o incapaz não con-
sentir ou não puder manifestar sua vontade. Vale repisar, ademais, que as pessoas
com deficiência podem se casar livremente desde que seja possível manifestar sua
vontade por si ou por seu responsável ou curador, nos termos do novo § 2.º do
artigo 1.550 do Código Civil.
No entanto, não se pode deixar de observar que a alteração pela Lei nº 13.146
do CC/02 traz situações que refletem contradição no próprio ordenamento ju-
rídico, pois, se a vontade é elemento essencial ao casamento, em que somente a
vontade própria deve prevalecer, torna-se difícil compreender que a vontade do
curador possa ser suficiente para que ocorra o casamento de portadora de pessoa
deficiência, chegando a ser ilógico por contrariar a natureza de pessoalidade que
possui o casamento, com um sério risco de facilitar a ocorrência de fraudes perpe-
tradas em um casamento realizado tão somente pela vontade do curador.
capítulo 2 • 68
A sentença que decreta a anulação do casamento será constitutiva negativa,
mantendo seus efeitos até a decretação de sua invalidade, devendo ser averbada
junto ao Registro Civil, retornando os ex-cônjuges ao estado civil anterior ao do
casamento. Por comportar vícios de natureza privada que geram apenas a anulação
do ato, permite que haja a confirmação por parte dos nubentes, resguardando-se
eventuais direitos de terceiros.
A atuação do Ministério Público é essencial nesse caso diante da questão de
ordem pública, atuando como fiscal da lei.
Casamento Putativo
A putatividade é algo que se reputa verdadeiro, mas não é, tendo sido criado
pelo Direito Canônico, já que não era concebível pela igreja o desprezo da boa-fé.
Sob a ótica do casamento putativo, a boa-fé há de se referir ao desconhecimento
(quando do ato da celebração) por um ou por ambos os nubentes quanto aos
impedimentos que fulminavam casamento, incorrendo em erro, nesse caso des-
culpável, de direito ou de fato, ou seja, é a ignorância quanto à existência de causa
de invalidade do casamento.
São exemplos clássicos dessa espécie de casamento: os irmãos que se casam
sem conhecer a sua condição de irmãos; a mulher que se casa com homem já ca-
sado sem conhecer sua situação anterior.
Segundo o artigo 1.561 do CC/02, o casamento putativo é nulo ou anulável,
mas, por ter sido contraído de boa-fé, pois um ou ambos os cônjuges desconhe-
ciam o vício que fulminava o casamento no momento de sua celebração, gera
efeitos mesmo diante da sentença eu reconheceu o vício.
Eduardo de Oliveira Leite (2005, p. 113) enumera como principais efeitos:
1.havendo boa-fé de ambos os cônjuges: os pactos antenupciais possuem vali-
dade até a data da anulação; não serão devolvidas as doações antenupciais; caso a
anulação seja decretada após a morte de um dos cônjuges, o outro (conforme or-
dem de vocação hereditária) o sucederá; os alimentos e o uso do nome do cônjuge
são devidos até a data da sentença anulatória; não causa a extinção da afinidade;
2.em relação ao cônjuge de boa-fé: os alimentos são devidos até a sentença anu-
latória; permanece no exercício do poder familiar sobre os filhos; possui direito à
meação do outro cônjuge; caso a anulação seja decretada após a morte do cônjuge
(respeitando a ordem de vocação hereditária), herdará normalmente; 3.quanto ao
cônjuge de má-fé: fica obrigado aos alimentos em relação à família até a data da
capítulo 2 • 69
sentença anulatória; não pode exercer o poder familiar sobre os filhos (salvo me-
lhor interesse da criança ou adolescente); perde o direito à meação do outro côn-
juge; embora os filhos o sucedam, esse não sucede aos filhos; ressalvada a hipótese
comprovada de ter prejudicada sua identificação no meio social ou com os filhos,
o cônjuge de má-fé perde o sobrenome de casado; 4.havendo má-fé de ambos os
cônjuges: os efeitos apenas se aproveitarão aos filhos.
A sentença que reconhecer a nulidade retroagirá até a data da celebração do
casamento; no entanto, não prejudicará terceiros de boa-fé.
capítulo 2 • 70
No artigo 19 do Código de Processo Civil de 2015, encontra-se prevista a ação de-
claratória com fins de reconhecimento da existência ou inexistência da relação jurídica.
De acordo com o artigo 1.546 do CC/02, realizada a prova supletória (dire-
ta complementar), será proferida sentença que deverá ser registrada no livro de
Registro Civil, retroagindo os efeitos dessa à data da celebração do casamento.
Admite-se, ainda, como meio de prova (indireta) do casamento a posse do es-
tado de casados, que se dá quando duas pessoas vivem e se apresentam para o meio
social como casadas. Não se deve confundir união estável com a união na posse do
estado de casados, pois, nesse último estado, há o reconhecimento de uma vivência
‘‘more uxorio’’, mas com provas evidenciais de que houve a celebração do casamento.
A posse do estado de casados é utilizada para comprovar a existência do ca-
samento sempre que não houver mais acesso ao registro do mesmo. Nesse caso, a
declaração judicial tem o condão de suprir a ausência da certidão de casamento.
São três os elementos caracterizadores da posse do estado de casados: nomem,
quando existe documento em que um cônjuge utiliza o sobrenome do outro;
‘‘fama’’ ou reputatio, quando são reconhecidos como casados pelo meio social;
tractatus, quando, publicamente, os que vivem na posse do estado de casados se
tratam como se casados fossem.
Admite-se a posse de estados de casados em favor da prole, sendo pressuposto
para o reconhecimento do instituto caso os pais estejam mortos ou nos casos de
demência de ambos ou do cônjuge sobrevivente; quando não possam manifestar
sua vontade; e também nos casos de ausência declarada. (artigo 1.545 do CC/02)
O reconhecimento do casamento, por via judicial, tem efeitos extunc, ou
seja, retroagirão até a data da suposta celebração, beneficiando, inclusive, os
filhos com a presunção pater is. Em caso de dúvida em relação à existência
do casamento, deve o juiz decidir a favor deste – in dubio pro matrimonio, de
acordo com o artigo 1.547 do CC/02.
O Novo Código de Processo Civil dispõe sobre regras procedimentais para as
ações de família, nos artigos 693 a 699, tendo aplicação para a ação que visa a fazer
prova do casamento, em que pese não haver menção no dispositivo 693 (CPC).
No entanto, o melhor entendimento tem sido o de ser o rol apenas exemplificativo,
conforme Enunciado nº 19 do IBDFAM: “O rol do art. 693 do Novo CPC é mera-
mente exemplificativo, e não taxativo”. (Disponível em: <https://goo.gl/h6wP18>.
Acesso em: 12 fev. 2017)
Ainda sobre o tema das provas e do assento do casamento, o artigo 1.544
do CC/02 e os artigos 7º, 13 e 14 da Lei de Introdução às Normas do Direito
capítulo 2 • 71
Brasileiro tratam do casamento celebrado no exterior, devendo ele ser registrado
em cento e oitenta dias, a contar da volta de um ou de ambos os cônjuges ao
Brasil. A Lei 6.015/73, em seu artigo 32, dispõe sobre o local em que deve ser
realizado o registro.
Segundo o entendimento da doutrina pátria, o prazo do artigo 1.544 do
CC/02 não impede que seja feito o registro ulterior, tendo apenas o condão de dar
publicidade ao ato, mesmo porque o casamento gera efeitos independentemente
do registro no Brasil.
capítulo 2 • 72
Geralmente, os nubentes que recorrem ao casamento nuncupativo já vi-
vem juntos e constituíram família, sendo o interesse maior a oficialização da
união. O casamento nuncupativo é instituição antiga, presente no Direito
Brasileiro a partir do Decreto nº 181, de 1.890, artigos 38 a 43, embora não
ocorra com frequência.
De acordo com o artigo 1.540 do CC/02, não sendo possível a presença de
autoridade para a realização do casamento e existindo o risco de morte de um dos
noivos, o casamento poderá ser realizado na presença de seis testemunhas, que não
podem ter parentesco com os noivos. No entanto, para sua validade, necessário
se faz que as testemunhas do ato compareçam perante a autoridade judicial mais
próxima, nos dez dias seguintes à realização do casamento nuncupativo, com fins
de que lhes sejam tomadas por termo as declarações, conforme dispõe o artigo
1.541 do CC/02. A formalidade é dispensada se o cônjuge convalescer e ratificar
o casamento perante a autoridade competente e do oficial do registro, e, embora
o Código Civil não explicite, a ratificação deve se dar não apenas pelo cônjuge
enfermo, mas por ambos os cônjuges.
Caso não sejam respeitados os requisitos dos artigos 1.540 e 1.541 do CC/02,
o casamento será tido por ineficaz, não gerando efeitos. Sendo, ainda, possível con-
cluir por sua nulidade devido ao desrespeito à forma e às solenidades (art. 166, IV e
V, do CC). Socorre-se à teoria geral do negócio jurídico da Parte Geral do CC/2002.
Lembre-se que haverá a informalidade da cerimônia, mas os noivos deverão
externar o seu consentimento.
CURIOSIDADE
Nuncupativo vem do latim nuncupativu, refere-se ao ato nominal, vocal, oral, de designar
solenemente. (FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/8UZTHv>. Acesso em: 12 fev.2017.
capítulo 2 • 73
Jurisprudência
TJ-RJ - apelação Apl 00262234120128190203 RJ 0026223-41.2012.8.19.0203
(TJ-RJ). Data de publicação: 06/11/2013. Ementa: apelação cível. Ação de
homologação de casamento nuncupativo. Art. 1540 do código civil. Iminente risco
de vida. Inobservância do requisito legal para homologação do ato. 1. O casamento
nuncupativo, ou in extremis vitae momentis, é aquele que se realiza quando um dos
contraentes se acha em iminente perigo de vida, não havendo tempo para que sejam
cumpridas as formalidades preliminares exigidas para celebração do casamento,
dispensando, inclusive, a presença do celebrante e a do oficial do registro civil. [...]2.
Não obstante as declarações apresentadas pela autora no sentido de que presenciaram
a celebração do casamento, certo é que não restou demonstrado que este se deu em
decorrência do nubente se encontrar em iminente risco de vida. 3. Apesar do alegado
estado de saúde de Nilton José de Vasconcelos Cabral, os depoimentos colhidos e as
fotografias anexadas, ao contrário do que é afirmado, dão conta de que este não se
encontrava na iminência do perigo de vida. 4. Decisão correta, na forma e no conteúdo,
que integralmente se mantém. DESPROVIMENTO DO RECURSO.
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CURIOSIDADE
Você sabia? “A imposição coacta de direitos e deveres faz lembrar a origem da palavra
"cônjuge", que identifica quem está unido pelos sagrados laços do matrimônio. O vocábulo
jugum era o nome dado pelos romanos à canga ou aos arreios que prendiam as bestas às
carruagens. O verbo conjugare (de cumjugare), entre outros sentidos, significa a união de
duas pessoas sob a mesma canga. Donde conjugis quer dizer jungidos ao mesmo jugo ou ao
mesmo cativeiro. Não há como esquecer isso quando se atenta ao exacerbado intervencio-
nismo estatal nas relações afetivas.” (DIAS, 2015, p. 168)
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A sevícia (maus-tratos, agressão, ofensa física) ou a injúria grave são violações a
esse dever e caracterizam a impossibilidade da comunhão de vida; (artigo 1.573,
III, do CC/02) d) Sustento, guarda e educação dos filhos – uma mistura de diretos
e deveres que decorrem do poder familiar e cuja infringência configurará injúria
grave (artigo 1.573, III, do CC/02), caracterizando, ainda, os crimes dos artigos
244 a 247 do Código Penal, com consequente perda do poder familiar.
Também são direitos e obrigações dos cônjuges decorrentes do casamento a
concorrência para o sustento da família, na medida das forças econômicas de cada
consorte (artigo 1.568 do CC/02), incluindo e compensando aí o trabalho exerci-
do dentro do lar. Pelo artigo 1.567 do CC/02, a direção da sociedade familiar deve
ser exercida pelo casal, buscando sempre a preservação dos interesses da família, e,
em caso de opiniões divergentes, a decisão caberá ao juiz.
Para os cônjuges, em decorrência do casamento, há a limitação do artigo 977 do
CC/02 no que tange à formação de sociedade entre pessoas casadas, devendo ser obser-
vados os artigos 979 e 980 do CC/02 quanto ao registro das declarações antenupciais.
Destaca-se, ainda, a existência dos direitos e deveres ligados à obrigação ali-
mentar; à constituição do bem de família; ao usufruto dos bens de filhos menores;
aos direitos sucessórios, que serão em capítulo próprio. No que se refere ao insti-
tuto da união estável e da união homoafetiva, optou-se por analisá-los no Capítulo
5, em título próprio; portanto, não deixe de prestigiá-lo com uma boa leitura!!!
ATIVIDADE
Responda às questões:
1) Uma mulher casada tem uma filha, havida de uma relação extraconjugal que foi registrada
em nome do marido. Nesse caso, poderia a filha se casar com o filho que teve o pai biológico
com outra mulher?
2) Pode pessoa divorciada se casar com a ex-cunhada?
3) Existe impedimento entre José e Julia (filha de Maria, pessoa da qual José se divorciou),
tendo Julia sido concebida com terceiro?
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GABARITO
1- Como juridicamente não são considerados irmãos, o impedimento apenas ocorrerá sem
alguém argui-lo.
2 - Sim. Considerando que houve extinção do parentesco por afinidade na linha colateral com
a dissolução do vínculo conjugal.
3 - Não, pois entre José e Julia não há relação de parentesco. Deve-se ressaltar que não
pode, no caso, haver a parentalidade afetiva (ou seja, ter Julia sido enteada de José).
RESUMO
Neste capítulo, você estudou o instituto do casamento, seu conceito, procedimento, seus
requisitos de existência, validade e eficácia, seus impedimentos e suspensões, o casamento
civil e religioso, seus efeitos e consequências no mundo jurídico e junto à sociedade.
O estudo do casamento, em sua amplitude, é, no ramo do Direito de Família, de impor-
tância ímpar, pois afeta diretamente o núcleo familiar, seja por meio dos direitos e deveres,
seja pelo risco de anulação, nulidade ou mesmo inexistência do casamento, considerando
seus impedimentos e suspensões que devem ser de conhecimento de qualquer operador do
direito. As formalidades e requisitos quanto à habilitação e à celebração do casamento são
de grande relevância no mundo jurídico.
Afinal, embora a figura do casamento tenha enfraquecido em decorrência da legalização
da união estável, esse ainda é um sonho para muitos e jamais estará “fora de moda”.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DIAS, M. B. Manual de Direito das Famílias. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.
DINIZ, M. H. Código Civil anotado. São Paulo: Saraiva, 2010.
GONÇALVES, C. R. Direito Civil Brasileiro, v. 6: Direito de Família – de acordo com a Lei n.
12.874/2013. São Paulo: Saraiva, 2014.
LEITE, E. de O. Direito Civil Aplicado, v. 5: Direito de Família. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.
NADER, P. Curso de Direito Civil, v. 5. Rio de Janeiro: Forense, 2016.
TARTUCE, F. Manual de Direito Civil. São Paulo: Método, 2016.
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3
Regime de bens
e dissolução do
casamento
Regime de bens e dissolução do casamento
Introdução
OBJETIVOS
• Identificar os principais efeitos patrimoniais do casamento, conceituando o regime de bens
e sua modalidade;
• Contextualizar os princípios que se aplicam aos regimes de bens e alcance e os efeitos do
pacto antenupcial e das doações antenupciais;
• Diferenciar as causas de dissolução da sociedade conjugal, das causas de dissolução do
vínculo conjugal;
• Identificar as formas de separação e de divórcio existentes no Brasil e analisar seus requi-
sitos e os efeitos da Emenda Constitucional nº 66/10.
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Efeitos patrimoniais do casamento
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Não se pode olvidar que o regime de bens sempre foi uma preocupação ao se
tratar de casamento, pois é o estatuto patrimonial das pessoas casadas destinado não
só a regular os efeitos econômicos (ativos e passivos) do casamento entre os cônjuges
como também deles em face de terceiros, caracterizando-se como um conjunto de
normas de ordem pública que disciplina a organização econômica do casamento.
No Brasil, pelo Código Civil de 1916, a família formava-se, exclusivamente,
pelo casamento indissolúvel. A comunhão universal de bens era o regime legal
adotado, fazendo surgir o que se chama de mancomunhão – propriedade a duas
mãos –, ou seja, existe na relação conjugal um condomínio de bens de tal forma
igualitário que sequer importa a origem do patrimônio e a época de sua aquisi-
ção. Outro regime existente à época era o dotal, no qual bens da mulher passa-
vam à administração do marido e seus rendimentos eram utilizados para atender
aos encargos do casal, inclusive o de prover o sustento da prole. O regime dotal
mostrou-se inútil por absoluto desuso no curso de sua existência, razão pela qual
acabou por ser revogado.
A Lei nº 6.515/77 (Lei do Divórcio) alterou o regime legal de bens do
casamento para o da comunhão parcial, afastando a comunicação dos bens ad-
quiridos antes do casamento, assim como excluiu da comunicação as heranças,
legados e doações que um dos cônjuges, a qualquer tempo – seja antes ou du-
rante o matrimônio –, tenha recebido, restando aos consortes o condomínio
somente dos aquestos, isto é, os bens adquiridos no período da vida em comum,
com escassas exceções.
Vale ressaltar que a união estável também adota o regime da comunhão par-
cial, podendo, no entanto, os companheiros adotarem outro regime por meio do
contrato de convivência, que nada mais é do que uma forma de pacto antenupcial.
Merece destaque o conceito trazido por Flavio Tartuce:
capítulo 3 • 82
Como será visto adiante, aos que contraírem matrimônio com mais de 70
anos de idade a lei estabelece o regime da separação obrigatória de bens.
Portanto, dada a relevância do fator econômico, obrigatoriamente tanto o
casamento quanto a união estável e a homoafetiva passam a se submeter a uma
determinada modalidade de regime de bens.
A partir da celebração do casamento, passa a vigorar o regime de bens, seja
o legal ou o de opção em pacto antenupcial (artigo 1.639, § 1º, do CC), sendo
vedada qualquer estipulação que determine a eficácia do regime jurídico antes da
celebração do casamento.
O Código Civil de 2002 nos traz uma variedade de possibilidades de regimes,
prevendo como padrão: a comunhão parcial; a comunicação universal; a sepa-
ração (legal e convencional de bens); e a participação final nos aquestos.
Em que pese o fato de que tenha o legislador previsto alguns regimes, optou
por não retirar dos cônjuges o exercício da autonomia privada (excetuada a hi-
pótese do artigo 1.641 do CC/02), possibilitando aos consortes estipulações de
cunho econômico diversas no pacto antenupcial e conferindo-lhes a possibilidade
de compor regimes mistos (artigos 1.639 e 1.640, parágrafo único, do CC/02).
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A par da liberdade de escolha existente no artigo 1.639 do CC/02, é facultado
aos nubentes, antes do casamento, estipular como lhes aprouver as regras sobre
disposição de seus bens, utilizando-se do pacto antenupcial (artigos 1.653 a 1.657
do CC/02), não podendo, no entanto, contrariar preceitos de ordem pública.
Nas palavras de Paulo Nader:
O Código Civil de 1916 previa a imutabilidade dos regimes de bens (salvo nos
casos do artigo 7º, § 5º, LICC, e caso os nubentes obrigados ao casamento sob um
regime se cassassem em outro, afrontando, assim, lei). Essa imutabilidade derivava
da influência do Direito Canônico e das Ordenações do Reino.
capítulo 3 • 84
Rompendo com a linha de pensamento do Código anterior, o Código Civil
de 2002 trouxe em seu artigo 1.639, § 2º, a permissão para alteração do regime de
bens desde que: feito por ação judicial (artigo 734 do CPC/2015 – de jurisdição
voluntário e com competência para tramitar na vara de família (onde houver)); a
pedido de ambos os cônjuges, apresentando razões justificadoras da alteração, a
fim de permitir o controle judicial formal, não substancial, da alteração, e desde
que não cause prejuízo a terceiros, sendo o justo motivo uma cláusula geral a ser
preenchida caso a caso.
Por exemplo, visando a atender ao disposto no artigo 977 do CC/02, poderia
se constituir motivo relevante, a alteração do regime de comunhão universal de
bens para o regime de comunhão parcial, possibilitando a constituição de socieda-
de empresária entre os cônjuges.
Outro exemplo é o Enunciado 262 da III Jornada de Direito Civil que permite a al-
teração do regime de bens mediante desaparecimento da causa suspensiva do casamento.
A sentença autorizadora da alteração do regime gera efeitos, em regra, ex nunc,
ou seja, a partir de sua constituição, e deve ser levada à averbação no registro de
casamento, devendo, ainda, ser registrada no Registro de Imóveis do domicílio do
casal para que possa gerar efeitos em face de terceiros, bem como, na forma do
artigo 979 do CC/02, deve ser levada a registro na Junta Comercial caso um ou
ambos sejam empresários.
No entanto, não é pacífica a questão da necessidade de motivação quando da
mutabilidade do regime, encontrando-se inúmeros casos em que a jurisprudência
tem mitigado a estrita exigência normativa do artigo 1.639, § 2º, do CC/2002.
(TJRS, Apelação Cível 172902-66.2011.8.21.7000, Marcelino Ramos, 8ª. Câmara
Cível, Rel. Des. Luiz Felipe Brasil Santos. j. 28.07.2011, DJERS 04.08.2011)
Seguindo a linha do Enunciado 113 da I Jornada de Direito Civil do CJF/
STJ no que tange à questão de apenas se permitir a mutabilidade quando não
houver prejuízo a terceiros, alguns julgados têm exigido a prova cabal de ausên-
cia de prejuízos. (TJSP, Apelação 644.416.4/0, Acórdão 4168081, Boituva, 4ª.
Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Ênio Santarelli Zuliani, j. 29.10.2009,
DJESP 10.12.2009)
No entanto, não é pacifico o entendimento quanto à necessidade de prova, pois
muitos julgados têm sido no sentido de que "a alteração do regime de bens não tem
efeito em relação aos credores de boa-fé, cujos créditos foram constituídos à época do
regime de bens anterior". (TJRS, Agravo de Instrumento 70038227633, Porto Alegre,
8.ª Câmara Cível, Rel. Des. Rui Portanova, j. 24.08.2010, DJERS 30.08.2010)
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O advento do novo regramento fez surgir uma polêmica sobre a possibilidade
de aplicação da mutabilidade motivada nos casamentos realizados à luz do Código
Civil de 1916. O melhor entendimento tem sido pela aplicação da mutabilidade
à luz das manifestações do Superior Tribunal de Justiça e do Enunciado 260 da III
Jornada de Direito Civil: “Artigos 1.639, § 2º, e 2.039: A alteração do regime de
bens prevista no § 2º do artigo 1.639 do Código Civil também é permitida nos
casamentos realizados na vigência da legislação anterior”. (Disponível em: <http://
www.cjf.jus.br>. Acesso em: 05 mar. 2017)
Poder-se-ia ter uma interpretação diversa com a leitura do artigo 2.039 do CC/02;
no entanto, um dos primeiros juristas a desmistificar tal entendimento foi Euclides de
Oliveira ao explicar a real intenção do legislador quanto ao dispositivo legal:
As regras relativas aos regimes de bens estão contidas nos artigos 1.639 a
1.652 do CC/02, cabendo registrar que o comando legal determina que, desde
a entrada em vigor da Lei nº 6.515/77 (Lei do Divórcio), o regime legal de bens
do casamento é o da comunhão parcial por se considerar o mais adequado às
modernas relações familiares e à nova percepção de igualdade entre os consortes,
uma vez que não anula a individualidade e autonomia das pessoas casadas com
relação ao seu patrimônio.
Antes do advento da Lei do Divórcio, o regime legal era o da comunhão
universal de bens.
Aos nubentes, no entanto, é facultada a realização de pacto antenupcial caso
não desejem a adoção do regime legal atual.
capítulo 3 • 86
Ademais, o artigo 1.641 do CC/02 impõe em algumas hipóteses o casamento
pelo regime da separação legal ou obrigatória de bens, sendo norma cogente e de
ordem pública, pois busca proteger determinadas pessoas.
Constam dos artigos 1.642 e 1.643 do CC/02 os atos que qualquer um dos côn-
juges pode praticar, independentemente do regime de bens adotado, sem que neces-
site do consentimento do outro cônjuge. Cabe ainda destacar que, quanto aos atos
relacionados à economia doméstica (previsão do artigo 1.643 do CC/02), dispõe o
artigo 1.644 do CC/02 que haverá solidariedade passiva legal de ambos os cônjuges.
Ademais, prevê o artigo 1.645 do CC/02 os legitimados à propositura das
ações correspondentes aos incisos III, IV e V do artigo 1.642 do CC/02. No en-
tanto, havendo terceiro prejudicado com a sentença que julgar os casos dos incisos
mencionados, poderá esse exercer direito de regresso contra o cônjuge que realizou
o negócio jurídico ou seus herdeiros.
Por outro lado, o artigo 1.647 do CC/02 mitiga a liberdade dos artigos 1.642
e 1.643 do mesmo Código Civil quando enuncia os atos e negócios que exigem a
outorga conjugal (salvo no regime da separação absoluta), restringindo, assim, a
autonomia privada.
Quanto à outorga conjugal prevista no artigo 1.648 do CC/02, é possível clas-
sificá-la em: outorga uxória (da esposa) e outorga marital (do marido). Havendo
negativa imotivada do cônjuge em sua concessão ou a impossibilidade de conce-
dê-la, caberá ao juiz supri-la, sob pena de tornar o ato praticado anulável por falta
de outorga ou de suprimento, sendo facultado ao cônjuge que não a concedeu
ou a seus herdeiros (artigo 1.650 do CC/02) pleitear-lhe a anulação até dois anos
depois de finda a sociedade conjugal.
Para se verificar se a denegação é justa ou não, devem ser levados em conta os
interesses da família, sobretudo dos filhos do casal.
É interessante também no caso da outorga conjugal lembrar que o direito
intertemporal influencia no instituto, pois, no Código Civil de 1916, a previsão
era de que sua ausência acarretaria a nulidade absoluta do ato, conclusão da leitura
dos artigos 235, 242 e 252 (Código Civil/16). Nesse sentido, é possível a aplica-
ção do artigo 2.035, caput, do CC/02, estabelecendo-se que, caso o ato tenha
sido celebrado sem outorga na vigência do Código anterior, será ele considerado
nulo, ainda que o interessado tenha proposto a ação apenas na vigência do Código
atual. Por outro lado, se o ato sem outorga se deu na vigência do CC/2002, será
considerado anulável.
Feitas as observações gerais sobre os regimes de bens, cabe tratá-los individualmente.
capítulo 3 • 87
Regime da comunhão de bens: comunhão parcial e comunhão universal
Na forma dos artigos 1.659 e 1.661 do CC/02, é possível uma análise sobre
os bens que são excluídos da comunhão segundo o artigo 1.659: I- Os bens que
cada cônjuge possuir ao casar e os que lhe sobrevierem, na constância do casamen-
to, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar. Embora esses bens não
se comuniquem, suas benfeitorias, frutos e rendimentos se comunicam; II- Os
bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em
sub-rogação dos bens particulares. Cabe salientar que a sub-rogação não precisa
ser na mesma espécie de bem, mas seu limite é o valor do bem particular. Assim,
se o bem sub-rogado é mais valioso, a diferença de valores que não tenha sido
coberta com recursos próprios e particulares do cônjuge irá se comunicar; III- As
obrigações (ativas e passivas) anteriores ao casamento. No entanto, é cabível o
entendimento de que as obrigações que se destinaram aos preparativos do casa-
mento devem se comunicar; IV- As obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo
reversão em proveito do casal; V- Os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos
de profissão. Meramente exemplificativo o inciso, pois resta claro que só não in-
gressam na comunhão se forem indispensáveis ao exercício de atividade própria do
capítulo 3 • 88
cônjuge, não se podendo presumir que tais bens foram adquiridos com o esforço
único de quem os utiliza. Assim, se representarem um investimento do casal, irão
se comunicar; VI- Os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge. No entanto,
deve-se entender que o que não se comunica é o direito a esses proventos. Uma
vez recebidos, passam a integrar o patrimônio comum (assim como os bens com
esses valores adquiridos), e outro não poderia ser o entendimento; caso contrário,
seria totalmente desarrazoado, pois o cônjuge que adquiriu bens para o lar com o
seu labor teria de partilhá-los, enquanto o outro que apenas guarda o que recebe
de seu labor restaria incomunicável; assim como o inciso VII- As pensões, meio-
-soldos, montepios e outras rendas semelhantes, sendo compreensível que o que
não se comunica é o direito a essas rendas. Uma vez recebidos, passam a integrar o
patrimônio comum (assim como os bens com esses valores adquiridos); VIII- Os
bens cuja aquisição tiver por título causa anterior ao casamento.
Diverge a jurisprudência quanto ao FGTS e às indenizações trabalhistas, havendo
julgado recente do STJ quanto ao cabimento da partilha de valores relativos ao FGTS:
CURIOSIDADE
Não deixe de acessar o Informativo do STJ nº 0581, Período: 14 a 28 de abril de 2016.
O julgado detalha a natureza jurídica do FGTS, bem como o cabimento ou não de partilha em
caso de Divórcio. (REsp 1.399.199-RS, julgado em 9/3/2016, DJe 22/4/2016)
capítulo 3 • 89
Considerando que a comunhão tem por elemento central a colaboração re-
cíproca, comunicam-se os bens (artigos 1.658 e 1.660 do CC/02): I- Que so-
brevierem onerosamente ao casal (ainda que apenas em nome de um deles), na
constância do casamento e observadas as exceções antes descritas; II- Que forem
adquiridos por fato eventual, com ou sem concurso de trabalho ou despesa ante-
rior. São exemplos: as loterias, os sorteios, os bingos, o descobrimento de tesouro,
a avulsão; III- Que foram adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de
ambos os cônjuges; IV-As benfeitorias (necessárias, úteis e voluptuárias) em bens
particulares de cada cônjuge; V- Os frutos de bens comuns ou dos particulares
de cada cônjuge percebidos na constância do casamento ou pendentes na extin-
ção da sociedade; VI- Os bens móveis adquiridos na constância do casamento
quando não se provar que foram adquiridos antes do matrimônio (artigo 1.662
do CC/02); VII- Os direitos patrimoniais de autor (artigo 39, Lei nº 9.610/98).
No regime de comunhão parcial de bens, a administração do patrimônio co-
mum cabe a qualquer dos cônjuges (artigo 1.663 do CC/02), vedadas cláusulas
limitativas em pacto antenupcial. As dívidas contraídas no exercício dessa admi-
nistração obrigam o patrimônio comum e o individual daquele que a contraiu,
bem como os bens do outro cônjuge na medida de seu proveito. Identificada a
malversação dos bens, poderá o juiz determinar que a administração dos bens
comuns se concentre na mão do outro consorte. Por fim, as dívidas contraídas por
qualquer dos cônjuges na administração de seus bens particulares e em benefício
desses não obrigam os bens comuns (artigo 1.666 do CC/02).
Pelo regime da comunhão universal de bens, optam os nubentes por trans-
formar o casamento em uma união não só de vidas, mas também de bens, sendo,
no entanto, necessário que o façam por meio do pacto antenupcial, optando pelo
regime da comunhão universal de bens.
capítulo 3 • 90
Nas palavras de Maria Berenice Dias:
capítulo 3 • 91
(respeitadas as considerações já feitas no tópico do regime de comunhão parcial).
Vale ressaltar que, no caso de comunhão universal de bens, a questão do FGTS já
se encontra mais facilmente disciplinada na jurisprudência, havendo um consenso
de sua comunicabilidade.
Jurisprudência
Verificam-se os seguintes precedentes: CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE
CONVERSÃO DE SEPARAÇÃO JUDICIAL EM DIVÓRCIO. REGIME DA COMUNHÃO
UNIVERSAL. PARTILHA DE VERBAS RESCISÓRIAS E FGTS. PROCEDÊNCIA. I.
Partilhável a indenização trabalhista auferida na constância do casamento pelo regime
da comunhão universal (art. 265 do Código Civil de 1916). II. Precedentes do STJ.
III. Recurso especial conhecido e provido. (REsp nº 781.384/RS, Rel. Ministro ALDIR
PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 16/06/2009, DJe 04/08/2009)
Bens aquestos serão aqueles adquiridos em conjunto pelo casal, integrando patrimô-
nio comum; os demais bens (adquiridos individualmente) não integrarão a comunhão.
O regime de participação final nos aquestos foi considerado uma novidade
do Código Civil de 2002, produzindo um deslocamento do foco do casamento
para a preocupação com o crescimento patrimonial do consorte; no entanto, é um
regime que trouxe incertezas e inseguranças.
Embora seja um regime híbrido (separação total na constância e comunhão
parcial na dissolução) ideal para cônjuges que exerçam atividades empresárias e
cujo patrimônio seja significativo, é regime cuja liquidação é difícil (é necessá-
rio realizar uma reconstituição contábil de todo o patrimônio feita por rigoroso
balanço contábil e financeiro) e que, portanto, não tem alcançado as graças dos
nubentes brasileiros.
De acordo com o artigo 1.672 do CC/02, que traz sua conceituação, é pos-
sível se constatar que o mesmo depende de pacto antenupcial. Os cônjuges que
optarem pelo regime de participação final nos aquestos poderão fazer constar do
capítulo 3 • 92
pacto antenupcial a possibilidade de livremente disporem dos bens imóveis, desde
que particulares, dispensando a outorga do outro.
No caso de dissolução da sociedade conjugal, deverão ser divididos apenas os
bens adquiridos durante o casamento, excluindo-se aqueles que já pertenciam,
exclusivamente, a cada um dos consortes.
A apuração dos aquestos será feita no momento em que cessar a convivência
conforme artigo 1.683 do CC/02, excluindo-se da soma os patrimônios próprios
na forma do artigo 1.674 do CC/02: os bens anteriores ao casamento e os sub-
-rogados em seu lugar; os que sobrevieram a cada cônjuge por sucessão ou libera-
lidade; as dívidas relativas a esses bens; e computando-se os bens adquiridos pelo
trabalho conjunto de acordo com o artigo 1.679 do CC/02.
Exemplificam Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2009, p. 269):
capítulo 3 • 93
Separação Convencional de Bens (artigos 1.687 e 1.688 do CC/02)
capítulo 3 • 94
separação legal obrigatória de bens. Outra hipótese de adoção obrigatória do regi-
me de separação legal de bens é quando o casamento se dá com pessoa maior de 70
anos de idade (a Lei nº 12.344, de 9 de dezembro de 2010, trouxe a idade limite
para ambos os sexos, que passou para setenta anos, alterando assim o inciso II do
artigo 1.641 do CC/02, que antes era de 60 anos) por entender o legislador que a
pessoa estaria vulnerável a golpes e a um casamento de mero interesse econômico.
No entanto, caso o cônjuge, antes do implemento da idade de 70 anos, já
tenha iniciado a união estável, para posteriormente convertê-la em casamento, tal
determinação não deve o alcançar, conforme lúcido entendimento do Enunciado
261 da III Jornada de Direito Civil de 2004 do Conselho da Justiça Federal.
A doutrina brasileira vem criticando severamente a manutenção da vedação
da liberdade de escolha quanto ao regime de bens ao maior de 70 anos por não
mais se justificar na atualidade; ademais, viola o artigo 1º, III, da CRFB/88, mos-
trando-se atentatória da liberdade individual, portanto descabida e injustificável.
A última hipótese de casamento pelo regime da separação obrigatória de bens
é a prevista no artigo 1.641, inc. III, do CC/02, ou seja, quando depender de
suprimento judicial, podendo ser considerada uma forma de discriminação, pois,
quando há o consentimento do representante legal para o casamento, os nubentes
não são atingidos pelo regime compulsório, e, se o suprimento judicial tem igual
efeito ao consentimento, não deveria haver a diferenciação na adoção de regimes.
De acordo com o enunciado nº 262 da III Jornada de Direito Civil do
Conselho da Justiça Federal, restando superada a causa impositiva da obrigatorie-
dade da separação de bens nas hipóteses I e III do artigo 1.641 do CC/02, nada
obsta a alteração do regime.
Pacto Antenupcial
capítulo 3 • 95
A escolha de um regime de bens diferente do regime previsto no artigo 1.640
do CC/02 (o regime da comunhão parcial de bens) decorre do princípio da li-
berdade de escolha e deve ser feita por pacto antenupcial, também designado
convenção matrimonial ou pacto dotal, que tem natureza jurídica nitidamente
negocial e acessória, sendo ainda facultativo e também aplicável à união estável e
à união homoafetiva.
Trata-se de ato pessoal, bilateral, nominado e típico, formal e solene, realizado
necessariamente por escritura pública, cuja eficácia está subordinada à realização
de casamento válido (o dies a quo é uma condição suspensiva) e ao respeito às nor-
mas de ordem pública, à moral ou aos bons costumes, segundo leitura do artigo
1.655 do CC/02. Sendo declarado nulo o pacto, aplicar-se-ão as regras do regime
da comunhão parcial de bens.
As normas específicas aos pactos antenupciais e aos institucionais da união
estável acham-se reunidas no conjunto dos artigos 1.653 a 1.657 e 1.537 do
Código Civil de 2002.
Consideram-se não escritas as cláusulas modificadoras da ordem sucessória
(pactos de succedendo ou de non succedendo), os direitos conjugais ou dos pais, assim
como as contrárias às normas de ordem pública e aos bons costumes, e, embora
possa ser reconhecida a nulidade da cláusula, essa não provoca a nulidade do pac-
to. Quando simplesmente anulável, é passível de confirmação pelas partes, mesmo
após o casamento, retroagindo a confirmação à data da solenidade matrimonial.
O menor pode realizar pacto antenupcial quando tiver autorização de ambos
os pais ou representante legal para o casamento, mas sua eficácia ficará condicio-
nada à aprovação de seu representante legal.
Os pactos antenupciais geram efeitos em face de terceiros (em relação aos bens
imóveis) após o seu registro em livro especial no Registro de Imóveis do domicílio
dos cônjuges, é o que estabelece o artigo 1.657 do CC/02, dando o registro publi-
cidade ao ato, alertando terceiros sobre a modificação no domínio do bem imóvel;
sem o registro a convenção antenupcial valerá apenas entre os cônjuges.
Doações Antenupciais
capítulo 3 • 96
A aceitação da doação é presumida da própria celebração do casamento. Vale
lembrar que, em regra, não perde validade a doação se o casamento for dissolvido
por separação, morte ou divórcio.
Dissolução do casamento
Breve histórico
capítulo 3 • 97
Apenas em 1977, com a aprovação da Emenda Constitucional nº 9 de 28
de junho de 1977, o divórcio, que dissolve o vínculo do casamento, passou a ser
permitido no Brasil. O citado Decreto deu nova redação ao § 1º do artigo 175 da
Constituição de 1969, suprimindo a impossibilidade de dissolubilidade do víncu-
lo matrimonial. Logo em seguida, houve a sua regulamentação pela Lei nº 6.515,
de 26 de dezembro de 1977.
A Constituição de 1988 tratou do assunto no § 6º do artigo 226, reduzindo o
prazo da separação judicial para um ano, possibilitando a conversão de separação
em divórcio, além de trazer a possibilidade do divórcio direto desde que compro-
vada a separação de fato por mais de dois anos.
Apenas em 2010, com a Emenda Constitucional nº 66/2010, o ciclo evoluti-
vo da sociedade em relação à extinção do vínculo matrimonial, iniciado com a Lei
nº 6.515/77 (conhecida como a Lei do Divórcio), restou completo.
capítulo 3 • 98
Por outro lado, há argumentos a favor da extinção da separação, pois a legis-
lação constitucional revoga a legislação infraconstitucional com ela incompatível;
então, se a Constituição Federal não prevê mais a separação, não há razão para a
sua subsistência no ordenamento infraconstitucional. Outro argumento é de que,
não havendo prazos ou requisitos para a concessão do divórcio, inócua teria se
tornado a separação que exigisse prazos diversos.
Por fim, como argumento na defesa da extinção, tem-se a teoria da deteriora-
ção factual (que se baseia na liberdade de escolha do modo de constituição, manu-
tenção e dissolução do casamento) e a teoria da intervenção mínima do Estado na
vida privada (que afirma ser desnecessário trazer ao espaço público dos Tribunais
a vida íntima do casal).
Fato é que a discussão permanece no meio jurídico, tendo o STJ se manifesta-
do, em julgado de 2016, no seguinte sentido:
Por outro lado, inúmeros são os julgados dos Tribunais que entendem pela
extinção da separação após o advento da Emenda Constitucional nº 66.
Segundo o site do CONJUR, com matéria datada de 22 de fevereiro de 2017,
intitulada “Ação sobre separação após a EC 66 é suspensa por pedido de vista”,
há em trâmite um processo na 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça versando
capítulo 3 • 99
sobre a possibilidade de separação judicial no ordenamento jurídico brasileiro
após a Emenda Constitucional 66/2010. (Confira a notícia completa. Disponível
em: < https://goo.gl/VIdRj6 >. Acesso em: 08 mar. 2017)
Ou seja, a questão continua polêmica, embora seja possível notar que os argu-
mentos que proclamam o fim da separação são mais convincentes juridicamente,
razão pela qual, conclui Maria Berenice Dias (2010, p. 14), “finalmente acabou
a inútil, desgastante e onerosa separação judicial – tanto para o casal como para
o próprio Poder Judiciário – que impunha uma duplicidade de procedimentos
para se conseguir acabar com o casamento”. Na mesma linha de que se encontra
extinta a separação, estão os ensinamentos de Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo
Pamplona Filho, Paulo Lôbo, Zeno Veloso, Flavio Tartuce, Rodrigo da Cunha
Pereira, Rolf Madaleno, Álvaro Villaça Azevedo, Cristiano Chaves de Farias e
Nelson Rosenvald.
Separação
capítulo 3 • 100
Da Separação Judicial
capítulo 3 • 101
Por analogia ao disposto no parágrafo único do artigo 1.576 do CC/02, é
possível a constituição de procuradores para fins de separação desde que conste da
procuração poderes especiais para tanto, assim como todas as condições do acor-
do, com especificação de não haver possibilidade de reconciliação.
Caso o casal venha a se reconciliar após ter sido concluída a separação por
escritura, poderão os mesmos se valer de nova escritura para o restabelecimento da
sociedade conjugal, averbando-a no registro civil.
Qualquer que seja a modalidade de separação, ela gerará efeitos jurídicos ex nunc,
provocando o fim da sociedade conjugal, extinguindo os deveres mútuos de fidelidade,
coabitação e vida em comum. Subsistirá o dever de prestar alimentos entre os cônjuges
se houver sido pactuado na convenção pelas partes (em cartório ou homologada em
juízo); quanto aos deveres relacionados aos filhos, se mantêm inalterados (guarda, visi-
tação, alimentos, poder familiar), devendo seguir as determinações legais.
Considerando que na separação mantém-se o vínculo matrimonial, não é per-
mitido se contrair novo casamento, uma vez que permanece o impedimento ma-
trimonial. É permitido, no entanto, aos cônjuges o restabelecimento, a qualquer
tempo, da sociedade conjugal, justamente pelo não rompimento do vínculo.
Quanto ao nome, caso tenha qualquer um dos cônjuges adotado o patroní-
mico do outro (artigo 1565, § 1º, do CC/02), é opção desse a permanência ou
exclusão do patronímico quando da separação, salvo na hipótese do artigo 1.578
do CC/02. Verifica-se por esse dispositivo que, havendo declaração de culpa, o
cônjuge culpado perde o direito de usar do sobrenome do outro cônjuge, ressalva-
dos os casos dos incisos I, II e III do artigo 1.578 do CC/02.
Divórcio
capítulo 3 • 102
Segundo as lições de Paulo Nader:
capítulo 3 • 103
A Resolução nº 220 de 26/04/2016 do CNJ alterou dispositivos da Resolução
do CNJ nº 35, de 24 de abril de 2007, para contemplar expressamente a hipótese
do estado gravídico da mulher juntamente com os demais requisitos legais que
permitem o divórcio por escritura pública.
A legitimidade para o pedido de divórcio, seja judicial ou notarial, é exclusiva
dos cônjuges (uma vez que personalíssima), facultando a lei, quando o cônjuge for
declarado incapaz, legitimidade a curador especial, ascendentes e irmãos em or-
dem preferencial (artigo 1.582, parágrafo único, do CC/02), podendo o divórcio
ser também realizado por meio de procuradores com poderes especiais, devendo a
ação de divórcio ser extinta se, no curso do processo, antes da sentença, qualquer
dos cônjuges vier a falecer, sendo, então, essa a causa da dissolução do vínculo.
O divórcio extingue o vínculo conjugal quando do trânsito em julgado da
sentença (no caso da via judicial) ou com a escritura pública (via administrativa),
independentemente de ser averbado no Registro Civil, em que pese ser a averba-
ção essencial no caso de se contrair novo matrimônio, sendo a tendência após a
EC nº 66/10 que passe a prevalecer apenas o uso do divórcio, caindo a separação
em desuso em face de sua evidente inutilidade no sistema atual.
A concessão do divórcio não exige prévia partilha de bens, conforme artigo
1.581 do CC/02, e não modifica os direitos e deveres dos pais com relação aos
filhos, de acordo com os artigos 1.579 e 1.632 do CC/02, pois a dissolução do
casamento deve apenas afetar a relação jurídica existente entre os consortes, jamais
atingindo a relação desses com a prole.
O divórcio direto consensual (judicial ou notarial) exige dos cônjuges a con-
venção das condições gerais que regerão o divórcio, tais como: guarda dos filhos,
alimentos, partilha de bens, manutenção ou não do nome de casado, quando for
o caso. Prevê em seu artigo 53 do CPC/15 a competência para a propositura da
ação visando à decretação do divórcio.
Havendo pedido de divórcio, caso um dos cônjuges tenha acrescido, por
ocasião do casamento, o patronímico do outro, prevê o artigo 1.571, § 2º,
do CC/02, que poderá o manter, salvo se disposto diversamente na separação
judicial (no caso de divórcio-conversão).
capítulo 3 • 104
Vale trazer à baila a crítica de Teresa Arruda Alvim Wambier, no que tange à
manutenção do nome de casado:
capítulo 3 • 105
Lei nº 12.874, de 29 de Outubro de 2013 – Separação e Divórcio por Autoridades
Consulares no Exterior
ATIVIDADE
Caso Concreto: Marília e Rafael foram casados por 5 anos no regime de comunhão
parcial de bens. Do casamento não foram gerados filhos, e resultou aquisição de patrimônio
comum. O casal resolveu se separar consensualmente por acreditar que seu relacionamento
já não é mais o que almejavam. Em 20 de fevereiro de 2010, distribuíram (por meio de seu
advogado) ação de separação consensual. Em 14 de julho de 2010, foram informados que
poderiam converter o seu pedido de separação em divórcio. Pergunta-se:
a) A propositura da ação de separação foi correta ou poderia ter desde logo o advogado
proposto o divórcio?
b) Querendo, podem Marília e Rafael se valer da EC 66/10 e converter o seu pedido de
separação em divórcio?
c) Em qualquer dos casos Marília e Rafael devem realizar a partilha de seus bens?
GABARITO
a) A propositura da ação de separação foi correta porque, à época que ingressaram com a
ação, para se requerer o divórcio era necessário um ano de separação judicial (divórcio con-
versão) ou dois anos de separação de fato (divórcio direto), requisitos não preenchidos pelo
casal (art. 226, § 6º, CC – com a redação anterior à da EC nº 66/10).
b) Doutrina e jurisprudência têm se manifestado de forma positiva, admitindo a conversão da
separação em divórcio a partir do advento da EC 66, que entrou em vigor em 13 de julho de
2010, das ações propostas antes da EC se em trâmite. No entanto, frise-se, a conversão não
pode ser imposta ao casal, mas sim partir da vontade de ambos (se o pedido for consensual)
ou de um deles (se litigioso).
capítulo 3 • 106
c) Entende-se que nem a separação (mesmo à luz do disposto no art. 1.575, CC), nem o
divórcio, exigem prévia partilha de bens (art. 1.581, CC).
RESUMO
A questão patrimonial sempre foi de suma relevância na relação matrimonial, estenden-
do-se, hodiernamente, à união estável e à união homoafetiva, uma vez que os nubentes, ao
decidirem pela vida em comum, idealizam constituir patrimônio para o bem-estar da família,
sendo necessário estabelecer regras a respeito dos bens pertencentes aos cônjuges.
No capítulo, apresentaram-se os regimes de bens possíveis de serem adotados pelos
nubentes. Nota-se que o sistema livre dos regimes é, naturalmente, o que melhor se coaduna
aos interesses dos cônjuges, em especial diante de uma sociedade que se apresenta com
ideais contemporâneos, conferindo aos nubentes o direito de eleger o regramento econômi-
co que melhor lhes aprouver por meio de pacto antenupcial.
Compreendemos os efeitos dos regimes de bens na sociedade conjugal e em relação a
terceiros. Foi possível distinguirmos separação e divórcio, os efeitos da EC nº 66/10 sobre
o casamento e o surgimento do procedimento administrativo da Lei 11.441/07 com vistas a
facilitar a formalização da extinção da sociedade conjugal e do vínculo matrimonial. O casa-
mento e sua dissolução do estrangeiro também foram alvos de estudo neste capítulo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRAGANHOLO, B. H. Casamento civil: regime de bens e seus reflexos patrimoniais e sucessórios.
Disponível em: <https://goo.gl/74BMDF>. Acesso em: 03 mar. 2017.
FARIAS, C. C. de; ROSENVALD, N. Direito das famílias. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.
DIAS, M. B. Manual de Direito das Famílias. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.
_____. Divórcio Já! Comentários à emenda constitucional 66 de 13 de julho de 2010. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2010.
NADER, P. Curso de Direito Civil. v. 5. Rio de Janeiro: Forense, 2016.
OLIVEIRA, E. de. Alteração do regime de bens no casamento. ln: DELGADO, M. L.; ALVES, J. F.
(Coords.). Questões controvertidas no novo Código Civil, v. 1. São Paulo: Método, 2003.
TARTUCE, F. Manual de Direito Civil, Volume Único. São Paulo: Método, 2016.
WAMBIER, T. A. A. Divórcio e nome da mulher divorciada. In: Revista de Direito Privado, n. 5,
janeiro-março de 2001.
capítulo 3 • 107
capítulo 3 • 108
4
Filiação e
reconhecimento
de filhos, poder
familiar e guarda
Filiação e reconhecimento de filhos, poder
familiar e guarda
Introdução
capítulo 4 • 110
OBJETIVOS
• Compreender a filiação no Direito Brasileiro sob a ótica civil-constitucional;
• Analisar a presunção de paternidade e maternidade e entender o seu alcance, compreen-
dendo a averiguação oficiosa da paternidade;
• Identificar a prova da filiação, compreendendo as formas de reconhecimento de filhos pre-
vistas no Código Civil, bem como seus efeitos;
• Compreender o conceito de poder familiar e sua evolução no ordenamento brasileiro, en-
tendendo os seus efeitos;
• Analisar as causas de suspensão e de destituição do poder familiar;
• Conceituar a guarda, identificando suas espécies e efeitos e a correlação com a Síndrome
da Alienação Parental.
capítulo 4 • 111
Afirmam Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2009, p. 474):
capítulo 4 • 112
verdade socioafetiva e que não se coadunam com os avanços biotecnológicos ca-
pazes de esclarecer a real filiação.
A presunção do artigo 1.597 é apenas relativa, juris tantum, podendo ser ilidi-
da por prova em contrário (o que contraria a determinação constitucional de não
discriminação dos filhos); no entanto, em face de terceiros, a presunção torna-se
absoluta, juris et de jure, uma vez que apenas é dada ao marido ou companheiro a
iniciativa de questionar a paternidade.
Na forma do artigo citado, presumem-se filhos (paternidade determinada pelo
critério biológico), na forma do artigo citado: 1) os nascidos 180 dias, pelo menos,
depois da sociedade conjugal ter sido estabelecida, considerando 180 dias um
período mínimo de gestação; 2) como aqueles cujo nascimento tenha se dado nos
300 dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal por morte, separação
judicial, nulidade e anulação do casamento (período máximo de gestação), cuja
contagem de prazo tem início a partir da separação de fato, independentemente
de decisão judicial ou dissolução extrajudicial.
No caso do inciso II, do artigo 1.597, do CC/02, é requisito se pressupor a
coabitação do casal nos 120 dias iniciais do prazo de 300 dias, diante do período
de verificação da concepção. Ademais, justifica-se a paternidade em casos de nas-
cimento prematuro ou atraso no parto consoante a existência de laudo médico.
O exame de DNA é o método que oferece a necessária certeza jurídica
da paternidade: com ele, praticamente as presunções legais perdem a sua im-
portância, uma vez que, realizado o exame de DNA, é possível a confirmação
exata da paternidade.
capítulo 4 • 113
mulher, ao se submeter a uma das técnicas de reprodução assistida com material
genético do falecido, esteja na condição de viúva e haja autorização escrita do ma-
rido para que se utilize seu material genético após sua morte.
Também é reconhecida a presunção de paternidade dos filhos havidos a qual-
quer tempo; quando se tratar de embriões excedentários decorrentes de concepção
artificial homóloga, são aqueles embriões excedentes resultantes de fecundação in
vitro que restaram congelados para que os pais resolvam seu destino, já que não
implantados na mulher. A Lei de Biossegurança (Lei nº 11.105/05) disciplina a
destinação e conservação dos embriões excedentários.
De acordo com o Enunciado 107 da I Jornada de Direito Civil, para os casos
de extinção da sociedade conjugal, em se tratando do inciso IV do artigo 1.597 do
CC/02, somente poderá ser aplicado se houver autorização prévia, por escrito, dos
ex-cônjuges para a utilização dos embriões excedentários, só podendo ser revogada
até o início do procedimento de implantação.
O inciso V do artigo 1.597 do CC/02 prevê, ainda, a presunção de paterni-
dade por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do
marido, e, mediante sua existência, não será possível impugnar a paternidade ou
retratar a autorização.
Ainda, sobre o tema presunção de paternidade, o Código Civil mantém regra-
mento incompatível com o desenvolvimento tecnológico e legislativo, bem como
sobrepõe a verdade biológica à afetiva, permitindo a existência do artigo 1.598,
CC, quase uma aberração jurídica (considerando a existência de prova de exame
de DNA e a filiação socioafetiva), mas que traz íntima ligação com o artigo 1.523,
II, do CC/02, que trata da causa de suspensão de casamento, sabendo-se que, se
a mulher não respeitar o prazo internupcial e vier a ter um filho, traz o artigo a
presunção de paternidade de que pai é o primeiro marido se o filho for nascido
nos trezentos dias contados da dissolução do casamento; será considerado do se-
gundo marido se nascido após esse período e se já houver decorrido o prazo do
artigo 1.597, I, do CC/02. O prazo de trezentos dias deve ser considerado não
apenas a partir do falecimento do ex-cônjuge, mas, genericamente, na dissolução
da sociedade conjugal.
O artigo 1.599, CC, trata da impotentia generandi, bastando provar sua
existência no momento da concepção, independentemente de ter sido ela
superada depois ou não.
Diante do sistema de presunção de paternidade adotado pelo Código Civil, a
confissão da mulher sobre a origem biológica do filho (artigo 1.602 do CC/02) ou
capítulo 4 • 114
o adultério demonstrado não são por si só suficientes para afastá-la (artigo 1.600
do CC/02), sendo certo que, pelo exame de DNA, hodiernamente, todas as pre-
sunções apresentadas pelo Código Civil podem ser ilididas.
Investigação de paternidade
capítulo 4 • 115
No polo passivo, figurará o filho; sendo absoluta ou relativamente incapaz,
será representado ou assistido por seu representante legal. O Ministério Público
deverá acompanhar todas as fases do processo, sob pena de nulidade, cabendo ao
final opinar sobre o mérito do pedido.
Sabe-se que é possível o ajuizamento de ação negatória de maternidade, ha-
vendo dispositivo legal vigente que autoriza a propositura da demanda, conforme
se depreende da leitura do artigo 1.608 do CC/02, em que pese sua raridade.
Nesse caso, a ação será movida pela figura materna, provando a falsidade do termo
ou das declarações nele contidas. Da mesma forma que ocorre com a ação nega-
tória de paternidade, caso tenha sido a ação proposta e venha a autora a óbito no
curso dela, será possível a sub-rogação pelos herdeiros.
capítulo 4 • 116
Antes do advento da Lei nº 12.004/2009, o STJ já vinha adotando, nos
casos de recusa de realização de DNA, o princípio da inversão do ônus da
prova; assim, cabia ao investigado realizar prova contrária à alegação dos
autos; dessa forma, conclui-se que a Lei veio a consagrar o entendimento já
sumulado pelo Superior Tribunal.
Por outro lado, embora não muito frequente, é possível ao pai mover ação
com pedido de negatória de paternidade, em que requer a produção de prova de
exame de DNA, com vista à exclusão da paternidade. Nesse caso, havendo a recusa
da mãe ou do filho na realização do exame de DNA, há a inversão do ônus da
prova – e, portanto, a presunção milita em favor do pai, conforme entendimento
resultante do julgamento da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, no
REsp.nº. 786.312, em maio de 2009, sendo desconstituída a paternidade, e, no
caso em questão, não se reconheceu a paternidade socioafetiva, já que a ação foi
proposta quando a criança se encontrava, ainda, com dois anos de idade.
capítulo 4 • 117
O ato de reconhecimento voluntário de filhos pode preceder ao nascimento
(artigo 26, parágrafo único, ECA; artigo 1.609, parágrafo único, CC/02) e, em
qualquer hipótese, deve ser considerado ato jurídico unilateral e personalíssimo.
Nas lições de Maria Berenice Dias:
capítulo 4 • 118
Embora o sistema de prova da filiação adotado pelo Código Civil seja o da
prova pré-constituída, ou seja, a filiação se prova pela certidão do termo de nasci-
mento registrada no Registro Civil, na forma do artigo 1.603 do CC/02, que tem
efeito declaratório, essa prova é “quase” absoluta, podendo o registro ser invalida-
do por erro ou falsidade ou a filiação ser provada por outros meios (artigo 1.605,
CC/02, cujo rol é exemplificativo).
É certo que o registro de nascimento não é a única forma de reconhecimento
voluntário da paternidade. A escritura pública, o escrito particular, o testamento e
a declaração manifestada perante o juiz também comprovam a filiação de acordo
com o artigo 1.609 do CC/02, sendo o ato voluntário e que gera os deveres de-
correntes do poder familiar.
Ademais, entre os meios de prova admitidos, confere-se a posse do estado
de filho, pois, se tratando de filiação, além de se prestigiar a filiação socioafeti-
va, prestigia-se o princípio da aparência, em que, inexistindo registro ou defei-
to de termo de nascimento, deve prevalecer a posse do estado de filho (quando
a pessoa desfruta de situação jurídica que não corresponde à verdade), que se
revela pela convivência familiar, passando a existir o afetivo (artigo 1.593 do
CC/02), mesmo porque a comprovação de origem genética, ainda que com
o exame de DNA, por si só, não é suficiente para demonstrar a existência de
relação de parentesco (dessacralização do DNA), uma vez que a paternidade
pode ser determinada pela afetividade.
De acordo com o artigo 1.606 do CC/02, é cabível a propositura de ação de
prova de filiação, cuja legitimidade é conferida ao filho enquanto viver, passando
aos seus herdeiros se morrer menor ou incapaz. Iniciada a ação pelo filho, os her-
deiros poderão dar continuidade, salvo se julgado extinto o processo.
Segundo Maria Berenice Dias (2015, p. 396), “O direito de conhecer a
origem genética, a própria ascendência familiar, trata-se de preceito funda-
mental, um direito da personalidade: direito individual, personalíssimo, que é
necessariamente o direito à filiação”.
A ação de prova de filiação se difere em vários aspectos da investigação de pa-
ternidade ou maternidade. A primeira se dá nos casos do artigo 1.606 do CC/02, e
há o relacionamento socioafetivo. Por outro lado, na investigação de paternidade,
em grande parte dos casos, há animosidade entre as partes, pois trata dos casos em
que a figura paterna ou materna recusou-se ao reconhecimento espontâneo.
O reconhecimento de filho que tenha atingido a maioridade apenas pode
se dar com o seu consentimento, em que pese a recusa imotivada não impedir o
capítulo 4 • 119
reconhecimento via judicial. Sendo o filho menor, terá, ao alcançar a maioridade,
o prazo de 4 (quatro) anos para impugná-la por meio de ação judicial, caso não
tenha sido feito anteriormente por seu representante legal, conforme se verifica na
análise do artigo 1.613 do CC/02, cujos efeitos serão extunc.
Necessário, ainda, tratar do tema quando não houver o reconhecimento espon-
tâneo pela figura paterna ou mesmo pela materna (esse último, mais raro). Sendo a
filiação um direito da personalidade e que envolve a dignidade da pessoa humana, cabe
ao filho o direito de ver reconhecida a paternidade e, consequentemente, a filiação.
Vale salientar que a genitora, ainda que casada, ao registrar o filho, não está
obrigada a fazê-lo no nome do marido, não precisando sequer declinar quem é
o pai. No entanto, caso indique no ato do registro como genitor quem não é
o seu marido, será instaurado procedimento oficioso e informal, podendo gerar
ação judicial de investigação de paternidade na forma da Lei 8.560/92, em que o
Ministério Público atuará nos interesses da criança, caso a mãe não intente ação
de investigação de paternidade representando o filho menor.
O filho havido fora do casamento (pois no casamento há a presunção - arti-
go 1.597 do CC/02), em cujo registro não tenha o nome do genitor (a), poderá
demandar, visando a obter judicialmente a regularização de seu registro de nas-
cimento, a inclusão do nome paterno/materno. O rito da ação é o comum, po-
dendo ser intentada a qualquer tempo, pois não está sujeita a prazo decadencial.
Sendo uma ação de Estado, obrigatoriamente, funcionará o Ministério Público,
sob pena de nulidade.
A legitimidade para propor a ação é do filho, sendo um direito persona-
líssimo, devendo estar representado ou assistido por seu representante legal,
se menor de idade, e, havendo negligência do representante legal, poderá o
Ministério Público ajuizar a ação investigatória em nome próprio, operando-
-se a substituição processual (Lei nº 8.560/90).
Por se tratar de ação personalíssima, diverge a doutrina quanto à possibilidade
de substituição do polo ativo em caso de falecimento, sendo que Paulo Nader,
Carvalho Santos, Clóvis Beviláqua, Arnoldo Medeiros da Fonseca e outros dou-
trinadores admitem o prosseguimento da ação pelos herdeiros, enquanto Carlos
Maximiliano posiciona-se de forma contrária.
É legitimado passivo na ação de investigação (reconhecimento) de paternida-
de/maternidade o suposto pai ou suposta mãe, ou seus herdeiros necessários (não
é em face do espólio, e sim de cada um dos herdeiros), em caso de falecimen-
to (artigo 27 do ECA), pois, ainda que não haja herança, o reconhecimento do
capítulo 4 • 120
vínculo é também de ordem moral; ademais, o Código Civil atual não condiciona
a propositura da ação a nenhuma exigência (existente no artigo 363 do CC/16 –
REVOGADO), prevalecendo o princípio da verdade real.
No que tange ao polo passivo da ação, o investigado poderá se opor ao pe-
dido de reconhecimento, negando a existência de relação sexual com a figura do
outro genitor; nesse caso, decisiva será a realização de prova por exame de DNA.
No entanto, conforme estudado anteriormente, poderá o investigado se negar a
submeter-se ao exame, o que gerará a presunção, ainda que relativa, de filiação, na
forma da Lei nº 12.004/09 e Súmula 301 do STJ.
Considerando ser a filiação um direito da personalidade e que ela representa
a dignidade da pessoa humana, Maria Berenice Dias (disponível em Consultor
Jurídico- <https://goo.gl/1j8aKR>, edição de 5.8.2009), ao tecer comentários so-
bre a Lei nº 12.004/09, pondera que, em vez de apenas confirmar a orientação
jurisprudencial, caberia ao legislador de plano
capítulo 4 • 121
Poder familiar
poder familiar é o instituto de ordem pública que atribui aos pais a função de
criar, prover a educação de filhos menores não emancipados e administrar
eventuais bens. [...]. O poder familiar, modernamente, é concebido como
instituto de proteção e assistência à criança e ao adolescente e não como
fórmula autoritária de mando para benefício pessoal.
capítulo 4 • 122
uma função de ordem pública, não pode ser negligenciada pelos pais, valendo
ressaltar que os poderes-deveres dos pais não se esgotam no rol do artigo citado,
pois, em conjunto, há no Estatuto da Criança e Adolescente os artigos 8º, 19, 22,
33 e 237, assim como no próprio Código Civil os artigos do CC/02 1.517, 1.630,
1.729, 1.730, 1.689 a 1.693 e 1.634.
No que tange ao inciso IX do artigo 1.634 do CC/02, a possibilidade dos pais
de exigir dos filhos que lhes prestem obediência, respeito e serviços próprios de
sua idade e condição, ser analisada e exercida sob a luz dos princípios do melhor
interesse da criança e do adolescente, e da dignidade da pessoa humana, sendo ve-
dados maus-tratos e relação ditatorial, pois, comprovado o excesso no exercício do
poder familiar, acarretará a perda ou suspensão do mesmo, além de configurar ato
ilícito passível de responsabilidade civil e indenização por danos morais aos filhos
quando comprovada a ocorrência de maus-tratos, passando a vigorar, no Brasil,
a Lei 13.010/2014, também conhecida como Lei da Palmada ou Lei Menino
Bernardo (criança que era vítima de violência praticada pela mãe e pelo padrasto).
Ademais, cabe aos pais, segundo artigo 1.634, VII, e artigo 1.690 do CC/02,
representar os filhos menores judicial e extrajudicialmente, sendo representados
quando a incapacidade for absoluta e assistidos quando relativa. Caso haja diver-
gência entre os pais no que se refere a decisões que deveriam ser comuns em ques-
tões relativas aos filhos, poderá o interessado buscar a via judicial para a solução,
sempre considerando o melhor interesse da criança e do adolescente.
capítulo 4 • 123
A destituição (perda) do poder familiar decorre de graves sanções impostas aos
pais pela quebra do exercício (artigo 1.638 do CC/02).
Segundo Flavio Tartuce (2016, p. 1.413), citando Jones Figueirêdo Alves e
Mário Luiz Delgado:
capítulo 4 • 124
Jurisprudência
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: Ap. Cível nº 70010114601, 7ª Câm. Cível, rel.
Des. Luiz Felipe Brasil Santos: “ECA. A destituição do poder familiar de pais que expõem
filhos pequenos à negligência e maus-tratos, ambiente familiar marcado por incesto e
abuso sexual, milita em favor dos interesses da criança na medida em que abre nova
perspectiva com a colocação em família substituta e possibilidade de adoção. Negaram
provimento. Unânime.” J. em 22.12.2004, consulta ao site do TJRS 14/03/2017.
Cabe ainda trazer à baila um instituto correlato ao poder familiar, podendo ser
motivo de perda da guarda pelo genitor, chegando-se a hipóteses de destituição do
poder familiar, e que, hodiernamente, vem sendo amplamente debatido na dou-
trina e na jurisprudência contemporâneas, que é a síndrome da alienação parental
(SPA) ou implantação das falsas memórias, sendo promulgada a Lei nº. 12.318,
de 26 de agosto de 2010, conhecida como Lei de Alienação Parental.
Jurisprudência
Regulamentação de visitas. Guarda da criança concedida ao pai. Visitas provisórias da
mãe. Necessidade. Preservação do superior interesse da menor. Síndrome da alienação
parental. Sentença de improcedência mantida. Recurso improvido, com determinação.
TJSP, Apelação com Revisão 552.528.4/5, Acórdão 2612430, Guarulhos, 8ª Câmara
de Direito Privado, Rei. Des. Caetano Lagrasta, j. 14.05.2008, DJESP 20.06.2008).
capítulo 4 • 125
A prática do ato de alienação parental viola a dignidade da pessoa humana,
pois retira do filho o direito fundamentável de convivência familiar, que é base
para a formação saudável de um indivíduo, devendo ser preservada sua saúde
emocional. O abuso moral contra a criança e o adolescente deve ser rechaçado,
sendo a conduta altamente reprovada pela sociedade, pois põe em risco a saúde
emocional do filho, podendo, inclusive, gerar responsabilidade civil do alienador.
Caso seja detectado o ato de alienação parental, caberá ao Ministério Público re-
querer a tomada de medidas urgentes para a preservação da integridade psicológica da
criança ou do adolescente, devendo se dar a garantia mínima ao filho e ao genitor de
visitação, ainda que assistida, como forma de garantir a reaproximação, se for o caso.
O Código de Processo Civil trouxe capítulo próprio destinado às ações de
família e, em especial, abordou a questão do abuso ou alienação parental, caso em
que o juiz, ao tomar o depoimento do incapaz, se fará acompanhar por especialista
(artigo 699 do CPC/15).
Em que pese não haver previsão expressa na Lei 12.318/2010 quanto à des-
tituição do poder familiar, nos casos em que restar comprovada a ocorrência de
ato de alienação parental, preocupou-se a lei em estabelecer a possibilidade de
suspensão do poder familiar, havendo casos na jurisprudência de inversão de guar-
da e até mesmo perda do poder familiar nos casos avançados de Síndrome de
Alienação Parental.
Jurisprudência
APELAÇÃO CÍVEL. ALTERAÇÃO DE GUARDA. GUARDA INICIALMENTE CONCEDIDA
À AVÓ MATERNA. ALIENAÇÃO PARENTAL. PERDA DA GUARDA DE OUTRA NETA
EM RAZÃO DE MAUS-TRATOS. GENITOR QUE DETÉM PLENAS CONDIÇÕES DE
DESEMPENHÁ-LA. Inexistindo nos autos qualquer evidência de que o genitor não
esteja habilitado a exercer satisfatoriamente a guarda de seu filho, e tendo a prova
técnica evidenciado que o infante estaria sendo vítima de alienação parental por parte
da avó-guardiã, que, inclusive, perdeu a guarda de outra neta em razão de maus-tratos,
imperiosa a alteração da guarda do menino. Preliminar Rejeitada. Apelação Provida.
(Apelação Cível Nº 70043037902, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl, Julgado em 29/09/2011). BRASIL - TJRS -
Apelação Cível Nº 70043037902. Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl, Julgado em
29/09/2011. Publicação 04.10.2011.
capítulo 4 • 126
Guarda
O termo guarda tem origem no termo alemão wargen, que significa guarda, espera.
Embora o vocábulo tenha significados plúrimos, a guarda dos filhos é uma
das atribuições do poder familiar, sendo certo que a dissolução da sociedade ou
do vínculo conjugal não modifica os direitos e deveres dos pais em relação aos
filhos, ou seja, mesmo quando a sociedade conjugal se desfaz, permanece o poder
familiar, em que pese o fato de que, por longos anos da história da sociedade, cos-
tumou-se atribuir apenas a um dos genitores a guarda do filho menor, conceden-
do-se ao outro a visitação. No entanto, mudanças foram ocorrendo na sociedade
e na forma de se enxergar o direito de guarda, chegando ao que se denominou
compartilhamento da guarda.
Nas lições de Maria Berenice Dias (2015, p. 522), “A palavra guarda significa
verdadeira coisificação do filho, colocando-o muito mais na condição de objeto do
que de sujeito de direito. Daí a preferência pela expressão direito de convivência”.
Segundo lições de Paulo Nader:
capítulo 4 • 127
A sociedade, no entanto, veio se modernizando, tendo surgido a Lei do
Divórcio, e no Código Civil de 1916 previu-se que, em caso de dissolução da
sociedade conjugal, não tendo os cônjuges chegado a um acordo e havendo culpa
pela dissolução, a guarda ficaria com o cônjuge inocente como uma forma de
punição ao culpado pela separação. Sendo ambos culpados, os filhos menores
poderiam ficar com a mãe.
Mas os tempos mudaram, e os pais passaram a reclamar o direito à guarda dos
filhos; afinal, a Constituição Federal trouxe a igualdade entre homens e mulheres.
Assim, o primeiro avanço se deu com o advento da Lei nº 11.698/2008 (Lei
da Guarda Compartilhada), deixando de ser priorizada a guarda unilateral ou
individual, sendo essa mudança significativa.
O código Civil de 2002 trouxe a definição de guarda unilateral e guarda com-
partilhada (artigo 1.583, § 1º, do CC/02), bem como apontou a preferência pelo
compartilhamento (artigo 1.584, § 2º, do CC/02); no entanto, por não ser impo-
sição legal a fixação da guarda compartilhada, permanecia-se a ocorrer, na prática,
a guarda unilateral, seja por vontade das partes, quando a dissolução do casamento
se dava de forma consensual, seja por fixação legal, em caso de litígio.
A Lei nº 13.058/14, também conhecida como Lei da Igualdade Parental,
trouxe, então, como principal modalidade de guarda, o compartilhamento (artigo
1.583, §2º, do CC/02): o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de
forma equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em vista as condições
fáticas e os interesses dos filhos. A lei veio priorizando o compartilhamento da
convivência (guarda) e estabelecendo igualdade parental entre genitores.
capítulo 4 • 128
Flavio Tartuce (2016, p.1.332, 1.333) apresenta uma explicação didática so-
bre as modalidades de guarda existentes de forma a diferenciá-las:
capítulo 4 • 129
Considerando que os filhos necessitam do convívio com ambos os geni-
tores, salvo os casos em que isso se torne impossível ou inviável, é que se pas-
sou a ter como regramento a guarda compartilhada ou o direito de convivência
em compartilhamento.
Vale dizer que, quanto mais conflituosa a relação entre os pais, mais se deve
deixar regulamentado o regime de convivência, evitando, com isso, que um genitor
fique sob o poder de autorização do outro para que tenha o convívio com o filho.
O Código Civil de 2002 disciplina a guarda em dois momentos: de filhos
havidos fora do casamento (artigos 1.611 e 1.612) e quando decorrentes da disso-
lução matrimonial (artigos 1.583 a 1.590).
Quando a guarda decorre de dissolução do casamento, o Código Civil/02 prevê a
guarda unilateral (exclusiva ou monoparental), a guarda compartilhada ou conjunta.
Qualquer das formas de guarda pode ser requerida por consenso ou por qualquer
dos genitores em ação de separação ou divórcio, ou de forma autônoma; no entanto, o
judiciário tem entendido que a guarda compartilhada é, hoje, a regra no ordenamento
jurídico brasileiro, sendo preferencialmente fixada, indeferindo pedidos de guarda e
não homologando acordos que tratem da guarda na modalidade unilateral.
Vale, por fim, lembrar que: as novas núpcias do genitor não lhe fazem perder
o direito de ter consigo os filhos (artigo 1.588 do CC/02); que o direito de visita
é conferido ao genitor que não possui a guarda, mas, para além de um direito do
pai, é um direito dos filhos em manter a convivência afetiva com o seu genitor
(artigo 1.589, CC); o fator determinante na fixação de qualquer das modalidades
de guarda deve ser o melhor interesse do menor ou incapaz, não sendo decisivos
os fatores econômicos.
Não havendo consenso entre os genitores quanto à guarda dos filhos, caberá à
justiça a difícil tarefa de decidir, sempre preservando o melhor interesse da criança
e do adolescente, privilegiando a guarda compartilhada, de forma a manter um
equilíbrio quanto ao tempo de convivência dos filhos com os genitores.
Recomenda-se a oitiva da criança sempre que possível e, como forma de auxi-
liar o juiz, a elaboração de laudo (estudo social), socorrendo-se de profissionais de
outras áreas, como o psicólogo e assistente social.
No que tange à competência para a propositura de ação relacionada à guarda
dos filhos, o critério utilizado é o do local onde se encontra a criança ou o ado-
lescente (Súmula 383 do STJ), devendo tramitar junto à vara de família, e apenas
será de competência da vara da infância e juventude se a criança ou o adolescente
estiver com seus direitos ameaçados ou violados por ato de abuso ou ato omissivo
capítulo 4 • 130
dos genitores ou responsáveis. A ação tramitará em segredo de justiça e será obri-
gatória a participação de Membro do Ministério Público, quando esse não for
parte, sob pena de nulidade.
No entanto, os meios autocompositivos, em especial a mediação de conflitos,
são os mais adequados para solver o litígio, haja vista a chance de possibilitar às
partes uma reflexão sobre a situação em que se encontram, enfrentando seus con-
ceitos e preconceitos, suas decepções, sentimentos negativos, como raiva, rancor,
entre outros, conscientizando-se da necessidade de manutenção do vínculo entre
os envolvidos na controvérsia, bem como levando-os a assumir suas próprias res-
ponsabilidades, com uma solução alcançada por ambos e não ditada pelo juiz, em
que estarão preservando o melhor interesse dos filhos, numa visão de que os pais
sempre desejam o melhor para aqueles que amam.
Guarda Compartilhada
capítulo 4 • 131
Ademais, não sendo harmoniosa a relação entre os genitores, o compartilha-
mento necessitará de regulamento com vistas a ficarem bem definidas as atribui-
ções de cada genitor, definindo-se, ainda, quanto tempo de convivência terão os
filhos com um e outro.
No que se refere à verba alimentar para os cuidados do filho, a criação e a
educação deles, deve se ajustar às peculiaridades do caso concreto, levando sempre
em consideração a necessidade de quem depende dos alimentos e a possibilidade
de quem deve provê-los.
CURIOSIDADE
A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, em acórdão relatado pela ministra Nancy
Andrighi, negou à mãe o direito de levar consigo, para os Estados Unidos, os três filhos que
viviam em sua companhia e em regime de guarda compartilhada. Em suas alegações, a re-
querente havia esclarecido que fora contemplada com uma vaga para curso de mestrado e
que o seu novo companheiro, de quem se encontrava grávida, estava vivendo naquele País.
Em suas razões, a ministra declarou que “não é aconselhável que sejam as crianças privadas,
nesse momento de vida, do convívio paterno, fundamental para um equilibrado desenvolvi-
mento de sua identidade pessoal”. Não seria recomendável que os filhos, aduziu, ficassem
distantes de sua mãe, pelo que o desejável seria a composição dos interesses individuais em
harmonia com o bem-estar dos filhos. STJ, 3ª Turma, Medida Cautelar nº 16357/DF, j. em
02.02.2010, pub. DJe em 16.03.2010. (NADER, 2016, p. 423)
O instituto da guarda deve ser visto com base no melhor interesse da criança
e do adolescente; assim, a legislação prevê hipóteses em que, sendo necessário, a
criança ou o adolescente será colocado sob a guarda de terceiro que não seja seu
pai ou mãe, podendo ser atribuída a um parente próximo ou mesmo colocado em
família substituta.
Na pratica, constata-se que inúmeros são os casos em que a guarda de fato
sempre esteve com os avós ou outros parentes da criança, que, somente longo
tempo depois de exercerem a guarda, buscam o judiciário para formalizá-la.
A guarda é concedida a terceiro quando os pais não apresentarem condições
capítulo 4 • 132
de exercer, com plenitude, seus deveres inerentes ao poder familiar, seja por
motivos temporários ou permanentes.
No entanto, quando a guarda for requerida apenas com fins previdenciários,
ou seja, para que o menor fique amparado no caso de óbito de algum parente
que pretende que a pensão por morte seja destinada a criança ou o adolescente, a
jurisprudência tem rechaçado o direito de concessão de guarda.
É possível se fazer uma breve evolução histórica no que concerne à guarda e à
relação previdenciária, sabendo-se que, em 1990, entrou em vigor o Estatuto da
Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), que, no § 3º do artigo 33, passou a
prever que a guarda confere à criança e ao adolescente o direito a ser considerado
dependente para fins previdenciários. O ECA tem como objetivo a proteção inte-
gral das pessoas protegidas pelo estatuto.
A Lei nº 8.213/91, tratando sobre os Planos de Benefícios do Regime Geral
de Previdência Social, entrou em vigor, trazendo em seu artigo 16, § 2º, quem
seriam as pessoas a terem qualidade de dependentes dos segurados, entre eles o
menor sob guarda.
Em 1996, a MP 1.523/96, que posteriormente foi convertida na Lei nº
9.528/97, que alterou o texto do § 2º do artigo 16 da Lei nº 8.213/91, excluiu
do rol de dependentes o menor sob guarda; no entanto, não houve qualquer alte-
ração no que refere ao ECA, que continuou prevendo o menor sob guarda como
dependente para fins previdenciários, passando a haver um conflito de normas.
No entanto, o ECA não pode ser tratado como uma simples lei, pois objetiva
proteger e amparar o menor por meio de políticas públicas, cumprindo o artigo
227 CF/88; nesse sentido, o STJ decidiu, em recurso especial publicado em de-
zembro de 2016, que ao menor sob guarda é concedida a qualidade de dependente
para fins previdenciários, pois a norma jurídica não pode conter conteúdo que
atente contra a dignidade da pessoa humana, e, embora a lei previdenciária seja
considerada norma específica, o ECA é estatuto que disciplina a proteção integral
da criança e do adolescente, devendo prevalecer sobre a lei previdenciária.
capítulo 4 • 133
Julgado do Superior Tribunal de Justiça:
Deve-se atentar que ao menor sob guarda será assegurada a qualidade de de-
pendente para fins previdenciários; no entanto, não será concedida a guarda com
fins meramente previdenciários, ou seja, não cabe aos avós, tios, entre outros,
requerer a concessão da guarda sem qualquer motivação, apenas para resguardar o
direito do menor em receber a pensão em caso de morte do guardião, sob pena de
se estar cometendo fraude.
capítulo 4 • 134
Nesse sentido, têm decidido os Tribunais:
A obrigação com os filhos menores é dada aos genitores; dessa forma, cabe
a esses o exercício da guarda, somente sendo estabelecida em favor de terceiros
quando os genitores estiverem impossibilitados ou impedidos de exercer o dever
que lhes compete.
capítulo 4 • 135
ATIVIDADE
Sobre o Poder Familiar (ou Parental), assinale com V (Verdadeiro) ou F (Falso):
( ) Poder familiar é o conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais no tocante à pessoa
e aos bens dos filhos menores não emancipados.
( ) Tal como no Direito Romano, o poder familiar ainda se destina à proteção do exclusivo
interesse do chefe da família.
( ) Havendo divergência entre os pais com relação ao exercício do poder parental, qualquer
um deles pode recorrer ao juiz para que esse resolva o impasse.
( ) A dissolução da sociedade conjugal altera o poder familiar.
( ) Morrendo o pai, o poder será exercido unicamente pela mãe. Caso a mãe se case nova-
mente, ao novo marido deverá ser estendido esse poder.
( ) Estão contidos no poder familiar, por exemplo: a criação e a educação dos filhos; tê-los em
sua companhia e guarda; sustento; concessão (ou não) de consentimento para o casamento;
nomeação de tutor por testamento ou outro documento autêntico; o poder de reclamá-los
por ação de busca e apreensão de quem ilegitimamente os possua; exigir que lhes prestem
obediência e respeito; exigir que realizem tarefas próprias da idade.
( ) São causas que podem extinguir o poder parental: morte de um ou de ambos os pais; mor-
te do filho; maioridade; entrega do filho para adoção; emancipação; destituição por sentença
judicial e que estão enumeradas exemplificativamente no art. 1635, CC.
( ) São causas de perda do poder familiar: castigo imoderado; abandono; prática de atos
contrários à moral e aos bons costumes; incidência reiterada nas causas suspensivas do
poder familiar.
( ) A perda do poder familiar é permanente e definitiva, e abrange toda a prole.
GABARITO
V, F, V, F, F, V, F, V, F
RESUMO
Neste capítulo, foi possível compreender que a mudança no conceito de família trouxe
consigo alterações substanciais para o Direito de Família, como a mudança do Pátrio Poder
para o Poder Familiar, como forma de efetivação do princípio da igualdade entre os genito-
capítulo 4 • 136
res, alterando, de igual forma, o instituto da guarda, que, em uma visão do Melhor Interesse
da Criança e do Adolescente, passou a equilibrar a convivência de ambos os genitores com
o filho, prevalecendo no ordenamento jurídico a guarda compartilhada em detrimento da
guarda unilateral.
Ainda foi possível estudar a filiação como um direito da personalidade, assim como re-
conhecimento da paternidade, impondo à legislação meios eficazes para se obter o reconhe-
cimento da paternidade/maternidade quando houver a negativa de qualquer dos genitores,
considerando que o desconhecimento da verdade biológica viola frontalmente o Princípio da
Dignidade da Pessoa Humana.
A sociedade tem evoluído em conceitos sobre os institutos que permeiam as relações
familiares, sempre buscando como base o afeto, o respeito, a dignidade da pessoa humana e
a proteção integral da família em qualquer modalidade que se apresente.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
________. https://goo.gl/6DC2fn, edição de 05/08/2009.
CHAVES, R.; FARIAS, C. C. de; ROSENVALD, N. Direito das Famílias. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.
DIAS, M. B. Manual de Direito das Famílias. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.
NADER, P. Curso de Direito Civil, v. 5. Rio de Janeiro: Forense, 2016.
______. Curso de Direito Civil, v. 5. Rio de Janeiro: Forense, 2009.
TARTUCE, F. Manual de Direito Civil. São Paulo: Método, 2016.
capítulo 4 • 137
capítulo 4 • 138
5
Alimentos,
bem de família
e união estável
Alimentos, bem de família e união estável
Introdução
capítulo 5 • 140
OBJETIVOS
• Conceituar alimentos e identificar suas características e suas espécies, discorrendo sobre
os princípios informadores dos alimentos;
• Estudar os pressupostos da obrigação alimentar;
• Compreender o conceito de bem de família, distinguindo o bem de família legal do bem de
família convencional;
• Entender o alcance do bem de família legal e identificar os efeitos do bem de família convencional;
• Conceituar a união estável, compreender seus pressupostos de caracterização e diferenciar
do concubinato;
• Identificar direitos e deveres aplicáveis;
• Reconhecer a possibilidade de conversão em casamento.
Alimentos
Espécies de alimentos
capítulo 5 • 141
Destacam-se como espécies de alimentos:
• Quanto à natureza: 1. Naturais (alimenta naturalia): compreendemos que
se considera necessário e indispensável à manutenção da vida: alimentos in natura,
vestuário, medicamentos (artigos 1.694, § 2º, e 1.704, parágrafo único, CC/02);
2. Civis (alimenta civilia ou côngruos): os quais compreendem a necessidade in-
telectual e moral da pessoa, em especial quanto à manutenção da condição social
do ser humano, abrangendo educação e lazer.
• Quanto à causa jurídica: 1. Legítimos ou legais: decorrem de uma obri-
gação legal advinda do vínculo de parentesco, união estável ou casamento, na for-
ma do artigo 1.694, CC/02; 2. Voluntários: advêm de um gesto de vontade decla-
rado, seja inter vivos ou causa mortis, como, por exemplo, instituição de usufruto,
constituição de renda; 3. Indenizatórios: diante de um ato ilícito praticado, surge
o dever do causador do dano em reparar o prejuízo, fixando-se, quando for o caso,
alimentos que possam manter o sustento da vítima ou de seus familiares (artigos
948, II, e 950, CC/02).
• Quanto à finalidade: 1. Definitivos ou regulares: quando são concedidos
em caráter permanente, seja por meio de sentença condenatória, seja em decorrên-
cia de acordo de vontades entre quem deve pagar e quem os recebe; 2. Provisórios:
quando fixados de plano pelo juiz em ação de alimentos um percentual a ser pago
pelo devedor até o desfecho do trâmite processual, na forma do artigo 4º da Lei
nº 5.478/68 (Lei de Alimentos), de rito especial, devendo, no entanto, existir o
mínimo de provas quanto ao vínculo de parentesco, casamento ou união estável,
por serem esses irrepetíveis. Cabe ressaltar a existência da Lei nº 11.804/08, que
disciplina os alimentos gravídicos, os quais serão fixados se convencido o juiz da
existência de indícios de paternidade.
Jurisprudência
0064378-38.2015.8.19.0000 - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 1ª Ementa DES.
FERNANDO FOCH LEMOS - Julgamento: 04/03/2016 - TERCEIRA CÂMARA
CÍVEL AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. Agravo de instrumento
interposto de decisão que fixou alimentos gravídicos provisórios. Pretensão recursal
de redução do valor fixado. 1. Sentença que intercorrentemente julga parcialmente
procedente pedido deduzido em ação de alimentos, torna inadmissível agravo de
instrumento interposto da decisão que fixara provisórios por perda intercorrente de
objeto. 2. Recurso ao qual se nega seguimento na forma do art. 557, caput, do CPC.
(TJ/RJ. Disponível em: <https://goo.gl/Pvq8MI>)
capítulo 5 • 142
Obrigação alimentar e direito a alimentos
Obrigação alimentar
capítulo 5 • 143
Diante das disposições constitucionais sobre família, Cristiano Chaves de
Farias e Nelson Rosenvald (2009, p. 585) concluem que:
capítulo 5 • 144
Jurisprudência
Ação de alimentos. Filho. Maioridade. Pretensão de majoração da verba alimentar fixada.
Necessidade/possibilidade. Ônus da prova. Proporcionalidade e razoabilidade. - Nos
termos do art. 1.694, § 1º, do Código Civil, os alimentos devem ser arbitrados de modo a
promover, equilibradamente, ideal proporcionalidade entre as necessidades presumidas
do alimentando e a capacidade contributiva de seu genitor. - Apesar do advento da
maioridade não extinguir, de forma automática, o direito à percepção de alimentos, em
virtude de esses passarem a ser devidos em virtude da relação de parentesco e não
mais em razão do Poder Familiar, necessário se faz que o alimentado comprove que
permanece tendo necessidade de receber alimentos, bem como que o alimentante
tem condições financeiras para supri-lo. - Não comprovando o alimentado a totalidade
das despesas que tem com seu sustento, tampouco a possibilidade do alimentante,
mas concordando seu genitor em efetuar o pagamento da pensão alimentícia fixada
em primeiro grau, necessário se faz manter o valor, pois ausente prova que indique a
viabilidade da majoração. (TJ-MG - Agravo de Instrumento Cv AI 10079130291531001
MG (TJ-MG) Data de publicação: 02/07/2014)
capítulo 5 • 145
a ordem estabelecida por lei. Salienta-se que o cônjuge não está inserido nessa
ordem sucessiva, já que não é parente do outro, decorrendo o seu dever de prestar
alimentos de fundamento legal diverso.
Os pressupostos para que se tenha a prestação de alimentos entre cônjuges
podem considerados: a existência de companheirismo, a proporcionalidade en-
tre a necessidade de quem os recebe e a possibilidade econômica de quem os
paga. A obrigação entre os ex-cônjuges decorre do dever de solidariedade, sendo
hodiernamente entendido como uma obrigação transitória (a depender da aná-
lise do caso), ou seja, fixada por um período de tempo, até que o outro ingresse
no mercado de trabalho, devendo ser considerada formação escolar, a profissão
e experiência profissional, além da idade do alimentando, entre outros fatores.
Todas as regras sobre alimentos aplicáveis ao casamento estendem-se à união
estável e à união homoafetiva.
capítulo 5 • 146
ou suspensão do poder familiar não são excludentes do dever de sustento dos
filhos menores ou incapazes; c) O filho com maioridade pode permanecer cre-
dor de alimentos quando: incapaz; ainda em formação escolar; encontrar-se em
situação de penúria não proposital; necessitar de medicamentos, além outras hipó-
teses aferíveis caso a caso; d) Em virtude da reciprocidade, ascendentes idosos ou
incapazes também têm direito de pleitear alimentos de seus descendentes (artigo
12, Estatuto do Idoso – Lei nº 10.741/2003); e) O nascituro pode ser beneficiado
por alimentos pleiteados por sua mãe no curso da gestação. Trata-se dos alimentos
gravídicos estabelecidos pela Lei nº 11.804/2008; f ) Não havendo parentes em
linha reta de primeiro grau aptos a prestar alimentos, admite-se que sejam plei-
teados nos graus subsequentes, sendo a mais comum conhecida como obrigação
alimentar avoenga (quanto aos avós paternos e maternos), cujo dever é subsidiário
ou complementar; g) Havendo guarda, os alimentos podem ser prestados pelos
pais, pelo guardião ou por ambos; h) Admite-se os alimentos entre irmãos (uni-
laterais ou bilaterais), em caráter de subsidiariedade; i) Os parentes por afinidade
não possuem direito aos alimentos por falta de expressa previsão legal.
Princípios
Por ser a família a base da sociedade, existem princípios que amparam as re-
lações familiares, da mesma forma que existem algumas obrigações; entre elas, a
obrigação alimentar, tida como um munus público, sendo as regras que a disci-
plinam de ordem pública, portanto, inderrogáveis por convenção entre as partes.
capítulo 5 • 147
poderão ser chamados os parentes de grau imediato para concorrerem no cumpri-
mento com vistas a complementar a obrigação de forma que aquele que necessita
tenha assegurado o mínimo existencial para a dignidade da pessoa humana.
Vale salientar que o rol trazido pela lei é taxativo, numerus clausus; assim, na
falta de alguma das categorias e não havendo a seguinte, extingue-se a obrigação
alimentar decorrente do parentesco.
capítulo 5 • 148
O Código Civil de 2002 prescreveu que a obrigação se transmite aos herdeiros
do devedor observados os critérios do artigo 1.694, que é de conteúdo genérico.
A remissão, embora criticada por vários doutrinadores por entenderem que melhor
seria a invocação do artigo 1.997, o qual, a exemplo do artigo 1.796 do Código Civil
de 1916, trata da responsabilidade por dívidas do falecido, é oportuna, pois dissipa
qualquer dúvida quanto ao alcance da regra (parentes, cônjuges ou companheiros).
Nas palavras de Paulo Nader (2016, p. 725), “Acreditamos que a interpreta-
ção mais aceitável, a prevalecer a atual redação do art. 1.700, seria a de considerar
transmissíveis apenas as prestações vencidas até a morte do devedor”.
Ainda sobre a transmissão da obrigação, merece referência, também, o dis-
posto no art. 948, inciso II, pertinente à sub-rogação da dívida na pessoa do
autor ou autores do crime de homicídio contra aquele que devia os alimentos e
pelo seu tempo provável de sobrevida.
Alternatividade
Divisibilidade
capítulo 5 • 149
Segundo Paulo Nader (2016, p. 729):
Irrenunciabilidade e incompensabilidade
capítulo 5 • 150
Ademais, o alimentante não pode exigir a compensação de seu crédito em face
do alimentando, sendo ainda vedadas a penhora e a cessão do crédito decorrente
da obrigação alimentar.
Da Prisão Civil
capítulo 5 • 151
Bem de família
capítulo 5 • 152
Direito de Família, artigos 1.711 a 1.722, dando-lhe feição nova para alcançar
maior efetividade.
Nas palavras de Maria Berenice Dias (2015, p. 362):
Flavio Tartuce (2016, p. 210) conceitua: “O bem de família pode ser concei-
tuado como o imóvel utilizado como residência da entidade familiar, decorrente
de casamento, união estável, entidade monoparental, ou entidade de outra ori-
gem, protegido por previsão legal específica”.
O bem de família pode ser classificado como: legal (obrigatório ou involuntá-
rio), instituído pela Lei n. 8.009/90; convencional, introduzido pelos artigos 1.711
a 1.722 do CC/02, ambos com evidente função social e caráter protetivo da família.
capítulo 5 • 153
A Súmula 205 do STJ afirma que a Lei nº 8.009/90 aplica-se também às
penhoras realizadas antes de sua vigência em virtude, justamente, da destinação
especial dada ao bem: moradia da família.
Lembre-se, ainda, que a impenhorabilidade não pode ser invocada: em razão
dos créditos de trabalhadores da própria residência por terem natureza de créditos
alimentares; pelo titular do crédito decorrente do financiamento (inclui-se tam-
bém contrato de mútuo) à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos cré-
ditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato; pelo credor de
pensão alimentícia (independentemente se decorrente de alimentos regidos pelo
Direito de Família ou se alimentos indenizatórios); para cobrança de impostos,
predial ou territorial, taxas (inclusive condominiais) e contribuições devidas em
função do imóvel familiar; para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido
como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar; por ter sido adquirido
com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressar-
cimento, indenização ou perdimento de bens; por obrigação decorrente de fiança
concedida em contrato de locação (residencial ou não residencial).
Cabe, no entanto, observar que há divergência na doutrina quanto à pos-
sibilidade de penhora de bem de família do fiador em contrato de locação. De
um lado, autores como José Rogério Cruz e Tucci e Carlyle Popp entendem que
o bem de família do fiador não pode ser penhorado para satisfação de débito
em contrato de locação. Por outro lado, e em conformidade com a jurisprudên-
cia do STJ e do STF, doutrinadores como Álvaro Villaça Azevedo, Alessandro
Segalla e Araken de Assis defendem ser legítima a penhora, com base no artigo
3º da Lei 8.009. O STJ pacificou entendimento ao editar a Súmula 549 que
estabelece a validade da penhora do bem de família quando se tratar de fiança
em contrato de locação (ver REsp 1.363.368).
A impenhorabilidade também não abrange as situações em que o devedor,
sabendo-se insolvente, adquire de má-fé imóvel mais valioso para transferir a
residência familiar, desfazendo-se ou não da moradia antiga (artigo 4º da Lei
8.009/90). Nesses casos, o juiz pode transferir a impenhorabilidade para o imóvel
anterior ou anular a venda, liberando a mais valiosa para a execução.
capítulo 5 • 154
Jurisprudência
Direito civil - bem de família - aquisição de imóvel mais valioso para transferência da
moradia familiar - insolvência configurada - ato fraudulento - penhora - cabimento. A
aquisição de imóvel mais valioso para transferência da moradia familiar, com a venda do
anterior no curso da execução e sem a oferta de outros bens livres e desembaraçados
após recusa justificada daqueles indicados à penhora pelo devedor, configura ato
fraudulento que comporta a aplicação do art. 4.º da Lei n.º 8.009/90, resultando na
penhora do imóvel residencial do executado. Recurso provido. (TJ-SP - Agravo de
Instrumento AI 5497169020108260000 SP 0549716-90.2010.8.26.0000 (TJ-SP).
Data de publicação: 08/04/2011)
capítulo 5 • 155
O bem de família é um dos institutos que visam a proteger a família, assegu-
rando-lhe a conservação da propriedade do imóvel, bem como das pertenças (arti-
go 93 do CC/02) e outros acessórios, impedindo a penhora por dívidas em geral,
estando o bem de família convencional ou voluntário inserido no Código Civil.
Dispõe o artigo 1.711 do CC/02 que o bem de família convencional pode ser
instituído pelos cônjuges ou pela entidade familiar, estando o usufrutuário ou con-
dômino impedido de figurar como instituidor. O bem de família convencional é
instituído por meio de escritura pública (forma ad soleminitatem) ou testamento
(cuja eficácia se dará apenas post mortem), não podendo o valor do bem (urbano
ou rural) ultrapassar valor superior a um terço do patrimônio líquido do instituidor
existente à época da instituição. Assim, se uma família possui um único imóvel, não
poderá protegê-lo pelas regras do Código Civil (bem de família voluntário), mas será
beneficiada pelo bem de família legal ou involuntário (Lei nº. 8.009/90).
O bem de família ainda pode ser instituído por terceiros (por doação ou testa-
mento, artigo 1.711, parágrafo único, do CC/02), mas nesse caso será necessária
a aceitação expressa de ambos os cônjuges ou da entidade familiar beneficiada.
Independentemente da forma de instituição, para que gere efeitos é necessário o
registro do título no Registro de Imóveis (artigo 1.714 do CC/02).
A solvabilidade dos instituidores é fundamental, sejam eles os próprios be-
neficiários ou os autores de liberalidade, sob pena de se configurar fraude contra
credores, conquanto a existência de dívidas não seja razão para se impedir a insti-
tuição desde que o ativo patrimonial supere o passivo.
O bem de família abrange não apenas o prédio, mas também as suas pertenças e
acessórios (artigo 1.712 do CC/02) e valores mobiliários (limitados ao valor do pré-
dio instituído como bem de família e perfeitamente individualizado) destinados à
conservação do imóvel e sustento da família (artigo 1.713 do CC/02). O instituidor
pode determinar que a administração desses valores seja confiada à administração
por entidade financeira, quando eles, então, não poderão ser afetados por qualquer
forma de liquidação sofrida pela instituição (artigo 1.718 do CC/02).
O Código Civil de 2002 estabelece que a impenhorabilidade do bem de famí-
lia alcançará tão somente as dívidas posteriores à sua constituição. As dívidas ante-
riores e as referentes a tributos do imóvel ou despesas de condomínio (propterrem)
são exceções à impenhorabilidade.
A proteção do bem de família convencional não se extingue com a dissolução
da sociedade conjugal (artigo 1.721 do CC/02) e dura enquanto viver um dos
cônjuges, ou, na falta deles, até que os filhos completem a maioridade, conforme
capítulo 5 • 156
disciplinado no artigo 1.716 do CC/02. Por outro lado, se extinguirá se falecidos
ambos os cônjuges ou companheiros e se não houver filhos menores ou incapazes.
Ademais, se verificada a impossibilidade da manutenção do bem, pode-se, a
requerimento dos interessados, extingui-lo judicialmente ou autorizar sua sub-
-rogação. Nesses casos, deverá o Ministério Público ser ouvido (artigo 1.719 do
CC/02). No caso de falecimento, o cônjuge supérstite poderá requerer a extinção
do bem de família se for o único bem do casal (artigo 1.721, parágrafo único, do
CC/02), podendo o magistrado negar o pedido quando verificar prejuízo a filhos
menores ou incapazes.
Deve-se atentar às seguintes questões: 1- o bem de família convencional não
extinguiu o legal; 2- só há necessidade de constituir o bem de família convencional
se a família utiliza vários imóveis como residência e não deseja que a impenhora-
bilidade recaia sobre o de menor valor; 3- a limitação patrimonial acaba servindo
para proteger pessoas mais abastadas.
União estável
capítulo 5 • 157
A liberdade de dissolver o casamento passou a ser um marco para muitas famí-
lias até então marginalizadas pela sociedade, pois possibilitou o reconhecimento
da união estável com status de família. A liberdade tem marcado, cada vez mais, as
relações familiares como novas formas de composição de famílias e possibilidade
de alteração de regime de bens (artigo 1.639, § 2º, do CC/02).
Entre 5 de outubro de 1988 e 29 de dezembro de 1994, embora houvesse a
previsão constitucional da união estável, não havia lei que a regulamentasse; assim,
continuava sendo tratada no âmbito do Direito das Obrigações, o que gerava de-
cisões contraditórias no âmbito judicial.
Em 30 de dezembro de 1994, com o advento da Lei nº 8.971, regulamenta-
va-se a união estável, sendo condicionada à verificação do prazo de cinco anos de
convivência ou existência de prole comum.
A lei trouxe a alteração da vocação hereditária, inserindo ao lado do cônjuge
a figura do companheiro sobrevivente, incluindo o companheiro na meação, e
concedeu direito de usufruto, em caso de morte do companheiro, sobre parte
dos bens deixados por esse. No entanto, quanto aos bens adquiridos sem esforço
comum, não fez qualquer menção.
Após as inúmeras críticas feitas à Lei nº 8.971, que ficou conhecida como
Lei do Concubinato, surgiu em 13 de maio de 1996 a Lei nº 9.278 (Lei dos
Conviventes, por ter substituído o termo companheiro por convivente), adotando
um conceito mais vago, com omissão de requisitos pessoais, tempo mínimo de
convivência e a existência de prole comum, fixando a vara de família para compe-
tência das ações relacionadas ao tema.
A lei dos conviventes trouxe a adoção do regime de bens semelhante ao da
comunhão parcial; no entanto, não proibiu os contratos de convivência (diante
do princípio da liberdade que rege o Direito de Família), tendo, ainda, previsão
expressa quanto ao direito real de habitação para o companheiro.
A lei dos conviventes restou vigente até 10.01.2003, quando passou a vigorar
o Código Civil com regulamentação da matéria nos artigos 1.723 a 1.727, e, em-
bora sem contornos bem definidos, veio prevendo: ausência de formalismo para
constituir e dissolver a união; convivência more uxorio; affectio maritalis ou ânimo
(objetivo) de constituir família; relação baseada no princípio da monogamia; di-
versidade de sexos; união notória e/ou pública; estável ou de duração prolonga-
da (não havendo fixação de prazo, desde que seja razoável para indicar o ânimo
de constituir família); inexistência de impedimentos matrimoniais (salvo artigo
1.723, § 1º, do CC/02), entendendo-se que as causas suspensivas do casamento
capítulo 5 • 158
não impõem o regime da separação obrigatória de bens à união estável, em que
pese a jurisprudência do STJ possuir entendimento pela aplicação do artigo 1.641
do CC/02 à união estável diante da suposta equiparação dela ao casamento. (por
todos: STJ, REsp 1.090.722, 3 .ª Turma, Rel. Min.Massami Ueda, j. 02.03.2010;
e REsp 646.259/RS, 4.ª Turma, Rel.Min. Luis Felipe Salomão, j. 22.06.2010)
Cabe destacar que, considerando o período intertemporal para a escolha
da norma aplicável a cada caso, será necessária a identificação do momento de
cessação da convivência.
O artigo 1.724 do CC/02 exemplifica o rol de deveres da união estável, que,
embora não se equipare ao rol do casamento, em muito se aproxima.
Seguindo a mesma regra do casamento, se outro não for o regime de bens ado-
tado pelos companheiros em contrato de convivência, o regime da união estável
será o da comunhão parcial de bens, conforme artigo 1.725 do CC/02; no entan-
to, deve-se ressaltar que não é o contrato de convivência que cria a união estável,
mas ela é condição iuris do pacto.
Na união estável, não há o dever de coabitação (Súmula 382, STF), em que
pese posicionamento de alguns doutrinadores e até mesmo por parte da jurispru-
dência no sentido de que o dever de coabitação apenas poderá ser dispensado,
consoante analogia ao artigo 1.569 do CC/02, por justa causa.
Jurisprudência
APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL POST
MORTEM. PRESENÇA DOS ELEMENTOS CARACTERIZADORES DA RELAÇÃO.
COABITAÇÃO DOS CONSORTES. PRESCINDIBILIDADE. SÚMULA 382 DO STF.
APLICAÇÃO. MANUTENÇÃO DO DECISUM. I. Configurada entre as partes a
convivência pública, contínua e duradoura, e estabelecida a relação com o objetivo
de constituição de família, impõe-se o reconhecimento da união estável com os seus
consectários. II. Pacífico o entendimento do Supremo Tribunal Federal no sentido de que
a vida em comum sob o mesmo teto, more uxorio, não é indispensável à caracterização
do concubinato? (Súmula 382), bem se aplicando à hipótese dos autos. III. Recurso
improvido. (TJ-MA - APL: 0036592011 MA 0029992-38.2009.8.10.0001, Relator:
VICENTE DE PAULA GOMES DE CASTRO, Data de Julgamento: 28/05/2013,
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 29/05/2013).
capítulo 5 • 159
Alguns direitos (recíprocos) decorrentes da união estável podem ser destaca-
dos, como: a ação de reconhecimento de união estável, que pode se dar por meio
de justificação ou de ação declaratória, sendo a sentença de natureza declaratória,
limitando-se ao reconhecimento da existência da união, com fixação de termo
inicial e final; o direito ao sobrenome do companheiro, nos termos do artigo 54,
§ 2º, e artigo 57, § 3º, da Lei de Registros Públicos, devendo haver a ação de
retificação do nome, na forma do artigo 109, da citada lei (julgado publicado no
Informativo 506 do STJ); o estabelecimento do vínculo de parentesco por afini-
dade, resultante do artigo 1.595 do CC/02; a adoção conjunta (art. 42, § 2º, do
ECA); a possibilidade do companheiro de exercer a curatela; o reconhecimento
do direito aos alimentos de acordo com o art. 1.694, CC; o reconhecimento do
exercício da inventariança pelo companheiro; o bem de família é atingido pela
impenhorabilidade da Lei nº 8.009/90 (artigo 1.711 do CC/02); no campo do
processo, há o impedimento para testemunhar; estendem-se aos companheiros os
benefícios previdenciários (Decreto-Lei nº 7.036/44; Lei nº 8.213/91).
A união estável, ainda que por escritura registrada em um cartório de notas,
não altera o estado civil, podendo os companheiros identificar-se como solteiros,
separados, divorciados ou viúvos.
O Código de Processo Civil de 2015 sabiamente inseriu em diversos artigos
a figura da união estável, seguindo a tendência atual, em que essa união é ampla-
mente reconhecida, sendo uma realidade de grande parcela da sociedade. O artigo
144 do CPC/2015, em seus incisos III e IV, VIII, ampliou os impedimentos do
juiz, inserindo a figura do companheiro; no que tange à citação, o artigo 244,
inciso II, do CPC/2015, também prevê a figura do convivente, o que não estava
no artigo 217, inciso II, do CPC/1973; também no que tange às provas, o artigo
388, inciso III, e artigo 391, parágrafo único, do CPC/2015, e ainda sobre as
testemunhas – artigo 447, § 2º, inciso I, do CPC/2015, com destaque. Quanto
à legitimidade para abertura do Inventário - artigos 617 e 618 do Novo CPC;
Embargos de Terceiro – artigo 674 do Novo Codex, enquanto o artigo 1.046 do
CPC/1973 não o expressava.
capítulo 5 • 160
Ademais, vale destacar a diferença entre união estável e concubinato,
sendo o último conceituado pelo Código Civil em seu artigo 1.727, em que
pese, no passado, ter a expressão concubinato sido utilizada para designar a
existência da união estável.
Flavio Tartuce traz em sua obra um quadro comparativo que bem destaca as
diferenças entre concubinato e união estável.
Constitui uma entidade familiar (artigo Não constitui entidade familiar, mas uma
226, § 3º, da CF/1988). mera sociedade de fato.
Pode ser constituída por pessoas soltei- Será constituída entre pessoas casadas não
ras, viúvas, divorciadas ou separadas de separadas, ou havendo impedimento ma-
fato, judicialmente e extrajudicialmente. trimonial decorrente de parentesco ou crime.
capítulo 5 • 161
Cabe eventual ação de reconhecimento e Cabe ação de reconhecimento e disso-
dissolução da união estável, que corre na lução de sociedade de fato que corre na
Vara da Família. Não se pode denominar Vara Cível.
a demanda como de dissolução de uma
sociedade de fato, erro comum na prática.
O Novo CPC trata dessa ação no seu art.
732, prevendo que as disposições relativas
ao processo de homologação judicial de
divórcio aplicam-se, no que couber, ao
processo de homologação da extinção
consensual de união estável. Para essa
demanda, também devem ser observadas
as regras especiais relativas às ações de
Direito de Família consagradas pelos arts.
693 a 699 do próprio CPC/2015.
Jurisprudência
Apelação cível. União estável. Relacionamento Paralelo ao casamento. Se mesmo
não estando separado de fato da esposa, vivia o falecido em união estável com a
autora/companheira, entidade familiar perfeitamente caracterizada nos autos, deve
ser reconhecida a sua existência, paralela ao casamento, com a consequente partilha
de bens. Precedentes. Apelação parcialmente provida por maioria". (TJRS, Acórdão
70021968433, Canoas, 8 .ª Câmara Cível, Rel. Des. José Ataídes Siqueira Trindade, j.
06.12.2007, DOERS 07.01.2008, p. 35)
capítulo 5 • 162
Direito de família. Apelação cível. Ação declaratória de união estável post mortem. Casamento
e união estável simultâneos. Reconhecimento. Possibilidade. Provimento. 1. Ainda que de
forma incipiente, doutrina e jurisprudência vêm reconhecendo a juridicidade das chamadas
famílias paralelas como aquelas que se formam concomitantemente ao casamento ou à
união estável. 2. A força dos fatos surge como situações novas que reclamam acolhida
jurídica para não ficarem no limbo da exclusão. Entre esses casos, estão exatamente as
famílias paralelas, que vicejam ao lado das famílias matrimonializadas. 3. Para a familiarista
Giselda Hironaka, a família paralela não é uma família inventada nem é família imoral, amoral
ou aética, nem ilícita. E continua com esta lição: ‘'Na verdade, são famílias estigmatizadas,
socialmente falando. O segundo núcleo ainda hoje é concebido como estritamente adulterino,
e, por isso, de certa forma perigoso, moralmente reprovável e até maligno. A concepção é
generalizada, e cada caso não é considerado por si só, com suas peculiaridades próprias.
É como se todas as situações de simultaneidade fossem iguais, malignas e inseridas num
único e exclusivo contexto. O triângulo amoroso sub-reptício, demolidor do relacionamento
número um, sólido e perfeito, é o quadro que sempre está à frente do pensamento geral,
quando se refere a famílias paralelas. O preconceito, ainda que amenizado nos dias atuais,
sem dúvida, ainda existe na roda social, o que também dificulta o seu reconhecimento na
roda judicial. 4. Havendo nos autos elementos suficientes ao reconhecimento da existência
de união estável entre a apelante e o de cujus, o caso é de procedência do pedido formulado
em ação declaratória. 5. Apelação cível provida". (TJMA, Recurso 19.048/2013, Acórdão
149.918/2014, 3ª Câmara Cível, Rei. Des. Jamil de Miranda Gedeon Neto, j. 10.07.2014)
CURIOSIDADE
JULGADO DO STF que entendeu NÃO ter a concubina direito ao benefício previdenciá-
rio do de cujus. (STF, RE 397.762-8/BA, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 03.06.2008)
JULGADO DO STJ que entendeu pelo direito de recebimento de pensão alimentícia.
(STJ, REsp 1185337/RS, 3ª Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 17.03.2015, DJe
31.03.2015)
capítulo 5 • 163
Conversão da União Estável em Casamento
A união estável é um fato social que não exige, em regra, documento, podendo
ser registrada em cartório, mas isso não é obrigatório. Por outro lado, o casamento
é um ato formal e solene, com um processo de habilitação e a celebração por um
juiz de paz ou de direito, sendo sua comprovação documental.
Assim, embora haja muitos pontos de contato entre união estável e casamen-
to, não é possível afirmar tratar-se de institutos equiparados.
Prevê o artigo 1.726 do CC/02 a possibilidade e autorização de conversão
da união estável em casamento, cujo pedido deve ser formulado por ambos os
companheiros junto ao juiz e com assento no Registro Civil. No entanto, esse
artigo trazido pelo CC/02 acabou por dificultar a conversão da união estável
em casamento, indo na contramão da norma constitucional que determina sua
facilitação, pois, pelo artigo 8º da Lei nº 9.278/96, era suficiente que se fizesse
o pedido diretamente ao oficial do Registro Civil, enquanto o artigo 1.726 do
CC/02 exige a figura do juiz.
Existem normas das corregedorias de diversos Tribunais de Justiça dispen-
sando o pedido judicial, limitando o pedido de conversão perante o Oficial do
Registro Civil, como, por exemplo, o Provimento 25/2005 do Tribunal de Justiça
de São Paulo atualizado pelo provimento 41/2012.
Quanto aos efeitos pessoais da conversão, eles se operam extunc, devendo ser
considerado casamento desde o início da convivência; por outro lado, tratando-se
de efeitos patrimoniais, opera ex nunc, evitando a ocorrência de injustiças entre os
conviventes, bem como a insegurança jurídica nas relações com terceiros.
capítulo 5 • 164
1.694 a 1.710; 1.790; todos do Código Civil de 2002; e os artigos do Código de
Processo Civil que se referem à união estável).
Parece ter sido encerrada no Brasil a divergência sobre o tema, concretizan-
do-se, plenamente, a proteção familiar da união homoafetiva, não se tendo outra
interpretação senão a de que a união homoafetiva se enquadra no conceito de
família, com o afastamento de preconceitos e discriminações.
LEITURA
Homoafetividade e família. Casamento civil, união estável e adoção por casais homoafe-
tivos à luz da isonomia e da dignidade humana. Disponível em: <https://goo.gl/aHbuwN>.
ATIVIDADE
Questão 1: Roberto e Marcela, divorciados, são pais de João. Quando João completou
dezoito anos, Roberto, que se encontrava desempregado, de imediato parou de pagar a pen-
são alimentícia, sem prévia autorização judicial. Com base na situação descrita, assinale a
afirmativa correta. (XX Exame da OAB - FGV 2016)
a) Por estar desempregado, Roberto não é mais obrigado a pagar a pensão alimentícia ao filho
maior de idade; logo, o pagamento da pensão pode ser interrompido sem autorização judicial.
b) O implemento da maioridade de João, por si só, faz com que não seja mais necessário o
pagamento da pensão alimentícia, independentemente da situação econômica do provedor.
c) O ordenamento jurídico tutela o alimentante de boa-fé; logo, a interrupção do pagamento
se dará com o mero fato da maioridade.
d) O cancelamento de pensão alimentícia de filho que atingiu a maioridade está sujeito à
decisão judicial mediante contraditório.
e) Não poderá João executar os valores não pagos por Roberto após ter completado 18
anos, considerando já estar apto a prover o próprio sustento.
capítulo 5 • 165
c) Para que seja reconhecida a impenhorabilidade do bem de família, é necessária a prova
de que o imóvel em que reside a família do devedor seja o único imóvel de propriedade do
devedor e que necessariamente seja utilizado exclusivamente como a residência da família.
d) A união estável não pode ser reconhecida caso um dos conviventes seja casado, ainda
que esteja separado de fato.
e) O concubinato e a união estável são institutos jurídicos idênticos.
GABARITO
Questão 1 - Letra D
Questão 2 - Letra B
RESUMO
No capítulo, foi possível compreender o conceito de alimentos no direito de família e
sua íntima ligação com os princípios da solidariedade e cooperação familiar, no qual não se
concebe que um ente da família se recuse a socorrer o outro que esteja em extrema penúria,
auxiliando-o no mínimo existencial. O binômio necessidade/ possibilidade foi apresentado
como forma de equilibrar a obrigação alimentar, utilizando-se da proporcionalidade para a fi-
xação da pensão alimentícia. Você aprendeu sobre as espécies de alimentos, quando podem
e devem ser fixados, e em que momento a obrigação pode ser extinta. Características como
irrenunciabilidade, impenhorabilidade, incompensabilidade, mutabilidade, transmissibilidade,
entre outras, foram analisadas.
No que tange ao instituto do bem de família, foram apresentadas as modalidades bem de
família legal e bem de família convencional, com suas características e peculiaridades. Você
pôde concluir que o objetivo da instituição do bem de família é a proteção do mínimo exis-
tencial para a entidade familiar, considerando o Principio da Dignidade da Pessoa Humana
e que a família é a base de uma sociedade saudável, devendo obter a proteção do Estado.
Por fim, foi possível verificar que a sociedade vem mudando o seu conceito de família,
sendo reconhecida a união estável entre homem e mulher e a união homoafetiva como en-
tidades familiares que merecem o respeito e a proteção estatal, sendo instituições que têm
por base a afetividade. Também pôde analisar a união estável e o concubinato, bem como as
divergências doutrinárias e jurisprudenciais que permeiam os dois institutos. Compreendeu
que o Direito de Família visa sempre à proteção da família, qualquer que seja sua origem.
capítulo 5 • 166
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CAHALI, Y. S. Dos alimentos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
DIAS, M. B. Manual de direito das famílias. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.
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TARTUCE, F. Manual de Direito Civil. São Paulo: Método, 2016.
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ANOTAÇÕES
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