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TERRORISMO E OUTRAS

SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES


Theory and practice of prevention and control

Organizador
Carlos Eduardo de Oliveira Vasconcelos
REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL

MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO


Raquel Elias Ferreira Dodge
Procuradora-Geral da República
João Akira Omoto
Diretor-Geral da Escola Superior do Ministério Público da União
Alberto Bastos Balazeiro
Diretor-Geral Adjunto da Escola Superior do Ministério Público da União

CÂMARA EDITORIAL – CED


MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Antonio do Passo Cabral - Coordenador da CED
Procurador da República

Geisa de Assis rodrigues


Procuradora Regional da República
MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO
Elaine Noronha Nassif
Procuradora do Trabalho
Virgínia Leite Henrique
Procuradora do Trabalho
MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR
Nelson Lacava Filho
Promotor de Justiça Militar
Selma Pereira de Santana
Promotora de Justiça Militar

MINISTÉRIO PÚBLICO DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS


Antonio Henrique Graciano Suxberger
Promotor de Justiça
Maria Rosynete de Oliveira Lima
Procuradora de Justiça
TERRORISMO E OUTRAS
SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES


Theory and practice of prevention and control

Organizador
Carlos Eduardo de Oliveira Vasconcelos
Brasília-DF
2018
ESCOLA SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO
SGAS Av. L2 Sul Quadra 604 Lote 23, 2o andar
70200-640 – Brasília-DF
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SECRETARIA DE INFRAESTRUTURA E LOGÍSTICA EDUCACIONAL


Nelson de Sousa Lima
ASSESSORIA TÉCNICA – CHEFIA
Lizandra Nunes Marinho da Costa Barbosa
ASSESSORIA TÉCNICA – REVISÃO
Carolina Soares dos Santos
ASSESSORIA TÉCNICA – PROGRAMAÇÃO VISUAL
Rossele Silveira Curado
PREPARAÇÃO DOS ORIGINAIS E REVISÃO DE PROVAS
Amanda Priscila de Sousa Farias, Carolina Soares dos Santos
Davi Silva do Carmo, João Gustavo Borges Marques
CAPA, PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO
Rossele Silveira Curado
Ilustração: Freepik
As opiniões expressas nesta obra são de exclusiva responsabilidade dos autores.

DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)


(BIBLIOTECA DA ESCOLA SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO)

T328 Terrorismo e outras situações de emergência: teoria e prática da prevenção e do


combate = Terrorism and other emergencies: theory and practice of prevention
and control / organizador: Carlos Eduardo de Oliveira Vasconcelos – Brasília :
ESMPU, 2018.
352 p.

ISBN 978-85-9527-029-9
ISBN (eletrônico) 978-85-9527-030-5

1. Terrorismo. 2. Terrorismo - prevenção. 3. Terrorismo internacional. 4. Brasil. Lei n.
13.260, de 16 de março de 2016. 5. Crime organizado. 6. Violência - Brasil. I. Vasconcelos,
Carlos Eduardo (org.). II. Título.

CDD 341.1366
Sumário

Palavras introdutórias 11

Apresentação 15

Introdução 17

1. Terrorismo e distinções necessárias 27

Tentativas de conceituação
Terrorismo e outras situações de emergência no Brasil:
desafios para o Ministério Público Federal
Carlos Eduardo de Oliveira Vasconcelos 29

Welcome to Absurdistan:
new criminal offenses to combat terrorism
Mark A. Zöller 41

Legislação
A tipificação de crimes terroristas no Brasil:
comentários à luz do Direito Internacional e do Direito comparado
Sven Peterke 55

A tipificação do crime de terrorismo


Pedro Taques 75
Tratamiento penal, procesal y penitenciario
de los delitos de terrorismo
Javier-Alberto Zaragoza Aguado 81

O terrorista como legislador:


primeiras reflexões sobre a Lei Antiterrorismo do Brasil
Carlos Eduardo de Oliveira Vasconcelos 99

Experiências
Atentados terroristas del 11-M en Madrid:
Sumario 20/04 del Juzgado Central de Instrucción N. 6
(una visión judicial del caso)
Javier-Alberto Zaragoza Aguado 113

Lutte contre le terrorisme:


enquêtes et leçons apprises –
les nouvelles formes de djihad
Ludovic Lestel 121

Instituições e instrumentos
The changing role of the prosecutor
in counter terrorism since September 11
Elizabeth Howe 139

Remarks to the Standing Senate Committee


on National Security and Defence
(Esclarecimentos do Procurador-Geral
do Ministério Público Federal do Canadá
ao Senado sobre as atribuições do Ministério Público
em casos de terrorismo)
Brian Saunders 147

Special Criminal Court


Liam Mulholland 151
A atividade de prevenção ao terrorismo e
os Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016
José Carlos Martins da Cunha 159

A visão do Exército: como minimizar a


possibilidade de atentados terroristas no Brasil
Laurence Alexandre Xavier Moreira 161

Ciberterrorismo
Alan Denilson Lima Costa 171

Cooperação internacional
O terrorismo e a cooperação internacional
Ricardo Andrade Saadi 175

O terrorismo no Direito Internacional e comparado


Vladimir Aras 187

2. Manifestações públicas 215

Situações de emergência e Direitos Humanos:


o uso da tortura por Estados Democráticos
André de Carvalho Ramos 217

Federazione Anarchica Informale (FAI): o fenômeno


do anarcoinsurrezionalismo ou o terrorismo “do bem”
Pierandrea Taurelli Salimbeni 233

Propostas para lidar com a violência


nas demonstrações públicas
José Mariano Benincá Beltrame 241
Vandalismo, terrorismo e os dilemas e contradições
do debate sobre a tipificação penal no Brasil:
uma visão do Ministério Público brasileiro
José Robalinho Cavalcanti 249

3. Facções criminosas 261

Gênese e evolução da organização criminosa


Primeiro Comando da Capital (PCC)
Lincoln Gakiya 263

Organizações silenciosas
Guaracy Mingardi 279

4. Hooliganismo 289

Violência em grandes eventos no Brasil:


os estrangeiros devem se preocupar?
Marcelo Muscogliati 291

Stanley Cup Riot Investigation


Caedmon Nash 299

B.C.'s Prosecution Service – Report on the 2011


Vancouver Stanley Cup Riot Prosecutions
Vancouver Riot Prosecution Team e
British Columbia Prosecution Service 311

Prosecution policy for football related offences


Association of Chief Police Officers e
Crown Prosecution Service 333
Investigating and prosecuting football
related violence and disorder
United Kingdom Football Policing Unit,
Association of Chief Police Officers e
Crown Prosecution Service 335

Sobre os autores 349


Palavras introdutórias
Terrorismo e situações de emergência:
teoria e prática da prevenção e do combate

O trabalho que ora se apresenta ao brasileiro, há contribuições do Exército,


grande público é o resultado de seminário Ministério Público Federal, Ministério Público
internacional havido em Brasília, em abril de do Estado de São Paulo, Secretaria de Justiça
2014, que reuniu os maiores especialistas e do Estado do Rio de Janeiro e Departamento de
atores nacionais e internacionais nos temas Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica
de terrorismo e violência em demonstrações Internacional do Ministério da Justiça.
públicas e no esporte.
Considero extremamente oportuna esta
Gostaria, inicialmente, de agradecer à publicação de iniciativa da Escola Superior
Secretaria de Cooperação Jurídica Internacional do Ministério Público da União, que objetiva
e à 2ª Câmara de Coordenação e Revisão pelos capacitar-nos para o enfrentamento dos
esforços na viabilização desse importante fenômenos modernos de criminalidade, como
seminário. Congratulo, igualmente, a iniciativa o terrorismo e a violência em manifestações
do Subprocurador-Geral da República Carlos públicas, cujas figuras típicas merecem
Eduardo Vasconcelos que, sensibilizado melhores contornos.
pela atualidade do tema, mormente em
razão da proximidade de grandes eventos Embora possamos considerar o Brasil
internacionais em solo brasileiro, não mediu um país pacífico, não devemos fechar os
esforços para a concretização desse relevante olhos para a realidade hoje vivida em plano
debate institucional. mundial. Mais do que nunca, temos certeza
de que os efeitos da globalização e a
Expresso igual agradecimento aos virtualização das relações tornaram qualquer
apoiadores do evento, à Associação Nacional país do globo vulnerável a possíveis atos
dos Procuradores da República, à Associação terroristas. Mesmo que novo o fenômeno
Internacional de Procuradores, à Embaixada em solo nacional, urge a adoção de medidas
da França, na pessoa de sua magistrada de multilaterais que venham a minimizar o risco
ligação Carla Fontinha, e à Escola Superior do da ocorrência nefasta desses crimes.
Ministério Público da União. Esta última agora
empresta o prestígio e a qualidade de seus Não temos dúvida quanto à complexidade
trabalhos na edição deste volume. dos fundamentos que animam as ações
terroristas, arraigadas no radicalismo político,
Os artigos aqui publicados incluem econômico, social, cultural e religioso,
contribuições de especialistas de países como perpetradas de forma errática quanto a local
Alemanha, Canadá, Espanha, Estados Unidos, e tempo. As raízes antigas e imbricadas do
Reino Unido, Irlanda, Itália e França. Do lado fenômeno, contudo, não podem ser capazes

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TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

de intimidar os Estados democráticos e sua Não podemos minimizar a importância da


população de bem, tornando-os eternos reféns experiência de diversos países do hemisfério
da insanidade criminosa fundamentalista. norte no combate ao terrorismo, nos quais
o debate acerca do tema se encontra em
Com efeito, a luta eficaz contra o terrorismo estágio avançado. Devemos reconhecer, nesse
requer atuação estatal coordenada. Por ser contexto, que ainda são tímidos os avanços
um fenômeno mundial, tem-se que várias são legislativos nos países de nosso continente em
as obrigações impostas internacionalmente relação a tão atual forma de criminalidade.
aos Estados no sentido de promover a
prevenção, a repressão e a punição dos atos Tenho que a escolha dos caminhos a serem
terroristas. seguidos depende do grau de profundidade
em que conhecemos o fenômeno. Portanto,
A complexidade da questão mereceu está a depender de nós a sinalização quanto
tratamento legislativo específico no âmbito à necessidade de dotarmos nossos países de
nacional, dotando os órgãos de controle, instrumentos legais que nos municiem nessa
persecução, acusação e julgamento de regras luta.
capazes de nortear a atuação estatal nas
ações conjuntas de combate ao terrorismo. Por fim, rápidas palavras em relação
às manifestações de rua ocorridas em solo
Ao lado da normatização interna, faz- nacional em junho de 2013.
se mister o aprofundamento da cooperação
internacional, unindo numa só teia de defesa O grau de democracia a que chegamos é
os esforços e os resultados positivos atingidos suficiente para entendermos que a liberdade
por cada Estado soberano no incremento da de expressão é princípio constitucional caro
luta antiterrorista. à cidadania. Insurgir-se faz parte do jogo
democrático. Nesse contexto, o Estado tem o
Reafirmo que o êxito nessa empreitada dever de garantir a segurança de todo aquele
está diretamente relacionado à nossa que deseja externar suas convicções, sejam
capacidade de promover a cooperação de que natureza for. Trata-se de forma de
multilateral entre os Estados. Por ostentarem manifestação direta da democracia.
características aparentemente lícitas, penso
que o enrijecimento do controle dos fluxos de Tal direito, contudo, não se confunde
recursos de origem não identificada se impõe, com alguns episódios ocorridos à época
dificultando-se o financiamento dos núcleos em diversos estados brasileiros, nos quais
terroristas. extrapolados os limites do direito à liberdade
de expressão. A infiltração de grupos radicais,
Destaco, ainda, a necessidade do fomento nitidamente motivados a depredações e
da formação de bancos de dados comuns à prática de violência física, desnatura a
entre os Estados, viabilizando o cruzamento beleza dos movimentos sociais, devendo
de informações acerca de possíveis núcleos ser peremptoriamente repelida pelo Estado,
terroristas no âmbito de cada país. o que passa, igualmente, pelo repensar

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TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

da tipificação legal das condutas delitivas Desejo a todos uma leitura inspiradora,
perpetradas. conclamando-os a difundir os resultados no
âmbito da atuação profissional de cada um.
As contribuições estampadas nesta
coletânea também objetivam dar um passo RODRIGO JANOT MONTEIRO DE BARROS
à frente na capacitação dos diversos atores Subprocurador-Geral da República
jurídicos, de nível federal ou estadual, na luta
contra tais formas modernas de criminalidade.

13
Apresentação

Vem a lume mais uma publicação da Escola por facções criminosas, que não raro têm
Superior do Ministério Público da União, desta colocado grandes cidades brasileiras em
feita abordando os temas do terrorismo e estado de pânico.
outras situações de alarme social, como a
violência em grandes eventos esportivos e Atos de terrorismo tanto podem ser
em torno de manifestações públicas. Fruto utilizados pelo Estado, ou pelo detentor do
principalmente do Seminário havido em poder para intimidar a população, como pelos
2014 com a participação de reconhecidos e que se sentem oprimidos ou injustiçados como
respeitados estudiosos dos temas, teve como reação ao poder dominante, podendo também
coordenador o Professor Subprocurador-Geral ser fomentados por Estados beligerantes
da República Carlos Eduardo Vasconcelos, no âmbito do Estado adversário. Veja-se por
Mestre em Direito e Estado pela UnB, também exemplo a guerrilha Kurda na Turquia, no Iraque
conhecedor e dedicado estudioso do assunto, e no Irã, a qual recebia apoio do respectivo
e que agora se encarrega de coordenar esta Estado beligerante contra o país em que se
publicação. encontrava localizada. Massoud Barzani pode
ser também um caso emblemático, perseguido
O Seminário organizado e presidido pelo por Sadam Hussein, tratado como criminoso,
Professor Carlos Eduardo em 2014 e que contou liderou os curdos contra Baghdad, e hoje é
com o apoio de órgãos do MPF e com relevante reconhecido como estadista.
colaboração da Embaixada da França, da ESMPU
e da ANPR, entre outros, serviu para a troca O rebelde minoritário, que reage ao
de informações e ideias entre autoridades mais forte e utiliza a tática de guerrilha
brasileiras e estrangeiras em torno da matéria, ou sabotagens, pode ser classificado
além de abordar o assunto também, mas não pelo Estado ou por aquele que está em
só, do ponto de vista acadêmico. superioridade como terrorista, por não estar
sob o manto formal da guerra declarada
O terrorismo permite múltiplas abordagens oficialmente contra adversários com tropas
e pode ser visto sob diversos ângulos e sempre regulares, uniformizadas e sob uma bandeira
de alguma forma procura uma justificativa para reconhecida.
as suas ações. Mesmo o termo não é de fácil
conceituação, vai desde o ataque a alvos civis No Brasil, Robert Southey, na sua clássica
à guerrilha contra alvos militares. A dificuldade História do Brasil, relata os feitos dos brasileiros
conceitual recomendou a abordagem conjunta durante anos de resistência à ocupação
de fenômenos frequentemente rotulados de holandesa, em que se mesclaram ações de
terrorismo, inclusive a violência desencadeada guerrilha, escaramuças e combates com forças

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TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

regulares, aquelas em algumas circunstâncias O estudo do terrorismo é na verdade


eventualmente seriam classificadas hoje como uma das faces do estudo da violência como
ações de terrorismo. forma de solução de conflitos. Se a busca da
paz e o combate à violência hão de ser uma
É interessante notar como, embora no prioridade em qualquer organização social,
terrorismo haja um núcleo conceitual comum não menos prioridade haverá de ter o estudo
a muitos estudiosos, há um outro aspecto das causas da violência. Ao fim e ao cabo,
circunstancial que o torna de difícil estudo. após perpassarem-se os aspectos políticos,
É clássico o exemplo de Yasser Arafat, líder econômicos e sociológicos, haverá de se chegar
da Autoridade Palestina, presidente (de 1969 à questão ética e moral do uso da violência, à
a 2004) da Organização para a Libertação questão da chamada “guerra justa” e à Lei de
da Palestina (OLP), líder da Fatah, a maior Talião.
das facções da OLP, e codetentor do Prêmio
Nobel da Paz. Arafat, na década de 1960, era Certamente, numa das pontas dessas
visto e reconhecido como líder guerrilheiro causas, está o orgulho humano, que muitos
e terrorista, não só por Israel e seus aliados se olvidam de enxergar. Nas palavras do Papa
como pela maior parte do Ocidente. Francisco, é necessário “não cedermos ao
orgulho que alimenta a violência e as guerras,
Esse aparente relativismo nós o mas termos a coragem humilde do perdão e da
encontramos em várias partes do mundo e paz”.
momentos da história: a resistência francesa
aos nazistas na II Guerra era vista por estes Essas recomendações valem também para
como terrorismo, não obstante o terror as demais formas de violência estudadas neste
espalhado pela Gestapo; lembremo-nos livro: aquela em torno do esporte, a que se
também dos partisans, da resistência italiana aproveita das manifestações públicas e aquela
– todos que, ao final, tornaram-se vencedores. desencadeada pelas facções criminosas.

Na década de 1960, foram inúmeros os Parabenizo o Professor Carlos Eduardo


grupos guerrilheiros que praticavam atos por mais esta iniciativa e todos os que se
terroristas. Se alguns se acabaram ou foram dispuseram a colaborar nesta obra, que
tratados como criminosos, como o Baader- certamente haverá de dar bons frutos nos
Meinhof, outros como o IRA, na Irlanda, apesar meios jurídicos e entre aqueles que se dedicam
de tratados como terroristas mas acabaram ao estudo das tormentosas questões aqui
por ter reconhecimento oficial, enquanto o tratadas.
ETA, no País Basco, perdeu força após aquela
região da Espanha obter razoável autonomia. JOSÉ BONIFÁCIO BORGES DE ANDRADA

Modernamente, temos os grupos islâmicos Subprocurador-Geral da República


de vários matizes, alguns tratados como Coordenador da 2ª Câmara
terroristas. Mais tarde, como registra a história, de Coordenação e Revisão
alguns acabarão por ter reconhecimento
oficial, enquanto outros se extinguirão.

16
Introdução

A atualidade dos temas que conformam este República, da Secretaria de Cooperação Jurídica
volume dispensa demonstração. O terrorismo Internacional, da 2ª Câmara de Coordenação e
é um dos problemas mais recorrentes nas Revisão (2ª CCR) – especializada em matéria
relações internacionais contemporâneas. criminal – e da Escola Superior do Ministério
Embora tenha poupado o Brasil até o presente, Público da União (ESMPU), com as importantes
não garante imunidade a nosso território, colaborações da Embaixada da França e
especialmente quando este passa a ser palco de da Associação Nacional dos Procuradores
grandes eventos internacionais, como a visita da República (ANPR) e o honroso apoio da
do Papa, a Copa das Confederações, a Copa do International Association of Prosecutors
Mundo de Futebol, e agora os Jogos Olímpicos. (IAP), entidade que congrega membros do
A violência das facções criminosas, não poucas Ministério Público em âmbito mundial, fez
vezes gerenciada a partir do interior dos realizar em Brasília memorável evento que
estabelecimentos prisionais, frequentemente reuniu especialistas nacionais e internacionais
é confundida com o primeiro ou a ele nesses quatro temas. O auditório constituiu-se
equiparada como reforço de argumentação, predominantemente de membros do MPF, com
mas logo se verá que a comparação não é útil prioridade para aqueles que atuavam nas doze
nem necessária. A violência nas manifestações capitais que sediariam jogos da Copa do Mundo,
públicas, geralmente pacíficas, converteu-se mas incluiu também membros do Ministério
num grave problema de segurança pública Público Militar (MPM), do Ministério Público
e ao mesmo tempo de garantia da liberdade do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e de
de manifestação do pensamento a partir das MPs estaduais; policiais federais e estaduais,
grandes demonstrações ocorridas em junho civis e militares; oficiais das Forças Armadas;
de 2013 nas grandes cidades do País. E o membros de serviços de inteligência diversos;
hooliganismo ou a violência no contexto de auditores da Receita Federal; enfim, um
grandes eventos esportivos tem experimentado público altamente especializado e diretamente
uma escalada nos últimos anos, tanto na interessado nos assuntos a serem discutidos.
quantidade quanto na brutalidade dos atos, Como não se tratou de evento meramente
afugentando famílias e pessoas pacíficas acadêmico, a ocasião serviu também para a
dos estádios, sem que as autoridades da aproximação e o intercâmbio de experiências
segurança pública tenham apresentado uma entre autoridades brasileiras responsáveis
resposta adequada, até porque o tema é pouco pela segurança dos grandes eventos e entre
estudado no Brasil. estas e seus homólogos estrangeiros.

Em abril de 2014, pouco antes da Copa do A ideia deste livro surgiu desse seminário
Mundo de Futebol, o Ministério Público Federal internacional, embora dele não seja uma mera
(MPF), por meio da Procuradoria-Geral da coletânea. A inspiração veio da percepção

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TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

de que os conhecimentos, experiências e de textos jurídicos, segundo experiências


técnicas então compartilhados mereciam ser anteriores, quase sempre é insatisfatória
disponibilizados a um público mais amplo, e até mesmo incompreensível (além de
considerando a pouca experiência brasileira extremamente cara), reclamando revisões
com esses fenômenos. Como os artigos aqui que correspondem quase a novo trabalho
publicados não são uma reprodução fiel do de tradução, para o qual não haveria tempo
seminário, algumas outras contribuições nem profissionais habilitados. Frente a essa
pertinentes foram agregadas. dificuldade, pensamos também que as pessoas
que lidam profissionalmente com as questões
No seu conjunto, esta obra reúne, decerto aqui estudadas dominem pelo menos a leitura
em formato compacto, o que há de melhor e útil de uma ou duas dessas línguas. Contamos,
mais atual em produção jurídica, criminológica pois, com a compreensão dos leitores para
e de experiência prática sobre os fenômenos essa opção.
aqui estudados, o que a torna vocacionada a
despertar o interesse do público especializado Passo a uma breve apresentação dos
a que se destina, de jornalistas a policiais e artigos, cuja disposição pode ser rapidamente
oficiais de inteligência, de juristas e legisladores percebida a partir de um lance de vista sobre
a presidentes de torcidas organizadas, de o índice.
membros do Ministério Público a líderes de
movimentos sociais. Só essa expectativa já O primeiro capítulo – Terrorismo e
justifica sua publicação pela Escola Superior Distinções Necessárias – possui o maior
do Ministério Público da União, em mais número de contribuições, até mesmo por ser o
uma iniciativa de difundir conhecimento principal alvo de reflexão desta obra, pelo que
sobre temas que dizem respeito às funções foi subdividido em cinco subcapítulos, a saber:
institucionais do Ministério Público. “Tentativas de Conceituação”, “Legislação”,
“Experiências”, “Instituições e Instrumentos” e
Os temas aqui tratados despertam paixões, “Cooperação Internacional”.
por vezes exacerbadas. A obra mantém um
compromisso com o pluralismo de ideias, Dois artigos foram agrupados sob a primeira
o que vai permitir notáveis divergências de rubrica deste capítulo: o primeiro deles –
opiniões, a começar pelo que se entende pelo Terrorismo e outras situações de emergência
fenômeno do terrorismo, apenas para ficar no no Brasil: desafios para o Ministério Público
exemplo mais emblemático. Por isso mesmo, Federal – busca precisamente extremar os
os artigos não expressam um pensamento quatro fenômenos aqui tratados, ao tempo em
oficial do Ministério Público Federal, a não que arrisca uma possível missão do MPF na
ser no aspecto de que nenhum deles defende coordenação de esforços para lidar com eles.
soluções fora do Estado Democrático de
Direito. O segundo artigo – Welcome to Absurdistan
– Bem-vindo ao Absurdistão – é da autoria do
Cabe-me uma palavra sobre as razões de professor Mark Zöller, da Universidade de Trier,
não termos traduzido os textos em inglês, certamente uma das maiores autoridades na
espanhol e francês. A tradução profissional Alemanha e no mundo em tema de terrorismo.

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TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

O texto está publicado em centenária revista aponta as dificuldades dos vários critérios de
jurídica alemã e foi traduzido ao inglês pelo definição utilizados e questiona a existência e
próprio autor especialmente para figurar o alcance de uma obrigação internacional do
nesta coletânea. Ele empreende uma crítica Estado brasileiro de criminalizar o fenômeno.
à reforma dos crimes de terrorismo de 2009
– Gesetz zur Verfolgung der Vorbereitung O então Senador da República Pedro
schwerer staatsgefährdender Gewalttaten Taques, atual Governador do Estado de Mato
(GVVG) – e, para isso, promove ampla discussão Grosso, traz sua experiência de ex-membro
sobre o conceito de terrorismo ao longo do do Ministério Público Federal atuante na
tempo, apontando a existência de mais de área do crime organizado e grande referência
uma centena de definições na doutrina e nas no Senado em questões penais, onde foi o
legislações, assim como mutações no próprio relator de projeto de Código Penal, e discorre
fenômeno conforme este ocorria no século sobre os vários projetos de lei em tramitação,
passado e no atual. Apesar de concordar com que buscavam tipificar o terrorismo e seu
toda a doutrina sobre a inconveniência da financiamento no ordenamento jurídico
multiplicação de crimes de perigo abstrato nacional, e as perspectivas de êxito de cada
na legislação penal, vê alguma vantagem de um deles.
tal expediente no caso do terrorismo, porque
permite a judicialização do fato, ao passo O Procurador-Chefe da Audiência Nacional
que a retirada do Direito Penal significaria da Espanha Javier-Alberto Zaragoza Aguado
entregar o terreno exclusivamente a órgãos enriquece esta obra com duas contribuições.
de inteligência, soluções militares e outras Na primeira, intitulada Tratamiento penal,
que não contam com as garantias do devido procesal y penitenciario de los delitos de
processo legal. terrorismo, expõe e analisa a legislação
espanhola sobre o tema, tida como uma
Sob a rubrica “Legislação”, temos quatro das mais completas do mundo, e põe-na em
contribuições. A tipificação de crimes confronto com o quadro normativo da União
terroristas, da autoria de Sven Peterke, Europeia e internacional.
professor de Direito Internacional da
Universidade Federal da Paraíba e membro De minha autoria, acrescido de última
do Instituto de Direito Humanitário e da hora, trago umas primeiras reflexões sobre
Paz da Universidade de Bochum, Alemanha, a Lei Brasileira Antiterrorismo, intitulada O
valendo-se do PLS n. 499/2013, que tramitou terrorista como legislador.
no Congresso Nacional antes da aprovação
da Lei n. 13.260/2016, a lei brasileira do Na rubrica “Experiências”, relatam-se casos
terrorismo, visita as soluções legislativas dos concretos de dois países alvos frequentes do
direitos comparado e internacional para os terrorismo internacional – França e Espanha
tipos terrorismo, associação para o terrorismo, –, apresentados por agentes públicos que
financiamento do terrorismo e incitação ao participaram das respectivas apurações ou
terrorismo. Ao sustentar que terrorismo é, na dos processos. Aqui vem o segundo trabalho
verdade, uma estratégia de comunicação, mais do Procurador-Chefe da Audiência Nacional
que um campo da criminalidade, o professor Javier-Alberto Zaragoza Aguado, Atentados

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TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

terroristas del 11-M en Madrid – Sumario 20/04 Prosecutors (IAP), The changing role of
del Juzgado Central de Instrucción N. 6 (una the Prosecutor in counter terrorism since
visión judicial del caso), sobre o tristemente September 11 – Modificações na missão do
célebre atentado à estação de metrô Atocha, Ministério Público no contraterrorismo desde
no qual narra os episódios e sua elucidação até o 11 de setembro –, advoga uma atuação
a execução das penas, sublinhando a eficiência compromissada com o Estado de Direito e
do sistema jurídico, da polícia e dos tribunais os Direitos Humanos, também buscando
em fazer funcionar o Estado de Direito sem reduzir a compreensível histeria coletiva que
lançar mão de leis ou medidas de exceção. se segue a atentados geradores de grande
comoção social. Noutros termos, o agente do
A contribuição francesa para esta Ministério Público é o depositário de um voto
rubrica vem de Ludovic Lestel, substituto do de confiança da população que demonstre
Procurador da República perante o Tribunal que os instrumentos do Estado de Direito são
de Grande Instância de Paris, com o título suficientes e que soluções de exceção podem
Lutte contre le terrorisme: enquêtes et leçons e devem ser descartadas.
apprises – les nouvelles formes de djihad
– Luta contra o terrorismo: investigações e O texto seguinte é de autoria de Brian
lições aprendidas – novas formas de jihad. Saunders, chefe do Ministério Público
Segundo o autor, a França fez uma clara opção Federal no Canadá. Em outubro de 2014,
pelo tratamento judiciário do terrorismo, ocorreu um atentado terrorista no entorno
renunciando expressamente ao tratamento do parlamento canadense em Ottawa,
militar. Portanto, não há uma “guerra”, e prontamente controlado pelas autoridades
sim uma luta contra o terrorismo. Também policiais. Dias depois, Saunders foi convocado
nos informa que, na legislação francesa, o à Comissão Permanente do Senado para
terrorismo não é um crime como tal definido, Segurança Nacional e Defesa a fim de prestar
mas uma circunstância agravante, um motivo esclarecimentos. Em brevíssima porém precisa
especial que se agrega a certos tipos penais alocução, ele explica a distribuição legal de
mais graves. Trata-se de um relevante critério tarefas da Real Polícia Montada, do MP Federal,
de criminalizar o terrorismo, como outros das jurisdições estaduais e até mesmo do
autores desta coletânea já terão demonstrado Advogado-Geral do Estado na repressão ao
nas rubricas anteriores. terrorismo. O texto de sua fala, Remarks to
the Standing Senate Committee on National
No subcapítulo “Instituições e Security and Defense, foi gentilmente cedido
Instrumentos” relacionados ao terrorismo, pelo autor para esta publicação.
agrupamos seis artigos, três dos quais alusivos
à instituição Ministério Público de diferentes Do Canadá passamos à República da
países e seu papel diante do terrorismo. Irlanda, país com uma experiência em
terrorismo diversa daquele de inspiração
O artigo de Elizabeth Howe, Procuradora- islâmica, de onde Liam Mulholland nos
Chefe da Coroa para a Inglaterra e Gales, traz interessante relato sobre uma Special
na ocasião cedida para o cargo de Diretora Criminal Court, competente exclusivamente
Jurídica da International Association of para o julgamento de terrorismo e crime

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TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

organizado. Apesar de algumas características potencial que tem de desestabilizar as ins-


criticáveis, como a possibilidade de elaborar tituições. Sua principal mensagem, depois
seu próprio procedimento, e alguns aspectos de discorrer sobre a doutrina do Exército na
que a aproximam de um tribunal temporário, prevenção e no combate do terrorismo em
diz o autor que essa instituição já passou suas quatro abordagens – antiterrorismo,
pela chancela da Corte Europeia de Direitos contraterrorismo, atividades de inteligência e
Humanos. gerenciamento das consequências –, é de que
haja mais integração entre as várias agências
José Carlos Martins da Cunha, do nacionais incumbidas dessas atividades, de
Departamento de Contraterrorismo da Agência modo a capacitá-las a realizar “operações in-
Brasileira de Inteligência, em seu artigo A teragências”.
atividade de prevenção ao terrorismo e os
Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016, Também do Exército, mas trazendo outro
expõe resumidamente o trabalho da Agência enfoque, o Coronel Alan Denilson Lima Costa,
Brasileira de Inteligência (ABIN) na atividade do Centro de Defesa Cibernética do Exército
de prevenção ao terrorismo, que tem caráter (CDCiber), aborda em Ciberterrorismo o uso da
permanente, e não apenas em ocasiões Internet pelo terrorismo para recrutamento,
de grandes eventos, compreendendo a proselitismo, arrecadação de contribuições,
identificação e o acompanhamento de pessoas incitamento ao ódio e à violência, treinamento,
ou grupos ligados a organizações terroristas inteligência, operações psicológicas e, no que
que operem no território nacional. No final do mais diz respeito ao CDCiber, desestabilização
artigo, há uma listagem de ações desenvolvidas de sistemas sensíveis ou estratégicos.
pela ABIN para prevenir o terrorismo, o que é
particularmente interessante, considerando A última rubrica do primeiro capítulo,
o pouco conhecimento, e até um certo dedicada à “Cooperação Internacional”
preconceito, que a sociedade brasileira ainda no combate ao terrorismo, traz duas
nutre em relação à atividade de inteligência. contribuições de especialistas, por dever
Nenhum Estado Democrático pode prescindir de ofício diuturnamente atualizados com o
de um serviço de inteligência, e o Estado estado da arte no Brasil. O artigo de Ricardo
brasileiro perde muito por não prestigiar Andrade Saadi, Diretor do Departamento de
sua agência e dotá-la de instrumentos, Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica
inclusive legislativos, que lhe permitam mais Internacional do Ministério da Justiça (DRCI),
desenvoltura em suas atividades. intitulado O terrorismo e a cooperação
internacional, aborda a cooperação
O Tenente-Coronel Laurence Alexandre internacional no combate ao terrorismo
Xavier Moreira, especialista em inteligência, e ao crime organizado, notadamente o
guerra assimétrica e antiterrorismo, traz a financiamento do primeiro, focalizando os
visão das Forças Armadas para a discussão, instrumentos de cooperação à disposição
a qual não podia faltar, considerando que o do Brasil no âmbito policial e do Ministério
terrorismo, por suas características multifa- Público. Em seu texto O terrorismo no Direito
cetárias, sempre será um problema de crimi- Internacional e comparado, Vladimir Aras,
nalidade e também de defesa nacional pelo Procurador Regional da República, Secretário

21
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

de Cooperação Internacional do Ministério investigador e seus conhecimentos sobre as


Público Federal e professor de Processo Penal ramificações dos grupos anarquistas italianos
da Universidade Federal da Bahia, detém- com seus congêneres gregos, espanhóis e
se nas normas internacionais de combate de outras partes do mundo, tudo a indicar
ao terrorismo, nas obrigações assumidas que o vandalismo verificado no rastro das
pelo Brasil em tratados internacionais, nas demonstrações públicas no Brasil nada mais é
recomendações do Grupo de Ação Financeira do que criminalidade comum.
Internacional (GAFI) concernentes à lavagem de
dinheiro e ao terrorismo, e analisa os projetos O então Secretário de Justiça do Estado
de lei então em debate no Parlamento. do Rio de Janeiro José Mariano Benincá Bel-
trame, com a conhecida experiência e a folha
Em quatro artigos, o segundo capítulo – de serviços que o tornaram um dos policiais
Manifestações Públicas – trata da violência mais conhecidos do País, compartilha com os
à margem ou no rastro de manifestações leitores suas propostas legislativas, elabora-
públicas geralmente pacíficas, como as que das por uma equipe de juristas e especialistas
ocorreram no Brasil em junho de 2013. em segurança pública, para dotar o Estado de
instrumentos mais adequados para lidar com a
André de Carvalho Ramos, Procurador violência nas demonstrações públicas e assim
Regional da República e professor de evitar arbitrariedades. É comum e justificado
Direito Internacional, Direitos Humanos e ouvir falar da violência policial. No entanto, o
livre docente da Universidade de São Paulo, texto mostra o outro lado, isto é, as dificulda-
apresenta no artigo Situações de emergência e des legais com que deparam os agentes da lei
Direitos Humanos: o uso da tortura por Estados e da ordem no trabalho de assegurar o direito
Democráticos uma importante contribuição, constitucional à livre manifestação do pensa-
que a rigor serviria de pano de fundo também mento e ao mesmo tempo preservar a ordem
nos demais capítulos. Trata da “cultura da pública.
tortura” nos Estados Democráticos, uma
espécie de tortura light ou emergencial, que José Robalinho Cavalcanti, Procurador
ele também chama de “tortura liberal”, mas Regional da República e atual Presidente
adverte que nem esse tipo de tratamento da Associação Nacional dos Procuradores
é endossado pelos tratados internacionais da República, traz contribuição intitulada
alusivos à tortura e ao tratamento desumano, Vandalismo, terrorismo e os dilemas e
cruel ou degradante. contradições do debate sobre a tipificação
penal no Brasil – uma visão do Ministério
Segue-se o trabalho de Pierandrea Taurelli Público brasileiro, na qual traça distinções
Salimbeni, da Direção Central de Polícia de entre o vandalismo de demonstrações
Prevenção de Roma, Itália, que traz artigo públicas e movimentos sociais, de um lado,
intitulado Federazione Anarchica Informale e o terrorismo, de outro; faz comparações
(FAI): o fenômeno do anarcoinsurrezionalismo com tipos penais previstos na velha Lei de
ou o terrorismo “do bem”. No texto, o Segurança Nacional, mas também questiona
autor relata sua experiência prática como a restrição do conceito de terrorismo a

22
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

motivações estritamente políticas, excluindo de associações criminosas corriqueiras, antes


o lucro, a exemplo dos atos das facções denominadas quadrilhas. Concorda com boa
criminosas. parte de estudiosos do meio jurídico, segundo
os quais em todas as organizações criminosas
O terceiro capítulo cuida da violência perenes existe algum vínculo com a máquina
das Facções Criminosas em dois excelentes do Estado. Propõe classificações. E discute
artigos ofertados por grandes especialistas se realmente existe uma “ideologia” entre
brasileiros. A discussão é necessária, pois não as facções criminosas brasileiras, como elas
poucas vezes essas manifestações têm sido proclamam em seus documentos e palavras
rotuladas de terrorismo por gestores públicos de ordem.
impotentes para coibi-las.
O quarto e último capítulo trata do
O Promotor de Justiça do Ministério Público Hooliganismo ou da violência no contexto de
de São Paulo Lincoln Gakiya é certamente grandes eventos esportivos, um fenômeno
o maior especialista sobre a estrutura e muito frequente mas pouco estudado no
o funcionamento do PCC, fruto de longos Brasil, sobre o qual trazemos contribuições do
anos de investigações e análises. Seu artigo, Canadá, Reino Unido e Brasil.
intitulado Gênese e evolução da organização
criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), Com o sugestivo título Violência em
promove uma revisão histórica do surgimento grandes eventos no Brasil: estrangeiros
dessa importante facção, presente em todos devem se preocupar?, Marcelo Muscogliati,
os estados da federação e em pelo menos Subprocurador-Geral da República, põe a
dois países sul-americanos, suas ações mais violência nos eventos esportivos no contexto
espetaculares ao longo dos anos, e chega da violência geral no Brasil e do sistema
ao ponto de elaborar um organograma de de justiça, evocando conceitos da teoria
sua complexa estrutura hierárquica. Discute econômica do Direito, que sugere que os
também e toma posição quanto à controvérsia benefícios superam os custos da violência no
sobre qualificar as atuações do PCC como atos Brasil. Contudo, também observa que houve um
de terrorismo. sensível declínio da violência durante a Copa
do Mundo de Futebol, que ele atribui à melhor
O renomado cientista político Guaracy coordenação entre as agências e instituições
Mingardi, pioneiro no estudo do crime encarregadas da segurança pública.
organizado no Brasil, Coordenador do Fórum
Brasileiro de Segurança Pública, oferece uma As duas contribuições do Canadá para
preciosa síntese de suas reflexões sobre as este capítulo vêm da cidade de Vancouver e
organizações criminosas de uma perspectiva se referem aos atos de vandalismo ocorridos
sociológica em seu trabalho Organizações por ocasião do jogo final da Copa Stanley
silenciosas. Esclarece que a maioria das de hockey, de 15 de junho de 2011, em que a
organizações criminosas atuantes no Brasil equipe local foi derrotada pela de Boston. O
nasceu nas prisões. Procura isolar suas primeiro trabalho, intitulado Stanley Cup Riot
características essenciais para distingui-las Investigation, é da autoria de Caedmon Nash,

23
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

do grupo de trabalho contra vandalismo da A primeira contribuição do Reino Unido


Polícia de Vancouver, e contém um relato da neste capítulo vem da Associação de Chefes
maior investigação dessa natureza na história de Polícia (ACPO) e do Serviço de Persecução
canadense, lembrando que os acontecimentos Penal da Coroa (CPS), que elaboraram uma
geraram prejuízos de mais de 3 milhões de Prosecution Policy for Football Related
dólares ao patrimônio de empresas, indivíduos, Offenses – Política de persecução penal para
polícia e corpo de bombeiros. O aspecto mais infrações relacionadas ao futebol. Entre 1985
impressionante dessa investigação é que ela e 1990, os clubes ingleses foram banidos do
foi em sua maior parte conduzida com base em futebol europeu devido a atos de vandalismo
milhares de horas de fotos e vídeos fornecidos ocorridos numa final da Eurocopa em Bruxelas
pela própria população, em resposta a entre o Liverpool e o Juventus. A partir disso,
chamamento público das autoridades. O texto a Inglaterra desenvolveu a legislação mais
é de 2014, quando parte das investigações e avançada e eficaz no combate à violência no
dos processos criminais ainda estava em curso. esporte, à homofobia, aos refrãos racistas ou
discriminatórios e a toda sorte de crimes de
O segundo trabalho é de 2016 e consiste ódio nos estádios, contando com o auxílio dos
num Relatório das persecuções penais do clubes, das torcidas organizadas e da população
vandalismo da Copa Stanley em Vancouver em geral. A síntese dessa política é que há
em 2011, preparado pelo Ministério Público uma presunção de investigação e persecução
da Província da Colúmbia Britânica, com o para cada ato de violência no futebol onde
propósito, entre outros, de permitir uma melhor quer que aconteça, que compreende sanções
compreensão da mecânica da persecução penais mas também ordens de banimento de
penal dependente de vídeo e fotografia estádios.
como provas principais. O relatório faz uma
minuciosa comparação com as apurações das A outra contribuição britânica intitula-
desordens ocorridas em Londres em agosto se Investigating and prosecuting football
do mesmo ano, com quatro dias de duração, related violence and disorder – Investigando
e sublinha o grau de preparo da Polícia de e processando violência e desordem
Vancouver, a ponto de merecer elogios de relacionada ao futebol –, um minucioso “passo
entidades de direitos humanos, como a a passo” da investigação e persecução penal
Associação de Liberdades Civis da Colúmbia de atos de violência no futebol, elaborado
Britânica. A quantidade de processados e em conjunto pela Unidade de Policiamento
condenados, segundo o relatório, teve o efeito do Futebol do Reino Unido (UKFPU), pela
de desencorajar vândalos que se aproveitam do Associação dos Chefes de Polícia (ACPO) e pelo
anonimato das multidões. Atualmente, convém Serviço de Persecução Penal da Coroa (CPS),
que se diga, a polícia e o Ministério Público de desde o flagrante ou da delegacia de polícia
Vancouver aproveitaram a experiência dos até o julgamento.
profissionais que atuaram nesse episódio para
criar uma equipe permanente especializada Neste ponto, cumpro com satisfação o
em vandalismo. dever de agradecer a todas as instituições e

24
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

pessoas que tornaram possível a concretização Nacional dos Procuradores da República, na


do projeto desta obra coletiva. Ciente do risco pessoa de seu Presidente, José Robalinho
de negligenciar algum nome, pelo que já Cavalcanti; à Embaixada da França, na pessoa
peço desculpas, agradeço especialmente à 2ª de sua então Magistrada de Ligação, Carla
Câmara de Coordenação e Revisão, na pessoa de Deveille-Fontinha; a Elizabeth Howe, General
sua então Coordenadora, a atual Procuradora- Counsel da International Association of
Geral da República, Raquel Ferreira Dodge, o Prosecutors; e, ainda, por vários tipos de apoio,
apoio prestado ao seminário internacional a Nicola Mahaffy, Crown Counsel do Ministério
desde a primeira hora; igualmente, ao então Público da Colúmbia Britânica, e a Marcelo
Secretário de Cooperação Internacional do MPF, Weitzel Rabello, então Procurador-Geral da
Vladimir Aras, que mobilizou toda a logística da Justiça Militar.
SCI para que a organização saísse impecável;
e ao Diretor-Geral da ESMPU Carlos Henrique Brasília, março de 2018.
Martins Lima, por seu apoio permanente para
que este livro pudesse circular. Às entidades CARLOS EDUARDO DE OLIVEIRA VASCONCELOS
que apoiaram o seminário internacional e/ou Subprocurador-Geral da República
a edição desta obra, a saber: à Associação

25
1. TERRORISMO E
DISTINÇÕES NECESSÁRIAS
Terrorismo e outras situações de emergência
no Brasil: desafios para o Ministério Público Federal

CARLOS EDUARDO DE OLIVEIRA VASCONCELOS coordenar, entre várias instituições públicas e


Subprocurador-Geral da República privadas, além de instituições científicas, que
se ocupam dos fenômenos, o esforço para a
formulação de uma política e uma estratégia
nacional de prevenção e gestão do terrorismo
Resumo e das situações de emergência.

Este ensaio discorre sobre quatro tipos de


emergências que costumam equivocadamente Introdução
ser rotuladas de “terrorismo”, e tenta extremá-
las na convicção de que reclamam soluções
diferenciadas. Em seguida, apresenta algumas Há pelo menos quatro espécies de
ideias em torno dos desafios que as situações manifestações de violência que costumam
de emergência levantam para o Estado e a ser evocadas indistintamente quando se
sociedade brasileira, notadamente ao ensejo fala de terrorismo no Brasil: o terrorismo
de grandes eventos esportivos internacionais, internacional, os atos de violência deflagrados
a exemplo da Copa do Mundo de Futebol da por facções criminosas conhecidas, os atos
FIFA e dos Jogos Olímpicos, mas também de violência e vandalismo associados a
sustenta que essas situações, ou pelo menos manifestações públicas geralmente pacíficas
o risco de que ocorram, tendem a assumir e, no contexto dos grandes eventos esportivos
caráter permanente, seja pela crescente que acontecem ou acontecerão no Brasil,
inserção internacional do Brasil, seja pela a violência associada ao esporte. Em 2014,
profunda crise de legitimidade experimentada por exemplo, ano da Copa do Mundo e de
pelas instituições representativas do Estado e grandes comícios eleitorais, a exuberância
da sociedade civil. Em outro tópico, constata com que essas situações de emergência
a ausência de uma política nacional para irromperam no Brasil, sobretudo depois das
o terrorismo e outras emergências, assim grandes demonstrações públicas ocorridas
como a falta de consenso capaz de viabilizar em torno de junho de 2013, tornaram essencial
uma legislação e políticas adequadas. Na distinguir esses fenômenos sem paixões
sequência, noticia os esforços e iniciativas nem ímpetos repressivos, a fim de que as
do Ministério Público Federal no sentido de instituições do Estado Democrático de Direito
se preparar e se qualificar para lidar, em seu possam melhor lidar com eles. As conhecidas
âmbito de atribuições, com as emergências dificuldades de natureza política em abordar
estudadas. Por fim, o artigo aponta uma essas situações – movimentos sociais,
vocação do Ministério Público Federal para violência policial, comissões da verdade, crise

29
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

do sistema penitenciário, aparente omissão sua proliferação se completa com a atuação


legislativa – reservam ao Ministério Público deficiente das autoridades, a interpretação
Federal uma missão irrecusável, que é também permissiva da legislação aplicável, e as sanções
uma janela de oportunidades. É propósito administrativas ridiculamente brandas.
deste ensaio contribuir para a distinção das
quatro manifestações de violência referidas Os atos de violência e pânico deflagrados
e sugerir a atuação mediadora e conciliadora por facções criminosas são bem conhecidos
para a qual Ministério Público Federal, pela no Brasil e não constituem novidade surgida
sua conformação, se apresenta como que com os grandes eventos. Cidades como
predestinado. Rio de Janeiro e São Paulo conhecem a
capacidade desses grupos de colocar o Estado
virtualmente de joelhos frente a suas ameaças,
Quatro espécies de situações quando decretam ataques a repartições
policiais e ônibus, toque de recolher e outros
de emergência e não apenas tipos de retaliações em resposta a alguma
terrorismo medida que ponha em risco seus lucrativos
negócios e promovem arrastões. No entanto,
A violência relacionada ao esporte ou podemos dizer que este é um fenômeno típico
hooliganismo mostrou-se em episódios de Estados fracos, incapazes de afirmar sua
recentes no Brasil, notadamente nas cenas supremacia em certos espaços territoriais,
protagonizadas por torcedores do Atlético inclusive em seus próprios presídios. Com risco
Paranaense e Vasco da Gama, em Joinville, de alguma simplificação, sua gênese no Brasil
cujas imagens ganharam o mundo como remonta à interação entre presos políticos
modelo da barbárie de que o ser humano em do regime militar e criminosos comuns, estes
multidão é capaz; na morte de um torcedor últimos assimilando, da pregação ideológica
perpetrada pela torcida do Corinthians em dos primeiros, apenas os métodos de atuação,
jogo ocorrido em La Paz; no uso de um vaso que passaram a empregar para fins de
sanitário como instrumento mortal em recente lucro. Com denominações como “Comando
jogo entre Santa Cruz e Paraná, no Estádio Vermelho” e “Primeiro Comando da Capital”,
Arruda, em Recife; e também se apresenta surgiram nominalmente invocando a bandeira
nas manifestações coletivas de hostilidade da melhoria das condições carcerárias, mas
racista nos estádios. Na Europa, as federações, logo mostraram sua verdadeira face e se
as autoridades e até as torcidas organizadas converteram em complexas organizações
uniram-se para adotar medidas preventivas criminosas. Sua atividade econômica gira em
e coercitivas. Hooligans ingleses conhecidos torno do comércio ilícito de drogas e armas
e “cadastrados” foram interceptados no e da gestão do jogo ilegal. Nos territórios
embarque e impedidos de viajar ao Brasil que controlam, cobram por sua “proteção” a
para a Copa do Mundo. No Brasil, existe uma população e prestam alguns serviços públicos
notória condescendência dos clubes em rudimentares. O Estado só penetra nesses
relação a suas torcidas, aliada a uma certa espaços mediante algum tipo de negociação ou
glorificação de seus atos. O cenário propício a autorização, velada ou ostensiva, dos líderes

30
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

da facção dominante. As festejadas UPPs nada judiciais que garantiram um suposto “direito
mais são do que uma tentativa de retomada a protestar com máscara” e a não ter seus
militar – que deveria se fazer acompanhar pertences revistados pela polícia. No outro
de outros serviços públicos além da mera extremo, setores conservadores ou alarmistas
proteção policial – dos territórios ocupados da sociedade reclamaram a criminalização
por essas facções para o restabelecimento da desses atos como nada menos que terrorismo!
ordem jurídica estatal. No mesmo contexto, na mesma ocasião,
aflorou violência nos chamados rolezinhos
Durante a Copa do Mundo, os grandes de adolescentes em shopping centers, logo
comícios eleitorais e as Olimpíadas de 2016, politizados à direita e à esquerda. Existe
o pior que se esperou dessas facções foi que, no ar uma palpável propensão a irrupções
aproveitando-se de grandes aglomerações, de violência, potencializada por uma difusa
deflagrassem atos de sabotagem e indignação com o mau funcionamento do
vandalismo, assaltos a bancos, sequestros estado e dos serviços públicos, a corrupção
de celebridades e turistas, e impusessem e a crescente dissintonia da representação
restrições à liberdade de locomoção, com política (e até sindical) com a população. Os
o fim de demonstrar força e desmoralizar o crimes bárbaros noticiados diariamente, assim
estado de Direito. Essas ocorrências seriam como vários atos coletivos e espontâneos
o suprassumo da incompetência brasileira – de justiçamento, que apontam para uma
sociedade e Estado – escancarada ao mundo, reprivatização da vingança pública, parecem
de proporcionar um ambiente com um mínimo advertir, ainda que desordenadamente, que a
de organização e segurança para um evento paciência do brasileiro cordial tem limites.
que, apesar de grandioso, seria algo trivial em
outras latitudes. Por fim, temos o terrorismo internacional,
praticamente desconhecido no Brasil, mas
Os atos de depredação e vandalismo no plausível de acontecer, devido à visibilidade
rastro de demonstrações públicas pacíficas, que atentados dessa índole adquirem durante
terceiro fenômeno de emergência a ser grandes eventos esportivos.
destacado, surgiram por primeira vez no
rastilho dos protestos multitudinários de junho O termo terrorismo tem tanto de carga
de 2013. Sobre essas demonstrações sabemos emocional e ideológica quanto de vazio
muito pouco ainda, talvez apenas o suficiente conceitual. Aliás, nenhuma definição obteve
para perceber que é refratário a rotulações aprovação inconteste nos foros internacionais
ou explicações simplistas e para afirmar e mesmo no ambiente acadêmico. Em linhas
que uniram brasileiros que mais tarde se gerais, aceita-se que consiste na agressão
polarizaram entre pró e contra impeachment. a pessoas ou grupos não combatentes,
Mas a violência se aproveitou do caráter difuso perpetrada de forma clandestina ou subreptícia,
do movimento. A perplexidade a respeito com o objetivo de influenciar o público e os
do fenômeno produziu certa sublimação governantes para uma causa política mediante
da violência por personalidades do mundo a difusão do medo e pânico. Portanto, seus
artístico e político, estimulada por decisões traços marcantes são a motivação política e a

31
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

difusão do medo ou terror. Não é uma ideologia desestabilizar ou desmoralizar as instituições


nem uma categoria delituosa, e sim um do estado e da sociedade.
método de atuação premeditado, permeado
de motivação política, portador de violência Talvez a melhor análise antropológica e
ou sua ameaça contra vítimas inocentes. As histórica do terrorismo internacional foi a que
vítimas imediatas não são seu alvo, e sim empreendeu Mahmood Mamdani no livro Good
instrumento para influenciar as instâncias Muslim, Bad Muslim: America, the Cold War
dirigentes da comunidade afetada. Além de and the Roots of Terror, de 2004, que também
método de ação, o terrorismo pode também mostrou a relação visceral existente entre o
ser visto como uma estratégia de comunicação, terrorismo internacional e o crime organizado,
já que procura atrair a atenção para uma que o financia, notadamente o tráfico de
mensagem de cunho político ou religioso. drogas. Segundo o renomado professor da
Se não existissem meios de comunicação, Universidade de Columbia, no final da Guerra
talvez não existisse terrorismo. Não é só a Fria, os americanos, traumatizados com a
conceituação que é controvertida, mas o derrota sofrida no Vietnã, deixaram de intervir
próprio fenômeno sofre mutações. No século militarmente em outros países, passando
XX, o terrorismo era predominantemente uma a praticar guerras “por procuração”, ou
atividade de Estados, enquanto em nossa seja, treinavam e armavam grupos rebeldes
época se distingue como uma atividade ou inimigos históricos, para que estes
privada. Além disso, no século passado, o derrubassem regimes hostis a seus interesses
terrorismo dirigia-se predominantemente a em qualquer lugar. Com o tempo, a pressão
seus próprios alvos políticos, ao passo que, da opinião pública democrática americana
no presente, descobriu-se que os atentados determinou que o Congresso dos Estados
causam mais medo e pânico quanto mais Unidos proibisse a CIA de usar dinheiro público
inocentes são as vítimas. para promover a derrubada de governos
hostis. Diante disso, a inteligência dos EUA
Há também que distinguir o terrorismo passou a estimular o tráfico internacional
da guerra convencional e da guerrilha. de drogas, cujos lucros impulsionaram o
Estas são modalidades de luta armada comércio de armas e financiaram golpes de
contra alvos político-militares, enquanto os Estado e insurgências, sem que se utilizasse
alvos do terrorismo têm caráter político- dinheiro do contribuinte americano. Com o
psicológico. Evidentemente, pode ocorrer, fim da Guerra Fria, surge um contingente de
e ocorre com frequência, o emprego de jovens pobres, desempregados, sem qualquer
métodos terroristas em conflitos armados, perspectiva de uma vida digna, mas bem
mas isto não deve confundir as situações. A treinados na luta, no manuseio de armas e
luta armada tem uma base territorial e luta explosivos, na tecnologia bélica. Esse cenário,
por território, ao passo que o terrorismo tem completado por um discurso messiânico de
uma dimensão geográfica difusa. As partes autocomiseração e ódio ao Ocidente, formou
beligerantes são visíveis e aspiram ao poder o caldo de cultura que resultou nas formas de
do inimigo; a organização terrorista, por sua terrorismo islâmico do Século XXI. Assim foi
vez, atua na clandestinidade e quer desgastar, com Osama bin Laden e seu grupo, treinados

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TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

e equipados pela CIA para lutar contra o tratou os terroristas [...] como criminosos e
regime pró-soviético do Afeganistão; com os não como combatentes”.
Contras na Nicarágua; com a Unita em Angola,
e praticamente todos os os conflitos armados É compreensível essa duplicidade de
ocorridos a partir do final da Guerra do Vietnã abordagem do terrorismo. Afinal, ele é
até o término da Guerra Fria. um problema criminal, mas também é de
defesa nacional, devido a seu potencial de
Não sendo guerra nem guerrilha, o desestabilizar as instituições do estado
terrorismo só pode ser categorizado como democrático de Direito. De certa forma,
crime (ou uma qualificadora, ou majorante, em qualquer crime constitui um desafio à ordem
algumas jurisdições), um crime internacional jurídica e à supremacia do Estado em deter o
politicamente motivado, e seus autores monopólio da violência legal. No terrorismo,
devem ser julgados segundo as leis penais porém, esse desafio é explícito e desejado.
e processuais aplicáveis. Quem considera
o terrorismo como uma espécie de conflito Devido à intensa carga ideológica e
armado (“guerra ao terror”) deve respeitar emocional que permeia o tema, é comum
as normas do Direito Humanitário, inclusive o argumento de que terrorismo são as
as atinentes ao tratamento dos prisioneiros agressões “dos outros”, enquanto as
de guerra, consolidadas nas Convenções de “nossas” são contraterrorismo ou lutas de
Genebra de 1949. A maior crítica ao campo de libertação. No entanto, se considerarmos que
concentração de Guantánamo é que os Estados o terrorismo é um método de atuação que
Unidos negaram às pessoas lá confinadas ataca inocentes como meio para atingir fins
tanto as garantias do devido processo legal estratégicos mediante a difusão do medo, não
quanto aquelas universalmente reconhecidas existe “terrorismo bom”. Segundo a noção
aos prisioneiros de guerra, deixando-as aqui delineada, não é terrorismo a Intifada
num limbo jurídico, despojadas de qualquer palestina, a luta indiana pela independência e
direito. Aliás, até mesmo razões pragmáticas o movimento dos direitos civis nos EUA, embora
recomendam o tratamento do terrorismo esses conflitos possam eventualmente ter
como um tipo (gravíssimo) de criminalidade. empregado métodos terroristas. Tampouco é
O magistrado inglês Lord Bingham, em seu terrorismo, embora censurável, o assassinato
opúsculo de 2010, intitulado The Rule of Law, de J.F.Kennedy, os massacres em escolas
fadado a se converter numa obra clássica do estadunidenses, o assassinato de oficiais
Direito e da Política, mostrou que, por trás da espanhóis pelo ETA, e a operação militar dos
retórica belicista comum aos EUA e ao Reino EUA no Afeganistão. Nitidamente, terrorismo,
Unido em relação ao terrorismo internacional na acepção aqui delineada, são o castigo
após os episódios de 11 de setembro, uma coletivo infligido por forças israelenses
sutil diferença fez com que este último país aos palestinos, os bombardeios a Dresden
colhesse mais êxitos na apuração e punição e a bomba sobre Hiroshima na II Guerra
dos atentados: “o governo britânico, em geral, Mundial, o assassinato de banqueiros pela
tratou o terrorismo como uma situação de Rote Armee Fraktion (RAF), na Alemanha (a
emergência civil, não como uma guerra, e menos que se considere os banqueiros como

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TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

agentes do sistema capitalista-imperialista, Desafios das emergências para o


hipótese em que seriam vistos como alvos Estado e a sociedade brasileiros
militares de quem combate esse sistema), o
treinamento dos Contras pelos americanos O Estado brasileiro tem dado mostras de
com o objetivo de aterrorizar a população estar despreparado para lidar com qualquer
da Nicarágua, os ataques de 11 de setembro, dos quatro fenômenos aqui analisados,
o atentado ocorrido na maratona de Boston devido à conhecida preferência nacional para
no início de 2013, os dois grandes atentados a improvisação. As dificuldades políticas
que comoveram a cidade de Paris no ano de para legislar racionalmente a respeito deles
2015. Tais exemplos aleatórios, historicamente são notórias, assim como há ímpetos de
verificados, mostram que o terrorismo “criminalização dos movimentos sociais”,
geralmente é praticado por grupos, isto é, pretendendo rotular todas as manifestações
organizações criminosas, mas também se como terrorismo ou crime contra a segurança
manifesta como “terrorismo de Estado” e até nacional; no outro extremo há os que
mesmo como atos de “lobos solitários”, como pretendem glorificar, justificar (e não apenas
os irmãos de Boston. “explicar”) a violência em demonstrações
públicas. Até mesmo medidas legislativas
No Brasil, quase nada do que em inofensivas para as liberdades públicas, mas
ocasiões foi rotulado de terrorismo tem as eficazes para a redução da violência, como a
características deste: nem a atuação das proibição do uso de máscaras e a ampliação
facções criminosas a partir do interior dos das possibilidades de revista policial de
presídios (as quais visam puramente ao manifestantes, encontram resistência em
lucro), nem as explosões despropositadas respeitáveis lideranças políticas e sociais, que
de violência patrocinadas por black blocks, romantizam a violência que se aproveita dos
Anonymous e outros rebeldes sem causa, nem protestos pacíficos das ruas, contribuindo para
os protestos promovidos por movimentos encobrir seu caráter autoritário, para não dizer
sociais, ainda que violentos. Todos esses fascista em muitos casos.
grupos podem praticar crimes, inclusive
alguns muito graves, como o dano a um Por outro lado, será realmente preciso
monumento histórico ou cultural, a agressão mudar a legislação brasileira, como reclamam
injustificada a um policial ou o homicídio do alguns, ou o problema está em sua interpretação,
cinegrafista Santiago. Contudo, rotulá-los de extremamente condescendente, caracterizada
terrorismo, embora muito a gosto de uma por um “coitadismo penal”, acompanhado de
retórica criminalizante e repressiva, é um uma espécie de “cafuné processual penal”?
exagero que mais banaliza o termo, gera mais
pânico e produz ganhos político-eleitorais A meu ver, tanto as razões favoráveis
do que soluciona problemas. Ademais, a quanto as razões contrárias à adoção de
ampliação do conceito de terrorismo politiza uma legislação sobre terrorismo no País são
desnecessariamente manifestações de pura equivocadas. Geralmente, quem se opõe a uma
criminalidade, que teriam mais a ganhar do legislação específica argumenta com o receio
que a perder com essa politização. de que ela seja utilizada para criminalizar

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TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

movimentos sociais e até a oposição política, num Estado Democrático de Direito. Certos
como se vê em vários países (Rússia e Turquia atos de violência são aceitáveis contra um
p. ex.). Mesmo com a adoção de uma ressalva Estado totalitário, onde não há possibilidade
em favor dos movimentos sociais, esses de participação política, mas não num Estado
setores temem que esta só seja considerada que, mesmo com todas as imperfeições, tem
judicialmente para demonstrações pacíficas, suas instituições sociais, políticas e jurídicas
mas seja prontamente afastada diante de em pleno funcionamento. Em segundo lugar,
qualquer desbordamento violento, o que é os atos de resistência à ditadura militar não
muito comum em movimentos multitudinários. seriam nem são considerados terrorismo pelo
Essa corrente de pensamento teme também Direito internacional. Um dos poucos consensos
que a definição legal de terrorismo tornaria que existem na discussão internacional sobre o
muitos atos historicamente verificados como conceito de terrorismo é que a resistência ao
resistência à ditadura militar em atentados ou, apartheid da África do Sul, as lutas de libertação
quando menos, associações terroristas. colonial e a resistência contra a opressão são
excepcionadas da rotulação. Nesta ressalva
De outro lado, os setores que clamam pela estariam incluídos os atos de violência contra
urgência de uma legislação sobre terrorismo as ditaduras latinoamericanas, de maneira que
no País querem estender a definição a todas o objeto das comissões da verdade continuaria
as emergências aqui discutidas, o que torna incólume. Por fim, a polêmica entre os a favor
a concretização de uma legislação apropriada de uma legislação definidora de terrorismo no
ainda mais difícil politicamente. Chegam ao Brasil e os contra deixaria de existir se ambos
ponto de afirmar que, diante de uma definição convencionassem limitar o esforço legislativo
legal de terrorismo, corroborando os receios àquilo de que cuidam as 13 convenções
dos setores que se opõem à criminalização, internacionais sobre terrorismo, isto é, o
perderiam sentido todas as comissões da terrorismo internacional, que o Brasil ratificou.
verdade, uma vez que os atos que apuram Não é intelectualmente honesto argumentar
passariam a ser vistos como terrorismo ou com obrigações internacionais do Brasil (que,
contraterrorismo. quando muito, reclamam apenas uma definição
do terrorismo internacional) a fim de definir
As duas ordens de pensamento têm episódios de violência doméstica (vandalismo,
alguma razão, mas se assentam em premissas facções criminosas, violência nos esportes)
falsas. Primeiramente, como já dito, não há como terrorismo, assim como também não é
“terrorismo do bem”. Se no passado certos atos honesto afirmar que, diante de um atentado
de violência eram aceitáveis como formas de terrorista, seus perpetradores restariam
luta contra a opressão, atualmente não mais impunes segundo a legislação brasileira atual.
se aceita a busca de qualquer fim político, não
importa quão nobre, mediante ofensas à vida ou Todas as emergências aqui discutidas são
à integridade física de pessoas inocentes. Nem censuráveis porque resultam em crimes como
os movimentos sociais devem ter a permissão homicídio, lesão corporal, roubo, sequestro,
de sequestrar, ferir ou matar inocentes em extorsão, cárcere privado, desaparecimento
nome de suas ideias – isso deve ficar bem claro forçado, associação criminosa – todos eles

35
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

definidos na legislação penal brasileira temos a Polícia Federal, a Agência Brasileira


atual. Os atos que atentam apenas contra o de Inteligência (ABIN), o Conselho de Controle
patrimônio geralmente não são considerados de Atividades Financeiras (COAF) do Ministério
terrorismo pelas convenções internacionais. da Fazenda, mais especificamente no âmbito
Portanto, seria muito mais factível um do fluxo de dinheiro que poderia servir para
consenso legislativo em torno de definições financiar essas atividades, e as Forças Armadas,
de terrorismo que tivessem por alvo apenas estas por meio de diferentes órgãos, como o
as manifestações do terrorismo internacional. Serviço de Inteligência do Exército, o Centro
As outras emergências também reclamam de Defesa Cibernética (CDCiber) e unidades
reformas legislativas, mas não deveriam de operações especiais. A Polícia Federal
ser tratadas como terrorismo. Quanto ao possui um centro antiterrorismo que monitora
terrorismo “doméstico”, o Brasil não tem regularmente atividades suspeitas. Até o
um histórico com episódios suficientes para Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA)
permitir ou recomendar uma legislação que os passou a ter uma linha de pesquisa em torno
trate como terrorismo. do terrorismo. Na esfera privada, notabiliza-se
a Febraban, entidade que congrega os bancos
No plano legislativo, portanto, é desejável, brasileiros e elabora cenários em que seus
é recomendável, é necessário que se promova associados poderiam ser alvo de atividade
alguma definição de terrorismo, mas a terrorista. Também o Ministério Público
“obrigação internacional” do Brasil situa-se Federal possui grupos de estudo e comissões
mais no plano dos resultados do que no dos que se esforçam por conciliar a necessidade de
meios. Poder-se-ia acrescentar que, na esfera assegurar e proteger o direito de manifestação
do processo penal e dos meios de investigação, com a necessidade de prevenir, investigar
e também dos serviços de inteligência, aí sim, e reprimir atividades terroristas e outras
faltam instrumentos mais adequados para emergências. Podemos ainda acrescentar os
dotar as autoridades de ferramentas que órgãos de segurança pública estaduais e as
lhes permitam prever, prevenir e investigar os universidades, como entidades interessadas
quatro fenômenos aqui discutidos. em diferentes aspectos das grandes situações
de emergência.

Uma política nacional No entanto, apesar de todos esses


esforços, alguns até sobrepostos e duplicados,
antiterrorismo e para as é notório que o País não delineou uma política
situações de emergências nacional antiterrorismo nem uma política para
lidar com os outros fenômenos aqui discutidos.
Mais do que da falta de leis, o Brasil se Nem mesmo para a Copa do Mundo houve
ressente da total ausência de uma política um esforço do Poder Executivo de articular
nacional antiterrorismo. Diversos setores do esses vários órgãos em torno de objetivos
Estado e da sociedade civil, com diferentes claramente estabelecidos. A cada situação que
enfoques, tratam do terrorismo e de outras eclode – demonstrações públicas, greves de
situações de emergência. No Poder Executivo, polícias militares e nos transportes públicos,

36
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

atuações das facções criminosas –, o que se a Procuradoria-Geral da República, por meio


observa é a improvisação ou a solução pontual de sua Assessoria de Cooperação Jurídica
para situações já verificadas. Internacional e da 2ª Câmara de Coordenação
e Revisão (que cuida de matéria criminal),
Não existe solução mágica para os com o apoio da ANPR e da Escola Superior do
complexos fenômenos aqui discutidos. Mas Ministério Público da União (ESMPU), realizou
o Estado e a sociedade não podem ficar em Brasília um seminário internacional inédito.
parados, acreditando que “Deus é brasileiro”, Durante três dias, procuradores da República
e se sujeitarem a perdas desnecessárias e das 12 cidades-sedes da Copa, atuantes em
ao vexame internacional de despreparo, caso matéria criminal e na defesa dos Direitos
alguma situação de emergência aconteça, Humanos, se reuniram com renomados
enquanto órgãos públicos, federais e especialistas nacionais e estrangeiros para
estaduais, e entidades privadas ocupam-se dos discutir formas de prevenção, investigação
fenômenos isoladamente, não compartilham e persecução penal dessas emergências. O
dados, informações nem conhecimentos, quer enfoque do treinamento foi o de garantir
por desconfianças mútuas, quer por puro – e não proibir – o pleno exercício de vários
corporativismo. direitos fundamentais, como o de reunião
e livre manifestação do pensamento, aí
incluído o protesto contra os governantes.
Desafios das emergências para Os Procuradores da República participantes
desse evento foram confrontados com
o Ministério Público Federal experiências e métodos bem sucedidos, que
não precisaram romper com os parâmetros do
O Ministério Público Federal tem discutido Estado Democrático de Direito. Especialistas
internamente essas questões há algum tempo de nove países com maior experiência nos
e procurado contribuir com o debate político- fenômenos estudados e, praticamente, todos
legislativo e com a sociedade civil. Essa os interlocutores brasileiros sobre o assunto
contribuição se faz tanto institucionalmente proferiram conferências ou participaram de
quanto pela entidade associativa dos painéis.
procuradores da República, a ANPR, mediante
a participação em comissões e colegiados, a Às vésperas da abertura da Copa do Mundo,
exemplo da ENCCLA (Estratégia Nacional de o Procurador-Geral da República, Rodrigo
Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro), Janot Monteiro de Barros, baixou a Portaria
dos projetos de Código de Processo Penal e PGR n. 422, de 29 de maio de 2014, instituindo
Código Penal em tramitação nas duas Casas um “Gabinete de Crise” para a Copa do Mundo,
do Congresso Nacional e dos projetos de lei sob sua presidência, composto de todos os
sobre terrorismo e crimes contra a segurança Procuradores-Gerais de Justiça das cidades
do Estado Democrático de Direito. que sediarão jogos da Copa do Mundo, do
Procurador-Geral do Ministério Público Militar,
Em abril de 2014, ao ensejo dos grandes de um Conselheiro do Conselho Nacional do
eventos esportivos programados para o Brasil, Ministério Público, facultando a participação do

37
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Ministro da Justiça na qualidade de convidado, inserção internacional do Brasil torna-o


e auxiliado por um grupo de apoio do mais alto vulnerável a tais ataques. Neste ponto,
nível. Por definição, tratou-se de um ato de cabe observar que os ataques terroristas
vida efêmera, cuja experiência, porém, poderá ocorridos após o 11 de setembro buscam
frutificar em iniciativas semelhantes de mais alvos mais desprotegidos, como templos
longa duração. religiosos, associações civis, pequenos ou
grandes eventos esportivos, instalações de
energia, grupos de turistas, bares e clubes de
Janelas de oportunidades para recreação com certo tipo de frequência capaz
o Ministério Público Federal de chamar a atenção da imprensa mundial.
Aliás, quanto mais inocentes as vítimas, mais
Devido a suas facetas de manifestação indignação causam os atentados e também
de criminalidade e de problema de defesa mais pânico, o que está na raiz da própria
nacional – notadamente no caso do terrorismo definição de terrorismo. Assim, quanto mais
–, é compreensível que os fenômenos aqui o Brasil e suas autoridades se jactarem de
estudados, num primeiro momento, atraiam que “Deus é brasileiro” e que aqui todos
mais a atenção de entidades federais, a exemplo vivem em paz, mais atraente ele se torna para
do próprio Ministério Público Federal. Por outro ataques do terrorismo internacional. Quanto
lado, os crimes que desses fenômenos resultam aos outros três fenômenos aqui estudados –
quase sempre são de competência da Justiça hooliganismo, violência nas demonstrações
dos estados: homicídios, lesões corporais, pacíficas de rua e violência comandada pelas
sequestros, danos ao patrimônio privado. Todos facções criminosas –, eles sempre existiram
eles colocam desafios à segurança pública, no Brasil e, ultimamente, não só devido
um direito fundamental constitucionalmente aos grandes eventos mas devido a uma
assegurado cuja responsabilidade maior notória crise de legitimidade das instituições
cabe às unidades da Federação, através de representativas, tendem a se intensificar.
suas polícias civis e militares bem como seus
sistemas de Justiça. Portanto, uma política Já se viu que o Estado brasileiro,
nacional de prevenção e gestão das situações notadamente o Poder Executivo em sua
de emergência necessariamente deverá atual administração, por razões históricas,
congregar todas as esferas do poder público político-ideológicas e até de posicionamento
assim como algumas entidades privadas internacional, não tem interesse nem numa
interessadas na matéria. legislação sobre terrorismo nem sequer em
congregar os vários esforços que se realizam
Acredito que dispensa demonstração a com muita competência, mas sem articulação
percepção de que as situações de emergência em torno de uma Política Nacional de
não são fenômenos sazonais, associados a Prevenção ao Terrorismo e Outras Situações
grandes eventos, mas vieram para ficar e de Emergência. Não é possível prescindir da
reclamam soluções de caráter permanente. Polícia Federal no aspecto da investigação das
Pode ser que o risco mais imediato do manifestações de criminalidade que possam
terrorismo internacional cesse ao cabo dos ser reconduzidas a um desses fenômenos. Mas
grandes eventos esportivos, mas a crescente também não é possível prescindir das Forças

38
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Armadas no trato desses fenômenos como privadas. À maneira da Estratégia Nacional de


potenciais ameaças à defesa nacional. De Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro
igual modo, embora todas essas instituições (ENCCLA), percebo a necessidade de uma “mini-
possuam seus próprios serviços de inteligência, ENCCLA”, uma Estratégia Nacional de Prevenção
não se pode prescindir da ABIN, que tem e Gestão de Situações de Emergência sob a
a missão precípua de produzir inteligência coordenação do MPF. Seu prestigioso papel de
para a segurança do Estado. Também o interlocutor e mediador diante da sociedade
Ministério Público Federal tem uma missão, civil, de instituições como as Forças Armadas
quando menos de traduzir judicialmente as e dos Poderes Constitucionais tornam-no
manifestações de criminalidade e concorrer também devidamente equipado e preparado
para a obtenção das medidas constritivas para essa missão.
necessárias a sua apuração – busca e
apreensão, prisões cautelares, monitoramento Como não tem, por definição, pretensões
telefônico, telemático e financeiro etc. E as políticas, de poder ou competências em relação
instituições científicas – não apenas o IPEA, a esses fenômenos, pode o MPF concorrer para
mas também as universidades e centros de a quebra da desconfiança entre algumas das
pesquisa – têm uma importante contribuição entidades que deles se ocupam, incentivá-las
a oferecer na compreensão dos fenômenos a compartilhar dados e inteligência, fornecer
e na construção de políticas sociais a eles o ambiente necessário a que discutam
destinadas, inclusive uma política criminal abertamente possíveis sobreposições e
que mantenha o equilíbrio entre garantias duplicidades e estabeleçam divisões de
e preceitos constitucionais aparentemente tarefa segundo a doutrina internacional e as
antagônicos: direito à segurança, à livre melhores práticas acerca do emprego de forças
manifestação de ideias, regular funcionamento armadas, polícias e serviços de inteligência.
dos Poderes do Estado. Todavia, também Uma vez estabelecido o ambiente de confiança
dispensa demonstração que nenhuma dessas e respeito recíprocos, essa congregação de
entidades pode, sozinha, abarcar todos os esforços poderá pactuar objetivos ou metas,
aspectos das emergências aqui estudadas. que vão desde a elaboração de projetos de lei
mais refletidos do que aqueles engendrados a
partir do calor e da emoção de acontecimentos
Conclusão dramáticos, inclusive de leis que guarneçam
melhor a atividade dos serviços de inteligência;
Com todas essas considerações, vejo para convênios com entidades internacionais,
o Ministério Público Federal uma missão, treinamento de polícias, até a construção de
quase uma predestinação, de promover a uma doutrina brasileira, de Estado e não de
convergência e o diálogo construtivo desses um Governo, sobre o manejo de situações de
compartimentos do Estado e da sociedade – em emergência, fiel às garantias constitucionais
caráter permanente. Na falta de um interesse mas também eficiente na repressão dos
explícito ou pelo menos perceptível do Poder abusos às liberdades públicas.
Executivo, o Ministério Público Federal é a
única instituição capaz de trazer à mesa de
discussão todas essas entidades públicas e

39
Welcome to Absurdistan:
new criminal offences to combat terrorism*

PROF. DR. MARK A. ZÖLLER any news broadcast and hardly any newspaper
University of Trier edition without reports on terrorist activities
from all over the world. The general social
debate on the appropriate means and ways
One of today’s most pressing questions of coping with the phenomenon of terrorism
is whether or not and if so, how and to what is in full progress. Starting point and initial
extent the current threats of modern, mainly spark for this development were, of course,
Islamic-influenced terrorism have to be the disastrous attacks on the World Trade
faced by means of criminal law. In Germany, Center and the Pentagon on 9/11. Among the
especially the criminal proceedings against about 3,000 victims of the attacks were also
one of the so-called ‘Kofferbomber’ (‘suitcase 6 German citizens1. However, more than by
bombers’) as well as against the members of the death of their fellow citizens, Germans
the ‘Sauerland-Gruppe’ (‘Sauerland group’) felt threatened by the fact that the attacks of
at the Oberlandesgericht Düsseldorf (Higher 9/11 were to a considerable extent planned
Regional Court of Düsseldorf) triggered an and arranged on German territory2. In the
intense legal-political discussion. The German social environment of the University Hamburg-
legislator reacted with the approval of the
Act on the Prosecution of the Preparation
* This text version including footnotes is based
of serious Acts of Violence against the State on an inaugural lecture held by the author at the
(‘Gesetz zur Verfolgung der Vorbereitung University of Trier on February 19, 2010. It was first
schwerer staatsgefährdender Gewalttaten’ or published in German in Goltdammer´s Archiv für
‘GVVG’) in 2009. The following – necessarily Strafrecht (GA 2010, pp. 607-621).
cursory – statements will show, however, that
legislative standards and aspects concerning 1 Three German citizens were on board the airplane
(flight number UA 175) which crashed into the South
the rule of law were disregarded as well as
Tower of the World Trade Center, one German
basic psychological aspects in dealing with
citizen was on board the airplane (flight number
international terrorism. UA 93) which crashed into a field near Shanksville,
Pennsylvania, and two German citizens were inside
the World Trade Center, New York City.
I. The Terrorist Threat 2 Concerning the historical background of the
attacks on 09/11, cf. The 9/11 Commission Report –
Final Report of the National commission on Terrorist
We are currently standing at a major Attacks Upon the United States, 2004, 160 ff.; Wright,
crossroad in dealing with modern, mostly Der Tod wird Euch finden: Al-Qaida und der Weg zum
Islamic-influenced, terrorism. There is hardly 11. September, 2008.

41
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Harburg, while remaining undetected by state their ignition, the two bombs did not explode
security authorities, a cell of the Al-Qaida due to a constructional defect. The extent of
network worked on the lethal plan of using the avoided attack became apparent, however,
civil airplanes as flying bombs. through the reasoning of the Oberlandesgericht
Düsseldorf (Higher Regional Court of
Especially after the self-dissolution of the Düsseldorf) in the judgment against one of the
leftist terror organization ‘Rote Armee Fraktion offenders in 20084. Here, it reads as follows: ‘If
(RAF)’ in 19983, the illusory impression was the bombs had exploded, the magnitude of the
created that in Germany and as a German detonation of each bomb could have coursed a
one could be relatively safe from terrorist huge fireball of up to 50 feet and an enormous
attacks. However, the attacks of 9/11 and the splinter throw. Taking into account that the
threat caused by a modern, Islamic-influenced detonation was meant to take place at noon,
terrorism has shattered the Germans’ ‘false during ‘lunchtime rush hour’, it can easily be
sense of security’ and ‘awakened’ the Germans imagined that it would have resulted in heavy
from their ‘sound sleep’. But, of course, 9/11 casualties and an enormous bloodbath.’
wasn’t a singular event. Only a few months
later, in April 2002, a total of 21 persons, among Fortunately, in September 2007, another
them 14 German tourists, were killed during attack could be prevented due to the
an Al-Qaida attack on the Tunisian Al-Ghriba timely intervention of the German security
Synagogue. Furthermore, Lebanese offenders authorities. In this case, the members of the
placed suitcase bombs in regional trains to the so-called ‘Sauerland-Gruppe’ (‘Sauerland
cities of Koblenz and Dortmund at the Cologne group’) of the Islamic Jihad Union were
Central Station as an act of retribution for arrested and accused of having prepared
the publication of the so-called ‘Mohammed terrorist attacks on public buildings like
caricatures’ in July 2006. Fortunately, despite discos, pubs or airports in Germany frequently
visited by US American citizens5. Especially
3 On 20.04.1998, a letter sent to the Reuters news
agency announced the following: ‘Almost 28 years 4 OLG Düsseldorf (Higher Regional Court of
ago, on May 14, 1970, the RAF was born in an act of Düsseldorf), decision of 9.12.2008 – III-VI 5/07; by
liberation: Today we are ending this project. The judgement of 24.11.2009, the Third Senate of the BGH
urban guerrilla in the shape of the RAF is now history. (Federal Supreme Court) (3 StR 327/09) rejected the
We, that is all of us who participated in the RAF until appeal, so that it became legally binding.
the end, are taking this step jointly. From now on, 5 The OLG Düsseldorf, with judgment of 4 March
we, like all others of this association, are former RAF 2010 – III-6 StS 11/08 and III-6 StS 15/08 sentenced
militants. […] The end of this project shows that we the two Germans Fritz Gelowicz and Daniel
were not able to succeed on this path. […] Hundreds Schneider (who had both converted to the Islam)
of years in prison terms for RAF prisoners were not for membership in a terrorist organization abroad
able to wipe us out, nor could all the attempts to in addition to agreement to murder, induction of
eradicate the guerrilla. We wanted a confrontation an explosion and coercion of constitutional bodies,
with the ruling powers. We acted as subjects when as well as preparation of an explosion crime to
we decided upon the RAF 27 years ago. We remain imprisonment of 12 years each; the Turkish citizen
subjects today, as we consign ourselves to history.’ Adern Yilmaz for attempted murder, perpetrated

42
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

the numerous recovered barrels of hydrogen measures. By means of these sanctions that
peroxide solution, a raw material for the notably interfere with the citizen’s liberty, the
production of explosives, which the offenders criminal law guarantees the enforceability
had been able to acquire from chemical of commands and prohibitions of our legal
dealers for months, caused consternation system, whenever other measures tend to fail6.
in the public. Finally and above all, it should
not be ignored that German Bundeswehr Despite the essential meaning of criminal
(German Federal Armed Force) soldiers who, law, the German legislator has been extremely
since January 2002, have committed their work reluctant when it comes to appropriate
to the peacekeeping force ISAF stationed in reactions to the general danger of terrorism
Afghanistan have also been victims of terrorist during the last ten years. This shall be
violence. This sad fact usually recedes into the explained in more detail in the following
background in the face of the ‘Kunduz affair’, pages using the example of the Law on the
concerning an air attack on tankers hijacked Prosecution of the Preparation of Serious Acts
by Talibans. The air attack was commanded of Violence enacted on 4 August 2009 – the so-
by the German Bundeswehroberst (Colonel of called GVVG7. First, however, we ought to clarify
the German Federal Armed Force) Georg Klein one more time, what and who we are dealing
on 4 September 2009 and resulted in civilian with when it comes to the players of modern
victims among the Afghan population. On the international terrorism and what the special
whole, the operation at the Hindu Kush cost features are, that have to be taken into account,
the lives of 40 German soldiers – 21 of which when dealing with them legally. Only then will
were killed in attacks and fights. it become clear why the legislator might have
taken the wrong turn with regard to the future
Hence, modern terrorism has long been of criminal law on terrorism8. The following
‘lurking around the corner’ and all social players explanations will focus on: (1) material criminal
are required to meet the challenges connected law, i.e., above all, relevant offences (and
to it. In this context, the law, particularly the thus, widely exclude questions concerning the
criminal law, can only be seen as one small, necessary criminal procedural rules) and (2)
yet important link in the chain of events. Any modern terrorism, namely Islamist (religiously
criminal prosecution leads to criminal penalty, motivated) terrorism.
particularly imprisonment and security

in addition to resistance against enforcement


6  See Jescheck/Weigend, AT, 5th edition (1996),
officers, membership in a terrorist organization
Section 11.1.
abroad, agreement to murder, inducing a bomb
explosion and coercion of constitutional bodies 7 BGBl. I, p. 2437; cf. Zöller, Terrorismusstrafrecht
as well as preparation of a bomb explosion to – Ein Handbuch, 2009, 562 ff.; Bader NJW 2009, 2853
imprisonment of 11 years; and the assistant of the ff.; Gazeas/Grosse-Wilde/Kießling NStZ 2009, 593
trio, the German-Turk Attila Selek for supporting ff.; Radtke/Steinsiek JR 2010, 107 ff.
a terrorist organization abroad in addition to 8 The fact that ‘this way was as wrong as it was
preparation of an explosion crime to imprisonment dangerous’ is also mentioned in Walter KJ 2008, 443
of five years. The sentence is final. (450).

43
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

II. Who or what is a terrorist? Palestinians – accuse each other of being


terrorists. In everyday language ‘terrorism’ is
Let us start with the underlying question of used as a ‘term of exclusion’12. The concerns
who or what a terrorist actually is – a question of individuals labeled as ‘terrorists’ are
that is neglected surprisingly often in legal considered to be non-negotiable and those
political discussions. being stigmatized as terrorists for a longer
period of time experience a considerable
loss of social legitimacy. Those, however, who
1. Lack of conceptual clarity position themselves as guerillas, partisans
or freedom fighters in international politics
The numerous attempts to define terrorism and media coverage, are usually able to gain
made by representatives of many academic significant competitive advantages regarding
disciplines may easily fill a middle-sized the implementation of their goals. The much
library9. This is due to (1) a lack of conceptual cited sentence, assigned to the former US
clarity and (2) the fact that ‘terrorism’ is a president Ronald Reagan: “One man’s terrorist
heavily moralized and politicized term: is another man’s freedom fighter” puts the
problem in a nutshell.
(1) The semantic meaning of the word
‘terrorism’ has undergone a constant change
during the history of ideologically motivated 2. The penal perspective
use of violence10. During the French Revolution,
the German National Socialism and the Things seem to be a little easier within the
Russian Stalinism, for instance, the main focus field of criminal law. Although the German legal
had to be put on different forms of a reign of system neither provides any legal definition
terror conducted by the state. In contrast to of terrorism nor establishes ‘terrorism’ as an
this, ‘terrorism’ has primarily been used as an independent criminal offence, there can be no
expression concerning private violence since doubt that terrorists are criminal offenders.
the middle of the 20th century. Whoever commits terrorist attacks, kills
(Section 211 ff. StGB13 and injures (Sections
(2) The term ‘terrorism’ is heavily 223 ff. StGB) other people, deprives them of
moralized and used primarily from the victims’ their liberty (Section 239 ff. StGB), damages
perspective11. This becomes particularly clear, things (Section 303 StGB) or jeopardizes the
if we take a closer look at the Palestinian security of road, air or maritime transportation
conflict, where, both sides – i.e., Israelis and (Sections 315b, 316c StGB).

9 See – pars pro toto – Alex P. Schmid who already Thus, with regard to criminal law the
examined more than 100 different definitions of question arises: What actually constitutes
terrorism in the first edition of his book “Political
the typical as well as characteristic nature
Terrorism: A Research Guide” of the year 1983.
10 In detail Zöller (fn. 7), 12 ff., 102. 12  Münkler, Die neuen Kriege, 2002, 175; Hetzer,
11  Schulte, Terrorismus- und Anti-Terrorismus- Rechtsstaat oder Ausnahmezustand?, 2008, 84.
Gesetzgebung, 2008, 18. 13  Strafgesetzbuch (German Criminal Code).

44
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

of a terrorist? The German Criminal Code fact that individuals commit serious crimes.
only provides a highly unsatisfactory answer It means that the offenders also have to
to this question. After all, certain forms of act with the subjective intention to pursue
involvement with terrorist groups in Germany their own political, religious or ideological
and abroad are punishable according to objectives15. They want to realize a legitimate
Sections 129a and 129b StGB. Especially the state of society according to their own beliefs.
comparison to a mere criminal organization Therefore, in the field of criminal law, it seems
according to Section 129 StGB leads, however, preferable to speak of ‘terrorist motivated
to a strange result. Whoever takes part in crime’.
an organization which aims at committing
criminal offences in general, shall only be Let us take the example of an Islamist
punished because of his/her involvement terrorist placing an explosive device at a
with a criminal organization. As soon as the government building: It can be taken for
organization aims, however, at committing granted that he or she wants to kill or at least
particularly serious offences as concretized hurt as many people as possible and destroy
in Section 129 (1) and (2) StGB (e.g., murder, or damage material assets. Furthermore,
manslaughter, hostage taking or arson), the however, the Islamist wants to reach a higher/
organization shall, all of a sudden – as if by ultimate goal, i.e. the return to the ‘right kind
magic – become a terrorist organization. of faith’. He/she assumes that his/her actions
The legislator obviously assumes that an are well suited to deal with the perceived
organization can radically turn from a criminal political, social or economic problems.
into a terrorist organization when crossing a Furthermore, Islamist acts of violence aim at
certain threshold regarding the nature and a reinstatement of the caliphate, a theocratic
severity of offences committed or planned form of government based on classical Islamic
by its members. Such a simple approach is laws, the so called sharia. To reach this ultimate
based, however, on a serious conceptual goal, the terrorist commits crimes – namely all
misunderstanding. offences that seem suitable in pursuing this
goal. Therefore, it can be concluded that the
The characteristic feature that specific characteristic of a terrorist cannot
distinguishes a common criminal from a be described by objective criteria, such as
terrorist is the latters’ special motivation14. the seriousness of the committed crime, the
Terrorism means more than the objective brutality of the act of violence or the amount
of victims it creates. Instead it is the offenders’
14  Herzog, Terrorismus – Versuch einer Definition subjective motivation which characterizes him
und Analyse internationaler Übereinkommen zu as a terrorist, his or her intention to achieve a
seiner Bekämpfung, 1991, 93 ff.; Cryer/Friman/ higher goal – one that exceeds the immediate
Robinson/Wilmshurst, An Introduction to outcome of the committed offence.
International Criminal Law and Procedure, 2007,
290 f.; Kühne, Schwind-FS, 2006, 103; Weigend,
Nehm-FS, 151 (162); Sedgwick 30 Studies in Conflict Law and Criminal Justice 2004, 14 (22); Spinellis,
& Terrorism (2007), 97 (99); also Symeonidou- Schlüchter-GS, 2002, 823 (829).
Kastanidou European Journal of Crime, Criminal 15  Zöller (fn. 7), 146.

45
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

III. Terrorism as a or to make something common’18. It describes


communication strategy a social action including other individuals.
And that is exactly what terrorists do. For
The unique feature of a terrorist crime can, them the respective criminal offence as such
however, not only be seen in the indirect pursuit holds no meaning. The important thing is the
of an ultimate goal, i.e. to bring about a social communicative inclusion of their audience
order according to one’s own ideological beliefs. in the broadcasting of information of such
On the way to reach such an ultimate goal, a criminal acts of violence.
terrorist has to strive for an important interim
goal first. This interim goal means spreading The following example may illustrate the
fear and terror 16. Terrorist acts of violence are point: A single car bomb attack on an Israeli
intended to intimidate the public and thus school bus or a military patrol of the German
influence the public opinion. Terrorism is a Federal Army in Afghanistan does not hold the
communication strategy 17 and – as experience potential to bring a whole state like Israel or
from past centuries shows, as such extremely Germany down to its knees. From a military
successful. The term ‘communication’ derives and strategic perspective such ‘pinpricks’ are
from the Latin word ‘communicare’ and means much too insignificant. The terrorist knows
‘to share, to inform, to let others participate this as well, of course. Through his actions,
however, he not only sends the message ‘I
have killed 20 of your school children or ten
16  This is also assumed on the European level by of your soldiers’. He also expresses that he or
article 1 I of the framework decision of the Council the organization he belongs to is willing and
of 13 June 2002 to combat terrorism (ABI. L 164, 3 able to strike anytime, anywhere and towards
from 22.6.2002) demanding that the individual everyone and that he/it will continue to do
actions mentioned under lit. a) to i) shall only be so until all enemies will be destroyed or the
deemed terrorist crimes if they are committed with intended ideological goals are achieved The
the objective to intimidate the population severely central message of terrorism towards the state
or to force public organizations or an international
and its citizens thus reads: ‘You are not safe!’
organization to an action or an omission or to
Terrorists want to undermine the existing social
seriously destabilize or destroy the political,
constitutional, economic or social basic structures
power structures. They hope that the national
of a country or of an international organization. law enforcement agencies will eventually lose
the support of the people as soon as the latter
17  Cf. Hoffman (fn. 11), 268 ff.; Pawlik, Der Terrorist
und sein Recht, 12; for further details concerning realize that the state is not able to protect
the dependencies between terrorism and them efficiently.
communication see, e.g., Jenkins, in: Carlion/Schaerf
(ed.): International Terrorism and World Security, 1975, Therein lies the perfidy of modern
13 ff.; Schmid/de Graaf, Violence as Communication terrorism. The terrorist commandos of the
– Insurgent Terrorism and the Western News Media,
1982; Greenberg (ed.), Communication and Terrorism, 18  Cf. key word “communication” in the free
2002; Peterleitner, Terrorismus als mediales Ereignis, encyclopediaWikipedia, available at https://
2010; Shoshani/Sloane, 3l (7) Studies in Conflict & en.wikipedia.org/wiki/Communication (in German:
Terrorism (2008), 627 ff. https://de.wikipedia.org/wiki/Kommunikation).

46
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

leftist RAF, for example, had mostly chosen killed two Israeli athletes and took nine others
their victims purposefully and carefully. The as hostages. A failed attempt to rescue these
abduction und assassination of the President hostages was followed by a massacre at the
of the Employer’s Union Hanns-Martin Schleyer military airport of Fürstenfeldbruck where
in 1977 or the murder of the board spokesman all hostages and five of the eight kidnappers
of the German Bank Alfred Herrhausen in 1989 were killed. At first glance, this act of terrorism
are typical examples of a symbolic strategy of seems to be an enormous failure because all
eliminating influential representatives of the terrorists were killed or captured and their
predominant political and social system the demand for the release of 236 Palestinian
RAF fought against. Actors of modern terrorism prisoners in Israel and five people being
in the 21st century, first and foremost the hardly imprisoned in Germany at that time (among
comprehensible Al-Qaida network, have further them RAF-leaders Andreas Baader and Ulrike
increased this communication of terror. They Meinhof) had not been met. On the level of
strategically victimize innocents instead of communication, however, the attack must be
targeting and killing single representatives of seen as a sensational success. The attention of
the current social system, e.g. high-ranking about 6,000 media representatives gathered
politicians, public prosecutors or business for coverage of the Olympic Games in Munich
leaders. Random members of the community was redirected: away from the sports events
– people like you and me – shall be killed towards the current situation of the Palestine
instead. Through this mainly non-verbal form liberation movement which had mostly been
of communication they send the message that blanked out before19. The Palestine terror
‘nobody is safe’ and ‘everyone may become a organizations experienced a significant
victim of terrorist attacks’. Therefore, it has to increase in members after the Munich attack 20.
be stated that modern terrorism distinguishes And finally, about one and a half years later,
itself from more traditional forms of terrorism the PLO was granted a special observer status
by a shift of its meaning: away from the with the United Nations.
individuality of the victim towards a supra-
individual symbolism of the result of the offence. Modern terrorism works, to a large extent,
because we live in a globalized media society.
Terrorists specifically use globally operating
IV. Why terrorism works media such as TV stations, newspapers and
the Internet to multiply their tidings of gloom
and doom. They know that the killing of
Whenever we try to develop German Federal Army soldiers in Afghanistan
counterterrorism strategies based on criminal will quite naturally make the headlines of
law we have to distinguish the primary level of
the commission of criminal offences from the 19  Cooley, Green March, Black September: The Story
underlying level of communication. To prove of the Palestinian Arabs, 1973, 126; Hirst, The Gun
the point let us turn the view to the events that and the Olive Branch, 1977, 311; Möge, in: Miller (ed.),
took place at the Olympic Games in Munich in Terrorism: The Media and the Law, 1982, 96; Hoffman
1972: a PLO-commando called ‘Organization (fn. 10), 119.
Black September’ invaded the Olympic Village, 20  Schmid/de Graaf (fn. 17), 31.

47
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

all news programs, print media and Internet During this press conference, she presented
forums only a few hours after the attacks. Only the cornerstones of a draft bill which later
a couple of decades ago no one would have became law22. Especially staying in so called
even thought ‘about a bicycle toppling down ‘terror camps’ was meant to be criminalized.
on Tian’anmen Square’. Today, we could hear These plans were triggered by the arrests of
all about it in the evening news. As a result the so-called Kofferbomber (suitcase bombers)
terrorists can quite easily fight us with our and the Sauerland-Gruppe (Sauerland group).
natural born craving for sensation. The mass In addition to this, intelligence obtained by
media of the Western world only spreads the German security agencies pointed to the fact
message of terrorist attacks in epic breadth that Islamist motivated individuals would
due to a natural interest in these matters on increasingly travel to the Afghan-Pakistani
the consumers’ side. Thus the worst thing that border area to be trained in the handling of
could happen to a terrorist organization would weapons, ammunition and explosives. And
be: taking actions and committing crimes that finally, the European Council's Convention
no one notices or cares about! on the Prevention of Terrorism signed by the
Federal Republic of Germany and entered into
force on June1, 2007 23 contained the obligation
V. The Act on the prosecution to criminalize training for terrorist purposes in
Article 7 24.
of the preparation of serious
acts of violence endangering terroristischer Straftaten”, available at http://www.
bmj.bund.de.
the state (2009) 22  Cf. the draft by the Federal Government of
25 March 2009 (BT-Drs. 16/12428) as well as the
Let us turn to the latest act of the legislator in
recommended resolution of the Legal Committee
the area of substantial counterterrorism criminal
of the German Bundestag of 26 May 2009 (BT-Drs.
law – the Act on the Prosecution of the Preparation
16/13145, 4) which essentially limits to inserting the
of Serious Acts of Violence Endangering the State word ‘or’ instead of the original word ‘are’ in Section
– shortly GVVG. This amendment to the German 89a II no. 3 StGB; for the draft stage of the GWGs
criminal code entered into force on August 4, Backes StV 2008, 654 ff.; Deckers/Heusei ZRP 2008,
2009 and brought three new criminal offences in 169 ff.; Gierhake ZIS 2008, 397 ff.; Montag DRiZ 2008,
Sections 89a, 89b and 91 StGB. 141; Radtke/Steinsiek ZIS 2008, 383 ff.; UM DRiZ 2008,
140; Walter KJ 2008, 443 ff.; Beck, Paulus-FG, 2009, 15
(21 ff.); Kauder ZRP 2009, 20 ff.; Sieber NStZ 2009, 353
1. Objectives and regulatory content ff.; Weißer ZStW 121 (2009), 131 (145 ff.); the attempt to
‘literally upgrade’ the draft done in their own house
Starting point of the legislative process (BMJ), Wasser/Platzeck DRiZ 2008, 315 ff.
which led to these new legal provisions 23  SEV No. 196.
was a press conference by former Federal 24  Also cf. article 1 of the Framework Decision
Secretary of Justice Brigitte Zypries on April 2008/919/JI of the Council of 28 November 2009 for
21, 2008 attracting a great deal of attention21. changing the Framework Decision 2002/475/JI for
combating terrorism (fn. 16) which obliges the EU
21  See related press release of 21.4.2008 “Zypries member states in article 2 lit. a) to c) particularly also
– Neue Straftatbestände wegen Vorbereitung to penalizing the public instigation for committing a

48
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

The efforts of the German legislator are sad examples of a general trend towards
described above led to disappointing and declining standards in the area of the German
sobering results. From a formal point of penal legislation. Therefore, I would like to
view the whole legislative package is flawed limit myself to a closer look at the “spirit”
with a wide array of technical mistakes and of these new criminal offences. As a starting
inaccuracies25. The use of unclear, uncertain point, a short look at some aspects of the new
and broad concepts and terminology26, the regulations might be helpful.
disregard of standards of international
law in the legal provisions concerning the According to Section 89a (2) no. l StGB, a
applicability of German criminal law to person shall be liable to imprisonment from
foreign-related cases27 and the inappropriate six months to ten years who prepares a serious
authorization reservations in favor of the offence endangering the state by instructing
Federal Ministry of Justice28 have already another person or receiving instruction in the
been dealt with in detail elsewhere29. They production or the use of firearms, explosives,
explosive or incendiary devices, nuclear fission
material or other radioactive substances,
terrorist crime, the recruitment as well as training
substances that contain or can generate
for terrorist purposes; more on that in Zimmermann
ZIS 2009, I ff.
poison, other substances detrimental to
health, special facilities necessary for the
25  Walter KJ 2008, 443 (448 f.).
commission of the offence or other skills. This
26  For example, “andere gesundheitsschädliche
describes behavioral patterns in a very early
Stoffe” (“other substances detrimental to health”)
stage of terrorist motivated offences. The
and “sonstige Fertigkeiten” (“other skills”) in Section
actual execution of a concrete attack lies far
89a (2) no. l StGB, “wesentlich” (“essential”) in
Section 89a (2) no. 3 StGB, “nicht unerhebliche in the future. This means that only abstractly
Vermögenswerte” (“not unsubstantial assets”) in dangerous behavior which might lead to a
Section 89a (2) no. 4 StGB, “Beziehungen” (“contacts”) terrorist motivated offence at a later time are
in Section 89b (1) StGB, as well as the central being criminalized. Such a strategy is based on
connecting factor of a “schwere staatsgefährdende the realization that potential offenders always
Gewalttat” (“serious violent offence endangering the need the support of other individuals conveying
state”). the necessary basic knowledge for terrorist
27  Cf. Section 89a (3) and Section 89b (3) StGB. attacks. With the new German provisions in
28  Cf. Section 89a (4) and Section 89b (4) StGB. counterterrorism criminal law this leads to
29  Particularly compare the detailed commentary the rather absurd result that their wording
of Sections 89a, 89b and 91 StGB von Paeffgen, in: also encompasses the completion of a basic
NK, 3. edition (2009) as well as Zöller (fn. 7), 564 ff.; military training with the Federal Armed Forces,
Deckers/Heusel ZRP 2008, 169 ff.; Gierhake ZIS 2008, the attendance of a driving or flight school,
397 (403); Beck, Paulus-FG, 15 (23 ff.); Gazeas/Grosse- sportive activities in a judo or karate club or
Wilde/Kießling NStZ 2009, 593 (595 ff.); Radtke/ the casual jogging run in the evenings, since
Steinsiek JR 2010, 107 (108) clearly revealing the the skills acquired this way may also be useful
weaknesses of the law; on the question of the law
determination also Fischer, StGB, 57. edition (2010),
Section 89a ref. 38 f.; in contrast, Bader NJW 2009, breach, neither under aspects of proportionality
2853 (2855) surprisingly is not able to determine a nor certainty.

49
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

for later terrorist ambitions30. Nevertheless, the innovation in German criminal law. The concept
German legislator did not stop at this forward of constant expansion has also been used by
shift towards a criminalization of preparatory the German legislator in the field of criminal
actions. To be on the safe side even the offences relating to abstract dangers to the
‘preparation of preparatory actions’ is being environment, economy, narcotics, taxes,
penalized. This theory can easily be confirmed foreign trade or computer systems during
with a look at the newly established Section the past decades31. Within counterterrorism
89b (1) StGB. According to the elements of criminal law as an important part of crimes
crime, even establishing or maintaining contact against the state, it can already be found in
to a terrorist organization is now considered the penalization of forming or participating
a criminal offence. E.g. it is punishable by in terrorist organizations. Such behavior is
German criminal law to send an email to already being punished in Sections 129a StGB
representatives of the Al-Qaeda-network (national terrorist organizations) and 129b
as long as this happens with the intention StGB (terrorist organizations abroad). For
of receiving instruction for the purpose of these offences it is not necessary that the
the commission of a serious violent offence organization or its members have already
endangering the state at a later time. Also in planned or executed certain forms of criminal
this situation it remains completely unclear behavior. By establishing these legal provisions
whether the person seeking information will the legislator expressed the fact that he
later decide to prepare, to attempt or actually is not willing to just stand and watch the
execute a certain attack. The same applies to infringement of legally protected rights such
Section 91 StGB relying to displaying, supplying as life, physical integrity or personal freedom
or obtaining written material on the internet and start prosecuting these actions only after
which by its content is capable of serving as the harm is done. Therefore, Sections 129a
an instruction to the commission of a serious and 129b StGB enable the German police and
violent offence endangering the state. prosecution service to intervene as soon as
terrorist group structures are recognized, i.e.
usually long before the actual commitment of
2. Failure to justify the certain criminal offences like bomb attacks. A
anticipation of criminalization perfect example for such a preventive strategy
is the arrest of the “Sauerland-group” in 2007
To be precise, the anticipation of before their members even got the chance to
criminalization within the area of preparatory put their deadly explosive devices into place.
actions in itself can hardly be seen as a technical
It goes without saying that such a
30  Cf. Deckers/Heusel ZRP 2008, 169 (171); Montag preventive function of counterterrorism
DRiZ 2008, 141; Zöller (fn. 7), 569; concerning the criminal law32 – similar to the effect of
unconstitutionality of the inclusion of ‘other skills’”
(in German: “andere Fertigkeiten”) within the scope
of Section 89a II no. l StGB based on article 103 II 31  Hassemer ZRP 1992, 378 (381).
GG, see Gazeas/Grosse-Wilde/Kießling NStZ 2009, 32  OLG München NJW 2007, 2786 (2787); Hassemer
593 (597). ZRP 1992, 378 (380); Nehm NJW 2002, 2665 (2670);

50
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Section 30 StGB for the general criminal In contrast to the new criminal offences
law33 – leads to a radical breach of the established by the GVVG, the criminal liability
system. And for good reasons there is a vivid within the context of a terrorist organization
academic discussion about the anticipation can be legitimized36. The typical risk potential
of criminalization by means of criminal of these organizations does not only derive
offences relating to abstract endangerments from the offences that may be committed by
to legally protected interests34. At least in the their members and the typical collaborative
field of counterterrorism law, however, there modus operandi. Their characteristic feature
seems to be no serious alternative. Keeping rather has to be seen in the underlying process
criminal law on the sidelines of the fight of group dynamics37. Once several people
against international terrorism would mean have joined for the purpose of committing
to leave the field to the regime of intelligence criminal offences, this association of people
services such as the Verfassungsschutz (Office gains a special momentum. Through the
for the Protection of the Constitution), the mutual contact among leaders, members and
Bundesnachrichtendienst (Federal Intelligence supporters of the organization, individual
Service) and the Militärischer Abschirmdienst barriers can be overcome, additional motives
(Military Counter Intelligence Agency)35. But for committing crimes will be added and with
intelligence agencies are typically not bound by the help of the organizational structure of the
the safeguards under the rule of law in criminal group, planning and executing criminal actions
proceedings like the requirement of initial will become much easier38. A group regularly
suspicion, the presumption of innocence, the creates some kind of ‘pull effect’ keeping
principle of fair trial, the obligation to inform members with doubts and hesitations in line
the accused of his rights or the guarantee of through the threat of otherwise stigmatizing
the right of defense. them as traitors. Thus, a terrorist organization
can be compared with and visualized as a giant
ocean liner that can hardly be stopped once it
Weißer JZ 2008, 388 (393); idem ZStW 121 (2009), 131 has picked up speed.
(153 ff.); Beck, Paulus-FG, 15 (26 ff.).
33 Concerning the controversy about the legitimacy
of Section 30 StGB, see MK-Joecks, 2003, Section 30 36  Cf. Backes StV 2008, 654 (659).
ref. 11 f.; NK-Zaczyk, Section 30 ref. l ff.; Roxin, AT U, 37  BGHSt 28, 147 (148); 41, 47 (51); BGH NJW 1992,1518;
2003, Section 28 ref. l ff.; Köhler, AT, 1997, 544; Jakobs LK-Krauß, 12. edition (2009), Section 129 ref. 4; MK-
ZStW 97 (1985), 751 (765 ff.). Miebach/Schäfer, 2005, 778. edition (63. update,
34  For examples see Kindhäuser, Gefährdung als March 2005) Section 129 ref. 4; SSW-Patzak, 2009,
Straftat – Rechtstheoretische Untersuchungen Section 129 ref. 6; Schroeder, Straftaten gegen das
zur Dogmatik der abstrakten und konkreten Strafrecht, 1985, 6; Rudolphi, Bruns-FS, 1978, 315
Gefährdungsdelikte, 1989; Zieschang, Die (320); Radtke/Steinsiek JR 2010, 107 (108).
Gefährdungsdelikte, 1998; Wohlers, Deliktstypen 38  LK-Krauß, Section 129 ref. 4; SK-Rudolphi/Stein,
des Präventionsstrafrechts – Zur Dogmatik Section 129 ref. 3; NK-Ostendorf, Section 129 ref. 5;
“moderner” Gefährdungsdelikte, 2000; Hassemer Nehring, Kriminelle und terroristische Vereinigungen
NStZ 1989, 553 ff.; idem ZRP 1992, 378 ff. im Ausland, 2007, 420 ff.; Gierhake ZIS 2008, 397;
35  Griesbaum, Nehm-FS, 125 (137). Weißer ZStW 121 (2009), 131 (136).

51
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

The new Sections 89a, 89b and 91 StGB maintaining a peaceful coexistence of humans,
lack such a legitimation for the anticipation we should not resort to the means of criminal
of criminalization due to group dynamics. law too hastily43. Our constitutional law,
According to the legislative materials, the focus particularly the rule of law, prohibits the simple
of these offences lies on cases of preparatory conclusion that dangerousness of a certain
actions in which there is no evidence of behavior inevitably leads to its punishability44.
the existence of a terrorist organization, New criminal offences dealing with abstract
meaning that actions of individuals cannot risks can only be added to the criminal code
be prosecuted as participation in or support if the interference with citizens’ fundamental
of such an organization39. Accordingly, during rights and freedoms can be justified45. The
the legislative process the German Federal offences described in Sections 89a, 89b and
Government was accused of having invented 91 StGB have been created to paraphrase
something new called the ‘one-person terror necessary preconditions for terrorist attacks.
cell’40. But behind this lighthearted note a more They deal with the required knowledge
serious truth is hidden. It describes nothing (e.g. about handling arms and explosives)
less than a ‘breach in a dam’ of the German or the necessary instrumentalities (e.g.,
criminal law system. The GVVG symbolizes firearms, toxins or financial resources). Such
the departure from an important principle of behavior will not necessarily and not without
German criminal law regarding crimes against intermediate steps lead to the commission of
the state: impunity of preparatory actions by attacks. At the time the GVVG has in mind it is
individuals41. still written only in the stars whether or not it
may come to the killing or violation of people
Due to its specific sanctions criminal or the damaging of property.
law represents a section of the legal system
intruding quite heavily in civil rights and Potential terrorist motivated offenders
liberties. Not everything which might be can still (and often will) change their minds
regarded as undesirable from a social point and decide against the use of preconditions
of view should be considered a criminal created by them to commit acts of violence.
offence with regard to the general principle Outside processes of group dynamics which
of subsidiarity42. Criminal Law is designed to the legislator has in mind in Sections 129a
secure only fundamental basics and values of and 129b StGB, the result of the decision-
our society. Whenever there are alternatives for making process of the individual concerning
the realization of a future criminal offence is
39  BT-Drs. 16/12428, 2. still open for input46. There is obviously no law
40  Following the fitting title of the contribution by
Puschke, Mitteilungen der Humanistischen Union 43  Roxin AT I, ref. 97 f.; Bringewat, Grundbegriffe
No. 204 (1/2009), l ff. des Strafrechts, 2nd edition (2008), ref. 24; Walter KJ
2008, 443 (445).
41  Gierhake ZIS 2008, 397 (405).
44  Gierhake ZIS 2008, 397 (405).
42  Concerning the term “ultima ratio” in the field
of criminal law, cf. BVerfGE 39, l (47); 90, 145 (172 f.); 45  Gierhake ZIS 2008, 397 (399).
Roxin, AT I, 4th edition (2006), Section 2 ref. 97 ff.; 46  Gierhake ZIS 2008, 397 (402); Weißer ZSfW 121
Jescheck/Weigend, AT, Section 11. 2. (2009), 131 (149).

52
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

of nature connecting the act of downloading of secondary importance. This leads to mere
a bomb-making instruction from the internet ‘symbolic criminal law’48 lacking a real field of
to the actual execution of a bomb attack. The application whose primary goal is a general
respective internet user can change his mind calming of our minds. It seems treacherous
– and presumably will do so in most cases. that the new criminal offences established in
The criminal offences created in 2009 thus 2009 were meant to deal with the stay and
describe abstract hazardous conditions whose training in so called ‘terror camps’ abroad
transformation into actual infringements but these words are not even mentioned in
usually still depends on self-determined the provisions. Probably the practicability of
behavior of the potential offender47. Such an these new legal provisions has never been
enormous anticipation of the criminalization the top priority. An Islamist saving a Jihadi
of preparatory acts for terrorist acts cannot training manual on his computer hard drive
be justified under the rule of law and therefore and confessing with tears in his eyes during his
has to be classified as disproportionate and trial that he has done all that in order to learn
unconstitutional. how to effectively commit acts of violence
against the state, is a work of fiction and rather
belongs to the world of fantasy.
3. Victory of fear?
It seems to be much more plausible that the
The question remains: what reasons may new criminal offences shall work as levers to
drive politicians to such disproportionate expand the scope of criminal investigations49.
measures? The answer seems to be obvious: Already the title of the act emphasizes the
it is pure fear, actually fear of being held ‘prosecution’ of the preparation of serious
responsible personally or at least politically for offences endangering the state50. According
a possible omission to use all possible means to todays’ legal situation, probable cause for
to protect individuals from terrorist attacks. the commission of an offence according to
How deep the fear of international terrorism Section 89a StGB opens the door to telephone
is rooted in our consciousness is illustrated surveillances (Section l00a [2] no. la StPO [=
by the events at the Munich Airport on January Strafprozessordnung; German Code of Criminal
20, 2010. A false alarm during the hand luggage Procedure]), acoustic surveillance of private
screening of a laptop had triggered an almost
panic fear of a terror attack and completely
48  Cf. Hassemer NStZ 1989, 553 ff.; idem Roxin-FS,
confused the air traffic in Germany for several 2001, 1001 ff.; Schulte (fn. 11), 233; Radtke/Steinsiek JR
hours. At least in cases of emergency, the 2010, 107 (108).
legal measures aim at demonstrating at least
49  NK-Paeffgen, Section 89a ref. 3; Fischer,
formally that everything has been done for Section 89a ref. 6; Walter KJ 2008, 443 (445 f.); Beck,
the protection of citizens. If such laws actually Paulus-FG, 15 (31); Sieber NStZ 2009, 353 (354 f.);
work effectively in practice and if they can be concerning problems that may emerge in respect to
regarded as truly constitutional seems to be investigations in practice, see Radtke/Steinsiek JR
2010, 107 (109).
47  Fischer, Section 89b ref. 1; Gierhake ZIS 2008, 397 50  Likewise Fischer, Section 89a ref. 6; he also
(402). regards the legal title as remarkable.

53
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

premises (Section l00c [2] no. la StPO), search state under the rule of law and towards a state-
of non-suspicious people (Section 103 I 2 StPO), like structure which may be called ‘Absurdistan’.
establishing control points on public streets Heribert Prantl, famous German journalist with
and squares (Section 111 [1] StPO; also cf. the “Süddeutsche Zeitung”, has aptly described
Section 163d [1] StPO), arrest warrants (Section this development in the title of his recent
112a I no. 2 StPO) or confiscation of assets book called “Der Terrorist als Gesetzgeber”
(Section 443 I l no. l StPO). This ‘upgrade’ for (The terrorist as legislator)52. If terrorism is a
the arsenal of criminal investigation measures communication strategy with the ultimate goal
was also influenced by the fear of terrorist of spreading fear and terror, we must not react to
threats. But in addition to this, there is another terrorism with a permanent state of emergency.
unpleasant truth to keep in mind. A significant As soon as we start to sacrifice fundamental
improvement of the current security situation principles of the rule of law in the fight against
could easily be achieved by creating new international terrorism, we will slowly but
jobs for police and judiciary which have been steadily – like a self-fulfilling prophecy – create
chronically understaffed for years. But such exactly the kind of state resembling the picture
measures would actually cost money – money, of an unjust nation which is drawn by terrorists.
which is not available or which politicians are In order to avoid any misunderstanding: terrorist
not willing to spend for this purpose. In contrast motivated crime clearly belongs to the worst
to this, the creation of new legal provisions is evils of humanity. Terrorists who kill and injure
cheap. Usually such a draft bill in matters of innocent people to abuse the widespread
criminal law contain a short notice stating that message of terror for their ideological purposes
no additional costs will arise51. must be prosecuted with utmost severity. But
we have to stop sacrificing those fundamental
principles of the rule of law that represent the
VI. On the way to Absurdistan identity of our society. We need more sense or
proportion and less delimitation, more normality
and less state of emergency, more consideration
Legal policy dominated by fear leads us and less panic. Otherwise, Al-Qaida and Co. have
away from the Federal Republic of Germany as a already won53 and we would really have to say:
‘Welcome to Absurdistan!’
51  Thus, with reference to GVVG in BT-Drs.
16/12428, 3 under “D. financial effects on the public
households”, it simply reads:
“1. Household expenses without effort of execution
None.
2. Effort of execution 52  Prantl, Der Terrorist als Gesetzgeber – Wie man
Due to the introduction of the new penal provisions, mit Angst Politik macht, 2008.
an additional effort for law enforcement agencies 53  Also see the evaluation by Walter KJ 2008, 443
and courts may arise, which is currently neither (450), according to which already the draft of the
quantifiable for the area of the federal government nor GVVG creates the impression ‘that our constitutional
the states. Possible additional expenses of the federal state loses its nerves when faced with the danger of
government must be considered in the individual the Islamic terror. With it, it harms itself more than
plans affected by the delay in each case.” terrorists could.’

54
A tipificação de crimes terroristas no Brasil:
comentários à luz do Direito Internacional
e do Direito comparado*
* Agradecimentos ao Procurador da República Tiago Misael de Jesus Martins, mestrando em Ciências Jurídicas
na Universidade Federal da Paraíba, pelo apoio precioso.

SVEN PETERKE comparado, ao mesmo tempo levando em


consideração conhecimentos criminológicos
Professor de Direito Internacional sobre o fenômeno. Ressalva-se que a análise
Público no Centro de Ciências Jurídicas feita não pretende ser completa ou exaustiva;
da Universidade Federal da Paraíba pelo contrário, trata-se de comentários
pontuais, cuja principal função consiste
em oferecer reflexões críticas sobre tema
1. Introdução complexo e suscetível de instrumentalização
para fins políticos.
Mais uma vez o Brasil discute sobre o
crime de terrorismo e a necessidade da sua Ninguém duvida da obrigação dos
tipificação. Desta vez, porém, o debate não foi Estados em tomar as medidas necessárias
estimulado por acontecimentos violentos, que para proteger seus cidadãos contra esse
ocorreram nas ruas brasileiras e abalaram o antigo flagelo da humanidade, que renasceu
público geral, mas pelo próprio legislador. nas últimas décadas em dimensões cada vez
Já há algum tempo circulam no Congresso mais assustadoras. Todavia, a pergunta que
Nacional vários projetos de leis que tratam se coloca é: até que ponto essas medidas
desse controvertido assunto1. No entanto, foi requerem reformas mais profundas do
nomeadamente o PLS n. 499/2013 que causou Direito Penal? Não faltam experiências com
as polêmicas mais recentes, sobretudo por legislação antiterrorista no direito comparado
propor a adoção de uma lei antiterrorista que e, infelizmente, sua análise recomenda a
define vários crimes terroristas, destacando- adoção de uma postura reservada, ao invés de
se, assim, de propostas mais modestas que só cair em entusiasmo prematuro. Há exemplos
previam leves modificações no Código Penal demais para a aplicação abusiva, excessiva
brasileiro2. ou, simplesmente, inadequada dessas leis
antiterroristas – que frequentemente carecem
A seguir, após breve apresentação de de um foco suficientemente preciso e podem
seu conteúdo central, o referido PLS será se tornar ferramentas de decisões arbitrárias,
analisado à luz das obrigações decorrentes com graves implicações para os direitos
do direito internacional público e do direito humanos 3. Até quando respeitam as regras

1  Por exemplo, o PL n. 4.674/2012 e o PLS n. 762/2011. 3  Para alguns exemplos ilustrativos: WHITAKER,
2  PLS n. 236/2011. 2007; FOOT, 2005.

55
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

do jogo do Estado Democrático de Direito, 2. Breve apresentação


tais leis tendem a produzir efeitos colaterais do PLS n. 499/2013
significativos que frustram as boas intenções
do legislador. Portanto, é preciso levar a sério O PLS em tela, assinado à época pelo
os potenciais defeitos e perigos de uma lei Senador Romero Jucá (PMDB) e pelo Deputado
antiterrorista em discussão no Congresso Federal Cândido Vaccarezza (PT), em nome
Nacional para prevenir danos futuros. da Comissão Mista destinada a consolidar a
legislação federal e a regulamentar dispositivo
Tornou-se costume apontar para o da Constituição Federal, apresenta-se sem
fato de que tais leis, por estipularem dúvida muito ambicioso. Conforme o seu art. 1º,
competências jurisdicionais especiais e penas ele procura nada menos do que definir “crimes
recrudescidas, normalmente introduzem de terrorismo, estabelecendo a competência
ideias bastante autoritárias ao modelo liberal da Justiça Federal para o seu processamento,
do Direito Penal4. No entanto, talvez seja além de dar outras providências”. No que se
ainda mais importante frisar que elas podem refere às “outras providências”, estipula, por
gerar processos discursivos e psicossociais exemplo, que os delitos “são inafiançáveis
estigmatizantes, que podem radicalizar e insuscetíveis de graça, anistia ou indulto”
conflitos, grupos e problemas sociais até (art. 10), em conformação ao art. 5º, inciso
então sob razoável controle do Estado. Daí XLIII, da Constituição Federal de 19885, carta
ser imperativa a análise objetiva e rigorosa de esta conhecida por seu repúdio explícito ao
todas as letras da lei proposta, reconhecendo, terrorismo6.
todavia, que as contribuições do Direito Penal
ao combate ao terrorismo são relativamente Seis são os crimes que o PLS n. 499/2013
modestas – ressalva que vale ainda mais no propõe. O primeiro deles se encontra
que se refere ao Direito Penal material. Quem tipificado logo em seu art. 2º, sob a rubrica
mata por motivos ideológicos, usa bombas ou “terrorismo”, e prevê pena de 15 a 30 anos
sequestra pessoas para chamar atenção para de reclusão para “provocar ou infundir terror
determinada causa política, jamais ficará ou pânico generalizado mediante ofensa ou
impune, pois sempre infringe tipos penais tentativa de ofensa à vida, à integridade física
que garantem sua condenação. Portanto, ou à saúde ou a privação da liberdade de
as perguntas-chave são se essa punição pessoa”. No mais, estipula reclusão de 24 a 30
prevista pela legislação vigente é adequada e
até que ponto há lacunas jurídicas em relação
5  Art. 5º, inciso XLIII, CF – A lei considerará crimes
a certas atividades terroristas que justificam
inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a
os delitos propostos no projeto de lei em
prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes
questão. e drogas afins, o terrorismo e os definidos
como crimes hediondos, por eles respondendo
mandantes, os executores e os que, podendo evitá-
los, se omitirem.
4  ALBRECHT, 2010, p. 385-397. 6  Art. 4º, VIII, CF.

56
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

anos, se o ato terrorista resultar em morte7, prática de terrorismo”. Para a subsunção do ato
e seis causas de aumento de pena como, por à norma é desnecessária a efetiva execução
exemplo, o emprego de explosivo ou fogo, da conduta terrorista. A pena é igual àquela
em meio de transporte coletivo ou contra prevista no art. 2º: reclusão, de 15 a 30 anos.
pessoas internacionalmente protegidas8.
Enfim, prevê consequências especiais se o O tipo mais brevemente descrito é aquele
ato for perpetrado por funcionário público, do art. 5º, que consiste em meras três palavras:
nomeadamente a perda de cargo, função “Incitar o terrorismo”, punido com três a oito
ou emprego público e a interdição para seu anos de reclusão. Em sequência, o art. 6º
exercício pelo dobro da pena aplicada9. estipula a mesma pena para o agente que der
“abrigo ou guarida a pessoa de quem se saiba
Crime correlato ao do art. 2º é o tenha praticado ou esteja por praticar crime
“terrorismo contra coisa”, previsto no art. de terrorismo”. Por fim, o derradeiro tipo penal
4º do PLS. As elementares do tipo são é a “associação em grupo terrorista”, descrita
semelhantes (“provocar ou infundir terror ou como aquela integrada por “três ou mais
pânico generalizado”), exceto pela ressalva pessoas com o fim de praticar terrorismo”, com
de que a ação ocorre “mediante dano a bem pena de cinco a 15 anos de reclusão12.
ou serviço essencial”. São considerados
como “serviço essencial” barragem, central Os sete artigos restantes tratam do
elétrica, aeroporto, porto, rodoviária, estação arrependimento que extingue a punibilidade,
de metrô, meio de transporte coletivo, ponte, da proteção legal para o repetitus13, do
hospital, casa de saúde, instituições de ensino cumprimento da pena14, bem como da
ou estádio esportivo, entre outros10. A pena competência da Justiça Federal para processar
prevista é de oito a 20 anos de reclusão, e julgar tais crimes15, além de outros detalhes.
com possibilidade de aumento para algumas Entre esses dispositivos derradeiros, destaca-
hipóteses definidas pelo art. 2º, § 2º11. se a revogação do art. 20 da Lei n. 7.170/1983 – “Lei
da Segurança Nacional”16, que hodiernamente
O art. 3º, intitulado “financiamento do criminaliza o cometimento de “atos de
terrorismo” criminaliza a ação de “[o]ferecer, terrorismo, por inconformismo político ou para
obter, guardar, manter em depósito, investir ou obtenção de fundos destinados à manutenção
contribuir de qualquer modo para a obtenção de organizações políticas clandestinas ou
de ativo, bem ou recurso financeiro com a subversivas”, prevendo uma pena de três a dez
finalidade de financiar, custear ou promover anos.

7  Art. 2º, § 1º, PLS 499/2013.


12  Art. 7º, PLS n. 499/2013.
8  Art. 2º, § 2º, PLS 499/2013.
13  Art. 8º, PLS n. 499/2013.
9  Art. 2º, § 3º, PLS 499/2013.
14  Art. 9º, PLS n. 499/2013.
10  Art. 4º, § 1º, PLS n. 499/2013.
15  Art. 10º, PLS n. 499/2013.
11  Art. 4º, § 2º, PLS n. 499/2013.  Seu § 3º
corresponde ao Art. 2º, § 3º. 16  Art. 12º, PLS n. 499/2013.

57
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Os principais argumentos constantes da sido declarada inconstitucional. Por outro


justificativa parlamentar para a apresentação lado, sua substituição por uma legislação
do PLS serão a seguir analisados. democraticamente mais legítima e moderna
não necessita da adoção de definição tão
ampla como a proposta nos arts. 2º e 4º do
3. Análises dos crimes PLS n. 499/2013.

previstos pelo PLS n. 499/2013 Na verdade, não há dever internacional


algum que obrigue a adoção de uma definição
legal para os crimes de terrorismo. Nos planos
3.1. A tipificação do conceito
universal e regionais20 há várias convenções
de terrorismo – arts. 2º e 4º antiterroristas que hoje gozam de alto nível
de aprovação na comunidade de Estados.
No que se refere à tipificação do conceito Além do mais, o Brasil é signatário de quase
de terrorismo, o PLS sustenta que “urge todos os acordos que costumam criminalizar
o estabelecimento de contornos jurídicos condutas terroristas específicas, tais como
concretos e razoáveis para a repressão penal sequestro de aeronaves, proteção do corpo
de atos terroristas, já que, de um lado, eles diplomático ou proibição de atentados com
são expurgados pela Constituição Federal bombas. Tipicamente, essas convenções
de 1988 e por muitos tratados ratificados surgiram em reação a ataques terroristas que
pelo Brasil, gerando a obrigação jurídica de chocaram o mundo em determinado momento
fazê-lo”17. Em seguida, defende-se que a falta histórico, assim possibilitando um consenso
de uma definição do crime do terrorismo na rápido, mas parcial, sobre um conceito até hoje
atual legislação brasileira tornaria “confusa controverso entre os Estados21. A ideia principal
a aplicação pelos órgãos internos desse desses acordos “parciais” é garantir jurisdição
instrumental normativo”18, agravado pelo fato universal sobre os delitos, harmonizar as
de que o art. 20 da Lei n. 7.170/1983 “padece de legislações nacionais e aumentar a eficiência
vários vícios, pois utiliza o maleável crime de da cooperação internacional concernente à
terrorismo para reprimir opositores [...] além matéria; todavia, nenhum deles prevê obrigação
de não definir o ato terrorista”19. Não obstante, internacional de tipificar determinado conceito
será que a argumentação parlamentar do terrorismo.
convence?
As convenções internacionais estabelecem
Indubitavelmente, merece apoio obrigações de resultado, ou seja, requerem
a ideia de pôr fim a lei de origem não uma revisão da legislação vigente para
democrática, cujo conteúdo central é tão garantir que as condutas consideradas como
indeterminado que há muito já devia ter terroristas sejam adequadamente puníveis na
ordem jurídica doméstica. Nem é necessária
17  PLS n. 499/2013, p. 4. 20  Para uma visão geral, ver DOSWALD-BECK, 2011,
18  Ibidem, p. 5. p. 128.
19  PLS n. 499/2013, p. 5. 21  O'DONNELL, 2006, p. 853.

58
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

referência explícita ao termo estigmatizante de “provocar ou infundir terror ou pânico


“terrorista”, que deve ser utilizado cautelosa e generalizado” seria excessivamente aberto e
restritivamente por duas importantes razões: “não responderia às críticas que fizemos sobre
além do seu possível abuso pela mídia e pela sua potencial e perigosa maleabilidade”26.
classe política, o termo é também altamente A seguir, a justificativa parlamentar alega a
suscetível a interpretações de cunho contextualização do crime proposto “pela
ideológico pelos próprios operadores da lei. motivação ideológica, religiosa, política
Portanto, justificar o PLS pela falta de definição ou de preconceito racial ou étnico”, que se
adequada desse crime na atual legislação é deu, sobretudo, pela inserção da expressão
argumento que só convence se houver boas “generalizada”. Ela servira para caracterizar a
razões para acreditar que a futura aplicação “dimensão ampliada” do terrorismo27.
dos tipos penais propostos ocorrerá de forma
menos tendenciosa do que o dispositivo Infelizmente, não é bem assim. Para
vigente. No entanto, isso é duvidoso. a concretização do Direito Penal não vale
a pretensão declarada na justificação
A justificativa do PLS explica que ele parlamentar, mas as elementares dos tipos
se deixou inspirar, no que se refere à penais propostos, pois são elas que serão
conduta nuclear da definição de terrorismo aplicadas e interpretadas pelas autoridades
(“provocar ou infundir terror ou pânico competentes. Observa-se que falta ao
generalizado”), pela famosa Convenção da caput dos arts. 2º e 4º qualquer referência
Liga da Nações de 1937 22-23. Historicamente, à motivação específica de terroristas, tendo
essa convenção representa o único exemplo como consequência direta sua potencial
em que negociações sobre a tipificação de um aplicação a coletivos que não se qualificam
conceito mais ou menos genérico resultaram como tais.
em aprovação final pelos Estados. Por essa
razão, sua citação é popular até hoje e Terroristas querem mais do que
serve para ponto referencial nos debates. simplesmente provocar ou infundir terror ou
Entretanto, a Convenção de 1937 nunca entrou pânico generalizado. Terrorismo é, em essência,
em vigor, entre outros motivos, pelas dúvidas violência simbólica para a promulgação de
concernentes à confiabilidade da definição mensagens políticas que devem alcançar
prevista24. Por isso, não representa sequer dois grupos-alvo: primeiro, os “inimigos” dos
direito costumeiro25. terroristas, que geralmente representam o
sistema dominante (político, econômico ou
O próprio PLS reconhece que restringir religioso) e aos quais se pretende desafiar
o tipo penal somente ao objetivo nuclear com a conduta chocante; e, segundo, os
simpatizantes dos métodos terroristas28-29.
22  Convention for the Prevention and Punishment
of Terrorism. LoN Doc. C.546M.385.1937.V. 26  PLS n. 499/2013, p. 6.
23  PLS n. 499/2013, p. 6. 27  Ibidem.
24  DUFFY, 2005, p. 19. 28  Ibidem.
25  SAUL, 2006, p. 78 (102). 29  WALDMANN, 2005, p. 36.

59
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

No caso dos simpatizantes, o ato da violência por exemplo, pela ocupação ilegal de espaço
serve para chamar a sua atenção e provocar privado e público –, e não clandestina, como
aplauso e aprovação; eles são estimulados a os terroristas fazem. Assim, a ação desses
apoiar a luta do grupo ainda fraco e pequeno movimentos sociais representa uma forma
e, por isso, sem condição real de enfrentar de protesto que se classifica melhor como
abertamente o Estado. desobediência civil 31.

Portanto, a violência faz parte de uma Em determinadas situações, no entanto,


estratégia complexa de comunicação em integrantes de movimentos sociais usam de
que a mídia desempenha uma função de fato violência, embora raramente de modo
destaque. Como existe muita violência sobre intencional contra outras pessoas, mas,
a qual a mídia costumeiramente relata – e até sobretudo, contra propriedade particular.
um considerável número de terroristas que Evidentemente, como qualquer outro cidadão,
concorrem pela atenção dela30 –, os terroristas eles podem e devem ser responsabilizados
precisam produzir um número de vítimas na Justiça pelos atos e danos causados.
acima do nível comum, ou praticar atos de uma O princípio da legalidade vale para todos.
brutalidade tal que choque o público geral, já Todavia, não se trata de terroristas ou, menos
relativamente imune contra tais imagens. ainda, de grupos terroristas. Seria excessivo
aplicar-lhes leis antiterroristas. Ocorre que há
Como o conceito proposto pelo vários exemplos das dificuldades dos órgãos
PLS n. 499/2013 não consegue capturar do Estado brasileiro em aplicar as leis de
adequadamente os verdadeiros motivos dos forma igual32, o que indica risco real de abuso
grupos terroristas, a redação do tipo penal da legislação proposta no PLS n. 499/2013,
proposto ficou demasiadamente “inclusiva”. aplicando-a aos movimentos sociais.
Uma breve discussão de dois exemplos
emblemáticos ilustra esse fato. O próprio legislador reconheceu esse risco
recentemente. Na Emenda n. 13 ao PLS, propus
a inclusão de um art. 14, que estipularia:
a) Inclusão de atos cometidos
por movimentos sociais Esta Lei não se aplica a manifestações
políticas, conduta individual ou coletiva
Em essência, os movimentos sociais são de pessoas, movimentos sociais ou
coletivos que lutam para o reconhecimento sindicatos, movidos por propósitos sociais
de reivindicações mal representadas pelo ou reivindicatórios, visando contestar,
Estado e pela classe política. Enquanto criticar, protestar, apoiar com o objetivo
essa luta se dá, em geral, de modo pacífico,
a infração de determinadas leis pode fazer
parte do cálculo desses grupos para chamar
atenção. Todavia, nessas situações a infração
é praticada de forma aberta e visível – como, 31  Comparar BOBBIO, 2008, p. 335.
32  Infelizmente, não faltam exemplos. Ver, entre
30  KRUMWIEDE, 2005, p. 29 (74). outros, TANGERINO; D’AVILA; CARVALHO, 2012, p. 1-21.

60
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

de defender ou buscar direitos, garantias e pois não querem desnecessariamente chamar


liberdades constitucionais33. a atenção das instituições públicas. Via de
regra, eles tentam manter o Estado à distância
Evidentemente, o argumento que serviu pela corrupção dos seus servidores, a qual
para justificar a tipificação do conceito de serve também como forma de infiltração nas
terrorismo no PLS – prevenir uma aplicação instituições do Estado e de manipulação de
confusa da lei pelas autoridades públicas suas decisões para a defesa de determinado
– não convence sequer seus próprios status quo ou para conquista de benefícios
autores. Sem dúvida, a cláusula de proteção pessoais35.
proposta pela Emenda nº 13 é necessária e,
provavelmente, teria certo efeito positivo, Quando os “soldados” do crime organizado
ainda que concedesse aos operadores da lei – muitas vezes, “soldados terceirizados” –
considerável margem de discrição. atacam o Estado com meios violentos, o
motivo é principalmente protesto contra
determinadas medidas de repressão que
b) Inclusão do crime organizado priva suas organizações de certos privilégios
ou espaços anteriormente concedidos pelo
Esse exemplo fica ainda mais evidente Estado. A Convenção da ONU contra Crime
quando se discute a necessidade de delimitar Organizado Transnacional, de 2000, ratificada
as diferenças essenciais entre o terrorismo pelo Brasil em 200436, reconhece essa
e o crime organizado, demonstrando a diferença motivacional entre crime organizado
“inclusividade” excessiva dos arts. 2º e 4º. e terrorismo de forma muito clara, falando
Existe uma diferença importante entre os dois para aquele de “benefício econômico ou outro
conceitos que consiste, sobretudo, no fato de benefício material”37.
que o último deles (crime organizado) oferece,
de modo empresarial, bens ou serviços ilícitos No Brasil, porém, a nova “Lei contra o
para obtenção de benefícios econômicos ou Crime Organizado”, Lei n. 12.850/2013, mal
outras vantagens materiais34. Em comparação incorpora essa diretriz importante, embora
com os grupos terroristas, seus perpetradores não vinculante, falando “do objetivo de obter,
não são contra “o sistema” vigente e não direta ou indiretamente, vantagens de qualquer
lutam por mudanças políticas no Estado; pelo natureza”38. A razão principal para a indiferença
contrário, geralmente, vivem muito bem nele, da citada lei em relação ao elemento subjetivo
pois conseguiram ocupar espaços em que parece ser o fato de ela justamente pretender
a autoridade do Estado ficou ausente. Por abarcar os grupos terroristas, deixando clara a
essa razão, criminosos organizados preferem
meios não violentos, em particular, ameaças,
35  KARSTEGT, 2012, p. 95 (98).
33  SENADO FEDERAL, 2014, p. 1. 36  Decreto n. 5.015, de 12 de março de 2004.
34  O conceito do crime organizado é igualmente 37  Conferir Artigo 2º, “a”, da Convenção da ONU
muito controverso em seus detalhes. No entanto, a Contra o Crime Organizado Transnacional. Compare
definição apresentada goza razoável aceitação na HAUCK; PETERKE, 2010, p. 407-436.
doutrina. Conferir ALBANESE, 2011, p. 4. 38  Art. 1º, § 1º, Lei n. 12.850/2013.

61
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

sua aplicabilidade “às organizações terroristas Sem dúvida, essa convergência pode
internacionais, reconhecidas segundo as ocorrer tanto no nível operacional como no
normas de direito internacional, por foro do nível motivacional, mas não se trata de um
qual o Brasil faça parte, cujos atos de suporte fenômeno comum ou sequer generalizado.
ao terrorismo, bem como os atos preparatórios Todavia, serve como argumento para reivindicar
ou de execução de atos terroristas, ocorram ou a unificação da “guerra ao terrorismo” e da
possam ocorrer em território nacional”39. Não é “guerra às drogas”, com várias implicações. Na
fácil compreender o que o legislador quer dizer praxe dos Estados, essa fusão já aconteceu
com “reconhecidas segundo as normas de em parte, pelos menos, no nível operacional.
direito internacional”, mas, dada a hipótese de Conceitualmente, porém, o direito internacional
que grupos terroristas se enquadram também continua a ser baseado na distinção tradicional
na Lei n. 12.850/2013, as perguntas que entre crime organizado e terrorismo. Para isso,
merecem uma análise mais fina são: por que há boas razões. Sobretudo, elas residem no
faz sentido distinguir entre os dois fenômenos fato de que a prevenção da criminalidade é
no nível conceitual?40 Justificam-se ou são aspecto fundamental e legitimador do direito
necessárias as diferenças motivacionais entre penal moderno, sendo a principal justificação
os grupos terroristas e o crime organizado em para a aplicação de medidas punitivas pelo
um tratamento jurídico diferenciado? Estado43. Pode ser verdade que várias medidas
investigativas, que provaram razoável eficácia
Há, de fato, teóricos que sustentam no combate ao terrorismo, também possuam
respostas negativas, questionando a a mesma utilidade no combate ao crime
tradicional distinção entre crime organizado organizado – e vice versa44. Entrementes,
e terrorismo. Eles partem da observação de há diferenças significativas que certamente
que atos terroristas ou até de insurgência importam no momento em que determinado
são cada vez mais praticados por “mafiosos”, tipo penal permite estigmatizar criminosos
geralmente, envolvidos no narcotráfico e, organizados como terroristas.
assim, na chamada “guerra às drogas”. Por isso,
esses autores falam de “narco-terrorismo”, Os últimos raramente se consideram
“terrorismo criminal”, “narco-insurgência” criminosos comuns, mas, via de regra,
ou “insurgência criminal”, representando lutadores de uma causa divina ou justa. Na sua
fusões conceituais altamente polêmicas41 opinião, a aplicação da violência é eticamente
na discussão sobre a “convergência” desses legitimada por valores superiores àqueles
fenômenos muito dinâmicos42. exprimidos pela legislação vigente. Por isso,
quando detidos, terroristas exigem geralmente
do Estado “inimigo” tratamento privilegiado
39  Art. 1º, § 2, II.
como “prisioneiros de guerra” e rejeitam
40 Não se confunde a questão conceitual (material) profundamente sua classificação como
com a processual.
criminosos comuns, sendo outro argumento
41  Comparar MARTIN, 2014, p. 243 (246), e SCHMID,
2005. 43  MEIER, 2007, p. 231.
42  Ver CHANG, 2010, p. 11-20; MAKARENKO, 2004, p. 44  Exemplo principal é a tentativa de privá-las das
129-145. suas fontes financeiras.

62
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

forte contra a tipificação do conceito. Por que seu poder. Pior ainda, se a lei proposta for
não os tratar como criminosos comuns, ao aprovada, legitimaria discursos e medidas
invés de afirmar, pela aplicação do estigma de populistas46 da classe política e de certos
terrorista, sua convicção de que são presos representantes das autoridades públicas sobre
por razões políticas? um “inimigo interno”, que, como vimos, seria
artificialmente criado pela própria legislação
Por outro lado, membros de organizações antiterrorista. Portanto, o PLS n. 499/2013
criminosas raramente duvidam da legitimidade pode ser um “gol contra” em virtude dos seus
política do Estado para condená-los. De certa potenciais efeitos contraproducentes.
forma, reconhecem que cometeram atos
puníveis conforme o código penal vigente.
Assim, estigmatizá-los como terroristas pode Conclusões parciais
desencadear efeitos fatais, pois logo podem
se sentir “honrados” pelo “prestígio” que o
Estado lhes concede. Talvez até se tornem Em resumo, não há qualquer obrigação
mais cientes do poder de que dispõem ou internacional que imponha a tipificação do
podem exercer, transformando-se em atores crime de terrorismo, menos ainda de modo
realmente políticos. Quando começam a se tão genérico como o proposto. O direito
considerar como “prisioneiros políticos” e seus internacional estabelece obrigações de
grupos como “politicamente perseguidos”, resultado, exigindo que os delitos previstos
chegou-se certamente a esse ponto perigoso nas convenções antiterroristas sejam
que consiste na criação desnecessária de um adequadamente perseguíveis e puníveis na
“inimigo interno”. jurisdição dos seus Estados Partes. Para
cumprir devidamente essas obrigações,
Frisa-se que, no Brasil, muitas facções basta revisar o Código Penal e implementar,
criminosas declaram em seus estatutos se for necessário, algumas modificações, por
lutarem contra a opressão no sistema exemplo, para a inserção de agravantes ou
penitenciário e pelos direitos humanos dos causas de aumento de pena. O que outros
presos45. Até agora, essa lenda foi relativamente Estados democráticos fizeram foi menos
fácil de deslegitimar, embora seja de amplo realizar reformas profundas em seu direito
conhecimento as condições muitas vezes material, e mais realizar modificações no
desumanas e degradantes das prisões direito processual para investigarem com
brasileiras (como recentemente afirmado pela mais eficácia esses delitos. Desde o advento
justiça italiana no caso Pizzolato). Diante disso, da Lei n. 12.850/2013, o Brasil dispõe de tal
a condenação dos integrantes dessas facções instrumento – para que mais do que isto?
criminosas organizadas por atos de terrorismo
pode ensejar dinâmicas que frustrem os Até Estados Democráticos de Direito,
esforços feitos pelo Estado para privá-los de que reconhecidamente sofrem ou sofreram
terrorismo interno, em geral conseguem
45  Vejam-se os exemplos do Comando Vermelho enfrentar o fenômeno sem tipificação deste.
(CV) e do Primeiro Comando da Capital (PCC) em
PORTO, 2007, p. 77 e 89. 46  Ver, para um exemplo, PETERKE, 2007, p. 230.

63
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Pergunta-se, portanto, por que o Brasil, que criminalização adequada. Existe, desde o
não tem histórico de terrorismo desde o ano de 1999, convenção específica sobre
retorno à legalidade democrática, deve adotar, o assunto que se destaca dos outros
sem necessidade evidente, uma legislação instrumentos internacionais por conter uma
de alto risco? Pelas razões expostas, os definição semigenérica de terrorismo48. Ela
argumentos a favor não são conclusivos. Pelo se refere a atos cometidos “com intenção de
menos, é difícil sustentar que os benefícios causar a morte ou lesões corporais graves
da lei proposta predominam sobre as suas […]49 quando o propósito do referido ato, por
possíveis desvantagens. sua natureza e contexto, for intimidar uma
população, ou compelir um governo ou uma
Um forte argumento de cunho formal organização internacional a agir ou abster-
a favor do PLS n. 499/2013 supostamente se de agir”50. Além disso, considera delito, no
decorre da própria CF de 1988, art. 5º, XLIII, seu âmbito de aplicação, todos os atos que
que adota uma postura dura em relação ao foram criminalizados como terroristas pelas
terrorismo, exigindo seu trato como crime convenções internacionais anteriores.
inafiançável e insuscetível de graça ou anistia.
No entanto, também esse inciso merece uma Após os atentados terroristas de 11 de
reflexão crítica. A experiência com terroristas setembro, o Conselho de Segurança da ONU
condenados demonstra que eles, quando exigiu mediante a Resolução n. 1.373/2001
envelhecem, tendem a largar suas ideias mais esforços dos Estados-Membros contra o
extremistas, reconhecendo que há outros financiamento do terrorismo, sobretudo pela
caminhos não violentos para defender suas ratificação e implementação da Convenção de
convicções47. Ter tais convicções é direito 1999, que na época ainda não estava em vigor51.
fundamental e não crime. Se determinado Desde 2005, o Brasil é Estado Parte, junto
terrorista já cumpriu uma boa parte da sua com 185 outros Estados52, comprometendo-
alta pena, pode até existir um interesse se a dispor de legislação interna capaz de
público em conceder-lhe graça, por exemplo, punir os que oferecem apoio financeiro a
para incentivar sua reintegração na sociedade terroristas. Ademais, tem compromissos
e motivar outros terroristas condenados a internacionais assumidos no âmbito de outras
seguir o exemplo. Portanto, sob a perspectiva
da prevenção, tratar-se-ia de um sinal
importante, pois serviria para transformar o
48  LAVALLE, 2000, p. 491 (492).
“inimigo” em cidadão.
49  Foi tirado pelo autor o trecho concernente a
sua aplicabilidade em situação de conflito armado,
que é outra grande polêmica, mas que deve ser
3.2. A tipificação do crime de desconsiderada aqui, pelo espaço limitado e ao
financiamento do terrorismo – Art. 3º objetivo deste trabalho. 
50  Art. 2º (1) “b” da Convenção Internacional para a
Outro tema de enorme complexidade
Supressão do Financiamento do Terrorismo, de 1999.
é o financiamento do terrorismo e sua
51  PETERKE, 2001, p. 217-221.
47  Conferir BOVENKERK, 2011, p. 261 (271). 52  Decreto n. 5.640, de 26 de dezembro de 2005. 

64
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

iniciativas contra o fenômeno53. A pressão Portanto, ao evitar uma criminalização


política para enfrentar o assunto aumentou que muitas vezes depende de julgamento
após relatos de fontes estrangeiras sugerindo demasiadamente político e subjetivo pelos
que o financiamento ao terrorismo seria uma operadores da lei, o legislador, se achar
atividade relevante no território brasileiro, em necessário tipificar o delito sob análise,
especial na Tríplice Fronteira54, onde existem precisa tomar algumas previdências em pelo
várias comunidades muçulmanas suspeitas menos dois sentidos: primeiro, assegurar-
de transferir fundos para terroristas no se de que não sejam punidas pessoas que
mundo árabe. Diante disso, o art. 3º do PLS n. somente tenham vaga ou abstrata ideia
499/2013 objetiva fechar uma suposta lacuna do verdadeiro destino dos seus recursos;
na ordem jurídica brasileira, tranquilizando segundo, deixar claro que apoiar projetos
determinados atores políticos. voltados ao (re)estabelecimento de condições
democráticas, à promoção de direitos
No entanto, vale lembrar que inexiste humanos ou do Estado de Direito jamais sejam
obrigação internacional de criar um tipo penal considerados financiamento ao terrorismo.
implementando a definição citada. Por outro Caso contrário, o tipo penal corre o risco de
lado, parece ser muito difícil criminalizar o ser considerado inconstitucional em virtude
financiamento ao terrorismo sem definir o da sua incompatibilidade com o princípio da
que se entende por terrorismo55, situação que certeza.
novamente leva à problemática já exposta.
Ocorre que ela é ainda mais complexa no Em razão dessa dificuldade, grande
presente contexto, pois, no mundo inteiro, é a relutância dos Estados em tipificar
existem inúmeros movimentos – e até o crime de financiamento do terrorismo.
partidos políticos legalmente constituídos – Para contornar o problema, alguns Estados
acusados de apoiar ou até praticar terrorismo. optaram por modificar a legislação contra a
Eles são às vezes classificados como lavagem de dinheiro, ou buscaram cumprir
organizações terroristas por determinados suas obrigações internacionais mediante
Estados (não necessariamente democráticos), a criminalização da “associação em grupo
enquanto outros governos discordam dessa criminoso” ou até “terrorista”, alegando sua
estigmatização, pois os priva efetivamente abrangência pela modalidade da cumplicidade
da possibilidade de manter contatos – manobra igualmente problemática e ainda
regulares e ajudar certas populações e seus a ser abordada57. Outros tipificaram uma
representantes. Hamas, Hizbollah e PKK lista de condutas específicas, constantes das
parecem ser os exemplos mais eminentes56. convenções antiterroristas, suplementadas por
delito que incorporava a definição semigenérica
da Convenção de 199958. Independentemente
53  Ver, para uma visão geral, BIERSTEKER; ECKERT;
dessas experiências, a inserção de cláusulas
ROMANIUK, 2008, p. 234-259. de exclusão que especifiquem o dolo como
54  SVERDLICK, 2005, p. 84 (88). 57  Exemplo é a Alemanha, que não dispõe de
55  SOREL, 2003, p. 365. artigo específico sobre financiamento ao terrorismo.
56  MARGUILES, 2007, p. 75. 58  Conferir Art. 278, d, do CP da Áustria.

65
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

pressuposto do financiamento ao terrorismo tipos penais de outros Estados. Na Suíça, por


e descriminalizem explicitamente o apoio a exemplo, a pena máxima chega a cinco anos; e
partidos políticos democráticos, organizações na Áustria, a dez anos, com base em uma pena
humanitárias e de direitos humanos, sempre mínima de um ano. Também parece possível
constitui técnica legislativa que deve ser levada aplicar multas em casos menos graves,
em consideração para conscientizar melhor os em respeito aos princípios constitucionais
operadores da lei sobre a problemática em da proporcionalidade e da culpabilidade.
questão59. Tendo em vista a falta de preocupação com
esses aspectos, comprovada pela omissão
O art. 3º do PLS descreve o financiamento de justificar devidamente o art. 3º no PLS n.
do terrorismo: “Oferecer, obter, guardar, 499/2013, há boas razões para considerá-lo
manter em depósito, investir ou contribuir de antemão incompatível com a CF. Recorde-
de qualquer modo para a obtenção de ativo, se que a classificação categórica de uma
bem ou recurso financeiro com a finalidade conduta como crime e não como contravenção
de financiar, custear ou promover prática de tem várias consequências no que se refere à
terrorismo, ainda que os atos relativos a este competência do Estado para restringir várias
não venham a ser executados”. Assim, concede garantias fundamentais. Portanto, o tipo
grande margem de discrição às autoridades penal previsto pode se tornar uma ferramenta
competentes, sem oferecer orientação mais poderosa na perseguição de determinados
específica. Na justificação do PLS, busca-se em indivíduos de questionável periculosidade.
vão por explanações que demonstrem alguma Como Friedrich Dencker uma vez resumiu, não
preocupação com esse aspecto. Alega-se, se pode “atirar com canhões sobre pardais”61.
simplesmente, a implementação da Convenção
de 199960. Na verdade, o art. 3º não se restringe Enfim, nem sequer existe verdadeira
aos atos por ela criminalizados. Antes, vai mais lacuna no Direito Penal brasileiro. A Lei n.
além, ao adotar um conceito de terrorismo 12.850/2013 criminaliza, com três a oitos anos
bem mais abrangente do que a definição já de reclusão e multa, “[p]romover, constituir,
problemática da Convenção de 1999. No mais, financiar ou integrar, pessoalmente, ou por
pergunta-se: o art. 3º do PLS n. 499/2013 interposta pessoa, organização criminosa”62.
refere-se, exclusivamente, ao “terrorismo” Como vimos, o conceito de organização
conforme o art. 2º ou também ao “terrorismo criminosa da Lei n. 12.850/2013 é aberto o
contra coisa” do art. 4º? suficiente para contemplar grupos terroristas
(“vantagem de qualquer natureza”)63, além da
De qualquer forma, mostra-se assustadora explícita aplicabilidade da lei às “organizações
a pena prevista (reclusão de 15 a 30 anos), terroristas internacionais, reconhecidas
igual à pena mínima cominada para aqueles segundo as normas de direito internacional”64.
que praticaram terrorismo contra pessoas.
61  DENCKER, 1987, p. 36 (49).
Vale a pena comparar a proposta com os
62  Art. 1º, § 2º, da Lei n. 12.850/2013.
59  Conferir Art. 260 do CP da Suíça. 63  Art. 1º, § 1º, da Lei n. 12.850/2013.
60  PLS n. 499/2013, p. 8. 64  Art. 1º, § 2º, II, da Lei n. 12.850/2013.

66
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Portanto, o legislador brasileiro já cumpriu 2000, tornou-se obrigação dos Estados-


suas obrigações internacionais quanto ao Partes criminalizar a “participação em grupo
financiamento ao terrorismo65. criminoso organizado”68. No entanto, como
visto, esse acordo internacional define o
conceito de tal modo que não abrange grupos
3.3. A tipificação do crime terroristas. Por outro lado, a ampla ratificação
de associação em grupo da convenção resultou em crescente número
terrorista – Art. 7º de legisladores que consideram certo e justo
tipificar o delito de “associação criminosa”69.
Eles querem dispor de instrumento capaz de
O Direito Penal moderno não é mais legitimar detenções de determinados sujeitos
o Direito Penal do autor, mas do ato perigosos que não podem ser acusados de
criminoso. Diante disso, deve ser vista com outro delito, ou porque sua comprovação é
grande preocupação qualquer tentativa de impossível, ou porque querem intervir já antes
criminalizar o mero pertencimento a coletivo da realização do plano criminoso.
com convicções ou intenções socialmente
perigosas. Em essência, tais tipos punem Foram particularmente os atentados de
condutas que sequer foram tentadas. Embora 11 de setembro que geraram uma discussão
o direito de associação não seja absoluto e sobre a necessidade de criar um tipo penal
esteja sujeito “às restrições previstas em lei e semelhante aplicável a grupos terroristas.
que se façam necessárias, em uma sociedade Na Resolução n. 1.373/2001, o Conselho de
democrática, no interesse da segurança Segurança da ONU recomendou essa medida
nacional, da segurança e da ordem públicas”66; aos seus membros. Desde então, muitos
por muito tempo, os Estados democráticos Estados, democráticos e não democráticos,
de direito reconheceram que delitos como introduziram tais tipos penais em suas
“conspiração”, nos países do common law, ou legislações, deixando para trás as dúvidas
“associação criminosa”, nos países de civil law, originais suscitadas. Seguindo esse exemplo, o
têm grande potencial de abuso, em particular art. 7º do PLS n. 499/2013 propõe: “Associarem-
no contexto de acusações com terrorismo67. se três ou mais pessoas com o fim de praticar
Por isso, nenhuma convenção antiterrorista terrorismo: Pena – reclusão de 5 (cinco) a 15
prevê obrigação internacional neste sentido. (quinze) anos”.

Com o advento da Convenção da ONU O Código Penal brasileiro sempre previu o


contra Crime Organizado Transnacional, de fato típico “associação criminosa” em seu art.
288, antes denominado “quadrilha ou bando”.
65  Se isso se deu de modo consistente e razoável Recentemente, o dispositivo foi alterado pela
é outra pergunta, que não pode ser analisada aqui. Lei n. 12.850/2013 para fazer dele constar:
66  Conferir Art. 22 (2) do Pacto Internacional sobre
Direitos Civis e Políticos, de 1966; e Art. 16 (2) da 68  Art. 5º da Convenção da ONU contra Crime
Convenção Americana de Direitos Humanos, de 1969. Organizado Transnacional, de 2000.
67  LABORDE, 2006, p. 1087 (1092). 69  Conferir SINN, 2006, p. 110-111.

67
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

“Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para razão das preocupações expostas, vários
o fim específico de cometer crimes: Pena legisladores nacionais decidiram tomar uma
- reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos”. O seu atitude mais cautelosa, prevendo penas
parágrafo único aumenta a pena até a metade mínimas geralmente em torno ou até abaixo
se a associação é armada ou se houver a de um ano72.
participação de criança ou adolescente. Além
disso, a Lei n. 8.072/1990 – Lei dos Crimes
Hediondos – aumenta a pena de três para seis 3.4. A tipificação da incitação
anos em caso de “terrorismo”, sem, no entanto, ao terrorismo – Art. 5º
definir o termo. Enfim, há também a Lei n.
12.850/2013, que disponibiliza tipos especiais Terrorismo é a utilização de violência
que garantem, como vimos, a punibilidade de simbólica para enviar certa mensagem, tanto
pessoas que integram grupos terroristas com a inimigos políticos quanto a simpatizantes.
três a oito anos de prisão. Em mais esse caso, Entrementes, essa estratégia de comunicação
inexiste lacuna jurídica. de atores fracos se tornou mais complexa na
era da globalização e não se restringe mais
Esse fato é reconhecido na justificação do à mera “propaganda da ação”73. Aproveita-se,
PLS n. 499/201370, mas falta qualquer explicação com facilidade e também muita habilidade,
sobre o motivo pelo qual um novo tipo penal, tanto dos meios de comunicação mais
com pena mais dura, ainda se faz necessário. tradicionais como dos modernos, em especial,
Com boas razões, pode-se até defender a os virtuais74, para fanatizar pessoas suscetíveis
existência de obrigação internacional para às ideologias extremistas. Seu objetivo é
justificar tal necessidade. Ela decorre da própria convencê-las a fazer parte da luta e pegar
Magna Carta e das convenções internacionais em armas. Pelo visto, o terrorismo islâmico
de direitos humanos, que garantem a atinge essa meta com muito sucesso, assim
liberdade de reunião e estabelecem critérios contrariando as políticas preventivas pelo
para a restrição desse direito. Considerando, abuso da liberdade de consciência, religião e
assim, o risco da sua aplicação tendenciosa, o reunião, mas, principalmente, pelo abuso do
proposto art. 7º é outro exemplo para ativismo direito à liberdade de expressão. E como faz
legislativo desnecessário. parte do seu cálculo provocar a tomada de
medidas drásticas pelos Estados (que revelam
Embora seja verdade que alguns Estados assim suas faces autoritárias, discriminatórias
dispõem de tipos penais quase idênticos, e imorais), esses grupos terroristas islâmicos
inclusive quanto à pena71, outra vez, o delito percebem com grande satisfação as restrições
proposto corre o risco de infringir vários e violações dessas garantias em nome do
princípios constitucionais, sobretudo o da seu combate. Por isso, o terrorismo desafia
proporcionalidade e culpabilidade, e seria, de forma sinistra os fundamentos das
sob a perspectiva do direito comparado,
um dos mais rigorosos do mundo – pois, em
72  Conferir o Art. 129a do CP da Alemanha.
70  PLS n. 499/2013, p. 7. 73  Ver BOCK, 2009, p. 34.
71  Conferir o Art. 210 do CP da Argentina. 74  UNODC, 2012.

68
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

sociedades livres e democráticas. Mas até “besta”, sem verdadeiras intenções criminosas?
que ponto o combate ao terrorismo justifica Significa deliberar, com muita seriedade,
restrições aos nossos direitos civis e políticos? sobre quais condutas ainda representam
Não representa qualquer restrição dessas manifestações legítimas, protegidas pelos
garantias fundamentais automaticamente uma direitos humanos e fundamentais, e quais são
vitória dos terroristas? tão perigosas que representem ameaças à
segurança pública.
Já há algum tempo, o Conselho de Segurança
da ONU exige que os Estados enfrentem o Ao dar diretrizes aos seus Estados
incitamento ao terrorismo75. No entanto, Partes, a Convenção Europeia de 2005 define
só existe um instrumento antiterrorista “provocação para cometer ofensa terrorista”
que obriga explicitamente os seus Estados como “a distribuição ou outra disponibilização
signatários a garantir que tal propaganda seja de uma mensagem ao público com a intenção
devidamente punível na legislação nacional: de incitar delito terrorista, quando esta
a Convenção Europeia para a Prevenção do mensagem, direta ou indiretamente, advogue
Terrorismo, de 200576. Esta não exige a criação uma ofensa terrorista, causando o perigo de
de novo delito se a conduta já se enquadrar que um ou mais delitos sejam cometidos”78.
em outros tipos penais, o que é, muitas vezes, Portanto, são três as providências propostas
o caso, em virtude do Pacto Internacional dos pelo supracitado instrumento: primeiro,
Direitos Civis e Políticos, de 1966. Seu art. 20 restringe-se a criminalização às mensagens
obriga os Estados a disporem de legislação de natureza pública; segundo, pressupõe dolo
específica que proíba propaganda de guerra e específico de incitar o cometimento de atos
“apologia do ódio nacional, racial e religioso terroristas; e, terceiro, exige a comprovação de
que constitua incitamento à discriminação, à que a conduta causa o perigo do cometimento
hostilidade ou à violência”77. de ato terrorista. Destarte, almeja prevenir,
em defesa da liberdade de expressão, a
Criminalizar especificamente o incitamento criminalização da mera glorificação do
ao terrorismo é um assunto muito mais terrorismo, não autorizando censuras gerais
delicado, pois pergunta-se: qual a qualidade ou mesmo prévias. Sem dúvida, continua
que uma informação deve ter para se qualificar importante enxergar com ceticismo o art. 5º
como incitamento ao terrorismo? Bastam da Convenção Europeia para a Prevenção do
mensagens implícitas ou se exige que elas não Terrorismo79. Todavia, para os fins didáticos
deixem dúvida nenhuma quanto às verdadeiras desta contribuição, ele demonstra a dificuldade
intenções do seu emissor? Como garantir que e a necessidade de se achar uma linguagem
a máquina do Estado não se dirija contra suficientemente sofisticada para considerar
pessoas que simplesmente falam desta forma os interesses em questão, inclusive para
demonstrar a insuficiência do art. 5º do PLS
75  Ver as resoluções n. 1.373/2001 e 1.624/2005. 
76  Art. 5º da Convenção Europeia para a Prevenção 78  Art. 5º da Convenção Europeia para a Prevenção
do Terrorismo, de 2005. do Terrorismo. Tradução livre pelo autor.
77  Art. 20 (2) do Pacto Internacional sobre Direitos 79  Ver, para uma discussão mais avançada da
Civis e Políticos, de 1966. problemática, SAUL, 2005, p. 868-886.

69
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

n. 499/2013, que simploriamente estipula ser proposto compatível com os princípios da


crime “Incitar o terrorismo: Pena – reclusão, de certeza, culpabilidade e proporcionalidade?
3 (três) a 8 (oito) anos”.

O projeto não define o que se entende 4. Observações finais


por “incitar”, além de referir-se a um conceito
do terrorismo que já é muito amplo. Outra A presente análise do PLS n. 499/2013 se
vez, busca-se em vão na justificação do PLS limitou a destacar algumas críticas referentes
por indícios de que o legislador esteja ciente aos tipos penais propostos. No entanto, restou
desse importante “detalhe”. Somente explica evidente que a matéria é bem mais complexa
o art. 10º, dizendo que os crimes previstos são do que as parcas oito páginas da justificação
inafiançáveis e insuscetíveis de graça, anistia parlamentar do PLS sugere. O que está na
ou indulto, não sendo “aplicável para o crime pauta do Congresso Nacional brasileiro é uma
de incitação ao terrorismo, previsto no art. legislação com graves consequências para o
[sic] da proposição, e que pretende combater Estado de Direito e os direitos humanos, que
hipótese de divulgação de material gráfico, impõe uma discussão rigorosa sobre o assunto.
sonoro ou de vídeo, inclusive por meio da
internet, que incite a comissão desse crime. Ninguém duvida da importância de
A pena prevista seria de três a oito anos de combater terrorismo, o Brasil mesmo assumiu
reclusão, com hipótese de aumento de um diversas obrigações internacionais neste
terço no caso de uso da internet”80. sentido. Ocorre que o PLS n. 499/2013 vai muito
além do que é necessário para cumpri-las com
Mais uma vez, o legislador demonstra muita base no princípio da boa-fé. Não há dever
confiança nos órgãos públicos competentes internacional nenhum de tipificar o terrorismo,
para aplicar e interpretar um tipo penal de o financiamento do terrorismo, associação
dificilíssimo manuseio. Ademais, outra vez, terrorista, a incitação ao terrorismo etc.
é no mínimo questionável a existência de Sobretudo, a implementação das convenções
verdadeira lacuna jurídica no CP, que, pelo antiterroristas requer, em verdade, a revisão
menos, veda com base em vocabulário um das leis existentes, com vistas a suprir lacunas
pouco mais diferenciado a “incitação ao de punibilidade em respeito a determinados
crime”81 e a “apologia de crime ou criminoso”82. atos internacionais. Sua identificação exata é
E, novamente, a pena mínima prevista parece fundamental para a iniciação de um debate
excessivamente dura. Será o tipo penal mais maduro e sério no País.

80  PLS n. 499/2013, p. 11. O PLS n. 499/2013 caracteriza-se por sua


81  Art. 286 do CP: Incitar, publicamente, a prática presumível “clareza”, que consiste em propor
de crime. Pena – detenção, de três a seis meses, vários tipos penais relativamente concisos,
ou multa. em uma linguagem de fácil compreensão,
82  Art. 287 do CP: Fazer, publicamente, apologia que parece exprimir o “bom senso”. Na
de fato criminoso ou de autor de crime. Pena – realidade, revelam-se tipos penais cuja
detenção, de três a seis meses, ou multa. compatibilidade com o princípio da certeza é,

70
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

muitas vezes, questionável, pois poucas foram CHANG, Peng. The Crime-Terror-Nexus:
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72
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

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73
A tipificação do crime de terrorismo

PEDRO TAQUES Para tratar da atividade legislativa a


Senador da República respeito do terrorismo, inicialmente, devem ser
diferenciados com clareza as manifestações
sociais legítimas, os excessos criminosos de
Atualmente, há grande debate no vândalos e o crime de terrorismo.
Congresso Nacional a respeito da necessidade
da tipificação do crime de terrorismo. O direito de livre manifestação do
Esse debate, inclusive, ganhou força – pensamento e a liberdade de reunião são
indevidamente, como será visto – em razão dos assegurados pelo art. 5º, incisos IV e XVI, da
abusos cometidos durante as manifestações Constituição Federal. Trata-se de verdadeiros
sociais que reivindicam melhores condições direitos fundamentais que devem ser
de vida para os brasileiros e práticas políticas fomentados, respeitados e, se necessário,
mais republicanas e democráticas. garantidos pelo aparato estatal.

Qual deve ser a resposta do Congresso As manifestações não se confundem de


Nacional perante essa situação? nenhuma forma com atos de vandalismo.
Atos de vandalismo são violações aos direitos
Muitos criticam – e com razão – o velho fundamentais de terceiros – vida, incolumidade
oportunismo político e, muitas vezes, eleitoral física, saúde, propriedade. Caso cometidos
de propostas legislativas que aumentam o durante as manifestações, são excessos
rigor penal para combater os males sociais. criminosos que devem ser reprimidos nos
Infelizmente, é frequente que os legisladores termos da legislação penal vigente. Entretanto,
apresentem o recrudescimento da legislação não se pode confundir o vandalismo com o
penal como única solução e verdadeira crime de terrorismo.
panaceia ao problema da segurança pública.
De modo diverso, o crime de terrorismo
Como senador da República e como relator pressupõe a violação aos direitos
da Comissão de Segurança Pública do Senado fundamentais com determinados objetivos
Federal, reforço meu compromisso com a políticos e sociais capazes de gerar grande
população de Mato Grosso – estado que tenho terror ou comoção generalizada. A tipificação
a honra de representar – e com a sociedade do crime de terrorismo não guarda nenhuma
brasileira de apresentar soluções concretas relação com as manifestações sociais ou
para que o Estado seja capaz de oferecer mesmo com os excessos – reitero, muitas
respostas firmes contra o vandalismo e a vezes, criminosos – que até agora vimos
baderna, mas também contra eventuais atos serem cometidos durante as manifestações. A
terroristas. magnitude e a intenção do agente no crime

75
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

de terrorismo alcançam patamares muito impõem essa obrigação. Além de resoluções do


maiores do que os casos vistos e não podem Conselho de Segurança que tratam do assunto,
ser com eles confundidos. deve-se destacar a Convenção Interamericana
contra o Terrorismo, que cria a obrigação de
Diante desse quadro, a primeira questão os Estados-Partes preverem mecanismos,
que se coloca em debate é a seguinte: o Brasil inclusive penais, de repressão ao crime de
deve prever em lei o tipo penal do terrorismo? terrorismo. A Convenção Interamericana
contra o Terrorismo, contudo, não oferece
Apesar de opiniões divergentes, é definição a respeito do crime, mas aponta para
necessário, sim, tipificar o crime de terrorismo, diversos outros atos internacionais em que são
e defendo que o momento adequado é agora. previstos casos específicos de atos terroristas.
Três são as razões para tanto.
Em terceiro lugar, deve-se aproveitar o
Em primeiro lugar, a Constituição Federal momento de relativa tranquilidade institucional
brasileira impõe, em seu art. 5º, inciso XLIII, para que o tema seja debatido a fundo e regulado
verdadeiro mandado de criminalização a da maneira mais adequada. Justamente por
respeito do tipo penal do terrorismo. Isso estarmos, pelo menos por enquanto, a salvo
significa que o constituinte originário, desde das ameaças do terrorismo, é necessário que o
a promulgação da Constituição de 1988, já criminalizemos com ponderação e razoabilidade.
estabelecera o dever de o legislador tipificar Devemos prever o crime de terrorismo antes que
tal conduta. Passados mais de 25 anos da ele eventualmente aconteça. Oxalá nunca sejamos
promulgação da Constituição, ainda não temos alvo de um ataque terrorista, pois, caso contrário
a previsão legal adequada. e não tenhamos um tipo penal respectivo,
estaremos sujeitos ao velho oportunismo político
É verdade que temos a menção a “atos e eleitoral da “legislação de emergência”.
de terrorismo” na Lei de Segurança Nacional
(art. 20, Lei n. 7.170/1983). O art. 1º, § 5º, da Uma vez assentada a necessidade de
Lei n. 10.744/2003, ao disciplinar a reparação tipificação do crime de terrorismo no Direito
civil a vítimas de tais atos, assim define ato brasileiro, pretendo expor, em breve síntese,
terrorista: “entende-se por ato terrorista as duas principais proposições que tramitam
qualquer ato de uma ou mais pessoas, sendo no Senado Federal a esse respeito:
ou não agentes de um poder soberano, com
fins políticos ou terroristas, seja a perda ou a) o Projeto de Lei do Senado n. 236/2012
dano dele resultante acidental ou intencional”. (PLS 236/2012); e
Entretanto, é evidente que tais conceitos não
suprem a necessidade de um tipo penal do b) o Projeto de Lei do Senado n. 499/2013
crime de terrorismo, em razão do princípio da (PLS 499/2013).
legalidade estrita que rege o direito penal.
Destaco, ainda, que foi apresentado pelo
Em segundo lugar, o Brasil deve tipificar o senador Romero Jucá o Projeto de Lei do Senado
crime de terrorismo, uma vez que é signatário n. 44/2014. No momento, o PLS encontra-se sob
de diversos atos internacionais que também exame da Comissão de Constituição, Justiça e

76
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Cidadania do Senado Federal, e fui designado 1. Conceito de terrorismo


relator da matéria. Contudo, em razão de
seu teor ser praticamente o mesmo do PLS O PLS 236/2012 (Novo Código Penal) e o
499/2013, deixo de analisá-lo individualmente PLS 499/2013, de autoria da Comissão Mista,
nesta breve exposição. Desse modo, o que for optaram por seguir caminhos diversos na
exposto em relação ao PLS 499/2013 também tipificação do crime de terrorismo.
vale para o PLS 44/2014.
O PLS 236/2012 prevê que será considerada
O PLS 236/2012 (Novo Código Penal) é fruto como crime de terrorismo uma série de
de requerimento que formulei à Presidência do condutas já criminalizadas (como o crime de
Senado Federal ainda em 2011 para que nosso lesão corporal ou crime de dano) qualificadas
Código Penal fosse reformulado. O Código pelo que se chama de dolo específico, ou seja,
Penal brasileiro data de 1940 e, infelizmente, uma intenção do agente que o distingue dos
não foi capaz de acompanhar a evolução da demais crimes. Nos termos do art. 249 do
criminalidade em nosso País. Contando com o substitutivo aprovado ao PLS 236/2012, será
apoio do então presidente, foi instalada uma considerada crime de terrorismo a conduta
Comissão de Juristas – presidida pelo ministro do de causar terror na população mediante as
STJ Gilson Dipp – que formulou um anteprojeto. condutas já criminosas, quando:
Após a apresentação formal do Projeto de Lei
do Senado n. 236/2012, foi designada Comissão I – tiverem por fim forçar autoridades
Especial de senadores na qual tive a honra de públicas, nacionais ou estrangeiras, ou
ser designado relator da matéria. pessoas que ajam em nome delas, a fazer
o que a lei não exige ou deixar de fazer o
Já na versão original do PLS 236/2012, que a lei não proíbe;
na forma como proposto pela Comissão
de Juristas, havia a tipificação do crime de II – tiverem por fim obter recursos para a
terrorismo. Em meu substitutivo ao projeto – manutenção de organizações políticas ou
aprovado na Comissão Especial de senadores grupos armados, civis ou militares, que
em 17.12.2013 – mantive as linhas mestras atuem contra a ordem constitucional e o
do PLS, com alguns aperfeiçoamentos que Estado Democrático; ou
pretendo expor em seguida.
III – forem motivadas por preconceito de
O PLS 499/2013, por sua vez, é resultado de raça, cor, etnia, religião, nacionalidade,
uma Comissão Mista, composta por deputados e origem, condição de pessoa idosa ou
senadores, que se debruçou sobre o tema. Esse com deficiência, ou por razões políticas,
projeto trata especificamente da tipificação do ideológicas, filosóficas ou religiosas.
crime de terrorismo e atualmente se encontra
sob exame do Plenário do Senado Federal. De outro lado, o PLS 499/2013, de autoria
da Comissão Mista de deputados e senadores,
Tendo por base essas duas proposições, não prevê dolo específico para o crime de
coloco em debate a seguir quatro pontos que terrorismo. Nos termos do art. 2º do projeto,
considero sensíveis na matéria. tipifica-se o crime de terrorismo da seguinte

77
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

forma: “Provocar ou infundir terror ou pânico “Não constitui crime de terrorismo a conduta
generalizado mediante ofensa ou tentativa de individual ou coletiva de pessoas movidas por
ofensa à vida, à integridade física, à saúde ou propósitos sociais ou reivindicatórios, desde
à privação da liberdade de pessoa”. que os objetivos e meios sejam compatíveis e
adequados à sua finalidade”.
Na minha visão, a previsão típica do PLS
236/2012 (Novo Código Penal) é superior e É evidente que a mencionada excludente
a conceituação feita no PLS 499/2013 abre de ilicitude não objetiva deixar impunes atos
margem para equívocos ao não prever o dolo terroristas, sejam eles praticados por militantes
específico do crime de terrorismo. de movimentos sociais ou não. Atos terroristas
são atos criminosos independentemente dos
Acredito que deva haver a previsão expressa sujeitos que os praticam.
de quais finalidades estão na base do crime
de terrorismo. A despeito das controvérsias Entretanto, não se pode esquecer da
no plano internacional acerca da melhor importante função intimidatória e simbólica
conceituação de terrorismo, o ato terrorista é do direito penal. O direito penal aponta quais
caracterizado pela agressão a bens jurídicos condutas são expressamente rejeitadas e,
com o objetivo de atingir determinadas caso praticadas, reprimidas com rigor penal.
finalidades políticas, sociais, preconceituosas É inegável que a existência de um tipo penal
etc. Isso para que se identifique com clareza abrangente pode intimidar condutas legítimas
o crime de terrorismo sem confundi-lo com os em decorrência da fluidez semântica das
demais tipos penais. Por essa razão, apresentei palavras a que invariavelmente está sujeito o
emenda nesse sentido ao PLS 499/2013. Direito – inclusive o direito penal. Além disso, a
ausência de ressalva expressa das atividades
de movimentos sociais poderá levar a abusos
2. Previsão de excludente de praticados pelos órgãos de repressão do
Estado – polícia, Ministério Público e Poder
ilicitude para manifestações Judiciário –, de modo que reivindicações
sociais legítimas legítimas sejam abafadas pelo temor à prática
do crime de terrorismo.
Considerando as confusões que têm
sido feitas a respeito da diferenciação de
manifestações sociais, atos de vandalismo 3. Previsão de competência da
e terrorismo, como apresentado no início da
presente exposição, é necessário prever causa
Justiça Federal para julgamento
expressa de exclusão de ilicitude para que do crime de terrorismo
manifestações sociais não sejam tomadas por
atos de terrorismo. O PLS 499/2013 fez importante avanço ao
prever que a competência para julgamento do
Nesse sentido, apresentei emenda ao PLS crime de terrorismo será da Justiça Federal.
499/2012 para que conste o seguinte dispositivo: Nos termos do art. 109 da Constituição

78
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Federal, sabemos que a Justiça Federal é a Uma primeira corrente defende que as
vocacionada a julgar as causas não somente regras de coautoria e participação devem reger
de interesse da União enquanto Administração a matéria. Dessa forma, o agente financiador do
Pública Federal, mas também as causas de terrorismo responderia pelo crime, no mínimo,
grande relevo social, inclusive diante das a título de participação por ter auxiliado o
responsabilidades internacionais assumidas agente que executa a ação material do tipo
pelo Estado brasileiro. penal.

Em razão disso, andou bem o PLS De outro lado, defende-se a importância


499/2013 ao prever a competência da Justiça da previsão de um tipo penal específico e
Federal para o julgamento do crime em autônomo do financiamento do terrorismo, o
questão. Salienta-se que, com a Emenda que facilitaria a persecução penal. Acredito
Constitucional n. 45/2004, criou-se o incidente ser essa a melhor solução, tendo em vista
de deslocamento de competência da Justiça que o crime de financiamento ao terrorismo
Estadual para a Justiça Federal no caso de é verdadeiro crime de perigo abstrato e que
graves violações aos direitos humanos, tendo se configura independentemente de o ato
por objetivo o cumprimento de obrigações terrorista ser praticado ou não. Essa foi a
internacionais assumidas pelo Brasil. solução adotada tanto pelo PLS 236/2012
(Novo Código Penal) quanto PLS 499/2013.
No caso do terrorismo, nada mais
adequado a prever, de imediato, a competência A questão que se põe é se a reprimenda
da Justiça Federal. De um lado, evitam-se penal deve ser a mesma no caso do crime de
discussões inúteis a respeito de qual ramo da terrorismo e no caso do crime de financiamento
justiça é competente, em nome da segurança do terrorismo. Tanto o PLS 236/2012 quanto o
jurídica e da celeridade processual. De outro PLS 499/2013 optaram por prever as mesmas
lado, atribui-se a competência para o ramo penas para os dois crimes. Entretanto, é
da justiça mais bem preparado para lidar inegável que a conduta de financiamento
com situações de grave repercussão nacional ao terrorismo, por vezes, acaba por ser
e internacional, como o caso do terrorismo. mais danosa do que a própria prática do ato
terrorista, tendo em vista a formação de redes
de criminalidade internacionais cujo objetivo é
4. Criminalização do praticar diversos crimes.

financiamento ao terrorismo Esses são, ao meu juízo, os principais


quatro pontos sensíveis em debate no Senado
Há consenso a respeito de que o finan- Federal a respeito da tipificação do crime de
ciamento ao terrorismo deve ser criminaliza- terrorismo. Tenho a certeza de que o Brasil
do. Há dúvidas, entretanto, a respeito de qual deve avançar e tipificar o crime em questão
deve ser a fórmula correspondente e de qual para evitar que eventuais atos terroristas, a
deve ser a pena imposta. que infelizmente estamos sujeitos, não sejam
devidamente punidos.

79
Tratamiento penal, procesal y
penitenciario de los delitos de terrorismo

JAVIER-ALBERTO ZARAGOZA AGUADO que emplea la Decisión Marco de 13-6-2002 de


Fiscal Jefe de la Audiencia Nacional lucha contra el terrorismo), o como expresa el
art. 571 del Código Penal español “alterar de
forma grave la paz pública o subvertir el orden
Probablemente la legislación penal constitucional”.
española contra el terrorismo es una de las más
completas que existen. Abarca una diversidad
de tipos penales que nos han permitido 1. Líneas fundamentales de la
responder con eficacia al fenómeno terrorista legislación penal antiterrorista
en sus diferentes dimensiones: no sólo frente
a las bandas o grupos que empleando armas
y alcance de las recientes
o explosivos cometen atentados, sino también reformas
a todas aquellas organizaciones o entidades
que sin ejecutar graves actos de violencia La legislación antiterrorista se caracteriza
contribuyen materialmente al sostenimiento por los siguientes rasgos:
de aquéllos, mediante la prestación de
apoyo ideológico, logístico y cobertura En primer lugar, por la incorporación de
material a los métodos terroristas, e incluso tipos penales claramente configuradores
desarrollan estrategias complementarias de de un importante adelantamiento de la
lucha a través de la ejecución sistemática de punibilidad y de las barreras de protección
actividades criminales de menor intensidad penal.
(actos de violencia callejera consistentes
en desórdenes públicos, daños, incendios, A los tipos penales de integración en
coacciones, amenazas al adversario político, organización o grupo terrorista incluido en
actos de enaltecimiento, etc.), e incluso frente el art. 571, y de colaboración previsto en el
a los que individualmente – sin pertenecer a art. 576 como una figura residual destinada a
ningún grupo u organización – lleven a cabo sancionar acciones genéricas y periféricas al
actos de terrorismo tipificados como tales margen de su contribución a un determinado
en el Código Penal, ya que en todos los casos resultado, hay que añadir:
persiguen los mismos objetivos: intimidar
y amenazar gravemente a la población, y - el delito de enaltecimiento del terrorismo
destruir o desestabilizar gravemente las y/o de humillación y menosprecio a las
estructuras políticas, constitucionales, víctimas que contempla el art. 578 (pena
económicas y sociales de los Estados o de una de 1 a 2 años de prisión).
organización internacional (en terminología

81
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

- la incriminación de los actos de captación, ilegales, amenazas y coacciones, incluyendo


adoctrinamiento, adiestramiento y una mayor agravación punitiva en atención a
formación dirigidos a la incorporación la condición del sujeto pasivo del delito (que
de otros a una organización o grupo éste sea miembro de las Fuerzas Armadas, de
terrorista o a la perpetración de cualquier las Fuerzas y Cuerpos de Seguridad del Estado,
delito de terrorismo en el art. 576.3 (pena Policías de las Comunidades Autónomas o de
de 5 a 10 años de prisión). los Entes locales). Por su parte, el art. 573
impone penas de prisión más elevadas para el
- la distribución o difusión pública de depósito de armas o municiones o la tenencia o
mensajes o consignas dirigidos a provocar, depósito de sustancias o aparatos explosivos,
alentar o favorecer la comisión de estos inflamables, incendiarios o asfixiantes, o de
delitos incrementando el riesgo de su sus componentes, así como su fabricación,
efectiva comisión que se regulan el art. tráfico, transporte o suministro de cualquier
579.1 párrafo 2º (pena de 1 a 2 años de forma, y la mera colocación o empleo de
prisión). tales sustancias o de los medios o artificios
adecuados.
- el art. 576 que regula la colaboración con
las actividades terroristas incluye como Lo mismo sucede con los delitos contra el
tales los actos de información o vigilancia patrimonio en el art. 575 cuando tales acciones
de personas, bienes o instalaciones; la criminales se cometan con el fin de allegar
construcción, acondicionamiento, cesión fondos a las bandas armadas, organizaciones
o utilización de alojamientos o depósitos; o grupos terroristas señalados anteriormente,
la ocultación o traslado de personas o con el propósito de favorecer sus finalidades.
vinculadas a organizaciones o grupos
terroristas; la organización y la asistencia Y con el tipo penal regulador del
a prácticas de entrenamiento; y cualquier terrorismo individual previsto en el
otra forma equivalente de cooperación, art. 577, y aplicable a quienes no estén
ayuda o mediación, económica o de otro integrados en estructuras o grupos de
género. naturaleza terrorista, pues cuando actúen
con la finalidad de subvertir el orden
- la previsión específica de castigo en el constitucional o de alterar gravemente la
art. 579.1 para la conspiración, proposición paz pública, o de contribuir a estos fines
y provocación para cometer cualquier atemorizando a los habitantes de una
delito de terrorismo. población o a los miembros de un colectivo
social, político o profesional, y cometieren
En segundo lugar, por un incremento notable
de la respuesta punitiva en comparación con homicidios, lesiones de las tipificadas
los restantes crímenes comunes. Así, el art. en los artículos 147 a 150, detenciones
572 prevé penas de prisión más elevadas que ilegales, secuestros, amenazas o
las normales – hasta 30 años para los casos coacciones contra las personas, o llevaren
de muerte – para los delitos de estragos e a cabo cualesquiera delitos de incendios,
incendios, para los delitos de homicidio y estragos, daños de los tipificados en los
asesinato, lesiones, secuestros, detenciones artículos 263 a 266, 323 ó 560, o tenencia,

82
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

fabricación, depósito, tráfico, transporte concurran las características establecidas


o suministro de armas, municiones para la organización criminal o para el
o sustancias o aparatos explosivos, grupo criminal (arts. 570 bis. 1 pfo. 2º y 570
inflamables, incendiarios o asfixiantes, ter 1. pfo. 2º respectivamente), exigiendo
o de sus componentes, serán castigados en ambos casos como elemento clave de
con la pena que corresponda al hecho la tipicidad que su finalidad u objeto sean
cometido en su mitad superior. la subversión del orden constitucional
o la alteración grave de la paz pública,
Las previsiones de mayor rigor punitivo pero manteniendo una respuesta punitiva
se cierran con una cláusula general, la diferenciada para los actos de promoción,
contenida en el art. 574, que obliga a constitución, organización y dirección (más
imponer las penas en su mitad superior agravada), y para los actos de participación
a los que perteneciendo, actuando al activa y simple integración.
servicio o colaborando con organizaciones
o grupos terroristas, cometan cualquier c) Se incriminan específicamente en
otra infracción – sea delito o falta – el art. 576, mediante la adición de
con la finalidad de subvertir el orden un tercer apartado y con las mismas
constitucional o de alterar gravemente la penas que el delito de colaboración, los
paz pública. actos de captación, adoctrinamiento,
adiestramiento o formación dirigidos a la
La reforma llevada a cabo por la ley orgánica incorporación de otros a una organización
5/2010 de 22 de Junio ha introducido también o grupo terrorista o a la perpetración de
importantes novedades en la legislación penal delitos de terrorismo. Esta previsión se
sustantiva del terrorismo que refuerzan en incorpora en cumplimiento de la Decisión
cierta medida la naturaleza excepcional de esa Marco de 28-11-2008 relativa a la lucha
normativa: contra el terrorismo, que a su vez venía a
implementar la Decisión Marco de 13-6-
a) Toma carta de naturaleza una de las más 2002.
importantes reclamaciones de las víctimas
del terrorismo: la imprescriptibilidad de d) El delito de financiación del terrorismo
los delitos de terrorismo (art. 130.4.inciso pasa a ser sancionado de forma autónoma
2º) y de las penas (art. 133.2.inciso 2º) en el art. 576 bis. La redacción del tipo
cuando se haya causado la muerte de una básico coincide sustancialmente con la
persona. definición de este delito que contempla
el art. 2 del Convenio de Naciones Unidas
b) La regulación de los delitos de para la Represión de la Financiación del
pertenencia o integración en banda Terrorismo de 9-12-1999 (BOE de 23-5-
terrorista se incorpora – con una 2002), sancionando al que por cualquier
sistemática más apropiada – al capítulo medio, directa o indirectamente, provea o
de los delitos de terrorismo en el art. recolecte fondos con la intención de que
571, y se establece la distinción entre se utilicen, o a sabiendas de que serán
organización y grupo terrorista, según utilizados, en todo o en parte, para cometer

83
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

cualquiera de los delitos comprendidos en estrechamente relacionada con la


este Capítulo o para hacerlos llegar a una naturaleza autónoma del tipo penal).
organización o grupo terroristas, y si los
fondos llegaran a ser empleados para la La regulación del delito de financiación del
ejecución de actos terroristas concretos terrorismo se completa con la penalización
el hecho se castigará como coautoría o de la forma culposa, limitándola a los casos
complicidad, según los casos, siempre que de imprudencia grave y reduciendo su ámbito
le correspondiera una pena mayor. subjetivo de aplicación a aquellas personas
legalmente obligadas a colaborar en la
Aunque la conducta de financiación ya prevención de las actividades de financiación
era subsumible en el delito de colaboración del terrorismo.
con organización terrorista del art. 576, como
una forma de cooperación económica con La incriminación específica del delito
las finalidades o las actividades terroristas, imprudente de financiación del terrorismo
lo cierto es que pueden apuntarse algunas tiene una justificación evidente: la 3ª Directiva
razones que justifican su penalización de 2005/60/CE de 26-10 del Parlamento
autónoma: Europeo y del Consejo (Diario Oficial de la
Unión Europea de 25-11-2005) sobre prevención
• la lucha contra la financiación del de la utilización del sistema financiero en el
terrorismo constituye hoy uno de blanqueo de capitales y la financiación del
los ejes centrales de la respuesta terrorismo obliga a aplicar a esta última figura
internacional contra el terrorismo, delictiva todas las disposiciones contenidas
básicamente porque se considera en la legislación de prevención del blanqueo
un instrumento esencial para la de capitales, y consecuentemente a darle un
congelación, el embargo y el decomiso idéntico tratamiento político-criminal, de
de los fondos que puedan tener relación modo y manera que cuando el incumplimiento
con el terrorismo, y es evidente que de esas medidas preventivas por parte de los
su incriminación específica facilitará sujetos obligados en los casos más graves
sobremanera la cooperación judicial facilite o favorezca no intencionalmente actos
internacional en las investigaciones de financiación de las actividades terroristas,
sobre esta actividad delictiva. pueda exigirse responsabilidad penal por
imprudencia como ya viene sucediendo en
• la tipificación autónoma de este delito relación con el delito de blanqueo de capitales.
potenciará las investigaciones sobre
esta actividad, y permitirá un mayor En síntesis, no había razones para
grado de aplicación de la ley penal conceder un tratamiento punitivo diferente a
frente a estos ilícitos comportamientos ambas infracciones penales. La transposición
(sirva de ejemplo lo que ha sucedido de la Tercera Directiva se ha plasmado en la
con el delito de blanqueo de capitales, ley 10/2010 de 28 de Abril de prevención del
en el que la eficacia de la acción blanqueo de capitales y de la financiación
policial y judicial se encuentra del terrorismo que adapta definitivamente

84
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

nuestro ordenamiento jurídico a la normativa f) Se introduce la medida de libertad


comunitaria e internacional. vigilada para los condenados por delitos
de terrorismo con duración diferente según
La ley 10/2010 de 28 de Abril no sólo diseña la gravedad del hecho criminal: si la pena
un marco preventivo-administrativo único impuesta es grave tendrá una duración
para el blanqueo de capitales y la financiación de 5 a 10 años, y si es menos grave de 1
del terrorismo, sino que además refuerza la a 5 años, plazos que se computarán una
aplicación práctica del sistema al establecer vez cumplida la pena privativa de libertad
medidas reforzadas de diligencia debida impuesta.
para las personas con responsabilidades
públicas relevantes y para los países con g) ha unificado en su sólo artículo – el
más probabilidades de vinculación con 572 – los comportamientos criminales más
estos fenómenos criminales, y crear un graves vinculados con el terrorismo:
Fichero de Titularidades Financieras bajo el
control del Ministerio Fiscal cuyo objeto es (1) los estragos e incendios terroristas
proporcionar información “en tiempo real” los cuales requieren que las
a los investigadores judiciales (Jueces y acciones comporten en ambos casos
Ministerio Público) respecto a activos, cuentas, necesariamente un peligro para la
depósitos y otros productos del sistema vida e integridad de las personas,
bancario que pueden tener un origen delictivo pues si tal peligro no concurriere las
o ser utilizados para financiar actividades conductas se castigarán como daños
criminales, en particular el terrorismo. terroristas previstos en el art. 266 en
relación con el art. 574 CP;
e) También se penalizan en el artículo
579, siguiendo las previsiones de la (2) los delitos con resultado de muerte,
Decisión Marco de 28-11-2008 antes citada, lesiones, secuestros, detenciones
la distribución o difusión pública por ilegales, incluyendo amenazas y
cualquier medio de mensajes o consignas coacciones, con una exacerbación
dirigidos a provocar, alentar o favorecer punitiva poco proporcional, al menos
la perpetración de cualquiera de los respecto a los dos últimos supuestos
delitos de este capítulo, generando o citados.
incrementando el riesgo de su efectiva
comisión, con pena de 6 meses a dos Los elementos característicos comunes a
años de prisión. Se trata de un tipo todos los delitos de terrorismo son: por una
penal distinto de los actos preparatorios parte el teleológico o tendencial, identificado
tradicionalmente punibles como la por la finalidad de subvertir el orden
provocación, conspiración o proposición constitucional o alterar gravemente la paz
para delinquir en los que se requiere una pública, cuya presencia es imprescindible en
mínima determinación del hecho concreto todos ellos (sean cometidos por miembros
que se pretende cometer. de organizaciones o grupos terroristas, o por
personas no integradas en los mismos), y que
se ha trasladado al nuevo art. 571, precepto en

85
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

el que se tipifican los delitos de pertenencia adecuado control parlamentario, los derechos
o integración en organizaciones y grupos reconocidos en los artículos 17, apartado 2, y
terroristas. 18, apartados 2 y 3, pueden ser suspendidos
para personas determinadas, en relación con
Y el segundo elemento característico, las investigaciones correspondientes a la
predicable del grupo de delitos contemplados actuación de bandas armadas o elementos
en los arts. 572 a 574, se concreta en que los terroristas”.
sujetos activos deben pertenecer, actuar al
servicio o colaborar con organizaciones o La doctrina constitucional de la que
grupos terroristas. Sin embargo, este segundo son fiel exponente las SSTC 199/87 de 16
elemento no es exigible respecto al delito del de Diciembre (Pn. Rodríguez-Piñero y Bravo
art. 577 (que incluye la figura del terrorista Ferrer) y la 71/94 de 3 de Marzo (Pn. Cruz
individual), y tampoco respecto a los delitos Villalón) se ha encargado de delimitar los
de los arts. 578 (enaltecimiento y humillación) requisitos para que el desarrollo legal del
y del art. 579 (difusión pública de mensajes). art. 55.2 CE sea constitucional. La primera
de ellas es realmente importante en cuanto
resuelve el recurso de inconstitucionalidad
2. La legislación planteado contra la ley orgánica 9/84 de 26 de
Diciembre sobre medidas contra las bandas
procesal antiterrorista armadas y elementos terroristas, una ley que
contemplaba medidas especialísimas y de
A diferencia de otras épocas, singularmente una intensidad restrictiva enorme como la
el período comprendido entre la transición detención policial incomunicada hasta 10 días,
democrática y finales de la década de los años o la suspensión de las decisiones judiciales de
80, época en la que el tratamiento jurídico libertad cuando se produjera el recurso del
penal y procesal del terrorismo discurría Ministerio Fiscal contra las mismas. Pues bien,
por la senda de las leyes especiales (baste la STC 199/87 no sólo declara inconstitucional
recordar las leyes orgánicas 11/80 y 9/84), en la ambas previsiones normativas, sino que
actualidad las especialidades procesales en la también excluye del ámbito de aplicación del
investigación y enjuiciamiento del terrorismo art. 55.2 CE los casos de apología del terrorismo,
son mínimas, están incorporadas a la y por ende, lo que hoy son los delitos previstos
legislación procesal ordinaria, y en la práctica en el art. 578 CP.
se concentran en la prórroga del período de
detención preventiva. Así la ley orgánica 4/88 de 25 de Mayo, en
consonancia con esa doctrina constitucional,
La posibilidad de restringir determinadas ha incorporado la detención preventiva por
garantías procesales para los casos de 48 horas más del plazo que establece el art.
terrorismo tiene su encaje constitucional en el 17.2 de la CE, y respecto a los derechos a la
art. 55.2 de la Carta Magna, a tenor del cual inviolabilidad del domicilio y al secreto de las
“una Ley Orgánica podrá determinar la forma comunicaciones del art. 18.2 y 3 CE, determina
y los casos en los que, de forma individual que puede prescindirse de la autorización
y con la necesaria intervención judicial y el judicial previa para entradas y registros, y

86
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

para la intervención de las comunicaciones en o mediante delegación en el Juez de Instrucción


determinadas circunstancias cuando se trate de la demarcación donde el detenido se
de delitos de terrorismo. encontrare, la situación de éste (apartado 3
del art. 520 bis).
También incluye una Disposición Transitoria
que atribuye la instrucción y enjuiciamiento 2. Registros domiciliarios. El art. 553
de los delitos de terrorismo a los Juzgados párrafo 1º faculta a los funcionarios policiales,
Centrales de Instrucción y a la Audiencia sin requerir autorización judicial y en casos de
Nacional, en vez de a los órganos judiciales excepcional o urgente necesidad, a entrar en
del lugar de comisión de los hechos, sin que cualquier domicilio para detener a presuntos
pueda entenderse que esta previsión afecta responsables de delitos de terrorismo, a
al derecho al Juez ordinario predeterminado registrar los mismos y a ocupar los efectos e
por la ley, ya que se trata de un órgano judicial instrumentos que se encontrasen.
que cumple con todas las garantías que la
ley y la doctrina constitucional establecen 3. Intervención de las comunicaciones. El
para considerar que está integrado en la art. 579.4 habilita al Ministro del Interior o,
jurisdicción ordinaria y que no pertenece a en su defecto, al Director de la Seguridad del
ninguna jurisdicción especial (SSTC 47/83 de 31 Estado para ordenar, en caso de urgencia y en
de Mayo-Pn. Begué Cantón y 101/84 de 8 de las investigaciones por delitos de terrorismo, la
Noviembre-Pn. Tomás y Valiente). observación de las comunicaciones postales,
telegráficas, telefónicas y de cualesquiera otras
Las disposiciones procesales específicas comunicaciones respecto a individuos sobre
para los casos de terrorismo se refieren a los que existan indicios de responsabilidad
tres aspectos puntuales: la prórroga del criminal por tales delitos. La intervención debe
plazo de detención de 72 horas, los registros ser comunicada inmediatamente y en escrito
domiciliarios y la intervención de las motivado al Juez competente, que en el plazo
comunicaciones. de 72 horas la confirmará o la dejará sin efecto.

1. Prórroga del plazo de detención. Así, el En la práctica de las investigaciones por


art. 520 bis de la Ley de Enjuiciamiento Criminal casos de terrorismo, ninguna de estas dos
permite la prolongación del período de últimas previsiones normativas es aplicada
detención de 72 horas establecido para poner por el Ministerio del Interior.
a disposición judicial a un detenido hasta un
límite de 48 horas más siempre que se solicite En cuanto a la incomunicación, desde
motivadamente dentro de las primeras 48 la reforma operada por la ley orgánica
horas de la detención, que el Juez competente 15/2003 de 25 de Noviembre, el régimen de
lo autorice dentro de las 24 horas siguientes a incomunicación de los detenidos y presos
la solicitud y por el tiempo necesario para los terroristas no es excepcional ni más grave que
fines investigadores. El control jurisdiccional el común. Si bien es cierto que el art. 509 de
sobre el desarrollo y ejecución de tal medida la ley procesal penal establece dos plazos de
se completa con la facultad otorgada al Juez de incomunicación, el criterio de distinción no es
requerir información y conocer, personalmente

87
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

la actividad terrorista sino la diferenciación efectiva hasta que el Juez dicte la resolución
entre delincuencia individual y codelincuencia. pertinente en el plazo de 24 horas.

La incomunicación se puede acordar


judicialmente para cualquier delito de forma 3. Legislación penitenciaria
excepcional, durante el tiempo estrictamente
necesario para practicar con urgencia
las diligencias tendentes a evitar que se Las especialidades relativas al tratamiento
sustraigan a la acción de la justicia personas penitenciario del terrorismo han sido
supuestamente implicadas en los hechos, que incorporadas fundamentalmente mediante
éstas puedan actuar contra bienes jurídicos de la ley orgánica 7/2003 de 30 de Junio sobre
la víctima, que se oculten, alteren o destruyan medidas de reforma para el cumplimiento
pruebas, o que se cometan nuevos hechos íntegro y efectivo de las penas, modificaciones
delictivos. Con carácter general se puede que afectaron no solo al Código Penal sino
acordar por un período de 5 días para detenidos también a la normativa penitenciaria.
o presos, sin posibilidad de prórroga salvo que
se trate de presos por delitos de terrorismo o a) En primer lugar, se reforma el artículo 36
delitos cometidos concertadamente y de forma del Código Penal para introducir en nuestro
organizada, en cuyo caso se podrá acordar la ordenamiento el conocido como período
prórroga hasta 5 días más, e incluso por otro de seguridad para los delitos de mayor
período de hasta 3 días aun después de haber gravedad, estableciéndose en el mismo la
cesado aquella siempre que hubiere méritos precisión de que, cuando se imponga una
para ello. pena de prisión superior a cinco años, el
condenado no podrá ser clasificado en el
Respecto a su contenido, a tenor del art. tercer grado hasta haber cumplido la mitad
527 de la ley procesal penal se traduce en de la pena impuesta. Ello no obstante, se
la restricción de tres derechos reconocidos introduce la previsión de que el juez de
con carácter general a todos los detenidos: vigilancia podrá dictar la aplicación del
1) imposibilidad de nombrar abogado de su régimen general de cumplimiento, previo
confianza y consecuentemente designación de pronóstico individualizado y favorable de
abogado de oficio; 2) imposibilidad de poner reinserción social y valorando, en su caso,
en conocimiento de persona de su confianza el las circunstancias personales del reo y
hecho y lugar de la detención; y 3) prohibición la evolución del tratamiento reeducador,
de entrevistarse con el abogado tras la práctica cuando no se trate de delitos de terrorismo
de la diligencia en la que hubiera intervenido. o cometidos en el seno de organizaciones
criminales.
La única singularidad en los casos de
terrorismo consiste en que, conforme al b) En segundo lugar, se reforma el artículo
apartado 2 del art. 520 bis, una vez solicitada 76 del Código Penal para modificar el límite
la incomunicación por la fuerza policial el máximo de cumplimiento de las penas
detenido queda incomunicado de manera elevándolo a 40 años para los supuestos

88
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

en que se cometan dos o más delitos al menos, dos de ellos estén castigados
de terrorismo, estando alguno de ellos por la ley con pena de prisión superior
castigado con pena de prisión superior a 20 a 20 años.
años, lo que encaja en los casos en que se
cometen atentados terroristas causando la d) De 40 años, cuando el sujeto haya
muerte de personas. Igualmente se eleva a sido condenado por dos o más delitos
40 años el límite máximo de cumplimiento de terrorismo de la sección segunda
de las penas en los supuestos de que del capítulo V del título XXII del libro
se hayan cometido dos o más delitos de II de este Código y alguno de ellos
especial gravedad, castigados por la ley esté castigado por la ley con pena de
con más de 20 años de prisión. prisión superior a 20 años.

Así el art. 76 proclama literalmente: 2. La limitación se aplicará aunque las


penas se hayan impuesto en distintos
“1. No obstante lo dispuesto en procesos si los hechos, por su conexión
el artículo anterior, el máximo de o el momento de su comisión, pudieran
cumplimiento efectivo de la condena haberse enjuiciado en uno sólo”.
del culpable no podrá exceder del
triple del tiempo por el que se le c) En tercer lugar, se reforma el artículo 78
imponga la más grave de las penas del Código Penal para que los beneficios
en que haya incurrido, declarando penitenciarios, los permisos de salida, la
extinguidas las que procedan desde clasificación en tercer grado y el cómputo
que las ya impuestas cubran dicho de tiempo para la libertad condicional en
máximo, que no podrá exceder de 20 los supuestos de crímenes especialmente
años. Excepcionalmente, este límite graves se refieran siempre a la totalidad de
máximo será: las penas impuestas en las sentencias, con
lo que se trata de activar una respuesta
a) De 25 años, cuando el sujeto haya penal más efectiva frente a los autores
sido condenado por dos o más delitos de crímenes muy graves, que además han
y alguno de ellos esté castigado por cometido una pluralidad de delitos, es
la ley con pena de prisión de hasta 20 decir, frente a aquellos que se encuentren
años. en los límites máximos señalados por el
artículo 76 del Código Penal (25, 30 ó 40
b) De 30 años, cuando el sujeto haya años de cumplimiento efectivo de condena
sido condenado por dos o más delitos a pena de prisión) y siempre que la pena
y alguno de ellos esté castigado por la a cumplir resulte inferior a la mitad de la
ley con pena de prisión superior a 20 suma total de las impuestas.
años.
Con esta regla y frente a supuestos de
c) De 40 años, cuando el sujeto haya condenas a 100, 200 ó 300 años, el delincuente
sido condenado por dos o más delitos y,

89
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

cumplirá en la práctica de forma íntegra y 3. En estos casos, el juez de vigilancia,


efectiva el límite máximo de condena. previo pronóstico individualizado
y favorable de reinserción social
Además, se incorporan igualmente los y valorando, en su caso, las
períodos mínimos de cumplimiento efectivo circunstancias personales del reo y la
de las condenas que permitirían acceder a evolución del tratamiento reeducador,
los beneficios penitenciarios, siempre que podrá acordar razonadamente, oídos
concurran las condiciones que con carácter el Ministerio Fiscal, Instituciones
general se precisan en la ley. En los casos Penitenciarias y las demás partes,
de delitos de terrorismo o cometidos en el la aplicación del régimen general de
seno de organizaciones criminales, el juez cumplimiento. Si se tratase de delitos
de vigilancia penitenciaria podrá acordar la de terrorismo de la sección segunda
concesión de un tercer grado cuando quede por del capítulo V del título XXII del libro
cumplir una quinta parte del límite máximo de II de este Código, o cometidos en el
cumplimiento de la condena impuesta, y podrá seno de organizaciones criminales, y
acordar la concesión de la libertad condicional atendiendo a la suma total de las penas
cuando quede por cumplir una octava parte impuestas, la anterior posibilidad sólo
del mencionado límite. será aplicable:

Así el art. 78 dice literalmente: a) Al tercer grado penitenciario, cuando


quede por cumplir una quinta parte del
“1. Si a consecuencia de las limitaciones límite máximo de cumplimiento de la
establecidas en el apartado 1 del condena.
artículo 76 la pena a cumplir resultase
inferior a la mitad de la suma total b) A la libertad condicional, cuando
de las impuestas, el juez o tribunal quede por cumplir una octava parte
sentenciador podrá acordar que los del límite máximo de cumplimiento de
beneficios penitenciarios, los permisos la condena”.
de salida, la clasificación en tercer
grado y el cómputo de tiempo para la d) En cuarto lugar, se modifican,
libertad condicional se refieran a la igualmente, en el Código Penal los
totalidad de las penas impuestas en artículos 90, 91 y 93 relativos a la libertad
las sentencias. condicional. Con esta modificación se trata
de mejorar técnicamente los supuestos
2. Dicho acuerdo será preceptivo en los de otorgamiento de dicha libertad
supuestos previstos en los párrafos a, condicional y su adaptación a las distintas
b, c y d del apartado 1 del artículo 76 modalidades delictivas, estableciendo
de este Código, siempre que la pena a condiciones mucho más restrictivas para
cumplir resulte inferior a la mitad de la los delitos de terrorismo y los cometidos
suma total de las impuestas. por organizaciones criminales.

90
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Artículo 90: de otros delitos por parte de la banda armada,


organización o grupo terrorista, bien para
“1. Se establece la libertad condicional atenuar los efectos de su delito, bien para
en la pena privativa de libertad la identificación, captura y procesamiento
para aquellos sentenciados en de responsables de delitos terroristas, para
quienes concurran las circunstancias obtener pruebas o para impedir la actuación
siguientes: o el desarrollo de las organizaciones o
asociaciones a las que haya pertenecido o
Que se encuentren en el tercer grado con las que haya colaborado, lo que podrá
de tratamiento penitenciario. acreditarse mediante una declaración expresa
de repudio de sus actividades delictivas y de
Que se hayan extinguido las tres abandono de la violencia y una petición expresa
cuartas partes de la condena impuesta. de perdón a las víctimas de su delito, así
como por los informes técnicos que acrediten
Que hayan observado buena conducta que el preso está realmente desvinculado
y exista respecto de los sentenciados de la organización terrorista y del entorno
un pronóstico individualizado y y actividades de asociaciones y colectivos
favorable de reinserción social, emitido ilegales que la rodean y su colaboración con
en el informe final previsto en el las autoridades”.
artículo 67 de la Ley Orgánica General
Penitenciaria. Artículo 91:

No se entenderá cumplida la "1. Excepcionalmente, cumplidas las


circunstancia anterior si el penado no circunstancias de los párrafos a y c
hubiese satisfecho la responsabilidad del apartado 1 del artículo anterior, y
civil derivada del delito en los siempre que no se trate de delitos de
supuestos y conforme a los criterios terrorismo de la sección segunda del
establecidos por el artículo 72.5 y 6 de capítulo V del título XXII del libro II de
la Ley Orgánica General Penitenciaria. este Código, o cometidos en el seno de
organizaciones criminales, el juez de
Asimismo, en el caso de personas vigilancia penitenciaria, previo informe
condenadas por delitos de terrorismo de del Ministerio Fiscal, Instituciones
la sección segunda del capítulo V del título Penitenciarias y las demás partes,
XXII del libro II de este Código, o por delitos podrá conceder la libertad condicional
cometidos en el seno de organizaciones a los sentenciados a penas privativas de
criminales, se entenderá que hay pronóstico de libertad que hayan extinguido las dos
reinserción social cuando el penado muestre terceras partes de su condena, siempre
signos inequívocos de haber abandonado los que merezcan dicho beneficio por
fines y los medios de la actividad terrorista y haber desarrollado continuadamente
además haya colaborado activamente con las actividades laborales, culturales u
autoridades, bien para impedir la producción ocupacionales.

91
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

2. A propuesta de Instituciones inobservara las reglas de conducta


Penitenciarias y previo informe del o incumpliera las condiciones que
Ministerio Fiscal y de las demás partes, le permitieron acceder a la libertad
cumplidas las circunstancias de condicional, el juez de vigilancia
los párrafos a y c del apartado 1 del penitenciaria revocará la libertad
artículo anterior, el juez de vigilancia concedida, y el penado reingresará
penitenciaria podrá adelantar, una vez en prisión en el período o grado
extinguida la mitad de la condena, la penitenciario que corresponda.
concesión de la libertad condicional
en relación con el plazo previsto en el 3. En el supuesto previsto en el
apartado anterior, hasta un máximo apartado anterior, el penado cumplirá
de 90 días por cada año transcurrido el tiempo que reste de cumplimiento
de cumplimiento efectivo de condena, de la condena con pérdida del tiempo
siempre que no se trate de delitos de pasado en libertad condicional”.
terrorismo de la sección segunda del
capítulo V del título XXII o cometidos e) En quinto lugar, se introducen dos
en el seno de organizaciones nuevos apartados en el artículo 72 de la
criminales. Esta medida requerirá Ley General Penitenciaria, en cuya virtud
que el penado haya desarrollado la clasificación o progresión al tercer
continuadamente las actividades grado de tratamiento requerirá, además de
indicadas en el apartado anterior y los requisitos previstos por la ley, que el
que acredite, además, la participación penado haya satisfecho la responsabilidad
efectiva y favorable en programas de civil derivada del delito y que muestre
reparación a las víctimas o programas signos inequívocos de haber abandonado
de tratamiento o desintoxicación, en la actividad terrorista, colaborando
su caso." activamente con las autoridades en la
lucha contra el terrorismo.
Artículo 93:
El primer apartado exige la satisfacción de
“2. En el caso de condenados por la responsabilidad civil como requisito para
delitos de terrorismo de la sección alcanzar el tercer grado, teniendo en cuenta
segunda del capítulo V del título XXII que el pronóstico favorable de reinserción
del libro II de este Código, el juez de social que preside la concesión de este grado
vigilancia penitenciaria podrá solicitar de tratamiento debe considerar la conducta
los informes que permitan acreditar efectivamente observada por el penado en
que subsisten las condiciones que orden a restituir lo sustraído, reparar el daño e
permitieron obtener la libertad indemnizar los perjuicios materiales y morales,
condicional. así como las garantías de que las satisfaga con
el patrimonio que pudiese llegar a adquirir en
Si en este período de libertad tanto no haya satisfecho su responsabilidad.
condicional el condenado delinquiera,

92
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Esta exigencia se justifica plenamente en de los requisitos previstos por el Código


aquellos delitos que han permitido al culpable Penal, que el penado haya satisfecho la
obtener un importante enriquecimiento ilícito responsabilidad civil derivada del delito,
y no se satisfacen las responsabilidades considerando a tales efectos la conducta
pecuniarias fijadas en sentencia a causa de efectivamente observada en orden a
haber ocultado el penado su patrimonio. Por restituir lo sustraído, reparar el daño
ello, se aplicará esta norma, singularmente, e indemnizar los perjuicios materiales
cuando el interno hubiera sido condenado por y morales; las condiciones personales
la comisión de delitos contra el patrimonio y y patrimoniales del culpable, a efectos
contra el orden socioeconómico que hubieran de valorar su capacidad real, presente y
revestido notoria gravedad y hubieran futura para satisfacer la responsabilidad
perjudicado a una generalidad de personas, civil que le correspondiera; las garantías
por delitos contra los derechos de los que permitan asegurar la satisfacción
trabajadores, por delitos de terrorismo, por futura; la estimación del enriquecimiento
delitos contra la Hacienda Pública y contra la que el culpable hubiera obtenido por la
Seguridad Social, así como delitos contra la comisión del delito y, en su caso, el daño
Administración pública comprendidos en los o entorpecimiento producido al servicio
capítulos V al IX del título XIX del libro II del público, así como la naturaleza de los
Código Penal. daños y perjuicios causados por el delito,
el número de perjudicados y su condición.
En el segundo apartado, la clasificación
en el tercer grado penitenciario en el caso de Singularmente, se aplicará esta norma
penados por delitos de terrorismo o cometidos cuando el interno hubiera sido condenado
en el seno de organizaciones criminales por la comisión de alguno de los siguientes
exige que los terroristas hayan satisfecho delitos:
su responsabilidad civil en los términos
del apartado anterior, así como que hayan a) Delitos contra el patrimonio y contra
abandonado la actividad terrorista y hayan el orden socioeconómico que hubieran
colaborado activamente con las autoridades revestido notoria gravedad y hubieran
para la obtención de pruebas o la identificación perjudicado a una generalidad de
de otros terroristas, en los términos previstos personas.
en la Decisión marco del Consejo de 13 de junio
de 2002, sobre la lucha contra el terrorismo. b) Delitos contra los derechos de los
trabajadores.
La nueva redacción de los apartados 5 y 6
del artículo 72 de la Ley Orgánica 1/1979, de 26 c) Delitos contra la Hacienda Pública y
de septiembre, General Penitenciaria, queda contra la Seguridad Social.
con el siguiente texto:
d) Delitos contra la Administración
“5. La clasificación o progresión al tercer pública comprendidos en los capítulos
grado de tratamiento requerirá, además

93
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

V al IX del título XIX del libro II del f) En sexto lugar, cabe mencionar
Código Penal. la aplicación de la doctrina “Parot”,
establecida por la jurisprudencia mediante
6. Del mismo modo, la clasificación o la STS 197/2006 de 28 de Febrero, en virtud
progresión al tercer grado de tratamiento de la cual el límite de 30 años de prisión,
penitenciario de personas condenadas de acuerdo con el art. 70 del CP de 1973 no
por delitos de terrorismo de la sección constituye una nueva pena que sustituya
segunda del capítulo V del título XXII del a las anteriores, sino una limitación al
libro II del Código Penal o cometidos en cumplimiento efectivo de las penas en
el seno de organizaciones criminales, los supuestos de concurso real de delitos.
requerirá, además de los requisitos Esto es, si bien el Código Penal parte de la
previstos por el Código Penal y la acumulación material de las penas como
satisfacción de la responsabilidad civil consecuencia del concurso real, la limita
con sus rentas y patrimonio presentes por medio de la acumulación jurídica, pero
y futuros en los términos del apartado sin sustituir las penas impuestas por una
anterior, que muestren signos inequívocos nueva.
de haber abandonado los fines y los medios
terroristas, y además hayan colaborado En aplicación de esta doctrina
activamente con las autoridades, bien jurisprudencial, los tribunales de la Audiencia
para impedir la producción de otros Nacional han impuesto la doctrina Parot en
delitos por parte de la banda armada, 86 casos, en el período comprendido entre el
organización o grupo terrorista, bien 2006 y el 2011.
para atenuar los efectos de su delito,
bien para la identificación, captura y No obstante, la citada doctrina ha sido
procesamiento de responsables de delitos dejada sin efecto por la sentencia del TEDH
terroristas, para obtener pruebas o para de 21-10-2013 dictada en el “caso Inés del Río
impedir la actuación o el desarrollo de contra España”.
las organizaciones o asociaciones a las
que haya pertenecido o con las que haya g) Por último cabe reseñar como medidas
colaborado, lo que podrá acreditarse que forman parte de la política penitenciaria
mediante una declaración expresa de antiterrorista las medidas de dispersión
repudio de sus actividades delictivas y de y alejamiento del colectivo de presos
abandono de la violencia y una petición pertenecientes a ETA, su inclusión en los
expresa de perdón a las víctimas de su programas FIES (Ficheros de Internos de
delito, así como por los informes técnicos Especial Seguimiento) con las limitaciones
que acrediten que el preso está realmente regimentales que tal condición conlleva en
desvinculado de la organización terrorista cuanto a su clasificación y régimen interno,
y del entorno y actividades de asociaciones y la previsión legal de intervención de
y colectivos ilegales que la rodean y su todas las comunicaciones que los internos
colaboración con las autoridades”. por terrorismo mantengan, incluso con

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TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

sus abogados cuando exista autorización B. Comunitaria (<http://eur-lex.


judicial al respecto conforme al art. 51.2 de europa.eu/es/index.htm>)
la Ley General Penitenciaria.

POSICIÓN COMÚN 2001/931/PESC del


Legislación vigente Consejo, de 27 de diciembre de 2001, sobre la
aplicación de medidas específicas de lucha
contra el terrorismo.
A. Nacional (<http://www.boe.es>)
DECISIÓN MARCO 2002/475/JAI del Consejo,
de 13 de junio de 2002, sobre la lucha contra el
LEY 12/2003, de 21 de mayo, de prevención terrorismo.
y bloqueo de la financiación del terrorismo.
DECISIÓN 2002/996/JAI del Consejo, de 28
LEY ORGÁNICA 7/2003, de 30 de junio, de de noviembre de 2002, por la que se establece
medidas de reforma para el cumplimiento un mecanismo de evaluación de los sistemas
íntegro y efectivo de las penas. legales y su ejecución a escala nacional en la
lucha contra el terrorismo.
LEY ORGANICA 4/1988 de 25 de Mayo
vigente en su Disposición Transitoria que DECISIÓN 2003/48/JAI del Consejo, de 19 de
atribuye el conocimiento, la instrucción y fallo diciembre de 2002, relativa a la aplicación de
de estos delitos a la Audiencia Nacional. medidas específicas de cooperación policial
y judicial en la lucha contra el terrorismo de
LEY 10/2010 de 28 de Abril sobre prevención acuerdo con el artículo 4 de la Posición común
del blanqueo de capitales y la financiación del 2001/931/PESC.
terrorismo.
DECISIÓN 2005/671/JAI del Consejo, de 20
LEY ORGANICA 5/2010 de 22 de Junio de de septiembre de 2005, relativa al intercambio
reforma del Código Penal. de información y a la cooperación sobre delitos
de terrorismo.
LEY DE ENJUICIAMIENTO CRIMINAL: arts. 384
bis, 520 bis, 553 párrafo 1º y 579.4. DECISIÓN 2008/342/CE del Consejo, de 29
de abril de 2008, por la que se modifica la
CODIGO PENAL aprobado por ley orgánica Decisión 2007/868/CE por la que se aplica el
10/95 de 25 de Noviembre: arts. 36, 76, 78, 90, artículo 2, apartado 3, del Reglamento (CE)
91, 92, 93, 127, 131, 133, 571 a 580. n.º 2580/2001 sobre medidas restrictivas
específicas dirigidas a determinadas personas
LEY GENERAL PENITENCIARIA aprobada por y entidades con el fin de luchar contra el
ley orgánica 1/79 de 26 de Septiembre. terrorismo.

95
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

DECISIÓN 2008/343/CE del Consejo, de C. Internacional: Consejo de Europa


29 de abril de 2008, que modifica la Decisión (<http://conventions.coe.int>)
2007/868/CE por la que se aplica el artículo 2,
apartado 3, del Reglamento (CE) n.º 2580/2001 CONVENIO europeo sobre la supresión
sobre medidas restrictivas específicas del terrorismo, hecho en Estrasburgo el 27 de
dirigidas a determinadas personas y entidades enero de 1977.
con el fin de luchar contra el terrorismo.
PROTOCOLO que reforma el Convenio
DECISIÓN 2008/615/JAI del Consejo, de 23 europeo sobre la supresión del terrorismo,
de junio de 2008, sobre la profundización de hecho en Estrasburgo el 27 de enero de 1977,
la cooperación transfronteriza, en particular de 15 de mayo de 2003.
en materia de lucha contra el terrorismo y la
delincuencia transfronteriza. CONVENIO del Consejo de Europa sobre
prevención del terrorismo, hecho en Varsovia
DECISIÓN 2008/616/JAI del Consejo, de 23 el 16 de mayo de 2005.
de junio de 2008, relativa a la ejecución de la
Decisión 2008/615/JAI sobre la profundización CONVENIO del Consejo de Europa relativo
de la cooperación transfronteriza, en particular al blanqueo, seguimiento, embargo y decomiso
en materia de lucha contra el terrorismo y la de los productos del delito, y sobre la
delincuencia transfronteriza. financiación del terrorismo, hecho en Varsovia
el 16 de mayo de 2005.
POSICIÓN COMÚN 2008/586/PESC del
Consejo, de 15 de julio de 2008, por la que se
actualiza la Posición Común 2001/931/PESC D. Internacional: Grupo de Acción
sobre la aplicación de medidas específicas Financiera-GAFI (<http://www.fatf-
de lucha contra el terrorismo y se deroga la gafi.org>)
Posición Común 2007/871/PESC.
8 RECOMENDACIONES especiales sobre la
DECISIÓN MARCO 2008/919/JAI del Consejo, financiación del terrorismo (octubre de 2001).
de 28 de noviembre de 2008, por la que se
modifica la Decisión Marco 2002/475/JAI sobre 9 RECOMENDACIONES especiales sobre la
la lucha contra el terrorismo. financiación del terrorismo (octubre de 2004).

POSICIÓN COMÚN 2008/959/PESC del


E. Internacional: Naciones Unidas
Consejo, de 16 de diciembre, que modifica la
Posición Común 2008/586/PESC por la que se
(<http://untreaty.un.org/English/
actualiza la Posición Común 2001/931/PESC access.asp>)
sobre la aplicación de medidas específicas de
lucha contra el terrorismo. CONVENCIÓN sobre delitos y otros actos
cometidos a bordo de aeronaves, hecha en
Tokio el 14 de septiembre de 1963.

96
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

CONVENIO para la represión del CONVENIO sobre la marcación de explosivos


apoderamiento ilícito de aeronaves, hecho en plásticos para los fines de detección, hecho en
La Haya el 16 de diciembre de 1970. Montreal el 1 de marzo de 1991.

CONVENIO para la represión de actos CONVENIO internacional para la represión


ilícitos contra la seguridad de la aviación civil, de los atentados terroristas cometidos con
hecho en Montreal el 23 de septiembre de 1971. bombas, abierto a la firma en Nueva York el 15
de Diciembre de 1997.
CONVENCIÓN sobre la prevención y
el castigo de los delitos contra personas CONVENIO internacional para la Represión
internacionalmente protegidas, inclusive los de la Financiación del Terrorismo, hecho en
agentes diplomáticos, hecha en Nueva York el Nueva York el 9 de diciembre de 1999.
14 de diciembre de 1973.
RESOLUCIÓN 1373/2001 aprobada por el
CONVENIO internacional contra la toma Consejo de Seguridad en su 4385ª Sesión,
de rehenes, hecho en Nueva York el 17 de celebrada el 28 de septiembre de 2001.
diciembre de 1979.
CONVENIO internacional para la represión
CONVENCIÓN sobre protección física de los de los actos de terrorismo nuclear, hecho en
materiales nucleares, hecha en Viena y Nueva Nueva York el 13 de abril de 2005.
York el 3 de marzo de 1980.
RESOLUCIÓN 60/288 adoptada por la
CONVENIO para la represión de actos Asamblea General – Estrategia global de
ilícitos contra la seguridad de la navegación Naciones Unidas contra el terrorismo (2006).
marítima, hecho en Roma el 10 de marzo de
1988.
F. Internacional: Org. de Estados
PROTOCOLO para la represión de actos Americanos (<http://www.cicte.oas.org>)
ilícitos contra la seguridad de las plataformas
fijas emplazadas en la plataforma continental, CONVENCIÓN Interamericana contra el
hecho en Roma el 10 de marzo de 1988. Terrorismo, hecha el 3 de junio de 2002.

PROTOCOLO para la represión de actos


ilícitos de violencia en los aeropuertos
que presten servicio a la aviación civil
internacional, complementario del Convenio
contra la seguridad de la aviación civil, hecho
en Montreal el 24 de febrero de 1988.

97
O terrorista como legislador:
primeiras reflexões sobre a
Lei Antiterrorismo do Brasil

CARLOS EDUARDO DE OLIVEIRA VASCONCELOS Se bem não houvesse a decantada obriga-


Subprocurador-Geral da República ção internacional com que setores interessa-
dos na edição da lei aterrorizaram o Congresso
Nacional para imprimir urgência em sua mis-
Enfim, temos a Lei, já até “batizada” por são legislativa, decerto o legislador brasileiro
uma extensa denúncia recebida pela Justiça se achava em omissão inconstitucional com
Federal no Estado do Paraná, que proferiu pe- um mandado constitucional de criminalização
sadas condenações1. Para quem achava que o instituído pela Carta de 1988, que menciona o
Brasil estava em mora com uma suposta “obri- terrorismo duas vezes, a começar pelo art. 4º,
gação internacional” de criminalizar o terro- VIII, ao erigir o repúdio a sua prática entre os
rismo, missão cumprida! Pelo menos nominal- princípios regentes da República Federativa do
mente, legem habemus. No entanto, quem se Brasil em suas relações internacionais, ao lado
deu o trabalho de ler os demais artigos desta do repúdio ao racismo, da prevalência dos di-
coletânea certamente terá percebido que não reitos humanos, da autodeterminação dos po-
existe essa tal obrigação internacional, pelo vos, da não intervenção, da igualdade entre os
menos nos termos em que vem sendo apre- Estados, da defesa da paz, da solução pacífica
sentada para consumo legislativo e publicitá- dos conflitos, da cooperação entre os povos
rio, mesmo porque a comunidade das nações para o progresso da humanidade e da conces-
ainda não se pôs de acordo quanto a uma de- são do asilo político. A segunda referência en-
finição do fenômeno terrorista. Quando muito, contra-se no inciso XLIII do art. 5º, que estabe-
haveria a obrigação de uma definição qualquer lece que “a lei considerará crimes inafiançáveis
para possibilitar o cumprimento da obrigação e insuscetíveis de graça ou anistia a prática
de criminalizar o financiamento do terrorismo, da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e
esta sim objeto de tratado internacional ratifi- drogas afins, o terrorismo e os definidos como
cado pelo Brasil. E também, claro, há uma obri- crimes hediondos [...]”. É desse dispositivo que
gação de resultado, isto é, de punir os crimes se extrai o mandado constitucional de cri-
resultantes do terrorismo com o arsenal penal minalização, do qual não pode se esquivar o
e processual penal disponível no ordenamento legislador ordinário, e também o comando de
jurídico nacional. um tratamento mais severo nos métodos de
investigação, no processo, nas penas e na exe-
1  Ação Penal n. 5046863-67.2016.4.04.7000/PR, que
cução penal, tratamento este destinado aos
tramitou pela 14ª Vara Federal de Curitiba. Denúncia
crimes hediondos, como a tortura, o latrocínio,
oferecida pelo Procurador da República Rafael
Brum Miron, do 5º Ofício Criminal e de Combate à o estupro e certas formas de homicídio, e os
Corrupção, da Procuradoria da República no Estado a eles equiparados. A omissão legislativa só é
do Paraná. comparável à hesitação legislativa em definir

99
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

– e só muito tempo depois criminalizar – o fe- sequestrar, manter em cárcere privado,


nômeno da organização criminosa. incendiar, depredar, provocar explosão,
praticar atentado pessoal ou atos de
Enquanto não definia nem criminalizava o terrorismo, por inconformismo político
terrorismo, o legislador espalhava alusões ao ou para obtenção de fundos destinados
termo em várias oportunidades, e desde longa à manutenção de organizações políticas
data. Em síntese, a legislação brasileira refe- clandestinas ou subversivas”, para o qual
ria-se a “terrorismo” nos seguintes diplomas comina a pena de reclusão de três a dez
infraconstitucionais, em ordem cronológica: anos, que pode ser dobrada se do fato
resultar lesão grave, e triplicada se do fato
a) Lei n. 6.815, de 19.8.1980, “Estatuto do resultar morte.
Estrangeiro”. Ao trazer um rol de situações
em que fica vedada a extradição, o art. 77, c) Lei n. 8.072, de 25.7.1990, “Lei dos Crimes
VII, apontava o crime político. Contudo, Hediondos”. Ao dar cumprimento parcial
o § 3º do mesmo artigo facultava ao STF ao art. 5º, XLIII, da Constituição, essa lei
“deixar de considerar crimes políticos os repete, no art. 2º, a lista de crimes que
atentados contra chefes de Estado ou a Carta Magna ordenou equiparar aos
quaisquer autoridades, bem assim os atos hediondos – a saber, a prática da tortura,
de anarquismo, terrorismo, sabotagem, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas
sequestro de pessoa, ou que importem afins e o terrorismo – e elege os crimes que
propaganda de guerra ou processos receberão esse rótulo por lei ordinária,
violentos para subverter a ordem política para de todos eles excluir a possibilidade
e social”. A nova Lei de Migração, Lei n. de anistia, graça e fiança, como já figura na
13.445, de 24.5.2017, revogou integralmente Constituição, e também excluir o indulto.
o velho “Estatuto do Estrangeiro”. No Ademais, impõe o regime inicial fechado
entanto, dispositivo semelhante encontra-se para o cumprimento da pena privativa de
no § 4º do artigo 82, que trata das vedações liberdade (até a Lei n. 11.464/2007, a pena
à extradição. Com efeito, doravante poderá deveria ser cumprida integralmente no
o Supremo Tribunal Federal desconsiderar regime fechado), a progressão de regime
a natureza política do atentado contra somente após o cumprimento de 2/5 da
chefe de Estado ou outra autoridade, pena, se primário o condenado, ou após
do crime contra a humanidade, do crime 3/5, se reincidente, e estende o prazo
de guerra (ainda pendente de definição da prisão temporária, fixado na Lei n.
no ordenamento jurídico brasileiro), do 7.960/1989 em cinco dias, para trinta dias,
genocídio e do terrorismo. prorrogáveis uma vez por igual período –
evidentemente somente para os crimes
b) Lei n. 7.170, de 14.12.1983, “Lei de Segurança hediondos e os a eles equiparados.
Nacional”. Seu art. 20 prevê um tipo muito
criticado por ser excessivamente aberto d) Código Penal, art. 83, V. A mesma “Lei
e, por isso, pouco preciso, consistente dos Crimes Hediondos” fez inserir no art.
em “devastar, saquear, extorquir, roubar, 83 do Código Penal, acerca do Livramento

100
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Condicional, a exigência do cumprimento da g) Lei n. 12.850, de 2.8.2013, “Lei do


fração de 2/3 da pena para condenados por Crime Organizado”. Muito saudada por
crimes hediondos, terrorismo e os demais finalmente pôr fim à hesitação legislativa
a eles equiparados, se os condenados em relação às organizações criminosas
forem reincidentes específicos em crimes (ora estabelecendo meios operacionais
da mesma natureza. para a prevenção e repressão, mas sem
definir o fenômeno – Lei n. 9.034/1995; ora
e) Lei n. 9.474, de 22.7.1997, “Estatuto dos definindo-o timidamente, mas se abstendo
Refugiados”. O art. 3º, III, exclui da condição de lhe estabelecer uma sanção penal –
de refugiado, entre outras categorias de Lei n. 12.694/2012), esta lei reformula o
indivíduos, aqueles que tenham cometido velho crime de quadrilha do art. 288 do
crime contra a paz, crime de guerra, crime Código Penal, rebatizado de “associação
contra a humanidade, crime hediondo, criminosa”, define o crime de “organização
participado de atos terroristas ou tráfico criminosa”, dotando-o de meios próprios
de drogas. de investigação criminal, obtenção
de prova e procedimento criminal, e
f) Lei Complementar n. 105, de 10.1.2001, estendendo sua aplicação às organizações
que dispõe sobre o sigilo das operações terroristas (art. 1º, § 2º, II), seja lá o que
financeiras. Fixado no caput do art. isso fosse na ocasião. Essa lei, portanto,
1º o dever de sigilo das operações às promoveu ampla reforma na disciplina dos
instituições financeiras listadas no § 1º, crimes associativos no Brasil. Nela estão
dispõe o § 3º importantes exceções ao previstos, com mais detalhes, vários meios
dever de sigilo, entre as quais, de nosso de prova já presentes dispersamente na
interesse, a comunicação às autoridades legislação brasileira, a saber: colaboração
competentes da prática de ilícitos premiada, ação controlada, infiltração
penais ou administrativos, “abrangendo de agentes, acesso a registros, dados
o fornecimento de informações sobre cadastrais, documentos e informações2.
operações que envolvam recursos Nada mais apropriado do que estender
provenientes de qualquer prática essas disposições aos crimes de
criminosa” (inciso IV, acrescentamos, terrorismo. A nova redação é decerto
independentemente de requerimento ou mais ampla, mas, ainda assim, teria
autorização judicial). O § 4º estabelece deixado de fora os crimes de terrorismo
hipóteses de decretação da quebra do praticados individualmente, não fosse a
sigilo, “quando necessária para apuração remissão mais abrangente do art. 16 da
de ocorrência de qualquer ilícito, em
qualquer fase do inquérito ou do processo
2 Para uma breve informação sobre cada um desses
judicial”, apontando, sem pretensão meios de obtenção de provas e outras questões
exaustiva, os crimes de terrorismo (inciso processuais, confira-se, querendo: VASCONCELOS,
I), lavagem de dinheiro ou ocultação de Carlos Eduardo de Oliveira. Crimes contra a paz
bens, direitos e valores (VIII), e crimes pública. In: QUEIROZ, Paulo (Org.). Direito penal:
praticados por organização criminosa (IX), parte especial. 3. ed. Salvador: JusPodivm, 2016. p.
além de outros. 1098-1107.

101
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Lei Antiterrorismo. Vale a pena comparar III do art. 1º da Lei n. 7.960, de 21.12.1989,
as duas redações deste inciso, a original e estendendo o cabimento da prisão
a atual, trazida pela Lei Antiterrorismo (Lei temporária aos crimes previstos na Lei
n. 13.260/2016): de Terrorismo. Por disposição da Lei n.
8.072/1990 (“Lei dos Crimes Hediondos”),
Esta Lei se aplica também [...] (II) às tal modalidade de prisão poderá durar
organizações terroristas internacionais, pelo prazo de trinta dias, prorrogáveis
reconhecidas segundo as normas por igual período, conforme já constava
de direito internacional, por foro do do art. 2º, § 4º, que repetiu os dizeres da
qual o Brasil faça parte, cujos atos de Constituição antes mesmo que terrorismo
suporte ao terrorismo, bem como os fosse criminalizado no País.
atos preparatórios ou de execução de
atos terroristas, ocorram ou possam
ocorrer em território nacional. [Redação Análise dos principais
original]
dispositivos da Lei n. 13.260/2016
Esta Lei se aplica também [...] (II) às
organizações terroristas, entendidas Art. 2º O terrorismo consiste na prática por
como aquelas voltadas para a prática um ou mais indivíduos dos atos previstos
dos atos de terrorismo legalmente neste artigo, por razões de xenofobia,
definidos. [Redação da Lei n. 13.260/2016] discriminação ou preconceito de raça,
cor, etnia e religião, quando cometidos
h) Lei n. 13.170, de 16.10.2015. Disciplina a com a finalidade de provocar terror
ação de indisponibilidade de bens, direitos social ou generalizado, expondo a perigo
ou valores em decorrência de resolução do pessoa, patrimônio, a paz pública ou a
Conselho de Segurança das Nações Unidas. incolumidade pública.
A ação, de tramitação sumaríssima, será
ajuizada pela AGU e pressupõe a edição § 1º São atos de terrorismo:
do ato de internalização no ordenamento
jurídico nacional da resolução do Conselho I - usar ou ameaçar usar, transportar,
de Segurança. Embora o terrorismo ainda guardar, portar ou trazer consigo
não estivesse previsto como infração penal explosivos, gases tóxicos, venenos,
a essa altura, o art. 10 já impunha ao juiz conteúdos biológicos, químicos, nucleares
a intimação da União quanto a sentenças ou outros meios capazes de causar danos
condenatórias relacionadas à prática de ou promover destruição em massa;
atos terroristas.
II - (VETADO);
i) Inserções feitas na Lei da Prisão
Temporária pela Lei Antiterrorismo. III - (VETADO);
Além da modificação na redação da Lei
n. 12.850/2013 acima noticiada, a Lei n. IV - sabotar o funcionamento ou apoderar-
13.260/2016 fez inserir a alínea p do inciso se, com violência, grave ameaça a

102
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

pessoa ou servindo-se de mecanismos preconceito de raça, cor, etnia e religião, e


cibernéticos, do controle total ou parcial, com a finalidade (o propósito, o objetivo)
ainda que de modo temporário, de meio de provocar terror social ou generalizado,
de comunicação ou de transporte, de com o resultado de expor a perigo
portos, aeroportos, estações ferroviárias pessoa, patrimônio, a paz pública ou a
ou rodoviárias, hospitais, casas de saúde, incolumidade pública, mediante a prática
escolas, estádios esportivos, instalações de certos crimes graves enumerados em
públicas ou locais onde funcionem seus incisos, pratica o crime de terrorismo
serviços públicos essenciais, instalações e está sujeito à pena de reclusão de
de geração ou transmissão de energia, doze a trinta anos, além das sanções
instalações militares, instalações de correspondentes aos crimes-meios.
exploração, refino e processamento de Temos aqui, portanto, um delito de ações
petróleo e gás e instituições bancárias e múltiplas, com seus elementos estruturais,
sua rede de atendimento; a saber, condutas, delitos-meios e sujeitos
ativos; seus elementos teleológicos, isto é,
V - atentar contra a vida ou a integridade as motivações e a finalidade ou o especial
física de pessoa: fim de agir, sem o qual o tipo não se perfaz;
e ainda o “resultado”, que na verdade se
Pena - reclusão, de doze a trinta anos, além contenta com a exposição a perigo de
das sanções correspondentes à ameaça ou pessoa, patrimônio, a paz pública ou a
à violência. incolumidade pública3.

§ 2º O disposto neste artigo não se aplica à Quanto ao resultado ou à consumação, não


conduta individual ou coletiva de pessoas seria inteiramente apropriado classificar o cri-
em manifestações políticas, movimentos me como formal ou de mera conduta, apesar
sociais, sindicais, religiosos, de classe ou de se tratar textualmente de crime de perigo
de categoria profissional, direcionados (“expondo a perigo pessoa...” etc.). Conforme
por propósitos sociais ou reivindicatórios, a ação com que o delito seja perpetrado, das
visando a contestar, criticar, protestar ou três hipóteses que sobreviveram ao veto pre-
apoiar, com o objetivo de defender direitos, sidencial, somente o inciso I (“usar ou amea-
garantias e liberdades constitucionais, çar usar, transportar, guardar, portar ou trazer
sem prejuízo da tipificação penal contida consigo explosivos...”) se apresenta rigorosa-
em lei. mente como sem resultado material. Por sua
vez, o inciso IV (“sabotar..., apoderar-se, com
O caput e o § 1º deste artigo vêm violência, grave ameaça... ou servindo-se de
preencher a lacuna de definir terrorismo
no ordenamento jurídico nacional 27 anos
3  CALLEGARI, André Luís; LIRA, Cláudio Rogério
após a promulgação da Constituição. É alvo
Sousa; REGHELIN, Elisangela Melo; CANCIO MELIÁ,
das maiores críticas dirigidas à lei. Segundo Manuel; LINHARES, Raul Marques. O crime de
ele, toda pessoa que, por motivação (em terrorismo: reflexões críticas e comentários à Lei de
razão, por causa de – aquilo que faz mover Terrorismo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2016.
a vontade) de xenofobia, discriminação ou p. 91-96.

103
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

mecanismos cibernéticos, do controle total A pena cominada constitui uma primeira


ou parcial, ainda que de modo temporário, de demonstração de que a emoção ou a paixão
meio de comunicação ou de transporte, de legislativa, aliadas à pressa, não são boas con-
portos, aeroportos...”) descreve condutas de selheiras, podendo conduzir a insuficiências
resultados muito palpáveis, pelo que poderia ou a excessos impraticáveis, em ambos os
admitir, em tese, a tentativa. A modalidade do casos para alegria dos potenciais terroristas,
inciso V (“atentar contra a vida ou a integri- que talvez não fizessem melhor fossem eles
dade física de pessoa”) contém por definição os legisladores. Dos ordenamentos jurídicos
um crime de resultado, que não precisa ser que servem de modelo ao Brasil e com vasta
a morte. Em todos os casos, evidentemente, experiência no trato do fenômeno – Portugal,
permanece a exigência de que a conduta ou Espanha, Itália, França, Alemanha – desconhe-
as condutas, ainda que se consumem mate- ço algum que tenha cominado pena tão ele-
rialmente, necessitam apresentar aptidão vada para a finalidade especial que converte
para expor a perigo pessoa, patrimônio, a paz o crime em terrorismo – reclusão de doze a
pública ou a incolumidade pública, pois, do trinta anos – à qual se deve agregar, em con-
contrário, configurarão outros crimes, mas curso material, a pena do crime-meio. Trata-
não o de terrorismo. Cabe aqui observar que -se de escandaloso e inaceitável bis in idem
a exposição a perigo de pessoa e patrimônio por expressa determinação legal, de duvidosa
é uma ideia passível de representação (tanto constitucionalidade. Do contrário, tratar-se-ia
quanto possível num crime de perigo). Por sua de mero concurso aparente de normas, facil-
vez, a exposição de perigo da incolumidade ou mente resolvido pelo princípio da consunção,
da paz pública padece das mesmas dificulda- em que o crime-fim absorve o crime-meio, pois
des de representação apontadas pela doutrina este constitui etapa necessária da consuma-
para os tipos codificados que buscam proteger ção daquele. Apesar dos tempos sombrios de
esses bens jurídicos. ativismo e moralismo judicial que vivemos, é
possível e até provável que os juízes recusem
Tudo isso verificado, ainda não se pode aplicação ao dispositivo nos termos em que
falar de terrorismo se não estiver presente o redigido, até porque a própria pena cominada
dolo, consubstanciado no fim especial de “pro- ao terrorismo já é das mais elevadas em nosso
vocar terror social ou generalizado”. Este é o ordenamento. Nem a Lei n. 7.170/1983, a fami-
verdadeiro sentido “comunicacional” do ter- gerada Lei de Segurança Nacional, concebeu
rorismo, que o distingue dos demais crimes, tal heresia jurídica ou fixou penas tão elevadas
como os atos praticados pelas facções crimi- para condutas idênticas ou equiparáveis.
nosas, inclusive o tráfico de drogas, por exem-
plo, ou dos crimes de guerra e outros crimes O sujeito ativo é “um ou mais indivíduos”.
internacionais em geral; dos atos, criminosos Tal disposição manifesta a aceitação pela lei
ou não, praticados por grupos guerrilheiros ou do chamado terrorismo do “lobo solitário”, até
no âmbito de guerras de libertação, como tal poucos anos atrás controvertido na doutrina
reconhecidos pelo Direito Internacional; e até e no direito comparado. Considerava-se que o
mesmo do extremismo político violento. terrorismo só era concebível como prática de
uma organização ou no âmbito de uma rede,

104
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

tanto assim que ele ainda é frequentemente criminalização desses atos preparatórios aca-
caracterizado como (ou confundido com) uma ba corroendo as tradições liberais do Direito
modalidade de crime organizado. Episódios Penal, pois inverte a presunção de inocência,
como os atos do norueguês Anders Behring alcança, nas medidas investigativas, um vasto
Breivik, que, inspirado de ideias cristãs de ex- número de cidadãos que não têm intenção cri-
trema direita, matou 77 jovens e feriu 51, em minosa e institui uma vigilância generalizada
2011; ou os atentados à Maratona de Boston do Estado sobre o indivíduo.
em 2013, protagonizados pelos irmãos cheche-
nos Dzhokhar e Tamerlan Tsarnaev, ainda eram Agora, quais são os atos que, tendo as mo-
vistos como crimes comuns, decerto gravíssi- tivações de xenofobia, entre outras, a finalida-
mos, mas insuscetíveis de configurar terroris- de de provocar terror social ou generalizado
mo, porque este pressupõe um planejamento e o resultado de expor a perigo pessoa, pa-
mais complexo, que não prescinde de uma trimônio, paz ou incolumidade públicas, cons-
organização e uma logística que envolvam a tituem os crimes de terrorismo? São aqueles
participação de várias pessoas. Tanto é assim acima mencionados, inseridos no § 1º do art.
que boa parte das legislações europeias sobre 2º, e mais nenhum outro, notadamente não os
o tema, elaboradas para lidar com suas mani- incisos vetados pela presidenta da República5.
festações da década de 1970 ou até do início
deste século, precisaram reformar-se, quase A cláusula de exclusão dos movimentos
sempre criminalizando o terrorismo individual sociais (§ 2º do art. 2º) é fruto de um entendi-
em tipo legal específico4. Atualmente, com a mento político entre as forças que idealmente
possibilidade de autorradicalização propor- não queriam nenhuma lei sobre terrorismo, ou
cionada pela internet, o terrorismo do lobo uma lei bem enxuta, para criminalizar o ter-
solitário não só deve ser reconhecido como rorismo internacional apenas, e aquelas que
tal como também se constitui numa de suas queriam uma lei dura, que permitisse rotular
modalidades mais perigosas, porquanto difi- de terrorismo “doméstico” desde as manifes-
cilmente detectável por serviços de inteligên- tações das facções do crime organizado do
cia, parentes ou vizinhos, já que o agente atua Rio de Janeiro até movimentos populares ou
silenciosamente e só pode ter sua intenção re- de desobediência civil acompanhados de al-
conhecida pelo conjunto de atos preparatórios guma violência, inclusive criminosa. Na verda-
(sites visitados, correspondência eletrônica, de, a definição de terrorismo foi tão tímida no
aquisição de produtos e substâncias normal- requisito da motivação que dificilmente uma
mente de acesso legal mas que podem ser
utilizados na confecção de explosivos etc.). A 5  O inciso II previa a conduta de “incendiar,
depredar, saquear ou explodir meios de transporte
4  Assim, Portugal, na Lei n. 52/2003, de 22.8, ou qualquer bem público ou privado”, e o inciso III
contempla o terrorismo individual no seu artigo previa “interferir, sabotar ou danificar sistemas de
4º, usando a expressão: “quem praticar os factos informática ou bancos de dados”. A justificativa dos
previstos no n. 1 do artigo 2º, com a intenção nele vetos considerou as “definições excessivamente
referida, [...]”. Na Alemanha, os §§ 129a e 129b, que amplas e imprecisas, com diferentes potenciais
essencialmente definem o terrorismo, focalizam ofensivos, cominando, contudo, em penas idênticas,
a associação terrorista ou o pertencimento ou a em violação ao princípio da proporcionalidade e da
colaboração com tal agremiação. taxatividade”.

105
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

organização como o MST o praticaria. Não me art. 288 do CP, a milícia do art. 288-A, a própria
consta que esta organização atue por motiva- organização criminosa da Lei n. 12.850/2013,
ções de xenofobia, discriminação ou precon- a inacreditável associação de dois da Lei de
ceito de raça, cor, etnia e religião. Portanto, o Drogas, e agora a associação terrorista, com
dispositivo não seria necessário de um ponto pena cominada de cinco a oito anos de reclu-
de vista da técnica legislativa. Contudo, eu não são. De passagem cabe observar que é fora da
diria que é um dispositivo inócuo. Ele serve de realidade condenar alguém por um crime de
anteparo à sofreguidão com que autoridades terrorismo (mínimo de doze anos), associação
brasileiras, acadêmicos e os próprios meios terrorista (mínimo de quatro anos) e, digamos,
de comunicação rotulam qualquer irrupção homicídio qualificado (mínimo de doze anos se
de violência urbana ou coletiva de terrorismo, for apenas um).
como uma forma de “desqualificar” o ato. É
preciso entender que, quando rotulamos inde- O art. 4º e seus parágrafos, inteiramente
vidamente uma manifestação genuinamente vetado, previa as condutas de apologia e in-
criminosa de terrorismo, como as facções cri- citamento aos crimes definidos nesta lei, com
minosas, estamos oferecendo-lhes um “upgra- aumento da pena mínima de quatro anos se
de”, porque o rótulo lhes confere uma “digni- praticadas pela internet. São conhecidas as
dade” política. Ao revés, quando etiquetamos objeções aos arts. 286 e 287 do Código Penal,
um movimento social que eventualmente co- que preveem, respectivamente, apologia e inci-
mete crimes de terrorista, subjaz a intenção tamento ao crime. Pelo menos eles têm penas
de desqualificá-lo perante a opinião pública, mais proporcionais. E se a apologia ou incita-
de equipará-lo aos “piores criminosos que a mento atingir grandes proporções, é previsível
humanidade conhece”. que o agente incida nas condutas dos arts. 2º
ou 3º da lei. Não me filio aos que consideram a
Art. 3º Promover, constituir, integrar ou liberdade de expressão como direito absoluto.
prestar auxílio, pessoalmente ou por No entanto, convenhamos com as razões do
interposta pessoa, a organização terrorista: veto em que o conceito é muito amplo, faltam
parâmetros precisos para garantir o exercício
Pena - reclusão, de cinco a oito anos, e do direito à liberdade de expressão, e a pena é
multa. desproporcionalmente elevada.

Este artigo define a “organização terro- Art. 5º Realizar atos preparatórios de


rista” como uma modalidade de organização terrorismo com o propósito inequívoco de
criminosa com fim específico, mas sem a espe- consumar tal delito:
cificação do número mínimo de membros. Fe-
lizmente foram extirpados os parágrafos, que Pena - a correspondente ao delito
pretendiam sujeitar às mesmas penas quem consumado, diminuída de um quarto até a
meramente hospedasse suposto terrorista. metade.
Não é saudável nem tecnicamente recomendá-
vel essa profusão de definições de crimes as- § 1º Incorre nas mesmas penas o agente
sociativos: já temos a associação criminosa do que, com o propósito de praticar atos de
terrorismo:

106
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

I - recrutar, organizar, transportar ou “lobos solitários” pelo mundo, considerando


municiar indivíduos que viajem para país a dificuldade logística de as organizações ter-
distinto daquele de sua residência ou roristas atuarem diretamente em toda parte.
nacionalidade; ou Além disso, o treinamento fornece ao interes-
sado não apenas métodos de atuação, de ata-
II - fornecer ou receber treinamento em que, de criar explosivos com material caseiro,
país distinto daquele de sua residência ou mas principalmente a doutrinação, o discurso
nacionalidade. do ódio destinado a legitimar a radicalização
que se forma.
§ 2º Nas hipóteses do § 1º, quando a
conduta não envolver treinamento ou Não deixa de ser curioso que o art. 10 ex-
viagem para país distinto daquele de sua pressamente informa que a desistência volun-
residência ou nacionalidade, a pena será tária e o arrependimento eficaz, previstos no
a correspondente ao delito consumado, art. 15 do Código Penal, aplicam-se ao tipo do
diminuída de metade a dois terços. art. 5º da lei em apreço. Na prática, será um
exercício mental de elevado grau de dificulda-
O art. 5º fala de coisas distintas em seu de traçar o marco divisor capaz de configurar
caput e parágrafos. “Realizar atos preparató- a desistência voluntária, ou indicar o ato eficaz
rios”, na prática, converte-se num cheque em que impede o resultado em condutas que con-
branco, num wild card para que as autorida- sistem na prática de atos preparatórios.
des acusem de terrorismo alguém que tenha
se convertido ao islamismo e incidentalmen- De resto, há que se criticar neste artigo o
te compre uma panela de pressão (usada nos modo de fixação da pena, que precisa repor-
atentados de Boston); alguém que estude ára- tar-se à pena do crime que o agente tinha em
be por diletantismo e acesse sites nessa lín- mente praticar, a exemplo do que já faz a Lei do
gua. A despeito da ressalva do artigo (“com o Genocídio. Trata-se de uma preguiça legislativa
propósito inequívoco de”), inequívoco é que, que acaba desestimulando o aplicador e intér-
a partir do levantamento da suspeita, o ônus prete da lei.
da prova se inverterá, e o suspeito se verá na
posição de ter que provar que não tem a in- Art. 6º Receber, prover, oferecer, obter,
tenção de praticar atos terroristas. Portanto, guardar, manter em depósito, solicitar,
a norma ofende os princípios da legalidade e investir, de qualquer modo, direta ou
do estado de inocência. Na prática, a prova do indiretamente, recursos, ativos, bens,
“propósito inequívoco” acaba se fazendo pelos direitos, valores ou serviços de qualquer
próprios atos preparatórios, em efeito circular, natureza, para o planejamento, a
e os primeiros suspeitos poderiam ser fotógra- preparação ou a execução dos crimes
fos, jornalistas, professores, pesquisadores ou previstos nesta lei.
meros curiosos.
Pena - reclusão, de quinze a trinta anos.
Por sua vez, os parágrafos falam de condu-
tas mais perigosas e bem definidas. O recruta- Parágrafo único. Incorre na mesma
mento tem sido uma forma frequente de criar pena quem oferecer ou receber, obtiver,

107
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

guardar, mantiver em depósito, solicitar, convenção; e o artigo 18, que determina aos
investir ou de qualquer modo contribuir Estados-Partes a imposição de uma série de
para a obtenção de ativo, bem ou obrigações de notificação às instituições fi-
recurso financeiro, com a finalidade de nanceiras, a fim de evitar que valores desti-
financiar, total ou parcialmente, pessoa, nados ao terrorismo transitem livremente no
grupo de pessoas, associação, entidade, mercado financeiro. E tanto não é verdade que
organização criminosa que tenha como não há uma obrigação internacional de crimi-
atividade principal ou secundária, mesmo nalizar o terrorismo como tal, que a Conven-
em caráter eventual, a prática dos crimes ção, ciente de não poder defini-lo7, preferiu
previstos nesta lei. adotar um anexo contendo os tratados que,
no momento de sua assinatura, configuravam
Este artigo é o que verdadeiramente preen- práticas terroristas. O Grupo de Ação Finan-
che a decantada obrigação internacional do ceira (GAFI), organismo intergovernamental
Brasil nesta matéria, que é a de punir todas as que tem por objetivo conceber e promover
formas de financiamento do terrorismo. Está estratégias contra a lavagem de capitais e o
em vigor no País a Convenção Internacional financiamento do terrorismo, é integrado pelo
para a Supressão do Financiamento do Terro- Brasil e monitora seus membros regularmente
rismo, concluída em Nova York em 1999 e pro- quanto à permeabilidade de seu sistema
mulgada pelo Decreto n. 5.640/20056. Como já financeiro e jurídico à circulação de dinheiro do
asseverado, não há uma obrigação internacio- terrorismo bem como à possibilidade jurídica
nal formal de criminalizar o terrorismo como do congelamento de bens de tal procedência.
tal, e sim a obrigação de resultado de punir os Também essa instituição cobrava do Brasil
atos dele resultantes, o que já se achava con- não mais que a criminalização do financia-
templado no ordenamento jurídico brasileiro mento do terrorismo.
independentemente desta lei.
De volta ao art. 6º da Lei n. 13.260/2016,
Dentre as várias disposições da Conven- chama a atenção do intérprete a absurda pena
ção Internacional para a Supressão do Finan- cominada, principalmente a pena mínima de
ciamento do Terrorismo, destaco o artigo 2, quinze anos de reclusão, que deverá ser apli-
que esboça definições que serviriam à tipifi-
cação dos delitos de financiamento do terro-
7  Há uma definição, sem pretensão exaustiva, no
rismo; o artigo 8, que trata da identificação,
artigo 2, primeiro parágrafo, alíneas a e b: “a) Um
detecção e congelamento ou confisco de fun- ato que constitua delito no âmbito de e conforme
dos ou rendas utilizados para o financiamento definido em um dos tratados relacionados no
do terrorismo; os artigos 11 e 12, que procu- anexo; ou b) Qualquer outro ato com intenção de
ram, respectivamente, facilitar a extradição e causar a morte de ou lesões corporais a um civil,
estimular a assistência mútua nos temas da ou a qualquer outra pessoa que não participe
ativamente das hostilidades em situação de conflito
6  Íntegra da Convenção Internacional para armado, quando o propósito do referido ato, por sua
a Supressão do Financiamento do Terrorismo natureza e contexto, for intimidar uma população,
disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ ou compelir um governo ou uma organização
ccivil_03/_Ato2004-2006/2005/Decreto/D5640.htm>. internacional a agir ou abster-se de agir”.

108
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

cada, por exemplo, a um indivíduo que contri- O mesmo teria acontecido com o art. 8º,
bua modicamente, em prestações mensais, a que previa causa de aumento pelo dano am-
uma entidade caritativa que preste serviços a biental, mas foi vetado em face da existência
parentes de terroristas mortos em ação, mas de legislação repressiva específica.
não tenha a menor ligação, pessoal ou profis-
sional, com a atividade terrorista. Também vetado foi o art. 9º, que prescre-
via o cumprimento da pena em estabelecimen-
Ainda com respeito à cooperação interna- to penal de segurança máxima para condena-
cional no combate ao terrorismo, especifica- dos a regime fechado, uma vez que, segundo
mente no tema de que trata este artigo, o art. as razões do veto, atentaria contra o princípio
15 contém uma série de regras concernentes da individualização da pena, ao impedir que se
a medidas assecuratórias sobre bens, direitos considerassem as condições pessoais do ape-
ou valores oriundos de crimes de terrorismo nado, tais como o grau da culpabilidade, os an-
praticados no estrangeiro. tecedentes, a conduta social, a personalidade
e os fatores subjetivos concernentes à prática
Art. 7º Salvo quando for elementar da delituosa.
prática de qualquer crime previsto nesta
Lei, se de algum deles resultar lesão Art. 11. Para todos os efeitos legais,
corporal grave, aumenta-se a pena de um considera-se que os crimes previstos
terço, se resultar morte, aumenta-se a nesta Lei são praticados contra o interesse
pena da metade. da União, cabendo à Polícia Federal
a investigação criminal, em sede de
Esta norma é totalmente supérflua, consi- inquérito policial, e à Justiça Federal o seu
derando que o crime de lesão corporal grave, processamento e julgamento, nos termos
assim como qualquer outro de natureza vio- do inciso IV do art. 109 da Constituição
lenta, soma-se à pena do crime de terrorismo Federal.
previsto no art. 2º desta lei, conforme deflui
do preceito sancionador daquele artigo. Aqui, Ao se reportar ao art. 109, IV, da Constitui-
a falta de técnica legislativa chegou a extre- ção da República, o legislador antiterrorista ca-
mos. Não bastando a possibilidade de bis in tegorizou o terrorismo como crime político ou,
idem que já resulta do preceito sancionador quando menos, de interesse da União, o que
do art. 2º, ainda acrescentou mais uma hipó- poderia encontrar fundamento em seu art. 4º,
tese de duplicação da punição pelo mesmo inciso VIII, que erige o “repúdio ao terrorismo”
fato, em autêntico exercício de direito penal como um dos princípios pelos quais se rege a
simbólico8. República Federativa do Brasil em suas rela-
ções internacionais.

8  Acerca deste conceito, por seu próprio criador, Todavia, a menção à “Polícia Federal” e ao
cf. HASSEMER, Winfried. Direito penal simbólico e “inquérito policial” é totalmente descabida
tutela de bens jurídicos. In: . Direito penal:
fundamentos, estrutura, política. Organização
Vasconcelos. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris
e revisão por Carlos Eduardo de Oliveira
Editor, 2007. p. 112.

109
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

e inoportuna, o que me faz suspeitar que Considerações finais


atendeu a interesses corporativistas. O
inquérito policial é uma forma de investigação Como se vê do exposto, não é uma lei
decrépita, burocrática e ineficaz, com toda a que possa ser celebrada. Atirou no que viu e
certeza em vias de extinção numa eventual acertou no que não viu. Penas severas, até
reforma do processo penal despida de raivosas, e tipos de pouco alcance. O teste
interesses corporativos. Há um grande definitivo é saber se os atentados terroristas
esforço em colocar a expressão em leis, quiçá contemporâneos, razão que deve ter inspirado
constitucionalizá-la, a fim de tornar o inquérito sua edição, seriam por ela alcançados, caso
policial a única forma legítima de investigação cometidos em local sob jurisdição brasileira.
criminal9. De resto, a menção feita no artigo Tomemos, a título de exemplo, o atentado
é totalmente supérflua. O mesmo se diga perpetrado pelo grupo Setembro Negro
da referência à Polícia Federal. Ainda que à delegação israelense nas Olimpíadas
ausentes do dispositivo, é óbvio que, tratando- de Munique, em 1972, o ataque às Torres
se de crime federal, a investigação se faria, Gêmeas em Nova York, em 2001, as explosões
de regra, pela Polícia Federal no instrumento ocorridas na Maratona de Boston, em 2013, e
a tanto prediposto, que é o inquérito os frequentes ataques que se abatem sobre a
policial. As inserções parecem conferir uma França nos últimos anos. Em nenhum deles se
“exclusividade” que não existe mas pode encontraria a motivação xenófoba, porquanto
suscitar controvérsias judiciais, ensejando não constituem ataques de uma maioria local
alegações de nulidade em relação a provas ou a uma minoria alienígena. De preconceito de
investigações produzidas, por exemplo, pelas raça, cor ou etnia tampouco é o caso. O dissídio
Forças Armadas, ou pelas polícias estaduais, entre palestinos e judeus não tem natureza
ou por meios que não o inquérito policial. racial ou étnica, muito menos religiosa. Trata-
se de uma disputa por território para a criação
9  Veja-se também a expressão “delegado de de um Estado Palestino independente e do
polícia” no caput do art. 12, em vez da tradicional inconformismo com a política dos Estados
“autoridade policial”. Tiveram grande êxito na Lei Unidos para aquela região. Nem mesmo
Antiterrorismo os contínuos esforços de setores os ataques que possam ser chamados
da Polícia Federal de (1) fortalecerem a figura
de terroristas no contexto do conflito da
do “delegado de polícia” como uma espécie de
Irlanda do Norte, que parecem ter a religião
magistrado que preside o inquérito policial qual
como pano de fundo, possuem motivação
um juiz de instrução, em detrimento do conjunto
dos policiais federais que efetivamente investigam; realmente religiosa, porquanto se disputa
(2) converterem o inquérito policial, presidido por entre o pertencimento ao Reino Unido e a
um delegado de polícia, em instrumento único de independência para a integração à República
investigação criminal, com exclusão de qualquer da Irlanda. Em todos esses casos, a lei brasileira
outro órgão e instrumento de investigação; e (3) seria inoperante, porque não incidiria. Já que
afirmarem-se, a longo prazo, como uma magistratura o legislador optou por enumerar motivações,
independente, que não investiga diretamente devia tê-lo feito com maior amplitude ou,
por serem “juristas”, mas ao mesmo tempo sem pelo menos, incluir a motivação política, de
se descolarem da atividade policial, por meio do maior abrangência. Melhor seria se, como em
inquérito policial.

110
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

outros ordenamentos jurídicos, simplesmente em analogias, em tratados internacionais que


prescindisse da motivação para a configuração criam obrigações para os Estados mas não
do tipo, bastando a finalidade de provocar terror criam tipos penais, e baseadas no potencial de
social ou generalizado, o resultado, que seria despertar emoções que a atividade terrorista
a exposição a perigo de pessoa, patrimônio, suscita, será difícil, com a lei que temos,
a paz pública ou a incolumidade pública, e obter condenações escorreitas por fatos que
a prática das condutas determinadas nos realmente se subsomem aos tipos previstos
incisos. A menos que se produzam denúncias em lei. Difícil, mas não impossível, no Brasil
e sentenças contendo imputações baseadas em que vivemos atualmente.

111
Atentados terroristas del 11-M en Madrid:
Sumario 20/04 del Juzgado Central de
Instrucción n. 6 (una vision judicial del caso)
JAVIER-ALBERTO ZARAGOZA AGUADO una nación que desde el primer momento
supo lo que debía hacer.
Fiscal Jefe de la Audiencia Nacional
A diferencia de otros países, no resultó
necesario modificar con urgencia las leyes para
1. Una reflexión previa restringir derechos y libertades, ni ampliar
indefinidamente los plazos de detención para
los sospechosos de terrorismo, ni recurrir a las
El año 2007 pasará a la historia por la fuerzas militares para combatir esta lacra y
celebración del juicio oral por los atentados reprimir indiscriminadamente cualquier brote
terroristas de Madrid. El balance de ese islamista radical, ni construir “guantánamos”
atentado terrorista no pudo ser más trágico: el jurídicos asentados sobre la negación del
11 de Marzo de 2004 191 muertos y casi 2.000 Estado de Derecho, en los que, excluida la
heridos fueron víctimas directas de la barbarie vigencia de los derechos fundamentales
terrorista más importante de la historia de y de las garantías constitucionales, todos
España y de Europa. Miles de personas que somos culpables sin juicio previo hasta que
viajaban a sus lugares de trabajo en los trenes dejamos de ser sospechosos. Sencillamente
fueron testigos presenciales de los atentados, fue suficiente aplicar la ley respetando los
y en sus retinas quedará grabada para siempre límites que la legalidad impone, y el resultado
la imagen del terror, de la tragedia y de la final está a la vista de todos: el Estado de
muerte. Fueron y son también víctimas. Derecho ha conseguido una inmensa victoria
en la lucha contra el terrorismo. Y el mundo
La sociedad española quedó sobrecogida entero, pues el juicio oral ha sido transmitido
ante un atentado tan brutal, pero, y esto es lo con total transparencia a todos los rincones
más relevante, a pesar de haber sido sacudida del planeta, ha sido testigo de ello.
por una intensa conmoción social demostró su
madurez, mantuvo la serenidad y, sobre todo, El juicio oral y la sentencia han servido
confió en la justicia. Millones de ciudadanos para demostrar que la actuación policial fue
se manifestaron al día siguiente contra el extraordinariamente eficaz, que la investigación
terrorismo en todo el territorio nacional sin judicial se ha ajustado a la legalidad, y que han
reclamar medidas de excepción, y sin mostrar sido respetados los derechos de los acusados
ansias de venganza. El tiempo les ha dado la y de las víctimas. Ha sido, en definitiva, una
razón. No hemos sido los primeros en padecer demostración de la capacidad y eficacia del
el terrorismo “jihadista”, pero sí hemos sido sistema judicial español, y el mejor homenaje

113
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

que se ha podido rendir a las víctimas: se Asturias durante los meses anteriores
ha establecido la verdad material y se ha al atentado, habiéndose acreditado
castigado a los culpables. que allí había dinamita Goma 2 Eco,
y que el resto de la dinamita intacta
Poco más de cuatro años después de encontrada en diversos escenarios
su inicio, la justicia española ponía fin en la relacionados con la célula terrorista
vía judicial ordinaria al procedimiento penal autora del atentado era de la misma
seguido por los atentados cometidos el 11 de clase.
Marzo de 2004 en Madrid. El Tribunal Supremo
mediante sentencia de 17-7-2008 resolvía el • otorgaba plena validez a las pruebas
recurso de casación interpuesto contra la más determinantes de la investigación
sentencia de la Sala de lo Penal de la Audiencia (la mochila de Vallecas, la furgoneta
Nacional de 31-10-2007, y lo hacía una vez más Renault Kangoo, los tráficos
desautorizando las siniestras teorías de la telefónicos y las vías de investigación
conspiración que habían venido sosteniendo que condujeron a la localización
durante casi cuatro años un lamentable del piso de Leganés), descartando
juicio paralelo, con el que se ha pretendido manipulación o fraude alguno en su
deslegitimar la investigación judicial y hallazgo y aportación al proceso.
quebrantar la confianza de los ciudadanos en
la Administración de Justicia. • respaldaba la investigación policial
y judicial en su conjunto, rechazando
El Alto Tribunal confirmaba con su la concurrencia de causas de nulidad
resolución – más allá de discrepancias de las pruebas, y reconociendo la
puntuales sobre la concreta participación de legitimidad en su obtención y en su
algun acusado o sobre la suficiencia de las incorporación al procedimiento penal.
pruebas de cargo en algunos casos- los ejes
centrales de la sentencia y de la acusación Es más, reafirmaba que el proceso penal
formulada por la Fiscalía: había cumplido sus objetivos, y que se habían
respetado las reglas y los límites que el Estado
• reconocía que el atentado había de Derecho impone, expresándose en el
sido planificado y ejecutado por fundamento jurídico preliminar de la sentencia
una célula terrorista “yihadista” de la siguiente manera:
vinculada con el salafismo e integrada
fundamentalmente por individuos “Se trata del atentado terrorista más grave
de origen marroquí, habiéndose perpetrado en España y uno de los más
descartado la intervención en los graves ejecutado en el mundo. Cuatro
hechos de otras organizaciones años y algo más de tres meses después, el
terroristas. Tribunal Supremo dicta, sobre estos hechos,
la sentencia definitiva en esta causa en el
• ratificaba que la dinamita empleada ámbito de la jurisdicción penal. La Justicia
para la comisión de los atentados penal, dentro de los límites impuestos
fue sustraída de Mina Conchita en por la condición humana, comprende la

114
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

respuesta a la acción delictiva mediante 1. Financiación del atentado: la célula


la atribución de responsabilidad criminal terrorista financió la adquisición de los
individualizada a los autores y partícipes, explosivos mediante el intercambio con varias
con la consiguiente sanción en su caso, decenas de kilogramos de hachís, después de
y también supone el reconocimiento del mantener varias reuniones entre los meses de
dolor y del daño, casi siempre irreparables Octubre de 2003 y Febrero de 2004 entre los
en su integridad, inflingido a las víctimas, máximos responsables de la célula terrorista
a través de la condena penal y de las (JAMAL AHMIDAN “El Chino”, jefe operativo
indemnizaciones pertinentes. Todo ello del comando) y de la trama asturiana que
mediante la respuesta razonada en un controlaba los explosivos (JOSE EMILIO SUAREZ
tiempo razonable”. TRASHORRAS).

2. Infraestructura que emplearon los


2. La preparación y terroristas: el alquiler de viviendas para refugio
de los integrantes de la célula terrorista,
la ejecución del atentado ocultación de los explosivos y fabricación de
bombas (alquiladas en los 3 meses anteriores),
El núcleo operativo de la célula terrorista se la adquisición de vehículos (algunos robados)
conformó a lo largo del año 2003 con personas y de los teléfonos se financió con reducidas
procedentes de dos facciones: un primer grupo cantidades de dinero en efectivo y con el
de delincuentes comunes comandados por desarrollo de actividades de microdelincuencia
JAMAL AHMIDAN, alias “El Chino”, individuo por parte de algunos implicados (robos,
extremadamente violento que sufrió un proceso falsificaciones, etc.).
de radicalización religiosa durante su estancia
en las cárceles marroquíes; y un segundo 3. Ejecución del atentado:
grupo de individuos pertenecientes a las
corrientes salafistas liderados por el SERHANE • en la mañana del día 11 de Marzo del
“EL TUNECINO” que se encargó de captar de 2004 los acusados, JAMAL ZOUGAN,
las mezquitas madrileñas a individuos que OTMAN EL GHANOUI y los que se
profesan el fundamentalismo concretamente
en su vertiente del movimiento TAKFIR WAL sus aliados; y no vacila en utilizar medios violentos
HIJRA, movimiento islámico radical integrado para alcanzar sus objetivos. Sus atentados van
dentro del salafismo-jihadismo marroquí, dirigidos principalmente contra el régimen marroquí
y sus aliados occidentales, y los judíos. Actualmente
conocido como el MOVIMIENTO SALAFIYA
el G.I.C.M. ha destinado gran parte de sus efectivos
JIHADIA, al que también pertenece el GRUPO
a engrosar las filas de la insurgencia iraquí
ISLÁMICO COMBATIENTE MARROQUÍ, GICM1.
encabezada por AL ZARQAWI (muerto el día 8-6-06)
y dispuestos a combatir en cualquier lugar en que se
1  Fundado en 1993 en Peshawar, Pakistán, e haga la/el Jihad. El G.I.C.M. tiene implantadas células
inspirado en el G.I.A. argelino, el G.I.C.M. tiene en las ciudades más importantes de Marruecos, y
por objetivo derrocar el régimen marroquí e es también activo en Asia, Oriente Medio, África,
instalar un estado estrictamente islámico. Hace un Península Escandinava y Europa Occidental (incluida
llamamiento a la Jihad contra el rey Mohamed VI y España).

115
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

suicidaron en Leganés el 3-4-2004 • en primer lugar, el riesgo de comisión


(SERHANE BEN ABDELMAJID FAKED de un nuevo atentado terrorista por
“EL TUNECINO”, JAMAL AHMIDAN “EL la misma célula (que se anunciaba
CHINO”, ALLEKEMA LAMARI, ABDENNABI en los vídeos de reivindicación
KOUNJAA, RIFAAT ANOUAR ASRIH, encontrados en los días posteriores),
RACHID OULAD AKCHA y MOHAMED llegando incluso a colocar un artefacto
OULAS AKCHA), en unión de algún explosivo similar a los utilizados en la
otro miembro de la célula dejaron las vía del Tren de Alta Velocidad el 2 de
mochilas con los explosivos en 4 trenes Abril a unos 60 kilómetros de Madrid
diferentes (a los que accedieron entre (que finalmente fue desactivado).
las 7 y las 7’15 am en la estación de
Alcalá de Henares), produciéndose las • en segundo lugar, la posible pérdida de
explosiones entre las 7’37 y las 7’40 am pruebas que el transcurso del tiempo
en los siguientes lugares: estación de podría producir.
Atocha, calle Téllez, estación El Pozo y
Santa Eugenia. Las principales líneas de investigación
que permitieron identificar a los partícipes en
• las 13 bolsas o mochilas contenían los atentados, a los integrantes de la célula
10 kilogramos de dinamita –Goma 2 terrorista y a otros colaboradores fueron las
ECO- cada una de ellas, con un sistema siguientes:
de activación temporizada mediante
despertador conectado a un teléfono
móvil (sistema empleado por GICM y que 3.1. Hallazgo de una furgoneta
en el que se adiestraba a sus miembros Renault Kangoo junto a la estación
en el campo de entrenamiento de de trenes de Alcalá de Henares
Jalalabad-Afganistán).

• de ellas 10 bolsas estallaron en los El mismo día de los atentados, sobre las
trenes, 2 fueron explosionadas por la 10,30 horas, se localizó una furgoneta marca
Policía en las estaciones de Atocha RENAULT, modelo KANGOO en las inmediaciones
y El Pozo, y una fue localizada en la de la Estación de cercanías de RENFE de dicha
madrugada del día 12 entre los efectos localidad, y en la misma fueron hallados
recuperados en El Pozo. perfiles genéticos de ALLEKEMA LAMARI y
ABDENNABI KOUNJAA (ambos se suicidaron en
Leganés el 3-4-2004 tras ser cercados por la
3. La investigación Policía), así como huellas del rebelde DAOUD
judicial de los hechos OUHNANE, y otros no identificados.

En su interior se encontró una bolsa


Dos cuestiones condicionaban de plástico de color azul, bajo el asiento
fundamentalmente la investigación: delantero derecho que contenía entre

116
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

otros efectos 7 detonadores, y un trozo de • un teléfono móvil marca Trium,


cartucho conteniendo restos de explosivo que Telefónica Movistar, con tarjeta Amena
corresponde a un cartucho de la denominada nº 652282963, el cual se encontraba
dinamita GOMA 2 ECO. Tanto los detonadores manipulado;
como el cartucho procedían de Mina Conchita
en Asturias. • un detonador eléctrico industrial,
similar a los anteriores;

3.2. Hallazgo de una bolsa con • un cargador de red o energía eléctrica,


artefacto explosivo entre los para teléfono móvil de la marca Trium,
efectos encontrados en el válido para el teléfono antedicho.
lugar de los atentados
El artefacto explosivo localizado y
desactivado era un artefacto real, de
Sobre las 2´40 horas del día 12 de marzo, iniciación eléctrica y activación temporizada,
en la Comisaría del Cuerpo Nacional de proporcionadas ambas por un teléfono móvil
Policía del distrito de Puente de Vallecas, de la marca TRIUM. Al examinar las funciones
cuando se estaba procediendo por agentes que tenía programadas el teléfono, se observó
de la Comisaría a efectuar una relación de que el reloj marcaba la hora correcta, y que
los efectos ocupados en el interior de los estaban activadas las de vibración y alarma-
vagones del tren que había hecho explosión despertador, a las 7´40 horas; sin embargo,
en la Estación del Pozo del Tío Raimundo, se no se produjo explosión alguna a la hora
encontró entre ellos una bolsa de deportes programada.
de color azul marino que infundió sospechas
a los referidos funcionarios policiales por lo Del análisis comparativo de los elementos
que requirieron la presencia de un Equipo de intervenidos en la furgoneta Renault-Kangoo
Desactivación de Explosivos para examinar su y del artefacto explosivo que no estalló, se
contenido. establecieron las siguientes coincidencias o
similitudes:
La bolsa que era de tipo de deportes de
color azul, tenía a su vez dentro una bolsa de • bolsas de plástico de color azul claro
plástico, tipo basura, de color azul claro y que de las utilizadas para basura, con
contenía en su interior: la misma apariencia, textura y color,
siendo ambas contenedores de partes
• 10.120 gramos de una sustancia de los artefactos;
gelatinosa, de textura similar a la
plastilina, de color blanquecino, como • detonadores eléctricos con cables de
sustancia o carga explosiva; color rojo y azul;

• 640 gramos de tornillos y clavos • las analíticas efectuadas a los restos de


introducidos o embutidos como explosivos encontrados en la furgoneta
metralla en la sustancia gelatinosa; Renault Kangoo apuntan la presencia

117
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

en su composición de Nitrocelulosa, C450 a la empresa SINDHU ENTERPRISE S.L.


Nitroglicol, Nitrato Amónico, Ftalato de Alcorcón, y ésta, a su vez, a JAWAL MUNDO
de Dibutilo, Metanamina y Carbonato TELECOM - Locutorio Siglo Nuevo, sita en la
Cálcico desactivado en la Comisaría calle Tribulete nº 17, en el madrileño Barrio
del Distrito de Puente de Vallecas, de Lavapíes, regentado por el procesado
ofreció el mismo resultado anterior; y condenado como autor material de los
atentados Jamal ZOUGAM.
• y las realizadas con muestra patrón
de Dinamita GOMA 2 ECO, da el mismo Se comprobó que entre esas 30 tarjetas,
resultado analítico; se encontraba la hallada en el teléfono móvil
del artefacto explosivo que no estalló, y otras
• todo lo cual viene a determinar que seis más que fueron usadas para encender 7
en ambos casos se utilizó el mismo teléfonos móviles bajo el área de influencia de
explosivo (GOMA 2 ECO). la BTS de Morata de Tajuña el 10 de Marzo de
2004, que no realizaron ninguna llamada y que
En ambos casos se pudo comprobar que fueron colocados en otros tantos artefactos
tanto los detonadores como la dinamita GOMA explosivos que estallaron en los trenes. Así
2 ECO habían sido fabricadas por la misma se pudo averiguar que la finca de Morata de
empresa, y las partidas habían sido vendidas Tajuña-Chinchón, alquilada con identidad falsa
a la empresa minera que explotaba Mina por JAMAL AHMIDAN a finales de Enero de 2004,
Conchita en Asturias. fue uno de los lugares donde almacenaron
los explosivos, en un habitáculo construido
expresamente a tal efecto, y prepararon los
3.3. Identificación de los teléfonos artefactos con sus correspondientes teléfonos.
y tarjetas utilizados en la preparación
y ejecución de los atentados Otras tarjetas fueron utilizadas por
personas involucradas en los Atentados del
11 M: RACHID OULAD AKCHA y JAMAL AHMIDAN
Tras la localización del artefacto explosivo “El Chino” (ambos se suicidaron en Leganés el
en la madrugada del día 12 de marzo de 2004, las 3-4-2004).
investigaciones se centraron en los elementos
encontrados: el terminal telefónico y la tarjeta
SIM, teniendo igualmente en consideración 3.4. La localización de
la información que pudiera brindar la red de la célula en Leganés
telefonía.
Tras el análisis de los tráficos telefónicos se
Con relación a la tarjeta SIM, se determinó averiguó que un individuo llamado MOHAMED
por la investigación que la empresa URITEL BELHJAD (sospechoso de vinculación con
2.000 S.A. de Bilbao, con fecha 4 de febrero células yihadistas) había alquilado en un piso
de 2004 vendió una remesa de 30 “Packs” en Leganés. Esta circunstancia se descubrió
de tarjetas AMENA y terminales MOTOROLA en la tarde del mismo día 3 de Abril. Una vez

118
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

identificado el piso y habiéndose comprobado 3. 5 delitos de estragos terroristas (20 años


que en su interior había varias personas de de prisión por cada uno)
etnia árabe, se procedió por fuerzas policiales
a conminarles para que se entregaran a las 4. Delitos de integración y/o colaboración
Autoridades. con organización terrorista (entre 5 y 14
años de prisión)
Sobre las 21 horas de ese mismo día, después
de que las fuerzas de seguridad desalojaran 5. Otros delitos: tráfico de explosivos,
a los ocupantes de las viviendas adyacentes, falsificación de documentos, robos, tráfico
los habitantes del piso, comenzaron a entonar ilícito de drogas, etc.)
cánticos religiosos islámicos y, sin atender
el requerimiento de la policía, se suicidaron El juicio oral: se inició el 15-2-2007 y
haciendo estallar toda la dinamita de la que terminó el 2-7-2007, practicándose durante el
disponían causando la muerte de un Policía mismo las siguientes pruebas:
nacional y heridas a varias personas.
• declaraciones de acusados (29)
Entre los restos encontrados en la vivienda
aparecieron varias armas de fuego, vídeos de • declaraciones de testigos
reivindicación de los atentados, documentación (aproximadamente 300)
falsificada y material de propaganda “yijadista”.
El Tribunal declaró probado que las 7 personas • declaraciones de peritos o expertos
que se suicidaron fueron autores materiales (aproximadamente 100) sobre las
del atentado terrorista del 11-M. siguientes materias: explosivos, ADN,
dactiloscopia, balística, documentos,
traductores, médicos forenses,
4. La acusación, el juicio psiquíatras, etc.)

oral y la sentencia • lectura de documentos (tuvieron


una gran importancia los tráficos
La acusación: se ha dirigido finalmente telefónicos)
contra 27 individuos, a los que hay que añadir
7 que murieron en Leganés y 4 huidos, con las • visionado de cintas (sobre
siguientes imputaciones: reivindicaciones, inspecciones
oculares, etc.) y audición de
Los cargos criminales que se han formulado conversaciones telefónicas
son:
• uso de videoconferencia con Francia,
1. 192 delitos de asesinato terrorista (30 Italia y Bélgica (para tomar declaración
años de prisión por cada uno) a miembros de otras células terroristas)

2. 1841 delitos de asesinato terrorista La sentencia. Se dictó el 31-10-2007 con el


intentado (18 años de prisión por cada uno) siguiente pronunciamiento:

119
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

• Condenados 21 (2 por autoría material, • Periciales científicas (explosivos,


1 por cooperación necesaria: con penas traductores, genéticas, lofoscópicas,
que suman 115.000 años de prisión) balísticas, documentoscopia, médicas,
14 por integración en organización etc.)
terrorista (con penas de 12 a 15 años
de prisión), 1 por colaboración con
organización terrorista (9 años de 6. Las víctimas
prisión), 6 por otros delitos (tráfico de
explosivos, falsificación documental,
tráfico ilícito de estupefacientes).
El tratamiento a las víctimas se concretó en
• Absoluciones: 6 (de los cuales 3 de la las siguientes disposiciones:
trama asturiana y 1 colaborador).
• Creación de una Oficina de Ayuda a las
Víctimas
5. Las pruebas
• Ejercicio de las acciones civiles por el
utilizadas en el juicio Ministerio Fiscal

• Información sobre las diferentes


incidencias del proceso penal
El tribunal declaró la validez de todas las
pruebas aportadas a la investigación judicial, • Espacios reservados para el
entre las que cabe mencionar las siguientes: seguimiento del juicio oral

• declaraciones de testigos protegidos, • Indemnizaciones a las víctimas en


incluidos informantes y colaboradores casos de muertes; gran invalidez;
de los servicios de inteligencia (para incapacidad permanente absoluta,
demostrar la existencia de la célula total y parcial; lesiones no invalidantes;
terrorista y la colocación de las pérdida de miembro principal; curación
bombas en los trenes) de las lesiones (hasta 1.500.000 euros)

• Tráficos telefónicos (para acreditar la • Pago anticipado de las indemnizaciones


relación entre los diferentes miembros por la Dirección General de Apoyo a las
de la célula y colaboradores) Víctimas

• Pericial de inteligencia de funcionarios • Medidas procesales de protección


policiales (para explicar la estructura, para las víctimas que declararon como
modus operando y funcionamiento de testigos: anonimato y no visualización
la célula terrorista) física

120
Lutte contre le terrorisme: enquêtes et
leçons apprises – les nouvelles formes de djihad

LUDOVIC LESTEL I. L’architecture globale:


le traitement judiciaire du terrorisme
Substitut Procureur de la République
près le Tribunal de Grande Instance Le dispositif de lutte contre le terrorisme
de Paris en France, s’il repose sur plusieurs intervenants
et notamment les services spécialisés de
renseignements, fonctionne autour du pivot
central qu’est le dispositif judiciaire.
Introduction
La France a en effet fait le choix, il y a
La menace terroriste est plus que jamais maintenant près d’une trentaine d’années de
présente, mondialisée, avec l’émergence de traiter des actes de terrorisme sous un angle
phénomènes nouveaux que l’on retrouve de judiciaire. La juridiction d’exception qui était
façon semblable dans les pays de différents alors compétente pour juger du terrorisme, la
continents. Cour de Sûreté de l’Etat, a été abandonnée en
1981. Il a alors été décidé de ne plus retenir une
Similitudes en effet dans la dérive des réponse militaire face à ces agissements: être
frères MERAH à TOULOUSE et celle des frères dans une lutte contre le terrorisme, plutôt que
TSARNAEV à BOSTON, similitudes entre dans une guerre.
l’agression de WOOLWICH à LONDRES et
celle commise quelques jours plus tard dans Le droit de la lutte anti-terroriste s’insère
le quartier d’affaire de la Défense près de donc aujourd’hui dans le droit commun de la
PARIS, similitudes encore des départs massifs justice judiciaire et offre dès lors d’indéniables
à destination de la Syrie qui touchent tous gages de transparence et de respect du
les pays européens, du Caucase ou ceux du contradictoire. C’est une grande force.
Maghreb et qui sont notamment le résultat
d’une radicalisation par internet. Tous les services qui interviennent dans
cette matière, ont pour objectif d’identifier,
Nos préoccupations sont communes et d’interpeller et de présenter devant la
la coopération doit être renforcée pour faire juridiction spécialisée française les personnes
face à une menace qui évolue. Nos systèmes suspectées de terrorisme. Ce dispositif est
législatifs doivent aussi s’adapter aux centralisé et c’est le parquet de Paris dont j’ai
phénomènes récents que constituent le cyber- la responsabilité qui est en charge au niveau
djihad ou les actions terroristes d’individus national de l’action publique en matière de
isolés. lutte contre le terrorisme.

121
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

La centralisation, à Paris, concerne non c’est à dire un élément moral, un mobile


seulement les poursuites, mais également qui vient aggraver la sanction prévue pour
l’instruction et le jugement des crimes et délits certaines infractions.
terroristes, ainsi que la procédure d’exécution
des peines, confiés à des magistrats spécialisés. Sont qualifiés de terroristes un certain
Ainsi, au parquet, 7 magistrats se consacrent nombre de crimes ou délits pré-existants
exclusivement à ces dossiers, depuis l’enquête en droit commun (atteintes volontaires à la
jusqu’au jugement; de même à l’instruction: vie, meurtres, blessures volontaires, vols,
8 juges n’instruisent que des affaires de destructions, infractions en matière d’armes
terrorisme; enfin, un juge de l’application et d’explosifs notamment...) lorsqu’ils sont
des peines est exclusivement compétent en commis intentionnellement en relation avec
la matière. Cet ensemble permet d’éviter au une entreprise individuelle ou collective
maximum la déperdition d’informations. ayant pour but de troubler gravement l’ordre
public par l’intimidation ou la terreur.
La législation anti-terroriste date pour
l’essentiel de 1986 (loi du 9 septembre 1986), Mais l’incrimination la plus importante
après que la France a été victime d’une série du dispositif de droit pénal français est
d’attentats meurtriers1. Cet arsenal législatif issue d’une loi du 22 juillet 1996 adoptée
a été ensuite régulièrement complété afin de pour répondre aux attentats ayant frappé la
mieux faire face à la menace. France en 1995 (GIA Algérien – 5 attentats) et
constitue l’association de malfaiteurs en vue
Le dispositif législatif est désormais articulé de préparer des actes de terrorisme.
de façon à permettre l’octroi à la puissance
publique, si les circonstances le justifient, de Cette infraction est devenue le cœur
pouvoirs exceptionnels et dérogatoires, tout en du dispositif français. Alors que la loi de
restant sous le contrôle des magistrats et dans 1986 s’inscrivait plutôt dans la répression
un cadre protecteur des libertés individuelles, d’infractions constituées dans leur formes
constitutionnellement et conventionnellement habituelles, c’est à dire par exemple l’assassinat
garanties. ou l’enlèvement, la notion d’association de
malfaiteurs terroristes reflète la volonté du
Juridiquement, dans notre Code pénal, le législateur d’agir en prévention. Cette intention
terrorisme est une circonstance aggravante, est alors particulièrement novatrice dans la
législation, en France, mais également dans le
monde, puisque la France est alors regardée
1  1982/1983: 3 attentats commis en France par
comme un pays liberticide, avec cette loi qui
CARLOS – 11 morts, 130 blessés - 1985: assassinat
du Général AUDRAN (DGA) par Action Directe - 1986: punit le tout début de la préparation d’une
le pic dans l’activité terroriste: - février/novembre: infraction.
série d’attentats dans Paris revendiqués par le
Hezbollah - assassinat de Georges BESSE (PDG Car il s’agit en effet d’une infraction
RENAULT) par Action Directe - attentat de la rue de d’anticipation. Cette incrimination permet
Rennes – 7 morts, 51 blessés d’intervenir très tôt dans le processus de

122
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

constitution des groupes terroristes et dans la créant un émoi considérable et ont relancé le
formalisation d’un projet d’attentat ou d’une débat sur les moyens à mettre en œuvre pour
action terroriste quelconque: elle permet détecter les radicalisations rapides et anticiper
d’atteindre les organisations terroristes très en les passages à l’acte de terroristes isolés.
amont de leur passage à l’acte, c’est-à-dire dès
les actes préparatoires de constitution d’une Ce débat a abouti au vote de la loi du
cellule terroriste et la collecte d’éléments 21 décembre 2012 qui vient compléter le
logistiques ou financiers (faux papiers, armes, dispositif législatif avec quelques dispositions
documentation, composants propres à importantes, notamment:
fabriquer un explosif, location d’appartement,
achat de téléphones portables, propagande • en rendant applicable la loi française
via internet doublée d’actes préparatoires...). aux actes préparatoires à l’acte de
terrorisme commis par des français
Il n’est pas nécessaire de faire la (ou résidents français) lorsqu’ils se
démonstration d’un projet d’attentat précis ou rendent à l’étranger. Jusqu’à présent
d’une action terroriste déterminée (date, heure, seule la direction d’un groupement
lieu, cible...) mais il faut prouver l’existence terroriste commise par un français
d’une entente ou d’un groupement ayant des à l’étranger pouvait être poursuivie.
visées terroristes, caractérisées par un ou Désormais, avec le nouvel article 113-
plusieurs faits matériels préparatoires de l’une 132 du Code pénal, tous types d’actes
des infractions terroristes spécifiquement préparatoires commis à l’étranger
listées par le Code pénal. Cette qualification peuvent être poursuivis, même si aucun
pénale offre donc la possibilité d’incriminer les acte n’a été préparé depuis le territoire
actes préparatoires aux actes de terrorisme, national. Désormais, le fait de rallier
dès lors qu’ils procèdent d’un groupe constitué un camp d’entraînement djihadiste est
d’au moins deux personnes. donc pénalement répréhensible, ce qui
n’était pas possible auparavant;
L’efficacité de la loi de 1996 et de la
qualification d’association de malfaiteurs • en créant une nouvelle infraction,
en vue de préparer des actes de terrorisme celle de «recrutement», d’incitation à
est indiscutable. C’est probablement ce qui participer à un groupe terroriste;
a permis à la France de ne pas avoir connu
d’attaque sur son sol après l’attentat de Port- • en facilitant les poursuites pour
Royal du 3 décembre 1996, et elle a été reprise apologie du terrorisme, délit qui reste
depuis lors dans beaucoup de législations
étrangères, sous différentes formes. 2  Article 113-13 (créé par LOI nº2012-1432 du 21
décembre 2012 - art. 2): La loi pénale française
Néanmoins, ce dispositif a été remis en s’applique aux crimes et délits qualifiés d’actes
cause par l’affaire MERAH sur laquelle je de terrorisme et réprimés par le titre II du livre IV
reviendrai dans un instant. Ces dramatiques commis à l’étranger par un Français ou par une
assassinats ont sidéré l’opinion publique en personne résidant habituellement sur le territoire
français.

123
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

une infraction soumise au droit de été démultipliés par l’essor d’internet et des
la presse mais avec une prescription réseaux sociaux, survenu en parallèle.
allongée et la possibilité de placer la
personne en détention provisoire.
II.1. Du djihad médiatique...
Cet arsenal législatif complété est-il
suffisant pour faire face à l’embrigadement En 2007, dans une interview accordée à la
massif qui s’opère sur internet et à l’émergence société de production d’AL QAIDA, “AL SAHAB”,
d’acteurs solitaires? Ayman AL ZAWAHIRI déclarait que ceux qui
mènent le Djihad médiatique sont des soldats
Comment répondre judiciairement à ces anonymes de la cause au même titre que ceux
phénomènes nouveaux? qui combattent dans les zones de conflits et
leur promettait, par là-même, le paradis.

II. Evolutions des formes Ainsi, AL QAIDA a très vite compris


qu’Internet serait le moyen de donner l’illusion
du terrorisme d’une emprise globale, d’être un mouvement
agissant en temps réel sur tous les théâtres
Les différentes manifestations du fait de conflits dans le monde et donc d’asseoir,
terroriste observées aujourd’hui conduisent vis à vis de tous, une légitimité mondiale dans
à penser que certains comportements sont sa stratégie de la terreur dans l’espoir évident
plus difficiles à appréhender dans le cadre en de faciliter tant le recrutement que le passage
vigueur. Si certains aménagements adoptés à l’acte d’internautes radicalisés par leur
récemment, en suite de l’affaire MERAH, se fréquentation de la toile.
révèlent immédiatement utiles pour faire face
notamment au phénomène syrien, d’autres De fait, les forums de discussion et
sembleraient encore nécessaires. de propagation d’idées djihadistes sont
principalement apparus après le 11 septembre
En matière de terrorisme islamiste, 2001 et se sont développés à la fin des années
dont il est principalement question ici, des 2000, à l’instar des sites MINBAR SOS, ANSAR
changements majeurs sont en effet intervenus AL HAQQ, SHOMOUK AL ISLAM, avec à leur tête
depuis la mort d’Oussama BEN LADEN, le 2 mai des administrateurs, qui détiennent les codes
2011 à ABOTTABAB (Pakistan). La disparition du d’accès et fixent la ligne éditoriale, et des
leader d’AL QAIDA a constitué pour beaucoup modérateurs, qui contrôlent les interventions
de ses adeptes une véritable perte de repères. des internautes.
Au-delà, sa succession étant assurée par Ayman
AL ZAWAHIRI, chantre du Djihad médiatique Les buts recherchés par ces sites sont bien
et auquel cette notion incombe, une tout évidemment la radicalisation d’internautes à
autre dimension a été donnée aux méthodes faible culture islamiste et le recrutement de
des activistes, stratégie dont les effets ont nouveaux adeptes.

124
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Se réclamant d’un islam originel fantasmé, Ainsi, ces sites internet pro-djihadistes
retour à la source de l’Islam, les groupes et leurs forums sont devenus des outils
radicaux fondent leur activité sur une recherche permettant à des individus de tisser des liens
obsessionnelle de la pureté, base d’un processus virtuels sans se connaître physiquement.
sectaire. Le discours prétendument religieux Juridiquement, ces échanges ont pu s’analyser
doit conduire l’individu à la rupture - sociale, comme une participation à une association de
familiale, scolaire, professionnelle parfois. La malfaiteurs en vue de préparer des actes de
diffusion de messages répétés accompagnés terrorisme et ont permis de poursuivre et de
de vidéos constituent des manœuvres de condamner des individus:
déstabilisation psychologique qui visent à
obtenir une allégeance inconditionnelle, une
diminution de l’esprit critique, une rupture Un exemple: le cas d’Adlène Hicheur
avec les références communément admises.
Cet ingénieur physicien au Centre Européen
Ces sites tendent à développer un de Recherche Nucléaire (CERN) de GENEVE, âgé
sentiment d’appartenance à une communauté de 32 ans, de nationalité franco-algérienne,
pure d’élus au-dessus du reste du monde. En a été condamné pour des échanges de mails
niant les notions d’espace et de temps, les soutenus début 2009 avec un membre éminent
nouveaux adeptes trouvent dans leur présence d’AQMI, PhoenixShadow, considéré comme son
sur internet la garantie d’un cadre, d’une place idéologue, dont il avait fait la connaissance via
et d’un pouvoir. Il s’agit de convaincre de internet.
l’appartenance à une filiation sacrée, d’effacer
les identités individuelles, de séduire par Au terme de ces échanges, cet ingénieur,
l’illusion de la toute puissance. alias Abou DOUJANA ou ABDJ, en était arrivé
à lui recommander des cibles françaises
Au delà de la propagande, ces sites dédiés comme le 27ème bataillon de Chasseurs-Alpins
ont servi également aux terroristes à échanger d’ANNECY présent parmi les troupes françaises
de l’information opérationnelle portant combattant en Afghanistan, ou des grandes
notamment sur: entreprises françaises comme TOTAL, SUEZ,
• le choix de cibles et l’élaboration d’un VIVENDI ou ELF. Ces derniers échanges ont
projet d’attentat; entraîné son interpellation.

• l’information nécessaire pour


Il s’est défendu en évoquant des
bénéficier d’une filière d’acheminement
conversations virtuelles, car il n’avait ni
en zone de conflit;
acheté de substances nocives ni recruté de
• le soutien financier à apporter aux kamikaze sur place pour mener à bien ces
djihadistes présents en zone de conflit; actions. Un comité de soutien composé de
• l’information délivrée par les 600 scientifiques s’est d’ailleurs mobilisé pour
djihadistes entre eux alors qu’ils se réclamer sa libération.
trouvent déjà en zone en conflit.
Les investigations ont montré qu’il
projetait en réalité la création en France d’une

125
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

unité de combat, cellule clairement destinée individuel et expose les moyens pratiques
à commettre des attentats et qu’il avait pour commettre un attentat ou une attaque
commencé à réunir des moyens logistiques terroriste, tenant ainsi parfaitement compte:
pour la mettre en place, sur l’instigation de
son contact au sein d’AQMI. Le Tribunal a donc • de la pression sécuritaire et
retenu à son encontre la participation à une de l’efficacité des services de
association de malfaiteurs en vue de préparer renseignement, qui ont rendu très
des actes de terrorisme et l’a condamné à une difficile la création de réseaux étendus
peine de 5 ans d’emprisonnement dont un an sur les territoires occidentaux, du fait
assorti du sursis. de la grande capacité de ces services à
détecter les filières;
Par un arrêt de 2010, la Cour d’appel de
Paris a estimé en revanche que la «simple» • de cette nouvelle donne mondiale liée
activité d’administrateur d’un site djihadiste, à l’essor d’Internet permet désormais
“Hansar Al Haqq”, dénuée de tout autre non seulement de convaincre mais
acte préparatoire à une action, ne pouvait offre aussi au convaincu les recettes
relever d’un acte de terrorisme au sens des pour agir.
articles 421-1 et suivants du Code pénal mais
seulement de l’apologie du terrorisme, limite Cet endoctrinement est à l’origine du
d’exception de la liberté d’expression. (affaire basculement d’individus isolés dans le
Adrien GUIHAL) terrorisme. Dès lors, la configuration du
terrorisme djihadiste a changé, s’éloignant
Ainsi, au-delà de l’analyse précise et fine de plus en plus des réseaux bien structurés
du contenu des messages, au-delà d’un simple des années 1990-2000 et de leurs modes de
soutien intellectuel résultant de convictions communication traditionnels.
radicales, il faut matérialiser et démontrer
un véritable soutien logistique à un projet Ainsi, le magazine INSPIRE, publication
terroriste. anglophone de cette branche d’AL QAIDA, dans
son nº09 publié début mai 2012 appelait dans
Si ce que l’on appelle désormais “le djihad un article intitulé «Le convoi des martyrs» au
médiatique” est désormais parfaitement recrutement de «Loups solitaires» destinés à
théorisé et intégré comme une composante effectuer des opérations martyrs.
importante du djihad lui-même par les
membres d’AL QAIDA, la stratégie a de Dans cette revue, AQPA y fait de la
nouveau grandement évolué notamment France une cible prioritaire après les Etats-
avec l’installation durable d’AL QAIDA dans la Unis et Israël et désigne les cibles à frapper:
péninsule arabique, au Yémen. les intérêts économiques de ces pays, les
institutions médiatiques, les infrastructures
En effet, cette organisation a adopté une militaires et les personnalités combattant
ligne politique qui prône un passage à l’acte l’islam.

126
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

L’objectif déclaré de cette revue est double: Autre dossier intéressant:


susciter le djihad dans les pays occidentaux Romain Letellier, alias
en général et anglo-saxons en particulier et Abou Siyad Al Normandy
fournir un savoir-faire destiné aux apprentis-
djihadistes en guise d’initiation pour terroristes Nous avons pu identifier et arrêter un jeune
endogènes (ou “homegrown terrorists”) à homme qui s’était fait modérateur d’un site
la commission d’attaques terroristes de relai d’AQPA (ANSAR AL HAQQ) et qui proposait
l’intérieur-même des pays occidentaux, dans à l’organisation ses services de traduction
lesquels ils résident et dont ils peuvent avoir en français de cette revue. En l’absence
la nationalité. d’indications opérationnelles précises ou
de message révélant l’existence d’un projet
Si un candidat est intéressé, trois adresses d’action, il a été poursuivi pour apologie du
mail ont été spécialement créées et une terrorisme. Il est en détention actuellement,
clé de chiffrement a été générée afin de en l’attente de son prochain procès, au cours
sécuriser les échanges entre les volontaires duquel il encourt 5 ans d’emprisonnement.
et l’organisation AQPA. Les volontaires sont
également invités à se rendre sur les forums Cette forme de provocation au terrorisme
jihadistes “Al Fidaa” et “Shoumoukh Al Islam”. est donc actuellement poursuivie comme une
Chaque volontaire doit transmettre à AQPA infraction de presse sans spécificité terroriste
divers renseignements et répondre aux relevant de la juridiction spécialisée et n’en suit
paramètres personnels indispensables à la donc pas le régime dérogatoire. Pour permettre
participation au «  projet  » (être musulman, aux services anti-terroristes de disposer
majeur, capable, entièrement dévoué à sa des moyens adéquats et de centraliser les
mission et disposé à obéir aux ordres d’AQPA). poursuites, il serait nécessaire de permettre
Il est enfin conseillé aux moudjahidins de de réprimer la provocation au terrorisme sous
s’entourer de toutes les précautions possibles l’angle de l’association de malfaiteurs en vue
et d’employer exclusivement un logiciel de de préparer des actes de terrorisme, lorsque
chiffrement, lequel est également fourni à la ces infractions dépasseraient le seul cadre de
demande («Ansar al moudjahidin 2»). la “presse”.

Or, cette revue, et en particulier ce Pour reprendre l’exemple de la revue


numéro, sont découverts très fréquemment en INSPIRE, cette forme de provocation au
possession des individus les plus radicalisés terrorisme qui revêt un caractère organisé,
que nous interpellons. L’année dernière, structuré, constitue davantage qu’une
nous avons ainsi interpellé une jeune femme infraction de presse. C’est un acte terroriste
qui s’était portée candidate auprès d’AQPA, qui pourrait être réprimé comme une
répondant clairement à l’appel d’offre formulé infraction terroriste. Une évolution de la loi
dans l’une de ses revues par l’organisation. Elle française en ce sens à l’instar de ce qu’ont
n’avait pas été retenue, étant une femme, mais fait nos partenaires étrangers, au Royaume-
sa démarche reste entière.

127
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Uni, en Espagne et aux Etats-Unis notamment, Ce qu’on appelle donc aujourd’hui le


apparaît souhaitable. terrorisme individuel est clairement une
conséquence du développement d’internet. Il
Autre évolution récente à noter et c’est est difficile de traiter l’un sans l’autre, puisque
probablement un effet pervers de l’affaire si des individus seuls peuvent se préparer,
Snowden: les groupuscules se sachant très c’est parce qu’ils découvrent comment faire
surveillés, sont de plus en plus prudents et sur internet.
diffusent moins d’informations opérationnelles
par Internet et utilisent pour leurs échanges
opérationnels le réseau Skype ou des sites ad II.2. ...au djihad individuel:
hoc très protégés ou Facebook. L’émergence du Loup solitaire?
Le djihad individuel a été prôné très tôt
Un exemple: l’affaire NIAZ par AQPA. L’action isolée présente en effet
de nombreux avantages: elle est quasiment
Mohamed Niaz ABDUL RASED, ingénieur indétectable par les services de sécurité, les
de nationalité indienne installé en France, seules personnes informées de l’opération
qui au cours de l’année 2010, s’est attaché, étant le moudjahidin solitaire et le comité
via Facebook, à repérer les profils de jeunes militaire d’AQPA, qui se charge du choix des
individus radicalisés de la banlieue parisienne cibles, de l’entraînement du volontaire et de la
qu’il recrutait dans le but de les endoctriner, communication médiatique, postérieurement
les entraîner et les acheminer au Pakistan. à l’attentat. Cette forme nouvelle de djihad
Parallèlement, il est parvenu à entrer en est désormais parfaitement théorisée par AL
contact avec des facilitateurs d’Al Qaïda QAIDA , sous le terme d’armées individuelles,
qui devaient servir de relais aux membres les «Armies of one».
du groupe parvenus au Pakistan, afin de
les diriger vers des camps d’entraînements Au-delà du mode d’action, la principale
terroristes en zone tribale, à la frontière différence entre ces individus et ceux qui
pakistano-afghane. agissaient dans les années antérieures est que
le processus de radicalisation qui les conduit
Ainsi, dans une stratégie de contournement, à agir n’est plus forcément lié directement
les terroristes ont alors adopté d’autres à l’influence d’un prêcheur radical ou d’une
vecteurs: la menace paraît désormais plus organisation en particulier qui les prendrait
diffuse, plus individualisée. C’est l’émergence en charge. L’organisation n’a plus besoin de
de nouveaux profils terroristes, qualifiés planifier d’opérations de grande envergure.
parfois de “loups solitaires”, le terme Les volontaires n’ont plus besoin de recourir
“solitaire” cachant cependant bien souvent aux circuits traditionnels. De chez eux, tout est
des complicités, souvent à distance, facilitées possible.
par le développement spectaculaire de la
communication à l’échelle mondiale. Les individus rapidement radicalisés par
ce “cyber djihad“ et cette propagande intense

128
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

peuvent désormais basculer dans le passage • l’assassinat d’un militaire à TOULOUSE


à l’acte de façon isolée, sans appartenir à une le 11 mars 2012,
cellule ou à un groupuscule, sans avoir été
formellement «recruté». • l’assassinat de deux militaires et la
tentative d’assassinat d’un troisième à
Pour autant, aussi solitaires qu’ils soient MONTAUBAN le 15 mars 2012,
dans leur action, ces individus restent malgré
tout toujours en interaction avec d’autres, • l’assassinat de 3 élèves et d’un parent
qu’il s’agisse de ceux rencontrés sur Internet et la tentative d’assassinat d’un 4ème
et avec lesquels les échanges permettent de enfant fréquentant l’école juive Ozar
faire fructifier des convictions radicales ou de Hatorah à TOULOUSE le 19 mars 2012.
construire un projet d’action, ou qu’il s’agisse
de proches comme on l’a vu à plusieurs Ses actes seront revendiqués par
reprises lorsque des fratries s’associent l’intéressé:
(Attentats de BALI en 2002, les frères MERAH,
les frères TSARNAEV...) ou des groupes • par téléphone auprès de la chaîne
parfaitement réduits (WOOLWICH). Dans le cas France 24,
des fratries, il a pu être observé que l’un jouait
systématiquement un rôle moteur dans la • par l’envoi d’un montage vidéo des
préparation des actes et la mise en condition crimes réalisé par le tueur lui-même,
psychologique, tandis que l’autre se consacrait auprès de la chaîne AL DJAZEERA à
à l’action, dichotomie délicate à appréhender Paris,
au plan judiciaire.
• puis par un communiqué publié le
Les effets de cette indéniable 22 mars 2012 sur le forum islamiste
individualisation du terrorisme sont arabophone “Al Ansar” par le groupe
perceptibles sur notre territoire, rendant “Jund Al Khilafa” se revendiquant d’AL
considérablement plus difficile le repérage et QAIDA.
la prévention de ce type d’action et mettant à
mal nos capacités de réponse judiciaire. Ces éléments démontrent à quel point
ce terroriste avait complètement intégré
Je vais maintenant vous présenter trois cas la stratégie médiatique d’AL QAIDA dans la
qui en sont l’illustration: commission de ses actes.

Lors des discussions avec les négociateurs


Merah au moment de son arrestation, il a expliqué
avoir été formé au tir en zone pakistano-
Mohamed MERAH est identifié pour afghane par AI Qaïda et avoir reçu la mission de
avoir commis, entre le 11 et le 19 mars 2012 à commettre des actions terroristes à son retour
TOULOUSE et MONTAUBAN, dans le Sud de la en occident. Il a dit avoir refusé de commettre
France: des assassinats contre des personnalités aux

129
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Etats-Unis ou des attentats-suicide et aurait Au retour de son second séjour, il fait


persuadé ses commanditaires de lui accorder l’objet d’un debriefing par la Direction Zonale
une autonomie dans la définition des actions du Renseignement Intérieur, localement
terroristes qu’il envisageait de mener sur le compétente, en novembre 2011. Son profil
territoire national, celles-ci étant financées par apparaît inquiétant, au point que l’agent
le produit de ses vols. traitant ait souhaité faire remonter une note
d’information à la Direction Centrale, seule à
Le parcours de cet individu né en France même d’évaluer la nécessité de judiciariser
de parents algériens, le 10 octobre 1988 la situation. Pour autant, au moment où il
à TOULOUSE, montre qu’il a grandi dans commet ses crimes, aucune décision n’est
un environnement radicalisé, et alors qu’il prise en ce sens.
multipliait les actes de petite et moyenne
délinquance (14 condamnations), et effectuait A la suite de cette affaire, nous nous
plusieurs séjours en prison, il aurait trouvé sommes donc interrogés au sein de mon
une alternative dans un ancrage religieux parquet sur ce qui aurait pu être utile pour agir
extrémiste. Sa radicalisation a alors été préventivement contre ce type d’individu. Nous
accentuée au contact de son frère aîné, sommes en effet partis du constat que si la
Abdelkader MERAH, soupçonné dès 2007, DCRI avait communiqué, après le debriefing de
dans le cadre d’une filière de djihadistes l’intéressé à l’automne 2011 les seuls éléments
toulousains ayant rallié une cellule d’AL QAIDA qu’ils semblent avoir eus alors, à savoir un
(La communauté d’ARTIGAT). individu ayant des convictions radicales, qui
part seul sur zone, nous n’aurions guère pu
A l’instar de ses aînés, Mohamed MERAH agir sur un plan judiciaire.
allait faire son apprentissage intellectuel
et opérationnel sur zone, mais, et c’est là En effet, nous aurions été confrontés à
la grande différence, il est apparu qu’il s’est une difficulté: l’essentiel de ce qui pouvait
rendu seul dans les zones tribales: alors apparaître suspect tenait en ces séjours
en zones tribales, mais qui, ne pouvaient à
• en Afghanistan, où il a été contrôlé eux seuls justifier de poursuites judiciaires,
par la Police Afghane à KANDAHAR le puisque la préparation d’actes de terrorisme
22 novembre 2010, après avoir traversé à l’étranger n’était alors pas punissable en
la Turquie, la Syrie, le Liban, Israël, France.
l’Egypte et le Tadjikistan,
Il manquait en effet un texte qui aurait
• puis au PAKISTAN où il a séjourné permis de l’entendre judiciairement et de
d’août à octobre 2011, manifestement perquisitionner son domicile dans le cadre
aux fins d’entraînement dans un camp d’une enquête terroriste sur la seule base de
au Waziristan. la connaissance qu’avaient les services d’une
attirance pour un islam radical lié à des séjours
À la suite de son premier contrôle, il sur zones djihadistes. Ce type d’investigations
est signalé en renseignement aux autorités aurait peut être permis de découvrir son arsenal
françaises, par les autorités américaines. et ainsi d’éviter les actes commis en mars 2012.

130
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Le législateur français a tiré les 22 mai 2013, par deux individus revendiquant
enseignements de ce type de profil et de ce ces actes au nom d’Allah.
mode d’action, en adoptant dès le 21 décembre
2012 des dispositions nouvelles en matière de Alexandre DHAUSSY, né le 30 mai 1991 à
terrorisme en rendant applicable la loi française VERSAILLES, converti en 2009, né dans une
aux actes préparatoires à l’acte de terrorisme famille catholique, inconnu des services de
commis par des français (ou résidents français) police ou de renseignement autrement que
lorsqu’ils se rendent à l’étranger. pour son approche radicale de la religion,
islamiste radicalisé par le visionnage incessant
Au-delà, cependant, c’est la question de de sites djihadistes, prétendra n’avoir pas agi
la lutte contre une nouvelle forme de menace par mimétisme avec les faits de LONDRES, ayant
tenant en une action individuelle qui se pose eu l’intention d’agir de la sorte auparavant. Il
aujourd’hui avec acuité. expliquera: «ce qui a été fait à LONDRES, je
l’ai pris comme un appel d’un frère aux autres
Si nous disposons des moyens de lutter frères. J’étais satisfait de voir qu’ils avaient agi
contre des individus qui s’associent pour comme ça et ça m’a conforté dans ma propre
mener une action terroriste, nous sommes prise de décision».
actuellement désemparés face à ces formes
émergentes. Ce qui semblerait nécessaire • Il indiquera enfin avoir choisi sa cible
aujourd’hui, serait de disposer des moyens de et son mode opératoire car:
lutter efficacement contre le phénomène de
l’auto-radicalisation cumulé parfois avec une • la doctrine religieuse lui imposait de
sorte de tourisme djihadique. combattre les mécréants, l’agression
des pays musulmans par les
puissances occidentales justifient que
Dhaussy/Woolwich: des militaires soient particulièrement
jeux de miroir à travers la Manche visés (à l’instar de Mohamed MERAH
qui déclarait à sa première victime
Le samedi 25 mai 2013, Alexandre DHAUSSY avant de l’assassiner: «Tu tues mes
poignarde à la carotide un soldat français frères, je te tue»).
engagé dans le cadre du plan de protection des
populations civiles «Vigipirate», en patrouille Sur ce point, il a donc parfaitement suivi la
dans un centre commercial très fréquenté des ligne d’action diffusée notamment par AQPA,
portes de Paris (Centre commercial les Quatre via Internet qui est d’agir seul, sans chercher
Temps à La Défense). Il agit immédiatement à rejoindre l’organisation, et avec les moyens
après avoir fait une prière qui lui donne «la disponibles localement.
force d’agir» et s’être assuré, ayant «consulté
Dieu», que son projet était une bonne action. Le concernant, seule a pu être retenue
l’infraction de tentative d’assassinat en
Cette tentative d’assassinat intervient juste relation avec une entreprise terroriste. Tout
après l’affaire de WOOLWICH, l’assassinat d’un le processus de préparation idéologique, de
soldat britannique en plein rue à LONDRES, le conditionnement, d’endoctrinement ayant

131
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

conduit à cette action terroriste n’a pu faire mourir en martyr. Il tente de partir en Iran mais
l’objet d’aucune poursuite car Alexandre est refoulé.
DHAUSSY a manifestement agi complètement
seul. S’il avait partagé son projet avec d’autres, Sa situation est signalée une première fois
pour effectuer des repérages, pour évoquer la par la DCRI début 2012 car il tient des propos
faisabilité du mode opératoire, pour acquérir de plus en plus radicaux sur Internet et se
un couteau, ce processus aurait fait partie rapproche d’un groupe djihadiste dont les
des éléments constitutifs de l’association de principaux acteurs viennent d’être interpellés.
malfaiteurs terroriste pénalement réprimée.
Il est interpellé, une perquisition a lieu à
Un autre exemple des limites auxquelles son domicile mais rien d’opérationnel ni y est
nous sommes confrontés aujourd’hui malgré découvert. Aucun élément ne vient asseoir qu’il
l’existence de cette incrimination quasi- ait pu bénéficier de contacts propres à faciliter
préventive qu’est l’association de malfaiteurs ses velléités djihadistes et donc à caractériser
terroriste: une association de malfaiteurs en relation avec
une entreprise terroriste. Les seules relations
qu’il a pu avoir ressortent de son activité sur
Le cas de Mehdy K. (Kiroffo): internet sans que ne soit en l’état matérialisé
la radicalité, la dangerosité et autre chose que des envois de messages
une arme sont insuffisantes pour prônant un islam radical. Il est relâché après
caractériser le comportement 48h de garde à vue et la procédure est classée
d’un terroriste sans suite.

L’année suivante, en juin 2013, son cas est


Le cas de Mehdy K. est symptômatique de nouveau signalé par la DCRI. Il exprime en
de nos limites dans l’articulation entre le effet de nouveau sur internet des positions
travail en renseignement et la judiciarisation extrêmement violentes prônant le djihad armé
des individus dont manifestement toutes contre les forces occidentales et une source
les intentions d’agir restent strictement humaine vient indiquer qu’il aurait acquis des
personnelles. armes.

Radié de l’armée en 2011 pour des Il est de nouveau interpellé. La perquisition


problèmes psychologiques, il commence à permet en effet de découvrir qu’il est en
fréquenter avec une grande assiduité des sites possession d’une arme: il s’agit d’un pistolet
pro-jihadistes. Sous le pseudonyme de “Mehdy d’alarme, acheté légalement, mais qu’il a tenté
du Dinne”, il navigue sur le forum PALTALK et le de modifier pour la rendre utilisable avec
site de FORSANE ALIZZA, un site pro-djihadiste des munitions létales. Il dispose également
français, postant nombre de messages de munitions artisanales qu’il a lui-même
extrémistes tels que “Ne prenez pas les juifs et fabriquées.
les chrétiens comme amis, qu’Allah les humilie
par nos mains”. Il annonce envisager de se Dans sa documentation, on découvre des
rendre en Afghanistan pour mener le djihad et notes relatives à la Taqiyah, conduite à tenir

132
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

pour éviter au djihadiste d’être repéré dans sous cette qualification qu’est par exemple
la société et parvenir à tromper l’ennemi (se mis en examen Alexandre DHAUSSY après la
fondre dans la masse, porter en permanence tentative d’assassinat qu’il a commise contre
une arme chargée, changer tous les 15 un militaire à La défense le 25 mai 2013. En
jours de numéro de téléphone, résister aux revanche, l’acte individuel terroriste consistant
interrogatoires...). en la préparation d’une action terroriste n’est
pas réprimée, la loi condamnant uniquement,
Ces éléments, qui laissent à penser que depuis la loi du 22 juillet 1996 l’association
cet individu est potentiellement dangereux et de malfaiteurs en vue de préparer des actes
probablement manipulateur, ne permettent de terrorisme, ce qui suppose la pluralité
pas, pour autant, de caractériser davantage d’auteurs.
l’association de malfaiteurs en vue de préparer
des actes de terrorisme: Mehdy K. n’est pas Or si l’efficacité du dispositif novateur en
plus en relation avec d’autres individus qu’il ne 1996 dans la lutte contre les groupes terroristes
l’était l’année précédente. Ses seuls contacts est indéniable et demeure d’actualité, il semble
restent des correspondants virtuels rencontrés en revanche ne plus répondre à l’évolution du
sur internet. La détention de l’arme, classée terrorisme telle qu’exposée ci-dessus avec
comme arme non létale, ne peut être reliée à une propagande des grandes organisations
aucun projet terroriste déterminé. terroristes islamistes à ne plus les rejoindre, à
ne plus revendiquer jusqu’au passage à l’acte
Dans ces conditions, il est donc relâché une son affiliation, mais à agir seul, de façon isolée.
seconde fois et la procédure est de nouveau
classée, en terrorisme. Des poursuites ont De façon concrète, si INSPIRE explique
été engagées sur le volet apologétique de comment fabriquer un engin explosif à partir
ses productions sur internet et la détention des produits d’usage courant (article de la
d’une arme modifiée, par des juridictions première édition titré “Comment fabriquer une
«ordinaires». Le suivi de cet individu a bombe dans la cuisine de maman”), un individu
cependant repris, en renseignement. qui serait dans cette démarche, s’il était
détecté pas les services spécialisés, ne pourrait
Ces exemples illustrent bien la nouvelle juridiquement pas être appréhendé tant qu’il
donne actuelle, et peut-être la nécessité de ne serait pas en possession de l’engin explosif.
repenser l’association de malfaiteurs en vue Cette situation n’apparaît pas satisfaisante car
de commettre des actes de terrorisme, et elle ne permet pas de répondre à une réalité
peut-être de se diriger vers une incrimination criminelle dont les exemples de Mohamed
individuelle de ces agissements. MERAH et probablement encore davantage
d’Alexandre DHAUSSY sont les plus parlants.
Si la loi pénale prévoit depuis 1986 l’acte
terroriste individuel, le texte, depuis 1993 Un délit autonome d’entreprise terroriste
l’article 421-1 du Code pénal, visant l’entreprise individuelle pourrait répondre à ces situations.
individuelle ou collective, cela ne s’applique Il prévoirait que constitue également un acte
que pour l’acte terroriste considéré en tant que de terrorisme le fait pour un individu de
circonstance aggravante d’une infraction. C’est préparer un des actes de terrorisme prévus

133
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

par la loi dès lors que cette préparation est Cette propagande qui utilise également
matérialisée par les éléments objectifs - qui des images choc illustrant la souffrance du
pourraient pour certains être cumulatifs - que peuple syrien aboutit à la radicalisation très
sont par exemple la prise d’attache par tout rapide d’un très grand nombre de jeunes
moyen avec une organisation terroriste, la européens qui partent sur zone via la Turquie
mission qui apparaîtrait confiée à l’intéressé, (qui compte 800 km de frontière commune
la consultation régulière de sites appelant au avec la Syrie et où ils peuvent se rendre sans
terrorisme, l’entraînement dispensé en France visa voire sans passeport) pour rejoindre les
ou à l’étranger, l’acquisition ou la tentative groupes combattants radicaux.
d’acquisition d’armes.
Les chiffres sont sans précédent et
A titre comparatif, la législation touchent tous les pays européens. Les services
britannique, poursuivant cet objectif réprime de renseignement estiment qu’actuellement:
depuis 2000 ce type de comportement. Il est 578 français ou résidents français sont
ainsi prévu dès le Terrorism Act de 2000 que impliqués: 244 combattant sur zone; 99 en
constitue un crime le fait, par exemple, pour transit; 76 rentrés; 21 décédés.
une personne de détenir tout objet lorsqu’il
existe des raisons de suspecter que cette 36 procédures sont actuellement en
détention à pour finalité la commission d’un cours au TGI de PARIS, dont 20 enquêtes
acte de terrorisme (art. 57 du Terrorism Act préliminaires et 16 informations, portant
2000). De façon plus explicite, le Terrorism Act sur 150 individus.
de 2006 réprime le fait pour une personne de
préparer, de quelque façon que ce soit un acte 21 individus sont actuellement mis
de terrorisme (“he engages in any conduct in en examen, pour l’essentiel du chef
preparation for giving effect to his intention” d’association de malfaiteurs en relation
art. 5 du Terrorism Act 2006). avec une entreprise terroriste; 12 sont
actuellement placés en détention
De même, l’article 89A du Code pénal provisoire.
allemand réprime le fait pour un individu
de préparer un acte de terrorisme lorsque Le profil-type du candidat au djihad en
cette préparation est caractérisée par un ou Syrie est celui d’un homme, âgé de 18 à 28
plusieurs éléments objectifs listés dans le ans, originaire des quartiers défavorisés d’une
texte. grande agglomération, ayant des origines
familiales Nord-Africaines, inconnu des services
spécialisés avant son départ, s’inscrivant dans
III. La Syrie: l’émergence d’une un processus de radicalisation relativement
nouvelle figure, le djihadiste 2.0 récent. La fréquentation via internet de sites
de propagande djihadiste est quasiment une
Les effets du du djihad médiatique se sont constante, tout comme l’utilisation du réseau
encore accrus récemment avec les événements social Facebook à des fins de prosélytisme,
de Syrie. mais également, parfois, opérationnelles.

134
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Facebook, dans l’utilisation qui en est faite • d’hommes et de femmes avec leurs
par les djihadistes syriens sert à partager enfants.
l’expérience, à la promouvoir, à nouer des
contacts, permettant de faire des récits en
direct et de toucher une population toujours La politique pénale
plus large, mais également à maintenir des
contacts avec les familles là où auparavant, La lecture des évènements se déroulant en
dans les zones de djihad, ces contacts étaient Syrie est rendue infiniment complexe par les fait
totalement exclus. La communication par ces qu’au-delà du soulèvement populaire contre
biais est telle que l’on peut parler aujourd’hui le pouvoir en place, la guerre civile syrienne
de djihadistes 2.0. apparaît également comme un conflit entre les
différentes composantes sociales, ethniques
La situation française présente une et religieuses de ce pays. La rébellion en lutte
particularité notable puisqu’on estime à 21% contre le pouvoir en place se compose d’une
la part des convertis à l’Islam, français ou multitude de groupes d’importance variable.
résidents habituels en France, partis pour
la Syrie, proportion la plus élevée des Etats Cette situation rend difficile la construction
européens concernés (17 % en Allemagne, de procédures judiciaires dans la mesure où
12% au Royaume-Uni, 3% en Belgique). Parmi rejoindre la rébellion ne constitue pas en soi
eux, on ne relève quasiment aucun individu un acte de terrorisme, mais uniquement si la
d’origine syrienne. frange ralliée est celle des groupes affiliés à
AL QAIDA et répertoriés comme terroristes
En outre, quelques départs de mineurs (Jahbat AL NOSRA et Etat Islamique en Irak et
ont été observés et médiatisés mais restent au Levant).
quantitativement marginaux (14).
Or, contrairement aux procédures des
Si la présence des femmes sur le théâtre combattants ayant rejoint l’Afghanistan ou
des combats reste très rarement observée, l’Irak dans la décennie précédente, ou plus
elles apparaissent jouer un rôle tant dans le récemment, les rangs d’AQMI, la pluralité de
processus de radicalisation que sur zone, dans possibilités ouvertes en Syrie rend le problème
un soutien «logistique». Deux enquêtes sont de la preuve plus prégnant.
actuellement ouvertes qui semblent révéler
l’envoi organisé de jeunes femmes radicalisées Si les spécialistes tendent à considérer que
comme «filles à soldats». l’ASL ne recrute guère d’étrangers et que les
occidentaux qui partent en Syrie n’y vont que
De plus, ont pu être observés des départs pour y rejoindre les groupes djihadistes, cela
familiaux, qu’il s’agisse: n’est pas si simple à établir judiciairement ni
même d’ailleurs en renseignement.
• de frères de sang (deux jeunes frères
partis ensemble seraient aujourd’hui Dès lors, la politique pénale menée sur ces
décédés), cas s’est construite autour de plusieurs axes:

135
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

• Dans un premier temps, il convient • Pour les individus qui ne sont pas
de collecter des éléments propres inscrits dans un projet de retour, des
à démontrer, tant en amont que mandats d’arrêt peuvent être délivrés
postérieurement au départ, un objectif si les éléments les impliquant dans des
proprement jihadiste. Se rendre en actes terroristes sont suffisants; des
Syrie et rejoindre la rébellion ne mandats de recherche valables sur le
constitue un acte de terrorisme que si territoire national peuvent également
la frange ralliée est celle des groupes être délivrés pour des individus contre
affiliés à Al Qaïda. Des éléments lesquels il existe moins d’éléments
matériels doivent donc permettre de mais qui doivent impérativement être
caractériser ce ralliement à un groupe entendus à leur retour en France.
terroriste (notamment des messages
sur Facebook, l’utilisation d’un numéro Au-delà, la crainte principale tient à la
de téléphone syrien mutualisé entre nature des projets qui peuvent être nourris
membres d’un groupe déjà repéré à leur retour sur le territoire français par des
comme affilié au Jahbat ou à l’EIIL, individus aguerris, formés militairement, ayant
une message laissé à la famille, des bénéficié d’un endoctrinement total et prêts à
échanges via Skype rapportés par les propager le djihad mondial.
membres de la famille...).
De telles craintes ne relèvent pas
• Les poursuites sont alors fondées uniquement des fantasmes les plus noirs des
sur l’application combinée des services de renseignement, en attestent ces
dispositions de l’article 421-2-1 du deux procédures récentes:
Code pénal relatives à l’association
de malfaiteurs en vue de préparer des • L’une, concernant un individu parti
actes de terrorisme, et de l’article 113-13 en Syrie fin juin 2013 dans le cadre
du même code, modifié par la loi du 21 d’une filière mise en place dans le
décembre 2012, qui permet désormais Nord de la France, qui, blessé au
de poursuivre des agissements combat, en revenu en France en août
délictuels commis par des français à 2013. Plusieurs sources humaines
l’étranger, en matière de terrorisme. ont indiqué qu’il détenait des armes
longues et s’entraînait au tir dans une
• Les individus ne font l’objet d’une forêt belge, où les armes sont très
mesure coercitive, à leur retour, que probablement cachées. Cet individu a
s’il existe des craintes particulières été arrêté en octobre dernier, placé en
qu’un projet d’action puisse être mené détention provisoire mais n’a toujours
sur le territoire national, ou si d’autres pas livré à cette heure l’emplacement
individus de la même filière sont de la cache. A son domicile, ont été
encore sur zone, pour permettre de découverts, outre des traces olfactives
recueillir un maximum d’informations. du stockage d’armes, des exemplaires

136
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

de la revue INSPIRE, dont le numéro L’on voit bien, au travers d’exemples


portant sur les actions individuelles comme ceux-là, toutes les difficultés nouvelles
contre l’Occident, outre les écrits posées par ce nouveau terrain d’action pour les
d’AL ZARKAWI et d’AL ZAWAHIRI. Faute djihadistes: très proche de nos frontières, très
de pouvoir sonder son esprit, il est facilement accessible, les parcours du retour
certain que cet individu a nourri des sont beaucoup plus rapides qu’ils ne pouvaient
projets d’action mais il est très délicat l’être des zones tribales traditionnelles. La
d’en rapporter la preuve, autrement détection des individus dangereux doit donc se
que par le biais de l’incrimination faire dans des délais singulièrement raccourcis
d’association de malfaiteurs en vue de et avec des possibilités de communication
préparer des actes de terrorisme. Sa qui échappent à tout contrôle, notamment
dangerosité est pourtant réelle. par l’utilisation de toutes les ressources de
l’internet.
• L’autre, relative à des individus
impliqués dans l’affaire dite de CANNES- Dans le cadre de la lutte contre les
TORCY, filière ayant commis un attentat départs de volontaires en Syrie, parmi d’autres
à la grenade contre une épicerie juive propositions, le recours à des entretiens
à SARCELLES en septembre 2012, et administratifs va désormais être systématisé.
qui a été démantelée à la veille d’une Sous la forme d’entretien préventifs, réalisés
action terroriste d’envergure, alors que avant le départ sur zone, leur but sera
des bombes associant cocotte-minute, notamment de dissuader les candidats au
poudre noire et clous étaient en cours djihad. Il s’agit d’un changement notable
de fabrication. Au moins 3 d’entre d’approche pour les services de renseignement
eux avaient quitté le territoire juste français.
avant les interpellations du groupe en
octobre 2012, pour rejoindre un groupe D’autres pistes sont certainement
djihadiste en Syrie. Deux d’entre eux, à explorer, comme la mise en place de
de retour vers la France début 2014 ont programmes de déradicalisation.
été appréhendés l’un en Italie, l’autre
en France, en possession des mêmes Bref, il me semble qu’à ce jour, malgré la
recettes d’explosifs. Au domicile de mobilisation constante de la Justice pour faire
celui interpellé en France la semaine face à ces menaces, la Justice seule n’est rien et
dernière, ont été découverts des le temps est peut-être venu de passer de l’anti-
engins explosifs déjà constitués terrorisme au Contre-terrorisme, englobant une
(composés de TATP dans des cannettes dimension préventive aboutie, dans l’ensemble
de Red-Bull). des politiques publiques menées.

137
The changing role of the prosecutor
in counter terrorism since September 11

ELIZABETH HOWE OBE their duties fairly and in accordance with the
rule of Law and should ’respect, protect and
General Counsel of the International
uphold the universal concept of human dignity
Association of Prosecutors
and human rights’ (Standard 1 h).
Chief Crown Prosecutor, England and
Wales* The tragic and horrific terrorist attacks
in USA on September 11th 2001 shook the
world and prompted an immediate and strong
world wide response. However in 2003 the

Managing Director, Institute for Security Studies,


South Africa: David Scharia, Senior Legal Officer
and Coordinator, Legal and Criminal Justice group,
UN Security Council, Counter-Terrorism Committee
Executive Directorate: Sue Hemming Head of
Special Crime and Counter Terrorism Division, Crown
Prosecution Service, England and Wales: Kim Prost
the Ombudsman of the United Nations Security
Council’s 1267 Committee for the Al-Quaida Sanctions
The International Association of List, Michèle Coninsx, President of Eurojust.
Prosecutors (IAP) is a world wide syndicate 1  ‘The Standards of Professional Responsibility
of prosecution services and associations and Statement of the Essential Duties and Rights
as well as individual members which has of Prosecutors’ were adopted by the IAP in 1999 and
been in existence since 1995. It has a number endorsed by the 17th United Nations Commission
of purposes, including the improvement of on Crime Prevention and Criminal Justice in 2008:
cooperation and support for the development “Commission on Crime Prevention and Criminal
of skills, learning and good practice for Justice resolution 17/2, entitled ‘Strengthening
prosecutors so that they can more efficiently the rule of law through improved integrity and
and effectively curb criminal activity in every capacity of prosecution services’, which contains
the Standards of Professional Responsibility and
sphere. One of the imperatives for prosecutors
Statement of the Essential Duties and Rights
which is enshrined in the IAP Standards for
of Prosecutors, developed by the International
Prosecutors 11 is that they should discharge
Association of Prosecutors, as an annex.” <http://
w w w.uno d c .or g /do cumen t s/co mmis si o n s/
* Elizabeth Howe would like to acknowledge CCPCJ/CCPCJ-ECOSOC/CCPCJ-ECOSOC-00/CCPCJ-
with thanks the contributions of Anton du Plessis ECOSOC-08/Resolution_17-2.pdf>.

139
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

UN Secretary General, Kofi Annan found it What is Terrorism?


necessary to say as follows:
There is no universal definition. The Oxford
“Our response to terrorism as well as our English Dictionary defines it as ’the unofficial or
efforts to thwart it and prevent it, should unauthorised use of violence and intimidation
uphold the human rights that terrorists in the pursuit of political aims’.
aim to destroy. Respect for human rights,
fundamental freedoms and the rule of law With increasing globalisation, the nature
are essential tools in the effort to combat of terrorism has over time changed from a
terrorism-not privileges to be sacrificed at a domestic to a transnational threat.
time of tension”.
Terrorism did not start in 2001, it was
Also in 2003, UN Resolution 1456 was prevalent prior to that date ― eg Northern
passed; ‘states must ensure that any measure Ireland where the fight by the Irish Republican
taken to combat terrorism comply with all Army (IRA) for cessation from the United
their obligations under international law and Kingdom in order to become part of the
should adopt such measures in accordance with Republic of Ireland owes its origins to previous
international law, in particular international centuries. The jurisdiction of the relatively new
human rights, refugee and humanitarian law’. International Criminal Court (ICC) in The Hague
does not include terrorism, but following the
Why the UN Secretary General was moved First World War, an attempt to establish an
to make this statement and why was it international tribunal to deal with terrorism
necessary to pass resolution 1456? and which offered a definition of terrorism
was abandoned due to the onset of the Second
The security imperative ― some may say World War.
hysteria ― which followed 9/11 led to the
commission of significant rule of law abuses.
Prosecutors are at the forefront in ensuring The Global Response to 9/11
that terrorist crimes ― notwithstanding the
sense of horror and outrage that they
evince ― are dealt with in accordance with The atrocities of 9/11 took terrorism to
the rule of law and with due regard to human another level. Only 17 days later there was
rights ― to do otherwise is unconscionable an immediate, unified and unprecedented
and on a practical level counter productive. response with the passing of UN Security
Lord MacDonald, former Director of Public Council Resolution 1373(28/9/2001) – all states
Prosecutions of England and Wales was quoted to afford one another ‘the greatest measure
as saying in regard to the 9/11 and 7/7/05 of assistance’ in connection with criminal
(London bombings) attacks, that the country investigations or criminal proceedings relating
of Britain had sacrificed “traditional ideals of to the financing or support of terrorist
freedom in the push against terrorism”. acts, including assistance in obtaining

140
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

evidence in their possession necessary for no independent review of the list and those
the proceedings. As a result many regions placed upon it.
introduced new or enhanced international
cooperation provisions into their legal regimes. In December 2009, the Office of
Resolution 1373 focused on prosecutions Ombudsman for delisting was established
targeting individuals and entities supporting and in 2010 Kim Prost was appointed as
and financing terrorism and also included Ombudsman (see picture below) to assist the
requirements to bring terrorists to justice. Sanctions Committee of the UN Security
Such requirements and expectations fall to the Council with delisting petitions (by now only
criminal justice systems of states to administer in regard to Al-Quaida). Kim was an ‘ad litem’
and enforce and to prosecutors to prosecute ― judge of the ‘International Criminal Tribunal
taking account of the interconnection between for the former Yugoslavia’ from July 2006 to
terrorism and all forms of acquisitive crime. June 2010 but previously, besides holding a
number of other significant positions, she
Other UN responses included the had worked for the Canadian Department of
establishment by Resolution 1373 of the Justice for almost twenty years as a federal
Counter-Terrorism Committee (CTC) which is at prosecutor. Kim has brought much needed
the centre of global efforts to fight terrorism ‘due process’ to the consideration of these
and facilitates technical assistance to states petitions and has sought to ensure ― so far as
to implement counter terrorism provisions and she is able ― transparency, fairness, disclosure
acts as an interstate coordinator. and adherence to the rule of law. To date, of
the approximately 33 cases she has dealt with,
In 2005 the Counter-Terrorism Committee approximately 19 have been granted.
Executive Directorate (CTED) was set up, which
identifies priority areas and sources funding
and requires country reports setting out the
extent of their counter-terrorism provision. In
2006, the UN General Assembly adopted the UN
Global Counter Terrorism Strategy (UNGCTS).

In October 1998, Resolution 1267


established the sanctions regime. Initially
this regime was directed to the Taliban and
to Al-Quaida and involved travel restrictions,
weapon prohibition and asset freezing. It
did not become a particular area of focused
interest until 9/11 when 200 were added to the
list in the first few months thereafter. There
was little redress or the possibility of recourse
to challenge listing decisions and there was

141
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

The universal legal regime agencies (EU). Eurojust - the European Unions’s
against Terrorism Judicial Cooperation Unit, was set up in 2002
to support investigations and prosecutions
From 1963, 18 international legal in member states of serious forms of crime,
instruments for specific acts of terrorism were including terrorism. Most referrals to date
passed, the principal message being ‘extradite have related to membership of terrorist
or prosecute’. These legal instruments covered organisations, but Eurojust was instrumental
the following acts of criminality ― all of which in providing assistance following the Madrid
fall under the responsibility of those involved bombings in 2004. Eurojust facilitates the
in traditional criminal justice systems: law exchange of information, supports the issue
enforcement, prosecutors and judges: and execution of European Arrest Warrants
• Hijacking (EAWs), facilitates investigation and evidence
gathering, eg through the interception of
• Aviation sabotage
telecommunications and enables the seizure of
• Violence at airports assets which may be used to finance terrorism.
• Acts against safety maritime navigation It is also responsible for the Terrorism
Convictions Monitor (TCM), an overview of
• Acts against safety fixed platforms
at sea terrorism related judicial developments and
analysis.
• Acts against internationally protected
persons Africa ― The 1998 attacks in Kenya and
• Unlawful taking and possession of Tanzania provided an impetus for enhanced
nuclear material counter-terrorism provision in Africa which
• Hostage taking culminated in the creation by the African
Union in 2010 of a Comprehensive African anti-
• Terrorist bombings
terrorist model law.
• Funding of terrorists
• Nuclear terrorism Central Asia ― Asean Convention on
Counter Terrorism - 2007

MENA (Middle East and North Africa)


There have been extensive regional
developments following 9/11
South East Asia

The following are some examples: Western Hemisphere

Europe has the most developed regional Challenges, these include the following:
counter-terrorism framework emanating from
the Council of Europe (CoE), Organisation 1. The Criminal Justice response-v-
for Security and Cooperation in Europe military/security response. The rising
(OSCE), the European Union’s institutions and interest of security in decision making

142
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

is arguably taking a higher priority The Anti Terrorism Crime and Security
than the observance of human rights, Act 2001 imposed 7 days detention without
but getting the public to care in the charge following 9/11. In 2003 the period
face of terrorist atrocities, is an uphill was increased to 14 days but in 2006 the
task. In a recent poll in the USA, 26% period was increased to 28 days following
of Americans favoured torture where the London bombings. In 2012 the periodwas
terrorism was involved, 45% were reduced to 14 days following a review by the
neutral. Independent Reviewer of Terrorism. Other
controversial measures have been Control
2. Cooperation within the ‘Intelligence’ Orders introduced in 2005, which restricted
community is vital but there need the movement and activities of terrorist
to be safeguards and an element of suspects. These were replaced by Terrorism
oversight. Prevention and Investigation Measures
(TPIMS) in 2012 which are to a limited extent,
3. In the name of counter-terrorism less restrictive, eg no relocation imposed but
there is a proliferation of practices added surveillance.
undermining human rights and the
rule of law. These include:
• Prolonged detention without charge
Operation Vivace
• Ill treatment of detainees
• Extraordinary rendition
Prosecution of the attempted bombings
• Abuse of principle of non-refoulement in London on 21st July 2005
(the practice of not returning
individuals who may be offenders to
Events on 21st July;
their country of origin if there would
be a serious risk of Human Rights
Three explosions on London underground
violations)
trains:
More generally-there is a need to avoid • Shepherds Bush – 1225hrs
the ‘Guantanamo Bay’ effect where terrorist
suspects treated outside traditional criminal • The Oval – 1230hrs
justice procedures are seen as ‘special’ and • Warren Street – 1240hrs
may even be hailed as martyrs or heroes. • One explosion on a double decker bus
in Hackney – 1330hrs
• 5th unexploded device discovered on
The United Kingdom experience 23rd July 2005 abandoned on waste
ground in Wormwood Scrubs
• Devices concealed in rucksacks
Detention without charge and the period
involved has been highly controversial.

143
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

• Main charge of all devices failed to


detonate
• No deaths or serious injuries

There was an extensive manhunt for the


suspects of the 4 explosions

Stills from CCTV (Closed-circuit Television)


were published internationally

Arrest of Muktah Said Ibrahim

Remains of one of the devices recovered


from Shepherds Bush tube

Model of the device

Bomb factory — 58 Curtis House — home


of Yassin Omar

144
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Findings and sentences said: “These were merciless and extreme


crimes. As they were rightly meant to be, the
Ibrahim, Mohammed, Omar and Osman sentences were severe and extreme. Beyond
were found guilty of conspiracy to murder and doubt, however, they were utterly justified.”
were sentenced to life imprisonment – each
to serve a minimum of 40 years. Mohammed These Terrorists were brought to justice
and Osman appealed against sentence. The with due regard for human rights and the rule
Appellate Judges dismissed the appeal and of law.

145
Notes for remarks to the Standing Senate
Committee on National Security and Defence*

*  Esclarecimentos do Procurador-Geral do Ministério Público Federal do Canadá ao Senado sobre as


atribuições do Ministério Público em casos de terrorismo. Em 22 de outubro de 2014, o centro de Ottawa foi
alvo de disparos de armas de fogo que causaram um morto e vários feridos. Um dos agressores refugiou-
se no prédio do Parlamento, então em sessão, onde o tiroteio continuou. As suspeitas recaíram sobre
agentes do chamado “Estado” Islâmico. Dias depois, em 3 de novembro, o chefe do Ministério Público
Federal, Brian Saunders, compareceu ao Senado para explicar ao Comitê Permanente de Segurança
Nacional e Defesa as tarefas de sua instituição e da polícia, assim como de agências provinciais análogas,
na prevenção e no combate ao terrorismo. [Nota do organizador]

Ottawa, November 3, 2014 advising on issues relating to national security


and terrorism prosecutions.
BRIAN SAUNDERS
Director of Public Prosecutions I’d like to begin by providing you with
background on the role of the PPSC in
prosecuting terrorism offences and in dealing
Mr. Chairman and Honourable Senators. with measures in the Criminal Code that seek
to prevent terrorism offences from occurring.
On behalf of the Public Prosecution
Service of Canada, I am pleased to have this The PPSC was created in 2006 with the
opportunity to address this committee in its coming into force of the Director of Public
examination of Security Threats facing Canada. Prosecutions Act. Our mandate under the Act
includes providing advice to law enforcement
Joining me today are George Dolhai and agencies, such as the RCMP, during
Ursula Hendel. Mr. Dolhai is Deputy Director investigations and prosecuting offences within
of Public Prosecutions in charge of the Drug, federal jurisdiction on behalf of the federal
National Security and Northern Prosecution Crown in a manner that is independent of any
Branch of the Public Prosecution Service of improper influence and respects the public
Canada-PPSC. He is responsible for oversight interest.
of all terrorism prosecutions and is a lawful
deputy of the attorney general for purposes of Our role as legal advisor to investigative
consenting to the commencement of terrorism law enforcement agencies is distinct from the
prosecutions, peace bond, recognizance investigative role they perform.
with conditions and investigative hearing
proceedings. Ms. Hendel is Senior Counsel, We do not initiate or direct police
and is the National Security Prosecutions investigations. At their request, we provide the
Coordinator. Her responsibilities include police with legal advice during an investigation.

147
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

This helps ensure that the techniques and Prosecutions to also provide the consent.
procedures they use are consistent with the Should we say something about the directive
law, including evolving rules of evidence and power of the Attorney General.
the Charter of Rights and Freedoms.
In deciding whether to consent on behalf of
Our role as legal advisor to investigative the Attorney General to charges being laid or
agencies is distinct from the investigative role to proceed with a prosecution where charges
they perform. Although prosecutors provide have been laid, we apply the same test.
advice during the course of an investigation,
prosecutors do not initiate, direct or supervise The test that we apply making this
investigations. They do not gather evidence. decision has two parts: we examine the
That is the role of the investigative agency and evidence gathered by police to see whether
its enforcement officers. Enforcement officers there is a reasonable prospect of conviction,
decide whether to commence an investigation, not whether a conviction is certain or even
who to investigate, how to investigate and probable. If we are satisfied that the evidence
whether to lay charges at the end of an meets this standard, we then decide whether
investigation. the public interest requires a prosecution to
be pursued.
For most criminal offences, once an
investigation is complete, the police can simply I should point out that the public interest
lay charges if they have reasonable grounds to normally requires a prosecution where serious
believe that an offence has been committed. offences such as terrorism are involved.
Prosecutors then conduct an independent Accordingly we have not declined to prosecute
review of the case and decide whether a a terrorism case on this basis.
prosecution should proceed.
I note that this test, or one very similar to
This procedure is altered slightly in the it, is also applied by provincial prosecution
case of prosecutions under the anti-terrorism services across the country when they decide
provisions of the Criminal Code. whether or not they will proceed with a
prosecution or consent to criminal charges
Before laying charges under these being laid.
provisions, the police must obtain the consent
of the Attorney General. This consent can be The prosecutor must be satisfied that
given by either a provincial or the federal this test is met throughout the proceedings.
Attorney General, as there is concurrent If at any time during the proceedings, the
jurisdiction to conduct such prosecutions. prosecutor concludes that it is not met, he or
she should end them by withdrawing or staying
To date, the consent has been given at the the charges.
federal level. The decision whether to consent
at the federal level is by law delegated to the Once a prosecution has been commenced,
Director of Public Prosecutions. I in turn have the prosecutor is in charge of the proceedings.
authorised the Deputy Directors of Public He or she continues to work closely with the

148
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

police to ensure that the required evidence is on their use and, where appropriate, to consent
presented in Court. to their use on behalf of the Attorney General.

It is significant that we apply the same In these cases, we assess whether the
assessment process for terrorism prosecutions evidence presented could satisfy a judge
as we do in any other criminal prosecution. that the legal requirements for the measure
Parliament has chosen to approach terrorism have been met. I say could rather than will
offences as part of Canada’s criminal law. deliberately – whether a judge ultimately will
This means as well that the admissibility and agree with our request is not our test.
weight of evidence in a terrorism prosecution
are assessed in the same way as in any other The test that we apply in determining
criminal prosecution. whether certain steps should be taken is always
dependent upon the law. First and foremost, we
As with any significant and complex assess the evidence available and determine if
investigation, we work closely with the police we agree with the police assessment that the
once the investigation has matured to a legal threshold for commencing a proceeding,
point where our legal advice is sought. Once whether a peace bond, a recognizance with
a prosecution has been commenced, the conditions, an investigative hearing or charges
prosecutor is in charge of the proceedings, has been met. Therefore, for example, in
but we continue to work closely with the relation to a peace bond, the test is whether
police to ensure that they can produce the there is a reasonable fear that a terrorism
required evidence for us to present the case offence will be committed by the person to be
into the Court. Who is in charge depends upon subject to conditions sought to be imposed by
whether it is at the investigative stage or once the court.
a proceeding has been commenced, but the
ongoing cooperation and consultation continue In relation to whether to consent to a
throughout. We do not initiate prosecutions prosecution based upon the charges that
unless we have received a consent by law the police believe there are reasonable
enforcement. When we receive a consent to grounds to believe has been committed, we
commence proceedings, we then evaluate the use for consent the same test as we use to
request. prosecute any offence. It is as follows: the
PPSC prosecutor examines the evidence to
Let me turn to three Criminal Code see whether there is a reasonable prospect of
provisions that are particular to the terrorism conviction. If there is, then we must decide if
context and that are preventative in nature. he or she decides whether, in light of the facts
I refer to recognizance with conditions, provable through admissible evidence and the
investigative hearings and peace bonds. whole of the surrounding circumstances, the
public interest requires a prosecution to be
In each instance, the prior consent of the pursued. This test is more or less the same
Attorney General is required before they can one applied by prosecution services across
be used. Our role in respect of each of these the country.
tools is where requested to advise the police

149
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

If the prosecutor is not subsequently given the limited role I’ve just described.
satisfied that the prosecution should proceed, Our assistance to the Committee is similarly
he or she can put an end to it by withdrawing limited to the parts of your inquiry that speak
or staying the charges. to the number of terrorism prosecutions there
have been in Canada and, more generally,
I indicated that we apply the same what were the results of Canadian terrorist
assessment process for terrorism prosecutions prosecutions. This close collaboration and
as we do in any other criminal prosecution. This mutual respect helps ensure cases are dealt
is significant. While there are some particular with fairly and justly.
powers, such as a recognizance with conditions
or investigative hearings that are particular to Thank you for the opportunity to address
the terrorism context, Parliament has chosen this committee. We are pleased to answer your
to approach terrorism as part of Canada’s questions.
criminal law. The terrorism provisions require
that the admissibility and weight of evidence 26 accused have had their cases dealt with
be assessed in the same way in a terrorism by trial courts 17 were convicted on one or
proceeding as in any other criminal process. more charges. One was acquitted of all charges
The terrorism provisions were not enacted as and one was discharged after a preliminary
emergency legislation and when the Supreme inquiry. Six persons have had peace bonds
Court of Canada reviewed the investigative imposed (five whose charges were stayed by
hearing it accepted that approach and held the Crown and one after serving his sentence).
the investigative hearing to be constitutional
based upon it being a permanent part of the Proceedings against four of them are
ordinary criminal law, not as something that underway and five more are wanted on
had its own special and temporary emergency outstanding arrest warrants. Five had the
justifications. charges stayed against them for entering into
peace bonds, 17 were convicted and the other
Honourable senators, I hope this brief four were found not guilty.
summary of our role has helped you better
understand our role in the handling of terrorism Of the 17 individuals convicted, all but
offences, both before and after charges are one were given a penitentiary sentence and
laid by the police. quite a few of them received a life sentence.
While the sentences imposed will depend on
As in all serious criminal cases, we work the circumstances of the offence and of the
in close collaboration with the police during accused, there is a body of developing case
the investigative stage while respecting their law that supports the proposition that terrorist
independent role. They work closely with us offences are among the most serious crimes in
once charges are laid or proposed and we our law.
exercise our independent prosecutorial role

150
Special Criminal Court

LIAM MULHOLLAND decision considers issues of fair procedures in


the context of the Special Criminal Court and
Head of Superior Courts Office
is specifically concerned with the disclosure
of the Director of Public Prosecutions
duties of the prosecution in the context of
Republic of Ireland trials in that Court.

Finally, I propose to examine some of the


Introduction commentary and reforms which have been
suggested in relation to the Special Criminal
Court.
The paper which I will deliver today will
consider the establishment of the Special
Criminal Court in Ireland and will provide The Special Criminal Court
detail in relation to its constitution, powers,
jurisdiction, and procedure. The background to the Special Criminal
Court is set out in the evidence of a Detective
The Special Criminal Court is the court Superintendent, recorded in the judgement
vested with the responsibility of dealing with of McMahon J. in Redmond v. Ireland & the
matters involving terrorism and terrorist Attorney General [2009] IEHC 201 as follows:
activity in Ireland. Since 1972 most of the cases
tried in the Special Criminal Court have related “Referring to the increased activities
to terrorism but a number of high-profile and attacks of the I.R.A. in the 1930’s
organised crime cases have also been heard he explained the necessity for the
there in more recent times1. introduction of the Offences Against the
State Act in 1939. The I.R.A. was declared
Having detailed the establishment of the to be an unlawful organisation and that
Special Criminal Court in Ireland, I propose to suppression order still continues in this
reflect on the recent decision in Donohoe. This jurisdiction. In detailed evidence to the
court he gave a brief history of the I.R.A.
1  See conference paper entitled “The Interplay (Irish Republican Army) and the emergence
Between EU & Domestic Counter-Terrorism Laws” of a breakaway faction in around 1969,
delivered at the ERA-ICEL Seminar on 2nd November now known as the Provisional I.R.A.
2007, available on <http://www.dppireland. Having outlined the objectives of the I.R.A.
ie/f iles tore/document s/ER A-ICEL _ Seminar_ he gave a description of the treatment
Speech_021107_Amended.pdf>. meted out to people who are suspected

151
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

of assisting police investigations, which Section 35 of the Offences Against the State
included interrogation and torture Act 1939, which is similar in tone and tenor to
sometimes resulting in execution. The fact that exhibited in Article 38 of the Constitution,
that it is an oath bound secret organisation provides that:
divided into cells creates problems for
the Gardaí making it difficult to infiltrate “If and whenever and so often as the
the organisation and gather evidence Government is satisfied that the ordinary
to prosecute member volunteers. The courts are inadequate to secure the
organisation is very energetic in trying to effective administration of justice and
identify members of the public who provide the preservation of public peace and
information to the police and are very order and that it is therefore necessary
assiduous in collecting evidence including that this Part of this Act should come
closely examining books of evidence to into force, the Government may make and
identify any such persons. If anyone is publish a proclamation declaring that the
identified in this manner it usually results Government is satisfied as aforesaid and
in serious torture or death. This represents ordering that this Part of this Act shall
a serious problem for the Gardai who bring come into force.”2
prosecutions before the ordinary courts
where witness and jury intimidation was Part V of the Offences Against the State Act
not unknown.” 1939 comes into force whenever the Government
makes a proclamation to the aforementioned
Article 38.3.1 of the Constitution of Ireland effect. The Special Criminal Court has been
permits the Oireachtas, the Irish legislature, established pursuant to Part V of the Offences
to legislate for the establishment of special Against the State Act 1939 on three occasions:
criminal courts and provides that: between 1939 and 1946, between 1961 and 1962,
and from 1972 to date.
“Special courts may be established by law
for the trial of offences in cases where it The composition of the Special Criminal
may be determined in accordance with such Court is regulated by Section 39 of the Offences
law that the ordinary courts are inadequate Against the State Act 1939. Under the legislation
to secure the effective administration the Special Criminal Court must consist of an
of justice, and the preservation of public uneven number of members, a minimum of
peace and order.” three, who are judges, barristers or solicitors
of at least seven years standing, or officers
Article 38 goes on to specify that the of the Defence Forces not below the rank of
constitution, powers, jurisdiction and procedure commandant 3. In the two earlier periods army
of such courts shall be prescribed by law.
2  Section 35(2) of the Offences Against the State
The legislative framework of the Special Act 1939.
Criminal Court was set out in Part V of the 3  Section 39 of the Offences Against the State Act
Offences Against the State Act 1939. To that end, 1939.

152
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

officers sat on the court. Since 1972 the court has its findings5. This practice of giving reasoned
only been staffed by serving or former judges. decisions is important, not least because as
However, the power to appoint army officers to the case of Taxquet v. Belgium, heard before
the Court remains on the statute book. One of the European Court of Human Rights, sitting
the key features of the Special Criminal Court as a Grand Chamber in November 2010, makes
is that it sits without a jury, and is therefore clear: [whilst] “the Convention does not require
of importance in the context of offences in jurors to give reasons for their decision and
which jury intimidation is a consideration. In Article 6 does not preclude a defendant from
that sense, the hearing of trials in the Special being tried by a lay jury even where reasons
Criminal Court is very appropriate in matters are not given for the verdict. Nevertheless,
involving terrorism or organised crime, due to for the requirements of a fair trial to be
the fact that jury intimidation is often an issue satisfied, the accused, and indeed the public,
in trials of that type. must be able to understand the verdict that
has been given; [as] a vital safeguard against
arbitrariness”.
Practice & Procedure
It was the recommendation of the
The Special Criminal Court is empowered Committee established to review the Offences
to make its own rules in relation to practice Against the State Acts 1939 – 1998, discussed
and procedure. In the absence of such rules of post in greater detail, that the SCC should be
practice and procedure, the rules of practice formally required to give such written reasons
and procedure which are applicable to the for every decision to convict.
trial of an individual on indictment in the
ordinary courts shall, as far as practicable, The advantages to an accused are
apply in the Special Criminal Court4. The words, apparent when one considers the opportunity
as far as practicable, are important in this afforded by reasons for conviction to, in turn,
regard, because, as we shall note later in this present reasoned arguments to a higher
paper, charges of membership of an unlawful appellate challenging conviction, based on
organization, in which opinion evidence of the exact, rather than any presumed basis for
a Garda (Police) Chief Superintendent is conviction.
admissible, are invariably dealt with in the
Special Criminal Court. Thus arguably in our system, a conviction
before the SCC is the only time the accused
(and indeed the public) truly can be said to
Reasons for its findings understand the reason(s) for the verdict which
has been given.
However, and unlike a jury trial, the Special
Criminal Court gives a reasoned decision for

4  Section 41 of the Offences Against the State Act 5  See O’ Malley, The Criminal Process (Roundhall,
1939. 2009) at p. 284.

153
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

No room for dissent? try the person charged7. Scheduled offences


which are dealt with in the Special Criminal
Pursuant to the provisions of Section 40 Court are almost always offences connected
of the Offences Against the State Act 1939 to subversive activity. Non-scheduled offences
every question before the Special Criminal are sent to the Special Criminal Court where
Court will be determined according to the (a) the offence is not a scheduled offence but
opinion of a majority of those members the person charged allegedly has subversive
present. Furthermore, no member or officer connections, or (b) there is a fear of jury
of the court is entitled to disclose whether intimidation.
any determination was or was not unanimous.
Finally, Section 40 provides that every
decision of the Special Criminal Court shall be Fair procedures and the
pronounced by one of its members only. Special Criminal Court
Section 43 of the Offences Against the State
Act 1939 vests the Special Criminal Court with As I noted earlier, the rules of evidence
the jurisdiction to try, acquit or convict “any which apply in the Special Criminal Court are,
person lawfully brought before that Court for for the most part, similar as those which apply
trial under this Act.” The Special Criminal Court, in the ordinary courts. The constitutional
therefore, essentially has jurisdiction to try any rights to a trial in due course of law and to fair
criminal offence. It is necessary, however, to procedures are detailed in Articles 38.1 and 40.3
distinguish between those offences which are of the Constitution of Ireland. The application
deemed to be scheduled offences (as defined of these constitutional rights, in the context of
in Section 36 of the Offences Against the State the Special Criminal Court, was well illustrated
Act 1939) and non-scheduled offences for the in the decision in the case of Kenneth Donohoe8.
purposes of the Act. The offences which are The aforementioned constitutional rights
presently deemed to be scheduled offences place a duty on the prosecution to disclose
for the purposes of Part V of the Offences to the defence all relevant evidence which is
Against the State Act 1939 are offences under within its possession. In the case of Director of
the Offences Against the State Act themselves Public Prosecutions v. Special Criminal Court9,
(membership of an unlawful organisation, being Carney J. defined relevant material as evidence
the IRA or some offshoot thereof), the Firearms which “might help the defence case, help to
Acts and the Explosive Substances Acts. disparage the prosecution case or give a lead
to other evidence”10. The prosecutorial duty of
Scheduled offences are tried in the Special disclosure, therefore, relates to any evidence
Criminal Court unless the Director of Public
Prosecutions (DPP) otherwise directs6. Non-
scheduled offences can be tried in the Special 7  Section 46 of the Offences Against the State Act.
Criminal Court on foot of a certificate from the 8  [2008] 2 IR 193 and Donohoe v Ireland - 19165/08
Director as to the inadequacy of the courts to Judgment 12.12.2013 [Section V].
9  [1999] 1 IR 60.
6  Section 45 of the Offences Against the State Act. 10  Ibid at p. 76 and p. 81.

154
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

which is relevant and within the prosecutions of Criminal Appeal for a certificate for leave
possession. to appeal the matter to the Supreme Court,
on the ground that it involved a point of law
In the case of DPP v Kenneth Donohoe11 of exceptional public importance or that
the accused was convicted in the Special it was desirable in the public interest that
Criminal Court of membership of an unlawful an appeal should be taken to the Supreme
organisation, namely the Irish Republican Court, pursuant to the provisions of Section
Army (the IRA), contrary to the provisions of 29 of the Courts of Justice Act 1924. The
Section 21 of the Offences Against the State Court of Criminal Appeal refused to grant
Acts 1939 to 1998, and was sentenced to four the Section 29 Certificate and held that while
years imprisonment. At the trial of the accused the disclosure of all relevant material was
one of the prosecution witnesses, a Chief mandatory, material which did not damage
Superintendent of An Garda Síochána (the the prosecution or assist the defence did not
Irish police force), claimed privilege against have to be disclosed to an accused12.
the disclosure of certain material, upon
which he had based his opinion or belief that Thereafter, the matter was appealed to the
the accused was a member of an unlawful European Court of Human Rights (ECHR)13, where
organisation. He claimed this privilege against the applicant alleged that the aforementioned
disclosure on the grounds that to make such non-disclosure of the material on which the
disclosure would endanger life and State Chief Superintendent had based his opinion or
security. The Special Criminal Court directed the belief, had made his trial unfair insofar as it
Chief Superintendent to produce all relevant had seriously restricted his defence rights and
documentary sources forming the basis of his had amounted to a violation of Article 6 of the
belief. The Special Criminal Court then reviewed Convention for the Protection of Human Rights
this material in order to be satisfied as to the and Fundamental Freedoms.
reliability of the chief superintendent’s belief.
Neither the prosecution nor the defence The ECHR observed at the outset that the
had access to the material in question. Upon Special Criminal Court was alert to the need to
examination of the material the Special Criminal approach the Chief Superintendent’s evidence
Court found that it constituted adequate and with caution, having regard to his claim of
reliable information upon which the Chief privilege and that the Special Criminal Court
Superintendent could legitimately have formed was aware of the necessity to counterbalance
his opinion and, further, that there was nothing the restriction imposed on the defence as a
in the material which, in its view, would have result of its decision upholding that claim.
assisted the accused.
The ECHR addressed three issues in
The accused applied for leave to appeal coming to its decision, namely, whether it was
against both conviction and sentence, which necessary to uphold the claim of privilege;
was refused by the Court of Criminal Appeal.
An application was then made to the Court 12  Ibid at 204.
13  See Donohoe v Ireland - 19165/08 Judgment
11  [2008] 2 IR 193. 12.12.2013 [Section V].

155
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

whether the undisclosed evidence was the In relation to the second issue, the Court
sole or decisive basis for the conviction, and held that the undisclosed evidence was
whether there were sufficient counterbalancing not the only basis for the conviction. This
factors, including the existence of strong was evident given that the Special Criminal
procedural safeguards in place to ensure that Court had heard evidence from over fifty
the proceedings, when judged in their entirety, other prosecution witnesses. Further, there
were fair 14. had been “significant” other corroborative
material before the Special Criminal Court 16.
In relation to the first issue, the ECHR found It identified three strands of corroborative
that the justifications given for the grant of evidence against the applicant.
privilege were compelling and substantiated. It
pointed out that the public and victims have In relation to the issue of the sufficiency
a strong interest in ensuring that organised of safeguards, the ECHR affirmed that the
and subversive crime is prosecuted and Special Criminal Court had adopted a number
that allowing police informers to provide of measures. It was noted that the Special
information anonymously is a vital tool in Criminal Court had reviewed the documentary
prosecuting organised and subversive crime. material upon which the Chief Superintendent’s
The applicant in this case did not challenge opinion or belief was based in order to assess
the view of the Chief Superintendent that the adequacy and reliability of his belief that
disclosure of his sources would endanger the applicant was a member of an unlawful
persons and State security. The ECHR noted the organisation; it had explored whether the non-
domestic court’s description of the unlawful disclosed material was relevant or likely to be
organisation in question , the IRA: ‘it was a relevant to the defence; and, finally, the Special
secretive and violent organisation, one which Criminal Court in deciding on the weight to
assiduously sought out and punished police attach to the Chief Superintendent’s evidence
informers through torture and death and one had expressly excluded from its consideration
which relied on the inevitable fear of testifying any information obtained through its review of
which those methods engendered’ It further the documentary material and had confirmed
noted that: “The admission of belief evidence, that it would not convict the applicant on the
combined with the inevitable grant of privilege basis of the Chief Superintendent’s evidence
for the sources of that belief also provides alone17.
a crucial tool to overcome the evidential
difficulties in prosecuting this particular It was further opined by the European
kind of charge”. The Court was of the view, Court of Human Rights that the Irish laws
therefore, that the decision not to disclose the allowing the admission of “belief” evidence
sources of the information in question had were such that evidence of that nature could
been necessary 15. only be provided by high-ranking members

16  See Para. 82 - 87.


14  See Para. 79.
17  See Para. 88.
15  See Para. 81.

156
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

of the Gardaí. The ECHR noted that the Chief Reform and the Special
Superintendent in the present case was Head Criminal Court
of the Special Detective Unit and had such
pertinent professional experience as to lead
the Special Criminal Court to state ‘that it was Both the benefits and drawbacks of the
difficult to envisage any other person in the Special Criminal Court have been considered
Sate more relevantly informed”. It was further by a number of review groups in recent years.
noted that the evidence of “belief” would be Most notably, a committee was appointed to
assessed by the Special Criminal Court as examine the operation of the Offences Against
being a belief or opinion as opposed to factual the State Acts in 2002. The Report of the
evidence and, indeed, that the evidence could Committee to Review the Offences Against the
still be tested through cross examination18. State Acts 1939-199820 examined all aspects
of the Offences Against the State Acts 1939-
In light of the foregoing, the European 1998, including those provisions relating to
Court of Human Rights held that there was the Special Criminal Court. The majority of
no violation of the applicant’s right to a the committee were of the view that the
fair trial. The Court was of the view that the Special Criminal Court should be retained21,
weight of the evidence other than the belief particularly in light of the continued threat
evidence, combined with the counterbalancing posed by terrorism and organised crime22.
safeguards and factors, had to be considered Those who favoured the retention of the
sufficient to conclude that the grant of Special Criminal Court were of the opinion
privilege in relation to the sources of the chief that certain specific modifications ought to
superintendent’s belief had not rendered the be made including, inter alia, the abolition
applicant’s trial unfair 19. of the current distinction between scheduled
and non-scheduled offences23. It was further
It is evident, therefore, that this practice recommended that decisions on sending
of claiming privilege over certain confidential cases to the Special Criminal Court should
sources of information in the Special turn on the circumstances of each individual
Criminal Court, in circumstances where case. In this context it was suggested that
other safeguards are present which ensure such decisions made by the Director of Public
the fairness of the trial, is a practice which Prosecutions ought to be reviewable24.
has been endorsed both at domestic and
international level. Thereby, it appears that
the practices, procedures and operation
of the Special Criminal Court have to some
20  Stationary Office, 2002.
extent been approved by the European Court
of Human Rights. 21  Subject to specific detailed modifications – see
pars 9.39 and 9.40.
22  Ibid, at par. 9.38.
18  See Para. 90 - 92.
23  Ibid, at par. 9.57.
19  See Para. 93.
24  Ibid, at par. 9.76.

157
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

As referred to previously it was also values of a modern liberal democratic


recommended that all decisions of the society and the protection of human
Special Criminal Court should be unanimous rights. In our judgment, the best course
in nature and further that the requirement to is for Ireland to join all other common law
give written reasons for the Court’s decision countries with jury trial and dispense with
ought to be placed on statutory footing 25. A the Special Criminal Court.”26
minority of the committee, of which there were
three, expressed their view that there was no It would seem, however, that in light of the
continued need for the Special Criminal Court recent decision in Donohoe the practices and
in the following terms: procedures adopted in the Special Criminal
Court are in fact consistent with the protection
“The existence of the Special Criminal Court of human rights, and have been endorsed as
can best be explained not by factually such by the European Court of Human Rights.
justified and specifically focused concerns Despite the issues of concern which have arisen
relating to the risk of jury intimidation in relation to the operation of the Special
unique in the common law world, but by Criminal Court, it is evident that the system
the desire to use strong means to put down currently in place in Ireland is both essential
violent, politically inspired crime. That and effective in dealing with matters relating
desire is understandable but the means to terrorism and organised crime within that
are, unfortunately, inconsistent with the jurisdiction.

25  Ibid, at pars. 9.85 and 9.87. 26  Ibid, at par. 9.96.

158
A atividade de prevenção ao terrorismo
e os Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016

JOSÉ CARLOS MARTINS DA CUNHA A Agência Brasileira de Inteligência (ABIN),


por intermédio do Departamento de Contra-
Departamento de Contraterrorismo da terrorismo (DCT/ABIN), tem como uma de suas
Agência Brasileira de Inteligência atribuições institucionais prevenir a consecu-
– DCT/ABIN ção de atos terroristas ou extremistas, sejam
eles perpetrados por organizações, sejam por
A atividade de prevenção ao terrorismo indivíduos imbuídos de ideologia antissistê-
independe da realização de grandes eventos. mica. Prevenir, para a Inteligência de Estado,
Há anos vem sendo realizada de forma pere- significa antecipar possíveis ameaças, anali-
ne e sistemática pela Inteligência de Estado sando fatos e situações que, via de regra, são
em parceria com a Polícia Judiciária Federal. de difícil detecção, tendo em vista a natureza
Todavia, a partir da realização da Conferência do ato a ser praticado. A atuação nesse uni-
da ONU Rio+20, a Copa das Confederações de verso implica garantir a proteção do Estado e
Futebol, a Jornada Mundial da Juventude em da sociedade sem alarde, principalmente para
2013 e a Copa do Mundo FIFA Brasil 2014, foi que não sejam gerados pânico e pavor desne-
intensificada a implementação de iniciativas cessários na população.
de coleta e busca de dados para a detecção,
identificação e acompanhamento de pessoas A atuação da Inteligência de Estado na
e/ou grupos ligados a organizações extremis- prevenção ao terrorismo está centrada ba-
tas ou terroristas que pudessem ameaçar a sicamente em cinco grandes ramificações,
realização desses eventos ou a segurança da sempre considerando o cenário nacional e o
sociedade ou Estado brasileiros. internacional: análise tática, análise estratégi-
ca, recrutamento de fontes humanas, controle
O Brasil é o responsável pela segurança de de alvos e monitoramento de mídias sociais
todos aqueles que participem desses eventos, (acompanhamento de sites e ação de agentes
sejam atletas, jornalistas, autoridades ou tu- virtuais).
ristas, nacionais e estrangeiros. Nesse sentido,
visando os jogos olímpicos e paralímpicos RIO Todas as atividades desenvolvidas buscam
2016, a expectativa é de que as ações até ago- identificar pessoas, grupos ou organizações
ra adotadas e as planejadas sejam suficientes suspeitas de envolvimento direto ou indire-
e adequadas para minimizar os riscos de ações to com estruturas ou ideologias terroristas,
criminosas de natureza extremista ou terrorista extremistas e/ou antissistêmicas, que repre-
durante o evento. Todavia, é necessário reiterar sentem ameaça à sociedade brasileira ou a
que não é possível garantir risco zero de atenta- estrangeiros presentes no País, à segurança
do terrorista, dadas as suas características. institucional e aos interesses estratégicos do

159
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Brasil, ou que ameacem a segurança nacional • Monitoramento sistemático das mídias


ou internacional. sociais e respectivo fortalecimento da
atuação de agentes virtuais;
Resumidamente, as principais ações de-
senvolvidas na prevenção ao terrorismo pela • Aprimoramento dos mecanismos de
Inteligência de Estado, tanto no Brasil como no identificação de supostas ameaças
exterior, são: terroristas por intermédio dos
sistemas de controle implementados
• Busca sistemática de dados que pos- na concessão de vistos a estrangeiros;
sam caracterizar atuação de indiví-
duos ou grupos, no Brasil ou exterior, • Desenvolvimento de programas de
ligados ao extremismo ou terrorismo; treinamento específicos com serviços
de inteligência estrangeiros buscando
• Acompanhamento de pessoas ou conhecer suas metodologias de traba-
grupos suspeitos de vinculação lho e ferramentas utilizadas na pre-
a atividades terroristas e/ou venção ao terrorismo; e
extremistas;
• Atualização constante dos mecanis-
• Aumento de intercâmbio de dados e mos de identificação de ameaças ter-
capacitação continuada dos integran- roristas, tanto no Brasil como no exte-
tes de órgãos do Sistema Brasileiro de rior, para a elaboração das avaliações
Inteligência (SISBIN); de risco voltadas para os jogos olím-
picos e paralímpicos RIO 2016, tendo
• Ampliação do intercâmbio de dados como parâmetro principal a sensibili-
com mais de 80 serviços de inteligên- dade das delegações estrangeiras.
cia estrangeiros;
Destaca-se que a rotina regular de preven-
• Ampliação de palestras visando à cons- ção ao terrorismo no Brasil pela inteligência
cientização da sociedade civil quanto de Estado segue inalterada. Em outras pala-
aos riscos da possibilidade de ocorrên- vras, foi mantido, e em alguns casos intensi-
cia de atentado terrorista no Brasil; ficado, o acompanhamento operacional de al-
vos e situações de ameaça assinalados. Parte
• Programas de aproximação e importante desse acompanhamento é feita em
arregimentação de setores da parceria com órgãos do SISBIN, em especial
sociedade para auxílio do sistema de com a Divisão Antiterrorista do Departamento
alerta brasileiro quanto a ameaças de Polícia Federal (DAT/DPF).
terroristas;

160
A visão do Exército: como minimizar a
possibilidade de atentados terroristas no Brasil

LAURENCE ALEXANDRE XAVIER MOREIRA mento Jihadista, pois, na época, militantes de


diversas regiões se reuniram para lutar con-
Oficial do Exército Brasileiro tra as tropas soviéticas que tinham invadido o
Especialista em guerra irregular e Afeganistão. Para isso, esses militantes rece-
prevenção e combate ao terrorismo biam treinamento em campos no norte do Pa-
quistão, por instrutores oriundos do Escritório
de Serviços Técnicos da Central Intelligence
O terrorismo de cunho extremista islâmi- Agency (CIA), dos Estados Unidos da América
co, que começou na década de 1960, foi re- (EUA), e do Serviço de Inteligência Militar Pa-
sultado da Guerra Fria e se proliferou com a quistanês (ISI, sigla em inglês). Fortalecidos
decisão soviética de financiar, treinar e incen- com a retirada soviética do Afeganistão, e
tivar grupos no Oriente Médio. A então União clamando crédito pelo subsequente colapso
Soviética e seus afiliados no Oriente Médio soviético, esses militantes decidiram expandir
também patrocinaram grupos terroristas de seus esforços para outras partes do mundo.
ideologia marxista na Europa e na América
Latina, e também estavam por trás do grupo A conexão existente entre os Estados pa-
terrorista Exército Vermelho Japonês1 (Japane- trocinadores do terrorismo e a Guerra Fria era
se Red Army). Lugares como Yêmen e Líbia se tão profunda que, com a queda do muro de
tornaram paraísos onde militantes marxistas Berlim e o posterior colapso da União Soviéti-
de diferentes nacionalidades se reuniam para ca, muitos declararam que o terrorismo havia
aprender técnicas, táticas e procedimentos terminado. Isso ficou evidenciado quando um
(TTP) terroristas, muitas das vezes instruídos grupo interagências que trabalhava em Nova
por equipes oriundas do ex-Serviço Secreto Iorque investigando o atentado a bomba ao
Russo (KGB) ou do Serviço de Inteligência da World Trade Center, em 1993, foi dissolvido pelo
Alemanha Oriental (Stasi), além de organiza- recém-empossado Assistente do Secretário de
ções militantes de extrema esquerda. Estado, que declarou que a Divisão do Serviço
de Segurança Diplomática não necessitava de
A Guerra Fria também foi responsável pela uma Divisão de Investigação Contraterrorismo,
criação da Al Qaeda e do transnacional movi- uma vez que o terrorismo havia se extinguido.
1 O Exército Vermelho Japonês foi autor de diversas
O terrorismo obviamente não terminou
ações de grande repercussão internacional.
com o fim da Guerra Fria. Os sentimentos oti-
Entre elas, vários desvios de aviões e ataques
a embaixadas ocidentais. Atualmente, o grupo mistas existentes em algumas agências gover-
continua ativo, contando com fortes redes de apoio namentais norte-americanas, bem como em
e financiamento. Evidências mostram estreitas outros países europeus (além de Israel), fez
ligações com grupos rebeldes no Peru. com que a ameaça jihadista crescente fosse

161
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

menosprezada, falhando principalmente em fazer frente à Al Qaeda e a seus simpatizantes.


proteger algumas instalações diplomáticas Ironicamente, ao mesmo tempo em que
sediadas em outros países. O relatório final o governo norte-americano foi capaz de
da Comissão Crowe 2, que foi criada para rever reestruturar a sua carga burocrática frente
as falhas existentes na não detecção dos dois à nova ameaça, criando novas organizações
atentados a bomba contra as embaixadas es- como o Departamento de Segurança Interna,
tadunidenses situadas em Nairóbi (Quênia) e os aparatos de segurança contraterrorismo
Dar Es Salaam (Tanzânia), ambos em 1998, ex- existentes antes de 11 setembro já haviam
plicitamente apontou negligência nas ações descartado a Al Qaeda como uma potencial
de segurança e contraterrorismo. Conclusão ameaça. Algumas dessas novas organizações
similar foi externada pela Comissão 9/113. Cabe desempenharam um importante papel no
lembrar que, em 1992, a sede diplomática is- sentido de ajudar os EUA a lidar com as
raelense em Buenos Aires também foi alvo de consequências de invadir o Iraque depois do
um atentado a bomba. Afeganistão. Washington gastou bilhões de
dólares para criar organizações e programas de
Os ataques terroristas de 11 de setembro fundos que não eram realmente necessários,
provocaram uma mudança na geopolítica porque as ameaças que eles deveriam
internacional, levando os EUA a concentrar combater – como as maletas com dispositivos
grande parte do seu esforço e recursos para nucleares que suspeitava-se que a Al Qaeda
possuía – na verdade não existiam. O fato é
2  O Report of the Accountability Review Boards on que a grande superpotência global saiu do seu
the Embassy Bombings in Nairobi and Dar ES Salaam equilíbrio, o que causou um desequilíbrio em
on August 7, 1998 foi publicado pelo Departamento
todo o sistema global.
de Estado norte-americano em janeiro de 1999
e recebeu essa denominação em virtude de a
Com a diminuição continuada da ameaça
Comissão ter sido chefiada pelo Almirante Willian J.
Crowe. jihadista, ressaltada com a eliminação de
Osama Bin Laden, em maio de 2011, e a queda do
3  A Comissão Nacional sobre os Ataques
Regime de Kadhafi, na Líbia (que normalmente
Terroristas nos EUA, também conhecida como 9/11
Commission, foi estabelecida em 27 de novembro recorria ao terrorismo como arma), tudo
de 2002 “para preparar uma conta total e completa indicava que haveria uma mudança na forma
das circunstâncias que envolveram os ataques de de encarar a problemática do terrorismo.
11 de setembro de 2001”, incluindo uma preparação Alguns estudiosos, inclusive, chegaram a tecer
e resposta imediata aos ataques. Também tinha comentários sobre a extinção do terrorismo.
como missão formular recomendações destinadas a
evitar ataques futuros. O relatório final da comissão Diversos fatos acontecidos em fevereiro
foi longo e baseado em extensas entrevistas e de 2012, que serão relatados mais à frente, e
depoimentos. Sua principal conclusão foi que as o atentado à Maratona de Boston, ocorrido em
falhas da Agência Central de Inteligência (CIA) e do abril 2013, serviram para mostrar que, embora
Federal Bureau of Investigation (FBI) permitiram
os terroristas e as suas TTP possam ter sofrido
que os ataques terroristas ocorressem e que se as
mudanças, isso não sinaliza, necessariamente,
agências tivessem atuado de forma mais sensata e
o fim do terrorismo.
contundente, os ataques poderiam ter sido evitados.

162
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Natureza do terrorismo fracos, o terrorismo geralmente concentra-


se em alvos civis (também chamados de soft
Existem muitas definições conflitantes a targets4) por serem mais fáceis de serem
respeito do que vem a ser terrorismo. Porém, atacados do que alvos militares.
para a proposta deste artigo, terrorismo será
definido simplesmente como uma violência O terrorismo não pode ser definido pelo
motivada politicamente contra civis não com- tipo de arma utilizada. Por exemplo, usar um
batentes. Todavia, cabe registrar alguns ata- veículo com um artefato explosivo improvisa-
ques terroristas desencadeados contra alvos do contra uma base da Força de Assistência
militares, nos quais o objetivo principal não à Segurança no Afeganistão (ISAF, sigla em in-
era só causar baixas mas também difundir glês) pode ser considerado como um ato de
uma mensagem psicológica, como, por exem- guerra irregular; porém, se esse mesmo veí-
plo, o atentado da Al Qaeda ao navio america- culo fosse usado contra um hotel em Kabul,
no USS Cole, no Golfo do Aden, em 2000, e os poderia assumir uma conotação terrorista.
atentados do Hezbollah às bases dos Mariners Isto significa que os militantes do Talibã po-
norte-americanos e dos paraquedistas france- dem empregar TTP de guerra convencional,
ses no Líbano, em 1983. de guerra não convencional e terrorismo du-
rante a mesma campanha, dependendo da
Terrorismo é uma tática, muitas vezes em- situação. O que deve ser levado em conside-
pregada de forma estratégica, utilizada por ração na análise é o objetivo psicológico do
uma grande variedade de atores. Não existe atentado.
um único credo, etnia, convicção política ou
nacionalidade como monopólio. Indivíduos Ataques terroristas são relativamente fá-
ou grupos de indivíduos dos mais variados e ceis de serem executados quando dirigidos
imagináveis – desde grupos racistas como a contra soft targets, principalmente se o agres-
Ku Klux Kan, organizações criminosas atuan- sor não estiver preocupado com a sua fuga
tes em favelas brasileiras, ou até mesmo um após o ataque, como foi o caso dos ataques
militante ativista cristão que teve como obje- em Mumbai, em 2008. Em que pese as forças de
tivo combater a legalização do aborto – utili- segurança de muitos países terem aprimorado
zaram atos terroristas como forma de atingir as suas técnicas de inteligência e com isso ob-
seus objetivos. tido bastante êxito na prevenção de ataques
nos últimos anos, é simplesmente impossível
Tradicionalmente, o terrorismo tem sido para os governos terem recursos para manter
uma tática dos mais fracos, ou seja, daqueles todo o país em segurança. Por isso, alguns ata-
que não têm o poder de impor sua vontade ques terroristas apresentam chances de êxito,
por meios políticos e militares. Com base na principalmente nas sociedades menos rígidas
afirmação de Carl Von Clausewitz de que a do ocidente.
guerra é a continuação da política por outros
meios, poder-se-ia dizer que o terrorismo é um 4  São exemplos de soft targets: hotéis, sistemas de
tipo de guerra e, assim, usa a violência para transporte (estações de metrô, aeroportos, barcas,
a consecução dos seus objetivos políticos. ônibus urbanos), pontos turísticos, arenas esportivas,
Exatamente por ser uma tática usada pelos mais casas noturnas etc.

163
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Ataques terroristas tendem a ser teatrais, a Al Qaeda. E, justamente, por não possuírem
exercendo um estranho fascínio sobre a ima- as TTP necessárias para realizarem um ataque
ginação humana. Muitas vezes eles criam um de grande vulto, representam uma ameaça
senso de terror único, capaz de suscitar rea- menos grave. E por não serem experientes,
ções proporcionalmente mais intensas do que esses jihadistas tendem a procurar ajuda para
aquelas decorrentes de desastres naturais realizar os seus planos. Essa assistência, ge-
de maior magnitude. Por exemplo, cerca de ralmente, envolve a aquisição de explosivos ou
222.000 pessoas morreram em 2010 no ter- armas de fogo, como no caso de Al Khalifi, em
remoto ocorrido no Haiti, contra menos de que um agente de segurança, passando-se por
3.000 em 11 de setembro de 2001; ainda as- um jihadista local, lhe forneceu um colete sui-
sim os ataques às torres gêmeas produziram cida e uma submetralhadora, ambos inertes,
uma sensação mundial de terror e uma reação antes que o suspeito fosse detido.
geopolítica que gerou um impacto profundo e
sem paralelo em eventos mundiais ao longo da Enquanto muitos formadores de opinião
última década. tendem a qualificar militantes como Al Khalifi
como ineptos, é importante ressaltar que, se
ele tivesse conseguido encontrar um facilita-
Ciclos e mudanças dor jihadista real, ao invés de um agente fe-
deral, o seu ataque poderia ter tido como con-
Alguns eventos ocorridos no início de 2012 sequência a morte de diversos civis inocentes.
ilustram perfeitamente a adaptabilidade das Richard Reid, internacionalmente conhecido
atividades terroristas e demonstram que, en- como “shoe bomber”, chegou perto de con-
quanto o terrorismo tiver condições de mudar seguir realizar seu ataque, em dezembro de
e se adaptar, ele estará longe de deixar de 2001, a bordo do voo 63 de Paris para Miami.
existir. O explosivo não detonou devido ao atraso de
um dia na decolagem de seu voo. Em virtude
Em 17 de fevereiro de 2012, as forças de de estar usando o tênis continuadamente por
segurança norte-americanas prenderam um mais de um dia, e de ter tomado chuva antes
marroquino nas proximidades do Capitólio, em de embarcar, o estopim ficou úmido, dificul-
Washington, que tinha como intuito realizar tando assim o seu acionamento. Outro caso
um ataque suicida no monumento americano. que vale a pena ser lembrado é o do paquis-
O suspeito, Amine Al Khalifi, é um exemplo cla- tanês naturalizado cidadão norte-americano,
ro na mudança da ameaça jihadista, que até Faisal Shahzad, que, em maio de 2010, plane-
então era baseada na utilização de militantes jou um atentado utilizando um carro bomba e
oriundos do núcleo base da Al Qaeda nas suas incendiário na Times Square, em Nova Iorque.
ações terroristas de vulto. Esse perfil tem se Ele somente não conseguiu êxito por imperícia
modificado nos últimos anos, uma vez que os na detonação inicial do artefato.
“novos” terroristas representam uma ameaça
mais difusa, pois eles são mais difíceis de se- Ainda assim, permanece o fato de que a
rem identificados pela inteligência nacional e ameaça jihadista atual provém de militantes as-
pelas forças de segurança, uma vez que não pirantes despreparados, ao invés de terroristas
possuem nenhuma vinculação hierárquica com treinados e enviados do exterior, como as equi-

164
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

pes que executaram os ataques em 11 de se- Também é importante ter em mente


tembro, nos EUA, ou os ataques de 1992 e 1994, que esse novo ciclo geopolítico não tem
na Argentina. Isso demonstra uma diminuição como executantes do terrorismo somente
na ameaça jihadista tradicional, fruto do au- governos estrangeiros, ou atores subnacionais
mento das atividades de segurança interna dos ou transnacionais vinculados a ideologias
países, bem como da eficácia das ações milita- como o jihadismo. Como visto nos ataques
res de tropas de forças especiais, bem-sucedi- de junho de 2011, na Noruega, conduzidos
das na eliminação de alvos de alto valor para as pelo cidadão Anders Breivik, ou em casos
organizações terroristas (líderes extremistas). mais antigos como Eric Rudolph, Timothy
McVeigh e Theodore Kaczynski, nos EUA, todos
Alguns eventos acontecidos no final de eram indivíduos nativos que possuíam uma
fevereiro de 2012 mostram como o terroris- variedade de queixas contra seus governos
mo pode se manifestar de forma diferente no ou sua sociedade, e recorreram a atentados
novo ciclo geopolítico que se apresenta. Em 13 terroristas para externar a sua revolta. Tais
de fevereiro, veículos diplomáticos israelenses tipos de ressentimentos, certamente, não
em Nova Déli (Índia) e Tbilisi (Geórgia) foram deixarão de existir.
alvos de artefatos explosivos. Em Tbilisi, uma
granada escondida embaixo do veículo foi des- Outro exemplo de destaque foram as ações
coberta antes de ser detonada. Em Nova Déli, dos irmãos Tsarnaev desencadeadas durante
uma bomba adesiva, colocada na traseira do a Maratona de Boston, em 2013. Tamerlan e
veículo, feriu a esposa do Adido de Defesa de Dzhokhar são de origem Chechena e residiam
Israel, enquanto ela dirigia o seu veículo para legalmente nos EUA desde 2003. Ainda não se
pegar os filhos na escola. sabe se a expertise para a construção dos ar-
tefatos explosivos veio de uma viagem realiza-
No dia 14 de fevereiro do mesmo ano de da pelo irmão mais velho a sua terra natal ou
2012, um homem iraniano foi preso após ficar por intermédio de consultas à Internet.
ferido em uma explosão ocorrida em uma casa
alugada em Bangkok (Tailândia). A explosão Ciclos geopolíticos continuarão a mudar e
teria ocorrido com um grupo de militantes essas variações podem causar alterações no
que estava preparando artefatos explosivos modus operandi de quem emprega o terroris-
improvisados para serem usados contra alvos mo, bem como na maneira como ele é empre-
israelenses naquela cidade. Dois outros irania- gado. Porém, como tática, o terrorismo vai con-
nos foram presos posteriormente (um deles na tinuar, não importa quais sejam os novos ciclos.
Malásia), acusados de estarem envolvidos com
o planejamento dos atentados.
Perspectiva brasileira
Embora essas recentes ações iranianas te-
nham falhado, elas mostram como o Irã está
usando a tática de terrorismo em represália Cada vez mais o Brasil se apresenta como
aos ataques que Israel supostamente estaria um global player. Um assento no Conselho de
conduzindo contra indivíduos associados ao Segurança da Organização das Nações Unidas
programa nuclear iraniano. (ONU) nunca foi tão almejado pela nossa políti-

165
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

ca externa. Em virtude disso, um questionamen- realizado para aumentar a capacitação dos


to deve ser feito: será que o Brasil está fazendo profissionais de segurança para que eles sai-
a sua parte para que isso possa ser merecido? bam como devem proceder. Quando se fala
em profissionais de segurança, o pensamento
Eventos como a Conferência Rio+20, em não deve ficar restrito somente aos policiais
2012; Copa das Confederações e visita do Papa civis e militares: guardas municipais, seguran-
Bento XVI, em 2013; Copa do Mundo, em 2014; e ças do metrô, shopping centers, casas notur-
os futuros Jogos Olímpicos e Paralímpicos, em nas, edifícios residenciais e estabelecimentos
2016, demonstram que o País está no caminho privados devem entrar nessa lista, e cabe
certo. O mundo confia na perícia brasileira ao Estado fornecer treinamento adequado e
para que seus atletas, turistas e autoridades fiscalizar a qualificação desses profissionais.
possam vir em segurança representar seus Trabalhadores que lidam com o público em
países, muitos dos quais alvos declarados de geral, como motoristas de táxi e funcionários
extremistas transnacionais. de hotéis, igualmente podem receber habili-
tação específica. Também englobada na ver-
Além do grande desafio de gerenciar tais tente antiterrorismo se encontra a aquisição
eventos, o segmento político está preocupado de materiais específicos como detectores de
em adequar algumas necessidades da socie- metais, detectores de explosivos (eletrônicos
dade brasileira, como redimensionar a capaci- e treinamento de cães farejadores), sistemas
dade dos aeroportos internacionais, melhorar eletrônicos de vigilância e principalmente um
o sistema de transporte urbano, adequar a es- eficaz sistema de controle migratório e de cre-
trutura hoteleira, terminar as obras nas arenas denciamento para que todos os participantes
esportivas, entre outras. Os profissionais da desses grandes eventos, sobretudo os estran-
área de segurança e defesa têm a obrigação de geiros, possam ser devidamente identificados.
planejar as atividades de segurança para que
elas transcorram em perfeita paz, pois, dessa Por contraterrorismo se entendem as me-
forma, estarão fazendo sua parte para projetar didas ativas que visam a impedir ou eliminar
a imagem brasileira internacionalmente. uma ameaça terrorista. Forças de Segurança
capacitadas, como o Comando de Operações
A defesa contra atentados terroristas é Especiais do Exército Brasileiro, Comando de
mundialmente exercida com base em quatro Operações Táticas da Polícia Federal e tropas
vertentes: o antiterrorismo, o contraterroris- de operações especiais das Polícias Civis e Mi-
mo, as atividades de inteligência e o gerencia- litares estaduais, permanecem em constante
mento das consequências. capacitação para se atualizarem e estarem em
condições de intervir, se assim for necessário.
O antiterrorismo consiste nas medidas Mais importante do que desenvolverem suas
passivas, defensivas, preparatórias e de pro- capacidades, individualmente, é a capacidade
teção tomadas para se evitar um ato terroris- de operarem em sintonia, ou seja, conjunta-
ta. Para que o Brasil se enquadre nos padrões mente, pois a experiência tem demonstrado
internacionais estabelecidos faz-se necessá- que sozinhas essas forças são insuficien-
rio que recursos sejam investidos pelas au- tes para erradicar ameaças de vulto. Operar
toridades competentes. Um esforço deve ser conjuntamente não significa possuir equipes

166
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

táticas mistas; muito pelo contrário, as espe- Defesa Nacional da Casa Civil da Presidência da
cificidades de cada tropa devem ser respeita- República (CREDEN)5, a Comissão de Relações
das. O que se busca é um Estado-Maior misto, Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos
treinado para pensar e decidir em conjunto, e Deputados (CREDN) e a Comissão de Relações
esse Estado-Maior decidirá onde e como em- Exteriores e Defesa Nacional do Senado Federal
pregar cada tropa, dependendo da situação (CRE) é de fundamental importância.
tática encontrada.
As atividades de inteligência são aquelas
Muitos profissionais dessa área ainda não desenvolvidas justamente para se identificar
entenderam que, nos dias de hoje, o contrater- a ameaça, e em conjunto com as forças con-
rorismo se caracteriza pela proatividade (dife- traterroristas supracitadas, evitar que algum
rentemente do contraterrorismo reativo, muito atentado aconteça, exatamente como no caso
empregado no século passado), ou seja, para do agente de segurança se passando por for-
que suas unidades possam entrar em ação e necedor de armas e explosivos, já menciona-
eliminar a ameaça terrorista, primeiramente os do. Contudo, não se restringe a isso. São vá-
profissionais de inteligência precisam identifi- rias as tarefas, como a ligação com serviços
car essas ameaças, caso contrário essas tropas de inteligência estrangeiros, controle da venda
operacionais estarão simplesmente fazendo de armas, controle do estoque de explosivos,
meras demonstrações de força, muito pouco gerenciamento dos imigrantes legais e ilegais,
eficazes. Uma medida eficiente é o emprego de repressão à emissão de documentos falsifica-
oficiais de ligação das tropas de operações es- dos, fiscalização de cargas internacionais que
peciais junto a centros de inteligência. Quando entram nos portos, fiscalização no repasse de
identificada a ameaça, esses operadores serão grandes quantias de dinheiro, enfim, diversas
assessores capacitados a ajudar na decisão de atividades que, no Brasil, são efetuadas por
qual deve ser o momento exato, de quando e
5 A Câmara de Relações Exteriores e Defesa Nacional
onde termina o trabalho da inteligência e se
(CREDEN) do Conselho de Governo é presidida
inicia o trabalho dos grupos táticos.
pelo Ministro-Chefe do Gabinete de Segurança
Institucional da Presidência da República (GSIPR) e
Propositadamente, as atividades tem por finalidade formular políticas, estabelecer
de inteligência e o gerenciamento das diretrizes, bem como aprovar e acompanhar
consequências ficaram para o final, pois programas e ações a serem implantados em
nessas duas áreas muito deve ser feito para matérias relacionadas a: cooperação internacional
melhorar o atual quadro nacional. Mais do em assuntos de segurança e defesa, integração
que a simples destinação de verbas, impõe-se fronteiriça, populações indígenas, direitos humanos,
uma mentalidade de que elas são realmente operações de paz, narcotráfico e outros delitos de
necessárias. Para que essa conscientização configuração internacional, imigração, atividade
seja desenvolvida, é de fundamental de Inteligência, segurança para as infraestruturas
importância uma ampla participação do críticas, segurança da informação e segurança
cibernética. Cabe, ainda, à CREDEN, o permanente
segmento político brasileiro, responsável, em
acompanhamento e estudo de questões e fatos
um sistema democrático, por formular leis e
relevantes, com potencial de risco à estabilidade
empregar verbas. O engajamento de órgãos institucional, para prover informações ao Presidente
como a Câmara de Relações Exteriores e da República.

167
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

diferentes órgãos. Falta no nosso País um ór- Cabe ressaltar que a Argentina, após sofrer os
gão central que seja o responsável por juntar atentados em 1992 e 1994, solicitou ajuda a es-
todas essas informações (literalmente como pecialistas de outros países para fazer frente
um jogo de quebra-cabeça) e com isso tenha a esses desafios. Não há dúvida na excelên-
uma ideia única da ameaça. Essa atividade é cia da capacidade de socorro das unidades
conhecida internacionalmente como opera- de pronta resposta nacionais. Basta lembrar
ções interagências. as operações bem-sucedidas realizadas por
integrantes da Defesa Civil e dos Corpos de
Para citar como as operações interagências Bombeiros no socorro às vítimas de desastres
devem funcionar, tomemos como exemplo os naturais de vulto acontecidos no Rio de Janei-
recentes assaltos a caixas eletrônicos utilizan- ro e em Santa Catarina. Mas o emprego desses
do explosivos, acontecidos no Estado de São especialistas em cenários de atentados terro-
Paulo e no Sul do País, que devem estar sen- ristas diverge, em alguns pontos, do emprego
do investigados pelas Polícias Civis estaduais. em desastres naturais. Um exemplo seria um
Para que o trabalho investigativo tenha efeito, atentado terrorista utilizando agentes quími-
algumas coordenações são necessárias, pois o cos, bacteriológicos, radiológicos e nucleares
controle da fabricação de explosivos no País é (QBRN). O Brasil possui equipamento e ma-
executado pelo Exército Brasileiro, a tarefa de terial limitados para responder a um desafio
rastrear onde o dinheiro do roubo está sendo dessa magnitude. Um bom exemplo foi o aci-
utilizado é de responsabilidade da Polícia Fe- dente que envolveu Césio 137, em Goiânia, em
deral, e caberá à Receita Federal identificar as 1987. Projete-se o pequeno incidente em uma
pessoas (físicas ou jurídicas) envolvidas, se o escala maior, como um atentado terrorista se
dinheiro proveniente do roubo for transferido valendo de uma “bomba suja”6, usando esse
para o exterior. Dentro deste mesmo exemplo, mesmo material radiológico. O grande se-
surgem outros questionamentos, como: qual gredo para se preparar para acontecimentos
a procedência dessa dinamite? Será que são dessa natureza é treinamento. Planos de con-
realmente bananas de dinamite, ou algum ou-
tro tipo de explosivo está sendo utilizado? De
onde vem a técnica desenvolvida pelos crimi- 6  Bomba suja é um termo usualmente empregado
nosos brasileiros em manejar explosivos? Ou para designar uma arma radioativa, ou seja,
seja, trata-se de um trabalho complexo que uma bomba não-nuclear que, quando acionada
deve, obrigatoriamente, ser desenvolvido em por intermédio de um explosivo convencional
(como TNT – Trinitrotolueno), dispersa material
conjunto.
radioativo armazenado em seu interior, causando
contaminação pela radiação e doenças semelhantes
Quando se fala em gerenciamento das
às que ocorrem quando uma pessoa é contaminada
consequências, o foco está em “o que” fazer por uma bomba atômica. A bomba suja, mesmo
após o atentado ter sido executado. Atividades com poucos quilos de lixo radioativo, quando
de socorro às vítimas, busca por sobreviven- este é dispersado diretamente na atmosfera,
tes, limitação dos danos e atividades forenses pode ocasionar uma nuvem de material radiativo,
de como o ataque aconteceu e, principalmen- provocando a contaminação e possível morte de
te, identificar quem foram os responsáveis. milhares de pessoas.

168
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

tingência devem ser confeccionados e, princi- informações midiáticas fez com que o sargento
palmente, ensaiados. da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro
(PMERJ) responsável pela eliminação do assas-
Diante dos novos desafios que estão se sino virasse um herói nacional. Sem dúvida ne-
apresentando, é necessário que a seguran- nhuma, o policial agiu bravamente, porém por
ça nacional receba a mesma atenção dada à instinto, colocando a sua própria vida em risco
economia brasileira, que, graças ao empenho ao realizar uma entrada tática sozinho para
dos nossos dirigentes, passou a ocupar posi- tentar resolver a situação sem uma correta
ção de destaque no cenário mundial. A cria- análise do que estava ocorrendo. Verdadeiro
ção de um órgão permanente de prevenção e herói foi o garoto que, mesmo baleado, correu
combate ao terrorismo, capaz de gerenciar e em busca de socorro, quando, na verdade, me-
desenvolver as capacidades de todas as ins- dida de elementar prevenção deveria deter-
tituições, é de fundamental importância. Essa minar a existência de uma linha telefônica na
organização já existiu, foi criada em 2009 e escola (“telefone vermelho”) que a colocasse
extinta em 2011, chamava-se Núcleo do Centro em contato direto com a unidade policial mais
de Coordenação de Prevenção e Combate ao próxima. Deveria ser também uma obrigação
Terrorismo (CCPCT), e estava vinculada ao Ga- do Estado fornecer agentes de segurança
binete de Segurança Institucional (GSI). A reati- capacitados para todas as escolas públicas,
vação desse órgão seria um importante passo sendo estes os responsáveis pela implemen-
nesse sentido. A existência de um órgão como tação de planos de contingência que treinas-
esse não significa que o Brasil esteja admitin- sem alunos, professores e funcionários sobre
do a possibilidade de uma ameaça terrorista como proceder em casos de emergência. Nada
em nosso território. Muito pelo contrário, ele disso existia e continua não existindo, em que
será o responsável por mostrar ao mundo que pese sua essencialidade em uma estrutura efi-
segurança é uma prioridade e, acima de tudo, caz de proteção. Além do mais, procedimentos
que somos um País seguro. adotados para evitar crimes comuns são ex-
tremamente úteis às medidas de prevenção e
Em que pese os sucessos alcançados nos combate ao terrorismo.
eventos já ocorridos, muito trabalho ainda
existe para ser feito. As experiências interna- Um Estado que almeja realmente possuir
cionais merecem ser estudadas e, principal- um assento no Conselho de Segurança da ONU
mente, os nossos próprios erros devem servir deve possuir uma estrutura digna de Primeiro
como fonte de ensinamentos. Vale lembrar Mundo e ser realmente capaz de manter a sua
o caso que chocou o Brasil em 2011, quando soberania, a integridade do seu patrimônio e o
um jovem com distúrbios mentais assassi- bem-estar do seu cidadão, ou seja, interesses
nou, brutalmente, crianças em uma escola em vitais da Segurança Nacional.
Realengo, no Rio de Janeiro. O desenrolar das

169
Ciberterrorismo

ALAN DENILSON LIMA COSTA Sem o intuito de teorizar sobre o tema, uma
vez que o terrorismo carece de uma defini-
Coronel do Exército Brasileiro ção consolidada e universalmente aceita, mas
do Centro de Defesa Cibernética apenas utilizando o senso comum para tentar
do Exército (CDCiber) compreender o que poderia ou não ser enqua-
drado como terrorismo, vemos que alguns in-
gredientes sempre estão presentes.

1. Generalidades Se o terrorismo carece de uma definição


consolidada e universalmente aceita, o que di-
A prática de atos terroristas é uma das zer do ciberterrorismo?
grandes discussões da comunidade interna-
cional nestes primeiros anos do século XXI e, Alguns países que enfrentam diariamente a
mesmo se tratando de uma ameaça à defesa ameaça do terrorismo, como é o caso de Israel,
da sociedade e à preservação da ordem públi- enquadram o ciberterrorismo como uma nova
ca, o Brasil ainda não possui em seu ordena- ameaça contemporânea capaz de provocar os
mento jurídico a conceituação de ato terroris- mesmos efeitos dos atos terroristas “tradicio-
ta, nem previsão de penas a serem aplicadas. nais”. Para efeito de acompanhamento pelos
órgãos de segurança do Estado, consideram
que o ciberterrorismo engloba as seguintes
vertentes de atuação:

• o uso da Internet para realizar o re-


crutamento, proselitismo, angariar
fundos, incitar o ódio e a violência,
treinamento, inteligência e operação
psicológica;

• a Jihad Eletrônica, representada pelos


“cyberarmy” e os “electronic army”, que
utilizam o espaço cibernético para rea-
lizar ataques cibernéticos e devenvol-
Fonte: Elaborada pelo autor (2014) ver as suas capacidades defensivas; e

171
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

• a associação de grupos terroristas A ameaça cibernética afeta diretamente


clássicos com o crime organizado na a soberania dos Estados, na medida em que
Internet (cibercrime), aprendendo suas seus ativos de informação estratégicos, suas
técnicas e contratando seus serviços. infraestruturas críticas e o conjunto da socie-
dade podem sofrer danos como consequência
de ataques cibernéticos perpetrados por pes-
2. A ameaça cibernética soas, grupos ou organizações com motivação
e capacidade técnica para conduzir tais ações.
No Brasil, a ameaça cibernética11 tornou-
-se uma preocupação do Estado por colocar Para que a sociedade brasileira ou os seus
em risco a integridade de estruturas estraté- indivíduos sintam-se livres de riscos, pressões
gicas essenciais à operação e ao controle de ou ameaças advindas do espaço cibernético
diversos sistemas e órgãos que, se afetados, (condição de segurança cibernética), diversas
poderão impactar a Segurança Nacional. A ações preventivas e reativas devem ser ado-
percepção dessa ameaça está presente nos tadas pelas diferentes instâncias do Estado,
principais documentos normativos da Defesa muitas das quais não implicam qualquer en-
Nacional: o Livro Branco de Defesa Nacional, a volvimento das Forças Armadas.
Política Nacional de Defesa e a Estratégia Na-
cional de Defesa. Qual seria o papel das Forças Armadas
brasileiras se a PETROBRAS fosse alvo do
mesmo programa malicioso que provocou o
apagamento de 30.000 discos rígidos (HD) dos
computadores da rede interna da petroleira
saudita ARAMCO?22

Para tanto, as ações preventivas e reativas


destinadas a garantir a segurança cibernética
nacional devem ser formuladas, coordenadas e
executadas pelo Estado e concebidas de forma
Fonte: Elaborada pelo autor (2014) integral e multidimensional, não se limitando
ao âmbito da Defesa mas envolvendo também
a segurança pública, a defesa civil, as empre-
1 Atores estatais ou não estatais (pessoas, grupos sas públicas e privadas, além de um conjunto
ou organizações) com motivação e capacidade de políticas públicas voltadas para as áreas
técnica para, por meio do espaço cibernético,
explorar uma ou mais vulnerabilidades dos ativos 2 Ataque de sabotagem orientado ao setor
de informação e realizar, sem autorização legal, energético da Arábia Saudita em agosto de 2012,
ações orientadas a acessar, manipular, extrair, quando o programa malicioso batizado de Shamoon
corromper ou destruir dados ou informações se alastrou pela rede interna da petroleira estatal
sensíveis em trânsito nas redes ou armazenadas ARAMCO, apagando o conteúdo de 30.000 discos
em sistemas de informação utilizados por órgãos rígidos dos computadores da empresa. Shamoon foi
governamentais, empresas/organizações públicas considerado o programa malicioso mais destrutivo
ou privadas, ou indivíduos (COSTA, 2013). descoberto até o momento.

172
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

econômica, social, educacional e científico- mento nacional e retardar o processo de ob-


-tecnológica. tenção da autonomia relacionada ao domínio
de tecnologias sensíveis.
Nesse mesmo diapasão, a Estratégia Na-
cional de Defesa prevê que Para afrontar a ameaça cibernética, é im-
portante que o Estado brasileiro estabeleça
Todas as instâncias do Estado deverão sua Política de Segurança Cibernética e crie
contribuir para que o incremento do nível um “ente” (agência, secretaria...) que funcione
de Segurança Nacional, com particular
como órgão central responsável pela coorde-
ênfase sobre [...] as medidas para a
nação, integração, regulação e fiscalização da
segurança das infraestruturas estratégicas,
incluindo serviços, em especial no que se Segurança Cibernética do País, essencial para
refere a energia, transporte, água, finanças dar foco às ações estratégicas decorrentes e
e comunicações, a cargo dos ministérios promover a sinergia entre os diferentes atores
da Defesa, de Minas e Energia, dos envolvidos: governo, sociedade, setor empre-
Transportes, da Fazenda, da Integração sarial, academia e comunidade internacional.
Nacional e das Comunicações, e o trabalho
de coordenação, avaliação, monitoramento
e redução de riscos, desempenhado pelo
Gabinete de Segurança Institucional da
Referências
Presidência da República (GSIPR) (END,
2013). BRASIL. Ministério da Defesa. Estraté-
gia Nacional de Defesa. EM Interministerial n.
Para fazer face a essa nova ameaça con- 00437/MD/SAE-PR, de 17 dez. 2008. 1. Ed. Bra-
temporânea, o Estado Nacional desempenha sília, DF, 2008.
um papel fundamental e deve seguir adaptan-
do-se nos campos político, social, econômico, . Ministério da Defesa. Livro
científico-tecnológico e militar, para continuar Branco de Defesa Nacional. Disponível em:
exercendo soberanamente sua autoridade <http://www.camara.gov.br/internet/agencia/
e controle domésticos, de forma a preservar pdf/LIVRO_BRANCO.pdf>. Acesso em: 13 ago.
seus interesses nacionais e resguardar a con- 2014.
dição de segurança.
COSTA, Alan. Cooperación regional en ma-
teria de ciberdefensa: nuevo reto para la UNA-
3. Considerações finais SUR. Instituto de Altos Estudios de la Defensa
Nacional. Caracas, Venezuela. 2013.
O crescente desenvolvimento do Brasil
deve ser acompanhado pelo aumento da sua ISRAEL. ICT Cyber-Desk Review.
capacidade de prevenir e responder a ameaças International Institute for Counter-Terrorism.
e agressões, sejam elas externas ou internas. Disponível em: <http://www.ict.org.il/Articles.
A ameaça cibernética orientada à Segurança aspx?WordID=26>. Acesso em: 13 ago. 2014.
Nacional, na forma de sabotagem ou de espio-
nagem cibernéticas, pode afetar o desenvolvi-

173
O terrorismo e a cooperação internacional

RICARDO ANDRADE SAADI a conflitos entre particulares, cujos reflexos


transcendem as fronteiras dos Estados.
Delegado de Polícia Federal com
especialização em crimes financeiros As fronteiras geográficas, cada vez mais
ligadas a aspectos meramente simbólicos,
Antes de entrar especificamente no tema, não representam grande obstáculo à livre
gostaria de parabenizar a Procuradoria-Geral circulação de bens, de serviços, de capitais
da República pela iniciativa de trazer à discus- e daquilo que melhor representa o avançado
são entre autoridades públicas e acadêmicas estado de globalização em que vivemos
tema tão atual e que vem sendo abordado em – a informação. Enquanto o século XIX foi
diversos foros internacionais. Dividiremos o ar- marcado pela sociedade industrial, no
tigo em três partes: 1. Cooperação Internacional; século XX surge a sociedade da informação,
2. Terrorismo; e 3. A Cooperação Internacional e permitindo que as informações sejam
o Terrorismo. transmitidas instantaneamente e dando
origem às redes sociais virtuais em níveis
locais, regionais e globais. Diante deste novo
1. Cooperação internacional cenário, surgem conflitos jurídicos entre
particulares que dependem da cooperação
jurídica internacional, uma vez que a jurisdição
O processo de globalização pode ser ana- é um produto do Estado soberano, e os países
lisado sob inúmeras perspectivas, todas elas devem colaborar para garantir que as pessoas
relacionadas à transformação dos espaços possam exercer seus direitos que transcendem
nacionais em arenas globais. Assim, temas as fronteiras dos Estados.
que antes eram estruturados sob uma ótica
estritamente nacional passam à escala mun- Vive-se um cenário onde iniciativas isoladas
dial, modificando por completo a dinâmica de regulação são percebidas como medidas de
das relações econômicas, financeiras, sociais e contrafluxo e destoantes do modelo predomi-
informativas. A realidade atual já não possui nante das relações internacionais. Ao mesmo
a marca do Estado nacional como figura pro- tempo, parte-se do pressuposto de que a so-
tagonista, condicionadora e, porque não dizer, ciedade internacional compartilha de determi-
limitadora das relações internacionais. As pes- nados valores básicos ligados à noção direitos
soas privadas foram elevadas à categoria de humanos, universalmente difundida e refletida,
sujeitos de Direito Internacional. O fenômeno expressa ou implicitamente, nos instrumentos
da globalização trouxe consequências nas re- internacionais consagrados a partir da Declara-
lações privadas internacionais, dando origem ção Universal dos Direitos Humanos de 1948.

175
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Nesse contexto também está o crime orga- obrigadas têm facilitado e impulsionado a
nizado, o qual, cada vez mais, tem caracterís- atuação das Polícias e Ministérios Públicos.
ticas transnacionais. Para que os Estados pos-
sam dar efetividade aos seus procedimentos A Recomendação n. 26 do GAFI1 determina:
jurídicos, bem como eficazmente combater a
macrocriminalidade, existe a necessidade da Os países deveriam criar uma UIF que
cooperação internacional. As fronteiras, que desempenhe um papel central nacional
antes representavam obstáculos à mobilida- para o recebimento (e se for permitido,
de, passaram a ser usadas como refúgio pelos solicitação), de análises e de divulgação
criminosos, que distribuem geograficamente de Relatórios de Operações Suspeitas e
as suas atividades ilícitas virtualmente sem outras informações relacionadas com a
limites, e isso exige que os Estados cooperem possível lavagem de ativos e financiamento
cada vez mais na investigação e na persecução do terrorismo. A UIF deveria ter acesso,
penal. direta ou indiretamente, e oportunamente,
à informação financeira, administrativa
Diversos textos internacionais, entre os e de fiscalização da lei que necessite
quais a Convenção de Palermo, a Convenção para cumprir apropriadamente com suas
de Viena e a Convenção de Mérida, bem como funções, incluindo análise dos Relatórios
o Grupo de Ação Financeira Internacional de Operações Suspeitas.
(GAFI), recomendam fortemente a cooperação
internacional como forma de atuação dos Es- A fim de dar cumprimento a tal recomenda-
tados no combate ao crime. ção, o Brasil, quando da elaboração da sua lei
contra a lavagem de dinheiro – Lei n. 9.613/1998
A cooperação internacional pode ocorrer –, determinou em seu art. 14 a criação do Con-
em nível de inteligência ou como cooperação selho de Controle de Atividades Financeiras
jurídica. Em nível de inteligência, pode-se citar (COAF). Segundo o art.16 de referido diploma
a troca de informações entre policiais, entre legal, O COAF é composto por servidores pú-
os membros dos Ministérios Públicos e entre blicos de reputação ilibada e reconhecida
as Unidades de Inteligência Financeira (UIF) ou competência, designados em ato do Ministro
outros órgãos administrativos. A cooperação de Estado da Fazenda, dentre os integrantes
jurídica vem se intensificando, e o papel da au- do quadro de pessoal efetivo do Banco Cen-
toridade central vem se consolidando em todo tral do Brasil (BACEN), da Comissão de Valores
o mundo, inclusive no Brasil. Mobiliários (CVM), da Superintendência de Se-
guros Privados (SUSEP), da Procuradoria-Geral
da Fazenda Nacional (PGFN), da Secretaria da
1.1. A cooperação internacional pelas Receita Federal (SRF), de órgão de inteligência
Unidades de Inteligência Financeira
1  As 40 Recomendações do GAFI podem ser
As unidades de inteligência financeira têm encontradas no site <http://www.fatf-gafi.org/
sido muito importantes no combate ao crime media/fatf/documents/FATF%20Standards%20-%20
organizado. As comunicações das pessoas 40%20Recommendations%20rc.pdf>.

176
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

do Poder Executivo, do Departamento de Po- não a possibilidade de ocorrência de lavagem


lícia Federal (DPF), do Ministério das Relações de dinheiro.
Exteriores (MRE) e da Controladoria-Geral da
União (CGU), atendendo, nesses quatro últimos Concluída a análise, se o COAF concluir
casos, à indicação dos respectivos Ministros que não existem indícios de lavagem de di-
de Estado. nheiro, alimenta seus bancos de dados e ar-
quiva a comunicação recebida3. Se concluir
O COAF funciona como uma força-tarefa pela existência de indícios, o COAF deverá co-
permanente, com a participação dos principais municar aos órgãos competentes, geralmente
órgãos governamentais imbuídos do combate a Polícia e o Ministério Público, para realiza-
à lavagem de dinheiro, viabilizando ações rápi- rem a investigação.
das e eficientes na prevenção e repressão ao
delito. O Grupo de Egmont, criado em 1995 por ini-
ciativa das principais UIFs de todo o mundo, é
Conforme orientação do GAFI, o COAF o principal canal internacional de intercâmbio
foi criado para que determinados órgãos de informações e de desenvolvimento institu-
(BACEN, SUSEP, CVM etc.) tenham a obrigação cional entre as unidades de inteligência finan-
de comunicar a ele a ocorrência de qualquer ceira dos países. Sua criação tornou-se neces-
operação suspeita2 ou atípica. Considera- sária para o combate à lavagem de dinheiro,
-se operação suspeita aquelas de valores uma vez que o crime frequentemente é um de-
não usuais para determinados clientes e as lito de natureza transnacional. Tem como ob-
de grande valor realizadas por clientes sem jetivo ampliar e sistematizar o intercâmbio de
grande capacidade financeira, entre outras. informações de inteligência financeira, melho-
rar os conhecimentos técnicos e atividades do
De posse das informações comunicadas pessoal, promover uma melhor comunicação
pelos órgãos mencionados, o COAF deve fa- entre as UIFs por meio da tecnologia e ajudar a
zer uma análise a fim de confirmar ou não os cria-las no mundo todo.
indícios de lavagem de dinheiro. Em referida
análise, o COAF deverá verificar a origem dos
fundos envolvidos na operação, a capacidade 1.2. Cooperação entre
financeira da pessoa denunciada, cruzar as Ministérios Públicos
informações com seus bancos de dados e efe-
tuar outras diligências a fim de confirmar ou A cooperação, como ferramenta da inteli-
gência, também pode ocorrer diretamente en-
tre membros dos Ministérios Públicos. A coo-
2  Importante salientar que o COAF não recebe
peração entre membros do Parquet, em geral,
informações somente das pessoas obrigadas.
Qualquer pessoa que quiser fazer uma denúncia 3  O Banco de Dados do COAF pode ser consultado
sobre lavagem de dinheiro pode procurar o COAF. a qualquer momento pelos outros organismos do
Além disso, o banco de dados do COAF é abastecido poder público. O COAF recebe diversos pedidos de
por outras fontes, como matérias jornalísticas. informações.

177
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

é regulada por meio de memoriais de enten- A cooperação internacional no âmbito


dimento, os quais têm sido utilizados para a da Polícia Federal deve ser coordenada pela
realização de atos mais simplificados e com Coordenação-Geral de Polícia Internacional
menor formalidade. (CGPI), a qual tem por missões principais a
efetivação da cooperação internacional no
O principal objetivo dos memorandos de âmbito da Polícia Federal, a representação da
entendimento firmados entre o Ministério Pú- Polícia Federal no exterior e o fornecimento
blico Federal e as instituições estrangeiras de subsídio ao diretor-geral, demais diretores
congêneres é a intensificação das atividades e coordenadores em temas internacionais
ligadas a possíveis solicitações formais de operacionais e estratégicos.
cooperação jurídica internacional, com o obje-
tivo de possibilitar a troca de informações, no Dentro da estrutura da CGPI, temos a
intuito de combater o crime organizado inter- Interpol Brasil. A Organização Internacional de
nacional de forma mais rápida e eficaz. Polícia Criminal, mundialmente conhecida pela
sigla Interpol4, é uma organização internacional
A colaboração entre os Ministérios Pú- que ajuda na cooperação de polícias de
blicos pode prever, ainda, aprimoramento de diferentes países. Atualmente sua sede é em
operadores do direito, promoção de progra- Lyon, na França, e, de acordo com seu próprio
mas específicos de combate ao crime organi-
zado e realização de estudos e encontros de
4  A Organização Internacional de Polícia Criminal,
coordenação.
mundialmente conhecida pela sua sigla Interpol (em
inglês: International Criminal Police Organization),
A Procuradoria-Geral da República tem é uma organização internacional que ajuda na
memorandos de entendimento firmados com cooperação de polícias de diferentes países. Foi
os Ministérios Públicos dos seguintes países: criada em Viena, na Áustria, no ano de 1923, pelo
Colômbia, Espanha, Itália, Japão, Paraguai, chefe da polícia vienense Johannes Schober, com
Peru, Portugal, Rússia, Ucrânia e Venezuela. a designação de Comissão Internacional de Polícia
Houve, ainda, a troca de cartas para intensi- Criminal. Entre 1938 e 1945 após a anexação da
ficar a cooperação entre o Ministério Público Áustria pelo Terceiro Reich, a organização foi
Federal e as instituições congêneres dos se- comandada por quatro diferentes oficiais nazistas
guintes países: Finlândia, Noruega e Suíça. da SS; Otto Steinhäusl, Reinhard Heydrich, Arthur
Nebe e Ernst Kaltenbrunner, todos eles mortos
durante a II Guerra Mundial ou executados como
criminosos de guerra ao fim do conflito. Hoje sua
1.3. Cooperação policial sede é em Lyon, na França, tendo adotado o nome
atual em 1956, e tem a participação de 190 países.
A cooperação policial pode se dar por A sigla Interpol foi pela primeira vez utilizada em
contatos diretos entre os policiais dos países 1946. Trata-se de uma central de informações para
envolvidos ou por organismos internacionais que as polícias de todo o mundo possam trabalhar
criados com o objetivo de facilitar a coopera- integradas no combate ao crime internacional, o
ção internacional entre as Polícias do mundo. tráfico de drogas e os contrabandos.

178
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

site, conta com 190 países membros5. Sem ganismos internacionais. Diversos documentos
dúvida nenhuma, é a mais importante rede oficiais já foram produzidos, entre os quais po-
de cooperação internacional. O escritório demos citar:
da Interpol-Brasília é responsável por fazer
a ligação entre os policiais brasileiros e os Organização das Nações Unidas (ONU):
policiais estrangeiros através dos escritórios
internacionais da Interpol. • Convenção sobre a Prevenção e Pu-
nição de Crimes Contra Pessoas que
Nesse momento de expansão da atividade Gozam de Proteção Internacional, In-
criminal pelo mundo, é de extrema importân- clusive Agentes Diplomáticos (Nova
cia que nosso país tenha representatividade York, 14.12.1973). Adesão em 7.6.1999.
no exterior. Um bom relacionamento com po- Promulgação: Decreto n. 3.167, de
lícias de outros países é um grande passo para 14.9.1999.
obter informações, e ter um policial brasileiro
trabalhando nesses países facilita o contato. • Convenção Internacional contra a To-
mada de Reféns (Nova York, 18.12.1979).
Percebendo esse momento, nos últimos Ratificação em 7.4.2000. Promulgação:
anos, a Polícia Federal abriu diversas adidâncias Decreto n. 3.517, de 20.6.2000.
no exterior, não só nos países vizinhos mas
também naqueles em que a cooperação é mais • Convenção Internacional para a Su-
constante. Atualmente a Polícia Federal possui pressão de Atentados Terroristas a
adidos nos seguintes países: África do Sul, Bomba (Nova York, 15.12.1997). Ratifica-
Argentina, Bolívia, Colômbia, Estados Unidos, ção em 19.7.2002. Promulgação: Decre-
França, Itália, Paraguai, Peru, Portugal, Reino to n. 4394, de 26.9.2002.
Unido, Suriname e Uruguai.
• Convenção para a Supressão do Finan-
Por sua vez, forças policiais de outros paí- ciamento do Terrorismo (Nova York,
ses possuem adidos no Brasil, como é o caso 9.12.1999). Assinada em 10.11.2001. Ra-
de: África do Sul, Alemanha, Austrália, Canadá, tificação em 16.09.2005. Promulgação:
Colômbia, Dinamarca, Espanha, Estados Uni- Decreto n. 5.640, de 26.12.2005.
dos, França Inglaterra, Itália, Japão, Peru, Por-
tugal e Suíça. Organização da Aviação Civil Internacional
(OACI):

2. Terrorismo • Convenção relativa às Infrações e a


Certos Outros Atos Cometidos a Bordo
O terrorismo internacional sempre foi dis- de Aeronaves (Tóquio, 14.9.1963). Rati-
cutido pelos países internamente ou por or- ficação em 14.4.1970. Promulgação: De-
creto n. 66.520, de 30.4.1970.
5 <http://www.interpol.int/About-INTERPOL/
Overview>.

179
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

• Convenção para a Repressão ao Apo- Agência Internacional de Energia Atômica


deramento Ilícito de Aeronaves (Haia, (AIEA):
16.12.1970). Ratificação em 14.2.1972.
Promulgação: Decreto n. 70.201, de • Convenção sobre a Proteção Física de
24.2.1972. Materiais Nucleares (Viena, 3.3.1979).
Ratificação em 8.2.1987. Promulgação:
• Convenção para a Supressão de Atos Decreto n. 95, de 16.4.1991.
Ilícitos contra a Segurança da Aviação
Civil (Montreal, 23.9.1971). Ratificação Porém, o tema ganhou ainda mais força
em 26.1.1973. Promulgação: Decreto n. após o atentado terrorista perpetrado contra
72.383, de 20.6.1973. as “torres gêmeas” em Nova Iorque, em 9 de
setembro de 2001. A partir de então, a atenção
• Protocolo para a Repressão de Atos Ilí- dos países e dos organismos internacionais se
citos de Violência em Aeroportos que multiplicou. O Grupo de Ação Financeira (GAFI),
Prestem Serviço à Aviação Civil Inter- por exemplo, editou 9 (nove) recomendações
nacional (Montreal, 24.2.1988). Ratifica- especiais que deveriam ser seguidas pelos paí-
ção em 8.6.1997. Promulgação: Decreto ses para combater esse crime6.
n. 2.611, de 2.6.1998.
Costuma-se dizer que os atos praticados
• Convenção sobre a Marcação de Ex- por algumas organizações, tais como IRA7,
plosivos Plásticos para Efeito de De- RAF8, Cartel del Golfo, Al Qaeda, entre outros,
tecção (Montreal, 1.3.1991). Ratificação são atos terroristas. Mas são atos terroristas
em 4.10.2001. Promulgação: Decreto n. baseados em que legislação ou tratado inter-
4.021, de 19.11.2001. nacional?

Organização Marítima Internacional (IMO): Se estudarmos a legislação dos diferentes


países ou dos múltiplos organismos interna-
• Convenção para a Supressão de Atos cionais, constataremos que não existe uma
Ilegais Contra a Segurança da Navega- definição única nem para terrorismo, nem para
ção Marítima (Roma, 10.3.1988 – Con- organizações terroristas. A título de exemplo,
ferência Internacional sob os auspí- citaremos abaixo algumas das definições en-
cios da IMO). Assinada pelo Brasil em contradas.
10.3.1988. Promulgação: Decreto Legis-
lativo n. 2.410/2002. A Convenção de Genebra, escrita no lon-
gínquo ano de 1937, diz que a expressão “atos
• Protocolo para a Supressão de Atos terroristas” quer dizer fatos criminosos dirigi-
Ilegais Contra a Segurança de Plata-
formas Fixas na Plataforma Continen- 6  Posteriormente, as 9 Recomendações Especiais
tal (Roma, 10.3.1988 – Conferência In- relacionadas ao terrorismo foram incorporadas às
ternacional sob os auspícios da IMO). 40 Recomendações do GAFI.
Promulgação: Decreto Legislativo n. 7  Exército Republicano Irlandês.
2.410/2002. 8  Fração do Exército Vermelho.

180
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

dos contra um Estado, e cujo objetivo ou natu- a non-combatant target by sub-national


reza é de provocar o terror em pessoas deter- groups or clandestine state agents, usually
minadas, em grupo de pessoas ou no público. intended to influence an audience10.

O Terrorism Act, da Inglaterra, por sua vez, Por sua vez, o Departamento de Defesa en-
afirma tratar-se de “uma ação ou omissão fatiza os objetivos:
quando o uso ou a ameaça é feito com propó-
sitos políticos, religiosos ou ideológicos”, sen- Terrorism is the calculated use, or
do que tal ação inclui inter alia “séria violência threatened use, of force or violence
contra uma pessoa, sérios danos à proprieda- against individuals or property to coerce or
de” ou cria um “sério risco à saúde ou à segu- intimidate governments or societies, often
rança do público ou de uma parte do público”. to achieve political, religious, or ideological
objectives11.
O Código Penal Francês diz que terroris-
tas são aqueles atos de violência, delimitados Como podemos ver, não há uma definição
como infrações contra uma empresa individual pacífica do que seja terrorismo. Existem, sim,
ou coletiva, que têm por objetivo perturbar a algumas diretivas comuns à maioria dos con-
ordem pública por intimidação ou por terror. ceitos, como a intimidação e o uso da violência.

O próprio EUA, país que atualmente é o E no Brasil, qual a definição de terrorismo


mais combativo às organizações terroristas, ou de atos terroristas? Até os dias atuais não
possui diversas definições. temos qualquer definição legal. O máximo que
temos de referência ao tema está na Lei n.
O Federal Bureau of Investigation (FBI) 7.170/1983, conhecida como Lei de Segurança
define o terrorismo, enfatizando os métodos Nacional, quando no art. 20 fala-se sobre ser
utilizados: crime, entre outras condutas, praticar “atos
de terrorismo” por inconformismo político ou
Terrorism is the unlawful use of force para a obtenção de fundos destinados à ma-
or violence against persons or property nutenção de organizações políticas clandesti-
to intimidate or coerce a government, nas ou subversivas.
the civilian population, or any segment
thereof, in furtherance of political or social A Lei n. 9.613/1998, que trata dos crimes
objectives9. de lavagem de dinheiro e foi posteriormente
alterada pela Lei n. 12.683/2012, trazia em seu
O Departamento de Estado norte-america- artigo primeiro o terrorismo como um crime
no enfatiza os motivos: antecedente ao crime de lavagem de capitais.
Ocorre que esse inciso jamais pôde ser utiliza-
Terrorism is premeditated, politically do por falta de tipificação do crime em nosso
motivated violence perpetrated against ordenamento pátrio.

9  Pynchon-Holms, John Burke, Tom. Terrorism, 10  Title 22 of the U.S. Code, Chapter 38, Section 265.
Pinnacle Books, 1994. 11  DoD Directive 2000.12.

181
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

O Brasil vem sofrendo grande pressão las relacionadas à circulação de recursos pelo
de alguns organismos internacionais para sistema financeiro internacional, bem como
que defina esse crime. O GAFI, por exemplo, a facilidade de locomoção das pessoas pelos
ao avaliar o Brasil, afirmou que o País não diferentes países do globo terrestre, as orga-
cumpre as recomendações relacionadas ao fi- nizações terroristas passaram a ter mais facili-
nanciamento ao terrorismo. Caso o Brasil não dades para praticar os seus atos.
sane essas deficiências nos próximos meses,
corre um risco muito grande de entrar em uma Temos conhecimento de que muitos dos
lista de países não cooperantes no combate à terroristas que tiveram papel importante nos
lavagem de dinheiro e ao terrorismo, o que lhe ataques de 11 de setembro de 2001 às torres
pode resultar dificuldades no sistema finan- gêmeas em Nova Iorque já estavam morando
ceiro internacional. nos Estados Unidos da América muito tempo
antes do dia do atentado.
Por conta disso, existem diversos projetos
de lei tramitando no Congresso Nacional so- Como viviam no próprio país alvo dos
bre o tema, dentre os quais merecem desta- ataques, os terroristas tiveram bastante tem-
que a reforma do Código Penal12 e o Projeto de po e condições para “conhecer o inimigo”,
Lei do Senado n. 499/2013. para entender como funcionava a lógica de
segurança dos EUA, e puderam detectar as
Porém, a efetiva tipificação do terrorismo fragilidades do World Trade Center, situação
em nosso país encontra grande resistência de determinante para a escolha do local dos ata-
uma parte da sociedade. Dois são os principais ques. Além disso, os pilotos dos aviões foram
motivos apontados. O primeiro é no sentido de treinados no próprio EUA, quando realizaram
que em nosso país não são praticados atos ter- curso de pilotos como qualquer outra pessoa
roristas e a tipificação do crime pode funcio- poderia fazer.
nar como um estimulador a sua pratica. Esse
argumento vai na lógica psicológica de que os As facilidades de movimentação de re-
indivíduos gostam de fazer o que é proibido. Já cursos pelo sistema financeiro internacional
o segundo motivo relaciona-se com os movi- permitiram que recursos fossem enviados de
mentos sociais, os quais temem que qualquer diversos países para dentro dos EUA, sem
que seja a tipificação dada ao terrorismo, seus serem detectadas como suspeitos, para que
atos poderiam ser “encaixados” no tipo penal. as despesas do atentado terrorista fossem
pagas.

3. A cooperação internacional Assim, verificamos que o terrorismo é um


crime que geralmente tem consequências em
e o terrorismo diversos países. Muitas vezes, os atos terroris-
tas são “preparados” em um país, financiados
Considerando todas as facilidades trazidas em outro e praticados em um terceiro. Assim,
pela globalização mundial, em especial aque- faz-se necessária a cooperação entre os paí-
ses para o efetivo combate a esse crime.
12  Projeto de Lei do Senado n. 236/2012.

182
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Conforme vimos acima, os países podem Quando falamos de cooperação jurídi-


cooperar de forma direta, buscando obter ca, aquela realizada por meio de autoridades
uma mera troca de informações, por meio centrais para utilização de documentos e/ou
das unidades de inteligência financeira, das informações em processos judiciais, o núme-
Polícias e/ou dos Ministérios Públicos, por ro de pedidos que envolvem o Brasil é muito
exemplo, ou, caso seja necessária a instrução pequeno. Desde 2003, ano em que foi criado
de um processo judicial, mediante cooperação o Departamento de Recuperação de Ativos e
jurídica internacional. Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), foram
tramitados apenas 3 pedidos de cooperação.
Outra forma de cooperação muito utili-
zada nos dias atuais é o treinamento ofereci- O primeiro deles foi oriundo da Argentina,
do por alguns países com maior expertise no país que sofreu um ataque terrorista a um de
assunto para outros com menos experiência. seus hotéis. O pedido tinha por objetivo con-
Diversos policiais brasileiros, por exemplo, firmar o local de residência de alguns suspei-
foram treinados pelo FBI, seja em seminários tos, bem como confirmar suas atividades co-
rápidos, seja em cursos mais longos como na merciais, com o objetivo de verificar possível
National Academy. financiamento ao ato terrorista.

Os objetivos principais da cooperação O segundo pedido, oriundo da Colôm-


internacional, quando falamos do crime em bia, objetivou, entre outras coisas, identificar
geral, são a produção de atos processuais, a quem seriam os responsáveis por uma gráfica
obtenção de provas em outros países e a re- que teria feito publicações (revista e livro) re-
tirada dos bens dos criminosos. Porém, quan- ferentes às FARC.
do falamos especificamente do terrorismo, o
principal objetivo é evitar que aconteçam atos Por sua vez, o terceiro e último pedido,
terroristas. Busca-se, também, a desarticula- também oriundo da Colômbia, buscou infor-
ção das organizações, seja por sua descapita- mações financeiras sobre determinada pessoa,
lização, seja pela prisão de seus membros. que estaria financiando atividades da organi-
zação supramencionada.
No Brasil, quando falamos de terrorismo,
sem dúvida, a maior parte da cooperação in-
ternacional é feita pela Polícia Federal. Além 3.1. Congelamento administrativo de
da Coordenação-Geral de Polícia Internacio- bens das organizações terroristas
nal, temos, dentro da estrutura da Diretoria de
Inteligência Policial, a Divisão de Repressão ao A Resolução n. 1373 do Conselho de Segu-
Terrorismo. As trocas de informações entre es- rança da ONU diz que
sas duas áreas da Polícia Federal e policiais de
outros países é constante, e objetiva não só a Os Estados devem suprimir o financiamento
prevenção do terrorismo em nosso país como de atos terroristas, criminalizar todo
também evitar que as organizações terroristas tipo de financiamento ao terrorismo,
pratiquem nele atividades comerciais, as quais congelar fundos relacionados a atividades
possam financiar futuros atos de terror. terroristas, negar proteção àqueles que

183
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

financiam, planejam, apoiem ou cometam tal solicitação foi encaminhada para a Advo-
atos terroristas. cacia-Geral da União, a qual propôs uma Ação
Ordinária de Cumprimento de Obrigação de
Por sua vez, a Recomendação Especial III13 Fazer. O magistrado acolheu o pedido da AGU,
do GAFI afirma: afirmando em sua decisão que o congelamen-
to dos ativos destina-se a suprimir as fontes
Cada país deveria implementar medidas financeiras que pudessem contribuir para o ar-
para congelar sem demora fundos ou mamento, o desrespeito aos direitos humanos
outros ativos de terroristas, daqueles e a utilização de violência contra civis.
que financiam terroristas e organizações
terroristas, de acordo com as resoluções A fim de se alinhar às tendências interna-
das Nações Unidas relacionadas à cionais, o Brasil, por meio da ENCCLA, elaborou
prevenção e supressão do financiamento um anteprojeto de lei que visa possibilitar o
de atos terroristas. congelamento administrativo de bens, basea-
do apenas nas resoluções do Conselho de Se-
O Brasil não é um país preferencial para o gurança da ONU, não sendo necessário a inter-
destino dos bens das organizações que prati- venção do Poder Judiciário.
cam atos de terrorismo. Porém, no ano de 2011,
tivemos um caso interessante. As resoluções Vale ressaltar que esse anteprojeto de lei
n. 1971 e n. 1973 do Conselho de Segurança da já sofre críticas no sentido de que o direito à
ONU14 determinam o embargo dos ativos des- propriedade é garantido pela Constituição Fe-
tinados ao governo da Líbia com o objetivo de deral de 1988, e sua privação não poderia ser
cessar os financiamentos aos armamentos, ao feita sem uma decisão judicial devidamente
desrespeito aos direitos humanos e à violência fundamentada.
contra a sociedade civil.

Autoridades financeiras do Brasil desco-


briram que existiam ações de uma instituição Referências
financeira ligada ao governo líbio custodia-
das em instituição financeira brasileira. Como
o Brasil não dispõe de uma legislação que BALTAZAR JR., José Paulo. Crime organizado
permite o bloqueio administrativo de bens, e proibição de insuficiência. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2010.
13  Apesar de as 9 recomendações especiais do GAFI
relacionadas ao terrorismo terem sido incorporadas BASEDOW, Jurgen. The Communitarization
às 40 Recomendações “normais”, a avaliação pela of the Conflict of Laws under the Treaty of
qual passa o Brasil nos dias atuais ainda verifica o Amsterdam. Common Market Law Review, v. 37,
cumprimento dos enunciados das 9 recomendações n. 3, p. 687-708, 2000.
especiais.
14  A Resolução n. 1971 foi internalizada pelo Brasil CALLEGARI, Luís André (Org.). Controle social
por meio do Decreto n. 7.460/2011, e a 1973, pelo e criminalidade organizada. Crime organizado:
Decreto n. 7.527/2011.

184
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

tipicidade – política criminal – investigação e LOULA, Maria Rosa Guimarães. Auxílio


processo: Brasil, Espanha e Colômbia. Porto direto: novo instrumento de cooperação
Alegre: Livraria do Advogado, 2008. jurídica internacional civil. Belo Horizonte:
Fórum, 2010.
CERVINI, Raul. Tóxicos: criminalidad
organizada, su dimension economica. In: MENDRONI, Marcelo B. Crime organizado
PENTEADO, Jacques de Camargo (Coord.). O – aspectos gerais e mecanismos legais. São
crime organizado Itália e Brasil. A modernização Paulo: Atlas, 2007.
da lei penal. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1995. NAÍM, Moisés. Ilícito – o ataque da pirataria,
da lavagem de dinheiro e do tráfico à economia
CUNNINGHAM, David. There is something global. Trad. Sérgio Lopes. Rio de Janeiro: Jorge
happening here: the newleft, the klan, and FBI Zahar, 2006.
counterintelligence. University of California,
2005. REZEK, Francisco. “Nova ordem” e crise
do direito internacional. In: TEIXEIRA, Maria
FERNANDES, Antônio Scarance. O conceito Elizabeth Guimarães; PETERSEN, Callado Fadul
de crime organizado na Lei 9.034. Boletim (Coords.); MEYER-PFLUG, Samanta Ribeiro
IBCCRIM, v. 31, p. 3, jul. 1995. (Colab.). Coletâneas de Estudos Jurídicos.
Brasília: Superior Tribunal Militar, 2008.
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-%2040%20Recommendations%20rc.pdf>.
Acesso em: out. 2015.

HORGAN, John. Psychology of terrorism.


Rutledge Press, 2005.

ISBARROLA, Alexandre da Silveira. Os


sistemas alternativos de remessa de fundos
no Brasil e sua relação com o crime de
lavagem de dinheiro. Disponível em: <http://
cnj.jus.br/dpj/cji/bitstream/26501/1403/1/
Tese_Sistemas%20alternativos%20de%20
remessas%20de%20 fundos.pdf >. Acesso
em: 20 maio 2010; ou disponível em: <http://
w w w.dominiopublico.g ov. br/p e s quis a/
PesquisaObraForm.do?select_action=&co_
autor=29471>. Acesso em: 12 out. 2015.

185
O terrorismo no Direito Internacional
e comparado*

*  Artigo escrito a partir de apresentação no Seminário Internacional Terrorismo e Outras Situações de


Emergência, promovido pela PGR e pela ESMPU, em Brasília, de 7 a 9 de abril de 2014.

VLADIMIR ARAS1 frequente, travada unilateralmente por aquele


Procurador Regional da República país em vários pontos do Oriente Médio.
(MPF/PRR-1) A Global War on Terror (GWOT) iniciada no
governo de George Bush surgiu como resposta
à internacionalização do terrorismo de tipo
Introdução jihadista. Mas os ataques têm-se intensificado
ao longo dos anos.

Não é mais novidade o fato de que o ter- As cruéis ações da Al Qaeda e do Estado
rorismo é uma ameaça global que ignora fron- Islâmico dominam os noticiários dos últimos
teiras nacionais e desrespeita os direitos hu- anos. Entes terroristas satélites, como a Al
manos e o patrimônio cultural da humanidade. Qaeda da Península Arábica (AQAP) ou o Boko
A era do terrorismo transnacional se firmou e Haram, da Nigéria, ganham manchetes cada
será difícil superá-la, apesar dos esforços da vez mais sangrentas.
comunidade internacional.
Antigas organizações tachadas de terroris-
Desde os atentados de 11 de setembro de tas, como a Organização para a Libertação da
2001, instalou-se uma guerra mundial contra o Palestina (OLP) e a Pátria Basca e Liberdade
terrorismo, capitaneada pelos Estados Unidos, (ETA), depuseram suas armas como resultado
ora sob os auspícios da ONU, ora sob o pálio da distensão política e de negociações inter-
da OTAN; mas outras vezes, o que é mais nacionais. Foi também o caso do Sendero Lu-
minoso e do Irish Republican Army (IRA). Outras
1 Professor assistente de Processo Penal da entidades que são consideradas terroristas
UFBA. Secretário de Cooperação Internacional da por certos países, como as Forças Armadas
PGR. Membro fundador do Instituto Baiano de Revolucionárias da Colômbia (FARC), estão em
Direito Processual Penal. Editor do Blog do Vlad avançado processo de negociação para a paz.
(Temas de Justiça criminal, direitos humanos,
lavagem de dinheiro, crime organizado, cooperação Porém, o aumento das tensões na África,
internacional, segurança pública etc.). Fez cursos no Oriente Médio e na Ásia, a fragilidade dos
sobre o Regime Global Antiterror (DiploFoundation
governos locais, a falta de democracia e o sub-
- Chipre), lavagem de dinheiro (PNLD/ENCCLA/MJ -
desenvolvimento contribuem para o recrudes-
Brasília), Convenção de Mérida (UNAFEI/JICA - Japão)
e reforma processual latinoamericana (CEJA - Chile).
cimento do terrorismo de fundo religioso ou
Mestre em Direito Público (UFPE). sectário, que é alimentado por interpretações

187
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

deturpadas do Corão e pela presença militar (terrorist financing) e à proliferação de armas


de nações ocidentais, sobretudo os Estados de destruição em massa (weapons of mass
Unidos, em países muçulmanos. destruction/proliferation financing).

Na última década, os riscos de atentados Considerado este contexto, o presente ar-


aumentaram no Ocidente devido à dispersão tigo busca identificar os instrumentos jurídicos
da ameaça dos lobos solitários, que atuam desenvolvidos pela comunidade das nações,
movidos por sentimentos individuais de para fazer frente ao fenômeno do terrorismo
impertinência ou por estratégias bem moderno, e a posição do Brasil como Estado
montadas de entidades criminosas voltadas Parte da ONU, membro do GAFI e signatário de
para a inoculação de células terroristas em mais uma dezena de tratados internacionais
países-alvo e que permanecem dormentes até antiterrorismo, tendo como foco a cooperação
o momento-chave. internacional em matéria penal.

Um outro elemento complicador se


mostrou presente, o surgimento dos 2. O fenômeno do terrorismo
combatentes terroristas estrangeiros (foreign
terrorist fighters), que exige providências
normativas específicas. A situação é É difícil definir terrorismo. Não existe
de tal modo preocupante que nações consenso em parte alguma sobre a melhor
democráticas se mobilizaram para organizar conceituação ou sobre a tipificação ideal
um arcabouço mais rigoroso de medidas de desta complexa conduta. Sequer existe uma
contratrerrorismo, como o rastreamento e convenção internacional única sobre o tema,
bloqueio de ativos de pessoas e entidades que hoje é objeto de mais de uma dezena de
listadas, a criminalização do financiamento tratados internacionais setoriais, promovidos
ao terrorismo em todas as suas formas, a por distintos organismos internacionais,
utilização de técnicas de investigação em como a Organização das Nações Unidas
modo preemptivo, assim como o emprego (ONU), a Agência Internacional de Energia
de cautelares destinadas a impedir que Atômica (AIEA), a Organização de Aviação Civil
cidadãos locais saiam dos seus países (travel Internacional (OACI) e a Organização Marítima
ban) para se engajar na jihad no exterior ou Internacional (OMI).
tomar parte em combates liderados pelo
Estado Islâmico. Tais cautelares permitem, Devido aos aspectos sociais, históricos,
por exemplo, a cassação de passaportes e, econômicos e políticos que marcam esse fe-
no plano substantivo, criam-se novas figuras nômeno, talvez seja inútil tentar conceituá-lo
delitivas relacionadas ao terrorismo, além de com precisão. O terrorista de hoje pode ser
fortalecer-se o regime de sanções das Nações visto como um libertador amanhã. O revolu-
Unidas e o arcabouço de recomendações cionário de ontem poderia ser visto como um
do Grupo de Ação Financeira Internacional terrorista hoje, notadamente quando se têm
(GAFI) contra a lavagem de dinheiro (money em mira as guerras de libertação nacional e os
laundering), o financiamento do terrorismo movimentos insurgentes no seio de ditaduras.

188
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Essa dificuldade conceitual se revela so- dos ataques a alvos civis reside em
bretudo na definição do terrorismo domés- interpretações equivocadas de escrituras
tico de cunho nacionalista ou secessionista, religiosas, notadamente o Corão;
que pode ser categorizado como insurreição,
e é menos presente no chamado terrorismo d) narcoterrorismo: forma de terror
internacional, de beligerância, nas chamadas empregada por organizações criminosas
guerras assimétricas ou irregulares, em que especializadas em narcotráfico, que
a conflagração se dá entre Estados nacionais empregam a violência em massa, ataques
e entidades designadas como terroristas, fora à população civil e a intimidação das
do modelo convencional de guerra ou das forças de segurança de determinado país,
guerras de guerrilha. para dominação territorial, manutenção
de mercados e de suprimentos para suas
Como a busca de definição perfeita é uma atividades ilícitas;
tarefa inglória, mais fácil classificar o terro-
rismo em grandes categorias não estanques. e) ciberterrorismo: emprego das tecnologias
Tendemos a simplificar o complexo quadro da comunicação e da informação para
existente e, sem pretensão de absoluta preci- ataques cibernéticos, com vistas à
são, optamos por estabelecer cinco grupos de paralisação de serviços baseados em
atividades terroristas: aplicações informáticas e à desabilitação
de infraestruturas críticas, quando tal
a) terrorismo político: de insurreição, de emprego se relaciona ao ativismo digital
insurgência ou de libertação nacional, ou “hacktivismo”, mas também quando
empregado por partidos ou agremiações visto como modus operandi das entidades
políticas clandestinas ou não, com vistas incluídas nas categorias anteriores. Quando
à secessão, ou à independência, ao fim do esses meios são usados por Estados,
domínio colonial, ou à autonomia regional confunde-se com o conceito de cyberwar.
ou à mudança de formas de Estado e
regimes de governo; Os atentados terroristas mais impactantes
das últimas décadas tiveram fundo religioso
b) terrorismo de Estado: repressão violenta, ou alguma relação com ideias de afirmação
orientada e indiscriminada praticada pelo nacional vinculadas a deturpações de lições
governo contra seus próprios cidadãos, do islamismo. O ataque às torres gêmeas em
tidos como opositores ou subversivos, com Nova York e ao Pentágono em Washington
vistas à manutenção do status quo e à prisão (2001), o atentado em Bali na Indonésia (2002),
ou eliminação de dissidentes mediante o atentado da estação de Atocha em Madri
execuções sumárias e desaparecimento (2004), o ataque à escola de Breslan por ter-
forçado de pessoas; roristas chechenos (2004), o fuzilamento de
jornalistas do Charlie Hebdo em Paris (2015),
c) terrorismo religioso ou sectário: forma as execuções cinematográficas de reféns pelo
de expressão violenta, notadamente contra Estado Islâmico (2014-2015) e os sequestros
interesses ocidentais, na qual a motivação em massa protagonizados pelo Boko Haram na

189
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Nigéria (2014) são exemplos aterrorizantes do que pregava contra o “multiculturalismo”. Extre-
que tais organizações violentas podem fazer. mistas de direita também promoveram ataques
Violações de direitos humanos em larga escala nos Estados Unidos em 1995, ceifando a vida
passaram a ser a tônica dos terroristas moder- de 166 pessoas no atentado ao prédio federal
nos. A destruição de milenares patrimônios da de Oklahoma City. Extremistas há em qualquer
humanidade aumenta o horror2. país, independentemente de religiões.

Reclamados por organizações terroristas Em sua Declaração sobre a Colaboração


que dizem professar o islamismo – mas que Público-Privada na Luta contra o Terrorismo,
em verdade deturpam os ensinamentos do aprovada em 2010 na cidade de Washington,
profeta Mohammed –, tais ataques também o Comitê Interamericano contra o Terrorismo
têm motivações políticas, na medida em que (CICTE) da Organização dos Estados America-
pretendem forçar Estados ou organizações nos (OEA) assevera que
internacionais a uma ação ou uma omissão.
As reinvindicações vão desde a desocupação a ameaça do terrorismo é agravada
territorial à libertação de prisioneiros. São ins- quando existem conexões entre o
piradas pela repulsa ao modo de vida ociden- terrorismo e o tráfico ilícito de drogas,
tal e pela rejeição a ocupações estrangeiras, o tráfico ilícito de armas, a lavagem de
especificamente a presença de tropas ame- dinheiro e outras formas de criminalidade
ricanas e europeias, e à influência da cultura organizada transnacional, e que tais atos
ocidental em países muçulmanos. ilícitos podem ser utilizados para apoiar e
financiar atividades terroristas.
Marcados pela tensão Oriente-Ocidente,
entram na lista dos piores atentados da his- O CICTE externou sua preocupação de que
tória a derrubada do voo 103 da PanAm sobre eventos de grande porte, “tais como encontros
Lockerbie, na Escócia, em 1987; os atentados desportivos, econômicos, culturais e políticos,
de Mumbai, na Índia, em 1993; o carro bomba bem como centros comerciais e empresariais,
lançado sobre a sede da AMIA em Buenos Ai- instalações turísticas, infraestrutura crítica de
res em 1994; e um sem número de ataques no transportes e serviços públicos, entre outros,
Iraque ocupado por forças americanas após a podem ser alvos de atos terroristas”.
Guerra do Golfo.
Conforme o item 11 dessa declaração, de-
Todavia, há o outro lado da moeda e não se vem os Estados-Membros da OEA assumir o
pode esquecer eventos como o atentado prati- compromisso de
cado em 2011, em Oslo e na ilha de Utoya, pelo
cidadão norueguês islamófobo Anders Breivik, adotar medidas para fortalecer os
mecanismos de cooperação internacional,
2  Como se viu em Mossul, Iraque (2015), em ataques especialmente no nível hemisférico,
do Estado Islâmico, que arrasou a antiga cidade incluindo a aplicação da extradição e da
assíria de Nimrud, ou na destruição, pelos Talibãs, assistência jurídica mútua, bem como
dos Budas de Bamyan (2001), que ficavam na região o intercâmbio de informação, incluindo
central do Afeganistão. informação financeira, em conformidade

190
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

com sua legislação interna, a fim de deter, secução criminal de crimes graves no âmbito
negar proteção e levar à justiça qualquer doméstico e no contexto transnacional.
pessoa que apoie ou facilite o financiamento,
planejamento, preparação ou cometimento Tais regimes jurídicos uniformes resultam
de atos de terrorismo ou a facilitação de do arcabouço convencional, derivado de trata-
refúgio seguro ou que participe ou tente dos específicos que têm os seguintes objetos:
participar dessas atividades. a criminalização global, no plano nacional, de
determinadas espécies criminais; a previsão
No âmbito mais geral, a Resolução n. 1373 nas leis domésticas de técnicas avançadas de
(2001) do Conselho de Segurança das Nações investigação criminal; e a observância do prin-
Unidas, aprovada pelo Decreto n. 3.976/2001, cípio da continuidade jurídica internacional
das jurisdições nacionais, no tocante à possi-
ressalta com preocupação a estreita bilidade, em qualquer parte, da busca transna-
ligação entre o terrorismo internacional cional de provas, de ativos e de suspeitos, um
e o crime organizado transnacional, o dos modos pelos quais se manifesta a ideia de
narcotráfico, a lavagem de dinheiro, o justiça penal universal.
contrabando de materiais nucleares,
químicos, biológicos e outros materiais Aos tratados que compõem esse micros-
potencialmente mortíferos, e, nesse sistema jurídico juntam-se as resoluções do
sentido, enfatiza a necessidade de Conselho de Segurança das Nações Unidas so-
incrementar a coordenação de esforços bre terrorismo e as 40 recomendações do GAFI,
nos níveis nacional, sub-regional, regional conformando o regime global antiterrorismo.
e internacional de modo a fortalecer
uma reação global a essa séria ameaça e Esquematicamente, podemos apontar a
desafio à segurança internacional. existência de ao menos onze regimes globais
de proibição, que foram construídos univer-
Tais declarações de princípios dessas duas salmente, ao longo do século XIX e do sécu-
organizações de que o Brasil faz parte mostram lo XX, paralelamente aos regimes regionais e
que a luta contra o terrorismo depende do es- universais de proteção aos direitos humanos.
forço mundial contra a criminalidade organiza- Enquanto estes têm conteúdo marcadamente
da – para o rompimento das sinergias hoje veri- de proteção a direitos fundamentais, aqueles
ficadas – e o aperfeiçoamento dos modelos de se prestam à veiculação de mandados expres-
cooperação internacional policial e jurídica. sos de criminalização de condutas conside-
radas graves e de uniformização universal de
procedimentos de extração processual penal.
3. O regime global antiterrorismo São eles:

a) regime global contra o tráfico de


Regimes globais de proibição são grandes pessoas: baseado numa série de tratados
modelos de harmonização de leis penais e dos séculos XIX e XX sobre a proibição do
de promoção de uniformização de técnicas e tráfico de escravos e do tráfico de mulheres
medidas especiais de investigação para a per- brancas, este regime de proibição agora é

191
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

fundamentalmente baseado no Protocolo Endangered Species of Wild Fauna and


à Convenção das Nações Unidas contra o Flora (CITES), concluída em Washington em
Crime Organizado (Convenção de Palermo 1973, no tocante a espécies da fauna e flora
de 2000, ou UNTOC) para Repressão ao ameaçadas de extinção;
Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres
e Crianças (trata de personas ou human e) regime global contra a pirataria
trafficking) e no Protocolo contra o Tráfico marítima: criminalização fundada na
de Migrantes (tráfico ilícito de migrantes Convenção das Nações Unidas sobre Direito
ou migrant smuggling); do Mar (UNCLOS), de 1982 (Convenção de
Montego Bay), na Resolução 1.897 (2009),
b) regime global contra o tráfico de do Conselho de Segurança das Nações
drogas: fundado na Convenção Única sobre Unidas, e noutros textos internacionais;
Entorpecentes de 1961 e na Convenção
das Nações Unidas contra o Narcotráfico f) regime global contra o crime
(Convenção de Viena de 1988), é o organizado transnacional: a associação
subsistema jurídico que influenciou grande em organização criminosa tornou-se
parte das convenções criminais mais objeto de regime próprio em 2000, com
modernas e, ao mesmo tempo, o modelo a Convenção das Nações Unidas contra o
que mais sofre críticas por supostamente Crime Organizado e seus três protocolos
promover uma abordagem belicista ou sobre tráfico de pessoas, de migrantes e
criminalizante do problema das drogas; de armas de fogo;

c) regime global contra o tráfico de armas: g) regime global contra a lavagem de


baseado no terceiro Protocolo à Convenção dinheiro: tratados regionais e globais, a
das Nações Unidas contra o Crime exemplo da Convenção de Palermo (UNTOC)
Organizado (Convenção de Palermo de e da Convenção de Mérida (UNCAC),
2000) sobre tráfico de armas, suas partes preveem a criminalização da lavagem de
e munições, na Convenção Interamericana dinheiro e determinam a implantação de
contra a Fabricação e o Tráfico Ilícito medidas para sua detecção e bloqueio e
de Armas de Fogo (CIFTA) de 1997, e na confisco de ativos;
Convenção contra o Tráfico de Armas
Convencionais ou Arms Trade Treaty (ATT) h) regime global contra a corrupção: a
de 2012, que restringe a comercialização criminalização da corrupção, do peculato
de tanques, blindados, helicópteros de e do suborno (este como corrupção no
ataque, sistemas de artilharia de grande setor privado) está prevista na Convenção
calibre, mísseis, lançadores etc.; das Nações Unidas contra a Corrupção
(Convenção de Mérida de 2003), na
d) regime global contra o tráfico de Convenção Interamericana contra a
espécies ameaçadas: essa modalidade Corrupção (Convenção de Caracas de
de tráfico é proibida notadamente pela 1997) e na Convenção da Organização
Convention on International Trade in para a Cooperação e o Desenvolvimento

192
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Econômico (OCDE) sobre Corrupção de k) regime global contra o terrorismo: o


Funcionários Públicos Estrangeiros em mais complexo dos regimes, formado a
Transações Comerciais Internacionais; partir de 1963, por mais de uma dezena
de tratados da Organização dos Estados
i) regime global contra a Americanos, da União Africana, da Liga dos
cibercriminalidade: a Convenção do Estados Árabes, do Conselho da Europa, da
Conselho da Europa de 2001 (Convenção de Organização de Aviação Civil Internacional,
Budapeste) é o primeiro texto convencional da Organização Marítima Internacional, da
para a criminalização e a persecução Agência Internacional de Energia Atômica
transnacional de cibercrimes, sejam eles e da Organização das Nações Unidas, com
computer-based crimes ou computer disposições variadas de direito penal e
crimes. Este regime global ainda está em processual penal, com inserção setorial,
construção, sendo formado ainda pelo e complementado por resoluções do
“Convenio Iberoamericano de Cooperación Conselho de Segurança da ONU e por
sobre Investigación, Aseguramiento recomendações do GAFI.
y Obtención de Prueba en materia de
Ciberdelincuencia“, da Conferência dos A respeito do último dos modelos listados,
Ministros da Justiça Iberoamericanos em 2006, a ONU começou a implantar uma es-
(COMJIB), concluído em 2014. A ONU discute tratégia mundial contra o terrorismo. Chama-
a aprovação de um tratado global sobre o da de UN Global Counter-Terrorism Strategy,
tema, posição defendida pelo Brasil; foi adotada por unanimidade pela Assembleia
Geral da organização, na forma de uma resolu-
j) regime global para a repressão dos ção (A/RES/60/288) e um plano de ação, tendo
crimes de guerra e contra a humanidade: como objetivo aperfeiçoar a resposta global
essas infrações penais têm dúplice inserção ao fenômeno terrorista.
– tanto na legislação doméstica quanto
na legislação de direito internacional O plano de ação condena o terrorismo em
penal. O regime é formado basicamente todas as suas formas e prevê o estabelecimen-
pelas quatro convenções de Genebra to de medidas para enfrentar as condições fa-
de 1949 sobre conflitos armados e seus voráveis à propagação do terrorismo e para
protocolos, pela Convenção Internacional reforçar a capacidade individual e coletiva dos
para a Proteção de Todas as Pessoas Estados e da ONU para combater o terrorismo,
contra Desaparecimentos Forçados (2006), sem prejuízo da proteção dos direitos huma-
pela Convenção Interamericana sobre o nos e da defesa do Estado de Direito. Entre tais
Desaparecimento Forçado de Pessoas medidas, pretende-se encontrar meios de en-
(Convenção de Belém do Pará, de 1994), frentar a ameaça crescente da utilização da In-
pela Convenção para a Prevenção e ternet por terroristas; modernizar os sistemas
Repressão do Crime de Genocídio de 1948, de controle fronteiriço, a fim de impedir as via-
e pelo Tratado Constitutivo do Tribunal gens de terroristas e a circulação de materiais
Penal Internacional (Estatuto de Roma de ilícitos; e melhorar a cooperação para a pre-
1998);

193
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

venção e a repressão da lavagem de dinheiro e 1. tratados sobre segurança de


do financiamento do terrorismo. diplomatas e outras pessoas
especialmente protegidas;
Como ponto digno de nota, a estratégia
da ONU de 2006 afirma que o terrorismo não 2. tratados sobre segurança marítima e
pode nem dever ser associado a qualquer re- plataformas de petróleo;
ligião, nacionalidade, civilização ou grupo ét-
nico. Adicionalmente, a resolução conclama os 3. tratado sobre a segurança de material
Estados-Membros a não se tornarem paraísos nuclear;
financeiros (tax havens) ou operacionais para
terroristas e a implantarem o princípio “extra- 4. tratado sobre a segurança da aviação
ditar ou julgar”3. civil e aeroportos;

Por fim, no âmbito da Estratégia da ONU 5. tratado sobre a tomada de reféns;


de 2006, pretende-se concluir uma conven-
ção mundial abrangente sobre terrorismo 6. tratado sobre o controle de explosivos
internacional. e supressão de atentados a bomba;

7. tratado sobre o financiamento do


4. Abrangência do regime terrorismo; e

antiterrorismo 8. tratado sobre controle de armas


convencionais.
Na perspectiva brasileira, o regime uni-
versal contra o terrorismo e seu financiamen- Tal esquema foi montado ao longo dos
to compõe-se de catorze tratados globais, anos pela Organização de Aviação Civil Inter-
firmados entre 1963 e 2012, e três conven- nacional (OACI/ICAO), pela Organização dos
ções interamericanas, concluídas entre 1971 Estados Americanos (OEA/OAS), pela Agência
e 2002, além das recomendações do GAFI e Internacional de Energia Atômica (AIEA/IAEA),
resoluções do Conselho de Segurança das pela Organização Marítima Internacional (OMI/
Nações Unidas. IMO) e pelas Nações Unidas (ONU/UNO).

Esquematicamente, esses documentos Não há um texto abrangente e universal


internacionais compreendem as seguintes sobre o tema. A Convention pour la prévention
categorias: et de la répression du terrorisme ou Convention
for the Prevention and Punishment of Terrorism
(Convenção de Genebra de 1937), patrocinada
3  United Nations Global Counter-Terrorism pela Liga das Nações, nunca entrou em vigor.
Strategy. Disponível em: <http://www.un.org/
en/terrorism/strategy-counter-terrorism.shtml>. No plano regional europeu, há também a
Acesso em: 4 mar. 2015. Convenção do Conselho da Europa Relativa ao

194
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Branqueamento, Detecção, Apreensão e Con- Tal lista não é completa, servindo apenas
fisco de Produtos do Crime e ao Financiamen- para revelar a preocupação global com o pro-
to do Terrorismo (Convenção de Varsóvia de blema do terrorismo, devido à forma insidiosa
2005), conhecida como CETS 198. e violenta pela qual se manifesta.

Outras organizações regionais instituíram


seus próprios arcabouços convencionais, tanto 5. Estrutura das convenções
na África quanto na Ásia, Europa e América, a
saber:
antiterrorismo

a) Convenção Árabe para a Supressão do Formadas por regras de harmonização tí-


Terrorismo da Liga dos Estados Árabes, pica e uniformização processual, os textos in-
assinada no Cairo, em 1998; ternacionais do regime global antiterrorismo
também contêm dispositivos de cooperação
b) Convenção da Organização da internacional.
Conferência Islâmica para Combater o
Terrorismo Internacional, adotada em 1999 Em suma, os Estados-Partes se obrigam a
na cidade de Ouagadougou; cumprir ou instituir:

c) Convenção Europeia para a Supressão 1) mandados expressos de criminalização


do Terrorismo, concluída em Estrasburgo para:
em 1997. a) tipificar certas condutas como atos
terroristas;
d) Convenção Interamericana contra o
b) tipificar o financiamento do terrorismo;
Terrorismo, concluída em Barbados em
2002; c) tipificar a lavagem de dinheiro relacionada
ao financiamento do terrorismo;
e) Convenção da União Africana para a
Prevenção e o Combate ao Terrorismo, 2) regras de flexibilização do sigilo bancá-
adotada em Argel em 1999; rio e financeiro;

f) Convenção Regional da Associação do 3) regras sobre técnicas especiais de in-


Sudeste Asiático para cooperação Regional vestigação;
para a Supressão do Terrorismo, assinada
em Katmandu em 1987; 4) regras subsidiárias de cooperação inter-
nacional.
g) Tratado de Cooperação entre os
Estados-Membros da Comunidade dos Eis as 14 convenções globais antiterrorismo
Estados Independentes para Combater o e seus protocolos. A elas se soma também o
Terrorismo, assinada em Minsk em 1999. ATT (Arms Trade Treaty, de 2013), que ainda não
está em vigor para o Brasil.

195
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

NOME NOME ASSINADA EM DECRETO


EM INGLÊS EM PORTUGUÊS FEDERAL

1963 Convention on Offences and Convenção sobre Infrações e Certos


Certain Other Acts Committed Outros Atos Praticados a Bordo de Tóquio Decreto n.
On Board Aircraft Aeronaves (1963) 86.520/1970
(Aircraft Convention)

1970 Convention for the Suppression Convenção para a Repressão ao


of Unlawful Seizure of Aircraft Apoderamento Ilícito de Aeronaves – Montreal Decreto n.
(Unlawful Seizure Convention) feita na Haia, (1970) 70.201/1972
em 16 de dezembro 1970.

2010 Protocol Supplementary to the


Convention for the Suppression of - Pequim -
Unlawful Seizure of Aircraft (2010)

1971 Convention for the Suppression Convenção para a Repressão aos Atos
of Unlawful Acts against the Ilícitos contra a Segurança da Aviação Montreal Decreto n.
Safety of Civil Aviation Civil – feita em Montreal, (1971) 72.363/1973
(Civil Aviation Convention) em 23 de setembro de 1971.

Convenção sobre a Prevenção e


1973 Convention on the Prevention Punição de Crimes contra Pessoas
and Punishment of Crimes Against que Gozam de Proteção Internacional, Nova York Decreto n.
Internationally Protected Persons inclusive Agentes Diplomáticos – (1973) 3.167/1999
(Diplomatic Agents Convention) adotada pela Assembleia Geral das
Nações Unidas em 14 de dezembro
de 1973.

Convenção Internacional contra a


1979 International Convention Tomada de Reféns, adotada pela Nova York Decreto n.
against the Taking of Hostages Assembleia Geral das Nações Unidas (1979) 3.517/2000
(Hostages Convention) em 17 de dezembro de 1979.

1980 Convention on the Physical Convenção sobre a Proteção Física do


Protection of Nuclear Material
 Material Nuclear, adotada em Viena, Viena Decreto n.
(Nuclear Materials Convention) em 3 de março de 1980. (1980) 95/1991

196
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

NOME NOME ASSINADA EM DECRETO


EM INGLÊS EM PORTUGUÊS FEDERAL

1988 Protocol for the Suppression of Protocolo para a repressão de atos


Unlawful Acts of Violence at Airports ilícitos de violência nos aeroportos
Serving International Civil Aviation, que prestem serviço à aviação civil
supplementary to the Convention internacional – complementar à Montreal Decreto n.
for the Suppression of Unlawful Acts Convenção para a Repressão de Atos (1988) 2.611/1988
against the Safety of Civil Aviation Ilícitos contra a Segurança da Aviação
(Extends and supplements the Civil, feita em Montreal, em 24 de
Montreal Convention on Air Safety) fevereiro de 1988.
(Airport Protocol)

1988 Convention for the Suppression Convenção para a Supressão de


of Unlawful Acts against the Atos Ilícitos contra a Segurança da Roma Decreto n.
Safety of Maritime Navigation Navegação Marítima – feita em Roma, (1988) 6.136/2007
(Maritime Convention) em 10 de março de 1988.

2005 Protocol to the Convention for


the Suppression of Protocolo à Convenção para a Londres Não
Unlawful Acts against the Supressão de Atos Ilícitos contra a (2005) ratificado
Safety of Maritime Navigation Segurança da Navegação Marítima

1988 Protocol for the Protocolo para a Supressão de


Suppression of Unlawful Acts Against Atos Ilícitos contra a Segurança de
the Safety of Plataformas Fixas localizadas na Roma Decreto n.
Fixed Platforms Located Plataforma Continental – feita em (1988) 6.136/2007
on the Continental Shelf Roma em 10 de março de 1988.
(Fixed Platform Protocol)

2005 Protocol to the Protocol for the Protocolo ao Protocolo para a


Suppression of Unlawful Acts against Supressão de Atos Ilícitos contra Londres Não
the Safety of Fixed Platforms Located a Segurança de Plataformas Fixas (2005) ratificado
on the Continental Shelf localizadas na Plataforma Continental

1991 Convention on the Marking of Convenção sobre a Marcação


Plastic Explosives for the Purpose of de Explosivos Plásticos Montreal Decreto n.
Detection para Fins de Detecção (1991) 4.021/2001
(Plastic Explosives Convention)

197
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

NOME NOME ASSINADA EM DECRETO


EM INGLÊS EM PORTUGUÊS FEDERAL

Convenção Internacional para a


1997 International Convention Supressão de Atentados
for the Suppression of Terroristas com Bombas Nova York Decreto n.
Terrorist Bombings
 – adotada pela Assembleia (1997) 4.394/2002
(Terrorist Bombing Convention) Geral das Nações Unidas em
15 de dezembro de 1997.

1999 International Convention


for the Suppression of the Convenção Internacional para a Nova York Decreto n.
Financing of Terrorism Supressão do Financiamento do (1999) 5.640/2005
(Terrorist Financing Convention) Terrorismo

2005 international
Convention for the Suppression Convenção Internacional Nova York Decreto
of Acts of Nuclear Terrorism para a Supressão de (2005) Legislativo n.
(Nuclear Terrorism Convention) Atos de Terrorismo Nuclear 267/2009

2010 Convention on the


Suppression of Unlawful Acts Pequim Não
Relating to International - (2010) ratificada
Civil Aviation
(New Civil Aviation Convention)

- Nova York Não


Arms Trade Treaty (ATT) (2013) ratificada

198
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

6. As resoluções do Conselho de em listas (UN list of designated terrorism


Segurança das Nações Unidas organizations).

Os alvos foram a Al-Qaeda e o Talibã. Pos-


O Conselho de Segurança das Nações teriormente, sanções relacionadas às ques-
Unidas (CSONU) é o principal órgão da ONU. tões da Líbia foram incluídas no rol do CSONU.
Formado por 15 membros, dos quais 5 são Mais recentemente, o Estado Islâmico passou
permanentes e têm poder de veto (China, Es- a ser objeto da Resolução do Conselho de Se-
tados Unidos, França, Reino Unido e Rússia), gurança. Eis algumas delas:
esse colegiado tem competências listadas na • 1.267 (1999), incorporada pelo Decreto
Carta das Nações Unidas4, especificamente na n. 3.267/1999
manutenção ou promoção da paz e segurança
• 1.333 (2000), incorporada pelo Decreto
internacionais.
n. 3.755/2001
O CSONU pode aprovar resoluções que são • 1.988 (2011), incorporada pelo Decreto
obrigatórias para os Estados-Membros, nos n. 7.608/2011
termos do artigo 25 e do capítulo VII da Carta, • 1.373 (2001), incorporada pelo Decreto
sempre que haja ameaça à paz, ruptura da paz n. 3.976/2001
ou ato de agressão: “Os membros da Organi- • 2.082 (2012), incorporada pelo Decreto
zação comprometem-se a aceitar e aplicar as n. 8.006/2013
decisões do Conselho de Segurança conforme
a presente Carta”. • 2.083 (2012), incorporada pelo Decreto
n. 8.014/2013
O CSONU pode determinar medidas que, • 2.178 (2014), ainda não incorporada5
• 2.199 (2015), ainda não incorporada6
[...] sem envolver o emprego de forças
armadas, deverão ser tomadas para Cabe aos Estados-Membros da ONU im-
tornar efetivas suas decisões e poderá plementar as resoluções do Conselho de Se-
convidar os Membros das Nações gurança, nos termos do tratado constitutivo
Unidas a aplicarem tais medidas. Estas da entidade. No particular, a Resolução n.
poderão incluir a interrupção completa 1373 (2001) determina que todos os Estados
ou parcial das relações econômicas,
dos meios de comunicação ferroviários, 5  Determina que os Estados-Membros alterem
marítimos, aéreos , postais, telegráficos, suas leis para restringir o trânsito internacional
radiofônicos, ou de outra qualquer espécie de indivíduos que teriam intenção de praticar
atos terroristas ou a estes vinculados, como
e o rompimento das relações diplomáticas.
financiamento, apoio logístico e recrutamento.
(Carta das Nações Unidas, art. 41).
6  Determina medidas contra o Estado Islâmico,
destinadas a impedir o comércio ilícito de petróleo,
Entre essas medidas está a possibilidade
o contrabando de relíquias antigas, a tomada de
de inclusão de pessoas e entidades terroristas
reféns, o financiamento de atividades do EI, da Al
Qaeda e da Frente Al Nusra (ANF), e a aquisição de
4  Decreto n. 19.841/1945. armas por esses grupos.

199
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

“devem prevenir e reprimir o financiamento de seu financiamento e consequentemente não


atos terroristas” e “criminalizar, sem demora, pode ser considerado um país cooperativo
os fundos e outros ativos financeiros ou re- neste campo.
cursos econômicos de pessoas que perpe-
tram, ou intentam perpetrar, atos terroristas,
ou participam ou facilitam o cometimento 7. As recomendações do GAFI
desses atos”.

A alínea e do artigo 2º da Resolução n. 1373 O Grupo de Ação Financeira Internacional


é ainda mais categórica, pois determina que os (GAFI) ou Financial Action Task Force (FATF) é
Estados assegurem que um organismo intergovernamental, sem per-
sonalidade jurídica, que foi criado em 1998
[...] qualquer pessoa que participe do pelo G-8, para implementar um arcabouço
financiamento, planejamento, preparo ou normativo não vinculante (soft law) composto
perpetração de atos terroristas ou atue por medidas de prevenção à lavagem de di-
em apoio destes seja levado a julgamento; nheiro (AML) e ao financiamento do terrorismo
assegurar que, além de quaisquer outras (CFT) em todo o globo.
medidas contra o terrorismo, esses atos
terroristas sejam considerados graves Essas medidas são consubstanciadas em
delitos criminais pelas legislações e 40 recomendações, que, na versão de fevereiro
códigos nacionais e que a punição seja de 2012, também incluem medidas para a pre-
adequada à gravidade desses atos. venção e repressão da proliferação de armas
de destruição em massa (WMD ou weapons of
Por sua vez, a alínea e do artigo 3º os mass destruction). Tais armamentos também
exorta a “Incrementar a cooperação e imple- podem ser utilizados para práticas terroris-
mentar integralmente as convenções e proto- tas, especialmente para a concretização de
colos internacionais específicos sobre terro- ataques químicos, biológicos, radiológicos ou
rismo, bem como as resoluções 1269 (1999) e nucleares (QBRN) e por isto mesmo passaram
1368 (2001) do Conselho de Segurança”. a integrar o mandato do GAFI, na luta contra
o financiamento de sua proliferação (financing
Algumas dessas resoluções preveem um of proliferation).
processo de designação de pessoas ou enti-
dades terroristas, havendo também procedi- As recomendações do GAFI não são obri-
mentos que asseguram o contraditório, para a gatórias, devido à sua natureza de soft law.
exclusão (de-listing) e a remoção de medidas Sua efetiva implantação é cobrada por meca-
cautelares de congelamento de bens e embar- nismos de revisão por pares (peer review), me-
gos para viagens aéreas e marítimas. diante a imposição de sanções, entre as quais
se incluem a suspensão do direito de voto do
Como se pode facilmente perceber pela Estado-Membro nas reuniões do Grupo e a pu-
simples leitura das principais resoluções do blicação de listas de países não cooperantes,
CSONU, desde 2001, o Brasil descumpre a segundo a técnica naming and shaming.
obrigação de tipificar o crime de terrorismo e

200
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

No contexto deste artigo, as recomenda- atentados específicos não venham a ocorrer. A


ções que mais nos interessam são as de nú- R-5 também sugere que o delito de financia-
mero 5 (terrorist financing offence) e número 6 mento do terrorismo seja considerado infração
(target financial sanctions related to terrorism penal antecedente para a configuração do cri-
and terrorist financing). Tais textos – que fa- me de lavagem de dinheiro.
ziam parte das antigas 9 recomendações es-
peciais sobre terrorismo – foram incorporados Por sua vez, a Recomendação n. 6 do GAFI
às atuais 40 recomendações do GAFI, consoli- – sobre as sanções financeiras específicas re-
dadas em 2012. lacionadas ao terrorismo e seu financiamento –
propõe aos Estados Partes que façam cumprir
Em suma, os Estados que aderiram ao mo- as resoluções do Conselho de Segurança das
delo de soft law do GAFI devem, entre outras Nações Unidas, de modo a facilitar e acelerar
providências, criminalizar o financiamento do o congelamento de ativos relacionados a práti-
terrorismo, estabelecer processos de listagem cas terroristas. É o que se lê aqui:
ou designação de pessoas e entidades terro-
ristas e prever sanções financeiras dirigidas Os países deveriam implementar regimes
a esses indivíduos e entes (targeted financial de sanções financeiras específicas em
sanctions). conformidade com as resoluções do
Conselho de Segurança das Nações
Eis o teor da Recomendação n. 5 (R-5) do Unidas relativas à prevenção e eliminação
GAFI/FATF sobre a infração de financiamento do terrorismo e do financiamento do
do terrorismo: terrorismo. As resoluções exigem que os
países congelem sem demora os fundos
Os países deveriam criminalizar o ou outros bens de qualquer pessoa ou
financiamento do terrorismo de acordo com entidade, e assegurem que nenhum fundo
o disposto na Convenção para a Eliminação ou outros bens sejam disponibilizados,
do Financiamento do Terrorismo, e direta ou indiretamente, a qualquer pessoa
deveriam criminalizar não apenas o ou entidade ou em benefício destas, sempre
financiamento de atos terroristas mas que essa pessoa ou entidade: i) tenha sido
também o financiamento de organizações designada pelo Conselho de Segurança das
terroristas e de terroristas individuais, Nações Unidas, ou sob a sua autoridade, nos
mesmo que não exista uma ligação a termos do Capítulo VII da Carta das Nações
um ato ou atos terroristas específicos. Unidas, nomeadamente em conformidade
Os países deveriam assegurar que essas com a Resolução 1267 (1999) e as suas
infrações sejam consideradas como resoluções subsequentes; ou ii) tenha sido
infrações subjacentes ao branqueamento designada pelo país em conformidade com
de capitais. o disposto na Resolução 1373 (2001).

De acordo com o texto, os Estados-Mem- As recomendações do GAFI também cuidam


bros do GAFI devem tipificar o crime de finan- de cooperação internacional. A seção G (reco-
ciamento de atos terroristas praticados por mendações 36 a 40) é inteiramente dedicada a
grupos, organizações ou indivíduos, ainda que esse tema, abarcando questões gerais de as-

201
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

sistência jurídica mútua, bloqueios cautelares te do nomen iuris atribuído à infração penal
e confisco de bens, extradição e outras formas aplicável, ou da sua classificação dogmática.
de cooperação internacional.
É certo que o Brasil não conhece tipos
No particular, a Recomendação n. 36 (R-36) penais específicos de terrorismo, e o financia-
estimula os Estados-Membros do GAFI a se mento do terror é conduta ainda atípica nesta
tornarem partes e a implementar sem demo- jurisdição. Sendo assim, no contexto da coo-
ra a Convenção de Viena (1988), a Convenção peração internacional e mesmo no plano do-
de Palermo (2000), a Convenção das Nações méstico, considerando-se a ausência de dupla
Unidas contra a Corrupção (2003) e a Conven- tipicidade homogênea, na imputação, o Minis-
ção para a Eliminação do Financiamento do tério Público pode valer-se subsidiariamen-
Terrorismo (1999). te de infrações penais comuns, previstas no
Código Penal, tais como o homicídio, a lesão
Adicionalmente, a R-36 encoraja os paí- corporal, o sequestro extorsivo e os crimes
ses integrantes do GAFI a ratificar e a aplicar de explosão, incêndio, inundação, atentado
outras convenções internacionais relevantes, contra meio de transporte, furto, roubo, dano
tais como a Convenção do Conselho da Eu- qualificado, contrabando, assim como outras
ropa sobre o Cibercrime (2001), a Convenção previstas em leis especiais, a exemplo do trá-
Interamericana contra o Terrorismo (2002) e fico de armas (Lei n. 10.826/2003, arts. 17 e 18),
a Convenção do Conselho da Europa sobre o dos crimes contra a Segurança Nacional (Lei n.
Branqueamento, a Detecção, a Apreensão e a 7.170/1983, arts. 12, 15, 16, 17, 18 e 20) e do crime
Perda dos Produtos do Crime e sobre o Finan- de associação em organização criminosa (art.
ciamento do Terrorismo (2005). 2º da Lei n. 12.850/2013).

Também importa a Recomendação n. 37 Tal quadro de tipificações subsidiárias –


(R-37) do GAFI, que, entre outros temas, cuida mas insuficientes devido aos compromissos
da cooperação internacional quando não es- internacionais assumidos pelo Brasil – tam-
tiver atendido o requisito da dupla tipicidade. bém se presta à matéria extradicional, nos
A regra estimula os países a prestar assis- termos da Recomendação n. 39 do GAFI, sen-
tência jurídica mesmo que não exista dupla do certo que a falta do tipo penal de terro-
incriminação, mas tão somente para o cum- rismo não impediria tout court a cooperação
primento de medidas não coercitivas, como internacional.
são aquelas de primeiro nível, isto é, atos de
comunicação processual e inquirições, por O Supremo Tribunal Federal adotou
exemplo. entendimento semelhante em pelo menos
três casos recentes. De fato, a Corte deferiu
A mesma regra R-37 recomenda que os os pedidos de extradição do major Manuel
países flexibilizem o requisito da dupla in- Juan Cordero Piacentini (Extradição 974, rel.
criminação nos demais casos de cooperação min. Ricardo Lewandowski, j. em 6 ago. 2009),
internacional em matéria penal, de modo a do major Norberto Raúl Tozzo (Extradição
considerá-lo adimplido independentemen- 1150, rel. Min. Cármen Lúcia, j. em 19 maio

202
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

2011) e autorizou a extradição de ambos para terrorismo), com acomodação típica mediante
a República Argentina, mesmo não existindo o uso de figuras delitivas comuns descritas na
aqui o tipo penal de desaparecimento forçado legislação penal.
de pessoas. Nesses dois casos, o STF afirmou
a existência do requisito da dupla tipicidade ao
conceder a extradição pelo crime de sequestro, 8. O quadro legal no Brasil
considerado permanente.
Nunca houve um atentado terrorista no
No caso Claudio Vallejos (Extradição 1.278, Brasil. Esta é uma verdade em termos, quando
rel. Gilmar Mendes, j. em 18 set. 2012), tal se tem em mira o terrorismo sectário.
orientação se firmou, como se lê na ementa
a seguir: Porém, práticas de terrorismo de Estado
tiveram lugar em nosso País durante a ditadu-
Extradição instrutória. 2. Crimes de ra militar (1964-1985), sendo exemplo marcante
tortura, homicídio, sequestro qualificado disto o atentado fracassado ao Riocentro, no
e desaparecimento forçado de pessoas. 3. Rio de Janeiro em 1981, tema que se relaciona
Atendimento dos requisitos formais. 4. Dupla à Justiça de Transição.
tipicidade. Desaparecimento forçado de
pessoas. Análise da dupla tipicidade com Por outro lado, atualmente já é possível
base no delito de sequestro. Entendimento detectar entre nós atividades terroristas de
adotado na EXT 974/Argentina. 5. Prescrição outra ordem, desde o aliciamento de jihadistas
dos crimes de tortura e homicídio, segundo até o funcionamento de células terroristas em
o ordenamento jurídico brasileiro. 6. Pedido nosso território, embora ainda dormentes. Na
de extradição deferido sob a condição de investigação do atentado contra a Associação
que o Estado requerente assuma, em caráter Mutual Israelense-Argentina (AMIA), em Buenos
formal, o compromisso de comutar eventual Aires, o Ministério Público argentino pediu ao
pena de prisão perpétua em pena privativa de Brasil a realização de várias diligências em
liberdade, com o prazo máximo de 30 anos. 7. nosso território para auxiliar a elucidação
Extraditando que responde a processo penal do ataque que matou 85 pessoas na cidade
no Brasil por crime diverso daquele que versa portenha em 1994.
o pedido de extradição. 8. Discricionariedade
do Chefe do Poder Executivo para ordenar Especialistas discutem se o Primeiro Co-
a extradição ainda que haja processo penal mando da Capital (PCC) tornou-se uma orga-
instaurado ou mesmo condenação no Brasil nização narcoterrorista, tendo em vista os
(art. 89 da Lei n. 6.815/1980). 9. Pedido de ataques cometidos em São Paulo em 2006,
extradição deferido parcialmente (somente nitidamente voltados à intimidação das forças
em relação aos crimes de sequestro). (Ext de segurança naquele Estado.
1.278, rel. min. GILMAR MENDES, 2ª Turma,
julgado em 18 set. 2012). Embora alguns estudiosos advoguem que
a famigerada Lei de Segurança Nacional (LSN)
Semelhante solução pode ser empregada – Lei 7.170/1983 – pode ser aplicada para repri-
no terrorismo (mas não no financiamento do mir atividades terroristas, o certo é que nosso

203
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

País ainda não tem um tipo penal de terrorismo, e resoluções que obrigam o Estado brasileiro,
nem criminalizou o financiamento do terroris- por sua inserção num campo específico dos
mo, tal como deve em função dos deveres in- crimes políticos, voltados à desestabilização
ternacionais que assumiu por ser parte de mais do Estado ou do regime de Governo.
de uma dezena de tratados antiterror, entre
eles a Convenção Interamericana contra o Ter- Há real dificuldade em tipificar o crime
rorismo (Convenção de Barbados, de 2002), e de de terrorismo, devido às suas características
ser membro da Organização das Nações Unidas difusas e heterogêneas e aos complexos as-
(ONU) e do Grupo de Ação Financeira Internacio- pectos sócio-políticos envolvidos na seleção
nal (GAFI), estando, portanto, sujeito às 40 reco- do bem jurídico tutelado e na formulação da
mendações baixadas por esse órgão e às várias conduta basilar. No campo da responsabilida-
resoluções do Conselho de Segurança da ONU7. de civil por atentados à aviação civil, o art. 1º,
§ 4º, da Lei n. 10.744/2003 estabelece que se
Na legislação brasileira8, o dispositivo entende “por ato terrorista qualquer ato de
que mais se aproxima de um tipo penal an- uma ou mais pessoas, sendo ou não agentes
titerrorismo é o art. 20 da Lei 7.170/83 (LSN), de um poder soberano, com fins políticos ou
segundo o qual se pune com pena de 3 a 10 terroristas, seja a perda ou dano dele resul-
anos quem devastar, saquear, extorquir, rou- tante acidental ou intencional”. Como se vê, a
bar, sequestrar, manter em cárcere privado, lei civil diz pouco e é imprecisa, risco que não
incendiar, depredar, provocar explosão, pra- se pode correr numa tipificação penal.
ticar atentado pessoal ou atos de terrorismo,
por inconformismo político ou para obtenção Uma série de projetos de lei tenta cumprir
de fundos destinados à manutenção de orga- a missão criminalizadora, todos ainda penden-
nizações políticas clandestinas ou subversivas tes de votação no Congresso Nacional. O mais
(sic). Em função do art. 109, IV, da Constituição, promissor deles é o PL n. 236/2012, que insti-
este crime é de competência federal, ficando tui o novo Código Penal. O terrorismo é objeto
prejudicado o art. 30 da LSN, que conferia tal dos artigos 245 a 248, inseridos no título dos
competência à Justiça Militar. “crimes contra a paz pública. Em consonância
com o regime convencional antiterrorismo, o
Obviamente, o art. 20 da LSN é insuficien- projeto lista uma série de condutas capazes de
te para dar cumprimento a todos os tratados “causar terror” na população e que configuram
o crime de terrorismo. Além disso, tipifica os
delitos de financiamento do terrorismo e de
7  Vide também o Decreto n. 7.168/2010, que dispõe
sobre o Programa Nacional de Segurança da Aviação favorecimento pessoal no terrorismo.
Civil contra Atos de Interferência Ilícita (PNAV/SEC);
o Decreto n. 4.376/2002, que dispõe sobre o Sistema Para reduzir resistências à sua aprovação,
Brasileiro de Inteligência; e o Decreto n. 5.485/2005, o PL n. 236/2012 prevê uma causa excluden-
que institui a Política de Defesa Nacional e considera te de ilicitude, que considera não haver crime
os crimes transnacionais uma ameaça à paz, à quando a conduta individual ou coletiva for
segurança e à ordem democrática. movida “por propósitos sociais ou reivindica-
8  Escrevo em março de 2015. tórios, desde que os objetivos e meios sejam

204
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

compatíveis e adequados à sua finalidade”. Eis ou transmissão de energia e instalações


o texto: militares:

Terrorismo Pena – prisão, de oito a quinze anos, além


das sanções correspondentes à violência,
Art. 245. Causar terror na população grave ameaça ou dano.
mediante as seguintes condutas:
§ 1º Somente se configura o crime descrito
I - sequestrar ou manter alguém em no caput quando a conduta:
cárcere privado, ou ameaçar de morte ou
lesão pessoas, ainda que indeterminadas; I - for praticada para forçar autoridades
públicas, nacionais ou estrangeiras, ou
II - usar ou ameaçar usar, transportar, pessoas que ajam em nome delas, a fazer
guardar, portar ou trazer consigo o que a lei não exige ou deixar de fazer o
explosivos, gases tóxicos, venenos, que a lei não proíbe;
conteúdos biológicos ou químicos ou
outros meios capazes de causar danos ou II - tiver por objetivo a obtenção de recursos
promover destruição ou ofensa massiva para a manutenção de organizações
ou generalizada; políticas ou grupos armados, civis ou
militares, que atuem contra a ordem
III - usar, liberar ou disseminar toxinas, constitucional e o Estado Democrático; ou
agentes químicos, biológicos, radiológicos
ou nucleares, ou outros meios capazes de III - for motivada por preconceito de
causar danos à saúde ou ao meio ambiente; raça, cor, etnia, religião, nacionalidade,
origem, condição de pessoa idosa ou
IV - incendiar, depredar, saquear, explodir com deficiência, ou por razões políticas,
ou invadir qualquer bem público ou ideológicas, filosóficas ou religiosas.
privado;
Exclusão de crime
V - interferir, sabotar ou danificar sistemas
de informática e bancos de dados; § 2º Não constitui crime de terrorismo a
conduta individual ou coletiva de pessoas
VI - sabotar o funcionamento ou apoderar- movidas por propósitos sociais ou
se, com grave ameaça ou violência a reivindicatórios, desde que os objetivos e
pessoas, do controle, total ou parcial, meios sejam compatíveis e adequados à
ainda que de modo temporário, de meios sua finalidade.
de comunicação ou de transporte, de
portos, aeroportos, estações ferroviárias Financiamento do terrorismo
ou rodoviárias, hospitais, casas de saúde,
escolas, estádios esportivos, instalações Art. 246. Oferecer ou receber, obter,
públicas ou locais onde funcionem serviços guardar, manter em depósito, investir ou de
públicos essenciais, instalações de geração qualquer modo contribuir para a obtenção

205
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

de ativos, bens ou recursos financeiros, delito de financiamento do terrorismo; introduz


com a finalidade de financiar, custear ou as figuras de terrorismo contra coisa, incitação
promover a prática de terrorismo, ainda ao terrorismo, favorecimento pessoal no
que os atos relativos a este não venham a terrorismo e associação em grupo terrorista;
ser executados: prevê a delação premiada para “arrependidos”;
institui regime mais gravoso de execução penal
Pena – prisão, de oito a quinze anos. e proíbe a anistia, a graça e o indulto.

Favorecimento pessoal no terrorismo A aprovação de um desses projetos é es-


sencial para preservar a posição do Brasil no
Art. 247. Dar abrigo ou guarida a pessoa de âmbito do GAFI9 e das Nações Unidas e para
quem se saiba ou deva saber que tenha cumprimento de compromissos internacionais,
praticado ou esteja por praticar crime de convencionais, assumidos pelo País ao longo
terrorismo: de décadas.

Pena – prisão, de quatro a dez anos. Atualmente, o Brasil se obriga perante 16


tratados internacionais do regime antiterror:
Escusa Absolutória
• ONU: cinco tratados

Parágrafo único. Não haverá pena se o • OACI: cinco tratados


agente for ascendente ou descendente em • OEA: três tratados
primeiro grau, cônjuge, companheiro estável
ou irmão da pessoa abrigada ou recebida. • OMI: dois tratados
• AIEA: um tratado10
Disposição comum
Como visto, os mandados de criminaliza-
Art. 248. As penas previstas para os crimes ção do terrorismo e seu financiamento estão
deste Capítulo serão aumentadas até a previstos nos tratados ratificados pelo Brasil,
metade se as condutas forem praticadas também na Constituição Federal (art. 5º, XLIII)
durante a realização de grandes eventos e na Recomendação n. 5 do GAFI.
esportivos, culturais, educacionais,
religiosos, de lazer ou políticos, nacionais
ou internacionais.
9  A inexistência desses tipos penais pode
comprometer a avaliação do Brasil pelo GAFI e
Há também em tramitação o PL n. levar à suspensão do País e à sua inclusão em
4.674/2012, do deputado Walter Feldman; o “listas sujas”.
PLS n. 762/2011, do senador Aloysio Nunes 10  Este último tratado da AIEA é a Convenção
Ferreira; o PL n. 5.773/2013, do deputado Onyx Internacional para a Supressão de Atos de
Lorenzoni; e o PLS n. 499/2013, do senador Terrorismo Nuclear, assinada em Nova York, em
Romero Jucá. Este último projeto tipifica o 2005, sob patrocínio da ONU. O texto desse tratado
crime de terrorismo, com suas modalidades foi aprovado pelo Decreto Legislativo n. 267/2009,
simples, agravada e qualificada; criminaliza o mas ainda não entrou em vigor interno.

206
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Segundo o inciso XLIII do art. 5º da Cons- participe ativamente das hostilidades


tituição de 1988, a lei “considerará crimes ina- em situação de conflito armado, quando
o propósito do referido ato, por sua
fiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia”
natureza e contexto, for intimidar uma
o terrorismo. Nos termos do inciso XLIV, “cons-
população, ou compelir um governo ou
titui crime inafiançável e imprescritível a ação uma organização internacional a agir
de grupos armados, civis ou militares, contra a ou abster-se de agir.
ordem constitucional e o Estado democrático”.
A falta de normas penais sobre terro-
No tocante ao financiamento do terrorismo, rismo e seu financiamento provocou situa-
a Convenção de 1999 (Decreto n. 5.640/2005) ções pitorescas. Na redação anterior à Lei n.
determina aos Estados-Membros que tipifi- 12.683/201212, a Lei de Lavagem de Dinheiro (Lei
quem a conduta de dar, oferecer ou receber va- n. 9.613/1998, artigo 1º, inciso II) previa entre os
lores para empregá-los, ou ciente de que serão crimes antecedentes o terrorismo e seu finan-
empregados, para: ciamento. Obviamente esse dispositivo jamais
• a prática de qualquer dos crimes foi aplicado.
previstos nos 9 tratados11 que compõem
o anexo I dessa Convenção; ou Outra tentativa que se mostrou incapaz de
• cometer qualquer outro ato com colmatar a lacuna normativa deu-se com a Lei
a intenção de causar a morte ou das Organizações Criminosas. Ao contrário do
lesões corporais graves a um civil que parece à primeira vista, a Lei n. 12.850/2013
ou a qualquer outra pessoa que não presta-se à persecução de três categorias de
condutas ilícitas, duas das quais não relacio-
nadas diretamente à atuação de entes crimi-
11 1. Convenção para a Repressão ao Apoderamento
Ilícito de Aeronaves, feita na Haia, em 16 de
nosos de tipo mafioso. Essa lei serve para a
dezembro de 1970; 2. Convenção para a Repressão investigação e repressão de:
aos Atos Ilícitos contra a Segurança da Aviação
Civil, realizada em Montreal, em 23 de setembro a) crimes praticados por organizações
de 1971; 3. Convenção sobre a Prevenção e Punição criminosas, ou seja, por um grupo
de Crimes contra Pessoas que Gozam de Proteção criminoso formado por 4 ou mais pessoas,
Internacional, inclusive Agentes Diplomáticos, com divisão de tarefas, voltado à obtenção
adotada pela Assembleia Geral das Nações de vantagens de qualquer natureza,
Unidas em 14 de dezembro de 1973; 4. Convenção mediante a prática de crimes graves
Internacional contra a Tomada de Reféns, adotada
pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 17 de
dezembro de 1979; 5. Convenção sobre a Proteção Marítima, feita em Roma, em 10 de março de 1988;
Física do Material Nuclear, adotada em Viena em 3 8. Protocolo para a Supressão de Atos Ilícitos contra
de março de 1980; 6. Protocolo para a Repressão de a Segurança de Plataformas Fixas Localizadas na
Atos Ilícitos de Violência nos Aeroportos que Prestem Plataforma Continental, feita em Roma em 10 de
Serviço à Aviação Civil Internacional, complementar à março de 1988; 9. Convenção Internacional para a
Convenção para a Repressão de Atos Ilícitos contra a Supressão de Atentados Terroristas com Bombas,
Segurança da Aviação Civil, feita em Montreal, em 24 adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas
de fevereiro de 1988; 7. Convenção para a Supressão em 15 de dezembro de 1997.
de Atos Ilícitos contra a Segurança da Navegação 12  Esta lei suprimiu o rol dos delitos antecedentes.

207
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

(aqueles cuja pena máxima seja superior Conforme explicitado, o tríplice alcance
a 4 anos) ou o cometimento de delitos da Lei do Crime Organizado resulta do exame
transnacionais; de seu próprio texto. Os incisos I e II do § 2º
do art. 1º da Lei n. 12.850/2013 deixam claro
b) delitos transnacionais (crimes à ser possível a utilização dos meios especiais
distância), no sentido do art. 109, inciso V, da de obtenção de prova em tais hipóteses, dis-
Constituição de 1988, independentemente pensando-se a existência de uma organização
de se tratar de criminalidade organizada. criminosa, desde que atendidas as premissas
Neste caso, os instrumentos da lei, ali descritas. Confira:
especialmente os meios de obtenção de
prova, podem ser aplicados à persecução § 2º Esta Lei se aplica também:
criminal desta modalidade de delinquência,
ainda que não haja o envolvimento de I – às infrações penais previstas em
uma organização criminosa no evento sob tratado ou convenção internacional
investigação; e quando, iniciada a execução no País, o
resultado tenha ou devesse ter ocorrido
c) crimes cometidos por entidades terroristas no estrangeiro, ou reciprocamente;
transnacionais, assim reconhecidas por
organizações internacionais das quais o II – às organizações terroristas
Brasil seja parte, seja para a investigação das internacionais, reconhecidas segundo as
infrações penais – subsidiárias ao crime de normas de direito internacional, por foro
terrorismo – tipificadas no Código Penal e na do qual o Brasil faça parte, cujos atos de
Lei de Segurança Nacional (Lei n. 7.170/1983), suporte ao terrorismo, bem como os atos
seja para futuramente apurar o delito de preparatórios ou de execução de atos
financiamento do terrorismo, conduta ainda terroristas, ocorram ou possam ocorrer
atípica na jurisdição brasileira. em território nacional.

Como se vê, optou-se pelo critério de lista Por ora, frustraram-se todas as tentativas
universal. Basicamente, poder-se-á aplicar a de resolver o problema da atipicidade. A Re-
nova lei para apuração de atos cometidos por comendação n. 2 da ENCCLA de 2012 levou em
entes denominados terroristas pela ONU (UN conta tal situação:
list of designated terrorism organizations), tal
como se dá com as resoluções do Conselho de Considerando a lesividade para o Estado
Segurança a respeito dos grupos extremistas Democrático de Direito e as graves
que realizaram atentados em Nova Iorque e consequências dos delitos de terrorismo,
Madri, por exemplo. Atualmente, entre outras em todas as suas formas;
decisões, o regime de sanções imposto ao Ta-
libã e à Al-Qaeda compreende os Decretos n. Considerando que o processo de
8.006/2013 e n. 8.014/2013, que fazem valer, avaliação mútua do Brasil pelo GAFI, ora
respectivamente, a Resolução n. 2082 (2012) e em andamento, entre as deficiências e
a Resolução n. 2083 (2012) do Conselho de Se- vulnerabilidades apontadas, destacou a
gurança da ONU.

208
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

ausência da tipificação do terrorismo e seu matéria penal que podem ser invocadas sem-
financiamento; pre que não existam tratados bilaterais ou
multilaterais de assistência jurídica mútua ca-
Considerando os 14 tratados ratificados pazes de assegurar a eficácia e/ou a continui-
pelo País, nos quais se comprometeu a dade da persecução penal.
tipificar e combater o delito de terrorismo;
As convenções do regime global antiter-
Considerando as Resoluções 1267, 1269, ror estabelecem um dever universal de per-
1333, 1363, 1373, 1390, 1452, 1455, 1526, secução dos crimes cuja tipificação ordenam.
1566, 1617, 1624, 1699, 1730, 1735, 1822, 1904, Desse dever resulta a regra de cooperação em
1988 e 1989, do Conselho de Segurança da caso de transnacionalidade da persecução,
Organização das Nações Unidas; quando se faça necessário obter provas no ex-
terior ou bloquear e recuperar ativos fora de
Considerando os riscos de lavagem de um determinado país, assim como conseguir
dinheiro e financiamento do terrorismo, a extradição ou entrega de suspeitos, réus ou
em função da Copa 2014 e Olimpíada 2016; condenados que estejam no estrangeiro.

Considerando o papel crescentemente No que tange à extradição, em caso de


importante do País no cenário internacional, não cooperação para a entrega de foragidos
inclusive, reivindicando assento devido ao critério de nacionalidade (inextradi-
permanente no Conselho de Segurança da tabilidade de nacionais), surge para os Estados
Organização das Nações Unidas; signatários o dever de processá-los em seus
territórios, conforme a regra aut dedere aut
A Estratégia Nacional de Combate à iudicare.
Corrupção e à Lavagem de Dinheiro
– ENCCLA recomenda, em caráter de Em suma, a cooperação internacional anti-
urgência, a tipificação do financiamento ao terrorismo (anti-T), contra o financiamento do
terrorismo e às organizações terroristas. terrorismo (CFT) e contra a proliferação de ar-
mas de destruição em massa (PF) compreende
Mais de três anos depois, essa a utilização de tratados bilaterais ou multilate-
recomendação ainda não mereceu a atenção rais de cooperação internacional; a invocação
do Congresso Nacional. de promessa de reciprocidade quando possível;
a implementação das resoluções do CSONU so-
bre terrorismo e das recomendações do GAFI/
9. Instrumentos de cooperação FATF; e a formalização de novos acordos regio-
nais em matéria de segurança e justiça criminal.
internacional – jurídica e policial
As grandes convenções internacionais
Quase todos os tratados em questão, no- contra o terrorismo e seu financiamento têm
tadamente os mais recentes, contêm regras absoluta relevância no campo da cooperação
subsidiárias de cooperação internacional em jurídica internacional, assim como os trata-

209
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

dos multilaterais dos quais o Brasil é parte, a Porém, os modelos mais completos de
exemplo da Convenção Interamericana sobre cooperação internacional estão na Conven-
Assistência Mútua em Matéria Penal (Conven- ção para a Supressão do Financiamento do
ção de Nassau) ou da Convenção das Nações Terrorismo de 1999 (Decreto n. 5640/2005), na
Unidas contra o Crime Organizado Transnacio- Convenção Internacional para a Supressão de
nal (Convenção de Palermo). Atos de Terrorismo Nuclear (Decreto Legislati-
vo n. 267/2009) e na mais recente Convenção
Quanto à Convenção de Palermo, há todo para a Supressão de Atos Ilícitos relativos à
um conjunto de dispositivos sobre cooperação Aviação Civil Internacional13 (Convenção de
internacional, inclusive extradição, que pode Pequim, de 2010), que ainda não foi ratificada
ser invocado como regra subsidiária, caso falte pelo Brasil.
um tratado bilateral ou multilateral específico.
A começar da Convenção de Tóquio de
No que concerne às convenções especi- 1963, todas têm dispositivos mínimos para am-
ficamente voltadas para a repressão do ter- pliação da jurisdição e sobre extradição, assim
rorismo e de seu financiamento, quase todas como sobre o princípio aut dedere aut iudicare.
elas contêm regras de cooperação internacio- Eis a formulação dessa regra tal como consta
nal em matéria penal que podem ser comple- do artigo 7º da Convenção sobre a Prevenção e
mentadas pela legislação doméstica ou outros Punição de Crimes Contra Pessoas que Gozam
tratados, na perspectiva de que não pode ha- de Proteção Internacional, inclusive Agentes
ver óbices injustificados à prestação de assis- Diplomáticos, concluída em Nova York, em 14
tência interestatal. Tomemos como exemplo o de dezembro de 1973:
artigo 13 da Convenção sobre a Proteção Física
de Material Nuclear, de 1980: Art. 7º. O Estado Parte em cujo território
encontrar-se o suposto autor do crime,
Art. 13.
caso não proceda à sua extradição, deverá,
1. Os Estados Partes prestar-se-ão sem exceção e sem demora injustificada,
mutuamente a maior assistência judiciária submeter o assunto às autoridades
possível nos processos gerais relativos competentes, para fins de instauração de
aos delitos previstos no Artigo 7, inclusive processo penal, em conformidade com o
quanto ao fornecimento das provas de que disposto na respectiva legislação.
disponham e que sejam necessárias ao
processo. Em todos os casos, a lei aplicável Ao lado do arcabouço convencional para
para a execução de uma demanda de a assistência jurídica, é de se ressaltar o im-
assistência é aquela do Estado requerente. portante papel dos tratados de cooperação

2. As disposições do parágrafo 1 não afetarão 13  A Convenção de Pequim sobre a Segurança


obrigações decorrentes de quaisquer da Aviação Civil (AVSEC) moderniza e consolida a
outros tratados, bilaterais ou multilaterais, Convenção de Montreal de 1971 e o seu Protocolo
que dispõem ou venham dispor, no todo Suplementar de 1988. O Brasil a assinou em 10
ou em parte, sobre a assistência judiciária de setembro de 2010. Há também um protocolo
mútua em matéria penal. complementar (Protocolo de Pequim, de 2010).

210
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

policial e aduaneira para segurança frontei- O tratado também autoriza que policiais
riça. Normalmente, os modelos existentes na de um país, mediante prévia ciência, atuem
região foram pensados para a prevenção e a como observadores durante investigação po-
repressão ao tráfico de drogas e ao contraban- licial transfronteiriça, para captura de pessoas
do, mas as estruturas que tais acordos estabe- sob vigilância policial (campana), até a inter-
lecem podem ser muito úteis para o enfrenta- venção da força local de segurança.
mento do terrorismo na América do Sul.
O Brasil tem um tratado semelhante com
Serve como exemplo desse modelo o Acor- a França. Cuida-se do Acordo de Parceria e de
do sobre Cooperação Policial em Matéria de In- Cooperação entre o Governo da República Fe-
vestigação, Prevenção e Controle de Fatos De- derativa do Brasil e o Governo da República
lituosos (Decreto n. 6.731/2009), firmado pelo Francesa em Matéria de Segurança Pública, ce-
Brasil e pelo Uruguai, na cidade uruguaia de lebrado em Brasília, em 12 de março de 199714.
Rio Branco em 2004. Este acordo permite a troca de informações
policiais sobre criminalidade transnacional
O tratado permite o intercâmbio de infor- organizada; tráfico de substâncias entorpe-
mações policiais para prevenir e/ou investigar centes ou psicotrópicas e de seus precurso-
fatos delituosos, sempre que tais atividades res; imigração irregular; terrorismo e também
não estejam reservadas pelas leis do Estado lavagem de dinheiro; tráfico de armas; segu-
requerido a outras autoridades e que o solici- rança dos portos, aeroportos e das fronteiras;
tado não viole sua legislação local. manutenção da ordem pública; polícia técnica
e científica; e gestão, recrutamento, seleção,
O acordo permite a realização de persegui- formação e especialização de pessoal.
ções transfronteiriças (hot pursuits), de modo
que as autoridades policiais das Partes, ao es- Seu artigo 5º refere-se especificamente ao
tarem em seu próprio território e perseguirem terrorismo, facultando a Brasil e França trocas
uma ou mais pessoas que, para eludir a ação de informações relativas aos atos de terroris-
das autoridades, ultrapassem o limite frontei- mo projetados ou cometidos, nas formas de
riço, poderão ingressar no território da outra execução e nos meios técnicos utilizados para
Parte somente para o efeito de requerer à
autoridade policial mais próxima a adoção do
14  Complementado pelo Protocolo Adicional
procedimento legal correspondente.
ao Acordo de Parceria e Cooperação com vistas à
criação do Centro de Cooperação Policial (Decreto
Caso efetuada a captura das pessoas mo- n. 8.344/2014). Serve às instituições policiais dos
tivo da perseguição, as autoridades policiais dois países como instrumento de manutenção da
da Parte requerida devem comunicar o fato segurança interna e de combate ao crime organizado
imediatamente às autoridades da Parte re- e a outros delitos transnacionais, salvo o terrorismo.
querente, enquanto os detidos permanecerão O Centro de Cooperação Policial funciona na
nessa situação conforme as disposições legais fronteira entre o Brasil e a Guiana Francesa e acolhe
estabelecidas no país de captura. policiais, oriundos, pela parte brasileira, da Polícia
Federal, e, pela parte francesa, da Polícia Nacional e
da “Gendarmerie Nationale”.

211
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

a execução de tais atos; e intercâmbio de in- de contraterrorismo, e o Batalhão de Defesa


formações relativas aos grupos de terroristas Química, Bacteriológica e Nuclear (DQBN). Es-
e aos membros desses grupos cujas ações te- ses órgãos se coordenam no Sistema Brasi-
nham sido ou venham a ser desenvolvidas no leiro de Inteligência (SISBIN), criado pela Lei
território de uma das Partes Contratantes e que n. 9.883/1999.
atentem contra os interesses da outra Parte.
No campo da cooperação internacional,
Por fim, devem ser lembrados dois tratados essas agências comunicam-se diretamente
do Mercado Comum do Sul: Acordo n. 23/2002 com seus congêneres no exterior. Outras ve-
sobre Cooperação em Operações Combinadas zes, valem-se do canal da Organização Inter-
de Inteligência Policial sobre Terrorismo e Deli- nacional de Polícia Criminal (Interpol), que,
tos Conexos entre os Estados Partes do Merco- desde 2005, disponibiliza no seu sistema de
sul (MERCOSUL/CMC/DEC 29/2002) e Acordo n. notices a difusão especial Interpol/Conselho
24/2002 sobre Cooperação em Operações Com- de Segurança da ONU (INTERPOL-United Na-
binadas de Inteligência Policial sobre Terroris- tions Security Council Special Notice), que é
mo e Delitos Conexos entre os Estados Partes expedida tendo como alvo pessoas ou enti-
do Mercosul, a República da Bolívia e a Repú- dades sujeitas a sanções impostas pelo CSO-
blica do Chile (MERCOSUL/CMC/DEC n. 29/2002), NU, para alertar os órgãos de persecução dos
ambos ainda em implantação na região. Estados-Membros quanto à existência de san-
ção dos mais diversos tipos, como o congela-
mento de ativos, embargo de armas, proibição
10. A cooperação internacional de viagens.

contra o terrorismo Para a transferência formal de provas de


uma infração penal, a cooperação interna-
No campo da assistência jurídica interna- cional se apoia nas autoridades centrais bra-
cional, convivem diversas autoridades nacio- sileiras, especialmente o Departamento de
nais de cooperação. Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica
Internacional (DRCI), órgão do Ministério da
Órgãos federais têm papel preponderante Justiça, e na Procuradoria-Geral da República.
neste tema. A Divisão Antiterrorismo (DAT) da
Diretoria de Inteligência da Polícia Federal é o No campo da cooperação extradicional, o
principal órgão de investigação de atividades Departamento de Estrangeiros do Ministério
terroristas no Brasil. A ela se somam a Agên- da Justiça tem papel preponderante, assim
cia Brasileira de Inteligência (ABIN), o Gabine- como o Itamaraty e a Procuradoria-Geral
te de Segurança Institucional da Presidência da República, no que tange à sua atribuição
da República (GSI), e as unidades contrater- nos processos de competência do Supremo
rorismo das Forças Armadas, notadamente Tribunal Federal.
do Exército Brasileiro, onde existem a Briga-
da de Operações Especiais, com atividades

212
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

No que tange à cooperação internacional, Camden Assets Recovery Interagency (CARIN)


não estritamente jurídica, deve-se considerar e a Stolen Assets Recovery Initiative (StAR),
uma gama de medidas aptas a fazer frente à sem prejuízo do apoio de organismos como
ameaça terrorista, entre as quais o controle a International Association of Prosecutors
de fronteiras, portos e aeroportos; o controle (IAP) ou da instituição de magistrados (ou
aduaneiro, do trânsito de pessoas e da produ- procuradores) de ligação.
ção, comércio e distribuição de armas de fogo,
munições e explosivos; e o controle da circula-
ção de ativos. Conclusão
No âmbito jurídico, os tratados de coope-
ração e as leis internas impõem a existência de É inegável a complexidade do regime glo-
um arcabouço abrangente sobre mutual legal bal antiterrorismo, com a interconexão de tra-
assistance, canais de assistência entre unida- tados patrocinados por diversas organizações
des de inteligência financeira (canal FIU-FIU); internacionais, resoluções do Conselho de Se-
a implementação de mandados transnacionais gurança da ONU e recomendações do GAFI.
de captura; e a formação de equipes conjuntas
de investigação. Desse subsistema normativo surgem obri-
gações internacionais para o Estado-Membro,
Além dos canais formais de cooperação que, no caso brasileiro, somam-se a mandado
jurídica internacional para a persecução expresso de criminalização previsto na Cons-
do terrorismo e seu financiamento, há a tituição de 1988. Seja por compromissos con-
possibilidade de troca de informações vencionais, seja por aceitação do regime de
por diversos meios, como a cooperação soft law do GAFI, o Brasil vê-se na contingência
policial propriamente dita (Interpol, de tipificar os crimes de terrorismo e seu fi-
Ameripol etc); a realização de operações nanciamento, conforme os vários tratados que
fronteiriças coordenadas no plano regional; o obrigam.
o compartilhamento de bases de dados
de investigação, como o SISME (Sistema de Está também obrigado o País a instituir
Informações do Mercosul); o uso das redes um regime compreensivo de cooperação in-
internacionais ou hemisféricas, a exemplo ternacional contra o terrorismo e seu financia-
da Iber-Red (canal Iber@), da Reunião mento, seja para assistência probatória, seja
Especializada de Ministérios Públicos para fins de extradição e recuperação de ati-
do Mercosul (REMPM) e de outras redes vos, de modo que o Brasil não seja tido como
regionais ou internacionais, como a Rede de “refúgio jurídico” para indivíduos e organiza-
Recuperação de Ativos do GAFILAT (RRAG), a ções terroristas.

213
2. MANIFESTAÇÕES PÚBLICAS
Situações de emergência e Direitos Humanos:
o uso da tortura por Estados Democráticos

ANDRÉ DE CARVALHO RAMOS1 difusos de uma comunidade. Concluo, então,


que estamos na “era dos conflitos dos direitos”.
Procurador Regional da República
Resta saber, então, quando é legítimo im-
por limites e restrições aos direitos humanos,
Introdução especialmente com foco nas chamadas situa-
ções de emergência nas quais o Estado de Di-
reito pode restringir direitos para sobreviver.
A contemporânea “era dos direitos”, na fe- Este artigo visa estudar as restrições e os li-
liz expressão de Bobbio (1992), é caracterizada mites aos direitos humanos, analisando, como
pela crescente adesão de Estados a tratados caso exemplificativo, a “ideologia liberal da
de direitos humanos, em uma escalada expo- tortura” que retrata o uso da tortura por Es-
nencial de criação de direitos, inclusive pela tados Democráticos, em especial no combate
via da interpretação por parte de órgãos in- ao terrorismo.
ternacionais.

Em face dessa expansão de direitos, foi 1. As restrições aos


inevitável a constatação de choques entre direitos humanos
direitos, quer entre direitos individuais, quer
entre direitos difusos, ou mesmo entre direitos A restrição a direitos humanos é realizada
individuais de um lado e direitos difusos de por meio de lei ou por meio de interpretação
outro. A solução tradicional para tais choques judicial que decide o conflito entre direitos em
seria a prevalência da norma mais favorável ao colisão (CARVALHO RAMOS, 2014, p. 136 e ss.).
indivíduo. Ocorre que esse princípio da norma A restrição em sentido amplo de um direito
mais favorável ao indivíduo (princípio pro consiste em ação ou omissão do Estado, que
homine) é inaplicável nesses choques, uma vez elimina, reduz, comprime ou dificulta de algu-
que tais colisões comumente se realizam entre ma maneira o exercício de direito fundamental
direitos cujos titulares são indivíduos distintos pelo seu titular, ou ainda enfraquece os deve-
ou mesmo entre direitos individuais e direitos res de proteção que dele resultam ao Estado,
afetando negativamente o exercício desse di-
1  Professor de Direito Internacional e Direitos reito por seu titular (NOVAIS, 2003, p. 247).
Humanos da Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo (Largo São Francisco). Doutor e Livre- Em sentido estrito, a restrição a um direito
Docente em Direito Internacional (USP). consiste em intervenções legislativas que fo-

217
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

ram autorizadas pela Constituição para limitar lei, estendidas aos sucessores e contra
determinado direito, desde que respeitados a eles executadas, até o limite do valor do
proporcionalidade e o conteúdo essencial dos patrimônio transferido;
direitos humanos. São as chamadas restrições [...]
legais aos direitos humanos. LVIII – o civilmente identificado não será
submetido a identificação criminal, salvo
Em relação às restrições legais, a nas hipóteses previstas em lei2.
Constituição de 1988 traz dois tipos claros de
restrições permitidas: a restrição ou reserva A terminologia varia: “na forma da lei”; “nos
legal simples e a restrição ou reserva legal termos da lei”; “previstas em lei”, entre outras,
qualificada. mas com uma característica comum: a Consti-
tuição não fixa previamente os requisitos, con-
A reserva legal simples consiste na au- dições ou parâmetros da lei a ser editada pelo
torização dada pela Constituição a edição legislador.
posterior de lei que adote determinada restri-
ção a direito fundamental. Basta a leitura da Por sua vez, a restrição ou reserva legal
Constituição para encontrarmos vários casos qualificada é aquela em que a Constituição,
de reserva de lei simples na seara dos direi- além de estabelecer a reserva de lei, esti-
tos humanos, como nos seguintes incisos do pula os requisitos e as condições que a lei
art. 5º: necessariamente deve observar. O art. 5º,
XIII, que trata da liberdade do exercício pro-
[...] fissional, estabelece ser livre o exercício de
VI – é inviolável a liberdade de consciência qualquer trabalho, ofício ou profissão, aten-
e de crença, sendo assegurado o livre didas as qualificações profissionais que a lei
exercício dos cultos religiosos e garantida, estabelecer.
na forma da lei, a proteção aos locais de
culto e a suas liturgias; Entretanto, toda reserva legal de um di-
VII – é assegurada, nos termos da lei, a reito fundamental é, na verdade, uma “reser-
prestação de assistência religiosa nas va legal proporcional”, ou seja, deve a lei que
entidades civis e militares de internação impôs a restrição ser aprovada pelo crivo da
coletiva; proporcionalidade3.
[...]
XV – é livre a locomoção no território
2  Conforme consta do voto do min. Gilmar Mendes
nacional em tempo de paz, podendo
no HC 82.424, rel. p/ o ac. min. presidente Maurício
qualquer pessoa, nos termos da lei, nele
Corrêa, julgamento em 17.9.2003, Plenário, DJ de 19
entrar, permanecer ou dele sair com seus mar. 2004. Também ver MENDES, Gilmar Ferreira;
bens; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo
[...] Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. São
XLV – nenhuma pena passará da pessoa Paulo: Saraiva, 2007, p. 297.
do condenado, podendo a obrigação 3  Voto do min. Gilmar Mendes no ADI 855, rel. p/
de reparar o dano e a decretação do o ac. min. Gilmar Mendes, julgamento em 6.3.2008,
perdimento de bens ser, nos termos da Plenário, DJE de 27 mar. 2009 [grifo nosso].

218
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

2. Os direitos sem reserva a cláusula tutelar da inviolabilidade


expressa: a reserva legal do sigilo epistolar não pode constituir
instrumento de salvaguarda de práticas
subsidiária e a “reserva ilícitas (HC 70.814, rel. min. Celso de Mello,
geral de ponderação” julgamento em 1º.3.1994, Primeira Turma,
DJ de 24 jun. 1994).
Há ainda direitos previstos na Constituição
sem qualquer menção à lei restritiva. Mesmo Além da “reserva legal subsidiária”, todos
assim, tais direitos estão sujeitos a uma os direitos fundamentais – mesmo sem restri-
reserva legal subsidiária, podendo o legislador ção expressa – submetem-se a uma “reserva
regular esse direito em face dos demais geral de ponderação” (NOVAIS, 2003, p. 359),
valores constitucionais. Claro que a norma uma vez que esses dispositivos estão sujeitos
legal regulamentadora deverá sobreviver ao à ponderação com outros valores previstos na
teste da proporcionalidade, demonstrando Constituição, relacionados a outros direitos
que a eventual limitação a direito previsto sem fundamentais em colisão.
restrição expressa da Constituição atendeu,
de modo proporcional, a realização de outros
direitos constitucionais. 3. As limitações dos direitos
O exemplo sempre lembrado é o da regu-
humanos pelas relações
lamentação do sigilo de correspondência pela especiais de sujeição
Lei n. 7.210/1984, que permite a violação da
correspondência do preso (art. 41, parágrafo Há limitações de direitos humanos que re-
único), apesar de o art. 5º, XII, da CF/88 tratar sultam da inserção do titular desses direitos
da “inviolabilidade da correspondência” sem em uma situação de sujeição especial do indi-
qualquer ressalva ou permissão de violação víduo perante o Poder Público. Essa sujeição
“nos termos da lei”. A lei foi considerada váli- ocorreria em razão do dever de atendimento a
da, uma vez que a interceptação da correspon- determinadas necessidades sociais, que, sem
dência dos presos foi justificada em nome da tal sujeição, não teriam como ser atendidas.
preservação do direito à segurança de todos,
inclusive dos agentes penitenciários. Nesse O exemplo maior seria o regime jurídico
sentido, decidiu o STF que: especial dos membros das Forças Armadas,
submetidos a hierarquia e disciplina próprias,
[...] a administração penitenciária, com afetando os direitos dos militares, e que se-
fundamento em razões de segurança riam indispensáveis para a boa organização
pública, de disciplina prisional ou de castrense. A própria Constituição de 1988 im-
preservação da ordem jurídica, pode, põe limites expressos aos direitos humanos
sempre excepcionalmente, e desde que dos militares, em especial no art. 5º, LXI (“nin-
respeitada a norma inscrita no art. 41, guém será preso senão em flagrante delito ou
parágrafo único, da Lei 7.210/1984, proceder por ordem escrita e fundamentada de auto-
à interceptação da correspondência ridade judiciária competente, salvo nos casos
remetida pelos sentenciados, eis que de transgressão militar ou crime propriamente

219
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

militar, definidos em lei”), e ainda no art. 142, disciplinar das Forças Armadas – com o
caput e § 2º (“Art. 142. As Forças Armadas, amesquinhamento do princípio da legalidade
constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela e tipicidade, permitindo amplíssima dose
Aeronáutica, são instituições nacionais perma- de discricionariedade na caracterização
nentes e regulares, organizadas com base na e na dosimetria de sanções disciplinares
hierarquia e na disciplina [...] § 2º Não caberá pelo superior hierárquico – é proporcional
habeas corpus em relação a punições discipli- e atende as finalidades em uma sociedade
nares militares”). democrática? Do nosso ponto de vista, não
basta justificar esse regime (imposto pelo
Esse atendimento a necessidades sociais “Estatuto dos Militares”, Lei n. 6.880/1980)
diferenciadas seria o fundamento para deter- apenas alegando a “relação especial de
minadas restrições ou mesmo supressões de sujeição”, mas deve ser analisado o conflito
determinados direitos existentes em situações entre os direitos dos indivíduos (submetidos
análogas no seio da sociedade civil. Conse- a tal poder) e os direitos dos terceiros, que
quentemente, o regime jurídico dos direitos são beneficiados pela existência de uma
humanos de militares, funcionários públicos, Força Armada preparada e eficiente.
sentenciados, estudantes e internos da rede
escolar pública, entre outros, seria distinto, e
poderiam ser seus direitos menos abrangentes 4. A democracia apta a
do que os direitos dos demais indivíduos que se defender e a teoria
não estivessem em tal situação.
do abuso de direito
O princípio da supremacia do interesse
público sobre o interesse privado é a A limitação de direitos humanos por meio
justificativa da legitimidade de tais restrições da teoria do abuso de direito é fonte de muitas
a direitos humanos dos submetidos a uma polêmicas4. Esse instituto, originário do direito
relação especial de sujeição. Contudo, não privado, consiste na proibição do exercício de
se justifica, na atualidade, a invocação determinado direito que tenha como objetivo
sem maior discussão dessa supremacia a supressão de outros direitos humanos ou do
do interesse público. Ao contrário, há hoje regime democrático. Essa cláusula consta já
o critério da proporcionalidade que pode da Declaração Universal de Direitos Humanos,
orientar a interpretação dos direitos desses que em seu artigo 30 estabelece que nenhum
indivíduos, no choque com os direitos dispositivo da Declaração poderá ser interpre-
de terceiros e bens constitucionalmente tado no sentido de conferir direito a outrem
protegidos. Não cabe apenas invocar o de realizar atividades tendentes a supressão
regime de “relação especial de sujeição” para de qualquer outro direito ou liberdade5.
restringir determinado direito: é necessário
que tal restrição seja proporcional e, com 4 Por todos, ver CARVALHO RAMOS, André de. Teoria
isso, resolva de maneira adequada o conflito geral dos direitos humanos na ordem internacional.
entre o direito do indivíduo submetido a tal 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
relação especial de sujeição e os direitos da 5  Pouco tempo depois, a Lei Fundamental de
comunidade. Por exemplo, será que o regime Bonn estabeleceria que não tem direito à proteção

220
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Assim, percebemos, de início, a polêmica. similar, a saber, o artigo 17, que estabelece a
Não há proteção de direitos humanos para proibição do abuso de direito7.
determinadas atividades que tenham como
objetivo a destruição de outros direitos ou li- Nos primeiros anos de funcionamento do
berdades, em especial as referentes ao regime sistema europeu de direitos humanos, a Co-
democrático. O passado totalitário europeu missão Europeia manifestou-se, em 1957, so-
dos anos 1920 e 1930 (ascensão do nazismo, bre a dissolução do Partido Comunista Alemão
por meio de eleições na República de Weimar, (KPD) pelo Tribunal Constitucional (BVG) da
entre outros) gerou a preocupação de evitar República Federal da Alemanha em 1956. Dito
que o regime democrático cometesse suicídio partido foi dissolvido por ter sido considerada
ao proteger (pela liberdade de associação par- a ideologia marxista-leninista “antidemocráti-
tidária, reunião, expressão etc.) aqueles que ca”. Seus bens foram confiscados e proibiu-se
querem sua destruição. a criação de outras associações que o subs-
tituíssem. Em sua defesa, o Estado alemão
O risco é permitir que maiorias decidam apelou ao artigo 21.2 da Lei Fundamental de
que determinadas ideologias não possam ser Bonn, que permite a dissolução de partidos
livremente discutidas (e quiçá apoiadas) no que atentem contra a ordem constitucional, e
seio da arena democrática, pois seriam “anti- ainda ao artigo 17 da Convenção Europeia.
democráticas”6.
Em plena Guerra Fria, a Comissão Europeia
Ora, a proteção internacional de direitos de Direitos Humanos julgou a demanda impro-
humanos visa, precipuamente, garantir direi- cedente8, considerando ser plenamente com-
tos básicos aos seres humanos, mesmo contra patível com a Convenção esse tipo de restrição
Constituições ou leis locais. São as minorias à liberdade de associação e expressão. Foi le-
que necessitam de proteção de direitos. Esse vado em consideração que, embora o Partido
princípio contramajoritário, uma das peças Comunista não realizasse atividades reais de
angulares da proteção de direitos humanos, destruição do regime democrático (pelo con-
pode ser inócuo caso a teoria do abuso de trário, buscava o poder pelas vias eleitorais),
direito no campo dos direitos humanos seja não havia renunciado formalmente à “revolu-
constantemente invocada (CARVALHO RAMOS,
2015).
7  “Artigo 17º Proibição do abuso de direito.
A prática da Corte Europeia de Direitos Hu-
Nenhuma das disposições da presente Convenção
manos é valiosa, pois a Convenção Europeia se pode interpretar no sentido de implicar para um
de Direitos Humanos conta com dispositivo Estado, grupo ou indivíduo qualquer direito de se
dedicar a actividade ou praticar actos em ordem à
destruição dos direitos ou liberdades reconhecidos
constitucional aquele que abusar de seus direitos na presente Convenção ou a maiores limitações de
para combater o regime democrático (artigo 18). tais direitos e liberdades do que as previstas na
6  Ver mais em ROVIRA, José Antonio. El abuso de Convenção.”
los derechos fundamentales. Barcelona: Peninsula, 8  Não havia ainda o direito de acesso direto da
1983. vítima à Corte Europeia de Direitos Humanos.

221
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

ção bolchevique” ou à “ditadura do proletaria- Em 1998, a Corte Europeia foi chamada a


do” do ideário comunista. avaliar a conduta da França, que condenou,
por apologia de crime de guerra e colabora-
Assim, a Comissão não distinguiu atos ma- ção, os responsáveis pela publicação de anún-
teriais de discursos políticos (como é tradicio- cio pago no jornal Le Monde, no qual louvavam
nal na jurisprudência norte-americana sobre e pediam a reabilitação histórica e moral do
liberdade de expressão) e arquivou a demanda. Marechal Pétain, chefe do governo colabora-
Parte da doutrina criticou duramente essa de- cionista de Vichy na 2ª Guerra Mundial. O go-
cisão por considerá-la desproporcional e des- verno francês defendeu-se, alegando que teria
truidora do núcleo essencial da liberdade de existido abuso da liberdade de expressão. A
expressão9. França11 invocou, então, aplicação do artigo 17
da Convenção, que excluiria os demandantes
Após, no caso Lawless contra Irlanda, a da proteção do artigo 10, referente à liberdade
Corte Europeia analisou a situação de um tra- de expressão12.
balhador de Dublin que havia estado preso du-
rante quase seis meses em estabelecimentos A Corte reconheceu que os fatos
militares, suspeito do crime de terrorismo, mas narrados se referiam à “página dolorosa”
sem ser levado à presença de um juiz. O gover- da história francesa, na qual um ex­-herói da
no irlandês utilizou em sua defesa a “guerra 1ª Guerra Mundial havia-se transformado
contra o terrorismo” legitimada pelo artigo 17 em colaborador nazista. Contudo, para que
da Convenção. Nesse caso, a Comissão Euro- o artigo 17 fosse aplicável, seria necessário
peia decidiu processar o Estado e a Corte jul- que os atos impugnados incitassem ódio,
gou desproporcionais as medidas da Irlanda, violência ou meios ilegais para destruir os
pois a violação do devido processo legal em direitos previstos na Convenção, o que não
nada auxiliava a luta do Estado contra o IRA. se havia passado. Assim, para a Corte, a
interpretação do artigo 17 deve ser estrita,
O raciocínio da Corte foi simples: a teoria pois as democracias devem tolerar visões
do abuso de direito era inaplicável ao caso, díspares da história, sendo desproporcional
pois o Sr. Lawless10, em teoria, teria abusado o uso de sanções penais referentes ao crime
da liberdade de expressão e de associação, e o
Estado restringiu direito totalmente diverso, o 11  Como já abordei em obra própria, o Estado
responde por atos de seu Poder Judiciário. Ver
direito ao devido processo legal.
CARVALHO RAMOS, André de. Responsabilidade
internacional por violação de direitos humanos. Rio
de Janeiro: Renovar, 2004.
9  Ver mais em GARCIA ROCA, Javier. La problematica 12  Corte Europeia de Direitos Humanos, Caso
disolución del Partido de la Prosperidad ante Lehideux e Isorni vs. França, julgamento de 23 de
el TEDH: Estado constitucional y control de las setembro de 1998. Saliente-se que, de início, a Corte
actuaciones de partidos fundamentalistas. Revista distinguiu o caso em análise dos chamados “casos
Española de Derecho Constitucional, n. 65, p. 295 e de revisionismo”, nos quais a negação do holocausto
ss., 2002. judeu e dos campos de concentração não deveria
10  O sobrenome da vítima é uma incrível merecer a proteção do artigo 10, pois a liberdade de
coincidência com os fatos em debate. expressão não garante a mentira histórica.

222
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

de apologia de crime de guerra para punir a interessante observar que a Corte praticamen-
conduta em questão13. te não cita o artigo 17 (invocado pelo Governo
turco) e se apoia nos limites do artigo 11 (liber-
No Caso Vogt, por sua vez, a Corte dade de reunião e associação), que não pode
reconheceu que o princípio da “democracia ser invocado por aqueles que não defendem a
apta a se defender” (wehrhafte Demokratie) separação da Igreja e do Estado17, tida como es-
é acolhido pelo artigo 17 da Convenção, sencial para a garantia dos direitos humanos18.
mas é necessário que o Estado prove que
suas medidas são coerentes com um juízo Esse julgamento reacendeu a polêmica
completo de proporcionalidade (idoneidade, da democracia militante e da visão pro futuro
necessidade e proporcionalidade em sentido da eventual ameaça ao regime democrático. É
estrito)14. certo que a teoria do abuso de direitos aplica-
da ao pluralismo político deve sofrer escrutí-
Nos últimos anos, a Corte Europeia avaliou nio estrito e ser considerada uma intervenção
várias dissoluções de partidos fundamentalis- gravíssima nos direitos fundamentais, a ser
tas turcos15. Em 2003, por decisão unânime de justificada em poucas ocasiões, quiçá quando
uma Grande Sala (17 juízes), a Corte considerou o partido for mera camuflagem de uma asso-
legítima a dissolução do Partido da Prosperi- ciação armada. Nem é preciso dizer que a dis-
dade (Refah Partisi) da Turquia por ser funda- solução de partidos políticos representativos
mentalista islâmico e, com isso, atentar contra de parcela da população frustra toda a espe-
os fundamentos da República laica turca16. É

17  O que também é polêmico e parece destinar-


13  Cabe salientar que a decisão do caso “Pétain”
se apenas aos países islâmicos, nos quais os
não foi unânime.
fundamentalistas são apoiados por parcela
14  Corte Europeia de Direitos Humanos, Caso Vogt significativa do eleitorado, pois, em vários países
vs. RFA, julgamento de 23 de setembro de 1995, Série tidos como democráticos, a Igreja Católica ainda
A, n. 323. possui tratamento privilegiado, inclusive com
15  Vide os casos do Partido Comunista Unificado educação católica em escolas públicas, como na
(TKBP), do Partido Socialista (SP), do Partido da Espanha. A própria Corte Europeia de Direitos
Liberdade e Democracia (OZDEP), do Partido do Humanos, no caso Otto Preminger Institut, não
Trabalho do Povo (HEP), todos contra a Turquia. A condenou a Áustria por ter censurado a exibição de
linha de defesa do governo turco em todos eles foi a filme (Das Liebeskonzil, baseado em obra satírica de
luta contra o terrorismo curdo e o fundamentalismo Oskar Panizza e seu julgamento por blasfêmia no
islâmico. Conferir em ALLUÉ BUIZA, Alfredo. século XIX) considerado ofensivo à religião católica,
Pluralismo político en Turquia y el Tribunal Europeo alegando que a maioria católica austríaca deveria
de Derechos Humanos. Revista de Estudios Europeos, ter sua sensibilidade respeitada. (Corte Europeia
n. 34, p. 131-153, 2003. de Direitos Humanos, Caso Otto­Preminger Institut
16  Tal partido não era diminuto e contava, em 1996, vs. Áustria, julgamento de 20 de setembro de 1994,
com 156 dos 450 representantes da Assembleia Série A, n. 295).
Nacional. (Corte Europeia de Direitos Humanos, 18  Um mês depois, a Espanha dissolveu o Partido
Caso Refah Partisi vs. Turkey, julgamento de 13 de Henri Batasuna, considerado braço político do
fevereiro de 2003). grupo terrorista ETA.

223
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

rança de tomada do poder por meios demo- do à tortura, nem a tratamento ou castigo
cráticos (GARCIA ROCA, 2005, p. 295 e ss.). cruel, desumano ou degradante” (artigo V). A
Convenção Americana sobre Direitos Huma-
É patente que os novos desafios às demo- nos, por sua vez, dispõe que: “Artigo 5º. [...]
cracias (em especial o terrorismo) não podem 2. Ninguém deve ser submetido a torturas,
ser esquecidos. O papel da teoria do abuso de nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou
direito deve ser de reforço ao juízo de propor- degradantes. Toda pessoa privada de liber-
cionalidade das restrições necessárias em uma dade deve ser tratada com o respeito devi-
sociedade democrática, e nunca ser uma teo- do à dignidade inerente ao ser humano”. No
ria autônoma ou um cheque em branco para Brasil, o direito à integridade física e moral
que governos, mesmo que eleitos democrati- decorre do art. 5º, III, da CF/88, que protege o
camente, asfixiem ideologias minoritárias ou ser humano contra a tortura e o tratamento
divergentes. degradante e desumano (“III – ninguém será
submetido a tortura nem a tratamento desu-
Cabe agora analisar um tema recorrente na mano ou degradante”).
proteção internacional de direitos humanos,
que é o uso sistemático da tortura. Na atua- A intangibilidade física também impede
lidade, o cenário pós-11 de setembro de 2001 que haja condutas invasivas do corpo huma-
trouxe à tona práticas ambíguas de Estados no, sem a anuência do titular, salvo para pro-
Democráticos (como os Estados Unidos) no teção de outros valores constitucionais, como
uso da tortura como instrumento de combate para salvar a vida.
ao terrorismo, como veremos a seguir.
No campo penal, a utilização contra a von-
tade do titular de partes do seu corpo para
5. As situações de fins probatórios será enfrentada no comentá-
emergência e a tortura rio ao art. 5º, LXIII (“o preso será informado de
seus direitos, entre os quais o de permanecer
calado, sendo-lhe assegurada a assistência
O direito à integridade física consiste na da família e de advogado”), que concretiza o
intangibilidade física do ser humano, que direito de não ser obrigado a se autoincrimi-
merece proteção contra tratamento degra- nar (garantia contra a autoincriminação, nemo
dante, desumano ou tortura. Por sua vez, o tenetur se detegere).
direito à integridade psíquica ou moral im-
plica a vedação do tratamento desonroso ou Além disso, a Constituição dispõe, no inci-
que cause sofrimento psíquico desnecessário so III do art. 5º, que “ninguém será submetido
ou odioso19. à tortura”. Logo depois, no inciso XLIII do mes-
mo art. 5º, impõe que a lei “considerará crimes
A Declaração Universal dos Direitos Hu- inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anis-
manos prevê que “ninguém será submeti- tia a prática da tortura, [...]”, por eles respon-
dendo os mandantes, os executores e os que,
19  Por todos, ver CARVALHO RAMOS, André de. podendo evitá-los, se omitirem. Retomou-se,
Curso de direitos humanos. São Paulo: Saraiva, 2014. então, a previsão da Constituição Imperial de

224
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

1824, que em seu art. 179, XIX, estabeleceu: em seu artigo 5º, § 2º, estabelece o princípio
“Desde já ficam abolidos os açoites, a tortura, do aut dedere, aut judicare, pelo qual o Estado
a marca de ferro quente, e todas as mais penas contratante tem o dever de extraditar ou julgar
cruéis”. o torturador que esteja sob sua jurisdição,
não importando a nacionalidade do autor ou
Assim, chegamos a um dos mais graves da vítima, ou o local em que a tortura tenha
casos de limitação de direito por situações de ocorrido. Também estabelece o artigo 5º o
emergência, que é o uso da tortura fundada dever do Estado de criminalizar a tortura,
em “razão de Estado”, quer sejam Estados di- na hipótese de ela ocorrer em seu território
tatoriais, quer sejam Estados Democráticos em (princípio da territorialidade da lei penal),
momentos de “conjuntura de pânico”. ou, caso ocorra fora do seu território, for seu
nacional o autor (princípio da nacionalidade
No plano internacional, a Convenção das ativa, justificando a extraterritorialidade da lei
Nações Unidas contra a Tortura e outros trata- penal) ou a vítima (princípio da nacionalidade
mentos ou penas cruéis, desumanos ou degra- passiva).
dantes, adotada em 10 de dezembro de 1984
(promulgada internamente pelo Decreto n. 40, Assim, para essa Convenção, a tortura é
de 15.2.1991), designa tortura como: ato que inflige dores ou sofrimentos agudos
(físicos ou mentais), por agente público (dire-
[...] qualquer ato pelo qual dores ou so- ta ou indiretamente), para: 1) obter confissão;
frimentos agudos, físicos ou mentais, são ou 2) obter informação; ou 3) castigar por ato
infligidos intencionalmente a uma pessoa próprio ou de terceiro; ou 4) para intimidar ou
a fim de obter, dela ou de uma terceira coagir; ou 5) por discriminação de qualquer na-
pessoa, informações ou confissões; de tureza (por exemplo, torturar um homossexual
castigá-la por ato que ela ou uma terceira por sua orientação sexual).
pessoa tenha cometido ou seja suspeita
de ter cometido; de intimidar ou coagir A Convenção de 1984 é criticada por ter
esta pessoa ou outras pessoas; ou por adotado uma definição estrita de tortura,
qualquer motivo baseado em discrimina- dando a entender que a tortura não pode
ção de qualquer natureza; quando tais do- ser cometida por omissão e negligência.
res ou sofrimentos são infligidos por um Também foi alvo de polêmicas a menção a
funcionário público ou outra pessoa no “sanções legítimas” que descaracterizam a
exercício de funções públicas, ou por sua tortura, exigência na época da negociação
instigação, ou com o seu consentimento do tratado dos países que adotam castigos
ou aquiescência. corporais. Essa menção a “sanções legíti-
mas” pode ser utilizada de modo abusivo
A Convenção ainda determina que não por países, como os Estados Unidos, interes-
se considerarão como tortura as dores sados em justificar os seus meios de interro-
ou sofrimentos que sejam consequência gatórios de suspeitos de prática de atos de
unicamente de sanções legítimas, ou que terrorismo (ver mais sobre tratamento cruel
sejam inerentes a tais sanções ou delas e o artigo 16 da Convenção da ONU contra a
decorram. Por sua vez, a Convenção da ONU, Tortura a seguir).

225
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Por sua vez, a Convenção Interamericana c) a Convenção Interamericana tipifica como


para Prevenir e Punir a Tortura, de 9 de de- tortura o ato de imposição de sofrimento
zembro de 1985 (promulgada internamente físico e psíquico com “qualquer fim”;
pelo Decreto n. 98.386/1989), dispõe que a
tortura é “todo ato pelo qual são infligidos d) a Convenção Interamericana admite que
intencionalmente a uma pessoa penas ou pode ser tortura determinada pena ou
sofrimentos físicos ou mentais, com fins de medida preventiva; e
investigação criminal, como meio de intimi-
dação, como castigo pessoal, como medida e) a Convenção Interamericana criou
preventiva, como pena ou com qualquer outro a “figura equiparada”, ou seja, são
fim”. Tal convenção cria uma figura equipara- equiparadas a tortura medidas que não
da de tortura, ao dispor que também é tortura infligem dor ou sofrimento, mas diminuem
“a aplicação, sobre uma pessoa, de métodos a capacidade física ou mental.
tendentes a anular a personalidade da vítima,
ou a diminuir sua capacidade física ou men- Além dessas definições, cabe lembrar que
tal, embora não causem dor física ou angústia o Estatuto de Roma (que criou o Tribunal Penal
psíquica” (artigo 2º, parte final). A Convenção Internacional) definiu tortura como sendo
dispõe que não estarão compreendidos no
conceito de tortura as dores ou os sofrimen- [...] o ato por meio do qual uma dor ou
tos que sejam consequências unicamente de sofrimentos agudos, físicos ou mentais, são
sanções legítimas, ou que sejam inerentes a intencionalmente causados a uma pessoa
tais sanções ou delas decorram. que esteja sob a custódia ou o controle
do acusado; este termo não compreende
Comparando a Convenção das Nações Uni- a dor ou os sofrimentos resultantes
das de 1984 com a Convenção Interamericana unicamente de sanções legais, inerentes
de 1985, temos as seguintes convergências: a essas sanções ou por elas ocasionadas
(artigo 7.2).
a) ambas consideram tortura como
“sofrimentos físicos e mentais”; e O STF utilizou a definição de tortura pre-
vista na Convenção da ONU de 1984 (incorpo-
b) para fins de investigação penal, rada internamente em 1991) para dar sentido
intimidação, castigo pessoal. ao tipo estabelecido no art. 233 do Estatuto
da Criança e do Adolescente (“Art. 233. Subme-
As divergências, por sua vez, são as seguintes: ter criança ou adolescente sob sua autoridade,
guarda ou vigilância a tortura: Pena – reclusão
a) só a Convenção da ONU exige que a de um a cinco anos” – HC 70.389/SP, rel. p/ o ac.
tortura seja feita por agente público ou min. Celso de Mello, DJ de 10 ago. 2001).
com sua aquiescência;
Resta agora analisarmos o uso de “situa-
b) só a Convenção da ONU exige que o ções de emergência” como justificativa adota-
sofrimento seja agudo; da por Estados Democráticos para a tortura ou

226
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

o tratamento desumano e degradante, como A inspiração da redação do artigo 16 foi


se verá a seguir. fruto de tratamento desumano a prisioneiros
realizado em plena Europa democrática, no
seio da luta antiterrorista britânica.
6. A “cultura da tortura”
Em 1971, o Reino Unido deflagrou a “Ope-
nos Estados Democráticos e ração Demetrius” para reprimir ativistas sus-
a reação internacionalista peitos de integrar ou apoiar o Irish Revolutio-
nary Army (IRA), na Irlanda do Norte, e deteve
quase 350 pessoas. Várias delas foram sub-
No seu artigo 2º, a Convenção da ONU con- metidas às chamadas “cinco técnicas” (“five
tra a Tortura, tratamento desumano e degra- techniques”) de interrogatório, que consis-
dante (1984) prevê que o Estado deve tomar tiam em: obrigação de ficar de pé por horas
medidas eficazes de caráter legislativo, admi- e horas, usar capuz cobrindo toda a cabeça
nistrativo, judicial ou de outra natureza, a fim (retratada em foto célebre de prisioneiro ira-
de impedir a prática de atos de tortura em quiano na prisão de Abu Ghraib, Iraque, feita
qualquer território sob sua jurisdição. por soldados norte-americanos), sujeição a
ruído excessivo, privação de sono e privação
Circunstâncias excepcionais, tais como de comida e água por prazo indeterminado.
ameaça ou estado de guerra, instabilidade Tudo voltado para desorientar, enfraquecer,
política interna ou qualquer outra emergência gerar privação de sentidos, intimidar, obten-
pública, não poderão ser invocadas como jus- do a total sujeição do prisioneiro para seus
tificação da tortura em nenhum caso, nem a propósitos.
ordem de um funcionário superior ou de uma
autoridade pública poderá ser invocada para Essas técnicas são comumente conhecidas
justificá-la. como “tortura invisível” e foram usadas tam-
bém por diversas ditaduras no mundo. A Irlan-
A proibição internacional do uso da tortura da, então, processou o Reino Unido perante
é, então, absoluta. a Corte Europeia de Direitos Humanos (Corte
EDH), na primeira demanda interestatal de
Contudo, essa mesma Convenção criou todo o sistema europeu de direitos humanos20.
uma divisão entre “tortura” e outros atos que Contudo, a Corte EDH, em julgamento de 18 de
constituem tratamentos ou penas cruéis, de- janeiro de 1978, considerou que tais técnicas
sumanos ou degradantes, mas que não são não eram tortura, mas sim tratamento cruel e
considerados “tortura”, tal como definida no desumano proibido no artigo 3º da Convenção
artigo 1º. De acordo com o artigo 16, os Esta- Europeia de Direitos Humanos.
dos se comprometem a coibir e punir tais atos,
quando forem cometidos por funcionário pú- 20  Sobre o sistema europeu de direitos humanos,
blico ou outra pessoa no exercício de funções ver CARVALHO RAMOS, André de. Processo
públicas, ou por sua instigação, ou com o seu internacional de direitos humanos. 4. ed. São Paulo:
consentimento ou aquiescência. Saraiva, 2015.

227
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Por isso, em 1984, a Convenção da ONU século XXI voltaram-se para (i) defesa de tor-
quis evitar que Estados utilizassem essas téc- tura de prisioneiros na “guerra ao terror” ou
nicas (e outras) sob a alegação de que não se para (ii) entrega desses prisioneiros a Estados
trataria de “tortura”. Pelo artigo 16 da Conven- ditatoriais amigos para que sejam submetidos
ção, o tratamento cruel, degradante e desuma- à tortura (a chamada rendição extraordinária
no também deve ser coibido e punido. ou tortura indireta). Jackson (2007) adotou o
termo “cultura da tortura” para designar esse
Em 1999, mostrando a evolução do siste- tipo de ação dos Estados Unidos.
ma europeu de direitos humanos, a Corte EDH
modificou sua posição, citando expressamente Essa “cultura da tortura” desenvolveu-se
a Convenção da ONU contra a Tortura de 1984 após o 11 de setembro de 2001, resgatando o
no Caso Selmouni vs. França, e considerou que dilema da “bomba-relógio acionada” [ticking
atos como submeter o prisioneiro a “corredor bomb ou Situação de Bomba-Relógio (SBR)].
polonês” (fazê-lo correr entre duas fileiras de Esse dilema foi debatido intensamente em
policiais e ser espancado), assediá-lo verbal- Israel, que utilizou, rotineiramente e por dé-
mente pela sua origem árabe, colocá-lo como cadas, várias técnicas de tratamento desu-
alvo de urina de um policial, obrigá-lo a simu- mano em interrogatórios de palestinos. Em
lar sexo oral com um policial, ameaçá-lo com 1971, consta do relatório do Comitê Especial
uma seringa pretensamente contaminada, da Organização das Nações Unidas (ONU) para
entre diversas outras condutas descritas no investigar a conduta israelense em territórios
caso, foram além do tratamento degradante e ocupados o registro das seguintes práticas
consistiram em tortura. contra prisioneiros palestinos: (i) suspensão
do detento pelas mãos e simultaneamente
Para a Corte EDH, a tortura pode ser sin- tração dos seus outros membros por horas –
tetizada em atos, com características cruéis até a perda da consciência; (ii) queimadura de
e severas, de violência física e mental, consi- cigarro; (iii) golpes e apertos nos genitais; (iv)
derados em seu conjunto, que causam dor e venda e amarras por dias; (v) uso de cães (mor-
sofrimento agudo. Com isso, a Corte modificou didas); (vi) choques elétricos na boca, ouvido,
seu posicionamento, uma vez que adota a in- testículos etc.21
terpretação evolutiva da Convenção Europeia
de Direitos Humanos (tida como um “instru- Em 1987, após a morte de dois prisioneiros
mento vivo”), sustentando que atos que hoje palestinos, o governo israelense estabeleceu
são caracterizados como degradantes ou de- uma Comissão independente para auditar tais
sumanos podem, no futuro, ser caracterizados práticas (Comissão Landau, de três membros,
como tortura. presidida por um antigo membro da Suprema

Se, do ponto de vista do Direito Internacio- 21 Ver “Report of the special committee to investigate
israeli practices affecting the human rights of the
nal, há a proibição absoluta do uso de tortu-
population of the occupied territories”, em especial
ra, sendo considerada inaceitável sua prática
§ 107. Disponível em:<http://unispal.un.org/UNISPAL.
como restrição à integridade física e psíquica, NSF/0/BC776349EAEE6F28852563E6005EDF08>.
é notório que vários Estados Democráticos no Acesso em: 13 out. 2014.

228
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Corte de Israel, Moshe Landau). A Comissão A partir dos atentados de 11 de setembro de


concluiu que as forças de segurança de Israel 2001, surgem novos debates sobre a utilização
utilizavam vários métodos físicos de interro- de tortura por Estados Democráticos em
gatórios de modo secreto e posteriormente situações de emergência. Essas discussões
mentiam para ocultá-los (cometiam perjúrio). e discursos públicos formam uma “ideologia
Ocorre que a posição da Comissão Landau a liberal da tortura” (LUBAN, 2005), cujas
favor da permissão de “pressão física mode- principais características são: (i) busca de
rada”, desde que regulada pelo Poder Público, normalização da tortura por meio de normas
foi considerada uma violação da Convenção internas dos Estados Democráticos, o que
da ONU contra a Tortura, pelo Comitê contra a tornaria não mais uma prática camuflada,
a Tortura, que analisou o relatório do Esta- evitando-se a insegurança jurídica e eventual
do israelense22. O governo de Israel, assim, persecução criminal dos perpetradores;
adotou a visão do “mal menor” (lesser evil), (ii) identificação de um objetivo nobre
ponderando a violação da integridade física (salvar milhões, combater terroristas etc.),
e psíquica dos presos com o eventual valor tornando a tortura uma decisão justificada
da informação obtida para a defesa de outros moralmente, mostrando que sua prática nos
direitos, em clara violação da proibição ab- Estados Democráticos não visa subjugar,
soluta da tortura prevista no plano interna- amedrontar ou punir inimigos políticos; (iii)
cional (como vimos anteriormente). Em 1999, caráter não sistemático voltado a casos
a Suprema Corte de Israel decidiu que, caso extremos (“situação da bomba-relógio”,
os interrogadores estejam em uma situação por exemplo), o que tornaria a tortura uma
de “bomba-relógio acionada” e usem esses prática excepcional e por isso limitada a
métodos de tortura (pressão física modera- alguns membros isolados da sociedade; e (iv)
da, na visão judicial), sua responsabilização restrição dos métodos, evitando-se mortes,
criminal posterior deve ser examinada dian- mutilações, lesões corporais permanentes e
te da excludente do “estado de necessida- outras práticas de Estados ditatoriais, dando-
de”. Imseis (2001), em análise da temática, se preferência a métodos mais sofisticados,
apontou, inclusive, que os prisioneiros víti- como os de humilhação e esgotamento físico
mas desses interrogatórios, em geral, sequer e psíquico (a chamada “tortura invisível” ou
eram processados por crime ou, caso fossem “tortura light”), o que teria a vantagem de
processados, eram alvo de processos crimes obtenção do mesmo resultado sem a comoção
por posse de livros banidos, arremesso de mediática da tortura de estilo medieval.
pedras contra forças de segurança etc., rea-
lidade bem distante do que se esperaria de A união dessas características torna o uso
suspeitos de crimes graves. da “tortura invisível” cômoda para Estados De-
mocráticos liberais, que, assim, ganhariam a
vantagem retórica de separar a tortura tradi-
22  Ver “Concluding observations of the Committee
cional (feita por ditaduras e regimes inimigos)
against Torture: Israel. 12/06/94. A/49/44, paras.159-171”.
da “nova tortura”, que seria compatível com os
Disponível em: <https://unispal.un.org/DPA/DPR/
unispal.nsf/0/C4421732035B02F185256B1E00701601>.
princípios de promoção de direitos humanos
Acesso em: 13 out. 2014. das democracias.

229
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Ocorre que, como se viu nas práticas do Anteriormente, os Estados Democráticos


Reino Unido e de Israel, a separação entre a simplesmente negavam a prática de tortura
tortura tradicional e a tortura contemporânea nos seus conflitos internos ou guerras colo-
praticada por esses Estados é meramente for- niais, ou quando revelada, buscavam punição
mal, pois não elimina o intenso sofrimento e a mesmo que o algoz pudesse ser visto como
crueldade de todas essas práticas. Para fragili- mero bode expiatório. Com essa nova ideo-
zar ainda mais a vítima, esses métodos deixam logia, a diferença entre a tortura tradicional
(propositalmente) poucos rastros visíveis ou e a “tortura invisível” gerou a substituição do
evidências externas, retirando credibilidade debate sobre a proibição absoluta da tortura
do relato e dificultando a formação de rede ex- pela discussão da proibição de alguns méto-
terna de apoio, além de fazer com que a vítima dos de tortura. Ao mesmo tempo, foi mantido
seja vista como “instável” e “emocionalmente na aparência o compromisso político das de-
desequilibrada”. mocracias com a proteção dos direitos huma-
nos, pois essa tortura seria uma tática emer-
Sua introdução como conduta aceita acar- gencial – causadora de danos leves –, e não
reta, rapidamente, seu uso sistemático, con- uma opção por sadismo e brutalidade25.
trariando o seu alegado cunho excepcional
(para impedir um “mal maior”), como provam Esse “pacto sinistro” das democracias para
os casos de Israel (IMSEIS, 2001), do Reino Uni- permitir o uso da tortura é combatido pela in-
do (CONROY, 2000) e dos Estados Unidos23. terpretação internacionalista dos direitos hu-
manos, que mantém intacta a proibição abso-
Assim, a “ideologia liberal da tortura” é um luta da tortura, como se vê na declaração, de
mito e apresenta somente a novidade de justi- 2013, do relator especial sobre tortura e toda
ficar a prática de tortura ou mesmo para exer- forma de tratamento degradante, cruel e de-
cício de contorcionismo de linguagem, para sumano, Juan Méndez, do Conselho de Direitos
permitir que as autoridades públicas afirmem Humanos da ONU, confirmando que as práticas
que se trata de interrogatório coercitivo, físico de detenção indefinida, confinamento em soli-
ou avançado24. tária e alimentação forçada na prisão de Guan-
tánamo podem ser consideradas tortura, cuja
proibição é “absoluta e inderrogável”26.
23  Sobre os casos de tortura sistemática a
prisioneiros iraquianos, ver DEBATTO, David. A Roberta (Org.). Tortura na era dos direitos humanos.
contrainteligência do Exército dos Estados Unidos e São Paulo: Edusp, 2014. p. 69-96; em especial, p. 85.
o processo de interrogatório em um ambiente tático: 25  Ver WOLFENDALE, Jessica. Tortura “light” e a
o serviço de informações do Exército e o Corpo normalização da tortura. In: CARDIA, Nancy; ASTOLFI,
Médico do Exército. In: CARDIA, Nancy; ASTOLFI, Roberta (Org.). Tortura na era dos direitos humanos.
Roberta (Org.). Tortura na era dos direitos humanos. São Paulo: Edusp, 2014; em especial, p. 75.
São Paulo: Edusp, 2014. p. 241-251. 26  In verbis: “Therefore, the Special Rapporteur
24  Sobre o contorcionismo da linguagem para considers the practice of indefinite detention,
alterar percepção da realidade pela Administração other conditions applied to them such as solitary
Bush, ver WOLFENDALE, Jessica. Tortura “light” e a confinement, as well as the use of force feeding
normalização da tortura. In: CARDIA, Nancy; ASTOLFI, as forms of ill-treatment that in some cases

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TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Conclusão: a importância dos seriam destruídos pela invasão humana no es-


direitos humanos internacionais paço sideral.

nas situações de emergência Fazendo um paralelo com a “guerra ao ter-


ror”, uma consequência despercebida do uso
Isaac Asimov, em conto publicado em 1957 da tortura por parte dos Estados Democráticos
(The Gentle Vultures), retrata a dúvida ética no combate ao terrorismo é justamente a per-
de uma raça extraterrestre pacifista, que ob- da de identidade e a deformação dos valores
serva a humanidade em plena Guerra Fria, no de promoção de direitos humanos. Nesse mo-
aguardo de uma esperada guerra atômica, o mento, reafirma-se a importância da proteção
que destruiria ambos os lados e impediria que internacional dos direitos humanos, que mos-
os seres humanos se lançassem ao espaço si- tra uma decisiva baliza de proibição absoluta
deral com a sua agressividade intacta. Só que do uso da tortura, mesmo em situações de
o previsível holocausto atômico não ocorria emergência e ainda que tais atos contem com
ano após ano, gerando uma dúvida ética entre o apoio silencioso e omisso da maioria (em pâ-
esses seres pacifistas: deveriam eles mesmos nico) de uma sociedade nacional.
lançar um artefato nuclear, disfarçadamente,
em uma grande cidade da Terra, para desen- De fato, a “ideologia liberal da tortura”
cadear uma guerra atômica entre os blocos e mostra a importância da essência contrama-
salvar o espaço de uma agressiva invasão hu- joritária dos direitos humanos. Com efeito, os
mana? O final da história é a manutenção do direitos humanos desenvolveramse no plano
ideal pacifista: eles se negam a jogar a bomba, internacional para fornecer proteção ao indiví-
pois isso implicaria corromper seus princípios duo na falha do Estado. Por isso, as garantias
e a destruição do seu modo de vida, da mesma possibilitam o acesso do indivíduo a órgãos
maneira que – eventualmente – algum dia eles internacionais após terem sido esgotados os
recursos internos. A jurisdição internacional é
subsidiária, porém sua existência fornece uma
can amount to torture. He recalls that torture is última esperança aos que foram ignorados
unacceptable and abhorrent from a moral and legal no plano interno (CARVALHO RAMOS, 2015). O
perspective, and that its prohibition is absolute and
Estado fica obrigado a garantir direitos bási-
non-derogable. Torture exists at the far end of a
cos a todos sob sua jurisdição, quer nacional
continuum of maltreatment and lesser forms of ill-
quer estrangeira, mesmo contra a vontade
treatment are often a gateway to torture. This is why
the international law prohibition and its absolute das maiorias e as paixões de momento. Indi-
nature are equally applicable to torture and to all retamente, o Direito Internacional dos Direitos
forms of cruel, inhuman or degrading treatment or Humanos é essencialmente contramajoritário,
punishment. States cannot limit the application of pois as maiorias em geral são bemsucedidas
this prohibition under their domestic law for reasons no processo político e auferem a proteção
of public emergencies, anti-terrorism measures or pretendida. Não necessitam e não procuram
in the context of armed conflicts”. Disponível em: a jurisdição internacional. Essa será acionada
<http://newsarchive.ohchr.org/EN/NewsEvents/ justamente pelos grupos vulneráveis, que não
Pages/DisplayNews.aspx?NewsID=13859&LangID=E>. logram êxito no plano doméstico. Assim, as mi-
Acesso em: 25 out. 2014. norias (grupos não hegemônicos, mesmo que

231
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

numericamente superiores) têm dificuldade de CONROY, J. Unspeakable acts, ordinary


fazer valer seus pontos de vista nas arenas po- people: the dynamics of torture. New York:
lítica e judicial internas, exigindo uma alavanca: Alfred A. Knopf, 2000.
a proteção internacional dos direitos humanos.
GARCIA ROCA, Javier. La problematica
A qualidade contramajoritária dos direi- disolución del Partido de la Prosperidad ante
tos humanos internacionais se revela na pro- el TEDH: Estado constitucional y control de
moção de novas interpretações de direitos, las actuaciones de partidos fundamentalistas,
em busca de tolerância e emancipação, em Revista Española de Derecho Constitucional, n.
especial contra posições tradicionais (com 65, p. 295 e ss., 2002.
viés cultural, social ou mesmo religioso) das
maiorias. Não é possível esquecer que mes- IMSEIS, Ardi. Moderate torture on trial:
mo democracias consolidadas passam por critical reflections on the Israeli Supreme Court
conjunturas de pânico e podem sacrificar os judgement concerning the legality of General
direitos de minorias, como se viu na luta an- Security Service interrogation methods.
titerror no pós-11 de setembro de 2001 nos Berkeley Journal of International Law, v. 19, p.
Estados Unidos e em países europeus, o que 328 e ss., 2001.
torna indispensável a adesão dessas demo-
cracias aos direitos humanos internacionais e JACKSON, Richard. Language, policy and
seu consequente monitoramento27. the construction of a torture culture in the war
on terrorism. Review of International Studies, v.
33, n. 3, p. 353-371, 2007.
Referências
LUBAN, David. Liberalism, torture and the
ticking bomb. Virginia Law Review, v. 91, n. 6, p.
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. 1425-1461, 2005.
Tradução de Carlos Nelson Coutinho. São
Paulo: Campus, 1992. NOVAIS, Jorge Reis. As restrições aos direitos
fundamentais não expressamente autorizadas
CARVALHO RAMOS, André de. Curso de pela Constituição. Coimbra: Coimbra Ed., 2003.
direitos humanos. São Paulo: Saraiva, 2014.

. Teoria geral dos direitos humanos


na ordem internacional. 5. ed. São Paulo:
Saraiva, 2015.

27  Sobre o monitoramento internacional, ver


CARVALHO RAMOS, André de. Processo internacional
de direitos humanos. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2015.

232
Federazione Anarchica Informale (FAI):
o fenômeno do anarcoinsurrezionalismo
ou o terrorismo “do bem”

PIERANDREA TAURELLI SALIMBENI Romano Prodi, a FAI produziu um documento


intitulado “Sobre Nós – Carta Aberta aos anar-
Chefe de Polícia Adjunto quistas e antiautoritários”, no qual descreve
Direção Central da Polícia de Prevenção, suas estratégias e seus programas.
Roma, Itália
Nos dias seguintes, dando continuidade à
A atividade anarcoinsurrecionalista surge, operação anterior, em diversas partes da Eu-
na Itália, tal como a evolução radical do mo- ropa, a FAI iniciou a “Operação Papai Noel”,
vimento anarquista mais amplo. Dele, porém, fazendo chegar encomendas incendiárias tam-
se distingue por ter assumido conotações ni- bém aos seguintes políticos e órgãos da União
tidamente independentes e marcadamente Europeia:
subversivas.
• em 29 de dezembro de 2003, na sede
Sob um ponto de vista operacional, o re- da Europol, na Haia, Países Baixos,
belde teoriza para uma estrutura organizacio- destinada ao diretor Juergen Storbeck;
nal organizada de cima para baixo. Propõe o
estabelecimento progressivo de “grupos infor- • no mesmo dia, em Frankfurt,
mais” por “afinidade”, visando à “ação direta”, Alemanha, para o diretor do Banco
isto é, à prática de ataques “imediatos e des- Central Europeu Jean Claude Trichet;
trutivos” contra o Estado e o capital.
• em 30 de dezembro de 2003, na sede
A mais recente evolução das estratégias do Eurojust, na Haia, dirigida ao
subversivas de grupos anarquistas é, certa- presidente Michael G. Kennedy;
mente, representada pela Federação Anar-
quista Informal (FAI). • na manhã do dia 5 janeiro de 2004, em
Manchester, Reino Unido, destinada
A estreia da FAI ocorreu em dezembro de a Gary Titley, membro do Parlamento
2003. Desde então, essa sigla assumiu uma e do Partido Trabalhista britânico.
função de ligação entre algumas das forma- Na verdade, o pacote foi aberto pela
ções subversivas conhecidas por ataques na esposa do parlamentar fora da casa,
Itália em anos anteriores. pelo que a explosão não causou
ferimentos nem maiores danos;
Em seu primeiro ataque, feito no dia 23 de-
zembro de 2003, em Bolonha, perto da casa do • na manhã do mesmo dia, em Bruxelas,
então presidente da Comissão Europeia, Prof. Bélgica, no Parlamento Europeu, dirigida

233
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

ao então líder do Partido Popular Os ataques principais em ordem cronoló-


Europeu, Hans Gert Poettering. O gica reivindicados pela FAI continuaram até
envelope foi imediatamente incendiado, março de 2007, quando houve uma trégua ope-
causando danos apenas materiais; racional que durou quase três anos.

• ainda em 5 de janeiro de 2004, um


pacote muito semelhante, desta A segunda fase da FAI
vez desarmado pelo esquadrão
antibomba, chegou ao deputado e
líder do Partido Popular espanhol José Desde dezembro de 2009, antes do início
Ignacio Salafranca. do “Núcleo Olga”, destacaram-se três outros
grupos que aderiram ao “pacto federativo”:
O núcleo da “Carta Aberta” referida teve “Irmãs em Armas – Núcleo Mauricio Morales”,
como objetivo superar as limitações “de pro- “Célula Revolucionária Lambros Fountas” e
jetos individuais”. Convidava simpatizantes a “Célula Liberte Eat e Billy - FAI/FRI”. Somados,
um novo “sistema organizacional federativo” eles perpetraram um total de 11 ataques.
que reunisse a organização e o debate teó-
rico-prático com o anonimato dos grupos e Os nomes das novas formações, além de
indivíduos. homenagearem anarquistas mortos ou deti-
dos, demonstram sua intenção de expandir o
Segundo o modelo proposto, cada cé- “pacto de apoio mútuo”, tido como a “coluna
lula deveria associar-se para compartilhar vertebral da FAI”, para além das fronteiras na-
a abordagem revolucionária proposta, com cionais. Particularmente, tinham por alvo gru-
base na prática da luta armada, na informa- pos subversivos que operavam na Grécia e no
lidade organizacional e na falta de ambições Chile, com vistas a uma solidariedade revolu-
vanguardistas. Com esses pressupostos, os cionária comum.
grupos poderiam unir-se em um “pacto de
apoio mútuo” baseado em três pilares: a so- Um exemplo dos ataques dessa fase está
lidariedade revolucionária, as campanhas na campanha “Operação Coma os Ricos” ou
revolucionárias e a comunicação entre os “Queime os CIEs”1, das “Irmãs em Armas”. No
grupos/indivíduos. dia 15 de dezembro de 2009, um pacote com
explosivo é entregue ao CIE – Centro Deten-
Embora a estreia da campanha da FAI tivo para Estrangeiros, em Gradisca d’Isonzo,
contra objetivos da Comunidade Europeia não província de Gorizia. No dia seguinte, uma
se tenha expandido no plano internacional, bomba explode em prédio da Universidade de
o modelo de organização informal proposto Bocconi, em Milão.
teve grande número de seguidores nas fran-
jas mais radicais da política nacional. A sigla Nos dias subsequentes, os sites anarquis-
FAI converteu-se numa marca que emprestou tas da Internet publicaram um documento as-
certa coerência ideológica a várias ações ra-
dicais importantes. 1  CIE: Centro de Identificação e Expulsão.

234
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

sinado por “Irmãs em Armas – Núcleo Mauricio ofensiva global denominada “FAI – Frente Re-
Morales – FAI”, dividido em quatro partes. volucionária Internacional”.

A primeira parte reivindica a autoria da A primazia na criação de um eficaz projeto


bomba na Universidade Bocconi, em Milão. A transnacional deve ser creditada à organiza-
segunda parte, intitulada “A rádio, revistas e ção terrorista grega “Conspiração das Células
sites do movimento”, argumenta que o “pri- de Fogo (CCF)”, que faz sua aparição na Gré-
meiro ato” foi realizado “em resposta a um cia em 2008 e, desde então, é responsável por
apelo feito publicamente por Gabriel Pombo mais de 150 ataques terroristas.
da Silva à solidariedade internacional com as
lutas que se estendem dentro e fora das pri- Os ataques da CCF intensificaram-se
sões em todo o mundo”. após a morte do estudante grego Alexandros
Grigoropoulos, ocorrida no dia 6 de dezembro
A terceira parte, intitulada “Mensagem de 2008, em Atenas, em consequência de uma
numa Garrafa”, mais extensa que as demais, explosão que também atingiu um policial.
contém uma “carta aberta ao movimento
anarquista internacional pelas Irmãs em Ar- Entre 1º e 4 de novembro de 2010, a
mas – Núcleo Mauricio Morales”, com par- “Conspiração” enviou 14 bombas em pacotes
ticular destaque para o “fermento insurre- para várias missões diplomáticas em Atenas
cional na Grécia e no Chile”. Outro objetivo e várias autoridades políticas europeias,
dos autores dessa mensagem é responder à incluindo Nicolas Sarkozy, Angela Merkel e Silvio
“globalização da dominação com a internacio- Berlusconi. Os ataques foram reivindicados
nalização das campanhas de insurgência” e a em dois documentos, tornados disponíveis na
“criação de uma rede de apoio antirrepressi- Internet no dia 25 de novembro.
va, para apoiar aqueles que são forçados a se
esconder”. O segundo desses comunicados, mais im-
portante, representa uma espécie de plata-
A quarta parte do documento, intitulada forma ideológica e programática, que contém
“Pacto Associativo”, contém o já referido “So- o projeto de formar “uma rede internacional
bre Nós – Carta Aberta aos anarquistas e an- informal de grupos guerrilheiros e indivíduos
tiautoritários”, lançada originalmente em de- antiautoritários e autônomos”. O documento
zembro de 2003. também manifesta solidariedade com organi-
zações anarquistas mexicanas, presos chilenos,
argentinos e russos por ações libertárias, e faz
Desenvolvimentos internacionais acenos a uma “cooperação informal com a FAI”
italiana, referindo-se a sua carta aberta “Sobre
Apesar de os apelos à internacionalização Nós”, considerada “um marco e uma aposta que
das campanhas de insurgência remontarem ainda permanece relevante e essencial”.
ao documento de 2003, somente no final de
2010 acontecerá a união entre grupos gregos Os convites para intensificar ações de
e italianos, que somariam esforços para uma guerrilha foram explicitamente incorporados

235
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

no documento da “Federação Anarquista Infor- pirado pela Federação Anarquista Informal e


mal – Célula Revolucionária Lambros Fountas”, por seu documento de fundação já referido, do
que assumiu a autoria dos pacotes explosivos qual faz longas transcrições.
entregues em Roma, em 23 e 27 de dezembro
de 2010, às embaixadas da Suíça, da Grécia e Em 31 de março de 2011, a “FAI – Irmãs em
do Chile. Armas – Núcleo Mauricio Morales” assumiu a
denominação de “FAI – Rede Internacional”, e
A identificação dos alvos dos ataques enviou três pacotes explosivos ao quartel da
baseou-se numa lógica de solidariedade: para Brigada de Paraquedistas “Folgore”, em Livor-
a Grécia, o ataque se dirigia às “estruturas no, à prisão grega Korydallos e aos escritó-
que representam o Estado grego”, em adesão rios da Agência de Energia Nuclear em Olten,
ao apelo lançado pelo grupo “Conspiração”, Suíça.
em 25 de novembro, e “em solidariedade
aos companheiros presos em Atenas devido Na ocasião, também foram distribuídos
a seus vínculos com a CCF”. Em relação à envelopes contendo uma “contribuição para
Suíça, pretendiam iniciar uma “campanha o debate”, assinada pelo “Irmãs”. Nesse
revolucionária para seus companheiros de documento, aderem à “proposta de uma rede
equipe Mark, Billy, Costa e Silvia, submetidos informal anarquista internacional”, formulada
a assédio constante por parte das autoridades pela organização helênica “Conspiração das
suíças”. Finalmente, a escolha da embaixada Células de Fogo”.
do Chile deveu-se à situação específica dos
“camaradas chilenos, que estariam enfrentando A essa altura, já se haviam juntado aos
uma onda de repressão”. projetos acima mencionados, além da “FAI
– Célula Lambros Fountas”, formações insur-
Em 9 de janeiro de 2011, a “Conspiração das gentes da Argentina, do Chile e do México.
Células de Fogo – Comando Horst Fantazzini”
espalha na Internet uma mensagem que susci- No texto do “Irmãs”, são definidos os
ta a necessidade de se “criar uma rede interna- contornos da “rede internacional”, que se en-
cional de indivíduos anarquistas e grupos de tende como uma “ferramenta organizacional
solidariedade” para apoiar “ativamente” mili- que tem como objetivo as possibilidades de
tantes de “células”, a fim de iniciar um “perío- coordenação e de crescimento da insurgên-
do beligerante e uma boa oportunidade para cia”, confirmando a estrutura horizontal e in-
novos ataques”. formal. Mais uma vez, afirmam os princípios
orientadores da Federação Anarquista Infor-
O texto evoca, entre outros subsídios, “as mal estabelecidos no documento de funda-
bem orientadas discussões dos irmãos italia- ção de 2003, “Carta Aberta aos Anarquistas
nos da ‘FAI – Célula Revolucionária Lambros e Antiautoritários”, ao qual a organização
Fountas’, as quais definem os contornos da terrorista grega Células de Fogo também ex-
‘rede internacional’, com ‘estrutura horizontal pressamente se referira em seu documento
e aberta a qualquer pessoa que queira agir, in- divulgado na Internet em janeiro de 2011.
dividual e coletivamente”. Também se diz ins-

236
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Contribuições programáticas acordo informal da segunda geração das ‘Cé-


adicionais produzidas na lulas de Fogo’”, confirmando a importância da
reivindicação, da autonomia e da subdivisão da
Grécia e na Itália estrutura organizacional e enfatizando o papel
das lutas sociais e da ação direta militante.
Em 30 de junho de 2011, o site <www.
culmine.noblogs.org> transmitiu um panfleto O documento ainda propõe a utilização
intitulado “O sol também nasce”, desenvolvido do logotipo da “Conspiração das Células de
no mês anterior por militantes da “Conspiração Fogo” como o símbolo da luta internacional
das Células de Fogo”. anarquista.

Nesse texto, afirmando que a experiência Em uma divulgação datada de 9 novembro


da luta por eles lançada é parte de um ciclo de 2011, intitulada “Uma proposta para a Fe-
inicial que pode ser considerado concluído, os deração/Frente Revolucionária Internacional
autores fazem um apelo à formação de “uma Anarquista Informal”, os membros detidos da
nova conspiração, que inclui uma extensa rede CCF indicam os países em que há células que
de células invisíveis, que não têm razão de se aderiram ao modelo federativo – Itália, Ingla-
encontrar pessoalmente”, mas que devem agir terra, Chile, México, Argentina, Rússia, Holan-
“de forma coordenada e através de apelos pela da, Peru, Bolívia, Indonésia, Austrália e Grécia”
imprensa independente”. – e oferece-lhes um plano estratégico capaz
de exceder os limites da “minoria anarquista
Em 1º de agosto de 2011, aparece na rede de luta, fragmentada e isolada dentro dos li-
mundial um comunicado de imprensa intitula- mites nacionais de cada lugar”, por meio da
do “Não diga que nós somos poucos”, assinado, identificação de um tema comum de interven-
entre outras organizações, por “FAI – Coopera- ção que melhora a perspectiva revolucionária
tiva Artesãos de Fogo”, “Frente Revolucionária das ações.
Internacional”, “FAI – Brigada 20 de Julho”.
O artigo posiciona-se favoravelmente à
O panfleto, após reiterar que os ataques proposta da FAI italiana de adotar o emble-
de 31 de março de 2011 foram perpetrados pe- ma da “Conspiração” grega por grupos que se
las “Irmãs em Armas”, chama a atenção para o identificam com a Frente Revolucionária Inter-
renascimento “das cinzas do velho e glorioso nacional, com “a inclusão de seus nomes na
anarquismo individualista” de uma nova “or- estrela da anarquia” e o lançamento de um
ganização informal”, representada por grupos “apelo potencial” para a ativação da FAI/FRI,
“que são unidos por um pacto sólido e claro referente a campanhas de solidariedade revo-
de guerra”. lucionária internacionais específicas.

Os autores do texto, observando que os É claro que os membros detidos da “Cons-


camaradas gregos são a “força motriz dessa piração” adquiriram um papel central na pro-
explosão de vitalidade revolucionária”, dizem moção de uma estratégia global de campa-
que a FAI/FRI reflete “os três pontos-chave do nhas de insurgência por meio da telemática de

237
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

propaganda: “A comunicação é a base de toda campanha de solidariedade internacional em


a estrutura informal”. O meio virtual permite favor dos companheiros indonésios.
a promoção de novas propostas operacionais
para grupos pertencentes à FAI.
O aparecimento do
“Núcleo Olga FAI/FRI”
A “Célula Liberte Eat e Billy –
FAI/FRI” e a resposta aos apelos A FAI italiana atinge seu clímax “operacio-
dos camaradas gregos nal” no dia 7 de maio de 2012, com o ataque,
em Gênova, contra o CEO da Ansaldo Nuclear,
A esse respeito, foi emblemática a ofensi- Roberto Adinolfi.
va deflagrada por iniciativa da “Célula Liberte
Eat e Billy – FAI/FRI”, que enviou três pacotes A ação foi feita por duas pessoas com ca-
explosivos, entregues em 7, 9 e 12 de dezem- pacetes, uma das quais permaneceu a bordo de
bro de 2011, respectivamente, em Frankfurt, ao um scooter enquanto a outra, depois de ter-se
CEO do Deutsche Bank; em Roma, ao diretor- agachado por trás dos ombros do gerente, dis-
-geral da Equitalia; e, em Paris, à Embaixada parou com uma arma visando deliberadamente
da Grécia. a perna da vítima.

Nas mensagens encontradas junto aos O documento de reivindicação, intitulado


pacotes – apenas com ligeiras diferenças “Núcleo Olga – Federação/Frente Revolucioná-
na parte inicial –, os autores, entre outras ria Internacional Anarquista Informal”, leva o
questões, afirmam ter-se juntado “com estas logotipo da CCF.
ações pequenas, porém precisas” à Federa-
ção Anarquista Informal e à Frente Revolucio- No texto, os autores falam do projeto de
nária Internacional, adotando, pela primeira uma “organização de perspectiva informal” e
vez, o logotipo da “Conspiração das Células dos anarquistas gregos, que têm a “determi-
de Fogo”. nação e coragem para lutar, e cuja coerência
e planejamento os tornaram fortes”. Ademais,
As mensagens também expressam solida- afirmam-se próximos aos libertários “nas pri-
riedade a Gabriel Pombo da Silva, prisioneiro sões de todo o mundo” e aos “mortos pela re-
anarquista espanhol na Alemanha na época, e pressão do Estado”.
ao “FAI Indonésia”, em particular a dois de seus
militantes, Eat e Billy, presos pela polícia indo- Além disso, observa-se no manifesto a
nésia sob a acusação de terem promovido, em intenção de se estabelecer o “Núcleo Olga”,
Yogyakarta, um ataque contra uma instituição referindo-se a Olga Ikonomidou, militante da
de crédito. organização CCF, à qual é reconhecido o papel
de liderança e de propulsão. Também são in-
Parece claro que essas ações tiveram o dicados os nomes de outros sete “camaradas
propósito de atender ao chamado, lançado em gregos” detentos.
novembro precedente, de ativar uma ampla

238
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Cedo chega a “resposta” dos militantes do Após um período de estagnação, o plane-


CCF, por meio do comunicado de imprensa inti- jamento da FAI voltou a operar em 9 de abril
tulado “Balas de palavras para as balas do FAI/ de 2013. Nessa data, duas bombas contendo
FRI”, publicado na Internet no dia 14 de maio pequena carga explosiva são entregues às de-
de 2012. pendências do jornal La Stampa, de Turim, e
a uma agência de detetives particulares em
No artigo, os autores declaram, entre ou- Brescia, chamada Europol. Os atos são reivin-
tros pontos, que “chamar o Núcleo de Célu- dicados por uma “Federação Anarquista Infor-
la Olga, homenageando nossa amiga, é uma mal/Frente Internacional Revolucionária – FAI/
grande honra para nós e um profundo ato de FRI – Célula Damiano Bolano”, este um prisio-
amizade que nunca será esquecido”, realçando neiro militante da organização terrorista grega
a importância da FAI/FRI, chamada “a segun- “Conspiração das Células de Fogo”.
da casa da Conspiração e metade do nosso
coração”. O texto que assume a autoria dos ataques
denomina-os “Operação Caça ao Espião”,
Em 14 de setembro de 2012, em Turim e e chega no dia 12 abril de 2013 ao jornal Il
Gênova, agentes da Digos2, da Polícia de Esta- Secolo XIX, de Genova. Nele se afirma, entre
do, e agentes do ROS3, dos Carabinieri, detêm, outras questões, que a “campanha iniciada
em seguida a um mandado expedido pelo pelos companheiros do núcleo ‘Olga’ com a
procurador da República de Gênova para o emboscada a Roberto Adinolfi vai continuar”.
delito previsto no artigo 280 do Código Penal
(bombas para fins de terrorismo ou subver- Os autores declaram que a agência
são), dois militantes anarquistas insurrecio- de detetives foi “atacada” por ser uma
nais, acusados de serem os autores do ata- “colaboradora da repressão”, responsável por
que: Alfredo Cospito, de 45 anos, e Nicola Jai, ter “fornecido equipamentos ambientais, como
de 35 anos. microfones e micros”. Por sua vez, a escolha
do jornal La Stampa foi motivada na acusação
Os dois presos, que pertenciam à área de que o veículo “valida as reconstruções da
mais extrema e radical da insurreição, há anos polícia e dos carabinieri, especialmente quando
promoviam publicações em âmbito nacional, se trata de abater indivíduos ativos na guerra
com o apoio do companheiro ideológico Be- contra o Estado”.
niamino Anna Cospito, com a intenção de re-
vitalizar o planejamento subversivo da equipe Depois de fazer ameaças explícitas contra
anarquista. jornalistas, os autores do folheto dedicam a
ação aos “companheiros presos” nas prisões
de Ferrara e Roma, aos presos na Suíça,
2  Digos: Divisioni investigazioni generali e Espanha e Grécia, bem como a todos os anar-
operazioni speciali, unidades de polícia política para quistas apertados “nas prisões em todas as
defesa do Estado democrático. partes do mundo”.
3  ROS: Raggruppamento Operativo Speciale,
unidade da Arma dos Carabinieri.

239
Propostas para lidar com a violência
nas demonstrações públicas

JOSÉ MARIANO BENINCÁ BELTRAME Collor de Mello, em 1992. Elas tiveram aprova-
ção de pelo menos 84% da população.
Secretário de Segurança Pública do
Estado do Rio de Janeiro Em resposta, o governo brasileiro anun-
ciou várias medidas para tentar atender às
reivindicações dos manifestantes, e o Con-
gresso Nacional votou uma série de conces-
1. Contextualização sões (a chamada “agenda positiva”), como ter
tornado a corrupção um crime hediondo, ar-
Os protestos no Brasil em 2013, também quivado a chamada PEC 37 e proibido o voto
conhecidos como Jornadas de Junho, materia- secreto em votações para cassar o mandato
lizaram-se em várias manifestações populares de legisladores acusados de irregularidades.
por todo o País, que inicialmente surgiram para Houve também a revogação dos então recen-
contestar os aumentos nas tarifas de trans- tes aumentos das tarifas nos transportes em
porte público – principalmente em Manaus, Vi- várias cidades do País, com a volta aos preços
tória, Fortaleza, Natal, Salvador, Recife, Maceió, anteriores ao movimento.
Belo Horizonte, Brasília, Goiânia, Porto Alegre,
São Paulo e Rio de Janeiro – e ganharam inten- As manifestações no Brasil seguiram o mes-
so apoio popular após a forte repressão poli- mo processo de “propagação viral” de protestos
cial contra as passeatas, levando grande parte em outros países, como a “Primavera Árabe”, no
da população a apoiar as mobilizações. mundo árabe, “Occupy Wall Street”, nos Estados
Unidos, e “Los Indignados”, na Espanha.
Atos semelhantes rapidamente começa-
ram a proliferar em diversas cidades do Brasil A partir do final daquele ano, vários
e do exterior em apoio aos protestos, passan- protestos têm sido realizados no Rio de
do a abranger uma grande variedade de temas, Janeiro, mas com um número bem menor de
como os gastos públicos em grandes eventos manifestantes. Anarquistas aproveitaram
esportivos internacionais, a má qualidade dos as manifestações de junho para colocar em
serviços públicos e a indignação com a corrup- prática a tática conhecida como black bloc,
ção política em geral. Os protestos geraram que consiste em atacar e depredar símbolos do
grande repercussão nacional e internacional. poder e do capitalismo. Tem esse nome porque,
nas manifestações, os anarquistas, vestidos
Trata-se das maiores mobilizações a que com roupas e máscaras pretas, formam um
o País assistiu desde as manifestações pelo bloco de pessoas que se coloca entre a polícia
impeachment do então presidente Fernando e o restante dos manifestantes. A estratégia

241
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

ganhou notoriedade durante as manifestações Para o repórter Gerardo Lissardy4, da BBC


contra o encontro da Organização Mundial Brasil, no entanto, os protestos diminuíram
do Comércio (OMC) em Seattle, em 1999. em razão do fim da Copa das Confederações e
Segundo Marcia Cavallari, diretora do IBOPE dos cinco pactos prometidos pela presidente
Inteligência, o foco dos protestos “se perdeu Dilma Rousseff. Segundo Sonia Fleury, doutora
quando começaram as ações dos black blocs, em Ciência Política e coordenadora de estudos
e isso fez com que a grande maioria das sobre a esfera pública da Fundação Getulio
pessoas, as que querem se manifestar por Vargas, ouvida por Lissardy, a ação de grupos
causas legítimas, se inibisse”1. O jornalista radicais que adotam a tática black bloc pode
Kennedy Alencar2 notou a baixa presença de ter afastado muitas pessoas dos protestos.
manifestantes nos protestos marcados para 7 Pesquisa realizada pelo instituto MDA em
de setembro de 2013, apontando como causas novembro de 20135 indica que, enquanto 81,7%
para isso a falta de pautas específicas após da população apoia os protestos que ocorrem
a queda das tarifas do transporte coletivo e desde junho, 93,4% não concorda com a ação
o fim da PEC 37. Essa visão é compartilhada dos grupos que adotam a violência como
por Lúcio Gregori3, secretário de Transportes forma de protesto.
de São Paulo na gestão de Luiza Erundina e
inspirador do movimento pelo passe livre.
Contudo, Kennedy Alencar destaca também 2. Foco das propostas
que a baixa adesão aos protestos de 7 de
setembro se deveu ao fato de que a maioria da
população não desejava endossar a violência I - Não objetivam restringir ou limitar o
que, segundo ele, tomou conta dos protestos. legítimo direito de livre manifestação pacífi-
ca e ordeira, previsto em nossa Constituição
Federal (CF).
1  JIMÉNEZ, Carla. Os brasileiros desejam mudança,
mas não a veem representada na oposição.
El País, São Paulo, 15 fev. 2014. Disponível em:
II - Buscam, justamente, prevenir, garantin-
<ht tp://brasil.elpais.com/brasil/2014/02/16/ do que esse legítimo direito seja exercido com
politica/1392511161_834011.html>. Acesso em: set. a devida segurança física e jurídica pelos cida-
2016.
2  ALENCAR, Kennedy. Protestos perdem força no 7 4  LISSARDY, Gerardo. Mas, afinal, haverá protestos
de Setembro. Blog do Kennedy, 7 set. 2013. Disponível na Copa? BBC Brasil, Rio de Janeiro, 13 dez. 2013.
em: <http://www.blogdokennedy.com.br/protestos- Disponível em: <http://www.bbc.com/portuguese/
perdem-forca-no-7-de-setembro/>. Acesso em: set. not icia s/2013/12/13 1208 _ s e g ur anc a _copa _
2016. gl.shtml>. Acesso em: set. 2016.
3  AUGUSTO, Leonardo. Protestos podem influenciar 5  CALGARO, Fernanda. Brasileiros aprovam
as eleições e tirar o brilho da Copa. Estado de Minas, protestos, mas 93% rejeitam “black blocs”, diz
Belo Horizonte, 1º jan. 2014. Disponível em: <http:// pesquisa. UOL Notícias, Brasília, 7 nov. 2013. Disponível
www.em.com.br/app/noticia/politica/2014/01/01/ em: <http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-
inter na _ polit ic a ,4 8 3 8 41/prote s tos-podem- noticias/2013/11/07/maioria-aprova-protestos-
influenciar-as-eleicoes-e-tirar-o-brilho-da-copa. mas-93-dos-brasileiros-reprovam-black-blocks-diz-
shtml>. Acesso em: set. 2016. pesquisa.htm>. Acesso em: set. 2016.

242
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

dãos, ao dotar a sociedade de instrumentos ju- I - Coibir o anonimato.


rídicos voltados para a coerção de condutas ilí-
citas que possam ser praticadas por vândalos. II - Coibir a posse de objetos/instrumentos
que possam causar lesões nas pessoas ou da-
III - Não buscam comparar as condutas nos ao patrimônio público e privado.
sob análise com atos de terrorismo, mas
coibir, conforme os ditames constitucionais, as III - Evitar conflito de manifestações em um
condutas de grupos especificamente voltados mesmo horário e local.
para a prática de violência (por exemplo, black
blocs), que gravitam em torno dos legítimos TIPIFICAÇÃO PENAL:
movimentos sociais, denegrindo-os e
afastando grande parte da população ordeira I - De atos de vandalismo/desordem.
e pacífica, que vê frustrada sua iniciativa de
manifestação por não apoiar os atos violentos. II - De incitação e de associação para a
prática de vandalismo/desordem.
IV - A legislação vigente não confere aos
órgãos públicos os instrumentos jurídicos ne- III - PENAS MAIS RÍGIDAS – Evitar a aplica-
cessários e suficientes para o melhor desem- ção da Lei n. 9.099/1995 para esses delitos, a
penho de suas atribuições, considerando os fim de que o autor não possa livrar-se solto
diversos ilícitos observados em um contexto logo após a lavratura de termos circunstancia-
de desordem urbana e o imperativo legal de dos, bem como permitir o juízo de admissibili-
individualizar condutas, coletar provas peri- dade e concessão de fiança apenas pelo Poder
ciais e testemunhos em um ambiente caracte- Judiciário, com idêntico propósito de dificultar
rizado pelo caos urbano. a imediata liberação dos autores de infrações
penais previstas na referida proposta.
V - As propostas, longe de querer apresen-
tar pacotes legislativos fechados, objetivam IV - O dano ao patrimônio privado, contex-
suscitar a discussão em nossa sociedade so- tualizado no crime de vandalismo/desordem,
bre os limites que devem ser pactuados para passa a ser de ação penal pública, facilitando
essas condutas, em busca do aprimoramento a persecução penal.
do Estado Democrático de Direito, em que se
confrontam direitos igualmente tutelados por Na sequência, apresento-lhes dois ante-
nossa CF, como “o de livre manifestação do projetos de lei que remeti ao Ministério da Jus-
pensamento, vedado o anonimato”, e o “de lo- tiça e ao Congresso Nacional, precedidos das
comoção das pessoas e serviços”. respectivas justificativas. O primeiro deles tem
cunho mais administrativo, pois visa a dotar o
Estado de poderes de polícia mais incisivos e
3. Principais pontos abordados de caráter preventivo, como revistar pessoas
em busca de objetos perigosos e impedir a
anonimidade. O segundo cria tipos penais que
A REGULAÇÃO visa a: incriminam a violência e o vandalismo em de-

243
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

monstrações públicas, assim como a associa- III - mediante prévio aviso à autoridade po-
ção para essas finalidades. licial e de trânsito; e

IV - sem o porte ou uso de quaisquer ar-


4. Anteprojeto de lei que mas ou objetos que possam causar lesão ou
dano.
regulamenta o exercício do
direito à livre manifestação § 1º A vedação de que trata o inciso II do
do pensamento e respectiva caput deste artigo não se aplica às manifesta-
ções culturais estabelecidas no calendário ofi-
justificativa
cial da União, dos Estados, do Distrito Federal
e dos Municípios e a outros eventos de caráter
LEI Nº ........... , DE ...........DE ...........DE 2013. festivo, cultural ou religioso.

ESTABELECE PROCEDIMENTOS A SEREM § 2º Para os fins do inciso III do caput, a


OBSERVADOS PELOS ÓRGÃOS PÚBLICOS E PE- comunicação deverá ser feita às unidades de
LOS CIDADÃOS, PARA O PLENO EXERCÍCIO DOS polícia judiciária, de polícia ostensiva, e de
DIREITOS CONSTITUCIONAIS PREVISTOS NOS trânsito em cuja circunscrição se realize ou,
INCISOS IV E XVI DO ARTIGO 5º DA CONSTI- pelo menos, se inicie a reunião pública para
TUIÇÃO FEDERAL, NOS CASOS DE MANIFES- manifestação do pensamento, com a definição
TAÇÕES EM LOCAIS PÚBLICOS, E DÁ OUTRAS do local e horário de início e término previstos
PROVIDÊNCIAS. para o evento.

A PRESIDENTA DA REPÚBLICA § 3º Considera-se comunicada a autorida-


de policial quando a convocação para a ma-
Faço saber que o Congresso Nacional de- nifestação de pensamento ocorrer através da
creta e eu sanciono a seguinte Lei: internet, através de e-mail institucional, e com
antecedência igual ou superior a quarenta e
Art. 1º O direito constitucional à reunião oito horas.
pública para livre manifestação do pensamen-
to será protegido pelo Estado, através dos Ór- § 4º Incluem-se entre as armas e objetos
gãos de Segurança Pública e de Trânsito, nos mencionados no inciso IV do caput as de fogo,
termos desta Lei. brancas, produtos explosivos e incendiários,
pedras, esferas, estilingues, bastões, tacos e
Art. 2º O direito constitucional à reunião similares.
pública para a livre manifestação do pensa-
mento será exercido: Art. 3º É especialmente proibido o uso
de máscara ou qualquer outra forma de
I - pacificamente; ocultar a identificação do cidadão, enquan-
to durar ou logo após o exercício do direito
II - vedado o anonimato; de manifestação.

244
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

§ 1º O descumprimento da determinação Art. 5º Esta Lei entra em vigor na data de


contida no caput deste artigo ensejará a iden- sua publicação.
tificação obrigatória daquele que praticar o ato
e imediata retirada da máscara ou de qualquer Brasília, em de de 2013.
outro objeto ou meio que lhe oculte o rosto,
por parte da autoridade policial ou seus agen- DILMA ROUSSEFF
tes, com sua condução à unidade de polícia
judiciária, para registro.
Justificativa
§ 2º O descumprimento do disposto no
inciso IV do art. 2º desta lei ensejará a iden- Considerando que, dentre os princípios que
tificação obrigatória daquele que praticar o regem e garantem o funcionamento do Estado
ato, e a apreensão das armas ou objetos, pela Democrático de Direito, ganham especial des-
autoridade policial ou seus agentes, com sua taque as liberdades de expressão, de reunião
condução à unidade de polícia judiciária, para e a segurança, e que, em consequência, são de
registro, sem prejuízo das demais sanções cí- vital importância as medidas assecuratórias
veis e penais cabíveis. ao exercício pleno de tal liberdade.

§ 3º Na hipótese de reincidência nas con- Considerando que tais direitos, para que
dutas previstas nos §§ 1º e 2º deste artigo, no possam contribuir na construção de uma so-
prazo de até 30 (trinta) dias, poderá a autori- ciedade livre, justa, solidária e igualitária, só
dade policial representar pela aplicação pelo podem ser exercidos com integral obediência
Juízo competente da medida restritiva de proi- aos cânones da Paz Pública, insculpidos na
bição de participação em manifestações ou Carta Constitucional, com destaque, entre ou-
reuniões em locais públicos pelo prazo de até tros, para os incisos IX, XV e XVI do seu art. 5º,
120 (cento e vinte) dias. ou seja, na forma da lei, de forma pacífica e
sem armas.
Art. 4º Os órgãos de segurança pública e
de trânsito só intervirão em reuniões públicas Considerando o amplo noticiário recente,
para manifestação de pensamento a fim de evidenciando a prática reiterada de atos de
garantir o cumprimento de todos os requisitos vandalismo, com consideráveis danos a bens
do art. 2º ou para a defesa: públicos e particulares, bem como ameaças
graves e ofensas diretas à integridade física
I - do direito constitucional a outra reunião de pessoas inocentes, civis e policiais, apro-
anteriormente convocada e avisada à autori- veitando-se tais pessoas, para a prática des-
dade policial e de trânsito; sas ações, de manifestações legítimas e pací-
ficas, acabando por causar graves temores aos
II - das pessoas humanas; manifestantes ordeiros e assim prejudicando
o direito da maioria de exercer plena e livre-
III - do patrimônio público; mente seus direitos de expressão e reunião
pacíficas.
IV - do patrimônio privado.

245
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Considerando que tais condutas ofen- tem o dever de agir) a adotar medidas coerci-
dem, simultaneamente, vários bens jurídicos tivas de proteção à coletividade, em conformi-
relevantes, tais como a paz e a incolumidade dade com o ordenamento jurídico.
públicas, o patrimônio público e particular, o
livre exercício pelos cidadãos de bem dos seus Considerando, por fim, que, ao se impor
direitos de expressão e reunião, como desta- uma pena restritiva de direito (e não de liber-
cado acima, dentre outros. dade, que provocaria uma resistência fortíssi-
ma com invocações históricas etc.), através da
Considerando que tais ações vêm sen- manifestação fundamentada do Estado-Juiz,
do promovidas por grupos de pessoas que não se enfrentaria tanta resistência, quer jurí-
se organizam previamente, quer em caráter dica, quer social, uma vez que sua adoção seria
eventual ou permanente, o que torna maior a razoável, proporcional e na medida necessária
ameaça de tais condutas à paz e à ordem de- para o exercício do direito pela coletividade,
sejadas. não ferindo direitos outros assegurados pela
CF, e, ao mesmo tempo, se abrindo uma al-
Considerando que o Estado vem buscan- ternativa legal e sem malabarismos jurídicos
do medidas que assegurem o exercício regular para um trabalho sistemático das autoridades,
do direito à livre manifestação, e ao fazê-lo se visando à desestruturação de grupos de cri-
obriga à adoção de medidas que, adequada- minosos que se infiltram nas manifestações
mente harmonizadas com o ordenamento jurí- legítimas com objetivos escusos, evitando-se
dico, justificam a adoção de atos coercitivos de discussões jurídicas infindáveis.
identificação, condução e eventual emprego
da força adequada e progressiva, que se faça Toma-se a iniciativa de apresentar o pre-
necessária para o seu cumprimento. sente anteprojeto de lei, estabelecendo proce-
dimentos mínimos a serem observados pelos
Considerando que o estabelecimento pelo Órgãos Públicos e pelos cidadãos, para o pleno
Estado de procedimentos mínimos para o exercício dos direitos constitucionais previstos
exercício do direito de manifestação, apesar nos incisos IV e XVI do art. 5º da CF.
de sua natureza complexa, é positivo, uma vez
que nenhum direito é absoluto, nem mesmo o
direito à vida, pois a própria CF traz tal exce- 5. Anteprojeto de lei que
ção, logo, para que a coletividade possa exer- tipifica crimes de desordem e
cer o direito à manifestação, também é ne-
cessário que individualmente se estabeleçam
o de associação para sua prática
procedimentos mínimos a serem observados em demonstrações públicas
por todos os envolvidos.
LEI Nº ........... , DE ........... DE ........... DE 2013.
Considerando que aqueles que reiteram no
descumprimento dos requisitos legais para o TIPIFICA OS CRIMES DE DESORDEM E O DE
exercício da livre manifestação estão abrindo ASSOCIAÇÃO PARA PRÁTICA DE DESORDEM E
mão desse direito e obrigando o Estado (que DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.

246
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

A PRESIDENTA DA REPÚBLICA veis por crimes mais graves que a posse e o


uso de tais substâncias possam caracterizar;
Faço saber que o Congresso Nacional de-
creta e eu sanciono a seguinte Lei: III - ocorrendo saques, subtração ou apro-
priação de bens, públicos ou privados, sem
Art. 1º Os artigos 287-A e 288-B, ambos do prejuízo das penas aplicáveis aos autores de
Código Penal, passarão a vigorar com a seguin- tais atos, quando identificados;
te redação:
IV - se a incitação é praticada utilizando
“Art. 287-A. Praticar ato que possa causar meios eletroeletrônicos que facilitem a divul-
desordem em lugar público ou acessível ao gação da incitação, tais como radiodifusão, te-
público, agredindo ou cometendo qualquer levisão, internet, sistema de alto-falantes ou
ato de violência física ou grave ameaça à pes- congêneres;
soa; destruindo, danificando, deteriorando ou
inutilizando bem público ou particular; inva- V - atingindo bens de interesse histórico,
dindo ou tentando invadir prédios ou locais artístico ou paisagístico:
não abertos ao público; obstruindo vias públi-
cas de forma a causar perigo aos usuários e Pena - reclusão de 3 a 8 anos e multa, além
transeuntes; a qualquer título ou pretexto ou e sem prejuízo das penas correspondentes à
com o intuito de protestar ou manifestar de- violência e ao mencionado nos incisos II e III
saprovação ou descontentamento com relação acima.
a fatos, atos ou situações com os quais não
concorde: § 3º Se resulta lesão corporal de natureza
grave:
Pena - reclusão de 2 a 6 anos e multa, além
e sem prejuízo das penas correspondentes à Pena - reclusão de 4 a 10 anos e multa,
violência. pela simples participação nos atos de desor-
dem, além e sem prejuízo das penas cabíveis
§ 1º Nas mesmas penas incorre quem in- aos autores dos atos que tenham causado as
citar, publicamente, às práticas descritas no lesões, quando possível identificá-los.
caput.
§ 4º Se resulta morte:
Formas qualificadas
Pena - reclusão de 6 a 12 anos e multa,
§ 2º Se o crime é cometido: pela simples participação nos atos de desor-
dem, além e sem prejuízo das penas cabíveis
I - por ocasião de reuniões ou manifesta- aos autores dos atos que tenham causado a
ções públicas; morte, quando possível identificá-los.

II - com emprego de substância inflamável [...]


ou explosiva, sem prejuízo das penas aplicá-

247
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Art. 288-B. Associarem-se três ou mais aos cânones da Paz Pública, insculpidos na
pessoas, em caráter eventual ou permanente, Carta Constitucional, com destaque, entre ou-
para a incitação ou a prática de atos de de- tros, para os incisos IX, XV e XVI do seu art. 5º,
sordem, vandalismo ou qualquer forma de vio- ou seja, na forma da lei, de forma pacífica e
lência, a serem cometidos durante a realização sem armas.
de concentrações populares, seja a título de
manifestações ou de eventos de qualquer na- Considerando o amplo noticiário recente,
tureza, onde tais concentrações sejam previa- evidenciando a prática reiterada de atos de
mente agendadas ou estiverem ocorrendo: vandalismo, com consideráveis danos a bens
públicos e particulares, bem como ameaças
Pena - reclusão de 3 a 6 anos e multa. graves e ofensas diretas à integridade física
de pessoas inocentes, civis e policiais, apro-
Art. 163-B. Associarem-se, três ou mais veitando-se tais pessoas, para a prática des-
pessoas, em caráter eventual ou permanente, sas ações, de manifestações legítimas e pací-
para a prática de atos de vandalismo: ficas, acabando por causar graves temores aos
manifestantes ordeiros e assim prejudicando
Pena - reclusão de 2 (dois) a 6 (seis) anos o direito da maioria de exercer plena e livre-
e multa, além e sem prejuízo das penas comi- mente seus direitos de expressão e reunião
nadas no art. 163-A e seus parágrafos acima.” pacíficas.

Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de Considerando que tais condutas ofen-
sua publicação. dem, simultaneamente, vários bens jurídicos
relevantes, tais como a paz e a incolumidade
Brasília, em de de 2013. públicas, o patrimônio público e particular, o
livre exercício pelos cidadãos de bem dos seus
DILMA ROUSSEFF direitos de expressão e reunião, como desta-
cado acima, dentre outros.

Justificativa Considerando, por fim, que tais ações vêm


sendo promovidas por grupos de pessoas que
Considerando que, dentre os princípios que se organizam previamente, ainda que even-
regem e garantem o funcionamento do Estado tualmente ou em caráter permanente, o que
Democrático de Direito, ganha especial des- torna maior a ameaça de tais condutas à paz e
taque a liberdade de expressão e de reunião à ordem desejadas.
e que, em consequência, são de vital impor-
tância as medidas assecuratórias ao exercício Toma-se a iniciativa de apresentar o pre-
pleno de tal liberdade. sente Anteprojeto de Lei, propondo a alteração
do Código Penal, para nele introduzir a tipifica-
Considerando que tais direitos, para que ção de DESORDEM e atividades correlatas, res-
possam contribuir na construção de uma so- saltando que tal iniciativa já encontra similar
ciedade livre, justa, solidária e igualitária, só no direito comparado, inclusive na codificação
podem ser exercidos com integral obediência europeia.

248
Vandalismo, terrorismo e os dilemas e contradições
do debate sobre a tipificação penal no Brasil:
uma visão do Ministério Público brasileiro*

* Este artigo reproduz o cerne da palestra intitulada “Terrorismo e vandalismo – perspectiva do Ministério
Público Brasileiro”, proferida pelo autor em 8.4.2014, durante o Seminário Internacional sobre Terrorismo e
Outras Situações de Emergência, voltado a Membros do Ministério Público Federal, realizado em Brasília-DF
entre os dias 7 e 9 de abril de 2014.

JOSÉ ROBALINHO CAVALCANTI1 Art. 5º


Procurador Regional da República
[…]

XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis


1. Introdução – o atraso e insuscetíveis de graça ou anistia a
brasileiro no debate sobre a prática da tortura, o tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins, o terrorismo
tipificação do terrorismo e os definidos como crimes hediondos,
por eles respondendo os mandantes, os
O repúdio ao terrorismo é um dos prin- executores e os que, podendo evitá-los, se
cípios das relações internacionais do Estado omitirem [grifo nosso].
brasileiro, assim previsto na própria Constitui-
ção Federal (art. 4º, inciso VIII). Demais disso, o Brasil vem sendo
demandado nos foros de suas relações
Igualmente, a tipificação do terrorismo internacionais a cumprir os diversos acordos
como crime, e crime especialmente ofensivo à e tratados pelos quais se comprometeu a
sociedade, está prevista na própria Constitui- combater o terrorismo e seu financiamento,
ção Federal. O Constituinte originário de 1988, passando tal combate necessária e
assim, impôs verdadeiro mandado de tipifica- inicialmente pelo menos pela tipificação
ção deste delito: destas duas condutas como crimes.

Tal pressão legítima e essa necessidade


1 Titular do 2º Ofício da Procuradoria Regional
da República da 1ª Região. Um dos representantes reconhecida tornaram-se mais presentes e
do Ministério Público Federal em metas, ações e prementes nos últimos anos em decorrência
Plenária das ENCCLAs de 2007 a 2015. Presidente da de circunstâncias do cenário geopolítico inter-
Associação Nacional dos Procuradores da República nacional que repercutem com especificidades
(ANPR). Mestre em Direito pela Universidade de na realidade brasileira, e também a partir de
Brasília. decisões tomadas pelo próprio Brasil.

249
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Com efeito, por decisão e opção sua, o Mas não apenas a Copa do Mundo ou a
Brasil candidatou-se – e por sua relevância no Olimpíada justificam, evidentemente, a urgên-
cenário internacional, logrou êxito, e foi esco- cia de se enfrentar a questão da tipificação do
lhido – a receber em sequência eventos de im- terrorismo e do seu financiamento na ordem
pacto global, que trouxeram ao País pessoas jurídica brasileira.
de todas as nações, com destaque para a Copa
do Mundo de Futebol de 2014 e as Olimpíadas Já se disse mais de uma vez que o Brasil
de 2016. não é nem pode ser uma ilha na comunidade
internacional. Pelo contrário, por opção sobe-
Desde os trágicos acontecimentos de Mu- rana, comprometeu-se com essa comunida-
nique em 19722, o mundo aprendeu que, ainda de – mormente na esteira dos esforços que o
que busquem e celebrem a paz – ou talvez por mundo vem fazendo após os acontecimentos
isto mesmo –, eventos como estes são atrati- de 11.9.2001 – especificamente a tipificar o ter-
vos para atentados terroristas de todos os ma- rorismo e seu financiamento.
tizes. O País que se dispõe a receber eventos
deste porte, portanto, traz para seu território, Nesta linha, para além de quebrar sua pa-
desde logo, ainda que por algumas semanas, lavra e compromisso com as demais nações –
pressões e conflitos de todo o mundo. Em e poucas coisas, se é que alguma, poderiam
Munique, como paradigma, a então Alemanha ser mais vexatórias e perversas para qualquer
Ocidental estava distante do conflito árabe-is- nação –, se insistir em não enfrentar a questão
raelense, cujo capítulo sangrento se desenro- da tipificação específica do terrorismo e seu fi-
lou em seu território. Mas foram a nação e o nanciamento, cedo o Brasil enfrentará sanções
povo alemães que restaram marcados e per- internacionais, de jaez econômico e político.
plexos por estarem despreparados e permiti-
rem aquela tragédia. Por outro lado, o Brasil é um País de imi-
grantes, com economia moderna e integrada
O Brasil tem flertado – a esta altura, com (particularmente seu sistema financeiro), rela-
acentuado grau de irresponsabilidade insti- ções diplomáticas normais com todas as na-
tucional, vez que, instado insistentemente a ções, além de uma fronteira terrestre de mais
corrigir a inércia normativa, tanto por atores de 15.000 km, nem sempre povoada ou corre-
internos, como o Ministério Público Federal e tamente monitorada, com 10 diferentes países.
entes do sistema de defesa, como por parcei- Todos estes são fatores que aumentam o ris-
ros externos – com o mesmo risco. co de ser o País palco de ações terroristas e,
principalmente, de que ações desenvolvidas em
2 Em 5 de setembro de 1972, durante os Jogos seu território contribuam de alguma forma para
Olímpicos, terroristas da organização palestina eventos de terror ou do seu financiamento3.
Setembro Negro, em alegada resposta à criação
do Estado de Israel e abandono do povo Palestino, 3 A versão mais aceita sobre o ataque à Associação
invadiram a Vila Olímpica e atacaram a delegação Mútua Israelita na Argentina (AMIA), ocorrido em
de Israel, sequestrando alguns de seus membros. 18.7.1994 – o maior atentado reconhecidamente
Onze desportistas israelenses foram assassinados terrorista na América do Sul nas últimas décadas,
em diversos momentos do sequestro e nenhum que deixou 85 mortos – aponta que recursos
refém foi libertado com vida. financeiros para o ato, assim como seu próprio

250
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Deve-se ressaltar, porém, que a conceitua- ram soberanamente legislações aceitáveis por
ção e tipificação de terrorismo (da qual depen- seus pares no que tange a criminalizar espe-
de logicamente a de seu financiamento) não é cificamente o terrorismo e seu financiamento.
trivial ou fácil. Não o foi em qualquer lugar do Apenas o Brasil, entre os países relevantes,
mundo. parece ter optado, de forma inaceitável, pela
inércia e pela ausência.
Ao inverso, o conceito de terrorismo a ser
introduzido na legislação, mormente na le- Mais especificamente ainda, o debate pú-
gislação penal, é uma questão delicada, que blico e legislativo no Brasil parece ter estaca-
envolve o momento histórico e definições de do na última quadra diante de um dilema pró-
política interna e externa. prio, qual seja, a discussão e confusão entre
vandalismo e terrorismo. Questiona-se sobre
De fato, a depender da amplitude do se a legislação antiterror poderia, ou deveria,
conceito adotado, poderiam – e podem – ser abranger fenômenos próprios e recentes de
abrangidos, vale dizer, entendidos como terro- vandalismo, ocorridos no contexto de mani-
ristas ou envolvidos com o terrorismo, entes festações públicas e movimentos sociais.
estatais, forças armadas tidas como regulares,
agrupamentos políticos reconhecidos interna Trata-se, em larga medida, como se expõe
e externamente, grupos de resistência a movi- a seguir, de uma questão superestimada e de
mentos totalitários e movimentos sociais. um falso impedimento.

No mesmo diapasão, um olhar sobre o


direito comparado permite concluir que não
2. Vandalismo e
existe uma solução técnica ou dogmática uni- movimentos sociais
forme para a tipificação do terrorismo. Há pelo
menos duas grandes vertentes nas diversas “Vandalismo” é conceito inexistente no Di-
legislações: uma incorporando a tipos penais reito e no Direito Penal brasileiro.
pré-existentes, como elemento teleológico do
delito, o especial fim de agir, consubstancia- Todavia, para os fins do presente debate, e
do no objetivo político mediante causação de enquanto relacionado a movimentos sociais e
terror à população; e outra tipificando como manifestações públicas, poderíamos proviso-
terrorismo atos que define e que buscam ater- riamente definir vandalismo como atos de vio-
rorizar a sociedade ou setores dela. Cada uma lência contra a propriedade e/ou agentes do
dessas vertentes tem consequências técnicas Estado, incluindo, com destaque, a ocupação
e políticas que devem ser cotejadas. (inclusive violenta) de prédios e espaços pú-
blicos (interdição de ruas e estradas). Decerto
Todas as nações que compõem a comu- ainda sabemos pouco sobre esses aconteci-
nidade internacional, todavia, enfrentaram mentos recentes, inclusive como tratá-los e
esses dilemas, fizeram suas opções e adota- classificá-los. Mas são eles que, no Brasil, têm
sido usados como pretexto para interromper
autor, teriam ingressado no território argentino
o debate acerca da tipificação de terrorismo.
pela fronteira com o Brasil, na região de Foz do
Iguaçu-PR.

251
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Esses atos de violência no contexto de Ocorre que, entre os presos, achava-se um


movimentos e manifestações sociais são co- cinegrafista e em seu poder um vídeo no qual
mumente premeditados como táticas de luta, o próprio movimento documentava – provavel-
de reivindicação e de mensagem política. mente objetivando instruções para invasões
futuras – a organização e os atos preparató-
De fato, os movimentos sociais, ou ma- rios, bem como a intenção do movimento. Está
nifestações de alguma forma organizadas, claramente documentado ali que a invasão foi
trabalham com a hipótese de enfrentamento feita majoritariamente por militantes treina-
controlado com o Estado e, neste diapasão, dos e experientes, e que alguma resistência
aceitam o risco, ou mesmo têm a intenção dos policiais da Câmara dos Deputados ou de
direta de cometer crimes, em regra contra o outros servidores estava dentro das previsões,
patrimônio e contra a liberdade de locomoção, com instruções para que fosse vencida com
os quais veem como taticamente justificados e emprego de violência, se necessário.
como mensagem de luta.
O número de policiais no local escolhido
Como exemplo paradigmático – comprova- para invasão, contudo, foi maior do que o es-
do em autos criminais –, pode-se citar o caso perado, e houve previsível perda de controle
da invasão da Câmara dos Deputados por mi- da violência após iniciada.
litantes do Movimento de Libertação dos Sem
Terra, ocorrido em 6.6.2006. Neste ponto, o que importa aqui fixar é que,
fora e além de qualquer dúvida, o enfrentamen-
Neste conhecido e muito divulgado episó- to com agentes policiais do Estado, e mesmo, se
dio, mais de 500 militantes foram presos em necessário, a prática de condutas sabidamente
flagrante, após quebra-quebra e desordem ge- delituosas – como resistência e dano, além da
neralizados ao invadirem – e encontrarem re- invasão e perturbação do funcionamento de
sistência da Polícia da Câmara dos Deputados – uma das Casas do Congresso Nacional – esta-
o recinto da Casa Legislativa, ocupando o Salão vam desde sempre na esfera de previsão e de
Verde, único acesso ao Plenário deliberativo4. vontade/indiferença do movimento.

4 Foram presos 498 invasores em flagrante por


É possível, de outra parte, pela experiência
ordem do presidente da Câmara dos Deputados,
e observação de outros casos5, extrapolar que
o comunista e depois duas vezes Ministro dos
este é um padrão dos movimentos sociais
Governos do Partido dos Trabalhadores, Aldo
Rebelo. Destes, 116 tiveram condutas criminais
individuais identificadas, foram denunciados e ameaça, o livre exercício de qualquer dos Poderes
estão sendo processados. Há nesse processo 25 da União ou dos Estados. Pena: reclusão, de 2 a 6
acusações de lesão corporal leve, uma de lesão anos”.
corporal grave e uma de lesão corporal gravíssima, 5 O mesmo MLST, semanas antes, invadira, com
além de acusações de resistência qualificada, dano bons resultados na ótica do movimento – afinal
qualificado, formação de quadrilha e de ocorrência obtiveram promessas de liberação de mais verbas
da tipificação do art. 18 da Lei de Segurança para assentamentos –, o Ministério da Fazenda,
Nacional (Lei n. 7.170/1983), que dispõe: “Art. 18 - ocupando e impedindo o funcionamento do
Tentar impedir, com emprego de violência ou grave Gabinete do então Ministro, Antônio Palocci. O

252
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

nesse tipo de conduta (invasão de prédios pú- tos sociais. Afinal, é o próprio governo, como
blicos, de estradas ou áreas públicas). Se não condutor das políticas públicas e ao mesmo
há objetivo próprio (dolo direto) de chegar ao tempo guardião da ordem, o alvo das manifes-
cometimento de crimes, há indiferença com tações dos movimentos sociais de onde extrai
eventuais resultados violentos (que no con- seu apoio político.
texto do presente debate são considerados
vandalismo). Essa tensão veio se avivar a partir das
manifestações públicas ocorridas em 2013,
Mais ainda: não raro há – e isto também muitas delas, e infelizmente, da mesma forma
foi gravado e está comprovado no caso da in- descrita acima, descambando para episódios
vasão da Câmara dos Deputados –, por parte de violência, mormente de danos a agências
dos líderes dos movimentos sociais organiza- bancárias e equipamentos públicos.
dos, treinamento específico e instruções sobre
como desobedecer agentes do Estado durante Todavia, há dinâmicas e fenomenologias
a invasão ou posteriores ações de desocupa- distintas no “vandalismo” decorrente dos mo-
ção, e de como enfrentar agentes policiais. vimentos sociais tradicionais e organizados e
naquele decorrente das manifestações mais
Não cabe no escopo e nos limites des- modernas, espontâneas e organizadas fora
te rápido artigo aprofundar-se nos detalhes dos canais políticos tradicionais. Estas últimas
deste tipo de conduta, muito menos discutir constituem fenômeno recente, em estudo, cuja
sua legitimidade social e política. O certo e dinâmica completa ainda está por ser desnu-
insofismável é que episódios semelhantes dada e compreendida.
trouxeram para o debate público e político
no Brasil uma tensão permanente. Se há por O que se pode observar, contudo, de se-
parte de algumas forças sociais e políticas melhante com os movimentos e práticas de
pressão para que se aumente o rigor criminal “invasão” dos movimentos sociais tradicionais,
no controle – “criminalização dos movimen- desde logo, é a mesma intenção de enfrentar
tos sociais” –, há também a pressão destes o Estado, de testar e buscar os limites da le-
mesmos movimentos sociais para ampliar os galidade – muitas vezes negando em discurso
limites de tolerância de sua ação que, nestes sequer a possibilidade de controle legal sobre
casos, deliberadamente busca o enfrenta- os movimentos e suas reivindicações - e as-
mento com a ordem pública e com a lei. sumindo o risco de cometer crimes, de lesão
corporal e de dano, principalmente. Nesse
Essa pressão é particularmente impor- sentido, o caráter descentralizado e inorgâni-
tante e incômoda, considerando que o Poder co, e mesmo a ausência de lideranças formais,
Executivo brasileiro, sempre com maioria no não altera o fundamento de enfrentamento do
Congresso Nacional, tem sido chefiado, des- Estado e da ordem pública.
de 2002, por um partido político advindo da
esquerda e com sólidas bases nos movimen- O resultado é o recrudescimento da tensão
política e legislativa.
padrão foi em tudo semelhante ao episódio do
Congresso Nacional, embora em escala menor.

253
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

De um lado, forças políticas que pretendem aos atos de violência e a qualquer instrumen-
reprimir ou pelo menos regular os movimen- talização política dos movimentos.
tos sociais com uso também do Direito Penal
propõem medidas legislativas de controle e re- Este é, em apertado resumo, o quadro da po-
pressão aos movimentos sempre que descam- lêmica e do impasse real, em larga medida pa-
bem ou se inclinem para a violência, vale di- ralisante, que envolve os movimentos sociais, o
zer, para o “vandalismo”. Tais medidas, porém, assim chamado “vandalismo”, e a possível tipifi-
não raro abrangem mais que os atos violentos, cação ou o enquadramento penal de condutas.
pretendendo afirmar o controle pelo Estado
de aspectos das manifestações em si, pondo Mas o que tudo isto teria a ver com o terro-
em risco, em alguma medida, o direito consti- rismo? Vandalismo, ligado ou não a movimen-
tucional de livre manifestação e expressão. De tos políticos, não se confunde com terrorismo,
outro, os movimentos sociais e seus aliados não deve ser tratado da mesma forma ou pela
políticos6 acusam essas medidas legislativas mesma legislação. A confusão entre essas
de pretenderem mais do que a mera repressão duas questões tem uma banda de jogo político
à violência. Entendem que buscam o controle (pois também o terrorismo, como já citado, é
e a repressão dos próprios movimentos e de um conceito difícil e sensível) e outra de falta
suas pautas reivindicatórias. Evidentemente, de cuidado técnico.
pretendem sempre alargar o espaço de mani-
festação, ainda que disto resultem sabidamen- É o que será exposto em seguida.
te episódios pontuais de violência.

E, uma vez mais, há dificuldades em lidar 3. Vandalismo não é terrorismo


com essa dicotomia por parte das lideranças
políticas, notadamente aquelas ligadas de algu- O que se pretende aqui defender é que a
ma forma a um Governo que se pretende cau- confusão traçada no debate público brasilei-
datário dos movimentos sociais organizados. ro entre repressão ao vandalismo, mormente
vinculado aos movimentos sociais, e o terro-
A opinião pública, por sua vez, divide-se rismo e sua tipificação, é claramente indevida,
entre apoiar as metas e pautas levadas às ruas e contém má compreensão dos parâmetros da
pelos movimentos sociais7 e a repulsa clara legislação internacional antiterror.

“Vandalismo”, e muito particularmente os


6  O que, no caso dos movimentos mais recentes, atos de vandalismo identificados com movi-
é de muito mais difícil definição, uma vez que se mentos sociais, não se confunde com terroris-
caracterizam pela inorganicidade, ausência de mo, e se a tipificação penal em um e outro caso
lideranças formais e desvinculação com partidos tem questões delicadas a enfrentar, isto não
políticos ou sindicatos.
significa que sejam os mesmos dilemas. São
7  Relacionadas, no caso de 2013, ao mau questões separadas, que devem ser tratadas e
funcionamento de serviços públicos, à ineficiência
tipificadas de forma distinta. O único traço de
do Estado e ao combate à corrupção – todas
bandeiras extremamente populares. união entre ambas, de cunho pragmático, é o

254
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

evidente despreparo do Estado brasileiro para expressamente excluir de seu âmbito os movi-
lidar com elas. mentos sociais8.

A confusão conceitual e no debate político, Contudo, não parece exata, necessária, e


contudo, advém de considerar que, em ambos muito menos inevitável essa confusão entre
os casos, tanto no terror, quanto na violência terrorismo de um lado e vandalismo em mo-
praticada nas táticas ou nas franjas dos movi- vimentos sociais e manifestações de rua de
mentos sociais, a violência teria, e tem, moti- outro. Uma correta análise dogmática permite
vação política. separar os dois fenômenos.

Para os que seguem, então, expressa ou Com efeito, se admitimos existir violência
implicitamente, esta linha de raciocínio, qual- tolerada ou vinculada a movimentos sociais,
quer legislação que tipifique como crime atos é inescapável concluir que essa violência tem
de violência com teleologia política correria sé- objetivos políticos – no sentido mais amplo
rio risco de atingir, a um só tempo, os atos de da palavra. Nesse caso, também é inafastá-
terror e os movimentos sociais. vel concluir que essa violência não tem como
objetivo infundir o terror. Antes, pretende con-
Daí a resistência – ora explícita, ora passi- vencer ou mesmo coagir o Estado a objetivos
va, porém sempre equivocada – daqueles, den- políticos, mas não pelo terror. Vale dizer, não
tro e fora do governo e de sua base política, há ali a teleologia de apavorar a sociedade, ou
que enxergam na regulação da violência assim parte dela, tomando-a de refém, para desta
como na elaboração de uma efetiva legislação forma buscar seus objetivos políticos.
antiterror um atentado à liberdade de ação e
manifestação dos movimentos sociais. Não é qualquer violência que aterroriza, e
nem qualquer enfrentamento ao Estado, ainda
Ainda que esse receio fosse fundado, urge que violento, pode ser considerado, ou é con-
que ele seja vencido, quando menos, pelas ra- siderado pelo Direito e pelo Direito Penal, da
zões expostas na primeira parte deste artigo. mesma forma.

O Brasil simplesmente não pode mais per- 8 E este caminho – que é possível e aceitável, ainda
que não seja o mais adequado ou elegante – já foi
manecer na inércia, pois está obrigado por sua
traçado. De fato, a Comissão de Juristas indicada
Constituição, por tratados internacionais e pela pelo Senado Federal, que teve como presidente
sua relação com as nações a tipificar o terro- o ministro Gilson Dipp, do Superior Tribunal de
rismo e seu financiamento como condutas cri- Justiça, e como relator o procurador regional da
minosas. Os custos sociais, econômicos e rela- República Luiz Carlos dos Santos Gonçalves, em
cionais de permanecer na inação e descumprir solução sem dúvida política, porém corajosa, por
fugir ao impasse, propôs em seu art. 239 uma
suas obrigações são intensos e insuperáveis.
tipificação coerente e razoável de terrorismo, à qual
Decerto tem o Brasil a prerrogativa soberana de fez seguir a seguinte causa de exclusão: “§7º Não
definir os parâmetros e o alcance dos tipos pe- constitui crime de terrorismo a conduta individual
nais de terrorismo segundo suas conveniências, ou coletiva de pessoas movidas por propósitos
podendo até, se desejar, embora desnecessário, sociais ou reivindicatórios, desde que os objetivos
e meios sejam adequados a suas finalidades”.

255
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Ora, contemplando o direito comparado, ONU – [Resolução n. 1.566 do Conselho de


mesmo a vertente legislativa e dogmática de Segurança] – Atos criminosos contra civis,
tipificação do terrorismo mais aberta, isto é, objetivando morte, lesão corporal grave,
aquela que opta por uma descrição mais gené- ou tomada reféns, de forma a provocar
rica e abrangente, tem por parâmetro comum estado de terror no público em geral
e central que o ato incriminado só será con- ou em um grupo de pessoas, intimidar
siderado terrorista se nele for identificada a uma população ou compelir governos ou
teleologia de gerar terror. organismos internacionais a praticar ou
deixar de praticar qualquer ato10.
Em textos da Comunidade Europeia, por
exemplo, terrorismo é definido como ato in- Na primeira das soluções ou vertentes
tencional que, por sua natureza ou contexto, acima apontadas, aquela que identifica como
pode atingir um país ou organização, quando terrorista apenas o ato violento que tem como
o autor comete o ato com o fim de intimidar propósito expresso provocar o terror, desde
gravemente uma população, coagir poderes logo estaria afastado conceitualmente, dog-
públicos ou organizações internacionais, de- maticamente, qualquer ato violento derivado
sestabilizar ou destruir estruturas políticas ou ou tolerado por movimento social ou reivindi-
sociais fundamentais. catório (vandalismo), porquanto este não tem
o escopo de provocar o terror.
Em outras vertentes legislativas, a coação
ao Governo está incluída entre os objetivos No segundo campo de soluções, também
possíveis para os atos de terror, o que poderia adotado por diversos países e preconizado
abarcar possíveis atos perpetrados por movi- pelas Nações Unidas, além da teleologia de
mentos sociais. infundir terror, o conceito abrange também o
objetivo de coagir o governo, o que poderia
Porém, nesses casos, os atos em regra ape- apressadamente ser atribuído como objetivo a
nas serão considerados terroristas se atingirem muitos movimentos sociais quando estes ad-
pessoas ou, se dirigidos contra coisas, atingi-
rem a infraestrutura do Estado, tudo isso pre- sem efeito vinculante, conceitos de ato terrorista e
cisamente para diferenciar, definir e isolar com de terrorismo muito bem elaborados.
exatidão as condutas que a sociedade entende 10 Livre tradução pelo autor. No original: “Recalls
e quer punir como verdadeiramente terroristas, that criminal acts, including against civilians,
as quais, ademais, necessitam apresentar a te- committed with the intent to cause death or serious
leologia de aterrorizar ou trazer pânico. bodily injury, or taking of hostages, with the purpose
to provoke a state of terror in the general public
or in a group of persons or particular persons,
Sirva de exemplo, no sentido ora exposto, intimidate a population or compel a government
a sugestão da ONU para a definição de ato or an international organization to do or to abstain
terrorista9: from doing any act” Security Council Resolution 1566
(2004) Concerning Threats to International Peace and
9 Embora não tenha jamais obtido a um consenso Security Caused by Terrorism, 8.10.2004. Disponível
sobre a definição de terrorismo, a ONU, em em: <http://www.refworld.org/cgi-bin/texis/vtx/
algumas resoluções, discutiu e enunciou, decerto rwmain?docid=42c39b6d4>. Acesso em: 4 mar. 2015.

256
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

mitem práticas que bordejam a violência. No O certo, contudo, é que, como acima de-
entanto, nesses casos, para que um ato com monstrado, há várias soluções – e soluções
o propósito de coagir o governo seja rotulado testadas, já em aplicação em diversos países –
de terrorista, é preciso que ele se inclua numa que permitem definir com clareza o tipo penal
listagem de condutas em espécie, as quais de terrorismo sem que que se confunda inde-
sempre exigirão violência contra a pessoa ou vidamente com atos ordinários de violência, ou
grande abrangência ou sensibilidade da vio- mesmo com violência política pontual.
lência contra coisa. Tais exigências afastam
por completo as hipóteses de violência rela- Por certo existe alguma possibilidade de
cionadas com movimentos sociais. confusão entre o vandalismo dos movimentos
sociais e o terrorismo. Ambos são violência
Decerto existem outras experiências e so- política. Ambos são problemas sociais a serem
luções legislativas mais drásticas em países enfrentados, inclusive pelo Direito Penal. Mas
relevantes, a exemplo do Reino Unido e Es- espero aqui ter demonstrado que são fenô-
tados Unidos, que não poderiam ser discuti- menos também ontologicamente diferentes
das nos estreitos limites deste trabalho. Nes- e com níveis de gravidade e tolerância social
ses países, é possível considerar terroristas radicalmente distintos.
quaisquer atos de violência praticados com
fins políticos, ou com fins de coagir o Governo Da mesma forma, é a tipificação do ter-
ou aterrorizar a população. Sua transposição rorismo – e de seu financiamento – e não a
irrefletida para o Brasil poderia gerar confu- repressão a atos de violência pontual dos mo-
são e enquadramentos indesejáveis, inclusive vimentos sociais que reclama urgente discipli-
alcançando a violência praticada por movi- na legal, ditada por compromissos do Brasil
mentos sociais. perante a comunidade internacional – sem
prejuízo também de uma discussão sobre a
Trata-se sem dúvida de definições abran- adequação do quadro jurídico penal presente
gentes e fortes, inclusive para os países que as para o manejo da violência advinda dos movi-
adotaram. Todavia, é compreensível que assim mentos sociais.
seja por pelo menos duas razões: Inglaterra
e Estados Unidos são países com experiência No próximo tópico, à guisa de finalização,
traumática recente com atos terroristas inter- abordaremos alguns dilemas remanescentes
nos e externos; em segundo lugar, a fluidez dos que afetam potencialmente terrorismo, a vio-
tipos penais é temperada pela jurisprudência, lência oriunda de movimentos sociais e o im-
que faz o direito julgando os casos concretos, passe jurídico-político tratado neste artigo.
no sistema do common law e stare decisis, vi-
gente em ambos.
4. Caminhos da legislação
Foge ao escopo e é desnecessário para o
presente trabalho buscar a melhor definição
penal antiterror no Brasil
jurisprudencial e discutir os limites efetivos, e
não apenas nominais, do conceito de terroris- Depois de tudo que até aqui se disse, pode
mo nestas duas nações. parecer contraditório lembrar que o Brasil pos-

257
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

sui, nominalmente, tipos penais em pleno vi- grupamento que tenha por objetivo a
gor que tratam do terrorismo. Essa lembrança mudança do regime vigente ou do Estado
é necessária para que não se cometa o mesmo de Direito, por meios violentos ou com o
erro que impede sua aplicação ao terrorismo emprego de grave ameaça.
internacional.
[...]
Com efeito, o art. 20 da Lei n. 7.170/1983, a
Lei de Segurança Nacional, assim dispõe: Art. 17 - Tentar mudar, com emprego de
violência ou grave ameaça, a ordem, o
Art. 20 - Devastar, saquear, extorquir, regime vigente ou o Estado de Direito.
roubar, seqüestrar, manter em cárcere
privado, incendiar, depredar, provocar [...]
explosão, praticar atentado pessoal ou
atos de terrorismo, por inconformismo Art. 19 - Apoderar-se ou exercer o controle
político ou para obtenção de fundos de aeronave, embarcação ou veículo de
destinados à manutenção de organizações transporte coletivo, com emprego de
políticas clandestinas ou subversivas. violência ou grave ameaça à tripulação ou
a passageiros.
Pena: reclusão, de 3 a 10 anos.
São atos violentos específicos que, igual-
Parágrafo único - Se do fato resulta lesão mente, podem ser equiparados a terrorismo,
corporal grave, a pena aumenta-se até o não somente com base na experiência inter-
dobro; se resulta morte, aumenta-se até nacional mas também porque alguns deles são
o triplo. objeto de tratados internacionais.

Trata-se, por qualquer critério, de uma de- Como se sabe, essa legislação está em ple-
finição razoável de terrorismo. no vigor e foi considerada constitucional pelo
Supremo Tribunal Federal. No entanto, ela é
E há mais. A mesma Lei contém as seguin- inaplicável ao terrorismo moderno e, decor-
tes previsões: rentemente, para que se dê por cumprida a
obrigação internacional do Brasil de tipificar o
Art. 15 - Praticar sabotagem contra terrorismo.
instalações militares, meios de
comunicações, meios e vias de transporte, Não se trata simplesmente, como pensam
estaleiros, portos, aeroportos, fábricas, e defendem alguns no debate público, de rejei-
usinas, barragem, depósitos e outras tar a aplicação de uma lei porquanto oriunda
instalações congêneres. do ciclo ditatorial e não democrático do País,
o que é verdadeiro11. Em razão da ideologia da
[...]
11 Afinal, se assim fosse, com muito maior razão
seriam inconstitucionais o Código Penal e o Código
Art. 16 - Integrar ou manter associação, de Processo Penal, ambos oriundos do período do
partido, comitê, entidade de classe ou Estado Novo, ditadura getulista em que o presidente

258
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

segurança nacional que permeia esse diploma internacional ou sectário pode ser punido com
normativo, todas as condutas ali previstas só base na LSN.
são aplicáveis se executadas com fins políti-
cos, e com determinados fins políticos, quais Isto bem demonstra um risco a mais a ser
sejam, a subversão interna ou a derrubada dos considerado quando da tipificação do terroris-
poderes da República Federativa do Brasil. mo na legislação interna.
Nesse sentido dispõem os artigos iniciais da
Lei de Segurança Nacional: Muitos defendem como melhor e mais pre-
ciso tratar como terroristas apenas os atos
Art. 1º - Esta Lei prevê os crimes que lesam com expressa motivação política, afastando,
ou expõem a perigo de lesão: assim, do tratamento legal de terrorismo, atos
de criminosos comuns, ainda que visem de for-
I - a integridade territorial e a soberania ma imediata aterrorizar a população. Para esta
nacional; linha doutrinária – mais do que respeitável –,
sendo o fim mediato do crime organizado não
II - o regime representativo e democrático, alterar a sociedade ou coagir o Estado, e sim
a Federação e o Estado de Direito; o lucro, seus atos, ainda que externamente se
amoldem ao conceito, não deveriam ser trata-
III - a pessoa dos chefes dos Poderes da dos como terrorismo12.
União.
E, de fato, inegavelmente, o fenômeno cri-
Art. 2º - Quando o fato estiver também minal aí tem outras motivações e caracterís-
previsto como crime no Código Penal, no ticas, pelo que haveria razões consideráveis
Código Penal Militar ou em leis especiais, para que não fosse enquadrado em igualdade
levar-se-ão em conta, para a aplicação com o terrorismo.
desta Lei:
É o que expõe, por exemplo, em recente
I - a motivação e os objetivos do agente; artigo, o professor e subprocurador-geral da
República Carlos Eduardo Vasconcelos13, que,
II - a lesão real ou potencial aos bens como outros doutrinadores, entende que a so-
jurídicos mencionados no artigo anterior.
12 Para estes, os atos de organizações criminosas
como o Primeiro Comando da Capital, em São
Portanto, ainda que os atos de terrorismo
Paulo, que, em 2006, por razões indiscutivelmente
concretos sejam aqueles enumerados nos ar- vinculadas apenas a suas atividades criminosas,
tigos dos crimes em espécie, só seriam con- executaram atos generalizados e aleatórios de
siderados terroristas e atingidos pela lei se violência contra pessoas e serviços públicos, tendo
voltados para expor a perigo ou derrubar o por fim imediato (afinal atingido) aterrorizar a
Governo brasileiro. Nenhum ato de terrorismo população e interromper as atividades econômicas,
não seriam exemplos de terrorismo.
13 VASCONCELOS, Carlos Eduardo. Atos violentos
vistos no Brasil não são terrorismo. Revista Consultor
governava por decretos. Jamais foram discutidos Jurídico, 17 mar. 2014. Disponível em: <http://www.
por um órgão legislativo. conjur.com.br/2014-mar-17/carlos-vasconcelos-atos-

259
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

lução pelo prisma da dogmática seria afastar Contudo, o mais importante a destacar
estes crimes do tipo do terrorismo, prevendo é que esta é apenas uma das inúmeras so-
como elemento teleológico necessário do cri- luções possíveis e em aplicação em diversos
me o fim político. países. Não há posições certas ou erradas
aprioristicamente quando se está discutin-
A indagação a ser feita, contudo, é se, com do conceitos densos politicamente, como é o
esta exigência, não estaríamos recaindo no caso do terrorismo.
mesmo erro da Lei de Segurança Nacional.
Como visto, ela é inaplicável na prática preci- O Brasil, por meio de debates no Congresso
samente porque subordinou seus tipos ao ob- Nacional e com a sociedade, deverá fazer suas
jetivo político. Um determinado fim político, é opções. Como demonstrado, não há qualquer
verdade, a subversão interna, mas ainda assim risco, pelo menos no plano conceitual e dogmá-
teleologia política. tico, de se confundir o terrorismo com o vanda-
lismo vinculado a manifestações de rua e movi-
A verdade é que o terrorismo moderno mentos sociais.
não parece ser passível de enquadramento no
conceito estreito de objetivo político, por mais Trata-se de um falso dilema que, portanto,
que se o tente alargar. não precisa sequer ser superado, e sim cabal-
mente afastado, para que possa o Brasil en-
Há, por exemplo, o terrorismo sectário, frentar e vencer o desafio – urgente – de de-
o religioso, aquele praticado pelos chama- bater e tipificar os crimes de terrorismo e seu
dos “lobos solitários”, com tênues e confusas financiamento.
ideias de supremacia ou de ordens superiores
ou religiosas. São atos de violência aleatória
e/ou voltados para aterrorizar a sociedade, ou
parte dela, que são universalmente tratados
como atos terroristas e que poderiam escapar
dessa malha, se o Brasil vier a optar, eventual-
mente, por amarrar os conceitos de terrorismo
de sua legislação a fins políticos.

O terrorismo talvez seja então melhor e


mais completamente definido como um méto-
do, como um ato de violência com teleologia
própria, sim, mas não necessariamente políti-
ca, e sim voltada para o fim de aterrorizar. Se o
fim mediato e secundário é político, religioso,
sectário, étnico ou simplesmente oriundo das
profundezas da individualidade, pouco importa.

violentos-vistos-brasil-nao-sao-terrorismo>. Acesso
em: 4 mar. 2015.

260
3. FACÇÕES CRIMINOSAS
Gênese e evolução da organização criminosa
Primeiro Comando da Capital (PCC)

LINCOLN GAKIYA laram quase que simultaneamente no estado,


evidenciando o alto poder de mobilização e a
Promotor de Justiça do
demonstração de força da facção na tentativa
Ministério Público de São Paulo
de intimidar as autoridades constituídas.
Membro do Grupo de Atuação
Especial de Combate a Organizações Em 2002, o PCC foi responsável por vá-
Criminosas (GAECO) rios atentados contra autoridades e insta-
lações públicas. Nesse período já se iniciava
uma disputa interna pelo poder.
1. Histórico
Em novembro daquele ano, um dos fun-
dadores da facção, Marcos Willians Herbas
O Primeiro Comando da Capital (PCC) foi Camacho, conhecido como Marcola, assumiu a
fundado em 1993, durante uma rebelião no liderança geral do PCC, destituindo os líderes
Centro de Reabilitação Penitenciária, anexo à Geleião e Cesinha, que, expulsos, fundaram o
Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté, em Terceiro Comando da Capital (TCC), facção que,
São Paulo. Alguns presos que articularam a com a morte de Cesinha e outros, aos poucos
rebelião criaram a facção com o nome ins- foi sufocada pelo PCC, não conseguindo até
pirado no time de futebol do presídio. hoje ter expressão nem dentro nem fora das
prisões do Estado de São Paulo.
Constatou-se que um dos objetivos maio-
res da criação dessa facção criminosa foi o de Em março de 2003, sob a liderança de
propiciar o controle da massa carcerária e o Marcola, o PCC teria determinado o homicídio
monopólio do crime no estado. do juiz Antonio José Machado Dias, da Vara de
Execuções Penais de Presidente Prudente-SP,
Em 18 de dezembro de 2000, uma rebelião também responsável pela execução das pe-
ocorrida na Casa de Custódia de Taubaté, do- nas impostas aos presos que se encontravam
minada pelo PCC, terminou com um saldo no Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) de
de nove presos mortos (quatro deles decapi- Presidente Bernardes. A morte do magistra-
tados) e a destruição total do espaço físico da do representou um duro atentado contra o
unidade. Estado.

No dia 18 de fevereiro de 2001, após or- No início de novembro de 2003, a facção


dens da liderança do PCC, ocorreu a denomi- desencadeou uma série de ataques na cidade
nada “megarrebelião”, quando presos de 25 de São Paulo, ocasião em que dois policiais
presídios e quatro cadeias públicas se rebe- militares morreram e cinco restaram feridos.

263
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

A partir de 2006, o PCC estruturou-se como 2012, um “salve” que partiu da liderança do PCC
uma verdadeira organização, com escalões de reclusa na Penitenciária II de Presidente Ven-
hierarquia e funções bem definidas, disciplina ceslau determinou o assassinato de policiais
rígida, criação de um setor jurídico, corrupção militares do estado, em represália ao combate
de autoridades, tentativa de se infiltrar no que as forças de segurança pública vinham tra-
meio político, compartimentação de funções vando com integrantes da facção em liberda-
e informações, utilização de empresas de fa- de. O “salve”, que preconizava que para cada
chada etc. bandido morto em confronto dois policiais mi-
litares deveriam ser assassinados, foi atendido
Em maio do mesmo ano, depois da transfe- pelos “soldados” do PCC, resultando no assas-
rência de cerca de 700 presos para a Peniten- sinato de 106 policiais militares no Estado de
ciária II de Venceslau, entre eles os principais São Paulo até o mês de dezembro de 2012.
líderes do PCC, a facção promoveu intensas re-
beliões e atentados contra agentes do Estado e
instalações, provocando a morte de vários po-
liciais, agentes penitenciários e guardas civis, o
2. Do atendimento do conceito de
que gerou grande pânico na população e uma organização criminosa, nos ter-
“crise” na segurança pública paulista. mos da Convenção das Nações
Unidas contra o Crime Organi-
Em agosto de 2006, foi registrada uma
nova série de ataques. Além disso, um repór- zado Transnacional (Decreto n.
ter da Rede Globo foi sequestrado e um vídeo 5.015/2004) e da Lei n. 12.694/2012:
foi entregue à rede de televisão para que ela precedentes jurisprudenciais
o exibisse durante a programação em troca da
libertação de seu funcionário. A mensagem
lida pelo integrante do PCC fazia críticas ao Segundo a Convenção das Nações Unidas
sistema penitenciário, pedindo revisão de pe- contra o Crime Organizado Transnacional, rati-
nas e melhoria nas condições carcerárias e ficada pelo Decreto n. 5.015/2004, considera-
posicionando-se contra o RDD. -se “grupo criminoso organizado” todo aquele
“ [ . . . ] estruturado de três ou mais pessoas,
Posteriormente, a facção ainda foi existente há algum tempo e atuando concerta-
responsável pelas mortes de Wellington damente com o propósito de cometer uma ou
Rodrigo Segura, diretor do Centro de mais infrações graves ou enunciadas na pre-
Detenção Provisória (CDP) de Mauá, no dia sente Convenção, com a intenção de obter,
26 de janeiro de 2007, e de Denílson Dantas direta ou indiretamente, um benefício eco-
Gerônimo, agente penitenciário do Centro de nômico ou outro benefício material”.
Readaptação Penitenciária (CRP) de Presidente
Bernardes, em maio de 2009, na cidade de Por sua vez, a Lei n. 12.694/2013, no art.
Álvares Machado-SP. 2º, define organização criminosa a associação,
de três ou mais pessoas, estruturalmente
Ainda numa clara demonstração de desa- ordenada e caracterizada pela divisão de
fio ao poder constituído do Estado, no ano de tarefas, ainda que informalmente, com

264
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

objetivo de obter, direta ou indiretamente, na dicção legal (art. 334, inciso I, do Código de
vantagem de qualquer natureza, mediante a Processo Civil), que independe de prova.
prática de crimes cuja pena máxima seja
igual ou superior a quatro anos ou que sejam Vejamos a seguir o atendimento dos requi-
de caráter transnacional. sitos mencionados para a caracterização do
PCC como organização criminosa.
O Primeiro Comando da Capital qualifica-
-se como grupo criminoso organizado, nos
termos da definição contida na Convenção 3. Da estrutura ordenada e
das Nações Unidas, assim como organização hierarquizada: organograma
criminosa, nos termos da Lei n. 12.694/2013.
Nesse sentido, aliás, já se manifestou o
e divisão de funções
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo,
ao julgar os autos de apelação n. 0012137- 3.1. Organograma e
65.2008.8.26.0576, da Comarca de São José do
divisão de funções
Rio Preto, oportunidade em que reconheceu a
existência do PCC como organização criminosa
armada, que atua dentro e fora dos presídios Com o objetivo de se estabelecer um enten-
paulistas, seja pelos inúmeros processos dimento prático relacionado às funções e aos
envolvendo a facção, seja pelo farto noticiário limites de atribuições de cada integrante do
que é veiculado pela imprensa a esse respeito, PCC, ao longo dos anos, por meio de análise,
o que constitui, por si só, um fato notório, busca e coleta de dados, foi possível traçar

265
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

e definir, dentro da organização criminosa, a PCC, estão aquelas em que integrantes


estrutura geral dessa facção, que pode ser vi- selecionados pela cúpula da facção reclusa
sualizada no organograma a seguir. na Penitenciária de Presidente Venceslau II
recebem a incumbência de exercer o papel
de liderança máxima fora do sistema
3.1.1. Terminologia empregada na penitenciário, disseminando a ideologia
designação das funções e das criminosa e aplicando a disciplina da
atividades ilícitas facção aos integrantes em liberdade,
com delegação de poder e autonomia
para cumprir as metas impostas pela
Na sequência, explica-se a terminologia cúpula reclusa, coordenando todas as
utilizada no organograma, indicada em cada ações criminosas de rua, com prestação
um dos quadros e campos que o compõem. de contas diretamente aos integrantes da
sintonia final geral da facção.
- Sintonia Final Geral: Setor correspondente
à cúpula da facção, composta por - Sintonia dos Gravatas: Setor responsável
sentenciados considerados fundadores da por contratar e disponibilizar advogados
organização criminosa, compreendendo para atuar para a facção.
o líder máximo, o sentenciado Marcos
Willians Herbas Camacho, vulgo Marcola, - Sintonia do Financeiro: Setor em que
e, logo abaixo na escala hierárquica, os são colocados apenas integrantes de
sentenciados Abel Pacheco de Andrade, alta confiança da cúpula, denominados
vulgo Boca de Ovo, Roberto Soriano, vulgo “sintonias”, responsáveis por administrar
Tiriça, Rogério Geremias de Simone, vulgo e controlar todas as finanças da facção. As
Gegê do Mangue, Daniel Vinicius Canônico, principais fontes de arrecadação financeira
vulgo Cego, Fabiano Alves de Souza, vulgo que compõem o caixa da organização estão
Paca, Julio Cesar Guedes de Moraes, vulgo assim divididas, segundo denominação
Julinho Carambola, e Edilson Borges dada por seus integrantes:
Nogueira, vulgo Biroska.
A - Progresso (tráfico de drogas):
- Apoio da Sintonia Final Geral: Setor Principal fonte de renda da facção,
composto por integrantes do PCC que é com o tráfico de drogas que ela
estão reclusos na Penitenciária II de consegue arrecadar a maior parte de
Presidente Venceslau e, na falta de um dos seus recursos.
sintonias finais, prestam apoio a estes no
desempenho das funções de liderança da A1 - Progresso FM: São os pontos de
organização. venda de drogas, também chamados
de “biqueiras” ou “lojas”, pertencentes
- Sintonia Geral de Rua: Entre as funções à própria facção, espalhados por todo o
consideradas “essenciais” para a Estado de São Paulo, e que constituem
existência da organização criminosa uma importante fonte de renda.

266
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

A2 - Progresso 100% (interno): Setor principalmente, à não utilização


que arrecada dinheiro com o tráfico de do sistema bancário para acúmulo
drogas comercializado no interior das do dinheiro, a fim de dificultar o
unidades prisionais. rastreamento das contas e o bloqueio
do numerário por parte dos órgãos de
B - Cebola (caixinha mensal): Setor combate ao crime organizado.
responsável por arrecadar o dinheiro
que os integrantes do PCC soltos são - Sintonia da Ajuda: Setor que fornece
obrigados a pagar para a facção como ajuda para os integrantes que estão
forma de mensalidade, cujo valor atual presos ou passando por dificuldades
é de R$ 850,00. financeiras. Familiares de integrantes do
PCC que perderam a vida em decorrência
C - Rifa: Setor que administra e controla da participação em “missões” ou
os valores arrecadados com a promoção atividades ilícitas por ordem da cúpula
de rifas, nas quais, a cada dois meses, são do PCC, em prol dos interesses da facção,
sorteados prêmios como apartamentos, também recebem auxílio financeiro deste
casas e veículos (carros e motos). A rifa é setor.
mais uma fonte de renda para a facção,
oferecida entre integrantes, criminosos - Sintonia dos Ônibus: Setor responsável
simpatizantes (“companheiros”) e por alugar, fretar ou comprar ônibus para
familiares. Cada integrante do PCC tem o transporte dos familiares dos presos às
dever de comprar 20 números de rifa, ao unidades prisionais localizadas no interior
custo de R$ 30,00 cada, ou seja, além da do Estado de São Paulo.
mensalidade (“cebola”), cada membro do
PCC paga à organização mais R$ 600,00 - Sintonia dos Cigarros: Setor responsável
bimestrais a título de rifa. pela compra de cigarros vindos de outros
países e revenda dentro das unidades
D - Mineral: Código criado por prisionais paulistas.
integrantes da facção para se
reportar à reserva financeira que - Sintonia dos Pés de Borracha (veículos):
estrategicamente se acumula a partir Setor que controla os veículos adquiridos
dos recursos oriundos das diversas e pertencentes à facção, utilizados nas
fontes de arrecadação ilícita da diversas práticas criminosas do grupo.
organização. Uma mineral significa R$
1.000.000,00 em espécie, que ficam - Sintonia Geral do Sistema: Setor
armazenados sob os cuidados de um responsável por administrar e
integrante de confiança da cúpula. organizar os integrantes do PCC presos,
Esse valor geralmente é enterrado recolhidos no sistema prisional paulista,
e muito bem guardado, e somente disseminando e mantendo a ideologia da
quem o enterrou sabe sua localização. facção e os anseios dentro das unidades
A adoção de tal estratégia se deve, penitenciárias. Divide-se em: Sintonia das

267
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Comarcas (distritos e cadeias); Sintonia das Baixada – abrange os municípios da


Femininas; Sintonia das Colônias (Centros Baixada Santista e do Litoral.
de Progressão Penitenciária); e Sintonia
dos CDPs (Centros de Detenção Provisória). Interior – subdividido de acordo
com os códigos de Discagem Direta
- Sintonia Geral do Interior: Setor a Distância (DDD) definidos pelos
responsável por administrar, organizar e serviços de telecomunicações, ou seja,
difundir a facção nas cidades e regiões do Regional 012 (região de São José dos
interior do Estado de São Paulo. Divide-se Campos e Vale da Ribeira), Regional 014
em áreas correspondentes aos DDDs de (região de Bauru), Regional 015 (região
telefonia: regiões 012, 014, 015, 016, 017, de Sorocaba), Regional 016 (região de
018 e 019. Ribeirão Preto), Regional 017 (região
de São José do Rio Preto), Regional
- Sintonia Geral dos Outros Estados: 018 (região de Presidente Prudente e
Responsável por administrar, organizar Araçatuba) e Regional 019 (Região de
e difundir a facção nos outros estados Campinas).
brasileiros. Este setor tem recebido metas
audaciosas com o objetivo de disseminar Para cada uma dessas subdivisões terri-
a ideologia e “batizar” o maior número toriais citadas, individualmente ou em grupos,
possível de criminosos nos outros os membros do PCC assumem funções dentro
estados. de “instâncias” verticalmente hierarquizadas,
assim denominadas:
- Sintonia Geral dos Outros Países: Setor
responsável por administrar, organizar Disciplina – criminoso ou grupo
e difundir a facção nos países vizinhos, selecionado perante determinado bairro
principalmente Paraguai e Bolívia, que são ou cidade, com o objetivo de disseminar
importantes fornecedores de drogas. a ideologia da facção na comunidade
local. Corresponde à primeira instância na
- Sintonia Geral da Rua: Com o objetivo de tomada de decisões. Os Disciplinas devem
organizar e definir esferas de atribuições reportar-se diretamente à Sintonia Geral
de todo o contingente de integrantes de sua região.
do PCC em liberdade no Estado de São
Paulo, a cúpula da facção estabeleceu Sintonia Geral – criminoso ou grupo
a distribuição regional e hierárquica selecionado perante um conjunto de
seguindo o critério territorial discriminado bairros ou cidades vizinhas, com o objetivo
a seguir: de disseminar a ideologia da f acção
n a quela área de atuação. Corresponde à
Capital – subdividida nas seguintes segunda instância na tomada de decisões.
regiões: Zona Sul, Zona Leste, Zona Os Sintonias Gerais devem reportar-se
Oeste, Zona Norte, Zona Central e ABC. diretamente à Sintonia Final de sua região.

268
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Sintonia Final – criminoso ou grupo e interceptações telefônicas (segundo suas


selecionado perante uma região (Capital e próprias convicções).
Interior, cada um com sete regiões), com o
objetivo de disseminar a ideologia da facção A elaboração desse “Novo Projeto Discipli-
naquela área de atuação. Corresponde à nar” objetivava, principalmente, maior divisão
terceira instância na tomada de decisões. do conhecimento e do poder destinado aos
Os Sintonias Finais devem reportar-se Sintonias Finais de Rua, aumentando o nú-
diretamente à cúpula do PCC, reclusa na mero de pessoas do “quadro”, que era de 14,
Penitenciária II de Presidente Venceslau- para um montante de 36 integrantes, visan-
SP, também denominada Sintonia Final da do a dificultar o trabalho investigativo das
Final. polícias (são mais pessoas para monitorar)
e facilitar as tomadas de decisões (são mais
- Quadro dos 36: Em decorrência de ações pessoas para opinar e decidir). Funciona como
policiais repressivas incessantes sobre as uma “instância superior” aos demais níveis
principais lideranças da facção na rua, neutra- hierárquicos existentes (Sintonia Final, Geral
lizando o poder de reação dos demais mem- e Disciplina), diretamente ligado à cúpula da
bros, com prisões e apreensões de armas, a facção, reclusa na P2 de Venceslau. O “quadro”
cúpula do PCC resolveu tomar medidas com o foi composto por cinco membros do PCC esco-
intuito de “retomar” o controle dos “irmãos” na lhidos em cada divisão territorial (basicamen-
rua, pois muitas ordens e determinações para te sete regiões), somados a mais um membro
“missões” (diversos tipos de ações) estavam hierarquicamente acima (espécie de chefe),
sendo transmitidas aos integrantes em liber- responsável pelo controle e pela coordenação
dade, mas não cumpridas. Assim, em meados de todos, totalizando 36 membros, seleciona-
de julho de 2011, foi “reeditado” e difundido dos sob critérios criminológicos e com perfis
um novo “Estatuto” do Primeiro Comando da de liderança.
Capital.

Após a difusão do “novo Estatuto”, inte- 4. Associação de quatro


grantes da cúpula do PCC elaboraram o cha-
mado “Novo Projeto Disciplinar”, reestrutu-
ou mais pessoas
rando toda a hierarquia de funções na rua,
em substituição à disposição até então exis- Consoante mencionado, o Primeiro Co-
tente. Essa nova estrutura foi denominada mando da Capital (PCC) é atualmente a maior
por eles de Quadro dos 36, com o intuito de organização criminosa em atuação no País. A
possibilitar que as grandes tomadas de deci- partir da transferência das principais lideran-
sões fossem centralizadas nos criminosos se- ças para a Penitenciária II de Presidente Ven-
lecionados que se encontravam em liberdade ceslau, ocorrida em maio de 2006, a facção
(na rua), minimizando as intervenções dire- ganhou o status de “multinacional do crime”,
tas daqueles que estavam presos, pelo fato dominando todo o tráfico de entorpecentes
de serem mais passíveis de monitoramentos no Estado de São Paulo, além de expandir

269
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

seus tentáculos por praticamente todos os 5. Objetivo de obter, direta


estados da federação e por outros países da ou indiretamente, vantagem de
América do Sul.
qualquer natureza, mediante a
Com a reunião de todos os líderes no mes- prática reiterada de crimes
mo estabelecimento prisional, Marcos Willians
Herbas Camacho, vulgo Marcola, solidificou O grupo criminoso tem funções bem de-
seu prestígio e liderança à frente da facção, finidas e os criminosos são indicados como
designando seus “homens de confiança” para responsáveis pela administração e coordena-
compor com ele o primeiro escalão da organi- ção das atividades, notadamente o tráfico de
zação criminosa (Sintonia Final Geral). Além de entorpecentes, incluindo-se o recebimento, o
Marcola, a Sintonia Final Geral foi composta armazenamento, a “produção” (que é a mistura
por Abel Pacheco de Andrade, vulgo Vida Loka da droga pura com produtos para aumentar a
ou Boca de Ovo; Rogério Geremias de Simone, quantidade de entorpecente, visando aumen-
vulgo Gegê do Mangue; Roberto Soriano, vul- tar o lucro), a distribuição, o recebimento dos
go Tiriça, Mamá ou Maionese; Daniel Vinicius valores da droga comercializada e o transporte
Canônico, vulgo Cego; Fabiano Alves de Souza, de valores arrecadados para o chamado cofre
vulgo Biano, Paca ou Pescoço; Edilson Borges ou mineral (local para onde são encaminhados
Nogueira, vulgo Birosca; e Júlio Cesar Guedes e guardados em espécie os lucros da atividade
de Moraes, vulgo Julinho Carambola; permane- criminosa). O grupo mantém, ainda, uma rígida
cendo com a mesma configuração desde 2006 disciplina em relação aos seus membros e em
até pelo menos o início de 2015. especial com os envolvidos na comercialização
da droga.
Após incessante trabalho de investigação
levado a termo por integrantes deste núcleo Conforme visto, para a consecução de
do GAECO, desde setembro de 2009 até o iní- seus objetivos criminosos, seus integrantes
cio de 2015, foi possível identificar, a partir da encontram-se espalhados por São Paulo e
composição da Sintonia Final Geral da facção, por outros estados da federação, divididos em
reclusa na Penitenciária II de Presidente Ven- células autônomas de atuação, por meio das
ceslau, os demais integrantes da organização quais o tráfico de drogas operado pela orga-
que compõem as diversas “sintonias” e as “cé- nização é realizado em cada região do Estado
lulas” que formam os mais variados setores da de São Paulo.
organização criminosa, cada qual com função
específica, mas todos unidos por meio da con- Assim, todo criminoso integrante do Pri-
vergência de vontades com os integrantes da meiro Comando da Capital, ocupando ou não
Sintonia Final Geral, imbuídos do objetivo de função nos quadros de liderança das sinto-
praticar os mais variados crimes, como tráfico nias, mantendo ou não contato direto com
de drogas, tráfico de armas, roubos, extorsão o armamento ou com as substâncias entor-
mediante sequestro, corrupção etc., os quais pecentes, contribui, direta ou indiretamente,
alimentam os cofres da organização criminosa para o esquema de tráfico de drogas e de ar-
e possibilitam a sua existência. mas que é operacionalizado pela organização
no território brasileiro.

270
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Grande parte dos membros da organiza- posto de diversas etapas, que vão da aquisi-
ção efetivamente atua, de maneira direta, em ção da droga em estado bruto ao transporte,
alguma das etapas inerentes ao esquema de estocagem, refino, divisão, embalagem e, final-
comercialização de drogas, mantendo conta- mente, revenda aos consumidores finais.
to com as substâncias entorpecentes até que
elas sejam finalmente entregues aos consu- Invariavelmente, grande parte dessas eta-
midores finais nos diversos pontos de reven- pas demanda proteção armada contra as po-
da (biqueiras ou lojas). Uma outra parte dos tenciais ameaças ao esquema, como investi-
membros da organização, mais seleta, apenas das de organizações rivais ou ações policiais,
gerencia e coordena a ação de seus subordi- o que conduz, necessariamente, à prática de
nados, jamais mantendo contato físico direto crimes relacionados a materiais bélicos.
com qualquer substância ilícita. Há, ainda, um
outro grupo de criminosos do PCC que, exer- Assim, a associação dos membros do PCC
cendo algumas funções específicas dentro da para o tráfico de drogas está indissociavel-
empresa criminosa, apenas cuida da existên- mente ligada à prática, constante e reiterada,
cia e manutenção da organização, tudo com dos delitos inerentes a armamento, especial-
vistas a otimizar o desenvolvimento da ativi- mente: aquisição, posse, porte, guarda, manu-
dade-fim da agremiação. tenção em depósito, transporte, fornecimento,
empréstimo e emprego de armas de fogo.
Conforme destacado, todos os membros
da organização que se encontram em liber- Além disso, os integrantes do PCC buscam,
dade contribuem, mensalmente, com uma a todo momento, também de maneira reitera-
quantia financeira (caixote ou cebola), atual- da, novos investimentos para as operações de
mente no importe de R$ 850,00, que é usada tráfico, sempre por meio da prática de graves
como investimento, fomento e incentivo ao trá- crimes patrimoniais, valendo-se da preexis-
fico de drogas e para a compra de armamentos. tente estrutura logística da organização, que
inclui membros e armamentos.
Portanto, considerada a sistemática de
atuação do PCC, todos os seus integrantes es- Não fosse isso suficiente, os membros do
tão associados para a prática reiterada do tráfi- PCC protegem a existência da organização a
co de drogas e compra de armamentos, e todos, todo custo e deflagram violentíssimas ações
independentemente da posição hierárquica e criminosas sempre que ameaçada a estrutura
da função desempenhada, contribuem, direta de funcionamento do bando.
ou indiretamente, para as infindáveis transa-
ções de entorpecentes praticadas diariamente. Apenas para lembrar, mencionamos as re-
beliões sincronizadas realizadas no ano de
Outrossim, a simples existência da orga- 2001, os atentados praticados em 2006, que
nização PCC também pressupõe uma série de resultaram em dezenas de mortos e incontá-
outros crimes. veis prejuízos financeiros, e, já no ano de 2012,
a onda de ataques e atentados que culmina-
O vasto e intrincado esquema de tráfico ram com a morte de quase uma centena de
de drogas operado pela organização é com- policiais militares do Estado de São Paulo.

271
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Dentro de tal contexto, conclui-se que o do estado era de 201.669 presos, distribuídos
Primeiro Comando da Capital é uma organiza- em 152 unidades prisionais.
ção criminosa armada, de caráter permanente,
destinada à prática do tráfico de drogas e de Das 152 unidades prisionais do Estado de
inúmeros outros delitos, estando “todos” os São Paulo, 137 possuem perfil de “convívio
seus membros incursos nas sanções do art. normal” e abrigam presos integrantes do PCC,
2º da Lei n. 12.850/2013 ou, quando menos, além de “companheiros” e “simpatizantes”,
no art. 288, parágrafo único, do Código Penal, perfazendo um total de 169.085 presos.
sem prejuízo de outros crimes específicos co-
metidos por cada integrante. Apenas 15 unidades prisionais possuem
perfil de “seguro” e abrigam 20.994 presos que
não são integrantes do PCC, na sua maioria
6. Expansão territorial inimigos daqueles e integrantes de facções
rivais – Terceiro Comando da Capital (TCC),
Amigos dos Amigos (ADA), Seita Satânica
Conforme mencionado, a partir de 2006, (SS), Comando Revolucionário Brasileiro da
com a centralização da liderança do PCC na Pe- Criminalidade (CRBC), Comissão Democrática
nitenciária II de Presidente Venceslau, a facção da Liberdade (CDL) etc. –, além de presos
ganhou os contornos de verdadeira organiza- condenados por crimes de natureza sexual
ção criminosa, com ramificações em todos os (pedófilos e estupradores) e aqueles que não
estados da federação e em outros países da podem conviver com integrantes do PCC por
América do Sul. outros motivos, como dívidas, rixas etc.

Com base em documentos de contabili- Portanto, analisando os números da po-


dade da facção apreendidos no curso da in- pulação carcerária fornecidos pela Secretaria
vestigação, bem como por meio de relatos de de Administração Penitenciária, verificamos
presos e do monitoramento das conversas que o PCC está presente em 90% das unida-
telefônicas de integrantes, estima-se que a des prisionais do estado. Nessas unidades, os
facção tenha atualmente, no Estado de São integrantes exercem um verdadeiro domínio,
Paulo, cerca de 6 mil integrantes cumprindo tanto assim que presos inimigos da facção
pena nas diversas unidades prisionais do es- não são aceitos, sob pena de serem mortos.
tado e 2 mil integrantes em liberdade, os quais,
inclusive, ao contrário daqueles que estão Assim, consoante se verifica na análise do
presos, têm obrigação de pagar mensalmente gráfico a seguir, enquanto o PCC está presente
a quantia de R$ 850,00 aos cofres do PCC, a em 90% dos presídios paulistas, seus oposi-
título de “caixinha ou cebola”. tores estão espalhados em 10% das unidades
prisionais, sendo forçoso concluir que o PCC
Segundo dados da Secretaria de Adminis- detém verdadeira hegemonia sobre os presí-
tração Penitenciária do Estado de São Paulo, no dios do estado.
mês de junho de 2015, a população carcerária

272
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

7. Da estabilidade no tempo
Conforme explicitado em tópicos anterio-
res, com a transferência de toda a liderança
do PCC e de seus principais integrantes presos
para a Penitenciária de Segurança Máxima II de
Presidente Venceslau, em maio de 2006, a fac-
ção se reorganizou, ganhando o status de orga-
nização criminosa transnacional, haja vista que
seus líderes vislumbraram a possibilidade de
Não bastasse a extraordinária expansão dominarem o tráfico interno de entorpecentes
do PCC no Estado de São Paulo, ocorrida nos no Estado de São Paulo, além de fixarem mem-
últimos anos, verificamos também que a or- bros no Paraguai e na Bolívia, a fim de adquiri-
ganização já se espalhou por praticamente rem drogas e armamento pesado diretamente
todos os estados da federação e tornou-se dos fornecedores estrangeiros, acabando com
transnacional, com a fixação e o batismo de os “atravessadores”.
integrantes em outros países da América do
Sul que produzem maconha e pasta base de A investigação levada a termo por este Nú-
cocaína, como o Paraguai e a Bolívia. cleo do GAECO demonstra inequivocamente
que, desde 2006, com a reunião da cúpula do
O fenômeno que tornou o PCC em uma PCC em Presidente Venceslau, de forma abso-
organização criminosa transnacional decorreu lutamente estável, duradoura e ininterrupta, a
da decisão de espalhar os líderes em presí- organização não deixou um dia sequer de prati-
dios de diversos estados brasileiros, a fim de car e idealizar a prática de crimes, seja por meio
cessar as constantes rebeliões e diluir o poder do domínio do tráfico de drogas e de armas e da
da liderança. No entanto, a decisão mostrou- prática de grandes crimes contra o patrimônio,
-se equivocada, pois os líderes batizaram di- seja por meio de atentados contra os integran-
versos integrantes em outros estados e disse- tes das forças de segurança do Estado.
minaram o PCC em todo o território nacional.
A presença do PCC nos países fronteiriços ao Mediante autorização judicial, foram cap-
Brasil foi apenas questão de tempo. tadas e gravadas centenas de horas de con-
versas entre integrantes em liberdade e a
Nesse sentido, documentos apreendidos liderança que se encontra presa na Peniten-
na Penitenciária de Guarulhos II, com integran- ciária II de Presidente Venceslau.
tes da Sintonia dos outros estados, demons-
tram que o PCC possuía, em novembro de 2012, Por meio do monitoramento telefôni-
cerca de 2.938 integrantes espalhados pelos co contínuo, que se estendeu do período de
diversos estados da federação. Os mesmos março de 2010 até janeiro de 2013, foi possível
documentos também indicam com precisão a acompanhar inúmeros diálogos entre os inte-
presença de integrantes do PCC no Paraguai e grantes do PCC, por exemplo, aqueles que au-
na Bolívia. torizavam a compra de drogas e armamentos,

273
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

o planejamento de resgates de presos ligados Resultado das ocorrências


relacionadas com o PIC 336/10
à facção, a prática de extorsões, sequestros,
Armas apreendidas
além de atentados contra a vida de policiais.
Tipo Quantidade
Submetralhadora 3
As investigações propiciaram a elucidação
Metralhadora 0
de diversos crimes cometidos por integrantes
Fuzil 47
da organização criminosa, a partir de ordens Lança-foguete 0
emanadas da liderança reclusa na Peniten- Pistola 24
ciária II de Venceslau, que culminaram com Revólver 7
o registro de 53 ocorrências policiais, entre Garrucha 0
prisões em flagrante, captura de foragidos da Carabina 0
justiça e apreensões de drogas e armas, tudo Espingarda cal. 12 0
isso no período compreendido entre o mês de Espingarda cal. 44 1
junho de 2010 até o ano de 2013, demonstran- Total geral 82
do, assim, a estabilidade da organização até a Outros materiais bélicos apreendidos
conclusão deste trabalho. Coletes de proteção balística 34
Carregadores 212
Explosivos 2
8. Do resultado obtido por Granadas 6
meio da ação controlada no Munições 5.290

curso da investigação Total geral


Pessoas presas
144
(art. 2º, II, da Lei n. 9.034/1995) Veículos apreendidos
Total geral 64
É importante destacar que, dadas as ca- Resgates evitados
racterísticas de atuação do PCC e a comple- Total geral 2
xidade da investigação, o Ministério Público Entorpecente apreendido
utilizou, com a devida autorização judicial, a Tipo Quantidade em kg
técnica investigativa da ação controlada, pre- Crack 78,517
vista no art. 2º, II, da Lei n. 9.034/1995, de modo Maconha 4.370,744

a permitir a adoção de específicas providên- Cocaína 340,867

cias quanto a crimes pontuais detectados no Haxixe 0


Ecstasy (cápsulas) 0,270
curso do trabalho, sem comprometer o sigilo
Total geral 4.790,398
da investigação até que a cabal apuração dos
Dinheiro apreendido
fatos fosse concluída.
Tipo Quantidade

Assim, durante as investigações, em virtu- Real 1.061.740,90


de do monitoramento telefônico dos integran- Guarani 0
tes da facção, foi possível a operacionalização Dólar Americano 2.700,00
de várias prisões em flagrante delito, além da Euros 0
apreensão de expressiva quantidade de drogas, Cheques 112.866,00
armas e dinheiro, conforme a tabela a seguir.

274
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

9. Da Sintonia Final Geral

A Sintonia Final Geral, consoante 10. Poder de intimidação


mencionado, compõe a cúpula da facção e capacidade de articulação
criminosa autodenominada Primeiro
Comando da Capital (PCC). É formada por do PCC – atentados terroristas
seu líder máximo, Marcos Willians Herbas
Camacho, vulgo Marcola, e, logo abaixo dele No ano de 2001, o PCC demonstrou capaci-
na hierarquia, pelos seguintes membros de dade de articulação ao promover uma megar-
sua exclusiva confiança: Abel Pacheco de rebelião simultânea em 29 presídios do Estado
Andrade, vulgo Abel, Boca de Ovo ou Vida Loka; de São Paulo.
Rogério Geremias de Simone, vulgo Gegê do
Mangue ou K-9; Roberto Soriano, vulgo Tiriça, Os ataques do PCC a policiais, prédios
Mamá ou Maionese; Daniel Vinicius Canônico, públicos e ônibus no Estado de São Paulo, em
vulgo Cego ou Judeu; Fabiano Alves de Souza, 2006, também acenderam a polêmica sobre a
vulgo Biano, Paca ou Pescoço; Edilson Borges semelhança entre a facção criminosa e uma
Nogueira, vulgo Biroska ou Vovó; e Julio Cesar organização terrorista. O debate em torno
Guedes de Moraes, vulgo Julinho Carambola, do assunto ganhou força quando o m inistro
Bola, Canela ou Sueco; todos eles presos do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes
na Penitenciária de Segurança Máxima II de classificou as mortes de policiais militares em
Presidente Venceslau desde maio de 2006 até São Paulo como atos de terrorismo.
a conclusão deste trabalho.

275
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Em que pese a paixão que cerca o assunto, sequestro do publicitário Washington Olivetto
não consideramos o PCC um grupo terrorista, –, preso no RDD de Presidente Bernardes-
e sim uma facção criminosa comum que usa o SP, juntamente com outros líderes do PCC,
terrorismo em suas ações, mas que não tem orientou a facção a usar táticas de guerrilha
uma posição política definida nem uma ideo- em ataques.
logia, razão pela qual não pode ser considera-
da terrorista.

No ano de 2003, o PCC determinou o as-


sassinato do juiz Antônio José Machado Dias:

11. Sugestões de combate à


organização criminosa PCC
no plano da atividade de
inteligência criminal

11.1. Inteligência criminal


(Obtenção de conhecimento na área de
segurança pública que possibilite a tomada
de decisões quanto à prevenção ou repressão
criminal)
a) Prever tendências – identificar os
próximos desdobramentos do crime.
b) Identificar as lideranças e os seus
elementos-chave.
O chileno Mauricio Hernandez Norambuena
(foto seguinte), líder da Frente Patriótica c) Monitorar a movimentação cotidiana da
Manuel Rodriguez (FPMR) – organização de organização criminosa para identificar sua
extrema esquerda que pregava a revolução rotina.
socialista pelas armas, responsável pelo d) Identificar os pontos fracos e informantes
em potencial.

276
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

11.2. Atividades de investigação b) Captação ambiental de sinais


eletromagnéticos, ópticos ou acústicos
(Aquelas mais intrusivas do ponto de vis- (celas e parlatórios).
ta das liberdades individuais, mas imprescin- c) Interceptação de comunicação telefônica
díveis para acessar o núcleo das decisões da ou telemática.
organização criminosa)
d) Colaboração premiada.
a) Ação controlada.

277
Organizações silenciosas

GUARACY MINGARDI Que o PCC é a principal organização crimi-


nosa do País é indiscutível. Controla a maioria
Cientista Político especialista em
dos presídios de São Paulo, do Paraná e do
Segurança Pública
Mato Grosso do Sul. Também é forte em vá-
Coordenador do Fórum Brasileiro de rios outros estados, além de manter posição
Segurança Pública significativa na maioria dos restantes. Para o
público em geral, porém, é como se eles não
existissem, raramente uma notícia chega ao
Dizem alguns teólogos antigos que uma das leitor ou telespectador.
melhores estratégias do Diabo é se fingir de
morto. Se ficar quietinho num canto ele atrai Para alguns grupos das Comunicações,
mais pessoas do que aparecendo e assustan- principalmente os vinculados à Rede Globo,
do todos. E além do Demônio muitos outros mencionar o nome significa dar publicidade ao
seres, reais ou mitológicos, usam da mesma grupo criminoso, torná-lo mais conhecido. E,
técnica. Assim atua a maioria das organiza- para os governos estaduais, mencionar a or-
ções criminosas. O cartel de Cali, por exemplo, ganização significa admitir o fracasso, que não
que tinha grande articulação com banqueiros controla os presídios e, em alguns casos, nem
e empresariado em geral na Colômbia, nunca mesmo as ruas. Na prática, essa estratégia sig-
foi de aparecer muito. Ao contrário de seus nifica manter a situação na penumbra, jogar o
colegas de Medellín, que matavam policiais jogo dos líderes do PCC, que utilizam a velha
e enfrentavam o Estado, eles ficaram quieti- tática atribuída ao diabo.
nhos em seu canto, enquanto a guerra contra
o tráfico matava mais gente que a peste na Co- Por outro lado existe uma inflação de notí-
lômbia. Com isso, tiveram menos problemas e cias sobre crime organizado. Parece que qual-
alguns de seus dirigentes ainda permanecem quer quadrilha é uma poderosa organização
no mercado. criminosa. Todavia uma leitura atenta mostra
que isso é um erro crasso. Nem tudo que a
O Primeiro Comando da Capital (PCC) pa- imprensa chama de crime organizado tem a
rece que está usando a mesma estratégia, no ver de fato com essa modalidade. Até o trá-
que conta com a anuência das autoridades de fico de drogas muitas vezes é extremamente
vários estados onde atua, principalmente onde fragmentado, apesar de o mercado sempre
fica a matriz, São Paulo. Depois de frequentar conseguir se firmar, tenha ou não uma organi-
as manchetes por seis anos (de 2001 a 2007), zação criminosa por trás. São Paulo, por exem-
ficaram quietos, fingindo-se de mortos, e ga- plo, até poucos anos vivia de pequenas “bocas
nhando muito dinheiro com o tráfico, grandes de fumo”1 cada uma de um grupelho qualquer.
roubos e outras atividades do tipo.
1 Atualmente chamadas de biqueiras.

279
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Atualmente o tráfico está sendo gerenciado A quinta característica, simbiose com o


cada vez mais pelo Primeiro Comando da Ca- Estado, é o grande diferencial. Ela é a mais im-
pital (PCC). Isso, porém, não implicou qualquer portante das cinco. Em todas as organizações
melhora na organização. Os usuários estão criminosas perenes existe algum vínculo com a
pagando os mesmos preços, comprando nos máquina do Estado. O exemplo mais simples diz
mesmos locais e a corrupção policial continua respeito ao tráfico de drogas ilícitas. Um ponto
igual, não aumentou nem diminuiu. de tráfico atende a clientela durante anos no
mesmo local. Sua localização é conhecida por
Em outras áreas do crime a situação é mais muita gente, só falta uma placa acima da porta.
complicada. A maioria dos roubos e furtos de Portanto tem necessidade de proteção. Nunca
veículos, por exemplo, são praticados por conseguiriam manter essa estabilidade sem
quadrilhas comuns ou indivíduos solitários, anuência de setores do aparelho repressivo,
mas existem organizações criminosas espe- assim como o jogo do bicho. Ambas as moda-
cializadas. O que também ocorre nos casos de lidades têm de ter um ponto conhecido e tran-
contrabando, que pode ser praticado por um quilo, senão os clientes “evaporam”. E a única
criminoso, uma quadrilha ou uma organização. forma de garantir isso é pagando por proteção.
O que se pode inferir disso é que a modalida-
de do crime não define a existência de crime Outra característica marcante do crime or-
organizado. São algumas características que o ganizado é que ele tem três modalidades di-
tornam diferente do crime comum. Entre elas ferentes: empresarial, endógeno2 e tradicional.
destacam-se cinco: O tipo empresarial é marcado por levar para
o crime alguns princípios modernos de admi-
1. Hierarquia nistração. Normalmente, são especializados e
atuam numa faixa única do mercado. As rela-
2. Previsão de lucros ções entre os membros são como um simples
contrato trabalho; o sujeito entra para a orga-
3. Divisão do trabalho nização e sai quando quer, não possui qualquer
outro vínculo. A lavagem de dinheiro é um dos
4. Planejamento empresarial principais exemplos desse tipo de organização.

5. Simbiose com o Estado Aquelas que seguem o modelo endógeno


nascem dentro de determinadas instituições,
As quatro primeiras são encontradas em mormente o Estado, e vendem facilidades.
toda atividade empresarial, mas foram adap- Atuam basicamente em desvio de dinheiro,
tadas pelas organizações criminosas. É muito corrupção, favorecimento etc. Esses grupos
difícil que uma empresa sem hierarquia, pre- vão além de apenas aproveitar as oportunida-
visão de lucros e mão de obra especializada des que surgem. Agem para manter pessoas
sobreviva no mercado moderno. E no crime
organizado ocorre o mesmo. Por sua vez, 2 Nos meus primeiros escritos não descrevi o modelo
numa quadrilha, por maior que seja, a lide- endógeno, porém, a observação da realidade e leitura
rança é mais fluida e quase sempre fundada da literatura mais recente fizeram-me incluí-lo na
na força ou na violência. tipologia.

280
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

por longos períodos nos postos-chave, muitas ral”. Optam pelo crime mais rentável do mo-
vezes cargos burocráticos menores. Também mento. É o caso da Máfia Siciliana, que, nas
recrutam novos elementos que possam influir últimas décadas, atuou no contrabando de
na situação. O ponto focal dessas organiza- cigarros, tráfico de heroína, morfina ou cocaí-
ções são atividades de fiscalização, investiga- na, extorsão, sequestro, venda de proteção
ção, compra etc. etc. Em algumas dessas atividades, utilizam
a força para manter o controle de determina-
As organizações tradicionais são mais com- do território. Assim também tentam proceder
plexas. O recrutamento de novos membros se o Comando Vermelho e seus congêneres no
baseia no apadrinhamento: para ingressar, Rio de Janeiro, mas nem sempre é assim. O
um candidato tem de ter um padrinho que se PCC não se interessa por controlar a favela,
responsabiliza por ele (ou dois, como exige o ele opta pelo controle do mercado de drogas
PCC). Muitas vezes, existe um ritual iniciático, o nela existente, da mesma forma que o bichei-
batismo, como na Máfia de New York, em que, ro só briga pelo monopólio do Jogo do Bicho
segundo relatos de membros, em cerimônia, o em seu território.
aspirante segurava um punhal e um santinho
de papel em chamas enquanto recitava algu- Existe ainda uma característica comum a
mas palavras em italiano, algo como: “Que eu todas as organizações criminosas tradicio-
queime como esse santo e seja morto por este nais: a lei do silêncio. Todos os grupos que se
punhal se trair meus irmãos.” Aliás essa é a mantêm por muito tempo no mercado seguem
ideia básica de uma organização tradicional, esse ditame. Não falar sobre a organização
são todos irmãos, e os chefes são considera- sem autorização é uma regra fundamental. O
dos primus inter pares. exemplo mais conhecido é o da omertà, uma
prática centenária seguida pelos grupos crimi-
Outra característica importante dessa nosos do sul da Itália. É um termo da língua
modalidade é o sistema de clientela, pois, napolitana que vem do latim humilitas e sig-
além dos irmãos, uma organização crimi- nifica humildade. Atualmente omertà exprime
nosa tradicional possui agregados, pessoas uma regra que impede qualquer um de coope-
que não fazem parte do grupo, mas mantêm rar com autoridades policiais ou falar a respei-
vínculo com alguns membros, sendo por eles to da irmandade.
comandados. No PCC, por exemplo, é comum
que o número de “irmãos” num presídio seja A história tem demonstrado que as orga-
pequeno, mas assim mesmo eles controlam a nizações criminosas só nascem em circunstân-
vida dentro da instituição penal através dos cias muito específicas. Não são quadrilhas que
inúmeros apenados que agem sob seu coman- crescem por conta do sucesso ou do carisma
do. Esses são os clientes. de seus líderes. Existem determinadas circuns-
tâncias que propiciam o surgimento delas. As
As organizações criminosas tradicionais quatro que pudemos identificar até o momen-
também têm o traço de atuar onde o lucro to são:
for maior, isto é, não possuem sempre a mes-
ma fatia do mercado. Elas fazem aquilo que, 1. Pela união de pequenas quadrilhas,
no meio policial, se conhece por “clínica ge- criando um conselho ou empossando

281
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

um chefão, como a Yakuza no Japão pela persuasão ou pela violência, dos pontos
medieval. de distribuição no varejo, principalmente nas
capitais. O PCC já passou desse ponto e atua
2. Pelos laços de sangue que unem gru- também no atacado, no que é, até certo ponto,
pos numa terra dominada por estra- seguido pelo seu maior rival, o CV.
nhos, num modelo parecido com o da
Máfia de New York, em que os italianos No Brasil, as únicas organizações de tráfico
não confiavam numa polícia essencial- que não nasceram na cadeia são as dedicadas
mente irlandesa. à comercialização de drogas para exterior. É o
caso dos grupos nigerianos, que usam muito da
3. Pela união de grupos interessados na estrutura tribal/étnica ou familiar em sua ação
manutenção do monopólio de uma delituosa. O seu principal métier é o transpor-
mercadoria ou serviço, como os cartéis te de cocaína para a Europa ou Oriente Médio,
de Cali ou Medellín. usando o Brasil como ponto de passagem. Os
grandes grupos que atuam nas fronteiras com
4. Na cadeia, a partir de uma liga de pre- o Paraguai e Bolívia também têm estrutura
sos. Como a Camorra napolitana, que diferenciada. Apesar de muitos de seus inte-
tem mais de um século de existência. grantes terem “puxado cadeia”, suas relações
têm mais a ver com o modelo normal de qua-
No Brasil, a cadeia tem sido a grande ges- drilhas, não sendo necessariamente classificá-
tora dessas organizações. Foi nela que sur- veis como organizações criminosas.
giram o Comando Vermelho (CV), o Primeiro
Comando da Capital (PCC), a Falange do Norte, O tráfico não nasceu com as organizações
o Bonde dos Quarenta, o Bonde dos Treze, o criminosas tradicionais. Na verdade, podemos
Primeiro Grupo Catarinense (PGC) e outros. até supor o contrário, isto é, sem ele, o núme-
ro, o poder e a lucratividade delas seria muito
Num primeiro momento, todos se consti- menor. Estariam voltadas para o jogo do bicho,
tuem como uma liga de presos que se opõem por exemplo, que por muito tempo foi uma das
à administração ou a outro grupo criminoso atividades mais lucrativas3.
dentro do ambiente carcerário. O segundo
passo é o controle do sistema carcerário, in- O início da escalada das organizações cri-
cluindo o do tráfico dentro dos muros da pri- minosas ocorreu na segunda metade da déca-
são. E depois, pelo menos no Brasil, a grande da de setenta, quando teve início uma mudan-
opção de todas elas é, no médio prazo, o nar- ça nos hábitos de consumo de drogas ilícitas
cotráfico. Mesmo os grupos cuja constituição nos dois principais centros consumidores do
original era de grandes ladrões, eles acabam país: Rio de Janeiro e São Paulo. A causa disso
optando, depois de algum tempo, pelo tráfico.
Um dos motivos disso é que todas essas orga-
3 O Jogo do Bicho não acabou, é evidente, mas
nizações têm a maioria de seus líderes dentro diminuiu muito. E o motivo não tem nada a ver com
dos presídios, onde o crime mais lucrativo é a repressão, e sim com a concorrência das loterias
a venda de drogas ilícitas. Depois do domínio estatais, cujos prêmios são maiores e dispõem de
do tráfico interno, começam a se apropriar, várias modalidades de jogos.

282
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

foi a opção dos mercados nos grandes centro Em São Paulo, a situação era mais fluida
americanos e europeus pela cocaína. Assim e o mercado muito pulverizado. Primeiro, por-
que a repressão nesses países se organizou que o uso do crack nunca implicou investi-
para controlar o novo fenômeno, começaram mentos de grande monta, já que seu principal
os problemas para as antigas rotas, que par- ingrediente, a pasta base de cocaína, podia
tiam direto dos países produtores. Aí o Brasil ser comprado a baixo custo (um quarto do va-
virou escala, ou seja, parte da cocaína passou lor da cocaína) em pequenas quantidades. A
a transitar em nosso País. E uma das regras transformação em crack era, e ainda é, feita na
do tráfico é que, por onde ele passa, sempre própria cidade. Basta pasta base, bicarbonato
fica um pouco. Então criou-se o mercado. O de sódio, uma panela e um fogão. Em segundo
primeiro grupo a se apropriar disso no Rio de lugar, devido ao maior controle sobre o tráfico,
Janeiro foram os bicheiros, depois substituídos já que praticamente não existe local em que a
pela antiga Falange Vermelha, hoje Comando polícia não tenha acesso, o que dificultava a
Vermelho. E o resto é história. existência de grandes organizações.

Na década de 1990, o mercado já estava Esse quadro sofreu significativa transfor-


estabelecido. Além do uso tradicional da ma- mação nos últimos anos. A procura pelo cra-
conha, comum às duas grandes metrópoles ck teve um período de baixa no início deste
brasileiras, os usuários cariocas deram prefe- século em São Paulo, mas recrudesceu com
rência à cocaína enquanto em São Paulo ocor- força. E o mercado das drogas deixou de ser
ria um surto de consumo de crack. Isso teve pulverizado e foi tomado pelo PCC. É verdade
reflexo simultâneo na organização do tráfico que ainda existem redutos de traficantes autô-
local e no internacional. nomos, mas o Primeiro Comando tem a hege-
monia da distribuição no varejo4. Ele também
O varejo da droga no Rio manteve-se cen- compra no exterior boa parte do que vende, o
tralizado em algumas dezenas de grupos vin- que o transforma num dos grandes grupos en-
culados às três principais organizações crimi- volvidos no tráfico internacional. Um exemplo
nosas locais (Comando Vermelho, Amigos dos disso é a apreensão feita pelo Departamento
Amigos e Terceiro Comando). Há dois motivos de Narcóticos de São Paulo (DENARC), em 2015,
para que isso tenha ocorrido. Em primeiro lu- de uma tonelada e seiscentos quilos num sítio
gar, o controle dos pontos de venda sempre foi na Grande São Paulo. Essa coca5 vinha direta-
relativamente centralizado no Rio, principal- mente do exterior e havia sido comprada por
mente devido à geografia local, já que a exis- um dos representantes do PCC.
tência de favelas em morros de difícil acesso
facilita a vida dos traficantes e dificulta a da
4 De crack, cocaína e maconha. Aparentemente,
polícia. as drogas sintéticas têm fornecedores e rotas
diferenciadas. Pelo menos por enquanto.
O segundo motivo é que a cocaína era
5 Não era crack nem pasta base de cocaína, produto
processada e comprada em grande escala no usado para fabricar as pedras de crack, era pó mesmo,
exterior, principalmente Bolívia, Paraguai e Co- e ainda nem sequer tratado para comercialização.
lômbia, o que dificultava a entrada de peque- Depois de passar pelas misturas normais iria se
nos traficantes no negócio. transformar em mais de 3 toneladas de cocaína.

283
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Para a criação do quase monopólio, não exemplo, não recebe ordens dos colegas cario-
foram necessárias guerras como no Rio de cas. Tem uma ligação ideológica, mesma estru-
Janeiro, já que não existiam outras organiza- tura, mas possui lideranças próprias e decide
ções atuando na mesma escala em São Paulo. seu próprio destino. Em outros estados, a liga-
A tomada do mercado se deu através de “con- ção com a cúpula carioca aparece mais, mas na
vencimento” dos pequenos grupos de que era maioria deles a criação ou a ascensão do grupo
interessante para eles aderirem ao PCC, pois é recente. Muitos surgiram como uma aliança
assim ganhariam proteção na eventualidade do CV com criminosos locais para impedir, ou
de serem presos. É evidente que esse discurso tentar impedir, a tomada do poder pelo PCC6.
tem sempre uma ameaça implícita, mas que na
maioria das vezes não chega a se concretizar. Que o Primeiro Comando também está
O processo ainda não está completo e talvez espalhado pelo País é notícia velha, mas a
nunca se concretize, pois é muito difícil o mo- proporção disso não foi mensurada ainda. E
nopólio total de qualquer produto. Mesmo a a forma de contágio é sempre a mesma. Um
Máfia nunca conseguiu dominar totalmente o ou mais membros são presos em um estado
mercado das drogas em Palermo. qualquer e “levam a mensagem do partido7 ”.
Assim mesmo, como se fosse uma cateque-
No Rio de Janeiro, por sua vez, a situação se. E aos poucos vão atraindo seguidores,
é inversa. O consumo de crack está crescen- não necessariamente grandes criminosos.
do não só através dos pequenos grupos de Num primeiro momento, eles querem apenas
criminosos que agora conseguem entrar no quantidade. Normalmente estabelecem uma
mercado, mas também com ajuda de setores meta, um número específico de membros.
do Comando Vermelho. Segundo alguns analis- Depois, começam a excluir alguns, malucos,
tas, isto estaria tirando poder das organizações individualistas etc. E aí, com a organização
e diluindo o mercado. Outro fator importante é formada, começam a estruturar a vida dentro
o processo de tomada dos morros que se ini- da cadeia e o tráfico fora.
ciou com a construção da primeira Unidade de
Polícia Pacificadora (UPP). É impossível dizer O interessante desse processo é que os
quanto essa ação do Estado mudou a situação principais adversários da organização têm sido
do CV, mas com certeza impactou na organi- alguns líderes do crime locais, não o Estado,
zação, assim como a entrada das milícias em que assiste o processo sem ter como intervir.
alguns locais ajudou a diminuir seu poder. Santa Catarina é um bom exemplo de estado
em que o PCC cresceu muito nos últimos anos,
Talvez por conta disso a sigla esteja ten-
tando criar novas filiais pelo Brasil. Inúmeras 6 Recentemente o CV cuiabano tem ameaçado
capitais têm, pelo menos dentro dos presídios, atacar fora do sistema prisional, principalmente
um grupo que se denomina Comando Verme- policiais e promotores de Justiça, como represália
lho. Alguns deles aparentemente têm mesmo à “perseguição” que estariam sofrendo. Teriam, se-
ligação umbilical com a matriz carioca, outros gundo o noticiário, tentado colocar uma bomba no
nem tanto; estão mais para franchising. Se- comando da PM estadual.
gundo autoridades locais, o CV de Cuiabá, por 7 Como os membros da organização e os policiais
paulistas se referem ao Primeiro Comando da Capital.

284
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

mas ainda é minoria por conta da oposição lo- Se o poder dentro do sistema prisional de
cal. Lá, o maior grupo ainda é o PGC (Primeiro alguns estados é grande, em São Paulo ele é
Grupo Catarinense), mas eles se desorganiza- praticamente hegemônico. Segundo todas
ram com a transferência das lideranças para as fontes, exceto a Secretaria de Administra-
presídios federais após os ataques feitos em ção Carcerária, a organização controla entre
2013. Com isso, o PCC conseguiu crescer, porque 70 e 80% dos presídios paulistas, mantendo
é mais organizado, mas continua quieto, pelo influência direta sobre a vida de uns 180.000
menos enquanto ainda é minoritário8. apenados, bem como sobre parte de suas fa-
mílias. Esse controle implica decidir sobre a
E, por conta da organização, o PCC conse- quantidade e o tipo de droga que entra na ca-
gue se manter, mesmo em situações adver- deia, quem tem direito a pensão para a famí-
sas. Quando o gerente de uma “biqueira” é lia, arbitrar e julgar incidentes no sistema, com
preso, outro membro do Primeiro Comando é penas que vão de espancamento à execução
nomeado para o posto. E dentro dos presídios etc. Tudo isso com o consentimento explícito
é a mesma coisa. Quando um deles, num pos- dos seus milhares de “batizados” e implícito
to de chefia, disciplina, por exemplo, é man- dos demais prisioneiros.
dado para o Regime Disciplinar Diferenciado
e fica incomunicável, outro “irmão” assume O crescimento dessa organização não se
o posto. No mesmo dia! E a nomeação é de- deve ao acaso. Eles atuam em duas linhas
cidida quase sempre através de conferência no convencimento dos colegas de prisão: a
telefônica, por meio dos incontáveis celu- ideologia e os interesses. O interesse é fácil
lares que existem nas cadeias brasileiras. A explicar. Quem é membro está protegido, tem
liderança, que pode estar em outro estado, emprego no mundo do crime e a família tem
participa da conferência, bem como os chefes algumas regalias. Por exemplo, quem financia
locais. Chegam ao acordo e nomeiam o novo muitas das viagens aos presídios do interior
titular do posto. para as visitas de mulheres e filhos é o PCC.
Outra coisa é o amparo à família de quem foi
É uma organização impessoal, voltada preso ou morto numa atividade coordenada
para o lucro, e que por isso é mais difícil de pelo “partido”.
controlar. Um grupo que depende de uma
liderança carismática perde o norte quando o A ideologia, por outro lado, parece só uma
líder é afastado ou morto, que é o que ocorre desculpa para quem está do lado de fora,
com a maioria dos outros grupos no interior mas é um meio importante de poder. Já foram
dos presídios. O PCC simplesmente substitui publicados vários estatutos9 do Primeiro Co-
o “irmão caído” e continua com os negócios mando da Capital, e na maioria deles apare-
como sempre. ce o slogan “Paz Justiça, Liberdade” às vezes
acrescido de Igualdade e União.
8 Uma característica importante de Santa Catarina é
que lá o Estado tem sabido atuar de forma a manter 9 Alguns deles reais outros apócrifos, mas usamos
algum equilíbrio entre os grupos rivais. O PCC só não aqui trechos apenas dos que possuem alguma
tomou conta do sistema prisional devido à atuação da confirmação, apareceram em mais de um local em
direção. alguma das apreensões policiais.

285
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Vários itens do estatuto reforçam a ideia iniciam mencionando “os companheiros mor-
da hierarquia como base de tudo. Um deles, tos pela opressão”.
por exemplo, avisa que aquele que “causar di-
visão dentro do comando, desrespeitando es- E tudo isso vai crescendo enquanto o Es-
ses critérios, será excluído e decretado”10. Ou- tado assiste impassível. Não apenas em São
tro ponto importante é que “a Sintonia Final11 Paulo, mas também em outras unidades da
é a última instância”. Quanto à territorialidade, federação. As desculpas são muitas: o PCC é
o estatuto fala que todo mundo está sujei- uma invenção da imprensa, coisa de meia dú-
to à hierarquia, não importa onde esteja. Em zia de presos; eles não provocam confusão, na
outras palavras, o membro tem de obedecer verdade alguns são os presos mais obedien-
esteja onde estiver. E para tornar bem claro tes; o Primeiro Comando mantém a paz nos
que determinados comportamentos não serão presídios etc.
perdoados, o estatuto decreta que, em casos
de traição, o delator será “decretado”. A base Na realidade, muitas dessas falas são
da ideologia, porém, não é repressiva. Fala da reais. O Primeiro Comando da Capital não quer
irmandade e do mundo do crime. confusão e mantém a paz no presídio. Pelo
menos até estar em condições de se livrar da
Por isso o ponto nevrálgico da ideologia oposição. Quando isso ocorre, o golpe é pre-
é a ideia de fim da opressão carcerária. O fim ciso e cirúrgico, como no dia em que mataram
daquela situação em que estão, isolados do a cúpula da Seita Satânica no Carandiru. En-
mundo e metidos num sistema que trata todos quanto esse dia não ocorre, eles se mantêm
como gado. E faz alusão a um futuro mítico, quietos, discutindo a paz com os grupos rivais.
onde estariam livres dessa opressão.
Enquanto isso, na rua “o pau come”, e os
Nenhuma ideologia forte pode prescindir crimes aumentam de escala e organização.
da figura dos heróis. Entre eles estão os lí- Portanto as possibilidades estão em aberto.
deres, é claro. Isolados e vítimas do sistema Não é possível prever o que fará uma organi-
como todos os “irmãos”, iguais a eles, mas zação criminosa desse porte, mas as ações dos
mais sábios, e cujas ordens não devem ser governos e do aparelho repressivo são previsí-
discutidas, sob pena de perder as vantagens veis. Ficarão aguardando e fingindo que tudo
adquiridas a tanto custo. E para respaldar toda está em paz. Até a próxima crise.
a ideia de continuidade, muitas vezes são in-
vocadas as figuras mitológicas dos mortos no
cumprimento do dever. Muitos dos salves se Referências
10 Leia-se morto.
11 Sintonia Final Geral, como às vezes é chamada, ADORNO, Sergio; SALLA, Fernando.
é o grupo de seis ou sete presos que comanda a Criminalidade organizada nas prisões e os
organização. Atualmente todos estão presos em ataques do PCC. Revista Estudos Avançados. v.
Governador Venceslau, um presídio de segurança 21, n. 61, São Paulo, set./dez. 2007.
máxima de São Paulo.

286
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

COELHO, Edmundo Campos. Oficina do . A trajetória vertiginosa do crack.


diabo e outros estudos sobre a criminalidade. Revista Scientific American. Edição Especial n.
Record: Rio de Janeiro, 2005. 38, 36-46, abr. 2010.

DIAS, Camila Caldeira Nunes. PCC. MUNIZ, Jaqueline de Oliveira; PROENÇA


Hegemonia nas prisões e monopólio da JUNIOR, Domício. Muita politicagem, pouca
violência. Saraiva: São Paulo, 2013. política: os problemas da polícia são. Estudos
Avançados USP, São Paulo, n. 61, 2007.
LIMA, R. S. Conflitos sociais e criminalidade
urbana: uma análise dos homicídios cometidos SCHILLING, Flavia. Corrupção, crime
no Município de São Paulo. São Paulo: organizado e democracia. Revista Brasileira de
Sicurezza, 2002. Ciências Criminais. São Paulo, n. 36, 2001.

MAAS, Peter. O caso Valachi. Coleção Vida e WERNER, Guilherme Cunha. O crime
Aventura. Livros do Brasil: Lisboa, 1973. organizado transnacional e as redes
criminosas: presença e influências nas
MINGARDI, Guaracy. O Estado e o crime relações internacionais contemporâneas. São
organizado. São Paulo: IBCCrim, 1998. Paulo: Universidade de São Paulo, 2009.

. O trabalho da inteligência
no controle do crime organizado. Estudos
Avançados. EDUSP, n. 61, 2007.

287
4. HOOLIGANISMO
Violência em grandes eventos no Brasil:
os estrangeiros devem se preocupar?

MARCELO MUSCOGLIATI1 devem ter os próprios brasileiros. Portanto, a


resposta é positiva. No Brasil, todos devem te-
Subprocurador-Geral da República
mer a violência. Por quê? Porque temos violên-
M.A. pela UCDavis
cia cotidiana e indiscriminada no País. Ela já foi
precificada e é uma constante do risco Brasil.
“If it bleeds, it leads.”
(anônimo)
A violência
“The first step in understanding
violence is to set aside our abhorrence Como já afirmado, a violência está presen-
of it long enough to examine why it te em todas as sociedades. A diferença está no
can sometimes pay off in personal or processo civilizatório de cada uma.
evolutionary terms. This requires one
to invert the statement of the problem Países hoje civilizados apresentam baixas
– not why violence occurs, but why it is taxas de homicídios. Em 2011, o Canadá regis-
avoided.” (Steven Pinker)2 trou 529 (1,5/100.000 hab.) e, de fato, está entre
os mais seguros do planeta. Contudo, em 1969,
O desafio deste estudo é refletir sobre a a cidade de Montreal, uma das mais seguras
seguinte pergunta: em eventos internacionais daquele país, viveu a sua noite de terror quan-
no Brasil, estrangeiros devem se preocupar do policiais e bombeiros fizeram greve, e a ci-
com a violência? dade se viu exposta à violência. Os registros
da mídia da época3 apontam que, em 16 horas
De pronto, é possível afirmar que a preocu- de greve, aconteceram 6 assaltos a banco, 12
pação não deve ser maior do que aquela que incêndios criminosos, uma centena de saques
e 2 homicídios4. Ao final do movimento pare-
1 Agradeço aos colegas do Ministério Público dista, 108 pessoas foram presas.
Federal Carlos Eduardo de Oliveira Vasconcelos e
Vladimir Aras a oportunidade para trabalhar com 3 Disponível em: <http://www.cbc.ca/archives/
o tema. A posição expressa neste texto não reflete categories/politic s/civil-unres t/general-27/
necessariamente aquela de quaisquer das pessoas montreals-night-of-terror.html>. Acesso em: 15 set.
citadas no texto e quaisquer erros são da minha 2014.
exclusiva responsabilidade. 4 “Analyses by Levitt and other statisticians of
2 The Blank Slate. Disponível em: <https:// crime suggest that deterrence works. Those who
itunes.apple.com/WebObjects/MZStore.woa/wa/ prefer real-world experiments to sophisticated
viewBook?id=361932022. statistics may take note of the Montreal police strike

291
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Em 2011, a Inglaterra registrou 540 De fato, o Brasil é um país onde a violência


(1/100.000 hab.). Entretanto, pesquisadores é endêmica7.
observaram que, em Oxford, a taxa de ho-
micídios já foi de 110 homicídios por 100.000 A respeito desse retrato, há muitos núme-
habitantes no século XIV e, na metade do sé- ros a serem pesquisados. Para este estudo,
culo XX, caiu para menos de 1 homicídio por serão considerados apenas os números de
100.000 habitantes5. homicídios8 intencionais. Estes estão regis-
trados e publicados no âmbito de um grande
Ainda no mesmo ano, a França registrou projeto mundial a respeito do “Estudo Global
743 (1,2/100.000 hab.), mas, ao estudar a vio- de Homicídios”9-10, da United Nations Office on
lência no seu período medieval, Georges Duby6 Drugs and Crimes (UNODC)11. Além da UNODC, o
apontou que não havia muitos dados e regis-
tros na França na Idade Média, pois, segundo
ele, “a morte, tal como a dor física, contava
pouco”. 7 Veja: <http://pdba.georgetown.edu/Security/
citizensecurity/brazil/documents/docworldbank.pdf>.
Acesso em: 15 set. 2014.
A violência brasileira 8 Os números não compreendem as mortes
decorrentes dos acidentes de trânsito.
9 Veja: <http://www.unodc.org/gsh/en/index.
Qual é a situação brasileira? html>. Acesso em: 15 set. 2014.
10 “Gaps in data availability - Data presented in this
No País, de fato, há comunidades que ainda report cover all United Nations Member States (193)
convivem com os números de Oxford do Sécu- and a number of territories/autonomous entities (26).
lo XIV e da França Medieval, além da constante In most cases, they are derived from national data
percepção de que a noite de terror da cidade repositories generated by either the criminal justice
de Montreal de 1969 acontece aqui em todas or the public health system. In the former, data are
as noites do ano. generated by law enforcement authorities in the
process of recording and investigating a criminal
case; in the latter, statistical information is produced
of 1969. Within hours of the gendarmes abandoning by health authorities certifying the cause of death of
their posts, that famously safe city was hit with six individuals. For reasons related to the preservation
bank robberies, twelve arsons, a hundred lootings, of both public health and safety, national authorities
and two homicides before the Mounties were called typically devote all due attention to recording and
in to restore order.” (PINKER, Steven. The better investigating deaths due to violent and external
angels of our nature. Disponível em: <https://itunes. causes. Consequently, either (or both) of these sources
apple.com/us/book/better-angels-our-nature/ are the best possible options available to produce
id440418090?mt=11>). statistical information on homicide”. Disponível em:
5 PINKER, Steven. The Better Angels of Our Nature: <http://www.unodc.org/documents/gsh/pdfs/2014_
Why Violence Has Declined. New York: Viking, 2011, GLOBAL_HOMICIDE_BOOK_web.pdf>. Acesso em: 15
p. 290. out. 2014 (p. 99).
6 DUBY, Georges. Ano 1000, Ano 2000. Na pista dos 11 Veja: <http://www.unodc.org>. Acesso em: 15 set.
nossos medos. São Paulo: UNESP, 1998, p. 100. 2014.

292
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Fórum Brasileiro de Segurança Pública12 tam- taxa de 9,7 homicídios por 100.000 habitan-
bém publica muitos dados interessantes a res- tes, ou seja, em 2012 foram registrados 649
peito da nossa violência coletiva. homicídios17.

Em 201113, os números apontavam para No Brasil de 2012, como média diária, fo-
42.785 homicídios, ou seja, 21,8 homicídios ram registrados 137,28 homicídios. A média ho-
por 100.000 habitantes. Entre 2004 e 2011, rária ficou em 5,72. A média mensal foi igual a
somente em 2 anos verificaram-se números 4.175,66. Fechar os olhos para esta realidade é
inferiores a 40.000 homicídios. Em 2010, ano impossível.
em que o Paraguai registrou 734 homicídios
(11,4/100.000 hab.), o Brasil registrou 43.684 Em São Paulo, a média por 100.000 habi-
(22,4/100.000 hab.)14 ou 119 por dia ou, as- tantes foi igual a 10,8, um pouco abaixo do
sustadoramente, 5 homicídios por hora. Sob Piauí, com números iguais a 11,1. No Paraná, foi
qualquer ponto de vista, é muito. igual a 31,7. Alagoas, um dos estados mais vio-
lentos do Brasil, registrou 76,3/100.000. A no-
Em 201215, último ano com dados conheci- ção de estado rico e estado pobre, no Brasil,
dos e publicados16, os números pioraram. Nas por si só não explica estes números18.
três Américas, foram registrados aproximada-
mente 157.000 homicídios intencionais, sendo Para o Brasil, estes números todos são
que 66% deles por arma de fogo (o maior índi- especialmente desafiadores porque a taxa de
ce global). O Brasil, líder em números absolu- homicídios aumentou mesmo com a imple-
tos, registrou 50.108 homicídios.
17 Ao contrário da crença popular brasileira, o
Para cada 100.000 habitantes, foram 25,2 Paraguai é mais seguro do que o Brasil.
homicídios em 2012. Para o mesmo período, 18 “A good example of stability in a country’s national
um dos países mais seguros da região, o Chi- homicide rate disguising disparities in homicide rates
le, marcou 550 homicídios e firmou uma taxa within its territory is Brazil, where, although the
de 3,1 homicídios por 100.000 habitantes. Os national homicide rate has changed little over the last
números da Argentina são desconhecidos, 30 years, there have been significant changes within
mas os do Paraguai corresponderam a uma its different states. Homicide rates have declined in
the States (and cities) of Rio de Janeiro and Sao Paulo,
12  Veja: <http://www.forumseguranca.org.br/ but they have risen in other parts of the country,
publicacoes>. Acesso em: 15 set. 2014. particularly the north and north-east. As homicides
13 Veja: <http://www.unodc.org/unodc/en/data- in Rio de Janeiro and São Paulo States decreased
and-analysis/homicide.html>. Acesso em: 15 set. 2014. (by 29 per cent and 11 per cent, respectively) from
14 Veja: <http://www.unodc.org/unodc/en/data- 2007 to 2011, the homicide rate increased by almost
and-analysis/homicide.html>. Acesso em: 15 set. 2014. 150 per cent in Paraiba and by half in Bahia.* An
exception to these trends is the north-eastern State
15  Veja: <http://www.unodc.org/unodc/en/data-
of Pernambuco, which experienced a decrease in its
and-analysis/homicide.html>. Acesso em: 15 set. 2014.
homicide rate during that time period, though it is still
16  Veja: <http://www.unodc.org/documents/gsh/ at a high level”. Disponível em: <http://www.unodc.
pdfs/2014_GLOBAL_HOMICIDE_BOOK_web.pdf>. org/documents/gsh/pdfs/2014_GLOBAL_HOMICIDE_
Acesso em: 15 set. 2014. BOOK_web.pdf>. Acesso em: 15 set. 2014 (p. 26).

293
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

mentação de uma política pública nacional expressão, mais responsabilidade individual


destinada ao desarmamento da população19 e mais previsibilidade na aplicação da lei
por mais de uma década, com a transformação em ambiente institucional estável 24. Neste
da posse de armas e munição desautorizadas contexto, a segurança jurídica na interpretação
e/ou não registradas em crimes graves20. Em da lei e a previsibilidade na aplicação da lei
outras palavras, o desarmamento não implicou penal são importantes.
redução dos homicídios, e a morte decorrente
de projétil de arma de fogo ainda é a líder no Nos mamíferos, a violência é estratégica25,
ranking estatístico. ou seja, ela somente é utilizada em hipóte-
ses onde os benefícios poderão superar os
Com tais números, o estranho será não en- custos do ato violento – como já se sabe há
contrar no Brasil um estrangeiro que foi vítima muito tempo, e a noite do terror em Montreal,
de violência, porque ela está disseminada, é em 1969, serviu para exemplificar. Deste modo,
endêmica e atinge brasileiros e estrangeiros21-22. diante dos números de homicídios registrados
no nosso país, pode-se afirmar que os benefí-
cios dos atos violentos superam os seus cus-
Processo civilizatório tos no nosso cotidiano. Em outras palavras, os
números apontam no sentido de que os custos
da violência no Brasil são baixos e precisam
Na realidade, conforme as lições de ser incrementados rapidamente.
Norbert Elias23 (The Civilizing Process), os
números apontam para um atraso no processo Como já afirmado em outro texto, produ-
civilizatório brasileiro. Historicamente, não se zido para o Instituto Palavra Aberta, via de
deve esquecer de que este processo só avança regra, humanos são violentos em razão de
com mais democracia, mais liberdade de competição, em razão do medo ou, finalmen-
te, em razão da glória26. Os interesses distin-
19 Veja: <http://www.entreguesuaarma.gov.br/ tos levam à competição violenta em face da
desarmamento/>. Acesso em: 15 set. 2014. ausência de um mediador qualificado pelo
20 BRASIL . Lei n. 10.826, de 22.12.2003. Disponível Estado (v.g., o roubo e o latrocínio; a ausência
em:<ht t p://w w w.pl analto.gov.br/cci v il _03/ da força de segurança em uma localidade ou
LEIS/2003/L10.826.htm>. Acesso em: 15 set. 2014. território para garantir a propriedade; as dis-
21 V.g.: <http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/ putas entre gangues para o controle de pon-
noticia/2014/06/policia-exclui-latrocinio-sobre- tos – território – para o comércio de drogas
morte-de-estrangeiro-dono-de-hostel-no-rio. e mercadorias ilícitas). A presença do medo
html>. Acesso em: 15 set. 2014.
22 Veja: <http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/ 24 C.f. NORTH, Douglass C. Institutions, transaction
noticia/2010/09/tia-e-prima-de-menina-austriaca- costs and productivity in the long run. Washington
serao-julgadas-por-tortura-diz-tj-rj.html>. Acesso University, St. Louis.
em: 15 set. 2014. 25 C.f. PINKER, Steven. Op. cit, p. 290.
23 C.f. PINKER, Steven. The Better Angels of Our 26 HOBBES, Thomas. Leviathan, 1651, apud PINKER,
Nature. Penguin Group: NY, 2011, p. 276. Steven, op. cit., p. 175.

294
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

também é causa de violência, uma vez que o viados aos autores de atos violentos, uma vez
receio de um dano pode implicar um ataque que, no fundo, há uma profunda contradição
preventivo ou uma reação extremada, igual- entre liberdade e virtude29.
mente em face da ausência de um mediador
qualificado. Aqui, por sinal, pode-se incluir Keith Rosenn30 identifica um sistema le-
uma das causas para a violência policial em gal no Brasil que, paradoxalmente, trabalha
grandes manifestações: o medo de perder o com uma constituição muito detalhada e uma
controle ou a credibilidade. A idéia de violên- capacidade de julgar milhares e milhares de
cia por glória está ligada à noção de honra e casos por ano, mas não demonstra capacida-
credibilidade, no sentido de evitar a vitimiza- de de implementar muitas garantias. Daniel
ção e criar obstáculos que possam desenco- Brinks segue no mesmo caminho, apontando
rajar a prática de atos violentos por terceiros, que o sistema é muito lento, formalista, inefi-
ou seja, a prevenção criminal 27. Neste último
ponto, é comum encontrar mais violência no
Brasil nas localidades onde a presença das
instituições é precária e prevalece a “cultura
da honra” (quem já não ouviu a frase: “Eu não
29 SANDEL, Michael. Disponível em: <http://www.
levo desaforo para casa!”28). Em outro senti-
justiceharvard.org>. Acesso em: 15 set. 2014.
do, o processo civilizatório demanda empatia,
30 “Judicial Review in Brazil: Developments under
auto-controle e senso moral, posturas estas
the 1988 Constitution”. “Judicial review in Brazil
incompatíveis com a “cultura da honra”.
is an extraordinarily complex hybrid institution
that attempts to marry the civil and common law
Para o controle da epidemia de violência, o traditions. Its level of complexity and the volume of
maior desafio não é criar coisas novas para re- constitutional cases have increased dramatically
duzir o incentivo à violência brasileira. É fazer since adoption of the 1988 Constitution. ... Forcing the
funcionar as que já existem. O “enforcement”, highest court in the country to deal with routine and
composto pelos Ministérios Públicos e pelas unimportant cases makes little sense and prevents
Polícias, o sistema de aplicação da lei penal, the STF from devoting its time and attention to the
pode evoluir para, de forma inteligente, incen- cases with national importance. The lower courts,
tivar nas pessoas a empatia, o auto-controle however, have displayed substantial resistance to
e a percepção de que as suas condutas terão being required to follow decisions of a higher court. ...
consequências e, também, para estimular na On paper, constitutional rights are better protected in
Brazil than in virtually any other country. ... The reality,
“profissão dos advogados” (escolas de Direito
however, is that many important constitutional rights
e no próprio Judiciário) uma compreensão mais
are honored in the breach. ... The paradox of judicial
profunda a respeito dos incentivos que são en-
review in Brazil is that despite an incredibly detailed
constitution and an elaborate system of judicial
27 PINKER, Steven. Op. cit., p. 1920. enforcement that decides a staggering number of
28 Muito comum no trânsito das grandes cidades constitutional cases, many constitutional guarantees
brasileiras, onde a empatia e o autocontrole não have not been implemented and still others are
imperam. O resultado está registrado, também, nos regularly disregarded.” (ROSENN, Keith S. 7 Sw. J.L. &
grandes números de vítimas dos acidentes de trânsito. Trade Am. 291, 2000).

295
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

ciente e fora do alcance31 da realidade social e É certo que o sistema jurisdicional brasi-
econômica32. leiro deve ser mais eficiente, e a solução para
este enigma está entre aquelas para as quais
31  “Choice of Law and Choice of Forum in Brazilian há concordância para o reconhecimento do
International Commercial Contracts: Party Autonomy,
problema, mas há profunda divergência quan-
International Jurisdiction, and the Emerging Third
to às muitas respostas possíveis, dependendo
Way”: “Brazilian judges often refer to the writings of
law professors when they confront legal questions
da ótica de quem responde. Como consequên-
that are not solved on the face of the code. It is cia, a morosidade impera.
difficult to apply the vague and generalized language
of Brazil’s code provisions to modern legal problems Para a consideração, entretanto, nunca é
without recourse to these scholarly materials. The demais reafirmar que não se deve esquecer
doctrinal teachings of these scholars are at least as que o Direito é, acima de tudo, ação coletiva, e
influential to Brazilian lawyers as persuasive case law o sistema legal inclui, primeiramente, um cor-
is to the common law lawyer - perhaps even more so. po de regras – as leis propriamente ditas33. Mas
In fact, Brazilian judges sometimes quote the textual tudo isso, em si mesmo, não passa de peda-
interpretations of esteemed law professors verbatim ços de papel. O que traz as leis à vida (quando
to dispose of a case, at times in foreign languages existem) são as pessoas e as instituições que
and without translation. n21 For this reason, this
as produzem, interpretam e aplicam34. Institui-
Note gives due deference to the writings of influential
ções, por sinal, são muito importantes para a
legal scholars whose theories on Brazilian private
international law are widely employed by judges when
compreensão da organização social, porque
debating Brazilian conflicts norms and advancing elas são conjuntos de regras, procedimentos
proposals for reform.” (STRINGER, Dana. 44 Colum. J. de aplicação e comportamentos morais e éti-
Transnat’l L. 959, 2006). cos de indivíduos para maximizar a riqueza e a
32 “Judicial Reform and Independence in Brazil and utilidade do que é relevante35.
Argentina: The Beginning of a New Millennium?”: “The
courts in Brazil have been criticized for many things Os números e dados estatísticos a respei-
- they are allegedly too slow, formalistic, inefficient, to dos atos de violência praticados durante a
and out of touch with current social and economic Copa do Mundo no Brasil ainda não são conhe-
realities. In contrast to the Argentine Supreme Court,
however, the courts in Brazil have been accused of
allow inflation to erode the value of the judgment. The
being overly rather than insufficiently independent
current debate over judicial reform began more than
and for hampering the ability of the executive to
ten years ago against this double backdrop of concern
carry out needed reforms. ... In terms of inefficiency
regarding an unaccountable and inefficient judiciary.”
and delays, one of the main targets for criticism has
(BRINKS, Daniel. 40 Tex. Int’l L.J. 595, 2005).
been the possibility of multiple interlocutory appeals
and the lack of binding precedent, both of which 33 Friedman, Lawrence M. Law in America: A short
encourage procedural delays and continuing appeals History. The Modern Library, NY, 2002.
on issues that have been repeatedly settled by the 34 Friedman, Lawrence M. Law in America: A short
Supreme Court. During periods of high inflation, for History. The Modern Library, NY, 2002.
example, the government itself had an official policy 35 North, Douglass C. Disponível em: http://
of appealing all judgments against it, regardless of n o b e l p r i z e . o r g /n o b e l _ p r i z e s/e c o n o m i c s/
the merits of an appeal, simply to delay payment and laureates/1993/press.html. Acesso em: 20 jul. 2013.

296
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

cidos em detalhes. Mas, intuitivamente, muitos Conclusão


perceberam uma redução focal e isto parece
ter sido o resultado de uma melhor coordena- Para a pergunta inicial a respeito da preo-
ção entre todas as agências e instituições en- cupação dos estrangeiros com a violência nos
carregadas da aplicação da lei e da prevenção eventos internacionais no Brasil, portanto,
criminal. Com a certeza dos dados, um outro vale a conclusão no sentido de que ela não
artigo será produzido. deve ser maior do que aquela que deve ter o
próprio brasileiro no seu cotidiano violento.
Lidar com estes desafios pode implicar Mas, com certeza, a solução do problema está
uma redução da violência na sociedade e, in- com os brasileiros.
clusive, contra estrangeiros. Porém, estes de-
safios demandam avanços institucionais nas
forças policiais 36 e no sistema de justiça.
Congresso Nacional, e que foram objeto de atenção
36 Disputas sobre o monopólio da investigação das manifestações de junho de 2013, estão na
criminal, como as materializadas na PEC n. 37, no contramão destes avanços.

297
Stanley Cup Riot Investigation

CAEDMON NASH a level of fan enthusiasm that mirrors the


popularity of soccer in South America and
Acting Sergeant of the Vancouver
Europe. The premier league for ice hockey is the
Police Department
NHL (National Hockey League), which consists
of 30 teams in Canada and the United States.
Teams play an 82-game regular season from
June 15th, 2011
October to April followed by four best-of-seven
elimination playoff rounds that last another 2
months. The winning team is rewarded with a
trophy named the Stanley Cup. This produces
an escalating fan fervor in the cities where
teams advance to the next playoff round.

I am Acting Sergeant Caedmon Nash of the


Vancouver Police Department. I have been a
member of the Vancouver Police Department
for 10 years, with assignments to patrol as
well as the bicycle squad of our Public Safety
or Crowd Control Unit. For the past 34 months Vancouver made the decision to host an
I have been assigned to the riot investigation outdoor viewing area for fans, with a giant screen
team. television and the streets closed to traffic. The
number of people who came to watch the first
I will be speaking today on the investigation game was too many for the chosen location,
that followed a riot in Vancouver, Canada on and so a larger screen was obtained and the
June 15, 2011. This riot occurred after the city’s venue moved to a location that would hold
hockey team lost the deciding game of the more people. While pubs and restaurants were
hockey championship. To put this in context, open for business, all were filled at capacity
ice-hockey is Canada’s National Sport with early in the day. Liquor sales outside of these

299
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

establishments were prohibited on the day of television screen were overturned. These
the game, but most hockey fans were aware vehicles were then set on fire. At the same
of this and so purchased their alcohol in the time two other vehicles in another part of
suburbs and were already intoxicated when downtown were also overturned. The crowd
they arrived in downtown Vancouver. Given the then turned on the police, throwing projectiles
crowds that attended it was not possible to of bottles, bricks, fences and anything else
search people for alcohol as they arrived. This they could get their hands on. The initial crowd
is the view for game 7 on June 15, 2011. This is an estimates of 150,000 dropped to between
8-lane roadway with a parking lot on the right 10,000 and 20,000 as many people had enough
side. There are actually cars in that parking lot, common sense to go home. The remaining
but there are so many people that you cannot were either intent on rioting and causing
see them. property damage or content to watch. Those
who remained to watch were still part of the
problem, as that made it more difficult for the
June 15, 2011 police to protect property. Only 928 police
officers were available for deployment, with
many of those coming from areas outside the
Game 7 Stanley Cup Final City of Vancouver. However, police were able to
Canucks vs Bruins disperse the crowds and quell the riot in just
over 4 hours. It took approximately 2 hours to
• 150,000 people in downtown core disperse crowds at the two original epicentres,
after which the strategy was to push rioters
• Young, male population
South out of the downtown core. The affected
• High levels of alcohol consumption
area measured approximately 6 blocks by 10
blocks. Police resources included riot police
The crowd estimates for June 15, 2011 are with shields, the mounted squad (horses), one
150,000 people in the downtown core. These bike squad of 8 members, and several police
were mostly young men, ages 16-25 and there service dogs. Tear gas was also deployed to
was a very high level of alcohol consumption assist in the dispersal.
and intoxication.

The crowd estimates for June 15, 2011 are


150,000 people in the downtown core. These
were mostly young men, ages 16-25 and there
was a very high level of alcohol consumption
and intoxication.

The riot began with a few minutes left in The riot was primarily property damage
the game, as two vehicles near the live-site to business and vehicles, but there were also

300
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

a number of assaults against members of Some businesses began to fill with smoke
the public, photographers, police and good from burning vehicles, which was enough to
samaritans who were attempting to protect activate the sprinkler system within the store.
property. Some businesses, such as this coffee Imagine the staff trapped inside, unable to
shop, had 3 staff members locked in a closet breathe because of the smoke, soaking wet
for close to an hour while their store was from the sprinklers, and having no way to
destroyed. They had no way to escape and no escape? Some staff report having phoned their
hope of being rescued. It was obviously a very families to say good bye as they thought they
traumatic experience for them. would not make it home alive.

Other business, such as this men’s suit In many circumstances the rioters were
store had their entire inventory stolen. not taking property for no reason other than
to riot and loot, as many young men were seen
taking women’s swim suits from this store.

Damages

112 Businesses damaged or destroyed


122 Vehicles were damaged or destroyed
Burned out cars lined the streets... • 93 Civilian vehicles;
• 5 Business vehicles; and
• 24 Emergency vehicles (Police, Fire,
and Ambulance)

When the riot was cleared, there were


112 business that were damaged. Some were
destroyed and never reopened after the riot.
There were 122 vehicles damaged or destroyed,

301
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

which included 93 civilian vehicles, 5 business is completed by the police, who forward the
vehicles and 24 emergency vehicles. completed investigation to Crown Prosecutors.
The Crown Prosecutors then present the
case before a judge with the accused person
Damages in CDN$ represented by his or her own lawyer. The
police and prosecutors function independently
– the police can not pressure the prosecution
Businesses: $2,715,591.59 to approve charges and prosecutors can not
(does not include lost time, direct the police investigation. However, police
wages, counseling) investigators can seek the opinion of the
prosecutors, and the prosecutors can request
Civilians: $537,869.00 the police provide additional information to
Police and Fire Department vehicles: strengthen the prosecution of any accused. We
$136,874.96 work together but are also independent.
The City of Vancouver did not have the
required police resources to investigate
In Canadian dollars (1 Canadian dollar =
this incident and so was assisted by the
3 Brazilian Real) these damages totaled $2.7
neighboring cities. This map shows the City
Million for businesses, 537 thousand for civilian
of Vancouver and the 15 neighboring cities
vehicles and 136 thousand for police and fire
who provided assistance. The scale of this
vehicles.
map is approximately 75km from Vancouver to
Abbotsford. The investigation team included
the Abbotsford Police, New Westminster Police,
Integrated Riot Investigation Port Moody Police, West Vancouver Police,
Team - IRIT Delta Police, the Royal Canadian Mounted
Police and the cross-jurisdictional Transit
Police. At its largest, the investigative team
included 41 police investigators, a 5-person
command team and 25 civilian support staff.
The results of this investigation make it the
largest criminal investigation of its kind in
Canadian history.

Video Evidence – Public Response


and Outrage
Lower Mainland = 16 Municipalities,
Population 2.6 Million Countless information on the number of
emails, likes to Facebook pages
The task of investigating the riot began All this evidence is un-sourced. Therefore
the very next day. In Canada, the investigation not verified for court use and prosecution.

302
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Vancouver does not have a system of However, all of this information – all these
closed-circuit cameras to allow for police photos and videos – are not accepted as court
monitoring of incidents or to gather evidence evidence in Canadian Courts. The problem is
of criminal offences. However, the thousands that none of this evidence can be verified or
of people who were downtown to watch the authenticated, which allows a lawyer to argue
hockey game and subsequent riot did have in court that it has been altered or fabricated.
cameras and recorded both photos and video.
In the days that followed the riot we received Meanwhile, people who had been featured
thousands of emails from the public offering prominently in the public media began turning
information and evidence. Evidence was also themselves in to the police. Many provided
posted to YouTube, Facebook and other photo- confessions, which was a challenge as no
sharing websites. evidence had been obtained to show what
offences they had committed. Each person
Within 1 week of the riot the Vancouver was interviewed by investigators, but the
Police received almost 4000 emails, many with investigation could not be completed until
attached videos and photos. after supporting video or photo evidence had
been found.
The public created websites to identify
rioters, and Facebook pages with over 100,000
“likes”. Documenting damages

None of this is accepted court evidence as


Investigators were tasked with gathering
it is unverified. evidence from each victim in riot. This
included:
Videos and photographs of the riot • Invoices for damages and detailed
appeared in newspapers, on websites and lists of stolen property
on television. Many rioters were recognized
by friends and family, which resulted in their • Written statements from store owners
losing jobs and friendships. Hundreds of and any affected staff
videos also appeared on YouTube. Many people • Any store security video
forwarded these videos and photos to the
Vancouver Police – with almost 4000 emails • Calls to 9-1-1 related to each business
being received in the week after the riot. The • Photographs of damage, as well as
size of some of the email attachments caused fingerprints and blood swabs for DNA
the City email system to crash. Members of the
public also created websites to identify people
involved in the riot, with one Facebook group The investigative team also compiled
receiving over 100,000 likes. This means there detailed reports for each affected business,
were 100,000 people receiving images through person or vehicle. For example, with a damaged
Facebook for the purpose of identifying rioters business this would include invoices for all
– and none of this was initiated by the police damages and repair costs as well as any stolen
investigators. or damaged property; written statements from

303
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

the owner and any staff who may have been newsprint) refused to provide their evidence,
inside the store or who came to the store and so many months went into obtaining a
to help clean up; any store security video court order for their evidence.
(although in some instances even the video
recorder was stolen during the riot); calls to
9-1-1 from anyone inside the store or anyone Video Evidence – Sourced
witnessing the damage from outside; and
photographs of damage as well as a forensic Hours of video = 5500+ or raw,
examination for fingerprints or blood for unedited video (includes CCTV)
DNA analysis. For assault files we would also
Total number of movie clips
request medical records.
provided = 5,654
Total number of images = 29,716
Video Evidence Sourced
150+ video formats, many proprietary
Video and photographs from formats
photographer / videographer, with
30 TB of data (equivalent to 7,500 DVDs
a written statement verifying the
or 45,000 CDs)
authenticity of evidence.
Sourced video can authenticate open-
Many “open-source” videos on YouTube
source video if it depicts the same
were subsequently sourced as the
incident
videographer was identified.
This gave us over 5,500 hours of video
Emails responded to obtain and almost 30,000 photos. As this came from
original evidence many different camera and security systems,
it meant we had evidence in over 150 different
Since the videos and photos that were on video formats. Many of these were proprietary
YouTube were not accepted court evidence, formats and were unique to their recording
investigators began working to obtain court- system. This volume of evidence required
acceptable video. This was done by replying over 30 terabytes of storage space, which is
to any email that had included a photo equivalent to 7,500 DVDs or 45,000 CDs.
to determine if the sender was the actual
photographer and if they had more photos or
video they could provide. Work was also done With this volume of evidence,
to try to identify the people who had posted
videos on YouTube so that the original video
how do you identify and
could be obtained. For every photographer track suspects?
or videographer we also asked for a written
statement to verify that the evidence was • Facial Recognition?
original and unaltered footage from the • AVID Media Composer?
riot. The media outlets (both television and

304
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

While we now had all the evidence we AVID Media Composer


needed, we still needed to identify suspects
and manage the evidence to present cases Instead, the investigation used a video
to the court on what each accused rioter had software package called “AVID Media
done. Two very different approaches were Composer”.
suggested – Facial Recognition software and a
video package named “AVID Media Composer”. AVID will ingest multiple video formats
and allow conversion / export to a commonly
viewable format.
Facial Recognition
AVID allows locator tags to be placed in
Riot investigation photos and video – these become part of a
• Do not have consistency in lighting, searchable database.
photo background, camera angles, etc.
This software allows multiple video
• Image / video of varying quality formats to be viewed simultaneously, and for
• Many suspects are masked or these different formats to be converted to a
disguised commonly viewable format.
• No set of known photos with
which to match riot images This software also allows locator tags to be
placed within video or photographs, with the
• Commercial software is of locators tags having metadata that becomes
limited reliability part of a searchable database. These locator
tags included descriptors of the clothing worn
Although many people believe the by anyone who was seen committing criminal
investigation used facial recognition offences, as well as other criteria such as
technology, this is not the case. In fact, this gender, hair colour etc.
was never even considered. Accurate facial
recognition software requires consistency IRIT (Integrated Riot Investigation Team)
in lighting, photo background, and camera partnered with the Law Enforcement and
angles. The video and photos from the riot Emergency Services Video Association (LEVA)
did not have this consistency, and were of to analyze and process this data. LEVA Lab in
varying quality, and many suspects were Indianapolis operated almost 24 hrs/day for
also masked or disguised. Furthermore, 2 weeks, with 51 analysts and investigators.
due to privacy rules the police do not have Using only VPD (Vancouver Police Department)
access to any set of known photographs to resources this would have taken 90 weeks
identify anyone seen in the riot footage. The even having the most sophisticated video lab
commercially available software that does in Canada. Each of these locator tags had to
facial recognition is also of limited reliability, be added manually. Close to 88,000 tags have
which would cause issues for the prosecution been added to the video evidence to help
of anyone involved in the riot. investigators locate suspects in the numerous
video exhibits.

305
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

UPPER GARMENT = 03OHOCK14


LOWER GARMENT = 03LONG
HEAD GEAR = HAT or 01HAT or 03HAT
GENDER = M
FOOT WARE = 01SHOES
Comments = Seattle, mask, S hat
HAIR =
FACIAL HAIR =
BAG =
WEAPON/TOOL =
RECORDING DEVICE = BODY MARKS =

This is an example of one of the more


prolific rioters, who was involved in damaging
3 vehicles, assaulting a good samaritan, and
looting from 4 different stores. He was also A search within the tags in AVID of those
careful to conceal his face through most identifying features found him very early
of the night, which makes it impossible to in the night, at a time when he did not yet
identify who he is. However, he did have have a mask over his face. From this picture
unique identifiers in his clothing. The shirt he has now been identified by the police
he is wearing is a jersey for the Vancouver investigators, and the Crown Prosecutors
Canucks hockey team, so that in itself was have reviewed the file and approved charges
not uncommon during the riot. When that is against him. When faced with the strength of
combined with the white shoes, blue jeans, the evidence against him, he has plead guilty
and a Seattle Mariner’s hat it does make him rather than go to trial and will be sentenced
unique among all the rioters. later this year.

306
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

There are countless examples of other • Categorized by posting user, riot


rioters who also attempted to conceal their events, named suspect
identity but were located and identified thanks
• Named Suspects - may be difficult to
to the careful “tagging” of images in AVID.
contact or identify the tipster, so no
court-admissible statement
Identifying Rioters Investigators began monitoring sites
such as YouTube and Facebook before the
• Open-source riot even started, but these efforts increased
• Website after the riot. Several investigators from our
• Poster Campaign Technological Crime Unit monitored Facebook,
YouTube and other “Identify the Rioter” websites
Although the investigative team now had a virtually 24 hours a day. Any comments that were
way to locate suspects in all the different video posted could be deleted, so it was important to
exhibits, the challenge remained to identify regularly monitor and capture that information.
who they were. The first strategy was to mine All of this information was carefully categorized
information from the “Identify Rioter” website by the riot event, suspect name, the name of
that had appeared in the days following the the person posting the information so that
riot. This was followed by a website created investigators could sort through this wealth of
by the investigative team, which allowed the information later. This information was useful
public to submit tips to identify rioters and as a starting point for investigators, but none
allowed them to remain anonymous if they so of these tips were accepted as court evidence
chose. By maintaining our own website we were to identify a rioter until it was accompanied by
able to select which rioters were to be featured a written statement from a witness willing to
on the website, and also were able to remove appear in court.
the images once a person had been identified.
Finally, two very successful poster campaigns,
in which over 100,000 posters featuring face
images of 100 each were distributed across the
Greater Vancouver area.

Identifying Rioters –
Open-Source
• Videos Posted on YouTube, Facebook,
Vimeo, etc.
• Captured daily (non-stop)
• Comments reviewed for potential
suspects

307
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

At the end of August 2011 the Investigative Within three days investigators are
Team launched an interactive website to confirming names for nine of the 40 suspects
identify riot suspects. The initial launch of featured on the website, an additional six
the website featured only 40 photos, in an people have turned themselves in, and 25
attempt to manage the information flow and tips have been received. With each tip the
any tips that were submitted. Within 3 days tipster has option of providing name and
the site had received over 100,000+ visits. contact details for follow-up statement. This
website has been restructured since the
initial launch, but continues to have images
rioters who remain unidentified. The site has
received millions of visitors.

Electronic Disclosure

Once the investigation into any identified


rioter was complete, the police investigators
would forward the investigation to prosecutors.
This was done in electronic format instead of
The launch of the website was supported the standard paper format.
by the Vancouver media outlets, with many
of the suspect images broadcast on the
news and reprinted in the newspapers. This Full Electronic Disclosure
website received 2,200 hits/hour and 50 new
tips within first hours of operation. • RTCC delivered on DVD
• Adobe pdf with hyperlinked
attachments, video etc.

The report with all accompanying


statements and videos was compiled on a DVD
as a linked document.

308
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Each report was divided into distinct • Approximately 246 guilty pleas so far
sections, naming the required witnesses
• 1239 Charges Recommended
and attachments. This makes it very easy for
review, but also makes it easier to assemble • 886 Charges Approved
the reports as some sections, such as the
• *as of April 7, 2014
narrative for damages to a business are
common to many reports. As stated earlier, this is the largest
investigation of its kind in Canadian history.
Although the investigation is winding down it
Suspects Charged is not yet concluded as suspects do continue
to be identified. As of today, charges have been
• Charges Recommended against recommended by the police against 358 rioters,
358 rioters and prosecutors have approved charges
against 294 rioters. These investigations have
• Charges Approved against 294 rioters be comprehensive enough to result in 246
guilty pleas so far.

309
B.C.’s Prosecution Service –
Report on the 2011 Vancouver Stanley Cup
Riot Prosecutions*
*  British Columbia, January 2016.

VANCOUVER RIOT PROSECUTION TEAM


BRITISH COLUMBIA PROSECUTION SERVICE

lmmediately following the riot in June


2011, there was considerable public dialogue
about the manner in which police and B.C.'s
Prosecution Service responded to the event.
Many questions were posed, including
questions about the time it was taking to
proceed with charges and prosecutions. The
Branch's report answers these questions and
provides important context for appreciating
the evidentiary and process complexities of
the riot cases.
Photo: Matthew Grapengieser

Over the past few years, the Branch has I am proud of the way in which Crown
sought increased opportunity to provide the Counsel and the Branchs' administrative
public with a better understanding of the role staff managed the riot prosecutions.
of the Prosecution Service, within the broader Notwithstanding the high-profile and public
justice system. Now that the riot prosecutions attention these cases attracted, the Riot
are very close to completion, the Branch can Prosecution Team did precisely what is
offer a behind­ the-scenes look at how these expected of an independent Prosecution
cases were marshalled through the criminal Service: they remained impartial; took a
justice system – from investigation by police, fair and principled approach to each case;
to charge assessment by Crown Counsel, trial and, working co-operatively with police,
and sentencing. Particular focus has been they kept their focus – methodical in their
given to the voluminous digital evidence that case preparation, steadfast in moving the
underlay the prosecutions, and the effort prosecutions forward, and exercising diligence
required by police and prosecutors to ensure in the public interest.
that a comprehensive and factually accurate
compilation of this evidence was available for In honour of their dedication and
each case. professionalism, all members of the

311
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Riot Prosecution Team received formal restraint was noted by the BC Civil Liberties
appreciation from the Branch in the spring Association1 and the courts2.
of 2015. In October 2015, Crown Counsel with
the Prosecution Team received national After the riot, police officers began the
recognition from the Federal/Provincial laborious task of collecting evidence related
(territorial Heads of Prosecution Committee to the circumstances of the riot and those
in celebration of their Commitment to Justice. responsible. The Integrated Riot Investigation
Team, (IRIT) was formed to conduct the
The public has been well served by the investigation. IRIT was comprised of police
work of the Riot Prosecution Team. On behalf officers from the Vancouver Police Department
of B.C.'s Prosecution Service, I thank them for and seven other Lower Mainland police
their excellence. agencies.

A week after the riot the Criminal Justice


M. JOYCE DEWITT-VAN OOSTEN, QC Branch (the Branch) established the Riot
Prosecution Team (RPT) to manage the riot-
Assistant Deputy Attorney General related offences that were brought to the
Criminal Justice Branch Branch by police for charge assessment and
Ministry of Justice and Attorney General prosecution.

The investigation and prosecution of the


Introduction riot was unique in scope and nature given the:
• large number of rioters;
For five hours on June 15, 2011, rioters
overtook the downtown core of Vancouver. • large number of alleged criminal acts;
Moments before the end of the last game in and
the Stanley Cup finals, when it was apparent • copious quantity of photographic
the home team would not win, some made the evidence (which would become the
choice to riot. The rioting crowd occupied West foundation of the investigation and
Georgia Street and the surrounding areas. The prosecution).
rioters set vehicles on fire, looted commercial
premises, and defiantly confronted the police. Media outlets broadcasted live coverage
Numerous police officers and civilians were of the riot. In the days following, many videos
assaulted. An atmosphere of lawlessness, and photographs taken by the public depicting
violence, and destruction quickly consumed the riot were posted on social media sites,
the downtown core of Vancouver. some even labeling rioters by name. The

The riot was brought under control by 1 <ht t ps ://bccl a .or g/new s/2011/0 6/b ccl a-
928 police officers. Their professionalism and congratulates-vpd-on-restraint-last-night/>.
2  See for example R v Yates, 2012 BCPC 250 at §12.

312
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

ability of the public to view the commission in the streets surrounding the public viewing
of multiple criminal offences during the riot areas. The television screen was set up on
and the outing of many of the rioters by name Hamilton Street.
led to a heightened expectation by the public
that the rioters could be easily and quickly
apprehended and prosecuted. In fact, the
investigation and prosecution of rioters was
enormously complex. This tension between
public expectations and reality was evident in
the media reports which questioned the slow
pace of the investigation3.

The purpose of this report is to:


• provide an overview of the riot-related
prosecution process and the evidence
available to the prosecution; and This photograph taken at 5:45 p.m. on June
15, 2011, shows the crowd of spectators that
• provide a better understanding of the
had amassed on West Georgia Street from
mechanics of a prosecution dependent on
video and photographs as the foundation Hamilton to Seymour Streets.
of the evidence.
The riot started in front of the Canada
Post building, depicted on the right-hand side
Location of the Riot of the photograph, at approximately 7:30 pm,
and spread throughout the downtown core
of Vancouver. During the five hours of rioting,
On June 15, 2011, the City of Vancouver set members of the crowd committed multiple
up public viewing areas in the streets of the criminal offences including arson, break and
downtown core for spectators to watch the enter, theft, mischief and assault.
final game of the Stanley Cup playoff on large
television monitors.

Approximately 55,000 people watched the


game at a public viewing area on West Georgia
Street and an additional 100,000 people were

3  “Vancouver police chief cites ‘double jeopardy’


for delay in laying riot charges” Globe and Mail
August 30, 2011 Wendy Stueck; CBC news “Delay in
Vancouver riot charges a contrast to U.K.” August 10,
2011; Globe and Mail “B.C. court system girds for riot-
related overload” October 31, 2011 Sunny Dhillon.

313
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

This map of the downtown core of Overnight, St. Paul’s Hospital, located in
Vancouver depicts the three square kilometre the riot zone, dealt with 250 emergency room
area where the riot occurred. visits. In comparison, Vancouver General
Hospital dealt with 15 emergency room visits
during the same time-period.
Scope and Impact of the Riot
The total estimated monetary loss resulting
from the riot was approximately $3.78M. These
During the riot, there were 112 businesses approximate costs were attributed in the
damaged, 122 vehicles were damaged or following way:
destroyed, and 52 assaults were reported
against civilians, police, and emergency • $2.7M to businesses;
personnel. • $540,000 to civilians; and
• $525,000 to the City of Vancouver,
On the night of the riot, 1,035 emergency BC Ambulance Services, and St. Paul’s
response personnel were deployed to the Hospital.
downtown core of Vancouver:
The psychological impact of the riot is
• 928 police officers, of which 606 were
difficult to quantify as personal experiences
members of the Vancouver Police
Department, the remainder were RCMP varied greatly. Some people were terrified of
members or members of other lower losing their lives, having barricaded themselves
mainland municipal police departments; inside businesses for safety, while others
defended property or other persons at risk to
• 63 members of the Vancouver Fire and
themselves. The riot stripped a sense of safety
Rescue Services; and
and security from many citizens.
• 44 members of the British Columbia
Ambulance Service.
The Investigation
The public sought the assistance of these
first responders by calling 911 in historic
proportion. For example, at one point during IRIT collected evidence by:
the riot there were 92 calls to 911 for Ambulance • identifying, interviewing, and taking
Services placed on hold. statements from over 2200 victims,
witnesses, property owners, and
Half an hour after the riot started, employees;
Ambulance Services determined that the
• photographing and documenting injuries
area was not safe and relocated all but six of to assault victims;
their specially trained members to St. Paul’s
Hospital. These six members were the only • photographing and documenting the
resource available to attend to the over 100 damage to buildings, vehicles, and other
property;
medical emergencies within the riot-zone.

314
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

• obtaining medical records, statements of at the store closed the store early and locked
loss, copies of repair bills, counselling bills, themselves inside the store for protection
and copies of registration documents; and
against the rioters. Once the rioters broke
• compiling forensic evidence. through the locked doors and steel barricades
at the store entrance the employees, fearing for
IRIT identified 297 discrete riot events. A riot their physical safety, hid in a small windowless
event was defined as an incident relating to: office in the basement of the store.
• a certain location, such as a building;
London Drugs suffered extensive damage
• a piece of property, such as a motor and financial loss, which included approximately
vehicle; or
$140,000 for repairs and $760,000 in stolen
• a person, such as a victim of an assault. and/or damaged merchandise.
These 297 events involved:
The evidence relating to this single event
• 26 arsons; included:
• 193 mischiefs (damage to property); • witness statements from the employees
• 26 break and enters; and trapped inside the store;

• 52 assaults on civilians, police officers • 911 calls from the employees, civilians,
and a firefighter. and a transit police officer relating to the
store;
These 297 events were individually and • CCTV video evidence from the interior
simultaneously investigated, thus requiring and exterior of London Drugs;
significant police resources. Some of the • witness statements from those who
identified events involved many victims and/ processed and provided the CCTV video
or suspected offenders, and were enormously to IRIT;
time consuming to investigate, and were • statement of loss and damage from
classified as major riot events. Three examples London Drugs;
of major riot events are London Drugs,
• photographs of the damage to exterior
Hudson’s Bay, and the assault of Mr. Mackay.
and interior of London Drugs;
• statements from those who seized
and processed the civilian video and
Major Event – London Drugs
photographs; and
A major riot event to commercial premises • details of the investigation for each
was committed by 316 individuals who broke rioter identified, included their IRIT
into and looted the London Drugs located at photograph, recognition evidence, arrest,
710 Granville Street. and interview.

The riot occurred during regular business


hours for London Drugs. Employees working

315
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Major Event – The Hudson’s Bay • statement of loss and damage for the
store;
The riot occurred during business hours for • photographs of damage to the exterior
the Hudson’s Bay department store. Employees and interior of the store;
closed the store early. The majority of the • statements from those who seized
employees, fearing for their safety, gathered on and processed the civilian video and
the top floor of the building. Loss prevention photographs; and
officers stayed on the first floor and attempted,
• details of the investigation for each
to no avail, to stop the rioters from looting the rioter identified, included their IRIT
store. The rioters broke through the locked photograph, recognition evidence, arrest,
doors or smashed through windows, entered and interview.
the store and looted it. Vehicles beside the
store were set on fire and the smoke came
through the broken store windows setting Major Event – Assault of Mr. Mackay
off the fire alarms and the sprinkler system.
The employees on the top floor believed the
building was on fire, and fled from the store Another example of a major riot event was
into the riot. the assault of Mr. Mackay. He was swarmed
and assaulted by 13 rioters when he attempted
The store suffered extensive damage and to stop rioters from damaging and looting the
loss of merchandise as a result of the riot. The Hudson’s Bay store.
financial loss was approximately:
• $432,000 in stolen property, A number of the rioters responsible for the
assault also caused damage to the Hudson’s
• $856,000 in physical damage to Bay and to three cars parked on Seymour
merchandise and the store itself, and
Street. The evidence gathered against each
• $58,000 in other riot related costs (such suspect in the assault of Mr. Mackay included
as trauma counselling for employees). the following:
• witness statements from Mr. Mackay as
The evidence gathered against each person to the assault and the impact upon him;
suspected in the vandalism to and/or looting
• video and photographs and witness
of the store included the following:
statements from videographers/
• witness statements and 911 calls from photographers who recorded the scene
employees inside the store; before, during and after the assault;
• 911 calls from persons outside the store; • witness statements from Bay employees
• CCTV video evidence of the exterior and and civilians who witnessed Mr. Mackay
interior of the store; protecting the store and/or being
assaulted;
• witness statements from those who
processed and provided CCTV video to IRIT;

316
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

• witness statements and statements of task. IRIT obtained the evidence from five
loss for the three citizens whose vehicles sources:
were parked beside the store;
• video and photographs taken by officers
• statement of loss for the damage done from various police agencies that were at
to the three cars; the riot;
• the material gathered in relation to the • video and photographs submitted by
Hudson’s Bay major riot event; and witnesses at the riot;
• details of the investigation for each • video from CCTV cameras throughout
individual involved in the swarming, the downtown core, including external
which included their IRIT photograph, tips, and internal video from businesses and
follow-up regarding recognition evidence, the City of Vancouver;
arrest and interview.
• video and photographs seized by IRIT
from media outlets; and
Photographic Evidence • video and photographs captured from
social media websites.

It was essential for IRIT to obtain the IRIT investigators were required to verify
available video and photographs of the riot the authenticity of all the photographic
to provide the evidentiary foundation for the evidence before it could be relied upon in
prosecution of the rioters. If criminal charges the prosecution. The police had to obtain
were to be approved and prosecuted, each statements from the approximately 500
element of the charged offences, specific to businesses and civilians who were originally
the named accused, would have to be proved in possession of this evidence. During the
beyond a reasonable doubt. prosecution, there were no legal challenges to
the admissibility of the video and photographs
Immediately IRIT was inundated with because the evidence had been properly
information from the public. In the first week authenticated.
alone, police received 280 Crime Stoppers tips
and 3,692 emails, including: Media outlets and freelance videographers
were present and recorded the events of the
• 53 emails with attached video;
riot. The media agencies refused to provide
• 708 emails with attached images; copies voluntarily of this evidence to the IRIT
• 676 emails with links to social media investigation. IRIT sought judicially authorized
sites; and Production Orders under the Criminal Code
to have the media agencies provide copies of
• 1,355 emails with hyperlinks to social
media sites. all video and photographs in their possession
depicting the downtown core of Vancouver
Processing and sourcing the massive leading up to and during the time of the riot.
amount of video evidence was a monumental A Judicial Justice of the Peace granted the

317
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Production Orders on September 23, 2011. The Fifty-one forensic video analysts and
media agencies then petitioned the Supreme investigators worked for over 4,000 hours
Court of British Columbia to exempt them to process the video at LEVA. By utilizing the
from complying with the Production Orders resources of LEVA, IRIT was able to process the
and a hearing was held on December 7 and video in two weeks. If IRIT had not used LEVA,
8, 2011. The Court declined to grant them an it would have taken approximately 90 weeks to
exemption4 and the media agencies provided process the video in Vancouver.
the material in January 2012.
Analysts processed the video by “tagging”
By the end of the investigation, IRIT had a suspect depicted committing a criminal
collected 402 video and photo exhibits from 304 offence. The imageof the person would be
sources. These exhibits comprised over 5500 tagged with a description of their personal
hours of video and over 29,700 photographs, characteristics and their clothing.
totaling over 30 TB of data, the equivalent to
7,500 DVDs or 45,000 CDs. In comparison, the These tags permitted an IRIT investigator
investigation of the 1994 Stanley Cup riot in to later use a search program, AVID Media
Vancouver produced only 100 hours of video Composer, to search the video and photograph
evidence. exhibits by the personal characteristics
and clothing descriptors of a particular riot
The 2011 riot occurred over five hours and suspect. The search would return all tagged
over a three square kilometer area. Any single images matching the description of a particular
rioter could, and many did, commit multiple riot suspect. Through this search process,
criminal acts at multiple locations. Evidence of IRIT investigators were able to uncover the
those criminal actions was effectively hidden, criminal conduct committed by individual
like a needle in a haystack, in multiple exhibits suspects without personally reviewing all of
taken by various videographers. It would have the photographic images.
taken an investigator almost three years simply
to view all of the video once. The processing of the video and
photographs in LEVA also ensured that evidence
Therefore, IRIT sought the assistance of the of the full conduct of a rioter was located.
International Law Enforcement and Emergency Some individuals turned themselves into the
Services Video Association (LEVA). IRIT took the police shortly after the riot and provided a
photographs and video evidence to the LEVA statement to the police of their conduct during
video lab in Indianapolis, Indiana in October the riot. The processing at LEVA permitted
2011. At the time, this was the only video lab in investigators to search all the evidence to
North America with the facilities to review and ensure the accuracy of these statements. At
process this volume of video evidence. times the search produced evidence showing
that an individual’s self-reported account was
inaccurate, and in fact the individual was much
4 Vancouver Sun, a Division of Postmedia Network more seriously involved.
Inc v BC, 2011 BCSC 1736.

318
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

The Riot Website recognition witnesses was a necessary and


time-consuming part of the investigation. Over
IRIT created a website for the public to the course of the investigation, IRIT obtained
assist in the identification of rioters. IRIT more than 1000 statements from recognition
posted photographs and video stills of witnesses.
suspected rioters on the website. Each suspect
was given a unique IRIT identification number.
The public could view these images and post The Prosecution
information to assist in the identification of a
suspected rioter. This information could only
be accessed by the police. The public could Establishing the Riot Prosecution Team
provide the information anonymously or
leave contact information, which allowed an A week after the riot, the Branch
investigator to follow up with the tipster as a established the RPT to manage the riot related
potential recognition witness. prosecutions. In all major prosecutions, there
is a lawyer who is the team lead to oversee
A recognition witness is a person who is able the administrative and legal decisions of
to look at a video or photograph and recognize the team. The team was initially composed
the person in the video or photograph. A of a team lead, three other lawyers and one
recognition witness is considered a reliable administrative assistant, all of whom had
witness if there has been a close and/or experience prosecuting major files. The team
lengthy relationship with that person. composition increased by an additional three
lawyers and two administrative assistants
The first website posting on August 30, when the accused numbered in the hundreds.
2011 contained photographs of 40 suspected
rioters. This number was chosen in order to The team was aware that they would be
manage the volume of anticipated tips and reviewing hundreds of investigative reports,
information that would follow. Within three each involving a voluminous amount of
days of the launch of the website it received evidence. From the outset, the team focused
over 100,000 visits and over 225 tips. on developing consistency in their approach
to all facets of the prosecution. All accused,
New suspect images continued to be added no matter when they were charged or which
to the website throughout the investigation. Crown Counsel had conduct of the file, had to
In total, more than 1,500 suspect names be treated fairly and consistently at all stages
were provided to IRIT via email, telephone, of the prosecution process.
and the website. As many of the tips were
from anonymous sources or from individuals The Branch received additional funding
unwilling to be witnesses, IRIT investigators due to the extraordinary costs associated with
were required to follow up on the tips in these prosecutions. The following table shows
order to find reliable recognition witnesses. the financial costs of prosecuting the riot-
Locating and interviewing prospective related files.

319
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Expense 2011/12 2012/13 2013/14 2014/15 2015/16* Total

Staffing 515,271 1,244,082 1,399,513 1,126,751 520,149 4,805,766

Other** 16,695 61,489 47,110 36,289 9,416 170,699

Total Expenditures 531,966 1,305,571 1,446,623 1,163,040 529,565 4,976,765

* Forecast
** Including witnesses, travel, transcripts, cellular phones, office expenses, building charges, and Law
Society fees.

Preparation for Riot Prosecutions

Between June and October 2011, before the RPT prepared for the consistent
police submitted any investigative reports, prosecution of alleged rioters by:
the RPT took steps to ensure a consistent
approach to all riot-related files, and to • Organizing the intake, management, and
ensure the justice system was prepared for tracking of all investigative reports and
the large number of expected prosecutions. prosecution files.

During this period, the RPT met with • Developing a master spreadsheet in
other justice system participants for the order to (amongst other things) provide
purpose of ensuring that proper resources all RPT members access to:
were in place for the riot prosecution files - file data;
that would soon be entering the system. The
RPT held discussions with Court Services - file assignments;
Branch regarding the technology required to - case outcomes and sentencing
present the photographic evidence in court. details; and
Discussions were also held with administrative - information required to answer the
judges and legal aid officials regarding the many external and internal inquiries.
expected influx of new files to the court
system. Corrections Branch was consulted • Reviewing case law and preparing
about a potential increase in the number of summaries of the law regarding:
offenders requiring supervision by probation
officers of court-ordered community work - the legal test for the charge of riot;
service.
- the admissibility of photographic
evidence;

320
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

- the admissibility of recognition Branch’s policy on charge assessment, which


evidence; requires that:

- the admissibility of statements for • there be a substantial likelihood of


both adults and youths; and conviction; and

- the legal considerations for riot • a prosecution is required in the public


sentencing hearings. interest.

• Organizing a consistent approach to The charge assessment guidelines are


charge assessment, composition of the established in Branch policy and are available
Information (charging document) and online at:
prosecution files generally.
< w w w . a g . g o v . b c . c a/p r o s e c u t i o n -
• Developing a consistent approach to s e r v i c e/p o l i c y -m a n/p d f/C H A1 _
bail. Generally, accused who did not have ChargeA ssessmentGuidelines.pdf >.
a criminal record were arrested on an
endorsed warrant, which permitted the The police submitted the first group
accused to be released on conditions by of RCCs to the RPT on October 31, 2011. The
the Officer in Charge, and an opportunity first charges were laid on November 30, 2011
was provided to these accused persons against both adult and youth accused. If an
to surrender voluntarily to the police. accused was between the ages of 12 and
17 on the date of the riot, the prosecution
• Acquiring the equipment and software proceeded in youth justice court.
required to review and organize the
photographic evidence. Between October 31, 2011 and July 24,
2014, the RPT assessed RCCs in relation to
366 suspected rioters. Ultimately, 912 charges
Charge Assessment
were laid against 300 alleged rioters. In total,
246 adults and 54 youths were charged. The
Under the Crown Counsel Act, Crown following graph shows the number of accused
Counsel are responsible for charge assessment that were charged with various offences5.
(the decision of whether or not a person will
be charged with a criminal offence). Once IRIT
completed the investigation of a particular
riot suspect, it presented the evidence 5  Accused may be charged with offences from
one or more categories; assault with a weapon
against that person in a Report to Crown
is included in the weapons offences category;
Counsel (RCC) and forwarded the RCC to the
possession of incendiary materials is included in
Riot Prosecution Team for charge assessment. arson category; possession of stolen property is
The RCC was reviewed in accordance with the included in the theft offences category.

321
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

Court Proceedings

An accused has the right to obtain legal appearances, arraignment hearings, trials, and
counsel and to receive full disclosure of all sentencing hearings.
relevant evidence in the possession of the
Crown. The RPT provided a disclosure package In the end, 284 accused pleaded guilty, 10
to defence counsel at the first court appearance accused chose to go to trial (9 were convicted),
in arraignment court, which included all of and the Crown entered a stay of proceedings,
the evidence contained within the RCC. The terminating the prosecution, against six
RCC included an overview of the riot; the accused because the Branch’s charge
particulars of the accused’s participation in assessment standard was no longer met. Over
the riot, including the photographic evidence 500 court days were required to complete the
of that participation; and, statements from trials and sentencing hearings6.
recognition witnesses, victims, and police
officers as relevant to that accused. The
accused had the choice of pleading guilty, or Presentation of Photographic Evidence
having a trial. The accused and defence counsel
needed time to review and discuss the often- Photographic images of an event are
voluminous disclosure. Therefore, the matter admissible as evidence to establish whether
would be adjourned until the disclosure was a crime has been committed and whether the
properly reviewed and a decision had been accused committed it. Through the tumultuous
made by the accused whether to plead guilty events of June 15, 2011, cameras recorded
or have a trial. the actions of those participating in the
riot. These actions were not caught on one
Over the course of the prosecution, continuous video, but rather on many smaller
the RPT was simultaneously conducting
6  One sentencing hearing is still outstanding at the
charge assessment, attending initial court
time of publishing this report.

322
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

clips of the various riot events from different hours of work by RPT but resulted in effective
videographers and photographers. The various and efficient use of court time.
video and photographs were not focused on
a particular rioter’s conduct but contained For example, during one trial the Crown
multiple rioters committing many criminal acts alleged that two accused traveled through
at the same time. eight separate areas of the riot committing
numerous criminal offences over the course
It is the role of Crown Counsel to present of three hours. The photographic evidence
relevant evidence upon which a judge can make consisted of 90 series of photographs or
findings of fact. The most relevant evidence video clips. In preparation for trial, it initially
in the riot prosecution was the photographic took the Crown five days to merely watch this
evidence. All of the available photographic photographic evidence. By organizing and
evidence against a particular accused had summarizing the evidence, the Crown was able
to be assembled into a coherent and cogent to present the same evidence in court in half
exhibit. For every trial and sentencing hearing, the time.
the video and photographs were organized
chronologically to depict the conduct of a The vast majority of the riot-related
specific rioter within the context of the riot as accused pleaded guilty due to the organized
a whole. and compelling Crown case, in particular the
photographic evidence. The countless hours
A judge might review the photographic spent by the RPT organizing this evidence
evidence outside of court as part of his or (and by the police in carefully gathering and
her deliberations on verdict or sentence. cataloguing this evidence) resulted in great
Crown Counsel also provided the judge with a savings in court time.
written summary of the photographic evidence
to assist the judge in locating the accused
amongst all of the other individuals in the Trials
photographic evidence.
Many accused initially set their matters for
The process of organizing the various pieces trial but the majority of the accused ended up
of photographic evidence into an exhibit and pleading guilty before the end of trial. There
preparing a written summary of that evidence were six trials, involving ten adults, which went
was a labour intensive job. The Crown reviewed to completion. All of these trials also involved
all of the evidence and selected the relevant allegations of other offences apart from riot.
photographic evidence. A list of the selected The other charges included allegations of:
evidence would be provided to administrative • assaulting a police officer;
staff that cut the video and photographs and
electronically copied them onto a disc, which • assaulting a firefighter;
became the exhibit. The process of organizing • assaulting civilians;
all of the photographic evidence for the trials • break and enter; and
and sentencing hearing required thousands of
• mischief to property.

323
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

The legal issues at the trials for the Youth, however, are sentenced pursuant
10 accused varied at each trial. The issues to principles contained in the Youth Criminal
included: Justice Act (YCJA), which did not at the time
• whether the accused intended to of the riot include general deterrence as a
participate in the riot; principle. The YCJA recognizes that youth are
less morally blameworthy for their conduct as
• whether the defences of self-defence or
their sense of moral responsibility is not fully
defence of a third party or use of force to
developed. Therefore, the YCJA emphasizes
prevent the commission of an offence were
available to an accused; the need to have youth accept responsibility
for their offence and for the court to craft a
• whether pre-charge delay or police sentence focused on rehabilitation. The youth
conduct warranted a judicial stay of court can only impose a jail sentence in narrow
proceedings;
circumstances.
• whether recognition witnesses’ evidence
was admissible; and In imposing sentence, the court weighs the
• whether the identification of the accused personal circumstances of the offender, the
from the photographs and video presented aggravating and mitigating factors, and the
at trial had been established. decisions made by other Canadian courts for
similar offences.
In order to establish the conduct of the
various accused, the Crown relied on evidence The sentences ultimately imposed
from: by the courts in relation to the adult and
youth rioters reflect the differences in the
• witnesses as to the events of the riot; and
applicable sentencing principles, as well as
• video and photographs of the events of the individualized process of sentencing. It is
the riot. a multi-faceted analysis, with no two cases
ever being exactly alike, even when committed
Nine of the ten accused were convicted and during the same event such as this riot.
one accused was acquitted.
During the sentencing hearings, Crown
Counsel provided the court with:
Sentencing Hearings • written Admissions or Submissions of
Fact outlining the riot in general and the
Adults are sentenced pursuant to the offender’s participation in particular;
principles of sentencing as established by
• the video and photographs that depicted
Parliament in the Criminal Code. General
the offender’s participation in the riot;
deterrence and denunciation are, in most
circumstances, given paramount consideration • the victim impact statements relevant to
in sentencing an adult rioter. the offender’s participation in the riot; and
• case law in relation to the sentencing
principles for a riot offender.

324
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Throughout the sentencing hearings, the to be part of the riot in the first place.
judges recognized the seriousness of the Violence and mob rule replaced peaceful
offence of rioting and the seriousness of this government (to paraphrase the judge in
riot in particular. the Loewen case). There lies the gravity of
the crimes committed by the accused.
In Regina v Patillo7, the Court stated:
In Regina v Yates the Court stated8:
Why is this offence considered to be so
serious? During a riot, the rule of law is I wish to comment on two things. First,
suspended by virtue of the actions of the although I have only been presented
rioters. Citizens nearby and further afield with short excerpts of the videos of the
cannot feel, and indeed are not, physically riot, it is an enormous understatement to
safe. The extraordinary call on emergency describe the scene of mayhem and gross
services of all kinds can result in there public disorder as shocking. The crowd was
being no assistance available for anyone composed almost entirely of young men
else in the community. Property of all and women, like Mr. Yates, who seemed
sorts, locked and secured in the ordinary to have completely lost sight of who they
way, is not safe from the crowd. By sheer were, who the police were, and that they
force of numbers, the rioters can break were destroying the community and the
through any security device and loot and neighbourhood of downtown Vancouver.
destroy at will.
Second, it was enormously disturbing to
Participation in a riot includes a vast range see the crowd's behaviour towards the
of behaviours. A riot will only end when Vancouver City Police. In all of the scenes
those involved do what they should have I viewed, the police were acting with the
done in the first place: stop and leave the utmost restraint. I can only imagine how
area. As long as there are observers, who terrifying it must have been for them to
by their very presence are encouraging be confronted by such an enormous,
the destruction, people watching, howling mob of drunken young people. It
sometimes cheering, and frequently would have taken considerable courage
taking photographs, the riot will continue. for all of the police, firefighters, and
other emergency personnel to stand up
The Court in Regina v Fuller said this at to that malevolent crowd. Their conduct
paragraphs 49 through 51: is a tribute to the high degree of their
professionalism, for which the entire City
One has to bear in mind that the only of Vancouver, and particularly the rioters
purpose of those rioters (mostly from 16 themselves, should be grateful.
to 25 years old, the accused being 22) was
the pleasure of destroying, terrorizing and The British Columbia Court of Appeal in R v
putting fear into those who did not want Peepre re-affirmed that both the context of the

7  R v Patillo, 2012 BCPC 299. 8  R v Yates, 2012 BCPC 250.

325
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

riot and the individual participation of the riot As set out in the sentencing graphs below,
offender must be considered when sentencing 94% of the adult riot offenders received jail
a riot offender9: sentences: 47% received a jail sentence to be
served in an institution and 47% received a jail
Special considerations apply to sentences sentence to be served in the community under a
imposed for participation in a riot. Conditional Sentence Order (CSO). Of the youth
Sentencing an offender for participation riot offenders, 19% received jail sentences: 2%
in criminal acts that involve widespread received a jail sentence in an institution and
public disorder requires a court to look not 17% received a jail sentence to be served in
only at the offender's individual conduct, the community under a Deferred Custody and
but also the broader context in which the Supervision Order (DCSO). While on a CSO or
individual participated. A rioter is culpable DCSO, the offender is under supervision, and
for not only his own conduct: he bears, in is required to abide by a number of conditions.
a general way, a share of responsibility for The conditions restrict the liberty of the
the more widespread acts of lawlessness offender. If an offender disobeys any of the
in which he participated… Citizens of conditions, the judge can order the offender
Vancouver and members of the larger to serve a portion of the remaining sentence
community present at the scene of the or the whole of the remaining sentence in an
Stanley Cup riot were terrorized by the institution.
acts of violence to persons and property
The remaining adults and youth offenders
that occurred. That violence, and the
were sentenced to community supervision. The
public's consequential feeling that law and
adults were bound by Probation orders, and
order had been cast aside, is significant
the youth were bound by Intensive Support
in our consideration of the fitness of Mr.
and Supervision Orders (ISSO) or Probation
Peepre's sentence. Participation in a riot
orders. The following graphs show the relative
is a deliberate criminal act that has grave
distribution of sentencing outcomes for adult
consequences for the safety and security
and youth offenders.
of our community. The corollary of that
fact is that those who participate must
expect to be punished severely. By using
the deterrent and denunciatory effects
of sentencing in a manner that accounts
for the current conditions in and values
of the community, courts can discourage
individuals from participating in acts of
public violence and, hopefully, prevent the
reoccurrence of events like the Stanley
Cup riot.

9  R v Peepre, 2013 BCCA 115 at §27.

326
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

charge assessment. 52 accused were brought


to court on breach related matters on one or
more occasions.

Comparing Riot Prosecutions in


Different Jurisdictions
Many comparisons have been made
between the prosecution of the 2011 Vancouver
Stanley Cup riot and the riots that occurred in
the United Kingdom between August 6-10, 2011.

There are enormous difficulties in making


Appeals meaningful comparisons between the two
prosecutions due to the disparate nature of
Members of the RPT were involved in the two events.
four appeals of adult riot sentences heard by
the British Columbia Court of Appeal. In the
first appeal, the Court of Appeal affirmed the Nature and Context of the Events
principles of sentencing in relation to rioters,
including stating that: The four-day “disorder” in England
was described as the “most widespread
…first time offenders (meaning those outbreaks of disorder seen in England for a
with no criminal record) will nevertheless generation”. The disorder spread through 22
receive a prison sentence of some London boroughs, and then spread to other
significant length if their conduct includes: towns and cities across England. Five people
inciting other; engaging in additional lost their lives, and 300 police officers were
criminal activity, such as assaults injured. Some reports pegged the financial
(particularly of a police officer), arson, or cost of the disorder at more than £370M11. The
wearing a mask; or committing multiple disorder was described as “widespread, fast
criminal acts in multiple locations10. moving and opportunistic criminal attacks on
property, loosely organized using social media,
and sometimes involving alliances between
Breaches rival gangs”12. The spread of the disorder to

The Riot Prosecution Team dealt with all 11  HMIC, The Rules of Engagement: A Review of
breaches of bail or probation by riot accused. the August 2011 Disorders, 2011, p. 13. <https://www.
In total, 147 RCCs alleging breach, in relation justiceinspectorates.gov.uk/hmic/media/a-review-
to 73 accused, were submitted to the RPT for of-the-august-2011-disorders-20111220.pdf>.
12  HMIC, The Rules of Engagement: A Review of the
10  R v Peepre, 2013 BCCA 115 at §30. August 2011 Disorders, 2011, p. 4.

327
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

other areas was attributed in part to social Video Evidence


media and termed “copycat violence”13.
Britain has over five million CCTV cameras,
In contrast, the Vancouver riot related to one for every 11 citizens16. The MPS collected
a single sporting event and an overcrowded 200,000 hours’ worth of CCTV footage for
downtown “live-site”, and alcohol over- investigating disorder offences17. The video
consumption. The riot lasted only a few hours, footage appears to have been immediately
and was restricted to Vancouver’s downtown available to police. At the time of the
core. There was never a real concern that disorder, several borough-policing teams
it would continue into subsequent days or had established Visual Identification Image
spread to other locations. Detection Offices, with trained staff, which
were “able to quickly secure CCTV evidence
and make early arrests”18.
Riot Participants
The video evidence available to prosecute
Only 17% of persons charged in the participants in the Vancouver riot was
Vancouver riot had a criminal record. provided by citizens, or obtained from media
outlets by Court Order. The gathering of the
Of the persons charged in the UK disorder, video footage, and the ultimate verification of
71% had at least one previous criminal its authenticity, took considerable time in the
conviction, and 40% had more than five investigative process.
previous offences. The Metropolitan Police
Service (MPS) reported that the majority of
persons arrested had a “history of serious Investigation and Prosecution
offending prior to their involvement in the
disorder 14”. Much of the continuing disorder in Most of the persons arrested and charged
the UK was attributed to opportunistic looting in the England disorder were never charged
by persons with criminal histories, who were with riot, violent disorder or similar offence
aware that police resources were committed under the UK Public Order Act 1986. Instead,
elsewhere15. they were charged with burglary or theft,

dec/14/reading-the-riots-investigating-england-s-
13  HMIC, The Rules of Engagement: A Review of the summer-of-disorder-full-report>.
August 2011 Disorders, 2011, p. 16. 1 6  < h t t p : // w w w . t e l e g r a p h . c o . u k /
14  Metropolitan Police Service, 4 Days in August: technology/10172298/One-surveillance-camera-for-
Strategic Review into the Disorder of August 2011, every-11-people-in-Britain-says-CCTV-survey.html>.
March 2012, p. 126. 17  Metropolitan Police Service, 4 Days in August:
15  Metropolitan Police Service, 4 Days in August: Strategic Review into the Disorder of August 2011,
Strategic Review into the Disorder of August 2011, March 2012, p. 127.
March 2012, p. 14 see also Reading the Riots, the 18  Metropolitan Police Service, 4 Days in August:
Guardian & the London School of Economics: Strategic Review into the Disorder of August 2011,
<http://www.theguardian.com/uk/interactive/2011/ March 2012, p. 127.

328
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

rather than the more serious charges under the order to large parts of London and other
UK Public Order Act 198619. Half of the offences communities.
charged were for burglary, “indicating the
extent to which the disorder was characterised The rapid spread of the disorder
by widespread looting”20. throughout London and other communities in
England required a rapid response from the
In contrast, 99% of the accused charged Criminal Justice system in order to reassert
with offences from the Vancouver riot were order. Mass arrests placed urgent demands on
charged with Riot under s. 65 of the Criminal prosecution and court resources21. London’s
Code. As discussed above, the offence of riot chief prosecutor, Alison Saunders, spoke of
is more difficult to prove than other offences, the “…need to make sure we are taking people
and requires much more evidence than proving off the streets," and of the need for "a swift
a mischief, theft or assault. reaction to the great disorder"22.

Court hours were extended to deal with


Urgency the surge of in-custody cases. Accused were
routinely detained in custody by the courts
The nature of the England disorder of while the riots were continuing, because of
August 2011 provided a very different context the immense fear across the country of the
and impetus for both law enforcement and riots starting again. Normally, 3.5% of accused
prosecution than the 2011 Vancouver riot. In persons would be denied bail, or 10% of persons
England, there was a continuing and serious charged with indictable offences, while about
spread of criminal behaviour that had to be 60% of persons arrested during the disorder
quickly extinguished so as to restore civil were remanded in custody23. Of the persons
that were found or pled guilty, 43% were given
an “immediate custody sentence”, whereas
19  Only 22% of the accused were charged with an such a disposition normally occurred only 12%
offence related to “violent disorder”, which includes
of the time. Custodial terms were significantly
the following offences: Violent disorder, Riot, Affray,
longer for those sentenced for offences during
Summary causing intentional harassment, alarm or
distress, Summary harassment, alarm or distress,
the disorder than otherwise24.
Assault with intent to resist apprehension or assault
a person assisting a constable, Common assault
21  4 Days in August, p. 130.
offences, Assaulting a constable and offences under
Public Order Act and Justice of the Peace Act). See 22  <http://www.theguardian.com/uk/2011/aug/12/
Statistical Bulletin on the Public Disorder of 6th to uk-riots-courts-warning>.
9th August 2011, Ministry of Justice, 13 Sept 2012, 23  <http://www.theguardian.com/uk/2011/aug/12/
pp. 7-8. <https://www.gov.uk/government/uploads/ uk-riots-courts-warning>; Statistical Bulletin on the
system/uploads/attachment_data/file/219665/ Public Disorder of 6th to 9th August 2011, Ministry of
august-public-disorder-stats-bulletin-130912.pdf>. Justice, 15 Sept 2011, p. 4.
20  The Guardian, Tuesday 3 July 2012: <http://www. 24  Statistical Bulletin on the Public Disorder of 6th
theguardian.com/uk/2012/jul/03/chaos-courts- to 9th August 2011, Ministry of Justice, 15 Sept 2011, p.
justice-system>. 4. See also: <http://www.channel4.com/news/more-

329
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

The quick reaction of the UK justice system approach to the prosecution function. Both
was “strongly believed” to have “reduced approaches have had their share of critics27.
copycat disorder and attrition rates” in part
due to the extensive media coverage of the
quick justice system response25. What was Legacy of the Prosecution
generally viewed as being necessary to bring
the situation in England back under control The Branch has learned much from
was swift justice26. the prosecution of the 2011 Vancouver riot,
including the importance of:
• building cohesive prosecution teams;
Comparing the Events
• effectively utilizing photographic
The prosecution of the England disorder evidence, where available;
and Vancouver riots were carried out in very • ensuring that full disclosure of all
different contexts. There was urgency in evidence is provided by investigators to
arresting and detaining rioters in London. Crown prior to charge approval; and
Investigators in Vancouver required more time • resisting pressure to dispense “quick”
to properly obtain and authenticate video justice.
evidence so that the offence of riot could be
properly established. The Criminal Justice In his 2012 review of the BC charge
Branch made conscious decisions to ensure assessment process, Mr. Gary McCuaig noted
criminal charges, when laid, properly captured the criticism of the police and prosecution
all of the criminal acts and available evidence for perceived delays in the riot prosecution
against the suspect. In order to obtain an and concluded that it demonstrated a
appropriate sentence for the offender, Crown misunderstanding of the process. He observed
Counsel must prove the full extent of the that the police and prosecution “have devoted
offender’s involvement. significant personnel … to organize a huge
amount of material so that the right people
At the risk of over-generalizing, the can be brought before the courts with strong
British authorities needed to restore order
by arresting and prosecuting as quickly as
27  The Guardian newspaper published many
possible. Prosecutors in British Columbia,
articles on the aftermath of the riots and the
where civil order was re- established very Justice system’s response in that country, some
quickly and was not further threatened, were of which noted there were concerns about their
able to choose a more thorough and expansive Justice system’s response to the disorder. We do not
mention this to criticize the British justice system
than-1-000-people-charged-with-riot-offences-
or its participants, simply to note that there are
met>.
choices that are made that have consequences to
25  4 Days in August, p. 131. the system. As the law and the justice system are
26  The Guardian, Tuesday 3 July 2012: <http://www. social constructs that should reflect society’s social
theguardian.com/uk/2012/jul/03/chaos-courts- values, these choices and their consequences are
justice-system>. worthy of public discussion.

330
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

evidence and the appropriate charges”28. By Although the riot investigation and
any measure, the final outcomes of the riot prosecution process has seemed protracted,
prosecutions confirm Mr. McCuaig’s earlier the cases have provided a repeated and
observations. ongoing reminder of the consequences of
participating in a riot. Dave Jones, a security
The scope of the 2011 Vancouver riot was consultant for the Downtown Vancouver
unprecedented in Canada. The breadth of Business Improvement Association noted in
the riot investigation and prosecution based August of 2015 that the prosecution of the
on photographic evidence was also without rioters has had a calming effect on the crowds
precedent. The photographic evidence was at major events in downtown Vancouver:
essential to identifying those who might have
otherwise remained anonymous. I think all the prosecutions were a wake-up
call for people — it was the most recorded
In R v Chou the Court stated: riot of all time. You can’t go anywhere now
without somebody recording you and it
When group unrest devolves to lawlessness, just makes it a much higher risk to behave
those who choose to stay in their midst are badly30.
not innocent bystanders – their presence
gives tacit or overt encouragement to In sum, the police and the prosecution
others to join the fray. The group as a whole service expended considerable resources
offers the shield of perceived anonymity to ensure that those who participated in the
to those individuals who, bolstered by Vancouver 2011 riot were held to account.
adrenaline or a false sense of bravado, feel Hopefully, this prosecution will deter – even
free to commit acts of lawlessness for thrill prevent – the reoccurrence of events like the
seeking and personal gain. As has become 2011 riot, as those who would riot and commit
evident, it is a fleeting anonymity in the age other crimes under cover of a crowd now know
of social media29. they do so at their peril.

28  Gary McCuaig QC, British Columbia Charge


Assessment Review, Schedule 11 to D. Geoffrey
Cowper QC, A Criminal justice System for the 21st
Century (2012), p. 235. 30 <ht tp://w w w.news1130.com/2015/07/29/
29  R v Chou, 2013 BCPC 23 at §28. fireworks-crowds-better-behaved-in-recent-years/>.

331
Prosecution policy for football
related offences

ASSOCIATION OF CHIEF POLICE football grounds providing a service to fans,


OFFICERS and those who provide the transport services
CROWN PROSECUTION SERVICE that allow them to travel also have the right to
carry out their work without fear of violence,
KEIR STARMER QC discrimination or intimidation.
Director Of Public Prosecutions
Our legislation concerning football
ANDREW HOLT matches and disorder associated with them is
widely recognised by other jurisdictions as the
Deputy Chief Constable
most effective in this field. The success of the
ACPO Lead on Football Matters
legislation, and in particular the use of Football
Banning Orders has excluded offenders from
Professional and semi-professional the vicinity of football matches, has deterred
football provides an opportunity for people others from becoming involved in violence and
from all walks of society and from all parts disorder and has enabled levels of policing at
of England and Wales to follow their sport, matches to be reduced. This has been achieved
to travel around the country and to meet and by a combination of self-policing by fans,
mix with other football fans. Many fans also high quality police investigations producing
follow their national team abroad as well as compelling evidence, and robust prosecutions
following those clubs that compete in European where appropriate.
competitions.
The Association of Chief Police Officers
The overwhelming majority of football (ACPO) and the Crown Prosecution Service (CPS)
fans are well-behaved and want nothing more will continue to operate a robust prosecution
than to attend games free from the fear of policy for football related offences during
violence, disorder, discrimination and other 2013/14 and beyond. This means that there will
crime. In recent years there has been an be a presumption of prosecution whenever
increase in families and diverse communities there is sufficient evidence to bring offenders
attending games together, encouraged by the before a court on appropriate criminal charges
friendlier atmosphere at grounds. Members of and where a Football Banning Order (FBO)
the community whose homes and businesses is considered necessary. As well as tackling
are close to football grounds have the right violence, disorder and criminal damage we
not to have their lives disrupted by football will deal robustly with offences of racist and
hooliganism. Those who work in and around homophobic and discriminatory chanting

333
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

and abuse and other types of hate crime. We ACPO and the CPS work closely with the
recognise, as do the overwhelming majority of Home Office and other government departments
decent fans, that there is a place for humour in a continuing effort to combat violence and
in football but where the line between humour disorder around football matches at home and
and offensive behaviour is crossed then abroad. They also work closely with colleagues
positive action will be taken. We will also take in Scotland and Northern Ireland to provide
firm action against those guilty of ticket touting consistency across all three jurisdictions in the
which will include an application for a FBO. We United Kingdom. The Football Association and
will deal with emerging challenges such as Professional Footballers’ Association work with
the use of pyrotechnics and pitch incursions ACPO and the CPS and have been consulted
involving assaults on players. over and support this policy. ACPO and the CPS
also work with KickItOut and Stonewall to jointly
Anyone receiving a FBO this season will tackle hate crime in football.
not be able to travel to support England or
Wales if they qualify for the World Cup finals in ACPO and the CPS wish to reassure
Brazil in June and July 2014. Their FBO will also decent football fans that their right to follow
require them to surrender their passports and their teams in safety will be protected by
will prevent them travelling anywhere abroad this policy. ACPO and the CPS also wish to
during the tournament. It will also prevent reassure members of the public who live and
them travelling to qualifying matches and work close to football grounds that their right
following their club abroad to European games. to carry on their lives and businesses free
As a FBO has a minimum duration of 3 years a from football related crime will be protected
ban imposed in 2013/14 will also prevent them by this policy.
travelling to Euro 2016 in France.

334
Investigating and prosecuting football
related violence and disorder

UNITED KINGDOM FOOTBALL POLICING UNIT


ASSOCIATION OF CHIEF POLICE OFFICERS The guide is just that ― it cannot cover every
CROWN PROSECUTION SERVICE eventuality and investigators and prosecutors
should always use their common sense and
discretion in dealing with individual cases.
Abreviaturas mais importantes do texto
However, the guide will provide a good starting
ACPO Association of Chief Police Officers point for police officers and prosecutors,
CPS Crown Prosecution Service particularly those with less experience.
UKFPU United Kingdom Football Policing Unit
FBO Football Banning Order This guide complements other guidance
SIO Senior Investigating Officer
issued by ACPO, the UKFPU and the CPS. We
OIC Officer in the Case
CCTV Closed Circuit Television hope that it will be a welcome addition to the
PNLD Police National Legal Database investigator and prosecutor's tool kit.
FIO Field Intelligence Officer
DPP Director of Public Prosecutions
PCA Parental Control Agreement – ou Police
Complaints Authority
CC
HMCS
NG
Crown Court
Her Majesty’s Courts Service
Non Guilty (plea)
CPS
CFS Commit ou Commital for Sentence, i.e.,
remessa do caso de uma Magistrate’s
Court a uma Crown Court devido a sua Investigating and prosecuting
maior gravidade football related violence and
PCMH Plea and Case Management Hearing
disorder

Introduction 1. Introduction – purpose and


scope of guidance
This guide has been written and edited by
police officers and prosecutors with extensive This guide is designed to cover outbreaks
experience of investigating and prosecuting of violence and/or disorder involving 3 or more
football related violence and disorder. It deals people. This guide supplements the ACPO
with incidents involving 3 or more people Manual on policing football. It is not designed
and covers all aspects of investigating and to cover offences involving one or two people,
prosecuting to a successful conclusion. and does not cover individuals committing

335
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

offences against the Football Offences Act and CPS. Nonetheless each organisation has
(other than as part of mass disorder). its’ own distinct role which is restated here for
completeness.

2. Legal Framework Police ― Investigate alleged offending


behaviour.
It is assumed that Police Officers and
Prosecutors reading this Guide are familiar CPS ― Review the case, finalise the charges
with the Football Spectators Act and the and prepare and present the case.
Football Banning Orders (FBO) regime. It is
also assumed that they are familiar with the Charging ― Although it is possible that
Football Offences Act, the Offences Against there will be offences that can be charged by
the Person Act and the Public Order Act. the police (in accordance with the Director’s
Almost all offending in and around football Guidance), some offences can only be charged
will be covered by one or more of these Acts. on the authority of a Crown Prosecutor. It
In summary these key Acts cover and regulate is strongly recommended that all charging
the following offending behaviour: decisions are made by the CPS in close
consultation with the police. Face to face
Football Offences Act ― Creates specific consultation is the preferred method.
summary offences within football stadia
Key roles will be (a person may cover one
Offences Against the Person Act ― Deals with or more roles):
GBH and wounding (ss18 &20), and ABH (s47)
Senior Investigating Officer (SIO) ― Overall
Public Order Act ― Deals with violence and responsibility for the investigation
disorder from Violent Disorder (s2) and lesser
offences Officer in the Case (OIC) ― Responsible for
producing the prosecuting file
Football Spectators Act ― Creates the
Football Banning Orders regime, including an Disclosure Officer
offence of breaching a FBO
Football Intelligence Officer ― For
Further guidance is available on the Police recognition/identification purposes
National Legal Database, and the CPS Legal
Guidance. Exhibits Officer

Optical Evidence Officer/Manager


3. Roles and responsibilities –
Police and CPS Pre-Charge Advice lawyer ― Responsible
for the charging decision
The key to successful investigations and
prosecutions is teamwork between the Police

336
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Reviewing Lawyer ― Responsible for the 5. Establishing the Aim


preparation of the case of the Investigation

Advocat ― Responsible for the presentation


a. Investigative strategy
of the case
It is important to set the strategy for the
N.B.: It is strongly recommended that the investigation. Many incidents of violence and
3 CPS roles are combined wherever possible. disorder have large numbers of potential
offences and offenders. The SIO should make
it clear which offences and offenders are to be
4. Setting up the Investigation Team investigated, and to prioritise the work of the
team. All members of the team should be clear
on the strategy, so that time and resources
It is vital that an Investigation Team be are not spent on matters that are not central
established as early as possible after the to the strategy. At this stage it is important
violence/disorder to be investigated. Local police to decide on either early arrest & bail (with
commanders will get an early feel for the size of controlled media release) or a more thorough
the investigation once they have received initial trawl of CCTV and compilation DVDs prior to
reports from those on the scene. Consideration the arrest phase. There are merits to both or a
should be given to identify a potential SIO in mixed approach.
advance of high risk games. Experience over
the last 5 years has shown that the sooner the b. Charging policy
team is set up the more successful the eventual
prosecution. Early establishment of the team Following on from the strategy it is vital to
often saves work later on as evidence can be have a clear charging policy and mode of trial
secured early and easily. that is followed throughout the investigation.
The SIO/OIC and prosecutor should document
It is strongly recommended that an early this policy which should state what charges
meeting is held with the CPS pre-charge/ are being considered, what evidential
reviewing lawyer and well in advance of any threshold will support a particular charge,
charging decisions. If the case is likely to be and what action should be taken with respect
heard in the Crown Court then the advocate to to applications for FBO’s. Due regard should
be instructed should be identified at an early be given to existing national ACPO and CPS
stage. It is strongly recommended that the policies and guidance.
CPS instruct an in-house Crown Advocate to
ensure continuity of advocacy. This allows for Many incidents of disorder have different
agreement on the shape of the investigation levels of participation and the policy should
and prosecution. Local police commanders/ also state a line below which charges will
the SIO should not hesitate to contact local not be brought. As an illustration, in a recent
CPS managers to identify the appropriate incident after a game a large crowd gathered
lawyer for the case, who should be freed up to confront opposing fans. Some tried to break
for early meetings and charging meetings. down fencing and others threw missiles. Some

337
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

gestured and some merely stood around. It is also key to ensure that resources are
In this case the charging policy stated that spent investigating those incidents that the
those throwing missiles would be charged with prosecution team intend to take to Court.
violent disorder, anyone identified attempting
to break down fencing would be prioritised d. Arrest, interview and bail policy
and charged with violent disorder; anyone
gesturing in a particularly extreme manner This section does not apply to those
might be charged with lesser Public Order Act arrested at the time of the violence and
offences and those merely present would not disorder but applies to those identified during
be charged at all. the investigation.

c. Agreeing overall aim – quality, If the prosecution team are working well
quantity or both? together it should be possible to agree a date
on which arrests will be made so that the
It follows from this that the prosecution prosecutor can be available to give charging
team should agree an overall aim. Another decisions before the detainee leaves custody,
recent incident involved a major pitch invasion thereby easing the bail management issues. To
and significant violence and disorder outside make this effective the prosecutor should have
the ground. Unsurprisingly priority was given seen and assessed the key evidence in advance
to the offending outside the ground, although of arrests and agreed likely charges with the
it would have been easy (had resources investigators. The prosecutor must be satisfied
permitted) to bring large numbers of offenders that any video evidence is clear and supports
before court on lesser offences inside the the proposed charges. Often arrests may be by
ground. There will be no right answer to the appointment as suspects are identified.
overall aim, but it is important to know what
the aim is, and when the investigation is likely It is good practice in any investigation
to be halted. It is perfectly sensible to agree to have an agreed interview strategy. One
an aim which has two strands – for example strategy that has proved effective is to ask a
early prosecution of those easily identified suspect to confirm that he was at a particular
committing summary only offences and slower incident, ascertain what he was wearing and
time prosecution of more serious offences to then ask for an account. Whether or not the
likely to end in the Crown Court. Clearly it is suspect admits the offence and video evidence
essential to ensure from the outset that the should be shown in interview and the suspect
potential prosecution will be viable. Also, should be asked to confirm that the person on
which court would be most appropriate to the video is him and to confirm his actions.
try the case given its severity, the strength of
evidence, gaps in continuity of visual evidence With good planning, the suspects should
and potential criticism of police tactics/ be charged and bailed to an agreed court date.
numbers and resultant negative publicity. Bail conditions should normally be imposed
This should be balanced against the numbers to prevent a repetition of similar offending
of likely defendants and time constraints of behaviour. Whilst conditions should be specific
completing the investigation within 6 months. to an individual offender, bail conditions can

338
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

be drafted that mirror the requirement of a 7. Liaison with UKFPU


FBO. Consideration should always be given to
imposition of an exclusion area around the Early liaison with UKFPU is highly
“home” ground on match days which should recommended. UKFPU may be able to offer
be made clear on a map. For serious offending some or all of the following:
reporting conditions on match days may be
a. Assistance with training (production of
appropriate.
videos)

6. Securing evidence b. Advice on best practice


c. Assistance with funding
There will be many sources of evidence, but
it is important to be selective in what is used
in the eventual prosecution case. A compelling 8. Use of video evidence
prosecution case will include some or all of the
following: It has often been said that a picture is
a. CCTV worth a thousand words. Nowhere is this
truer than in presenting offences of violence
b. EGT
and disorder to a Court, particularly when the
c. Police photographers (if present)
quality is good and is accompanied by sound.
d. Police statements (including Bronze & (?) Officers will normally have to trawl hours
Silver commanders) of video evidence to produce a product that
e. Members of public statements (including may only last a few minutes, but time spent
impact) preparing high quality video evidence is time
f. Medical statements (if officers or public well spent, and ultimately gives the best
injured) chance of securing admissions in interview
g. Photos/video footage from media and/or a guilty plea.
outlets
h. Any airborne assets
i. Statements from Police Silver/Bronze a. Management of video evidence
commanders (including the impact on them
as individuals as well as on the public). This It is self-evident that any video evidence
statement should detail their experience in must be admissible in Court, for it to be of
football policing and can contain opinion any evidential value. In large investigations
on the gravity of the incident (compared an “Optical Evidence Log” should be started
with other personal experiences) post incident and where possible a nominated
“Optical Evidence Manager” be appointed,
Statements should include information with a role akin to that of the Exhibits Officer.
about how much experience the witness has of The Optical Evidence Manager can then be
attending football, policing football or living in responsible for the continuity of evidence as
the area of the offence. It should also contain the video evidence is managed and edited
the impact on the witness. before use in interview and court. The following
sequence highlights the issues:

339
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

i) Optical evidence takes many forms and therefore recommended that an Overview DVD
is produced by multiple witnesses and is produced that can be used for every court
agencies. (Format A) hearing in a particular operation, together
ii) The same evidence at i) is often seized with individual DVDs for each defendant. These
by persons other than those producing. can normally be the DVD used in interview,
although occasionally defence advocates may
iii) The format of the optical evidence
object to the “circling” of their client.
is diverse; Tape, DV, Mini DVD, DVD,
Multiplex, Digital, Time delay - again
not exhaustive. This will commonly need
altering to DVD format so that it can be 9. Identification of Suspects
viewed. (Format B)
iv) It will then often be edited or cut and There is excellent guidance on identification
the relevant evidential pieces extracted. issues on PNLD, and prosecutors should
(Format C) always be able to give advice to investigators.
v) Slowed. (Format D) Particular attention should be paid to the
difference between identification evidence
vi) Compilations of different exhibits made and evidence of recognition.
for each offender. (Format E)
vii) Circled or Highlighted. (Format F) There are two common defences used in
incidents of violence and disorder. Either the
suspect/defendant denies presence or he
b. Preparation for interviews denies that his acts amount to an offence. Of
these identification is the better defence, and
A DVD should be prepared for each once a suspect/defendant admits presence
suspect. It should start with a good quality still (particularly if caught on camera) then it
shot of the suspect. The DVD should contain a is relatively easy to prove the substantive
clip of the acts of the suspect, together with offence.
sufficient footage of the overall incident. It is
possible to slow video footage down, and to The best way of stopping identification
circle the suspect and follow him throughout becoming an issue in a case is to get a
an incident. Both techniques are effective. defendant to admit presence and to confirm
that it is him on a photograph or video,
which is evidence in the case. Normally a
c. Presentation in court suspect will be identified after the day of
the offence. This can be through recognition
The prosecutor will need to be able to by the investigation team, identification by
show a Court an overview of the incident officers (after images are circulated within
to put individual acts and offenders into Force), identification by members of the
context. He/she will also need to open the public if images are published in the media,
case against each individual defendant. It is or by suspects giving themselves up. In

340
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

these circumstances the witness is normally SIO/FIO’s can use this as an opportunity to
recognising an individual rather than picking seek the assistance of the public and to set out
out an individual (through a formal ID process) their determination to bring offenders before
and this evidence should besufficient to prove the courts.
ID. Any statement should explain how well the
witness knows the person he is claiming to
recognise. b. To identify suspects

Football Intelligence Officers and Many local newspapers and local TV


“Spotters” are often able to identify offenders stations will publish photos of wanted
caught on camera through their regular contact suspects, and this has proved a fruitful line of
with football fans. However, many offenders enquiry in many cases.
in cases of major disorder are not regulars at
matches and so the methods described above
must also be used. c. To publicise court results

It is important to disclose the evidence of This has two benefits: firstly it lets the
identification to suspects in interview. public know that we are succeeding in bringing
successful prosecutions. Secondly it can
Once they have admitted presence, and have a deterrent effect on future offending
ideally confirmed themselves in a photo or on behaviour. However, the prosecution team
video, then identification is effectively closed should be wary of publishing light sentences
as a defence. or cases when FBOs are not imposed – unless
we are able to state that we are appealing the
decision.
10. Working with the Media
d. To obtain supportive editorial/
The media can be used to great
comment pieces
advantage throughout an investigation and
prosecution. Normally the local media will Cooperation with the media and successful
be more likely to get involved, but national prosecutions are likely to generate very positive
media outlets have been of assistance in local publicity, both for the investigation itself,
major investigations. and for the wider issues of tackling violence
and disorder, as well as publicising the benefits
of FBOs.
a. To publicise investigation/appeal
for witnesses
e. At Court
The media are likely to carry a story i. Provision of information
immediately following violence and disorder.

341
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

It follows that prosecutors/police officers Most suspects (and their solicitors) will be
should cooperate with the media to ensure aware that there is likely to be video evidence.
they have accurate information. This may However, it is often better to get an account
include releasing photos and/or video from a suspect, including confirmation
footage once this is in the public domain that he was at the relevant scene, and a
(having been exhibited or played in Court). description of clothing worn, before showing
ii. Press statements/conferences the video evidence. It is essential when
showing video evidence to get the suspect to
In large cases it may be worth issuing
identify himself on the video and to confirm
statements at the end of the prosecution.
on tape what he is doing. Whenever video
If there is significant media interest
tape is available it should be shown at some
consideration should be given to holding
stage during the interview.
a press conference or to a pre-recorded
(and embargoed) interview with the SIO
and/or prosecutor. Local force and CPS
12. Pre-charge advice
media officers should be consulted and
Under the current DPP’s guidance, CPS
can provide specialist advice and support.
authority must be given to charge offences of
violent disorder, affray and offences against
11. The interviews the person other than common assault.

a. Timing
Admissions in interview, especially when
coupled with photographic/video evidence,
provide the best possible chance of securing It should be possible to arrange for pre-
guilty pleas in court. Whilst there is no single charge advice to be given whilst a suspect is in
correct way to conduct a suspect interview the custody, provided the prosecutor has seen the
following techniques have proved successful in evidence against that suspect before interview,
recent investigations. and provided the prosecutor is aware of the
date and timing of the interview. This means
that the only new evidence the prosecutor will
a. Pre-interview disclosure
have to consider is the interview.

Most suspects will know the generality of


b. By whom – ideally one
the allegation against them. There is little
to be gained from withholding evidence,
prosecutor throughout
particularly of a generic type such as
impact statements from members of the For major investigations best practice is for
public caught up in disorder. one prosecutor to give advice throughout. That
individual may nominate and brief a second
prosecutor to assist. CPS Direct advice should
b. Structure – when
only be sought in an emergency, as their lawyers
to use video evidence

342
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

will rarely if ever have seen the video evidence to a set date so that the Custody Sergeant
of an incident or will be aware of the totality dealing with returning suspects can have an
of an interview. Use of a single prosecutor will overview of the whole operation.
ensure consistency of advice.
b. Court dates (if PCA
c. Consideration to be given to given before release)
prosecutor seeing evidence before
interview – agreeing provisional charges It is essential to charge and bail all offenders
to the same court date. See paragraph 15 below.
It is best practice for the prosecutor to
see all evidence before interview. This has two
c. Conditions – to mirror FBO
benefits – it speeds up the charging decision,
and it ensures that the suspect is arrested It is necessary to tell an offender at the
and interviewed on the charge most likely to point of charge if a FBO will be applied for. It
brought. therefore makes sense and is proportionate
to impose bail conditions that mirror the FBO,
on the grounds that this will prevent further
d. Provision of generic
offending. Interviewing officers should be
advice for all files provided with a standard set of bail conditions
that can be tailored to individual needs (for
Whilst the evidential test will have to be example if the offender resides within an
applied afresh in each case, it is likely that the exclusion area near the ground). Further
public interest factors in favour of prosecution conditions to deal with individual risks, such
are likely to be the same for all suspects in as failing to surrender, can be added at the
an investigation. Out of court disposals will discretion of the Custody Sergeant.
only exceptionally be considered for the most
minor offences and anyone involved in a violent
disorder or serious assault will almost certainly 14. Production of File/Advance
face charges. It is therefore likely that similar Information
advice will be given on many files. It is also likely
that the same witness statements (describing
the generality of an incident) will be used on a a. Agree file contents in advance
number of advices. b. Choice of witnesses

13. Bail Issues i. For all cases as generic witnesses


ii. For specific cases – police and civilian
a. Return bail dates (if PCA not
available whilst in custody) 15. Liaison with the Court

If it is not possible to provide PCA on the Early liaison with Her Majesty’s Court
first occasion, it is sensible to bail all suspects Service is essential to ensure the smooth

343
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

running of the prosecution, and this should be a. Making clear attitude – no plea
undertaken by the prosecutor in the case. bargaining

If the SIO/OIC and prosecutor have agreed


a. To agree special courts and dates
a charging strategy then there should be no
(including future CC dates) plea bargaining. What is sensible however
is to advise the defence that the prosecutor
This should be done ideally before the first will acknowledge cooperation and remorse in
offender is charged. The prosecutor should interview, and that the same prosecutor will be
inform the Court of the likely number of presenting the case throughout.
offenders, to assist the Court. HMCS will also
provide the prosecutor with dates of hearings
b. Provision of Advance Information
in the Crown Court where appropriate.

b. To agree consistency of Advance Information should be provided as


Bench/Judiciary/Clerk soon as possible, and should be available the
evening before the first court hearing. Ideally
This ensures consistency of approach and all evidence should be typed up – to make it as
speeds up the court process. This is also the easy as possible for defence advocates and to
preferred method of HMCS. take away excuses for not entering a plea on
the day. All evidence that will be relied upon
c. To inform of presentation should be served as AI, so the Court can be
of evidence/AI informed that the defendant has always been
aware of the case against him.
The prosecutor/officer in the case should
ensure that the courtroom can play video
c. Provision/access to video evidence
evidence, before the first case is called on. It
is often prudent to do this the day before the
hearing. It is also important to identify spare The defence should have seen any video
rooms for the playing of video evidence to evidence in interview. The defendant and/or his
defence solicitors on the day of the hearing. solicitor should be offered a copy of the video
The prosecutor should also ensure that the evidence in advance of the first hearing, subject
Legal Advisor is given Advance Information and to a written undertaking only to use the video
Charge Sheets as far in advance of the hearing to assist in the preparation of his defence.
as possible to allow time to prepare.

16. Dealing with the Defence 17. The First Hearing

The Criminal Procedure Rules place a duty


Dealing with the defence starts in the police on all parties to make progress at every hearing
station, and a consistent approach should be and to actively manage the case. The aim of the
taken by both police officers and prosecutors. first hearing should be to secure as many guilty

344
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

pleas as possible and to keep bail conditions in sentence (CFS) to the Crown Court. If a not guilty
force. It is also important that the prosecution plea is entered or no plea is indicated it will
team are seen to “boss” the court. This is best sometimes be possible to prepare committal
achieved by the prosecutor being supported by papers the same day (or even in advance) to
the OIC and any other police officer involved in keep the pressure on the defence and to have
the case that is available. the case sent to the Crown Court after only
one hearing. If there are any indictable only
a. No adjournments charges these must be sent to the Crown Court
at first hearing.
Provided the defendant knows the case
against him, and his solicitor has had Advance d. Secure Bail Conditions
Information and any video evidence there
should be no reason for an adjournment. If a The prosecutor should ask the Court to
solicitor asks for an adjournment to view the extend the bail conditions imposed by the
video evidence or to take instructions from Custody Sergeant, even in the event of a
the defendant then the prosecutor should guilty plea. There may be occasions on which
invite the Court to put the case back for a conditions can be eased, but the fundamental
short adjournment the same day. Under no conditions preventing attendance at and travel
circumstances should the prosecutor agree to matches should be maintained.
to an adjournment to another date.

18. Provision of Information


b. Push hard for guilty pleas – or
to Crown Court
force NG plea
The Crown Court must be served with
Although the Magistrates Court Act allows committal papers (for PCMH) or the papers
a defendant to refuse to indicate a plea, in an following a committal for sentence. It is often
either way case, the prosecutor should push worth providing the following:
hard for a plea to be entered. Making it clear
that the same prosecutor will appear at all
a. Consider writing case summary
court hearings and that he/she will inform
the sentencing tribunal of the point at which
(to be agreed with OIC/SIO)
a plea was entered, may persuade defendants
to enter early guilty pleas to secure maximum A case summary setting out the totality
credit for so doing. of the offending on the day, and containing
a summary of the evidence of key witnesses
c. Where appropriate send to Crown common to all defendants, will assist the court
Court after first hearing in dealing with the case.

Whenever a guilty plea is entered on a


b. Consider producing a
serious, either way charge, then the prosecutor
should ask for the case to be committed for
schedule of offenders

345
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

A schedule summarising the acts of each b. Push for admissions under s10,
offender will help the court to differentiate and agreement of s9 statements
between different offenders. Such a schedule
could also contain the age and previous In the event of not guilty pleas the
convictions of the offender, together with their prosecutor should push for admissions and/
admissions and attitude in interview. or the agreement of statements to be read
to cover as much of the prosecution case as
c. Serve both on the Defence possible. This will shorten the trial and narrow
down the issues in dispute.
Anything served on the Court must also be
served on the Defence out of fairness.
c. Minimise need for witnesses –
particularly police witnesses
d. Ensure appropriate equipment
available in Court Following on from paragraph 19.b the
prosecutor should only call the witnesses
See paragraph 15c. It is vital to check that whose evidence is disputed or whose evidence
any videos to be played will work on the court is particularly compelling. Prosecutors should
equipment. seek to limit the calling of police witnesses
to police commanders or officers specifically
involved in unique parts of the case. Arresting
19. PCMH in Crown Court and interviewing officers should not be called,
but should be agreed with the defence.
A similar approach should be taken as for
the first hearing in the Magistrates Court. It
d. Clarify issues and push
is important to ensure that the Court knows
that the case against the offender has not
for defence statement
changed since first hearing, and that he had
the opportunity to enter a plea/plead guilty at Providing the committal papers included
that hearing. The aim should be to set a trial Primary Disclosure the defence should have
date or secure a guilty plea in every case. All provided a Defence Statement. If this has not
defendants yet to enter a guilty plea involved happened the judge should be informed and
in the incident should ideally appear at the asked to set a tight deadline for service. In any
same time. event, the defence will have to complete the
PCMH form and identify the triable issues (see
a. Push for Guilty Plea paragraph 19b). Wherever possible interviews
and the continuity of video evidence should
The Judge is likely to do this by reminding be agreed.
the offender of credit for a guilty plea. The
prosecutor must make it clear that the defence e. Secure Bail Conditions
have all the evidence against their client. As paragraph 17d above.

346
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

f. Consider separate/joint trials suspect interview, highlighting each individual’s


involvement. If a schedule has been produced
The prosecutor should have a view on the opening must be consistent with this.
the appropriate conduct of any trials. The Each offender’s previous convictions should
presumption should be that all defendants be placed before the Court, or previous good
should be tried together, although character acknowledged.
separately indicted, unless this results in an
unmanageable trial.
d. Apply for FBO in each case – assisting
Court with law as necessary
20. The Sentencing Hearing –
Magistrates or Crown Court The prosecutor must be familiar with the
law surrounding FBOs and be ready to assist
It is important that the Sentencing Court the Court. Many Magistrates and Judges will
is made aware of the full story involving all not have imposed a FBO before and will need
defendants to be sentenced, and is made to have it explained in detail.
aware of the existence of any suspects still
i. Agree with FIO/Football Banning Order
to be arrested or defendants still to face the
Unit whether stand-alone application or
court. If there has been a previous sentencing
other information available.
hearing the prosecutor must be able to assist
the Court with details of any sentences passed Where the offender is known to the FIO, any
on other offenders. The following will provide other relevant information that strengthens
a sensible structure. the application for a FBO should be placed
before the court. This may include previous
a. Generic opening of incident convictions and/or evidence being gathered in
support of a civil application for a FBO.
Set the scene and explain the incident in
its entirety. If a written summary has been
produced the prosecutor should stick to it. 21. Conclusion

b. Play overview video There is no perfect way of investigating


and prosecuting major incidents of violence
This allows the Court to see the totality or and disorder. However, if all of the points in
flavour of the incident. paragraphs 2 to 19 are considered and covered,
it is more likely than not that the result will be
a successful prosecution.
c. Open each individual
in turn, playing DVD

For each defendant the prosecutor should


play the individual DVD prepared before the

347
Sobre os autores

Alan Denilson Lima Costa


Coronel do Exército Brasileiro, lotado no Centro de Defesa Cibernética (CDCiber).
André de Carvalho Ramos
Professor doutor e livre-docente de Direito Internacional e do Programa de Direitos Humanos
da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo; Procurador Regional da República;
ex-Procurador Regional Eleitoral em São Paulo; foi visiting fellow do Lauterpacht Centre for
International Law (Cambridge).
Association of Chief Police Officers e Crown Prosecution Service
Associação dos Chefes de Polícia e Ministério Público da Coroa, Reino Unido.
Brian Saunders
Director of Public Prosecutions (Chefe do Ministério Público Federal do Canadá).
Caedmon Nash
Membro do Departamento de Polícia da Cidade de Vancouver, Canadá; integrante da Força-
Tarefa de Combate ao Vandalismo.
Carlos Eduardo de Oliveira Vasconcelos
Subprocurador-Geral da República; docente de Ciências Penais; organizador deste volume.
Elizabeth Howe
Chairperson da International Legal Assistance Consortium (ILAC), Suécia; General Counsel
da International Association of Prosecutors (IAP, Associação Internacional de Membros
do Ministério Público); Chief Crown Prosecutor England and Wales (Procuradora-Chefe do
Ministério Público da Inglaterra e do País de Gales).
Guaracy Mingardi
Cientista político; doutor pela Universidade de São Paulo; especialista em segurança
pública, com trabalhos nas áreas de investigação policial, inteligência e análise criminal,
crime organizado e corrupção.
Javier-Alberto Zaragoza Aguado
Fiscal de Sala del Tribunal Supremo com designação de Fiscal-Jefe de la Audiencia
Nacional; professor universitário; autor de obras jurídicas em temas de Direito Penal e
Processo Penal; atuou no processo “Caso 11-M”, alusivo ao atentado ao metrô de Madri
em 11 de março de 2004.
349
TERRORISM AND OTHER EMERGENCIES
Theory and practice of prevention and control

José Bonifácio Borges de Andrada


Subprocurador-Geral da República; Coordenador da 2ª Câmara de Coordenação e Revisão
(2ª CCR – matéria criminal); ex-Advogado-Geral da União; ex-Procurador-Geral do Estado de
Minas Gerais.
José Carlos Martins da Cunha
Diretor de Contraterrorismo Substituto da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN).
José Mariano Benincá Beltrame
Secretário de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro; Delegado de Polícia
Federal; especialista em inteligência estratégica, crime organizado e análise de dados
de inteligência; um dos idealizadores do projeto Unidade de Polícia Pacificadora (UPP),
aplicado no Rio de Janeiro.
José Robalinho Cavalcanti
Procurador Regional da República; Presidente da Associação Nacional dos Procuradores da
República (ANPR).
Laurence Alexandre Xavier Moreira
Coronel do Exército Brasileiro; Comandante do 12º Batalhão de Infantaria (12º BI) em Belo
Horizonte; especialista em guerra irregular e prevenção e combate ao terrorismo.
Liam Mulholland
Head of Superior Courts, Office of the Director of Public Prosecutions (Procurador-Chefe
perante as cortes superiores, Gabinete da Procuradora-Geral do Ministério Público, República
da Irlanda).
Lincoln Gakiya
Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo lotado em Presidente
Prudente-SP na 1ª Promotoria de Execuções Criminais e no Grupo de Atuação Especial de
Repressão ao Crime Organizado (GAECO).
Ludovic Lestel
Procurador Substituto na Seção de Luta contra o Terrorismo e Atentados à Segurança do
Estado perante o Tribunal de Grande Instância, Paris, França.
Marcelo Muscogliati
Subprocurador-Geral da República; Coordenador da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão
(5ª CCR – Combate à Corrupção).

Mark A. Zöller
Professor de Direito Penal e Processual Penal alemão, europeu e internacional e de Direito
Penal Econômico da Universität Trier, Alemanha.

350
TERRORISMO E OUTRAS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA
Teoria e prática da prevenção e do combate

Pedro Taques
Governador do Estado de Mato Grosso; ex-Senador da República, ocasião em que foi relator
do Projeto de Código Penal; ex-Procurador da República.
Pierandrea Taurelli Salimbeni
Vice Questore Aggiunto dela Polizia di Stato – Direzione Centrale dela Polizia di Prevenzione
(Chefe de Polícia Adjunto, Direção Central da Polícia de Prevenção, Roma, Itália).
Ricardo Andrade Saadi
Diretor do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional
(DRCI) do Ministério da Justiça; Delegado de Polícia Federal com especialização em
crimes financeiros.
Rodrigo Janot Monteiro de Barros
Subprocurador-Geral da República.
Sven Peterke
Professor adjunto de Direito Internacional da Universidade Federal da Paraíba; doutor
summa cum laude pela Ruhr-Universität Bochum, Alemanha; ex-professor visitante da
Universidade de Brasília; pesquisador com publicações nacionais e internacionais nas áreas
de Direito Internacional dos Direitos Humanos, Direito Internacional Humanitário e crime
organizado transnacional.
United Kingdom Football Policing Unit, Association of Chief Police Officers e
Crown Prosecution Service
Unidade de Policiamento do Futebol do Reino Unido, Associação dos Chefes de Polícia e
Ministério Público da Coroa.
Vancouver Riot Prosecution Team e British Columbia Prosecution Service
Força-Tarefa de Persecução Penal de Vandalismo – Ministério Público da Colúmbia
Britânica, Canadá.
Vladimir Aras
Procurador Regional da República; Secretário de Cooperação Internacional do Ministério
Público Federal; professor assistente de Direito Processual Penal da Universidade Federal
da Bahia.

351
Obra composta em Fira Sans
e impressa em papel offset 90g/m2 pela
Gráfica e Editora Ideal Ltda. – Brasília-DF
<ideal@idealgrafica.com.br>
3.000 exemplares

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