Você está na página 1de 11

“La folie et la société”  conferência no Japão proferida em 1970 e publicada em 1978 (nota

do texto no DE, p.477)

DE II, 222, p.477-499

O que os etnólogos fizeram a respeito das sociedades – esta tentativa de explicar os


fenômenos negativos ao mesmo tempo que os fenômenos positivos –, eu me pergunto se não
se poderia aplicá-lo à história das ideias. O que eu quis fazer, e que eu quero refazer ainda,
pois as primeiras tentativas de minha parte sem dúvida não foram tão boas, nem precisas,
nem suficientes, o que eu quero fazer, é uma conversão do mesmo gênero. Em vez de explicar,
como na época de Paul Hazard ou na Alemanha na época de Cassirer, em vez de explicar a
cultura, a ciência, as ideias de uma época ou de uma sociedade a partir do sistema de crenças,
em vez de procurar primeiro o que é admitido, reconhecido ou valorizado por uma sociedade,
eu me perguntei e me pergunto sempre se o interessante não seria ao contrário procurar o
que, em uma sociedade, isso que, em um sistema de pensamento, é rejeitado e excluído.
Quais são as ideias, ou quais são os comportamentos, ou quais são as condutas, ou quais são
os princípios jurídicos ou morais que não são aceitos, que não podem ser aceitos, que são
excluídos do sistema? É nessa medida que eu fui levado a me interessar pelo problema da
loucura. A loucura, em uma sociedade como a nossa, e em outras partes, eu penso, não
importa em que sociedade, é evidentemente antes de tudo o que é excluído. Eu me pergunto
se não se poderia estudar o racionalismo clássico ou, de uma forma mais [480] geral ainda, o
sistema de racionalidade de nossas sociedades, das sociedades que nos são contemporâneas,
se não se poderia examinar, analisar esse sistema de racionalidade estudando, ao mesmo
tempo que o sistema positivo de racionalidade, o sistema negativo de exclusão. Que forma de
loucura se exclui? Como se exclui a loucura? Como se demarca um limite entre o que é razão e
loucura? Talvez seja precisamente se colocando nesse eixo do limite, nessa fronteira, nessa
lâmina de faca entre a razão e a desrazão, entre a loucura e a não loucura, que se poderá
compreender ao mesmo tempo o que é reconhecido e admitido positivamente por uma
sociedade e o que, por essa mesma sociedade, por essa mesma cultura, é excluído e rejeitado.
Eis aí a perspectiva, um pouco etnológica, que eu quero aplicar à história das ideias. Eu digo
‘etnológica’ na medida em que se trataria de aplicar à história das ideias um método, uma
forma de análise dos sistemas que já é bem sucedida na ordem da etnologia. Eis aí então o
quadro geral no qual eu quero colocar este estudo”1 (DE II, 222, p.479-480).

1
“Ce que les ethnologues ont fait à propos des sociétés – cette tentative pour expliquer les
phénomènes négatifs en même temps que les phénomènes positifs –, je me demande si on ne pourrait
pas l’appliquer à l’histoire des idées. Ce que j’ai voulu faire, et ce que je voudrais refaire encore, car les
premières tentatives de ma part n’étaient sans doute pas très bonnes, ni précises, ni suffisantes, ce que
je voudrais faire, c’est une conversion du même genre. Au lieu d’expliquer, comme à l’époque de Paul
Hazard ou en Allemagne à l’époque de Cassirer, au lieu d’expliquer la culture, la science, les idées d’une
époque ou d’une société à partir du système de croyances, au lieu de chercher d’abord ce qui est
admis, reconnu ou valorisé par une société, je me suis demandé et je me demande toujours si
l’intéressant ne serait pas au contraire de chercher ce qui, dans une société, ce qui, dans un système de
pensée, est rejeté et exclu. Quelles sont les idées, ou quels sont les comportements, ou quelles sont les
conduites, ou quels sont les principes juridiques ou moraux qui ne sont pas reçus, qui ne peuvent pas
être reçus, qui sont exclus du système ? C’est dans cette mesure-là que j’ai été amené à m’intéresser au
problème de la folie. La folie, dans une société comme la nôtre, et d’ailleurs, je pense, dans n’importe
quelle société, c’est évidemment avant tout ce qui est exclu. Je me demande si on ne pourrait pas
étudier le rationalisme classique ou, d’une façon plus [480] générale encore, le système de rationalité de
« Dialogue sur le pouvoir », publicado em inglês no fanzine de Simeon Wade « Chez Foucault »,
entrevista de 1975 e publicada em 1978

DE II, 221, 465-476.

Conversa entre Foucault e um grupo de estudantes americanos

Disponível em: https://progressivegeographies.files.wordpress.com/2015/02/wade-ed-1978-


chez-foucault.pdf Último acesso em: 23/01/2019.

“Eu não tento encontrar atrás do discurso alguma coisa que seria o poder e que seria a sua
fonte, como em uma descrição de tipo fenomenológico ou não importa que método
interpretativo. Eu parto do discurso tal como ele é! Em uma descrição fenomenológica, tenta-
se deduzir do discurso alguma coisa que concerne ao sujeito falante; tenta-se encontrar, a
partir do discurso, quais são as intencionalidades do sujeito falante – um pensamento em via
de se fazer. O tipo de análise que eu pratico não trata do problema do sujeito falante, mas
examina as diferentes maneiras pelas quais o discurso desempenha um papel no interior de
um sistema estratégico onde o poder está implicado, e pelo qual o poder funciona. O poder
não estão então fora do discurso. O poder não é nem fonte nem origem do discurso. O poder é
alguma coisa que opera a través do discurso, já que o discurso é ele mesmo um elemento em
um dispositivo estratégico de relações de poder” (DE II, 221, p.465).

“Je n’essaie pas de trouver derrière le discours quelque chose qui serait le pouvoir et qui en
serait la source, comme dans une description de type phénoménologique ou dans n’importe
quelle méthode interprétative. Je pars du discours tel qu’il est ! Dans une description
phénoménologique, on essaie de déduire du discours quelque chose qui concerne le sujet
parlant ; on essaie de retrouver, à partir du discours, quelles sont les intentionnalités du sujet
parlant – une pensée en train de se faire. Le type d’analyse que je pratique ne traite pas du
problème du sujet parlant, mais examine les différentes manières dont le discours joue un rôle
à l’intérieur d’un système stratégique où du pouvoir est impliqué, et pour lequel du pouvoir
fonctionne. Le pouvoir n’est donc pas au-dehors du discours. Le pouvoir n’est ni source ni
origine du discours. Le pouvoir est quelque chose qui opère à travers le discours, puisque le
discours est lui-même un élément dans un dispositif stratégique de relations de pouvoir. » (DE
II, 221, p.465).

nos sociétés, des sociétés qui nous sont contemporaines, si on ne pourrait pas examiner, analyser ce
système de rationalité en étudiant, en même temps que le système positif de rationalité, le système
négatif de l’exclusion. Quelle forme de folie exclut-on ? Comment exclut-on la folie ? Comment
découpe-t-on une limite entre ce qui est raison et folie ? Peut-être est-ce précisément en se plaçant
dans cet axe de la limite, sur cette frontière, sur cette lame de couteau entre la raison et la déraison,
entre la folie et la non-folie, que l’on pourra comprendre à la fois ce qui est reconnu et admis
positivement par une société et ce qui, par cette même société, par cette même culture, est exclu et
rejeté. Voilà la perspective, un petit peu ethnologique, que je voudrais appliquer à l’histoire des idées. Je
dis ‘ethnologique’ dans la mesure où il s’agirait d’appliquer à l’histoire des idées une méthode, une
forme d’analyse des systèmes qui a déjà réussi dans l’ordre de l’ethnologie. Voilà donc le cadre général
dans lequel je voudrais placer cette étude”.
“Não, o poder não é o sentido do discurso. O discurso é uma série de elementos que operam
no interior do mecanismo geral do poder. Em consequência, é preciso considerar o discurso
como uma série de acontecimentos, como acontecimentos políticos, através dos quais poder é
veiculado e orientado” (DE II, 221, p.465).

“Non, le pouvoir n’est pas le sens du discours. Le discours est une série d’éléments qui opèrent
à l’intérieur du mécanisme général du pouvoir. En conséquence, il faut considérer le discours
comme une série d’événements, comme des événements politiques, à travers lesquels du
pouvoir est véhiculé et orienté » (DE II, 221, p.465).

Eu me dei por objeto uma análise do discurso, fora de toda formulação de ponto de vista. Meu
programa não se funda sobre os métodos da linguística [467]. A noção de estrutura não tem
nenhum sentido para mim. O que me interessa, no problema do discurso, é o fato que alguém
disse alguma coisa em um momento dado. Não é o sentido que eu procuro colocar em
evidência, mas a função que se pode assignar ao fato que essa foi dita nesse momento. É isso
que eu chamo acontecimento. Para mim, trata-se de considerar o discurso como uma série de
acontecimentos, de estabelecer e de descrever as relações que esses acontecimentos, que nós
podemos chamar de acontecimentos discursivos, mantém com outros acontecimentos, que
pertencem ao sistema econômico, ou ao campo político, ou às instituições. Ao encará-lo sob
este ângulo, o discurso não é nada além de um acontecimento como os outros, mesmo se,
bem entendido, os acontecimentos discursivos têm, em relação aos outros acontecimentos,
sua função específica. Um outro problema é de demarcar o que constitui as funções
específicas do discurso e isolar certos tipos de discurso entre os outros. Eu estudo também as
funções estratégicas de tipos particulares de acontecimentos discursivos no interior de um
sistema político ou de um sistema de poder” (DE II, 221, p.466-467).

« Je me suis donné pour objet une analyse du discours, en dehors de toute formulation de
point de vue. Mon programme ne se fonde pas non plus sur les méthodes de la linguistique
[467]. La notion de structure n’a aucun sens pour moi. Ce qui m’intéresse, dans le problème du
discours, est le fait que quelqu’un a dit quelque chose à un moment donné. Ce n’est pas le
sens que je cherche à mettre en évidence, mais la fonction que l’on peut assigner au fait que
cette chose a été dite à ce moment-là. C’est cela que j’appelle événement. Pour moi, il s’agit
de considérer le discours comme une série d’événements, d’établir et de décrire les rapports
que ces événements, que nous pouvons appeler des événements discursifs, entretiennent
avec d’autres événements, qui appartiennent au système économique, ou au champ politique,
ou aux institutions. A l’envisager sous cet angle, le discours n’est rien de plus qu’un événement
comme les autres, même si, bien entendu, les événements discursifs ont, par rapport aux
autres événements, leur fonction spécifique. Un autre problème est de repérer ce qui
constitue les fonctions spécifiques du discours et d’isoler certains types de discours parmi
d’autres. J’étudie aussi les fonctions stratégiques de types particuliers d’événements discursifs
à l’intérieur d’un système politique ou d’un système de pouvoir » (DE II, 221, p.466-467).
“Eu utilizo a palavra ‘arqueologia’ por duas ou três razões principais. A primeira é que é uma
palavra com a qual se pode jogar. Arche, em grego, significa ‘começo’. Em francês nós temos
também a palavra ‘archive’ [arquivo], que designa a maneira pela qual os acontecimentos
discursivos foram registrados e podem ser extraídos. O termo ‘arqueologia’ remete então ao
tipo de pesquisa que [469] se dedica a extrair os acontecimentos discursivos como se eles
estivessem registrados em um arquivo. Uma outra razão pela qual eu utilizo essa palavra diz
respeito a um objetivo que eu me fixei. Eu procuro reconstituir um campo histórico em sua
totalidade, em todas suas dimensões políticas, econômicas, sexuais. Meu problema é
encontrar a matéria que convém analisar, o que constituiu o fato mesmo do discurso. Assim
meu projeto não é fazer um trabalho de historiador, mas descobrir porque e como as relações
se estabelecem entre os acontecimentos discursivos. Se eu faço isso, é com o objetivo de saber
o que nós somos hoje. Eu quero concentrar meu estudo sobre o que nos chega hoje, sobre o
que nós somos, uma dimensão histórica profunda, e, no interior desse espaço histórico, os
acontecimentos discursivos que se produziram há séculos ou anos são muito importantes. Nós
somos inextricavelmente ligados aos acontecimentos discursivos. Em um sentido, nós não
somos nada além do que o que foi dito, há séculos, meses, semanas...” (DE II, 221, p.468-469).

« J’utilise le mot ‘archéologie’ pour deux ou trois raisons principales. La première est que c’est
un mot avec lequel on peut jouer. Arche, en grec, signifie ‘commencement’. En français nous
avons aussi le mot ‘archive’, qui désigne la manière dont les événements discursifs ont été
enregistrés et peuvent être extraits. Le terme ‘archéologie’ renvoie donc au type de recherche
qui [469] s’attache à extraire les événements discursifs comme s’ils étaient enregistrés dans
une archive. Une autre raison pour laquelle j’utilise ce mot concerne un objectif que je me suis
fixé. Je cherche à reconstituer un champ historique dans sa totalité, dans toutes ses
dimensions politiques, économiques, sexuelles. Mon problème est de trouver la matière qu’il
convient d’analyser, ce qui a constitué le fait même du discours. Ainsi mon projet n’est-il pas
de faire un travail d’historien, mais de découvrir pourquoi et comment des rapports
s’établissent entre les événements discursifs. Si je fais cela, c’est dans le but de savoir ce que
nous sommes aujourd’hui. Je veux concentrer mon étude sur ce qui nous arrive aujourd’hui ,
sur ce que nous sommes, ce qu’est notre société. Je pense qu’il y a, dans notre société et dans
ce que nous sommes, une dimension historique profonde, et, à l’intérieur de cet espace
historique, les événements discursifs qui se sont produits il y a des siècles ou des années sont
très importants. Nous sommes inextricablement liés aux événements discursifs. En un sens,
nous ne sommes rien d’autre que ce qui a été dit, il y a des siècles, des mois, des semaines… »
(DE II, 221, p.468-469).
“Não se pode compreender o desenvolvimento das forças produtivas exceto ao delimitar, na
indústria e na sociedade, um tipo particular ou muitos tipos de poder trabalhando – e
trabalhando no interior das forças produtivas. O corpo humano é, nós o sabemos, uma força
de produção, mas o corpo não existe tal qual, como um artigo biológico ou como um material.
O corpo humano existe no interior e através de um sistema político. O poder político dá um
certo espaço ao indivíduo: um espaço onde se comportar, onde adotar uma postura particular,
onde se sentar de uma certa maneira, onde trabalhar continuamente. Marx pensava – e ele o
escreveu – que o trabalho constitui a essência concreta do homem. Eu penso que esta é uma
ideia tipicamente hegeliana. O trabalho não é a essência concreta do homem. Se o homem
trabalha, se o corpo humano é uma força produtiva, é porque o homem é obrigado a
trabalhar. E ele é obrigado, porque ele é investido por forças políticas, porque ele está preso
em mecanismos de poder” (DE II, 221, p.470).

« On ne peut comprendre le développement des forces productives sauf à repérer, dans


l’industrie et dans la société, un type particulier ou plusieurs types de pouvoir à l’œuvre – et à
l’œuvre à l’intérieur des forces productives. Le corps humain est, nous le savons, une force de
production, mais le corps n’existe pas tel quel, comme un article biologique ou comme un
matériau. Le corps humain existe à l’intérieur et au travers d’un système politique. Le pouvoir
politique donne un certain espace à l’individu : un espace où se comporter, où adopter une
posture particulière, où s’asseoir d’une certaine manière, où travailler continûment. Marx
pensait – et il l’a écrit - que le travail constitue l’essence concrète de l’homme. Je pense que
c’est là une idée typiquement hégélienne. Le travail n’est pas l’essence concrète de l’homme.
Si l’homme travaille, si le corps humain est une force productive, c’est parce que l’homme est
obligé de travailler. Et il y est obligé, parce qu’il est investi par des forces politiques, parce qu’il
est pris dans des mécanismes de pouvoir » (DE II, 221, p.470).

“Eu não aceito essa palavra dialética. Não e não! É preciso que as coisas estejam bem claras.
Desde que se pronuncia a palavra ‘dialética’, começamos a aceitar, mesmo se não se diz, o
esquema hegeliano da tese e da antítese, e com ele uma forma de lógica que me parece
inadequada, se se quiser dar desses problemas uma descrição verdadeiramente concreta. Uma
relação recíproca não é uma relação dialética” (DE II, 221, p.471).

« Je n’accepte pas ce mot de dialectique. Non et non ! Il faut que les choses soient bien claires.
Dès que l’on prononce le mot ‘dialectique’, on commence à accepter, même si on ne le dit pas,
le schéma hégélien de la thèse et de l’antithèse, et avec lui une forme de logique qui me paraît
inadéquate, si l’on veut donner de ces problèmes une description vraiment concrète. Un
rapport réciproque n’est pas un rapport dialectique » (DE II, 221, p.471).
“Examinemos então a palavra ‘contradição’. Mas primeiro deixe-me dizer a vocês a que
uponto eu estou feliz porque vocês puseram essa questão. Eu creio que ela é muito
importante. Vejam vocês, a palavra ‘contradição’ tem, em lógica, um sentido particular. Sabe-
se bem o que é uma contradição na lógica das proposições. Mas quando se considera a
realidade e que se busca descrevê-la e analisar um número importante de processos,
descobre-se que essas zonas de realidade são isentas de contradições.

Tomemos o domínio biológico. Encontra-se aí um número importante de processos recíprocos


antagonistas, mas isso não quer dizer que se trate de contradições. Isso não quer dizer que
haja, de um lado do processo antagonista, um aspecto positivo, e do outro, um aspecto
negativo. Eu penso que é muito importante compreender que a luta, os processos
antagonistas não constituem, como o pressupõe o ponto de vista dialético, uma contradição
no sentido lógico do termo. Não há dialética na natureza. Eu reivindico o direito de estar em
desacordo com Engels, mas na natureza – e Darwin o mostrou muito bem – se encontra
numerosos processos antagonistas que não são dialéticos. Para mim, esse tipo de formulação
hegeliana não se mantém de pé.

Se eu repito, permanentemente, que existe um processo como a luta, o combate, os


mecanismos antagonistas, é porque se encontra esses processos na realidade. E esses não são
processos dialéticos. Nietzsche falou muito desses problemas; eu diria mesmo que ele falou
bem mais frequentemente que Hegel. Mas Nietzsche descreveu esses antagonismos sem
referência nenhuma a relações dialéticas” (DE II, 221, p.471).

« Examinons alors le mot ‘contradiction’. Mais d’abord laissez-moi vous dire à quel point je suis
heureux que vous ayez posé cette question. Je crois qu’elle est très importante. Voyez-vous, le
mot ‘contradiction’ a, en logique, un sens particulier. On sait bien ce qu’est une contradiction
dans la logique des propositions. Mais lorsqu’on considère la réalité et que l’on cherche à
décrire et à analyser un nombre important de processus, on découvre que ces zones de réalité
sont exemptes de contradictions.

Prenons le domaine biologique. On y trouve un nombre important de processus réciproques


antagonistes, mais cela ne veut pas dire qu’il s’agisse de contradictions. Cela ne veut pas dire
qu’il y ait, d’un côté du processus antagoniste, un aspect positif, et de l’autre, un aspect
négatif. Je pense qu’il est très important de comprendre que la lutte, les processus
antagonistes ne constituent pas, comme le présuppose le point de vue dialectique, une
contradiction au sens logique du terme. Il n’y a pas de dialectique dans la nature. Je
revendique le droit d’être en désaccord avec Engels, mais dans la nature – et Darwin l’a fort
bien montré – on trouve de nombreux processus antagonistes qui ne sont pas dialectiques.
Pour moi, ce type de formulation hégélienne ne tient pas debout.

Si je redis, en permanence, qu’il existe des processus comme la lutte, le combat, les
mécanismes antagonistes, c’est parce qu’on retrouve ces processus dans la réalité. Et ce ne
sont pas des processus dialectiques. Nietzsche a beaucoup parlé de ces problèmes ; je dirais
même qu’il en a parlé bien plus souvent que Hegel. Mais Nietzsche a décrit ces antagonismes
sans référence aucune à des rapports dialectiques » (DE II, 221, p.471).
Você invoca aqui o problema da alienação. Mas, veja você, pode-se dizer muitas coisas sobre a
alienação. Quando você diz ‘meus problemas’, você não está em via de introduzir as grandes
questões filosóficas, teóricas, como, por exemplo, o que é a propriedade, o que é o sujeito
humano? Você disse ‘meus’ problemas. Mais isso constituiria o objeto de uma outra discussão.
Que você tenha um trabalho, e que o produto desse trabalho, do seu trabalho, pertença a
alguma outra pessoa, isso é um fato. Isto não é entretanto uma contradição nem uma
combinação recíproca; é o objeto de um combate, de um enfrentamento. Qualquer que seja, o
fato de que o produto de seu trabalho pertença a alguma outra pessoa não é da ordem da
dialética. Isso não constitui uma contradição. Você pode pensar que é moralmente
indefensável, que você não pode suportar isso, que é preciso que você lute contra isso, sim,
certamente. Mas isso não é uma contradição, uma contradição lógica. E me parece que a
lógica dialética é realmente muito pobre – de um uso fácil, mas realmente muito pobre – para
quem deseja formular, em termos precisos, significações, descrições e análises dos processos
de poder” (DE II, 221, p.472).

« Vous invoquez ici le problème de l’aliénation. Mais, voyez-vous, on peut dire beaucoup de
choses sur l’aliénation. Lorsque vous dites ‘mes problèmes’, n’êtes-vous pas en train
d’introduire les grandes questions philosophiques, théoriques, comme, par exemple, qu’est-ce
que la propriété, qu’est-ce que le sujet humain ? Vous avez dit ‘mes’ problèmes. Mais cela
constituerait l’objet d’une autre discussion. Que vous ayez un travail, et que le produit de ce
travail, de votre travail appartienne à quelqu’un d’autre est un fait. Ce n’est cependant pas une
contradiction ni une combinaison réciproque ; c’est l’objet d’un combat, d’un affrontement.
Quoi qu’il en soit, le fait que le produit de votre travail appartienne à quelqu’un d’autre n’est
pas de l’ordre de la dialectique. Cela ne constitue pas une contradiction. Vous pouvez penser
que c’est moralement indéfendable, que vous ne pouvez le supporter, qu’il vous faut lutter
contre cela, oui, bien sûr. Mais ce n’est pas une contradiction, une contradiction logique. Et il
me semble que la logique dialectique est vraiment très pauvre – d’un usage facile, mais
vraiment très pauvre – pour qui souhait formuler, en termes précis, des significations, des
descriptions et des analyses des processus de pouvoir » (DE II, 221, p.472).
Quais são, se há, os interesses normativos que sustentam sua pesquisa ?

[...]

É uma questão muito difícil de responder. Eu poderia responder me colocando em um plano


pessoal, um plano conjuntural, ou mesmo um plano teórico. Eu escolherei o segundo, o plano
conjuntural. Eu tive, ontem à noite, uma discussão com alguém que me disse: ‘Você concentra
seus estudos sobre domínios como a loucura, os sistemas penais, etc., mas todo isso não tem
nada a ver com a política’. Eu penso que, de um ponto de vista [473] marxista tradicional, ele
tinha razão. É verdade que, durante os anos sessenta, problemas como a psiquiatria ou a
sexualidade faziam figura, ao lado de grandes problemas políticos tais como a exploração dos
trabalhadores, por exemplo, de problemas marginais. Ninguém, entre as pessoas de esquerda
na França e na Europa, se interessava, à época, pelos problemas da psiquiatria e da
sexualidade, que eram julgados marginais e menores. Mas, depois da desestalinização, desde
os anos sessenta, nós descobrimos, eu penso, que um bom número de coisas que nós
considerávamos como menores e marginais ocupam uma posição completamente central no
domínio político, dado que o poder político não consiste unicamente nas grandes formas
institucionais do Estado, nisso que nós chamamos o aparelho de Estado. O poder não opera
em um só lugar, mas em lugares múltiplos: a família, a vida sexual, a maneira como se trata os
loucos, a exclusão dos homossexuais, as relações entre os homens e as mulheres... todas essas
relações são relações políticas. Nós podemos mudar a sociedade apenas com a condição de
mudar essas relações. O exemplo da União soviética é, a esse respeito, decisivo. Nós podemos
dizer que a União Soviética é um país no qual as relações de produção mudaram depois da
revolução. O sistema legal concernente à propriedade também mudou. Da mesma forma, as
instituições políticas foram transformadas depois da revolução. Mas todas as relações de
poder miúdas, na família, a sexualidade, na usina, entre os trabalhadores etc., permaneceram,
na União Soviética, o que elas são em outros países ocidentais. Nada mudou realmente” (DE II,
221, p.473).

« Quels sont, sil y en a, les intérêts normatifs qui sous-tendent votre recherche ? […]

C’est une question à laquelle il est très difficile de répondre. Je pourrais répondre en me
plaçant sur un plan personnel, un plan conjoncturel, ou même un plan théorique. Je choisirai le
deuxième, le plan conjoncturel. J’ai eu, hier soir, une discussion avec quelqu’un qui m’a dit :
‘Vous concentrez votre étude sur des domaines comme la folie, les systèmes pénaux, etc.,
mais tout cela n’a rien à voir avec la politique’. Je pense que, d’un point de vue [473] marxiste
traditionnel, il avait raison. Il est vrai que, pendant les années soixante, des problèmes comme
la psychiatrie ou la sexualité faisaient figure, auprès des grandes problèmes politiques tels que
l’exploitation des travailleurs, par exemple, de problèmes marginaux. Personne, parmi les gens
de gauche en France et en Europe, ne s’intéressait, à l’époque, aux problèmes de la psychiatrie
et de la sexualité, que l’on jugeait marginaux et mineurs. Mais, depuis la déstalinisation, depuis
les années soixante, nous avons découvert, je pense, que bon nombre des choses que nous
considérions comme mineures et marginales occupent une position tout à fait centrale dans le
domaine politique, étant donné que le pouvoir politique ne consiste pas uniquement dans les
grandes formes institutionnelles de l’État, dans ce que nous appelons l’appareil d’État. Le
pouvoir n’opère pas en un seul lieu, mais dans des lieux multiples : la famille, la vie sexuelle, la
manière dont on traite les fous, l’exclusion des homosexuels, les rapports entre les hommes et
les femmes… tous ces rapports sont des rapports politiques. Nous ne pouvons changer la
société qu’à la condition de changer ces rapports. L’exemple de l’Union soviétique est, à cet
égard, décisif. Nous pouvons dire que l’Union soviétique est un pays dans lequel les rapports
de production ont changé depuis la révolution. Le système légal concernant la propriété a lui
aussi changé. De même, les institutions politiques se sont transformées depuis la révolution.
Mais tous les menus rapports de pouvoir dans la famille, la sexualité, à l’usine, entre les
travailleurs, etc., sont restés, en Union soviétique, ce qu’ils sont dans les autres pays
occidentaux. Rien n’a réellement changé » (DE II, 221, p.473).

“Sim, nós desejamos trabalhar, nós queremos e amamos trabalhar, mas o trabalho não
constitui nossa essência. Dizer que nós queremos trabalhar e fundar nossa essência sobre
nosso desejo de trabalhar são duas coisas muito diferentes. Marx disse que o trabalho é a
essência do homem. Esta é, no fundo, uma concepção hegeliana. É muito difícil integrar essa
concepção ao conflito que opunha as classes no século XIX. Você talvez saiba que Lafargue, o
genro de Marx, escreveu um pequeno livro do qual ninguém fala jamais nos círculos marxistas.
Esse silêncio me diverte. A indiferença a esse livro é irônica, mas ela é mais que irônica: ela é
sintomática. Lafargue escreveu, no século XIX, [475] um livro sobre o amor ao lazer. Pare ele
era realmente impossível imaginar que o trabalho possa constituir a essência do homem. Entre
o homem e o trabalho, não existe nenhuma relação essencial” (DE II, 221, p.474-475).

« Oui, nous désirons travailler, nous voulons et nous aimons travailler, mais le travail ne
constitue pas notre essence. Dire que nous voulons travailler et fonder notre essence sur notre
désir de travailler sont deux choses très différentes. Marx disait que le travail est l’essence de
l’homme. C’est là, en son fond, une conception hégélienne. Il est très difficile d’intégrer cette
conception au conflit qui opposait les classes au XIXe siècle. Vous savez peut-être que Lafargue,
le gendre de Marx, a écrit un petit livre dont personne ne parle jamais dans les cercles
marxistes. Ce silence m’amuse. L’indifférence dont ce livre fait l’objet est ironique, mais elle
est plus qu’ironique : elle est symptomatique. Lafargue a écrit, au XIXe siècle,[475] un livre sur
l’amour du loisir. Il lui était vraiment impossible d’imaginer que le travail puisse constituer
l’essence de l’homme. Entre l’homme et le travail, il n’existe aucun rapport essentiel » (DE II,
221, p.474-475).
Devo compreender que, de acordo com você, a maneira como utilizamos as ferramentas e as
descobertas dos intelectuais não ressortit pas a leur domaine? O que está para os
trabalhadores, para o povo que diz respeito o problema de saber que uso fazer do trabalho dos
intelectuais? Você não pode antecipar o uso que se poderia fazer das suas [476] ferramentas e
de suas análises? Você pensa em modos de uso que você não aprovaria?

« Dois-je comprendre que, selon vous, la manière dont on utilise les outils et les découvertes
des intellectuels ne ressortit pas à leur domaine ? Que c’est aux travailleurs, au peuple
qu’appartient le problème de savoir quel usage faire du travail des intellectuels ? Ne pouvez-
vous anticiper l’usage qu’on pourrait faire de vos[476] outils et de vos analyses ? Pensez-vous à
des modes d’utilisation que vous ne sauriez approuver ?

“Não, eu não posso antecipar nada. O que eu posso dizer, é que eu creio que nós devemos ser
muito modestos no que concerne ao eventual uso político do que nós dizemos e fazemos. Eu
não penso que existe uma filosofia conservadora ou uma filosofia revolucionária. A revolução
é um processo político; é também um processo econômico. Mas isso não constitui uma
ideologia filosófica. E isso é importante. E a razão porque uma filosofia como a de Hegel pôde
ser ao mesmo tempo uma ideologia, um método e uma ferramenta revolucionários, mas
também alguma coisa de conservador. Tome o exemplo de Nietzsche. Nietzsche desenvolveu
ideias, ou ferramentas, se você prefere, fantásticas. Ele foi assimilado pelo partido nazista; e,
agora, são os pensadores de esquerda que, para um bom número entre eles, o utilizam. Nós
não podemos então saber, de maneira certa, se o que nós dizemos é revolucionário ou não.

Está aí, eu creio, a primeira coisa que é preciso reconhecermos. O que não significa que nossa
tarefa seja simplesmente fabricar ferramentas que sejam belas, úteis ou agradáveis
[amusants], e em seguida escolher quais nós desejamos colocar no mercado, para o caso de
alguém que queira adquiri-la ou se servir. É bonito, tudo isso, mas há mais. Quem quer que
tente fazer alguma coisa – elaborar uma análise, por exemplo, ou formular uma teoria – deve
ter uma ideia clara da maneira como ele quer que sua análise ou sua teoria sejam utilizadas;
ele deve saber para que fins deseja ver se aplicar a ferramenta que ele fabrica – que ele
fabrica, ele – e de que maneira ele quer que suas ferramentas se vinculem àquelas que outros
fabricam, no mesmo momento. De maneira que eu considero como muito importantes as
relações entre a conjuntura presente e o que você faz no interior de um quadro teórico. É
preciso ter essas relações bem claras na mente. Não se pode fabricar ferramentas para não
importa que fim; é preciso fabricá-las para um fim preciso, mas saber que elas serão utilizadas
talvez para outros fins.

O ideal não é fabricar ferramentas, mas construir bombas, porque uma vez que se tiver
utilizado as bombas que se construiu, ninguém mais pode se servir delas. E eu devo
acrescentar que meu sonho, meu sonho pessoal, não é exatamente construir bombas, pois eu
não gosto de matar pessoas. Mas eu quero escrever livros bombas, isto é, livros que sejam
úteis precisamente no momento em que alguém os escreve ou os lê. Em seguida, eles
desaparecem. Esses livros seriam tais que eles desapareceriam pouco [477] tempo depois que
tenham sido lidos ou usados. Os livros deveriam ser dos tipos das bombas e nada além. Depois
da explosão, poder-se-ia lembrar às pessoas que esses livros produziram um belo fogo de
artifício. Mais tarde, os historiadores e outros especialistas poderiam dizer que tal ou tal livro
foi tão útil quanto uma bomba e tão belo quanto um fogo de artifício” (DE II, 221, p.475-477).
Non, je ne peux rien anticiper. Ce que je peux dire, c’est que je crois que nous devons être très
modestes en ce qui concerne l’éventuel usage politique de ce que nous disons et faisons. Je ne
pense pas qu’il existe une philosophie conservatrice ou une philosophie révolutionnaire. La
révolution est un processus politique ; c’est aussi un processus économique. Mais cela ne
constitue pas une idéologie philosophique. Et cela c’est important. C’est la raison pour laquelle
une philosophie comme celle de Hegel a pu être à la fois une idéologie, une méthode et un
outil révolutionnaires, mais aussi quelque chose de conservateur. Prenez l’exemple de
Nietzsche. Nietzsche a développé des idées, ou des outils, si vous préférez, fantastiques. Il a
été repris par le parti nazi ; et, maintenant, ce sont les penseurs de gauche qui, pour bon
nombre d’entre eux, l’utilisent. Nous ne pouvons donc savoir, de manière certaine, si ce que
nous disons est révolutionnaire ou non.

C’est là, je crois, la première chose qu’il nous faut reconnaître. Ce qui ne signifie pas que notre
tâche soit simplement de fabriquer des outils qui soient beaux, utiles ou amusants, et ensuite
de choisir lesquels nous souhaitons mettre sur le marché, au cas où quelqu’un se porterait
acquéreur ou voudrait s’en servir. C’est bien beau, tout cela, mais il y a plus. Quiconque essaie
de faire quelque chose – élaborer une analyse, par exemple, ou formuler une théorie – doit
avoir une idée claire de la manière dont il veut que son analyse ou sa théorie soient utilisées ; il
doit savoir à quelles fins il souhaite voir s’appliquer l’outil qu’il fabrique – qu’il fabrique, lui – et
de quelle manière il veut que ses outils se rattachent à ceux que d’autres fabriquent, au même
moment. De sorte que je considère comme très importants les rapports entre la conjoncture
présente et ce que vous faites à l’intérieur d’un cadre théorique. Il faut avoir ces rapports bien
clairs à l’esprit. On ne peut pas fabriquer des outils pour n’importe quelle fin ; il faut les
fabriquer pour une fin précise, mais savoir qu’ils seront peut-être utilisés à d’autres fins.

L’idéal n’est pas de fabriquer des outils, mais de construire des bombes, parce qu’une fois
qu’on a utilisé les bombes qu’on a construites, personne d’autre ne peut s’en servir. Et je dois
ajouter que mon rêve, mon rêve personnel, n’est pas exactement de construire des bombes,
car je n’aime pas tuer des gens. Mais je voudrais écrire des livres bombes, c’est-à-dire des
livres qui soient utiles précisément au moment où quelqu’un les écrit ou les lit. Ensuite, ils
disparaîtraient. Ces livres seraient tels qu’ils disparaîtraient peu de [477] temps après qu’on les
aurait lus ou utilisés. Les livres devraient être des sortes de bombes et rien d’autre. Après
l’explosion, on pourrait rappeler aux gens que ces livres ont produit un très beau feu d’artifice.
Plus tard, les historiens et autres spécialistes pourraient dire que tel ou tel livre a été aussi
utile qu’une bombe et aussi beau qu’un feu d’artifice » (DE II, 221, p.475-477).

Você também pode gostar