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pra criança. A sorte que ela tem é que a mãe cedeu uma parte do terreno e
construiu uma casa. Agora, se morasse em casa alugada, como é que ela ia
viver com quatro crianças e um salário?
P: Imagino, que é o caso de muita gente no Brasil, que vive de... Imagina, a
pessoa vai ganhar um salário mínimo, ter 4 filhos pra sustentar, ela não tem
ajuda dos pais.
E: Sim, parece que tem. Parece que ajuda, mas quando bem quer.
E: E ela ainda tem uma mãe que tá debilitada em casa, na casa dela, na
própria casa, residência, mas tem um sábado que ela tem que pra ir cuidar da
mãe, que reveza ela com a outra irmã, sendo que ela ainda paga babá pra
cuidar dos filhos, pra ela poder ir trabalhar.
E: Entendeu? E eu digo, tem vez que a irmã dela não pode ficar com filho e ela
tem que faltar o trabalho, e um dia de trabalho é 25, 50 reais que é perdido.
E: Um salário mínimo.
E: Duas horas de almoço, e dia de sábado a gente trabalha de 7 horas até 11.
P: Além do salário, vocês recebem outros benefícios?
E: Tânia.
P: Bom, a gente já começa então falando sobre trabalho, que é esse item. Tu
começou a trabalhar com que idade, Tânia?
E: O meu pai faleceu desde cedo, eu tinha, acho que uns 11 anos de idade, eu
to com 35...
P: Foi acidente?
E: Foi. Ele trabalhava como... ele trabalhava com negócio de navios, né? Aí um
acidente mesmo lá dentro da empresa lá fez com que isso acontecesse.
E: Não, porque assim, devido a minha mãe nova também, minha mãe me teve
com 15 anos, mulher nova, que naquela época não podia, quem me registrou
foi meus avós, eu sou registrada nos meus avós e meu pai só me ajudava
assim por fora, inclusive, eu fui conhecer ele eu já tinha meus 10 anos, com 11
anos ele faleceu.
E: Conheci com 10 e ele faleceu. Ele já era um senhor já, bem senhorzinho.
Mas desde sempre foi minha mãe que sempre... cuidou assim.
E: São três: eu, minha irmã e mais o meu irmão, né. Aí...
E: Sim.
P: E dos teus avós, tu tem lembrança? Eles eram daqui de Manaus também?
E: Parte do meu pai não, eu não cheguei a conhecer a família do meu pai, mas
a minha avó ainda é viva, que eu chamo de mãe, que é minha mãe-vó e o meu
avô já é falecido, tá com dois anos que ele faleceu.
E: Isso, de Manaus.
P: E no teu trabalho atual, Tânia, como é que é um dia típico assim? Que horas
tu chega, que trabalho tu faz, que tipo de problemas tu tem?
P: É
E: Assim, o meu horário aqui é seis e meia, né? Eu chego umas 6:20, às vezes
pulando, 6:35. Eu acho tranquilo, na verdade, eu acho assim tranquilo. Tem
muitos que reclamam “ah, porque assim, assim”, eu acho tranquilo. Eu acho
que você vê que vira e mexe eu to aqui passeando, já foi-se a época que aqui
era tipo... Quando eu entrei aqui era tipo trabalho escravo que eu dizia, na
época que eu entrei aqui.
E: Mesma empresa. Porque a gente tinha um encarregado que ele era muito
rígido. Ele era uma pessoa legal, eu acho até bom trabalhar com pessoas
rígidas porque a empresa fica até mais concentrada, né? Então ele era muito
rígido, botava a gente pra trabalhar mesmo, não podia ver a gente parado, não
podia ver conversando, não podia ver passeando, era todo tempo ali com o
chicote. Depois que eu saiu, eu digo que depois que ele saiu virou a bagunça.
P: Por que?
E: Porque aqui todo mundo faz o que quer, entendeu? Era pra mim tá lá pro
meu setor, eu to aqui (risos). Meu encarregado já foi, ele veio aqui, ele viu que
eu tava aqui e o que eu respondi? Ele perguntou “por que a senhora tá aqui?”
eu digo “eu já terminei o meu serviço e to pra cá”, então, quer dizer, se fosse o
outro: “terminou o seu serviço, mas é pra ficar lá pro seu setor”.
E: Entendeu? Então, quer dizer, isso já foi mais rígido. Então eu acho tranquilo
trabalhar aqui, apesar de ser pouca essas regalias toda de “faltou, pega isso”,
essas coisas toda, tranquilo.
P: Em geral vocês não têm problemas com o trabalho, conflito com colegas ou
com superiores?
E: Eu não tenho. Muitos têm mas eu não tenho, devido que eu não sou assim
de dar trela mais não. Tem muitos assim que vem com fofoquinha, tem muitos
que tiram fotos, filmam, essas coisas que a gente tá fazendo e joga lá pro
encarregado pro encarregado dar esculhambação na gente, mas quando a
gente sabe se comunicar e falar direito, a gente já não liga pra isso, eu já não
ligo. Eu não tenho, graças a Deus eu to com um ano e seis meses aqui e eu
nunca tive atritos com ninguém, com ninguém assim, eu sempre fui muito de
respeitar, mas também à altura, né?
P: Sim, sim, entendi. Em geral, qual tipo de... digamos assim, habilidades o teu
trabalho exige? O que tu precisa saber manejar, enfim, o que exige assim o
trabalho de você?
E: Assim, que eu tenho muito medo assim, mas eu acho assim, que se o
encarregado fosse mais rígido, eu acho que todos já sabiam fazer: que a gente
trabalha com máquinas de lavagem, umas máquinas de lavar. Muitos sabem,
mas usam quando bem quer, tipo assim: sábado a gente vai ter uma lavagem,
muito que sabem usar a máquina “ah, eu não vou porque não quero, to
cansada”. Então quer dizer, eu acho que eles deviam ter mais... coisa. Como
eu falo pra eles “olha, se você me ensinar...”, porque eu tenho curiosidade de
aprender a mexer na máquina, mas ninguém quer me ensinar, eu não vou
exigir também né, mas eu tenho vontade assim. Eu acho que não tem o que eu
não saiba usar além dessa máquina.
E: Sim, penso sim. Inclusive eu já mandei uns currículos assim pro Distrito, né?
Porque assim, apesar de... aqui é bom, “ah, mas tu vai sair? A ADAP é uma
mãe”, mas eu não quero passar o tempo todo né, limpando o chão, limpando
banheiro, essas coisas todas. Como eu falei pra você: Não é um trabalho ruim,
mas também não é um trabalho que tá me satisfazendo direito.
P: Falando em... Que eu comentei sobre trabalho dos sonhos... Teve algum
trabalho que tu já desejou muito ou que tu deseja “po, esse é o trabalho que eu
queria”?
P: Não? Por que? Tu não gostava de... Num lugar ou tu saía vendendo?
E: Não. Eu trabalhei em loja, como em loja, tipo assim porque eu peguei numa
loja que era mais esperto do que eu, entendeu? Eu tava vendendo, ia lá... O
pessoal, por ser mais antigo na empresa, ia lá e tomava minha vez e eu saía
sem nada no bolso. Então eu me desanimei, foi só duas, três vezes que
trabalhei assim, mas também me desanimei, daí já não quis mais.
[alguém abre a porta e fala algo com Tânia que não é compreensível no áudio.
Tânia responde: “tu tá me atrapalhando” (risos)]
E: Bom, logo quando eu entrei aqui, eu cheguei a receber 700 e pouco. Depois
disso, eu nunca mais vi o que era 700 e pouco, só é 500, 600... né? Devido a
ter muitos descontos, é desconto de vale transporte, vale refeição, o tal do
INSS, aí sai... cai 573, 590...
P: Quer dizer que de 700 e pouco cai pra 500 e pouco por causa dos
descontos?
P: É curso de que?
P: É o pacote, né?
E: Ainda não deu, não deu. Te confesso que ainda não deu. Eu tenho
poupança na Caixa, mas tá lá vazia, pra dizer que ela não tá vazia, nem sei se
ela tá com 10 reais, se já não me roubaram e no Banco do Brasil eu to com 5
reais. Ainda tem um empréstimo aí que eu fiz
P: Tá pagando?
P: Tava falando que foi a tua mãe que criou você e mais...
E: Sim, a gente sempre moramo juntos, ela nunca foi de deixar a gente assim...
né, não. Sempre ela trabalhava. Eu e meu irmão como éramos mais velhos, a
gente cuidava da menor que é minha irmã, que hoje tá maior do que a gente.
Ela trabalhava, na madrugada ela saía e já deixava tudo pronto, o café, essas
coisas toda e a gente se responsabilizava de cuidar da casa e levar a menor
pra escola e ia junto na escola também.
E: Acho que uns dois, três anos a gente ficamo nessa rotina.
E: São Raimundo pro Japiim? Dava muito mais, ixi, éramos pequenininhos
E: A gente passava São Raimundo, Praça 14, Cachoeirinha... pra poder entrar
no Japiim, e a gente ainda vinha na... assim na... Que estudava de manhã, a
gente vinha, na volta a gente passava aqui na casa da tia que morava no
Japiim pra comer alguma coisa, a gente ainda tinha que vir ainda na sorte de o
marido dela não estar pra tia dar comida pra gente.
P: É mesmo?!
P: Então se fosse definir assim, digamos, a tua vida na tua infância era...
E: Razoável, meio balançada. Mas graças a Deus a gente nunca passou essa
dificuldade de não ter uma comida durante o dia pra gente.
P: E a relação de vocês com a mãe de vocês como era? Ela era muito dura
com vocês?
E: Porque eu sempre fui muito danada. E também assim, ela pegava muito no
meu pé, eu gostava de me divertir, gostava de brincar, ia pra rua mesmo,
brincava na rua, né. Então ela já não gostava. Eu dizia... eu lembro que eu
dizia até que ela não gostava de mim porque eu fazia as coisas em casa, ela
chegava, eu tinha que apanhar porque ela dizia que alguma coisa tava errada.
Eu já apanhei de vassoura, já apanhei de panela na cabeça, coisas assim,
diferente que eu via que com meus irmão, minha irmã, não acontecia com eles.
Todo final de semana eu tinha que lavar a casa, se ela chegasse do trabalho e
não tivesse a casa lavada, era porrada.
E: Era. Hoje não, hoje eu digo que ela é boba. Se eu deixar, a minha filha rola e
bola com ela.
P: Então ela não era muito de carinho assim?
E: Não, não era. Porque também ela era assim... Saía na madrugada, chegava
tarde, cansada... Então, se encontrasse alguma coisa bagunçada dava na
minha.
E: Peia.
P: Certo.
E: Mas eu não me arrependo não, se não fosse essas peia, sabe lá o que eu
não seria... Porque assim, na época, acho que eu tinha os meus 11 anos,
devido também ela não poder ficar assim com os 3, eu ajudava a sogra de uma
tia minha que já faleceu, lá na Praça 14, ela vendia... Fazia banca pra vender
salgado, essas coisas, eu ia pra lá, eu já trabalhava ajudando ela.
P: Com 11 anos?
E: Com 11 anos. E você sabe que quando você mora assim em casa dos
outros não é a nossa casa, sempre tem aquelas humilhações, tudinho né?
Então era assim, eu convivi assim... Eu tinha essa minha tia que já é falecida,
ela usava droga junto com o marido, cansaram de usar droga na minha frente,
cansaram de comprar droga e eu ia junto, eles faziam a sacanagem deles tudo
na minha frente... Eu acho assim que quando uma criança entra pra uma
adolescência e quer ser um pouco a frente, legal, não liga pra essas coisas. Foi
isso que aconteceu, eu não bebo, não fumo.
[alguém abre a porta da sala e fala algo incompreensível, Tânia diz “tu tá me
atrapalhando” para a pessoa. Para o pesquisador diz: “tu tá vendo? Tu viu?
Acabamos de sair de uma reunião deles lá”
P: Gente...
E: Ta vendo?
E: Isso é uma sacanagem. Tu sabe assim como eu vejo, como eu digo pra
você, ela não é uma empresa ruim. Como dizem, é uma empresa mãe, mas
tem muitos por aí que não querem saber de arrumar... Se tu for andar num
setor assim e tu vê um setor sujo, eles não tão nem aí, aí eles botam quem tá
trabalhando pra fora e quem não tá continua o tempo que eles bem quiserem.
E: O que eu acho é assim, que eles vejam mais... Mais essas pessoas assim
que dão aquela confiança, que deixa o beijinho, um copo de... um prato de
comida. Eles não vejam muito pelo trabalho das pessoas, eles vejam pelo
puxar do saco, entendeu? É como eu digo... Eu digo mesmo pras meninas, eu
não tenho medo. Eu sei que o dia que eu tiver de sair daqui, eu sei que foi
difícil eu conseguir trabalho, eu passei 6 meses, seis meses ralados mesmo,
né? Então assim, que eu acho assim que o dia que eu sair daqui e for um
pouco mais pra frente – vai custar, mas e arrumo melhor, entendeu? Eu arrumo
melhor, é desse jeito. Eu trabalhava ali, naquele setor, acho que no segundo
bloco aqui, eu trabalhava no segundo bloco, eu lavava sala, eu espanava,
passava óleo nas coisas, limpava as paredes... Aí tem esse nosso
encarregado, entrou um outro grandão, o Genival, quando eu menos esperei
eles me tiraram do meu setor. Por que? Eu nem entendei o por que! Aí peguei,
fui e perguntei do encarregado por que eles tinham me tirado do meu setor, ele
disse que isso não me interessava, que eles iam conversar comigo e eu
estava em observação, aí eu digo “por que eu estou de observação? Não
entendi. Eu não to cuidando do bloco direito?”, aí ele disse pra mim que eu tava
em observação porque tinha muita reclamação de professor, que estavam
reclamando do meu serviço porque eu não estava limpando, que eu tava isso,
tava aquilo. É... eu não sei. Porque eu sempre fui assim, eu sempre fui de me
dar bem com as pessoas, eu me comunico mesmo, né? Eu chegava, falava
com as professoras, tudinho, ninguém reclamava nada, eu chegava cedo,
sempre fui de chegar cedo, fazia meu serviço, mas sabe o que era? A menina
lá embaixo onde eu to agora, era muito assim com eles, com ele, né, que é o
baixinho que é o nosso encarregado agora, ela queria vir pro meu setor. Por
que ela queria vir pro meu setor? Porque o meu setor era limpo, ela não queria
ter trabalho, passava os dias tudo em sala de ar condicionado... aí ele foi, me
tirou e colocou ela. Aí eu fiquei jogada, de um lado pro outro, de um lado pro
outro, sem setor.]
P: Entendi.
E: Entendeu?
E: Não. Eu acho que se tivesse feito isso, eu acho que eu era uma usadora
junto, mas tranquilo. Nunca senti nem vontade de fazer nada porque eu via que
isso não era coisa... Ela apanhava do cara lá, do marido dela... ele dava nela,
ela dava nele, era aquela sacanagem toda. Então aquilo ali sempre eu já...
Sempre procurei, sempre quis algo melhor pra mim, então eu via que aquilo ali
não era vida pra mim.
E: Não. Nunca eles me tocaram um dedo, assim que eu lembre eu nunca fui de
apanhar. Eu apanhava da minha mãe, sim, mas assim de onde eu morava não.
P: Tu sabe que a gente sempre herda coisas dos pais assim, da mãe, coisas
boas e coisas nem tão boas. O que tu acha que tu herdou da tua mãe?
E: Eu acho assim que eu herdei dela, eu sou muito assim, eu tenho o meu jeito,
eu não gosto de confusão, como ela também não gosta, ela não gosta de
confusão, mas também quando explode, explode. Às vezes - eu não vou dizer
assim que eu não tenho motivo, mas eu explodo assim... às vezes... Eu digo
assim, minha filha tem 10 anos, eu converso, converso com ela, às vezes dá
vontade de explodir com ela. Eu não bato na minha filha porque eu lembro do
meu passado, entendeu? Aí depois eu fico “não, eu tenho que dar nela. Eu
tenho que dar nela porque eu apanhei, né e eu não fiquei coisas que... Se a
minha filha não apanhar, ela vai virar coisa que não presta” eu fico com isso na
minha cabeça, entendeu? Mas ao mesmo tempo não... Esse mundo já tá tão
doido que a gente não pode bater que a criança se revolta, aí foge, vira isso,
vira aquilo, entendeu? E ainda tem o tal do Conselho Tutelar que a gente não
pode nem dar uma palmada, uma ripada que a gente corre o risco da gente
sem presa por causa da criança, né? Mas eu acho que é isso, eu tenho uma
parte que sou calma, outra parte eu sou explosiva demais, mas tranquilo.
P: Tá certo. E tem alguma cosia que tu tentou fazer diferente da tua mãe além
de não querer bater na tua filha ou evitar pelo menos°
P: É, digamos uma coisa assim... alguma coisa que ela fez e que você não quis
fazer... quis fazer diferente, seja no trabalho, na vida, no comportamento, de
maneira geral...
E: Acho que não. Eu acho assim que minha mãe teve cada filho de um pai, ela
optou por isso, talvez não deu certo. A gente nunca sentamos pra conversar em
relação a isso. Meu filho tem um pai, minha filha tem outro pai, também assim
né? Eu vivi com o pai do meu filho, dos meus 16 anos aos meus 22 anos eu
vivi com ele, que eu me separei e fui morar na casa da minha mãe. Aí o
negócio de festa, tudinho, conheci o pai da minha filha, dali só fez... como fala
na boca popular “só fez me emprenhar e tchau”
P: Que isso!
E: Eu sempre falo isso, né? (risos) Eu digo assim, minha filha tá com 10 anos,
meu filho com 17, meu filho morou comigo até os 15 porque tava querendo se
ajuntar com uma turminha, né... Eu tinha que ir trabalhar, ou eu trabalhava ou
cuidava do menino. Na época eu trabalhava no restaurante, pegava 10 da
manhã e largava uma hora, meia-noite pra voltar pra casa. Então o menino foi
se criando, se criando, já querendo se enturmar com gente que não presta. Eu
logo percebi e mandei pros avós, lá hoje graças a Deus ele tá bem, indo na
igreja, tudinho, legal.
E: Vários casos desse. Então eu prefiro assim viver sozinha, eu não... E não
vou dizer que não tenho, tenho o meu namorado tudinho, ele me ajuda, graças
a Deus, mas eu não quero mas aquela pessoa pra viver ali comigo na minha
casa, eu não quero mais viver com a pessoa ali no mesmo teto.
E: Cada um no seu cantinho. A gente briga, vai pra lá, demora a gente tá no
telefone, tá bem. A gente vive a nossa vida assim, mas tranquilo. Eu acho
assim que eu não tenho algo de fazer diferente dela, eu acho assim que ela foi,
ela é uma mulher muito guerreira, né, tá lutando, trabalha, tá trabalhando e
hoje a gente tá... Como a minha irmã não tá trabalhando, mas a gente tá
ajudando ela assim, ela faz as vendas dela, tá vendendo garrafinha, eu vendo
aqui e ela vende lá
P: Garrafinha é o que?
E: Então ela vende assim. Aí a minha foi, abriu um crédito e tirou uma freezer já
pra ajudar também, eu compro uns refrigerante pra deixar em casa pra ela
vender, pra ver se ela termina a faculdade dela.
P: Serviço Social?
E: Lá na Uninorte.
E: Deve estar. Então a gente tá lutando aí por ela, aí. Pelo menos uma é pra
sair formada.
E: Tá muito liberal.
P: Como assim?
E: Eu lembro que na minha época, até hoje a minha irmã comenta assim, que
na nossa época a gente tinha o nosso horário pra sair e nosso horário pra
entrar, a gente brincava, mas tinha que fazer as coisas dentro de casa, se a
gente dizia não, a gente apanhava. Passava alguém se tivesse conversando, a
gente levava uma mãozada e nada acontecia, e sala de aula era a mesma
coisa, a gente respeitava a professora, agora já não existe isso. O que eu vejo
assim da criação, as diferenças, se a gente for bater, a criança já sabe o
número do Conselho Tutelar, ligou... Ninguém quer saber o motivo, a razão, o
que a criança fez, quem tá com a razão é a criança, se a criança te dá uma
porrada, tu tem que deixar ela dar, a criança fala alto contigo, tu não pode
meter a mão na cara dela, corre o risco de pegar uma cadeia, pagar uma
multa...
E: Como assim?
P: Se tu já presenciou algum caso perto da tua casa de algum filho que colocou
o pai no... denunciou?
E: Sim, sim. O menino... A mãe tinha ido trabalhar, o menino com as irmãs
ficaram em casa, foram pra rua, tudinho, o menino na brincadeira lá com os
outros colegas jogou uma pedra, quebrou a vidraça da casa da mulher, a
mulher foi bater na casa da vizinha lá quando chegou. A vizinha saiu, ela meteu
a porrada no menino, o menino simplesmente ligou, o Conselho Tutelar veio na
mesma hora, e isso era de noite, o Conselho Tutelar veio, recolheu o menino e
recolheu a mãe. E ela bateu assim nas pernas dele que não era pra ele sair de
casa, bateu de cinto. Aí às vezes dá até medo de a gente bater e acontecer
alguma coisa. Esses dias mesmo eu falei pra minha filha, minha filha tem 10
anos, ela andava com negócio de “não, eu não vou” e já entortava a boca. Aí
eu disse pra ela “eu vou te dar uma surra, Isabel, e vou te dar o telefone pra ti
ligar pro Conselho Tutelar, eu quero ver se você vai conseguir viver no
Conselho Tutelar com a mordomia que você tem aqui em casa. Eu na minha
época, eu não tinha Sky, eu não tinha uma internet, eu não tinha uma televisão,
eu não tinha tempo pra mim assistir televisão porque ou eu estudava, que eu
fazia caminhada pra mim ir pra minha escola e chegava morta de cansada e
tinha que fazer as cosias dentro de casa. Você não sabe fazer um arroz e tem
10 anos, um dia que eu lhe bater, eu vou lhe bater de com força, se o Conselho
Tutelar vier me recolher, vai recolher nós duas, mas eu saio e você fica. Eu
quero ver como você vai sobreviver desse jeito”.
E: Ela fica assustada. Ela não fala nada, ela chora, mas ela fica assustada.
P: Hoje tu falou que tu mora junto com a tua mãe, né? É no mesmo lugar que
cê disse que ela tinha conseguido um terreno?
P: Pra ti, o que significa ter uma casa própria? O que é ter uma casa própria?
E: Significa muito, vi que minha mãe se... Eu acho assim que se ela pudesse,
que hoje ela tem problema nas pernas, a gente mora num local que num lado
da escada são 95 degrau e no outro são 35 degrau, de um lado e doutro. O
sofrimento dela pra ela subir aquela escada é muito, mas tem que subir,
precisa sair, né? Então assim, se eu pudesse dar um local melhor pra ela, eu
lutava pra isso, tanto eu quanto a minha irmã, o meu irmão, a gente lutava pra
isso, mas não tem, né? Graças a Deus hoje ela tem essa casa dela, não
precisa de aluguel, não precisa tá se batendo em casa dos outros. Eu fiz um...
eu fiz minha inscrição pra SUHAB, inclusive, quando entrar de férias eu tenho
até que tentar resolver isso.
P: Nunca ligaram?
E: Nunca ligaram. Eu já fui lá e nada de... negócio de meu nome estar em lista,
nem nada.
E: Eles só dizem assim que tá parado, não tão chamando ninguém ainda, não
tão ligando pra ninguém e tá parado, não tem ninguém no sistema.
E: Não, porque eu tenho que ir trabalhar. Aí, o que acontece? Eu tava até
falando pras meninas que eu to doida pra ficar de férias, mas não é pra mim
descansar, é pra mim pegar o dinheiro, como eu... Lá em casa é assim, a parte
da frente, vamos supor que é mais ou menos esse pedaço aqui com um
pedaço ali até próximo a porta, frente e traz. Eu to na parte de traz, na frente é
onde tem a televisão, a mesa né que a gente compra. Meu irmão conseguiu
fazer em cima um quarto pra ele e pra minha mãe, dorme ele e a minha mãe
juntos lá. Minha irmã também o marido dela fez um empréstimo lá que até hoje
tão pagando esse empréstimo pra fazer o local dela lá, eu que to embaixo.
Então assim, eu ainda to lutando pra ver se eu consigo fazer pra menos fazer a
divisão pelo menos de compensado.
P: Tua filha dorme onde?
E: Ela dorme comigo, nós temos uma cama, né, ela dorme comigo. Aí assim,
eu digo assim, eu tava falando pro meu primo: Mano, quando eu entrar de
férias e pegar um dinheiro eu vou comprar um cimento pra ver se consegue
pelo menos ajeitar aqui pra fazer meu fechado aqui.
E: É o documento.
P: Tá aqui: sendo o seu último dia de trabalho... Não, não, minto. Dia 22/11, é...
Isso aqui tão dando a notificação, né, prazo...
E: Poxa, eu vou ficar sozinha sem minha amiga. A gente se apega, né, muitas
colegas...
E: Como assim?
E: Eu tenho até o meu terceiro. Segunda série eu era muito peralta, eu era
muito inteligente.
P: Ah, tu estudou até a segunda série?
P: Pois é
E: Eu lembro que eu tinha umas colegas que diziam assim... Uma vez eu tirei
um 8,5 numa prova que eu chorei, eu chorei por causa desse 8,5. Aí as
meninas “deixa de ser metida” – eu lembro até hoje.... “deixa de ser metida, tu
tira 8,5 e fica chorando aí, tem gente que tirou 6, 7 e tá tudo de boa”. Eu digo
“mas eu não aceito, eu estudo pra isso” porque eu tinha tanto medo de tirar
nota baixa devido a minha mãe ser tão rígida, que eu morria de medo de
apanhar.
P: Ela cobrava, é?
E: Cobrava, então eu estudava. To dizendo pra ti que eu não sou o que presta
porque não estudei.
P: É mesmo, é?
E: Sim, sim. Bons professores, tinha a professora Roseli, a Rosineide que até
hoje eu me lembro delas, onde eu encontro eu falo com elas.
P: Tu lembra quais eram as maiores dificuldades em relação a estudo?
E: Minha dificuldade?
P: Conjugações...
P: Ah, morfologia.
E: Ao trabalho, ao namoro...
E: Como assim?
E: Não, na época não. Porque agora tem, você saiu da escola, se você quiser
fazer um estágio na escola, você faz. Agora já não tem... Aliás, na época não
tinha e agora você tem. Por exemplo, você tá numa escola, se você quiser
fazer um estágio na escola, aí você vai e faz.
E: Eu acho assim... EU não vou dizer que a escola... A escola educa sim
quando você quer ser educado, mas a maioria da educação, né, vem de dentro
de casa. É como eu digo pra minha filha: “minha filha, sua obrigação é ir pra
escola, as professoras estão lá pra te ensinar, então a maioria das coisas aqui
é comigo, cê passa o dia na escola, de tarde você tá em casa”. Então eu acho
assim que a função da escola é todos os professores orientar e tentar que as
crianças se coisem, se ajeitem mais pra educação”
P: Pode entrar.
E: Pegue o seu papel, eu to triste, eu já chorei (risos), meu coração tá
magoado. Eu já falei pra ele. Menina, eu não entendi, Josi.
Josi: Nem eu, não entendi nada. Sei nem onde tira esse negócio aqui...
Josi: Amazonas
E: Amazonas?!
E: Não é, menina?
Josi: Naquela hora ele não veio aqui? Por que ele não falou pra mim?
E: Isso que eu tava falando pra ele, que engraç... Tivemos a reunião, por que
ele não pediu logo pra ficarem?
Josi: Não, ele falou que não tinha ninguém demitido, né?
E: Pois é!
E: Quando?
Josi: É, eu ia fazer.
Josi: Menina, eu tenho que ver onde é que faz esse negócio desse exame.
E: Tu sabe o que eu vou fazer então? Tu tem que pedir... Eu vou pedir pra vir
pra cá.
Josi: É, mas aí a dona menina também vai pedir, né? A dona Neide...
E: Como assim?
E: FGTS e seguro
Josi: Só isso.
E: E sendo que eles descontam aí... Eu acho isso um absurdo, não sei se é
certo, mas eles descontam, se a gente falta, descontam vale-transporte, né,
descontam vale-transporte e descontam no salário e se a gente tirar férias eles
descontam vale-transporte e descontam nossas faltas, aliás no salário. Ela vai
pegar a conta, né? Aí eles descontam vale-transporte e falta, eles descontam
se tu tem atestado... Cada atestado é 25 cent... 25 reais. Se tu tiver 5 atestado,
já vai uma turma de dinheiro pra eles.
E: Como?
Josi: Não, porque eu não tenho carteira de trabalho, eu vou ter que tirar minha
carteira de trabalho amanhã porque eu tenho que ir lá dia 25 com isso aqui, ó.
Josi: Eu vou falar pra ele “amanhã eu não venho porque tem que ter até o dia
25, tem que levar carteira de trabalho e identidade, amanhã eu não venho”.
E: Vai dar complicação, como é que tu vai colocar tua profissão e teus anos de
trabalhado?
Josi: Uhum. Aí vou ter que ir lá no PAC. Diz que tira rapidinho, né?
P: É, vai ajudar.
E: Ai, Jo... Não quero que tu saia não, e agora?
E: Ah, a Neide queria. Agora eu não to entendendo da Sílvia, a Sílvia vem todo
dia, vai entender!
Josi: Todo dia não, tem vez que ela nem vem.
E: Sim, mas nem tanto. Ela vem todo santo dia, Josi, era difícil ela faltar. Talvez
ela tenha pedido também, né?
P: Ah, é?
E: Há 4 anos.
P: Qual igreja?
P: Já é 4:30
E: 5 horas...
P: Porque aí não tem problema, como eu te falei, a gente pode continuar em
outro momento, a gente já fez acho que mais da metade. Ainda tem mais três
tópicos. Mas aí a gente conversa mais um pouco e daqui a pouquinho tu sai e a
gente pode continuar amanhã ou depois, sem pressa. Ou então até fora daqui,
se tu optar... Pra mim não tem problema.
E: Igreja e trabalho.
P: Fora disso?
E: Não sou de ter amizade. Pra não dizer que eu não tenho amizade, eu tenho
uma, duas, acho que umas 5 amigas só com quem eu converso mais e eu
conto mesmo as minhas situações.
E: Não.
E: Eu durmo muito.
E: Sim, eu saio com a minha filha. Ela me cobra assim, aí eu saio e também
quando eu tenho um dinheiro assim pra mim comprar pelo menos um sorvete
pra ela. Mas quando eu não saio, aí tem a tia, a tia às vezes tem uma
programação e já leva ela, mas é raro. Eu to com uns dias aí devendo já... Ela
quer passear na Ponta Negra, mas eu ainda não tive dinheiro pro sorvete.
E: Bruno e Marrone.
P: Tu gosta de sertanejo?
E: Eu gosto assim, eu gosto muito de filme infantil que eu assisto junto com a
minha filha, eu assisto junto com ela. Eu gosto de assistir terror
P: E ela gosta?
E: Da Malévola, é o filme assim de uma bruxa, né... Que ela se apaixona pelo
pai de uma criança, só que esse pai trai ela, é um filme infantil e foi um filme
muito bonito, eu gosto dele.
P: Já bebeu? Bebe?
E: Não bebo.
E: Ô Josi! (risos) Josi, cadê minha coca? Eu bebo muita coca, pode botar na
mesa, to nem vendo.
Josi: Eu vou falar pro meu colega que daqui eu já vou pra outro emprego. Pra...
Limpa Norte, num tem uma Limpa Norte? Ele falou que no dia que eu sair pra
ADAP é só pular pro outro.
Josi: É lá no São Raimundo. Eu vou lá, não vou nem entrar nesse seguro não.
E: Mas fala com ele primeiro pra ti não fica desempregada, doida!
E: Essa Josi...
Josi: Ah, das mentiras dela, né? (risos) Pois é, menina, a Tânia disse “eu já
sabia”.