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a. 172
n. 452
jul./set.
2011
INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO BRASILEIRO
DIRETORIA – (2010-2011)
Presidente: Arno Wehling
1º Vice-Presidente: Victorino Coutinho Chermont de Miranda
2º Vice-Presidente: Max Justo Guedes
3º Vice-Presidente: Affonso Arinos de Mello Franco
1ª Secretária: Cybelle Moreira de Ipanema
2ª Secretária: Maria de Lourdes Viana Lyra
Tesoureiro: Fernando Tasso Fragoso Pires
Orador: José Arthur Rios
CONSELHO FISCAL
Membros efetivos: Antônio Gomes da Costa, Marilda Corrêa Ciribelli e Jo-
nas de Morais Correia Neto.
Membros suplentes: Pedro Carlos da Silva Telles e Marcos Guimarães Sanches.
CONSELHO CONSULTIVO
Membros nomeados: Augusto Carlos da Silva Telles, Luiz de Castro Souza,
Lêda Boechat Rodrigues, Evaristo de Moraes Filho, Hé-
lio Leoncio Martins, João Hermes Pereira de Araujo, José
Pedro Pinto Esposel, Miridan Britto Falci e Vasco Mariz
DIRETORIAS ADJUNTAS
Arquivo: Jaime Antunes da Silva
Biblioteca: Claudio Aguiar
Museu: Vera Lucia Bottrel Tostes
Coordenadoria de Cursos: Antonio Celso Alves Pereira
Patrimônio: Guilherme de Andréa Frota
Projetos Especiais: Mary del Priore
Informática e Disseminação da Informação: Esther Caldas Bertoletti
Relações Externas: Maria da Conceição de Moraes Coutinho Beltrão
Relações Institucionais: João Maurício Ottoni Wanderley de Araújo Pinho
Iconografia: D. João de Orléans de Bragança e Pedro Karp Vasquez
Coordenação da CEPHAS: Maria de Lourdes Viana Lyra e Lucia Maria Paschoal
Guimarães.
Editoria do Noticiário: Victorino Coutinho Chermont de Miranda
COMISSÕES PERMANENTES
ADMISSÃO DE SÓCIOS: CIÊNCIAS SOCIAIS: ESTATUTO:
José Arthur Rios, Alberto Ve- Lêda Boechat Rodrigues, Maria Affonso Arinos de Mello Fran-
nancio Filho, Carlos Wehrs, Al- da Conceição de Moraes Couti- co, Alberto Venancio Filho,
berto da Costa e Silva e Fernan- nho Beltrão, Helio Jaguaribe de Victorino Coutinho Chermont
do Tasso Fragoso Pires. Mattos, Cândido Antônio Men- de Miranda, Célio Borja e João
des de Almeida e Antônio Celso Maurício A. Pinto.
Alves Pereira.
Indexada por/Indexed by
Ulrich’s International Periodicals Directory – Handbook of Latin American Studies (HLAS) –
Sumários Correntes Brasileiros
Correspondência:
Rev. IHGB – Av. Augusto Severo, 8-10º andar – Glória – CEP: 20021-040 – Rio de Janeiro – RJ – Brasil
Fone/fax. (21) 2509-5107 / 2252-4430 / 2224-7338
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Tiragem: 700 exemplares
Impresso no Brasil – Printed in Brazil
Revisora: Sandra Pássaro
Secretária da Revista: Tupiara Machareth
Trimestral
ISSN 0101-4366
Ind.: T. 1 (1839) - n. 399 (1998) em ano 159, n. 400. – Ind.: n. 401 (1998) - 449 (2010) em n. 450
(2011)
N. 408: Anais do Simpósio Momentos Fundadores da Formação Nacional. – N. 427: Inventá-
rio analítico da documentação colonial portuguesa na África, Ásia e Oceania integrante do acervo
do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro / coord. Regina Maria Martins Pereira Wanderley
– N. 432: Colóquio Luso-Brasileiro de História. O Rio de Janeiro Colonial. 22 a 26 de maio de 2006.
– N. 436: Curso - 1808 - Transformação do Brasil: de Colônia a Reino e Império.
Conselho Consultivo
Amado Cervo – UnB – Brasília – DF – Brasil
Aniello Angelo Avella – Universidade de Roma Tor Vergata – Roma – Itália
Antonio Manuel Botelho Hespanha – UNL – Lisboa – Portugal
Edivaldo Machado Boaventura – UFBA e UNIFACS – Salvador – BA
Fernando Camargo – UPF – Passo Fundo – RS – Brasil
Geraldo Mártires Coelho – UFPA – Belém – PA
José Octavio Arruda Mello – UFPB – João Pessoa – PB
José Marques – UP – Porto – Portugal
Junia Ferreira Furtado – UFMG – Belo Horizonte – MG – Brasil
Leslie Bethell – Universidade Oxford – Oxford – Inglaterra
Márcia Elisa de Campos Graf – UFPR– Curitiba – PR
Marcus Joaquim Maciel de Carvalho – UFPE – Recife – PE
Maria Beatriz Nizza da Silva – USP – São Paulo – SP
Maria Luiza Marcilio – USP – São Paulo – SP
Nestor Goulart Reis Filho – USP – São Paulo – SP – Brasil
Renato Pinto Venâncio – UFOP – Ouro Preto – MG – Brasil
Stuart Schwartz – Universidade de Yale – Inglaterra
Victor Tau Anzoategui – UBA e CONICET – Buenos Aires – Argentina
SUMÁRIO
SUMMARY
Carta ao Leitor 11
Lucia Maria Paschoal Guimarães
I ARTIGOS E ENSAIOS
ARTICLES AND ESSAYS
Dossiê História do Direito –
Dossier on the History of Law
Apresentação 13
Presentation
Samuel Rodrigues Barbosa
Pelo rei, com razão: comentários sobre as reformas
pombalinas no campo jurídico 15
Pro King, with Good Reason: comments on the legal reforms
undertaken by the Marquis of Pombal
Álvaro de Araujo Antunes
Súditos del-rei na América Portuguesa. Monarquia Corporativa,
virtudes cristãs e ação judicial na Villa de Nossa Senhora
da Luz dos Pinhais de Curitiba no século XVIII 51
The King’s subjects in Portuguese America: Corporate
Monarchy, christian virtues and legal action in Vila de São José
dos Pinhais, Curitiba, during the eighteenth century
Luís Fernando Lopes Pereira
As Prelecções de Ricardo Raymundo Nogueira (1746-1827):
alguns aspectos do discurso pró-absolutista na literatura
jurídica portuguesa do final do antigo regime 87
The lectures of Ricardo Raymundo Nogueira (1746-1827):
some aspects of the pro absolute power writings in the Portuguese
legal literature during the end of the ancient regime
Airton Cerqueira-Leite Seelaender
Nativismo por adoção: letras e percurso do doutor Marcelino
Pereira Cleto (1778-1794) 115
Native by adoption: Dr. Marcelino Pereira Cleto’s (1778-1794)
writings and route
Marco Antonio Silveira
II COMUNICAÇÕES
NOTIFICATIONS
Pensamento jusfilosófico de Clóvis Beviláqua ao final
do século XIX 429
The jus-phisosophical thought of Clovis Bevilaqua
at the end of the nineteenth century
Maria Arair Pinto Paiva
O Imperador da língua portuguesa 461
The Emperor of the Portuguese language
Arnaldo Niskier
O padre Antônio Vieira, um diplomata desastrado 473
Father Antonio Vieira – A clumsy diplomat
Vasco Mariz
V DOCUMENTOS
DOCUMENTS
Documentos sobre “Juízes Ordinários” nos territórios
brasileiros no século XVIII 547
Documents on “Common Judges” in Brazilian territories
in the seventeenth century
Joaquim Romero de Magalhães
IV RESENHAS
REVIEW ESSAYS
Geografias Pátrias: Portugal e Brasil 615
Luciene Carris Cardoso
• Normas de publicação 371
Guide for authors 373
Carta ao Leitor
Boa leitura!
I – ARTIGOS E ENSAIOS
ARTICLES AND ESSAYS
APRESENTAÇÃO
PRESENTATION
Samuel Rodrigues Barbosa 1
Resumo: Abstract:
O artigo analisa a constituição do campo jurídi- This paper will analyze the establishment of the
co português, no reinado de D. José I, que teve Portuguese legal system during the kingdom of
como Secretário do Reino Sebastião José de D. Jose I, whose Secretary was Sebastiao Jose
Carvalho e Melo, o Marquês de Pombal. Por um de Carvalho e Melo, Marquis of Pombal. On the
lado, investiga as mútuas implicações das forças one hand it will investigate mutual implications
reguladoras, expressas na reforma da Universi- of regulatory forces, expressed by the reform of
dade de Coimbra e na fixação de novas diretri- the University of Coimbra and on the fixation of
zes legais pela Lei da Boa Razão. De outro lado, new legal guidelines by the Law of Good Rea-
trata da prática dos agentes da administração da son. On the other hand, it deals with the prac-
justiça, mais especificamente, os de Mariana e tice of legal administration agents, more specifi-
Vila Rica, importantes centros da Capitania de cally, those of Mariana and Vila Rica, important
Minas Gerais. centers of Colonial Minas Gerais.
Palavras-chave: Justiça, Reforma da Universi- Keywords: – Reform of the University of Coim-
dade de Coimbra, Lei da Boa Razão. bra – The Law of Good Reason.
Sob o risco de dizer mais do mesmo, não cabe aqui uma revisão da
extensa historiografia que gira, invariavelmente, em torno do nome de
Pombal. Não há como ignorá-lo. Mesmo entre as críticas que tendem
a desmerecê-lo, ele está lá, como o centro dos ataques. Desse eixo de
transmissão a mover polêmicas estampadas em livros e artigos sem fim,
importa ao presente estudo destacar a centralidade de Sebastião José de
Carvalho e Melo e de algumas das suas reformas no campo jurídico.
8 – Segundo Laerte Ramos, “a pedagogia pombalina foi a expressão de uma época, ex-
pressão tanto mais significativa quanto ainda hoje sugere fecundas lições proporcionadas
de perplexidades para uns e certezas para outros”. CARVALHO, Laerte Ramos. As refor-
mas pombalinas da instrução pública. São Paulo: Edusp/Saraiva, 1978, p. 191.
9 – Segundo Fernando Novais: “grosso modo, a face reformista das Luzes que incidirá
mais sobre a metrópole; na colônia, a face revolucionária. Esta a ambiguidade funda-
mental do pensar ilustrado, ao mesmo tempo reformista e revolucionário, dependendo da
situação em que se processe a sua leitura”. Os universitários de Coimbra, por exemplo,
leram e comentaram livros “anticatólicos”, entre os quais, Monstesquieu, Voltaire, Locke,
Mirabeau e a obra O Emílio, de Rousseau, “vendo nele a confissão de Fé, na qual protesta
o autor ser sectário da religião natural, como única, verdadeira e suficiente para a felici-
dade do homem”. NOVINSKY, Anita Waingort. Estudantes brasileiros ‘afrancesados’ da
Universidade de Coimbra: a perseguição de Antônio Morais e Silva: 1779-1806. In: CO-
GGIOLA, Oswaldo (org.). A revolução francesa e seu impacto na América Latina. São
Paulo: Edusp: Brasília: CNPq, 1990.” NOVAIS, Fernando Antonio. Portugal e Brasil na
crise do Antigo Sistema Colonial (1777-1808). 2ª ed. São Paulo: Editora Hucitec, 1983,
p.158.
10 – Sobre o assunto, ver: VILLALTA, Luiz Carlos. Reformismo ilustrado, censura e
práticas de leitura: usos do livro na América Latina. São Paulo, 1999. Tese (Doutorado
em História) – Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo.
Pufendorf entendia a lei natural como aquela que era fundamentada nas
máximas da reta razão, no entendimento humano que “tem a faculdade
de descobrir clara e distintamente” uma ordem quando se debruça sobre
a natureza e a constituição dos homens.49 Neste sentido, o direito natural
passou a ser entendido como um conjunto de diretrizes morais e racionais
que se fundam na natureza do homem e são descortinadas pela razão.
posteriormente, por autores como Cristiano Tomásio, Wolfio e João Barbeirac, autores
cujas obras circulariam pelo mundo português impulsionadas pela reforma. COMPÊN-
DIO Histórico do Estado da Universidade de Coimbra (1771), pp. 219-220.
49 – GILISSEN. Introdução a História do direito, p. 373.
50 – LEMOS. Relação geral do estado da Universidade: 1777, p. 48.
51 – COMPÊNDIO Histórico do Estado da Universidade de Coimbra (1771), p. 205.
O direito canônico, por sua vez, tem o uso limitado ao tribunal ecle-
siástico, demarcando as áreas de competências do poderes.
Destarte, para Telles, o proposto na Lei da Boa Razão não era ob-
servado nos Estatutos da Universidade de Coimbra ou, o que poderia ser
mais aberrante, haveria um equívoco de interpretação da lei, ainda que o
suposto redator de ambos os documentos fosse a mesma pessoa! Outras
considerações são tecidas sobre a vacuidade da definição do que pode
ser entendido como “leis políticas e econômicas” ou até mesmo como
“nações polidas”, que, segundo o autor, bem poderia ser qualquer nação
cristã da Europa.
“Estas razões me fizeram olhar com horror para o estilo ordinário, en-
tre nós, até aqui, praticado: eu me apartei do uso comum e segui nova
trilha. Tendo-me em primeiro lugar persuadido da intrínseca justiça da
causa que defendo procurei depois fazê-la evidente com razões sóli-
das. E para que fique manifesta, uma vez por todas, a causa de seguir
o estranho método, que me propus, eis aqui os importantes preceitos,
dos quais nunca me apartei [...].” 73
72 – Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT) – Fundo Real Mesa Censória, Caixa
508, documento 4703.
73 – ANTT – Fundo Real Mesa Censória, Caixa 508, documento 4703.
75 – Em seu livro, Jean Domat observa que “as regras de direito são expressões curtas e
claras e que exige a Justiça nos diversos casos...”. A forma com que José Pereira Ribeiro
compunha suas argumentações mostrava-se afinada com essa perspectiva. DOMAT, Jean.
As leis civis na sua ordem natural, 1689, apud GILISSEN. Introdução histórica ao direi-
to, p. 365.
76 – Arquivo da Universidade de Coimbra (AUC) - Actos e graus de estudantes da Uni-
versidade por Faculdade. Curso de Direito. José Pereira Ribeiro.
77 – Arquivo da Casa Setecentista de Mariana (ACSM)- 2 Ofício, Códice 211, Auto
5264.
78 – Era comum os agentes da Justiça darem audiência em suas residências, numa clara
mostra de confusão entre público e privado. Segundo Arno Wehling “a ideia de uma re-
partição pública distinta do local de residência somente se imporia no século XIX, com o
novo modelo de Estado e de administração. WEHLING, Arno; WEHLING, Maria José.
“O funcionário Colonial entre a sociedade e o rei”. In: PRIORE, Mary del. Revisão do
“Eu com ela escrevo [...] com quantas ordenações se podiam lembrar,
advertir, entender é bem parecer, e por isso mesmo para não ser ex-
tenso, a ela me reposto, afastando-me de toda antiqualha, opiniões de
D.D. suas questões de nome e pareceres indiscretos, com direitos ecle-
siásticos, pontifícios, constituições de certos bispados, menos polidos
sistemas, sustentados com as leis imperiais, porque neste reino se acha
autorizado e proibido pela citada lei de 18 de agosto de 1769.” 86
Referências Bibliográficas
ALBUQUERQUE, Rui; ALBUQUERQUE, Martim. História do direito
Português. 2.V. Lisboa: Faculdade de direito, 1983. MACHADO, Diogo Barbosa.
Bibliotheca lusitana. Lisboa: Biblioteca Nacional, 1998. CD-ROM.
ANASTASIA, Carla Maria Junho. A Lei da Boa Razão e o novo repertório da
ação coletiva nas Minas setecentista. Vária História, Belo Horizonte: Editora
UFMG, n.28, 2002.
ANASTASIA. Carla Maria Junho. Vassalos rebeldes: motins em Minas Gerais no
século XVIII. Vária História, Belo Horizonte: Editora UFMG, n.13, jun. 1994.
ANTUNES, Álvaro de Araújo. Fiat Justitia: os advogados e a prática da justiça
em Minas Gerais (1750-1808).Campinas, SP: Pós-graduação do Departamento
de História da Unicamp, 2005 (Tese, Doutorado em História).
AVELAR, Hélio de Alcântara. História Administrativa do Brasil: administração
pombalina. 2ª ed. Brasília: Fundação Centro de Formação do Servidor Público/
Editora UnB, 1983.
BLANCHÉ, Robert. História da lógica de Aristotéles a Bertrand Russel. São
Paulo: Martins Fontes, 1985.
Fontes Impressas
ALMEIDA, Candido Mendes de. Auxiliar jurídico: apêndice às Ordenações
Filipinas. 2.v. Rio de Janeiro, 1870. Edição fac-similada de Lisboa, Fundação
Calouste Gulbenkian, 1985.
TELLES, José Homem Correia. “Comentário Crítico à Lei da Boa Razão.” In:
ALMEIDA, Candido Mendes de. Auxiliar jurídico: apêndice às Ordenações
Filipinas. 2.v. Rio de Janeiro, 1870. Edição fac-similada de Lisboa, Fundação
Calouste Gulbenkian, 1985.
ORDENAÇÕES Filipinas. Coimbra: Fundação Calouste Gulbenkian, 1985.
VERNEY, Luís Antônio. Verdadeiro Método de estudar. 3ª ed. Porto: Domingos
Barreira, s/d.
COMPÊNDIO Histórico do Estado da Universidade de Coimbra (1771).
Coimbra: Universidade de Coimbra, 1972, p.11.
LEMOS, Francisco. Relação geral do estado da Universidade (1777). Atlântida
Editora, Coimbra, 1980.
MACHADO, Diogo Barbosa. Bibliotheca lusitana. Lisboa: Biblioteca Nacional,
1998. CD-ROM.
Fontes Manuscritas
Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT)
Fundo Real Mesa Censória, Caixa 508, Documento 4703.
Leis – Livro 9. Alvará por que V. Majestade há por bem reparar os estudos das
línguas latina, grega e hebraica e da Arte da Retórica da Ruína a que estavam
reduzidos.
Arquivo da Universidade de Coimbra (AUC)
Actos e graus de estudantes da Universidade por Faculdade. Curso de direito.
José Pereira Ribeiro.
Arquivo da Casa Setecentista de Mariana (ACSM)
2 Ofício, Códice 211, Auto 5264.
1 Ofício, Códice 383. Auto 8385.
2 Ofício, Códice 204, Auto 5102
1 Ofício, Códice 460, Auto 10100.
1 Ofício, Códice 383, Auto 8385.
Arquivo Histórico do Museu da Inconfidência Mineira – Casa Setecentista do
Pilar (AHMIM-CSP)
1 Ofício, Códice 235, Auto 3902.
1 Ofício, Códice 249, Auto 4286.
10 – Tradução livre do autor de: “La società e la cultura di antico regime continuano a
riconoscerci a lungo nell’idea di un cosmo armoniosamente ordinato, nell’idea di una
società che per gradi, distinzioni e dignità diverse si ordina ripetendo in se stessa la logica
diseguale della creazione.” In: COSTA, Pietro. Civitas: storia della citadinanza in Europa:
Dalla civiltà comunale al settecento. Roma/Bari: Laterza, 1999. p.66.
11 – Tradução livre do autor de: “La testa, che regge e governa il corpo físico, corrispon-
de al princeps, che presiede alla vita del corpo político; il cuore al senato; gli occhi e gli
orecchi ai giudici”. In: COSTA, Pietro. op. cit. p.9.
12 – Tradução livre do autor de: “esistevano poteri diversi e di differente gerarchia e am-
bito, dei quali non si poteva assolutamente dire che discendessero da una autorizzazione
“só devemos ter como rei o mais digno e honesto de todos. Porquanto
a honestidade só brilha em todo o seu fulgor quando a razão, a parte
mais nobre de nosso espírito, conseguir a supremacia e administrar
acertadamente o reino que a natureza lhe confiou. Assim procederá
quando, dentro da devida medida, reprime desatinos, refreia paixões,
modera afectos e deles se faz obedecer”.16 Diferencia aqui Osório o
soberano virtuoso do tirano, “aquêle que não atender a Deus, enjeitar
os ditames da razão, der guarida à impureza e ao prazer; o que violar
as leis divinas e humanas e recorrer ao dolo e à simulacro”. 17
Assim, para Osório seria tirano e não rei o Monarca que tolhesse
a liberdade de todos. O Monarca deve ser dotado de sabedoria divina
para saber da natureza e cultivar as virtudes, ser casto, manso, modesto
e grave, afinal “se o Príncipe houver determinado dotar a república de
bons costumes, ser-lhe-á necessário não tanto fazê-lo com ameaças e san-
ções legais, como, sobretudo, com notáveis exemplos de continência e de
O Rei justo deveria ser fiel, manso, liberal e zeloso, além de diligen-
te em seu governo. Em seu temperamento deveria ser discreto e come-
dido, corajoso e magnânimo. Para uma virtude perseverante, requer-se
morigeração e instrução adequada, incluindo Dialética, Retórica, Ma-
temática, História e Filosofia. E também o Soberano deverá sujeitar-se
às leis. Como diz Osório, ninguém pode ser bom timoneiro se não tiver
sido marinheiro durante muitos anos. Assim, destaca o império da Lei,
vista como dádiva da bondade divina, decretos de Sua sabedoria, pactos
sacrossantos da sociedade humana, às quais devem estar submetidos mes-
mo os reis, afinal,
“Elas reprimem a violência do mal; obstam a ciladas e fraudes; con-
têm as normas da honestidade; opõem-se ao mal e à torpeza e acabam
com os motivos de discórdias. Elas proporcionam os preparativos para
a guerra; constroem as bases da paz e da tranquilidade; servem de
apoio à estabilidade da república, e prendam-na com muitas riquezas
e enfeites. Portanto, quem se sujeitar às leis será escravo da sabedoria,
da honestidade, da imortalidade, do dever e da religião.” 23
crito pela justiça e pela lei”.24 Quando fala em leis, destaca não apenas as
escritas, mas também os costumes admitidos por todos.
30 – Tradução livre de: “autonomia come capacita di darsi un ordinamento, come es-
pressione delo slancio ‘costituente’ di um soggetto collettivo. Il libero pullulare di forme
associative, di cui la città comunale è l’espressione politicamente piu significativa.” In:
COSTA, Pietro, op. cit., p. 5.
31 – Tradução livre do autor de: “Il nesso forte che la cultura medievale e post-medievale
instaura fra soggetto e il ‘corpo’ político, fra l’individuo e la città non é destinato ad esau-
rirsi con il venir meno delle condizioni storiche che lo hanno generato: è un tema di fondo
del discorso della citadinanza, che non cessa di ricreare e riformulare, entro cordinate
culturali sempre diverse, il momento del legame vitale del soggetto con il corpo político.”
In: COSTA, Pietro, op. cit., p. XX.
32 – Tradução livre do autor de: “questa appartenenza non può essere descritta semplice-
mente ricorrendo agli elementi dell’ordine e della gerarchia. Nel rapporto di citadinanza
non si fronteggiano solo differenziate posizioni di potere: l’ente gerarchicamente supe-
riore è una grandezza collettiva il cui rapporto con il soggettto obbediente è un rapporto
di comando in quanto è anche um rapporto di inclusione.” In: COSTA, Pietro. op. cit., p.
20.
33 – Tradução livre do autor de: “Esiste non il soggetto, ma una molteplicità di condizioni
soggettive gerarchicamente connesse.” In: COSTA, Pietro, op. cit., p. 41.
34 – Tradução livre do autor de: “Tutti i cittadini sono egualmente sudditi del sovrano, ma
ciascuno dipende dal sovrano in ragione dello status al quale appartiene: il discorso della
cittadinanza e della sovranità e la teorica degli ordini si combinano perfettamente (...) La
relazione diretta con il sovrano è quella di un soggetto che, nella gerarchia degli status,
occupa quella posizione di ‘governatore della casa’ cui già tutto il discorso medievale
della cittadinanza si riferiva: status familiae e status libertatis (il cittadino è un suddito
libero) continuano a delimitare ‘dal basso’ l’ambito della cittadinanza.” COSTA, Pietro,
op. cit., p.77.
35 – HESPANHA, António Manuel. A política perdida. Curitiba: Juruá, 2009.
a g.t bastante para exercer os cargos da dita justiça que faz numero de
tres povos. F. pella ordenação ordena sua Magestade que avendo trinta
homens se eleja justiça e de mais de que conta que Vm. ce por duas
vezes procurou aos Cappitains mores das Cappitanias debayxo lhe
viessem criar justiça na dita povoação sendo que não era necessario
por ter avido ja justiça em algum tempo creada pello defunto Cappitão
mor Gabriel de Lara que levantou Pelourinho em nome do Donatário,
o Snr marquez de Cascaiz. Pelo que requeremos a Vm. ce da parte de
Deus e el-Rey que visto o que alegamos e o nosso pedir ser justo e
bem comum de todo este povo o mande ajuntar e fazer eleyção e criar
Justiça e Camara formada para que asim aja themor de Deus e del-Rey
e por as couzas em caminho.” 40
“Na forma da planta que ele deixa feita (sem passar para privados)
como não tem cal paredes de pedra e barro; faz uma descrição minu-
ciosa do edifício. Por fora ao menos 40 palmos de comprimento e 30
de largura; embaixo a cadeia com 20 por 13,5 (por conta da largura
das paredes) duas cadeias com duas janelas e acima dois cômodos
também: uma para as audiências e outra dentro para vereações. (...) A
casa do conselho se orne com cadeiras e bofete e a das audiências com
banca, e bancos para os officiaes e partes se sentarem: as enxovias
se proverão com troncos, grilhões, algemas e ferros necessários para
segurança dos presos.” 53
56 – Não por acaso, os processos sob a guarda do Arquivo Público do Paraná deste perí-
odo começam em 1711, quando da vinculação da Vila à Capitania de São Paulo. Embora
não existisse ainda um registro em ata das audiências dos juízes (o que também está
previsto nos Provimentos do ouvidor), os processos são instruídos e formalizados desde
a segunda década do século XVIII. Os registros começam a ser feitos a partir de um dos
Provimentos: “Proveo que os Juízes ordinários obriguem ao Tabalião tenha dous livros
encadernados igualmente, em hu dos cuais tomem os autos das querellas das pessoas que
se queixarem de alguns malefícios, e no outro livro se escreverão os ditos das testemunhas
que se perguntarem as taes querellas que ham de ser até quatro testemunhas, e que vulgar-
mente se chama somarios.” BOLETIM DO ARCHIVO MUNICIPAL DE CURYTIBA.
Documentos para a História do Paraná. Sob a direcção de Francisco Negrão. Volume VIII.
Provimentos e Correições (1721-1812). Curitiba: Impressora Paranaense, 1927, p. 29.
57 – BOLETIM DO ARCHIVO MUNICIPAL DE CURYTIBA. Documentos para a His-
tória do Paraná. Sob a direcção de Francisco Negrão. Volume VIII. Provimentos e Correi-
ções (1721-1812). Curitiba: Impressora Paranaense, 1927, p. 14.
Apesar dos conflitos, a maior parte dos casos era decidida em comum
acordo e tendo em vista os interesses tanto locais quanto metropolitanos.
Embora rara seja a aplicação da lei portuguesa, em particular na primeira
instância do juiz ordinário, o sentido das decisões, mesmo com base nos
costumes ou em outras fontes, garantia as pretensões reinóis no local.
Referências Bibliográficas
ABREU, Capistrano de. Capítulos de História Colonial. Brasília: Editora da
Universidade, 1963.
BICALHO, Maria Fernanda Baptista. As câmaras ultramarinas e o governo do
Império. In: FRAGOSO, João (org.) O antigo regime nos trópicos; a dinâmica
imperial portuguesa (séculos XVI - XVIII). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2001, (189-222).
BEJA, António de. Breve doutrina e ensinança de Príncipes. Lisboa, 1525.
Resumo: Abstract:
Indicando as opções políticas disponíveis para By indicating the political options available to
a elite dos letrados portugueses no final do sé- the elite of Portuguese scholars at the end of
culo XVIII, bem como o que podia ser dito e the Eighteenth century, as well as what could be
convinha ser dito no ensino coimbrão do “Di- said and how convenient that would be for the
reito Pátrio”, a linguagem e os posicionamentos studies of the country’s Law at the University of
das “Preleções” de R.R. Nogueira legitimavam Coimbra, the language and the postures of R. R.
a expansão da atividade legislativa real e a Nogueira’s “Prelecções” authenticated the ex-
submissão do meio jurídico às leis do Absolu- pansion of the monarchy’s legal activity and the
tismo Reformador. Os conceitos de “polícia” e submission of the legal area to the laws of the
“economia” tendiam a marcar esferas em que o Reformative Absolute Power. The concepts of
monarca, implicitamente equiparado ao pai de “police” and “economy” tended to determine
família no gerir da “grande casa” do reino, po- the fields in which the monarch – implicitly seen
deria regular, ordenar e impor condutas, sem os as the paternal figure reigning over the king-
bloqueios que a tradição jurídica havia, desde a dom’s “large house” – could rule, ordain and
Idade Média, imposto na prática aos reis. impose behaviors without the blockade that the
legal tradition had imposed to the Kings’ prac-
tices since the Middle Ages.
3 – Cf., entre outros, Macedo, Elogio historico..., pp. 11-12, 14-15, 17 e 22; “Prefacio
do Editor” a Nogueira, Prelecções..., pp. III-IV; Innocencio Francisco da Silva, Dic-
cionario bibliographico portuguez, Lisboa, Imprensa Nacional, 1862, v. 7, p. 162;
Rodrigues, Memoria..., p. 213.
4 – Anteriormente fora Lente Substituto de Direito Pátrio em diversos períodos (1782-
1784, 1786 e 1789) e catedrático de Instituta (1790-1795). Cf. Merêa, “Notas sobre alguns
lentes...”, p. 323; e Rodrigues, Memoria..., p. 123.
5 – Cf., entre outros, Macedo, Elogio historico..., pp. 26, 28, 30 e 40-1; “Prefacio do
Editor” a Nogueira, Prelecções..., p. IV; Silva, Diccionario bibliographico..., p. 162.
6 – Para uma comparação com a análoga corrente que existia na Espanha, cf., entre
outros, Francisco Tomás y Valiente, Manual de Historia del Derecho Español, Madrid,
Tecnos, 1996, pp. 383-4 e Charles C. Noel, “Charles III of Spain”, in: H. M. Scott (org.),
Enlightened Absolutism, 4ª ed., Houndmills/London, Macmillan, 1994, pp. 119-143,
p.125, 128-130, 143, em especial.
7 – Cf. F. A. L. Vaz, “A difusão das idéias econômicas de Antonio Genovesi em Portu-
gal”, Cultura, v. 11, 1999, pp. 563-567, p. 567.
8 – Cf., por exemplo, Nogueira, Apontamentos..., f. 166, 174 e 177, assim como Noguei-
ra, Prelecções..., pp. 135 e 137.
da cidade nos aspectos que mais afetavam seu dia a dia (conservação de
ruas, abastecimento de água, limpeza urbana, prevenção de incêndios,
controle de pesos e medidas no comércio, etc.).
37 – Sobre o tema, além das obras acima indicadas e dos estudos de A. M. Hespanha, cf.
Daniela Frigo, “Disciplina rei familiariae”, Penélope, nº 6, 1991, pp. 47-62.
40 – Cf. Seelaender, Polizei..., p. 72. Embora o jurista lusitano faça referência a uma
edição vienense de 1777, é mais provável que tenha usado uma tradução italiana (Milão,
1784).
41 – Cf. a chamada “Lei da Boa Razão” de 18/8/1769, em especial o § 9º, conforme
transcrita em José H. Corrêa Telles, “Commentario crítico à Lei da Boa Razão”, in: Can-
dido Mendes de Almeida, Auxiliar jurídico [1870], reimpressão, Rio de Janeiro / Lisboa,
Gulbenkian, 1985, pp. 443-478, p. 454.
42 – Sobre a necessidade de integrar “em um sistema” tanto o direito vindo do passado
quanto as numerosas leis novas no âmbito da “Industria, Policia, [...] etc.”, cf. as observa-
ções do jurista e estadista Tomás Antônio Villanova Portugal em Almeida, Auxiliar..., v. 1,
p. XXIX.
43 – Concluída por volta de 1795/1796, a obra somente foi publicada em 1858 pela Uni-
pombalina, 2ª ed., São Paulo, Ática 1993, p. 78 (n. 218); Fernando A. Novais, Portugal e
Brasil na crise do antigo sistema colonial, 6ª ed., São Paulo, Hucitec, 1995, pp. 229-30; e
sobretudo Vaz, “A difusão das ideias...”, pp. 553-4 e 561ss. Quanto à maneira de Nogueira
lidar com as ideias de Genovesi, cf., além da tradução supracitada, Vaz, “A difusão das
ideias...”, p. 563ss.
47 – Nogueira, Apontamentos..., f. 168v, grifo nosso, e 174v. O mesmo ideal de maximi-
zação das bases do poderio estatal pode ser encontrado tanto em Genovesi quanto nos
tratados de polícia disponíveis na Biblioteca da Universidade de Coimbra. Ver Antonio
Genovesi, Lições de economia civil e politica traduzidas..., s/d, trad. de Ricardo Raymun-
do Nogueira, Biblioteca Nacional de Portugal, Manuscrito, códice 2168, f. 1 e Johann
Heinrich Gottlob von Justi, “Préface”, in: Élémens généraux de police [Grundsätze der
Policeywissenschaft, 1756], Paris, Benoît Rozet, 1769, p. 3: “aumenter ses forces & sa
puissance autant qu’il en est capable”.
48 – Nogueira, Prelecções..., p. 121. A Economia Civil ensinava, no ver do autor, “noço-
ens geraes do que he util, ou prejudicial ao bem do Estado”. Já o que era justo ou injusto,
isso competia ao Direito Natural definir. Ver Nogueira, Apontamentos..., f. 168v e 173v,
sobretudo.
49 – Cf. Nogueira, Apontamentos..., f. 174 e Prelecções..., p. 136. Essa ideia de instru-
mentalidade do econômico correspondia, aliás, a uma das principais tendências do discur-
so mercantilista. Cf. Eli F. Heckscher, La época mercantilista, México, Fondo de Cultura
Económica, 1983, pp. 9, 463ss, 466, em especial.
pelos “escriptores de economia”. Um conceito alternativo mais amplo, contudo, não chega
a ser mencionado nas Prelecções... (cf. p. 152). Ver também Nogueira, Apontamentos..., f.
174-174v. Também nesse ponto, não se deve excluir a possível influência de Genovesi.
54 – Nogueira, Prelecções..., pp. 121-2.
55 – Ao lado da finalidade policial da segurança – o combate à “vida livre e licenciosa”
geradora de “homens viciosos” tendentes ao crime – havia aqui uma outra finalidade,
esta meramente econômica: “fomentar a industria” das classes baixas procedendo “contra
os vadios e mendigos”. Cf. Nogueira, Prelecções..., p. 153. Ver ainda pp. 152 e 155 (em
exame conjunto), como também pp. 152-7, além de Genovesi, “Lições de Economia Civil
e Politica Traduzidas...”, f. 304.
56 – Cf., respectivamente, Nogueira, Prelecções..., p. 10 (n. 1) e p. 134.
Estado; dentro desta “machina” devia a Justiça, a rigor, exercer uma fun-
ção meramente instrumental60.
62 – Nogueira, Prelecções..., p. 155. Ver ainda pp. 146 e 155-8. Citações extraídas da
p. 156, onde também encontramos uma singela exposição do conteúdo das Ordenações
Filipinas [1603]..., v. 1, pp. 104-5 (I, LVIII, 17). Também descrevendo as posturas como
“Acórdãos”, cf. Correa da Silva, Prelecções..., v. 2, f. 71. Talvez possamos ver, nesses ter-
mos sobrepostos, uma marca da transição de Satzung para Gebot, na tipologia de Wilhelm
Ebel, Geschichte der Gesetzgebung in Deutschland, Göttingen, O. Schwartz, 1988. Para
a atitude dos corregedores quanto às posturas, cf., por exemplo, Nogueira, Prelecções...,
pp. 135ss e 152-158. Uma relativização dos aspectos formais de certos tipos de lei pode,
aliás, ser encontrada em Nogueira, Prelecções..., pp. 109-110 e 112-3.
63 – Ver, e.g., Nogueira, Prelecções..., p. 191; e Nogueira, Apontamentos..., f. 185, que
versa sobre a “cola” no âmbito da educação universitária.
64 – Cf., e.g., o Decreto de 4/11/1755 e o Alvará de 25/6/1760 , in: Appendix das Leys Ex-
travagantes, Decretos e Avisos, Lisboa, Mosteiro de São Vicente de Fora, 1760, pp. 387 e
309 (n. 19), respectivamente; além do Alvará de 15/1/1780, in: António Delgado da Silva,
Collecção da legislação portugueza, Lisboa, Typ. Maigrense, 1828, pp. 255-6. Ver ainda
Nogueira, Prelecções..., p. 140. Sobre o “processo de polícia” no Antigo Regime, com
o registro de posições discordantes sobre a funcionalidade deste conceito, ver A. C. L.
Seelaender, “A Polícia e as funções do Estado”, Revista da Faculdade de Direito UFPR,
v. 49, 2009, pp. 73-88, p. 79, e T. Simon, Gute Policey....
65 – Cf. Nogueira, Apontamentos..., f. 175. Tal entendimento correspondia, também, à
crença do autor, de que os “textos” do direito vigente continham “decisoens e não princi-
pios” (ibidem).
66 – Cf. Nogueira, Apontamentos..., f. 171 e 181-2. Neutralizava-se, nesse contexto, o
potencial crítico da ideia de que o Direito Natural esclarecia o que o legislador “podia
fazer”. Ver Nogueira, Apontamentos..., f. 169.
Resumo: Abstract:
Este artigo tem por objetivo reconstituir a tra- The objective of this paper is to reconstitute the
jetória e o pensamento do doutor Marcelino trajectory and the thoughts of Dr. Marcelino
Pereira Cleto, magistrado régio que atuou como Pereira Cleto, royal magistrate who acted as
juiz de fora de Santos (1779-1787), ouvidor do itinerant judge in Santos (1779-1787), as om-
Rio de Janeiro (1787-1791), escrivão da devas- budsman in Rio de Janeiro (1778-1791), as
sa fluminense sobre a Inconfidência Mineira notary for the Rio de Janeiro inquiry on the In-
(1789-1790) e desembargador da Relação da confidencia Mineira2 (1789-1790) and as judge
Bahia (1791-1794). Através da concatenação of the Court of Appeals at the Relação da Bahia3
de sua atuação administrativa e dos escritos que (1791-1794). Through the linkage of his admin-
deixou – especialmente os atinentes à história istrative action and his writings – especially
de São Paulo e à jurisdição eclesiástica no Bra- those concerning the history of São Paulo and
sil –, busca-se sugerir que, embora nascido em the ecclesiastical jurisdiction in Brazil – this
Portugal, Pereira Cleto absorveu concepções paper suggests that, though born in Portugal,
nativistas emergentes no período em que viveu Pereira Cleto absorbed the native concepts that
na América. emerged during the period he lived in America.
Palavras-chave: Marcelino Pereira Cleto; Amé- Keywords: Marcelino Pereira Cleto – Portu-
rica portuguesa; administração; historiografia. guese America – Administration – History writ-
ings.
Papéis do Brasil
A renovação dos estudos relativos à história política da América por-
tuguesa, beneficiada pelo contato mais arraigado, nas últimas décadas,
com a historiografia e os arquivos lusos, resultou em abordagens varia-
das, dentre as quais pode ser destacada a que privilegia a reconstituição
de trajetórias individuais de autoridades. Tal perspectiva coaduna-se, cer-
1 – Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo (USP). Professor Adjunto
da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). Bolsista de Produtividade em Pesquisa 2
pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Agradeço
à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) pelo financia-
mento de pesquisas decisivas para a confecção deste artigo. Agradeço às colegas Andréa
Lisly Gonçalves e Maria Eliza de Campos Souza por prestimosas informações, bem como
a Ronald Raminelli e seus orientandos por terem debatido este artigo e proposto sugestões
fundamentais.
2 –1Patriotic movement against the Portuguese domination in Brazil.
3 –1The Bahia Court of Law.
4 – Cf. Stuart Schwartz. Burocracia e sociedade no Brasil colonial. Trad., São Paulo:
Perspectiva, 1979; Arno Wehling & Maria José Wehling. Direito e justiça no Brasil colo-
nial. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. José Subtil. O desembargo do Paço. Lisboa: UAL,
1996; Nuno Gonçalo Monteiro, Pedro Cardim & Mafalda Soares da Cunha (org.). Optma
pars. Elites ibero-americanas no Antigo Regime. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais,
Instituto de Ciências Sociais, 2005. Luciano Raposo de Almeida Figueiredo. “Rapsódia
para um bacharel”. In: Luciano Raposo de Almeida Figueiredo & Maria Verônica Campos
(coord.). Códice Costa Matoso. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 1999, pp. 37-
154. Caio César Boschi. “Textos introdutórios”. In: José João Teixeira Coelho. Instrução
para o governo da Capitania de Minas Gerais (1782). Belo Horizonte: Arquivo Público
Mineiro, 2007, pp. 21-150.
5 – A Dissertação, datada de 25 de outubro de 1782, foi inicialmente publicada no núme-
ro XXI dos Anais da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, em 1899, pp. 193-254. Em
1977, foi novamente editada, compondo, com outros três trabalhos, o primeiro volume
da Coleção Paulística, sob o título Roteiros e notícias de São Paulo colonial (pp. 11-52).
Enquanto a primeira publicação procurou preservar a grafia original, a segunda, aparen-
temente retirada da anterior, efetuou uma atualização por vezes problemática e deixou
de inserir as notas feitas pelo próprio Pereira Cleto. Por isso, as citações da Dissertação
neste artigo tomarão como base a edição dos Anais. As atualizações das referências aqui
citadas, tanto de grafia quanto de pontuação, são responsabilidade do autor.
9 – Idem.
10 – Idem.
11 – ANTT. Desembargo do Paço. Consultas sobre propostas de nomeações para lugares
de justiça. Maço 1913.
12 – ANTT. Registro Geral de Mercês de D. Maria I. Livro 2, folhas 248 e 248v. Chance-
laria de D. Maria I. Livro 11, folha 208; livro 83, folha 366; livro 80, folha 52v.
Nativismo18
Se Cleto percebeu logo a necessidade de se formular um novo mo-
delo de desenvolvimento para a capitania vicentina, ancorado na redu-
ção dos gastos militares – aparentemente menos vitais após a assinatura
do Tratado de Santo Ildefonso, em 1777 – e no incentivo à agricultura,
também não lhe escapou a cristalização de um discurso nativista, expres-
so, por exemplo, na lembrança da Guerra dos Emboabas e nos trabalhos
16 – ANTT. Fundo Conde das Galveas / Condes de Povolide. Arquivo da Casa dos Condes
das Galveias. Maço 12 (pare 1 e 2). Atestações passadas pelo capitão-general. Minutas.
Uma vez que o fundo de onde foi extraída a certidão consiste de documentação privada de
Martim Lopes Lobo de Saldanha, ela se apresenta sob a forma de rascunho.
17 – ANTT. Fundo Conde das Galveas / Condes de Povolide. Arquivo da Casa dos Con-
des das Galveias. Maço 12 (pare 1 e 2). Correspondência das Câmaras dos Municípios.
Atestações passadas a favor de Martim Lopes Lobo de Saldanha.
18 – Infelizmente, não é possível, apesar de sua importância para os argumentos deste
artigo, desenvolver aqui uma discussão sobre o conceito de nativismo. Registre-se, con-
tudo, que ele não é concebido como forma pré-nacionalista, nem reduzido à expressão de
sentimentos, por parte dos colonos, contrários ao colonizador e em defesa de interesses e
costumes locais ameaçados. Este último sentido existiu durante a colonização da América
portuguesa, mas não esgota a discussão. É preciso, na verdade, pensar em nativismos,
cujos significados variam no tempo e no espaço. Sendo assim, o termo nativismo é en-
tendido neste artigo como sinônimo de valorização e reconhecimento da pequena pátria.
Na segunda metade do século XVIII, especialmente após as reformas pombalinas, era
possível pensar as relações entre os interesses de colonizadores e colonizados tanto em
termos de contradição como em termos de articulação. A apropriação nativista de Marce-
lino Pereira Cleto, nesse contexto, compõe os esforços de uma gama de magistrados lusos
no sentido de reconhecer e valorizar algumas dessas pátrias coloniais com o intuito de
inseri-las num modelo mais amplo de império. Nesse sentido, tais esforços fizeram parte
da tentativa de se elaborar um projeto de império luso-brasileiro, já gestado no pombalis-
mo e depois sistematizado com d. Rodrigo de Sousa Coutinho. Esse projeto, no entanto,
tem de ser compreendido pelo que foi: uma proposta política que, por fim, acabou arras-
tada pelas contradições do tempo.
Muito mais provável foi o contato com frei Gaspar, seja porque o
beneditino viveu na Vila de Santos boa parte dos dez anos em que o dou-
tor Marcelino nela serviu, seja por ter este compilado, conforme se disse
acima, trabalhos daquele. A esse respeito, não parece excessivo apontar a
19 – Laura de Mello e Souza. “São Paulo dos vícios e das virtudes”. In: O sol e a sombra.
São Paulo: Companhia das Letras, 2006, pp. 109-47.
20 – Cf. Pedro Taques de Almeida Pais Leme. Informação sobre as minas de S. Paulo. A
expulsão dos jesuítas do Colégio de S. Paulo. São Paulo: Cia. Melhoramentos de S. Paulo,
s.d.; História da Capitania de São Vicente. Brasília: Senado Federal, 2004. Frei Gaspar da
Madre de Deus. Memórias para a história da Capitania de S. Vicente, hoje chamada de
S. Paulo. São Paulo: Martins Fontes, s.d.
21 – Mencione-se que o subtítulo da História da Capitania de São Vicente era precisa-
mente o seguinte: “Demonstração verídica e cronológica dos donatários da Capitania de
S. Vicente, concedida a Martim Afonso de Sousa, primeiro donatário dela, desde o ano de
1581 até o de 1624, em que sua neta, a exma condessa de Vimieiro d. Mariana de Sousa da
Guerra, foi repelida da Vila de S. Vicente, capital da dita Capitania, e das Vilas de Santos e
S. Paulo, pelo exmo conde de Monsanto d. Álvaro Pires de Castro”. Sobre a vida e a obra
de Pedro Taques, cf. Afonso de E. Taunay. “Pedro Taques e a sua obra”. In: Pedro Taques
de Almeida Pais Leme. Informação sobre as minas. Op. cit., pp. 5-64; e “Pedro Taques de
Almeida Pais Leme (1714-1777). Escorço biográfico”. In: Pedro Taques de Almeida Pais
Leme. História da Capitania de São Vicente. Op. cit., pp. 15-61.
24 – Marcelino Pereira Cleto. Dissertação. Op. cit., pp. 211-2. Como lembra Afonso de
Taunay, em “Pedro Taques e sua obra”, op. cit., p. 45, para o linhagista “viviam os seus
contemporâneos ‘amortecidos na ignorância de seus nobres progenitores e das suas hon-
rosas virtudes e ações’, muitos dos quais ‘já degenerados do mesmo esplendor dos seus
antigos ascendentes’”. Como consequência disso, “notava-se ‘nas assembléias de todas
as vilas e cidade capital de S. Paulo’ não mais se elegerem, como outrora, para oficiais
das câmaras ‘homens de maior honra, zelo e desinteresse, lamentando-se esta infeliz de-
cadência em todo o Estado do Brasil, onde já não se escolhiam os sujeitos da primeira
graduação para ornarem os corpos dos senados, à imitação dos séculos de 1500 a 1700”.
25 – Marcelino Pereira Cleto. Dissertação. Op. cit., pp. 211-2.
Parte da resposta a essa dúvida está no fato de que, para muitos dos
homens e mulheres da época, não havia contradição entre os dois fenôme-
nos. Taques e Madre de Deus, aliás, sempre se declararam fiéis vassalos
de Sua Majestade. Ademais, a busca de inserção no mercado internacional
fora um problema crucial na história de São Paulo, dividida entre certa
autonomia e o risco da pobreza. Em poucas palavras, não era difícil para
letrados como Cleto pensarem num sistema imperial no qual as diversas
partes se articulassem e, em certa medida, se harmonizassem. Do vocabu-
lário do doutor Marcelino, como demonstra o trecho citado acima, fazia
parte o termo sistema, cujo significado implicava o conjunto de estraté-
gias políticas e econômicas voltadas ao desenvolvimento de uma região.
No caso, o sistema que privilegiou o povoamento do Sertão deveria ser
substituído pelo que privilegiava o da Marinha. Na concepção de Pereira
“Estas minas, visto que estes gêneros nos vêm de fora, [quando] ad-
ministrados não pela Fazenda Real, mas dadas por determinado tempo
a particular, a quem a Fazenda Real emprestasse dinheiro, e ainda
escravos dos muitos que há na Capitania, que foram dos extintos jesu-
ítas, para o estabelecimento, também por tempo certo, seriam de uma
grandíssima utilidade à Fazenda Real, e concorriam para o aumen-
to das povoações que estivessem naquela vizinhança, não só porque
o trabalho de semelhantes minas havia de trazer àquele lugar muita
gente além dos que haviam de concorrer para a compra, mas também
porque os que estão estabelecidos em agricultura haviam de ter me-
lhor saída aos seus efeitos, e, por consequência, se animariam mais a
trabalhar32.”
34 – Cf. José João Teixeira Coelho. “Catálogo de algumas determinações reais que devem
saber os governadores”. In: Instrução para o governo da Capitania de Minas Gerais
(1782). Op. cit., pp. 207-13. Coleção sumária e as próprias leis, cartas régias, avisos e
ordens que se acharam nos livros da Secretaria do Governo desta Capitania de Minas
Gerais, reduzidas por ordem a títulos separados. Belo Horizonte: Arquivo Público Minei-
ro, 2010. A referência ao repertório de Baltazar da Silva Lisboa, assim como à sua autoria,
encontra-se no Catálogo da Exposição de História do Brasil. Brasília: Editora Universi-
dade de Brasília, 1981, tomo I, p. 525. O título completo do trabalho é o que segue: “Co-
leção cronológica e analítica em que se compreendem recapituladas todas as providências
administrativas, políticas e econômicas que se expediram ao vice-rei e capitão-general do
Estado do Brasil por especial mandado e ordem do príncipe regente nosso senhor, desde
14 de setembro de 1796 até 20 de maio de 1800”.
35 – ANTT. Papéis do Brasil. Códice 10, p. 187v. Nos comentários introdutórios à Co-
leção sumária, Caio C. Boschi explica que a ordem de 1754, a ser remetida aos diversos
governos das conquistas, tinha como desígnio que o desembargador da Relação do Porto
Inácio Barbosa Machado elaborasse uma “coleção das leis e ordens expedidas para os do-
mínios ultramarinos”. Caio C. Boschi. “Para conservar os povos em sossego”. In: Coleção
sumária. Op. cit., p. 27.
43 – Sobre o regimento dos ouvidores do Rio de Janeiro, cf. Maria Eliza de Campos
Souza. Ouvidorias de comarcas, legislação e estrutura. Varia Historia. Belo Horizonte:
Departamento de História, UFMG, n. 21, 1999, pp. 206-19.
44 – AHU – RJ. Caixa 149, documento 74 e 75. 22 de julho de 1791. “Consulta do Con-
selho Ultramarino à rainha [D. Maria I], sobre o requerimento do ouvidor da Comarca do
Rio de Janeiro, Marcelino Pereira Cleto, solicitando provisão que declare que aos ouvido-
res da comarca toca a jurisdição de deliberarem como ação nova dentro das cinco léguas
a que foram restritos pela carta régia de 10 de Dezembro de 1701”.
Sendo assim, mesmo que por via indireta, Marcelino Pereira Cleto
via-se novamente, agora no Rio de Janeiro, próximo do ponto de vista de
grupos dirigentes locais. Salvaguardadas as diferenças nos propósitos, as-
sim como o paulista frei Gaspar da Madre de Deus acabaria, em 1797, por
publicar suas Memórias para a história da Capitania de S. Vicente sob
os auspícios da Academia Real de Ciências de Lisboa, Azeredo Coutinho
47 – Cf. Afonso Carlos Marques dos Santos. No rascunho da nação. Rio de Janeiro: De-
partamento Geral de Documentação e Informação Cultural, 1992, em especial a seção
“Na Corte da América portuguesa”, pp. 119-.27. Maria Fernanda Bicalho. A cidade e o
Império. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003; e Nireu Cavalcanti. O Rio de Janei-
ro setecentista. Rio de Janeiro: Zahar, 2004.
48 – Sobre os conflitos do juiz de fora Baltazar da Silva Lisboa, cf. Afonso Carlos Mar-
ques dos Santos. No rascunho da nação. Op. cit., em especial a seção “O anonimato e o
medo”, pp. 31-51; e Ronald Raminelli. Viagens ultramarinas. São Paulo: Alameda, 2008,
em especial o capítulo “Naturalistas em apuros”, pp. 177-212.
49 – Sobre a trajetória de Azeredo Coutinho, cf. Sérgio Buarque de Holanda. “Apresenta-
ção”. In: Obras econômicas de J. J. da Cunha Azeredo Coutinho. São Paulo: Companhia
Editora Nacional, 1966, pp. 13-53.
51 – AHU – RJ. Caixa 166, documento 58. 29 de agosto de 1797. “Auto de justificação
dos serviços do sargento-mor Francisco Pereira da Silva, despachado pelo [juiz privativo
das justificações dos serviços militares], desembargador e chanceler da Relação do Rio de
Janeiro, Antônio Dinis da Cruz e Silva”.
52 – Autos de correições dos ouvidores do Rio de Janeiro (1748-1820). Rio de Janeiro:
Arquivo do Distrito Federal, 1931, pp. 83-85. Infelizmente, não foram encontradas refe-
rências a correições dos anos de 1789 e 1790.
53 – Idem, pp. 71-82.
57 – AHU – RJ. Caixa 144, documento 17. 11 de agosto de 1789. “Ofício do [juiz de
Fora do Rio de Janeiro], Baltazar da Silva Lisboa, ao [secretário de estado da Marinha e
Ultramar, Martinho de Melo e Castro], sobre os trabalhos que tem feito na área de Histó-
ria Natural, sendo os resultados sempre remetidos para o Reino da forma já estabelecida;
queixando-se das descomposturas feitas pelos ministros da Relação do Rio de Janeiro à
sua pessoa no que diz respeito ao envio do material juntado nas suas viagens”.
58 – Autos de correições dos ouvidores do Rio de Janeiro (1748-1820). Op. cit., p. 85.
59 – Cf. Noronha Santos. Fontes e chafarizes do Rio de Janeiro. Revista do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional. Rio de Janeiro, n. 10, 1946, nota, 29, p. 27.
Abusos eclesiásticos
Quando de sua posse como ouvidor do Rio de Janeiro, Cleto traba-
lhava num outro escrito, cujo tema envolvia os complexos embates sobre
a jurisdição eclesiástica no Brasil. O contexto em que escrevia sobre tal
assunto mostrava-se espinhoso na medida em que, aos recorrentes abusos
de clérigos na cobrança de seus serviços – cujas queixas haviam se acu-
mulado na América por todo o século XVIII –, somavam-se as críticas de
inspiração pombalina. Como indicou Afonso Carlos Marques dos San-
tos, os senhores Silva Alvarenga e João Marques Pinto, respectivamente
professores régios de Retórica e Grego na Cidade do Rio de Janeiro, re-
meteram a Martinho de Melo e Castro, pelo menos desde o ano de 1787,
algumas representações em que acusavam os frades de São Bento e de
Santo Antônio de lhes usurparem os estudantes e de reintroduzirem, em
prejuízo das determinações reais, o ensino praticado pelos jesuítas69. Na
devassa aberta em 1794, o jovem bacharel Mariano José Pereira atribuiu
sua prisão à vingança do franciscano Raimundo Penaforte, membro do
Colégio de Santo Antônio que, dois anos antes, havia assistido aos úl-
timos momentos dos inconfidentes. Por detrás do conflito, achava-se a
obra do padre Antônio Pereira de Figueiredo, Tentativa teológica, na qual
se propunham teses próximas ao regalismo e ao episcopalismo70. Tendo
Pombal expulsado os jesuítas em 1759, opondo-se ainda ao molinismo e
ao misticismo da Jacobéia – a ponto de, em 1768, levar o bispo de Coim-
bra ao cárcere –, restara, nas décadas seguintes, após a Viradeira, uma
virulenta disputa que não excluiu a América. A irritação de frei Raimundo
ocorrera porque Mariano José Pereira, não podendo suportar a crítica do
dito frade ao marquês de Pombal, inserida numa tradução que o religioso
69 – “Representação dos professores régios de Humanidades da Cidade do Rio de Janeiro
à rainha dona Maria I. Rio de Janeiro, 15 de janeiro de 1787”; “Representação dos profes-
sores régios de Humanidades do Rio de Janeiro, dirigida à rainha dona Maria I, em 28 de
março de1793”. In: Afonso Carlos Marques dos Santos. No rascunho da nação. Op. cit.,
pp. 160-5 e 166-70.
70 – Antônio Pereira. Tentativa teológica em que se pretende mostrar que, impedido o
recurso à Sé Apostólica, se devolve aos senhores bispos a faculdade de dispensar nos
impedimentos públicos do matrimônio e de prover espiritualmente em todos os mais casos
reservados ao papa, todas as vezes que assim o pedir a pública e urgente necessidade dos
súditos. Lisboa: Oficina de Miguel Rodrigues, 1766.
“que SMaj use das cautelas e providências mais próprias para que,
nos empregos que podem ter influência nos povos, haja pessoas de
inteira fidelidade, porque geralmente o caráter dos brasileiros é terem
oposição aos vassalos de SMaj europeus, porque se persuadem que os
nacionais do país têm mais talento e são mais dignos de governarem,
e que os europeus lhe[s] levam a riqueza que são devidas aos filhos
deste continente, e que eles desejam insaciavelmente para sustentar o
luxo e vaidade que entre eles é sem limite77.”
Foi, enfim, nesse contexto que Marcelino Pereira Cleto elaborou seu
escrito sobre a jurisdição eclesiástica no Brasil e, algum tempo depois,
dirigiu-de às Minas com o intuito de apurar a Inconfidência. O texto en-
volvendo a atuação da Igreja na América certamente compôs um circuito
mais amplo. No caso da Capitania de Minas Gerais, desde o início da
ocupação do território, o problema dos valores a serem pagos aos cléri-
4 de março de 1790”. In; Afonso Carlos Marques dos Santos. Op. cit., p. 155. Em poema
intitulado “Obra feita aos senhores de Portugal”, atribuído ao coronel José Aires Gomes,
um dos implicados na Inconfidência Mineira, os xingamentos ao estilo dos citados pelo
missivista abundavam: “Marotos, cães, labregos, malcriados, porcos, / baixos, patifes,
presumidos, piratas no furtar / enfurecidos, piolhentos, sebosos, cusbriados. // Atende que
do Reino vens perdido / a chorar no Brasil os teus pecados. / E tanto que da sabugem o cu
cá limpam, / começam a largar com mãos largas, / sem se lembrar dos seus antigos estados
vis”. Autos de devassa da Inconfidência Mineira. Op. cit., v. 3, 1977, p. 417.
77 – [Carta de Sebastião Xavier de Vasconcelos Coutinho a Martinho de Melo e Castro,
em 30 de maio de 1791]. In: Anuário do Museu da Inconfidência. Ouro Preto/MG: Dire-
toria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, ano II, 1953, p. 210.
78 – Cf. Caio C. Boschi. Os leigos e o poder. São Paulo: Ática, 1986; Dom Oscar de Oli-
veira. Os dízimos eclesiásticos do Brasil. Belo Horizonte: Universidade de Minas Gerais,
1964.
79 – Luciano Raposo de Almeida Figueiredo & Maria Verônica Campos (coord.). Códice
Costa Matoso. Op. cit., pp. 660-764.
80 – Luciano Raposo de Almeida Figueiredo. “Rapsódia para um bacharel”. Op. cit., p.
91.
81 – José João Teixeira Coelho. Instrução para o governo da Capitania de Minas Gerais
(1782). Op. cit., p. 224.
82 – Idem, p. 224.
83 – Idem, p. 225.
84 – Instrução para o visconde de Barbacena. Anuário do Museu da Inconfidência. Ouro
Preto/MG: Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, ano II, 1953, p. 118.
85 – Idem, p. 118.
86 – Cf. Autos de devassa da Inconfidência Mineira. Op. cit., v 8, 1977, nota 1, p. 107.
93 – Sobre esse ponto, afirma Luciano Figueiredo: “Assim, parece indiscutível que, à
custa de todo o desgaste que representou, Caetano da Costa Matoso foi o artífice que
concluiu a obra de conquista da jurisdição pelo Poder Real. A legislação produzida du-
rante sua atuação e nos anos imediatamente seguintes regulando a presença régia sobre a
jurisdição eclesiástica em inúmeras esferas é prova suficiente disto”. “Rapsódia para um
bacharel”. Op. cit., p. 88. A carta de Pereira Cleto, todavia, sugere que tal conclusão deve
ser relativizada.
94 – ANTT. Papéis do Brasil. Códice 1, p. 56v.
95 – A substância dos receios de Pereira Cleto apareceu também em Costa Matoso, que,
no início de sua atuação em Vila Rica, em conta remetida ao Conselho Ultramarino, diz
ter decidido de início “não inovar em coisa alguma”, temendo a reedição dos conflitos
jurisdicionais experimentados por seu antecessor, “de que se seguiram tão perniciosas
consequências, e talvez a morte daquele reto ministro pela defesa da jurisdição de Sua
Majestade”. Apud. Luciano Figueiredo. Op. cit., p. 85. Como ocorreria com Baltazar da
Silva Lisboa no Rio de Janeiro dos anos de 1790, Matoso também não cumpriu a promes-
sa, pagando alto preço por isso.
96 – ANTT. Papéis do Brasil. Códice 1, p. 56v.
com base nos costumes da América e no exame das ordens expedidas via
Mesa da Consiência e Conselho Ultramarino102.
Inconfidência
Em que pese a possível inocuidade da solução indicada por Mar-
celino Pereira Cleto na análise que fez sobre os excessos eclesiásticos,
sua carta, quando cotejada com a representação em defesa do direito dos
ouvidores de conhecerem ações novas, demonstra o grau de belicosidade
vivenciada no jogo de poder, no Rio de Janeiro. O desânimo de Cleto
com o desempenho de ministros da Relação era, de fato, acentuado, sen-
do pautado pelo medo de ver-se abatido. Sobre essa ameaça, teve e teria
à disposição o exemplo do colega Baltazar da Silva Lisboa, com quem
provavelmente manteve boas relações. Se, em 1791, o juiz de fora do
Rio de Janeiro requeria sua substituição, queixando-se que suas sentenças
não eram cumpridas por serem todos os negócios resolvidos na sala do
vice-rei, dois anos mais tarde, achou-se envolvido numa estranha devas-
sa, resultante de carta anônima que o conclamava a organizar uma re-
belião na cidade103. Para averiguar o incidente, o chanceler da Relação,
Sebastião Xavier Vasconcelos Coutinho, requereu ao vice-rei a participa-
ção dos escrivães já designados para o Tribunal da Alçada. A justificativa
102 – É importante ressaltar, a respeito das reflexões de Pereira Cleto sobre o tema da
jurisdição eclesiástica, que seu conjunto documental, compondo hoje o fundo Papéis do
Brasil da Torre do Tombo, passaram antes, conforme se disse, pelas mãos do doutor An-
tônio Pereira de Almeida Silva e Sequeira, lente da Universidade de Coimbra. Essa infor-
mação é relevante, dentre outros motivos, porque o códice 15 do referido fundo consiste
num texto intitulado Jurisdição eclesiástica no Brasil, cuja autoria é do prórprio Silva e
Sequeira. Assim, uma comparação cuidadosa entre a carta do doutor Marcelino e o texto
do docente de Coimbra poderá mostrar se os estudos do primeiro não constituíram a base
para a obra do último. Quanto ao “papel” enviado por Pereira Cleto junto da carta, não foi
possível, até o momento, identificá-lo.
103 – AHU – RJ. Caixa 148, documento 14. 16 de novembro de 1791. “Oficio do juiz de
Fora do Rio de Janeiro, Baltazar da Silva Lisboa, ao secretário de estado da Marinha e
Ultramar, Martinho de Melo e Castro, remetendo arbusto e cristais para o Real Gabinete
de História Natural; solicitando a sua substituição; informando que todos os negócios
são resolvidos na sala do [vice-rei do Estado do Brasil, conde Resende, D. José Luís de
Castro], desrespeitando-se as funções do lugar que ocupa”. Autos de exame e averiguação
sobre o autor de uma carta anônima escrita ao juiz de fora do Rio de Janeiro, dr. Baltazar
da Silva Lisboa. Anais da Biblioteca Nacional. Rio de Janeiro, n. 60, 1940, pp. 260-313.
de maio, uma devassa para apurar o caso, indicando como juiz e escrivão
dela, respectivamente, o desembargador da Relação José Pedro Machado
Coelho Torres e Marcelino Pereira Cleto. A reunião de ambos em em-
preitada tão delicada demandaria, decerto, superação de possíveis rusgas,
porquanto Torres havia sido um dos responsáveis pelo acórdão da Rela-
ção que retirara de Cleto o direito de conhecer ações novas na Ouvidoria.
Em Minas, nos dias 20 e 21 do mesmo mês, o governador mandaria pren-
der alguns suspeitos de peso: o vigário de São José, Carlos Toledo, e os
antigos ouvidores do Rio das Mortes e de Vila Rica, Alvarenga Peixoto e
Tomás Antônio Gonzaga. Algumas semanas depois, em 12 de junho, ins-
tituiu o visconde uma segunda devassa, indicando o novo ouvidor de Vila
Rica, Pedro José de Araújo Saldanha, como juiz, e o ouvidor de Sabará,
José Caetano César Manitti, para escrivão.
116 – Idem.
117 – Carta do ministro Martinho de Melo e Castro ao visconde de Barbacena, comu-
nicando o recebimento da devassa de Minas Gerais, que é estudada em vários pontos
e analisada a atuação dos principais implicados no movimento. Anuário do Museu da
Inconfidência. Op. cit., p. 104.
Intromissão
Tomando-se como parâmetro as reflexões do doutor Marcelino acer-
ca da decadência de São Paulo e dos abusos eclesiásticos na América,
bem como sua aversão aos conflitos jurisdicionais, não parece excessivo
sugerir que a Inconfidência consolidou alguns de seus pontos de vista.
A ideia de que uma profunda reforma nos domínios de Sua Majestade,
fundada em pressupostos regalistas, não se opunha à valorização do nati-
vismo e dos costumes locais talvez tenha, para Cleto, se reforçado com o
infortúnio dos inconfidentes punidos. Que tais reformas esbarravam nas
idiossincrasias de ministros, clérigos e governadores, eis um ponto de vis-
ta que, depois dos acontecimentos em Minas, devia continuar partilhando
com Martinho de Melo e Castro. Nesse sentido, era plausível que o com-
portamento do doutor Marcelino viesse a oscilar após as tensões deriva-
das do acúmulo de frustrante experiência no serviço régio, da tentativa
da Relação de escanteá-lo, das dificuldades no implemento da devassa
fluminense e, permeando tudo isso, do medo de ver-se abatido e desonra-
do. Sendo assim, um último conflito antes de deixar o Rio de Janeiro fez
Pereira Cleto subir o tom.
“Nestes termos, eu não digo a VEx que não obedeço. Conheço a supe-
rioridade do lugar de VEx; conheço a sua representação; conheço que
da minha absoluta resistência se não seguiria utilidade nem ao serviço
de Sua Majestade, nem ao bem e quietação dos vassalos, e que é ne-
cessário, em lugar tão distante do Trono, dar a todos exemplo de obe-
diência e reconhecimento aos superiores que Sua Majestade estabe-
lece; proponho só a VEx, para desempenho do juramento que prestei
de cumprir as leis e ordens de Sua Majestade, para desonerar a minha
consciência, para que se conheça a honra do meu comportamento, as
dúvidas que tem contra si a execução do respeitável despacho de VEx,
para que em tempo algum possam atribuir-se-me as consequências e
prejuízos que dela resultam123.”
124 – Idem.
125 – Idem.
“Esta conta do ouvidor está muito bem feita, e pelos documentos que
a acompanham mostra este ministro que obrou com a justiça que devia
em não cumprir a portaria que lhe dirigiu o vice-rei sobre a entrega
dos bens que se referem, por ser inteiramente oposta às leis e reais or-
dens de SMaj, como o dito ministro lhe expôs na resposta junta: pelo
que entendo se pode declarar a este ministro que fez bem em observar
as ordens de SMaj e não cumprir contra elas a referida portaria do
vice-rei 126.”
Guerra contínua
Tendo, afinal, terminado seu período no Rio de Janeiro, o doutor
Marcelino tomou posse da Relação da Bahia em 21 de junho de 1791129.
126 – Cf. AHU – RJ. Caixa 148, documento 36; caixa 146, documento 35; caixa 149,
documentos 48, 49 e 50. 24 de janeiro de 1791.
127 – Idem.
128 – José João Teixeira Coelho. Instrução para o governo da Capitania de Minas Ge-
rais. Op. cit., pp. 201-12.
129 – Luís dos Santos Vilhena. A Bahia no século XVIII. Bahia: Itapoã, 1969, v. II, p. 311.
Resumo: Abstract:
O texto analisa as atividades extrajudiciais This paper will analyze the extra-judicial activi-
dos magistrados no Brasil colonial e, em sen- ties of Colonial Brazil magistrates as opposed
tido inverso, as atribuições judiciais de outros to the judicial obligations of other elements in
elementos da administração pública, como os public administration, such as those responsible
provedores da fazenda. Os autores trabalham for public finances. The authors’ hypothesis is
com a hipótese que, sobretudo em fins do século that - mostly at the end of the Eighteenth centu-
XVIII, a administração colonial brasileira era, ry – Brazilian colonial administration was, per
numa perspectiva weberiana, mistura de formas the Weberian perspective, a mix of bureaucratic
burocráticas e patrimoniais, que poder-se-ia de- and patrimonial forms that could be called
nominar “prismáticas”. “prismatic”.
Palavras-chave: Justiça colonial – justiça ad- Keywords: Colonial justice – Administrative
ministrativa – estado colonial – administração justice – Colonial state – Colonial Brazil.
colonial – Brasil colonial.
12 – Lapeire, Henri, Le XVIe. Siècle – les forces internationales, Paris, PUF, 1967, p.
232.
13 – Eram, alias, comuns as referências bíblicas na documentação coeva, especialmente
nas acepções de retribuição (dar a cada um o que lhe é devido), como em Sab. 5, 6-9; Is.
5, 16, 56; Dn. 9; retidão do julgador, Sl. 9,9; 95, 10; Is. 11, 3; At. 17, 31; Apoc. 19, 11; e
equidade, Rs 3,6; Prov. 2,8; 8; 20.
14 – Ordenações Afonsinas, FCG, Lisboa, , 1998, v. I, p. 4.
15 – Ordenações Manuelinas, FCG, Lisboa, , 1984, v. I, p. 2.
19
No caso dos provedores de capitanias, que até 1548 ainda não ha-
viam recebido regimento, o princípio foi o mesmo. Cabia-lhes conhecer
por ação nova “todos os feitos, causas e dúvidas que se moverem sobre
coisas que toquem à minha fazenda” 36, quer entre os respectivos oficiais,
quer entre eles e os contribuintes. Mesmo nas situações em que não mais
estivessem em causa os rendimentos reais, os provedores constituíam-se
no juízo competente, de cujas decisões não caberiam mais apelação ou
agravo até a alçada de dez mil-réis. Nos casos excedentes, caberia recurso
ao provedor-mor37.
39 – Idem, v. I, p. 310.
40 – 2. Regimento das Terras Minerais do Brasil, in Mendonça, Marcos Carnei-
ro de, op. cit., v. I, p. 317.
41 – Idem, v. I, p. 320.
42 – Regimento de Ordenanças, in Mendonça, Marcos Carneiro de, op. cit., v.
I, p. 175.
A justiça eclesiástica, por sua vez, fazia-se nos quadros de uma or-
ganização administrativa fortemente hierarquizada, que ia do arcebispado
à paróquia, passando pelos bispados. Às funções religiosas e administra-
tivas dos sacerdotes (fossem arcebispos, bispos ou vigários paroquiais)
acrescentavam-se as judiciais, exercidas quer individualmente, pelos vi-
gários que prolatavam suas sentenças, quer colegialmente, quando havia
câmaras em bispados ou tribunais de relação eclesiástica (neste caso, so-
mente em Salvador).
Um ato tão nobre e tão digno, aliás, que no Ocidente cristão os car-
gos da magistratura em geral ficavam de fora da venalidade dos ofícios
públicos, pois a sua venda poderia ser associada à simonia. O mesmo não
se aplicava aos funcionários judiciais, dos tribunais e dos juízos monocrá-
ticos, que incorriam na regra geral da venalidade.
Resumo: Abstract:
O texto refere-se à adoção da Constituição Es- This paper refers to the adoption by Brazil of the
panhola de 1812, alcunhada “La Pepa”, no Bra- 1812 Spanish Constitution, known as La Pepa,
sil, na segunda década do século XIX, episódio during the second decade of the Nineteenth cen-
pouco conhecido da história constitucional bra- tury. This is a rather unknown episode of the
sileira. Examina, por outro lado, a influência Brazilian Constitution history. On the other
ideológica da Constituição Espanhola na evo- hand, it will examine the ideological influence
lução constitucional brasileira, especificamente, of the Spanish Constitution on the constitutional
na primeira constituição brasileira, a Constitui- evolution in Brazil, specifically on the first Bra-
ção do Império Brasileiro de 1824. zilian Constitution, the 1824 Constitution of the
Brazilian Empire..
Palavras-chave: Liberalismo, Revolução e Es- Keywords: Liberalism, Revolution and the State
tado de Direito. of Law.
1. Introdução
¡Viva La Pepa!, exclamava o povo espanhol em Cádiz na Solenida-
de de São José do já quase bicentenário 19 de março de 1812. O brado,
saudação à promulgação da Constituição Política da Monarquia Espanho-
la (carinhosamente chamada “La Pepa”4), marcava o início de um novo
1 – Este texto foi originalmente redigido sob o título “Viva la Pepa: la historia no con-
tada de la Constitución Espãnola de 1812 en tierras brasileñas”, tendo sido apresentado
no V Simpósio Internacional, Cádiz, Hacia El Bicentenario/ Union Latina, em 2010, em
Cadiz..
2 – Professor do Programa de Pós-Graduação em Direito da UNESA e professor visitan-
te da UERJ e colaborador da UNISINOS.
3 – Graduado e Mestrando em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(UERJ). Vice-presidente Jurídico do Centro Interdisciplinar de Ética e Economia Perso-
nalista (CIEEP).
4 – Apenas uma curiosidade histórica: utiliza-se o apelido “pepe” (versão feminina:
“pepa”) para os homens chamados José em língua espanhola. A origem encontra-se na
abreviatura do título latino de São José, pai putativo de Jesus Cristo (pater putativus, ou,
simplesmente, P. P., “pepe”). Aí encontramos a justificativa para a alcunha da Constitui-
por bem decretar que essa constituição regesse até á chegada da constituição que sabia e
socegadamente estão fazendo as côrtes convocadas na minha muito nobre e leal cidade de
Lisboa; observando-se, porém, hoje que esta representação era mandada fazer por homens
mal intencionados e que queriam a anarchia, e vendo que o meu povo se conserva, como
eu lhe agradeço, fiel ao juramento que eu com elle, de commum accordo, prestámos na
praça do Rocio no dia 26 de fevereiro do presente anno; hei por bem determinar, decretar,
e declarar por nullo todo o acto feito hontem, e que o governo provisório, que fica até á
chegada da constituição portugueza, seja da fórma que determina o outro decreto e ins-
trucções que mando publicar com a mesma data d’este, e que meu filho o principe rea1
ha de cumprir e sustentar até chegar a mencionada constituição portugueza.”. CÂMARA
DOS SENHORES DEPUTADOS DA NAÇÃO PORTUGUESA, op. cit., pp. 197-198.
côrtes até 1698, nas quaes se tratavam os mais importantes negócios relativos á política,
legislação e fazenda; e n’este período, que abrange a mais de cinco seculos, os portugue-
zes se elevaram ao cume da gloria e da grandeza, e se fizeram acredores do distincto logar
que, a despeito da inveja e da parcialidade, hão de sempre occupar na historia dos povos
europeus. O que hoje, pois, querem e desejam não é uma innovação é a restituição de suas
antigas e saudaveis instituições, corrigidas e applicadas segundo as luzes do seculo e as
circumstancias politicas do mundo civilizado [...]” CÂMARA DOS SENHORES DEPU-
TADOS DA NAÇÃO PORTUGUESA, op. cit., p. 123.
31 – Ibidem, p. 8.
Cederam os liberais neste ponto para não verem suas posições der-
rotadas em outros temas, uma vez que não apenas as Cortes Constituintes
possuíam entre seus deputados grande numero de clérigos, mas também
o povo era majoritariamente católico, não raro de tendência mais conser-
vadora. Na Pepa, mais que na Constituição brasileira de 1824, observa-se
tal fato com maior clareza na proibição do exercício de outras religiões
que não o catolicismo romano.
5. Conclusão
Como conclusão deste artigo, pode-se dizer que a Constituição de
Cádiz de 1812 era conhecida no Brasil, chegando a neste ser aplicada
fugazmente. Uma série de fatos históricos documentados, dentre os quais
um aqui foi narrado, demonstra que a influência do texto da Pepa foi mais
direta do que uma mera comunhão de ideais. Deve-se reconhecer também
um influxo da Constituição Espanhola na Constituição brasileira de 1824
por via reflexa, ou seja, por meio da Constituição Portuguesa de 1822,
diretamente influenciada pelo texto gaditano e guardando ainda mais se-
melhanças com o texto espanhol.33
Referências Bibliográficas
BERBEL, Márcia Regina. A Constituição Espanhola no mundo luso-americano
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BONAVIDES, Paulo. As nascentes do constitucionalismo luso-brasileiro, uma
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______. A evolução constitucional do Brasil. Estudos avançados, vol.14, nº. 40,
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CALMON, Pedro. Introdução ao Diário da Assembléia Geral Constituinte e
Legislativa do Império do Brasil. Brasília: Senado Federal, 2003. Tomo I.
CÂMARA DOS SENHORES DEPUTADOS DA NAÇÃO PORTUGUESA.
Documentos para a História das Cortes Geraes da Nação Portugueza. Tomo I.
Lisboa: Imprensa Nacional, 1883.
CARVALHO, Manuel Emílio Gomes de. Os deputados brasileiros nas Cortes
Geraes de 1821. Porto: Chardron, 1912.
Resumo: Abstract:
O artigo discute a administração da justiça na This paper discusses the administration of
primeira metade do século XIX no Império do justice in the Brazilian Empire during the first
Brasil a partir da análise da divisão entre os decade of the Nineteenth century, based on the
novos poderes políticos constitucionais, e dos analysis of the division between the new con-
problemas que envolveram a criação e funcio- stitutional, political powers and the problems
namento de cargos e instituições vinculados ao involving the creation and operation of offices
judiciário. Entre eles, os vários e recorrentes and institutions linked to the Judiciary. Among
conflitos de jurisdição, a amplitude de questões the latter, the various and recurring conflicts of
circunscritas na pasta da Justiça, o controle e jurisdiction, the wide range of issues circum-
manutenção da ordem pública – com a imbri- scribed within the Office of Justice, the control
cação entre as funções judiciárias e policiais, e and maintenance of public order – with the inti-
a utilização de força armada por parte de seus mate relationship between legal and police ac-
agentes. Defendemos que os impasses na imple- tions and the use of armed forces by their agents.
mentação de um modelo liberal de justiça – que In our view, the impasses on the implementation
previa, ao mesmo tempo, sua independência e of a liberal model of justice – that at the same
controle dos magistrados e tribunais –, devem time anticipated its independence and the con-
ser vistos à luz da manutenção do funcionamen- trol of magistrates and courts of law – would
to de uma cultura jurisdicional, bem como dian- demonstrate that operation of the legal culture
te da complexificação das ações para aplicação should be maintained, due to the complexity of
da lei pelos agentes da justiça. actions concerning the application of the law by
legal agents.
Palavras-chave: Império, Justiça, instituições, Keywords: Empire – Justice – Institutions -
Direito. Law.
1. Introdução
Desde meados do século XVIII é possível observar, em todo mundo
ocidental, a difusão de um programa ilustrado racionalizador das insti-
tuições e dos próprios indivíduos, aliado a uma política generalizada de
reforma nas ações dos governos (tanto no Velho como no Novo Mundo),
1 – Doutora em História Social pela Universidade de São Paulo. Professora Adjunta da
Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).
tranquilidade pública.
56 – Referimo-nos aqui às conhecidas revoltas regenciais que, a despeito da particularida-
de de cada uma, foram recorrentes nos anos da Regência. Ver como Ilmar R. de Mattos,
“La experiencia del Imperio del Brasil”, Antonio Annino (et. alii), De los imperios a las
naciones: Iberoamerica, Ibercaja/Obra Cultural, 1994, analisa que, diante das alternativas
radicais que surgiram na esteira da abdicação de D. Pedro, a monarquia pode prevalecer
no Brasil sob a legitimidade da Constituição.
57 – CL, Actos do Poder Executivo, 6/junho/1831.
84 – Idem, 24/setembro/1835.
85 – CL, Actos do Poder Executivo, regulamento de 2/fevereiro/1842, artigo 34 .
86 – Imperiais resoluções tomadas sobre consultas da Seção de Justiça do Conselho de
Estado. Anos de 1842 a 1846. Consulta de 22/outubro/1844, em que Conselho apoia a
decisão do presidente da província do Maranhão que resolveu que um conflito entre um
capitão (comandante de armas) e o desembargador chefe de polícia seria de competência
militar. De que o mesmo presidente teria ouvido as partes, bem como consultado a Rela-
ção, decidindo que as ofensas atribuídas ao comandante de armas haviam sido realizadas
quando o mesmo capitão, na qualidade de ajudante, impediu o desembargador a entrar no
palácio do governo por ordem do presidente (p. 87).
87 – Imperiais resoluções tomadas sobre consultas da Seção de Justiça do Conselho de
Estado. Anos de 1842 a 1846. Consulta de dezembro, p. 54.
O fato é que a intervenção, ainda que prevista como inicial, dos pre-
sidentes nos conflitos entre autoridades judiciárias, fazia parte da lógica
de sua criação como um instrumento constitucional conservador da or-
dem – afinal, eram eles escolhidos pelo Imperador –, além de referendar
antigas práticas à nova ordem legalista89. Atividade nem sempre tranqui-
la, haja vista um ofício do presidente do Pará, em 1849, em que pedia
esclarecimento sobre o que deveria fazer no caso do procedimento crimi-
noso do juiz de direito da Comarca de Santarém pela absolvição que fez
de um réu em termos visivelmente ilegais90. O presidente reconhecera ser
o caso uma questão de partidos, mas se esquivara fazer uma ação mais
contundente. Os conselheiros, no entanto, foram categóricos, da mesma
forma que o procurador da Corte, em dizer que o magistrado incorrera em
“grave prevaricação” e deveria ser suspenso91.
E das Consultas ao Conselho de Estado, uma decisão de 28/9/1850, em que são conde-
nados os atos arbitrários de um juiz municipal, o qual deveria ser imediatamente respon-
sabilizado.
100 – CDG, 4/janeiro/1832.
101 – Idem, 15/março/1832.
102 – Veja-se como essa postura foi comum em relação ao Supremo Tribunal de Justiça,
em especial, na ação de Diogo Antonio Feijó. Ver: Andréa Slemian, “O Supremo Tribunal
de Justiça nos primórdios do Império do Brasil (1828-1841)”.
Nacional, 1848.
117 – Imperiais resoluções tomadas sobre consultas da Seção de Justiça do Conselho
de Estado. Anos de 1842 a 1846. Bellarmino Braziliense Pessoa de Albuquerque (org.).
Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1877, v.1. Consulta de 24/novembro/1843, pp. 44
seg.
118 – Idem, p. 48.
jurados, e que fariam as listas para nomeação dos juízes municipais e dos
promotores públicos – este último tinha por função dar parte de denún-
cias, solicitação de prisão e de punição dos criminosos – encaminhadas
ao governo da província.
Mas fica evidente que, apesar do esforço por parte daqueles envol-
vidos com o projeto liberal de sua criação, a autoridade dos juízes de paz
não era muitas vezes reconhecida em pé de igualdade com outros agentes
da justiça. Um caso sintomático é o do ex-juiz de paz da Vila de Canta-
galo, Joaquim José Soares que, em 1834, foi suspenso por ordem do pró-
prio ministro da justiça, a partir de acusações feitas pela Câmara e pelo
promotor de que ele não cumprira com suas obrigações para formação do
Conselho de Jurados136. Ele, no entanto, recorrera, alegando tanto que a
falha teria sido do órgão municipal – que não teria feito em tempo compe-
tente o sorteio dos juízes –, como que ele não fora chamado a se defender
conforme estaria marcado no artigo 154 da Constituição, na citada lei de
14 de junho de 1831, e nas formalidades do Código do Processo. Arrema-
tava, por fim, que nem se remetera a questão ao poder judiciário, e pedia
sua reintegração ao cargo.
Isso porque a base da concepção de justiça era que ela possuía papel
fundamental na manutenção da ordem social, onde a imbricação entre as
distintas esferas e autoridades judiciais e policiais era um fato corriquei-
ro. O mesmo acabava sendo reiterado numa ordem do ministro da Justiça
que, em 1841, encarregava o recrutamento a oficiais do Exército e aos
comandantes da Guarda Nacional debaixo da direção dos juízes de direito
e do chefe de polícia, dando-lhes instruções145. No mesmo ano, a seção de
Justiça do Conselho de Estado aprovava que o governo poderia, na falta
de voluntários, preencher o número respectivo da Guarda Municipal Per-
manente, responsável sobretudo pelo policiamento, com praças escolhi-
dos pelo Exército146. Autorizava também que se fizessem as modificações
convenientes na organização do mesmo Corpo a fim de:
Nessa mesma chave estava a Guarda Nacional, cuja lógica não seria
estruturalmente alterada com sua reforma em 1850. Desde sua criação em
1831, são frequentes as dúvidas na sua organização, em cujo processo as
Câmaras tinham um papel fundamental. Com o Ato Adicional em 1834,
também as províncias passariam a administrá-las localmente151, sob a co-
nivência do governo que, num período bastante conturbado politicamen-
te, seguia a mesma lógica de delegação aos particulares grande parte do
controle e manutenção da ordem pública. Em decreto aprovado em 1836,
fornecia o governo aos presidentes das províncias do Rio Grande do Sul,
5. Considerações finais
Do quadro de instituições, agentes e conflitos que tiveram lugar no
processo de construção de uma justiça constitucional para o Império do
Brasil, e que se apresentou aqui de maneira multifacetada, vale à pena su-
blinhar algumas relações que dão significado e moldura ao seu desenho.
Em primeiro lugar, que a complexificação das soluções institucionais que
o paradigma legalista ilustrado portava consigo, e que não foi uma es-
pecificidade no caso brasileiro obviamente, marcaria profundamente o
funcionamento das novas instituições políticas e jurídicas que tentaram
dar conta da formação de novos regimes representativos e de garantia dos
direitos dos seus cidadãos. O que tocava diretamente na questão da justiça
já que seu campo, na lógica de separação de poderes, deveria ser circuns-
crito, bem como revisto seu papel na aplicação/interpretação da lei. No
Brasil, a solução monárquica projetada apresentava uma predominância
do Executivo no arbitramento de conflitos, a legitimidade do Legislativo
como evocação da representação da nação, e um discurso mais eloquente
acerca do controle da justiça à semelhante das bandeiras mais radicais que
ganharam corpo após os movimentos revolucionários de fins do Setecen-
tos, num primeiro momento. Esse arranjo, moderado por suposto, tentara
limitar institucionalmente o amplo campo de atuação do novo Judiciário
e seus agentes para a esfera das questões ordinárias, dos cidadãos entre
si, entendendo-os sobretudo como responsáveis pela aplicação da lei e
não mais sua interpretação, à luz de outras experiências das monarquias
constitucionais europeias. Mesmo com a tentativa de reforço do poder de
justiça e de sua independência a partir da década de 40, o desenho estru-
tural de sua esfera e arbítrio continuaria.
Resumo: Abstract:
O Código Criminal do Império do Brasil, de The Brazilian Empire’s 1830 Criminal Code
1830, previa em seus artigos 113, 114 e 115 o anticipated in its articles 113, 114 and 115,
crime de insurreição, que penalizava os escravos the crime of insurrection, that punished slaves
que tentassem obter sua liberdade por meio da who attempted to obtain their freedom through
força, bem como terceiros que os auxiliassem na force, and also third parties who helped them in
consecução de seus intentos. A partir de dicio- their attempt. Based on dictionaries and docu-
nários e documentos dos séculos XVII, XVIII ments dating from the Seventeenth, Eighteenth
e XIX (da Espanha, França, Inglaterra, Estados and Nineteenth centuries (from Spain, France,
Unidos e Brasil), e também da historiografia England, USA and Brazil), as well as pertinent
pertinente, o presente artigo visa recuperar de historical writings, this paper aims at identify-
que maneira esse tipo penal foi incoporado ao ing how that punishment was incorporated into
referido código, considerando-se que a palavra the referred Code since the word insurreição2 (in
insurreição (em português) não fora ainda dicio- Portuguese) had not yet been included in dic-
narizada até inícios do XIX, e que ela aparecia tionaries until the beginning of the Nineteenth
em documentos brasileiros da década de 1820 century and that it appeared in Brazilian docu-
com um sentido completamente distinto daquele ments in the 1820s with a totally different mean-
do código. ing than that in the Code.
Palavras-chave: Código Criminal – Insurreição Keywords: Criminal Code – Insurrection –
– escravidão – direito penal. Slavery – Penal Law.
Cabral de Mello, São Paulo, Editora 34, 2001, p. 319 (grifo nosso).
12 – Ibidem, p. 609 (grifo nosso).
13 – Ibidem, p. 612.
14 – Ibidem, p. 638 (grifo nosso).
Fidelissima bem Reconheceu que era inevitavel, para por os seus Es-
tados a coberto das perniciosas vistas dos insurgentes, levantar uma
barreira segura, justa e natural entre elles e o Brazil [...].”15
21 – Nouveau Dictionnaire de la Langue Française. Par J.-Ch. Laveaux. Paris, Chez De-
terville, Libraire, 1820, p. 1049.
22 – Samuel Johnson, A Dictionary of the English Language, Londres, Printed for J.
Knapton; C. Hitch and L. Hawes; A. Millar; R and J. Dosley; and M. and T. Longman,
1756, vol. 1, p. (INS-INT); Thomas Sheridan, A Complete Dictionary of the English
Language. 3a. ed. Londres, Charles Dilly, 1790, vol. I, p. (INS-INT).
23 – E o verbete continua explicitando mais claramente as diferenças entre os distintos
tipos de movimentos. ����������������������������������������������������������������������
“It differs from mutiny, as it respects the civil or political govern-
ment; whereas a mutiny is an open opposition to law in the army or navy. Insurrection is
however used with such latitude as to comprehend either sedition or rebellion. [...] 2. A
rising in mass to oppose an enemy [little used.]” . Noah Webster, An American Dictionary
of the English Language, Nova Iorque, Published by S. Converse, 1828, vol. 1, p. (INS-
INT).
24 –������������������������������������������������������������������������������������
Logo na segunda página, ao arrolar as ações do rei britânico que justificavam a in-
dependência, os signatários culpavam-no por ter “excited domestic insurrection amongst
us, and has endeavoured to bring on the inhabitants of our frontiers the merciles Indian
savages, whose known rule of warfare is an undistinguished destruction of all ages, sexes,
and conditions”. Já na Constituição, entre os poderes do Congresso, determinava-se “To
provide for calling forth the militia to execute the laws of the Union, suppress insurrec-
tions, and repel invasions”. “The Declaration of Independence”, “The Constitution of the
United States”, in The Public Statutes at Large of the United States of America, Boston,
Charles C. Little and James Brown, 1845, disponível no site “A Century of Lawmaking
for a New Nation: U.S. Congressional Documents and Debates, 1774 - 1875”, http://me-
����������
mory.loc.gov/cgi-bin/ampage.
25 – Com a Revolução Francesa, a população livre de cor de São Domingos começara a
pleitear total igualdade jurídica com a população branca. Em agosto de 1791, em meio às
disputas entre esses grupos, os escravos da colônia se sublevaram, conseguindo o controle
de parte da ilha. Em 1804, São Domingos, doravante, Haiti, alcançaria finalmente sua
independência.
Ainda que não se saiba quantas edições e cópias haviam de fato sido
feitas e distribuídas gratuitamente, o períodico inglês indicava sua larga
circulação.
death, and be utterly excluded the benefit of clergy, and of all laws
made concerning the same.”32
32 – Conforme Van Caenegem, o benefício do clero era um antigo privilegium fori que
“costumava ser um real privilégio do clero; estava enraizado no império romano cristão
e fora ocasião de ferozes lutas entre o Estado e a Igreja. Contudo, no início do século
XVIII, ele se transformara em um ‘privilégio’ que todo condenado por um crime doloso
da common law podia reivindicar e, assim, escapar à pena de morte (sendo, em vez disso,
deportado segundo a legislação de 1717)”. R. C. van Caenegem, Juízes, legisladores e
professores, Rio de Janeiro, Elsevier, 2010, p. 23; “An Act directing the trial of Slaves,
committing capital crimes; and for the more effectual punishing conspiracies and insur-
rections of them; and for the better government of Negros, Mulattos, and Indians, bond or
free”, The Statutes at Large being a collection of all the Laws of Virginia, Richmond (VA),
Franklin Press – W. W. Gray print, 1820, vol. 4, p. 126, disponível no site http://vagenweb.
org/hening/vol04-01.htm (grifos nossos).
33 – Morris destaca que essa alteração teria sido feita em decorrência de uma série de
levantes escravos e supostas conspirações no mundo colonial inglês (Antigua, 1736; Ca-
rolina do Sul, e Maryland, 1739; e Nova Iorque, 1741). The Statutes at Large being a
collection of all the Laws of Virginia, Richmond (VA), Franklin Press – W. W. Gray print,
1819, vol. 6, p. 105; Morris, Southern Slavery and the Law, op. cit., p. 267.
slave or slaves to rebel or make insurrection, every such free person so coun-
selling, advising, plotting or conspiring, or so aiding, assisting, or abetting,
on conviction of any of the such offences, shall be held and deemed a felon,
and shall suffer death without benefit of clergy, by hanging by the neck.”34
34 – Ao fim do transcrito artigo 24, do capítulo 111, “An act reducing into one, the several
acts concerning Slaves, Free Negroes and Mulattoes”, os autores remetiam aos Statutes
de 1797, 1803, 1814 e 1816. O artigo anterior do Revised Code remetia à lei passada em
1748, transcrita acima, e também a reenactements em 1769, 1794 e 1803. The Revised
Code of the Laws of Virginia, Richmond (VA), Printed by Thomas Ritchie, 1819, vol. 1,
p. 427.
35 – “Acts relating to slaves”, § 10, The Statutes at Large of South Carolina, Columbia
(SC), Printed at A. S. Johnston, 1840, vol. 7, p. 347.
this province”. Diploma legal que pouco mais de vinte anos depois foi
novamente reeditado pelos representantes da colônia.36
42 – APB-CD, 1830, tomo 1º, Rio de Janeiro, Typographia de H. J. Pinto, 1878, sessão de
6 de maio de 1830, pp. 78-79; sessão de 7 de maio de 1830, p. 80.
43 – APB-CD, 1830, tomo 2º, op. cit., sessão de 10 de setembro de 1830, pp. 487-488;
sessão de 11 de setembro de 1830, p. 492.
44 – APB-CD, 1830, tomo 2º, op. cit., sessão de 15 de setembro de 1830, p. 512.
45 – APB-CD, 1830, tomo 2º, op. cit., sessão de 15 de setembro de 1830, p. 512.
Vasconcelos, por sua vez – a quem parecia que dos códigos nada se
poderia tirar, pois, caso contrário “outro há de ser o resultado de todo este
trabalho” – declarou votar contra o requerimento, pois a câmara já havia
decidido “que o código vá à comissão especial sobre o mesmo, que taes
emendas sejam recebidas até o 1º de Julho [sic]” e que, portanto, caso o
trabalho de Livingston fosse encaminhado para tradução, uma tarefa de
três ou quatro meses, ficaria suspensa “a discussão sobre o código, do
que resultaria não termos um sofrível, indo atrás do optimo”. Hollanda
Cavalcanti secundou o colega mineiro, alegando desta vez que, caso fosse
para tradução, uma vez que havia um só exemplar, a comissão não pode-
ria consultá-lo; propunha então que, não existindo muitos deputados com
capacidade de traduzir o inglês, o código de Livingston fosse consultado
“naquellas cousas que forem mais precisas”. Julgando-se a matéria discu-
tida, ficou estabelecido o primeiro encaminhamento proposto, ou seja, o
envio da obra de Livingston à comissão.52
quatorze títulos. O título dois, “Of offences against the sovereign Power
of the state”, dividido em três capítulos, previa os crimes de traição, se-
dição e, finalmente, “Of exciting insurrection”, definido da seguinte ma-
neira:
“Art. 115. Any free person who shall aid in any insurrection of slaves
against the free inhabitants of this state, who shall join in any secret
assembly of slaves, in which such insurrection shall be planned, with
design to promote it, or shall excite or persuade any slaves to attempt
such insurrections, shall be imprisoned at hard labour for life.
Art. 116. By “insurrection”, is meant an assembling with ARMS, with
intent to regain their liberty by force.
Art. 117. The term to “excite” in the description of this offence, means
to offer any persuasion or inducement, which has insurrection for its
immediate object. It excludes the construction that would make those
guilty who only use language calculated to render the slaves discon-
tented with their state. This, if done with design to promote such dis-
content, is an offence punishable by fine, not less than fifty, nor more
than two hundred dollars; or imprisonment, not less than thirty days,
nor more than six months, in close custody.”54
60 – Idem, p. 186.
61 – Louis Casimir Moreau-Lislet, A General Digest of the Acts of the Legislature of
Louisiana: passed from the year 1804, to 1827, inclusive, and in Force at this Last Period,
New Orleans, Printed by Benjamin Levy, 1828, vol. 1, pp. 362-374.
62 – “American criminal law and criminal procedure, with its devices for the protections
of the individual against the arbitrary authority, had obvious advantages over the admin-
istration of criminal justice under the Spanish, and Louisianans were quick to see this”. O
direito civil, contudo, tanto substantivo quanto adjetivo, daria azo a intensas disputas. Em
1806, por exemplo, o governador vetou uma lei que visava garantir a manutenção da tradi-
ção legal continental, impossibilitando futuras leis que visassem à introdução da common
law vigente no país; em 1808, contudo, um Digest of the Civil Laws Now in Force in the
Territory of Orleans, aprovado pela legislatura e pela autoridade executiva do território
terminaria garantindo a vigência daquilo que, dois anos antes, fora motivo de veto. Dargo,
Jefferson’s Louisiana, op. cit., pp. 31-32, 191, 237, 271.
63 – Moreau-Lislet, A General Digest of the Acts of the Legislature of Louisiana, op. cit.,
p. 377. (grifo nosso).
64 – Idem, p. 116 (grifo nosso).
68 – Tal lista aparece ao fim do primeiro volume da obra, em um anexo intitulado “Offen-
ses créés par Statuts, dans la Louisiane, depuis as cession aux États-Unis”. Há que desta-
car que grande parte dos tipos penais que ele destaca foram incorporados à legislação do
território de Orleans pela lei de 4 de maio de 1805, ou seja, pelo diploma legal que, se-
gundo Dargo, ele mesmo teria sido responsável por escrever. Edward Livingston, Exposé
d’um système de législation criminelle pour l’État de la Lousiane et pour les États-Unis
d’Amérique, Paris, Guillaumin et Cie Éditeurs, 1872, pp. 571-587.
69 – Lawrence Friedman, em sua obra A History of American Law, destaca que a justiça
criminal nas colônias britânicas, tal como o direito colonial em geral, era normalmente
menos formal e mais simplificada que o direito inglês, mas que, ainda assim, houve aos
poucos sua conformação à prática inglesa. Para Thomas Morris, “[t]he core of American
slave law was the common law of England, as well as the equitable principle used in
English Chancery courts. We miss this because we have not paid enough attention to the
fact that it was indeed the property element in the slave that was ‘juristically’ significant”.
Morris pondera, contudo, que é evidente que o direito inglês não forneceu “direct rules
for the policing of slaves”, mas afirma, por outro lado, que também é verdade que havia
“ample precedents in English legal traditions for the governance of lower-class people,
precedents that were easily adapted to slaves in the colonies. It is also true that some of
the colonial police regulations were responses of slave owners to particular problems in
the colonies that had no parallel in England”. Friedman, A history of American Law, op.
cit., p. 32; Morris, Southern Slavery and the Law, op. cit., pp. 38, 56-57.
Thomas Morris, em seu livro Southern Slavery and the Law, destaca
que a primeira referência importante sobre insurreição aparecera, na In-
glaterra, no tratado de Edward Coke, de 1644:
“To levy war against the King” era justamente uma das cláusulas
do statute de 1352, do reinado de Eduardo III, que, segundo Alan Orr,
“was the principal statutory foundation of English treason law throughout
70 – Edward Coke, The Third Part of the Institutes of the Laws of England, Londres,
Printed for E. and R. Brooke, 1797, p. 10.
71 – Morris, Southern Slavery and the Law, op. cit, p. 266.
72 – William Hawkins, Treatise of the Pleas of the Crown, Savoy, printed by Eliz. Nutt,
1716,vol. 1, p. 37 (grifo nosso).
73 – De acordo com o referido statute, era traição “(1) compassing or imagining the death
of the king or queen, or eldest male heir to the throne; (2) violating the king’s ‘compan-
ion’, his eldest unmarried daughter or the eldest male heir’s wife; levying war on ‘the
king in his realm’; (4) adhering to the king’s enemies in his own realm ‘or elsewhere’; (5)
counterfeiting the great or privy seal, the king’s coin, or bringing counterfeit coin into the
realm; and (6) killing the chancellor, treasurer, or any of the king’s justices in the execu-
tion of their offices”. Alan Orr, Treason and the State: law, politics, and ideology in the
English Civil War. Cambridge, Cambridge Univ. Press, 2002, pp. 11-12
74 – Tanto em Coke, quanto em Hawkins, as referidas menções à insurreição aparecem
nos capítulos dedicados a high treason.
75 – Morris, Southern Slavery and the Law, op. cit., p. 264.
76 – Sobre essa questão ver Orr, Treason and the State, op. cit., cap. 1.
77 – Morris, Southern Slavery and the Law, op. cit., p. 265.
78 – Ibidem, p. 264.
79 – J. Bellamy, The Law of Treason in England in the Later Middle Ages, Cambridge,
Cambridge Univ. Press, 1970, p. 14, apud Orr, Treason and the State, op. cit., p. 12. “Its
inclusion in the statute of 1352 is highly significant as were the sections decreeing it trea-
son to kill a magistrate in the execution of his office or to counterfeit coin, all of which
corresponded with the Roman law of treason”. Orr, Treason and the State, op. cit., p. 12.
80 – Ver Bellamy, The Law of Treason in England, op. cit., pp. 103 e ss.
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1 – Doutor em Ciência Política pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ). Professor de Pensamento
Constitucional Brasileiro no Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Gama Filho (UGF) e de Pensamento Político
Brasileiro na Escola de Ciência Política da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Também leciona Teoria do
Estado na Universidade Federal Fluminense (UFF).
Introdução
O confronto entre o desenvolvimento político-ideológico brasileiro
com aquele ocorrido à mesma época na França ou na Inglaterra, ou em
Portugal e na Espanha, indica que a nossa palheta ideológica era menos
diversificada do que aquela da Europa Ocidental. Nosso debate se dá es-
sencialmente dentro dos limites da ideologia liberal em sentido lato, e,
portanto, progressista, dividida entre uma direita mais preocupada com a
ordem (“conservadora”) e uma esquerda mais ocupada da liberdade (“li-
beral” no sentido estrito). Os extremos não existem, ou se existem, são
inexpressivos. Assim, por exemplo, o discurso reacionário ultracatólico
de retorno ao Antigo Regime, brandido pela extrema direita ultra ou le-
gitimista na França, em Portugal e na Espanha, não encontra equivalente
sério no Brasil. Por suas vezes, modalidades radicais, democráticas ou so-
cialistas, ou não medram, ou surgem de modo espasmódico ou meramen-
te retórico em momentos de crises sistêmicas (antes como consequências
que como causas de tais crises). Nada há de equivalente ao cartismo,
ao socialismo utópico, ao socialismo científico, no debate político-parla-
mentar da época. Fora da arena parlamentar, apenas um manifesto pelos
direitos sociais, último suspiro de uma revolta provincial sufocada – não
por acaso, no ano de 1848. Qual a razão do predomínio esmagador desse
liberalismo centrista ou moderado no período – e que, aliás, tão pouca
atenção tem merecido, em benefício do pensamento “exaltado”, muito
menos representativo, a título de sua pretensa vacuidade ideológica? Por
que determinados conceitos ou discursos foram recepcionados pelos ato-
res da cena política e outros não? Por que alguns tiveram maior repercus-
são e outros, menor, em relação às sociedades de onde eles foram “impor-
tados”? A resposta política adequada a estas perguntas não passa por uma
explicação para a qual as idéias eram importadas indiscriminadamente
e estavam, portanto, “fora do lugar” (tal, pelo menos, como esta expres-
são é vulgarmente compreendida), mas por indagar se estava ao alcance
linguístico ou cultural dos agentes a recepção desta ou daquela “ideia”
(conceito ou linguagem); por verificar as diferenças de estrutura social
e cultural entre a sociedade importadora e a exportadora, bem como os
Hab/km2 60 2,4
Urbanização 20 % 6%
Alfabetização 20 % 6%
res para além de certos limites. No que tange ao grau de crueza da tran-
sição do Antigo Regime para o governo constitucional e representativo
(o Estado liberal) na América Ibérica, comparadas às francesas, as elites
hispânicas eram menos modernas, e suas sociedades, mais tradicionais;
havia menor incidência de direitos “feudais”; o status nobiliárquico era
mais disseminado e precário, facilitando a mobilidade social; que não
houve forte mobilização popular autônoma, nem fenômenos equivalentes
ao do jacobinismo11. Por esses motivos, o grau de violência da transição
não teria sido tão feroz quanto na França, se circunscrevendo essencial-
mente aos extratos superiores da sociedade. Acrescente-se aqui, no caso
brasileiro, por se ter operado no âmbito de uma esfera pública bem mais
diminuta, homogênea e elitizada, o processo revolucionário foi ainda me-
nos radical. A disseminação da escravidão como forma compulsória de
trabalho unificava a elite em torno de fórmulas moderadas de transição.
Além disso, a presença, antes da revolução, da Corte portuguesa, no Rio
de Janeiro, habituou boa parte da aristocracia brasileira à ideia de uma au-
toridade central na América, que exercesse jurisdição sobre o conjunto do
território. Some-se a este acidente o fato de que, ao retornar à Europa, o
Rei deixou atrás de si, na qualidade de regente, o príncipe herdeiro do tro-
no – autoridade mais que legítima, portanto. Este estava rodeado de um
núcleo de Estado unitário, formado por tribunais, secretarias de Estado,
quartéis e estabelecimentos de ensino, administrados por uma burocracia
majoritariamente brasileira que, formada em Coimbra, tendo servido a
Dom João VI, permanecera em função, agora sob as ordens do príncipe.
Assim, não houve oportunidade para o surgimento de caudilhos que dis-
putassem com chances de êxito a chefia do Estado (como no Rio da Prata)
ou que patrocinassem campanhas separatistas (como na Grã-Colômbia).
Mas essa frouxidão, como se vê, era condição mesma para a reconsti-
tuição daquela mesma sociedade estamental nos trópicos – ainda que a
partir de materiais diferentes da metrópole. Ademais, no fim das contas,
a nota social predominante era a aristocrática, haja vista que o comércio e
a acumulação de capital não eram percebidos pelos comerciantes de gros-
so trato como um fim, mas como meio para que pudessem adquirir terras
e viver como grandes senhores, ou seja, tornarem-se nobres da terra26. O
modo capitalista com que a elite rural brasileira conduzia seus negócios
conciliava-se dessa maneira sem maiores atritos com seu etos aristocrá-
tico – mesmo porque o ganho com a exportação dos produtos primários
constituía o meio de sua obtenção e manutenção. Em função da concepção
corporativa de sociedade, por meio da qual a monarquia figurava apenas
como a cabeça de um sistema político no qual o poder político era exerci-
do de modo descentralizado por todos os que possuíssem poder social de
fato, a nobreza da terra predominou durante os primeiros dois séculos do
domínio português de modo inconstrastável na colônia. Ela monopolizou
os cargos de vereança, desafiou a autoridade de governadores, expulsou
os eventuais invasores, tornou inócuos os regramentos que impediam a
escravidão indígena. A vontade da Coroa só prevalecia por meio de um
demorado processo de negociação com a aristocracia local.
27 – SAMPAIO, Antônio Carlos Jucá de. Os Homens de Negócio do Rio de Janeiro e sua
Atuação nos Quadros do Império Português (1701-1750). In: FRAGOSO, João; BICA-
LHO, Maria Fernanda; GOUVÊA, Maria de Fátima (org.). O Antigo Regime nos Trópi-
cos: a dinâmica imperial portuguesa. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2001, p. 80
28 – FRAGOSO, João. Fidalgos e Parentes de Pretos: notas sobre a nobreza principal da
terra no Rio de Janeiro. In: FRAGOSO, João Luís Ribeiro; ALMEIDA, Carla Maria Car-
valho de; SAMPAIO, Antonio Carlos Jucá de. Conquistadores e Negociantes: história de
elites no Antigo Regime nos trópicos. América lusa, séculos XVI a XVIII. Rio de Janeiro,
Civilização Brasileira, 2007, p.38.
Antônio de Pádua Danesi. 2ª edição. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1997, p. 79. WEHLING;
WEHLING. Formação do Brasil Colonial, op. cit., p. 227.
32 – HESPANHA, Às Vésperas do Leviathan, op. cit., p. 521.
33 – GOUVÊA, Maria de Fátima Silva. Poder Político e Administração na Formação
do Complexo Atlântico Português. In: FRAGOSO, João; BICALHO, Maria Fernanda;
GOUVÊA, Maria de Fátima (org.). O Antigo Regime nos Trópicos: a dinâmica imperial
portuguesa. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2001, p. 305.
34 – Idem, ibidem, p. 310. WEHLING; WEHLING. Formação do Brasil Colonial, op.
cit., pp. 227 e 301.
4. A plebe e a escravidão
E o restante da população da América Portuguesa, que compunha
a plebe? As diferenças de estrutura social também eram bastante signi-
ficativas no campo, onde se achava noventa por cento da população. Na
Europa ocidental, o campesinato se dividia em livres e servis, sendo que
35 – SAMPAIO, Antonio Carlos Jucá de. Famílias e Negócios: a formação da comunidade
mercantil carioca na primeira metade dos setecentos. In: FRAGOSO, João Luís Ribeiro;
ALMEIDA, Carla Maria Carvalho de; SAMPAIO, Antonio Carlos Jucá de. Conquistado-
res e Negociantes: história de elites no Antigo Regime nos trópicos. América lusa, séculos
XVI a XVIII. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2007, p. 230.
47 – BONIFÁCIO, Maria de Fátima. O Século XIX Português. 3ª. edição. Lisboa, ICS,
2007.
“Quando dizemos povo, claro está que não falamos da massa igno-
rante, ou destituída de interesse na ordem social, que os demagogos
adulam e de que fazem o objeto de suas especulações; mas sim dos
homens pensantes, honestos e que nada tendo a ganhar na anarquia
olham para qualquer aparência de menos prezo que se note a respeito
da Nação, do seu decoro e prosperidade.” 58
Conclusão
Pelas razões acima aduzidas, não haveria espaço no Brasil oitocen-
tista para ideologias reacionárias, à direita, nem demasiado igualitárias,
à esquerda. Se sua sociedade não conhecera uma aristocracia titulada de
origem feudal juridicamente privilegiada, como na Europa, também não
possuía complexidade social, escassamente urbanizada, escravista e ma-
ciçamente analfabeta como era. Estava apenas ao alcance da elite letrada
recepcionar conceitos ou linguagens políticas ou formulá-los, e pela sua
posição dominante, ela não poderia ter inclinação a promover nenhum
tipo de radicalismo, pelo menos em períodos “normais”. Ele só prosperou
no Brasil oitocentista em épocas de crise oligárquica, ou seja, de desacor-
do das elites agrárias e burocráticas a respeito do formato institucional.
Assim, pipocando entre 1821 e 1824 e 1831 e 1834, quando aquele desa-
cordo foi saliente, o radicalismo insurrecional, tão intenso no Portugal oi-
tocentista, desapareceu no final daquela década do cenário político brasi-
leiro. Por isso, a importância concedida nos últimos vinte anos ao estudo
do radicalismo, entendido em sentido amplo, tem sido desproporcional
ao seu peso numa perspectiva de longa duração. Refiro-me ao equívoco
de alguns acadêmicos que, entusiasmados (e justamente) pelos aportes da
história social ou cultural, vêm deixando de fora de suas considerações
as estruturas empíricas da sociedade brasileira da época, como se as re-
lações de força se resolvessem exclusivamente no campo da persuasão
ideológica per se. Essa ilusão de ótica, que confere proporção exagerada
aos movimentos intelectuais urbanos da época, induz o leitor a crer que
sistas que as dos países centrais. A prática delas, porém, pressupunha uma
sociedade muito diversa da existente, muito mais urbanizada e educada.
O resultado desse hiato era um funcionamento das instituições adaptado
à realidade social do país, que passava forçosamente pelo controle das
eleições e pela restrição das garantias constitucionais ao âmbito das eli-
tes. Por essa razão mesmo, boa parte do debate da época se desenvolveu
em torno desse problema: como praticar um governo representativo num
país sem povo politicamente presente, onde apenas as elites, agrárias ou
burocráticas, tinham a capacidade de se fazer representar.
Bibliografia
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CONTIER, Arnaldo Daraya. Imprensa e Ideologia em São Paulo (1822-1842):
matizes do vocabulário político e social. Petrópolis, Editora Vozes, 1979.
Resumo: Abstract:
Partindo da premissa no sentido de que a histó- Based on the premise that the history of juridi-
ria dos conceitos jurídicos (ou a história do pen- cal concepts (or the history of juridical think-
samento jurídico) tem enormes potencialidades ing) has great potential of analysis, this paper
de análise, este trabalho retoma a produção do reviews the intellectual production of Brazilian
jurista brasileiro Augusto Teixeira de Freitas – jurist, Augusto Teixeira de Freitas – focusing on
e mais particularmente sua “Consolidação das his “Consolidation of Civil Laws” of 1857 – to
Leis Civis”, de 1857 – para enquadrá-lo como acknowledge him as a typical representative of
típico representante da cultura jurídica do sé- the juridical culture of Nineteenth century Bra-
culo XIX brasileiro: numa tensão e ecletismo zil: a tense and eclectic period still undefined
próprios de um período que ainda oscila en- between pre-modern and modern characteris-
tre características pré-modernas e modernas. tics. At the end, the paper also shows how the
Mostra-se, ao final, como o jurista brasileiro, Brazilian jurist, in the aforementioned work,
no trabalho referido, inclusive teve um papel de also played the role of “inventor” as he inter-
“inventor” na interpretação e compilação que preted and compiled the period’s civil legisla-
fez da legislação civil do período. tion.
Palavras-chave: Teixeira de Freitas; Brasil; Keywords: Teixeira de Freitas – Brazil – juridi-
pensamento jurídico; século XIX cal thinkings – Nineteenth century.
um lado, e a circulação de uma certa leitura marxista que desencorajava que se levasse a
sério qualquer dimensão “superestrutural”, de outro, foram elementos que incidiram neste
contexto. Ver a respeito FONSECA, Ricardo Marcelo. Introdução teórica à história do
direito. Curitiba: Juruá, 2009, p. 100 e segs.
4 – GROSSI, Paolo. Scienza giuridica italiana: un profilo storico (1860-1950). Milano:
Giuffré, 2000, p. XVI. (tradução livre). Ver ainda o texto “pensamento jurídico” em GROS-
SI, Paolo. História da propriedade e outros ensaios. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.
11 – A “Consolidação das leis civis”, como se sabe, foi um trabalho preparatório levado a
efeito por Teixeira de Freitas após a sua nomeação, pelo governo imperial, para elaborar
o projeto de código civil do Império. A ideia do autor era sistematizar a legislação vigente
no âmbito do direito civil da época, que era tremendamente labiríntica naquele momento,
já que composta pela Legislação portuguesa (que o governo após independência manteve
vigente), pelas leis brasileiras que haviam sido promulgadas desde a independência até
então, pelas leis de países estrangeiros (as leis das nações “cultas e civilizadas” que a Lei
da Boa Razão de 1769 trouxe para o arcabouço jurídico português) e pelas Ordenações
Filipinas. Foi publicada, em sua primeira edição, em 1857. Era composta de uma longa
“Introdução” e da “Consolidação” propriamente dita, que buscava expressar em artigos
sucintos (nos moldes dos documentos codificatórios do código XIX) aquilo que seria o
conjunto normativo vigente no Brasil da época.
c) Bem ao gosto dos ventos que sopravam neste momento nos países
europeus, percebe-se da parte de Teixeira de Freitas o ingresso em
algumas escaramuças contra concepções jusnaturalistas. Se no início
do período codificatório (na transição do século XVIII para o XIX) o
“positivismo jurídico”13 era visto como uma transição natural e conse-
quente do período racionalista do jusnaturalismo (ou seja: a positiva-
ção dos preceitos jurídicos nada mais significava do que a realização
da razão), a partir de agora (o momento de consolidação do mundo
burguês e a sua consequente necessidade de estabilização e endeusa-
mento do valor da segurança jurídica) positivismo jurídico e jusnatu-
ralismo passam a ser vistos como opostos e partes de uma dicotomia.
Nesse debate, adere Teixeira de Freitas aduzindo, por exemplo, que
o autor do Digesto português caminhou muito mal na medida em que
12 – TEIXEIRA DE FREITAS, Augusto. Introdução, “in” BRAZIL. Consolidação das
Leis Civis (publicação do governo). Rio de Janeiro: Typographia universal de Laemmert,
1857, p. VII.
13 – O autor destas linhas, aqui, previne-se de qualquer acusação de anacronismo: está
ciente que, neste período, em se tratando de “positivismo jurídico”, não se formulou ainda
o “nome”, apesar de já existir a “coisa”.
A resposta a esta pergunta não pode ser dada de modo tão apressado.
Teixeira de Freitas, como personagem híbrido que é, está muito longe
de entrar nas roupas frouxas de um “tipo ideal”. E isto por uma série de
motivos:
coisa móvel e o demandado não tiver bens de raiz (parece bem mais uma
disposição de cunho processual do que de direito material); já o título X
do Livro 4o. das Ordenações trata das hipóteses de vendas e alienações de
coisas sobre as quais pendem litígios judiciais; já o título 11 do Livro 4o
das Ordenações trata da proibição de constrangimento de vender os bens
a outros (sobretudo da própria família); e, finalmente, o título XXXVI do
Livro 4o das Ordenações trata da hipótese de alguém morrer sem nomear
alguém para a propriedade de foro.
defini-la pelos poderes (no caso, de usar e dispor) que o sujeito têm com
relação à coisa. Em suma, transfigura-se o texto das Ordenações (editado
em 1603 e que é expressão típica do “ius commune”, isto é, de uma apre-
ciação originariamente medieval da experiência jurídica) em dispositivo
individualista, moderno, à feição dos códigos oitocentistas. A operação de
‘Consolidação’, como se vê aqui, foi muito além da “reunião dos textos”
vigentes. Ocorreu sem dúvida alguma um caráter criador e conformador
(viabilizado pelo discurso “científico” do qual Teixeira de Freitas que-
ria ser o porta-voz) de um certo direito, um direito ainda não legal, não
promulgado, mas que a partir dali vai gozar de prestígio e até mesmo de
vigência24: não pode ser esquecido que após a promulgação e divulgação
da Consolidação (e em vista do malogro das tentativas de codificação até
1916), este texto serviu como guia na jurisprudência e na doutrina brasi-
leira por decênios.
go, cumpriu também, até algum ponto, uma tarefa de produção de um or-
denamento jurídico. Foi um verdadeiro inventor (travestido de compila-
dor de um direito supostamente vigente). Ao buscar ser o tradutor de uma
experiência jurídica que a todos parecia confusa e labiríntica, acabou por
ser dela o traidor, visto que, em alguma medida, superou-a e subverteu-a,
ao nela projetar (dizendo estar só “consolidando”) o que nela não existia.
O adágio da língua italiana que relembra como o tradutor de um texto está
sempre próximo de sua própria traição (traduttore/traditore) parece caber
como uma luva ao assim chamado “jurisconsulto do império”.
Resumo: Abstract:
Os meses que seguiram à Proclamação da Re- The months following the Proclamation of the
pública no Brasil viram recrudescer o senti- Republic in Brazil witnessed the growth of
mento antiportuguês no país. O antilusitanismo anti-Portugal feelings in the country. These
manifestou-se tanto na sua vertente popular, so- feelings were present among the lower popula-
bretudo em ações contra imigrantes portugueses tion, mostly through actions against Portuguese
radicados no meio urbano brasileiro, quanto em immigrants settled in Brazilian urban areas, as
crescentes dificuldades nas relações oficiais do well as in the growing difficulties involving the
novo Estado republicano com Portugal monár- new republican State official relations with the
quico. A correspondência diplomática entre a Portuguese monarchy. The diplomatic corre-
Legação lusitana no Rio de Janeiro e sua chan- spondence between the Portuguese Representa-
celaria em Lisboa revela episódios inusitados tion in Rio de Janeiro and its Foreign Ministry
que envolveram autoridades dos dois países. in Lisbon reveals unusual events involving au-
Em dezembro de 1889, três ocorrências de for- thorities of both countries. In December 1889,
te caráter antilusitano e xenófobo marcaram o three apparently articulated episodes of strong,
cotidiano da Capital Federal, aparentemente de xenophobic, anti-Portuguese feelings, marked
maneira articulada, levantando a suspeita de the daily activities of the Capital city. Suspicion
participação do ministro das Relações Exterio- of participation in those episodes fell on Quin-
res Quintino Bocaiúva, chanceler no primeiro tino Bocayuva, Minister of Foreign Relations
gabinete republicano. A suspeita nunca foi tor- and Chancellor in the first republican Minis-
nada pública, mas encontra-se registrada na do- try. That suspicion never became public; how-
cumentação diplomática portuguesa, apontando ever it is registered in Portuguese diplomatic
para aspecto pouco dimensionado nas relações documents, as a rather unimportant aspect in
binacionais luso-brasileiras do período. Luso-Brazilian bi-national relations during the
period.
Palavras-chave: Antilusitanismo; República; Keywords: Diplomacy – Anti-Portuguese feel-
Imigração; Imprensa. ings – Republic – Immigration – Press.
8 – Idem, ibid.
9 – VIANNA, Antonio Joaquim Barboza. Ofício reservado n.º 74 do encarregado do
Consulado de Portugal em Pernambuco a Manuel Garcia da Rosa, da Legação de Portugal
no Rio de Janeiro; Recife, 11.07.1890; LPRJ, correspondência recebida, 1890/1891, caixa
223, maço 1, AHD.
15 – CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados. São Paulo: Companhia das Letras,
1987.
16 – CONDE DE PAÇO D’ARCOS. Ofício confidencial n.º 22-A ao Conde de Valbom;
Rio de Janeiro, 24.12.1891; LPRJ, correspondência recebida, 1890/1891, caixa 223, maço
1, AHD.
17 – Grêmios republicanos da comunidade portuguesa foram criados, no período, em pelo
menos outras cinco cidades brasileiras: São Paulo, Santos, Belém do Pará, Recife e Pelo-
tas, além do Rio de Janeiro; sua localização em regiões diversas sugere ampla aceitação
do novo regime pelos imigrantes lusos no Brasil.
22 –������������������������������������������������������������������������������
SANTOS, Fernando Mattoso. Nota do ministro extraordinário de Portugal no Bra-
sil a Manoel Deodoro da Fonseca, presidente da República do Brasil; Rio de Janeiro,
04.09.1891; Missões Estrangeiras no Brasil. Portugal/Grã-Bretanha, 1823/1922; estante
273, prateleira 1, maço 10, Arquivo Histórico do Itamaraty (AHI).
23 – Decreto n.º 4 de 19.11.1889. Decretos do Governo Provisório da República dos Esta-
dos Unidos do Brasil, 1889/1891. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1914, v. 1, pp. 3-4.
único da ilha que viria a ser habitado, foi denominado Praia dos Portu-
gueses, numa homenagem notória acatada pelos militares e republicanos
brasileiros.
—
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CENTRO REPUBLICANO PORTUGUÊS DO RIO DE JANEIRO. Ata da
Assembléia Geral, de 20.12.1891; anexo ao ofício confidencial n.º 22 do Conde
de Paço d’Arcos ao Conde de Valbom; Rio de Janeiro, 24.12.1891; Legação de
Portugal no Rio de Janeiro (LPRJ), correspondência recebida, 1890/1891, caixa
223, maço 1, Arquivo Histórico-Diplomático (AHD) do Ministério dos Negócios
Estrangeiros (MNE) de Portugal.
CONDE DE PAÇO D’ARCOS. Ofício confidencial n.º 21 ao Conde de Valbom;
Rio de Janeiro, 24.12.1891; LPRJ, correspondência recebida, 1890/1891, caixa
223, maço 1, AHD-MNE.
CONDE DE PAÇO D’ARCOS. Ofício confidencial n.º 22-A ao Conde de Valbom;
Rio de Janeiro, 24.12.1891; LPRJ, correspondência recebida, 1890/1891, caixa
223, maço 1, AHD-MNE.
GRUPO VERMELHO. SOCIEDADE IRREDENTISTA. Carta-ameaça à
Legação de Portugal no Rio de Janeiro; anexo n.º 1 ao ofício confidencial n.º 21
do Conde de Paço d’Arcos ao Conde de Valbom; Rio de Janeiro, 24.12.1891;
LPRJ, correspondência recebida, 1890/1891, caixa 223, maço 1, AHD-MNE.
Resumo: Abstract:
O artigo analisa a implantação e consolidação This paper analyzes the implantation and con-
da siderurgia no Brasil e o papel desempenha- solidation of the steel industry in Brazil and the
do pelo Estado neste processo. O texto aborda role of the State in this process. The text will
com maior ênfase os períodos compreendidos focus on the period that goes from the initial
nas primeiras décadas do século XX, à época decades of the Twentieth century, the so-called
da chamada “República Velha”, e nos anos se- “Old Republic”, to the years following the 1930
guintes à Revolução de 1930, em que a criação Revolution, when the creation of Companhia
da Cia. Siderúrgica Nacional e da Cia. Vale do Siderurgica Nacional and Companhia Vale do
Rio Doce, durante o governo Vargas, represen- Rio Doce during the Vargas administration,
tam o ponto culminante da atuação estatal para a represented the highest point reached by State
efetiva implantação da indústria pesada no país. actions towards a positive insertion of heavy
Este recorte histórico é propício para a discus- industry in the country. This historical episode
são de temas centrais à industrialização nacio- propitiates the discussion of themes central to
nal, como a importância da iniciativa estatal no industrialization in Brazil, such as the impor-
processo de industrialização diante da ausência tance of State initiatives in the process of in-
de capital nacional e em contraposição ao con- dustrialization, given the absence of private,
trole estrangeiro sobre os recursos minerais. As- domestic financing, and also to compensate for
sim, a solução da “questão siderúrgica” revela foreign control over mineral resources. Thus,
o enfrentamento do Estado a problemas como the solution of the “steel industry issue” reveals
a exploração adequada dos recursos minerais the State confrontation of problems such as the
nacionais, o tratamento jurídico da propriedade adequate exploration of the country’s mineral
de minas e jazidas, bem como a atuação de capi- resources, the legal aspects of the ownership
tais estrangeiros na atividade industrial interna, of mines and large deposits of ore, as well as
com o intuito de efetivar políticas voltadas à in- the role of foreign capital in internal, industrial
dependência econômica, cujo pressuposto era o activities. The purpose was to establish policies
controle do Estado sobre seus recursos naturais dealing with economic independence that would
para beneficiar a economia nacional. allow for the State control of its natural resourc-
es to benefit the country’s economy.
Palavras-chave: siderurgia, industrialização, Keywords: Steel Industry – Industrialization –
estatização. State Activities.
que não estaria adaptado ao Brasil. Ver Wilhelm von ESCHWEGE, Pluto Brasiliensis,
vol. 2, pp. 271-277. Sobre a decadência da mineração, ver, ainda, Caio PRADO Jr., For-
mação do Brasil Contemporâneo – Colônia, pp. 169-174.
7 – João Pandiá CALÓGERAS, As Minas do Brasil e Sua Legislação, vol. I, pp. 160-
163; vol. III, pp. 8-10 e COMPANHIA VALE DO RIO DOCE, A Mineração no Brasil e
a Companhia Vale do Rio Doce, pp. 98-101. A necessidade da doação ser expressa estava
prevista nas Ordenações Filipinas, Livro 2º, Título XXVIII: "Por quanto em muitas doa-
ções feitas per Nós, e per os Reys nossos antecessores, são postas clausulas muito geraes
e exuberantes, declaramos, que por taes doações, e clausulas nellas cônteùdas, nunca se
entende serem dadas as dizimas novas dos pescados, nem os veeiros e Minas, de qualquer
sorte que sejam, salvo se expressamente forem nomeados, e dados na dita doação. E para
prescrição das ditas cousas não se poderá allegar posse alguma, postoque seja immemo-
rial".
8 – Francisco de Assis BARBOSA, Dom João VI e a Siderurgia no Brasil, pp. 50-52 e
Geraldo Mendes BARROS, História da Siderurgia no Brasil – Século XIX, pp. 43-47.
21 – João Pandiá CALÓGERAS, As Minas do Brasil e Sua Legislação, vol. III, pp. 76-
110 e 147-188 e Attilio VIVACQUA, A Nova Política do Sub-Solo e o Regime Legal das
Minas, pp. 530-532.
22 – Attilio VIVACQUA, A Nova Política do Sub-Solo e o Regime Legal das Minas, pp.
305-311; Afrânio do AMARAL, Siderurgia e Planejamento Econômico do Brasil, pp.
272-274; Edgard J. ROGERS, “Brazil’s Rio Doce Valley Project: A Study in Frustration
and Perseverance”, Journal of Inter-American Studies, vol. 1, nº 2, pp. 124-125; Hum-
berto BASTOS, A Conquista Siderúrgica no Brasil, pp. 107-108; Luciano MARTINS,
Pouvoir et Développement Économique, pp. 168-169 e Marta Zorzal e SILVA, A Vale do
Rio Doce na Estratégia do Desenvolvimentismo Brasileiro, p. 131.
nome do grupo foi modificado, em 1911, para Itabira Iron Ore Company,
que se tornou a companhia responsável pela execução do contrato de con-
cessão com o Governo brasileiro, autorizada pelo Decreto nº 8.787, de 16
de junho de 1911. Após os estudos iniciais, no entanto, faltaram recursos
para a Itabira Iron junto a seus financiadores externos, que desejavam
uma garantia do Estado brasileiro em relação aos empréstimos que fariam
à Itabira Iron, garantia esta que o Governo brasileiro se recusou a forne-
cer. Sem recursos externos e com o início da Primeira Guerra Mundial,
muito pouco foi realizado pela Itabira Iron, que não cumpriu nenhuma de
suas obrigações assumidas no contrato de concessão24.
24 – Edgard J. ROGERS, “Brazil’s Rio Doce Valley Project: A Study in Frustration and
Perseverance”, Journal of Inter-American Studies, vol. 1, nº 2, pp. 125-127; Humberto
BASTOS, A Conquista Siderúrgica no Brasil, pp. 125-128; Werner BAER, Siderurgia e
Desenvolvimento Brasileiro, pp. 91-92; Luciano MARTINS, Pouvoir et Développement
Économique, pp. 169-170; Liana AURELIANO, No Limiar da Industrialização, pp. 50-
51; Dermeval José PIMENTA, A Vale do Rio Doce e Sua História, pp. 27-34; Wilson SU-
ZIGAN, Indústria Brasileira: Origem e Desenvolvimento, pp. 277-278; COMPANHIA
VALE DO RIO DOCE, A Mineração no Brasil e a Companhia Vale do Rio Doce, pp. 154-
156; Sydenham LOURENÇO Neto, Marchas e Contra-Marchas da Intervenção Estatal,
pp. 78-79 e Marta Zorzal e SILVA, A Vale do Rio Doce na Estratégia do Desenvolvimen-
tismo Brasileiro, pp. 130-131. Além da Itabira Iron, dois industriais brasileiros, Carlos
Wigg e Trajano de Medeiros, obtiveram do Presidente Hermes da Fonseca, em fevereiro
de 1911, a concessão para a instalação de uma grande usina siderúrgica integrada, nos
termos do Decreto nº 2.406/1911. No entanto, a Câmara dos Deputados rejeitou a apro-
vação do contrato, entendendo que se criaria um virtual monopólio com financiamento
público, autorizando a rescisão do contrato ou a extensão das vantagens obtidas a todas as
demais empresas que se propusessem a atuar na siderurgia (artigo 83 da Lei nº 2.544, de
04 de janeiro de 1912). Com o impasse instalado, o contrato não foi executado, nem ofi-
cialmente anulado, mas nunca iria obter a aprovação legislativa necessária. Vide Luciano
MARTINS, Pouvoir et Développement Économique, pp. 170-171 e Wilson SUZIGAN,
Indústria Brasileira: Origem e Desenvolvimento, pp. 278-279.
25 – João Pandiá CALÓGERAS, As Minas do Brasil e Sua Legislação, vol. II, p. 573.
27 – João Pandiá CALÓGERAS, As Minas do Brasil e Sua Legislação, vol. II, pp. 582-
583.
28 – João Pandiá CALÓGERAS, As Minas do Brasil e Sua Legislação, vol. I, p. X, vol.
II, pp. 576-577.
29 – Artigo 2º do Decreto nº 2.933/1915: "Art. 2º – A mina constitue propriedade immo-
vel, distincta do sólo, sendo alienavel isoladamente. Os accessorios permanentemente
destinados á exploração, obras d'arte, construcções, machinas e instrumentos, animaes e
vehiculos empregados no serviço da mina, bem como o material de custeio em deposito,
são considerados immoveis".
30 – João Pandiá CALÓGERAS, As Minas do Brasil e Sua Legislação, vol. III, pp. 309-
334; Attilio VIVACQUA, A Nova Política do Sub-Solo e o Regime Legal das Minas, pp.
534-539 e Alberto VENÂNCIO Filho, A Intervenção do Estado no Domínio Econômico,
pp. 133-134.
31 – Attilio VIVACQUA, A Nova Política do Sub-Solo e o Regime Legal das Minas, pp.
308-311; Edgard J. ROGERS, “Brazil’s Rio Doce Valley Project: A Study in Frustration
and Perseverance”, Journal of Inter-American Studies, vol. 1, nº 2, pp. 127-129; Hum-
berto BASTOS, A Conquista Siderúrgica no Brasil, pp. 115-117 e 132-133; Osny Duarte
PEREIRA, Ferro e Independência, pp. 27-31; Werner BAER, Siderurgia e Desenvolvi-
mento Brasileiro, pp. 92-93; Edmundo de Macedo Soares e SILVA, O Ferro na História
e na Economia do Brasil, pp. 76-78; John D. WIRTH, A Política do Desenvolvimento na
Era de Vargas, pp. 59-60; Luciano MARTINS, Pouvoir et Développement Économique,
pp. 171-174; Liana AURELIANO, No Limiar da Industrialização, pp. 51-52; Dermeval
José PIMENTA, A Vale do Rio Doce e Sua História, pp. 34-40; COMPANHIA VALE
DO RIO DOCE, A Mineração no Brasil e a Companhia Vale do Rio Doce, pp. 156-158;
Sydenham LOURENÇO Neto, Marchas e Contra-Marchas da Intervenção Estatal, pp.
79-81 e Marta Zorzal e SILVA, A Vale do Rio Doce na Estratégia do Desenvolvimentismo
Brasileiro, pp. 133-134. Para a versão do Presidente Epitácio Pessoa, em que este defende
o contrato com a Itabira Iron como necessário para o desenvolvimento da siderurgia no
país, vide Epitácio PESSOA, Pela Verdade, pp. 377-399. Já Percival Farquhar teve seus
pontos de vista defendidos pelo livro, nada isento e repleto de imprecisões históricas, do
norte-americano Charles A. GAULD, Farquhar, pp. 358-369. Epitácio Pessoa, ainda, ou-
torgou a concessão para exploração de uma usina para fusão de minério de ferro e fabri-
cação e laminação de aço pelo processo de altos fornos a madeira para a Usina Queiroz
Júnior Ltda. (antiga Usina Esperança), por meio do Decreto nº 15.493, de 23 de maio de
1922. Ver Francisco Magalhães GOMES, História da Siderurgia no Brasil, pp. 151-152.
43 – Celso FURTADO, Formação Econômica do Brasil, pp. 323-335; Caio PRADO Jr.,
História Econômica do Brasil, pp. 287-300; Octavio IANNI, Estado e Capitalismo, pp.
61-63; Stanley E. HILTON, "Vargas and Brazilian Economic Development, 1930-1945: A
Reappraisal of his Attitude Toward Industrialization and Planning", The Journal of Eco-
nomic History, vol. 35, nº 4, pp. 754-762 e 769-777; Sônia DRAIBE, Rumos e Metamor-
foses, pp. 94-95; Pedro Cezar Dutra FONSECA, Vargas: O Capitalismo em Construção,
pp. 181-202; Ricardo BIELSCHOWSKY, Pensamento Econômico Brasileiro, pp. 248-
259; Francisco Luiz CORSI, Estado Novo: Política Externa e Projeto Nacional, pp. 47-49
e 56-58 e Pedro Paulo Zahluth BASTOS, "A Construção do Nacional-Desenvolvimentis-
mo de Getúlio Vargas e a Dinâmica de Interação entre Estado e Mercado nos Setores de
Base", Revista EconomiA, vol. 7, nº 4, pp. 246-253. Ver também Attilio VIVACQUA, A
Nova Política do Sub-Solo e o Regime Legal das Minas, pp. 37-47.
44 – Gabriel COHN, Petróleo e Nacionalismo, pp. 14-15; John D. WIRTH, A Política
do Desenvolvimento na Era de Vargas, p. 120; Sylvio Fróes ABREU, Recursos Minerais
do Brasil, vol. 2, pp. 392-394 e COMPANHIA VALE DO RIO DOCE, A Mineração no
Brasil e a Companhia Vale do Rio Doce, p. 173.
48 – Attilio VIVACQUA, A Nova Política do Sub-Solo e o Regime Legal das Minas, pp.
315-320; Humberto BASTOS, A Conquista Siderúrgica no Brasil, pp. 130-139; Osny Du-
arte PEREIRA, Ferro e Independência, pp. 36-37; Edmundo de Macedo Soares e SILVA,
O Ferro na História e na Economia do Brasil, pp. 89-98; John D. WIRTH, A Política do
Desenvolvimento na Era de Vargas, pp. 66-68; Luciano MARTINS, Pouvoir et Dévelo-
ppement Économique, pp. 188-195; Dermeval José PIMENTA, A Vale do Rio Doce e Sua
História, pp. 49-52 e COMPANHIA VALE DO RIO DOCE, A Mineração no Brasil e a
Companhia Vale do Rio Doce, pp. 180-181.
49 – Attilio VIVACQUA, A Nova Política do Sub-Solo e o Regime Legal das Minas, pp.
575-581; Afrânio do AMARAL, Siderurgia e Planejamento Econômico do Brasil, pp.
274-275; Osny Duarte PEREIRA, Ferro e Independência, pp. 43-45; Gabriel COHN,
Petróleo e Nacionalismo, pp. 16-18; Medeiros LIMA, Petróleo, Energia Elétrica, Si-
derurgia: A Luta pela Emancipação – Um Depoimento de Jesus Soares Pereira sobre a
Política de Getúlio Vargas, pp. 58-59; Luciano MARTINS, Pouvoir et Développement
55 – Edgard J. ROGERS, “Brazil’s Rio Doce Valley Project: A Study in Frustration and
Perseverance”, Journal of Inter-American Studies, vol. 1, nº 2, pp. 131-132; Werner
BAER, Siderurgia e Desenvolvimento Brasileiro, pp. 93-94; John D. WIRTH, A Política
do Desenvolvimento na Era de Vargas, pp. 62-63 e 84 e Luciano MARTINS, Pouvoir et
Développement Économique, pp. 205-206. Para a versão de Farquhar, visto como "víti-
ma" de poderosos interesses financeiros internacionais aliados a grupos brasileiros que
não desejavam o desenvolvimento do país, vide Charles A. GAULD, Farquhar, pp. 382-
495.
56 – Getúlio VARGAS, "Problemas e Realizações do Estado Novo" in A Nova Política do
Brasil, vol. V, p. 180.
estatal, no Brasil. Por sua vez, o Ministro das Relações Exteriores, Oswal-
do Aranha, seguiu para Washington com o mesmo objetivo. O resultado
de ambas as missões foi a promessa do Export-Import Bank de financiar o
equipamento da usina siderúrgica brasileira e o início das negociações, em
abril de 1939, com a United States Steel. A empresa norte-americana se
manifestou contrária à solução estatal e propôs uma companhia de capital
misto, brasileiro e americano, além do envio de uma missão técnica ao
Brasil. Após um ano de estudos, os americanos concluíram pela viabilida-
de de utilização do carvão brasileiro60 e pela localização da usina no pró-
prio Distrito Federal, em localidade situada a uma distância próxima das
jazidas de ferro de Minas Gerais e das minas de carvão de Santa Catarina,
além de possuir instalações portuárias e ferroviárias adequadas ou que
poderiam ser mais facilmente melhoradas. A proposta norte-americana
foi vista como superior às demais e, para garantir seu êxito, cancelou-se
a concessão da Itabira Iron definitivamente em 11 de agosto de 1939, por
meio do Decreto nº 1.50761.
torizações estava prevista expressamente no artigo 143, §4º da Carta de 1937: "§ 4º – In-
depende de autorização o aproveitamento das quedas dágua já utilizadas industrialmente
na data desta Constituição, assim como, nas mesmas condições, a exploração das minas
em lavra, ainda que transitòriamente suspensa".
65 – Humberto BASTOS, A Conquista Siderúrgica no Brasil, pp. 186-187; Werner BAER,
Siderurgia e Desenvolvimento Brasileiro, pp. 100-101; Edmundo de Macedo Soares e
SILVA, O Ferro na História e na Economia do Brasil, pp. 133-134; Luciano MARTINS,
Pouvoir et Développement Économique, pp. 223-225; Francisco Luiz CORSI, Estado
Novo: Política Externa e Projeto Nacional, pp. 147-151 e Sydenham LOURENÇO Neto,
Marchas e Contra-Marchas da Intervenção Estatal, pp. 144-145.
66 – John D. WIRTH, A Política do Desenvolvimento na Era de Vargas, pp. 91-94.
67 – Attilio VIVACQUA, A Nova Política do Sub-Solo e o Regime Legal das Minas, pp.
331-340; Humberto BASTOS, A Conquista Siderúrgica no Brasil, pp. 188-194; Edmundo
de Macedo Soares e SILVA, O Ferro na História e na Economia do Brasil, pp. 134-136;
Francisco Magalhães GOMES, História da Siderurgia no Brasil, pp. 246-268; COMPA-
NHIA VALE DO RIO DOCE, A Mineração no Brasil e a Companhia Vale do Rio Doce,
pp. 183-184; Francisco Luiz CORSI, Estado Novo: Política Externa e Projeto Nacional,
pp. 151-158 e Sydenham LOURENÇO Neto, Marchas e Contra-Marchas da Intervenção
Estatal, pp. 145-146.
país tendo que se alinhar totalmente ao lado dos Estados Unidos, embora
conseguisse pressionar os norte-americanos para a obtenção de vantagens
para a industrialização, como o financiamento da implantação da siderur-
gia estatal69.
75 – Caio PRADO Jr., História Econômica do Brasil, pp. 320-322; Sulamis DAIN, Em-
presa Estatal e Capitalismo Contemporâneo, pp. 267-268, 276-277, 280-281 e 283-285;
Sônia DRAIBE, Rumos e Metamorfoses, pp. 125-128 e Marta Zorzal e SILVA, A Vale do
Rio Doce na Estratégia do Desenvolvimentismo Brasileiro, pp. 52-53, 124 e 126-127.
Vide também Wanderley Guilherme dos SANTOS, O Ex-Leviatã Brasileiro, pp. 29-33.
76 – John D. WIRTH, A Política do Desenvolvimento na Era de Vargas, pp. 105-109.
Ver, ainda, Sulamis DAIN, Empresa Estatal e Capitalismo Contemporâneo, pp. 133-136
e 281-283 e Pedro Cezar Dutra FONSECA, Vargas: O Capitalismo em Construção, pp.
269-271. Afrânio do Amaral, por exemplo, em 1946, entendia que a siderurgia poderia
transformar a estrutura econômica brasileira de tal forma que sua disseminação pelo in-
terior do país poderia promover um surto de desenvolvimento que deveria ser planejado
pelo Estado, acelerando a implementação de grandes reformas na educação, saúde, estru-
tura fundiária, etc. Ver Afrânio do AMARAL, Siderurgia e Planejamento Econômico do
Brasil, pp. 385-415. Na opinião de Sydenham Lourenço Neto, o caso da implantação da
usina siderúrgica estatal no Brasil é curioso: "A junção de um virtual oligopólio privado
com um virtual monopólio estatal – que logo se converteria em virtual oligopólio estatal –
criou um mercado potencialmente competitivo. Isto é, a intervenção estatal direta, mesmo
limitada pelo poder político dos produtores de aço, gerou um modelo mais próximo do
mercado livre do que anteriormente existia" in Sydenham LOURENÇO Neto, Marchas e
Contra-Marchas da Intervenção Estatal, p. 162.
Referências Bibliográficas
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Siderúrgica: 1930-1975” in LIMA Jr., Olavo Brasil de & ABRANCHES, Sérgio
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Glória, 2ª ed., Belo Horizonte, EdUFMG, 2002.
COHN, Gabriel, Petróleo e Nacionalismo, São Paulo, Difel, 1968.
Resumo: Abstract:
Como expresión de una línea de investigación As the expression of a line of investigation that
que el autor desarrolla en torno de la perspectiva the author develops under an Argentine per-
argentina respecto de los productos y debates de spective, concerning the intellectual production
la cultura jurídica brasileña durante la prime- and debates over Brazilian juridical culture
ra mitad del siglo XX (fenómeno que hasta el during the first half of the Twentieth century (a
momento no había sido tenido en cuenta por los phenomenon that had not yet been taken into
iushistoriadores), aquí se examina de qué ma- account by historians), this paper will examine
nera una de las más prestigiosas publicaciones ways in which one of the most prestigious, pro-
profesionales editadas en Buenos Aires consi- fessional journals published in Buenos Aires,
deró el derecho del Brasil durante el quinque- took into consideration the Law in Brazil during
nio 1941-1945. En lo fundamental, se concluye the five-year period, 1941-1945. Basically, one
que teniendo como estímulo las propuestas del may conclude that, stimulated by legal compari-
comparativismo jurídico, los autores argentinos son proposals, the Argentine authors attentively
examinaron con mucha atención la legislación y examined Brazilian legislation and doctrine.
la doctrina brasileña. Imbuidos de un marcado Inspired by strong criticism and motivated by a
espíritu crítico y motivados por la búsqueda de search for proposals that would prove useful to
propuestas que resultasen útiles para su propia their own reality, the Argentines would praise
realidad, los argentinos solían elogiar la inde- the independence of Brazilian juridical thinking
pendencia del pensamiento jurídico brasileño y and its adequacy to the challenges coming from
su adecuación frente a los desafíos que proponía an ever changing social reality.
una cambiante realidad social.
Palavras-chave: Argentina – Cultura jurídica – Keywords: Argentina – Juridical Culture – His-
Historia del Derecho – Abogados. tory of Law - Lawyers.
Introducción
Ofrezco aquí un ensayo que se integra a una línea de investigación
que ya motivó una primera contribución durante el Segundo Encuentro
celebrado por el Instituto Latino Americano de Historia del Derecho y la
Justicia (Curitiba, 2009)2: me refiero a la recreación de la imagen argen-
sas, cabe señalar que las obras o los trabajos brasileños consultados solían
ser de reciente factura, lo cual nos remite a la constante actualización de
los materiales brasileños examinados en la Argentina.
38 – Cfr. sus artículos La equidad frente al derecho positivo. La Ley. t. 32. octubre-di-
ciembre de 1943; y Clovis Bevilacqua frente al pensamiento jurídico actual. La Ley. t. 35.
julio-septiembre de 1944.
39 – El problema de las casas para obreros en el Brasil. La Ley. t. 32. octubre-diciembre
de 1943.
40 – Véase su artículo, traducido por Carlos Giuliani Fonrouge, Ideas generales sobre
imposición de los beneficios extraordinarios. La Ley. t. 40. octubre-diciembre de 1945.
41 – Cfr. La Ley. t. 23, p. 23, sección doctrina.
42 – La Ley. t. 23, p. 27, sección doctrina. julio-septiembre de 1941
43 – A. Comentario a J.A.César Salgado, “Especialización de la magistratura criminal”,
Revista Forense (Rio de Janeiro), diciembre de 1943. La Ley. t. 34, pp. 1211 y 1212. abril-
junio de 1944.
Ahora bien, los frecuentes elogios no eludían las críticas. Así, al co-
mentar la obra de Alipio Silveira, Conceito e funçoes da equidade em
face do direito positivo (especialmente no direito civil), Sao Paulo, edi-
ción del autor, 1943, Lorenzo Carnelli lamentó el que prevaleciese una
confusa erudición. “Nada podría encontrarse [allí] , atinente a la equidad,
-sostiene el comentarista- que no estuviera en él referido con pertinencia,
aunque en ciertos instantes se pierde el pensamiento del autor bajo el peso
de las citas”53. Otro ejemplo del tamiz crítico al que eran sometidos los
productos jurídicos brasileños se encuentra en el análisis efectuado por
Roberto Terán Lomas al código penal de 1942. Admite este comentarista:
“Hemos indicado en cada caso nuestra opinión sobre lo que consideramos
los aciertos y los desaciertos del código penal del Brasil. Pese a algunos
criterios que conceptuamos equivocados, y en especial a la excesiva am-
plitud de las medidas de seguridad, podemos concluir que se ha brindado
al Brasil un buen código represivo, a corto plazo de la sanción de aquel
monumento jurídico que es el código penal suizo de 1937”54.
55 – La Ley. t. 21, p. 11, sección revista de revistas. La Ley. t. 23, p. 4, sección bibliografía.
La Ley. t. 27, p. 1155. julio-septiembre de 1942.
56 – L.C.G. Comentario a Astolfo de Resende, El anteproyecto del código de las obliga-
ciones. La Ley, t. 35, pp. 1245 y 1246. julio-septiembre de 1944.
57 – La Ley. t. 24, p. 3, sección revista de revistas.
58 – La Ley. t. 24, p. 16, sección revista de revistas.
59 – La Ley. t. 28, p. 1155. octubre-diciembre de 1942.
60 – Liebman, E. Art. cit., p. 960. La Ley. t. 31, p. 1156. julio-septiembre de 1943.
61 – Cfr. Silveira, A. La equidad frente al derecho positivo. Art. cit. p. 1060 y ss.
62 – Carnelli, L. Comentario a Alipio Silveira, Conceito e funcoes da equidade em face
do direito positivo (especialmente no direito civil). La Ley. t. 35, p. 1158. julio-septiembre
de 1944.
63 – La Ley. t. 21, p. 13, sección revista de revistas.
64 – La Ley. t. 28, p. 1172. octubre-diciembre de 1942
Consideraciones finales
Para mediados del siglo XX el interés argentino en la cultura jurídica
brasileña bien puede caracterizarse como intenso y frecuente. Entiendo
que la causa de esta curiosidad respondió, en buena medida, a la común
sensibilidad con la que los juristas de ambos países asumían la proyecci-
ón social del derecho68. Así, mientras que en la Argentina esta dimensión
de lo normativo se asumía como algo insoslayable69, en la jurisprudencia
brasileña coetánea se pregonaba que “el derecho no se petrifica, ni el
juzgador puede quedar insensible a la realidad”. En definitiva, advierto
una notable sintonía entre las preocupaciones y sensibilidades jurídicas
argentinas y brasileñas del momento. Así las cosas, no resulta sorpren-
dente que un autor brasileño reprodujese las palabras del profesor argen-
tino Atienza, conforme con las cuales se preconizaba retornar “al juez de
70 – SILVEIRA, A. La equidad frente al derecho positivo. Art. cit., pp. 1054 y 1067.
71 – Cfr. un ejemplo de lo dicho en La Ley. t. 34, p. 924. octubre-diciembre de 1944.
II – comunicações
NOTIFICATIONS
Resumo: Abstract:
O trabalho investiga o pensamento jus-filosófico This article will investigate the jus-philosophi-
de Clóvis Beviláqua (1859-1944), ao final do cal thought of Clovis Bevilaqua (1859-1944) at
sec. XIX , através da análise de sua obra Juris- the end of the Nineteenth century, through the
tas Philosophos (1897). O objetivo da análise é analysis of his work, Philosopher Jurists (1897).
detectar as principais concepções da filosofia do The purpose of this analysis is to identify the ex-
direito que, então, influenciavam o autor do an- isting, principal philosophical concepts of Law
teprojeto do 1º. Código Civil Brasileiro (1916). that influenced the author of the First Brazilian
A hipótese de trabalho se cinge ao fato de que tal Civil Code draft (1916). The hypothesis of this
conhecimento pode abrir caminhos para a com- paper deals with the fact that such knowledge
preensão de questões importantes, ligadas ao might open the way to the understanding of im-
estudo da história do direito no Brasil, da qual portant issues concerning the studies of the his-
Clóvis Beviláqua é um partícipe privilegiado. A tory of Law in Brazil, of which Clovis Bevilaqua
análise de conteúdo da obra propiciará o estu- was a privileged participant. The contents
do da evolução histórica do direito, das várias analysis of this work will facilitate the study of
escolas jurídicas que influíram nesta evolução the historical evolution of Law, of the various
e da metodologia adotada pelos diferentes jus- Law schools that influenced that evolution and
filósofos estudados por Clóvis em seu livro. O of the methodology used by the different jus-
cientificismo reinante na “Escola do Recife”, da philosophers studied by Clovis Bevilaqua in his
qual Clóvis foi um dos principais membros, vai book. The scientism dominating the “School of
dar margem a interpretações epistemológicas. O Recife”, where Clovis Bevilaqua was one of its
objetivo final – que é perseguido por Clóvis – é prime members would lead to epistemological
alcançar uma concepção científica do direito interpretations. The end purpose – pursued by
Clovis – is to reach a scientific concept of Law.
Palavras-chave: Pensamento jusfilosófico; Keywords: Jus-philosophic thought – Clo-
Clóvis Beviláqua; Século XIX (final) “Escola vis Bevilaqua – End of Nineteenth century –
do Recife”. “School of Recife”.
Preliminares
Nosso interesse em investigar o pensamento jusfilosófico de Clóvis
Beviláqua, ao final do século XIX, foi despontado por dois motivos: 1)
1. Dados Biográficos
Clóvis Beviláqua nasceu em Viçosa, município do Estado Ceará, no
dia 4 de outubro de 1859 e faleceu na cidade do Rio de Janeiro, então
Distrito Federal, em 26 de julho de 1944. Filho do vigário de sua cidade
natal – José Bevilacqua e de D. Martiniana de Jesus Aires. Seu avô pater-
no – Ângelo Bevilacqua – era italiano, da cidade de Trieste, que chegou
a Fortaleza como náufrago, aí fixando residência. Casou com D. Luísa
Gaspar de Oliveira, de tradicional família cearense.3
2. Juristas Philosophos
2.1.1 Prefácio
Ao prefaciar seu próprio livro, logo no primeiro parágrafo, Clóvis
cuida de advertir que não vai se ocupar
Declara, a seguir, que não foi sua intenção escrever a história da filo-
sofia jurídica. Diz ele: “destaquei alguns nomes typicos, representativos
de uma fórma nova do pensamento jurídico, quando não creadores de
uma phase nova da sciencia”5. Aqui, Clóvis mostra sua adesão ao novo,
mergulhado que estava no ethos da Escola do Recife – demolidora do di-
reito natural – teológico e metafísico (então, ainda vigente na Faculdade
de Direito), escola formada por um grupo de estudiosos do direito, lide-
rados por Tobias Barreto, que promoveu uma desejada (pelos estudantes)
e tardia abertura às idéias filosóficas e jurídicas, ideias que, segundo Cló-
vis, já vinham sendo alicerçadas a partir do século XVII . Mostra claro,
neste ensejo, a relação da Filosofia com a Ciência, orientadas por novos
paradigmas (naturalismo, historicismo, positivismo jurídico, evolucionis-
mo e monismo).
2.1.2 Introdução
Na Introdução de Juristas Philosophos, publicado em 1897, Clóvis
faz uma análise da evolução do Direito, desde as citadas “origens obscu-
ras” até o período que lhe é contemporâneo.
5 – Ibidem, idem.
6 – Ibidem, idem.
jusfilosóficas dos helenos e são eles que vão iluminar e vivificar a juris-
prudência romana.9
9 – Idem: 5 e 6 .
10 – Idem: 9 .
11 – Idem: 9 .
E as discrimina:
“De um lado, é a teoria do direito natural cujas sementes fôram lan-
çadas pela philosophia grega, que dominára um momento em Roma,
e resurgira no seculo XVI com Oldendorp e Hemming, e se firmára
definitivamente no livro celebre de Grotius – De jure belli ac pacis. De
outro, a reacção positivista de Bentham pelo utilitarismo. De outro,
finalmente, a tendência histórica que iniciára Cujas e que deu nasci-
mento á brilhante eschola de Savigny.”12
2.2 Os Escolhidos
2.2.1 Cicero (106 a.C. – 43 a.C.)
17 – Idem: 38.
18 – Idem: 40.
21 – Idem: 55 e 56.
22 – Idem: 56.
23 – MORIN: 357 e segs.
leis, “completando uns trechos com outros”, e veremos “que não é tam
exclusiva a sua doutrina, como, a principio se afigura.”24
24 – BEVILÁQUA (1897):58.
25 – Idem: 69.
26 – Idem: 70.
“que Jhering deixou quasi no olvido, porém que tem tambem o seu
valor especial para merecer particular exame, como no-lo mostrou
Tobias Baretto, desenvolvendo e completando assim as doutrinas do
mestre.”28
Indaga Clóvis: Como surge e para que fim existe esse sistema de
institutos e de normas que constitui o direito?
27 – Idem: 70 e 71.
28 – Idem: 71.
29 – JHERING, in BEVILÁQUA ( 1897): 71 e 72.
“O direito não é uma idéa logica, mas uma idéa de força; eis porque
a justiça que soergue, numa das mãos, a balança onde peza o direito,
sustenta, com a outra, a espada para faze-lo valer. A espada sem a ba-
lança é a força bruta; a balança desacompanhada da espada é o direito
em sua impotência.” 32
30 – Idem: 73.
31 – BEVILÁQUA (1897): 75.
32 – JHERING, in BEVILÁQUA (1897): 77.
36 – Idem: 88.
37 – Idem: 89.
38 – Idem: 92.
39 – Idem: 93.
“O homem não possue uma idéa innata do direito, pois que este é um
phenomeno social que se transforma indefinidamente e se tem vindo
consolidando, aos poucos, laboriosamente.”43
Clóvis encerra seu estudo sobre Post, comparando sua doutrina com
a de Jhering, realçando o modo como elas se completam, uma preen-
chendo as lacunas da outra. Por exemplo: Post vê o direito agindo na so-
ciedade, acentuando suas formas diferentes e sua evolução; Jhering, por
46 – Idem: 106.
47 – Idem: 110.
48 – Idem: 112.
49 – Idem, p. 113.
Como diz Clóvis, ele e Sílvio quase sempre estão de acordo quanto
às doutrinas filosóficas que interessam ao direito. Na realidade, ambos
concebem o direito como um fenômeno social, que pode ser estudado
cientificamente, fenômeno que é uma das criações fundamentais da hu-
manidade. Ainda consideram que o direito se enquadra no campo de ob-
servação que é a sociologia. Tobias se posicionava de forma contrária aos
dois. Grandes amigos, Tobias e Sílvio se enfrentaram de maneira cortês,
quando da publicação do livro do primeiro – Variações anti-sociologicas,
quando Sílvio rebateu, um a um, os argumentos expendidos por Tobias.
Das conclusões que Sílvio Romero alcançou com seu livro Ensaios
de Philosophia do Direito, apontadas por Clóvis, cumpre registrar a preo-
cupação do autor em justificar a sociologia como ciência, para isso defen-
dendo a possibilidade da existência de leis sociais e que sua formação não
será obstaculizada pela liberdade humana – esta um fato inegável e que
não impede o estudo do direito sobre bases científicas. A sociologia
“occupa-se com os phenomenos humanos estudáveis nos diversos
grupos, raças, povos, etc., em que se acha dividida a humanidade, para
desses factos induzir os princípios geraes que se pódem applicar ao
grande todo.”54
Sílvio, com seu livro, abriu um largo debate, e a sociologia dele saiu
mais revigorada e mais resistente, ainda incipiente, mas já grandiosa sín-
tese de experiência humana.
Mais uma vez, as ideias de Sílvio e Clóvis são iguais no que diz res-
peito à concepção da sociedade. Tal concepção
“depende, forçosamente, da concepção mais geral do universo, em
cujo grêmio incommensuravel ella se agita. Pede, pois, a lógica a pre-
via affirmação de uma philosophia para a orientação das pesquizas no
campo da actividade social.”55
54 – BEVILÁQUA (1897):134.
55 – Idem; 135 .
3. Análise conclusiva
Nosso interesse em pesquisar o pensamento de Clóvis Beviláqua
sobre questões filosóficas e da ciência do Direito data de alguns anos e,
porque supomos que o período vivido no Recife foi o de sua formação
epistemológica fundamental, resolvemos “começar do começo”. Em Re-
cife, dedicou-se aos labores de acadêmico, bibliotecário e professor na
velha Faculdade de Direito, e, principalmente, participou do movimento
intelectual denominado “Escola do Recife”. Várias indagações povoam
nossa cabeça. Durante a elaboração deste trabalho, algumas delas foram
satisfeitas e é sobre elas que, a seguir, vamos tratar. Por primeiro, vamos
verificar os posicionamentos de Clóvis ligados a duas questões episte-
mológicas, por elas estarem muito presentes em sua obra aqui analisada.
Depois, tratamos de aspectos metodológicos e de conteúdo, e, por derra-
deiro, procuramos sintetizar sua concepção científica do direito.
59 – Idem: 139.
60 – Idem: 88.
61 – Idem, p. [III].
62 – VIEHWEG, 1991: 56 .
65 – MIRANDA, Pontes de. Fontes e evolução do direito civil brasileiro, p. 489. In: GO-
MES, Orlando, 1958: 23.
66 – GADAMER, 2007: 41.
67 – Ver BONAVIDES, Paulo, 1967:203.
68 – BEVILÁQUA, 1897:121.
Referências bibliográficas
ADEODATO, João Maurício (org.). Jhering e o Direito no Brasil. Recife: Editora
Universitária da UFPE, 1995.
ADORNO, Theodor. Introdução à Sociologia. Tradução Wolfgang Leo Maar.
São Paulo: Editora UNESP. 2008.
BEVILÁQUA, Clóvis. Juristas Philosophos. Bahia: José Luiz da Fonseca
Magalhães, Editor – Livraria Magalhães, 1897, [XIV] + 145 pp.
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BEVILAQUA, Clóvis. Teoria Geral do Direito Civil. Ed. rev. e atual. Por: prof.
Caio Mário da Silva Pereira. Rio de Janeiro: Ed. Rio, F. Alves, 1975, 343p.
BOBBIO, Norberto. El Positivismo Jurídico. Traducción de Rafael de Asis y
Andrea Greppi. Madrid. Editorial Debate, 1993. [2] 241 [3] pp.
BONAVIDES, Paulo. Teoria do Estado. São Paulo: Editora Saraiva, 1967.
BONAVIDES, Paulo. Teoria do Estado. 4ª ed. rev. e ampliada. S. Paulo. Malheiros
Editores Ltda., 2003, 464 pp.
GADAMER, Hans – Georg. Hermenêutica e a filosofia prática. Volume III.
Tradução de Marco Antônio Casanova. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007.
KUHN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. 5ª edição. São Paulo:
Editora Perspectiva S.A., 2000, 257 pp.
69 – Idem, p.118 .
Resumo: Abstract:
Através de suas cartas e sermões antológicos, Through his memorable letters and sermons,
Padre Antônio Vieira – missionário, diplomata, Father Antonio Vieira – missionary, diplomat,
orador sem paralelo, político e gênio literário – unparalleled speaker, politician and literary
pregou a igualdade dos povos e das raças e foi genius – preached the equality of peoples and
árduo defensor de um estilo fácil e natural da races, and was a strong defender of an easy and
língua portuguesa, sem “a corrupção dos vocá- natural style of Portuguese language, “uncor-
bulos estrangeiros”. Entende-se assim por que rupted by foreign vocabulary”. Thus it is easy
ele foi exaltado por Fernando Pessoa como o to understand why Fernando Pessoa celebrated
“imperador da língua portuguesa”. Nascido em him as the “emperor of the Portuguese lan-
Portugal, Vieira defendeu o Brasil contra a pá- guage”. Father Vieira was born in Portugal but
tria-mãe, nunca deixando de criticar fortemente defended Brazil against the motherland, never
o comportamento da metrópole em relação à ceasing to strongly criticize its behavior regard-
colônia e também contra a invasão holandesa ing the Colony as well as against the invasion
em Pernambuco. Este artigo pretende mostrar of Pernambuco by the Dutch. This article aims
o discurso missionário-político de Padre Antô- at focusing on the politico-missionary speeches
nio Vieira na defesa do Brasil e sua população in defense of Brazil and its population against
diante dos desmandos da metrópole. Em parti- the excesses of the Metropolis. Particular focus
cular, relato a ligação de Vieira com os judeus e is aimed at the bond between Father Vieira and
cristãos-novos que, com grande tino comercial, the Jews and cristãos-novos2 which, with strong
tenacidade e capacidade de organização, impe- commercial vision, tenacity and organizational
diu a invasão da Bahia pelos holandeses. capacity, impeded the invasion of Bahia by the
Dutch.
Palavras-chave: Vieira – cartas – sermões – Keywords: Vieira – Letters – Sermons – Portu-
língua portuguesa – colônia – judeus. guese language – Colony – Jews.
O estilo deve ser fácil e natural, para que o sermão seja como uma
árvore, com raízes, tronco, ramos, folhas, varas, flores e frutos: “Mui-
tos pregadores há que vivem do que não colheram e semeiam o que não
trabalharam... Antigamente pregavam bradando, hoje pregam conversan-
do... Cito o exemplo de Moisés: desça minha doutrina como chuva do
céu, e a minha voz e as minhas palavras como orvalho que se destila
brandamente e sem ruído.”
quando o ouvinte vai para casa confuso e atônito, sem saber de si, então é
a preparação que convém, então se pode esperar que faça fruto.”
e tolhido de pés e mãos, sem haver mão esquerda que castigue, nem
mão direita que premeie; e faltando a justiça punitiva para expelir os
humores nocivos, e a distributiva para alentar e alimentar o sujeito,
sangrando-o por outra parte os tributos em todas as veias, milagre é
que não tenha expirado.”
Faz uso então Vieira de uma admirável metáfora para tornar sua ex-
posição não só mais clara e visual, mas também mais contundente:
“Com terem tão pouco do Céu os ministros que isto fazem temo-los
retratados nas nuvens. Aparece uma nuvem no meio daquela Bahia,
lança uma manga ao mar, vai sorvendo por oculto segredo da natureza
grande quantidade de água, e depois que está bem cheia, depois que
está bem carregada, dá-lhe o vento e vai chover daqui a trinta, daqui a
cinqüenta léguas. Pois, nuvem ingrata, nuvem injusta, se na Bahia to-
maste essa água, se na Bahia te encheste, por que não choves também
na Bahia? Se a tiraste de nós, por que a não despendes conosco? Se
a roubaste a nossos mares, por que a não restituis a nossos campos?
Tais como isto são os ministros que vêm ao Brasil – e é fortuna geral
das partes ultramarinas. Partem de Portugal estas nuvens, passam as
calmas da Linha, onde se diz que também refervem as consciências,
e em chegando, verbi gratia, a esta Bahia, não fazem mais que chu-
par, adquirir, ajuntar, encher-se (por meios ocultos, mas sabidos), e ao
cabo de três ou quatro anos, em vez de fertilizarem a nossa terra com
a água que era nossa, abrem as asas ao vento, e vão chover a Lisboa,
esperdiçar a Madri. Por isto nada lhe luz ao Brasil, por mais que dê,
nada lhe monta e nada lhe aproveita, por mais que faça, por mais que
se desfaça. E o mal mais para sentir de todos é que a água que por lá
chovem e esperdiçam as nuvens não é tirada da abundância do mar,
como noutro tempo, senão das lágrimas do miserável e dos suores do
pobre, que não sei como atura já tanto a constância e fidelidade destes
vassalos. O que o Brasil dá, Portugal o leva. Tudo o que der a Bahia,
para a Bahia há de ser: tudo o que se tirar do Brasil, com o Brasil se
há de gastar.”
No ano de sua morte, 1697, envia Vieira uma carta da Bahia em que
assinala:
“Das coisas públicas não digo a Vossa Mercê mais do que ser o Brasil
hoje um retrato e espelho de Portugal em tudo o que Vossa Mercê me
diz dos aparatos de guerra sem gente nem dinheiro, das searas dos
vícios sem emenda, do infinito luxo sem cabedal e de todas as outras
contradições do juízo humano.”
Mas não foi apenas de sua pátria-mãe, Portugal, que Vieira defendeu
o Brasil. Um inimigo muito insidioso aprestava-se a conquistar o Brasil
a partir de uma invasão da Bahia: os holandeses. Quando os franceses
tomaram Dunquerque aos espanhóis em 1645, Portugal inteira vibrou e
comemorou – menos Vieira que, hábil estrategista, previu logo as terrí-
veis consequências do ocorrido. Não mais ameaçados por ataques dos
espanhóis a partir de Dunquerque, os holandeses passavam a ter várias
armadas livres para se aventurar de novo contra o norte do Brasil. Quem
relatou com riqueza de detalhes a participação de Vieira neste importante
episódio foi o historiador inglês Robert Southey:
“Previsto havia sido o perigo que ameaçava a Bahia, sendo dele ad-
vertido o rei de Portugal pelo jesuíta Antônio Vieira, homem extraor-
dinário não só pela eloqüência, mas em todas as coisas. Cantara-se na
Capela Real de Lisboa um Te Deum pela tomada de Dunquerque pe-
los franceses, e tinham os ministros e principais personagens da corte
concorrido por esse motivo ao beija-mão em grande gala. Terminada
a cerimônia, disse Vieira a el-rei que a dar-lhe por esta ocasião os pê-
sames ali fora. Perguntou-lhe D. João como assim. ‘Porque’, respon-
deu ele, ‘até agora têm-se visto os holandeses obrigados a manter nas
águas de Dunquerque uma esquadra, que lhe assegurasse a passagem
do canal aos seus próprios navios; aliados aos franceses, já disto não
carecem, e a força tornada assim disponível será empregada contra
nós, podendo agora Sigismundo Shoppe, que pela segunda vez gover-
na Pernambuco, realizar a ameaça feita no tempo de Diogo Luís de
Oliveira, isto é, assenhorear-se da Bahia sem perder uma só gota de
sangue, só com impedir-nos por meio da sua armada os suprimentos.
Mas, apontando o perigo, não se via Vieira embaraçado em inculcar o
remédio. Dizendo-lhe el-rei: ‘E que vos parece que façamos?’”
Aqui o jesuíta mostra outra faceta notável: mais do que o seu grande
tino comercial, uma imensa capacidade de organização. Southey trans-
creve as próprias palavras de Vieira:
Vale mencionar ainda uma vez os judeus que vieram para Pernam-
buco com os holandeses, entre eles o primeiro rabino da América, Isaac
Aboab da Fonseca (1605-1693): eles fundaram no Recife a primeira sina-
goga da América e, expulsos os batavos do Brasil, foram engrandecer a
recém-fundada Nova Amsterdã, na ilha de Manhattan, depois Nova York.
Resumo: Abstract:
Quando Portugal se libertou do jugo espanhol In 1640, when Portugal became free from
em 1640, não tinha meios para lutar contra a Spanish domination, the country did not have
Espanha e os Paises Baixos. O padre Vieira re- the means to fight against Spain and the Low
comendou a D. João IV negociar a compra do Countries. Father Vieira recommended that D.
Nordeste ocupado pelos holandeses, ou vendê- Joao IV should negotiate either the purchase
lo. Não conseguindo, ele negociou com o carde- of Northeastern Brazil, which was occupied
al Mazarin o casamento de D.Teodósio, herdei- by Holland, or its sale. As he was unsuccess-
ro do trono, com a Grande Demoiselle, filha do ful, Father Vieira then negotiated with Cardinal
duque de Orleans, que reinaria em Portugal até Mazarin the marriage of D. Teodosio, heir to
a maioridade do rapaz. the Portuguese throne, with the Grande Dem-
oiselle, daughter of the Duke of Orleans, who
would reign over Portugal until the young man
became of age.
Palavras-chave: A venda do Nordeste, o diplo- Keywords: Sale of Northeastern Brazil – Vie-
mata Vieira, o casamento francês de D.Teodosio, ira, the diplomat – The French marriage of D.
Vieira na Italia. Teodosio – Vieira in Italy.
O padre Antônio Vieira é talvez hoje mais lido no Brasil do que Ca-
mões. Sua obra impressa é vastíssima, destacando-se vários volumes de
sermões, que tiveram numerosas edições a partir do século XVII. Muito
apreciadas são também as suas Cartas a diversas personalidades da época,
a começar por aquelas dirigidas a el-Rei Dom João IV, o primeiro monar-
ca a governar Portugal depois da Restauração de sua independência da
Espanha, em 1640. Mas vamos limitar-nos à faixa do tema escolhido, e
eu diria que a sua correspondência com o Marquês de Niza, o superem-
baixador português em Paris, e com Sousa Coutinho, embaixador junto
aos Estados Gerais, merecem especial atenção. Lembro que no Catálogo
do acervo da nossa Biblioteca Nacional o interessado poderá ter ampla
escolha para aprofundar seus conhecimentos sobre as muitas e perigosas
andanças do genial sacerdote.
—
Para melhor compreensão do controvertido personagem, começo por
um rápido resumo de sua vida aventurosa, antes de focalizarmos o tema
principal de nosso estudo. Antônio Vieira nasceu em Lisboa em 1608,
filho do mulato Cristóvão Vieira Ravasco e de Maria Azevedo. No ano
seguinte seu pai viajou só para Salvador, onde arranjara um bom emprego
público. O menino só foi trazido para o Brasil em 1614, quando já tinha
seis anos. Antônio foi educado no colégio jesuíta de Salvador e lá estudou
teologia, retórica e filosofia. Seus mestres estimulavam os debates entre
alunos para desenvolver a argumentação, o que lhe seria de muita utilida-
de na carreira política e sobretudo como orador sacro.
Vieira tinha então 33 anos de idade, era alto, magro e sua eloquên-
cia já havia atingido suficiente maturidade. Em Lisboa começou a pregar
na igreja de São Roque e o povo acorria para ouvi-lo. Em 1642 falou
“Confesso meu talento incapaz para negócio tão grande, que porven-
tura o não terá Portugal tamanho em muitos anos”.
“Só resta saber qual será o preço destes que chamamos de meio-cati-
vos e meio-livres, com que se lhes pagará o trabalho de seu serviço.
O dinheiro desta terra é o pano de algodão e o preço ordinário por que
servem os índios, e servirão cada mês, são duas varas de pano, que va-
lem dois tostões. Coisa que é indigna de se dizer e muito mais indigna
de que, por não pagar tão leve preço, haja homens de entendimento
e de cristandade, que queiram condenar suas almas e ir ao inferno”
(Vieira, 1957, t. 21:193).
“Os escravos eram todos vistos como mouros e, como tais, infiéis,
inimigos que o Papa Eugênio IV autorizou o direito de “cativar”. Jus-
tificava a Igreja de então, através de seus teólogos, que sobre os afri-
canos de todas as raças recaía o preceito bíblico que, descendendo de
Cã, estariam condenados à escravidão. Como acentua o padre Manuel
da Nóbrega, nasceram com esse destino, que lhes veio por maldição
de seus avós”. 2
ra, que lhe valeria a prisão no cárcere do Santo Ofício de 1665 a 1667.
Felizmente a rainha viúva apiedou-se dele e mandou convidá-lo a pregar
novamente na Capela Real. Isso ensejou nova missão a Roma, onde espe-
rava anular o processo contra ele.
Referências Bibliográficas
AZEVEDO, João Lúcio de. Dezanove cartas inéditas do Padre Antônio Vieira,
Academia de Ciências de Lisboa, 1916. Contém excelente estudo introdutório
sobre as negociações em Paris e Haia.
_______. História de António Vieira, Livraria Clássica, Lisboa, 2 volumes, 1918
e 1920.
BAETA NEVES, Luiz Felipe. Vieira e a Imaginação Social Jesuítica (Maranhão
e Grão-Pará no século XVII). Topbooks, Rio de Janeiro, 1997.
BARROS, Padre André de. Vida do Padre Antônio Vieira, Lisboa, 1742.
BESSELAR, José van den. Maurício de Nassau: esse desconhecido – FAPERJ,
Rio de Janeiro, 1982.
BOXER, C.R. A Great Luso-Brazilian Figure – Padre Antônio Vieira, S.J., 1608-
1697. The Hispanic and Luso-Brazilian Councils, da Universidade de Londres.
Notável resumo do tema por ilustre historiador inglês.
CABRAL DE MELLO, Evaldo. O Negócio do Brasil, 2ª edição, Topbooks, Rio
de Janeiro, 2003. Estudo pormenorizado de toda a conjuntura da época no Brasil
e em Portugal pelo melhor especialista na história do Nordeste da atualidade.
VIEIRA POLÍTICO
VIEIRA, THE POLITICIAN
José Arthur Rios 1
Resumo: Abstract:
A comunicação aborda a carreira política de This text broaches the political career of Anto-
Antônio Vieira. Conselheiro, confidente do rei nio Vieira. He was King D. Joao IV’s advisor
d. João IV, que o distingue em espinhosas mis- and confident, trusted by the latter with diffi-
sões, Vieira fez do profetismo arma política. No cult missions. Vieira was seen as a prophet and
abatimento causado em Portugal pela derrota used this quality as a political weapon. After
na África e pelo domínio Espanhol levanta um Portugal’s defeat in Africa and during Spanish
pendão de revolta e esperança, acenando para domination, Vieira raises a banner of revolt and
o povo português horizontes sobrenaturais de hope, suggesting to the Portuguese people new
glória e poder. horizons of glory and power.
Palavras-chave: Antonio Vieira – profetismo Keywords: Antonio Vieira – Political Prophet –
político – Quinto Império. Fifth Empire.
Até hoje se pede contas a Vieira do Papel Forte, designação dada por
D. João IV ao documento por ele solicitado aos jesuítas sobre a política
em relação à Holanda, imputando-lhe a pecha de traidor – do ponto de
vista nacionalista de sua vinculação brasileira. Isso porque nas intrincadas
negociações entre Portugal e Holanda sugeriu como medida transitória,
se vendesse Pernambuco aos flamengos. Não só as forças que opunha Ho-
landa ao pequeno país eram esmagadoras, como a Espanha estava sempre
pronta a abocanhar um torrão que havia pouco, misteriosamente, lhe fu-
gira. Vieira era um súdito do rei de Portugal e visava a salvar a monarquia
mesmo ante poderes invencíveis. Não dando Pernambuco como perdido,
mas como hoje diríamos em jargão jurídico, com cláusula de retrovenda
– a “retro aberto” como escreveu Vieira, “para o tornarmos a tomar com
uma mesma facilidade quando nos virmos em melhor fortuna”. Robert
Southry, historiador insuspeito, mais tarde lhe daria razão.
Tudo isso está nos sermões, nas cartas, vazadas em linguagem cas-
tiça. O púlpito era sua tribuna, o sermão seu instrumento. Em tempos
barrocos o sermão era de expressão de críticas e protestos. Fazia as vezes
do manifesto, do panfleto, do jornal. Do púlpito Vieira traçava estratégias
políticas, vibrava acusações, premiava e castigava. Daí sugeriu que se
estendesse o Brasil até Buenos Aires; que se aproveitasse o declínio e os
apertos da Espanha para conquistar o Chile, o Peru; que se fortalecesse
a Marinha e se vigiasse as costas extensas da colônia, os rios abertos –
problema de nossos dias, cercados que estamos de competidores, senão
de vizinhos hostis.
Foi por aí, montado numa canoa, num igarapé perdido que, em 1959,
escreve a André Fernandes, confessor de D. João IV, depois bispo no Ja-
pão, – uma longa carta que acabaria por mudar o destino do signatário e
abrir nova e tormentosa fase nessa movimentada vida.
Só que Vieira, agora profeta político, foi mais longe: o rei transfigu-
rado viria submeter toda a Terra, as dez tribos perdidas de Israel, realizan-
do assim a profecia bíblica. Seria então o advento do Quinto Império –
isto é depois de Assíria, Babilônia, Grécia e Roma, – o Império de Cristo
sobre o mundo.
Resumo: Abstract:
O texto trata, fundamentalmente, da missão evan- This text deals, essentially, with the evangeli-
gélica e catequética iniciada pelo padre Antônio cal and catechetical missions started by priest
Vieira na Serra de Ibiapaba (Ceará), a partir de Antonio Vieira in Sierra Ibiapaba (Ceará), from
1655. A Missão perdurou até 1759, quando foi 1655. The mission lasted until 1759, when it was
extinta por ordem do Marquês de Pombal. Des- dissolved by Marquis of Pombal’s order. It also
taca, também, os motivos históricos e o fervor highlights the historical reasons and the fervor
com que o famoso jesuíta enfrentou as situações of the famous Jesuit who faces adverse situa-
adversas na defesa dos indígenas tabajaras, mas, tions in the defense of Tabajaras indians, but at
ao mesmo tempo, como adverte o autor, desco- the same time as the author emphasizes, ignor-
nhecendo o mesmo rigor e desumanidade utili- ing the rigor and inhumanity used by the same
zados pelos mesmos senhores que escravizavam masters who enslaved black people. The Jesuit
negros. A Missão Jesuítica da Serra de Ibiapaba, Mission in Sierra Ibiapaba besides the beauty
além da beleza do texto escrito por Vieira, no of the text written by Vieira, which recounts his
qual narra sua experiência, reflete, ainda, o lado experience, also reflects the less known side of
menos conhecido desse significativo momento this significant moment in our history: the set
de nossa história: os assentamentos de núcleos of people, villages and nowadays towns which
e vilas, hoje, cidades, resultantes de iniciativas largely served to consolidate the settlement pro-
que, em grande medida, serviram para consoli- cess of that moutainous region of Ceará.
dar o processo de povoamento daquela região
serrana cearense.
Palavras-chave: Jesuítas. Missão. Indígenas. Keywords: Jesuits. Mission. Indians. Enslave-
Escravização. Povoamento. ment. Settlement.
Introdução
Muito se tem falado na obra literária do Padre Antônio Vieira, porém
nem sempre, com o mesmo denodo e interesse, os estudiosos se debruça-
ram sobre suas ações práticas de missionário. Talvez a dificuldade esteja
em separar o trabalho intelectual do trabalho prático, este resultante não
da leitura de um discurso escrito, mas da observação histórica de realiza-
ções concretas, visíveis e palpáveis ao longo do tempo.
Talvez por causa dos efeitos provocados por esse processo, a Missão
Jesuítica da Serra de Ibiapaba, no Ceará, tenha sido lembrada, até hoje,
mais em virtude da força extraordinária do texto escrito por Vieira sobre
tal experiência do que, propriamente, dos efeitos e frutos provocados pela
implementação de tão importante ação “prática” vivenciada pelos jesuítas
naquela ampla região cearense.
“O todo da sua figura era grave e autorizado – estatura mais que ordi-
nária – fronte elevada e majestosa – tez morena e como crestada do sol
dos trópicos – barba espessa e crescida – cabelos negros na mocidade
e alvos e nevados na velhice – olhar vivo e cintilante”.6
Somente dois anos mais tarde, em 1655, Padre Vieira poria em prática
a planejada Missão Jesuítica à serra de Ibiapaba, no Ceará. Acabara de vi-
ver lamentáveis experiências com as missões ao Itapecuru e ao Tocantins.
As causas mais imediatas eram as graves acusações aos capitães-mores
tidos como cobiçosos e prevaricadores, que reagiam ao monopólio das
missões por parte da Companhia de Jesus, sob a exclusiva responsabili-
dade e direção do Padre Antônio Vieira. As dificuldades foram enormes e
logo o padre constatou a má vontade do capitão-mor. Mas a chegada dos
jesuítas tornara-se empecilho claro à prática constante de apresamento de
índios para escravizá-los e vendê-los nos mercados – negociações feitas
com a conivência das autoridades, quando não com a participação dire-
ta delas. Exemplo disso aparece claramente na resposta do Padre Vieira
ao rei D. João IV, a propósito de uma consulta que este lhe fizera sobre
a vantagem de dividir a região com dois capitães-mores. A resposta do
padre foi terminante:
“Digo que menos mal será um ladrão que dois; e que mais dificultosos
serão de achar dois homens de bem, que um. Sendo propostos a Catão
dois cidadãos romanos para o provimento de duas praças, respondeu
que ambos lhe descontentavam, um porque nada tinha, outro porque
nada lhe bastava. Tais são os dois capitães-mores, em que se repartiu
este governo. Baltasar de Sousa não tem nada, Inácio do Rego não lhe
basta nada; e eu não sei qual é maior tentação, se a necessidade, se
“Ficando só, e sem língua, porque ainda a não tinha estudado, se re-
tirou por ordem dos superiores para o Portugal, (mas) logo fez voto
de voltar (ao Maranhão), quando lhe fosse possível, a levar por diante
a mesma empresa, e buscar nela o mesmo gênero de morte que Deus
então lhe negara, ao que ele dizia, por indigno.”10
9 – AZEVEDO, João Lúcio de. Cartas do Padre Antônio Vieira. Coimbra, 1925. Cf.
Carta de 10 de abril de 1654, pp. 549/571.
10 – VIEIRA, Padre Antônio. Sermões. Cf. vol. 24. Relação da Missão da Serra de Ibia-
E, com efeito, como diz Vieira, por desejo de Deus, o Padre Luís
Figueira retornou ao Maranhão e, partindo em missão à “barra do
Grão-Pará no ano de 1643, com onze de quinze religiosos que trazia con-
sigo, foi cair nas mãos dos tapuias aroás, da boca do Rio das Amazonas,
onde ele e os mais foram primeiro mortos com grande crueldade, e depois
assados e comidos por aqueles bárbaros.”11
O plano, após levado ao rei, foi aprovado como lei pela provisão real
de 9 de abril de 1655. A propósito desse instituto legal, Varnhagen salien-
tou que a provisão concedera “à Companhia toda a supremacia sobre os
índios, com exclusão de outra qualquer ordem ou poder [grifo do histo-
riador], sendo o próprio Padre Vieira declarado logo chefe ou superior,
com poderes quase ilimitados.”13
Além do mais, como bem comentou Varnhagen, a nova lei não impe-
dira a escravização dos índios, mas, ao contrário, “sancionou a continua-
ção das entradas para escravizar índios. A grande inovação consistiu em
entregar tudo ao arbítrio da Companhia, ou antes do próprio padre Vieira,
de cujas mercês passavam por conseguinte a ficar dependentes todos os
missão de escravos nunca poderá este Estado ser nada, tendo aliás tanto
com que ser grande. Sabida coisa é que os trabalhos das suas fábricas só
escravos podem suportar.”22
Padre Vieira, apesar de seu poder absoluto sobre a Junta das Mis-
sões, preferiu ceder ou capitular diante de interesses de pessoas que de-
sejavam, a todo custo, auferir vantagens com a escravização de índios.
Quando esses interesses ficaram claramente manifestados por intermédio
dos representantes das câmaras de Grão-Pará e Maranhão, o Padre Vieira
não teve dúvida: fechou os olhos a seus escrúpulos e, ele mesmo, passou
a proceder como mediador do processo de aprisionamento e escraviza-
ção de índios durante as missões realizadas pela região amazônica. Como
observou Varnhagen, “ninguém mais do que ele dispunha dos índios que
impediam a pregação do Evangelho” [grifo nosso].23
“... tendo-se retirado com suas armas aos lugares mais ocultos e defen-
sáveis das suas brenhas, em distância de mais de cinquenta léguas, lá
foram buscados, achados, cercados, rendidos e tomados quase todos,
sem dano mais que de dois índios nossos levemente feridos. Ficaram
prisioneiros duzentos e quarenta, os quais, conforme as leis de V. M., a
título de haverem impedido a pregação do Evangelho, foram julgados
escravos e repartidos aos soldados [grifo nosso].”24
27 – ABREU, Capistrano de. Caminhos Antigos e Povoamento do Brasil. 4ª. ed., Rio de
Janeiro: Editora Civilização Brasileira / MEC, 1975, pp. 135 e s.
28 – ABREU, Capistrano de. Op. cit., 1975, p. 136.
Fez mais o Padre Vieira: mandou que o Padre Manuel Nunes, noutro
veleiro, se dirigisse à sede da província do Ceará com o objetivo de pre-
gar o evangelho aos tapuias. Além do mais, ele mesmo tomou a iniciativa
de viajar à Bahia, onde pretendia conseguir discípulos da irmandade de
Santo Inácio a fim de ajudá-lo na catequese dos indígenas do Maranhão,
ora em franca expansão.
Enquanto isso, o navio que levava o Padre Vieira deu fundo nas
praias de Camocim, onde foi encontrado, casualmente, o emissário Fran-
cisco Murereíba, que partira há um ano com as cartas para os maiorais dos
indígenas tabajaras da serra de Ibiapaba e que todos já o consideravam
morto.
Dessa feita, o Padre Vieira contou apenas com dois jesuítas: padres
Antonio Ribeiro e Pedro Barbosa de Pedroso. Ribeiro, perfeito conhece-
dor do ambiente colonial e bastante versado nas línguas dos nativos; Pe-
droso, recém-chegado de Portugal, natural de Leiria, revelava crescente
interesse pela causa da catequese.
A viagem seria feita parte por mar, parte por terra. O próprio Padre
Pedroso, em relato a seu superior, esclareceu as condições iniciais da ex-
pedição:
Mais tarde, quando o Padre Antônio Vieira ali chegou, assim descre-
veu a serra de Ibiapaba no seu conjunto:
“Ibiapaba, que na língua dos naturais quer dizer Terra Talhada, não é
uma só serra, como vulgarmente se chama, senão muitas serras juntas,
que se levantam ao sertão das praias de Camocim, e, mais parecidas
a ondas de mar alterado que a montes, se vão sucedendo, e como en-
capelando umas após das outras, em distrito de mais quarenta léguas;
são todas formadas de um só rochedo, e em partes escalvado e medo-
nho, em outras cobertas de verdura e terra lavrada, como se a natureza
retratasse nestes negros penhascos a condição de seus habitadores, que
sendo sempre duras, e como de pedras, às vezes dão esperanças, e se
deixam cultivar. Da altura dessas serras não se pode dizer coisa certa,
mas que são altíssimas, e que se sobe, às que o permitem, com maior
trabalho da respiração que dos mesmos pés e mãos, de que é forçoso
usar em muitas partes. Mas, depois que se chega ao alto delas, pagam
muito bem o trabalho da subida, mostrando aos olhos um dos mais
formosos paineis que porventura pintou a natureza em outra parto do
mundo, variando montes, vales, rochedos e picos, bosques e campi-
nas dilatadíssimas, e dos longes do mar no extremo dos horizontes.
Sobretudo, olhando do alto para o fundo das serras, estão-se vendo as
nuvens debaixo dos pés, que, como é coisa tão parecida ao céu, não só
causam saudades, mas já parece que estão prometendo o mesmo que
se vem buscar por estes desertos.”36
“As águas são excelentes, mas muito raras, e a essa carestia atribuem
os naturais ser toda a serra muito falta de caça de todo o gênero; mas,
bastava para toda esta esterilidade ser habitada ou corrida há tantos
anos de muitas nações de tapuias, que, sem casa nem lavoura, vivem
da ponta da frecha, matando para se sustentar, não só tudo o que tem
nome de animal, mas ratos, cobras, sapos, lagartixas, e de todas as
outras imundícias da terra.” 38
Conclusão
Como vimos, as ações missionárias do Padre Antônio Vieira, a jul-
gar-se pela sua incursão à serra de Ibiapaba, no Ceará, numa época em
que mal começara a colonização daquela região, têm, no campo prático,
importantíssima significação para a história brasileira.
III – documentos
documents
Resumo: Abstract:
O estudo introduz documentos sobre a adminis- This paper introduces documents on the admin-
tração da justiça ordinária no Brasil colonial. istration of common justice in Colonial Brazil.
Nele são identificadas situações, não previstas Situations will be identified that were not antici-
nas Ordenações do Reino, referentes à designa- pated in the Kingdom’s Ordinances, referring to
ção de juízes leigos para povoações longínquas, the nomination of common judges to distant set-
com atribuições semelhantes às dos juízes de tlements with similar assignments as the juizes
vintenas, reforçadas de modo a aproximá-las de vintena2, reinforced in such ways as to bring
daquelas dos juízes ordinários das câmaras mu- them closer to those of the common judges in
nicipais. municipal chambers.
Palavras-chave: juízes ordinários – juízes lei- Keywords: Common Judges – Lay Judges – Ad-
gos – administração da justiça – Brasil colônia. ministration of Justice – Colonial Brazil.
4 –1AHU, – Cons. Ultra. – Brasil/ B – Cód. 246, fl. 73 v, Documento II; Márcio Roberto
Alves dos Santos, Fronteiras do sertão baiano: 1640-1750. São Paulo: USP – Departa-
mento de História, 2010, pp. 318-319 usa apenas os dois primeiros documentos.
8 –1AHU, Cons. Ultra. — Cartas régias – Bahia, Cód. 246, fl. 111, Documento IV.
9 –1AHU, Cons. Ultra. — Cartas régias – Bahia, Cód. 246, fls. 125 e 147, Documentos V e VI.
10 –1AHU, Conselho Ultramarino, Cartas régias — Bahia, Cód. 246, fl. 111.
11 –1AHU, Cons. Ultra. – Brasil/Pi – Cx. 1, Docs. 59, 60 e 65. Documentos VII a IX.
Magistrado com carreira longa, que terminou como Desembargador na Relação do Porto,
passando por Desembargador e Ouvidor Geral do crime na Relação da Bahia. Vd. José
Subtil, Dicionário dos Desembargadores (1640-1834). Lisboa: EDIUAL, 2010, p. 100.
12 –1AHU, Con. Ultra. — Brasil – Piauí, Cx. 1, docs. 60 e 65. Documentos VIII e IX.
Será também nos novos territórios das Minas onde outra vez se re-
corre a juízes ordinários sem subordinação a municípios. Terá sido cria-
ção do ouvidor-geral da comarca do Rio das Velhas, por volta de 1731, de
criação de juízes eleitos pelo povo, inovação que o rei autoriza em 1732.14
Autorização que ficou a valer, como escreve em 1746 Gomes Freire de
Andrada, governador do Rio de Janeiro tendo a seu cargo também as
Minas Gerais: “Foy V. Mag.de servido por sua real ordem de 28 de Abril
de 1732, mandar criar no certão da Capitania das Minas, dous juizes or-
dinarios, e dous escrivaens do publico, judecial e notas, hû no destricto
do Papagayo, distante de Vila Real do Sabará, cabeça da comarca, outo
13 – Joaquim Romero Magalhães, “As Câmaras Municipais, a Coroa e a cobrança dos
quintos do ouro nas Minas Gerais (1711-1750)”, in Labirintos Brasileiros. São Paulo:
Editora Alameda, 2011.
14 – AHU, – Cartas Régias – Minas Gerais, Cód. 241, fl. 155 v. Documento X.
15 – AHU, – Cons. Ultra. – Brasil/MG – Cx. 32, Doc. 12; Idem, Cx. 46, Doc. 14; Idem,
Cartas Régias – Minas Gerais, Cód. 241, fl. 155 v. Documentos X, XI e XII.
16 – AHU, Con. Ultra. – Brasil – MG, Cx. 32, doc. 12. Documento XI.
17 – Luiz Palacin, Goiás 1722-1822. Estrutura e conjuntura numa Capitania de Minas,
Goiânia: Departamento Estadual de Cultura, 1972, p. 118.
18 – “Motins do Sertão”, in Revista do Arquivo Público Mineiro, anno I, fasc. 4, p. 650;
Luciano Figueiredo, “Furores sertanejos na América portuguesa: rebelião e cultura políti-
ca no sertão do rio São Francisco, Minas Gerais (1736)”, in Oceanos, Lisboa, CNCDP, nº
40 – Outubro / Dezembro 1999.
19 – AHU, – Con. Ultra. – Brasil/MG – Cx. 41, doc. 30.
Sempre foi entendida como solução provisória esta dos juízes ordi-
nários, enquanto se não constituíssem mais povoados como vilas. Para
que a realeza nem sempre encontra boas razões. Perante uma proposta
do ouvidor-geral de Serro do Frio, em 1731, o Conselho Ultramarino não
acedeu às razões apresentadas negando a elevação do Arraial dos Fanados
a vila. O que afinal ocorrerá logo depois tomando o nome de Nossa Se-
nhora da Graça do Bom Sucesso das Minas Novas do Araçuaí, na área da
ouvidoria do Serro do Frio. Elevação talvez mal justificada, uma vez que
quinze anos passados ainda aí não havia casas de câmara nem cadeia.20
20 –�����������������������������������������������������������������������������
AHU, – Con. Ultra. – Brasil/MG – Cx. 30, doc. 55; Waldemar de Almeida Barbo-
sa, Dicionário Histórico-Geográfico de Minas Gerais, Belo Horizonte, Editora Saterb,
1971.
tória que fosse, embora. Nas Minas Gerais as funções dos juízes ordiná-
rios veem-se acrescidas de outras como as de juízes dos órfãos ou de pro-
vedores das fazendas dos defuntos e auzentes. Assim era defendido pelos
próprios moradores na Campanha do Rio Verde em 1779. Rio Verde que
se incluía no distrito da Intendência de Rio Verde, Ajuruoca, Sapucahy,
Pouzo Alto e Baypendi da Comarca do Rio das Mortes.28
41 – AHU, – Con. Ultra. – Brasil/Pa – Cx. 22, doc. 2026 e Cx. 25 doc. 2369.
42 – AHU, Cartas régias – Maranhão, Cód. 209, fls. 115 v – 116. Documentos XIII.
43 – AHU, Cartas régias – Maranhão, Cód. 209, fls. 187-188 v; Idem, Cód. 271, fls. 165
v-166. Documento XXIII.
44 – Nesta primeira abordagem N. S. da Conceição ficou por identificar, dado haver várias
freguesias com o mesmo orago. AHU, Cartas régias – Maranhão, Cód. 271, fls. 29 v-30,
94 v-95 e 175 r-v; Idem, Con. Ultra. – Piauí. Cx. 4, doc. 267. Documento XIV a XVI e
XIX-XX.
45 – AHU, Con. Ultra. – Maranhão, Cx. 29, doc. 2978. Documento XVII.
o rei seja “servido ordenar que em cada Arrayal do termo daquella Villa
em distancia de trinta até quarenta legoas haja vintenarios e Escrivão com
poder de fazer escrituras e Inventarios, tomando por avaliadores os ho-
mens bons do lugar, remetendo-os logo para a villa, e que os mesmos
vintenarios fação por mandados, não só as deligencias dos Juizos, mas tão
bem as da Fazenda Real.” A este pedido o rei, ouvido o governador, não
pode senão responder em 1754 “que eles devem observar a Ordenação.”
Assim, e “na forma della fazerem Juizes e Escrivães nos Arrayaes aonde
houver mais de vinte moradores, e como na mesma lei se acha dada a pro-
videncia da jurisdição, e exercicio que devem ter estes officiaes, se não
necessita de outra despozição, tendo elles officiaes da Camara entendido
que estes officiaes das vintenas devem fazer as deligencias que os Juizes
ordinarios, e os Ouvidores e officiaes das Câmaras seus superiores lhes
ordenarem por mandados que lhes passarem.” Quanto ao reforço de po-
deres em termos de fazenda, outra legislação fora já publicada, e devia ser
acatada. Em 1781, e para se evitarem despesas inúteis nas Minas Gerais a
Rainha determina que se cometessem certas diligências aos “vintanarios
que há por todos os Arrayaes.” Pelos juízes das vintenas passavam as ci-
tações poupando-se na deslocação de oficiais dos concelhos.49
veo para que me determine se devo conservar o dito Juiz, e seo escrivão,
ou suspendello.” Lisboa vai responder pedindo o parecer do governador
Gomes Freire de Andrada e da câmara de São João d’El-Rei, em cujo ter-
ritório se incluíam as Minas de Itajubá. Recebidos estes pareceres – e o do
governador comenta e rebate o da câmara – são ainda ouvidos o Provedor
da Fazenda Real e o procurador da Coroa em Lisboa. Só então, e haven-
do reunido pareceres favoráveis à decisão do ouvidor-geral, o Conselho
Ultramarino se pronuncia e aprova a criação do juiz ordinário nas Minas
de Itajubá. Já se estava em 1758 quando o rei apõe o seu “Como parece”
ao processo. Tinha sido o largo período de quatro anos à espera da deci-
são final.50 Por esses anos também acrescida atenção se presta em que os
vintenarios não faltem nas distâncias entre eles de 30 a 40 léguas – não
é de excluir que alguma indistinção se fizesse com os Juízes ordinários.51
Documento I
Para o Governador e Cappitam General do Estado do Brasil
(à esquerda)
Remedio temporal que se deve dar no Certão dos Rodellas pellos res-
pectivos crimes e atrozes cazos que sucedem, e ordenar que de 5 em 5
legoas haja hum Juiz ordinario.
Documento II
Para o Governador Cappitam General da Bahia
Documento III
Copia da Carta de S. Mag.de que Deus guarde sobre se criarem Capita-
ens mores, e mais cabos de milícia para as freguezias do certão.
Documento IV
Para o Governador Geral do Brasil
para ellas para que por este caminho se possa milhor obrar o meu
serviço na execução dellas . Escritta em Lisboa aos 11 de Fevereiro
de 1700 // Rey
AHU, Conselho Ultramarino, Cartas régias – Bahia, Cód. 246, fl. 111
Documento V
Para o Governador Geral do Brasil
Dom Joam de Lancastro Amigo. Etc. Por ter rezoluto que o Bacharel
Diogo Pacheco de Carvalho passe ao Rio Grande do Sul cituado no
Certão dos Rodellas, a devaçar do escandalozo sucesso que padeceo
o Juiz ordinario daquella villa. Me pareceo ordenarvos lhe deis toda
a gente, e infantaria que lhe for necessaria declarandolhe que hão de
estar a ordem deste Ministro para executar em tudo o que elle lhes
mandar, e poder povoar com toda a segurança no dito certão certão
dos Rodellas, sem temor da oppozição, que lhe possão fazer os dellin-
quentes, e tirar devaça deste sucesso, pernunciando, e prendendo aos
culpados, e tirada a dita devaça voltar para essa cidade, e com os cul-
pados que puder prender para serem sentençeados nessa Rellação,
como por Justiça, para que sirva a esta demonstração de exemplo para
refrear aos mais a que vendo imitem, em tão abominaveis, e horriveis
procedimentos digno este por tantas rezões de hum exemplar castigo.
Escrita em Lisboa a 3 de Março de 1701 // Rey
Documento VI
Para os officiaes da Câmara da Cachoeira
Documento VII
Senhor
Emquanto ahy fordes Ouvidor geral das ditas partes Hey por bem que
os Cappitães e Ouvidores das ditas Cappitanias em que vos não es-
tiverdes tenham somente alçada nos feitos crimes em que a alguns
escravos ou gentios forem acuzados de cazos em que por direito, e
minhas Ordenações hé posto penna de asoutes, ou cortamento de ore-
lhas, e assim nos cazos em que piães e christãos livres pello mesmo
modo hé posto pena de asoutes, ou degredo athé tres annos, e nos
cazos de pessoas de mais qualidade terão somente alçada athé hû anno
de degredo para fora da Cappitania, e nas pennas pecuniárias athé
vinte cruzados.
que passei a prezente certidão nesta villa da Moucha aos vinte e sete
dias do mes de Junho de mil e setecentos e vinte e sette annos
Documento VIII
Como parece ao Conselho Lx.ª occidental 16 de Agosto de 1730
Senhor
Joaquim ???
Documento IX
Haja vista o Procurador da Coroa Lx.a occidental 22 de Novembro de
1731
Senhor
Asim que tomey posse deste lugar dey conta a V. Mag.de do que nel-
le achey, e agora o fasso prezenciando, e o como o meu Antecessor
meteu justissas em os ramos desta Capitania por serem algûs em dis-
tancias de cento e sincoenta legoas deu aos Juizes pedanos (sic) o
titollo de Juizes ordinarios com o conhecimento de cauzas e crimes, e
porque me pareceu este procedimento incurial mandey, que hum dos
Juizes assistisse no meyo, digo que hum dos Juizes ordinarios desta
villa asistisse o meyo de hum dos ramos, e que nelle diferisse a todas
as cauzas, e somente deyxey ficar no Parnaguá o mesmo Juiz pedano
(sic) com a jurisdição que exercia em rezão de ser grande o povo e
differente Capitania a que se lhe agregou de novo a Povoação de Ter-
ras Novas junto aos Tocantins, e me parece Senhor ser muito precizo
meter nesta Capitania do Parnagoá (sic) Juiz ordinário assim pela dita
rezão de ser grande a Povoação como por se achar em distancia de 25
dias de jornada desta Villa, em que he emposivel poderê vir os mora-
dores da dita Capitania requerer a esta Villa o que seja subordinado a
Camera desta dita Villa donde poderão vir fazer a elleyção de três em
três annos para as Justiças da dita Capitania na forma da Ordenaçam,
e porque não posso proceder ao tal efeyto sem faculdade de V. Mag.de
dou esta conta para que me conceda sendo servido. Mocha do Piauhy
de Mayo o 01º de 1731.
Rubricas
Documento X
Para o governador das Minas
Dom João Etc. Faço saber a vos Conde das Galveas Governador e Ca-
pitão General da Capitania das Minas, que o Ouvidor Geral da Com-
marca do Rio das Velhas me reprezentou em carta de 22 de Agosto do
anno passado da qual com esta se vos remete a Copea asignada pelo
Secretario do meu Conselho Ultramarino o quanto se faz precizo para
a boa admenistração da justiça que eu mande crear no certão da sua
Commarca dous Juizes elleitos pelo povo na forma que aponta com
seos Tabaliães para o Judicial repartindoselhes destrictos competentes
hum no Papagayo, e outro em São Romão. Me pareceo ordenarvos
informeis com vosso parecer o que fareis, ouvindo pessoas praticas
daquelle certão. El Rey Nosso Senhor o mandou pelo Doutor Manoel
Fernandez Varges, e Gonçalo Manoel Galvão de Lacerda Concelhei-
ros do seo Concelho Ultramarino. E se passou por duas vias. Dionizio
Cardozo Pereira a fez em Lix.a ocidental em 28 de Abril de 1732.
Documento XI
Junta a Carta haja vista o Procurador da Coroa. Lix.ª occidental 10 de
Dezembro de 1737 (Lavre?)
Senhor
certão, me consta que de muntos (sic) annos a esta parte, e antes que
a V. Mag.de se dese esta conta, há na vizinhanças do Papagayo, e São
Romão, Juizes e Tabaliaens, os Juizes recebem querelas e tirão devas-
sas, remetendoas para livramentos à ouvidoria do Sabará, e quanto ao
civel, conhecem athé quantia de vinte e cinco mil reis, e executão as
sentenças que se lhe cometem da Ouvidoria ou deprecão de outros juí-
zos. O sitio do Papagayo fica distante dés jornadas da vila do Sabará, e
o de São Romão quazi dezouto; e suposta esta distancia, me parecia se
não devia inovar na matéria nada, mais que aumentarlhe a jurisdição
até trezentos mil reis, com apelação e agravo para a ouvidoria, porque
esta quantia se reputa modica no País, e que quanto ao crime se dese
jurisdição ao Ouvidor, que achando por agravo de injusta pornum-
ciação, ou por apelação que algua pessoa fora pornunciada, contra a
forma de direito, por impericia do Juis, podese darlhe provimento e
mandalo soltar, sem ser necessario esperar a decizão da Relação da
Bahya, em gráo de apelação, para deste modo se evitarem as vexações
que as vezes cauza, a grande distancia dos recursos, ou que a pronun-
cia do Juis durase só athé os autos subirem a Ouvidoria, aonde procun-
ciandose de novo ficase sem vigor algû a pronuncia do Juis.
V. Mag.de rezolverá o que achar ser mais conveniente a seu real ser-
viço.
Documento XII
Dom João por graça de Deos Rey de Portugal, e dos Algarves daquém
e dalem mar em Africa Senhor de Guiné Etc. Faço saber a vós Gover-
nador e Capitão General da Capitania do Rio de Janeiro, com o gover-
no das Minas, que por parte de António Francisco Lima, se me fés a
petição de que com esta se vos remete a Copia asignada pelo Secreta-
rio do Conselho Ultramarino, em que pede lhe faça mercê determinar
que sem embargo de hûa vossa Portaria, as Justiças ordinarias aceitem
os requerimentos do suplicante contra a Provizão porque separaste
Senhor:
a perigos de vida, sem conveniência, nem achar quem lhe desse, pela
serventia que pedia para fazer nomeação.
Documento XIII
Esta a conta que dá o Governador do Estado do Maranhão a respeito
de ser necessário na Ribeira da Parnahiba hum Juiz Ordinario, e de
haver a mesma necessidade na Capitania do Gurupá
Documento XIV
Para o mesmo (Governador do Maranhão)
Documento XV
Para o governador do Maranhão
AHU, — Con. Ultra. – Cartas Régias, Maranhão, Códice 271, fl. 175
r-v.
Documento XVI
Satisfasce ao que S. Mag.de ordena sobre a conta, que deu o Ouvidor
geral da Capitania de S. Luiz do Maranhão, a respeito de ser precizo
criarse em cada hum dos destritos da Parnahiba, Aldeias Altas e Mea-
rim hum Juiz ordinario com seu escrivão, e Meirinho. E Vista.
que nesta freguezia se devia por tão bem hum Juiz Ordinario com seu
escrivão, e Meirinho, sendo todos os Juizes ordinários elleytos em
pellouro, e que os escrivães sirvão tão bem de Tabaliães para fazerem
as Escripturas, e aprovarem os testamentos, de que havia necessidade
urgente; e porque os Ouvidores como Corregedores são obrigados a
vizitar aquella Capitania havendo os ditos Juizes ordinarios, poderão
com mais formalidade fazer correição; e outro sim, que na parte onde
lhe parecer mais conveniente se possa mandar erigir hûa cadea segura
para nella se recolherem os malfeitores, e creminozos, de della serem
remetidos para a Cadeya da correição.
O que visto
Documento XVII
Cópia:
algum duvida, que alem da dita freguezia ao Itapicurú, tem mais por
termo todos os dos Ryos Miarim, e Pindaré, correndo the os Pirizes;
com tudo nos parece util, e necessario ao serviço de Deus, e do dito
Senhor, que nos ditos ryos Miarim, e Pindaré tão somente, se crie de
novo hum Juiz ordinario, com seus officiaes, e Meyrinho, por ser mui-
to dificil virem aqueles moradores, que são bastantes a esta cidade, e
os juizes della o hirem aquelles ditos ryos às ocorrencias dos negocios
da sua justissa, e penozo o hirem estes dittos juizes da cidade a elles às
devaças de mortes, e roubos, que continuamente se estão cometendo
nos ditos Ryos, tanto pelo longe, e perigos de mar, quanto pela diffi-
culdade da condução, e gastos para elles de canoas, e remeiros, que
he o mais difficil de achar. He o que nos parece informar a V. Ex.a por
menos informados nesta matéria; para o dito Senhor ordenar o que for
servido. Deos Guarde a V. Ex.a muitos annos. S. Luiz em Camera de
26 de Novembro de 1745 // De Vossa Ex.a // Affectuozos subdittos e
veneradores. Hilário Pereira de Caceres//Brás de Souza Sá//Balthazar
Pereira dos Reys//Theodoro Amado Annes//João Mendes da Sylva. E
eu Jozé Gonçalvez da Fonseco secretario do Governo a fiz escrever da
própria que fica na Secretaria do Estado a que me reporto.
Documento XVIII
(Para o Governador do Rio de Janeiro com o governo das Minas Ge-
raes) Para o mesmo
Dom João & Faço saber a vos Gomes Freire de Andrade Governador e
Capitam General do Rio de Janeiro com o governo das Minas Geraes
que se vio a vossa carta de outo de Outubro de 1745, sobre a conta
que vos dera o Ouvidor que foi do Rio das Velhas Simão Caldeira
da Costa Mendanha do grande numero de povo que havia concorrido
para o novo descubrimento do Paracatú, e as providencias que dera
para ali se não experimentar falta na administração da justiça creando
hum Juiz ordinario e hum Tabalião; o que vos precizara a convocar
hûa junta em Villa Rica sobre esta matéria, na qual se asentara, que
se conservasse o mesmo Juiz ordinario e Tabalião, e que se nomeasse
Documento XIX
Na creação desta Capitania se mandaram fazer tres juizes ordinarios
hum para a freguezia do Pernaguá, outro para a Freguezia do Serobim,
e para a Piracuruca outro, que eram as três freguezias de que se com-
punha esta comarca; foy crescendo o povo em forma que já os Prella-
dos Ecleziasticos tem devidido estas em mais tres, hûa no districto da
Goroguca, outra na Catinguinha e N. Sr.a da Conceição outra: à cabeça
de cada hûa destas tres ultimas, e novas freguezias se tem acumulado
muito povo, e como vivem distantes os juízes mais de sincoenta, e
sessenta legoas, sam os distúrbios, e insolências continuas, sem que a
justiça por conta das distancias possa dar a providencia necessaria à
boa ademenistração della; pello que se me fez precizo dar conta a V.
Mag.e para me determinar o poder meter nos pellouros mais três juízes
que acomodem as três freguezias ultimamente devedidas. Moucha 30
de Agosto de 1746.
Documento XX
Para o mesmo (Ouvidor Geral do Estado do Maranhão)
Dom João Etc. Faço saber a vos Ouvidor geral da Cappitania de S. Luiz
do Maranhão, que se vio a conta que me destes em carta de quinze de
Setembro de 1743 aserca da necessidade, que havia de se crearem em
cada hum dos destrictos da Parnahiba, Aldeas Altas, e Mearim hum
Juiz ordinario com seu escrivão, e Meirinho, sobre cuja materia man-
dando informar o Governador desse Estado satisfez a isso, e em tudo
foi ouvido o Procurador da minha Coroa, o que visto attendendo eu a
que os destrictos do Rio Pernahiba para essa parte do Maranhão são
muito extenços, e que com hum Juiz ordinario, e seu escrivão, que de
novo mandei crear para elles não hé bastante para acudir com prompto
remedio ás ocurrencias da justiça por distarem aquelles moradores,
quarenta e mais de sessenta legoas do lugar, e assistencia do dito Juiz;
sou servido por rezolução de 27 de Setembro de 1746 em Consulta
do meu Conselho Ultramarino ordenar se crie outro Juiz ordinario,
com seu Escrivão do judicial, e notas, e Meirinho nas povoações das
Aldeas Altas; o qual terá por jurisdição os destrictos, e povoações que
pegão da matta do Jaguará para fora correndo pelo dito Rio Parnahi-
ba assima, e Rio Itapecurú the os fins dos ditos habitadores, ficando
todas as maes povoações da dita mata para essa parte do Maranhão
the a caza forte do Iguará incluzive e Rio abaixo da Parnahiba the
beiramar, por destricto do Juiz ja de novo creado, a que hoje o vulgo
chama o Juiz da Parnahiba; ordenando tãobem que os Juizes da Vila
do Itacú alem da dita Vila tenhão por destricto da sua jurisdição todos
os moradores contiguos á mesma vila e os do Rio Moni asima thé a
dita Caza forte do Iguará exclusive; e de outra banda do mar em fronte
os moradores do Monimirim, Parajussara, Nazareth, e Tuxa thé as po-
voações antigas do Rio Itapecurú, e sua Freguezia exclusive em razão
da tal Freguezia ser, e sempre ter sido destricto, e do termo dessa ci-
dade de S. Luiz do Maranhão, e por me ser prezente que a respeito do
destricto, e termo dessa Cidade não houvera em tempo algum duvida
de que alem da dita Freguezia ao Itapecurú tem mais por termo todos
os dos Rios Mearim, e Pindaré correndo the os Pirizes, com tudo por
ser conveniente ao serviço de Deos e meu, e util a meos vassalos, sou
outro sim servido, que nos ditos Rios Mearim e Pindaré são somente
se crie de novo hum Juiz ordinario com seus officiaes, Escrivão e Mei-
rinho por ser muito difícil virem aquelles moradores a essa Cidade, e
os Juizes della irem àquelles Rios aos negocios da justiça, devaças de
mortes, e roubos commetidos nos ditos Rios, tanto pelo longe, e peri-
gos do mar, como pela deficuldade da condução, e gastos para elles de
canoas, e remeiros; pelo que se vos ordena façaes as ditas creações, e
devizões na forma apontada nesta minha ordem. ElRey Nosso Senhor
por Thome Joaquim da Costa Corte Real, e o Doutor Antonio Freire
de Andrade Conselheiros do seu Conselho Ultramarino, e se passou
por duas vias. Pedro Alexandrino de Abreu Bernardes a fez em Lx.a a
10 de Março de 1747
Documentos XXI
Para o mesmo (Governador do Rio de Janeiro)
Dom João & Faço saber a vós Gomes Freire de Andrade Governador e
Cappitam General da Cappitania do Rio de Janeiro com o governo das
Minas Geraes, que se vio o que me escreveo o Ouvidor Geral do Serro
do Frio em carta de 31 de Outubro do anno passado de que com esta
se vos remete copea sobre ser precizo crear-se de novo hûa villa em
qualquer dos três Arrayaes de Jequitahy, e Almas e Barreiras, ou haver
em qualquer delles hum Juiz ordinario com seu Tabalião, Alcayde, Es-
crivão e Porteiro por ser em utilidade das partes, e boa administração
da justiça. Me pareceu ordenarvos informeis com vosso parecer de-
Documentos XXII
Para o mesmo (governador do Rio de Janeiro)
Dom João & Faço saber a vos Gomes Freire de Andrade Governador
e Cappitam General do Rio de Janeiro com o governo das Minas, que
vendosse o que me escreveo o Ouvidor do Serro do Frio em carta de
5 de Setembro de 1747 de que com esta se vos remete copia sobre
ser precizo crearse no certão daquella comarca dous Juizes pedaneos
assim como os há nos Arrayaez de S. Romão, e Papagayo da Comarca
de Sabará para supprirem a falta da Justiça e a distancia do Recur-
so. Me parece ordenarvos informeis com vosso parecer. ElRey Nosso
Senhor o mandou por Thome Joachim da Costa Corte Real, e pello
Doutor Antonio Francisco de Andrade Illustres Conselheiros do seu
Conselho Ultramarino; e se passou por duas vias. Luiz Manoel a fez
em Lx.a a 17 de Junho de 1748.
Documento XXIII
Para o Ouvidor Geral da Cappitania do Maranham
execução o referido, porem como tinheis noticia que das Aldeas Altas,
e freguezia de S. Bento das Balsas que tem hoje mais de outo centos
fogos, vay grande distancia a que com facilidade não poderá acudir o
Juis do dito destricto, e continuamente estejão sucedendo cazos em
que he preciza a sua assistencia, me expunheis que seria conveniente
a meu serviço, e ao bem dos povos crease outro na dita freguezia para
assim ficarem os destrictos mais proporcionados para se acodir com
prompto remedio aos insultos que continuamente sucedem nos cer-
tões. O que visto Me pareceu ordenarvos informeiz com vosso parecer
com toda a clareza neste parecer, dando conta de como preticastes a
creação destes dous Juizes, declarando a que villas ficarão pertencen-
do ou se ficarão separadas as suas jurisdições, ou se há capacidade
de se crearem villas em cada hûa dellas com vereadores, e mais offi-
ciaes competentees para o governo da Républica, e da mesma sorte
informeis se será conveniente crear villas nos destrictos donde ellas
se hão de examinar, e que rendimentos poderão ter estas camaras para
as suas despezas. ElRey Nosso Senhor o mandou pelos Conselheiros
do seu Conselho Ultramarino abaixo asignados, e se passou por dias
vias. Caetano Recardo de Sousa a fez em lx.a a 20 de Abril de 1750. O
Secretario Joaquim Miguel // Andrade // Borges
Documento XXIV
Para o mesmo (Gomes Freire de Andrade)
Dom Jozé etc. Faço saber a vos Gomes Freire de Andrada Governador
e Cappitam General da Cappitania do Rio de Janeiro, com o governo
das Minas Geraes, que vendosse o que me reprezentou José Roiz Fro-
es Descobridor das Minas do Paracatú em carta de dez de Março do
prezente anno de que com esta se vos remette copea sobre as grandes
opreções que tem experimentado aqueles povos por falta de adminis-
tração de justiça porque sendo precizo crearemse Juizes ordinarios
na forma da ley, os ouvidores de Sabará os nomeão como lhes parece
sem proceder a eleição para poderem ter jurisdição ordinaria, como o
ouvidor actual o fizera nomeando a hû seu sobrinho por Juiz com ou-
tros empregos, pello que esperavão que eu fosse servido para os livrar
dos vexames que apontavão, mandar crear naquelle continente villa
Documento XXV
Copea Senhor
2ª via
Dom Jozé por graça de Deos Rey de Portugal e dos Algarves daquém
e dalém mar em África, Senhor de Guiné Etc. Faço saber a vós Go-
vernador e Cappitam General da Cappitania das Minas Geraes, que
vendose a conta, que me deo o Ouvidor geral da Comarca do Rio das
Mortes, em carta de dezassete de Abril do prezente anno de que com
esta se vos remete copia sobre os motivos que o obrigarão a pôr hû
Juiz ordinário, e hû Escrivão nas Minas de Itajubá, e a necessidade que
há de se crear outro na Jeruoca. Me pareceu ordenarvos informeis com
vosso parecer, declarando a necessidade que há de se estabalescerem
Juizes nestes destrictos, e a que villas elles pertencem, e em que dis-
tancia ficao das ditas villas, ouvindo por escrito os officiaes das Cama-
ras dellas. ElRey Nosso Senhor o mandou pellos Concelheiros do seu
Concelho Ultramarino abaixo assignados, e se passou por duas vias,
Antonio Ferreira de Azevedo a fez em Lixboa a trinta de Dezembro de
mil setecentos sincoenta e quatro.
Copea
Dom Jozé por graça de Deos Rey de Portugal e dos Algarves daquem
e dalem mar, em Affrica, Senhor de Guine Etc. Faço saber a vos Go-
vernador, e capitão General da Capitania das Minas Geraes, que ven-
dose a conta que me deu o Ouvidor geral da Comarca do Rio das
Mortes em carta de dezasete de Abril do prezente anno de que com
esta se vos remete copea sobre os motivos que obrigarão a pôr hû
Copia
Senhor Governador
Isto he o que se nos ocorre dizer aos dous pontos da conta do Dezem-
bargador Corregedor desta Comarca mas como a innata prudência de
V. Sª. he de mais superior esphera, a ella nos remetemos para que com
milhor expectação ponha na prezença de Sua Mag.de o mais acerta-
do.
Senhor
Ao Conselho parece que V. Mag.de seja servido, criar hum Juiz ordi-
nario para as Minas de Ittajubá que seja elleyto com os mais officiaes
da Camara da Villa de S. João DelRey na forma da Ordenação, e mais
Leys que as declarão establecidas para a elleyção das justiças e tirará
sua carta de uzança pelo Corregedor da Comarca, e terá a mesma ju-
risdição no destricto das ditas Minas, excepto nas cauzas crimes em as
quaes poderá prender os culpados tomar querellas, proceder a devasas
e pronunciar as deligencias e remetter estes proceços crimes ao juizo
da Ouvidoria com os reos que forem prezos para nelle se senticiarem
as suas culpas e com seu tabalião do judicial e notas para com este
escrever. E pelo que toca ao Juiz que pede o Ouvidor para as Minas da
Jeruoca, parece ao Concelho que por hora se escuze esta providencia
sopposto o que respondem os officiaes da Camara e pelo seu expedien-
te manda o Conselho informar ao Ouvidor da Comarca sobre o abuso
da jurisdição que a Camara diz que praticão os Juizes de Sapucahy e
da Campanha do Rio Verde, para que este faça praticar a estes juízes o
mesmo que dispoem a Ordenação a respeito dos Juizes de Vintena não
se achando ordem de V. Mag.de para que a altere porque sem ella não
podem uzar da jurisdicão que a Camara lhes concidera e com a sua
informação intreporá a Câmara o seu parecer nesta matteria.
Documento XXVI
Para o mesmo (Governador das Minas Geraes)
Dom José Etc. Faço saber a vós Governador das Minas Gerais que
vendose o que me reprezentarão os officiaes da camara de Vila Real
do Sabará em carta de 20 de Novembro de 1754 de que com esta se
vos remete copia, em que pertendem seja servido ordenar em cada
Arrayal daquele termo em distancia de trinta até quarenta legoas, haja
ventanarios, e Escrivães com poder de fazer escritura, e Inventarios,
tomando por avaliadores os homens bons do lugar, remetendo-os logo
para a Villa e que os mesmos ventanarios fação por mandados não só
as deligencias dos Juizos mas tambem as da Fazenda Real, para deste
modo se evitarem os danos que reprezentão os ditos officiaes da Ca-
mara. Me pareceu ordenarvos informeis com vosso parecer ouvindo
por escrito os Ouvidores das Comarcas dessas Minas. El Rey Nosso
Senhor o mandou pellos Conselheiros do seu Conselho Ultramarino
abaixo asignados, e se passou por duas vias. Theodoro de Abreu Ber-
nardes a fez em lx.ª a 19 de Fevereiro de 1756. O Secretario Joaquim
Miguel // Andrade // Costa
Documento XXVII
Para o mesmo (Para o Governador interino da Cappitania do Rio de
Janeiro, e Minas Gerais)
Dom José Etc. Faço saber a vós Governador da Cappitania das Minas
geraes que havendo visto o que informastes em carta de 25 de Abril do
anno proximo passado sobre a conta que me deo o Ouvidor geral da Co-
marca do Rio das Mortes, de que pella necessidade que se lhe expuzera de
haver nas Minas de Itajuba, quem administrasse Justiça aos seus habitan-
tes se vira obrigado, sem ordem minha, a pôr nella hû juiz ordinario, e hû
escrivão interinamente té eu lhe determinar se devia ou não conservarsse,
reprezentandome seria tão bem conveniente porse outro Juiz ordinario na
Jeruoca para com elle se poderem atalhar as mortes, e outras insolencias
que são continuas naquelle citio; e vendo o que sobre esta materia respon-
derão os Procuradores de minha Fazenda e Coroa. Fuy servido por minha
real rezolução de dezanove do corrente mez, e anno, tomada em consulta
do meu Conselho Ultramarino; permitir os Juizes ordinarios com seus Es-
crivães para os destritos referidos. ElRey Nosso Senhoro mandou pellos
Conselheiros do seo Conselho Ultramarino abaixo asignados, e se passou
por duas vias, Caetano Ricardo da Silva a fez em Lx.a a 26 de Setembro
de 1758. O Secretario Joaquim Miguel // Andrade // Costa
Documento XXVIII
Para o Ouvidor geral da Comarca do Sabará
Dom Jozé Etc. Faço saber a vós Ouvidor Geral da Comarca do Sa-
bará que vendosse o que me reprezentarão os officiaes da Camara
de Villa Real dessa Comarca, para que eu fosse servido ordenar que
em cada Arrayal do termo daquella Villa em distancia de trinta até
quarenta legoas haja vintenarios e Escrivão com poder de fazer es-
crituras e Inventarios, tomando por avaliadores os homens bons do
Documento XXIX
Para o Ouvidor da Comarca do Serro do Frio
Documento XXX
Segue a conta que fazem os moradores do Continente e Campanha
do Rio Verde Comarca do Rio das Mortes, em que pedem a S. Mag.
de
se digne por piedade dar as providencias necessarias para evitarem
os grandes incomodos e prejuizos que padecem, sendo obrigados a
hir propor as acçoens novas na cabeça da comarca perante o ouvidor,
devendo-o fazer no Juizo ordinario daquele Continente aonde se expe-
rimentão iguaes damnos e extorçoens das sismarias, e cobranças das
dividas da Real Fazenda pelos officiaes que se mandão de Vila Rica.
E vão os documentos que se anexão
Que a creação deste juizado não fora por outra rezão que não fosse
de aliviar aos povos de proporem as suas acçoens na ouvidoria ou
ordinario de S. João. Que a ley do Reyno Livro 2º ttº quarenta e cinco
§ 50 defendia interporemse as acçoens novas nas ouvedorias excepto
dos Poderozos; que naquella Capitania era estillo, diria melhor abuzo
pois não julgava estillo que se devesse praticar / aquele que era dia-
metralmente oposto à ley / o poremse acçoens novas perante o ouvi-
dor e por isso justamente se queixavão os Supplicantes moradores na
Campanha do Rio Verde dos exorbitantes gastos que os officiaes da
Ouvidoria lhes fazião.
Que tãobem era conforme à ley do Reyno que o Juiz ordinario da-
quele termo, separado e proprio sirva juntamente de Juiz dos orphãos
emquanto no dito termo, e povoação não houver tantos menores que
possa ter lugar crearse hum juiz dos orphãos separado e diverso do
Juiz ordinario; asim como era repugnante à mesma ley, que esteja o
Juiz dos orphãos da Villa de São João exercitando ainda jurisdição no
termo dos Suplicantes depois de separado do da dita Vila, e que aos
mizeraveis orphãos do referido termo, que estão na mesma grande dis-
Pelo que sahindo os ditos officiaes de Vila Rica se lhe deverá contar
hum só caminho da dita Vila athé a capital do termo aonde forem
fazer as deligencias, a que forem mandados, o qual caminho lhes será
satisfeito por todas as partes a que respeitarem as ditas deligencias,
rateandose a despesa delle por todas; e da Vila Cabeça do termo das
deligencias athé os lugares dellas, se contará o vencimento delles na
forma costumada; havendo cuidado de se não mandarem officiaes de
Vila Rica a termos remotos, a hûa só deligencia; mas indo encarrega-
dos de muitas para ficar mais suave a despeza do caminho, que se deve
contar às partes.
tão as deligencias dos ditos termos, porque por este modo cessará a
grande despeza do caminho que se costuma contar de Vila Rica, salvo
somente os cazos em que forem taes as deligencias que para ellas se
faça precizo mandar officiaes de que a Junta da Fazenda tenha maior
conhecimento e faça mais confidencia. O que assim seria muito con-
veniente se praticasse quando, a este Concelho não parecesse melhor,
que nem esses officiaes houvesse rezidentes nas Vilas capitaes dos
termos e comarcas, e deputados para as deligencias das ditas comar-
cas, e que as deligencias se mandem fazer pelos officiaes das respec-
tivas ouvidorias, e cabeças de comarcas dirigindose as ordens para
ellas, aos Ouvidores e Juizes de Fora das ditas Comarcas e termos,
para elles as mandarem executar pelos ditos seos officiaes ou pelo
menos encarregandoselhes que vigiem sobre a execução dellas, e das
cobranças a que se dirigirem, sob penna de se lhes dar em culpa nas
suas rezidencias toda a omissão em que nisso incorrerem; e porque
adoptandose este meio, evitarsehá o infinito numero de officiaes da
Fazenda espalhados por diferentes comarcar, os continuos roubos que
costumão cometer fiados na longa distancia que vivem da rezidencia
da Junta, e as dezordens que costumão haver por esta cauza entre os
Menistros da dita Junta, e os Ouvidores das respectivas comarcas da
rezidencia daqueles officiaes, querendo a dita Junta por ouvidores não
possão autualos e prendellos pelos furtos, e extroçoens que notoria-
mente fazem nas suas comarcas, e que nellas fazem de impunidade
e não obstante as continuas vexaçoens, e opressoens dos mizeraveis
Povos, os quaes pela grande distancia em que vivem de Vila Rica ou
não podem recorrer a dita Junta da Fazenda ou a ella recorrem debalde
pela prepotencia dos ditos officiaes, e tem por menor mal sofrerem
silenciosamnte as violencias dos ditos officiaes, em cujas nomeaçoens
athe se pratica o abuzo de serem excessivas e por se passarem cartas
de semelhantes officiaes a todos, ou a grande parte dos que o pedem
por intersses particulares sem a indispensavel atenção que se devia
ter a não se concederem se não aos precizos, e necessários para a boa
arrecadação da Fazenda Real, e execução das deligencias para ella
necessárias, e sem se attender que com a supeflua concessão de seme-
lhantes cartas se faz conservar na ociozidade a numeroza multidão de
individuos a que ellas se concedem e se habelita hum igual numero de
vadios para chuparem livremente o sangue e a substancia dos povos, o
que praticão, fingindo ordens, e fazendo deligencias que lhe faz con-
ta, e não executando as que se lhes encarregão quando as partes lhes
IV – RESENHAS
REVIEW ESSAYS
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inglês, francês, espanhol ou italiano.
• Exceto os trabalhos dirigidos à seção Bibliografia, os autores deverão, obrigatoriamente, apresentar
títulos e resumos nos idiomas português e inglês, independentemente do idioma do texto original, e caso
este não esteja em português ou inglês, acrescentar resumo na língua original, não podendo ultrapassar
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representativas do conteúdo do trabalho, também em português e inglês, e no idioma original quando
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• Chapters: LAST NAME, First Name. Title of the chapter. In: LAST NAME, First Name (ed.). Title of
the book in italics: subtitle. Edition. City: Publisher, year, p. nn-nn.
• Article: LAST NAME, First Name. Title of the article. Title of the jounal in italics. City: Publisher.
Vol., n., p. x-y, year.
• Thesis: LAST NAME, First Name. Title of the thesis in italics: subtitle. Thesis (PhD in …..) Institution.
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• Internet: LAST NAME, First Name. Title. Available at: www….., consulted dd.mm.yy.
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