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AUTOR:1
Algumas de suas obras são índios e Criadores e O Messianismo Craô, hoje não
mais à venda. Leciona atualmente na Universidade de Brasília e regularmente oferece
dois cursos de extensão: Áreas Etnográficas da América Indígena e Mitologia indígena.
RESUMO DA OBRA:2
1
Informações disponíveis em: http://www.juliomelatti.pro.br/cv.pdf. Acessado em 15/06/15.
2
MELATTI, J. O Messianismo Crâo. São Paulo: Editora Herder, 1972. Disponível em: http://www.
Juliomelatti.pro.br/livros/livro72.pdf, acessado em 15/06/15.
utilizada na década de 60 e 70, período o qual o livro foi publicado. Contudo, optou-se
por utilizar essas nomeações na resenha para se manter fiel ao livro.
A relação interétnica conflituosa é definida pelo autor pelo ataque em 1940 dos
sertanejos sobre os indígenas. Esse acontecimento é registrado com a contagem de 26
índios craôs mortos e nenhum sertanejo. Ele começou com uma armadilha, quando um
fazendeiro da região, José Santiago ofereceu uma rês aos índios. Estes concentraram-se
na aldeia para comerem a oferenda do fazendeiro. Enquanto estavam reunidos, os
indígenas foram massacrados pelo fazendeiro. O líder no momento da tribo propôs uma
conversa com o fazendeiro que comandava. Primeiramente recebeu uma garantia de vida,
mas ao se aproximar dele foi morto. Depois do evento, uma unidade governamental do
S.P.I. foi instalada na região para garantir a segurança dos craôs. Houvera uma punição
aos responsáveis pelo massacre, contudo somente nominalmente. A instauração da
unidade do órgão federal auxiliava os indígenas, todavia a rixa com os sertanejos
continuava. A visão dos craôs quanto aos civilizados dividia-se entre os distantes em
grandes cidades, pelo tratamento aos indígenas e presentes concedidos, enquanto os
próximos, sertanejos, eram alvo da vingança dos craôs pelos constantes ataques e
invasões a suas terras. Esta dualidade na visão estará incorporada na mensagem
messiânica, pois a figura o messias será do civilizado distante o qual distribui presentes,
uma figura paternalista que se associa com Wapo. O autor termina analise desse primeiro
ponto apresentando outros grupos em que viam um beneficiário no civilizado distante.
Em seguida, Julio Melatti aborda sobre o mito de Auke que serviu para consolidar
o movimento messiânico. O texto mostra as variações sobre esse mito que passa por
vários grupos. Apresenta-se a versão craô, algumas versões não ficam claro quem foi o
pai de Auke, porém outras indicam que é Papam – sinônimo de Pït que significa Sol,
traduzindo como Deus. Alguns dos relatos apontam que esta entidade tomou formato de
uma serpente para seduzir a mulher que seria mãe de Auke pela relação com essa
divindade. Fruto dessa união, Auke tinha poderes de se transformar em animais,
principalmente aquáticos. Segundo o mito, ainda no útero a criança conseguia sair e se
transformar em outros seres. Os poderes desse ser assustavam os integrantes de sua tribo,
e temiam que algum mal pudesse vir dessa criança. Então, a comunidade decide mata-lo,
quem é o responsável pela decisão vária de versão, podendo ser o avô materno, o povo
ou até o tio materno. Depois de diversas tentativas, queimam o menino, o qual aparentava
estar morto. Contudo, no lugar de sua morte encontraram uma grande casa com diversas
mercadorias e instrumentos, cada versão vária o conteúdo da casa. Auke teria se
transformado em no primeiro “cristão”. O texto indica que os objetos da casa demonstram
o poder dos civilizados possuíam. O mito varia neste momento. Uma das versões aponta
que Auke faz com os índios escolham entre um arco-e-flecha e uma espingarda, como
escolheram o primeiro recebem a cultura material indígena em vez da tecnologia – os
negros escolheram a espingarda, segundo o texto, assim ficando com a tecnologia. Outra
versão do mito, Auke engana os jovens a entram na casa e tranca-os – tornando-se os
primeiros civilizados –, enquanto os mais velhos são espantados por tiros – permanecendo
indígenas. Os craôs acreditam que a figura de Auke não morreu, ele reside em algum
centro urbano segundo os relatos dos indígenas.
Este mito, segundo o autor, surgiu para explicar a diferença de tecnologia entre os
grupos. Porém, ele deve ter uma origem em outro mito. Com isso Melatti apresenta com
outros grupos com uma mitologia similar. Os caiápo também possuem um mito, o qual
uma jovem tem relações com um lagarto, gerando um filho com poderes de transformar
neste animal. A aldeia assustada decide queimar a árvore onde abitavam os lagartos com
fogo. Entretanto, alguns conseguem fugir e se refugiam em uma aldeia que se tornará a
“cristã”. A jovem grávida também escapa de sua comunidade para ir até este novo grupo.
Alguns pontos dessa estória são similares com o de Auke, como a relação sexual de uma
jovem com criatura gerando um filho com capacidade de transforma-se, e destruição pelo
fogo. O autor questiona-se qual grupo influenciara primeiro, craôs sofre os caiápo ou o
contrátio. Contudo, Melatti afirma possibilidade de uma terceira opção, considerando as
características desses mitos como uma matriz comum aos dois. Em seguida, apresenta-se
outro mito desta vez do grupo bororo, o qual tem uma mesma matriz com os craôs e
caiápo por pertencer ao mesmo tronco linguístico Jê. Similar aos outros dois, uma mulher
chamada Aturuaroddo ficou grávida devido ao contato com o sangue de uma sucuriju,
não houve nenhuma relação entre o animal e o humano neste caso. O filho antes de nascer
conseguia sair do útero em forma de sucuriju. Os irmãos da mãe matam o filho também
através do uso do fogo, contudo a suas cinzas transformam-se em plantas para uso dos
bororo, não em outro ser. Analisando esses três mitos, o autor afirma que Auke foi
constituído por meio dessa matriz comum após o contato com o civilizado. A presença
constante do fogo mostra também como este elemento simboliza o extermínio para esses
grupos. Contudo, Melatti a formação da estória de Auke não se deu somente pela alteração
da tradição, mas também do uso e mudança do mito de Adão e Eva que foi passado pelos
civilizados aos indígenas. A utilização desse conto pelas comunidades nativas ocorre para
entender também a diferença entre os “cristãos” e os indígenas. Novamente existe
diversas versões, algumas que se relacionam com a estrutura do mito de Auke, porém os
pontos interessantes dessa ressignificação de Adão e Eva seria a perda do paraíso para os
indígenas e não a toda a humanidade como no original, assim explicando a diferença na
relação interétnica.
O autor ainda aponta que José Nogueira visava uma transformação em “cristão”
não somente pela obtenção dos objetos, mas também no trabalho. Também, apresenta-se
o desejo de vingança que Nogueira alimentava pela morte de parentes seus no ataque de
1940. Melatti aponta José Nogueira tem um subconsciente que se relaciona com Auke, o
que levou a tomar certa posição do movimento. Por fim, o autor coloca que o vidente
organizou o movimento no momento propício para existir.
Em segundo lugar, a relação entre a chuva e o herói Auke envolve raio, relâmpago,
trovão e nuvens escuras. Auke é ligado à água e ao fogo, ao sair do ventre da mãe no
ribeirão e se transformar em animais, e se transforma em civilizado quando o atiram ao
fogo. Melatti aponta que Roberto DaMatta ao analisar a versão Canela do mito, compara
com o mito da origem do fogo, pois Auke vem da natureza, entra na sociedade e é expulso
pelo fogo, assim como a chuva é externa aos craôs, relacionada com animais, plantas,
mortos. Assim, José Nogueira aproveitou elementos que favoreceram a transformação de
Auke em civilizado ao personificar a chuva, o que também contribuiria com a
transformação dos índios em civilizados.
Uma das descrições canelas da lenda de Auke é a história de uma mulher que,
caminhando pelo rio, encontrou uma cobra, uma encarnação de Deus, e copulou com ela,
ficando grávida de Auke. Durante a gestação, a criança saía do ventre da mãe e se
transformava nas mais diversas criaturas. Ao nascer, atingiu a idade adulta na mesma
tarde, voltando a transformar-se em criança assim que os demais índios se aproximavam
para visitá-lo. A criança causou medo em seus pais, que decidiram matá-lo antes que
oferecesse riscos para a tribo. Para isso, a índia chamou seu pai (chamado de “tio”, em
outras versões) para dar cabo ao menino. O avô tentou dar fim ao menino três vezes,
obtendo sucesso apenas na terceira vez, quando o atirou em uma fogueira. Mais tarde, os
pais da criança foram até a floresta revirar as cinzas do menino, mas no lugar dos restos
da fogueira encontraram uma casa de telhas, com criações de gado e galinhas. Auke havia
se transformado em homem cristão civilizado, e tentou oferecer aos demais índios a
mesma condição, dando a eles o poder de escolher entre armas de fogo ou arco e flecha,
porém estes ficaram com medo e optaram por permanecer com suas armas rudimentares,
permanecendo assim como selvagens.
Porém, como descrito no texto, a mulher deu à luz um natimorto, fato encarado
como um suposto resultado do encantamento lançado por um índio apaniecrá. A própria
líder do movimento esclarecia que, na verdade, seu filho havia deixado o útero para
encontrar Auke no céu, mas que dentro de alguns meses, caso as danças e rituais na casa
da líder os agradasse, tanto a irmã quanto Auke voltariam para dar início ao período de
transformações na aldeia.
De acordo com o autor, uma possível causa das diferenças entre o movimento
messiânico ramcocamecrá e o craô se deve ao fato de que os craôs possuía redundâncias
em suas crenças. A ideia de que uma transformação de selvagens para civilizados
aconteceria repentinamente estava presente em ambas as crenças, entretanto a crença craô
carregava consigo a característica de “cargo cult”, ou seja, de que receberiam animais e
mercadorias, e acreditavam que a providência viria através da entidade “Chuva”, que seria
o redentor.
O autor finaliza o capítulo deixando em aberto o questionamento de por que as
tribos apaniecrás, crincatis e pucobiês, também de tradição timbira, em contato com o
mesmo segmento da sociedade brasileira e com os mesmso mitos não tiveram nenhum
movimento messiânico como os ocorridos entre os ramcocamecrás e craôs, ou se a
existência dos mesmos eram apenas desconhecidas. Questiona também quais seriam os
requisitos para assumir a liderança de um movimento dessa magnitude, visto que os já
conhecidos possuíram líderes tão diferentes, mas ao mesmo tempo tão semelhantes.
CONCLUSÃO
Três textos que podem ser relacionados com o livro de Julio Melatti, O
Messiânismo Craô, são o texto “A socialiação primária” no livro A Construção Social da
Realidade de Berger e Luckmann3; a “Introdução: Tema, método e objeto desta pesquisa”
do livro Os Argonautas do Pacífico Ocidental de Malinowski4; e por fim o livro
Metáforas históricas e realidades Míticas de Sahlins5.
3
BERGER, P. LUCKMANN, T. A Sociedade como Realidade Subjetiva. In.: A Construção da Realidade.
Petrópolis: Vozes, 1988, pp. 173-184.
4
MALINOWSKI, B. Introdução: Tema, método e objetivo desta pesquisa. In.: Os Argonautas do Pacífico
Ocidental. São Paulo: Abril Cultural, 1984, pp.17-34.
5
SAHLINS, M. Metáforas históricas e realidades Míticas. Rio de Janeiro: Jorge Jahar Editor, 2004.
integral da comunidade pelo convívio que Malinowski defende relaciona-se pela
abordagem que Melatti faz.
Por fim, a relação entre Sahlins com abordagens de mudança de uma estrutura
pela formação de uma conjuntura de mudança pode ser vista no movimento messiânico
craô. Contudo, o messianismo acaba se tornando em uma estrutura que se reproduz,
Melatti define esse movimento como cíclico entre um período de espera e atividade.
Portanto, o movimento se reproduz, assim fazendo parte de uma estrutura.