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Outro elemento importante nos protestos, e também destacado por Tatagiba (2014), é a
presença de símbolos nacionais na paralisação. Durante diversas reportagens fomos capazes
de observar o uso de bandeiras e demais símbolos que faziam referência à nação brasileira.
Este fato está atribuído também ao não envolvimento partidário dessa manifestação, que
procura se legitimar utilizando-se de aspectos comuns entre o povo brasileiro para ganhar
empatia dos demais grupos da sociedade, visando um bem comum não só da coletividade dos
caminhoneiros, como também da sociedade brasileira como um todo.
Assim, o movimento dos caminhoneiros possui grande semelhança com as Jornadas de Junho
que ocorreram em 2013, tendo em vista que a mobilização dos caminhoneiros também não
estava determinada com bases partidárias, assim como foi destacado por Tatagiba (2014) no
trecho abaixo, sobre as Jornadas de Junho, retirado de seu texto:
TATAGIBA, Luciana. 1984, 1992 e 2013. Sobre ciclos de protestos e democracia no Brasil.
2014, p.48
Nas Jornadas de Junho, não apenas a infraestrutura de mobilização esteve assentada
em outras bases, sem qualquer papel efetivo dos partidos no recrutamento e
organização das mobilizações, como também cresceu de forma inédita o nível de
hostilidade em relação à presença dos partidos e dos militantes partidários nos
protestos.
Além disso, um aspecto interessante neste protesto e que consolida o ponto de vista da Elisa
P. Reis (2000) abordado em seu texto, seria o fato de como essas manifestações alcançaram o
apoio da elite, que se materializa nos donos de postos, empresários do ramo e acionistas em
empresas de produção de combustíveis. Isso ocorre, pois a autora acredita que entender a
visão das elites pode ajudar em aspectos tais como a redução das desigualdades. Com o apoio
da elite, os caminhoneiros ganharam ainda mais força em suas reivindicações que, sanadas, se
torna um passo ainda maior para a diminuição da desigualdade social no País.
Reconhecer a importância das elites também não significa negar a importância dos
demais atores sociais. O comportamento das elites é, em grande parte, reativo às
pressões e ações vindas de baixo. Com quer que seja, a maneira como as elites
reagem, suas ações e inações são aspectos centrais quando se quer entender a
dinâmica das desigualdades e/ou identificar maneiras de combater a pobreza e
reduzir as desigualdades. (REIS, 2014, p. 144)
Um ponto importante neste estudo, é a grande proporção que o movimento ganhou, gerando
impactos na vida de todos os cidadãos, que se viram ilhados por conta da falta de
abastecimento no país provocada pela paralisação. O desabastecimento de comida, a
suspensão das entregas pelos Correios, os cancelamentos de voos nos aeroportos e a escassez
dos combustíveis fizeram com que as grandes elites se sentissem pressionadas em encontrar
um acordo para que houvesse o fim da paralisação. Isso é muito bem retratado pela autora
Reis (2000) em seu texto, quando a mesma declara que em situações onde a proteção
individual não se torna suficiente, as elites acabam descobrindo a necessidade de soluções
coletivas (REIS, 2000, P.144).
Com isso, o governo se viu obrigado a tomar atitudes quanto a estes fatos e cedeu aos pedidos
realizados pelos caminhoneiros. Ficou decidido, em acordo com os caminhoneiros, os
seguintes ajustes por parte do governo: isenção da cobrança do eixo suspenso dos pedágios; a
garantia de um período de no mínimo 30 dias para reajustes; redução de R$ 0,46 no preço do
óleo Diesel nas refinarias, o que corresponde aos valores de PIS e Cofins; garantia aos
De acordo com Weber (1993, p.121), a politica deve ser feita com o cérebro, contudo torna-se
indispensável que ela não seja feita apenas com o cérebro. Cabendo assim, aos partidárias a
ética da convicção, mas ao contrario das manobras realizadas pela presidência mediante as
manifestações dos caminhoneiros, não caberia de acordo com o autor, recomendar atuações
com base na ética de convicção ou de responsabilidade para com os sindicalistas, que nesse
caso, compreendem-se também como os manifestantes. Insta salientar que Weber (1993)
define que:
WEBER, Max. Ciência e Politica: duas vocações. Ano: 1993 Editora: Cultrix. p.63, 113-114
A nenhuma ética é dado ignorar o seguinte ponto: para alcançar fins “bons”, vemo-
nos, com frequência, compelidos a recorrer, de uma parte, a meios desonestos ou,
pelo menos, a meios perigosos, e compelidos, de outra parte, a contar com a
possibilidade e mesmo a eventualidade de consequências desagradáveis. E nenhuma
ética pode dizer-nos a que momento e em que medida um fim moralmente bom
justifica os meios e as consequências moralmente perigosas. (WEBER, 1993, p.114)
Verifica-se, como a própria atuação dos atores, que fatos e decisões tomadas na paralisação
dos caminhoneiros atendem aos requisitos para a definição de política e, consequentemente,
permite a análise do evento baseando-se nas definições da ciência política. Conforme exposto
por Schmitter (1965), no que refere-se ao conceito de política, define-se quatro aspectos que
podem definir a política, sendo eles: "instituições", onde existe a representação representado
TATAGIBA, Luciana. 1984, 1992 e 2013. Sobre ciclos de protestos e democracia no Brasil.
2014, p.47
REIS, Elisa P. Percepções Da Elite Sobre Pobreza E Desigualdade. 2000, p. 144.
do Estado ou Governo; "recursos", que são utilizados em forma de Poder, Influência ou
Autoridade; "processos", representados pela formulação de decisões; "função", que na política
passa pela resolução não-violenta de conflitos. No caso apresentado, podemos identificar
todos esses aspectos.
Um dos principais atores, sendo chamado de imediato para atender às reivindicações dos
caminhoneiros, é o próprio Governo. No entanto, como o próprio Schmitter (1965) relata, a
definição de Estado e Governo foi revista para uma abarcar outros elementos que não fazem
parte do Estado tradicionalmente. A Petrobrás, empresa estatal e, por isso, influenciada por
decisões governamentais, também é um ator do evento em análise e pode ser vista como parte
do Governo. Apesar de Schmitter (1965) citar três escolas para definição dos recursos, a que
melhor se encaixa no caso apresentado é a Influência, visto que o Governo, por meio de sua
influência, pode agir para solucionar o impasse e terminar com a greve, seja dentro do próprio
Estado para alterações de leis e tributos junto ao Congresso Nacional, seja em uma empresa
estatal diretamente ligada aos preços dos combustíveis, a Petrobrás. A formulação de decisões
está muito clara no acordo realizado entre as lideranças do movimento grevista dos
caminhoneiros e o próprio Governo, na tentativa de encerrar a paralisação. Conforme exposto:
Diante do exposto, a resolução de conflitos dentro de uma sociedade é uma função política. A
paralisação dos caminhoneiros consiste em um conflito existente entre essa classe de
trabalhadores, o próprio Estado e os agentes econômicos que influenciam os preços dos
combustíveis utilizados no transporte rodoviário, principal item da pauta reivindicatória do
movimento grevista. De acordo com os recursos disponíveis e os diferentes interesses dos
atores desse evento, existe o desejo e a vontade de se resolver o conflito apresentado sem
utilizar de violência como ponto inicial de partida, e também não sendo usado como ponto
final.
GLOBO. Após a greve dos caminhoneiros, Temer se reúne com Pedro Parente.
Disponível em: < https://g1.globo.com/politica/noticia/governo-faz-proposta-para-
suspensao-da-paralisacao-dos-caminhoneiros.ghtml >Acesso em: 16 Jun. 2018
WEBER, Max. “A Política como vocação”. Ciência e política: duas vocações. São Paulo:
Ed. Cultrix, 1993