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Neves EM, Longhi MR, Franch M, organizadores. visão mais microscópica permite acessar os signi-
que é imposto pelo governo, mas o que fica “de à conclusão. Assim, nem todas as doenças estão
fora” da visibilidade do governo, uma vez que o cobertas pelas políticas de saúde disponíveis. No
aborto inseguro é considerado ilegal. Para isso, as Capítulo 11, busca-se estudar as biorredes que se
autoras pesquisaram o perfil e as motivações de mobilizam para a criação de políticas públicas
mulheres que praticaram esse tipo de aborto no para pessoas com doença falciforme. Os atores
contexto do Rio Grande do Norte. Corroborando envolvidos acusam a falta de atenção a essa doença
com pesquisas já realizadas3, os dados apresen- genética como racismo institucional, correspon-
tam que quem realiza o aborto são as mulheres dendo a mais um marcador de desigualdade social
comuns, muitas vezes casadas, que têm filhos, uti- da população negra.
lizando medicação para produzir o abortamento, No que se refere ao uso de anabolizantes, o
são escolarizadas, de diferentes classes sociais e Capítulo 12 apresenta a visão ambígua dada sobre
religiosas. As principais motivações citadas para o tema pelo discurso dos profissionais da área
o abortamento perpassam a satisfação pessoal e a da medicina. Quando o paciente é jovem e quer
responsabilidade individual, questões econômicas transformar seu corpo, o uso dessa substância é
limitadas e violência conjugal. considerado arriscado; mas quando o paciente é
A temática abordada seguinte é o HIV/Aids. idoso, o uso da mesma substância é recomendado
Tanto no Capítulo 7 como no Capítulo 8, fica para enfrentar o processo de envelhecimento. Esse
evidente que os serviços de saúde têm dificuldade questionamento evidencia aspectos moralizantes
em abordar prevenção, tratamento e continui- que perpassam a indicação de tais substâncias para
dade do cuidado de pacientes afetados. Maksud os pacientes.
apresenta a análise de quatro pesquisas orientadas O Posfácio, de Fleischer, apresenta um diálogo
e coorientadas por ela a fim de refletir sobre os ficcional entre três personagens que aguardam
discursos que permeiam as instituições de saúde atendimento no “banco de espera” de um centro de
em relação ao HIV/Aids. Já Silva foca a dinâmica saúde, articulando as problemáticas e as compreen-
conjugal sorodiscordante para HIV/Aids diante sões emergidas nos capítulos anteriores. De forma
de situações de risco, tendo como única opção o dinâmica, os personagens interagem e apresentam
uso de preservativos nas relações sexuais. Nessa os meandros da convivência com doenças e os mo-
dinâmica, os casais não condicionam o risco às dos de atenção dos serviços de saúde para diagnós-
suas decisões reprodutivas, criando estratégias pra tico e tratamento delas. Esse esforço de alteridade
se relacionarem sexualmente sem uso da camisinha ao trazer a voz dos usuários nos presenteia com a
mesmo que eventualmente. finalização de uma obra que ressoa a urgência de
Outra questão bastante pertinente à Antropo- diálogo entre as Ciências Humanas e Ciências da
logia da Saúde é o estudo da própria construção Saúde para melhorar a atenção em saúde.
do discurso biomédico em nome da ciência, como Em suma, a relevância dessa obra se destaca
também objetivam outros estudos clássicos4. No pelas questões contemporâneas problematizadas,
Capítulo 9, a autora busca novos significados e pela articulação analítica e crítica dos atores envol-
compreensões que permeiam o que é o “bom” vidos no pensar e no fazer saúde e pela publicação
embrião a partir de imagens e escores construídos acessível promovida pela Associação Brasileira de
por profissionais de saúde para definir a qualidade Antropologia (ABA). Como explicita Knauth na
de embriões na utilização do processo de reprodu- orelha do livro, os autores que compõem essa cole-
ção assistida. Nessa mesma linha de raciocínio, o tânea são “novas lideranças” da área que colaboram
Capítulo 10 apresenta o contraste das concepções para consolidar e reverberar os estudos no âmbito
de ética de instituições científicas e da sociedade da Antropologia da Saúde.
quando se trata da atenção a pessoas com doenças
raras. Ainda que essas pessoas tenham direito a Referências
medicação, falta-lhes o acesso a ela, uma vez que
não há pesquisas suficientes para confirmar sua 1. Fassin D. Humanitarianism as a Politics of Life. Public
eficácia e para a sua disponibilização ao público Culture. Society for Transnational Cultural Studies 2007;
19(3):499-520.
pelas políticas de saúde. Nesse sentido, a burocracia 2. Mol A. The logic of care: health and the problem if patient
e a lentidão das instituições científicas para o uso choice. London: Routledge; 2008.
dessas novas medicações destinadas a doenças raras 3. Diniz D, Medeiros M. Aborto no Brasil: uma perspectiva
criam um impasse em nome da ciência. domiciliar com técnica de urna. Cien Saude Colet 2017;
As políticas de saúde são definidas a partir da 22(2):653-660.
4. Good B. How medicine constructs its objects. In: Good
medicina baseada em evidências, o que demanda B. Medicine, Racionality and Experience. Cambridge:
tempo, critérios específicos e recursos para chegar Cambridge University Press; 1994. p. 65-87.
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