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PORTO ALEGRE, SÁBADO, 7/7/2007, E DOMINGO, 8/7/2007 29

O Diário Gaúcho jornalista que viveu boa parte


começa hoje a contar dela: Renato Dornelles,
uma história. 43 anos, 21 de profissão.
Durante dez sábados, Como repórter policial de
o jornal vai relembrar Zero Hora, cobriu rebeliões
uma época que marcou e entrevistou boa parte dos
o crime organizado bandidos.
no Rio Grande do Sul. E, para apresentá-la de
Uma época diferente da forma diferente ao leitor
atual: um tempo em que durante os dez sábados,
os bandidos cometiam colegas se uniram a
atrocidades, assaltos e Renatinho: a diagramadora
tráfico de drogas, mas Flávia Kampff, o
protegiam as comunidades ilustrador Alexandre
onde moravam. Hoje, os Oliveira e a estudante
criminosos da nova geração de Jornalismo Denise
transformam em vítimas seus Waskow. Formaram uma
próprios vizinhos. “quadrilha” do bem, que
O primeiro capítulo da trabalhou pensando no
história está publicado nas nosso leitor.
páginas seguintes e ocorreu
há 20 anos. Ela começa ● Robin Hood só é
com o motim do Presídio legal em livros
Central, de Porto Alegre, Parece filme policial: táxi
em 1987. Foi quando os invade o saguão do Plaza Por fim, é preciso deixar
gaúchos descobriram que a em 8 de julho de 1994 uma coisa bem clara.
massa carcerária do Estado uma cena só vista nos filmes O Diário Gaúcho não
atuava sob um comando cuidavam da comunidade: policiais: um táxi invadiu o quer com esta reportagem
único, embora espalhada no morro, ninguém matava, saguão do então principal hotel transformar bandidos em heróis
● Traficantes cuidavam roubava ou estuprava. Também
por diversas casas e unidades da comunidade da Capital, o Plaza São Rafael. ou passar para seus leitores a
prisionais, em diferentes não faltavam comida nem No dia seguinte, a dupla se sensação de que é seguro ter
cidades. Foi quando se ouviu São deste período roupa para os moradores. entregou. uma organização criminosa
falar, pela primeira vez, na tal personagens como Anão e O último capítulo da história Melara foi morto a tiros cuidando de seu bairro.
Falange Gaúcha, uma união de Carioca. Traficantes poderosos, se desenrola num 8 de julho, depois de fugir da prisão, em Bandidos devem pagar por seus
presos que, já naquela época, eram os “donos” do Morro como neste domingo. Só Charqueadas, em janeiro de crimes. E cidadão nenhum tem
comandava os crimes mesmo da Cruz. Operavam a venda que em 1994. Numa noite 2005. Seu corpo apareceu a obrigação de se submeter ao
atrás das grades. de drogas a partir das vielas fria de sexta-feira, Melara perfurado a bala, numa colônia mal para viver com uma falsa
na parte alta do Partenon. E e Fernandinho, dois dos japonesa no Interior de Dois tranqüilidade. Histórias como a
principais criminosos da época, Irmãos. Com sua morte, de Robin Hood, que tirava dos
promoveram uma rebelião chegou ao fim uma geração de ricos para dar aos pobres, só
no mesmo Presídio criminosos. são legais nos contos infantis.
Central do início da A idéia de relembrar o
história e fugiram, ● Um especialista escreve passado serve para registrar
deixando um rastro sobre o assunto como atuavam quadrilhas que
de sangue e morte hoje não mais existem. Não
pela madrugada. A A missão de contar a história são bandidos melhores nem
perseguição à dupla foi entregue a um piores do que os atuais. São
terminou com diferentes. E, no desenrolar
dos acontecimentos, também
serão lembrados atos heróicos
de homens da lei bravos e
honrados, que lutaram para
enfrentar os malfeitores.
Alguns policiais deram sua
própria vida nesta missão. Estes
exemplos, sim, queremos que
fiquem para sempre, por serem
dignificantes.
Boa leitura a todos.

Renato acompanha ALEXANDRE BACH


a saída de reféns EDITOR-CHEFE
em Charqueadas O time do bem: Denise (E), Alexandre,
Flávia e Renato (sentado)
30

Terror no Central
Texto: Renato Dornelles
Falange, “uma quadrilha a fu”
Fotos: Banco de Dados
Arte: Alexandre Oliveira A notícia do motim Jorge Luiz Devitz, o Piá,
Diagramação: Flávia Kampff espalhou-se e Jesus Aderbal Martins,
Colaboração: Denise Waskow rapidamente. Centenas o Toco. À exceção de
de policiais militares e Carioca, traficante, os
civis, seguidos de um demais eram
batalhão de jornalistas, assaltantes.
logo chegaram ao Pelo pacto,
presídio. Os profissionais assumiram um
de imprensa colocaram- compromisso: a criação
se junto à cerca lateral de um caixa comum. O
da prisão, a poucos fundo da organização,
metros das janelas das alimentado pelas
salas nas quais os oito atividades criminosas
bandidos ameaçavam dos que estivessem em
os 31 reféns. Daquele liberdade, serviria não
local, era possível ouvir só para financiar novas
os amotinados: fugas, mas igualmente
– Se a polícia invadir, para amenizar
Presídio Central: morre todo mundo – condições de vida no
gritou Frida. cárcere, principalmente
local em que surgiu Vico deu um aviso: através da compra de
a Falange Gaúcha – Só queremos ir vantagens.
embora. Não vamos A organização, criada
ferir ninguém. Agora vai havia poucos meses,
sair daqui uma seguia o modelo do
quadrilha a fu. Comando Vermelho, do
Dois mortos no início do motim O anúncio feito por Rio. Ou seja,
Vico dizia respeito à assaltantes e traficantes
Numa das celas da maior de acesso ao associação dos unidos para comandar
prisão gaúcha, o assaltante Instituto de assaltantes de banco ao presídios e favelas.
Vítor Paulo Mahus Fonseca, o Biotipologia Criminal tráfico de drogas. Era, As exigências dos
Vico, 22 anos, não conseguia (IBC), em prédio também, a confirmação presos foram aceitas
controlar a ansiedade durante a anexo. Estavam da Falange Gaúcha. A pelas autoridades das
madrugada de 28 de julho de sendo aguardados organização havia sido áreas da Justiça e da
1987. Estava prestes a, por Arno tramada mediante um Segurança Pública. A
juntamente com outros oito Kaulkmann da pacto, travado no conclusão era de que
apenados, colocar em prática Rosa, o Alemão interior de prisões que, não poderiam correr
um audacioso plano de fuga do Arno, Pedro Adelar Frida, além dos envolvidos no riscos: com 31 vidas
Presídio Central. dos Santos, Luís nervoso... motim de 1987, incluía, em seu poder, os oito
Amanheceu. Seguindo o Ronaldo Mercaus, entre outros, José bandidos dominavam a
plano, Vico juntou-se a Silvino o Prego, Camilo Astrogildo Pereira situação. Decidiram,
Vogel, o Alemão Frida, e a de Melo, o Fontella, o Professor, então, ceder-lhes dois
Jocélio Teixeira no térreo do Camelinho, Paulo Dilonei Francisco automóveis Monza e
Pavilhão B. Os três, com dois Ricardo Silveira Melara, Cézar permitir-lhes a fuga.
revólveres calibre 38 e uma dos Santos Roeper, o Fernandes, o Baleia,
pistola 7.65 que haviam sido Paulinho Escort, e ...e Carioca,
colocados no presídio dentro de Humberto Luciano
um botijão de gás, fizeram uma Brás de Souza, o tranqüilo
religiosa refém. Usando-a como Carioca.
escudo, seguiram em rápidas Os oito, sem maiores
passadas até o saguão do dificuldades,
prédio da administração. dominaram um guarda
No caminho, encontraram e cruzaram o portão que
dois agentes penitenciários. separava o presídio do
Foram ouvidos 14 ou 15 tiros. IBC. Em pouco tempo, a
Pouco depois, um dos agentes, porta da sala onde
Milton Clarel de Azevedo, com reuniam-se psicólogos,
um balaço na barriga, estava psiquiatras e estagiários
estendido no saguão. No canto responsáveis pelas
oposto, estava o corpo de avaliações de presos – 19 vai todo mundo pra banha –
Jocélio. mulheres e 12 homens – foi gritou Frida. Paulinho (E)
Vico e Frida seguiram em aberta bruscamente. O grupo, agora, tinha 31 entra no Monza
frente e já chegavam ao portão – Todo mundo quieto, senão reféns. para testá-lo
30

Vico é executado
● Texto: Renato Dornelles
● Fotos: Banco de Dados ● Arte: Alexandre Assaltante e companheira foram torturados
Oliveira ● Diagramação: Flávia Kampff
● Colaboração: Denise Waskow – Bandido bom é poucos metros, com duas
bandido morto – não se perfurações no peito, cinco
cansava de repetir o velho na cabeça, duas no braço
Após o motim no mês Desova na e experiente policial, na
manhã de 10 de agosto
esquerdo e marcas de
queimaduras nas mãos.
de julho no Presídio margem
freeway
da
de 1987, enquanto
observava, à distância, os ● Havia fugido duas
Central (assunto dois corpos encontrados
junto à margem direita
vezes do Central
da BR-290 (a freeway), Naquela época, Vico, de
do primeiro capítulo no km 83, em 22 anos, era considerado o
Cachoeirinha. A cada vez principal assaltante de
desta série, publicado no que ele repetia a frase,
alguém perguntava:
banco do Estado. Ingressou
no crime ainda menor, com
final de semana passado), – Mas quem são?
O veterano
assaltos a táxis e ao
comércio, em Canoas. Foi
que resultou na fuga de oito investigador então
enchia o peito, coçava
preso pela primeira vez em
1983 e havia fugido em
a barba e respondia: duas oportunidades do
bandidos, o meio policial gaúcho – É o assaltante Vico Presídio Central. Na
e a amante dele. primeira, em 1985. Na
continuou agitado naquele ano A morte de Vitor
Paulo Mahus Fonseca,
segunda fuga, em 1986,
escapou dentro de um saco
de 1987. Principalmente pela ação o Vico, soou como
uma bomba no meio
de aniagem, recolhido com
o lixo do presídio.
da Falange Gaúcha, organização policial. Havia apenas
13 dias que fugira do
Quatro meses depois de
escapar, Vico foi preso de
Presídio Central, novo, em Guaíba, junto com
criada por um grande grupo liderando um motim. Luís Mercaus da Silva, o
Agora estava ali, Prego. Nessa captura,
de bandidos, nos moldes do morto a tiros, de
bruços, mãos
segundo o delegado local,
Valdo Nóbrega, um policial
Comando Vermelho, do Rio, amarradas às costas.
Sua companheira,
de Porto Alegre fez várias
ameaças de morte ao
para dominar o crime em prisões e Jussana, estava a bandido.

favelas do Sul. Arno fez uma revelação surpreendente


O fato de maior repercussão foi o Arno Kaulkamann da Rosa, o
Alemão Arno, estava na mira da
numa casa da Vila Santa Rosa, na
Zona Norte da Capital. O foragido
execução de Vico, um dos líderes polícia. Em menos de dois meses, foi surpreendido enquanto dormia,
desde que fugira do Presídio sem chances de reação.
da organização, num crime que Central, já havia assassinado outro
bandido e um comerciante no
Na Delegacia de Roubos e
Extorsões, Arno fez uma revelação
município de Estrela, participado surpreendente: acusou o também Arno foi
acabaria provocando outros, numa de dois assaltos a bancos em falangista José Astrogildo Pereira pego na
Caxias do Sul, um em São Marcos Fontella, o Professor, de ter Zona Norte
reação em cadeia. e outro em Urussanga (SC). Neste assassinado Vico e ainda admitiu
último, que teve as participações ter participado na morte de
tícia no Diário de Pedro Adelar e de Prego, dois Jussana.
O assunto já foi no vigilantes foram mortos. Havia O jovem assaltante, segundo
ainda um assalto a um motel, em Arno, teria sido executado à
Caxias do Sul. Os casais, nus, traição, numa emboscada da qual
foram reunidos numa sala grande, teriam participado ainda Pedro
onde os bandidos os obrigaram a Adelar e Prego. O motivo, ele não
entregar talões de cheques e sabia ao certo.
dinheiro. – Só sei que foi briga deles –
Em setembro daquele 1987, ao resumiu Arno.
prenderem o condutor de um A confissão de Arno, verdadeira
Monza roubado, policiais ou não, poderia lhe custar caro
obtiveram uma informação devido ao prestígio que Vico
preciosa: Arno estava refugiado gozava entre os demais presos.
7 e 8/ 7/2007
PORTO ALEGRE, SÁBADO, 14/7/2007, E DOMINGO, 15/7/2007 31

Prisão de Carioca: questão de honra


O maior desafio para a polícia tráfico, o morro “estava
era a recaptura do traficante sujo”. Só havia um jeito:
Humberto Luciano Brás de Carioca tinha de ser
Souza, o Carioca, um dos preso.
líderes da Falange Gaúcha. Era
público que ele havia voltado ● “Liberdade não se
para o Morro da Cruz, no qual mendiga”
comandava o tráfico de drogas.
Na tarde de 31 de agosto, Seguindo uma
caminhões e dezenas de informação anônima,
viaturas começaram a dezenas de policiais
descarregar policiais no Morro cercaram a casa de um
da Cruz e na Vila Vargas. Eram advogado, no Bairro
muitos, em torno de 500. Os Teresópolis, onde Carioca
civis, com coletes pretos. Os havia buscado refúgio para Ninguém
militares, com suas tradicionais fugir do cerco montado no escapava do
fardas. Muitos a pé, outros, em Morro da Cruz. pente-fino
viaturas. Não importava o sexo O caminho foi aberto com
ou a idade: ninguém entrava ou uma rajada de
saía do morro sem ser metralhadora, disparada na
revistado. Do alto, em um porta. Em questão de
helicóptero, o diretor da Divisão segundos, Carioca, que
de Investigações da Polícia Civil, dormia ao lado de sua
delegado Wilson Müller, companheira, de apenas 15
controlava a operação. anos, estava cercado por
Duas horas depois de policiais armados.
iniciada, a operação foi Assustada com os tiros, a
encerrada. Porém, como se mãe do advogado sofreu um
tivesse conquistado um ataque cardíaco fulminante.
território, a polícia montou uma Carioca, enquanto isso, era
barraca no topo do morro, na levado para a Delegacia de
qual ficaram acampados alguns Capturas e, dali, para a
agentes. A idéia era mantê-los penitenciária. Ainda assim, o
por tempo indeterminado, em traficante mostrava-se
sistema de revezamento. confiante: Helicóptero
O posto improvisado na – Liberdade não se mendiga. sobrevoa a
barraca surtia efeito. Para Se conquista. Custe o que cruz que dá
delinqüentes não ligados ao custar, vou fugir de novo. nome ao morro

Mortes no canavial Professor assume morte de Vico e paga com a vida


Passo do Sossego, a 50km de José Astrogildo Pereira caminhão-guincho atravessado dois acidentes (em Torres e
Restinga Seca (que, por sua vez, fica Fontella, o Professor, integrante na pista, policiais civis, em Osório). Seus dois reféns
a 228km de Porto Alegre) não tinha da Falange Gaúcha, mais militares e patrulheiros estavam mortos.
esse nome por acaso. A localidade parecia um mito. rodoviários tentaram pará-lo, À polícia, Professor admitiu
vivia na maior calmaria. No dia 16 de Seguidamente era reconhecido mas Professor, disposto a ter assassinado Vico,
outubro de 1987 à tarde, porém, os em assaltos a bancos, tanto tudo, jogou o Escort contra o confirmando a versão de
moradores estranharam a presença no Rio Grande do Sul, como caminhão. Depois, houve um Alemão Arno. À imprensa,
de três homens nunca vistos por Adelar em Santa Catarina. Mas nunca cerrado tiroteio. Quando chegou a dizer que mudaria
aquelas bandas, no interior de um acabava preso. No dia 11 de cessou a troca de tiros, o esse depoimento em juízo.
Monza. Resolveram avisar a polícia dezembro daquele 1987, saiu bandido foi encontrado Mas parecia tarde demais.
que, pelas placas, descobriu que o à noite, num Passat, de consciente, com escoriações No dia 23 de dezembro, à
automóvel pertencia a um juiz auditor Florianópolis rumo a Porto decorrentes dos noite, Professor foi levado para
de Santa Maria e havia sido furtado. Alegre. Na viagem, deixou a Penitenciária Estadual
Paralelamente, na rodoviária local, um rastro de sangue. do Jacuí. No dia seguinte,
era preso o assaltante Cézar Coelho Em Araranguá (SC), às 7h30min, respondeu à
Fernandes, o Baleia, integrante da Professor matou atropelado conferência (contagem de
Falange e foragido da Penitenciária Prego um patrulheiro que tentou presos).
Estadual do Jacuí. Ele revelou a abordá-lo. Já em Torres Pouco tempo depois, os
identidade dos ocupantes do Monza: Pedro Adelar, (RS), capotou o Passat e guardas foram informados
Prego e um terceiro, conhecido como Dig. A fez refém um taxista que de que haviam dois corpos Leia no
informação de Baleia alvoroçou a cidade. tentou socorrê-lo. em uma cela. Professor
A polícia cercou o município, montando Quilômetros à frente, o tombou com mais de 30 próximo
barreiras em suas principais saídas. Porém, por táxi ficou sem estocadas (golpes de faca final de
uma estrada de chão batido, os bandidos combustível. O bandido, artesanal). A seu lado,
conseguiram seguir para Restinga Seca. Uma então, ainda com o estava morto Baleia, o semana:
prolongada perseguição acabou no interior de um taxista, invadiu um Escort mesmo que fora preso em Falange
canavial. A Brigada Militar cercou a área, mas os no acostamento da BR- Restinga Seca havia dois
bandidos não se entregaram. Num tiroteio, 101 e fez outro refém: José foi meses. Por vingança ou promove
morreram Pedro Adelar, Prego (acusados pela um sargento da preso queima de arquivo, a morte mais dois
morte de Vico) e o PM Pedro Guilherme Senna. Aeronáutica. depois de de Vico começava a produzir
Em Osório, com um acidente conseqüências. motins
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Mais dois motins


● Texto: Renato Dornelles O capítulo anterior
● Fotos: Banco de Dados ● Arte: Alexandre
Oliveira ● Diagramação: Flávia Kampff Banco vira campo de batalha
● Colaboração: Denise Waskow
Sexta-feira, 18 de acionou o alarme e, em
dezembro de 1987: dia de poucos minutos, a Brigada
O conturbado ano pagamento de 13º salário
e propício a assaltos a
Militar chegava ao local.
Bandidos e PMs
de 1987 parecia banco. Principalmente
naquele ano, que teve
travaram um tiroteio,
transformando o local num
quase cem crimes deste campo de batalha. No
inacabável para tipo, no Estado.
Eram 12h50min, e a
final, ficaram feridos duas
crianças, um cliente, um
a Falange Gaúcha 14 e 15/7/2007 agência do Banco do Brasil
de Alvorada estava lotada
policial militar e um dos
bandidos: Jesus Aderbal
– organização criada por Naquele ano, ocorreram mais de quando quatro homens a
invadiram, armados,
Silveira Martins, o Toco,
integrante da Falange
anunciando o 91º assalto. Gaúcha, que, baleado
bandidos para comandar 90 assaltos a bancos no Estado. Um funcionário numa perna, não
conseguiu acompanhar
o crime em prisões e favelas No 91º, seria capturado Jesus seus comparsas na fuga.
Toco chegou à delegacia
afirmando que havia
do Estado. Depois do motim Aderbal Silveira Martins, o Toco, matado o assaltante Vitor
Mahus Fonseca, o Vico.
do Presídio Central (tema do que, dias depois, lideraria um Apresentou uma versão
diferente da relatada por
primeiro capítulo da série) e motim no Hospital Penitenciário. Arno Kaulkmann da Rosa,
o Alemão Arno (que
acusara José Astrogildo
da execução de Vico (segundo E 1988 começaria com uma Pereira Fontella, o
Professor, de ter
capítulo), entre outros fatos, rebelião na Penitenciária Toco:
audacioso
assassinado Vico).
– O Vico vivia dizendo
que eu era chinelão. Ele
houve novos acontecimentos. Estadual do Jacuí (PEJ). ou azarado? tinha mais é que morrer
mesmo – disse Toco.

Ameaça na Para fechar o ano turbulento


janela do
hospital Havia 11 dias que Toco fora dele, entraram outros apenados, Já passava das 22h, quando
preso. O assaltante estava com empunhando facas: rebelados e reféns começaram
a perna protegida por um gesso, – Tudo mundo no chão, vamo a deixar o hospital. Os três
devido ao tiro que havia levado. – gritou Rudinei, anunciando o automóveis partiram em alta
Estava no Hospital Penitenciário, início de um novo motim. velocidade. No início da
em prédio anexo ao Presídio madrugada, todos os reféns
Central. Nele, médicos e ● Liberdade durou pouco haviam sido liberados.
enfermeiros conviviam com para Toco Para um dos foragidos, o
presos enfermos, sentimento de liberdade foi
independentemente do Com o álcool recolhido na breve demais. Toco, com sua
grau de periculosidade. farmácia do hospital, os perna engessada, não foi longe.
Às 11h30min do dia amotinados enxarcaram as Procurou a casa de familiares,
29 de dezembro, o roupas de alguns reféns. A todo em Alvorada. Porém, a polícia foi
médico Mário o instante, repetiam que mais rápida. Quando o bandido
Marques, diretor do ateariam fogo, caso a polícia chegou ao local, policiais já o
hospital, recebia invadisse o local. aguardavam. Enquanto Toco
funcionários em seu Em uma reunião entre o retornava à prisão, o secretário
gabinete. Iriam secretário de Segurança Pública, Waldir Walter explicava a posição
começar uma reunião Waldir Walter, que acumulava a do governo:
de rotina, quando pasta da Justiça, e o governador – Tivemos uma postura no
houve uma brusca Pedro Simon, entre outros, sentido de preservar vidas. Não
interrupção: o preso foram aceitas as exigências. Um acreditamos que a decisão de
Refém Rudnei Braseiro, Opala e dois Santana foram liberar os amotinados vá
colocado no armado com revólver, colocados à disposição dos incentivar outros presos a
porta-mala invadiu a sala. Atrás criminosos. provocarem novas rebeliões.
PORTO ALEGRE, SÁBADO, 21/7/2007, E DOMINGO, 22/7/2007 35

Mudam as direções
● Depois da série de motins, a Secretaria de Justiça ● Alguns dias depois, foi nomeado para a direção Começava a surgir, no papel, a Penitenciária de
começou a entregar a direção das maiores prisões do Presídio Central o major PM Edson Freitas Alta Segurança de Charqueadas (Pasc).
gaúchas a oficiais da Brigada Militar. Furtado.
● O término do motim da Pej não devolveu a
● O primeiro a assumir foi o capitão PM Edward ● O governador Pedro Simon adiantou que seria tranqüilidade ao sistema penitenciário gaúcho.
Flores de Siqueira, a quem foi entregue o controle construída uma nova prisão, para ser a nova No dia seguinte, 620 presos deflagraram greve
da Pej. penitenciária de segurança máxima do Estado. de forme no Presídio Central.

Rivais dos rebelados


Para começar o novo ano abriram um buraco
para se esconder
A resposta ao secretário ano anterior, com
Waldir Walter não tardou. Dilonei Francisco
Seis dias depois do Melara e outros
motim do Hospital oito presos.
Penitenciário, às
10h30min do dia 4 de ● Rivais ficaram
janeiro de 1988, um com medo
grupo de 20 presos da
Penitenciária Estadual do Para impedir
Jacuí (Pej), em uma possível
Charqueadas, com um invasão da
Prédio localizado estoque e um estilete, polícia, eles
à margem do Rio iniciou uma rebelião. amarraram
Jacuí foi palco de Foram rendendo alguns reféns
agentes, recolhendo nas grades das
rebelião em 1988 armas e, em pouco janelas das duas
tempo, estavam salas que
amotinados, com 27 ocupavam, no
reféns, na sala primeiro e
da no segundo andares abriram
administração. do prédio da um buraco numa das
Como se não administração. celas, cavaram um túnel
bastasse, se Exigiam dois e se esconderam.
apossaram das automóveis e um Antes do entardecer,
chaves de carro-forte para fugir circulou uma notícia
todas as celas e jornalistas para referente a uma suposta
dos mais de Piá acompanhá-los até a primeira vítima: Arno
600 presos e saída do município. Kaulkmann da Rosa, o
do depósito de armas. Os amotinados eram Alemão Arno, teria sido
Entre os amotinados bastante temidos. Tanto morto, como represália
BM pronta para estava Jorge Luiz do que, ao descobrirem que por ele ter participado da
agir na Pej Amarante Devitz, o Piá, eles haviam se rebelado, execução de Vico e
que havia tentado fugir no presos de um grupo rival Jussana.

“Daqui para frente, o rigor da lei” Arno: uma morte


anunciada
Por volta das 20h, a Brigada sobreviveu. Terminado o motim, ameaça de uma fuga em massa
Militar iniciou uma operação de foi computado o saldo: três de mais de 600 presos? Fique
guerra. Um helicóptero deixou agentes e o preso Carlos Alberto muito claro. Nós pretendemos, A notícia de que Arno Kaulkmann da
no telhado do pavilhão da Moratto de Lima, o Betinho daqui para frente, agir sempre Rosa, o Alemão Arno, teria morrido no
administração quatro PMs que Boró, mortos. com o rigor da lei. início do motim agitou a Pej. Porém,
atiraram bombas de gás O governador Pedro Simon O governador voltou a dizer terminada a rebelião, o cadáver não foi
lacrimogêneo nas duas salas mudara o discurso em relação que o único objetivo era a fuga: encontrado. Para surpresa geral, Alemão
ocupadas. Do chão, integrantes às rebeliões anteriores: – Em se tratando de presos Arno estava vivo na chamada cela do
do Batalhão de Choque atiravam – Minha disposição é de não perigosos, o que eles queriam seguro (isolamento). No dia 25 daquele
em direção às salas. negociar, porque isto, de fazer era sair. Por esta razão, mesmo mês (janeiro de 1988), ele iria à Vara de
Na madrugada seguinte, motins, pode se tornar moda. que estivessem confinados no Execuções Criminais para depor sobre a
foram retirados do prédio cinco Imagina se o governo não Hotel Plaza São Rafael, iriam morte de Vico.
agentes penitenciários e uma tomasse essa iniciativa, quando procurar um jeito de fugir. Três dias antes de ir à Justiça e
servente, todos baleados, e o havia a quatro após deixar o
amotinado Jeová isolamento, Arno foi acordado
Machado da Silva, que às 7h15min:
fora rendido. – Ô vagabundo, levanta que
Tomados de hoje vamos acertar as contas –
cansaço, sede e fome, foi a última frase que ouviu. Em
os presos começaram seguida, foi morto com cerca
a se render. Ao final da de 50 estocadas. Arno
manhã, apenas José Robôs, na linguagem dos
Salvador da Silva presídios, são presos que
Santos, o Zé do Doro, executam serviços sujos encomendados.
permanecia irredutível. Laranjas são os que assumem a autoria,
Por volta das 15h30min sem ter executado. Ambos recebem em
– 29 horas depois de troca privilégios ou proteção. Era o caso Leia no
iniciada a rebelião – um de Nego Chico que, em 1983, havia
capitão PM aproximou- assassinado ou assumido a morte do próximo
se de uma das janelas e assaltante de bancos Pingüim, no final de
passou um revólver a Presídio Central.
um dos reféns. Após a morte de Arno, Nego Chico se semana: a
Mesmo com as mãos vangloriava pelos corredores da Pej: morte de
amarradas às grades, o – Não “tô” arrependido. Não vinguei a
refém atirou três vezes morte de Vico porque nem conhecia ele. Carioca,
em Zé do Doro. Refém ferido Apertei (matei) o Arno por minha moral o Rei do
Socorrido, o bandido é retirado de aqui dentro. A gente tinha bronca antiga.
ambulância Morro
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Os reis do morro
● Texto: Renato Dornelles
● Fotos: Banco de Dados ● Arte: Alexandre Carioca, a bola da vez
Oliveira ● Diagramação: Flávia Kampff
● Colaboração: Denise Waskow O traficante ocasião, Carioca No dia 24 de
Humberto Luciano estava na Penitenciária setembro de 1989,
Brás de Souza, o Estadual de um domingo,
O assassinato de Alemão Carioca, participante
do motim de julho
Charqueadas (Pec), e
dois amigos seus
terminado o horário de
visitas, Carioca,
Arno, na Penitenciária de 1987 no
Presídio Central e
um dos líderes da
foram flagrados no
momento em que
entregavam a um
recolhido a uma cela
do seguro (isolamento)
por ter denunciado as
Estadual do Jacuí, em Falange Gaúcha,
estava custando
policial militar de
serviço na prisão uma
ameaças de morte
que sofria, parecia
caro para o tráfico pasta com dinheiro desesperado. Quando
janeiro de 1988, não do Morro da Cruz.
Para não matá-lo,
e um revólver calibre
38.
sua companheira se
despediu, o traficante,
encerrou o ciclo de baixas uma facção da
organização exigia ● Gritava como
como uma criança, se
agarrou às grades e,
dos traficantes o uma criança chorando, implorou
entre os integrantes da pagamento
mensal de um A tentativa de
para que ela não
fosse:
Falange Gaúcha – organização “pedágio”.
Além disso,
não havia
suborno já estava – Não me deixa
sendo investigada pelo aqui. Vão me matar.
serviço de informações A jovem foi retirada
criada por bandidos para perspectiva de
que Carioca,
da Brigada Militar, que pela guarda, que
havia interceptado alegava o final do
agora recolhido à alguns bilhetes escritos horário de visitas. A
controlar o crime em prisões e Penitenciária
Estadual do Jacuí
por Carioca, propondo companheira do
a propina ao PM traficante saiu da
favelas. (Pej), conseguisse
fugir. Em maio de
envolvido. Por isso, de penitenciária
uma hora para outra, assustada, ouvindo
1989, fracassara foi suspenso o ainda os gritos
Desde agosto de 1987, já uma tentativa de
libertá-lo. Na
pagamento do
pedágio.
desesperados de
Carioca.
haviam morrido também
Simulação de suicídio caiu por terra
Vico, Prego, Pedro Adelar,
A jovem enforcado com seu encontrado na frente
Professor e Baleia. Em 1989, companheira do
traficante já havia
próprio cadarço de
tênis, na cela de
de sua cela. Outros
indícios foram
começavam as ameaças a retornado a Porto
Alegre, quando, na
isolamento, onde
estava sozinho. A
destacados pelo
secretário da Justiça,
Pej, começaram a versão oficial era de Bernardo de Souza:
Carioca, o idolatrado líder do circular as
informações sobre
que se matara, durante
uma crise depressiva.
– De acordo com o
laudo do IML, os sinais
tráfico de drogas no Morro da dois enforcamentos.
Um deles, na sexta ● Piso molhado,
encontrados na língua
de Carioca são
galeria. Era Paulo meias secas diferentes dos que
Cruz, que estava na Pej. Miranda da Rosa, o
Paulinho Pistoleiro, No dia seguinte,
deveriam ser
encontrados em caso
que estava essa versão começaria de suicídio por
pendurado por uma a cair por terra. O enforcamento.
O capítulo anterior corda presa a uma Instituto Médico Legal Uma outra pista foi
janela basculante do revelava a existência deixada pelos
banheiro. Marcas de equimoses e criminosos. O piso da
em seu corpo não escoriações cela estava molhado, e
deixavam dúvidas de (ferimentos) nas as meias de Carioca,
que havia sido costas, braços, dedos que estava sem tênis,
assassinado: e testículos. secas. Além disso,
sangramento no Além disso, Carioca, presidiários disseram
nariz e hematomas havia deixado uma lista que viram cinco
no rosto. de pessoas que tinham homens entrando e
O traficante sabia O outro era a intenção de matá-lo, saindo da cela do
que seria morto justamente Carioca, num bilhete traficante.
21 e 22/7/2007
PORTO ALEGRE, SÁBADO, 28/7/2007, E DOMINGO, 29/7/2007 35

Marcado para morrer


● Jesus Aderbal Silveira Martins, das celas da Penitenciária Estadual trabalhava como auxiliar de plantão
o Toco, assim como Professor e de Charqueadas (PEC), Toco comeu da guarda interna (condenados com
Alemão Arno, que haviam sido um sanduíche que lhe chegou às bom comportamento que cuidavam
assassinados na prisão, estava mãos envenenado. Passou mal, dos portões das galerias) afirmou
condenado. O motivo: havia dito que vomitou, sentiu tonturas, mas ter recebido uma proposta de
matara Vico. acabou socorrido a tempo. Cz$ 10 mil de Dilonei Francisco
Melara e de Celestino Linn pela
● No dia 4 de maio de 1988, numa ● Naquele mesmo mês, um preso que chave da cela de Toco.

Luto volta ao Morro da Cruz


Com a morte de Carioca, Anão procurou conquistar o
parte do Morro da Cruz respeito e a admiração das
cobriu-se de luto. O demais pessoas da
traficante foi velado numa comunidade. Para tanto,
das casas da comunidade. impôs regras de segurança,
Depois, o caixão percorreu “proibindo” homicídios,
as principais ruas e vielas da assaltos, furtos e estupros
vila, ao som de tiros de no morro. Quem
revólveres e rajadas de descumprisse, poderia se
metralhadoras. O enterro foi considerar morto. Ali, só
realizado no Cemitério se traficava.
Ecumênico João XXIII.
Para uma parcela da ● Aproveitava-se de
sofrida população local, o brechas do Estado
traficante, equivocadamente,
era considerado um “Robin Além disso, distribuía
Hood”, que obtinha dinheiro ranchos para as famílias
“dos bacanas” com a venda necessitadas, remédios
de tóxicos e depois ajudava para doentes e idosos,
a quem precisava. balas, biscoitos e
O império do tráfico foi brinquedos para a
herdado por Carioca em criançada.
setembro de 1979. Antes Aproveitando-se de
disso, ele pertencia a brechas deixadas pelo
Eduardo Corrêa dos Santos, Estado, Anão tornou-
o Anão, que o criou. Em se um ídolo, Caixão de Carioca
meados da década de 70, o idolatrado e defendido percorreu ruas e
pequeno homem, de um por muitos. vielas nos braços de
metro e meio de altura – por Em troca da segurança e seus amigos
isso, o apelido – começou a da assistência, Anão exigia
impor suas regras na área fidelidade e proteção
formada por cinco vilas, perante a polícia. O
onde viviam 25 mil pessoas, traficante fez juras de amor Uma nova sucessão no comando do tráfico
organizando o tráfico e à comunidade e, certo dia,
tornando-se seu líder. afirmou que só sairia do Com a morte de Anão, sempre escapava das garras caminhão de mudanças.
Numa segunda etapa, morro morto. Carioca, seu braço-direito, da lei. Em 1982, desceu o Meses depois, Carioca
vindo do Rio de Janeiro, foi morro e foi dormir no voltaria a fugir, participando
alçado à condição de patrão. barraco de uma amante, na do motim no Presídio
Anão alternava locais Adotou algumas Vila São Carlos, no Bairro Central.
em que dormia providências, como a de
recrutar meninos para o
Intercap. Acordou na mira
dos revólveres da polícia e,
Antes disso, havia
associado o tráfico às
exército do tráfico, na função durante a manhã, já quadrilhas de assaltantes de
A captura de Anão um cobertor, uma de vigias. De locais chegava ao Presídio Central. banco.
virou questão de honra garrafa térmica, um estratégicos, em pontos O traficante ficou cinco Mas agora Carioca estava
para a polícia. O revólver calibre 38, altos, eles controlavam todas anos em regime fechado. morto, e o luto voltava ao
traficante sabia disso e, algumas parangas de as entradas do morro. A Em 1987, beneficiado pela Morro da Cruz. Além disso,
para evitar surpresas maconha e a Mimosa, qualquer carro ou grupo de troca de regime, foi uma nova sucessão estava
desagradáveis, alternava fiel vira-latas do pessoas estranhas que transferido para o semi- prevista no comando do
os locais em que traficante. Ele havia fossem vistos, sinalizavam aberto, na Colônia Penal tráfico de drogas do local.
passava as noites. Na sumido. com fogos de artifício ou por Agrícola Daltro Filho, em Chegava a vez de Jorge Luís
madrugada de 14 de Na manhã seguinte, o rádio transmissor. A cada Charqueadas. Fugiu, mas Queirós Ventura, o Jorginho
setembro de 1979, ele mistério foi desfeito. alarme, Carioca tratava de acabou recapturado pela da Cruz, 28 anos, braço-
dormiu no porão Eram 6h30min se esconder. polícia, que subiu o Morro direito de Carioca, que se
do Grupo Escolar quando uma Mesmo assim, ele nem da Cruz disfarçada em um encontrava foragido.
América, na Vila jovem encontrou
Vargas. Anão
Por volta das agonizante, com
2h, três homens um ferimento de
desembarcaram bala no tórax.
de um táxi na Socorrido,
comunidade. Anão morreria a
Armados, se caminho do
apresentaram como Hospital de Pronto Leia no
policiais e exigiram Socorro. A notícia de sua
informações acerca do morte espalhou-se próximo
paradeiro do traficante. rapidamente, e o morro final de
Prevaleceu a lei do acordou de luto. Várias
silêncio. Assim mesmo, bandeiras pretas foram semana:
minutos depois, foram hasteadas nas casas e, começa a
ouvidos vários tiros. até mesmo, na Cruz da
No local onde Anão igreja que dá nome ao guerra nas
dormia, restava apenas morro. prisões
Bandeira preta no
império do tráfico gaúchas
34

Guerra na prisão
● Texto: Renato Dornelles
● Fotos: Banco de Dados ● Arte: Alexandre Jorginho não resiste ao cerco policial
Oliveira ● Diagramação: Flávia Kampff
● Colaboração: Denise Waskow O cerco policial ao traficante Camaquã (Zona Sul do Estado.
Jorge Luís Queirós Ventura, o Porém, Jorginho conseguiu furar
Jorginho da Cruz, aumentou o bloqueio, seguindo para São
Com a morte do consideravelmente. Foi uma das
conseqüências da morte de
Lourenço do Sul.
A Delegacia de Tóxicos de
traficante Carioca Humberto Luciano Brás de
Souza, o Carioca. Afinal,
Jorginho era o sucessor no
Porto Alegre manteve-se no
encalce do traficante. No dia 19
de setembro daquele ano,
(tema do capítulo comando do tráfico do Morro da
Cruz. O traficante, então,
quando embarcava em um táxi
em São Lourenço, para buscar
resolveu buscar refúgio maconha em Camaquã,
anterior), seu braço temporariamente no Interior do
Estado.
Jorginho acabou surpreendido
por agentes da especializada.
direito, Jorginho da Cruz, Pouco a pouco, os homens
mais próximos a Jorginho na
Naquela época, o traficante
estava indiciado em cinco
hierarquia do tráfico foram inquéritos e com prisão
era o mais cotado para capturados. No dia 8 de julho de
1990, o próprio líder esteve
preventiva decretada pela
Justiça. Para a polícia, sua
assumir o comando do tráfico no Jorginho
foi preso no
perto de ser preso, quando
policiais cercaram um sítio onde
ele estava escondido, em
prisão representava um grande
golpe no esquema de tráfico do
Morro da Cruz.
Morro da Cruz. Seria mantida, Interior

assim, uma tradição iniciada Melara foge e é preso numa fazenda


com a sucessão de Anão por A cotação do Presídio
Regional de Bagé estava
abóbora furtada.
A fumaça acabou
Peões
prenderam
alta. Havia muito tempo chamando a atenção Melara e...
Carioca, havia dez anos. que ninguém conseguia
fugir de lá. Por isso, alguns
de dois peões que,
apenas com o uso de
Porém, na Falange Gaúcha – dos principais bandidos do
Estado haviam sido
relhos, prenderam
Melara. A dupla
transferidos para aquela entregou o assaltante
organização criada por bandidos prisão. Entre eles, Dilonei
Francisco Melara,
à Brigada Militar. Um
Melara cabisbaixo,
condenado a 48 anos de calado e
para comandar o crime em reclusão por assaltos e
duplo homicídio.
inconformado foi
algemado e devolvido
prisões e favelas – havia mais Em 14 de março de
1991, porém, Melara
ao sistema
penitenciário.
liderou a fuga de um grupo
gente interessada no comando de presos. Para recapturá-
los, houve uma grande
do tráfico: Melara. Criou-se uma mobilização, inclusive com
o envio de policiais civis da
Delegacia de Capturas e
guerra nas prisões. militares do Grupamento
de Ações Tático Especiais
(Gate), da Capital, que se
juntaram ao contingente
O capítulo anterior local. Aos poucos, os
foragidos iam sendo pegos.
Passadas duas semanas,
faltava apenas Melara. No
dia 27 daquele mês,
quando mais de cem
policiais o procuravam,
inclusive com um avião
bimotor e cães farejadores,
o bandido assava, num
matagal da Estância do ... o entregaram
Céu, em São Gabriel, uma à Brigada Militar
28 e 29/7/2007
PORTO ALEGRE, SÁBADO, 4/8/2007, E DOMINGO, 5/8/2007 35

Para a Pasc, às pressas


● A guerra entre os detentos das principais prisões precipitou uma
decisão da Secretaria de Justiça, em janeiro de 1992: 55 deles,
de alta periculosidade, foram removidos do Presídio Central,
da Pej e da Pec para a Penitenciária de Alta Segurança de
Charqueadas (Pasc), ativada em caráter emergencial.

Foram várias batalhas


Grupos liderados por Jorginho da Cruz e por Agentes e PMs Estadual do Jacuí, em janeiro de 1988.
Melara começaram a disputar, dentro das contiveram
prisões, a hegemonia da Falange Gaúcha. tumulto na Pec ● A morte de Topo Gigio provocou reações contrárias
nos pavilhões B (ocupado por aliados de Melara) e
Incêndio C (do grupo liderado por Jorginho da Cruz).
● No dia 14 de março de 1991, no Pavilhão
C do Presídio Central, numa disputa entre as ● No pátio, presos do C comemoravam. Indignada,
facções, seis presos morreram carbonizados e a turma do B se armou de trabucos e, pelas janelas
22 ficaram feridos. das celas, começou a alvejar os rivais. Houve revide.
Um preso ficou ferido na perna.
Pistolas
● Piá, a principal testemunha do massacre de
● Em fevereiro de 1991, Careca Quico, do grupo Topo Gigio, resolveu abrir a boca. Ao secretário de
de Jorginho da Cruz, recebeu, na Galeria C do Justiça, Geraldo Gama, ele disse que havia sido
Presídio Central, duas pistolas 7.65, dentro de espancado por agentes penitenciários, juntamente
um motor de refrigerador. Elas teriam sido ali com Topo Gigio, na cela de triagem.
colocadas por um agente penitenciário, subornado ● O tráfico mantinha um caixa no Pavilhão C do
para facilitar a entrada de drogas e armas na prisão. Presídio Central, para a compra de regalias, como Trabucos
acesso a drogas, quatro visitas semanais e até a ● 7 de janeiro de 1992: era dia de visitas para o
● Uma das pistolas foi escondida debaixo de um escolha de melhores alojamentos.
azulejo, na parede de uma cela. A outra era usada Pavilhão C, e, às 10h, os presos aguardavam seus
por Jorginho da Cruz, líder do Pavilhão C. Ataque familiares no pátio. Do Pavilhão B
partiram tiros de trabuco.
Seqüestros ● No 25 de outubro de 1991, na Penitenciária
Estadual de Charqueadas (Pec), um grupo de ● Quatro presos que estavam no pátio
● Em 1990, a polícia havia prendido um assaltante presos da galeria B atacou 45 rivais da Galeria ficaram feridos.
que tinha um bilhete com orientações para o C, no pátio. Quem atacou levou a pior: três
seqüestro do então governador Pedro Simon. A presos da galeria B foram mortos. ● Outros três, entre os quais, Chico
mensagem estava assinada com as letras D.F.M., Cavalheiro, que estavam no pavilhão
de Dilonei Francisco Melara. ● Melara, da galeria B, assistiu a tudo de sua Piá B e efetuaram os disparos, foram
cela. Jorginho da Cruz, que estava no pátio, gravemente feridos no rosto por tiros
● Em 1990, também, Nego Dago, Dentinho, Pelezinho saiu ileso. Os dois tinham segurança, feita por que, literalmente, saíram pela culatra.
e Pé de Pato, do grupo de Jorginho da Cruz, presos de suas facções.
planejaram seqüestrar um juiz da Vara de Execuções Piá
Criminais. Desistiram porque o magistrado ● Melara e Jorginho tinham até quem
● No dia 31 de janeiro de 1992, circulou entre
estava com seguranças. provasse seus alimentos para ver se não os presos a informação de que Piá seria morto.
estavam envenenados. A Superintendência dos Serviços Penitenciários
● Em reunião no Pavilhão C do Presídio Central,
em 1991, o grupo de Jorginho da Cruz ● O medo de que a comida fosse (Susepe) determinou sua remoção para a
decidiu seqüestrar o então governador Alceu envenenada provocou recém-ativada Penitenciária de
Collares. Quatro assaltantes estiveram perto um crime em novembro Alta Segurança de Charqueadas
de tentar executar o plano. (Pasc). Porém, ele não aceitou.
Topo Gigio de 1991. Foi morto,
com um tiro de trabuco ● Dois dias depois, Piá foi
● Em todos os planos, a idéia era trocar a (espingarda artesanal), o
autoridade seqüestrada por presidiários. enforcado em uma cela do
preso Leandro Araújo dos Santos, pavilhão B do Presídio Central.
Armas o Zé Galinha, 37 anos, que Era a única testemunha da
trabalhava na cozinha da Pec. morte de Topo Gigio.
● Sob o assoalho de uma casinha de santo, na frente
do terreiro da mãe-de-santo de Jorginho da Cruz, na ● O autor do crime foi Francisco Pistola e pólvora
Vila São José, na Capital, foram encontradas uma dos Reis Cavalheiro, o Chico
metralhadora 9mm, quatro pistolas e munição. Cavalheiro, do grupo da galeria B. ● Em maio de 1992, a
Alegou que Zé Galinha, a serviço de segurança da Pec recebeu a
● As armas e a munição seriam utilizadas no Jorginho da Cruz, pretendia matar informação de que pólvora,
seqüestro de autoridades e, depois, devolvidas ao os rivais por envenenamento. espoleta e uma pistola
tráfico do Morro da Cruz. entrariam na prisão, para que
Topo Gigio fossem mortos quatro presos:
Armas na ● No Presídio Central, em 10 de Mulher tentou Jorginho da Cruz, Nego Pinto,
casinha de dezembro de 1991, João Clóvis levar maconha e Mamadeira e Luizinho.
santo de Oliveira Vieira, o Topo Gigio, pólvora para a Pec
● Dias depois, na revista a
37 anos, braço direito de Melara, visitantes, foram descobertas num
amanheceu morto na cela de triagem, com fundo falso de um pote de comida, levado por uma
escoriações e hematomas pelo corpo. Leia no
mulher, pólvora, espoleta e maconha.
próximo
● Topo Gigio era conhecido por ter sido libertado
Incêndio final de
por Melara e Celestino Linn num ônibus da
Empresa Caxiense, em 1985, num episódio em ● Em 13 de agosto de 1992, o grupo de Melara semana:
que foram mortos dois agentes penitenciários. tentou matar 140 rivais, incendiando um pavilhão
da Penitenciária Estadual do Jacuí (Pej). Provocaram cresce o
● Topo Gigio estava na cela com Jorge Luiz Devitz, um curto-circuito e atearam fogo em colchões. Mas poder de
o Piá, um dos líderes do motim da Penitenciária os presos foram retirados a tempo para o pátio. Melara
34

Melara, o eleito ● Texto: Renato Dornelles


● Fotos: Banco de Dados ● Arte: Alexandre “O preso tratado como cidadão”
Oliveira ● Diagramação: Flávia Kampff
● Colaboração: Denise Waskow

Depois da morte Melara ganhava terreno,


de importantes e sua fama e seu poder
líderes da Falange iam crescendo no mundo
Gaúcha – criada do crime. Paralelamente,
por bandidos para uma nova geração de O secretário
Geraldo Gama (E)
comandar o crime em bandidos começava a surgir reuniu-se com
Melara (D)
prisões e favelas gaúchas e a engrossar as fileiras da Na disputa pelo comando Geraldo Gama deixou a
da Falange Gaúcha, Dilonei Pasc elogiando Melara:
– , como Vico, Professor Falange Gaúcha. Francisco Melara começava a
levar vantagem sobre o arqui-
– É uma pessoa simples e
um bom negociador. Detém
e Carioca, começou a ser rival Jorge Queirós Ventura, o
Jorginho da Cruz. Por
uma liderança forte, mas não
é intransigente. Adotamos
determinação de Melara, 600 uma nova política prisional: a
O capítulo anterior
travada uma guerra pelo presos do Presídio Central e
das penitenciárias Estadual de
de manter uma maior
aproximação com o apenado.
Charqueadas (Pec), Estadual Dessa política, nasceu o
controle da organização do Jacuí (Pej) e de Alta
Segurança de Charqueadas
slogan “O preso tratado como
cidadão”. E como todo o
criminosa. De um lado, o (Pasc) decretaram greve de
fome em fevereiro de 1992.
cidadão que se preze, os
presos foram convocados a
O secretário de Justiça, do irem às urnas para elegerem
grupo de Melara. De outro, a Trabalho e da Cidadania,
Geraldo Gama, reuniu-se
seus líderes, aqueles que
seriam seus porta-vozes nas
facção de Jorginho da Cruz. durante três horas com
Melara, no refeitório da Pasc.
reuniões com os
representantes do governo.
O presidiário levou, como Na Pasc, Melara foi eleito
4 e 5/8/2007
Nessa guerra, aos poucos, assessor, Celestino Linn. com cerca de 30% dos votos.

Roubos começaram em táxis e ônibus


O eleito na Pasc para tentava impressionar com banco.
ser representante dos frases fortes. Dizia que o Em 1985, ficou
presos, Dilonei Francisco gerador de conflitos nas marcado ao liderar a
Melara, não admitia prisões era o próprio operação que libertou seu
qualquer comando ou sistema penitenciário parceiro João Clóvis de
influência sobre a massa “precário e falido”. Oliveira Vieira, o Topo
carcerária e negava a Gigio. Na ação, Melara e
existência de uma falange ● Fugiu duas vezes Celestino Linn mataram
nos presídios gaúchos. da Pec dois agentes
Com 1,85m de altura penitenciários.
e cabelos grisalhos, aos Seu ingresso no mundo Melara também foi o
33 anos, naquele ano de do crime ocorrera na responsável pela primeira
1992, Melara mais do década de 70, com e pela segunda fugas
que nunca se esforçava assaltos a táxi e ônibus ocorridas na Penitenciária
Presos para passar a idéia de um em Caxias do Sul. No Estadual de Charqueadas
elegeram seus “bandido social”, fruto de início dos anos 80, foi (Pec), na época, de
representantes um sistema injusto, e condenado por assalto a segurança máxima.
34

Melara, o eleito ● Texto: Renato Dornelles


● Fotos: Banco de Dados ● Arte: Alexandre “O preso tratado como cidadão”
Oliveira ● Diagramação: Flávia Kampff
● Colaboração: Denise Waskow

Depois da morte Melara ganhava terreno,


de importantes e sua fama e seu poder
líderes da Falange iam crescendo no mundo
Gaúcha – criada do crime. Paralelamente,
por bandidos para uma nova geração de O secretário
Geraldo Gama (E)
comandar o crime em bandidos começava a surgir reuniu-se com
Melara (D)
prisões e favelas gaúchas e a engrossar as fileiras da Na disputa pelo comando Geraldo Gama deixou a
da Falange Gaúcha, Dilonei Pasc elogiando Melara:
– , como Vico, Professor Falange Gaúcha. Francisco Melara começava a
levar vantagem sobre o arqui-
– É uma pessoa simples e
um bom negociador. Detém
e Carioca, começou a ser rival Jorge Queirós Ventura, o
Jorginho da Cruz. Por
uma liderança forte, mas não
é intransigente. Adotamos
determinação de Melara, 600 uma nova política prisional: a
O capítulo anterior
travada uma guerra pelo presos do Presídio Central e
das penitenciárias Estadual de
de manter uma maior
aproximação com o apenado.
Charqueadas (Pec), Estadual Dessa política, nasceu o
controle da organização do Jacuí (Pej) e de Alta
Segurança de Charqueadas
slogan “O preso tratado como
cidadão”. E como todo o
criminosa. De um lado, o (Pasc) decretaram greve de
fome em fevereiro de 1992.
cidadão que se preze, os
presos foram convocados a
O secretário de Justiça, do irem às urnas para elegerem
grupo de Melara. De outro, a Trabalho e da Cidadania,
Geraldo Gama, reuniu-se
seus líderes, aqueles que
seriam seus porta-vozes nas
facção de Jorginho da Cruz. durante três horas com
Melara, no refeitório da Pasc.
reuniões com os
representantes do governo.
O presidiário levou, como Na Pasc, Melara foi eleito
4 e 5/8/2007
Nessa guerra, aos poucos, assessor, Celestino Linn. com cerca de 30% dos votos.

Roubos começaram em táxis e ônibus


O eleito na Pasc para tentava impressionar com banco.
ser representante dos frases fortes. Dizia que o Em 1985, ficou
presos, Dilonei Francisco gerador de conflitos nas marcado ao liderar a
Melara, não admitia prisões era o próprio operação que libertou seu
qualquer comando ou sistema penitenciário parceiro João Clóvis de
influência sobre a massa “precário e falido”. Oliveira Vieira, o Topo
carcerária e negava a Gigio. Na ação, Melara e
existência de uma falange ● Fugiu duas vezes Celestino Linn mataram
nos presídios gaúchos. da Pec dois agentes
Com 1,85m de altura penitenciários.
e cabelos grisalhos, aos Seu ingresso no mundo Melara também foi o
33 anos, naquele ano de do crime ocorrera na responsável pela primeira
1992, Melara mais do década de 70, com e pela segunda fugas
que nunca se esforçava assaltos a táxi e ônibus ocorridas na Penitenciária
Presos para passar a idéia de um em Caxias do Sul. No Estadual de Charqueadas
elegeram seus “bandido social”, fruto de início dos anos 80, foi (Pec), na época, de
representantes um sistema injusto, e condenado por assalto a segurança máxima.
34

Melara, o eleito ● Texto: Renato Dornelles


● Fotos: Banco de Dados ● Arte: Alexandre “O preso tratado como cidadão”
Oliveira ● Diagramação: Flávia Kampff
● Colaboração: Denise Waskow

Depois da morte Melara ganhava terreno,


de importantes e sua fama e seu poder
líderes da Falange iam crescendo no mundo
Gaúcha – criada do crime. Paralelamente,
por bandidos para uma nova geração de O secretário
Geraldo Gama (E)
comandar o crime em bandidos começava a surgir reuniu-se com
Melara (D)
prisões e favelas gaúchas e a engrossar as fileiras da Na disputa pelo comando Geraldo Gama deixou a
da Falange Gaúcha, Dilonei Pasc elogiando Melara:
– , como Vico, Professor Falange Gaúcha. Francisco Melara começava a
levar vantagem sobre o arqui-
– É uma pessoa simples e
um bom negociador. Detém
e Carioca, começou a ser rival Jorge Queirós Ventura, o
Jorginho da Cruz. Por
uma liderança forte, mas não
é intransigente. Adotamos
determinação de Melara, 600 uma nova política prisional: a
O capítulo anterior
travada uma guerra pelo presos do Presídio Central e
das penitenciárias Estadual de
de manter uma maior
aproximação com o apenado.
Charqueadas (Pec), Estadual Dessa política, nasceu o
controle da organização do Jacuí (Pej) e de Alta
Segurança de Charqueadas
slogan “O preso tratado como
cidadão”. E como todo o
criminosa. De um lado, o (Pasc) decretaram greve de
fome em fevereiro de 1992.
cidadão que se preze, os
presos foram convocados a
O secretário de Justiça, do irem às urnas para elegerem
grupo de Melara. De outro, a Trabalho e da Cidadania,
Geraldo Gama, reuniu-se
seus líderes, aqueles que
seriam seus porta-vozes nas
facção de Jorginho da Cruz. durante três horas com
Melara, no refeitório da Pasc.
reuniões com os
representantes do governo.
O presidiário levou, como Na Pasc, Melara foi eleito
4 e 5/8/2007
Nessa guerra, aos poucos, assessor, Celestino Linn. com cerca de 30% dos votos.

Roubos começaram em táxis e ônibus


O eleito na Pasc para tentava impressionar com banco.
ser representante dos frases fortes. Dizia que o Em 1985, ficou
presos, Dilonei Francisco gerador de conflitos nas marcado ao liderar a
Melara, não admitia prisões era o próprio operação que libertou seu
qualquer comando ou sistema penitenciário parceiro João Clóvis de
influência sobre a massa “precário e falido”. Oliveira Vieira, o Topo
carcerária e negava a Gigio. Na ação, Melara e
existência de uma falange ● Fugiu duas vezes Celestino Linn mataram
nos presídios gaúchos. da Pec dois agentes
Com 1,85m de altura penitenciários.
e cabelos grisalhos, aos Seu ingresso no mundo Melara também foi o
33 anos, naquele ano de do crime ocorrera na responsável pela primeira
1992, Melara mais do década de 70, com e pela segunda fugas
que nunca se esforçava assaltos a táxi e ônibus ocorridas na Penitenciária
Presos para passar a idéia de um em Caxias do Sul. No Estadual de Charqueadas
elegeram seus “bandido social”, fruto de início dos anos 80, foi (Pec), na época, de
representantes um sistema injusto, e condenado por assalto a segurança máxima.
PORTO ALEGRE, SÁBADO, 11/8/2007, E DOMINGO, 12/8/2007 35

Pensamentos de Melara

Seguindo o exemplo dos “ídolos”


A guerra entre presos parecia participara da morte de um
interminável. No interior do professor de Educação Física para
Estado, passaram quase roubar o seu carro, na Rua José
despercebidas as mortes de Bonifácio, em Porto Alegre. No
Alemão Frida, Paulinho Escort, mesmo ano, assaltara uma
participantes do motim de videolocadora e, diante
1987 no Presídio Central, da chegada da polícia,
e Toco, que afirmara ter mantivera uma
matado Vico. Os três funcionária do
foram assassinados dentro estabelecimento como
de prisões. refém, com uma arma
Por outro lado, uma apontada para a sua
nova geração de cabeça. Depois, liderara
assaltantes começou a Bicudo um motim na antiga
preocupar a polícia e a Fundação Estadual do
ganhar destaque no noticiário Menor – Febem (atual Fundação
policial. Um deles era Carlos de Assistência Sócio-Educativa).
Jefferson dos Santos, o Bicudo, agora, tinha mais de
Bicudo, o mesmo jovem que, 18 anos e estava condenado por
aos 16 anos, em 1987, havia assaltos e estupros. Preso na
Bicudo manteve sido preso por arrombamentos Penitenciária de Alta Segurança
jovem sob mira em Canoas e confessara ser fã de Charqueadas (Pasc), onde
de sua arma de Vico, Professor e Melara. tever a chance de realizara o
O mesmo Bicudo, em 1988, sonho de conhecer e se juntar ao
aos 17 anos incompletos, bando de Melara.
Assaltante de peruca loira
Policiais na
Outro integrante da nova ladrões já se preparavam frente da casa
geração era Fernando para fugir, quando o PM assaltada
Rodolfo Dias, o que patrulhava aquela
Fernandinho, um ex- área da cidade surgiu na
integrante de gangues entrada do prédio. Ao
juvenis, alto, magro, perceber que ocorria um
branco, frio e calculista, assalto, o policial militar se
que passou a assaltar entrincheirou atrás de
bancos com uma floreiras. Como havia
peculiaridade: usava uma grande movimento no
peruca loira. local, resolveu não atirar.
Foi assim que Fernandinho não teve a
Fernandinho e outros três mesma preocupação. Com
homens atacaram o posto sua pistola, disparou uma
bancário localizado no saraivada de tiros contra o
bloco dos consultórios policial militar, acertando
médicos do Hospital dois. Enquato o PM era
Moinhos de Vento, em socorrido, Fernandinho e
Porto Alegre, numa sexta- seus companheiros fugiam
feira 13, de agosto, em no Voyage, em alta
1993. velocidade. Invasão na Boa Vista
Fernandinho, vestindo Dois meses depois,
um sobretudo e com a Fernandinho foi preso No dia 6 de outubro de na suíte do casal para horas de negociações. Para
sua tradicional em Caxias do Sul 1993, outro assaltante formalizar o assalto: se entregar, os bandidos
peruca, misturou- e transferido ganhava as manchetes: – Queremos 200 mil pediam para serem levados
se aos clientes do para o Presídio Eram 8h15min, quando dólares – foram enfáticos. para presídios do Interior.
posto. De Central, em um estudante de 18 anos, Um dos assaltantes era Chardozinho considerava
surpresa, sacou Porto Alegre. atrasado, deixava sua casa, Luiz Paulo Chardozin Pereira, essencial essa exigência. Ele
uma pistola no Bairro Boa Vista, em o Chardozinho, indiciado em estava comprometido com a
automática e rendeu Porto Alegre, para ir à cinco inquéritos: facção da Falange Gaúcha
dez pessoas. aula, no Colégio três por roubo, liderada por Melara e, dessa
Depois, agarrou Anchieta. Ao entrar em um por homicídio forma, obrigado a mandar
quatro malotes com seu carro, ouviu uma e outro por furto. dinheiro para dentro das
dinheiro e saiu voz estranha, em tom Quando o dono penitenciárias. Havia
correndo. de deboche: da casa entrou falhado, e isso poderia
Dois outros – Pô, cara. Tu em contato com custar-lhe a vida, caso fosse Leia no
assaltantes o demorou, e a gente já amigos a fim de levado para o Presídio próximo
aguardavam no tava indo embora. Chardozin arrecadar a Central ou para o complexo
saguão e um quarto O rapaz foi dominado quantia solicitada, de Charqueadas. final de
ao volante de por dois homens e um deles Quando os policiais foram semana: a
um Voyage, forçado a retornar à desconfiou e chamou a autorizados a entrar na casa,
já com o residência, onde estavam polícia. os dois assaltantes foram invasão do
motor seus pais, sua irmã, uma A casa foi cercada por algemados e presos. Plaza São
ligado. cozinheira e uma copeira. policiais militares e civis, e o Chardozinho, contra sua
Os Encapuzados, os dois caso virou um assalto com vontade, foi levado ao Rafael
Fernandinho foi assaltantes reuniram todos reféns. Foram mais de nove Presídio Central.
preso em Caxias
30

Terror nas ruas


● Texto: Renato Dornelles
● Fotos: Banco de Dados ● Arte: Alexandre
Oliveira ● Diagramação: Flávia Kampff
O começo Bicudo (E) com o
refém Claudinei
As exigências
● Colaboração: Denise Waskow No dia 7 de julho, uma quinta- Já no início das
feira, à tarde, seis presos-pacientes negociações, os
– Fernando Rodolfo Dias, o amotinados exigiram
O gelado dia 8 de julho de Fernandinho, Francisco dos Reis
Cavalheiro, o Chico Cavaheiro,
que a eles se
juntassem Carlos
Pedro Ronaldo Inácio, o Bugigão, Jéfferson Souza dos
1994 ficou na história José Carlos Pureza, Vladimir Santos, o Bicudo, e
Santana, o Sarará da Vó, e Nauro Luiz Paulo
de Porto Alegre. Pereira, o Boró – armados
renderam 27 funcionários do
Schardozin Pereira,
o Chardozinho, que
Pela manhã, carros, Hospital Penitenciário, em prédio
anexo ao Presídio Central, e
estavam no
Pavilhão B do
começaram o motim. Presídio Central,
telhados e calçadas foram dominado pelo grupo de
Melara. Os negociadores cederam em troca
momentaneamente cobertos uma telefonista que havia passado mal.
Bicudo assumiu o comando do motim.

por fragmentos de gelo, O líder


classificados pelos especialistas Na madrugada do dia 8, removidos da Penitenciária de
avançaram as negociações Alta Segurança de
como neve granular. entre os presos e uma
comissão formada por
Charqueadas (Pasc) para o
local do motim os presos
À noite, a seqüência de um motim representantes dos três
poderes, da Polícia Civil e da
Dilonei Francisco Melara e
Celestino Linn, que saíram
Brigada Militar. Uma nova pela porta da frente e sem
promovido pela facção da exigência foi atendida: foram algemas.

Falange Gaúcha liderada por Melara deixa a


Claudinei, baleado, fica
caído ao lado do Gol
Melara no Hospital Penitenciário, Pasc pela porta da
frente. Atrás (D),
Celestino Linn
ganhou as ruas com cenas típicas de
cinema e parou uma amedrontada A fuga
Capital. O desfecho se daria no Às 21h40min do dia 8, terminou a rebelião
no Hospital Penitenciário. Divididos em três
Gol cedidos a eles, dez amotinados deixaram
principal hotel da cidade, na época, o pátio do Presídio Central, com três reféns
em cada carro. Começava uma longa,
não sem antes deixar um saldo de cinematográfica, dramática e sangrenta
caçada pelas ruas de Porto Alegre. Dezenas
de automóveis, com centenas de policiais, Tiroteio
cinco mortos. seguiram os carros dos bandidos.
Bicudo, que dirigia o Gol no qual
estavam também Melara,
O capítulo anterior Fernandinho e Linn, abandonou o
volante na Rua Ivo Corseul, no
Bairro Petrópolis, e fugiu a pé. Um
dos reféns, o diretor do Hospital
Penitenciário, Claudinei Santos,
assumiu a direção. Porém, pouco
tempo depois, houve tiroteio na
rua. Claudinei foi atingido nas
costas e, a seu pedido, retirado do
carro. Na rua, o inspetor João
Enrolados em Bento Freitas Nunes também foi
cobertores, bandidos se baleado e morreu.
preparam para a fuga
11 e 12/8/2007
30

Motim sem fim


● Texto: Renato Dornelles
● Fotos: Banco de Dados ● Arte: Alexandre O capítulo anterior Um líder à distância
Oliveira ● Diagramação: Flávia Kampff
● Colaboração: Denise Waskow
A mais longa e Melara,
sangrenta rebelião da na Pasc,
A rebelião iniciada história do sistema
prisional gaúcho não
arquitetou
o motim
no Hospital começou no momento
em que foram feitos
reféns no Hospital
Penitenciário Penitenciário, no dia 7
de julho de 1994, e
no dia 7 de julho 18 e 19/8/2007
não terminou na tarde
de 9 de julho, com a
rendição de Dilonei Francisco
de 1994, que ganhou Investigações revelaram
Melara e Fernando Rodolfo
Dias, o Fernandinho – que
o PC, menos de um mês antes
da realização do motim.
haviam invadido o hotel Plaza Dois dias antes da rebelião,
as ruas da cidade que o motim demonstrou São Rafael.
Havia pelo menos dois
Fernandinho, que estava no
PC, procurara atendimento no
no dia 8, e foi ter um o poder de Melara, líder da
meses que Melara começara a
planejar a ação. Recolhido a
Hospital Penitenciário, mas fora
encaminhado de volta ao
uma cela individual na presídio. Porém, sob a pressão
desfecho no hotel Plaza Falange Gaúcha, no interior Penitenciária de Alta
Segurança de Charqueadas
de líderes do Pavilhão B (como
Bicudo) e com a alegação de
São Rafael, no dia 9 (tema dos principais presídios. No
(Pasc) e vendo como quase
nulas suas chances de fugir
que pretendia evitar tumultos,
a direção do PC convenceu os
daquela prisão, arquitetou um diretores do hospital a
do capítulo anterior), pós-motim, continuaram
motim para o Hospital
Penitenciário – anexo ao
aceitarem a baixa do bandido.
Em uma época em que os
Presídio Central (PC). telefones celulares eram raros
continuou repercutindo as mortes e, para alguns, Como parte do plano, Melara
conseguiu com que Carlos
entre a população e não
chegavam aos presos, Melara
e produzindo as conseqüências foram
Jéfferson Souza dos Santos, o
Bicudo, que também estava na
transmitia recados e orientava
ações nas principais prisões
Pasc, fosse transferido por via (cerca de 600 apenados eram
conseqüências. definitivas. administrativa, à revelia de
qualquer decisão judicial, para
fiéis a ele) usando visitantes
como pombos-correio.

A morte de Linn Conseqüências para toda a vida


No pós-motim, depois da Entre os reféns, dois de uma Edilei sobreviveu, mas, com os
rendição de Melara e mesma família sofreram as piores 12 tiros que levou, perdeu parte
Fernandinho, outros destinos consequências: Claudinei Carlos de um rim e do intestino, teve a
foram sendo traçados. Um dos Santos (na época diretor do bexiga furada e ficou com um
deles foi o de Celestino Linn, Hospital Penitenciário) foi levado braço paralisado. Além do trauma
que chegara a invadir o Plaza como refém no carro em que psicológico.
São Rafael, na noite de 8 de estavam Melara, Bicudo,
julho, mas que fora Fernandinho e Linn. Ele Tiro mudou
dominado em seguida. Ele levou um tiro que garante
deixou o local caminhando. ter sido disparado de fora do a vida de
Linn foi levado por policiais carro. A bala perfurou seus Claudinei
O bandido
ao Hospital de Pronto saiu do Plaza pulmões, cortou sua medula
Socorro (HPS). Porém, caminhando espinhal e lhe deixou preso a
temendo que outros uma cadeira de rodas.
bandidos tentassem resgatá-lo, Seu filho, Edilei, também
médicos lhe deram alta. O bandido foi haviam ido trabalhar. funcionário do hospital, foi
conduzido, então, ao Hospital Penitenciário, No dia seguinte, por volta das 7h, um levado no carro que foi
no dia 9. No dia 10, um médico prescreveu agente penitenciário foi ao quarto de Linn crivado de balas pela polícia,
seu estado como “estável”. À noite, o para lhe servir café e o encontrou morto. Pelo na Lomba do Pinheiro. Os
atendimento ficou por conta da equipe de laudo de necropsia, o assaltante morreu com três bandidos que estavam no
segurança, pois, ainda traumatizados com o quatro ferimentos por projéteis de arma de veículo – Boró, Pureza e
motim, os auxiliares de enfermagem não fogo (tiros). Sarará da Vó – morreram.
PORTO ALEGRE, SÁBADO, 25/8/2007, E DOMINGO, 26/8/2007 31

Recapturados
● O assaltante Pedro Ronaldo Ignácio, o Bugigão, um ● Dois dias depois da captura de Bugigão,
dos foragidos do Presídio Central depois do motim a polícia terminou a caçada aos fugitivos
do Hospital Penitenciário, foi preso na madrugada prendendo Francisco dos Reis Cavalheiro, o
do dia 24 de julho de 1994 (duas semanas Chico Cavalheiro, encontrado em um barraco
depois da rebelião), no Bairro Rubem Berta, em da Vila Divinéia, também na Capital. Chico
Porto Alegre. Com graves problemas de saúde, foi Cavalheiro foi assassinado com 12 facadas, na
indultado (recebeu perdão judicial) em 2002. Pasc, em outubro de 2006.

A curta vida de um bandido


No dia 19 de julho de
1994, o motim do Hospital
Penitenciário nem havia
deixado as manchetes
quando um assalto a
banco movimentou a
Região Metropolitana.
Por volta das Na fuga,
11h30min, o participante após o
da rebelião Carlos motim
Jefferson Souza dos (8/7/94)
Santos, o Bicudo, 23
anos, e outros dois
homens, a pé,
aproximaram-se de uma
agência bancária na Vila
Líder de uma Fernandes, em Canoas.
quadrilha de Enquanto isso, um outro
menores (E) estacionava um Kadett fugiram a pé, em meio
(28/8/87) na frente do banco. a um conjunto de casebres. bandido carregava uma
Antes de entrar na granada. A doméstica entrou
agência, Bicudo deu um ● Morte ainda na rapidamente em casa e ouviu
Preso por
tiro no vigilante, acertando-o juventude tiros. Em seguida, olhou pela
na barriga. Depois, numa ação janela e viu Bicudo caindo. O
assaltos rápida, ele e seus parceiros Os quatro começaram a assaltante havia recebido um
(8/12/87) roubaram cerca de R$ 70 mil jogar dinheiro para o alto, balaço no lado esquerdo da
e fugiram, no Kadett. tentando fazer com que os cabeça.
Em Esteio, a quadrilha moradores atrapalhassem a Os policiais colocaram
passou a ser perseguida por perseguição da polícia. Bicudo em uma ambulância e
uma guarnição da Brigada Incansáveis, os criminosos o levaram para o Hospital
Militar. Em seguida, surgiram pulavam cercas, corriam pelos Getúlio Vargas. Pouco tempo
outras viaturas e houve troca terrenos, sem, no entanto, depois, ele morreria com
de tiros. Na Vila Vargas, junto conseguir abrir vantagem em hemorragia grave. Chegava ao
à RS-118, entre Sapucaia do relação aos PMs. fim a carreira do bandido que
Sul e Viamão, os Uma doméstica apavorou-se crescera se espelhando em
assaltantes quando viu Bicudo invadir sua criminosos como Vico (morto
abandonaram o propriedade. Foi ela quem em 1987), que sonhara fazer
Preso por automóvel e primeiro percebeu que, além parte da Falange Gaúcha e
de uma que morrera muito jovem,
latrocínio pistola, o como seu “ídolo”.
(10/5/88)
Preso por
estupro
(18/5/90)

Depois de um
assalto com
reféns a uma Recapturado após
videolocadora liderar motim na
(7/6/88) Febem (23/6/88)

Queriam matar Melara, mas quem morre é Jorginho da Cruz


Passados os efeitos imediatos do colchões e atirando pedras retiradas missão de matar Melara. A pistola foi semelhante à de seu antecessor no
maior motim da história do sistema de um muro. De outro, cerca de entregue à Justiça. comando do tráfico de drogas no
prisional gaúcho, a guerra no interior 200 homens do Batalhão de Choque Morro da Cruz, Luciano Brás de
dos presídios continuou. Em da Brigada Militar com ● O luto voltou ao Morro Souza, o Carioca, assassinado em
novembro de 1995, a fidelidade a bombas de efeito moral. A da Cruz 1989. Os outros oito presos que
Melara provocou uma rebelião. rebelião só foi controlada dividiam a cela com ele estavam no Leia no
O líder da Falange Gaúcha havia uma hora e meia depois. A morte tramada foi a de pátio no momento em que o corpo
sido punido e proibido de receber Enquanto na Pec Melara Melara, mas quem acabou foi encontrado. Ao serem próximo
visitas na Penitenciária de Alta recebia solidariedade, na morrendo foi Jorginho Luiz interrogados, cumpriram a lei do final de
Segurança de Charqueadas (Pasc). Pasc tentavam matá-lo. No Ventura, o Jorginho da Cruz, silêncio, uma das regras mais
Por conta disso, eclodiu uma revolta mesmo dia em que eclodia seu principal rival na disputa conhecidas no cárcere. semana:
na vizinha Penitenciária Estadual de a rebelião, era descoberta Jorginho pelo comando da Falange Jorginho foi velado na sede da a guerra
Charqueadas (Pec): 106 dos 206 com um preso uma pistola Gaúcha. Aos 33 anos, ele foi Associação dos Moradores da Vila
presidiários decidiram não retornar a Browning, calibre 6.35, de enforcado na cela 2 da 4ª galeria da Vargas, atrás do Morro da Cruz. O entre Os
suas celas depois das visitas. fabricação belga. Disse ele que Penitenciária Estadual do Jacuí (Pej), luto voltou ao local, inclusive com Manos e
A revolta resultou em batalha: de recebeu a arma de um agente em Charqueadas, no dia 5 de bandeiras pretas em algumas
um lado, presos ateando fogo em penitenciário, em sua cela, com a fevereiro de 1996. Foi uma morte casas. Os Brasas.
34

Manos X Brasas ● Texto: Renato Dornelles


● Fotos: Banco de Dados ● Arte: Alexandre Papagaio driblou vigilância da Pasc
Oliveira ● Diagramação: Flávia Kampff
● Colaboração: Denise Waskow
Na última virada de século, Papagaio, líder de uma por sua misteriosa fuga da
uma nova geração de quadrilha responsável por Penitenciária de Alta
bandidos começava a fazer assaltos milionários a bancos Segurança de Charqueadas
Com a morte de seu principal sombra a Dilonei Francisco
Melara, dentro e fora das
e carros-fortes no Rio Grande
do Sul e em Santa Catarina.
(Pasc), em 5 de junho de
1999. Para tanto, ele e outro
rival, o traficante Jorge Luís prisões. Um deles era o
assaltante Cláudio Adriano
Ribeiro, o
Além dos assaltos,
Papagaio ganhou notoriedade
preso teriam, durante a
madrugada, arrancado
grades de suas celas e
Ventura, o Jorginho da Cruz passado por um muro de
oito metros para chegar ao
pátio interno da
(tema do capítulo anterior), penitenciária.
Depois, teriam passado
Dilonei Francisco Melara acreditava sob duas cercas de seis
metros de altura. Papagaio
ainda teria vencido um
que finalmente reinaria absoluto muro de dois metros,
última barreira que o
separava das ruas. Seu
no comando da Falange Gaúcha companheiro foi
recapturado antes de
(organização criada por bandidos ultrapassar a muralha.
Tudo isso teria ocorrido
durante uma falta de
para comandar o crime em presídios e Papagaio foi
recapturado
energia elétrica. Em 6 de
janeiro do ano seguinte,
em Santa
favelas). Porém, logo surgiriam outros Catarina
Papagaio foi recapturado
no Litoral catarinense.

nomes para disputar o posto. Até Marcola passou por aqui


Entre os novos concorrentes de Outro que fez sombra à
fama de Dilonei Francisco
levado para a Penitenciária
Modulada de Ijuí, na Região
megarrebelião: em 29
prisões paulistas, em 22
Melara despontava Valmir Benini Melara nas prisões gaúchas
foi Marcos William Herbas
Noroeste, no dia 16 de
fevereiro de 2001. Dois dias
cidades, 28,3 mil presidiários
transformaram 13 mil
Camacho, o Marcola. O atual depois, como represália pela pessoas em reféns. Marcola
Pires, o Brasa. Fiéis a ele, centenas de número 1 na hierarquia do
Primeiro Comando da Capital
transferência, o PCC
promoveu uma
ficou no Estado até as
primeiras semanas de março
(PCC), de São Paulo, chegou daquele ano.
presos criaram o grupo Os Brasas, que ao Rio Grande de Sul numa
operação especial das
passaram a rivalizar com Os Manos, polícias paulista e gaúcha.
Atendendo a um pedido
do governo paulista,
como se autodenominou, a partir autoridades da área
prisional gaúcha
de então, O capítulo anterior
aceitaram a
transferência de
Marcola para prisões
a facção do Estado. A
alegação era de que
a situação nos
da Falange presídios de São
Paulo começava a
Gaúcha ficar crítica e, para
contorná-la, era
necessário que
liderada por Marcola fosse
transferido. Marcola (cabeça
Marcola chegou
Melara. 25 e 26/8/2007 ao Estado e foi
encoberta) passou
temporada em Ijuí
PORTO ALEGRE, SÁBADO, 1º/9/2007, E DOMINGO, 2/9/2007 35

A disputa no início do Século


● Três grupos lutavam pela hegemonia dentro das ● Os Manos eram hegemônicos na Pasc.
principas cadeias gaúchas:
● Os Brasas tinham maior poder no Presídio
● Os Manos, Os Brasas e Os Abertos. Central.
● Estimativas oficiais apontavam que 2,5 mil ● Os Abertos eram maioria na Colônia Penal
detentos integravam os três bandos. Agrícola Daltro Filho.

Confrontos violentos Compositor de pagode


Mas nem Cláudio Adriano Enquanto A disputa entre Os para passar a viver de
Ribeiro, o Papagaio, nem Marcos alguns presos Manos e os Brasas não direitos autorais, algo só
William Herbas Camacho, o pediam paz... impedia que Dilonei possível no país a
Marcola, conseguiram fazer Francisco Melara voltasse compositores consagrados.
concorrência a Dilonei Francisco seu pensamento para Enquanto compunha em
Melara no comando do crime outras coisas. E, em em sua cela na Pasc,
organizado no interior de 2004, até como Melara fazia planos de
presídios gaúchos. Quem compositor ele conseguiu trocar de regime prisional,
despontou nesse sentido foi chamar a atenção. do fechado para o semi-
Valmir Benini Pires, o Brasa. No dia 23 de agosto aberto, no qual o preso
Com Melara e Brasa como daquele ano, uma rádio da pode sair da cela e circular
respectivos líderes, surgiram Capital executou a música livremente dentro dos
como principais facções da Casinha Na Colina, limites da cadeia.
Falange Gaúcha, na virada do apresentada como Houve uma longa
século, Os Manos pagode, com letra e batalha judicial, que tinha
e Os Brasas. melodia fracas, gravada de um lado o Ministério
Havia ainda um num CD de demonstração Público e a Secretaria da
terceiro grupo, (demo) por uma banda Justiça e da Segurança,
formado por que nem nome tinha. contrárias à mudança, e
dissidentes Casinha na Colina seria de outro a defesa do
dos outros uma das 25 letras já apenado. A disputa chegou
dois: Os compostas pelo apenado ao Superior Tribunal de
Brasa Abertos. que, segundo sua defesa, Justiça (STJ), em Brasília,
As disputas pretendia assinar contrato onde Melara conseguiu a
entre grupos provocavam tensão, ... alguns com alguma gravadora mudança de regime.
como no dia 26 de março de criavam
2002, no Presídio Central. pânico...
Integrantes de Os Brasas que Casinha Na Colina
estavam na 2ª e na 3ª galerias Autor: D. F. Melara
do Pavilhão D revoltaram-se Vou te dar muito
No começo da noite carinho
com a descoberta de um plano conheci você
de fuga e com a suspensão das Muito amor, linda
Que noite linda menina.
visitas. Que interessante, cheia E o que virá depois,
de prazer Só Deus mesmo pra
● Tumulto durou cinco horas Tudo o que rolou, saber,
no Central Foi pra lá de loucura, Sonho com bastante
Flutuei nas alturas Vida e
Os Brasas decidiram, então, fazendo amor com você Bem pouquinho sofrer...
que Os Manos, que estavam Garota linda estou E o que virá depois,
na 1ª galeria, pagariam o pato. apaixonado Só Deus mesmo pra
Aceite o meu pedido, saber,
Tentaram invadi-la, mas os Deixa eu ser seu
fiéis a Melara colocaram fogo Sonho com bastante
namorado, Vida e
em colchões. Houve um Vou fazer uma casinha Bem pouquinho
grande tumulto, só contido Pra nós dois lá na sofrer...
cinco horas depois pela ... e outros colina,
Brigada Militar. ameaçavam

Melara conquista o semi-aberto Furgão levou


Melara da Pasc
para a CPA
No dia 6 de outubro de apenados que continuavam Devido ao clima tenso
2004, um furgão da no regime fechado. na colônia penal e nas
Superintendência dos ruas, a segurança
Serviços Penitenciários ● Até seu sono era decidiu realizar uma
(Susepe) partiu da vigiado revista no alojamento
Penitenciária de Alta ocupado pelo Manos.
Segurança de Charqueadas Como ele facilmente seria Foram encontrados
(Pasc) levando Dilonei reconhecido nas ruas, passou dois revólveres, duas
Francisco Melara para a a comandar, entre outros pistolas, uma
Colônia Penal Agrícola (CPA) apenados de Os Manos na espingarda, 76
Daltro Filho, a poucos metros CPA, assaltos e furtos em projéteis de pistola, 21
de distância. Charqueadas, durante o dia. de revólver, três
Pela lei, no regime semi- Como conseqüência, o carregadores de Leia no
aberto os presos só podem registro de crimes contra o pistola, oito celulares,
sair da área da prisão com patrimônio triplicou no 66 pedras de crack e próximo
ordem judicial. Porém, a frágil município, passando de dez vários estoques. Pelo lado áreas final de
vigilância permitia a para 30 diários, em média. dos rivais Os Abertos, foi penitenciária e de segurança. regime semi- semana:
apenados darem No interior da CPA, a rotina encontrada até uma granada. aberto da Penitenciária
“escapadinhas” e retornarem também foi alterada. Melara As freqüentes ameaças de ● Transferência em Estadual do Jacuí (Pej). a morte
sem que o desrespeito à passou a andar cercado por morte a Melara, o risco de operação sigilosa No dia 25 de novembro do mito e
norma fosse notado. até seis seguranças quando um grande enfrentamento na daquele ano, numa operação
Melara, pelas regras de sua acordado. Enquanto dormia, CPA e os assaltos em Entre as decisões estava a praticamente sigilosa, o o fim da
facção criminosa, deveria subordinados se revezavam Charqueadas pautaram uma de transferir o líder de Os Melara foi transferido de Falange
mandar dinheiro para os no zelo de seu sono. reunião de autoridades das Manos da CPA para a ala de prisão.
30

A morte do mito
● Texto: Renato Dornelles
● Fotos: Banco de Dados ● Arte: Alexandre
O capítulo anterior
Alerta em todo o Sul do país
Oliveira ● Diagramação: Flávia Kampff
● Colaboração: Denise Waskow
Às 20h do dia 29 de novembro pátio, que não era cercado. Logo,
de 2004, depois de mais um dia só sua consicência poderia
de trabalho na ala do regime impedi-lo de fugir.
A guerra no interior semi-aberto da Penitenciária
Estadual do Jacuí (Pej), como era
No Norte do Estado,
imediatamente, a Polícia
dos presídios rotina, os agentes começaram a
conferência dos presos. Dos 38
Rodoviária Federal montou
barreiras na rodovia Erechim-
alojados no local, um não Concórdia (SC), a BR-153, e no
continuava, agora respondeu à chamada.
O alerta foi dado e, em poucos
acesso à BR-480, que leva a
Chapecó (SC).
25 e 26/8/2007
com os grupos Os minutos, soava nos rádios de
viaturas da Brigada Militar, da
No município de Espumoso, a
Polícia Rodoviária Estadual fez
Polícia Civil e das Polícias barreira na RS-332, que leva a
Manos (principal faccão Segurança Rodoviárias Federal e Estadual:
– Atenção para alerta de fuga.
Passo Fundo. Em Tupanci do Sul,
onde moravam familiares de
da Falange Gaúcha), Os de Charqueadas (Pasc), para o Melara fugiu.
Desde que chegara à Pej,
Melara, foi realizada uma
operação de buscas.
transferido da Colônia Penal Barreiras foram montadas
Brasas e Os Abertos como semi-aberto, na Colônia Penal Agrícola Daltro Filho, havia uma
semana, Melara trabalhava na
também durante a madrugada
seguinte nas fronteiras com a
protagonistas (tema do Agrícola Daltro Filho. Porém, o cozinha e tinha livre acesso ao Argentina e o Uruguai.

capítulo anterior). temor de que ocorresse um


Líder de Os Manos, Dilonei grande conflito motivou sua
Francisco Melara, depois de transferência para a ala do
uma batalha judicial, regime semi-aberto da
conquistou o direito de mudar Penitenciária Estadual do Jacuí
do regime fechado, na (Pej). Foi um passo para a fuga
Penitenciária de Alta e outro, para a morte. Barreiras
tentavam conter a
fuga do bandido

Caçada mobilizou grande número de policiais


A notícia da fuga de Melara serviço Disque-Denúncia, do Um ex-taxista da Capital, que
espalhou-se rapidamente e Departamento Estadual de virara vendedor ambulante
chegou a Santa Catarina. Investigações Criminais (Deic) em Planalto, jurou ter visto o
Todas as delegacias daquele e o 190 da Brigada Militar bandido a bordo de um
Estado foram avisadas e passaram a tocar Vectra bordô na RS-406, que
receberam uma foto do insistentemente com liga o município de Nonoai a
foragido. A polícia catarinense informações de pessoas que Santa Catarina. Apesar do
montou barreiras na divisa acreditavam ter visto o forte aparato policial, nem
com o Rio Grande do Sul. criminoso. Por sinal, Melara uma pista do criminoso foi
A caçada a Melara “era visto” em vários locais, a encontrada.
mobilizou um grande número centenas de quilômetros uns Além disso, não eram raros
de policiais que, nos dias dos outros, em frações de os boatos sobre uma suposta
seguintes, passaram a minutos, segundo os morte do criminoso. Entre
percorrer endereços de telefonemas. outras coisas, circulavam
Foto de Melara possíveis amigos e familiares Uma das dicas provocou informações de que ele teria
foi espalhada do bandido, na Região uma mobilização de 200 sido executado e enterrado
pelas estradas Metropolitana. O telefone do policiais no Norte do Estado. nas proximidades da Pej.
PORTO ALEGRE, SÁBADO, 8/9/2007, E DOMINGO, 9/9/2007 31

Coisas da Falange
● Em 1989, a Falange Gaúcha promoveu uma série ● Em 1994, Dilonei Melara escreveu uma carta ● O delegado José Tadeu Vargas, da polícia catarinense,
de mortos por encomenda dentro dos presídios. Nos ao então governador, Alceu Collares, negando denunciou, em 1994, que a Falange Gaúcha teria
dez primeiros meses daquele ano, foram pelo menos denúncia feita por outros presos de que ele ramificações naquele Estado. Os principais elos
20. Na maioria dos casos, era simulado suicídio por estaria planejando o seqüestro da primeira-dama, seriam dois irmãos do assaltante Carlos Jefferson dos
enforcamento. Neuza Canabarro. Santos, o Bicudo (morto naquele ano).

Um especialista em fugas cinematográficas


O tempo passava, e a bandido, em mais de 20 primeira e a segunda
fuga de Dilonei Francisco anos de crimes. A fugas da Penitenciária
Melara ia se tornando o primeira foi em 1985, do Estadual de Charqueadas
maior motivo de dor-de- Presídio Regional de (Pec), até então
cabeça para a polícia. As Passo Fundo. No período considerada de segurança
informações anônimas em que esteve foragido, máxima.
continuavam causando ganhou fama como Em 1991, Melara
confusão. Melara era criminoso cruel ao liderou uma fuga em
visto de Norte a Sul, de resgatar seu comparsa massa do Presídio
Leste a Oeste do Rio João Clóvis de Oliveira Regional de Bagé. Três
Grande do Sul, em Santa Vieira, o Topo Gigio, de anos depois, embora
Catarina, Paraná, no um escolta em um ônibus estivesse na Penitenciária
Uruguai e na Argentina. da Expresso Caxiense, em de Alta Segurança de
Tornara-se um pesadelo uma ação que resultou Charqueadas (Pasc), teve
que atormentava na morte de dois agentes importante participação
Ônibus foi populações de diferentes penitenciários. no motim realizado no
palco de duplo cidades e lugarejos. Nos dois anos Hospital Penitenciário, na
assassinato em Era a sexta fuga do seguintes, protagionizou a Capital.
1985

Ficava pouco tempo longe das grades Execução durante a noite


Embora fosse um Dia 25 de janeiro de 2005:
especialista em fugas, eram 21h40min quando
Melara não ficava muito moradores de uma colônia
tempo longe das grades. japonesa no interior de Dois
Em sua segunda fuga da Irmãos ouviram mais de dez
Pec, em 1987, depois de tiros. Em seguida, um carro
resistir por uma semana partiu em alta velocidade.
com um tiro na perna, Na manhã seguinte, o
sem qualquer zelador de um sítio
atendimento médico, ele encontrou o cadáver de
embarcou em um táxi, em um homem. À sua volta,
Viamão. Desconfiado que Preso por havia um boné, um celular
não receberia o dinheiro acaso em e um óculos de sol , todos
da corrida, o taxista Viamão ensangüentados, além de
acionou a Polícia oito estojos de munição de
Rodoviária Estadual. pistola.
Mesmo sem reconhecê- A perícia constatou que o
lo, patrulheiros o rosto estava desfigurado por
encaminharam à 2ª tiros. Havia mais de 20
Delegacia de Polícia, onde perfurações de balas – 11
um inspetor se de entrada e nove de saída –
surpreendeu: em outras regiões da cabeça,
– Mas é o Melara – barriga e nádegas.
disse o policial. Em um compartimento com
um fecho, no boné, havia um
● Caiu nas mãos de papel com uma declaração a
dois peões Melara, com o desejo de que
Deus o protegesse.
Da fuga de Bagé,
participaram mais cinco
Recapturado ● Teve o mesmo destino Três fases
presos que, aos poucos, de antigos companheiros do bandido
foram recapturados. por peões em
Melara, enquanto isso, São Gabriel No Departamento Médico Legal
resistia a um cerca de foram constatadas tatuagens espalhadas pelo corpo:
mais de cem policiais civis uma cruz no lado esquerdo do peito, uma caveira na
e militares. Quinze dias coxa direita e as palavras “amor”, “ódio” e “vingança”
depois, porém, ele foi escritas na perna esquerda. Por fim, um exame das
capturado em São Gabriel impressões confirmou: o corpo era de Melara.
por dois peões de Morria um mito, o presidiário mais emblemático da
estância, que o história do sistema penitenciário gaúcho e o bandido
entregaram à polícia. que virou sinônimo de criminalidade no Estado.
Em 1994, pôs em Acabava a Falange Gaúcha, organização que, durante
prática um plano que lhe duas décadas, comandou vidas e determinou mortes
permitiu sair da Pasc, com dentro e fora de presídios.
um motim realizado no Melara, agora, passava a fazer parte da mesma
Hospital Penitenciário. Na estatística da qual já faziam parte Jocélio, Vico, Pedro
fuga, ele e outros dois Adelar, Prego, Professor, Baleia, Alemão Arno, Toco,
bandidos acabaram se Anão, Carioca, Topo Gigio, Linn, Piá, Paulinho Escort,
confinando com reféns no Alemão Frida, Bicudo, Betinho Boró, Pureza, Sarará da
Hotel Plaza São Rafael, Vó, Nauro Boró, Jorginho da Cruz e tantos outros,
onde só lhes restou uma Após a rendição como ele, condenados e executados pela mesma
alternativa: a rendição. no Plaza sentença informal de morte.

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