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CADERNO DE RESUMOS
VII Jornada Discente do PPGMPA
21 a 24 de agosto de 2018
Auditório A do CTR ECA/USP
SAO PAULO - SP
VII Jornada Discente do PPGMPA
21 a 24 de agosto de 2018
Auditório A do CTR ECA/USP
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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
ESCOLA DE COMUNICAÇOES E ARTES
PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇAO
EM MEIOS E PROCESSOS AUDIOVISUAIS
Coordenação: Profa. Dra. Esther Hamburger
Vice-Coordenação: Profa. Dra. Irene Machado
Secretaria do PPGMPA: Ellen Elza Pereira
DEPARTAMENTO DE CINEMA, RÁDIO E TV - CTR
Chefia de Departamento: Prof. Dr. Almir Antonio Rosa
Vice-chefia de Departamento: Prof. Dr. Eduardo Santos Mendes
Comissão de Coordenação de Curso
Titular: Prof. Dr. Rubens Arnaldo Rewald
Suplente: Prof. Dr. Roberto Franco Moreira
Secretaria do Departamento: Ivone Vantini
COMISSÃO VII JORNADA DISCENTE
Alexandre Gomes do Nascimento
Anna Karinne Martins Ballalai
Carolina Azevedo Di Giácomo
Driciele Glaucimara Custódio Ribeiro de Souza
Maria Luiza Dias de Almeida Marques
Marina da Costa Campos
Thiago Siqueira Venanzoni
DIAGRAMAÇÃO E IDENTIDADE GRÁFICA
Alexandre Gomes do Nascimento
Aline Rabelo Santos Luiz
LOGOMARCA E IDENTIDADE VISUAL
Ivan Santaella
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APRESENTAÇAO
A Jornada Discente do PPGMPA tem proporcionado, ao longo de sete anos, um
espaço de interação acadêmica e diálogo em suas diversas instâncias: entre os
estudantes, professores e funcionários. E pela segunda vez é organizada pelos
próprios discentes do programa. Sempre refletindo nas melhorias e também
alçando novos passos, esta sétima edição apresenta um formato diferente dos
anos anteriores: contemplará não só as apresentações das pesquisas de seus pós-
graduandos, como também algumas preocupações comuns que serão
transformadas em mesas especiais no período noturno.
A primeira dessas inquietações está relacionada com as dúvidas sobre a pesquisa
e a escrita acadêmica. Para isso, reuniremos os Professores do Programa de Pós-
Graduação em Meios e Processos Audiovisuais da ECA/USP, Professores do
Departamento de Cinema, Rádio e TV e os próprios discentes do programa para
uma conversa onde serão lançadas questões iniciais para se pensar as próprias
práticas investigativas e de redação no campo da Comunicação e do Audiovisual.
Muitas destas angústias são oriundas não somente pelas incertezas dos caminhos
percorridos, mas também pelo trabalho solitário da escrita e das auto exigências
quanto à qualidade do texto. Por isso, convidamos o Prof. Dr. Robson Nascimento
da Cruz, da Faculdade de Educação da UFMG, que apresentará a palestra “O pacto
elitista das Ciências Humanas e o sofrimento com a escrita acadêmica como
estratégia de controle social”. Em um contexto de vários casos de depressão e
suicídio dentro da Academia, é necessário destinar um tempo para se pensar a
saúde física e mental de nossos pós-graduandos.
A noite destinaremos um espaço também para a exibição de curtas-metragens dos
alunos do programa de pós, com o intuito de divulgar os trabalhos artísticos deste
corpo discente que vai além dos projetos de pesquisa. Por fim, para encerrar a
Jornada Discente, propomos um debate para se pensar o passado, o presente e
futuro da universidade pública com a questão das ações afirmativas. Jupiara
Castro, fundadora do Núcleo de Consciência Negra da USP, a artista audiovisual e
pesquisadora do PPGMPA Lyara Oliveira, a realizadora e também pesquisadora
do Programa Lygia Pereira discutirão o percurso de tais ações e os desafios para
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implantá-las dentro das instituições públicas, como a própria USP. A conversa será
mediada pela jornalista e mestre pelo PPGMPA, Mariana Queen.
Nos períodos matutinos e vespertinos, a programação da Jornada ficará por conta
das apresentações das pesquisas dos discentes do PPGMPA. Serão 12 mesas
com as seguintes temáticas: Mesa 1 – Crítica e historiografia;; Mesa 2 – Imersão e
Espectatorialidade;; Mesa 3 – O audiovisual em diálogo com outras artes;; Mesa 4 –
Estilos e processos criativos;; Mesa 5 – Ensaísmo e experimentação no cinema;;
Mesa 6 – Visibilidades contemporâneas;; Mesa 7 – Mulheres no audiovisual;; Mesa
8 – Montagem e procedimentos narrativos;; Mesa 9 – Imagens do Corpo;; Mesa 10
– O audiovisual em tempos de comunicação digital;; Mesa 11 – Política, cultura e
audiovisual;; e Mesa 12 – Representações da mulher no audiovisual.
Tanto a organização das mesas quanto os nomes que lhes definem partem de um
trabalho cuidadoso de aproximar as pesquisas que apresentam questões-
problemas comuns assim como também aproximar as três linhas de pesquisa do
programa: História, teoria e crítica;; Poéticas e técnicas;; e Cultura Audiovisual e
Comunicação. E o que guiou o percurso de organização da Jornada Discente é,
justamente, a aproximação e integração entre os pós-graduandos. Nossos sinceros
agradecimentos à Coordenação do PPGMPA, Profa. Dra. Esther Império
Hamburger, e a vice Profa. Dra. Irene Machado;; à Chefia do Departamento de
Cinema, Rádio e TV, Prof.Dr. Almir Antonio Rosa e à Vice-Chefia Prof. Dr. Eduardo
Simões dos Santos Mendes;; aos Coordenadores de Curso, o Titular Prof. Dr.
Rubens Arnaldo Rewald e o Vice-Titular Prof. Dr. Roberto Franco Moreira;; aos
professores do PPGMPA e do CTR;; à secretária do PPGMPA Ellen Elza Pereira;; à
secretária do PPG-AV, Karina de Andrade;; à secretária do Departamento CTR,
Ivone Vantini;; à assessora interna de comunicação da ECA, Susana Sato;; à
produtora de eventos da ECA, Maria de Lourdes Bianchi Avila, e sua estagiária,
Raquel Lustosa;; à Vivi Muller, Victor Shirai e Daniel Alves, da secretaria do CTR.
Sem o apoio de vocês esta jornada não seria possível. Que esta seja, mais uma
vez, uma jornada de interação, conhecimento e de conexão discente! Sejam bem-
vindos!
Comissão Organizadora
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11h00 – 11h20 – Coffee break
11h20-13h20 MESA 2 – Imersão e Espectatorialidade
· Espectatorialidade nos simuladores cinematográficos de viagem do primeiro cinema no
Brasil – Carolina Azevedo Di Giacomo
· Para além do quadro: Estratégias de expansão da imagem no audiovisual contemporâneo
– Lyara Oliveira
· As imagens múltiplas de museus contemporâneos e espaços expositivos: uma imersão
Sci-nestésica – Lívia Machado
· A EXPERIÊNCIA DO INTERATOR: mídias digitais, interatividade e suportes imersivos no
documentário – Bruno Rogerio Silva Passos Machado
· O Design Audiovisual aplicado à criação de produções sonoras e audiovisuais – Daniel
Gambaro
Comentadora: Prof. Dra. Lúcia Monteiro
13h20 –14h30 – Pausa para o almoço
14h30-16h30 MESA 3 – O audiovisual em diálogo com outras artes
· Visita de Katherine Joyce ao Museu de Nápoles em Viagem à Itália: Montagem, tempo e
movimento – Nikola Matevski
· Imagens circulantes, ideias ressurgentes: a migração como método analítico nos estudos
de cinema – Driciele Glaucimara Custódio Ribeiro de Souza
· Da arte de ver e de mostrar: sobre técnica e estética em Cézanne (1989), filme de Huillet-
Straub – Dalila Camargo Martins
·Aparte, Melodrama e Comentário Político em “House of Cards” – Giancarlo Casellato
Gozzi
· O encontro entre linguagens na narrativa gráfica “Maciste no Inferno” (1983), de Valêncio
Xavier – Daniel Felipe E. L. Fonseca
Comentadora: Profa. Dra. Irene Machado
16h30-16h50 – Coffee break
16h50-18h50 MESA 4 – Estilos e processos criativos
· O mundo documentado de Albert Kahn: expressão e sentido nas imagens em cores dos
Arquivos do Planeta – Tássia Caroline Zanini
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· Por um Cinema Corsário – Bruno Vieira Lottelli
· Abel Ferrara e a transição no estilo cinematográfico norte-americano – Rafael Dornellas
Feltrin
· O Cinema de Michael Mann: o autoral e o político na Hollywood contemporânea – Lucas
do Valle Pereira
· “Justiça”: Reflexos e Refrações de uma cinematografia realista – Alexandre Gomes do
Nascimento
· A teoria de Eisenstein e a direção de fotografia – Taís de Andrade e Silva Nardi
Comentador: Prof. Dr. Atílio Avancini
19h30 – MOSTRA de curtas-metragens dos discentes do PPGMPA
23 DE AGOSTO (Quinta-feira)
09h-11h MESA 5 – Ensaísmo e experimentação no cinema
· Destruir os monumentos: o super8 no Brasil e no México nos anos 1970 – Marina da
Costa Campos
· O duelo de Andy Warhol e Marie Menken: por uma arte anti-romântica? – Ivan Amaral
· Afinidades eletivas: alquimia e informe no cinema de Jürgen Reble – Rodrigo Faustini
dos Santos
· Rio-desborde: ensaio imagético das enchentes nas cidades de São Paulo e Santiago de
Chile – Vivian Javiera Castro Villarroel
· Rocha que voa: uma aproximação entre filme e memória – Carolina Gonçalves Pinto
Comentador: Prof. Dr. Henri Gervaiseau
11h00-11h20 – Coffee break
11h20-13h20 MESA 6 – Visibilidades contemporâneas
· Estética da Cultura Hip-Hop – Elenildes Dantas
· Jornalismo Visual: as imagens vencedoras como representação de minorias no Prêmio
Vladimir Herzog – Beatriz Gomes Furtunato
· O estigma do jovem em conflito com a lei no cinema e na televisão – Caio Túlio Padula
Lamas
· Mataram meu irmão: em busca do sujeito e da visibilidade periféricos – Aline Silva de
Senzi
· Comparação do New Queer Cinema com filmes LGBT atuais: a fascinação continua? –
Ricardo Sant’Anna, Mariana Suzuki e Angelo Lopez
Comentadora: Profa. Dra. Esther Hamburger
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13h20 –14h30 – Pausa para o almoço
14h30-16h30 MESA 7 – Mulheres no audiovisual
· Helena Ignez e o caso Belair: a atriz/produtora e a produção experimental – Anna
Karinne Martins Ballalai
· Trajetória da direção cinematográfica de Helena Ignez – Gabriela Maruno
· A experiência pioneira de Rita Moreira – Lívia Perez
· A ressignificação no cinema de found footage feito por mulheres – Clara Bastos
Comentadora: Profa. Dra. Mariana Souto
16h30- 16h50 – Coffee break
16h50-18h50 MESA 8 – Montagem e procedimentos narrativos
· A repetição no cinema brasileiro moderno: notas introdutórias – Alexandre Wahrhaftig
· O cinema de Arthur Omar: Triste Trópico (1974) e o inventário nacional – Natalia
Belasalma de Oliveira
· A montagem na obra de Satoshi Kon – Matheus Pinto Biscaro
· Um Dia na Vida: material gravado como filme para pesquisas futuras – Juliana Penna
· Paraísos artificiais: o documentário como tratamento do fato na era eletrônica e digital –
Douglas Galan
· A montagem e a composição de vídeos performances generativas – Bruno Mascena
Comentadora: Profa. Dra. Cecília Mello
19h30 – PALESTRA: O pacto elitista das Ciências Humanas e o sofrimento
com a escrita acadêmica como estratégia de controle social
Prof. Dr. Robson Nascimento da Cruz (FAE/ UFMG)
24 DE AGOSTO (Sexta-feira)
09h-11h MESA 9 – Imagens do Corpo
· Entre corpo e personagem: pessoa, figura, presença – João Vitor Resende Leal
· Ecos do canto: voz, corpo e melodrama – Felipe Ferro Rodrigues
· A Rosticidade na Arte Contemporânea: a procura pela imagem-sensação no mundo da
imageria – Cristina Valéria Flausino
· Corpos Brasileiros em Cena: a Dança Contemporânea no Jornalismo Audiovisual
Especializado – Sofia Franco Guilherme
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· Edgard Navarro e o Corpo do escracho – Geraldo Blay Roizman
Comentador: Prof. Dr. Eduardo Morettin
11h00-11h20 – Coffee break
11h20-13h20 MESA 10 – O audiovisual em tempos de comunicação digital
· O político e o social no cinema brasileiro recente por meio da ancoragem e do engate -
Eduardo Paschoal de Sousa
· Vloggers: o acontecimento comunicacional e o cotidiano na rede social YouTube – Paula
Pires da Silva
· O gesto fotográfico e a comunicação em tempos digitais – Bruna Alves de Queiroga
· O resgate da força expressiva da oralidade na contemporaneidade – a retomada do rádio
consciente – Mário Alves dos Santos Júnior
· A modelização de textos semióticos na construção de identidades estéticas de projetos
transmídia – Gisele Frederico
Comentador: Prof. Dr. Eduardo Santos Mendes
13h20 –14h30 – Pausa para o almoço
14h30-16h30 MESA 11 – Política, cultura e audiovisual
· A Política de Cultura e a Ascensão da Indústria de Televisão no Brasil, 1950-1985 –
Thamyris Almeida
· Mestiços na cultura e na arte – Andréia Guimarães Moura
· Por um audiovisual negro: perspectivas poéticas, técnicas e éticas no filme Zumbi Somos
Nós – Daniel Correia Ferreira Lima
· A imagem partida: fraturas no cinema brasileiro recente – Raul Arthuso
· As fissuras do tempo: práticas coletivas no audiovisual brasileiro contemporâneo –
Thiago Siqueira Venanzoni
Comentador: Prof. Dr. Almir Antônio Rosa
16h30-16h50 – Coffee break
16h50-18h50 MESA 12 – Representações da mulher no audiovisual
· Cleo de Verberena: uma cineasta brasileira – Marcella Grecco de Araújo
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· A criminosa de Lúcio Cardoso em O Crime do Dia e Porto das Caixas – Lívia Azevedo
Lima
· O Movimento Feminino pela Anistia em reportagens da Rede Globo Minas – Marcella
Furtado
· A jornada das heroínas: protagonismo feminino no cinema contemporâneo brasileiro –
Katia Kreutz
· Amélia e a representação da mulher caipira no cinema brasileiro – Erika Amaral
· Mulheres negras no audiovisual: a formação do olhar criativo de realizadoras negras e
suas produções – Lygia Pereira dos Santos Costa
Comentador: Prof. Dr. Rubens Machado Jr.
19h30 – DEBATE de encerramento: Ações afirmativas na universidade
pública
Jupiara Castro – Núcleo de Consciência Negra da USP
Lyara Oliveira – artista audiovisual, professora e pesquisadora
Lygia Pereira – realizadora e mestranda pelo PPGMPA
Mediação: Marina Queen – jornalista e mestre pelo PPGMPA
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SUMÁRIO
MESAS ESPECIAIS ................................................................................... 13
MESA 1 – Crítica e historiografia................................................................ 16
MESA 2 – Imersão e Espectatorialidade.................................................... 23
MESA 3 – O audiovisual em diálogo com outras artes.............................. 33
MESA 4 – Estilos e processos criativos...................................................... 42
MESA 5 – Ensaísmo e experimentação no cinema.................................... 54
MESA 6 – Visibilidades contemporâneas.................................................... 62
MESA 7 – Mulheres no audiovisual............................................................. 70
MESA 8 – Montagem e procedimentos narrativos....................................... 77
MESA 9 – Imagens do Corpo...................................................................... 88
MESA 10 – O audiovisual em tempos de comunicação digital................... 97
MESA 11 – Política, cultura e audiovisual................................................... 104
MESA 12 – Representações da mulher no audiovisual.............................. 113
MESAS ESPECIAIS
21 DE AGOSTO (Terça-feira)
19h30 – Abertura
Roda de conversa: Desafios da escrita acadêmica e da pesquisa em cinema
e audiovisual
Com o corpo docente e respectivas coordenações e chefias do PPGMPA e do
Curso de Cinema e Audiovisual do CTR ECA/USP
22 DE AGOSTO (Quarta-feira)
19h30 - MOSTRA de curtas-metragens dos discentes do PPGMPA
23 DE AGOSTO (Quinta-feira)
19h30 - PALESTRA: O pacto elitista das Ciências Humanas e o sofrimento
com a escrita acadêmica como estratégia de controle social
Prof. Dr. Robson Nascimento da Cruz (FAE/ UFMG)
A condição da escrita enquanto uma ação que será submetida ao olhar alheio é
suficiente para torná-la um ato capaz de gerar algum nível de desconforto
psicológico mesmo no mais habilidoso e seguro dos escritores acadêmicos.
Todavia, nas ciências humanas e sociais não raro o limiar do sofrimento com a
prática textual ultrapassa os limites do suportável psicologicamente. Basta dizer
que a escrita está na centralidade das causas responsáveis pela instauração ou
agravamento de quadros psicopatológicos de acadêmicos e acadêmicas dos mais
diferentes níveis de formação. Tendo em vista este cenário, meu propósito
nesta palestra é argumentar que o mal-estar psicológico com a escrita, nas ciências
humanas e sociais, tem algumas de suas origens nos modos como premissas
românticas e elitistas são reproduzidas no cotidiano acadêmico. Nessa perspectiva,
avalio que o sofrimento com a escrita acadêmica não seria mero sintoma da
incapacidade individual de estudantes e professores, mas sofisticada estratégia de
um sistema social com função bastante definida: impedir a mobilidade e manter
hierarquias sedimentadas no universo acadêmico.
Robson Nascimento da Cruz mestrado em Psicologia pela Universidade Federal
de Minas Gerais (2008), doutorado em Psicologia pela Universidade Federal de
Minas Gerais (2013) e pós-doutorado pela Pontifícia Universidade Federal de São
João Del-Rei (2015) e Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2015-2017).
Atua nos seguintes temas: história e epistemologia da psicologia experimental e
psicologia social, análise do comportamento, métodos qualitativos;; problemas
psicológicos da escrita acadêmica.
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24 DE AGOSTO (Sexta-feira)
19h30 – DEBATE de encerramento: Ações afirmativas na universidade
pública
Jupiara Castro – Núcleo de Consciência Negra da USP
Lyara Oliveira – artista audiovisual, professora e pesquisadora
Lygia Pereira – realizadora e mestranda pelo PPGMPA
Mediação: Marina Queen – jornalista e mestre pelo PPGMPA
Jupiara Castro é fundadora do Núcleo de Consciência Negra da USP, ex-diretora
da FASUBRA Sindical, atualmente é responsável pelo departamento de recursos
humanos do Centro de Saúde Escola Samuel Barnsley Pessoa (CSEB) da
Faculdade de Medicina da USP, trabalha na universidade desde 1985.
Lyara Oliveira é artista audiovisual, professora, pesquisadora, produtora e diretora
de TV. Doutoranda na ECA-USP no Programa de Meios e Processos Audiovisuais.
Mestra em Artes Visuais na Faculdade Santa Marcelina com bolsa FAPESP.
Atualmente é professora nos cursos de graduação e na pós-graduação em
Comunicação no Centro Universitário Belas Artes de São Paulo e na FAAP -
Fundação Alvares Penteado.
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QUARTA-FEIRA, 22 DE AGOSTO
9h00 – 11h00
MESA 1: CRÍTICA E HISTORIOGRAFIA
A companhia produtora Amazônia Cine-film e Silvino Santos:
problematização de fontes autobiográficas
Sávio Luis Stoco
Email: saviostoco@gmail.com
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa:História, Teoria e Crítica
Orientador: Eduardo Victorio Morettin
Resumo expandido
Apresentaremos uma revisão de fontes acerca da história da companhia produtora
Amazônia Cine-film (ACF), sediada em Manaus, na qual trabalhou o
documentarista Silvino Santos (1886-1970) no final da década de 1910. Se não a
única, essa foi uma das principais iniciativas formalmente constituída que produziu
e circulou filmes no contexto da primeira crise da borracha na Amazônia brasileira.
Seus trabalhos foram exibidos em cinemas não apenas da capital amazonense,
bem como em Belém e São Luís. Trata-se de um empreendimento valorizado na
historiografia relativa às primeiras experiências cinematográficas do cineasta. No
entanto, após a divulgação da primeira pesquisa acadêmica sobre Silvino, ou seja,
a dissertação escrita por Selda Costa (1988;; publicação em livro, 1997), houve
cristalização do conhecimento sobre essa companhia.
O motivo dessa cristalização talvez se relacione ao fato de que o momento de maior
popularidade na trajetória de Silvino no Brasil seja posterior, alcançado com No
paiz das Amazonas (1922) - realizado por outra firma, a J. G. Araújo. Assim, no que
tange a ACF, não houve outras investidas de pesquisa, a não ser textos que
sintetizaram fontes secundárias. Trabalhando, sobretudo a partir de dados oriundos
do relato autobiográfico de Silvino (1969), os dois livros de Costa No rastro de
Silvino Santos (1987) e Eldorado das ilusões (1997) incorreram em imprecisões. O
caderno de memórias do cineasta, apesar de central para compreensão da
trajetória do cineasta, apresenta erros identificáveis, como é passível no caso dos
relatos memoriais. Baseando-nos em fontes ainda não analisadas, buscaremos
contribuir para precisar e aprofundar a história da ACF. Dentre outros aspectos,
questionaremos a data de 1917 para o início da companhia, defendendo a ideia
que isso ocorreu em 1918.
Apresentaremos o nome formalizado da firma, à qual a ACF (nome fantasia) se
ligou;; bem como o nome dos três sócios, importantes exportadores de borracha.
Membros estes que diferem, em parte, dos apresentados na autobiografia. Por
meio do discurso indireto dos sócios, publicado em jornal, acessaremos os
objetivos da produtora com relação ao plano de produzir o filme que se chamaria
Amazonas, maior rio do mundo (1920). Neste ponto chegamos ao cerne de nossa
revisão: defenderemos que esse filme foi estratégico para os negócios dos sócios
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e da Associação Comercial do Amazonas instituição na qual o trio ocupou
importantes cargos - diferente da ideia idealizada de um “sonho de Silvino”, como
consta na autobiografia e obteve adesão de pesquisadores, marcando a
historiografia. No repertório da companhia, ainda promoveremos reordenação e
incluiremos um título, creditado à J. G. Araújo. Estudando o repertório em
perspectiva, reconheceremos dois significativos filões temáticos: o relativo à região
amazônica e outro peruano que irão acompanhar a obra de Silvino até No rastro
do Eldorado (1925). Concluiremos chamando atenção para os obstáculos das
fontes autobiográficas.
Palavras-chave
Cinema brasileiro;; produtora cinematográfica;; Silvino Santos.
Bibliografia
COSTA, Selda. Eldorado das ilusões: cinema & sociedade: Manaus (1897-1935).
Manaus: Edua. 1996.
_________;; LOBO, Narciso. No rastro de Silvino Santos. Manaus, Governo do
Estado, 1987.
DAOU, Ana Maria. A belle époque amazônica. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.
MELLO, Márcia. O império comercial de J. G. Araujo e seu legado para a Amazônia
(1879-1989). 2010. Disponível em: <https://www.
academia.edu/4543993/O_Imperio_comercial_de_J.G._Araujo_e_seu_legado_pa
ra_ama zonia>. Acesso em: 29 nov. 2013.
MORETTIN, Eduardo. Tradição e modernidade nos documentários de Silvino
Santos. In: PAIVA;; SCHVARZMAN. (org.). Viagem ao cinema silencioso do Brasil.
RJ: Beco do Azougue, 2011.
SANTOS, Silvino. Romance da minha vida. Manuscrito (Museu Amazônico,
Manaus), 1969.
SOUZA, Márcio. A expressão amazonense: do colonialismo ao neocolonialismo.
Manaus, Valer. 2010.
__________. Silvino Santos: O cineasta do ciclo da borracha. Manaus, Edua/Valer,
2007.
Walter da Silveira, historiador do cinema brasileiro
Claudio Leal
Email: claudioleal1@yahoo.com.br
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Mateus Araújo Silva
Resumo expandido
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O crítico baiano Walter da Silveira (1915-1970) exerceu regularmente a crítica entre
1942 e 1970, em Salvador. Fundador do Clube de Cinema da Bahia, ele
desenvolveu a análise do moderno cinema europeu e um ensaísmo voltado para a
história do cinema brasileiro. Os temas da autenticidade do filme e do estilo
nacionais se intensificaram nos ensaios críticos da década de 1950, que
mobilizaram a teoria do subdesenvolvimento ao articular história e economia.
A definição do filme brasileiro, a crítica da autoimagem deformada do país e o
exame dos embaraços da indústria nacional do cinema vão pautar as reflexões de
Walter. Episódios relevantes da história do cinema brasileiro adensaram as
reflexões teóricas do crítico sobre autenticidade e independência, condições
objetivas e subjetivas do filme brasileiro, industrialização, colonialismo cultural e
uso da paisagem na aclimatação temática.
A crítica integrava-se ao sistema delineado por Walter para a saída do cinema
brasileiro do estado de alienação, deficiência técnica e imaturidade estética. Neste
trabalho, apresentaremos os pontos decisivos das reflexões historiográficas de
Walter. Glauber o situava no centro do pensamento do cinema brasileiro moderno,
ao lado de Alex Viany e Paulo Emílio Sales Gomes.
Palavras-chave
cinema brasileiro;; Walter da Silveira;; Glauber Rocha.
Bibliografia
ROCHA, Glauber. Revisão crítica do cinema brasileiro. São Paulo: Cosac Naify,
2003.
______. Revolução do cinema novo. São Paulo: Cosac Naify, 2004.
SILVEIRA, Walter da. A história do cinema vista da província. Salvador: Fundação
Cultural do Estado da Bahia, 1978.
_________. O eterno e o efêmero. Salvador: Oiti Editora, v.1, 2 e 3, 2006.
O método histórico de Jean-Claude Bernardet em Cinema brasileiro:
propostas para uma história
Bárbara Felice
Email: babi.felice@gmail.com
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Eduardo Victorio Morettin
Resumo expandido
Para compreender o método e o pensamento histórico de Jean-Claude Bernardet
apresentado em Cinema Brasileiro: propostas para uma história, analiso, além do
texto final do livro publicado em 1978, o manuscrito do livro, a correspondência
entre o autor e os editores e textos ensaísticos publicados pelo autor em períodos
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e que tenham relação direta com as discussões realizadas no livro.
A primeira
edição de Cinema brasileiro: propostas para uma história, lançada em 1979,
contém, logo após a ficha catalográfica, um indício da história de feitura do texto:
“Em 1977, Guy Hennebelle e Alfonso Gumucio Dagron pediram-me um texto sobre
o cinema brasileiro para incluir num livro sobre cinema latino-americano a ser
editado na França e na Espanha. O presente livro é uma ampliação desse texto.”
O projeto mencionado é o livro Les cinémas d'Amérique Latine, lançado em 1981,
que, curiosamente, não contém nenhum texto de autoria de Jean-Claude
Bernardet: o responsável pelo capítulo que trabalha cinema brasileiro é Paulo
Paranaguá. Há, no entanto, documentos no Arquivo Jean-Claude Bernardet,
depositados na Cinemateca Brasileira, que apontam caminhos: uma pasta na qual
se encontra um manuscrito enviado aos editores Hennebelle, Dagron e Lherminier
com um bilhete: "Material elaborado para capítulo de Les cinémas d'Amérique
Latine, e que não foi aceito pelo editor". Levantarei na apresentação questões
suscitadas pelos editores e por Bernardet e que se manifestaram nos manuscritos
trocados e nas correspondências que acompanharam o processo textual.
Também serão discutidas as questões de método que se apresentam a partir da
comparação do quarto e quinto capítulos de Cinema Brasileiros: propostas para
uma história, respectivamente Novo ator: o Estado e O proletariado aparece lá onde
não estava sendo procurado, com textos publicados pelo autor em periódicos ativos
na época de lançamento do livro. São eles “Os operários no rumo do cinema
nacional”, de 5 de outubro de 1978, “Zézero X o fantasma da castração”, de
primeiro de janeiro de 1973, “A encruzilhada do cinema político”, de vinte três de
abril de 1973, uma nota de falecimento de um operário em um set de filmagem e
críticas de jornal, presentes principalmente depois da segunda metade da década
de 1970, que comentam o filme histórico e as relações entre o Cinema e Estado.
Palavras-chave
Crítica, história, cinema brasileiro.
Bibliografia
Bernardet, Jean Claude. Cinema brasileiro: propostas para uma história. Editora
Companhia das Letras, 2009.
HENNEBELLE, Guy;; DAGRÓN, Alfonso Gumucio. Les cinémas de l'Amérique
latine.. CinemAction, 1981.
Panorama Histórico do Cinema Japonês de Cunho Sobrenatural
Cláudio Augusto Ferreira
Email: claudio.ferreira@usp.br
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Esther Imperio Hamburger
Resumo expandido
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O cinema chega ao Japão em 1897, apenas dois anos após a primeira exibição
pública do cinematógrafo dos Irmãos Lumière. Os primeiros filmes eram exibidos
com o acompanhamento de um narrador (benshi), que tinha a função de explicar
para os japoneses as imagens do cotidiano ocidental e dar colorido aos esquetes
narrativos. Os primeiros filmes rodados no Japão vieram logo depois;; eram
documentais e mostravam cenas do cotidiano, ruas movimentadas, danças
tradicionais e outros espetáculos.
Salvo futuras descobertas, o filme de teor narrativo mais antigo a ter sobrevido é
Momijigari (Contemplação das Folhas de Outono), de Shibata Tsunekichi (1850–
1929), filmado em 1899. O curta-metragem registra cenas do drama dançante de
kabuki homônimo, no qual o samurai Taira no Koremochi derrota um demônio da
montanha e, dessa forma, dá início à História do Cinema Japonês de Cunho
Sobrenatural.
Os filmes japoneses de cunho sobrenatural têm uma base sólida nos
teatros tradicionais do Japão – nô, bunraku (teatro de bonecos) e kabuki – e
também nas literaturas setsuwa e kaidan.
Em seus primórdios, o cinema japonês
teve por referência formal majoritária o teatro kabuki e, por quase duas décadas,
manteve-se bastante diferente dos outros cinemas nacionais, que tinham por base
os cinemas narrativos americano e europeu. A pesquisadora Keiko I. McDonald
reitera a influência determinante do teatro tradicional japonês sobre o cinema
japonês: “Os críticos usualmente identificam as três principais características do
início do cinema japonês como onnagata ([homens] interpretadores de mulheres),
benshi (comentadores) e tomadas longas centro-frontais seguindo uma
continuidade estrita” (McDONALD, 1994, p. 23). Dessa forma, os filmes do primeiro
cinema japonês são como peças filmadas a partir da plateia e apresentadas quase
sem cortes – as filmagens carecem de roteiro e o fluxo narrativo dos filmes é ditado
pelo benshi.
Na década iniciada em 1910 isto começa a mudar, tanto pelo surgimento do
sistema de estúdio – Nikkatsu foi fundada em 1912 e Shôchiku em 1920 – quanto
pelos experimentos com técnicas importadas do ocidente (primeiro plano,
montagem paralela etc.). Isto vem a culminar no melodrama Rojô no reikon (Almas
na estrada), dirigido por Murata Minoru em 1921 e considerado o primeiro filme
japonês a ser diretamente influenciado pelo modelo de cinema americano
(BALMAIN, 2008).
Nesta segunda fase do cinema japonês, os filmes se aproximam
mais dos produzidos no resto do mundo, mas ainda mantêm características
próprias. Como defende Nöel Burch (1982), enquanto o cinema ocidental se
identifica com a profundidade, a centralidade e a continuidade, a tradição
cinematográfica nipônica deste período privilegia a planicidade, a descentralidade,
a descontinuidade e serve de contraposição aos códigos de edição do cinema
dominante.
É preciso ressaltar que desde o início o cinema esteve sujeito à
censura imperial de ideias ocidentais, de pornografia e de atitudes de oposição ao
imperador e ao governo. Com a crescente militarização do Japão, uma terceira fase
de censura imperial rígida e propaganda de valores nacionalistas se instaura no
cinema japonês durante a Guerra do Pacífico e é substituída por uma quarta fase
de censura americana e propaganda de valores ocidentais durante o Período de
Ocupação (1945-1952) (HIRANO, 1992).
20
Com o fim da ocupação, diretores como Ozu, Mizoguchi e Kurosawa, ainda que
promovendo valores ocidentais como o empoderamento das mulheres, promovem
uma nova busca pela japonicidade, incorporando em suas obras muitos elementos
das tradições japonesas. Nesta fase, vemos em relação ao cinema de cunho
sobrenatural uma proliferação de filmes que adaptam narrativas ou personagens
do período Edo, frequentemente com o termo kaidan (história extraordinária)
fazendo parte do título (HARAGUCHI, MURATA, 2000;; IZUMI, 2000). Esta quinta
fase do cinema japonês de cunho sobrenatural dura mais ou menos até o final da
década de setenta e é simultânea ao surgimento dos filmes de kaijû (monstros
gigantes), da nûberu bâgu (nouvelle vague) japonesa e dos filmes pink (eróticos
não-explícitos).
Nas décadas de 1980 e 1990 a produção de filmes contendo
fantasmas e outros seres sobrenaturais é mais comedida e esporádica. Esta sexta
fase termina com o surgimento e a popularidade mundial do J-Horror, que a partir
de filmes como Ringu (1998), Juon (2000) e suas respectivas adaptações
americanas – O Chamado (2002) e O Grito (2004) – foram capazes de fazer o onryô
(fantasma vingativo) feminino se tornar parte do imaginário mundial
contemporâneo.
A produção de filmes de J-Horror (sétima fase) tem se tornado
mais esparsa na última década, mas com os aprimoramentos – a evolução e
consequente barateamento – da tecnologia de computação gráfica, a adaptação
massiva de narrativas originárias dos mangás, animes e videogames, além da
produção de continuações de franquias, vem se tornando uma tendência aparente
e poderia ser até mesmo entendida como uma oitava fase.
Palavras-chave
cinema fantástico;; cinema japonês;; fantástico sobrenatural;; História do Cinema;;
estudos comparativos.
Bibliografia
BALMAIN, Colette. Introduction to Japanese horror film. Edinburgh: Edinburgh
University Press, 2008. xi, 214 p., il. ISBN 9780748624751.
BURCH, Noël. Pour un observateur lointain: Forme et signification dans le cinéma
japonais. Paris: Gallimard, 1982. 392 p., il. ISBN 207021429X. (Cahiers du
Cinéma).
HARAGUCHI, Tomô;; MURATA, Hideki (coords.). Nihon kyôfu (horâ) eiga e no
shôtai (Convite para o cinema de terror japonês). Tokyo: Heibonsha, 2000. 144 p.,
il. ISBN 4582943462.
HIRANO. Kyôko. Mr. Smith Goes to Tokyo: Japanese Cinema under the American
Occupation, 1945-1952. Washington: Smithsonian Institution Press, 1992. 400 p. il.
ISBN 9781560984023.
IZUMI, Toshiyuki. Ginmaku no hyakkai: honchô kaiki eiga taigai (Cem estórias
estranhas na tela prateada: quase todos os filmes fantásticos deste país). Tokyo:
Seidosha, 2000. 343, 37 p. ISBN 4791758099.
McDONALD, Keiko Iwai. Japanese classical theater in films. London: Associated
University Presses, 1994. 355 p. ISBN 0838635024.
21
A crítica retórica de P. Adams Sitney
Lucas Bastos Guimarães Baptista
Email: lucasbaptista2205@gmail.com
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Cristian da Silva Borges
Resumo expandido
O crítico e historiador norteamericano P. Adams Sitney tornou-se uma referência
incontornável nos estudos de cinema em meados dos anos 1970, quando publicou
seu primeiro livro, Visionary Film: The American Avant-Garde (Nova York: Oxford
University Press, 1974). O papel central de Sitney na editoria da revista Film Culture
e na fundação do Anthology Film Archives, bem como sua familiaridade com as
obras e os autores do cinema experimental, fizeram de seu trabalho um verdadeiro
paradigma de investigação e teorização sobre os filmes da chamada vanguarda
americana. A influência da poesia romântica é fundamental na morfologia proposta
por Sitney;; uma influência reconhecida já no início de sua carreira, desenvolvida
posteriormente em outras publicações, e que é frequentemente a ligação mais fértil
entre seu vocabulário e as referências declaradas de seus objetos.
Há uma segunda rede de influências, entretanto, menos explorada mas não menos
importante, que deriva da crítica literária. Estudioso de filologia e aluno de nomes
como Harold Bloom, Leo Spitzer e Paul De Man, Sitney recorre à terminologia da
crítica literária e a procedimentos mais usuais no tratamento de composições
verbais em alguns de seus textos sobre cinema. É sobretudo uma atenção à
estilística e à poética que surge em suas análises – mais especificamente, em suas
análises de obras narrativas que não se enquadram no cânone estabelecido por
sua exegese do cinema experimental. Em comentários sobre Dimitri Kirsanov,
Aleksandr Dovzhenko e Robert Bresson, Sitney identifica figuras de linguagem e a
emergência de um estilo a partir da utilização consistente dessas figuras;; vistos em
conjunto, estes comentários apontam para uma abordagem retórica da composição
fílmica. Quais as operações formais preferidas por um cineasta? Como essas
operações podem representar operações de linguagem ou de pensamento, num
sentido mais amplo? Em que medida o filme, mesmo sem recurso à palavra,
constrói neste processo algo como um discurso? São estas questões, centrais no
pensamento cinematográfico e tratadas anteriormente por autores como Sergei
Eisenstein e Jean Mitry, que retornam de maneira concentrada em certos artigos
de Sitney.
Esta apresentação propõe uma visão de conjunto da produção de Sitney voltada
para este tópico. Serão mencionados os textos com suas principais referências
literárias e serão mostrados trechos de filmes que exemplificam algumas de suas
análises.
Palavras-chave:
P. Adams Sitney, Crítica cinematográfica, Estética cinematográfica, Retórica.
Bibliografia
22
SITNEY, P. Adams. “Cinematography vs. the Cinema: Bresson’s Figures”, in
QUANDT, James (ed.), Robert Bresson (revised). Toronto: TIFF, 2011.
__________. “Dimitri Kirsanoff”, in ROUD, Richard (ed.), Cinema: A Critical
Dictionary, Vol. II. Nova York: Viking Press, 1980.
__________. “Dovzhenko’s Intellectual Montage”, in The Essential Cinema: Essays
on the films in the collection of Anthology Film Archives. Nova York: Anthology Film
Archives, 1975.
__________. Modernist Montage: The Obscurity of Vision in Cinema and Literature.
Nova York: Columbia University Press, 1990.
__________. The Cinema of Poetry. Nova York: Oxford University Press, 2015.
__________. “The Idea of Abstraction”, Film Culture, 63-64 (1977).
__________. “The Rhetoric of Robert Bresson”, in The Essential Cinema: Essays
on the films in the collection of Anthology Film Archives. Nova York: Anthology Film
Archives, 1975.
11h20 – 13h20
MESA 2: IMERSÃO E ESPECTATORIALIDADE
Espectatorialidade nos simuladores cinematográficos de viagem do primeiro
cinema no Brasil
Carolina Azevedo Di Giacomo
Email: ninagiacomo@gmail.com
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Eduardo Victorio Morettin
Resumo expandido
Os simuladores de viagem Auto-Tours (e depois Cinema-Automóvel), que
passaram pelas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre entre os anos
de 1907 e 1908, foram um tipo de entretenimento cinematográfico muito diferente
do que estamos acostumados a chamar de sala de cinema. Nestes aparelhos, os
espectadores atuavam como passageiros de viagens fictícias. Eles se sentavam
em um carro cenográfico enquanto, numa tela à frente, eram projetados filmes
captados em veículos percorrendo ruas de grandes cidades norte-americanas e
europeias.
Durante a primeira década da história do cinema brasileiro, depois da
chegada dos primeiros filmes em 1896, eram os exibidores ambulantes que,
passando pelos teatros já tradicionais, mostravam as imagens em movimento,
comumente trazidas do estrangeiro. As casas de entretenimento, não dedicadas
exclusivamente ao cinema, ofereciam várias outras atrações não-fílmicas ao
23
público, como peças teatrais, atrações circenses, espetáculos de variedades,
campeonatos de luta etc. Se os ambientes de exibição do primeiro cinema já eram
muito diferentes do que se consolidou alguns anos depois, os simuladores de
viagem estão mais longe ainda da definição tradicional de sala de cinema.
A atração do aparelho parece estar justamente na possibilidade de o espectador,
que provavelmente nunca havia sentado em um automóvel, tomar contato com a
excitação sensorial da cidade moderna, de uma perspectiva privilegiada e segura.
Era comum que os filmes exibidos usassem determinados tipos de vistas, como a
passagem por túneis ou pontes, o que enfatizava a sensação de que o espectador
podia compartilhar seu ponto de vista com o do veículo.
A atração surgiu em 1905,
em um parque de diversões dos Estados Unidos como uma forma de
entretenimento barato sob o título de Hale’s Tours and Scenes of the World,
simulando viagens de trem. Os filmes eram acompanhados pelo balanço dos
assentos, efeitos sonoros e ventiladores que simulavam o vento que uma viagem
real produziria no interior do vagão. Nos anos seguintes, a atração se espalhou por
diferentes países, chegando inclusive ao Brasil, até desaparecer em meados dos
anos 1910.
Os simuladores cinematográficos de viagem foram um tipo de sala de cinema
diferente do que o público estava acostumado a ver. Eles seguiam a tradição dos
panoramas que utilizavam telas pintadas para dar a impressão, no espectador, de
estar tomando parte em uma viagem por lugares distantes. Ao contrário do que
ocorria nos Hale’s Tours americanos, que eram frequentados por membros das
classes baixas, os simuladores brasileiros Auto-Tours e Cinema-Automóvel
participaram da tentativa de elevação da sala de cinema a um espaço digno da
presença da elite. O sucesso das atrações nos Estados Unidos e na Europa,
independentemente das classes sociais que lá a frequentavam, parece ter sido o
suficiente para divulgá-las aqui como atrações apropriadas a um público
considerado inteligente e civilizado.
Palavras-chave:
Primeiro cinema;; espectatorialidade cinematográfica;; distinção social.
Bibliografia
DI GIACOMO, Carolina Azevedo. O espectador como passageiro: os simuladores
de viagem do primeiro cinema no Brasil (1906-1908). Vivomatografías. Revista de
estudios sobre precine y cine silente en Latinoamérica, n. 1, Dezembro de 2015,
pp. 6- 32. Disponível em:
<http://www.vivomatografias.com/index.php/vmfs/article/view/11>. Acesso em:
27.06.2018.
GAUTHIER, Philippe. The movie theater as an institutional space and framework of
signification: Hale’s Tours and film historiography. In: Film History 21, n. 4, 2009.
MUSSER, Charles. The Railway Subgenre: Spectator as Passenger. In: Before the
Nickelodeon: Edwin S. Porter and the Edison Manufacturing Company. Berkeley /
Los Angeles / Oxford: University of California Press, 1991.
SEVCENKO, Nicolau. A capital irradiante: técnica, ritmos e ritos do Rio. In:
NOVAIS, Fernando A. (Coord.-geral);; SEVCENKO, Nicolau (Org.). História da vida
24
privada no Brasil. República: da Belle Époque à Era do Rádio. Vol. 3. São Paulo:
Companhia das Letras, 1998.
Para além do quadro: Estratégias de expansão da imagem no audiovisual
contemporâneo
Lyara Oliveira
Email: lyara.oliveira@usp.br
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: Poéticas e Técnicas
Orientador: Patrícia Moran Fernandes
Resumo expandido
Estamos entrando em uma nova era de possibilidades de recursos visuais ou
estamos dando continuidade a uma vertiginosa espiral de experimentações visuais
já conhecida? Os elementos visuais balizadores de uma cultura do audiovisual tem
que ser reinventados? Conhecer e pesquisar os usos contemporâneos do
audiovisual, em particular da produção de conteúdo para as práticas de construção
de experiências imersivas que fazem uso da linguagem e das tecnologias
audiovisuais, é a proposta da presente pesquisa.
O objeto da pesquisa são as práticas contemporâneas de produção do audiovisual,
mais especificamente a criação de filmes em realidade virtual com o uso de
recursos de captação e processamento de vídeo em 360º.
O conteúdo audiovisual produzido com tecnologia de vídeo em 360º pode ser
experimentado com o uso de dispositivos móveis, com óculos de realidade virtual
ou a partir de interações diretas com a tela de exibição. Essa interação possibilita
ao usuário acessar as imagens de um ponto de vista único (o da câmera que fez a
imagem) com uma amplitude de 360º. Dentro desse ambiente imersivo o usuário
escolhe para onde quer olhar durante o tempo da interação. Documentários, vídeo
clips, vídeos publicitários, vídeos demonstrativos e educativos além de instalações
artísticas e experimentações tecno-poéticas, têm sido concebidos com essa
tecnologia.
Para atingir o objetivo propomos uma leitura transversal na história da produção
audiovisual começando no cinema, passando pela televisão, pelo vídeo e
chegando até as mídias digitais, realizando assim um exame conceitual e de
aplicação prática dos elementos de composição da imagem audiovisual.
Compondo um banco de informações sobre as experiências com novas práticas de
produção audiovisual.
Para pensar essas novas práticas audiovisuais, entendemos como crucial a
compreensão da presença do corpo nessas experiências e como a construção de
conteúdos audiovisuais para essas novas práticas deve refletir a presença do corpo
e a elaboração de conteúdos imagéticos que extrapolam o enquadramento e a
referência material e de linguagem da tela. Alguns conteúdos audiovisuais
contemporâneos estão sendo construídos para serem experimentados com o corpo
25
como um todo. Conteúdos que exigem estímulos sensoriais, que questionam a
noção convencional de presença uma vez que nos transportam para espaços
virtuais.
A experimentação estética no audiovisual sempre esteve, de certo modo, ligada a
apreensão perceptiva que, de uma forma ou de outra, está ligada à questão do
corpo e do espaço. É viável articular uma forma outra de compreender a apreensão
audiovisual? Privilegiando a percepção sensória pelos sentidos em detrimento de
uma intepretação racional formadora de sentido? Ou de estabelecer ao menos uma
aceitação da possibilidade desses diferentes modos de estar no mundo, ser afetado
por ele e apreendê-lo.
Nesse questionamento, a ideia de estar com as coisas, estar em um ambiente e
estabelecer com esse ambiente uma relação permeada de sensibilidade é a
proposta do pesquisador Hans Ulrich Gumbrecht. Gumbrecht pensa e reflete sobre
essa relação a partir da materialidade do encontro e pensa também a relação que
se estabelece de um modo não necessariamente interpretativo. Nos interessa
nessa pesquisa manter uma proximidade com essas reflexões, expandindo-as e
questionando-as em uma proposta de compreender suas possíveis conexões com
a prática audiovisual contemporânea.
O esquadrinhamento teórico e a análise de obras de artistas e realizadores do
audiovisual é acompanhado de uma proposta de investigação prática, de criação e
produção de conteúdo audiovisual. O que propomos é a criação de um ambiente
imersivo multissensorial para experimentação e fruição de um conteúdo audiovisual
que está sendo produzido durante o desenrolar da pesquisa, a obra
DISPORÁTICAS.
DIASPORÁTICAS é uma experiência imersiva que coloca o usurário como
participante de um jogo cênico. Tentando promover uma imersão sensorial para
provocar uma reação de empatia crítica com as colocações de vivências de seis
personagens. Em um ambiente cênico neutro, seis mulheres negras formam uma
cena onde expressam suas emoções a respeito de diferentes experiências de
deslocamento forçado de seus países de origem até o Brasil, as personagens
representam desde mulheres foram escravizadas até as refugiadas
contemporâneas, criando uma alegoria sobre deslocamento e territorialidade ao
mesmo tempo em que apresenta esses conceitos dentro da aplicação audiovisual
na construção de ambientes virtuais.
A pesquisa busca analisar as práticas contemporâneas de produção de conteúdo
audiovisual em uma tentativa de compreender como os tradicionais usos de
elementos da chamada linguagem audiovisual precisam ser repensados e
reconfigurados na concepção de conteúdos audiovisuais para exibição em
plataformas tecnológicas que exibem imagens de ampla cobertura.
Palavras-chave:
audiovisual imersivo, linguagem audiovisual, presença, sensorialidade.
Bibliografia
AUMONT, Jacques. Teorias dos cineastas, As. Campinas: Papirus, 2004.
26
___________ et al. Estética do filme, A. Campinas: Papirus, 2007.
BELLOUR, Raymond. Entre-imagens. Campinas: Papirus,1997.
DUBOIS, Philippe. Cinema, vídeo, Godard. Tradução de Mateus Araújo Silva. São
Paulo: Cosac Naify, 2004.
GUMBRECHTBRECHT, Hans Ulrich. Produção de presença: o que o sentido não
consegue transmitir. Rio de Janeiro: Contraponto;; PucRio, 2010.
MACHADO, Arlindo. Pré-cinemas & Pós-cinemas. Campinas: Papirus,1997.
__________. 1993. Máquina e imaginário: o desafio das poéticas tecnológicas. São
Paulo: Edusp, 1993.
MARTIN, Marcel. A linguagem cinematográfica. Tradução de Vasco Granja, Lauro
Antonio. São Paulo: Brasiliense, 2003.
MELLO, Christine. Extremidades do Vídeo. São Paulo: Editora SENAC, 2008.
XAVIER, Ismail (1977). O Discurso Cinematográfico. Opacidade e Transparência.
Rio de Janeiro: Paz e Terra.
YOUNGBLOOD, Gene. Expanded Cinema. New York: Dutton, 1970.
As imagens múltiplas de museus contemporâneos e espaços expositivos:
uma imersão Sci-nestésica?
Lívia Machado
Email: liviamachado@usp.br
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: Cultura e Comunicação Audiovisual
Orientador: Irene de Araújo Machado
Resumo expandido
Museus contemporâneos e espaços expositivos artísticos podem ser lidos como
lugares de imagens inseridas em contextos de transformações culturais e
potencialidades técnicas e artísticas de sua época. O cinema, as experimentações
curatoriais, as tecnologias eletrônicas e digitais e distintos movimentos artísticos
entraram e foram utilizados pelo museu e por galerias de arte, ressignificando uma
ideia anterior desses espaços, limitada ao imaginário de objetos tridimensionais.
Nesse contexto surge o problema das dinâmicas e estéticas da configuração das
imagens nesses lugares e de novas possibilidades de experiência e imersão do
observador nessas imagens.
A imagem será considerada nesta pesquisa como o contexto, a técnica de
representação, criação, recreação e desdobramento da produção sígnica, não se
restringindo à sua especificidade visual e podendo também ser sonora, degustativa,
tátil, mental, etc. A imersão, por sua vez, será estudada como um efeito do ato
perceptivo do signo e seu desdobramento enquanto interpretante. Dessa forma,
não haveria imagem percebida pela mente interpretadora que não fosse imersiva.
27
No entanto, as possibilidades de imersão seriam diferentes para cada sugestão
estética e interativa.
A hipótese seria que a experiência entre visitante interator e imagens múltiplas nos
museus contemporâneos e espaços artísticos expositivos se encaminharia para
vez mais para uma imersão “sci-nestésica” – expressão que serviria como
neologismo e ponto de partida para correlacionar três planos diferentes que seriam
investigados na tese e que se atravessariam enquanto imagens que se deslocam
– a “cinestesia” de um cinema que transborda e o movimento da imagem em suas
multitelas;; a “sinestesia” multissensorial dos estímulos da audiovisualidade e da
ressonância e reverberação de sua ambiência;; e da noção de “science-fiction” e da
ciência como forma artística de recriar pensamentos e divagações a partir de
ferramentas de entretenimento criativo e, em alguns casos, pedagógicas. A relação
com a imagem e a iconicidade seriam os principais fatores da experiência estética
nesses lugares.
O termo “cinestesia” vem da etimologia do grego “kinaísthesis”1, junção entre
“kine”, que significaria “movimento” e “áiesthesis”, que seria a “sensação,
capacidade de sentir”. Se pensarmos no cinema e no lugar na imagem como um
espaço cinemático, podemos perceber que a exposição da luz e ritmo de
alternância nessas exposições geram cadência. O cinema enquanto cinestesia
seria dispositivo e instrumento para observar o funcionamento e a dinâmica do
movimento das imagens múltiplas nos museus e nas multitelas. Nesse cenário
também poderia ser observada uma aproximação dos campos “cinema” e “museu”,
proporcionando ao visitante interator - experiência distintas das vividas
anteriormente nesses lugares separadamente.
O termo “sinestesia” surge da palavra “synaísthesis” formado pela noção de “syn”,
que representação a sugestão de união, com a “áisthesis”, relação de sensações,
para sugerir. A experimentação das diversas emoções aparenta ser encontrada na
ressonância da vibração sonora desses espaços, potencialmente táteis, e os
desdobramentos por todo o corpo pelo conjunto artístico. A “audiovisualidade” das
dinâmicas na imagem será interpretada e questionada enquanto uma combinação
e não enquanto soma “visual” e “sonora”. O espaço ressonante, “un limite invisible
entre el espacio visual y el acústico”. (MCLUHAN, 1996, p.22)
Por fim, a sugestão do “sci-“ serviria para pautar o pensamento da imersão a partir
de dois sentidos distintos: o “sci-fi” proposto pelos enredos de ficção futurista, que
lidam com especulações de universos habitados por seres e máquinas com
inteligência artificial e, por outro lado, a noção de ciência, com uma perspectiva
pedagógica da geração de conhecimento em ambientes educativos. Para indagar
se e como essa imersão sci-nestésica aconteceria serão estudadas instalações
expositivas em espaços culturais como CCBB, Sesc, Instituto Moreira Salles, entre
outros e os oito museus mais visitados do Brasil. A fim de questionar similaridades
nesses três campos será proposto um diagrama e estudos das linguagens e das
dinâmicas em questão, tendo como referências metodológicas e analíticas a
gramática especulativa da semiótica perceana e a semiótica da cultura.
Palavras-chave
Imagens, Sinestesia, Sci-nestesia, Interatividade, Museu.
28
Bibliografia
FLUSSER, Vilém. O universo das imagens técnicas. São Paulo: Annablume, 2009.
HEIDEGGER, Martin. A época das imagens do mundo. Disponível em:
http://ghiraldelli.pro.br/wp-content/uploads/Heidegger-A-%C3%89poca-das-
Imagensde-Mundo.pdf
LOTMAN, Iuri. La Semiosfera I. Semiótica de la cultura y del texto. Madrid: 1996.
MACHADO, Irene. Experiências do Espaço Semiótico. In: Estudos da Religião,
v.29, n.1, 13-34, jan-jun, 2015. Disponível em:
http://dx.doi.org/10.15603/21761078/er.v29n1p13-34
MACHADO, Lívia. Comunicação Imersivas dos museus: a semiótica em
AuschwitzBirkenau e no Museu da Língua Portuguesa. Dissertação para obtenção
de título. UFJF, 2016.
MANOVICH, Lev. The language of New Media. Cambridge: MIT Press, 2002.
McLUHAN, Marshall. La aldea global. Tradução de C. Ferrari. Barcelona: Gedisa,
1996.
MURRAY, Janet H. Hamlet no Holodeck. São Paulo: Itaú Cultural: Unesp, 2003.
PEIRCE, C. S. (1931-1958). Collected Papers. Volume 1-8. Cambridge: Harvard
University Press.
A EXPERIÊNCIA DO INTERATOR: mídias digitais, interatividade e suportes
imersivos no documentário
Bruno Rogerio Silva Passos Machado
Email: bruno.rpm@gmail.com
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: Poéticas e Técnicas
Orientador: Almir Antônio Rosa
Resumo expandido
Ansiamos trabalhar com a mídia nativa dos computadores para realizar aquilo que
fazemos com o cinema e o qual temos chamado de documentário. Este é um
trabalho que se questiona como transpor para esta outra mídia a mesma prática
que utiliza a linguagem cinematográfica para falar. Por conseguinte, este é um
trabalho que também olha para a semiótica. Pois partimos do pressuposto de que
se buscamos falar, comunicar, expressar um ponto de vista sobre o mundo
concreto, acreditamos então que devemos, primeiramente, entender como estas
funções são realizadas. Como nos expressamos? Ou melhor, como podemos nos
expressar? Assim, revelamos que este trabalho olha para esta disciplina em busca
de uma base que nos ajude na transposição apontada logo a cima. Isto é, este
olhar não é inocente, ele espera encontrar neste domínio os conhecimentos que
clareiam o mecanismo da voz do documentário para, então, propor direções
29
possíveis para a estruturação de uma voz através dos elementos oriundos do
computador como mídia.
Desta maneira, em uma escrita atenta, estruturaremos nosso texto em função de
expressarmos estas ideias, este pontual interesse. Assim, veremos alguns
preceitos de semiótica que dão conta de caracterizar os signos, a linguagem e a
comunicação. E será a definição do texto artístico como um texto criado com
densidade, onde todos os elementos da linguagem mostram-se aptos a se
tornarem peças significantes para um mesmo quebra-cabeça, que manteremos
nossa atenção. Por fim, a percepção da existência de uma dimensão da linguagem
que trabalha com a analógica, e não com a lógica, abre nossos caminhos para
demarcar, tomando o cinema como paralelo, um estudo sobre as possibilidades da
mídia do computador como linguagem.
No campo do documentário, exploraremos e nos aprofundaremos na sua dimensão
de discurso acerca do mundo histórico, seu caráter de construção de um argumento
através da organização de imagens audiovisuais de base cinematográfica.
Esperamos focar nosso olhar em um modo de representação do documentário
onde a presença da voz carrega uma intensa carga reflexiva através da constante
demarcação da subjetividade do documentarista na construção do seu argumento
sobre o mundo concreto. É por viés da subjetividade que nos concentraremos na
continuidade da discussão. Dele, avançamos para falar dos ensaios-fílmicos, obras
que aparentam tornar o papel do discurso cada vez mais o ponto central, cada vez
mais demarcado, ao ponto de permitir que a subjetividade seja refletida na sua
própria estrutura, nas imagens áudio e visuais e nas suas organizações.
Ao final destes dois tópicos, esperamos indicar intersecções e novos caminhos,
principalmente no que concerne a possibilidades informativas e estéticas. Como
dito, esperamos representar com estes escritos a nossa hipótese de que o trabalho
com a dimensão analógica da linguagem é uma resposta para o nosso desejo em
estruturar no campo das mídias computacionais uma voz semelhante a que temos
construída no domínio do documentário. Nesta linha, imaginamos a discussão
seguinte tendo uma função dupla: ao propormos uma metodologia de análise, uma
que leva em consideração o embate entre a lógica e a analógica, estaremos tanto
aplicando o conteúdo apresentado anteriormente quanto também avançando para
a demonstração prática desta hipótese, já que será nele que buscaremos
apresentar as ferramentas que nos auxiliará no momento que nos debruçarmos
sobre nossos objetos.
No momento da análise, esperamos um efeito retroativo. Primeiramente, com o
método de análise proposto anteriormente, iremos olhar para nossos objetos no
intuito de reparar como estão presentes neles os elementos das mídias
computacionais. Ansiamos para demarcar maneiras que os elementos de mídia
podem ser semantificados, ou seja, esperamos encontrar exemplos de como eles
podem ser organizados para, analogicamente, remeter a alguma informação, ou
qualidade específica, tratada no domínio do conteúdo. Ao tempo, em segunda
ordem, ao escolhermos três obras que utilizam abordagens distintas, mas que
dialogam no meio e no assunto, esperamos ser capazes de encontrar semelhanças
entre elas, possíveis de serem resultantes da mídia do computador, de onde,
30
tomando nosso entendimento do conceito de sistema modelizante, poderemos
destaca-la como uma linguagem.
Em conclusão, ao final, esperamos dar vida ao tal efeito retroativo mencionado. Ao
conectar esta última informação com o aquilo que foi tratado no primeiro capítulo
da dissertação, construímos assim um texto que ilustra o desempenho da mídia
computacional de agir como uma linguagem, ao apontar tanto o seu caráter
modelizante quanto o seu caráter modulador. Ao fazer essa asserção, esperamos
então voltar para nosso desejo de falar do mundo histórico, entretanto, agora, com
uma outra linguagem já assimilada, uma que leva o cinema a outras aventuras.
Palavras-chave:
Documentário, Interatividade, Imersão, Mídia, Linguagem.
Bibliografia (Máximo de 1000 caracteres)
ALMAS, Almir. Televisão digital terrestre: sistemas, padrões e modelos. São Paulo:
Alameda, 2013.
DELEUZE, Gilles. Pintura: el concepto de diagrama. Buenos Aires: Cactus, 2012.
EISENSTEIN, Sergei. O princípio cinematográfico e o ideograma. In: CAMPOS,
Haroldo de (org.). Ideograma: Lógica. Poesia. Linguagem. São Paulo: Cultrix, 1977.
EISENSTEIN, Sergei. A forma do filme. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1990.
GERVAISEAU, H. A.: Escrituras e figurações do filme ensaio. In: TEIXEIRA,
Francisco Elinaldo. O Ensaio no Cinema, São Paulo: Hucitec, 2015, p. 92-118.
LOTMAN, Iuri. Estrutura do texto artístico. Lisboa: Estampa, 1978.
MANOVICH, Lev. The Language of New Media. Cambridge. MIT, 2001.
NICHOLS, Bill. Introdução ao Documentário. São Paulo: Editora Papirus, 2008.
NICHOLS, Bill. A voz do documentário. In: RAMOS, Fernão Pessoa (org.). Teoria
contemporânea do cinema. Vol. 2. São Paulo: Editora Senac, 2005.
O Design Audiovisual aplicado à criação de produções sonoras e
audiovisuais
Daniel Gambaro
Email: dgambaro@usp.br
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: Cultura e Comunicação Audiovisual
Orientador: Eduardo Vicente
Resumo expandido
Este artigo propõe o Design Audiovisual (DA), uma proposta de fluxo processual
de análise e produção, como um modelo metodológico capaz de atender aos
desafios e oportunidades vigentes no ambiente midiático contemporâneo. A
introdução de mecanismos e ambientes baseados na internet (como websites,
31
mídias sociais, aplicativos etc.) acrescentou novos hábitos de consumo de mídia,
incluindo uma maior simultaneidade na realização de atividades desse tipo por
parte dos indivíduos. Além disso, filmes, programas de rádio e TV, podcasts e
vídeos online passaram a contar com uma maior atividade de fãs.
Dentro dessas circunstâncias, torna-se necessária uma ferramenta de análise e
produção que possibilite compreender as formas e significados atribuídos
historicamente durante o ato de fazer e consumir mídias audiovisuais e sonoras,
mas que também consiga vislumbrar formas atualizadas de consumo. Ou seja, o
produtor e o crítico de mídia devem ser capazes de compreender diferentes
instâncias de fruição de uma mesma obra, delimitadas institucionalmente (cinema,
rádio, TV, web), mas ancoradas nas tecnologias disponíveis.
É hipótese central deste trabalho que um modelo como o Design Audiovisual, por
incorporar um conjunto de conhecimentos e métodos de disciplinas como os
Estudos de Mídia e estudos das Interações Humano-Computador, ajuda a quebrar
padrões instituídos e possibilita uma compreensão mais abrangente das
possibilidades trazidas pelas novas ferramentas de comunicação.
A metodologia
do DA, em desenvolvimento em conjunto com pesquisadores da UFPB, descreve
elementos e atores envolvidos na circulação da produção audiovisual, com vistas
a diferenciar posições assumidas pelos indivíduos e possibilitar estratégias
complementares, porém direcionadas a cada posição. As pessoas que se
relacionam com o conteúdo são classificados de acordo com quatro papéis que
podem assumir durante a fruição: Audiência, o nível mais básico de atividades,
como simplesmente sintonizar um canal de TV ou baixar um podcast;; Sintetizador,
o conjunto de pessoas que cujas atividades básicas são o comentário e o
compartilhamento de informações, por exemplo, sobre o filme ou programa
assistido;; Modificador, pessoas que se apropriam e criam novos conteúdos a partir
do original, alteram aspectos (como paródias) ou participam ativamente da
produção;; e Produtor, isto é, o criador ou criadores de conteúdo original,
independentes ou trabalhando para uma instituição como uma emissora de rádio
ou uma produtora de cinema. Cada um desses quatro papéis pode ser elevado a
Player, que é o indivíduo que utiliza todos os recursos disponíveis dentro de um
nível.
A mudança de um papel a outro ocorre a partir da aquisição de competências pelos
indivíduos, e são motivadas a partir de Gatilhos de Ação ou de Inércia, isto é,
affordances planejadas pelas instâncias produtoras para promover mais
engajamento ativo, ou mais atenção concentrada. Conectando os papéis e
definindo o planejamento do produto existem quatro Linhas de Design: do
Conteúdo, que se refere à obra audiovisual ou sonora e as interfaces de consumo;;
da Identidade, da Motivação e da Experiência.
O trabalho analisará dois conjuntos midiáticos a partir da metodologia do Design
Audiovisual. O primeiro observa as estratégias interativas da Rádio GaúchaZH,
especialmente após a junção da emissora de rádio e do jornal impresso em uma
única empresa, com consequente reforço das ferramentas digitais (website, mídias
sociais e aplicativo para celular). O outro exemplo é a observação das estratégias
transmidiáticas do programa de humor Tá no Ar: A TV na TV, da Rede Globo.
32
Como conclusões preliminares, observa-se um avanço no contato com a audiência
online, e uma breve tentativa de transformação da Audiência em Sintetizadores,
porém as ações são, ainda, muito limitadas. No caso da emissora de rádio, durante
a programação faltam Gatilhos de Ação que envolvam o ouvinte a participar
ativamente das redes na web (por meio do compartilhamento ou do comentário). A
disponibilização assíncrona de conteúdo, da mesma forma, conta com as
affordances naturais das mídias sociais para se propagarem. Assim, a emissora
acaba por valorizar demais o ouvinte do tipo Audiência e pouco projeta sua
transformação em Sintetizador. Já o Tá no Ar, apesar de trabalhar Gatilhos de
Inércia enquanto é transmitido, avança na atividade dos fãs a partir da incorporação
de estratégias on line melhor elaboradas. Por outro lado, cria grande dificuldades
de modificação por parte dos fãs e pouco estende o conteúdo em outros canais
além da TV, mídia de referência.
Palavras-chave:
Design Audiovisual;; Rádio;; Televisão;; Interatividade
Bibliografia (Máximo de 1000 caracteres)
BECKER, V.;; GAMBARO;; D;; RAMOS, T.S. Audiovisual Design and the
Convergence Between HCI and Audience Studies. In KUROSU, M. (ed.) Human-
Computer Interaction. User Interface Design, Development and Multimodality. HCI
2017. Cham: Springer, 2017. p. 3-22 (Lecture Notes in Computer Science, vol.
10271). doi: 10.1007/978-3-319- 58071-5
GAMBARO, D. et al. “The Development of Individuals’ Competencies as a
Meaningful Process of the Audiovisual Design Methodology”. In: KUROSU, M. (ed.)
Human- Computer Interaction: Theories, Methods and Human Issues - Part I. HCI
2018. Lecture Notes in Computer Science, vol. 10901. Cham: Springer, 2018, pp.
1-14. DOI: 10.1007/978-3-319-91238-7_6.
JENKINS, H.;; FORD, S.;; GREEN, J. Cultura da Conexão: criando valor e significado
por meio da mídia propagável. São Paulo: Aleph, 2014.
14h30 – 16h30
MESA 3: O audiovisual em diálogo com outras artes
Visita de Katherine Joyce ao Museu de Nápoles em Viagem à Itália:
Montagem, tempo e movimento
Nikola Matevski
Email: nikola.matevski@gmail.com
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Mateus Araújo Silva
33
Resumo expandido
Beaubourg, L cente d’art Georges Pompidou (1977) representa uma das raras
ocasiões na filmografia de Roberto Rossellini em que obras de arte dispostas em
museus são visadas diretamente pela câmera. Algo semelhante ocorre em outras
duas ocasiões: nos 25 minutos finais do episódio 11 da série La lotta del uomo per
la sua soprevivvenza (1973) e na sequência de visita de Katherine Joyce ao Museu
Arqueológico de Nápoles em Viagem à Itália (1954). Nessa comunicação, pretendo
me concentrar nesse último exemplo, tecendo observações a respeito da
montagem e da mobilização do ponto de vista, bem as diferentes formas de fixação
do tempo no cinema e na escultura.
Os filmes de Rossellini deste período não são, ao contrário do que o legado crítico
pode fazer parecer, avessos à montagem. Mostrar “a realidade que está aí” jamais
deixou de requerer o corte, como pode ser constatado nos 465 planos de Viagem
à Itália. O desconforto de Rossellini, no fundo, nunca foi com o corte propriamente
dito, mas com a convenção que fez dele o recurso da narração, enquanto elemento
de ligação entre dois planos, e uma figura da subjetivação do ponto de vista, dentro
da cena. Em Viagem à Itália, essas duas exigências são deslocadas nas
sequências do museu (como também dentro das catacumbas e em frente ao gesso
revelado em Pompéia). Rossellini promove nesses momentos uma separação
radical entre as personagens e os objetos enigmáticos do passado. O corte viola a
lógica do olhar, quebrando o eixo entre a personagem e o objeto percebido.
Instaura-se assim um colapso do raccord enquanto instrumento de ligação, criando
uma perda de significado relacionada à falência da costura ficcional no seio da
alteridade, entre o sujeito e o outro. Essa perda de significado corresponde, para
Katherine e Alex Joyce, a uma impossibilidade de se situar na lógica de um tempo
e de uma memória que garantiria o elo entre passado e futuro.
No caso específico da visita de Katherine ao museu, essa lacuna persiste e é
acentuada. O plano que visa as estátuas é liberado num tatear exploratório cujo
movimento se insere como um enxerto no tecido ficcional, diluindo a narração e
expandindo o campo. As esculturas não são encaradas como unos indivisíveis,
como é comum, por exemplo, nas fotografias totalizantes dos livros didáticos de
história da arte, que adotam uma vista única do objeto e, com frequência, o isolam
da arquitetura expositiva – penso, por exemplo, no compêndio ilustrado de H.
Janson. O plano do filme é, ao contrário, parcial e analítico, seccionando a peça
para explorar sua dinâmica formal.
O correlato inalienável, cinematográfico, desse procedimento encontra-se na
duração, que é como uma injeção de tempo aplicada ao instante fixado pela
estátua. Se o equilíbrio do Sátiro ébrio, do Sátiro adormecido ou do Suplício de
Dirce, mostrados na cena, prenunciavam um instante seguinte, da inevitável queda
do corpo, aqui trata-se justamente de realizar esse tempo aludido, que não pertence
mais à figura, mas ao observador engajado em sua visada. Esse sujeito
observador, no entanto, é aquele pressuposto no ponto de vista que determina o
plano e a imagem. Aéreo e volúvel, ele não impõe uma unidade ordenada e legível
ao campo, mas abstrai o espaço na alternância entre as estátuas e Katherine.
A vista parcial e seletiva, aliada ao movimento na duração, abala a dimensão
unívoca das figuras, desprendendo-as do “classicismo” de uma unidade ordenada
34
e significante, desmembrando-a em partes e cortando os laços de fixidez com o
chão. Desafiando a gravidade e levitando pelo espaço, o ponto de vista inscreve a
escultura no celuloide como um suspense da matéria plástica, especialmente nos
closes do Suplício de Dirce. A composição resultante é marcada por um tempo
casual, guiado pela duração do olhar, que visa o particular dentro do geral,
delimitado com as bordas e ativando o espaço adjacente, centrífugo. O simbólico é
assim submetido ao plástico: não podemos ver nem ter tempo de interpretar os
objetos que adornam a Hércules ou reparar nos animais encravados no suporte de
Suplício. O que há de indicial e alusivo ao movimento nas estátuas, como sugeria
Laura Mulvey, dobra-se no olhar mediado do plano que possui um critério próprio
de inscrição do tempo e do movimento no celulóide. Tal critério não se restringe
apenas à duração propriamente dita, mas também ao olhar variável que não busca
o controle desses objetos, mas uma ação contingente às formas, curvando-se à
sedução de seus volumes.
A divisão do todo em partes não é uma desarticulação brusca ou confronto, mas
gesto que se deposita na superfície escultural para reter sua beleza mais
elementar. Não há, sob esse viés, qualquer ambição inequívoca de uma leitura
traduzida por uma sintaxe do cinema aplicável a uma arte clássica codificável, mas
a exploração mais solta e direta das formas. A arte nesse caso não “diz” porque
ela, afinal, não é ventríloqua de discursos, mas um fenômeno do mundo que aqui
se torna plenamente vivo.
Palavras-chave:
Viagem à Itália, Roberto Rossellini.
Bibliografia
BERGALA, Alain;; NARBONI, Jean (Orgs.) Roberto Rossellini. Paris, Editions de
l’Étoile/Cahiers du Cinéma, 1990.
BANDINELLI, Ranuccio Bianchi. O relevo honorífico e o retrato. In ARGAN, Giulio
Carlo. História da arte italiana: da antiguidade a Duccio – V.1. São Paulo: Cosac
Noify, 2003. P. 194 – 208.
JANSON, Horst Woldemar. A escultura clássica. In: JANSON, Horst Woldemar.
História da Arte. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1998. p. 129-149.
JACOBS, Steven. “Galleries of the Gaze: The Museum in Rossellini’s Viaggio in
Italia and Hitchcock’s Vertigo”. In: Framing Picures: Film and Visual Arts.
Edimburgo: Edinburgh University Press, 2012.
MULVEY, Laura. “Vesuvian Topographies: The Eruption of the Past in Journey to
Italy”. In: FORGACS, David;; LUTTON, Sarah;; NOWELL-SMITH, Geoffrey (Orgs.).
Roberto Rossellini - magician of the real. London: BFI Publishing, 2000.
35
Driciele Glaucimara Custódio Ribeiro de Souza
Email: driciele.souza@usp.br
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Mateus Araújo Silva
Resumo expandido
Método que ainda hoje suscita reações entre historiadores da arte, a tentativa de
retraçar o trajeto percorrido, no tempo e no espaço, pelas imagens encontra suas
raízes, em fins do século XIX, nos estudos de Aby Warburg acerca da influência
das civilizações mediterrâneas na cultura artística do Quatrocentos italiano.
A fim de desvendar o campo de forças atuante na formação da cultura artística da
Renascença, o historiador alemão retomou a retórica gestual das imagens
clássicas, acreditando poder encontrar aí um inventário de pré-formações que
contribuíra para a constituição do estilo renascentista. Às voltas com a questão da
representação da vida em movimento, acreditava Warburg, os artistas mobilizaram
elementos da Antiguidade incrustados na memória social, adaptando-os às
exigências práticas, aos gostos e à mentalidade da sociedade florentina do século
XV. (GINZBURG, 1989, p. 45-46). Momento de intensa perambulação de imagens,
a época entre Piero della Francesca e a escola de Rafael conhece um dinâmico
processo de intercâmbio de valores expressivos, fenômeno de fundamental
importância, segundo Warburg (2015, p. 372), quando se pretende compreender a
transformação das formas artísticas como parte integrante de um amplo processo
de circulação.
Logo, não se tratar apenas do uso artístico de formas de figuração preexistentes,
mas da mobilização de um conjunto de representações materiais amplamente
disponíveis. De modo que, suscetíveis a infindos sistemas de constelações, os
antigos modelos pictóricos, deslocados de seus contextos originários, não eram
acionados artisticamente apenas quando da necessidade figurativa, mas sofriam
verdadeiros processos de “ressemantização”.
Inspirado nas reflexões de Aby Warburg sobre a permanência e a transformação
de valores expressivos no processo de produção de imagens, Jacques Aumont
ajusta aos estudos cinematográficos o procedimento metodológico do historiador
da arte alemão, acreditando que a reconstituição do itinerário percorrido por
determinadas combinações formais permitiria evocar uma afinidade profunda entre
cinema e pintura. Possuidor de uma recente história, o cinema, argumenta o teórico
francês (2005), não buscaria modelos exemplares em seu interior, antes voltar-se-
ia a um longínquo patrimônio figurativo, abrigo de profícuas ideias sobre a
representação. Daí Aumont imaginar a dinâmica dos movimentos migratórios não
como o deslocamento de imagens entre um filme e outro, mas como a transferência
de antigos princípios de pensamento sobre a figuração, formulados como imagem
pela pintura. (AUMONT;; MARIE, 2012, p.189)
Obstinado a revelar estes empréstimos figurativos, levados a cabo pelo cinema,
Aumont dedica-se a examinar o modo segundo o qual situações originalmente
picturais são reinterpretadas e esculpidas por operações essencialmente
36
cinematográficas. Diante do que, considera o autor (2005, p.70), se não raro o
cinema utiliza-se de dispositivos representativos herdados da cultura pictórica, ele
não o faz por meio da reprodução irrefletida de temas e motivos, mas pela
arquitetura de processos dialógicos com a pintura, engendrados pela transição de
problemas e soluções de representação.
Palavras-chave:
cinema e pintura, teoria e estética cinematográfica, cinema europeu, história da
arte, pintura renascentista.
Bibliografia
AGAMBEN, Giorgio. Aby Warburg et la science sans nom. Tradução do italiano
Marco Dell’Omodarme. In: Image et mémoire. Paris: Éditions Hoëbeke, 1998.
(Collection Arts & esthétique)
AUMONT, Jacques. Matière d’images. Paris: Éditions Image Modernes, 2005.
(Collection Inventeurs de Formes, 9)
AUMONT, Jacques;; MARIE, Michel. Dicionário teórico e crítico de cinema.
Tradução Eloísa Araújo Ribeiro. 5a ed. Campinas, SP: Papirus, 2012.
GINZBURG, Carlo. De A. Warburg a E. H. Gombrich: notas sobre um problema de
método. In: Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história. Tradução Federico
Carotti. 2a ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1989. p. 41-93.
WARBURG, Aby. Histórias de fantasmas para gente grande: escritos, esboços e
conferências. Organização Leopoldo Waizbort;; tradução Lenin Bicudo Bárbara.
São Paulo: Companhia das Letras, 2015.
Da arte de ver e de mostrar: sobre técnica e estética em Cézanne (1989), filme
de Huillet-Straub
Dalila Camargo Martins
Email: dalila.c.martins@gmail.com
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Rubens Luís Ribeiro Machado Junior
Resumo expandido
Em 1985, quatro anos antes do lançamento do filme Cézanne (1989), de Danièle
Huillet e Jean-Marie Straub, Gilles Deleuze já reconhecera, em A imagem-tempo,
ser o pintor provençal mestre do casal de cineastas (DELEUZE, 2005, p. 302).
Decerto, engendra-se no média-metragem comissionado pelo Musée d’Orsay,
porém recusado devido a seu cariz demasiadamente autoral, uma equiparação de
ambas as estéticas. Essa equiparação excede o intuito de aproximar da
sensibilidade contemporânea as obras de um século passado, ao elencar outros
autores e dispor materiais heterogêneos, traçando um arco histórico mais amplo
para analisar a problemática da “arte de ver e mostrar” (AUMONT, 1990, p. 104).
37
O filme é dividido em duas partes. Primeiro, introduz-se a estética cézanniana para,
só então, exibirem-se suas obras. “Os dois aspectos mais marcantes da
organização formal de materiais na primeira parte [...] são repetição e variação”
(BÖSER, 2004, p. 162). Na meia-hora inicial, retratos fotográficos de Cézanne ao
trabalho, tirados por André Derain, alternam-se com diferentes vistas
cinematográficas atuais da montanha Sainte-Victoire, motivo dileto de suas
paisagens. Em voz over, Huillet-Straub leem trechos selecionados de Cézanne —
Dialogue avec Joachim Gasquet, uma compilação de conversas ocorridas entre
1896 e 1904, elaborada e publicada pelo poeta e crítico de arte em 1921. Como
respostas alusivas ao conteúdo desses trechos, são inseridas, “sem qualquer cola
de pontuação” (PAÏNI, 2012, p. 209), sequências dos filmes Madame Bovary
(1934), de Jean Renoir, adaptação do romance de Gustave Flaubert, e A Morte de
Empédocles (1987), dos próprios Huillet-Straub, a partir da peça trágica de
Friedrich Hölderlin. Na segunda parte, a leitura continua enquanto nove pinturas
cézannianas aparecem sempre com molduras ou cavaletes em evidência. Por fim,
há um plano documental do edifício parisiense em que Cézanne tinha seu estúdio
no fim da vida.
Assim como os meios fotográficos e cinematográficos empregados contêm já o
problema da impressão caro à estética cézanniana, as referências trazidas por
Huillet- Straub apresentam modos de ver e de mostrar derivados dos assuntos
tratados. Tanto em Madame Bovary quanto em A Morte de Empédocles, as
escolhas de enquadramento performam os estilos das matrizes textuais: planos
médios renoirianos de longa duração com acentuada profundidade de campo e
quadros dentro de quadros equivalem à impessoalidade da escrita flaubertiana;; a
fixidez do plano que segmenta o corpo do ator que interpreta Empédocles ao se
levantar é o gesto huillet-straubiano correspondente à utopia hölderliniana de
comunhão com a natureza diante da separação consumada. Tais problemas
ressoam no preceito cézanniano de olhar para as coisas como se fosse a primeira
vez ou de o artista ser um receptáculo da realidade. Contudo, ao não eliminar
discrepâncias entre o tom lírico das palavras rememoradas por Gasquet e as
pinturas cézannianas, ou ao não escamotear os indícios de urbanização em Aix-
en-Provence, Huillet-Straub apontam para a acúmulo das camadas interpretativas
a que está sujeita toda e qualquer obra ao longo do tempo.
Atenta-se, consequentemente, para a técnica da originalidade desenvolvida por
Cézanne, para seu trabalho de desnaturalização das convenções. A afirmação de
que “é preciso voltar a ser clássico por meio da natureza, ou seja, por meio da
sensação”, não significa outra coisa senão que os pintores não deveriam se ater às
maneiras do passado ao representar a natureza, mas defrontar a tradição com uma
recarga histórica de experiência pessoal. Portanto, o retorno do artista moderno às
fontes criativas não equivaleria a uma eterna repetição, mas, inversamente, ao
resgate da natureza enquanto temporalidade. Em Cézanne and the End of
Impressionism, Richard Shiff conclui que este tipo de atualização das obras
clássicas recomendado por Cézanne era, essencialmente, uma visão
impressionista da própria relação entre estilo expressivo e sensação particular,
segundo a qual os artifícios deveriam ser restringidos com precisão e as técnicas
adviriam do presente vivo.
38
A partir desse processo de depuração dos recursos de linguagem adquiridos
mediante experiência pessoal é que se define o intertexto cézanniano em Huillet-
Straub: “...os Straub livram o texto do máximo de referências culturais e filosóficas
para não reter senão o que, nos supostos propósitos de Cézanne, lhes possa servir.
Em outras palavras, os propósitos com os quais eles identificam seu método como
cineastas.” E se se pode dizer que Huillet-Straub e Cézanne “desejam ser os
primeiros e os mais simples em sua arte” (PAÏNI, 2012, p. 206), não é porque
ambos aspiram ao insight peremptório do estado natural da sensibilidade humana
a se firmar através de um automatismo, mas devido ao trabalho de reconhecimento
da resistência dos materiais, dos limites técnicos e de suas causas, por intermédio
do qual a percepção se modula.
Palavras-chave:
Estética;; Técnica;; Impressionismo;; Jean-Marie Straub;; Danièle Huillet;; Paul
Cézanne
Bibliografia
AUMONT, Jacques. La terre qui flambe. In: PAÏNI, D.;; TESSON, C. (eds.). Jean-
Marie Straub, Danièle Huillet: Hölderlin, Cézanne. Lédignan: Editions Antigone,
1990.
BÖSER, Ursula. “The conscientious observation of things” — reframing Cézanne.
In: The art of seeing, the art of listening: the politics of representation in the work of
Jean-Marie Straub and Danièle Huillet. Frankfurt: Peter Lang, 2004.
DELEUZE, Gilles. A imagem-tempo. São Paulo: Brasiliense, 2005
FRY, Roger.
Cézanne, a study of his development. Nova Iorque: Noonday Press, 1958.
GASQUET, Joachim. Cézanne. Paris: Les éditions Berheim-Jeune, 1921.
MERLEAU-PONTY, Maurice. A dúvida de Cézanne. In: O olho e o espírito. São
Paulo: Cosac Naify, 2004.
PAÏNI, Dominique. Straub, Hölderlin, Cézanne. In: GOUGAIN, Ernesto et al (org.).
Straub- Huillet. São Paulo: CCBB, 2012.
SHIFF, Richard. Cézanne and the end of impressionism – a study of the theory,
technique and critical evaluation of modern art. Chicago: University of Chicago
Press, 1984.
Aparte, Melodrama e Comentário Político em “House of Cards”
Giancarlo Casellato Gozzi
Email: giancarlo.gozzi@usp.br
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Esther Império Hamburger
Resumo expandido
39
Este trabalho consiste na apresentação das conclusões feitas durante a finalização
de minha dissertação, uma pesquisa iniciada em 2016 e centrada na análise da
série televisiva House of Cards (Netflix, Beau Willimon, 2013-). No início
particularmente interessada na relação que o protagonista da série, o deputado
tornado Presidente Frank Underwood, cria com seus espectadores a partir de
monólogos realizados diretamente para a câmera, esta pesquisa se expandiu para
uma interpretação de suas primeiras temporadas, balizada por uma comparação
com um grupo de peças históricas de William Shakespeare e pelos estudos em
torno do melodrama.
A apresentação iniciará, portanto, com uma análise destes apartes do protagonista,
relacionando-os com os apartes de outro protagonista-vilão: Ricardo, o duque de
Gloucester, das peças histórica de Shakespeare “Henry VI, parte 3” e “Ricardo III”.
Esta relação entre os dois personagens, apesar de sua distância histórica,
denuncia a defesa que a série faz de uma atitude pragmática perante a política, ao
positivar as ações de Underwood, por mais amorais que sejam, e criticar
personagens cujas ações sejam consideradas “ideológicas demais”.
Essa dicotomia entre pragmatismo e ideologia será reposta e qualificada a partir da
terceira temporada, quando as ações de Underwood serão contrapostas às de sua
esposa, Claire. Sua cumplicidade com as ações de seu marido começa a ser freada
pela crescente consciência de suas consequências, como quando o enfrenta na
metade dessa temporada por conta do suicídio de um militante LGBT na Rússia.
Essa consciência a fará se distanciar de Frank (chegando a abandoná-lo ao final
da temporada), e pontuará uma diferenciação entre a atitude que os dois
personagens têm perante seus próprios pragmatismos. Enquanto o que Frank
denomina seu “pragmatismo impiedoso” é cada vez mais criticado dentro do mundo
diegético, a atitude de Claire, enquanto um pragmatismo consciente, ou moral, é
positivada. Tal processo chega ao seu clímax ao final da quinta temporada, quando
o establishment político arma para Frank renunciar à Presidência, com Claire
assumindo o cargo.
40
(ZELINSKY, 1988), que a série amplamente defende. Ou seja, um moralismo à
serviço de um Pragmatismo, e não um fim em si mesmo. Essa interpretação de
“House of Cards”, a ser defendida na apresentação, será amparada em uma análise
textual dos episódios das primeiras três temporadas.
Palavras-chave:
“House of Cards”;; Aparte dramático;; William Shakespeare;; Melodrama.
Bibliografia
BROOKS, Peter. The Melodramatic Imagination: Balzac, Henry James, Melodrama,
and
the Mode of Excess. New Haven e Londres: Yale University Press, 1976.
CANDIDO, Antonio. “A culpa dos reis: mando e transgressão no Ricardo II”. In:
NOVAES, Adauto (org.). Ética. São Paulo: Companhia das Letras: Secretaria
Municipal de Cultura, 1992.
GLEDHILL, Christine. “The Melodramatic Field: An Investigation”. In: GLEDHILL,
Christine. (ed.) Home Is Where the Heart Is: Studies in Melodrama and the
Woman’s Film. Londres: BFI Publishing, 1987, p. 5-39.
WILLIAMS, Linda. “Mega-Melodrama! Vertical and Horizontal Suspensions of the
‘Classical’”. In: Modern Drama. Toronto: University of Toronto Press, v. 55, n. 4,
2012, p. 523-543.
ZELINSKY, Wilbur. Nation into State: the Shifting Symbolic Foundations of
American Nationalism. Chapel Hill: The University of North Carolina Press, 1988.
O encontro entre linguagens na narrativa gráfica “Maciste no Inferno” (1983),
de Valêncio Xavier
Daniel Felipe E. L. Fonseca
Email: danielfelipefonseca@gmail.com
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: Cultura e Comunicação
Orientador: Irene de Araújo Machado
Resumo expandido
De toda a obra impressa do artista multimeios Valêncio Xavier (1933-2008), o livro
Maciste no Inferno, publicado no início dos anos 1980, é aquele em que de modo
mais direto o autor se propôs a abordar o cinema – para a composição do livro,
foram utilizados fotogramas de um filme italiano de 1926, Maciste all’Inferno,
realizado pelo diretor Guido Brignone. Contudo, a arte fílmica aparece não apenas
como pano de fundo temático, mas também enquanto promotora de um
tensionamento fronteiriço de códigos distintos. Tal constatação implica tanto em
uma oportunidade de aprofundamento na problemática do movimento interativo
entre linguagens em sua obra quanto em uma dificuldade, na medida em que o
imediatismo da proposta de relacionar os aspectos cinematográficos e literários
torna-se um convite informal a um esquematismo reducionista.
41
Se em outros momentos criativos – quer sejam literários ou audiovisuais – sua
produção trabalha com o imbricamento de temporalidades, colocando em xeque
uma visão diacrônica da História, neste livro a narratividade retilínea do cinema
clássico recebe uma espécie de ode, e é construída por meio de uma relação
gráfica e textual de paralelismo entre diegeses distintas: a ação projetada na sala
escura é concomitante às situações vividas pelos espectadores;; ambas têm, por
assim dizer, “vidas próprias”, e se desenvolvem num mesmo contínuo temporal.
Devido a esses fatores, o estudo desse livro em específico se mostra relevante no
contexto das discussões acadêmicas acerca da atividade criativa de Xavier, na
medida em que abre caminhos significativos para as investigações das linguagens
em processos de interação, bem como da influência midiática no ambiente literário.
A análise articula o objeto com contribuições da semiótica da cultura (Lotman) e da
teoria da comunicação (McLuhan).
Palavras-chave:
Literatura brasileira;; cinema;; fronteira semiótica;; literatura e mídia.
Bibliografia
LOTMAN, Iuri. La semiosfera I. Madrid: Ediciones Cátedra, 1996.
McLUHAN, Marshall. Joyce, Mallarmé and the press. In: The Sewanee Review.
Baltimore: The Johns Hopkins University Press,Vol. 62, No. 1 (Jan. - Mar., 1954),
pp. 38- 55.
XAVIER, Valêncio. Maciste no Inferno. In: O Mez da Grippe e Outros Livros. São
Paulo: Companhia das Letras, 1998.
16h50 – 18h50
MESA 4: ESTILOS E PROCESSOS CRIATIVOS
O mundo documentado de Albert Kahn: expressão e sentido nas imagens em
cores dos Arquivos do Planeta
Tássia Caroline Zanini
Email: tassiazanini@usp.br
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: Poéticas e Técnicas
Orientador: Atílio José Avancini
Resumo expandido
Esta pesquisa parte do estudo de um recorte do acervo pioneiro de Albert Kahn,
intitulado Os arquivos do planeta, produzido nos cinco continentes entre 1908 e
1931, que reúne vasta coleção de fotografias e filmes mudos em 35 mm, em cores
e em preto e branco. Em 1908, Albert Kahn, banqueiro e mecenas francês, viajou
para o Japão e a China, passando pelos Estados Unidos;; em 1909, visitou por
42
alguns meses a América do Sul, incluindo o Brasil, Uruguai e Argentina. Fazendo
uso da mais moderna tecnologia fotográfica da época, o autocromo, que
possibilitava praticidade na captura de imagens em cores, Kahn e seu motorista
produziram muitas fotografias dos locais, incluindo as primeiras imagens em cores
do Rio de Janeiro, que registraram os soldados que retornavam da Guerra de
Canudos e formavam as primeiras favelas nos morros do Rio.
Essas fotografias foram o estopim de um projeto ambicioso: documentar em
imagens as várias transformações do mundo no início do século. Para tanto, Albert
Kahn contratou fotógrafos e financiou diversas expedições fotográficas para os
cinco continentes, a fim de testemunhar as características e o modo de vida em
diferentes lugares e culturas. As expedições duraram 22 anos e visitaram mais de
50 países, resultando no acervo de 72 mil autocromos (em cores), 4 mil placas
estereoscópicas (a maioria em PB) e 183 mil metros de filme mudo 35mm (100
horas de gravações), a maioria também em PB. Kahn acreditava que, para captar
o mundo com o máximo de realismo possível, era necessário fazer uso da cor e da
imagem em movimento, pois as fotos coloridas e os filmes seriam capazes de
trazer, juntos, mais detalhes e contextos das práticas testemunhadas. Idealista e
internacionalista, Kahn acreditava que somente a imagem, e seu poder de
convencimento, poderia criar um mundo de fraternidade e compreensão
intercultural.
Seus objetivos com a grande documentação incluíam promover a tolerância e a paz
mundial. As expedições de Albert Kahn documentaram tanto a vida simples e
cotidiana, como o trabalho e o entretenimento, as relações familiares, as ruas e
hábitos da população, quanto eventos importantes da época, como a queda de
impérios, o nascimento de nações e a decadência da Europa pós-guerra. Tradições
prestes a desaparecer, como rituais antigos e vilas e cidades a serem destruídas,
também foram documentados, explicitando o processo de modernização em
expansão, com a marcha da globalização, as migrações para a cidade e a
reconfiguração de vários locais do planeta. Com a grande crise de 1929, Albert
Kahn perdeu grande parte de sua fortuna, sendo forçado a encerrar o projeto em
1931.
Em função dos desdobramentos da crise, da falta de recursos e da dificuldade em
reproduzir as placas de vidro para atingir um público massivo na época, os arquivos
permaneceram guardados por quase um século, só sendo redescobertos
recentemente. A mansão em que Kahn viveu, nos arredores de Paris, ficou sob
posse do estado a partir de 1933, tendo sido adquirida, junto com Os arquivos do
planeta, pela Prefeitura do Sena em 1936. O local torna-se o Musée départemental
Albert-Kahne em 1986, e inicia a construção de uma galeria de exposições em
1990. O acervo só começa a ser aberto a exposições públicas a partir de 2002 e,
desde 2016, o espaço passa por uma grande reforma para modernização e
ampliação, com previsão de término para 2018. Depois de tantos anos fechado, o
acervo de Kahn só começa a se tornar mais conhecido com o lançamento, em
2008, do livro e do documentário para televisão intitulados The wonderful world of
Albert Khan, coproduções entre o museu e a rede inglesa BBC (British Broadcasting
Corporation).
43
Diante desse contexto, e da importância desse extenso arquivo documental,
pretende- se analisá-lo a fim de compreender melhor o papel da cor na imagem
técnica, desde seu início e desdobramentos até a atualidade, com ênfase em suas
funções, características estéticas e de linguagem e consequências na produção de
sentido. O objetivo é entender como se deu a evolução técnica e as mudanças
estéticas do preto e branco ao colorido, e que reflexos essas diferenças de
linguagem representam nas produções contemporâneas fotodocumentais e
cinedocumentais. Paralelamente, este estudo também investigará a trajetória
histórica do fotodocumentarismo e sua pretensão em representar a realidade,
buscando compreender as mudanças que impulsionaram ou limitaram a produção
visual em cores. O corpus será analisado a partir do referencial teórico-
metodológico de Vilém Flusser e autores parceiros na Teoria da Imagem e da
Mídia. As hipóteses da pesquisa se concentrarão em duas vertentes sobre o
emprego da cor: na representação mais fiel da realidade (um dos objetivos do
acervo de Kahn) e em seu emprego majoritário pós advento da indústria gráfica e
da era imagética digital.
Palavras-chave:
História da fotografia;; Fotografia em cores;; Fotodocumentarismo e
cinedocumentarismo;; Os arquivos do planeta;; Albert Kahn.
Bibliografia
BELLONE, Roger;; FELLOT, Luc. Histoire mondiale de la photographie en couleurs,
des origines à nos jours. Paris: Hachette, 1981.
COOTE, Jack H. The illustrated history of colour photography. Londres: Fountain
Press, 1993.
FLUSSER, Vilém. Filosofia da caixa preta: ensaios para uma futura filosofia da
fotografia. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2002.
KOSSOY, Boris. A fotografia como fonte histórica: introdução à pesquisa e
interpretação das imagens do passado. São Paulo: Secretaria da Cultura, Ciência
e Tecnologia, 1980.
MACHADO, Arlindo. A ilusão especular: uma teoria da fotografia. São Paulo:
Gustavo Gili, 2015.
OKUEFUNA, David (Org.). The wonderful world of Albert Kahn: colour photographs
from a lost age. London, UK: BBC Books, 2008.
PANOFSKY, Erwin. Significado nas artes visuais. São Paulo: Perspectiva, 1976.
THE wonderful world of Albert Kahn: Albert Kahn’s archives of the planet. [S.l.]: BBC
Home Entertainment, 2011. 3 DVDs (450 min), NTSC, color.
Por um Cinema Corsário
Bruno Vieira Lottelli
44
Email: brunolottelli@gmail.com
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Rubens Luís Ribeiro Machado Junior
Resumo expandido
Enfronhada diretamente nas contendas mais calorosas de cada período histórico
do cinema brasileiro, a trajetória de Carlos Oscar Reichenbach Filho atravessou
quatro décadas. Durante esse percurso, sua obra testemunhou intensas e
subsequentes modificações no contexto do país, englobando experiências tão
contrastantes que vão desde a repressão da ditadura militar, passando pelo
desbunde da contracultura, a distopia do regime autoritário em processo de
abertura, a utopia da redemocratização, a frustração do projeto neoliberal
chegando até a primeira década das novas experiências popular-trabalhistas.
Para garantir a continuidade de sua filmografia, e até mesmo a própria
sobrevivência, Reichenbach precisou reinventar-se constantemente. Dessa forma,
seu cinema conheceu modos diversos de produção, aventurou-se por temas e
esquemas narrativos variados e ainda reelaborou algumas vezes o sentido de sua
relação com o público. Durante o período universitário, por exemplo, apesar de sua
filiação godardiana, Reichenbach abandonou a graduação para fazer “filmes
péssimos”, que, no entanto, garantiriam retorno comercial imediato e a
concretização de uma carreira profissional como cineasta. Depois de um período
como produtor e diretor independente (1968-75), inclusive tendo pago seus tributos
ao cinema publicitário, Reichenbach mergulhou de cabeça no esquema de
produção da “Boca do Lixo” a fim de retomar a trilha do “cinema de autor”, mesmo
que trabalhando na maioria das vezes como mão-de-obra terceirizada, tendo
fotografado, roteirizado e dirigido dezenas de filmes neste período (1976-86).
Além de ser um cineasta imparável, Reichenbach atuou como crítico
cinematográfico em jornais, revistas e portais online, e encontrou tempo para ser
cineclubista, oficineiro, professor universitário e agitador cultural, tornando-se peça-
chave para a formação de diversos cinéfilos e cineastas de gerações posteriores a
sua. Sua movimentação intensa, alternando estilos e projetos conforme a ocasião,
combinada com intervenções frequentes no debate público - através de entrevistas,
manifestos, atividades de formação, etc. - conferiram-lhe uma certa
performatividade ao mesmo tempo prolífica e crítica, especialmente preocupada
em denunciar as limitações crônicas do desenvolvimento cultural brasileiro.
Segundo Reichenbach, em entrevista concedida para Carlos Adriano, publica na
revista eletrônica Trópico: “A função do criador é colocar o poder contra a parede:
seja ele de direita, centro ou esquerda. Cultura é antena e vigília permanente”
(REICHENBACH, 2003).
Tal performatividade pode evocar a imagem de um corsário - termo que reverbera
um sugestivo imaginário presente no interior da filmografia reichenbachiana - a
navegar atentamente ao sabor dos ventos de cada período histórico, alterando
suas rotas sempre que necessário, ora abarrotado de recursos, ora carregando
apenas o essencial, pilhando de todas as fontes de referência que achar
necessário, sem hierarquizações ou distinção de origem. Apesar dessa miríade de
experiências que caracteriza a obra de Carlos Reichenbach, encontramos uma
45
marca registrada em sua postura, o seu norte ético: a busca por autonomia
intelectual e liberdade criativa a despeito das condições de produção à disposição.
Para a consecução de objetivos ético e políticos de certa forma rígidos,
Reichenbach permitiu maior flexibilidade à sua diretriz estética, mais ágil e reflexiva
em relação às conjunturas históricas. Reconhecido como um sujeito passional por
todas as pessoas que o conheceram, Reichenbach investia uma energia pessoal
volumosa em qualquer projeto - fílmico ou não - que iniciasse, mas, notoriamente,
sabia “abandonar o navio” quando verificava que as possibilidades de sucesso
estavam exauridas. Em outras palavras, sua filiação a estratégias e movimentos
duravam enquanto os rendimentos ético-estético-políticos pudessem ser
aproveitados, não lhe restando constrangimento em levantar âncoras e deixar para
trás - ou mesmo renegar - determinada obra ou estilo para que sua carreira pudesse
seguir adiante: “Eu não sou vítima de projetos, sabe aquele que fica, "ah, vai dar
vinte anos e aquele filme não saiu, vou me trucidar", etc. e tal.” (REICHENBACH,
1999).
Finalmente, para os objetivos desta comunicação, buscaremos analisar a obra de
Reichenbach a fim de verificar em que medida podemos reconhecê-lo como autor
de um “cinema corsário”. Para compreender melhor a ressonância deste conceito
no ato criativo de seu fazer cinematográfico, interessa-nos investigar as relações
entre as formas estéticas e os modos de produção utilizados pelo cineasta para
viabilizar seus filmes. Sua extensa e múltipla obra abre-se como um baú do tesouro
para quem deseja entender um cinema que organicamente integra-se ao seu tempo
histórico, ao ser produzido de acordo com as condições possíveis sem abrir mão
de sua subjetividade.
Palavras-chave:
Carlos Reichenbach;; Cinema Corsário;; Análise Fílmica.
Bibliografia
CAETANO, D. A cinefilia canibal dos filmes de Carlos Reichenbach. Filme Cultura,
v. 53, Rio de Janeiro, 2011.
LYRA, M. Carlos Reichenbach: o cinema como razão de viver. São Paulo: Imprensa
Oficial, 2004.
REICHENBACH, C. Anarquia poética contra o cinemão. São Paulo: Folha de São
Paulo, 1979. Entrevista concedida a Jairo Ferreira.
______. Depois do vendaval. Cinética (online), São Paulo, 2010. Disponível em:
http://www.revistacinetica.com.br/embrafilmecarlao.htm
______. Entrevista com Carlos Reichenbach: depoimento. Rio de Janeiro: Revista
Contracampo (online), 1999. Entrevista concedida a Ruy Gardnier e Daniel
Caetano.
______. Reichenbach: político, poético e popular: depoimento. São Paulo: Revista
Trópico (online), 2003. Entrevista concedida a Carlos Adriano. Disponível em:
http://p.php.uol.com.br/tropico/html/textos/1607,1.shl
46
Abel Ferrara e a transição no estilo cinematográfico norte-americano
Rafael Dornellas Feltrin
Email: rafaeldornellas91@gmail.com
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Mateus Araújo Silva
Resumo expandido
A apresentação tem como base o meu projeto de mestrado. Buscaremos uma
breve análise de duas obras do diretor norte-americano Abel Ferrara: Vício
frenético (Bad Liutenant, 1992) e Blackout (Blackout, 1997). Partindo desses dois
trabalhos realizados pelo cineasta buscaremos identificar a evolução que se deu
na linguagem e na forma cinematográfica norte-americana na passagem do
maneirismo cinematográfico surgido nos anos 1970 com o advento da Nova
Hollywood aos filmes já de meados da década de 1990. Onde exatamente Abel
Ferrara se encaixa ao olharmos para a história do cinema industrial norte-
americano? Porque estudar tais transições no estilo tendo como tema central esse
diretor? Como o diretor progressivamente abandona tais preceitos predecessores
à sua geração e após atingir a maturidade no filme de 1992 aponta um novo
caminho que desemboca no filme de 1997? É justo alocar o Ferrara pós-Blackout
na rótulo do cinema de fluxo? O que Ferrara traz consigo de mais básico dos
procedimentos formais de uma tradição (o cinema experimental e o cinema
clássico)? Buscando um enfrentamento direto com os filmes (em trechos utilizados
como exemplo), construiremos nossa reflexão e iremos delinear e explanar tais
questões e hipóteses.
Palavras-chave:
Abel Ferrara;; cinema norte-americano;; maneirismo cinematográfico;; cinema
experimental.
Bibliografia
BORDWELL, David. Sobre a história do estilo cinematográfico. Campinas, SP:
Papirus, 2013.
BRENEZ, Nicole. Abel Ferrara. Illinois: University of Illinois Press, 2006.
FRYE, Northrop. Anatomia da crítica. São Paulo: É realizações, 2014.
GALLAGHER, Tag. “Geometry of Force: Abel Ferrara and Simone Weil”, in
Screening the Past, n° 10, 2000.
JONES, Kent. “Abel Ferrara – the man: who cares?”, in Lingo, 4. A journal of arts,
1994.
JOHNSTONE, Nick. Abel Ferrara: The King of New York. London: Omnibus Press,
1999.
OLIVEIRA JR, Luiz Carlos. A mise en scène no cinema: do clássico ao cinema de
fluxo. Campinas, SP. Papirus, 2013.
47
SITNEY, P. Adams. Visionary Film. Nova York: Oxford University Press, 2002.
THORET, Jean-Baptiste. Le Cinéma américain des années 70. Cahiers du Cinéma,
2009.
_____________. Gravity of the flux. Senses of cinema, 2007.
WOOD, Robin. Hollywood from Vietnam to Reagan... and beyond. New York:
Columbia University Press, 2003.
O Cinema de Michael Mann: o autoral e o político na Hollywood
contemporânea
Lucas do Valle Pereira
Email: valle.lvp@gmail.com
Nível: Iniciação Científica
Linha de pesquisa: Iniciação Científica
Orientador: Cristian da Silva Borges
Resumo expandido
A pesquisa se propõe a analisar o caráter político e autoral no cinema do cineasta
norte-americano Michael Mann, tomando como base três de seus filmes: Profissão:
Ladrão (Thief, 1981), Colateral (Collateral, 2004) e Miami Vice (idem, 2006). Mann
é um dos principais nomes do cinema norte-americano nos últimos 30 anos,
destacando-se por conseguir, ao mesmo tempo, imprimir um estilo autoral ao
abordar temas das esferas política e filosófica e atender certas demandas estéticas
e mercadológicas dos conglomerados multimidiáticos da Hollywood
contemporânea. Por conseguir transitar nesse meandro entre arte e indústria, Mann
se mostra um diretor consciente de sua posição dentro da produção mainstream
do cinema norte-americano, o que lhe permite realizar filmes com altas cifras
orçamentárias sem precisar abrir mão de seu controle criativo.
Assim, munido de toda estrutura que os altos investimentos hollywoodianos podem
proporcionar, Mann consegue dialogar com um grande público e discutir temas
raros ao cinema comercial, desde a metaforização de conceitos marxistas em uma
fábula criminal (em Thief) até a atualização e expansão de tópicos
representacionais do gênero policial para o contexto de um mundo globalizado (em
Collateral e Miami Vice). Partindo desses três filmes, a pesquisa pretende analisar
os procedimentos que Mann emprega para fomentar a discussão de seus temas e
a forma como ele consegue transcender as restrições do cinema padronizado de
Hollywood.
Palavras-chave
cinema, política, Michael Mann.
Bibliografia
BERNARDET, Jean-Claude. O autor no cinema: a política dos autores: França,
Brasil anos 50 e 60. São Paulo: Brasiliense, 1994.
48
FOUCAULT, Michel. Segurança, Território, População. São Paulo: Martins Fontes,
2008.
GAINE, Vincent M.. Existentialism and Social Engagement in the Films of Michael
Mann. Londres: Palgrave Macmillan, 2011.
GUATTARI, Félix. Revolução Molecular: pulsações políticas do desejo. 3 a ed. São
Paulo: Brasiliense, 1985.
KRAMER, P. Post-classical Hollywood. In: HILL, J. e GIBSON, P.C. (Orgs.).
American cinema and Hollywood. Oxford: Oxford University Press, 2000.
MELEIRO, Alessandra (Org.). Cinema no Mundo: indústria, política e mercado. São
Paulo: Escrituras, 2007, 4 v.
RAYNER, Jonathan. The Cinema of Michael Mann: Vice and Vindication. Nova
York: Columbia University Press, 2013.
ROSENFELD, Anatol. Cinema: Arte & Indústria. São Paulo: Perspectiva, 2013.
WOOD, Robin. Hollywood: From Vietnam to Reagan... and Beyond. Nova York:
Columbia University Press, 2003.
Justiça: Reflexos e Refrações de uma cinematografia realista
Alexandre Gomes do Nascimento
Email: alexandre.rtv@gmail.com
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa:
Poéticas e Técnicas
Cultura
Orientador: Patrícia Moran Fernandes
Resumo expandido
Justiça, minissérie veiculada pela TV Globo em 2016, foi um sucesso de crítica e
de público. A obra se destacou por vários aspectos, dentre os quais estão as
imagens criadas pelo diretor de fotografia Walter Carvalho. Seu desafio foi traduzir
para a tela o “compromisso com o realismo”, ponto de partida da narrativa
desenvolvida pela roteirista Manuela Dias e pelo diretor artístico José Luiz
Villamarim. A simplicidade com que esse conceito se apresenta acaba por
mascarar questões de grande complexidade, uma vez que a realidade não é algo
que se revela de imediato ao olhar inocente. Trata-se de um todo multifacetado,
composto por diferentes formas ideológicas e pontos de vista, fato que nos leva a
falar em realidades, no plural. Sendo assim, as imagens criadas por Walter
Carvalho deixam de ser encaradas como simples reflexo do real e se tornam ilusões
especulares, consequência direta das refrações ideológicas e tecnológicas sob as
quais tais imagens estão subordinadas.
Devido a pluralidade assumida pelo termo “realismo” buscamos, nesse primeiro
momento, fazer um levantamento da sua ocorrência enquanto estilo, no interior dos
sistemas de representação. Mais do que inventariar, pretendemos explicitar o
problema, a fim de contribuir para uma crítica das convenções tomadas como
regras canônicas. É importante insistir nesse ponto pois muitas teorias formuladas
49
a partir do pós-guerra são utilizadas, ainda hoje, como alicerce para justificar o
caráter realista das imagens fotográficas e cinematográficas, relegando qualquer
tipo de estilização como uma heresia. André Bazin foi um dos principais defensores
do realismo cinematográfico, acreditando na objetividade dos equipamentos de
captação em função da sua reprodução automática, reivindicando para o complexo
aparato tecnológico o poder de refletir o mundo de maneira fria, através da
neutralidade de seus procedimentos formais. Nessa configuração, o
operador/enunciador surge como um mero administrador de informações. Bazin
desconsiderava a série de escolhas feitas pelo sujeito da enunciação, envolvendo
necessidades técnicas e estéticas. De acordo com Jacques Aumont, a imagem
cinematográfica está “...subordinada ao tipo de filme empregado, ao tipo de
iluminação disponível, à definição da objetiva, à seleção necessária e à
hierarquização dos sons, como é determinada pelo tipo de montagem, pelo
encadeamento de sequências e pela direção.” (2006, p.135).
Embora o realismo tenha sido motivo de debates acalorados no campo do
audiovisual, essa questão tem sido discutida há muito tempo por diferentes
sistemas de representação. Na pintura, uma das primeiras manifestações do termo
ocorreu ainda no século XIX, como título de uma exposição artística do pintor
Gustav Courbet (1819- 1877), cujo lema era “pintar as coisas como elas são”. As
obras de Courbet foram influenciadas pelas transformações políticas, econômicas
e sociais do período;; motivadas pela ascensão da burguesia e pela revolução
industrial, que destruiu a tradição do artesanato, substituindo-a pela produção
mecânica das fábricas. Ao invés de temas religiosos e protagonistas pertencentes
à aristocracia, Courbet trouxe a classe trabalhadora e os temas do cotidiano para
o primeiro plano.
Ainda no século XIX, Émile Zola compôs “Germinal”, livro que narra a história de
uma greve de mineiros provocada pela redução de salários. Para escrever a obra,
Zola passou dois meses trabalhando na extração de carvão, submetendo-se ao
modo de vida dos mineiros, passando longas horas do dia dentro de uma mina de
carvão quente e úmida. Além de escritor, Zola era jornalista, razão pela qual
procurou imprimir um estilo objetivo em “Germinal”, relatando a dura realidade da
vida dos mineiros. Anos mais tarde, em 1930, seu livro serviu como inspiração para
os filmes do “Realismo Poético Francês”, movimento estilístico que não possuía um
programa pré-definido. Os realizadores criavam suas obras a partir da observação
dos acontecimentos reais, resultando em obras fiéis àquela realidade, mas com um
tom lírico. Outro movimento nitidamente influenciado foi o neorrealismo italiano que,
reagindo ao fascismo e à participação italiana na Segunda Guerra Mundial, retratou
a classe trabalhadora urbana, assombrada pelo desemprego.
Independente se a abordagem é feita pelo viés ontológico, estilístico, ideológico ou
tecnológico, o fato é que o termo realismo apresenta em si um paradoxo;; ao mesmo
tempo que os sistemas de representação utilizam índices do real para compor seus
respectivos discursos, eles apenas conseguem criar uma ilusão especular. É com
base nesse levantamento histórico, teórico e crítico que nos lançamos, daqui em
diante, à análise da cinematografia realista da minissérie Justiça, um duplo desafio
na medida em que somos levados a considerar a poética de Walter Carvalho em
função dos materiais e materialidades do audiovisual contemporâneo, sem deixar
50
de considerar os fatores extra-diegéticos que estão incorporados no discurso
visual.
Palavras-chave
Cinematografia;; Direção de Fotografia;; Imagem;; Justiça;; Realismo;; Ideologia,
Estilo, Walter Carvalho.
Bibliografia
AUMONT, Jacques et al. A estética do filme. Trad. de Marina Appeenzeller. 9a
edição. Campinas, SP: Papirus, 2012.
BARTHES, Roland. A Câmara Clara. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984.
BAZIN, André. O que é o cinema? São Paulo: Cosac Naify, 2014.
BENJAMIN, Walter. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica.
Apresentação, Tradução e notas de Francisco de Ambrosis Pinheiro Machado.
Porto Alegre: Zouk 2014.
BORDWELL, David. Sobre a história do estilo cinematográfico. Tradução de Luís
Carlos Borges. Campinas, SP: Editora Unicamp, 2013.
BURCH, Noel. Práxis do cinema. Trad. de Michelle Pithon e Regina Machado. São
Paulo: Perspectiva, 2015.
FLUSSER, Vilém. O Universo das imagens técnicas: elogio da superficialidade.
São Paulo: Annablume, 2008.
GOMBRICH, E. A História da Arte. Rio de Janeiro: LTC, 1993.
MACHADO, Arlindo. A ilusão especular. São Paulo: Gustavo Gili, 2015.
MALPAS, James. Realismo. Trad. Cristina Fino. São Paulo: Cosac & Naify Edições,
2000.
A teoria de Eisenstein e a direção de fotografia
Taís de Andrade e Silva Nardi
Email: taisna@usp.br
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: Poéticas e Técnicas
Orientador: Maria Dora Genis Mourão
Resumo expandido
A obra teórica de Sergei Eisenstein é bastante influenciada por seu trabalho como
realizador e professor, atividades que lhe permitem uma visão prática do cinema,
referente ao processo de produção das obras. Muitos de seus textos se utilizam de
análises de seus próprios filmes para explicitar a aplicação de seus conceitos
teóricos ligados à importância e à expressividade do cinema, e por isso nos
parecem fontes estimulantes para uma discussão sobre a fotografia
51
cinematográfica, atividade que une conceito à prática, a busca de expressividade a
escolhas técnicas.
Além disso, é possível perceber em seus textos grande preocupação com a
construção da imagem, ligada especialmente à composição do plano e à
manipulação das linhas, tons, elementos sob responsabilidade do diretor em
conjunto com o diretor de fotografia e o diretor de arte. Eisenstein exibe um
pensamento imagético e gráfico e por isso propomos aplicar à direção de fotografia
suas definições em relação à montagem.
A proposta desta apresentação é então utilizar termos e princípios propostos por
Eisenstein para analisar a direção de fotografia como ferramenta expressiva dentro
da construção de um filme brasileiro contemporâneo.
É difícil de resumir a obra teórica de Eisenstein tendo em vista que os conceitos
apresentados em seus textos, espalhados em várias publicações, mudam de nome,
de ênfase e de utilização nos diferentes momentos de sua teorização. Por isso é
comum vermos sua teoria dividida em fases. Aqui, no entanto, vamos considerar
muitos conceitos como evoluções de ideais e termos anteriores, como o faz
Jacques Aumont em Montage Eisenstein. Essa abordagem nos permite um diálogo
mais livre entre textos de diferentes momentos e a escolha dos termos que melhor
se conectam à direção de fotografia. Vamos partir então do conceito de “montagem
vertical”. A “montagem vertical” indica uma concepção da obra que engloba tanto a
montagem interna a cada plano como a relação entre as “linhas de movimento” que
formam o desenrolar do filme. Podemos compreendê-la como um pensamento
estruturante sobre a obra, que atravessa todos seus elementos – mise-en-scène,
imagem, som e montagem (como colagem de planos) –, e utilizá-la, portanto, como
fundamento para analisar os aspectos da construção da imagem, intra e entre
planos, que concernem ao trabalho do diretor de fotografia.
A importância dada a montagem intra-plano é marcada pela crença na identificação
entre forma e conteúdo. Se a forma gera significados ao criar conflito entre os
planos, ela é um elemento especialmente importante para a expressão do tema em
si e do ponto de vista do autor em relação aos eventos que retrata (EISENSTEIN,
1932). É daqui que pulamos para o conceito de fotografia cinematográfica criativa
ou discursiva, emprestando este segundo termo ao modo como muitos autores se
referem à montagem de Eisenstein.
Procuramos nesta apresentação demonstrar a importância da fotografia
cinematográfica como ferramenta de expressão dentro do filme. Falamos de uma
direção de fotografia criativa que procura construir uma narrativa visual e não
apenas representar o mundo exterior baseando-se numa captação com
enquadramentos e iluminação naturalistas. Através das ideias de Eisenstein
buscamos valorizar uma fotografia desassociada da ideia de registro e conectada
à ideia de criação de sentido. Essa direção de fotografia discursiva se baseia na
montagem vertical do plano, ou seja, na construção do plano como justaposição de
camadas de significados estabelecidos pelos diversos elementos da imagem –
enquadramento, movimentos, tom, cor, linhas, forma, profundidade e ritmo. O
diretor de fotografia cria, em parceria com o diretor e diretor de arte, maneiras
visuais de contar a história, que formam relações polifônicas com os outros
52
elementos do filme – som, interpretação, figurinos, cenários, montagem, etc. – de
modo a fortificar os sentidos da obra. Essas relações são construídas sobretudo
pela organização de conflitos ou afinidades entre as imagens do filme.
Para Eisenstein, o conflito é o princípio fundamental da montagem. Também é a
essência do apelo emocional do filme e de sua construção ideológica dentro do
método dialético por se apoiar no dinamismo característico do ser e da vida. O
conflito é a chave da relação produzida pela emenda entre fragmentos, que permite
a comparação entre eles;; que por sua vez possibilita a percepção de temas e sub-
temas e suas sínteses em um novo significado. É a percepção dos conflitos internos
à obra que guiará a análise de Quase Memória.
Quase Memória é um filme dirigido por Ruy Guerra, com direção de fotografia de
Pablo Baião (2016), em que nos é apresentado o encontro de um personagem com
ele mesmo em outro momento de sua vida. Carlos Velho e Carlos Jovem
repentinamente se encontram no mesmo lugar e passam a discutir como e porque
essa união aconteceu. O aparecimento de um embrulho de conteúdo incerto os faz
lembrar do pai, um jornalista excêntrico chamado Ernesto.
Palavras-chave
montagem, Eisenstein, fotografia cinematográfica, conflito, narrativa visual.
Bibliografia
AUMONT, J. Montage Eisenstein. Paris: Editions Albatros: 1979.
BLOCK, B. A narrativa visual: Criando a estrutura visual para cinema, TV e mídias
digitais. Trad. Cláudia Mello Belhassof. São Paulo: Elsevier, 2010.
EISENSTEIN, S. A Forma do Filme. Trad. Teresa Ottoni. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1990, p. 49-70.
________. The Film Sense. Edição e tradução de Jay Leyda. New York: Meridian
Books, 1957.
MOURÃO, D. “A montagem cinematográfica como ato criativo” In Significação:
revista de cultura audiovisual. v. 33, n. 25, p. 229-250. São Paulo, 2006.
QUASE Memória. Direção: Ruy Guerra. Roteiro: Ruy Guerra, Bruno Laet e Diogo
Costa, a partir da obra de Carlos Heitor Cony. Direção de fotografia: Pablo Baião.
Brasil: Canal Brasil, Globo Filmes, Kinossaurus Filmes, 2016.
53
QUINTA-FEIRA, 23 DE AGOSTO
9h00 – 11h00
MESA 5: ENSAÍSMO E EXPERIMENTAÇAO
Destruir os monumentos: o super8 no Brasil e no México nos anos 1970
Marina da Costa Campos
Email: marina.dacosta@gmail.com
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Rubens Luís Ribeiro Machado Junior
Resumo expandido
Esta exposição tem o intuito de apresentar a pesquisa de doutorado iniciada em
2016, cujo tema direciona-se para as aproximações entre a produção superoitista
do Brasil e do México na década de 1970, a partir da articulação entre pesquisa
histórica e análise fílmica. Para esta exposição analisaremos dois curtas-metragens
Esplendor do martírio (Sérgio Peo, 1974) e Ah, verdá? (Sérgio Garcia, 1973).
Levando em consideração os diferentes processos históricos e a singularidade e
complexidade do movimento superoitista de cada território, é possível identificar
traços que aproximam essas produções: a opção pelo experimental como discurso,
a ironia e metáfora como forma crítica e a reflexão sobre a cultura, a sociedade e o
cinema. Os filmes aqui escolhidos abordam direta ou indiretamente, as
reverberações da década de 1960, em especial o ano de 1968: a implementação
do Ato Institucional nº5, AI-5, no Brasil, o massacre de estudantes na Plaza
Tlatelolco no México e as manifestações do movimento estudantil na França.
Esplendor do martírio é um curta-metragem produzido em 1974 e que traz o
espetáculo de rua oferecido por um engolidor de fogo alternado com performances
do próprio diretor ao enfrentar a delimitação e ordenação do espaço público. Sob a
trilha sonora de Money e Time do álbum The dark side of the moon, do Pink Floyd,
o filme se desenvolve com a demonstração artística de um artista de rua e suas
habilidades com o fogo, assistido por transeuntes curiosos. Um recorte de jornal
nos apresenta o Monumento aos heróis, com inscrições à caneta de “esplendor do
martírio”. Uma garota, com as mãos e olhos atados se desvencilha do que lhe
reprime e coloca seu futuro no jogo de cartas, enquanto outro homem, interpretado
pelo próprio diretor, faz uma performance com vendas nos olhos e amarrado em
um poste de uma rua da capital. Neste conjunto de imagens, outra cena se associa:
a de um jovem, da equipe de filmagem, percorrendo avenidas da cidade até chegar
num monumento e atacá-lo. É contido por dois homens (que não sabemos se são
seguranças ou pessoas comuns) e logo após preso por policiais. No fim, rasteja até
morrer deixando o rastro de sangue pelo corpo e pela Avenida Rio Branco. O filme
traz a performance como respiro da instantaneidade e a oposição aos monumentos
como formas de resistência, sufocadas pela ditadura militar.
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Ah, verdá?, filme mexicano de Sergio García, também traz o ataque aos
monumentos ao tratar da história de um casal “revolucionário” alienado. Os jovens
instalam bombas em pontos cívicos como o Monumento de la Revolución e a sede
do PRI, Partido Revolucionário Institucional, e fogem da polícia. Realizam uma
série de ações “delinquentes”: roubam livros, tem relações sexuais em um carro
alheio e roubam outro carro. O garoto é morto na perseguição, mas a garota
permanece, desta vez produzindo LSD e despejando a droga nas estações de
abastecimento de água da cidade. Com uma banda sonora com várias canções de
rock, o curta recorre a ironia para indagar o grau “revolucionário” desta geração e
o ataque aos monumentos como forma de resistência. A partir deste breve esboço
podemos apontar que ambos os filmes trazem a agressão aos símbolos da história
e da cidade como resposta a uma ação: se eles oprimem, vamos destruí-los, ou
pelo menos ridicularizá-los.
O afrontamento e a posterior perseguição também são aspectos em que estes
filmes convergem, ao mostrar que para a desobediência não há outra resposta
senão a violência e a morte, e assim identificamos o autoritarismo permeando todas
as esferas da vida em sociedade: na política, na cultura, na economia... Apesar da
repressão, esta postura de deboche traz uma perspectiva de ação no sentido de
que o confronto se dá no nível simbólico, justamente o mesmo nível em que o
regime da tecnocracia opera. Esta exposição, portanto, dedica-se a entender como
esta resposta à opressão e também a uma série de tensionamentos políticos,
culturais e sociais se dá nestes filmes experimentais.
Palavras-chave
super8;; experimental;; Brasil;; México;; monumentos.
Bibliografia
AGUSTÍN, José. La contracultura en México. Cidade do México: Debolsillo, 2012.
DIDI-HUBERMAN, Georges (org). Levantes. São Paulo: Edições Sesc, 2017.
FUENTES, Carlos. Em 68: Paris, Praga e México. trad. Ebréia de Castro Alves. Rio:
Rocco, 2008.
GASPARI, Elio;; Hollanda, Heloisa Buarque de;; Ventura, Zuenir. Cultura em trânsito:
da repressão à abertura. Rio: Aeroplano, 2000.
MACHADO JR, Rubens. Marginália 70. O experimentalismo no Super8 brasileiro.
Poetas, artistas, anarco-superoitistas. São Paulo: Itaú Cultural, 2001.
________________. Cidade & Cinema, duas histórias a contrapelo nos anos 1970.
In: MACHADO, Carlos Eduardo;; MACHADO JÚNIOR, Rubens;; VEDDA, Miguel
(org.). Walter Benjamin: experiência histórica e imagens dialéticas. São Paulo:
Editora Unesp, 2015, p.363-374.
MANTECÓN, Álvaro. El cine súper 8 em México 1970-1989. México: Filmoteca
UNAM, 2012.
Roszak, Theodore. A contracultura. (1968) trad. Donaldson M. Garschagen, 2ª ed.,
Petrópolis: Vozes, 1972.
55
O duelo de Andy Warhol e Marie Menken: por uma arte anti-romântica?
Ivan Amaral
Email: ivanamaral.reis@gmail.com
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Cristian da Silva Borges
Resumo expandido
Marie Menken (1909-1970), cineasta e artista plástica, nascida em Nova York e
filha de imigrantes lituanos, é considerada por amigos próximos, como Stan
Brakhage, uma influência definitiva para muitos cineastas da vanguarda norte-
americana do cinema. A teoria e a crítica acerca de sua obra, ao reconhecer tal
influência, no entanto, a inscreve em tradições de realização como a do filme lírico
e a do filme-diário, sem perceber que a proposição formal de Menken a afasta
substancialmente de qualquer espécie de estética romântica. Tomando como
objeto um found-footage em 16mm, exibido pela primeira vez por meio do filme
Notes em Marie Menken, de Martina Kudlaceck, sem data ou títulos precisos, nunca
exibido em nenhum circuito ou ciclo de filmes, degradado pela má conservação, no
qual Andy Warhol e Marie Menken encenam um duelo de câmeras Bolexes 16mm,
podemos investigar mais a fundo a proposta cinematográfica de Marie Menken.
Valendo-se da análise da forma de seus filmes, do uso do single-frame, da
montagem na própria câmera, a proposta é situar o horizonte estético de realização
de Marie Menken em sintonia com a proposição de Melissa Ragona, que sugere
um distanciamento da realizadora em relação à alocação de seu cinema como
resultado do filme-lírico e do filme-diário, por meio dos escritos de P. Adams Sitney
e David E. James, respectivamente. Também nos valemos da teoria de Vilém
Flusser acerca do aparato fotográfico para contrapor a proposição mais recente de
P. Adams Sitney em relação à Marie Menken, que classifica seu cinema como
resultado do que chama de “câmera-somática”.
Palavras-chave
Marie Menken Vanguarda norte-americana cinema experimental
Bibliografia
BRAKHAGE, Stan. Film at Wit’s End. Eight Avant-Garde Filmmakers. New York:
McPherson, 1991.
CRASE, Douglas. Both: A Portrait in Two Parts. New York: Pantheon Books, 2004.
DEREN, Maya. “Amateur Versus Professional”. Film Culture, n.39, 1965, pp.45-46.
FLUSSER, Vilém. Filosofia da caixa preta. São Paulo: Annablume, 2011.
MEKAS, Jonas. “Elogio à Marie Menken: cine-poeta.” In: MOURÃO, Patrícia (org.).
Jonas Mekas. São Paulo: Centro Cultural Banco do Brasil, 2013.
METZ, Cristian. A significação no cinema. São Paulo: Perspectiva, 2014.
56
MOURÃO, Patrícia. A invenção de uma tradição: caminhos da autobiografia no
cinema experimental. Tese de doutorado. Universidade de São Paulo, Escola de
Comunicações e Artes, Programa em Meios e Processos Audiovisuais, 2016.
RAGONA, Melissa. “Swing and Sway. Marie Menken’s Filmic Events”. In: BLAETZ,
Robin (org.). Women’s Experimental Cinema. Critical Frameworks. Durhan e
Londres: Duke University Press, 2007.
Afinidades eletivas: alquimia e informe no cinema de Jürgen Reble
Rodrigo Faustini dos Santos
Email: orfaustini@gmail.com
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Cristian da Silva Borges
Resumo expandido
Em seus textos sobre o cinema found footage, André Habib (2008) propõe uma
topografia de duas linhas de criação constantes - a dos “cineastas-catadores",
interessados na pátina do tempo sobre as imagens, operando um resgate da cultura
material análogo ao do trabalho do arqueólogo ou do colecionador de curiosidades,
minimizando a intervenção no material, focando seu trabalho nas re-organizações
possíveis e condições de apresentação dos achados (teríamos aqui Peter Delpeut,
Bill Morrison, entre outros);; e a prática dos "cineastas-alquimistas", que se
diferenciam destes ao interferirem diretamente (e corrosivamente) no material de
arquivo, visando "transmutá-lo" em algo novo. O autor continua sua delineação da
prática ao compará-la à "alquimia do verbo”, na alegoria de Rimbaud, que fala de
uma busca por “faíscas de Ouro” em sua poiesis. A hipótese de um cinema
alquímico provém, como o autor indica, de Jürgen Reble, cineasta que se declara
um alquimista fílmico, fazendo diversas referências à arte hermética em sua obra.
De início, porém, a relação com a alquimia soa incompleta ou adaptada, pois, se
partirmos de uma relação estrita com a prática histórica, a busca dos alquimistas
pela perfeição, sintetizada no ouro (ou Pedra Filosofal) parece distante das
paisagens ruidosas e ruiniformes que povoam os filmes de Reble, realizados a
partir de intervenções físicas, químicas e orgânicas no material fotoquímico, que é
denegrido de sua forma primeira (REBLE, 1995). Por mais que existam nesses
filmes temáticas de ordem espiritual, a constante iconografia de esfacelamento de
imagens e a proliferação de ruídos do dispositivo que é realizada parecem difíceis
de conciliar com o idealismo da alquimia. Ao invés de abandonar a metáfora
proposta por Habib como um todo, ancorados na insistência do próprio Reble em
denominar sua prática como alquímica, encontramos uma possível conciliação ao
observarmos outra apropriação do imaginário alquímico na arte - não tanto
proveniente do simbolismo de Rimbaud quanto derivado do pensamento
Batailleano, estudioso da alquimia (LEBEL;; WALBERG;; 1995) que cunhou um
termo particularmente produtivo para discutir visualidades abjetas e miásmicas
como as de Reble - o informe, agente de transubstanciação da forma rumo ao
irreconhecível e, principalmente, de rebaixamento da mesma: Allergic to the notion
of definitions, then, Bataille does not rather give informe a meaning;; he posits for it
57
to undo a formal job: categories, to deny that each thing has its proper form to
imagine meaning as gone shapeless… The boundaries of terms are not imagined
by Bataille as transcended, but merely as transgressed or broken, producing
formlessness through deliquescence, putrifaction, decay. (KRAUSS, 1985, p. 39).
Tal trabalho com opostos, estruturante da operação do informe, pode ser lido como
uma releitura de uma das máximas da alquimia encontrada na Tabula Smaragdina:
'O que está em cima é semelhante ao que está abaixo e o que está abaixo é
semelhante ao que está em cima’… A partir do princípio de que o mais alto provém
do mais baixo e vice e versa, e de que tudo é obtido do único por meio da conjunção
de opostos, a obra ‘alquímica', partindo da união do Sol com a Lua, engendra o
sopro vital.” (GOLDFARB, 1987, p. 25). Se ‘purificação' parece inadequado para
descrever o cinema de Reble, a transgressão da forma e a indução de intempéries
no suporte se aproximam mais de seus campos de ação e são paralelos à "arte
hermética" - de fato, a alquimia prevê a degenerescência e mortificação da matéria
como sua etapa inicial, o Nigredo (GOLDFARB, 1987). Na arte moderna, com a
"abstração informal", reflexos desse informe batailleano se apresentam nas obras
de Dubuffet (que realizou a série "Pedras Filosofais" na década de (1950) e de
alemães contemporâneos de Reble, como Beuys e Kiefer, cujas obras também
referenciavam à alquimia (MÈREDIEU, 1994). A degradação da matéria fílmica em
Reble, que intensifica sua presença via o ruído, coloca-o, assim, em diálogo
próximo da exploração da matéria feita por esses artistas, e nos ajuda a pensar
afinidades entre cinema experimental, alquimia e o informe.
Palavras-chave
materialidade;; impureza;; cinema experimental;; alquimia;; Jürgen Reble
Bibliografia
BEAUVAIS, Y. Poussiere d’image: articles de films (1979-1998). França: Paris
Experimental, 1998. 200p.
GOLDFARB, A. Da alquimia à química. Brasil: Nova Stella/EDUSP, 1987. 280p.
HABIB, A. Aura, destruction et reproductibilité numerique, 2008. Disponível em:
<http://www.horschamp.qc.ca/spip.php?article305>. Acessado em: 12/05/2018.
KRAUSS, R. Corpus Delicti. October, EUA, vol. 33, pp.31-72.
LEBEL, R.;; WALBERG, I (eds.). Atlas Archive Three: Encyclopaedia Acephalica.
Inglaterra: Atlas Press, 1995. 173p.
MÈREDIEU, F. Histoire Matérielle & Immatérielle de l’art moderne. França: Bordas,
1994. 405p.
REBLE, J. Chimie, Alchimie des couleurs. In MCKANE, Miles;;
BRENEZ, Nicole (dir.). Poétique de couleur. Anthologie. Paris: Louvre/ Institut de
l’image, 1995.
________. Les Champs de Perception. 1995. Disponível em:
<http://www.filmalchemist.de/ publications/ScratchBook.html>. Acessado em:
18/07/2016.
58
Rio-desborde: ensaio imagético das enchentes nas cidades de São Paulo e
Santiago de Chile
Vivian Javiera Castro Villarroel
Email: vivian.javiera@gmail.com
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: Poéticas e Técnicas
Orientador: Atilio José Avancini
Resumo expandido
Este projeto de doutorado propõe uma comparação iconográfica entre os principais
rios que atravessam as cidades de São Paulo e Santiago de Chile. Partindo das
reflexões a respeito do ensaio fílmico de Arlindo Machado, Francisco Elinaldo
Teixeira e Timothy Corrigan e explorando o método de montagem de artistas como
Chris Marker, Allan Sekula e Rosangela Rennó, procura-se produzir um ensaio
autoral, fotográfico e audiovisual. Será selecionado material de arquivo e serão
produzidos documentos autorais sobre os rios Tietê em São Paulo e Mapocho em
Santiago, reunindo fragmentos de imagens, textos e sons que falam do presente e
do passado das cidades. Serão consideradas as enchentes do início do século XX
e as que têm ocorrido no século XXI, estabelecendo comparações por meio de
fotografias das cheias e também das obras de engenharia civil que retificaram os
cursos dos rios.
O rio surge como metáfora para referir-nos a uma contínua tensão entre
crescimento econômico e meio ambiente. A hipótese da tese de doutorado é ler as
enchentes como metáforas do fracasso dos projetos de modernização urbana.
Embora seja difícil propor um paralelo temporal entre São Paulo e Santiago devido
às suas particularidades históricas, pretendo criar algumas relações conceituais e
visuais a partir dos rios, já que ambos foram brutalmente alterados, poluídos e
interferidos por pistas expressas de automóveis. O rio Tietê, palco das narrativas
míticas sobre as bandeiras paulistas e a formação do Brasil, está isolado nas
marginais. O Rio Mapocho, cenário de batalhas nos começos da cidade de
Santiago e logo no período colonial, fronteira entre ricos e pobres, é considerado
um lugar esquecido e perigoso na grande parte da sua extensão. Ambos, contudo,
vêm sendo alvo de grandes e intermináveis obras públicas – Despoluição do rio
Tietê e “Mapocho urbano limpio” – que sempre prometem um futuro brilhante para
duas das maiores metrópoles da América Latina.
Palavras-chave
arte;; audiovisual;; fotografia;; ensaio;; memória.
Bibliografia (Máximo de 1000 caracteres)
CASTILLO, Simón. El río Mapocho y sus riberas. Espacio público e intervención
urbana en Santiago de Chile (1885-1918). Santiago: Ediciones Universidad Alberto
Hurtado, 2014.
CORRIGAN, Timothy. O filme-ensaio: desde Montaigne e depois de Marker.
Campinas: Papirus, 2015.
59
CHION, Michel. La Audiovision. Barcelona: Paidos Iberica. 1993.
JORGE, Janes. Tietê: o rio que a cidade perdeu, São Paulo 1890-1940. São Paulo:
Alameda, 2006.
KURZ, Robert. O colapso da modernização. São Paulo: Paz e Terra, 1999.
MACHADO, Arlindo. O filme-ensaio. IN: SAMPAIO, Rafael & Mourao. M. D. Chris
Marker, bricoleur multimídia. Rio de Janeiro: Centro Cultural Banco do Brasil, 2009.
p.20-33.
NICHOLS, Bill. La representación de la realidad. Cuestiones y conceptos sobre el
documental. Barcelona: Paidós, 1997.
TEIXEIRA, Francisco Elinaldo (org.). O ensaio no cinema: Formação de um quarto
domínio das imagens na cultura audiovisual contemporânea. São Paulo: Huitec,
2015.
Rocha que voa: uma aproximação entre filme e memória
Carolina Gonçalves Pinto
Email: carolinagp@usp.br
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: Poéticas e Técnicas
Orientador: Patrícia Moran Fernandes
Resumo expandido
Em seu filme Rocha Que Voa (2002), Eryk Rocha insere sobre uma imagem de
arquivo a seguinte inscrição “a memória não se grava como um filme.” Esta frase
figura em meio a um filme que concentra seus esforços em resgatar recordações
que amigos guardam a propósito de Glauber Rocha, cineasta morto em 1981. O
cinema, arte que se faz a partir da manipulação do tempo e, quase sempre também,
do espaço, pode oferecer um campo de criação para a memória. Pretendemos
examinar de que maneira as operações realizadas para a composição de um filme
podem sugerir uma aproximação com os elementos que compõem a memória. À
luz de conceitos referentes à memória, expostos nos textos Mémoire Collective et
Sociologie Du Bricolage de Roger Bastide e Memória Coletiva de Maurice
Halbwachs, e dos textos sobre a montagem cinematográfica Esthétique du
Montage de Vincent Amiel, além de conceitos elaborados por Sergei Eisenstein em
A Forma do Filme e O Sentido do Filme, pretendemos tecer esta investigação,
centrada no filme Rocha Que Voa (2002) de Eryk Rocha. Buscamos estabelecer
esta aproximação entre estes dois campos tendo como escopo os elementos
formais e plásticos do cinema.
Consideramos como elemento principal para articular nossa análise, a montagem
cinematográfica, compreendendo não somente sua dimensão imagética, como
também sonora. Rocha que Voa nos oferece diversas possibilidades de pensarmos
sobre a memória, ao evocar o cinema cubano em relação com o cinema brasileiro;;
a história destes dois países em suas relações com o continente africano e todas
estas possíveis aproximações, apresentadas no filme a partir da trajetória deste
Glauber Rocha que é evocado, mas também de sua história pessoal. Este filme
60
tem como ponto de partida um material sonoro de arquivo encontrado pelo
realizador em Cuba, no qual o cineasta Glauber Rocha concede um depoimento.
Glauber, que já vivia no exílio no momento em que passa por Cuba, elabora
considerações sobre o cinema brasileiro, cubando e latino americano, em vista de
sua trajetória neste cenário. O filme busca sobretudo recuperar o pensamento
político e artístico de Glauber Rocha, que se expressa nesta entrevista à qual Eryk
Rocha teve acesso. Em Rocha que Voa, coexistem imagens retiradas dos filmes
dirigidos por Glauber Rocha, filmes de outros cineastas latino americanos e
entrevistas, gravadas para a realização do filme (1999- 2002), em Cuba, com
pessoas que tiveram contato com Glauber ou que foram diretamente influenciadas
por seu cinema.
Vale ressaltar que o filme se utiliza de diversos suportes para imagem, como tipos
diferentes de película e imagens em vídeo. Além da fragmentação proporcionada
no filme pela diversidade do material e a alternância constante entre estes, faz parte
das estratégias da montagem o uso de fusões de imagens e também o a presença
de diversas camadas que compõem o som. Sons e imagens nem sempre são
sempre utilizados de forma sincrônica no filme, que busca também se inspirar do
pensamento estético do cinema de Glauber. Comparamos o uso destes materiais
no filme, ao conceito de montagem vertical apresentado por Eisenstein, no qual o
autor coteja a forma cinematográfica à musical. A sobreposição dos elementos em
muitas camadas, até a ausência total de imagens no filme, guarda de fato, muita
semelhança com uma orquestração, na qual o silêncio, um ou diversos sons
compõem a totalidade de uma estrofe musical. Os fragmentos utilizados neste filme
não são articulados na edificação de um discurso;; a narrativa assume papel
secundário ao concatenar os fatos apresentados, o filme, não tem como objetivo
principal relatar a trajetória de Glauber por Cuba, mas de expor o contato de
Glauber com o pensamento daqueles com quem ele conviveu neste período e de
que forma seu cinema e sua pessoa os marcaram.
Vincent Amiel define a montagem discursiva como aquela que: “utilizando cada
plano como um elemento significante, é de ordem <intelectual>”. Ao relacionar à
memória com a maneira como a montagem agencia estes materiais, pensamos no
conceito de bricolage, formulado por Claude Levi-Strauss, do qual se serve Roger
Bastide. O conceito de bricolage se refere, sobretudo, a traços culturais de
determinado grupo que ainda podem ser identificados em culturas diversas, mesmo
tendo estes grupos já desaparecido ou se integrados a uma nova forma de
sociedade. Cada fragmento utilizado em Rocha que Voa guarda relação com suas
origens e contextos nos quais foram produzidos, tanto no que diz respeito aos
filmes de Glauber Rocha, como também os materiais de arquivos e os mais
recentes, produzidos para o filme. Ao serem elencados na montagem, partem de
seus significados originais, assumem outro sentido, enquanto elementos que
compõem esta nova semântica do filme.
Palavras-chave
Filme Ensaio, Memória, Montagem.
Bibliografia
ADORNO, Theodor, W. O Ensaio como Forma in Notas de Literatura I, Editora 34,
São Paulo, 2003.
61
AMIEL, Vincent. Esthétique du Montage. Nathan, Paris, 2001.
BASTIDE, R. “Mémoire collective et sociologie du bricolage » [1970], Bastidiana 7-
8, 1994.
CORRIGAN, Timothy. O filme-esnsaio desde Montaigne e depois de Marker,
Papirus, Campinas, 2015.
EISENSTEIN, Sergei. A Forma do Filme, Jorge Zahar Editor, Rio de Janeiro, 1990
_____________. O Sentido do Filme, Jorge Zahar Editor, Rio de Janeiro, 1990.
FREUD, S. Notes sur le ‘bloc-notes magique’ [1925] In: Huit études sur la mémoire
et ses troubles, 1925.
HALBWACHS, Maurice. A Memória Coletiva, Centauro Editora, São Paulo, 2003.
TARKOVSKI, Andrei. Esculpir o Tempo, São Paulo, Martins Fontes, 1998
Referências Filmográficas:
ROCHA, Erik. Rocha que Voa, 2002
ROCHA, Glauber. Barravento, 1962
________. O Leão de Sete Cabeças, 1970
11h20 – 13h20
MESA 6: VISIBILIDADES CONTEMPORANEAS
Estética da Cultura Hip-Hop
Elenildes Dantas
Email: elenildes@usp.br
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: Cultura e Comunicação Audiovisual
Orientador: Ciro Juvenal Rodrigues Marcondes Filho
Resumo expandido
Quando o DJ Afrika Bambaataa lançou o hip-hop, não poderia imaginar a dimensão
que o movimento tomaria, passadas mais de quatro décadas. Criada como forma
de resistência e protesto contra a situação precária das comunidades periféricas
de negros e latinos dos Estados Unidos, a cultura hip-hop, desde então, vem se
espalhando pelas principais periferias do mundo, incluindo o Brasil. Para além de
um projeto político organizado, a própria movimentação, saindo de dentro das
periferias, já é, em si, uma revolução. Foi para dar voz aos povos da periferia e por
seus próprios meios, que surgiu o hip-hop (que significa “movimento de quadris”)
nos anos 1970, no bairro do Bronx, em Nova York, como forma de resistência e
protesto contra a situação precária das comunidades periféricas de negros e
latinos: desde então, o hip-hop vem se espalhando pelas principais periferias do
62
mundo, inclusive no Brasil. Apesar de oficialmente o hip-hop ter surgido na década
de 1970, alguns de seus elementos surgiram ainda em 1960, como o rap, o graffiti
e o funk. O hip-hop possui três elementos principais: música, dança e arte gráfica.
A música é representada pelo rap e, de certa forma, pelo funk, além dos DJ e MC
(DJ - disc jockey que cria batidas rítmicas, com pequenos trechos de música, com
ênfase em repetições (grooves), e MC – mestre de cerimônia, indivíduo que usa o
microfone para animar o público, originalmente em festas jamaicanas e
posteriormente levado para os Estados Unidos por imigrantes desse país), mas
também pelo Beatbox, técnica de percussão vocal do hip-hop, com a imitação do
som de instrumentos musicais por meio da boca. Outro elemento caracterizador do
hip-hop é a dança de rua, representada pelo break (praticado pelos dançarinos b-
boys e b-girls).
Enquanto a arte gráfica é representada pelo graffiti (ou grafito, palavra de origem
italiana que significa “escrita feita a carvão”) e pela pichação, que, na sua origem,
não apresentavam diferenciação entre si. O DJ Afrika Bambaataa é considerado o
pioneiro do hip-hop como movimento social e não apenas como expressão cultural,
ao fundar a ONG Zulu Nation, em 12 de novembro de 1973, nos Estados Unidos,
cujo lema era “Paz, União e Diversão”. Seu objetivo era o de promover a
autoafirmação dos afrodescendentes por meio da dança, da música e do grafite.
Também é creditada a Bambaataa a criação do próprio termo “hip-hop”. Um pouco
antes, em 11 de agosto de 1973, ocorreu aquilo que seria considerado o primeiro
evento do hip-hop, em uma rua do Bronx: a festa de aniversário de Cindy Campbell,
irmã do DJ Kool Herc, nome artístico do jamaicano Clive Campbell, o qual teria
levado para a América o hábito das festas de rua com carros de som, verdadeiras
discotecas portáteis. Há uma controvérsia quanto ao fato de o funk poder ser
incluído como um dos elementos da cultura hip-hop, visto que o funk tem uma
postura menos politizada que o rap. Os rappers consideram que os funkeiros estão
em busca apenas de diversão e sucesso fácil, sem muita consciência política.
Entretanto, funk e rap possuem origem comum, especialmente em referência ao
modo de fazer música a partir da base de outras, num processo de colagem.
Também existe resistência em se admitir a pichação como um dos elementos do
movimento hip-hop, uma vez que esse movimento a desaprova por considera-la
apenas uma transgressão pela transgressão, sem intenção de transformar a
realidade. O rap (rhythm and poetry - ritmo e poesia) e o graffiti são considerados
expressões genuínas do movimento hip-hop, o qual é composto pelas letras do rap
e pelas expressões visuais do graffiti, que procuram traduzir todo o sentimento de
revolta e de desejo de luta por melhores condições de vida para a população
esquecida da periferia: “O graffiti subverte o espaço urbano com suas inscrições
não permitidas por toda a cidade, demarcando territórios e expondo afiadamente a
existência de uma população historicamente invisibilizada.” (MOASSAB, 2011, p.
159). A origem do hip-hop está na cultura oral africana, especialmente, por ter
influência do rap, este relacionado aos contadores de história oral africanos.
Trazendo para o contexto nacional, o rap guarda semelhanças com a embolada e
com os repentistas nordestinos, com seus desafios e improvisações.
O hip-hop chegou ao Brasil na década 1980 com o break e o rap, no centro e na
periferia de São Paulo, e se espalhou pela periferia de outras capitais quase que
simultaneamente. O disco Hip-Hop Cultura de Rua, de 1988, é considerado a marca
63
de chegada do movimento no Brasil. São vários os rappers que participam do
álbum, entre eles, Thaíde e DJ Humberto (DJ Hum), até hoje dois dos principais
nomes do hip-hop nacional. A bem da verdade, o hip-hop chegou ao Brasil
primeiramente pela dança. Um grupo de artistas de rua encabeçado pelos b-boys
como Nelson Triunfo e o próprio Thaíde, realizava suas performances de break na
estação São Bento do metrô, no centro de São Paulo.
Palavras-chave
Cultura hip-hop, Graffiti, Estética.
Bibliografia
BERGSON, Henri. Matéria e Memória. São Paulo: Martins Fontes, 1990.
_____Ensaio Sobre os Dados Imediatos da Consciência. Lisboa: Edições 70,
1988.
CAMARGOS, Roberto. Rap e Política: percepções da vida social brasileira. São
Paulo: Boitempo, 2015.
HUISMAN, Denis. Estética. Lisboa: Edições 70, 2012.
HUNTER, Garry. A arte de rua ao redor do mundo. São Paulo: Mandras, 2013.
MEIRELLES, Renato & ATHAYDE, Celso. Um país chamado favela: a maior
pesquisa já feita sobre a favela brasileira. São Paulo: Editora Gente, 2014.
MOASSAB, Andréia. Brasil periferia(s) a comunicação insurgente do hip-hop. São
Paulo: Educ, 2011.
SILVA, Gustavo Souza da. Pontos de vista em documentários de periferia: estética,
cotidiano e política. Tese de doutorado do PPGMA/ECA da Universidad de São
Paulo. São Paulo: 2011.
Jornalismo Visual: as imagens vencedoras como representação de minorias
no Prêmio Vladimir Herzog
Beatriz Gomes Furtunato
Email: beatrizfurtunato@usp.br
Nível: Iniciação Científica
Linha de pesquisa: Iniciação Científica
Orientador: Atilio José Avancini
Resumo expandido
Desde a sua criação a fotografia se expande e, com o aumento dos meios
comunicacionais e tecnológicos, as imagens utilizadas no fotojornalismo aparecem
com grande frequência na vida dos espectadores. Porém, os seus significados,
representações, implicações e problemas éticos e sociais são pouquíssimos
estudados no cenário acadêmico brasileiro. Acredito que com esta pesquisa será
possível entender o papel do fotojornalismo como portador de mensagens,
analisando se às imagens vencedoras e as menções honrosas do Prêmio
64
Jornalístico Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos possuem pontos de
convergência às representações de minorias e sua possível colaboração na
manutenção dos estigmas sociais que recaem sob estas pessoas. Com esta
pesquisa, daremos destaque aos profissionais de fotojornalismo e fotojornalistas
brasileiros, buscando entender o funcionamento desta categoria dentro dos
veículos de comunicação nacional e, principalmente, sua disposição dentro da
premiação do Instituto Vladimir Herzog. A partir da análise das fotos premiadas nos
últimos sete anos da premiação refletiremos a escolha, papel, importância,
possibilidades de discursos das imagens e suas relações como portadoras de
significados dentro de uma notícia jornalística, além de “A linguagem fotográfica
deve se comunicar informalmente com o leitor no sentido do conhecimento. O
fotojornalismo, como portador de significado, tem condições de tornar a notícia
mais humana e ampliada.” (AVANCINI, 2017).
Também refletiremos acerca da colocação do teórico Vilém Flusser em seu livro
“Filosofia da caixa preta” (2011) onde este coloca que as “Imagens não são
conjunto de símbolos com significados inequívocos, como o são as cifras: não são
"denotativas". Imagens oferecem aos seus receptores um espaço interpretativo:
símbolos “conotativos”. A partir disso, pensaremos sobre o papel de significação
das fotografias ponderando se este papel é capaz de gerar interpretações que
colaborem a reprodução e manutenção dos estigmas que recaem sobre as
minorias sociais. Ainda referente a essa temática, buscaremos entender como a
ética jornalística pode se relacionar com o material jornalístico, compreendendo
como ocorre a escolha de fotografias e os critérios utilizados para a sua seleção
dentro dos organizadores da premiação, procurando entender o papel do fotógrafo
dentro do ato de fotografar e sua possível relação com os indivíduos e com as
narrativas visuais retratados. “Mesmo que incompatível com a intervenção, num
sentido físico, usar uma câmera é ainda uma forma de participação. Embora a
câmera seja um posto de observação, o ato de fotografar é mais do que uma
observação passiva” (SONTAG, 2004).
Palavras-chave
Fotojornalismo;; Estigmas;; Significação.
Bibliografia
AVANCINI, ATÍLIO. A expansão do fotojornalismo. Revista Extraprensa. São Paulo,
v.11, n.1, 2017.
AVANCINI, Atílio. A imagem fotográfica do cotidiano. Brazilian Journalism
Research, v. 7, p. 50-68, 2011.
BARTHES, ROLAND. A câmara clara;; Trad. Julio Castanon Guimarães. São Paulo,
SP: Nova Fronteira, 2015.
DUBOIS, Philippe. O ato fotográfico. Campinas: Papirus, 1994.
FLUSSER, Vilém. Filosofia da caixa preta - ensaios para uma futura filosofia da
fotografia. São Paulo, SP: Annablume, 2011.
FREUND, Gisèle. Fotografia e Sociedade. Lisboa, Portugal: Vega, 1989.
MACHADO, Arlindo. A Ilusão Especular. São Paulo: Brasiliense⁄∕Funarte, 1984.
65
MARTINS, José. Sociologia da fotografia e da imagem. São Paulo, SP: 2.ed,
Editora Contexto, 2014.
SONTAG, Susan. Diante da dor dos outros;; trad. Rubens Figueiredo. São Paulo,
SP: Companhia das letras, 2011.
_____________. Ensaios sobre fotografia;; trad. Rubens Figueiredo. São Paulo, SP:
Companhia das letras, 2004.
O estigma do jovem em conflito com a lei no cinema e na televisão
Caio Túlio Padula Lamas
Email: caiolamas@uol.com.br
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: Cultura e Comunicação Audiovisual
Orientador: Rosana de Lima Soares
Resumo expandido
Esta pesquisa tem como foco as inter-relações das estratégias de representação
do jovem em conflito com a lei na televisão e no cinema brasileiro pós-retomada,
tomando como objetos específicos de estudo filmes e programas lançados e
exibidos a partir dos anos 2000 e que tenham como destaque central em seus
enredos o tema do jovem autor de ato infracional. Também foi considerada a
variedade de gêneros, indo da grande reportagem de TV ao drama, da não-ficção
à ficção. Foram escolhidos os programas de televisão Cidade dos Homens,
Repórter Record, Conexão Repórter e Profissão Repórter, e os longas-metragens
Cidade de Deus, Querô, “Juízo: Jovens Infratores do Brasil e De Menor. A hipótese
central é a de que os discursos veiculados na mídia televisiva são em sua maioria
unívocos em circunscrever esse tipo de infrator sob a condição do jovem negro,
pobre, perigoso, violento e impune. Este viés discursivo é assimilado parcialmente
pela cinematografia nacional, sobretudo aquela de maior circulação e público.
Contraposições mais efetivas a esse discurso surgem em uma cinematografia
brasileira de circulação mais reduzida e em parte da programação televisiva de
veiculação não diária. A abordagem a ser utilizada combina referenciais teóricos
das Ciências da Linguagem, das Ciências Sociais, do Cinema, da Comunicação e
de outros campos, incluindo autores como E. Goffman, B. M. Mazzara, T. Tadeu
da Silva, N. Elias, P. Charadeau, R. L. Soares, M. R. Gomes, R. Stam, J. Aumont,
A. Machado e E. Hamburger.
Palavras-chave
menor infrator, discurso circulante, cinema brasileiro
Bibliografia
CHARAUDEAU, Patrick. Discurso das mídias. São Paulo: Contexto, 2013.
ELIAS, N.;; SCOTSON, J. L. Os Estabelecidos e os Outsiders. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar, 2000.
GOFFMAN, E. Estigma. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1978.
66
HAMBURGER, Esther. Violência e pobreza no cinema brasileiro recente: reflexões
sobre a ideia de espetáculo. Revista Novos Estudos, 78, julho de 2007, p. 113-128.
MAZZARA, B. M. Estereotipos y prejuicios. Madri: Acento Editorial, 1999.
SOARES, Rosana de Lima. De palavras e imagens: estigmas sociais em discursos
audiovisuais. Revista da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação
em Comunicação. E-compós, Brasília, v.12, n.1, jan/abr. 2009.
SHOHAT, E.;; STAM, R. Etnicidades-em-relação. In: Crítica da imagem
eurocêntrica: Multiculturalismo e representação. São Paulo: Cosac Naify, 2006.
TADEU DA SILVA, T. Identidade e diferença. Rio de Janeiro: Petrópolis, Vozes,
2000.
Mataram meu irmão: em busca do sujeito e da visibilidade periféricos
Aline Silva de Senzi
Email: alinesenzi@gmail.com
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: Cultura e Comunicação Audiovisual
Orientador: Rosana de Lima Soares
Resumo expandido
O projeto de mestrado se propõe a analisar o documentário Mataram meu irmão
(2013), de Cristiano Burlan, como uma possível intersecção entre duas tendências
do documentário brasileiro contemporâneo: a representação da periferia, e os
documentários autobiográficos subjetivos. O longa-metragem é tido como um ponto
de partida para tratar questões de visibilidade no campo do cinema e da cultura
midiática.
Introdução: Mataram meu irmão (2013) se inicia com a conversa telefônica do
diretor, Cristiano Burlan, com uma funcionária do cemitério onde seu irmão, Rafael,
estava enterrado, após ter sido morto a sete tiros no Capão Redondo, bairro
periférico da cidade de São Paulo onde o diretor havia passado boa parte da
infância e adolescência junto a seu irmão. Os restos mortais de Rafael haviam sido
removidos, segundo Cristiano, sem quaisquer explicações. Já a funcionária justifica
o deslocamento devido ao tipo de contrato que havia sido feito. Ao perguntar se
seria possível resgatar estes restos, ele se depara com a burocracia para ter acesso
ao corpo do irmão.
A cena inicial de Mataram meu irmão apresenta a questão que se torna crucial para
esta pesquisa. Em que momento seu irmão passou a ser apenas um conjunto de
restos mortais, uma soma de partes que não configuram um todo, isto é, um
sujeito? É nesta busca subjetiva pelo “sujeito” que parte o diretor. Nesta jornada,
ele não apenas narra sua própria história pessoal, mas também constrói um retrato
sobre a violência urbana e sobre uma experiência compartilhada por muitos dos
moradores da periferia da capital paulista. A dissertação pretende analisar de que
modo o documentário Mataram meu irmão se inclui no jogo que define o que
67
merece se tornar visível (HAMBURGER, 2007) no campo do cinema e da cultura
midiática, seja pelos elementos construtivos do próprio documentário, seja por seu
contexto sociocultural de produção. Para isso, serão revistos alguns dos principais
documentários brasileiros que levantam o tema das periferias e violência urbanas.
A pesquisa revisitará a bibliografia que debate o tema no Brasil, assim como para
os documentários que têm a subjetividade como elemento central para discussões
autobiográficas circunscritas em uma determinada discussão histórica. Por fim,
serão identificados o modo com que Mataram meu irmão retrata o assunto, os
métodos e os elementos estéticos adotados. Desta maneira, a dissertação tem a
intenção de poder contribuir para a discussão em torno do cinema documentário
como ferramenta de representação e visibilidade periférica.
Metodologia: Para abordar o documentário a partir dos eixos da visibilidade e
subjetividade, será feita uma revisão bibliográfica de teorias multidisciplinares,
abrangendo a teoria do cinema, análise de discurso, estudos culturais, com ênfase
no multiculturalismo, e sociologia. O documentário será estudado dentro daquilo
que Esther Hamburger (2007) chama de “disputa pelo controle da produção de
visualidade”. Situações de pobreza e violência estiveram presentes ao longo da
história do cinema moderno no Brasil, notadamente na década de 60. A respeito
dos documentários, o estudioso norte-americano Michael Renov aponta que o
gênero foi marcado pela impressão de realidade do cinema potencializada pela
ideia que se tem do cinema de não-ficção, assim como pela influência da
objetividade do telejornalismo. Desta maneira, enquanto o cinema de ficção ficou
atrelado ao campo da subjetividade, o documentário foi mais associado à
objetividade e à ciência. Dos anos 1990 para cá, no entanto, uma quantidade
notória de cineastas vem colocando numa posição central a representação do self
e, consequentemente, a subjetividade no documentário (RENOV, 2004).
Ainda segundo Renov, o trabalho de alguns documentaristas autobiográficos, que
representam sua própria subjetividade, serve para discutir aquilo sobre os quais os
teóricos pós-modernistas também versam, em um entendimento de que a história
e a subjetividade são conceitos que se transpassam mutualmente - o que chama
de “subjetividade social”. O documentário adota ainda uma abordagem classificada
como “modo performático” por Bill Nichols (2016), que questiona o conhecimento
científico como melhor método para apreensão de questões sociais e políticas.
Considerações finais Vencedor do Mataram meu irmão do prêmio de melhor
documentário brasileiro de longa-metragem no festival É Tudo Verdade, no ano de
seu lançamento, o documentário pode ser tido como mais um marco no jogo de
visualidade que determina aquilo que é visível ou não no campo do cinema e da
cultura midiática, como estuda Esther Hamburger (2007).
Palavras-chave:
Documentário, periferia, visibilidade, subjetividade.
Bibliografia
BERNARDET, Jean-Claude. Cineastas e imagens do povo. São Paulo, Brasiliense,
1985.
68
HAMBURGER, E. “Políticas da representação: ficção e documentário em Ônibus
174”. In: Mourão, Maria Dora & Labaki, Amir. O cinema do real: organização de
Maria Dora Mourão e Amir Labaki. São Paulo: Cosac Naify, 2005, p. 142-157.
________________. Violência e pobreza no cinema brasileiro recente: reflexões
sobre a ideia de espetáculo. In: CEBRAP, Novos Estudos, São Paulo, n.78, p. 113-
128, jul, 2007.
LINS, C.;; MESQUITA C. Filmar o real: sobre o documentário brasileiro
contemporâneo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2008.
NICHOLS, B. Introdução ao documentário/Bill Nichols;; trad.: Mônica Saddy
Mantins. - 6a ed. - Campinas, SP: Papirus, 2016. (Coleção Campo Imagético).
RENOV, M. The subject of documentar. Minneapolis University of Minnesota Press
: c2004.
STAM, R. Introdução à teoria do cinema;; trad. Fernando Mascarello. - 5a edição -
Campinas, SP: Papirus, 2013. - (Coleção Campo Imagético)
Comparação do New Queer Cinema com filmes LGBT atuais: a fascinação
continua?
Ricardo Sant'Anna, Mariana Suzuki e Ângelo Lopez
Email: ricardo.santanna@usp.br
Linha de pesquisa: Iniciação Científica
Orientador: Esther Império Hamburger
Resumo expandido
O trabalho foi feito a partir da leitura dos textos da B. Ruby Rich “New Queer
Cinema” e “After New Queer Cinema”. Neles, a autora cita alguns filmes e comenta
sobre como eles apresentam semelhanças e diferenças na forma de ser “queer”.
Alguns traços em comum são apropriação, ironia, reconstrução da história com
construtivismo social, e esses filmes são irreverentes e cheios de prazer. A partir
dessa análise, assistimos e pesquisamos sobre dois filmes citados: Línguas
Desatadas (1989), do Marlon Riggs e Veneno (1991), do Todd Haynes.
Comparamos eles com dois filmes atuais: Moonlight (2016), do Berry Jenkins e
Carol (2016), também do Todd Haynes. Por meio dessa comparação, concluímos
que os filmes atuais perderam o caráter embativo que os do New Queer Cinema
traziam, tanto no conteúdo quanto na forma.
Moonlight e Carol foram feitos de modo a serem mais aceitos pela maior quantidade
possível de pessoas, tanto que fizeram boa bilheteria e foram exibidos em circuito
comercial. Eles não quebram com a normatividade existente na sociedade, mesmo
se tratando de personagens gays e lésbicas, pois são narrativas de descoberta da
sexualidade tratadas de maneira convencional, com imagens higienizadas. Já
Línguas Desatadas e Veneno apresentam trabalhos energéticos, cheios de prazer
e de críticas, em narrativas que fogem do imaginário comum sobre histórias de
personagens LGBTs. Esses filmes, nos anos 90, já ultrapassaram a questão da
descoberta de sexualidade e tratavam de temas como HIV, sexo e desejo,
69
violência, etc. Em termos da linguagem, há mistura de gêneros em ambos os filmes,
desde cenas musicais a cinema direto, cenas inspiradas em filmes B sci-fi dos anos
50, entrevistas (tanto reais quanto ficcionalizadas), etc. Há novos e dissidentes
modos de afeto e prazer retratados nos filmes do New Queer Cinema. Essas obras
eram exibidas apenas em festivais e foram responsáveis por provar que havia um
público para esse tipo de filme. Com isso, sentimos que os filmes atuais perderam
o caráter queer apresentado pelo New Queer Cinema.
Palavras-chave
Queer, LGBT, filme, comparação
Bibliografia
RICH, B. Ruby. “New Queer Cinema”.
RICH, B. Ruby. “After New Queer Cinema”.
SCHOONOVER, Karl. GALT, Rosalind. “O mundo do cinema queer: da estética ao
ativismo”.
ARAÚJO, Tatiana Brandão de. “O que é cinema queer, companheir@s?”
HARTMAN, Andi. “Structural/Sexual Transgression: Todd Haynes’ Poison as a
Critique of Homonormativity”.
RUCAS, Derek P. “Empowerment and Gay/Black Viewership in ‘Tongues Untied’”
WATTS, Stephanie. “Moonlight and the performativity of masculinity”
14h30 – 16h30
MESA 7: MULHERES NO AUDIOVISUAL
Helena Ignez e o caso Belair: a atriz/produtora e a produção experimental
Anna Karinne Martins Ballalai
Email: annaballalai@usp.br
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Rubens Luis Ribeiro Machado Junior
Resumo expandido
Este trabalho é parte da minha pesquisa de doutorado, intitulada “O ator e o cinema
moderno no Brasil”, desenvolvida desde 2017 no Programa de Pós-Graduação em
Meios e Processos Audiovisuais da ECA/USP, com a orientação do Prof. Dr.
Rubens Luís Ribeiro Machado Júnior e como bolsista CAPES. Esta pesquisa
propõe o estudo das relações entre o trabalho do ator no meio de expressão
cinematográfico e o debate sobre o cinema moderno no Brasil – este último
compreendido como um recorte conceitual historicamente determinado, com
70
ênfase nas discussões das décadas de 1960-70, oriundas do cenário teórico
consolidado após a II Guerra Mundial. Serão tomados como eixos centrais de
análise a produção textual e discursiva e a produção fílmica. Interessa investigar,
por um viés historiográfico e pela análise fílmica, diferentes estilos de interpretação
e de atuação de atores em filmes do cinema moderno brasileiro, procurando
compreender a circulação de atores e atrizes, personas e personagens, ideias,
métodos, experiências e práticas, notadamente nos filmes ligados ao Cinema Novo
e ao Cinema Marginal. Tal investigação está vinculada ao Grupo de Pesquisa
(CNPq) do qual faço parte: História da Experimentação no Cinema e na Crítica
(HECC), liderado pelo Prof. Dr. Rubens Machado Júnior.
No doutorado, uma das figuras de destaque será a atriz e cineasta Helena Ignez,
detentora de uma trajetória exemplar no moderno cinema brasileiro. Tal trajetória
vem sendo objeto de minhas investigações desde o meu trabalho como
pesquisadora profissional nos Arquivo Tempo Glauber (RJ), no Setor de
Documentação da Cinemateca do MAM-RJ, e no Arquivo Rogério Sganzerla. Na
pesquisa acadêmica, venho me debruçando sobre o trabalho da atriz Helena Ignez
no âmbito do cinema moderno desde a minha dissertação de mestrado, “O ator-
em-ato: a dialética ator/personagem em Copacabana mon amour”, defendida em
2014.
Para a presente comunicação nesta VII Jornada Discente se coloca um duplo
objetivo: 1) Por um lado, compreender a experiência da Belair Filmes em suas
estratégias de produção calcadas num investimento primordial no trabalho do ator,
num flerte com o cinema experimental, com a produção independente de baixo
orçamento, e com um cinema de contestação política, em plenos “Anos de
Chumbo” da Ditadura Civil-Militar no Brasil. 2) Por outro, investigar, à luz da
trajetória da atriz/cineasta Helena Ignez, nas décadas de 1960-70, se é lícito atribuir
à artista a dupla função de “atriz/produtora”, no caso Belair Filmes. Em O pátio
(1958) sua participação na produção e viabilização do filme de estreia de Glauber
Rocha (também o da própria Ignez) é mencionada apenas em caráter episódico.
Consideramos válido, no entanto, investigar com profundidade a participação de
Helena Ignez como sócia-fundadora da Belair, como deflagradora do projeto e
eventualmente desempenhando o papel de produtora. Se esta hipótese for factível,
cabe perguntar se este gesto representaria uma tentativa de dar continuidade ao
caráter “imprevisível e original dentro do panorama do cinema brasileiro” de seu
trabalho de atriz em A mulher de todos (Sganzerla, 1969), citando aqui o cineasta
Rogério Sganzerla na controversa entrevista ao Pasquim “A mulher de todos e seu
homem”, publicada originalmente em fevereiro de 1970. Destacamos na referida
entrevista, a postura autocrítica e a atitude deliberada da atriz, bem como a de
Sganzerla, de romper com a tradição cinemanovista. Mas como pensar essa
ruptura não apenas na ordem do discurso, mas investigando o projeto de cinema,
que a partir de uma iniciativa de Ignez, em tese, vai reunir, na Belair, três
promissoras trajetórias: a da própria atriz, a de Julio Bressane e a Rogério
Sganzerla?
Podemos atribuir a esta aposta de Helena Ignez na criação de uma “empresa”
cinematográfica o status de um pensamento, uma reflexão, acerca das condições
de criação do ator em cinema, no sentido de propor certa autonomia do ator no
âmbito da realização cinematográfica? De que maneira Helena Ignez estaria assim
71
contribuindo para uma práxis de cinema moderno no Brasil? E, comparativamente
à inovação formal do ponto de vista da criação do ator em A mulher de todos, como
podemos analisar as personagens femininas e o trabalho de atriz de Ignez, de
forma diversa, nos filmes de Bressane e de Sganzerla, realizados na Belair? De
que forma a análise fílmica pode “dar a ver” um trabalho de construção de
personagem que em cinema, como já argumentamos em nossa dissertação de
mestrado, “O ator-em-ato: a dialética ator/personagem em Copacabana mon
amour”, depende não apenas do trabalho do ator, mas dos modos de produção, do
estilo de direção de atores e da atuação de outros técnicos, atores e membros da
equipe? Sendo assim, analisar a atuação de Helena Ignez em diferentes filmes da
Belair, mas relativamente num mesmo contexto de produção, poderá ser prolífico
para estudar a versatilidade e a diversidade de processos de construção de
personagem no que tange ao seu trabalho de ator.
Palavras-chave
Ator cinematográfico;; Cinema Moderno no Brasil;; Cinema Experimental;; Helena
Ignez;; Belair Filmes
Bibliografia (Máximo de 1000 caracteres)
ARAÚJO, L.C. Joaquim Pedro de Andrade: primeiros tempos. São Paulo: Alameda,
2013.
BALLALAI, A.K. O ator-em-ato: a dialética ator/personagem em Copacabana mon
amour. Dissertação de Mestrado apresentada ao PPGPS/UERJ. Rio de
Janeiro:2014.
BAZIN, A. O que é cinema? São Paulo: Cosac Naify, 2014.
CANDIDO, A. et al. A personagem de ficção. S. Paulo:Perspectiva, 1976.
CARVALHO, M.S. A nova onda baiana: cinema na Bahia 1958/1962. Salvador:
EDUFBA, 2003.
GOMES, P.E.S. Crítica de cinema no Suplemento Literário. Vols. I e II.Rio de
Janeiro: Paz e Terra,1981.
MACIEL, L.C. “O ator e o novo realismo do cinema”. In: COSTA, F. M. et al. Cinema
moderno, Cinema Novo. Rio: José Alvaro, 1966.
MELO, L.A.R. Produção, distribuição e exibição no Rio de Janeiro (1948-54). Tese
apresentada ao PPGCOM UFF. Niterói: 2011.
PUPPO, E.[org]. Cinema marginal brasileiro e suas fronteiras. S. Paulo: Heco,
2004.
SGANZERLA, R. Rogério Sganzerla: Encontros. CANUTO, R.[org] Rio: Azougue,
2007.
Trajetória da direção cinematográfica de Helena Ignez
Gabriela Maruno
Email: gabrielamaruno@gmail.com
Nível: Doutorado
72
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Ismail Norberto Xavier
Resumo expandido
Os filmes dirigidos por Helena Ignez ultrapassam as referências ao cinema
marginal e se constituem como um corpus cinematográfico contemporâneo de
características e relevância próprias. Acredita-se que se trata de uma produção
fílmica que não se obriga a ser contígua ao cinema das décadas de 1960 e 1970,
e que se configura como a expressão autoral de uma cineasta de particular domínio
técnico das ferramentas audiovisuais disruptivas e das temáticas pertinentes ao
atual período histórico e social no qual se enquadram suas obras. Dirigindo curtas
e longas-metragens desde 2003, tendo estreado seu 9º filme em 2017, Helena
Ignez é personagem constante de mostras e entrevistas que a exaltam como atriz-
musa do cinema brasileiro.
No entanto, essas ações pouco têm debatido sobre seu trabalho como diretora,
roteirista e produtora. Há indícios de uma importante contribuição realizada pelas
obras dirigidas por Helena, passível de análise crítica sob a ótica da metodologia
cinematográfica, e que a incluem no rol das realizadoras de destaque na
historiografia do cinema brasileiro. O objeto a ser investigado é a construção da
trajetória da cineasta, ou seja, os limites estéticos pelos quais Helena Ignez escolhe
seguir ou burlar, e qual o alcance da sua contribuição artística para o cinema
nacional experimental. Sabe-se, de antemão, que vão além de seu trabalho como
atriz e dos estigmas construídos sobre a sua vida pessoal.
Palavras-chave
Helena Ignez;; Cinema Brasileiro;; Cinema Experimental.
Bibliografia (Máximo de 1000 caracteres)
ANCINE. Anuário OCA 2016. Grupo de Estudos Multidisciplinar da Ação afirmativa.
Boletim GEMAA n.2, 2017.
GUIMARÃES, Cao. Gambiarras. San Juan, II Trienal Poligráfica de San
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HOLLANDA, Heloísa Buarque de (org.). Realizadoras de cinema no Brasil: 1930-
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HONNETH, Alex. Invisibilidade: sobre la epistemologia moral del reconnocimiento
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VANOYE, Francis;; GOLIOT-LÉTE, Anne. Ensaio sobre a análise fílmica.
Campinas: Papirus, 2008 (5ª edição).
XAVIER, Ismail. Alegorias do subdesenvolvimento: cinema novo, tropicalismo,
cinema marginal. São Paulo: Cosac Naify, 2012.
73
A experiência pioneira de Rita Moreira
Lívia Perez
Email: livia@doctela.com.br
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Esther Império Hamburger
Resumo expandido
No fim da década de 1970 as ‘minorias’ sociais no Brasil iniciaram lutas para
ampliar a noção de direitos políticos e cidadania para além das fronteiras
tradicionais atendidas pela política convencional. O clima social e político
experimentado face à ditadura militar brasileira (1964-1985) ajudou a delinear
diferentes experiências. O impacto dessas experiências - ora no exílio, ora face à
repressão - na geração que esteve empenhada na luta por direitos dos grupos
sociais minoritários nos anos 1980 recupera impressões a partir dos anos 1960,
tecendo referências à contestação cultural vivida tanto no exterior, quanto no Brasil
pela aproximação dos círculos culturais. Neste panorama a militância política se
expande contemplando temáticas para além das clássicas questões da esquerda,
ou seja, temas do indivíduo e de costumes. É o momento histórico no qual surgem
organizações e grupos interessados em renovar o sistema social e político do país.
Aos poucos os coletivos e grupos se organizam, criando espaços de resistência,
sobrevivendo com princípios diferentes daqueles aplicados na sociedade brasileira
patriarcal. No mesmo período, a popularização do vídeo permitiu o acesso aos
meios de produção audiovisual a grupos e pessoas interessados nas questões
ditas ‘minoritárias’. Com o vídeo, realizadores que vinham ensaiando formas
alternativas desde o 16 mm, estabelecem uma produção mais econômica e,
portanto, mais independente. Neste contexto são criados coletivos feministas de
vídeo como o Comulher e o Lilith Video, espaços simbólicos nos quais a experiência
do vídeo conjugou-se à resistência cultural e estética de representações. Ainda,
alguns realizadores insólitos trabalharão em consonância com movimentos
populares em suas obras. Rita Moreira, escritora, poeta, editora e cineasta é uma
destas realizadoras com o diferencial de que ela mesma teve a experiência da
efervescência cultural nos Estados Unidos desde os anos 1970, onde iniciou sua
carreira. Ela integra a geração pioneira do vídeo independente no Brasil, formando-
se em vídeo documentário pela New School for Social Research, em Nova York,
no começo dos anos 1970, período no qual foi correspondente do semanário
Opinião. Com Norma Bahia Pontes dirigiu quase vinte filmes concentrando sua
abordagem em quatro áreas de interesse: feminismo, homossexualidade, ecologia
e movimentos identitários. Seus documentários como Temporada de Caça, She
has beard, Lesbian Mothers, As Sibilas, A Dama do Pacaembu, entre outros foram
exibidos e premiados em festivais nacionais e internacionais.
São filmes que tencionam os limites entre o documentário clássico e a videoarte,
lançando luz sobre porções da sociedade geralmente colocadas à margem nos
grandes centros urbanos. O estudo propõe-se a apresentar sua filmografia e
observar a forma como as questões das minorias sociais, em suas obras,
perpassam a militância não sendo por elas comprimidas nem encerradas num
modelo de filme militante autoritário e panfletário. Recorrendo à análise de alguns
74
de seus curtas-metragens, esta reflexão identifica os elementos estéticos de sua
obra entendendo que a abordagem da autora propõe uma linguagem do vídeo
ressignificada fora de sua expressão industrial hegemônica mais conhecida.
Palavras-chave
vídeo;; feminismo;; identidade.
Bibliografia
D. BOYLE. Subject to change: Guerilla Television Revisited. Nova Iorque: Oxford
University Press, 1997.
MACHADO, Arlindo. Made in Brasil: Três Décadas do Vídeo Brasileiro. São Paulo:
Itaucultural, 2003.
MARSCH, Leslie. Brazilian Women's Filmmaking: From Dictatorship to Democracy.
University Illinois Press, 2012.
MARTIN D, SHAW D. Latin American Women Filmmakers: Production, Politics,
Poetics. London: I. B. Tauris, 2017.
PERUZZO, C.M.K. Comunicação nos movimentos populares: a participação na
construção da cidadania. Petrópolis: Vozes, 2004.
ROSA, María Laura. Disidencias sexuales y video documental feminista en los años
70. Arte y políticas de identidad. vol.16 Jun. 2017 p. 37-54.
SANTORO, L.F. A imagem nas mãos: vídeo popular no Brasil. São Paulo: Summus,
1989.
SOBRINHO, Gilberto Alexandre. Vídeo e televisão independentes no Brasil e a
realização de documentários. Lumina. n.8. UFJF: 2017.
75
fazer com que as imagens alheias sirvam a seu próprio propósito, através do poder
transformador da montagem.” (WEES, 1993).
No artigo “A subjetividade e as imagens alheias: ressignificação” (2000), Jean-
Claude Bernardet reflete sobre o processo de criação de seus dois filmes de found
footage: São Paulo, Sinfonia e Cacofonia (1994) e Sobre os Anos 60 (1999).
Bernardet devota especial atenção para a forma como o conceito de autoria se
coloca em filmes como esses, nos quais o realizador não tem controle sobre a mise-
en-scène, que foi considerada a grande marca do cinema de autor pela crítica
francesa, por exemplo. Bernardet trabalha com o conceito de ressignificação,
cunhado por Judith Butler, para sugerir que o procedimento pode ser especialmente
potente para aqueles que tem a sua identidade definida por terceiros, no seu caso,
a população LGBTQI. O conceito de ressignificação parte da ideia de que as
identidades são efeitos da sociedade em que vivemos, ou, em outras palavras, são
produzidas culturalmente a partir de repetições de gestos, de ações. Essa ideia da
identidade como algo que não é fundante ou fixo abre o campo para certas
possibilidades de ação sobre essas identidades, ainda que restritas pela cultura
dominante. Sendo o cinema um campo importante de construção dessas
identidades, faz sentido pensar a apropriação do material alheio como um gesto de
ressignificação dessas identidades forjadas pelo discurso dominante. A tradição
dos estudos de gênero no cinema vem se detendo desde os anos 1970 sobre a
construção da imagem e da identidade das mulheres a partir do cinema.
Em seu artigo pioneiro “Visual Pleasure and Narrative Cinema”, publicado em 1975
na revista Screen, Laura Mulvey usou o modelo da psicanálise para situar a mulher
no cinema clássico como apresentada no lugar de objeto do olhar fetichista, fonte
de prazer visual, enquanto o homem seria o sujeito, fonte de identificação e
movimento narrativo. Ainda que o artigo tenha sido revisado tanto por Mulvey
quanto por outras pensadoras, ele permanece como importante ponto de partida
para pensar a construção imagem da mulher no cinema dominante. Vinte anos
depois, Mulvey faz uma distinção entre o fetichismo e a curiosidade a partir da
intenção do olhar. O olhar fetichista super-valoriza a aparência, para esconder uma
realidade que lhe é temível, enquanto o olhar curioso procura desvelar o que está
por baixo da superfície;; é um olhar que investiga. Sugerimos que a prática do found
footage se aproxima de um exercício do olhar curioso, através dos recursos de
montagem que emprega - aceleração, repetição, fragmentação, substituição de
banda sonora, montagem de correspondências, entre outros. Nesses casos, não
se trata apenas de destruir o prazer visual, mas muitas vezes deslocar esse prazer
da figura feminina para o evocar de outras maneiras, pelos cortes ou pela textura
da imagem, por exemplo, ou pelo prazer da descoberta de algo novo nessas
imagens. O found footage passa a ser um recurso usado com mais frequência na
década de 1950, com as vanguarda norte-americana do pós-guerra. Essa
popularização do uso de materiais alheios se dá justamente em um período no qual
as imagens se proliferavam em diversos sentidos. A televisão trazia para dentro
dos lares uma infinidade de imagens jornalísticas, publicitárias, além de filmes e
seriados que ditavam qual deveria ser o estilo de vida da família americana.
O começo da vanguarda americana é marcado por grandes nomes masculinos
tidos como gigantes, mas a geração seguinte, atuante principalmente nos anos
1980, abarca uma plurissemia de vozes, e vai permitir a atuação de diversas
76
mulheres que empregam o found footage de maneira feminista, entre elas Abigail
Child, Su Friedrich, Leslie Thornton e Peggy Ahwesh. Essa nova geração, nascida
e criada na era da televisão, vai estabelecer uma relação mais dialética com as
imagens apropriadas, que muitas vezes são parte de um imaginário afetivo das
realizadoras. Além disso, o desenvolvimento do movimento feminista vai permitir
que essas cineastas assumam posturas feministas em seus trabalhos, colocando
em debate questões como identidade, corpo, violência, pornografia, entre outras, e
o found footage se mostra campo fértil para essa exploração.
Palavras-chave
gênero;; found footage;; mulheres.
Bibliografia (Máximo de 1000 caracteres)
BERNARDET, Jean-Claude. A subjetividade e as imagens alheias: ressignificação.
In: BARTUCCI, G. (org). Psicanálise, cinema e estéticas de subjetivação. Rio de
Janeiro: Imago, 2000.
BRENEZ, Nicole;; CHODOROV, Pip. Cartografia do found footage. Revista Laika,
São Paulo, v. 3, n. 5, jun. 2015.
DE LAURETIS, Teresa. Technologies of Gender: Essays on Theory, Film, and
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LEYDA, Jay. Films beget films. A study of the compilation film. Londres: Georg Allen
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MULVEY, Laura. "Visual Pleasure and Narrative Cinema." Screen, v. 16, n. 3, p. 6-
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RUSSELL, CATHERINE. Archiveology: Walter Benjamin and archival film practices.
Durham : Duke University Press, 2018.
WEES, William C. Recycled Images: the Art and Politics of Found Footage Films.
New York: Anthology Film Archives, 1993.
16h50 – 18h50
MESA 8 – MONTAGEM E PROCEDIMENTOS NARRATIVOS
A repetição no cinema brasileiro moderno: notas introdutórias
Alexandre Wahrhaftig
Email: lecowar@gmail.com
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Cristian da Silva Borges
77
Resumo expandido
“Nós estamos condenados! Nós estamos condenados!” grita para os céus o Cristo
Militar (Tarcísio Meira). Ele repete o grito, repete sua constatação de que houve
uma implosão e de que serão tragados pelo “abismo”. Aurora Madalena (Ana Maria
Magalhães) está ao seu lado e pede que ele mate o industrial Brahms. O casal, à
beira do mar, parece em estado de transe. A câmera, inquieta e afoita, acompanha
a euforia dos personagens, enquadrando e desenquadrando-os sem cessar. A
música cresce, mas logo em seguida diminui. Silêncio. Um fade out feito com o
diafragma da lente sugere o fim da cena. Escuro e silêncio. Mas eis que tudo
novamente retorna e a cena se reinicia: “Nós estamos condenados! Nós estamos
condenados!”. A cena descrita, em sua constante repetição, pertence ao filme A
idade da terra (1980), de Glauber Rocha, um filme atravessado pela forma da
repetição. Há mais de uma sequência, por exemplo, em que o personagem de
Tarcísio Meira repete sem cessar um determinado discurso. Em outros momentos,
a repetição se dá pela intrusão da voz do diretor na cena: Glauber surge, em off,
pedindo aos atores que refaçam os diálogos com mais intensidade, o que ocorre
em seguida.
Apesar da singularidade de tal mise en scène de repetição, o filme A idade da terra
não é um caso isolado. Ao longo da história do cinema brasileiro moderno,
encontraremos diversos filmes nos quais a repetição se manifesta com tamanha
força a ponto de assumir não apenas uma centralidade estilística, mas inclusive
uma dimensão estruturante. Há o caso emblemático de Bang bang (1971) de
Andrea Tonacci, que, além de ser marcado por um movimento cíclico, chega ao
ponto de repetir a cena inicial de forma quase idêntica no meio do filme. Podemos
destacar também os filmes de Rogério Sganzerla e Júlio Bressane, do período de
sua produtora Belair. Em Copacabana mon amour (Rogério Sganzerla, 1970), por
exemplo, Sônia Silk e a Turista Argentina (interpretadas por Helena Ignez e Lillian
Lemertz) repetem as falas de um diálogo desencontrado como se não interagissem
de fato entre si. Não é possível, e nem desejável, generalizar um sentido único para
a recorrência da repetição no cinema brasileiro do período, mas o fato de ela
atravessar a obra de diferentes cineastas faz com que indaguemos as ligações
entre esse específico elemento formal-narrativo e a multiplicidade estética dessa
cinematografia. Levantamos a hipótese não apenas da possibilidade de tais
ligações, mas da configuração, através da repetição, de um singular pensamento
estético e político que cabe investigar mais detidamente pela análise dos filmes.
Para guiar nossa pesquisa, propomos quatro prismas sob os quais a repetição pode
ser pensada no cinema brasileiro, cada um atentando para um efeito particular de
sua forma. Em primeiro lugar, há o prisma da agressividade: a repetição seria uma
forma agressiva de apresentar o texto fílmico, quebrando a suposta continuidade
do fluxo temporal das imagens e sons. A repetição pode aparecer tanto sob a forma
compacta e agressiva do faux-raccord, quanto pelas insistentes reiterações de falas
que entravam uma possível progressão narrativa.
A repetição também pode aludir ao processo de filmagem como no caso da voz do
Glauber instruindo o elenco ou no caso do episódio de Carlos Reichenbach para o
filme As libertinas, no qual, segundo Fernão Ramos “algumas ações são repetidas
78
em sequência, como se o montador, distraído, tivesse se esquecido de separar
diferentes tomadas de uma mesma cena do copião” (RAMOS, 1987, p. 69).
Aqui, surge o prisma do meta-cinema para pensarmos a repetição. Mas mais do
que incorporar o processo à obra, a repetição pode evidenciar a estrutura interna
do filme pela serialização explícita de seus procedimentos: é o caso de Bang-bang.
Um terceiro ponto é a performatividade. A repetição pode emergir diretamente
através dos corpos em cena, intensificando o caráter performático dos atores e
atrizes (em contraposição a um caráter representacional das personagens). A
montagem cede lugar a longos planos-sequências e, ao invés do corte articular
repetições, são os corpos, em continuidade, que fornecem a descontinuidade
repetitiva por seus gestos e falas, âmbito em que cinema da Belair é exemplar. O
quarto prisma de abordagem da repetição, que atravessa todos os outros,
apresenta-se como pergunta: haveria um pensamento histórico-político envolvido
na sua incorporação cinematográfica? Há filmes que sugerem ligações explícitas
entre repetição e contexto histórico – em Jardim das espumas (1970), de Luiz
Rosemberg Filho, a repetição aparece articulada à tortura;; ou em Manha cinzenta
(1969), de Olney São Paulo, a repetição das primeiras imagens no fim do filme
intensifica a sensação de sufocamento da ditadura. Para além de tais ligações
explícitas, indagamos: que pensamento a repetição pode engendrar acerca da
temporalidade e da história nos diferentes filmes brasileiros do período?
Palavras-chave
cinema novo, cinema marginal, repetição, Glauber Rocha, Rogério Sganzerla
Bibliografia (Máximo de 1000 caracteres)
BELLOUR, R. Cine-Repetitions. Screen, v. 20, n. 2, p. 65–72, Summer 1979.
GOMES, P. E. S. Uma situação colonial? E-book. São Paulo: Companhia das
Letras, 2016.
MOULLET, L. Entretien aven Luc Moullet. Cahiers du Cinéma, n. 216, p. 40-49-62,
outubro 1969.
RAMOS, F. Cinema Marginal (1968-1973): a representação em seu limite. São
Paulo: Brasiliense, 1987.
ROCHA, G. Revolução do Cinema Novo. São Paulo: Cosac Naify, 2004.
SGANZERLA, R. Por um cinema sem limites. Rio de Janeiro: Azougue, 2001.
STAM, R. O espetáculo interrompido: cinema e literatura de desmistificação. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1981.
XAVIER, I. O cinema brasileiro moderno. São Paulo: Paz e Terra, 2004.
_________. Sertão Mar: Glauber Rocha e a estética da fome. São Paulo: Cosac
Naify, 2007.
_________. Alegorias do subdesenvolvimento: cinema novo, tropicalismo, cinema
marginal. São Paulo: Cosac Naify, 2012.
O cinema de Arthur Omar: Triste Trópico (1974) e o inventário nacional
79
Natalia Belasalma de Oliveira
Email: nataliabelasalma@gmail.com
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Mateus Araújo Silva
Resumo expandido
Como é sabido, o processo de modernização do cinema brasileiro foi balizado pela
consciência aguda de que a criação de uma forma que sublinhasse a atuação do
cineasta enquanto autor, enquanto sujeito crítico na lida com a matéria
cinematográfica, não podia estar dissociada de uma postura engajada perante as
contradições do mundo subdesenvolvido. Como potente manifestação de um
zeitgeist que colocava as questões sociais no centro do debate cultural, Cinema
Novo e Cinema Marginal abarcaram uma vasta gama de estilos que desenharam
esse quadro de inflexão da linguagem cinematográfica. Suas variações são muitas
e passam, dentre outras abordagens, pela investida no realismo crítico, pela
fragmentação do tom brechtiano, pela assimilação do pop via mediação tropicalista
e pelo esfacelamento completo da narrativa.
No entanto, por mais diverso que esse leque de invenções seja, estabeleceu-se
uma dicotomia entre Cinema Novo e Cinema Marginal que normatizou a
compreensão do que é essa nossa produção moderna. Ainda que os dois grupos
tenham, de fato, cultivado tal polaridade, a própria evidência dos filmes revela que
os limites entre um e outro não são tão impermeáveis quanto gostariam os
integrantes de cada movimento. Além disso, tal categorização não abarca a obra
de certos cineastas que, apesar de afastados dos círculos efetivamente formados,
não deixaram de se sintonizar a esse espírito do tempo. É nesse conjunto paralelo
que se encontra a produção de Arthur Omar. A obra de Omar é vasta e se estende
do início dos anos 1970 aos dias de hoje;; vai da imagem estática em película
fotossensível à vídeo-arte digital, passando pelo cinema em 35mm, em 16mm e
pelo vídeo analógico.
Apesar da relativa circulação de seu trabalho como fotógrafo, a produção de cinema
de Omar ainda hoje é pouco conhecida e usualmente depositada no bolsão do
experimental – noção que, apesar de justa, parece se assentar numa cômoda
impossibilidade de integração a um contexto mais amplo. Além disso, a maior parte
da literatura dedicada à analise de seus filmes ou se atém à inventividade com que
tais obras dissociam bandas sonora e imagética ou ao caráter antropológico
envolvido na teoria fotográfica de Omar. Apesar de percepções absolutamente
pertinentes e justas, as operações mobilizadas pelo cineasta extrapolam tais
definições e devem ser também identificadas como significativas desse período de
modernização do cinema brasileiro. Claro exemplo disso é seu único longa-
metragem, Triste Trópico. O filme de 1974 narra a história do Dr. Arthur Alves
Nogueira, médico brasileiro que, depois de concluída a formação em Paris, volta
ao Brasil e percorre uma trajetória atravessada por intempéries. Apesar de
construído sob a estrutura do documentário clássico (uma voz over que relata fatos
enquanto imagens variadas desfilam pela tela), não é preciso muito tempo de filme
para que o espectador perceba que se trata de uma história fantástica e, portanto,
80
ficcional. Para além desse óbvio jogo entre realidade e fabulação, Triste Trópico se
arranja como uma espécie de inventário do país.
Seja de modo direto ou através de alusões, o filme convoca passagens,
personagens, aspectos e problemáticas que atravessaram a história brasileira
desde a chegada do colonizador. Suas imagens colocam em evidência as torturas
contra heterodoxias católicas, o imaginário da modernização dos anos 30, o ideário
positivista e as comemorações do carnaval nos anos 70. E quando conjugadas ao
tom clínico de uma narração que descreve as excentricidades e tragédias que
acometem o protagonista, compõem uma obra que parece trazer à tona os
processos de recalque histórico, transformando o Dr. Arthur, portanto, em uma
espécie de bode expiatório da violência institucional. O universo das migrações, os
movimentos camponeses, messianismo e antropofagia compõem a fatura desse
filme que, enquanto potente gesto de experimentação, explora as possibilidades de
síntese do discurso documental. Nesse sentido, esta comunicação se dedicará
apresentar aspectos da obra de Arthur Omar e, especificamente, a analisar Triste
Trópico com o objetivo de entender quais as possíveis mediações que o cineasta
constrói entre a gramática cinematográfica (notadamente aquela de abordagem
documental) e formação histórica e cultural do Brasil.
Palavras-chave
Arthur Omar;; Triste Trópico;; Cinema Moderno;; Cinema Brasileiro
Bibliografia
ANDRADE, Oswald. A utopia antropofágica. São Paulo: Globo, 2011.
AVELLAR José Carlos. O garçom no bolso do lápis. In: Imagem e som, imagem e
ação, imaginação. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1982, p.158-160.
CUNHA, Euclides da. Os sertões.
São Paulo: Ubu Editora / Edições Sesc São
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LÉVI-STRAUS, Claude. Tristes Trópicos. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
OMAR, Arthur. O antidocumentário, provisoriamente. Cinemais: revista de cinema
e outras questões audiovisuais. Campos dos Goytacazes : UENF, N°8, p. 179 –
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RAMOS, Guiomar. Um cinema brasileiro antropofágico? (1970-1974). São Paulo:
Annablume;; Fapesp, 2008.
XAVIER, Ismail. Viagem pela heterodoxia. Significação – revista brasileira de
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_____. O cinema brasileiro moderno. São Paulo: Paz e Terra, 2001.
A montagem na obra de Satoshi Kon
Matheus Pinto Biscaro
81
Email: matheuspbiscaro@gmail.com
Nível: Iniciação Científica
Linha de pesquisa: Iniciação Científica
Orientador: Cecilia Antakly de Mello
Resumo expandido
A pesquisa proposta teve por objeto a montagem no cinema do diretor japonês
Satoshi Kon (1963-2010), com ênfase em seus filmes Perfect Blue (Pāfekuto Burū,
1997), Millenium Actress (Sennen Joyū, 2001) e Paprika (Papurika, 2006). Kon é
um dos principais nomes da animação japonesa, ao lado Hayao Miyazaki (A viagem
de Chihiro, 2001) e Katsuhiro Otomo (Akira, 1988). Autor de uma curta porém
influente carreira cinematográfica, Kon produziu, animou, escreveu e dirigiu quatro
longas-metragens e uma série de televisão, que tiveram um grande impacto não
apenas na animação japonesa como também no cinema hollywoodiano
contemporâneo, especialmente na obra dos renomados diretores Daren Aronofsky
e Christopher Nolan.
O objetivo deste estudo foi analisar os artifícios utilizados pelo diretor na montagem
de seus filmes para mesclar os diferentes tempos e espaços que compõem suas
narrativas. Gostaríamos de sugerir que, através da montagem, Kon não apenas
articula de modo primoroso tempo e espaço como também promove o
embaralhamento dos limites entre a realidade e a fantasia, entre o passado e o
presente. Esse embaralhamento funciona em seus filmes como um comentário
contundente sobre a sociedade japonesa contemporânea e sua indústria cultural,
que produz obras audiovisuais e gráficas dispostas a promover a imersão em
realidades virtuais e imaginárias em detrimento do real objetivo. Seu conhecimento
da gramática narrativa clássica (em especial, a montagem) e a certeza de que tal
léxico é presente no imaginário das pessoas possibilitou ao autor explorar as
expectativas do espectador.
Palavras-chave
Anime, animação, montagem, Satoshi Kon, Japão.
Bibliografia (Máximo de 1000 caracteres)
AMIEL, Vincent. Estética da montagem.
AUMONT, Jacques et al. A montagem in A estética do filme.
BAZIN, André. O que é o cinema?
BORDWELL, David, STAIGER, Janet e THOMPSON, Kristin. The Classical
Hollywood Cinema: Film Style and Mode of Production to 1960.
KEHR, Dave. “Anime Dreams, Transformed into Nightmares”. The New York Times,
20 de maio de 2007.
NAPIER, Susan. "Excuse Me, Who Are You?": Performance, the Gaze, and the
Female in the Works of Kon Satoshi by Susan Napier.
OSMOND, Andrew. Satoshi Kon: The Illusionist.
POITRAS, Gilles. Anime Essentials: Every Thing a Fan Needs to Know.
82
WILLIAMS, Richard. The Animator’s Survival Kit.
WILLIAMS, Raymond. O drama numa sociedade dramatizada.
Um Dia na Vida: material gravado como filme para pesquisas futuras
Juliana Penna
Email: julianampenna@gmail.com
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: Poéticas e Técnicas
Orientador: Atílio José Avancini
Resumo expandido
O projeto de pesquisa tem como objeto o filme Um Dia na Vida, de Eduardo
Coutinho (1933-2014), exibido em sessão única na Mostra de Cinema de São Paulo
de 2010. O filme é uma colagem de trechos de comerciais e programas de televisão
aberta, gravados pelo cineasta em um único dia (1 de outubro de 2009), e editados
de forma a apresentar um resumo da produção de sentidos recebidas pelo
telespectador brasileiro. O objetivo deste projeto é situar a obra dentro da
filmografia do documentarista Eduardo Coutinho em contraponto a seu método
usual de produção e filmagem, assim como identifica-la como uma narrativa crítica
ao conteúdo produzido para televisão aberta no Brasil. Coutinho defende teses
próprias sobre a mesma utilizando para isso a construção de um mosaico de
imagens sem a adição de nenhum elemento textual alheio ao material original. Além
disso, a sobreposição dos recortes da programação televisiva, marcada pela
transição intensa e rápida de um tipo de conteúdo a outro, ao ser exibida em um
cinema, ambiente designado às produções cinematográficas, torna o filme Um Dia
na Vida uma demonstração empírica e tátil das diferenças profundas de formatação
entre TV e cinema, que persistem até hoje, mesmo em um contexto de hibridização
entre cinema e televisão.
Palavras-chave
cinema;; televisão;; montagem;; Eduardo Coutinho
Bibliografia (Máximo de 1000 caracteres)
AUMONT, Jacques e MARIE, Michel. Dicionário Teórico e Crítico de Cinema. São
Paulo: Papirus Editora, 2006.
BAZIN, André. Ontologia da Imagem Fotográfica. In: XAVIER, Ismail. A experiência
do cinema.
DEBORD, Guy. A sociedade do Espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto, 1997.
DEBRAY, Regis. As três idades do olhar. In: Vida e morte da imagem. Petrópolis:
Vozes, 1994.
DUBOIS, Phillippe. Cinema, Vídeo, Godard. São Paulo: Cosacnaify, 2004.
83
FERNANDES, Marcos Leandro Kurtinaitis. Found footage em tempo de remix:
cinema de apropriação e montagem como metacrítica cultural e sua ocorrência no
Brasil. São Paulo: ECA-USP, 2013.
FLUSSER, Vilém. O universo das imagens técnicas: elogio da superficialidade. São
Paulo: Annablume, 2008.
MACHADO, Arlindo. A Televisão levada a sério. São Paulo: Editora Senac, 2000.
XAVIER, Ismail. Indagações em torno de Eduardo Coutinho e seu diálogo com a
tradição moderna. In: Comunicação e Informação, Volume 7, n° 2. Jul./dez. 2004.
Paraísos artificiais: o documentário como tratamento do fato na era eletrônica
e digital
Douglas Galan
Email: douglasgalan@gmail.com
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: Cultura e Comunicação Audiovisual
Orientador: Irene de Araújo Machado
Resumo expandido
É correto dizer que a era eletrônica e digital aumentou a informação audiovisual?
Existe uma difusão/profusão de visualidade na era cibernética, que denunciam a
elevação da presença dos instrumentos do vídeo em variedade, volume e
diversidade. Mesmo em face de novas tecnologias que poderiam trazer uma
hipotética reinvenção para os modos de fazer cinema, as lógicas que consagraram
o estilo documental de composição audiovisual prevalecem. Assim, o documentário
permanece como um recurso para apreensão daquilo que se vê: um instrumento
de puro registro, enlaçado pela égide da consagrada alcunha da “informação” e da
“verdade”. O que por extensão pressupõe que, para que exista um trabalho de
registro documental, um “fato” precisa acontecer no mundo. Se a narrativa tornou-
se uma “camisa de força” para a ficção, a entrevista e o depoimento viraram a chave
para o gênero documental de produção audiovisual.
O documentário é aquilo que informa, muitas vezes tornando-se meramente uma
reportagem de padrão jornalístico estendida. Ao menos é assim que a sua
produção aparece na maior parte dos casos em que os documentários estão
disponíveis no ambiente da rede digital de computadores. Surpreendentemente,
uma força ainda maior parece imperar sobre essa arte visual, ainda na atualidade:
a determinação de palavras que rondam sua produção, tais como fidelidade,
acontecimento e, novamente, registro, “verdade”. Nessa situação, um paradoxo se
instala: o domínio da palavra sobre a criação da imagem, base da constituição de
toda obra audiovisual. Se o documentário se reproduz e se consagra pela forma
anteriormente apontada na era eletrônica, sua tradição, desde o cinematógrafo, no
entanto, mostra prismas diferentes de obras: com distintas relações com as
técnicas e os aparatos, levando a explorações artísticas variadas, o que mostra
outras vertentes possíveis, mas geralmente classificadas como experimentalismo,
excepcionalidade ou autoria.
84
O que se busca realizar nessa reflexão é de uma ordem bem mais simples: apenas
analisar e pensar sobre formas de criação documental a partir de explorações no
espaço digital. Para isso, esperamos utilizar como fonte de estudo um projeto ainda
mais modesto: as práticas de um documentário em fase de processo de produção
para constituição de base de análise e resultado de pesquisa de doutorado voltada
para o tema da agricultura urbana na cidade de São Paulo. Os mecanismos de
realização deste documentário, o trabalho operacional de execução (tais como
argumento, roteiro, filmagem e edição) já apreendido, serão aspectos analisados
com essa finalidade. Nesse trabalho, buscamos assim interrogar se o documentário
em si estaria capacitado para retratar e explorar o espaço comunicante do qual faz
parte, atualmente.
Palavras-chave
Documentário;; Espaço digital;; Explorações;; Agricultura;;
Bibliografia
BAZIN, André. O que é cinema? São Paulo: Ubu, 2018.
GAUDREAULT, André;; MARION, Philippe. O fim do cinema? Uma mídia em crise
na era digital. Campinas: Papirus, 2016.
GAULTHIER, Guy. O documentário: um outro cinema. Campinas: Papirus, 2011.
NICHOLS, Bill. Introdução ao documentário. Campinas: Papirus, 2016.
RAMOS, Fernão Pessoa. Mas afinal… o que é mesmo documentário? São Paulo:
SENAC, 2008.
XAVIER, Ismail. A experiência do cinema. Rio de Janeiro: Graal, 1976.
A montagem e a composição de vídeos performances generativas
Bruno Mascena
Email: bruno.mascena.santos@usp.br
Nível: Iniciação Científica
Linha de pesquisa: Iniciação Científica
Orientador: Patrícia Moran Fernandes
Resumo expandido
O trabalho propõe estudo de performances audiovisuais generativas de artistas
brasileiros a fim de analisar as implicações formais e dramáticas da programação
procedural na montagem ou composição do vídeo. Para isso, nos cabe antes
discutir o que é arte generativa e o que é montagem. Tendo clareza sobre a
acepção de cada termo poderemos construir um debate sólido sobre a poética e a
estrutura de algumas obras - pensando sempre poética e estrutura como elementos
retroalimentativos. A partir do debate colocaremos a questão principal deste
trabalho: o audiovisual generativo ainda é montado? "Arte generativa" refere-se a
qualquer objeto artístico desenvolvido em parte ou inteiramente através de um
sistema, seja ele computacional ou não, desde que esse sistema seja colocado em
funcionamento com certo grau de autonomia. Philip Galanter (2003) categoriza o
85
generativo como um método de criação que pode ou não estar vinculado a uma
tecnologia ou poética, assim o termo apenas aponta para um subgrupo da arte do
qual múltiplos resultados podem surgir. Entretanto, apesar da multiplicidade de
resultados, é possível mapear o comportamento estrutural dessas obras.
Considere os exemplos abaixo, seguidos pela descrição do funcionamento de seus
sistemas generativos: (1) BBBBBBBBBBBBBBB / (2) ZZZZZZZZZZZZZZZZ / (3)
KKKKKKKKKKKKKKK transmissão aleatória de uma letra e sua repetição
consecutiva (4) VGDRYJOOSAZFEAD / (5) GATOSDORMEMMUITO / (6)
GATOSFRIOLEITE transmissão aleatória de letras (7) GAAHBPIIQJETTFU
transmissão aleatória de duas letras, seguida pela repetição dessa segunda letra,
transmissão da letra subsequente à primeira e, por fim, a transmissão da letra
subsequente às duas letras repetidas. Nota-se que o mesmo sistema é capaz de
resultar em objetos mais ou menos abertos e estruturalmente diferentes. (1), (2) e
(3) são contínuos, sem modulação, resultados de uma transmissão extremamente
ordenada. (1) talvez não conduza nenhuma informação ou significado. (2) e (3)
também podem, por exemplo, ser interpretados respectivamente como
onomatopeia do sono e gargalhadas em redes sociais. A estrutura define-se, nos
três, pela repetição de pequenos fragmentos. (4) também parece não conter
sentido e informação, mas em oposição à transmissão dos exemplos anteriores, a
sua é extremamente desordenada. Não há, portanto, estrutura. (5) e (6) transmitem
informações claras e concretas: gatos, dormem, muito e gatos, frio, leite. É simples
e instintivo dividi-los em blocos menores, captar a essência de cada um desses
blocos e ressignificá-los através de associações com os blocos anteriores e
posteriores. (5) é semanticamente definido e a leitura é feita no sentido posto, ou
seja, gatos costumam dormir bastante. (6) é mais aberto e exige que o leitor faça
conexões, assim, a leitura pode ser (a) gatos, no frio, gostam de leite, ou (b) gatos
não gostam de leite frio, ou (c) gatos preferem leite frio… (7) parece tão aleatório
quanto (4), mas sua transmissão não é desordenada. Para que (7) se construa é
preciso que tenhamos duas letras escolhidas ao acaso: GA. Depois a segunda letra
será repetida e sucedida pela subsequente à primeira, logo a sequência continuará
com as letras A e H.
Por fim, a letra subsequente às duas que foram repetidas, logo, o bloco terminará
com a letra B. Um novo bloco começará em seguida com o sorteio de duas letras
quaisquer e assim sucessivamente. É possível prever o comportamento desse
sistema e suas tendências, que não é, portanto, aleatório, mas, sim, caótico. Como
demonstram os exemplos, a aleatoriedade absoluta não permite estrutura, o caos,
sim. A existência de uma estrutura permite que o todo seja dividido em objetos
menores, compostos por um ou mais elementos. E a relação entre esses objetos
pode ou não gerar informação e significado. Aqui, começamos a caminhar para
uma analogia bastante óbvia com a montagem dos planos no cinema: blocos
(planos, cenas, sequências) que se relacionam com os que os cercam,
comunicando e causando sensações.
Mas será que a montagem é capaz de abarcar todas as possibilidades do
generativo? A evolução técnica da montagem possibilitou a integração de
elementos da imagem virtual, computadorizada, ao processo de edição. Vincent
Amiel (2014) coloca que a montagem virtual “permite os chroma keys, as
modificações na imagem, as combinações dentro do enquadramento. Pode-se
86
interpretar as colocações de Amiel ainda numa outra camada e pensar nas
modificações dentro das imagens. Pode-se entender o pixel como análogo ao plano
e analisar uma montagem interior à montagem dos próprios planos, uma montagem
interna a cada um deles. Aqui, o plano não seria mais o menor elemento passível
de distorção, mas composto por outros elementos maleáveis. Colocam-se as
seguintes questões: A operação de montar planos no cinema é a mesma de
construir e editar imagens digitais? A manipulação da malha digital da imagem é
uma forma de montagem quando a aleatoriedade não permite estrutura externa
clara?
Palavras-chave
Montagem;; arte generativa;; performance audiovisual.
Bibliografia
AUMONT, J. A montagem. In: A estética do filme.
AMIEL, V. Estética da montagem.
BAZIN, A. O que é o cinema?
BODEN, M & EDMONDS, E. What is generative art?
BORDWELL, D. El cine de Eisenstein: teoría y práctica.
DUBOIS, P. Cinema, vídeo, Godard.
ECO, U. A obra aberta.
EISENSTEIN, S. Montagem de atrações In: XAVIER, Ismail (org), A experiência do
cinema.
_________. O Sentido do Filme.
_________. A Forma do Filme.
GALANTER, Philip. What is Generative Art? Complexity theory as a context for art
theory.
IVERSEN, M (org). Chance, Whitechapel: Documents of Contemporary Art
MACHADO, A. Pre-cinemas e pós-cinemas. 6 ed.
MARTIN, M. As elipses, Ligações e transições, A montagem, A profundidade de
campo, O espaço, O tempo. In: A linguagem cinematográfica
MORAN, P. (org). Cinemas Transversais. Iluminuras
_________. “Outras montagens, novas temporalidades: primeiras notas”.In: XII
Estudos de Cinema e Audiovisual
TARKOVSKI, A. Esculpir o tempo
XAVIER, I., D.W. Griffith: o nascimento de um cinema.
87
SEXTA-FEIRA, 24 DE AGOSTO
9h00 – 11h00
MESA 9: IMAGENS DO CORPO
Entre corpo e personagem: pessoa, figura, presença
João Vitor Resende Leal
Email: jv.leal@gmail.com
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Cristian da Silva Borges
Resumo expandido
Nas narrativas de Império dos sonhos (Inland empire, David Lynch, 2006), Holy
motors (Leos Carax, 2012) e O congresso futurista (The congress, Ari Folman,
2013), os protagonistas são atores de cinema cuja trajetória se confunde com
aquela dos personagens que são chamados a representar. Os corpos (e rostos e
vozes) de Nikki Grace (Laura Dern), Monsieur Oscar (Denis Lavant) e Robin Wright
(interpretada pela própria atriz Robin Wright) funcionam como um denominador
comum a diversos personagens que emergem na narrativa por entre
desaparecimentos e duplicações, intensidades performáticas e exercícios
plásticos, raccords e descontinuidades. Neste trabalho, buscaremos observar como
a categoria de personagem proposta por esses filmes confronta as noções
habituais de identidade individual, repensa os imperativos da coerência narrativa e
atribui maior visibilidade às questões da intensidade e da materialidade dos corpos
em cena.
A partir dessas observações, propomos uma breve reflexão acerca do personagem
cinematográfico. De um modo geral, pressupõe-se que o personagem encarna num
corpo (o corpo de um ator) e que a fluidez narrativa repousa na duração e na
reiteração desse corpo em cena – é fazendo sentido das reaparições e do
movimento dos corpos que nos dispomos a compreender as histórias que os filmes
nos contam. Para que a narrativa seja plenamente compreensível, espera-se ainda
que o personagem seja forjado nos moldes da pessoa humana e manifeste traços
psicológicos e motivações verossímeis – não por acaso, ambos os termos pessoa
e personagem remetem a persona, termo latim que significa máscara – “per/sonare,
a máscara pela (per) qual ressoa a voz (do ator)” (Mauss, 2003, p. 385). Portanto,
o personagem pode ser, na maioria das vezes, “simples mas adequadamente
definido como uma ‘pessoa representada’” (Michaels, 1998, p. XIV).
As noções de pessoa, personagem e corpo, no entanto, coincidem apenas
temporária e parcialmente: no cinema, o personagem-pessoa pode se desligar com
relativa facilidade do corpo que lhe serve de base sensível, assim como o corpo do
ator pode exceder o personagem-pessoa que o atrela à narrativa. Noutras palavras,
o cinema permite que “a identidade individual seja colocada em cena como um
puzzle”: no personagem, pessoa e corpo representam grandezas passíveis de
serem combinadas e recombinadas de maneira relativamente livre (Wulff, 1997, p.
88
15). A nosso ver, os protagonistas de Império dos sonhos, Holy motors e O
congresso futurista exploram de modo consciente e bastante consequente esses
momentos de desencontro entre pessoa e corpo, fazendo com que vislumbremos
outras dimensões do personagem cinematográfico. Assim, conhecidas as
implicações e os limites do personagem-pessoa, nossa investigação se voltará a
duas outras dimensões, ao que propomos chamar de personagem-figura e de
personagem-presença.
Palavras-chave
Personagem, pessoa, figura, presença, ator
Bibliografia
GARNIER, Xavier. L’éclat de la figure: Étude sur l’antipersonnage de roman.
Bruxelas, Berna, Berlim: PIE - Peter Lang, 2001.
GUMBRECHT, Hans Ulrich. Produção de presença: O que o sentido não consegue
transmitir. Rio de Janeiro: Contraponto, 2010.
LANDOWSKI, Eric. “Modos de presença do visível” in OLIVEIRA, Ana Claudia.
Semiótica plástica. São Paulo: Hacker Editores, 2004, pp. 97-112.
MAUSS, Marcel. “Uma categoria do espírito humano: a noção de pessoa, a de ‘eu’”
in Sociologia e antropologia. São Paulo, Cosac Naify, 2003, pp. 367-397.
MICHAELS, Lloyd. The phantom of the cinema: Character in modern film. Nova York:
State University of New York Press, 1998.
PAVIS, Patrice. “Le personnage romanesque, théâtral, filmique”. Iris, nº 24, 1997,
pp.
171-183.
SCHEFER, Olivier. “Qu’est-ce que le figural?” Critique, nº 630, 1999, pp. 912-925.
89
WULFF, Hans. “La perception des personnages de film”. Iris, nº 24, 1997, pp. 15-
32.
Ecos do canto: voz, corpo e melodrama
Felipe Ferro Rodrigues
Email: felipe.ferro.rodrigues@usp.br
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Esther Império Hamburger
Resumo expandido
O melodrama e a ópera parecem ter duas diferenças irreconciliáveis. O melodrama,
em seus clímaxes mudos onde o acompanhamento musical preenche o espaço
emocional, é o drama da falha da voz frente à emoção: é um modo de
representação que torna aparente o que está oculto, que traduz, em signos visíveis,
o embate moral sub-reptício entre as forças absolutas do Bem e do Mal. A ópera,
em contrapartida, é o drama da condensação dos sentimentos em voz pura, do
triunfo da voz sobre a emoção: a ária não funciona no sentido de avançar a
narrativa, mas reage a ou reflete sobre ela em fluxos emotivos, não raro com o
personagem imóvel em maior ou menor grau, é o momento de em que todo o corpo
se torna voz. No entanto, melodrama e ópera se aproximam na medida em que
ambos, em seus momentos mais altos, são a dissolução total da palavra. No
melodrama, o que se esgota sob a pressão do sentimento exacerbado não é a voz
propriamente, mas a linguagem. A palavra dá lugar ao grito, ao choro, ao suspiro e
outros lamentos inarticulados que são, todos eles, voz.
90
A voz que narra o filme é uma voz defunta, fantasmagórica, que é novamente
silenciada uma última vez quando, acometida pelas estágios finais da agonia, Lisa
para de escrever, é impedida de terminar: a voz que cessa marca o momento da
morte. Em Imitação da vida, há outro caso de silenciamento, dessa vez não auto-
infringido como o de Lisa, mas outorgado pela condição de Annie (Juanita Moore),
a mãe negra cuja filha, auto-denominada "quase branca", renega. Assim como em
Carta, a morte como agente libertador da voz. Durante todo o filme, Annie é o único
personagem que chora em silêncio absoluto, a ela não são permitidos as explosões
de violenta emoção ou mesmo sequer os soluços. Apenas quando seu corpo
finalmente falece — no meio de uma tentativa de dize que se sente muito cansada,
novamente a voz que cessa como indicativo da morte — é que ela ganha o direito
de cantar e ser ouvida.
Em seu funeral, cuidadosamente planejado por ela em vida, uma voz reina sobre
todas as outras: não qualquer voz, uma voz distintamente negra. A pesquisa que
proponho, se dá pelo viés da voz que pode, é claro, ser música e trilha, mas que
frequentemente não o é. Proponho também analisar um corpus que possui uma
afinidade a priori com a ópera pela via do modo melodramático, e não apenas pela
presença da da influência da ópera nesses filmes. A pertinência do melodrama
também é confirmada pela multitude de dimensões ocultas e sensoriais que
florescem no cinema e na televisão contemporâneas, os excessos que passam
pela corporalidade: a tensão entre realismo e melodramático muda, mas o
melodrama persiste.
Palavras-chave
melodrama, voz, ópera, intermidialidade.
Bibliografia
ABBATE, Carolyn. Unsung Voices: Opera and Musical Narrative in the Nineteenth
Century. Princeton: Princeton University Press, 1991.
91
A Rosticidade na Arte Contemporânea: a procura pela imagem-sensação no
mundo da imageria
Cristina Valéria Flausino
Email: crisvalery@gmail.com
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: Cultura e Comunicação Audiovisual
Orientador: Irene de Araújo Machado
Resumo expandido
À pergunta sobre qual rosto se expressará na contemporaneidade ou sobre como as
linguagens artísticas irão representá-lo, o que se propõe para esse encontro, como
recorte de um capítulo em finalização, será apresentar as primeiras conclusões acerca
do modo como o rosto irá se expressar depois da sua longa travessia pela
modernidade;; refletir sobre a expressão do rosto após o retrato fotográfico, o close
cinematográfico, a colagem, o ready-made, a performance, a videoarte e todos os
outros meios próprios à expressão imaginal. Como se para sobreviver o rosto se
moldasse ao aparato criado pelas sociedades tecnológicas na sua paixão pelo registro
e reprodução de imagens, aspecto central de toda a investigação em curso, no
capítulo em referência, buscamos apresentar as novas “feições” do homem moderno,
tendo como diagnóstico principal que rosto e imagem tornaram-se indissociáveis, um
processo de “acoplagem” que se justifica pela nossa interpretação acerca das
máquinas abstratas de rostificação, que encontramos no pensamento dos filósofos
franceses Gilles Deleuze e Félix Guattari (1996). Segundo os autores, os rostos
nascem de uma máquina abstrata de rostificação, que opera por semióticas mistas,
uma combinação de dois eixos: um de significância e outro de subjetivação
(DELEUZE;; GUATTARI, 1996, p. 31).
Esses estratos produzem o que os autores definem como muro branco – buraco
negro;; sobre os muros, inscrevem-se os valores da modernidade, por meio dos
buracos negros, escavam-se os desejos, as paixões, está alojada a própria
consciência. Dito de outro modo se trata de um processo que leva o sujeito é
introduzir-se num rosto, a produzir um rosto para si mesmo, a aprisionar-se nos
buracos negros, refém de desejos e vontades que não são as suas, mas aquelas
determinadas pelos axiomas que definem quais rostos serão bem aceitos, quais
rostos serão aprovados pelo sistema, quais rostos estarão entre os melhores, os mais
bonitos, mais viris, os que terão mais autoridade. Subordinados à máquina e, na nossa
perspectiva, com o poderoso auxílio dos aparelhos de registro e reprodução das
imagens, surge um rosto que se expressa de acordo com uma dada formação social,
cujo olhar é recorte do visível;; seus atos estão em conformidade com as palavras de
ordem e seu agir está preso em agenciamentos delimitados por molduras
predefinidas. Sob essa perspectiva, buscamos observar e descrever os modos como
as linguagens artísticas colaboram para os processos rostificadores, mais
precisamente no trabalho de artistas como Jeff Koons (1955) e Andy Warhol (1928 –
1987), os quais transformam o rosto em produtos de idolatria, assimiláveis e de fácil
aceitação, como se os rostos nascessem de linhas de produção industrial. Objetos de
desejo, ligados à cultura comercial, que dá a todas as coisas o mesmo sentido e a
mesma feição. O díptico de Marilyn Monroe (1962), que colocamos em evidência
nessa apresentação, compara a tela de Warhol às matrizes do rosto do homem
moderno, mesmo tipo usado na imprensa, como clichê para reproduções.
92
Segundo aspecto da nossa abordagem é buscar discernir entre as imagens-clichês,
que caracterizam o mundo sem dobras, sem recuo, sem lastro, sem referencial, das
imagens-enigma, aquelas que seriam portadoras da afecção, conceito que Gilles
Deleuze mobiliza a partir de Espinosa e que produzem a Sensação, aquilo que
determina os instintos e faz a "passagem" de uma sensação a outra (MACHADO,
2009, p. 238). Imagens capazes de nos mover, de nos tirar do lugar, que têm a
potência de nos afetar e nos transformar. Elas são, nesse estudo, o antídoto contra
as rostidades;; são elas que nos conduzem à possibilidade de pensar num rosto fora
das convenções do muro branco, que se recusa a reproduzir o mesmo e busca uma
existência “original” fora dos buracos negros.
Para fazer frente às imagens-clichês, recorremos ao estudo deleuziano das pinturas
de Francis Bacon, em Lógica da Sensação (2007), onde identificamos os “métodos”
do pintor na produção dos retratos e autorretratos que caracterizam sua obra;; o uso
dos diagramas para fazer surgir a Figura, a forma disforme, o figural, como se o pintor
visse além das camadas superficiais e trouxesse para as telas o que se oculta sob as
rostidades: deformações, achatamentos, profundas distorções. Num cotidiano de
comunicação flexível e fluido, nosso pressuposto é, portanto, um rosto transformado
em imagens-ícones, simulacros, esvaziados de sentido, sem resistência aos
processos avassaladores das máquinas de captura, que tornam o rosto triste,
enfadonho, “rosto-bunker”, fechado em si mesmo, incomunicável, incapaz de produzir
o acontecimento que gera a vida. Assim, o que se requer, é rasgar os véus que o
encobrem, a fim de fazer descortinar uma imagem verdadeira, fissurar os clichês que
nos impedem de apreciar o céu, de vivenciar a fantasia (o delírio, a loucura) e
percorrer o universo do instante, “para engendrar nele cavalos alados e dragões de
fogo” (DELEUZE;; GUATTARI, 2010, p. 237).
Palavras-chave
Rosto, rostidade, Arte Contemporânea, Máquina Abstrata.
Bibliografia
DELEUZE, GILLES. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia, vol. 3/ Gilles Deleuze,
Félix Guattari. São Paulo: Editora 34, 1996.
______________. Francis Bacon: Lógica da Sensação. Rio de Janeiro, Jorge Zahar
Editor, 2007.
______________. O que é filosofia? / Gilles Deleuze, Félix Guattari. São Paulo:
Editora 34, 2010.
MACHADO, Roberto. Deleuze, Arte e Filosofia. Rio de Janeiro, Zahar, 2009.
Corpos Brasileiros em Cena: a Dança Contemporânea no Jornalismo
Audiovisual Especializado
Sofia Franco Guilherme
Email: sofiafrancog@gmail.com
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
93
Orientador: Rosana de Lima Soares
Resumo expandido
A pesquisa investiga as concepções da dança contemporânea brasileira
apresentadas no telejornalismo especializado em pautas culturais e direcionado a um
público presumidamente interessado nas produções artísticas do país. Para tal,
analisaremos a Série Corpos exibida pelo programa Starte, no canal jornalístico
GloboNews, em abril de 2014 em comemoração ao Dia Internacional da Dança.
Consideraremos a individualidade de cada um dos quatro episódios e também a série
enquanto um conjunto fechado, observando as relações estabelecidas entre suas
partes. Adotaremos como aporte teórico-metodológico a análise do discurso
(CHARAUDEAU, 2012) e teorias de análise do audiovisual (MACHADO, 2000) e do
jornalismo cultural (PIZA, 2011), e conceitos de formatos e gêneros em televisão
(SOUZA, 2004;; DUARTE e CASTRO, 2007) e dos mundos da TV (JOST, 2004). Ao
mesmo tempo, analisaremos as possibilidades de construção narrativa do
telejornalismo e sua capacidade de aprofundamento crítico ao discorrer sobre
produções artísticas partindo de discussões teóricas sobre crítica de mídia (FOLLAIN,
2016) e sobre a relação do audiovisual com a documentação de processos criativos
(SALLES, 2010). Quanto a sua relevância, esta pesquisa se justifica, primeiramente,
pelo importante papel que os discursos disseminados pela mídia exercem na
formação de uma opinião pública.
Palavras-chave
comunicação, telejornalismo, dança, análise de discurso, narrativas audiovisuais.
Bibliografia
CAMARGO, A.V.A. A dança que o jornal reporta: considerações sobre dança e
jornalismo cultural no Brasil. Dança: Revista do Programa de Pós-Graduação em
Dança. Salvador, v. 3, n. 2, jul/dez, 2014.
CHARAUDEAU, P. Discurso das mídias. São Paulo: Contexto, 2012.
DUARTE, E.B.;; CASTRO, M.L. D. Comunicação Audiovisual – Gêneros e Formatos.
Porto Alegre: Sulina, 2007.
FOLLAIN DE FIGUEIREDO, V. L. Crise na crítica e declínio do paradigma estético da
modernidade. In: Anais, XXV Compós, UnB, 2016.
JOST, F. Seis lições sobre televisão. Porto Alegre: Sulina, 2004.
MACHADO, A. A televisão levada a sério. São Paulo: Senac, 2000.
PIZA, D. Jornalismo Cultural. São Paulo: Contexto, 2011.
SALLES, C.A. Arquivos de Criação: arte e curadoria. São Paulo: Ed. Horizonte, 2010.
SOUZA, J.C.A. de. Gêneros e formatos na televisão brasileira. São Paulo: Summus,
2004.
SOUZA, T.C.C. A Análise do não verbal e os usos da imagem nos meios de
comunicação. Ciberlegenda. Niterói: UFF, n6, 2001.
Edgard Navarro e o Corpo do escracho
Geraldo Blay Roizman
95
Email: geblayroiz@ig.com.br
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Rubens Luís Ribeiro Machado Junior
Resumo expandido
Se fossemos localizar O Rei do Cagaço dentro do universo cinematográfico de Edgard
Navarro, ele faria parte, de forma geral, do chamado surto superoitista no Brasil, e do
grande ciclo de filmes realizados em Super-8 na década de 70 nas chamadas
Jornadas de Cinema da Bahia, que possuíam, em geral, um forte teor provocativo ao
mesmo tempo poético e político, e principalmente de um sentido muito preciso de
despojamento na flexibilização da linguagem possibilitada pela novidade da bitola.
Estes filmes provocadores, estimulados pelo contexto das Jornadas, fizeram parte,
como o próprio diretor nomeia, da chamada “tríade freudiana”, sendo a fase oral
estabelecida com Alice no país das Mil Novilhas, a fálica com Exposed e a anal com
O Rei do Cagaço. A comicidade de O Rei do Cagaço aconteceria nos extremos
contrastantes estabelecidos entre o alto e o baixo ventre, entre a literalidade do
excremento e a palavra na impessoalidade do infinitivo verbal, nas corridas
emolduradas pela contagem científica dos passos, no ataque às nádegas na frente
da igreja e a culpa cristã corroborada pelo sensacionalismo do locutor radiofônico
carnavalizando a gravidade religiosa. Se aqui esses contrastes servem ao deboche,
ao escracho, a brincadeira se encontraria na própria construção da sonoridade do
filme, na própria palavra em inserts de vozes, músicas e narrações radiofônicas que
se enquadrariam no sentido de esculhambar o espaço público da cidade e seus
monumentos e a situação política repressiva ao nível corpóreo.
De modo geral, há neste filme uma deriva suja e subversiva em uma cidade fundada
na sublimação do prazer e da imundície e no apego ao dinheiro identificado ao próprio
excremento. Seja caminhando, brincando, pegando carona, alfinetando o bumbum ou
correndo e cagando á esmo, haveria um encontro anárquico de crianças e adultos se
cruzando livremente na perversão polimorfa de uma fase anal sádica. A ação
performática desses personagens soltos, transgredindo o espaço público em seus
atos perversos de subversão evocariam a ressonância da catarse coletiva das
manifestações comportamentais contraculturais de jovens e artistas na época, a festa
como um ritual onde se operava a redescoberta do corpo como múltiplo no
afloramento de estímulos e percepções e que nesse instante deixava de ser
instrumento resignado de força de trabalho para ser um momento de liberação ou que
funcionasse como um intervalo em que o sistema permitia o reconhecimento de sua
própria contestação e ao mesmo tempo, no Brasil, mascarando o clima repressivo.
Tudo isso feito através de uma poética experimental viva na leveza do “quase nada”
que é a leveza da câmera na mão, dessacralizando no superoitos que fez a própria
intelecção psicanalítica, e que possibilitaram Navarro manter a criança viva talvez até
hoje e recusar, escapar ao controle no encontro selvagem com as imagens nascidas
de seu imaginário, utilizando, desta forma, o cinema como expressão de
dessublimação do princípio do prazer. Uma forma de desterritorialização,
desregramento tanto da natureza da polis como intestinal e da mundanidade em
oposição aos padrões de sociabilidade, as águas paradas do conservadorismo. Esse
nó de significações vivas talvez seja o próprio Super-8 de Navarro ao engajar-se
corporalmente de forma tão visceral.
96
Procede como uma forma perversa polimorfa escrachada de atingir o aparelho
repressivo de um país conservador até a medula, na sua retenção anal histórica,
através do descobrimento do corpo perdido da infância. Liberta-se assim, evacuando
o próprio tempo histórico expelido como excremento.
Palavras-chave
Edgard Navarro, Super-8, O Rei do Cagaço.
Bibliografia (Máximo de 1000 caracteres)
BATAILLE, G. O Ânus Solar. Lisboa: Hiena Editora, 1985.
___________. História do Olho. São Paulo: Cosac & Naify, 2003.
BROWN, N. O. Vida Contra Morte. Petrópolis RJ: Vozes, 1972.
___________. El Cuerpo del Amor. Barcelona: Santa &Cole Publicaciones S.L, 2005.
11H20 – 13H20
MESA 10 - O AUDIOVISUAL EM TEMPOS DE COMUNICAÇÃO DIGITAL
O político e o social no cinema brasileiro recente por meio da ancoragem e do
engate
Eduardo Paschoal de Sousa
Email: eduardopaschoals@gmail.com
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: Cultura e Comunicação Audiovisual
Orientador: Rosana de Lima Soares
Resumo expandido
97
Ao considerar a conjuntura das produções do cinema nacional nos últimos cinco anos
– de 2012 a 2017 –, podemos listar alguns pontos de reflexão: a pluralidade de
produtores oriundos de diferentes lugares, nem sempre polos tradicionais de
produção audiovisual;; a reincidência temática que nos parece problematizar o popular
de alguma maneira em um conjunto relevante de obras;; e o contexto social e político
efervescente e explícito no qual essas obras são produzidas e, posteriormente, se
colocam em circulação, ao influenciar sua recepção discursiva. Partimos dessas
indagações para a dúvida mais geral desta pesquisa: como essa conjuntura impactou
nas produções do cinema brasileiro dos últimos cinco anos, considerando sua
produção – portanto uma primeira instância de circulação da obra – e sua recepção –
a forma como os espectadores, a mediação e o ambiente crítico motivaram a
circulação e a interpretação desses filmes?
Para compreender essas duas esferas da obra, a produção e a recepção, utilizaremos
três eixos de investigação metodológica: a teoria semiopragmática, que além de se
caracterizar como método de análise das obras também faz parte dos eixos teóricos
de pesquisa;; a consideração das esferas de ancoragem e engate e de que forma elas
ocorrem nos filmes analisados;; e a crítica das mídias, na expansão da análise das
obras também para seu contexto. A dimensão da obra a partir de um social e um
político, nos aproxima da teoria semiopragmática de Roger Odin (1997, 2000 e 2011),
retomada por Guillaume Soulez (2011 e 2013) por meio da deliberação. De um lado,
Odin (2011) considera toda obra audiovisual como uma forma de produção de sentido
formada por duas esferas: a da produção, que seria o espaço de emissão da obra;; e
a da leitura, ou sua esfera de recepção. Ambas as fases dependem de uma série de
fatores para que haja a completude desse processo, tanto contextos políticos e sociais
compartilhados, como contratos em termos de gênero, forma, etc. Portanto, há uma
dupla produção de sentido que opera de forma independente, em uma primeira etapa
de emissão da obra, mas também em sua recepção discursiva.
Podemos compreender, a partir do autor, que há uma instância enunciativa tanto na
produção quanto na recepção da obra. Já Soulez (2013) vai ampliar essas duas
esferas considerando fundamentalmente a pluralidade dos contextos sociais e
políticos como determinantes para a deliberação do espectador frente à obra, na
maneira como ele problematizará os diversos espaços críticos do documento
audiovisual, sendo atravessado por diferentes esferas públicas de discussão e de
reflexão crítica. Ao olhar de forma inicial para um certo conjunto de filmes recentes,
percebemos que há obras que se ancoram em um contexto político e social, mas não
despertam identificação no espectador. Outras, pelo contrário, se conectam ao
espectador por motivos outros que não são suas ancoragens no contexto. E há
aquelas que realizam os dois movimentos ao mesmo tempo. Buscaremos investigar
como isso se dá no cinema brasileiro recente, em que nos parece haver uma grande
incidência de filmes que confluem simultaneamente os dois movimentos, tanto no
arrimo de sua âncora, quanto ao construir pontes e elos de ligação com seu
espectador.
Palavras-chave
cultura audiovisual;; crítica das mídias;; cinema brasileiro;; narrativa;; recepção
discursiva.
98
Bibliografia
BERNARDET, J. C.;; GALVÃO, M. R. Cinema, repercussões em caixa de eco
ideológica. São Paulo: Editora Brasiliense, 1983.
ESQUENAZI, J. P. Sociologie des oeuvres. Paris: Armand Colin, 2007.
MARTÍN-BARBERO, J. Culturas populares. In: ALTAMIRANO, Carlos (org.).
Términos críticos de sociología de la cultura. Buenos Aires: Editora Paidós, 2002.
ODIN, R. Cinemá et production de sens. Paris: Armand Colin, 1997.
________. De la fiction. Paris: De Boeck Universite, 2000.
________. Les espaces de communication: introduction à la semió-pragmatique.
Grenoble : Presses Universitaires de Grenoble, 2011.
SOULEZ, G. Quand le film nous parle: rhétorique, cinéma et télévision. Paris: PUF,
2011.
________. La délibération des images. Communication & langages, p. 3-32, 2013.
XAVIER, I. O cinema brasileiro moderno. São Paulo: Paz e Terra, 2001.
________. Alegorias do subdesenvolvimento. São Paulo: Cosac Naify, 2012.
Vloggers: o acontecimento comunicacional e o cotidiano na rede social
YouTube
Paula Pires da Silva
Email: paulapires@usp.br
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: Cultura e Comunicação Audiovisual
Orientador: Ciro Juvenal Rodrigues Marcondes Filho
Resumo expandido
No momento atual, somos representados pela imagem de dezenas de pessoas
desatentas, olhando fixamente para baixo, entretidos com aparelhos de
microcomputadores luminosos, caminhando sem direção, feitos de “zumbis” pelo uso
constante dos dispositivos digitais: viciados em redes sociais e, paradoxalmente,
antissociais. Pode ser que não saibamos mais dos nomes dos novos atores das
novelas, mas, não raro um(a) novo(a) youtuber desponta com seu canal na plataforma
de mídia e, instantaneamente, somos tentados a conhecê-lo: saber de onde vem, por
que faz sucesso na Internet e descobrimos que o(a) mesmo(a) já está consagrado:
uma celebridade do momento. No Brasil e fora dele, algumas personalidades
conquistam milhares de fãs e seguidores, ultrapassando cifras da audiência na TV ou
no cinema, tornando-se, assim, quase que instantaneamente celebridades midiáticas.
Estamos lidando com um processo comunicativo, portanto, recente, que surpreende
pela facilidade e rapidez de conexão, imprevisibilidade, nível de participação, novas
configurações do espaço e do tempo, outros modos de criação e produção de
conteúdo;; o que implica, ainda, outros sentidos de percepção. Baseando-se
previamente nesses aspectos, optou-se, aqui, pesquisar um novo fenômeno que se
99
apresenta nas redes sociais da Internet (novo, não no sentido de “recente”, mas no
sentido de ”inédito", por gerar fascínio em outros usuários e, consequentemente, de
reproduzir o modelo na plataforma e fora dela), tentando observá-lo a partir do seu
lugar, sem previamente julgar qualquer direção a ser tomada pelos próprios objetos
de observação, posto que intentamos nos colocar próximos ao atual dinamismo social
provocado pelas produções e usos das tecnologias de comunicação e informação.
Por implicar certo grau de subjetividade, a pesquisa segue por uma linha
epistemológica que ofereça ao objeto um caminho livre para que ele seja observado
em sua ocorrência.
Assim, conectando-se ao princípio norteador das pesquisas fundamentadas pela
Nova Teoria da Comunicação, buscamos vivenciar o acontecimento do fenômeno,
participando dele, deixando-o seguir sua própria dinâmica para que, nesse processo,
sejamos capazes de captar o que nele nos comunica ou nos afeta. Mas o que há de
tão fascinante nessas imagens, nesses diálogos que quase instantaneamente se
replicam e provocam a participação de milhares de usuários nas redes? Por que o
cotidiano é tão interessante nas redes sociais se, na prática, lidamos com ele
indiferentemente? Quem são esses usuários que até há pouco tempo eram anônimos
e, hoje, são considerados celebridades midiáticas? Qual é a produção de sentido de
uma produção audiovisual amadora, sem roteiro que geram reações de milhões de
pessoas? Existe, de fato, comunicação nesse processo? Todas essas questões são
impulsoras de uma pesquisa que se inicia com o desafio de imergir em um oceano de
práticas que se alteram a cada instante.
Palavras-chave
Comunicação, afeto, YouTube.
Bibliografia
BARTHES, Roland. A Câmara Clara. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015.
CERTEAU, Michel. A invenção do cotidiano – Artes de fazer. Petrópolis – RJ: Vozes,
2014.
DELEUZE, Gilles. Lógica do sentido. São Paulo: Perspectiva, 2015.
LAPLANTINE, François. De tout petits liens. Paris: Mille et une nuits, 2003.
MARCONDES FILHO, Ciro. O princípio d Razão Durante – O círculo cibernético: o
observador e a subjetividade. São Paulo: Paulus, 2011.
________________________. O princípio da razão durante: o conceito de
comunicação e a epistemologia metafórica. São Paulo: Paulus, 2010.
100
MENDONÇA, Carlos Magno Camargo;; CARDOSO FILHO, Jorge;; DUARTE, Eduardo.
Comunicação e sensibilidade – Pistas metodológicas. PPGCOM UFMG, 2016.
SHAVIRO, Steven. Without Criteria – Kant, Whitehead, Deleuze and Aesthetics.
Massachusetts: The MIT Press, 2009.
STRANGELOVE, Michael. Watching YouTube – extraordinary videos by ordinary
people. Toronto: University of Toronto Press, 2010.
O gesto fotográfico e a comunicação em tempos digitais
Bruna Alves de Queiroga
Email: brunaqueiroga@usp.br
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: Cultura e Comunicação Audiovisual
Orientador: Ciro Juvenal Rodrigues Marcondes Filho
Resumo expandido
Levando em conta que a relação humana - fotografia, exige uma observação
diferenciada, pois se baseia principalmente em imagens e não no discurso, propõe-
se aqui a operação de um procedimento não convencional de estudo de comunicação.
A partir de um enfoque fenomenológico, pretende-se debater como se dá o potencial
comunicacional no gesto fotográfico, considerando o ambiente de observação híbrido
tanto online como offline. Fundamentalmente, a pesquisa se propõe a estudar a
relação do usuário comum com suas interações na rede social Instagram. De
abordagem prioritariamente qualitativa, a observação do fenômeno pretende ser um
relato do processo de formação da fotografia contemporânea. No período de transição
do analógico para o digital, surgiram paralelamente a essas inovações tecnológicas,
as redes sociais, cuja intenção era a de conectar pessoas que faziam parte de um
mesmo grupo. Para atender a essa demanda, a indústria tecnológica passou a investir
em recursos de grande armazenagem de dados para agilizar o carregamento, a
transferência, o compartilhamento e a memória que circula na internet. As câmeras
digitais, por sua vez, passaram a ser acopladas aos telefones móveis, e em pouco
tempo o smartphone, no final dos anos de 1990, combina telefonia celular e
computação, superando, em 2013, a venda de telefones tradicionais. Os telefones
“inteligentes” popularizaram ainda mais a produção e compartilhamento da fotografia
fazendo uso de ferramentas como o aplicativo Instagram.
O serviço prometia ser uma ferramenta de captação de momentos cotidianos. Para
realizar tal operação, o serviço disponibilizava filtros que remetiam à estética das
câmeras Polaroid, revigorando a ideia da fotografia analógica instantânea. Em
seguida, foi disponibilizado o uso das hashtags, colocando um termo como variável
importante do que viria a se tornar o tipo de visualidade da fotografia atual. A palavra
e a imagem caminham juntas na visualidade contemporânea. A pesquisa proposta
busca se inserir na discussão do potencial comunicacional da fotografia, por meio de
uma abordagem epistemológica que vê a comunicação antes de mais nada enquanto
fenômeno estético. Uma comunicação qualitativa, que pode até ser mensurada por
critérios empíricos positivistas, mas que acredita que esse procedimento perde o
essencial da vivência da fotografia, que é seu apelo a instâncias incapturáveis pelos
instrumentos de mensuração formal.
101
Destacamos que o objetivo não é o estudo do suporte, mas da forma como os usuários
de tal suporte se relacionam com o mundo e entre si por meio de imagens fotográficas.
Para uma melhor compreensão do desenvolvimento das condições e formas de ver,
trabalharemos com Jonathan Crary e seus questionamentos em relação a percepção
e a cultura moderna. As proposições de fotografia contemporânea de Joan
Fontcuberta. E com Aby Warburg e sua perspectiva sobre a visualidade das imagens
que ainda faz tão atual a composição visual de mosaico trabalhada em seu Atlas
Mnemosyne muito próxima a que se apresenta no Instagram. Além é claro, dos
autores tradicionais da teoria da fotografia como Walter Benjamin, Roland Barthes e
Vilém Flusser.
Palavras-chave
Fotografia;; Comunicação;; Fenomenologia;; Instagram.
Bibliografia
BARTHES, Roland. A câmera clara. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984.
BENJAMIN, Walter. Experiência Histórica e imagens dialéticas. Org. Carlos Eduardo
Jordão Machado, Rubens Machado Jr., Miguel Veda. 1. Ed. São Paulo: Editora Unesp,
2005.
CRARY, Jonathan. Técnicas do observador: sobre visão e modernidade no século
XIX. Rio de Janeiro: Contraponto. 2012.
FLUSSER, Vilém. Filosofia da caixa preta. São Paulo: Hucitec, 1985.
MERLEAU-PONTY, Maurice. Fenomenologia da Percepção. São Paulo: Martins
Fontes, 2006.
MANOVICH, Lev. Instagram and contemporary image. 2017.
Disponível:http://manovich.net/content/04-projects/147-instagram-and-contemporary-
image/instagram_book_manovich.pdf (acesso 20/07/2018).
MARCONDES FILHO, Ciro. Nova Teoria da Comunicação. Volume 1. O rosto e a
máquina: O fenômeno da comunicação visto pelos ângulos humano, medial e
tecnológico. São Paulo: Paulus, 2013.
O resgate da força expressiva da oralidade na contemporaneidade – a retomada
do rádio consciente
Mário Alves dos Santos Júnior
Email: mariojunior@usp.br
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: Cultura e Comunicação Audiovisual
Orientador: Mauro Wilton de Sousa
Resumo expandido
Compreender a genealogia da oralidade com seus meandros é essencial para
resgatar o propósito e a relevância que a força expressiva da oralidade sempre teve
ao longo dos tempos nos processos decisórios que mudaram os rumos das
civilizações. Podemos destacar dois grandes momentos em que a oralidade adquire
“horizontes de significação”.
102
O primeiro é o da oralidade física, presencial, a oralidade do pastor, do padre que faz
o sermão, espécie de atualização da voz do soberano, do líder religioso. O segundo
momento, foi o da contemporaneidade, que se desenvolveu na medida que
apareceram, há 150 anos, os aparelhos de gravação e os primeiros registros da voz
(os fonógrafos). Quando da oralidade mediada ao vivo e registrada. A mudança do
uso da voz significou novas possibilidades de expandir a oralidade, visto que ela agora
passa a ser produzida em massa.
Palavras-chave
rádio;; oralidade;; narrativa;; cultura do ouvir;; educação.
Bibliografia
DERRIDA, Jacques. Gramatologia / Jacques Derrida;; [trad. Miriam Chnaiderman e
Renato Janine Ribeiro] – São Paulo: Perspectiva, 2013 – (Estudos;; 16).
LÓPEZ QUINTÁS, Alfonso. Descobrir a Grandeza da Vida. Introdução à Pedagogia
do Encontro;; trad. Gabriel Perissé. São Paulo: ESDC, 2005.
MARCONDES FILHO, Ciro. O escavador de silêncios: formas de construir e de
desconstruir sentidos na comunicação: Nova teoria da comunicação II / Ciro
Marcondes Filho. – São Paulo: Paulus, 2004. – (Comunicação).
MCLUHAN, M. A Galáxia de Gutenberg;; a formação do homem tipográfico;; trad. de
Leônidas Gontijo de Carvalho e Anísio Teixeira. São Paulo, Editora Nacional, Editora
da USP, 1972.
ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social: Ensaio sobre a origem das línguas;;
Discurso sobre as ciências e as artes / Jean-Jacques Rousseau: tradução de
Lourdes Santos Machado: introdução e notas de Paulo Arbousse-Bastide e Lourival
Gomes Machado – 2 ed. – São Paulo: Abril Cultural, 1978 (Os pensadores).
A modelização de textos semióticos na construção de identidades estéticas de
projetos transmídia
Gisele Frederico
Email: gisele.fred@gmail.com
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: Poéticas e Técnicas
Orientador: Almir Antônio Rosa
Resumo expandido
O final do século XX foi marcado pelo desenvolvimento de tecnologias que
possibilitaram uma transformação na cultura material de nossa sociedade, em que a
informação passou a ser um produto amplamente comercializado. Nesse contexto, a
convergência digital surgiu como um novo paradigma comunicacional, artístico e de
distribuição. Uma obra transmídia, fruto da convergência, é aquela que explora
diferentes plataformas e mídias, que se relacionam e formam uma rede onde o
espectador-usuário pode navegar por um amplo universo narrativo. O objetivo deste
trabalho é analisar a construção da identidade estética na obra transmídia The
Walking Dead por meio de uma abordagem semiótica. Primeiramente, faremos uso
das teorias desenvolvidas por Iuri Lotman, membro da escola de Tartu-Moscou, ao
103
aproximarmos os conceitos de semiosfera e de sistema transmídia, ao propor que
ambos comportam-se como espaços geradores de semiose entre as diferentes
linguagens que os compõem. Em seguida, analisaremos como se deu a tradução dos
quadrinhos para a série televisiva com base nos estudos de Julio Plaza, Haroldo de
Campos, Roman Jakobson e Décio Pignatari. A partir dessa análise, identificaremos
textos semióticos que se modelizam em todo o sistema transmídia, construindo sua
identidade estética. Os elementos de matriz modelizante serão identificados a partir
da sintaxe cinematográfica, fundamentada nas teorias de Nöel Burch, André Bazin,
Gilles Deleuze, Ismail Xavier, entre outros.
Palavras-chave
Transmídia;; estética;; semiótica.
Bibliografia
JENKINS, Henry. A cultura da convergência. 2. ed. São Paulo: Aleph, 2009.
LOTMAN, I.;; USPENSKII, B. Sobre o mecanismo semiótico da cultura. In: LOTMAN,
I. M., ______, IVÄNOV, V. Ensaios de semiótica soviética. Tradução V. Navas e S. T.
De Menezes. Lisboa, Horizonte, 1981.
LOTMAN, Iuri M. A estrutura do texto artístico. Trad. Maria do Carmo V. Raposo;;
Alberto Raposo. Lisboa: Estampa, 1978.
___________. La semiosfera I: semiótica de la cultura y del texto. Trad. Desiderio
Navarro. Madri: Ediciones Cátedra, 1996.
___________. La semiosfera II: semiótica de la cultura, del texto, de la conducta y
del espacio. Trad. Desiderio Navarro. Madri: Ediciones Cátedra, 1998.
MCLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação como extensões do homem. 1. ed.,
19ª reimpressão. São Paulo: Pensamento-Cultrix Ltda., 2016.
14h30 – 16h30
MESA 11 - POLÍTICA, CULTURA E AUDIOVISUAL
A Política de Cultura e a Ascensão da Indústria de Televisão no Brasil, 1950-
1985
Thamyris Almeida
Email: thamyris_almeida@brown.edu
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Esther Império Hamburger
Resumo expandido
Enquanto vários estudos examina as formas com que os regimes autoritários latino-
americanos usaram a mídia no final do século XX, a mídia sob governo democrático
recebe pouca atenção.
104
Este estudo destaca um período de transição política, eu investigo como a relação
entre a mídia e o Estado foi formada sob o governo democrático (1950-64) — e as
implicações de tais laços sob autoritarismo (1964-85). Pesquisa preliminar extensa
mostra que a indústria de televisão formou uma relação de trabalho com o estado sob
democracia, lançando as bases para o uso da televisão pelo regime militar para
moldar a cultura popular brasileira em meio às batalhas sobre moralidade e conteúdo
subversivo. Interrogando materiais de arquivos estaduais e coleções temáticas e
pessoais pouco utilizadas, minha dissertação explora um período da história da
televisão no Brasil que recebeu pouca atenção acadêmica, mas oferece um espaço
exclusivo para abordar como as divergências ideológicas moldaram o cânone cultural
e a identidade nacional no Brasil e com qual resultados. Ao cobrir tanto o período
inicial da Guerra Fria quanto o regime militar, eu problematizo suposições sobre a
ditadura e os meios de comunicação de massa, interrogando as raízes dessa relação
em um período democrático.
Palavras-chave
televisão, cultura, identidade nacional, guerra fria, moralidade.
Bibliografia
Alberto, Paulina. “When Rio Was Black: Soul Music, National Culture, and the
Politics of Racial Comparison in 1970s Brazil.” HAHR. 89.1 (2009): 3-39.
Brennan, Niall P. “Authority, Resistance, and Representing National Values in the
Brazilian Television Mini-Series.” In Media, Culture & Society 37.5 (2015): 686-702.
Cowan, Benjamin. Securing Sex: Morality and Repression in the Making of Cold War
Brazil. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2016.
González de Bustamante, Celeste, “Muy Buenas Noches": Mexico, Television, and
the Cold War. Lincoln: University of Nebraska Press, 2012.
Hamburger, Esther and Eugênio Bucci, eds. A TV aos 50: Criticando a televisão
brasileira no seu cinqüentenário. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2000.
Spigel, Lynn. Make Room for TV: Television and the Family Ideal in Postwar
America. Chicago: University of Chicago Press, 1992.
Williams, Raymond. Television: Technology and Cultural Form. London: Fontana,
1974.
Mestiços na cultura e na arte
Andréia Guimarães Moura
Email: andreiamoura007@hotmail.com
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: Cultura e Comunicação Audiovisual
Orientador: Irene de Araújo Machado
Resumo expandido
A condição humana estrutura-se em uma existência de natureza dialógica. As trocas
acontecem das mais variadas formas. Na comunicação direta entre indivíduos, entre
sistemas, espécies, coletivos.
105
Verbalmente, na forma de textos, no gestual, comportamental, no implícito. A
capacidade de troca entre seres e sistemas implica, necessariamente, a existência de
dois ou mais indivíduos/sistemas, que podem ter maior ou menor níveis de
semelhanças entre si. E estes encontros, diálogos, são a razão de ser dos sistemas
culturais e sua fonte de evolução. Lótman (2013), afirma que no mundo real sempre
se está em confrontação com com a presença do outro. "Outro", neste sentido, tem a
conotação de "estrangeiro". A parte da pesquisa que se pretende apresentar está
relacionada à aproximação de conceitos de "mestiçagem" e "estrangeiro". Acepções
trabalhadas por François Laplantine, Alexis Nouss, Amálio Pinheiro e Iuri Lótman. E
que de certo modo sintetizam esta necessidade de encontros, diálogos da condição
humana e as possilidades que resultam destes imprevisíveis. O que seria
"estrangeiro", o que seria "mestiçagem" dentro da cultura? Como estas manifestações
aparecem na arte? Para Lótman (2013), estrangeiras são as forças desconhecidas
que penetram de forma imprevisível e constantemente a cultura. A intrusão do não
sistêmico em um sistema constitui, neste sentido, uma das fontes mais importantes
da transformação cultural. A outra pessoa, o outro mundo são essenciais para o
próprio entendimento da cultura como tal, pois as pretensas "identidades", o "próprio",
só são apercebidos face à confrontação com o "outro".
O autor também identifica o estrangeiro, de forma mais ampla, como um "estado de
espírito", uma disposição à alteridade. Ser estrangeiro é assumir-se peregrino. Por
sua vez, a predisposição à viagem, ao estar em trânsito é gatilho de enriquecimento
das culturas, do aumento das reservas de informação circulante. Ao cortar os laços
com o "lugar comum" o indivíduo constrói sua antítese, mas ao mesmo tempo esta
passa a ser sua realidade. A mudança constante entre "próprio" e "estrangeiro" e
"estrangeiro" e "próprio" é mecanismo fundamental na evolução das culturas. Disto,
desprende-se que estar estrangeiro é manter-se no território do transito, sempre
sensível ao encontro, sempre à mercê do imprevisível, sempre protagonizando
doloroso desprendimento do próprio, sempre sendo "eu" no outro e permitindo ao
"outro" ser no "eu". O estrangeiro impele a transformação. O ininterrupto
estranhamento do outro impele a transformação criativa. O viajante, o andarilho, é
mestiço. E neste ponto, importa aproximar os conceitos trabalhados pelos autores.
François Laplantine, Alex Nouss e Amálio Pinheiro tratam a condição mestiça como
viagem, mobilidade, invenção nascida do encontro. Entendimento de uma identidade
marcada pela multiplicidade de identidades possíveis. No mestiço não é possível
nenhuma antecipação, nenhuma previsibilidade.
E transformações criativas. O constante transformar-se produz sociedades livres em
níveis diversos. Laplantine (2002) afirma que a "liberdade de espírito convida à
liberdade da forma". É na arte, espécie de "reino" da forma, que os níveis de liberdade
das sociedades são (de algum modo) perceptíveis. Que a quantidade de informação
circulante e de reservas informacionais se demonstra. O estudo em questão procura
entender e apresentar possibilidades do que representa ser mestiço, estrangeiro, na
cultura e como esta condição pode ser observada em manifestações artísticas.
Palavras-chave
cultura;; arte;; mestiçagem;; imprevisibilidade.
Bibliografia
ABDALA JR., B. (Org.). Margens da cultura: mestiçagem, hibridismos e outras
misturas. São Paulo: Boitempo, 2004.
BURKE, P. Hibridismo Cultural. São Leopoldo: Editora Unisinos, 2003.
LAPLANTINE, F.;; NOUSS, A. A Mestiçagem. Lisboa: Piaget, 2002.
LÓTMAN, I. Cultura y explosión. Barcelona: Gedisa, 1999.
___________. La semiosfera: semiótica de la cultura e del texto. Vol I. Frónesis
Cátedra: Universitat de Valencia, 1996.
___________. The unpredictable workings of culture. Tallinn: TLU Press, 2013.
MACHADO, I. Escola de semiótica: a experiência de Tártu-Moscou para o estudo da
cultura. Cotia: Ateliê Editorial;; São Paulo: Fapesp, 2003.
___________ (Org.) Semiótica da cultura e semiosfera. São Paulo:
Fapesp/AnnaBlume, 2007.
___________. Cultura em campo semiótico. Revista USP, São Paulo, n. 86, jun/ago
2010, p. 157-166.
PINHEIRO, A. Aquém da identidade e da oposição: formas na cultura mestiça.
Piracicaba: Unimep, 1994.
Por um audiovisual negro: perspectivas poéticas, técnicas e éticas no filme
Zumbi Somos Nós
Daniel Correia Ferreira Lima
Email: danielcflima@usp.br
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: Poéticas e Técnicas
Orientador: Almir Antônio Rosa
Resumo expandido
I. É preciso acreditar na potência da invenção. No primeiro encontro iremos debater
como pensar um audiovisual negro. A partir da análise do filme Zumbi Somos Nós
vamos pensar como se constrói uma outra “voz” para pesquisa artística e outros
procedimentos para o audiovisual, baseados na ética e organicidade do processo.
107
Partindo da colocação de Francis Fanon, “O terceiro mundo deve começar a
reescrever nova[s] história[s] da humanidade” refletimos como fazer uma nova história
do cinema? Como inventar uma nova gênese que possa nos libertar de estruturas
normalizadas, padronizadas que afinal reproduzem um mundo do qual queremos criar
um desvio? II. É preciso romper com o saber que exclui o outro. A exemplo do
processo da Frente 3 de Fevereiro pensaremos como um coletivo pode dirigir um
filme? Como fazer um filme como 21 diretores? Como criar uma dinâmica onde o
saber não seja exclusor e elemento de autoridade e silenciamento?
preciso romper com a estrutura vertical hierárquica do cinema! Uma análise sobre a
dinâmica pedagógica aplicada no audiovisual Zumbi Somos Nós para proporcionar
uma horizontalidade no processo criativo. Do movimento pendular, às colagens
coletivas e à coordenação rotativa. III. É preciso romper com o método fixo. Neste
encontro analisaremos, a partir do filme Zumbi Somos Nós, como podemos criar um
caminho que se cria enquanto se caminha. Um olhar sobre as filmagens e sequências
que foram criadas em diferentes momentos, em diferentes situações, com diferentes
recursos e estruturas de produção. Pontuaremos o cuidado de manter alguns
denominadores em comum que garantem a espinha dorsal (técnica e conceitual) do
trabalho. A aposta nas intervenções urbanas como disparadores de debate será
colocada em contexto a partir de ações anteriores do coletivo e dos artistas
participantes. Como se construiu uma pesquisa sobre racismo em contínuos passos
de criação, ação e reflexão? Perguntas que geram respostas poéticas que por sua
vez são novas perguntas disparadoras. IV. É preciso romper com a linearidade. Neste
encontro analisaremos o roteiro e montagem do filme Zumbi Somos Nós. Iniciaremos
com as obras referenciais do filme como: Hiroshima Mon Amour (Alain Resnais e
Marguerite Duras, 1959);; A negra de.... (Ousmane Sembène, 1966);; Soy Cuba
(Mikhail Kalatozov, 1964);; Surplus (Direção: Erik Gandini, 2003);; e A verdadeira
história de Huey P Newton (Spike Lee, 2001). Observaremos como essas referências
alimentam a montagem do filme e como são recriadas novas composições. Na
sequência, seremos levados a trajetória transmidiática da trilogia Zumbi Somos Nós:
o Filme;; o Livro;; e o Álbum Musical. Por último a análise das diferentes temporalidades
dentro da ação com a bandeira Brasil Negro Salve. V. É preciso promover a
transversalidade do saber.
Palavras-chave
Frente 3 de Fevereiro, audiovisual, negritude.
Bibliografia (Máximo de 1000 caracteres)
Daniel Lima é bacharel em Artes Plasticaś pela Escola de Comunicaçaõ e Artes da
USP, Mestre em Psicologia Clínica pelo Núcleo de Estudos da Subjetividade da
PUC/SP e doutorando em Meios e Processos Audiovisuais pela Escola de
108
Comunicação e Artes da USP. Desde 2001 cria intervenções e interferências no
espaço urbano. Próximo de trabalhos coletivos, desenvolve pesquisas relacionadas a
mídia,́ questões raciais e processos educacionais. Membro fundador da A Revolução
Não Será Televisionada, Política do Impossível e Frente 3 de Fevereiro. Dirige a
produtora e editora Invisíveis Produções. www.danielcflima.com.
A imagem partida: fraturas no cinema brasileiro recente
Raul Arthuso
Email: raul.arthuso@gmail.com
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Esther Império Hamburger
Resumo expandido
"A Imagem Partida" é uma análise imanente de alguns filmes brasileiros de ficção
recentes até o imediato pré-Golpe. Filmes como O Som ao Redor (Kleber Mendonça
Filho, 2012), Branco Sai Preto Fica (Adirley Queirós, 2014), Casa Grande (Felipe
Barbosa, 2014), Que Horas Ela Volta? (Anna Muylaert, 2015) ou Filme de Aborto
(Lincoln Péricles, 2016) reacenderam o debate sobre a representação de certas
fraturas da nossa sociedade, repondo na tela discussões importantes da vida
brasileira, como a ordem arcaica do latifúndio sustentada pela política de privilégios,
mesmo depois dos avanços sociais do país ao longo das duas últimas décadas;; a
sociabilidade entre as classes sociais no espaço doméstico e urbano, a violência
contra populações periféricas, a representação de minorias, ou aborto, apenas para
listar algumas questões que ganharam a frente em obras marcantes do cinema
brasileiro dos últimos cinco ou seis anos.
Com este quadro em mente, "A Imagem Partida" propõe um corpo-a-corpo com filmes
de ficção brasileiros deste novo século que refletem um momento de dissenso e
conflito, com humores e ânimos mais erosivos, numa sociedade em franca
transformação. Organizados em seis linhas de força, proponho, pelo método
comparativo, um cotejo entre filmes diversos em suas intenções, modos de produção
e objetivo no panorama cultural, a fim de, no confronto de visões diferentes das
mesmas questões, refletir sobre as propostas da cinematografia brasileira
contemporânea no retrato do país. O Brasil passou por um período de transformações
sociais profundas, com reconfiguração da pirâmide social, otimismo consumista e
mudança de status simbólico do país no cenário mundial, desembocando no momento
atual de tensões e acirramento das posturas que se manifesta nas obras, tendo como
enfoque principal, a partir dos contrastes, a oposição entre formas de conciliação e de
exposição das fraturas da realidade.
Como afirma Jessé Souza, a realidade social não é visível a olho nu, o que significa
que o mundo social não é transparente aos nossos olhos". O cinema é uma forma
poderosa de trazer à vista essa realidade. A crítica imanente, por sua vez, tem o
potencial de trazer a primeiro plano essa visão da realidade que os criadores
imprimem nas obras.
109
Então, o corpus da pesquisa engloba filmes de diferentes naturezas dentro da
produção cinematográfica brasileira: Tropa de Elite e Branco Sai Preto Fica ocupam
simbolicamente espaços distintos no debate público tanto entre si quanto em relação
a De Pernas pro Ar 2 e Que Horas Ela Volta?. Assim, trata-se de um estudo que
confronta visões de diferentes setores da produção cinematográfica sobre as formas
de representação das dinâmicas sociais brasileiras contemporâneas.
O trabalho busca entender o cinema brasileiro enquanto um corpo vivo, analisando
aspectos estéticos e ideológicos que se confrontem para mostrar que mesmo filmes
muito diferentes enquanto estilo, modo de produção e finalidade no mercado
audiovisual convivem em seu tempo, dialogando ainda que de maneira transversal.
Esse método busca abrir a possibilidade de expandir o diálogo entre os filmes para
além de seu próprio espaço de atuação, propiciando confrontos inesperados entre as
obras e abrindo as conexões para além dos guetos que ocupam e recolocando a
interação dos filmes no espaço de uma cultura interligada.
Afinal, mesmo essas obras vindo de lugares simbólicos diferentes, nascem de um
mesmo país e um mesmo tempo. Assim, a apresentação "A Imagem Partida" pretende
mostrar o atual estágio da pesquisa, discutindo seus parâmetros, seus pontos de
partida e os esboços de análises em curso.
Palavras-chave
cinema brasileiro;; contemporâneo;; sociedade.
Bibliografia
AB’SABER, Tales. Lulismo, carisma pop e cultura anticrítica. São Paulo: Hedra, 2011.
BENTES, Ivana. “Sertões e favelas no cinema brasileiro contemporâneo: estética e
cosmética da fome”. In: Alceu, v.8, n. 15, p. 242-255, jul./dez., 2007.
CAETANO, Daniel (Org.). Cinema Brasileiro 1995-2005: ensaios sobre uma década.
Rio de Janeiro: Azougue Editorial, 2005.
EDUARDO, Cléber & Valente, Eduardo. Cinema brasileiro anos 2000, 10 questões
[catálogo]. São Paulo: Centro Cultural Banco do Brasil, 2011, p.44-47.
MENDES, Adilson (org.). Encontros: Ismail Xavier. Rio de Janeiro: Azougue Editorial,
2009.
NAGIB, Lúcia. A utopia no cinema brasileiro. São Paulo: Cosac Naify, 2006.
NOBRE, Marcos. Imobilismo em movimento: da abertura democrática ao governo
Dilma. São Paulo: Companhia das Letras, 2013.
XAVIER, Ismail. “Estado e territórios: transcrição do debate Espaços em Conflito –
Tradição e Atualização”. In: Catálogo da Mostra Tiradentes SP 2016, p. 124-126.
São Paulo: SESC, 2016.
As fissuras do tempo: práticas coletivas no audiovisual brasileiro
contemporâneo
Thiago Siqueira Venanzoni
110
Email: thiagovenanzoni@usp.br
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: Cultura e Comunicação Audiovisual
Orientador: Rosana de Lima Soares
Resumo expandido
Notabiliza-se hoje em dia, em espaços midiáticos e audiovisuais, o surgimento de
ações coletivas. Na música, com grupos periféricos ocupando-se da produção e
circulação de seus projetos, na poesia, com os slams promovidos por reuniões de
pessoas em centros urbanos, etc. No cinema, apesar da complexidade nas formas de
produção, esse fenômeno também ocorre em alguma escala e passa a ganhar
destaque em circularidades restritas na complexidade crítica a essas produções.
Vemos duas questões a esse fenômeno, a primeira diz respeito a determinadas ações
e políticas públicas de incentivo às práticas coletivas e periféricas. A mais notável
dessas políticas são os Pontos de Cultura, surgido no último ano do governo Lula.
O seu modelo de incentivo e produção ocasionou uma mudança estrutural
reconhecida e passou a nortear outros editais locais, em estados e municípios. A
segunda questão é no âmbito cultural e discursivo, a ver com a emergência de novos
atores sociais em um renovado espaço público que apresenta demandas por
reconhecimento a grupos sociais subalternos, que se traduz em novos modos de
produção e consumo cultural, seja no cinema, no audiovisual, na música ou na poesia.
Essas duas questões podem ser analisadas ao longo do tempo de uma década,
aproximadamente, para encontrar seus pontos de fissura. Em 2004 o diretor Paulo
Sacramento lança o seu documentário Prisioneiro da grade de ferro sobre os
encarcerados da Casa de Detenção do Carandiru, em São Paulo. A equipe do filme
aplicou algumas oficinas e workshops de uso de câmera, gravação, e algumas dessas
imagens captadas somam-se à narrativa. Segundo o crítico Luiz Carlos Merten, em
texto lançado à época da exibição do documentário no Festival É tudo verdade, o que
Sacramento consegue é um forte contrato com os prisioneiros do Carandiru e afirma
que o diretor, ao dar os workshops, “forneceu aos presos o instrumental para que eles
filmassem, sem intermediário, a sua própria imagem” (MERTEN, L.C. A força de um
contrato estético e social. O Estado de S. Paulo, 16 de abril de 2004. Acesso em:
01/07/2018).
Essa instância narrativa localizava, segundo Merten e outros, um contrato estético e
social. Entretanto, uma condição sempre foi questionada ao ser pensado essa
produção, seu caráter de “real”, uma vez que os prisioneiros foram colocados na
hierarquia da produção. Sobre isso, Figueiredo (2009) traz a crítica de Bernardo
Carvalho sobre a obra de Sacramento, diz ele quando “o cineasta tem à disposição
tantos artifícios quanto o autor de um filme de ficção. Nesse sentido, diz o romancista,
O prisioneiro da grade de ferro seria tão artificial quanto o filme de Babenco”
(FIGUEIREDO, 2009, p.35). Os artifícios comentados por Bernardo Carvalho
remontam ao longo do tempo uma espécie de engodo ao se chamar pelo outro que a
narrativa do documentário traduz. Como também oculta seu caráter mediador do
processo, já que há oficinas e workshops emulando um certo tipo de fazer que a
produção pretendia junto aos seus personagens. Por outro lado, essa percepção,
apesar de raramente ser lembrada no complexo crítico à época do seu lançamento,
111
hoje parece ainda mais pertinente quando olhamos as produções de coletivos
consolidados no cinema e no audiovisual nacional. O que justifica o aspecto aqui
trazido não restritivo aos modos de produção mas também um processo cultural e
parte do seu efeito discursivo, da enunciação da narrativa e suas circularidades.
Compara-se ao que Eliane Caffé, diretora do filme Era o hotel Cambridge (2017),
relata em entrevistas sobre o processo de produção desse filme coletivo que ela
dirigiu. A princípio, a narrativa seria sobre os refugiados em São Paulo, porém, ao
longo da pesquisa e ao descobrir que grande parte desses migrantes vai morar em
ocupações no centro da cidade, Caffé então compreende a dimensão que a narrativa
pode alcançar a partir dos movimentos de luta por moradia existentes na cidade. Essa
compreensão, porém, não parte apenas da produção, mas também das
impossibilidades levantadas pelos próprios movimentos de ocupação do Cambridge,
como, por exemplo, a criminalização aos movimentos sociais e a desconfiança a
essas apropriações por parte de circuito de produções que estão fora do contexto
político da ocupação. A produção, assim, passou a participar ativamente do cotidiano
da ocupação, em assembleias, em debates construídos pelos moradores atuais do
Cambridge, e, a partir de uma troca, formou-se o lugar da produção, integrando os
moradores à equipe.
Justifica-se a pesquisa, por fim, para a análise e a crítica em relação às mudanças no
contexto cultural em jogo, que impossibilitam a realização de filme em um modo de
produção mais canônico e a necessidade de outro tipo de produção ao se pensar na
visibilidade a grupos sociais periféricos.
Palavras-chave
práticas, coletivo, audiovisual contemporâneo, visibilidade, reconhecimento.
Bibliografia
FIGUEIREDO, V. L. F. Novos realismo e o risco da ficção. Comunicação, Mídia e
Consumo, São Paulo, vol.6, n.16, p.29-43, 2009.
FRASER, N. Reconhecimento sem ética? Lua Nova, São Paulo, n. 70, p. 101-138,
2007.
FRASER, N;; HONNETH, A. Redistribution or recognition? A political-philosophical
exchange. New York;; London: Verso, 2003.
ORTIZ, R. Universalismo e diversidade. São Paulo: Boitempo, 2015.
RANCIÈRE, J. As imagens querem realmente viver? In: ALLOA, E (Org.). Pensar a
imagem. Belo Horizonte: Autêntica, 2015. p. 191-204.
______. A partilha do sensível. São Paulo: Editora 34, 2005.
SAFATLE, V. O circuito dos afetos: corpos políticos, desamparo e o fim do indivíduo.
2. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2016.
SERELLE, M. A ética da mediação: aspectos da crítica de mídia em Roger
Silverstone. Matrizes, São Paulo, v. 10, n. 2, p. 75-90, 2016.
112
16h50 – 18h50
MESA 12: REPRESENTAÇÕES DA MULHER NO AUDIOVISUAL
Cleo de Verberena: uma cineasta brasileira
Marcella Grecco de Araújo
Email: marcellagrecco@gmail.com
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Esther Império Hamburger
Resumo expandido
Situada na confluência dos estudos de gênero, história cultural e estudos de cinema,
o objetivo geral da minha tese de doutorado é entender a experiência pioneira de
Jacyra Martins da Silveira/Cleo de Verberena, cineasta brasileira. No percurso será
explorado o cinema e sua relação com a vida moderna e em que medida ele
influenciou na inserção das mulheres paulistas na esfera pública do início do século
XX, tanto como espectadoras como quanto profissionais.
Adensar a historiografia do cinema brasileiro é outro objetivo da tese em andamento.
Para esse encontro a proposta é apresentar brevemente o caminho que venho
trilhando e as expectativas que norteiam a pesquisa.
Palavras-chave
Cinema brasileiro;; cinema silencioso;; diretora;; pioneira
Bibliografia
BULL, Sofia;; WIDDING, Astrid Söderbergh. (orgs.). Not so silent. Women in cinema
before sound. Estocolmo: Stockholm University Press, 2010.
ARAÚJO, Luciana Corrêa de.“Cléo de Verberena e o trabalho da mulher no cinema
silencioso brasileiro”. In: HOLANDA, Karla;; TEDESCO, Marina. Cavalcanti. (orgs.).
Feminino e plural: mulheres no cinema brasileiro. Campinas: Papirus, 2017.
CONDE. Maite. Consuming visions: female stars, the melindrosa and desires for a
Brazilian film industry. In: BERGFELDER, Tim;; SHAW, Lisa;; VIEIRA, João Luiz. Stars
and stardom in Brazilian cinema. Oxford: Berghahnbooks, 2017.
GALVÃO, Maria Rita. Crônica do cinema paulistano. São Paulo: Ática, 1975. PRADO,
José Maria do. Memórias do cinema paulista: 1896-1981. São Paulo: manuscrito
depositado na Cinemateca Brasileira, 1981.
SCHPUN, Mônica Raisa. Les années folles à São Paulo: hommes et femmes au temps
de l’explosion urbaine (1920-1929). Paris: l’Harmattan/IHEAL, 1997.
A criminosa de Lúcio Cardoso em O Crime do Dia e Porto das Caixas
Lívia Azevedo Lima
113
Email: liviaazevedolima@gmail.com
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Ismail Norberto Xavier
Resumo expandido
Na prosa de ficção, o escritor Lúcio Cardoso buscava criar densidade psicológica em
uma forma moderna. Dentre os seus temas, são constantes as oposições
cidade/campo, bem/mal, assim como traição, decadência, incesto, loucura, tédio,
homossexualismo e fracasso. As protagonistas, na maioria das vezes mulheres em
estado emocional limítrofe, cometem um ato transgressor e, a partir disso, se
observam pela primeira vez: descobrem sua condição humana frágil e essencialmente
solitária, distante de Deus. É o caso de Ida, da novela Mãos vazias (1938);; de Nina e
Ana, da obra-prima cardosiana Crônica da casa assassinada (1959);; e de Donana de
Lara e Sinhá, do romance inacabado O viajante (1973, publicação póstuma). Todas
comentem crimes ou pecados, sofrem e cumprem seus destinos trágicos de
isolamento ou morte. Na esteira da bem-sucedida coluna de Nelson Rodrigues, A Vida
Como Ela é, lançada pelo jornal Última Hora, em setembro de 1951, sete meses
depois, em abril de 1952, o periódico A Noite convida Lúcio Cardoso para manter a
seção "O Crime do dia". Nesse espaço, Lúcio criava ficções a partir de crimes
mirabolantes e folhetinescos, que por si só já soavam como literatura. Mais tarde, ao
sugerir o argumento de uma produção de baixo orçamento para o amigo Paulo César
Saraceni estreiar no longa-metragem, Lúcio retoma a prática de "O Crime do Dia" e
transforma o "crime da machadinha", um episódio de grande repercussão na década
anterior, no argumento do filme Porto das Caixas (1962).
No caso real, a ré Araci Abelha, acusada de matar o marido Abel Abelha com golpes
de machado em Niterói, foi presa em abril de 1948, mas absolvida por falta de provas
em novembro do mesmo ano. No filme, a personagem vivida pela atriz Irma Álvarez
culpa o marido (Paulo Padilha) por sua condição de miséria e marasmo na cidade
decadente de Porto das Caixas e decide matá-lo para se libertar dessa situação. Pede
ajuda de homens que encontra pelo caminho, um barbeiro e um soldado, e do amante
(Reginaldo Faria). Este concorda em ajudá-la, mas na hora decisiva fraqueja e ela
executa a ação sozinha. O crime, como em muitos dos textos da coluna e das novelas
e romances do escritor, já está anunciado de forma desde o início, o que assistimos
é como ele ocorre e como reverbera nas personagens. Além da produção em prosa e
poesia, Lúcio Cardoso atuou no teatro e no cinema. Como dramaturgo, estreou com
a peça O filho pródigo, encenada pelo Teatro Experimental do Negro em 1947, e
chegou a ter uma companhia, o Teatro de Câmara. No cinema, escreveu, entre outros,
o roteiro de Almas adversas (1949), dirigido por Leo Marten e estralado por Bibi
Ferreira, e dirigiu o inacabado, A mulher de longe (1949), sobre uma mulher, à
semelhança da personagem Nina de Crônica da casa assassinada, que é acusada de
ter levado o mal para uma ilha.
Ao mesmo tempo, é por meio da figura feminina que ele faz um diagnóstico preciso
da repressão patriarcal de seu tempo e, com o modo de vida de suas personagens,
antecipa questões das décadas posteriores, marcadas pela urbanização e pela
emancipação sexual.
Palavras-chave
Lúcio Cardoso;; Paulo César Saraceni;; personagem feminina;; argumento;; crônica.
Bibliografia
CARDOSO, Elizabeth. Feminilidade e transgressão: uma leitura da prosa de Lúcio
Cardoso. São Paulo: Humanitas, 2013.
CARDOSO, Lúcio. Crônica da casa assassinada. Ed. crítica. 2ª ed. Mario Carelli
(Org.). Paris: Unesco, 1996.
SANTOS, Cássia dos. “O criador e a criatura: notas sobre a concepção de Nina em
Crônica da casa assassinada”. Revista Brasileira, v. 72. Rio de Janeiro: ABL, 2002,
pp. 211-28.
FREIRE, Miguel. "Argumento de Lúcio Cardoso". In: Uma luz brasileira: A contribuição
de Mario Carneiro. Niterói, 2006. Dissertação de mestrado em Comunicação, UFF,
pp. 150-89. Fundo Lúcio Cardoso do Arquivo-Museu de Literatura Brasileira da FCRB-
RJ Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional: http://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-
digital/ LAMEGO.
Valéria F. "A coluna 'O Crime do Dia'". In: O conto e a vida literária de Lúcio Cardoso.
Tese de doutorado em Letras, PUC-RJ, 2013, pp. 90-123.
SARACENI, Paulo César. Por dentro do cinema novo: minha viagem. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 1993.
O Movimento Feminino pela Anistia em reportagens da Rede Globo Minas
Marcella Furtado
Email: marcellafurtado@yahoo.com.br
Nível: Doutorado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Eduardo Victorio Morettin
Resumo expandido
O período entre 1964 e 1985 compreende um momento muito peculiar na História do
Brasil, em razão das significativas mudanças políticas ocorridas e seu impacto no
cotidiano da população brasileira. Compreendendo histórias notórias e passagens que
ainda carecem de mais estudos, a ditadura militar é até hoje objeto de muitas
pesquisas, provocando indagações e questionamentos em diversas pessoas que
desejam ver este período revelado com mais detalhes. Desta forma, o assunto tem
sido objeto de estudos acadêmicos em diversas áreas do conhecimento, entre elas
pesquisas voltadas à análise dos registros audiovisuais feitos à época, bem como o
exame de filmes documentais e ficcionais realizados posteriormente e que abordam
aspectos distintos daquele momento histórico.
115
Para a realização de pesquisas sobre a ditadura são considerados documentos
textuais, imagens fotográficas, jornais, depoimentos daqueles que participaram ou
presenciaram os fatos ocorridos durante aqueles anos, entre outras fontes.
Questionado durante muito tempo, o documento audiovisual ganhou espaço,
relevância e reconhecimento dentro destes estudos, e ele se estabelece cada dia mais
como uma importante fonte de informações.
Em Belo Horizonte, há poucos espaços que guardam e disponibilizam para o público
a consulta a acervos audiovisuais que se relacionam com a memória e história da
cidade. Dentre eles, o Museu da Imagem e do Som de BH é o que possui em seu
escopo principal a guarda e difusão de documentos audiovisuais, sendo também o
que possui maior acervo fílmico e videográfico, totalizando mais de 50 mil títulos, nos
mais diversos suportes. É um conjunto amplo e diversificado. São obras que vieram
de diferentes fontes, produzidas sob condições variadas e com resultados igualmente
heterogêneos. Há produções ficcionais, documentais, jornalísticas e filmes de família,
entre outros. No conjunto da diversidade temática do Museu, há também as matrizes
originais de material jornalístico produzido pela Rede Globo Minas entre 1968, data
de sua inauguração, e 1983, quando a emissora parou de utilizar filmes em película
para a produção de suas telerreportagens.
Do período compreendido por este Fundo, há registros audiovisuais que abordam
temas diversos relacionados à cidade de Belo Horizonte, como política, esportes,
eventos, comportamento, saúde, educação, cultura, entre outros. Muitos
pesquisadores procuram o Museu da Imagem e do Som de Belo Horizonte buscando
imagens relacionadas ao período da ditadura militar na cidade. Pelos levantamentos
feitos a partir da demanda destes consulentes, a equipe do MIS- BH percebeu a
diversidade e riqueza de registros sobre aquele momento presentes no acervo da
instituição. Na maioria das vezes os pesquisadores querem imagens 'prontas',
contextualizadas e que tragam registros simbólicos sobre as ocorrências da época:
manifestações estudantis, embates com a polícia, pessoas correndo pelas ruas,
ações no DOPS (Departamento de Ordem Política e Social) etc. Porém, em muitos
casos, as imagens que encontram são material bruto, registros primários sobre fatos
ocorridos naquele momento. Não há edição e os fatos muitas vezes aparecem
descontextualizados, demandando que se faça ainda um trabalho de contextualização
destes registros, uma das metas da pesquisa de doutorado aqui apresentada. Porém,
a falta de contexto e edição não tornam estes registros menos importantes. Pelo
contrário. O fato destes rolos estarem ainda em seu estado bruto os tornam ainda
mais completos, sem os cortes e censuras que uma possível edição poderia causar.
O capítulo abordado nesta apresentação envolve a análise de como o Movimento
Feminino pela Anistia (MFPA) aparece em cinco reportagens realizadas pela Rede
Globo Minas na cidade de Belo Horizonte entre os anos 1977 e 1979. Para tanto,
faremos uma breve contextualização do MFPA na capital mineira, para então
buscarmos entender de que forma a memória do período é construída em reportagens
sobre o Movimento.
Palavras-chave
televisão;; acervo;; audiovisual;; ditadura;; memória.
Bibliografia
DELGADO, Lucília de Almeida Neves. Helena Greco: humanismo intransigente. In:
FICO, Carlos. Além do golpe: versões e controvérsias sobre 1964 e a Ditadura Militar.
Rio de Janeiro: Record, 2004.
MORETTIN, Eduardo. Acervos cinematográficos e pesquisa histórica: questões de
método. MORETTIN, E. V. (Org.);; ARAUJO, D. C. (Org.);; REIA-BAPTISTA, V. (Org.).
Ditaduras revisitadas: cartografias, memórias e representações audiovisuais. 1. ed.
Faro: CIAC/Universidade do Algarve, 2016. v. 1. 829p.
MOTTA, Rodrigo Patto Sá. As universidades e o regime militar: cultura política
brasileira e modernização autoritária. Rio de Janeiro: Zahar, 2014. 429 p.
NAPOLITANO, Marcos. 1964: história do regime militar brasileiro. São Paulo:
Contexto, 2014. 365 p.
OLIVEIRA, Ana Maria Rodrigues de. Helena Greco, eu te batizo: anistia. REIS FILHO,
Daniel Aarão. Ditadura e democracia no Brasil: do golpe de 1964 à Constituição
de 1988. Rio de Janeiro: Zahar, 2014. 191 p.
A jornada das heroínas: protagonismo feminino no cinema contemporâneo
brasileiro
Kátia Kreutz
Email: katiakreutz@usp.br
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: Cultura e Comunicação Audiovisual
Orientador: Irene de Araújo Machado
Resumo expandido
O projeto busca estudar o protagonismo feminino na produção audiovisual brasileira
contemporânea, mais especificamente nos longas-metragens O Céu de Suely (2006),
de Karim Aïnouz, Que Horas Ela Volta? (2015), de Anna Muylaert, e Pela Janela
(2017), de Caroline Leone. Tendo como base a “jornada do herói” e analisando a
maneira como as personagens iniciam suas trajetórias em posição de não-
protagonismo, a pesquisa pretende apontar a importância dos desfechos nos quais
as mulheres assumem o controle sobre suas narrativas e, com isso, libertam-se da
opressão de realidades limitantes.
117
Nos três filmes estudados, as protagonistas são agentes de mudança e se tornam,
por meio dessas ações, heroínas de suas próprias histórias.
Palavras-chave
mulher, cinema brasileiro, protagonismo.
Bibliografia
CAMPBELL, Joseph. O Herói de Mil Faces. São Paulo: Cultrix/Pensamento, 1989.
GUBERNIKOFF, Giselle. A imagem: representação da mulher no cinema. São Paulo:
Summus, 2009
HASKELL, Molly. From Reverence to Rape: The Treatment of Women in the Movies.
Estados Unidos: Penguin Books Ltd., 1977.
HOLLINGER, Karen. Feminist Film Studies. Estados Unidos: Routledge, 2012.
LAURETIS, Tereza de. Alice Doesn’t: feminism, semiotics, cinema: an introduction.
London: The Mainillan Press, 1978.
LIMA, Helcira (Org.). Representações do feminino no cinema brasileiro. Belo
Horizonte: Viva Voz, 2013.
MURDOCK, Maureen. The Heroine's Journey. Estados Unidos: Shambhala, 1990.
REIS, Thais Botrel. A mulher e o cinema: representação feminina no mercado
cinematográfico brasileiro. Belo Horizonte: 2017. Dissertação (Mestrado) –
Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Belas Artes.
WHITE, Patricia. Women’s cinema, world cinema: projecting contemporary
feminisms. Estados Unidos: Duke University Press, 1964.
Amélia e a representação da mulher caipira no cinema brasileiro
Erika Amaral
Email: aerikaamaral@gmail.com
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: História, Teoria e Crítica
Orientador: Eduardo Victorio Morettin
Resumo expandido
Nesta pesquisa, tecemos uma análise sobre os processos de construção de
personagens mulheres caipiras no cinema brasileiro. Para tanto, selecionamos os
filmes Amélia (2000), de Ana Carolina, e Uma vida em segredo (2001), de Suzana
Amaral, postos em diálogo com as relações intermidiáticas de representação da figura
caipira nas artes. Para iniciar o debate sobre esta questão, apresentamos a pesquisa
em seu estado atual: através da análise fílmica de Amélia, destacamos traços
marcantes das protagonistas, como linguagem, figurino e os espaços em que se
inserem, que remetem à cultura caipira.
A representação de tais hábitos e práticas culturais do Brasil rural, contraposta à figura
da atriz francesa Sarah Bernhardt, suscita o exame de outra questão candente,
118
sugerida pela narrativa: as tensões que surgem do embate cultural e linguístico entre
as personagens produzem significações quando pensadas como alegorias para os
processos históricos de colonização. Amélia se inicia em 1905: Francisca e Oswalda,
donas de terras em Cambuquira, Minas Gerais, viajam para o Rio de Janeiro
acompanhadas da criada Maria Luísa para impedir que sua irmã Amélia, assistente
de Bernhardt, venda sua parte da fazenda. Porém, descobrem o falecimento da irmã
e, ao tentar reaver o dinheiro de Amélia, tornam-se costureiras da atriz.
Para examinar as personagens, selecionamos traços marcantes de suas
personalidades, características físicas, figurino e linguagem. Francisca é uma mulher
idosa, de cabelos grisalhos, que porta sempre um vestido preto. Tem personalidade
forte e é quem toma as decisões em Cambuquira.
Oswalda é a irmã do meio, mais tímida e contida, com figurino também simples e
recorrente. Maria Luísa, por sua vez, é a mais jovem das caipiras. É quem mais se
contagia com a presença de Bernhardt: aprende palavras em francês e é presenteada
com um vestido vermelho, decotado, que destoa das vestimentas das irmãs. Amélia
é a irmã mais nova, que surge majoritariamente nas memórias de Bernhardt. Tem os
lábios pintados de vermelho, pó-de-arroz na pele e utiliza joias, itens ausentes do
figurino das caipiras. De modo semelhante, a aparência de Bernhardt contrasta com
a caracterização das caipiras: tem cabelos cor de cobre, a pele extremamente
maquiada de pó-de-arroz, batom vermelho nos lábios;; utiliza chapéus, luvas,
grinaldas, anéis, brincos e inúmeros tipos de vestidos, robes e mantos de seda. Em
termos de linguagem e linguajar, Francisca, Oswalda e Maria Luísa usam termos
chulos e frases curtas, têm um forte sotaque do interior de Minas Gerais e, em
diversos casos, tentam se comunicar com a francesa através da fala pausada e de
gesticulações. A atriz, em contrapartida, expressa-se com vocabulário sofisticado e
discursa longamente sobre suas memórias e sentimentos, sem realizar esforços para
tornar sua fala compreensível para as demais.
Os espaços nativos das personagens também se diferenciam entre si. Os aposentos
de Bernhardt são recheados de mobílias sofisticadas, cortinas longas, pinturas,
louças, tecidos e almofadas, enquanto que, com uma parcimônia austera, o casarão
da fazenda de Cambuquira é ocupado por esparsos móveis de madeira, velas e
oratórios;; nos ambientes externos, predominam construções rústicas, como
estábulos, cercas, hortas. Esta caracterização dicotômica de mineiras e francesa
concorre para elaborar uma crítica à postura intransigente de Bernhardt em relação
às caipiras. Contudo, é possível traçar paralelos entre a contenda das personagens e
a referência à história da colonização do Brasil. Uma síntese desta inconciliabilidade
se manifesta na sequência em que, após ouvir os impropérios da atriz, Francisca
declama, enfurecida, o poema I-Juca Pirama, de Gonçalves Dias. De um lado, posta-
se a cultura caipira, de sotaque marcante, que remete diretamente às tradições e
práticas culturais das zonas rurais, oriundas dos primeiros movimentos de
bandeirantismo em terras brasileiras no século XVI (CANDIDO, 2010) e de outro lado,
a cultura europeia, caracterizada pelo refinamento dos gestos e erudição. Por meio
da figura da mulher francesa, que humilha e ridiculariza as brasileiras de diversas
formas ao longo da narrativa, forma-se uma alegoria à condição de país colonizado,
subjugado pelo imperialismo europeu.
Neste sentido, Ana Carolina constrói personagens que se sublevam contra esta
tradição de exploração e afirmam o orgulho de sua própria cultura diante da presença
119
estrangeira. Ao fim da sequência, Bernhardt retira-se, derrotada, diante da força das
caipiras. As dicotomias entre as personagens, portanto, estendem-se para além das
nacionalidades, como se verifica em termos de linguagem e figurino. Buscamos,
assim, realizar uma breve leitura de Amélia com o objetivo de contribuir para
esclarecer esta disparidade entre as representações da mulher brasileira e da mulher
francesa, que, postas em conflito, configuram-se como alegoria para as tensões do
colonialismo que marcam a história do Brasil.
Palavras-chave
cinema brasileiro, mulher caipira, crítica feminista de cinema.
Bibliografia
CANDIDO, Antonio. Os parceiros do Rio Bonito. Estudo sobre o caipira paulista e a
transformação dos seus meios de vida. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul, 2010.
Mulheres negras no audiovisual: a formação do olhar criativo de realizadoras
negras e suas produções
Lygia Pereira dos Santos Costa
Email: lygiapsc@gmail.com
Nível: Mestrado
Linha de pesquisa: Poéticas e Técnicas
Orientador: Almir Antônio Rosa
Resumo expandido
O ensaio The Oppositional Gaze (1992), escrito pela intelectual negra estadunidense
bell hooks* trata da experiência espectatorial de mulheres negras americanas e
desenvolve uma linha de pensamento que tem no olhar uma forma de enfrentamento
às narrativas hegemônicas. Resgatando a relação entre o olhar do escravizado e seu
senhor, hooks constrói uma argumentação que contempla no ato de olhar uma relação
de poder. Sendo o poder como uma forma de dominação que se reproduz em
diferentes locais, empregando aparatos, mecanismos e estratégias similares de
controle, a tentativa de reprimir o olhar das pessoas negras teria gerado, em resposta,
uma ânsia pelo olhar, um desejo rebelde, um olhar opositivo. Encarar torna-se um
mecanismo de resistência e transformação. Ao longo do século XX as imagens,
difundidas pela fotografia, cinema e televisão alteraram significativamente as relações
interpessoais, assim como a maneira como os processos de subjetivação e políticas
identitárias são formados.
Para investigá-las é importante ressaltar que a tentativa de definição de um olhar único
da mulher negra em face às imagens é um terreno perigoso. Tal análise precisa ser
feita considerando determinadas nuances para não cair em uma posição essencialista
na qual se assume mulheres negras como vítimas da opressão racial e de gênero e
que por isso, têm um campo de visão inerentemente diferente.
Dessa reflexão surge uma terceira questão: Diretoras e roteiristas negras, a partir de
suas experiências como espectadoras críticas, constroem relações de olhar que
levam a contestação, resistência, interrogação e invenção de um futuro por meio de
seus filmes? Tendo como base as proposições de bell hooks, essa pesquisa pretende
debruçar-se sobre o trabalho de realizadoras negras brasileiras contemporâneas e os
diálogos que seus filmes possibilitam com o cinema nos países da diáspora e da
África.
Tomo como recorte analítico o trabalho de jovens cineastas negras que têm produzido
filmes ao longo da última década e que se lançam na produção de narrativas sobre a
experiência negra. Dessa forma, entram como objeto de pesquisa os filmes: Cores e
Botas (2010), de Juliana Vicente;; O Dia de Jerusa (2014), de Viviane Ferreira;; A
Boneca e o Silêncio (2015), de Carol Rodrigues;; Kbela (2015), de Yasmim Thayná;;
Aquém das Nuvens (2011), de Renata Martins e Conflitos e Abismos: A Expressão da
Condição Humana (2014), de Everlane Moraes.
Palavras-chave
processo criativo;; olhar cinematográfico;; diáspora africana;; realizadoras negras.
Bibliografia
DU BOIS, William B. E. As almas da gente negra. Co-autoria de Heloisa Toller Gomes.
Rio de Janeiro, RJ: Lacerda, 1999. 322 p.;;
FERREIRA, Ceiça;; SOUZA, Edileuza Penha de. Formas de Visibilidade e
(Re)Existência no Cinema de Mulheres Negras. In: HOLANDA, Karla;; TEDESCO,
Mariana Cavalcanti. (Orgs). Feminino e Plural: mulheres no cinema brasileiro. 1. ed.
Campinas, SP: Papirus, 2017. 240 p.;;
STUART, Hall. Da diáspora: Identidade e mediações culturais. Organização de Liv
Sovik. Belo HoHorizonte, MG: Editora da UFMG, 2009. 410 p.;;
Hooks, Bell. Reel to real: race, sex, and class at the movies. New York;; London:
Routledge, c1996. 244 p.;;
SANTOS, Boaventura de Souza;; MENESES, Maria Paula (Orgs). Epistemologias do
Sul. 1. ed. Coimbra: Edições Almedina S.A., 2009. 641 p.;;
SHOHAT, Ella;; STAM, Robert. Critíca da imagem eurocêntrica: multiculturalismo e
representação. Coautoria de Robert Stam;; Tradução de Marcos Soares. São Paulo,
SP: CosacNaify, 2006. 528 p.
121