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13º Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

:: ANAIS ::
ISSN: 2236-4366

23 a 26 de maio de 2017
Curitiba-PR/Brasil
A NAIS DO XIII S IMPÓSIO I NTERNACIONAL DE C OGNIÇÃO
E A RTES M USICAIS

23 a 26 de maio de 2017

A SSOCIAÇÃO B RASILEIRA DE C OGNIÇÃO E A RTES M USICAIS


U NIVERSIDADE F EDERAL DO PARANÁ
U NIVERSIDADE E STADUAL DO PARANÁ

editado por
Luis Felipe Oliveira

C URITIBA – 2017
Apresentação

Saudações da ABCM
Representando a Diretoria da ABCM (Associação Brasileira de Cognição e Artes Mu-
sicais) dou as boas vindas a todos os convidados, pesquisadores, professores, alunos e
colaboradores de diferentes instituições do Brasil e do exterior, que vêm participar do
SIMCAM 13. É uma grande honra recebê-los em Curitiba, cidade onde realizamos o
primeiro SIMCAM, em 2006. Nosso objetivo é divulgar estudos e pesquisas acadêmicas
que contribuem para a ampliação e consolidação da área da cognição musical no Brasil
e no mundo. Em 2016 a ABCM completou 10 anos de sua criação e em 2017, neste
início de nova década, a ABCM busca cada vez mais fortalecer e promover as parcerias
internacionais e estreitar laços de amizade e colaboração com muitos pesquisadores de
instituições brasileiras e internacionais. Em 2017 a ABCM contou com a colaboração
de muitos pesquisadores de associações parceiras, como SACCOM (Argentina), PSIC-
MUSE (Colômbia) e AEPMIM (Espanha) para a realização e divulgação do SIMCAM13.
Nesta sudação agradeço a todos por esta preciosa parceria. Aproveito também para agra-
decer especialmente a minha colega de organização do SIMCAM 13, Prof.a Me. Clara
Piazzeta; o coordenador científico, Prof. Dr. Luis Felipe Oliveira; o coordenador das
apresentações artísticas, Prof. Dr. Marcos Nogueira; a coordenadora dos GEs, Prof.a Dr.a
Beatriz Raposo e todos os demais professores da diretoria da ABCM, professores con-
vidados, professores pareceristas, alunos monitores/colaboradores. Agradeço, por fim,
a todos os professores/pesquisadores, performers, alunos de graduação e pós-graduação,
enfim, todos aqueles que contribuíram de algum modo para que o evento fosse organizado
e realizado em 2017 com grande êxito, incluindo a colaboração das instituições UFPR,
UNESPAR, Capes, CNPq e Amplificar Empresa Júnior da UFPR.

Cordiais saudações a todos,


Rosane Cardoso de Araújo – Presidente da ABCM (2014/2017)

ii
Saudação das organizadoras do SIMCAM 13
Realizar o SIMCAM 13 por meio da colaboração da ABCM, UNESPAR e UFPR foi
uma rica experiência, com muitas alegrias e desafios. Chegamos ao SIMCAM 13 com
a certeza de que a colaboração e união entre nossas instituições nos fortaleceram e nos
permitiram juntar forças para vencer obstáculos que, isoladas, não conseguiríamos supe-
rar. Queremos neste momento agradecer a colaboração das pessoas envolvidas em nossas
instituições (UNESPAR e UFPR) que prontamente nos auxiliaram na elaboração do SIM-
CAM 13, em especial à diretoria da UNESPAR, Campus II / FAP; à Direção do Centro
de Área Musica e Musicoterapia da UNESPAR, Campus de Curitiba II / FAP e demais
professores; à Orquestra OLA, da FAP, em especial a Prof.a Dr.a Simone Cit, que pronta-
mente aceitou o convite para realizar o concerto de abertura; à direção do Setor de Artes,
Comunicação e Design da UFPR, em especial ao Prof. Dr. Dalton Razera e a Secretá-
ria executiva Sallete Miyake; ao Colegiado do Programa de Pós-Graduação em Música da
UFPR; ao Chefe do Departamento de Comunicação da UFPR, particularmente o professor
Dr. Mário Messagi Júnior, que gentilmente cedeu o Auditório e salas de aulas do Depar-
tamento de Comunicação para realização do SIMCAM 13; e ao Departamento de Artes
da UFPR. Agradecemos também as agências de fomento Capes e CNPq pelos recursos
liberados; aos membros da diretoria da ABCM; aos professores convidados e professores
pareceristas; aos alunos voluntários, especialmente à aluna doutoranda Dayane Battisti
pelo empenho em manter sempre atualizada a página do SIMCAM 13; à Empresa Am-
plificar; e enfim, a todos os participantes SIMCAM 13 que colaboram para realizar este
simpósio com entusiasmo e participação efetiva.

Saudações,
Clara Márcia Piazzetta – UNESPAR, Campus II/FAP
Rosane Cardoso de Araújo – UFPR, Programa de Pós-Graduação em Música

iii
Saudação da Diretoria Científica
É com satisfação que apresentamos os Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição
e Artes Musicais, que neste ano foi diligentemente realizado através da parceria entre a
Universidade Federal do Paraná e da Universidade Estadual do Paraná, instituições as
quais saúdo nas figuras da Prof.a Dr.a Rosane Cardoso de Araújo e da Prof.a Me. Clara
Márcia Piazzetta, coordenadoras gerais do evento. Gostaria também de acrescentar a estas
linhas iniciais um agradecimento aos membros da diretoria da Associação Brasileira de
Cognição e Artes Musicais, pela competente promoção do evento e pela confiança em
mim depositada para a coordenação dos trabalhos científicos desta edição do SIMCAM.
Agradeço também a todos os diretores de subárea e todos os pareceristas que colaboraram
com a ABCM na avaliação dos trabalhos submetidos ao simpósio, os quais encontram-se
nominalmente elencados na parte pré-textual deste volume.
Neste ano de 2017 o SIMCAM contou com a brilhante participação de três convidados
internacionais que trouxeram contribuições importantes para o âmbito dos estudos brasi-
leiros na área da Cognição Musical. Nossos convidados foram Michel Imberty, Professor
Emérito da Université de Paris Nanterre, Anna Rita Addessi, da Università di Bologna,
e Favio Shifres, da Universidad Nacional de La Plata. Ao lado destes renormados pro-
fessores, pesquidores brasileiros de expressiva produção intelectual promoveram debates
instigantes nas três mesas-redondas que ocorreram durante o SIMCAM 13. A Prof.a Dr.a
Regina Antunes Teixeira dos Santos (UFRGS) mediou o debate sobre Motivação e Au-
torregulação com a participação da Prof.a Dr.a Cristina Tourinho (UFBA), da Prof.a Dr.a
Liane Hentschke (UFRGS) e da Prof.a Dr.a Cristiane Hatsue Vital Otutumi (UNESPAR).
A segunda mesa-redonda tratou de questões sobre Composição e Cognição, com a co-
laboração do Prof. Dr. Antenor Ferreira Correa (UnB), Prof. Dr. Guilherme Bertissolo
(UFBA) e da Prof.a Dr.a Roseane Yampolschi (UFPR), com a mediação do Prof. Dr. Mar-
cos Nogueira (UFRJ). A temática da interrelação entre Cognição e Saúde foi abordada
na terceira mesa-redonda, mediada pela Prof.a Me. Clara Márcia Piazzetta (UNESPAR),
com a participação da Prof.a Dr.a Marília Nunes-Silva (UEMG), da Prof.a Dr.a Claudia
Regina de Oliveira Zanini (UFG) e da Prof.a Dr.a Rosemyriam Cunha (UNESPAR).
Além das conferências e mesas-redondas, a décima terceira edição do SIMCAM con-
tou com a apresentação de 65 trabalhos de pesquisadores afiliados à ABCM, sendo 59
comunicações orais e 6 pôsteres. Nesta edição, ainda destacamos o trabalho dos 6 grupos
de estudo que foram aprovados, os quais desenvolveram suas atividades de maneira ple-
namente satisfatória, promovendo o debate e ampliando a troca de informações entre os
pesquisadores da área da Cognição Musical, em diversas das suas interfaces.
Nas páginas que se seguem, oferecemos todos os resumos das conferências, das mesas-
redondas e dos grupos de estudo, assim como os textos completos dos trabalhos apresen-
tados na forma de comunicação oral e de poster. Ao final do volume encontra-se um
índice de autores para facilitar a busca por trabalhos. Desejamos a todos uma excelente e
frutífera leitura!

Luis Felipe Oliveira – UFMS

iv
Universidade Estadual do Paraná
Prof. Ms. Antonio Carlos Aleixo
Reitor
Prof. Dr. Sidney Roberto Kempa
Vice-Reitor
Prof. Armindo José Longh
Pró-Reitora de Extensão e Cultura
Prof.a Ms. Pierangela Nota Simões
Diretor do Campus de Curitiba II - FAP
Prof. Ms. Marcelo Bourscheid
Vice-Diretor do Campus de Curitiba II - FAP
Prof.a Ms. Clara Márcia de Freitas Piazzetta
Diretora do Centro de Área de Música e Musicoterapia
Prof. Dr. André Ricardo de Souza
Coordenador do Colegiado de Licenciatura em Música
Prof. Dr. Alvaro Henrique Borges
Coordenador do Colegiado de Bacharelado em Música Popular
Prof.a Dr.a Noemi Nascimento Ansay
Coordenadora do Colegiado de Bacharelado em Musicoterapia
Helio Ricardo Sauthier
Chefe da Divisão de Extensão e Cultura

v
Universidade Federal do Paraná
Prof. Dr. Ricardo Marcelo Fonseca
Reitor
Profa . Dra . Graciela Inês Bolzón de Muniz
Vice-Reitora
Prof. Dr. Francisco de Assis Mendonça
Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação
Prof. Dr. André Luiz Felix Rodacki
Coordenador de Programas de Pós-Graduação – stricto sensu
Prof. Dr. Dalton Luiz Razera
Diretor do Setor de Artes Comunicação e Design
Prof. Dr. Luiz Paulo Maia
Vice-Diretor do Setor de Artes Comunicação e Design
Salette A Franco Miyake
Secretária Executiva do Setor de Artes Comunicação e Design
Prof. Dr. José Estevam Gava
Chefe do Departamento de Artes
Prof.a Dr.a Rosane Cardoso de Araújo
Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Música
Prof. Dr. Hugo Melo
Coordenador dos Cursos de Música (Bacharelado e Licenciatura)

vi
Associação Brasileira de Cognição e Artes Musicais
Prof.a Dr.a Rosane Cardoso Araújo
presidente
Prof. Dr. Mauricio Dottori
vice-presidente
Prof.a Me. Clara Márcia Piazzetta
tesoureira
Prof. Dr. Luis Felipe Oliveira
secretário
Prof.a Dr.a Beatriz Raposo de Medeiros
relações públicas
Prof. Dr. Rael B. G. Toffolo
webmaster
Prof. Dr. Marcos Nogueira
comitê editorial

Comissão Organizadora
Prof.a Dr.a Rosane Cardoso de Araújo
coordenação geral
Prof.a Me. Clara Márcia Piazzetta
coordenação geral
Prof. Dr. Marcos Nogueira
coordenação artística
Prof.a Dr.a Beatriz Raposo de Medeiros
coordenação dos grupos de estudo
Doutoranda Dayane Battisti
Elaboração do site e do material gráfico
Doutorando Jean Pscheidt
Equipe de coordenação dos alunos voluntários
Mestrando Flávio Dias Veloso
Equipe de coordenação dos alunos voluntários

vii
Comissão Científica
Prof. Dr. Luis Felipe Oliveira (UFMS)
presidente

Comitê Internacional
Prof.a Dr.a Anna Rita Addessi
Università di Bologna
Prof. Dr. Basilio Fernádez Morante
Universidad de Internacional de Valencia
Prof.a Dr.a Beatriz Ilari
University of Southern California
Prof.a Dr.a Genoveva Salazar Hakim
Universidad Distrital Francisco José de Caldas
Prof.a Dr.a Isabel Martinez
Universidad de la Plata
Prof.a Dr.a Pilar Jovanna Holguín Tovar
Universidad Pedagógica e Tecnológica de Colombia

Comitê Nacional
Prof. Dr. Antenor Ferreira Corrêa (UnB)
diretor da subárea Cognição Musical e Estudos Culturais
Prof.a Dr.a Beatriz Raposo de Medeiros (USP)
diretora da subárea Cognição Musical e Ciências da Linguagem
Prof.a Me. Clara Márcia Piazzetta (UNESPAR)
diretora da subárea Cognição Musical e Saúde
Prof. Dr. Marcos Nogueira (UFRJ)
diretor da subárea Cognição Musica e Processos Criativos
Prof. Dr. Rael B. G. Toffolo (UEM)
diretor da subárea Cognição Musical e Processos Perceptivos
Prof.a Dr.a Rosane Cardoso de Araújo (UFPR)
diretora da subárea Cognição Musical e Desenvolvimento da Mente Humana

viii
Pareceristas
Acácio Piedade (UDESC)
Alexandre Mauat (UFRGS)
Ana Cristina Gama Dos Santos Tourinho (UFBA)
André Luiz Gonçalves de Oliveira (UNOESTE)
Andre Sinico da Cunha (PPG Música/UFRGS)
Antenor Ferreira Corrêa (UnB)
Basilio Fernádez Morante (Universidad Internacional de Valencia)
Beatriz Ilari (University of Southern California)
Beatriz Raposo de Medeiros (USP)
Camila Siqueira Gouvêa Acosta Gonçalves (Associação de Musicoterapia do Paraná)
Celio Roberto Eyng (UNIOESTE)
Clara Márcia Piazzetta (UNESPAR)
Clint Randles (University of South Florida)
Cristiane Hatsue Vital Otutumi (UNESPAR)
Daniel Puig (PPGM-UNIRIO/UFRJ)
Danilo Ramos (UFPR)
Diana Santiago (UFBA)
Edwin Ricardo Pitre Vasquez (UFPR)
Evandro Rodrigues Higa (UFMS)
Franciele Felix Macedo (UFSCAR)
Genoveva Salazar (Universidad Distrital Francisco José de Calda)
Geraldo Henrique Lima (UNESAR)
Graziela Bortz (UNESP)
Guilherme Bertissolo (UFBA)
Gustavo Rodrigues Penha (UFMS)
Hugo Leonardo Ribeiro (UnB)
José Davison da Silva Júnior (IFPE)
José Eduardo Fornari (UNICAMP)
Liliam Barros Cohen (UFPA)
Luciane da Costa Cuervo (UFRGS)
Luis Felipe Oliveira (UFMS)
Marcos Mesquita (UNESP)
Marcos Nogueira (UFRJ)
Maria Bernardete Castelan Póvoas (UDESC)
Maria Cristina de Carvalho Cascelli de Azevedo (UnB)
Marina Freire (UFMG)
Matthias Lewy (UnB)
Mauricio Dottori (UFPR)
Midori Maeshiro (UFRJ)
Noemi Ansay nascimento Ansay (UNESPAR)
Patricia Vanzella (UFABC)
Pedro Augusto Silva (UFRN)
Pilar Jovanna Holguín (Universidad Pedagógica y Tecnológica de Colombia)
Rael B. G. Toffolo (UEM)
Regina Antunes Teixeira Dos Santos (UFRGS)

ix
Ricardo Dourado Freire (UnB)
Rosane Cardoso de Araujo (UFPR)
Rosemyriam Cunha (UNESPAR)
Sonia Ray (UFG)
Tiago Madalozzo (UNESPAR)
Verônica Magalhães Rosário (UFMG)
William Teixeira (UFMS)

x
Sumário

I Programação 1

II Resumos 15
Conferências 16
Musique, Temps et Narrativité: Origines et destins de la musicalité humaine
(Michel Imberty) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
Children’s musical creativity and improvisation in reflexive interaction (Anna
Rita Addessi) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
Contra el desperdicio de nuestra experiencia musical (Favio Shifres) . . . . . . 17

Mesa-redonda 1: Motivação e Autorregulação 19


Ensino coletivo de violão em cursos superiores de música e a Teoria Social
Cognitiva: prática musical e promoção da aprendizagem regulada de es-
tudantes (Cristina Tourinho) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
Crenças de autoeficácia de professores que atuam com música na educação
básica (Liane Hentschke) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
A autorregulação da aprendizagem em estudos na Percepção musical (Cristiane
Hatsue Vital Otutumi) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20

Mesa-redonda 2: Composição e Cognição 21


Por uma epistemologia da composição musical (Antenor Ferreira Correa) . . . 21
Composição e cognição: contribuições da cognição musical incorporada para a
criação de estratégias para o compor (Guilherme Bertissolo) . . . . . . . 22
Investigação de estratégias de pesquisa gestual interdisciplinar, a partir da im-
provisação livre, para fins de criação musical (Roseane Yampolschi) . . . 22

Mesa-redonda 3: Música e Saúde 23


Avaliação da cognição musical: contextos e perspectivas (Marília Nunes-Silva) 23
Música, Musicoterapia e Saúde — Cuidando do Ser (Claudia Regina de Oli-
veira Zanini) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24
Musicoterapia: música e saúde em prática (Rosemyriam Cunha) . . . . . . . . 24

Concertos 25
Alma: a expertise pianística de Egberto Gismonti (Vinicius Bastos Gomes) . . . 25
Hiperimprovisação (Manuel Silveira Falleiros) . . . . . . . . . . . . . . . . . 26

xi
SoS: Self-Organized Sonifications Through a Touchless Virtual Piano (José
Eduardo Fornari) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
Três Reverências para Piano a Quatro Mãos de Acácio Piedade: Uma Reflexão
Sobre Sincronia Entre Pianistas Durante o Processo de uma Interpretação
(Maria Bernardete Castelan Povoas e Luís Claúdio Barros) . . . . . . . . 27
Preparação do recital de piano à 4 mãos (Carmen Célia Fregoneze e Daniela
Tsi Gerber) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28

Grupos de Estudo 29
Cognição, Música e Musicoterapia (Coordenação: Clara Márcia Piazzetta e
Claudia Zanini) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
Cognição e Educação Musical (Rosane Cardoso de Araújo) . . . . . . . . . . . 29
Música e Teorias da Cognição (Coordenação: Beatriz Raposo de Medeiros e
Luis Felipe Oliveira) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
Semântica Cognitiva e Música (Coordenação: Marcos Nogueira e Guilherme
Bertissolo) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31
Neurociências e Performance Musical (Coordenação: Luciane Cuervo) . . . . 31

III Trabalhos Completos 33


Cognição Musical e Estudos Culturais 34
Musical responses to body percussion: initial findings on children/youth inte-
ractions with bodily-based activities (Kristina B. Tyrenius e Antenor Fer-
reira Corrêa) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35
A Folia e a Festa do Divino em Guaratuba (Brasil): um estudo de caso sob
a perspectiva das representações sociais (Carlos Eduardo de Andrade e
Silva Ramos) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44
Concepts of time and music (Marcos Mesquita) . . . . . . . . . . . . . . . . . 53

Cognição Musical e Ciências da Linguagem 60


A percepção do movimento no discurso da música eletroacústica (Caoqui San-
ches Pereira) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61
A sílaba na fala e no canto e a questão da estabilidade: um estudo preliminar
(Beatriz Raposo de Medeiros e João Paulo Cabral) . . . . . . . . . . . . 69
Transcrição Musical da Prosódia da Fala (Alexsandro R. Meireles, Antônio R.
M. Simões e Beatriz Raposo de Medeiros) . . . . . . . . . . . . . . . . . 78

Cognição Musical e Saúde 87


Proposta de um Aplicativo na Hipersensibilidade Sonora no Autismo (Débora
Line Gomes e Cybelle Maria Veiga Loureiro) . . . . . . . . . . . . . . . 88
Percepção e Cognição na Educação Musical de Pessoas com TEA e as Contri-
buições das Construções Simbólicas para Constituição do Sujeito (Caro-
line Blumer e Vilson Zattera) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 97
Avaliação da Musicalidade: possibilidades de utilização da Avaliação IMTAP
com crianças de três a cinco anos de idade (Josiane Fernanda Covre e
Claudia Regina de Oliveira Zanini) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 106

xii
Avaliação em Musicoterapia e a utilização da versão brasileira do IMTAP (Gus-
tavo Henrique Costa e Clara Marcia Piazzetta) . . . . . . . . . . . . . . 114
Música, saúde e bem-estar: quadro conceitual e pesquisas recentes (José Davi-
son da Silva Júnior) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 122
Musicoterapia, Música, Saúde e Bem-estar: aspectos convergentes, divergentes
e instrumentos de avaliação (Clara Márcia Piazzetta) . . . . . . . . . . . 130

Cognição Musical e Processos Perceptivos 138


Ouvido Relativo: Definição, Relevância para a Percepção Musical e Inter-
relações com o Ouvido Absoluto (Nayana Di Giuseppe Germano, Hugo
Cogo Moreira e Graziela Bortz) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 139
Prácticas, concepciones y valoraciones del desarrollo auditivo musical en es-
cenarios curriculares y extracurriculares: cuatro casos de estudiantes de
composición y arreglos (Genoveva Salazar Hakim) . . . . . . . . . . . . 148
Relações de afinação entre sons resultantes e sistemas de afinação (Ricardo
Dourado Freire) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 157
Análise da entoação praticada em Silent Night: um estudo de caso a partir
de performances vocais de amadores (Cesar Augusto Pereira da Silva e
Ricardo Goldemberg) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 167
Processos cognitivos da percepção do metro e possíveis relações com o treina-
mento auditivo (Letícia Dias de Lima) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 174
Etologia na comunicação de significados simbólicos musicais (Bernardo Aguiar
de Souza Penha e José Eduardo Fornari) . . . . . . . . . . . . . . . . . . 182
Studying Possible Emotional Impacts in the Remote Cooperation of Partici-
pants of Virtual Choirs (Daniel Amato e José Eduardo Fornari) . . . . . . 191
Interações musicais via webconferência na Educação a Distância: apresentando
possibilidades para fundamentar um referencial teórico (Vanessa de Souza
Jardim e Paulo Roberto Affonso Marins) . . . . . . . . . . . . . . . . . . 197
Respostas emocionais à sonoridade pianística de Arno Roberto von Buettner
(Danilo Ramos e Anderson Toni) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 205
Harmonia como Tensão: considerações acerca da principal metáfora subjacente
a pesquisas sobre percepção de harmonia e tonalidade (Mauro Orsini
Windholz) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 213
A lógica e o processo da escuta riemanniana (Felipe Augusto Vieira da Silva) . 221
Dimensiones acústicas y percepción del timbre en el procesamiento de graba-
ciones del análisis musical (María Marchiano e Isabel Cecilia Martínez) . 230

Cognição Musical e Processos Criativos 238


A atenção na prática deliberada em performance musical (Eduardo de Carvalho
Torres) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 239
Interação reflexiva e criatividade: uma experiência com alunos iniciantes em
bateria (Jean Felipe Pscheidt e Rosane Cardoso de Araújo) . . . . . . . . 247
Investigações sobre a relação de expertise musical e expertise pedagógica (An-
derson César Alves) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 255
A expertise musical de Egberto Gismonti sugere o planejamento de práticas
deliberadas alternativas: um estudo preliminar (Vinicius Bastos Gomes e
Danilo Ramos) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 263

xiii
A individualidade musical na performance: conceitos teóricos, estratégias me-
todológicas e perspectivas (Tairone Nunes Magalhães, Davi Alves Mota e
Maurício Alves Loureiro) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 270
Um estudo de caso sobre motivação e criatividade com participantes de um coro
infantil (Flávia de Andrade Campos Silva e Rosane Cardoso de Araújo) . 278
Imagética musical e metáfora como recurso ativador/indutor do gesto corporal
na interpretação e na performance musical (Arícia Ferigato e Maurício
Alves Loureiro) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 287
The observation of ancillary gestures using the Laban-Bartenieff Movement
Fundamentals (Thaís Fernandes Santos e Maurício Alves Loureiro) . . . . 294
Comunicação gestual entre músicos: uma revisão dos métodos de pesquisa em-
pregados (Aglaê Machado Frigeri e Mayra Stela Dunin Pedrosa) . . . . . 302
Mapeamento Gestual Braille na Livre Improvisação (Antonio Fernando da Cu-
nha Penteado e José Eduardo Fornari) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 309
Percepções de professores e alunos quanto ao uso de tecnologia no ensino e
aprendizagem de piano de nível superior (Luciana F. Hamond) . . . . . . 318
Privações de retroalimentação, estímulo e instrumento no aprendizado de qua-
tro danças de Schubert por um estudante de piano em Extensão Univer-
sitária: resultados preliminares de um experimento (Renan Moreira Ma-
deira e Regina Antunes Teixeira dos Santos) . . . . . . . . . . . . . . . . 327
Expressividade musical da performance no violino: um estudo de caso (Juliana
Lima Verde, Sandra F. C. D. Freire e Ricardo Dourado Freire) . . . . . . 335
A relação entre a notação e as poéticas interpretativas de música nova para flauta
transversal (Valentina Daldegan) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 344
A performance musical e o jogo em Hans-Georg Gadamer (Isadora Scheer Ca-
sari) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 353
Perspectivas lógicas-semióticas no processo criativo musical de Pierre Boulez
(Alberto Ferreira da Silva) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 361
Cognição incorporada e experiência duracional em música: um método (Nilo
Rafael Baptista de Mello) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 368
A constituição schemática da imaginação na criação de solos instrumentais (Ce-
lio Roberto Eyng e Magda Floriana Damiani) . . . . . . . . . . . . . . . 376
A Study on Multisensorial Sonification Strategies for the Blind Performer (An-
tonio Fernando da Cunha Penteado, Vilson Zattera e José Eduardo Fornari)383

Cognição Musical e Desenvolvimento da Mente Humana 391


Licenciandos em Música e Educação Básica: reflexões a partir de um estudo
quantitativo realizado em âmbito nacional (Mário André Wanderley Oli-
veira) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 392
O ensino da expressividade musical no jazz baseado no ensino de idiomas (En-
dre Solti e José Eduardo Fornari) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 399
Um estudo sobre a autorregulação de alunos de percussão em cursos de bacha-
relado em música (Flávio Denis Dias Veloso e Rosane Cardoso de Araújo) 407
Autorregistro como estratégia autorregulatória para a aprendizagem musical
(Veridiana de Lima Gomes Krüger e Igor Mendes Krüger) . . . . . . . . 416

xiv
Influências da Autorrealização e da Experiência Estética sobre os Fatores Pes-
soais dos Processos Criativos e Motivacionais da Aprendizagem Musical
(Igor Mendes Krüger e Veridiana de Lima Gomes Krüger) . . . . . . . . 424
Habilidades e Estratégias para Gerir a Ansiedade Antes e Durante o Recital:
Abordagem Metodológica de estudos Multicaso com Pianistas Estudantes
e Profissionais (Dayse Gomes Mendes) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 433
Motivação no ensino coletivo de violão (Dayane Battisti e Rosane Cardoso de
Araújo) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 442
Avaliando habilidades musicais e linguísticas em crianças nos estágios iniciais
da alfabetização de escolas públicas brasileiras (Guilherme Alves Delmo-
lin de Oliveira, Olga Valéria Campana dos Anjos Andrade, Paulo Estêvão
Andrade e Patricia Maria Vanzella) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 451
Considerações sobre questões estéticas nas aulas de trombone: estudo de 4
casos em universidades brasileiras (Marcos Botelho) . . . . . . . . . . . 460
Música de cámara y aprendizaje significativo: una estrategia pedagógica para
el fortalecimiento de los procesos académicos y musicales (Robinson Gi-
raldo Villegas) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 468
A repetição como nuance de deliberação na prática pianística em diferentes
níveis de expertise (Michele Rosita Mantovani e Regina Antunes Teixeira
dos Santos) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 477
Bullying escolar e o estudo de violino (Sandra Carvalho de Mattos) . . . . . . 485
Desenvolvimento musical e musicalidade (Flávia Fiorini da Silva e Ana Lúcia
Vasquez) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 492
A Compreensão Musical em Crianças Pequenas: um estudo exploratório dentro
de um projeto de extensão (Bruna Canedo França e Mariana de Araújo
Stocchero) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 501
Percepção e Ação no Método O Passo (Cassius Bonfim e Luis Felipe Oliveira) . 510
Pesquisas sobre memória musical apresentadas no SIMCAM (2006-2016): uma
revisão sistemática (Fase 1) (Alessandro Pereira da Silva, Mônica Caja-
zeira Santana Vasconcelos, Jonatas Leal e Diana Santiago) . . . . . . . . 519
Estudos sobre a mente musical: Criação de disciplina para o Ensino Superior
(Luciane Cuervo) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 529

Pôsteres 537
A percepção e a produção musical nos aspectos auditivos, vocais e emocio-
nais como fatores de influência na prática do canto coral (Sandra Regina
Cielavin, Vilson Zattera e Adriana do Nascimento Araújo Mendes) . . . . 538
Estudo individual da escrita rítmica e melódica e a autorregulação da aprendi-
zagem (Elcio Antonio de Almeida Junior e Cristiane Hatsue Vital Otutumi) 547
Transtorno do espectro do autismo: um levantamento bibliográfico (Patricia
Dauzacker e Mariana de Araújo Stocchero) . . . . . . . . . . . . . . . . 554
Brincando e cantando: proposta de ação metodológica com intervenções lú-
dicas nas práticas musicais do coro infantil (Micheline Prais de Aguiar
Marim Gois) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 562
Representações sociais sobre a criatividade musical das crianças (Susan Stepha-
nie Opiechon e Rosane Cardoso de Araújo) . . . . . . . . . . . . . . . . 569

xv
A motivação como variável interveniente à aprendizagem: o alunado contem-
porâneo nas aulas de educação musical na rede básica de ensino (Franci-
ele Felix Macedo e José Zula de Oliveira) . . . . . . . . . . . . . . . . . 577

Índice de autores 584

xvi
Parte I

Programação

1
⇤Mesa 1 - Motivação e autorregulação: Cristina Tourinho (UFBA); Liane Hentsche (UFRGS); Cristiane Otutumi
(UNESPAR/Embap); Mediadora: Regina Antunes Teixeira (UFRGS).
⇤⇤MESA 2 - Composição e cognição: Antenor Ferreira Correa (UnB); Guilherme Bertissolo (UFBA); Roseane Yampolschi
(UFPR); Mediador: Marcos Nogueira (UFRJ).
⇤ ⇤ ⇤MESA 3 - Música e saúde: Marília Nunes (UEMG); Claudia Zanini (UFG); Rosemyriam Cunha (UNESPAR/FAP);
Mediadora: Clara Maria Piazzetta (UNESPAR/FAP).

2
Sessão 1: Quarta-feira, 24 de maio de 2017
Cognição Musical e Estudos Culturais, Cognição Musical e Ciências da Linguagem

Horário Trabalho
16h30 Musical responses to body percussion: initial findings on children/youth interactions with bodily-
based activities
Kristina B. Tyrenius e Antenor Ferreira Corrêa
16h50 A Folia e a Festa do Divino em Guaratuba (Brasil): um estudo de caso sob a perspectiva das Repre-
sentações Sociais

3
Carlos Eduardo de Andrade e Silva Ramos
17h10 Concepts of time and music
Marcos Mesquita
17h30 A percepção do movimento no discurso da música eletroacústica
Caoqui Sanches Pereira
17h50 A sílaba na fala e no canto e a questão da estabilidade: um estudo preliminar
Beatriz Raposo de Medeiros e João Paulo Cabral
18h10 Transcrição Musical da Prosódia da Fala
Alexsandro R. Meireles, Antônio R. M. Simões e Beatriz Raposo de Medeiros
Sessão 2: Quarta-feira, 24 de maio de 2017
Cognição Musical e Processos Perceptivos

Horário Trabalho
16h30 Ouvido Relativo: Definição, Relevância para a Percepção Musical e Inter-relações com o Ouvido
Absoluto
Nayana Di Giuseppe Germano, Hugo Cogo Moreira e Graziela Bortz
16h50 Prácticas, concepciones y valoraciones del desarrollo auditivo musical en escenarios curriculares y
extracurriculares: cuatro casos de estudiantes de composición y arreglos
Genoveva Salazar Hakim

4
17h10 Relações de afinação entre sons resultantes e sistemas de afinação
Ricardo Dourado Freire
17h30 Análise da entoação praticada em Silent Night: um estudo de caso a partir de performances vocais de
amadores
Cesar Augusto Pereira da Silva e Ricardo Goldemberg
17h50 Processos cognitivos da percepção do metro e possíveis relações com o treinamento auditivo
Letícia Dias de Lima
18h10 Etologia na comunicação de significados simbólicos musicais
Bernardo Aguiar de Souza Penha e José Eduardo Fornari Novo Junior
Sessão 3: Quarta-feira, 24 de maio de 2017
Cognição Musical e Desenvolvimento da Mente Humana

Horário Trabalho
16h30 Licenciandos em Música e Educação Básica: reflexões a partir de um estudo quantitativo realizado
em âmbito nacional
Mário André Wanderley Oliveira
16h50 O ensino da expressividade musical no jazz baseado no ensino de idiomas
Endre Solti e José Eduardo Fornari Novo Junior
17h10 Um estudo sobre a autorregulação de alunos de percussão em cursos de bacharelado em música

5
Flávio Denis Dias Veloso e Rosane Cardoso de Araújo
17h30 Autorregistro como estratégia autorregulatória para a aprendizagem musical
Veridiana de Lima Gomes Krüger e Igor Mendes Krüger
17h50 Influências da Autorrealização e da Experiência Estética sobre os Fatores Pessoais dos Processos
Criativos e Motivacionais da Aprendizagem Musical
Igor Mendes Krüger e Veridiana de Lima Gomes Krüger
18h10 Habilidades e Estratégias para Gerir a Ansiedade Antes e Durante o Recital: Abordagem Metodoló-
gica de estudos Multicaso com Pianistas Estudantes e Profissionais
Dayse Gomes Mendes
Sessão 4: Quarta-feira, 24 de maio de 2017
Cognição Musical e Processos Criativos

Horário Trabalho
16h30 A atenção na prática deliberada em performance musical
Eduardo de Carvalho Torres
16h50 Interação reflexiva e criatividade: uma experiência com alunos iniciantes em bateria
Jean Felipe Pscheidt e Rosane Cardoso de Araújo
17h10 Investigações sobre a relação de expertise musical e expertise pedagógica

6
Anderson César Alves
17h30 A expertise musical de Egberto Gismonti sugere o planejamento de práticas deliberadas alternativas:
um estudo preliminar
Vinicius Bastos Gomes e Danilo Ramos
17h50 A individualidade musical na performance: conceitos teóricos, estratégias metodológicas e perspec-
tivas
Tairone Nunes Magalhães, Davi Alves Mota e Maurício Alves Loureiro
18h10 Um estudo de caso sobre motivação e criatividade com participantes de um coro infantil
Flávia de Andrade Campos Silva e Rosane Cardoso de Araújo
Sessão 5: Quarta-feira, 24 de maio de 2017
Cognição Musical e Processos Criativos

Horário Trabalho
16h30 Imagética musical e metáfora como recurso ativador/indutor do gesto corporal na interpretação e na
performance musical
Arícia Ferigato e Maurício Alves Loureiro
16h50 The observation of ancillary gestures using the Laban-Bartenieff Movement Fundamentals
Thaís Fernandes Santos e Maurício Alves Loureiro

7
17h10 Comunicação gestual entre músicos:uma revisão dos métodos de pesquisa empregados
Aglaê Machado Frigeri e Mayra Stela Dunin Pedrosa
17h30 Mapeamento Gestual Braille na Livre Improvisação
Antonio Fernando da Cunha Penteado e José Eduardo Fornari Novo Junior
17h50 A Study on Multisensorial Sonification Strategies for the Blind Performer
Antonio Fernando da Cunha Penteado, Vilson Zattera e José Eduardo Fornari Novo Junior
18h10 Percepções de professores e alunos quanto ao uso de tecnologia no ensino e aprendizagem de piano
de nível superior
Luciana F. Hamond
Sessão 6: Quinta-feira, 25 de maio de 2017
Cognição Musical e Saúde

Horário Trabalho
16h30 Proposta de um Aplicativo na Hipersensibilidade Sonora no Autismo
Débora Line Gomes e Cybelle Maria Veiga Loureiro
16h50 Percepção e Cognição na Educação Musical de Pessoas com TEA e as Contribuições das Construções
Simbólicas para Constituição do Sujeito
Caroline Blumer e Vilson Zattera
17h10 Avaliação da Musicalidade: possibilidades de utilização da Avaliação IMTAP com crianças de três a

8
cinco anos de idade
Josiane Fernanda Covre e Claudia Regina de Oliveira Zanini
17h30 Avaliação em Musicoterapia e a utilização da versão brasileira do IMTAP
Gustavo Henrique Costa e Clara Márcia Piazzetta
17h50 Música, saúde e bem-estar: quadro conceitual e pesquisas recentes
José Davison da Silva Júnior
18h10 Musicoterapia, Música, Saúde e bem Estar: aspectos convergentes, divergentes e instrumentos de
avaliação
Clara Márcia Piazzetta
Sessão 7: Quinta-feira, 25 de maio de 2017
Cognição Musical e Processos Perceptivos

Horário Trabalho
16h30 Studying Possible Emotional Impacts in the Remote Cooperation of Participants of Virtual Choirs
José Eduardo Fornari Novo Junior e Daniel Chris Amato
16h50 Interações musicais via webconferência na Educação a Distância: apresentando possibilidades para
fundamentar um referencial teórico

9
Vanessa de Souza Jardim e Paulo Roberto Affonso Marins
17h10 Respostas emocionais à sonoridade pianística de Arno Roberto von Buettner
Danilo Ramos e Anderson Toni
17h30 Harmonia como Tensão: considerações acerca da principal metáfora subjacente a pesquisas sobre
percepção de harmonia e tonalidade
Mauro Orsini Windholz
17h50 A lógica e o processo da escuta riemanniana
Felipe Augusto Vieira da Silva
Sessão 8: Quinta-feira, 25 de maio de 2017
Cognição Musical e Desenvolvimento da Mente Humana

Horário Trabalho
16h30 Motivação no ensino coletivo de violão
Dayane Battisti e Rosane Cardoso de Araújo
16h50 Avaliando habilidades musicais e linguísticas em crianças nos estágios iniciais da alfabetização de
escolas públicas brasileiras
Guilherme Alves Delmolin de Oliveira, Olga Valéria Campana dos Anjos Andrade, Paulo Estêvão
Andrade e Patricia Maria Vanzella

10
17h10 Considerações sobre questões estéticas nas aulas de trombone: estudo de 4 casos em universidades
brasileiras
Marcos Botelho
17h30 Música de cámara y aprendizaje significativo: Una estrategia pedagógica para el fortalecimiento de
los procesos académicos y musicales
Robinson Giraldo Villegas
17h50 A repetição como nuance de deliberação na prática pianística em diferentes níveis de expertise
Michele R Mantovani e Regina Antunes Teixeira Dos Santos
18h10 Bullying escolar e o estudo de violino
Sandra Carvalho de Mattos
Sessão 9: Quinta-feira, 25 de maio de 2017
Cognição Musical e Desenvolvimento da Mente Humana

Horário Trabalho
16h30 Desenvolvimento musical e musicalidade
Flávia Fiorini da Silva e Ana Lúcia Vasquez
16h50 A Compreensão Musical em Crianças Pequenas: um estudo exploratório dentro de um projeto de
extensão
Bruna Canedo França e Mariana de Araújo Stocchero

11
17h10 Percepção e Ação no Método O Passo
Cassius Bonfim e Luis Felipe Oliveira
17h30 Pesquisas sobre memória musical apresentadas no SIMCAM (2006-2016): uma revisão sistemática
(Fase 1)
Alessandro Pereira da Silva, Mônica Cajazeira Santana Vasconcelos, Jonatas Leal e Diana Santiago
17h50 Estudos sobre a mente musical: criação de disciplina para o Ensino Superior
Luciane Cuervo
18h10 Emílio Contemporâneo: O sujeito musical analisado pela Teoria da Complexidade
Júlio César Stefanoni
Sessão 10: Quinta-feira, 25 de maio de 2017
Cognição Musical e Processos Criativos

Horário Trabalho
16h30 A variabilidade e o descanso na prática pianística
Arilton Medeiros Junior e Maria Bernardete Castelan Póvoas
16h50 Privações de retroalimentação, estímulo e instrumento no aprendizado de quatro danças de Schubert

12
por um estudante de piano em Extensão Universitária: resultados preliminares de um experimento
Renan Moreira Madeira e Regina Antunes Teixeira dos Santos
17h10 Expressividade musical da performance no violino: um estudo de caso
Juliana Lima Verde, Sandra F. C. D. Freire e Ricardo Dourado Freire
17h30 A relação entre a notação e as poéticas interpretativas de música nova para flauta transversal
Valentina Daldegan
Sessão 11: Quinta-feira, 25 de maio de 2017
Cognição Musical e Processos Criativos, Cognição Musical e Processos Perceptivos

Horário Trabalho
16h30 A performance musical e o jogo em Hans-Georg Gadamer
Isadora Scheer Casari
16h50 Perspectivas lógicas-semióticas no processo criativo musical de Pierre Boulez
Alberto Ferreira da Silva

13
17h10 Cognição incorporada e experiência duracional em música: um método
Nilo Rafael Baptista de Mello
17h30 Dimensiones acústicas y percepción del timbre en el procesamiento de grabaciones del análisis mu-
sical
María Marchiano e Isabel Cecilia Martínez
17h50 A constituição schemática da imaginação na criação de solos instrumentais
Celio Roberto Eyng e Magda Floriana Damiani
Sessão 12: Quinta-feira, 25 de maio de 2017
Pôsteres

Horário Trabalho
16h30 A percepção e a produção musical nos aspectos auditivos, vocais e emocionais como fatores de in-
fluência na prática do canto coral
Sandra Regina Cielavin, Vilson Zattera e Adriana do Nascimento Araújo Mendes
16h50 Estudo individual da escrita rítmica e melódica e a autorregulação da aprendizagem
Elcio Antonio de Almeida Junior e Cristiane Hatsue Vital Otutumi
17h10 Transtorno do Espectro do Autismo: um levantamento bibliográfico

14
Patricia Dauzacker e Mariana de Araújo Stocchero
17h30 Brincando e cantando: proposta de ação metodológica com intervenções lúdicas nas práticas musicais
do coro infantil
Micheline Prais de Aguiar Marim Gois
17h50 Representações sociais sobre a criatividade musical das crianças
Susan Stephanie Opiechon e Rosane Cardoso de Araújo
18h10 A motivação como variável interveniente à aprendizagem: o alunado contenporâneo nas aulas de
educação musical na rede básica de ensino
Franciele Felix Macedo e José Zula de Oliveira
Parte II

Resumos

15
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Conferências

Musique, Temps et Narrativité: Origines et destins de la musicalité


humaine
Michel Imberty
Professeur Émérite à l’Université de Paris Nanterre

La narrativité, structure de l’expérience humaine du temps, est-elle aussi ce qui organise


notre expérience musicale? Autrement dit, la musique raconte-elle des histoires? Pendant
longtemps, et parfois encore aujourd’hui, la plupart des musicologues et des sémiolo-
gues ont répondu par la négative. Or en littérature, on peut identifier une structure de
l’expérience du temps, antérieure au récit lui-même, que l’on peut dire proto-narrative,
et qui organise en alternances successives de tensions et de détentes, de répétitions et de
variations, de temps pleins et denses et de temps vides ou morts, d’attentes, de surprises
et de satisfactions, la cohérence et le déroulement du récit.
Or la musique est ressentie fondamentalement comme une succession «d’instant-
après-instant», cette succession créant aussi les diverses sortes de continuités et disconti-
nuités du temps musical. La plus commune, celle qui correspond au sentiment immédiat
de tout auditeur mais aussi à la description la plus générale de la musique, est celle de
la continuité linéaire, c’est-à-dire quelque chose comme le devenir. Elle serait liée à la
tonalité classique – et sans doute à toutes les formes de modalités que l’on rencontre dans
les diverses musiques du monde.
Cependant, à côté de cette approche classique, on voit de plus en plus de travaux tenter
de cerner l’origine proprement «biologique» ou «neurophysiologique» de la narrativité
comme mode humain d’appréhender le temps, mais aussi comme mode d’adaptabilité
cognitive et affective de l’humain aux temps sociaux et culturels : la musicalité serait
ainsi une des capacités constitutives de l’homme pour la culture en général. La narrativité
serait un mode de fonctionnement très général du cerveau humain, une manifestation
biologique et psychologique de la façon pour l’être humain d’être dans le temps.
Cependant, en musique, cette linéarité directionnelle de la tonalité a perdu peu à peu
de son importance : il s’en est suivi, au cours du XXo siècle, une crise profonde de notre
langage musical. Sans doute d’abord Schoenberg, mais d’autres compositeurs se sont
affranchis de cette proto-narrativité linéaire pour construire des oeuvres aux structures
éclatées et algébrisées, dans lesquelles le temps ne passe pas, n’a pas de direction ni de
sens. C’est ce paradoxe qu’il faut comprendre à la lueur d’un nouveau retournement dans
les dernières années du siècle, où de nouvelles formes renouent avec le temps-devenir,
donnant le sentiment d’une directionnalité forte qui implique une structure proto-narrative
avec une ligne de tension dramatique orientée, et qui nous racontent ainsi de nouvelles
histoires d’intentionnalités sans paroles ni concepts pour les dire.

16
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Children’s musical creativity and improvisation in reflexive


interaction
Anna Rita Addessi
Università di Bologna

Several scholars approached the issue of children’s musical improvisation and creati-
vity from different perspectives and by means of different methodologies, giving rise
to discussion about the definition of improvisation in children’s musical experience, the
relationships between improvisation and creativity, learning/teaching theories and so-
cial/familial contexts. I will discuss this issue through the “reflexive interaction para-
digm”, which refers to a particular kind of human-machine interaction based on the me-
chanism of repetition and variation, where interactive systems are able to imitate the sty-
les of the user which is playing an instrument. The theoretical framework of reflexive
interaction and several experimental studies will be introduced. We carried out several
observations in naturalistic context of child-machine, infant-adult, and peer-to-peer in-
teraction. The results will be discussed on the light of the experimental procedure and
the recent literature in neuroscience and music education. The discussion will focus on
the observation and analysis of several case studies of children interacting with reflexive
technologies and/or parents. In particular way we will discuss the efficacy of reflexive
pedagogy in the field of children’s music performance and creativity and the issue of the
analysis and assessment of children’s ability to improvise.

Contra el desperdicio de nuestra experiencia musical


Favio Shifres
Universidad Nacional de La Plata

La Psicología de la Música nació con el impulso cientificista de la psicología experimental


en el siglo XIX. Como parte del instrumento de poder para imponer una monocultura del
rigor del saber (la Ciencia Moderna) determinó la necesidad de una distancia epistemo-
lógica entre el sujeto (investigador) y el objeto de conocimiento (la experiencia musical),
basada en la concepción de música del Iluminismo y la Teoría de la Música Occidental,
por un lado, y en las bases epistemológicas y metodológicas de la psicología del len-
guaje. Esta ciencia de la música desprecia otras concepciones de música y desconoce el
conocimiento propio del sujeto cognocente, considerándolo meramente como un sistema
(más o menos dinámico) que produce respuestas ante estímulos sonoros. Básicamente,
invisibiliza otras experiencias musicales no occidentales.
Este trabajo recoge algunas reflexiones surgidas de la necesidad de enunciar una psi-
cología de la música desde mi propia experiencia como investigador y sujeto musical
subalternizado por la epistemología dominante. Parte de asumir un locus de enunciación
en el Sur Global, específicamente en Sudamérica y se propone dejar atrás supuestos que
confinan las experiencias locales a la no existencia. Para ello interpelo un par de supuestos
básicos de la Psicología de la Música hegemónica. En primer lugar, analizo la noción de

17
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

música como lenguaje, derivada de los enfoques lingüísticos estructuralistas que fundaron
la tradición cognitivo estructuralista de los estudios en música. En segundo lugar discuto
la supremacía del sonido en la experiencia musical que ha operativizado el cognitivismo
clásico.
En general el trabajo se propone contribuir a una discusión acerca del rol de la psicolo-
gía cognitiva, las neurociencias y la musicología estructuralista occidental en el concierto
de unas ciencias cognitivas de la música que contribuyan a la inteligibilidad de nuestra
experiencia musical.

18
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Mesa-redonda 1: Motivação e
Autorregulação

Mediação: Regina Antunes Teixeira dos Santos (UFRGS)

Ensino coletivo de violão em cursos superiores de música e a Teoria


Social Cognitiva: prática musical e promoção da aprendizagem
regulada de estudantes
Cristina Tourinho
Universidade Federal da Bahia

A fala problematiza o ensino de violão em aulas coletivas associada aos aportes teóricos
da TSC neste contexto. No caso, aulas de instrumento para estudantes de graduação
que não cursam Bacharelado em Violão e estão matriculados na disciplina Instrumento
Suplementar. A pesquisa, iniciada empiricamente em 2013 foi sendo estruturada nos
anos consecutivos com o apoio do Projeto Casadinho-Procad do CNPq e a parceria com
a Profa. Dra. Roberta Azzi, da UNICAMP.
Sete conceitos propostos por Zimmerman, Bonner e Kovack (2002) foram adaptadas
para o contexto do ensino de música: modelação, aprendizagem autorregulada, autorre-
gulação, autoavaliação, autoeficácia e feedback. Além disso, os cinco princípios teóricos
descritos por Ormrod (2003 , baseados na TSC, descrevem e se aproximam dos princípios
do ensino coletivo de violão desenvolvidos pela autora.
“Aprender a tocar” é uma atividade que envolve cognição, atividades motores, autor-
regulação e concentração. Os estudantes desta disciplina irão usar o violão no exercício
profissional como um complemento para suas atividades de ensino e criação. Não serão
concertistas e a finalidade é, segundo a ementa, “que possam se expressar usando o instru-
mento” (UFBA, 2011). No caso, estudantes de graduação precisam desenvolver técnica,
leitura de partitura e cifras (inclusive a primeira vista), habilidade técnica/interpretativa e
criação.
A análise das práticas aplicadas revelou que utilizar os construtos da TSC pode ser
uma prática altamente promissora para o ensino de violão.

19
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Crenças de autoeficácia de professores que atuam com música na


educação básica
Liane Hentschke
Universidade Federal do Rio Grande do Sul

O Grupo FAPROM tem se dedicado, nos últimos oito anos, aos estudos de motivação
para aprender e ensinar música, conforme pesquisas e publicações listadas no site do
grupo (www.ufrgs.br/faprom). Nos últimos três anos tem pesquisado sobre a autoeficácia
de professores de música no Brasil. O projeto de pesquisa, financiado pelo CNPq, tem
como objetivo investigar o perfil do professor que trabalha com música nas escolas de
educação básica e suas crenças de autoeficácia. O referencial teórico é oriundo da teoria
social cognitiva que tem como seu principal construto a autoeficácia, que se refere às
expectativas, percepções, julgamentos ou crenças sobre a capacidade que uma pessoa
possui quanto a realizar uma determinada tarefa (BANDURA, 2008). O método utilizado
nesta pesquisa foi um survey baseado na internet, utilizando um questionário dividido
em duas partes: a) questões sobre o perfil do professor e; b) escala de autoeficácia. A
amostra contou com 918 professores respondentes que atuam em diferentes etapas do
ensino básico. Será relatado um recorte dos dados da pesquisa, principalmente no que diz
respeito às dimensões da escala em relação ao tempo de atuação, maior escolaridade e
níveis de ensino em que os professores atuam.

A autorregulação da aprendizagem em estudos na Percepção musical


Cristiane Hatsue Vital Otutumi
Universidade Estadual do Paraná

esta comunicação tem o objetivo de apresentar a utilização de diferentes recursos didáti-


cos e a opção pela teoria da Autorregulação da Aprendizagem na perspectiva da Teoria
Social Cognitiva (TSC), do psicólogo canadense Albert Bandura, para as aulas de Per-
cepção Musical da graduação. Propõe-se a autorregulação da aprendizagem em caráter
de infusão curricular, ou seja, contida e estruturando uma disciplina obrigatória, em vez
do modelo extracurricular ou integrado a um componente curricular mais distante da prá-
tica musical. Os resultados mostram uma relação positiva dos alunos frente às atividades,
propiciando uma atmosfera de diálogo mais consciente sobre seu processo de aprender
em coletivo, além de possibilitar novas reflexões ao professor, principalmente em relação
a sua abordagem na matéria.

20
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Mesa-redonda 2: Composição e
Cognição

Mediação: Marcos Nogueira (UFRJ)

Por uma epistemologia da composição musical


Antenor Ferreira Correa
Universidade de Brasília

Música e conhecimento estão categoricamente atrelados. Talvez, a prova mais cabal dessa
afirmação seja o fato de que a música está presente na universidade, admitida como área
de formação, estudo e pesquisa. Não obstante, considerar a música como forma de conhe-
cimento não é unanimidade. François Pachet (2005), por exemplo, questiona: “A música
é uma forma de conhecimento? [e responde:] Provavelmente não.” Contrariamente a ele,
opõem diversos autores como Peter Milward, Keith Swanwick e David J. Elliott, que não
somente afirmam a música como forma, mas também como veículo de conhecimento.
Partindo desses posicionamentos antagônicos, pretendo propor uma reflexão sintética
sobre a natureza, formas e processos relativos ao conhecimento em música de modo a
conceber uma epistemologia da composição musical. Nesse sentido, perpassam as consi-
derações presentes neste texto as seguintes indagações: Que tipo de conhecimento poder
ser adquirido e transmitido compondo-se música? Que tipo de conhecimento poder ser
adquirido por meio da fruição musical? Que tipo de conhecimento poder ser adquirido
na performance musical? Os meandros desses questionamentos levaram a ponderar como
as formas de conhecimento proposicional, procedimental e por familiaridade compõe o
discurso composicional.
Interrogar a atividade composicional, e consequentemente a música, como forma de
conhecimento implicará, necessariamente, em confrontar a possibilidade de a música ser
comunicada e compreendida. Entendo a ocorrência de ao menos dois tipos de compreen-
são musical, as quais chamarei de fenomênica e intelectual. Esta proposição, consequen-
temente, conduzirá a discussões sobre o processo de significação em música.

21
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Composição e cognição: contribuições da cognição musical


incorporada para a criação de estratégias para o compor
Guilherme Bertissolo
Universidade Federal da Bahia

Como a composição e cognição podem se entrelaçar? O que pode uma informar à outra?
Nessa palestra, discuto noções da cognição musical incorporada que se articulam em
aspectos do compor, tais como memória, expectativa, gesto e metáfora. Os conceitos
que fundamentam as pesquisas relacionadas têm como referência central o conceito de
mente incorporada no estudo do sentido musical e dos processos criativos envolvidos nas
práticas musicais. Pretendo exemplificar como alguns dos mecanismos do entendimento,
que são mais amplamente aplicados na descrição da experiência musical sob o prisma
da percepção e da análise, podem possibilitar a criação de estratégias em composição,
contribuindo para o ensino e a teoria do compor, a partir da articulação entre a semântica
cognitiva e a semântica cultural proposta em uma pesquisa em andamento.

Investigação de estratégias de pesquisa gestual interdisciplinar, a


partir da improvisação livre, para fins de criação musical
Roseane Yampolschi
Universidade Federal do Paraná

A relevância das pesquisas em música que abarcam reflexões sobre o corpo, em con-
textos variados, não mais pode ser subestimada. O interesse crescente da comunidade
acadêmica e de artistas em relação à temática se reflete principalmente em uma expan-
são dos discursos de natureza científica, voltados para âmbitos diversos de conhecimento
musicológico e interdisciplinar. Para o nosso propósito, no atual estágio deste trabalho,
interessa refletir o assunto de modo a embasar, parcialmente, o que compreendemos ser
a finalidade última desta pesquisa: investigar, na práxis artística, possíveis configurações
gestuais como parte de um universo sonoro mais abrangente, interdisciplinar, para fins de
criação musical. A partir do trabalho com a improvisação livre, reunindo estudantes de
música, o que se pretende é propiciar a vivência de formas não convencionais de aborda-
gem gestual – levando-se em conta as suas variantes possíveis desde parâmetros artísticos
selecionados –, que sirvam para subverter, em parte, fundamentos estéticos cristalizados
que comumente dão sentido às pesquisas de som na criação musical.

22
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Mesa-redonda 3: Música e Saúde

Mediação: Clara Márcia Piazzetta (UNESPAR/FAC)

Avaliação da cognição musical: contextos e perspectivas


Marília Nunes-Silva
Universidade do Estado de Minas Gerais

Nos últimos anos, houve um considerável avanço no estudo da música a partir da pers-
pectiva neurocientífica, propiciando a evolução do conhecimento teórico e dos construtos
relacionados ao processamento cognitivo musical. O desenvolvimento e a utilização de
métodos padronizados para a avaliação da cognição musical, nos contextos clínico e de
pesquisa, ainda se constitui em um desafio dentro deste campo de conhecimento. Os estu-
dos realizados com músicos profissionais e com indivíduos com déficits seletivos de ha-
bilidades musicais favoreceram a construção de modelos cognitivos úteis à compreensão
da cognição musical. Estes modelos cognitivos especificam os componentes envolvidos
no processamento musical e suas possíveis interações, e norteiam a construção de instru-
mentos padronizados de avaliação, possibilitando a testagem de hipóteses relacionadas
a estes componentes. Um destes modelos teoricamente orientados guiou o desenvolvi-
mento da Montreal Battery of Evaluation of Amusia (MBEA). A MBEA é uma bateria
de testes que avalia seis componentes do processamento musical (contorno, escala, in-
tervalo, ritmo, métrica e memória musical) e tem se mostrado fidedigna e válida para o
diagnóstico de diferentes déficits musicais, agrupados sob o termo amusia. A MBEA foi
validada para o contexto brasileiro e tem sido utilizada em pesquisas com populações com
condições neuropsicológicas, e na prática clínica para estimar o impacto de intervenções
baseadas em elementos da música e elaborar estratégias mais eficazes de reabilitação. A
utilização e o desenvolvimento de instrumentos padronizados para a avaliação musical
nos contextos clínico e de pesquisa deve ser estimulada, para a obtenção de resultados
mais fidedignos e interpretações teoricamente embasadas.

23
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Música, Musicoterapia e Saúde — Cuidando do Ser


Claudia Regina de Oliveira Zanini
Universidade Federal de Goiás

A música tem sido utilizada em rituais de cura desde os primórdios da civilização, como
os vivenciados no Xamanismo com povos primitivos ou ainda hoje, em resgates dessa
cultura. Com a criação de cursos de Musicoterapia, na segunda metade do século XX,
vem crescendo a gama de conhecimentos acerca da utilização da música com objetivos
terapêuticos por um profissional qualificado academicamente, o musicoterapeuta. Como
objetivo da palestra, tem-se o de apresentar uma vertente dessa profissão, visto que entre
as possibilidades de atuação em atividades de avaliação, prevenção ou promoção da saúde
e tratamento, buscar-se-á contextualizar a última. Sendo um profissional que atua em um
paradigma do cuidado, o musicoterapeuta vem se inserindo em diferentes áreas. Pretende-
se expor um panorama de intervenções e pesquisas que podem ser conduzidas por meio
da Musicoterapia e que visam estabelecer esta área como uma terapia complementar ou
integrativa, possibilitando o tratamento, a reabilitação e a habilitação. Ao abordar a re-
lação existente entre Musicoterapia e os conhecimentos acerca da música e do cérebro,
tendo as áreas da Psicologia, da Neurociência e da Cognição Musical como importantes
aliadas, espera-se ampliar olhares para a perspectiva atualmente difundida como Prática
Baseada em Evidência nesse campo científico.

Musicoterapia: música e saúde em prática


Rosemyriam Cunha
Universidade Estadual do Paraná

Ligações entre a arte dos sons e as práticas de saúde são registradas desde a antiguidade.
A música faz parte da vida social e cultural da humanidade e como tal impacta a vida
cotidiana. É proposta desta reflexão apresentar argumentos que mostrem aspectos da in-
fluência do som sobre a saúde das pessoas. A reflexão passa por documentos que indicam
prejuízos causados pelo som sobre a saúde. Um conceito abrangente de música funda-
menta o pensar sobre ruído, som e música como fenômenos acústicos que incidem sobre a
saúde humana. Uma visão social coloca a música no patamar de convenção s ocial, de ati-
vidade humana. A saúde é defendida com base nos Estudos da Deficiência e dados sobre
a violência urbana. Relativizados os conceitos de saúde e música, articula-se um encontro
entre esses eventos com a teoria e prática da Musicoterapia e suas ressonâncias sobre o
bem estar humano. Seja no campo da reabilitação, da estimulação ou da socialização,
essa prática se insere no campo hospitalar, educacional, social, neurológico e da saúde
mental, no envolvimento dos participantes em processos mediados pelo fazer musical.
Na interação entre música, musicoterapeuta e participante, a ação sonora tem a finalidade
de reabilitar, estimular, socializar, informar e fortalecer e ampliar as possibilidades de
ação sobre o meio circundante. Aqui o fazer musical se volta para modificar situações de
violência causadas pelo isolamento e descrédito na potencialidade de desenvolvimento.
São interações sonoras com o objetivo de promover e construir saúde. Palavras-chave:
palavra, palavra, palavra.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Concertos

Alma: a expertise pianística de Egberto Gismonti


Vinicius Bastos Gomes
Universidade Federal do Paraná

A prática deliberada, atividade estruturada com objetivo explícito de melhorar o desem-


penho, é um dos caminhos mais aceitos para a aquisição da performance em nível de
expert. Entretanto, a literatura mostra que a expertise é, na maioria das vezes, restrita
a um contexto, mesmo dentro de um domínio. No âmbito da música, uma performance
pode possuir diversos objetivos, o que traz também reflexos na elaboração e realização
da prática deliberada. Egberto Gismonti, multi-instrumentista brasileiro de renome in-
ternacional, realiza performances pouco convencionais ao piano solo. O objetivo desta
apresentação é trazer apontamentos da dissertação “Alma: o estilo pianístico de Egberto
Gismonti” e resultados parciais da atual pesquisa de doutorado do pesquisador, que lida
com estratégias de prática deliberada para que se alcance a performance em nível de ex-
pert no piano improvisado brasileiro. Para isso, o pesquisador/performer intepretará, ao
piano solo, e comentará brevemente algumas das peças contidas no álbum “Alma” (EMI-
Odeon, 1986), de Egberto Gismonti. Os resultados apontam para a necessidade de que
o pianista desenvolva estratégias para uma prática deliberada que seja afinada com um
dos principais das performances do pianista estudado, que nesse caso parece ser o de va-
riar suas composições a cada exposição de suas partes em termos de forma, sonoridade,
harmonia, acompanhamentos e melodia. Conclui-se, portanto, que para realizar uma per-
formance em nível de expert que objetive a idiossincrasia pianística de Egberto Gismonti,
além das habilidades motoras para a exposição de suas músicas, necessita-se a criação da
capacidade de modificá-las de maneira improvisada.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Hiperimprovisação
Manuel Silveira Falleiros
Universidade Estadual de Campinas

A performance proposta pretende apresentar na prática a utilização de modelo de estraté-


gia criativa para a Livre Improvisação baseado em pesquisas anteriores sobre endoconcei-
tos como promotores de ações criativas e relações com características pós-modernas. En-
tendemos a Livre Improvisação como um fazer musical singular que emerge da condição
pós-moderna, ativando na forma musical suas características particulares: a convivência
de tempos e modos; a permeabilidade, a excitação contínua; a instabilidade permanente;
tempo efêmero; “presentismo”; a imoderação; a antiregionalização (Lipovestsky, 2004).
Observamos que o processo criativo em Livre Improvisação depende mais de resoluções
heurísticas e heteropoiéticas, por conta disto apresentamos uma proposta substitutiva com
a utilização do conceito de ressonância emocional e endoconceitos (Lubart, 2008) como
promotores de processos heurísticos em música não-idiomática (Bayley, 1993) ou genera-
tiva. Através do mecanismo automático de ressonância (Lubart, 2008) o perfil emocional
de um endoconceito se propaga através das memórias e ativa outros endoconceitos através
de uma rede de associações cognitivas, propiciando ações criativas e inventivas. Aplica-
mos esta estratégia sobre as singularidades pós-modernas, o que dá origem ao título da
proposta.

SoS: Self-Organized Sonifications Through a Touchless Virtual Piano


José Eduardo Fornari
Universidade Estadual de Campinas

SoS is a self-organized algorithm designed in Pd-extended (PureData:


www.puredata.info) whose goal is to create a real-time sonification1 of dynamic gestu-
res in a touchless (without physical contact) fashion, similar to the way of playing the
notorious electronic musical instrument Theremin.2 In the SoS patch (an algorithm in
Pd) data from hands’ gestures are retrieved by means of a webcam embedded in a lap-
top (where the patch is running). This data is represented in real-time into MIDI (Music
Instrument Digital Interface) notes that are played by the virtual piano within the music
notation software Musescore (https://musescore.org/). Both Pd and Musescore are free
softwares. This means that they respect the freedoms of: 1) Running the program as you
wish, for any purpose (freedom 0); 2) Studying how the program works and changing it so
it does your computing as you wish (freedom 1); 3) Accessing to the source code so it can
be freely redistributed (freedom 2); 4) Modifying and distributing copies of your versions
to others (freedom 3). SoS is therefore a free patch running a free performance in free
softwares. It aims the creation of a conceptual real-time multimodal artwork. The goal
1
Sonification is the use of non-speech audio to convey information or perceptualize data. In our case the
sonification is given only by piano sounds.
2
Theremin is an early electronic musical instrument controlled touchless (without physical contact) by
the performer. It is named after the Westernized name of its Russian inventor, Léon Theremin, who patented
the device in 1928.

26
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

here is to musically explore the metaphor of the performance of a solo (lonely) touchless
piano. By doing so, SoS allows the creation of musical phrases through the sonification
of gestures of hands in the open air. Data from such gestures are retrieved by means of a
computer vision algorithm. These touchless gestural sonifications can be done also with
other types of movements, such as the ones from a dancer or a crowd. In this performance,
gestures from the hands of a performer that never touches a piano keyboard, do loosely
control the performance of a virtual (non existential) piano that, nevertheless, plays mu-
sical phrases as sonifications of such touchless touches. This performance also presents
the visual projection of the real-time capture of images (the performer’s hands) blended
with few geometric figures (rectangles) that move around in the screen, in different colors
and paths. Each figure represents one of the melodic lines being generated by the gestu-
res from the hands in the air, which are given by a multi blob (a cluster of pixels bigger
that a certain threshold) detection algorithm that transforms in data each dynamic blob
retrieved by the computer vision. SoS aims to state and explore the paradox of a non exis-
tential piano played by touchless touches that nevertheless creates a prosodic sonification
hopefully conveying aesthetic meaning.

Três Reverências para Piano a Quatro Mãos de Acácio Piedade: Uma


Reflexão Sobre Sincronia Entre Pianistas Durante o Processo de uma
Interpretação
Maria Bernardete Castelan Povoas e Luís Claúdio Barros
Universidade Estadual de Santa Catarina

O recital é resultante de uma investigação sobre a prática instrumental de duo pianístico


durante o processo de construção interpretativa da obra para piano a quatro mãos, Ci-
clo Reverências, do compositor Acácio Piedade (1961) e dedicada ao Duo. A pesquisa
tem como foco o exame de questões relativas à sincronia e integração de gestos entre
pianistas, verificadas durante a prática das peças constantes do ciclo: Abertura Soviet
- Reverência a Dmitri Shostakovich (2009), Adagio Misterioso - Reverência a Gustav
Mahler (2016), e Dança do Menino Tuhú - Reverência a Villa-Lobos (2016). As obras,
escritas com um intervalo de sete anos entre a primeira e as duas últimas, representam,
nas palavras do compositor, reverências aos mestres que foram referências na sua for-
mação (Piedade, 2016). Para a análise foram considerados princípios da antecipação do
movimento corporal (Schmidt & Wrisberg, 2010; Sloboda, 2008) e questões relativas à
sincronia e integração de gestos, entendidos como a reunião de dois ou mais movimentos
(BARROS, PÓVOAS: 2015, 2013; PÓVOAS, 2008, 1999). Este contexto encontra-se
exemplificado em excertos musicais das peças e na execução da obra pelo duo. Os ex-
certos foram selecionados visando a operacionalização da execução em passagens onde a
proximidade entre as mãos dos pianistas ocasionou uma limitação de desempenho. Estra-
tégias de estudo, baseadas no ciclo e na organização de gestos em movimentos flexíveis
nas coordenadas X, Y e Z (PÓVOAS, 1999), foram aplicadas nesses trechos para fins de
garantir a integração do duo e a fluência musical, visando a qualidade do resultado sonoro
e a realização instrumental no andamento pretendido.

27
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Preparação do recital de piano à 4 mãos


Carmen Célia Fregoneze e Daniela Tsi Gerber
Universidade do Estado do Paraná

Problema: A precisão da execução simultânea de obras complexas dentro do repertório


para piano à quatro mãos. Objetivos: Investigar o processo de preparação da performance
observando a variedade estilística de cada obra; a executar com igualdade sonora e de
caráter as diferentes articulações; ressaltar a clareza da textura; desenvolver simultanei-
dade na habilidade motora; utilizar o pedal com o intuito de destacar as vozes e procurar
o colorido sonoro; controlar as dinâmicas; tocar com agógica que propicie ao duo uma
expressividade na execução. Pressupostos teóricos: Segundo Casella (1936, p. 233) a
escrita para piano a quatro mãos também é uma forma de música de câmera com suas
particularidades e funções atribuídas, a essa categoria de música se tem escrito obras de
singular interesse. A partitura é o ponto de partida para o estudo e a construção de uma
interpretação musical, é, portanto, parte fundamental na tomada de decisões interpretati-
vas para alcançar a fidelidade do que o compositor expressou, contudo, essas decisões vão
além, o duo deve almejar a interação com a expressividade quanto aos aspectos que não
estão descritos na partitura. Procedimentos metodológicos: Para execução das obras,
cada membro do duo realiza individualmente o preparo da sua parte e estudo analítico do
repertório para posterior discussão dos procedimentos e ensaio dos duos, visando traba-
lhar todas as questões estilísticas/interpretativas de cada obra.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Grupos de Estudo

Cognição, Música e Musicoterapia


Coordenação: Clara Márcia Piazzetta e Claudia Zanini
Universidade Estadual do Paraná e Universidade Federal de Goiás

O Grupo de Estudos tem como objetivo principal integrar conhecimentos sobre Música,
Cognição, Saúde e Musicoterapia. Tem acontecido desde o SIMCAM realizado em 2010,
no Rio de Janeiro. A partir das discussões desenvolvidas nos últimos anos, quando tive-
mos a participação de profissionais e estudantes advindos, principalmente, da Educação
Musical e da Musicoterapia, surgiu a motivação para aprofundar, no SIMCAM de 2017,
os aspectos vivenciados por meio das experiências musicais. Essas experiências, de au-
dição, composição, recriação e improvisação musicais, descritas por Bruscia (2000), no
campo da Musicoterapia, podem ter diferentes objetivos, em atividades de educação mu-
sical ou de promoção à saúde. Assim, baseados no princípio de que cada uma dessas
experiências envolve processos cognitivos específicos, dependendo do contexto de sua
aplicação, visa-se refletir sobre esses, de modo a descrever e compreender as semelhan-
ças e diferenças existentes. Espera-se ampliar diálogos e experiências colaborativas entre
os profissionais ligados às diferentes subáreas da música, em virtude das capacidades em
reconhecer processos e estudos envolvendo a cognição musical, a coordenação motora e
o funcionamento cerebral, considerando a importância do convívio com a música, uma
vez que essa é uma experiência multimodal. Para tanto, serão utilizadas a apreciação de
recursos de mídias diferenciadas e a consulta à documentos disponíveis virtualmente.

Cognição e Educação Musical


Rosane Cardoso de Araújo
Universidade Federal do Paraná

As discussões deste grupo focam temas que articulam os estudos da cognição e educação
musical sob algumas perspectivas como: recepção/percepção, desenvolvimento musical,
aquisição da expertise, processos de aprendizagem musical e criatividade, bem como al-
guns temas da psicologia e da música que influenciam o fazer musical, especialmente a
motivação e autorregulação da aprendizagem. O objetivo para o GE é apresentar diferen-
tes possibilidades de estudos sobre cognição e psicologia cognitiva que estão relacionados
com o ensino e a prática musical. O GE é destinado a alunos, professores e pesquisadores
que desenvolvem processos de práticas, ensino e aprendizagem musical, em diferentes
contextos. As atividades no grupo incluem a revisão de obras e investigações de autores

29
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

nacionais e internacionais, referências na área da cognição, psicologia e educação musi-


cal.

Música e Teorias da Cognição


Coordenação: Beatriz Raposo de Medeiros e Luis Felipe Oliveira
Universidade de São Paulo e Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

A proposta atual deste GE é dar sequência, principalmente ao que já foi visto nos últimos
dois anos. Este GE originou-se baseado na discussão das abordagens dinamicistas e agora
busca observar outras abordagens teóricas. O objetivo do GE é responder a questões que
nos ajudem a refletir sobre o papel das teorias em nossas buscas, estudos, etc.
No Simcam 11, realizado em Pirenópolis as teorias focadas nas discussões do GE fo-
ram: o cognitivismo, para o qual podemos citar Chomsky e a famosa TGMT ou GTTM de
F. Lerdahl & R. Jackendoff (1983); o conexionismo (por ex: K. Plunkett) e o dinamicismo
(Port e Van Gelder, 1995 e Large, 2010; especificamente para a música).
No Simcam 12, realizado em Porto Alebre, levantamos a discussão em torno das
ideias das seguintes hipóteses teóricas: a Hipótese do Recurso da Sintaxe Compartilhada
(SSIRH) de A. Patel e a Tonal Pitch Space, de Fred Lehdal. Também aí trouxemos à tona
qual seria a opção teórica dos palestrantes convidados: Peter Webster, Eugenia Costa-
Giomi e Isabel Cecilia Martinez.
Para o Simcam 13, em Curitiba, seguiremos estimulando os participantes a responde-
rem as perguntas que consideramos fundamentais: Quais são as teorias da cognição exis-
tentes? Como elas (ou algumas delas) dão conta do que entendemos por música/língua?
Como temos embasado nossos trabalhos de cognição com estas teorias? Quais as ques-
tões que temos sobre nossos objetos de estudo? São elas contempladas pela abordagem
teórica que escolhemos? Esperamos poder rever as ideias básicas de SSIRH e de TPS,
à luz do artigo A neurodynamic account of musical tonality (Large et al, 2016). Neste
artigo, a visão neurodinâmica de E. Large sobre a música encontra diálogo com o conhe-
cimento sobre a percepção de tom e tonalidade de J. Bharucha e C. L. Krumhansl para
estabelecer um modelo biológico plausível e, portanto transcultural, a partir da ideia da
percepção de uma invariância musical que é comum a todos os seres humanos.

30
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Semântica Cognitiva e Música


Coordenação: Marcos Nogueira e Guilherme Bertissolo
Universidade Federal do Rio de Janeiro e Universidade Federal da Bahia

O Grupo de Estudo, reunido pela primeira vez no SIMCAM 9, em Belém (2013), pro-
põe o debate acerca das pesquisas cognitivas do sentido musical e do desenvolvimento
de métodos descritivos da forma musical, no contexto dos processos criativos em Mú-
sica. O referencial teórico abordado é essencialmente vinculado à semântica cognitiva e,
em especial, ao paradigma da ciência cognitiva incorporada—enacionista (enactivist)—,
recebendo, sobretudo, contribuições da psicologia, da linguística e das neurociências cog-
nitivas, dentre outros domínios das ciências da mente contemporâneas. Os conceitos que
fundamentam as pesquisas relacionadas têm como referência central o conceito de “mente
incorporada” e seus desdobramentos, tal como discutidos a partir das teorias cognitivas
da categorização (Rosch), das affordances (Gibson), da memória (Baddeley; Edelman;
Snyder), da atenção (Pashler), da percepção (Bregman; Noë; Deutsch; Dowling) da metá-
fora conceitual (Lakoff & Johnson; Johnson; Spitzer; Zbikowski, Brower), da expectativa
(Bharucha; Huron; Abdallah & Plumbley), do gesto (Burrows; Hatten; Gritten & King;
Larson; Phillips-Silver) e da sintaxe/repetição (Margulis; Narmour; Huron; Temperley).
Propusemos como núcleo central de discussão no SIMCAM 12 (2016) a contribuição
dessa pesquisa cognitiva de base experiencial para o entendimento dos processos criati-
vos musicais, bem como o seu papel no âmbito da teoria da música no século XXI. Para as
sessões do GE no SIMCAM 13 (2017) propomos discutir mais detidamente o potencial de
aplicação desse arcabouço teórico-metodológico às atividades de criação e performance
musical. Todos os interessados neste campo de investigação são bem-vindos ao GE, que
tem investido também na elaboração de uma lista de descritores da subárea e de uma bi-
bliografia especializada a ser discutida pelo GE e disponibilizada, em breve, no site da
ABCM.

Neurociências e Performance Musical


Coordenação: Luciane Cuervo
Universidade Federal do Rio Grande do Sul

O objetivo deste GE consiste em fomentar o debate e a pesquisa acerca das contribui-


ções de conhecimentos neurocientíficos relevantes na construção da performance musi-
cal. Busca-se contemplar a complexidade da manifestação musical, articulando saberes
e práticas interdisciplinares intrínsecos ao desenvolvimento cognitivo e o contexto socio-
cultural.
As duas últimas décadas foram marcadas por avanços extraordinários no que concerne
às possibilidades investigativas do engajamento neural no comportamento musical. É
possível afirmar que o fazer musical, manifestado por meio da audição, percepção, visão
(leitura), gesto, memória, movimento, linguagem, criação, dentre outras ações, engloba
diversas regiões e funções cerebrais, dos dois hemisférios, de forma dinâmica e complexa.
Apesar disso, ainda são difundidos mitos acerca do cérebro, como a percentagem reduzida
de utilização da massa encefálica, a lateralidade e dominância cerebral, genialidade/dom
x expertise, entre outros.

31
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Para Tokuhama-Espinosa (2012), o primeiro passo necessário para a difusão de co-


nhecimentos neurocientíficos é justamente o de desconstruir os mitos sobre o cérebro.
Suas investigações apontam que há quatro principais categorias de saberes, sendo predo-
minante a categoria “Mitos” entre seus sujeitos de pesquisa:

1. Estabelecido — conhecimentos comprovados por pesquisas neurocientíficas. Ex.:


Plasticidade neuronal.

2. Provável – tendem a ser comprovados pela neurociência. Ex.: Etapas sensíveis.

3. Especulação inteligente — articulação de ideias que não foram desmentidas por


campos diversos da neurociência. Ex.: Diferenças entre os gêneros.

4. Mitos — concepções do senso comum que não possuem comprovação científica.


Ex.: Cérebro direito e esquerdo.

Conhecimentos neurocientíficos têm muito a enriquecer a pedagogia da Performance.


Expressar-se através da música inclui a capacidade de poder interpretar ou criar a sua
versão para uma obra, imprimindo um caráter pessoal e transmitindo algo de si mesmo
ao ouvinte. Da produção à recepção, existe um longo caminho, cujo objetivo principal,
conscientemente ou não, é a aquisição de técnica em busca da expressividade refletidos
no fenômeno performático. É sabido que a prática deliberada é parte fundamental na
concepção da performance, porém, o que se defende, é que essa prática evite a repetição
mecanicista e inexpressiva, tão comuns no estudo do instrumento e da voz. A plasticidade
cerebral reage a estímulos de diversas naturezas, sejam eles motores, sejam puramente
mentais.
Processos mentais de audição, de leitura à primeira vista, de leitura silenciosa, de
estudo técnico e expressivo, regulação das emoções, controle da ansiedade, entre outros
podem ser fortemente qualificados quando aliados a resultados de investigações das Neu-
rociências. Termos como consolidação do aprendizado, neuroplasticidade, sistema de
recompensa e o conhecimento de regiões específicas do cérebro envolvidas mais intensa-
mente no fazer musical vão ao encontro de uma tomada de consciência acerca de atitudes
e pensamentos que aperfeiçoam o processo de construção da performance.
O que se constata hoje é que a diversificação de estratégias metodológicas de estudo,
o respeito às condições de consolidação do aprendizado e a capacidade de adiamento
de gratificação do sistema de recompensa são elementos que exemplificam contribuições
de conhecimentos neurocientíficos ao processo de concepção da performance musical.
Um dos principais tributos que a música fornece ao cérebro é a regulação das emoções,
uma das habilidades mais importantes dentre as quais se fazem necessárias durante uma
apresentação musical e toda a trajetória prévia inerente a ela.

32
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Parte III

Trabalhos Completos

33
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Cognição Musical e Estudos Culturais

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Musical responses to body percussion: initial findings on children/youth


interactions with bodily-based activities

Kristina B. Tyrenius1
Örebro Universitet (Sweden)
kristina.balstedttyrenius@oru.se

Antenor Ferreira Corrêa2


Universidade de Brasília (UnB)
antenorferreira@yahoo.com.br

Abstract: In this paper, we present considerations about the use of body percussion as a
cognitive strategy. We understand the body occupy a kernel position in the process of acquiring
knowledge. In this sense, we conducted observations during the workshops offered in Sweden
by the Brazilian group Batucadeiros to 1250 participants. The public who attended these
workshops was culturally distinctive and did not have a common language to be shared. The
analysis of the collected material pointed to remarkable transformations in the participants’
behavior. Moreover, allowed to posit the use bodily-based activities as a noteworthy vehicle
enabling music apprehension.
Keywords: body percussion, music apprehension, personal development, Batucadeiros.

Respostas Musicais à percussão corporal: resultados iniciais sobre a interação de crianças e


adolescentes com atividades corporais
Resumo: Considerações sobre o uso de percussão corporal como estratégia cognitiva.
Entendemos que o corpo ocupa posição central no processo de aquisição de conhecimento.
Neste sentido, realizamos observações durante oficinas realizadas na Suécia pelo grupo
brasileiro Batucadeiros para 1250 participantes. O público destes workshops era culturalmente
distinto, sem compartilhar de um idioma comum para comunicação. A análise do material
coletado mostrou notáveis transformações na atitude dos participantes. Além disso, permitiu
postular o uso de atividades corporais como um excelente veículo para a apreensão musical.
Palavras-chave: percussão corporal, apreensão musical, desenvolvimento pessoal,
Batucadeiros.

Introduction

In October 2016 a group from Brasília named Batucadeiros was invited to present body
percussion workshops in Askersund community, Region Örebro, Sweden. The Brazilian
group ran workshops for 1250 kids/youth in ages from 6 to16 years old. Among these people,
there were students from compulsory schools, refugees, immigrants, and people with special
needs. Many of the participants are not English, Portuguese, and neither Swedish speakers.
Thus, body percussion became a common language among them. In addition, the group

1
Researcher supported by Teaching Education Border, Örebro Universitet.

2Researcher supported by CAPES (Coordination for the Improvement of Higher Education Personnel) and FAP-
DF (Federal District Research Support Foundation, Brazil).

35
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

offered a clinic for 90 teachers coming from different types of schools, levels, and areas.
Moreover, Batucadeiros presented four musical performances in which the audience could
interact with the group singing and making body percussion.
During the interactions between Batucadeiros and the participants, we could observe
interesting aspects regarding music learning process and social interaction. Notably
concerning with individual behavior, it was possible to note changings in the manner how the
participants did relate to the activities proposed by the leaders. Over time, while
accomplishing those activities (which did last around 60 minutes) their inner transformations
became evident. These personal changings, besides having an immediate impact on
participants´ musical apprehension, also pointed to a significant use of body percussion as
means to orient children towards a process of music cognition within diverse cultural
contexts.
In what follows, we are going to reflect about those varieties of personal expressions
and behaviors considering body percussion as a way to enable communication within diverse
cultural contexts. We are driven by the following interrogation: the teaching process in the
majority of regular schools is strongly based on an intellectual type of cognition. That means,
is up to the brain perceiving and developing the contents transmitted by the teacher. For its
turn, this intellectual mode is structured by the language and communicated verbally. Thus,
what would happen with this frame of work in the absence of common language shared by
teacher and students?
Regarding the methodology, we shall use here a twofold set: description of reactions
and transformations observed in the workshops’ participants, and further analysis of this
material. As the workshops were recorded on video, it was possible to analyze the changings
in behavior throughout the activities proposed. At the same time, we could evaluate the
musical responses and consequent level of musical apprehension among the different public.
Based in the realm of social cognition, we admit that the body of an individual
belonging to a particular cultural context reveals not only his/her personal identity, but also
features of the whole group in its unity. It happens because the process of acquiring
knowledge is guided by the ideologies and beliefs of the group where the individual belong
in. However, the situation faced during the workshops is at minimum atypical. The children
who participated are living in a situation of transnationality or translocality, once they are
being educated according to a Swedish system outside their homeland (in the case of
immigrants or war refugees). Therefore, they are not completely immersed in a specific

36
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

ideology, but otherwise facing a friction of distinctive cultural realities. This aspect pointed to
the necessity of searching for new teaching strategies. In this sense, to encompass bodily-
based activities in the classroom, alongside with the massive intellectual procedures observed
in the educational system, appeared as an excellent tool at the service of music teaching and
learning and personal development.

A Brazilian Body Percussion Group in Sweden


In Sweden, compulsory schools can apply for funds from Swedish Arts Council in projects
called: “Creative school”. Askersunds community, Region Örebro, applied and received this
grant, which allowed bringing the Brazilian group Batucadeiros for a two-week long visit to
work with all schools of this community. These workshops, seminars, and concerts were also
accomplished in collaboration with Örebro University, what makes the public even more
eclectic, encompassing since pupils from preschool until university professors. During the
activities in elementary schools, it was possible to accomplish a sort of “ethnographic”
observation, taking notes and video recording the interaction between participants and the
group of leaders who ran the activities.
All workshops had, basically, the same structure, occurring in a gymnastic hall or in a
regular classroom, where all desks and chairs, previously, had been piled against the walls.
When the students (an average of 30 children per group) along their teachers entered the
classroom, two or three leaders of the Batucadeiros received them. The reactions of the
students are worth mentioning. As we all know, both children and youth have the habit of
talking, laughing, and even quarrel. Even though, some of the students were totally silent and
calm when entering the classroom. One possible reason for this quietness might be due to the
fact that they had no previous idea about what would happen in that activity. Certainly, the
students’ first contact with a non-familiar group along with the absence of verbal language
promptly set a different expectation among them.
In every workshop, Batucadeiros open their arms showing the form of a circle in the
air. Since there was no spoken communication, the students had to figure out what the
meaning of the gesture and follow the instructions. After everybody had formed a circle and
sat on the floor, Batucadeiros started an artistic body percussion performance. This
performance involved a choreography consisting of claps, stomps, snaps, etc., along with
vocal inflexions such as: “doh”, “boh”, “poh”, “shi”, “pah”, “kah”, “plah”, “dum”, “tum”,
“txum”. While making moves and sounds, the group combined traditional Brazilian rhythms

37
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

like samba, baião, bossa nova with more modern styles as funk and pop. After the musical
performance was finished, the leaders gave a signal to everyone stand up and form a circle,
which is named “roda”.
Following, the leaders conducted different types of warm-ups, but all instructions
continued being non-verbal, what created an intense silence, with small outbursts of laughs of
embarrassments, especially during the massage called “karate” and “playing piano” on each
other shoulders, a non-common practice in Swedish classrooms. Right after the warm up, the
leaders started to perform basic body percussion patterns, and the participants, observing the
suggestive gestures of the leaders, beginning to reproduce these patterns. As it could be
expected, some of the participants were able to reproduce rightly the rhythms proposed. On
the other hand, some of them could not perform a correct imitation. Obviously, laughs and
mockeries took place in the class. Some of the students, because of shyness or fearing making
mistakes, even refused trying to perform the exercises. Notwithstanding, observing their
colleagues were having fun trying to execute the activities, those students felt motivated to
participate. Already in this briefly moment, it was possible to note changings in the posture of
the children, shifting from initial embarrassment, shyness or reluctance, to a proactive attitude
of trying to perform the activity and daring to experiment. As a basis for further analysis, we
will describe more detailed some of those activities.
After the warm-ups were finished, the leaders methodically initiate the teaching of
several body percussion rhythmic patterns (as showed in Figure 1, for instance). The idea
behind this systematic conduct is to establish the particular teaching process that stands as a
sort of didactical philosophy of Batucadeiros, which is structured in six pillars:
experimentation, creation, appreciation, expression, body solfège, and flow (Amorim, 2016,
p.143). Instead of using a traditional master/pupil teaching structure, the Batucadeiros
methodology is driven in a way to remove this distinction so that everybody is teacher and
student at the same time. In this sense, since the beginning of the exercises, all the participants
are invited to purpose their own rhythmic pattern. Thus, one leader performs a body
percussion pattern that is imitated by the audience. Following, a person standing at the right
side of the leader has the responsibility for purposing another pattern of his own, which will
be imitated by the whole group. Next, another person standing at the right side will have a
chance to create his/her own pattern to be reproduced by the whole group, and so on. In this
procedure, everybody shares the role and the responsibilities of the leader.

38
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Figure 1: example of body percussion rhythmic pattern and the same pattern “translated” into solfège

As the activity went on, the participants increased their security and we observed a
gradual improvement of their coordination to perform the exercises. This fact seems to
indicate that the didactic grounded on Batucadeiros philosophy had been implanted and
substantiated in the participants. We must emphasize all activities ran by the leaders or
proposed by the participants did not use verbal communication. Eye contact, facial
expressions, and body movements transmitted all the information. The assimilation of the
musical content so occurred observing what had been suggested and by its further imitation.
In addition, this procedure also created a connection among the participants.
The next activity involved improvisation, which is an important part of the
Batucadeiros pedagogy. In this context, improvisation could also be identified with
experimentation. In the improvisation exercise, the leader presents a body percussion
rhythmic pattern and the participant has to “answer” with a new original pattern improvised
combining sounds previously learned. And here there is a new element. If the participant
wish, s/he can use sounds of his/her own experience. That means, if a sound was not showed
before this sound is not rejected or avoided, but otherwise welcome. Normally, teachers do
not approve a noisy and disturbing environment in their classrooms. Shouting, whispering,
shushing, hand clapping are repelled. However, in the body percussion context, these sounds
finds their places and can be used with musical intent. We can say that this kind of procedure
supports creativity because even the funniest sonorous expression will be well received and
will find its place in the context. At the same time, this practice undermines the stress and
pressure existing in “being exposed” in front a group of 30 people. This also has an impact on
personal development, because what a person “says” musically will be received and answered
by the others, no matter the “form” of that content. This raises self-confidence and diminishes
insecurity, especially in the children and shy people.

Analysis of reactions and interactions during body percussion workshops


It seems to us that, gradually, the teachers are bringing back the body as a vehicle enabling
learning. The number of courses or extracurricular activities related to Eurhythmics increases

39
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

every day. Even though, we understand the cognitive process could benefit much more with
the adoption of bodily-based methods. As shown by Lakoff and Johnson (1999) and Johnson
(1987) in their studies in cognitive linguistic, the body accomplishes a fundamental role in the
cognitive process. It means that it is not only up to the brain to run the process of acquiring
knowledge because mind and body are not independents. As the authors claimed, our
cognitive faculty has its onset with the perception of the world, what occurs making use of all
senses. Furthermore, the most basic metaphors are linked to our discernment of the
surrounding space, what begins with the awareness of our own body. In reason of this, there
are concepts that could not be learned intellectually, once they demand the relation of the
body with the space. Some concepts such as balance, container, nesting, for instance, have to
be learned in the body before being developed in the brain. Only intellectually, it is not
possible to understand the notion of balance, for example.
In this regarding, the diversity observed in ethnical groups could serve as a
paradigmatic case. The exclusion of the body from the educative process, accomplished in
reason of bourgeoisie ideology, is not present in traditional communities. In this sense, one
can observe a prejudice in the use of the body, thereby considered by the elite as belonging to
the lower class of society.
Jacques Dalcroze, who spent a time in Africa (Cf: Haward and Ring, 2001), was the
first pedagogue to acknowledge and theorize about the use of the body in music education. In
Dalcroze's view, the musical potential is latent in all people, and in order to blossom it a
person needs to learn how channelizes focus to listening using equally mind and body.
Because of this, he introduced kinesthetic approach in his teaching methods. Therefore, the
management of mind and physical instincts stands as a foundation his method (Cf: Haward
and Ring, 2001).
Along with these authors, and based on the observations accomplished during the
workshops, we are enabled to assure the importance of the bodily-based activities to the
cognitive process as a whole and also individually as a way of personal development. One
example of this could be seen in Figure 2. This photo was taken at the very beginning of the
workshop and depicts a Batucadeiro leader along with some children displaying diverse
reactions like shyness, reluctance in participate, anxiety and even mistrust for do not grasp the
reasons they had to join in.

40
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Figure 2: reactions of children in the beginning of the body percussion workshop showing shyness, mistrust,
apprehensiveness, and reluctance

As the workshop went on, the children start to be more receptive and feeling more
motivated to, at least, trying to reproduce the proposed exercises. Of course, it is a prerogative
of the leader to “break the ice” and encourage the participants. Regarding this aspect,
Batucadeiros has developed an interesting concept called “criançamento”, meaning that the
adult must rediscover and reintegrate in his/her personality the spirit of being child, what
means, among other features, being open to the new, being curious towards the knowledge,
using the imagination, yelling, running, jumping. All these characteristics, sometimes, have
been repressed in the classroom environment, and it is exactly by welcoming these attitudes
and allowing themselves acting like a child that the Batucadeiros leaders manage to motivate
the children. Figure 3 shows a further moment in the workshop illustrating a changing in a
child behavior. It is possible to note a gradually more receptivity attitude towards the
activities, like if the child passed to realize something different. The same girl is shown in a
further moment, and then, obviously, appreciating and enjoying because she started having
fun to perform the exercises.

41
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Figure 3: 2 different reactions of a child in two moments of the body percussion workshop shifting her posture
from a more receptive to enjoyment attitude

Hargreaves, Miell, and Macdonald (2002) in their Chapter titled What are musical
identities, and why are they important? suggested an interesting method for thinking about
musical identity. The authors separate this subject in two groups: identity in music and music
in identity. Identity in music is socially defined, within given cultural roles and music
categories. Music in identity implies “how music is used as means or resource for developing
other aspects of our individual identities” (2002, p.2). By and large, we observed the same use
of music at the service of personal development and the quest for identity. It was evident
during the progression of workshops the increment of participants' self-confidence. From their
initial shyness and embarrassment, fearing to make mistakes, they changed to a more
proactive posture, daring to experiment. Their suspicious and reluctance gave place to
motivation and enjoyment. These transformations occurred mainly because the level of
understanding about the exercises was raised. This augmentation is also due to the propitious
environment engendered by the leaders. To create this favorable mood, Batucadeiros admits
in their activities some aspects often repelled in a regular classroom. For instance, in general,
the teachers do not like noisy space, which is considered contrary to the educative procedures.
Likewise, kids disturbing and running around are not welcome. Because of these sort of
attitudes, teachers repeat many times in a class "sit still", "go to your desk”, “stop doing this".
The educative system is based on an ideal silent and calm ambient (which we call library
room). Conversely, Batucadeiros encouraged children to use noise with musical intention.
Moreover, rush gave place to ordinated move towards and into the game. In this way,
participants felt motivated to experiment, to improvise without fear making errs, because if

42
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

something does not go like planned, this is not a reason for a reprimand, but otherwise for
fun.
To sum up, based on our analysis of the transformations observed during the
workshops to such diverse public, we believe body percussion is a valid strategy to be
adopted in the classroom. Besides promoting motivation and self-confidence, body percussion
sets the body as an element of cognition.

References
Amorim, Roberto Ricardo Santos de. (2016). Batucadeiros: Educação musical por meio da
percussão corporal. Dissertação de mestrado apresentada ao programa de pós-graduação
em Educação da Universidade de Brasília.
Dalcroze, E. J. (1988). Rhythm, Music and Education. Salem: Ayer Company Publishers, Inc.,
1988 [1921].
Hargreaves, David J.; Miell, Dorothy; Macdonald, Raymond A. R. (2002). Musical Identities.
Oxford, New York: Oxford University Press.
Johnson, Mark. (1987). The Body in the Mind: The Bodily Basis of Meaning, Imagination,
and Reason. Chicago: University of Chicago Press.
Lakoff, George; Johnson, Mark. (1999). Philosophy in the Flesh, the embodied mind and its
challenge to Western Thought. Basic Books: New York.
Haward, Lawrence W.; Ring, Reinhard. (2001). “Emile Jaques-Dalcroze”. In: Grove Music
Online. Oxford Music Online, 2001. Accessed on 30 January 2017.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

A Folia e a Festa do Divino em Guaratuba (Brasil):


um estudo de caso sob a perspectiva das Representações Sociais

Carlos Eduardo de Andrade e Silva Ramos


Universidade Federal do Paraná - UFPR
somarsolrac1981@gmail.com

Resumo: Este trabalho apresenta resultados parciais de um estudo de caso explanatório que
investiga a música da Folia do Divino no Município de Guaratuba (litoral do Paraná) e suas
relações com a Festa do Divino. A partir da Teoria das Representações Sociais foi possível notar
contradições que apontam para diferentes vivências da mesma música por dois grupos: os
Paroquianos e os Devotos Populares. Para a coleta de dados usou-se ferramentas da etnografia,
bem como aproveitamento de experiência em campo advindas da pesquisa anterior, feita no
Mestrado. Os resultados parciais demonstraram essa divisão incomum entre Festa e Folia. Com
isso a pesquisa passa atualmente por redirecionamento metodológico, com vistas ao levantamento
de dados pertinentes à analise dos fenômenos de Representações Sociais. Tais resultados já
apontam um lugar marginal da Folia em relação à Festa, a partir de indícios de incompreensão dos
Paroquianos sobre a música da Folia. Tal marginalidade também se objetifica na disposição
geográfica do itinerário da Folia, bem como de seu lugar na dinâmica financeira da Festa.
Palavras-chave: Sociologia cognitiva, Psicologia cultural, Teoria do conhecimento, Etnografia,
Folia do Divino.

The ‘Folia’ and the ‘Festa do Divino’ in Guaratuba (Brasil): a case study from the perspective
of the Social Representations
Abstract: This work presents partial results of an explanatory case study investigating the music
of the ‘Folia do Divino’ in the Municipality of Guaratuba (coast of Paraná) and its relations with
the ‘Festa do Divino’. From the Theory of Social Representations it was possible to notice
contradictions that points different experiences of the same music by two groups: the Parishioners
and the Popular Devotees. For the data collection, ethnography tools were used, as well as the use
of field experience from the previous research, done in the Masters. Partial results demonstrated
this unusual split between ‘Festa’ and ‘Folia’. With this, the research is currently undergoing
methodological redirection, looking for collection of pertinent data to the analysis of the Social
Representations phenomena. These results already point to a marginal place of ‘Folia’ in relation
to the ‘Festa’, starting from signs of Parishioners incomprehension about the Folia’s music. This
marginality is also objectified in the geographical disposition of ‘Folia's’ itinerary, as well as its
place in the financial dynamics of the ‘Festa’.
Key-words: Cognitive sociology, Cultural psychology, Theory of knowledge, Ethnography, ‘Folia
do Divino’.

O presente trabalho apresenta resultados parciais de um doutorado em andamento1, que estuda


a manifestação musical da Folia do Divino e suas relações com a Festa do Divino no
município de Guaratuba, litoral do Paraná. A pesquisa se configura como um estudo de caso
explanatório com uso de ferramentas da etnografia (Yin, 2005). O caráter ‘explanatório’
concerne à intensa discussão com o aporte teórico escolhido, visando generalizações teóricas
(ibid, p. 22). Abaixo, a Folia e a Festa serão descritas separadamente.
A Folia consiste no evento musical ritualístico no qual um grupo de músicos
tradicionais sai em itinerário visitando casas de devotos ao Divino Espírito Santo. Nestas
visitas, executam uma ordem específica de ações, conduzidas pela música cantada em versos

1
Junto à UFPR - Universidade Federal do Paraná - Brasil

44
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

improvisados. Esse ritual representa para os envolvidos a visita do próprio Espírito Santo,
abençoando o lar e permitindo pedidos, agradecimentos, e afins. Tais visitas ocorrem somente
durante o dia, entretanto se espalham por um longo período de tempo, que vai desde a Páscoa
até a abertura da Festa do Divino, geralmente ocorrida nas primeiras semanas de julho2.
No que concerne ao aspecto musical da Folia, seus protagonistas e respectivas funções
musicais são os seguintes: Mestre (viola caiçara3 e voz principal); Caixa4 (também canta a voz
‘contrato’); Rabequista5; e a voz Tiple6 (aberta à participação de crianças). Para a execução
musical, eles se colocam em uma disposição espacial específica. Formam uma ‘meia lua’ com
Rabequista, Mestre, e Caixa. De frente para o Mestre fica o Tiple, estabelecendo comunicação
estreita e concentrada entre esses dois. Esse dado é importante, uma vez que os versos são
improvisados primeiramente pelo Mestre, e depois o texto precisa ser distribuído pelos outros
cantores na polifonia que surge logo em seguida.
Faz-se agora uma descrição curta do ritual. Tudo se inicia ainda fora das casas, na rua,
enquanto o Caixeiro toca o ‘buzzz’ característico, avisando aos moradores que a folia está
passando. Com isso, algum morador sinaliza que quer receber a Folia. Nesse instante se inicia
uma sequência rápida de ações: os moradores vão ao encontro dos foliões para pegar as
Bandeiras7, enquanto o rabequista já inicia ornamentos que anunciam o início da cantoria. Ao
mesmo tempo, há um impulso que leva todos pra dentro da casa, sem troca de cumprimentos
ou grandes pedidos de licença. Então, já dentro da casa, canta-se a Chegada, e somente ao

2 A Folia do Divino ocorre em diversos lugares do Brasil, tanto no litoral quanto no interior do continente. Esses períodos
de circulação da Folia variam muito de acordo com a região em que ocorrem. É bastante comum que a saída da Folia
aconteça logo após a Páscoa, pois isso marca o período de Pentecostes. Entretanto, o fim do itinerário da Folia pode variar.
No caso de Guaratuba, a comunidade local se acostumou a fazer a Festa próximo à data da Festa de Santa Cruz.

3
A viola caiçara tem características próprias. Dentre elas, afinações próprias e a corda ‘turina’: uma corda adicional,
aguda, que vai até metade do instrumento, possuindo cravelha separada, na divisa do corpo do instrumento com o braço.

4
A caixa da Folia traz uma esteira na pele de resposta que consiste numa corda afinável, com cravelha própria, na qual se
colocam penas de galinha para, com a vibração, produzirem um ‘buzz’ característico.

5 Por sua vez, a rabeca da Folia de Guaratuba se diferencia das rabecas caiçaras dedicadas ao Fandango. A rabeca de
Fandango é mais aguda, e por isso menor e menos bojuda que a rabeca de Folia. Com isso o corpo harmônico das notas
graves é bastante proeminente.

6
‘Tiple’ é o nome dado à voz cantada mais aguda dentre as três linhas melódicas da polifonia da música da romaria. Esse
nome da voz tem espantosa origem na voz ‘triplum’, advinda do nascimento da polifonia ocidental, na Idade Média. Tal
costume da participação infantil é fartamente comentado pelos protagonistas tanto em Guaratuba quanto em Paranaguá, bem
como citado na literatura consultada. Isso foi tratado em profundidade por ocasião do Mestrado, no capítulo XXX, (XXX).

7 Elemento imprescindível da Folia. São duas Bandeiras: a Vermelha representa o Divino; a Branca representa a
Santíssima Trindade.

45
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

final dela é que se fala ‘boa tarde’, ‘como vão as coisas?’, etc. Ao final do canto de Chegada,
um dos foliões, comumente o Tiple, passa uma sacolinha de tecido, na qual o devoto faz uma
oferta em dinheiro (não importa o valor). Em resposta, os Foliões cantam o Agradecimento.
Aqui há um ponto crucial do ritual, que somente o trabalho de campo pôde esclarecer.
Nesse momento, devotos menos experientes, ou menos interessados, podem simplesmente
terminar a escuta do Agradecimento, e os foliões finalizam a visita, seguindo para a rua,
iniciando mais uma vez todo o ciclo. Entretanto, se o devoto faz nova oferta, não importando
o valor, mesmo que seja em forma de alimentos, a resposta dos foliões será tocar outra
música: a Despedida, que pode ser Despedida Velha ou a Nova, mas somente uma delas. É
importante esclarecer que grande parte da riqueza musical está justamente nesses dois cantos
de Despedida. A Chegada, o Agradecimento e a Alvorada são contrapontisticamente idênticos,
mudando somente as letras. Por sua vez, cada uma das Despedidas (Nova e Velha) tem
aspectos próprios que enriquecem a música da Folia.
Na organização diária do ritual, a casa onde ocorre a última visita consistirá no lugar
onde os foliões farão seu pouso: comem a última refeição do dia, dormem na casa, e tomam o
café da manhã do dia seguinte. Nesse caso, o ritual sofre pequenas adições: principalmente o
canto da Alvorada, executado antes do sol nascer. Por um lado, é importante considerar que as
famílias de tais casas de pouso são próximas dos foliões, e de grande devoção ao Divino.
Outrossim, o costume do pouso aponta para necessidades específicas de quando o itinerário
adentra regiões inóspitas e de difícil acesso. Em tais localidades, não há mínimas condições
de se voltar pra casa durante a noite, e então é preciso dormir na região. Quando a Folia está
em regiões urbanas, não é incomum que os foliões regressem à casa do Mestre para dormir.
Abordando agora a Festa, sua organização é feita pela comunidade comercial da cidade,
em parceria com a Paróquia local8. Isso diverge bastante da organização da Folia, que surge
espontaneamente dos foliões e enquanto manifestação cultural popular, bastante ligado ao
aspecto ritualístico das visitas. Contudo, para facilitar a descrição, a Festa do Divino em
Guaratuba pode ser melhor apresentada discernindo-se o aspecto religioso do comercial.
Em seu aspecto religioso, a Festa constitui uma novena que vai de um sábado até o
domingo seguinte, totalizando nove dias. Assim, trata-se de uma novena concentrada que
ocorre concomitantemente ao aspecto comercial, nos mesmos dias. As orações acontecem

8
Paróquia Ns. Sra. do Bom Sucesso

46
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

durante a missa ao final de cada dia. Para tanto, os párocos convidam os foliões a tocarem
nessas celebrações, mas elas não dependem disso. Durante a novena também anunciam o
próximo Casal Festeiro, que consiste no casal responsável por organizar a festa.
Em seu aspecto comercial, a Festa assume grande envergadura, promovendo importante
movimentação financeira, e consistindo num dos ‘carros-chefe’ das estratégias de turismo
empreendidos pela cidade. Monta-se uma ampla cobertura para proteção de intempéries, e
nelas, dezenas de barracas de comércio, em sua maioria de alimentos. Também monta-se um
palco de atrações artísticas, além de parque de diversões infantis. Ocorrem sorteios, bingos e
afins, e contratam artistas para animar a festa.9
O próprio discernimento entre os dois eventos (Folia e Festa) já se mostra como
resultado de pesquisa, uma vez que no caso de Guaratuba as dinâmicas da Festa e da Folia se
encontram regidas por instâncias sociais diversas e atualmente em contradição.10 Tal divisão é
uma excessão quando comparado aos relatos encontrados na literatura sobre as festividades ao
Divino no Brasil (Araújo, 1967; Frade, 2005; Moraes, 1979)
Considerando tal divisão entre a Festa e a Folia, dividiu-se os grupos de sujeitos desse
cenário da seguinte maneira: o grupo dos ‘Paroquianos’ e o grupo dos ‘Devotos Populares’.
Há fortes indícios de que cada grupo compreenda o fenômeno musical da Folia de maneiras
diversas. É possivel caracterizar resumidamente esses dois grupos:
O Grupo dos ‘Paroquianos’ – estão mais ligados à Festa do Divino, e se relacionam
menos com a Folia. Somam-se padres e pessoas em sua maior parte vinculados à Igreja
Católica Guaratubana que participam ativamente da Festa, sua organização e efetivação.
Dentre estes, estão os Casais Festeiros, que são figuras centrais para a Festa, mas que
contraditoriamente advém da própria tradição popular.
O Grupo de ‘Devoção Popular’ – são músicos e devotos da Folia do Divino, que
participam ativamente de seu itinerário, acompanham, recebem-na em suas casas, conhecem
os meandros do ‘ritual’ musical, mas que pouco ou nada participam da organização da Festa.

9
Para se ter uma idéia do alcance da Festa, em 2016 a empresa de televisão credenciada da Rede Globo no Paraná
montou o ‘Palco RPC’, oferecendo programação artística e transmissões ao vivo em rede estadual.

10 Durante a pesquisa do Mestrado (Ramos, 2012), investigou-se o processo de ensino/aprendizagem da música da Folia
do Divino na cidade de Guaratuba. A principal estratégia de coleta de dados naquela ocasião foi o uso de ferramentas da
etnografia: observação sistemática com produção de caderno de campo; descrições densas; gravações musicais em áudio;
transcrições musicais. Tal experiência em campo foi muito rica: acompanhou-se a romaria musical dos foliões (incluindo
pousos) e as participações dos mesmos nas novenas. Disso já se depurava uma divisão nas relações sociais em torno das
festividades ao Divino em Guaratuba, o que tornou compreensível que hoje existam duas instâncias envolvidas nessa cultura:
a Folia do Divino e a Festa do Divino.

47
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Contudo, tais divisões estão imersas em contradições sociais que foram ficando cada
vez mais flagrantes na experiência de campo. Foi por conta de necessidades metodológicas e
epistemológicas advindas dessas contradições que o projeto de Doutorado surgiu, optando
pelo aporte teórico das Representações Sociais11 . As contradições mais importantes, desde o
Mestrado, giraram em torno principalmente das relações entre a Folia e a Igreja.
Primeiramente, observou-se um lugar marginal da Folia em suas relações com a Festa
do Divino. O fenômeno musical da Folia ocupa um espaço limitado na Festa, reduzindo-se a
imagens da divulgação (muitas vezes sem som algum); e participação nas Entradas das missas
da novena, (nesse caso sim, com presença sonora musical, mas em situações contraditórias).
Essa marginalidade também se objetifica no itinerário da Folia, que tem ampla
circulação nas periferias da região, junto às populações dos bairros mais pobres. Ao que tudo
indica, a Folia faz mais sentido para as populações dessas regiões; enquanto que, no centro da
cidade, encontrou-se indícios de estranhamentos e incômodos. O Centro, de caráter mais
comercial, não é tão afeito ao fenômeno musical/social da Folia quanto os bairros e o ‘sítio’12 .
Outra expressão dessa marginalidade ocorre na dinâmica financeira da Festa. A
contratação de artistas e músicos ocorre a altos custos de cachê. Enquanto isso, os foliões tem
dificuldades de se manter durante o período de romaria, pois precisam suspender seus ofícios,
e se queixam de pouco apoio da Festa para suas longas locomoções ao executar a romaria.
Todavia, a experiência em campo tem demonstrado que a Festa do Divino se distanciou
de tal maneira da Folia do Divino, que certas compreensões básicas entre as duas instâncias
simplesmente se perderam e possivelmente estão se reconstruindo sobre novas bases.
Compreender esse processo é o objetivo principal dessa pesquisa. Os dados levantados até
agora apontam ampla diversidade de indícios de tais desencontros. De maneira sucinta
podemos citar: sentidos diversos e contraditórios para a palavra folia; incompreensão pelos
Paroquianos do aspecto improvisatório da música; comparações injustificadas com a música
‘Bandeira do Divino’ de Ivan Lins; Regulamentos de Condomínios que proíbem entrada da
Folia; os Paroquianos em diversas situações referem-se aos foliões como ‘meros’
divulgadores da festa; situações embaraçosas na configuração espacial da Folia quando ela

11
Doravante será usada a abreviação “Teoria das R.S.” ao referir-se à Teoria das Representações Sociais, para melhor
fluência do texto

12
Termo usado pelos próprios foliões ao referirem-se às populações ruralizadas do interior

48
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

sobe ao altar ou ao palco, dado que o Tiple fica de costas para o público; confusões na noção
de dependência mútua entre Folia e Festa, nos dois grupos; inconsistências na noção de
‘artista’ quando aplicada aos Foliões; incompreensão de certos momentos do ritual da Folia
por parte dos padres; diferenças cruciais nas dinâmicas de legitimação de lideranças entre os
Devotos e os Paroquianos; dificuldades dos Casais Festeiros em se relacionar com os Foliões;
diferenças fundamentais na organização da compreensão teológica de conceitos usados
mutuamente por Devotos e Paroquianos; estranhamentos por ocasião da passagem da Folia
pelo Centro da cidade; diálogo truncado com a linguagem da grande mídia por ocasião das
gravações para rádio e TV; a Festa se relaciona diretamente com a sociabilidade das classes
mais altas da cidade, enquanto que a Folia vai no sentido oposto.
Foi considerando esse conjunto de contradições resumidamente apresentadas que a
presente pesquisa passou a se concentrar no aspecto de conflito e resistência no qual a Folia
do Divino está imersa, e que julgou sobressair como prioritário e inevitável. Ao que tudo
indica, o que está ocorrendo é um reflexo de amplos processos de ameaça à diversidade
cultural, em escala nacional e mundial, e localmente, isso torna o modo de vida caiçara
vulnerável. Por outro lado, o fenômeno musical da Folia demonstra capacidade para a
resiliência social, dinamizando a vida comunitária, e por isso precisa ser valorizada como
saída para a brutalidade dos avanços neoliberalistas do capitalismo.13
Metodologicamente, a presente pesquisa tem feito uso de diversos tipos de evidências,
tais como publicações de revistas locais, atuais e históricas, além de utilizar ferramentas
advindas da etnografia, a saber: o trabalho de campo participante e consequente produção de
registros sistemáticos (produção de caderno de campo; registros em áudio de relatos;
descrição densa; entrevistas e eventuais transcrições musicais) (Barz, & Cooley, 2008;
Campbell, 2013; Nettl, 2008; Rockwell, 1987; Seeger, 2008). O trabalho de cunho etnográfico
consistiu em visitas de trabalho de campo desde outubro de 2015, algumas com intuito
específico de acompanhar a Romaria por mais 3 dias, bem como 2 dias da novena. Buscou-se
também maior aproximação com os Paroquianos e com os eventos relacionados aos usos dos
foliões para a divulgação da festa. 14 Essa primeira fase do trabalho de campo, em diálogo com

13
Tal aspecto já vinha surgindo e foi alvo de discussões bastante pertinentes durante o Mestrado.

14 O material etnográfico levantado durante o Mestrado, desde 2010, também faz parte do escopo de dados que vem
sendo analisado.

49
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

o aporte teórico, apontou a necessidade de investigar quais as R.S. em torno do fenômeno


musical da Folia do Divino estão em ‘circulação’ nos 2 grupos: Paroquianos e Devotos. Por
conta disso, a pesquisa passa atualmente por um redirecionamento metodológico e pretende
fazer uso de entrevistas envolvendo apreciação musical da Folia.
Por sua vez, dentre o material impresso já encontrado pode-se listar: edições da Revista
‘Voz da Paróquia’ – produzida pelos Paroquianos; Revista ‘Giro Pop’ – produção
independente que visa promoção do comércio e da cultura local, apresenta várias matérias
sobre a Folia e a Festa; e por fim, publicações guaratubanas disponíveis no acervo histórico da
Biblioteca Estadual do Paraná. Foram encontrados jornais e periódicos diversos que passarão
por análise de conteúdo15. Tais análises cooperarão de maneira crucial para a compreensão
das R.S. atualmente em curso sobre a Folia do Divino no ambiente cultural urbano de
Guaratuba; enquanto que, as publicações históricas permitirão um primeiro delineamento de
hipóteses sobre o processo de construção histórica de tais R.S..16

Contribuições da Teoria das Representações Sociais


A despeito de se tratar de um campo teórico que dialoga com a Sociologia, a Teoria das R.S.
nasce em 1961 no contexto da Psicologia Social, com uma publicação de Moscovici que
investigou “as maneiras como a psicanálise penetrou o pensamento popular na
França” (Duveen, 2007 p. 9). Com isso, aprofundou-se a idéia de que os grupos humanos, as
instituições e sociedades são ambientes pensantes, e que “os indivíduos não se limitam a
receber e processar informação, são também construtores de significados e teorizam a
realidade social” (Vala, 2004, p. 457). Nesse sentido, Moreira (2005) considera que, a partir
dessa abordagem, qualquer manifestação de conhecimento e saber humano passa a ter uma
história e um contexto social. Uma vez que os dados apontam para o fato de que os dois
grupos identificados (Paroquianos e Devotos) não compreendem nem participam da Folia do
Divino da mesma forma, planeja-se abordar tais clivagens através da Teoria das R.S.
Conquanto, uma preocupação importante da Teoria das R.S. é justamente

15
Tratam-se de exemplares abrangendo o período de 1953 até 2003. Alguns periódicos trazem diversos números, e
outros trazem apenas volumes isolados. Dentre os títulos, pode-se listar: O Caiçara (até 2003); Guaratuba (1991); Tribuna de
Guaratuba (1966 a 1970); Folha de Guaratuba (1998 a 2005); O Grito (1957);e O Jornal (1953 a 1957).

16 Nesse momento avalia-se a viabilidade epistemológica da sociologia de Bourdieu para a análise desse material. O
estudo teórico para tal avaliação tem se concentrado na obra Gênese e Estrutura do Campo Religioso (Bourdieu, 2007).

50
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

circunscrever de maneira científica as diferentes percepções de um mesmo fenômeno por


diferentes grupos sociais. Por conseguinte, esse campo teórico inaugura a necessidade de
aprofundar o conceito de senso-comum. Assim, a teoria das R.S. pode ser entendida como
uma epistemologia daqueles saberes essenciais ao funcionamento da sociedade que não se
encaixam nos modelos científicos de conhecimento (Moscovici, 2007).17
O olhar do pesquisador em campo a partir da Teoria das R.S. comporta o
estranhamento do familiar e familiarização do estranho, peculiares à etnografia. Nesse
sentido, compreender uma sociedade pensante se dará através do estudo: “a) das
circunstâncias em que os grupos se comunicam, tomam decisões e procuram tanto revelar,
como esconder algo; b) das suas ações e suas crenças, isto é das suas ideologias, ciências e
representações” (Moscovici, 2007, p. 43).
O autor reitera que a atenção do pesquisador em R.S. deve se voltar para as
“conversações normalmente usadas na sociedade” e para os “boatos” (ibid, p.84); as
“exatidões relativas” (ibid, p. 59), as “situações de crise” (ibid, p. 91). Ou seja, deve estar
atento àqueles fenômenos de linguagem, gesto, comportamento e imaginário (ibid, p. 218)
nos quais há uma intenção clara de evitar discussões e negociações de significado. Entretanto,
os mesmos significados não estão estabelecidos, gerando então ambiguidades, melhor
percebidas e sentidas pelo pesquisador, justamente por não ser nativo.
É nesse sentido que o redirecionamento metodológico está sendo guiado, buscando
abarcar de maneira objetiva os elementos que demonstrarão o surgimento das Representações
Sociais acerca da música da Folia do Divino nos dois diferentes grupos.

Referências
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mitos e lendas, 1 (pp. 31-96) São Paulo: Melhoramentos.
Arruda, A. (2002) Teoria das representações sociais e teorias de gênero, Cadernos de
Pesquisa, 117, 127-147.
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ethnomusicology. New York: Oxford University Press.
Bourdieu, P. (2007). Gênese e estrutura do campo religioso. In Bourdieu, P. A economia das
trocas simbólicas. (pp. 27-78) São Paulo: Perspectiva.

17 A Teoria das RS permite isso uma vez que “Moscovici propõe uma psicossociologia do conhecimento, com forte apoio
sociológico, mas sem desprezar os processos subjetivos e cognitivos” (Arruda, 2002, p. 131).

51
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Campbell, P. S. (2013). Etnomusicología y Educación Musical: punto de encuentro entre


música, educación, y cultura. Revista internacional de educación musical (Vol.1, n.1, pp.
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Duveen, G. (2007). O poder das idéias, In Moscovici, S. Representações sociais:
investigações em psicologia social (pp. 7-28) Petrópolis: Vozes.
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(Vol.2, n.2, pp. 27-36) UERJ.
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Moscovici, S. (2007). Representações sociais: investigações em psicologia social. Petrópolis:
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Nettl, B. (2008). Foreword. In G. Barz, & T. Cooley (Ed.), Shadows in the Field: new
perspectives for fieldwork in ethnomusicology (pp. v-x), New York: Oxford University
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Ramos, C. E. A. S (2011), Ensino/aprendizagem da música da Folia do Divino Espírito Santo
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Extraído de http://polsocytrabiigg.sociales.uba.ar/files/2014/03/Rockwell-El-proceso-
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Yin, R. K. (2005). Estudo de caso: planejamento e métodos. Porto Alegre: Bookman.

52
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Concepts of time and music

Marcos Mesquita
Instituto de Artes da Unesp
marcosmesquita@yahoo.com.br

Abstract: The concepts of cyclic and linear time influenced and still influence time experiences of
all mankind. The text discusses if it is possible to apply these concepts to musical studies and
comment opinions on time of some twentieth-century composers.
Key-words: cognitive psychology, cultural theory, enculturation, cyclic time, linear time, musical
time cognition.

Conceitos de tempo e música


Resumo: Os conceitos de tempo cíclico e linear influenciaram e ainda influenciam as vivências
temporais de toda a humanidade. O texto discute se é possível aplicar estes conceitos aos estudos
musicais e comenta opiniões sobre tempo de alguns compositores do século XX.
Palavras-chave: psicologia cognitiva, teoria cultural, aculturação, tempo cíclico, tempo linear,
cognição do tempo musical.

1. Cyclic and linear time


The chronometrical time is not only a measurement system invented by the European culture,
it is also, and more significatively, a consequence of a conceptual construction, developed
within millennia. This construction influenced all temporal experiences of occidental culture
and governs today, so to speak, the life of almost all mankind. This conceptual construction is
called linear time. We have to go back in history in order to follow its gradual development.
In a previous stage, as result of observations of natural phenomena – for instance the
cycles of day/night, of moon phases or of seasons of the year –, human beings of earliest
civilizations created a cosmogonic system which reflected the same temporal order of these
phenomena. The temporal aspect of this system is called cyclic time. In the view of Gerald
James Whitrow, the initial contribution to the development of the linear time concept came
from the first known eschatology which was conceived by humans. This eschatology was
disseminated by Zoroaster – or Zarathustra – in sixth century BC and later influenced
Judaism, Christianity and Islam:

[…] at death God passes judgement on man and that this decides his fate when the

world is finally transformed into the same state of perfection as when it left the
hands of the Creator. At the last, immortal glory will be the reward of those who
adhere to the Truth, whereas the followers of the Lie will be condemned to ‘a long
age of darkness, foul food and cries of woe’ (Whitrow, 1988, p. 34).

53
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

This teleological view of time determined definitively the occidental mentality.


Approximately from this epoch on Jews began to see history as the gradual revelation of
god’s intention. Later, attaching a universal dimension to their belief, Christians saw Christ’s
crucifixion as an unrepeatable event. This led to the conclusion that “time must be linear
rather than cyclic. This essentially historical view of time, with its particular emphasis on the
non-repeatability of events, is the very essence of Christianity” (Whitrow, 1988, p. 57). Short
and to the point: it can be said that from this moment on the soil was already fertile for
concepts like progress, evolution, free will and even history – here is meant that these
concepts were developed over the course of many centuries of the occidental civilization. The
linear time experienced its scientific justification in seventeenth century through ideas by
Isaac Newton and Gottfried Wilhelm Leibniz:
Despite the difference between Newton’s and Leibniz’s views concerning the nature
of physical time, in other respects their ideas about the concept were similar. Both
believed that time was universal and unique, the universe comprising a succession of
states, each of which exists for an instant, successive instants being like the order of
points on an indefinitely extended straight line. This was the concept of time which
was to dominate physical science until the advent of Einstein’s special theory of
relativity early this [twentieth] century (Whitrow, 1988, S. 130).

The concept of linear time did not simply oust or replace that one of cyclic time.
Nowadays time experiences are ideed a mixture from both concepts with preponderance of
the linear one. Time experience of most human beings point out as a reciprocal, not always
peaceful, relationship between inherent human characteristics and learned concepts from a
given culture: “although our awareness of time is a product of human evolution, our ideas of
time are neither innate nor automatically learned but are intellectual constructions that result
from experience and action” (Whitrow, 1988, p. 5-6).

2. Cyclic and linear music?


The possible musical reflections on the above exposed concepts are vast, widespread. On the
one hand, it can be said that repetition and recapitulation in music – until a certain extent of
variation or transformation – can be associated with the concept of cyclic time, for they create
a bond with something that was heard in the past – recent or distant –, and the human capacity
to perceive this bond induces the perceiver to “close the cycle” of this process, establishing a
relationship between events distant in time; on the other hand, contrast and development can
be associated with the concept of linear time, for they cut – not completely, however – the
connection to the past sound events and, so to speak, compel the perceiver to the present or to

54
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

imagine what comes next in the future. Of course this is not that simple, because music is a
multiparametric art: it is possible that one parameter undergoes a change or a variation, while
others ones do not. The countless possibilities in this concern create ambiguous events which
are tremendously difficult to measure in simple psychometric tests. In Example 1, it can be
easily seen and heard that the melodies played by first and second violins – indicated
respectively as A2 and A3 – in measures 3-4 have the same rhythmical structure of that one
which viola has played in measures 1-2 – indicated as A1 –, with different intervallic
structures, however. Note, nevertheless, that the melodic range of viola and second violin is
the same, a minor 9th actually – G3-Ab4 and B3-C5 respectively):

Example 1. Joseph Haydn, String Quartet, op. 64, No. 1, Trio from 2nd movement, ms. 1-4

In this case, the rhythmical structure is the decisive agent which establishes a cognitive
relationship among segments A1, A2, and A3. Arnold Schoenberg was aware of the
multiparametric possibilities in music, when he defined variation “as changing a number of a
unit’s features, while preserving others” (Schoenberg, 1948/2010, p. 287).
In a broader approach, Olivier Messiaen speculates about endogenous – personal,
psychological – and exogenous – social, cultural – aspects of time perception and
measurement:
For the musician and the specialist in rhythm [rythmicien] the perception of time is
the source of all music and rhythm. […] Bergson claims that the duration is an
“immediate assumption [donnée immédiate] of the consciousness”: this is the title of
his first book. As a matter of fact, the duration presents itself to us with tempo
fluctuations, speed changes: it is the experienced duration [durée vécue],
heterogeneous duration, whose judgement depends essentially on the number of
exterior and interior events which have filled it for each of us in the present and in
the past. In face of the experienced duration stands the abstract time or structured
time [temps structuré] (Messiaen, 1995, p. 9). 1

He compares the characteristics of experienced duration and structured time and place them in
a didactic table:

55
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Experienced duration Structured time

The duration is concrete. The time is abstract.


(estimated in comparison to us – it mistakes (like an empty frame, in which we put the
for the succession of our conscience states) world and ourselves)

The duration is heterogeneous. The time is homogeneous.


(sometimes fast, sometimes slow – with (all its parts are identical)
thousand tempo nuances, a prodigious
variety of different slownesses and speeds)

The duration is qualitative. The time is quantitative.


(dependent on our nature – no measurable) (measurable, numbered – relative to the
phenomena which serve to its
measurement: if these phenomena change,
our time structuration changes with them)

The duration is subjective. The time is objective.


(in ourselves) (outside ourselves)

Table 1. Comparison between experienced duration and structured time after Messiaen (1995, p. 12)

The structured time manifests itself in music through, among others, beat – regular or
irregular –, meter – ditto –, tempo and its fluctuations, the density of sound processes, the
chronometrical duration of segments, movements and works, and the proportion between
sections and the whole. But all they shape the surface of musical events, from which the
perceiving beings get a cognitive depth. The predominance of a teleological form conception
in the tonal western music during the so called Viennese Classicism and great part of romantic
music reflects exemplary the acme of the linear time concept in music. This time view was
and is still questioned in varied tendencies of new music from the first decade of the twentieth
century on. Bernd Alois Zimmermann writes about the diversity of human time experience:
Past, present and future are bound to the succession process, as we know, merely in
their appearance as cosmic time. In our mental reality, however, this succession does
not exist, what possesses a more real reality than the to us well familiar clock, which
actually indicates us nothing else than there is no present in strict sense. The time
bends into a sphere form [Kugelgestalt]. From this picture of the sphere form of time
I have developed, based on the philosophical term, my pluralistic compositional
technique, which takes the polystratification of our musical reality into account
(Zimmermann, 1968/1974, p. 35). 2

In the beginning of the 1950s, many composers pleaded for an idealized


desemantization of music – either adherents of integral serialism or of aleatory music.
Absorbed in this attitude, John Cage wrote: “[…] what will be done is to more and more
completely liberate sounds from abstracts ideas about them and more and more exactly to let
them be physically, uniquely, themselves” (Cage, 1952/1975, p. 100). This desemantization

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

had a significative consequence for the time experience in music, especially what concerns its
mnemonic aspect. Imploding the notions of thematic or sound material, some composers of
this periode created musical works which do not establish clear tematic or sound relationships
during their performance/listening; hence the listener can hardly relate the thematic/sound
events which other, an occurrence that in general brings confusion or amazement to the
listener's memory. In the case of Cage, aleatory processes played a crucial part in this context:
It is thus possible to make a musical composition the continuity of which is free of
individual taste and memory (psychology) and also of the literature and ‘traditions’
of the art. The sounds enter the time-space centered within themselves, unimpeded
by service to any abstraction, their 360 degrees of circumference free for an infinite
play of interpenetration (Cage, 1952/1976, p. 59).

Having this in mind, one can understand Cage’s strategy in relation to sound material and his
rejection to any kind of development of sound material. Similar questions in the case of
integral serialism were discussed in Mesquita (2012 and 2016). An idealistic inflection is also
noticeable in the considerations by Zimmermann:
In the possibility of interval projection into vertical as well as into horizontal, time
seems […] also projectable in both directions. Thus we experience sound as “one
after another” of tones in time distance zero, tone sequence as “simultaneous”,
shifted in time […]. In this point of view, the idea of time unity as unity of present,
past and future [...], this as modern as also immemorial idea, takes a new perspective
in the music as “time art”, as art of temporal order within the continuous present of
the all comprehensive basic structure, which we must establish as order principle of
all relationships within a composition (Zimmermann, 1957/1974, p. 11-12).

The connection with the concept of “perpetual present”, as it is understood by mystics, is not
to deny here: composers imagine that the listener is transported into an atemporal experience
which resembles vaguely a mystical trance. In this condition, one experiences a kind of
abolition of time transitoriness. Years later, Pierre Boulez uses in his writings similar terms
like Zimmermann, naturally liberate from mystical content: “these dimensions [vertical,
diagonal, horizontal] are only one characteristic, modified by the internal time which governs
the organizations, going from zero (vertical, simultaneous) to a determined number
(horizontal, successive)” (Boulez, 1963, p. 133). If sound processes are conditioned by these
three dimensions, than two more embracing categories determine way and manner, how
sound processes can be projeted in time:
[…] we will distinguish [...] two categories in musical time: [...] In pulsed time,
duration structures refer to the chronometrical time in function of a marking, of a
landmark [...] regular or irregular, but systematic [...]. Amorphous time refers to
chronometrical time just in a global way; durations, with their determined
proportions (not values) or with any sort of proportion indication, manifest
themselves in a time field. Only the pulsed time is susceptible to be affected by

57
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

speed, accelaration or decelaration [...] the relationship between chronometrical time


and the number o beats will be the index of speed. The amorphous time will be only
more or less dense according to the statiscal number of events which will happen
during a global chronometrical time; the relationship of this density to the
amorphous time will be the index of accupation. [...] The amorphous time is
comparable to the smooth surface, pulsed time to the striated surface; that’s the
reason why, by analogy, I will call the two defined categories as smooth time and
stried time (Boulez, 1966, p. 99-100).

There are also two relationships which are, for Boulez, the fundamental laws of musical time.
On the one hand, time is filled without counting it. Here the sound processes are statistically
distributed in time, and their groupings shape different possible densities (smooth time). On
the other hand, one counts the time in order to fill it. Here the sound processes are
rhythmically ordered, and their groupings reflect different speeds (stried time). Some sound
processes form clues in chronometrical time and these are internally ordered by the perceiver.
This relationship between sound processes and cognition is a multistratified process that can
be observed under varied points of view:
[…] we grasp [the time] only with the aid of sensitive reference points, so indirectly,
and on the condition that these reference events engrave themselves somewhere, do
not disappearing without trace. [...] It is essential that the reference events leave their
mark on my memory, otherwise they will not exist. In fact, the underlying postulate
is that the time, in the sense of impalpable Heraclitean flow, does not have any
meaning, unless in reference to the man who observes, to me. [...] In order that this
image-mark of the phenomenon becomes a reference point, it is necessary the notion
of anteriority. But this notion seems as circular and impenetrable as the immediate
notion of flow. It is doubtful a synonym. We change slightly the point of view. When
the events or phenomena were synchronous, the universal time would be abolished,
for anteriority would desappear. The same, if the events were completely smooth,
that is without beginning and without end, and even without “perceptible” internal
modification or roughness, the time would be abolished as well. It seems that the
notions of separation, bypass [contournement], difference, discontinuity, which are
very connected, are preconditions to the notion of anteriority. In order that
anteriority exists, it is necessary to be able to distinguish entities which so allow to
“go” from one to another (Xenakis, 1988/1994, p. 98-99).

The sound flow is shaped in many respects by composers, for example he/she decides
about the sound materials and their projection strategies on the chronometrical time or a total
duration, as well on the relationships among one sound material and others – here the
different degrees of affinity among sound materials play the most important part. But as
aforesaid, musical time has a subordinate relationship to chronometrical time, and in this
context the perceiver has also a formal/creative function by finding clues during the sound
flow which is proposed by the composer.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

3. Last remarks
The concepts of cyclic and linear time, allthough just partially applicable in musical
theory and analysis, can guide an embracing approach on music both as a cognitive and
enculturated product of human ingeniousness. As multiparametric art, music is able to
relativize contrasts between tematic or sound unities, blurring the differences between cyclic
and linear events. But this kind of difficulty should not hinder us in the search of new possible
analytic ways, of new kinds of inquiries of old subjects, and of new kinds of psychometric or
image tests with human participants.

References
Boulez, Pierre (1963). Penser la musique aujourd’ hui. Geneva: Editions Gonthier.
Cage, John (1952/1975). Juilliard Lecture. In A Year from Monday (new ed.). London: Marion
Boyars, 95–111.
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Mesquita, Marcos (2012). Duração e cálculo: reflexões de alguns compositores entre as
décadas de 1930 e 1960. Música em perspectiva, vol. 5. nº 2, 48-64.
Mesquita, Marcos (2016). Serialismo integral e defasagem temporal de parâmetros sonoros.
In Subversões de protocolos: uso impróprio. Niterói: PPGCA-UFF, 7-18.
Messiaen, Olivier (1995). Le Temps. In Traité de rythme, de couleur et d’ornithologie. Vol. 1.
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Whitrow, G. J (1988). Time in History. The evolution of our general awareness of time and
temporal perspective. Oxford: Oxford University Press.
Xenakis, Iannis (1988/1994). Sur le temps. Kéleütha. With preface and notes by Benoît
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Zimmermann, Bern Alois. (1957/1974). Intervall und Zeit. In Christof Bitter (ed.), Intervall
und Zeit. Mainz: B. Schott’s Söhne, 11-14.
Zimmermann, Bernd Alois (1968/1974). Vom Handwerk des Komponisten. In Christof Bitter
(ed.), Intervall und Zeit. Mainz: B. Schott’s Söhne, 31-37.
1 Translations from French and German by the author.
2 About his pluralistic style and the concept of Kugelgestalt, see Gruhn 1983.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Cognição Musical e Ciências da


Linguagem

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

A percepção do movimento no discurso da música eletroacústica

Caoqui Sanches Pereira


Universidade Federal do Rio de Janeiro
caoqui@gmail.com

Resumo: O presente artigo tem o intuito de relacionar a teoria musical espectromorfológica de Denis
Smalley com a semântica enacionista de George Lakoff e Mark Johnson (1980, 1999), em especial no
que diz respeito ao conceito de esquema de imagem (Johnson, 1987). Tal relação se dará através da
ontologia do movimento (The Primacy of Moviment) de Sheets-Johnstone (1999), que nos adverte
sobre como o movimento estrutura a experiência e o desenvolvimento humano. A teoria de Smalley
foi escolhida por se tratar de uma ferramenta de organização discursiva para a Música Eletroacústica,
nos servindo, portanto, como exemplo de uma abordagem enacionista da experiência musical. Dessa
maneira, o trabalho busca, à luz da semântica cognitiva, contribuir para o entendimento do sentido da
Música Contemporânea através da percepção do movimento. Com isso acreditamos nos aproximar de
resultados mais concretos acerca do movimento e do gesto musical, o que nos parece essencial para a
ampliação do debate em torno do sentido da música.
Palavras-chave: esquemas de imagem, espectromorfologia, movimento, semântica cognitiva,
conceitualização.

Perception of movement in electroacoustic music discourse


Abstract: This papers aims to relate the spectro-morphological musical theory of Denis Smalley with
the enactivism semantics of George Lakoff and Mark Johnson (1980, 1999), in particular, with regard
to the image-schematic concept (Johnson, 1987). This relationship will occur through the ontology of
movement (The Primacy of Motion; Sheets-Johnstone (1999), which warns us about how movement
structures human experience and development. Smalley's theory was chosen since it is a tool of
discursive organization for Electroacoustic Music, constituting an example about the enactivism
approach of the musical experience. Therefore, the work seeks, in the light of cognitive semantics, to
contribute to the understanding of the Contemporary Music meaning, through the perception of
movement. With this, we believe that we are getting closer to more tangible results about the
movement and the musical gesture, which seems essential to broaden the debate around the music
meaning.
Key-words: image schema, spectro-morphology, motion, cognitive semantics, conceptualization.

Introdução
Este artigo deixa em evidência a relação entre a teoria musical espectromorfológica de Denis
Smalley com a semântica enacionista de George Lakoff e Mark Johnson (1980, 1999), em
especial com o conceito de esquema de imagem (Johnson, 1987). A saber, a
espectromorfologia é uma abordagem para materiais sonoros e estruturas musicais que lida
com o espectro das alturas e seu perfil dinâmico no tempo. A teoria espectromorfológica nos
interessa, porque, segundo Perez (2011), ela pode ser admitida como uma ferramenta de
organização discursiva para a Música Eletroacústica. O interesse em relacionar esses dois
termos torna-se pertinente pela possibilidade de integrar uma ferramenta discursiva da Música
Eletroacústica com a cognição incorporada (ciência cognitiva enacionista), ou seja, mostrar
como a experiência sensório-motora é capaz de perceber um “movimento sonoro” e entendê-

61
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

lo por meio de um discurso musical. Todavia, a linha guia que ajudará a traçar essa relação
será a ontologia do movimento (The Primacy of Moviment) de Sheets-Johnstone (1999) que
adverte sobre como a percepção do movimento estrutura a experiência e o desenvolvimento
humano. Portanto, este artigo trata de examinar a vida pelo viés do movimento, procurando
compreender a capacidade humana de atribuir sentido às coisas, vendo que é possível
compreender a experiência da vida em geral—e a experiência musical, em particular. Sendo
assim, parece ser necessário investigar a capacidade humana de se mover criando sentido no
mundo ao redor.

A Ontologia do Movimento
Os movimentos que um ser humano é capaz de realizar com seu próprio corpo são
determinantes para o desenvolvimento da sua realidade e para a forma do fenômeno que ele
percebe. O artigo, ao dizer movimento, está se referindo à capacidade de perceber uma
trajetória enquanto experiência, subjulgando-a temporalmente, ou seja, determinando um
agora, como presente, na continuidade de um passado e projetando-a, pela expectativa, num
futuro. Perceber qualquer movimento contextualiza toda ação realizada, tanto para o que está
no ambiente ao redor, quanto para a realização dos próprios atos.
Sheets-Johnstone (1999) tem o propósito de retornar à experiência atual de um
indivíduo, demonstrando como a percepção do movimento é a capacidade primária de buscar
seu próprio sentido. Ao escrever sobre isso, ela diz, primeiramente, que o ser se constrói
através de movimentos. Isso quer dizer que percepções específicas do próprio sujeito surgem
na decorrência de todo o tempo, em atitudes táteis e cinestésicas. Assim é que ele descobre
suas capacidades corporais atribuindo os conceitos que são próprios para cada situações em
que se encontra. O movimento, portanto, é uma condição para a realização de todas as coisas,
sendo assim, utilizando-o como exemplo, o conceito “viver" sempre vai se referir ao que
ocorre em movimento na experiência. Portanto, é em movimento que a vida de toda a criatura
adquire realidade.
Para perceber melhor que é através do movimento que se cria sentido para a vida,
Sheets-Johnstone (1999) retrata os primeiros movimentos de um organismo vivo. Pretende-se
demonstrar através da autora, como que perceber o movimento foi o ponto de partida para
viver no mundo e criar, por assim dizer, algum sentido para as diversas condutas possíveis.
Ela diz que o movimento do próprio ser se originou através da sua própria capacidade de se
mover em relação ao ambiente que o circunda, ou seja, em relação ao que está situado ao seu

62
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

redor. Assim, segunda ela, é através do movimento que se desenvolve um repertório de


possibilidades conhecidas, um repertório pelo qual se diz “eu posso” para uma série de
objetos e acontecimentos que estão ao redor, no mundo particular de cada organismo.
Desenvolvem-se caminhos distintos de movimentos criados pelo ser em seu próprio corpo e
na própria espontaneidade do movimento. Aos poucos, são identificados braços que se
estendem, espinhas que se curvam, joelhos que se flexionam etc. Cada ser se descobre como
um organismo animado em um ambiente cinético-cinestésico e cria todo um reino cinético de
infinitas possibilidades através de um repertório de “eu posso” (posso estender, posso
alcançar, esticar, arrebentar, retornar, etc). Dessa maneira o ser humano embarca numa longa
jornada de fazer sentido.
Dos primeiros movimentos, onde o sentido é inconsciente, vai se criando com a
cognição, uma dinâmica da interação de forças e configurações inerentes aos nossos
movimentos espontâneos. Assim, os conceitos corporais vão se fundando e, nessa base de
conceitos, a compreensão fundamental para um conjunto de significados é forjada e um
mundo todo é criado. Descobrimos-nos podendo falar sobre nossos movimentos. Quando os
sentidos cinestésicos são criados no organismo, progressivamente se atinge um complexo de
compreensões de conceitos que obtém um vasto conteúdo, se tornando possível, portanto, a
relação com inúmeros acontecimentos corporais. Assim, a natureza do ser é descoberta
encontrando coerência nas experiências e articulando uma forma particular de vida (assim
como a natureza do mundo). O organismo se torna animado por diversas forças de interação,
manipulando uma constelação de objetos particulares peculiares à forma de vida cultural e
individual. Dessa maneira também, os vínculos com os conteúdos musicais ocorrem e a sua
manipulação se dá ao perceber conjuntos de organizações sonoras que se movem
esteticamente uma em relação às outros.
Para concluir as considerações sobre o movimento, Sheets-Johnstone (1999) fala sobre
a animosidade e a aquisição da consciência. Ela diz que no ser humano, a “animosidade”
forma uma base cinética e cinestésica enraizando os entendimentos conceituais e
desenvolvendo a consciência. Tal consciência se desdobra na base por movimentos
espontâneos, se estende por conceitos espaço-temporais qualitativos e emana o que dizemos
ser criativo dos atributos de nossos movimentos. Qualquer movimento é realizado com certo
grau de liberdade, depende da sugestão que o espaço ou o tempo nos proporciona, sendo
constituído através da nossa própria experiência do movimento. É com o movimento próprio
que se criam as qualidades para a experiência.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Até esse ponto foi possível perceber que a ontologia do movimento de Sheets-Johnstone
(1999) é de fundamental importância para compreender como se atribui sentido à música a
partir da experiência que ela proporciona. Para a música, o significado se dá da mesma
maneira que o significado de tudo mais que existe. Como advertiu Nogueira (2003), o sentido
do movimento é o fator que regula toda experiência de um evento musical, é ao percebê-lo
que se compreende o gesto nele implícito, podendo ter tanto implicações espaciais, quanto
implicações temporais. Portanto, as qualidades musicais se vinculam com os sentimentos do
ouvinte conforme o movimento presente é decorrente.

Esquemas de Imagem: a estruturação da experiência


Antes de tentar apresentar aqui o conceito de esquema de imagem, é preciso compreender que
o movimento foi apresentado de uma forma geral e que agora temos condições de evidenciar
estritamente a relação que a teoria espectromorfológica possui com o enacionismo.
Primeiramente é preciso entender que Mark Johnson procurou discutir as atribuições humanas
antes de estruturar estes sentidos na forma de um conceito. Portanto, é o termo esquema de
imagem (image schema) que depende da estruturação humana, e não o contrário. Enfim,
Johnson (1987) faz algumas objeções dizendo que os esquemas de imagem são padrões
abstratos da nossa experiência e são centrais para o sentido e para as nossas inferências. Para
ser mais preciso na aplicação do conceito, o autor deixa claro que esquemas não são
proposições objetivas que especificam a abstrata relação entre símbolos e realidade objetiva.
Um esquema consiste de pequenas partes e relações, pois pode, indefinidamente, estruturar
muitas percepções, imagens e eventos. Os esquemas de imagem operam por um lado com
estruturas proposicionais abstratas, e por outro, com imagens particulares concretas.
Segundo Johnson (1987), o esquema é um padrão recorrente que dá forma, regularidade
e está sempre organizando as atividades. Esses padrões emergem como estruturas
significativas advindas da mobilidade no espaço, da manipulação de objetos e das interações
perceptuais. Esse caráter dinâmico do esquema é importante para a visão de sentido e de
racionalidade, porque se constituem por padrões relativamente fluidos e têm alterações em
vários contextos. Eles não são fixos objetivamente, mas ganham uma relativa estabilidade ao
receber uma localidade convencional numa rede de significados. Podemos perceber que os
esquemas de imagem possuem estrutura e posição definidas: “uma boa parte da estrutura dos
sentidos pode ser considerada fixa na maior parte do tempo” (Johnson, 1987/1990, p. 29). Isso
dá condições de alegar que até mesmo os sentidos convencionais, chamados literais, não são

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

livres de contexto, eles dependem de um vasto background de esquemas compartilhados,


capacidades, práticas e conhecimentos. Tal background mencionado por Johnson (1987), foi
sendo apreendido a partir de uma liberdade de movimento.
Johnson (1987) descreve certas posições padronizadas, visíveis na experiência humana.
O corpo se localiza diante das situações encontradas e, para onde for observar, se encontra:
dentro e fora, perto ou longe, encima ou embaixo, etc. Para descrever a forma como se
entende cada posição padronizada dessa, uma pessoa utiliza os termos que competem às
posições destacadas na maneira em que se encontram, porém, até mesmo sem mencioná-las é
possível se colocar perceptivamente nessa situação. Ou seja, não precisa falar que o copo está
sobre a mesa, ao lado da luminária para localizá-lo nessa posição, o corpo já se coloca em tal
situação posicionando o que está ao seu redor, fazendo parte de sua paisagem. Essa estrutura é
possível por causa desses esquemas que o corpo aprende através da sua experiência de vida.
Ainda no que diz respeito ao entendimento das coisas, Johnson (1987) formula uma
hipótese utilizando os esquemas de imagem: a compreensão da estrutura sintática e semântica
a partir de padrões de significado da experiência, emerge das estruturas dos esquemas de
imagens e se revelam em nossas atividades diárias. Ele observa que o esquema de orientação
temporal e espacial se constitui no dia-a-dia, inclusive na maneira em que se opera a
linguagem. Como exemplo de um esquema, pode-se observar o “in-out” (um esquema de
contêiner ou de cerco). Johnson (1987) acredita que esse estado de “in-out” é o mais
intimamente atrelado com a experiência de orientação corporal. Essa situação pode ser
reconhecida porque esse padrão se repete em várias situações diferentes e em cada caso o
esquema é realizado por caminhos diferentes. Essa organização do ambiente formatada numa
situação decorrente de fatores temporais é projetada, inclusive, nos objetos inanimados, tal
qual na maneira que se começa a utilizá-los no próprio movimento corporal. Na prática, uma
projeção numa pasta de dente, por exemplo, ela “sai” de “dentro” do tubo, esse fato é descrito
dessa maneira em analogia à própria experiência de uma pessoa que sai de algum espaço
delimitado. Também se pode estender metaforicamente o esquema material, físico para o não
físico. Essas projeções metafóricas são uma das principais maneiras de conectar os diferentes
sentidos de um termo. Assim, também é possível chegar ao sentido da música, pois ao ouvi-la,
o corpo todo do ouvinte fundamenta um processo de imaginação criativa das “situações” que
os sons da música o colocam.
O esquema de conteúdo (in-out) também é importante nos processos de escolha, de
rejeição, de separação, entre outros. Johnson (1987) observou que os sistemas formais

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

(relativos à inferência de formas) possuem muitas das suas propriedades e relações por
padrões de experiência, os quais são recursos para organizá-la e compreendê-la, os quais se
aplicam na identificação de um trecho musical e das suas respectivas qualidades. No campo
do conhecimento não objetivista o esquema de imagem é um padrão contínuo com estruturas
internas suficientes para contrair, restringir ou submeter uma inferência. Como os esquemas
seriam centrais para a estrutura dos sentidos, influenciariam os caminhos pelos quais se cria o
sentido das coisas e a razão sobre elas. Por exemplo, ao raciocinar ou pensar sobre algo, um
ponto é entendido como partida ou início e, consequentemente, procuram-se outros pontos até
que se encontre uma chegada ou término.
Expostas as principais características da estruturação do esquema de imagem na atitude
humana, a teoria de Smalley, agora, vai se apresentar como uma via de aplicabilidade da
filosofia enacionista. Para Smalley organizar e classificar o discurso musical, ele precisou
identificar, delimitar e comparar cada movimento e cada característica sonora relacionada a
um conceito que seria veiculado e denominado como tal. Portanto, sua ação pode ser tomada
como um claro exemplo de estruturação dos esquemas de imagens e da percepção do
movimento sonoro ocorrendo na organização de um discurso musical.

Espectromorfologia e Movimento
A exposição da ontologia do movimento de Sheets-Johnstone (1999) e da estruturação dos
esquemas de imagens de Lakoff e Johnson (1987) possibilita estabelecer uma relação com a
teoria espectromorfológica de Denis Smalley. O caminho está aberto para a integração dessas
duas teorias, o que falta agora é apontar na teoria espectromorfológica o modo como Smalley
fundamentou sua teoria no movimento e percebeu as trajetórias de um evento sonoro, tal
como os esquemas de imagens estabeleceram. Dessa maneira ficarão expostas neste artigo as
evidências de que essas duas teorias podem ser profundamente relacionadas. Esse caminho
tem o intuito de alcançar, mais especificamente, o sentido de um discurso musical.
No que diz respeito ao som e à música, Smalley (1992) diz que o movimento e a energia
são campos entrelaçados nas espectromorfologias dos sons: “Não há som sem energia em seu
espectro e não há energia sem movimento” (Smalley, 1992, p.528). Segundo ele, a energia
(energy-field) depende do movimento (motion-field) e estão presentes no tempo e nas
variações dos níveis estruturais de uma música. Smalley (1992) diz que o movimento pode ser
percebido tanto no comportamento textural, quanto no contorno externo e interno do espectro
sonoro. O movimento musical será interpretado como tal se a sua tendência direcional for

66
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

suficientemente consistente e/ou mantida por um intervalo de tempo adequado. A


direcionalidade de um trecho musical, portanto, é percebida segundo a orientação da sua
trajetória e se consiste através de uma percepção que infere e, consequentemente, se formata
relativamente. Esse processo se dá segundo a decorrência dos acontecimentos da
movimentação sonora desde seu ponto inicial até seu ponto de chegada. Smalley (1997) diz
que uma ação humana produz uma espectromorfologia através do movimento e da energia de
seu gesto ao utilizar seu senso de toque para aplicar energia a um corpo sonoro. Dessa
maneira, o gesto é a energia da trajetória do movimento, o qual excita um corpo sonoro
criando uma “vida” espectromorfológica. Segundo ele, a noção de gesto como princípio de
formação sonora é consentido como a propulsão do avanço temporal na maneira de conduzir
um objetivo a outro, presentes na estrutura do movimento e expressos através das mudanças
das formas espectrais. É essa similaridade entre a direção do perfil sonoro e do gesto que
carrega o trecho musical de significados para quem ouve.
As metáforas do movimento e do desenvolvimento são formas apropriadas de
considerar a música eletroacústica, já que, segundo Smalley (1997), os conceitos tradicionais
de ritmo são inadequados para descrever os contornos do gesto eletroacústico e o movimento
interno da textura, os quais são expressos através da grande variedade de espectromorfologias.
Frequentemente, ao ouvir uma música, é possível se lembrar de movimentos externos a ela.
Ao definir essas lembranças, o ouvinte seleciona termos que realizam uma conexão com o
espaço real. Isso se dá porque, desde que o movimento e seu processo de desenvolvimento
possuam um contorno espectral, eles se tornam um conjunto neste espaço.
Agora é possível perceber como Smalley utiliza o movimento para fundamentar sua
percepção sonora e criar a sua teoria. Os parâmetros que se aplicam na direção da trajetória
podem ser observados através das metáforas do movimento. Elas se projetam no discurso
através da movimentação dos elementos sonoros e se estabelecem na posição em que o sujeito
que descreve se situa, ou seja, é possível perceber que os parâmetros utilizados como
classificação da trajetória sonora têm uma grande relação com a orientação segundo os
esquemas de imagem de Johnson (1987). Vamos observar alguns exemplos descritos pelo
próprio Smalley (1997): os movimentos e seus processos de desenvolvimento possuem
tendências direcionais que conduzem a nossa expectativa a resultados possíveis, elas são
guias úteis na atribuição da função estrutural. Por exemplo, se o movimento é unidirecional,
seu desenvolvimento pode ser ascendente, plano ou descendente. Se encontrarmos um
movimento lento e ascendente, criamos expectativa para algum resultado, ele poderia

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

continuar subindo, perdendo seu volume até que se perdesse, ou então ficar mais rico levando
a um ponto de impacto; poderia ser absorvido por outros eventos, mudar de direção se
tornando um movimento de parábola, ou alcançar um teto e se estabilizar. Sua continuidade
poderia ser ainda convergente ou divergente, ascendente ou descendente, acumulativa ou
dissipativa, conglomerativa ou difrativa.
Após as explanações desse artigo, ficam óbvias as relações que a teoria
espectromorfológica possui com os esquemas de imagem. Dessa maneira, fica claro que é
possível realizar futuros trabalhos mais detalhadas no que diz respeito às especificidades
dessa união. Nesse intuito, o amálgama dessas teorias, contribuiria para as discussões em
torno da compreensão do discurso da música eletroacústica. A justificativa da aplicação
dessas teorias ao repertório da música eletroacústica se dá porque ela possui uma ampla gama
de movimentos. Sua liberdade espectromorfológica permite uma extensa variedade de
atitudes em direção a movimentos contínuos e descontínuos, conjuntos e disjuntos, além de
uma incomparável elasticidade do fluxo temporal. Portanto, a música eletroacústica seria um
bom laboratório para o estudo do sentido musical à luz da cognição incorporada, porque esse
gênero musical apresenta uma coleção de gestos musicais ricos e variados.

Referências
Johnson, M. (1987). The Body in the Mind – The Bodily Basis of Meaning, Imagination, and
Reason. Chicago: University of Chicago Press.
Nogueira, M. (2003) O Imaginário Metafórico da Escuta. Semiosfera – Revista de
Comunicação e Cultura . Ano 3, nº 4 – 5 . Universidade Federal do Rio de Janeiro
Perez, M (2011). A Espectromorfologia como Discurso: Considerações acerca da Obra
Teórica de Denis Smalley. Maringá: Universidade Estadual de Maringá.
Sheets-Johnstone, M. (1999). The primacy of movement (expanded 2nd ed.).Oregon:
University of Oregon.
Smalley, D. (1986) Spectro-morphology and Structuring Processes, The Language of
Electroacoustic Music, ed. S.Emmerson, p. 61-93, Londres: Macmillan.
Smalley, D. (1994). Defining Timbre – Refining Timbre, Contemporary Music Review,
volume10, parte 2, p. 35-48, Harwood Academic Publishers.
Smalley, D. (1997). Spectromorphology: Explaining Sound-Shapes, Organised Sound, 2(2), p.
107-126, Cambridge University Press.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

A sílaba na fala e no canto e a questão da estabilidade:


um estudo preliminar 1

Beatriz Raposo de Medeiros


Universidade de São Paulo
biarm@usp.br

João Paulo Cabral


Trinity College Dublin
Rjpsr.cabral@gmail.com

Resumo: A questão levantada neste estudo é como distinguir a fala do canto, levando em conta dois
parâmetros acústicos como a duração da sílaba e a frequência fundamental (F0). A hipótese inicial é
de que haveria mais variabilidade na fala do que no canto, o qual apresentaria maior estabilidade na
realização dos parâmetros investigados. Trechos extraídos de Macunaíma de Mário de Andrade foram
produzidos como fala atuada e como canto por participantes femininas. Extraíram-se o F0 médio e a
duração de cada sílaba para análises quantitativas e comparativas. A hipótese não foi confirmada, a
partir do que conclui-se que a sílaba não é a melhor unidade para se verificar a variabilidade em
questão. Por outro lado, os resultados obtidos lançam luz sobre as interações entre fala e canto.
Palavras-chave: canto, fala, cognição musical.

The syllable in speech and singing and the stability issue: a preliminary study
Abstract: The issue raised in this study deals with the distinction between speech and singing, taking
into account two acoustical parameters, as syllable duration and fundamental frequency (F0). The
initial hypothesis is that there would be more variability in speech than in singing, which would
present greater stability in the performance of the investigated parameters. Extracts from Macunaíma
de Mário de Andrade were produced as acted speech and as singing by female participants. The mean
F0 and the duration of each syllable were extracted for quantitative and comparative analyzes. The
hypothesis was not confirmed, from which we conclude that the syllable is not the best unit to verify
the variability issue. On the other hand, results shed light on the interactions between speech and
singing.
Key-words: speech, singing, musical cognition

Introdução: objetivo e hipóteses

A problemática levantada neste estudo é que há porções tanto na fala como no canto, nas
quais a coexistência de suas características individuais pode ser percebida, o que sugere que
há uma gradação, e não necessariamente uma mudança abrupta na produção de fonação e de
outros aspectos da fala quando canto com texto é produzido. No entanto, é difícil capturar a
gradação em objetos tão complexos como o canto e a fala e, assim, para este estudo,
escolhemos níveis mais categóricos para analisar. O objetivo do presente trabalho é focar dois
aspectos acústicos da produção da fala e do canto que levam a uma resposta à pergunta

1 Este trabalho é financiado pela FAPESP, processo 2015/06283-0. O segundo autor é financiado pela Science
Foundation Ireland (Grant 13/RC/2106) e faz parte do ADAPT (www.adaptcentre.ie), em Trinity College
Dublin.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

específica: como distinguir a fala do canto, levando em conta dois parâmetros acústicos como
a duração da sílaba e a frequência fundamental (F0)? A hipótese inicial é de que para ambos
os parâmetros eleitos, a fala mostrará mais variabilidade e o canto, por sua vez, mostrará uma
menor variabilidade.
Esta hipótese mostrou-se exploratória e advém de estudos que indicam, com base em
seus resultados e observações, que a fala cantada apresentaria mais estabilidade ou
continuidade do que a fala falada, como os estudos de Deutsch e colegas (2011) e Kolinsky e
colegas (2009). Sobre as rápidas mudanças na fala comparadas às do canto, Deutsch e colegas
(2011) dizem o seguinte: “Speech consists of frequency glides that are often steep and of
rapid amplitude and frequency transitions. In contrast, song consists largely of discrete pitches
that are sustained over relatively long durations...” (p. 2245). Para Kolinsky e colegas (2009),
investigando os segmentos cantados, as vogais sustentam a continuidade da melodia e estão
integradas aos intervalos de alturas, o que faz com que consoantes sejam processadas com
maior independência da informação melódica. E por fim, é preciso apontar o trabalho
fundamental de Fujisaki (1983) que desvendou a dinâmica da frequência fundamental na fala
e no canto através de estudo acústico com importantes correspondências fisiológicas: na fala,
há uma queda espontânea de F0 e, no canto, ao contrário, elevações e quedas de F0 são
controlados a fim de se sustentar a nota musical durante um determinado espaço de tempo. O
controle em questão ocorre graças às propriedades mecânicas da laringe que viabilizam a
tensão necessária das pregas vocais para a produção da frequência de fonação.
Dado que a fala, bem como o canto constituem-se de sinal acústico, escolhemos dois
parâmetros acústicos comuns a ambos para observar seu comportamento: F0 e duração dos
segmentos, mais especificamente, sílabas. Levantamos a questão de que, obviamente, uma
canção inteira nunca será percebida como fala, e então consideramos que os fenômenos em
questão deveriam ser capturados em intervalos de tempo mais curtos. Assim, elegemos o nível
da sílaba para defender a hipótese de que F0 e os parâmetros de duração seriam menos
variáveis no canto do que na fala. Considerando a duração: (i) as sílabas teriam uma duração
mais longa e menos variável no canto do que na fala e considerando F0, (ii) a variação desse
parâmetro seria menor no canto do que de fala, na maioria das vezes.
Claramente, os dois itens que formam a hipótese deste artigo podem e devem ser
relativizados, uma vez que a duração na fala e no canto e o F0 na fala e no canto, não são
fenômenos categoricamente distintos.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

A ideia de estabilidade

A ideia principal de estabilidade e instabilidade na fala neste artigo está diretamente


relacionada à variação ao longo de um determinado intervalo de tempo. As mudanças no
tempo são intrínsecas ao fenômeno da fala que envolve movimentos articulatórios e sinal
acústico. As vogais tônicas são em geral mais longas e com uma trajetória de formantes mais
estável do que a das vogais átonas, apenas para dar um exemplo. No canto, as restrições
musicais como a métrica do ritmo e a afinação preveem interação entre eventos de tempo e de
frequência de fonação que são intrinsecamente mais estáveis ou, como afirma este estudo,
mostram mais estabilidade do que eventos de fala. Para uma abordagem de fonologia
dinamicista (Browman e Goldstein, 1992), a estabilidade está relacionada com um estado
mais estável da tarefa coordenada de articuladores da fala. É neste estado estável que o alvo
da tarefa dos articuladores é atingido e esse alvo corresponde à unidade fonológica.
Do ponto de vista da neurodinâmica, a estabilidade está relacionada aos padrões espaço-
temporais de atividade do sistema nervoso. Neste caso, o sistema nervoso é não-linear, o que
causa uma ressonância a eventos musicais percebidos e não uma mera resolução de problemas
relacionados com eventos musicais, como resolver uma sequência de acordes (Large, 2010).
É claro que a percepção desempenha um papel muito importante na teoria dinâmica do
funcionamento do sistema nervoso e sua resposta a alguns eventos sonoros é tal que aqueles
de frequência estável tornam-se mais salientes. É o que acontece com alguns tons preferidos
em uma escala musical. No entanto, está além do escopo deste artigo entrar em detalhes sobre
a relação entre neurônios e funcionamento auditivo dentro de um modelo oscilatório.
Ainda podemos relacionar a ideia de estabilidade à de repetição, bem como de duração
de eventos e previsibilidade. Tais elementos são encontrados em estruturas hierárquicas,
implicando em organização que prevê eventos de ordem alta encaixando outros de ordem
baixa. Este é o caso da organização temporal na música, uma vez que notas curtas podem ser
embutidas em intervalos temporais de notas mais longas, em uma determinada métrica.
Diante do exposto, podemos dizer que o conceito de estabilidade permeia várias
disciplinas que visam a explicar padrões de produção e principalmente padrões de percepção
de habilidades humanas, como a linguagem e a música.

O experimento

Os textos escolhidos para serem falados e cantados por seis participantes femininos foram as
de quatro canções que constituem versões cantadas de trechos da obra literária Macunaíma: o

71
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

herói sem nenhum caráter de Mário de Andrade. As canções foram compostas pela musicista
popular Iara Rennó e gravadas no disco compacto Macunaíma Ópera Tupi (MOT) lançado em
2008. Neste disco, as canções foram executadas, em sua maior parte, por uma cantora, a
própria compositora, e isso definiu a escolha de sujeitos femininos para este estudo.
O conjunto de textos oriundos da obra literária de Andrade adequou-se bem a nosso
propósito, pois representa versões faladas e cantadas com os mesmos enunciados linguísticos
e realizadas espontaneamente como arte. Este fato poupou o experimento de criar uma versão
cantada para um texto originalmente escrito, ou vice-versa, de ter-se que realizar o texto da
canção como fala.
Os títulos das canções são: Conversa, Jardineiro, Macunaíma e Valei-me. Para cada
canção foi criada uma partitura musical com a linha melódica, com a divisão rítmica com base
numa escuta cuidadosa do disco compacto MOT. De agora em diante, a palavra "canção" será
usada para se referir aos textos escolhidos, uma vez que a correspondência buscada entre a
fala e o canto originou-se a partir das canções, como já explicado.

Método: coleta, tratamento e mensuração dos dados

Três atrizes e três cantoras foram gravadas em uma cabine com tratamento acústico, equipada
com um microfone AKG e um gravador Boss. Instruções em uma tela de computador foram
dadas às atrizes para que elas pudessem produzir a fala atuada para os quatro textos das
canções. Em contato anterior, as atrizes relataram que não conheciam as versões cantadas dos
textos escolhidos. Esta foi uma solicitação dos pesquisadores para evitar possíveis
interferências de aspectos das canções na produção da fala. A fala atuada foi definida como
uma condição de fala a ser comparada com a condição de tempo livre do canto. Antes da
sessão de gravação, as cantoras foram solicitadas a responder um pequeno questionário, a fim
de garantir que aprenderiam as canções, tanto de oitiva como através da partitura. As cantoras
também receberam instruções em uma tela de computador antes de gravar. Todas as
participantes tiveram um tempo para treinamento para que pudessem se familiarizar com a
tarefa. Cada canção foi gravada pelo menos duas vezes por cada participante e cada sessão
durou cerca de duas horas.
Uma vez armazenados em um cartão SD, os dados foram convertidos de um formato
BRW com o software BR Series Wave Converter para um formato wav, fornecendo arquivos
sonoros longos que foram visualizados e ouvidos com o Praat versão 6.0.19. A melhor
execução de cada canção foi escolhida. Assim, havia quatro canções/textos proferidos por

72
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

dois conjuntos de três participantes. As variáveis que compõem o conjunto de dados são as
seguintes: 4 Canções; 25 Sentenças; ≈ 285 Sílabas; 1 Condição de fala (fala atuada); 1
Condição de canto (tempo livre); 3 Atrizes e 3 Cantoras.
Os textos das canções foram segmentados em sentenças com os seguintes critérios
linguísticos: uma sentença nominal ou verbal, cujo núcleo era complementado quando
necessário, formando uma oração completa, ou mesmo uma subordinada, desde que seu
núcleo estivesse complementado. Estes critérios permitiram sentenças com duração máxima
de 11 segundos. Posteriormente, as frases foram segmentadas em sílabas.
A segmentação e a rotulagem dos dados foram feitas utilizando-se textgrids do Praat. As
primeiras textgrids foram criadas apenas para dois dos sujeitos e usadas como referências para
um algoritmo de alinhamento de etiquetas do Matlab para obter as textgrids restantes
automaticamente. Posteriormente, essas textgrids foram revisadas manualmente.
As medidas de duração foram obtidas a partir de arquivos .lab contendo o tempo final
de cada sílaba, o que possibilitou calcular a diferença entre esses finais. A duração das
sentenças foi calculada a partir da soma de suas sílabas. Para obter-se a duração das canções,
somaram-se as sentenças, depois de eliminarem-se as pausas e as repetições. Os resultados
podem ser resumidos como segue:
Tabela 1: Durações em segundos da canção, da sentença e da sílaba na fala e no canto. Todas as
participantes confundidas em suas respectivas modalidades (fala e canto).
Conversa Jardineiro Macunaíma Valei-me
Fala Canto Fala Canto Fala Canto Fala Canto

Canção 11,2 16,1 13,1 21,4 14 38,2 12,1 23,4


Sentença 1,6 2,3 1,31 3 2,33 6,4 2 3,9
Sílaba 0,178 0,256 0,188 0,298 0,187 0,478 0,195 0,397

Como esperado, as sílabas são mais longas no canto, o que implica haver mais sílabas
por segundo na fala. A razão sílaba por segundo é de 2,9 no canto e 5,4 na fala. Isso tudo
merece discussão na seção final.
A extração de F0, ou pitch, foi feita com o Praat, usando dois scripts: um que calculava
o pitch médio de cada intervalo rotulado em um arquivo textgrid e outro que extraía os
valores de F0 calculados em uma janela temporal de 0.01 segundos, ao longo da sentença.
Assim, obtivemos o valor F0 médio por sílaba e muitos valores por sentença para cada
canção. A Tabela 2 apresenta o pitch médio por sílaba, já que esta é uma unidade que carrega
tanto uma informação musical, como uma informação linguística.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Tabela 2: Valores médios de F0 em Hertz das sílabas em cada canção.

Fala Canto

Canção
Conversa 214,5 258,7

Jardineiro 203,3 287,7


Macunaíma 193,4 241,2
Valei-me 210,3 278,4

Deve-se dizer que os valores médios de pitch do canto podem parecer reducionistas,
pois não representam, por exemplo, a tessitura de cada canção (Sol3 a Sol4 para Conversa,
Mi3 a La4 para Jardineiro; Fá3 a Fá4, para Macunaíma e Fá3 a Sol4 para Valei-me) e,
portanto, não parecem muito diferentes da frequência de fonação da fala. Esta questão será
discutida à luz de considerações sobre os objetos deste estudo, que como já foi dito,
constituem-se de fenômenos que não se diferenciam categoricamente.

Análises quantitativas: O PVI e a variância de pitch


Para verificar a variabilidade da duração, bem como para a variabilidade de F0, todas as
participantes foram confundidas e os valores médios utilizados foram aqueles obtidos no nível
da sílaba. A sílaba foi escolhida como o melhor segmento para se verificar a variabilidade
investigada, pois corresponde, na imensa maioria dos casos, à nota musical e assim é
considerada como com o segmento que transmite tanto a informação musical como a
informação linguística.
Utilizou-se o PVI normalizado (índice de variação por pares traduzido do inglês
pairwise variability index) para observar como a duração das sílabas varia tanto na fala como
no canto. Este índice é amplamente utilizado em estudos de ritmo linguístico e usa um
intervalo intervocálico como seus pares sucessivos (Grabe e Low, 2002). A equação PVI é a
m 1
seguinte: PV I =

dn dn+1 .
n=1

m 1
A equação PVI normalizada é: PVInor malised = ∑ d n d n+1 / (d n + d n+1)
n=1

Optamos por este índice após obter, em geral, maiores variâncias para a duração da
sílaba cantada, em comparação com a sílaba falada.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Na tabela 3, os resultados de fala e canto podem ser comparados. Os resultados brutos


de PVI mostraram maior variação na duração das sílabas cantadas, e os resultados de PVI
normalizados mostraram uma variação média ligeiramente maior nas sílabas faladas apenas
para uma canção, Valei-me.

Tabela 3: Variabilidade de duração das sílabas em milissegundos. Resultados brutos (br) e normalizados
(norm).
Conversa Jardineiro Macunaíma Valei-me
br norm br norm br norm br norm
Fala 76 205 85 218 81 206 84 205

Canto 137 263 173 244 268 264 147 189

Ainda que sejam as diferenças absolutas das médias normalizadas, menores do que as
diferenças das médias brutas, os resultados mostram maior variação da duração da sílaba no
canto, o que se opõe à hipótese investigada.
Para observar a variação de pitch intra-sílaba na fala e no canto, primeiramente, foram
eliminados os zeros, isto é, as sílabas ensurdecidas na fala e suas correspondentes no canto de
modo a obter-se o mesmo número de sílabas para fala e canto. Em seguida, calculou-se a
variância intra-sílaba de cada sílaba e depois a variância de cada amostra (944, fala e 2677,
canto), tendo-se aplicado um teste F, para o qual o valor de p foi igual a 0.00 (alfa a 0.05),
indicando diferença significativa entre as variâncias de pitch na fala e no canto.

Conclusão e próximos passos


Diante dos resultados obtidos tanto para a duração como para o pitch, não foi verificada a
hipótese da menor variação dos parâmetros de duração e F0 para o canto. Há dois aspectos a
serem discutidos brevemente aqui e que podem ser aprofundados futuramente em um artigo
estendido.
O primeiro aspecto é a integração do andamento e da métrica musicais, a partir do que é
possível prever a duração de cada nota musical. Sendo o andamento de cada canção
correspondente ao moderato, esperava-se que a maior parte das notas entoadas, colcheias que
alinhavam-se com as sílabas do texto, apresentassem uma duração média de 274,5
milissegundos2. Esse valor de duração está próximo aos valores médios das sílabas cantadas

2 Obtém-se este valor, levando-se em conta uma métrica binária e um andamento médio de 110 bpm, a partir do
qual calculam-se as batidas por segundo, valor que é divido por 1 para se obter a duração em segundos de uma
só batida.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

de duas das quatro canções investigadas, ao passo que os valores médios de duas outras estão
mais próximos de 500 ms e portanto representativos de notas mais longas, como a semínima
(ver Tabela 1 ). Pode-se considerar este fato uma interação importante entre canto e fala e que
explica parcialmente os resultados quantitativos relativos à hipótese de variação da duração da
sílaba, a qual não foi verificada. Diferente do esperado, a grande quantidade de sílabas-notas
correspondentes a colcheias não resulta em menor variação da duração silábica no canto em
comparação com a fala e é preciso, então, observar a participação das semínimas e mínimas
em termos duracionais. No entanto, o que é preciso ressaltar nesta conclusão é que a sílaba
cantada pode trazer elementos temporais da sílaba falada (por exemplo, alongamento das
consoantes fricativas) fazendo com que as sílabas idealmente iguais em duração, realizem-se
com durações variadas.
O segundo aspecto é o da tessitura das canções, que não excede uma oitava mais dois
tons e meio e o fato de que essa oitava se aproxima da tessitura de F0 da voz feminina (196 a
392 Hz). O compartilhamento de tessitura entre fala e canto é comum no canto popular e, por
isso, esperava-se que a fala não fosse tão diferente do canto em termos de amplitude. Este
fenômeno, porém, parece ter influenciado fenômenos de ordem menor, que ocorrem no
interior da sílaba. Sendo assim, cabe trazer à tona, em análise qualitativa, elementos tanto da
fala como do canto que influenciaram a grande variabilidade de pitch no nível da sílaba. Na
fala, como no canto, variações maiores de F0 podem ocorrer por efeitos microprosódicos;
erros do algoritmo que considera vários pontos máximos em porções totalmente desvozeadas
e presença de muitos pontos de F0 na porção vozeada da consoante. Exclusivamente no canto,
o glissando é um elemento que deve ter atenção especial no tocante à variação de F0 ao longo
da vogal.
Em suma, concluímos que a sílaba, a unidade escolhida para se verificar a variabilidade
na fala e no canto não foi adequada. Assim, não é possível defender que o canto apresenta
maior estabilidade que a fala nos parâmetros eleitos. Os próximos passos serão verificar a
variabilidade no nível do fone.

Referências
Browman, C. e L. Goldstein (1992) “Articulatory phonology: an overview”, in Phonetica, 49,
pp 155-180.
D. Deutsch, T. Henthorn, R. Lapidis (2011), “Illusory transformation from speech to song”
Journal of the Acoustic Society of America, 129, 4, pp 2245-2252.
Fujisaki, H. (1983) Dynamic characteristics of voice fundamental frequency in speech and
singing. The Production of Speech. P.F. MacNeilage, New York: Springer-Verlag, 39-55.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Grabe, E. & Low, E. L. (2002) Durational variability in speech and the rhythm class
hypothesis. In Gussenhoven, C. & Warner, N. (eds.) Papers in Laboratory Phonology 7,
Berlin, Mouton de Gruyter, 515-546.
R. Kolinsky, P. Lidji, I. Peretz, M. Besson, J. Morais Processing interactions between
phonology and melody: vowels sing but consonants speak , Cognition 112, pp 1- 20,
2009.
E. Large, “A dynamical systems approach to musical tonality”, R. Huys and V. Jirsa (Eds),
Non-linear dynamics in human behavior, SCI 328, pp 193-211, 2010.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Transcrição Musical da Prosódia da Fala


Alexsandro R. Meireles
Universidade Federal do Espírito Santo
meirelesalex@gmail.com

Antônio R. M. Simões
University of Kansas
asimoes@ku.edu

Beatriz Raposo de Medeiros


Universidade de São Paulo
biarm@usp.br

Resumo: Este estudo usa notação musical para descrever a prosódia da fala do português brasileiro,
espanhol mexicano e inglês americano. Através dessa pesquisa, estabelecemos as bases nas quais
expandiremos nosso trabalho futuro da metodologia à coleta e análise de dados para depois
fazermos observações iniciais sobre padrões prosódicos potencialmente significantes. A metodologia
adotada aqui nesse estudo exploratório pode ajudar a solucionar padrões imprevisíveis da prosódia
da fala, especialmente no que concerne a entonação e, consequentemente, nos levar à inovações dos
modelos prosódicos atuais.

Palavras-chave: melodia da fala, notação musical, prosódia da fala.


Musical Transcription of Speech Prosody
Abstract: This study uses musical notation to transcribe Brazilian Portuguese, Mexican Spanish,
and American English. Through this research we establish the basis on which to expand our future
work on speech prosody, from methodology to data collection and analyses, and then make initial
observations regarding potentially significant prosodic patterns. The methodology that we have
developed in this exploratory study may help solve unpredictable patterns of speech prosody,
especially in regards to intonation, and consequently lead to the improvement of current speech
prosody models.
Key-words: speech melody, musical notation, speech prosody.

1. Introdução
É amplamente conhecido pelos linguistas o fato de a fala ser composta por elementos
musicais como ritmo da fala, entonação e dinâmica da fala. A área da linguística que investiga
essa musicalidade é chamada de prosódia da fala. Recentemente, houve um crescente
interesse nesse campo e desde 2002 uma conferência especial sobre o tema, Speech Prosody
(http://isle.illinois.edu/sprosig/sp2002/), tem sido organizada para investigar profundamente
todas as áreas interdisciplinares que trabalham com prosódia. Embora alguns aspectos
musicais estejam presentes na fala, raros pesquisadores utilizaram notação musical para
representar a fala. Por outro lado, alguns compositores famosos como Beethoven,
Schoenberg, Reich e Janáček representaram a fala usando pautas musicais tradicionais.
No prefácio de Pierrot Lunaire (1912) (http://www.schoenberg.at/index.php

/en/onlineshop/product/212-pierrot-lunaire-companion-paperback), Arnold Schoenberg

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

informou aos músicos que as notas músicas na partitura não deveriam ser cantadas. Os
cantores, portanto, deveriam interpretá-las como uma representação da fala, i.e., uma
“melodia da fala”. O ritmo deveria ser “como se você estivesse cantando”, mas a voz deveria
variar o tom continuamente com subidas e descidas. O compositor, no entanto, tinha ciência
de que havia diferença entre a fala comum e o tipo de canto envolvido em uma forma musical.
A figura 1 mostra um excerto dessa peça. É claro, pelas palavras do próprio compositor, que
ele pretendia representar a fala com notação musical, mas não como uma representação
fidedigna desta, pois “in no way should one strive for realistic, natural speech”. Outro fato
relevante para a música de Schoenberg é o uso da atonalidade, a qual é muito apropriada no
canto, pois as línguas não possuem uma tonalidade específica para guiar suas melodias.

Figura 1. Excerto da fala-melodia de Schoenberg (representada por um sinal “x” na nota) como vista em Pierrot
Lunaire op. 21. A cruz representa as notas da fala. Disponível gratuitamente em http://imslp.org/wiki/
Pierrot_Lunaire,_Op.21_(Schoenberg,_Arnold).

A pesquisa de Rapoport (Rapoport, 2004, 2016) investigou as origens da notação de


Schoenberg. De acordo com o autor, o ritmo musical foi baseado na estrutura silábica do texto
em alemão escrito por Otto Erich Hartleben, e a melodia da fala (Sprechmelodie) foi baseada
nos padrões entonacionais do alemão. A fim de provar essa hipótese, as vozes de 2 falantes
alemães (1 masculino nascido em 1920 e 1 feminino jovem) foram gravados. As análises
vocais dos contornos entonacionais da fala nos textos lidos apresentam evidência
experimental e elucidam a origem das melodias da fala (Sprechmelodies) de Schoenberg pela
entonação do alemão falado.
Embora houvesse interesse recente em simular a fala usando notação musical, a fala
possui uma longa tradição em influenciar a escrita musical. O canto gregoriano, por exemplo,
não possuía notação rítmica em seu início, a qual era baseada simplesmente no ritmo oratório
da fala (Sherman, 1997). Além disso, Harnoncourt (1973: 225) ilustrou a importância dada
pelos teoristas da música barroca à afinidade entre fala e música. Essa influência da fala na
música continuou ao longo dos séculos. Mahler comentou, por exemplo, que “with me, the
melody always grows out of the words? The words, so to speak, generate the melody – never
vice versa. It is the same with Beethoven and Wagner. An this is the only way to achieve an
indissoluble unity of word and note” (Bauer-Lechner, 1980, p. 50).

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

A pesquisa de Deutsch (Deutsch et al., 2011; Tierney et al., 2012) apresenta explicações
de como a fala pode resultar em música. A pesquisadora e suas colegas (Deutsch et al., 2011)
descobriram que quando uma sentença é repetida continuamente, ela é interpretada
perceptualmente como música em vez de fala. Em outro experimento, Tierney et al. (2012)
encontraram evidências neurológicas para essa ilusão perceptual. De acordo com esse estudo,
“a network of brain regions associated with the perception and production of pitch sequences
showed greater response when subjects listened to the song stimuli” (p. 5).
A ilusão musical na fala pode ser a base na qual muitos compositores fundamentam suas
músicas. Há muitas músicas pop que usam escala musical padrão para representar a fala1,
como Jazz Discharge Party Hats (1983) de Frank Zappa, So Happy (1984) de Steve Vai e
Yankee Rose (1986) de Steve Vai. Vai é bastante conhecido por ser um transcritor virtuoso,
como pode ser visto em So happy, uma música em que o longo texto falado é imitado por sua
guitarra, similar ao que acontece na música de Zappa supra citada. Em Yankee Rose, temos
um exemplo de como o guitarrista fala com o vocalista usando a mecânica da guitarra. A
figura 2 mostra como a guitarra simula a sentença “She’s beautiful” com slides e o uso da
alavanca (whammy bar). Lembramos, como afirmado por Deutsch et al. (2011: 2245), que
“speech consists of frequency glides that are often steep, and of rapid amplitude and
frequency transitions.” Steve Vai parece ter consciência dessa característica da fala, pois ele
utiliza essas dinâmicas para simular a fala.

Figura 2: A guitarra de Steve Vai simulando a sentença “She’s beautiful”.

2. Transcrição sistemática da fala com notação musical


2.1. A teoria das melodias da fala de Janáček
Leoš Janáček (1854-1928) foi um compositor tcheco que ficou maravilhado com as melodias
presentes na fala. De acordo com Fiehler (2013), ele desenvolveu sua “Teoria das Melodias da
Fala” à época em que estava escrevendo sua ópera Jenůfa (1903). O compositor disse que
“speech melodies by stealthily listening to those passing by and how he observed their
expressions and movements, as well as the surroundings. All of that was reflected in the

1
Essas músicas podem ser facilmente encontradas no YouTube.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

melodic ideas he wrote down” (Fiehler, 2013, p. 41). No mesmo texto, o autor afirma que o
compositor pretendia representar fielmente a fala. Por essa razão, como acontece com a fala,
“his melodic fragment are unstructured, phrased unconventionally, unconstrained by key or
meter” (Fiehler, 2013, p. 42).
É importante ressaltar que a teoria de Janáček tinha como um de seus objetivos criar um
estilo musical autenticamente tcheco. No entanto, sabemos que a estrutura musical, em geral,
é muito mais regular do que a estrutura prosódica da fala. Assim, o uso da fala estrita como
meios de composição sempre foi um grande problema para os compositores. De acordo com
Tyrrel (1970:793), Janáček relatou em 1916 que “tune is created by the word, the whole
melody depends thus upon the sentence, it couldn't be otherwise”. No entanto, embora o
compositor negasse que encaixava palavras a uma melodia pré-existente, Tyrrel (1970) mostra
que ele frequentemente o fez quando reescrevia suas peças.
Apesar disso, como mostrado por Fiehler (2013), Janáček disse que o quebra-cabeça da
correspondência estrita entre fala e música, “could be solved by using the contours and
rhythms of spontaneous vernacular expression as the ultimate source” (p.43). No entanto, essa
questão continua sendo um problema não resolvido para os compositores. Como exemplo,
Fiehler (2013) comentou que o compositor Alban Berg teve tanto problema ao compor sua
ópera Wozzeck que “decided to use forms from absolute music to give shape to individual
scenes” (p.43).
Embora a teoria de Janáček não seja muito instrutiva em como se poderia transcrever as
melodias de fala, reconhecemos que ele tentou desenvolver um método bastante científico
com essa finalidade. Para reforçar essa perspectiva, mencionamos que ele “included the exact
concrete circumstances of the speech melody” (Vainiomäki, 2012, p. 170), e anotou a
melodia da fala como toda informação necessária para seu registo, como o ritmo, tempo,
dinâmica e agógica (Vainiomäki, 2012, p. 171).
Vainiomäki (2012) mostra um exemplo da aplicação à música de uma das melodias
registradas por Janáček. Nesse trecho, o compositor capturou o “disappointment of a young
lady at the station in Brno” (p. 200). Na clave de sol, temos a melodia transcrita da fala e na
clave de fá temos a harmonia criada para a melodia da fala.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Figura 3. Exemplo de Janáček de uma música baseada na melodia da fala.

2.2. Os métodos sobre a melodia e medida da fala de Joshua Steele (1775)


A ideia de se transcrever a fala usando notação musical vem mesmo antes da época de
Janáček. Em 1775, Joshua Steele escreveu o livro “An essay towards establishing the melody
and measure of speech to be expressed and perpetuated by peculiar symbols” (Steele, 1775).
Embora não tivesse as ferramentas instrumentais modernas para ajudá-lo em sua transcrição,
ele desenvolveu um método peculiar de notação musical da fala.
De acordo com Steele (1775), até mesmo homens instruídos não conseguem perceber
“rapid slides of the voice, upwards and downwards, in common speech” (p. 4). No entanto,
ele considerava que se alguém desenvolvesse um método consistente de transcrição da
“modulation of the melody of speech”, “even the vulgar may be taught to know what the
learned can now scarce comprehend” (p. 5). Diferentemente de Janáček, contudo, Steele
estava mais interessado no lado linguístico da fala.
Esse estudo tem um grande ponto em comum com nosso artigo, pois ele refere-se à
ideia de que a fala seria melhor representada por uma escala em quartos de tons. Essa escala é
composta por 24 tons da seguinte forma: Dó, Dó (1/4 de tom acima), Dó#, Dó# (1/4), Ré, Ré
(1/4), Ré#, Ré# (1/4), Mi, Mi (1/4), Fá, Fá(1/4), Fá#, Fá# (1/4), Sol, Sol(1/4), Sol#, Sol# (1/4),
Lá, Lá(1/4), Lá#, Lá# (1/4), Si, Si(1/4). A figura 4 representa a escala de quartos de tons usada
por Steele. Em sua transcrição, ele usou ‘x’ para representar o aumento de ¼ de tom na
respectiva nota. Assim, por exemplo, G(1/4) possui 1 ‘x’; G#, 2 ‘x’s sobrepostos; e G#(1/4), 3
‘x’s sobrepostos.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Figura 4. A representação da fala de Steele com uma escala em quartos de tons.

A transcrição de Steele parece uma mistura de curvas de frequência fundamental,


notação musical e outras notações prosódicas. Sua representação musical é, pois, muito mais
representativa da prosódia da fala do que a de Janáček. De acordo com Steele (1775), a
representação tradicional da música não é suficiente para representar a fala. Ele acrescenta,
por exemplo, símbolos como / e \ para representar “how many quarter tones the voice is to
slide” (p. 7). Esses slides são chamados de “accents of notes of melody” (p. 7).
Steele (1775:24) resume seu modelo para transcrever a fala. De acordo com ele, a fala
consiste de melodias por slides, e o ritmo deve ser medido com quantidade (longo e curto) e
cadência (leve e pesado). Outro símbolo usado pelo pesquisador foi ênfase ou cadência
(pesada, leve, mais leve). Um exemplo de cadência está na figura 5. Observe os símbolos
acima de “not to be” que representam consecutivamente as cadências “pesada”, “leve” e
“mais leve”.

Figura 5: Representação de uma transcrição da fala de Steele (1775, p. 13).

3. Metodologia científica para transcrever a fala usando notação musical


Em Simões e Meireles (2016), começamos a desenvolver um programa de pesquisa para
transcrever a prosódia da fala usando notação musical. As transcrições do português

83
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

brasileiro, espanhol mexicano e inglês americano foram feitas automaticamente com os


programas Ableton Live 9 Suite e, posteriormente, anotadas no Finale 2011. Depois de termos
feito essas transcrições através da conversão wav para MIDI, verificamos que essas
transcrições não eram muito precisas2. Por essa razão, desenvolvemos um método mais
sofisticado de transcrição baseado no sinal acústico3.
Devido às limitações dos vários programas de conversão para MIDI que utilizamos,
podíamos apenas transcrever a fala com uma escala de tradicional de 12 tons. No entanto,
através das medidas realizadas das frequências da fala, notamos que, na maior parte do tempo,
as freqüências das sílabas não correspondiam exatamente às frequências da escala musical
temperada. Por essa razão, pensamos em expandir essa escala para incluir intervalos menores
do que o semitom. Num primeiro momento pensamos em usar uma escala de oitavos de tons,
mas, como divisões menores do que o quarto de tom são muito difíceis para ouvintes (mesmo
músicos treinados) perceberem, escolhemos usar uma escala em quartos de tons. Essa escala é
usada, por exemplo, na música árabe e é também conhecida por guitarristas. Nossa escala,
pois, consiste de 24 tons espaçados igualmente. Um exemplo dessa transcrição pode ser vista
na figura 6.

Figura 6. Exemplo de uma transcrição em quartos de tons de um trecho do Soneto de Fidelidade de Vinícius de
Moraes lido por uma informante brasileira feminina.

4. Discussão e considerações finais


Argumentamos nesse artigo que a notação musical é um sistema de transcrição que pode
ajudar a resolver muitos dos problemas que encontramos com sistemas de transcrição para a
prosódia da fala nas últimas décadas. Uma das vantagens da notação musical é que ela se
aplica a todas as línguas, diferentemente do que vemos com os grandes esforços para criar
sistemas de transcrições prosódicas. Estudantes de linguística e aqueles interessados em

2
Informamos que vários outros programas foram usados, como Melodyne, Cubase, Logic Pro, SonicVisualizer e
Tony, porém nenhum desses programas transcrevia bem os dados da fala e, além disso, não havia possibilidade
de transcrição em quartos de tom.

3
Não descrevemos detalhamente os procedimentos metodológicos devido ao limite de páginas do artigo.

84
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

prosódia da fala podem se inscrever em aulas de teoria para aprender a sofisticação e


eficiência da notação musical.
Esse estudo é fruto dos passos que nós autores estamos seguindo para usar a notação
musical, a fim de entender como a prosódia da fala funciona. Foi necessário caminharmos por
essas explorações iniciais para estabelecermos um objetivo de longo termo para o uso da
notação musical em nossa pesquisa sobre a prosódia da fala. Tendo conquistado nossos
objetivos iniciais, nosso próximo passo é aumentar o número de falantes a serem gravados,
bem como o número de línguas a serem analisadas.
A notação musical é um meio excelente para entendermos e compararmos a prosódia da
fala entre as línguas. O uso da transcrição musical pode intimidar pesquisadores que não são
músicos no início, mas os sistemas atuais de notação musical podem eliminar essa
intimidação. Relacionamo-nos muito mais facilmente com a notação musical da fala do que
com a música, porque somos mais acostumados com a fala, principalmente em nossa língua
materna.

Referências
Bauer-Lechner, N. (1980). Recollections of Gustav Mahler. English translation, Dika Newlin,
1923, p.50. Faber Music. London: Faber & Faber, 1980.
Deutsch, D., Henthorn, T., and Lapidis, R. (2011). Illusory transformation from speech to
song. Journal of the Acoustical Society of America, 2011, 129, 2245-2252.
Fiehler, J. (2013). The Search for Truth: Speech Melody in the Emergence of Janáček’s
Mature Style. In: Harmonia: Leoš Janáček: Life, Work, and Contribution. The Journal of
the Graduate Association of Musicologists and Theorists at the University of North Texas,
Special Issue, May 2013.
Harnoncourt, Nikolaus von (1973). Das quasi Wort-Ton-Verhältnis in der instrumentalen
Barockmusik. In: Colloquium Music and Word. Musik und Wort, arranged and edited by
Rudolf Pečman. Colloquia on the history and theory of music at the International Musical
Festival in Brno 1969. Volume 4, 225–228.
Rapoport, E. (2004). Schoenberg – Hartleben’s Pierrot Lunaire: Speech – Poem – Melody –
Vocal Performance. J. New Music Research 33: 71-111.
Rapoport, E. (2016) “On the Origins of Schoenberg’s Sprechgesang in Pierrot Lunaire.” Min-
Ad: Israel Studies in Musicology Online 2 (2016) at http://www.biu.ac.il/HU/mu/min-ad/
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Simões, A. R., Meireles, A. R. (2016). The Rhythms of Speech in Musical Notation:
Comparative Study of American English, Mexican Spanish, and Brazilian Portuguese. In:
Proceedings of the 8th International Conference on Speech Prosody, Boston, USA, 2016.
Sherman, B. Inside Early Music: Conversations with Performers. New York : Oxford
University Press, 1997.
Steele, J. (1775). An essay towards establishing the melody and measure of speech, to be
expressed and perpetuated by peculiar symbols. London: Boyer and Nichols. 2nd. Edition
1779, Prosodia Rationalis. London: Nichols.
Tierney, A., Dick, F., Deutsch, D., and Sereno, M. (2012). Speech versus song: Multiple pitch-

85
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

sensitive areas revealed by a naturally occurring musical illusion. Cerebral Córtex.


Tyrrell, J. (1970). Janáček and the Speech-Melody Myth, in The Musical Times, Musical
Times Publications Ltd., Vol. 111, No. 1530 (Aug., 1970), pp. 793-796. http://
www.jstor.org/stable/955301.
Vainiomäki, T. (2012). The Musical Realism of Leoš Janáček – From Speech Melodies to a
Theory of Composition, Ph.D. dissertation, Helsinki, Finland, University of Helsinki,
Faculty of Arts, 356 pages. https://helda.helsinki.fi/bitstream/handle/10138/36087/
themusic.pdf?sequence. Last Visited in October 2016.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Cognição Musical e Saúde

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Proposta de um Aplicativo na Hipersensibilidade Sonora no Autismo

Débora Line Gomes


Universidade Federal de Minas Gerais
decamus@gmail.com


Cybelle Maria Veiga Loureiro


Universidade Federal de Minas Gerais
cybelle@musica.ufmg.br

Resumo: Após estudo da Hipersensibilidade Sonora objetivamos criar um instrumento de atividade digital
especificamente para observar os comportamentos em indivíduos portadores do Transtorno do Espectro do
Autismo (TEA) expostos aos sons propostos. Trata-se de uma pesquisa exploratória, tendo como sujeitos
crianças, idade mínima de 5 anos, diagnosticados com TEA, submetidos ao método da Escala de Avaliação de
Traços Autísticos (ATA), com expectativa de modificar comportamentos corriqueiros.
Palavras-chave: hipersensibilidade sonora, hipersensibilidade auditiva, transtorno do neurodesenvolvimento,
transtorno do espectro do autismo.


Proposal of an App in Hypersensitivity to Sounds



Abstract: After a study of Sound Hypersensitivity we aimed to create a digital activity instrument specifically
to observe the behavior of individuals with Autism Spectrum Disorder (ASD), exposed to the proposed
sounds. This is an exploratory study, having as subjects children, minimum age of 5 years, diagnosed with
ASD, submitted to the method of the Scale of Assessment of Autistic Traits (ATA), with the expectation of
modifying common behaviors
Keywords: hypersensitivity to sounds, neurodevelopmental disorders, hypersensitivity acoustic, autism
spectrum disorder.

Introdução
Essa pesquisa é parte do projeto de Mestrado, da autora, aprovado Programa de Pós-Graduação
da Escola de Música da UFMG, na linha de pesquisa de Sonologia. Este projeto aguarda
aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa (COEPE) da UFMG.
A audição humana ultrapassa o requisito de sobrevivência, é essencial para a comunicação
e desenvolvimento artístico, evidenciando sentimentos e sensações através dos sons, da música,
artes visuais e audiovisuais. A audição é fundamental para a comunicação, bem como para o
desenvolvimento da fala, pois só existe comunicabilidade se a emissão e a recepção forem
efetivas (Lent, 2002). Esse processo complexo foi estudado por Vitto e Feres (2005), relatando
casos de disfunção de linguagem e comunicação devido à perda auditiva, evidenciando a
dificuldade de diagnóstico em crianças não falantes. São encontrados na literatura os termos
Hipersensibilidade Auditiva, Audiosensibilidade, Fonofobia, Hiperacusia e Redução à
Tolerância para Sons. Esses termos, até certo modo, são considerados sinônimos. A pesquisa de

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Gomes (2008) destaca que Hiperacusia (hiper=excesso, akousis=audição) é mais usado, porém
não o mais adequado. Outra autora que explorou o tema foi Aita (2001), elucidando a
Hiperacusia como uma desordem da sensação de intensidade caracterizada pela queixa de
hipersensibilidade aos sons do dia-a-dia. Gonçalves e Tochetto (2005) alongam essa compreensão
atentando aos sons do cotidiano, que para a maioria das pessoas são toleráveis, para o
hiperacústico são demasiadamente intensos. Nesse sentido, torna-se um sintoma descrito pelo
paciente. Usaremos em nosso texto o termo Hipersensibilidade Sonora, porém nossa busca pelo
tema engloba também Hiperacusia. O autor Hazell (2002) descreve alguns componentes que
podem contribuir com a sensibilidade anormal manifesta nesses indivíduos. Uma delas é a
Hiperacusia, uma disfunção no processamento do som no Sistema Nervoso Central, em que a
cóclea é perfeitamente normal nos pacientes que se queixam de irritação excessiva a
determinados sons e níveis comuns de ruídos. Isso também pode ocorrer em pessoas com algum
tipo de perda auditiva. Ressalta que indivíduos com Hiperacusia, muitas vezes, podem apresentar
Misofonia, que é a aversão em ser exposto a um certo som, pela crença absoluta, que este barulho
danificará seu ouvido. Casos em que a aversão é muito intensa, pode-se chamar de Fonofobia, ou
seja, medo do som. Lembra também que os sons referidos podem ser do nosso cotidiano, como
buzina de carro, sons da cozinha, discurso alto e que, em nenhuma circunstância, podem ser
considerados prejudiciais ou danosos ao aparelho auditivo. Além disso, observa que em
Misofonia, os sons tendem ao desconforto com base em significados ou associações e que sons
apreciados como música, são tolerados em níveis até mais elevados. Na prática, a maioria das
pessoas com Hipersensibilidade ao Som ambiental têm Hiperacusia e Fonofobia
simultaneamente, todavia em proporções variadas. No tratamento é importante diagnosticar quais
conjunturas estão presentes e qual é a dominante. Prosseguindo com o raciocínio de Hazell
(2002), outro componente capaz de contribuir com a Hipersensibilidade aos Sons é o
Recrutamento. Ele esclarece que o Recrutamento é uma redução nos elementos neurais na orelha
interna (células ciliadas) de forma que uma mudança pequena na intensidade do estímulo produz
uma mudança maior na resposta da orelha interna. Sendo assim, mais fibras nervosas serão
ligadas ou "recrutadas" para um estímulo sonoro correspondente, como um instrumento musical.
Neste contexto, a perda auditiva sensorial e incapacidade de ouvir sons “silenciosos” (entre 0 a
20 dB), pode ser associada à intolerância paradoxal para sons altos em consequência ao
Recrutamento. Uma orelha com Recrutamento pode muito bem ser incapaz de ouvir sons baixos,

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abaixo de 50dB, particularmente de alta frequência, mas reconhecer todos os sons acima de 80dB
não só de modo desconfortável, mas susceptível de produzir distorção. Com relação às patologias
associadas a Hipersensibilidade Sonora, Gonçalves e Tochetto (2005) descrevem quatro
prováveis etiologias. A primeira é a condição clínica envolvendo o Sistema Auditivo Periférico e
definidas como Paralisia de Bell, Estapedectomia, Síndrome de Ramsay Hunt, Recrutamento e
Perda Auditiva Induzida por Ruído. A segunda condição é referente ao Sistema Nervoso e citam
Enxaqueca, Depressão, Traumatismos Cranianos Leves, Síndrome de Williams, Distúrbio de
Aprendizagem e Gagueira e Zumbido. A terceira etiologia é relativa à doença hormonal e
infecciosa apontando Doença de Addison e Doença de Lyme. Os autores lembram que existem
relatos de causas desconhecidas, efetivando-se como item quatro da pesquisa. Hazell (2002)
acrescenta o exemplo quase universal do som criado por riscar o giz em um quadro, esclarecendo
que nossa percepção de intensidade não é dada somente pela força do som que chega ao ouvido.
Para ele alguns sons se tornam altos, intrusivos e desagradáveis pelo significado adquirido ou
associação criada. O som do giz na ardósia danificará às orelhas? Ou o som da água gotejando no
banheiro perturbará o sono? Essas ilustrações podem banalizar a patologia, de forma a todos
pensarmos que de algum modo somos hiperacústicos, porém vale lembrar que as reações perante
esses sons tornam-se hipersensíveis, iniciam num medo irracional e transforma-se numa crença
absoluta, trazendo sofrimento. Menciona também casos de pacientes com absoluta convicção de
que suas vidas são arruinadas pelo ruído das fábricas próximas, dos geradores ou dos sons de
baixa frequência transmitidos através da terra, os quais apenas eles podem ouvir e as demais
pessoas são incapazes de perceber. O autor ainda traz o conceito de “Correspondencia de
Padrões” e a descreve como capacidade que o cérebro tem em detectar sons reduzidos num
ambiente repleto de outros sons, como por exemplo, identificar alguém chamando o seu nome
numa sala cheia. E explica, se forte, a “Correspondencia de Padrões” resulta em uma percepção
sonora alta e intrusiva e se fraca a percepção sonora resultante é proporcionalmente fraca. Esses
sons fracos se transformam em percepções intrusivas e desagradáveis muito altas que se tornam
constantemente audíveis, quer queiramos quer não. Quem orienta a correspondência de padrões e
a consequente percepção sonora é o sistema límbico, responsável pelos comportamentos
instintivos, pela emoção e aprendizagem (Hazell, 2002).
Para entender ainda mais a Hipersensibilidade Sonora, recorremos a tabela de poluição
sonora, relacionando a intensidade em dBs a ambientes corriqueiros (Tabela 1) do autor Lent

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(2002). A partir desse dado podemos ter uma ideia geral do nível de desconforto das pessoas que
sofrem com a hipersensibilidade sonora. Nos estudos de Gonçalves e Tochetto (2005) há uma
abordagem clara quanto ao limiar de desconforto dos hiperacústicos que em alguns casos
movimenta-se em torno de 40 e 50 dBs, mas a presença da patologia é detectada quando o
desconforto é menor que 90 dBs. Os autores apresentam ainda uma tabela de classificação da
hiperacusia quanto ao grau de severidade (Tabela 2).

Para o tratamento, Hazell (2002) orienta treinamento auditivo onde a exposição ao sons
ambientais ao paciente é realizado gradualmente ao invés de evita-los, sustenta que é um
processo lento, mas definitivo e que, o período necessário para obtenção de resultados positivos
depende da severidade da patologia sugerindo um período de 2 meses para mudanças notórias. É
essencial a busca pelo tratamento e a não minimização dos sintomas, que muitas vezes são
sensoriais e até traumáticos. Segundo Malcore (1999), quando a hiperacusia se manifesta de
forma repentina, muitos entram em um período de crise profunda, com depressão severa. Estas
pessoas se sentem tremendamente isoladas e não imaginam como é possível continuar
convivendo com o barulho (Bassanello, 2000).
Em nosso estudo focalizamos a Hipersensibilidade Sonora no Transtorno do Espectro do
Autismo (TEA). O TEA é parte da população denominada Transtorno do Neurodesenvolvimento
que se caracteriza por déficits que variam desde limitações muito específicas na aprendizagem ou
no controle de funções executivas até prejuízos globais em habilidades sociais ou de inteligência

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(D. L. Gomes, André, & Loureiro, 2016). Além dessas, um fenômeno nos chamou a atenção em
especial, consiste na disfunção da Hipersensibilidade Sonora, que muitas pessoas dessa
população possuem (E. Gomes, Pedroso, & Wagner, 2008b), (Gonçalves & Tochetto, 2005). Esse
assunto é pouco estudado, mas que revelou-se peça de análise em países diferentes como
Inglaterra (Hazell, 2002), EUA (Siddons, n.d.), Portugal (Fernandes, 2014) e Brasil (E. Gomes,
Pedroso, & Wagner, 2008a). Muitos desses estudos são referentes a qualidade de vida dos que
sofrem com Hipersensibilidade Sonora e quais sons específicos provocam esse sintoma (Hazell,
2002), (Gomes 2008), (Gonçalves & Tochetto, 2005). Neste grupo destaca-se, na literatura, o
Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) como a população que mais se enquadra no
diagnóstico de Hipersensibilidade Sonora, que de acordo com Gomes (2008), deva ser pela
“demonstração comportamental incisiva como tapar os ouvidos quando um som incomoda, ou
agitar-se e desorganizar-se pelo mesmo motivo ou ainda demonstrar expressão/sensação de dor
ou medo”. No tocante à patologia, o DSM-5 descreve que o TEA caracteriza-se por déficits
persistentes na comunicação social e na interação social em múltiplos contextos, incluindo
déficits na reciprocidade social, em comportamentos não verbais de comunicação usados para
interação social e em habilidades para desenvolver, manter e compreender relacionamentos.
Além dos déficits na comunicação social, o diagnóstico do TEA requer a presença de padrões
restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades. É considerando pela a
American Psychiatric Association (2013), que os sintomas mudam com o desenvolvimento. Os
critérios diagnósticos preenchidos com base em informações retrospectivas, podem ser
mascarados com mecanismos compensatórios. A Associação ainda estabelece que indivíduos com
um diagnóstico do DSM-IV bem estabelecido de Transtorno Autista, Transtorno de Asperger ou
Transtorno Global do Desenvolvimento sem outra especificação, devem receber o diagnóstico de
TEA.
Assumpção e colegas (1999) propõem o uso da Escala de Avaliação de Traços Autísticos
(ATA) que tem função de avaliar o perfil conductual da criança, embasada nos diferentes aspectos
diagnósticos. A escala lista sintomas que nos permite mensurar as condutas apresentadas de
maneira a se estabelecer um diagnóstico de maior confiabilidade para avaliação de aspectos
específicos do comportamento. O autor levanta 23 comportamentos autísticos baseados nas
descrições do Manual de Diagnóstico DSM-IV e anteriores, dos quais destacamos: dificuldade
na interação social, falta de contato visual e atenção, exploração dos objetos, alteração de

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linguagem e comunicação, movimentos estereotipados e repetitivos. Utilizar essa escala pode ser
a garantia que indivíduos portadores do TEA sofram também com a Hipersensibilidade Sonora,
levando em consideração as dificuldades citadas acima, pois não é regra que todo autista tenha
Hipersensibilidade Auditiva e talvez, a ATA nos garanta que o indivíduo selecionado realmente
manifesta comportamentos de irritabilidade aos sons, tapando o ouvido, ou agitando-se,
desorganizando ou ainda demonstrando expressão/sensação de dor ou medo. Baseado nos
comportamentos repetitivos manifestos, buscaremos propostas multisensoriais para que, através
de um jogo, as inquietações sonoras produzidas pelo aplicativo sejam uma forma de
dessensibilizarão mediante exposição aos mesmos.

Objetivo
Criar um aplicativo com atividades voltadas para a Hipersensibilidade Auditiva no Autismo com
o objetivo de modificar comportamentos corriqueiros como irritabilidade, desorganização, tapar
os ouvidos e contato visual com o objeto sonoro.

Metodologia
Pesquisa de caráter exploratório que busca imergir no tema, identificar limitações na população
de crianças de 5 anos, com TEA e submetidas a ATA, pontuá-las e rastrear possibilidades de
tratamento e educação. Como perspectivas futuras, propomos analisar tecnologias aplicáveis e
inovações para então elaborar materiais tecnológicos tendo como uma possível referência a área
da Engenharia, Ciências da Computação e Desenvolvimento de Games que acrescentem, tanto
melhoria na qualidade de vida, quanto na produção literária. Nesse sentido, podemos citar o
software Auti-Sim, concebido na Hackathon Health Tech, uma maratona que reúne anualmente
em todo mundo desenvolvedores, programadores, designers, profissionais da saúde e
empreendedores, com o objetivo de desenvolver soluções em tecnologia na área de saúde.
Participantes: Crianças com Autismo leve e/ou moderado (Loureiro, 2006, p. 36), diagnosticados
com Hipersensibilidade Sonora, de ambos os sexos e com idade mínima de 5 anos. Definimos
essa idade tendo como referencia o desenvolvimento intelectual apresente em manifestações de
consciência corporal e coordenação motora (Loureiro, 2006, p. 60). Critério de Inclusão:
Crianças diagnosticadas com TEA, leve e/ou moderado. Critério de Exclusão: Outras populações

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que possuem Transtorno do Neurodesenvolvimento mas que não possuam TEA. Instrumentos:
Será realizada uma Pré-Produção em telas de diagramas tendo como instrumento o celular ,
movimento de interação de apenas 1 jogador de cada vez, construção em fases que incluam
diferentes etapas sucessivas, função touch screen. Uma segunda opção seria de executar o jogo
em computador, tendo gráficos em 2D e simplicidade na navegação. Para Protótipo escolhemos
o desenvolvedor Unity 3D , e em Teste-alfa, será necessária avaliação técnica antes de incluir o
aplicativo em sessões de atividades práticas, só assim, depois de garantir as funcionalidades
técnicas na população avaliada, é que poderemos partir para Fase de Teste-beta que deve
apresentar estabilidade técnica, eliminar os erros e garantir as sugestões relatadas (Neto & Santos,
2012).

Abaixo estão divididas em 6 telas storyboards que desenvolvemos para demonstrar as ações
que envolvem o joguinho de estourar balões. O objetivo da atividade é colocar o dedo na tela do
celular, mirar nos balões que caem de cima para baixo e estoura-los. Essa ação emitirá um som
característico e contará pontos por estouro. Quanto mais detonações acontecerem, mais pontos o
jogo contabiliza, gerando assim um nivelamento de fases gradual. Além disso sons aleatórios
aparecerão trazendo surpresas a quem joga.

As seguintes regras serão estabelecidas: Na Tela 1cada vez que um balão é estourado um som
desconfortável é emitido e uma animação é realizada. Na Tela 2 se balões=10, sala enche de
movimento e o número de pessoas e barulho interno aumenta. A Tela 3 aciona a função aleatório:
moto passa com som, se clicar nela repete o barulho e ela percorre a tela. Já na Tela 4, se
balões=20, fogos de artifício serão ativados em toda tela com som alto. Tela 5, se balões=30,
muda a interface do jogo para fantasmas e música fica sinistra. E a Tela 6 traz função aleatórios:
randomicamente passa alguém rindo no ambiente, ou cai um copo, ou choro.

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Considerações
Os aparelhos eletrônicos que servirão de mídia para o aplicativo também são fonte de pesquisa.
Verificar a capacidade de emissão sonora protendida e capacidade de resposta do aparelho, fazer,
por assim dizer, uma varredura ampla das possibilidades tecnológica do instrumento transmissor
empregado, buscando alternativas que integrem ao máximo o fim tecnológico pretendido. Sons
graves não são bem reproduzidos por aparelhos portáteis, por isso faz-se necessário também
estudar quais seriam os harmônicos simulares para equivalência com sonoridade pretendida.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Percepção e Cognição na Educação Musical de Pessoas com TEA e as


Contribuições das Construções Simbólicas para Constituição do Sujeito

Caroline Blumer
Programa de Pós-Graduação - IA - UNICAMP

carolineblumer@hotmail.com


Vilson Zattera

Laboratório de Acessibilidade – Biblioteca Central - UNICAMP

vilson.zattera@gmail.com

Resumo: Os conteúdos abordados neste artigo fazem parte de uma pesquisa de mestrado em andamento.
Neste recorte destacaremos alguns estudos e tópicos relevantes a respeito da percepção e da cognição
musical em pessoas com o Transtorno do Espectro do Autismo a fim de fomentar reflexões e,
conseqüentemente, promover ações e estratégias mais eficientes para Educação Musical no TEA. Neste
contexto, propomos ao educador um olhar para além das questões inerentes à transmissão do
conhecimento musical ressaltando a importância das experiências simbólicas vivenciadas em aula e de
suas contribuições para constituição do sujeito.
Palavras-chave: percepção, cognição, educação musical, autismo

Perception and Cognition in the Musical Education of People with ASD and the Contributions of
Symbolic Constructions to the Constitution of the Subject
Abstract: The contents covered in this article are part of an ongoing master's degree research. In this
section we highlight some studies and relevant topics regarding the perception and musical cognition in
people with Autism Spectrum Disorder in order to foster reflections and, consequently, to promote more
effective actions and strategies for Music Education in TEA. In this context, he proposes to the educator a
look beyond the inherent issues of the transmission of musical knowledge, emphasizing the importance of
the symbolic experiences lived in class and of their contributions to the constitution of the subject.
Key words: perception, cognition, music education, autism

1. Introdução
Como educadora musical e professora de canto sempre me questiono a respeito de como as
experiências musicais vividas em aula afetam meus alunos e como as informações sonoras,
práticas e teóricas que tratamos são percebidas e assimiladas por eles. Há oito anos venho
atuando no Instituto Ser em Campinas, na educação musical de pessoas com autismo e, neste
caso, os questionamentos são de ordem mais complexa, pois na maioria das vezes não há um
feedback imediato do aluno. Aquela pista que nos mostra se estamos no caminho certo por vezes
demora a aparecer neste contexto educacional.
O presente artigo é um recorte da minha pesquisa de mestrado cujo tema é “A Educação
Musical aliada à Clínica Psicomotora e as Construções Simbólicas no Trabalho com Pessoas com
TEA”. A pesquisa em pauta propõe, através de revisão bibliográfica, uma investigação elaborada

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

sobre os aspectos e pontos de interseção entre a Educação Musical e a Clínica Psicomotora, uma
vertente da psicomotricidade que incorpora à sua prática conceitos psicanalíticos. A metodologia
foi adotada com o intuito de proporcionar uma contextualização histórica e conceitual com
relação à psicomotricidade e às construções simbólicas dentro dos princípios da Clínica
Psicomotora abordada amplamente pelos autores Negrine (1995), Souza (2004), Fonseca (2008) e
Levin (1995). A investigação também se estende aos pedagogos musicais que utilizaram a
psicomotricidade em seus trabalhos de educação musical com práticas voltadas para o
“simbólico” como Jacques Dalcroze e Edgar Willems. Por fim, através de uma análise cuidadosa
deste conteúdo e da realização de uma entrevista semi-estruturada com o psicomotricista Esteban
Levin, a pesquisa intenciona identificar os aspectos mais relevantes que poderão se tornar
ferramentas na prática pedagógico musical no âmbito do TEA, bem como observar de que
maneira se dão as construções simbólicas neste processo e como elas podem influenciar na
constituição do sujeito.
Neste recorte, especificamente, destacaremos alguns estudos e informações a respeito da
percepção e da cognição musical com relação às pessoas com Autismo propondo ao educador um
olhar para o sujeito e para as construções simbólicas a fim de fomentar reflexões e,
consequentemente, ações mais eficientes nas práticas educacionais musicais no TEA.

2. O Autismo e a Experiência Simbólica


O Autismo faz parte dos Transtornos do Neurodesenvolvimento e é classificado como Transtorno
do Espectro Autista (TEA), uma síndrome comportamental que se divide em três sintomas
principais: a) dificuldade de interação social; b) déficit na linguagem e na comunicação verbal e
não verbal; c) a presença de comportamentos repetitivos, estereotipias e interesses restritos. Tem
causas múltiplas e, de acordo com a DSM V (Manual de Diagnóstico e Estatística dos
Transtornos Mentais), pode se apresentar nos graus leve, moderado e grave, por isso a
denominação Espectro Autista. (APA, 2013)
Diante dos sintomas supracitados indivíduos com TEA podem apresentar dificuldade no
“brincar”, comportamentos sociais fora de contexto, dificuldade na percepção de si e do outro,
pensamento extremamente concreto, dificuldade para compreender metáfora, humor, ironia,
sarcasmo e expressões faciais, ecolalia e fala monótona. A despeito destas características o
psicólogo, psicanalista e psicomotricista argentino Esteban Levin (1995) nos diz que, nos

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Transtornos do Espectro Autista, existe dificuldade na construção do simbólico, na compreensão


do sentido figurativo e isso se estende à relação do indivíduo com seu próprio corpo. “No
autismo, o corpo da criança não tem outra referência do que a de estar à margem [...] o corpo é
pura carne sem ligação representacional, é puro real [...] permanece mudo, silencioso, carente de
qualquer gestualidade” (Levin, 1995, p. 196). Sem a construção de uma imagem simbólica de
nosso corpo real não nos apropriamos dele, logo, não nos reconhecemos como sujeitos.
Desta forma, a construção de experiências simbólicas surge como um ponto importante a
ser considerado nas práticas pedagógicas dentro dos Transtornos do Autismo. Para Levin, o
educador deve “doar” a sua experiência infantil, ou seja, criar a “cena”, o “cenário”, atribuir
significado a fala, aos movimentos, aos comportamentos estereotipados e, a partir disto construir
uma nova experiência com esse aluno a fim de ajudá-lo a apropriar-se de si como sujeito e assim,
constituir sua imagem corporal (LEVIN, 2010, p. 80).
Referimo-nos à imagem corporal como a figuração mental que temos de nosso corpo,
subjetivamente, do ponto de vista imaginativo-mental diferente do que chamamos de esquema
corporal que é apenas a noção tridimensional que temos de nós mesmos e das partes do nosso
corpo (Louro, 2012, p. 92).

3. Considerações sobre a Percepção Sensório-Musical no TEA


A percepção musical começa pelo processo da audição humana, ou seja, a captação do sinal
acústico pelos ouvidos, depois, a tradução dessa informação de oscilação mecânica em sinais
elétricos e, posteriormente, a condução destes sinais via nervo auditivo até o cérebro. Através do
sentido da audição percebemos o som, que é compreendido por meio dos nossos processos
cognitivos que, por sua vez pode provocar reações afetivas, evocando emoções (Fornari, 2013). O
que significa que: “Podemos ouvir sem escutar, escutar sem compreender, ou compreender sem
nos emocionar” (Fornari, 2013, p.123)
Apenas com esta breve análise é possível perceber o quão relevante é o funcionamento do
nosso cérebro e suas conexões sinápticas para o processamento dos estímulos sensoriais que
recebemos. Nos anos 60, um grupo liderado pela médica brasileira Monica Zilbovicius,
pesquisadora do Instituto Nacional da Saúde e da Pesquisa Médica (Inserm) da França, foi o
primeiro a descobrir evidências de que alterações no sistema nervoso central estivessem por traz
do autismo. Nestes estudos verificou-se que crianças com autismo apresentavam atividade

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reduzida no sulco temporal superior, pequena área do lobo temporal. Inicialmente se acreditava
que o lobo temporal fosse importante apenas para a percepção dos sons. Entretanto, estudos mais
detalhados mostraram que tanto o sulco temporal superior como outra área do lobo temporal, o
giro fusiforme, estavam envolvidos no processamento de dois tipos de informações relevantes
para as interações sociais. Eles captam informações auditivas, sobre a voz de um interlocutor, e
visuais, como os movimentos dos olhos, os gestos e as expressões faciais; processam-nas e as
distribuem para outras áreas cerebrais associadas às emoções e ao raciocínio lógico. (Zorzetto,
2011)
Apesar das divergências entre os pesquisadores sobre as possíveis origens das
anormalidades sensório-perceptuais nos autistas, há um consenso de que estas são de fato
inerentes ao autismo. Gomes et al. (2008) relatam que as alterações sensório-perceptuais podem
acometer até 90% dos autistas, com prevalência para as hipersensibilidades auditivas, visuais e
táteis, assim como hiposensibilidade à dor. Seus estudos apontaram que 23,9% dos sujeitos
autistas apresentavam hipersensibilidade auditiva e tátil, e a hiposensibilidade a dor esteve
presente em 41,3% da amostra. Khalfa et al. (2004), utilizando o limiar de desconforto em
relação à hipersensibilidade auditiva, relatam que 63% dos autistas não suportam estímulos acima
de 80dB. (Gomes et al., 2008).
Os estudos acima indicados nos confirmam que, impreterivelmente, teremos de lidar com
anomalias sensório-perceptuais no contexto educacional nos Transtornos do Autismo. Anomalias
estas que não geram apenas dificuldade ou sensibilidade em relação à percepção auditiva ou tátil,
mas também quanto à interpretação dos estímulos sonoros, visuais, gestuais e faciais ofertados.
Também não há um padrão determinado, ou seja, não sabemos com quais anomalias lidaremos
até que nos coloquemos em contato direto, corpo a corpo, com o aluno.
Como resultado, sejam em proporções maiores ou menores, estas anomalias irão influenciar
na percepção e na construção do universo simbólico destes alunos. Confirma-se assim a
observação de Levin (1995) quanto à importância das construções simbólicas neste contexto
educacional, da criação de “cenas” nas quais o educador poderá “doar” sua experiência simbólica
a fim de que através desta vivência compartilhada o aluno possa apropriar-se simbolicamente de
si, como sujeito, e, consequentemente, dos conteúdos sonoros-musicais abordados.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

4. Cognição Musical, Linguagem e o Papel do “Outro” Sonoro


Com relação ao funcionamento do cérebro autista e a cognição musical, diversos pesquisadores,
com o intuito de investigar o paradoxo entre os prejuízos de linguagem e a preservação das
habilidades musicais no autismo, realizaram investigações que podem trazer contribuições
importantes a nós, educadores musicais. Nos estudos relatados foram empregados a ressonância
magnética funcional e o tensor de difusão de imagem para avaliar a organização estrutural e
funcional dos sistemas neurais que normalmente são compartilhados   pelo processamento   da
linguagem e da música. Em relação às áreas da linguagem, há duas regiões primordiais no
cérebro humano, uma localizada na região anterior do mesmo, área de Broca, com um centro no
giro frontal inferior à esquerda, e outra na região posterior, área de Wernicke, com um centro no
giro temporal posterior, médio e superior à esquerda (Lai et al., 2012).
A área de Wernicke reconhece o padrão de sinais auditivos e interpreta-os até obter
conceitos ou pensamentos, enquanto a área de Broca verbaliza um pensamento, convertendo os
sinais nos padrões de ativação neuronal necessários à produção da fala (Schirmer et al., 2004). De
acordo com Wan et al. (2010) comparando o padrão de ativação das áreas da linguagem entre
indivíduos com autismo de alto funcionamento e controles em uma tarefa de compreensão de
uma sentença escrita, o grupo com autismo apresentou uma ativação maior na área de Wernicke,
mas diminuição da ativação na área de Broca. Em compensação, a área de Broca foi ativada
mediante realização de atividades relacionadas à música como, por exemplo, cantar ou fingir que
toca um instrumento, o que envolve uma ligação entre as regiões frontal e temporal do cérebro.
As informações acima sugerem que as atividades musicais envolvendo o canto, a imitação e
outras podem estimular não somente o desenvolvimento de habilidades práticas, mas também
contribuir para os processos de aquisição da linguagem e, por conseguinte, para a expressão e
comunicação nos TEA.
Esteban Levin (1997), percorrendo o caminho da invenção da linguagem proposto por
Freud, se utiliza das expressões “espelho sonoro” e “eco virtual”. Pensando num bebê que
começa a pronunciar seus primeiros fonemas, como “tá-tá”, o autor presume que ao emitir este
som o bebê o ouça como um ruído. Ao chocar-se com o meio esta onda sonora retorna aos
ouvidos do bebê como um novo som. Este “eco virtual” seria o efeito do “espelho sonoro” (o
Outro sonoro), este “Outro Sonoro” (mãe, pai, avó...) reconhece no “tá-tá” um chamado,
interpretando-o como um som que chama e não somente como um ruído gutural. Desta forma, ao

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

passar pelo espaço deste Outro, o “ta-tá” retorna ao bebê não mais como ruído e sim como a
melodia inclusa no dizer de um fonema. Nesta relação, este “Outro Sonoro” dá um novo
significado ao som originalmente emitido.
Um dos sintomas predominantes no autismo é a presença da fala ecolálica, ou seja, uma
fala repetitiva que contém apenas um significado sem nenhum nível metafórico, sem um marco
simbólico que o limite ou ordene. Para o autor, esta falta na diversificação dos significados
advindos desse “ecovirtual” compromete ainda mais o desenvolvimento da linguagem no TEA.
Neste sentido, como educadores, em nossas práticas educacionais poderemos fazer o papel
deste “Outro Sonoro” que interpreta e dá significado aos sons, aos fonemas isolados ou a uma
fala ecolálica, colocando-os dentro de um contexto musical e social com uma pluralidade de
significados simbólicos contribuindo para o desenvolvimento da linguagem e, novamente, para a
constituição da imagem corporal do aluno.

5. A Neuroplasticidade e a Plasticidade Simbólica na Constituição do Sujeito


A neuroplasticidade é a capacidade do cérebro de se adaptar continuamente as modificações do
meio em que ele se encontra. Neste processo, pode haver no cérebro um aumento de eficiência
nas conexões entre os neurônios (sinapses), os sistemas neuromoduladores podem se modificar e
até mesmo novas células nervosas podem se formar ou se realocar para cumprirem novas
funções. No que diz respeito à prática musical, um treinamento puramente “mecânico” estimula
menos a formação destas conexões do que uma experiência realizada através de diversos canais
sensoriais e de diferentes maneiras (Cattapan, 2016).
Esta mesma plasticidade é citada por Levin que aponta a experiência simbólica como uma
das fontes geradoras da plasticidade neuronal e de rearranjos que podem contribuir
significativamente para o desenvolvimento psicomotor do sujeito. Também afirma que a
qualidade das possibilidades de conexão das sinapses e das redes neuronais pode ser diferente de
acordo com a experiência vivida. Levin diz que qualquer experiência aprendida e repetida produz
plasticidade cerebral e pode proporcionar o desenvolvimento de novas condutas e aquisições. No
entanto, quando se trata de uma experiência simbólica, significante esta produz uma plasticidade
neuronal de tônus mais intenso e forte e que permite ao sujeito apropriar-se subjetivamente desta
experiência. Esta capacidade de apropriação subjetiva do sujeito o autor chamou de plasticidade

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

simbólica, que é o efeito da experiência simbólica na relação com o Outro e, que nos permite
constituir nossa própria imagem corporal (Levin, 2010 apud Blumer, 2016).
Assim sendo, no âmbito da educação musical, é muito importante considerarmos a
plasticidade cerebral e também a qualidade das experiências vivenciadas no trabalho com pessoas
com deficiência, principalmente, nos transtornos do espectro do autismo.
No entanto, devemos nos lembrar de que a neuroplasticidade, apesar de ser comprovada,
tem suas limitações e não há como prever quando e quanto o cérebro de uma pessoa pode se
reorganizar, apenas sabemos que ela é uma aliada em nossa missão como facilitadores da
aprendizagem (Louro, 2012).

Conclusão
A partir dos tópicos e estudos acima referenciados, podemos concluir que há diversos pontos
importantes a serem considerados com relação à Educação Musical nos Transtornos do Espectro
do Autismo.
Primeiramente, há de se observar as características inerentes ao TEA e suas implicações
para as áreas motoras, cognitivas, sociais, emocionais e para a constituição da imagem corporal
do sujeito.
Na questão sensório-perceptiva, pudemos constatar que teremos de lidar com anomalias na
percepção e na interpretação de estímulos auditivos, visuais e táteis. Além disso, que não há um
padrão de ocorrência, teremos de observar caso a caso e nos posicionarmos a fim de buscarmos
estratégias adequadas.
Do ponto de vista cognitivo musical, os déficits na área da linguagem verbal e não verbal
podem dificultar a compreensão de alguns conteúdos. Por outro lado, verificamos que atividades
musicais relacionadas ao canto e a imitação promovem uma ativação da área de Broca podendo
assim auxiliar na comunicação e no desenvolvimento da linguagem no TEA. Esta informação
pode ser bastante relevante na elaboração de nossas ações pedagógicas.
A neuroplasticidade apresenta-se como grande aliada e fator importante a ser considerado,
uma vez que revela a capacidade do cérebro de se adaptar e de se modificar aos receber os
estímulos adequados.
A construção de experiências simbólicas associadas às práticas educacionais também
demonstrou ser muito importante no contexto do autismo. Funcionando como uma espécie de

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

trampolim para que o aluno possa construir um universo simbólico e apropriar-se simbolicamente
de seu corpo.
Por fim, percebemos que, como educadores musicais, desempenhamos um papel
importante não só para o contexto educacional, mas para a constituição do “sujeito” a quem
ensinamos. Somos o Outro por trás da imagem especular da imitação; poderemos ser o “Outro
Sonoro” dando significado aos sons e; somos o Outro que proporciona uma experiência simbólica
marcante capaz de gerar plasticidade simbólica e constituição da imagem corporal.

Referências
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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Avaliação da Musicalidade: possibilidades de utilização da Avaliação IMTAP


com crianças de três a cinco anos de idade

Josiane Fernanda Covre


josianecovre@gmail.com
Universidade Federal de São Carlos

Claudia Regina de Oliveira Zanini


mtclaudiazanini@gmail.com
Universidade Federal de Goiás

Resumo: A musicalidade é uma das habilidades inerentes ao ser humano. Acredita-se que seu
desenvolvimento contribua para um ser no mundo de forma integra. Sendo a musicalidade uma
habilidade/característica humana desenvolvida processualmente torna-se possível a visualização e
acompanhamento desse processo ao longo da vida. O presente trabalho busca ilustrar, através de um
estudo de múltiplos casos, com abordagem quali-quantitativa, a utilização da Avaliação IMTAP para
análise do desenvolvimento da musicalidade de crianças de três a cinco anos de idade. Para se
alcançar este objetivo foram atendidas três crianças, semanalmente, com um total de treze
intervenções musicoterapêuticas e realizou-se a aplicação da avaliação IMTAP (Individualized Music
Therapy Assessment Profile) antes e após o período de intervenções. Este instrumento de avaliação foi
utilizado para coleta de dados que foram analisados a partir da comparação das pontuações individuais
obtidas através de sua aplicação no domínio musicalidade subdomínio fundamentos. Somaram-se aos
dados obtidos com a avaliação IMTAP a análise de fichas musicoterapêuticas, filmagens, relatórios
das intervenções musicoterapêuticas para melhor compreender as interações dos participantes. Os
resultados revelaram que a Musicoterapia contribuiu para o desenvolvimento da musicalidade das
crianças participantes do estudo e este desenvolvimento pode ser verificado nos dados obtidos com a
aplicação da avaliação IMTAP. Conclui-se que os resultados qualitativos são consonantes aos
resultados obtidos por meio da Avaliação IMTAP, apontando para sua validade quando da sua
utilização com crianças de três a cinco anos de idade.
Palavras-chave: desenvolvimento cognitivo; musicalidade infantil, imtap, musicoterapia; avaliação.

Abstract: Musicality is one of the inherent abilities of the human being. We believe that their
development contributes to a being in the world in an integrated way. Musicality is a human ability /
characteristic developed through a process, it becomes possible to visualize and follow this process
throughout life. The present work seeks to illustrate, through a multiple-case study, with a qualitative-
quantitative approach, the use of the IMTAP Assessment to analyze the musical development of three
to five-year-old children. To achieve this goal, three children were treated weekly with thirteen music
therapy interventions, and the IMTAP (Individualized Music Therapy Assessment Profile) evaluation
was performed before and after the intervention period. This evaluation instrument was used for data
collection that were analyzed from the comparison of the individual scores obtained through its
application in the musicality domain subdomain fundamentals. The data obtained with the IMTAP
assessment evaluation included the analysis of music therapy records, filming, and reports of the
music therapy interventions to better understand the participants' interactions. The results revealed that
Music Therapy contributed to the development of the musicality of the children participating in the
study and this development can be verified in the data obtained with the application of the IMTAP
assessment. We concluded that the qualitative results are consonant to the results obtained through the
IMTAP Assessment, pointing to their validity when used with children from three to five years old.
Key-words: cognitive development; child musicality; imtap; music therapy; evaluation.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Introdução
A musicalidade é uma das habilidades inerentes ao ser humano acredita-se que seu
desenvolvimento contribua para um desenvolvimento cognitivo e um ser no mundo de forma
integra. São possíveis e observáveis relações entre a musicalidade e o desenvolvimento
cognitivo musical infantil.
Brito (2003) afirma que, desde bebê, os seres humanos possuem instinto rítmico e
auditivo bem desenvolvido e é através dessa capacidade musical ou musicalidade inata que se
desenvolve o sistema motor coordenativo e cognitivo da criança, de forma complexa e lúdica.
Com relação ao desenvolvimento da musicalidade, Pedrini (2003) explica que, mesmo
envolvendo habilidades complexas, a musicalidade se desenvolve, até certo ponto, de maneira
espontânea. Esta reflexão a faz considerar que todas as pessoas possuem pré-disposição ao
desenvolvimento de habilidades musicais.
O desenvolvimento musical pode ser visto como as mudanças que ocorrem no fazer
musical de maneira mais ou menos espontânea, em virtude da educação musical formal
recebida ou pelo aprimoramento de habilidades em atividades específicas da área da música.
Considera-se, principalmente, a ideia de transformação que ocorre neste fazer musical ao
longo do tempo (Ilari, 2009).
Entre zero e dois anos, as crianças exploram a sonoridade de objetos de seu cotidiano e
brinquedos; experimentam a voz e sons vocais; respondem a estímulos musicais através de
respostas como o sorriso, os movimentos corporais de estiramento ou balanço e balbucios
(Valerio & Gordon, 1998; Brito, 2003; Jeandot, 2001).
Nas crianças de três e quatro anos de idade, evidencia-se a capacidade de acompanhar o
pulso de uma canção, mesmo que ainda de forma não intencional. Suas respostas a música
vão ganhando contornos e se manifestando de forma que os movimentos e o cantarolar, antes
reflexos, passem a ter uma relação mais direta com as canções ouvidas. (Jeandot, 2001;
Valerio& Gordon, 1998).
As crianças de quatro anos de idade são capazes de participar de grupos rítmicos
marchando, pulando e caminhando de acordo com o compasso e também de imitar com
precisão padrões rítmicos simples, mesmo com poucas repetições (Jeandot, 2001).
Na faixa etária entre os três e cinco anos de idade, as crianças conseguem identificar os
sons de seu ambiente cotidiano e de instrumentos musicais já vistos ou manipulados,
percebendo diferenças e semelhanças entre eles. Também conseguem perceber o resultado
sonoro das diferentes formas de manipular objetos e instrumentos musicais (Ibid.).

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Tendo realizado este percurso de exploração e desenvolvimento de habilidades


sensoriais e motoras, a criança busca atividades cada vez mais desafiadoras para si buscando
ampliar suas capacidades musicais (Brito, 2003).
A avaliação IMTAP - Individualized Music Therapy Assessment Profile (BAXTER et al,
2007) foi desenvolvida ao longo de cinco anos, por um grupo de seis musicoterapeutas, frente
às necessidades identificadas em suas clínicas quanto a ter um protocolo de avaliação
minucioso que abordasse as especificidades de domínios não musicais em um ambiente
musical., o que possibilitaria a construção de um perfil completo do indivíduo e, onde seriam
identificados em quais aspectos a Musicoterapia poderia atuar de forma mais efetiva e qual
seria a melhor área para iniciar o trabalho musicoterapêutico. (Baxter et al, 2007).
A avaliação é constituída por domínios, que são as grandes áreas abrangidas pelo
instrumento e que organiza os dados referentes àquela área e por subdomínios que
contemplam as subáreas de cada domínio.
A IMTAP é constituída por 374 habilidades dispostas em dez domínios tratando-se,
portanto, de:
[...] um instrumento de avaliação em musicoterapia utilizado para mensurar dez
diferentes grupos de comportamentos distintos: musicalidade, comunicação
expressiva, comunicação receptiva/percepção auditiva, interação social, motricidade
ampla, motricidade fina, motricidade oral, cognição, habilidade emocional e
habilidade sensorial (Baxter et al, 2007 apud Silva, 2012, p.14).

Cabe ressaltar que cada um dos domínios pode ser avaliado separadamente, havendo a
orientação dos autores para que o subdomínio fundamentos do domínio Musicalidade, que
contém as habilidades principais desse domínio, seja incluído em todas as avaliações
utilizando a IMTAP.
Apresenta-se aqui um recorte da pesquisa Contribuições da musicoterapia para a
comunicação de crianças com alterações da linguagem (Covre, 2015) onde foram avaliados
os domínios Comunicação Receptiva, Comunicação Expressiva e subdomínio fundamentos
do domínio Musicalidade. No presente estudo, faz-se um recorte dos resultados obtidos com a
avaliação do subdomínio fundamentos do domínio Musicalidade, apresentado na figura 1.
No domínio Musicalidade são examinadas as respostas inatas a estímulos musicais
variados bem como a forma e o desejo de se engajar nas atividades musicais. No subdomínio
fundamentos são observados o interesse, as reações e o entusiasmo em participar das
propostas musicais. (Baxter et al, 2007).

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

O domínio Musicalidade apresenta ainda os subdomínios Andamento; Ritmo;


Dinâmica; Vocal; Ouvido absoluto e relativo; Criatividade e desenvolvimento de ideias
musicais; Leitura Musical; Acompanhamento.
Para atribuir as pontuações na avaliação IMTAP considera-se o seguinte esquema de
pontuações: N (nunca) para quando em nenhum momento aquele comportamento foi
apresentado; R (raramente) para quando o comportamento foi apresentado em até 50% das
tarefas propostas; I (inconsistente) para quando o comportamento foi apresentado em entre 51
e 79 % das tarefas propostas e C (consistente) para quando o comportamento foi apresentado
em entre 80 e 100 % das tarefas propostas.
A escolha de tal instrumento de coleta de dados deveu-se ao fato deste ser um
instrumento de avaliação desenvolvido por musicoterapeutas, para auxiliar em sua atuação
profissional e identificar o desenvolvimento dos pacientes que vivenciam os processos
musicoterapêuticos. Assim, por ser um instrumento próprio da Musicoterapia e que contempla
possibilidades de avaliação dentro dos objetos desse estudo, optou-se por utilizá-lo.

Metodologia
Todos os procedimentos para a aplicação da IMTAP foram conduzidos de acordo com as
orientações que constam no manual da referida avaliação, como consta em sua publicação.
(BAXTER et al, 2007). Dentre as orientações constam: a manutenção do mesmo local de
atendimentos para as avaliações, a realização de um protocolo de atendimentos que previsse
atividades que contemplassem todos os itens da escala a serem avaliados, a retirada do local
de atendimentos de quaisquer materiais que possam desviar a atenção do cliente durante a
avaliação, o registro em vídeo para aumentar a confiabilidade da coleta dos dados e a
necessidade de ligar os aparelhos de filmagem antes da entrada do cliente na sala. A coleta de
dados para a avaliação IMTAP foi realizada em duas etapas. A primeira delas, aqui
denominada Avaliação Inicial, foi realizada uma semana antes do início das intervenções. Os
participantes compareceram individualmente em horários pré-agendados, de forma que não se
encontrassem ou presenciassem a avaliação dos demais participantes.
A segunda etapa, denominada Avaliação Final, foi realizada uma semana após o término
do período de intervenções e, da mesma forma, os participantes compareceram
individualmente em horários pré-agendados e não se encontraram.
Durante as avaliações foram realizadas atividades segundo o protocolo pré-estabelecido,
com duração média de 40 minutos para cada criança. As avaliações foram feitas

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

individualmente, sem a presença dos pais na sala. Todos os atendimentos foram gravados em
vídeo para análise posterior.
A partir dos dados coletados nas Avaliações Inicial e Final, o desempenho das crianças
foi transposto para a Escala IMTAP no domínio Musicalidade, subdomínio Fundamentos.

Após atribuir notas para cada um dos itens da avaliação, os dados foram lançados
nas tabelas referentes a cada item que, de acordo com sua dificuldade de realização ou
complexidade, recebeu notas nos valores de 0 a 7. Realizada esta etapa, os valores foram
somados dentro de seu subdomínio e estabeleceu-se a porcentagem de realizações dentro de
um máximo possível pré-determinado. Seus escores foram somados e teve-se a porcentagem
total, sempre considerando um valor máximo possível pré-determinado.

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Durante as avaliações e o processo de atendimentos as inter-relações musicais se


deram por meio das técnicas de re-criação e improvisação musical que, em muitos momentos,
foram utilizadas de forma coordenada ou entrelaçada.
A re-criação musical foi utilizada para desenvolver habilidades sensório-motoras,
desenvolver e/ou ampliar a empatia com o outro, aprender ou dominar comportamentos,
trabalhar e agir cooperativamente, como apontado por Bruscia (2000). A possibilidade de
utilização desta técnica durante os atendimentos musicoterapêuticos do grupo aconteceu
também para favorecer e reforçar a capacidade de escolha, ampliar as possibilidades de
audição e percepção musical, da fala e do outro.
A improvisação musical foi utilizada para desenvolver a espontaneidade, a
criatividade, a liberdade de expressão, o senso de identidade, as habilidades interpessoais e a
de tomar decisões (Bruscia, 2000). Durante as improvisações, as crianças fizeram música
tocando, cantando, criando melodias, ritmos, instrumentos e combinando timbres.
As canções utilizadas foram, em sua maioria, canções de domínio público, que fazem
parte do cancioneiro folclórico brasileiro e, dessa forma, por serem familiares às crianças, se
tornaram fácil sua execução instrumental e/ou vocal. Para Andrade e Konkiewiltz (2011), a
métrica encontrada ‘nos ritmos’ de uma cultura, possibilita que, quando utilizadas canções da
cultura do executante, os movimentos corporais, o bater palmas, a marcha e o canto sejam
executados e sincronizados com maior facilidade.

Desenvolvimento

Durante a etapa de avaliação muitos objetivos foram identificados, sendo alguns deles
comuns a todas as crianças e outros, individuais. Ao longo do processo, buscou-se trabalhar
esses objetivos identificados de maneira integrada, de forma que as intervenções
contemplassem as necessidades individuais dos três participantes em um único programa de
intervenções, utilizando-se repertório comum a todas as crianças em atividades lúdicas e
coletivas, vivenciadas por meio das experiências musicais descritas por Bruscia (2000).
Como fio condutor do processo de intervenções musicoterapêuticas, foram consideradas
as etapas de constituição da musicalidade, descrita anteriormente, assim como estudos sobre
as contribuições da aplicação da Musicoterapia para o desenvolvimento da musicalidade das
crianças.
Buscou-se, portanto, ao longo do processo de intervenções: resgatar e ampliar os
comportamentos protomusicais, proporcionar momentos de escuta e de imitação e estimular

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

movimentos e expressão corporal, a partir dos estímulos musicais ou em conjunto com a


música.
Participaram do estudo três crianças com idades entre três e cinco anos de idade,
apresentadas aqui com nomes fictícios.
Heitor iniciou os atendimentos com três anos de idade. O escore, obtido com a
aplicação da avaliação inicial IMTAP foi 78% e, após a análise dos dados, foram
estabelecidos como objetivos para os atendimentos de Heitor: ampliar as possibilidades de
expressão pessoal através da voz e da execução de instrumentos; trabalhar a percepção e
execução de motivos musicais; ampliar a coordenação e percepção rítmica. Ao final das
intervenções, o escore da avaliação final de Heitor foi de 90%, evidenciando desenvolvimento
nas áreas de expressão pessoal, execução musical e apontando para a necessidade de manter o
trabalho com a percepção rítmico/musical.
Isabela iniciou os atendimentos com quatro anos de idade obtendo escore de 80% na
avaliação inicial. Para seus atendimentos foram estabelecidos como objetivos: ampliar as
possibilidades de expressão pessoal através da voz e da execução de instrumentos; trabalhar a
percepção e execução de motivos musicais; trabalhar a execução em conjunto instrumental e
vocal. Na avaliação final Isabela atingiu os 100%, demonstrando habilidade em todos os itens
avaliados pela IMTAP especialmente no que se refere ao uso da voz para expressar-se
musicalmente.
Paulo, que iniciou os atendimentos com quatro anos de idade, obteve escore de 78% na
avaliação inicial e para ele foram estabelecidos como objetivos: ampliar as possibilidades de
expressão pessoal através da voz e da execução de instrumentos; trabalhar a percepção e
execução de motivos musicais; trabalhar a execução em conjunto instrumental e vocal. Ao
final do período de intervenções, Paulo obteve escore de 100% na avaliação IMTAP,
demonstrando ter alcançado os objetivos estabelecidos para seu atendimento e domínio em
todas as habilidades avaliadas pelo instrumento, destacando-se a ampliação das habilidades de
percepção musical.

Considerações Finais
A avaliação IMTAP, utilizada nesse processo, mostrou-se um instrumento adequado para o
acompanhamento do desenvolvimento de crianças na faixa etária dos três aos cinco anos no
domínio musicalidade, pois, os dados obtidos quando de sua aplicação apontaram de maneira
clara os pontos que exigiam atenção no desenvolvimento de cada criança, possibilitando o

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

estabelecimento de objetivos musicoterapêuticos mais específicos para cada criança e para o


grupo.
Destaca-se a aplicabilidade desse instrumento de avaliação para crianças na faixa etária
acompanhada neste estudo, pois ao confrontar os dados da literatura com as análises das
crianças pode-se observar que uma criança nesta faixa etária, com desenvolvimento típico, é
capaz de alcançar os escores máximos para todas as habilidades avaliadas.
Aponta-se como uma limitação deste estudo o número restrito de sessões realizadas e, o
pequeno número de participantes e a avaliação apenas do subdomínio fundamentos, domínio
Musicalidade. No entanto, considerando os benefícios trazidos pelas intervenções
musicoterapêuticas às crianças participantes, vislumbra-se a continuidade de estudos nessa
área de atuação para buscar novas evidências para a Musicoterapia.

Referências
Andrade, P.E. & Konkiewltz, E.C. (2011). Fundamentos neurobiológicos da música e suas
implicações para a saúde. Neurociências. n.03, p.172-183.
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PublishersBrito, T. A.(2003). Música na educação infantil: proposta para a formação
integral da criança. São Paulo: Peirópolis.
Bruscia, K. (2000). Definindo Musicoterapia. (2ªed.). Rio de Janeiro: Enelivros.
Covre, J. (2015). Contribuições da Musicoterapia para a comunicação de crianças com
alterações de linguagem. 2015. (Dissertação de Mestrado não publicada). Escola de
Música e Artes Cênica, Universidade Federal de Goiás.
Ilari, B.S.. (2009). Música na infância e na adolescência: um livro para pais, professores e
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Jeandot, N..(2001) Explorando o universo da música. São Paulo: Scipione (2ͣ ed.).
Pedrini, J.R..(2013). Desenvolvimento musical: dons e talentos inatos? Anais do XXI
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tecnologia e inovação: perspectivas para pesquisa e ações em educação musical.
Pirenópolis, 04- 08 nov2013(pp.812-820) =
Silva, A.M..(2012). Tradução para o português brasileiro e validação da escala
Individualized Music Therapy assessment profile (IMTAP) para uso no Brasil. 2012.
120 f. (Dissertação de Mestrado não publicada). Faculdade de Medicina, Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.
Valerio, W.& Gordon, E. et ali (1998). Music Play. Chicago: GIA Publications.

113
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Avaliação em Musicoterapia e a utilização da versão brasileira do IMTAP

Gustavo Henrique Costa


Unespar Campus de Curitiba II – FAP
cohgus@gmail.com

Clara Marcia Piazzetta


Unespar Campus de Curitiba II – FAP
clara.piazzetta@unespar.edu.br


Resumo: Este trabalho apresenta o estudo bibliográfico de pesquisa realizada dentro do programa
de Iniciação Científica da UNESPAR, A Aplicação da IMTAP no Centro de Atendimento e Estudos
em Musicoterapia. O presente estudo busca, no contexto da musicoterapia, comunicação e relação
intramusical, identificar instrumentos de avaliação já construídos e em especial a aplicação da
ferramenta IMTAP nos trabalhos realizados por musicoterapeutas brasileiros. Dois estudos de
aplicação da IMTAP foram destacados: Um apresenta que a Musicoterapia contribuiu para o
desenvolvimento integral da comunicação das crianças participantes do estudo. O outro aponta,
por meio da ferramenta IMTAP, a possibilidade de traçar o perfil do paciente e os objetivos
musicoterapêuticos. Foi constatado como resultado a identificação da trajetória histórica dos
modelos de avaliação em Musicoterapia. Há uma trajetória de modelos de avaliação da área,
influenciados pelas vivencias musicoterapêuticas, devido cada profissional musicoterapeuta
desenvolver processos próprios de avaliação embasados em disciplinas de áreas afins em sua
atuação. Também foi observada a compreensão do uso de avaliadores nos processos
musicoterapeutico e a aplicação da IMTAP pós sua validação no Brasil.
Palavras-chave: musicoterapia, avaliação IMTAP, comunicação.

Music Therapy Assesment and the use of the IMTAP Brazilian version
Abstract: This article presents the bibliographic study of a research that took place inside the
Scientific Initiation program at UNESPAR, The IMTAP Application in the Treatment and Studies
in Music Therapy Center. The present study aims, through bibliographic and literature studies, in
the communication and the intramusical relationship context, to indentify assessment instruments
already developed and specially the application of the IMTAP tool in the works accomplished by
the Brazilian musical therapists. Two studies of the IMTAP application were highlighted: One
which presents that the Music Therapy has contributed to the integral communication development
of the children who took part in the treatment. The other one points out, through the IMTAP tool,
the possibility to describe the patient’s profile and the music therapeutic objectives. It was found as
the result, the identification of the historic trajectory of the assessment models in Music Therapy.
Here there is a trajectory of the assessment models in the area, influenced by the music
therapeutic experiences, due to fact that each music therapist professional develops one’s own
assessment process based on subjects in areas related to his or her professional performance. It
was also observed the comprehension of the assessment use in music therapeutic process and the
application of the IMTAP after its validation in Brazil.
Key-words: music therapy; IMTAP assessment, communication.

Introdução
Musicoterapia como prática profissional desenvolve-se por experiências sonoras e musicais,
vivenciadas em ambientes terapêuticos. Possui abordagens, técnicas e métodos pautados na
intervenção e ação terapêutica, ou seja, processos musicoterapêutico. O objetivo da utilização
da música e/ou seus elementos constitutivos como objeto intermediário de uma relação

114
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

terapêutica, possibilita o desenvolvimento dos aspectos biopsicossocial de um indivíduo, para


integrá-lo na sociedade (Barcellos, 1985). Para isso usa experiências musicais vivenciadas nos
relacionamentos que se desenvolvem através delas “como forças dinâmicas de mudança”. Os
procedimentos para essa ajuda envolvem “aferição, tratamento e avaliação” (Bruscia, 1987).
Musicoterapia é descrita, deste modo, como uma forma experimental de terapia porque ela é
centrada na experiência do cliente (Bruscia, 2000).
A atuação da Musicoterapia inclui o encontro entre o profissional musicoterapeuta, as
pessoas que se dispõem a experiência e a prática musical (Arndt et al, 2016).“A música
originou infinitas formas de relação.Estas formas constituem a pedra fundamental da
musicoterapia” (Alvin, 1967) dentro de processos terapêuticos.
O processo musicoterapêutico consiste de três etapas: 1) avaliação inicial, na qual o
terapeuta avalia o paciente por meio de atividades musicais e reuniões com familiares,
procurando identificar e definir metas e objetivos; 2) tratamento, etapa na qual o
musicoterapeuta interage e trabalha com o paciente, utilizando as experiências musicais para
evoluir em direção às metas estabelecidas; e 3) avaliação final, na qual o terapeuta irá avaliar
as respostas apresentadas à problemática do paciente, tomando por base a avaliação inicial.
(Gattino, citado em Silva et al, 2012).
Ao longo da história da Musicoterapia a avaliação musical de pacientes é parte dos
processos musicoterapêutico. Desde o inicio de sua sistematização, seguindo por uma visão
médica, existiam mensurações que buscavam a influência da música nas alterações da pressão
arterial, batimentos cardíacos ou ao tônus muscular (Gregory, citado em Silva et al, 2013).
Ainda dentro do modelo médico, Benenzon, organizou dois protocolos, a Ficha
Musicoterapêutica, preenchida a partir do primeiro contato do paciente com o
musicoterapeuta, e a Testificação do enquadre não-verbal – Testificação Musical, a partir do
primeiro contato do paciente com os instrumentos musicais, sons e músicas gravadas.
(Benenzon, 1985).
Por outro lado, a partir de visões Humanistas e aspectos filosóficos musicais o destaque
em avaliação não estava na ação da música sobre o corpo humano, mas sim na relação do
participante com a música e com o musicoterapeuta. A Abordagem Nordoff e Robbins
construiu, assim, um instrumento para avaliar a musicalidade nos final dos anos 1970:
Response, relationshipand musical communicativeness. A construção de ferramentas para
avaliação de pacientes ou participantes do trabalho musicoterapêutico é contínua e cada vez
mais especializada. No século XXI as propostas são construídas a partir de trabalhos clínicos

115
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

e oferecem em seus resultados possibilidades de conhecer o desenvolvimento do processo


musicoterapêutico bem como “fornecer aos musicoterapeutas um método para analisar e
avaliar os recursos musicais” (Carpente, 2016, p1).
O presente trabalho ao abordar o tema da avaliação em musicoterapia, busca por
estudos bibliográficos identificar instrumentos já construídos. Em especial a ferramenta The
Individualized Music Therapy Assessment Profile – IMTAP (Baxter et al 2007) traduzida e
validada para uso na língua portuguesa por Silva et al (2012) e sua aplicação por
musicoterapeutas brasileiros.

Desenvolvimento
Os processos de avaliação em Musicoterapia inicialmente foram construídos com base em
disciplinas de áreas afins, como psicologia e pedagogia. É importante ressaltar que a
utilização de instrumentos de avaliação não específicos da musicoterapia pode resultar em
avaliações imprecisas (Gattino, 2012).
Os musicoterapeutas Paul Nordoff e Clive Robbins nos anos de 1970 ao proporem a
Musicoterapia Criativa embasaram o trabalho em aspectos cognitivos musicais de cada
pessoa. A musicalidade, segundo a visão da Filosofia da Música não é apenas um dom
musical que poucas pessoas apresentam e desenvolvem uma competência específica para o
fazer artístico musical. Para eles, cada pessoa apresenta uma Music Child que é parte do seu
self ’ e ao responder “à experiência musical, encontra significado e interesse” (Nordoff &
Robbins, 1977, p.1). A avaliação proposta nessa abordagem musicoterapêutica visava
identificar a Music Child através da ferramenta Response, relationship and musical
communicativeness. Os elementos fundamentais pautavam aspectos cognitivos do fazer
musical do participante dentro de experiências musicais estruturadas de modo a favorecer a
improvisação musical do participante, seu fazer espontâneo na comunicação musical
construída na relação entre musicoterapeuta, musica e a pessoa atendida.
Benenzon (1985) por influencia do modelo médico e bases Psicanalíticas de atuação
desenvolveu a Ficha Musicoterapêutica como etapa primária de interação Terapeuta e
Paciente. Que permite focalizar o interrogatório sobre este mundo (musical do paciente). “A
razão deste primeiro encontro é a de explicar que para poder começar a terapia é necessário
conhecer a história sonoro-musical do paciente e de seu ambiente em forma profunda e
exaustiva” (Benenzon, 1985). O autor preconiza a necessidade de uma testificação musical
precedente ao tratamento, a fim de colher dados que ajudem a identificar o (princípio de) ISO
do paciente – identidade sonora. Essa testificação é composta de duas partes, onde na primeira

116
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

o paciente passa por uma experiência receptiva e na segunda convidado a experimentar uma
série de instrumentos musicais (Costa, 1989).
Até a primeira década do século XXI pode-se perceber a diversidade de propostas de
instrumentos de avaliação (tabela 1) segundo o levantamento realizado por Wigram, (2000);
Wigram, Nygaard Pedersen, Bonde, (2002); Layman et al (2002) (apud, Salokivi, 2012).

Nordoff & Robbins 1977 Response, relationship and musical


communicativeness
Bruscia 1987 Improvised music
Wells 1988 Emotionally disturbed adolescents
(song choice, composition and improvisation)
Goodman 1989 Music Therapy Assessment for Emotionally
Disturbed Children

Rajimaekers 1993 Diagnosis


Grant 1995 Cognitive, perceptual, motor and visual skills
Pavlicevic 1995 Musical interaction
Sikstrom & Skille 1995 Psychological function
Di Franco 1999 Sound-musical profiles
Lowey 2000 Music Psychotherapy Assessment
Layman, Hussey, Laing 2002 Music Therapy Assessment for Severally
Emotionally Disturbed Children
Baxter, Berghofer, Nelson , 2007 The Individualized Music Therapy Assessment
Peters, Roberts, MacEwan Profile [IMTAP] (for pediatric and adolescent
settings)

Tabela 1: Modelos de avaliação em Musicoterapia (retirado da Dissertação de Mestrado de Salokivi, 2012)

Na atualidade os instrumentos construídos a partir da prática clínica buscam


especificidades de atuação por clientelas, como por exemplo, no trabalho com crianças do
espectro autista - TEA. Ferrari (2013) organizou a escala ERI (Escala de Relações
Intramusicales). Uma ferramenta de análise usada em pacientes com TEA de diferentes
graus.A escala tem nove níveis variando de nenhum registro de interação com os sons e os
instrumentos musicais, até o registro total, com a intenção comunicativa no fazer musical
compartilhado com o musicoterapeuta. Para a construção dos registros nos nove níveis é
fundamental a descrição da experiência musical apresentada à criança com a identificação do

117
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

modo de interação aceito por ela. Assim avalia e registra, também, o fazer musical/
musicoterapêutico do musicoterapeuta.
Preocupados com as avaliações imprecisas, resultado de testes de outras disciplinas
próximas a musicoterapia, e percebendo a necessidade de avaliação dos processos
musicoterapêutico, uma equipe de seis musicoterapeutas elaborou a Individualized Music
Therapy Assessment Profile – IMTAP. Um grupo de protocolos de avaliação individual na
musicoterapia que trabalha com processos de avaliação em diferentes níveis a fim de
apresentar um “perfil” de cada participante em musicoterapia ao longo dos processos de
intervenção (Silva et al, 2012). Apresentado no formato de livro/manual inclui sessões de
avaliação e exemplos de atividades e intervenções. O material acompanha um CD-ROM que
proporciona ao/a terapeuta armazenar dados das sessões, e, criar tabelas e gráficos que
mostram o desenvolvimento e áreas a serem trabalhadas no processo musicoterapêutico
(Baxter et al, 2007).
O IMTAP foi concebido para avaliar as habilidades de crianças e adolescentes com
necessidades especiais, várias deficiências graves físicas, distúrbios da comunicação,
transtorno do espectro do autismo, distúrbios emocionais graves, prejuízos sociais, e
dificuldades de aprendizagem. Vista como uma ferramenta de auxilio na elaboração de metas
e objetivos terapêuticos, o IMTAP permite construir planejamentos de processos breves e
longos, como uma linha de base para os objetivos e planos de tratamentos. Por meio de
gráficos e tabelas trabalha com um conjunto de informações detalhadas, fácil de compreender
sendo possível abordar e avaliar conjuntos de habilidades gerais e específicas do participante
nos processos de musicoterapia.
Configura-se por fichas de tabelas seccionadas em dez domínios independentes como:
Musicalidade; Comunicação Expressiva; Comunicação Receptiva ou Percepção Auditiva;
Motricidade Grossa ou Ampla; Motricidade Fina; Motricidade Oral; Habilidade Sensorial;
Habilidades Cognitivas; Habilidade Emocional; e Interações Sociais. Cada um dos quais
contêm subdomínios, no total, 374 itens descritos como parâmetros de avaliação. Utiliza do
sistema NRIC (Nunca = 0%; Raramente = Abaixo de 50%; Inconsistente = 50 – 79%;
Consistente = 90 – 100%) para a composição dos resultados.
Esse instrumento mostra-se abrangente de modo a apresentar um amplo espectro das
condições em que se encontra o participante a partir da experiência musical compartilhada
com o musicoterapeuta. Sua tradução e validação para o português permitiu aos
musicoterapeutas brasileiros o acesso a essa ferramenta.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Metodologia
Pesquisa bibliográfica textual em livros, dissertações e artigos publicados no contexto da
musicoterapia, a fim de identificar, apresentar e compreender a metodologia das aplicações da
ferramenta IMTAP nos trabalhos realizados por musicoterapeutas brasileiros. As palavras
chaves usadas foram: musicoterapia, avaliação, IMTAP, comunicação e musicalidade.
Duas publicações foram selecionadas para apresentação no presente trabalho, ambas
apresentam usos práticos das fichas da IMTAP, em demandas de atendimento ao participante
de musicoterapia com dificuldades de comunicação, musicalidade e relação intramusical. O
texto de Covre (2015), Contribuições da Musicoterapia para a comunicação de crianças com
alterações da linguagem, e o texto de Santana et al (2015), ), A Experiência do uso da Escala
Individualized Music Therapy Assessment Profile (IMTAP) em Pacientes com Paralisia
Cerebral.

Resultados e discussão
A publicação de Covre (2015) Contribuições da Musicoterapia para a comunicação de
crianças com alterações da linguagem desenvolve uma pesquisa de abordagem quali-
quantitativa, a fim de investigar quais as contribuições que a Musicoterapia pode trazer para a
comunicação de crianças de três a cinco anos de idade com alterações da linguagem. Sua
pesquisa desenvolveu-se por meio de observação de filmagens das sessões de três crianças em
atendimentos musicoterapêuticos semanais, com um total de treze intervenções onde realizou-
se a aplicação da avaliação IMTAP antes e após o período de intervenções.
A pesquisa utilizou os domínios da musicalidade, comunicação receptiva e
comunicação expressiva. Sua metodologia se deu por análise de fichas musicoterapêuticas,
filmagens, relatórios das intervenções musicoterapêuticas e nas avaliações realizadas por uma
fonoaudióloga para compreender as interações dos participantes com a música, os demais
participantes e a musicoterapeuta, por meio das propostas da profissional (Covre, 2015).
A avaliação IMTAP mostrou-se como um instrumento adequado para o
acompanhamento do desenvolvimento de crianças na faixa etária dos três aos cinco anos nos
domínios musicalidade, comunicação receptiva e comunicação expressiva, como observados
neste estudo, pois destacou aspectos importantes dentro de cada um dos domínios, apontando
de maneira objetiva os pontos que exigiam atenção no desenvolvimento de cada criança. Isso
possibilitou o estabelecimento de objetivos musicoterapêuticos específicos para cada criança e
para o grupo.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

No trabalho de Santana et al (2015), A Experiência do uso da Escala Individualized


Music Therapy Assessment Profile (IMTAP) em Pacientes com Paralisia Cerebral o objetivo
da pesquisa foi analisar a aplicabilidade da escala IMTAP em pacientes com Paralisia
Cerebral (PC). Analisaram quatro dos dez domínios da escala: motricidade ampla,
comunicação receptiva/percepção auditiva, cognição e musicalidade. Em uma amostra de
nove pacientes com PC em dez sessões de atendimento individual com duração de 30 minutos
cada. A metodologia designou duas pesquisadoras para conduzir a pesquisa, tendo a
pesquisadora I a responsabilidade pela avaliação inicial e final e a pesquisadora II, a
realização das intervenções musicoterapêuticas. Santana et al (2015) relata que não houve
relevância estatística quanto à distribuição de sexo, idade e nível motor nem diferença
significativa entre os momentos inicial e final em todos os domínios. A escala estudada é
aplicável em pacientes com PC e, por meio dela é possível traçar o perfil do paciente e os
objetivos musicoterapêuticos (Santana et al, 2015).

Considerações finais
Realizada a pesquisa bibliográfica textual no contexto da musicoterapia, percebe-se uma
carência de estudos de instrumentos de avaliação específicos validados para uso no Brasil. O
estudo do tema da avaliação em Musicoterapia revela que os Instrumentos de avaliação da
área são recursos essenciais que auxiliam o desenvolvimento dos processos musicoterapêutico
ocasionando maior lucidez dos resultados. O desenvolvimento de ferramentas para avaliações
vão desde escalas emprestadas de outras áreas até as que são construídas a partir da prática
clinica. Com isso percebe-se o crescimento e consistência da Musicoterapia em suas
especificidades. Percebe-se também que o número de trabalhos de musicoterapia, no Brasil,
que aplicam instrumentos de avaliação pode ser ampliado.
As avaliações IMTAP, utilizadas nos trabalhos apresentados, seguiram um padrão de
análise de acordo com o modelo da ferramenta, onde os preenchimentos das fichas de
avaliação se dão por meio de analises de filmagens dos atendimentos realizados. Com a
finalidade de avaliar o processo da terapia, assinalando o sistema NRIC com base nas
oportunidades ofertadas de experiências musicais, pelo terapeuta ao participante. Ambas
destacaram a eficiência do instrumento para a definição dos objetivos terapêuticos e Santana
(2015) identificou que após um período de tratamento não foi evidenciado, pelo uso da
ferramenta IMTAP, resultado estatístico significativo nos domínios avaliados. A IMTAP, em
sua amplitude de domínios requer um treinamento pessoal, da observação e assimilação, dos
itens dos domínios analisados com as ações realizadas na sessão de musicoterapia.

120
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Referências:
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Baxter, H. T., Berghofer, J. A., MacEwan, L., Nelson, J., Peters K., & Roberts, P. (2007) The
individualized music therapy assessment profile – IMTAP. Foreword by Ronald M.
Borczon. ISBN-13: 978-1-84310-866-5.
Benenzon, R. (1985) Manual de musicoterapia. Tradução: Clementina Nastari. Enelivros. Rio
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alterações da linguagem. Universidade Federal de Goiás, Escola de Música e Artes
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Gattino, G. S.: Walter FF, Schüler-Faccini L. (2010) Fundamentos sobre validade para o
campo musicoterapêutico. In: Musicoterapia ABd, editor. X Encontro Nacional de Pesquisa
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Nordoff, P. & Robbins,Clive. (1977) Creative music therapy. New York, NY.
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Silva, A. M. (2012) Tradução para o português brasileiro e validação da escala
Individualized music therapy assessment profile (IMTAP) para uso no brasil. Dissertação
de Mestrado, UFRGS. Porto Alegre, RS.

121
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Música, saúde e bem-estar: quadro conceitual e pesquisas recentes

José Davison da Silva Júnior


Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco
davisonjr@gmail.com


Resumo: Este artigo tem como objetivo apresentar o quadro conceitual do campo de prática e
pesquisa ‘Música, Saúde e Bem-estar’, composto por cinco categorias que estão relacionadas:
Musicoterapia, Música Comunitária, Educação Musical, Música no Cotidiano e Música na Medicina,
bem como as pesquisas apresentadas em cada uma dessas categorias durante as últimas edições da
International Conference on Music Perception and Cognition, que é a principal conferência
internacional que discute a percepção e cognição musical. A relação entre Música, Saúde e Bem-
estar é complexa e multifacetada, envolvendo a questão central de por que a música tem sido
considerada um agente terapêutico em muitos estudos contemporâneos. Ao longo dos anos, o interesse
e as pesquisas sobre esse tema vem crescendo. Após a sistematização da área, que aconteceu no a n o
de 2010, a categoria Música na Medicina concentrou o maior número de pesquisas, seguida pelas
categorias Música Comunitária, Música no Cotidiano, Educação Musical e Musicoterapia.

Palavras-chave: musicoterapia, pedagogia musical, percepção musical.


Music, health, and wellbeing: conceptual framework and recent research

Abstract: This paper aims to present the conceptual framework of the field of practice and research
‘Music, Health and Wellbeing’, composed of five categories that are related: Music Therapy,
Community Music, Music Education, Every day uses of music and MusicMedicine, as well as the
research presented in each of these categories during the last editions of the International Conference
on Music Perception and Cognition, which is the main international conference that discusses musical
perception and cognition. The relationship between music, health and well-being is complex and
multifaceted, involving the central question of why music has been considered a therapeutic agent in
many contemporary studies. Over the years, interest and research on this topic has been growing.
After the systematization of the area, which took place in 2010, the category Music Medicine
concentrated the largest number of researches, followed by the categories Community Music, Every
day uses of music, Music Education and Music Therapy.

Key-words: music therapy, music pedagogy, music perception.

Introdução
Devido ao crescente reconhecimento dos benefícios das intervenções musicais na saúde,
foram organizados dois simpósios sobre Música e Saúde durante The 10th International
Conference on Music Perception and Cognition (ICMPC) em 2008, no Japão. O primeiro
simpósio apresentou uma série de estudos empíricos, relacionando os efeitos da participação
musical e da escuta musical em parâmetros da saúde. O segundo simpósio discutiu os efeitos
de práticas musicais em músicos amadores e músicos profissionais.
Durante The 11th International Conference on Music Perception and Cognition,
realizado em 2010, nos Estados Unidos, foram estabelecidas as bases que sistematizaram e
consolidaram a Música, Saúde e Bem-estar como um campo de prática e pesquisa,
envolvendo algumas áreas, como a terapia, educação, comunicação, contextos clínicos e

122
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

aplicados. Os temas discutidos no ICMPC de 2010 foram organizados, em 2012, no livro


Music, health, and wellbeing (MacDonald, Kreutz & Mitchell, 2012).
Este artigo tem como objetivo apresentar o quadro conceitual da Música, Saúde e
Bem-estar, composto por cinco categorias: Musicoterapia, Música Comunitária, Educação
Musical, Música no cotidiano e Música na Medicina e as pesquisas apresentadas nessas
categorias durante as últimas International Conferences on Music Perception and Cognition
(2012, 2014 e 2016).

Quadro conceitual para Música, Saúde e Bem-estar


A relação entre Música, Saúde e Bem-estar é complexa e multifacetada, envolvendo a questão
central de por que a música tem sido considerada um agente terapêutico em muitos estudos
contemporâneos. A música tem sido considerada curativa, terapêutica e com outros valores
médicos no decorrer da história. Um grande desafio é estabelecer uma relação causal entre as
atividades musicais e os benefícios na saúde e bem-estar. Existem algumas possíveis razões
pelas quais a música pode produzir efeitos positivos na saúde, tais como: a música é ubíqua,
emocional, envolvente, distrai, gera uma demanda física, é ambígua, social, comunicativa,
afeta o comportamento e a identidade (MacDonald, Kreutz & Mitchell, 2012).
MacDonald (2013) apresenta o quadro conceitual para Música, Saúde e Bem-estar, na
tentativa de integrar disciplinas que utilizam a música em razão de resultados positivos, as
quais incluem: Musicoterapia, Música Comunitária, Educação musical, Música no Cotidiano
e Música na Medicina. Essas áreas não estão isoladas, mas tem profunda relação uma com as
outras.
A primeira área é a Musicoterapia, a qual se estabeleceu no início do século XX,
desenvolvendo-se tanto na pesquisa quanto em intervenções terapêuticas. Um elemento chave
na Musicoterapia é a ênfase na relação terapêutica entre o musicoterapeuta e o cliente. As
intervenções musicoterapêuticas irão focar nos benefícios psicológicos ou fisiológicos dos
clientes como objetivo primário e serão realizadas por musicoterapeutas qualificados. As
intervenções musicoterapêuticas não terão o desenvolvimento musical, em termos do aumento
de habilidades técnicas, como objetivo primário e não estarão preocupadas com o aumento
geral das atividades artísticas no domínio musical (MacDonald, 2013).
De forma contrária, a Música Comunitária não terá os efeitos terapêuticos como
objetivo primário, mas sim o acesso às atividades artísticas fora de contextos convencionais
de ensino. Os coros comunitários e as classes de percussão são exemplos de intervenções da

123
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Música Comunitária. Pode não haver uma ênfase no desenvolvimento de habilidades técnicas.
O objetivo primário pode ser oferecer uma oportunidade para a expressão criativa em
contextos não formais. Um aspecto importante é que muitas intervenções de Música
Comunitária têm os benefícios psicológicos como um importante benefício secundário
(MacDonald, 2013).
Outra área importante é a Educação Musical. Em muitos contextos, a Educação
Musical é definida por uma ênfase no desenvolvimento de habilidades musicais. A função
primária da Educação Musical não é terapêutica ou social, no entanto, muitos educadores
musicais estão interessados nos amplos benefícios do ensino da música. Pesquisas recentes
investigam os efeitos das aulas de música em outros aspectos não musicais do funcionamento
psicológico. Surge aqui uma sobreposição da Educação Musical com a Musicoterapia e com a
Música Comunitária (MacDonald, 2013).
A quarta área, Música no Cotidiano, não é um campo distinto de prática da mesma
maneira que as três áreas anteriores são. Contudo, essa área tem uma importante relevância
sobre os efeitos da música na saúde e bem-estar. A discussão sobre a escuta musical poder
produzir efeitos positivos em nossa saúde e bem-estar gera um reconhecimento que esta é
uma importante área de estudo. Cada vez que selecionamos uma música para ouvir, nós
fazemos muitas avaliações sofisticadas sobre nosso atual estado mental e ambiente em que
iremos ouvir música. Dessa forma, nós reconhecemos que nossa escuta musical tem efeitos
profundos em como nós nos sentimos e também afeta as outras pessoas que podem estar
escutando nossa seleção musical (MacDonald, 2013).
A Música na Medicina refere-se a uma área especializada de trabalho na Música,
Saúde e Bem-estar que ocorre em contextos médicos. Essa talvez seja a disciplina mais focada
e especializada, com poucas pessoas trabalhando nessa área do que nas outras categorias. Um
exemplo típico da intervenção da Música na Medicina pode envolver pacientes escutando
música no procedimento cirúrgico para ajudar a reduzir a percepção de dor e ansiedade. Essa
abordagem é aplicada em cirurgia, anestesia, odontologia, dor, cuidado paliativo, cuidado
intensivo, obstetrícia, pediatria, geriatria, oftalmologia e neurologia. De alguma maneira, as
intervenções da Música na Medicina estão muito relacionadas como a Musicoterapia porque
tem resultados terapêuticos como objetivo primário. A Música na Medicina não se sobrepõe
com a Educação Musical ou com a Música Comunitária. Outra questão importante é que a
maioria das intervenções da Música na Medicina utilizam música pré-selecionada
(MacDonald, 2013).

124
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Pesquisas recentes
Após a sistematização da Música, Saúde e Bem-estar como campo de prática e pesquisa
(MacDonald et al., 2012), foram apresentados vários trabalhos no ICMPC. Organizamos os
trabalhos pelo ano em que foram apresentados, seus objetivos ou resultados e a categoria a
qual pertencem, dentro do quadro conceitual tratado anteriormente.
Durante The 12th International Conference for Music Perception and Cognition que
aconteceu em 2012, na Grécia, foram apresentados oito trabalhos na temática Música, Saúde e
Bem-estar. Um trabalho esteve inserido na categoria Música no Cotidiano, quatro na categoria
Música na Medicina, dois na categoria Musicoterapia e um na categoria Educação Musical.
No trabalho da categoria Música no Cotidiano, Gao & Rickard (2012) exploraram as relações
entre os hábitos de escuta musical, as estratégias de enfrentamento relacionadas à música e os
níveis de ansiedade em estudantes universitários.
Na categoria Música na Medicina, Tamar, Armin & Sergi (2012) investigaram a
percepção interativa entre o som e o corpo, sugerindo possíveis aplicações para a fisioterapia.
Os autores mostraram que o feedback sonoro poderia ser integrado eficientemente na
percepção do corpo. Wammes, Müllensiefen & Williamson (2012) apoiaram as hipóteses que
os indivíduos que sofrem de alucinações e psicoses vivenciam as imagens musicais de forma
similar aos sintomas de sua doença (nomeada de alucinação auditiva) e geralmente são
incapazes de distinguir entre as duas. Benoit, Kotz & Dalla Bella (2012) resumiram as
evidências clínicas e de imagem cerebral dos efeitos das indicações auditivas na marcha de
pacientes com a doença de Parkinson. McAuley et al. (2012) investigaram a discriminação
rítmica, utilizando ritmos simples e complexos para pessoas com a doença de Parkinson.
Na categoria Musicoterapia, van Vugt et al. (2012) concluíram que a musicoterapia
poderia aumentar a recuperação motora após um acidente vascular cerebral no grupo de
pessoas que utilizaram teclado. Dakovanou, Anagnostopoulou & Triantafyllaki (2012)
mostraram que aspectos da patologia da paciente investigada puderam estar associados com
os atributos musicais e estruturas encontradas em suas improvisações musicais. Na categoria
Educação Musical, Moura, Bortz & Aguiar (2012) apresentaram um tratamento
individualizado e a evolução da distonia focal em um guitarrista, depois de três e seis meses
de tratamento.
Na The 13th International Conference for Music Perception and Cognition, que
aconteceu em 2014, na Coreia do Sul, foram apresentados quatro trabalhos sobre Música,

125
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Saúde e Bem-estar. Dois trabalhos estiveram na categoria Música no Cotidiano, um trabalho


esteve na categoria Música Comunitária e um trabalho na categoria Educação Musical.
O primeiro trabalho da categoria Música no Cotidiano a dia explorou o papel de
experiências musicais no bem-estar de casamentos/parcerias em um grupo de cinco casais que
estavam aposentados e com boa saúde, procurando oferecer novos insights sobre a
importância da música em áreas importantes de suas vidas, identidade e relacionamentos
sociais (Morgan et al., 2014). O segundo trabalho, de Groarke & Horgan (2014), teve como
objetivo estudar como a escuta musical poderia facilitar o bem-estar subjetivo e eudaimônico
em jovens e idosos.
Na categoria Música Comunitária, Kreutz & Oldenburg (2014) mostraram resultados
que sugerem que cantar pode aumentar o bem-estar psicológico individual, bem como induzir
respostas de vínculo social e biológico. Na categoria Educação Musical, Panebianco-Warrens
(2014) explorou as experiências de fluxo de dançarinas profissionais de ballet, em um
contexto de performance e verificou que a experiência, a música e o nível de habilidades
musicais parecem ter um importante papel no fluxo vivenciado pelas dançarinas de ballet.
Na The 14th International Conference for Music Perception and Cognition, que
aconteceu no ano de 2016, na cidade de San Francisco, Estados Unidos, houve um maior
número de trabalhos apresentados sobre Música, Saúde e Bem-estar. No total foram onze
trabalhos. Quatro trabalhos estiveram na categoria Música Comunitária, dois na categoria
Educação Musical, dois na categoria Música no Cotidiano e três na categoria Música na
Medicina.
Os quatro trabalhos da categoria Música Comunitária foram organizados no simpósio
‘Cantar em coral e bem-estar’, o qual envolveu pesquisadores que estão investigando o papel
positivo que coros e grupo de cantores podem ter em diversos contextos, discutindo os
impactos que os grupos corais têm tido na saúde, na vida social e na vida intelectual dos
cantores, bem como nos mecanismos que podem sustentar essas mudanças (Launay, 2016).
Na categoria Educação Musical, Vik, Skeie & Specht (2016) exploraram os efeitos de
tocar piano na reabilitação neurológica de pacientes com traumatismo craniano. Greasley et
al. (2016) tratou sobre as perdas auditivas em músicos. Na categoria Música no Cotidiano,
Chin & Rickard exploraram as relações entre as diversas motivações para o engajamento com
a música e as percepções relatadas pelos próprios sujeitos sobre sua capacidade musical.
Groarke, Hogan & McKenna-Plumley (2016) investigaram a eficácia de intervenções de

126
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

escutar música com músicas escolhidas pelos próprios participantes, com sujeitos idosos e
jovens adultos.
Os trabalhos da categoria Música na Medicina foram organizados no simpósio
‘Música em contextos clínicos’, o qual teve como objetivo agrupar novas pesquisas que
estudam o uso efetivo da música no setor médico e dar impulso para futuras pesquisas na
área. Foram tratados temas como mudanças neurobiológicas na improvisação vocal, a
percepção da música no implante coclear e os efeitos de intervenções musicais nos níveis de
estresse durante cirurgia cesariana (Schaal, 2016).

Considerações finais
O campo de estudos ‘Música, Saúde e Bem-estar’ foi sistematizado em 2010. Desde então
vem discutindo os efeitos terapêuticos da música em cinco áreas: Musicoterapia, Música
Comunitária, Educação Musical, Música no Cotidiano e Música na Medicina. Essas áreas
podem utilizar a música para alcançar benefícios psicológicos como objetivo primário ou
secundário.
Através das publicações nos anais da International Conference on Music Perception
and Cognition (ICMPC) pudemos observar o desenvolvimento desse campo. As pesquisas
concentraram-se na Música na Medicina, com sete trabalhos, seguida pela Música no
Cotidiano e Música Comunitária, com cinco trabalhos. A Educação Musical teve quatro
trabalhos e a Musicoterapia teve dois trabalhos.
Percebemos que o uso da música em contextos médicos, fora do contexto da
Musicoterapia, tem sido o foco dos estudos. Também há interesse nos benefícios psicológicos
da música fora dos contextos formais de ensino e no dia a dia das pessoas. Os estudos na
Educação Musical estiveram direcionados para a saúde dos músicos, como a distonia focal e a
perda auditiva. Inferimos que a Musicoterapia teve apenas dois trabalhos em 2012 e nenhum
trabalho nos anos seguintes porque os musicoterapeutas discutem suas especificidades em um
grupo de trabalho e estudo próprio da Musicoterapia durante a ICMPC.

Referências
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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

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128
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

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escom2012_book_of_abstracts.pdf

129
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Musicoterapia, Música, Saúde e Bem-estar: aspectos convergentes,


divergentes e instrumentos de avaliação

Clara Márcia Piazzetta


Unespar Campus de Curitiba II – FAP
clara.piazzetta@unespar.edu.br


Resumo: Este trabalho apresenta um estudo bibliográfico comparativo entre áreas de Musicoterapia
e Música, Saúde e Bem Estar com o objetivo de identificar pontos convergente no que tange ao uso
de manifestação artística no ambiente da saúde e, divergentes quanto às formas de utilização da
música e as bases teóricas sobre alguns pontos entre eles, a musicalidade. Na Musicoterapia,
técnicas e instrumentos de avaliação destacam a interação musical entre o paciente e o
Musicoterapeuta como essencial para o trabalho. Música para o tratamento de enfermidades não
resume o trabalho da musicoterapia uma vez que, sua eficácia está apoiada na experiência com a
Música e em intervenções por meio sonoro musical construído na relação interpessoal terapêutica e
na relação intra e intermusical. Os instrumentos de avaliação que consideram a musicalidade e a
cognição musical dão suporte a esse diferencial da aplicação da música como musicoterapêutica.

Palavras-chave: musicoterapia, IMTAP, IMCAP-ND, MBEA, cognição musical.

Music Therapy, Music, health and wellbeing: convergent and divergent aspects
Abstract: This work presents a comparative bibliographical study between music therapy and
music, health and wellbeing areas with the aim of identifying convergent points regarding the use of
artistic expression in the health environment and, divergent as to the ways of using music and the
bases Theoretical about some points between them, the musicality. In Music Therapy, evaluation
techniques and instruments highlight the musical interaction between the patient and the Music
Therapist as essential for the work. Music for the treatment of infirmities does not summarize the
work of music therapy since its effectiveness is based on the experience with Music and on musical
sound interventions built in the interpersonal therapeutic relationship and the intra and intermusical
relationship. The instruments of evaluation that consider musicality and musical cognition support
this differential of the application of music as music therapy.
Key-words: music therapy, IMTAP, IMCAP-ND, MBEA, musical cognition.

Introdução
A Musicoterapia em essência é um campo interdisciplinar com métodos e técnicas específicas
(Barcellos, 2016). Deste modo, potencializa o desenvolvimento integral, a partir de
intervenções que visam ações do fazer musical e da musicalidade de cada pessoa, ou seja,
biopsico, espiritual e social, alcançados em intervenções que colocam em ação a cognição
musical.
Cognição musical pode ser entendida como um termo que congrega capacidades
perceptivas e práticas nos domínios do fazer musical. Correa et al, (1998), denomina funções
musicais como o conjunto de atividades cognitivas e motoras envolvidas no processamento da
música. Caracteriza-se como uma atividade multimodal do pensamento por envolver distintas
áreas, ao mesmo tempo, na performance musical: visual, auditiva, motora, cognitiva e
emocional. Essa autora denomina esse modo de funcionamento do processamento da

130
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

informação musical até a execução como practo-gnosia musical.


O entendimento da mente musical ou cognição musical, segundo Ilari(2009), se faz por
meio de um exercício interdisciplinar quando a pessoa está diante de manifestações artísticas
como a música e trabalha com ações conceituais e estéticas.
Enquanto aspectos perceptivos, as questões de capacidades discriminatórias, de altura,
intensidade, timbre e andamento dialogam para a construção de significado da experiência
musical imbuído dos afetos colocados em ação (Koelsh, 2011). Estudos científicos se
debruçam sobre esse tema de Música e emoções humanas em pesquisas quantitativas que
trazem em suas metodologias estratégias para a identificação de sentimentos acionados pela
escuta musical (Ramos et.al 2012, Ramos 2014).
MacDonald e colaboradores (2012) organizaram uma área de conhecimento
denominada: Música, saúde e bem estar. Deste modo voltaram-se às significativas evidencias
da ação da música sobre o ser humano com impactos diretos na melhora da qualidade de vida.
Destacaram ser a arte musical, um recurso de baixo custo ao colaborar com o tratamento de
pessoas que desenvolvem ou estão acometidas de doenças neurológicas (MacDonald et al,
2012).
Neste ponto, o cruzamento de percursos entre os estudos da Musicoterapia e Música,
Saúde e Bem estar mostram-se evidentes e, quanto aos resultados alcançados, podem ser
entendidos como sobreposições. Com mais especificidade, trabalhos de Musicoterapia na
Medicina e Música na Medicina seguem paralelamente, segundo estudos de meta análise
realizados por Dileo (2006), Effects of music and music therapy on medical patients: a meta-
analysis of the research and implications for the future.
As ferramentas científicas existentes alcançam a mensuração de processos perceptivos
sonoros e musicais assim como ação da música sobre o ser humano. Também as ferramentas
da Musicoterapia revelam as particularidades da relação que cada pessoa estabelece com a
música e com o meio à sua volta pelo exercício da musicalidade.
Um estudo bibliográfico exploratório busca ampliar o entendimento da sobreposição
entre Musicoterapia, Música Saúde e Bem Estar identificando pontos convergentes e
divergentes por meio de artigos, capítulos de livros, apostilas de cursos de treinamento de
técnicas específicas, dissertações e as ferramentas de avaliação de capacidades musicais
Amusia e os manuais de avaliação da interação musical construídos pela Musicoterapia.

131
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Instrumentos avaliação no contexto da Musicoterapia e da Música e Medicina


A mente musical em ação pode ser visualizada nos exames de neuroimagens e por
ferramentas para avaliação de capacidades e incapacidades nos domínios da música. Um
exemplo é a avaliação de Amusia desenvolvida por Peretz e col. (2003), Montreal Battery of
Evaluation of Amusia (MBEA). Essa Bateria foi traduzida e validada para o português por
Nunes e col. (2010) e aplicada por pesquisadores brasileiros (Ferreira &Ikuta. 2015; Andrade,
et al. 2016.).
A musicalidade é reconhecida como um atributo essencial da espécie humana, onde o
homem é um animal musical, isto é, um ser predisposto à música e com necessidade de
música, um ser que para sua plena realização precisa expressar-se em notas musicais e deve
produzir música para si mesmo e para o mundo (Zuckerkandl, 1956, 1973). Por essa visão
todos podem entender e se relacionar com a música e cérebros lesionados podem se
reorganizar por meio da plasticidade neural exercitada pela experiência musical, Protocol
Evaluation for Effective Music Therapy for Persons with Nonfluent Aphasia (Tomaino e Kim,
2008).
Pensando por esse ponto de vista algumas ferramentas de avaliação desenvolvidas
recentemente, por musicoterapeutas, buscam conhecer a mente musical através de
experiências musicais compartilhadas, ou seja, no espaço de relações entre musicoterapeuta,
música e as pessoas que são atendidas na Musicoterapia.
Os resultados são construídos através da avaliação pelo entendimento da musicalidade
em ação durante o processo musicoterapêutico. Duas ferramentas de avaliações individuais
são apresentadas por já estarem traduzidas para o português:
Individual Music-Centered Assessment Profile for Neurodevelopmental Disorders
(IMCAP – ND) (Carpente, 2013, tradução de Gattino , 2016) e Individualized Music Therapy
Assessment Profile (IMTAP) ( Baxter et. Al 2007, tradução e validação por Silva et al 2012)

Musicoterapia Médica
No trabalho de Musicoterapia Médica defendido por Dileo-Maranto (apud, Schapira, 2016)
destaca-se a especificidade do vínculo entre o musicoterapeuta e o paciente “usualmente
através da música”. Por esse vínculo o musicoterapeuta entra em ressonância com o estado do
paciente. Segundo Stern (1985 apud Shapira, 2016. p.1), se estabelece o fenômeno da
“sintonia empática”, ou “ a habilidade para compreender e validar a percepção de um
indivíduo sobre sua experiência”. O terapeuta coloca em prática uma habilidade para

132
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

identificar e reconhecer as experienciais emocionais e psicológicas do paciente. Esse


reconhecimento possibilita ao paciente um estado de maior consciência de seus ‘estados
internos’ e de suas mensagens implícitas. Com o reconhecimento de seu estado interno, o
paciente é guiado para as ações de mudanças.
Essa técnica trabalha a partir do processamento musical e formação de imagens, a
imaginação humana. Assim pode-se dizer que a ressonância com um paciente em
musicoterapia “pode ser mais poderosa, imediata e significante, validando e oferecendo a este
um retorno mais direto e intenso sobre sua própria experiência subjetiva” (Dileo-Maranto
apud Schapira, 2016 p.2).
Com base nessa ambientação de ressonância desenvolve-se a técnica do Entrainment
rítmico (Rider, 1985 apud Shapira 2016), efetiva nos tratamentos de dores crônicas. Essa
técnica “implica um processo interpessoal que inclui tomada de consciência, criatividade e
ressonância” (Dileo-Maranto apud Schapira, 2016 p.2).
Nesse contexto não se considera o uso da Música para a saúde como de baixo custo uma
vez que a formação de um profissional habilitado e certificado para usar a música como
recurso terapêutico não é de baixo custo. Além dos investimentos com a formação musical
têm os investimentos com a formação de musicoterapeuta. Essa inclui: supervisões, terapia
pessoal e cursos de aperfeiçoamento, como por exemplo, para manejo de instrumentos de
avaliação (IMCAP-ND; IMTAP),ou o aprendizado do manejo de técnica específica para
construção da relação terapêutica em Musicoterapia e medicina (ressonância) e aplicação de
técnica específica para a redução da dor (Entrainment).

Música Saúde e Bem Estar


Motivados por um desejo de investigar intervenções inovadoras, não invasivos, e
economicamente viáveis que adotam definições contemporâneas de saúde, profissionais e
pesquisadores em todo o mundo têm desenvolvido pesquisas com ações artísticas. Deste
modo os ambientes relacionados nessa área são (fig 1): Educação Musical, Uso da Música no
Cotidiano, Música Comunitária, Musicoterapia em par com Música e Medicina.
O foco destas pesquisas tem sido em atividades agradáveis e acessíveis que facilitam a
exploração da criatividade com um impacto significativo sobre os principais indicadores de
saúde (MacDonald et al 2012). São pesquisas qualitativas fenomenológicas para o re
significar do modo de ser e viver de cada pessoa.

133
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Musica Saúde e Bem estar

Música e
Medicina

Música Uso da
Educação Musicoter
Comunitá Música no
Musical apia
ria Cotidiano

Fig. 1 – Musica Saúde e Bem Estar, organograma organizado por MacDonald et al (2013).

Pesquisas em pacientes com epilepsia já diagnosticadas, Papp (2014) e Maguire (2012)


discutem com bases neurocientíficas, a ação da música no cérebro. A redução de crises
epilépticas relaciona-se com mudanças no sistema dopaminérgico para a redução de índices
de cortisol. O prazer com a música está no centro dessas mudanças. As pesquisas não tratam
sobre a cognição musical, ou mente musical, ou funções musicais, mas mensuram com a
ajuda de exames de neuroimagens o funcionamento cerebral identificando os pontos
acionados e os neurotransmissores ativados.

Avaliação em Música Saúde e Bem Estar


A diversidade da área Música Saúde e Bem Estar contempla diferentes possibilidades de
avaliação voltadas ao entendimento da condição de bem estar que se encontra a pessoa
enferma.
O olhar do segmento Música e Medicina utilizam muitas evidencias dos estudos sobre
Música e Cérebro. Atualmente a melhor ferramenta para mensurar os déficits das funções
musicais é a Montreal Battery of Evaluation of Amusia (MBEA), uma bateria com seis testes
que avalia o processamento musical referente à discriminação da organização melódica
(contorno, escala, intervalo), temporal (ritmo, métrica) e memória incidental. Em 2010, a
bateria de testes foi traduzida e validada no Brasil por Marília Nunes Silva e colaboradores e
em 2012 realizaram a versão reduzida visando uma melhor aplicabilidade.
Essa bateria, como o nome já indica, busca a identificação de habilidades musicais
pobres ou inexistentes – amusia. Quando usada entre indivíduos com desenvolvimento típico
ela também pode medir as diferenças individuais. (Andrade, et al. 2016).

134
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Instrumentos de avaliação em Musicoterapia


O trabalho da Musicoterapia considera a relação musical entre paciente e musicoterapeuta.
Deste modo, os instrumentos de avaliação construídos nesse segmento têm especificidades
para a área da Musicoterapia.
O Individual Music-Centered Assessment Profile for Neurodevelopmental Disorders
(IMCAP – ND), é uma ferramenta de avaliação construída com base na musicalidade em ação
e tem por base a interação musical, a comunicação, a cognição e a percepção “e pela
capacidade de respostas dentro do fazer musical para indivíduos com transtornos do
neurodesenvolvimento” (Carpente, 2013). Os elementos avaliados são habilidades musicais –
emocionais (MEARS), habilidades musicais cognitivas e perceptivas (MCPS), além de
capacidades de respostas musicais (MRS) que se referem à preferências, eficiência
perceptual, e autoregulação no fazer musical compartilhado.
Uma equipe de seis musicoterapeutas elaborou a Individualized Music Therapy
Assessment Profile – IMTAP. Conjunto de protocolos de avaliação individual na
musicoterapia que trabalha com processos de avaliação em diferentes níveis a fim de
apresentar um “perfil” de cada participante em musicoterapia ao longo dos processos de
intervenção (Silva et al, 2012).
Dez domínios independentes são trabalhados pelo IMTAP: Musicalidade;
Comunicação Expressiva; Comunicação Receptiva ou Percepção Auditiva; Motricidade
Grossa ou Ampla; Motricidade Fina; Motricidade Oral; Habilidade Sensorial; Habilidades
Cognitivas; Habilidade Emocional; e Interações Sociais. Cada um dos quais contêm sub-
domínios, no total, 374 itens são descritos como parâmetros de avaliação.

Considerações finais
Um olhar atento às publicações nas áreas de Musicoterapia, Música e Saúde revela as
especificidades destes ambientes que a princípio parecem se tratar de uma mesma coisa: a
Música usada para a saúde das pessoas. De fato, nesse ponto existe uma sobreposição. Como
apresentou MacDonald (2013), musicoterapia relaciona-se com Música e Saúde, mas Musica
e Saúde não demonstra a Musicoterapia apenas.
Enquanto Musicoterapia está totalmente voltada às relações construídas entre
pacientes e musicoterapeutas nas experiências musicais compartilhadas, Música Saúde e Bem
Estar volta-se aos resultados e à condição de qualidade de vida de pessoas enfermas.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

As técnicas apresentadas por Dileo (1997 apud Shapira 2016) de ressonância e


entrainment mostram a complexidade e a importância de formação e treinamento específico
por parte do musicoterapeuta para seu uso.
Os instrumentos de avaliação apresentados nesse trabalho da mesma forma deixam
essas diferenças mais em evidencia. Avaliação de capacidades musicais, MBEA, limitadas ou
inexistente é importante para o olhar das evidencias nos estudos de Música e Cérebro.
Os resultados da avaliação de interações musicais inseridas em processos
musicoterapêuticos voltam-se para as possibilidades de cada pessoa dentro de suas condições.
Permitem também um feedback ao musicoterapeuta das capacidades terapêuticas das
experiências apresentadas e vivenciadas entre ambos.
Deste modo, as particularidades na metodologia de intervenções musicais e formas de
avaliação do trabalho realizado revelam que se trata de áreas de conhecimentos distintos.

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137
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Cognição Musical e Processos


Perceptivos

138
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Ouvido Relativo: Definição, Relevância para a Percepção Musical


e Inter-relações com o Ouvido Absoluto
Nayana Di Giuseppe Germano
Instituto de Artes da UNESP
nayanager@hotmail.com

Hugo Cogo Moreira


Psiquiatria / UNIFESP
hugocogobr@gmail.com

Graziela Bortz
Instituto de Artes da UNESP
grazielabortz@gmail.com

Resumo: As habilidades musicais conhecidas como Ouvido Absoluto (OA) e Ouvido Relativo (OR)
são muito discutidas e estudadas por diversos pesquisadores. Resumidamente, o OA seria a
capacidade de identificar/emitir alturas sem nenhuma referência, enquanto o OR, por sua vez, seria a
capacidade de identificação/emissão de diversos estímulos melódicos/harmônicos a partir de uma
altura de referência. Apesar dessas duas habilidades serem bastante familiares a músicos, o número de
pesquisas relacionadas a cada um dos temas não é equivalente, uma vez que existe um número
significativamente maior de trabalhos que investigam diversos aspectos do OA comparado a pesquisas
dedicadas especificamente ao OR. Para diminuir esta lacuna, este trabalho tem como objetivo explorar
o campo do OR, trazendo reflexões acerca do desenvolvimento dessa habilidade, sua importância para
músicos, sua definição, e outras questões que tangem a área da educação musical e a disciplina de
percepção musical. O artigo apresenta uma breve visão sobre a disciplina percepção musical e sua
correlação com o OR, assim como explora diferentes caracterizações sobre esta habilidade, seguidos
de algumas observações sobre as inter-relações entre o OA e o OR. Como resultado, apontamos que
há dois sentidos distintos acerca da habilidade do OR, um amplo (músicos e não músicos) e um
restrito (somente músicos), os quais não são abordados conjuntamente na bibliografia consultada. Este
fato, combinado à existência de diferentes mitos sobre o OA, distorce a compreensão sobre as duas
habilidades e acaba criando um falso entendimento dessas.
Palavras-chave: ouvido relativo, ouvido absoluto, percepção musical, cognição musical.

Reflections on Relative Pitch: Definitions, Relevance to Auditory Perception and Interrelationships


with Absolute Pitch
Abstract: The musical abilities known as Absolute Pitch (AP) and Relative Pitch (RP) have been
discussed and studied by several researchers. Concisely, AP would be the capacity to identify/sing
pitches without reference, while RP would be the capacity to identify/utter various melodic/harmonics
stimuli starting from a reference pitch. Despite these two abilities being familiar to musicians, there is
no equivalence regarding the number of researches on each subject, since there are many researches
dedicated to AP, but a much smaller number of researches dedicated specifically to RP. In order to
decrease this gap, the present research aims to explore the RP phenomenon, bringing reflections about
the development of this ability, its importance to musicians, its definition, and other questions
regarding musical education and music perception. This paper presents a brief overview of the
discipline of music perception and its correlation with RP, explores different perspectives about this
ability as well as the interrelations between AP and RP. As a result, we point out that there are two
distinct senses about RP ability, which has not been covered together at the consulted bibliography.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

This fact, combined with some myths about AP phenomenon, distorts the understanding about the two
skills and creates a false understanding about them.
Keywords: relative pitch, absolute pitch, music perception, music cognition.

Introdução
As habilidades musicais conhecidas como Ouvido Absoluto (OA) e o Ouvido Relativo (OR)
são muito discutidas e estudadas por diversos pesquisadores não só na área musical, mas
também na área da neurociência e psicologia. O OA é frequentemente caracterizado como a
capacidade de identificar/emitir alturas sem nenhum tipo de referência1, enquanto o OR, por
sua vez, costuma ser caracterizado como capacidade de identificação/emissão de diversos
estímulos melódicos/harmônicos a partir de uma altura de referência. Apesar de essas duas
habilidades serem bastante familiares a músicos, o número de pesquisas relacionadas a cada
um dos temas não é equivalente, uma vez que existe um número significativamente maior de
trabalhos que investigam diversos aspectos do OA. O motivo dessa discrepância muito
provavelmente advém do fato de que o OA é um objeto de estudo que desperta grande
curiosidade, sendo muitas vezes idealizado como um mistério cognitivo a ser desvendado; já
o OR é tratado como uma habilidade comum, capaz de ser adquirida através de treinamento
por qualquer pessoa. Contudo, compreender melhor o OR é extremamente importante para o
domínio musical e áreas correlacionadas, com especial destaque para o campo da percepção
musical. Deste modo, o presente trabalho tem como objetivo explorar a habilidade do OR,
trazendo reflexões acerca do desenvolvimento dessa habilidade, sua importância para
músicos, sua definição, sua relação com o OA e outras questões que tangem a área da
educação musical e da percepção musical.

Percepção Musical e Definição de Ouvido Relativo


A disciplina Percepção Musical está presente na grade curricular de praticamente todos os
cursos de música ao redor do mundo (Burns e Campbell, 1994). O objetivo principal dessa
disciplina costuma ser a preparação do estudante para o exercício pleno da profissão de
músico, capacitando-o a discriminar e reconhecer elementos musicais diversos através da
audição, solfejar de forma afinada, precisa e fluida melodias e ritmos distintos, além de torná-
lo capaz de transcrever, por meio da audição, variados elementos musicais de forma correta e
mais acurada possível. O aprendizado de tais habilidades não costuma ser uma tarefa fácil
nem mesmo rápido, sendo que, na maior parte das vezes, o estudante leva alguns anos até se

140
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

tornar capaz de realizar com destreza os objetivos propostos. O treino específico e regular de
Percepção Musical busca desenvolver a habilidade cognitiva conhecida como OR.
Burns e Campbell (1994) fornecem uma descrição do fenômeno do OR, embora
defendam que tal habilidade não é essencial nem para a apreciação musical nem para a prática
instrumental:
[...] a maioria dos músicos treinados desenvolve o chamado OR, habilidade de
identificar intervalos musicais. Por exemplo, quando apresentados a dois tons 2 cuja
razão entre suas frequências corresponde a algum dos intervalos da escala de
temperamento igual, seja sequencialmente (intervalos melódicos) ou
simultaneamente (intervalos harmônicos), os portadores de OR são capazes de
identificar o intervalo usando o rótulo verbal apropriado. De forma equivalente, se
for dito que um dos tons que compõem o intervalo é uma nota em particular na
escala (Dó, por exemplo), eles podem dar o nome da outra nota. Finalmente, se for
dado um tom de referência e o rótulo verbal de um intervalo, eles são capazes de
produzir o intervalo. Embora essa habilidade não seja essencial para a habilidade de
tocar música, ela é necessária em certas situações (por exemplo, quando um
vocalista precisa ler uma peça musical à primeira vista), e em cursos de percepção
musical, nos quais a habilidade é desenvolvida e que fazem parte do currículo da
maioria dos cursos de música. Nesta seção, os limites e precisão do OR são
explorados, juntamente com os limites da habilidade de portadores de OR de
discriminar intervalos em tarefas de discriminação de pares de alturas. (Burns &
Campbell, 1994, p. 2706).

A habilidade do OR também está presente em não músicos, ao menos em certa


medida. De forma mais ampla, o fenômeno do OR pode ser atribuído a qualquer pessoa que
consiga realizar tarefas musicais básicas relacionadas a alturas, como reconhecer uma música
familiar transposta ou tocada em um instrumento diferente do original, tarefas que dependem
da capacidade de reconhecimento intervalar e tímbrico (realizados de forma
predominantemente instintiva e inconsciente). Como grande parte da população de não
músicos é capaz de realizar esse tipo de tarefa e muitos também são capazes de cantar canções
familiares de forma afinada, tais pessoas podem ser consideradas portadoras de OR. Por outro
lado, no sentido restrito da definição apresentado anteriormente, o OR refere-se à capacidade
de nomear intervalos e outros elementos musicais (como tríades, tonalidades, progressões
harmônicas, escalas, entre outros). Músicos não só precisam reconhecer músicas familiares
como fazem os não músicos, mas também devem ser capazes de reconhecer conscientemente
e nomear verbalmente e/ou por meio de transcrição os principais elementos utilizados na
composição de obras musicais (por exemplo, se o intervalo ouvido foi uma terça maior ou
uma terça menor). Essa divisão vai de acordo com tratados muito antigos, como Jadassohn
(1899) que aborda alguns parâmetros referentes ao assunto do OR:

141
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Ouvido Relativo é a relação que qualquer tom dado carrega em relação a algum tom
de referência. Quase todas as pessoas possuem OR em algum grau. Antes de estudar
música, uma pessoa deve ao menos ser capaz de diferenciar um uníssono de um
intervalo; uma tríade maior de uma menor; e a cantar dois ou três tons diatônicos
depois de tê-los escutado (Jadassohn, 1899, p. 3).

Na perspectiva de que não músicos são capazes de fazer relações musicais intervalares
que podem caracterizar o sentido amplo de OR, Plantinga e Trainor (2005) realizaram uma
abordagem muito interessante sobre a possível retenção de alturas absolutas em exposições
musicais repetidas sempre na mesma tonalidade. Isso pode explicar o fato de que muitos não
músicos são capazes de cantar, sem referência, uma música familiar na tonalidade original:

[...] um código de OR, por outro lado, não contém informação sobre as atuais
frequências fundamentais. Pelo contrário, ele consiste na sequência de distâncias de
alturas entre sucessivos tons melódicos e vogais. A grande maioria dos adultos
codifica alturas musicais predominantemente em termos relativos. Por exemplo, eles
reconhecem uma música como “Parabéns a você” independentemente se a música se
iniciou com uma nota mais grave ou mais aguda, contanto que a distância entre os
intervalos esteja correta. A maior parte das pessoas adultas, depois de um curto
intervalo de tempo, não se lembra precisamente das alturas absolutas, embora a
experiência de uma música em particular ou um som sempre na mesma altura possa
levar a alguma retenção de alturas absolutas (Halpern, 1989; Levitin, 1994;
Schellenberg & Trehub, 2003; Terhardt & Seewann, 1983, citado por Plantinga &
Trainor, 2005, p. 2).

É importante observar que os trabalhos supramencionados não tinham como objetivo


principal investigar a fundo o OR, mas sim fazer uma relação dessa habilidade com a
habilidade do OA. Talvez por essa razão, nenhuma dessas pesquisas discuta a probabilidade
de haver duas possíveis definições distintas de OR, uma mais restrita, que se refere
exclusivamente a músicos treinados, e outra mais ampla, que inclui leigos. Dessa forma,
enquanto alguns autores abordam a habilidade em seu sentido geral (presente em todas as
pessoas), outros a abordam em seu sentido restrito (adquirida através de treinamento musical).

Ouvido Relativo e Ouvido Absoluto: Algumas Considerações


Quando se busca uma definição geral de um termo musical, um dos lugares mais pesquisados
é o Dicionário Grove de Música, pois além de ser uma referência conceitual reconhecida e
estabelecida, ele fornece definições relativamente detalhadas e com sólido embasamento
bibliográfico. O fato do dicionário Grove Online não contemplar o termo OR nos deixou
bastante intrigados, pois o mesmo dicionário fornece uma definição bastante detalhada sobre

142
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

o OA. Esta ausência pode ser um forte indício de que não existe uma preocupação real em
estudar o fenômeno do OR na área musical.
De fato, encontramos as principais referências ao OR nos autores dedicados à pesquisa
e compreensão do OA, onde o OR é tratado primordialmente como uma habilidade cognitiva
distinta, mas de interesse acentuadamente menor. O “mistério a ser desvendado” em torno do
OA está relacionado à constatação de que a habilidade aparenta ser, segundo a maior parte dos
pesquisadores, incomum tanto entre músicos como entre não músicos, e que é em geral
considerada inata, não sendo aparentemente possível de ser adquirida através do treinamento
musical (como o OR notoriamente o é).
Todo esse interesse no “dom incomum” que é o OA, contribuiu para a criação da lenda
de que portadores de OA são pessoas totalmente raras e incomuns que possuem algum tipo de
super-habilidade perante qualquer outro ser do mundo. Essa lenda nos leva a acreditar que
portadores de OA são capazes de identificar com precisão qualquer altura em qualquer
instrumento, e que nunca erram. Seguindo esse raciocínio, muitas pessoas acreditam que os
portadores de OA poderiam ser dispensados da disciplina percepção musical (ou ao menos de
parte de seu conteúdo), uma vez que grande parte do que é ensinado nessa disciplina já seria
sabido e dominado pelos portadores, tornando-a pouco proveitosa para essas pessoas.
Contudo, esta crença está longe de ser verdadeira. Como pesquisadores e músicos,
devemos compreender que a ideia de que portadores OA apresentam uma percepção de
alturas infalível é um mito. Muitos portadores de OA possuem, segundo vários autores,
diversas limitações em relação a timbre, registro, tempo de resposta, além de apresentarem
uma perceptível margem de erro (considerada em torno de meio tom)3.
Ademais, alguns autores defendem que o OA pode atrapalhar não só a aquisição plena
do OR, mas também a aquisição de conceitos musicais específicos, além de poder dificultar a
apreciação musical. Uma vez que portadores de OA reconhecem alturas através de rótulos, o
conceito de intervalos fica em segundo lugar, esquecido, levando o portador a apenas perceber
as duas alturas ouvidas isoladamente e, em seguida, calcular qual seria o intervalo entre elas,
como se fosse uma conta matemática. Alguns portadores de OA não são capazes de
reconhecer nem sequer intervalos simples, como uma oitava, se não puderem ouvir a altura
rotulada, demostrando um subdesenvolvimento significativo da habilidade do OR.
Quanto à apreciação musical, alguns autores acreditam que o OA pode atrapalhá-la.

Em relação ao Ouvido Relativo, músicos com tone-AP podem ser menos habilidosos
do que outros músicos, calculando intervalos e acordes a partir dos nomes das notas

143
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

ao invés de ouvi-los diretamente (Miyazaki, 1991-2, 1993-4). Além disso, a sua


consciência constante dos rótulos das alturas musicais pode atrapalhar ou distrair a
apreciação da música (Parncutt & Levitin, 2013).

A comparação das habilidades cognitivas do OA e do OR em relação à percepção


musical foi realizada em um estudo de Miyazaki (1995) com o objetivo específico de
comparar a performance dos dois tipos de portadores no reconhecimento de intervalos desde
um semitom até uma oitava. Os resultados apontam que portadores de OA são fracos em
processos que envolvem o OR e mostram uma tendência a sempre depender do OA:

OA e OR são dois modos bem diferentes de processamento de alturas e podem ser


incompatíveis em alguns casos. Um caso de treinamento de OA que obteve sucesso
em crianças (Oura & Eguchi, 1982), mostrou que o OA é mais eficientemente
adquirido antes dos 7 anos de idade, depois disso o OR se desenvolve. Esta
transformação sugere que o desenvolvimento do OR pode dificultar a aquisição do
OA (Hulse et al., 1992). Também pode haver o efeito contrário – isto é, o OA, uma
vez adquirido, interfere com o completo desenvolvimento do OR, porque crianças
que adquirem o OA preciso cedo na infância tendem a persistir em usar o OA em
atividades musicais e não têm nenhuma motivação para aprender o OR (Miyazaki,
1995, p. 962).

A falta de motivação apontada por Miyazaki (1995) é um dado bastante importante,


pois grande parte dos exercícios melódicos e harmônicos propostos nas aulas de percepção
musical para iniciantes pode, sem nenhum problema, ser respondido utilizando-se unicamente
o OA. Assim, o aluno portador de OA pode se sentir desestimulado a acompanhar aulas em
que o professor ensine dicas aos demais discentes para que estes possam realizar as tarefas
propostas (dicas estas que fazem parte do desenvolvimento do OR), enquanto o aluno
portador de OA já é capaz de realizar tais tarefas utilizando seus próprios meios.
É nesse ponto que encontramos a grande deficiência de portadores de OA que não
possuem OR. Uma vez que esses portadores, no início de seus estudos, não dispuseram de
interesse ou motivação para desenvolver o OR, quando atingem um nível avançado no curso
de percepção musical, começam a sentir certas dificuldades em algumas tarefas mais
complexas, como o reconhecimento de funções harmônicas, a realização de transposições e
modulações em ditados e solfejos, chegando até mesmo a apresentar dificuldades em tarefas
mais simples como a distinção de tríades maiores e menores. Assim, o aluno se vê impotente,
pois por conta de variadas limitações, não consegue utilizar apenas o OA para suprir suas
necessidades. É exatamente nesse momento que tal discente percebe a necessidade de
desenvolver o OR, porém, como não trabalhou de forma progressiva desde o início de seus

144
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

estudos, se depara com uma enorme dificuldade (ou seja, o aluno passa subitamente do tédio à
ansiedade). Essa cadeia de eventos leva alguns alunos a culpar o OA pelas suas dificuldades,
dizendo que ele “atrapalha” no desenvolvimento do OR, mas o que realmente acontece é que
esse portador de OA está tentando pular etapas do processo, querendo desenvolver o OR
apenas para tarefas em que seu OA não é suficiente, ou seja, tarefas musicalmente mais
complexas.

Apontamentos Finais
Conforme apontado, as habilidades do OA e do OR são de interesse não somente do campo
musical, mas também de áreas como a neurociência e psicologia. Contudo, o OR é
significativamente menos estudado do que o OA. Deste modo, objetivamos explorar neste
trabalho a habilidade do OR, trazendo reflexões acerca do desenvolvimento dessa habilidade,
de sua importância para músicos e, principalmente, de sua definição. Passamos então a
apresentar uma rápida visão sobre a disciplina percepção musical e sua correlação com o OR,
enquanto exploramos diferentes caracterizações sobre esta habilidade. A seguir, tecemos
algumas considerações sobre as inter-relações entre o OA e o OR, incluindo questões sobre as
interferências que uma habilidade exerce sobre o desenvolvimento da outra.
Como resultado deste trabalho, vimos que há dois sentidos distintos acerca da
habilidade do OR, que apresentam características comuns, mas que operam em polos distintos
em relação à percepção de elementos melódicos e harmônicos: um sentido mais amplo e outro
mais restrito. O que mais chama a atenção é que cada trabalho consultado explora apenas uma
dessas definições. Como consequência, não apenas o OR costuma ser deixado em segundo
plano frente ao OA, mas ele também acaba sendo apenas parcialmente explorado nestes
trabalhos. Consequentemente, para que seja possível uma compreensão mais apurada sobre o
OR, é essencial que futuras pesquisas se dediquem a aprofundar estudos sobre ela, mas em
ambos os sentidos apontados.
Por fim, apesar da pouca bibliografia existente sobre o OR, apontamos que essa
habilidade é essencial na vida de músicos. Essa incongruência deve-se sobretudo à existência
de certos mitos sobre o OA. Um desses mitos, não apresentado anteriormente, presente nas
comunidades musicais (aceito de forma implícita ou explícita) e potencialmente mais
problemático, considera que possuir a habilidade do OA pode ajudar a fazer de alguém um
músico melhor. Os pormenores desse mito não foram discutidos nesse trabalho, mas é
importante ressaltar que a névoa em volta deste e outros mitos em relação ao OA distorce a

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

realidade perceptiva musical e acaba criando um falso entendimento das duas habilidades.
Obviamente, a musicalidade é multifacetada e o componente dominante (pelo menos na
música tonal) é desenvolver um forte senso de OR (Ross et al, 2005). Consequentemente,
para serem melhores músicos, portadores de OA devem buscar desenvolver plenamente o OR
por meio de treinamento. Por tal razão, faz-se necessária a conscientização por parte da
comunidade docente e músicos profissionais de que a obtenção do OR é importante na
carreira musical e que todos os estudantes devem considerar a possível busca por esse
aprimoramento, pois os ajudará a enfrentar os desafios musicais de sua carreira.

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1 A definição do OA ainda é controvérsia entre os autores, com diversos parâmetros consensuais e não
consensuais envolvidos em sua abordagem. Para uma discussão aprofundada sobre a questão, ver Germano
(2015).
2 A palavra “tom” foi escolhida para a tradução da palavra originária da língua inglesa “tone”. A primeira
dificuldade encontrada nessa tradução foi a questão semântica, pois a palavra “tom” apresenta certa ambiguidade
por contemplar significados distintos. Segundo Nattiez (1985), a palavra tom possui quatro acepções: 1-
Indicação de uma altura, que pode ser tanto determinada (Ex.: a nota dó) quanto indeterminada (Ex.: os tons
agudos da voz); 2- Intervalo entre duas alturas (Tom e Semitom); 3- Definição de uma escala musical (o tom de
uma determinada música); 4- Tom como qualidade, expressão ou colocação (Ex.: o tom familiar da voz). No
presente trabalho, a tradução da palavra tone por tom será abordada como sentido de altura específica (dentro da
1° acepção apontada por Nattiez).

3 Para mais informações e referências sobre o assunto, ver Germano (2015).

147
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Prácticas, concepciones y valoraciones del desarrollo auditivo musical en


escenarios curriculares y extracurriculares: cuatro casos de estudiantes de
composición y arreglos

Genoveva Salazar Hakim


Universidad Distrital Francisco José de Caldas
salazar_genoveva@yahoo.com

Resumen: La audición estructural es una habilidad que se busca desarrollar en el contexto


universitario en asignaturas como Formación Auditiva y Entrenamiento Auditivo, entre otras. No
obstante, la audición musical, como modo de aprendizaje perceptual y de conocimiento, se va
afinando desde que se tiene la posibilidad de interactuar con la música. Así, varios de los
escenarios de aprendizaje, informales y formales en los que han estado inmersos los estudiantes
universitarios, propician desarrollos auditivos en función de las prácticas musicales en las que se
involucran. El objetivo es indagar por las prácticas, concepciones y valoraciones de desarrollo
auditivo que tienen los estudiantes del PCAM, a partir de la observación de cuatro casos del
énfasis de Composición y Arreglos, considerando prácticas de aprendizaje y de hacer musical en
escenarios previos a la carrera y durante esta. El estudio es exploratorio, con metodología
cualitativa. La información es recolectada a través de entrevistas semiestructuradas aplicadas por
estudiantes. En los resultados prevalecen concepciones del desarrollo auditivo orientado a la
audición estructural cuyo proceso de aprendizaje se percibe como arduo y en ocasiones frustrante.
Las imágenes auditivas de estructuraciones musicales consolidadas desde prácticas instrumentales
previas a la carrera, son una base relevante para los conocimientos conceptuales que demanda la
audición estructural. No obstante, al ingreso a la carrera, la ausencia del uso de su instrumento
familiar en la tarea de identificar estructuras musicales en las clases de Formación Auditiva,
dificulta la creación de los nuevos significados que demanda la audición estructural.
Palabras claves: competencias, audición, percepción musical, significado musical.

Practices, conceptions and evaluations of musical listening development in curricular and


extracurricular scenarios: four cases of students of composition and arrangement
Abstract: The so-called structural listening is a skill that seeks to be developed in the university
context in subjects as Listening Education and Ear Training, between others. However, the musical
listening, as a mode of perceptual learning and knowledge, is something that is becoming tuned
since there is the possibility of interacting with music. Thus, several of the scenarios of learning,
informal and formal, in which university students have been immersed, encourage listening
developments according to the musical practices in which they are involved. The purpose of this
study is to inquire for practices, conceptions and evaluations of musical listening development that
have the students of the PCAM, through the observation of four cases of the Composition and
Arrangements emphasis, considering their practices of learning and musical performances during
the career and before it. The study is exploratory with qualitative methodology. The information is
collected through semi-structured interviews applied by students. The results reveal that
conceptions of listening development are oriented through structural listening; this learning
process is perceived as hard and sometimes frustrating. The auditory images consolidated from
instrumental practices prior to their career, are a relevant basis for conceptual knowledge implied
in structural listening. However, at the beginning of the career, the fact of not having its familiar
instrument for resolving problems of musical structure identification in subjects as Ear Training,
makes difficult the creation of new meanings that demands musical listening.
Key-words: competences, audition, musical perception, musical meaning.

Tener desarrollo auditivo es una competencia de gran importancia en las carreras de


formación profesional en música. En dicho contexto, existen asignaturas como Formación

148
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Auditiva y Entrenamiento Auditivo orientadas al desarrollo de competencias auditivas,


consistentes en lograr habilidades para identificar, denominar y describir aspectos de
estructuración musical mediante términos y sistemas de notación de la tradición occidental.
Este tipo de competencias auditivas se asocian con la llamada audición estructural, cuya
posesión se demuestra mediante conocimientos de tipo proposicional o declarativo.
Las asignaturas como Formación Auditiva se ubican en los primeros semestres de la
carrera, como necesidad de cualificar el manejo de la lectoescritura musical aunada a la
identificación auditiva de aspectos estructurales de la música, expresables mediante los
códigos de comunicación y notación (sonoros, verbales, escritos, gestuales). En el contexto
académico, la existencia de este tipo de asignaturas se ve necesaria, en la medida en que
aportan conocimientos básicos de comunicación musical, para acceder a otros particulares de
las prácticas de aprendizaje instrumental, compositivo, en dirección y en historia y análisis de
los estilos musicales, entre otros.
No obstante, el logro de competencias auditivas puede ser comprendido en contextos
más amplios en cuanto a escenarios de formación y contenidos de aprendizaje y enseñanza.
Podría decirse que previo a tener una inmersión en escenarios que enfatizan el desarrollo de la
audición estructural, los estudiantes han tenido aprendizajes musicales en donde han
desarrollado habilidades auditivas vinculadas a prácticas musicales, bien sea con o sin la
mediación de la lecto-escritura musical, por ejemplo, sacando música “de oído”, tocando
solos o en grupo, o componiendo.
¿Qué tipo de prácticas de aprendizaje musical han tenido los estudiantes previo a la
carrera, en donde consideran que han desarrollado habilidades auditivas? y ¿de qué tipo son
dichas habilidades? ¿Cómo valoran los estudiantes sus desarrollos auditivos y cómo observan
la articulación de sus habilidades auditivas entre los diferentes escenarios de aprendizaje y
práctica previos a la carrera y dentro de ésta? Estas son preguntas que han orientado este
trabajo y que, además de posibilitar nutrir de contenido la categoría de audición musical como
modo de conocimiento, permiten tener una aproximación a aspectos que facilitan o dificultan
la transferencia de conocimientos entre los diferentes escenarios de aprendizaje y práctica
musical por los que transitan los estudiantes. De igual forma, posibilitan tener una noción
sobre hasta que punto las intituciones universitarias tienen en cuenta en sus propuestas
pedagógicas las prácticas auditivas de los estudiantes previas a la carrera.

149
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Fundamentación
La audición, como modalidad perceptual básica para aprendizajes y prácticas musicales
diversos, constituye un modo de conocimiento musical que involucra conocimientos de tipo
proposicional y no proposicional (Johnson, 1987; Stubley, 1992; Cox, 2011). Desde una
perspectiva corporeizada, la experiencia auditiva y los significados que se crean a partir de la
misma son de naturaleza transmodal (sincronía entre modalidades perceptuales) y
transdominio (confluencia de dominios de la experiencia) (Johnson, 1987; Martínez, 2009;
Shifres, 2006, 2012). A su vez, siguiendo la hipótesis de la mímesis (Cox, 2011), la
comprensión musical que involucra la audición se basa en mímesis motoras y en la
imaginación que puede ser de naturaleza intramodal, intermodal o amodal, en lo que respecta
a modalidades perceptuales y dominios de la experiencia involucrados en la construcción de
significados y en los procesos de aprendizaje.
Según lo planteado por Clarke (2005) desde la perspectiva ecológica de la audición, a
través de las diversas interacciones con las prácticas musicales que ofrece el entorno es que se
va cualificando, afinando y adaptando el sistema perceptual auditivo para captar las
propiedades estructurales de los objetos del ambiente, entre estos, todos aquellos que
consideremos musicales. El desarrollo auditivo musical a su vez implica poder actuar de
manera competente en las prácticas sociales y culturales que involucran la participación en la
música.
Son diversos los escenarios y prácticas en los cuales nos involucramos musicalmente y
que ofrecen oportunidades de cualificación, o de refinamiento de habilidades auditivas
musicales (Clarke, 2005). Desde la perspectiva de las prácticas de aprendizaje, estos
escenarios o situaciones pueden ser de naturaleza formal o informal (Green, 2002, 2008). En
el contexto de la académica, se favorecen algunos espacios para el desarrollo de la audición
de manera explícita, orientándose especialmente a un modo de escucha reconocido como
audición estructural, en donde se privilegia la imaginación, el pensamiento y la descripción de
enunciados musicales, en términos de categorías y sistemas de notación desarrollados por la
teoría musical de Occidente (Shifres, 2009).
No obstante, las habilidades auditivas para el desempeño musical en diversas prácticas
(interpretación, composición, dirección) y sus particularidades, no pueden ser vistas como
producto exclusivo de las acciones e interacciones que tienen lugar en un solo espacio de
formación, llámese este Solfeo, Entrenamiento Auditivo o Formación Auditiva. Por el
contrario, son múltiples los escenarios y prácticas que contribuyen al desarrollo de los

150
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

estudiantes en cuanto a habilidades y conocimientos que involucran la audición musical y la


cualifican (Salazar 2015, 2015a).

Objetivo
El propósito de este trabajo es mostrar resultados parciales de investigación sobre las
prácticas, concepciones y valoraciones de desarrollo auditivo de estudiantes del PCAM en
aprendizajes y prácticas previos a la carrera musical y durante esta, centrándose en el estudio
de cuatro casos del Énfasis en Composición y Arreglos.

Método
Este es un estudio exploratorio de aproximación cualitativa, basado en la observación de
cuatro casos de estudiantes del Énfasis en Composición y Arreglos que se encontraban
cursando los últimos semestres de carrera en el PCAM. En su totalidad eran hombres y sus
edades eran de 31 (1), 27 (1) y 26 (2) años. La metodología comprendió: (1) la realización de
entrevistas semiestructuradas realizadas por pares; (2) el análisis y la sistematización de las
entrevistas, y (3) la interpretación de datos para lo cual se consideró: (a) la inferencia de
desarrollos auditivos que hizo la investigadora a partir de los testimonios sobre prácticas de
aprendizaje musical relatadas por los estudiantes y, (b) las descripciones puntuales de los
estudiantes sobre sus propias habilidades auditivas. Se tuvo en cuenta categorías como:
procesos transmodales y transdominio, modos de conocimiento proposicionales y no
proposicionales, prácticas de aprendizaje (informales, formales) y audición estructural.

Resultados
Inicialmente se presenta una síntesis de recorridos de los estudiantes previo a la carrera en
cuanto a las prácticas musicales transitadas y a sus escenarios, para dar un marco contextual a
los resultados respecto de las concepciones y valoraciones de los desarrollos auditivos de los
casos observados.

Prácticas auditivas y musicales previas a la carrera


Desde lo relatado por los estudiantes, se puede observar que previo al ingreso a la carrera,
ellos han tenido prácticas musicales en ambientes tales como: la exploración instrumental en
solitario o "autodidacta", la participación musical tocando en agrupaciones con amigos o en
el colegio, el estudio instrumental con profesor particular y/o en academia, y el estudio

151
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

formalizado con rasgos similares a las propuestas de formación profesional en carreras de


música pero en pequeña escala.
Una constante en los cuatro casos observados es la inmersión en la música a partir de la
exploración y el aprendizaje de un instrumento, por motivaciones diferentes: querer tocar un
instrumento, hacer música en solitario o en agrupaciones, traducir el entorno circundante o el
mundo interior desde las posibilidades sonoras de un instrumento. En algunos casos la
exploración instrumental se inicia en solitario y en otros se aprende bajo la orientación de un
profesor (en academia o en colegio). En los procedimientos referidos sobre la práctica
instrumental se alude a “sacar de oído”, “transcribir directamente al instrumento”, “orejear” y
seguir las indicaciones de un profesor para tocar; todo esto se hace habitualmente sin la
mediación de la notación musical. Esta última se utiliza posteriormente como: recurso para
cualificar la técnica de ejecución del instrumento, para comunicar aspectos estructurales
(cifrados, ritmos, melodías, repertorios) en función de tocar músicas de determinados géneros
y para estudiar solfeo, entrenamiento auditivo, armonía, tocar en ensambles en escuelas de
música y hacer arreglos a ser ejecutados instrumentalmente.
En los procedimientos descritos por los estudiantes en cuanto a la práctica instrumental,
se infiere que al “sacar de oído” se aplican recursos de imaginación que involucran el
recuerdo, la memorización, las habilidades de ejecución que se consolidan durante la
búsqueda de sonoridades y el afianzamiento de procedimientos para obtenerlas. El “sacar de
oído” se articula con prácticas como cantar lo que se escucha y luego encontrar e imitar en el
instrumento lo que se canta, algo que, de acuerdo con Cox (2011), constituye una imitación
intermodal. De igual forma, se da la imitación intramodal, cuando en el entorno escolar entre
pares, o en la relación profesor-alumno, el estudiante observa e imita cómo el otro toca
determinado aspecto musical, desde una fuente sonora similar a la que se manipula. La
imitación, de tipo amodal se observa cuando se hacen “traducciones” de imágenes
emocionales al instrumento.
En las alusiones al desarrollo auditivo en la etapa previa a la carrera, este se asocia
poco con la práctica de “sacar de oído”. La mayor asociación de logros auditivos se da en
relación con las prácticas de identificación de estructuraciones sonoras en correlación con la
habilidad de nombrarlas con categorías teórico musicales y escribirlas con la notación
tradicional en pentagrama, lo cual conceptualmente se relaciona con la audición estructural y
cuyo nicho de desarrollo tiene lugar en una asignatura como Gramática Musical en los cursos
de preuniversitario.

152
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Prácticas auditivas en la carrera


Los estudiantes asocian reiteradamente las prácticas y los desarrollos auditivos con la
asignatura Formación Auditiva. Tener un oído musical educado llega a asimilarse
predominantemente con poder dar nombre y escribir en lenguajes formalizados –objetualizar-
lo que se escucha, en cuanto a aspectos estructurales de la música, es decir, con
conocimientos de tipo proposicional. Este tipo de habilidades auditivas se vincula con un
modo consciente de pensar sobre la música, legitimado por la formación académica y de alta
estima por los estudiantes, al ser un componente importante para su identidad como músico
profesional que lo diferencia de otros músicos. Este modo de pensar e imaginar la musica no
es algo fácil de aprender y se relaciona con poder hablar de la música y saber y entender qué
sucede desde la audición, es decir, tener consciencia de lo que se escucha apoyándose para
esto en la fundamentación teórica que se aprendió en la primera etapa de la carrera.
Con menor frecuencia los estudiantes se refieren a otro tipo de habilidades auditivas,
diferentes a las de la audición estructural. Al respecto, se alude a tener habilidades vinculadas
a algún tipo de producción sonora y comunicativa en relación con práctica instrumental. Estas
incluyen conocimientos de tipo no proposicional como: recordar y saber cómo suena algo e
identificarlo sin saber qué o cómo se le denomina; reproducir lo que se escucha, cantando o
tocando con otro instrumento diferente a la voz; seguir auditivamente la parte de algún
instrumento; detectar si algo está bien tocado o si tiene errores de notas o de desfases en la
ejecución, por el hecho de estar familiarizado con lo que se está tocando; sacar repertorio de
oído en un instrumento; ser ágil en lo anterior; y tocar un instrumento armónico en la chisga
pudiéndose orientar con facilidad en tiempo real, durante el rol de acompañante; y aprender a
escucharse como grupo en función de lograr una ejecución expresiva de acuerdo con las
secciones de una pieza musical.

Valoraciones
En asignaturas como Gramática Musical y Formación Auditiva, los estudiantes valoran sus
desarrollos auditivos comparando sus logros con los de los pares de la clase, sobre la base de
los requerimientos de estos espacios. Al respecto, aparecen expresiones que aluden a “estar
atrás de”, “quedado” o “mucho mejor” que los compañeros, en aspectos de identificación de
estructuras sonoras.
De igual forma, se adjudica el logro de habilidades auditivas a la familiaridad que se
tenga frente a repertorios, estilos, formatos y estructuras, desde temprana edad; algo que se ha

153
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

logrado especialmente tocando. También se señala la importancia de tener formas de


relacionar y aplicar un contenido visto en diversos contextos, lo cual ayuda al afianzamiento y
la clarificación de contenidos.
En primera instancia, para las tareas de transcripción se hace referencia a que facilita el
hecho de que lo que se escucha sea familiar -a nivel tímbrico, de articulaciones y de fraseos-
con el instrumento que cada uno ha tocado y en el caso contrario, la tarea resulta menos fácil.
Esta facilidad, según Cox (2011), tendría que ver con la posibilidad de la imaginación motora
mediante mímesis, es decir, de poder imitar de forma encubierta e inconsciente lo que se está
escuchando desde la misma modalidad (intramodal), con programas motores que son
familiares y en conjunción con la sub-vocalización. En concordancia con esto, las dificultades
que los estudiantes manifiestan tener frente a tareas de reconocimiento auditivo y de
transcripción, las relacionan con no tener familiaridad con los modelos de estructucturación
sonora presentados en clase, en cuanto a que no se asemejan a lo realizado en sus prácticas
instrumentales (roles instrumentales, formatos y géneros musicales en los que han
participado).
El cambio de perspectiva conceptual y de prácticas para abordar un contenido que
aparentemente es el mismo, crea dificultades, que, grosso modo, se relacionan con el paso de
prácticas como “sacar de oído” repertorios en el instrumento, a otras que implican pasar
“directamente” a la partitura lo que se escucha, sin la ayuda instrumental. Este paso se ha
referido como difícil y frustrante en sus inicios, en todos los casos.
Lo anterior podría explicarse en parte porque se le está quitando la posibilidad al
estudiante de materializar y analizar lo que escucha plasmándolo en su instrumento. Esto
puede tener que ver con los vínculos que se han establecido a través de la ejecución
instrumental entre códigos sonoros y de notación, y patrones motrices y topográficos con el
instrumento, es decir, con la experiencia transmodal y cognitiva implícita en las tareas de
sacar música de oído al instrumento. En la nueva etapa, al transcribir un dictado, el estudiante
no cuenta con el apoyo sólido ni con la espacialidad que le da el instrumento, en donde la
producción sonora tiene un lugar, y unas acciones corporales y motrices manifiestas y otras
encubiertas, que son sustrato de conocimientos no proposicionales a los cuales se vinculan los
nuevos conceptos.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Conclusiones
En todos los casos se deja ver que la práctica instrumental de los estudiantes previa a la
carrera ha sido relevante para el aprendizaje perceptual auditivo. Para el caso de las
competencias auditivas enmarcadas en la audición estructural en asignaturas como Gramática
y Formación Auditiva, se resalta el hecho de que pese a no tener explícitamente en estos
escenarios un acceso directo a los instrumentos y a las músicas que hacen parte de la
experiencia musical vivida, estos constituyen un sustento importante para los procesos de
conocimiento y reconocimiento de estructuras musicales, especialmente cuando se halla
familiaridad entre lo experimentado previamente y lo que tiene lugar en las clases.
Así, las músicas y los instrumentos practicados previo al ingreso a la carrera, se
constituyen en experiencias que permiten anclar los nuevos conocimientos. Entendiendo esto
desde la perspectiva ecológica de la audición musical (Clarke, 2005) y de la cognición
corporeizada, dicha experiencia conforma un cúmulo de fuentes ya experimentadas –
corporales, imágenes motrices, emociones, sentido de identidad, entre otros aspectos-, que se
vuelven a visitar -recordar, reconocer y sentir- en los escenarios de clase, bajo otros contextos
sonoros y demandas cognitivas. De allí la facilidad de reconocimiento auditivo que expresan
tener los estudiantes, cuando lo que se estudia se parece en algunos rasgos a lo ya practicado
por ellos.
Por el contrario, la falta de proximidad del contenido con lo experimentado
previamente, dificulta la tarea de análisis auditivo para la transcripción. Lo anterior también
tiene un sustento en lo que plantea Cox (2011) a través de la hipótesis mimética y las
diferentes modalidades de imitación (intramodal, intermodal y amodal), en el sentido en que
entre más cercana sea la experiencia de la persona, en relación con la fuente instrumental a
imitar, mayor es la posibilidad de facilitar la tarea de imitación y de comprensión.
La dificultad expresada por los estudiantes en sus procesos formativos frente al
desarrollo de la audición estructural lleva a considerar la necesidad de generar estrategias que
faciliten el tránsito de “sacar de oído” desde el instrumento hacia los modos proposicionales
de conocimiento que conlleva la audición estructural y la escritura en pentagrama. Una
posible estrategia podría ser retornar está primera práctica, dando lugar a imitaciones más
manifiestas que encubiertas de las configuraciones que se quieren resignificar desde la
perspectiva de la audición estructural.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Referencias bibliográficas
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Salazar Hakim, G. (2017). Desarrollo de la audición musical en prácticas curriculares y
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Shifres, F. (2009). Notas para un debate sobre el rol de la Audición Estructural en el
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Martínez]. En R. Colwell (Ed.),Handbook of research in Music Teaching and
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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Relações de afinação entre sons resultantes e sistemas de afinação

Ricardo Dourado Freire


UnB
freireri@unb.br

Resumo: O fenômeno dos sons resultantes foi abordado inicialmente pelo organista Sorge (1703-
1778) e pelo violinista Tartini(1692- 1770) baseado em suas experiências práticas. Helmholtz
fortaleceu o conhecimento teórico e tornou-se a referência nas áreas de acústica e psicoacústica a
partir dos seus estudos sobre sons combinatórios. Howard e Angus (2009) consideram que relação
musical entre sons resultantes e notas musicais depende do sistema de afinação em uso e este artigo
teve o objetivo de identificar as relações de afinação entre sons resultantes gerados a partir dos
intervalos produzidos entre a nota Lá4 e Lá3. As notas resultantes foram analisadas a partir dos
valores das frequências nos sistemas de afinação Igual, Pitagórica e Justa. O estudo foi realizado a
partir de uma metodologia quantitativa que investigou os valores das frequências tendo como
referência o modelo matemático de Roederer (2008) e das razões para Afinação Pitagórica e Justa
propostos por Gunther (2008). Resultados mostram que cada tabela de afinação apresenta intervalos
com valores que podem ser exatos com um sistema de afinação ou diferir em até meio tom em outro.
Palavras-chave: Percepção Musical, Sons resultantes, Sistemas de Afinação. Performance
Musical, Acústica .

Tunning relationships between combination tones and temperaments


Abstract: Combination tones have been identified by Sorge (1703-1778) and Tartini (1692- 1770)
based on their instrumental experiences. Helmholtz established the theoretical framework for further
studies up to today and Howard & Angus (2009) consider the musical relationship of combination
tones to notes played therefore depends on the tuning system in use. This article aimed to identify
the combination tones present in intervals within the octave based on Equal, Pythagoric and Just
temperaments. This study analyses combination tones frequencies based on Roederer mathematical
model. The tuning tables were based on ratios indicated by Gunther (2008). Results show that
combination notes can be exact in one temperament or differ up to a semitone in another
temperament.
Key-words: Music Perception, Tuning, Combination Tones, Music Performance, Acoustics.

Introdução
O resultado do fenômeno psicoacústico que ocorre quando duas frequências de alta
intensidade soam simultaneamente atraiu a atenção de músicos, físicos, matemáticos e
psicólogos. A presença de uma terceira frequência, de característica não direcional, instigou a
busca da compreensão deste fenômeno chamado sons resultantes na literatura em português.
Desde o séc. XVIII, compositores, intérpretes e construtores de instrumentos realizam
investigações na busca do enriquecimento do resultado musical decorrente da associação entre
sons geradores e sons resultantes. Estudos de Helmholtz(1895) demonstraram que o
processamento dos sons resultantes ocorre na cóclea, o que permite que seja considerado um
fenômeno psicoacústico e objeto de estudo da área de cognição musical.
A ideia de sons resultantes me interessou desde meus estudos na graduação, quando tive
aulas música de câmera com um violinista muito experiente que mencionou que era importante
afinar as cordas duplas no violino a partir da audição dos sons resultantes. Desde então uma
questão importante ficou: Como afinar as notas pelos sons resultantes? Após vinte cinco anos

157
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

pensando sobre o tema, iniciei investigações que me levaram a questão principal para este
artigo: Qual a relação entre notas resultantes e os distintos sistemas de afinação? O objetivo
deste artigo foi identificar as frequências dos sons resultantes decorrentes dos intervalos
formados dentro de uma oitava e compará-los com as frequências das notas nos sistemas de
Afinação Igual, Afinação Pitagórica e Afinação Justa.
A identificação do fenômeno dos sons resultantes aparece inicialmente na literatura
musical em 1745, na obra Vorgemach der musicalischen Composition, do organista e
compositor alemão Georg Andreas Sorge (1703-1778). No entanto, o fenômeno dos sons
resultantes tornou-se conhecido a partir do Trattato di Musica, de 1754, do violinista e
compositor italiano Giuseppe Tartini (1692- 1770), que identificou a presença de“Il terzo
suono”, ou seja, um terceiro som presente na performance de determinados intervalos. A
aplicação dos sons resultantes na composição e performance de suas obras permitiu que o
fenômeno fosse também denominado como “sons de Tartini”. (Peterson, 1908)
A literatura teórica em língua inglesa apresenta uma terminologia específica para o
fenômeno dos sons resultantes, distintas da tradução utilizada na língua portuguesa. Trabalhos
de Helmholtz (1895), Peterson (1908), Roederer (2008) e Howard e Angus (2009) utilizam o
termo sons combinatórios (combination tones). Helmholtz (1895) propõe a divisão do
fenômeno em dois conceitos específicos: sons diferenciais (differential tones) para indicar os
sons resultantes mais graves, e sons somatórios (summational tones) para indicar sons
resultantes mais agudos.
No contexto da performance musical, o termo sons resultantes necessita ser especificado
para definir não apenas sons ou frequências, mas para identificar notas musicais específicas.
Neste caso, as notas identificadas precisam estar definidas dentro de um sistema de afinação,
pois observações de Roederer (2008), Howard e Angus (2009) e Hjetermann (2013) indicam
que as notas resultantes de determinados intervalos apresentam problemas de afinação quando
se utiliza o sistema de Afinação Igual.

Metodologia
O presente estudo utilizou uma metodologia quantitativa de análise dos dados a partir do
modelo matemático de Roederer (2008) e dos sons resultantes presentes em determinados
intervalos musicais indicados por Helmholtz (1895). Foram identificadas as frequências das
notas resultantes presentes nos intervalos de uma escala cromática entre Lá 3 – Sol# 4, tendo a
nota Lá 4 como nota aguda de referência para formação dos intervalos. Os resultados
permitiram a identificação das notas resultantes em cada intervalo e também indicaram as

158
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

diferenças de frequência entre as notas resultantes e suas notas correspondentes em cada sistema
de afinação. Foram realizados três estudos com os valores das frequências das notas no Sistema
Igual, Sistema Pitagórico e Sistema Justo.
Roederer (2008) define que resultantes como:
sensações de altura que surgem quando dois sons puros de frequências f1 e f2 soando
conjuntamente, sendo percebidos com maior facilidade quando apresentados com
grande intensidade. Os sons resultantes não estão presentes no estímulo original e
surgem como resultado da distorção não-linear do sinal acústico dentro do ouvido.
(Roederer, 2008)

A relação entre intervalos e sons resultantes pode ser representada pela equação: fS =
f1 – f2, na qual f1 indica a frequência da nota aguda, enquanto f2 indica a frequência da nota
grave. A relação entre frequências e sons resultantes de Roederer (2008) está representada na
figura 1. Roederer (2008) também apresenta um exemplo musical com os intervalos: Lá3-Dó#4
(3aM), Lá3-Ré4 (4ªJ), Lá3-Ré# (4ª Aum) e Lá3-Mi4 (5ª J) no qual existe a indicação das notas
resultantes, com uma nota observando que as notas resultantes a serem ouvidas têm alturas
aproximadas. Além disso, Roederer explica que “alguns sons diferenciais são gerados
desafinados por causa do sistema de Afinação Igual do instrumento”. (Roederer, 2008, p.46)

Figura 1 – Representação gráfica das relações na formação de sons resultantes, retirado de Roederer (2008)

De acordo com Howard e Angus (2009) os sons resultantes são facilmente identificados
quando dois instrumentos iguais tocam notas agudas com intensidade forte, principalmente
quando o intervalo corresponde a notas consecutivas da série harmônica de um som gerador
comum. No entanto, os autores observam que o sistema igual não apresenta notas que tenham
frequências de acordo com a série harmônica e que “a relação musical entre sons resultantes e
notas musicais depende do sistema de afinação em uso.” (Howard e Angus, 2009, p. 259)
Para Hjetermann, os sons resultantes devem estar vinculados “a qualquer estrutura
derivada da série harmônica, e não devem estar vinculados a escalas ou sistemas de afinação”.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

(Hjetermann, 2013, p.) Ele afirma que o Sistema Igual não possui nenhum intervalo em comum
com a série harmônica e que alguns compositores preferem o uso de intervalos justos, pois os
sons resultantes podem reforçar a tonalidade de maneira ampla. Por outro lado, o sistema de
Afinação Igual cria sons resultantes que não apresentam relação com os intervalos geradores.
Portanto, o Sistema Igual pode oferecer problemas para a utilização de sons resultantes no
contexto musical enquanto os intervalos justos possibilitam o uso intencional dos sons
resultantes no contexto composicional com indicações para variação na afinação de notas
específicas.
A coleta de dados consistiu na identificação das frequências das notas resultantes
presentes nos intervalos dentro de uma oitava. A escolha de intervalos como elemento de
análise baseia-se no exemplo apresentado por Helmholtz (1895, p.156) para as notas resultantes
dos intervalos mais comuns no contexto diatônico (Figura 2). Os intervalos de 2ª m, 2ª M, 7ª m
e 7ª M não foram especificados por Helmholtz e neste caso, foram considerados os valores das
frequências das notas mais próximas em cada sistema de afinação.

Figura 2 – Tabela com as Razões e sons resultantes dos intervalos (Helmholtz, 1895)

Notas resultantes e sistemas de Afinação


A primeira análise foi realizada com os valores das frequências das notas no sistema de
Afinação Igual, pois a literatura indica que existem problemas de afinação sem especificá-los.
Neste caso, faz-se necessário identificar as diferenças nos valores das frequências das notas
resultantes em relação às notas equivalentes no sistema de Afinação Igual. (Figura 3)

160
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Figura 3 – Intervalos e notas resultantes de acordo com o sistema de Afinação Igual.

A partir da Figura 3, é possível observar que todas as notas resultantes apresentam


frequências diferentes das frequências das notas equivalentes no sistema de Afinação Igual.
Merecem atenção os desvios de afinação nos seguintes intervalos: 6ª Maior (7,56 Hz), 3ª Maior
(6,96 Hz), 3ª menor (-6,85 Hz), 7ª menor (-5,90 Hz), 6ª menor (-4,01 Hz) e 4ª Aumentada (-
3,90 Hz).
Em uma análise inicial as frequências da 3ª Maior e da 3ª menor ficaram muito distantes
das notas indicadas por Helmholtz, sendo que cada nota resultante ficou mais próxima de uma
nota com um semitom de diferença. A 3ª Maior no intervalo Lá 4 (884 Hz)- Fá 4 (701,63 Hz)
apresentou como nota resultante a frequência 182,37 Hz, que está mais próximo da nota Fá# 2
(185,84 Hz), com diferença de apenas -3,47 Hz. No caso do intervalo de 3ª menor, Lá 4 (884
Hz) - Fá# 4 (743,35 Hz), o som resultante 140,65 Hz fica apenas 1,43 Hz acima da nota Dó# 2
(139,22 Hz).
A partir dos dados apresentados, nos quais as notas resultantes de todos os intervalos
apresentam valores que diferem das frequências das notas do sistema igual, confirmam-se as
afirmações de Roederer, Howard & Angus (2009) e Hjetermann (2013) que indicam que as
notas resultantes apresentam frequências que criam batimentos dentro do sistema de Afinação
Igual. Torna-se importante destacar que as notas resultantes nos intervalos de 3as e 6as ficam
extremamente desafinadas.

161
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

O Sistema de Afinação Pitagórico baseia-se nos princípios de afinação das quintas com
razão 3/2, sendo que todas as quintas e quartas justas são puras. Desta maneira, estão indicadas
as razões de afinação para as frequências das notas na Tabela 1, tendo a nota Lá como centro
tonal e de acordo com a descrição das razões indicadas por Gunther (2008, p. 376).

Afinação Pitagórica
Lá Sib Si Dó Dó# Ré Mib Mi Fá Fá# Sol Sol# Lá
256/24 32/2 81/6 729/51 128/8 27/1 243/12
1/1 9/8 4/3 3/2 16/9 2
3 7 4 2 1 6 8
-
2 27,63 29,10 31,08 32,74 34,96 36,83 39,33 41,44 43,65 46,62 49,11 52,44 55,25

- 110,5
1 55,25 58,21 62,16 65,48 69,93 73,67 78,67 82,88 87,31 93,23 98,22 104,89 0
110,5 124,3 130,9 139,8 147,3 165,7 186,4 196,4 221,0
1
0 116,41 1 6 5 3 157,33 5 174,62 7 4 209,78 0
221,0 248,6 261,9 279,7 294,6 331,5 372,9 392,8 442,0
2
0 232,82 3 3 0 7 314,67 0 349,23 4 9 419,55 0
442,0 497,2 523,8 559,4 589,3 663,0 745,8 785,7 884,0
3 465,65 629,33 698,47 839,11
0 5 5 1 3 0 8 8 0
Tabela 1 – Valores das frequências das notas no sistema de Afinação Pitagórica a partir do centro tonal Lá.

O Sistema Pitagórico foi analisado a partir valores das notas resultantes mais próximas
na Tabela 1 demonstrados na Figura 4.

162
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Figura 4 – Intervalos e notas resultantes de acordo com o sistema de Afinação Pitagórica.

A partir da figura 4 é possível observar que os intervalos: 5ªJ, 4ªJ e 2ªM apresentam as
notas resultantes com frequências iguais às frequências das notas correspondentes no sistema
Pitagórico. No entanto, as notas dos intervalos de 7ªm (-6,14 Hz), 6ªM (10,91 Hz), 6ªm (-6,91
Hz) e 4ªAum (6,04 Hz) apresentam notas resultantes com valores divergentes das frequências
no Sistema Pitagórico. Observa-se que o intervalo Lá 4- Fá 4 apresenta um som resultante com
diferença de apenas -0.94 Hz, mas esta frequência corresponde a nota Fá# 2 que está um
semitom acima da nota indicada por Helmoltz para o intervalo de 3ª M. Situação semelhante
ocorre no intervalo Lá 4- Fá# 4 que apresenta uma diferença de -1,73 Hz, a qual corresponde à
nota Dó# 2 que está um semitom abaixo da nota proposta por Helmoltz.
O sistema de Afinação Justa baseia-se na série harmônica de uma nota específica para
encontrar as razões que representam os intervalos puros, ou seja, sem batimentos. Desta
maneira, foi elaborada uma tabela (Tabela 2) para identificação das frequências de cada nota, a
partir do centro tonal Lá e de acordo com a descrição de Gunther (2008, p. 376).

163
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Afinação Justa
Lá Sib Si Dó Dó# Ré Mib Mi Fá Fá# Sol Sol# Lá
1/1 16/15 9/8 6/5 5/4 4/3 7/5 3/2 8/5 5/3 9/5 15/8 2/1
-1 55,25 58,93 62,16 66,30 69,06 73,67 77,35 82,88 88,40 92,08 99,45 103,59 110,50

1 110,50 117,87 124,31 132,60 138,13 147,33 154,70 165,75 176,80 184,17 198,90 207,19 221,00
2 221,00 235,73 248,63 265,20 276,25 294,67 309,40 331,50 353,60 368,33 397,80 414,38 442,00
3 442,00 471,47 497,25 530,40 552,50 589,33 618,80 663,00 707,20 736,67 795,60 828,75 884,00
Tabela 2 – Valores das frequências das notas no sistema de Afinação Justa a partir do centro tonal Lá.

O sistema de Afinação Justa apresenta dez intervalos nos quais as frequências das notas
resultantes correspondem exatamente às frequências das notas do sistema de afinação (Figura
5). Os únicos intervalos que apresentam valores distintos são a 7ª Maior (-1,84 Hz) e 7ª menor
(-11,05 Hz), no entanto estes intervalos apresentam pouco valor prático, pois apresentam notas
muito próximas à nota mais grave do intervalo gerador.

Figura 5 – Intervalos e notas resultantes de acordo com o sistema de Afinação Justa.

Observa-se que as notas resultantes nos intervalos 5ª J, 4ªJ, 3ªM e 2ªm reforçam uma
das notas do intervalo gerador. Em outros casos, a nota resultante completa a tríade maior (6ªM,
6ªm, 3ª m) ou a tríade diminuta (4ª Aum). O intervalo de 2ªM também deve ser observado, pois
mesmo apresentando a nota resultante com diferença de frequência igual a zero, a nota Fá 1 é

164
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

uma nota diferente das notas no intervalo gerador, situação que cria uma nota dissonante de
difícil afinação.

Conclusão
As notas resultantes são um fenômeno psicoacústico que podem auxiliar na afinação de
determinados intervalos. Intervalos que apresentam notas resultantes que coincidam com as
notas do intervalo gerador permitem a identificação mais rápida e maior precisão no ajuste da
afinação durante a performance musical. Após a coleta de dados, foi possível observar que o
sistema de Afinação Igual demonstrou ser o modelo com maiores divergências entre sistema de
afinação e notas resultantes. Todos os intervalos apresentaram notas resultantes desafinadas em
relação ao intervalo principal.
O sistema de Afinação Justa demonstrou o maior grau de exatidão na relação entre notas
resultantes e sistemas de afinação, pois foi possível observar que as notas resultantes afinam
perfeitamente nos intervalos de 6ªM, 6ªm, 5ª J, 4ªJ, 3ªM, 2ª M e 2ªm. Neste caso, quando dois
instrumentos tocam um intervalo agudo e fazem os ajustes necessários, o som resultante irá
demonstrar que os intervalos nas vozes superiores estão afinados.
O sistema de Afinação Pitagórica apresenta um intervalo com nota resultante de valor
exato que oferece uma nova possibilidade de afinação. A 2ªM no intervalo Lá4-Sol4 apresenta
Sol 1 como nota resultante. Neste caso, a nota mais grave do intervalo é reforçada e oferece
melhor referência para a afinação do intervalo. A utilização da razão 16/9 para a 2ª Maior torna-
se uma opção para a afinação do intervalo que enriquece o contexto tonal em situações
específicas. Caberá ao músico escolher qual a razão, e consequentemente qual nota resultante
oferece melhor resultado musical para sua execução em cada contexto específico.
Este foi um estudo inicial que apresentou a aplicação da fórmula matemática na
identificação de notas resultantes. No entanto, é necessário um estudo mais aprofundado com
outros modelos incluindo resultantes de segunda e terceira ordem, bem como a identificação
dos sons resultantes realizados com diversos instrumentos. Desta maneira, será possível avaliar
possibilidades práticas para utilização deste conceito e atividades perceptivas para trabalho de
afinação coletiva, como conjuntos de câmara ou orquestra. O processo cognitivo de percepção
e identificação dos sons resultantes pode auxiliar tanto músicos quanto compositores no
desenvolvimento de procedimentos para enriquecimento da sonoridade de intervalos e acordes,
buscando “sensações de sons” específicas inspiradas pelas ideias e propostas de Helmholtz.

Referências

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Gunther, L. (2008). The Physics of Music and Color. New York: Springer.
Helmholtz, Hermann von (1895). On the Sensations of Tone as a Physiological Basis for the
Theory of Music, 3ª edição inglesa, traduzida por Alexander J. Ellis. London: Longmans,
Green, and Co.
Hjetermann, B. (2013). Combination Tones as Harmonic Material. Tese de Doutorado não
publicada. Northwestern University, Evanston.
Howard, D. , Angus, J. (2009). Acoustics and psychoacoustics (4th ed.). London: Focal Press,
p. 259 – 260.
Peterson, J. (1908). Combination Tones and Other Related Auditory Phenomena. Tese de
Doutorado não publicada. University of Chicago, Chicago.
Roederer, J. (2008). The Physics and Psychophysics of Music: An Introduction (4th Edition).
New York: Springer.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Análise da entoação praticada em Silent Night:


Um estudo de caso a partir de performances vocais de amadores

Cesar Augusto Pereira da Silva


Unicamp
cesaraupereira@gmail.com

Ricardo Goldemberg
Unicamp
rgoldem@iar.unicamp.br 


Resumo: O trabalho investiga como se dá a prática da entoação em performances vocais, sem nenhum
tipo de acompanhamento. O foco do trabalho é um estudo de caso que parte da análise de diversas
execuções de cantores amadores do canto natalino Silent Night, obtidas no Youtube. Os dados para análise
foram obtidos por meio de dois programas: Tarsos e Temperament. Adotando-se alguns sistemas de
afinação e temperamento como modelo, é possível avaliar se nessas performances a prática da entoação se
aproxima de algum deles. Percebe-se que a tendência é que a afinação oscile em uma faixa média entre os
temperamentos pitagórico e igual, e, contrariando o senso comum dos músicos, o maior desvio ocorre
quando comparada à afinação justa.
Palavras-chave: afinação, capacidade de entoação, temperamentos musicais, voz.

Analysis of the intonation practiced in Silent Night: A case-study based on amateurs vocal
performances
Abstract: This paper investigates the intonation in vocal performances, without any kind of
accompaniment. The investigation focus is a case-study , which analyses several amateur performances of
the song “Silent Night” found on Youtube. The data was obtained through the use of two kinds of
software: Tarsos and Temperament. Adopting some systems of tuning and temperament as models, it is
possible to evaluate how close the intonation used in each of these performances is with them. In general,
the tendency is that the intonation oscillates between Pythagorean tuning and equal temperament, and in
disagreement with many musician’s claims, the greatest deviations are observed when comparisons with
just intonation were made.
Key-words: tuning, intonation ability, musical temperaments, voice.

Introdução
A voz humana é um instrumento musical extremamente flexível, capaz de executar
transformações graduais e contínuas tanto no domínio timbrístico quanto no domínio da
frequência. Com relação às frequências emitidas, ela é classificada comumente entre os
instrumentos de afinação não fixa, mais especificamente, dentre os de afinação livre. Sendo
assim, a entoação (capacidade de executar intervalos de maneira musical e equilibrada) numa
performance vocal, estaria teoricamente sempre muito próxima de condições ideais, limitada
apenas pelo treinamento musical e acuidade perceptiva do intérprete, isto é, as relações das
frequências dependeriam apenas de escolhas determinadas pelo músico e da sua capacidade de

167
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

executá-las. Esse processo foi descrito por Henrique (2002, p. 937) como: “mais que uma
tentativa infrutífera de reprodução e verificação rigorosa de uma frequência física exata, é um
compromisso de audição de si mesmo e dos outros, em cada momento, em cada nota”.
No extremo oposto dos instrumentos de afinação livre, situam-se os instrumentos de
afinação fixa, nos quais, durante a execução musical, o intérprete não tem controle algum sobre
as frequências emitidas. Bons exemplos desses instrumentos são os instrumentos de teclas, como
o piano, o órgão e o cravo. Para tornar esses instrumentos executáveis, paralelamente ao
desenvolvimento deles, também foram desenvolvidos vários sistemas teóricos de afinação, com
frequências que atendem a proporções pré-estabelecidas, os temperamentos.
Ainda que, do ponto de vista teórico, a entoação possa ter como referenciais temperamentos
específicos, na prática, ela está sujeita a critérios de ordem pessoal e interpretativos. Do ponto de
vista psicoacústico, a percepção de alturas musicais acontece mediante a identificação de
categorias, conforme apontado em “Some Notes Regarding Tuning and Temperament”, do
Laboratório de Cognição e Musicologia Sistemática da Universidade de Ohio:
(…) the perception of pitch has been shown to be categorical in nature. In vision, many
shades of red will be perceived as "red". Similarly, listeners tend to mentally "re-code"
mis-tuned pitches so they are experienced as falling in the correct category. Mis-tuning
must be remarkably large (>50 cents) before they draw much attention. This insensitivity
is especially marked for short duration sounds -- which tend to dominant music-making.
(Huron, s/d, s/n)

Apesar de existir uma extensa literatura tratando da afinação de instrumentos de afinação


fixa, foi apenas no séc. XX que foram criadas ferramentas capazes de fazer análises de entoação
de instrumentos de afinação não fixa em tempo real. Através do uso de osciloscópios e
oscilógrafos, Greene (1937), Nickerson (1949) e Mason (1960) foram capazes de verificar na
prática tendências de afinação e compará-las com temperamentos. O trabalho desses
pesquisadores foi fundamental nessa área, porém, através de ferramentas computacionais atuais,
existe a possibilidade de uma amostragem imensamente maior, abrangendo excertos musicais
mais extensos, e até mesmo obras inteiras. Portanto, uma atualização dos trabalhos desses
pesquisadores a partir de ferramentas mais modernas, especialmente após o desenvolvimento de
algoritmos de rastreamento de fundamentais, como, por exemplo, o Yin, utilizado no presente
trabalho, é desejável e talvez até necessária, e pode trazer novos dados sobre o tema.

168
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Materiais e Métodos
Os dados da análise foram retirados de gravações disponíveis na internet, através do youtube. Os
arquivos de áudio foram então submetidos à análise de dois programas: Tarsos e Temperament.
O primeiro deles, Tarsos, foi desenvolvido por Six e Cornelis (2011), ambos da University
College Guent, na Bélgica, especialmente para a análise etnomusicológica, e é descrito como
“uma plataforma modular para extrair e analisar alturas e organização de escalas na música” (Six
& Cornelis, 2011, p. 169). O programa “analisa o áudio em blocos de 10 milissegundos, e para
cada bloco estima uma frequência fundamental” (Six & Cornelis, 2011, p. 170), classificando-os
em uma escala com resolução de 1200 centos por oitava.
Dos algoritmos de detecção de alturas disponíveis no programa, optou-se por utilizar o
algoritmo Yin, pois, conforme Cheveigné e Kawahara (2002), ele tem uma taxa de erros
aproximadamente três vezes menor que outros algoritmos, e propriedade necessária para tratar
elementos de ordem musical.
Embora o uso de algoritmos para a análise de sinais de áudio e detecção de alturas seja
confiável, à medida que o sinal torna-se complexo, limitações aparecem, principalmente através
de falsas detecções, que aparecem na forma de parciais ou sub-harmônicos. Por essas razões, uma
análise polifônica não é tão acurada.
Diante do propósito do presente trabalho, essas limitações não foram um problema. O
intuito é verificar a entoação da voz solo, completamente desacompanhada de qualquer tipo de
instrumento ou outras vozes, e verificar quais são as tendências mais comuns em direção aos
temperamentos. A escolha do repertório para tal propósito é que necessitaria ser muito cuidadosa.
Foi então escolhido o canto natalino Silent Night (“Noite feliz” em português) composto em 1818
por Franz Xaver Gruber, e considerado patrimônio cultural imaterial pela UNESCO. Em uma
busca pelo youtube foi possível encontrar diversas performances que se enquadraram nos
requisitos do estudo, e embora não existam informações a respeito da instrução musical dos
intérpretes, é possível perceber que em sua grande maioria, se não totalidade, são amadores. Em
alguns casos foi possível analisar a canção inteira, com o tema sendo cantado duas vezes, porém
em outros casos, durante a repetição os intérpretes adicionaram ornamentos ou outras vozes, e
nesse caso ficamos com a melodia apresentada apenas na primeira vez. Um critério utilizado foi
que a melodia completa fosse apresentada pelo menos uma vez em cada uma das análises.
As gravações obtidas através do youtube foram as seguintes:

169
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Quadro 1 – Lista de gravações consultadas pelo youtube, com respectivos endereços de acesso em 20/09/2016.

Nome do vídeo Link no youtube

Silent Night A Capella Cover https://www.youtube.com/watch?v=54u5ETqgY6E

Silent Night (Male A Capella) https://www.youtube.com/watch?v=2KRbXVD9VeA

Silent Night - Acapella - Dean Chalmers Music https://www.youtube.com/watch?v=dNqy7ZE4aF0

Sara McLoud - Silent Night Acapella Cover https://www.youtube.com/watch?v=Owfb-Ytckb4


(Christmas Song)
Silent Night - (Keona Acapella Cover) https://www.youtube.com/watch?v=W3vrEZgqhbs

Silent Night A Capella Cover- Jared Reynolds https://www.youtube.com/watch?v=Z5F4biF-ePY


Christmas
Silent Night (Acapella Cover) https://www.youtube.com/watch?v=j6bDPOB1iSQ

silent night acapella cover https://www.youtube.com/watch?v=0LMD4DxfW9A

Silent Night (Acapella Cover) https://www.youtube.com/watch?v=4D7GCOs8lyQ

"Silent night" & "Astro del ciel" (italian version) - https://www.youtube.com/watch?v=bJcmX6YrhBg


Acapella cover
Fonte: Elaboração própria.

O segundo programa utilizado para a análise dos dados foi o Temperament, que é um
programa desenvolvido por Simon Caplette, da Universidade de New South Wales, Australia, e
permite calcular e comparar diferentes temperamentos, através de desvios em centos. Para validá-
lo, comparamos os gráficos do programa com os temperamentos descritos em Arakawa (1999) e
Hall (1991), e ele se mostrou perfeitamente compatível com esses autores.
Os dois programas utilizados para esta pesquisa são gratuitos e de uso livre.

Resultados
Para cada uma das performances, o programa Tarsos gerou um histograma de classes de altura
(pitch-classes). Os valores obtidos pelo programa são mostrados na seguinte tabela, com a média
de desvio em centos das várias aparições de cada grau da escala ao longo da peça:

Tabela 1 – Desvio médio em Centos de cada grau diatônico a partir do temperamento igual

Nome do vídeo 1ºgrau 2ºgrau 3ºgrau 4ºgrau 5ºgrau 6ºgrau 7ºgrau


Silent Night A Capella Cover 0 -17 -13 -2 -37 -36 -11

170
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Silent Night (Male A Capella) 0 -47 -28 -53 -4 0 -14

Silent Night - Acapella - Dean 0 1 -13 10 -4 15 -5


Chalmers Music
Sara McLoud - Silent Night 0 -2 -19 -17 8 -9 -29
Acapella Cover (Christmas Song)
Silent Night - (Keona Acapella 0 31 44 22 38 36 31
Cover)
Silent Night A Capella Cover- Jared 0 10 29 7 -4 0 -17
Reynolds Christmas
Silent Night (Acapella Cover) 0 -8 2 -5 -1 12 -20

silent night acapella cover 0 -20 8 -14 -10 0 -14

Silent Night (Acapella Cover) 0 10 -16 -8 -7 -21 31

"Silent night" & "Astro del 0 -20 -7 -14 -25 -12 -5


ciel" (italian version) - Acapella
cover
Fonte: Elaboração própria.

Optamos em tomar a tônica, 1º grau, como referência, e por esta razão, o desvio dela é
sempre zero.
Esses dados foram inseridos no programa Temperament, que comparou essas informações
com os sistemas de afinação pitagórico, justo e igual, dando o desvio padrão a partir de cada um
deles. O desvio padrão é dado a partir da média dos valores em centos dos desvios de todos os
graus (Caplette, s/d, s/p). Também foi apontado qual seria o temperamento mais próximo de cada
performance, dentre uma série de temperamentos contidos na memória do programa, e o desvio
padrão a partir dele.

Tabela 2 - Desvio padrão a partir de cada temperamento

Nome do vídeo Desvio a partir Desvio temp. Temp. justo Desvio a partir do temp.
do temp. igual pitagórico mais próximo
Silent Night A Capella Cover 14 centos 15 centos 15 centos 12 Werckmeister III

Silent Night (Male A Capella)* 21 20 24 20 Pitagórico

Silent Night - Acapella - Dean 9 11 12 8 Mesotônico – 1/6 de


Chalmers Music coma
Sara McLoud - Silent Night 12 14 9 7 Kirnberger II
Acapella Cover (Christmas Song)
Silent Night - (Keona Acapella 13 11 18 11 Pitagórico
Cover)
Silent Night A Capella Cover- 13 14 16 13 Igual
Jared Reynolds Christmas

171
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Silent Night (Acapella Cover) 9 11 13 9 Young II

silent night acapella cover 9 9 15 9 Igual

Silent Night (Acapella Cover) 16 15 17 15 Pitagórico

"Silent night" & "Astro del 8 8 13 8 Igual


ciel" (italian version) - Acapella
cover

Fonte: Elaboração própria.

Discussão e conclusões
Observando a tabela dois, é possível perceber que a entoação nas performances analisadas fica
entre a afinação pitagórica e o temperamento igual. Os dados obtidos reiteram em parte com os
dados obtidos por Goldemberg (2014), Silva e Goldemberg (2016a), Silva e Goldemberg
(2016b), Greene (1937), Nickerson (1949) e Mason (1960). Levando-se em conta os três sistemas
de afinação tomados como padrão do estudo, o maior desvio ocorre com relação ao sistema justo,
e no geral, as performances se situam entre os sistemas igual e pitagórico.
Comparando os dados obtidos com outros estudos que utilizaram os mesmos métodos de
análise: Goldemberg (2014), Silva e Goldemberg (2016a), Silva e Goldemberg (2016b), é
possível perceber que a performance de profissionais e amadores seguem a mesma tendência
geral, situando-se entre as afinações pitagórica e igual. A principal diferença está na variabilidade
das frequências emitidas dentro de cada uma das categorias de altura, que podem ser observadas
nos gráficos gerados pelo programa Tarsos, mas que infelizmente por uma questão prática não
poderão ser reproduzidos aqui: as performances de profissionais tocando violino, violoncelo e
flauta mostram uma pequena variação dentre as frequências emitidas correspondentes a cada
classe de altura se comparadas às performances de canto amador, as razões para tanto podem ser
duas: 1) o canto tem sua entoação ainda mais livre do que os instrumentos de corda, pois estes
ainda contam de certa maneira com a referência das cordas soltas, 2) além do presente estudo ter
como enfoque o canto, os seus intérpretes são amadores, o que certamente também contribui para
essa variabilidade. Outro aspecto que difere entre essas pesquisas é o desvio padrão a partir dos
temperamentos iguais e pitagórico: nas performances profissionais os desvios padrão obtidos
situavam-se entre 2 e 10 centos, e neste presente estudo, situam-se entre 8 e 20 centos, o que é
justificável por se tratarem de amadores. São considerados aqui como desvio padrão o menor
valor para cada performance dentre afinação pitagórica e temperamento igual. Esses dados

172
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

corroboram a afirmação de Burns (1999, p.257), de que os padrões de entoação são aprendidos
dentre os intervalos das escalas em uso em uma determinada cultura, e consequentemente, a
habilidade de entoação depende da capacidade do músico de reproduzir essas categorias
aprendidas. Sendo assim, é natural que músicos amadores tenham uma menor precisão e maior
variabilidade na entoação.

Referências
Arakawa, H. (1995). Afinação e Temperamento: Teoria e Prática. Campinas: Edição do autor.
Burns, E. M. (1999). Intervals, Scales, and Tuning. In DEUTSCH, Diana (Ed.), The Psychology
of Music (2nd edition, pp. 215-264). San Diego, CA: Academic Pess.
Caplette, S. (n.d.) “A New Application for Temperament and Tuning”. In Music Acoustics,
University of New South Wales (Ed.). Extraído de <http://newt.phys.unsw.edu.au/music/
temperament/>.
Cheveigné, A. & Kawahara, H. (2002). Yin, a fundamental frequency estimator for speech and
music. Journal of the Acoustical Society of America, v. 111, 1917-1930.
Goldemberg, R. (2014, agosto). Análise da entoação praticada por violinistas profissionais em
performances selecionadas da Partita No. 3 (BWV1006) de J. S. Bach. XXIV Congresso da
Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Música, São Paulo, SP, Brasil.
Greene, P. C. (1937). Violin Intonation. Journal of the Acoustical Society of America, v. 9, 43-44.
Grout, D. & Palisca, C. (2004). História da Música Ocidental. Lisboa: Gradiva.
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173
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Processos cognitivos da percepção do metro e possíveis relações com o


treinamento auditivo

Letícia Dias de Lima


PPG - IA - UNESP
leticiadiaspiano@gmail.com

Resumo: Os processos cognitivos envolvidos na percepção rítmica têm sido objeto de estudo de
diversas pesquisas na área de cognição musical. Dentro do tema, alguns conceitos como pulsação,
metro, ritmo e agrupamento são comumente e, em geral, separadamente tratados. Distinguindo, em
primeiro lugar, estes conceitos, o presente trabalho apresenta algumas formulações teóricas a respeito
do metro e relaciona tais formulações a questões cognitivas da percepção rítmica, como nossa
sensibilidade a regularidades do tempo musical, a organização mental do ritmo, as bases da percepção
do metro, dentre outras. Num segundo momento, refletiremos sobre possíveis aplicações destas ideias
à prática de treinamento auditivo. Serão ainda expostos e discutidos tópicos relacionados a esta
disciplina e ao aprendizado musical, também com base em pesquisas de cognição musical,
enfatizando a relevância da percepção do metro nestes contextos. A abordagem metodológica é
bibliográfica, sendo as principais referências para este trabalho as teorias e pesquisas de autores como
Lerdahl e Jackendoff (1983), Karpinski (2000), London (2012) e Thompson (2015).
Palavras-chave: metro, ritmo, cognição, percepção, treinamento auditivo.

Cognitive processes of meter perception and possible relations with ear training

Abstract: The cognitive processes involved in rhythmic perception have been the object of study of
several researches in the area of musical cognition. Within this matter, some concepts like beat, meter,
rhythm and grouping are usually and, in general, separately treated. Primarily distinguishing these
concepts, this paper presents some theoretical formulations about meter and relates these formulations
to cognitive issues of rhythmic perception, such as our sensibility to regularities of musical time, the
mental organization of rhythm, the basis of meter perception, among others. Then, we will reflect on
possible applications of these ideas to the practice of ear training. Topics related to this discipline and
musical learning will be exposed and discussed, also based on musical cognition research,
emphasizing the relevance of meter perception within theses contexts. The methodological approach
is bibliographic, and the main references to this work are the theories and researches of authors
like Lerdahl & Jackendoff (1983), Karpinski (2000), London (2012) and Thompson (2015).
Keywords: meter, rhythm, cognition, perception, ear training.

Introdução
As habilidades auditivas que um músico deve desenvolver englobam desde o discernimento
de aspectos como textura, timbre, tessitura e dinâmica até tarefas mais específicas
normalmente empregadas na disciplina de treinamento auditivo, como solfejos, ditados e
transcrições. Pesquisas na área de cognição musical revelam um crescente interesse nos
processos cognitivos envolvidos na aquisição de tais habilidades. Segundo Hallam (2006),
progressos consideráveis foram feitos no desenvolvimento de nossa compreensão das
estruturas e funções cerebrais envolvidas no processamento e aprendizado de música.
Em "Aural Skills Acquisition: The Development of Listening, Reading, and Performing
Skills in College-Level Musicians", Karpinski (2000) procura oferecer uma base consistente

174
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

de relações entre as disciplinas de cognição musical e treinamento auditivo, estabelecendo


conexões entre teorias cognitivas, dados de pesquisas e princípios teóricos e didáticos dessas
áreas. O autor propõe que, anteriormente à identificação de elementos musicais ligados à
altura, como intervalos, escalas e acordes – geralmente introduzidos no início do treinamento
– sejam abordadas questões mais elementares; dentre elas, a percepção rítmica.
Ritmo, pulsação, metro1 e agrupamento são alguns dos conceitos comumente tratados e
assim subdivididos em pesquisas e teorias cognitivas sobre percepção rítmica. Os pioneiros
Lerdahl e Jackendoff (1983), por exemplo, já apontam para metro e agrupamento como
diferentes aspectos do ritmo. Thompson e Schellenberg (2006) reforçam que pesquisadores
vêm tratando desses aspectos separadamente. Isso ocorre tanto na elaboração de teorias
cognitivas quanto no desenvolvimento de experimentos, em que apenas um elemento em
particular costuma ser testado. As breves definições a seguir servem ao propósito de distinguir
estes conceitos e assim evitar que se confundam com as concepções de metro que serão
discutidas neste trabalho.
Ritmo pode ser definido como "o padrão serial de durações marcado por uma série de
eventos" (McAULEY, 2010, p. 166). Jones afirma que o ritmo consiste em "figuras seriais
baseadas no arranjo de intervalos de tempo distintos. Contrasta com o metro, que é baseado
em intervalos de tempo fixos [embedded]" (2009, p. 87). Segundo Cirelli et al. (2016), as
pessoas facilmente extraem do ritmo um pulso subjacente, as pulsações (beats), que são
perceptivamente organizadas em grupos hierárquicos para criar a representação de uma
estrutura métrica interna, através da qual é interpretada uma alternância entre pontos fortes e
fracos. O metro, para London (2012), é a criação de ciclos hierarquicamente integrados de
atenção e expectativa e serve como uma base temporal para nossa percepção de figuras
musicais.
Outro aspecto da estrutura musical é o agrupamento que, assim como o metro, é
organizado “hierarquicamente, com pequenos grupos de duas ou três notas encaixadas em
grupos maiores, como frases. No nível mais alto da hierarquia, estão os grupos
correspondentes às seções e movimentos da música." (THOMPSON & SCHELLENBERG,
2006, p. 107). De acordo com Lerdahl e Jackendoff (1983), metro e agrupamento são aspectos
da estrutura musical cujas propriedades básicas diferem fundamentalmente: consistem na
organização hierárquica de unidades, no agrupamento, e de pulsações, no metro. O metro

1 A tradução do termo meter como "metro" pode ser observada em trabalhos que constam nos anais das últimas cinco edições
do SIMCAM (2012-2016). Por isso, consideramos que a palavra "metro" encontra-se devidamente integrada ao vocabulário
nativo.

175
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

envolve uma estrutura de níveis de pulsações que não implica em segmentação; já o


agrupamento é a própria segmentação (Temperley, 2001), esta percebida através de
acentuações subjetivas causadas por mudanças em dimensões como altura, duração,
intensidade, timbre ou mesmo harmonia (Deliège, 1987; McAuley, 2010, Thompson, 2015).
A seguir iremos abordar algumas formulações teóricas sobre o metro e suas relações
com questões cognitivas da percepção rítmica, oferecendo, desta forma, ferramentas que
possibilitem refletir sobre eventuais aplicações dessas relações à prática de ensino do
treinamento auditivo.

Metro, percepção e cognição


Alguns estudos apontam para uma forte tendência que temos de inferir algum tipo de estrutura
de pulsações regulares a partir da música, inclusive para que possamos sincronizar nossos
movimentos com ela. Honing (2013) afirma que pesquisadores ainda estão divididos a
respeito da base desta habilidade, ou seja, se ela se desenvolve espontaneamente ou se é
aprendida – enfatizando origens biológicas ou culturais, respectivamente.
Jones (2009) destaca essa tendência de "mantermos o tempo" em sincronia com a
música – batendo os pés, palmas ou mesmo dançando – como evidência da percepção do
metro, que se refere à "sensibilidade do ouvinte a regularidades do tempo musical" (p. 81). De
fato, o pulso, por "marcar unidades iguais no contínuo temporal" (COOPER & MEYER,
1960, p. 3), torna a noção de metro possível; porém, o pulso, por si, é insuficiente para gerar
esse sentido (London, 2012). "É a interação de diferentes níveis de pulsações [...] que produz
a sensação do metro" (LERDAHL & JACKENDOFF, 1983, p. 68). Portanto, a estrutura
métrica consiste em pulsações organizadas hierarquicamente.
A literatura destaca a importância do papel do metro em nossa organização perceptiva
da música e o quanto estruturas métricas facilitam a eficiência do processamento de padrões
temporais (Temperley, 2001). As durações rítmicas, por exemplo, são percebidas com mais
dificuldade quando ocorrem como eventos isolados (Thompson, 2015). Os experimentos de
Desain e Honing (2003) evidenciam as relações entre a formação de categorias rítmicas2 e a
presença de um contexto métrico. Os participantes – músicos altamente treinados – foram
orientados a notar os estímulos apresentados através de uma interface. No segundo
experimento foram utilizados os mesmos estímulos do primeiro, porém contextualizados num
estrutura métrica.

2
Categorização é o processo cognitivo pelo qual reconhecemos e classificamos objetos.

176
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Os autores esperavam uma maior consistência nas respostas aos estímulos quando um
contexto métrico fosse apresentado, além de mudanças em tamanho e forma das categorias
rítmicas dependendo desses contextos. Suas hipóteses foram confirmadas e observou-se que a
identificação de estímulos foi facilitada quando apresentada num contexto métrico apropriado.
Thompson ainda salienta que:

Uma vez estabelecida a estrutura métrica, ela guia nossa atenção e nós tendemos a
continuar percebendo pontos regulares de ênfase mesmo quando não há eventos
musicais presentes, como uma nota ou acorde. [...] O metro é parcialmente
subjetivo, e nós podemos inferir pulsações e acentos que não estão objetivamente
presentes (2015, p. 97).

A subjetividade do metro tem sido discutida por muitos autores, especialmente ao


distingui-lo do conceito de ritmo. Apesar de tal diferenciação não ser unânime – como
questionado por Hasty (1997) – há um consenso geral de que as noções de ritmo e metro são
bastante distintas. Isso fica claro em modelos de carreamento (entrainment)3, como proposto
por Justin London em "Hearing in Time":

Metro envolve nossa percepção inicial assim como a antecipação subsequente de


uma série de pulsações que nós abstraímos da superfície rítmica da música enquanto
ela se desdobra no tempo. Em termos psicológicos, o ritmo envolve a estrutura de
estímulos temporais, enquanto o metro envolve nossa percepção e cognição de tais
estímulos" (2012, p. 4).

Assim, o metro se mostra como um fenômeno cognitivo, e o papel do ouvinte seria,


portanto, sincronizar sua atenção e suas ações com padrões temporais presentes na música.
O mesmo autor destaca ainda a origem ecológica do "poder expressivo" da música, que
deriva em grande parte dos significados que atribuímos a padrões sonoros do ambiente, como,
por exemplo, uma sensação de distanciamento ao ouvirmos um decrescendo melódico. Neste
contexto, ele acrescenta que o metro é um comportamento mais abrangente, "não [...]
fundamentalmente musical em sua origem. Em vez disso, o metro é uma forma musicalmente
particular de carreamento, uma sincronização de algum aspecto de nossa atividade biológica
com eventos regularmente recorrentes no ambiente" (p. 4). Apesar da grande influência que
abordagens ecológicas da percepção temporal exercem sobre pesquisas de percepção rítmica e

3 Este termo se refere ao processo de sincronização de nossas expectativas temporais com eventos que ocorrem no ambiente
(London, 2012).

177
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

cognição, ele salienta que, além dos fatores biológicos envolvidos em comportamentos
métricos de atenção e sincronização, estes também são aprendidos, ensaiados e praticados.
A antecipação de pulsações regulares subsequente à percepção do metro é um fenômeno
que depende muito mais da capacidade do ouvinte de gerar padrões métricos do que dos
próprios estímulos sonoros, que não precisam ser absolutamente constantes para que a
interpretação inicial no metro permaneça a mesma. "Uma vez estabelecido um padrão métrico
claro, o ouvinte apenas o renuncia se houver evidências fortemente
contraditórias" (LERDAHL & JACKENDOFF, 1983, p. 17), como, por exemplo, o
surgimento claro de um padrão métrico alterado.
Honing (2013) salienta que é possível que haja uma predisposição processual da
cognição humana de extrair regularidades hierarquicamente estruturadas de padrões rítmicos,
mesmo que estes sejam complexos. Esta propensão envolve, por parte do ouvinte, um senso
de diferenciação do estímulo em "dois, três ou quatro", por exemplo; um senso de metro que
London chama de subjective metricization, que pode variar devido a fatores como idade,
treino e enculturação. Por se tratar de uma percepção hierárquica, deve-se considerar neste
processo o papel da acentuação.
Segundo Berry, o acento denota uma força relativa de um evento sonoro, se comparado
com seus eventos adjacentes; unidade métricas são iniciadas com acentuações, por isso "a
questão do metro é a questão do acento" (1987, p. 317). Podemos relacionar esta afirmação ao
que Lerdahl e Jackendoff (1983) definem como "acentos métricos", em que uma pulsação é
relativamente forte no contexto métrico. Este tipo de acento é visto pelos autores como uma
concepção mental, inferida pelos padrões de acentuação da superfície musical.
A abordagem comportamental do metro discutida aqui, por fim, posiciona a questão da
acentuação também no ouvinte "carreado" (entrained). London (2012) admite que este é um
dos aspectos atraentes desta abordagem, pois os problemas comumente encontrados nas
concepções de acentuação quando esta se encontra "na música" são sutilmente solucionados
pela acentuação como fenômeno cognitivo. "Quando o metro é encarado como o carreamento
do ouvinte à superfície musical, a acentuação métrica se torna um efeito colateral natural do
processo de atenção" (p. 19).
A inferência do ouvinte se deve também à natureza seletiva deste processo de atenção,
que nos leva a focar nos eventos temporais mais salientes em meio a um excesso de estímulos
do qual não somos capazes de extrair toda a informação. Assim, o senso de metro
possivelmente surge de uma necessidade que temos de agrupar os estímulos, mesmo que

178
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

sejam absolutamente idênticos – como cliques – em pequenos grupos, trazendo um senso


também subjetivo de agrupamento.
A afirmação de Winold de que "a estrutura métrica é melhor descrita através [...] de
grupos de pulsações" (1975, p. 217) corrobora a concepção de Berry (1987) de que o metro é
um dos aspectos do agrupamento. Este, enquanto ferramenta organizadora da nossa
percepção, é um processo cognitivo que, de fato, tem no metro uma das possíveis resultantes.
Porém, o agrupamento enquanto aspecto estrutural da música apresenta unidades em
diferentes níveis hierárquicos – como pequenos conjuntos melódicos, frases, seções e
movimentos de uma peça – e, como mencionado anteriormente, implica em segmentação, o
que não ocorre com o metro (Temperley, 2001).

Metro e treinamento auditivo


Os conteúdos discutidos neste trabalho podem levar a uma reflexão por parte de músicos e
educadores sobre os caminhos de introdução e desenvolvimento destas questões na disciplina
de treinamento auditivo. Em primeiro lugar, fica clara a importância de se abordar a
percepção do metro anteriormente à percepção e ao conhecimento de figuras rítmicas, por
exemplo. Já que aparentemente tendemos a perceber as regularidades da música sem
necessidade de treino, provavelmente ainda mais proveitoso seria introduzir a percepção
métrica através da escuta direta, sem uso de notação musical. Como somos também capazes
de aprimorar essa percepção com o treino, a notação musical e todos os conceitos nela
embutidos serviriam ao propósito de complementar esta habilidade com os conhecimentos
teóricos apropriados.
Segundo Gruhn e Rauscher (2006), o aprendizado musical foca no desenvolvimento de
representações mentais caracterizadas por diferentes formas de decodificação; propriedades
musicais intrínsecas, como pulso e metro, são representadas por conexões neurais que só
podem ser reconhecidas quando ativadas através de estímulos auditivos; por outro lado, essas
entidades musicais só podem ser articuladas – cantando ou tocando – se forem concebidas
como representações mentais.
Algumas pesquisas revelam a importância dessas representações, como o estudo de
Paney e Buonviri (2013) – em que foram investigadas as respostas de estudantes de música a
ditados musicais – que mostra que muitos sentem dificuldade com a notação rítmica. Esta
dificuldade, de acordo com os autores, pode ser agravada por não haver uma forma clara de
ensino de ritmo por parte dos professores, e uma possível solução para estimular a fluência

179
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

dos alunos neste tipo de atividade seria ajudá-los a construir um vocabulário sólido dos
padrões comuns, já que os alunos que não apresentam dificuldades são aqueles que possuem
justamente a habilidade de reconhecer padrões.
De acordo com Drake, "um dos principais fatores que influenciam a dificuldade em
reproduzir ritmo pode ser a dificuldade em perceber a estrutura deste ritmo: um ritmo fácil de
perceber será relativamente fácil de reproduzir" (1993, p. 33). Como mencionado
anteriormente, estruturas métricas facilitam a eficiência do processamento de padrões
rítmicos. Desta forma, fica evidente a importância do estudo cauteloso do pulso e então do
metro previamente ao estudo de figuras rítmicas. Karpinski corrobora esta ideia e afirma que a
regência é o meio musical e prático de representar o metro, pois combina a percepção de
pulsos com uma organização hierárquica destes pulsos, e só deve ser usada neste estágio, e
não antes. O autor ainda expõe que a percepção do metro é uma habilidade essencial à
performance de qualquer música métrica e, apesar disso, é "raramente abordada
separadamente nos livros didáticos." (2000, p. 22).
Dentro da disciplina de treinamento auditivo, a escuta de todos os elementos que fazem
parte da estrutura musical é de reconhecida importância. Dedicar-se pouco à prática da
percepção do pulso e do metro ou omitir este estudo auditivo prévio deixa lacunas no
aprendizado. Estas podem ser responsáveis por dificuldades posteriores envolvidas na
concepção, execução, transcrição e leitura de figuras rítmicas. Na hipótese de o estudante de
música conhecer toda a teoria rítmica de fórmulas de compasso e figuras e ainda encontrar
dificuldades em sua execução, sua experiência pode ser enriquecida com o sentido musical
que a percepção do metro ajuda a construir.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

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181
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Etologia na comunicação de significados simbólicos musicais

Bernardo Aguiar de Souza Penha


DM-IA/UNICAMP
berasp@gmail.com

José Eduardo Fornari


NICS/UNICAMP
tutifornari@gmail.com

Resumo: A Etologia é uma ciência que estuda o comportamento de animais (incluindo humanos) de
modo a obter informações sobre seu estado emocional através da observação de seus padrões de
comportamentos, gestos e expressões. Tal ferramenta pode ser utilizada no estudo da emoção evocada
pela música, tanto com relação à escuta quanto à performance musical. Este trabalho apresenta o
desenvolvimento teórico atual de uma pesquisa de doutorado que investiga os possíveis significados
musicais gerados a partir de manipulações de elementos sonoros, em termos de significados
expressados e/ou percebidos, bem como os consequentes efeitos emergentes nos ouvintes, por meio
dos significados evocados. Este trabalho relaciona a abordagem da psicologia analítica, sobre os
símbolos e o inconsciente, com a abordagem da etologia, sobre a comunicação animal, em relação aos
processos cognitivos e neurais, e os efeitos comportamentais provocados pela música no organismo
do ouvinte.
Palavras-chave: sentido musical, emoção musical, comunicação não verbal.

Ethology in the communication of musical symbolic meanings


Abstract: Ethology is a science that studies the behavior of animals (including humans) in order to
obtain information about their emotional state through the observation of their behavior, gesture and
expression patterns. Such a tool can be used in the study of emotions evoked by music, both with
respect to musical listening and performance. This work presents the current theoretical development
of a doctoral research, which investigates possible musical meanings generated from manipulations of
sound elements, both in terms of expressed and/or perceived meanings, as well as the consequent
emerging effects in the listeners, through evoked emotion. This work relates the analytical psychology
approach, about symbols and the unconscious, with the approach of ethology, about animal
communication, in relation to cognitive and neural processes, and the behavioral effects caused by
music in the listener's organism.
Keywords: musical meaning, musical emotion, nonverbal communication.

1. Introdução
Música, tanto quanto linguagem, é um fenômeno que muitos estudiosos consideram florescer
apenas entre humanos. A origem da música remonta à história e, juntamente com a
linguagem, vem ocorrendo em todas as comunidades que se tem registro (Patel, 2008). Apesar
da origem indeterminada, é provável que a música tenha sido iniciada a partir da tentativa de
imitação, por grupos humanos, dos padrões sonoros encontrados na natureza, como as
regularidades acústicas encontradas no som dos pássaros, dos insetos e das tempestades.
Frequentemente, em seus processos criativos, músicos inspiram-se em aspectos acústicos de

182
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

paisagens sonoras1 , que foram coletados ao longo dos séculos e assim passaram a fazer parte
do inconsciente coletivo, termo criado por Carl Jung, referente às estruturas da mente
inconsciente que são compartilhadas por indivíduos da mesma espécie (Jung, 2002).
Complementarmente a este conceito, diversos pesquisadores (Panksepp & Bernatzky,
2002; Trehub, Hannon & Schachner, 2010; Juslin & Laukka, 2003) defendem que, desde sua
origem, a música tenha sido uma extensão da comunicação afetiva dos humanos (sons
emocionais inatos), ou seja, os elementos prosódicos das nossas expressões vocais e os
movimentos rítmicos regulares de nosso aparato motor (Panksepp & Bernatzky, 2002), os
quais funcionam como estímulos comunicativos (sinais etológicos) capazes de comunicar
estados emocionais. Com o surgimento da comunicação verbal (com significado semântico)
ela passou a apresentar fortes traços culturais, decorrentes da expansão do neocortex cerebral,
o que permitiu o surgimento do pensamento imaginativo (Panksepp, 2009).
Pode-se dizer que a voz humana é capaz de transmitir valência2 , estimulo fisiológico e
intensidade emocional, por meio de suas modificações nos domínios espectral e temporal
(Schlaug et al., 2013). Este fato fornece evidência para se supor que o trato vocal tenha sido o
primeiro instrumento musical, seguido pelo tambor (Panksepp, 2009). Além disso, o que pode
ter fomentado a transição da utilização de sons emocionais animais primitivos para as
habilidades proto-musicais, é a fala/canto maternal, juntamente com a responsividade
emocional-musical dos bebês (Trehub, Hannon & Schachner, 2010; Panksepp, 2010).
Esse aspecto comunicativo vocal (Panksepp, 2009), inato e inerente à nossa espécie,
influenciou as respostas emocionais do indivíduo ao ser exposto à música. Os elementos
prosódicos das expressões vocais fundamentaram os mecanismos subjacentes à evocação de
emoções, os quais ocorrem de maneira inconsciente, e cujo processamento cerebral é, em
grande parte, feito em regiões “primitivas”, comuns também a outras espécies de animais,
como o sistema límbico. Não há maiores evidências de que outros animais possuam uma
“mente musical”, mas há inquestionáveis evidências de que esses, especialmente outros
mamíferos, possuem “mentes emocionais”. Os sentimentos afetivos primitivos de outros
animais, assim como os nossos, também emergem das regiões cerebrais subcorticais
(Panksepp, 2009).

1Termo cunhado por Murray Schafer (soundscape) que denota um ambiente acústico, similar ao ambiente

visual que compõe uma paisagem, e que pode ser facilmente percebido e identificado pelo ouvinte.
2Em psicologia, valência refere-se a qualidade que se estende entre atração (valência positiva) e aversão

(valência negativa). Em música, esta dimensão costuma representar a extensão de emoções entre o alegre e o
triste.

183
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

A partir desta base em comum, levanta-se o seguinte questionamento: Seria possível


criar objetos musicais capazes de comunicar significados simbólicos determinados, e ainda
influenciar a geração de significados específicos evocados no ouvinte? A próxima seção
apresenta as bases etológicas para o aprofundamento da discussão a respeito da possível
transmissão de significados simbólicos específicos através da música.

2. Sinais, Pistas e Intervalos


Segundo a Etologia, disciplina da zoologia que estuda o comportamento animal, existem dois
tipos de comunicação animal, os sinais e as pistas (Huron, 2012c). Sinais são atos
comunicativos intencionais, que envolvem comportamentos inatos e mecanismos fisiológicos
com a intenção de alterar subitamente o comportamento do observador. Os sinais são
biologicamente preparados, tanto para se comportar de uma maneira específica (emissor),
quanto para reagir de uma maneira específica (receptor) quando se observa um
comportamento de sinalização. Um exemplo típico de sinal é o chacoalhar do guizo da
cascavel. Os sinais tendem a ser evidentes e ostensivos e apresentam uma característica
multimodal, ou seja, ocorrem por mais de uma via comunicativa (visual, auditiva, olfativa,
etc.). Pistas, por outro lado, são comportamentos não intencionais, mas que acabam por
transmitir informações específicas. Estas são totalmente aprendidas por meio da exposição a
um ambiente. Pistas podem também ser multimodais, mas geralmente são unimodais por não
terem sido desenvolvidas ao longo da evolução para serem atos comunicativos. Um exemplo
típico de pista é o som do zumbido do mosquito antes de picar, que não tem necessariamente
a intenção informar o seu ataque, mas que o acaba fazendo de todo modo.
Segundo Huron (2012c), um exemplo de pista na emoção humana é a tristeza. Esta pode
ser caracterizada como um estado afetivo de baixa excitação fisiológica, ou seja, baixa
frequência cardíaca, respiração rasa, perda de apetite, sonolência, engajamento com o mundo
reduzido, tendência a evitar conversas. Isso acontece por um baixo nível de acetilcolina,
tornando os músculos menos tensos, mais relaxados, e com menor reatividade. Desta maneira
a voz fica mais suave e vagarosa, mais grave e monótona. A fala fica mais balbuciada e com
um timbre menos brilhante. No entanto, tais características podem ser facilmente confundidas
com relaxamento, ou cansaço. Portanto, esta é uma pista etológica.
Já o desespero é um sinal. Este apresenta um nível de excitação fisiológica mais alto,
sendo caracterizado por uma frequência cardíaca acelerada, respiração errática,
enrubescimento, presença de lágrimas, congestão nasal, vocalização ingressiva (produção de

184
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

som enquanto inala), fazendo com que o timbre da voz se torne mais brilhante, com
glissandos melódicos, fonação ingressiva, e fala entrecortada. Tais características são muito
evidentes e por isso o desespero pode ser considerado um sinal etológico. Ambos tipos de
comunicação ocorrem simultaneamente e com frequência, devido às funções adaptativas
relacionadas a estes estados emocionais.
A tristeza, sendo uma pista, pretende mudar o próprio comportamento do indivíduo, ao
induzir o realismo depressivo, que o coloca em um estado ruminativo, o que abaixa as
expectativas e o faz contemplar estratégias mais adaptadas ao ambiente. O desespero, sendo
um sinal etológico, pretende mudar o comportamento dos observadores que interagem com tal
indivíduo, ao encorajar em outros indivíduos, por meio de tais comportamentos, uma reação
mais altruísta. Todas essas características podem ser observadas na música (Huron, 2008).
Em termo de construções melódicas, escalas com intervalos de alturas (pitches)
menores do que o normal ou habitual, assim como informa a abordagem da etologia, têm uma
maior tendência a ser considerados mais tristes (Huron, 2010). Tendo em vista que, na cultura
ocidental, 75% das músicas são feitas na escala/campo harmônico maior, os indivíduos desta
cultura tem uma maior tendência a criar expectativas de escutar uma música como que
composta na escala maior. Por isso, eles teriam a tendência de considerar as músicas
compostas na escala menor como tristes, ou seja, por conterem intervalos menores que o
normal, o que não necessariamente ocorreria para indivíduos que nasceram e cresceram, por
exemplo, na Bulgária, uma vez que naquela comunidade, a escala mais comum é a escala
menor.
Mas por que exatamente o modo menor soa triste, e não outras escalas que também
tenham intervalos de alturas menores do que o normal? Modificar algumas alturas em relação
ao modo maior, faz com que alguns intervalos tornem-se menores, mas outros tornem-se
maiores. Se todas as alturas em uma escala fossem igualmente possíveis e todas as sequências
de altura fossem igualmente comuns, então a modificação de um tom na escala não teria
qualquer efeito na média do tamanhos dos intervalos. Acontece que, na música “real”, certos
graus da escala tem maior probabilidade de ocorrer, e nem todas as sequências de alturas são
igualmente comuns, por isso realizar alterações em alguns graus da escala afeta a média dos
tamanhos dos intervalos melódicos. Huron (2010b) realizou um experimento, com 300
melodias no modo maior, sobre o efeito de alterações específicas em graus da escala, na
média dos tamanhos de intervalos melódicos. Por exemplo, diminuir os graus 3 e 6
combinados (escala menor harmônica) gera as menores médias nos tamanhos de intervalos.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Aumentar apenas o grau 4 (modo lídio), gera as maiores médias nos tamanhos de intervalos,
fazendo com que as músicas respectivamente tornem-se mais tristes (menor harmônico) e
mais alegres (lídio) do que o normal.

3. Som, Inconsciente e Símbolo


A audição é um dos primeiros sentidos que surgem na formação do feto humano (David,
2007), sendo que desde o momento da audição estar totalmente operacional,
aproximadamente na vigésima semana de gestação, este nunca mais cessa de captar
informação acústica. Assim, só conseguimos lidar com essa enorme e ininterrupta quantidade
de informação, devido à existência do inconsciente (conjunto de processos mentais que
ocorrem sem a participação ou o monitoramento da atenção). Não temos consciência de tudo
que chega através de nossos canais perceptivos e só direcionamos nossa atenção (uma
faculdade da consciência) para os dados considerados relevantes por nossos processos
cognitivos de avaliação da realidade. O inconsciente não é apenas um armazenador de
informações, mas um sistema de funcionamento mental, com leis de articulação e linguagem
própria (Garcia-Roza, 2009). Esta linguagem é simbólica, e não está associada à linguagem
verbal, mas a imagens (ou padrões) mentais, que não são necessariamente visuais, e que
consistem em representações do que foi percebido, os perceptos (Damásio, 1999).
Para Jung (2008), símbolo é um termo, um nome ou uma imagem familiar, mas que
possui sentidos especiais, além do seu significado comum. Esta palavra ou imagem tem um
aspecto inconsciente mais amplo, o qual não se pode precisamente definir ou explicar.
Quando a mente explora um símbolo, é conduzida a conceitos que podem estar fora do
alcance da razão. Isso acontece porque, segundo Freud, o consciente abrange a representação
da coisa (pessoa, objeto, ou conceito) agregada à representação da palavra que a esta se refere,
ao passo que a representação inconsciente refere-se à representação simbólica desta coisa, e
que não possui associação fundamental com a linguagem (Garcia-Roza, 2009).
Baseado nisso, pode-se argumentar que os sons também podem ganhar significados
além daqueles fundamentais à sua existência (normalmente manifestos e óbvios) e
apropriarem-se de conotações e nuances indiretas, representando ideias, conceitos, emoções e
sentimentos, e assumindo uma função simbólica a qual muitas vezes é comunicada de/para o
inconsciente.
Lévi-Strauss afirma que a cultura é um conjunto de sistemas simbólicos, e que tais
sistemas não são constituídos a partir do momento em que traduzimos um dado externo em

186
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

símbolos. Ao contrário, é o pensamento simbólico que constitui o fato cultural ou social. Estes
sistemas com função simbólica constituem as leis estruturais do inconsciente (Garcia-Roza,
2009). Sendo a música parte fundamental da cultura de uma comunidade, ela também é
constituída pelos símbolos e obedece às suas funções simbólicas. Uma das áreas que se baseia
neste conceito como papel determinante do processo composicional é a música composta para
filmes. Pode-se dizer que esta é composta com o propósito de transmitir mensagens à psique
do espectadores, com as quais se pretende persuadi-los a experienciar o arcabouço emocional
determinado pelo roteiro. Nesse caso específico, a música comunica um significado simbólico
implícito às imagens visuais (Green, 2010). Outro interessante domínio da arte musical é a
música instrumental, a qual não acompanha a significação semântica contida na letra da
canção, mas que também tem a habilidade de induzir a mente inconsciente do ouvinte, de uma
maneira simbólica, para que este responda emotivamente, dentro do contexto de suas próprias
experiências de vida (Nebenzahl, 2000).

4. Música, Emoção e Sentimento


Em relação à ativação cerebral dos ouvintes e dos músicos intérpretes, o processamento da
escuta e pensamento de sons tonais, aparentemente ocorre em grupos especializados de
caminhos neurais, nas regiões superior temporal e frontal do córtex, particularmente no
hemisfério direito. No entanto, estudos recentes mostram atividades bilaterais em áreas
occipitais, normalmente envolvidas num processamento visual, apesar da ausência de entrada
de sinais visuais (Brandt, 2009). Além disso, partes do córtex motor são ativadas, e também
áreas para-límbicas (que são ativadas em processamentos emocionais) mostraram estar
envolvidas nos aspectos avaliativos da experiência musical.
Segundo Damásio & Habibi (2014), quando a música é prazerosa para o ouvinte e
provoca a sensação de arrepios, alterações fisiológicas ocorrem, como aumento na taxa de
batimento cardíaco, na taxa de respiração, na condutância da pele e a diminuição da
temperatura. Além disso, também há alterações na liberação de dopamina em regiões
cerebrais, como núcleo accumbens e núcleo caudado (altamente correlatos com a sensação de
prazer, ou mais especificamente com comportamentos de busca por recompensa e reforço de
aprendizado), congruentes com o prazer na antecipação de eventos. Já quando a música não
evoca sentimentos e emoções tão prazerosas, mas alguns com valência negativa, pode-se
observar o resultado comportamental característico de ansiedade, frustração, medo e/ou

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

tristeza, e um aumento de atividade no giro parahipocampal, no pré-cúneo, e na amídala,


gerado, por exemplo, pela ação de passagens musicais dissonantes.
Para Damásio (2011), as emoções são um conjunto padronizado de respostas químicas e
neurais produzidas pelo cérebro, quando este identifica um estímulo emocionalmente
competente, como um objeto ou uma situação relevante. E existem duas vias de atuação das
emoções no organismo, sendo elas: 1) a via corpórea, ao criar um estado que envolve ajustes
no balanço homeostático, e gerar comportamentos e expressões faciais específicos, 2) a via
cerebral, a qual produz uma alteração no seu modo de operação durante aqueles ajustes
corpóreos, resultando por exemplo em uma modulação do foco de atenção concedida aos
estímulos. Por outro lado, os sentimentos, que são representações mentais das mudanças
fisiológicas que caracterizam as emoções, provêem ao organismo alertas mentais, o que
amplifica o impacto de uma uma dada situação, melhora o aprendizado, e aumenta a
probabilidade de que situações comparáveis possam ser antecipadas.

5. Considerações Finais
As linhas epistemológicas (psicologia analítica, cognição musical e etologia), apresentadas
como sustentação teórica para o presente artigo são distintos caminhos de investigação que se
convergem. Nota-se que a comunicação acústica afetiva dos animais (sobretudo dos
mamíferos), ainda que ocorra de maneira direta e inata, decorre da manipulação de aspectos
físicos intrínsecos às espécies, acarretando em alterações acústicas que, sem seus contextos
evolutivos históricos (cujas informações são armazenadas no inconsciente coletivo das
comunidades), não carregariam em si qualquer significado intrínseco; como é o caso da
música.
Ao observarmos as mensagens comunicadas pelos animais, notamos seu caráter
simbólico, que conecta os estados internos, observados por meio de comportamentos, com
seus significados. Para exemplificar, podemos tomar o uivo de um lobo, que não carrega em
suas características sonoras qualquer significado inerente, mas que transmite simbolicamente
seu estado interno. Assim também ocorre com a música, que a princípio não carrega um
significado intrínseco, mas que se tomada como uma variação mais sofisticada, derivada da
comunicação afetiva animal, permite obtermos indicações mais detalhadas de seus
significados simbólicos. Podemos observar o estudo da etologia, que oferece conceitos
reveladores neste quesito. Os sinais e as pistas podem ser entendidos como configurações
simbólicas dos afetos, cuja correspondência musical é significativa.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Por fim, esta pesquisa almeja contribuir com aspectos envolvidos neste campo
interdisciplinar, o que poderá fomentar o desenvolvimento de futuras pesquisas sobre:
métodos de análise musical baseado nos significados simbólicos emergentes, estudos sobre a
diferenciação de estilos ou gêneros musicais (com base nos significados simbólicos que estes
contém), e outros desdobramentos, em outras áreas de pesquisa, além da cognição musical.

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190
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Studying Possible Emotional Impacts in the Remote Cooperation of


Participants of Virtual Choirs

Daniel Amato
Instituto de Biociências / Rio Claro / UNESP
maestrodanielamato@gmail.com

José Eduardo Fornari


NICS / COCEN / UNICAMP
tutifornari@gmail.com

Abstract: Choir practice is a musical activity closely tied with time and space, where its singers
members traditionally must be simultaneously in the same location at the same time. Recent advances
in information and communications technologies (ICT) has allowed the creation of musical virtual
reality environments such as in the project entitled “Virtual Choir”, by Eric Whitacre, where the
participants of a choir are remotely located and sometimes hadn't even meet each other in person. This
work seeks to theoretically explore the intervenient technological, methodological and musical
impacts in the remote cooperation of singers participants of virtual choirs, as well as investigate what
are the possible differences in the emotional state of their members.
Keywords: choir, ICT, emotion musical, virtual reality

Resumen: El coro es una actividad musical fuertemente ligada al tiempo y al espacio, donde
tradicionalmente sus miembros cantantes tienen que ser necesariamente de forma simultánea en el
mismo lugar. Con los avances en tecnologías de la información y la comunicación (TIC) se ha
convertido en posible crear entornos de realidad virtual musicales, como en el proyecto Virtual Choir,
el trabajo de Eric Whitacre. Este busca explorar filosóficamente las interveniências tecnológicas de la
estética musical de el corales (virtual y locales) y el posibles impactos en el estado emocional de sus
miembros.
Palabras clave: coral, TIC, musicales emoción, realidad virtual.

Introduction
It can be said that at the turn of the millennium the internet and its virtual environment of
computing and social networks (also known as the Cyberspace) have become ubiquitous for
all contemporary activities, contributing and influencing the sociocultural modus operandi of
work, education, leisure and arts. In response to this phenomenon, researches have been
published, in the most diverse areas of knowledge, investigating the impacts of cyberspace on
intra and interpersonal relationships, especially in the context of leisure (PEREIRA, 2007;
GARBIN, 2003). More precisely, this researches refer to the leisure time spent by individuals
in cyberspace, where cultural experiences are also aggregated in acquired habits (during the
process of socialization) and in the psychological predispositions of each user. This
individuals, as a subject of multiple actions, can be defined by variables related to their
sociocultural structure in cyberspace, which encompasses not only sociocultural aspects, but
also economical, ideological, and anatomical ones (CUNHA, 1987).

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Demand for leisure in the cyberspace has steadily increased, mainly with respect to
video games. Responding to this demand, the ICT industry is constantly launching
innovations such as new platforms, games and their versions, constantly produced and
reproduced from / to the contemporary generation of this interactive ICT revolution. These
users, in addition of being naturally adapted for virtual reality, are often their own designers,
programmers and players. This also allows its customers to transcend physical barriers,
hitherto insurmountable, such as simultaneous, multiple and seemingly immediate remote
communication (FERRARI, 2007; BRITO, 2006). Adherence to the cyberspace is often
motivated by a myriad of possibilities for personal improvement and development, as well as
by its innumerable ludic perspectives. These are aspects that may be the required incentive for
inserting its users into existing leisure activities (MARCELLINO, 1990; SCHWARTZ,
2003 ), adding to the fact that they can also develop skills by means of distance education
(KENSKI, 2007; MIRANDA, 2007).

Choir and cyberspace


Considering that leisure activities are a polysemic sociocultural phenomenon, their
characteristics promote the possibilities of different experiences associated with the interests
of individuals, which can be pedagogically grouped into several cultural contents (e.g.
Artistic, Sportif, Intellectuals, Handcrafts, Social) , as proposed by Dumazedier (1973),
Camargo (1989) and Schwartz (2003). Among the cultural contents of leisure, there is the
virtual, as proposed by Schwartz (2003), who acknowledged the growth of interest in human
relationships in cyberspace, going beyond mere leisure, as considered by Dumazedier (1973).
Many of these activities developed in the cyberspace have already become daily routines,
such as: the use of social networks (Facebook, Twitter, etc.), chats (Skype, GTalk, Messenger,
etc.), multiplayer games, online relationships, among others. It is noted, therefore, the
increasingly interest of users for activities that are traditionally performed in person, as it is
the case of musical production, and more specifically, as treated in this work, the activity of
Virtual Choir singing.
This modality of music is currently being increasingly supported by the cyberspace, in
particular, through social networks for the massive sharing of audiovisual information (such
as Youtube). Two interesting examples are: 1) Virtual Choir: a group of 2052 singers remotely
located, created and conducted by the American maestro Eric Whitacre (YOUTUBE, 2010);
2) Accent Vocal Group; a capella (unaccompanied singing) group of six singers from five

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

different countries that rehearsed and recorded several arrangements without these singers
meet each other in person (YOUTUBE, 2016).
However, the evolution of activities related to the development of choral singing in the
cyberspace is just beginning. It has not yet been fully understood and explored, both in the
academic literature as well as by practitioners of this musical modality. It is known that choral
singing practiced in the traditional way (with singers simultaneously present in the same
local) normally brings an emotional gratification to the participants, possibly based on the
achieve of synchrony of musical aspects, such as rhythm, pitch tuning and well balanced
loudness. This is known as Entrainment. In music, this term refers to the spontaneous
synchronization of gestures, behaviors and even the emotional state of the participants,
mediated by the synchronous communication of musical aspects. Some ethnomusicologists
suggest that entrainment has an evolutionary origin, where the hominids (the predecessors of
contemporary humans) entered a type of collective trance through sound synchronization that
decreased individual interests (i.e. survival of the self) while increased collective ones (i.e.
survival of the group). Musical entrainment has been used along the history to facilitate and
promote the coordination of collective activities that are fundamental for the survival of the
group, such as harvests, seine fishing, group hunts and even wars (JORDANIA, 2011). That
may be the reason why there is no records (to our knowledge) of any human community in
any given place or time of history that didn't have music.
Virtual choirs are in the frontier between collective and remote. The offering of a
rewarding experience of collective identity, at the same time that it is a remote activity done
in differentiated time (going from the rehearsals to the performance of each participant)
brings interesting philosophical questions, instigated by the sense of understanding how this
musical modality is processed and performed in cyberspace, especially in regard to the
emotions evoked by the performance, in the singers and in the audience.
The human social nature seems to be the factor that, at any scale, promotes the
spontaneous creation of virtual communities, which brings the opportunity to exchange
experiences in a faster and wider level, thus influencing the autopoietic1 emergence of musical
aspects, supplanting temporal, geographical and even idiomatic limits. Thus, we believe that
there is a geniuine need to investigate how the participants' emotions are processed during
virtual choir singing activities. Despite its collective result, a virtual choirs also requires the
previous and solitary work of each participant in rehearsing and also recording their

1
Autopoiesis refers to a system that is capable of autonomously reproduce and maintain itself.

193
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

individual performances before turning it into collective. This work also focusses on the
investigation of the psychological impacts on the participants of virtual choirs when they
watch their final presentation resulting from their contributions, made in differentiated places
and times.

Music, Space and Time


Music has also been present in social relations of the individual (mortal and ephemeral) with
his/her deities (immortal and permanent), both in terms of appreciation and/or performance.
Although musical activity has accompanied humanity since its earliest days (GROUT;
PALISCA, 2007), it was only at the turning of the millennium that music broke away from the
obstacles of time and space, where it was originally ephemeral (music lasted only during the
performance), and local (a musical performance could be watched only in one single
location). With the advent of audio recording, in the 20th century, the art of music began to
acquire a more concrete and manipulable aspect, which was first represented by the concept
of Sound Object (ROADS, 2001) that, in the cyberspace, can be effortlessly reproduced,
losslessly copied and virally transmitted, thus easily transcending the previous barriers of time
and space (FORNARI, 2011).
Although musical instruments are a result of a technological evolution, they can reach
an evolutionary climax, where the incremental step of their adaptation decelerates or even
halts. This is the case with the musical instruments that compound the traditional Western
European orchestra, such as the string family (violins, violas, cellos and basses). Other
musical instruments, however, continue to evolve, seeking new gestural and sonic
possibilities. This is the case of digital electronic musical instruments. These have made room
for the expansion of the conception of music in the 20th century, which was formerly
restricted to a defined canvas of timbres, elegant melodies and well-behaved harmonies; to the
integration of new timbres, noise and even non-musical sounds, thus delivering and
highlighting more subtle and profound human emotions, specially of the contemporary urban
life (ROSS, 2009). Thanks to the advances of electronic technology , 20th century music was
the first to analyze, transform and generate a myriad of new timbres. On the other hand, in
singing, the musical instrument is the body of the singer (SCHWARTZ; AMATO, 2011). This
instrument has its performance determined by: sociocultural aspects, singer's aesthetic
interests, and his/her genetic expression (phenotype) that is ultimately responsible by his/her
instrument design.

194
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Conclusions
For us, it is intriguing and therefore interesting to understand the rules and laws regarding the
adherence of Virtual Choir Singing, specially in terms of the emotions that are evoked and the
expectations associated with this leisure activity. Regarding psychosociocultural aspects, there
are several concerns that arise from prerogatives here presented, such as: What are the
emotional states that these singers (usually amateurs) manifest as part of this virtual activity.
What is the musical individual perspective of Virtual Choir participants. What factors of
adhesion impels an individual to choose and engage in this modality of leisure activity. These
and other questions are still open, and compound the fundamental motivation of this study,
seeking to broaden the reflections and understandings about the impact of the use of ICTs in
the field of leisure for the ones who develop a musical activity (in this case, Virtual Choir).
This research, currently under development, has a qualitative nature; a methodology
that seems to fit for this type of study, because it allows to elaborate a initial and deeper
understanding on the subjective aspects here involved (MINAYO; SANCHES, 1993). This
project intendeds to be developed through the union of bibliographical and exploratory
research, as a way to expand the horizons of knowledge coming from the retrieval of
subjective data and the publishing of its discoveries. This research aims to bring a greater
consistency to the reflections proposed here, about Virtual Choirs, thus providing the
cooperation with several fields under which this interdisciplinary theme is studied (GIL,
1996).
In future researches, we plan to explore some concepts based on ICTs to investigate
behavioral changes in participants of virtual choirs, especially regarding their values and
concepts on this activity. This may represent a change in the understanding of well known
physical (present, local) concepts such as solid and heavy, liquid and light (BAUMAN, 2001).
In this perspective, one can even oppose the idea of Lévy (1996), when he states that the
virtual does not oppose the real, since it opposes the present, that is, subverts stable physical
parameters, of the 19th century. Virtual undergoes a process of dynamic updating, but virtual
and real are merely of different natures, not mutually exclusive. Virtual and real complement
each other (MONAGHAN, 2012).

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196
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Interações musicais via webconferência na Educação a Distância:


apresentando possibilidades para fundamentar um referencial teórico

Vanessa de Souza Jardim


Universidade de Brasília
nessa.jd@hotmail.com

Paulo Roberto Affonso Marins


Universidade de Brasília
pramarins@gmail.com


Resumo: Este estudo tem como objetivo apresentar possibilidades para fundamentar um referencial
teórico que dialogue com o tema de pesquisa sobre interações musicais via webconferência que tem
como lócus de pesquisa o curso de Licenciatura em Música a Distância da Universidade de Brasília
(UnB). Assim, realizou-se uma pesquisa de cunho bibliográfico e esta evidenciou como referencial
teórico, a abordagem sistêmico-relacional da interação mediada por computador proposta por Primo
(2003; 2008) como a mais apropriada para se investigar como ocorrem as interações musicais via
webconferência no referido curso, bem como entender como os interagentes se planejam, identificar
as interações que se estabelecem neste contexto e compreender o olhar dos interagentes no processo.
Espera-se que esta proposta de referencial teórico provoque discussões em relação à interação em sua
complexidade, valorizando a ação entre os interagentes e, que possibilite novos encaminhamentos
para atualizações e mudanças em relação aos processos interativos síncronos online em cursos de
música a distância em geral.
Palavras-chave: interação, sistemas dinâmicos, ação/atuação, licenciatura em música, educação a
distância.

Musical Interactions via Web conferencing in Distance Education: presenting possibilities to


support a theoretical framework
Abstract: This study aims to present possibilities to support a theoretical framework that dialogues
with the research topic about musical interactions via web conferencing that has a locus of research
the distance education undergraduate degree program im, and refers to masters research in progress
that has a locus of research the distance education Undergraduate Degree Program in Music of
University of Brasília (UnB). Thus, a bibliographical nature review was conducted and this showed as
theoretical framework, the so-called systemic-relational approach of computer-mediated interaction
proposed by Primo (2003; 2008) as the most appropriate to investigate how the musical interactions
occur via web conferencing in referred undergraduate degree program, as well as to understand how
the integrants plan, identify the interactions which are established in this context, and understand the
look of integrants in the process. It is hoped that this proposal of theoretical framework leads to
discussions regarding interaction in its complexity, valuing the action between the integrants and that
enables new referrals for updates and changes concerning the online synchronous interactive
processes in music distance education courses in general.
Key-words: interaction, dynamical systems, action/performance, undergraduate degree in music
education, distance education.

Introdução
Este estudo tem como objetivo apresentar possibilidades para fundamentar um referencial
teórico que dialogue com uma pesquisa de mestrado em andamento que traz em evidência o
tema interações musicais via webconferência e tem como lócus de pesquisa o curso de

197
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Licenciatura em Música a Distância da Universidade de Brasília (UnB). Para clarificar, é


importante ressaltar que neste tema de pesquisa as inquietações emergiram em torno das
Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) que possibilitam interações síncronas por
meio de canais como videoconferências, aula satélite ou webconferências.
Com o avanço das tecnologias e expansão da internet nos finais dos anos de 1990,
possibilitou-se o desenvolvimento de recursos via telemática – que combina o uso de
computador com os meios de telecomunicação – assim, a videoconferência ou
webconferência passa ser um recurso bastante utilizado nos contextos educacionais. Para
Moore e Kearsley (2007, p. 152), “O ensino a distância eficaz depende de uma compreensão
profunda da natureza da interação e de como facilitá-la por meio de comunicações
transmitidas com base em tecnologia”, inclusive, apontam que a interação entre “aluno-
instrutor” é considerada “como essencial pela maioria dos alunos e como altamente desejável
pela maior parte dos educadores” (Moore, Kearsley, 2007, p. 152).
Também, convém ressaltar que as interações síncronas via webconferência na EaD
tendem a representar uma nova forma de presencialidade. Nesta perspectiva, as palavras de
Moran (2002) são bastante convincentes:
Na medida em que avançam as tecnologias de comunicação virtual (que conectam
pessoas que estão distantes fisicamente como a Internet, telecomunicações,
videoconferência, redes de alta velocidade) o conceito de presencialidade também se
altera. Poderemos ter professores externos compartilhando determinadas aulas, um
professor de fora "entrando" com sua imagem e voz, na aula de outro professor [...].
Haverá, assim, um intercâmbio maior de saberes, possibilitando que cada professor
colabore, com seus conhecimentos específicos, no processo de construção do
conhecimento, muitas vezes a distância. (Moran, 2002, p. 2).

Cruz e Barcia (2000) ainda salientam que na EaD, a videoconferência é um dos recursos
tecnológicos que mais se aproxima do contexto da sala de aula convencional. Cruz (2001, p.
58) também enfatiza que, “No caso da videoconferência usada para fins educativos, pode-se
dizer que a sala de aula é virtualizada, ao permitir que a aprendizagem ocorra numa interação
de co-presença mediada entre professores e alunos”. Não obstante, Carneiro, Tarouco,
Maraschin (2001, p. 514) destacam que “A videoconferência recria o ambiente de sala de
aula, mesmo quando os participantes estão distantes”. A autoras ainda complementam que “há
a sensação de presença dos participantes: a conexão visual e a interação entre os participantes
auxiliam na compreensão e os ajuda a sentirem-se próximos uns dos outros” (Carneiro,
Tarouco, Maraschin, 2001, p. 514).

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Quando o assunto é interações musicais via webconferência, pesquisas como de Braga


(2009); Ribeiro (2013); Kruse et al (2013) e Dye (2016) enfatizam o tema. Braga (2009), por
exemplo, analisou e refletiu sobre os padrões de interação mais frequentes e pertinentes
observados durante um curso de violão mediado por videoconferência. Já Ribeiro (2013),
investigou os processos motivacionais de estudantes do curso de Licenciatura em Música da
Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN) em interações online, nas aulas de
violão. Por outro lado, Kruse et al (2013) buscaram explorar os benefícios e desafios de aulas
de piano vivenciadas entre um aluno de graduação e o professor, por meio do software de
webconferência Skype, enquanto que, Dye (2016) analisou o uso de videoconferência no
ensino da música aplicados por 3 (três) alunos de graduação a 6 (seis) estudantes de ensino
médio que faziam parte de bandas de música a partir de padrões de comportamento dos
estudantes e professores.
Também, é importante ressaltar que, Jardim e Marins (2016) realizaram um estudo e
trouxeram em evidência as primeiras aproximações da literatura em relação ao tema
interações no ensino e aprendizagem musical via videoconferência na EaD. Nesta revisão de
literatura inicial, os autores enfatizaram que, embora haja um crescimento de pesquisas, a área
de música ainda carece de estudos que investiguem as interações no ensino e aprendizagem
musical via videoconferência.
Percebe-se então, que embora as interações musicais via webconferência seja um tema
que já vem sendo explorando na área da música, a área ainda carece de estudos que
aprofundem em outros aspectos, principalmente, em relação às interações que ocorrem neste
contexto da webconferência, focando na ação entre e no olhar dos interagentes . Dessa forma,
observa-se a necessidade de apresentar possibilidades para fundamentar um referencial
teórico que auxilie nesta investigação.

Metodologia
Este estudo se apresenta como pesquisa de cunho bibliográfico e fundamenta-se nas
proposições de Gil (2002). Em geral, a pesquisa bibliográfica “é desenvolvida com base em
material já elaborado, constituindo principalmente de livros e artigos científicos” (Gil, 2002,
p. 44). Portanto, as informações contidas neste estudo, compreendem livros, artigos
científicos e uma tese. E, tem o intuito de dialogar com abordagens teóricas relacionadas ao
conceito de interação.

199
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Interações, origens e abordagens teóricas


O termo interação tem suas origens na ciências sociais. Por exemplo, Maldonado e Reichert
(2010) destacam que,
Originária das Ciências Sociais, interação é a unidade mais fundamental dos eventos
sociais, caracterizada pelo contato entre pessoas que adaptam seu comportamento ao
do outro, em que se verifica a correspondência ou não das expectativas mútuas ou
sua rejeição”. (Maldonado; Reichert, 2010, p.118).

Ao dialogar no campo da Comunicação e nos estudos da mídia, autores como


Maldonado e Reichert (2010, p. 118) destacam que ainda “não se encontra uma definição
fechada de interação. A noção predominante na área trata-a como um processo que se
desenvolve entre receptores de um lado e a mensagem midiática de outro”.
Na área da Informática, Maldonado e Reichert (2010) também enfatizam que,
a interação é usada de forma contrária à tradição sociológica, ainda que o conceito
tenha sido tomado das Ciências Sociais. A interação, na visão dos informatas, refere-
se ao processo estabelecido entre seres humanos e máquinas – a interação humano-
computador (IHC) –, sem cobrir a comunicação entre duas ou mais pessoas que se
desenvolve com a mediação do computador. Outro ponto importante é que na
Informática é possível se ter interação (humano-máquina) sem comunicação,
enquanto na Sociologia só há interação se houver comunicação. (Maldonado,
Reichert, 2010, p. 119).

Quando se fala de interação na EaD, uma teoria muito difundida é a teoria da interação
a distância (distância transacional). Para Moore e Kearsley (2013, p. 295), na teoria da
interação a distância, a própria distância “é um fenômeno pedagógico, e não simplesmente
uma questão de distância geográfica”, portanto, o aspecto que pressupõe ser mais importante
se refere ao “efeito que a separação geográfica tem no ensino e aprendizagem, especialmente
na interação entre alunos e professores, sobre a concepção de cursos e sobre a organização de
recursos humanos e tecnológicos” (Moore, Kearsley, 2013, p. 295).
Ainda considerando a interação no contexto educacional da EaD, duas correntes
interacionista se destacam: a epistemologia genética de Piaget e a Teoria Sócio-histórica de
Vygotsky. Neste sentido, Barbosa (2012, p. 85) salienta que a “A teoria de Piaget prioriza a
interação entre sujeito e objeto” destacando que o conhecimento cognitivo se evolui a partir
da “ação do indivíduo sobre o objeto de seu conhecimento”. Por outro lado, para Vygotsky, “a
interação social, a cultura e a linguagem exercem forte influência sobre a
aprendizagem” (Barbosa, 2012, p. 85). A autora ainda enfatiza que, no cenário da EaD,
a teoria socioconstrutivista ou sociointeracionista de Vygotsky atende às
peculiaridades dessa nova abordagem de ensino/aprendizagem, em razão de
enfatizar a interação social como fator que propicia trocas recíprocas que, na

200
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

concepção de educadores, é um fator de grande importância para o desenvolvimento


cognitivo do aprendiz. (Barbosa, 2012, p. 85-86).

Outro pesquisador que podemos ressaltar em relação à interação que busca


possibilidades interativas em contextos mediados por computador (incluindo a EaD) é Alex
Primo (2003; 2008) que traz uma nova abordagem de orientação sistêmico-relacional da
interação mediada por computador, dedicando ao estudo do relacionamento que se estabelece
entre os interagentes (participantes da interação) e distinguindo as interações quanto ao
relacionamento mantido, “observando o que se passa entre os sujeitos, entre o interagente
humano e o computador, entre duas ou mais máquinas” (Primo, 2008, p. 14).
De acordo com Primo (2003; 2008), é importante ressaltar que a perspectiva sistêmica
encontra raízes no conjunto teórico desenvolvido por Maturana e Varela (1995), a chamada
Escola Chilena, onde o principal interesse é a organização do ser vivo e não a sua estrutura,
para tal Maturana (1997) cria o construto “autopoiese”, que significa “autocriação” que,
“Trata-se de uma rede de processos de produção na qual cada componente participa da
produção ou transformação de outros componentes da rede” (Primo, 2008, p. 68), ou seja, a
produção da rede é contínua e a organização dos seres vivos é a sua própria produção; na
postura sistêmica de Piaget (1973; 1996), que valoriza a totalidade do problema complexo da
interação humana, onde o estudo do conhecimento e da interação deve articular biologia,
psicologia e sociologia; e, na ética do diálogo de Freire (2001) no intuito de trabalhar a
dimensão política do diálogo.
Assim, a partir do relacionamento entre os interagentes, Primo (2007) propõe dois tipos
de interação: a mútua e a reativa. Para Primo (2008, p. 57),
a interação mútua é aquela caracterizada por relações interdependentes e processos
de negociação, em que cada interagente participa da construção inventiva e
cooperada do relacionamento, afetando-se mutuamente; já a interação reativa é
limitada por relações determinísticas de estímulo e respostas. (Primo, 2008, p. 57).

Primo (2008) também apresenta o termo multiinteração, destacando que as interações


podem ser simultâneas. Neste sentido, o autor exemplifica que em um chat “ao mesmo tempo
em que um interagente conversa com outra pessoa, ele também interage com a interface
gráfica do software e também com o mouse, com o teclado” (Primo, 2008, p. 58). Assim, o
autor conclui que, “em muitos casos tanto se pode estabelecer interações reativas quanto
mútuas, simultaneamente” (Primo, 2008, p. 58).

201
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Dessa forma, mediante os referenciais teóricos até aqui apresentados, a abordagem


proposta por Primo (2003; 2008) encontra sua relevância por valorizar o processo interativo
em sua complexidade, como um todo, não de forma isolada, mas como um sistema. Neste
sentido, Moore e Kearsley (2013, p. 12) salientam que, “uma visão sistêmica é muito útil para
a compreensão da EaD como um campo de estudo e que adotar a abordagem sistêmica é o
segredo da prática bem sucedida”. Assim, considerando o tema de pesquisa referente às
interações musicais via webconferência no contexto do curso de Licenciatura em Música a
Distância da UnB, a abordagem sistêmico-relacional da interação mediada por computadar
(Primo, 2003; 2008) torna-se consistente, pois estudar interação em um contexto da EaD, é
viável valorizar a interação mútua, reativa e multiinteração, mas com ênfase na ação e
relacionamento entre os interagentes, mesmo porque, conforme salientam Dotta, Braga e
Pimentel (2012, p. 2) “a condução de uma aula virtual síncrona [...] envolve o domínio das
inúmeras funcionalidades da webconferência, fluência no uso simultâneo de algumas
ferramentas e alta capacidade para a gestão da comunicação entre os participantes”, e de certa
forma, essas “funcionalidades da webconferência” reflete diretamente nas interações que
ocorrem neste contexto.

Algumas considerações
Este estudo teve como proposta apresentar possibilidades para fundamentar um referencial
teórico para uma pesquisa de mestrado em andamento que traz como tema as interações
musicais via webconferência no curso de Licenciatura em Música a Distância da UnB.
Portanto, foi realizada uma pesquisa de cunho bibliográfico no intuito de verificar teorias que
fundamentem as interações que ocorrem em contexto de ensino e aprendizagem a distância.
Desta forma, evidenciou-se como principal proposta, a abordagem sistêmico-relacional da
interação mediada por computador sob a ótica de Alex Primo (2003; 2007).
Assim, considerando as interações musicais via webconferência por meio de uma
perspectiva sistêmica, é viável investigar como ocorrem as interações via webconferência no
curso de Licenciatura em Música a Distância da UnB e, especificamente, entender como os
interagentes se planejam, identificar as interações que se estabelecem neste contexto e
compreender o olhar dos interagentes no processo, só assim, enquanto pesquisadores,
poderemos ampliar o olhar para o fenômeno e construir conhecimentos levando em
consideração as experiências do outro, pois conforme salienta Demo (2012, p. 12) “Sendo o
olhar naturalmente autorreferente, [...] (vemos os outros, não como são, mas como somos),

202
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

mas podemos, por razão de método, cuidar de entender o outro, até onde possível, a partir
dele”. Neste sentido, a abordagem sistêmico-relacional da interação mediada por computador
é relevante, pois, conforme salienta Primo (2008, p. 57-58) “Ao valorizar o relacionamento
entre os interagentes, as conclusões que daí decorrem oferecem novos encaminhamentos”.
Espera-se então, que esta proposta de referencial teórico provoque discussões em
relação à interação em sua complexidade, valorizando a ação entre os interagentes e, que este
referencial teórico possibilite “novos encaminhamentos” para atualizações e mudanças em
relação aos processos interativos síncronos e online em cursos de música a distância em geral.

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204
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Respostas emocionais à sonoridade pianística de Arno Roberto von Buettner


Danilo Ramos
Universidade Federal do Paraná
daniloramosufpr@gmail.com

Anderson Toni
Universidade Federal do Paraná
andersontoni12@gmail.com

Resumo: Arno Roberto von Buettner foi um pianista, compositor e arranjador brasileiro que, em
seu método intitulado “Expansão harmônica: uma questão de timbre”, propôs uma nova forma de
harmonização pianística para canções do repertório popular urbano brasileiro baseada em uma
hierarquia de dissonâncias na relação melodia/acorde que resulta em uma harmonização moderna e
estilizada. O objetivo desta pesquisa foi comparar a influência da aplicação das técnicas de
expansão harmônica criadas por Buettner com outras técnicas de harmonização tradicionais, em
termos de respostas emocionais. 20 participantes (músicos e não músicos) participaram de um
experimento que envolveu tarefas de escuta sobre cinco trechos musicais de cerca de 40 segundos
do repertório popular urbano brasileiro, apresentado em ordem aleatória entre os participantes, em
quatro versões: (1) cantada; (2) instrumental para conjunto; (3) instrumental para piano solo a
partir de harmonizações tradicionais; e (4) instrumental para piano solo a partir de harmonizações
feitas por Buettner. Após ouvir cada trecho musical, os participantes deveriam escolher a qual
estilo musical cada trecho apreciado pertencia, por meio de um este de escolha forçada. Eles
também preenchiam escalas emocionais (alcance 0-10) referentes ao quanto eles consideraram a
música como sendo agradável/desagradável (valência afetiva) e calma/ativa (arousal). Por meio do
delineamento experimental 4 (versões) x 5 (trechos musicais), o teste ANOVA mostrou diferenças
estatísticas significativas para trechos musicais executados por Buettner sobre os níveis de
valência afetiva e arousal em relação aos outros trechos apresentados. Além disso, os trechos com
as harmonizações feitas por Buettner não foram considerados pelos ouvintes como pertencentes ao
mesmo gênero musical que os trechos musicais apresentados em outras versões (bossa-nova).
Palavras-chave: respostas emocionais, emoção musical, Arno Roberto von Buettner.

Emotional responses to Arno Roberto von Buettner’s pianistic sonority


Abstract: Arno Roberto von Buettner was a pianist, composer and Brazilian arranger who, in his
method titled "Harmonic Expansion: a matter of timbre", he proposed a new form of piano
harmonization for songs of the Brazilian urban popular repertoire based on a dissonance’s
hierarchy in relation melody / chord that results in a modern and stylized harmonization. The
purpose of this research was to compare the influence of application of harmonic expansion
techniques created by Buettner with other traditional harmonization techniques in terms of
emotional responses. 20 participants (musicians and non-musicians) participated in an experiment
with listening tasks involving five pieces of music with 40 seconds of duration, referring to
Brazilian urban popular repertoire presented in random order in four versions: (1) sung version;
(2) group instrumental version; (3) instrumental piano solo, involving traditional harmonies; and
(4) instrumental piano solo involving Buettner’s harmonization. After listening to each excerpt,
participants filled in a forced choice test by choosing to which style of music each piece belonged.
Participants also completed an emotional scale (range 0-10) by classifying each excerpt as pleasant
/ unpleasant (affective valence) and calm / aroused (arousal). Through the experimental design 4
(versions) x 5 (musical excerpts), an ANOVA showed significant differences for musical excerpts
performed by Buettner in levels of affective valence and arousal in relation to others excerpts.
Moreover, the Buettner excerpts were not considered by listeners as the same musical genre
presented in other versions (bossa-nova).

Keywords: emotional responses, musical emotion, Arno Roberto von Buettner.

Introdução e objetivo

Segundo Levitin (2006, citado em Ilari, 2010), a cognição musical busca compreender os
processos mentais em comportamentos musicais como a percepção, a compreensão, a
memória, a atenção, a performance, a criação e outros. Este trabalho se encontra

205
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

principalmente em duas destas vertentes: (1) processos cognitivos em música e (2) emoção e
motivação, na medida em que avalia questões acerca de como uma música é percebida (por
meio de respostas emocionais) e recebida (por meio de associação de eventos musicais a
estilos musicais) pelo ouvinte.
O jazz brasileiro, também conhecido como “música instrumental” (MI), é um gênero
musical popular brasileiro no qual há o destaque para os instrumentistas e a valorização de
improvisos, virtuosismos e estruturações harmônicas e melódicas dentro de concepções de
musicalidade brasileira e jazzística. Bastos e Piedade (2006) descrevem o jazz brasileiro,
como uma designação ambígua no qual os instrumentos ficam em primeiro plano e não há
texto nem letra. Porém, os autores afirmam ser possível o uso da voz, ainda que quase sempre
como uma parte instrumental (sem letra).
O choro teve grande contribuição para a musicalidade brasileira e aproximações com o
jazz. Porém, para Piedade (1997, 1999, 2003, citado em Bastos & Piedade, 2006), o jazz
brasileiro surge mais apoiado pelo cenário instrumental da bossa-nova do que do choro.
Engana-se quem define jazz brasileiro, ou “música instrumental”, como um gênero
derivado do jazz norte-americano. Para Piedade (2005), o que há é uma “fricção de
musicalidade”, que é uma tensão entre a musicalidade brasileira e a norte-americana: “as
musicalidades dialogam, mas não se misturam. Suas fronteiras musical-simbólicas não são
atravessadas, mas sim objetos de uma manipulação que acaba por reafirmar as
diferenças” (Piedade, 2005, p.200).
Arno Roberto von Buettner foi professor de piano, tanto na Universidade de Campinas,
em São Paulo, quanto em casa. Foi idealizador e criador de um método para o ensino de piano
popular intitulado "Expansão harmônica: uma questão de timbre", tendo recebido grande
influência de compositores do final do século XIX e começo do XX, como Debussy, Scriabin
e Schoenberg, bem como o modo como estes compositores faziam uso dos acordes alterados
(de função dominante, que possuem as notas b9, #9, #11 e/ou b13 em sua formação - Levine,
1989) em suas composições (Buettner, 2004).
Buettner (2004) propõe inicialmente abertura de acordes por meio da harmonização de
cada nota da melodia da canção a ser harmonizada, sem que a formação resultante da
associação harmonia/melodia tenha repetição de notas (dobramentos), ilustrando isso por
meio de exemplos em partituras e áudio. Na sequência, o método apresenta artifícios que

206
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

possibilitam uma flexibilização harmônico-melódica sobre as harmonias originais das canções


a serem harmonizadas pelos pianistas. Para isso, o método apresenta capítulos sobre
substituições de acordes dominantes, interpolações1 , clichês no modo menor e, finalmente,
usos dos acordes diminuto e meio diminuto. Ao fim do método, Buettner (2004) apresenta
uma mesma canção em duas versões: uma com a harmonização original e outra com a sua
proposta de expansão harmônica, apresentando ao estudante uma aplicação consistente da
expansão harmônica por ele proposta.
Portanto, o objetivo da presente pesquisa é comparar a influência da aplicação das
técnicas de expansão harmônica criadas por Buettner (2004) com outras técnicas de
harmonização tradicionais, levando-se em conta duas medidas: respostas emocionais e
respostas relacionadas a qual estilo musical esta maneira de tocar está associado. A hipótese
do presente estudo é a de que as performances executadas dentro da aplicação do método de
expansão harmônica desencadeiem emoções diferentes nos ouvintes em relação a
performances tradicionais no repertório popular urbano brasileiro.

Metodologia
Participantes: foram divididos conforme (figura 1) a distribuição de expertise musical dentro
de uma sociedade proposta por Lehmann, Sloboda e Woody (2007).

Figura 1: Distribuição da expertise musical dentro de uma sociedade. Retirada de “Psychology for musicians:
understanding and acquiring the skills” de Lehmann, Sloboda e Woody (2007), p. 16.

Os níveis da figura 1 são distribuídos de baixo pra cima em: (1) pessoas comuns sem
treinamento musical formal que possuem seus conhecimentos musicais devido a aculturação
passiva2 ou por meio do ensino de música no setor público (disponível para todos); (2)
músicos iniciantes que possuem algum tipo de treinamento musical formal ou informal, mas

207
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

não tem a música como atividade principal e de sustento; (3) músicos experts como
professores, artistas e compositores que têm a música como atividade profissional; e (4)
músicos experts de elite que são músicos de reconhecimento internacional entre os experts.
Para este estudo, foram selecionados 20 participantes com idades entre 15 e 50 anos
distribuídos proporcionalmente dentro deste modelo (8 - 6 - 4 - 2). A apresentação dos trechos
musicais foi em ordem aleatória e os participantes levaram, em média, 25 minutos para
realizar o experimento.

Materiais/Equipamentos: o estudo foi realizado em um ambiente silencioso e sem estímulos


visuais ou auditivos que pudessem interferir na concentração dos ouvintes. Foram utilizados
um notebook Lenovo, um fone de ouvido Nokia e os softwares e-Prime, Statistica e Excel. Ao
final do experimento, foi aplicado um questionário complementar para analisar as estratégias
cognitivas dos participantes e as impressões do experimento.

Caracterização do material musical: cinco trechos musicais da música popular brasileira (Pra
dizer adeus – Edu Lobo; Eu te amo – Tom Jobim & Chico Buarque; Sabiá – Tom Jobim &
Chico Buarque; Luiza – Tom Jobim & Chico Buarque; Chora coração – Tom Jobim e Vinícius
de Moraes) em quatro versões: (1) gravação original com letra; (2) versão instrumental
executada de maneira tradicional, em conjunto instrumental; (3) versão instrumental
executada de maneira tradicional ao piano; (4) versão instrumental executada por Arno
Roberto von Buettner (total: 20 trechos musicais).

Procedimento: após assinarem um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, os


participantes receberam as instruções do pesquisador, incluindo informações apresentadas no
programa, sobre a pesquisa e foram informados que deveriam dar suas opniões após cada
trecho musical através das seguintes perguntas:
Pergunta (1): em uma escala de 0 a 10, o quanto este trecho musical lhe foi agradável?
Pergunta (2): em uma escala de 0 a 10, o quanto este trecho musical lhe deixou
fisiologicamente ativado?
Pergunta (3): dos gêneros musicais abaixo, em qual você acredita que o trecho musical ouvido
se encaixa melhor? (Os gêneros listados foram: (1) Baião; (2) Bossa-nova; (3) Choro; (4)
Música de concerto; (5) Frevo; (6) Jazz; (7) Modinha; (8) Rock; (9) Samba; (10) Outro).

208
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Análise de dados: para as respostas emocionais (arousal e valência afetiva), o teste ANOVA
foi utilizado para fazer a comparação entre as médias de respostas obtidas pelos ouvintes na
escala de diferencial semântico (alcance: 0-10), em função das versões de trechos musicais
apresentadas, conforme o delineamento experimental 5 (trechos) x 4 (versões). Para as
respostas referentes à escolha dos gêneros musicais pelos ouvintes, o ANOVA foi utilizado e
comparou, a partir do mesmo delineamento experimental, as diferenças entre as respostas
esperadas e respostas recebidas. Tanto para as respostas emocionais quanto para as respostas
de associação aos estilos musicais, foram consideradas diferenças estatísticas significativas
quando os valores de p encontrados foram menores que 0,05.

Resultados e discussão
O gráfico da figura 2 indica os índices de arousal e valência afetiva encontrados a partir das
respostas emocionais dos ouvintes para as quatro versões de trechos musicais apresentadas.

Figura 2: Índices de arousal e valência afetiva encontrados a partir das respostas emocionais dos ouvintes para
as quatro versões dos trechos musicais apresentadas.

O teste ANOVA mostrou uma diferença estatística significativa entre os níveis de


arousal e valência afetiva encontrados, em função das versões de trechos musicais
apresentadas (F 9,199; p=0,000008), indicando que, a valência afetiva (índices encontrados
entre 6,44 e 7,61) desencadeada nos ouvintes da presente pesquisa foi sempre maior do que o
arousal (índices encontrados entre 5,01 e 5,84).
Com relação aos níveis de arousal encontrados, o teste ANOVA mostrou diferenças
estatísticas significativas somente entre as versões original e conjunto instrumental

209
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

(p=0,014771), original e piano executada por Buettner (p=0,000009), conjunto instrumental e


piano executada por Buettner (p=0,015764) e piano e piano executada por Buettner
(p=0,000973).
Com relação aos níveis de valência afetiva encontrados, o teste ANOVA mostrou dados
semelhantes àqueles encontrados para os níveis de arousal: assim, diferenças estatísticas
significativas somente apareceram entre as versões original e conjunto instrumental
(p=0,030248), original e piano executada por Buettner (p=0,000008), conjunto instrumental e
piano executada por Buettner (p=0,000023) e piano e piano executada por Buettner
(p=0,000009).
Apenas as categorias bossa-nova, música de concerto, jazz e outro estilo receberam
porcentagens de votos significativas para a análise, como indica a tabela da figura 3. As
diferenças estatísticas significativas entre porcentagens esperadas e recebidas estão destacadas
com maior número de casas decimais.

Figura 3: Porcentagens de associações das versões dos trechos musicais apreciados com a lista de estilos
musicais apresentadas aos ouvintes. Dentro de cada categoria, a linha superior indica a porcentagem de votos
recebida e a linha inferior indica os valores de p encontrados.

Verificou-se que, considerando os trechos musicais utilizados no presente estudo,


quanto maior o grau de complexidade harmônica que foi implicado sobre as harmonizações
dos temas no contexto da bossa-nova, maior foi a associação dos trechos a outro gênero
musical (neste caso, a música de concerto, seguido de outro estilo e jazz). Verifica-se,
também, que algo semelhante aconteceu conforme a maior variação timbrística dentro do
tema executado. Estes dados de associação de uma música a outro gênero musical devido sua
maior complexidade harmônica ou timbrística mostraram-se ainda maiores na parcela da
população que possui o conhecimento musical adquirido apenas por aculturação passiva,

210
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

como definido e exposto neste trabalho por Lehmann, Sloboda e Woody (2007) por meio da
pirâmide de distribuição da expertise musical dentro de uma sociedade (figura 1).
De maneira geral, os níveis de arousal e de valência afetiva mantiveram-se maior para
as versões com menor complexidade harmônica. Ao observar que os dados do presente
experimento apresentaram a valência afetiva sempre maior que o arousal, destaca-se que estes
dados convergem com os dados de Gabrielsson e Lindstrom (2001, citado em Webster &
Weir, 2005), na medida em que os autores alegam que ouvintes têm associado melodias e
harmonias simples com valência afetiva positiva, enquanto melodias e harmonias complexas
estão associadas com valência afetiva menor ou negativa. Os trechos músicas nas versões
executadas por Buettner traziam uma harmonização estilizada e mais complexa e os níveis de
arousal e valência afetiva foram os menores para estes trechos musicais, demonstrando um
estranhamento dos ouvintes em comparação com as outras versões apresentadas.
Os trechos musicais executados por Buettner foram, em sua maioria (41%), associados
à música de concerto, situação que o próprio Buettner (2004) destaca em seu livro, apesar de
tratar-se harmonizações para a prática popular. Segundo Piedade (1997, 1999, 2003, citado
em Bastos & Piedade, 2006), o jazz brasileiro nasce apoiado principalmente na bossa-nova,
gênero o qual os trechos musicais executados por Buettner obtiveram a segunda maior
porcentagem de votos (22%), em partes por ter sua versão original calcada nesse gênero
musical. Buettner também era um pianista que tocava em grupos de jazz no Brasil. Os dados
do presente experimento mostraram julgamentos dos ouvintes associados a outros gêneros
musicais (19%) e ao jazz (11%), o que pode indicar a tendência da associação da música
executada por Buettner ao estilo que Bastos e Piedade (2006) definem como jazz brasileiro.
Esta maneira de Buettner interpretar o repertório brasileiro traz características que fazem um
diálogo com a música brasileira, a música de concerto e o jazz global e norte-americano,
podendo estar relacionado com o que Piedade (2005) chama de “fricção de musicalidade”,
sendo possível pensar que a maneira de Buettner de tocar, e como o pianista descreve em seu
método, pode estar associado ao que se atribui ao jazz brasileiro ou a aplicação de novos
recursos para um repertório já explorado.

211
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Considerações finais
Para os trechos musicais executados por Buettner, obteve-se respostas significativamente
diferentes das outras versões, tanto em respostas emocionais quanto em relação ao gênero
musical. Assim, os dados obtidos na presente pesquisa vão de encontro à hipótese deste
estudo, mostrando que realmente a maneira de Buettner interpretar, que está descrito em seu
método de expansão harmônica, desencadeia respostas emocionais e de gênero musical
diferentes das performances tradicionais do repertório popular urbano brasileiro.
Acredita-se que a associação do presente estudo com pesquisas que envolvam análises
do código musical de Buettner e de outros músicos do cenário que Bastos e Piedade (2006)
chamam de jazz brasileiro (como Hermeto Pascoal e Egberto Gismonti) possam indicar
semelhanças e apontar a possibilidade de o método de expansão harmônica proposto por
Buettner ser um meio de estudo para uma prática do jazz brasileiro ao piano ou um meio de
estudo da utilização de recursos em comum com o jazz brasileiro.

Referências
Bastos, M. B., & Piedade, A. T. C. (2006). O desenvolvimento histórico da “música
instrumental”, o jazz brasileiro. Anais do Congresso da Associação Nacional de Pesquisa
e Pós-Graduação em Música, Brasília, DF, Brasil, 16.
Buettner, A. R. von. (2004). Expansão harmônica: uma questão de timbre. São Paulo: Irmãos
Vitale.
Ilari, B. S. (2010). Cognição musical: origens, abordagens tradicionais, direções futuras. In
Ilari, B. S. & Araújo, R. C. (Orgs.). Mentes em Música. Curitiba: Editora UFPR.
Lehmann, A., Sloboda, J. A., & Woody, R. H. (2010). Psychology for musicians:
understanding and acquiring the skills. New York: Oxford University Press.
Levine, M. (1989). The jazz piano book. Chicago: Cher Corporated.
Piedade, A. T. C. (2005). Jazz, música brasileira e fricção de musicalidades. Anais do
Congresso da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Música, Rio de
Janeiro, RJ, Brasil, 15.
Webster, G. D., & Weir, C. G. (2005). Emotional Responses to Music: Interactive Effects of
Mode, Texture, and Tempo. Motivation and Emotion, Vol. 29, No. 1, 19-39.
1 A interpolação ocorre quando um acorde muda de função harmônica no decorrer de uma harmonização (Buettner,
2004).
2 Aculturação passiva é definida por Lehmann, Sloboda e Woody (2007) como a aquisição cultural feita por todas as
crianças em função da exposição natural de qualquer estímulo dentro de uma cultura.

212
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Harmonia como Tensão: considerações acerca da principal metáfora


subjacente a pesquisas sobre percepção de harmonia e tonalidade

Mauro Orsini Windholz


Universidade Federal do Rio de Janeiro
maurowindholz@gmail.com

Resumo: O presente trabalho apresenta uma análise de exemplos recentes da literatura em cognição
musical sobre percepção de harmonia e tonalidade e identifica a principal metáfora conceitual
subjacente a tais estudos: harmonia é tensão e relaxamento, e considera as possíveis limitações que
esta forma de se entender harmonia acarreta para a produção de conhecimento sobre o assunto. Em
primeiro lugar, são identificadas três teorias principais norteadoras de pesquisas recentes a respeito da
percepção de alturas musicais. Alguns exemplos representativos de cada uma são descritos, e é
identificada a maneira como o elemento da tensão e relaxamento se faz presente nestes trabalhos e
estrutura o entendimento do fenômeno harmônico. Em seguida, a natureza metafórica deste elemento
é apontada, de acordo com conceitos da ciência cognitiva enacionista. Por último, são discutidas as
maneiras pelas quais o nosso conhecimento do fenômeno harmônico pode estar sendo restringido por
esta forma de entendê-lo, à luz de evidências de pesquisas recentes que empregam uma abordagem
diferente no estudo da harmonia.
Palavras-chave: cognição musical, harmonia, forma tonal, metáfora conceitual, enacionismo.

Harmony as Tension: considerations about the main metaphor underlying research on the
perception of harmony and tonality
Abstract: This work presents an analysis of recent exemples of the literature on music cognition
about perception of harmony and tonality and identifies the main conceptual metaphor underlying
such studies: harmony is tension and relaxation, and considers the possible limitations that this form
of understanding harmony entails for the production of knowledge on the subject. First, three main
theories that guide recent researches on the perception of musical pitch are identified. Some
representative examples of each are described, and the way in which the element of tension and
relaxation is present in each of these works and how it structures the understanding of the harmonic
phenomenon is identified. Next, the metaphoric nature of this element is shown, in accordance with
concepts of the enactivist cognitive science. Lastly, the ways in which our knowledge of the harmonic
phenomenon might be constrained by this form of understanding it are discussed, in light of evidences
from recent studies that adopt a different approach to the study of harmony.
Key-words: music cognition, harmony, tonal form, conceptual metaphor, enactivism.


Entender harmonia em música como uma sucessão de acordes ou outras organizações de
alturas musicais mais ou menos tensas é uma forma bastante tradicional de se conceber e
teorizar a respeito deste fenômeno. O elemento da tensão se faz presente em importantes
trabalhos teóricos a respeito de harmonia e tonalidade pelo menos desde Rameau, podendo ser
encontrado em diversos autores posteriores como Riemann, Schenker, Costère, entre outros
(Bigand, Parncutt & Lerdahl, 1996). A ideia de que determinados acordes introduzem tensão a
uma progressão harmônica, que é posteriormente resolvida por acordes menos tensos, se
tornou uma maneira convencional de se entender harmonia (Saslaw, 1996), que de fato não é
estranha a qualquer um que já tenha estudado harmonia tonal.

213
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Esta forma de se conceber o fenômeno harmônico é de tal modo penetrante na cultura


musical ocidental que tem norteado de maneira fundamental pesquisas recentes na área de
cognição musical, muitas das quais de caráter empírico e contando com maior rigor científico
do que trabalhos teórico-musicais. Neste artigo, discuto a natureza metafórica desta maneira
de se entender harmonia e como ela tem determinado e restringido a produção de
conhecimento a respeito deste fenômeno. Para tanto, apresento inicialmente uma revisão de
alguns trabalhos recentes da área de cognição musical que dão grande destaque ao elemento
de tensão como fundamental para a experiência musical. Em seguida, discuto a natureza
metafórica deste elemento, de acordo com conceitos propostos pela ciência cognitiva
enacionista, identificando a metáfora conceitual harmonia é tensão e relaxamento como a
principal forma que temos de estruturar e entender o fenômeno harmônico. Encerro
discutindo quais aspectos da experiência da harmonia poderiam estar sendo limitados por esta
forma de endentê-la, à luz de evidências fornecidas por pesquisas recentes em psicologia da
música que adotam uma abordagem diferente no estudo deste fenômeno.

1. O elemento da tensão em pesquisas recentes da área de cognição musical


Para os propósitos da presente discussão, é útil categorizar alguns trabalhos recentes da área
de cognição musical em três teorias principais e inter-relacionadas: expectativa e aprendizado
estatístico, hierarquias tonais e espaço de altura tonal. Tais teorias têm sido influentes na
produção científica da área de cognição musical das últimas décadas, e nortearam diversos
trabalhos da área. Discutiremos a seguir como o elemento da tensão e relaxamento subjaz a
todas elas e determina como o conhecimento a respeito de harmonia e tonalidade segundo
estas teorias é produzido.
A primeira teoria tem sua origem no trabalho de Leonard B. Meyer no livro Emotion
and Meaning in Music (1956), no qual autor identifica no domínio das expectativas a
principal fonte da força emocional e da possibilidade de geração de significado em música.
Segundo o autor, “se (…) um estímulo presente nos leva a esperar um evento musical
consequente mais ou menos definido, então esse estímulo tem significado” (Meyer, 1956, p.
35, trad. nossa). Este trabalho teve uma profunda influência em gerações posteriores de
pesquisadores, chegando a ser considerado um de três livros que formam “um núcleo do que
consideramos mais importante na psicologia da música” (Dowling & Harwood, como citado
em Gjerdingen, 2008, p. 972, trad. nossa).

214
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

O elemento da tensão é fundamental para a teoria das expectativas de Meyer, e


desempenharia um papel de grande importância nas respostas afetivas à música (Bigand,
Parncutt & Lerdahl, 1996; Bigand & Parncutt 1999; Krumhansl & Cuddy, 2010). De fato, a
influência que o trabalho de Meyer teve na produção acadêmica sobre música a partir da
segunda metáde do séc. XX pode em parte ter sido responsável pela persistência da noção de
tensão e relaxamento em todas as teorias apontadas acima.
Um exemplo mais recente e bastante representativo do emprego da teoria das
expectativas na abordagem do fenômeno tonal é o trabalho de David Huron no livro Sweet
Anticipation: Music and the Psychology of Expectation (2006). Neste livro, Huron procura
aprofundar o trabalho de Meyer à luz de novas evidências e teorias fornecidas pelas ciências
psicológicas, dando maior respaldo empírico e estatístico às suas teorias. O elemento da
tensão se faz presente no trabalho de Huron como um dos estágios que o autor identifica na
sua tentativa de formalizar os processos psicológicos que decorrem da formação de
expectativas: Imaginação, Tensão, Previsão, Reação e Avaliação (Huron, 2006).
A segunda teoria que identificamos aborda o fenômeno harmônico tonal segundo a
noção de hierarquias tonais. Desenvolvida principalmente pela pesquisadora americana Carol
L. Krumhansl em diversos trabalhos (para um sumário desta pesquisa, ver Krumhansl, 1990),
a teoria das hierarquias tonais afirma que um dos princípios estruturais mais fundamentais da
música é o estabelecimento de pontos de referência em notas que são “estáveis, repetidas
frequentemente, enfatizadas ritmicamente, e que aparecem em posições estruturalmente
importantes em frases musicais” (Krumhansl & Cuddy, 2010, p. 51, trad. nossa). Tais pontos
de referência estabeleceriam uma hierarquia entre as alturas musicais e ocupariam o topo da
mesma. A teoria afirma que as hierarquias tonais seriam internalizadas por ouvintes de um
determinado estilo musical através de dois princípios cognitivos básicos: o estabelecimento de
pontos de referência cognitivos, que possibilitam economia de processamento neural e
estabilidade mnemônica, e a sensibilidade de ouvintes a regularidades estatísticas em música,
que permite a identificação da distribuição e frequência de ocorrência de notas em música. As
hierarquias tonais assim internalizadas “desempenhariam um papel central em como
sequências musicais são percebidas, organizadas, lembradas e em como expectativas são
formadas durante a escuta” (Krumhansl & Cuddy, op. cit., p. 51, trad. nossa).
No artigo A Theory of Tonal Hierarchies in Music (Krumhansl & Cuddy, 2010), as
autoras apresentam um sumário da teoria das hierarquias tonais e de muitas pesquisas
realizadas em décadas recentes que adotaram esta abordagem. É interessante observar como

215
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

as autoras incluem toda uma seção dedicada à discussão da relação da teoria das hierarquias
tonais com o elemento de tensão. Ao iniciarem a seção, as autoras afirmam que “O crescer e
decair da tensão é fundamental para a experiência da música e pode contribuir para a resposta
emocional” (p. 76, trad. nossa), citando em seguida o próprio Meyer (1956), Krumhansl
(2002) e Krumhansl & Agres (2008). Vemos assim como o elemento da tensão e relaxamento
é caro também à teoria das hierarquias tonais, em parte inclusive através da influência do
trabalho de Meyer. De fato, a teoria das hierarquias tonais foi testada empiricamente na sua
capacidade de prever os níveis de tensão sentidos por ouvintes quando da escuta de
sequências curtas de acordes em um estudo (Bigand, Parncutt & Lerdahl, 1996). Nesse
estudo, a teoria realiza a previsão de que acordes que ocupariam uma posição alta na
hierarquia evocariam pouca tensão, e acordes que se situam mais abaixo na hierarquia
evocariam tensão maior. Dessa forma, o elemento da tensão e relaxamento determina como o
conhecimento a respeito de harmonia é produzido de acordo com a teoria das hierarquias
tonais.
A terceira teoria que mencionamos diz respeito a teoria do espaço de altura tonal,
formulada pelo compositor e pesquisador americano Fred Lerdahl ao longo de diversos
trabalhos (Lerdahl & Jackendoff, 1983; Lerdahl, 2001, entre outros). A teoria propõe que as
relações entre diferentes acordes e tonalidades em música tonal sejam concebidas como
existindo em um espaço, no interior do qual seriam estabelecidas distâncias entre estas
entidades musicais. A teoria então apresenta diversas fórmulas e métodos para se calcular
precisamente estas distâncias, das quais ouvintes supostamente possuiriam um esquema
mental internalizado que determinaria a escuta de entidades harmônicas em um repertório
tonal e, possivelmente, em outros estilos de música de harmonia. Segundo a teoria, por
exemplo, a distância entre um acorde de I grau e um de V grau equivale a 5, enquanto que um
acorde de II grau estaria a uma distância de 8 do mesmo I. Similarmente, a tonalidade de Sol
maior estaria a uma distância de 7 da tonalidade de Dó maior, enquanto que a sua distância da
tonalidade de Mi menor seria equivalente a 9 (Lerdahl & Krumhansl, 2007). Temos assim
uma interpretação do fenômeno harmônico tonal segundo a noção de espaço.
O elemento da tensão é fundamental para a teoria do espaço de altura tonal, que procura
se estabelecer como uma maneira de formalizar e prever os movimentos de tensão e
relaxamento que as alturas musicais podem suscitar. De fato, o modelo também foi testado
empiricamente nesse aspecto no mesmo estudo mencionado anteriormente sobre a teoria das
hierarquias tonais (Bigand, Parncutt & Lerdahl, 1996) e ainda em outros dois estudos

216
Modeling Tonal Tension 335

Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

subsequentes (Bigand & Parncutt, 1999; Lerdahl & Krumhansl, 2007). Nestas pesquisas, é
testada a hipótese de que quanto mais distante um acorde de um centro tonal, maior a tensão
que será sentida pelo ouvinte. A figura 1 apresenta um exemplo retirado de Lerdahl &
FIGURE 10. Tension rules: (a) sequential tension plus surface dissonance; (b) hierarchical tension plus surface dissonance.
Krumhansl, 2007, no qual valores de tensão segundo o modelo de espaço de altura tonal são
Included in Figure 11 are numerical values from the The same calculations appear in the tabular format in
previstos para o Tema
application doin Graal
of the rules da 10.ópera
Figures 9 and The firstParsifal
Figure 12.de
TheRichard
events for TseqWagner (fig.
in Figure 12a 1). Na parte
are listed
row of numbers between the staves lists surface disso- in sequential order. The table decomposes the surface-
nance values. The second row lists sequential tension dissonance and pitch-space factors into their compo-
superior davalues,
figura, temos uma análise da estrutura
obtained by calculating d from one chord to the nent prolongacional
parts. The values in each do tema,
row are summed que estabelece as
to reach
next and adding surface distance values. For example, the total sequential tension for each event. In Thier in
relações dethehierarquia entre
sequential distance from cada evento
Event 2 to Event 3 is sonoro
7, and do trecho
Figure e determina
12b, the target chords (those toconsequentemente
the right of the os
the surface dissonance value for Event 3 is 1; so the arrows) are still listed in sequential order, but the source
sequential
valores de Thetensão tension associated with Event
hierárquica. Entre3 is 7 +os
1 = 8. chords (those to the left of the arrows) are now listed by
pentagramas, são identificados os valores de
third row similarly lists hierarchical tension values, the immediately dominating events in the tree. For
obtained globally by adding the distance numbers next example, the notation Thier(4 3) indicates that Event 3,
dissonância,to the
tensão
branchessequencial e tensão
of the tree and then adding thehierárquica
surface becausedeit branches
cada evento.from EventEstes
4, derivesvalores
its tensioneram então
distance values. Thus the hierarchical distance from value from Event 4. In accordance with the hierarchical
testados emsonance
Event 2 to Event 4 is 0 + 7 +subjetivos
experimentos 7 = 14, and the surface tension rule,
comdis-ouvintes, em Figureum 12b includes the additional
procedimento semelhante aos
value for Event 4 is 1; hence the hierarchical columns of “local total” and “inherited value.” The hier-
tension associated with Event 4 is 14 + 1 = 15. archical tension for each event, given in the “global
outros estudos mencionados.

FIGURE 11. Grail theme (diatonic version) from Wagner’s Parsifal, together with its’ theoretically preferred prolongational analysis, surface
dissonance values, sequential tension values, and hierarchical tension values.
Fig. 1. Valores de tensão previstos para o tema do Graal. Extraído de Lerdahl & Krumhansl, 2007, p. 335.

O estudo de Lerdahl & Krumhansl (2007) ilustra bem a importância do elemento da


tensão nestas abordagens, iniciando com a frase “O fluxo e refluxo de tensão é básico à
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experiência musical” (p. 329, trad.Allnossa), e citando em seguida uma série de trabalhos que
use subject to JSTOR Terms and Conditions

compartilhariam desta visão (a saber: Berry, 1976, Hindemith, 1937; Kurth, 1920; Rothfarb,
2002, Schenker, 1935; Zuckercandl, 1956; Krumhansl, 1996, 1997; Palmer, 1996). Os autores
afirmam ainda que “Porque tensão tonal é um fenômeno unicamente musical (diferentemente
de outros fatores como flutuações em intensidade, velocidade ou contorno), é talvez o aspecto
mais crucial no qual música tensiona e relaxa” (p. 329, trad. nossa). Neste estudo os autores
testaram também modelos teóricos neo-riemannianos que possuem estruturas semelhantes às
da teoria do espaço de altura tonal, demonstrando que, ainda que não tenham sido concebidos
com este intuito, tais modelos se mostram suscetíveis a uma abordagem envolvendo o
elemento da tensão e relaxamento.

217
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Dessa forma, podemos ver como o elemento da tensão e relaxamento não só advém de
uma longa tradição em teoria da música como também desempenha um papel fundamental na
forma como o conhecimento a respeito de harmonia e tonalidade é produzido em pesquisas
mais recentes da área de cognição musical. Este elemento se configura assim como um
verdadeiro paradigma teórico que determina a maneira como entendemos o fenômeno
harmônico.

2. Possíveis limitações do paradigma tensão-relaxamento


Refletindo sobre este paradigma de acordo com conceitos propostos pela denominada ciência
cognitiva enacionista, em especial como definidos por Lakoff & Johnson (1980) e Johnson
(1987), é possível observar a sua natureza essencialmente metafórica. Segundo estes autores,
metáforas são um modo fundamental que seres humanos possuem de entender a realidade a
sua volta, no sentido de que toda vez que entendemos um determinado domínio de nossa
experiência nos termos de um outro domínio de natureza diferente, o estaríamos fazendo de
maneira metafórica. Ao entendermos o fenômeno harmônico segundo nossa experiência de
tensão e relaxamento, originária do domínio de movimento e esforço físico (Lerdahl &
Krumhansl, 2007), estaríamos empregando a metáfora conceitual harmonia é tensão e
relaxamento. Toda metáfora conceitual esclarece determinados aspectos da experiência que
procura entender ao mesmo tempo em que inevitavelmente obscurece outros (Lakoff &
Johnson, 1980). A partir do momento em que identificamos a natureza metafórica da maneira
predominante que temos de entender harmonia atualmente, podemos tecer alguns
questionamentos sobre quais aspectos possivelmente relevantes desta experiência estariam
sendo obscurecidos pela metáfora/paradigma vigente.
Um fenômeno que possivelmente não é contemplado pelo escopo do paradigma tensão-
relaxamento são os diferentes estados emocionais expressados por diferentes tipos de acordes
individualmente. Lahdelma e Eerola (2016) investigaram a capacidade de diferentes tipos de
acordes expressarem emoções distintas. Para tanto, realizaram um experimento no qual 14
tipos diferentes de acordes foram tocados isoladamente com dois timbres diferentes (piano e
cordas sintetizados) para 269 participantes, que eram então solicitados a avaliarem a emoção
expressada pelo acorde em uma escala de nove itens emocionais elaborada pelos autores
(dentre os quais tensão era apenas um). Foi encontrada uma consistência significativa na
atribuição de determinados estados emocionais aos diferentes tipos de acordes. Por exemplo:
tríades maiores foram associadas à felicidade, enquanto que menores, à tristeza; tríades

218
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

diminutas e aumentadas foram associadas à tensão; acordes tocados com timbre de cordas
foram associados à ternura e nostalgia.
O paradigma da tensão e resolução se ocupa prioritariamente do “aumentar e decair” da
tensão ao longo de progressões harmônicas. Trata, em outras palavras, da dimensão horizontal
da harmonia, e não contempla esta multiplicidade de resultados afetivos encontrados para
acordes individuais, a sua dimensão vertical (Lahdelma & Eerola, 2016), pois um acorde
soado isoladamente não estabelece diferentes níveis de tensão que possam ser previstos ou
medidos. A única tensão que um acorde isolado poderia gerar seria com relação ao seu nível
de dissonância sensorial, que foi uma das variáveis computadas como um valor de tensão em
Lerdahl & Krumhansl (2007). Neste estudo, maior dissonância sensorial de um acorde
implicaria em maior tensão gerada pelo mesmo. No entanto, somente o nível de dissonância
de um acorde individual não parece ser suficiente para explicar os resultados perceptivos
encontrados por Lahdelma e Eerola. Um dos itens na escala emocional elaborada pelos
autores era preferência, e estudo mostrou que os acordes mais preferidos pelos participantes
foram acordes maiores com sétima maior e menores com sétima menor. Este resultado levou
os autores à conclusão de que maior consonância percebida em um acorde não implica
necessariamente em maior preferência pelo mesmo, pois se fosse esse o caso, as tríades
maiores e menores, que exibem menor dissonância sensorial, deveriam ter sido as mais
preferidas pelos participantes. Logo, o nível de dissonância, e consequentemente de tensão de
um acorde, não explica a preferência que ouvintes têm por determinados acordes soados
isoladamente.
Temos dessa forma exemplos de uma gama de fenômenos associados à percepção da
dimensão vertical da harmonia que não faz parte do escopo do paradigma da tensão e
resolução. O próprio fato de que a produção bibliográfica a respeito da percepção de
harmonia e tonalidade deu tão pouco destaque aos efeitos da harmonia vertical até o estudo de
Lahdelma e Eerola atesta a hegemonia do paradigma de tensão e relaxamento em pesquisas
em cognição musical e a forma como ele tem limitado o estudo deste fenômeno à sua
dimensão horizontal e as suas propriedades de geração de maior ou menor tensão. Para que a
pesquisa em cognição musical possa contemplar melhor estes e outros fenômenos relativos à
percepção de alturas musicais, seria necessária talvez uma nova forma de se conceber a
harmonia, para que assim seja possível encontrar explicações mais satisfatórias a respeito do
seu poder expressivo.

219
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Referências
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Lakoff, G., Johnson, M. (1980). Metaphors we Live By. Chicago and London: University of
Chicago Press.
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Cambridge: MIT Press.
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Meyer, L. B. (1956). Emotion and Meaning in Music. Chicago: University of Chicago Press.
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the Conceptualization of Music. Journal of Music Theory, vol. 40 no. 2 (pp. 217-243).

220
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

A lógica e o processo da escuta riemanniana

Felipe Augusto Vieira da Silva


Universidade de São Paulo
felipe_gtr@hotmail.com

Resumo: O trabalho busca o compreensão da ideia de escuta musical contida na obra de Hugo
Riemann a partir de seus escritos sobre estética, escuta, e ritmo musical. Para tal tarefa foi
realizada um levantamento bibliográfico na busca de elementos que mostrassem os fundamentos
de seu processo de escuta. Primeiramente, foi pesquisada sua tese ‘Musikalische logik: Über das
Musikalische Hören’ que foi o fundamento de seus trabalhos posteriores. Em um segundo
momento, foram levantados elementos da sua teoria da escuta tonal a partir de seus tratados sobre
ritmo musical, em especial, no seu System der Musikalischen Rhythmik und Metrik. Os resultados
dessa pesquisa mostram os parâmetros da escuta riemanniana ainda fundamentados em sua
‘estética da dualidade’; assim, foram escolhidos dois parâmetros da escuta riemanniana -
Auftaktigkeit e Achttaktigkeit - , como pilares de seu modelo de escuta. Essas duas manifestações
são vistas pela pesquisa como o início do pensamento da forma como processo musical.
Palavras-chave: escuta, forma musical, estrutura rítmica, processo, Riemann.

The logic and the process of Riemannian listening


Abstract: The work aims to understand the idea of musical listening contained in the work of
Hugo Riemann from his writings on aesthetics, listening, and musical rhythm. For this task a
bibliographic survey was made in the search for elements that showed the fundamentals of its
process of listening. First, his thesis 'Musikalische logik: Über das Musikalische Hören' was
revised which was the basis of his later works. Subsequently, elements of his theory of tonal
listening were raised from his treatises on musical rhythm, especially in his System der
Musikalischen Rhythmik und Metrik. The results of this research show the parameters of
Riemannian listening still foundations in his 'aesthetics of duality', thus, two parameters of the
Riemannian listening, Auftaktigkeit and Achttaktigkeit, were chosen as pillars of their listening
model. These two manifestations are seen by research as the beginning of thought of musical form
as process.
Key-words: listening, musical form, rhythm structure, process, Riemann.

Introdução
É de senso comum reconhecer a importância de Riemann para a musicologia como precursor
de muitos campos dos estudos musicais. Embora sua grande contribuição para a teoria tonal
tenha sido sua teoria harmônico-funcional, o grande legado que Riemann trouxe para a
Musikwissenschaft foi a mudança de paradigma que, antes focada na teoria da composição,
agora é fundamentada na questão da percepção consciente das estruturas musicais. Ele tem
como alvo principal a construção de uma ‘lógica da escuta musical’ como ponto de partida
para sistematizar qualquer teoria e essa lógica caminha com o objetivo de encontrar
normativas, generalizações para responder à questão: ‘como nós escutamos música?’ Em sua
tese de doutorado de 1873 encontramos o título “A lógica Musical: principais características
das razões fisiológicas e psicológicas do nosso sistema musical1”(Riemann, 1973, p.1). No

1
Hauptzüge der physiologischen und psychologischen Begründung unseres Musiksystems

221
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

entanto, o rodapé traz o título original de sua defesa: “dissertação sob o título: sobre a escuta
musical”, ou, “a partir da escuta musical.”2 . Assim, pode-se dizer que o grande objetivo de
Riemann, em grande parte da sua obra, era a busca por uma lógica da percepção sonora.

1. A busca por uma lógica da escuta


Contrariando essa tendência de sua época que visava tratados voltados para a composição,
Riemann inicia sua jornada teórica na tentativa de estabelecer leis básicas da percepção
musical. Riemann diz: nos deparamos, a cada passo, com tais relações aparentemente
convencionais; parece, no entanto, apenas conveniência e quando observadas mais de perto,
conhece-se, que deveria haver uma lei lógica como base para isso. (Riemann, 1873, p.41)
Em linhas, gerais a partir de suas pressuposições sistêmicas estruturalistas ele prevê
que a escuta de uma obra musical seja realizada pelas partes básicas, por meio de atitudes
comparativas, até o final da obra quando estará apta a fazer uma síntese com ‘o todo’. Para ele
tudo é um ato comparativo entre partes ou estruturas fracionadas, assim, cada vez que surge
uma nova estrutura a atividade cognitiva a compara com aquela ouvida previamente e atualiza
seu quadro taxonômico atribuindo-lhe uma função qualitativa. Em seu escrito sobre estética
de 1888, Wie hören wir Musik?3 ele diz:
O visitante da catedral de colônia, que não seja o próprio arquiteto, possui uma
grande vantagem sobre qualquer ouvinte da Nona Sinfonia de Beethoven que não
seja um músico[ouvinte treinado]. O primeiro está à frente da catedral e pode gastar
o tempo que quiser absorvendo em sua imaginação primeiramente a estrutura
completa e, então, gradualmente, mais e mais detalhes. Iniciando com a apreensão
das simetrias de grandes escalas, e passando dessas para as de menor escala. Não é
assim com o ouvinte. A música não espera uma vez que entra em seu ouvido, se ele
[ouvinte] não tiver êxito em aprendê-la, ele perdeu a chance de entendê-la melhor na
comparação com o que virá depois. Tudo depende, portanto, da apreensão clara do
máximo de figuras minuciosas e suas corretas relações entre elas, na verdade,
entendendo os menores pontos de simetrias. (RIEMANN, 1888, p.43 apud
REHDING, 2003, p.3)

Riemann faz uma comparação entre a forma de apreensão do objeto visual (espacial) e
do objeto musical (temporal), sendo que na observação espacial o intérprete visual pode
apreender o todo e migrar para as partes, ou pode começar pelas partes em direção ao todo.
Sua vantagem sobre o ouvinte está na ideia de que pode voltar a observar a mesma parte
quantas vezes forem necessárias para entender a imagem. Ao contrário disso, na

2
Als Dissertation unter dem Titel: Über das Musikalische Hören.

3 Hugo Riemann.(1923). Wie hören wir Musik? Grundlinien der Musik-Ästhetik. Berlin: Max Hesse.

222
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

contemplação de um objeto temporal só há uma única chance de observação e como é um ato


comparativo, perdendo-se esta chance haverá consequências para tudo que ocorrerá
posteriormente. Há, portanto, duas maneiras por meio das quais a apreensão do objeto
temporal pode ocorrer: o método dedutivo (analítico), ou o método indutivo (sintético). O
método dedutivo-analítico seria um tipo de escuta atribuída às pessoas que teriam a
capacidade de desmembrar a peça em qualquer direção, podendo observar cada parte ou
compasso do início ao fim, e do fim para o início. Mas Riemann faz uma ressalva alegando
que há casos raros em que pessoas conseguem ter a percepção do ‘todo’. Nesse sentido,
apenas o compositor (arquiteto sonoro) poderia ter uma visão holística da obra. Por outro
lado, a escuta do performer e do ouvinte é baseada no método indutivo (sintético), que
compreende a música apenas ao final da obra construindo uma imagem a partir daquilo que se
conseguiu apreender. E, como acontece nesse método, há um tipo de ‘cálculo probabilístico’
a partir da porcentagem de estruturas apreendidas para dar sentido à sua escuta.
Como é uma coisa impossível agrupar milhares de acordes sucessivos em uma
imagem geral, torna-se necessário um desmembramento no sentido de facilitar a
visão geral. O método dedutivo (analítico), portanto, desmembraria toda a obra tonal
em partes, períodos, frases, compasso e elos de compassos. [...]No entanto, criadores
de uma força menor raramente concebem mais que alguns poucos compassos, aos
quais com acompanhamento, o restante se incorpora de forma cristalizada. Pelo
ponto de vista do artista que reproduz (performer) e também para o ouvinte, o
método indutivo (sintético) é o único que possibilita a compressão. (RIEMANN,
1973, p.41)

Após a publicação de suas teorias de harmonia funcional Riemann mergulha num longo
período de reflexões teóricas na tentativa de mudar o paradigma da escuta musical, e esse
caminho passa pelos estudos dos ritmos publicados em seu System der Musikalischen
Rhythmik und Metrik (1903)4. Esse tratado exemplifica o perfil da escuta riemanniana baseada
na mesma estética da dualidade que fundamentou seus pensamentos harmônicos, assim, a
partir deste escrito, pode-se resumir a escuta em dois parâmetros: Auftaktigkeit e
Achttaktigkeit.

2. A escuta riemanniana ‘em processo’


A ideia da processualidade na música tem sido amplamente debatida em obras recentes,
como exemplo em Schmalfeldt que encontra fundamentos em Adorno e Dahlhaus defendendo
a ideia de que ‘forma é processo’. (Dahlhaus apud Schmalfeldt, 2011, p.10) A forma passa ser

4
RIEMANN, Hugo. (1884). Musikalische Dynamic und Agogik. Hamburg: Rhater, 1884

223
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

a “maneira pela qual o conteúdo de uma obra é feita inteligível pelo ouvinte”, como também
consiste em padrões abstratos que proveem ao ouvinte “pontos de referências e
previsibilidade, facilitando a apresentação de um conteúdo que necessariamente varia de obra
para obra. (Bonds, 1988 apud Schmalfeldt, 2011, p.5). Nessa perspectiva formal, toda a
escuta musical adquire um aspecto de becoming (werden), um constante ‘tornar-se’, um
processo.
Pouco citada nas discussões contemporâneas sobre esse tema, a contribuição de
Riemann tem sido esquecida, ao contrário do que ocorreu com suas teorias funcionais e
transformacionais. No entanto, são em suas obras de ritmo musical que as concepções sobre
‘processo’ aparecem e são essas obras que ocuparam boa parte da sua atenção na última fase
da sua produção teórica. Em seu Musikalische Dynamik und Agogik (1883) ele faz um
extenso trabalho sobre expressividade na interpretação musical e o resultado principal é
estabelecer o motivo musical como elemento que por si só representa a ideia de um werden.
Ele classifica inúmeros motivos dentre os quais os de final-acentuados (abbetont) representam
o anseio de escutar a forma em processo se desenrolando no tempo. Ele diz que esses motivos
possuem um “esforço enérgico, com uma intenção de crescimento e de become” (Wachsen,
Werden, Wollen). (Riemann, 1984, p.12 apud Hunnicutt, 2000, p.88).
Para Riemann entender o papel que a dimensão rítmica desempenha é importante tanto
para o ouvinte quanto para o intérprete, afirmando que “talvez um desenvolvimento sadio do
aprendizado do ritmo seja mais adequado do que o aprendizado da harmonia” (Riemann,
1903, p.vii). Ele entende o ritmo como a dimensão que indexa a música no tempo e torna o
tempo uma dimensão concreta na qual o conteúdo sonoro é transmitido. O ritmo nunca é
estático, sempre está em processo e os acordes só se convertem em harmonia quando a
temporalidade rítmica entra em cena.
Se o ritmo é, em princípio, verdadeiramente a estruturação de um processo temporal
- não uma estruturação do tempo abstrato, mas sim de um acontecimento perceptível
que se desdobra ao longo do tempo – de acordo com um padrão de mensurabilidade
normalmente dado, então está claro que até mesmo sua mais simples manifestação,
uma séries de time-spans iguais, adquire significado apenas através do
relacionamento do conteúdo daqueles time-spans. (RIEMANN, 1900, p.140)

Estudos contemporâneos têm destacado a importância da organização rítmica a partir da


percepção de padrões tais como Jones, Kidd e Wetzel (1981) que demostraram que a
dimensão rítmica “pode funcionar como uma pista de atenção do streaming de
atenção.” (SLOBODA, 2008, p.247). Nesse sentido, grande parte do reconhecimento de
estruturas tonais é são determinada pela organização rítmica.

224
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Riemann faz, portanto, a relação entre processos cognitivos e temporalidade na qual a


música vai sendo construída no tempo e na mente do ouvinte. Sua inteligibilidade é um
processo de contemplação da própria construção da música, e o ouvinte pode acessar na
memória cada elemento e compará-lo em qualquer dimensão formal, desde as pequenas partes
até grandes seções, ao final faz uma síntese daquilo que ouviu.
A apreensão na memória - enfatizado por Aristoxeno – engloba cada dimensão
crescente, de modo que a escuta de uma peça musical não é de todo a observação de
uma série de eventos desfilando em sequência, mas sim uma compilação daquilo que
é trazido até nós numa sucessão temporal: uma construção na memória.
(RIEMANN, 1900, p.140)

A base estrutural da escuta rítmico-formal riemanniana é o mesmo tipo de dualismo


contido nas funções harmônicas nas quais tudo se manifesta a partir da relação temporal
‘Leve-para-pesado’, significando que todos os gestos musicais têm preferencialmente seu
início leve de um upbeat em direção ao downbeat estrutural forte. Isso traz à tona a primeira
generalização de sua teoria: o conceito de Auftaktigkeit, que numa tradução literal significaria
‘anacrusidade’, e que também pode ser entendido como “em processo de anacruse”. No nível
da superfície musical o motivo é quem exprime essa ideia, tomamos como exemplo o motivo
da quinta sinfonia de Beethoven (fig.1b) que manifesta o conceito de que a música caminha
em processo de ‘anacrusidade’ em direção ao downbeat estrutural.
Há, portanto, uma negação da lógica da escuta tradicional estabelecida pela teoria dos
acentos em que o início do compasso configura-se como a “cabeça do compasso” e todos os
outros elementos posteriores estão subordinados a ele. A escuta é invertida para a ideia de que
o downbeat estrutural se torne o final do motivo, o alvo para o qual tudo converge, todos os
elementos anteriores estão subordinados ao Taktschwerpunkt ( ).

a) b)
Fig. 1 – Time-span em processo de anacrusidade para o ponto de gravidade.

O fato de Riemann tratar desse assunto em seus escritos sobre ritmo, e não de harmonia,
está na importância que a segmentação motívica tem na percepção musical. Há pesquisas
atuais que apoiam sua visão tais como a de Smith (1983, apud Sloboda, 2008, p.246) que se
concentrou na percepção de agrupamentos examinando padrões rítmicos percebidos por
músicos e não-músicos. O resultado mostra o agrupamento gestáltico por proximidade
temporal e a conclusão mais importante é sobre os não-músicos: apesar de não preservarem a
métrica original mantiveram o agrupamento mais primitivo de proximidade. É possível ver

225
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

que o padrão rítmico resultante do experimento de Smith é similar à ideia de segmentação


pelo auftaktigkeit.

Fig.2 – Agrupamentos gestálticos por proximidade temporal resultante do


experimento de Smith (1983 apud SLOBODA, 2008, p.246)

Esse tipo de agrupamento para Riemann dá a ideia de que a música está sempre ‘em
processo motívico’, de um elemento de valor-leve para um valor-pesado, de um upbeat para
um downbeat estrutural. No entanto, para a escuta de trechos mais longos entra em cena o
conceito de Achttaktigkeit, que em uma tradução livre poderia ser ‘octamensurabilidade’. Na
prática é a organização qualitativa, simétrica, e hierárquica do período de oito compassos da
música tonal. Sua concepção é de que a música é construída e, consequentemente, escutada
por pareamento de eventos sonoros (time-spans), ao passo que seus conteúdos adquirem
valores qualitativos tais como valor-leve/valor-pesado, que resultam naquilo que conhecemos
como semifrases, períodos, etc. A figura 3 mostra o pareamento de vários motivos na qual
adquirem alternância entre valor-leve e valor-pesado seguindo a lógica de “crescendo em
peso”.

Fig. 3 – Exemplo de análise riemanniana contemplando a direcionalidade e o peso de cada motivo.

Essa é uma tentativa de explicar como o ouvinte qualifica os gestos musicais, e nessa
perspectiva o motivo funciona como agente que provoca continuidade e descontinuidade
temporal linear. Como podemos ver, os motivos 1 e 2 manifestam um desejo de ‘crescendo
em peso’, mas não possuem uma ampla continuidade devido ao equilíbrio rítmico do motivo
em relação ao seu ponto de gravidade. Isso os torna motivos internamente-acentuados (ver as
flechas de direcionalidade). Já o número 3 é um legítimo motivo com final-acentuado que
gera ampla continuidade em direção ao último motivo que refreia o movimento.
É importante ressaltar que a paridade no Achttaktigkeit só se dá no primeiro nível entre
os motivos 1→2; 3→4; 5→6; 7→8, e nunca haverá relacionamento estrutural entre os motivos

226
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

4 e 5 por exemplo. Riemann entende que embora a música seja executada linearmente, o
processo de percepção ocorre de maneira arquitetural, isto é, cada bloco motívico une-se ao
seu par pertinente criando outras unidades maiores em outros níveis estruturais. Nesse
sentido, a música é construída na memória a partir de ‘empilhamento’ de eventos que fazem
correlações multidirecionais (fig.4).

Fig. 4 – Representação da organização lógico-estrutural e direcional do Achttaktigkeit .

O gráfico acima mostra a normativa que baliza a escuta tonal em termos frasais, ao
passo que reflete o conflito dualista entre o Auftaktigkeit (flechas) e o Achttaktigkeit (blocos).
No entanto, é sabido que na prática o repertório não se limita à esse modelo (período de oito
compassos), assim, quando um período foge desse padrão abstrato é gerada uma
descontinuidade formal. Nesse sentido a forma entra em processo de ‘estase’ ou
‘progressividade excessiva’, e consequentemente a escuta entra em conflito entre fluxo dos
eventos e paralização (ou adiantamento) da forma musical. Abaixo (fig.5) vemos o exemplo
da análise de Riemann do Quarteto de Cordas, Op.54, de Haydn, onde o Achttaktigkeit é
ampliado duas vezes na primeira semifrase: o segundo motivo (2) é expandido pelo motivo
(2a), em seguida, no motivo (4), ocorre uma expansão ainda maior, classificada como (4a) e
(4b). É importante notar o papel dos colchetes que colocam a ideia tanto de segmentação
motívica como de hierarquização dos mesmos, a exemplo dos motivos (4a) e (4b) onde o
colchete aparece aberto do lado esquerdo e sobreposto ao colchete de seu motivo original (4),
dando a ideia de hierarquia.

Fig 5 – Análise da funções motívico-estruturais segundo Riemann. Haydn, Quarteto de Cordas em Sol
Maior, Op. 54, No.1, segundo movimento, comp. 1-12.

227
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

A escuta proposta por Riemann faz com que as estruturas motívicas desenvolvam uma
qualidade ou uma função formal. O parâmetro de escuta riemanniano que dá qualidade de
“processo” (Auftaktigkeit) pode sofrer alteração de direcionamento em nível de superfície,
como é o caso do exemplo analisado. As flechas direcionais indicam que a escuta pode sofrer
um revés causado pela estase na forma periódica em nível superficial. Já em níveis mais
profundos ela gera uma ampliação da semifrase proposicional ocasionando um ‘desequilíbrio’
na forma periódica simétrica, criando assim uma espécie de dissonância formal que precisa
ser resolvida em algum momento na obra (fig.6).

Fig 6 – Representação da estrutura do quarteto de Haydn, e suas descontinuidades no desenvolvimento.

3.Considerações Finais
Embora Riemann seja conhecido pelas suas teorias harmônico-funcionais, pouco de sua
produção sobre a escuta musical tem sido explorada. Nesse trabalho pudemos fazer o percurso
desse pensamento que inicia com sua tese inaugural (1973), passando por seus escritos sobre
estética e ritmo musical. A partir de sua visão dualista pudemos encontrar duas generalizações
que balizam sua ideia de escuta: o Auftaktigkeit e Achttaktigkeit. Além disso observamos que
esses parâmetros se constituem como o início do pensamento de “forma como processo” que
dá a ideia de um constante ‘tornando-se’(Becoming, Werden). Se entendermos a base
epistemológica de Riemann e suas concepções de escuta, poderemos resinificar inclusive
questões já estabelecidas no que diz respeito a suas teorias funcionais. Espera-se que
futuramente sua obra sobre estética e ritmo seja apreciada tanto quando suas teorias
transformacionais e que possa ser somada a elas na tentativa de ter uma visão ampliada do
pensamento riemanniano.

4. Referências
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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

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Breitkopf & Härtel.
Schmalfeldt, J. (2011). In the processes of becoming. Oxford: Orxford.
Sloboda, J. (2008) A mente musical: a psicologia cognitiva da música. Londrina: EDUEL.

229
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Dimensiones acústicas y percepción del timbre en el procesamiento de


grabaciones del análisis musical

María Marchiano
Universidad Nacional de La Plata
maria.marchiano@hotmail.com

Isabel Cecilia Martínez



Universidad Nacional de La Plata

isabelmartinez@fba.unlp.edu.ar

Resumen: El timbre es un fenómeno estudiado por diversos campos de estudio. A diferencia de otras
cualidades sonoras, ni sus propiedades acústicas ni sus vínculos con las experiencias perceptivas están
aún claramente establecidos. Partiendo de la idea de que un acercamiento interdisciplinario puede
favorecer a delinear las problemáticas en el entendimiento de esos vínculos, el trabajo propone una
articulación del campo del análisis musical con los estudios computacionales sobre percepción
auditiva y las tecnologías de extracción de información de señales de audio, procesando un fragmento
de la grabación de la obra Cifuncho de Mariano Etkin y comparando los resultados con el análisis
sobre la misma realizado por Mastropietro y Anzil (2014). Las propiedades acústicas definidas por los
estudios de percepción auditiva usados en el presente trabajo cuyos correlatos perceptivos están
vinculados a la caracterización del timbre son el centroide espectral, el flujo espectral y el tiempo de
ataque. El estudio revela nexos y diferencias entre las dimensiones tímbricas y la percepción musical
de los analistas, mostrando un vínculo especialmente estrecho entre el centroide espectral y el análisis
musical de los autores.
Palabras clave: timbre, percepción auditiva, análisis musical, percepción musical, cualidades
sonoras.

Acoustic dimensions and perception of timbre on the recording processing of musical analysis
Abstract: The timbre is a phenomenon studied by many research fields. Unlike other sound qualities,
niether its acoustic properties nor its links with perceptual experiences are clearly established yet.
Starting with the idea that an interdisciplinary approach can favor delineating the troubles in the
understanding of those links, the article proposes an articulation of the musical analysis with the
computational studies of auditory perception and extracting information technologies from audio
signals, processing a recording excerpt of Mariano Etkin’s Cifuncho and comparing the results with
the analysis on the same topic made by Mastropietro y Anzil (2014). The acoustic properties defined
by the auditory perception studies used in the present article whose perceptual links are related to
timbre characterization are spectral centroid, sprectral flux and attack time. The study shows nexuses
and differences between timbral dimensions and the analysts’ musical perception, showing a specialy
tight link between the spectral centroid and the authors’ musical analysis.
Key-words: timbre, auditory perception, musical analysis, musical perception, sound qualities.

1. Introducción
En el trabajo se realizará un estudio tímbrico interdisciplinario de un fragmento de una obra
musical. A continuación expondré el estado actual de los campos de estudio puestos en
común: el análisis musical, los estudios sobre percepción del timbre y el software
especializado de análisis de señales de audio.

230
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

1.1 Análisis musical


El método hermenéutico se instala en el análisis musical a principios del siglo pasado. La
hermenéutica consiste en la interpretación de textos por parte de un sujeto individual que
revela un sentido oculto a partir de su propia experiencia de lectura, cuyas habilidades
analíticas son las únicas herramientas mediadoras entre el texto y su interpretación. La
comprensión del sentido en la interpretación musical implica una traducción lingüística de la
obra (Gadamer, 1996), desarrollada sobre el estudio de la partitura, texto musical por
excelencia de la tradición occidental, y generalmente sustentada por la escucha de versiones
de la pieza. En los inicios la escucha de interpretaciones estuvo necesariamente atada a las
performances en vivo, mientras que actualmente la tecnología permite a los analistas
incorporar el uso de grabaciones de las obras en el proceso analítico. Aunque su uso en el
análisis musical puede considerarse una ventaja ya que la experiencia perceptiva puede
repetirse cuantas veces se desee, los defensores de la cultura receptiva del campo conciben a
la grabación como una imitación irreal de la interpretación en vivo (Turino, 2008) y por lo
tanto una limitación para el acercamiento a la obra.
Los métodos desarrollados por la disciplina a partir de los cuales se aborda el análisis de
las obras están basados en el estudio de la altura, el ritmo y la forma (Cook, 1987),
dimensiones estructurantes de la música clásico-romántica, mientras que el timbre fue
tradicionalmente abordado sólo en relación a la fuente emisora del sonido. La ausencia casi
total de referencias al timbre en la escritura tradicional hace que deba inducirse de forma
indirecta de las alturas y duraciones y que su análisis sea, por lo tanto, complejo.

1.2 Estudios sobre percepción del timbre y software de análisis


El campo de la psicología de la música que investiga el fenómeno tímbrico se desarrolla sobre
supuestos cognitivos clásicos. En la actualidad, el timbre es considerado una variable
perceptiva con correlatos acústicos, y se busca “determinar la estructura de la representación
perceptiva multidimensional del timbre (el llamado “espacio tímbrico”) (...), y entonces
intentar definir los factores acústicos y psicoacústicos que sustentan esa
representación” (McAdams, 1999, p. 85). Gran parte de los estudios (Caclin, Giard,
McAdams, Smith y Winsberg, 2007; Caclin, McAdams, Smith y Winsberg, 2005; McAdams,
1999) coinciden en la existencia de al menos tres dimensiones tímbricas presentes en todo
sonido: el centroide espectral, el flujo espectral y el tiempo de ataque.

231
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

El centroide espectral y el flujo espectral son dos dimensiones acústicamente centradas


en las características espectrales de una señal de audio. El centroide es el centro de gravedad
del espectro de la señal o “el balance de los parciales altos y bajos en el espectro. (...) Si un
tono tiene un brillo más agudo que otro, entonces tiene más energía en las frecuencias
altas” (Bregman, 1990, pp. 96-97). El flujo espectral mide la fluctuación del centroide
espectral durante los primeros milisegundos de la señal. El tiempo de ataque, en cambio, está
definido por el tiempo que tarda la señal en ir desde el punto de menor al de mayor energía
durante los primeros milisegundos de la envolvente dinámica y su correlato perceptivo es la
“mordida” del tono. Bregman, cuyo aporte central consistió en la definición de los procesos
perceptivos involucrados en la agrupación y segmentación del flujo sonoro, tras una
evaluación retrospectiva concluye que la simpleza acústica de los sonidos sintetizados usados
en estos trabajos impide el acercamiento a mecanismos perceptivos dinámicos y complejos
como los involucrados en la experiencia musical, limitando el estudio de la percepción
auditiva.
Estas dimensiones tímbricas son propiedades acústicas perceptivamente relevantes,
identificadas a través de la comparación automatizada entre las descripciones de los sujetos
sobre sus percepciones y las características acústicas de los estímulos utilizados en
experimentos de laboratorio, y se encuentran más fuertemente radicadas en las propiedades
físicas del sonido que en la experiencia musical (Fig. 1). Las ideas de “brillo” y “mordida”
son formas metafóricas multimodales de comunicar la experiencia (Forceville, 2006; Eitan,
2010) en relación al timbre del sonido.

Fig.1: Dimensiones perceptivas y acústicas en torno al timbre.

Estos estudios se desarrollan en mutua colaboración con las tecnologías de extracción


de información de señales de audio, que procesan datos de duración, frecuencia y nivel de
presión sonora (NPS).

232
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

2. Objetivos
1) Evaluar los aportes del método de procesamiento de grabaciones de las obras con
software de extracción de información de señales de audio sobre las dimensiones
tímbricas para el análisis musical.
2) Estudiar las conexiones y los límites entre las propiedades acústicas y las perceptivas
del fenómeno tímbrico comparando un caso de análisis musical con la información
extraída con software especializado de la grabación de la obra.

3. Estudio de un caso: Cifuncho


En esta sección haremos referencia en primer término al análisis realizado por Mastropietro
(2014) y Anzil sobre Cifuncho, de Mariano Etkin1, y en segundo término compararemos y
enriqueceremos el análisis musical evaluando la correspondencia de las percepciones de los
autores y los resultados obtenidos en el análisis de la señal correspondientes las dimensiones
tímbricas planteadas por los estudios cognitivos computacionales, considerando a la
experiencia perceptiva de los analistas como intrínseca al proceso y a los resultados del
análisis musical.

3.1 Análisis de Mastropietro y Anzil


En el análisis de la obra Cifuncho, Mastropietro y Anzil plantean que en un fragmento del
comienzo de la obra (Fig. 2) se produce una modulación tímbrica2 cuya transformación
principal es la pérdida de intensidad del Re central, el paulatino aumento de la predominancia
perceptiva del Re6 y el refuerzo progresivo de los componentes espectrales superiores. Estas
ideas no poseen referencias a la partitura sino que fueron discriminadas auditivamente por los
autores y/o inferidas a partir de los parámetros escritos en la partitura. La modulación, que se
genera como consecuencia de la manipulación de las alturas, las intensidades, las duraciones
y los modos de ejecución, es discontinua: los cuatro momentos están intercalados por tres
materiales musicales que no forman parte del proceso. Según los analistas, la disminución de
la intensidad del Re central se genera en el segundo momento por un aumento de intensidad
de las componentes espectrales superiores y una pérdida de las inferiores que refuerza el 4to
armónico (Re6), en el tercer momento por la ejecución del armónico Re6 que refuerza la zona

1 El trabajo con una obra para instrumento solista busca evitar la complejidad del vínculo entre acústica y percepción

relativa a la habilidad humana de discriminación de diferentes fuentes sonoras simultáneas.


2 Para estudiar las características del proceso de transformación tímbrica propuestas por los autores, ver Mastropietro,
2014, pp 32-53.

233
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

superior del espectro y por la disminución de intensidad que debilita la intensidad del Re
central, y en el cuarto momento por la ejecución del Re armónico, omitiendo el Re central.

Fig. 2: Cuarto sistema de la primera página partitura de Cifuncho, de Mariano Etkin.

3.2 Análisis de la grabación


La grabación usada fue cedida por Mastropietro y procesada con los programas SG1 en
Reaper v5.18 y MIRToolbox de MatLab v2015a.

3.2.1 Características espectrales generales


La visualización del espectrograma (Fig. 3) permite identificar fácilmente los “momentos”
planteados por Mastropietro y Anzil, dados por cambios en la distribución de la energía en el
espectro y mostrando un estrecho vínculo entre las características acústicas y las percibidas
del fragmento. Aunque los autores perciben un aumento de relevancia de la formante Re6
(1176Hz aprox.) en los dos últimos momentos, transformación central en su análisis de la
modulación, el seguimiento de su comportamiento a través del espectrograma no muestra
indicios de incremento del NPS, sino que, contrariamente, disminuye notoriamente en el
tercer momento. Además, entre los momentos 2 y 3, y 3 y 4 (ataques 3, 5 y 7) se produce una
disminución progresiva de la intensidad de los armónicos inferiores. Es probable entonces que
la percepción del incremento paulatino de sonoridad del Re6 que indican los autores se deba a
la disminución de la intensidad de los armónicos primero, segundo y tercero en el momento 3
y a su ausencia en el momento 4.

Fig. 3: espectrogramas (izq.) y centroide espectral (der.) del fragmento completo de Cifuncho.

234
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

3.2.2 Centroide espectral


La descripción de la modulación tímbrica en el fragmento de Cifuncho relativa a la pérdida de
intensidad de los armónicos superiores realizada por Mastropietro y Anzil está íntimamente
vinculada a la definición acústica del centroide espectral y a la percepción del brillo. Su
análisis (Fig. 3) muestra que hay un cambio acústico no lineal del centro de gravedad hacia
zonas de frecuencias cada vez más altas del espectro, que promedia entre los 1500 y los
4300Hz. Al igual que con la formante Re6, el centroide es parte de un proceso de cambio en
las características espectrales en el que las frecuencias bajas disminuyen haciendo que cobren
más peso relativo las altas: su valor asciende no por un aumento de intensidad en las zonas
altas sino por una disminución en las bajas.
El desarrollo temporal del centroide espectral no muestra un comportamiento
diferenciado entre los segmentos identificados como parte del proceso de modulación y los
demás ataques sino que su ascenso involucra al fragmento entero. Es probable entonces que la
segmentación perceptiva propuesta por los analistas sea una consecuencia de la vinculación
del centroide espectral con otros parámetros. Por ejemplo, la selección de alturas por parte del
compositor podría influir en la agrupación del flujo sonoro en dos grupos: aquellos en los que
sólo se ejecuta la nota Re (los “momentos”) y otros en los que suena la nota Sol (los ataques
intermedios). Las alturas condicionarían la agrupación perceptiva de los eventos, resaltando la
percepción de los cambios tímbricos entre esos momentos y generando una segmentación en
la modulación del centroide espectral acústicamente continua.

3.2.3 Tiempo de ataque y flujo espectral


El flujo espectral (Fig. 4) presenta un grado bajo y constante de fluctuación durante todo el
fragmento, salvo en durante el segundo momento y el sexto ataque. El segundo momento
tiene una forma de ejecución diferente al resto del fragmento (unísono en doble cuerda, roce
de la cuerda, movimiento transversal del arco) que se aleja de las técnicas abordadas por los
métodos de estudio tradicionales del instrumento. Es probable que tanto los batimentos del
unísono como la pérdida de control de los movimientos del instrumentista por la forma de
ejecución inusual sean los causantes del aumento abrupto de la fluctuación espectral. En el
sexto ataque las pequeñas variaciones del flujo espectral podrían ser generadas por la
inestabilidad del arco dada por los cambios de velocidad abruptos al final y al comienzo del
sonido.

235
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Fig. 4: Flujo espectral (izq.) y tiempo de ataque (der.) del fragmento completo de Cifuncho.

En los instrumentos de cuerda frotada, las características acústicas del ataque están
fundamentalmente vinculadas a los golpes de arco (Godoy, 2010). En Cifuncho el compositor
indica que el movimiento del arco debe ser fluido y continuo en todo momento, por lo que las
diferencias entre el tiempo de ataque de cada nota (Fig. 4) son consecuencia del intento de
control por parte del instrumentista de otros parámetros especificados en la partitura
(velocidad, cantidad y posición del arco, ejecución de dobles cuerdas y armónicos, y diversos
movimientos de la mano izquierda que dificultan o facilitan la resolución de las técnicas del
arco). Es probable, entonces, que en esta obra los valores del tiempo de ataque estén más
ligados a las particularidades de la ejecución que a características compositivas estructurales
de la obra.
El tiempo de ataque y el flujo espectral no se relacionan con la caracterización tímbrica
de los momentos y del proceso de modulación descriptos por Mastropietro y Anzil.

4. Conclusiones
La investigación del fenómeno tímbrico se encuentra en construcción. La interrelación entre
los diversos campos que abordan su estudio permite identificar las conexiones y los límites
entre el ámbito de la experiencia humana y el de la acústica, ofreciendo un panorama sobre el
estado del tema imprescindible para futuras investigaciones que persigan la comprensión del
fenómeno tímbrico. La comparación entre las percepciones de Mastropietro y Anzil en el
análisis de un fragmento musical y las dimensiones tímbricas creadas por los estudios
cognitivos computacionales revelan coincidencias y distancias: la percepción de la progresiva
relevancia del cuarto armónico es consecuencia de la disminución de energía en el resto del
espectro y la percepción de un paulatino refuerzo de los componentes espectrales superiores
se relaciona a la transformación del centroide espectral, pero el flujo espectral y el tiempo de
ataque no muestran correlatos con el análisis musical de los autores. Además, el análisis

236
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

interrelacionado de las dimensiones acústicas (las frecuencias fundamentales y el centroide


espectral, en este caso) permitió entablar relaciones significativas con la percepción musical
de los analistas que no pudieron ser abordadas a través del estudio aislado de las dimensiones.
Si bien es cierto, por un lado, que las descripciones de los analistas son válidas para
explicar la creación musical y, por otro, que las dimensiones tímbricas no refieren de forma
directa a la experiencia musical, el uso de software de análisis constituye una instancia
irremplazable que permite informar a la experiencia analítica sobre la multidimensionalidad
tímbrica inaccesible a través de la partitura, y a la percepción auditiva sobre los procesos
acústicos que la sostienen.

Referencias
Bregman, A. S. (1990). Auditory Scene Analysis: The Perceptual Organization of Sound.
Cambridge, Estados Unidos: The MIT Press.
Caclin, A. Giard, M. McAdams, S. Smith, B. Winsberg, S. (2007). Interactive processing of
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Caclin, A. McAdams, S. Smith, B. Winsberg, S. (2005). Acoustic correlates of timbre space
dimensions: A confirmatory study using synthetic tones. The Journal of the Acoustical
Society of America, 118, 471-482.
Cook, N. (1987). A guide to musical analysis. Oxford, Inglaterra: Oxford University Press.
Eitan, Z. Timmers, R. (2010). Beethoven’s last piano sonata and those who follow crocodiles:
Cross-domain mappings of auditory pitch in a musical context. Cognition, 114(3),
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Forceville, Ch. (2006). Non-verbal and multimodal metaphor in a cognitivist framework:
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379-402). Nueva York, Estados Unidos: Mouton de Gruyter.
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Godoy, R. I. (2010). Gesture and timbre. En: R. I. Godoy y M. Leman. Musical gestures.
Sound, movement, and meaning (pp. 183-211). Nueva York, Estados Unidos: Routledge.
Mastropietro, C. (2014). Música y timbre. El estudio de la Instrumentación desde los
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Turino, T. (2008). Music as Social Life. The Politics of Participation. Chicago, Estados
Unidos: The University of Chicago Press.

237
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Cognição Musical e Processos Criativos

238
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

A atenção na prática deliberada em performance musical

Eduardo de Carvalho Torres


Universidade Federal do Rio de Janeiro
eduardotorres@ufrj.br


Resumo: Neste artigo discuto o exercício da atenção enquanto elemento indispensável para a
realização da prática deliberada, no âmbito da performance musical, demonstrando a função
substancial desempenhada pela memória, bem como a influência da motivação nesse processo. É
crescente, em pesquisas acadêmicas da área de música no Brasil, o interesse pelos temas aqui
relacionados, possivelmente pelas claras contribuições que estes conhecimentos podem oferecer,
sobretudo para o músico de performance. No entanto, durante o trabalho de revisão sobre a literatura
relacionada às pesquisas acadêmicas das áreas de prática deliberada e performance musical verifiquei
a necessidade de abordar a questão da atenção com maior profundidade. Neste artigo pretendo discutir
as origens psicológico-cognitivas da atenção e sua relevância para o bom desempenho em prática
deliberada, de modo a oferecer uma contribuição teórica para pesquisas neste campo. Para a realização
deste trabalho, realizei uma revisão de literatura cotejando teorias da música, da psicologia, da
educação e das ciências da mente, em geral, visando à fundamentação de uma teoria da atenção na
prática deliberada em performance musical. Como resultado, apresento uma hipotética estrutura que
fundamenta o papel da atenção na prática deliberada.

Palavras-Chave: atenção na prática deliberada, memória e motivação na performance musical,
prática deliberada.

The attention in deliberate practice in musical performance


Abstract: In this article I discuss the exercise of attention as an indispensable element of deliberate
practice, in the field of musical performance, demonstrating the strong function developed by
memory, as well as the influence of motivation in this process. In the Brazilian academic research of
music area, it is growing the interest by the topics pointed out here, possibly because of the clear
contributions that this knowledge could offer, especially for perform musicians. However, during the
work of revision about the related literature of deliberate practice and music performance academic
research I verified the necessity to approach the question of attention deeply. In this paper, I intend to
discuss the psychological-cognitive origins of attention and its relevance to good performance in
deliberate practice, to offer a theoretical contribution to searchers in this field. To carry out this work,
I realized a literature review, comparing theories of music, psychology, education and sciences of
mind, in general, looking for substantiating of a theory of attention in deliberate practice in musical
performance. As a result, I present a theoretical framework that justifies the role of attention in
deliberate practice.
Keywords: attention in deliberate practice, memory and motivation in musical performance,
deliberate practice.

Introdução
O conceito de prática deliberada introduzido por Ericsson, Krampe e Tesch-Römer (1993),
desde a sua assimilação vem adquirindo projeção em diversos domínios do conhecimento.
Particularmente no campo das pesquisas acadêmicas da área de música esse conceito tem sido
objeto de análise presente em pesquisas estrangeiras (Ruthsatz et al, 2007; Krampe &
Ericsson, 1996; Kenny & Gellrich, 2002) e nacionais (Alves & Freire, 2014; Galvão, 2006;
Souza, 2014; Quintério & Gloeden, 2016; Santiago, 2006; Zorzal, 2015; e outros) dedicadas

239
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

aos mais variados assuntos, como por exemplo para conhecimento e apreciação da assim
chamada performance expert, no contexto da performance musical, e outros temas afins.
Nota-se que os trabalhos que abordam a prática deliberada em particular invariavelmente têm
assinalado que atenção e/ou concentração mental são fatores determinantes para a qualidade
desta prática, sem se aprofundar, no entanto, no conhecimento científico relativo a estes
temas, nem tampouco discutir os meios para sua obtenção.
Em primeiro lugar, é necessário que se esclareça a distinção entre atenção e
concentração mental. De acordo com Castle e Buckler (2009) a atenção pode ser dividida em
“seletiva” e “dividida”. O primeiro caso estaria relacionado à “atenção focada”, ou em outras
palavras, a concentração sobre determinado objeto. No segundo, quando “dividida” e
desfocada ou desconcentrada, portanto, os autores entendem ser possível a um indivíduo
atender a determinada demanda, ainda que desconcentrado. Partindo desse pressuposto, o
presente estudo aborda o conceito de atenção, termo abrangente e difícil de delimitar,
conforme Styles (2006), e o papel desta função cognitiva para o bom desempenho do
indivíduo na prática deliberada.
A atenção vem sendo estudada por especialistas ao menos desde o final do século XIX,
tendo em William James (1890) um de seus pioneiros. Desde então, diversos autores
buscaram definir este conceito — grosso modo entendido como uma habilidade do indivíduo
de selecionar, atender e/ou responder a determinados estímulos e ignorar, voluntariamente (ou
não), outros (Styles, 2006; Broadbent, 1958; Pashler, 1998; Eysenck & Keane, 2010; Lima,
2005; Castle & Buckler, 2009) —, bem como compreender suas estruturas, limitações e
soluções para viabilizar seu melhor desempenho.
Alguns pesquisadores têm discutido a íntima relação que a atenção guarda com o
funcionamento da memória (Helene & Xavier, 2003; Cowan, 1997; Styles, 2005; Underwood,
1979), fato que ainda tem sido relativamente pouco debatido, muito embora a memória seja
indiscutivelmente imprescindível para a realização de quaisquer funções cognitivas
elementares, conforme ilustra Baddeley (1999) — este afirma que a melhor forma de entender
a importância da memória é imaginar como seria a vida sem memória. No âmbito das
pesquisas acadêmicas de música, a memória, particularmente, tem sido estudada com um
pouco mais de profundidade, ainda que não abordando a questão da atenção, por exemplo, em
trabalhos como os de Snyder (2001), Gerber (2012) ou Chaffin, Logan & Begosh (2012),
dentre outros.

240
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Nas seções seguintes, primeiramente esclarecerei as questões referentes à prática


deliberada. Então, discutirei as origens da atenção e sua relevância para o bom desempenho
em prática deliberada. No terceiro e último tópico, destaco a importância da motivação para a
obtenção e a manutenção da atenção, além das consequentes influências sobre todo o
processo.

Prática deliberada
Definida por Ericsson, Krampe e Tesch-Römer (1993), esta prática foi inicialmente
caracterizada por um conjunto de atividades práticas orientadas através do intermédio de
alguém — um professor, treinador, orientador — cuja finalidade é aperfeiçoar o desempenho
de habilidades específicas. Os autores afirmam ainda que esta atividade “requer esforço e não
é inerentemente agradável” e que “os indivíduos são motivados a praticar, porque a prática
melhora a performance”(p. 368), revelando, portanto, a importância da motivação para o
estudo deliberado e, consequentemente, para a performance musical.
Em relação ao uso do termo performance, é definida por Goldberg (1979/2006) como
uma forma de manifestação artística caracterizada pela “realização em ação”, quando o
performer se apropria de quaisquer recursos artísticos e suportes, numa relação direta com o
público. Assumindo-se esta compreensão, notória para o músico, entende-se que a música, por
sua natureza, é uma arte de performance.
Quanto à qualificação desta realização, alega-se haver um padrão de performance
caracterizado pela excelência, denominada performance expert. Por definição, a expertise
refere-se a um “desempenho superior consistente sobre um conjunto específico de tarefas
representativas para um domínio” (Ericsson & Lehman, 1996, p. 277). Alguns exemplos de
pesquisas da área de música (ou relacionados a ela) que têm abordado a expertise musical
com interesse podem ser conhecidos nos trabalhos de Krampe e Ericsson (1996), onde os
autores investigam a prática deliberada na manutenção de habilidades cognitivo-motoras em
pianistas experts e em pianistas amadores; em Santiago (2006), discute-se a integração entre
prática deliberada e o aprendizado informal da música; em Galvão (2006), que trata das
consequências da atividade musical para o desenvolvimento cognitivo e emocional das
pessoas, também em Alves e Freire (2014), interessados em discutir a performance expert de
clarinetistas, e ainda em Zorzal (2015), que propõe uma reflexão sobre a prática musical e os
aspectos práticos da preparação da performance musical, enfocando a autonomia do estudante
de instrumento—dentre outros trabalhos.

241
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

O cerne do presente trabalho encontra-se na frase sustentada pelo consagrado trabalho


de Ericsson e colegas (1993, p. 370): “é necessário manter total atenção durante o período da
prática deliberada”, argumento presente também nos trabalhos de Souza (2014), Alves e
Freire (2014) e Galvão (2006). O que chama atenção para a centralidade do tema da atenção
na prática deliberada é, conforme observei inicialmente, a singularidade do trabalho seminal
de Ericsson e colegas, referência e denominador comum nos trabalhos que abordam, com
algum destaque, a prática deliberada. Isso revela a consistência dessa concepção, mas que, no
entanto, não aborda de forma mais substancial as origens e a manutenção da atenção, como
também, as formas como este recurso cognitivo pode ser viabilizado.

Implicações no funcionamento da atenção: Memória


Não é novidade que a literatura dedicada aos temas de atenção e memória tenha buscado, de
algum modo, enfatizar a relação de causalidade entre estas duas funções cognitivas humanas.
Ainda que o volume de conhecimento produzido sobre esses temas seja relativamente
pequeno (Helene & Xavier, 2003), é possível encontrar obras inteiras dedicadas ao tema,
como em Cowan (1997), Styles (2005) e Underwood (1979). Mas a grande porção encontra-
se em forma de capítulos ou seções de livros e artigos, tal como em Pashler (1998), Cohen
(2014), Eysenck e Keane (2010), Fougnie (2008), Bjork e Bjork (1996), e outros. No campo
da música, pesquisas que envolvam atenção, memória e prática deliberada, por exemplo, ou
quaisquer outras temáticas que envolvam as funções cognitivas destacadas neste trabalho, no
entanto, ainda carecem de maior aprofundamento.
Helene e Xavier (2003), em um trabalho que busca aproximar atenção de memória,
observaram que “diversos fenômenos atencionais parecem ser manifestações diretas do
funcionamento dos sistemas de memória” (p.13). Estes autores notaram que o acumulo de
registros de experiências passadas da vida de um indivíduo, possibilitam que seu sistema de
memórias faça “previsões probabilísticas sobre o ambiente” e que essa capacidade de
antecipar e “selecionar as informações que serão processadas”, consequentemente
desenvolvem uma intencionalidade (p. 12). Em outras palavras, os autores consideram que
graças a esta capacidade de prever resultados com base em experiências passadas, o sistema
nervoso humano é capaz de promover ações que conduzam uma determinada ação a um
resultado pretendido e possibilitem ao indivíduo direcionar sua atenção, selecionando as
informações que serão processadas. Essa posição representa um pensamento revolucionário e
fundamental para o estudo deliberado, pois admite a possibilidade de prever a atenção, tal

242
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

como observá-la de forma consciente (meta-atenção). Helene e Xavier defendem que


“processos controlados” ou “processos voluntários de direcionamento da atenção” (p. 16), em
oposição a processos automatizados de captação atencional, por serem processos conscientes
são utilizados em casos excepcionais de tarefas complexas, que envolvem planejamento e
demandam tempo para sua execução por grau de complexidade e/ou desafio. Por fim,
sugerem que através de um processo de automatização de tarefas complexas, como os
desafios impostos à prática deliberada — fazendo um paralelo —, poderiam aliviar a carga
atencional, melhorando a qualidade do desempenho da atividade proposta, e, por conseguinte,
da performance.

O papel da motivação
A motivação caracteriza-se como um elemento psicológico que proporciona ao indivíduo
energia para realizar determinada ação (Reeve, 2006; Ryan & Deci, 2000). Araújo (2015)
considera a motivação “fundamental para quem vivencia a experiência musical e (...) o
elemento que garante a qualidade do envolvimento no processo” e, ainda, que “o que nos leva
a agir (...) são motivos gerados no contexto da nossa vida cotidiana, (...) sejam de ordem
subjetiva ou objetiva” (p. 45). Alves e Freire (2014) defendem que é a motivação o elemento
que garante o foco atencional durante a prática deliberada, sem a qual seria improvável a
realização e a sustentação desta atividade. Para esses autores, “a prática requer muita
concentração, e a manutenção do foco no estudo é uma atividade considerada como não
prazerosa, por isso a motivação é elemento fundamental para manter o foco e sustentar os
esforços que a prática musical exige a longo prazo” (p. 79) — argumento corroborado por
outros autores (Ericsson et al., 1993; Feltovich, Prietula & Ericsson, 2006; Gomes, 2008).
De acordo com Csikszentmihaly (1997), quanto mais distante as afinidades
motivacionais e emotivas de uma pessoa para com uma situação ou objeto, mais difícil é a
capacidade de concentrar a atenção do indivíduo. Ao contrário, quando alguém gosta da
atividade que desempenha e é motivada para superar suas dificuldades, mais fluentemente a
concentração ocorre. Para esse autor, controlar a atenção significa “controlar a experiência”;
“a informação atinge a consciência somente quando atendemos a ela” e o “estresse que
experimentamos depende mais do quão bem controlamos nossa atenção, do que o que
acontece conosco” (p. 128). Csikszentmihaly consagrou-se por ter desenvolvido uma teoria
motivacional denominada “Teoria do fluxo”, segundo a qual, quando sob condições onde as
habilidades do indivíduo e os desafios impostos a este se encontram em equilíbrio, o

243
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

indivíduo atingiria um “estado de fluxo”, quando então seria possível experimentar um


intenso estado de prazer e concentração. Ele sustenta que “o fluxo é uma fonte de energia
psíquica que foca a atenção e motiva a ação” (p. 140).

Considerações finais
A prática deliberada é caracterizada pela composição de vários fatores, dentre os quais se
atribui à atenção uma importante função nesse processo, de acordo com os argumentos
evidenciados neste trabalho. É natural, portanto, que se conclua que o estudo deliberado é um
processo significativo para a construção da performance musical, e indispensável quando se
trata da performance expert.
Uma revisão de literatura em torno dos conceitos acima discutidos possibilita-nos
estruturar a fundamentação do papel da atenção na prática deliberada da seguinte forma: a
prática deliberada envolve o exercício da atenção de forma decisiva; é inconcebível entender
prática deliberada sem atenção; o processo atencional, por sua vez, está condicionado pelo da
memória, que em maior ou menor proporção determina o grau de direcionamento da atenção e
o desenvolvimento de intencionalidades na seleção de informações; a atenção, no entanto, é
apoiada pela motivação, processo que garante a manutenção e a continuidade do exercício da
ação a qual o indivíduo é submetido, revelando o complexo ciclo de ação direta da motivação
sobre a atenção, esta, sobre a prática deliberada, e, consequentemente, sobre a performance.

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246
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Interação reflexiva e criatividade: uma experiência com alunos


iniciantes em bateria

Jean Felipe Pscheidt


Universidade Federal do Paraná
pscheidtjean@gmail.com

Rosane Cardoso de Araújo


Universidade Federal do Paraná
rosane_caraujo@yahoo.com.br

Resumo: Esta pesquisa apresenta os resultados de um experimento didático conduzido com o


objetivo de investigar os comportamentos reflexivos percebidos durante as atividades de interação
reflexiva e de criação aplicadas no contexto do ensino de bateria para crianças. A hipótese de que a
interação reflexiva humano/humano pode ser usada como um recurso eficaz para o processo
criativo (Addessi, 2012, 2014, 2015) é investigada no contexto da interação entre professor e aluno
em aulas de bateria. O experimento foi realizado em uma escola de ensino especializado em
música e envolveu duas crianças estudantes de bateria, uma de seis e outra de onze anos. Os
resultados indicam que a interação entre professor e aluno foi promovida com base nas condutas
essenciais para a qualidade reflexiva da interação, sendo elas a imitação/variação, corregulação,
troca de turno e contingência temporal. A atividade de interação se mostrou uma ferramenta
didática para um trabalho voltado a criatividade musical, despertando a escuta atenta,
improvisação, dinâmica e exploração de timbres. Novas pesquisas são indicadas dentro da
perspectiva da interação reflexiva e criatividade, considerando o campo de possibilidades a ser
explorado para a área da música e cognição.
Palavras-chave: criatividade, interação reflexiva, bateria.

Reflective Interaction and Creativity: An Experiment with Beginning Students on drums


Abstract: This research presents the results of a didactic experiment conducted with the aim of
investigating the reflexive behaviors perceived during the activities of reflexive interaction and
task-based applied in the context of drums teaching for children. The hypothesis that reflexive
interaction human/human can be used as an effective resource for the creative process (Addessi,
2012, 2014, 2015) is investigated in the context of teacher-student interaction in drums classes.
The experiment was conducted at a music education school, and involved two drummer students,
one six years old and the other eleven years old. The results indicate that the interaction between
teacher and student was promoted based on the essential conducts for a reflective quality of the
interaction, as imitation/variation, coregulation, turn-taking and temporal contingency. The
interaction activity was an important didactic tool for a work focused on musical creativity,
promoting attentive listening, improvisation, dynamics and the exploration of timbres. New
researches are indicated within the perspective of reflexive interaction and creativity, considering
the field of possibilities to be explored for the area of music and cognition.
Keywords: creativity, reflective interaction, drums.

Introdução
Criatividade pode assumir diversos significados e, neste trabalho, será abordada a partir do
viés teórico da interação reflexiva. O paradigma da interação reflexiva resulta de diversas
pesquisas que estudaram a interação musical entre pais e filhos e entre homem e máquina,

247
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

neste caso, a partir da plataforma MIROR – um sistema musical interativo reflexivo1


(Addessi, 2014, 2015).
A hipótese de que o sistema musical interativo reflexivo (MIROR) promove a
criatividade musical foi estudada e confirmada por Addessi (2014, 2015), tendo como alicerce
teórico pesquisas que estudaram a interação entre humanos, como no caso da interação vocal
entre pais e crianças (Addessi, 2012). No MIROR-Impro, o sistema funciona quando a
criança toca uma frase e ao parar, o sistema gera uma resposta súbita com base naquilo que
foi tocado anteriormente. Esse processo permite, de acordo com Addessi (2015), desenvolver
a criatividade musical do indivíduo. Estudos que buscam relacionar a criatividade com a
interação reflexiva têm sido desenvolvidos por alguns pesquisadores. Um exemplo é o estudo
de Araújo e Addessi (2014), que investigaram a criatividade em um ambiente reflexivo
observando a qualidade do envolvimento da criança na tarefa, por meio da teoria do fluxo
(Csikszentmihalyi, 1996).
A interação reflexiva é uma forma de motivar e reforçar a conduta criativa da criança,
por meio da improvisação musical. Este processo é composto por elementos que garantem a
qualidade reflexiva da interação como a imitação/variação, troca de turno entre os
participantes, contingência temporal e corregulação (Addessi, 2015). Logo, além do caráter
reflexivo, estas condutas são importantes para o desenvolvimento da criatividade musical
Este trabalho se apropria da perspectiva da interação humano/humano, tendo como
objetivo geral verificar os comportamentos reflexivos durante as atividades de interação
reflexiva e de criação aplicadas no contexto do ensino de bateria para crianças. Neste contexto
é investigado a hipótese de que a interação reflexiva humano/humano pode ser considerada
um recurso eficaz para o processo criativo no contexto do ensino de bateria para crianças.

Criatividade musical e a interação reflexiva


Dentre as várias definições para criatividade, a ideia da produção de algo novo, que tenha
certo grau de utilidade, é recorrente na literatura (Sternberg, 2010; Csikszentmihalyi, 1996).
No contexto da interação reflexiva, a criatividade musical tem sido pesquisada sob o viés da
teoria do fluxo, contudo, nesta pesquisa, as condutas consideradas essenciais para garantir a
qualidade reflexiva são incorporadas como elementos para a discussão do processo criativo. 


1
O software MIROR (Music Interaction Relaying On Reflexion) foi desenvolvido no âmbito de um projeto de
pesquisa co-financiado pelo 7° Programa de Pesquisa e Desenvolvimento da União Europeia.

248
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Addessi (2015) reconhece o mecanismo da imitação/variação como um dos princípios


da interação reflexiva de modo que sua natureza está baseada na criação de um diálogo
natural, construído com base em limites biológicos como o erro sensorial, fatiga física, e,
acima de tudo, um equilíbrio entre repetição e novidade (Addessi, 2012, 2015). Na troca de
turno o exercício é ouvir e ser ouvido. É a capacidade de ser sensível para a alternância de
tempo entre os indivíduos que interagem. Assim, o tempo de cada participante deve ser
similar para que haja regularidade, um dos princípios que sustentam a interação reflexiva
(idem). Addessi (2012) explica a contingência temporal utilizando a metáfora da interação
vocal/musical entre mãe e filho. Mãe e filho dialogam, constantemente, num jogo vocal
espontâneo (fato observado particularmente durante a troca de fraldas), mas quando a mãe
não respeita o intervalo de interação ou quando é abusiva na quantidade de estímulo, a criança
apresenta passividade e desorganização. Por fim a corregulação é o momento onde um
participante regula seu comportamento em decorrência do comportamento do outro indivíduo.
Isso ocorre quando o indivíduo leva o outro em consideração (Addessi, 2015).
De acordo com Addessi (2015), a qualidade reflexiva da interação depende do grau em
que estes comportamentos ocorrem, sendo naturalmente essenciais para que o diálogo musical
aconteça.

Metodologia
A experiência didática foi conduzida com duas crianças iniciantes em bateria no fim do ano de
2016, explorando a interação entre professor e aluno. Nesse sentido, foi realizado um teste de
diagnóstico, que é um teste utilizado para investigar os pontos fortes e dificuldades de uma
determinada experiência vivenciada por algum indivíduo (Cohen et. al. 2007). Esse modelo
de teste serviu para descobrir quais os comportamentos humanos do paradigma da interação
reflexiva apareceram durante o experimento, e de que modo eles interferiram no processo
criativo da criança.
Cada experimento foi dividido em três sessões e foi aplicado uma vez com cada
participante. A primeira sessão foi chamada de Exploração, a segunda de Aplicação e a
terceira de Síntese. Para este trabalho foram selecionados para a análise uma atividade da
sessão dois e uma atividade da sessão três de cada experimento aplicado. No primeiro e
segundo experimento, a atividade da sessão dois foi chamada de “espelho com defeito”, onde
o professor imitava aquilo que o aluno tocava no instrumento, porém, inserindo pequenas
alterações. Na sessão chamada Síntese, uma atividade de criação guiada foi aplicada, cabendo

249
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

ao professor narrar uma pequena história, dando espaço para que o aluno explorasse
livremente as possibilidades de sonorização.
Para o experimento foram selecionadas duas crianças, uma de seis e outra de onze anos,
que estavam frequentando regularmente aulas de bateria em uma escola especializada no
ensino de música, localizada na cidade de Curitiba-PR.
O teste foi aplicado em uma sala previamente preparada, contendo duas baterias
acústicas dispostas uma em frente da outra, equipadas com pratos e banco, dois pares de
baquetas e duas câmeras digitais.
Todas as sessões foram gravadas no formato de áudio/vídeo. Após cada experimento o
professor realizou algumas observações no formato de um diário de campo.

Discussão
Os dados serão descritos e analisados a partir dos comportamentos reflexivos apresentados
pelas crianças ao decorrer de cada atividade. Os gráficos ajudam a compreender os
comportamentos percebidos e sua frequência.

Comportamentos reflexivos durante as atividades de interação e criação guiada


Durante as atividades de interação, selecionadas para análise neste texto, foram percebidos
vários fenômenos. Na sessão com a criança de seis anos o tempo de duração da atividade de
interação foi de 50 segundos, já o da criança de onze anos foi maior, durando 2 minutos e 50
segundos (ver Figura 2). Na figura 1 é possível observar alguns dados:
• A criança de onze anos apresentou índice maior de imitação/variação,
corregulação e troca de turnos comparado à criança de seis anos.
• A criança de seis anos propôs um número maior de frases não correguladas.
• A criança de onze anos constantemente improvisou e variou suas frases a partir
das respostas do professor, se adaptando com mais facilidade ao estilo interativo
reflexivo da atividade comparado a criança de seis anos.

250
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Frequência dos comportamentos reflexivos durante a


atividade de interação "espelho com defeito"
18 17
16 16

14
Número de vezes

9
6
5
5 3 3
1
0
Imitação/variação Corregulação Criança propõe outra frase Toca de turno

Criança de 6 anos Criança de 11 anos


Colunas1

Figura 1

Na sessão da atividade de criação guiada, a criança de seis anos demonstrou estar mais
envolvida, contudo, seu tempo de interação também foi curto (figura 3). O gráfico 2
demonstra a ausência de corregulação por parte da criança de seis anos, indicando que não
houve o jogo de interação de modo que as frases tocadas pelo professor não interferiram
naquilo que a criança executou. A criança de 11 anos apresentou frases mais longas,
interagindo com as respostas do professor e alternando os turnos de maneira natural. O tempo
de turno da criança de 11 anos foi maior tanto na atividade de interação como na atividade
guiada (figura 3).
Frequência dos comportamentos reflexivos durante a
atividade de criação guiada
16 15
Número de vezes

12

4
4 3 3 3 3
2
0
0
Imitação/variação Corregulação Criança propõe outra frase Troca de turno

Criança de 6 anos criança de 11 anos


Colunas1

Figura 2

251
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Duração dos turnos


3,00

2,5

Minutos 2,25

1,50
1,09

0,75
0,5 0,46

0,00
Atividade de interação

Criança 6 aos Criança de 11 anos


Professor

Figura 3

Qualidade musical dos comportamentos observados


A capacidade de gerar novas ideias musicais é essencial para um processo criativo (Webster,
2002). O caráter reflexivo que o professor exerceu durante a atividade de interação
possibilitou que a criança sempre estivesse propondo ideias musicais de modo que o seu
próprio vocabulário musical era reforçado pelo professor por meio das respostas imitadas com
certo grau de variação. Nesse sentido, a criança de onze anos compreendeu rapidamente o
exercício de ouvir e ser ouvida, possibilitando a troca de turnos baseada no exercício contínuo
de improvisação. Estes mecanismos corroboram para gerar um diálogo criativo significativo
(Addessi, 2012).
Na atividade de interação, onde o professor atuava apenas como um “espelho
inteligente”, a criança de onze anos apresentou índices maiores das condutas. Assim, a
passividade do professor parece ter corroborado para que a criança estivesse mais à vontade
para propor contínuas variações, importantes para a manutenção do diálogo (Addessi, 2014).
A criança de seis anos executou frases mais curtas durante a interação, contudo, imitou/variou
além de reconhecer que foi imitada, regulando suas frases a partir das respostas que o
professor oferecia. Nesse sentido, os mecanismos necessários para a interação reflexiva foram
encontrados (Addessi, 2012, 2015). Já na atividade de criação guiada, a criança de seis anos
explorou mais suas próprias frases sem considerar aquilo que o professor tocava, ou seja, não
houve corregulação.

252
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Isso não afetou o processo de criação, contudo, comparando as frases executadas em


cada uma das atividades, é possível perceber que na atividade de interação houve um número
maior de variações na estrutura rítmica, dinâmica e de timbres explorados no instrumento.
A criança de onze anos, em geral, correspondeu melhor durante as atividades e
apresentou um vocabulário musical mais extenso, provavelmente decorrente de seu tempo de
aprendizado maior com o instrumento. Sternberg (2010) enfatiza a perspectiva de criatividade
resultando de um processo de profundo domínio de determinado aspecto que permite ao
indivíduo divergir e assim variar e criar produtos inovadores. Isso pode responder o fato da
criança de seis anos apresentar números inferiores das condutas musicais bem como do tempo
total de turnos.

Considerações finais
Neste estudo foram observadas e discutidas alguns dos comportamentos essenciais para a
interação reflexiva considerando seu potencial para promover a criatividade musical (Addessi,
2014). Os comportamentos analisados permitiram ilustrar a qualidade reflexiva tanto da
atividade de interação como da atividade de criação. Apenas na atividade de criação aplicada
com a criança de seis anos não foi percebido a corregulação, o que parece ter interferido no
jogo de interação entre a criança e professor.
A hipótese da interação reflexiva humano/humano como um recurso para o processo
criativo necessita de mais dados para que possa ser confirmada, contudo, os resultados
indicam que as crianças apresentaram alguns comportamentos importantes para o aprendizado
musical como a escuta atenta, exploração de timbres no instrumento, dinâmica, improvisação
e criação. Estes comportamentos foram encontrados em outras pesquisas utilizando o software
Miror-Impro, como em Addessi (2015).
Do ponto de vista de ferramentas que estimulem o desenvolvimento da criatividade
musical, a interação reflexiva como recurso pedagógico apresentou possibilidades de
exploração no contexto do ensino de instrumento. De um modo geral, a duração do exercício
interativo reflexivo esteve atrelado ao grau de conhecimento apresentado por cada criança no
instrumento, confirmando a ideia de Sternberg (2010) a respeito da importância do
conhecimento como um recurso que potencializa a experiência criativa.
Os elementos que garantem a qualidade reflexiva da experiência, como o mecanismo de
espelhamento de imitação/variação, corregulação, troca de turno, compõem um arcabouço
teórico importante para discutir a criatividade musical no contexto do ensino de instrumento,

253
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

sendo preciso novas pesquisas que explorem tanto a interação humano-humano, como a
interação homem-máquina no ambiente reflexivo.

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254
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Investigações sobre a relação de expertise musical e expertise pedagógica

Anderson César Alves


Universidade Federal do Rio de Janeiro
andersoncesar@id.uff.br

Resumo: Este artigo discute a construção da expertise entre clarinetistas brasileiros. Teve como
objetivos investigar a aquisição da expertise na performance dos participantes, analisando,
particularmente, o papel dos professores no desenvolvimento dessa expertise em performance
musical. O trabalho parte de referenciais teóricos seminais como Dreyfus e Dreyfus (1980), Berliner
(1986,1988), Ericsson et al. (1993) e discute pesquisas mais recentes em torno da expertise musical.
Como estratégia metodológica utilizou-se a entrevista semiestruturada, com quatro clarinetistas
experts. As análises foram realizadas a partir do cotejo entre os discursos dos participantes e a
literatura sobre expertise musical e expertise pedagógica. Através desse processo, foi possível
identificar que professores de clarinete de alto desempenho pedagógico são fundamentais para a
construção do alto nível técnico e artístico das performances musicais dos seus alunos
Palavras-chave: expertise na clarineta, professor expert, pedagogia da performance musical,
expertise artística, expertise pedagógica.

Investigation about the relation between musical expertise and expertise in pedagogy
Astract: This paper discusses the development of expertise between Brazilian clarinetists. The
objective of this research was to investigate the acquisition of musical performance expertise in the
research subjects, focusing on the importance of the Teacher in the development of said expertise. The
research stems from the theoretical works of Dreyfus & Dreyfus (1980), Berliner (1986,1988),
Ericsson et al. (1993) and also more modern researches about musical expertise. The methodology
consisted of semistructured interviews with four expert clarinet players. The analysis was made based
on the excerts between the participants discourse and the references about musical expertise and
pedagogy expertise. Through this process it became identifiable that highly pedagogically oriented
clarinet Teachers are essential for the development of a high technical and artistic level in the musical
performance of their students.
Keywords: clarinet expertise, expert professor, pedagogy of music performance, artistry expertise,
pedagogical expertise.

A performance musical pode ser caracterizada pela realização artística em um instrumento


musical, e envolve controlar os processos cognitivos relacionados à performance. A
performance pode ser construída na interação entre aspectos técnicos, aspectos interpretativos
e estratégias individuais desenvolvidas em longo prazo, que podem contribuir para que os
músicos obtenham performances experts.
As pesquisas sobre expertise são derivadas de registros a partir de estudos empíricos em
diferentes campos, e os dados demonstraram fatores determinantes para o alcance do
desempenho superior que perpassa por diferentes domínios. O volume diminuto de pesquisas
sobre expertise do professor de instrumento pode estar relacionado às particularidades
intrínsecas da relação professor-aluno, que é distinta do modelo convencional de ensino em
outras áreas (Duke & Simmons, 2006).

!1
255
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Encontramos clarinetistas brasileiros considerados experts, atuando como professores, e


isso instigou-me a investigar as práticas utilizadas pelos professores de clarineta que levaram
determinados estudantes à condição de solistas de alto nível. Expertise pode ser definida
como a capacidade, adquirida pelo exercício prático, de desempenhar qualitativamente bem
uma tarefa particular de domínio específico (Frensch & Stenberg, 1989, p. 158). Ericsson e
Lehman (1996) consideram que a expertise na área de música está associada ao desempenho
técnico de um músico, sendo este provido, ao longo do tempo, por meio do estudo deliberado
e de uma série de estratégias para resolução de problemas.
Esse artigo vai discutir os resultados parciais da minha pesquisa, que buscou investigar
o alto nível de performance de clarinetistas observados no Brasil. Nos resultados apresentados
pude verificar que o nível alto nível de performance de clarinetistas está diretamente
relacionado a práticas pedagógicas de alto nível de seus professores, e a hipótese levantada
nesse artigo é de que o desenvolvimento da expertise da performance é relacionado à
qualidade no acesso a professores de alto desempenho. Os resultados parciais corroboram a
hipótese de que a expertise musical está diretamente relacionada ao acesso a professores
experts em sua formação.

Teorias da expertise
No contexto da psicologia cognitiva, a pesquisa sobre expertise é classificada em três
gerações de teorias. A primeira geração da teoria da expertise foi influenciada pelos trabalhos
de Newell e Simon (1972), que eram centrados nas teorias de resolução de problemas por
meio dos métodos heurísticos, que poderiam ser aplicados em vários domínios com um
mínimo de conhecimento sobre o conteúdo de cada domínio particular. Essa técnica consiste
na capacidade de reduzir as respostas possíveis ao problema, aplicando métodos gerais de
resolução em qualquer domínio, independentemente de seu conteúdo (Galvão, 2003). A
segunda geração de teorias da expertise foi fundamentada na arquitetura cognitiva
denominada sistema de produção serial desenvolvida por Newell (1973) que criou ligações
entre a ciência cognitiva e a inteligência artificial, que originou-se uma ciência cognitiva
interdisciplinar. O sistema de produção em série simula o desempenho inteligente humano, no
qual a informação é tratada em série, e dirigida por meio de sequências lineares de
informações, porém é limitada somente a uma realização por vez. A terceira geração é o
conexionismo simbólico, no qual as informações são interconectadas à uma rede neural. O

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256
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

paralelismo proposto pelo modelo conexionista suporta a representação do conhecimento, e as


decisões são baseadas nas interações entre as conexões neurais (Holyoak, 1994).

Expertise em pedagogia
As pesquisas sobre expertise em diferentes domínios começaram a ser desenvolvidas a partir
de 1980, sobretudo na área da pedagogia. Nessas pesquisas as características de indivíduos
que apresentavam performance superior despertou o interesses dos pesquisadores das áreas
educacionais, pois as qualidades desses indivíduos se relacionava diretamente com às
características de professores eficientes. Isso despertou o interesse do pesquisador Berliner
(1988) que adaptou o modelo heurístico de desenvolvimento de habilidades proposto pelos
dois irmãos professores da Universidade da Califórnia: o filosofo Hubert Dreyfus, e o
cientista da computação Stuart Dreyfus para o desenvolvimento das expertises pedagógicas.
Baseado nesse modelo de desenvolvimento de habilidades de Dreyfus e Dreyfus (1980),
o pesquisador Berliner (1988) apresentou cinco estágios do desenvolvimento proposto no
modelo tais como: novato, iniciante avançado, competente, proficiente e expert.
O primeiro estágio é o professor novato. Seu comportamento é racional e relativamente
inflexível, e tende a seguir regras e procedimentos que foram instruídos a seguir, e espera-se a
performance dentro de um limite, e a experiência do mundo real parece ser muito mais
importante do que a informação verbal. O segundo estágio é o professor iniciante avançado, e
sua experiência se relaciona com o conhecimento verbal, no qual as semelhanças entre
contextos são reconhecidas e o conhecimento epísódico é construído. O conhecimento
estratégico adquirido permite seguir as regras estabelecidas ou mesmo ignorá-las. O terceiro
estágio é o professor competente, e suas escolhas são conscientes sobre o que irão fazer,
estabelecendo prioridades e decisões sobre esse planejamentos. Os objetivos são bem
definidos, e sabem meios pelos quais alcancarão esses objetivos previamente definidos. O
quarto estágio é o professor proficiente, que desenvolveu intuição e know-how por meio da
experiencia acumulada, reconhecendo similaridades que permitem prever com precisão
eventos. O professor proficiente, embora intuitivo no reconhecimento de padrões e nas formas
de conhecimento, ainda é analítico e deliberativo nas tomadas de decisão. E o último estágio é
o professor expert. Os autores apresentam que os professores novatos, iniciantes avançados, e
competentes são racionais, os professores proficientes são intuitivos, e os professores experts
desenvolveram a habilidade de compreender a situação de maneiras não analíticas, e suas
decisões são tomadas de forma não-deliberativas.

!3
257
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Foi necessário estabelecer um conjunto de critérios para definir as características do


professor expert no ensino do instrumento . Segundo Berliner (2004) uma das formas de
avaliar o desempenho do professor expert está associado diretamente ao nível de performance
de seus estudantes. Ainda segundo o autor, tornar se um professor expert leva cerca de sete a
dez anos em seu domínio de atuação. Nesse ponto, as características entre a expertise do
professor e o desenvolvimento da expertise do instrumentista coincidem, pois, como Ericsson
e colaboradores (1993), Williamon (2004), Gomes (2008) discutiram em seus artigos que a
expertise musical também seria alcançada após dez mil horas de prática deliberada. Estes
autores evidenciaram que a expertise em vários domínios específicos é alcançada após dez
anos de estudo, e mesmo após atingir a expertise musical, há a necessidade de continuar os
estudos sistemáticos como forma de manter o alto nível de performance em longo prazo.

“Muitos exercícios que ele criava, assim, eram criações dele”

Em pesquisa anterior sobre a construção da expertise de clarinetistas, realizei entrevistas


semiestruturadas com quatro clarinetistas de orquestras brasileiras, incontestavelmente
reconhecidos pelos pares como performers experts. O critério para a escolha dos quatro
clarinetistas em minha pesquisa anterior ocorreu da seguinte forma: primeiramente, o
principal fator foi o alto nível de desempenho observado em suas performances musicais, em
segundo lugar, deveriam ser chefes de naipes das principais orquestras sinfônicas nacionais, e
por último, não poderiam conhecer as terminologias usadas pela psicologia da música.
Iniciei a nova pesquisa dedicada à investigação da construção da expertise pedagógica
de professores de clarineta, analisando o conteúdo dos depoimentos colhidos anteriormente,
estritamente relacionados às descrições de procedimentos metodológicos adotados pelos
professores desses depoentes em sua prática pedagógica no instrumento, e acerca da
relevância que estes professores tiveram para que seus estudantes tivessem construído suas
competências artísticas.
Nessa pesquisa anterior sobre expertise na performance da clarineta a ferramenta
principal de suporte metodológico foi a entrevista semiestruturada, que busca explorar
elementos mais subjetivos e complexos que não podem ser obtidos por meios quantitativos
tradicionais (Gaskell, 2002). O roteiro dessa entrevista foi elaborado a partir de quatro
questionamentos. A narrativa dos participantes foram transcritas, e isso possibilitou chegar a
conclusões aprofundadas a respeito das estratégias de preparação da performance desses
clarinetistas. O discurso dos participantes foi cotejado como forma de dialogar com a

!4
258
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

literatura de referência em psicologia cognitiva, psicologia da música e psicologia da


educação.
O método que desenvolvo agora é diferente do método que utilizei na fase anterior da
pesquisa. A coleta dos dados ocorrerá por meio da triangulação entre a análise de protocolo,
entrevista semiestruturada, análise de conteúdo. A análise de protocolo consiste na observação
e filmagem da aula, com a finalidade de compreender os procedimentos que estão por trás das
ações pedagógicas desses professores de instrumento (Ericsson, 2006).
No presente artigo exemplifico o procedimento abordando o depoimento de apenas um
dos instrumentistas entrevistados em minha pesquisa anterior. Segue o trecho no qual o
participante evidencia a atuação de seu professor. Em dado momento da entrevista ele destaca
a importância fundamental dos professores iniciais em sua formação. Seu professor
recomendou-lhe que fosse estudar com outro professor, por ele indicado:
Meu primeiro professor falou assim: eu gostaria que você fosse estudar com o
Professor Fulano, que foi meu professor. Aí foi quando eu fui fazer um teste numa
Universidade, que tinha acabado de começar (...), e eu passei no teste e comecei a
fazer aula com o professor que me foi indicado.

O professor expert desenvolve formas espontâneas de atuação e, caso os procedimentos


não sejam executados conforme o planejado, novos processos são evocados como forma de
resolver o problema (Berliner, 1988):
Nesse início, eu lembro que fiquei fazendo muitas aulas, fazendo muitos exercícios
que ele criava, assim, eram criações dele, como notas longas, sonoridade, intervalos
cromáticos, muito concentrados na manutenção da embocadura e da coluna de ar.
Então, eu lembro que ficamos muito tempo batendo nessa tecla. Aí, passando esse
primeiro estágio, ele começou a entrar como o Demnitz [Método Elementar para
Clarineta], o primeiro caderno do Rose [32 estudos for clarinete], o Baerman
[Método para Clarinete], o Kroepsh [declarar o título da obra], aí eu comecei fazer
peças do tipo Concertino de Weber.

Outro depoimento que corrobora a importância do pedagogia do professor na


construção da prática efetiva do aluno. O participante relata que seu professor elaborava e
criava os exercícios em sala de aula, e somente depois de um tempo ele começou a utilizar o
método Klose da escola Francesa de clarinete.
No começo, as aulas de clarinete giravam em torno das coisas que o meu professor
escrevia, assim escalas em semibreve e foi aumentando, ele escrevendo, aí depois
ele começou a pegar umas lições de alguns métodos como o Klose.

Neste trecho o participante declara que devido à grande dificuldade que tinha em refinar
sua técnica, seu professor ficava muito tempo com ele, e isso ajudou-o a organizar seu

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259
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

pensamento. Declara ainda em outro trecho que o professor o instruir a sempre ouvir
gravações, e após ouvir, sua cabeça armazenava as informações, e assim ia aprendendo. Ou
seja, esse sugestão indicada pelo professor auxiliou-o na memorização das peças musicais.
Segue o trecho dessa narrativa:
Meu professor ficava muito comigo, pois eu era uma pessoa que tinha dificuldade
para refinar a minha técnica. Ele me ajudou a começar pensar nessas coisas, enfim
ele organizou meu pensamento. Uma coisa positiva que meu professor instruiu era
ouvir muito gravações de boa qualidade. E eu lembro que ele falava: não fica só
ouvindo clarinete, ouve piano, violino, e eu sempre ouvi, e minha cabeça
armazenava muito aquilo que eu ouvia, e eu ia aprendendo junto com isso.

Nesse trecho fica evidente que os processos utilizados pelo professor consistem nas
etapas do planejamento estratégico da prática deliberada, tais como: elaboração de estratégias
de estudo diário, com metas estabelecidas e objetivos definidos. A seguir o trecho que
evidencia o planejamento de estudos do participante elaborado por seu professor:
Meu professor elaborou um plano de estudo diário para mim que incluía, vinte
minutos de nota longa, uma hora de escalas, 40 minutos de estudos, e uma hora de
peças diversas, que incluía sempre uma peça solo, uma sonata e um concerto. Então
ficou mais ou menos estabelecido um tempo de três ou quatro horas diárias

Os professores experts são mais sensíveis às demandas da tarefa e à situação social


quando resolvem problemas, e possuem padrões mais rápidos e precisos de reconhecimento
de capacidades de seus alunos (Berliner, 2001, 2004). Segue o relato do Fernando, que
evidencia a capacidade de resolução de problemas que seu professor utilizou naquele
momento:
Quando eu comecei a ter aula com meu professor, ele me perguntou se eu estava
fazendo aulas de matérias teóricas, e como estava meu contato com aulas de teoria e
harmonia. Eu falei: - professor, lá na escola de música da minha cidade, a gente não
tem isso, tinha somente aula de solfejo. Ele falou: então você tem que procurar
alguma dessas aulas. Ele me disse para procurar a escola de música no interior de
São Paulo, que era uma escola de referência. Então, ele falou assim: vai ver se você
consegue ter contato com uma dessas aulas que isso vai ser muito importante para
você. - Eu fui pra escola de música e me matriculei nas aulas de harmonia, teoria e
história da música.

Esse professor desenvolveu a habilidade de observar os contextos sociais do aluno,


analisando também elementos extrínsecos à própria performance, encaminhando-o para
melhorar a formação musical. A análise da fala do participante sugere que o professor
percebeu uma formação superficial na sua iniciação musical, e sugeriu que procurasse uma
renomada escola de música no interior de São Paulo, como forma de melhorar essa formação.
A força dessa narrativa mostrou o importante papel que esse professor teve na estruturação,

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260
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

construção da performance, e reconhecimento da capacidade desse aluno, e isso foi


fundamental para sua formação musical completa desse participante

Considerações finais
A literatura sobre expertise em docência se desenvolveu principalmente na área educacional e
o objetivo principal dessas pesquisas consiste em investigar a aquisição da expertise
pedagógica. Os primeiros pesquisadores que investigaram a aplicação dos resultados obtidos
em Educação e Psicologia à prática musical, evidenciaram desempenhos de notáveis
professores de música em geral, mas não puderam desenvolver investigação igualmente
consistente no campo da pedagogia da performance musical. Dentre outras questões que vêm
sendo abordadas mais recentemente, no Brasil e no exterior, destaco: como um determinado
professor de instrumento tornou-se um professor expert ?
A investigação inicial de minha pesquisa atual teve por objetivo principal analisar o que
declararam quatro clarinetistas brasileiros reconhecidos como experts, acerca do desempenho
de seus professores e do papel que este desempenho teve no desenvolvimento dos alunos
como instrumentistas experts. Com base na análise preliminar desses dados surgiu a questão:
em que medida suas expertises em performance na clarineta estariam fundamentadas no alto
desempenho pedagógico de seus professores? Os resultados preliminares dessa análise
cotejado com o quadro teórico construído até aqui vêm evidenciando que sim. Contudo, as
análises também apontaram lacunas teóricas que exigem preenchimento, a fim de
possibilitarem um aprofundamento da avaliação das práticas pedagógicas desses professores
e, enfim, fundamentarem um exame mais objetivo: (1) da relação entre expertise pedagógica e
competência artística do estudante de performance musical; e (2) da relação entre expertise
artística e competência do professor de performance musical.

Referências
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Colleges for Teacher Education. (1-35). Washington, DC.
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accomplishments. In: Obiols, R. B.; Martínez, & A. E. et al (Orgs.). De la teoria… a
l’aula: formación del professorat i ensenyament de las Ciências Socials. (13-28).
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261
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

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directed skill acquisition. Berkeley, University of California: Operations Research
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Ericsson, K. A., Krampe R. T. H., & Tesch-Römer C. (1993). The role of deliberate practice in
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know better? In: Sternberg, R. J.(Org.). Advances in the psychology of human
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Galvão, A. C. T. (2003). Pesquisa sobre expertise: perspectivas e limitações. Temas em
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Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático. (pp.64-89)
Tradução Pedrinho A. Guareschi. Petrópolis: Vozes.
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(Dissertação de Mestrado), Universidade Católica de Brasília, Brasília, DF, Brasil.
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Williamon, Aaron (2004) Practice Strategies. Musical Excellence. Oxford, UK: Oxford
University Press.
Entrevista semiestruturada com o participante realizada no dia 23/03/2012. São Paulo.
Registro em áudio. São Paulo SP.

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262
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

A expertise musical de Egberto Gismonti sugere o planejamento de práticas


deliberadas alternativas: um estudo preliminar

Vinicius Bastos Gomes


Universidade Federal do Paraná
viniciusbastosgomes@gmail.com

Danilo Ramos
Universidade Federal do Paraná
daniloramosufpr@gmail.com

Resumo: A literatura acerca da expertise mostra que as habilidades a serem desenvolvidas pelos
indivíduos podem variar significativamente, mesmo dentro de um domínio. No âmbito da música, o
fazer pode possuir comportamentos diferentes, especialmente em relação ao repertório musical a ser
executado, que influenciará a prática deliberada, caminho mais indicado para a obtenção de uma
performance em nível de expert. Egberto Gismonti, multi-instrumentista e compositor brasileiro de
renome internacional, costumou, ao longo de sua carreira, realizar ao piano performances de modo a
encará-las de maneira pouco convencional. O objetivo desta pesquisa é realizar uma reflexão sobre
uma concepção de performance e um modo de encarar a prática deliberada baseados em relatos de
Gismonti. Para isso, depoimentos do músico a respeito da maneira como ele considera sua
performance e sua prática deliberada foram coletados e analisados em relação à literatura disponível
sobre o tema. Os resultados apontam que a interpretação musical de Gismonti tem como um dos
objetivos principais a criação de recursos cognitivo-motores para variar a performance de sua música
a cada exposição de suas partes em termos de forma, sonoridade, harmonia, acompanhamentos e
melodia. Conclui-se, portanto, que é necessário que haja o planejamento de práticas deliberadas
afinadas diretamente com esse propósito, no intuito de trazer alternativas estratégicas para que
estudantes de piano possam realizar performances musicais como aquelas do compositor em questão.
Palavras-chave: expertise, prática deliberada, Egberto Gismonti.

Egberto Gismonti’s musical expertise suggests the planning of an alternate deliberate practice: a
preliminary study
Abstract: The literature about expertise shows that skills to be developed by individuals can vary
significantly, even within a domain. In a music context, the musical making may have different
behaviours, especially in relation to the musical repertoire to be performed, which will influence the
deliberate practice, the most suitable way to obtain performance at the expert level. Egberto Gismonti,
a multi-instrumentalist and internationally renowned Brazilian composer, used throughout his career
to perform piano performances in an unconventional way. The objective of this research is to carry out
a reflection about a conception of performance and a way of facing the deliberate practice based on
Gismonti's reports. For this, the musician's statements about the way he considers his performance and
his deliberate practice were collected and analyzed in relation to the available literature about the
subject. The results point out that Gismonti's musical interpretation has as one of the main objectives
the creation of cognitive-motor resources to vary the performance of his music to each exposition of
its parts in terms of form, sonority, harmony, accompaniments and melody. It is concluded, therefore,
that there is a need for the planning of deliberate practices directly attuned to this purpose, in order to
bring strategic alternatives for students achieve musical performances such as those of the composer
in question.
Key-words: expertise, deliberate practice, Egberto Gismonti.

Introdução e objetivo
Por expert, entende-se alguém amplamente reconhecido como uma fonte confiável de

263
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

conhecimento, técnica, habilidade, cuja capacidade de julgamento é dotada de autoridade,


corroborada pelo público ou por seus pares. Nesse sentido, a expertise pode ser definida como
o conjunto de características, habilidades e conhecimentos que distinguem experts de
principiantes e de pessoas de menor experiência (Ericsson, 2006). Já a performance em nível
de expert é considerada consistente, mensurável e reprodutível a partir dos principais experts
do mundo nos mais variados domínios (Ericsson, 1996).
Chi (2006) apresenta diversas características acerca da expertise, das quais quatro são
aqui apresentadas: (a) a expertise é limitada ao domínio; (b) a expertise é limitada a um
contexto dentro de um domínio; (c) experts são mais bem sucedidos em escolhas de
estratégias apropriadas para a resolução de problemas; (d) experts são mais oportunistas na
utilização de recursos (informações disponíveis) para a solução de problemas. Um exemplo
dessas constatações é o fato de que jogadores experts de xadrez só apresentam uma
memorização para uma quantidade maior de peças em um tabuleiro em relação a não-experts,
mas apenas quando a organização delas remonta em uma situação real de jogo.

Como caminho para alcançar a performance em nível de expert, Ericsson, Krampe e


Tesch-Romer (1993) propuseram a prática deliberada, uma atividade altamente estruturada,
cujo objetivo explícito é melhorar o desempenho do indivíduo nas mais variadas tarefas no
qual ele está submetido (Ericsson et al., 1993). Segundo o autor, essa prática só pode ser
desenvolvida por indivíduos que almejam a aquisição contínua de algum progresso em sua
performance (Ericsson, 2006, p.694). Segundo Lehmann, Sloboda e Woody (2007), esse tipo
considera a aquisição de objetivos específicos que, de certa forma, estão um pouco acima do
nível de performance atual do indivíduo e as tentativas de atingi-lo são feitas em momentos
de grande concentração.
A performance musical é definida por Ray (2005) como o momento em que o músico
(instrumentista, cantor ou regente) executa uma obra musical exposto à crítica de uma plateia
ou mesmo de um ou mais professores, simulando, assim, uma apresentação. Assim, uma
performance musical pode requerer habilidades diferentes dos músicos que se propõem a
executá-la, dependendo de seu contexto. Nesse sentido, a grosso modo, é comum que a
performance de um pianista de jazz dependa, em grande parte do tempo, da habilidade de
criar melodias sobre harmonias pré-estabelecidas e que a performance de um músico de
concerto dependa, também em grande parte do tempo, da habilidade de reproduzir um texto
musical escrito por um compositor e, com as diferenças interpretativas voltadas para aspectos
diferentes dos de um performers de jazz.

264
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

O compositor e multi-instrumentista brasileiro Egberto Gismonti, um expert de


carreira internacional, apresenta uma maneira bastante particular de encarar suas
performances ao piano. Nesse caso, o músico, compositor e intérprete de sua própria obra
possui uma música que transcende os limites entre as nomeadas música popular e de concerto,
demonstrando objetivos sonoros pouco usuais quando está no palco. Tais objetivos costumam
confundir os estudantes de música aspirantes a uma expertise similar, principalmente no que
diz respeito a como devem proceder com relação à prática deliberada a ser desenvolvida para
a execução de sua obra.
Segundo Duke, Simmons e Cash (2009), poucos estudos dedicaram-se à maneira com
que experts desenvolvem sua prática deliberada. Ainda que o volume de estudos a respeito da
prática deliberada tenha aumentado, grande parte dedica-se às estratégias de desenvolvimento
num processo no qual o intérprete executa peças musicais escritas. Uma quantidade menor de
estudos envolvem a prática jazzista e uma quantidade ainda menor dedica-se ao estudo de
práticas similares às de Egberto Gismonti. Sendo assim, o objetivo deste artigo é realizar uma
reflexão sobre uma concepção de performance e um modo de encarar a prática deliberada
baseados em relatos do compositor e multi-instrumentista brasileiro Egberto Gimonti.

Metodologia
Segundo Gil (2002), a pesquisa documental vale-se de materiais que não recebem ainda
tratamento analítico, ou que ainda podem ser reelaborados de acordo com o objetivo da
pesquisa. Desse modo, o método utilizado na presente pesquisa foi o documental de caráter
exploratório interpretativo, a partir de depoimentos de Egberto Gismonti encontrados na
dissertação A Interpretação e o pianismo de Egberto Gismonti em sua obra "Sonhos de
Recife” (2005) de Cândida Silva, que tivessem foco no tema expertise e sua prática
deliberada.

Material, procedimentos e análise de dados: para a coleta de dados foi necessário um


MacBook Pro e os depoimentos de Egberto Gismonti. Os excertos encontrados foram
categorizados em dois grupos: o primeiro com indicações de como Gismonti concebe o seu
próprio fazer musical enquanto performer e o segundo com indicações de como o músico
procedeu com relação a sua prática deliberada no curso de sua carreira musical. Os
depoimentos foram tabulados e analisados em relação aos dois grupos acima mencionados.

265
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Resultados
São apresentados aqui alguns dos resultados mais expressivos para os objetivos desse estudo.
No grupo 1, sobre como Egberto Gismonti concebe sua performance, foram encontrados os
seguintes relatos:

“Se eu conhecer as outras partes e a minha, e a coordenação delas, qualquer acontecimento que
não seja aquele que esteja previsto não é um erro. É uma abertura. Pode ser chamada de
improvisação, ou uma brecha que abriu. Quantas vezes você estava pretendendo tocar notas tais e
por um descuido qualquer você tocou outra, que te pareceu muito melhor? A liberdade ou a
preparação para um concerto é que você tem que ficar tão veloz, [que] qualquer ocasional que
aconteça e que seja bom te faça esquecer o que estava combinado. Você vai seguindo a música
que está se apresentando pra você. Esse é o processo de preparação que não dura uma temporada,
nem duas; dura a vida. [...]” (Silva, 2006, p.61).

“Para aqueles que têm uma leitura profunda, a compreensão é muito mais ampla, porque não é um
compasso, é o contexto todo. Leva isso para um ator: você nunca vai ver a Fernanda Montenegro
gaguejar uma peça, ou parar, porque se ela esquece 1, 2, 3, 4, 5 palavras, ela lembra as outras 15
mil. Porque o que interessa são as 15 mil, e não as 10” (Silva, 2006, p.61).

“Mas eu, como compositor, passei a não considerar mais nenhum erro de nada, até porque eu já
errei e qualifiquei muito o que eu estava fazendo. Muitas vezes eu toquei coisas erradas e pensei
“Mas isso aí é muito melhor do que eu tinha pensado!” (Silva, 2006, p.61).

No grupo 2, sobre a prática deliberada do compositor foram encontrados os seguintes


relatos:

“Várias vezes eu fui repreendido pelos meus professores porque eu ficava brincando com esses
exercícios, e fazendo tentativas de coisas que teoricamente eram impossíveis, mas hoje eu
faço” (Silva, 2006, p.53).

“Escalas eu adorava, e praticava de maneira que uma mão estava numa diferença de um semitom
em relação à outra” (Silva, 2006, p.53).

“Tem gente que precisa estudar muito, outras nem tanto. [...] Mais ou menos isso o que eu aprendi
na prática, quando me dei conta que essa minha desordem era em função de uma ordem que me
deram. E eu, a vida inteira, nunca segui nenhuma ordem. Essa desordem criou-se desde que eu era
muito pequeno” [...] (Silva, 2006, p.53).

“Nos estudos técnicos, Behringer, Czerny, há muitos e muitos anos, eu encontrava o que gostava,
porque aquilo ali é só uma questão de você praticar o que você quer ouvir. Aquilo é muito chato,
mas se você quiser, você harmoniza de uma maneira muito interessante, ou torna ritmicamente
interessante. Eu não tinha consciência de que eu estava iniciando um processo de exercício para
independência. Por várias vezes eu mostrei esses exercícios, já aqui no Rio, para pessoas como
Dulce Vaz Siqueira, Aurélio Silveira, acentuando uma mão diferente da outra. Mas com o tempo
eles começaram a aceitar. Era tradicional, mas não totalmente” (Silva, 2006, p.54).

“O que eu tenho absoluta certeza é que eu nunca gostei da repetição técnica para me libertar a ser
um bom intérprete. Eu nunca acreditei que isso liberta o intérprete” (Silva, 2006, p.57).

266
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Gismonti fala ainda sobre sua prática atual:

“Qualquer pianista tradicional que faz uma carreira como intérprete, que é o meu caso, se prepara
igualmente para todas as performances. Seguramente, ele vai sofrer muito mais do que deveria.
Porque se ele se prepara no nível técnico para a melhor performance do mundo, e não encontra,
em 90% dos locais, o piano que ele precisa, ele vai se aborrecer e isso vai interferir. Aí, o que eu
falei: é o emocional, não é o sensorial. Prepare a música, não o piano. [...] Eu estou falando de
preparação, só não é a tradicional [...]. Então, a preparação é relativa, e é específica” (Silva, 2006,
p.59).

“A preparação é sempre relacionada a onde é, à qualidade do local, quem é o parceiro ou não, o


tamanho... Tudo isso influencia” (Silva, 2006, p.60).

“Então quando eu digo que me preparei, eu me preparei para tocar aquela sala. Não é tocar
naquela sala, mas tocar aquela sala. Tanto que faz parte da preparação técnica, independente de
quanto eu estudei...” (Silva, 2006, p.60).

“Quando eu chego no Colón, faço “plin” e o teatro faz “roooom”, ele está conversando comigo.
[...] “Eu não vim aqui pra tocar piano, eu vim tocar piano nesse teatro. Se não, eu ficava em casa”.
Se o teatro passou a ser o segundo estágio da composição, que é o intérprete, aí o “Frevo” passou
a ser [canta um trecho da música liricamente]. Essa liberdade é evidente que eu admito
[...]” (Silva, 2006, p.66).

Discussão
Os depoimentos acima encontrados apresentam traços comportamentais bastante singulares
de Gismonti enquanto intérprete. Em sua análise sobre o disco Alma, Gomes (2015) considera
a forma, a sonoridade, as harmonias, os acompanhamentos e a melodia como recursos
utilizados pelo compositor para criar variação para as performances e, embora as seções das
músicas se repitam, há sempre algo que costuma ser modificado entre a exposição e uma
reexposição. Gismonti também varia bastante a sonoridade de suas interpretações. Tanto a
alteração de dinâmicas, quanto de articulações são usadas para que transite entre uma seção
da peça e outra ou mesmo para variações internas às seções, utilizando-se de articulações
diferentes em repetições subsequentes, por exemplo. Além disso, em relação às melodias,
Gismonti apresenta duas maneiras básicas de variação: a primeira com a alteração de
elementos como a rítmica das frases, ou pela adição de ornamentos e a segunda pela criação
de frases sobre uma harmonia pré-estabelecida, como é comum na execução do jazz. O autor
ainda aponta que se trata de um pianista com recursos para poder variar suas performances
por caminhos interpretativos - como uma mudança rítmica de uma melodia ou pela alteração
de sua dinâmica em relação à execução anterior - ou pela combinação de outros
procedimentos, como a mudança brusca de uma seção de articulação predominantemente
legato para outra, ainda não executada, cuja forma de se acompanhar é modificada, assim

267
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

como sua articulação, e sob a qual a melodia ganha notas extras, ou é tocada em blocos. O
que torna essas interpretações ainda mais complexas é o fato de que essas variações não são
escritas, o que faz com que muito do que acontece nas interpretações estudadas seja decidido
durante as performances.
Segundo Chi (2006), a expertise parece estar limitada ao domínio e a um contexto
dentro de um domínio. Além disso, a autora afirma que experts são mais bem sucedidos em
escolhas de estratégias apropriadas para a resolução de problemas e também são mais
oportunistas na utilização de recursos (informações disponíveis) para a solução desses
problemas. Já no estudo realizado por Duke, et al. (2009) acerca da diferença entre a prática
deliberada de pianistas de diferentes níveis de expertise, os pesquisadores afirmam que um
dos diferenciais entre os pianistas de mais alto nível de expertise e os de níveis menores é a
capacidade de lidar com erros (o autor se refere a erros referente a notas musicais ou mesmo
erros de interpretação). Os autores afirmam que, ao contrário do que os pianistas de menor
nível de expertise imaginavam, os melhores pianistas relataram não cometer menos erros nos
inícios de suas práticas, mas sim de apresentarem maior capacidade de corrigi-los e evitar a
reincidência no curso de suas carreiras.

Sendo assim, é possível supor que aspectos cognitivos relacionados à performance de


Egberto Gismonti tenham uma relação direta com o cruzamento dos dados das pesquisas
citadas acima. Gomes (2015), em uma análise das performances encontradas no álbum
“Alma”, de 1986, afirma sobre a flexibilidade encontrada nas interpretações do compositor:

“Flexibilidade essa, que é alcançada além de sua concepção musical, pelo domínio técnico que
possui do instrumento. O que notamos é um pianista com recursos para poder dar variedade e
interesse às suas performances por caminhos extremamente sutis - como uma leve mudança
rítmica de uma melodia ou até mesmo pela alteração de sua dinâmica em relação à execução
anterior - ou a combinação de muitos tópicos, como a mudança brusca de uma parte de
articulação predominantemente legato para outra, ainda não executada, cuja forma de se
acompanhar é modificada, assim como sua articulação, e sob a qual a melodia ganha notas extras,
ou é tocada em blocos” (Gomes, 2015, p.188).

Essa maneira de interpretar que exige do intérprete a capacidade de modificar diversos


elementos, estruturais e interpretativos das composições, muitas vezes no ato da performance
(leia-se: sem ensaio prévio), parece implicar em uma prática deliberada com objetivos
bastante específicos. E uma vez que a expertise é geralmente restrita a um contexto dentro de
um domínio, estratégias para a interpretação de peças escritas em sua totalidade, como as
apresentadas por Duke et al. (2009), como executar trechos lentamente ou marcar pontos-

268
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

alvo, parecem importantes, mas não suficientes para uma performance que tem como objetivo
modificar diversos elementos das composições em tempo real.

Sendo a qualidade da prática de intérpretes experts um fator decisivo na qualidade das


interpretações (Duke et al., 2009), os depoimentos de Egberto Gismonti parecem ser fontes
importantes na busca por uma prática de resultados eficazes quando o propósito das
performances do intérprete forem semelhantes aos demonstrados pelo pianista. O
delineamento de um programa de prática deliberada semelhante ao de Gismonti parece
envolver uma preparação complexa, que remete um estudo sistemático sobre o conhecimento
estrutural das peças musicais a serem executadas e sobre um conhecimento que vise
apuramento técnico e cognitivo para que o estudante consiga imaginar e executar o que se
pensa em tempo real.

Este artigo tem como apontamentos futuros a realização de estudos longitudinais que
envolvam o desenvolvimento de uma metodologia de prática deliberada com exercícios que
permitam ao estudante comportar-se de acordo com as indicações encontradas nos
depoimentos de Egberto Gismonti.

Referências
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Chi, Micheline T. M. (2006). Two approaches to the study of expert's characteristics. In:
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Gomes, V. B. (2015). Alma: o estilo pianístico de Egberto Gismonti. Dissertação de Mestrado.
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Lehmann, A. C., Sloboda, J. A. & Woody, R. H. (2007). Psychology for musicians:
understanding and acquiring the skills. New York: Oxford University Press.
Silva, C. L. B. (2005). A Interpretação e o pianismo de Egberto Gismonti em sua obra
"Sonhos de Recife". Dissertação de Mestrado. UFRJ. Rio de Janeiro. RJ. Brasil.

269
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

A individualidade musical na performance: conceitos teóricos, estratégias


metodológicas e perspectivas
Tairone Nunes Magalhães
Universidade Federal de Minas Gerais
taironemagalhaes@gmail.com

Davi Alves Mota


Universidade Federal de Minas Gerais
davialvesmota@gmail.com

Mauricio Alves Loureiro


Universidade Federal de Minas Gerais
mauricio.alves.loureiro@gmail.com

Resumo: A individualidade em uma performance musical está relacionada ao conjunto das


características comuns às diferentes performances realizadas pelo mesmo músico, a partir das
quais é possível para os ouvintes distinguir o indivíduo que a realizou. Neste texto, apresentamos
alguns estudos importantes que investigam a individualidade musical na performance, e
discutimos conceitos teóricos, estratégias metodológicas e resultados importantes já obtidos a
respeito do assunto. A discussão tem como foco trabalhos que tratam da individualidade
diretamente, assim como a análise de diferenças individuais em performances e a identificação
automática de músicos. Primeiramente apresentamos uma reflexão a respeito do que é exatamente
a individualidade na performance, e através de que meios ela pode ser comunicada/percebida. Em
seguida são discutidos alguns aspectos e desafios do estudo da individualidade na música popular
e erudita, dificuldades metodológicas e as diferenças tipicamente existentes entre performances
individuais e em grupo. Por fim, traçamos algumas perspectivas e especulações a respeito das
possíveis aplicações de tais conhecimentos na criação, escuta e educação musical.
Palavras-chave: performance musical, expressividade, expressão musical.

Musical individuality in the performance: theoretical concepts, methodological approach and


perspectives
Abstract: Individuality in music performance is related to a set of common characteristics shared
by different performances played by the same musician, by means of which it is possible for
listeners to discriminate them. In this work we present a few important studies related to
individuality in music performance and discuss some theoretical concepts, methodological
approaches and results obtained in the field. Our discussions focuses on studies explicitly related
to individuality, individual differences in performances and automatic performer identification.
First we present a discussion regarding what exactly is the individuality in musical performances,
and how it can be communicated/perceived. Next, we discus some aspects and challenges involved
in the study of individuality in classic and popular music, methodological issues, and some typical
differences between solo and group performances. Ultimately we discuss perspectives and
speculations regarding possible applications for such knowledge in music creation, listening and
music education.
Key-words: music performance, expressiveness, musical expression.

Introdução
A capacidade de distinguir diferentes indivíduos é essencial para os seres humanos
estabelecerem vínculos sociais. Dentre as diversas características que podem estar

270
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

relacionadas à individualidade estão: traços faciais, voz, jeito de andar, etc. Além disso, a
individualidade pode ser comunicada de forma eficiente por meio da música.
É possível observar uma consistência entre diferentes execuções de uma peça pelo
mesmo músico. Diante do fato que conseguimos perceber essa consistência e relacionar a
performance ao indivíduo, a única hipótese possível é que existe nessas performances um
conjunto de características comuns, que são então percebidas como únicas daquele intérprete
e que as distinguem de performances executadas por outros intérpretes.

A individualidade na performance musical


Recentes estudos têm abordado a individualidade musical, buscando compreender a forma
como se manifesta e como é percebida. Em (Gingras, 2014), um artigo introdutório a respeito
do tema, o autor apresenta algumas referências importantes de trabalhos que tratam
diretamente da questão da individualidade na performance musical, todos desenvolvidos ao
longo das últimas três décadas.
Segundo Sloboda (2000), performances musicais possuem uma componente técnica e
uma componente expressiva. A componente técnica está relacionada à mecânica da produção
de um resultado coordenado fluente, enquanto a componente expressiva deriva de variações
intencionais de parâmetros selecionados pelo instrumentista visando manipular os resultados
cognitivos e estéticos para transmitir ao ouvinte.
Em uma performance, o músico detém controle sobre vários parâmetros expressivos,
referentes a variações temporais (início e fim de nota), de intensidade, altura e timbre. Tais
parâmetros são continuamente variantes e a combinação de possíveis formas de manipular tais
parâmetros resulta em uma explosão combinatória de possibilidades (Repp, 1999). O número
de parâmetros passíveis de manipulação é determinado pelo instrumento utilizado, gênero
musical, repertório e contexto cultural. A estrutura musical executada e as convenções
definem as manipulações expressivas esteticamente aceitáveis daquela estrutura. Por meio da
manipulação destes e possivelmente de outros parâmetros, os músicos são capazes de
produzir performances expressivas, e daí emerge sua individualidade musical.
Geralmente na música erudita a ênfase de tais manipulações expressivas se dá
principalmente por meio de súbitas perturbações temporais e flutuações dinâmicas. Na música
popular se visa transmitir um caráter distinto e individual através do som peculiar da voz do
cantor, a sonoridade dos instrumentos e a mixagem (Wöllner, 2013). Tradicionalmente na
música erudita as peças são escritas nota por nota na partitura, muitas delas com indicações de

271
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

andamento, dinâmica, etc. Enquanto isso, na música popular, visto que muito é transmitido de
forma oral e informal, há vários exemplos de músicos que não leem sequer uma nota na
partitura. Certamente tais diferenças influenciam os parâmetros disponíveis para o músico
expressar sua individualidade nestes diferentes contextos culturais.
Tipicamente, ouvintes esperam de um intérprete mais do que simplesmente a execução
de uma performance padrão. Repp (1999) argumenta que a diversidade é importante porque
oferece aos ouvintes diferentes perspectivas sobre uma mesma peça. Já para o intérprete, duas
forças opostas precisam ser equilibradas: convencionalidade e individualidade. Se por um
lado, artistas tendem a seguir certas normas estéticas, por outro lado eles desejam se distinguir
de outros músicos e expressar algo mais. Portanto, se espera que o músico se distancie da
linha de base, em algum grau, sem que a performance deixe de ser ideal, ou seja, sem
ultrapassar os limites esperados para determinado contexto (gênero, repertório ou contexto
cultural).

Quantificando a individualidade
Em um estudo envolvendo 28 performances da peça ‘Träumerei’ de Robert Schumann,
executadas por 24 pianistas (Repp, 1992), foi identificada a recorrência de padrões temporais
globais baseados na estrutura da composição, e de padrões locais de manipulações temporais,
tais como ritardandos. Tal recorrência foi observada em performances executadas por
pianistas distintos, indicando a existência de uma uniformidade na interpretação de
determinados aspectos da composição. Em contrapartida, o autor identificou a existência de
variações temporais individuais na interpretação de certos gestos musicais, que segundo o
próprio autor seriam suficientes para considerar cada execução como única, mesmo que
outros parâmetros expressivos não tenham sido levados em conta. Já as performances
realizadas por um mesmo pianista, apesar de distintas, eram mais similares entre si, indicando
algum grau de consistência em interpretações de uma peça executada por um mesmo
indivíduo.
Várias evidências sugerem que humanos utilizam os valores médios dos membros de
uma categoria para gerar internamente uma espécie de representação mental de uma ideia
estética. Alguns autores adotam o termo protótipo para se referir a tal ideia estética (Wöllner
et al., 2012; Repp, 1997). Segundo um estudo realizado por Langlois e Roggman (1990),
rostos humanos gerados digitalmente, constituídos pelos atributos médios de rostos reais, são
geralmente considerados mais atraentes do que os rostos originais. O mesmo ocorre com a

272
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

voz humana, conforme mostrado por Bruckert et al. (2010). Vogais geradas a partir da
combinação de várias vozes foram consideradas mais atrativas do que as vozes individuais.
Repp (1997) realizou dois experimentos nos quais ouvintes avaliaram performances geradas
artificialmente utilizando valores médios de performances individuais. As performances
originais também foram avaliadas pelos mesmos ouvintes. Os resultados mostraram que as
performances geradas por valores médios foram consideradas superiores às originais no
aspecto qualidade. Entretanto, quando avaliadas sob o aspecto individualidade, as
performances médias foram avaliadas como inferiores, ou seja, há uma correlação negativa
entre as dimensões qualidade e individualidade. Portanto, é provável que a tendência de a
média ser mais atraente não se confirme de maneira inequívoca quando se trata de um objeto
artístico, que passa ser mais atrativo quando se percebe o afastamento da média.
Em conformidade com a abordagem metodológica adotada por Repp (1997), Wöllner
(2013) argumenta que para avaliar o grau de individualidade de uma performance, é
necessário determinar uma linha de base a partir da qual se possa estabelecer uma
comparação. Ao invés de utilizar uma performance sem expressão gerada por computador,
essa linha de base deve consistir nos valores médios das características expressivas, obtidos a
partir de várias performances humanas, dentro de um mesmo contexto cultural. Uma
performance que se distancie dessa linha de base seria, portanto, uma performance mais
individual, enquanto a performance média estaria relacionada ao protótipo a partir do qual os
músicos expressam sua individualidade. Há estudos que utilizam os valores nominais
representados na partitura como linha de base para tal análise, entretanto, os estudos mais
atuais convergem na ideia de que trabalhar com a média é uma estratégia metodológica mais
adequada no estudo da individualidade. Stamatatos (2002) apresenta um artigo no qual ele
compara as duas estratégias de forma empírica, e mostra que por meio da utilização de valores
médios é possível obter uma taxa de acerto maior em um classificador com o objetivo de
identificar o intérprete de uma performance.

Ideia padrão e o conceito de performance prototípica


Em Crítica do Juízo, Kant estabelece uma discussão a respeito de ideais estéticos e introduz o
conceito de ideia padrão, que seria uma intuição individual (da imaginação) através da qual se
expõe o padrão para julgar um objeto como pertencente a uma categoria. Sobre tal conceito, o
autor faz a seguinte afirmação (Kant, 1987, p. 135, tradução nossa):
A ideia padrão não é de maneira alguma o arquétipo integral da beleza dentro de
uma categoria, mas a forma que constitui a condição indispensável de toda a beleza

273
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

e, consequentemente, meramente a conformidade na exibição da categoria. (...) É


precisamente por isto, também, que a ideia padrão não pode conter qualquer
característica específica, já que assim ela não seria a ideia padrão para aquela
categoria. Tampouco é por causa de sua beleza que nos agrada sua exibição, mas
meramente porque ela não contradiz nenhuma das condições sob as quais, por si só,
algo de tal categoria pode ser belo. A exibição é, meramente, academicamente
correta1.

O raciocínio de que uma performance prototípica (que possua conformidade em relação


ao seu contexto, sem qualquer característica específica) é meramente uma performance que
atende às condições indispensáveis à peça, se encaixa na visão de ideia padrão de Kant. Tal
performance consiste meramente na execução correta da peça. Uma execução que não
contradiz as condições necessárias para que ela assim seja considerada. Já a individualidade,
esta se manifesta exatamente através das características específicas.

A individualidade na música popular


O estudo da individualidade na música popular traz consigo inúmeros desafios, devido ao fato
de os parâmetros da performance disponíveis para o músico manipular serem geralmente mais
amplos e flexíveis, em comparação à música erudita. O improviso é um elemento muito mais
presente na música popular. Diante de tal cenário, se torna muito mais difícil o problema de
estabelecer um protótipo de performance para avaliar a questão da individualidade. Decisões
tomadas pelo músico no momento da improvisação, como a escolha do contorno melódico de
uma frase, podem influenciar radicalmente o caráter expressivo ou individual de uma
performance.
Uma possível é se concentrar na análise de características individuais de aspectos
específicos da performance que possam ser formalizados mais facilmente. Por exemplo, em
(Magalhães et al., 2015) foram desenvolvidos descritores para avaliar os perfis de vibrato e
bending2 de guitarristas, os quais foram utilizados para gerar mapas representativos das
distâncias entre os perfis individuais de oito guitarristas. Em (Magalhães, 2015), os mesmos
dados foram classificados utilizando o algoritmo KNN (K-Nearest Neighbours), que foi capaz

1
Texto na edição em inglês: “The standard idea is by no means the entire archetype of beauty within this kind, but
is only the form that constitutes the indispensable condition of all beauty, and hence merely the correctness in the exhibition
of the kind. (...) It is precisely because of this, too, that the standard idea cannot contain any specific characteristics, since
then it would not be the standard idea for that kind. Nor is it because of its beauty that we like its exhibition, but merely
because it does not contradict any of the conditions under which alone a thing of this kind can be beautiful. The exhibition is
merely academically correct.”

2 “[Bending ou] pitch bending se refere ao ajuste da altura de uma nota. Geralmente representa uma suave variação
contínua da altura, que pode se dar na transição de uma nota para outra, nesse caso denominada portamento ou
glissando” (Chen, Smith, & Wolfe, 2009, tradução nossa).

274
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

de identificar o intérprete a partir do perfil de vibrato de notas isoladas, com taxa de acerto de
66,4%, em um conjunto de dados contendo performances de oito guitarristas.
A combinação de vários descritores de expressão tende a gerar modelos mais robustos
para identificação de instrumentistas. Kroher e Gómez (2014) desenvolveram um modelo para
identificação automática de cantores em estilos de performance improvisativos, utilizando um
conjunto de descritores de timbre, vibrato, ornamentação, dinâmica e altura. Para a etapa de
classificação, utilizaram SVM (Support Vector Machines). O modelo proposto alcançou taxas
de acerto acima de 80% na identificação do cantor utilizando todo o conjunto de descritores
proposto.
Ainda há relativamente poucos estudos que visam estudar a individualidade em gêneros
musicais que envolvem improvisação, certamente em grande parte devido às dificuldades
metodológicas. Para ir além da análise de características específicas individuais e se obter
uma representação mais ampla da individualidade na improvisação, se faria necessário adotar
alguma metodologia que permitisse, por exemplo, analisar as ideias expressadas pelo músico
por meio da melodia improvisada. Possivelmente desenvolver um modelo simbólico que
permita relacioná-las com a estrutura pré-definida da peça.

Performances solo e em grupo


Geralmente performances solo apresentam maior grau de individualidade do que aquelas
executadas em grupo (Repp, 1999). Tocando sozinho, o músico tem maior liberdade de
manipulação de parâmetros expressivos. Em (Wöllner et al., 2012), os autores indicam que
uma performance mais convencional facilitaria a sincronização entre os membros do grupo,
por se aproximar mais do protótipo mental. O autor elaborou um experimento em que vários
sujeitos eram instruídos a marcar o tempo (tapping) a partir do movimento previamente
mapeado de vários regentes. O movimento era exibido por meio de pontos de luz em uma
tela. Foram gerados também movimentos protótipos por meio da combinação das médias dos
movimentos reais de vários regentes. Os sujeitos foram capazes de sincronizar com mais
precisão com os movimentos protótipo do que com os mapeados de regentes individuais.

Aplicações
O conhecimento dos processos envolvidos na construção da individualidade musical em
performances musicais pode ampliar os horizontes para o surgimento de novas abordagens
pedagógicas na prática musical, novas tecnologias para produção musical, ou até mesmo

275
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

novas maneiras de se ouvir música. O aprofundamento do conhecimento sobre a


expressividade e individualidade pode possibilitar a criação de ferramentas interativas para
auxiliar o músico no desenvolvimento de sua expressividade e linguagem individual. A
produção musical poderia se beneficiar com o desenvolvimento de softwares sequenciadores
capazes de modelar performances individuais a partir de trilhas puramente mecânicas. Na
catalogação de bibliotecas musicais, acervos ou listas de execução pessoais podem se
beneficiar através da identificação automática de instrumentistas em gravações não
documentadas ou sem marcações. Sistemas interativos de reprodução musical podem ser
desenvolvidos para não apenas reproduzir determinada música, mas também modificá-las em
termos de seu caráter expressivo/individual, de acordo com o gosto do próprio ouvinte.
Os exemplos acima são apenas suposições sobre tecnologias que podem ser viabilizadas
a partir do aprofundamento do conhecimento a respeito da individualidade musical.
Certamente, outras aplicações e recursos tecnológicos podem ser viabilizados e desenvolvidos
à medida que ela for melhor compreendida.

Considerações finais
É notável o crescimento, nos últimos anos, dos estudos que abordam diretamente a
quantificação da individualidade musical, as diferenças individuais e a identificação
automática de músicos. Vários estudos proeminentes sugerem que para se quantificar a
individualidade, a melhor abordagem é estabelecer uma linha de base constituída das médias
de várias performances (protótipo), a partir da qual seja possível caracterizar uma
performance individual. Apesar de vários resultados significativos terem sido alcançados em
estudos relacionados à música erudita, há ainda poucos estudos relacionados a gêneros que
envolvem improvisação. Tais estudos certamente dependerão do desenvolvimento de novas
ferramentas e estratégias metodológicas. Particularidades de certos instrumentos musicais ou
contextos culturais abrem possibilidades para a ampliação de estudos mais específicos sobre a
individualidade musical, nos quais algumas abordagens metodológicas citadas neste trabalho
podem vir a ser utilizadas.

Referências
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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

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277
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Um estudo de caso sobre motivação e criatividade com participantes de um


coro infantil

Flávia de Andrade Campos Silva


UFPR
flavia_a_c@hotmail.com

Rosane Cardoso de Araujo


UFPR
rosanecardoso@ufpr.br

Resumo: Este artigo é um recorte de uma pesquisa que teve como foco apontar elementos criativos e
motivacionais da prática de docência de uma regente no processo de ensino/aprendizagem no contexto
de um coro infanto-juvenil da cidade de Curitiba/PR. A metodologia utilizada foi um estudo de caso,
definido por Ventura (2007) como, uma investigação específica de um determinado caso definido a
priori pelo pesquisador. Os dados foram coletados através de cinco observações dos ensaios do coro e
um questionário realizado com os participantes do coro estudado. Através dos resultados foi possível
destacar que, o canto coral é uma atividade que favorece o aprendizado musical e as atividades lúdicas
e criativas influenciaram positivamente a motivação e o envolvimento das crianças e adolescentes. Os
resultados podem colaborar com novas pesquisas em diferentes contextos trazendo novas
compreensões para a área da Educação Musical e Coro infantil.
palavras-chave: motivação, criatividade, coro infantil.

A case study on motivation and creativity with participants in a children's choir


Abstract: This article is a cut of a research that had as focus to point out creative elements and
motivations of the teaching practice of a rule in the process of teaching / learning no context of an
juvenile child of the city of Curitiba / PR. The methodology used in the case study, defined by Ventura
(2007) as, a specific investigation of a certain case defined a priori by the researcher. The data were
collected through five observations of the choir tests and a questionnaire performed with the
participants of the choir studied. Through the results it was possible to emphasize that choral singing
is an activity that favors musical learning and the playful and creative activities positively influenced
the motivation and involvement of children and adolescents. The collaborative results with the new
researches in different contexts bringing new understandings to the area of Musical Education and
children's Choir.
Key-words: motivation, creativity, children's choir.

1. Introdução
Este artigo é um recorte de uma pesquisa realizada em uma universidade de Curitiba/PR, que
buscou investigar os procedimentos didáticos de uma regente que colaborassem com os
processos criativos e motivação da prática musical de um coro infanto-juvenil. O objetivo
geral foi investigar, no contexto de um grupo coral infanto-juvenil, os procedimentos
didáticos que propiciavam motivação e processos criativos para a prática musical do grupo, na
manutenção e aquisição de repertórios. A metodologia utilizada na pesquisa inicial foi um
estudo de caso único e a coleta de dados incluiu observações dos ensaios do coro, entrevista
com a regente e aplicação de questionário aos integrantes do coro. Nesse texto serão

278
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

destacados os resultados das observações dos ensaios e do questionário aplicado com os


participantes do coro.

2. Fundamentação teórica: motivação, criatividade e canto coral


Três temas foram revisados para realização da pesquisa, relacionados ao objeto de
estudo em questão: motivação, criatividade e prática de coro infantil. Seguem alguns dados
sobre cada tema:

2.1 Criatividade
De acordo com Carneiro (2010), pesquisas sobre criatividade começaram a ser realizadas a
partir do século XX, especificamente nos anos 50. O objetivo dos estudos até os anos 70 era
descrever o perfil do indivíduo criativo, bem como o aprimoramento de técnicas que
desenvolvesse a criatividade. Com o decorrer dos anos, as pesquisas passaram a observar a
criatividade sob as influências de fatores sociais, culturais e históricos (Alencar, 2016, p. 01).
Segundo Barrett (2009), criatividade é um termo que gera discussão entre os pesquisadores da
área para chegar a uma única definição, pois depende da ótica que o pesquisador irá enfatizar:
o processo criativo (pensamento criativo e motivação), o produto criativo (invenções ou obras
de arte), a pessoa criativa (dando ênfase a emoções, valores e temperamento), e o ambiente
(social e cultural) em que a atividade criativa acontece. Muitos pesquisadores definiram a
criatividade como um processo de criar algo original, como música, teatro, dança, uma nova
história, inovações tecnológicas e etc. Para Torrance (apud Novaes, 1971, p.18).a criatividade
é definida como: “processo que torna alguém sensível aos problemas, deficiências, hiatos ou
lacunas nos conhecimentos, e o leva a identificar dificuldade, procurar soluções, fazer
especulações ou formular hipóteses, testar e retestar essas hipóteses, possivelmente
modificando-as, e a comunicar os resultados”.

2.2 Motivação
A motivação é um tema que pode ser trabalhado em diversas áreas da vida, influenciando as
atitudes e escolhas de um indivíduo. Segundo Bzuneck (2009), a origem da palavra motivação
vem do verbo latino movere, que significa motivo, sendo assim o termo é algo que possui
relação direta com a ação que move um indivíduo a executar uma determinada tarefa. A
motivação é discutida no contexto do ambiente escolar mantendo relação direta com o
processo de aprendizagem do aluno, assim como é abordada no ambiente de aprendizagem

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

musical. Diversos trabalhos têm sido desenvolvidos sobre motivação e música com apoio de
referenciais teóricos e teorias que investigam fatores que colaboram ou não com o
desenvolvimento da motivação na aprendizagem musical (ARAÚJO & ANDRADE, 2013).
Dentre esses estudos destacam-se autores como: Araújo (2010, 2013); Araújo e Pickler
(2008); Araújo e Andrade (2013); Bzuneck (2009); Guimarães (2009) entre outros autores.

2.3 Canto coral


O canto coral é uma atividade na qual a criatividade está inserida, através dos procedimentos
didáticos utilizados pelos regentes e por despertar a aspectos criativos nos participantes do
coro. Para Neto e Amato (2007), o coro é uma organização com diferentes finalidades:
motivação pessoal, formas de lazer, cantar um determinado repertório e/ou aprender música,
contudo, todos anseiam pelo objetivo principal do coro: cantar. Para Penna (1990), a atividade
de canto coral é um instrumento privilegiado de musicalização. Portanto, deve proporcionar
às crianças momentos de vivência, reflexão, busca pela a sensibilidade, desenvolvimento nas
atividades musicais, compreensão da música como uma forma de conhecimento, despertar a
criatividade, colaborar no desenvolvimento motor e cognitivo. Já o momento do ensaio para o
coro infantil deve ser um momento prazeroso, mas não no sentido apenas de lazer, mas um
prazer por estar desenvolvendo uma atividade musical e crescendo nela individualmente e
coletivamente (Figueiredo, 2006).

3. Metodologia
A metodologia dessa pesquisa é o Estudo de Caso, definido por Gil (2002) como, “um estudo
profundo e exaustivo de um ou poucos objetos, de maneira que permita seu amplo e detalhado
conhecimento” (2002, p.54). A unidade-caso escolhida nesta pesquisa foi um coro infanto-
juvenil da cidade de Curitiba/PR. Os instrumentos de coletas de dados utilizados foram: cinco
observações dos ensaios registradas em um caderno de campo; entrevista semiestruturada
com a regente registrada por meio de uma gravação de áudio; e um questionário aplicado aos
participantes do coro. Foi realizado um teste piloto com cinco integrantes de diferentes coros
de Curitiba/PR e São José dos Pinhais/PR para que fosse possível validar o questionário.
Portanto, para esse artigo, serão apresentados apenas os resultados das observações dos
ensaios e do questionário aplicado aos participantes do coro.
Os participantes foram 18 crianças e adolescentes entre 10 e 19 anos que fazem parte do
coro estudado. O questionário foi dividido em duas partes: (1) dados gerais dos participantes;

280
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

e (2) questões sobre a participação nos ensaios, sobre repertório e sobre as apresentações do
coro, em escala Likert de três ou cinco pontos, na qual um (N=1) correspondia a não gosto e
cinco (N=5) a gosto muito.

4. Resultados das observações dos ensaios do coro


A partir de um roteiro previamente elaborado foram observados vários elementos presentes no
contexto dos ensaios. Foram realizadas cinco (N=5) observações dos ensaios do coro no mês
de agosto de 2016. Os dados coletados foram registrados em um caderno de campo. Para a
análise dos dados, as questões foram organizadas em três categorias de análise: Ensaio,
Regentes e Crianças, conforme a seguinte tabela:
Ensaios Regentes Crianças

• É possível observar uma ordem • Como os regentes recebem as • Como as crianças reagem quando
nas atividades? crianças? chegam ao ensaio?

• Se sim, quais? • Como os regentes se • Como as crianças se relacionam


comunicam com as crianças com os outros componentes do
durante o ensaio? coro?

• Repertório do coro • Quais os recursos didáticos • Como as crianças se relacionam


utilizados? com os regentes?

• As atividades musicais são • Como os regentes ensinam um • Como é o momento de despedida?


lúdicas? novo repertório às crianças?

• As atividades musicais são


criativas? Como?

Tabela 1 – Observações dos ensaios do coro

Durante as observações foi possível verificar vários aspectos sobre motivação das
crianças, sobre a importância do ensino da música através do canto e sobre as possibilidades
da utilização de processos criativos durante os ensaios. As crianças e os adolescentes
chegavam animados para o ensaio, gostavam de cantar no coro e eram muito receptivos com
as atividades musicais e repertório propostos pela regente. O ambiente de ensaio era um
momento descontraído entre os integrantes, no qual a relação entre os mesmos e com os
regentes é espontânea e amigável. Para Amabile (1998), o ambiente é fundamental para o
desenvolvimento da criatividade. De acordo com Wechsler (1993), o ensino criativo deve ser
realizado pela motivação intrínseca do indivíduo, ou seja, através da motivação interna e não
por fatores externos, como recompensa ou punição.
Por meio das observações, foram identificadas atividades musicais lúdicas e criativas,
tanto nos exercícios de aquecimento vocal, quanto na prática do repertório. Dentre estas
atividades, é possível destacar:

281
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

• A regente utilizava diferentes estratégias para conduzir os trabalhos de aquecimento


vocal como, por exemplo, a realização de exercícios com movimentos corporais e o
uso de elementos imaginários para ensinar a colocação da voz;
• A utilização de materiais para orientar conceitos, como um elástico velho e um novo
para exemplificar a maneira em que a voz deve e como não deve ser projetada;
• Nos momentos de ensinar novos repertórios a regente projetava a letra no data show
ou entregava uma cópia para cada criança. Em seguida, ela ensinava a rítmica da
música utilizando voz e palmas e marcando o pulso com os pés. Depois cantava
trechos da melodia e solicitava que as crianças cantassem juntamente com ela. Por
último, cantava a música inteira com as crianças. Para ajudar as crianças a decorar a
letra da música ela fazia gestos de elementos que estavam presentes na letra da
canção.
• Quando a canção possuía divisão das vozes era realizado um ensaio separado dos
naipes, para que as crianças pudessem aprender a sua linha vocal. Para Schimiti
(2003), a repetição da melodia para a fixação se faz necessário, mas deve ser feito de
uma forma motivadora e que gerem momentos de prazer para as crianças.

4.1 Resultados do questionário com os participantes do coro


A maioria dos integrantes do coro tem idade entre 10 e 15 anos totalizando 78%, com uma
predominância do gênero feminino de 78%. Em relação à prática musical, o maior número
dos participantes (67%) alegou que toca algum tipo de instrumento musical, sendo que os
instrumentos mais indicados foram piano, flauta e violão. No que se refere ao tempo de
participação nas atividades do coro, a maioria (56%) respondeu que participavam das
atividades do coro entre um e três anos. A questão sobre os motivos que levaram os
participantes a ingressarem no coro tinham nove (N=9) opções, nas quais os participantes
poderiam assinalar mais de uma alternativa. Às duas opções com maior número de indicações
foram, gosto de cantar (30%) e gosto de atividades musicais (28%).
A segunda parte do questionário foi composta por cinco (N=5) questões de múltipla
escolha. A primeira questão teve como objetivo verificar se os participantes gostavam de
participar dos ensaios do coro. A maioria dos alunos (N=12 alunos, 67%) indicou que
“gostam muito”, quatro (N=04 alunos, 22%) indicaram que “gostam”, e dois (N = 02
alunos, 11%) indicaram que gostam “mais ou menos” de participar dos ensaios do coro (ver
gráfico 1). Nenhum participante indicou as alternativas “gosto pouco” ou “não gosto”. Ao

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

analisar esta questão foi possível verificar a motivação dos participantes durante os ensaios.
Durante as observações dos ensaios, foi observada a presença de diferentes atividades
musicais lúdicas e criativas, nas quais colaboravam para a concentração e motivação dos
participantes. Neste sentido Kohlrausch (2015, p.58) afirma que “o contexto social pode
influenciar na motivação dos coristas”.

Gráfico 1 - Participação nos ensaios do coro

A segunda questão foi sobre as atividades de aquecimento vocal. A maioria dos


alunos (N=07 alunos, 39%) indicou que “gostam”, cinco (N=05 alunos, 28%) “gostam
muito”, quatro (N=04 alunos, 22%) gostam “mais ou menos”, um (N=01 aluno, 5%) “gosta
pouco” e um (N=01 aluno, 5%) “não gosta” das atividades de aquecimento vocal (ver gráfico
2). De acordo com Kohlrausch (2015), a preparação vocal pode aumentar o senso de
competência dos integrantes e colaborar para que os mesmos vejam os resultados durante a
prática musical do coro.

Gráfico 2 - Atividades de aquecimento vocal

283
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

A terceira questão teve a finalidade de verificar o gosto dos participantes em relação


ao repertório que executam no coro. A maioria dos participantes (N=12 alunos, 67%) apontou
que “gostam muito”, três (N=03 alunos, 17%) “gostam” e três (N=03 alunos, 16%) gostam
“mais ou menos” do repertório do coro (ver gráfico 3). As alternativas “gosto pouco” e “não
gosto” não foi indicada pelos participantes. Figueiredo (1990) aponta que executar um
determinado repertório não é apenas cantar a melodia que está grafada na partitura, mas
depende de outros fatores como, afinação, precisão rítmica, equilíbrio das vozes e timbres.

Gráfico 3 – Repertório do coro

A quarta questão foi sobre a participação dos integrantes nas apresentações do coro.
A maioria dos integrantes (N =16 alunos, 89%) indicou que “gostam muito” e dois (N=02
alunos, 11%) integrantes “gostam” de participar das apresentações do coro (ver gráfico 4). As
questões “mais ou menos”, “gosto pouco” e “não gosto” não foram indicadas pelos
participantes. Segundo Góis (2015), as apresentações do coro são importantes para o processo
da prática coral, pois afeta diretamente na motivação do grupo e é um dos meios para realizar
a avaliação do trabalho.

Gráfico 4 – Repertório do coro

284
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

A última questão do questionário foi elaborada em três pontos da escala Likert e os


participantes deveriam escolher uma das alternativas que fosse de acordo com sua resposta. O
objetivo dessa questão era averiguar a presença da família e/ou amigos nas apresentações do
coro. A maioria dos participantes (N=12 alunos, 67%) indicou que os familiares e/ou amigos
“sempre” estão presentes nas apresentações e seis (N=06 alunos, 33%) participantes indicou
que os familiares e/ou amigos costumam assistir “às vezes” as apresentações do coro (ver
gráfico 5). A alternativa “nunca” não foi assinalada pelos participantes. É possível verificar a
presença de familiares e/ou amigos nas apresentações do coro, fato este que colabora com os
fatores motivacionais dos participantes e algumas vezes, pode servir como incentivo a outras
crianças e adolescentes a participarem das atividades do coro.

Gráfico 5 – Participação da família/amigos nas apresentações

5. Considerações finais
Os dados analisados demonstraram resultados relacionados ao uso de processos criativos no
ensaio do coro por parte da regente e à motivação dos integrantes em participar das atividades
e apresentações do coro. Em relação às três categorias de analise definidas no questionário
(ensaios, repertório e apresentações) a questão que foi mais destacada pelos participantes foi
relacionada à motivação em participar das apresentações do coro. A questão que obteve o
menor índice de respostas “gosto muito” foi sobre as atividades de aquecimento vocal.
Através dos resultados obtidos nesta pesquisa foi possível destacar as atividades de canto
coral enquanto procedimento para a aprendizagem musical e aquisição de habilidades e
também foi possível concluir que as atividades criativas podem influenciar de forma muito
positiva na motivação dos coralistas e no desempenho musical e envolvimento dos mesmos
com as atividades realizadas.

285
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Referências
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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Imagética musical e metáfora como recurso ativador/indutor do gesto


corporal na interpretação e na performance musical
Arícia Ferigato
CEGeME – Centro de Estudos do Gesto Musical e Expressão
Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG
ariciaferigato@yahoo.com.br

Maurício Alves Loureiro


CEGeME – Centro de Estudos do Gesto Musical e Expressão
Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG
mauricio.alves.loureiro@gmail.com

Resumo: O presente artigo pretende discutir, a partir de uma perspectiva teórica, o papel da
imagética musical e da metáfora como recurso ativador/indutor do gesto no processo de
construção da interpretação e na performance musical. Considerando o termo “imagética” como
referente às representações mentais de informações vindas da nossa interação com o mundo físico,
e preservadas na nossa memória sensorial incorporada, a imagética musical não considera apenas
representações mentais aurais, mas também visuais e motoras. A partir de uma revisão de literatura
específica, este artigo propõe relacionar o conceito de “imagética musical” com a teoria da
“cognição musical incorporada” considerando a metáfora como “gancho” cognitivo entre o
domínio da representação mental e a realização musical através da interpretação e performance. A
partir desta reflexão, buscamos investigar o papel da metáfora como recurso ativador/indutor do
gesto corporal no processo de construção da interpretação e na performance musical expressiva.
Este artigo é parte da revisão de literatura de pesquisa de doutorado em andamento que estuda o
gesto (movimentos corporais específicos) na construção da interpretação e performance expressiva
da harpa de pedais, identificando seus significados e funções através de uma abordagem
exploratória de caráter empírico.
Palavras-chave: imagética musical, cognição musical incorporada, metáfora, gesto.

Musical imagery and metaphor as an activator / inducer of gesture in interpretation and


musical performance
Abstract: The present article intends to discuss from a theoretical perspective the role of musical
imagery and metaphor as an activator / inducer of gesture in the process of interpretation
construction and musical performance. Considering the term "imagery" as referring to the mental
representations of information coming from our interaction with the physical world, and preserved
in our embodied sensory memory, musical imagery considers not only aural but also visual and
motor mental representations. From a specific literature review, this article proposes to relate the
concept of "musical imagery" with the theory of "embodied musical cognition" considering the
metaphor as a cognitive "link" between the domain of mental representation and musical
realization through interpretation and performance. We seek to investigate the role of metaphor as
an activator / inducer of body gesture in the interpretation practice and expressive musical
performance. This article is part of the literature review of the current doctoral research that
studies the gesture (specific body movements) in the construction of interpretation processes and
expressive performance of the pedal harp, identifying its meanings and functions through an
exploratory approach with an empirical character.
Keywords: musical imagery, musical embodied cognition, metaphor, gesture.

Introdução
Como descrevemos música objetivamente? Como descrevemos as sensações que ela nos
evoca? E ainda, como o perceber e o descrever afetam a forma como fazemos música? Estes

287
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

questionamentos comumente permeiam nossos pensamentos a respeito da interpretação e


performance musical. O perceber música e o fazer música são habilidades humanas que
evocam todos os nossos sentidos, pois a nossa percepção é multidimensional e, em algum
nível, sinestésica (Sagiv, Ilbeigi e Bem-Tal, 2011). O cruzamento de modalidades na nossa
percepção pode transformar esta característica sinestésica em ações criativas ao sermos
capazes de associar informações vindas de diferentes domínios para as mais variadas
finalidades, o que permite composições imagéticas que nos ajudam a realizar determinada
ação.
Um exemplo prático da imagética musical no contexto da prática instrumental são as
metáforas associadas aos resultados sonoros almejados. Essas metáforas podem induzir os
nossos movimentos para a produção sonora, formalizar estes conjuntos de movimentos
corporais em gestos completos em som e sentido.
O presente artigo é parte da revisão de literatura de pesquisa de doutorado em
andamento que estuda o gesto (movimentos corporais específicos) na construção da
interpretação e performance expressiva na harpa de pedais. Esta pesquisa busca identificar
significados e funções do gesto corporal do harpista através de uma abordagem exploratória
de caráter empírico. Considerando que a expressividade está relacionada com a forma que o
músico manipula parâmetros sonoros musicais a fim de evidenciar estruturas musicais
específicas (Loureiro, 2006), a reflexão sobre o impacto do gesto corporal para a performance
expressiva na harpa levou a questionamentos mais profundos sobre as origens desses gestos
de intenção expressiva do harpista, gerando reflexões sobre o papel da imagética musical e a
metáfora como recurso que possibilita a melhor execução de um gesto fazendo links com o
nosso conhecimento incorporado.
Deste modo, esta revisão busca suporte teórico para o design dos experimentos desta
pesquisa, que pretende analisar a influência de instruções metafóricas no resultado sonoro-
gestual da realização de um determinado trecho musical na harpa. A metodologia de análise
prevê comparações de dados observados em performances de um mesmo sujeito, assim como
entre diferentes sujeitos, visando identificar similaridades e diferenças entre as abordagens
performáticas de cada harpista. Os participantes dos experimentos serão recrutados entre
alunos do curso de bacharelado em harpa da UFMG.

288
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Imagética musical e cognição musical incorporada


Para melhor endereçar o conceito de imagética musical é importante considerar que o
conceito de “imagética” (também compreendido como “representação mental”) tem sido
utilizado e amplamente investigado em muitas áreas do conhecimento como, por exemplo, a
filosofia, psicologia e neurociências cognitivas. A imagética mental é uma experiência quasi-
perceptiva, que se assemelha a uma experiência perceptiva, mas ocorre na ausência do
estímulo externo apropriado, funcionando como uma forma de representação mental. É
bastante aceita a ideia de que a imagética é, em grande parte, objeto de controle voluntário
dando suporte à intencionalidade das nossas ações (Thomas, 2014).
Apesar do termo “imagética” compreender uma relação direta com a palavra
“imagem” remetendo ao domínio visual destas representações mentais, a imagética mental
tem sido investigada também nos domínios aural e motor. Estes aspectos da nossa percepção,
o visual, aural e motor, são centrais para compreender o conceito de imagética musical.
Schneider e Godoy (2001) consideram a imagética musical um fenômeno
multidimensional por abranger muitos aspectos de maneira simultânea. A imagética mental é
um objeto de estudo que ainda necessita de mais conhecimento sobre suas bases neurológicas,
entretanto, pesquisas demonstram haver uma “equivalência funcional” entre a percepção e a
imagética, o que significa que muito do substrato neurológico envolvido na percepção
“primária” também está envolvida na imagética “pura”, o que torna a distinção entre
percepção e imagética não muito clara mesmo no nível neurológico (2001, p. 21).
O estudo sobre essas representações mentais, que estamos chamando de imagética, se
subdivide em aspectos específicos da nossa percepção, fazendo emergir focos de estudo mais
específicos como a imagética visual, imagética auditiva, imagética motora, por exemplo.
Apesar da subdivisão necessária à sistematização do estudo científico sobre este fenômeno,
essas representações mentais ativam diferentes áreas do cérebro relativas aos diferentes
sentidos de forma simultânea, reafirmando o caráter multidimensional do fenômeno.
Ao eleger a imagética como conceito a ser discutido no contexto proposto por este
artigo consideramos importante ressaltar que nossa perspectiva sobre a imagética musical se
apoia numa visão incorporada da cognição. Esta perspectiva encontra suporte na corrente
enacionista, por considerar que a conexão entre a atuação do sujeito e suas bases motoras
superam a mera representação do mundo físico na mente.
Questionando a tradição filosófica ocidental que compreende a faculdade da razão
como separada e independente do que fazemos com os nossos corpos (a razão vista como

289
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

independente da percepção e movimento corporal), assim como Spinoza, filósofo holandês do


século 17 já questionou essa abordagem herdada principalmente de Descartes, Lakoff (1999)
se apoia na teoria da mente incorporada para considerar a forma como os sistemas perceptivo
e motor atuam na nossa capacidade de realizar inferências racionais e, por consequência, na
formação de tipos de conceitos particulares. As ciências cognitivas promoveram novos e
importantes insights para um antigo problema filosófico: o problema sobre o que é real e
como sabemos se é real. De acordo com Lakoff:

Na perspectiva cognitiva incorporada nosso senso do que é real começa e depende


crucialmente dos nossos corpos, especialmente do nosso aparato sensório-motor que
nos permite perceber, mover e manipular, e de estruturas detalhadas do nosso
cérebro, que vão sendo formadas tanto pela evolução quanto pela experiência
(Lakoff, 1999, p. 17).

Nesta perspectiva, o conhecimento não emerge da percepção passiva, mas da


necessidade da ação no ambiente que gera o conhecimento necessário para agir no ambiente.
Abordando a prática musical a partir da perspectiva cognitiva incorporada, Leman (2008)
propõe que a ligação entre mente e conteúdo é baseada no papel do corpo como mediador
entre a energia física e seu significado, enfatizando assim o aspecto fenomenológico e
incorporado da cognição. Inicialmente, o paradigma da cognição dava mais ênfase ao
processamento mental do que ao papel dos gestos e da ação. A ideia de que o envolvimento
musical é baseado na simulação e imitação incorporada do movimento de formas sonoras tem
uma longa tradição nos estudos empíricos sobre a performance musical (Leman, 2008, p.43 ).
Este processo cognitivo de aprendizado pela experiência corporal enfatizado pela
abordagem cognitiva incorporada da música levantada por Leman pode trazer um olhar mais
atento para o aspecto motor da imagética musical. Lotze e Halsband (2006) frisam que
músicos são conhecidos por empregar a “imagética motora” para aprimorar sua performance
assim como para memorizar o conceito estético-emocional da obra musical. Entretanto,
ressaltam que no contexto musical a imagética motora não é puramente cinestético, mas
também inclui os domínios aural e visual (2006, p. 390).

Da imagética ao gesto: metáfora como “gancho” cognitivo


A intenção expressiva formalizada por meio da criação imagética de ideias sonoras apoiadas
no nosso conhecimento incorporado (metáforas) se torna uma heurística eficaz ao traduzir
essas ideias (representações mentais) em gestos corporais apropriados ao sucesso da intenção
expressiva. Para Leech-Wilkinson e Prior (2014):

290
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

As heurísticas na performance fazem com que o tocar seja muito mais fácil de
controlar, ao produzir sons que parecem corretos de se ouvir aprendendo a fazer
estes sons parecerem corretos de se tocar. Este processo envolve a combinação do
som pretendido a uma imagem, como forma de auxiliar na produção da ação precisa
requerida para tornar o som capaz de gerar no ouvinte uma resposta que, mesmo que
não seja exatamente o que o músico intencionou, desempenhará o seu papel na
criação de uma performance expressivamente persuasiva da partitura. (Leech-
Wilkinson e Prior, 2014, p.55)

Deste modo, através dos anos de prática e experiência, torna-se possível a cada músico
codificar informações dinâmicas, emocionais e motoras para a realização de efeitos
particulares até que se tornem mais naturais. Leech-Wilkinson e Prior consideram que a
“imagem” é a chave para este processo, onde a metáfora se apresenta como uma “poderosa
técnica multimodal cujas causas ainda necessitam ser desvendadas” (2014, p.55).
Relações metafóricas sinestésicas são comuns (ou mesmo fundamentais) para o
aprendizado, percepção, interpretação e performance musical. No cotidiano do músico é
muito comum vermos metáforas nas indicações de andamento e caráter (ex: Allegro
Spirituoso, Lento, Doloroso e etc, que denotam não só o andamento, mas também estados
emocionais), no uso para descrever características do som (aveludado, áspero, claro, escuro,
doce, etc...) e do gesto (metáforas para o movimento como: “como uma onda”, “fluido” e etc).
Também é possível observar esta mesma relação metafórica, através do cruzamento de
modalidades em análises de performances com abordagens empíricas do movimento na
performance (em um nível mais amplo) e do gesto corporal (em um nível mais específico)
como o traçado musical em resposta ao estímulo musical (Repp, 1992; Godoy, Haga e
Jensenius, 2006). Neste exemplo, vemos o cruzamento de modalidades entre o domínio da
percepção aural e sua tradução através do domínio visual como a notação resultante da
resposta ao estímulo aural.
A partir destes exemplos torna-se notável o quão comum é este cruzamento de
modalidades e o quanto é importante à tomada de consciência que estes estudos podem
proporcionar tanto para a continuação da pesquisa sobre estes fenômenos quanto para a vida
prática de performers musicais.

Considerações finais
A imagética é uma combinação de vários aspectos da nossa percepção que estão guardados na
nossa memória incorporada, ativada por nossas habilidades cognitivas. No contexto musical
instrumental esta combinação envolve não só aspectos aurais da nossa percepção, mas

291
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

também visuais e motores. Estes elementos podem formar desde a representação mental de
um som até formas sonoras mais amplas como uma estrutura musical.
A partir da literatura revisada, sugerimos que a metáfora pode ser uma das maneiras de
formalizar a imagem musical de um som a favor da realização deste através do gesto corporal
sobre o instrumento, como por exemplo: uma metáfora para um som, como aquilo que dá os
subsídios necessários para a formalização da imagem deste som e para a incorporação deste
conhecimento através da ação. Esta formalização poderia possibilitar a transformação desta
ideia, ou imagem, em um gesto que tem como finalidade o sucesso da intenção sonora que se
quer realizar.
A partir deste contexto é possível considerar que as metáforas podem ser um recurso
imagético que induz o gesto intencionado, mesmo que este seja um gesto novo e não realizado
nenhuma vez anteriormente (é neste ponto que acessamos nosso “conhecimento incorporado”
através da nossa memória “sensorial-motora” e habilidade associativa), o que poderia explicar
o frequente uso heurístico das metáforas como recurso didático no aprendizado da técnica
instrumental, interpretação e performance musical expressiva.

Referências
GODØY, Rolf Inge, HAGA, Egil e JENSENIUS, Alexander Refsum Exploring
Music-Related Gestures by Sound-Tracing. A Preliminary Study. Proceedings of
the COST287-ConGAS 2nd International Symposium on Gesture Interfaces for
Multimedia Systems (GIMS2006). 2006, 27-33
LEECH-WILKINSON, Daniel e PRIOR, Helen M. (2014). Heuristics for Expressive
Performance. In: Fabian, Dorottya, Timmers, Renee e Schubert, Emery (2014).
Expressivness in Music Performance: empirical approachs across styles and cultures.
Oxford University Press. p. 34 – 57.
LAKOFF, George. (1999). The Embodied Mind. In: Lakoff, George e Johnson, Mark. (1999).
Philosophy in the Flesh: the Embodied Mind & its Challenge to Western Thought. Basic
Books, New York – EUA. p. 16 – 44.
LEMAN, Marc (2008). Embodied music cognition and mediation technology. The MIT Press,
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LOUREIRO, Maurício Alves. (2006). A pesquisa empírica em expressividade musical:
métodos e modelos de representação e extração de informação de conteúdo expressivo
musical. Revista Opus 12, p. 07-32.
LOTZE, Martin e HALSBAND, Ulrike. (2006). Motor Imagery. Journal of Physiology - Paris
99. p. 386–395
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Gestaltung Und Bewegung in Der Musik. Haskins Laboratories Status Report on Speech
Research. SR·111/ 112. p. 265 – 278.
SAGIV, Noam, ILBEIGI, Alireza e BEN-TAL, Oded. (2011). Reflections on Synesthesia,
Perception, and Cognition. Intellectica, 2011/1, 55, pp. 81-94.

292
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

SCHNEIDER, Albrecht e GODOY, Rolf Inge. (2001). Perspectives and Challenges of


Musical Imagery. In: GODOY, Rolf Inge e JORGENSEN, Harald. (edited by). Musical
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THOMAS, Nigel J.T. (2014). Mental Imagery. Standford Encyclopedia of Philosophy. First
published Tue Nov 18, 1997; substantive revision Fri Sep 12, 2014. Acesso em: http://
plato.stanford.edu/entries/mental-imagery/

293
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

The observation of ancillary gestures using the Laban-Bartenieff Movement


Fundamentals

Thaís Fernandes Santos


UFMG
thaisfrs@yahoo.com.br

Maurício Alves Loureiro


UFMG
mauricio.alves.loureiro@gmail.com

Abstract: The aim of this work is to examine the physical gestures performed by the musicians
during a musical performance through the visual analysis using the Laban-Bartenieff Movement
system. The purpose is to suggest an investigation for observers perceiving movement without
formal training in this topic. For this, we designed an experiment involving five professional flutists
who were asked to play two different excerpts, four times each one: (1) the second movement of
Wind Quartet No. 2, in G major by G. Rossini, (2) Allegro meno mosso of Woodwind Quartet by H.
Villa-Lobos. The motion and audio of different flutist performances were analyzed to evaluate the
relationship between physical gestures and musical phrase organization. Concerning the relation
between ancillary gestures and the expressive intentions, we observed three dominant trends:
grouping by musical phrase, enhance sense of tempo or rhythmic unit and the conduction of musical
motif. The findings point to a possible relationship between musicians’ movement and the planning
of musical phrases, given that the motion conveys the performer’s musical intentions.
Key-words: nonverbal communication, musical gesture, musical expression, music performance.

A observação do gesto acompanhante a partir dos Fundamentos dos Movimentos de Laban-


Bartenieff
Resumo: O objetivo deste trabalho é realizar uma análise visual, através dos fundamentos dos
movimentos de Laban-Bartenieff, nos gestos físicos realizados pelos músicos, durante uma
performance. Para tanto, realizamos um experimento envolvendo cinco flautistas profissionais
executando dois excertos musicais: (1) o segundo movemento do quarteto para sopros de G. Rossini,
(2) Allegro meno mosso do quarteto para madeiras de H. Villa-Lobos. Analisamos o movimento e o
áudio dos flautistas e as possíveis relações entre o gesto acompanhante e a maneira na qual os
músicos organizam suas frases musicais. Apontamos, assim, três possíveis hipóteses de relação entre
eles: o gesto relacionado com as frases musicais, o gesto realçando o pulso ou uma unidade rítmica
e, por fim, o gesto como condutor de um motivo musical. Nossas observações apontam para uma
possível relação entre o movimento e o discurso musical ou a maneira na qual eles se comunicam
com os ouvintes e/ou com outros músicos, numa performance em conjunto.
Palavras-chave: comunicação não verbal, gesto musical, expressão musical, performance musical.

Introduction
The process in which the musical communication occurs varies broadly. Empirical research
has shown evidence that performers manipulate consciously different acoustic parameters,
aiming at expressing their ideas to the audience and to other musicians.
The physical gestures produced by players, during their performance, are another aspect
that has been observed by a broad group of researchers. Results have indicated that although
body movements are essential to the sound production of the instrument, gestures, in many

294
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

cases, are so closely related to the musicians’ artistic intentions (M. Wanderley, 2002).
The term ancillary gestures designates those gestures that are part of performance but
are not produced to generated sound (Miranda & Wanderley, 2006) and these movements
have been considered essential to the instrumentalist’s performance. Furthermore, these
gestures are stable and reproducible even after extended periods of time.
Jane Davidson was able to observe that the audience can recognize the musician’s
expressiveness in both modalities: acoustical and visual. Furthermore, results have shown
that participants considered the image as important as sound (Davidson, 1994). Susan Goldin-
Meadow also corroborated with the idea that gestures appear to serve an important function
for listeners (communication), although the mechanism by which we produce gestures need
not involve communication and the audience. An alternative possibility is that we provide
gestures as part of the process of thinking (Goldin-Meadow, 2005).
According to Goldin-Meadow, gestures appear along with speech and consequently,
assumes the intentionality of communication. The author explains that the speakers may not
be entirely aware of having produced hand movements, but they are very conscious of having
spoken. In this sense, the gestures are used for communication and, consequently, they are
deliberate. According to Rudolph Laban, the performers make use of their movements from
their abilities and acquired skills to convey expressions, intentions, and emotions (Chagnon,
Campbell, & Wanderley, 2005).
The aim of this work is to analyze the physical gestures executed by musicians during a
musical performance and to examine the pattern of gestures related to their artistic intentions
and aspects of the musical structure, using the Laban-Bartenieff system. The purpose is to
suggest an investigation of perceived movement by observers without formal training in this
topic.
Although musicians express awareness through the manipulation of sound, most players
are likely to show movement throughout their bodies in some way. In this study, we use the
gestures during the investigation of musical phrase boundaries. Given that motion is
associated with musical discourse, our hypothesis is that gestures can express the way which
musicians understand musical structure and convey the direction of a musical phrase.
The Laban-Bartenieff Movement Fundamentals was created by Rudolph Laban (1879 –
1958) and Irmgard Bartenieff (1900 – 1981) and consists of a framework for describing,
recording, and developing movement. Although intense training is needed to ultimately
understand the system, an adequate knowledge of Laban-Bartenieff Movement Fundamentals

295
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

can be learned and used to observe movements.

Method
The experiment involves five professional flutists who were asked to play two different
excerpts, four times each: (1) the second movement of Wind Quartet No. 2, in G major by G.
Rossini; (2) the Allegro meno mosso of Woodwind Quartet by H. Villa-Lobos.
Movement and audio data obtained from different performances of every flutist were
analyzed to evaluate the relationship between physical gestures and musical phrase
organization. Flutists involved in this experiment have not received formal movement
training.
Motion tracking was done with the NDI Optotrak Certus motion capture device, at a
sampling rate of 100 frames per second. Markers were positioned on the flutists’ bodies and
instruments. The Optotrack cameras were placed vertically, two meters away from the
musicians. Two rigid bodies were used, one on the flutists’ head and another on the
instrument. 3-D spacial position of infra-red markers was recorded as a function of time.
Coordinates x, y and z corresponded to lateral displacement, height and depth, respectively.
We also used video and sound recordings - obtained using the Zoom Q2HD Handy HD Video
Recorder – as a complementary tool for analyzing movement.

Analysis
Laban-Bartenieff Movement Fundamentals describes movement through the four inter-related
categories of Space, Effort, Shape and Body. However, in this paper, we focus on a simple
understanding of concepts to one particular class: Shape.
The shape is the gesture a person’s body makes in space. In other words, this is
apparently connected with the body attitude in space. That said, shaping qualities determine
not only particular body use, but also the mental intent of the person, and can be extremely
useful for observation of musicians.
The relationship between body and space produces shapes in constant movement. There
are three modes of shape changing: (1) flow, (2) direction and (3) carving. The shaping
qualities are primarily related to breath, given that both are separated by opening (inhaling)
and closing (exhale) actions. The shaping features are extensions or reflections of the motion
as in the breath. The opening-closing shaping qualities are (1) rising-sinking, vertical (2)
advancing-retreating, horizontal and (3) widening-narrowing, sagittal, through the

296
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

manipulation of the body.


Opening and closing actions can be explained by showing the direction and plane through
which the body is moving. The directional shape can be a cyclical or linear motion, which the
body is moving in space aiming to achieve the particular point. Finally, the carving shape
involves the interaction between two bodies in mutual adaptation.

Discussion
According to Marc Leman, the narrative and experimental viewpoints may be integrated
through a particular approach to the concept of embodiment. The human body is thereby
understood as a mediator between the musical mind and the physical environment, and
gestures can be perceived as the way in which this mediator deploys itself in space and time
(Leman, 2008).
The author explains that depending on the viewpoint, the gesture can be studied as
simple body movement (starting with kinematics and kinetics), or as an expression of human
intentionality, an experience that is implied by this body movement.
During the visual observation, we recognized and selected four shapes: cyclical motion in the
clockwise direction; forward and backward; up and down; and finally, no entirely cyclical
movement also in clockwise direction, considering distinctive functions for each one.

Figure 1: Four selected shapes: full circle, forward and backward, up and down, and half circle.

The cyclical motion was identified when musicians grouped the musical phrase
acoustically. For instance, figure 3 shows the relative movement of the flute in 3 dimensions
played by flutist A during the performance of excerpt by Villa-Lobos.

Figure 2: Excerpt of Allegro meno mosso of woodwind Quartet by Heitor Villa-Lobos.

297
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Figure 3: 3D trajectory of the flute in excerpt by Villa-Lobos, for Flutist A. The triangle registers the initial
point of the movement segment.

According to the visual observation of flutist A’s motion, we can perceive only one
gesture in his/her performance. This broad and unique movement can suggest the relation
between physical gesture and organization of musical phrases. Once that, we perceived no
sound and gestures segmentation during the performance of the flutist A.
On the other hand, the flutist B, during his/her interpretation of the same excerpt,
performed gestures related with rhythmic sense, given that the motion of flute corresponds in
the specific instance of the pulse. Figure 4 represents the shape, forward and backward, and
the possible relationship of this gesture and the time sense of music, being so another
interpretation of the same piece.
We perceived that the shape, forward and backward, also presents relation with the
sense of time, given that the position of the flute in fore front corresponds with the pulse of
this piece (grey ball marks).
The movement of up and down was identified in others studies (Teixeira, Loureiro,
Wanderley, & Yehia, 2015; M. M. Wanderley, Vines, Middleton, McKay, & Hatch, 2005) and
results have suggested that this particular motion also is related to the rhythmic structure of
phrase. The authors have pointed that the motion up/down (vertical movement) might be
necessary to keep regular features associated with time.
In our observation, we identified two different gestures to represent the same sense of
time, up/down and foward/backward. It can be related to the individuality of each musician
and his/her way to move in the space, given that the movements tended to be idiosyncratic. In
the last example, the gesture can be part of both level, structural (sense of tempo) and
interpretative (choice to express the pulse in a different plane).

298
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Figure 4: 3D trajectory of the flute in excerpt by Villa-Lobos, for Flutist B. The triangle registers the initial
point of the movement segment and the grey ball marks the pulse.

A natural motion to maintain a sense of tempo occurs when a musician taps his foot or,
like in these mentioned cases, when instrumentalists move their instrument up and down, to
keep rhythmic. Figure 6 shows the relative movement of the flute in a performance of two
different flutists (B on the top / C on the bottom), of Rossini’s excerpt. In the upper part of the
figure, we can perceive that the vertical movement of the instrument appears exactly in the
same point of the pulse, and another one, the motion is related to the rhythmic structure of
the piece.
The motif, dotted eighth-note and sixteenth-note is featured by the vertical movement of
each part of rhythm (sixteenth-note), gray circles. These findings corroborate with others
studies about the vertical motion (up/down) and the possible relationship between rhythmic
patterns and the sense of maintaining the time. Wanderley and colleagues have argued that
“eliminating body movement takes away a means of being aware of the passage of
time” (Wanderley et al, 2005, p.102).

Figure 5: Second movement of Wind Quartet No. 2, in G major by Gioachino Rossini.

Figure 6: Comparing time-warped graphs of vertical movement of flute for flutist B (top) and C’s (bottom)
during their performances. The pulses are marked by triangles and the lines are the segmentation of
each bar.

299
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

The relationship between ancillary gestures and the musical score, as well as the
difference between styles movement among performers, can vary broadly. However, since our
focus is to present a visual analyze and to recognize the possible relation with the way that
musicians organize their musical idea, it becomes necessary to compare different flutists to
understand different interpretations and individual choices.
Finally, the shape, the half circle, has been recurrent in several flutists in a specify
musical motif, upbeat and downbeat. The mentioned theme is considered as a unit used by
Rossini to compose this excerpt. The relation between the gesture (half circle) and this
particular musical part can be explained due to the mental representation of this known motif.
This short part consists of the anacrusis in which the upbeat clearly drives to the point that we
consider as the goal point, assuming that the downbeat is the strongest part of the motif.
Figure 7 shows the shape featuring the half circle performed by flutists D and E.
According to Leman, many of these repeatable movement patterns seem to be
intimately connected to the structure of the music being performed. It should be noted that
these movements might also have a communicative function of enhancing the perceivers’
experience of the sound’s phrasing (Leman, 2008).

Figure 7: 3D trajectory of the flute in the motifs sections (upbeat and downbeat) by Rossini, for Flutist D
(left) and E (right). The triangle registers the initial point of each movement segment and the stars mark
the onset of the downbeat.

Conclusion
In this paper, we have present findings from an exploratory analysis of flutists’ expressive
gestures. We have analyzed the motion of five flutists using the Laban-Bartenieff Movement
Fundamentals and the possible relation between the shapes performed by musician and their
musical intentions. For this paper, we just used the shape category and identified four gestures
through a visual analysis, which we demonstrated using the movement tracker data,
previously captured.
Concerning the relation between ancillary gestures and the organization of musical
phrase, we observed three dominant trends: grouping by the musical phrase, enhance the

300
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

sense of tempo or rhythmic structure and the conduction of musical motif. Theses directional
shapes seem the motion performed by flute players until the musical object point. These
findings point to a possible relationship between musicians’ movement and the organization
of their musical ideas, conveying the performer’s musical intentions.
Previously, Wanderley (2002) points that there is the correspondence between the
gestures at specific points in the score, due the recurrence that an instrumentalist played the
same piece many times. It suggests that ancillary gestures are not randomly performed nor
just a visual effect, but that these gestures are an integral part of the performance process.
Future research is needed to clarify the different performance styles and the features of
gestures performed by each one by an individual analysis.
The work presented here was just a part of the process for a comprehensive analysis of
musicians’ gestures including the system described by Rudolph Laban and Irmgard Bartenieff
and the identification of shapes and the relation of mental representations of the musical score
in ancillary body movement.

Reference
Chagnon, M.-J., Campbell, L., & Wanderley, M. (2005). On the Use of Laban-Bartenieff
Techniques to Describe Ancillary Gestures of Clarinetists. Montreal. Não publicado.
Davidson, J. (1994). What type of information is conveyed in the body movements of solo
musician performers? Journal of Human Movement Studies, 6, 279–301.
Goldin-Meadow, S. (2005). Hearing gesture: How our hands help us think. Harvard
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Miranda, E., & Wanderley, M. (2006). New Digital Musical Instruments: Control and
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Teixeira, E. C. F., Loureiro, M. A., Wanderley, M. M., & Yehia, H. C. (2015). Motion
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Wanderley, M. M., Vines, B. W., Middleton, N., McKay, C., & Hatch, W. (2005). The Musical
Significance of Clarinetists’ Ancillary Gestures: An Exploration of the Field. Journal of
New Music Research, 34(1), 97–113.

301
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Comunicação gestual entre músicos:


Uma revisão dos métodos de pesquisa empregados

Aglaê Machado Frigeri


Universidade Federal do Paraná
glafrigeri@gmail.com

Mayra Stela Dunin Pedrosa


Universidade Federal do Paraná
mayrapedrosa@hotmail.com

Resumo: O objetivo deste artigo é apresentar pesquisas recentes sobre os métodos empregados para
estudos sobre a comunicação gestual entre músicos. Por ser considerada um conhecimento tácito, a
comunicação gestual é investigada como elemento importante para uma boa performance, já que
salienta a compreensão do material musical por parte dos integrantes de um grupo, além de ajudá-los a
realizarem ajustes entre si. Assim, este artigo visa contribuir para o esclarecimento sobre quais
caminhos têm sido adotados com maior frequência nos últimos anos que procuram ampliar o
entendimento sobre a comunicação gestual. Para tanto, foi feita uma revisão sistemática, abrangendo
tanto a música de câmara quanto a popular, de artigos de língua inglesa, disponíveis em banco de
dados selecionados. A tradução para o português é de inteira responsabilidade dos autores.
Palavras-chave: comunicação gestual, interação não-verbal, movimento corporal.

Gestural communication among musicians: a review of research methods employed


Abstract: the focus of this article is to present recent research on methods employed for studies on
gestural communication among musicians. As it is considered tacit knowledge, gestural
communication is studied as an important element for a good performance, since it reinforces the
comprehension of the musical material by the members of an ensemble, besides helping them
coordinate with each other. So, this article aims to contribute to the enlightenment of the paths more
frequently adopted in the last years for a comprehensive understanding of gestural communication.
For this, a systematic review was done focusing in articles written in English available in selected data
banks, covering both chamber music and popular music. The translation into Portuguese is the sole
responsibility of the authors.
Keywords: gestural communication, non-verbal interaction, body movement.

1. Introdução
As pesquisas relacionadas à comunicação gestual apresentam abordagens bastante
diversificadas, tanto no que se refere à terminologia utilizada quanto aos métodos de análise.
Por possuírem caráter interdisciplinar, estas pesquisas podem ser encontradas no campo da
psicologia, neurologia, linguística, biomecânica e também música. Portanto, torna-se
fundamental alguns esclarecimentos quanto à terminologia empregada, para que o foco no
âmbito musical seja preservado (Jensenius, 2014) e para que seja possível identificar de
antemão o foco dos métodos empregados nas análises. Além de “comunicação gestual”,
podem ser encontrados os termos “modos de comunicação”, “comunicação não-verbal”,

302
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

“interação não-verbal”, “movimento corporal” e, especialmente, “gesto musical”. Segundo


Matt Rahaim:
Tentativas para definir gesto musical raramente entram em acordo; os fatos
produzidos por medidas quantitativas e interpretações qualitativas parecem estar em
desajuste; e, apesar da necessidade desesperadora de um diálogo interdisciplinar,
humanistas e cientistas parecem estar mutualmente fora do tom. (in Gesture 10:1,
2010, p.109)

De acordo com Mello, Kaminski e Ray (2014), “nas pesquisas realizadas no Brasil
sobre comunicação gestual, o enfoque é voltado para o movimento do corpo na interpretação,
assim como na expressão musical (Zavala, 2012; Póvoas, 2009, 2012; Domenici, 2013)”. Por
sua vez, a presente pesquisa tem como foco a revisão sistemática de textos relacionados à
interação entre músicos de grupos de câmara, mais especificamente quartetos de cordas e
quartetos/sextetos de jazz. Este recorte deve-se à semelhança entre estes grupos, embora, num
primeiro momento, possam parecer completamente distintos. Segundo Seddon & Biasutti
(2009), a maior evidência é justamente a diferença entre os instrumentos e os gêneros
envolvidos, mas a semelhança encontra-se na tentativa de ambos os grupos em “criar uma
nova performance musical”, assim como na comunicação entre seus integrantes, durante os
ensaios e concertos, para alcançá-la.
Este estudo pretende, por meio de uma revisão sistemática, apresentar pesquisas
recentes sobre os métodos empregados para estudos sobre a comunicação gestual entre
músicos. Desta forma, concluímos que poderíamos contribuir para um esclarecimento sobre
quais os caminhos adotados com maior frequência nos últimos anos que buscam uma
compreensão mais abrangente sobre esta temática, ao fornecer um panorama considerável
sobre pesquisas recentes aos futuros pesquisadores da área. Vale ressaltar que cada um dos
artigos selecionados traz um leque generoso de pesquisadores em sua referência bibliográfica,
que deve ser consultado para o devido aprofundamento que uma pesquisa exige.
Os artigos aqui citados são, em ordem alfabética: A Meta-study of musicians' non-verbal
interaction (Jensen & Marchetti, 2010); Analysis of Leadership in a String Quartet
(Glowinski, Badino, D'Ausilio, Camurri & Fadiga, 2012); Bodily Mediated Coordination,
Collaboration, and Communication in Music Performance (Davidson & Broughton, 2015);
Jazz Improvisers’ shared understanding: a study case (Schober & Spiro, 2014); Method for
Analyzing Gestural Communication in Musical Groups (Hospelhorn & Radinsky, 2016);
Sensorimotor communication in professional quartets (Badino, D'Ausilio, Glowinski,
Camurri & Fadiga, 2014); Synchronization and leadership in string quartet performance: a

303
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

case study in auditory and visual cues (Timmers, Endo, Bradbury & Wing, 2014); Toward a
dynamical theory of body movement in musical performance (Demos, Chaffin & Kant, 2014);
Understanding movement during performance: A recurrence quantization approach (Demos,
Frank & Chaffin, 2011).

2. Metodologia
Trata-se de um artigo de revisão sistemática, um método de pesquisa meticuloso que utiliza
como fonte de dados a literatura sobre determinado tema, identificando os métodos de
pesquisa utilizados em uma área e indicando novos caminhos para futuros pesquisadores.
Inicialmente, visando identificar os artigos sobre o assunto, realizou-se uma busca
automática seguindo as seguintes etapas:
1. Definição dos eixos de pesquisa: representam a temática de pesquisa envolvida, ou
seja, Comunicação Gestual e Música.
2. Definição das palavras-chave: definidas a partir dos eixos de pesquisa e da leitura
prévia de artigos da área de pesquisa. É importante ressaltar que para uma busca mais
abrangente nas bases de dados, os termos foram definidos em língua inglesa. Sendo assim,
utilizou-se a combinação das palavras-chave (strings de busca) apresentadas na tabela 1.

Eixo de Pesquisa Palavras-chave


Comunicação Gestual Non-verbal interaction
Non-verbal communication
Collaboration
Gestural communication
Body movement

Gesture
Música Music
Improvisation
Performance
Musical
String quartet
Jazz
Chamber orchestra
Tabela 1 – Palavras-chave utilizadas para pesquisa
Fonte: Os autores.

3. Busca em base de dados: de acordo com as palavras-chave e as strings, realizou-se


uma busca automática nas bases Web of Science, Portal de Periódico CAPES, Google
Schoolar e Research Gate, de agosto a setembro de 2016. Buscas manuais também foram

304
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

feitas nas referências bibliográficas dos artigos encontrados, também denominada busca snow
balling.
Num segundo momento, iniciou-se a seleção dos artigos, tendo como critérios de
inclusão: apenas artigos científicos e apenas documentos publicados entre 2010 e 2016. Como
elementos de exclusão, foram desconsiderados os artigos relacionados à educação infantil,
orquestra, regência, piano, sopros, percussão. A filtragem foi realizada em título, resumo e
palavras-chave; quando estes elementos não eram devidamente esclarecedores, foi feita uma
leitura da introdução e da conclusão.
Finalmente, chegou-se à formação de banco de artigos que foi elaborado a partir da
leitura completa dos artigos para verificação do alinhamento ao tema de pesquisa abordado. A
extração de dados foi relacionada às informações de autoria, ano de publicação e método de
pesquisa. A análise dos artigos refere-se aos procedimentos técnicos dos métodos de pesquisa
utilizados, assim como a natureza dos dados. Desta forma, o banco de artigos é composto de 9
artigos representativos da temática envolvida, que podem ser identificados na tabela 2.

3. Resultados das Análises dos Artigos


Serão apresentadas as metodologias de cada artigo que compõem o banco representativo da
temática de maneira sucinta na tabela 2. Quanto aos procedimentos técnicos, é possível
identificar que a maior parte dos artigos adota a pesquisa experimental como procedimento de
abordagem. A pesquisa documental e o estudo de caso também foram identificados como
procedimentos utilizados, contudo estes aparecem em menor proporção. Em relação à
combinação de procedimentos técnicos, ressalta-se que um artigo adota o levantamento
bibliográfico e a pesquisa documental. E outros dois artigos adotam o levantamento
bibliográfico e a pesquisa experimental.
Quanto à natureza dos dados, mais da metade dos artigos adotam uma abordagem
qualitativa. Os artigos que adotam uma abordagem quantitativa representam 23% do banco de
artigos. Outros 15% adotam uma abordagem conjunta, qualitativa e quantitativa.

Gráfico 1 – Análise quanto à natureza dos dados. (Fonte: Os autores.)

305
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Título Autor Ano Metodologia


A Meta-study of Jensen & 2010 Meta-estudo. Levantamento Bibliográfico. Pesquisa documental. Abordagem
musicians' non-verbal Marchetti Qualitativa.
interaction Enfoca a comunicação não-verbal como um fator de segurança para uma boa
performance, já que possibilita aos músicos corrigirem-se sem interrupções,
além de conceitos sociais, como processos de interação/divisão, BDI Model e
autoeficácia.

Análise de registros áudio visuais de aulas e apresentações.
Analysis of Leadership in Glowinski, 2012 Pesquisa Experimental. Abordagem Quantitativa (com base em econometria,
a String Quartet Badino, D'Ausilio, ou Granger Causality).
Camurri & Fadiga Análise de movimento de cabeça dos músicos em relação a um músico
referencial, identificando o e/ou os líderes, ou seja, aquele(s) que tem
capacidade de influenciar o comportamento dos outros músicos.
Bodily Mediated Davidson & 2015 Levantamento Bibliográfico. Abordagem Qualitativa.
Coordination, Broughton Trata do corpo na performance, aspectos motores, tipos de comportamento
Collaboration, and corporal, a função dos comportamentos corporais e faciais dos músicos na
Communication in Music performance, o corpo nos processos de parceria, os tipos de performance
Performance comunicativa, finalizando com um olhar sobre as diferenças culturais e de
gênero.
Jazz Improvisers’ shared Schober & Spiro 2014 Estudo de Caso. Abordagem Qualitativa.
understanding: a study Experimento feito com dois músicos de jazz que, sem se conhecerem nem se
case verem, gravam três improvisos sobre standards de jazz, depois gravam
depoimentos sobre seus desempenhos, intenções, além de julgar o
desempenho do outro. O estudo conclui que os músicos não precisam ter a
mesma compreensão do que fazem para realizar um grande improviso.
Method for Analyzing Hospelhorn & 2016 Levantamento Bibliográfico. Pesquisa Experimental. Abordagem Qualitativa.
Gestural Communication Radinsky Investiga o papel do gesto como meio de compartilhar negociações de
in Musical Groups significado e aprendizagem musical.

Apresenta um questionário sobre os gestos produzidos durante os ensaios. O
método apresentado consta da gravação do ensaio de um quarteto de cordas,
em vídeo, e a análise dos gestos musicais expressivos; observação e descrição
dos movimentos de cabeça e de torso; procura de semelhanças de gestos entre
os integrantes; ligação dos gestos com a partitura.
Sensorimotor Badino, D'Ausilio, 2014 Pesquisa Experimental. Abordagem Quantitativa (com base em econometria,
communication in Glowinski, ou Granger Causality).
professional quartets Camurri & Fadiga Investigado através do uso de gravações (vídeo câmeras), marcadores e
sensores são ligados ao corpo dos integrantes de quartetos de cordas
profissionais. O método utilizado (Granger Causality) se baseia em um
algoritmo que mede se o comportamento de um músico tem alguma influência
sobre o comportamento de outro músico do grupo.
Synchronization and Timmers, Endo, 2014 Pesquisa Experimental. Abordagem Qualitativa.
leadership in string Bradbury & Wing Registro em áudio e vídeo de um quarteto de cordas, que repetiram quinze
quartet performance: a vezes o mesmo trecho, realizando pequenas variações interpretativas
case study in auditory individuais a cada vez. Aplicação de um questionário referente às impressões
and visual cues de cada músico sobre tempo e interação com os outros.
Toward a dynamical Demos, Chaffin & 2014 Levantamento Bibliográfico. Pesquisa Experimental. Abordagem Qualitativa. 

theory of body movement Kant Explica os métodos de análise e como eles revelam conexões adicionais entre
in musical performance movimento, estrutura e expressão.
Understanding Demos, Frank & 2011 Pesquisa Experimental. Abordagem Qualitativa e Quantitativa. 

movement during Chaffin Partindo da afirmativa que a análise dos métodos tradicionais para exploração
performance: A dos movimentos dos músicos em performance acaba por demonstrar que a
recurrence quantization relação do movimento com a marcação do tempo musical é complexa e
approach possivelmente caótica, os autores sugerem o uso de novos parâmetros de
análise, baseados em uma técnica da Teoria de Sistemas Dinâmicos
desenvolvida para analisar sistemas caóticos, a reconstrução de fase-espaço
(PSR), que reorganiza toda informação registrada de movimentos durante a
performance numa única dimensão. Uma vez que todo o sistema tenha sido
reconstruído, ele é submetido à análise quantitativa de recorrência (RQA),
para localizar similaridades de uma mesma performance, e a análise
quantitativa de recorrência cruzada (CRQA), para comparar diferentes
performances.
Tabela 2 – Artigos e metodologias empregadas. (Fonte: Os autores.)

4. Discussão
Concluiu-se primeiramente que a pesquisa experimental foi o método de pesquisa mais
utilizado por melhor adequar-se ao estudo da comunicação gestual entre músicos,
especialmente por proporcionar uma investigação mais criteriosa das relações de causa e

306
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

efeito do gesto dentro do contexto musical. Observamos ainda que alguns artigos se limitam à
explicação de termos envolvidos na temática, pois a diferença de termos relacionados à
comunicação gestual acaba sendo uma das dificuldades a se transpor no processo de pesquisa
sobre este assunto. Por exemplo, a pesquisadora Jane W. Davidson utiliza o termo movimento
corporal, pois encara o corpo como elemento inserido no processo de linguagem, enquanto
que Alexander Demos, apesar de utilizar o mesmo termo, considera inapropriado adaptar o
contexto musical, onde “os significados e os gestos são ambíguos e vagos”, a métodos e
teorias da área de comunicação. Por sua vez, pesquisadores como Karl K. Jensen e Emanuela
Marchetti, utilizam o termo interação não-verbal procurando “um entendimento mais
profundo da música como uma prática social de habilidades”.
Como consequência deste embasamento teórico se voltar tanto para Linguagem,
quanto para Sociologia, Psicologia e/ou Música, as escolhas dos métodos utilizados nas
pesquisas experimentais acabam sendo muito divergentes, abrangendo desde recursos
tecnológicos simples até outros bastante sofisticados, sobrepostos a complexos raciocínios
físico-matemáticos. Este é um aspecto importante a ser ressaltado aos futuros pesquisadores
da temática em questão, seja para escolher a metodologia adequada ou para selecionar o
material necessário para coletar devidamente os dados da pesquisa.
Outro fato que se conclui é que a maioria das pesquisas analisadas contemplam a
abordagem qualitativa, exatamente por ressaltar a importância das interpretações dos eventos,
mais do que as interpretações do pesquisador, e por procurar compreender a totalidade do
fenômeno corporal e interativo da comunicação gestual entre músicos.

5. Bibliografia
Badino, L., D'Ausilio, A., Glowinski, D., Camurri, A. & Fadiga, L. (2014). Sensorimotor
communication in professional quartets. Neuropsychologia, 55, 98-104.
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307
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

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Timmers, R., Endo, S., Bradbury, A. & Wing, A. M. (2014). Synchronization and leadership
in string quartet performance: a case study of auditory and visual cues. Frontiers in
Psychology, 5, 645.

308
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Mapeamento Gestual Braille na Livre Improvisação

Antonio Fernando da Cunha Penteado


Departamento de Música, Instituto de Artes, UNICAMP
nando@nandopenteado.com

José Eduardo Fornari


Núcleo Interdisciplinar de Comunicação Sonora (NICS / COSEN), UNICAMP
tutifornari@gmail.com

Resumo: O gesto musical é uma habilidade cognitiva voltada à expressão estética da arte sonora. A
livre improvisação musical permite a total liberdade exploratória de tal capacidade. Este trabalho
apresenta o Braille Handles (BH), um equipamento cuja finalidade original é a escrita do braille em
ambientes computacionais. Neste trabalho, o BH é utilizado como um instrumento musical, ativado
por gestos em braille. O controle gestual de processos de síntese sonora envolve um processo
chamado de mapping. Este é responsável por fazer a ponte entre o gesto musical e parametrização
estética da geração sonora computacional. O presente trabalho, além de demonstrar o uso do BH como
um instrumento musical, também apresenta uma utilização prática do conceito de mapeamento, como
recurso composicional e performático, para a livre improvisação, como ferramentas de
desenvolvimento da percepção e da cognição musical.
Palavras-chave: gesto musical, estrutura rítmica, processo composicional.

Abstract: The musical gesture is a cognitive ability focused on the aesthetic expression of sound art.
Free improvisation allows the full exploratory freedom of such ability. This work presents the Braille
Handles (BH), an equipment whose original purpose is the writing of braille in computational
environments. In this work, BH is used as an expanded musical instrument, activated by gestures in
Braille. The gestural control of sound synthesis processes involves a process called mapping. This is
responsible for making the bridge between the musical gesture and aesthetic parameterization of the
computational sound generation. The present work, in addition to demonstrating the use of BH as an
expanded musical instrument, also presents a practical use of the concept of mapping as a
compositional and performative resource for free improvisation as tools for the development of
musical perception and cognition.
Keywords: musical gesture, rhythmic structure, music composition.

Introdução
A performance musical é uma arte fortemente dependente tanto do domínio do tempo quanto
da habilidade do interprete em controlar assertivamente gestos musicais a fm de maximizar a
expressividade de sua performance, de acordo com uma intenção estética compartilhada, entre
si (interprete) e aquela intrínseca à obra (dada pela notação musical). O movimento corporal é
uma das mais habilidades cognitivas mais desenvolvidas, onde indivíduos normais (sem
deficiências motoras) são capazes de controlar intrincados e simultâneos movimentos,
aparentemente sem esforço mental. Gesto musical é aqui entendido como o movimento (do
interprete) com intenção estética (necessário para controlar a geração dinâmica do som
musical). No entanto, outros tipos de gesto podem ser utilizados para o controle de processos
musicais, como é aqui apresentado.

309
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

No universo da deficiência visual, o alfabeto braille é utilizado para diversas atividades,


entre elas também para a notação musical. Para que uma partitura seja acessível ao deficiente
visual, esta deverá ser impressa em relevo no sistema conhecido como "musicografia braille",
o qual se utiliza das mesmas células de seis pontos da escrita convencional em braille, porém
com uma diferente interpretação dos símbolos para representar os elementos musicais
(Penteado, Zattera e Fornari, 2015). Contudo, Bonilha (2006), afirma que "os músicos com
deficiência visual possuem pouca autonomia nesse processo, havendo sempre a necessidade
do envolvimento de uma pessoa vidente", referindo-se aqui a uma pessoa com visão normal.
Uma das questões que prejudicam a autonomia do músico com deficiência visual é a
dificuldade de inserir dados do sistema braille1 no computador utilizando um teclado
convencional para informática que não tem uma maneira direta para a inserção de células
braille. Os poucos dispositivos que permitem tal procedimento como os displays braille
(http://www.acessibilidadelegal.com/33-display-braille.php) possuem um custo elevado.
Pensando em minimizar o problema da inserção de dados, os autores deste trabalho
desenvolveram anteriormente um sistema de baixo custo para a inserção direta das células
braille em computadores, denominado BH (Braille Handles) e possui patente requerida no
INPI sob número de registro BR10201600556. O invento possui seis chaves, cada uma
relativa a um dos seis pontos de uma célula braille e permite a adição de outras que podem
funcionar como as teclas de deslocamento (control, alt e shift) de um teclado comum.
Este equipamento foi projetado para ter como função principal a inserção de dados em
braille no computador como se fosse um teclado convencional, com a única diferença que em
vez de teclas alfanuméricas, o dispositivo possui os pontos de uma célula braille. Mas sua
concepção permitiu que tal função pudesse ser ampliada para além de um dispositivo de
inserção de texto para atuar como um controlador eletrônico inteligente de uso geral, capaz de
ser integrado a diferentes equipamentos como celulares, teclados musicais midi, e outros que
possuam uma interface de comunicação serial usb, podendo ser também integrado a softwares
que ofereçam controle através de um teclado de computador ou de protocolos como OSC
(Opend Sound Control - http://opensoundcontrol.org/osc), UDP, TCP, etc.
Dentro da perspectiva de buscar novas alternativas de uso para o invento, aventou-se a
possibilidade de sua utilização como um instrumento musical digital, no controle gestual de
síntese sonora, o que permitiu sua participação no concerto da obra "Treatise" do compositor
Cornelius Cardew, apresentado na íntegra pela primeira vez no Brasil na Casa do Lago da

1
sistema de escrita para cegos, onde os caracteres são representados por padrões (células) em alto relevo.

310
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

UNICAMP em 09/06/2016 por alunos da disciplina de pós-graduação oferecida pelo prof dr


Manuel Falleiros. Esta obra é conhecida como o "Monte Everest" das partituras gráficas,
composta por 193 páginas de notação musical alternativa baseada apenas em elementos
gráficos, sua criação foi inspirada no "Tractatus Logico-Philosophicus" do filósofo Ludwig
Wittgenstein, que examina os limites da linguagem humana. De forma similar, Cardew
buscou explorar em sua composição os limites da notação musical, utilizando símbolos não
convencionais e sem qualquer significado prévio, exigindo que cada músico ou grupo crie seu
próprio conjunto de significados para a execução deste concerto.
Este trabalho descreve algumas técnicas de utilização do BH neste contexto da prática
musical conhecida por Livre Improvisação, onde música é criada sem partitura ou convenções
prévias; porém guiada pela percepção musical e processos cognitivos dinâmicos dos
integrantes. Aqui, o BH é utilizado como um instrumento musical que explora a extrapolação
do conceito de mapeamento2 como um ferramenta em processos criativos e de performance
através das habilidades cognitivas do gesto musical.

Instrumentos, Gestos e Mapeamentos


A criação de instrumentos musicais digitais e o controle das sínteses sonoras de tais
instrumentos através do gesto do musicista consiste numa abrangente área do conhecimento
que envolve três importantes fases: a modelagem do instrumento; a captura do gesto do
musicista e; o processo de mapeamento;
A modelagem abarca todo o processo de estudo do funcionamento acústico de um
instrumento em cada estágio da sua cadeia transdutiva, desde o momento inicial de entrada de
energia mecânica no sistema introduzida pelo músico no momento do ataque, passando por
todo o processo de ressonância até a transdução final desta energia em som. O modelo
completo portanto envolveria a parametrização dos modos de ataque, do corpo do instrumento
e da sua ressonância, processo que demanda "um estudo sobre o comportamento físico dos
instrumentos, sua tradução em modelos matemáticos e, posteriormente, a sua estimulação
com sistemas de cálculo numérico" (Manzolli, 2015). Segundo o professor Sílvio Ferraz, o
termo transdução não é adequado quando após a modelagem, e já dentro de um sistema
virtual, o som sofre algum tipo de transformação, caso em que se prefere utilizar o termo
tradução para designar o processo.

2 mapeamento aqui refere-se à estrutura de conexão entre parâmetros de entrada da interface (no caso, o BH) e
os controles do processamento ou síntese sonora.

311
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Para uma definição básica do termo gesto aplicado neste ensaio temos: "a gesture is a
body movement that contains information" (Kurtenbach, 1990), ou seja, o gesto não é apenas
um movimento do corpo mas sim um movimento que carrega uma informação ou uma
intenção musical. Neste aspecto, para os propósitos deste trabalho interessa apenas a captura
gestual de movimentos que o musicista executaria com intuito de produzir som no
instrumento, embora durante a execução seja natural que o musicista produza outros
movimentos além dos que se deseja capturar. Os movimentos são capturados através de
sensores e transdutores, os primeiros possuem uma saída elétrica e os últimos realizam uma
transferência genérica de energia, apesar disso a maioria dos sensores são transdutores,
empregando um ou mais mecanismos de transdução para produzir a saída de sinal elétrico
(Wanderley, 2015). Os sensores podem ser dos mais diversos tipos, entre eles: resistivos,
campo eletromagnético, efeito hall, campo elétrico, campo magnético, ultrassom,
infravermelho, acelerômetros, giroscópios, bússolas, etc. Segundo o professor Marcelo
Wanderley, a escolha do sensor certo deve ser baseada no gesto que se prentende capturar e
não partir do ponto de vista contrário de pensar qual gesto se captura com um determinado
sensor, o que, segundo sua grande experiência nesta área, melhora o processo geral para uma
captura mais precisa, e ainda deixou em tom jocoso uma observação que é uma metáfora
bastante válida: "se você tiver um martelo o mundo todo lhe parecerá um prego", enfatizando
a necessidade de se pensar detalhadamente o que se pretende capturar antes de se escolher o
sensor mais adequado.
A terceira e última fase é chamada mapeamento e consiste basicamente na ligação entre
os parâmetros de controle derivados da captura da ação do performer (captura de seus gestos
para produzir música) com os parâmetros de síntese do instrumento digital (Wanderley, 2015).
Grosso modo o 'mapeamento' faz a interligação entre dados coletados dos gestos do musicista
e os parâmetros de controle de síntese, de maneira semelhante aos patch bays dos estúdios de
gravação ou os antigos sistemas de telefonia ligando ponto a ponto por meio de um cabo, no
caso do mapeamento apenas virtualmente. O papel do mapeamento abre espaço para uma
intensa discussão como dois pontos de vista contrastantes, o primeiro que entende o
mapeamento como uma característica ligada à composição e o segundo em que o
mapeamento é parte integral do instrumento, portanto influenciando a maneira como o
performer faz uso do instrumento em diferentes contextos (Wanderley, 2015).
Isto posto, "encontramo-nos diante da possibilidade de utilizar diversos níveis de
representação computacional como suporte para análise, composição e performance musical.

312
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Aplicados à extração de características do material sonoro, esses procedimentos auxiliam a


concepção de novas formas de escritura musical e interpretação" (Manzolli, 2013). Assim, o
estudo de estruturas generativas algorítmicas, síntese, análise e processos interativos irão
servir de suporte para a realização de projetos criativos com suporte computacional (Manzolli,
2015). Tais projetos podem ir desde sonificações e instalações até o uso em performances ao
vivo no estilo live eletronics ou ainda mais além em composição que explorem o uso de um
modelo em forma de instâncias capazes de gerar interatividade inclusive no próprio processo
de composição. Esta interatividade que poderia ser chamada de Live Interactive Composition,
coloca em questão os limites entre compositor, composição, intérprete e até mesmo a
partitura, enquanto o suporte físico para a composição. Além disso tais mudanças de
paradigmas envolveram a necessidade nos compositores de "consequentemente
desenvolverem diferentes formas de notação musical" (Fornari e Maia, 2011).

Mapeamento, braille e livre improvisação


Uma célula braille é um conjunto de seis pontos dispostos em duas colunas verticais com três
pontos cada uma, no BH, cada ponto é representado por uma tecla. A posição de cada ponto,
se está em relevo ou não, ou no BH se a chave está pressionada ou não, determina o um
significado para a célula braille, porém como com seis pontos o total de combinações
possíveis seria apenas 64, para ampliar o seu uso, o significado de cada combinação de pontos
dependo do contexto em que a célula aparece. Uma única célula braille pode ser a letra 'D', ou
o número '4', ou uma nota musical (a nota Dó com duração de semínima) (Penteado et al
2015). Se o braille é aplicado à matemática ou a uma língua estrangeira, a mesma combinação
de pontos pode ter ainda outros significados.
Para a utilização das células braille, inseridas no computador através do BH, como
controladoras dos parâmetros de sínteses sonoras, configurando assim o dispositivo como um
instrumento musical digital, as células são mapeadas através do software livre Puredata
(https://puredata.info/) para um conjunto de diversos tipos diferentes de sínteses sonoras,
entre as quais estão a síntese subtrativa, aditiva, granular, ring modulation, FM, AM, etc. As
células correspondentes às letras de "A" até "G" no braille podem ser mapeadas para as
frequências das notas musicais, ao longo de uma oitava, de Lá até Sol, ou as mesmas letras
poderiam determinar a intensidade de um oscilador de áudio, ou ainda, tais letras poderiam
ser mapeadas para os controles de graves, médios e agudos de filtros passa-banda ou controle
das suas larguras de bandas (fator Q). As possibilidades são muitas e a este mapeamento

313
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

capaz de produzir ou alterar o timbre do instrumento, referindo-se a uma ligação via software
entre o gesto e a síntese, recebe o nome de mapeamento.
A questão agora é: como seria possível extrapolar este conceito do mapeamento para
usá-lo como recurso na livre improvisação?
Miguel Antar traça um interessante paralelo entre a técnica do clown e o improvisador:
"Improvisação Musical Contemporânea não se submete a alguma expectativa de gênero no
que diz respeito ao resultado sonoro, mesmo trabalhando sobre alguma indicação básica de
direção; por exemplo improvisar com base em um quadro, ou partindo de uma palavra, (...) O
clown e, na nossa perspectiva, o músico improvisador, precisam ter uma reação imediata à
situação em que estão envolvidos." (Antar, 2014)
Observa-se no texto acima a necessidade do livre improvisador de possuir a
sensibilidade de captar elementos, muitas vezes não diretamente musicais, como uma imagem
ou uma palavra, e usar isso para nortear a sua improvisação. A ideia de se fazer esta tradução
de algo não musical para um elemento sonoro é bastante próxima estruturalmente ao que
ocorre na técnica do mapeamento em sistemas de instrumentos digitais.
Pode servir como ferramenta ao improvisador, mentalizar de um lado os estímulos do
grupo musical em que atua e organizá-los como se fossem dados de entrada a serem
processados por um sistema computacional, de outro lado categorizar as possibilidades
timbrísticas de seu instrumento e criar uma função de interconexão entre ambas, esta
interconexão seria o recurso do mapeamento aplicado à livre improvisação.
A título de clarificar esta ideia com exemplos práticos, imagine-se que o musicista
recebe como estímulos alguns sons que variam em altura, aleatoriamente, indo do grave ao
agudo e vice e versa, supondo que também que tal musicista resolva utilizar a forma de reagir
categorizada por (Globokar) como "imitar". Para esta situação, o óbvio seria contar com sua
percepção e tocar as alturas exatas que ouve, porém, o musiscista poderia optar por algo mais
elaborado, e utilizar-se das variações de alturas e associar a elas algum outro parâmetro no seu
instrumento como a dinâmica, a duração ou a textura. Esta associação de variações de altura a
variações de um outro parâmetro instrumentístico é exatamente o que acontece na fase de
mapping quando em ambiente computacional se busca o controle de um instrumento digital a
partir de um gesto do musicista.
Evidentemente, este resultado pode ser obtido de maneira inconsciente, porém, se o
músico buscar de maneira voluntária a ponte entre o estímulo e a produção do som, as
chances aumentam de se obter um resultado final melhor ou no mínimo mais elaborado.

314
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Assim como ocorre com o mapeamento em ambiente computacional, na livre


improvisação também outras camadas de abstração podem ainda ser utilizadas, como por
exemplo o uso de mnemônicos taquigráficos para a representação de padrões rítmicos ou
melódicos como propostos por Penteado et al (2015) e apresentados na fig. 1 abaixo:

Fig. 1. Padrões rítmicos nomeados taquigraficamente com números

Se o improvisador, numa primeira tradução dos estímulos recebidos, fizer um


mapeamento para uma tabela taquigráfica em vez de mapear diretamente para som, pode ser
uma nova opção de interpretação, a fig. 2 apresenta um mapeamento inicial de altura para
padrões taquigráficos e em seguida um mapeamento dos padrões taquigráficos para som.

Fig. 2. Estímulo e reação mapeada para taquigrafia musical

O BH pode facilitar esta execução, permitindo que o musicista não precise tocar a célula
rítmica nota por nota, e sim apenas inserir o número correspondente ao padrão taquigráfico
que deseja executar.
De maneira inversa, o estímulo poderia ser rítmico, o musicista que decidide-se pela
ação de "imitar", poderia perceber o número de ataques por célula rítmica que algum músico
esteja tocando e mapear este número para a intensidade do som que seu próprio instrumento
esteja produzindo, e novamenteo o BH permitiria a inserção, em braille, da dinâmica
pretendida, pois é um dispositivo que permite igualmente captura do gesto como um
instrumento qualquer (como uma flauta, um teclado, etc) ou ainda permite a inserção de
valores numéricos, letras ou símbolos, como um teclado de computador.

Conclusão
Neste artigo buscou-se apresentar o BH, um dispositivo para a inserção computacional de
dados em braille aqui utilizado como controlador gestual mapeando dados da habilidade
cognitiva de articulação deste movimento de digitação como controlador musical para a Livre
Improvisação.
Na criação de instrumentos musicais digitais tem-se três fases distintas, a saber:

315
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

modelagem do instrumento, captura do gesto do musicista e o mapeamento. O mapeamento é


uma ponte de ligação entre entre gesto e síntese, e de certa forma é uma etapa de tradução do
gesto para parâmetros da síntese. Durante o exposto, mostrou-se um pouco das possibilidades
do BH funcionar como um instrumento musical, o mapeamento de caracteres em braille para
controle de sínteses diversas e além deste uso físico do mapeamento tentou-se ressaltar a
conexão intrínseca entre a técnica do mapeamento e a livre improvisação.
Alguns músicos chamam a técnica aqui apresentada de filtro, mas a palavra filtro parece
trazer um significado forte de uma 'ação subtrativa' ou de bloqueio de algum elemento
pertencente ao conjunto filtrado, já a palavra mapeamento parece ser mais adequada ao
propósito apresentado neste artigo, além de se aproximar melhor do efeito em si que
representa, e ainda traz uma forte carga semântica advinda dos estudos de instrumentos
digitais controlados por gesto.
Como pode-se imaginar, o campo da Livre Improvisação é muito amplo e, pela sua
natureza, de difícil determinação de regras ou diretrizes para um improvisador, a liberdade
para a criação neste campo é tão ampla que às vezes até o próprio conceito de nota musical se
perde, por esta razão, as ferramentas funcionam mais como estimulantes a este tipo de criação
do que condutores, mas sem dúvida proporcionam uma fonte a mais de ideias para o livre
improvisador permitindo-o explorar esteticamente através de suas habilidades perceptuais e
cognitivas.

Referências bibliográficas
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improvisação não é palhaçada. XXIV Congresso da Anppom - São Paulo/SP.
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Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Instituto de Artes).
Fornari, J., Maia, I. (2011). Interactive Notation: Towards a Computer Model for Interactive
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2236-8353. Encontro Internacional de Música e Artes Sonoras (EIMAS) 2011.
Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) - Juiz de Fora - MG. 13
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Massachusetts, California, New York, et al.: Addison-Wesley Publishing Company.
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316
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Wanderley, M. M. (2015). Notas de aula da disciplina MS - 106 A. Não publicado.

317
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Percepções de professores e alunos quanto ao uso de tecnologia no ensino e


aprendizagem de piano de nível superior

Luciana F. Hamond
Institute of Education, University College London
lucianahamond@gmail.com

Resumo: O feedback na aprendizagem do piano é intra e interpessoal. Há evidências de que a


tecnologia pode aumentar o feedback na aprendizagem. Este estudo de caso-ação exploratório
investigou o uso pedagógico de feedback mediado por tecnologia no ensino e aprendizagem de
piano de nível superior no Brasil. Três professores de piano e respectivos alunos participaram
deste estudo. A coleta de dados envolveu três conjuntos de dados: vídeo-observação das aulas (n =
6), entrevistas com os participantes (n = 12), além de dados gerados por tecnologia. O sistema de
tecnologia envolvido era um piano digital conectado a um computador portátil com software de
estação de trabalho de áudio digital usando uma interface digital de instrumento musical. Os dados
da performance musical gerados por tecnologia foram gravados no sistema de tecnologia usada e
poderiam ser acessados a qualquer momento durante as aulas. Uma análise de dados qualitativos
de múltiplos métodos foi adotada. Este artigo analisa as percepções dos participantes ao usarem o
feedback mediado pela tecnologia em suas aulas de piano. Os resultados sugerem benefícios do
uso da tecnologia tanto para aumentar a conscientização dos alunos sobre as próprias execuções
musicais quanto para tornar o o foco da aula mais claro. A mudança no processo de aprendizagem
ao se usar este sistema tecnologico foi comentada, uma vez que o foco e objetivos das aulas se
tornaram mais claros. O uso de feedback adicional gerado por este sistema tecnológico tem o
potencial de transformar a abordagem pedagógica de piano convencional de ensino superior.
Palavras-chave: feedback, tecnologia, pedagogia do piano.

Perceptions of teachers and their students on the application of technology in higher education
piano learning and teaching
Abstract: Feedback in piano learning is both intra- and inter-personal. There is evidence that
technology can augment both types of feedback in learning. An exploratory action-case study
investigated the pedagogical use of technology-mediated feedback in higher education piano
studios. There were six participants from Brazil: three pairs comprised of a piano teacher and his/
her student. Data collection involved three data sets: video observation of lessons (n = 6),
interviews with participants (n = 12), and technology-generated data. The technology system
involved was a digital piano connected to a laptop computer with Digital Audio Workstation
software using a Musical Instrument Digital Interface. Performance-related data by student and/or
teacher were recorded using the technology system; this could be accessed at any time during the
lessons. Data were analysed using a multi-method qualitative data analysis approach. This paper
analyses the perceptions of the participants when using technology-mediated feedback in their
piano lessons. Findings suggest that the participants agreed on the benefits of technology use for
enhancing student conscious-awareness of their own performance outcomes and for making the
learning process quicker. Participants also noted a significant change in the learning process when
using this technology system: additional feedback seemed to make the lesson focus clearer and
helped to define the performance goals. The use of additional feedback generated by this
technology system thus has the potential to transform the pedagogical approach in conventional
higher education piano learning and teaching.
Keywords: feedback, piano pedagogy, technology.

Introdução
O feedback é crucial para a aprendizagem, em pesquisas educacionais recentes é referido
como aquelas "informações fornecidas por um agente (por exemplo, professor, peer, livro,

318
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

self, experiência) sobre aspectos da compreensão e da performance" (Hattie & Timperley,


2007, p.81). Wiener foi o primeiro a conceituá-lo no campo da cibernética onde "a diferença
entre este [um determinado padrão] e a ação efetivamente realizada é usada como uma nova
entrada" (Wiener, 1949, p.13). Em educação, o feedback "informa sobre a diferença entre o
nível referência e o real" da performance (desempenho) de um aluno (Ramaprasad, 1983, p.
4). Embora, normalmente fornecido pelo professor, o feedback pode ser acessado pelo aluno
através da autoavaliação com base em seus sistemas internos de feedback (Hattie &
Timperley, 2007).
O feedback, no aprendizado de piano, é intrapessoal e interpessoal. O feedback
intrapessoal se dá no interior do indivíduo; o interpessoal ocorre entre indivíduos ou entre um
indivíduo e uma fonte externa, como por exemplo, a tecnologia. O feedback intrapessoal no
processo do aprender e tocar piano abrange os feedback auditivo, visual e proprioceptivo
(incluindo o tátil, sinestésico e vestibular) (Banton, 1995, Finney & Palmer, 2003; Repp,
1999). O feedback auditivo é crucial na aprendizagem e memorização de uma nova peça
(Finney & Palmer, 2003). Em performances de piano solo, perturbações no tempo do
feedback auditivo prejudicaram o desempenho da performance, enquanto perturbações de
altura das notas no feedback auditivo não atrapalharam a performance (Finney, 1997; Furuya
& Soechting, 2010). Em performances de duos de piano, o feedback visual para os
movimentos da cabeça e do corpo desempenham um papel importante para obter a
sincronização entre os dois pianistas, quando há remoção do feedback auditivo do parceiro
(Bishop & Goebl , 2015, Goebl & Palmer, 2009). A remoção do feedback visual (visão do
teclado e das mãos) também interfere na leitura à primeira vista ao piano (Banton, 1995). O
feedback proprioceptivo em combinação com o auditivo (tocar e escutar) na aprendizagem do
piano parece ser mais benéfico para a memorizaçãoo de peças do que apenas se aprender com
um feedback auditivo (somente ouvindo); isso se deve às associações auditivomotoras
(Bishop & Goebl, 2015; Brown & Palmer, 2012; Halwani, Loui, Rüber & Schlaug, 2011).
Além disso, o feedback intrapessoal está relacionado a outros processos internos não
sensoriais, como por exemplo, a consciência (Acitores, 2011; Jeannerod, 2006), o
conhecimento metacognitivo (Schraw & Dennison, 1994), as habilidades de autorregulação
(Nielsen, 2001) e o sense of self (Damasio, 2000), sendo que cada um destes pode contribuir
para a aprendizagem.
O feedback interpessoal entre o professor de piano e seu aluno abrange os tipos: verbal
e não verbal. O feedback verbal envolve informações, providas pelo professor, para melhorar

319
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

a performance do aluno, tais como: dar instruções, fazer perguntas, fornecer informações,
feedback geral (positivo ou negativo), escrever na partitura e tecer comentários informais
(Benson & Fung, 2005, Burwell, 2010, Siebenaler, 1997, Speer, 1994, Welch, Howard,
Himonides, & Brereton, 2005). Os mesmos estudos também abordam um feedback não verbal
dado pelo professor, como por exemplo: tocar junto com o aluno; modelar (tocando ou
cantando); imitar a performance do aluno, fazendo gestos de mão; conduzir (reger) ou bater o
pulso; e outros modos de feedback não verbais (sorrir, rir, balançar a cabeça).
No entanto, os estudos na área do ensino individual de instrumento ou voz mostram as
características de uma relação mestre-aprendiz, com o professor dominando e o aluno
dependente da modelagem do professor (Hallam, 1998; Jørgensen, 2000). O processo
apresenta características de uma abordagem pedagógica de transferência, ao invés de uma
abordagem pedagógica transformadora (Carey & Grant, 2015). Outro estudo recente
(Hamond, 2013) revela que professores e alunos de nível superior no Reino Unido não
compartilham as mesmas perspectivas quanto às prioridades de ensino e aprendizagem de
piano.

Objetivo

Há evidências dos benefícios da aplicação da tecnologia no ensino de música (Himonides,


2012) e mais especificamente na aprendizagem instrumental ou vocal (Zhukov, 2013). Neste
estudo, tecnologia envolve as novas tecnologias digitais tais como dispositivos digitais e
programas de computador relacionados ao fazer musical e é conceituado como ‘qualquer
ferramenta que sustente o ensino e a aprendizagem musical’ (Himonides, 2012, p.433). A
tecnologia é usada como ferramenta para o ensino transformador (Savage, 2007), tornando o
ambiente de aprendizagem mais colaborativo (King, 2008), além do fato de que os alunos já
têm acesso a várias formas de tecnologia para uso individual (Zhukov, 2013). Vários tipos de
tecnologia têm sido aplicados à aprendizagem instrumental, inclusive de piano, ou vocal: a
gravação de vídeo (Daniel, 2001), o feedback MIDI (Riley, 2005), o feedback por computador
(Juslin, Karlsson, Lindstrom, Friberg, & Schoonderwaldt, 2006), tecnologia de mídia em
aulas de piano em grupo (Benson, 1998), uso de feedback visual em tempo real (RTVF) em
aulas de voz (Welch et al., 2005), e RTVF em aprendizagem de percussionistas (Brandmeyer,
2006). Dentre os benefícios estão: tornar os alunos mais conscientes de suas performances,
desenvolver-lhes o senso de autoavaliação e autorreflexão crítica (Carey & Grant, 2015;
Riley, 2005; Zhukov, 2010). Outros tipos de tecnologia foram utilizados na aprendizagem

320
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

instrumental ou vocal, porém há pouca pesquisa sobre feedback no ensino e aprendizagem de


piano de nível superior. O objetivo do presente estudo é explorar a aplicação de feedback
mediado por tecnologia, em termos de feedback visuais e auditivos adicionais, no ensino e
aprendizagem de piano de nível superior, a fim de melhorar a performance de alunos em aulas
sob orientação de seus professores.

Metodologia e métodos

A metodologia adotada nesta investigação foi estudo de caso-ação (Braa & Vidgen, 1999),
uma metodologia híbrida que combina aspectos de estudo de caso (Stake, 1995; Yin, 2014) e
pesquisa-ação (Kemmis, 1993). Os participantes foram três professores de piano de nível
superior e um de seus alunos no Brasil, trabalhando uma peça memorizada de seu repertório
atual, e a pesquisadora (a autora do presente artigo), agindo como mediadora da tecnologia
nas aulas. O sistema tecnológico aplicado foi: um piano digital (Yamaha Clavinova), um
computador portátil (laptop), rodando um DAW software através de uma interface MIDI, uma
tela de PC adicional colocada na frente do estudante de piano, um cabo VGA para conectar o
laptop a tela de computador adicional. Cada dupla professor-aluno teve experiência de uso de
tecnologia em duas aulas de piano, trabalhando em um movimento de uma sonata clássica
memorizada. Atividades do teclado e do pedal derivadas das peformances musicais do aluno,
ou até mesmo do professor, foram gravadas através do DAW software; eestes dados puderam
ser acessados a qualquer momento durante a aula. A coleta de dados envolveu observação de
aulas filmadas em vídeo (n = 6), entrevistas com os participantes, separadamente (n =12), e
coleta de dados da performance musical, gravados no DAW software.

Resultados

Este artigo enfoca as percepções de professores e alunos de piano de nível superior quanto à
aplicação de feedback mediado por tecnologia. Os resultados da análise temática das
entrevistas com professores e respectivos alunos complementaram os resultados obtidos nas
análises qualitativas de dados dos vídeos e dos dados gerados por tencologia. Cada dupla de
professores e alunos de piano do ensino superior mostrou ter diferentes pontos de vista em
relação à prioridade de ensino e aprendizagem entre si, com exceção do estudo de caso C para
o item precisão rítmica. No entanto, professores foram unânimes ao declarar que o maior
objetivo na aula de piano com seus alunos é “fazer o aluno se ouvir”.

321
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

A Tabela 1, a seguir, mostra as discrepâncias de opiniões de professores e seus alunos


quanto às prioridades de ensino e aprendizagem de piano em suas aulas.

Tabela 1: Percepções de professores e seus alunos quanto às prioridades de ensino e aprendizagem de piano
(Hamond, 2017).

As percepções dos participantes quanto ao uso da tecnologia foram categorizadas nos


seguintes temas: (a) feedback visual em tempo real; (b) feedback visual posteriori (playback);
(c) feedback auditivo posteriori (playback); (c) parâmetros da performance musical
trabalhados; (d) consciência da performance; (e) mudança no processo de aprendizagem; e (f)
mudança na abordagem pedagógica. O uso do feedback visual em tempo real foi comentado
apenas por três participantes, variando nas três duplas de professores e alunos (estudos de
caso A, B e C): (1) uso individual para o aluno no estudo de caso A, para melhora de aspectos
relacionados à articulação na performance; e (2) uso compartilhado, ou seja, pelo professor e
aluno, no estudo de caso B, para melhora de aspectos relacionados à articulação, e precisão
melódica. O uso do feedback visual posteriori (playback) foi reportado pelo estudo de caso A,
especificamente para a melhora de aspectos da dinâmica e articulação. O uso do feedback
auditivo posteriori (playback) foi reportado pelos participantes por beneficiar o aprendizado
dos alunos através da comparação da performance desejada (intencionada) com a performance
real (ouvida). Professores e alunos reportaram que alguns parâmetros da performance musical
podem ser mais claramente trabalhados com o uso de tecnologia, como por exemplo: (1)
articulação através das assincronicidades das notas MIDI; (2) dinâmica através das cores das
notas MIDI e dos valores de velocidade de ataque das teclas; (3) precisão melódica através da
presença ou não de notas MIDI; e (4) precisão rítmica e tempo através dos tamanhos das notas
MIDI e entre notas MIDI.
Professores e alunos foram unânimes em relação ao aumento da consciência das
performances através do uso deste sistema tecnológico, desde que alunos puderam se ouvir,

322
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

sem execução da obra, adquirindo a mesma posição do professor, de ouvir e refletir sobre sua
performance. A maior contribuição deste trabalho através do uso da tecnologia foi tornar os
alunos conscientes de suas performances, de modo a realizarem ou não as mudanças
necessárias para o aprimoramento de determinados parâmetros da performance musical na sua
execução musical. Percepções quanto à mundança no processo de aprendizagem foram
observadas por todos os participantes. Professores e alunos comentaram que o processo de
aprendizagem foi mais rápido com o uso de tecnologia, que deixou o foco da aula mais claro e
os objetivos para aprimoramento da execução musical mais definidos. No entanto, opiniões de
professores e alunos divergiram quanto à mudança na abordagem pedagógica. Alunos
relataram que uma clara mudança foi devida a aplicação de tecnologia em suas aulas.
Professores relataram que não observaram nenhuma mudança, pois utilizaram as mesmas
estratégias de ensino de suas aulas convencionais (sem uso de tecnologia). Desta forma,
segundo as percepções de professores e alunos de piano de nível superior, a aplicação de
feedback gerado por tecnologia no ensino e aprendizado de piano constitui uma ferramenta
que pode otimizar as aulas convencionais de piano, pois engloba aborgagem pedagógica
similar ao ensino do piano convencional, e acrescenta aspectos diferentes, como os tipos de
feedback adicionais (visual e auditivo) gerados através do uso de tecnologia. Professores e
alunos mostraram diferentes opiniões quanto à frequência do uso desta tecnologia, adequação
ao tipo de repertório e estágio do processo de aprendizagem (Tabela 2).

Tabela 2: Percepções de professores e alunos de nível superior quanto ao uso da tecnologia em termos de
frequência de uso, repertório recomendado e estágio de aprendizagem (Hamond, 2017).

323
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Discussão
As perspectivas dos professores e respectivos alunos quanto ao uso de tecnologia no ensino e
aprendizagem de piano de nível superior sugerem o benefício na aplicação deste sistema
tecnológico para aprimoramento da performance do aluno. A utilização do feedback adicional
posteriori (playback), gerado pela tecnologia, ao lado do feedback oferecido pelo professor,
oferece uma possibilidade de comparação da performance desejada e a performance realizada,
principalmente pelos alunos. Desta forma, após ouvirem a gravação, e observarem a
representação visual de suas performances, os alunos poderão se tornar mais conscientes de
suas execuções musicais, autônomos e independentes em seu processo de aprendizagem. Os
resultados obtidos nesta pesquisa complementam aqueles relatados em pesquisas anteriores
sobre o uso de tecnologia em aprendizagem instrumental e vocal (Benson, 1998; Brandmeyer,
2006; Daniel, 2001; Juslin et al, 2006; Riley, 2005; Welch et al., 2005). Este artigo quer
mostrar que o feedback adicional gerado por tecnologia pode otimizar o ensino tradicional de
piano de nível superior, pois aumenta o feedback intrapessoal do aluno e a consciência de sua
execução musical, além de permitir que o foco da aula se torne claro.

Agradecimentos
A autora agradece a todos os participantes desta pesquisa, o apoio acadêmico do Professor
Graham F. Welch e Dr. Evangelos Himonides durante o doutorado. Esta pesquisa de
doutorado teve financiamento da CAPES. Esta apresentação foi possível através da SEMPRE
Conference Award.

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326
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Privações de retroalimentação, estímulo e instrumento no aprendizado de


quatro danças de Schubert por um estudante de piano em Extensão
Universitária: resultados preliminares de um experimento

Renan Moreira Madeira


PPGMUS-UFRGS
renan.moreira@ufrgs.br

Regina Antunes Teixeira dos Santos


Instituto de Artes – PPGMUS - UFRGS
regina.teixeira@ufrgs.br

Resumo: O presente manuscrito discute como a manipulação de retroalimentações sensoriais


(auditiva e cinestésica), de estímulos (partitura e gravação) e da disponibilidade ou não do instrumento
influenciam o aprendizado de peças novas (D.145 nº3, D.365 nº6, D.781 nº4 e D.781 nº5, de Franz
Schubert) por um estudante piano em nível de extensão universitária. Foram realizadas quatro sessões
experimentais de coletas de dados nas quais as peças foram aprendidas em quatro diferentes situações
de privação de retroalimentação ou estímulo, com ou sem o piano. Os dados produzidos, na forma de
gravações em áudio e vídeo das sessões de prática, foram analisados buscando identificar os
procedimentos empregados na tentativa de aprendizagem das peças sob condição experimental. Os
resultados preliminares mostraram os recursos e estratégias de prática do estudante investigado para
lidar com as diferentes situações de privação, a forma como ele manipulou seus conhecimentos de
modo a aprender as peças. Condições nas quais as peças foram aprendidas a partir de gravação foram
mais dificilmente adaptadas ao estudo em condições normais, evidenciando limitações do estímulo
aural como fonte de conhecimento.
Palavras-chave: prática instrumental, retroalimentação sensorial, níveis de expertise.

Deprivations of feedback, stimuli an instrument on the learning of four Schubert dances by a high
school piano student: preliminary results of an experiment
Abstract: The present paper reports to a Master’s degree research, still being developed, which aims
to investigate how the manipulation of sensorial feedbacks (auditory and kinesthetic), stimuli (score
and recording) and the availability or not of the instrument can imply changes on the learning of new
musical pieces by piano student in a high school age . Four experimental sessions have been
conducted, in which the student learned four different short piano compositions in four different
situations of deprivation of sensory feedback or stimuli, with or without a piano available to practice.
The produced data, which consists of audio and video recordings, has been analyzed trying to identify
the strategies employed by the student to practice the compositions during the experimental situation,
their relations with his level of development and the way in which he learned the piece. Preliminary
results have shown that the student employed some practice strategies in order to learn the pieces. The
compositions learned from the audio recordings were more difficult to adapt to normal practice
conditions, showing evidences that the score alone is a limited source of knowledge.
Key-words: instrumental practice, sensory feedbacks, expertise levels.

Introdução
Segundo Altenmüller (2008, p. 410), “a execução musical é provavelmente a mais exigente
das habilidades humanas e o fazer musical requer a integração multimodal de informações
sensoriais e motoras bem como o preciso monitoramento da performance via retroalimentação
auditiva”. As informações sensoriais às quais se refere Altenmüller são aquelas advindas dos

327
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

canais auditivo, visual, cinestésico e tátil (Gabrielsson, 1999) que se relacionam e interagem
no momento da prática ou da performance musical. Estes canais sensoriais possibilitam ao
instrumentista o acesso às informações sobre o conteúdo de suas ações (ou seja, o resultado
ou a resposta a suas ações). A retroalimentação pode ser de natureza auditiva ou cinestésica1.
A retroalimentação auditiva envolve a “audição dos sons que o performer
produz” (Gabrielsson, 1999) e estas informações são “particularmente relevantes já que a
produção sonora é o objetivo do fazer musical” (Finney e Palmer, 2003, p. 52).
Retroalimentação cinestésica diz respeito à posição e à movimentação espacial do
instrumentista com relação ao instrumento, que lhe permitem, por exemplo, que “se dê conta
de ter tocado uma nota errada mesmo antes de tê-la ouvido” (Gabrielsson, 1999).
Vários trabalhos tem investigado a influência das retroalimentações sensoriais na
performance musical. Banton (1995) investigou os efeitos da privação de retroalimentações
auditiva e visual (impossibilidade da visualização do teclado) na leitura à primeira vista de
pianistas, tendo os dados mostrado que a ausência de retroalimentação auditiva não
aumentava a quantidade de erros mas, de maneira contrária, a ausência de retroalimentação
visual gerou mais erros de nota. Repp (1999) interessou-se pelos efeitos da privação da
retroalimentação auditiva sobre os aspectos expressivos da performance pianística (como
dinâmicas, timing e pedal), tendo concluído que a ausência de retroalimentação auditiva
provocava efeitos pouco significativos na performance, exceto pelo pedal, que era empregado
com menos acuidade na situação de privação. Mantovani (2014), trabalho do qual o presente
manuscrito é uma extensão, investigou os efeitos da privação de retroalimentações sensoriais
no aprendizado inicial de peças por estudantes de piano em diferentes níveis acadêmicos,
tendo concluído que em todas as condições propostas de privação de retroalimentação os
estudantes recorreram a estratégias de manipulação de conhecimento declarativo/semântico
para lidar com a situação de privação. Dentre os propósitos desta manipulação estavam
estabelecer e coordenar os movimentos necessários à performance ou criar uma imagem
mental da peça. Mantovani (2014) analisou entrevistas semiestruturadas, produtos de
performance obtidos após a prática dos participantes e quanto tempo estes despendiam para
realizar a prática nas situações de privação.
O presente manuscrito, recorte de uma Dissertação de Mestrado em andamento,
descreve o efeito da privação singular ou pareada de estímulos, os quais também serão

1 Esta pesquisa se interessa apenas pelas retroalimentações auditiva e cinestésica. Retroalimentações tátil, visual, vibrotátil e
vestibular não fazem parte do escopo deste trabalho

328
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

chamados de fontes de conhecimento – partitura e gravação2 – e de retroalimentações


sensoriais – auditiva e cinestésica –sobre o aprendizado de novas peças para piano por um
estudante de piano em nível de extensão. Trata-se de um caso dentro de um conjunto de 16
estudantes investigados, contemplando vários níveis de expertise, cujo estudo em
profundidade propiciou um aperfeiçoamento dos métodos de análise e do tratamento do
conjunto de dados, objetos de uma Dissertação de Mestrado.

Metodologia
Tratando-se de um estudo experimental, foram delineadas situações de coletas de dados
divididas em duas partes. Na primeira combinava-se a privação de retroalimentações
sensoriais com a privação de estímulos e a privação ou disponibilidade do meio: o piano. Na
segunda parte, o estudante continuava a praticar a mesma peça em condições normais de
estudo (com o piano, o estímulo e todas as retroalimentações disponíveis). Esta estratégia
metodológica visou identificar os procedimentos similares (ou específicos) de cada situação
de privação de retroalimentação sensorial com aquelas da prática habitual (sem restrições) do
estudante.
Assim, na primeira parte desse experimento, as quatro situações de privação de
retroalimentação foram: (A) privação de retroalimentação aural e cinestésica, com
disponibilidade da partitura, ou seja, a peça foi aprendida a partir da partitura, sem
disponibilidade de piano; (B) privação de retroalimentação cinestésica, sem disponibilidade
da partitura, na qual a peça foi aprendida a partir de gravação, sem disponibilidade de piano;
(C) privação de retroalimentação auditiva, com disponibilidade da partitura, ou seja a peça foi
aprendida a partir da partitura, em um piano elétrico desligado; (D) privação da partitura, na
qual a peça foi aprendida a partir de gravação, com disponibilidade de piano.
Os estímulos empregados foram quatro danças de Schubert, duas ternárias: (1) Landler
D.145 nº3; (4) Valsa D.365 nº6, e duas binárias (2) Escocesa D.781 nº4; e (3) Escocesa D.781
nº5. As diferentes exigências técnico/interpretativas destas peças se justificam no âmbito da
Dissertação de Mestrado, na qual é uma amostra maior é analisada. As sessões de coletas de
dados foram dividas em duas partes, cada uma tendo duração máxima de 15 minutos, visando
equilibrar o tempo despendido no estudo com privação com o tempo de estudo pós-privação.
O estudante participou de quatro sessões de coletas de dados, tendo-as realizado segundo a
seguinte combinação de peça e condição: A-1; B-2; C-3 e D-4. Este recorte produziu um

2
Gravação comercialmente disponível da peça a ser estudada.

329
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

conjunto de dados de 1h55min55s de vídeos de prática, dois produtos de performance e duas


entrevistas semiestruturadas.
Os vídeos de prática foram analisados buscando mapear e quantificar as estratégias de
prática empregadas pelo participante para lidar com a situação de privação. Os procedimentos
foram categorizados a partir da observação da prática, sendo que alguns deles foram
específicos a certas condições. Estes procedimentos foram quantificados por número de
incidências, que permitiram um olhar mais aprofundado sobre a prática com privação e pós-
privação.

Resultados
A Figura 1 apresenta a distribuição das incidências de procedimentos de prática observados na
prática com privação nas quatro modalidades. Ações como a execução de mãos juntas ou
separadas e a prática da harmonia ou da melodia se aplicaram a todas as condições de estudo.
De acordo com a Figura 1, pode-se observar que na condição A, na qual o participante
aprendeu a peça apenas a partir da partitura, sem piano ou gravação disponíveis, não foram
observadas incidências de prática da peça de mãos juntas, nem da peça completa ou de seções
isoladas da peça. O participante focou sua prática na simulação (simular os movimentos que
seriam necessários à execução da peça no piano) de trechos isolados, muito curtos, sobretudo
da harmonia (cinco incidências). O participante simulou a melodia da peça em três ocasiões,
vocalizando a melodia ou trechos dela em sete momentos. Tal procedimento demonstra a
importância de preencher a lacuna ocasionada pela ausência de retroalimentação auditiva, já
que “uma importante qualidade observada nos instrumentistas é a forte associação entre os
processamentos sensorimotor e auditivo” (Altemüller, 2004, p.410).

330
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Figura 1: Numero de incidência de ações observadas nas quatro condições de privação de


retroalimentação sensorial.

De acordo com a Fig. 1, comparando as incidências de solfejo/vocalização das outras


condições, percebe-se que na condição B, na qual o participante tinha apenas a gravação para
aprender a peça, sem piano ou partitura, houve o maior número de recorrência ao recurso
vocal. Isso se justifica pelo fato de que, sendo a gravação o único meio de prática da peça, a
voz se torna elemento importante na formação da imagem da peça, seja identificando
intervalos, trocas de registros ou repetição de padrões. A condição C registrou apenas uma
incidência de solfejo/vocalização, mesmo com a ausência de retroalimentação auditiva. Nesta
condição, o estudante teve dificuldades em conseguir praticar a peça de forma coesa e fluente,
tendo o estudo sido frequentemente permeado de notas erradas, com repetição de notas e
compassos na tentativa de corrigir o erro. A ausência do som acarretou em dificuldades de o
estudante em perceber os erros e corrigi-los com eficácia. Finalmente, a condição D, por sua
vez, não registrou nenhuma atitude de vocalização/solfejo, uma vez que o participante tinha o
instrumento disponível para experimentar e reproduzir aquilo que ouvia na gravação.
No comparativo entre as condições B e D, nas quais a peça era aprendida a partir da
gravação (a partitura era, portanto, privada), a análise dos vídeos de prática mostrou que na

331
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

condição B o estudante ouviu a gravação completa da peça 35 vezes3, mas em 16 momentos o


foco de atenção do estudante não era a audição, pois ele desempenhou ações de transcrição da
peça, de solfejo e vocalização ou movimentos das mãos enquanto a gravação estava em curso.
Em seis momentos durante a prática, ele sentiu necessidade de parar a gravação e realizar as
ações de transcrição ou vocalização, momentos que sinalizavam uma maior demanda de
atenção e reflexão para realizar as ações. Na condição C, a peça completa foi ouvida cinco
vezes e oito vezes em partes (contra um total de 35 vezes completa e uma vez em partes na
condição B) e, desta vez, as ações de reprodução do material escutado foram realizadas em
maior número quando a gravação estava desligada, evidenciando a formação da imagem
mental da peça com uma necessidade de menor manipulação do estímulo e maior
manipulação do instrumento, com maior demanda da memória, tendo em vista que o
participante não realizou nenhuma anotação nesta condição.
A Figura 2 apresenta um gráfico que sistematiza as incidências de comportamentos de
prática observados na prática com pós-privação. No tocante à segunda parte do estudo,,
observou-se que o estudante teve maior dificuldade em adaptar as peças às condições normais
de estudo após ter praticado nas situações que o privavam da partitura (B e D), mesmo que
tenha conseguido realizar satisfatoriamente o aprendizado das peças nessas durante o período
de estudo em situação de privação de retroalimentação. Pode-se notar que nas condições B e
D, o estudante realizou menos repetições da peça inteira ou de partes isoladas, revelando
problemas de fluência na execução e problemas relativos à memorização das peças. Em
nenhuma das condições o estudante conseguiu executar as peças com fluência, principalmente
pelo fato de que as tentou executar de memória, mobilizando consideráveis esforços para este
fim, o que não foi possível de atingir no tempo reduzido das sessões experimentais. Isso
configura uma atitude típica de estudantes em nível de expertise iniciante, por buscar
memorizar a peça estudada, visando libertar-se da partitura, o mais rápido possível. Esse tipo
de abordagem torna-se não sistemática, suscetível a falhas recorrentes, uma vez que é
primariamente fundada na programação motora, baseada na memorização por encadeamentos
associativos (Chaffin et al., 2009).

3
O aparelho reprodutor de áudio usado nas sessões de coletas de dados permitia que a gravação fosse tocada
várias vezes, recomeçando do início, sem que o estudante precisasse operar o aparelho.

332
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Figura 2: gráfico de incidência de ações observadas nas quatro condições de estudo pós- privação de
retroalimentação sensorial.

Considerando o conjunto de procedimentos utilizados, percebe-se que o foco do


estudante esteve centrado na leitura superficial da partitura, negligenciando dimensões
expressivas. Destaca-se o fato de os resultados aqui apresentados dizerem respeito à prática de
apenas um estudante, impossibilitando a discussão sobre estilos individuais de aprendizagem
musical ou sobre capacidades e habilidades pessoais de diferentes sujeitos.

Considerações Finais
É importante ressaltar o caráter preliminar dos resultados deste manuscrito. As análises
apresentadas nesta comunicação evidenciam que em duas das condições A e B, o participante
recorreu ao recurso do solfejo/vocalização para lidar com a privação de retroalimentação. Na
condição A, a voz preencheu a lacuna deixada pela ausência de retroalimentação do som do
piano, e na condição B, esta serviu como instrumento de decodificação da melodia. Na
segunda parte da prática, as peças aprendidas a partir do estudo da partitura (em detrimento
daquele do estímulo aural) foram mais facilmente adaptadas ao estudo em condições normais,

333
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

evidenciando que o estímulo aural (gravação), isolado da partitura, torna-se uma fonte
limitada de conhecimento.

Agradecimentos
R.M.M. agradece ao CNPq pela bolsa concedida. R.A.T.S. agradece ao CNPq (Projeto
304461/2016-4).

Referências:
Altenmüller, E. (2004). Neurology of musical performance. Clinical medicine, Vol.8 nº4, (pp.
410-413). Royal College of Physicians.
Banton, L. (1995). The role of visual and auditory feedback during the sight-reading of music.
Psychology of music, nº23, (pp. 3-16).
Chaffin, R., Logan, T. R., and Begosh K. T. (2009). Performing from memory. The Oxford
handbook of music psychology, eds. S. Hallam, I. Cross, and M. Thaut, (pp. 364-376).
New York. Oxford University press.

Finney, S. Palmer, C. (2003). Auditory feedback and memory for music performance: Sound
evidence for an encoding effect. Memory and cognition. Vol.1 nº 31, (pp. 51-64).
Psychonomic Society.
Gabrielsson, A. 2002. The performance of music. The Psychology of Music, ed. Diana
Deutsch, (pp. 501-602). San Diego. Academic press, 2nd edition.
Mantovani, M. (2014) Privações de retroalimentações sensoriais em condições de estudo: um
experimento com estudantes de piano em diferentes níveis acadêmicos. Dissertação de
Mestrado. Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Repp, B. (1999). Effects of auditory feedback deprivation on expressive piano performance.
Music perception, nº16, (pp 409-438).

334
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Expressividade musical da performance no violino:


um estudo de caso

Juliana Lima Verde


Universidade de Brasília – UnB
limaverdeju@gmail.com

Sandra F. C. D. Freire
Universidade de Brasília – UnB
sferraz@unb.br

Ricardo Dourado Freire


Universidade de Brasília – UnB
freireri@unb.br

Resumo: A expressividade musical é um aspecto recente e controverso na pesquisa em música. Dos


estudos seminais sobre a expressividade da execução pianística, a discussão se ampliou para outros
instrumentos, incluindo o ensino e pesquisa em aprendizagem do instrumento. O presente estudo visa
investigar a construção da expressividade musical do violino com crianças de sete a quinze anos de
idade em situação de performance e objetivou identificar as decisões interpretativas que uma aluna de
violino utiliza na execução musical. Foi realizada uma entrevista semiestruturada com a participante
de 14 anos a partir do vídeo do seu recital de formatura no livro 3 do Método Suzuki. Fundamentado
no modelo teórico de Keith Swanwick e em sua teoria espiral de desenvolvimento musical, a análise
utiliza o conceito de decisões interpretativas no processo da aprendizagem musical. Os resultados
mostram que a violinista realizou decisões interpretativas por meio do uso de elementos expressivos
como: dinâmica, vibrato e movimentos corporais. Além disso, foi possível compreender que as
decisões cognitivo-motoras relacionadas à expressividade foram ensinadas pelo professor de violino e
influenciadas pelos pais que participam da construção da expressividade musical da aluna.
Palavras-chave: expressividade, expressão musical, performance musical, violino

Musical Expression on the violin: a case study


Abstract: Musical expressiveness is a recent and controversial aspect of music research. From the
seminal studies on pianistic performance’s expressiveness, the discussion was extended to other
instruments and acquired conceptual frameworks to be applied also in teaching and research on
musical instrument’s learning. This article presents one case study from a Master´s research project
about young violinists’ decisions about music expression. The subject is a fifteen year-old girl who
had played a recital for Suzuki Method Book 3. This research is based on K. Swanwick’s music
development spiral and the analysis uses the concept of interpretive decisions in the process of
musical learning. The methodology included an interview with the student and analyzed the student’s
reactions while watching a video of a piece from her recital. The results have shown that the violinist
made many conscious decisions using expressive elements during the performance on stage. She
mentioned that dynamics, vibrato and body movement where important elements to demonstrate
expression and it was possible to conclude that many cognitive and motor decisions where constructed
with her violin teacher and also by comments from their parents.
Keywords: violin learning, musical expression, music performance, violin

A expressividade é um elemento subjetivo que sempre foi objeto de discussão entre músicos
na performance musical. No entanto, a discussão acadêmica sobre expressividade somente
adquire relevância e projeção a partir do final do século XX, quando encontra espaço para

335
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

tornar-se objeto de pesquisa no meio acadêmico internacional. Estudos de Hevner (1935),


Meyer (1956), Sloboda (1985), Juslin (1997), Palmer (1997) e Gabrielsson (1999) auxiliaram
nos vínculos que existem entre psicologia e música para justificar e legitimar os estudos atuais
na área de expressividade musical (Juslin & Sloboda, 2001).
Um dos instrumentos musicais que obteve a primazia nos primeiros estudos sobre
expressividade foi o piano. Clarke (1999) esclarece o fato, pois “a performance ao piano
domina quase todos os estudos, o que é muito natural pelas vantagens que este instrumento
oferece em termos de som e em termos do próprio mecanismo, favorável aos métodos de
gravação” (Clarke, 1999, p. 75). Por meio dos avanços nas pesquisas, foi possível avaliar
também de que maneira os músicos executam em outros instrumentos musicais. Segundo
Benetti Jr. (2013) foi possível compreender por meio dos trabalhos que “a expressividade
ocorre segundo variações executadas pelos instrumentistas sobre parâmetros “neutros”
fornecidos pelo texto musical (p.ex. articulações, tempo, dinâmica, altura etc.), no sentido de
comunicar a sua interpretação ao ouvinte” (Benetti Jr., 2013, p.151). O autor ainda apresenta
um conceito de expressividade na performance.
A expressividade consiste em um fenômeno de comunicação influenciado pela
habilidade do performer em transmitir a mensagem, estrutura, carácter, intenção
musical e emoção através de mecanismos de execução que integram uma vasta gama
de elementos, desde parâmetros físicos a elementos estéticos. (Benetti Jr., 2013, p.
10).

A definição apresentada por Benetti Jr. (2013) demonstra as várias facetas da


expressividade, pois está relacionada aos movimentos, intenções e emoções do intérprete na
performance musical; mas principalmente, com o foco em comunicar algo para o ouvinte,
com a finalidade em transmitir. Juslin (2003) reforça este pensamento ao realizar uma
pesquisa com músicos de vários países como Inglaterra, Itália e Suécia. Nesse estudo foi
possível constatar que a maioria dos músicos considera a expressão como “comunicar
emoções” e “tocar com sentimento”.
De acordo com Karlsson e Juslin (2008), a expressividade foi considerada como um
conhecimento tácito, não podendo ser aprendido e na maioria das vezes é transmitida
implicitamente pelos professores de instrumento. Assim, a fim de investigar mais sobre este
elemento subjetivo na música, houve um crescente interesse em pesquisas que abordasse o
foco em identificar as estratégias de ensino da expressividade (Meisnner, 2016; Brenner;
Strand, 2013; Laukka, 2004; Lindstrom et al., 2003;Woody, 2006; Woody, 2000). Por meio
destes estudos foi possível perceber o interesse em auxiliar professores de instrumentos no
desenvolvimento das habilidades expressivas de seus alunos. As investigações foram

336
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

concentradas no ensino da expressividade e realizadas com universitários, jovens ingressantes


à universidade, adolescentes e crianças.
Em sua Teoria Espiral de desenvolvimento Musical, Keith Swanwick (2003) aborda a
expressividade musical como um dos estágios da aprendizagem. O educador musical explica
que o “caráter expressivo está implícito em muitos tipos de decisões de performance, na
escolha do andamento, nos níveis de acentuação, nas mudanças de dinâmicas e na articulação
– como o movimento de um som ao outro som está organizado” (Swanwick, 2003, p. 62).
Além disso, Swanwick (2004) discute que o uso dos materiais sonoros pelos alunos (altura,
duração, dinâmica, articulação, frases, andamento, timbre, postura entre outros) é relevante
para que possam “explorar e lidar com essas coisas por si mesmos, fazendo escolhas no
desempenho e composição, bem como identificá-los na música de outras
pessoas” (Swanwick, 2004, p. 131). Assim, diferente da noção de transmissão abordada por
Juslin, para Swanwick, a construção do caráter expressivo está definida como “decisões de
expressividade”. A fim de compreender mais a respeito sobre essa temática na aprendizagem
de instrumentos musicais, este artigo apresenta como questão geradora: Como a
expressividade musical pode ser manifestada em uma performance de alunos de violinos
brasileiros?
Juslin (2003) avalia que a “investigação sobre a expressão poderia ajudar a tornar o
conhecimento tácito explícito” (Juslin, 2003, p. 274). Woody (2000) salienta que investigar as
intenções do músico para o fomento da expressividade musical também está em discussão em
muitos estudos. Mobilizados por essa lacuna e necessidade investigativa, o objetivo deste
estudo, de caráter piloto, foi identificar quais as decisões de expressividade musical que uma
aluna de violino utiliza no momento da performance musical em um contexto de escuta. A
fim de nortear o conceito de expressividade para esta pesquisa, este trabalho foi embasado em
Keith Swanwick (2003), o qual apresenta “decisões expressivas” na aprendizagem musical.
Assim, por meio deste estudo inicial poderá identificar as decisões e influencias que os alunos
possuem para desenvolver suas habilidades expressivas.

Metodologia
A metodologia utilizada para a pesquisa de mestrado em andamento foi a entrevista
semiestruturada com os violinistas participantes em que assistem o vídeo de sua última
formatura de violino. A entrevista foi feita com base nos estudos de Swanwick (2003) tendo
como foco a construção do caráter expressivo na aprendizagem musical de crianças. As

337
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

perguntas da pesquisa em andamento foram elaboradas para a faixa etária definida de sete a
doze anos. A fim de testar as questões foi realizado um estudo piloto em novembro de 2016
com uma aluna de violino de catorze anos do projeto de extensão Música para Crianças –
(MPC) da Universidade de Brasília – (UnB).
No projeto a metodologia de ensino utilizada pelos professores de violino é o
Método Suzuki. Ao final do término de cada livro, os alunos realizam um recital de formatura
na qual apresentam todas as músicas estudadas. Foi analisado para o estudo piloto o vídeo da
formatura do livro três de violino realizada em setembro de 2016. A música escolhida pela
aluna foi o Gavotte in G Minor de Johann Sebastian Bach. Os resultados alcançados para este
estudo piloto foram por meio de uma análise de conteúdo em discussão com Swanwick
(2003).

Resultados
Ao assistir o vídeo de sua última formatura de violino a aluna demonstra seriedade e atenção.
A violinista relata o que mais lhe chamou atenção em sua performance e diz: “É... eu gostei
das minhas dinâmicas, mas eu não achei que elas não foram do jeito que eu queria. Eu poderia
ter exagerado mais.. no forte e no piano. Mas eu gostei das minhas dinâmicas”. Além disso, a
aluna faz uma autocrítica de seu desempenho musical, pois poderia ter executado melhor as
dinâmicas. Ainda no aspecto do que lhe chamou mais atenção a violinista explica: “eu gostei
do movimento, que eu toco muito parada. Aí nessa formatura eu consegui fazer mais esse
movimento”. Nesse momento a aluna se movimenta para frente e para trás expressando o
movimento do corpo que realizou no momento do recital. E ainda afirma que esse movimento
é bom! Sobre o movimento do corpo, a aluna fala que o professor de violino pede esse
movimento e diz expressando satisfação: “ele pede às vezes, só que eu não faço, aí... nessa...
eu fiz”.
Ao falar sobre o que mais gosta no aspecto da forma desta peça a aluna conta com
sorrisos: “eu gosto da parte que tem que ser forte e... é a parte C da música que tem (nesse
momento a aluna canta a melodia da parte C) Eu gosto dessa!”. A violinista detalha: “é como
se mudasse o caráter da música. Tipo... tá tocando... aí é uma história, aí nessa parte acontece
alguma coisa que você precisa demonstrar mais. Aí... eu gosto disso!”. A violinista fala sobre
os recursos que utilizou para destacar este trecho: “eu fiz vibrato e tentei fazer mais forte”. E a
aluna comenta mais a respeito desta peça: “eu acho que ela é bem simplesinha de tocar, eu

338
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

não acho uma peça que..., coisas muito difíceis o diferentes, eu gosto dela! Ela é simplesinha
e legal!”.

Figura 1: Parte C do trecho da peça Gavotte in G Minor de Johann Sebastian Bach.

Quando a pesquisadora pergunta quais sentimentos ela teve no início da peça musical, a
aluna não responde de imediato. Fica pensativa por um instante, e responde: “eu fiquei bem
feliz, né?... Não tenho nenhum sentimento... não sei”. A pesquisadora pergunta se ela pensa
primeiro em notas ou frases, e a violinista comenta: “eu pensei nas frases, pra eu poder
terminar uma frase em vez de... nunca terminar e depois quando a plateia percebe eu já tô em
outro trecho”. Nesse momento, é possível identificar uma atenção da violinista para o público.
E a aluna comenta as suas intenções de comunicar algo para a plateia:

Eu queria que eles meio que pensasse na música como uma história. Que começa...
tem começo, meio e fim. Aí tem partes que, são mais fortes, partes mais é... piano,
pra que as pessoas meio que façam assim: aí forte, aí piano, aí forte e aí piano, aí
na parte de... (a aluna canta a parte C da música), fazer assim!

Ao descrever as suas intenções utilizando a dinâmica na peça, a aluna conta como


queria que a plateia reagisse ao ouvir a sua performance. A violinista movimenta com o corpo
e demonstra com os olhos a reação que gostaria de ver do público. Ao narrar o forte a aluna
expressa movimentando o corpo um pouco para frente e levanta os olhos de surpresa e no
piano a aluna volta o corpo para trás e relaxa os olhos. Na parte C da peça a aluna demonstra
uma grande surpresa, movimentando todo o corpo para trás. A aluna expressa ainda um certo
desapontamento e crítica consigo mesma, pois não conseguiu ver esta reação do público em
relação as dinâmicas e comenta: “eu poderia ter exagerado mais”.

339
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Durante a entrevista, a aluna não explica que emoções ela queria passar nesta peça por
meio das dinâmicas, mas diz: “queria só que, eu queria que cada um, interpretasse essa
história de um jeito diferente. Humm.... eu não sei explicar!”. Durante a entrevista a aluna
ainda manifesta a presença do professor de violino na construção da performance da peça
Gavotte in G Minor de J.S. Bach. A violinista relata a versão que ouviu em sala de aula
A versão que me contaram foi a versão da aula do João, que tem um grupo de
estudantes que eles invadiram um lugar... aí estão perseguidos por um cara e eles se
escondem. Aí depois o cara chega e eles saem correndo, aí eles fogem do lugar.
É...essa foi a versão que me contaram, aí.. e meio que tentei fazer ela com mais
detalhes.

Em relação à quais emoções a peça transmite, a aluna comenta: “não é bem um


sentimento que ela passa, ela passa uma sensação (sorrisos). Uma sensação... pra mim, ela [a
peça] passa uma sensação de movimento, que ela nunca é... tão arrastada, ela é sempre mais
contínua, aí essa sensação de tá sempre se movendo”. Após este comentário a aluna descreve
melhor a sensação de movimento e explica: “meio que, acho que, expressa: como se uma
pessoa estivesse correndo num lugar sem obstáculo, ela pode correr para onde quiser. Tipo
livre!”. Ao refletir em sua própria performance musical a aluna diz que tocou no recital como
estudou e ensaiou, porém ela pensou fazer além do que estava na partitura: “eu fiz do jeito
que eu estudei, mas eu tentei passar meio que uma coisa que não fosse apenas eu estar lendo
uma partitura. Tentei passar naturalidade pra ter aquele negócio de cada um pensar do jeito
diferente”. A aluna descreve o que seria essa naturalidade: “meio que, é... tá escrito na
partitura, aí tô seguindo a partitura do jeito que ela tá escrito. Mas na hora meio que esqueço a
partitura, aí eu lembro de detalhes da partitura que eu posso mudar e o resto que eu posso
fazer igual, pra ter esses detalhezinhos”. Em seu relato sobre a naturalidade, em buscar se
desprender da partitura, a aluna ainda ressalta:
(...) as dinâmicas tão na escrita... Aí eu nunca consegui fazer essas dinâmicas direito
nessa música. Aí eu tentei fazer elas, melhorar elas na hora, que eu acho mais
espontâneo. Foi bem legal! E o vibrato eu tinha aprendido há pouco tempo antes da
formatura, (...) Aí eu tentei meio que soltar mais o meu vibrato, e não sambar o arco
porque eu fico bem nervosa e às vezes ele faz assim (a aluna demonstra o
movimento com o braço direito o arco tremendo) É... porque eu tentei não sambar
(risos e sorrisos de satisfação) ... aí eu não sambei.

Durante a entrevista foi possível identificar a participação da mãe no processo de


preparação para o recital de violino. A presença dos pais é uma característica singular no
Método Suzuki, pois os mesmos são agentes ativos na aprendizagem do aluno. A violinista
comenta: “a minha mãe sempre pede para eu fazer umas coisas que ela se lembra de o

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

professor ter falado ou o que ela acha que ficaria melhor”. Além disso, a aluna fala com mais
detalhes:
Ela pede pra eu prestar atenção na dinâmica também, porque, todo mundo pede pra
prestar atenção na dinâmica (risos) aí ela fala: olha na partitura essa vez, depois toca
sem olhar, pra você decorar as dinâmicas e não precisar olhar na hora (...) ela fala
em dinâmicas, mas também ela fala tipo, às vezes ela pede pra eu não tocar muito
fechada. Eu meio que, que quando eu tô fechada, eu tô tocando tipo, eu tô tocando,
sou eu e a partitura. Ela pede meio que, me desprender da partitura, pra eu tocar
mais livremente.

Além do ensino do professor foi possível identificar a influencia da mãe na construção


da expressividade musical da performance da aluna. Ela é responsável em lembrar as
orientações do professor de violino nos estudos de casa, como por exemplo: a dinâmica. Além
disso, a mãe interage com a filha dando dicas de como ela deve estar diante do palco e assim
obter um desempenho musical promissor. A aluna comenta sobre a expressão do seu rosto
“ele tava mais escondido. Eu tava meio que, que eu não sou espalhafatosa, eu sou bem tímida
eu, eu tava só tocando como, eu tentava pensar que eu tava sozinha, pra eu poder tocar o
minueto melhor”. Ela ainda explica como fez para se concentrar no recital “(...) aí eu olhava
só pro meu violino e pras cordas e tentava me concentrar mais na peça”. Ao final da conversa
a aluna expõe o que é expressividade musical para ela: “eu não sei explicar... (risos) é quando
você expressa (risos), é quando você passa uma sensação”. Além disso, a aluna explica:
Queria passar essa... de movimento pra fazer com que a plateia meio que se sinta
dentro da história, para que ela possa ser livre naquela história, tipo, pensar qualquer
coisa que ela queira pensar até mesmo viajar no meio da música, pra, ser meio que
uma trilha sonora na cabeça delas.

Por meio da entrevista com a aluna foi possível identificar as decisões de


expressividade musical utilizadas na formatura de violino. Das quais podemos perceber e
destacar o recurso das dinâmicas, do vibrato e o movimento do corpo. Além disso, a intenção
de comunicar uma sensação de movimento na música para o público como uma história foi
identificada pela aluna como expressividade musical. Outro aspecto percebido durante a
conversa foi a contribuição da mãe na construção da expressividade musical da aluna. Por
meio da fala da aluna foi possível compreender como a mãe participa no processo de
aprendizado do violino, pois além de repetir as orientações do professor, ela dá instruções de
como a aluna deve agir no palco.

341
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Considerações finais
Este estudo piloto de uma pesquisa de mestrado em andamento teve como objetivo identificar
quais as decisões de expressividade musical que uma aluna de violino utiliza no momento da
performance musical em um contexto de escuta brasileiro. Os resultados alcançados mostram
a atenção da aluna em demostrar os elementos expressivos como a dinâmica e o vibrato na
peça Gavotte in G Menor de J.S. Bach. As decisões de expressividade musical utilizadas pela
violinista demonstram a consciência em expressar na música a intensidade do som, por meio
de exageros nos pianos e fortes nas frases musicais. A violinista expressa: “aí eu nunca
consegui fazer essas dinâmicas direito nessa música. Aí eu tentei fazer elas, melhorar elas na
hora, que eu acho mais espontâneo. Foi bem legal!”. Reforçando este pensamento, Swanwick
(2003) explica que a manifestação da expressividade musical são decisões nas possibilidades
de caminhos musicais que o intérprete pode realizar em sua performance musical. O Educador
musical detalha essas escolhas:
O caráter expressivo está implícito em muitos tipos de decisões de performance, na
escolha do andamento, nos níveis de acentuação, nas mudanças de dinâmicas e na
articulação – como o movimento de um som ao outro som está organizado.
Tampouco a expressão musica deve ser confundida com ‘auto-expressão’. A
expressão musical inerente não está em nosso senso sobre nós mesmos, mas na
percepção do caráter da música. Na forma das frases, no fluxo dos motivos tonais e
ritmos, nas mudanças de timbre, acento, velocidade e níveis de intensidade,
podemos encontrar similaridades entre o movimento da música e a ‘emoção’
humana (Swanwick, 2003, p. 62).

Foi possível verificar a viabilidade e mudanças do roteiro semiestruturado de


entrevista e os procedimentos empíricos para os demais participantes da pesquisa. Além disso,
observou-se como uma jovem aluna de violino realizou decisões de expressividade musical e
demonstrou capacidade de reflexão ao assistir sua própria performance. Outro dado relevante
deste estudo piloto foi a atuação da mãe no processo de construção da expressividade musical
da violinista. Assim, é viável entender que a expressividade musical pode ser aprendida,
considerando que não só o professor de violino, mas os pais participam no processo de
construção da expressividade musical da violinista. Nesse sentido, é válido fomentar
investigações nesta faixa etária, e também com crianças ainda mais jovens, a fim de tornar a
expressividade musical um elemento essencial e importante na aprendizagem de instrumentos
musicais.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

A relação entre a notação e as poéticas interpretativas de música nova para


flauta transversal

Valentina Daldegan
Centro Universitário Internacional Uninter/Universidade Federal do Paraná
valentinadaldegan@gmail.com

Resumo: Na flauta transversal, ainda não são muitos os intérpretes que se aventuram a construir
uma interpretação de uma peça absolutamente nova e estreá-la. Isso é particularmente evidente
quando a peça inclui técnicas estendidas e notação não convencional. Sobre a notação, é importante
frisar que seu papel é crucial na construção de uma interpretação, pois, ainda que tenha limitações, é
o meio pelo qual o compositor pode registrar sua criação. No caso da música nova, já que não existe
uma tradição socialmente compartilhada nem para a criação e nem para a notação, o desafio do
intérprete em construir a música partindo do que está notado, é ainda maior. O tema de minha
pesquisa é estudar como se dá a construção de uma interpretação de música nova quando o
performer não tem como base a audição de outras interpretações da obra. A discussão da notação é o
recorte desenvolvido mais extensamente nesta comunicação.
Palavras-chave: interpretação de música contemporânea, notação, flauta transversal.

The relation between notation and the poetics on the performance of new music for flute
Abstract: There are not many flutists that venture into creating an interpretation of an absolutely
new piece and premiering it. This is particularly clear when a piece includes non-conventional
notation and extended techniques. About notation, it is important to insist that its role is crucial in
building an interpretation, since, even with limitations, it is through notation that a composer may
register his creation. In the case of new music, since there is no shared social tradition for its
creation and notation, the challenge to the performer to build the piece starting from what is written
down, is even greater. The subject of my research is the study of how interpreting new music takes
form, whenever the performer has not got as a basis the audition of former renderings of the piece.
The discussion of notation is the standpoint developed more fully in this communication.
Keywords: performance of contemporary music, notation, flute.

Introdução
Apesar do aumento recente do número de flautistas que tocam música contemporânea, ainda
não são muitos os intérpretes que se aventuram a construir uma interpretação de uma peça
absolutamente nova e estreá-la. Isso é particularmente evidente quando a peça inclui técnicas
estendidas e notação não convencional. Esta lacuna parece decorrer de uma série de fatores
pouco estudados: a relação entre o texto musical e a construção de uma interpretação que não
tem como tomar como base interpretações anteriores da mesma peça e muitas vezes nem
mesmo de peças estilisticamente semelhantes; os juízos que os intérpretes lançam sobre essas
peças; o nível de conhecimento/desconhecimento por parte dos intérpretes das diferentes
notações utilizadas pelos compositores na música de hoje; a falta de ordenamento/destilação
das práticas dos instrumentistas que habitualmente constroem interpretações de música nova
na forma de uma indicação de sistematização dessas práticas. Diante deste contexto, o tema
de minha pesquisa é estudar como se dá a construção de uma interpretação de música nova

344
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

quando o performer não tem como base a audição de outras interpretações da obra.

A notação e seu papel na música de hoje


A construção de uma interpretação é sempre uma (re)criação da partitura, pois a notação, por
mais detalhada que seja, não compreende todas as nuances e graus de expressividade que são
parte fundamental do trabalho do intérprete. A ideia de que a interpretação ultrapassa o campo
da práxis, e que se aproxima da poiesis, é ainda mais pertinente quando tratamos da
performance de música nova, em que o intérprete terá que lidar com variantes que muitas
vezes não estão previstas, pois os compositores buscam explorar novas possibilidades, criar
novas sonoridades e usar poéticas novas.
Sobre a notação, é importante frisar que seu papel é crucial na construção de uma
interpretação, pois, ainda que tenha limitações, é o meio pelo qual o compositor pode registrar
sua criação. A não ser no caso de um compositor-intérprete, em que ele mesmo execute suas
próprias peças e não tenha a ambição de que outros o façam, a partitura é o ponto
intermediário que marca tanto a responsabilidade do compositor (de deixar claro o que
pretende com a obra) quanto a do intérprete (que deve transformar em sons as ideias notadas).
No caso da música nova, já que não existe uma tradição socialmente compartilhada nem para
a criação e nem para a notação, o desafio do intérprete em “construir” a música partindo do
que está notado, é ainda maior do que nas peças que fazem parte do repertório tradicional até
o século XIX e início do século XX ou ainda aquelas cuja linguagem se assemelha a essas. A
esse respeito, Almeida afirma que

a leitura musical de grande parte do repertório contemporâneo tornou-se tarefa de


alta exigência e propôs novos desafios a seus intérpretes. Isso não se deve apenas ao
aumento da complexidade notacional, mas também à multiplicidade de escrituras na
música nova. Diante de uma obra contemporânea, o intérprete se confronta com um
universo musical em grande parte singular e novo, ao contrário da prática
interpretativa na música tradicional, que lida com uma escritura histórica,
amplamente decodificada e compartilhada. (2011, p. 73)

Nesse sentido, em texto de 1963, Leonard Stein, que fora assistente de Schoenberg,
discorre sobre a riqueza das novas técnicas experimentais que estavam surgindo e que
contribuíam para a falta de entendimento do idioma contemporâneo. Segundo o autor, em
períodos mais antigos havia uma “prática comum” e os símbolos na partitura representavam
“relações definidas entre alturas, durações, dinâmicas, e modos de ataque, definidas por
progressões harmônicas regularmente ordenadas interagindo com acentos métricos, fraseado
rítmico e tempo para produzir estruturas maiores.” Ao compositor, caberia “designar alguns

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

desvios da prática comum ou sugerir sutilezas de execução, caso desejasse.” Entretanto, na


composição a partir do século XX, “em que cada situação pode ser única, (. . .) parece que
cada ocorrência musical necessitaria de sua própria descrição especial, e que apenas através
de uma considerável experiência e exposição a novos métodos o intérprete” (Stein, 1963, p.
63).
Sobre isto, David Behrman, em um artigo intitulado “What indeterminate notation
determines”, esclarece que

o papel tradicional da notação era fixar certos elementos da performance e deixar


outros para a ‘musicalidade’ repassada ao instrumentista por seus professores e
absorvida por seu meio. Muitas das coisas feitas pelo músico, e absolutamente
essenciais para uma boa performance, não podiam ser encontradas na partitura. (…)
Tinha-se como certo que qualquer intérprete poderia obedecer às demandas literais
da notação. Se ele tinha talento ou não dependia se sua ‘musicalidade’ poderia ‘dar
vida’ à música.” (1965, p. 58)

De acordo com Behrman, na música serial, essa ‘musicalidade’ tornara-se inútil, pois
qualquer desvio rítmico, na dinâmica ou no timbre não eram bem-vindos e os intérpretes
deveriam obedecer literalmente aos requisitos notados na partitura. Ele frisa que “o leque de
sons que um instrumentista é capaz de realizar é tão extenso e suscetível a nuances que
nenhuma notação poderia esperar controlar tudo, especialmente não tudo ao mesmo
tempo” (Behrman 1965, p. 59). Com relação a esse controle exacerbado, Jean-Yves Bosseur
destaca o papel dos compositores da chamada “ nova complexidade”:

esta determinação excessiva e deliberada dos princípios da notação, encontra-se


mais recentemente em Brian Ferneyhough. Orientando a interpretação num sentido
de transcendência (termo já utilizado aos propósitos dos “estudos transcendentais”
da notação do século XIX), o músico deve colocar entre parênteses seu ego para se
perder na complexidade do labirinto de prescrições e tender, como precisa o
compositor em Cassandra’s Dream Song para flauta, a reproduzir o maior número de
detalhes das notações fixadas com uma minúcia deliberadamente excessiva. (2014,
p. 106)

Logo após a criação do serialismo e do controle exacerbado de cada detalhe em cada


nota que influenciou uma geração de compositores no fim da década de 1940 — em que o
performer tinha pouquíssima liberdade na interpretação e que culmina mais tarde com o
movimento da nova complexidade da qual Ferneyhough faz parte — tivemos, na direção
oposta, partituras de obras abertas, com notação indeterminada, em que as decisões, em um
leque que pode variar desde a própria escolha das notas até a combinação de elementos extra-
musicais na performance (cena, movimento), cabiam ao performer. Philip Thomas, no artigo
“Determining the indeterminate”, discute os papéis do compositor e do performer frente a

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

partituras de notação indeterminada:

Colocar a obra e o compositor dentro de um contexto de prioridades composicionais


e estéticas pode ser vital ao dar forma à interpretação de partituras com notação
indeterminada. Assim como fornecer indicações quanto ao conteúdo (altura,
duração, dinâmica, etc.), uma compreensão e apreciação das intenções do
compositor podem guiar o intérprete na decisão sobre o que determinar (e como
determinar) e sobre o que não determinar. (2007, p. 132)

O autor defende que um bom performer vai arranjar todas as decisões de performance
de modo a encorajar o som a ser o foco da atenção e não o performer (p. 137).
A variação dos graus de controle que o compositor deseja para o resultado final da
música é outro fator a ser considerado pelo intérprete. Hoje temos, muitas vezes, obras que
combinam diferentes notações. Numa mesma peça podemos ter trechos em que o compositor
especifica mais detalhadamente suas intenções e outros com maior liberdade para o músico.
Não é incomum que as orientações da notação sugiram mais explicitamente gestos e timbres
do que notas e ritmos (o resultado sonoro relevante em certas ocasiões dependerá mais
daqueles do que destes), muitas vezes pelo que chamamos “notação prescritiva”.
Seeger (1977, apud Zampronha 2000, p. 55) define que “a notação prescritiva diz ao
intérprete quais ações ele deve tomar frente ao seu instrumento para produzir a música. O
resultado sonoro será uma decorrência de tais ações. Já a notação descritiva diz qual o
resultado sonoro desejado, sem indicar ao intérprete como deve tocar seu instrumento para
produzir tal resultado.” As notações prescritiva e descritiva na maior parte das vezes aparecem
mescladas numa mesma partitura, pois não são excludentes (p. 99).

Notação de técnicas estendidas e música nova para flauta transversal


Muitas das práticas que iniciaram na segunda metade do século XX, já tornaram-se
“tradicionais” na música contemporânea, e podemos afirmar que certas sonoridades — e
mesmo algumas outras convenções — são hoje parte de um leque já conhecido, e na música
instrumental são os sons produzidos por técnicas estendidas (Perlove, 1998). Na flauta
transversal, que é o foco deste estudo, o uso de técnicas estendidas como recurso poético teve
seu marco inicial em 1936 com a peça Density 21.5, de Edgard Varèse, que, além de outros
recursos pouco explorados na escrita flautística, incorporou sons percussivos (cliques de
chave) pela primeira vez em uma peça para flauta solo (Toff, 1996).
Hoje, além dos cliques de chave, vários sons que são produzidos por técnicas estendidas
são amplamente utilizados por compositores, e sistematizados em métodos, estudos e manuais

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

que podem servir como “guias” para intérpretes e compositores. Como exemplo de manual de
técnicas estendidas, temos Metodo per flauto, de Pier Luigi Mencarelli (1975), parte da
coleção “Nuova tecnica per strumenti a fiato di legno” de Bruno Bartolozzi — pioneiro na
sistematização de técnicas estendidas para instrumentos de madeira. Mais recente e
complementar ao trabalho de Mencarelli, os livros de Robert Dick, Tone Development
through Extended Techniques e The Other Flute, são também referência no estudo das
técnicas estendidas, especialmente nos Estados Unidos (Dick 1986 e 1989). Outra fonte
bastante rica e muito utilizada tanto por intérpretes quanto por compositores é o tratado Flûtes
au présent, do flautista Pièrre-Yves Artaud e do compositor Gerard Geay, que, além de tabelas
de posições tanto para flauta de concerto quanto para flautim, flauta contralto e flauta baixo,
traz descrições detalhadas das técnicas estendidas mais usadas, com uma sugestão de notação
bastante aceita na literatura contemporânea para flauta, especialmente na Europa (Artaud
1980). Além destes, vários outros flautistas têm-se dedicado à sistematização das técnicas
estendidas mais usadas no repertório contemporâneo, inclusive divulgando seus trabalhos em
sites abertos na internet (são exemplos Wil Offermanns, Larry Krantz, e John McMurtery).
Além das técnicas estendidas que são consideradas standard (sobre as quais os materiais
citados versam — por exemplo jet whistles, whisper tones, trilos tonais, glissandos, slap
tongues, frulatto, entre outros — o intérprete que se aventura a tocar peças desse repertório
que está em constante construção depara-se frequentemente com novos desafios propostos
pelos compositores que estão em busca contínua por novas sonoridades e formas. Aí reside o
objeto desta pesquisa: como organizar a poética das práticas interpretativas dessa música que
é tão plural quanto as possibilidades sonoras de hoje?
Em sua dissertação de mestrado, a flautista Cássia Carrascoza aborda o tema,
descrevendo o processo interpretativo para a performance de três peças de compositores
brasileiros, destacando as técnicas estendidas para flauta transversal. Ela ressalta que nesse
tipo de repertório são comuns os elementos “extra-musicais” (como declamações de textos,
gestos teatrais e movimentos corporais) e que o músico deve estudar e preparar inclusive as
“ações que não estão diretamente ligadas à produção sonora instrumental e que fazem parte
do gestual da performance” (Carrascoza 2009, 15). Análises interpretativas como as presentes
no trabalho de Carrascoza são bastante importantes para lançar luz sobre a performance das
obras estudadas e podem inclusive servir de base para o estudo de outras obras (outros
exemplos são: Redgate 2007; Del Pozzo 2007; Dufallo, 2007; Scotto, 1988; Uscher, 1983).

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Decisões interpretativas
Retomemos a ideia de que toda interpretação é um processo de criação. A princípio, não se
trata de deixar de lado as ideias do compositor, muito pelo contrário — acredito na ideia
pareysoniana de que a lei única da interpretação é a própria obra. Há entretanto posturas como
a de Benedetto Croce — de uma execução impessoal e objetiva (que acredito impossível) —
ou desconstrucionistas, que apontam para a preeminência do intérprete sobre a obra artística,
e relegam o compositor à condição de abandono (cf. Abdo, 2000). A relação compositor/
intérprete será estudada, no entanto, não é o foco principal. O que interessa nesta proposta de
pesquisa é aquela interpretação cuja criação é baseada na notação, sem audições anteriores,
mas que leva em conta a intencionalidade da obra. O propósito é investigar como são feitos os
julgamentos que são parte da criação na interpretação, inclusive das nuances que não são
notadas mas que vão dar forma à performance, e então a sistematização das possibilidades
dessas escolhas.
A partir das ideias da semiologia musical, que tomara a música como um processo
comunicativo, com influência especial de Jean Molino, a atenção dos estudos de musicologia
voltada à interpretação é geralmente dedicada ou às partituras ou às gravações, por estas
serem parte do que Molino define como “nível neutro” ou imanente (Laske, 1977). Para
Jean Molino, o próprio projeto de compreender a música é muito recente. De acordo com
ele, antes do século XIX, o que havia eram manuais com princípios e regras para a produção
de uma “boa obra”: “a primeira fase do estudo dos fatos musicais foi ao mesmo tempo
normativa e poética”. No final do século XVIII teria havido um deslocamento: a música não é
mais vista do ponto de vista do criador, mas de seu consumidor, não é mais produção ou
produto, mas “esgota-se nas reações que provoca no espectador”. Só com Riemann, diz
Molino, constitui-se uma análise mais técnica, cujo projeto é contemplar o conjunto da
partitura — seu nível neutro, textual —, por um método rigoroso e explícito, que finalmente
separe a dimensão poética daquela imanente na obra (Molino, 1977, p. 141-143). Os estudos
de Nicholas Cook (2001) e Eric Clarke (2004), por exemplo, tomam o caminho indicado por
Molino e concentram-se no estudo da performance por meio da análise de gravações (também
tomadas como nível neutro).
Diferentemente das pesquisas que se fundam na semiologia, como muito do que se
tem visto nos estudos de cognição na interpretação musical , a proposta desta é tomar como
base as ideias de poética de Carl Dahlhaus, que aproveita a sugestão do filósofo Erick
Rothacker para distinguir normativo e poético: haveria uma proposição primária de normas,

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

que não cabe ao estudo acadêmico, e uma elaboração e sistematização secundária (esta sim,
acadêmica) das proposições: a investigação da poética da música. Poética para Dahlhaus é a
“sistematização daquelas ideias e categorias, princípios e critérios que, implícita ou
explicitamente, fundamentam os julgamentos e decisões musicais”, no caso desta pesquisa,
dos intérpretes. Assim, pretende-se estudar o padrão coerente dos julgamentos e decisões dos
intérpretes que, vistos assim, não dependem mais dos gostos dos indivíduos, mas são
intersubjetivos e debatíveis (Dahlhaus 1983, pp. 101-105). A hipótese é que seja possível
conceber um conjunto de práticas de interpretação de obras de vanguarda a partir da leitura da
partitura, sem ouvir interpretações anteriores, como um processo de criação, articulado numa
poética no sentido que Carl Dahlhaus atribui ao termo.
Assim, o objetivo é o estudo dos princípios criativos (poéticas) que orientam as
decisões de flautistas quanto à preparação de peças inéditas de música nova que envolva
técnicas estendidas e notação não-tradicional para flauta transversal.
Está sendo realizado um estudo de campo que conta com a participação de flautistas
profissionais que habitualmente estreiam peças de música nova, no processo de leitura e
interpretação de três miniaturas — que foram compostas sob encomenda por Roberto
Victorio, Silvio Ferraz e Jean Yves Bosseur especialmente para este projeto — todas
apresentam técnicas estendidas e escrita não tradicional. Cada flautista registra em áudio/
vídeo seus momentos de estudo, tocando e verbalizando seu raciocínio e tomadas de decisão,
para que seja possível identificar os critérios de seus julgamentos e escolhas, possíveis
dificuldades de leitura ou ambiguidades indesejadas e imprecisões na partitura. Não é pré-
determinado o número de sessões de estudo dedicados a cada peça, que fica a critério de cada
flautista, mas o nível de proficiência deve ser tal que a peça possa ser tocada em público.
Esses áudios/vídeos servem de instrumentos de coleta de dados para análise. Após esse
período de estudo do repertório e análise dos dados, haverá entrevista semi-estruturada com
cada um dos intérpretes para elucidar possíveis dúvidas e complementar lacunas que possam
ter surgido durante a análise. A discussão final dependerá dos resultados obtidos nessa coleta
de dados, que segue em andamento.
Pretende-se, no decorrer do estudo, lançar luz sobre questões ainda pouco estudadas
dos processos cognitivos da construção de interpretação para repertórios novos que envolvam
notação não-tradicional. Existe uma literatura mais ampla voltada à música tonal (cf. Agawu,
2009; Lehmann et alii, 2007), originada na área da semiótica e da educação musical.
Especialmente sobre notação, vem sendo investigada, por exemplo, a criação de notação por

350
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

crianças (cf. Barrett, 2005). Entretanto não foram até agora encontrados trabalhos que
discutam com certa profundidade os processos psicológicos, filosóficos e propriamente
musicais, da criação de interpretações por performers experts a partir de partituras de notação
não tradicional. Acredito que este trabalho, voltado à flauta transversal, possa desdobrar-se em
novas propostas de pesquisa extensível a outros instrumentos e outros repertórios, de modo a
elucidar o processo criação de interpretação e de poéticas da música nova.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

A performance musical e o jogo em Hans-Georg Gadamer

Isadora Scheer Casari


PPG em Música – UNIRIO
isadorascheer@hotmail.com

Resumo: O objetivo do artigo é apresentar o conceito de jogo na obra de Hans-Georg Gadamer


(2012) e suas relações com novos paradigmas da cognição sobretudo com o enacionismo (Varela,
1991). Procurarei por fim esboçar possíveis desdobramentos que o conceito pode oferecer à
construção de uma teoria da performance musical. A relação da hermenêutica filosófica de Gadamer
com o paradigma enacionista da cognição acontece pela superação da dicotomia na relação sujeito/
objeto que ambas abordagens enfrentam. Gadamer apresenta uma teoria geral da interpretação que
pretende explicar de que forma compreendemos e interpretamos o mundo. O conceito de jogo trazido
pelo autor permite abordar e iluminar diversos aspectos implicados em nossa interpretação de mundo,
sendo portanto uma teoria do entendimento. Gadamer traz a questão da compreensão para além da
consciência de quem conhece, ao entender que esse processo não suspende a alteridade do outro, mas
a conserva. Para Gadamer devemos nos desfazer de um modelo de entendimento centrado seja no
objeto, seja no sujeito, que é também um projeto enacionista. A compreensão é sempre um acordo, um
diálogo e num diálogo não existem sujeitos e objetos. É justamente a possibilidade de jogar-se sempre
com (alguém ou alguma coisa) que possibilita ao conceito apresentar a alteridade como um aspecto
inerente à compreensão. Transposta para o contexto da performance musical, o conceito de jogo
permite uma abordagem ampla de diversos aspectos implicados na performance tal como a relação
interprete e ouvinte assim como o caráter imponderável, dinâmico e circunscrito presente em toda
performance.
Palavras-chave: performance musical, filosofia cognitiva, enacionismo, jogo, Hans-Georg Gadamer.

The Musical Performance and the game in Hans-George Gadamer


Abstract:The aim of the paper is to present the concept of play in the work of Hans-Georg Gadamer
(2012) and its relations with new paradigms of cognition, especially with enactivism (Varela, 1991). I
will try to sketch possible developments that the concept can offer to the construction of a theory of
musical performance. The proximity between Gadamer’s philosophy and the enactivism paradigm
takes in consideration that both overcome the dichotomy subject / object. Gadamer introduce a general
theory of interpretation which intends to explain how we comprehend and interpret the world. The
concept of game enables to approach diverse aspects implied in our interpretation of the world, being
therefore a theory of the understanding. Gadamer claims that to understand is to preserve the
otherness which means to overcome the idea that understanding happens in a self-centered
consciouness. In that sense, it is necessary to overcome the dichotomy subject / object, which is also
the goal of the enactivism paradigm. Comprehension always happens as a dialogue where there are no
subjects or objects. It is precisely the possibility of always playing with (someone or something) that
enables the concept of game to present otherness as an inherent aspect of understanding. Transposed
to the context of musical performance, the concept of game allows a broad approach to several aspects
of performance such as the interpreter and listener relationship as well as the imponderable, dynamic
and circumscribed character present in every performance.
Keywords: music performance, cognitive phylosophy, enactivism, game, Hans-Georg Gadamer.

1. Introdução
É crescente o interesse de pesquisadores que estudam os processos de compreensão musical
(Nogueira, 2014; Oliveira, 2014; Zbikowsky, 2002) em buscar modelos que superem o
paradigma representacionista da cognição. Nesse modelo cognitivo aquilo que conhecemos é

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a representação de uma realidade externa e objetiva que independe do sujeito cognoscente. As


abordagens cognitivas tradicionais trazem consigo pressupostos epistemológicos e filosóficos
que não apresentam condições necessárias e suficientes para explicar a mente musical em toda
sua envergadura (Oliveira, 2014). O principal desses pressupostos é a noção de que o eu, ou
sujeito cognoscente, é “o epicentro do conhecimento, da cognição, da experiência e da
ação” (Varela, 1991, p.18). Assim na concepção tradicional de cognição a consciência
apreende e representa internamente os objetos externos. Nesse sentido estrito, representação é
a operação mental na qual a mente humana faz presente na consciência um objeto que lhe é
exterior. Por meio das representações mentais, tornamos a realidade, que nos é exterior, um
objeto da consciência. Os modelos filosóficos que predominaram no Ocidente desde o
Renascimento até meados do século XIX preconizavam que as produções humanas eram
consideradas representações fiéis de uma realidade pré-concebida. Assim “nossos signos eram
confiáveis, nossas linguagens verídicas e nosso espírito estava em pleno acordo com o
mundo” (Delacampagne, 1997, p.11). Tal concepção permeia até hoje nosso entendimento da
realidade dando origem ao critério moderno de objetividade. O presente artigo é um esforço
na direção de oferecer ao leitor uma posição filosófica comum aos debates contemporâneos
em cognição musical, sobretudo aqueles que visam novos modelos para a compreensão
musical.
Em sua obra Verdade e Método, publicada pela primeira vez em 1960, Hans-George
Gadamer (1900-2002) dedica-se a investigar modalidades de conhecimento que ultrapassam o
campo de controle da metodologia científica. O filósofo, representativo da hermenêutica1
contemporânea, compreende que tanto na arte quanto na experiência histórica existe uma
“verdade” que escapa a noção tradicionalmente difundida na ciência. Gadamer entende a
experiência de verdade não como uma apreensão correta da realidade, mas como
compreensão. Seu projeto inicial ao escrever Verdade e Método (2012) era pensar uma
hermenêutica das ciências humanas, embora ele vá ainda mais longe ao esboçar uma
hermenêutica da linguagem (Grodin, 2012). Apesar do título, Verdade e Método é uma crítica
à ideia de que a verdade é apenas uma questão de método (Grodin, 2012). A ideia de método,
que pressupõe uma distância entre observador e objeto, não se basta para as ciências humanas,
uma vez que o espectador está sempre comprometido em algum nível com a interpretação

1 A ideia central da concepção filosófica hermenêutica contemporânea é que o entendimento e a interpretação são
processos essencialmente humanos, sendo portanto, o que poderíamos chamar de uma filosofia do entendimento.

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desse objeto e, como veremos adiante, em sua filosofia fica cada vez mais diluída a ideia de
que sujeito e objeto são instâncias separadas.
Gadamer (2012) defende que a verdade, antes de ser uma questão metodológica, é uma
experiência de entendimento mútuo e que acontece dentro de uma certa linguagem. A verdade
não é assim o “desvelamento de uma situação oculta” (Grespan, p.12, 2008), mas é próprio
ato da compreensão. Com isso não se pretende deslegitimar o conhecimento que chamamos
de científico, ou seja, que é construído segundo critérios objetivos e do método científico, mas
a crítica de Gadamer (2012) é justamente à visão de que o conhecimento científico é o único
verdadeiro. Ele critica a imposição cega a um tipo de conhecimento que se coloca
independente do intérprete, imposição essa que tende a nos tornar impenetráveis ao
reconhecimento de outras modalidades de saber que são próprias das ciências humanas e das
artes, e é justamente na experiência da arte que Gadamer vai procurar subsídios para construir
seu modelo de entendimento.

2. O jogo em Gadamer
A experiência da arte é antes de tudo uma experiência de compreensão. A arte não é apenas
um “objeto” de fruição estética; mas, para Gadamer, ela nos possibilita experimentar uma
verdade. Ao defender essa tese, o autor promove uma ampliação da noção de verdade que não
se limita apenas aquilo que é cientificamente cognoscível (Grodin, 2012). A fim de pensar o
que é o encontro com a obra de arte, que posteriormente se desdobrará como um modelo para
pensar o entendimento humano, Gadamer utiliza o conceito de jogo como fio condutor para
explicação ontológica da experiência da arte, pois “entender uma obra de arte é deixar-se
levar por seu jogo” (Grodin, 2012).
Jogo é um processo dinâmico, de sentido medial, de caráter imponderável e circunscrito
no tempo, no espaço e a regras e que estabelece uma realidade autônoma (Callois, 1999;
Gadamer, 2012; Huizinga, 2012). Nele está implícito um movimento de vaivém e o ser do
jogo é a própria realização desse movimento que não se fixa e que não cessa (Gadamer,
2012). O caráter cinético do jogo é tão proeminente para compreendermos sua natureza que é
irrelevante quem começou tal movimento: o modo de ser do jogo não permite que quem joga
se comporte em relação a ele como um objeto, quem joga não é pois o sujeito do jogo. Por ter
uma natureza que lhe é própria, em nenhuma medida se limita a subjetividade ou a
consciência do jogador. O movimento de vaivém pertence tão essencialmente ao jogo que é
impossível jogar sozinho. Para que haja jogo é indispensável a presença de um elemento outro

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que responda ao jogador ou que o questione. Justamente nesse ponto reside seu sentido de
“mediação total” (Gadamer, 2012 (I), p. 165). A fascinação do jogo para aquele que joga,
repousa justamente na saída de si próprio que o jogo suscita, na entrada “em um nexo
dinâmico que desenvolve sua própria dinâmica” (Gadamer, 2012(II), p. 180)
O conceito de jogo é central para pensarmos o fenômeno da compreensão, da linguagem
e da arte (Gadamer, 2012). É importante deixar claro que o pensamento do filósofo é
orientado em grande parte por uma crítica ao princípio subjetivista que determina o
pensamento moderno (Gadamer, 2012 (II), p.11). A crise do idealismo subjetivo imprimiu
uma direção completamente nova ao sentido do que é compreender. É o outro que possibilita
que o eu entenda algo sendo portanto um elemento crucial do ato da compreensão (Gadamer,
2012(II), p.17). É importante destacar que o outro pode assumir diferentes formas, não é
necessariamente uma pessoa, mas é tudo aquilo que se constitui como alteridade, ou seja,
“como elemento não imediatamente acessível, compreensível” (Grespan, 2008) e a partir do
qual posso enxergar a mim mesmo.
Ao romper com a centralidade do eu no processo de construção de sentido, o autor traz
a questão da compreensão para além da consciência de quem conhece, ao entender que esse
processo não suspende a alteridade, mas a conserva. Devemos assim nos desfazer de um
modelo de entendimento centrado seja no objeto, seja no sujeito. A compreensão é sempre um
acordo, um diálogo e num diálogo não existem sujeitos e objetos. É justamente o caráter
medial do jogo que confere ao conceito a possibilidade de se pensar a alteridade como um
aspecto inerente à compreensão. Todo ato de compreensão se estabelece a partir da dialética
da pergunta e da resposta. Esse processo não se limita ao diálogo entre duas pessoas, mas
também na relação texto e intérprete, espectador e a obra de arte e, por fim, entre o homem e o
mundo. Como um jogo, todo processo de compreensão é um ato em aberto na medida em que
é uma ação interpretativa e não a reprodução interna de uma realidade externa. No jogo da
arte não somos nós que dirigimos a ação interpretativa mas somos transportados para uma
realidade que nos ultrapassa: o jogador se dobra à autonomia do jogo. A subjetividade de
quem joga encontra-se implicada mas em nenhuma medida ela é o “sujeito” do jogo.
A compreensão não é apenas um produto da consciência, mas um processo mais amplo.
Ela não se inicia nem se esgota no sujeito que compreende, mas ao contrário, compreender
produz um momento de desprendimento de si-mesmo (selbst) que deveria ser investigado
pelo modelo do jogo (Gadamer, 2012(II), p.151). O espaço de jogo comporta um movimento
de alternância, que não pode ser reduzido a subjetividade do jogador, pois “a real experiência

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do jogo consiste no fato de que, no jogo, passa a predominar algo que obedece inteiramente as
suas próprias leis” (Gadamer, 2012(II), p. 154). Quando alguém entra no jogo, pode
experimentar essa alternância fluida, que parece caminhar por si mesma, e que confere à
subjetividade do jogador uma experiência de liberdade e leveza, “o que entra ou está em jogo
já não depende de si mesmo, mas é dominado por essa relação chamada jogo” (Gadamer,
2012(II), p.154). O jogo é capaz de impor uma realidade que enlaça o jogador num encontro
que o transforma. A subjetividade dos indivíduos, seu comportamento e sua autocompreensão,
mergulham numa “determinação” maior que lhes comporta.
O modelo de compreensão que Gadamer apresenta como alternativa ao modelo
tradicional no qual sujeito e objeto são instâncias autônomas baseia-se na ideia de que a
experiência da compreensão é uma experiência de estar-fora-de-si. O autoesquecimento que o
mergulho no jogo produz na consciência que joga não é uma perda da posse de si-mesmo,
mas seu alargamento. A saída de si-mesmo é o movimento essencial do conhecimento, dai a
“capacidade que a arte tem de expandir e modificar a compreensão que se tem de si próprio e
do mundo” (Gay, 2010, p140). Compreender significa manter com aquilo que se compreende
uma espécie de diálogo produzindo alguma coisa nova que inexistia antes desse encontro,
“quando alguém compreende o que o outro diz, este algo não é apenas o que o outro tinha em
mente, mas algo partilhado, comum” (Gadamer, 2012(II) p.29). Essa concepção de
compreensão fica clara quando pensamos em um diálogo entre duas pessoas que buscam um
acordo, uma visão de mundo comum. O que Gadamer faz é transpor esse modelo para a
compreensão das coisas do mundo, que além de ser partilhada com outros indivíduos é
construída no próprio jogo com o mundo.

3. O paradigma enacionista
A hermenêutica gadameriana e o paradigma enacionista da cognição (Varela, 1991)
compartilham a noção de que a compressão não é centrada nem no objeto nem no sujeito, mas
na relação entre eles. Muito mais do que um produto (ou uma representação) da consciência
do sujeito, o entendimento é um processo dinâmico e dialógico (como o movimento de
vaivém do jogo que não se fixa e que não cessa). As duas abordagens rompem com o modelo
tradicional do conhecimento que ao longo da história foi entendido como uma questão ora
objetiva, ora subjetiva. Na abordagem enacionista a cognição não é a representação de um
mundo pré-concebido, mas sim a atuação de um organismo no mundo, tendo assim relação
direta com os tipos de experiência que temos enquanto seres corpóreos e de características

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específicas de nosso corpo, da maneira como nos locomovemos, de como interagimos


fisicamente com os objetos, de aspectos de simetria e assimetria do corpo humano, de
características estruturais de nosso cérebro e também de nossa afetividade. No paradigma da
cognição incorporada, as estruturas cognitivas emergem dos padrões sensórios motores
próprios do corpo humano.
Nosso cérebro é um sistema cooperativo e auto-organizado e não uma rede uniforme de
processamento de dados. Nossa cognição não é centralizada, mas sim uma rede distribuída,
onde a mente não está apenas na cabeça, mas em todo o corpo (Varela, 2000). Nossas
respostas neuronais se alteram em decorrência do contexto e operam em redes que emergem
em decorrência de nossas experiências, não possuindo caminhos ou módulos fixos. A mesma
rede que opera nosso controle motor e nossa percepção, opera também nossa racionalidade e a
configuração em redes emergentes é um elemento central na arquitetura da cognição humana.
Aquilo o que é percebido não é uma computação de uma informação externa, mas sim a
emergência de um estado global. O mundo não é independente daquele que o experimenta,
não é uma estrutura fixa e transcendental que deve ser corretamente conhecida pela razão. Os
conceitos que organizam nosso entendimento são moldados por nossa experiência no mundo e
não por uma realidade externa e transcendental que deve ser corretamente capturada (Lakoff
& Jonhson, 1999; Varela, 1991). O sujeito cria e é criado pelo mundo ao interagir com ele.
Não há um mundo preestabelecido, mas um mundo percebido. Esse mundo percebido não
existe a priori de maneira objetiva e externa ao sujeito, tão pouco é uma construção somente
subjetiva. Assim como a hermenêutica de Gadamer, a abordagem enacionista posiciona-se
entre esses dois polos: o da subjetividade e da objetividade. Trazer a questão da compreensão
para um campo intermediário entre objetividade e subjetividade evidencia o fato de que, pelas
duas abordagens apresentadas, não é possível pensar a compreensão como um fenômeno
unilateral no qual um sujeito compreende um objeto, ela por sua vez é dialógica. Sujeito e
objeto não podem ser entendidas como autônomos, mas interconectadas em uma relação que
os abrange, relação essa que Gadamer chama de jogo.

3. Desdobramentos: o jogo da performance.


A experiência da performance musical é uma experiência de compreensão. Alguma coisa
acontece quando compreendemos, algo que escapa do nosso controle, escapa das nossas
intenções e ações, como vimos ao longo do texto a compreensão tem algo de jogo e que como
jogo tem uma dimensão imponderável de encontro com o outro. A performance pode ser

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pensada como um jogo no qual participam produtores e espectadores que jogam um jogo
comum. Numa análise apressada poderíamos pensar que o “sujeito” da performance é o
músico e que o ouvinte simplesmente assiste à performance e, por tanto, essa relação é
unilateral. No entanto, o músico não é o sujeito que produz o sentido da performance, ele não
tem esse poder. O sentido de uma performance é sempre uma construção partilhada. A
experiência de compreensão que acontece no ato da performance pública de uma obra é um
jogo entre as intenções do intérprete (ou interpretes), do compositor e dos ouvintes. A
presença do espectador dá o contexto no qual a performance acontece, é a presença dele que
possibilita esse evento que damos o nome de performance (podemos pensar que diferentes
audiências geram diferentes performances, ou tocar em casa para familiares é a mesma coisa
que tocar para uma banca de especialistas?).
Gostaria de me ater a um outro aspecto da performance: sua preparação. Enquanto a
performance é uma experiência pública, sua preparação, ou aquilo que costumamos chamar
de prática ou estudo, é um trabalho solitário e que envolve muitas horas de preparação
(Chaffin & Lemieux, 2004; Ericsson, 1997; Reid, 2002;). A capacidade de refletir, de regular e
de organizar a própria prática são fatores relevantes para a construção de habilidades de
performance musical que é, portanto, uma atividade dinâmica que exige o constante
direcionamento da atenção.
Meu argumento é que a atividade de tocar um instrumento é dinâmica no sentido que
apenas um jogo pode ser. O jogo, assim como a performance, é uma experiência que se
realiza a partir de uma configuração fluida de sentidos (Santos, 2013). Assim como a
performance, o jogo não tem um fim ou um desenrolar preestabelecido, ou seja, “o jogo se
revela justamente como um fenômeno que se descobre em ato, isto é, realizando-se” (Santos,
2013, p. 105). Como processo dinâmico, todo jogo comporta um risco intrínseco e uma
dimensão de abertura para o mundo. Jogar é constantemente a experiência de uma saída
extática de si-mesmo para um nexo dinâmico e autônomo à vontade do jogador. Na situação
de jogo estamos abertos à experiência. O jogo é assim um processo que conta com a
capacidade de adaptação e flexibilidade do jogador.
Quando jogamos, experimentamos um espaço de interseção e de extensão entre nós
mesmos e o mundo. Sempre que jogamos, jogamos com alguém ou com alguma coisa. Ao
jogarmos nos abrimos para a interpretação e para a ação do outro, assim, no jogo o eu e o
outro formam um meio continuo e inseparável. Por fim, o jogo é um processo que se
configura, entre outras coisas, pela abertura, flexibilidade, prazer e concentração da

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consciência que joga e por isso é um campo profícuo para que a ação criativa possa se
desenvolver. Trazer o conceito de jogo para a cena dos debates em performance musical
coloca em destaque o aspecto criativo, dinâmico, imponderável, intrinsecamente motivado e
circunscrito (no tempo, no espaço e a regras) dessa atividade possibilitando a ampliação do
entendimento do músico sobre suas próprias experiências de performance.

Referências
Callois, R. (1990). Os jogos e os homens: a máscara e a vertigem. Lisboa: Ed. Cotovia.
Chaffin, R; Lemieux, A. (2004). General perspectives on achieving musical excellence. In
Williamon, A. Strategies and techniques to enhance performance. (pp: 19-39) New York:
Oxford University Press.
Delacampagne, C. (1997). História da filosofia no século XX. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Ericsson, K. A. (1997). Deliberate practice and acquisition of expert performance: an
overview. In Jogensen, H.; Lehmann, A. Does practice make perfect? Current theory on
instrumental music practice. (pp: 9-51) Oslo: NMH-publikasjoner.
Gadamer, H.G. (2012). Verdade e método (12nd ed). Petrópolis: Editora Vozes.
__________________. (2012). Verdade e método II: complementos e índice (12nd ed).
Petrópolis: Editora Vozes.
Gay, M.A. (2010). Estou de altos! As possibilidades do jogo para a história. Dissertação de
mestrado, Programa de Pós-graduação em História, Pontifícia Universidade Católica, Rio
de Janeiro.
Grespan, J. (2008). Prefácio. In: Araújo, A, M. A atualidade do acontecer. (pp:11-15) São
Paulo: Humanitas.
Grodin, J. (2012). Hermenêutica. São Paulo: Parábola editorial.
Huizinga, J. (2012). Homo Ludens: o jogo como elemento da cultura. São Paulo: Ed.
Perspectiva.
Lakoff, G.; Johnson, M. (1990). Philosophy in the Flesh: The embodied mind and its
challenge to western thought. New York: Basic Books.
Nogueira. M. (2014). Música na carne: o caminho para a experiência musical incorporada.
Música em contexto, anoVIII, V.1: 92 – 119.
Oliveira, L.F. (2014). O estudo da música a partir do paradigma dinâmico da cognição.
Percepta – Revista de Cognição Musical, 2 (1): 17-36, Curitiba.
Reid, S. (2002). Preparing for Performance. In: Rink, J. Musical Performance: a guide to
understanding. (pp:102-112) New York: Cambridge University Press.
Santos, L.A. (2013). O fenômeno do jogo e a hermenêutica de Hans-Georg Gadamer. Revista
Intuito, 6(2):102-112, Porto Alegre.
Varela, F. Thompson, E. Rosch, E. (1991). A mente corpórea: ciência cognitiva e experiência
humana. Lisboa: Instituto Piaget.
Varela, F. (2000). El fenòmeno de la vida. Santiago: Dolmen Ediciones.
Zbikowski, L. (2002).Conceptualizing music: cognitive structure, theory and analysis. New
York: Oxford University Press.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Perspectivas lógicas-semióticas no processo criativo musical de Pierre Boulez

Alberto Ferreira da Silva


Unicamp
albertodiferreira@hotmail.com

Resumo: Este artigo pretende, através da análise dos escritos de Pierre Boulez, destacar
procedimentos lógico-cognitivos no processo da composição musical. Primeiramente
demonstraremos como o teórico americano Charles Peirce monta sua teoria cognitiva-semiótica
trazendo como unidade um pensamento primeiro, nomeado pelo autor de “lógica abdutiva”. Em
sequência, seguindo uma corrente de pesquisa que utiliza da lógica abdutiva no estudo do processo
criativo, faremos uma análise da teoria composicional de Pierre Boulez interpretando o dialogismo
dos apontamentos do compositor como um processo cognitivo-lógico na perspectiva do fenômeno
abdutivo. Nestes escritos, Boulez apresenta o material e a idéia composicional como necessários e
implícitos no processo criativo. A realização composicional exige uma relação de conflito entre
idéia e material, fazendo do processo criativo uma ação complexa na qual o compositor depende
de sua percepção cognitiva para fazer a obra existir. A partir desta reflexão tentaremos demonstrar
que é possível observar os elementos dentro de uma ação criativa e colocá-los à luz da análise
científica.
Palavra Chave: criatividade, processo composicional, gesto musical, Pierre Boulez, cognição.

Cognitive-logical perspectives in the creative process of Pierre Boulez


Abstract: This article intends through the analysis of Pierre Boulez’s writings, to detach logical-
cognitive procedures in the process of the musical composition. At first, we’ll demonstrate how the
theoretical American Charles Peirce sets up his cognitive-semiotics theory, bringing out an idea
namely by the author as the logical of abduction. Following a line of research which uses the
abduction logical to study the creative process, we’ll make an analysis of Pierre Boulez’s
compositional theory considering the dialogism of the author’s notes as a cognitive-logical process
inside the phenomenon of abduction. In his theory, Boulez presents the material and compositional
idea as necessary and implied in the creative´s process. The compositional achievements demands
a relation of conflict between idea and material. Therefore, being the creative process a complex
action, the composer depends on his cognitive perception to turn the work into reality. We’ll show
that it is possible to observe the elements within a creative action, and put them in the light of
scientific analysis.
Key-words: creativity, compositional process, musical gesture, Pierre Boulez, cognition.

Para a apreciação da proposta analítica deste artigo, partiremos do conceito de lógica


desenvolvido por Immanuel Kant. Para Kant, tudo na natureza ocorre segundo regras, seja o
caminhar dos animais, o fluxo da queda da água, etc. Nessa perspectiva, na faculdade do
pensar estaria também implícita uma lógica, mesmo quando não estamos conscientes do uso
que fazemos dela. Deste modo, Kant compara o funcionamento da lógica com o
funcionamento da gramática:
Do mesmo modo, a gramática geral, por exemplo, é a forma de uma língua em
geral. Mas falamos mesmo não conhecendo a gramática, e quem não conhece, no
entanto fala, possui na verdade uma gramática e fala segundo regras de que não
tem consciência, porém. (KANT, 2003, p. 25)

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Haveria então, para Kant, dois pontos acerca dos estudos da lógica: o primeiro é ser o
fundamento de todas as outras ciências e do próprio estudo do intelecto, por se preocupar com
a forma como este se constitui. O segundo ponto é que, pelo seu caráter abstrativo, a lógica
não pode ser um “órganon” das ciências, em outras palavras, apenas com o uso da lógica não
é possível atendermos às necessidades de conhecimento de uma dada ciência. Assim, a lógica
se apresenta como um “juízo de apreciação” e “correção” do nosso conhecimento e não uma
ciência autônoma na descoberta dos objetos. Esta compreensão irá justificar a aplicação lógica
sobre o processo criativo e não permitirá uma substituição dos elementos que caracterizam a
criação musical pela lógica.
Apesar de seu caráter abstrativo, a ciência lógica reconhece no pensamento seus últimos
meios para seu uso próprio. Esta característica leva à autonomia da lógica quanto ela mesma,
sendo a priori de qualquer pensamento, um “cânone” do intelecto com sua organização
constitutiva e leis necessárias.
A teoria lógica de Kant foi um dos pilares metodológicos para o aprofundamento
científico de Charles Peirce ao se debruçar sobre a teoria do signo. Esta última, que já havia
sido inaugurada por John Locke em 1690, foi revisada e ampliada a partir das reformulações
da lógica de Kant, principalmente pela adesão de Peirce ao raciocínio abdutivo. Os estudiosos
do processo criativo demonstram, em publicações recentes, como Peirce reconhece que a
descoberta na ciência se equivale à descoberta na arte. Por isso, partimos de sua metodologia
para observar a criação na composição musical. Assim, Peirce desenvolve o conceito de
raciocínio abdutivo, que está diretamente conectado com o processo de criação de novas
idéias (COCCHIERI, 2008, p.33). Anterior às inferências lógicas de dedução e indução, a
abdução seria responsável por criar as hipóteses e descobertas diante de um fenômeno
desconhecido.
Sem grande rigor, definimos que o raciocínio abdutivo estaria para a descoberta, o
dedutivo para a análise e o indutivo para a prova das hipóteses através de uma experiência
empírica (COCCHIERE, 2008, p.41). De acordo com Cocchiere:
(...) o raciocínio abdutivo se efetiva nas seguintes etapas: percepção de anomalia;
surpresa e dúvida; abandono do hábito anterior; geração e seleção de hipóteses
(...) a segunda etapa da investigação é a dedução, que consiste em uma análise
formal que atua como argumento explicativo e antecipatório das hipóteses
levantadas como prováveis (...) a terceira etapa resultante do processo de
raciocínio se realiza na indução, em que há certa correspondência entre algo ser
verdadeiro, e posteriormente se inferir a uma classe inteira de ocorrência de
coisas semelhantes. (COCCHIERE, 2008, p. 44)

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Uma vez que existe para Peirce uma equivalência entre a mente do investigador e o
universo dinâmico, é importante esclarecer que o raciocínio abdutivo tem caráter lógico-
formal e espontâneo. Ou seja, no caso do processo perceptivo sensorial, já teríamos o
desenrolar de uma complexa tarefa lógico-semiótica. Este entendimento lógico implícito ao
processo de percepção é o que fundamenta a teoria semiótica Peirceana (COCCHIERI, 2008,
p. 42).
Deste modo, a clássica definição semiótica se estabelece no reconhecimento de três
fatos pela mente, levando em conta que entre a mente e o objeto (entendido como a realidade
exterior à mente) há um signo como mediação. Temos então “o signo em si mesmo; uma mera
qualidade (uma cor, uma sensação), “um existente concreto” onde o signo está conectado ao
seu objeto (som da porta batendo, som do relâmpago) e o signo como representação de uma
lei geral (palavras, um código) (PEIRCE, 2003, p. 51).
Para manter o devido recorte metodológico neste artigo, nos limitaremos à teoria de
Peirce no que diz respeito ao quadro lógico até aqui discutido e não envolveremos a
categorização dos signos. Assim, na montagem da discussão sobre o processo criativo
musical, fomentado aqui por Pierre Boulez, caminharemos na observação e identificação das
relações com a teoria de Peirce incutidos nos elementos discutidos pelo autor francês.
Jean-Jacques Nattiez no prefácio de “Escritos Seletos” menciona o fato de Boulez estar
dentro do grupo de compositores que mais escreveu, possuindo um pensamento que “baseia-
se num olhar retrospectivo, crítico e acelerado dos momentos estéticos fortes do século XX
musical, a partir dos quais define a sua própria trajetória” (BOULEZ, 2012, p.15).
Nattiez evidencia ainda o fato de que, ao escrever sobre outros compositores, um
compositor acaba definindo a si próprio, trazendo desta forma uma importante visão aos
propósitos de nossas reflexões: “Boulez preserva um liame muito específico com o passado:
nunca se volta e recorre a ele para imitar traços empíricos de estilo, mas para retirar lições
quanto aos princípios” (BOULEZ, 2012, p.13). Partindo das premissas levantadas com a
observação de Nattiez, o ato de compor obedece a certos princípios e nosso intuito é observar
quais os possíveis elementos que fariam parte da criação composicional e como se daria seu
funcionamento na visão de Boulez. Neste intento, formulamos as questões: seria o ato
composicional processo de descoberta tal qual se realizaria no processo abdutivo? Em que
medida podemos ter o processo composicional musical como um operação lógica?

363
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Em “Invenção, técnica e linguagem”, Boulez faz uma primeira abordagem sobre o


problema da composição apontando o material como um dos elementos primordiais do
processo composicional, uma vez que é impossível separar material da invenção:
A invenção musical está, pois, diretamente associada ao material, exige a sua
renovação, reclamando-lhe recursos insuspeitos. Esta reciprocidade da invenção
e do material é uma das características mais basilares de toda a civilização
musical. (BOULEZ, 2012, p.254)

Mas haveria uma gênese do processo além da manipulação com o material? No seu
texto de 1980 “A composição e os seus diferentes gestos”, Boulez define a composição como
uma “especulação”. O processo criativo passaria pela “contradição” entre a especulação e a
realidade do material. (BOULEZ, 2012, p.257)
Diante deste fato de “contradição” entre a especulação e a realidade, Boulez afirma que
é necessário formalizar a “ideia musical”. O que veremos no desenvolvimento do compositor
é em que medida a ideia está submetida a uma constrição e quando se configura como uma
especulação ou uma hipótese.
A “ideia musical” é demonstrada como um elemento basilar no processo criativo que
advém de algumas premissas. Primeiramente, há sempre circunstâncias históricas que
determinam um certo vocabulário, nas quais a ideia deve estar ligada a algum consenso de
alturas ou codificada em alguma linguagem rítmica. Assim, Boulez determina que “estes dois
elementos, altura e durações, são elementos primordiais fora dos quais a ideia musical, em
rigor, não existe”. (BOULEZ, 2012, p. 260) De forma menos genérica, mas ainda assim
preponderante, a ideia pode estar ligada a convenções de formas musicais que constringem :
“pela estrutura de um andamento (...) pelo tempo adotado (...), pela destinação do material – o
tema pode ser destinado ao desenvolvimento, à variação, à simples repetição, pelo
instrumento – a ideia é constringida pelos recursos próprios da manipulação instrumental”.
(BOULEZ, 2012, p. 261)
Em suas conclusões, Boulez afirma que mesmo distante das constrições mencionadas
haveria ainda outra mais forte e ilusória, sendo esta a da própria memória:
A memória acumula em nós um certo número de modelos, incluindo igualmente
os nossos próprios modelos. É um universo constante de referências a que é
muito difícil subtrair-se. Criamos assim para nós, sem que tal seja perfeitamente
consciente, ou sem que queiramos reconhecê-lo de modo patente, uma
linguagem pessoal de referência, uma rede de gestos inventivos, para os quais
somos tentados a apelar, aos quais nos reportamos em caso de urgência
(BOULEZ, 2012, p. 261)

364
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Por fim, o compositor francês se questiona sobre o quão real pode ser a ideia musical -
“Será, aliás, tão real, como acabo de descrever, a ideia inicial?” (BOULEZ, 2012, p.262) -
colocando em condição de hipótese ideias que, nas suas mais sensíveis gêneses, têm um
caráter virtual e indeterminado. Assim, Boulez provoca que a composição “dependerá então
do confronto destas hipóteses com a realidade do material musical” e que “na verdade, ideias
primordiais tão abstratas poderiam realizar-se segundo qualquer código”. A ideia para Boulez
teria então uma generalidade que caberia a qualquer forma de expressão onde “ao ler um
quadro, ao refletir sobre um fenômeno qualquer, o compositor pode sentir-se possuído do
famoso demônio da analogia”. (BOULEZ, 2012, p.262)
Considerando as propriedades analisadas por Boulez sobre o processo composicional,
podemos fazer a relação de que haveria uma afinidade do raciocínio abdutivo com o ato de
criação, por ambos nutrirem suas hipóteses a partir de um fenômeno observado ou fato
genérico ou ainda por ambos partirem da descoberta dos fenômenos ou fato através da
percepção.
Em resumo, se existe uma forma de conhecer/perceber o mundo é através da abdução, e
até aqui, pelos dados apresentados do processo criativo a partir da perspectiva de Boulez,
constatamos que podemos incluí-lo nesta lógica abdutiva.
Voltando ao pensamento de Peirce, este autor formula que existiria movimentos de
síntese e análise no processo de aquisição do conhecimento, onde a mediação é feita por
aparelho cognitivo denominado por ele de “juízo perceptivo”(COCCHIERI , 2008, p. 43)
A definição de juízo perceptivo consiste em uma ação não controlada pela razão que
percebe as coisas no mundo. O juízo perceptivo antecederia a abdução, sendo a porta de
entrada dos elementos da realidade e o motor para o raciocínio abdutivo:
Trata-se de um quase-raciocínio, instintivo, uma espécie de adivinhação,
altamente falível, mas o único tipo de operação mental responsável por todos os
nossos insights e descobertas. Sem ele, o homem perderia a capacidade de
descobrir, do mesmo modo que, sem asas, os pássaros seriam incapazes de voar.
(SANTAELLA, 1993, p.67)

Em linhas gerais, o juízo perceptivo é a ação involuntária da percepção como algo que
está diante de nossos olhos, um sabor ou sensação decorrente de algo. A abdução, por sua vez,
é a ação consciente da percepção que controla o que percebemos. Para Peirce, “toda forma
geral de reunir conceitos é, em seus elementos, dada na percepção” (PEIRCE, 2003, p.228
apud COCCHIERI, 2008, p.45).

365
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Diante das reflexões aqui apresentadas, cabe a consideração final de que este estudo é
um início das preposições sobre o processo criativo musical na perspectiva das ciências
cognitivas. Apesar de haver relevantes publicações sobre a lógica-semiótica na área de
processos criativos ainda é pouco usual a aplicação desta na composição musical.

Considerações Finais
O que conseguimos prover desta análise, por ora, é que podemos relacionar o procedimento
composicional ao processo lógico que se inicia na percepção. Futuros estudos poderiam
relacionar a questão do material com a ideia musical, aprofundando em que aspecto cognitivo
se daria este movimento. É importante ressaltar o trabalho do compositor e pesquisador José
Augusto Mannis que contribui para os estudos dos processos cognitivos da percepção como
fundamento do ato composicional, onde o material é o elemento básico de qualquer
composição: “Processos Cognitivos da Percepção, Análise e Síntese atuando no processo
criativo” (2014) e “Processo Criativo: do material à concretização compreendendo
interpretação performance” (2011) .
A análise de outras teorias composicionais sob a luz da teoria perceptivo-semiótica,
poderia nutrir uma área dentro dos estudos da composição que integrasse o procedimento
cognitivo. Dentro das artes em geral, a Crítica Génetica ocupa esse espaço, tomando
ferramentas da psicologia, semiótica e filosofia para compreender o processo criativo do
artista. O reconhecimento das artes como uma profunda ciência de representação da
experiência traz enorme dinamismo aos estudos sobre o homem em geral. Parte de um
significado de um fenômeno é sintetizado na obra de arte, resguardando tempo histórico,
experiência e particularidades do indivíduo. Estaríamos, desta maneira, realizando uma
verdadeira arqueologia da criação ao adentrar o processo criativo de uma obra, levantando
novas possibilidades de metodologia e descobertas científicas dentro desta temática.
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366
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

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Editora Anna Blume. São Paulo.

367
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Cognição incorporada e experiência duracional em música: um método

Nilo Rafael Baptista de Mello


PPGM - Escola de Música da UFRJ
nilomell@gmail.com

Resumo: O presente artigo ocupa-se do estudo da metodologia a ser aplicada a uma pesquisa
experimental com suporte teórico calcado na cognição incorporada. Ao se entender o procedimento
mental de construção de sentido da musica como essencialmente inconsciente, depara-se com a
questão acerca de como se pode proceder a uma investigação desse conhecimento sem que, ao fim, se
descambe para o objetivismo e representacionismo da musicologia tradicional. Baseado em teoria
essencialmente enacionista, discuto a adoção de um método que se mostre apto a testar as situações de
experimentação de objetos musicais pelo ouvinte, de modo a perscrutar seu procedimento de
categorização, em bases enacionistas.
Palavras-chave: cognição incorporada, categorização, esquemas de imagem, semântica cognitiva .

Embodied Cognition and the durational experience in music: a Method


Abstract: The present article studies the methodology to be applied to a cognitive embodied theory
supported experimental research. As we understand the musical meaning´s construction mental
procedure as essentially unconscious, a problem poses itself: how can we effectively investigate this
procedure without compromising the embodied theoretical base of the research? I discuss the
methodological approach that can accompany this embodied theory, in order to test it without
compromising its corpus with the representative theories associated with traditional musicology.
Key-words: embodied cognition, enact, categorization, image schemata, cognitive semantics.

Introdução
O presente artigo visa discutir um método a ser adotado em um ambiente de pesquisa cuja
base teórica seja essencialmente enacionista, de modo a constituir um corpus completo da
pesquisa, que possa ser entendido propriamente como enacionista. O aparecimento, nas
últimas três décadas, do estudo cognitivo da música acontece em momento de revalorização
da pesquisa da semântica musical. Mais recentemente, uma quantidade crescente de pesquisas
acadêmicas em música tem adotado uma base teórica enacionista. Por outro lado, é notório
que essas novas teorias propostas muitas vezes têm sido encaradas, em termos experimentais,
sob uma ótica metodológica ligada à musicologia tradicional, de base cognitivista, impedindo
que as próprias teorias em que se baseiam consigam alçar voo mais duradouro.
A questão acerca do sentido da música, portanto, requer não tão somente uma teoria
cognitiva que se assente em base enacionista, mas também uma metodologia experimental
que não esteja voltada à tradição musicológica arraigada no formalismo oitocentista que
perdurou, no século passado, em trabalhos importantes (citar alguns como o de Meyer, 1956)
e no representacionismo, sob pena de tornar-se paradoxal a própria pesquisa, em certo
sentido. Mais especificamente, este artigo trata da questão que surge a partir de pesquisa
acerca da construção do entendimento musical em torno da função dos esquemas de imagem

368
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

(Johnson, 1987) na experiência duracional do ouvinte e sua influência para o entendimento do


fluxo sonoro-musical.
Categorizam-se os “objetos sonoros” através do mesmo processo cognitivo que
constitui o entendimento de objetos dotados de materialidade corpórea (Zbikowski, 2002;
Rosch, 1977, 1978), podendo-se admitir que os processos de categorização e mapeamento
entre domínios (cross-domain mapping) estão na base de edificação do entendimento,
desempenhando função essencial, também, na elaboração do sentido musical. Conforme Mark
Johnson e George Lakoff, em sua extensa obra (Lakoff, 1987, 1988; Johnson, 1987, 2007;
Lakoff & Johnson, 1980, 1999;) que versa sobre cognição incorporada aplicada aos mais
diversos domínios de conhecimento, é por meio das projeções metafóricas que são edificados
os diferentes entendimentos. E não haveria de ser diferente, em específico, no que toca à
noção de duração musical: por constituírem o alicerce de todo entendimento, os esquemas de
imagem não deixam de desempenhar papel essencial aqui, podendo ser entendidos como a
base desse conhecimento, também. , A grande questão, a este ponto, diz respeito a qual seria o
procedimento ideal de modo a identificar qual esquema fundamenta determinada construção
cognitiva oriunda da audição musical.
Discuto, portanto, algumas questões que me parecem importantes, acercada elaboração
de um método experimental de investigação do processo de entendimento musical, a partir da
descrição da experiência duracional da música.

A base teórica
A pesquisa que venho realizando possui base teórica essencialmente enacionista, na medida
em que, partindo do pressuposto que os esquemas de imagem (Johnson, 1987) encontram-se
na fundação de todo tipo de categorização humana (Zbikowski, 2002; Rosch, 1978), incluídos
aí os objetos musicais, busco entender a relação entre a predominância de um determinado
tipo de esquema ou esquemas, em uma dada audição musical, e a experiência duracional
resultante dessa audição. Entendo que os esquemas utilizados nesta categorização do objeto
musical influenciam diretamente a percepção subjetiva de tempo, bem como a construção da
percepção de duração do trecho.
É importante ressaltar que me refiro aqui à categorização, ou seja, à construção
inconsciente de sentido empreendida na interação da mente com o estímulo sonoro-musical, e
não à conceituação, fenômeno volitivo que visa comunicar o que foi previamente
categorizado e, portanto, entendido. Trata-se aqui de importantíssima distinção, na medida em

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

que o objeto de estudo e, portanto, de investigação que se discute não é exatamente o conceito
a que se chega, após ter o ouvinte referenciado o que categorizou com seu conhecimento, mas
os modelos ou procedimentos inconscientes que possibilitam esse entendimento prévio.
Tal fato leva ao primeiro problema acerca do método investigativo. É que para que se
chegue aos procedimentos mentais inconscientes, não me parece haver outro caminho senão
aquele que se inicia pela enunciação do ouvinte. Ou seja, parece-me que acessar o
inconsciente musical alheio só é possível através da manifestação do que essa pessoa pensa
acerca do que ouviu. E de pronto, portanto, parece haver um problema inicial que diz respeito
ao ponto de partida da investigação que se mostra manifestamente contaminado pela
conceituação do ouvinte, na medida em que este não expressa exatamente o processo, mas o
resultado deste, tendo-se, ademais que levarmos em conta o empobrecimento intrínseco das
descrições linguísticas das experiências e toda a gama de manipulação muitas vezes distorcida
com que os investigados contaminam os relatos. Nas palavras de Nogueira:
É plausível assentir que a nomeação pode ser um mero ato poético — no sentido
grego de criar —, mas a conceituação envolve um mergulho mais profundo na
experiência linguística, uma vez que resulta em sentidos proposicionais que não
podem ser produzidos contingente e arbitrariamente (Nogueira, no prelo).

Esse primeiro empecilho pode ser refutado com esse mergulho na conceituação, ao
argumento de que essa contaminação pode ser depurada a partir da teoria do mapeamento
entre domínios (Lakoff & Johnson, 1980). Com efeito, ao enunciarmos o entendimento
abstrato, recorremos a metáforas relacionadas a outros campos de entendimento, mais
concretos, de maneira a manifestarmos linguisticamente, e em bases que possam ser
apreendidas por nossos pares, aquilo que entendemos após a escuta musical. Disserta-se
acerca do objeto musical, um entendimento inconsciente e subjetivo, não em bases
completamente abstratas, mas fazendo relações com campos do conhecimento mais concretos,
de modo a facilitar a comunicação. Essencialmente, entretanto, o que o ouvinte faz é traduzir,
em termos linguístico-referenciais, seu inconsciente, deixando entrever, no seu discurso, quais
esquemas de imagem estariam na base dessa construção. É, portanto, caminho reverso, para o
construto inconsciente, a partir da enunciação do ouvinte acerca daquilo que ouve.
Um segundo empecilho descortina-se, a este ponto. Ainda que seja possível, portanto,
como aludido, que se chegue a que esquemas de imagem predominam no processo de
entendimento musical, há que se lembrar das palavras de Johnson (1987, p.29): “embora os
esquemas sejam estruturas definidas, são padrões dinâmicos, ao invés de imagens fixas e
estáticas, como os representam seus diagramas visuais”. Por não serem estruturas fixas ou

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

bem definidas, atualizando-se e modificando-se quando aplicadas a cada contexto, poder-se-ia


pensar que as correlações das durações com a percepção duracional apareceria contaminada
de imprecisões, nunca sabendo exatamente o pesquisador se está diante de um esquema de
imagem predominante ou de seu meio-irmão, atualizado e com aparência do primeiro.
Tal fato, também, não poderia ser mais distante da realidade. Menciono aparente
empecilho justamente porque, ainda que os esquemas sejam construtos dinâmicos e não se
assemelhem a formas perenes e determinadas, eles possuem características intrínsecas bem
definidas. Assim, um esquema de caminho precisa ter atributos essenciais como origem,
destino e movimento, que não se confundiriam quando, por exemplo, transmutado em um
esquema de bloqueio, com a interrupção momentânea desse movimento, frustrando a
expectativa do destino (Huron, 2006).
Superados, portanto, esses dois empecilhos iniciais que poderiam, ao meu ver, frustrar
uma investigação séria dos esquemas, passo a propor uma metodologia para realizar tal feito.

Um método
Em se tratando de uma pesquisa acerca da semântica musical, há que se levar em conta que,
uma vez estabelecidas a teoria e premissas sobre as quais se vai pesquisar, é preciso
empreender a investigação empírica, de forma a testar aquela teoria. Em que bases, portanto,
conseguir-se-ia realizar uma tal investigação, tendo em vista o caráter inconsciente desses
processos mentais, bem como a base enacionista de nossa teoria? Perguntado de outra forma:
de que maneira seria possível adentrar as estratégias inconscientes postas em prática na
mente, com o fim de estudá-las de forma científica e, portanto, objetiva, sem que se descambe
para uma investigação não dos construtos essenciais, mas das representações destes,
correndo-se o risco de contaminar com base cognitivista uma pesquisa essencialmente
enacionista?
Tendo em vista esse processo de constituição inconsciente do conhecimento musical a
que se visa aplicar o método de verificação, algumas considerações prévias precisam ser
feitas. Em primeiro lugar, é necessário ter em mente que o objetivo da investigação é
conhecer as estratégias de categorização que estão sendo utilizadas e não a própria
categorização, embora, como já mencionado, haja a necessidade de se iniciar pelo que o
ouvinte referencia. A investigação desses esquemas predominantes na conceituação precisa,
portanto, dar-se a partir da enunciação do ouvinte acerca daquilo que ouve e, de maneira a se
evitar a mera análise da referência do ouvinte, este caminho deve ser interpretado à luz das

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

teorias enacionistas (Johnson, 1987, 2007; Zbikowski, 1995, 2002; Snyder, 2000; Lakof &
Johnson, 1980, 1999). Sobre esse caminho interpretativo, o professor Nogueira (2016, p.20)
também nos ensina:
penso que o caminho inverso de observação das construções enunciativas da
superfície linguística de nossas descrições musicais como meio de acessar os
mapeamentos entre domínios que operamos ao intencionar o sentido da música
mantém o foco de investigação estritamente no domínio paradigmático da cognição
incorporada, a partir do que penso que devemos nos manter, se visamos à construção
de teorias enacionistas do sentido musical.

Em certo sentido, esse “caminho inverso das construções enunciativas da superfície


linguística” enseja uma análise do discurso, uma vez que é exatamente a partir da observação
da estrutura e dos termos discursivos adotados pelos investigados que se vai poder chegar aos
esquemas que ensejam estes termos e metáforas. De que forma realizar o referido caminho na
presente pesquisa? Em uma análise mais detida, a técnica do questionário me parece o meio
ideal de levar adiante esta pesquisa. Na definição de Gil (1999, p. 128):
Pode-se definir questionário como a técnica de investigação composta por um
número mais ou menos elevado de questões apresentadas por escrito às pessoas,
tendo por objetivo o conhecimento de opiniões, crenças, sentimentos, interesses,
expectativas, situações vivenciadas, etc.

Ressalto, aqui, na definição do professor, as “situações vivenciadas” dando


interpretação mais ampla. Em essência o que se procura na pesquisa é justamente analisar o
aspecto inconsciente da construção de sentido musical. Tomando por base a ideia de que
entendimento não pressupõe conceituação, esta consciente, o que se busca ao arguir o ouvinte
são exatamente as sensações provocadas pela exposição à escuta musical, entendidas aqui
perfeitamente como uma situação vivenciada. Por meio da descrição dessa situação, através
de uma interpretação estrita, tentamos chegar efetivamente ao procedimento inconsciente,
onde predominam determinados esquemas de imagem, que vão variar de acordo com as
descrições dessas vivências.
Para além de permitir ir direto ao ponto do que foi sentido (e entendido) pelo ouvinte
quando da exposição à escuta, o questionário apresenta outras vantagens estratégicas, como a
possibilidade de se atingir um grande número de pessoas, eliminando eventuais flutuações nos
resultados, gastos comedidos quando da implementação da investigação, na medida em que
não há que se falar em entrevistas individualizadas, por exemplo, adicionando ao bom
desenrolo logístico do experimento, a garantia do anonimato dos participantes, de modo a
diminuir influências mútuas ou preconceitos induzidos pela identificação. Adicionalmente e

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

talvez mais importante, é método que não contamina a teoria enacionista, na medida em que
se investiga, de fato, as sensações por meio das descrições dos diretamente afetados por elas,
sendo, quiçá, a maneira mais direta de acessar de forma mais ou menos objetiva um conteúdo
tão subjetivo e de difícil manifestação.
É importante, entretanto, que o questionário seja bem estruturado, apresentado questões
de múltipla escolha, no que concerne, por exemplo, à estimativa duracional do trecho ouvido,
bem como questões discursivas, em que o participante tem maior capacidade de ação, não
sendo tão restrito pelos parâmetros impostos. Quanto a esta restrição, é importante ressaltar
que, por se tratar de tema tão subjetivo, me parece imprescindível que algum grau de restrição
tenha de ser adotado, sob pena de se legitimar anotações das mais variadas, sem conexão
alguma com o que se pesquisa. Aqui, a restrição apresentar-se-ia não como uma indução a
resultado, mas a parâmetros bem definidos no questionário, guiando o participante a voltar
sua concentração ao objeto da análise em estudo: a sensação que o entendimento do trecho
musical causa no ouvinte e a estimativa da duração daquele trecho ouvido, dentro de algumas
possíveis oferecidas.
Ora, é justamente a partir dessas observações do que enunciará o ouvinte, que pretendo
estudar a formulação de um método que investigue a construção do entendimento musical. É
partindo da “superfície linguística”, um meio aparentemente menos objetivo de acessar o
conhecimento inconsciente do ouvinte, que pretendo discutir os processos semânticos
musicais, particularmente relacionando as estruturas proposicionais básicas do discurso sobre
o entendimento da música à experiência duracional constitutiva do seu sentido. E não poderia
ser diferente, na medida em que a enunciação do ouvinte parece ser, senão o único, o caminho
mais eficiente até os processos mentais inconscientes de constituição do sentido. O que se
enuncia, entretanto, não é exatamente aquilo que foi sentido, mas o que foi possível
conceituar através do filtro da linguagem. Assim:
em geral a música só pode ser conceituada e comunicada discursivamente por meio
de metáforas procedentes de nossas experiências incorporadas — ou procedentes de
metáforas de nossos conceitos incorporados —, estas que assim constituídas podem
nos revelar, por meio do que delas persistiria em nossas descrições linguísticas da
música, as estratégias que empregamos para formar os nossos sentidos musicais
(Nogueira, no prelo).

Dito de outra forma, as estratégias mentais empregadas para a constituição de um


sentido musical estão intrinsecamente relacionadas às nossas experiências incorporadas, que
são referenciadas no discurso, quando da conceituação do que foi entendido pelo ouvinte. É

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

preciso, portanto, ter uma ideia precisa das possibilidades dessas experiências, que se tornam
a referência para a construção do sentido musical e que se deixam antever nos discursos
adotados pelos ouvintes, discursando sobre essa experiência de escuta.
Assim, o planejamento da investigação a que serão submetidos os ouvintes impõe-se em
termos de um grupo a ser investigado em uma dimensão subjetiva, tomando por base o
material a ser utilizado na escuta, bem como a apreciação do discurso produzido por esses
ouvintes, quando indagados acerca do entendimento desse material ouvido, com vistas a
chegarmos à uma correspondência entre o enunciado no discurso de resposta e os atributos
básicos de determinado esquema de imagem, que estaria, portanto, predominando naquele
entendimento do trecho musical em questão, sendo associado à determinada experiência de
duração.

Considerações finais
A investigação subjetiva do procedimental inconsciente de construção de sentido, baseado em
uma teoria cujo alicerce encontra-se na cognição incorporada é possível, fazendo-se uso de
procedimentos já disponíveis ao pesquisador. É imprescindível, no entanto, que esta
investigação seja orientada sob premissas que impliquem em uma tentativa de conhecer o
procedimento e, assim, evitar o objetivismo dos métodos formalistas tradicionais. A adoção de
estratégias de limitação das respostas dos investigados pode, adicionalmente, ser entendida
como ferramenta que ter por objetivo promover tanto a concentração dos participantes sobre o
objeto de estudo da pesquisa, como uma orientação que impede que a pesquisa seja
contaminada com resquícios de representacionismo.

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375
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

A constituição schemática da imaginação na criação de solos


instrumentais

Celio Roberto Eyng


UNIOESTE – FBE
celioeyng@hotmail.com

Magda Floriana Damiani


UFPEL – FAE/PPGE
flodamiani@gmail.com

Resumo: O artigo discute a constituição schemática da imaginação na criação de solos


instrumentais. Para isso, realizou-se um estudo de casos múltiplos com quatro guitarristas adultos
familiarizados com a criação de solos instrumentais de blues e seus derivados em tempo real. Por
meio de entrevistas, com roteiro pré-estabelecido, os músicos foram indagados sobre sua formação
musical e seus processos de criação. Os dados produzidos foram submetidos à análise textual
discursiva e interpretados a partir do paradigma indiciário de investigação. Observou-se que os
músicos participantes se utilizam de três schemas imagéticos principais para a produção de seus
solos: schema das características sonoras de um estilo musical (schema estilístico), schema das
ações e percepções envolvidas na prática musical (schema procedimental) e schema da eficácia
simbólica.
Palavras-chave: aprendizado musical, improvisação musical, processos criativos.

The schematic constitution of the imagination on the creation of instrumental solos


Abstract: The article discusses the schematic constitution of the imagination in the creation of
instrumental solos. A multiple case study was carried out with four adult guitarists acquainted with
the creation of blues instrumental solos, and their derivatives, in real time. Through interviews,
guided by a pre-established script, musicians were asked about their musical formation and their
creative processes. Data were submitted to discursive textual analysis and interpreted according to
the evidential paradigm. It was observed that participants used three main imagery schemas to
produce their solos, such as the schema of the sound characteristics of a musical style, the schema of
the actions and perceptions involved in musical practice, and the schema of symbolic efficacy.
Key-words: musical learning, musical improvisation, creative processes.

Introdução
Para descrever a maneira como se estrutura a imaginação na criação de solos instrumentais,
foi utilizado, no presente trabalho, o conceito de schema (BARTLETT, 1932). O “schema
refere-se a uma organização ativa de reações passadas, ou experiências passadas, que se
supõem estar sempre operando em qualquer resposta orgânica bem adaptada”1 (BARTLETT,
1932, p. 201). Dizendo de outra forma, o schema seria uma massa organizada de experiências
pela qual um cenário cognitivo toma forma, na mente das pessoas, permitindo o
processamento de novas informações.
Pensa-se que o ato de imaginar musicalmente pode ser compreendido como um
processo cognitivo estruturado em schemas (BARTLETT, 1932). A sonoridade das músicas
do Wes Montgomery2, por exemplo, pode ser reproduzida, na mente da pessoa, porque ela

376
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

dispõe de um schema deste tipo de música. Por certo, a pessoa não consegue lembrar, por
vezes, de um tema específico, mas a guitarra semiacústica, o baixo acústico e a bateria podem
“tocar” em sua mente. Este é um exemplo de schema que reconstrói o cenário cognitivo de
um trio jazzístico.
Os schemas mnemônicos permitem reconstruir cenários cognitivos como uma consulta
ao dentista, uma ida ao mercado e, neste exemplo, citado acima, o som de um trio jazzístico.
Pelo fato de que o schema fornece noções gerais relacionados às maneiras de fazer música
utilizadas por outros músicos, o “preenchimento” dos detalhes corre por conta da mente de
quem está compondo. Por isso, pensa-se que o desenvolvimento da capacidade de criar solos
instrumentais em tempo real passa pela internalização, por parte do músico, de schemas que
possibilitam a produção de combinações imagéticas. Assim, com a gradativa internalização de
noções gerais relacionadas às maneiras pelas quais outros músicos improvisam, os músicos
passam a extrair delas uma lógica de construção musical. De que outra maneira o músico
conseguiria desenvolver a habilidade de improvisar, em tempo real, novas combinações
melódicas, se não houvesse internalizado tais noções, pela via do aprendizado teórico ou
intuitivamente? Imitar não significa, tão somente, fazer tal qual os outros fazem, mas
internalizar significados compartilhados em uma comunidade acerca das ações mediadas por
instrumentos físicos e semióticos envolvidos em uma prática específica, reconstruindo estas
ações no plano interno (mental) na forma de schemas.
Por certo, existem outros fatores que influenciam o surgimento de combinações
imagéticas e a criação de solos instrumentais em tempo real como, por exemplo, a motivação
pessoal, a quantidade e a qualidade das práticas anteriores, bem como do aprendizado
musical. Possivelmente, o meio social também se constitui em fator determinante, tanto para a
inibição e supressão de uma prática criativa, quanto para o seu fortalecimento e
aprimoramento. O interesse desta pesquisa exploratória foi sugerir um princípio geral, do
ponto de vista da Psicologia do Desenvolvimento, que explicasse o surgimento de
combinações imagéticas e, por conseguinte, a criação de solos instrumentais em tempo real.
Partiu-se da ideia de que essa criação pressupõe a internalização (VIGOTSKI, 2009),
por parte do músico, de schemas relacionados aos estilos musicais que pratica/ouve (schema
estilístico), schemas relacionados às ações e percepções envolvidas na execução instrumental
(schema procedimental), como a imagem mental dos dedos pressionando as cordas da guitarra
ou do desenho das escalas que serão utilizadas no decorrer da improvisação e schemas
relacionados aos sentimentos e sensações associados a fatores extramusicais (schema da

377
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

eficácia simbólica).

Metodologia
Com o objetivo de analisar a constituição schemática da imaginação na criação de solos
instrumentais, realizou-se um estudo de casos múltiplos para o qual foram selecionados
quatro guitarristas adultos, com média de idade de 35 anos e experiência musical relacionada
à prática da guitarra elétrica de, pelo menos, dez anos3 . A seleção dos músicos foi realizada
por conveniência, a partir do grupo de pessoas do convívio musical de um dos pesquisadores.
Os músicos eram familiarizados com a improvisação de solos instrumentais de gêneros
populares, principalmente de blues e seus derivados. Dentre os participantes, os músicos LD,
AP e VM são professores de música e compõe/improvisam música instrumental regularmente.
O músico EJ, embora tenha curso de graduação em educação musical, trabalha, atualmente,
na área da Publicidade e Propaganda. Do ponto de vista da atuação profissional, apenas LD e
VM exercem a profissão de músico, na atualidade, com apresentações públicas semanais. O
músico AP trabalha como luthier.
As entrevistas e sessões de improvisação ocorreram na própria residência dos
participantes da pesquisa, com duração média de uma hora cada. Por meio de entrevista com
roteiro pré-estabelecido, buscamos coletar os seguintes dados sobre a formação musical dos
músicos e sobre seus processos de criação: tempo de estudo de música, capacidade de leitura
de partitura ou cifrado, capacidade de “tirar música de ouvido”, o que imaginam quando
criam solos instrumentais e a existência de hábito de imaginar linhas melódicas sem a prática
instrumental concomitante. Por vezes, os músicos utilizaram-se do instrumento musical,
concomitantemente à produção das respostas às perguntas do pesquisador, para demonstrar a
relação entre o que estavam falando e sua prática musical. Na parte final da entrevista, os
participantes foram solicitados a imaginar um solo instrumental para o acorde de mi com
sétima e relatar o que lhes “aparecia na mente”, ao fazê-lo. A escolha deste acorde deveu-se
ao fato de que, na prática da guitarra elétrica e do violão, a sonoridade do acorde de mi com
sétima costuma ser muito utilizada na criação de riffs de blues e seus derivados, devido às
suas características timbrísticas, ao ser produzido com o emprego de cordas soltas. As falas,
obtidas por meio das entrevistas, foram submetidas à análise textual discursiva (MORAES,
2003) e interpretadas por meio do paradigma indiciário de investigação (GINZBURG, 1989).

378
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Análise dos dados


Neste trecho da entrevista, o músico LD relata o que costuma imaginar quando está criando
seus solos instrumentais:
LD: [...] eu vou primeiro imaginando blocos de acordes. Eu vou imaginando como
se os acordes fossem aparecendo na frente. Mi menor (é estranho...). Eu, às vezes,
estudo com o software, que reproduz o playback; então, no software, aparece a
simbologia da cifra do acorde. Às vezes, eu estou tocando e vejo aquele acorde
brilhando na minha frente. Aí vem o segundo compasso, o próximo acorde, e vai...
Outras vezes eu imagino paisagens. Teve alguns por do sol que eu vi e me marcaram
muito. Inclusive eu estou tocando e enxergando aquele sol se pondo daquela forma e
tal. E aí eu não penso, necessariamente, no acorde. Eu penso naquela paisagem. Às
vezes, pessoas, também, que passaram pela vida. Então, às vezes eu imagino a
pessoa e eu tocando nesse sentido, meio que uma homenagem a essa pessoa. Outras
vezes, eu tento pensar no bloco da melodia, só que eu enxergo o movimento dos
dedos no braço do instrumento. Às vezes, um salto [solfeja e toca], eu imagino, eu
vejo como se fosse, sei lá, meio que um filme: o braço da guitarra na minha frente e
os dedos saltando. Então, varia bastante. Eu tenho várias formas de imaginar isso.
Algumas vezes eu penso em cores, também. Tocar um sol maior [toca o acorde]: sol
maior é azul [risos]. Que tipo de relação que existe aí, eu não sei dizer. Mas eu
imagino o sol maior como azul. O Lá menor [toca o acorde], ele vai ser meio
alaranjado, meio por do sol. Então, difícil dizer. Vou criando várias imagens.
Depende também da música.

No excerto acima, identificou-se que o músico LD imagina musicalmente valendo-se de


três tipos de schemas: o procedimental, o estilístico e o da eficácia simbólica. Segue, agora,
um excerto selecionado da entrevista com o músico AP. No trecho abaixo, ele relatou o que
imagina quando está criando um tema instrumental:
AP: [...] quando eu imagino a música, vem só a melodia e o timbre que eu quero
para que aquela melodia soe; se eu imaginar que eu vou fazer um arpejo aqui, daí eu
vou sair desse arpejo e subir numa pentatônica... Aí, todo lado da criatividade vai
embora. Por isso, quando eu estou criando, a primeira coisa é a melodia: não sei
nem se é arpejo, se é pentatônica, se é um modo jônio. Eu não quero nem saber o
que é que é isso. Eu quero saber da melodia. Daí a melodia está ligada em muitas
coisas: divisões de tempo diferentes, pausas diferentes e o timbre. A primeira coisa
que eu imagino é a melodia e o timbre. O que eu quero é o que é necessário para
soar a melodia. Muitas vezes, você está fazendo uma música que tem a ver com
determinado clima, aí você até imagina a situação que a pessoa vai ouvir aquela
música. Por exemplo, uma música em que o cara está numa rodovia, dirigindo, com
a mão esquerda na janela: imagino aquele som que tem a ver com o ritmo do carro
andando. Isso sim, se for uma música que tem a ver com aquilo, você imagina o som
que tem a ver com aquilo.

No excerto acima, o músico AP relata imaginar musicalmente valendo-se de dois


schemas: o schema estilístico e o schema da eficácia simbólica. Seguindo adiante, transcreve-
se a resposta do músico VM. Abaixo, ele responde à seguinte solicitação: imagine alguma
frase musical para o acorde de mi com sétima e relate o que imaginou:

379
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

VM: [...] se você me dá um mi com sétima, eu já imagino um mi com sétima típico


de guitarra. O dedo tocando uma pentatônica e já sabendo o som que vai ter essa
nota. Imagino um bend, por exemplo, na nota ré, chegando no mi; eu sei que som
que tem, mas isso é pelo costume que tenho de tocar tanto isso daqui, de praticar
bastante. Eu imaginaria os dedos, pensando como guitarra. Se eu começar a pensar
em outro instrumento, daí eu pensaria em sonoridade, apenas. Claro, porque se eu
imaginar um solo para saxofone (eu não toco saxofone), eu já imaginaria aquelas
notas sendo produzidas; eu imaginaria outras notas, diferente da guitarra: um outro
fraseado; uma outra cadência harmônica; de repente, um outside, um cromatismo
diferente. Mas é que na guitarra eu pensaria nas notas da pentatônica. Conseguiria
bolar frases assim.

O músico VM imagina novas soluções melódicas a partir dos schemas procedimental,


estilístico e da eficácia simbólica. Finalizando a análise inicial dos dados, segue o excerto do
músico EJ, o qual sugere que este músico utiliza-se principalmente dos schemas estilístico e
da eficácia simbólica.
EJ: [...] às vezes, eu consigo imaginar uma melodia que imite um movimento
erudito, uma linha melódica erudita, relacionar esse som com algo mais
cinematográfico. Às vezes, eu tô com uma melodia gregoriana, dos primórdios do
gótico, aquele movimento mais melódico, e, na minha cabeça, tá um filme de guerra:
tá a melodia lá e um cara, num filme, em câmera lenta, levando um tiro, ou um cara
lutando de espada. É uma coisa mais cinematográfica [...].

Discussão
Voltando-se para o primeiro excerto, entende-se que o aprendizado teórico possibilitou ao
músico LD o desenvolvimento da capacidade de escolher as escalas que serão utilizadas na
improvisação de suas frases musicais, no decorrer de um encaminhamento harmônico. Por sua
vez, LD não imagina apenas acordes, mas seus dedos tocando melodias, paisagens e/ou
pessoas vívidas em suas lembranças, sons e cores4, utilizando-se, portanto, de schemas que
possibilitam a formação de cenários cognitivos diversificados, mais ligados aos sentimentos e
às sensações envolvidos na prática musical.
Considera-se que os diferentes tipos de imagética musical – entendendo este conceito
como um conjunto de representações mentais ativado quando a pessoa está imaginando
musicalmente –, usados pelo músico LD, constituem maneiras distintas de praticar música.
Enquanto ele imagina as cifras, os blocos de acordes ou os dedos pressionando as cordas da
guitarra elétrica, ou seja, schemas relacionados aos procedimentos envolvidos na prática
musical (schema procedimental), nos momentos em que ele imagina paisagens, pessoas e/ou
busca correlacionar sons e cores, o objetivo é desviar-se dos procedimentos técnicos, porque
adquiriu a segurança necessária para pensar sobre quais escalas funcionam bem, em um
encadeamento harmônico determinado, valendo-se de schemas de eficácia simbólica. Pensa-

380
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

se que isso se confirma, quando LD complementa que:


LD: [...] depende também da música. Às vezes, tem uma música que eu to um pouco
inseguro em tocar, eu vou imaginando blocos de acordes. Então, as músicas que eu
já estou mais seguro, eu vou imaginando situações, cores, paisagens [...].

A fala do músico AP sugere que sua imagética musical é predominantemente sonora.


Também, o músico relata imaginar situações em que a música seria fruída por outra pessoa.
Nesse contexto, é recorrente o schema da visualização e audição mental de situações como a
descrita no segundo excerto, transcrito na seção anterior, de uma pessoa dirigindo seu carro
em uma rodovia (schema da eficácia simbólica). Deduz-se que o equilíbrio entre o
aprendizado teórico e o “tirar música de ouvido”, na formação do músico AP e no
desenvolvimento de sua prática musical, manifesta-se no tipo de relação que ele estabelece
com a teoria musical: o mais importante, para ele, seria a combinação dos sons e não o
conhecimento teórico, em si. Para ele, imaginar os aspectos teóricos, como arpejos, escalas e
modos, no decorrer dos processos criativos, seria um entrave à criatividade. Talvez, por causa
disso, o schema, reiteradamente citado por AP, no decorrer da entrevista, seja o das
características sonoras do estilo musical (schema estilístico) e o schema da eficácia simbólica.
VM, que estudou improvisação musical por meio de workshops, pautou-se no “tirar
música de ouvido” como força principal no desenvolvimento de sua musicalidade. Para ele,
imaginar a criação de um solo instrumental, na guitarra elétrica, envolveria a visualização e a
audição mentais dos dedos pressionando as cordas da guitarra elétrica, especialmente a escala
pentatônica – schema análogo àquele identificado no excerto do músico LD (schema
procedimental). No entanto, conforme aponta o terceiro excerto, apresentado na seção
anterior, ao imaginar uma frase musical para outro instrumento, o músico VM relata que
pensaria na sonoridade. Desse modo, não visualizaria mentalmente os dedos tocando um
saxofone, pois não toca esse instrumento, mas o som que poderia provir desse instrumento
musical. Note que o schema alterou-se: ao invés dos procedimentos técnicos com o
instrumento musical (a guitarra elétrica), VM relata que imaginaria as características sonoras
do saxofone, provavelmente, tocando uma sonoridade jazzística, a julgar pelo outside e pelo
cromatismo (schema estilístico).
Em relação ao quarto excerto, apresentado na seção anterior, nota-se que o contato do
músico EJ com a tradição musical erudita exerceu fascínio sobre seu imaginário. Seja
imaginando um tema instrumental, seja imaginando uma melodia de canto gregoriano, seus
schemas estão imbricados com elementos visuais e sonoros, como se fosse uma “animação

381
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

fílmica”. Assim, os schemas estilístico e da eficácia simbólica são recorrentes em sua


entrevista.

Considerações finais
Neste artigo, analisou-se a constituição schemática da imaginação na criação de solos
instrumentais. Assim, chegou-se à conclusão de que os músicos que participaram da pesquisa
se utilizam de três schemas imagéticos principais: o schema das características sonoras de um
estilo musical (schema estilístico), o schema das ações e percepções envolvidas na prática
musical (schema procedimental) e o schema da eficácia simbólica.

Referências
Bartlett, F. C. (1932). Remembering: A study in Experimental and Social Psychology.
Cambridge: Cambridge University Press.
Ginzburg, C. (1989). Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história. São Paulo: Companhia
das Letras.
Moraes, R. (2003). Uma tempestade de luz: a compreensão possibilitada pela análise textual
discursiva. Ciência e Educação, 9 (2): 191-211.
Vigotski, L. S. (2009). A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes.

1
“‘Schema’ refers to an active organisation of past reactions, or of past experiences, which must always be
supposed to be operating in any well-adapted organic response” (BARTLETT, 1932, p. 201). Optou-se em
utilizar a grafia original utilizada por Bartlett (1932).

2 Guitarrista do jazz da década de 1960.

3
Esta pesquisa contou com o apoio financeiro da CAPES e da Fundação Araucária.

4 Aparentemente,o músico LD não é sinestésico, ou seja, não possui cruzamento de sensações (auditiva e visual,
por exemplo), mas procura estabelecer correlações entre sons e cores.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

A Study on Multisensorial Sonification Strategies for the Blind Performer

Antonio Fernando da Cunha Penteado


Depart. de Música / IA / UNICAMP
nando@nandopenteado.com

Vilson Zattera
Laboratório de Acessibilidade / BC / UNICAMP
vilson.zattera@gmail.com

José Fornari
NICS / COCEN / UNICAMP
tutifornari@gmail.com

Abstract: The computer music technique known here as sonification lets performers transform in
real time data retrieved from other media into sound and music. The visual impaired musicians
normally have access to computer music tools only by means of technological accessibility tools
(such as screen readers) and dedicated hardware interfaces (such as braille displays). At the same
time, these musicians also present enhanced sensorial abilities due to a neural process known as
neuroplasticity. This article presents the study of two strategies of sonification for the blind
performer. Both aim to explore the enhanced abilities of blind performers in order to allow them to
create novel sonifications. These strategies explore the sonification of a media known by the blind as
both retrieve data from their use of the traditional cane for the blind. One of them use bodiless data,
such as a theremin, while to other use the opposite approach by means of a full contact interface that
retrieve pavement textures. Both are dependent on the multisensoriality approach used by the blind
to navigate using its cane, while retrieve bodiless and full contact data for a sonification
performance.

Key-words: multisensoriality, sonification, visually impaired.

1. Introduction
The cane is, for the blind, an extension of his/her hand. In the same manner that anyone
extending the hand to detect and/or identify surrounding objects, the cane expands the ability
of the blind to detect and identify the surroundings both in space (extending the range of
action) and time (making this process fast enough so the blind can walk while identifying the
path). The cane also protects the blind from small collisions thus encompassing some amount
of confidence to let its user to get some social independency.
Initially the cane was pretty much a light, long and thin stick whose user would move
sideways in front of him/herself, somehow resembling a sweeping movement. The tip of this
type of cane was rigid and would normally only touch the pavement in the extremes of each
sweeping movement, thus conveying a limited and fragmented amount of data retrieved from
the pavement texture. This type of cane used to provide discrete haptic pavement texture data
information.
Nowadays canes are provided with a rolling tip that let the user to roll it along the

383
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

whole sweeping movement, thus providing a full range of information, not only from the
extremes but from the entire movement, thus enlarging the data retrieved. This type of cane
provides analog haptic pavement texture data information.
These two types of approaches can be compared with digital and analog audio. In
digital audio, information is regularly sampled, in a frequency called “sampling rate”, which
is, for instance, the type of audio in a CD player. In analog audio, information is represented
as a continuous curve, correlated to the continuous variation of the acoustic pressure, which is
the case of a long-playing vinyl, or phonograph.

2. Multisensoriality
A blind is able to feel the near presence of a wall before touching it, by other sensory cues,
such as hearing (change in soundscape reverberation), sense of temperature and smell. This
approach is called multisensory integration. This is a discipline that studies how the
information from the different sensory perceptions of the same individual (i.e. sight, hearing,
touch, smell, balance, etc.), are integrated by the brain in order to deliver immediate and
autonomous detection and identification of objects or situations (Stein 2009).
For the blind, several situations require the use of multisensoriality. In a cold day, it is
difficult for the blind to wear gloves as them reduce his/her haptic capacities, of identifying
object by touch or feeling the vibrations delivered by the rolling tip of the cane, thus
impairing the ability of properly detecting changes in the path. Another usual situation that
reduces the multisensorial ability of the blind is wearing a hood. This garment remains in
front of the outer ear which reduces the binaural ability of sound source location. The same
happens in noisy ambients. By reducing sound location, the blind may experience orientation
difficulty and mental confusion.
It can be said that multisensoriality is intrinsic to the blind in all his daily activities,
among them that of getting around, because without this information, it would be very
difficult for the blind to walk with a minimum of safety and spatial orientation. Just as the
echolocation of an animal like the bat, whose hearing sometimes turns into vision, the other
senses of the blind often become his/her sight.
Once fully supported, multisensoriality may be enough to let the blind to walk around
without the cane (specially in a known environment). This is more common in people who
were born or became blind in a early age. People who become blind after certain age usually
have more difficulty to use multisensorial cues as substitute of vision.

384
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Pinker (1994), argues that there is strong psychological evidence of the existence of an
abrupt age decrease in the ability of an individual to learn a new language without accent
(known as the critical period hypothesis). This might be similar to the case of individuals who
became blind after the critical period of acquiring multisensorial location ability was over. As
this may initially seem to suggest that the brain is somehow fully developed after the critical
period, thereafter remaing virtually unchanged, there are evidences that strongly suggest that
new abilities are actually developed in the brain neural pathways structure, in response to a
major change (Pascual-Leone 2005). This phenomenon is called neuroplasticity and can be
observed at multiple scales, since from minute changes in neurons to larger-scale brain
changes such as cortical remapping in response to great changes, such as the continuous
blocking or permanent loss of the stimuli from a sense (such as vision). Nevertheless, cortical
remapping is actually more efficient when happening in the individual early age of
development.

3. Sonification
According to Kramer (1994) sonification can be defined as the use of non contextual
(semantic) audio to convey information or perceptual data, usually retrieved from other
medias (such as vision. Auditory perception is known to have wide ranges in the perception of
amplitude (0dB to 120dB SPL), frequency (20Hz to 20.000Hz), temporal (50ms to several
seconds) and spatial location (binaural hearing). This provides an interesting opportunity to
provide and alternative, or to complement visual perception.
In computer music, sonification techniques are used as an aesthetic tool to provide the
generation of artificial soundscapes for performances and artwork installations, such as in
(Fornari 2013). In term to the cane for the blind, the one with a rigid tip (without the roller)
can be used for a discrete sonification while the current one, with roller, for an analog
sonification. It is also interesting to point the similarity of both canes with a Radar (the
object-detection system that uses the emission and retrieval of the reflexion of radio waves in
order to locate and identify moving objects, in terms of their size, distance, velocity,
acceleration and angle). The cane movement also acquires data of the object by retrieving
haptic feedback data. The frequency and range of the sweeping movement determines the data
frequency and amplitude resolution in an Heisenberg's uncertainty principle fashion, as there
is a fundamental limit to the precision of both, being them like complementary variables.

385
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

3.1 Bodiless approach


A most common feature found in virtually all musical instruments is the existence of a
physical body; an interface that require to be touched in order to retrieve musician gestural
data. For example, a piano retrieves gestures throughout its keyboard and pedals, while an
electronic musical instruments, retrieve gestural data with a digital interface, (e.g. MIDI
controllers). However, there are few instruments that do not require a physical (touchable)
interface to mediate the gestural retrieval process. Instead, they are directly controlled by the
performer's movements without any physical interface to be touched, grasped or attached.
They are here named as Bodiless Musical Instruments (Fornari 2012). Probably the early type
of bodiless musical instrument is the Theremin (Roads 1996)
Portas (2015) introduces the development and implementation of a cane for the blind
musician. This cane has attached an electronic ultrasonic sensor that allows it to increase the
accessibility of the user, both to be used as an accessibility device as well as an electronic
musical instrument. This was called Therengala because its design is inspired on the famous
electronic musical instrument Theremin.
Therengala mainly uses two ultrasonic distance sensors that work together, bringing
informations about surrounding object, obstacles and persons. The electric signals sent by
those sensors are then read by an Arduino Nano board and processed before sending their
informations to a computer where parameters, in the form of numbers, will be converted into
sound. Arduino is a board for prototyping matters, it counts on a microcontroller with
memory and processing capabilities, according to its official website https://www.arduino.cc,
its principal advantages are to be: inexpensive, cross-plattaform, simple and clear
programming environment, opens source hardware and extensible hardware and software.
Arduino boards are sold in many different flavors, and the Nano choosen one is sized in
less than 18 x 45 mm, weights about 7 g and is a very low power consumption device, it can
be sourced with little batteries, and is ideal to the proposed implementation on a cane. Signals
are transmitted and received via RF (radio frequency) to and from a computer wirelessly,
through air cooled antennas.

386
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017


Figure 1. User holding Therengala (left). Detail of its open-hardware circuitry and antenna (right).

At the computer side, once parameters are received, a software called Puredata (a.k.a.
PD) takes control to produce audio using the mapping technique, which is defined by Hunt
(2000) as the liaison or correspondence between control parameters (derived from
performer actions, in this case with the Therengala) and sound synthesis parameters. There
are a large variety of sound synthesis parameters, citing some of them: frequency, wave form,
ADSR, dynamics or amplitude, filters, etc, which can be associated with Therengala's
feedbacks about captured distances, for example, a synthetized sound can become more
intense or with a higher pitch whenever the sensors approximate to a subject.

3.2 Full contact approach


It is feasible to attain information with the cane using another approaches, the full contact
approach presented here uses vibration sensors for the task. The most common vibration
sensors are piezoelectric ones, these devices are capable of transducing mechanical energy
into electricity.
With the use of a piezoelectric device close to the tip of the cane it is granted some
feedbacks about the floor, about its texture, roughness, consistency and constitution, pave
type, whether its composed of tiles or if it is smooth or more continuous surface, informations
about its coverage, if it is solid like cement, or muddy, covered with gravel, sand, grass, etc.
According to the roughness of the pave, the feedback can be more constant if the
granulation is fine, or feedbacks can come with interruptions, in the case that the tip of the
cane do some little jumps, where it is expected more impacts and shocks with larger
amplitude but short in the domain of time.

387
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

The cane operates like the needle of a turntable, reading embossing informations of the
floor, identifying patterns of the surface. Latter on, each pattern is sent to the computer where
they are associated with different synthesized sounds, or where those reading patterns can
control parameters of the sound generation.
The use of the cane can vary according to the class of the building where the user is
walking along, and sometimes the direction and/or the way of the movement also are
meaningful, walking in a ladder, if the user is going up, the cane is held in a vertical line,
receiving impacts of the steps, when going down, the top of the cane deviates from the
vertical line in an angle towards the user, the impacts are weaker. When walkin in a slope or
ramp, feedbacks are different if going up or going down.
In compositional terms, it is possible, for instance, to associate those impacts with larger
intervals, modulations, dynamics, and constant vibrations with chromatic melodies, thinking
in traditional music. It is possible to associate those feedbacks with the Q factor of a band
pass filter of a subtractive synthesis feeded by a white noise. It is possible to associate pitch
and durations with those feedbacks. The possibilities of mapping are countless.

Discussion
In functional terms, the use of a multisensorial cane able to sonify the surrounding visual
information, besides allowing a security improvement for the blind's locomotion, specially in
terms of avoiding higher objects (such as tree's branches) also expands the perceptual range of
the traditional tool through a significant surplus of data received, which implies in a mojor
increase of the blind's self-confidence and locomotion autonomy.
In artistic terms, the cane, which is such an important and indispensable tool for the
blind, can now be a musical instrument for the performance of interactive sonic art through
the real time sonification. This may incur in the discovery of new perspectives for the study
and composition of artificial soundscapes.
Such developments aim to achieve a new paramount in the accessibility for the musical
performance, pinpointing new pathways for its composition, such as: a new computer music
interface for analysis, composition and performance; as well as a new accessible musical
interface that uses an object so familiar to the blind, as it is the cane. This may signify that
this device can provide Reciprocal Accessibility, once that this new cane can also be used by
non-blind musicians, so they will be able to experience, while sonifying, the haptic process
that allows the blind to retrieve and process visual surrounding information. The importance

388
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

of such developments is also based on the fact that they are not adaptations from other
previous ones, but rather a novel development started from the scratch and focused on
enabling the access of the blind musician for the sonification of his surroundings.
The purpose of converting stimuli from an specific sense to another, like from tactile
(mostly solid vibration) to auditory (mostly air vibration) also foresees new possibilities in the
field of accessibility to other types of impairments. For instance, an inverse approach of the
one presented here, in 3.2, that transformed sounds into tactile vibrations could be used by
people with hearing loss, to retrieve part of the information that is originally acoustic.
Nowadays some movie theaters seats are equipped with mechanic actuators that allow them to
vibrate together with the audiovisual information from the movie, which surely have an
important role in the enhancement of narrative and dramatic effect. A system providing such
audition to haptic conversion, in real time, might be used, for instance, by hearing-impaired
people to better understand the meaning and aesthetics of sonic arts.

Conclusion
This work presented two strategies for the multisensorial sonification for the blind musician,
using adapted canes. The first one, that uses bodiless strategy, is already implemented. The
second one, that uses full contact approach, is currently under development. Both use open
source hardware and software as a way to provide free access for their implementation and
further the improvement of these projects by other researchers.
This work also aims to nourish a philosophical and aesthetic discussion on the use of
such sonification strategies for the blind performer in terms of the generated soundscapes
perception, cognitive identification and evoked emotion. How does the aesthetic content is
affected by the synesthetic performance fruition created by the blind user? How could Gibson
(1979) “theory of affordances” be applied to define de action possibilities latent in the
surrounding environment reach (being it touchable or not) of such cane? How Mayer (1956)
definitions for two sets of musical aesthetic contrasting positions (absolutists x referentialists;
formalists x expressionists)1 can elucidate the emergence of musical meaning delivered by a
tool of simultaneous pragmatic (or functional) and artistic use. What types of expectations and

1 Absolutists: "musical meaning lies exclusively within the context of the work itself.". Referentialists:
"musical meanings refer to the extramusical world of concepts, actions, emotional states, and character."
Formalists: "the meaning of music lies in the perception and understanding of the musical relationships set
forth in the work of art and that meaning in music is primarily intellectual". Expressionists: "the
expressionist would argue that these same relationships are in some sense capable of exciting feelings and
emotions in the listener"

389
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

anticipatory responses, in reaction to such artistic performances, could be generated by this


tools, based on the ITPRA model, from Huron (2006).
These are fundamental questions that shall be addressed in future researches related and
derived from the introductory work here present. Music and accessibility is an exciting field
of research. More than being merely dedicated to provide access to contemporary tools for the
sensory impaired, it is actually a two-way path of research in which people without any
sensory impairment can also benefit, by having access to the universe of the sensory deprived.
This may provide to both new insights and changes in paradigms, as well as, the eventual
exploration of enhanced abilities, that the lack of a sense naturally develops on the brain of
the sensory deprived, by the action of neuroplasticity. Both type of musicians (sensory
impaired or not) have aesthetic perspectives, perceptual and cognitive limitations and
advantages that tools like the ones here presented aim to help them to explore and develop, by
bridging a path of communication and cooperation between these two sides of reality.

Acknowledgement
The authors would like to thank the grants received from CAPES that helped them as the
financial support of this work.

References
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390
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Cognição Musical e Desenvolvimento da


Mente Humana

391
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Licenciandos em Música e Educação Básica: reflexões a partir de um estudo


quantitativo realizado em âmbito nacional

Mário André Wanderley Oliveira


UFRGS/UFRN
mawoliveira@gmail.com

Resumo: Esta comunicação apresenta reflexões sobre a relação entre licenciatura em música e
escola de educação básica a partir de uma pesquisa cujo objetivo foi investigar a motivação de
licenciandos em música em sua formação inicial. O referencial teórico do estudo foi baseado no
Modelo de Expectativa e Valor (ECCLES; O’NEILL; WIGFIELD, 2005). Como método para essa
investigação foi definido o survey interseccional baseado na internet, com a adoção da técnica bola
de neve. Na coleta de dados, foram contabilizados 477 retornos de todas as regiões do país. Por
meio de Análise Fatorial Confirmatória, os dados coletados e o modelo teórico se mostraram
desajustados, o que acrescentou ao procedimento analítico técnicas de Análise Fatorial Exploratória.
Nesse procedimento, uma forma diferente de organização e análise dos dados foi identificada e o
estudo passou a adotar quatro fatores em vez de seis construtos. Com base na relação dos fatores
resultantes e as variáveis observadas do estudo, foi possível perceber que toda a amostra apresentou
indícios de estar otimista e confiante em sua formação inicial, o que respondeu ao objetivo geral.
Isso, contudo, não se traduziu na intenção de todos em atuar na educação básica, posto que essa
variável dividiu a amostra. Foi possível concluir que a intenção dos licenciandos em atuar na
educação básica não é predita pela forma como eles são observados, mas pela forma como eles
mesmos se observam, pela valoração mais intensa de suas experiências presentes no curso, pela
perspectiva mais otimista de suas futuras experiências e por crenças que eles têm em suas
capacidades e em si mesmos.
Palavras-chave: motivação, licenciandos em música, educação básica.

Undergraduates in Music and Basic Education: reflections from a study conducted in Brazil
Abstract: This article presents the results from a research that aimed investe the motivation of
music undergraduates in their initial formation. The theoretical framework of the study was based on
the Expectation and Value Model (ECCLES; O'NEILL; WIGFIELD, 2005). As a method for this
quantitative investigation, the internet-based intersectional survey was defined, with an adoption of
the snowball sampling. In the data collection, 477 returns were counted from all regions of the
country. By means of Factorial Analysis Analysis, the data collected and theoretical model showed
misfit, which approved the technical analytical procedure of Exploratory Factor analysis. In this
procedure, a different form of data organization and analysis was identified and the study went
through four factors rather than six constructors. Based on the relationship between the results
obtained and the observed variables of the study, it was possible to notice that the whole sample
showed signs of being optimistic and confident in their initial training, which responded to the
general objective. This, however, does not translate into an approach of all levels in basic education,
which is variable divided a sample. It was possible to conclude that the intention of licenciandos in
acting in basic education is not predicted by the way in which they are observed (men, women,
young, adults, northeastern, southerners, experienced, inexperienced, etc.), There is no course from
the more optimistic perspective of their future perspectives and beliefs that they have in their
capacities and in themselves.
Key-words: motivation, music teacher course, basic education.

Introdução
Esta comunicação apresenta reflexões sobre a relação entre licenciatura em música e escola de
educação básica, a partir de resultados de uma pesquisa cujo objetivo foi investigar, em

392
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

âmbito nacional, a motivação de licenciandos em música em sua formação inicial. Trata-se de


uma pesquisa realizado sob pressupostos do Modelo de Expectativa e Valor (Eccles; O’Neill;
Wigfield, 2005), cujos construtos teóricos são: Autopercepção de Habilidade / Expectativa de
Sucesso, Dificuldade da Tarefa, Esforço Requerido e Valores (Interesse, Importância e
Utilidade). O Modelo propõe que a Autopercepção de Habilidade para realizar uma tarefa e a
Expectativa de Sucesso de seus realizadores são indicadores significativos de sua motivação.
Ademais, as percepções acerca da Dificuldade da Tarefa e do Esforço Requerido para realizá-
la são, além dos Valores que que lhe são atribuídos, aspectos centrais no estudo dessa
motivação (Eccles; O’Neill; Wigfield, 2005).
Figueiredo e Soares (2012) indicaram que, mesmo após a promulgação da Lei nº
11.769/2008, que tornou a música conteúdo curricular obrigatório na educação básica, a
escola ainda figurava como um espaço de atuação pouco atrativo para grande parte dos
profissionais em formação docente na área. O trabalho, realizado com 1.924 licenciandos,
destacou “a falta de motivação dos estudantes para a atuação na educação básica”, uma vez
“que apenas 28% dos estudantes participantes deste estudo desejam atuar na educação
básica”. (Figueiredo & Soares, 2012. p. 267).
Soares, Schambeck e Figueiredo indicaram ser “preocupante e desafiador o fato da
grande maioria dos estudantes participantes desta pesquisa pretenderem atuar como
professores, mas não na escola pública” (2014, p. 60). Todavia, os autores consideraram ser
compreensível tal resultado haja vista a situação da educação pública no país: a falta de
condições de trabalho, os baixos salários, a permanência da polivalência em muitos sistemas
educacionais, entre outros (Soares; Schambeck; Figueiredo, 2014). Nessa perspectiva, é
possível inferir que, a despeito de importantes conquistas da educação musical no tocante à
educação básica, ainda são necessárias conquistas no âmago das Instituições de Ensino
Superior (IES). Nesse sentido, faz-se necessário, cada vez mais, conhecer os(as)
licenciandos(as) em música: suas perspectivas, seus interesses, suas escolhas, etc.
A partir da percepção deste contexto, busquei, na pesquisa, investigar, à luz do a
motivação do licenciandos em música em sua formação inicial, a partir do modelo teórico
anteriormente citado. Nesta comunicação especificamente, apresento resultados que dizem
respeito à atratividade da carreira docente em música na educação básica entre os estudantes
de licenciaturas em música do país.

393
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Escolhas metodológicas
A fim de realizar a coleta de dados, foi adotado como referência o instrumento psicométrico
Academic Scale (Eccles; O’Neill; Wigfield, 2005), cujos itens estão agrupados conforme os
construtos do Modelo de Expectativa e Valor, proposto por Eccles, O’Neill e Wiegfield
(2005). A metodologia deste trabalho, de abordagem quantitativa, se configurou como um
survey intersecional baseado na internet, com a adoção da técnica bola de neve (Cohen,
Manion, Morrison, 2007). E, na análise dos dados, foram utilizadas técnicas e procedimentos
de estatística descritiva e inferencial (Damásio, 2012; Dancey, Reidy, 2006; Field, 2009;
Pasquali, 1999; 2003; Urbina, 2007). A primeira versão da escala psicométrica foi adaptada
para esta pesquisa e utilizada num estudo piloto, o qual foi realizado no Grupo de Pesquisa
Formação e Atuação de Profissionais em Música (FAPROM) do Programa de Pós-Graduação
em Música da UFRGS (PPGMus/UFRGS) e no curso presencial de Licenciatura em Música
da mesma instituição. O instrumento, após a coleta de dados, recebeu ajustes com base no
feedback dos respondentes e em testes estatísticos – Alfa de Cronbach e Teste de Correlação
Linear de Pearson (FIELD, 2009) – que apontaram indícios de inconsistência em alguns itens
da escala. O instrumento foi, então, reformulado e utilizado na coleta final do estudo.
Convertido em um questionário virtual, o instrumento por meio de redes sociais, aplicativos
de celular, listas de e-mails e e-mails pessoais.

Discussão dos resultados


Ao final da coleta de dados, foram contabilizados 678 retornos, sendo que, destes, 201 foram
desconsiderados por apresentarem preenchimento parcial ou por terem sido preenchidos por
não licenciandos em música. Dessa forma, 477 retornos foram considerados válidos e,
portanto, constitutivos da amostra geral deste estudo. Esses 477 participantes são oriundos de
cursos de licenciatura em música de Instituições de Ensino Superior (IES) de todas as regiões
do Brasil. A região como maior número de estudantes foi o Nordeste (35,4%), seguido de
Sudeste (30,8%) e Sul (20,8%). As regiões Centro-Oeste e Norte apresentaram as menores
porcentagens de respondentes da amostra: 7,8% e 5,2% respectivamente. Os cursos dos
respondentes são, em sua maioria, oferecidos por IES públicas. Do total de respondentes, 413
licenciandos indicaram que os seus cursos são oferecidos por universidades, institutos ou
faculdades públicas: as instituições federais receberam 281 indicações; as estaduais, 131; e as
municipais, apenas uma. Já as IES particulares foram indicadas por 64 respondentes. A maior
parte da amostra foi composta por licenciandos do sexo masculino. Do total de respondentes,

394
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

279 participantes indicaram esse sexo e 198, o sexo feminino. A amostra foi constituída, em
sua maior parte, por jovens adultos com até 35 anos de idade. A média de idade da amostra foi
de 27,22 anos e as idades mínima e máxima observadas foram, respectivamente, 17 e 62 anos.
A maior parte dos respondentes indicou ter ingressado no curso de licenciatura em música nos
últimos cinco anos – entre 2011 e 2015 –, o que foi esperado, tendo em vista que o tempo
médio para conclusão do curso é de quatro anos. O ano de 2013 foi aquele no qual a maior
parte dos respondentes indicaram ter ingressado na graduação. Somando o número de
respondentes que ingressaram nesse ano (2013) com o número de respondentes que
ingressaram no ano de 2014, há indícios de que a prevalência na amostra é de estudantes da
fase intermediária da licenciatura (2º e 3º anos do curso). O grupo de respondentes se mostrou
dividido em relação à intenção em atuar na educação básica: 48,01% indicaram a intenção de
atuar nesse contexto, ao passo que 51,99% não indicaram essa intenção.

As propriedades psicométricas da escala


Após a etapa descritiva da análise, foram realizados procedimentos estatísticos que tiveram
como finalidade identificar a distribuição amostral dos dados vinculados aos construtos
teóricos, bem como para identificar as propriedades psicométricas da escala a partir dos dados
empíricos (Damásio, 2012; Dancey, Reidy, 2006; Pasquali, 1999; 2003). Tal processo foi
fundamental para embasar a escolha dos testes subsequentes – de relação estatística entre as
variáveis – e para definir as variáveis latentes – Fatores – que foram consideradas na análise.
A partir dos testes de Kolmogorov Smirnov e Shapiro Wilk, foi possível identificar a não
normalidade (p < 0,05) da distribuição amostral e, por conseguinte, a indicação da mediana
como a mais adequada medida de tendência central para a amostra. Ademais, foi indicada, por
meio dos testes, a utilização de testes não paramétrico – Mann Whitney e Kruskall-Wallis –
para as análises de relação estatística das variáveis (ver Dancey; Reidy, 2006; Field, 2009).
Ao investigar as propriedades do instrumento psicométrico, os resultados obtidos na
Análise Fatorial Confirmatória – AFC foram insatisfatórios com base em valores de referência
(Laros, 2005; Damásio, 2012). Assim, foi conduzida a Análise Fatorial Exploratória – AFE
(Laros, 2005; Damásio, 2012) do material empírico, o que trouxe à tona uma estrutura latente
dos dados que se diferenciou da estrutura teórica em que se baseou a escala. Em vez de seis
construtos teóricos, foram identificados quatro Fatores como elementos estruturantes dos
dados, três dos quais coincidentes com três construtos teóricos previamente propostos:
Autopercepções de Habilidade / Expectativa de Sucesso, Dificuldade Percebida da Tarefa e

395
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Esforço Requerido (com exceção de um item); e um que abarcou três construtos teóricos:
Valor Intrínseco (Interesse), Valor de Realização (Importância) e Valor Extrínseco (Utilidade).
Os três fatores consistentes com o modelo teórico passaram a ter, neste estudo, a mesma
denominação dos construtos com os quais coincidiram. Já o Fator não coincidente com um
construto único do modelo, passou a ser denominado Valores, já que englobou – e indicou a
indissociabilidade do Interesse, da Importância e da Utilidade.
O Modelo de Expectativa e Valor, bem como o instrumento psicométrico utilizado como
referência neste estudo, se desenvolveram a partir de pesquisas sobre a motivação de crianças
e adolescentes norte-americanos em seus estudos escolares na área de matemática. Portanto,
ambos se consolidaram com uma sensibilidade à atribuição de valores de indivíduos dessas
faixas etárias aos estudos do seu nível educacional. No contexto da escola, é possível que o
Interesse, a Importância e a Utilidade não apresentem necessariamente fortes correlações, haja
vista que a educação elementar, sendo compulsória, apresenta estudantes que não
necessariamente optaram pelo estudo. Embora possa ser comum uma alta atribuição dos três
Valores (Interesse, Importância e Utilidade) por uma criança ou adolescente aos seus estudos,
podem ser também comuns outras possibilidades. Eles podem apresentar Interesse, atribuir
Importância, mas não perceberem a Utilidade dessas atividades. Podem considerar
Importantes, perceber Utilidade, mas não terem Interesse pelas atividades. E podem ter
Interesse, perceber Utilidade, mas não considerar Importante o estudo.
No curso superior, contexto no qual os estudantes são, em sua maioria, adultos e têm
diversas opções de escolha – até mesmo a opção de não cursar uma graduação –, é possível
que a correlação entre os Valores seja diferente. No caso dos cursos de licenciatura em música
brasileiros, houve uma correlação tão forte entre os três Valores que a divisão proposta pelo
modelo teórico passou a não ter tanta coerência quanto parece ter no contexto escolar. Dessa
forma, os três Valores passaram a ser um único construto neste estudo.

A educação básica como possibilidade de atuação


Através dos testes não paramétricos de Mann Whitney e de Kruskal Wallis, apenas o Fator
Dificuldade da Tarefa se mostrou fracamente correlacionado às demais variáveis. Sua não
variação estatisticamente significativa foi um dado importante, uma vez que indicou a não
diferenciação dos grupos da amostra nesse aspecto. Houve, dessa forma, indícios de que, em
geral, a formação inicial não é considerada um grande desafio para os licenciandos em música
das diferentes regiões, sexos, etapas do curso, faixas etárias, IES e experiências na área. Em

396
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

relação aos demais Fatores e suas correlações com as variáveis observadas, foi possível inferir
que a motivação na formação inicial se diferencia quando são consideradas as variáveis
demográficas, institucionais e pessoais observadas. Isso, no entanto, apenas diferenciou os
grupos que apresentaram os escores mais elevados daqueles que apresentaram os escores
menos elevados – mas também altos, cabe frisar. Por meio dos testes de Mann-Whitney, as
únicas variáveis do estudo que foram fortemente associadas à intenção em atuar na educação
básica foram os fatores: Autopercepção de Habilidade/Expectativa de Sucesso, Esforço
Requerido e Valores. Ou seja, a intenção dos licenciandos em atuar na educação básica parece
não ser predita pela forma como eles são observados (homens, mulheres, jovens, adultos,
nordestinos, sulistas, experientes, inexperientes na área, etc.), mas pela forma como eles
mesmos se observam. É predita pela valoração mais intensa de suas experiências presentes no
curso, pela percepção mais otimista de suas experiências futuras e pelas crenças que eles
próprios têm em suas capacidades e em si mesmos.

Considerações finais

Considerando os resultados apresentados, foi possível perceber que o grupo de licenciandos


em música apresentou indícios de estar otimista e confiante em sua formação inicial. Contudo,
isso não se traduziu na intenção de todos em atuar na educação básica, posto que essa variável
dividiu a amostra em dois grupos. Esses dois grupos não se diferenciaram significativamente
em nenhum aspecto demográfico, institucional e pessoal contemplado. Ambos tão somente se
diferenciaram pelos fatores Autopercepção de Habilidade / Expectativa de Sucesso, Esforço
Requerido e Valores.

Por ter investigado a motivação dos licenciandos em sua formação inicial e


correlacioná-la com a intenção desses estudantes em atuar na educação básica, este trabalho
potencialmente pode contribui com uma maior visibilidade de um aspecto sobre o qual as
licenciaturas em música e os sistemas de ensino têm, notadamente, poder: a promoção de um
espaço no qual os(as) estudantes possam se sentir competentes, autônomos e pertencentes,
além de engajados socialmente. Isso para que, se tiverem intenção, atuem futuramente na
educação básica, contribuindo com a sociedade. E que, se não almejarem, contribuam também
com a sociedade, mas de outra forma: atuando naquilo em que virem Interesse, Importância e
Utilidade e se percebam bem, se realizando num trabalho que contribui para uma sociedade
mais ética, justa humana.

397
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Referências
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Urbina, Susan. Fundamentos da testagem psicológica. Porto Alegre: Artmed, 2007.

398
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

O ensino da expressividade musical no jazz baseado no ensino de idiomas

Endre Solti
Departamento de Música / IA / UNICAMP
soltiendre@hotmail.com

José Eduardo Fornari


NICS / COCEN / UNICAMP
tutifornari@gmail.com

Resumo: A literatura científica da área de cognição musical tem indicado nos últimos anos uma
discussão em andamento sobre as similaridades entre música e linguagem verbal. Recentes estudos
nas áreas de musicologia, linguística e neurociência têm constatado características em comum entre o
processamento e desenvolvimento da música e da linguagem. Este artigo apresenta uma revisão da
literatura onde se constata uma dificuldade maior na educação e consequente assimilação de
conteúdos musicais relacionados com a expressividade musical. O objetivo deste trabalho é apresentar
um embasamento teórico sobre a similaridade entre música e linguagem de modo a fomentar e validar
a criação de uma futura estratégia de ensino a distância da expressividade musical no contexto do jazz,
baseada em estratégias existentes do ensino de idiomas.
Palavras-chave: Expressividade musical, Ensino de idiomas, Ensino a distância.

A study on distance learning for the musical expressivity in jazz


Abstract: The scientific literature of the field of musical cognition has indicated in recent years an
ongoing discussion about the similarities between music and verbal language. Recent studies in
musicology, linguistics and neuroscience have found common characteristics between the processing
and development of music and language. This article presents a review of the literature that underline
the great challenge that is the proper education and consequent assimilation of musical contents
related to expressiveness. The intention of this work is to present a theoretical basis on the similarity
between music and language in order to foment and validate the creation of a future distance learning
strategy for the teaching of musical expressivity in the context of jazz based on existing strategies of
distant learning language teaching.
Key-words: Musical Expressivity, Language learning, Distance learning.

1. Introdução
Atualmente existe uma grande tendência à intensificação do ensino à distância (EaD), devido à
enorme gama de benefícios que o mesmo traz ao ensino de forma geral. Apesar desta forma de
ensino existir a longa data, na forma de cursos regulares com materiais didáticos enviados por
correio, as tecnologias de comunicação e informação (TIC) aplicadas no EaD possibilitaram o
desenvolvimento exponencial das possibilidades de aprendizado e, através da aplicação de
recursos de multimídia interativo, proporcionou aos seus alunos algumas facilidades, tais
como a flexibilidade de tempo para os estudos, permitindo estudar a qualquer hora; a quebra de
barreiras espaciais, permitindo estudar em qualquer lugar; a facilidade de emissão e recebimento
instantâneo de materiais; e a possibilidade de atuação em larga escala, podendo atingir um número
bem mais significativo de alunos que o modelo tradicional presencial.

399
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Entretanto, o ensino de um instrumento musical através do EaD é algo que ainda


oferece vários desafios, tanto ao professor quanto ao aluno, principalmente no que concerne
aos conteúdos performáticos instrumentais relacionados à improvisação musical jazzística.
A dificuldade de transmissão de tais conteúdos relacionados com a improvisação
musical jazzística foi relatada em XXX (2015), onde é apresentado um estudo com alunos da
licenciatura em música com habilitação em instrumento da Universidade Vale do Rio Verde
(UninCor). O objetivo deste foi averiguar a eficácia das disciplinas de instrumento musical
guitarra elétrica e violão popular. Foram avaliados somente os conteúdos relacionados com a
improvisação musical, divididos na pesquisa em recursos fraseológicos (aplicação de
patterns1) e linguagem jazzística, que aqui será chamada de Expressividade Musical
Idiomática (EMI). Os resultados apontaram para problemas de assimilação dos conteúdos
relacionados com a EMI jazzística. De acordo com a pesquisa, este tipo de conteúdo é
relacionado com o Conhecimento Processual 2 (CP), termo introduzido por John Anderson
(1982). Para este ensino ainda é necessária a presença física de um professor para a sua
assimilação e maturação. Diante desse contexto, este artigo pretende promover uma revisão
da literatura com o objetivo de apresentar embasamento teórico para a criação de uma
ferramenta de ensino a distância voltada para o ensino da EMI jazzística, baseada em
estratégias do ensino a distância de idiomas, dessa forma, reduzindo a dependência pessoal do
alno da presença constante de um professor.

2. Música e linguagem
Apesar das muitas controvérsias, são evidenciados aqui alguns dos principais argumentos
sobre a similaridade entre música e linguagem. As artes, sobretudo a música, tradicionalmente
são intuitivamente entendidas como sendo uma forma de linguagem. Tal noção fica evidente
em documentos regulatórios para a educação, tais como os PCNs (Parâmetros Curriculares
Nacionais) para a área de conhecimento Arte no ensino fundamental, onde em um dos blocos
de conteúdos na proposta para a música é chamado de “Apreciação significativa em música:
escuta, envolvimento e compreensão da linguagem musical" (Penna, 2008, p.65). No mesmo

1
Patterns são padrões melódicos ou frases já consagradas improvisadores consagrados usados para o
ensino e aprendizagem da improvisação.
2
O autor divide em dois os conhecimentos quanto à sua forma de aquisição: o Conhecimento
Declarativo (CD), armazenado na memória de longa duração, de fácil descrição através da fala/ escrita, e
Conhecimento Processual (CP), armazenado no subconsciente e de difícil descrição através dos protocolos
verbais, relacionado com a psicomotricidade e depende da automatização de movimentos.

400
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

documento, voltado para o ensino médio, as Artes levam o título de "Linguagens, códigos e
suas tecnologias". Para autores da educação musical, tais como Forquin, a questão da música
como linguagem tem sido útil para gerar uma perspectiva eficiente de atuação pedagógica,
visto que esta “permite combater o mito do dom e colocar questões como as condições de
familiarização com as linguagens artísticas e o acesso socialmente diferenciado à
arte” (Forquin, 1982 como citado em Penna, 2008, p.66).

2.1 Perspectiva linguística


Apesar de música sempre ter sido intuitivamente considerada como sendo uma linguagem,
conforme mencionado anteriormente, David Witten afirma que a música não é uma linguagem
absoluta, pois ela não tem vocabulário (Witten 1995 como citado em Penna, 2008, p.66). Este
posicionamento quanto às Artes como não sendo uma linguagem, toma como referência a
linguagem verbal. Sob esta perspectiva, autores tais como Langer (1989 como citado em
Penna, 2008, p.66) afirmam que, para haver linguagem, deve-se haver uma acepção
discursiva; possuir unidades permanentes de significação combináveis (palavras) em unidades
maiores (frases), com equivalências fixas que permitam a definição com a tradução. Para
Langer, tais unidades ou palavras permanentes de significados, fornecidas através da
linguagem, devem ser entendidas e reunidas em um todo, através do processo chamado
“discurso”. Para Penna, esta visão está enfocada dentro da tradição saussuriana, no sentido em
que este considera a linguagem verbal como sistema abstrato, onde seu significado é
completamente dado pela organização sintática e semântica, o que permite que a linguagem
verbal possa ser “dicionarizada, desse modo permitindo que esta possa “fornecer definições
que explicitam as equivalências fixas das unidades permanentes de significação" (Penna,
2008, p. 66). De acordo com a mesma autora, estudos recentes da linguística, como a análise
do discurso e a pragmática apontam para uma centralização do contexto com a intenção, em
que os processos de compreensão, interpretação e a possibilidade de vários sentidos passam a
ter suma importância, tirando a linguagem verbal da sua posição absoluta. Isto traz a
linguagem verbal a uma esfera de significação essencialmente ambígua e indeterminada, que
“não se esgota no próprio funcionamento do sistema linguístico abstrato, embora, sem dúvida,
deste dependa” (Penna, 2008, p. 68).
Dentre os autores que defendem as artes como sendo uma forma de linguagem,
podemos citar Marcushi, que traz à tona a ideia de que “a significação não se acha
autonomamente no texto” (Marcushi, 1995 como citado em Penna, 2008, p. 69). Para este

401
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

autor, a significação de um texto é resultante de um conjunto de fatores, dentre eles o


contexto, os conhecimentos de mundo, a intenção, a relação entre os interlocutores, etc.,
sendo a inserção contextual apenas um destes fatores. Assim sendo, pressupõe-se que seja
possível se chegar a múltiplas interpretações de um mesmo texto, onde o sistema linguístico é
apenas um sistema de códigos ou cifras, onde cabe ao público leitor os conhecimentos
específicos e necessários para a sua plena decifração.
Dessa forma, podemos concluir que a palavra “linguagem”, em uma abordagem mais
atual, refere-se a um conjunto de unidades menores de significação (palavras ou notas/ frases/
acordes musicais) que se juntam em um discurso (texto completo ou composição musical),
onde o seu pleno entendimento vai depender dos conhecimentos de mundo (ou
conhecimentos específicos individuais) do ouvinte; do texto ou da obra musical.

2.2 Perspectiva da neurociência


Segundo a neurociência, existem de fato semelhanças e diferenças entre comunicação verbal e
musical. Nettl e Everett (2005 como citado em Patel, 2008, p.535) afirmam que música e
linguagem são universais porque aparecem em todas as sociedades humanas,
independentemente das suas especificidades culturais. Patel complementa dizendo que ambas
são organizadas por meio de sistemas particulares ou conjunto de elementos discretos que,
quando vistos separadamente, possuem de pouco significado, mas que quando combinados,
formam estruturas com grande diversidade de significados. Este autor também destaca uma
diferença básica entre a fala e a música, que é o timbre. Na fala, o timbre tem uma enorme
importância nos significados contidos no discurso, enquanto que na música isso é bastante
raro, principalmente na música tonal ocidental (onde a mesma melodia pode ser tocada em
instrumentos de diferentes timbres, sem que isto modifique o seu significado).
Do ponto de vista neural, Charles Limb (2008), que procurou evidenciar as regiões
cerebrais responsáveis pela criatividade musical. No primeiro experimento, um músico
pianista foi convidado a tocar uma melodia memorizada e, logo após, a improvisar sobre a
harmonia dessa melodia. A execução musical foi examinada por meio de imagem por
ressonância magnética funcional (fMRI scanner), que mapeou as regiões cerebrais em
atividade durante a performance. Observou-se que, para a melodia memorizada, determinada
área cerebral é ativada, em detrimento de outra área, que se apaga, e vice-versa. No segundo
experimento, o mesmo músico foi convidado a revezar improvisos com outro músico (no caso
o próprio pesquisador, que tocou o segundo piano), como que em uma espécie de diálogo

402
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

improvisacional. Foi observado que, durante esta “conversa musical”, a área de Broca (região
cerebral correspondente à linguagem, ou comunicação expressiva) se ascendia, o que de certa
forma endossa o pressuposto intuitivo de que a improvisação musical tem similaridades com a
fala humana.
Outro ponto de comparação entre música e linguagem verbal é em relação à sintaxe
musical. Da mesma forma como nas linguagens, a maioria dos gêneros musicais também
apresenta estruturação sintática, composta por elementos perceptuais distintos, com regras e
normas para a combinação destes elementos em sequência (Patel, 2008, p.537). Nos idiomas,
encontramos as letras (equivalentes às notas), palavras (equivalentes à grupos de notas dentro
do compasso), frases (equivalentes às frases musicais, que podem estar dentro de um ou mais
compassos), sentenças (equivalentes aos agrupamentos de frases, formando uma ideia
musical) formando uma única redação (equivalentes à obra musical). Todavia, as principais
diferenças entre a estruturação sintática da linguagem e da música, são duas: 1) Na linguagem
verbal existem categorias gramaticais (por exemplo, substantivos e verbos), enquanto que na
música isto não ocorre. No entanto, a estrutura formal de ambos são hierárquicas e lógicas; 2)
Na imensa maioria dos gêneros musicais existe algum tipo de andamento; a presença de uma
unidade rítmica com pulsação regular. Na linguagem verbal falada, existe pouca ou nenhuma
ocorrência de tal fenômeno.
Enquanto que Limb (2008) sugere que tanto a comunicação verbal quanto a musica
utilizam a mesma região cerebral para os seus processamentos de suas respectivas
performances, Patel (2008) relata experimentos que comprovam que o processamento de tais
dados se dá de forma compartilhada entre as diferentes regiões do nosso cérebro. Tais
experimentos baseiam-se no fato de pacientes com amusia (perda da capacidade para
processar informação musical) que não tiveram as suas capacidades linguísticas afetadas
(afasia), e vice-versa. Apesar do fato de que este experimento não pode contar com um grande
número de voluntários, devido à raridade de tais patologias, o mesmo pode fornecer
evidências de que de fato diferentes faculdades cognitivas (fala e música) podem compartilhar
as mesmas regiões cerebrais no seu processamento.

3. Conhecimento declarativo e processual


Em termos cognitivos, uma das semelhanças entre música e a linguagem verbal é o fato de
que ambas levam um longo tempo para se desenvolverem plenamente. Entretanto, observa-se
duas diferenças básicas entre música e língua falada e escrita quanto ao processo de aquisição

403
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

e maturação, que é o período e o tempo de exposição aos componentes de ambas as


expressões. Na linguagem verbal, o contato com a fala é desde cedo e constante, até mesmo
durante a fase uterina do indivíduo, onde a mãe já começa a ‘conversar’ com o seu filho, e
esse contato se estende por toda a sua vida. Na linguagem escrita, este contato costuma se
iniciar mais tarde, onde na maioria dos indivíduos, a educação musical começa por volta dos
seis anos de idade, sem se tornar, na imensa maioria dos casos, uma necessidade básica (como
a fala) na relação desse indivíduo com sua comunidade. Ou seja, o tempo de exposição para a
língua falada e escrita é muito maior do que no caso da música.
Outro ponto importante a ser considerado é que todo o conhecimento necessário para o
desempenho da linguagem falada e escrita pode ser facilmente transmitido através da própria
fala, ou seja, este é um Conhecimento Declarativo (CD), enquanto que certos elementos ou
conteúdos musicais, de cunho prático, tais como a apreensão e o desenvolvimento da EMI,
necessitam de uma estratégia que vá além da verbalização dos procedimentos, uma vez que
este depende de mecanismos de comunicação que não podem ser imediatamente transmitidos
pelo discurso verbal, mas que tem que ser desenvolvidos através da repetição e prática. Este é
um Conhecimento Processual (CP). Tais estratégias podem ser compostas de observação com
audição ativa (ou seja, vendo, ouvindo e tentando reproduzir), enquanto que o
desenvolvimento e refinamento desta habilidade ficam a cargo de uma série de ações
repetitivas, de tentativa e erro, até que se estabeleça no aluno, uma habilidade performática
cuja ação seja segura e adequada. Anderson (1989) descreve que podem ser necessárias cerca
de dez mil repetições de uma mesma ação complexa para se chegar ao seu refinamento final.
Sanders (1991) observa que o processo cognitivo que ocorre durante a aquisição de
conhecimentos baseados no CP é afetado durante a ação, e podem não estar disponíveis para
serem exteriorizados, portanto de difícil transmissão entre os pares, professor e alunos. Um
bom exemplo da dificuldade de descrição dos componentes musicais, através dos protocolos
de comunicação verbal, é a escrita musical convencional. Os diversos gêneros musicais
possuem certos nuances específicos; “sotaques” estilísticos que dificilmente consegue ser
grafado em notação musical tradicional, o que incorre na inevitável descrição incompleta da
obra musical através da notação, que, incompleta dinâmica e ritmicamente, assemelha-se a
um mapa, que descreve, mas não é o caminho.
Isto é explorado num experimento conduzido por Daniel Levitin (2012), sobre o
reconhecimento da EMI. Neste, Levitin aponta para uma relação entre tempo de vivência
musical dos músicos, em relação à sua maior sensibilidade às variações de expressividade

404
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

musical, sugerindo que certos nuances relacionados com a expressão musical somente podem
ser percebidos pelos músicos mais experientes. Ou seja, a sensibilidade às diferenças de EMI
aumenta proporcionalmente aos anos de experiência musical.

4. Conclusão
EMI é uma das habilidades mais demoradas para serem assimiladas e maturadas (Kratus,
1996, p.36), podendo demorar muito mais para serem desenvolvidas, se comparadas às
demais habilidades necessárias para a realização de uma performance instrumental,
principalmente se levarmos em conta que o contato com a música, de forma geral, é bem
menor que o contato com a fala e escrita. Além disso, autores, tais como Ripoll (1991),
afirmam que as pessoas aprendem de forma heurística e individual. Ou seja, o processo de
aprendizagem pode ter como principal aliado e responsável, o próprio aluno. Neste sentido,
Ginsborg afirma que, cabe a cada pessoa descobrir o seu próprio método de memorização e
aquisição de conhecimentos (Ginsborg, 2002, p.157).
Este artigo traz o embasamento teórico de uma pesquisa em andamento, cujo objetivo
futuro é a criação de um modelo computacional voltado para a aquisição e desenvolvimento
da E I jazzística através de recursos EaD, nos moldes dos aplicativos de ensino de idiomas,
como o Duolingo (www.duolingo.com). Este aplicativo solicita que o usuário reproduza,
textual e verbalmente, frases da língua estrangeira que está estudando. Do que foi aqui
apresentado, esta estratégia poderá ser adaptada para o estudo e desenvolvimento da EMI. Ao
invés da frase falada, o usuário irá reproduzir, no seu instrumento, uma frase de jazz,
apresentada em notação musical e áudio. O algoritmo fará a verificação do grau de EMI do
aluno por meio de descritores acústicos. O swing, típico do jazz, poderá ser averiguado
através de uma métrica dada pela correlação dos arquivos de áudio executado pelo aluno em
contraste com um banco de dados, armazenado num servidor online. Caso não esteja
adequado, o usuário será solicitado a gravar um novo arquivo, até que o algoritmo detecte um
grau aceitável de correlação. Desse modo, espera-se que num futuro próximo, seja possível
estudar e desenvolver a EMI de gêneros de música idiomática, de forma remota, automática,
não-supervisionada, eficiente e lúdica.

Referências
Anderson, J. R. (1989) Theory of the Origins of Human Knowledge. Artificial Intelligence
Journal, 40 (1-3), 313-351.
Anderson, J.R. (1982) Acquisition of Cognitive Skill. Psychological Review, 89 (4), 369-406.

405
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Ginsborg, J. (2002) Singing by heart: memorization strategies for the words and music of
songs. In: JW Davidson, (Ed.). The music practitioner: exploring practices and research
in the development of the expert music performer, teacher and listener. 149-160. London:
Routledge.
Hallan, S. (1995) Professional musicians approaches to the learning and interpretation of
music. Sage Journals: Psychology of Music, 23, 111-128.
Hallan, S. (1997) The development of memorization strategies in musicians: implications for
education. British Journal of Music Education. 14, 87-97.
Kratus, J. (1996). A developmental approach to teaching music improvisation. British Journal
of Music Education. 26, 27-37.
Levitin, Daniel (2012). CIRMMT Student Symposium and General Assembly. University of
McGill, Montreal. Recuperado em 9 setembro, 2016 de https://www.youtube.com/watch?
v=GtSCVqIDl-k
Limb, Charles. (2010). Your Brain on Improv. Vídeo TED. Recuperado em 12 de setembro,
2016 de https://www.ted.com/talks/charles_limb_your_brain_on_improv?
language=en#t-284808A
Patel, Aniruddh D. ( 2008) Music, Language and the Brain. Oxford Universiity Press. New
York. pg. 535-540.
Penna, Maura. (2008) Música(s) e seu ensino (2ª ed.). Porto Alegre: Sulina.
Ripoll, H. (1991). The understanding-acting processing sport: the relationship between the
semantic and sensoriomotor visual function. International Journal of Sport Psychology,
22, 221-243.
Sanders, A. (1991) Ergonomics. Simulation as a Tool in the Measurement of Human
Performance. London and New York: Taylor & Francis Group, 34, 1991. pg. 995-1025
Solti, E. (2015). Avaliação do ensino-aprendizagem de guitarra elétrica e violão popular na
licenciatura em música modalidade à distância da Universidade Vale do Rio Verde.
Dissertação de mestrado, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP, Brasil.

406
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Um estudo sobre a autorregulação de alunos de percussão em cursos de


bacharelado em música

Flávio Denis Dias Veloso


Universidade Federal do Paraná – UFPR1

flavio.d.veloso@hotmail.com

Rosane Cardoso de Araújo


Universidade Federal do Paraná – UFPR/CNPq2
rosane_caraujo@yahoo.com.br


Resumo: O tema desta pesquisa é a aprendizagem autorregulada na prática instrumental de


percussionistas. A autorregulação pode ser compreendida como a capacidade de autogerir e direcionar
o comportamento, a partir do estabelecimento de metas e diretrizes de estudo. No âmbito da formação
instrumental, a adoção de tais condutas estimula o engajamento cognitivo, favorecendo a aquisição de
habilidades de maneira deliberada. Desta forma, o objetivo central do presente estudo foi verificar, por
meio de um estudo de levantamento (survey de pequeno porte), a possível existência de aspectos
autorregulatórios na rotina de estudo de alunos de percussão em cursos de bacharelado em música
(habilitação em instrumento). Participaram desta investigação 20 alunos(as) de quatro universidade
das regiões Sul e Sudeste do Brasil. A partir da análise dos dados, pôde-se notar que ao longo das três
fases da autorregulação acadêmica o controle das competências cognitivas relacionadas a esse
processo aumentou progressivamente. De um modo geral, a competência melhor dominada pelos
percussionistas foi a “atribuição causal”, na fase de autorreflexão. Por outro lado, a competência
“monitoramento do progresso”, na fase de realização, apresentou-se como a menos controlada entre as
12 competências autorregulatórias investigadas.
Palavras-chave: autorregulação; aprendizagem; performance musical.

A study on self-regulation of percussion students in music baccalaureate courses


Abstract: The theme of this research is about self-regulated learning in the percussionist’s
instrumental practice. Self-regulation can be understood as the ability to self-manage and direct
behavior, from the establishment of goals and study guidelines. In the scope of instrumental
formation, the adoption of such behaviors stimulates the cognitive engagement, favoring the
acquisition of skills in a deliberate way. Thus, the central objective of the present study was to verify,
through a survey (small survey), the possible existence of self-regulating aspects in the routine of
undergraduate students on percussion. Twenty students from four universities in the South and
Southeast regions of Brazil participated in this research. From the analysis of the data, it could be
noted that throughout the three phases of academic self-regulation the control of the cognitive
competences related to this process increased progressively. In general, the competence best
dominated by percussionists was the "causal attribution", in the phase of self-reflection. On the other
hand, the "progress monitoring" competence, in the implementation phase, was the least controlled
among the 12 self-regulatory competences investigated.
Key words: self-regulation; learning; music performance.

1. Introdução
No âmbito da formação instrumental, uma sessão de estudo proveitosa e eficiente demanda as
capacidades de planejamento e participação ativa no processo de aprendizagem, a habilidade
de diagnosticar problemas e corrigi-los e o estabelecimento de metas e estratégias adequadas

407
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

para se atingir os objetivos estipulados (WOODY, 2004). Além disso, é necessário que o
instrumentista em formação tenha confiança em suas capacidades, desenvolvendo-se a partir
do equilíbrio entre as habilidades que possui e o nível de dificuldade das tarefas as quais está
sendo submetido, considerando que o individuo que confia em suas capacidades persiste
diante das dificuldades, esforçando-se o suficiente para atingir seus objetivos e alcançando
bons resultados (CAVALCANTI, 2015).
Além dos desafios gerais da formação dos instrumentistas, é importante considerar-se as
particularidades da aprendizagem em cada instrumento, partindo do contexto musical e
formativo em que o estudante encontra-se inserido. Nesse sentido, essa pesquisa teve como
foco a formação dos percussionistas sinfônicos no Ensino Superior, mais especificamente nos
cursos de Bacharelado em Música (habilitação em instrumento). De acordo com a literatura
especializada (BARTOLONI, 2011; GIANESELLA, 1999), entre os desafios formativos
particulares enfrentados pelos percussionistas, destacam-se a necessidade de domínio técnico-
interpretativo de uma grande variedade de instrumentos e a necessidade de inserção em
diferentes contextos e grupos instrumentais.
A partir da delimitação do referencial teórico (a autorregulação da aprendizagem sob a
perspectiva sociocognitiva) e do objeto de estudo (a formação dos percussionistas sinfônicos),
o objetivo central desta pesquisa foi verificar, por meio de um estudo de levantamento (survey
de pequeno porte), a possível existência de elementos autorregulatórios na rotina de estudo
dos percussionistas investigados (20 bacharelandos em música de quatro universidades das
regiões Sudeste e Sul do Brasil).
O presente texto consiste em um recorte de uma pesquisa maior, cujos dados coletados
foram divididos em três eixos: (1) a caracterização da comunidade investigada, (2) o
delineamento dos principais desafios formativos enfrentados pelos percussionistas e (3) a
investigação dos aspectos autorregulatórios presentes nos hábitos de estudo dos colaboradores
deste survey, com base nas três fases do “Modelo de Aprendizagem Autorregulada de
Zimmerman (2000)” – (1) Fase Antecedente, (2) Fase de Realização e (3) Fase de
Autorreflexão. Na apresentação e discussão sobre os dados aqui proposta, será dada ênfase
exclusiva ao terceiro e último eixo, concentrando-se nos aspectos autorregulatórios da
aprendizagem dos percussionistas entrevistados.

408
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

2. Fundamentação Teórica
Santiago (2006) justifica a importância do desenvolvimento das habilidades autorregulatórias
na prática instrumental ressaltando sua relevância para o progresso instrumental, conferindo
direcionamento e qualidade aos momentos de estudo e favorecendo o alcance de melhores
níveis de performance musical. Nessa perspectiva, Zimmerman (2000) esclarece que o estudo
autorregulado inclui a mobilização de mecanismos cognitivos tais como estabelecimento de
metas, autoinstrução, autoavaliação, autorreforçamento, autorrecompensas e as crenças de
autoeficácia, compreendidas como a percepção pessoal em relação à própria inteligência, as
habilidades, os conhecimentos e os recursos que se dispõe para realização de determinada
tarefa (SCHUNK, 2001).
De acordo com Polydoro e Azzi (2009), foram criados vários modelos de intervenção
para a autorregulação, a exemplo dos modelos de Zimmerman (2000), Pintrich (2000) e
Rosário (2004). O modelo adotado nesta pesquisa foi o “Modelo de Aprendizagem
Autorregulada de Zimmerman (2000)”, que prevê o desenvolvimento da autorregulação
acadêmica em três fases:
1) FASE ANTECEDENTE: as competências relacionadas a esta fase precedem o início das
tarefas de aprendizagem e consistem na análise e planejamento das atividades a serem
desenvolvidas e na estipulação de metas pessoais. Nesta fase, as questões referentes à
motivação são de suma importância (SIMÃO E FRISON, 2013, p.7).

2) FASE DE REALIZAÇÃO: também chamada de “controle do desempenho”, esta etapa


compreende os subprocessos de auto-observação e autocontrole e exige, entre outras
coisas, automonitoramento. As estratégias selecionadas na fase antecedente são aqui
utilizadas com o objetivo de alcançar resultados positivos (CAVALCANTI, 2015).

3) FASE DE AUTORREFLEXÃO: ocorre ao fim de um ciclo de estudos, por meio da


avaliação dos resultados obtidos em comparação com as metas estabelecidas na fase
antecedente. Esta fase é também chamada de “fase de avaliação”, na qual o estudante
analisa a sua própria atuação com a finalidade de identificar as decisões que podem ter
sido tomadas de maneira inapropriada ou ineficaz, para estar em condições de corrigi-las
em situações de aprendizagem futuras.

A respeito deste modelo, Cavalcanti (2015) esclarece que “a fase antecedente influencia
o controle do desempenho [fase de realização], que, por sua vez, influencia a fase

409
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

autorreflexiva. O ciclo está completo quando o processo autorreflexivo exerce influência sobre
o antecedente” (p.193).

Figura 1 – Esquema representativo do modelo de aprendizagem 



autorregulação desenvolvido por Zimmerman (2000).

3. Metodologia

A metodologia utilizada nesta pesquisa foi estudo de levantamento (survey de pequeno porte).
De acordo com Gil (2008), o estudo de levantamento é um delineamento exploratório que
permite verificar dados sobre o comportamento de determinado grupo por meio da
interrogação direta. A população investigada foi de 20 estudantes de graduações em cursos de
bacharelado em música (habilitação em instrumento) de quatro IES das regiões Sudeste e Sul
do Brasil, que concordaram em participar desta pesquisa. Os participantes obtiveram
esclarecimentos sobre o desenvolvimento da pesquisa e sua participação na coleta de dados
foi facultativa e mantida em anonimato3.
O instrumento de coleta de dados consistiu em um questionário com 27 perguntas,
dividido em três partes, contemplando questões abertas (parte I) e questões desenvolvidas a
partir de uma escala Likert em 5 pontos (partes II e III), onde 1 representou discordância total
e 5 concordância total, havendo uma gradação entre os pontos extremos da escala4. A PARTE
I foi responsável pela caracterização da comunidade investigada, a PARTE II teve como
objetivo delinear os principais desafios formativos enfrentados pelos percussionistas e a
PARTE III buscou investigar os aspectos autorregulatórios presentes nos hábitos de estudo
dos colaboradores deste survey. O foco de interesse do presente texto são os dados angariados
na PARTE III do questionário.
Nesta etapa, as questões foram elaboradas tomando como referência competências
cognitivas específicas relacionadas com cada uma das três fases da autorregulação acadêmica

410
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

apresentadas pelo “Modelo de Aprendizagem Autorregulada de Zimmerman (2000)” – Fase


antecedente (Q=16 a 19), Fase de realização (Q=20 a 23) e Fase de autorreflexão (Q=24 a 27),
contendo quatro questões para cada fase (ver TABELA 1). Além disso, a fim de evitar
possíveis problemas de compreensão das perguntas e elucidar as questões apontando aspectos
específicos da formação dos percussionistas (sobretudo no âmbito sinfônico), todas as
perguntas da parte III do questionário apresentaram, logo abaixo do enunciado, uma
exemplificação que procurou expor de maneira prática as competências cognitivas aplicadas
em situações do cotidiano de estudo dos percussionistas graduandos.

TABELA 1 – Competências cognitivas consideradas na formulação da PARTE III do questionário.


FASE ANTECEDENTE
QUESTÃO 16 QUESTÃO 17 QUESTÃO 18 QUESTÃO 19
Planejamento das Estabelecimento de metas Diagnóstico de problemas Manutenção da
tarefas e delineamento de motivação
estratégias

FASE DE REALIZAÇÃO
QUESTÃO 20 QUESTÃO 21 QUESTÃO 22 QUESTÃO 23
Gestão das horas de Monitoramento do próprio Revisão e adaptação das Conduta de
estudo progresso estratégias autoinstrução

FASE DE AUTORREFLEXÃO
QUESTÃO 24 QUESTÃO 25 QUESTÃO 26 QUESTÃO 27
Conduta de Consciência Metacognitiva Atribuições causais Considerar as
autojulgamento autorreflexões em ciclos
de estudo futuros

4. Resultados e Discussão

A respeito dos resultados referentes à incidência de elementos autorregulatórios na rotina de


estudo dos percussionistas, foi possível notar que em nenhuma das 12 competências
cognitivas investigadas (associadas às três fases do processo de autorregulação) os
participantes demonstraram um controle extremamente baixo, o que sugere uma boa
capacidade de autorregulação. Além disso, o controle das competências previstas pelo
“Modelo de Aprendizagem Autorregulada” de Zimmerman aumentou progressivamente de
acordo com as fases deste modelo, sendo a última fase marcada por um maior domínio das
estratégias autorregulatórias.

411
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Na Fase Antecedente (início do processo autorregulatório), o aspecto que mais se


destacou positivamente foi o “diagnóstico de problemas e o delineamento de estratégias”,
considerando que 55% do total de participantes desta pesquisa (N=20) afirmou dominar essa
competência, enquanto apenas 10% disse nunca ou raramente conseguir diagnosticar
problemas e planejar estratégias de ação; os demais 35% indicaram um meio-termo
(marcando o item 3 da escala likert). Em contrapartida, o “planejamento das tarefas”
apresentou um domínio razoável por parte dos percussionistas entrevistados, onde apenas
35% indicou conseguir e 15% afirmou nunca ou raramente conseguir planejar as tarefas a
serem realizadas em um ciclo de estudos; os 50% restantes apontaram um meio-termo a esse
respeito.
Na Fase de Realização (etapa de controle do desempenho), o aspecto que mais se
destacou positivamente foi a “gestão das horas de estudo”, que consiste basicamente no
controle do tempo despendido para a realização das diversas atividades de estudo instrumental
(delineadas na Fase Antecedente). A esse respeito, 55% dos percussionistas entrevistados
disseram dominar esta competência enquanto apenas 5% afirmou nunca ou raramente realizar
uma boa gestão do tempo de estudo; 40% optou por um meio-termo. Por outro lado, o
“monitoramento do progresso” apresentou os resultados menos positivos em comparação não
somente aos elementos investigados na Fase de Realização, mas em todas às três fases da
autorregulação acadêmica, considerando que apenas 35% dos participantes afirmou conseguir
realizar um bom monitoramento das sessões de estudo enquanto 20% disse nunca ou
raramente conseguir desempenhar esta tarefa; os demais 45% optaram por um meio-termo a
esse respeito.
Na Fase de Autorreflexão (fase final de um ciclo de estudo), todos os quatro elementos
autorregulatórios investigados apresentaram-se dominados pelos percussionistas de maneira
satisfatória. No entanto, os dados referentes às “atribuições causais” a destacaram como a
competência cognitiva melhor controlada pelos percussionistas investigados, não somente
nesta fase, mas em todo processo autorregulatório. Nesse sentido, 70% dos participantes
afirmaram conseguir justificar e atribuir causas aos seus êxitos e fracassos e apenas 5%
afirmou nunca ou raramente dominar essa competência; os 25% restantes optaram por um
meio-termo. Além das atribuições causais, a “conduta de autojulgamento” também se
destacou positivamente. Para esta competência, 60% dos percussionistas entrevistados
afirmaram conseguir realizar o autojulgamento de seu desenvolvimento instrumental,
atribuindo valor aos avanços conquistados e realizando as autocríticas necessárias; 10% disse

412
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

nunca ou raramente dominar essa competência e os demais 30% indicaram um meio-termo a


esse respeito.
Em suma, foi possível notar que a comunidade investigada apresentou um bom domínio
da maioria dos elementos relativos à autorregulação acadêmica. O aspecto mais positivo em
todo processo consistiu nas “atribuições causais” e, embora nenhuma competência tenha se
mostrado não dominada pelos percussionistas, o “monitoramento do progresso” apresentou-se
menos controlado pelos colaboradores desse estudo. 


5. Considerações Finais
Em síntese, a partir da análise dos dados a respeito dos aspectos autorregulatórios presentes
nos hábitos de estudo dos percussionistas entrevistados, foi possível notar que:
I. Nenhuma das 12 competências autorregulatórias investigadas demonstraram-se
controladas em níveis extremamente baixos por partes dos percussionistas.
II. O controle de tais competências aumentou progressivamente de acordo com as fases do
“Modelo de Aprendizagem Autorregulada” de Zimmerman (2000).
III. Na Fase Antecedente, o aspecto que mais se destacou positivamente foi o “diagnóstico de
problemas e o delineamento de estratégias”, e o que menos se destacou foi o
“planejamento das tarefas”.
IV. Na Fase de Realização o aspecto que mais se destacou positivamente foi a “gestão das
horas de estudo”, e o que menos se destacou foi o “monitoramento do progresso”.
V. Na Fase de Autorreflexão todos os quatro elementos autorregulatórios investigados
apresentaram-se dominados pelos percussionistas de maneira satisfatória.

413
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

VI. De um modo geral, a competência melhor dominada pelos percussionistas foi a


“atribuição causal”. Por outro lado, a competência “monitoramento do progresso”
apresentou-se como a menos controlada.

Por fim, constatou-se que a aplicação dos mecanismos autorregulatórios nas sessões de
estudo resulta em práticas instrumentais mais eficientes, melhorando o engajamento na
realização das atividades e, consequentemente, o desempenho dos instrumentistas.
Finalmente, ressalta-se a necessidade de o instrumentista em formação intervir em seu
processo de aprendizagem, cabendo aos professores estimular a consciência de independência
em seus alunos, certos de que respeitar a autonomia dos indivíduos em formação é respeitar
sua dignidade e reconhecê-los como peça-chave do seu desenvolvimento (FREIRE, 2014). Do
mesmo modo, cabe aos aprendizes desempenhar um papel ativo em seu aperfeiçoamento
instrumental, conscientes de sua capacidade de analisar, avaliar, decidir e intervir em sua
aprendizagem, exercendo o autoconhecimento necessário para tornar-se agente do seu
desenvolvimento.

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414
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Zimmerman, B. J. (2000). Attaining self-regulation: A social cognitive perspective. In M.


Boekaerts, P. Pintrich e M. Zeidner (Eds.), Handbook of Self-Regulation. New York:
Academic Press.
1 Licenciado em Música pela Universidade Federal do Paraná – Brasil e atualmente Bacharelando em Música pela

mesma instituição; membro do grupo de pesquisa PROFCEM – Processos Formativos e Cognitivos em Educação Musical.

2 Bolsista de Produtividade CNPq – Brasil; Professora Associada na Universidade Federal do Paraná e coordenadora do
grupo de pesquisa PROFCEM – Processos Formativos e Cognitivos em Educação Musical.

3
O instrumento de coleta de dados foi testado em um estudo piloto para a análise da confiabilidade e coerência interna
das questões. Após a realização do estudo piloto, o questionário foi aplicado para a população definitiva em formato físico ou
virtual (via plataforma do goolge docs).

4
Para a análise dos dados coletados as questões foram quantificadas a partir da soma dos pontos a fim de criar resultados
por grupo de itens, onde 1 e 2=NUNCA CONSIGO/RARAMENTE CONSIGO; 3=MEIO-TERMO; 4 e 5=CONSIGO/
SEMPRE CONSIGO.

415
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Autorregistro como estratégia autorregulatória para a aprendizagem musical

Veridiana de Lima Gomes Krüger


Universidade Federal de Pelotas
limaveridiana@yahoo.com.br

Igor Mendes Krüger


Universidade Federal do Pampa
igorkruger@unipampa.edu.br

Resumo: Muitos são os fatores, considerados pela literatura sobre aprendizagem musical, que
influenciam, tanto positiva quanto negativamente, o desenvolvimento das habilidades musicais. Um
desses fatores, que tem ganhado destaque nas pesquisas nos últimos anos, é a capacidade de
autorregular o percurso de aprendizagem. Os resultados das pesquisas indicam que quanto maior for
a capacidade do estudante de aprender a aprender melhores serão os seus resultados de
aprendizagem. Tendo como referencial teórico central a Teoria Social Cognitiva de Albert Bandura,
mais especificamente o que diz respeito aos processos autorregulatórios, o presente trabalho
apresenta uma discussão em torno da utilização da estratégia autorregulatória de autorregistro, por
meio da utilização das técnicas de estimulação da recordação e autoscopia, como uma das
possibilidade de conduzir o estudante de música a uma aprendizagem ativa, consciente e autônoma.
Defendemos a utilização do autorregistro enquanto estratégia de aprendizagem que requer
intencionalidade, consciência e sistematização no intuito de conduzir o estudante a desenvolver a
autonomia de seu percurso de aprendizagem.
Palavras-chave: aprendizado, autorregulação, avaliação, estratégia de autorregistro.

Self-registration as a self-regulatory strategy for musical learning


Abstract: There are many factors, considered in the literature on musical learning, that influence,
both positively and negatively, the development of musical abilities. One of these factors, which has
gained prominence in researches in recent years, is the ability to self-regulate the learning path.
Research results indicate that the greater the student's ability to learn to learn, the better his learning
outcomes will be. Having a central theoretical reference to the Cognitive Social Theory of Albert
Bandura, more specifically with regard to self-regulatory processes, the present work presents a
discussion about the use of self-regulatory self-registration strategy, through the use of memory
recall techniques and Autoscopy , One of the possibilities to lead the student of music to an active,
conscious and autonomous learning. We advocate the use of self-registration as a learning strategy
that requires intentionality, awareness and systematization in order to lead the student to develop the
autonomy of his/her learning path.
Key-words: learning, self-regulation, evaluation, self-registration strategy .

Introdução

O tornar-se músico envolve o desenvolvimento e o controle de diversas competências, tais


como auditivas, motoras, cinestésicas, visuais, etc. (Alves, Freire, 2014; Hallan, 2012; 2013;
Galvão, 2006;), o que torna longa a trajetória do estudante na busca pelo desenvolvimento de
suas habilidades musicais. No domínio da música, uma série de pesquisas tem sido realizada
com a finalidade de compreender os diferentes fatores que podem influenciar, tanto positiva
quanto negativamente, o desenvolvimento de tais competências. A autorregulação da
aprendizagem é apresentada como um dos importantes componentes a serem considerados

416
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

durante o percurso formativo de um músico (McPherson, Zimmerman, 2002; McPherson,


Renwick, 2001). Em função da pertinência dos estudos referentes à autorregulação da
aprendizagem musical e da necessidade de ampliação das pesquisas com tal abordagem, neste
trabalho, discutimos a contribuição do autorregistro, por meio das técnicas de estimulação da
recordação e autoscopia, no processo de desenvolvimento de capacidades autorregulatórias do
músico, em especial do subprocesso de autoavaliação. Cabe salientar que algumas pesquisas,
no domínio da música, têm utilizado a estimulação da recordação como forma de coleta de
dados referentes aos processos autorregulatórios dos estudantes. No entanto, abordamos, aqui,
algumas possibilidades do uso dessa técnica para conduzir os estudantes a uma aprendizagem
autorregulada por meio da autoavaliação.

Autorregulação e a aprendizagem musical


A autorregulação é uma das capacidades básicas que, segundo Bandura (1997; 1991; 1986),
caracterizam o ser humano como agente do seu próprio percurso de vida. Para Zimmerman
(2000), a autorregulação é, talvez, a característica mais importante do ser humano, pois
permitiu que nossos ancestrais pudessem se adaptar e sobreviver a condições de mudança,
enquanto outras espécies foram extintas.
O trabalho de Bandura (1997; 1991; 1986) apresenta a autorregulação como um sistema
que opera a partir de três subfunções psicológicas (auto-observação, processos de julgamento
e autorreação) que direcionam a ação dos indivíduos em diferentes circunstâncias da vida
dando forma as suas intencionalidades. O sistema proposto por Bandura vem sendo utilizado
como base de referência por pesquisadores da Teoria Social Cognitiva para a elaboração de
modelos de investigação e intervenção em diferentes domínios do conhecimento (Polydoro,
Azzi, 2009).
No que se refere ao domínio da educação, a autorregulação da aprendizagem vem sendo
explicada como um processo cíclico e multidimensional. Cíclico por se desenvolver a partir
de três fases principais: a prévia, a execução e a autorreflexão, e multidimensional, pois, em
cada uma das fases, estão envolvidas dimensões cognitiva-metacognitiva, comportamental,
motivacional e contextual, que se interconectam de modo recíproco (Veiga Simão, Frison,
2006; Zimmerman, 2013).
O modelo de autorregulação da aprendizagem, proposto por Zimmerman (2013; 2000),
compõe-se de três fases cíclicas – fase prévia (antecipação), fase de execução e fase
autorreflexiva – que, por sua vez, se organizam em subprocessos. Embora possamos descrever

417
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

as fases do processo de autorregulação da aprendizagem separadamente para fins didáticos, é


importante ressaltar que essas são dinâmicas e cíclicas “devendo ser pensadas em termos de
graus de um continnuum” (Boruchovitch, 2014, p.404), em que não há como estabelecer, com
precisão, o início de uma das fases e o final da outra, uma vez que elas se interconectam de
forma bidirecional.
Por meio da autorregulação, o estudante torna-se protagonista do seu percurso de
aprendizagem, envolve-se ativa e conscientemente na busca por seus objetivos, planejando,
monitorando e avaliando o seu percurso e, se necessário, modificando o seu curso de ação.
Cabe salientar que a autorregulação “não é um traço de personalidade nem uma característica
só de alguns indivíduos” (Veiga Simão, Frison, 2013, p. 5). A autorregulação é apresentada
pela literatura como uma importante ferramenta para que os estudantes alcancem seus
objetivos de aprendizagem com êxito (Veiga Simão, Frison, 2013; Zimmerman, 2013; Paiva,
Lourenço, 2012; ).
No domínio da música, nos últimos anos, um considerável número de pesquisas têm
sido realizadas com o intuito de compreender os processos autorregulatórios que estão
envolvidos durante a prática musical e a forma como esses processos se relacionam com o
nível de desenvolvimento dos estudantes. Após uma revisão de literatura, realizada em
diferentes bancos de dados nacionais e internacionais, foi possível identificar que as pesquisas
têm dado ênfase na investigação da dimensão motivacional do processo autorregulatório da
aprendizagem musical, e na elucidação das estratégias, utilizadas pelos estudantes, durante o
seu percurso de aprendizagem.

Os resultados das pesquisas sugerem que estudantes com nível avançado de habilidades
musicais demonstram um alto nível de autorregulação, o que permite que eles controlem e
monitorem suas seções de prática e utilizem mais estratégias autorregulatórias (Nielsen, 2001;
2015). Quanto aos aspectos motivacionais, os dados indicam que estudantes que possuem
maior nível de autoeficácia utilizam uma maior variedade de estratégias cognitivas e
metacognitivas durante a prática musical (Nielsen, 2004; Özmentes, 2008).

Ao compreendermos o impacto positivo que a autorregulação da aprendizagem exerce


no percurso formativo do músico, se faz necessário encontrarmos mecanismos que auxiliem
os estudantes a desenvolverem as capacidades autorregulatórias que irão auxiliá-los durante o
processo de aprendizagem musical. Para Veiga Simão (2013), os ambientes de aprendizagem
podem criar situações autorregulatórias propositalmente, visando ajudar o estudante a tornar-
se ativo e consciente do seu processo de aprendizagem. Para tanto, a literatura sobre

418
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

autorregulação sugere que a utilização de estratégias1 de aprendizagem desempenham um


papel central nesse processo (Veiga Simão, 2004; Zimmerman, 2013; Zimmerman, Martinez-
Pons, 1986; Zimmerman, 2013).

Autorregistro como estratégia para desenvolver a aprendizagem autorregulada em


música: as possibilidades do uso da estimulação da recordação e da autoscopia

A pesquisa de Zimmerman e Martinez-Pons (1986) apresenta uma série de estratégias de


aprendizagem, utilizadas por estudantes para autorregular o seu aprender. Dentre essas
estratégias está a que os autores denominam manutenção de registro e monitoramento, que
consiste em registrar eventos e resultados do seu percurso de aprendizagem. A utilização
dessa estratégia serve a dois importantes subprocessos autorregulatórios: a auto-observação e
o autojulgamento. Na fase de execução do processo autorregulatório, é necessário que o
estudante observe e monitore o seu desempenho, visto que é a partir do acompanhamento
desse progresso que, na fase de autorreflexão, ele fará as autoavaliações a respeito dos
resultados alcançados. Os subprocessos monitoramento e autoavaliação são de fundamental
importância no processo formativo do estudante, uma vez que os indivíduos não podem
mudar se não souberem o que mudar (Bandura, 1991). Para servirem de técnicas, que podem,
tanto identificar esses dois subprocessos autrregulatórios, servindo a propósitos investigativos,
quanto conduzir o estudante ao desenvolvimento desses subprocessos, utilizadas com função
formativa, destacamos aqui a estimulação da recordação e a autoscopia.
A autoscopia caracteriza-se pela utilização de videogravação de ações, de episódios
específicos, submetidos, posteriormente, à auto-observação e à autoanálise, tendo como
finalidade a tomada de consciência do agente da ação (Amado, Veiga Simão, 2014). Já a
estimulação da recordação é uma técnica que se baseia na verbalização dos processos mentais
e consiste na reprodução (reapresentação), por meio de áudio e/ou vídeo, de um determinado
episódio de aula, estudo, etc., gravado com a finalidade de permitir que o indivíduo que
protagonizou o episódio recorde e relate os seus pensamentos e ações durante a realização de
tal atividade (Veiga Simão, 2012).
Em termos procedimentais, podemos dizer que a estimulação da recordação envolve
dois momentos. O primeiro consiste na gravação de um determinado episódio e o segundo, de

1 Não queremos aqui reduzir a autorregulação da aprendizagem ao uso de estratégias. Uma série de fatores estão
envolvidos nesse processo, tornando-o complexo. Porém, por questões de delimitação, trataremos neste trabalho,
especificamente do papel das estratégias de aprendizagem no desenvolvimento da autorregulação da
aprendizagem.

419
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

uma entrevista em que se solicita ao agente da ação que, ao assistir à reprodução do episódio,
relate os pensamentos e as decisões tomadas durante a realização da ação. Não existe uma
padronização para a entrevista. O professor/pesquisador poderá fazer uso de um roteiro
semiestruturado, estruturado, ou ainda, deixar que as questões do debate surjam no decorrer
da observação do episódio em forma de comentários livres. Também não existe uma
padronização quanto à forma de observação da gravação e ao número de vezes que será
observada, podendo a mesma ser reproduzida de forma integral ou serem selecionados alguns
recortes específicos da gravação. Esste tipo de técnica pode ser utilizada tanto em trabalhos
individuais quanto coletivos (Amado, Veiga Simão, 2014; Veiga Simão, 2012).
Entendemos que a utilização de gravações de áudio e/ou vídeo, no domínio da música,
não é uma ferramente nova. Dificilmente, encontraremos um músico que já não tenha feito
uso de tal técnica. Porém, discutimos aqui a sua utilização enquanto técnica atrelada a uma
estratégia de autorregistro intencional, consciente e sistematizada ao invés do seu uso
esporádico. Salientamos que tal estratégia pode ser de grande valia para estudantes iniciantes
de música, principalmente, se levarmos em consideração o fato de que a maior parte do
percurso formativo de um músico ocorre de forma solitária, o que requer que este desenvolva
capacidades autoavaliativas.
A pesquisa de McPherson e Renwick (2001), realizada com estudantes de música de
idade entre 7-9 anos, identificou que estudantes dessa faixa etária possuem uma baixa
capacidade de controlar e monitorar a própria aprendizagem. Ao analisarem as seções de
estudo dos participantes da pesquisa, os autores concluíram que os erros cometidos durante as
seções de prática não eram detectados e corrigidos pelos estudantes. As pesquisas de Oare
(2012) e Nielsen (2015) demonstraram que, embora os estudantes utilizassem uma série de
“estratégias de aprendizagem”, tais como a utilização do metrônomo, dividir a obra estudada
em pequenas partes, procura de ajuda, dentre outras, eles não sabiam como e quando utilizar
tais estratégias. Os resultados dos referidos autores sugerem que esses procedimentos são
utilizados pelos estudantes, pois são de uso comum entre estudantes de música, ou seja, são
utilizados como replicação de técnicas e não como estratégias de aprendizagem. Nesses casos,
em que os estudantes não possuem consciência de como conduzir as seções de prática de seu
instrumento, a estimulação da recordação pode ser de grande valia, uma vez que estimula a
metacognição, favorecendo a tomada de consciência dos processos utilizados durante a
aprendizagem e auxilia em muito no desenvolvimento reflexivo do estudante (Veiga Simão,
2012).

420
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Hallan (2001) identificou que 60% dos estudantes, que participaram de sua pesquisa,
deixavam erros sem serem corrigidos durante as seções de prática e, além disso, esses erros
eram praticados durante o período de estudos. Para a autora, o conhecimento de estratégias
para a prática musical não é útil para aumentar o desenvolvimento das habilidades musicais
dos estudantes, a menos que sejam desenvolvidos esquemas apropriados para permitir o
monitoramento e a avaliação de erros durante o percurso de aprendizagem. A mesma autora
salienta que, para progredir em um instrumento, é necessário o desenvolvimento e um extenso
domínio de mecanismos de monitoramento e avaliação da aprendizagem. Nesse sentido,
entendemos que a estratégia de autorregistro, por meio das técnicas de autoscopia e
estimulação da recordação, desempenham um importante papel no desenvolvimento dessas
habilidades.
A pesquisa de Silveira e Gavin (2016) utilizou a estimulação 2 da recordação com a
finalidade de examinar o efeito da gravação e reprodução em áudio na autoavaliação da
performance de estudantes que participavam de programas de bandas de escolas dos Estados
Unidos. Os estudantes preencheram um questionário de autoavaliação da performance em 3
ocasiões: 1) após a performance – sem ouvir a gravação; 2) após a primeira audição da
gravação da performance e 3) após a segunda audição da gravação da performance. Os
resultados da pesquisa indicam que, ao ouvirem as gravações de suas performances, os
estudantes passaram a se autoavaliar de forma mais crítica, diminuindo a pontuação atribuída
inicialmente (sem a audição da performance). Para os autores, esse resultado pode estar
associado ao que (Hoorens, 1993) denomina de superioridade ilusória, e pode ser fruto de
uma série de fatores, dentre eles, a falta de experiência em autoavaliação. A literatura (Bergee,
1993, 1997) também indica casos em que a autoavaliação tende a aumentar com o passar do
tempo. Em ambos os casos, o que se pode perceber é a pequena relação entre a autoavaliação
dos indivíduos e seu nível de desempenho real (Norman, 2004; Lew, Alwis & Schmidt, 2010),
o que dificulta o processo de aprendizagem do estudante, uma vez que, para que possa
desenvolver suas habilidades, é preciso que o estudante tenha consciência de quais os
aspectos que devem ser melhorados.
Por essas razões, defendemos aqui que, se utilizadas de forma intencional, consciente e
sistematizada, a estimulação da recordação e a autoscopia podem se converter em importantes
ferramentas no desenvolvimento metacognitivo de estudantes de música, proporcionando,

2 Tomamos a liberdade de utilizar o termo estimulação da recordação tendo em vista que o procedimento
utilizado na pesquisa se refere à tal técnia. Porém, destaca-se que os autores referem-se ao procedimento
utilizado como gravação de áudio.

421
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

assim, a otimização dos seus resultados de aprendizagem, visto que, por meio de tais técnicas,
é necessário que o indivíduo reflita a respeito de seus processos de tomada de decisões, ou
seja, ele é instigado a explicar as razões que o fizeram optar por determinada decisão em
detrimento de outras.

Considerações finais
A utilização de estratégias autorregulatórias de aprendizagem é apresentada, na literatura,
como um importante fator no processo de desenvolvimento de habilidades musicais. Neste
trabalho, buscamos explorar um pouco a contribuição da utilização da estratégia de
autorregistro, por meio das técnicas de estimulação da recordação e autoscopia, no
desenvolvimento de tais habilidades. Cabe salientar que essas técnicas não devem ser
interpretadas como “receitas mágicas” para a aprendizagem musical, e sim, como uma das
várias possibilidades de desenvolvimento de uma aprendizagem ativa, consciente e autônoma.
Destaca-se, ainda que, por se tratar de um processo complexo e diretamente ligado ao
indivíduo, a autorregulação distancia-se de uma ideia de padronização. Assim, por vezes, a
estratégia e/ou técnica que funciona para um indivíduo não irá funcionar, da mesma forma,
para outro. Por esse motivo, faz-se necessário o uso consciente, crítico e adaptativo de tais
estratégias e técnicas.

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423
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Influências da Autorrealização e da Experiência Estética sobre os Fatores


Pessoais dos Processos Criativos e Motivacionais da Aprendizagem Musical

Igor Mendes Krüger


Universidade Federal do Pampa - UNIPAMPA
igorkruger@unipampa.edu.br

Veridiana de Lima Gomes Krüger


Universidade Federal de Pelotas - UFPel
limaveridiana@yahoo.com.br

Resumo: O presente artigo tem como objetivo principal apresentar uma série de reflexões teóricas
realizadas sobre temas como, a autorrealização, experiência estética, indivíduos autorrealizados e sua
relação com os fatores pessoais que influenciam os processos criativos e motivacionais em ambientes
de aprendizagem musical. Essas análises reflexivas foram embasadas teoricamente por autores
vinculados à fenomenologia estética, à psicologia humanista, à psicologia analítica e à psicologia
positiva. Entendemos que tais autores apresentam concepções similares a respeito das temáticas aqui
abordadas. Como principais resultados, chegamos à hipótese de que existem indivíduos que buscam
vivenciar, com maior frequência, experiências estéticas durante a realização de atividades, tanto de
aprendizado musical, quanto durante a realização de atividades criativo/musicais. As experiências
estéticas, por ocorrerem em momentos cognitivo/experienciais anteriores à linguagem, à conceituação
e, consequentemente, à cultura, favorecem o desenvolvimento de uma maior autoconsciência por parte
do indivíduo que a vivencia. Por essas razões, acreditamos que a vivência desse tipo de experiência e,
consequentemente, a busca por sua repetição, favoreça o desenvolvimento da motivação intrínseca. A
motivação intrínseca gerada por atividades autotélicas, nas quais os indivíduos sofrem menores
influências dos ambientes sócio/culturais em que estão inseridos, faz com que esses alcancem um
estado de autorrealização que, em nosso caso de estudo, está vinculado ao desenvolvimento de
atividades musicais. Por sofrerem menos com as influências ambientais, esses indivíduos, apresentam
uma maior probabilidade de se envolverem em processos de aprendizado autônomos, mais
conscientes e efetivos, além de alcançarem resultados artísticos originais e com maiores propensões
ao belo.
Palavras-chave: Desenvolvimento cognitivo, Motivação, Teoria do fluxo, Autorrealização,
Experiência Estética.

Influences of Self-Realization and Aesthetic Experience on Personal Factors of Creative and


Motivational Processes of Musical Learning
Abstract: The main objective of this article is to present a series of theoretical reflections on topics
such as self-realization, aesthetic experience, self-realized individuals and their relationship with the
factors that influence creative and motivational processes in musical learning environments. These
reflexive analyzes were based theoretically by authors linked to aesthetic phenomenology, humanistic
psychology, analytical psychology and positive psychology. We understand that these authors present
similar concepts to the topics discussed here. The main results, we come to the hypothesis that, there
are individuals who seek to experience, more frequently, aesthetic experiences during the performance
of activities, both of musical learning, and during the performance of creative/musical activities. The
aesthetic experiences, because they occur at cognitive/experiential moments prior to language, to the
conceptualization, and consequently to culture, favor the development of a greater self-awareness on
the part of the individual who experiences it. For these reasons, we believe that the experience of this
type of experience and, consequently, the search for its repetition, encourage the development of
intrinsic motivation. The intrinsic motivation generated by autotelic activities, in which individuals
suffer minor influences from the socio-cultural environments in which they are inserted, makes them
reach a state of self-realization which, in our case study, is linked to the development of musical

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

activities. Because they suffer less from environmental influences, these individuals are more likely to
engage in autonomous learning processes, more conscious and effective, besides, achieve original
artistic results and with greater propensity to the beautiful.
Key-words: Cognitive Development, Motivation, Flow Theory, Self-Realization, Aesthetic
Experience.

Introdução

O objetivo principal deste trabalho é apresentar os resultados de análises reflexivas que temos
realizado sobre os conceitos de autorrealização, experiência estética, indivíduos
autorrealizados e suas relações com os processos criativos e motivacionais que influenciam a
aprendizagem musical. Utilizamos, como base teórica para essas reflexões, obras de autores
vinculados a diferentes correntes filosóficas e psicológicas, como a fenomenologia estética, a
psicologia analítica, a psicologia humanista e a psicologia positiva.
Em nossos estudos anteriores sobre os processos criativos e motivacionais, que
ocorrem em ambientes de ensino e aprendizagem musical (Krüger & Krüger, 2016),
encontramos cinco fatores principais que influenciam tais processos. São eles os Fatores
Pessoais, Culturais, Sociais, Ambientais e Comportamentais que se influenciam de forma
recíproca e polidirecional. No entanto, as principais dificuldades e dúvidas que nossos estudos
geraram, até o atual momento, estão relacionadas aos Fatores Pessoais, visto que, com base na
literatura (Bandura, 2008; Czikszentmihalyi,1994) e nas entrevistas que realizamos1,
percebemos que os indivíduos, que possuem maior motivação intrínseca do que extrínseca
para a realização das atividades, alcançam os melhores resultados em suas empreitadas
artísticas e de aprendizado musical.
Ao refletirmos a respeito dos dados coletados e, também, ao ampliarmos a revisão de
literatura, percebemos que existem traços de personalidade que caracterizam os indivíduos
com maior ou menor inclinação para a motivação intrínseca. Assim, começamos a levar em
consideração a importância das experiências estéticas vivenciadas durante a realização das
atividades criativo/musicais para o aumento da motivação intrínseca dos alunos. Foi então
que, ao revisar a literatura sobre o assunto, percebemos que diferentes autores descrevem
fenômenos similares utilizando denominações distintas para essas experiências e para os
indivíduos que as podem perceber. Portanto, neste artigo, apresentaremos um pouco dessas

1 Realizamos entrevistas com dois professores de Cursos de Bacharelado em Composição Musical, de


Universidades localizadas na região sul do Brasil e com quatro coordenadores artístico/pedagógicos, quatro
professores e cinco alunos do projeto de educação musical venezuelano conhecido mundialmente como El
Sistema.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

revisões e reflexões sobre os termos que chamaremos de Autorrealização, Experiência


Estética e Indivíduo Autorrealizado.

Autorrealização
A autorrealização é um termo comumente empregado no contexto de religiões orientais como
o Hinduísmo (Das, 1989, p.13). Para essas religiões, as concepções de natureza, realidade e
sobre os objetivos da vida humana são radicalmente diferente das concepções vigentes no
ocidente. Para a filosofia das religiões hindus, a autorrealização é o objetivo final da vida, ou o
sentido da vida. Nesse contexto, a autorrealização consiste em que os indivíduos alcancem um
estado elevado de autoconsciência, desapegando-se do materialismo e alcançando uma
elevação espiritual. Esse estado elevado de autoconsciência permite aos indivíduos que eles
conheçam o "seu verdadeiro Eu" (Atma ou Self) (Klostermaier, 2003, p.31).
No ocidente, no contexto da Psicologia Humanista, utilizou-se o termo
autoatualização para descrever características que, a nosso ver, assemelham-se com as
características da autorrealização das religiões orientais2. Maslow (1970, p.150) define a
autoatualização como “o pleno uso e exploração de talentos, capacidades, potencialidades,
etc.”. Para esse autor, as pessoas autoatualizadas “parecem estar cumprindo e fazendo o
melhor do que são capazes de fazer, lembrando-nos da exortação de Nietzsche: Torna-te o que
és!”. Maslow acreditava que os seres humanos têm um desejo inato de expressar e
desenvolver seus talentos e potencialidades naturais, mas que, esse desejo não surge até que
as necessidades físicas e psicológicas mais básicas da pessoa sejam cumpridas.
No contexto da Psicologia Analítica, Jung (2008) apresenta o termo "individuação",
que, a nosso ver, apresenta características similares aos termos autorrealização e
autoatualização, apresentados anteriormente.

Individuação significa tornar-se um ser único, na medida em que por


"individualidade" entendermos nossa singularidade mais íntima, última e
incomparável, significando também que nos tornamos o nosso próprio si-mesmo.
Podemos, pois, traduzir "individuação" como "tornar-se si-mesmo" (Verselbstung)
ou "o realizar-se do si-mesmo" (Selbstverwirklichung) (JUNG, 2008, p.60).

2 Cabe ressaltar aqui que, de acordo com Das (1989), os psicólogos humanistas lidam com um fenômeno
natural, isto é, o eu fenomênico. Eles não postulam qualquer entidade sobrenatural ou metafísica, como alma ou
espírito. Mesmo quando eles reconhecem a possibilidade de uma experiência mística, por exemplo, a experiência
de pico de Maslow, eles interpretam isso como um fenômeno puramente natural.

426
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Para Jung, o self é a totalidade da psique, o centro de toda a energia psíquica do


homem, a fonte de todas as pulsões. A interação de princípios opostos é fundamental para a
psicologia analítica, e Jung (1980, p.49) afirma que “nenhuma energia é produzida onde não
houver tensão entre contrários; por isso, é preciso encontrar o oposto da atitude consciente”.
Dessa forma, o processo de individuação pode ser relacionado a uma inteiração dinâmica
entre os opostos apolíneo e dionisíaco3, no qual a embriaguez, causada pelo estado
dionisíaco4, coloca o indivíduo em contato com o inconsciente coletivo5, resultando na
integração dos princípios opostos do consciente/inconsciente, introversão/extroversão e
intuição/sensação, trazendo à consciência uma compreensão da totalidade da psique, o self.

Experiência Estética
No contexto filosófico da Fenomenologia Estética, tendo como base teórica os escritos de
Dufrenne (2012), podemos dizer que a experiência estética é um momento de contemplação
de um objeto estético6 que permite ao homem uma momentânea libertação do pensamento
para além do intelecto. Para Figurelli (in Dufrenne, 2012, p.13), “O homem é um ser-no-
mundo. E estar no mundo leva o homem a buscar o fundamento que consiste no acordo do
homem com o mundo. Daí a importância da experiência estética. Ela reconcilia o homem
consigo mesmo.” Nas palavras de Dufrenne:

Antes de construir conceitos ou máquinas, enquanto fabricava as primeiras


ferramentas, o homem criou mitos e pintou imagens. Mas essa prioridade não pode
ser reivindicada tanto pela religião, quanto pela arte? Tal disputa, provavelmente,

3
De acordo com Jung (1985, p.194) existem dois principais tipos psicológicos os introvertidos e os
extrovertidos. As manifestações apolíneas são relacionadas aos introvertidos, pois proporcionam "uma percepção
de intimas imagens da beleza, da medida e dos sentimentos domados pela proporção". Enquanto as
manifestações dionisíacas "são fluxos de um poderosíssimo perceber universal que surge irresistível e que
embriaga os sentidos com o vinho mais forte". Jung diz ainda que "neste estado o indivíduo participa com a
máxima medida da percepção, sensível e afetivamente. Se trata pois, de uma extroversão de sentimentos
vinculada ao elemento da percepção, as quais denominamos percepções sentimentais." Nesse estado, o indivíduo
entra em contato com o inconsciente coletivo.

4Para uma maior compreensão dos opostos Apolo e Dionísio, consultar a obra "O Nascimento da
Tragédia ou Helenismo e Pessimismo" de Nietzsche.

5
O inconsciente coletivo é constituído pela soma dos instintos e dos seus correlatos, os arquétipos. Assim
como cada indivíduo possui instintos, possui também um conjunto de imagens primordiais. A prova convincente
disto encontramo-la, antes de tudo, na psicopatologia das perturbações mentais em que há irrupção do consciente
coletivo. É o que acontece na esquizofrenia. Aqui podemos observar a emergência de impulsos arcaicos,
associados a imagens inequivocamente mitológicas (Jung, 2000, p.37).

6 As obras de arte podem ser objetos estéticos quando percebidas como tais, no entanto, o objeto estético
não se resume a tais obras. O campo do objeto estético é mais amplo do que o da arte, podendo abarcar também
o mundo natural.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

não tem sentido nesse primeiro momento da humanidade. Religião e arte só mais
tarde se distinguirão verdadeiramente. Aqui é suficiente compreender que a arte
espontânea exprime o liame do homem com a Natureza. E é nisto que a estética vai
meditar: ao construir uma experiência original, ela reconduz o pensamento e, talvez,
a consciência à origem (Dufrenne, 2012, p.23)

A experiência estética, proporcionada pelas obras de arte, depende tanto da


sensibilidade do artista quanto da sensibilidade do espectador, pois, “do mesmo modo como o
artista se aliena na criação da obra de arte, assim o espectador se aliena na percepção estética:
entrega-se totalmente à manifestação do objeto” (Figurelli in Dufrenne, 2012, p.16). Isso se
dá em função de a experiência estética afetar a sensibilidade humana, situando-se no terreno
da percepção sensorial e, portanto, ocorrendo em momentos cognitivo/experienciais
anteriores à simbolização, à conceituação, à linguagem e, consequentemente, em momentos
anteriores à culturalização da experiência fenomênica.

Assim, a experiência estética pode ser descoberta na partida de todas as rotas que a
humanidade percorre: ela abre o seu caminho à ciência e à ação. E é claro que ela se
situa na origem, naquele ponto em que o homem, confundido inteiramente com as
coisas, experimenta sua familiaridade com o mundo; a Natureza se desvenda para
ele, e ele pode ler as grandes imagens que ela lhe oferece. O porvir do logos
prepara-se no encontro anterior à linguagem quando é a Natureza que fala. Natureza,
naturante, que produz o homem e o inspira a ter acesso à consciência. Compreende-
se, portanto, que certas filosofias optem por privilegiar a estética: com isso
remontam à fonte, a todas as suas análises nela se encontram orientadas e
esclarecidas (Dufrenne, 2012, p.30).

Voltando ao contexto da Psicologia Humanista, Maslow (1970) descreve a experiência


que chamou de “Experiência Mística” ou “Experiência de Pico” que, a nosso ver, apresenta
características similares às descritas por Dufrenne para as Experiências Estéticas.
Maslow encontrou, através de revisões de literatura e, também, com base no que
descreviam seus pacientes, correlações entre experiências denominadas como, experiência
criativa, experiência estética, experiência de insigth, experiência orgástica. Ele chegou à
conclusão de que cada uma dessas experiências mudava as pessoas e as suas percepções de
mundo.
Um aspecto da experiência mística é a perda completa, ainda que momentânea, de
temor, ansiedade, inibição, defesa e controle, o cessar do atraso e da renúncia. O
temor à desintegração e dissolução, o temor a ser desdobrado pelos (instintos), o
temor da morte ou da loucura, o temor de ceder a um prazer ou emoção
desenfreados, todos tendem a desaparecer ou a cair em desuso nesse momento. Isso
também implica abrir-se para uma maior percepção, já que o temor desvirtua. Pode
ser considerado como mera gratificação, mera expressão, mera alegria. Porém, como
está no mundo, representa uma espécie de fusão do princípio de prazer e do
princípio de realidade de Freud (Maslow, 1991, p.253).

428
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Maslow (1991, p.254) acrescenta ainda que “essa pessoa chega a mais integra e
unificada, mais única e idiossincrásica, mais viva e espontânea, mais expressiva e totalmente
desinibida, mais fácil e enérgica, mas atrevida e corajosa, a mais autotranscendente
experiência, esquecendo-se de si”.
Levando a discussão para o terreno da Psicologia Positiva, encontramos, em
Czikszentmihalyi (2014b; 1998), o que ele denominou de Estado de Fluxo, que, a nosso ver,
também apresenta características semelhantes às Experiências Estéticas.
O fluxo é uma atividade autotélica7, “descrita, de forma notavelmente semelhante, por
muitos entrevistados, oriundos de diferentes culturas” (Czikszentmihalyi, 2014b, p.24) como
uma atividade de profundo envolvimento e extremamente agradável. Czikszentmihalyi (1996,
p.111) apresenta os nove sentimentos que mais foram mencionados pelos entrevistados a
respeito do estado de fluxo. São eles: clareza de objetivos a cada passo do caminho para a
realização das atividades; feedback imediato para as próprias ações, pois, em fluxo,
percebemos o quão bem estamos indo; equilíbrio entre habilidades e desafios, pois, se os
desafios forem muito fáceis, perdemos o interesse neles e, se estiverem muito além de nossas
capacidades, eles geram frustração; ação e consciência são mesclados, porque, em fluxo,
nossa atenção é focada no que estamos fazendo, e as habilidades e os desafios são mesclados,
ao mesmo tempo em que produzimos, constantemente, feedbacks auto avaliativos; distrações
são excluídas da consciência, pois a única coisa que importa, em estado de fluxo, é a atividade
que estamos realizando, naquele exato momento, e nenhuma preocupação externa pode
interromper essa concentração; não há preocupação com falhas, pois a sensação de controle
total, proporcionada pelo fluxo, faz com que as falhas não sejam percebidas ou faz com que
não nos importemos com elas; a autoconsciência desaparece, já que, em fluxo, estamos tão
envolvidos com o que estamos fazendo que ficamos protegidos do ego, fazendo com que as
limitações impostas por ele desapareçam, proporcionando um alargamento dos limites de
nosso self; a percepção do tempo é distorcida, isto é, uma hora pode passar, e teremos a
sensação de que se passaram apenas alguns minutos; a atividade torna-se autotélica,
diferentemente de boa parte das atividades de nossas vidas, em que realizamos atividades
exotélicas, ou seja, atividades que realizamos para alcançar outros objetivos que não são a
atividade em si, uma vez que as atividades autotélicas são realizadas para obter o prazer que
se sente ao realizá-las, fazendo com que as atividades sejam o fim em si.

7 Atividades autotélicas não possuem finalidade ou sentido além ou fora de si.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Indivíduos Autorrealizados
Cabe ressaltar, aqui, que nossa concepção de indivíduos autorrealizados se distingui
completamente das concepções das religiões orientais, apresentadas na seção Autorrealização.
Para essas religiões, os indivíduos que atingem a autorrealização são aqueles que alcançam
uma elevação espiritual, transcendendo as necessidades materiais e libertando-se da roda das
encarnações.
Em nossa concepção, os indivíduos autorrealizados são aqueles que, através da
realização de determinadas atividades, como, por exemplo, o desenvolvimento de atividades
criativo/composicionais em música, conseguem vivenciar experiências estéticas, ou místicas,
ou ainda, entrar em estado de fluxo, autoatualizando-se e individuando-se. Acreditamos que,
ao vivenciarem tais experiências, esses indivíduos adquiram maiores níveis de motivação
intrínseca para a realização de suas atividades, desenvolvendo um maior senso crítico,
utilizando o máximo das possibilidades de sua agência pessoal8, sofrendo menores influências
culturais, sociais e ambientais, proporcionando que seus comportamentos criativo/musicais
resultem em obras originais e de maior propensão ao belo.
Nossas afirmações, apresentadas no parágrafo anterior, encontram referências tanto
nos escritos de Maslow (1991) sobre as pessoas autoatualizadas, quanto de Czikszentmihalyi
(2014a; 1996) sobre os indivíduos criativos.
Maslow (1991, p.198) apresenta as principais características das pessoas
autoatualizadas: elas possuem uma maior percepção da realidade, tolerância, espontaneidade,
centram-se em problemas, são solitários, autônomos, possuem uma maior sensibilidade,
vivenciam experiências místicas, possuem afinidade humana, humildade e respeito nas
relações interpessoais, são éticos, bem-humorados, criativos, apresentam resistência à
aculturação ou à socialização.
Csikszentmihalyi (2014a, p.170) expõe que, de acordo com seus estudos, os
indivíduos criativos são caracterizados não só por suas características individuais, mas, sim,
pela sua capacidade de operar através de todo o espectro de características humanas. Elas
podem apresentar, ao mesmo tempo, personalidades introvertidas e extrovertidas, gregárias e

8 De acordo com Bandura (2008, p.15), ser agente significa fazer as coisas acontecerem de maneira
intencional, por meio dos próprios atos. Ser agente é estar engajado no seu próprio desenvolvimento. Segundo
essa perspectiva, as pessoas são auto-organizadas, proativas, autorreguladas e autorreflexivas, contribuindo,
assim, para as circunstâncias de suas vidas, não sendo apenas produtos dessas condições. Por meio da agência, as
pessoas se motivam e orientam suas ações, de forma a criar ou transformar circunstâncias que vivenciam e,
também, escolher a forma como lidar com tais circunstâncias, criando estilos de comportamento que lhes
proporcionem realizar resultados desejados.

430
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

sociáveis, sensíveis e insensíveis, arrogantes e humildes e apresentar traços de androginia,


dependendo da fase do processo criativo em que estejam envolvidos, ou como a ocasião
exigir. O que determina o seu comportamento não é uma estrutura interna rígida, mas são as
exigências da interação entre eles e o domínio simbólico em que estão trabalhando.

Considerações Finais
Acreditamos que indivíduos que alcancem experiências estéticas por meio da realização das
atividades de aprendizagem musical interpretam as influências advindas dos ambientes sócio/
culturais, aos quais estão inseridos durante a realização de tais atividades, como
potencialidades, visto que a vivência sensorial, causada pelas experiências estéticas, é tão
gratificante que conduz o indivíduo a superar as limitações do ego.
Portanto, o principal resultado ao qual chegamos com a realização deste trabalho, é a
hipótese de que A motivação intrínseca, apresentada por alguns indivíduos para a prática de
atividades de aprendizagem ou criativo/musicais, pode ser o resultado de experiências
estéticas. Caso esta hipótese possa ser confirmada em estudos posteriores, poderemos crer que
a motivação intrínseca, gerada nesses contextos educativos, depende de experiências sensório/
cognitivas que ocorrem em momentos anteriores à conceituação, à linguagem e à cultura. Por
essa razão, esses indivíduos conseguem agir com o máximo das possibilidades de sua agência
pessoal, visto que as imposições dos ambientes sócio/culturais são menos relevantes para eles,
proporcionando que eles desenvolvam obras com maior originalidade e maior propensão ao
belo.

Referências
Bandura, A. (2008). A evolução da teoria social cognitiva.   BANDURA, A.; AZZI, RG;
POLYDORO, S. Teoria social cognitiva: conceitos básicos. Porto Alegre: Artmed, 15-41.
Csikszentmihalyi, M. (1993). The evolving self. New York. NY: HarperCollins.
Csikszentmihalyi, M. (1996). Flow and the psychology of discovery and invention. New York:
Harper Collins.
Csikszentmihalyi, M. (1998). Finding Flow: The Psychology of Engagement With Everyday
Life. Basic Books.
Csikszentmihalyi, M. (2014a). The Systems Model of Creativity: The Collected Works of
Mihaly Csikszentmihalyi.Dordrecht: Springer
Csikszentmihalyi, M. (2014b). Applications of Flow in Human Development and Education:
The Collected Works of Mihaly Csikszentmihalyi. Dordrecht: Springer
Das, A. K. (1989). Beyond self-actualization. International Journal for the Advancement of
Counselling, 12(1), 13-27.
Dufrenne, M. (2012). Estética e filosofia. São Paulo: Perspectiva.
Jung, C. G. (1980). Psicologia do Inconsciente. Trad. de Maria Luiza Appy. Petrópolis. Vozes.
Jung, C. G. (1985) Tipos Psicológicos: Tomo 1. Buenos Aires: Editorial Sudamericana.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Jung, C. G. (2000). A natureza da psique. Petrópolis: Vozes.


Jung, C. G. (2008) O Eu e o Inconsciente. Petrópolis: Vozes.
Klostermaier, K. K. (2003). A concise encyclopedia of Hinduism. Oneworld Publications.
Krüger, I. M.; Krüger, V. L. M. (2016) Modelo de Sistemas para a Criatividade e Teoria
Social Cognitiva: Uma Relação Complexa de Complementaridade. Anais do XII
SIMCAM. Porto Alegre, RS, 2016.
Maslow, A. H. (1970). Motivation and Personality. New York: Harper & Row.
Maslow, A. H. (1991). Motivación y personalidad. Ediciones Díaz de Santos.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Habilidades e Estratégias para Gerir a Ansiedade Antes e Durante o Recital:


Abordagem Metodológica de estudos Multicaso com Pianistas Estudantes e
Profissionais

Dayse Gomes Mendes


UFPB
daysemusic@yahoo.com.br

Resumo: Este artigo apresenta a metodologia utilizada em nossa dissertação de mestrado


“Habilidades e estratégias para gerir a ansiedade antes e durante o recital”. O objetivo geral desta
pesquisa consistiu em investigar as habilidades e estratégias de performance utilizadas por pianistas
para gerir a ansiedade nas apresentações. A metodologia expôs um estudo de caso do tipo multicaso,
cujos participantes foram estudantes e profissionais de Recife - PE, os quais foram classificados no
grupo 1: três estudantes de piano da Escola Técnica de Criatividade Musical (ETECM) e no grupo 2:
três pianistas profissionais, todos em fase de preparação para o recital. Os dados de campo coletados
foram entrevistas semiestruturadas antes e após o recital, questionário de comportamento e de
ansiedade, roteiro de estudo e gravação dos recitais. As análises e os resultados consistiram na
triangulação dos dados, os quais seguiram algumas etapas: 1) descoberta e análise das habilidades e
estratégias utilizadas antes e durante a performance para o gerenciamento da ansiedade, 2)
compreensão da percepção comportamental que os pianistas tiveram de si mesmos nos dias
precedentes à apresentação e percepção dos sintomas de ansiedade antes e durante a execução e 3) a
avaliação qualitativa dos resultados. Inferiu-se que tanto estudantes como profissionais apresentaram
habilidades e estratégias eficientes para alcançar o objetivo, com o mínimo de ansiedade. Porém, estes
aspectos mostraram-se em diferentes níveis de conhecimento e desenvolvimento cognitivo.
Palavras-chave: desenvolvimento cognitivo, habilidade, resolução de problemas, avaliação.

Skills and Strategies for Managing Anxiety Before and During the Recital: Methodological
Approach to Multicase Studies with Pianists Students and Professionals
Abstract: This article presents the methodology used in our master's dissertation “Abilities and
Strategies for managing anxiety before and during the recital”. The general objective of this research
consists to investigate the performance abilities and strategies used by pianists to manage anxiety
during presentations. We used a case study for the methodology, whose participants were students and
professionals Recife - PE, Brazil, which were classified as Group 1): three piano students at Escola
Técnica de Criatividade Musical (ETECM) and, Group 2): three professional pianists, all of them in
the stage of preparation for a recital. The collected data were semistructured interviews before and
after recitals, questionnaire concerning behavior and anxiety, study sequence routines, and audio
register of recitals. The analyses and results of data consisted of three parts which followed these
steps: 1) discovery and analysis of the abilities and strategies used before and during the presentation
to control anxiety, 2) comprehension of the perception of behavior that pianists had of themselves
during the days preceding the presentation and perception of anxiety symptoms before and during
performance, 3) qualitative evaluation of results. It is inferred that not only students, but also
professionals presented efficient abilities and strategies to reach their objective, with a minimum of
anxiety. These aspects, however, exist on different levels of knowledge and cognitive development.
Keywords: cognitive development, skill, problems solving, behavior, evaluation

Introdução
A dissertação que tem como tema “Habilidades e Estratégias para gerir a ansiedade antes e
durante o recital: um estudo multicaso com pianistas estudantes e profissionais” teve como
objetivo geral investigar as habilidades e estratégias de performance utilizadas por pianistas

433
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

para gerir a ansiedade durante apresentações públicas. Nessa perspectiva, buscou-se investigar
algumas etapas que, no parecer da pesquisadora, foram julgadas necessárias para uma
possível superação de dificuldades que pianistas enfrentam, advindas da exposição ao
público.
Na investigação, supôs-se que pianistas profissionais, graças ao maior tempo de palco,
apresentariam mais habilidades e estratégias que pudessem tornar a ansiedade mais amena, ao
passo que estudantes, em razão da pouca ou nenhuma experiência em recital-solo, exibiriam
habilidades e estratégias bastante embrionárias. Para esse grupo, considerou-se a influência do
ambiente escolar. Portanto, este estudo buscou oportunizar a aproximação da experiência de
profissionais à experiência inicial de estudantes de piano, investigando como se envolvem nas
atividades de preparação para o recital, desde a escolha de repertório até sua apresentação em
público e posterior autoavaliação da execução.
A pesquisa consistiu em uma abordagem qualitativa, da qual se presume o contato
direto do pesquisador com os participantes e a situação investigada. Ela valoriza a
subjetividade dos sujeitos e o nível interpretativo, ao contrário de outras abordagens que
enfatizam a objetividade, a relação causa versus efeito e a mensuração (Freire, 2010). A
pesquisa qualitativa “propicia a construção de novas abordagens, revisão e criação de novos
conceitos e categorias durante a investigação” (Minayo, 2006, p.57).
Esta pesquisa fez referência a um estudo multicaso ou casos múltiplos. “A evidência dos
casos múltiplos é, muitas vezes, considerada mais vigorosa e o estudo, em geral é, por essa
razão, visto como mais robusto”. (Herriott & Firestone, 1983 apud Yin, 2010, p. 77). De
acordo com Yin (2010, p. 78), nesse tipo de estudo, “cada caso deve ser selecionado
cuidadosamente para que se possa prognosticar resultados similares (uma replicação literal)
ou produzir resultados contrastantes, mas em situações previsíveis (uma replicação teórica)”.

O Processo Metodológico
Os participantes da pesquisa foram seis pianistas, divididos em dois grupos: três estudantes da
Escola Técnica de Criatividade Musical (ETECM) do curso técnico de piano e três pianistas
profissionais. No primeiro grupo, havia três jovens de idade e nível de desenvolvimento
pianístico diferentes. A referência a cada um deles foi pelo gênero masculino, os estudantes.
O segundo grupo da pesquisa, também tratado pelo gênero masculino, os profissionais,
foi composto por participantes de diferentes idades e distintas vivências de palco. Todos
experientes na docência e dois deles ainda exerciam a função docente no desenrolar da

434
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

pesquisa. A coleta de dados ocorreu também em Recife-PE, ora na própria residência dos
participantes, mediante entrevistas, ora via Skype, para um dos profissionais não residentes na
cidade. A observação dos recitais ocorreu no Conservatório Pernambucano de Música, e na
Igreja Batista Emanuel, também na mesma cidade.
Segundo André (2005), definir os critérios para a escolha dos participantes num estudo
multicaso é um dos primeiros passos do pesquisador. No entanto, só após os contatos iniciais
com o campo poderão ser confirmados. Dessa forma, a escolha de ambos os grupos se
justificou pela necessidade de pianistas que estivessem prestes a realizar recital,
preferencialmente no período de junho a setembro de 2013.
Os instrumentos de coleta de dados incluíram pesquisa bibliográfica nas áreas de
educação musical, psicologia da música e performance musical, as quais permitiram constituir
um referencial teórico sólido e uma leitura contextualizada da situação em estudo; entrevistas
semiestruturadas, questionários e gravações. As etapas se desenvolveram da seguinte forma:

1. Entrevista com os participantes antes do recital.


A abordagem de entrevista semiestruturada foi adotada a fim de permitir em profundidade
uma exploração das questões elaboradas. Esse método seguiu um conjunto de questões
previamente definidas, mas numa abordagem informal, em que os entrevistados discorreram
sobre o que foi perguntado sem se prender somente às indagações feitas pelo entrevistador,
cuja intenção foi dar ao depoente espaço para respostas não previstas, enriquecer ou
aprofundar o conhecimento do assunto estudado e possibilitar novas interpretações (Freire,
2010).
Como técnica, foi utilizada a análise categorial temática (Bardin, 2008). A categorização
das entrevistas se organizou de acordo com a condução dos resultados obtidos na interação
entre a pesquisadora e o entrevistado, mesmo que as respostas não tenham sido previstas. Na
elaboração e aplicação das entrevistas, as categorizações temáticas ainda não haviam sido
definidas. Apenas no momento da análise, com base na fala dos participantes da pesquisa, é
que surgiram estas: 1. Planejamento de estudo; 2. Ansiedade e sintomas; 3. Preparação para
o recital.

2. Roteiro de estudo nas dez últimas semanas que antecederam ao evento.


O roteiro de estudo foi elaborado com questões objetivas e subjetivas. As objetivas tiveram o
intuito de investigar as horas de prática e o planejamento de estudo diário, nas subjetivas, cuja

435
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

pretensão era descobrir a maneira de os participantes se autoavaliarem, ou seja, descrever


rendimento, cumprimento de metas e disposição para o estudo naquele dia.

3. Questionário de comportamento aplicado uma semana antes do evento.


O questionário utilizado foi retirado do CES-D (Center for Epidemiologic Studies -
Depression Scale). Apesar de esse método ter sido originalmente criado para um objetivo
específico, decidiu-se utilizá-lo nessa investigação, na intenção de avaliar o comportamento
dos participantes na semana anterior ao recital. Para isso, foi preciso modificar a maior parte
das questões do questionário original, reduzindo para 14 itens escalares sobre humor,
sintomas somáticos e interação com os outros. Desses, seis questões eram positivas e cinco,
negativas. A resposta a cada uma dessas questões seguiu um grau de intensidade de acordo
com cada sintoma percebido durante a semana precedente à performance: raramente (1 dia);
durante pouco tempo (1 ou 2 dias); durante um tempo durante um tempo moderado (3 ou 4
dias); durante a maior parte do tempo (5 a 7 dias).

4. Gravação do recital.
Esse instrumento permitiu a investigação visual do comportamento dos participantes em
apresentação pública. A coleta de informações, mediante seu relato, vinha sendo feita, mas a
filmagem do evento foi o momento crucial para inferir o que se falou do que se observou.

5. Questionário de ansiedade, realizado logo após a apresentação.


Essa técnica seguiu o modelo proposto pelo IDATE. Segundo Fioravanti (2006), o Inventário
de Ansiedade Traço-Estado (IDATE) é um dos instrumentos mais utilizados para quantificar
elementos subjetivos relacionados à ansiedade, desenvolvido por Spielberger et al (1970) e
traduzido e adaptado para o Brasil por Biaggio (apud Fioravanti, 2006). Desde então, vem
sendo empregado para medir o nível de ansiedade, traço e estado em pesquisas de psicologia e
medicina, por exemplo, com mais de mil estudos publicados (Kaipper, 2008).
Para esta pesquisa, resolveu-se adaptar o questionário original a fim de atender aos
objetivos propostos. No momento da aplicação do questionário de ansiedade, explicou-se aos
participantes que as respostas não se baseavam no certo e errado, mas de acordo com as
opções dadas. Decidiu-se aplicar o método após o recital, pois se compreende que a aplicação
dessa técnica poderia suscitar algum tipo de ansiedade antes do evento.

436
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

6. Entrevista após o recital


Essa segunda parte da entrevista semiestruturada ocorreu no mesmo dia do evento ou até dois
dias depois. O objetivo foi investigar sintomas de ansiedade, pensamento e autoavaliação. Os
questionamentos referiram-se especificamente ao momento do recital, e categorização
temática foi semelhante para ambos os grupos: 1. Rotina; 2. Sintomas de ansiedade antes,
durante e após o palco; 3.Concentração; 4. Autoavaliação; no entanto, para o grupo 1, foi
acrescentado a categoria 5: Ambiente/Contexto escolar

Cruzamento de Dados: O Resultado


O resultado desta etapa de análise foi a descoberta das habilidades e estratégias para amenizar
a ansiedade dos participantes da pesquisa. Tomando-se por base uma segunda análise das
entrevistas semiestruturadas e roteiros de estudos, foram identificadas e classificadas as
habilidades e estratégias utilizadas pelos participantes antes, durante e após o recital. Em
seguida foram criados dois quadros comparativos entre estudantes (E) e profissionais (P),
semelhante ao proposto por Sternberg (2000). O primeiro, contendo as habilidades e o
segundo, as estratégias.
De acordo com Sloboda (2008) habilidade consiste na aquisição de hábitos. A
principal característica de um hábito é o seu automatismo e a pouca ou nenhuma capacidade
mental para executá-lo.
Anderson (citado em Sloboda, 2008, p. 286) define o desenvolvimento das habilidades
em três estágios diferentes, o cognitivo, o associativo e o autônomo:

O estágio cognitivo envolve uma codificação inicial da habilidade em uma forma


suficiente para permitir que o aprendiz gere o comportamento desejado, pelo menos
num nível de aproximação grosseira. Neste estágio, é comum observar mediações
verbais, em que o aprendiz repete as informações necessárias à execução da
habilidade. O estágio associativo é aquele em que a habilidade passa a ser executada
de maneira suave. Os erros na compreensão inicial da habilidade são sucessivamente
detectados e eliminados. Concomitantemente, desaparece a mediação verbal. No
estágio autônomo há uma melhoria gradativa e continuada na performance de uma
habilidade. Frequentemente, nesse estágio, as melhorias continuam indefinidamente.

Como forma de análise, foram utilizados os estágios propostos pelo autor, para
classificar cada habilidade sem realizar comparações sobre a qualidade de cada uma, mas sim
a eficiência de atuação. Não há limites na construção do conhecimento musical. Um estudante
de música iniciante reflete conceitos musicais que surgem com base nas aulas de solfejo e

437
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

revela uma teia crescente de compreensão. Suas habilidades de leitura servem de contexto
para a construção do conhecimento musical.
As habilidades encontradas nos estudantes não se apresentaram no mesmo estágio que
nos profissionais, nem poderiam, pois, segundo Sternberg (2008), os esquemas dos
especialistas envolvem unidades maiores de conhecimento e altamente interconectadas, já os
esquemas dos novatos envolvem unidades de conhecimento relativamente pequenas e
superficiais, porém, na visão da pesquisadora, com grande possibilidade de crescimento. Logo
abaixo apresentamos as habilidades encontradas em profissionais e estudantes no quadro
comparativo.
PROFISSIONAIS ESTUDANTES

Habilidade perceptiva das diferentes memórias XXXXXXX


que interagem numa execução: mental, auditiva,
visual, digital e tátil
Habilidade de preparação Habilidade de preparação
Habilidade de ensaio Habilidade de ensaio

Habilidade de avaliação musical Habilidade de avaliação musical


Habilidade da repetição consciente XXXXXXX

Habilidade técnica Habilidade técnica


Habilidade interpretativa Habilidade interpretativa
Habilidade de memorização Habilidade de memorização

Habilidade de concentração Habilidade de concentração


Habilidade de performance musical Habilidade de performance musical

Habilidade pedagógica XXXXXXX


XXXXXXX Habilidade de pensamento positivo

Quadro 1: Quadro das Habilidades utilizadas antes, durante e pós-recital pelos sujeitos da pesquisa

Por sua vez, a estratégia, segundo Sloboda (2008), consiste em quebrar a habilidade a
ser aprendida em um conjunto de componentes que podem ser adquiridas passo a passo. O
músico que tem prática e experiência em uma habilidade particular tem qualificação para
pensar em esquemas de treinamento, por isso há muitas maneiras possíveis de segmentar uma
atividade, ou definir estratégias de acordo com as necessidades de cada um. É mais
importante a assimilação do princípio de segmentação que a imposição de algum esquema
como o melhor de todos (Sloboda, 2008).
Jorgensen (2004) aponta três fases de aprendizagem para uma prática instrumental
eficaz: 1) Planejamento e preparação; 2) Execuções da prática; 3) Observação e avaliação. As

438
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

respectivas fases de prática são entrelaçadas e cíclicas, ou seja, não há uma hierarquia entre
elas, mas constantes reelaborações e feedback. Sendo assim, o planejamento da aprendizagem
é constituído de tentativas e erros. É impossível planejar um treinamento ideal, pois isso
dependerá das competências que o indivíduo adquire. Cada instrumentista, seja aluno ou
profissional, tem seu tempo e forma de aprender (Sloboda, 2008). Semelhantemente ao
quadro anterior, apresentamos abaixo o quadro comparativo das estratégias encontradas tanto
em profissionais como em estudantes.

PROFISSIONAIS ESTUDANTES

Estratégia de planejamento de estudo Estratégias de planejamento de estudo


Estratégia de amadurecimento do repertório Estratégia de amadurecimento do repertório
Estratégia para manter o interesse no repertório XXXXXXX

Estratégia de reelaboração da interpretação musical Estratégia de reelaboração da interpretação musical


XXXXXXX Estratégia de recuperação

Estratégia de simulação do recital Estratégia de simulação do recital (pseudoaudição)


Estratégia de gravação durante ensaios XXXXXXX
Estratégias de amenização da ansiedade Estratégias de amenização da ansiedade

Estratégia de concentração XXXXXXX


Estratégia de relaxamento XXXXXXX

Estratégia de administração do tempo XXXXXXX


XXXXXXX Estratégia cognitiva
XXXXXXX Estratégia para estabelecer objetivos e metas

Quadro 2: Quadro das Estratégias utilizadas antes, durante e pós-recital pelos sujeitos da pesquisa

Ao fazer um cruzamento dos questionários com a entrevista após o recital relatamos os


sintomas apresentados durante o recital em estudantes e profissionais. Segundo Valentine
(apud Cunha, 2013), os sintomas foram de origem fisiológica (por exemplo, frio no
estômago), cognitivo: (insegurança) e comportamental (por exemplo, tremor). Não obstante,
os estudantes relataram que esses sintomas foram mais evidentes antes de entrar no palco e
durante a execução. Os profissionais, por sua vez, relataram sintomas diferentes: o aumento
gradual da tranquilidade à medida que se aproxima o evento; preocupação e ansiedade para
iniciar o recital e leve apreensão, preocupação. De modo geral, constatou-se que os sintomas
nos profissionais foram menos intensos que os estudantes.

439
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Considerações Finais
A metodologia utilizada na pesquisa consistiu em uma abordagem qualitativa, a qual
enfatizou mais o processo que o produto e deu significado ao fenômeno na perspectiva dos
participantes. O método utilizado foi o estudo multicaso, em que os participantes envolvidos
foram divididos em dois grupos: grupo 1, estudantes e grupo 2, profissionais. As técnicas de
coleta de dados foram entrevista semiestruturada, roteiro de estudo nas dez semanas
antecedentes ao evento, questionário de comportamento e de ansiedade e gravação dos
recitais.
Dos instrumentos citados, apenas os roteiros tiveram certa resistência por parte de
alguns participantes. Julgamos que uma das causas foi o tempo que tomaria e a falta de
disposição para o preenchimento. Outros motivos justificados foram o tempo escasso por
conta de trabalho e visão comprometida; um dos estudantes não devolveu os roteiros nem
justificou o motivo.
Na intenção de verificar a percepção dos sujeitos sobre comportamento antes do recital
e os sintomas durante a execução, escolhemos os questionários de comportamento e
ansiedade. Este questionário permitiu termos uma dimensão mais objetiva da mudança de
comportamento e de sentimento, na semana do recital, dos sintomas de ansiedade que já
estavam atuando. O questionário de ansiedade, por sua vez, permitiu verificarmos os sintomas
de ansiedade encontrados no pianista no momento do recital. As entrevistas após o recital e o
questionário, métodos aplicados posteriormente ao palco, foram instrumentos eficazes a fim
de apresentarmos os sintomas de ansiedade presentes no momento da performance.
Valendo-nos da análise dos dados, inferimos que tanto estudantes como profissionais
sentiram ansiedade antes e durante a performance. Apesar de interferir minimamente no
desempenho, não foi motivo impeditivo da execução, por isso a ansiedade atuou de forma
positiva; descobrimos que os sujeitos utilizaram habilidades e desenvolveram estratégias mais
convenientes para cada um, as quais possibilitaram a amenização do medo de palco de forma
direta ou indireta.

Referências
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educacional. Brasília: Líber Livro editora.
BARDIN, Laurence. (2010). Análise de conteúdo. 5. ed. Lisboa, Portugal: Edições 70.
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Escala de Ansiedade-Traço do IDATE. Aval. psicol., v. 5, n. 2, dez. Porto Alegre.
Extraído de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677>

440
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

FREIRE, Vanda Bellard, (org.). (2010). Horizontes da pesquisa em música. Rio de


janeiro: 7letras.
JORGENSEN, Harald.(2004). Strategies for individual practice. In: WILLIAMON, Aaron.
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York: Oxford University press.
KAIPPER, Marcia Balle. (2008). Avaliação do inventário de ansiedade traço-estado (IDATE)
através da análise de Rasch.. 138f (Dissertação de mestrado). Faculdade de medicina,
UFRGS: Porto Alegre. Extraído de <http://hdl.handle.net/10183/17463>
SLOBODA, John A. ( 2008) Aprendizagem musical e desenvolvimento: Treinamento e
aquisição de habilidades. In: A mente musical: A psicologia cognitiva da música. [Trad.
[Beatriz Ilari e Rodolfo Ilari]. pp. 284-314. Londrina: EDUEL.
STERNBERG, Robert J. (2008). Psicologia cognitiva; trad. Roberto Cataldo Costa.
4.ed. Porto Alegre: Artmed.
YIN, Robert K. (2010). Estudo de caso: planejamento e métodos. [Trad. Ana Thorell] 4. Ed.
Porto Alegre: Bookman.

441
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Motivação no ensino coletivo de violão

Dayane Battisti
Universidade Federal do Paraná - UFPR
daya_battisti@hotmail.com

Rosane Cardoso de Araújo


Universidade Federal do Paraná - UFPR
rosanecardoso@ufpr.br

Resumo: O ensino coletivo de instrumentos musicais apresenta vantagens como a democratização do


acesso, a interação entre os alunos, o ambiente lúdico, a cooperação, a motivação, entre outros. Assim,
neste estudo, o objetivo geral foi investigar a motivação para aprender violão em grupo com alunos
iniciantes no instrumento. A metodologia utilizada foi uma Survey de pequeno porte com aplicação de
questionário. Participaram da pesquisa 21 alunos de violão em grupo de uma instituição da cidade de
Curitiba-PR. Foram 14 alunos do gênero masculino e 7 do gênero feminino, a maioria entre 9 e 14
anos. Neste recorte são apresentados os resultados e discussões das questões sobre a motivação dos
alunos para aprender violão, sua opinião sobre as aulas em grupo e sobre o repertório das aulas.
Palavras-chave: motivação, pedagogia musical, aprendizado, ensino coletivo, violão.

Motivation in collective guitar teaching


Abstract: Group instrumental teaching shows advantages such as democratization of the access to
the information, interaction among students, playful environment, cooperation, motivation and so
forth. The target of this study was to investigate the motivation to learn how to play guitar in-group.
The methodology used was a small survey made by the use of a questionnaire. Twenty-one guitar
students from an institution located in Curitiba (Brazil) took part in the research. The research
participants were 12 male students and 7 female students, most from 9 to 14 years old. In this section,
we present the results and discussions of the questions about students' motivation to learn guitar, their
opinion about the group classes and about the class repertoire.
Key words: motivation, music pedagogy, learning, collective teaching, guitar.

O presente artigo é um recorte da dissertação de mestrado1 cujo tema foi a aprendizagem do


violão por meio do ensino coletivo, com foco nos processos motivacionais. Assim, o objetivo
para este texto é apresentar parte dos resultados e discussões do estudo desenvolvido,
especificamente os dados sobre a motivação dos alunos para aprender violão, considerando
suas opiniões sobre as aulas em grupo e sobre o repertório ensinado nas aulas.
A relação entre a motivação para aprender e o contexto do ensino coletivo de
instrumentos tem sido investigada por diversos pesquisadores (Cruvinel, 2003, Caetano, 2012,
Dantas, 2010, Tourinho, 1995, para citar alguns). De acordo com Cruvinel (2004, p. 34), no
ensino coletivo de instrumentos musicais “o resultado musical ocorre de maneira rápida,
motivando os alunos a darem continuidade ao estudo do instrumento”. Já sobre a motivação

1 Dissertação de mestrado defendida em 26 de fevereiro de 2016, com título Um estudo sobre as


crenças de autoeficácia no ensino coletivo de violão. Extraído de: http://acervodigital.ufpr.br/handle/
1884/44070.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

do aluno para a aprendizagem no contexto coletivo, Dantas (2010, p. 411) destaca os


seguintes elementos: “(...) a oportunidade de aprender em conjunto, o fato de sentir-se parte
de um grupo musical, a atuação e o estímulo do professor, e a sonoridade do grupo”.
A metodologia utilizada na pesquisa foi uma survey de pequeno porte. Participaram da
pesquisa 21 alunos de violão em grupo de uma instituição da cidade de Curitiba-PR. Foram
14 alunos do gênero masculino e 7 do gênero feminino, a maioria entre 9 e 14 anos. Neste
texto, portanto, são apresentados os resultados e análises referentes às questões 5, 6 e 7 do
questionário aplicado. Tais questões focaram nos seguintes pontos: a motivação para a escolha
do instrumento; a opinião sobre a aprendizagem do violão em aulas coletivas; e a opinião
sobre o repertório estudado em grupo na relação com a motivação geral do estudante.

Motivação para aprender violão


Na questão 5, os participantes foram questionados sobre os motivos que os levaram a decidir
aprender violão e na sequência foi apresentada uma série de alternativas com respostas ligadas
à motivação intrínseca (MI) e extrínseca (ME) ou amotivação (AM), e os alunos podiam
assinalar mais de uma alternativa.
O motivo mais recorrente nas respostas dos alunos foi gostar de música, sendo que
76% (N=16) dos alunos assinalaram este motivo; 52% (N=11) responderam ter intenção de
aprender novas habilidades; 48% (N=10) assinalaram que decidiram aprender a tocar violão
por ser divertido; e 48% (N=10) responderam que a motivação para aprender a tocar violão
estava relacionada com o gosto pelo som do instrumento. Os demais motivos podem ser
observados na Figura 1:

Figura 1: Motivos para aprender violão (dados da pesquisa)

443
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

O primeiro motivo para aprender violão, assinalado por 76% dos alunos (N=16), é
“porque eu gosto de música”. Esse resultado foi ao encontro dos resultados encontrados por
Rosa (2015) em sua pesquisa sobre a motivação de adolescentes para o aprendizado de violão.
Araújo (2015, p. 53) constata que “o envolvimento com a música e com as outras artes em
geral é considerado, em senso comum, sempre prazeroso, agradável e de forte caráter
intrínseco”. Apesar desta ideia não ser sempre uma premissa, pois o aprendizado de um
instrumento musical envolve empenho e motivação, ela pode ser relacionada com o motivo
mais citado pelos alunos, que decidem aprender a fazer algo que gostam.
O segundo motivo, assinalado por 52% dos alunos (N=11), foi “porque quero aprender
novas habilidades”. Esta motivação para aprender novas habilidades está relacionada com um
aspecto teórico da motivação denominado necessidade por competência, formulado por Deci
& Ryan (1985). De acordo com os autores: “a cada nova aquisição de habilidade existe um
espaço para se divertir exercitando essa nova habilidade, mas o tédio logo se instala quando o
sujeito simplesmente exercita a mesma habilidade repetidas vezes” (Deci & Ryan, 1985, p.
27).
Em terceiro lugar, foram encontrados os mesmos resultados numéricos para as
respostas “porque é divertido” e “porque eu gosto do som do violão”, sendo que cada um
deles foi indicado por 48% dos alunos (N=10). Analisando a indicação “porque é divertido”
pode-se comparar à pesquisa de Palheiros (2006, p. 320) com crianças britânicas e
portuguesas, na qual a autora também constatou que “algumas crianças referiram razões não
musicais como socializar com os colegas e a música ser ‘divertida’ e ‘fácil’”.
Os que assinalaram a questão “outros” corresponderam a 29% dos respondentes
(N=6). Para os “outros” motivos, os participantes deram as seguintes justificativas:

Quero tocar quase tudo (Q3, M, 10 anos);


Eu gostaria de aprender a tocar mais de um instrumento (Q9, M, 12 anos);
Gosto de me expressar e tocar violão é uma forma de fazer isso (Q11, M, 13 anos);
Porque sou atriz e quero ter um diferencial (Q18, F, 33 anos);
Recomendação de psicóloga (Q19, M, 32 anos).

Observa-se que a maior parte dos “outros” motivos citados pelos alunos também estão
ligados a motivação intrínseca, com exceção do motivo de “recomendação de psicóloga”.

444
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Opinião dos alunos sobre as aulas em grupo


A sexta questão foi sobre a opinião dos alunos a respeito das aulas em grupo, nas seguintes
palavras: “O que você acha de ter aulas de violão em grupo?”. A seguir, foram transcritas as
respostas de cada aluno e, observando a recorrência de palavras e assuntos nas respostas dos
alunos, foi possível agrupá-las em quatro diferentes categorias: (1) legal; (2) aprender com os
outros; (3) compartilhar/tocar com/para os outros; (4) preferia individual.

Figura 2: Opinião dos alunos sobre as aulas em grupo (dados da pesquisa)

445
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

De forma geral, a opinião dos alunos sobre as aulas em grupo foi positiva. Na primeira
categoria estão agrupadas as respostas ligadas a palavra “legal”, onde alguns responderam
muito legal, bom, divertido e em quase todas as respostas agrupadas nas outras categorias
também existe alguma referência positiva como bom, ótima, interessante, importante. Esta
opinião positiva se relaciona com um dos motivos mais assinalados da questão anterior, onde
os alunos assinalaram que decidiram aprender violão “porque é divertido”. Desta forma o
ambiente lúdico, aparece na opinião dos alunos sobre as aulas em grupo.
Seis dos alunos, ao expor sua opinião sobre as aulas em grupo, citaram de alguma
forma a experiência vicária de observar o outro e aprender com ele, por isso foram agrupados
na categoria “aprender com os outros”. Azzi (2014, p. 36) explica que dentro da Teoria Social
Cognitiva, o que Bandura denominou Efeito Modelador ou Aprendizagem por Observação
“relaciona-se com a aquisição de comportamentos novos, os quais a pessoa não apresentava
ou que tinham probabilidade quase nula de ocorrência”. A autora continua explanando que
“em situações de aprendizagem, o modelo ou o sujeito que está sendo observado exibe
comportamentos que o observador não possuía, mas que, após a situação de aprendizagem,
passa a ter condição de reproduzir” (Azzi, 2014, p. 36). No contexto do ensino coletivo, além
do modelo do professor, os alunos encontram também os modelos de seus pares e suas
respostas demonstram que eles têm consciência da presença dos modelos e que podem
aprender com eles.
Outros seis alunos citaram palavras como compartilhar, tocar com os outros ou para os
outros. Esta categoria foi chamada de “compartilhar/tocar com/para os outros”. O ambiente de
ensino coletivo proporciona um espaço de compartilhamentos, onde além de poderem tocar
juntos, é muito comum um aluno tocar para o outro ver, mostrando algo que aprendeu e
motivando o outro a tocar também. Neste sentido, Dantas (2010, p. 406) constatou que “para
os estudantes o fator que mais contribui para a motivação no processo de aprendizagem é a
interação no grupo” e Santayana (2012, p.27) argumenta que “as aulas coletivas geraram nos
alunos certo estímulo ao perceber que mesmo sendo iniciante no instrumento é possível fazer
música e se sentir integrante de um grupo”.
Na resposta de outro aluno de 9 anos, é possível perceber a referência à sonoridade do
grupo: “É ruim tocar sozinho e bom tocar com alguém tem mais som”. A sonoridade também
apareceu em um dos motivos mais assinalados pelos alunos para o aprendizado do
instrumento: “porque gosto do som do violão”. Outros autores também encontraram em suas
pesquisas a indicação de que a sonoridade obtida no grupo é um fator relevante e estimulante

446
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

na experiência da prática musical coletiva, como Cruvinel (2003), Dantas (2010) e Caetano
(2012).
Mesmo manifestando opiniões positivas, dois alunos comentaram que preferiam aulas
individuais. Um aluno de 13 anos disse: “Eu acho bom, mas preferia sozinho”; e uma aluna de
33 anos opinou: “Acho tranquilo, mas particular é sempre melhor”. Ainda que sejam uma
minoria, a opinião destes alunos reflete a preferência deles pela aula individual, que Tourinho
(2007) denominou como “mito” da atenção exclusiva, isto é, a ideia de que a aula individual é
sempre melhor por ter a atenção exclusiva do professor.

Opinião dos alunos sobre o repertório das aulas


A sétima pergunta foi enunciada da seguinte maneira: “O que você acha das músicas que está
aprendendo a tocar?”. A seguir, as respostas de cada participante foram transcritas agrupadas
em três categorias: (1) legais/boas/divertidas; (2) legais porque eu escolhi; (3) fácil/difícil:

Figura 3: Opinião dos alunos sobre o repertório das aulas (dados da pesquisa)

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

As respostas dos alunos foram agrupadas por semelhança e proximidade semântica e a


maior parte das respostas (N=14) foi enquadrada na primeira categoria: “legais/boas/
divertidas”. As demais respostas também se encaixariam nesta categoria, porém, foram
criadas outras duas categorias para as respostas que mencionaram a escolha do repertório e
questões sobre facilidades/dificuldades de execução. De forma geral, a opinião dos alunos
sobre o repertório que estavam aprendendo foi muito positiva, nenhum deles respondeu não
gostar das músicas. Tourinho (1995) e diversos outros autores (Cruvinel, 2003; Caetano,
2012; Santayana, 2012; Rosa, 2015) convergem para a importância do repertório de interesse
dos alunos como fator motivador para a aprendizagem e nas respostas de alguns alunos surgiu
a questão de escolha das músicas.
A última categoria engloba opiniões que a princípio podem parecer opostas, visto que
um aluno considera alguns acordes difíceis enquanto outros dois acharam as músicas fáceis.
As respostas foram agrupadas na mesma categoria pelo fato de citarem o mesmo fator que é o
nível de dificuldade das músicas.

Conclusão
Ao buscar compreender os fatores de motivação dos alunos para aprendizagem musical,
vários dados foram encontrados por meio deste estudo. Sobre os motivos para aprender violão
observa-se que estavam, em sua maioria, relacionados à motivação intrínseca, onde a escolha
pelo aprendizado do instrumento ocorre por sua própria causa, sem pressões externas
(Guimarães, 2009).
Já as opiniões dos participantes sobre as aulas em grupo, a maior parte dos alunos
afirmou achar legal e divertido. Alguns citaram a possibilidade de aprender com os outros, de
compartilhar as músicas tocando junto com o grupo e de ajudar e ser ajudado. Estas respostas
se relacionam com as experiências vicárias dos alunos e no contexto do ensino coletivo, além
do modelo do professor, os alunos encontram também os modelos de seus pares e suas
opiniões demonstraram que eles tinham consciência da presença dos modelos e que podiam
aprender com eles. Apenas dois alunos afirmaram que preferiam aulas individuais e essa
opinião reflete um certo preconceito que ainda existe sobre o ensino coletivo de instrumentos
musicais, onde prevalece a ideia de que a aula individual é melhor por ter a atenção exclusiva
do professor (Tourinho, 2007).
Por fim, foi possível constatar que todos os alunos afirmaram gostar das músicas que
estavam aprendendo a tocar e a participação na escolha do repertório apareceu na fala de

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

alguns alunos, denotando a preocupação do professor em trabalhar um repertório que


agradasse as turmas e, consequentemente, aumentasse a oportunidade de manter o processo
motivacional ativo.
Como conclusão deste estudo, entende-se que os   resultados encontrados
apontaram   para a relevância das relações entre aulas coletivas de violão e o processo
motivacional do aluno, considerando que no ensino coletivo de instrumentos musicais: (a)
existe um ambiente de troca de experiências, onde os alunos têm a oportunidade de aprender
em conjunto, tanto com o professor como com os colegas; (b) o resultado musical ocorre de
maneira rápida; (c) a sonoridade do grupo muitas vezes pode ser mais interessante para o
aprendiz; e (d) a escolha do repertório é um fator relevante para a motivação nesta
modalidade de ensino.

Referências
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449
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

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450
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Avaliando habilidades musicais e linguísticas em crianças nos estágios iniciais


da alfabetização de escolas públicas brasileiras

Guilherme Alves Delmolin de Oliveira


Programa de Pós-Graduação em Neurociência e Cognição – UFABC
guiharris@gmail.com

Olga Valéria Campana dos Anjos Andrade


União Nacional das Instituições de Ensino Superior Privadas
olguinhavandrade@yahoo.com

Paulo Estêvão Andrade


Department of Psychology, Goldsmiths University of London
paulo_sustain@yahoo.com

Patricia Maria Vanzella


Núcleo Interdisciplinar de Neurociência Aplicada – UFABC, Departamento de Música – UnB
pvanzella@yahoo.com

Resumo: Um estudo anterior encontrou correlações positivas entre o desempenho em uma tarefa de
transcrição de sequências musicais (MSTT) e habilidades de processamento fonológico e leitura em
crianças brasileiras de classe média-alta (Zuk, Andrade, Andrade, Gardiner, & Gaab, 2013). O presente
estudo investigou a aplicabilidade da MSTT em uma amostra de alunos de escolas públicas. 73 alunos (35
meninas), sem treinamento musical formal fora da escola, completaram testes cognitivo-linguísticos, a
MSTT e tarefas da Bateria de Avaliação de Habilidades Musicais de Montreal (MBEMA) cuja tarefa
melódica requer a discriminação tonal fina. A consciência fonológica (r = .438, p = .000354, p <.001) e a
fluência de leitura (r = .312, p = .0151, p = .01) se correlacionaram fortemente com a MSTT, mas não se
correlacionaram com as tarefas da MBEMA. Estes resultados sugerem que a MSTT, por não requerer
discriminação tonal fina, poderia, diferentemente da MBEMA, envolver um processamento auditivo
sequencial relevante para a linguagem e funções executivas. Novos estudos poderiam avaliar o uso desta
tarefa na identificação precoce de crianças com risco para dislexia.
Palavras-chave: Desenvolvimento cognitivo, Avaliação, Percepção auditiva.

Title: Evaluating musical and linguistic abilities in children in the early stages of literacy in
Brazilian public schools
Abstract: A previous study showed positive correlations between performance in a task of transcription of
musical sequences (MSTT) and phonological processing as well as reading skills in Brazilian upper-
middle-class children (Zuk et al., 2013). The present study investigated the applicability of MSTT in a
sample of public school students. 73 students (35 girls), without formal music training outside of school,
completed cognitive-linguistic tests, the MSTT and tasks of the Montreal Battery for Evaluation of
Musical Abilities (MBEMA).   Unlike the MBEMA, the   MSTT does not require fine tonal
discrimination. The phonological awareness (r = .438, p = .000354, p <.001) and reading fluency (r = .
312, p = .0151, p = .01) correlated strongly with MSTT, but did not correlated with MBEMA tasks. These
results suggest that MSTT,   but not MBEMA, could involve sequential auditory processing relevant to
language and executive functions. New studies could evaluate the use of this task in the early
identification of children at risk for dyslexia.
Keywords: Cognitive development, Evaluation, Auditory perception.

451
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

1. Introdução
O estudo da Cognição Musical apresenta interdisciplinaridade entre diversas áreas da
Neurociência e Ciências Cognitivas (Zatorre, 2005). Um estudo recente apontou correlações entre
o desempenho em uma tarefa de percepção musical e domínios cognitivos da linguagem
relacionados à leitura em crianças em estágios iniciais da alfabetização (Zuk et al., 2013). Há
evidências também de que o treinamento musical facilita o processamento fonológico e
correlaciona-se positivamente a habilidades de leitura (Gardiner, Fox, Knowles, & Jeffrey, 1996;
Moritz, Yampolsky, Papadelis, Thomson, & Wolf, 2013). Estudos de neuroimagem corroboram
associações entre treinamento musical e processamento da linguagem em crianças e adultos
(Jentschke, Koelsch, & Friederici, 2005; Wong, Skoe, Russo, Dees, & Kraus, 2007). Em crianças,
o treinamento musical também demonstrou facilitar o processamento subcortical de expressões
da fala durante a leitura (Strait, Hornickel, & Kraus, 2011), ressaltando a importância do
treinamento musical durante os estágios iniciais da aprendizagem infantil.
A dislexia é um transtorno neurológico de origem genética (Peterson & Pennington, 2012)
que apresenta seus sintomas durante o início da alfabetização. Seu diagnóstico, contudo, pode
levar vários anos para ser realizado e baseia-se na discrepância entre os scores de QI verbal e QI
não-verbal. Mesmo que a criança apresente dificuldades claras desde o início da aprendizagem de
leitura, é necessário aguardar até o terceiro ano (ou ainda mais tarde) para que o diagnóstico de
dislexia seja efetivamente concluído (Andrade, Andrade, & Capellini, 2015). Neste cenário, a
Resposta à Intervenção surge como possibilidade de uma nova prática diagnóstica. Trata-se de
um processo orientado através de três níveis de atenção que visa a triagem e a intervenção focal
com os participantes não-respondentes às ações interventivas no ensino da leitura e escrita
((Andrade et al., 2015; Fuchs & Fuchs, 2006). A identificação precoce do risco para que uma
criança apresente dificuldades de aprendizagem pode ser amenizada através de atenção
individualizada e de intervenções que amenizem sofrimentos futuros. Scarborough (1998)
indicou que comportamentos de risco para dificuldades de leitura podem ser identificados ainda
na pré-escola. Atualmente diversas ferramentas de triagem para crianças com dificuldades de
leitura buscam investigar deficiências no processamento auditivo, cognitivo e linguístico,
principalmente no processamento de fonemas, percepção, produção e compreensão da fala (Flax,
Realpe-Bonilla, Roesler, Choudhury, & Benasich, 2008). Crianças com dificuldades de leitura
também possuem déficits no processamento fonológico em rimas, aliterações e na identificação

452
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

sutil de mudanças entre palavras apresentadas oralmente (Bradley & Bryant, 1978) assim como
déficits em discriminação auditiva temporal, percepção e produção rítmica (Tallal, 2004;
Thompson, Russo, & Quinto, 2008; Thomson & Goswami, 2008). A discriminação de estruturas
métricas musicais, empregadas na distinção entre ritmos, apresenta diferenças singulares entre
crianças com e sem dificuldades de leitura (Goswami, Huss, Mead, Fosker, & Verney, 2013).
Tarefas baseadas em música têm se mostrado eficientes como ferramentas para melhorar a
leitura e a ortografia (Santos, Joly-Pottuz, Moreno, Habib, & Besson, 2007) bem como para
identificar precocemente crianças com risco de apresentarem transtorno no processo de
alfabetização (Zuk et al., 2013). A Tarefa de Transcrição de Sequencias Musicais (MSTT),
desenvolvida nesse último estudo,
[...] visa investigar se a relação entre a percepção musical e habilidade de leitura é válida
para uma tarefa de discriminação musical composta pelo sequenciamento isocrônico de
sons e pela discriminação dos acordes que, adicionalmente, preservem a validade
ecológica da experiência musical. (Zuk et al., 2013, p. 2).

No presente trabalho usamos a MSTT, para avaliar se essa tarefa musical estaria associada
a diferentes domínios cognitivos - avaliados através de tarefas da Bateria Montreal de Avaliação
Habilidades Musicais (Montreal Battery for Evaluation of Musical Abilities, MBEMA - Peretz et
al., 2013) e do Protocolo de Avaliação de Habilidades Cognitivo-Linguísticas (PAHCL - Capellini
& Smythe, 2012). Adicionalmente, também investigamos se os resultados prévios de Zuk et al.
(2013) seriam replicáveis em alunos de escolas públicas. A replicação dos resultados em distinto
contexto socioeconômico traria mais uma indicação da possibilidade de utilização de forma
ampla de uma tarefa musical como ferramenta de identificação precoce para o risco de
transtornos da aprendizagem.

2. Métodos
2.1 Participantes
Uma amostra de 73 alunos, com idade entre 7,3 a 11,5 anos, regularmente matriculados no 2º e 3º
ano do ensino fundamental, sem treinamento musical formal fora da escola, completaram tarefas
do PAHCL, a versão abreviada da MBEMA e a tarefa MSTT. Dentre esses 73 participantes, 37
estavam matriculados no 2º ano (média de idade= 8 anos e 5 meses, DP= 8 meses, 17 meninas) e
36 no 3º ano (média de idade= 8 anos e 10 meses, DP= 4 meses, 18 meninas). Participaram do
estudo apenas os alunos sem deficiência sensório-motora (surdez, cegueira), sem transtornos

453
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

neurodesenvolvimentais (psicoses, autismo), com domínio adequado da sua língua materna e,


finalmente, que receberam permissão de seus pais. Este projeto foi aprovado pelo Comitê de
Ética em Pesquisa da Universidade Federal do ABC.

2.2 Procedimentos
A coleta de dados ocorreu ao longo do segundo semestre do ano-calendário acadêmico durante o
horário escolar. As tarefas musicais MBEMA e MSTT foram aplicadas coletivamente enquanto as
tarefas do PAHCL foram aplicadas individualmente em alunos de quatro salas de aula, duas do 2º
ano e duas do 3º ano.

2. 3 Descrição dos Instrumentos


2.3.1 Tarefas do Protocolo de Avaliação de Habilidades Cognitivo-Linguísticas (PAHCL)

2.3.1.1 Fluência na leitura


Mede-se pelo número de palavras lidas em voz alta pelo aluno em 1 minuto de uma lista de
70 palavras. Se a leitura de todas as 70 palavras durar menos de 1 minuto, o número de palavras
corretamente lidas é estimado por 1 minuto. Assim, a pontuação máxima depende, em última
instância, da velocidade de leitura da criança.

2.3.1.2 Consciência fonológica


Aliteração: Três palavras são faladas pelo examinador e, em seguida, a criança deve indicar
duas (entre essas três palavras) que começam com o mesmo som. Após três sequências-treino,
inicia-se o teste (que consta de dez sequências de três palavras; pontuação máxima possível: 10).
Rima: Três palavras são faladas pelo examinador e, em seguida, a criança deve indicar duas
(entre essas três palavras) que terminam com o mesmo som. Após três sequências-treino, inicia-se
o teste (que consta de 20 sequências de três palavras; pontuação máxima: 20).
Segmentação silábica: O examinador fala uma palavra e a criança deve repetir a palavra
falada enquanto bate com o dedo na mesa em cada sílaba. A segmentação silábica correta de 20
palavras leva a uma pontuação máxima possível.

454
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

2.3.2 Bateria de Montreal de Avaliação de Habilidades Musicais (MBEMA, versão abreviada)


A versão abreviada da Bateria de Montreal de Avaliação de Habilidades Musicais (MBEMA) é
composta por dois testes, Melodia e Ritmo, cada um com 20 itens. Cada item é composto por
duas melodias separadas por um intervalo de 1 segundo. No teste de Melodia, as sequências
apresentaram mudanças em escala, contorno ou intervalo. Já no teste de Ritmo as sequências
apresentaram apenas alterações de figura rítmica, sem alterações melódicas. As crianças devem
ouvir atentamente às duas melodias e decidirem se estas são iguais ou diferentes e, na sequência,
assinalar um X na coluna “IGUAL” e/ou “DIFERENTE” em uma Folha de Resposta.

2.3.3 Tarefa de Transcrição de Sequência Musical (MSTT)


As sequências da MSTT consistem em quatro sons isócronos compostos por duas díades
diferentes (dois intervalos harmônicos), uma no registro grave [um intervalo de uma quinta justa,
com frequências fundamentais 110Hz (A) e 165Hz (E)] e o outra no registro agudo [uma quarta
justa, com frequências fundamentais de 330Hz (E) e 440Hz (A)] que as crianças aprendem a
codificar como os sons "grosso" e "fino", respectivamente (para mais detalhes ver Zuk et al.,
2013). Neste estudo os estímulos foram sintetizados digitalmente usando o Guitar Pro 6 (Arobas
Music, Lille, França) em timbre de violão. Vinte sequências de quatro sons foram apresentadas de
forma lenta (88bpm) e isócrona. As crianças foram instruídas a codificar ("desenhar") cada uma
das sequências de quatro sons em símbolos visuais usando uma linha vertical "|" para um som
fino (o intervalo mais agudo, de quarta justa) e um círculo "O" para o som grosso (o intervalo
mais grave, de quinta justa). Por exemplo, uma dada sequência de sons “agudo, agudo, grave,
agudo” seria corretamente codificada como: “ | | O | ”. A Figura 1 apresenta a transcrição de
quatro sequências e suas respectivas respostas corretas a serem codificadas e respondidas pelas
crianças. Houve uma sessão de treinamento antes da aplicação do protocolo experimental.

Figura 1: Transcrição de quatro sequências e respectivas respostas corretas a serem codificadas pelas crianças.
Um círculo "O" para o som grave e uma linha vertical "|" para um som agudo.

455
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Apenas sequências transcritas precisamente com quatro sons e na ordem correta foram
consideradas corretas (um ponto). Quando menos de quatro sons eram transcritos em uma dada
sequência, considerou-se uma resposta insuficiente (IR). Quando mais de quatro sons eram
transcritos em uma dada sequência, considerou-se uma resposta supérflua (RS). As respostas
insuficientes e supérfluas não pontuavam.

2.4 Análise estatística


As médias e desvios-padrão foram calculados para o grupo todo em cada uma das avaliações.
Para investigar a extensão e natureza das relações entre MSTT e avaliações cognitivas e
linguísticas, foram implementadas correlações controlando pela idade através do software SPSS
versão 20.0 (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA) para Windows. Estes procedimentos estatísticos
buscaram esclarecer a extensão e a natureza das relações das capacidades musicais com as
medidas cognitivas e linguísticas.

3. Resultados
As pontuações obtidas nas tarefas Aliteração, Rima e Segmentação silábica foram somadas para
representar a variável Consciência Fonológica (PA). As tarefas de nomeação rápida de figuras e
de números foram somadas para representar a variável Nomeação Automática Rápida (RAN). A
Tabela 1 fornece médias e desvios-padrão nas tarefas musicais e cognitivo-linguísticas. Alguns
valores de DP são elevados porque, mantemos os valores abertos na análise, uma vez que este
estudo foi realizado em um contexto de uso de ferramentas coletivas de rastreamento para
identificar crianças em risco do surgimento de problemas de aprendizagem.

Tabela 1. Médias (DPs) nas Tarefas Musicais e Cognitivas-Linguísticas

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Correlações
Na Tabela 2, as correlações corrigidas por Bonferroni nas tarefas musicais com habilidades
linguísticas revelaram que a MSTT estava mais fortemente correlacionada com a Consciência
Fonológica (r = .438, p = .000354, p <.001) e a Fluência de Leitura (r = .312, p = 0,0151, p =
0,01). Como pode ser observado na Tabela 2, a MSTT também mostrou uma correlação
importante com a Ordem de Figuras (r = .362, p = .0036, p <0,05). Em contraste, as habilidades
melódicas e de ritmo medidas pelo MBEMA abreviado não mostraram nenhuma correlação
significativa com o domínio verbal.

Tabela 2. Correlações corrigidas de Holm-Bonferroni, entre a idade e as tarefas musicais e cognitivo-

linguísticas.

Por outro lado, os resultados sugerem que a MSTT parece ser única em relação as tarefas
da MBEMA, visto que foi correlacionada com medidas verbais (leitura e processamento
fonológico). Estes fatores mostraram ser dimensões cognitivas distintas na literatura,
particularmente as dimensões verbal e não-verbal (Carrol, 1992; Neisser et al., 1996). Este
resultado sugere que a MSTT poderia envolver processamento sequencial relevante para a
linguagem e funções executivas, o que é consistente com a natureza da tarefa que exige atenção,
memória de trabalho, processamento de sequenciamento auditivo.

Conclusões
Foram encontradas associações significativas entre a tarefa musical MSTT e as habilidades
linguísticas, especificamente nas tarefas de leitura e processamento fonológico. Relações entre a

457
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

percepção musical e o processamento fonológico foram reportados na literatura e corroboram


com estes achados (Anvari, Trainor, Woodside, & Levy, 2002; Moritz, Yampolsky, Papadelis,
Thomson, & Wolf, 2013). Em contraste, as tarefas da MBEMA não se correlacionaram com o
processamento fonológico e a leitura. Essa diferença ocorreu porque, diferentemente da
MBEMA, a MSTT foi projetada para evitar o processamento tonal fino e envolver
preferencialmente (ou talvez seletivamente) mecanismos dedicados ao processamento de padrões
sequenciais, um mecanismo básico provavelmente compartilhado entre música e linguagem,
domínios que podem ser pensados como sequências sonoras padronizadas e hierarquicamente
estruturadas, cuja análise requer a computação de relações estruturais inerentes (Koelsch e Siebel,
2005, Fedorenko et al, 2009). Outra importante contribuição do presente trabalho foi mostrar a
aplicabilidade da MSTT em escolares da rede pública municipal e, portanto, em outros contextos
socioeconômicos. Por fim, estes dados contribuem com o uso de tarefas coletivas para a
identificação precoce de crianças em risco para dislexia. Futuras investigações poderiam
comparar o desempenho de alunos de escola pública e privada.

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459
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Considerações sobre questões estéticas nas aulas de trombone: estudo de 4


casos em universidades brasileiras

Marcos Botelho
UFBA/UFG
trombone@globo.com

Resumo: O presente trabalho reflete sobre as questões estéticas de 4 professores de trombone. Em


etapas anteriores de nossa pesquisa, constatamos que os professores de trombone das universidades
brasileiras atribuem importância mediana às questões relacionadas à estética em suas aulas. Por meio
de observação, podemos constatar como 4 destes professores lidam com estas questões na prática.
Foram feitas observações in loco, além de utilizar dados obtidos por meio de questionários
respondidos pelos professores e alunos. Foi constatado que os 4 professores tinham dificuldades de
verbalizar suas correções/adequações estéticas para seus alunos em aula. Os quatros professores
utilizavam estratégias semelhantes, conduziam seus alunos com gestos (semelhantes a um maestro) e/
ou cantando, indicando sutilezas estéticas não verbalizadas.
Palavras-chave: pedagogia da performance, expressão musical, interpretação .

Considerations on aesthetic issues in trombone lessons: study of 4 cases in universities
Abstract: The present work reflects on the aesthetic question of 4 trombone teachers. In previous
stages of our research, we found that the trombone teachers of the Brazilian universities attach
medium importance to the aesthetics-related issues in their classrooms. Through observation, we can
see how 4 of these teachers deal with these issues in practice. Observations were made locally, in
addition to using data obtained through questionnaires answered by teachers and students. It was
found that the 4 teachers had difficulties verbalizing their aesthetic corrections / adjustments in their
students in class. The four teachers used similar strategies, led their pupils with gestures (like a
teacher) and / or singing, indicating unvoiced aesthetic subtleties.
Key-words: performance pedagogy, musical expression, interpretation.

Em nossa pesquisa de doutoramento estamos estudando o ensino de trombone nos cursos de


graduação das universidades brasileiras. O presente trabalho refere-se somente aos resultados
referentes às questões estéticas obtidas na terceira etapa de nossa pesquisa por meios de
observações in loco. Nesta etapa visitamos 4 universidades entre maio e agosto de 2016 (uma
universidade de cada região do Brasil ,exceto centro-oeste, uma da região sul, uma da região
norte, um da região nordeste e uma da região nordeste). Observamos as disciplinas
relacionadas especificamente ao trombone durante uma semana. Foi utilizada uma ficha de
observação que contemplava os seguintes itens: relacionamento professor/aluno, rotina das
aulas, questões técnicas e estéticas abordadas e observações gerais.
Para o presente trabalho ainda utilizamos alguns resultados obtidos de um questionário
em que 20 dos 23 professores de trombone, localizados em cursos de graduação nas
universidades brasileiras, responderam no ano de 2016. Por meio deste questionário
buscamos fazer o perfil pedagógico de cada professor. Para manter o anonimato, os
professores serão assim identificados: professor A (mestre, menos de 40 anos de idade e

460
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

professor há 3 anos), professor B ( mestre, menos de 30 anos de idade e professor há 6 anos),


professor C ( mestre, menos de 50 anos e professor há 18 anos) e professor D (doutor, menos
de 50 ano e professor há 16 anos). Foram observadas 26 aulas, assim distribuídas: 5 aulas do
professor A, 6 aulas do professor B, 5 aulas do professor C e 10 aulas do professor D. Após
cada aula os alunos ainda responderam um questionário sobre suas percepções de suas aulas
de instrumento e de seu respectivo professor de trombone.

O professor e a música
Entendemos que cada professor de instrumento tem grandes desafios pedagógicos diários
para enfrentar. De modo geral, as aulas de instrumentos nas universidades são aulas
individuais. O professor assume papel de orientador, facilitador e conselheiro, por muitas
vezes, por conta da nossa realidade brasileira, de pai, irmão etc.
Pelos questionários constatamos que mais da metade dos professores 20 respondentes
tem mais de 40 anos e se declaram professores a mais de 15 anos, destes 13 são mestres, 5
doutores e 2 pós-graduados. (BOTELHO, 2016). Portanto, suas experiências e vivências
constituem–se em conhecimentos riquíssimos que devem ser compartilhado. Penna (2013, pg
18) afirma que “a atuação em sala de aula é indispensável para a formação do professor, já
que uma parte da aprendizagem da profissão docente só ocorre e só de inicia em exercício”.
Lehmann et al (2009) ainda comentam: “Music teaching is interesting because some teachers
start out as teachers, whereas others start out as performing artists and become teachers
without formal qualifications” (LEHMANN et al, 2009, p. 9).
Segundo Penna (2013), duas coisas são importantes num processo de educação
musical:
É indispensável articular o que e como para ensinar efetivamente, quer dizer, para
desenvolver um verdadeiro processo educativo, compreendido não apenas como
transmissão de conteúdo, mas como um processo de desenvolvimento das
capacidades (habilidades, competências) do aluno, de modo que ele se torne capaz
de apropriar-se significativamente de diferentes saberes e fazer uso pessoal destes
em sua vida (PENNA, 2013, p. 14, grifos da autora)

Assim, entendemos que conhecer o conteúdo das aulas de instrumentos seja ter
habilidades artísticas e estéticas para a performance, mesmo que inconscientemente.
Entretanto, estas habilidades inconscientes não são inatas, mas sim habilidades que talvez o
professor não consiga verbalizar. Portanto, podemos supor que o “o que” ensinar,apontado
por Penna (2013) anteriormente, seja consolidado a partir da prática artística e performática
dos professores. Sloboda (2008) ainda comenta que “A habilidade musical é adquirida

461
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

através da interação com um meio musical. Consiste na execução de alguma cultura


específica em relação aos sons musicais (SLOBODA,2008, pg 257)”. O mesmo autor ainda
complementa que chama de enculturação o processo de apropriação cognitiva de uma
cultura. Assim, afirma que “a enculturação também é caracterizada por uma ausência de
esforço autoconsciente, bem como pela ausência de instrução explícita (SLOBODA,2013,
p. 259, grifos nossos)”.
Em nossas observações, pudemos notar que em todas as aulas, embora com gradações
distintas, haviam observações dos professores do tipo: “faça musica”, “fraseie melhor”,
“queira dizer algo” etc. Estas observações sobre a performance dos alunos são bastante
vagas, para não dizer quase insignificantes. Entretanto, estas frases eram acompanhadas de
demonstrações do professor tocando e/ou por estratégias como: conduzir os alunos com
gestos (como regentes) ou cantando. Deste modo, ficou aparente uma dificuldade dos
professores em verbalizar as suas observações e recomendações sobre questões estéticas.
Embora, geralmente, as observações dos professores tenham sido vagas, seus exemplos
tocando foram sempre muito ricos e expressivos. Talvez aqui começamos a localizar o
componente “como” apontado por Penna (2013).
Devemos notar que, pelas respostas dos questionários (BOTELHO, 2016), os
professores entendam que a prática da performance, o ato de tocar, é de fundamental
importância para seus alunos. Assim, a valorização da performance por parte dos professores,
muitas vezes fora de suas aulas, vem corroborar com a ideia, exposta inicialmente, que em
aulas de performance o “o que” e “como”, apresentados por Penna (2013), passe
fundamentalmente pela performance na prática. Desde o conteúdo até mesmo a maneira de
transmiti-lo deva passar pela prática, aliando-se processos e conhecimentos culturais. Assim,
tendo a prática como principal suporte para as aulas, a verbalização torna-se difícil, ou
mesmo talvez não seja o melhor meio.
Desta forma, devemos pensar numa pedagogia retroalimentada pela performance, em
que música se ensine e desenvolva com o fazer música. Em que conhecimentos musicais,
profundos, só possam ser acessados e transmitidos por meio da música. Assim, a prática e a
performance em situações reais devam ser os conteúdos das aulas .
McGill (2007) ainda complementa que devemos descartar a falsa barreira entre técnica
e musicalidade. A musicalidade só pode ser completamente alcançada se a técnica não for um
empecilho. Do mesmo modo, a técnica só faz sentindo como caminho para uma
expressividade artística. Devemos ser capazes de fazer música como um discurso coerente e

462
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

compreensível. Nas aulas ficou clara a distinção de concepções sobre técnica e estética de
alguns professores. Os professores A e B separam uma da outra, em suas aulas há momentos
em que somente tratam de questões técnicas e outros de estéticas. Em uma das aulas, o
professor A ainda fez o seguinte recomendação para o aluno: “o método é técnica, chegou na
música faça música”. Por outro lado, os professores C e D, trataram das duas questões
simultaneamente. Mesmo quando os alunos estavam tocando exercícios técnicos, suas
observações tinham algum conteúdo estético. Exemplificando: em uma aula o professor C
pediu para que o aluno pensasse em “um arco de frase”, afirmando que pensando na tensão e
repouso da frase o aluno conseguiria tocar uma determinada nota aguda que estava com
dificuldade.
A música sempre envolve várias formas de pensar e fazer, ligadas a específicas
habilidades, ideais e valores musicais, em que implicam em uma prática necessária para
domínio desta essência processual da musicalidade (GRUHN, 2005). A busca da
musicalidade é um processo progressivo em que estudante e professor encontram e resolvem
problemas genuinamente musicais e que surgem da prática (ELLIOT,1995).
Lehman et al. (2007) afirmam que alguns atributos dos professores interferem na
relação do processo cognitivo do aluno. A qualidade das observações dos professores sobre a
execução dos alunos faz com que aos poucos ele consiga “internalizar o professor” e traçar
metas e objetivos. Instruções objetivas fazem com que o aluno crie internamente imagens e
metáforas.
A reflexão prática é fundamental para o desenvolvimento da musicalidade porque o
fazer musical existe a partir de uma série de hábitos, sentimentos, rotinas etc. Desenvolver a
musicalidade é, em parte, criar uma conscientização de um fazer musical, incluir julgamentos
sobre a natureza do fazer e da obra musical em cada contexto (ELLIOT, 1995).

Questões estéticas
Nos questionários que os professores responderam os itens relacionados à estética não foram
muito valorizados. Na questão 2, sobre o que os professores mais valorizavam em suas aulas
o item “expressividade” foi classificado como de média importância por 66% dos
professores. Na questão 3, sobre a performance dos alunos, o item “musicalidade” também
foi classificado como de média importância por 45% . Na questão 7, a respeito da rotina de
estudos, os exercícios melódicos foram apontados como de mediana importância por 53%
dos professores. Entretanto na questão 4, relativa a explicação dos professores, o item

463
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

“gênero/estilo” mostrou-se controverso, 47% valorizam este item, enquanto outros 41%
atribuíram média importância (BOTELHO, 2016).
Mcgill (2007) inicia seu capitulo intitulado “Talent?” assim:
Most musicians feel it is possible to teach technique. Yet many of those same
musicians also feel it is practically impossible to teach someone to be expressive;
how often has on heard the phrase “You’ve either go it or you don’t”? (McGILL,
2007, p. 18)

Acreditamos que a música deva ser o objeto principal das aulas de trombone, os
próprios professores já deixaram claro, por suas repostas, que acreditam que a performance é
o principal em suas aulas. Nos questionário dos alunos, as questões estéticas foram pouco
valorizadas também. Nas questões que poderiam responder abertamente, há grande
predomínio de elementos técnicos, três alunos, dois do professor A e um do professor B,
escreveram explicitamente claro que entendem que “a técnica é o caminho para a
performance”.
A principio, quando analisamos os questionários, parece-nos que os professores
privilegiavam as performances e que nelas havia uma propensão a valorizar somente questões
ligadas à técnica, dando ênfase a afinação (BOTELHO, 2016). Entretanto, após nossas visitas
pudemos ter uma compreensão bastante diferente sobre tais aspectos. Principalmente
observando estratégias semelhantes entre professores que, em seus perfis pedagógicos,
demonstraram concepções díspares sobre o tema.

Estratégias observadas
Pudemos observar duas estratégicas que foram repetidas, com algumas pequenas variações,
em todas as aulas observadas: a condução do professor (seja por gestos como um maestro,
seja cantando) e sua própria performance como demonstração. As duas estratégias apontadas
mostraram-se complementares, entretanto a proporção que elas foram empregadas variou
muito de professor para professor. Não encontramos nada na literatura que fizesse alguma
menção à estas estratégias. Também observamos explicações verbais, mas estas
demonstraram-se bastante vagas.
Em todas as aulas observadas, por vários momentos durante a execução dos alunos, os
professores realizaram movimentos como se estivessem conduzindo-os com movimentos
como os de um maestro. Estes movimentos foram feitos quando os professores estavam
preocupados com o fraseado e seus contornos. Muitas vezes indicavam algumas dinâmicas
não escritas e mudanças de caráter. Ficou claro nas observações que após as explicações do

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

professor, geralmente, os alunos não eram capazes de reproduzir estes detalhes. Porém,
quando os professores faziam tais gestos, era quase que imediato a mudança no que o aluno
tocava.
Frequentemente, não nos parecia que o aluno estava olhando diretamente para estes
gestos, nem mesmo que o próprio professor tinha consciência desta ação. Todavia, era clara a
comunicação existente entre os dois, uma comunicação muda, velada e provavelmente
inconsciente. Entretanto, o resultado era notório nas execuções dos alunos.
O aprendizado da música é realizado, em grande parte, pela capacidade de imitação.
Portanto, acreditamos que o papel do professor está em gerar situações de aprendizado para o
aluno criar, por si próprio, um “repertório” de habilidades músico-motoras. Tais situações
são criadas pela prática em um ambiente de execução, instrução e imitação (Rocha & Boggio,
2013).
Millcan (2013) afirma que os alunos desenvolvem habilidades de escuta ao comparar as
suas performances com modelos ideais e por meio de imitação tentam alcançá-los.
Complementa que:
As students perform each excerpt, the teachers simultaneously evaluate their
performances while referencing a mental image or model of the ideal performance.
This image may be a visual representation or an aural one. (MILLICAN, 2013, p.
47)

Associado à estes gestos ainda observamos que os professores cantavam com os


alunos enquanto este tocava, geralmente isto era associado aos gestos. Em raros momentos,
observamos somente o professor cantando. Logicamente a proporção da utilização entre as
duas estratégias foi diferente. Haviam professores que se utilizavam mais dos gestos, como o
professor A, e outros que cantavam mais, como o professor D.
Millican afirma:
expert applied teachers during private instruction have a clear auditory image that
guides their decision making and that teachers value modeling musical skills and
performances to their students as an effective way to convey musical concepts
(MILLICAN, 2013, p. 47)

Por meio destas indicações, os professores conseguiam transmitir as concepções


estéticas que pretendiam, mesmo que parcialmente. Os dois professores que, aparentemente,
não faziam diferença entre estética e técnica se utilizavam das mesmas estratégias para
adequação/correção de alguns itens puramente técnicos, em especial da articulação. Deste
modo, o que os professores procuram fazer é transmitir conceitos estéticos, não verbais.
Assim, seja conduzindo com as mãos, tocando ou cantando, procuram torna-se modelos

465
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

ideais, padrões a serem alcançados. Devemos lembrar que o ambiente de sala não é um
ambiente de prática genuíno, mas sim uma simulação. Deste modo, por meio deste meio
idealizado buscava criar modelos estéticos sólidos para os alunos.
Desenvolver a capacidade de ouvir e agir sobre isto é fundamental para formação de
um músico. Portanto, acreditamos que estas estratégias além de desenvolverem tais
habilidades, ainda a utilizam para transmissão de conhecimento. Elliot (1995) afirma:
Musicing of whatever kind always includes another kind of doing called music
listening. Music makers listen for what their tlioughtful actions produce and for
what other musicers do and make. (…) Thus music listening is an essential thread
that binds musicers (ELLIOT, 1995, p. 78)

Este processo é, aparentemente, inconsciente tanto para os professores como para os


alunos. Entretanto, observamos que esta estratégia só seria eficiente a médio ou longo prazo.
Efetivamente, os alunos conseguiam reproduzir o que foi proposto pelo professor após
poucas repetições, ou até mesmo imediatamente. Todavia, ficou evidente que tais mudanças
não têm efeitos prolongados. Em vários casos, no exercício e/ou peça apresentados em
seguida, os alunos já não eram mais capazes de reproduzi-las.
Sloboda (2008) nos informa que muitas vezes o aluno mostra-se incapaz de transferir a
sugestão de um fraseado para uma passagem específica para outra sequência semelhante. Em
outro momento, o autor informa que um dos pontos fundamentais para o aprendizado é a
repetição. Explica-nos que não podemos nos ater à resultados de imediatos neste caso: “ as
pessoas tornam-se hábeis numa certa tarefa quando são confrontadas com sucessivas
oportunidades de envolver-se com elementos desta tarefa” (SOLOBODA, 2008, p. 286).
Outra estratégia, observada com bem menos frequência que as anteriores, utilizada
pelos professores era fazer os alunos cantarem, reproduzindo suas instruções. Cada professor
se utilizava de uma forma diferente. Quando os alunos apresentavam problemas persistentes
de afinação, o professor C fazia seus alunos cantarem e corrigia a afinação primeiro com o
aluno cantando. Os professores B, C e D também se utilizavam deste artifício para correções
relacionadas à articulação. Nos exercícios de aquecimento do grupo de trombones o professor
A também realizou exercícios de escalas lentos que foram primeiro cantados, buscando-se
afinação e equilíbrio, antes de executar tocando.

Considerações finais
Entendemos que todos estes artifícios ajudavam aos alunos a criarem uma ideia clara de
como gostariam que suas execuções soassem. Desenvolviam modelos baseados tanto nos

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

exemplos dados pelos professores tocando e cantando, como por suas próprias performances
quando eram conduzidos pelos professores com gestos ou também cantando. Millican (2013,
p. 50) ainda afirma que: “students develop the ability to quickly evaluate these models, and
teachers use this skill to their advantage.”
Nos questionários aplicados aos professores de trombone das universidades brasileiras,
constatamos que os itens relacionados à estética tinham, de modo geral, média importância
para a maioria dos respondentes. Entretanto, nas observações em 4 universidades, pudemos
perceber preocupações sobre a performance e estética. Também observamos que conduzir os
alunos por gestos (parecidos com os movimentos de um maestro) e/ou cantar eram estratégias
comuns e eficientes de todos os professores, apesar da diferenças em suas concepções.

Referências
Botelho, M. (2016) O ensino de trombone nas universidades do Brasil: Resultados
preliminares In: XII SIMCAM Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais.
(274-282) Porto Alegre: UFRS
Elliot, D. (1995). Music matters: a new philosophy of music educations.New York: Oxford
University Press.
Grunh, W. (2005) Understanding musical understanding. In Elliot, D (org,), Praxial Music
Educacion: Reflection and dialogues. (pp 98-111) New York: Oxoford Press
Lehmann, A. ,Sloboda, J. & Woody, R. (2007). Psychology for musicians: understanding and
acquiring the skill. New York: Oxford Press.
McGill, D. (2007) Sound in motion: a performer’s guide to greater musical expression.
Bloomington: Indiana university press.
Millican, J. (2013). Describing Instrumental Music Teachers’ Thinking: Implications for
Understanding Pedagogical Content Knowledge In: National Association for Music
Education 31(2) (pp. 45–53)
Penna, M. (2013). Introdução. In: Materio, T. & Ilari, B. Pedagogias em educação
musical.Curitiba: Editora Intersaberes (13-24)
Rocha, V. C. da; Boggio, P. S.(2013) A música por uma óptica neurocientífica. In Per Musi
n.27, Belo Horizonte,( pp.132-140)
Sloboda, J.A., (2008). A Mente Musical: a psicologia cognitiva da música.(Tradução: Ilari, B.
& Illari, R).Londrina: Eduel

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Música de cámara y aprendizaje significativo: una estrategia pedagógica para el


fortalecimiento de los procesos académicos y musicales

Robinson Giraldo Villegas


Universidad Industrial de Santander
robinson.giraldo@correo.uis.edu.co

Resumen: El artículo presenta los resultados de la investigación que buscó demostrar la importancia de la
práctica de música de cámara como complemento en el proceso de formación integral de los estudiantes
de un programa de licenciatura en música del país. El aprendizaje significativo, fue la teoría   que
fundamentó el estudio bajo la principal mirada de Gabriel Enrique Rusinek en complemento con
diferentes autores, quienes mencionan que dicha teoría facilita la enseñanza y aprendizaje en los procesos
musicales. Se utilizó la metodología cualitativa con la estrategia investigativa estudio de caso,
recolectando datos tanto de docentes y estudiantes del programa donde se desarrolló la investigación como
de docentes pertenecientes a otros programas profesionales en música del país. Los resultados permiten
conocer que la práctica de música de cámara aporta aspectos propios del área al proceso formativo
integral de los estudiantes como audición, interpretación de repertorios de diferentes épocas y estilos,
desarrollo de la articulación, respiración y fraseo. Asimismo, dicha práctica permite a los estudiantes hacer
uso de los diferentes conceptos aprendidos en otras asignaturas como análisis musical, armonía, gramática
musical, además de promover el trabajo grupal y el aprendizaje cooperativo. De igual forma, los
resultados obtenidos permiten plantear mediante la experiencia del investigador principal, cómo se da el
aprendizaje significativo en la práctica de música de cámara.
Palabras clave: aprendizaje musical, cognición musical, música de cámara, interpretación, educación
musical.

Chamber music and meaningful learning: a pedagogical strategy for the strengthening of academic
and musical processes 
Abstract: The article presents the investigation results that searched to demonstrate the importance of
chamber music practice as a complement in the process of integral development of the students of a music
program in the country. The meaningful learning was the theory that the study was based on, under
Gabriel Enrique Rusinek’s principal look and with a complement of different authors, who mention that
such theory facilitates the teaching and learning in the musical processes. It was utilized the qualitative
methodology with the investigative strategy of case study, collecting data not only from teachers and
students of the program where the investigation was developed but also teachers who belong to other
music professional programs of the country. The results allow knowing that the chamber music practice
contributes proper aspects of the area to the formative integral process of the students such as auditions,
interpretation of repertoires of different epochs and styles, articulation development, breath and phrasing.
Additionally, this practice permits to the pupils to make use of different learned concepts in other subjects
such as musical analysis, harmony, musical grammar, also promoting group work and the cooperative
learning. Likewise, the obtained results allow to set out through the experience of the main investigator,
how the meaningful learning is produced in the practice of chamber music.
 Key Words: musical learning, musical cognition, chamber music, interpretation, musical education.

Contextualización y fundamentación del problema


El presente estudio buscó demostrar cómo a través de la práctica de música de cámara, se pueden
fortalecer los procesos académicos y musicales de un programa de licenciatura en música del

468
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

nororiente de Colombia, el cual existe desde el año de 1984 y pese a que en el año de 1994 se le
realizó una reestructuración, al momento del desarrollo de la investigación no se había incluido la
práctica de música de cámara en su plan de estudios. La ausencia de la música de cámara en el
programa en mención, ha generado una limitada producción musical, esto se evidencia en la
escasa oferta de conciertos y conformación de agrupaciones de cámara con proyección
departamental, nacional e internacional. En tal sentido y con el fin de contribir al mejoramiento
de la problemática que se expone, se tomaron como antecedentes cuatro programas de
licenciatura en música del país adscritos a diferentes universidades púbicas, teniendo como
principal argumento la inclusión de la música de cámara en sus planes de estudio y la forma en
que a través de esta práctica instrumental, permiten que sus estudiantes complementen
adecuadamente su proceso de formación integral. Además del objetivo general ya mencionado, el
estudio planteó como objetivos específicos identificar las percepciones de profesores y
estudiantes del programa respecto a la música de cámara, proponer acciones que permitiéran la
inclusión de la práctica de música de cámara en el plan de estudios del mismo y crear un
semillero formativo en música de cámara en el formato ensamble de metales y percusión.

Fundamento teórico
En los años noventa (1990) se presentó al mundo el constructivismo, una teoría psicopedagógica
para ser aplicada en los procesos de enseñanza en la educación y así reformar el sistema
educativo (Picardo, Escobar & Pacheco, 2005). Dicha teoría buscó comparar la educación
tradicional, que se caracteriza por transferir los conocimientos de forma pasiva y memorística,
con la educación moderna, que propone articular el saber con el saber hacer, esto con el propósito
de mejorar la calidad en la educación (Cárdenas, 2004). Entre los principales autores del
constructivismo que han revolucionado la forma de enseñar y aprender se encuentra David Paul
Ausubel y su teoría del aprendizaje significativo (Rodríguez, Moreira, Sahelices & Greca, 2008).
Ausubel define su teoría como el mecanismo mediante el cuál el ser humano obtiene y almacena
una gran cantidad de conceptos, que puede representar en diferentes áreas del conocimiento
(Ausubel, 1963).
Konnikova (1969), menciona que el aprendizaje significativo permite al alumno obtener
significado en su aprendizaje, siempre y cuando éste tenga la capacidad para relacionar el nuevo
material o información con sus pre saberes, logrando una especie de enraizamiento inteligente de

469
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

la nueva información en su estructura conceptual. Según Ausubel (1976), para que el aprendizaje
sea significativo, debe poseer dos características, la no-arbitrariedad y la sustantividad. No-
arbitrariedad se refiere al material significativo que se relaciona de manera no-arbitraria con el
conocimiento existente en la estructura cognitiva del estudiante (Ausubel, 1963). Sustantividad
significa la incorporación a la estructura cognitiva de materia o sustancia, es decir, nuevos
conocimientos o ideas, más no palabras precisas usadas para expresarlas (Ausubel, 1963).
Gabriel Enrique Rusinek basado en la teoría propuesta por Ausubel, plantea cómo a través
de ésta, se pueden dar los diferentes procesos de enseñanza y aprendizaje en la educación
musical. Uno de los planteamientos hechos por Rusinek (2003), es “el aprendizaje musical como
desarrollo de procesos cognitivos”, en donde propone cómo a través de tres tipos de cogniciones
musicales, se podrían llegar a resolver las problemáticas reales en el aula como qué hacer cuando
el tiempo y el espacio son insuficientes, cuando los estudiantes no aprenden de la manera que se
espera, cuando hay conflictos grupales o cuando termina el curso y el estudiante no ha logrado un
adecuado aprendizaje. Rusinek, basado en los tres tipos de conocimientos musicales propuestos
por Stubley (1992), sugiere tres tipos de cogniciones musicales entendidas como conjuntos de
procesos cognitivos. Éstas son, cognición auditiva, cognición de la ejecución y cognición
compositiva.
La cognición auditiva hace referencia a las representaciones mentales que se dan en el
cerebro a través de la audición, logrando mediante sonidos ya existentes en la estructura
cognitiva, generar aprendizaje mediante nuevos sonidos a largo plazo, es decir, un aprendizaje
significativo (Bregman, 1990). La cognición de la ejecución plantea que en la ejecución
instrumental intervienen componentes afectivos, motrices y cognitivos (Rusinek, 2003). Según el
mismo autor, los afectivos se refieren al almacenamiento de información en la memoria a largo
plazo, los motrices se dan en las acciones del cuerpo humano para producir sonido mediante la
ejecución de un intrumentos musical y los cognitivos requieren de una representación mental, la
cual según Slodoba (1982), se encuentra inmersa en la ejecución instrumental al momento de
interpretar una obra musical, siendo dicha representación mental controlada por el intérprete de
manera voluntaria, logrando a su vez una forma de aprendizaje significativo. Finalmente, la
cognición compositiva, incluye procesos de imaginación mental mediante los que se logra crear
música, dicha imaginación puede ser convertida en sonido en tiempo real cuando se improvisa o

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

puede ser transcrita a través de la escritura musical para su posterior ejecución en tiempo diferido
(Rusinek, 2003).
Otro de los planteaminetos hechos por Rusinek, es el “aprendizaje musical significativo”,
en el que obligatoriamente intervienen las cogniciones mencionadas anteriormente y que se
complementan con la asimilación de contenidos, conceptos, hechos, proposiciones, sistemas
teóricos además de las actitudes propias de la práctica musical (Rusinek, 2004). En tal sentido, el
mismo autor porpone entonces basado en la teoría de Ausubel dos ejes, por medio de los que se
puede lograr significatividad en los procesos de enseñana musical, estos son el eje de recepción-
descubrimiento y significativo-memorístico. El primer eje, se caracteriza por que busca que el
estudiante memorice de manera mecánica determinados conceptos (conocimiento procedimental),
es decir, la no arbitrariedad en Ausbel (Rusinek, 2004). El segundo eje, se caracteriza por la
interacción entre previos y nuevos conocimientos (conocimiento declarativo), lo que en Ausbel
significa Sustantividad (Rusinek, 2004). Es importante mencionar que, en cada eje, Rusinek
plantea tres combinaciones, respectivamente, por recepción, por descubrimiento guiado y por
descubrimiento autónomo, además el mimso autor resalta que sólo se puede llegar a dar un
aprendizaje significativo si cada eje se convierte en un complemento del otro. Esta propuesta
teórica, adicionalmente se fundamenta con distintos trabajos de investigación musical que han
utilizado la teoría del aprendizaje significativo como soporte conceptual, entre ellos: Emoción,
música y aprendizaje significativo, realizado por Yadira Albornoz en el año 2009, Música como
estrategia facilitadora del proceso enseñanza-aprendizaje desarrollado por Andrea María Vides
Rodríguez en el año 2013 y Aprendizaje significativo a través de la experiencia musical,
elaborado por Norberto Magín Prieto Trancón en el año 2012.

Método y resultados
Se utilizó el método de investigación cualitativo propuesto por autores como Hernández,
Fernández y Baptista (2010) y la estrategia investigativa estudio de caso bajo la mirada de autores
como Yin (2009). Los participantes estuvieron divididos en dos grupos así: seis estudiantes del
programa objeto de estudio y cuatro profesores tanto del programa objeto como de otras
instituciones de educación superior del país. Asimismo, se creó un semillero formativo en música
de cámara integrado por estudiantes del programa objeto y que estuvo a cargo del investigador
principal, agrupación piloto en la que se aplicaron y desarrollaron los aspectos propios del área.

471
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Se utilizaron como instrumentos de recolección de datos el cuestionario y la entrevista. Una vez


recolectada y analizada toda la información, los principales resultados se agruparon en cuatro
categorías. Ver gráfica No 1.

Gráfica No 1. Resultados por categorías

472
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Conclusiones
Se concluye entonces que, la música de cámara como estrategia pedagógica puede llegar a
complementar el proceso formativo de los estudiantes a nivel académico, pedagógico e
interpretativo, estando estos directamente correlacionados con los tres tipos de cogniciones
musicales propuestas por Rusinek (2003), en tal sentido, la cognición auditiva se relaciona con la
parte académica, pues según el mismo autor, dicha cognición permite el desarrollo de aspectos
como la audición rítmica y tímbrica, así como la discriminación interválica-tonal y la
sincronización sensorio motora. El nivel pedagógico se relaciona con la cognición de la ejecución
musical a través de sus componente afectivos, motrices y cognitivos, ya que dichos componentes
hacen referencia al almacenamiento de información, sensaciones y acciones a largo plazo
(Rusinek, 2003), por lo tanto, el estudiante tendría la capacidad de replicar los conocimientos
adquiridos tanto en su instrumento como en la práctica de música de cámara, convirtiéndose esto
en un aporte pedagógico para la formación musical integral y su futura labor docente.
En cuanto al nivel interpretativo, es importante mencionar que éste hace referencia a la
interpretación musical fundamentada desde la teoría y la práctica, bien sea como solista o en
diferentes formatos de cámara, por lo tanto, la cognición compositiva posee gran afinidad con
este aspecto, ya que según Rusinek (2003), la creación musical entendida como interpretación
musical, sucede de forma correcta cuando tanto los procesos procedimentales (procesos
mecánicos) como los declarativos (procesos mentales) se estructuran adecuadamente. Por último,
en cuanto a los ejes recepción-descubrimiento y significativo-memorístico propuestos por el
mismo autor, es importate mencionar que además de las anteriores cogniciones, también están
basados en los procesos procedimental (saber hacer) y declarativo (saber entender) (Rusinek,
2007). En tal sentido y con el propósito de documentar la experiencia que tuvo investigador a
través del trabajo de cámara realizado con el semillero formativo en música de cámara que
funcinó como agrupación piloto, a continuación mediante el eje recepción-descubrimiento
(procesos procedimentales o repetitivos) y sus diferentes combinaciones, el investigador plantea a
través de situaciones reales que se presentaron durante la práctica de cámara con dicha
agrupación , cómo se da el aprendizaje significativo en la misma . Ver tablas No 1, No 2 y No 3.

473
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Tabla No 1. Eje repetitivo por recepción.

Aprendizaje Tradicional Aprendizaje Significativo


Cuando un integrante de un grupo de cámara estudia Cuando el mismo integrante estudia dicha obra de
individualmente su partitura en aspectos técnicos manera grupal (ensayo), podrá entender cómo se
como figuras, articulaciones, tempos y dinámicas, relaciona su línea melódica, articulaciones y
posiblemente puede garantizar el adecuado dinámicas con otros instrumentos, obteniendo
funcionamiento mecánico y técnico de la obra, más significancia en su aprendizaje.
no entender el contexto general de la misma.

Tabla No 2. Eje repetitivo por descubrimiento guiado

Aprendizaje Tradicional Aprendizaje Significativo


Los intérpretes de una agrupación de cámara cuando Si dichos intérpretes realizan la misma lectura
hacen la lectura de una obra musical, podrían lograr haciendo uso de sus pre saberes (experiencia) para
que dicha lectura se convierta en una simple acción relacionarlos con los contenidos de la partitura,
mecánica, sí sólo se limitan a leer las indicaciones generarían un aprendizaje significativo, pues además
mínimas escritas en la partitura como tempo, de cumplir el propósito de leer la partitura,
dinámica, articulación y las diferentes figuras posiblemente puedan llegar a realizar una adecuada
musicales. interpretación musical.

Tabla No 3. Eje repetitivo por descubrimiento autónomo

Aprendizaje Tradicional Aprendizaje Significativo


En la interpretación de una obra musical en un La cantidad de repeticiones para lograr afinar dichos
conjunto de cámara, pueden aparecer diferentes acordes, podría variar si al momento de realizar el
tipos de acordes y dependiendo su disposición trabajo para corregir la afinación, se tienen en cuenta
(inversión) y funcionalidad, tendrán un mayor grado los diferentes aspectos teóricos como la estructura
de dificultad para lograr su correcta afinación. En de los diferentes tipos de acordes (mayor, menor,
estos casos, se sugiere repetir algunas veces los aumentado, disminuido), cantidad de notas
acordes que presentan problemas hasta que su duplicadas, qué instrumentos tienen asignadas las
sonoridad y afinación sea la correcta, utilizando diferentes notas del acorde o la función armónica
dichas repeticiones para hacer los ajustes necesarios. que dichos acordes están ejerciendo en determinada
Mientras las repeticiones se hagan sin tener en frase musical. Esto permitiría llegar a una correcta
cuenta aspectos teóricos relacionados con el tema, afinación teniendo en cuenta tanto lo práctico
este proceso podría tomarse como un procedimiento (sonido, articulación y balance) como lo teórico,
por ensayo y error, pues si bien posiblemente se logrando quizás fundamentar el procedimiento por
llegaría a resolver el problema, no se adquirirían las ensayo y error, optimizar el tiempo de ensayo y
herramientas necesarias para aprender a solucionarlo lograr que los intérpretes (estudiantes) aprendan a
posteriormente. resolver el problema y puedan replicarlo en su futura
labor docente.

Finalmente es importante mencionar que, la creación de agrupaciones de cámara, beneficia


el desarrollo cultural y musical tanto de las instituciones educativas como de las regiones a las

474
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

que éstas pertenecen, esto se afirma según los resultados obtenidos con la creación del semillero
formativo en música de cámara, pues dicha agrupación desarrolló una destacada actividad
académica, musical, cultural y social, participando en eventos no sólo a nivel institucional, sino
nacional e internacional, dando visibilidad tanto a la institución como a la región, además de la
labor pedagógica realizada con sus integrantes por parte del investigador principal. De
igualmanera, es pertinente resaltar que, esta propuesta de investigación contribuyó para que desde
el año 2018 se incluya la práctica de música de cámara en el plan de estudios del programa.

Bibliografía
Albornoz, Y. (Enero-Marzo de 2009). Emoción, música y aprendizaje significativo. Educere,
13(44), 67-73. Recuperado el 20 de Junio de 2015, de http://www.redalyc.org/articulo.oa?
id=35614571008
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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

A repetição como nuance de deliberação na prática pianística em diferentes


níveis de expertise

Michele Rosita Mantovani


Universidade Federal do Rio Grande do Sul
mantovani.michele@gmail.com

Regina Antunes Teixeira dos Santos


Universidade Federal do Rio Grande do Sul
regina.teireixa@ufrgs.br

Resumo: A repetição é uma essência do fenômeno da prática pianística que apresenta nuances de
deliberação conforme o nível de expertise do pianista. Essa comunicação oral tem por objetivo
discutir essas nuances da repetição observadas na prática de quatro pianistas em diferentes níveis de
expertise (extensão, graduação, pós-graduação e profissional/docente). A metodologia abrangeu a
gravação em áudio e vídeo de uma sessão de prática de uma peça do repertório de cada participante
e uma entrevista semiestruturada. Os dados foram analisados conforme a abordagem de análise
fenomenológica proposta por Giorgi & Giorgi (2008) e os resultados indicam que as nuances de
deliberação na prática acerca da repetição correspondem à finalidade e à variedade com que essa é
empregada.
Palavras-chave: Prática pianística, repetição, níveis de expertise, deliberação.

Repetition as nuance of deliberation in pianistic practice at different levels of expertise


Abstract: Repetition is an essence of the phenomenon of pianistic practice which displays nuances
of deliberation according to the level of expertise of the pianist. This oral communication aims to
discuss these nuances of repetition observed on practice of four pianists at different levels of
expertise (university extension, undergraduate, graduate students and professional/professor). One
session of piano practice of one piece of music from each pianist’s repertoire was recorded in audio-
video, as well one semi structured interview, as part of methodology. The data were analyzed
according to the approach of phenomenological analysis proposed by Giorgi & Giorgi (2008), and
results show that nuances of deliberation in practice about repetition match to the purpose and the
variety with which is applied.
Key-words: Piano practice, repetition, levels of expertise, deliberation.

Introdução
A prática é um comportamento multifacetado em forma de ensaio ou treino sistemático para
aprender ou adquirir proficiência num dado domínio de conhecimento, a qual possibilita a
construção de habilidades e competências a longo-prazo (Barry & Hallam, 2002; Hallam,
2006; Lehmann et al 2007). Como um atrativo objeto de estudo ao longo dos últimos 30 anos,
a prática tem sido abordada em pesquisas que investigam bases teóricas, metodológicas e
variáveis psicológicas que a sustentam (Miksza, 2012): a natureza do repertório e da
complexidade da tarefa, o gerenciamento do tempo, a organização, o planejamento, o
emprego de estratégias cognitivas, a autorregulação, a motivação, a memorização, as
habilidades musicais do sujeito, são alguns dos muitos fatores já dialogados no campo
científico (JØrgensen, 2005; Lehamnn & Sloboda, 2007, entre outros). Para Barry & Hallam

477
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

(2002) e Lehamnn et al (2007), a prática compreende atividades para o aprendizado de uma


obra e/ou aperfeiçoamento de uma performance, que perpassam a concepção de uma ideia
global da peça, o trabalho técnico para dominá-la, a prática da performance no trabalho do
repertório como um todo e no refinamento de detalhes técnico-interpretativos, e manutenção
da peça com sutis modificações na interpretação. Gruson (1981/2000) e Sternberg (2010)
consideram a prática como uma sequência de transição de processos controlados para
processos automáticos nos quais as informações musicais são processadas em unidades de
significado crescentes, tanto em extensão quanto em complexidade.
Outro fator discutido e de interesse a esse trabalho diz respeito à relação entre a prática
e a expertise, isto é, ao nível de especialização de conhecimento atingido em termos de
aquisição de habilidades num dado domínio de conhecimento. Pesquisas acerca da expertise
datam da década de 80, quando os irmãos Dreyfus e Dreyfus realizaram estudos
fenomenológicos em diferentes áreas de especialização e propuseram cinco níveis crescentes
(novato, iniciante avançado, competente, proficiente e expert) para caracterizar o processo de
aquisição e desenvolvimento de habilidades em termos de compreensão racional. Em Música,
especificamente na literatura que relaciona a prática com expertise, se observa um conjunto
consonante de pesquisas com o interesse em explicar a figura do expert como expoente
máximo, vislumbrado na imagem do músico que apresenta destreza nas habilidades técnicas e
expressivas, bem como originalidade artística e idiossincrática em sua performance (ver, por
exemplo, Ericsson et al, 1993; Hallam, 1997; Lehmann et al, 2007). Para Hallam (2006), o
tempo de prática acumulado, as estratégias de prática e as habilidades metacognitivas são
fatores determinantes no nível de expertise do sujeito.
O presente trabalho apresenta um recorte da pesquisa de doutorado em andamento que
tem por objetivo averiguar a deliberação na prática pianística em função do nível de expertise;
o recorte apresentado nessa comunicação oral tem por objetivo discutir nuances de
deliberação na prática acerca da repetição, aspecto comum presente na prática dos níveis de
expertise observados.

Metodologia
A presente pesquisa contou com a participação de 18 estudantes de piano (alunos de cursos de
extensão, graduação, mestrado, doutorado) e profissionais/docentes. A coleta de dados que
consistiu em gravar em áudio-vídeo 30 minutos de prática de duas peças dos seus repertórios
em etapa inicial de aprendizagem e a uma entrevista semiestruturada com questões acerca de

478
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

suas práticas. Uma câmera filmadora digital Sony® modelo HDR-CX560 foi disponibilizada
para que os participantes se gravassem, bem como tivessem a flexibilidade de selecionar e/ou
descartar as gravações que eles desejassem e evitar a inibição perante um observador externo;
os participantes foram orientados a sentir-se o mais a vontade possível durante as filmagens e
a manterem seus procedimentos habituais de prática, e, alguns deles preferiram realizar as
gravações em suas casas e com equipamentos próprios. Do total de 18 participantes, foram
selecionados quatro casos para representar um aluno de Extensão, um de Graduação, um de
Pós-graduação e um profissional/docente (respectivamente P3, P9, P13 e P17) considerando o
engajamento dos mesmos na pesquisa. A Tabela 1 apresenta o perfil dos participantes, as
peças selecionadas e o tempo de sessão de prática gravada duração da coleta:

Tabela 1 – Perfil dos participantes e detalhamento das obras gravadas

Os dados foram analisados conforme a abordagem de análise fenomenológica proposta


de Giorgi & Giorgi (2008), a saber: descrição dos dados na íntegra, constituição de unidades
de significado (segmentadas conforme o foco de atenção dos participantes e organização da
prática), conexão das unidades que resultam nas essências do fenômeno, e descrição do
fenômeno e suas essências. Uma das essências do fenômeno constatado na prática dos quatro
casos selecionados diz respeito à repetição, aqui entendida como insistência em dado
segmento da obra, delimitado a partir de um recorte micro ou macro da peça; ex.: repetir um
motivo/célula rítmica, um (ou mais) compasso(s), uma frase, uma seção, parte da seção, etc.

479
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Essa essência apresentou nuances distintas de deliberação conforme o nível de expertise dos
sujeitos, as quais serão discutidas a seguir acerca da prática da Peça 1 de cada participante.

Resultados e discussões
Quando P3 pratica a Sonata KV545/Allegro de A. Mozart é possível notar sua intenção em
melhorar o delineamento das dinâmicas e fraseado dos c.1-12 (primeira região temática da
exposição da sonata) e da linha cromática descendente nas semicolcheias da mão esquerda
dos c. 13-14, o dedilhado dos c.50-51 conforme anotado à lápis em sua partitura (“estudar os
dedilhados lentos”) e o trillo dos c.70-71, por exemplo. Entretanto, nota-se a repetição
aleatória de vários trechos (c.5-14, 22-58, 58, 13-14, por exemplo) tocados de mãos juntas ou
de mãos separadas em que não se identifica foco, apenas nota-se alguns ajustes de notas.
Assim, P3 apresenta características de um iniciante avançado segundo Dreyfus & Dreyfus
(1981): tem uma percepção limitada do contexto (o todo da obra) e reconhece aspectos
isolados desse todo. Observa-se, também, que P3 repete trechos que ora coincidem com as
delimitações estruturais da peça e ora não, sugerindo que sua compreensão estrutural da obra
é ainda incipiente, apontando a ausência de seleção criteriosa sobre os aspectos que
precisam ser melhorados. Repetir é também uma estratégia de P3 para corrigir notas nos
trechos aleatórios ou ainda para ajustar os focos percebidos (como, por exemplo, c.50-51
repetidos cerca de 38 vezes, apenas com a mão esquerda, sem pedal, mais devagar ou
apressando a cada repetição; ou ainda, nas 10 repetições do trilllo dos c.70-71) que nem
sempre são solucionados satisfatoriamente, apontando que a repetições demasiadas tornam-se
improdutivas.
Diferente de P3, P9 estuda por trechos em todo tempo, organizados e repetidos
conforme as delimitações estruturais da Sonata KV310/Allegro maestoso de A. Mozart: nota-
se a intenção de aperfeiçoar o trecho c.1-22 (primeira região temática e transição para a
segunda região temática) acerca do tipo de toque das colcheias da mão esquerda (c.1-3), na
clareza das notas repetidas (c.3, 7-8, 15-16), no delineamento da voz superior da mão
esquerda (c.13-14) e na precisão rítmica das semicolcheias (c.16-22), enquanto que no trecho
c.22-27 há a intenção de decodificar a linha da mão direita e de estudar o dedilhado do c.26.
Assim como P3, P9 utiliza-se da repetição para ajustar algum aspecto, combinadas com o
estudo de mãos juntas, mãos separadas, com/sem pedal e com variações no andamento
(devagar/apressando/rápido); as repetições demasiadas, no entanto, ocorrem em recortes ainda
menores que coincidem com algum desenho motívico ou ainda com inícios e fins de frases.

480
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Essas repetições parecem não apenas ter o intuito de ajustar algo, mas também automatizar o
ajuste realizado, visto que P9 repete igualmente esses segmentos menores de 4 a 12 vezes
seguidas, tocando corretamente na maioria dessas repetições. Nota-se ainda o acréscimo de
variações nas repetições dos c.22-27 (decodificação da linha da mão direita): variações
rítmicas nos grupos de quatro semicolcheias (alternar o ritmo para uma semicolcheia longa e
outra curta, ou tocar três semicolcheias mais curtas e 1 mais longa a cada grupo de quatro
semicolcheias), mudanças na articulação (tocar staccato onde há indicação de legato), ou
tocar em registros diferentes do piano (uma ou duas oitavas acimas). Essas repetições variadas
(trecho c.22-27) demonstram que P9 utiliza-se de mais recursos para melhorar um dado
aspecto e, diferente do estudo do trecho c.1-22, não se observa nenhuma intenção expressiva
enquanto o participante trabalha na decodificação da linha da mão direita. Isso sugere que: (1)
P9 parece separar o aprendizado de notas dos aspectos expressivos, que por sua vez parece
ocorrer apenas após o primeiro estar automatizado ao participante; isso parece ser um fator
limitante do nível de expertise do sujeito, no qual os aspectos de um contexto são tratados
separadamente com diferentes graus de importância, característica atribuída a um competente,
segundo Lester (2005); (2) as repetições variadas podem ser um fator de distração na atenção
se este não está aprendido e/ou automatizado, que nesse caso corresponde aos aspectos
expressivos.
A prática da obra Pour le Piano/Prelude de C. Debussy por P13, apesar de assemelhar-se
em partes às dos casos anteriores (delimitação estrutural da obra e conforme as mudanças de
textura e do aspecto visual notado na partitura) os trechos são segmentados em partes
maiores (c. 1-6, 6-41, 41-59, 57-127, 127-163) e condensam múltiplos focos de atenção: (i)
refinamento de precisão rítmica de passagens específicas (c. 1-6, 14-2, 41-43, 79-82, 127-133)
e técnico-mecânicas (c. 43-47, 55-57, 127-129, 150, 163); (ii) clareza na maneira de expressar
o fraseado (c. 6-23, 26-41); (iii) delineamento de mudanças harmônicas, de dinâmica e
acentos (c. 5, 24-27,57-59). Essa segmentação e repetição de trechos em unidades maiores são
consonantes às afirmações de Gruson (1981/2000) e Sternberg (2010) em que as informações
musicais são processadas em unidades de significado crescentes, tanto em extensão quanto em
complexidade na prática. Assim como P3 e P9, P13 também realiza repetições combinadas
com o estudo de mãos juntas, mãos separadas, com/sem pedal e com variações no andamento
(devagar/apressando/rápido), somadas ainda às mudanças de articulação entre as vozes (tocar
a voz superior da mão direita em staccato ou non legato onde há indicação de legato, c.
41-43), à marcação do pulso com o pé e à redução do andamento numa seção escrita em

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

acordes em fortíssimo para enfatizar a mudança de textura e dinâmica (c.43-58 e 119-127); no


entanto, P13 realiza essas combinações de forma sistemática e cíclica, de modo que todos os
trechos estudados apresentam frequentemente essas combinações, o que não ocorre na prática
dos casos anteriormente comentados. Ainda nesse âmbito, as combinações de repetições com
aumento gradativo de andamento por P13 parecem ter o intuito de evidenciar a clareza dos
aspectos trabalhados, bem como em perseguir algum nível de fluência na realização após ter
ajustado tais aspectos. Nota-se que P13 também repete fragmentos curtos (c.41-43) para
ajustar (como nos c.41-43 em que ajusta as dinâmicas e delineia o gesto de anacruse-tempo
forte do c.42-43) e automatizar o ajuste realizado, entretanto, as repetições são realizadas em
quantidades significativamente menores (até três vezes) que para P3 ou P9; isso sugere que
P13 despende menos tempo e energia no ajuste de um dado aspecto, revelando ainda ter um
nível de expertise mais elevado que os demais participantes até então mencionados. Diferente
de P9, P13 não segmenta o aprendizado de notas e aspectos expressivos, e parece ter uma
compreensão holística da obra à medida que abrange todos esses aspectos dentro do contexto,
além de alcançar produtos com certa habilidade; essas características são próprias de um
proficiente, conforme apontadas por Dreyfus & Dreyfus (1981) e Lester (2005).
Assim como P13, P17 também organiza a prática do Prelúdio op. 23 n.9 de S.
Rachmaninoff em trechos maiores que condensam variados focos de atenção, também
segmentados conforme as delimitações estruturais da peça e/ou mudanças de textura e do
aspecto visual notado na partitura, abrangendo, assim, o estudo da peça na íntegra: no trecho
c.1-11, nota-se a intenção de melhorar o delineamento de articulações dinâmicas (c.9-11) e de
ajustar notas (c.10); nos c.11-36 são trabalhados o delineamento das vozes da mão direita (c.
14-17, 11-15), ajuste de notas (c.16), e fraseado e dinâmicas do c.11-23 (de mãos juntas ou
apenas mão esquerda); no trecho c.30-49 são estudados o delineamento das vozes da mão
direita (c.36-42 e 30-34) e das articulações (c.46-49); no trecho c.46-51 são trabalhados o
delineamento dos intervalos de terças (c.46-47), do arpejo do c.48-49 e da voz superior da
linha da mão esquerda (c.50-51). P17 utiliza-se, ainda, abundantemente de variações rítmicas
(uma semicolcheia mais curta e outra mais longa; uma semicolcheia longa e três curtas a cada
grupo de quatro semicolcheias; dobrar a figuração rítmica de duas semicolcheias em oito
semifusas, por exemplo exemplo) e de mudanças de articulações entre as vozes, bem como
acrescentas movimentos gestuais específicos às repetições a fim de encontrar um meio de
realização motora para o aspecto trabalhado. Acerca das mudanças de articulações, foram
percebidas: estudo das vozes superior da mão direita em legato e da voz inferior em staccato,

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

e vice-versa; estudo de ambas as vozes em staccato, ou non legato; pequenos cortes e/ou
respirações entre as articulações indicadas a cada 6, 8 ou 10 semicolcheias. Em relação aos
movimentos gestuais realizados em algumas repetições, foram constatados: movimentos de
rotação do punho/braço; movimento de rotação punho e de braço como se acentuasse cada
nota; movimentos flexíveis de punhos, braços e cotovelos, como se evitasse e/ou aliviasse a
tensão física; movimentos exagerados de articulação dos dedos; movimentos tipo “garras”,
como se raspasse a tecla ao tocar; tocar com o punho mais alto e flexível. Nota-se que todas
essas repetições variadas utilizadas por P17 apresentaram melhoras nos aspectos trabalhados,
bem como refletem um vasto repertório de estratégias decorrentes do nível de expertise do
participante, o qual se associa às características de um expert, segundo Dreyfus & Dreyfus
(1981) e Lester (2005): esse detém um profundo conhecimento da área e visão holística do
contexto, bem como reconhece e utiliza abordagens alternativas para lidar com o mesmo.
Também as combinações e repetições com aumento gradativo de andamento revelaram a
busca por clareza e fluência dos aspectos trabalhados, e, a prática de P17 apresentou constante
monitoramento dos movimentos gestuais.

Considerações Finais
Para níveis mais elementares de expertise, repetir é uma estratégia de ajuste de aspectos
isolados da obra praticada, resultado esse que corrobora a afirmação de Hallam (2006) acerca
da repetição como estratégia de correção de erros para níveis elementares de expertise; à
medida que a expertise se desenvolve, esse procedimento se mantém e é empregado para
automatizar os ajustes realizados. Repetições combinadas com o estudo de mãos juntas/
separadas, com/sem pedal e variações de andamento foram inerentes aos níveis de expertise
observados; ademais, foi observada alguma sistematização entre essas combinações à medida
que a expertise aumentava (P13 em relação à P3 e P9). Repetições combinadas às variações
de andamento parecem ainda ter a finalidade de evidenciar a clareza e fluência na execução de
um dado aspecto para níveis mais elevados de expertise (P13 e P17). Combinações entre
repetições, mudanças de ritmos e articulações tendem a crescer em variedade à medida que a
expertise aumenta, tal como afirma Hallam (2006); entretanto, a intensidade com que essas
são empregadas não apresentou relação com a expertise, exceto para P17, em que essas foram
recorrentes e acrescidas de variados movimentos gestuais. Em suma a repetição apresentou
nuances de deliberação na prática pianística em função da expertise dos participantes. Futuras
pesquisas nesse âmbito de compreensão podem ainda elucidar de que forma as especificidades

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

do repertório interferem na qualidade, quantidade e finalidade e variedade das repetições


empregadas, bem como averiguar se tais nuances de deliberação são mutáveis ou estáveis
num estudo longitudinal da prática dessas obras entre os níveis de expertise.

Agradecimentos
M. R. Mantovani agradece a CAPES pela bolsa concedida. R. A. T. dos Santos agradece ao
CNPq pelo recurso concedido (Projeto Universal no. 472652/2012-5).

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Bullying escolar e o estudo de violino

Sandra Carvalho de Mattos


Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
sdmattos@terra.com.br

Resumo: Somos seres cercados por palavras. Distintos dos demais primatas, falamos, e nossa
percepção da voz humana é extremamente sutil. Podemos decodificar rapidamente nuances que
expõem humores e estados de espírito, além de várias outras particularidades. O som da voz de uma
criança, somente pela característica do timbre, pode ser o gatilho para bullying na escola. Bullying é
o fenômeno de coerção grupal e pode ser encontrado também em outros primatas. Como somos
extremamente grupais, essa marca de distinção negativa causa na vítima estado de constante
pressão. O artigo apresenta parte do Diário de Campo, procedimento etnográfico, onde explicita o
bullying vivido por uma menina e de como, por meio do estudo de violino, teve início um ciclo
diferente em relação ao grupo. Essa nova descrição de si mesmo toma forma singular e positiva. Nas
aulas de violino ela vive o contorno particular da experiência sonora, onde a singularidade é
reconhecida como algo de valor. No caso de Larissa, tocar violino também foi percebido como
prestígio.
Palavras-chave: voz, música, bullying.

School bullying and the study of violin


Abstract: We are beings surrounded by words. Unlike other primates, we speak, and our perception
of the human voice is extremely subtle. We can quickly decode nuances that expose moods and
states of mind, as well as various other particularities. The sound of a child's voice, just because of
the timbre, can be the trigger for bullying in school. Bullying is the phenomenon of group coercion
and can be found also in other primates. Living in a group is extremely important for us, but if a
person has a negative quality that sets them apart, it can cause them to feel victimized and in a state
of constant pressure. This article is a part of Field Diary, an ethnographic procedure, which explains
the bullying lived by a girl and how, through the study of violin, the stages of her life were different
in relation to the group. This new way that she sees herself takes on a singular and positive form. In
violin lessons she lives her life with a particular aura. It is a result of the sound experience, where
the singularity is recognized as something of value. In Larissa's case, playing violin was also
perceived as a prestige.
Key-words: voice, music, bullying.

Somos seres da fala. As palavras nos acompanham de tal forma que sem ela estaríamos
destinados a gritos e guinchos, assim como os outros primatas. Possuímos percepção
extremamente apurada da linguagem falada. Pequenas modificações de entonação ou
articulação da voz causam em nós uma sucessão de impressões que identificamos
imediatamente. O som da voz pode ser considerado agradável ou agressivo, e por meio desse
mesmo som uma criança pode sofrer bullying na escola. Apenas a percepção da diferença no
timbre da voz ou na região onde ela é utilizada é suficiente para causar estranhamento e
impulsiona a pressão do grupo contra uma criança.
O objetivo do presente artigo é indicar como a música pode abrir espaços
transformadores no cotidiano escolar de crianças que vivem a brutalidade do bullying. Para

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abordar o tema utilizarei parte do Diário de Campo1 , procedimento etnográfico de pesquisa


que acompanha minha observação. Ele contém o relato de ações de violência cotidiana de
bullying direcionado a uma menina. Bullying é uma ação grupal coerciva e também pode ser
encontrado em outros primatas. Apesar de vários estudos analisarem o sofrimento por meio
do bullying infringido a crianças no espaço escolar (LARA-ROS.2017, PUREZA.2016), é
necessário ampliar a pesquisa na busca de caminhos que possam redimensionar os atos, e
tornar positivo o contorno das relações.
Vários pesquisadores têm se dedicado ao estudo de pessoas em sofrimento e os
processos de modificação que podem ocorrer nos momentos de crise, entre eles Boris
Cyrulnik (CYRULNIK,2009,s/ano), Michèle Petit (PETIT 2009a,2009b), Viktor Frankl
(FRANKL,2008) e Aaron Antonovsky (ANTONOVSKY,1979). No episódio aqui
apresentado, o que determina o início da tirania grupal é a voz. Ao falar há um enunciado
direcionado ao grupo, que nos aceita ou rejeita. Porque somos seres extremamente grupais,
segundo Waal (WAAL, 2010) Harari (HARARI,2015), e Dumbar (DUMBAR,
1998,2007,2014), a reação positiva do grupo é muito valorizada e a reação negativa do grupo
é algo assustador.
Fazer música pode causar um tipo particular de relacionamento entre as pessoas, de
acordo com John Sloboda (SLOBODA,2010). Quando tocamos a voz silencia e entra em cena
outro tipo de voz: o som do instrumento. A música delimita grupos e pode invocar lembranças
pessoais, valores e episódios. Andreas Lehmann (LEHMANN,2007) argumenta que tocar um
instrumento reveste o instrumentista do efeito prestígio. Para Martin Clayton (CLAYTON,
2012) a música é instrumento de grande flexibilidade para mediar relações.
O episódio relatado é posto em cena por meio de Rodrigo 2 , professor na escola. Seu
TCC- Trabalho de Conclusão de Curso, é desenvolvido em torno das aulas de violino, que
acontecem semanalmente. Como anteriormente acordado com o professor de violino, ele
senta-se ao fundo da sala. Observa, anota, sorri. Ao final do primeiro dia ele me disse: “estou
impressionado com a Larissa 3. Ela aqui é muda! No dia a dia da escola ela é rude, grosseira,
assim como a voz dela. Ela nem sabe o quanto é hostil. Debate com os professores. Já chegou
a discutir comigo e com outra professora ao mesmo tempo. Ela diz que tenho preconceito

1 Diário de Campo é um procedimento etnográfico utilizado inicialmente por Bronislaw Malinowski, e que
propõe a técnica de investigação por meio de registro detalhado dos eventos.

2 Nome modificado por proteção.

3 Nome modificado por proteção à criança.

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contra a personalidade dela” e prossegue com a voz abafada: o gênero dela. As crianças a
tratam como homossexual, e perguntam quando ela vai assumir que é gay. Ela fala muito alto,
é meio masculinizada. Não sei de onde tira tanta agressividade.”
Nesse momento, em meio ao ruído das crianças que guardam partituras, instrumentos e
estantes, ouço uma voz que reconheço: é grave, potente, brilhante. É Larissa. Só então
percebo que ela enfrenta bullying por um simples motivo: o timbre da voz. Larissa, ao viver a
pressão do cotidiano não arrefece, contra-ataca com gritos e resistência. O resultado não é
melhor. Recebe advertências da direção e é percebida como uma das Crianças Problema na
escola.
A voz humana possui uma gama incrível de características. Ao falar com alguém,
mesmo que seja ao telefone, imediatamente percebemos seu estado de humor, idade, cultura,
sexo, nível social. Somente por meio do som falado sabemos com precisão a coragem, o
temperamento, se introvertido ou extrovertido. A voz tão logo é ouvida evoca a pessoa no
total.
O som da voz nos distingue de tal forma que a partir dos seis meses de idade, podemos
saber a qual cultura pertence um bebê. Cada infante constrói, pouco a pouco, a sua própria
voz se adaptando às formas sonoras utilizadas pelas pessoas que falam com ele (PETIT,
2009a). O ato de falar é uma apropriação sonora e representação de si. Sem o acesso à voz
continuaríamos acomodados aos guinchos, sem poder atingir nossos destinos de seres da
palavra. Quando falamos há outro que nos ouve. Implica em que se estabeleça interlocução.
Sempre que falo algo, falo a alguém. Há uma intenção. Ao falar, eu me falo e defino o outro
em relação a mim. Falar pode ser entendido como comportar-se significativamente frente ao
outro. No caso de Larissa, ao emitir a singularidade do seu som ela é rejeitada, é tida como
inadequada. O grupo impõe a ela opressão. Sem dúvida estamos diante de alguém condenado
pelo coletivo. Essa é uma das grandes crueldades do grupal.
O bulllying é um fenômeno bastante conhecido nas escolas. Ele é caracterizado por
diversas formas de agressão. A vítima geralmente possui alguma característica que é vista
pelo grupo como imprópria. A provocação é repetida de forma incansável sempre em caráter
degradante e ofensivo. Mesmo quando a vítima rechaça e se defende, ainda assim o processo
continua e se aprofunda, resultando em longos períodos de submissão. O fenômeno consiste
em encontrar um indivíduo identificado com algum delito ou diferença, responsabilizá-lo por
isso e expulsá-lo do grupo. Com isso proporciona aos membros remanescentes o sentimento
de inculpabilidade e reconciliação. São padrões coletivos de comportamento.

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Esse comportamento também é encontrado entre grupos de outros primatas, para


apaziguar tensões. Cyrulnik se refere a essa conduta como Bode Expiatório (CYRULNIK, s/
ano). O autor comenta a hierarquização entre dois grupos de saimiris, pequenos macacos
tropicais. Os machos desafiam-se em duelos violentos. Estabelece-se um grupo vencedor. No
grupo dos vencidos assiste-se a modificação das estruturas sociais. Após estabelecer nova
composição indicam qual deles será o Bode Expiatório. A partir de então, o grupo concentra a
agressividade nesse alvo escolhido que vai emagrecer rapidamente, alterar seu estado geral,
sofrer contínuos ferimentos e muitas vezes morrer. Por meio desse artifício, os outros machos
do grupo poderão apaziguar a tensão, descarregar a agressividade que não ousaram utilizar
contra o grupo vencedor. O grupo tranquiliza-se.
Entre nós, quem é identificado como Bode Expiatório sente-se inferior, rejeitado e
culpado. Acredita ser incapaz de atingir os ideais do acusador. Apesar de, à primeira vista, a
melhor resposta ser o afastamento desse indivíduo do grupo, no ambiente escolar o
procedimento torna-se difícil. A modificação necessária seria o deslocamento para outra
escola. Mas ao tirarmos o sofredor do ambiente de sofrimento, também o retiramos de seu
grupo de pertencimento.
Somos seres grupais. Cada um de nós traz a poderosa marca do instinto de rebanho. Há
poucos animais despojados desse instinto. “O vínculo é o elemento essencial de nossa
espécie. Não há nada que nos faça mais felizes” (WAAL, 2010: 29). Segundo o autor, com
frequência somos inclinados a pensar que o dinheiro, a fama e o sucesso sejam elementos
realmente importantes, mas o que faz bem às pessoas é o tempo que elas passam com os
amigos e a família. Waal (WAAL,2010), Harari (HARARI, 2015) e Dumbar (DUNBAR,1998,
2007, 2014), entre outros pesquisadores, enfatizam a importância do vínculo entre nós
humanos Nosso cérebro desenvolveu-se com a evolução do vínculo afetivo. O sistema
límbico foi acrescentado ao cérebro, e isso possibilitou emoções como afeição e o prazer.
Estar em grupo é de tal forma importante para nós que Cyrulnik descreve os seguintes
acontecimentos na França: em Mayenne os adolescente se suicidavam-se 50% a mais que a
média nacional. Pouquíssimos sofriam de distúrbios psíquicos. Quase todos eram
dessocializados. O grupo de risco eram meninas entre 15 e 24 anos, e os problemas eram
provenientes em escolas. “As soluções são essencialmente culturais, pois, nesse estágio do
desenvolvimento da pessoa, a incitação para viver é extrafamiliar” (CYRULNIK,2007:139).
Acontece que para aquelas meninas o exterior era vazio. Larissa tem um pequeno grupo de
amigas que a acompanha dando suporte, mas a força da opressão do grupo é muito intensa.

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De volta à cena de final de aula, Larissa levanta, arruma seu material, guarda o violino e
sai sorridente. No grupo de aulas de violino ela é exemplar. É estudiosa, concentrada e jamais
foi percebida como criança problema. Com frequência ajuda outras crianças quando
encontram dificuldades. Em nenhum momento teve qualquer atitude agressiva. A imagem de
Larissa no grupo de violinos é completamente positiva. Entendemos que cada pessoa pode se
transformar se houver espaço que favoreça a transformação.
O ambiente do fazer música é neutro e todos são completamente novos ao iniciarem.
Idade, classe social, cor da pele ou qualquer outro sinalizador de diferenciação encontra-se em
segundo plano. As aulas de violino acontecem como espaço governado por um tempo
particular, feito de lentidão e de pequenos detalhes. Há um ritmo sensorial onde pouco se fala,
mas se ouve. O exercício é atento a pequenos detalhes sonoros como o arco na fricção das
cordas, o lugar exato de cada dedo ao pressionar a corda. Ali, fala-se uma língua diferente.
Um ambiente estético. O espaço de manobra para Larissa é anunciado.
Do falar ao tocar violino. A música cria para Larissa um novo grupo de contexto e isso
amplia a margem de leitura sobre ela, revelando outra face que é entendida como diferencial
positivo. Ao estudar música a ideia de que cada um pode ter sua própria voz é imediatamente
percebida. Essa é uma das marcas do músico cultivadas desde o começo: sua singularidade.
Ao iniciar as aulas de violino, Larissa costura uma forma diversa de dizer sobre si mesma,
pois somos construídos por inúmeras pequenas histórias. Ao tecer peças e pedaços do
universo, ela faz uma nova roupagem, se reconta. Nasce outra versão de si mesma.
A ação de fazer música, ou seja, produzir e organizar sons, é motivada inicialmente pela
curiosidade, sem a intenção imediata de comunicar algo. A pessoa está inclinada a manejar o
instrumento, tocar para si mesma, experimentar. O que está em jogo é o próprio prazer de
produzir som, sem qualquer compromisso. Acontece que nesse exato momento tem início
uma forma modificada de percepção de si mesmo e do outro; o escutar e o ser escutado. E
quando os estudantes tocam juntos, a ação individual torna-se então em ação com o outro. A
relação entre as pessoas passa por outro nível de compreensão, diferente do que foi
estabelecido anteriormente. Ao mesmo tempo o sujeito está tocando para si mesmo e em
contato com o outro. Forma-se o binomio ação-relação. A linguagem é revestida de roupagem
diferente, a voz falada se cala e outra voz toma o cenário: o som do instrumento.
A música é ferramenta de extrema flexibilidade para modelar e mediar relações entre si
mesmo e outras pessoas (CLAYTON, 2012). Em toda nossa histórica como humanidade, a
música tem sido usada como instrumento de interação. Fazer música em grupo contribui para

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

alargar as fronteiras de cada um, pois nossa contribuição individual torna-se mais significante.
Nosso esforço é amplificado para além de nossas habilidades. É necessário adquirir a
desenvoltura de coordenação entre o meu som e o som do outro. Algo original é realizado no
encontro das pessoas. Quando tocamos juntos descobrimos o valor e importância de cada um
em momentos diferentes. (SLOBODA,2010)
A música envolve o grupo e cria identidade. Desde aborígenes, no norte da Austrália,
que possuem cantos para tipos diferentes de clãs, que não podem ser entoados por outros clãs,
até os times de futebol no mundo moderno e industrializado, que possuem seus próprios
cantos e ‘gritos de guerra’ aclamados nos estádios. A música delimita grupos além de ser
associada a acontecimentos, podendo invocar memórias pessoais de relação emocional, assim
como valores e eventos. (LEHMANN,2007)
Outra característica que acompanha quem toca um instrumento é o efeito prestígio.
Cada cultura musical constrói uma hierarquia social de valores, e tocar um instrumento como
violino, no mundo ocidental, envolve o instrumentista em algo de valor e institui o olhar
diferenciado diante do grupo (LEHMANN,2007). O violino representa a orquestra e carrega a
aura relacionada a dificuldade, delicadeza e singularidade. Conseguir fazer algo que nos
diferencia causa orgulho e sensação de importância. “Ocupar com orgulho seu lugar físico,
afetivo, psicológico e social, é isso o que o fato de pertencer possibilita. O orgulho é
importante porque facilita a construção da identidade” (CYRULNIK,2007:81). Ter orgulho de
si mesmo tinge o comportamento com importância. A narrativa de sofrimento transforma-se
em história de vitória. No grupo de violinos Larissa é revestida de valor.
A voz de Larissa a tornava diferente. O som grave que produzia fez cair sobre ela o
peso do que é diferente como indesejado e inaceitável. Com isso inicia-se o bullying, a
perseguição contínua. A pressão onde qualquer resposta que ela tentasse para se defender
somente aumentava a incitação à rejeição. Quando Larissa inicia o estudo de violino percebe
que nesse espaço o som é importante e não envolve julgamento entre o grave ou agudo. É
lugar de apreciação sonora, onde, apesar de ensaiarem as mesmas linhas melódicas, cada um
possui certa maneira particular de tocar. Tocar violino é algo que traz prestígio. Larissa é
resgatada do universo do inaceitável para o do admirável. Isso demonstra a importância do
estudo de como a música pode criar possibilidades de transformação em momentos de
sofrimento.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Referências
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Camila Boldrini. São Paulo: Editora 34.
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fenômeno de bullying na infância: uma revisão sistemática da literatura. Curitiba:
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Paulo: Companhia das Letras.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Desenvolvimento musical e musicalidade

Flávia Fiorini da Silva


Universidade Estadual do Paraná, Campus I – Escola de Música e Belas Artes do Paraná
flaviafiorinidasilva@gmail.com

Ana Lúcia Vasquez


Universidade Estadual do Paraná, Campus I – Escola de Música e Belas Artes do Paraná
antropologiaembap@gmail.com

Resumo: O objetivo desse artigo é investigar, através de uma revisão de literatura, se a musicalidade é
uma habilidade capaz de ser desenvolvida. Para isso, é necessário descrever como ocorre o
desenvolvimento musical em culturas ocidentais e investigar as possíveis denominações que esse
termo recebe. Evidências arqueológicas mostram que a música tem estado presente na vida do
Homem desde as sociedades mais remotas. Referente a ela, encontra-se o termo musicalidade. Ainda
sem um significado consensual, porém tangível a habilidades e receptividades referentes a percepções
de tom e ritmo e aspectos de sensibilidade musical, discute-se que seja uma característica humana e
por isso, possível de ser desenvolvida. Os resultados indicam que o ambiente no qual o indivíduo está
inserido exerce forte influência na construção de habilidades e conhecimentos. As competências são
desenvolvidas mutua e conjuntamente com aspectos hereditários. Porém, o desenvolvimento depende
significativamente de estímulos específicos. A carência desses estímulos pode comprometer a
obtenção de certas habilidades, e entre elas, habilidades ligadas à musicalidade.
Palavras-chave: aprendizagem musical, desenvolvimento musical, musicalidade.

Musical development and musicality


Abstract: The purpose of this article is to investigate, through a literature review, if musicality is a
skill capable of being developed. For this, it is necessary to describe how the musical development
occurs in western cultures and to investigate the possible denominations that this term receives.
Archaeological evidence shows that music has been present in the life of human from the most remote
societies. Concerning it, one finds the term musicality. Still without a consensual meaning, but
tangible to the abilities and receptivities perceptions of tone and rhythm and aspects of musical
sensitivity, it is argued that it is a human characteristic and therefore, it is possible to be developed.
According to the bibliography consulted, the environment in which the individual is inserted exerts a
strong influence in the construction of skills and knowledge. Competences are developed together
with hereditary aspects. However, development depends significantly on specific stimuli. The lack of
these stimuli can compromise the attainment of certain abilities, and among them, abilities linked to
musicality.
Key-words: musical development, musical learning, musicality.

Introdução
Musicalidade é um termo que abrange uma série de significados. O termo é uma construção
histórica baseada nos aspectos sociais, políticos, econômicos e culturais de cada sociedade
(HALLAM, 2006) e a expressão “ser musical” depende de aspectos próprios de determinada
região, ou seja, as características que fazem uma pessoa adquirir essa qualidade são diferentes
em cada cultura (BLACKING, 1973). Em sua definição ocidental refere-se ao sentido
musical, ou seja, à transmissão e compreensão do que é ouvido e/ou tocado.
Ao mesmo tempo, evidências arqueológicas mostram que a música tem estado presente
na vida do Homem desde as sociedades mais remotas (BLACKING, 1973; PETRAGLIA,
2013). A partir disso, discute-se que a musicalidade é uma característica humana.

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Considerando que ela seja uma constitutiva do ser humano, observa-se que também pode ser
desenvolvida. Para Sloboda (2008, p.259), a música é interiorizada através do processo de
enculturação, resultante de experiências culturais, capacidades primitivas que “estão presentes
no nascimento ou logo após” e, “um sistema cognitivo geral que muda rapidamente, à medida
que são aprendidas muitas outras habilidades que têm base na cultura.”.
Tendo como base as pesquisas citadas, esse artigo tem por objetivo verificar se a
musicalidade é uma habilidade que pode ser desenvolvida. Para isso, será necessário
descrever as etapas pelas quais o desenvolvimento musical acontece nas culturas ocidentais e
investigar as possíveis denominações que esse termo se refere.

Desenvolvimento musical
As habilidades musicais são resultado da interação do Homem com o meio musical. Para a
cognição musical usa-se o termo enculturação para designar a “aquisição espontânea da
habilidade musical em crianças ocidentais, do nascimento até os anos centrais da
infância” (SLOBODA, 2008, p.259). Esse modo de apropriação tem duas características
principais: ausência de esforço autoconsciente e de instrução explícita. O termo também se
refere ao “desenvolvimento posterior de habilidades musicais especializadas, que acontecem
tipicamente em um ambiente educacional autoconsciente” (SLOBODA, 2008, p.259).
Segundo Sloboda (2008), a enculturação é possibilitada através da relação de três elementos
principais: um conjunto de capacidades primitivas presentes no nascimento ou logo após; um
conjunto de experiências advindas da cultura; e um sistema cognitivo que se adapta
rapidamente aos estímulos fornecidos.
Na cultura ocidental, a enculturação é o principal processo de aquisição da habilidade
musical pela criança até por volta dos 10 anos de idade. A partir disso, o treino passa a exercer
papel importante nesse desenvolvimento que, fundamentado na enculturação, pode chegar ao
que se define como expertise1 (SLOBODA, 2008).
Ainda na fase intrauterina, o bebê já demonstra uma escuta ativa. Ele reconhece (e
prefere em relação a outras vozes de mulheres) a voz materna a partir do terceiro dia de vida
(DECASPER; FIFER apud ILARI, 2002) além de “histórias (DeCasper e Spence, 1986),
rimas, parlendas (DeCasper et al, 1994) e canções (Lamont, 2001) ouvidas durante o último

1
“Excelência em uma determinada habilidade” (SLOBODA, 2008, p.260).

493
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

trimestre da gravidez” (apud ILARI, 2002, p.84). Existe também a percepção de contornos
melódicos, os quais, para os bebês, são mensagens afetivas (ILARI, 2002).
Após o nascimento, bebês demonstram percepção acerca do fraseado musical. Eles têm
preferência por “pausas naturais (inseridas no final das frases musicais)” a pausas artificiais
(que cortavam a frase musical) (ILARI, 2002, p.86). Estudos também constataram que até um
ano de idade, os bebês já conseguem perceber diferentes células rítmicas e fórmulas de
compasso (ILARI, 2002).
A primeira forma de consciência musical dá-se através da diferenciação de sequências
musicais de não-musicais. Para isso, é necessário que a criança já seja capaz de perceber
aspectos essenciais do som, como variações na altura e no ritmo. Por volta dos cinco meses de
idade, eles conseguem discriminar estruturas sequenciais e padrões rítmicos. Aos seis meses
de vida, ele demonstra, por meio de expressões faciais, preferências por sons “sensualmente
bonitos” (MOOG apud SLOBODA, 2008, p.264). Por volta dos nove meses, ele passa a
realizar o “balbucio cantado”, mas sem qualquer relação de altura e ritmo com a melodia. A
partir do primeiro ano, a criança começa a imitar alturas cantadas e a demonstrar um
comportamento musical importante: a imitação entoacional da fala , ou seja, a exploração pré-
vocal, denominada balbucio, por glissandos2 microtonais3 em diferentes tons. Até essa idade,
há pouca evidência “de que as crianças guardam muita informação musical das canções que
ouvem com frequência” (SLOBODA, 2008, p.267). Acredita-se que nesses casos, o
reconhecimento de determinada canção ocorra pela palavra, timbre ou textura.
A primeira grande mudança na enculturação musical ocorre por volta dos 18 meses,
quando a criança passa a realizar o canto espontâneo. Nessa fase, ela utiliza palavras isoladas
com alturas discretas estáveis para experimentar a construção de intervalos melódicos. O
canto espontâneo se desenvolve gradativamente. No início, a criança projeta intervalos
aproximados de segundas e terças, maiores e menores. À medida que a criança caminha para
o segundo ano de vida, ela acrescenta intervalos de quartas e quintas. As canções são
repetitivas em termos rítmicos e melódicos e o uso de pausas se dá apenas por necessidade de
respiração. Entre o segundo e terceiro aniversário, ela alcança uma afinação relativamente

2
“Efeito obtido com instrumento de cordas, sopro, teclado ou no canto, que consiste em saltar de uma nota à
outra com pouco ou nenhuma distinção dos sons intermediários” (DOURADO, 2004, p.148).

3Microtom: “Intervalo menor do que o SEMITOM” (DOURADO, 2004, p.205). O semitom equivale à metade
de um tom inteiro (DOURADO, 2004).

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correta e seus cantos espontâneos passam a ser mais longos. As canções também passam a
demonstrar maior organização interna, porém a criança ainda não percebe que existe uma
estrutura hierárquica que conduz à finalização (SLOBODA, 2008). A imitação de canções
conhecidas começa por volta dos dois anos e meio. Essas imitações tendem a acertar
primeiramente o ritmo e o contorno melódico e posteriormente, os intervalos com precisão. A
criança só conseguirá cantar canções inteiras durante seu terceiro e quarto aniversário e
apenas aos cinco anos, as reproduzirá de maneira correta (SLOBODA, 2008).
À medida que a criança cresce, a canção espontânea torna-se mais longa, porém cada
vez mais rara. Aos cinco anos, a criança procura por reproduzir as canções que ouve com
precisão, tentando evitar erros. Gardner e Wolf (apud SLOBODA, 2008, p.272) citam que
nessa fase a criança passa do mapeamento topológico, no qual a criança representa os
acontecimentos com relações aproximadas de forma e tamanho, para o mapeamento digital.
Nele, existe “um amor pela repetição exata” (SLOBODA, 2008, p.272). As crianças anseiam
pelas mesmas músicas e histórias por semanas ou até meses. Graças a esse estágio, a criança
forma um novo nível de conhecimento musical, mantendo, por exemplo, uma única
tonalidade no decorrer de uma canção e conseguindo construir algo musical a partir de um
pulso já existente (MOOG apud SLOBODA, 2008). Ainda nessa fase, a criança possui
conhecimentos implícitos de métrica e harmonia, porém não consegue utilizá-los de maneira
explícita. Ou seja, ela não marca “o pulso de maneira confiável” e ainda não percebe
dissonâncias grandes (SLOBODA, 2008, p.276).
Entre os cinco e os 10 anos de idade, o desenvolvimento musical consiste na
concretização de pensamentos reflexivos a respeito de estruturas e padrões musicais
(SLOBODA, 2008, p.278). Entre os cinco anos e a fase adulta, o juízo reflexivo torna-se cada
vez mais complexo, desde a percepção de dissonâncias à violação de “estruturas musicais
comuns” (SLOBBODA, 2008, p.282). Outra habilidade desenvolvida é a sensibilidade
estilística, descrita como a capacidade de perceber se dois excertos musicais fazem parte da
mesma música, compositor ou período. Coincidindo com a Teoria de desenvolvimento de
Piaget (de pré-operacional para operacional), essa fase permite a pessoa “classificar
explicitamente a música como algo que se ajusta a regras e estilo, e por uma melhora
crescente em tarefas de memória e percepção sobre as sequências que conformam com as
regras” (SLOBODA, 2008, p.284).

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Até o início da pré-adolescência, a criança possui uma imaginação extremamente fértil.


No âmbito musical, os alunos “estão mais receptivos à música. (...) Eles não apenas ouvem
bem, mas se movimentam, dançam, cantam, criam, improvisam, imitam, representam, tocam
e, sobretudo, apreciam a música com entusiasmo” (ILARI, 2009, p.43), além de utilizarem
notações inventadas para a música ouvida.

Musicalidade
O termo musicalidade é frequentemente utilizado, porém ainda carece de definição
consensual (HALLAM, 2006). Gembris (apud CUERVO 2009) relata que houve três
significados diferentes desse termo. O primeiro, entre os anos de 1880 a aproximadamente
1920, teve um cunho de discriminação entre o que era considerada música de qualidade e o
que não era. A segunda fase, a partir de 1920, foi relacionada aos testes de habilidades
musicais que surgiram no início do século XX. O termo musicalidade ou talento era
classificado “como sendo uma aptidão ou habilidade natural que era o responsável pela
atividade musical do indivíduo.” (SERAFINE apud WIESE, 2011, p. 18). O termo abrangia
apenas aspectos e habilidade musicais sem considerar as perspectivas socioculturais do
indivíduo. Nesse contexto, tanto Hallam (2006) quanto Blacking (1973) defendem que a
musicalidade só pode ser mensurada quando comparada a padrões existentes em uma mesma
cultura e que tais testes costumam considerar habilidades musicais apenas na música ocidental
(BLACKING apud WIESE, 2011).
O terceiro e último significado é o mais utilizado no momento e valoriza o discurso
musical do indivíduo, ou seja, essa fase “é destacada como a de geração de sentido musical,
relacionada à habilidade musical de compreender e transmitir o sentido da música que está
sendo executada, ouvida ou criada.” (CUERVO, 2009, p. 54). Para Hallam (2006), o termo
assume diversos significados, como: habilidade, aptidão, potencial e talento. Para Queiroz, a
musicalidade deve ser considerada como uma maneira de percepção (apud WIESE, 2011),
não apenas da percepção da música e sua criação, mas de sua relação com o mundo
(QUEIROZ, 2006).
Levitin (apud WIESE, 2011, p.23) relata outros aspectos que podem ser considerados
parte da musicalidade: “os hábitos de escuta, o prazer e a memória musicais, e o nível de
envolvimento de uma pessoa com a música”. Para Cuervo (2009) a musicalidade é o meio

496
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

pelo qual o performer transmite uma ideia pessoal ao ouvinte. Esse discurso pode estar
inserido em uma criação ou na interpretação de uma composição alheia. Swanwick (apud
WIESE, 2011), educador e pesquisador musical britânico, caracteriza a musicalidade como
um discurso musical, no qual se mostra através da expressividade ao tocar.
Queiroz (2006, p.2) aprofunda o assunto e defende que a musicalidade porta as
características da pessoa que a manifesta, transmitindo “seus potenciais, tendências,
deficiências, limitações, habilidades, traumas etc.” O autor ainda propõe os elementos pelos
quais a musicalidade é transmitida: escalas (diatônicas maiores e menores, pentatônicas e
modais) e suas harmonizações; intervalos - “diferentes tensões, gravitações e repousos entre
os tons musicais, isto é, suas qualidades dinâmicas, sejam eles simultâneos (harmonia) ou
em sequência temporal (melodia)” (2006, p.3); ritmos métricos e livres - diferentes fórmulas
de compasso e suas acentuações; andamentos e suas graduações, pausas e fermatas;
intensidade - dinâmica de volume; timbre - a exploração de timbres no mesmo instrumento;
voz humana - respiração, colocação e sua utilização de acordo com os itens já citados.
Para concluir, Sacks (2011) amplia o termo definindo-o como “uma vasta gama de
habilidades e receptividades, das mais elementares percepções de tom e ritmo aos aspectos
superiores da inteligência e sensibilidade musical” (SACKS, 2011, p. 109), sendo essas,
indissociáveis umas das outras.

Discussão
Segundo Hallam (2006), existiram duas vertentes para a origem da musicalidade no Homem.
A primeira atribui aos seres humanos a capacidade de desenvolvimento musical. Essa vertente
é embasada por pesquisas neurológicas e sugere que: a apreciação musical é uma habilidade
encontrada em estruturas cerebrais desde o início do desenvolvimento neural; o
processamento musical é estruturado em dois elementos principais: a decodificação de alturas
musicais (notas ao longo de uma escala musical) e a noção de batidas regulares (pulso). A
segunda vertente sugere diferenças individuais determinadas geneticamente. Contudo, os
comportamentos e traços humanos dificilmente podem ser associados a genes específicos e,
como foram demonstradas em pesquisas recentes, as habilidades musicais são resultado de
uma gama de combinações genéticas, além de questões físicas, cognitivas e emocionais
(HALLAM, 2006).

497
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Hoje, a corrente mais aceita é a que o ambiente no qual o indivíduo está inserido exerce
forte influência no desenvolvimento musical. Em paralelo, estudos começam a demonstrar
uma relação entre herança genética e influência do ambiente. Conforme essa linha, o processo
de desenvolvimento de alguma habilidade é facilitado quanto maior o conhecimento já
adquirido pelo indivíduo. As estruturas cerebrais são altamente adaptáveis e conforme o
acúmulo de experiências musicais e a inserção em um ambiente rico musicalmente são
capazes de aprimorar determinadas competências. (HALLAM, 2006) Essa teoria, embora
sendo a mais aceita hoje, possui alguns obstáculos. Ao tratar do savantismo4 e de crianças
prodígio, pesquisas sugerem que algumas funções cerebrais agem independentemente5 .
Piaget (apud CUERVO, 2009), descreve uma lista de fatores que influenciam no
desenvolvimento intelectual da criança: fatores biológicos que agem conjuntamente aos
estímulos de aprendizagem e experiência; experiência física a partir do contato com o objeto;
fatores sociais – estímulos e interação cultural; e equilibração- a “aprendizagem nova gera
um jogo de regulações e compensações que exige uma equilibração progressiva e dinâmica,
sendo esse processo decisivo no desenvolvimento.” (CUERVO, 2009, p. 56).
Cuervo (2009), baseando-se na teoria de Piaget, propõe uma analogia desses fatores
com o desenvolvimento musical. Segunda a autora, assim como ocorre no desenvolvimento
intelectual, os agentes que contribuem para o desenvolvimento musical agem mutuamente.
Dessa forma, os componentes responsáveis pela musicalidade vão além de aspectos técnicos
específicos (CUERVO, 2009). A autora cita que elementos como ambientes familiares e
escolares e a vivência musical em suas diversas esferas também são peças formadoras da
musicalidade. Todas as informações recebidas pelo sujeito ao longo de uma trajetória e toda a
interação que elas propiciam com o meio são fenômenos fecundos para o desenvolvimento de
determinadas habilidades, que são construídas gradativamente (CUERVO, 2009).
Sloboda (2008, p.25), assim como Blacking (1976) e Hallam (2006), defende que “tanto
a linguagem quanto a música são características da espécie humana que aparentam ser
universais para todos os seres humanos e específicas dos seres humanos”. Ele alega nessa
citação que todos os seres humanos em geral são capazes de desenvolver essas competências.

4
“(...) distúrbio psíquico com o qual a pessoa possui uma grande habilidade intelectual aliada a um déficit de
inteligência. Tais habilidades são sempre ligadas a uma memória extraordinária, porém com pouca compreensão
do que está sendo descrito.” (SINDROME...2008. Disponível em http://www.universoautista.com.br/.

5
Ver mais em HALLAM, 2006.

498
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Porém, se nem todas as pessoas adquirem o mesmo grau de habilidade é porque existem
condições específicas para tais desenvolvimentos. Assim, “lesões cerebrais ou carência de
experiências apropriadas” são determinantes nesses processos. (SLOBODA, 2008, p. 25)
A afirmação de Sacks (2011) também converge para essa ideia. Ele descreve o resultado
obtido por Suzuki através de seu método (de mesmo nome) ao ensinar crianças a tocar
violino. O método, fundamentado na imitação, comprovou que quase todas as crianças
ouvintes são capazes de tocar um instrumento musical (SACKS, 2011). Sacks ainda tece uma
analogia com a linguagem. Praticamente todas as pessoas desenvolvem essa competência por
ela fazer parte do ambiente em que criança cresce. A música, por outro lado, nem sempre está
presente e, como qualquer outra habilidade, necessita de determinados estímulos para
desenvolver-se inteiramente.

Considerações finais
A musicalidade é um termo abrangente e adquire diferentes significados conforme a cultura
que a analisa e percebe. No ocidente, geralmente compete habilidades musicais como
decodificação de alturas dentro de uma escala e de ritmos, além de habilidades referentes à
apreciação, memória e nível de envolvimento com a música. Para a educação musical, o
termo mais utilizado na cultura refere-se à transmissão de um discurso musical. Esse discurso
dá-se através da expressividade ao tocar.
Na cultura ocidental, o desenvolvimento musical ocorre principalmente através da
enculturação e pesquisas demonstram que o ambiente no qual o indivíduo está inserido exerce
forte influência na construção de habilidade e conhecimentos. Por exemplo, o sistema de
escalas é diferente de acordo com a região. No ocidente ela é construída a partir de tons e
semitons. No oriente, divide-se a escalas em partes ainda menores de semitons, o que para
nós, soaria desafinado.
A construção dessas competências é desenvolvida mutua e conjuntamente com aspectos
hereditários. Assim, formam-se as características ditas musicais em determinada cultura.
Porém, o desenvolvimento depende significativamente de estímulos específicos. A carência
desses estímulos pode comprometer a obtenção de certas habilidades. A menos que sejam
portadoras de lesões, más formações ou outros déficits biológicos, a maioria das pessoas é
capaz de desenvolver habilidades musicais. Tal fato foi observado com o Método Suzuki,

499
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

onde quase todos os alunos foram hábeis a tocar violino com significativa qualidade, de
ouvido e por imitação.

Referências
Blacking, J. (1973). How musical is man?. Seattle: University of Washington Press.
Cuervo, L. C. (2009). Musicalidade na performance com a flauta doce. Dissertação (Mestrado
em Educação). Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre.
Dourado, H. A. (2004). Dicionário de termos e expressões da música. São Paulo: Editora 34
Ltda.
Hallam, S. Musicality. In: McPherson, G. (2006). (Org.). The child as musician. p. 213 – 238.
New York: Oxford University Press.
Ilari, B. S. (2002). Bebês também entendem de música: a percepção e a cognição musical no
primeiro ano de vida. V. 7, 83-90. Revista da ABEM. Porto Alegre.
Ilari, B. S. (2009). A música na infância e adolescência, um livro para pais professores e
aficionados. p. 42-61. Curitiba: Editora IBPEX.
Petraglia, M. S. (n.d.) Musicalidade: um atributo humano. Extraído de http://
ouvirativo.com.br./
Queiroz, G J. P. (2006). Musicalidade das diferenças: como desenvolver a musicalidade
individual. Extraído de http://biblioteca-da-musicoterapia.com/bibliografia.php.
Sacks, O. (2011). Alucinações musicais. São Paulo: Editora Schwarcz LTDA.
Sloboda, J. A. (2008). A mente musical: psicologia cognitiva da música. Trad. de B. Ilari e R.
Ilari. Londrina: EDUEL.
Wiese, T. (2011). O(s) conceito(s) de musicalidade na perspectiva de experts, professores e
bacharéis da área de flauta doce. Dissertação de Mestrado em Música. Curitiba:
Universidade Federal do Paraná.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

A Compreensão Musical em Crianças Pequenas: um estudo exploratório


dentro de um projeto de extensão

Bruna Canedo França


Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
brunnacanedo@gmail.com

Mariana de Araújo Stocchero


Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
mariana.stocchero@ufms.br

Resumo: Este artigo é um recorte do Trabalho de Conclusão de Curso desenvolvido no ano de 2016
que se caracterizou como um estudo exploratório, com abordagem qualitativa, e teve como tema a
compreensão musical de crianças de 4 e 5 anos dentro de um projeto de extensão universitária. Como
objetivo, buscou-se investigar sobre a compreensão musical da criança e como esta é manifestada
durante as referidas aulas. Para tanto, fez-se necessário pesquisar, por meio de bibliografia
especializada e da observação a campo, como se dá o processo da compreensão musical na primeira
infância. Como técnica de coleta de dados, a observação não participante in loco de 6 aulas com
filmagem das principais atividades e a descrição das mesmas, resultou na análise dos dados, tendo o
referencial teórico pesquisado servido de base para o entendimento das situações observadas. Os
resultados reforçam a ideia de que as experiências concretas são fundamentais para o desenvolvimento
da compreensão musical nas crianças, bem como, as estratégias didáticas utilizadas pelo professor,
também exercem influência. Conhecer sobre os processos de compreensão musical auxiliam o
professor de música que desenvolve atividades com esta faixa etária e contribui com o tema música na
primeira infância.
Palavras-chave: compreensão musical, musicalização, primeira infância.

The Musical Understanding in Young Children: an exploratory study in an extension project


Abstract: This article is a part of the undergraduate monography developed in the year 2016, which
was characterized as an exploratory study with a qualitative approach, and had as its theme the
musical understanding of 4 and 5 year old children within a university extension project. As an
objective, we sought to investigate the child's musical understanding and how it is manifested during
the lessons. Therefore, it was necessary to research, through specialized bibliography and field
observation, as the process of musical understanding in early childhood. As a data collection
technique, non-participant observation of 6 classes with filming of the main activities and their
description resulted in the analysis of the data, and the theoretical framework researched served as a
basis for understanding the observed situations. The results reinforce the idea that concrete
experiences are fundamental for the development of musical understanding in children, as well as the
didactic strategies used by the teacher, also influence. Knowing about the processes of musical
understanding helps the music teacher who develops activities with this age group and contributes to
the theme of music in early childhood.
Key-words: musical understanding, music education, early childhood.

Introdução
Este artigo é um recorte do trabalho de conclusão de curso desenvolvido na Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul no ano de 2016 que teve por objetivo investigar a
compreensão musical de crianças na primeira infância. Nos últimos anos, a produção
acadêmica sobre o assunto vem aumentando, contribuindo com o tema, ampliando a discussão
tão necessária sobre a música na primeira infância. Longe de resolver as questões primordiais
sobre o assunto, esta pesquisa especificamente, buscou conhecer sobre a compreensão
musical da criança e como esta é manifestada em aulas de musicalização infantil. Sendo

501
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

assim, como as crianças demonstram a absorção dos conhecimentos musicais adquiridos


durante essas aulas? Para averiguar essas questões, tivemos por objetivo, investigar, por meio
de bibliografia especializada e da observação a campo, o desenvolvimento da compreensão
musical na primeira infância. Para tanto, um levantamento bibliográfico sobre o assunto e a
observação de aulas de musicalização infantil dentro do PCIU - Projeto Coral Infantojuvenil
da UFMS - foram realizadas como um estudo exploratório, com abordagem qualitativa. Para
investigar tais objetivos nos referenciamos em trabalhos desenvolvidos na área (Caregnato,
2015; Maffioletti, 2013; Deckert, 2004; Beyer, 1995; etc.).

Música e primeira infância


A música se faz presente no cotidiano das crianças de várias formas, mesmo antes de seu
nascimento, quando ainda bebês, através de canções que embalam seu sono e, conforme
crescem, em brincadeiras e em jogos. Ouvir música, cantar uma canção, participar de
brincadeiras de roda e jogos de mãos, são atividades que irão despertar nas crianças o gosto
pelo fazer musical, além de proporcionar a vivência de elementos da linguagem musical (Ilari,
2009).
Maffioletti (2013) realizou uma pesquisa sobre as significações criadas pelas crianças
para obter a compreensão musical, que nos leva a refletir sobre os efeitos e papel da música
na educação e de como podemos, como educadores, fazer com que as crianças aprendam
conteúdos que possam enriquecer suas experiências com a música. São episódios onde as
crianças criam para si, oportunidades de aprendizagem ao explorar instrumentos musicais,
atribuem significados ao que fazem, interpretam suas experiências e extraem daí uma maneira
de compreensão.
As crianças atribuem significações ao que fazem. Durante as atividades, podem até
explorar os instrumentos de maneira semelhante, porém, as interpretações que elas fazem são
diferentes, particulares de cada uma. Para Maffioletti (2013), as crianças fazem uso das
relações como formas de abordar a realidade, na intenção de compreender, pois segundo a
autora:
[...] ter uma compreensão superficial ou uma compreensão mais aprofundada sobre
um determinado conteúdo vai depender do tipo de relação que a criança estabelece
no decorrer da experiência. Antes que ela possa estabelecer relações que exprimem
conexões de compreensão, a sua abordagem da realidade apoia-se na apreensão
imediata dos dados fornecidos pela percepção ou pelas sensações cinestésicas
(MAFFIOLETTI, 2013, p. 138).

502
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Esta autora acredita que para conseguir compreender o acontecimento ou o objeto, é


necessário o aluno tocar e sentir de maneira objetiva. Porém, destaca que o que se faz de
concreto durante a experiência tem de passar por uma reconstrução interna, para que as ações
de tocar, ouvir e apalpar “imitem internamente o que foi objetivamente vivenciado pelo
corpo”. Somente depois de interiorizadas é que podemos falar dos “processos de abstração, os
quais representam as ações práticas e suas significações no plano do
pensamento” (Maffioletti, 2013, p.138).
Tomando como base a perspectiva construtivista de Jean Piaget (Deckert, 2004;
Caregnato, 2015), podemos dizer que a aprendizagem se dá por um processo de construção,
através das ações do sujeito com o objeto e com o ambiente, por meio de esquemas e
conceitos. Esses esquemas são padrões de comportamento já organizados para a compreensão
da realidade, e que passam pelos processos de assimilação, que é quando a criança incorpora
algo novo a uma estrutura já conhecida, e de acomodação, que vem a ser a transformação na
qual o organismo passa para modificar os esquemas anteriores para se adaptar à nova
situação. Todo esse processo implica em desconstruir um conhecimento já assimilado para
reconstruí-lo e reorganizá-lo a um novo esquema cognitivo. Em suma, podemos dizer que “o
conhecimento se dá quando acontece um desequilíbrio quanto à conceituação de algo já
conhecido” (Deckert, 2004, p. 2). Transpondo esses conceitos para a educação musical,
podemos exemplificar da seguinte maneira: a criança ao entrar em contato com o instrumento,
como um xilofone, precisará explorá-lo de diversas formas para, só então, estar apta a adquirir
um novo conhecimento. Esta criança começa a organizar os sons tocando as teclas
aleatoriamente, em sequência (subindo e descendo) realizando glissandos e posteriormente
escala em graus conjuntos, este processo se caracterizou por assimilar um novo conceito na
prática (subir e descer, caminho sonoro, agudo e grave, graus conjuntos, escala) e adaptar este
conhecimento ao que já possuía. Segundo a abordagem piagetiana, podemos então dizer que o
processo de conhecimento se dá por meio de uma sucessão de equilibrações que levam a
ações e pensamentos cada vez mais complexos. Sendo então, “um restabelecimento do
equilíbrio não como o anterior, mas como um novo equilíbrio num nível superior,
funcionando como ponto de partida para um novo desequilíbrio” (Deckert, 2004, p.3).
Com base na teoria de Piaget, Swanwick e Tillman (1986, citado por Pereira, 2010)
elaboraram uma teoria de desenvolvimento musical a partir de análises das composições de

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

crianças, na qual elucida elementos comuns às experiências musicais significativas para as


mesmas, que são: material sonoro, caráter expressivo, forma e valor (possibilidade de se
conceber a música como um sistema simbólico). Após longas investigações, estes estudos
revelaram que o desenvolvimento musical se dá a partir de níveis ordenados e cumulativos. O
que se observou foi o avanço gradual da consciência das “camadas” essenciais do discurso
musical: material sonoro, expressão, forma e valor simbólico, a qual, deverá se manifestar na
performance, na apreciação e na composição desde que em condições apropriadas. Essas
quatro camadas estão divididas em dois níveis, que tendem a ser ora assimilativas e intuitivas,
ora acomodativas e analíticas. A espiral tem, então, duas dimensões: o lado esquerdo do espiral
refere-se à construção pessoal e o lado direito à interação social. O equilíbrio desse processo
dialético é garantido “pela contínua troca da estrutura de pensamento e a interação com o
outro” (REIS e OLIVEIRA, 2011, p. 3051).

Metodologia
A pesquisa teve como objetivo investigar a compreensão musical de crianças de 4 e 5 anos,
participantes de aulas de musicalização do grupo pré-coro PCIUzinho (grupo iniciante do
Projeto Coral Infantojuvenil da UFMS), na cidade de Campo Grande/MS, buscando
indicadores que pudessem evidenciar a compreensão musical durante atividades das aulas
para crianças dessa faixa etária.
O grupo participante da pesquisa constituiu em 10 crianças na turma 1, sendo 7
meninas e 3 meninos; e 8 crianças na turma 2, sendo 5 meninas e 3 meninos. A técnica de
coletas de dados utilizada nessa pesquisa foi a observação não participante in loco, ou seja, no
local em que o evento aconteceu, com filmagens das principais atividades desenvolvidas
durante as aulas de musicalização do referido grupo.
As aulas observadas aconteceram na sala de Prática de Ensino do Curso de
Licenciatura em Música da UFMS, que possui variados instrumentos para musicalização
infantil. Ao todo, foram filmadas 6 aulas e a observação das mesmas resultou em um
detalhado diário de campo. Para a realização das filmagens, foram utilizadas 2 câmeras
digitais e, eventualmente, complementadas com filmagens realizadas no celular, pela própria
pesquisadora, que de acordo com o planejamento diário, focava em determinados alunos
durante específicas atividades. As aulas tiveram os seguintes encaminhamentos conforme
tabela abaixo:

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Tabela 1: Resumo das aulas observadas


Elaborado pelas autoras

Análise e discussão dos dados


Com base na observação não participante, e na descrição das imagens coletadas, foi possível
analisar alguns comportamentos e gestos das crianças que puderam evidenciar a compreensão
musical das mesmas. Esses comportamentos foram observados por meio de três indicadores:
gestos corporais, expressões verbais e expressões gráficas.
‘Gestos corporais’ como meio para averiguar a compreensão musical da criança,
puderam ser observados durante a atividade com a música ‘O Cachorro’. A monitora toca ao
piano a música para que os alunos juntamente com a professora cantem e façam gestos
conforme altura e movimento sonoro da melodia da canção. Ainda com a música ‘O
Cachorro’, pode-se observar o indicador ‘Expressões verbais’ durante uma atividade de grafia
analógica, onde, ao som da música, a professora faz um gráfico de acordo com a altura da
melodia. Quando questionados sobre o que aconteceu com o som, uma aluna responde que ele
‘ficou grosso’, a professora explica então, que na verdade, o contrário ocorreu. Outra aluna
faz gesto com a mão, explicitando que o som subiu. Podemos observar que a primeira aluna
mencionada compreende o conceito, porém ainda confunde seu nome, já que na verdade o
som estava agudo e ela respondeu grave. Podemos perceber esse quase domínio também no
que se refere ao uso das nomenclaturas da altura (grave/grosso). Nesta atividade, podemos
observar que a utilização de gestos contribuiu para que as crianças pudessem associá-los ao

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

som, facilitando a compreensão da altura das notas. De acordo com Freire e Freire (2013), os
sinais corporais tornam mais clara a relação das alturas para os alunos. Ainda de acordo com
os autores, as “crianças pequenas tornam-se capazes de cantar, acompanhar os colegas e
visualizar o próprio movimento das notas” (Freire & Freire, 2013, p. 119). Sendo assim, o uso
de tal recurso pedagógico, facilita a compreensão dos pequenos e serve como experiência de
leitura corporal que antecede a grafia musical.
Em outro momento, depois de escutar a música ‘Introdução e Marcha Real do Leão’ do
Carnaval dos Animais de Camille Saint-Säens, os alunos interpretaram o leão fazendo gestos
e movimentos andando pela sala, e em seguida executaram a música tocando xilofones e
tambores. Em seguida, a professora pede aos alunos para irem à lousa escreverem o som que
ouvem. Ela coloca no aparelho de som apenas o trecho da música onde tocam os glissandos e
ostinatos. Depois de analisar todas as grafias, foram selecionadas as duas mais frequentes: 1)
emaranhado de linhas e 2) linha reta. Por meio de votação, os alunos escolhem a grafia que,
na opinião deles, mais se parecia com o som ouvido: o desenho 1 – emaranhado de linhas. É
colocado novamente o trecho da música que sugere o rugido do leão (glissandos), a
professora desenha simultaneamente enquanto ouve a música, o emaranhado de linhas nos
glissandos e traços pequenos no ostinato. Os alunos observam atentamente. Quando
perguntados pela professora do que se tratava a grafia na lousa, um aluno responde eufórico:
- ‘É o grito do leão!’, a professora responde que se trata da partitura do grito do leão e explica
que a partitura é onde se escreve a música. Em seguida, pede para as crianças ‘lerem’ com ela
a partitura, fazendo sons do glissando e a sílaba ‘ta’ no ritmo do ostinato.
Para Maffioletti (2013), ler uma partitura compreende em entender as regras que
conduzem os símbolos, a autora diz ainda, que a leitura e a escrita musical fazem parte da
construção do aprendizado em música. Sendo assim, a autora acredita ser necessário que as
crianças vivenciem um processo semelhante, para que o uso da escrita musical seja entendido
como uma necessidade lógica tornando-se uma forma de comunicação. Independentemente do
tipo da escrita – se convencional ou contemporânea – o importante é a produção de
significados compartilhados e discutidos no grupo, para então, adotar tais significações como
forma de representação.
Diante do que foi exposto, podemos dizer que a observação in loco e não participante,
foi uma etapa importante para este trabalho, visto que as filmagens coletadas contribuíram

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

para análise de vários aspectos, que mesmo a pesquisadora estando presente nas aulas, talvez
a mesma não atentaria para alguns detalhes e comportamentos que foram cruciais para trazer
reflexões sobre os processos da compreensão musical das crianças.

Considerações finais
Uma pesquisa de caráter exploratório, muitas vezes, suscita novos questionamentos, abre o
campo de investigação, promove a familiaridade do pesquisador com o ambiente/fato/
fenômeno (Gil, 2010). Durante a primeira etapa deste trabalho, tivemos um referencial teórico
que nos trouxe subsídios para compreender o pensamento da criança. Porém, as referências
sobre compreensão musical foram limitadas, visto que há poucas pesquisas em língua
portuguesa sobre o assunto. No entanto, depois de irmos a campo e analisarmos as imagens,
acabamos nos deparando com a necessidade de buscar, além do referencial já lido, outras
referências pertinentes, devido às hipóteses que surgiram ao observar o comportamento dos
alunos.
Vimos neste estudo que a experiência concreta é importante para o processo de
aprendizagem musical das crianças. Essas experiências servem como recurso para que a
criança compreenda de forma mais clara e objetiva conceitos musicais. Vimos também que a
professora usou de estratégias para auxiliar a compreensão das crianças: a estratégia
mnemônica ajudou na compreensão e execução do ritmo; os gestos corporais auxiliaram os
alunos a ter mais clareza na altura das notas facilitando a entoação e afinação da canção ‘O
Cachorro’. Na brincadeira Morto/Vivo musical, por exemplo, foi feita uma analogia entre
morto-grave e vivo-agudo. Depois de compreendido esse significado a criança deve
descontruir essa analogia para obter novo significado (grave e agudo como parâmetro
musical). Esta desconstrução é necessária ao processo de aprendizagem musical, como
pudemos observar.
Diante da importância da musicalização para o desenvolvimento infantil, podemos
salientar o papel do professor como mediador do aprendizado da criança, pois cabe a ele
propiciar um ambiente que estimule os alunos a aprenderem. Através das aulas de
musicalização, o professor pode envolver os alunos em atividades lúdicas e ricas que levam a
criança à experimentação e vivência musical significativa, contribuindo para a compreensão
musical dos pequenos. No entanto, para que o professor efetivamente consiga desenvolver

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

aspectos da compreensão musical, é necessário pesquisa, estudo e reflexão sobre a prática


pedagógica. Durante a análise dos dados, por meio das filmagens, não somente questões
referentes à compreensão musical emergiram, mas também sobre o processo de ensino e
aprendizagem como um todo. Para o professor é importante este olhar do pesquisador
reflexivo sobre a prática.
Como sugestão, para uma melhor análise da compreensão musical especificamente, faz-
se necessário um tempo de exposição maior das crianças nas atividades, bem como um tempo
maior de observação e pesquisa, sugerindo possíveis estudos longitudinais, onde
metodologias diversificadas possam ser testadas. Neste sentido, as atividades propostas
podem ser determinantes para a coleta de dados, uma vez que, focar em determinado tipo de
atividade, como a composição, por exemplo, traria resultados mais aprofundados sobre a
compreensão musical das crianças. Durante um estudo exploratório é comum acontecer mais
questionamentos do que encontrar respostas. Tais questionamentos levantam hipóteses
contribuindo para o tema, o que nos impulsionam a abordar mais profundamente o assunto, e
explorar, em estudos futuros, o leque de possibilidades que este trabalho nos proporcionou
nos indicando possíveis caminhos no campo da compreensão musical da criança na primeira
infância.

Referências
Caregnato, C. (2015).A compreensão musical da criança: o desenvolvimento da
simultaneidade em música a partir da obra de Piaget. Manaus: UEA Edições.
Beyer, E.S.W. (1995) A construção de conceitos musicais no indivíduo: perspectivas para a
educação musical. In: Revista da ABEM, vol. 9/10, (pp.22-31) Porto Alegre.
Deckert, M. (2004). Desenvolvimento cognitivo musical através de jogos e brincadeiras. In IV
Educere, II congresso nacional de educação. Extraído de http://www.pucpr.br/eventos/
educere/educere2004/anaisEvento/paginas/educere.htm
Freire, R.D.; Freire, S.F.C.D. (2013). Sinais Musicais: O Corpo como a primeira
representação da lógica musical pela criança. In: Ilari, B.S.; Broock, A. (orgs) Música e
educação infantil, (pp.99-121) Campinas: Papirus.
Gil, A.C. (2010) Como elaborar projetos de pesquisa. (5. Ed.) São Paulo: Atlas.
Ilari, B. (2009) Música na infância e na adolescência: um livro para pais, professores e
aficionados. Curitiba: Ibpex.
Maffioletti, L.A. (2013) Significações que possibilitam a compreensão musical. In: Ilari,
B.S.; Broock, A. (orgs) Música e educação infantil, (pp.123-145) Campinas: Papirus.
Pereira, L.R.O.M. (2010) As Atividades de apreciação musical em diálogo com o desenho:
Uma análise das primeiras expressões do conhecimento musical por crianças de 3 a 6
anos. Dissertação de Mestrado em Música não publicada, Universidade Federal de Minas
Gerais, Belo Horizonte.

508
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Reis, L. A.; Oliveira, F. N. (2011). Processos cognitivos e aprendizagem de música: uma


análise de aspectos figurativos e operativos na formação de conceitos musicais. In: X
Congresso Nacional de Psicologia Escolar e Educacional. (pp.3046-3062) Extraído de:
https://abrapee.files.wordpress.com/2012/02/conpe-trabalhos-completos-anais_x-conpe-
final.pdf

509
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Percepção e Ação no Método O Passo

Cassius Bonfim
cassiusbonfim@gmail.com

Luis Felipe Oliveira


Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
luis.felipe@ufms.br

Resumo: Este trabalho apresenta uma análise conceitual do método O Passo a partir de conceitos
advindos da teoria da percepção direta de J. Gibson. Inicialmente, descrevemos o método em questão,
focando-nos em seus pressupostos epistemológicos. Em seguida, apresentamos uma breve descrição
do conceito de percepção e ação, assim como as noções de affordances e invariantes, conforme a
teoria gibsoniana. Por fim, esboçamos a correlação entre os pressupostos do método O Passo com
esses conceitos.
Palavras-chave: pedagogia musical, percepção ecológica, psicologia cognitiva, cognição incorporada
e situada.

Perception and action in the method O Passo


Abstract: This paper presents a conceptual analysis of the method O Passo using some concepts from
the theory of direct perception developed by J. Gibson. Firstly, we describe such a method,
considering its epistemological assumptions. Then, we show a brief description of the concept of
perception and action, as well as the notions of affordances and invariants, as postulated by Gibson.
Finally, we sketch out the correlations among the method’s assumptions and the gibsonian notions.
Key-words: music pedagogy, ecological perception, cognitive psychology, embodied embedded
cognition.

Introdução

Este trabalho apresenta uma análise do método O Passo sob a luz de noções advindas de
teorias que podemos situar dentro do paradigma dinâmico da cognição. De maneira geral,
pode-se entender que o desenvolvimento da ciência cognitiva abarca três principais
paradigmas: o paradigma cognitivista; o paradigma conexionista; o paradigma dinâmico da
cognição (Oliveira, 2014; 2016). Em cada um desses paradigmas observam-se reformulações
históricas das noções centrais dos estudos cognitivos, assim como do próprio entendimento do
que seja a cognição e das maneiras pelas quais é possível estudá-la. Empregaremos, neste
trabalho, alguns conceitos da teoria da percepção direta (também chamada de psicologia
ecológica) conforme formulada por J. J. Gibson (1966; 1979) – uma perspectiva a qual
podemos situar dentro do paradigma dinâmico da cognição – para analisar o referido método.
Seria impossível, dentro dos limites deste texto, oferecer uma análise completa da correlação
encontrada entre o método e a teoria, de forma que nos limitaremos a meramente esboçar os
pontos principais dessa correlação, após descrevermos brevemente o método O Passo e o
conceito de percepção e ação apresentado pela teoria gibsoniana.

“O Passo”

510
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Criado em 1996 por Lucas Ciavatta, o método tem como meta tornar o fazer musical
acessível, na contramão do processo altamente seletivo que é possível se observar quanto ao
acesso à prática musical, tanto nos espaços populares quanto nos espaços acadêmicos.
(Ciavatta, 2009, p.15)i.

A maior inspiração d’O Passo foi (...) o fazer musical popular brasileiro,
principalmente no que diz respeito à relação corpo e música no processo de
aquisição do suingue. Baseado num andar específico e orientado por quatro pilares
(corpo, representação, grupo e cultura), O Passo introduziu no ensino-aprendizagem
de ritmo e som novos conceitos, como posição e espaço musical, e novas
ferramentas, como o andar que dá nome ao método, notações orais e corporais e
a Partitura d'O Passo. (Ciavatta, 2009, p. 15)

Além dos quatro pilares citados, os quais serão detalhados ao longo do trabalho, o
método se baseia em dois princípios: inclusão e autonomia. Ao abordar a inclusão, o autor não
se prende ao sentido estrito do conceito em relação à educação e cidadania das pessoas com
deficiência (cf. descrito em Louro, 2012, p. 30), mas em vários outros fatores que, por
ventura, possam vir a se tornar obstáculos à aprendizagem musical, como a discussão acerca
do “dom musical”, e o acesso a quaisquer recursos materiais, que na sua falta,
impossibilitariam o aprendizado do aluno. Assim, o método foi idealizado a partir de um dos
mais naturais processos do ser humano (que não tenha alguma impossibilidade): o andar.
Todavia, mesmo esse recurso tão natural deve ser reaprendido para que se adapte aos
objetivos do programa.
No que diz respeito à autonomia, o ensino através d’O Passo tem como objetivo
desenvolver a capacidade do aluno de tocar ou cantar sem se “apoiar no outro”. Muitas vezes
os alunos, ao fazer música em grupo, aparentam saber o que estão fazendo, mas, ao realizar a
atividade sozinhos é que se nota a lacuna no aprendizado. O Passo, a partir do conceito de
posição, fornece as ferramentas necessárias para corrigir tal situação. Enfatizando que são de
suma importância o rigor do professor – que não deve ser confundido com rigidez – e a
vontade do aluno em aprender, para que esta lacuna seja preenchida.
O Passo se sustenta sobre quatro pilares: corpo, representação, grupo e cultura.
Sobre o corpo, o autor, em consonância com Jacques Dalcroze (1967), afirma que o ritmo
musical é um fenômeno essencialmente físico. Ou seja, qualquer manifestação do fazer
musical humano é indissociável do corpo e, qualquer alteração no movimento corporal altera

511
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

e redefine o resultado musical. Deste modo, aprender música, implica em aprender a


“musicalizar” o corpo.
O segundo pilar – representação – é definido através das representações mentais
defendidas no cognitivismo clássico. Segundo o autor, as representações, a partir de objetos
concretos (partitura, instrumento, etc.) ou abstratas (subjetivas), servem como referência e
suporte ao fazer musical. Também é colocada neste tópico a escrita, como uma forma de
representação gráfica do que se faz em música.
Fazer música em grupo recebe neste método um olhar atento. Para Ciavatta, é muito
importante que o músico não somente esteja tocando no mesmo tempo e espaço que outros
músicos, mas que ele esteja sincronizado, em sintonia, acoplado com o(s) outro(s).

Quando ouvimos o que estamos tocando, avaliamos o som que estamos produzindo
e vamos melhorando-o em seu ritmo e afinação. Quando ouvimos a nós mesmos e a
mais alguém, o mesmo processo deve se dar e ainda é preciso interagir com o som
que nos chega. (p.33)

O quarto, e não menos importante, pilar é a cultura. Reflete-se sobre o modo como uma
cultura opera sobre os indivíduos que a compõem e como é por eles operada, e sobre a
dicotomia tradição versus novo, buscando fortalecer tanto os valores pessoais, quanto sociais.
Ciavatta (p. 36) alerta que “não há sentido, ou sequer possibilidade, de que se estabeleçam
dualismos paralisantes do tipo indivíduo versus cultura, ou novo versus velho, ou cultura
erudita versus cultura popular. Há apenas diálogo, interação.”.
Apesar dos pilares e princípios serem de grande valor, o grande trunfo, por assim dizer,
do método é o conceito de posição. O Passo, conforme dito anteriormente, tem suas bases no
andar – um andar específico, com função específica dentro das bases musicais. Cada passo é
realizado buscando estabelecer a pulsação da música e é posicionado no espaço em relação ao
tempo do compasso. De certa forma, tempos são apenas tempos, quando não se leva em conta
a posição que ele ocupa em relação pulso musical e/ou ao compasso. Assim, uma nota que
convencionamos como durando 1 tempo pode ter várias posições. Para Ciavatta, a forma
tradicional de ensino da leitura rítmica musical, somente levando em conta as durações, gera
uma enorme lacuna no desenvolvimento da percepção do aluno, justamente por geralmente
não deixar claro para o aprendiz a posição da nota.
Para estabelecer a posição, O Passo situa o andar em posições no espaço em que ele se
dá, tendo como referência o “pé forte”, ou seja, a lateralidade do indivíduo, para estabelecer o

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

tempo 1 e os outros tempos mantendo a alternância dos passos, fazendo assim, uma forma de
regência de compasso com os passos. Para alguns autores, entre eles Ciavatta, só existem
compassos simples ou compostos de 2, 3 ou 4 tempos, enquanto compassos com outra
configuração seriam chamados, segundo este viés, de compassos mistos. Assim, por exemplo,
um compasso de 5 tempos pode ser visto como um compasso de 2+3 ou 3+2 tempos.
O sistema também leva em consideração as subdivisões do tempo e os compassos
compostos. Para estabelecer corporalmente o contratempo, o andar necessita de dobrar os
joelhos entre cada passo. Assim, saber um contratempo é muito mais do que saber que é uma
nota que está no meio do tempo – é saber corporalmente que ela ocupa uma posição
exatamente intermediária entre os tempos, e as semicolcheias, entre os contratempos.
Esgotar todos os detalhes acerca do método ocuparia um espaço demasiado, e não é o
objetivo deste trabalho. Deste modo, aconselha-se que os interessados na metodologia
busquem mais detalhes através dos canais disponibilizados pelo autor.ii

Percepção e Ação
Como dito na Introdução deste trabalho, o trabalho do psicólogo norte-americano James J.
Gibson oferece uma abordagem teórica e experimental para o estudo da percepção que resulta
num entendimento não-computacional da mente humana. Dentro da teoria da percepção direta
assume-se, necessariamente, uma visão não-internalista da informação. A informação
(ecológica) é aquilo que está entre o organismo que percebe e o mundo que é percebido –
portanto, a informação não é uma representação mental de um sujeito elaborada a partir dos
seus sentidos. A percepção é direta, nesse entendimento, porque não precisa da mediação de
uma representação simbólica (a pedra fundamental da ciência cognitiva).
Assim como não se separa radicalmente o interno do externo, sendo a informação o que
acopla esses dois polos da existência, não se separa percepção de ação, como ocorre nas
descrições das teorias implícita ou explicitamente computacionais da ciência cognitiva. Nas
palavras de Michaels & Carello (1981, p. 47): “Para a percepção ser válida, ela precisa se
manifestar em ações apropriadas e efetivas sobre o ambiente. E, por sua vez, para ações serem
apropriadas e efetivas elas devem ser compelidas por percepções precisas do ambiente”. iii Em
resumo, percebemos para agir e agimos para perceber, em um sistema de causalidade circular
onde não existe um primeiro e um segundo, e que não podem ser separados para qualquer
tratamento teórico.

513
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Se dentro desse acoplamento organismo-ambiente a informação é que os une, que os faz


ser efetivamente parte de um mesmo sistema complexo, ela pode ser definida a partir destes
dois polos. Ou, em outras palavras, a informação se constitui de informação-para e
informação-sobre, informação para um percebedor e informação sobre o ambiente. Em
termos gibsonianos: affordacesiv e invariantes. “Os affordances do ambiente são o que ele
oferece ao animal, o que ele provê ou fornece, tanto para o bem quanto para o mal” (Gibson,
1979, p. 127).v Em contrapartida, “(…) invariantes são aqueles padrões de estimulação de
alta-ordem que sustentam as constâncias perceptivas, ou, em termos mais gerais, as
propriedades persistentes do ambiente as quais se diz que um animal conhece” (Michaels &
Carello, 1981, p. 40).vi
Sobre a interface entre a psicologia ecológica e a música, considerando especialmente
esses dois conceitos descritos acima, encontramos alguns trabalhos que os abordam
relacionados à análise de música acusmática (Windsor, 1995), à difusão de música
eletroacústica (Andrean, 2011), às paisagens sonoras (Toffolo & Oliveira, 2005; Toffolo,
Oliveira & Zampronha, 2003), à análise da música eletroacústica (Toffolo & Schulz, 2008).
Na área dos estudos dos processos de significação musical, Clarke (2006) propõe um modelo
baseado na abordagem ecológica da percepção e Menin e Schiavo (2012) discutem
affordances sonoros. Na área da educação musical, alguns trabalhos têm utilizado desses
conceitos na análise e avaliação de processos de ensino-aprendizagem (Oliveira, 2005;
Mertzig & Oliveira, 2009; Oliveira, Mertzig & Schulz, 2006).

O passo ecologicamente situado


Após termos descrito brevemente alguns conceitos e pressupostos do método O Passo, e
depois de uma sucinta apresentação da perspectiva gibsoniana da percepção e ação, apoiada
sobre o acoplamento informacional entre percebedor e ambiente, passaremos a considerar
cada um dos quatro pilares conceituais do referido método, quais sejam, o corpo, a
representação, o grupo e a cultura. Por fim analisamos o conceito de posição sob a ótica da
psicologia ecológica.
Quanto ao corpo, educadores musicais já têm teorizado sobre sua importância nos
processos de ensino e aprendizagem. A abordagem ecológica da percepção mostra-se como
uma outra contribuição a reforçar o argumento de que a cognição não pode ser separada da
atuação. Perceber, compreender, agir, são processos interligados e mutuamente dependentes.

514
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Padrões rítmicos podem ser entendidos não como abstrações descoladas da corporeidade, mas
como invariantes perceptivas, que informam sobre as recorrências dos estímulos, e
affordances, que compelem à ação integrada. Neste sentido, O Passo mostra-se como um
método sintonizado com as abordagens mais recentes da ciência cognitiva, encontrando
correspondência com as abordagens dinâmicas da cognição musical, que se entende
incorporada e situada.
O segundo conceito sob investigação, a representação, é o mais controverso. Uma das
constantes das teorias cognitivas dinamicistas é que elas colocam em cheque a consideração
da representação mental como condição necessária para a explicação de processos cognitivos.
Neste ponto, o método em discussão aparenta carregar sem muito questionamento a
representação mental como condição necessária. Como coloca Haselager (2004), a ciência
cognitiva é viciada em tal noção, empregando-a sem questionamento ou revisão crítica quanto
a sua necessidade explicativa. O método O Passo, conformando-se à grande maioria das
pesquisas em cognição musical, assume que para compreender um fenômeno é preciso
representá-lo internamente. Não se trata de advogar uma exclusão da representação mental,
mas de rever-se quando ela é teoricamente indispensável,vii especialmente em perspectivas
que unificam os domínios da percepção e da ação.
O grupo é o terceiro pressuposto do método, entendendo-se que a prática coletiva é
muito importante para os processos de aprendizagem musical, assim como o é para a
performance musical em geral – música é, em sua essência, uma atividade coletiva. Dentro da
perspectiva do ensino musical, a prática em conjunto implica em dinâmicas complexas de
percepção e ação, de sincronização e dessincronização, de auto-organização e de auto-ajuste.
Tais conceitos são basais para as abordagens dinamicistas da cognição e, neste aspecto, O
Passo mostra-se como uma metodologia conceitualmente atualizada.
No que tange à cultura, Gibson propriamente não a aborda, pois concentra-se na teoria
da percepção direta, e para falar-se em cultura entra-se na chamada percepção de segunda-
mão, que envolve mediações. Não obstante, desenvolvimentos posteriores da psicologia
ecológica abordam a temática do aprendizado perceptivo, o qual envolve fatores culturais
(e.g. Gibson & Pick, 2000). Outros autores comprometidos com teorias que se inserem no
paradigma dinâmico da cognição abordam questões de cultura, em uma perspectiva

515
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

atuacionista, incorporada e situada (e.g. Maturana, 1995; Varela et al, 1991). Correlacionar O
Passo a tais teorias seria uma forma de justificar teoricamente esse pressuposto metodológico.
Por fim, temos o conceito de posição, fundamental na metodologia em questão.
Limitaremo-nos a apontar que, pelas hipóteses dinamicistas e ecológicas, o conceito de
posição conforme trabalhado n’O Passo é deveras interessante porque se concebe tal conceito
como ação, que envolve tanto percepção quanto propriocepção – outra noção importante para
Gibson. Assim, entende-se que a compreensão rítmica é não apenas um processo interno, de
processamento de representações mentais, mas um processo cognitivo que deve ser
considerado enquanto corporeidade, enquanto atuação, ou seja, como cognição incorporada e
situada, e que pode ser descrita pelos conceitos de affordances e invariantes.

Conclusão
Destarte, após passarmos por cada um dos pilares que edificam conceitualmente o método O
Passo, podemos verificar que suas proposições encontram ressonância com as teorias do
paradigma dinâmico da cognição. Portanto, mesmo que tal discussão esteja além daquelas
inicialmente evidentes na proposição metodológica original, a visão de mente – e,
especificamente, de mente musical – implicada supera a visão da mente computacional, ainda
que carregue, mesmo que de maneira desnecessária e acrítica, a noção de representação
mental. A análise crítica das metodologias de ensino musical a partir das teorias cognitivas
contribui significativamente para ambas as áreas: as metodologias de ensino se tornam mais
conscientes de seus pressupostos conceituais e da visão de mente que postulam, explicita ou
implicitamente; ao mesmo tempo, as teorias cognitivas contribuem de maneira direta não só
na revisão epistemológica da práxis pedagógico-musical, mas também oferecem justificativas
para determinadas práticas e sugerem novas abordagens.

Referências:
Andean, J. (2011). Ecological psychology and the electroacoustic concert context. Organized
Sound, 16 (2), 125–133.
Clarke, E. (2005). Ways of listening: an ecological approach to the perception of musical
meaning. New York: Oxford University Press.
Gibson, E. e Pick, A. (2000). An ecological approach to perceptual learning and
development. , Cambridge, MA.: Oxford University Press.
Gibson, J. J. (1966). The Senses Considered as Perceptual Systems. Boston: Houghton Mifflin
Company.
Gibson, J. J. (1979). Ecological Approach to Visual Perception. Hillsdate: Lawrence Erlbaum

516
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Associates Publishers.
Haselager, W. (2004). O mal estar do representacionismo: sete dores de cabeça da ciência
cognitiva. In Ferreira, A., Gonzalez, M., and Coelho, J. (eds): Encontro com as ciências
cognitivas, v. 4, pp 105–120. Coleção Estudos Cognitivos. Marília: Unesp Publicações.
Louro, V. (2012). Fundamentos da Aprendizagem da Pessoa com Deficiência. São Paulo: Ed.
Som.
Maturana, H. R. (1995). Da Biologia à Psicologia. Porto Alegre: Artmed.
Menin, D. e Schiavo, A. (2012). Rethinking Musical Affordances. AVANT, III (2), 202–215.
Mertzig, P. e Oliveira, A. L. G. (2009). Enaccionismo e ecologia: uma reflexão em educação
musical. Anais do V Simpósio de Cognição e Artes Musicais, pp. 390–401.
Michaels, C. F. e Carello, C. (1981). Direct perception. Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hall.
Oliveira, A. L. G. (2005). Educação auditiva e educação musical: uma proposta
ecologicamente orientada. Encontro Anual da ABEM, Belo Horizonte.
Oliveira, A. L. G., Mertzig, P. e Schulz, S. (2006). Cognição musical como enacção e algumas
possibilidades de implicações metodológicas em educação musical. Actas de la V
Reunión de SACCoM.
Oliveira L. F. (2014). O estudo da música a partir do paradigma dinâmico da cognição.
PERCEPTA-Revista de Cognição Musical, v. 2, n. 1, p. 17.
Oliveira L. F. (2016). O debate sobre o representacionalismo nas Ciências Cognitivas.
Kínesis, Vol. VIII, n° 17, Julho 2016, p.85-114
Toffolo, R. B. G. e Oliveira, A. L. G. (2005). Uma abordagem atuacionista da tipo-morfologia
de Pierre Schaeffer. In Dottori, M. e Ilari, B. (eds): Anais do Simpósio de Cognição e
Artes Musicais, pp 131–145. UFPR, Curitiba.
Toffolo, R. B. G., Oliveira, L. F., e Zampronha, E. S. (2003). Paisagem sonora: uma proposta
de análise. Anais do 14 Encontro da Associação Nacional de Pesquisa em Pós-graduação
em Música.
Toffolo, R. B. and Schulz, S. L. (2008). A análise musical de acordo com a psicologia
ecológica. Anais do XVIII Congresso da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-
Graduação em Música.
Varela, F. J., Thompson, E., and Rosch, E. (1991). The embodied mind: cognitive science and
human experience. Cambridge, MA: The MIT Press.
Windsor, L. (1995). An perceptual approach to the description and analysis of acousmatique
music. PhD thesis, University of Sheffield, Department of Music.

i Todas as referências desta seção são de Ciavatta, 2009

ii www.opasso.com.br

iii “For perception to be valuable, it must be manifested in appropriate and effective actions on the
environment. And, in turn, for actions to be appropriate and effective, they must be constrained by accurate
perception of the environment.”

iv Affordance é a substantivação do verbo que, em língua inglesa, significa oferecer, proporcionar,


fornecer. Por não ter uma tradução direta e satisfatória em língua portuguesa, que dê conta de significar o termo
cunhado por Gibson, é usual se empregar o termo original. Assim o faremos neste texto.
v
“The affordances of the environment are what if offers the animal, what it provides or furnishes,
either for good or ill.”

517
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

vi
“(…) invariants are those higher-order patterns of stimulation that underlie perceptual
constancies, or, more generally, the persistent properties of the environment that an animal is said to know.”

vii N'O Passo considera-se também outras formas de representação, formas externas, não
necessariamente vinculadas ao conceito de representação mental da ciência cognitiva. Nossa análise, aqui,
refere-se exclusivamente a esse conceito.

518
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Pesquisas sobre memória musical apresentadas no SIMCAM (2006-2016):


uma revisão sistemática (Fase 1)

Alessandro Pereira da Silva


UFBA/UFS
alessandropereira.s@gmail.com

Mônica Cajazeira Santana Vasconcelos


UFBA/UEFS
moncajazeirapiano@gmail.com

Jonatas Leal
UFBA
jonhlmusic@gmail.com

Diana Santiago
UFBA
disant@ufba.br

Resumo: Esta revisão tem como objetivo levantar o estado da arte da pesquisa em memorização
musical no Brasil a partir dos trabalhos publicados nos Anais do Simpósio de Cognição e Artes
Musicais (SIMCAM) que tratam da temática no período 2006-2016. Este artigo apresenta a Fase
1 da pesquisa, fase essa que teve como objetivos específicos: mapear quantitativamente os
estudos sobre a memória (quantidade de trabalhos, pesquisadores, instituições) e categorizá-los
por eixos temáticos. Foram estabelecidos seis eixos temáticos para categorização, dos quais três
são aqui apresentados. A próxima fase da revisão, em andamento, consiste na análise das
metodologias empregadas pelos pesquisadores em seus trabalhos e seus resultados.
Palavras-chave: memória, música, anais do SIMCAM.

Research on musical memory presented at SIMCAM (2006-2016): a systematic review


(Phase 1).
Abstract: This review aims to present the state of the art of the research on music memorization
in Brazil. It centers on the data published in the Proceedings of the Symposium of Cognition and
Musical Arts (SIMCAM) from 2006 to 2016. This paper presents Phase 1 of the review, which
intended to map the studies about music memory, their researchers, institutions, and thematic
axes. Six thematic axes have been established, of which three are presented here. The next,
ongoing phase of the review consists in the analysis of the methodologies used in the studies and
their results.
Keywords: memory, music, SIMCAM annals.

Introdução

A primeira edição do Simpósio Internacional de Cognição Musical (SIMCAM) aconteceu no


ano de 2005, em Curitiba, e foi coordenada pelos pesquisadores Maurício Dottori e Beatriz
Ilari. O evento teve a participação de pesquisadores de todo o Brasil e do exterior, que,
segundo Ray (2014), receberam muito bem a proposta desse congresso. A partir daí e com a
criação da Associação Brasileira de Cognição e Artes Musicais (ABCM) em 2006, os eventos

519
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

ocorrem anualmente e, desde 2011, têm sido exclusivamente a nível internacional1. Neles,
vários trabalhos têm sido apresentados, trazendo contribuições para a consolidação da área de
cognição musical no Brasil.
Uma das temáticas transversais aos inúmeros estudos relacionados à cognição musical,
são pesquisas relacionadas à memória. Ela é um dos principais processos cognitivos humanos
e, sem ela, não há retenção daquilo que foi ensinado, o que impossibilitaria o processo de
aprendizagem. Referindo-se à educação musical, Fonseca & Santiago (2014, p.122) afirmam
que, para a educação musical, “a memória alia-se ao fato de a música ser uma arte temporal e
necessitar do constante funcionamento de todos os tipos de memória humana para a sua
realização”. Desse modo, a memória tem uma contribuição muito importante e significativa
para a aprendizagem musical, indicando a relevância de uma revisão bibliográfica que tenha
como foco essa temática.

Critérios Metodológicos
Seguindo as etapas de uma revisão bibliográfica integrativa2, para a realização deste trabalho,
primeiramente foi delimitada a questão de pesquisa: como a memória tem sido abordada na
literatura produzida nos anais do SIMCAM? Após a revisão bibliográfica, estruturou-se os
eixos temáticos para sistematização da mesma: Eixo 1. MPP - Memória e Processos
Perceptivos; Eixo 2. MP - Memória e Performance; Eixo 3. MS- Memória e Saúde; Eixo 4.
MPC - Memória e Processos Criativos; Eixo 5. MEC - Memória e Estudos Culturais; Eixo 6.
MCL - Memória e Ciências da Linguagem. Esses eixos foram adaptados do SIMCAM 113.
Em seguida, tendo em vista a grande quantidade de trabalhos encontrados a partir da busca
por palavra-chave, ficou definido que o principal critério de inclusão dos trabalhos numa
primeira fase dessa revisão seria a presença do termo memória ou seus derivados nos títulos
dos trabalhos. Para esse artigo, optou-se por focar três eixos temáticos: Memória e Processos

1 Até 2011, havia a alternância anual entre um evento nacional e um internacional.

2
De acordo com Souza, et.al. (2010), o processo de elaboração da revisão integrativa se divide em seis fases: 1ª) elaboração
da pergunta norteadora; 2ª) busca na literatura, ou seja, incluir os estudos encontrados; 3ª) coleta de dados; 4ª) análise crítica
dos dados; 5ª) discussão dos resultados; 6ª) apresentação da revisão integrativa. Estes podem ser expressos em tabelas,
gráficos ou quadros, nos quais seja possível a comparação entre todos os estudos selecionados.

3 Os eixos temáticos do SIMCAM 11 foram: Cognição Musical e Desenvolvimento da Mente Humana; Cognição Musical e
Processos Criativos; Cognição Musical e Processos Perceptivos; Cognição Musical e Ciências da Linguagem; Cognição
Musical e Saúde e Cognição Musical e Estudos Culturais. Disponível em http://www.abcogmus.org/documents/
SIMCAM11.pdf

520
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Perceptivos, Memória e Performance e Memória e Saúde. Esses três eixos temáticos somaram
28 trabalhos. Dessa forma, os dados e informações que estão apresentados aqui são o
resultado parcial da revisão bibliográfica realizada. Após a coleta dos dados, os registros
foram divididos em dados quantitativos e qualitativos, a saber: 1. Número de artigos com a
memória como temática principal; 2. Mapeamento das instituições e autores dos textos
selecionados; 3. Síntese do que trata cada artigo; 4. Principais referências bibliográficas
utilizadas pelos autores. Apresentamos aqui a síntese dos resultados da Fase 1 (descritiva).

Análise e Interpretação dos Dados


Os anais do SIMCAM apresentaram uma média de 537 páginas cada, num total de 5.911 de
todas as edições somadas. Observou-se que os SIMCAM(s) 2 e 7 apresentaram as menores
quantidades de páginas, mas isso não indica um menor número de trabalhos apresentados. O
total de trabalhos eM todas as edições é 758, resultando em uma média de, aproximadamente,
68 artigos por edição. A edição de número 3 do evento foi a que apresentou 120 trabalhos,
mas de maneira geral todas as edições se mantiveram na média.
Outro dado levantado foi o mapeamento geográfico dos trabalhos. A região Sudeste do
país predomina na produção bibliográfica sobre memória nos anais do SIMCAM nas
pesquisas sobre o tema, com 14 trabalhos. As instituições do Centro-Oeste brasileiro
aparecem com 8 trabalhos oriundos da Universidade de Brasília (UNB) e da Universidade
Federal de Goiás (UFG). A região Nordeste aparece com 7 trabalhos, todos oriundos da
Universidade Federal da Bahia (UFBA).4
Do total de 758 trabalhos apresentados nos anais do SIMCAM, foi constatado que 34
apresentavam o termo memória em seus respectivos títulos, o que representa 4,48%. Destaca-
se que o SIMCAM 10 apresentou o maior número de artigos sobre a temática: 6 trabalhos. Já
no SIMCAM 5 e 2 não houve trabalhos que abordaram a memória como temática principal.
Segundo Prodanov e Freitas (2013, p.114), “a categorização consiste na organização
dos dados para que o pesquisador consiga tomar decisões e tirar conclusões a partir deles.
Isso requer a construção de um conjunto de categorias descritivas (...)”. Após a tabulação dos
dados de identificação acima detalhados (temática dos artigos apresentados, instituição de
origem, etc.), foi feita a categorização dos artigos selecionados a partir dos eixos temáticos
determinados. Utilizando-se da argumentação dos autores Ilari et. al. (2010, p.699), na edição

4 Se o trabalho foi assinado por mais de um pesquisador de instituições diferentes, foram computadas todas as instituições.

521
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

do SIMCAM 6, vale salientar que seria muito complexo categorizar de maneira rígida os
trabalhos, visto que a maioria deles poderia ser colocada em mais de uma categoria. “Em
alguns casos, a intenção do (s) autor (es), os objetivos da pesquisa, métodos e referenciais
teóricos estavam muito claros e eram facilmente categorizáveis, porém, em outros casos, tal
categorização se tornou ainda mais difícil”.
Os trabalhos foram distribuídos nos respectivos eixos temáticos na seguinte proporção:
Eixo 1. MPP - Memória e Processos Perceptivos (13 trabalhos); Eixo 2. MP - Memória e
Performance (9 trabalhos); Eixo 3. MS- Memória e Saúde - (6 trabalhos); Eixo 4. MPC -
Memória e Processos Criativos (3 trabalhos); Eixo 5. MEC - Memória e Estudos Culturais (2
trabalhos). Eixo 6. MCL - Memória e Ciências da Linguagem (1 trabalho)5 .

Análise dos Trabalhos por Eixo Temático


Neste artigo serão descritos a seguir os trabalhos dos eixos 1, 2 e 3 (Memória e Processos
Perceptivos, Memória e Performance e Memória e Saúde).

Eixo 1. MPP - Memória e Processos Perceptivos [Total de trabalhos: 13]


O eixo Memória e Processos Perceptivos foi o que apresentou o maior número de trabalhos,
que foram agrupados segundo suas temáticas. Foram encontrados cinco trabalhos sobre
memória e percepção de melodias, um trabalho sobre memória e percepção de dinâmicas, um
trabalho sobre memória e percepção rítmica e seis trabalhos sobre memória e percepção em
geral. Esses trabalhos sobre memória e percepção em geral trataram de treinamento e
desenvolvimento da percepção musical.
Os títulos dos trabalhos que abordaram a memória e percepção melódica são: O ouvido
absoluto não facilita a memorização de melodias (SIMCAM 10), Influência de dificuldades
musicais em percepção e produção na memória operacional para melodias (SIMCAM 10),
Memória de trabalho e solfejo (SIMCAM 10), Memória de curto prazo para melodias: efeito
das diferentes escalas musicais (SIMCAM 7) e Memória de curto prazo para melodias: efeito
das diferentes escalas musicais (SIMCAM 6). Sobre memória e percepção da dinâmica:
Memória operacional e percepção dinâmica (SIMCAM 8). Sobre memória e percepção
rítmica: Música e movimento: apontamentos sobre memória e a neurociência da música
(SIMCAM 11). Sobre memória e percepção em geral: Memória e imitação na percepção
musical (SIMCAM 6), Contextualização musical no treinamento auditivo: transferindo

5
As referências de todos os artigos estão em anexo.

522
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

memórias à prática musical (SIMCAM 6), O efeito de doze meses de treino musical em
crianças na Avaliação Automatizada da Memória Operacional (AWMA) (SIMCAM 8), O
processo auditivo, a memória e suas interfaces nas habilidades musicais: um estudo
neurocientífico (SIMCAM 8), Em busca de um modelo de memória aplicável à audiação
notacional (SIMCAM 9). Nesse eixo temático, chamou atenção a concentração de artigos
oriundos da Universidade de Brasília (4 trabalhos), sendo três deles assinados pelo
pesquisador Ricardo Dourado Freire.
De maneira geral, os trabalhos no eixo sobre memória e processos perceptivos
buscaram integrar os estudos cognitivos com os processos de aprendizagem e percepção dos
aspectos musicais. Notou-se que a maior parte dos trabalhos envolveu metodologias
empíricas com utilização de testes, visando uma compreensão da memória. Dentre as
categorias de memória, os estudos estiveram centrados na relação entre a memória
operacional ou de trabalho e a apreensão dos elementos musicais. Observou-se que nas
referências bibliográficas dos trabalhos houve a predominância de autores estrangeiros, dentre
eles Alan Baddeley, Diana Deutsch e Edwin Gordon.
Por fim, pode-se concluir que os trabalhos desse eixo temático buscaram compreender
os processos cognitivos da percepção musical e como as relações com os diferentes tipos de
memória atuam durante o processo de identificação e decodificação dos elementos musicais.

Eixo 2. MP - Memória e Performance [Total de trabalhos: 9]


No eixo Memória e Performance constaram três trabalhos sobre estratégias de memorização
utilizando o repertório do violão, um trabalho sobre estratégias de memorização para
clarineta, um trabalho sobre estratégias de memorização para cello, um trabalho sobre a
influência da memória na leitura à primeira vista e três trabalhos destinados à revisão
bibliográfica sobre memória e performance.
Os trabalhos que relacionaram a memória, performance e instrumento abordaram as
estratégias de memorização, levando em conta os aspectos idiomáticos dos respectivos
instrumentos. Nos três trabalhos voltados ao violão os autores apontaram a necessidade de
fragmentação das obras e na ativação de diferentes mecanismos de memorização para
diferentes obras e estilos. O que se notou nestes três trabalhos foi a preocupação em mostrar
estratégias de memorização para aperfeiçoar e aumentar a eficácia do tempo despendido no
aprendizado das obras. Sob essa mesma perspectiva, no artigo O processo de emissão do som
na clarineta e a geração de memória muscular: aplicabilidades no ensino e performance, o
autor relacionou a memória e a idiomática do instrumento com o objetivo de mostrar os

523
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

benefícios de um estudo eficaz na aquisição de uma memória muscular. No trabalho sobre a


influência da memória na leitura à primeira vista o autor discutiu as habilidades mnemônicas,
cinestésicas e perceptivas necessárias para o desenvolvimento de uma leitura musical mais
fluente e eficaz. O autor concluiu que não só a memória de trabalho, mas também a memória
cinestésica de longo prazo desempenha um papel fundamental na localização rápida das notas
no instrumento.
Em grande parte dos trabalhos que apresentaram revisão da literatura sobre memória e
performance, os principais objetivos foram mostrar os métodos de memorização utilizados
por instrumentistas, apresentar as pesquisas já realizadas e abordar os tipos relações entre as
tipologias de memórias estudadas pela psicologia cognitiva e as categorias de memória
atribuídas à memória musical. Portanto, esses estudos pretenderam também estabelecer
estratégias de memorização musical por meio de revisão da bibliografia existente.
Por fim, com relação às referências bibliográficas utilizadas nesses trabalhos, houve a
predominância da literatura em língua inglesa com os seguintes autores: Aaron Williamon,
Roger Chaffin e John Sloboda. Dentre os autores brasileiros mais citados estão Sônia Ray,
Diana Santiago6 e Beatriz Ilari.

Eixo 3. MS - Memória e Saúde [Total de trabalhos: 6]


A partir do SIMCAM 5 foram realizados Grupos de Estudos (GE) para discutir e aprofundar
várias temáticas. Na Musicoterapia, por se tratar de uma área ampla no que diz respeito à
pesquisa, à prática e à teoria, a quantidade de trabalhos tem crescido nos últimos anos e,
consequentemente, a contribuição de estudos musicoterapêuticos tem aumentado no âmbito
do SIMCAM.
Todos os trabalhos encontrados neste eixo têm um viés na melhora da autoestima e da
qualidade de vida das pessoas, principalmente de idosos. Foram estes: Práticas
musicoterápicas e o desempenho cognitivo em idosos com queixas de memória (SIMCAM 4),
Estimulação da memória pelo canto como base de educação musical na maturidade: um
aspecto social (SIMCAM 6), A musicoterapia na preservação da memória de idosos
institucionalizados (SIMCAM 10), Um estudo sobre a educação musical e o desempenho da
memória (SIMCAM 10), Memórias autobiográficas e atividades musicais: uma pesquisa com
idosos (SIMCAM 11) e A utilização da entrevista autobiográfica no estudo das memórias
autobiográficas evocadas pela música (SIMCAM 12).

6
Citada como Santiago, D. ou Fonseca, D.S.

524
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

O primeiro artigo listado tratou da memória como uma das funções cognitivas mais
estudadas devido ao declínio desta função no processo de envelhecimento. A autora discutiu
como as práticas de estimulação cognitiva associada à música, canto e memórias orais
(intervenção musicoterapêutica) contribuem para a promoção do bem-estar para idosos com
queixas de memória e de baixo nível socioeconômico. O segundo artigo, numa perspectiva da
Cognição Social, concentrou-se em como as atividades com o canto estimulam trabalhar a
memória, contribuindo para a melhora da autoestima e da qualidade de vida dos idosos. No
terceiro artigo, os autores abordaram a contribuição que a Musicoterapia pode trazer como
uma das modalidades de tratamento para o indivíduo idoso, visando a reabilitação e/ou
preservação de suas funções cognitivas. Dentre as publicações citadas neste eixo, os últimos
três trabalhos foram escritos pelos mesmos autores e trataram de pesquisa sobre as memórias
evocadas pela música e como esta influencia a quantidade de conteúdo das memórias
autobiográficas.

Considerações Finais
Os estudos sobre a memória musical abarcados por esta revisão sistemática permitem-nos
observar a natureza versátil e interdisciplinar da pesquisa realizada na área. Os trabalhos sobre
memória e processos perceptivos (Eixo 1) buscaram compreender os processos cognitivos da
percepção e como as relações com os diferentes tipos de memória atuam durante o processo
de identificação e decodificação dos elementos musicais; no campo da performance (Eixo 2)
os estudos abordaram as pesquisas sobre estratégias de memorização que facilitassem a
compreensão do discurso musical e potencializassem o tempo despendido no estudo das
mesmas; já nos estudos sobre memória e saúde (Eixo 3), ficou evidenciada a preocupação em
entender como a prática musical pode evocar as memórias para contribuir com a melhoria da
autoestima e da qualidade de vida das pessoas.

Foi possível constatar que os estudos sobre memória estão distribuídos de forma
desigual entre as regiões do país, sendo a região Sudeste aquela com maior produção, seguida
pelas regiões Centro-Oeste e Nordeste. Os eixos temáticos mais pesquisados têm sido os que
abordam a memória em conjunto com os processos perceptivos, com a performance e com a
saúde. Dessa maneira, observou-se que há lacunas nas pesquisas sobre memória e estudos
culturais, memória e ciências da linguagem e memória e processos criativos. Além disso, a
utilização frequente de referências bibliográficas estrangeiras aponta que há possibilidades de
desenvolvimento nessa área de pesquisa no Brasil.

525
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Em suma, pôde-se perceber a evolução das pesquisas, eixos temáticos, os caminhos e


lacunas nessa área de estudo no país. A próxima fase da revisão, em andamento, consiste na
análise das metodologias empregadas pelos pesquisadores em seus trabalhos. Em conjunto,
essas etapas são ferramentas fundamentais para a recuperação e avaliação, não só de estudos
isolados, mas também de um tema importante na cognição musical como é a temática da
memória.

Os autores agradecem os recursos obtidos do CNPq, por meio de Bolsa de


Produtividade em Pesquisa e pelo Edital Universal UNIVERSAL MCTI/CNPq n.14/2013 -
Processo n. 476881/2013-7, e à Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado da Bahia por Bolsa
PIBIC FAPESB-UFBA 2016-2017.
Referências
Botelho, L. de L. R.; Macedo, M.; Gauthier, F. (2012) Contribuições do método da revisão
bibliográfica sistemática da literatura para a temática da mudança organizacional (p. 1-12). In:
Anais... 2º CONEPRO-SUL, Joinville. Disponível em http://www.sociesc.org.br/
congressos/SearchCONEPRO/artigos/015_2012_ Acesso em 07 de novembro de 2016.
Fernandes, J.N. (2013). A produção do conhecimento na área da Educação Musical nas
publicações da ANPPOM de 1989 a 2010. (p.251-267). In: Educação Musical: temas
selecionados. 1ª ed., Curitiba: CRV.
Fonseca, L.P. R. da; Santiago, D. (2014). A memória musical infantil: estudo exploratório
sobre audição de sequência de timbres por crianças de 4 a 12 anos. (p.120-139). Música em
Contexto, Brasília, nº. 1.
Ilari, et.al. (2010) Cognição e Ensino e Aprendizagem Musicais -Grupo de Trabalho- (p.
698-700)). Anais do VI SIMCAM, Rio de Janeiro: UFRJ.
Prodanov, C. C.; Freitas,e. C. (2013). Metodologia do trabalho científico [recurso eletrônico] :
Métodos e técnicas da pesquisa e do trabalho acadêmico.2. ed., Novo Hamburgo: Feevale.
Disponível em: www.feevale.br/editora.
Ray, S. (2014) Fatores de estresse e ansiedade na performance musical: Histórico e
perspectivas após 10 anos de SIMCAM. (p.115-126). Revista Percepta. Curitiba: 1 (2).
Disponível em http://www.abcogmus.org/journals/index.php/percepta/article/view/27
Acesso em 23 de out. 2016.
Rother, E. T.(2007). Revisão sistemática versus revisão narrativa. [Editorial]. Acta Paul
Enferm.; 20(2): v e vi. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ape/v20n2/a01v20n2.pdf.
Acesso em 07 de nov. 2016.
Souza,M. T. et.al. (2010). Revisão integrativa: o que é e como fazer.(p.102-106) Revista
Einstein . São Paulo: 8 (1). Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?
pid=S1679-45082010000100102&script=sci_arttext&tlng=pt Acesso em 07 de nov.
2016.
Site da ABCM: http://www.abcogmus.org/new_abcm/index.php/anais-simcam-all/anais-de-
eventos

Trabalhos por eixo (ordem: do mais recente para os mais antigos)

EIXO 1. MEMÓRIA E PROCESSOS PERCEPTIVOS – MPP [12 Trabalhos]


SIMCAM 11
1. BERTISSOLO, Guilherme (2015) Música e movimento: apontamentos sobre memória e a
neurociência da música - (p.99-105). Anais do XI SIMCAM, Pirenópolis: UFG – EMAC.

526
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

SIMCAM 10
2.VANZELLA, Patrícia et.al. (2014). O ouvido absoluto não facilita a memorização de melodias (p.
253-260). Anais do X SIMCAM 10, Campinas: UNICAMP.
3. BENASSI, Mariana et.al. (2014). Influência de dificuldades musicais em percepção e produção na
memória operacional para melodias (p.445-452). Anais do X SIMCAM, Campinas: UNICAMP.
4. FREIRE, Ricardo; IBARRA, Renata F. C. (2014). Memória de Trabalho e Solfejo (p.495-500). Anais
do X SIMCAM, Campinas: UNICAMP.
SIMCAM 9
5. SILVA, Ronaldo da, GOLDEMBERG, Ricardo, GIMENES Marcelo. (2013). Em busca de um modelo
de memória aplicável à audiação notacional (p.38-49). Anais do IX SIMCAM, Belém: UFPA.
SIMCAM 8
6. FREIRE, Ricardo D. (2012). Memória operacional e percepção dinâmica. (p.438-443). Anais do VIII
SIMCAM, Santa Catarina: UDESC/ Departamento de Música.
7. RIBEIRO, Fabiana S.; SANTOS, Flávia H. dos (2012). O efeito de doze meses de treino musical em
crianças na Avaliação Automatizada da Memória Operacional (AWMA). (p.202-207). Anais do VIII
SIMCAM, Santa Catarina: UDESC/ Departamento de Música.
8. CONCEIÇÃO, Maria B. L. (2012). O processo auditivo, a memória e suas interfaces nas habilidades
musicais: um estudo Neurocientífico (p. 546-551). Anais do VIII SIMCAM, Santa Catarina: UDESC/
Departamento de Música.
SIMCAM 7
9. WERKE, Mariana E. B. (2011). Memória de Curto Prazo para Melodias: Efeito das Diferentes Escalas
Musicais (p.86-88). Anais do VII SIMCAM, Brasília: UNB.
SIMCAM 6
10. BENASSI-WERKE et. al. (2010). Memória de Curto Prazo para Melodias: Efeito das Diferentes
Escalas Musicais (p. 301- 304). Anais do VI SIMCAM, Rio de Janeiro: UFRJ.
11. FREIRE, Ricardo D. (2010). Memória e Imitação na Percepção Musical (p.9-17). Anais do VI
SIMCAM, Rio de Janeiro: UFRJ.
12. BORTZ, Graziela. (2010). Contextualização Musical no Treinamento Auditivo: Transferindo
Memórias à Prática Musical (p.1-8). Anais do VI SIMCAM, Rio de Janeiro: UFRJ.

EIXO 2. MEMÓRIA E PERFORMANCE – MP [9 TRABALHOS]


SIMCAM 12
1. SOUZA, Joao B. C. de; WOLFF, Daniel (2016). Memória e aprendizagem de obras para violão em
afinações não usuais. (p. 622 – 630). Anais do XII SIMCAM, Porto Alegre: UFRGS.
SIMCAM 11
2. MELLO, Felipe M. de; RAY, Sonia. (2015). Técnicas de ensaio para repertório com técnicas
estendidas: memorização e pontos de apoio. (p.49-55). Anais do SIMCAM 11, Pirenópolis, UFG –
EMAC.
3. FONSECA, Diana S. (2015). Vestígios da música no tempo: pesquisas em memória e performance
musical. (p.26). Anais do SIMCAM 11, Pirenópolis, UFG – EMAC. (Resumo Mesa Redonda)b
SIMCAM 9
4. BORGES, Nery; AGUIAR, Werner. (2013). Relação entre pontos de referência e tipos de memória no
processo de memorização do Estudo nº 7 para violão de Heitor Villa-Lobos. (p.500-510). Anais do IX
SIMCAM, Belém: UFPA.
SIMCAM 7
5. ALVES, Cristiano. (2011). O processo de emissão do som na clarineta e a geração de memória
muscular: aplicabilidades no ensino e performance. (p.129-142). Anais do VII SIMCAM, Brasília: UNB.
6. BALTHAZAR, Laura; FREIRE, Ricardo D. (2011). A memória na psicologia cognitiva e memória
musical na Perspectiva do Intérprete. (p.165-174) Anais do VII SIMCAM, Brasília: UNB.
7. KAMISNSKI, Leonardo C.; AGUIAR, Werner. (2011). Métodos de memorização e a construção da
performance instrumental. (p.175-174) Anais do VII SIMCAM, Brasília: UNB.
SIMCAM 4

527
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

8. FIREMAN, Milson. (2008). O papel da memória na leitura à primeira vista. (p.374-379) Anais do IV
SIMCAM, São Paulo: USP/FFLCH – Departamento de Linguística.
SIMCAM 3
9. LISBOA, Tânia; CHAFFIN, Roger et. al. (2007). Memorizing in Cello Playing: practice, performance
and expression. (p.96-100). Anais do III SIMCAM, Salvador: UFBA.

EIXO 3. MEMÓRIA E SAÚDE – MS [6 TRABALHOS]


SIMCAM 12
JÚNIOR, José D.; FONSECA, Diana S. (2016) . A utilização da entrevista autobiográfica no estudo das
memórias autobiográficas no estudo das memórias autobiográficas evocadas pela música (p.631-639).
Anais do XII SIMCAM, Porto Alegre: UFRGS.
SIMCAM 11
JÚNIOR, José D.; FONSECA, Diana S. (2015). Memórias autobiográficas e atividades musicais: uma
pesquisa com idosos (p.241-248). Anais do XI SIMCAM, Pirenópolis: UFG – EMAC.
SIMCAM 10
3. MEDEIROS, Ivany F.M.; ZANINI, Claudia R.de O. (2015) A Musicoterapia na preservação da
memória de idosos institucionalizados (p.380-387). Anais do X SIMCAM. Campinas: UNICAMP.
4. JÚNIOR, José D.; FONSECA, Diana S. (2014). Um estudo sobre a Educação Musical e o desempenho
da memória em idosos. (p.471-478). Anais do X SIMCAM 10, Campinas: UNICAMP.
SIMCAM 6
5. MAYDANA, Celina A. V.; BRASIL, Maria de Fátima M. (2010). Estimulação da memória pelo canto
como base de educação musical na maturidade: um aspecto social (p. 663-671). Anais do VI SIMCAM,
Rio de Janeiro: UFRJ.
SIMCAM 4
6.GATTI, Patrícia. (2008). Práticas musicoterápicas e o desempenho cognitivo em idosos com queixas de
memória (p. 380-386). Anais do IV SIMCAM, São Paulo: USP/FFLCH – Departamento de Linguística.

EIXO 4. MPC - MEMÓRIA E PROCESSOS CRIATIVOS [3 TRABALHOS]


SIMCAM 12
1. VASCONCELOS, Mônica C.S; FONSECA, Diana S. (2016) Memória autobiográfica, histórias de vida
e processos de criação (p.640-651). Anais do XII SIMCAM, Porto Alegre, UFRGS.
2. MERLINO, Julio C.V. (2016). A memória como condicionante do sentido musical na improvisação. (p.
652-659). Anais do XII SIMCAM, Porto Alegre, UFRGS.
SIMCAM 10
3. VASCONCELOS, Mônica C.S; POLONI, Naira. (2014). Memórias Musicais: registro de um percurso
formativo através da criação em sala de aula. (p.227-233). Anais do X SIMCAM, Campinas, UNICAMP.

EIXO 5. MEC - MEMÓRIA E ESTUDOS CULTURAIS [2 TRABALHOS]


SIMCAM 9
1.RAMOS, Danilo et,al. (2013) Cultura e memória: considerações sobre a recepção musical. (p.
308-318). Anais do IX SIMCAM, Belém: UFPA.
SIMCAM 3
2.TRAVASSOS, Elizabeth. (2007). Memória e melos: abordando etnograficamente a 'cognição
musical’(p.127-128). Anais do III SIMCAM, Salvador: UFBA.

EIXO 6. MCL - MEMÓRIA E CIÊNCIAS DA LINGUAGEM [1 TRABALHO]


SIMCAM 4
1. WERKE, Mariana. (2008). Memória operacional para tons, palavras e pseudopalavras em músicos. (p.
358-366). Anais do IV SIMCAM, São Paulo: USP/FFLCH – Departamento de Linguística.

528
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Estudos sobre a mente musical:


Criação de disciplina para o Ensino Superior

Luciane Cuervo
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
luciane.Cuervo@ufrgs.br

Resumo: A relevância dos temas concernentes aos estudos sobre a mente musical é argumento
consolidado por diversas pesquisas interdisciplinares das últimas décadas, as quais mostram um alto
engajamento neural nas práticas musicais. A inserção do assunto em cursos de formação e
popularização dos conhecimentos neurocientíficos aplicados à música, no entanto, ainda carecem de
iniciativas, apesar de constatada grande demanda na comunidade acadêmica. Pensando nisso, foi
criada a disciplina “Estudos sobre a mente musical”, propondo o assunto de modo introdutório na
graduação de música. De natureza eletiva, em 2017 a disciplina contempla a sua primeira turma,
ofertada na modalidade presencial a todos os cursos e ênfases da música na Universidade Federal do
Rio Grande do Sul e sem exigir pré-requisitos dos estudantes. Nessa direção, o presente trabalho
parte da reflexão sobre a musicalidade humana, justificando a relevância do campo, e demonstra o
percurso desenvolvido da concepção até a aprovação e oferecimento da disciplina ao curso de
graduação em música, incluindo os desafios da sua implementação.
Palavras-chave: cognição musical, musicalidade, neurociências.

Studies on the musical mind: Creation of Curricular Discipline for undergraduate course
Abstract: The relevance of themes concerning studies of the musical mind is a consolidated
argument. Several interdisciplinary researches of the last decades showing a high neural engagement
in musical practices. However, the insertion of the theme into courses of training and popularization
of neuroscientific knowledge applied to music still lack initiatives, despite verified great demand in
the academic community. Thinking about it, the discipline "Studies on the musical mind" was
created, proposing the subject in an introductory way in the graduation of music. Of elective nature,
in 2017 the discipline will contemplate its first class, offered in the modality presencial to all the
courses and emphases of the music in the university XXX and without demanding prerequisites of
the students. In this direction, the present work starts from the reflection on human musicality,
justifying the relevance of the theme, and demonstrates the course developed from the conception to
the approval and offering of the discipline to the undergraduate music course, including the
challenges of its implementation.
Key-words: Musical cognition, musicality, neurosciences.

Musicalidade do Homo Sapiens


As manifestações de musicalidade acompanham a humanidade desde os seus primórdios, num
processo dinâmico e em constante transformação, relacionado ao contexto temporal,
geográfico, sociocultural, tecnológico e cognitivo do indivíduo e de seu grupo numa esfera
global.
Harari (2014) é enfático ao afirmar que o ponto-chave do sucesso do
desenvolvimento cognitivo do Homo sapiens consistiu na sua capacidade de agir de
maneira coletiva, colaborativa e, principalmente, criativa, inventando histórias sobre si
mesmo e performances ficcionais, o que o diferencia de outras espécies. Para ele, a
flexibilidade e a inventividade na improvisação de novas organizações sociais constituídas

529
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

ante os novos obstáculos e dilemas impostos pelo contexto foram habilidades


fundamentais para a preservação e evolução da espécie em detrimento de outras. Essas
capacidades colaborativas podem tanto construir feitos benéficos e solidários, como
produções artísticas, eventos esportivos, discussões intelectuais e processos de ensino e
aprendizagem, como também atos danosos em larga escala, como organizações
criminosas, exércitos violentos ou movimentos conduzidos por fanatismo religioso, como
exemplifica Harari (2014). O autor argumenta ainda que, enquanto a comunicação é
utilizada por outras espécies para se organizarem em relação aos recursos reais do
ambiente para a sua sobrevivência, a comunicação humana evoluiu de maneira
extraordinária, alcançando reflexões subjetivas e elementos criativos que não existem “no
mundo real”, mas, sim, somente na imaginação. É precisamente sobre este aspecto que a
arte emerge como criação humana de fundamental importância na história da humanidade,
ao fomentar a criação de novas realidades ficcionais que só existem no mundo virtual dos
pensamentos, das narrativas e da imaginação (Harari, 2014).
A capacidade de integração e coesão social precisou de subsídios que fomentassem
movimentos coletivos e colaborativos. Ressalta-se, nessa linha de pensamento, a importância
da narrativa, da mente imaginativa e criatividade, elementos muito próximos e naturais à
musicalidade humana expressa por meio da performance, assim como o sentimento de coesão
social e de coletividade que o fazer musical promove. A performance musical é uma
manifestação que nasceu justamente da necessidade de expor, através de condutas
expressivas, a imaginação, os pensamentos, os sentimentos, as narrativas e os rituais
intimamente atrelados ao contexto cultural do ser humano.
A performance musical, por conseguinte, é um tipo de produto resultante de
significativo investimento de tempo e energia para a sua concepção e execução surgida em
tempos muito remotos, podendo assumir as mais variadas funções numa comunidade
(Dissanayake, 2008; Huron, 2012).
Conforme Huron (2012), a mente é resultado tanto de fatores biológicos quanto
culturais, e o peso que cada estudioso dá a uma dessas abordagens direcionará as bases de seu
raciocínio a ser defendido. Com argumentos sobre o aspecto evolucionista da música, Huron
(2012) acredita que é relevante discutir essa vertente, pois essa área pode contribuir para a
forma como as coisas são aprendidas e, por conseguinte, como a música é aprendida. Ele
demonstra algumas Teorias Adaptativas da Música para argumentar em favor dessa tese:

530
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

1) Forma de galanteio – o fazer musical de indivíduos machos poderiam ser


demonstração de boa saúde e pontos positivos para atrair parceiras;
2) Coesão social – no sentido de promover o compartilhamento, aumentando a eficácia
de organizações sociais;
3) Esforço de grupo – como canções de trabalho ou guerra, por exemplo;
4) Desenvolvimento auditivo – Ouvir música tornaria o indivíduo mais receptivo aos
sons do ambiente, como forma de exercitar a audição;
5) Resolução de conflitos – o estudioso dá o exemplo com o ato de sentar em volta da
fogueira: para falar, há chances de briga e conflito, no entanto sentar ao redor de uma fogueira
para cantar, pode ser uma atividade social mais segura e integradora;
6) Passatempo seguro – à medida que o homem foi se tornando mais proficiente na
coleta e caça, por exemplo, a música pode ter se tornado um recurso de passar o tempo de
modo seguro, como modo de preservar a espécie;
7) Comunicação transgeracional – como forma de passar histórias e fatos de um grupo
social através da tradição oral, a música tem-se mostrado eficaz recurso mnemônico ao longo
dos séculos.
Partindo-se do argumento de que a musicalidade faz parte da história do Homo Sapiens,
algumas investigações têm se centrado no questionamento acerca do que é universal e do que
é particular no fazer musical, ou o que é genético e o que é cultural. Hoje se considera que o
ser humano possui capacidade para a música assim como para a cultura e a linguagem
(Blacking, 1973; Cross, 2003; Peretz et al., 2002; Levitin, 2010; Dissananyake, 2011). Mithen
(2006) crê que a música é universal, contudo, culturalmente diversa. A experiência social é
um dos fatores determinantes do desenvolvimento intelectual. Um conceito basilar nesse
sentido é a plasticidade neuronal, que pode ser explicada como a capacidade do cérebro em
reconfigurar suas redes neurais diante de situações de novas experiências de aprendizagens ao
longo da vida, sejam elas formais ou informais, fortalecendo os saberes e as práticas
consistentes e descartando conexões superficiais de aprendizagens irrelevantes.
Ao ponderar sobre a musicalidade como uma característica humana, como ressalta
Maffioletti (2001), é instigante pensar que a amusia pode vir a ocorrer entre 2,5% (Sacks,
2007) e 4% (Peretz et al., 2002) de uma população. A prevalência de amusia congênita foi
estimada em índice ainda mais elevado em alguns contextos, como exemplifica os cerca
de 5% nos Estados Unidos, conforme achados de pesquisa de Hyde e Peretz (2004). A
amusia consiste em uma disfunção ligada ao processamento musical, mais

531
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

especificamente aos aspectos da percepção do ritmo ou da melodia ou produção de música


e, mais raramente, em dificuldades manifestadas na leitura ou grafia musical. Pode ser
ocasionada por lesão ou possuir natureza congênita. Há indícios de que a amusia possua
componentes hereditários, especialmente no que concerne ao déficit da percepção da
frequência musical, conforme pesquisa de Peretz, Cummings e Dubé. (2007). Esse cenário
é particularmente interessante à Educação Musical, considerando que suas possíveis
limitações serão minimizadas ou mesmo superadas por meio da utilização de determinados
recursos pedagógicos e tecnológicos durante a construção da performance musical, e essas
estratégias poderão enriquecer planejamentos pedagógicos de processos educativo-musicais
(Cuervo, 2016).
Há fortes indícios de que o músico seja um modelo ideal para investigar a adaptação
funcional e estrutural do sistema motor e auditivo (Schlaug, 2003). O diálogo entre as
neurociências e a educação é desejável e necessário, e ele ocorre também por meio da difusão
e popularização dos conhecimentos neurocientíficos na formação de professores, esfera na a
qual a presente pesquisadora se inclui. Como explica Nunes-Silva (2014, p.21), visto a
complexidade do desempenho cognitivo envolvido na música “[...] o estudo do
processamento musical pode fornecer insights também para a compreensão de outras funções
cognitivas e das redes neurais envolvidas no funcionamento cerebral de alta ordem”, ideia
também defendida por Levitin e Tirovolas (2009) e Herholz e Zatorre (2012). Os
pesquisadores Peretz, Cummings e Dubé, 2007 corroboram a opinião de que o ser humano
nasce com o potencial para fazer música e falar, deduzindo, portanto, que tanto a
capacidade do aparato neurológico para a música quanto para a linguagem foram
codificadas pelo genoma.

A inserção da temática no Ensino Superior


Welch (2014) destaca a importância da realização de investigações interdisciplinares para
compreender o modo de funcionamento e desenvolvimento da mente, numa visão integral que
contemple a saúde, o contexto sociocultural e os benefícios cognitivos que a prática musical
suscita. Para ele, é fundamental estimular a mente numa abordagem integral, considerando a
música como elemento marcante nesse contexto. Ele acredita que há embasamento
investigativo que comprova a importância da música no desenvolvimento cognitivo humano e
que este é um argumento relevante para justificar o acesso universal ao estudo de música por
meio da educação musical.

532
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

A inserção da temática no Ensino Superior consiste num grande desafio, visto a


histórica resistência do meio acadêmico a projetos interdisciplinares e currículos fortemente
enraizados em conteúdos tradicionais, os quais, muitas vezes, repelem o conhecimento novo.
Aliado a isso, há o fato de ainda não haver iniciativas regulares de formação de professores de
música que venham a contemplar temas como “música e cérebro” no Brasil, o que acaba por
gerar certo receio de profissionais da área em abordar o tema em cursos de formação básica.
O conteúdo, assim, acaba restrito a círculos fechados de pesquisadores, dificultando a
popularização desses saberes.
Os cursos de graduação em música no Brasil, de modo geral, possuem uma grade
curricular baseada em temáticas tradicionais como história (ocidental) da música, aspectos
técnicos da formação básica, como teoria e percepção musical, harmonia e contraponto,
práticas musicais sob diferentes enfoques, gêneros e estilos, além de temáticas da esfera
pedagógica, no caso das licenciaturas (Cuervo, Adami & Sonza, 2014).
O contexto de formação acadêmica também carece de reflexões e práticas sobre o
processo criativo, assunto primordial no que concerne às práticas musicais, seja tocar ou
cantar e criar música, seja compor ou improvisar. O processo criativo em música envolve
diferentes aspectos, ligados à área da composição musical, psicologia e neurologia. A
psicologia é uma área pioneira na pesquisa desse campo, existindo diferentes teorias,
normalmente vendo o processo criativo como um processo de resolução de problemas
(Adami, 2010). Raramente abrangem o conhecimento biológico do processamento musical e
suas potencialidades e, quando esse assunto está presente, é de maneira informal e como parte
adicional de disciplinas como Psicologia da Música. A pedagogia da performance musical,
por outro lado, não costuma abordar aspectos neurocientíficos, cujo teor poderia corroborar no
aperfeiçoamento do processo de sua construção. Além do desempenho artístico e didático
individual, o professor de música, com base em tais conhecimentos, poderia contribuir de
maneira extraordinária na elaboração de diferentes estratégias educacionais tanto para alunos
normais quanto com disfunções, como defendem Cuervo, Adami e Sonza (2014).
Motivada pela relevância do tema e constatação de alta demanda na comunidade acadêmica,
conferida pela ocasião de ofertas de cursos na esfera da extensão universitária e por um
conjunto de iniciativas envolvendo o assunto (Cuervo, 2014), foi concebida a disciplina
“Estudos sobre a mente musical” direcionada ao Ensino Superior de Música. Por ser a
primeira oferta aos estudantes em 2017, sua realização não deixa de ter um caráter
exploratório inerente, visto também o ineditismo da proposta nos cursos superiores de música,

533
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

conforme levantamento realizado (Cuervo, 2014). Importante dizer que a proposta possui
caráter inclusivo, sem exigência de pré-requisito e aberta a todas as ênfases do curso de
música da universidade, além de integração com membros da extensão universitária em busca
de estudos interdisciplinares.
Essa disciplina contempla a introdução aos estudos sobre a musicalidade humana,
propondo o estudo acerca das contribuições das neurociências para a compreensão da mente
musical numa abordagem interdisciplinar. A partir do estudo e discussão das mais recentes
pesquisas da área, a disciplina se propõe a refletir sobre a percepção e apreciação, criação e
performance musical, contemplando o processamento da música no cérebro.
Para isso, possui como objetivos: estudar a musicalidade humana a partir das contribuições de
investigações no campo neurocientífico, introduzir os fundamentos do processamento
neuronal da música e discutir as contribuições das neurociências para a compreensão e
aperfeiçoamento dos processos de criação, execução e apreciação musical.
Convicta da necessidade de democratizar o acesso aos conhecimentos neurocientíficos,
conectando-os aos saberes e práticas musicais de modo acessível e atraente a estudantes de
música em nível de graduação, a disciplina parte da discussão acerca da natureza da
musicalidade e os mitos que circundam a temática música e cérebro. Pretende abordar, ainda,
reflexões sobre a memória e aprendizagem musical, o processo de leitura à primeira vista,
distúrbios da aprendizagem musical, o mapeamento da música no cérebro e os benefícios que
a música suscita no desenvolvimento cognitivo global do ser humano.
A primeira oferta da disciplina contemplará os fundamentos das ciências cognitivas,
adotando o conceito de Del Nero (s/ data) quando diz que o termo é vinculado a um conjunto
de esforços interdisciplinares que buscam “compreender a mente e a sua relação com o
cérebro humano”. Desses esforços, destacam-se as articulações entre as áreas de
neurociências, psicologia, linguística, filosofia e a inteligência artificial. Com o intuito de
tornar esses saberes acessíveis ao público da graduação, a disciplina, portanto, procura
introduzir conceitos básicos da cognição musical, e seus desdobramentos em psicologia,
neurofisiologia e neuroanatomia, sempre articuladas ao campo da música. Serão discutidos os
princípios dos processos de sinapse e redes neurais, memória e aprendizagem musical, o
conhecimento sobre o Sistema de Recompensa e a plasticidade neuronal, bem como o
mapeamento da música no cérebro, entre outros subtemas.
Sua metodologia inclui aulas presenciais com abordagem interacionista, incentivo de
participação de convidados especialistas e apoio metodológico complementar do ambiente

534
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

virtual de aprendizagem. As experiências de aprendizagem serão estruturadas no estudo e


discussão de textos propostos, proposição docente e discente de apreciação e análise crítica de
objetos virtuais de aprendizagem e produções audiovisuais indicadas, pesquisa e
compartilhamento de materiais sobre o tema bem como dinâmicas coletivas presenciais, como
performances ao vivo e propostas interativas de práticas sobre o tema.
Os critérios da avaliação processual baseiam-se em princípios includentes de construção
da aprendizagem, valorizando a participação do estudante tanto nas aulas presenciais quanto
no ambiente virtual e estratégias colaborativas de trabalho. Ciente das limitações que
porventura possam surgir na abordagem em formação básica de música, as referências básicas
essenciais foram selecionadas dentre materiais acessíveis e predominantemente no idioma
português. Nas referências complementares, foram indicados anais de eventos científicos,
especialmente dos simpósios promovidos pela ABCM, periódicos da área e produções
audiovisuais internacionais acessíveis em sua versão legendada.
Acredita-se, enfim, que a proposição de uma disciplina que contemple o tema “mente
musical” pode vir a corroborar na compreensão sobre a relevância da música na formação
integral do ser humano. Defende-se, com igual convicção, que o acesso e a apropriação de
conhecimentos básicos sobre os modos de engajamento do cérebro com a música, a
compreensão sobre os mecanismos de aprendizagem musical e o conjunto de comportamentos
musicais reflitam-se nos processos criativos, perceptivos e performáticos, de modo a auxiliar
o aperfeiçoamento de estratégias pedagógicas no ensino, na aprendizagem e na
autoaprendizagem de música.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Pôsteres

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

A percepção e a produção musical nos aspectos auditivos, vocais e


emocionais como fatores de influência na prática do canto coral

Sandra Regina Cielavin


Mestranda em Música na Universidade Estadual de Campinas
sandracielavin@hotmail.com

Vilson Zattera
Laboratório de Acessibilidade / BC / UNICAMP
vilson.zattera@gmail.com

Adriana do Nascimento Araújo Mendes


Departamento de Música, Universidade Estadual de Campinas
aamend65@gmail.com

Resumo: O presente artigo, é parte de uma pesquisa em andamento que na sua totalidade, tem a
finalidade de investigar o uso de tecnologias digitais de informação e comunicação aplicadas à
prática do canto coral. No recorte específico deste trabalho, o objetivo é discorrer sobre pontos
que envolvem a percepção e a produção musical nos aspectos auditivos, vocais e emocionais como
fatores de influência na prática do canto coral. A metodologia de abordagem qualitativa, consiste
em pesquisa bibliográfica por meio de leitura e fichamento de textos relativos ao tema proposto
com o intuito de dialogar com as concepções de autores que tratam do assunto, bem como de
relacioná-las à prática coral. O coro adulto no contexto da educação musical tem o propósito de
incluir pessoas sem experiência musical anterior. Nesse sentido, é comum os indivíduos
apresentarem dificuldades de afinação, respiratórias, de emissão vocal, emocionais, entre outras.
As questões provenientes desses problemas podem estar ligadas a falta de vivência musical, a
percepção auditiva nos aspectos da memória e da atenção, ou ainda, a bloqueios que podem ter
sido ocasionados por crenças na ausência de aptidão para música.
Palavras-chave: Percepção musical. Audição. Voz. Emoção. Canto coral.

Perception and musical production in the auditory, vocal and emotional aspects as influencing
factors in the practice of choir singing
Abstract: This article is part of an ongoing research that in its totality has the purpose of
investigating the use of digital information and communication technologies applied to the practice
of choral singing. In the specific clipping of this work, the objective is to discuss points that
involve perception and musical production in the auditory, vocal and emotional aspects as
influencing factors in choral singing practice. The methodology of qualitative approach consists of
bibliographical research through reading and writing texts related to the proposed theme. With the
intention of dialoguing with the conceptions of authors that deal with the subject, as well to relate
them to the choral practice. The adult choir in the context of musical education is intended to
include people without previous musical experience. In this sense, it is common for individuals to
present tuning, respiratory, vocal emission, and emotional difficulties, among others. The issues
arising from these problems may be related to lack of musical experience, auditory perception in
aspects of memory and attention, or blockages that may have been caused by beliefs in the absence
of aptitude for music.
Keywords: Musical Perception. Audition. Voice. Emotion. Choir Singing.

Introdução
Na educação musical, o canto coral é uma área que possibilita a aprendizagem das
propriedades sonoras de altura, ritmo e intensidade. A prática coral está presente em escolas,

538
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

empresas, centros comunitários, e permite que os integrantes desenvolvam o convívio social.


No entanto, indivíduos adultos que decidem participar do canto coral, e que não vivenciaram
experiências musicais anteriores, podem apresentar dificuldades relacionadas a afinação, a
emissão vocal, ao ritmo, entre outras.
É comum receber o relato de adultos que foram rotulados como desafinados ou sem
talento para música e, que, consequentemente, pensam não possuírem aptidões musicais.
Segundo Swanwick (2014), todos os indivíduos têm capacidade de desenvolver
competências musicais, porém, a falta de estímulo pode comprometer esse desenvolvimento.
Silva (2012) indica que na concepção do educador musical Zoltán Kodály, a música pertence
a todos e deve ser parte da vida do ser humano. De acordo com Paz (2000), para o compositor
Villa-Lobos, todos podem receber ensinamentos musicais, notadamente, nos aspectos do
ouvir e do cantar. As experiências na música coral, especificamente, envolvem os processos
de percepção musical ao ouvir, de emissão ao cantar, do uso da memória no registro e
recuperação de informações e das emoções produzidas.
O presente artigo, é parte de uma pesquisa em andamento que na sua totalidade, tem a
finalidade de investigar o uso de tecnologias digitais de informação e comunicação aplicadas
à prática do canto coral. A pesquisa justifica-se pela atualidade do tema e pela lacuna de
trabalhos existentes na realidade brasileira. No cronograma deste projeto está previsto, em
momento posterior, apresentar a descrição de exercícios e de estratégias aplicadas às
tecnologias digitais que poderiam contribuir com a área coral. No recorte específico deste
trabalho, o objetivo é discorrer sobre pontos que envolvem a percepção e a produção musical
nos aspectos auditivos, vocais e emocionais como fatores de influência na prática do canto
coral. A metodologia de abordagem qualitativa, consiste em pesquisa bibliográfica por meio
de leitura e fichamento de textos relativos ao tema proposto com o intuito de dialogar com as
concepções de autores que tratam do assunto, bem como de relacioná-las à prática coral.

A percepção musical e a sociedade contemporânea


Um dos elementos essenciais que possibilitam a percepção musical é o ouvir. O primeiro
sentido percebido desde a formação do feto, é a audição. Benenzon (1988) aponta que os sons
respiratórios e vocais, bem como os ruídos de movimentos musculares ou viscerais da mãe,
contribuem para o conjunto de experiências que tem a finalidade de estímulo e de
comunicação com o bebê. Nas etapas posteriores do desenvolvimento humano, a audição
continua sendo um importante canal de recepção e de interpretação do mundo.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

A revolução industrial possibilitou a construção de novas máquinas e consequentemente


provocou a maior concentração de indivíduos nas cidades. A produção musical também
passou por muitas transformações. Como apresenta Gohn (2010, p. 27) “os meios de gravação
e reprodução sonoras surgidos, como o fonógrafo de Thomas Edison no fim do século XIX,
permitiram que a música fosse ouvida sem a presença de músicos”. O aparecimento do
computador, dos programas musicais e da Internet modificaram substancialmente as formas
de produção musical, bem como, de acesso a música.
Atualmente, os indivíduos que vivem nas cidades, são expostos a uma imensa
quantidade de sons, o que Schafer (2001) denomina de paisagem sonora lo-fi, que segundo o
autor, quer dizer aquela em que os sinais acústicos, se embaralham atrapalhando a escuta
precisa dos sons. Outro fator a ser considerado é o efeito que a paisagem sonora
contemporânea tem no aspecto auditivo das pessoas. Schafer (2001) afirma que:
O crescimento da intensidade na música ocidental tem um paralelo no crescimento
da faixa de frequência. No decorrer dos últimos cem anos, novos instrumentos foram
projetados com o objetivo de levar a tessitura sonora para além dos limites da
audibilidade em ambas as direções, até que, com a música eletrônica contemporânea
e com o equipamento de reprodução em alta-fidelidade, uma tessitura completa,
compreendida entre aproximadamente 30 hertz e 20 mil hertz, ficasse disponível
para o compositor e para o executante (Schafer, 2001, p. 167).

Schafer (1991) sugere alguns exercícios que permitam o treinamento auditivo utilizando
sons do ambiente, como por exemplo, bater uma palma e perguntar qual foi o último som
ouvido antes da palma e qual foi o primeiro depois da palma. Na intenção de propor a
conscientização dos integrantes do coral em relação a paisagem sonora, o regente poderia
desenvolver atividades de gravação de sons em diferentes locais, tais como: casa, escola,
trabalho, entre outros. Os coristas poderiam representar as paisagens sonoras utilizando sons
corporais e vocais e logo após, discutirem em forma de roda de conversa sobre os efeitos
auditivos percebidos em cada um. A gravação e a representação sonora das atividades
poderiam ser auxiliadas por suporte tecnológico computacional. Considerando as interações
dos indivíduos com as paisagens sonoras atuais, possivelmente, o que e como as pessoas estão
ouvindo ultimamente, têm influência sobre sua percepção e produção musical, notadamente
quando estão envolvidas na prática do canto coral.
De acordo com Sobreira (2003) os requisitos essenciais relativos ao canto e que podem
ser as principais causas da desafinação são agrupados em percepção musical, memória
musical e produção vocal. Portanto, existem diversas questões envolvidas, quando um
indivíduo sem conhecimentos musicais se propõe a participar de um coro. Este trabalho tem

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

por objetivo apontar elementos da percepção auditiva nos aspectos da atenção e da memória
musical e da produção vocal dos indivíduos que se envolvem na participação de um coral.

A percepção musical e os aspectos auditivos


A percepção musical relacionada aos aspectos auditivos possui um conjunto considerável de
variáveis que devem ser pontuadas. Sobre a temática do ouvir, Huron (2006) indica que a
expectativa auditiva envolve componentes inatos e aprendidos. Os inatos estão relacionados
aos eventos da natureza que podem produzir uma resposta de medo, como os sons do trovão
ou a presença de animais perigosos. Os aprendidos, dependem da significação do som em
determinado ambiente e podem assumir a característica de serem assustadores ou podem ser
encarados como uma oportunidade de realizar uma ação, como por exemplo, abrigar-se de
uma tempestade quando necessário.
Sloboda (2008) expõe que na música os sons estabelecem relações significativas uns
com os outros, de maneira agrupada e não de forma isolada, portanto, para que a percepção
musical seja desenvolvida, é necessário que o indivíduo perceba as analogias e identifique
estes ajuntamentos. Outro fator pertinente a percepção está relacionado a atenção na audição
musical. Segundo experimentos realizados, ouvintes que foram submetidos a audição de
melodias tocadas simultaneamente, demonstraram que eles foram propensos a identificar
apenas uma delas para seguir, fato que, segundo o pesquisador, afetaria a percepção completa
de uma estrutura musical polifônica, por exemplo (Dowling, 1973 como citado em Sloboda,
2008, p. 218).
O próximo ponto está relacionado a memória na audição musical, que se apresenta
como um elemento essencial, no qual é imprescindível que o ouvinte se lembre de eventos
musicais anteriores. De acordo com Sloboda (2008):
Uma modulação para uma nova tonalidade é ouvida apenas se alguém se lembrar da
tonalidade anterior. Um tema é ouvido como sendo transformado apenas se alguém
consegue lembrar a versão original, a partir da qual se deu a transformação. E assim
por diante. Uma nota ou acorde não tem significado musical senão na relação com
as notas ou eventos anteriores posteriores. Perceber um evento musicalmente (isto é,
reconhecer pelo menos parte de sua função musical) é relacioná-lo a eventos
passados. Portanto, é importante que nós saibamos até que ponto somos capazes de
lembrar eventos musicais passados, e que saibamos quais são os fatores que
auxiliam a nossa memória (Sloboda, 2008, p. 229).

Sobreira (2003) aponta que a memória musical pode ser estimulada no convívio social,
como família, escola e outros ambientes que os indivíduos frequentem e ainda em estudo

541
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

comparativo que mostram que as crianças que tiveram mais oportunidades de cantar com a
família, de ouvir música frequentemente e de serem expostas a maior variedade de estilos
musicais eram mais desenvolvidas musicalmente (Shelton, 1969 como citado em Sobreira,
2003, pp. 65-66).
A organização de alturas e sua relação com a percepção do ouvinte têm sido objeto de
estudo de alguns autores. Como sinaliza Krumhansl (2006, p. 76) “uma ideia que influencia
toda a pesquisa cognitiva em música é que a representação mental da música pode ser
formalizada mediante um conjunto de regras. Simon e Sumner (1968) articularam as
premissas básicas dessa abordagem”. Krumhansl (2006) salienta que primeiramente, a função
das regras é deixar que o indivíduo tenha expectativas em relação a eventos dispostos em
sequência. Depois, entende-se que as regras funcionam baseadas em estruturas definidas de
elementos. O terceiro ponto diz respeito a descrição das regras por determinados operadores e
o quarto item refere-se à aplicação das regras em padrões hierarquicamente organizados.
Nesse sentido de acordo com Huron, podemos inferir que a audição parece estar intimamente
ligada a expectativa. Os sujeitos constroem uma relação entre o que ouvem e o que esperam
que se realize concretamente. Huron (2006) traz um apontamento que trata do mecanismo
antecipatório que está presente nos indivíduos. A antecipação tende a ser naturalmente
pessimista e a gerar tensões, no entanto, à medida em que se tem familiaridade com um tema
ou atividade a ser desenvolvida, o mecanismo antecipatório é acalmado. A expectativa possui
três funções: motivação, preparação e representação. Quando é possível prever situações
relacionadas a eventos futuros, os indivíduos podem elaborar um planejamento procurando
minimizar consequências negativas, o que os leva a motivação ou então a preparar-se com
estratégias apropriadas para enfrentar imprevistos e ainda, representar situações de sucesso ou
de fracasso utilizando um mecanismo de seleção natural (Huron, 2006). Com o intuito de
trabalhar as dificuldades de afinação advindas da falta de treino, o regente poderia apresentar
as propriedades do som, o agrupamento de notas em pentacordes e intervalos de forma
sequenciada, escalas, até que os integrantes se familiarizassem com as sequências de sons.
Além disso, poderia elaborar pequenos exercícios que estimulassem a construção da memória
musical, tais como, repetições de pequenas frases musicais e cânones.
O estabelecimento de regras sequenciais musicais que o cantor pode vir a aprender
associadas a memorização consciente, poderia influenciar positivamente suas expectativas
relacionadas às experiências musicais no canto coral e ser um elemento facilitador no que diz
respeito as dificuldades de afinação derivadas de questões auditivas.

542
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

A produção musical nos aspectos vocais


O canto é uma forma de expressão inerente ao ser humano. O ato de cantar além de ser uma
experiência musical agradável pode trazer alguns benefícios. Ilari (2003) indica que o ato de
cantar permite acionar os sistemas da linguagem, da memória e de ordenação sequencial. O
canto em conjunto é uma atividade que está presente desde os primórdios, seja em rituais
religiosos ou em obras de concerto. Ocorre que a educação musical deve ser acessível a todas
as pessoas e na prática coral, nem sempre os integrantes que ingressam na atividade, tem
vivências musicais prévias e, portanto, não é raro que apresentem dificuldades de afinação ao
cantar.
Além das questões auditivas elencadas neste trabalho, existem problemas neurológicos
que podem ocasionar a produção vocal de forma desafinada, no entanto, para fins deste artigo,
serão pontuadas algumas dificuldades mais comuns relacionadas à produção vocal.
“Desafinado é a pessoa incapaz de reproduzir corretamente a altura das notas; semitonado é
aquela que canta em semitons, desentoado, que desafina para baixo e monotônico, pessoa que
gravita em torno de uma mesma altura (próxima à da fala) ” (Paparotti & Leal, 2013, p. 136).
A pessoa desafinada nem sempre tem consciência do som que produz e de suas
dificuldades para cantar de forma correta. Sobreira (2003) elenca alguns itens que afetam a
produção vocal, dentre eles estão os problemas respiratórios, as tensões musculares, extensão
vocal inadequada, dificuldade de reprodução de intervalos, sexo, idade, problemas
psicológicos, modelos imitados, texto, ritmo e hereditariedade.
Um dos elementos mais importantes na produção vocal é a respiração, que é a base do
canto, no entanto, se ela for deficiente, pode comprometer o resultado esperado. Para
Fernandes (2009, p. 205) “cantar não é apenas falar em alturas determinas com o
prolongamento da duração das vogais. Além disso, as exigências respiratórias do canto
superam as da fala”.
A tensão muscular é um outro fator que pode prejudicar a emissão vocal. O cantor deve
manter uma postura ereta, livre de tensões, não deve contrair os músculos de maneira
exagerada. Quanto a dificuldade de reprodução de intervalos, Sobreira (2003) sugere como
forma de treinamento que sejam adotadas melodias curtas e de extensão vocal reduzida.
O regente é o formador musical de seu grupo de cantores. De acordo com Zander (2008,
p. 29) “cada coro canta e fala (dicção) como seu guia canta, fala e se movimenta”. É
necessário ter entendimento de todos os aspectos mencionados para ser uma boa referência

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vocal ao grupo, propondo exercícios e conscientizando os coralistas sobre cada item


necessário a uma boa produção vocal.

A percepção e a produção musical nos aspectos emocionais


Um dos fatores que podem contribuir positivamente ou negativamente com a atuação do
corista em sua percepção e produção musical são os aspectos emocionais. A timidez, por
exemplo, é um elemento que pode dificultar a emissão vocal. Levitin (2006) afirma que o
poder da música para evocar emoções é amplamente utilizado em filmes, anúncios comerciais
e até pelas mães para acalmarem os seus bebês.
O envolvimento com a prática musical através do canto coral faz com que o participante
entre em contato com suas emoções, que podem vir pela lembrança de uma canção que
marcou um importante momento de sua vida, ou pelo caráter mais alegre ou melancólico de
uma peça. Levitin (2006) sugere que as notas em alturas mais agudas podem transmitir a
sensação de excitação, enquanto que as mais graves de tristeza e que existem uma série de
combinações que podem produzir efeitos emocionais nas pessoas, inclusive as variações de
tonalidades e de modos maiores e menores.
Além das possibilidades de vivências de uma gama de emoções que podem ser
experimentadas pelos coristas existem os aspectos de convivência que permitem a interação
com os integrantes. Segundo Dias (2012, p. 139) “além do domínio da voz, conhecimento da
própria sonoridade, essa sintonia decorre do exercício de vivência em comunidade, da
habilidade de produzir em equipe, do entendimento das trocas dentro de um grupo”. A
experiência musical no coral pode evocar diversas emoções nos integrantes, bem como,
produzir a sensação de pertencimento nos indivíduos, fato que pode contribuir com a
produção de expectativas positivas e agradáveis a todos os envolvidos.

Considerações finais
Este artigo procurou apresentar questões relacionadas a percepção e a produção musical nos
parâmetros auditivos, de emissão vocal e emocionais considerando-os como fatores
influenciadores na prática do canto coral. A metodologia consistiu em pesquisa bibliográfica
por meio de leitura e fichamento de textos relativos aos aspectos da percepção e da produção
musical como fatores de influência na prática do canto coral.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

A prática coral de adultos sem experiência musical traz alguns problemas relacionados
as dificuldades dos participantes em termos de percepção auditiva, afinação, memória e
emoção. Todos os indivíduos têm possibilidade de vivenciarem a música e precisam ser
orientados nesse sentido.
Quanto a percepção musical e a sociedade contemporânea discutiram-se as
modificações na produção musical provocadas pelo aparecimento dos computadores e pelas
diferentes formas de acesso à música na atualidade. Além disso, comentou-se a respeito dos
efeitos da paisagem sonora lo-fi sobre a percepção auditiva dos indivíduos, bem como de suas
implicações na prática do canto coral.
A percepção musical e os aspectos auditivos tiveram como foco buscar entender os
processos ocorridos na audição e que envolvem a capacidade de identificação do som nos
aspectos melódicos e harmônicos, a atenção e a memória musical. O ponto que apresentou a
produção musical nos aspectos vocais procurou enfatizar as dificuldades de produção vocal
mais frequentes, tais como problemas respiratórios, tensões musculares e dificuldade de
reprodução de intervalos. Na abordagem da percepção e a produção musical nos aspectos
emocionais ressaltaram-se as relações existentes entre a prática coral e a vivência de emoções,
bem como de interações com um grupo que tem o mesmo interesse musical.
O regente coral tem muitos desafios quando trabalha com um grupo sem conhecimentos
musicais, no entanto, é possível buscar compreender o indivíduo e todo o universo sonoro que
o cerca, de maneira a propor vivências musicais conscientes para que os integrantes do coro
tenham acesso ao fazer musical e consigam desenvolver suas habilidades de modo prazeroso.

Referências
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M. Uricoechea, Trad.). São Paulo: Summus.
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Fernandes, Â. J. (2009). O regente coral e a construção da sonoridade coral: uma
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The MIT Press Cambridge, Massachusetts.
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mente musical: ensaios sobre os processos cognitivos em música – da percepção à
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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

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York: DUTTON.
Paparotti, C., & Leal, V. (2013). Cantonário: Guia prático para o canto. Brasília: Musimed.
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Brasília: Edtora MusiMed.
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Schafer, M. R. (2001). A afinação do mundo: uma exploração pioneira pela história passada
e pelo atual estado do mais negligenciado aspecto do nosso ambiente: a paisagem
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Zander O. (2008). Regência coral. Porto Alegre: Movimento.

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Estudo individual da escrita rítmica e melódica e a autorregulação da


aprendizagem

Elcio Antonio de Almeida Junior


el-cio@hotmail.com

Cristiane Hatsue Vital Otutumi


Unespar, Câmpus Curitiba I, EMBAP

Resumo: Essa pesquisa de iniciação científica em fase de desenvolvimento, tem como finalidade
principal investigar os processos de estudo de alunos ingressantes de um curso de música em
relação à sua escrita rítmica e melódica. Cientes de que essa habilidade tem sido uma das mais
desafiantes na disciplina Percepção Musical, o projeto mira a preparação para a tarefa, a realização
de exercícios e autoavaliação no final das atividades. Essa escolha tem fundamento nos princípios
da Autorregulação da aprendizagem, no prisma de Albert Bandura (2008), considerando ainda o
modelo de Zimmerman (2000, 2002). Em uma abordagem qualitativa, o trabalho conta com a
revisão de literatura, a elaboração e realização de encontros com alunos matriculados da disciplina
de percepção musical I da instituição e a análise dos resultados de acordo com Bardin (2010). O
intuito é que seja possível aprofundar conhecimento sobre as práticas de estudo individual dos
alunos participantes e auxiliar a melhoria dessas ações.
Palavras-chave: escrita musical, autorregulação da aprendizagem, percepção musical.

Title: Individual study of rhythmic and melodic writing and the self-regulated learning
Abstract: This scientific initiation research in the development phase has the main purpose of
investigating the study processes of incoming students of a music course in relation to their
rhythmic and melodic writing. Aware that this ability has been one of the most challenging in the
Musical Perception discipline, the project looks at task preparation, exercise and self-assessment at
the end of activities. This choice is based on the principles of Self-regulation of learning, in the
prism of Albert Bandura (2008), considering also the model of Zimmerman (2000, 2002). In a
qualitative approach, the work includes the literature review, the elaboration and accomplishment
of meetings with students enrolled in the discipline of musical perception 1 of the institution and
the analysis of the results according to Bardin (2010). The intention is that it be possible to deepen
knowledge about the practices of individual study of the participating students and to help improve
these actions.
Key-words: musical writing, self-regulation learning, aural perception.

Introdução e Justificativa
A atividade de escrita rítmica e melódica é um exercício recorrente à maioria dos estudantes
de graduação em música. Ela se faz presente na disciplina de percepção musical, sendo
também em alguns casos, pré-requisito para realização de Testes de Habilidade Específica
(THE) para o ingresso em cursos superiores de música.
Entretanto, nem sempre essas habilidades são de fácil aquisição, como ressalta Otutumi
(2008), “estudantes, em sua maioria, sabem traduzir a escrita musical para seu instrumento,

mas bem pouco praticam o processo inverso, da sonoridade para a escrita”.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

São diversos os fatores que contribuem para essas dificuldades, formação musical
fragmentada; falta de material de apoio; metodologia de ensino pautada em moldes
tradicionais, em que a estrutura de ensino é, muitas vezes, centrada no professor - esse aspecto
também alertado por educadores como Saviani (2009) e Mizukami (2001). Tendo em vista
esse quadro, entende-se a necessidade de estimular processos que acompanhem a tarefa e
privilegiem a autonomia na construção do conhecimento.
A Teoria Social Cognitiva (TSC) é produto do trabalho de Albert Bandura, professor
psicólogo e pesquisador canadense, referência na área. Os estudos que originaram a TSC
tiveram início a partir de 1950, sendo apenas em 1986 a primeira publicação oficial com essa
nomenclatura. Em seu trabalho, Bandura (2008) visa entender o comportamento humano
tendo como base a Agência, conceito relacionado às capacidades exclusivamente humanas
tais como a simbolização, pensamento antecipatório, autorreflexão, autorregulação (principal
referencial de nossa pesquisa), entre outras (POLYDORO E AZZI, 2011).
O mecanismo autorregulatório trata de um processo cíclico e individual, em que as
ações realizadas são autogeradas, e ajustadas de acordo com as metas, pensamentos e
sentimentos pessoais, além das crenças motivacionais de cada indivíduo (POLYDORO E
AZZI, 2008). O desenvolvimento do comportamento autorregulado está ligado a três
subfunções (POLYDORO E AZZI, 2008): auto-observação; processos de julgamento e
autorreações. A primeira delas, a auto-observação está relacionada ao monitoramento do
desempenho de uma ação, é nesta fase que são obtidas informações para que determinado
comportamento ocorra. É importante ressaltar que tal fase não se limita à mera observação,
trata-se de um processo ativo de autoconhecimento, crucial na definição de metas. Quanto
maior o refinamento da auto-observação, melhor será a integração das outras duas
subfunções.
As informações obtidas na primeira fase sofrem os processos de julgamento (segunda
subfunção), e, a partir das comparações, ocorre também a atribuição de valor ao
comportamento, que varia entre apropriada, neutra e sem valor (POLYDORO e AZZI, 2008).
A atribuição de valor está fortemente ligada a fatores motivacionais, quanto maior o valor
atribuído à atividade, maior serão os esforços para sua realização, e refinamento da auto-
observação e autorreação.
A última subfunção da autorregulação relaciona-se à autorreação, é nessa fase que
ocorre a avaliação do comportamento desenvolvido, sendo que ela pode ser positiva, negativa,
neutra ou ainda inexistente. A autorreação permite uma mudança ou aprimoramento do

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

comportamento, sendo que há também, nesses casos, os chamados autorreforços, este último
ligado aos:
[...] padrões de desempenho que, quando satisfeitos tendem a regular o
comportamento por meio de recompensas autoproduzidas, tais como orgulho e
autossatisfação. Quando as pessoas não conseguem corresponder a seus padrões, seu
comportamento é seguido de autoinsatisfação ou autocrítica (G. J. FEIST, J. FEIST,
ROBERTS, 2015, p. 340).

Zimmerman (2000) também propõe um modelo que sintetiza o processo de


autorregulação em três fases. A principal diferença entre o esquema de Zimmerman e as
subfunções da autorregulação se aplicam ao contexto em que cada uma está inserida. Bandura
descreve as subfunções tendo como propósito, o entendimento do comportamento humano,
enquanto Zimmerman aplica seu modelo no contexto educacional, com o intuito de atingir
objetivos acadêmicos específicos (POLYDORO E AZZI, 2008).
As fases do Modelo de Zimmerman são: fase prévia; de realização e auto-reflexão. A
primeira delas está relacionada ao processo de análise da tarefa e do objeto de estudo. É nessa
etapa que há o estabelecimento de objetivos a serem alcançados, assim como o
“levantamento” dos recursos disponíveis para realização da tarefa, trata-se da análise dos
conhecimentos que o indivíduo já detém sobre o assunto a ser estudado, é nesta primeira fase
que ocorre a elaboração de estratégias para o desenvolvimento da aprendizagem.
A segunda fase está relacionada à concretização do estudo e ao emprego dos recursos e
estratégias estabelecidos na primeira fase, assim como análise do comportamento individual
durante a tarefa. Há ainda nessa fase aspectos adicionais relacionados ao gerenciamento de
tempo, e espaço físico e controle da atenção na atividade (FREIRE, 2009).
A terceira e última fase apresenta um caráter avaliativo acerca dos procedimentos e
resultados, sendo realizado uma análise dos objetivos alcançados, observando se estes últimos
condizem com as metas estabelecidas na primeira fase do processo.
A partir do exposto, propõe-se nesse trabalho, a discussão sobre o estudo individual das
práticas de escrita melódica e rítmica musical, tendo como bases metodológicas a realização
de diferentes atividades que visam entender os processos que norteiam essa prática, assim
como melhoria dessas habilidades, e o desenvolvimento do estudo mais autônomo pela
autorregulação da aprendizagem. O público alvo desta pesquisa são alunos ingressantes do
curso de licenciatura em música da Unespar, EMBAP (Escola de Música e Belas Artes do
Paraná), matriculados na disciplina de Percepção Musical I.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Em relação à organização da escrita musical, consideramos na elaboração das propostas,


autores que discursam sobre a matéria, as experiências de Caregnato (2016) sobre a notação
de músicas ouvidas, a memória musical; pesquisas de iniciação científica desenvolvidas na
Embap como Hellstrom e Otutumi (2016), acerca dos métodos para estudo de solfejo e a
construção de exercícios associados, e Oliveira e Otutumi (2016), com a análise de dois
materiais didáticos voltados à prática do solfejo, além dos livros utilizados nas aulas nessa
instituição como A New approach to sight singing (BERKOWITZ, FONTRIER, KRAFT,
1997), Método Prince Leitura e Percepção (PRINCE, 1993), Rítmica (GRAMANI, 1999) e
outros.

Objetivos:
• Discutir os aspectos da preparação e da autoavaliação no processo de estudo
individual relacionado à prática da escrita rítmica e melódica, com ingressantes
matriculados na disciplina Percepção Musical;
• Acompanhar as ações prévias, de execução da tarefa e de avaliação por meio do
diálogo, da leitura e escrita de textos e excertos musicais, atividades que se configurem
a partir do modelo de Zimmerman e o processo autorregulatório de aprendizagem;
• Verificar os resultados refletindo sobre as informações dos participantes e
dimensionando-as para o aprimoramento das práticas futuras na disciplina.

Metodologia e Estratégias de ação:


A metodologia para a execução desse projeto, tem natureza qualitativa. Entende-se como
qualitativa “a modalidade de pesquisa voltada para o entendimento de fenômenos humanos e
cujo objetivo é obter uma visão detalhada e complexa sobre esses fenômenos [...], dessa
forma, é dado ênfase à linguagem e à percepção dos informantes” (KNECHTEL, 2014, p. 97).
Os processos metodológicos envoltos na pesquisa se constituem de três grandes fases: 1)
pesquisa bibliográfica e preparação das atividades; 2) Realização das atividades com
estudantes; 3) Verificação do material e análise de dados.
Na primeira etapa houve o levantamento de artigos, livros, textos de dissertações e
teses, e outros materiais que são a fundamentação teórica do trabalho. Autores da subárea da
Percepção Musical foram, estudados além de textos da Autorregulação da Aprendizagem e
Cognição Musical.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Na segunda fase ocorre a seleção das informações e o planejamento das atividades com
os alunos. Essas, englobam práticas de escrita rítmica e melódica, que tem por objetivo
identificar as técnicas e a dimensão da escrita dos voluntários. Foi elaborado um questionário
de natureza aberta, cujas questões abordam plano de aprendizagem do aluno, estabelecimento
dos objetivos e as técnicas de aprendizagem, temas estes, relacionados ao modelo de
Zimmerman (2000, 2002). Com o intuito de testar a eficácia das questões, será realizada a
aplicação de um questionário teste, aplicado a alunos veteranos. Para o alcance dos objetivos
haverá 05 encontros entre pesquisadores e alunos participantes, assim estruturados:
1º: apresentação da ideia geral do trabalho, construindo um diálogo sobre a
autorregulação da aprendizagem. Haverá também a discussão sobre o processo de escrita
rítmica e melódica dos participantes, no que se refere à organização, realização e avaliação.
Para tanto, estruturou-se uma breve explicação verbal para apresentação das ideias da
pesquisa; aplicação do questionário sobre a escrita rítmica e melódica; introdução sobre a
autorregulação, com posterior diálogo.
2º: Planejamento e realização junto aos estudantes, de um conjunto de ditados
(melódico e rítmico) de caráter experimental para localizar os alunos sobre os quesitos como a
concentração, memorização, anotação e outros. Para esses exercícios, haverá uma seleção de
materiais, extraídos de métodos de percepção rítmica e melódica. Pretende-se corrigir e
dialogar sobre o processo e as estratégias utilizadas.
3º: Realização de atividades lúdicas relacionadas aos conteúdos estabelecidos para os
ditados rítmicos e melódicos. Essas práticas pretendem aproximar os participantes aos
elementos da música, sua atenção às propriedades do som, ao movimento e direção das alturas
e dos padrões rítmicos.
4o: realização da escrita rítmica e melódica. Após os exercícios haverá avaliação
juntamente aos participantes. Os ditados serão realizados de maneira individual.
5º: a última reunião será para discussão sobre os processos de escrita desenvolvidos e as
impressões sobre o processo, além do estímulo ao planejamento e rotina de estudos,
gerenciamento de tempo, autocrenças, fatores desmotivacionais e outros.
A última fase da metodologia será a análise dos dados obtidos de acordo com a Análise
de Conteúdo de Bardin (2010). As reflexões serão expostas no grupo de pesquisa
Epistemologias e Práticas em Educação Musical – EPEM em conjunto à construção do artigo
com resultados finais do processo.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Resultados Esperados:
A partir dessa pesquisa espera-se como resultado, compreender as práticas de estudo
individual dos alunos participantes, com uma intenção secundária, mas não menos importante,
de auxiliar a melhoria dessas ações. Estabelecer uma conexão entre as práticas de estudo e o
modelo da autorregulação da aprendizagem, (com o fomento à discussão sobre o processo de
organização dos estudos) tem a finalidade de despertar nos alunos um processo
autorregulatório cada vez mais consciente.
Tendo em vista os conhecimentos heterogêneos de uma classe, e os desafios
pedagógicos relacionados, torna-se cada vez mais necessário trabalhos e abordagens que
estimulem práticas mais refinadas de estudo autônomo, com destaque para a busca do
autoconhecimento e metas eficazes de estudo.

Referências:
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estudo fundamentado na teoria de Piaget visando à construção de contribuições à
atividade docente. Tese (Doutorado em Música), Instituto de Artes, UNICAMP,
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musical: práticas para um estudo coletivo. Extraído de https://www.dropbox.com/sh/
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Knechtel, M. R. (2014), Metodologia da Pesquisa em Educação: uma abordagem teórico-
prática dialogada (pp. 97). Curitiba: Editora Inter Saberes 1ª ed.
Mizukami, M. G. N. (2001), Abordagem tradicional, In: Ensino: as abordagens do processo,
12º reimpressão, São Paulo: Editora Pedagógica e Universitária LTDA
Oliveira, M. S, Otutumi, C. H. V. (2015) O solfejo na disciplina de percepção musical: estudo
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http://www.fecilcam.br/eventos/index.php/eaic/EAIC/paper/viewFile/2951/881

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

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Otutumi, C. H. V. (2013). Percepção Musical e a escola tradicional no Brasil: reflexões sobre
o ensino e propostas para melhoria no contexto universitário (pp 71). Tese
(Doutorado em Música), Instituto de Artes, UNICAMP, Campinas: São Paulo.
Extraído de: http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?code=000912343
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Polydoro S. A. J; Azzi R. G. (2011). Contribuições da Teoria Social Cognitiva contexto de
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Psicólogo In: Azzi, R. G., Gianfaldoni, M. H. T. A. (2011). Psicologia e Educação.
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Saviani, D (2009). Escola e democracia: teorias da educação, curvatura da vara, onze teses
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Zimmerman, B.J (2000). Attaining self-regulation: a social cognite perspective. In:
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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Transtorno do espectro do autismo: um levantamento bibliográfico

Patricia Dauzacker
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
patriciahalliwell@hotmail.com

Mariana de Araújo Stocchero


Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
mariana.stocchero@ufms.br

Resumo: O autismo, também denominado Transtorno do Espectro do Autismo, é considerado uma


perturbação neurobiológica complexa, incluída no grupo das perturbações globais do
desenvolvimento, que se manifesta através de dificuldades de comunicação e interação
comprometendo o contato do indivíduo com o meio. Não existe uma cura, somente a possibilidade
de atenuarem-se os sintomas e a maneira como o indivíduo interpreta o mundo e se relaciona com o
ambiente ao longo da vida. Esta pesquisa, ainda em andamento, pretende levantar o que foi
produzido sobre a temática dentro dos Anais do SIMCAM, de 2005 a 2016, abordando as
especificidades do Transtorno do Espectro do Autismo e os benefícios que a musicalização pode
trazer para o desenvolvimento em nível cognitivo, socialização e comunicação para as crianças
portadoras do TEA. Esperamos com esta pesquisa, contribuir para que profissionais da educação
musical que trabalham com o desenvolvimento de pessoas com o Transtorno do Espectro do
Autismo, obtenham mais informações sobre o tema.
Palavras-chave: autismo; musicoterapia; educação musical.

Autism Spectrum Disorders: a bibliographical survey


Abstract: Autism, also known as Autism Spectrum Disorders (ASD), is a complex neurobiological
deficit, described as a continuum of diagnoses, often leading to difficulties with the communication
and interaction of the individual which causes his social withdrawal from the environment. There is
no cure, only the possibility of reducing the symptoms and the way an individual relate to and
function in the world and society he’s part of. This research intends to show what was produced on
the subject within the proceedings of SIMCAM, from 2005 and 2016, aproaching the specificities
of   Autism Spectrum Disorders   and the benefits that musical education can bring   to
cognitive, socialization and communication development for autistic children. We hope with this
research, to contribute so that music education  teachers who work in the cognitive development of
people with Autistic Spectrum Disorders can have more information on the subject.
Key-words: autism; musical therapy; music education.

Introdução
O ser humano desde que nasce sente necessidade de se comunicar e interagir com o meio.
Porém, existem crianças que desenvolvem uma forma especial de comunicação. Comunicação
com características específicas onde o indivíduo apresenta comportamentos peculiares,
alheios ao mundo ao seu redor que dificulta a interação social, a linguagem e o
comportamento.
As pessoas com estas características são diagnosticadas com Transtorno do Espectro do
Autismo (TEA), termo criado por Leo Kanner, em 1943, originalmente descrito como
Distúrbio Autístico de Contato Afetivo.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

A relação entre Música e Autismo vem sendo estudada e despertando interesse de


educadores musicais que, devido à inclusão, se deparam com os desafios que o convívio com
indivíduos com TEA impõe. O autismo vem sendo amplamente estudado e divulgado nas
últimas décadas, portanto, saber quais são os benefícios que a musicalização pode trazer para
a comunicação e a interação de crianças com Transtorno do Espectro do Autismo torna-se o
objetivo desta pesquisa.

Este trabalho, ainda em andamento, pretende investigar as relações entre a Síndrome do


TEA e a música a partir das publicações em Anais do Simcam, de 2005 a 2016, contribuindo
assim, para a divulgação de conhecimento acerca das especificidades do Transtorno do
Espectro do Autismo e os benefícios que a musicalização pode trazer para o desenvolvimento
em nível cognitivo, socialização e comunicação para as crianças portadoras deste transtorno.

O Transtorno do Espectro do Autismo


O Transtorno do Espectro do Autismo, ou simplesmente TEA, está inserido dentro do CID 10
(Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde) na
categoria de Desordens Globais de Desenvolvimento, que abrange síndromes que se
caracterizam por desajustes significativos na sociabilidade, na comunicação além de
implicarem em comportamentos repetitivos.
O termo “autista” foi descrito pela primeira vez pelo psiquiatra austríaco Leo Kanner no
ano de 1943, em uma pesquisa intitulada “Distúrbios Autísticos do Contato Afetivo”, na qual
ele identificou dentro de um grupo de crianças classificadas até então como esquizofrênicas,
falhas no diagnóstico dessas crianças, pois eram indivíduos com comportamentos muito
específicos que não se enquadravam em nenhuma descrição clínica. Ele assim o fez, e
somente 30 anos depois, seu estudo foi publicado, fazendo com que o Autismo fosse aceito
como condição crônica do desenvolvimento, um transtorno a parte dos outros, devido ao
prejuízo na linguagem e na comunicação das pessoas afetadas por ela (Kanner, 1971).
Um dos aspectos mais relevantes sobre o TEA é a interação social, ou comprometimento da
mesma. Desde muito cedo, crianças com autismo tendem a ignorar o ambiente que as cerca,
as pessoas e familiares próximos, porque por vezes o reconhecimento facial não acontece. A
nível cognitivo, elas não compreendem sentimentos ou estados mentais alheios, a chamada

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

“1Teoria da Mente”, o que prejudica o desenvolvimento da empatia. O vocabulário, mesmo


que seja extenso, carece de habilidades de reconhecimento de figura de linguagem e
metáforas, levando-as sempre ao entendimento do sentido literal de uma frase (Louro, 2014).
Dentre as características peculiares desse transtorno estão a chamada ecolalia, a repetição de
sons e palavras, a inversão pronominal, referindo-se a si mesmo em terceira pessoa, além de
movimentos corporais repetitivos, a falta de contato visual e dificuldades de socialização
(Schawtzman, 1994).
A relação entre autismo e música não é nova. Estudos vêm sendo desenvolvidos em
diversas áreas, como a psicologia, musicoterapia e educação, com o objetivo de tentar
compreender como o indivíduo com autismo se relaciona com a música e como a música o
auxilia na compreensão de mundo, além do uso da música enquanto ferramenta no tratamento
do TEA, por meio de métodos terapêuticos.
Segundo o psiquiatra argentino Benenzon (1988):
Uma das funções da música é abrir canais de comunicação para que haja uma
expressão corpóreo-sonoro-musical integrada, pois é o conjunto de sons ou de
fenômenos acústicos e de movimentos internos que caracterizam ou individualizam
cada ser humano (Benenzon, 1988, p.38).

A música enquanto aspecto multiforme permite uma experiência sensorial que não só
desenvolvem ações, como também ideias (Barros, 2012). De acordo com Gainza (1988, p.22)
“A música e o som, enquanto energias estimulam o movimento interno e externo no homem;
impulsionam-no a ação e promovem nele uma multiplicidade de condutas de diferentes
qualidade e grau”.
Brito (2003) corrobora:
A música é uma forma de linguagem que faz parte da cultura humana desde tempos
remotos. É uma forma de expressão e comunicação e se realiza por meio da
apreciação e do fazer musical. (...) Durante o processo de musicalização, a criança
desenvolve a capacidade de expressar-se de modo integrado, realizando movimentos
corporais enquanto canta ou ouve uma música (Brito, 2003, p.93).

Por ser considerada mais uma forma de linguagem, a música atinge e afeta, traduz e
condiciona sentimentos e ideias, e se transforma em um instrumento útil de sociabilidade e
descoberta, tão necessário para indivíduos com síndromes que impedem o desenvolvimento
dos processos de cognição.

1 A Teoria da Mente é a capacidade de atribuir estados mentais a outras pessoas (...) Em suma, a Teoria da Mente
possibilita prever sobre os sentimentos e pensamentos alheios, criar hipóteses e tomar decisões (CAIXETA;
NITRINI, 2002; LOURO, 2014).

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Dentre os inúmeros efeitos que a música traz ao corpo humano, Benenzon (1985 p.35)
cita a “diminuição da pressão sanguínea, regularização da respiração, aumento dos reflexos
musculares e diminuição do impacto de estímulos sensoriais”. Além disso, a música atua no
sistema nervoso ativando as áreas cerebrais durante certas atividades musicais, estimulando a
neuroplasticidade, que é a capacidade do cérebro de se adaptar quando o sistema nervoso é
exposto a novas experiências (Queiroz, 2003).
A relação pré-existente do ser humano com o som, aliado a uma técnica direcionada
para o bem estar do indivíduo, possibilitam à musicoterapia assim como também à educação
musical, a oportunidade de abrir-se uma janela para trabalhar os déficits cognitivos e dentro
da perspectiva musical, trabalhar os educacionais também.
Crianças com autismo que frequentemente evitam o contato interpessoal e muitas vezes
nem possuem a capacidade da fala desenvolvida, possuem habilidades musicais incomuns.
Isto talvez, porque tenham escolhido a música como principal canal de expressão e
comunicação, ou também porque a música está presente intrinsecamente em todas as fases do
ser humano e que precisa de tão pouca estimulação externa, quanto falar ou andar de uma
criança normal, que se torna parte pertinente da vida (Gardner, 1996).
A musicalização é entendida como um processo de educação musical voltada para a
potencialização da percepção dos parâmetros sonoros bem como a fruição musical através de
atividades lúdicas com o objetivo de socialização, desenvolvimento da criatividade e
psicomotricidade, otimizando a relação da criança com o seu universo e o mundo em que
vive. A educação musical tem como enfoque o fazer musical, porém se preocupa com os
mesmos propósitos da musicoterapia no sentido de desenvolvimento da socialização,
cognição e expressividade. (Almeida; Campos, 2013)
Segundo Fonterrada:
A educação musical não é apenas uma atividade destinada a divertir e entreter
pessoas, tampouco um conjunto de técnicas, métodos e atividades com o propósito
de desenvolver habilidades e criar competências, embora essa seja uma parte
importante de sua tarefa. O mais significativo na educação musical é que ela pode
ser o espaço de inserção na arte da vida do ser humano, dando lhe possibilidade de
atingir outras dimensões de si mesmo e de ampliar e aprofundar seus modos de
relação consigo próprio,com o outro e com o mundo. (Fonterrada, 2005, p.106).

A música é, e por si só, expressa uma intenção, capaz de incitar um emaranhado de


emoções e a inclinação para apreciá-la é algo inerente do ser humano, que reage à experiência
de forma espontânea e em sua maioria, positivamente. Esse poder da música é vivenciado por
todas as pessoas, não importando se possuem deficiências ou não. Sendo assim, ainda que um

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

indivíduo com TEA possua suas singularidades, a Educação Musical acontecerá para ele da
mesma forma.
No estudo apresentado por Molnar-Szakacs et al. (2009, p.91), o autor indica que:

Kanner apresentou 11 crianças e citou inúmeras vezes suas habilidades musicais e


interesses. Desde então, pesquisadores tem buscado como funciona o processamento
musical das crianças com TEA. E enquanto a habilidade da fala pode ou não ser
deficiente, o interesse por música e particularidades da mesma são compreendidos
por indivíduos com TEA da mesma maneira que pessoas comuns e habilidades
excepcionais na música aparecem em até 40% dos casos (Molnar-Szakacs et al.,
2009, p.91).

Esse interesse de acordo com o estudo deve-se ao fato que, crianças com TEA não
desenvolvem a Teoria da Mente e, portanto, não são capazes de ler feições ou emoções
humanas, o que, por via de regra, as tornam propensas a direcionar a atenção para objetos
inanimados mais do que pessoas. Contudo, a música, por ser um conceito abstrato, com
padrões repetitivos, pode e é recomendada como ferramenta auxiliar no progresso e melhoria
da expressividade, empatia e linguagem (Molnar-Szakacs et al., 2009).

Metodologia
A este trabalho compete a análise sobre a produção científica em cima do tema Educação
musical e Autismo, dentro do contexto do SIMCAM (Simpósio Internacional de Cognição e
Artes Musicais promovido pela ABCM -Associação Brasileira de Cognição e Artes
Musicais). Tendo por enfoque a análise dos textos encontrados em anais dessa conferência,
desde seu início até o presente momento. O intuito é analisar o que vem sendo apresentado
sobre o TEA e onde a educação musical se encaixa no desenvolvimento e aprendizado para os
alunos portadores desse transtorno. Sendo a ABCM voltada para assuntos relacionados à
cognição, processos mentais de aprendizagem da música, a publicação de estudos
relacionando a temática com o autismo, é pertinente.
O mapeamento da produção foi elaborado com base nos doze anais do SIMCAM
durante o período de 2005 até 2016. Buscou-se identificar, entre artigos e pôsteres, textos
referentes à temática de Educação Musical e Autismo. Dentre os doze anais do SIMCAM,
foram encontrados seis textos dentro do contexto TEA e Educação.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

A pesquisa foi dividida em duas categorias: pesquisa de campo e pesquisa bibliográfica.


Dentre os artigos levantados, três deles obtiveram seus resultados através de observação de
atividades ou relato de experiência dentro de uma escola de música e através de aulas de
teatro musical.
Foi possível constatar que, em todas as pesquisas de campo, foram observados somente
pequenos grupos de alunos ou, por vezes, apenas um indivíduo portador de TEA, indicando
que a pesquisa de campo com alunos com autismo, especialmente crianças, é extremamente
difícil de ser desenvolvida, devido às especificidades metodológicas e éticas referentes ao
contato e o desafio que essa síndrome traz tanto para educadores, terapeutas e o próprio
âmbito familiar onde estão inseridos.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

De modo geral, em todos os artigos e pôsteres apresentados, percebe-se a relevância que


a música proporciona através da ludicidade, fortificando a relação do tema Educação Musical
e Autismo, onde uma experiência sonoro-musical é capaz de contribuir e transformar a
relação autismo-meio.

Considerações finais
Esta pesquisa encontra-se em andamento, em fase de análise do teor dos textos levantados, e
ao final da análise dos artigos pretende-se estabelecer relações entre os estudos publicados no
SIMCAM e a necessidade de desenvolvimento da área de educação musical de indivíduos
com TEA.
Particularmente em síndromes como o Transtorno do Espectro Autista, a experiência
musical se traduz em uma abertura nos canais de comunicação, muitas vezes carentes nesses
indivíduos. Ou seja, mesmo em um transtorno global de conhecimento que, por vezes, desafia
a compreensão da comunidade científica, há a possibilidade de um conceito abstrato como é
conhecida a música, de trabalhar déficits cognitivos que até então, eram diagnosticados,
porém, não existia o tratamento terapêutico adequado.
Na busca pelo conhecimento, uma troca de informações no que diz respeito às pesquisas
e atividades propostas como estratégias de uma formação continuada, necessárias à educação
inclusiva, ainda está longe de alcançar patamares satisfatórios. Em doze anais do SIMCAM,
apenas seis artigos sobre o tema “Educação Musical e Autismo” foram encontrados. Em um
simpósio que aborda os processos cognitivos e sua relação com a música, deparar-se com
apenas seis artigos demonstra uma escassez de pesquisas de campo, levantamentos
bibliográficos e estudos de caso, trazendo luz a questionamentos que dizem respeito a todo
docente que trabalhe com a Educação Musical. A pouca quantidade publicada até o presente
momento reflete a necessidade de aprofundamento de pesquisas relacionadas ao tema, que
podem trazer benefícios aos indivíduos portadores desta síndrome bem como à Educação
Musical.
Referências
Almeida, D. T., Campos, A.M.P. Educador Terapeuta – Os benefícios do olhar especialista
em musicoterapia na educação musical. Revista Brasileira de Muscoterapia Ano XV,
nº15, p.43-56.2013.
Barros, M. R.. A música como mediadora no desenvolvimento cognitivo em crianças com
perturbações autísticas: intervenção junto de uma aluna com perturbações
autísticas.Tese de Mestrado da Escola Superior de Educação João de Deus de Lisboa.
Mestrado em Necessidades Especiais, 2012.
Benenzon, R. Manual de Musicoterapia. Rio de Janeiro: Enelivros, 1985.

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Benenzon, R. Teoria da Musicoterapia: Contribuição ao conhecimento não verbal. São


Paulo: Summus editorial, 1988.
Brito, T. A. Música na Educação Infantil. 2003.
Caixeta L., Nitrini R. Teoria da Mente: Uma Revisão com Enfoque na sua Incorporação pela
Psicologia Médica. Universidade de São Paulo, 2002.
Fonterrada, M. De tramas e fios. São Paulo: Editora Unesp, 2005.
Gainza, V. H. Estudos da Psicopedagogia Musical. 3. Ed. São Paulo: Summus, 1988.
Gardner, H. Mentes que criam: Uma anatomia da criatividade observada através das vidas
de Freud, Einstein, Picasso, Stravinsky, Eliot, Graham e Gandi. Trad. Maria Adriana
Veríssimo Veronese. Porto Alegre: Artes Médicas. 1996.
Kanner, L., Rodrigues, A., & Ashenden, B. (1972). How far can autistic children go in
matters of social adaptations?Journal of Autism and Childhood Schizophrenia, 2, 9-33.
Louro, V. Jogos musicais, transtorno do espectro autista e teoria da mente:um relato de
experiência. Anais do X Simpósio de Cognição e Artes Musicais, pp. 345-353.
Universidade Estadual de Campinas: UNICAMP, 2014.
Molnar-Szakacs I. et al. Autism, Emotion Recognition and the Mirror Neuron System: The
Case of Music. MJM.87-98; 2009.
Queiroz, G. J. P. Aspectos da Musicalidade e da Música de Paul
Nordoff e suas implicações na prática clínica musicoterapêutica. São
Paulo: Apontamentos Editora, 2003.
Schwartzman, J. S. Autismo Infantil/ José Salomão Schwartzman. Brasília, CORDE, 1994.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Brincando e cantando: proposta de ação metodológica com intervenções


lúdicas nas práticas musicais do coro infantil

Micheline Prais de Aguiar Marim Gois


Universidade Federal do Paraná
michelinegois@gmail.com

Resumo: O presente trabalho discorre sobre um projeto de pesquisa de doutorado em Música –


Educação Musical e Cognição, pelo Programa de Pós-Graduação em Música da Universidade
Federal do Paraná. Considerando o canto coral como uma atividade exercida no mundo todo, pelas
mais variadas formações e com diferentes objetivos, dentre os vários tipos de corais, tem-se como
foco da pesquisa o coro infantil. A pesquisa será realizada no município de Curitiba – Paraná e tem
como objetivo geral analisar uma proposta de ação metodológica por meio de intervenção lúdica
nas práticas musicais de dois coros infantis em contexto socioculturais diferentes. A abordagem
metodológica a ser utilizada é qualitativa compreendendo uma pesquisa-ação para se estabelecer
os aspectos e efeitos da ludicidade por meio de intervenções nas práticas musicais do coro infantil.
Os dados serão gerados por meio de inserções práticas no campo e entrevistas semiestruturadas.
Pretende-se por meio da pesquisa identificar evidências decorrentes de ações lúdicas no contexto
coral como promotoras da construção de conhecimento musical bem como proporcionar aos
regentes de coros infantis e educadores musicais um novo olhar ao lúdico como processo
educacional aplicável.
Palavras-chave: pedagogia musical, aprendizado, competências, ludicidade, coro infantil.

Playing and singing: proposal of methodological action with ludic interventions in the musical
practices of a children's choir
Abstract: The present work discusses a research project of doctorate in Music - Music and
Cognition, by the Graduate Program in Music of the Federal University of Paraná. Considering
choral singing as an activity carried out worldwide by the most varied backgrounds and with
different objectives, this research focuses specifically on children's choir. The research will be
carried out in the city of Curitiba - Paraná and has as general objective to analyze a proposal of
methodological action through playful intervention in the musical practices of two choirs in
different sociocultural contexts. The methodological approach to be used is qualitative, comprising
of action research to establish the aspects and effects of playfulness through interventions in the
choral practices of children. The data will be generated through practical field participation and
semi-structured interviews. The objective of the research is to identify instances from playful
action in the choral context, as promoters of the construction of musical knowledge, as well as to
provide the regents of children's choirs and musical educators a new look at play as an applicable
educational process.
Key-words: music pedagogy, learning, competences, playful, children choir.

Introdução
A proposição deste projeto, com ênfase na inserção lúdica no coro infantil, surgiu de reflexões
sobre o processo de ensino-aprendizagem da música nesse contexto e de questionamentos
quanto ao ser possível que o ensino de música esteja vinculado a ações metodológicas de
ensino-aprendizado que sejam práticas, divertidas e prazerosas.
Observa-se a existência de inúmeras pesquisas e relatos de experiências que registram
os diferentes espaços onde se efetivam o processo prático de ensinar e aprender música, bem

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

como as diferentes formas como esse processo se dá. Desse modo, destaca-se uma ampliação
na atuação da Educação Musical nos mais diferentes contextos. Kraemer (2000) fundamenta a
Educação Musical nesses novos espaços, observando que se trata de uma área do
conhecimento que “ocupa-se com as relações entre a(s) pessoa(s) e a(s) música(s) sob os
aspectos de apropriação e de transmissão” (p. 52). Complementa Sousa (2000), em seus
trabalhos, apresentando contribuições teóricas e práticas para se entender a relação ‘cotidiano
e ensino’, que se aproximam das intenções e articulações teórico-metodológicas da pesquisa.
Ao discorrer sobre educação musical por meio do canto coral atrelamos ao assunto
questões de cunho técnico-musicais, mas também discutimos a importância que a música tem
na formação do indivíduo como um todo. Estudiosos sobre o assunto mencionam ainda que a
música estimula o desenvolvimento de uma série de virtudes e também proporciona a
integração entre outras áreas do currículo educacional.
Figueiredo (1990) comenta que “é fundamental que se reflita sobre a atividade coral. Os
regentes devem se lembrar de sua função educacional” (p. 90). Haverá assim, maiores
possibilidades de desenvolvimento consistente do conhecimento musical, que conduzirá ao
aprimoramento da prática coral.
As experiências profissionais enquanto professora de música e regente coral, instigam a
refletir sobre tal processo e suscitam questionamentos: É possível que o ensino de música
esteja atrelado a uma metodologia prática que seja divertida e prazerosa? Quais benefícios
são evidentes e como esses podem ser alcançados e utilizados nas atividades como regente
coral? Tais questionamentos se ampliaram e levam buscar respostas que possam esclarecer
um panorama quanto às atividades de ensino de música e prática coral com crianças de forma
que o envolvimento em tais atividades lhes seja de aprendizado prazeroso.
Autores como Brito (2003), Hentsche & Del Ben (2003), entre outros renomados,
contribuem com reflexões sobre experiências e propostas práticas do ensino de música para
crianças. Ampliando a reflexão quanto aos aspectos relacionados à prática de ensino para tal
faixa etária, a partir de leituras realizadas, de acordo com Macedo (2003), entende-se que as
atividades lúdicas oferecem à criança momentos em que colocam a serviço da aprendizagem
toda a sua energia, alegria e vontade. O referido autor apresenta indicadores que permitem
inferir a dimensão lúdica na aprendizagem. Tais aspectos foram observados e analisados na
pesquisa1 realizada durante o mestrado, onde se podem contemplar tais indicadores inseridos

1 Pesquisa que resultou na dissertação com título “A dimensão lúdica na regência de coro infantil”, defendida em
fevereiro de 2015.

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

no contexto e na prática do coro infantil. A pesquisa realizada culminou em apontamentos que


permitem compreender a ludicidade como um processo de aprendizagem em si mesma e não
apenas como estratégia de ensino.
Enquanto pesquisadora e com experiência profissional na regência de coro infantil há 16
anos, compartilho heuristicamente da necessidade de que ao contexto inserido, se oportunize
um aprendizado que lhe seja condizente e significativo. Neste contexto, somando-se à
temática da pesquisa, as convicções obtidas a partir de experiências profissionais
desenvolvidas na docência e na regência, norteiam a escolha do tema da pesquisa:
compactuando e adepta quanto à ludicidade inserida nas atividades musicais do coro infantil,
como e quais seriam as possibilidades de intervenção lúdica na prática musical do canto coral
com crianças em contextos de aprendizado distintos? Quais seriam as aproximações quando
inseridas em tais contextos? Serão investigadas e analisadas as intervenções lúdicas por meio
de práticas pedagógico-musicais e também entrevistas com crianças participantes da proposta.
Partindo da hipótese que “todo saber se instala nos horizontes abertos pela percepção” (Ponty,
1994, p. 280), considera-se que o trabalho com crianças envolve o jogo e a brincadeira e estes
são elementos de aprendizagem que trazem prazer e motivação, o que justifica o princípio da
relação inseparável entre ludicidade e aprendizagem.

Objetivos
Esta pesquisa tem como objetivo geral analisar uma proposta de ação metodológica com
intervenção lúdica nas práticas musicais do coro infantil em dois contextos socioculturais
distintos.
Para tanto, tem-se como objetivos específicos estudar aspectos sobre a regência de coro
infantil em contextos socioculturais diferentes; identificar as aproximações da prática lúdica
com o ensino musical; levantar possibilidades do contexto coral para intervenções lúdicas;
descrever após analisar, as interfaces das atividades de regência sob a óptica da ludicidade;
investigar por meio de entrevistas semiestruturadas as impressões beneficiárias quanto às
inserções lúdicas no contexto coral; identificar e descrever o olhar das crianças sobre as
propostas lúdicas vivenciadas em ambos os contextos.

Revisão de Literatura
Estudos e pesquisas na área de educação musical apontam o canto coral como um espaço de
ensino-aprendizagem da música. Sendo assim, pensar a educação musical por meio da prática

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

coral seria buscar a consciência da época em que vivemos e pensar nos participantes
envolvidos nesse contexto histórico-cultural complexo e dinâmico.
Como seres sociais, ninguém é igual. Constroem-se nas vivências e nas experiências
sociais em diferentes lugares - em casa, na igreja, nos bairros, escolas, e são construídos como
sujeitos diferentes e diferenciados, no seu tempo-espaço (Bourdieu, 2010). Kater (2004) faz
referência a algumas características de uso da música verificadas de maneira corrente em
projetos de ação social, com a finalidade de evidenciar novas perspectivas de formação
humana, oferecidas pela educação musical.
A atuação de regentes corais nos mais diferentes contextos tem sido discutida de forma
mais intensa nas últimas décadas. Na prática de um coro infantil, autores como Rao (1993),
Leck (1995), Campos (1997), Schimiti (2003), Lackschevitz (2006), Lima (2007), abordam o
tema por meio de suas experiências profissionais na área, salientando que o regente esteja
atento às necessidades decorrentes desta ação.
Considerando que “a criança aprende brincando e brincando ela é feliz” (Cely, 1997, p.
127), da revisão de literatura foram selecionados alguns autores que de forma direta ou
indireta contribuem para a discussão sobre o coro infantil enquanto espaço de aprendizagem
por meio de intervenções lúdicas - envolvendo o jogo e a brincadeira, numa perspectiva mais
ampla que inclui a questão pedagógico-musical.
Schimiti (2003) descreve a atuação dos regentes de coro infantil, refletindo sobre suas
ações bem como fornecendo diretrizes e atividades para o trabalho coral. A autora alerta que
no trabalho com crianças é preciso se dar conta de que teorias abstratas, se substituídas por
referências mais concretas, trazem um resultado mais imediato, uma compreensão mais
segura e lúdica. Segundo a autora, nada melhor que aproveitar recursos visuais para a fixação
e incorporação de conteúdos no trabalho com crianças, bem como dispor de atividades
criativas nos ensaios porque estimulam a atenção e aumentam o tempo de concentração.
No âmbito do coro infantil, uma boa aprendizagem se dá através da motivação e
dedicação do regente. O cuidado na preparação e no planejamento das atividades que farão
parte dos ensaios torna-se fundamental. Figueiredo (1990) em seu trabalho demonstra a
importância de uma preparação adequada do ensaio dentro de uma perspectiva educacional.
Uma prática prazerosa e bem fundamentada incitará posturas de busca constante pela
atividade e pelo aperfeiçoamento.
O ensaio no coro infantil é, portanto, um espaço de lazer onde diálogo, reflexão e
questionamento são constantes. Nesse sentido, Elza Lakschevitz (2006) atenta para atitudes e

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

procedimentos do regente no trabalho com crianças apontando que se mantenha “sempre em


vista o prazer, o jogo, a brincadeira” (Lakschevitz apud Lakschevitz 2006, p. 55-56). A autora
também apresenta o repertório coral como um meio para que a criança entre em contato com
diversos elementos musicais, questões sociais, educativas e culturais.
Bellochio (1994) ao abordar aspectos do desenvolvimento sócio cognitivo de crianças
que participam de um coro, afirma que “a criança envolvida com a atividade coral desenvolve
um referencial forte, que a coloca em destaque frente a seus companheiros (...) em função do
desenvolvimento de conhecimentos que subsidiam e impulsionam a criatividade musical” (p.
186). Doreen Rao (1993) afirma que o objetivo maior dessa atividade é promover um auto
crescimento e permitir que as crianças explorem e disciplinem sua musicalidade não apenas
para o bom desempenho das atividades musicais, como para seu desenvolvimento geral como
ser humano.
Fucci Amato (2008) preocupa-se em seus estudos, entre vários aspectos que envolvem a
prática coral, com o contexto sócio cultural em que os coros estão inseridos. Há autores que
em suas experiências e pesquisas relatam tais considerações: Kater (2004), que estabelece
como núcleo central da música, o de contribuir para uma melhor qualidade de vida,
conectando criativamente e a cada instante a realidade presente e suas dimensões potenciais e
latentes; Joly (2003), que fala da necessidade de desenvolvermos ações de transformação, do
profissional capaz de agir e refletir e Campbell (2003) que complementa tal ideia ao expor a
respeito do aprendizado musical da criança, como um resultado do ambiente ao qual pertence.
Por isso, a necessidade de uma atuação profissional que leve em conta os anseios dos
aprendizes, as peculiaridades dos contextos em que o ensino se faz presente e as relações
construídas entre os diferentes atores, ultrapassando a mera transmissão de conhecimentos.
Em busca de subsídios na literatura para se enxergar o lúdico no contexto do coro
infantil, destacam-se autores que tratam do tema ludicidade - Huizinga (2001), Macedo
(2003), Brougère (1998), e outros que forem apontados durante o processo de pesquisa.
Na literatura da Educação, toma-se a reflexão em Tardif (2012) com ênfase nos saberes
experienciais que em um primeiro momento instigam a realização da pesquisa.

Metodologia
Baseado em autores como Gil (2008) e Thiollent (1986) o método de pesquisa escolhido para
esta investigação é a pesquisa-ação que se caracteriza pelo envolvimento do pesquisador e dos
pesquisados no processo de pesquisa, numa postura dialética (Gil, 2008).

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Serão escolhidos como unidade de investigação 2 coros infantis em contextos


socioculturais distintos na cidade de Curitiba – Paraná, possibilitando que as crianças
participem de atividades musicais, mediadas pela pesquisadora e por outras crianças. Segundo
Thiollent (1986), a pesquisa-ação é “um tipo de pesquisa social com base empírica que é
concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou a resolução de um problema
coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes (...) estão envolvidos de modo
cooperativo ou participativo” (p. 14). Acrescenta o autor que na pesquisa-ação os
pesquisadores desempenham papel ativo, acompanhando e avaliando as ações desencadeadas
em função dos problemas, tornando possível estudar dinamicamente os problemas, decisões,
ações, negociações, conflitos e tomadas de consciência que ocorrem entre os agentes durante
o processo de transformação da situação.
Serão realizadas observações, intervenções nos grupos selecionados e entrevista
semiestruturada junto às crianças participantes.
O processo de interpretação dos dados terá como base a análise qualitativa considerando
a avaliação das entrevistas e das observações das intervenções, além dos registros em diário
de campo, em diálogo com a literatura estudada.

Considerações preliminares
A realização desta pesquisa trará benefícios à área de Educação Musical e Regência Coral não
só ao auxiliar regentes e educadores a refletirem sobre a importância e consequências de sua
prática em busca por desenvolver um trabalho que atenda as características socioculturais e
cognitivas do seu grupo, mas contribuirá principalmente na apresentação de ações
metodológicas para a atividade de canto coral infantil com ênfase na ludicidade.
Espera-se, ao longo do percurso investigativo, reunir evidências para argumentar em
favor da inserção lúdica no processo educacional, superando o senso comum de ludicidade
enquanto elemento complementar da educação e deslocando-o para o centro da ação
educativa, como forma de promover construção de conhecimento na música e defendendo a
proposta de educação musical no espaço do ensaio coral como uma possibilidade de ensino-
aprendizagem que seja eficaz, dinâmica e lúdica.

Referências
Bellochio, C. (1994). O canto coral como mediação ao desenvolvimento sócio-cognitivo da
criança em idade escolar. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal
de Santa Maria, Santa Maria.

567
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Bourdieu, P. (2010). A escola conservadora: as desigualdades frente à escola e à cultura. In M.


Nogueira; A. Catani. Escritos de Educação. Petrópolis: Vozes.
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criança. São Paulo: Peirópolis.
Brougère, G. (1998). Jogo e educação. Porto Alegre: Artes Médicas.
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568
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Representações sociais sobre a criatividade musical das crianças

Susan Stephanie Opiechon


UFPR / CNPq
susan.opiechon@hotmail.com

Rosane Cardoso de Araújo


UFPR/CNPq1
rosanecardoso@ufpr.br

Resumo: O presente texto traz resultado parcial de uma pesquisa cujo objetivo geral foi investigar as
representações de alunos de licenciatura sobre o conceito de “criatividade musical” e sobre a ideia da
“criança musicalmente criativa”, utilizando como referencial teórico estudos sobre Criatividade e
Representações Sociais. A metodologia utilizada foi a survey e o instrumento de coleta de dados um
questionário. Participaram do estudo 21 alunos de licenciatura em música de uma instituição da cidade
Curitiba. Os resultados indicam que os estudantes de música possuem, em sua maioria, representações
sociais sobre a existência da ‘criança criativa musicalmente’ sendo capazes de elencar características
dessa criança. As representações dos estudantes sobre a criatividade musical das crianças
possibilitaram a organização de categorias gerais que incluíram aspectos de compreensão musical,
execução musical, sensibilidade, exploração sonora, entre outros.
Palavras-chave: Criatividade, representações sociais, aprendizado.

Social representations of children's musical creativity


Abstract: The present text brings a partial result of a research whose general objective was to
investigate the representations of undergraduate students on the concept of "musical creativity" and on
the idea of "creative child in music”, using as reference theoretical studies about Creativity and Social
Representations. The methodology used was the survey and the instrument of data collection a
questionnaire. Participated in the study 21 undergraduate students (music education) of an institution
of the Curitiba city. The results indicate that music students have, social representations about the
existence of the “creative child in music” being able to list characteristics of this child. The students'
representations of children's musical creativity allowed for the organization of general categories that
included aspects of musical comprehension, musical performance, sensitivity, sound exploration,
among others.
Key-words: Creativity, social representations, learning.

1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho traz como tema as representações sociais de alunos de licenciatura sobre a
criatividade musical. Para Addessi (et alii, 2010), ao levantarmos opiniões e pensamentos dos
estudantes de graduação, encontramos concepções e conhecimentos implícitos
(representações sociais) que afetam suas identidades profissionais e consequentemente suas
formas de ensinar e/ou aprender. Assim, considerando-se que o discente possui representações
sociais que guiam suas decisões e atitudes, o objetivo desta pesquisa foi investigar as
representações de alunos de licenciatura sobre o conceito de “criatividade musical” e sobre a
ideia da “criança musicalmente criativa”, utilizando como referencial teórico da pesquisa

1 Bolsistas do CNPq

569
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

estudos sobre Criatividade (Sternberg, 2010), Criatividade musical (Barrett, 2000) e


Representações Sociais (Moscovici, 2007).
Para esta pesquisa o método escolhido foi o estudo de levantamento (ou survey). De
acordo com Babbie (1999) e Gil (2000), o estudo de levantamento tem caráter exploratório e
permite coletar dados sobre o comportamento e/ou opiniões de determinado grupo, por meio
da interrogação direta. Participam deste estudo alunos do curso de Licenciatura em Música
da Universidade Federal do Paraná que frequentavam diferentes períodos do curso. Por meio
de um questionário foram coletados dados sobre a opinião dos participantes acerca da
criatividade musical e sobre a criança criativa musicalmente.
Uma das principais razões para esta pesquisa está no fato de que a criatividade é um
termo muito presente na educação e de grande relevância para o desenvolvimento musical.
Assim, estudar e observar como a população de futuros educadores musicais compreendem
este termo é de grande contribuição especialmente na área musical, pois de acordo com
Barrett (2000) a criatividade pode ocorrer numa variedade de níveis, sugerindo realizações
musicais avaliadas no contexto de educação musical pelos próprios professores.
Neste texto serão apresentados os resultados parciais referente às representações sociais
dos estudantes de graduação sobre “criança criativa” e a criatividade musical das crianças.

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Nesta etapa do trabalho serão abordados dois tópicos. O primeiro tratando sobre as
representações sociais a partir da psicologia social. O segundo sobre o conceito de
criatividade e a relação com a música e aprendizagem.

2.1 Representações sociais


Segundo Moscovici (apud Araújo, 2015) quando se considera o sistema cognitivo a partir da
psicologia social pressupõe-se que a maneira na qual cada pessoa tem em compreender o
ambiente ao seu redor acontece por meio de processamentos de informações. As
representações sociais, de acordo com Moscovici (2007) são processos simbólicos do
cotidiano onde o indivíduo está inserido e que servirão de guia nas decisões e
comportamentos de cada um. São formulações vinculadas a uma criação coletiva constituindo
um tipo de realidade imposta sobre os indivíduos de modo partilhado e influenciando-os.
De acordo com Addessi et al (2010) as representações sociais constituem um processo
de construções simbólicas da realidade da pessoa, ou seja, são elaborações cognitivas afetadas

570
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

por uma posição social particular tomada por indivíduos que a produzem, protótipos
implícitos que guiam nossos julgamentos e comportamentos como indivíduos que existem
num universo de consenso. As transformações acontecem por meio de conflitos de natureza
social podendo ser mutáveis.

2.2 Criatividade
A origem da palavra criatividade está ligada ao ato da criação e invenção. Não há uma única
definição para o conceito de criatividade, no entanto existem algumas formas de classificá-la
mais aceitas pela maioria dos pesquisadores científicos. Assim, entende-se que a criatividade
está relacionada à maneira de produzir algo como uma teoria, dança, história ou sinfonia, que
seja original e ao mesmo tempo válido (Sternberg, 2010). Segundo Barrett (2000) a tentativa
em definir criatividade tem-se mostrado a partir da perspectiva da pessoa, processo, produto e
ambiente no qual a atividade criativa se é observada.
No campo da música, Barrett (2000) evidencia o papel do professor no
desenvolvimento da criatividade que também está ligada a fatores de motivação intrínsecos
(internos) e extrínsecos (externos). Outros fatores principais descritos pela autora é o tempo
em que se está exposto à determinada atividade, envolvimento da tarefa e a autoconfiança
para ousar e explorar durante as atividades musicais.
Ao estabelecer ambientes que educam o “individuo criativo” em música, Barrett (2000)
cita uma série de elementos que precisam ser levados em conta, como o equilíbrio cuidadoso
entre as tarefas que são interpretadas como motivadoras intrínseca e extrinsecamente; o
cuidado com o desenvolvimento de estratégias cognitivas que ajudem os estudantes a lidar
com a atividade criativa e sentirem-se confortáveis ao correr riscos com materiais e processos
não familiares e familiares; o encorajamento do estudante para questionar e adotar uma
“orientação de descoberta” para suas atividades musicais.

3. METODOLOGIA E RESULTADOS
O método utilizado foi o estudo de levantamento (ou survey). De acordo com Gil (2000) e
Babbie (1999), a survey (ou o estudo de levantamento) é um método de pesquisa que propicia
a aquisição de dados sobre situações e comportamento de determinado grupo, através da
interrogação direta.
O instrumento de coleta de dados foi um questionário, elaborado com questões de
múltipla escolha, fechadas, dependentes e abertas. O questionário foi testado, inicialmente,

571
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

em um estudo piloto para análise da confiabilidade e coerência interna das questões. Após o
estudo piloto o questionário foi aplicado para a população definitiva. Participaram da pesquisa
21 alunos do curso de Licenciatura em Música da Universidade Federal do Paraná. Seguem,
abaixo, os dados de caracterização do grupo.

3.1. Idade: A maioria dos participantes se encontram na faixa etária entre 18 a 30 anos (ver
gráfico 1).

3.2. Gênero: Os gêneros indicados no questionário foram feminino, masculino e outro.


Assinalaram onze para masculino e dez para feminino (ver gráfico 2).

3.3. Período: A maior parte dos entrevistados foram estudantes do 2º e 6º período, que
correspondem ao 1º e 3º ano do curso (ver gráfico 3).

572
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

3.4. Representações sobre “criança criativa”: Foi questionado aos participantes se


acreditam que existem “crianças mais criativas musicalmente”, com três alternativas de
resposta: “sim”, “não” e “não sei” (ver gráfico 4).

Caso o participante assinalasse “sim”, deveria descrever quais são as características da


criança criativa musicalmente. Dentre as características mais descritas estão a “facilidade com
a prática musical/ musicalidade” e a “maior experiência musical” (ver gráfico 5). Houve
apenas uma exceção em uma das respostas, na qual uma pessoa marcou “não”, mas descreveu
as características solicitadas.

573
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Estes resultados indicam que os estudantes de música possuem, em sua maioria,


representações sociais sobre a existência da ‘criança criativa musicalmente’ e as suas
características. Tais representações são fruto da experiência musical e pessoal dos alunos,
desenvolvidas a partir de diferentes contextos nos quais eles cotidianamente convivem. 67%
dos participantes responderam “sim”, isto é, que existem crianças com maior criatividade
musical e conseguiram elencar características da criança criativa. Este resultado vem de
encontro com Nogueira e Bahia (2005), ao observarem que os estudos atuais da criatividade,
especialmente a partir da segunda metade do séc. XX, focam na verificação das características
individuais da criatividade.
Também foi possível observar que, a partir das características listadas pelos estudantes,
as representações construídas sobre a criatividade musical possibilitaram a organização de
categorias gerais. Tais categorias surgem de ideias compartilhadas nas quais os indivíduos
integram experiências pessoais (Addessi et alii, 2011). As categorias elencadas pelos
participantes incluíram aspectos de compreensão musical, execução musical, sensibilidade,

574
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

exploração sonora, entre outros elementos, indicando que a observação da criatividade


musical pode ocorrer em diferentes níveis, conforme aponta Barret (2000).

4. CONCLUSÃO
O objetivo desta pesquisa foi investigar as representações de alunos de licenciatura sobre o
conceito de “criatividade musical” e sobre a ideia da “criança musicalmente criativa”,
utilizando como referencial teórico da pesquisa estudos sobre Criatividade e Representações
Sociais. Neste texto foram apresentados os resultados parciais referente às representações
sociais dos estudantes de graduação sobre “criança criativa” e criatividade musical das
crianças. Os dados indicaram que: (a) os estudantes participantes da pesquisa (em sua
maioria) possuem representações sociais sobre a existência da ‘criança criativa musicalmente’
e as suas características; (b) as representações construídas sobre a criatividade musical
possibilitaram a organização de categorias gerais que são fruto de ideias compartilhadas e
experiências pessoais vivenciadas pelos participantes; (c) as categorias elencadas pelos
participantes incluíram aspectos de compreensão musical, execução musical, sensibilidade,
exploração sonora, entre outros elementos; (d) 24% dos participantes não souberam responder
se existem crianças com maior criatividade musical, o que indica que, sobre este tema, os
alunos ainda poderão modificar/construir suas representações, a partir, por exemplo, das
experiências vivenciadas no curso de licenciatura em música e das suas experiências de
prática de ensino (dentre outros contextos).

Referências
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International Conference on Music Perception and Cognition (ICMPC 11). [pp. 28 – 35].
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Aprendizagem e Ensino. [pp. 333-362]. Lisboa, Portugal: Relógio D’Água Editores
Sternberg, R. J. (2010). Psicologia Cognitiva. Tradução: Ana Maria Dalle Luche, Roberto
Galman. (5ª ed.). São Paulo: Cengage Learning.

575
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

A motivação como variável interveniente à aprendizagem: o alunado


contemporâneo nas aulas de educação musical na rede básica de ensino

Franciele Felix Macedo


Universidade Federal de São Carlos
franarfmusic@gmail.com

José Zula de Oliveira


Instituto Hering – Universidade Candito Mendes
jotazula@gmail.com

Resumo: O presente trabalho expressa uma visão reflexiva feita a partir do contato com a disciplina
de Estágio na rede básica de ensino, especificamente na rede pública e a partir de estudos realizados
desde o início do curso de Licenciatura em Educação Musical pela Ufscar, tendo como objetivo
discutir e contribuir para a reformulação da referida atividade no ensino básico, tendo em vista a Lei
11.769/08, ora em vigor, frente ao que foi verificada uma profunda desmotivação do alunado para com
esta disciplina. Como embasamento teórico, além do texto da referendada Lei, tivemos a leitura e
reflexão sobre alguns textos tirados da vasta literatura pertinente ao assunto. Tendo-se como variáveis
intervenientes as questões citadas pode-se esperar que a motivação pelas aulas de Educação Musical
ocorra a contento e o resultado do ensino de Educação Musical seja mais promissor. Espera-se que o
Questionário, instrumento de averiguação, aplicado aos alunos do 7º e 8º ano da rede básica de ensino,
participantes da disciplina de artes das seguintes escolas: Escola Estadual Amadeu Amaral – SP e na
Escola Estadual Altina Maynardes Araujo – Tatuí SP, revelará a opinião do alunado quanto a sua
participação nas aulas de Educação Musical e, certamente fornecerão conteúdos para sugerir
reformulação da árdua tarefa de ministrar aulas de uma disciplina tão importante para na vida dos
alunos no mundo moderno.
Palavras-chave: motivação, educação musical, ensino de música, professor de educação musical.

Abstract: The present work expresses a reflexive vision made from the contact with the discipline of
Internship in the basic network of education, specifically in the public network and from studies
carried out since the beginning of the Degree in Music Education by Ufscar, aiming to discuss and to
contribute to the reformulation of said activity in basic education, in view of Law 11.79 / 08, now in
force, in light of which there was a profound lack of motivation of the student to this discipline. As a
theoretical basis, besides the text of the referendada Law, we had the reading and reflection on some
texts taken from the vast literature pertinent to the subject. Having as intervening variables the
mentioned questions one can expect that the motivation for the Musical Education classes will occur
to the content and the result of the Education of Music Education will be more promising. It is
expected that the Questionnaire, an instrument of inquiry, applied to the students of the 7th and 8th
grades of the basic education network, participating in the arts discipline of the following schools:
Amadeu Amaral State School - SP and the Altin Maynardes Araujo State School - Tatuí SP , Will
reveal the student's opinion about their participation in Music Education classes and will certainly
provide content to suggest reformulation of the arduous task of teaching classes of such an important
discipline in the lives of students in the modern world.
Keywords: motivation, musical education, teaching music, professor of music education.

Introdução
Das mudanças do mundo moderno têm surgido muitos problemas de adequação aos novos
costumes, à nova maneira do viver humano. Um destes problemas está relacionado com a
educação, e nesta, com o ensino. O que ensinar? Como ensinar? A quem ensinar? Quem
ensina? Quem aprende? Responder a estas perguntas é um bom começo para abordar

577
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

elementos fundamentais e adquirir novas informações onde estímulo, impulso, reforço e


respostas às questões levantadas anteriormente são essenciais à implantação de uma educação
eficaz (LOURENÇO; PAIVA, 2010 p.135). O tema deste trabalho pede sugestões e indicações
que visem solucionar os problemas decorrentes do magistério desta disciplina tão importante
para o viver humano: a Educação musical no ensino básico. Por Educação musical (EM)
entenderemos aqui,

um campo de estudos que se refere não ao ensino técnico de música para formar
profissionais da prática musical, mas ao fornecimento dos subsídios para que um
cidadão tenha condições de, em se relacionando com a música, possa dela usufruir o
que de saudável ela proporcione. Mas nem todo mundo pensa desta forma,
confundindo educação com preparo técnico (OLIVEIRA, 2015, p. 3).

No Brasil a educação musical, tida como real recurso educacional tem acontecido de
forma assistemática e tantas vezes de maneira descontrolada, pois quem tem controlado as
preferências individuais dos lares, dos amigos e mesmo das escolas é a indústria cultural e,
frente a ela, até o folclore está perdendo o seu papel na Educação (OLIVEIRA, 2015, p. 3).
Diante do atual status que e fundamentado em nossa experiência em sala de aula, podendo
para isto ser listadas muitas variáveis como teremos oportunidade de analisar neste trabalho,
levando em consideração que nem sempre nos damos conta, professores e alunos, da
importância, da motivação para que consigamos realizar nossos objetivos. Não será que se
desse mais importância a este assunto se resolveriam muitos problemas que emperram o
andamento das aulas de educação musical, transformando- as em algo bem mais prazeroso?
Acreditamos que dando especial condição de motivação a alunos e professores frente à
problemática do ensino, sobretudo do ensino básico, foco do nosso trabalho, seríamos bem
sucedidos em nossas aulas de educação musical? Mas para constatar se estamos certos ou não,
quanto à existência de desmotivação e a que nível ela se antepõe pensamos em ouvir o
alunado falar.

Metodologia
O instrumento de coleta de dados que subsidiaram nosso estudo foi um Questionário que teve
as seguintes características: Elaboramos o Questionário tendo em mente as determinações
feitas por CERVO, 2007 p. 51, onde encontramos informações pertinentes sobre os principais
pontos quando, em pesquisa, opta-se pelo uso de um Questionário e tomamos nota do
seguinte: a) Elaborar uma ou mais perguntas referente a cada dado a ser levantado; b)
Selecionar o tipo de pergunta a ser utilizado diante das vantagens e desvantagens de cada tipo,

578
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

com vistas ao tempo a ser consumido para obter os dados e a maneira de tabulá-los e analisá-
los. Estas duas indicações nortearam-nos na elaboração das cinco questões dispostas no
Questionário. Usamos um formato de indagação que não induzisse o respondente a dar
respostas estereotipadas, como as de dar notas de 1 a 10. Usamos para evitar este viés uma
“linha cega” (sem pontuação e que nas “Orientações” à aplicação do Questionário foi
instruído como preenchê-la) que induziria o respondente a pensar mais no gostar ou não da
variável indagada, do que conferir-lhe uma nota estereotipada. E continuando com o expresso
por CERVO (o.c.) quando diz que para que se possa ter algo concreto é preciso esquematizá-
lo da forma mais clara possível, para que o leitor consiga compreender os dados expostos e
suas respostas. Classificado, de acordo com o texto, que o questionário aplicado constará de
perguntas abertas onde, segundo Cervo (2007, p. 51) seja destinado à obtenção de respostas
livres, mesmo que possibilitem recolher informações ou dados mais ricos e variados e que
para sua codificação e análise apresentem maior dificuldade.
Foram cinco as questões formuladas no Questionário, sendo a primeira (“Gosto muito
da aula de Artes e Educação Musical” e seu oposto “Não gosto nada das aulas de Artes, em
especial das aulas de Educação Musical”) considerada a pergunta chave para responder sobre
a motivação do alunado à frequência às aulas de educação musical e as demais elaboradas
abordando variáveis que, a nosso ver, poderiam ter interferência com a primeira que como
dissemos supra deveria refletir a motivação ou não para ir às aulas de educação musical.
Questionário que foi aplicado a 83 participantes (48 homens e 35 mulheres) com idade
escolar entre 13 e 14 anos (média de 13,08), do 7º e 8º ano da rede básica do ensino, uma na
Capital (São Paulo): Escola Estadual Amadeu Amaral e outra no interior (Tatui/SP): Escola
Estadual Altina Maynardes Araujo.
Do Questionário constaram perguntas cujas respostas nos deviam fornecer subsídios
para a constatação do porquê de tanta desmotivação e conseqüentemente a indicação do
oposto: o que conduziria o alunado a uma motivação consistente e persistente à participação
nas aulas de Educação Musical. Servirão também como conteúdo à reflexão sobre o tema, as
observações no estágio na disciplina de Artes, expressas nos relatórios elaborados, que de
certo modo refletem acontecimentos observados nas propostas efetuadas pelos professores em
sala de aula, geralmente questões pertinentes ao comportamento dos alunos e do professor. Irá
ajudar também em reflexões sobre os resultados encontrados, além dos dados obtidos no
questionário e possíveis entrevistas, a busca bibliográfica a respeito do assunto. Na tentativa
de encontrá-las recorremos à pesquisa bibliográfica sobre o assunto (no caso: motivação/

579
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

desmotivação) e encontramos ricos materiais usando-os como base para continuar e poder
desenvolver a pesquisa descritiva e experimental deste trabalho, podendo hipoteticamente
chegar a algumas conclusões às perguntas levantadas.

Resultados
Caracterizando os sujeitos pesquisados:
O presente trabalho teve como objetivo primário responder à pergunta: Por que, de modo
geral, é tão baixa a motivação do alunado contemporâneo para assistir às aulas de Educação
Musical, sobretudo na escola pública? Frente ao que foi formulada a seguinte hipótese: A
profunda desmotivação à frequência às aulas de Educação Musical e participação nas
mesmas, entre muitas variáveis, poderia estar afetando o despreparo dos professores em
relação à sua competência, quanto à metodologia usada, quanto à seleção dos conteúdos a
serem ministrados, a isto tudo somada a vocação ou carisma que o candidato a professor
deve ter para o desempenho desta profissão.
O instrumento de coleta de dados que subsidiaram nosso estudo foi um Questionário
que foi aplicado a 83 participantes (48 homens e 35 mulheres) com idade escolar entre 13 e
14 anos (média de 13,08), do 7º e 8º ano da rede básica do ensino, frequentadores de duas
escolas, uma na Capital (São Paulo): Escola Estadual Amadeu Amaral e outra no interior
(Tatui/SP): Escola Estadual Altina Maynardes Araujo, ambas escolas da rede pública.

O que a coleta de dados forneceu:


Parte dos resultados obtidos a partir do Questionário está transcrita na Tabela 1:

Tabela 1

Questões Pontuação Pontuação % pontuação


atribuível atribuída atribuida
1.Gosto muito da aula de Artes e 6.557,0 4.191,00 63,91%
Educa. Musical .
2. Gosto muito do que o 6.557,0 3.950,00 60,24%
professor de Educação Musical
ensina
3. Gosto muito da maneira como 6.557,0 4.068,00 62,04%
o professor de Educação Musical
dá as aulas

580
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

4. A sala onde tenho as aulas de 6.557,0 3535,00 53,91%


Educação Musical é bem
equipada para o professor dar
boas aulas
5. Eu gostaria muito de aprender 6.557,0 4839,00 66,17%
a tocar um instrumento musical
nas aulas de Educação Musical
Qdo. considerada a somatória 26228,00 16932,00 64,56
das médias das Questões 2,3,4 e
5 p/ todos os respondentes

Questão 1, a Questão 1 tinha como objetivo investigar se de fato havia desmotivação


ou não à assistência às aulas de Educação musical.
As questões seguintes, de 2 a 5, tinham por objetivo fornecer dados que
significativamente comprovassem a hipótese levantada: existência de (des)motivação.
Questão 2: a Questão 2 tinha como objetivo investigar se o conteúdo ministrado nas
aulas de Educação Musical era pertinente à aprovação dos alunos.
Questão 3: a Questão 3 tinha como objetivo investigar se a metodologia usada pelo
professor nas aulas de Educação Musical tinha aprovação dos alunos.
Questão 4: a Questão 4 tinha como objetivo investigar se o ambiente usado pelo
professor para dar as aulas de Educação Musical era considerado adequado a esta atividade.
A partir dos dados coletados foi feita também uma comparação dentre alunos e alunas
visando investigar se havia diferença no comportamento de ambos quanto à participação nas
aulas de Educação Musical. Para efeito desta comparação, eliminamos aleatoriamente 12
respondentes do sexo masculino, para que em número, o número de respondentes do sexo
masculino se igualasse ao dos respondentes do sexo feminino (35 respondentes). A Tabela 2
exibe a pontuação obtida:
Tabela 2

MENINOS MENINAS

Questões Pontuação % Pontuação %


pontuação pontuação
1.Gosto muito da aula de Artes e 69,33% 1617,00 58,48%
Educa. Musical . 1917,00
2. Gosto muito do que o professor 1743,00 63,03% 1657,00 59,92%
de Educação Musical ensina

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2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

3. Gosto muito da maneira como o 1712,00 61,91% 1687,00 60,01%


professor de Educação Musical dá
as aulas
4. A sala onde tenho as aulas de 1680,00 60,75% 1457,00 52,69%
Educação Musical é bem equipada
para o professor dar boas aulas
5.Eu gostaria muito de aprender a 2230,00 80,65% 1918,00 69,36%
tocar um instrumento musical nas
aulas de Educação Musical
Qdo. considerada a somatória das 7635,00 69,03% 6719 60,75%
médias das Questões 2,3,4 e 5 p/
35 respondentes de cada sexo

Outros achados, objetivos secundários foram, entre outros possíveis:


O Questionário permitiu avaliar também a aspiração profissional dos respondentes e obteve
que 8 deles querem ser médico, 8 engenheiro, 6 advogados, 6 jogador de futebol, 5
veterinário, 4 arquiteto, 3 empresário, 3 gamer, 2 tinham a pretensão de ser músicos, 2
policial, 2 estilista e as profissões pediatra, tratorista, balconista, agrônomo, fotografo,
dublador, caminhoneiro, cabeleireiro, guitarrista, Mc de Rap e judoca foram indicados por
apenas um aluno.

Discussão

Observou-se pequena diferença entre médias e/ou porcentagens obtidas pelos respondentes de
modo geral. Com a aplicação de uma estatística mais refinada poder-se-ia eventualmente
encontrar diferenças significativas aceitáveis. Mas não tendo até o momento sido efetuada tal
estatística vamos deixar de apresentar possíveis conclusões a este estudo.
Tendo-se em vista que a pontuação máxima atribuível a cada quesito seria de 6557,00
pontos para cada Questão (79 mm tamanho da linha vezes 83 respondentes), apuramos para
cada questão o expresso na Tabela 1. Idem, agora considerados os dois sexos, meninos e
meninas, foram possíveis estabelecer as médias para cada grupo. O resultado está expresso na
Tabela 2.
Com base nos dados coletados conforme descritos na metodologia e transcritos acima,
tem-se a esperança de que seja possível responder as seguintes perguntas:

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Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

a) Existe de fato desmotivação para assistir às aulas de educação musical na


rede básica do ensino fundamental na rede pública? Será que os dados coletados confirmam
esta hipótese?
b) As variáveis intervenientes pesquisadas (conteúdos propostos pelo professor,
metodologia adotada pelo professor, comunicação entre o professor e os alunos, instalação do
ambiente em que são ministradas as aulas e interesse individual dos alunos pela aula de
educação musical, como fonte de subsídios para sua vida futura) seriam suficientemente
comprobatórias para a rejeição da hipótese nula?
c) Pela ordem de pontuação registrada como se distribuiriam em termos de
importância as variáveis pesquisadas?
d) Haveria diferença significativa na motivação dos respondentes quando
considerados separadamente: alunos do sexo masculino x do sexo feminino?
d) Estaria a aspiração profissional do respondente relacionada com a
motivação para assistir as aulas de Educação Musical?
Esperamos em breve poder apresentar, baseado nas conclusões da estatística,ao
respostas às perguntas efetuadas acima.

Referências
BZUNECK, José Aloyseo. Motivar seus alunos: sempre um desafio possível.
FADIMAN, J. & FRAGER, R. Teorias da Personalidade. Editora Harber & Row doBrasil
Ltda. 1979, p. 259-272.
FONTERRADA, Marisa Trench Oliveira. De tramas e Fios: Um ensaio sobre música e
educação. São Paulo: Editora Unesp, 2008.
GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2008.
LEI no. 11.769 de 18 de agosto de 2008, assinada pelo Presidente da República, Luiz Inácio
Lula da Silva, Secretário da Educação, Fernando Haddad.
LOURENÇO, Abílio Afonso e PAIVA, Maria Olímpia Almeida de. A Motivação escolar e o
processo de aprendizagem. Centro de Investigação em Psicologia e Educação (CIPE),
Escola Secundária Alexandre Herculano, Porto, Portugal.
MADEIRA, Ana Ester Correia e MATEIRO Teresa “Motivação na aula de música: Reflexões
de uma professora” Associação Brasileira de Cognição e Artes Musicais, 2013 P. 67 à
82).
OLIVEIRA, José Zula. Introdução a Música de Todos os Tempos, teoria e prática, 2006.
Lábarn Gráfica e Editora ltda. São Paulo.
OLIVEIRA, José Zula. Palestra sobre oEnsino de Música: Educação Musical no ensino
básico. 2015. na FIg – Guarulhos SP
PENNA, Maura. Educação Musical e educação integral: a música no Programa Mais
Educação. Revista da ABEM. Londrina, v. 19, n. 25, p 141-152, 2011.
RICHARD, D. G. Psychology: The Science of Mind and Bahavior. 1992. p. 902-904.Hodder
& Stoughton, Cambridge London.

583
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Índice de autores

Addessi Antenor F., 21, 35


Anna Rita, 17 Costa
Almeida Jr. Gustavo H., 114
Elcio Antonio, 547 Covre
Alves Josiane F., 106
Anderson C., 255 Cuervo
Amato Luciane, 31, 529
Daniel, 191 Cunha
Andrade Rosemyriam, 24
Olga Valéria C. A., 451
Paulo Estêvão, 451 Daldegan
Araújo Valentina, 344
Rosane C., 29, 247, 278, 407, 442, Damiani
569 Magda F., 376
Dauzacker
Barros Patricia, 554
Luís C., 27
Eyng
Battisti
Celio R., 376
Dayane, 442
Bertissolo Falleiros
Guilherme, 22, 31 Manuel S., 26
Blumer Ferigato
Caroline, 97 Arícia, 287
Bonfim Fornari
Cassius, 510 José Eduardo, 26, 182, 191, 309,
Bortz 383, 399
Graziela, 139 França
Botelho Bruna C., 501
Marcos, 460 Fregoneze
Carmen C., 28
Cabral Freire
João Paulo, 69 Ricardo D., 157, 335
Casari Sandra F. C. D., 335
Isadora S., 353 Frigeri
Cielavin Aglaê M., 302
Sandra Regina, 538
Corrêa Gerber

584
Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais 2017

Daniela T., 28 Martins


Germano Paulo Roberto A., 197
Nayana G., 139 Mattos
Gois Sandra C., 485
Micheline P. A. M., 562 Medeiros
Goldemberg Beatriz R., 30, 69, 78
Ricardo, 167 Meireles
Gomes Alexsandro R., 78
Débora L., 88 Mello
Vinicius B., 25, 263 Nilo R. B., 368
Mendes
Hakim Adriana N. A., 538
Genoveva S., 148 Dayse G., 433
Hamond Mesquita
Luciana F., 318 Marcos, 53
Hentschke Moreira
Liane, 20 Hugo C., 139
Mota
Imberty
Davi A., 270
Michel, 16

Jardim Nogueira
Vanessa S., 197 Marcos, 31
Nunes-Silva
Krüger Marilia, 23
Igor M., 416, 424
Veridiana L. G., 416, 424 Oliveira
Guilherme A. D., 451
Leal José Zula, 577
Jonatas, 519 Luis Felipe, 30, 510
Lima Mário A. W., 392
Letícia D., 174 Opiechon
Loureiro Susan S., 569
Cybelle M. V., 88 Otutumi
Maurício A., 270, 287, 294 Cristiane H. V., 20, 547

Macedo Pedrosa
Franciele F., 577 Mayra S. D., 302
Madeira Penha
Renan M., 327 Bernardo A. S., 182
Magalhães Penteado
Tairone N., 270 Antonio F. C., 309, 383
Mantovani Pereira
Michele R., 477 Caoqui S., 61
Marchiano Piazzetta
María, 230 Clara M., 29, 114, 130
Martínez Povoas
Isabel C., 230 Maria Bernardete C. P., 27

585
2017 Anais do XIII Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais

Pscheidt Anderson, 205


Jean Felipe, 247 Torres
Eduardo C., 239
Ramos Tourinho
Carlos E. A. S., 44 Cristina, 19
Danilo, 205, 263 Tyrenius
Santiago Kristina B., 35
Diana, 519
Vanzella
Santos
Patricia M., 451
Regina Antunes T., 327, 477
Vasconcelos
Thaís F., 294
Mônica C. S., 519
Shifres
Vasquez
Favio, 17
Ana Lúcia, 492
Silva
Veloso
Alberto F., 361
Flávio D. D., 407
Alessandro P., 519
Verde
Cesar Augusto P., 167
Juliana L., 335
Felipe Augusto V., 221
Villegas
Flávia A. C., 278
Robinson G., 468
Flávia F., 492
Silva Jr. Windholz
José D., 122 Mauro O., 213
Simões
Antônio R. M., 78 Yampolschi
Solti Roseane, 22
Endre, 399
Stocchero Zanini
Mariana A., 501, 554 Claudia R. O., 24, 29, 106
Zattera
Toni Vilson, 97, 383, 538

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