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Nos períodos em que se evidenciou a hipertrofia do executivo, este ditou as regras

'CAPÍTULO 2
da política educacional, segundo o modelo que se pretendeu adotar, quer na política,
q u e r na economia, quer enfim, e m ambos^os setores.. . . . ....... FATORES ATUANTES N A E V O L U Ç Ã O D O
Nesses diferentes períodos, todavia, á educação escolar passou a.organizar-se.não
mais de forma fragmentária por causa do avanço e do fortalecimento do regime centra-
SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO
lizador, mas de forma que refletisse as contradições próprias de um sistema político
responsável mais pela metamorfose das formas tradicionais de controle do poder do
que realmente pela criação de formas novas.
2.1. Evolução do e n s i n o no Brasil

A economia colonial brasileira fundada na grande propriedade e na m ã o de obra


escrava teve implicações de ordem social e política bastante profundas. Ela favorece o

t aparecimento da u n i d a d e básica do sistema de p r o d u ç ã o , de vida social e do sistema de


poder representado pela família patriarcal.
O isolamento e a estratiíicação sociais, esta, a princípio, basicamente dual, aliados
à necessidade de m a n u t e n ç ã o de um esquema de segurança, favoreceram u m a estrutu-
ra de p o d e r fundada na autoridade sem limites do d o n o de terras.
Foi a família patriarcal que favoreceu, pela natural receptividade, a importação de
formas de p e n s a m e n t o e idéias dominantes na cultura medieval européia, feita através
da obra dos jesuítas. Afinal, ao branco colonizador, além de tudo, se i m p u n h a distin-
guir-se, p o r sua origem européia, da população nativa, negra e mestiça, e n t ã o existen-
te. A classe d o m i n a n t e , detentora do poder político e econômico, tinha de ser t a m b é m
detentora dos bens culturais importados.
Não é, pois, de se estranhar que na Colônia t e n h a m vingado hábitos aristocráticos
devida. No propósito de imitar o estilo da metrópole, era natural que a c a m a d a d o m i -
nante procurasse copiar os hábitos da camada nobre portuguesa. È, assim, a sociedade
latifundiária'c escravocrata àcãbou por ser também uma sociedade aristocrática. E
Para isso contribuiu significativamente a obra educativa da Companhia de Jesus.
As condições objetivas que portanto favoreceram essa ação educativa foram, de
u
n i lado, a organização social e, de outro, o c o n t e ú d o cultural que foi t r a n s p o r t a d o
para a Colônia, através da formação mesma rios padres da Companhia de Jesus. A pri-
meira condição consistia na predominância de u m a minoria de donos de terra e s e n h o -
f e s
de engenho sobre uma massa de agregados e escravos. Apenas àqueles cabia o direi-
P à educação e, m e s m o assim, em número restrito, p o r q u a n t o deveriam estar excluí-
0 s f
.;' d s s a minoria as mulheres e os filhos primogênitos, aos quais se reservava a dire-
J K Íú.i-Ura r l a s n e g ó c i o s paternos. Destarl.:, a escola -era freqüentada s o m e n t e p e l o s fi-
homens que n ã o os primogênitos. Estes recebiam apenas, além de u m a r u d i m e n -
educação escolar, a preparação" pára a s s u m i r a direção do clã, da família e d o s negó-
|H ' ° m t u i o Era, portanto, a um limitado grupo de pessoas pertencentes a classe
n

•Oante que estava destinada a educação escolariz;?.da.


A segunda condição consistia no conteúdo cultural de q u e se faziam portadores os ca, "porque não perturbava a estrutura vigente, subordinava-se aos imperativos do
padres. Que conteúdo era esse? Era. a n t e s d e tudo, a materialização do próprio espírito meio social, marchava paralelamente a ele. Sua marginalidade era a essência de que vi-
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da Contrarreforma, q ü C í e x a r a c t e r i z o u sobretudo por u m a enérgica reação c o n t r a o via e se alimentava .


p e n s a m e n t o crítico, que começava a d e s p o n t a r na Europa, p o r um apego a formas dog- Casavam-se, portanto, òs objetivos da população, q u e buscava educação c o m os
máticas de pensamento, pela revalorização da Escolástica. c o m o método e como filo- objetivos da educação jesuítica. Aqueles, identificados exclusivamente com a ilustra-
sofia, pela reafirmação da autoridade, quer da Igreja, quer dos antigos, enfim, pela prá- ção da mente, estes representados pelo conteúdo cultural "importado em bloco do
tica de exercícios intelectuais c o m a finalidade de robustecer a memória e capacitar o Ocidente, internacionalista, de tendência inspirada p o r u m a ideologia religiosa católi-
raciocínio para fazer comenLários de textos. Se aos jesuítas de então faltava o gosto ca e a cuja base residiam as humanidades latinas e os comentários das obras e Aristóte-
pela ciência, sobrava-lhes, todavia, um entranhado amor às letras, cujo ensino era a les, solicitadas n u m sentido cristão. Tratando-se de uma cultura neutra do p o n t o de
maior preocupação. "Humanistas por excelência e os maiores do seu tempo, concen- vista nacional (mesmo português), estreitamente ligada à cultura européia, na Idade
travam lodo o seu esforço, do p o n t o de vista intelectual, em desenvolver nos seus dis- Média, e alheia a fronteiras políticas - como tinha de ser a cultura difundida por u m a
cípulos as atividades literárias e acadêmicas, que correspondiam, de resto, aos ideais associação essencialmente internacional, com o característico de verdadeira milícia
de "homem culto" em Portugal, onde, como em toda a Península Ibérica, se encastela- papalina - é certo q u e essa mesma neutralidade (se n o s colocarmos do p o n t o de vista
ra o espírito da Idade Média e a educação, dominada pelo.clero, não visava por essa qualitativo) nos impede de ver, nessa cultura, nas suas origens e nos seus p r o d u t o s ,
época senão a formar letrados eruditos. O apego ao dogma e à autoridade, a tradição : uma cultura especificamente brasileira, u m a cultura nacional ainda em formação" .
escolástica e literária, o desinteresse quase total pela ciência e a repugnância pelas aü- • Não se p o d e m perder de vista, evidentemente, os objetivos práticos da ação jesuítica
vidades técnicas e artísticas t i n h a m forçosamente de caracterizar, na Colônia, toda a: no Novo Mundo: o recrutamento de fiéis e servidores. Ambos foram atingidos pela ação
educação modelada pela metrópole, que se manteve fechada e irredutível ao espírito^ educadora. A catequese assegurou a conversão da população indígena e foi levada a cabo
crítico e de análise, à pesquisa e a experimentação'. mediante criação de escolas elementares para os "curumins" e de núcleos missionários
Resta-nos agora saber de que forma esse tipo de conteúdo veio corresponder aosi no interior das nações indígenas. A educação que se dava aos "curumins" estendia-se aos
anseios da minoria d o m i n a n t e na estrutura da sociedade nascente. j filhos dos colonos, o que garantia a evangelização destes. A simples presença dos padres
O ensino que os padres jesuítas ministravam era completamente alheio à realidade* já era garantia de manutenção da fé entre os colonos. Quanto aos servidores da Ordem,
da vida da Colônia. Desinteressado, destinado a dar cultura geral básica, sem a preocu-3 estes deveriam ser preparados para o exercício do sacerdócio e foi principalmente para
pação de qualificar para o trabalho, uniforme e neutro (do p o n t o de vista nacional,] eles que se fundaram os colégios, onde se passou a ministrar o ensino das ciências h u m a -
como quer Fernando de Azevedo), não podia, por isso mesmo, contribuir para modifi-1 nas, as letras e as ciências teológicas. Foi também na camada dominante que se recruta-
cações estruturais na vida social e econômica do Brasil, na época. Por outro lado, a ins4 ram os homens que iriam engrossar as fileiras dos sacerdotes da Ordem.
trução em si não representava grande coisa na construção da sociedade nascente. Asj Assim, os padres acabaram ministrando, em princípio, educação elementar para a
atividades de produção não exigiam preparo, quer do p o n t o de vista de sua adrninis^j população índia e branca cm geral (salvo as mulheres), educação média p a r a os h o -
tração, quer do ponto cie vista da mão de obra. O ensino, assim, foi conservado à mar-: mens da classe dominante, parte da qual continuou nos colégios preparando-se para o
:gem, sem utilidade prática visível para uma economia fundada na agricultura rudi-; ingresso na classe sacerdotal, e educação superior religiosa só para esta última. A parte
mentar e no irabalho escravo. Podia, portanto, servir tão somente à ilustração de áH da população escolar que não seguia a carreira eclesiástica encaminhava-se para a Eu-
guns espíritos ociosos que, sem serem diretamente destinados à administração da uni-? ropa, a 6 m de completar os estudos, principalmente na Universidade de Coimbra, de
dade produtiva, embora sustentados por ela, podiam dar-se ao luxo de se cultivarem; ondedeviam voltar os letrados.
Evidentemente, a esse tipo d e d e s o c u p a d o s sociais, cujo destino não estava associado»; A obra de catequese, que, em princípio, constituía o objetivo principal da presença
uma atividade manual - então reservada aos cativos e, portanto, estigmatizada - oé, da Companhia de Jesus no Brasil, acabou gradativãmente cedendo lugar, em i m p o r -
mesmo profissional definida, só podia interessar uma educação cujo objetivo pxecíjpuá tância, à educação da elite. E foi com esta característica q u e ela se firmou d u r a n t e o p e -
fosse cultivar "as coisas d c espírito", isto é, uma educação literária, humanista, capa^ rfocio em que estiveram presentes no Bras"i! ã s s ê ü s membros e também c o m essa m e s -
de dar brilho ã inteligência. 'A esse tipòtie indivíduos eonvinha bem a educação jeguítif

• S o d r c N.w Sfnfrsi d • bim w


3
-Azcveclo,:-.o . cu..p.-4
i :

1 . A Z E V E D O , F . A c u l t u r a b r a s i l e i r a . V o l . II, p . 2 4 .

3S
ma característica que ela sobreviveu à própria expulsão dos jesuítas, ocorrida no sécu- ficação das disciplinas isoladas.^Leigos começaram a ser introduzidos no ensino e o
lo XVIII. Dela estava excluído o povo e foi graças a.ela q u e o Brasil se "tornou, por mui- Estado assumiu, pela primeira vez, os encargos da educação.
to "t.empÒ","ürn país da Europa", com os olhos voltados para fora, impregnado de u m a '."..' Mas, apesapdissoy-aíituação não m u d o u em suas bases. Recorde-séde qúe os jesiíí- "
cultura intelectual transplantada, alienada e alienante. Foi ela, a educação dada pelos ias mantiveram, além de colégios para a formação de seus sacerdotes, seminários p a r a
jesuítas, transformada em educação de classe, com as características que tão b e m dis- a formação do clero secular. Era esse o clero q u e atuava principalmente nas fazendas
tinguiam a aristocracia rural brasileira, que atravessou todo o período colonial e i m p e - de onde ele proviera, constituído, c o m o era, de filhos das famílias proprietárias. F o r a m
rial e atingiu o período republicano, sem ter soírido, em suas bases, qualquer modifi- estes que formaram a massa de tios-padres e capelães de engenho e que, por exigência
cação estrutural, m e s m o q u a n d o a demanda social d c educação começou a aumentar, das funções, foram também os mestres-eseola ou preceptores dos filhos da aristocracia
atingindo as camadas mais baixas da população e obrigando a sociedade a ampliar sua rural. Formados nos seminários dirigidos pelos jesuítas, eles foram os naturais conti-
oferta escolar. Era natural que assim fosse, porque esse tipo de educação veio a trans- nuadores de sua ação pedagógica. C o m p u s e r a m também o maior contingente de p r o -
formar-se no símbolo da própria classe, distintivo desta, fim, portanto, almejado por fessores recrutados para as chamadas aulas regias introduzidas com a reforma pomba-
todo aquele que procurava adquirir status. Na época colonial mesma, "...já não era so- lina. Assim, "embora parcelado e fragmentário e rebaixado de nível, o ensino mais va-
mente pela propriedade da terra e pelo n ú m e r o de escravos que se media a importância riado nos seus aspectos orientou-se para os m e s m o s objetivos, religiosos e literários, e
se realizou com os mesmos métodos pedagógicos, com apelo à autoridade e ã discipli-
ou se avaliava a-situação social dos colonos: os graus de bacharel e o s de mestre em a r -
na estreita, concretizados nas varas de marmelo e nas palmatórias de sucupira, tenden-
tes (dados pelos colégios) passaram a exercer o papel de escada ou de ascensor, na hie- j
do a abafar a originalidade, a iniciativa e a força criadora individual, para p ô r em seu
rarquia social da Colônia, onde se constituiu uma pequena aristocracia de letrados, fu-1 5
lugar a submissão, o respeito à autoridade e a escravidão aos modelos antigos" .
turos teólogos, padres-mestres, juizes e magistrados" .
Símbolo de classe, esse tipo de educação livresca, acadêmica e aristocrática foi fa-1 O século XIX, no Brasil, viu porém surgir u m a estratificação social algo mais com-
tor coadjuvante na construção das estruturas de poder na Colônia. Isso porque a classe | plexa do que a predominante no período coloiúal. A presença, pelo menos, de uma ca-
dirigente, aos poucos, foi tomando consciência do p o d e r dessa educação na Formação! mada intermediária, se não surgida, mas acentuada cora a mineração, fez-se cada vez
de seus representantes políticos junto ao poder público. Os primeiros representantes J mais visível, principalmente na zona urbana, o n d e se radicou. Sua participação na vida
da Colônia j u n t o às cortes foram os filhos dos senhores de engenho educados no s i s t e - | social passou então a ser mais ativa, não tanto pelas atividades produtoras a que estava
ma jesuítico. Casaram-se, assim, portanto, a grande propriedade, o niandonismo e ai ligada - o artesanato, o pequeno comércio, a burocracia - mas sobretudo pelò,compro-
cultura transplantada expandida pela ação pedagógica dos jesuítas. I metimento político. Foi nesta camada intermediária que se recrutaram os indivíduos liga-
dos ao jornalismo, às letras e principalmente à política. O período marcante de sua presen-
Esse complexo sobreviveu mesmo ã expulsão dos jesuítas em 1759. A decadência.!
ça loi o da Regência, por isso mesmo um dos períodos mais conturbados do século.
econômica em que entrou o Reino Português, principalmente com a queda da rninera-J
O mercado interno, criado e reforçado com a economia de mineração, foi um fator -
ção, e o atraso cultural que, entre outras coisas, tevê n o fanatismo religioso u m de seus!
importante na ascensão dessa classe intermediária, que Nelson W e r n e k Sodré prefere
fatores, fez com que surgisse na Metrópole um descontentamento geral em relação ao?
chamar de pequena burguesia, pelas afinidades que teve com a mentalidade burguesa,
jesuítas. Na Colônia já se faziam notar os atritos entre estes e a população, em t o m o dá
também em plena ascensão na Europa. Essa classe desempenhou relevante papei na
questão da escravização dos índios. Juntava-se a isso a presença, tanto no Reino quantq
evolução da política n o Brasil monárquico e nas transformações por que passou o regi-
na Colônia, de idéias provindas do cnciclopedismo, declaradamente anticlcricais. Da ns-
me no final do século. E se ela pôde fazê-lo, isso se deve sobretudo ao instrumento de
censão do Marquês de Pombal, cuja linha de pensamento estava estreitamente vinculada
Cfúe dispôs para afirmar-se como classe: a educação escolarizada.
ao cnciclopedismo, resultou a expulsão dos jesuítas de Portugal e de seus domínios, -j
Inúmeras foram as dificuldades daí decorrentes para o sistema educacional. Da ex;
Assim, o período que se seguiu à independência política viu também diversifi-
c
ar-se um pouco a demanda escolar: a parte da população que então procurava a escola
pulsão até as primeiras providências para a substituição dos educadores e do sisterníj
Janão ?ra apenas pertencente à classe oligárquico-rural. A esta, aos poucos, se somava
jesuítico transcorreu um lapso de 13 anos. Com a expulsão, desmantelou-se toda umí d

:
pequena camada intermediária, que, dèsttè"cedo,"percebeu o valor da escola como
estrutura administrativa de ensino. A' uniformidade da ação pedagógica, a perfeita
^sirurp.ento de ascensão social. Desde m u i t o antes, o título d e d o u t o r valia t a n t o
transição de um nível escolar' para outro', a graduação; foram substii todas pela diversi;
^ a n t o o de proprietário de terras, c o m o garantia par? a conquista de prestígio social e

S
°ORH : N . W . Síntese dc história da cultura brasileira
de poder político. Era compreensível, portanto, que, desprovida de terras, fosse para o criação dos primeiros cursos superiores (não teológicos) na Colônia. Embora organi-
título que essa pequena burguesia iria apelar, a fim de firmar-se como classe e assegu- zados na base.de aulas avulsas, esses cursos tinham um sentido profissional prático.
Tar-se o status a que aspirava. • • ^-.-w;^.-. Dentre-as. escolas superiores, distinguiram-se a Academiá~Rèãl da Marinha e a Acade-
Mas, se essa camada intermediária procurou a educação, c o m o meio de ascensão mia Real Militar, esta mais tarde transformada em Escola Central e Escola Militar de
social, são suas relações com a classe dominante que vão proporcionar-nos uma com- Aplicação, que tiveram a incumbência de formar engenheiros civis e preparar a carrei-
preensão maior da característica dominante no ensino brasileiro, na época e posterior- ra das armas. Os cursos médico-cirúrgicos da Bahia e do Rio de Janeiro foram as célu-
mente. Essas relações são ainda relações de dependência. Uma vez que as camadas in- las das nossas primeiras Faculdades de Medicina. Não se pode omitir a criação de um
feriores viviam na servidão ou na escravatura e o trabalho físico era tido como degra- curso de Economia Política, que ficou a cargo de José da Silva Lisboa. O Gabinete de
dante, não é de se estranhar que se considerasse o ócio como um distintivo de classe. Química organizado na corte e o Curso de Agricultura criado na Bahia, em 1812, fo-
Não era, pois, a essas camadas q u e a classe intermediária iria ligar-se, mas à camada su- r a m d u a s tentativas de implantação do ensino técnico superior, que, se não vingaram,
perior, de q u e m iria depender para obter ocupações consideradas mais dignas, como pelo m e n o s tiveram o mérito de trazer para a Colônia opções diferentes em matéria de
as-funções burocráticas, administrativas, intelectuais. " N u m a estrutura social, como a educação superior. Deve-se assinalar ainda a presença da Missão Cultural Francesa,
existente no Brasil do início do século XIX, a camada intermediária, em que são recru- que teve como conseqüência a criação da Real Academia de Desenho, Pintura, Escul-
tados os intelectuais, deveria^ depender da classe d o m i n a n t e , cujos padrões .aceita e tura e Arquitetura Civil, em 1820. Esta seria transformada depois em Escola Nacional
consagra. Nada a aproxima das classes dominadas, que fornecem trabalho" . Se assim de Belas-Artes. Finalmente, a criação do Museu Real, do Jardim Botânico, da Biblioteca
é, o ensino que essa classe procurava era justamente aquele que se proporcionava a Pública, cujo acervo inicial foi de 60.000 volumes, vindos da Biblioteca do Palácio da
própria classe dominante, p o r q u e era o único que "classificava". Vemos assim que, Ajuda, em Portugal, e, ainda, a Imprensa Regia completaram o q u a d r o da criação da
embora já existissem duas camadas distintas freqüentando escolas, o tipo de educação fnfraestrutura cultural de que necessitava a corte para viver na Colônia.
permanecia o m e s m o para ambas, ou seja, a educação das elites rurais. C o m D. João, no entanto, não apenas nascia o ensino superior, m a s t a m b é m se ini-
Todavia, se, por um lado, a pequena burguesia se ligou à classe dominante da qual ciava um processo de autonomia que iria culminar na independência política. Toda-
dependia, p o r o u t r o , ela estava, pela própria característica de classe burguesa, vincula- via, o aspecto de maior relevância dessas iniciativas foi o fato de terem sido levadas a
da às idéias liberais então dominantes na Europa. Essa foi a contradição maior, no di- cabo, com o propósito exclusivo de proporcionar educação para uma elite aristocráti-
zer de Nelson W e r n e c k Sodré, em qr.e viveu essa nova classe emergente: de um lado, ca e nobre de que se c o m p u n h a a corte. A preocupação exclusiva com a criação de e n -
suas relações de dependência para com a aristocracia rural, e, de outro, sua ligação sino superior e o a b a n d o n o total em que ficaram os demais níveis do ensino d e m o n s -
com a ideologia burguesa que primava, na Europa, pela contestação da antiga ordem- tram claramente esse objetivo, com o que se acentuou u m a tradição - q u e vinha da C o -
fundada em ideais aristocrático-feudais. E sena essa contradição que iria acabar provo- lônia - a tradição da educação aristocrática. Ao m e s m o tempo lançaram-se as bases
cando não só a ruptura das d u a s classes aqui no Brasil,-como a vitória d o s ideais bur para uma revolução cultural que, embora lenta, culminou de certa forma na i n t r o d u -
gueses sobre a ideologia colonial, vitória que se concretizou, n u m a primeira fase, co ção de hábitos de p e n s a m e n t o e ação q u e vigoravam na Europa do século XIX e c o m -
a abolição da escravatura c a procbmação da República e, posteriormente, com a inr puseram a ideologia da burguesia brasileira em ascensão, no final do século.
plantação do capitalismo industrial. A independência política não modificou o q u a d r o da situação de ensino, pelo m e -
Que tipo de escola predomino" nessa ordem social é o que aqui nos importa verifi i o s de imediato. Considerada por J o ã o Cruz Costa como "simples transferencia de p o -
car. Em primeiro lugar, convém assinalar a herança recebida da Colônia. Além de al deres dentro de uma mesma classe, (a Independência) entregaria a direção da n o v a
g u m a s escolas primárias e médias, em mãos de eclesiásticos, existiam também os semi a
Vão aos proprietários de terras, de engenhos e aos letrados"'. O papel, p o r t a n t o , q u e
nários episcopais, entre os quais sobressaiu o Seminário de Olinda, fundado em 180 0 s
letrados passaram a desempenhar na nova ordem política foi de indiscutível relê-
pelo Bispo Azeredo Coutinlio, famoso por seu espírito de renovação científica, e ain 'áncia, u m a vez que foram eles que, ^m sua maioria, ocuparam os cargos administrati-
v

algumas aulas regias criadas com a reforma porabalina. - vos c polítíebsr A importância assumida pela educação d e i e i r a d o s d u r a n t e toda a m o -
A presença do príncipe regente, D. João, p o r 12 a n o s , trouxe sensíveis mudanç ... Oarquia estava diretamente ligada à necessidade de o país ter de p r e e n c h e r o q u a d r o
;

e r a
no quadrcrdas instituições educacionais da-época.-\ principal delas foi-; semtlúvida • £ l d a administração e dá política' A escolaTrepresentada sobretudo pelas novas fa-

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1 A
6.tbid.,p. 91 ' > J . C . . "As N o v a s I d é i a s " . In- H O L A N D A . S.B. O Brasil monárquico.
custa do sacrifício de alguns mestres-escola, que, destituídos de habilitação para o exer-
cuidados dc Direito, criadas na década de 1820 - u m a em S. Paulo e outra em Recife
cício de qualquer profissão rendosa, se viam na contingência de ensinar.
ambas em 1827 - passou a desempenhar o papel de fornecedora do pessoal qualificado ^
O fato de a maioria dos colégios secundários estarem em mãos de particulares
para essas funções. Apesar da existência de cursos de Medicina, Engenharia e Artes.,
acentuou ainda m a i s o caráter classista e acadêmico do ensino, visto que apenas as fa-
que as antecederam, as íaculdades-tle-Direito lograram u m a supremacia na formação
mílias de altas posses podiam pagar a educação de seus filhos.
dos q u a d r o s superiores do Império.
A transformação que esses colégios sofreram no decorrer do século XIX, no senti-
Por outro lado, a forma assumida pelo ensino superior, mormente o jurídico, de
do de se tornarem meros cursos preparatórios para o ensino superior, foi u m a decor-
currículo universalista e humanístico, acabou p o r influenciar ou mesmo condicionara
rência da pressão exercida pela classe d o m i n a n t e , a fim de acelerar o preparo de seus
estrutura do ensino secundário. Vejamos como se deu isso. O Ato Adicional de 1834
filhos e assim interligá-los no rol dos h o m e n s cultos. A legislação decorrente desse
"conferiu às Províncias o direito de legislar sobre instrução pública e estabelecimentos processo culminou com a isenção da obrigatoriedade de freqüência, com o que se ins-
próprios a promovê-la, excluindo, porém, de sua competência as faculdades de Medi- tituiu a matrícula por disciplina e se eliminou a seriação. Aos p o u c o s , tanto liceus p r o -
cina e Direito e as Academias então existentes e outros quaisquer estabelecimentos vinciais quanto colégios particulares foram-se convertendo em meros cursinhos pre-
que, no futuro, fossem criados por lei geral"''. Isso suscitou u m a dualidade de sistemas, paratórios para os exames de admissão ao ensino superior existente. Até o Colégio Pe-
com superposição de poderes (provincial e central) relativamente ao ensino primário dro 11, criado na corte e único mantido pelo Governo Central para servir de m o d e l o ,
e secundário. O poder central se reservou, e a ela se limitou, o direito de promover e não pôde escapar à pressão. E, apesar dos cuidados que mereceu por parte dos gover-
regulamentar a-educaçãono município neutro e a educação d e nível superior, e m t o d o j nantes, ele acabou por transformar-se t a m b é m n u m curso preparatório. Se,"alem disso,
o Império, e n q u a n t o delegou às províncias a incumbência de regulamentar e promo- se levar em conta que nem liceus provinciais nem colégios particulares podiam confe-
ver a educação primária e média em suas próprias jurisdições. Esse monopólio do en-, rir o grau de bacharel - privilégio do Colégio Pedro II e requisito para inscrição nos
sino superior de que gozou o poder central, aliado ao currículo vigente nas duas escoa cursos superiores - pode-se imaginar q u a n t o desinteresse havia nas províncias pela
Ias de Direito, q u e contavam com a preferência da população escolar, acabou influindo organização séria do ensino. Geralmente, o preparo começava nas províncias para ter-
sobre a composição do currículo e toda a estrutura da escola secundária, segundo afir-| minar com a passagem pelos exames parcelados que o Pedro 11 realizava para conferir
ma Maria de Lourdes Mariotto Haidar. isso de deveu a que: o grau de bacharel. Por a: se p o d e avaliar q u ã o propedêutico era o ensino secundário e,
a) o ensino secundário destinava-se ao p r e p a r o dos candidatos ao ensino s u p e r i o r ^ ao mesmo tempo, quão seletivo acabou por ser.
razão por que seu conteúdo se estruturou em função deste, Completam o quadro geral do ensino, no período monárquico, além de p o u c a s es-
b) os candidatos aos cursos superiores e r a m examinados nesses próprios cursos colas primárias (eni 1088, 250.000 alunos para uma população dc 14 milhões de habi-
segundo critérios fixados por estes mesmos . 9
j tantes), dos liceus provinciais, em cada capital de província e dos colégios particula-
Esse caráter propedêut ico assumido pelo ensino secundário, somado ao seu conteú- res, em algumas cidades importantes, alguns cursos normais, o Liceu de Artes e Ofícios,
do humanístico, fruto da aversão a todo tipo de ensino profissionalizante, próprio dç criado na corte, em 1856, e mais alguns cursos superiores, q u e foram enriquecidos
qualquer sistema escolar fundado numa o r d e m social escravocrata, sobreviveu até há com a-transformação da antiga Escola Central em Escola Politécnica, e a criação da
pouco e constituiu o fator mesmo do atraso cultural de nossas escolas. Escola de Minas de Ouro Preto, no Governo de Rio Branco (1871-1876).
A descentralização ocorrida com o Ato Adicional de 1834, como já se disse, delego Para se. ter uma idéia da predominância do ensino jurídico sobre os demais ramos,
às províncias o direito de regulamentar e promover a educação primária e secundári?. assinale-se que cm 1864, nas duas faculdades de Direito, estavam matriculados 8 2 6
que ocorreu a contar de então foi a tentativa de reunir antigas aulas regias em liceus, se alunos, contra 294 em Medicina, 154 em Engenharia (Escola Central) e 109 na Escola
muita organização. Nas capitais foram criados os liceus provinciais. A falta dc recursoSj Militar e de Aplicação. Considerando que nessas faculdades, além do ensino relaciona-
no entanto, que um sistema falho ri; tributação e arrecadação da renda acarretava, irn do com a profissão, que era a do Direito, também se ministrava ensino ligado às h u m a -
possibilitou as províncias de criarem u m a rede organizada de escolas. O resultado foi nidades, pode-se compicender o q u a n t o p r e d o m i n o u , na eviucação das camadas q u e
que o ensino, sobretudo o secundário, acabou ficando nas mãos da iniciativa privada e,' freqüentavam as escolas.a formação aeadêmica^humanísüca e retórica.
ensino primário foi relegado áo abandõfíõVcóm pouquíssimas escolas, sobrevivendo Se-se-lembrai, além <üsso, de que a educação popular estava a b a n d o n a d a e de que a
e
ducação média era meramente propedêutica, pode-se ajuizar do q u a n t o a educação
vi minimizada, a ponto de transformai-se em -mera ilustração "c preparação para o
5. ALMEIDA. F M . dc. Constituições do. Brasil L.éi de 12/8/1834, a n . 10. § %". ex
e r c í c i o de lunções, nas quais a retórica tem papel mais importante do que a criativi-
i. HAIDAR, M.L.M. O ensino secundário no imptóio brasileiro

40
iladc. I ais funções eram exercidas por aqueles q u e praticavam o jornalismo o u a polí- A dualidade do sistema educacional brasileiro, se, de u m lado, representava a d u a -
tica, razão pela qual as camadas em ascensão ou as camadas dirigentes revelaram p r e - lidade da própria sociedade escravocrata, de onde acabara de. sair-á República, de o u -
ferência especial pelas Faculdades de Direito. tro, representava ainda, no funtlo, a c o n t i n u a ç ã o dos a n t a g o n i s m o s em t o r n o da c e n -
A cultura transmitida pela escola--''guardava, -pois,- o.timbre.aristocrático". E o tralização.e descentralização do poder. A vitória dos princípios lederalistas q u e consa-
guardava e m l u n ç a ó " das "exatas necessidades da sociedade escravista'' F n q u a n t o n ã o grou a a u t o n o m i a - d o s - p e d e r e s estaduais fez com que o G o v e r n o F e d e r a l / r e s e r v a n -
p r e d o m i n a v a m nessa sociedade relações de teor capitalista, n e n h u m a contradição de do-se u m a parte da tarefa de p r o p o r c i o n a r educação à n a ç ã o , fiãó interferisse d e ' m o d o
caráter excludente pôde ocorrer entre as c a m a d a s que p r o c u r a v a m a educação: a aris- algum nos direitos de a u t o n o m i a reservados aos Estados, na c o n s t r u ç ã o de seu sistema
tocracia rural e os estratos médios. de ensino. C o m o um n ã o interferia na jurisdição do o u t r o , as ações eram completa-
A Constituição da República de 1 8 9 1 , q u e instituiu o sistema federativo de gover- mente independentes e, o q u e era n a t u r a l , díspares, em m u i t o s casos. Isso acabou ge-
no, consagrou t a m b é m a descentralização do e n s i n o , ou melhor, a dualidade de siste- rando u m a desorganização completa n a construção d o sistema e d u c a c i o n a l , o u m e -
o
m a s , já que, pelo seu artigo 3 5 , itens 3 e 4°, ela reservou à União o direito de "criar ins- lhor, dos sistemas educacionais brasileiros.
a
tituições de ensino superior e secundário nos Estados" e "prover a instrução secundá- A par dessa dualidade, a 1 República tentou várias reformas, sem êxito, para a so-
ria no Distrito Federal", o que, c o n s e q u e n t e m e n t e , delegava aos Estados competência lução dos problemas educacionais mais graves. A primeira delas, a de Benjamin C o n s -
paraiprover e legislar sobre educação primária A prática, p o r é m , acabou gerando o se- tatam, a mais ampla, não chegou s e q u e r a ser posta em prática, a n ã o ser em alguns as-
guinte sistema: à União cabia criar e controlar a instrução superior em toda a n a ç ã o , pectos. Tentou a substituição do c u r r í c u l o acadêmico por um c u r r í c u l o enciclopédico
b e m c o m o criar e controlar o ensino s e c u n d á r i o acadêmico e a irisír.ução em i o d o s os -com inclusão de disciplinas científicas, consagrou o ensino seriado, d e ú m a i o r organi-
níveis do Distrito Federal, e aos Estados cabia criar e c o n t r o l a r o ensino primário e o cidade ao sistema todo. a t i n g i n d o a reforma as escolas primárias, as escolas n o r m a i s , as
e n s i n o profissional, que, na época, c o m p r e e n d i a p r i n c i p a l m e n t e escolas normais (de secundárias (através da reforma do Distrito Federal), além " d o e n s i n o superior, artísti-
n
nível médio) para moças e escolas técnicas para rapazes. co e técnico, em todo território do p a í s " ' e da criação do Pedagogium, centro de aperfei-
Era, p o r t a n t o , a consagração do sistema dual de ensino, q u e se vinha m a n t e n d o çoamento do magistério e "impulsor das reformas". Faltava, p o r é m , para a execução da
desde c Império. Era também u m a forma de oficialização da distância que se mostrava, reforma, alem de uma inlraestrutura institucional que pudesse assegurar-lhe a implanta-
na pratica, e.ntre a educação da classe d o m i n a n t e (escolas secundárias acadêmicas e es- ção, o apoio político das elites, que viam nas idéias do reformador u m a ameaça perigosa
colas superiores) e a educação do povo (escola primária e escola profissional). Refletia à formação da juventude, cuja educação vinha, até então, s e n d o pautada n o s valores e
essa situação urna dualidade que era o p r ó p r i o retrato da organização social brasileira. padrões da velha mentalidade aristocrático-rural. Era toda uma estrutura social e econô-
O que, no e n t a n t o , não ocorria ao sistema assim consagrado era o fato de a nova socie- mica entrando no processo de formação do povo e colocando-se c o m o entrave à renova-
dade brasileira, que despontava c o m a República, já ser mais complexa do que a anteri- ção pedagógica. Se a reforma Benjamin Constant teve o mérito de r o m p e r "com a antiga
or sociedade escravocrata. Havia vários estratos sociais emergentes. O povo já não tradição do ensino humanístico". não teve, porém, o cuidado de p e n s a r a educação a
abrangia apenas a massa h o m o g ê n e a d o s agregados das fazendas e dos p e q u e n o s artífi- partir de uma realidade dada, pecando, portanto, pela base e sofrendo dos males de q u e
ces e comerciantes da zona urbana: transparecia a heterogeneidade da composição so- Vão padecer quase .todas as reformas educacionais que se tentou implantar no Brasil.
cial popular, pela divergência de interesses, origens e posições. Exisnaja u m a p e q u e n a Ademais, é preciso que se leve em conta o nível de preocupação q u e o governo v i n h a
burguesia, em si m e s m a heterogênea, uma camada m é d i a de intelectuais letrados ou manifestando para com a r e c o n s t r u ç ã o do sistema educacional. A p r ó p r i a criação do
p a d r e s , os militares em franco prestígio, urna burguesia industrial, ensaiando seus pri- Ministério da Instrução, Correios e Telégrafos, de curta d u r a ç ã o , r e u n i n d o n u m só ór-
meires passos, e todo um contingente de imigrantes q u e , na zona urbana, se. ocupavam gão a administração de coisas tão dispares, denunciava o grau de i m p o r t â n c i a q u e as-
de profissões que definiam classes médias e, na zona rural, se ocupavam da lavoura. sumia, para as classes dirigentes do m o m e n t o , a educação do p o v o .
Estes últimos eram, tanto no q u e respeitava ao nível cultural quanto ao que caracteri-
Outras reformas se seguiram a essa, mas não lograram acarretar n e n h u m a m u d a n -
zava os interesses, bastante diferentes das camadas camponesas que se o c u p a v a m da
ça substancial ao sistema. Algumas delas, corno a Lei Orgânica Rivadávia Corrêa, no
e c o n o m i a de subsistência e, mais diferentes ainda, do contingente saído da escravidão.
Governo do Marechal H e r m e s da F o n s e c a , em 1911, chegaram até a o c a s i o n a r um re-
Todo"esse~cornplexo organismo -social já não p o d i a - c o m p e u l a r - j i e . ^
.-írecesso na evolução d õ sislémá,Trm v i r t u d e de facultar total, l i b e r d a d e é a u t o n o m i a
caráter simplista. A pressão não tardaria, pois, a provocar a r u p t u r a das limitações ÜU'
jtos estabelecimentosê s u p r i m i r o caráter oficial do ensino, o q u e t r o u x e resultados d e -
postas p e l ^ Constituição. E a -instituição da escola* cal cada ri%princí'pio dfcd u ai idade
social, iria aos poucos ter seus alicerces c o m p r o m e t i d o s pelo crescimento e complex*"
s, •AZEVEDO. r. A tultuia brasileiro, uimo ül, p 1 23

42 43
sastrosos. A reforma Carlos Maximiliano representou uma contramarcha: reoficiah- listados seguindo, sem transformações profundas, as linhas do seu desenvolvimento
zou o e n s i n o , reformou o Colégio Pedro 11 e r e g u l a m e n t o u o ingresso nas escolas supe- tradicional, predeterminadas na vida colonial e no regime do Império"'".
riores. E a Reforma Rocha Vaz, no G o v e r n o A r t h u r Bcrnardes, em 1925, representou a Na verdade, o c o n t r o l e do p o d e r p e l a s oligarquias rurais, q u e , e v i d e n t e m e n t e , p r o -
última tentativa do período no sentido de instituir n o r m a s regulamentares para o ensi- p u n h a m reformas e legislavam sobre a educação, acabou p o r projetar no sistema esco-
no, Tendei o mérfuTde estabelecer; p e l a primeira vez; u m acordo entre a União e os lar a mesmarmentálidade que havia sido plasmada na Colônia e tinha vigorado d u r a n t e
Estados, c o m o fün de promover a educação primária, eliminar os exames preparatórios a M o n a r q u i a ; " G m e s m o espírito literário e l i v r e s c o , á n i ê s m a falta de audácia c o n s t r u -
e p a r c e l a d a s , ainda vigentes e herança do Império. Foi, na verdade, u m a tentativa de tiva e a m e s m a p r e o c u p a ç ã o excessiva de fórmulas jurídicas, ou de formalismo e de
i m p o r a sistematização sobre a desordem. "jurisdicismo", nas expressões de José Maria Belo" . 13

T o d a s essas reformas, porém, n ã o passaram de tentativas frustradas e, m e s m o Mesmo a burguesia industrial em ascensão copiava os modelos de c o m p o r t a m e n t o e
q u a n d o aplicadas, representaram o p e n s a m e n t o isolado e desordenado dos comandos educação da classe latifundiária. E era natural que assim fosse: era esta última que tinha
políticos, o que estava muito longe de p o d e r comparar-se a u m a política nacional de fornecido parte de seu capital h u m a n o e econômico para engendrar o processo d e i n d u s -
educação. S e g u n d o F e r n a n d o Azevedo, " d o p o n t o de vista cultural e pedagógico, a Re- uialização. Era, pois, no c o m p o r t a m e n t o da classe oligárquica que ia a burguesia n a s -
pública foi u m a revolução que abortou e q u e , contentando-se com a m u d a n ç a do regi- cente buscar seus exemplos e era a educação dessa classe q u e ela iria solicitar para si.
m e , não teve o p e n s a m e n t o ou a decisão de realizar u m a transformação radical no sis- Além disso, as próprias classes médias emergentes, q u e n ã o t i n h a m , c o m o já se
tema de e n s i n o para provocar u m a renovação intelectual das elites culturais e políti- disse antes, n e n h u m a afinidade ou ligação c o m as camadas mais pobres da p o p u l a ç ã o ,
11
cas, necessárias às novas instituições d e m o c r á t i c a s " . Se se leva em conta q-ue^as elites, não possuíam senão o m e s m o m o d e l o de educação a copiar. Viam elas nessa e d u c a ç ã o
que p a s s a r a m desde logo a controlar o p o d e r , representavam as oligarquias do café, às de classe, vigente cm t o d o o território nacional, um i n s t r u m e n t o bastante eficaz de as-
quais se j u n t a r a m , pouco a pouco, as velhas oligarquias rurais de a t u a n t e ação política, censão social. Anísio Teixeira assinalou bem esse aspecto, ao afirmar que "para esta so-
no t e m p o do Império, é j u s t o concluir-se q u e o tipo de educação reivindicado por essa ciedade aparentemente r e n o v a d a , mas realmente estacionaria, assim c o m o o latifún-
classe para a nação só poderia ser aquele ao qual ela mesma vinha sendo submetida. A dio se faz o m o l d e para a industrialização, a educação de elite se faz o m o l d e para certo
"renovação intelectual de nossas elites culturais c políticas" foi um fato que não se deu, tipo moderado de educação p a r a ascensão social, q u e não fosse suscetível de q u e b r a r a
visto que o c o m a n d o político, econômico e cultural se conservou nas mãos da classe estrutura aristocrática e conservadora da sociedade".
q u e tinha recebido aquela educação literária e humanística, originária da Colônia e Às novas pretensões educacionais das classes emergentes r e s p o n d e r a m , todavia,
q u e t i n h a atravessado todo o Império "sem modificações essenciais". depois, as camadas d o m i n a n t e s c o m certos m e c a n i s m o s de defesa que, na oíerj.a da
Depois, a vitória do federalismo, q u e dava plena autonomia aos Estados, acentuou, educação escolarizada, se caracterizaram pela escassez d e o p o r t u n i d a d e s e conserva-
não só no p l a n o econômico, mas t a m b é m no plano educacional, as disparidades regio- ção do caráter e m i n e n t e m e n t e literário. Buscavam, com isso, preservar o p a t r i m ô n i o
nais. Colocando o ensino à mercê das circunstâncias político-econômicas locais, o fede- da educação para o ócio.
ralismo acabou por aprofundar a distância q u e já existia entre os sistemas escolares esta- Agravava a situação o fato de que nem a estrutura econômica da nação permitia ofe-
duais. Sim, p o r q u e os Estados que c o m a n d a v a m a política e a economia da nação e eram, recer educação técnica em abundância, dada a falta de recursos e a escassez da d e m a n d a
em conseqüência, sede do poder econômico, estavam em condições privilegiadas para de mão de obra qualificada, determinada pelo nível de industrialização do país, n e m
equipar, c o m melhores recursos, o aparelho educacional, enquanto os Estados mais po- tampouco as populações estavam interessadas nesse ensino técnico, símbolo de classe
bres, sem a possibilidade de qualquer ingerência nos destinos do país e, mais ainda, sem dominada. A velha mentalidade escravocrata n ã o era privilegio das camadas dirigentes:
condições de colocar cm pé de igualdade suas reivindicações j u n t o ao poder público, fi- era também u m a característica marcante do c o m p o r t a m e n t o das massas q u e se acostu-
cavam à m e r c ê de sua própria sorte. Esse liberalismo político e econômico, que. acabou niaram, após três séculos, a ligar trabalho com escravidão. O p o v o , principalmente as ca-
p o r transformar-se n u m liberalismo educacional foi fator de relevância no aprofunda- riadas médias que almejavam ascender na escala social, afastou logo de si a idéia de e d u -
m e n t o das desigualdades socioeconômicas e culturais das diversas regiões do país, o car-se para o trabalho. Decorreu daí que, m a l g i s d o os esforços priva tis tas das camadas
que, evidentemente, redundou na impossibilidade de se criarem u m a unidade e conti- dominantes, a educação, q u e acabou por expandir-se, foi j u s t a m e n t e aquela q u e repre-
n u i d a d e de ação pedagógica. Vamos ver, assim, a educação è^acultura tomando impulso sentava o próprio símbolo de classe. Foi, assim,-que a falta de tradição*de'classe m é d i a .
em determinadas regiões do sudeste do Brasil, sobretudo em São Paulo, e o restante dos
l 2
-ld., p . i 1 9 .

l 3
-ld.,ibid.
11.1bid.,p. 1 3 4 .

44
aiiaclaMO tator escravidão, tez com q u e a "intenção do sistema escolar brasileiro de pro- ça cultural, a d e m a n d a social de educação e o sistema de p o d e r p e r m a n e c e r a m d u r a n t e
ver às necessidades educativas de cada classe, s e m lhe alterar a-estrutura social, confir- o período que a n t e c e d e u a década de 1920, integrados na formação de um c o m p l e x o
m a n d o a distribuição da educação às estreitas necessidades de cada classe", não lograsse sócio-econômico-político-cultural qüe fez c o m que a educação ofertada à p o p u l a ç ã o
êxito. A classe média aspirava ao status de elite e não podia ver na e d u c a ç ã o n a r a o traba- brasileira c o r r e s p o n d e s s e à s reais exigências da sociedade então existente.
lho, tão estigmatiáado-durante três séculos, um objetivo almejável. Ü m à Vez que a economia"não fazia exigências à escola em t e r m o s de d e m a n d a eco-
Era essa u m a situação que iria delinear-se mais claramente após a Primeira G r a n d e nômica de recursos h u m a n o s ; que a herança cultural havia sido criada a partir da im-
G u e r r a e caracterizar profundamente o p e r í o d o seguinte. No começo da República, as portação de m o d e l o s de p e n s a m e n t o provenientes da Europa; q u e a estratificação so-
classes m é d i a s q u e emergiam na z o n a u r b a n a n ã o tinham ainda a força numérica q u e cial, p r e d o m i n a n t e m e n t e dual na época colonial, havia destinado à escola apenas parte
iria ter a contar dos anos 1930. D u r a n t e todo o p e r í o d o de que estamos tratando, o pre- da aristocracia ociosa; q u e essa d e m a n d a social de educação, m e s m o q u a n d o e n g l o b o u
d o m í n i o n u m é r i c o coube às populações estabelecidas na zona rural. Esse fato, deter- no seu perfil os estratos m é d i o s urbanos, p r o c u r o u s e m p r e na escola u m a forma de ad-
m i n a d o pela estrutura socioeconômica vigente, foi também fator determinante na quirir ou manter status, a l i m e n t a n d o , a l é m disso, um preconceito contra o trabalho
composição efetiva da demanda escolar, no decorrer do período. Para u m a economia que não fosse intelectual e u m a vez, enfim, q u e todos esses aspectos se integravam, é
de base agrícola, como era a nossa, s o b r e a q u a l se assentavam o latifúndio e a m o n o - possível afirmar-se q u e a e d u c a ç ã o escolar existente, c o m o r i g e m na ação pedagógica
c u l t u r a e.para cuja produtividade não contribuía a modernização d o s fatores de p r o d u - dos Jesuítas, correspondia às exatas necessidades da sociedade c o m o um todo. A fun-
ção, m a s tão s o m e n t e se contava c o m a existência de técnicas arcaicas de cultivo, a ção social da escola era, e n t ã o , a.de fornecer os e l e m e n t o s q u e iriam p r e e n c h e r os qua-
e d u c a ç ã o realmente não era considerada c o m o fator necessário. Sc a p o p u l a ç â o s e con- dros da política, da administração pública e formar a "inteligência" do regime. É possí-
vel, assim, pensar na ausência de u m a defasagem entre e d u c a ç ã o e desenvolvimento,
centrava na zona rural e as técnicas de cultivo n ã o exigiam n e n h u m a preparação, n e m
nessa época, ou seja, é possível pensar n u m a ausência de defasagem e n t r e os p r o d u t o s
m e s m o a alfabetização, está claro q u e , para essa população camponesa, a escola não ti-
acabados oferecidos pela escola e a d e m a n d a social e e c o n ô m i c a de educação.
nha q u a l q u e r interesse. Enquanto as classes médias e operárias urbanas procuravam a
escola, p o r q u e dela precisavam para. de um lado, ascendei na escala social e, de outro, A contar do m o m e n t o , p o r é m , em q u e um desses fatores começa a fazer exigências
obter um m í n i m o de condições para c o n s e c u ç ã o de emprego nas p o u c a s fábricas, para diferentes à escola, o c o m p l e x o entra em crise. A intensificação do p r o c e s s o de u r b a n i -
a g r a n d e massa composta de populações trabalhadoras da zona rural, a escola não ofe- zação, q u e tem na deterioração das formas de p r o d u ç ã o no c a m p o e na industrializa-
recia q u a l q u e r motivação. Essa foi a razão pela qual o índice de analfabetismo no pe- ção crescente suas causas principais, p a s s o u a criar, desde a Primeira República, os
ríodo foi bastante alto e as reivindicações escolares das classes emergentes p u d e r a m germes do desequilíbrio.
ser, de alguma forma, atendidas. A 1 República leve, assim, um q u a d r o de demanda; No que toca à d e m a n d a social de educação, esse processo fez modificar-se substan-
educacional que caracterizou bem as necessidades sentidas pela população e, até certo cialmente o seu perfil, introduzindo nele um contingente cada vez maior de estratos mé-
p o n t o , r e p r e s e n t o u as exigências educacionais de u m à sociedade cujo índice de urba- dios e populares que passaram a pressionar o sistema escolar para q u e se expandisse. A
nização e de industrialização ainda era baixo. A permanência, p o r t a n t o , da v-elha e d u - estreita oferta de ensino de então começou a chocar-se com a crescente procura.
cação acadêmica e aristocrática e a p o u c a importância dada à educação popular funda-J Já com respeito à economia, a evolução de um m o d e l o exclusivamente agrá-
v a m - s e na estrutura e organização da sociedade. Foi somente q u a n d o essa estrutura; rio-exporlador para um m o d e l o parcialmente urbano-industriaí, afetou o equilíbrio
c o m e ç o u a dar sinais de ruptura que a situação educacional principiou a tomar rumosjjj estruturai dos fatores influentes no sistema educacional pela inclusão de n o v a s e cres-
diferentes. De um lado, no campo das idéias, as coisas começaram a mudar-se coral centes necessidades de recursos h u m a n o s pai a ocupar funções nos setores s e c u n d á r i o
c

m o v i m e n t o s culturais e pedagógicos em favor de reformas mais profundas; de o u t r o ] terciário da economia. O m o d e l o econômico em emergência passou, então, a fazer
no c a m p o das aspirações sociais, as m u d a n ç a s vieram com o aumento da demanda e s c o j solicitações à escola.
lar impulsionada pelo ritmo mais acelerado d o processo de urbanização ocasionado pelos Esses dois aspectos - o crescimento acelerado da demanda social de educação, dc
u ,
i m p u l s o d a d o ã industrialização após a Primeira Guerra e acentuado depois de 1930. 1 . n lado/e o aparecimento de u m a demanda de recursos h u m a n o s , de outro - . c r i a r a m as. -
':condições- parada quebrallõ"equilíFriò. U m a vez estabelecido'jp desequilíbrio, q u e se
! 'acentuou sobretudo a contar de 1930, a crise do sistema educacional obedeceu,- na-sua'
2 . 2 . I n t e g r a ç ã o e desintegração d c f a t o r e s - -\
•': ^^ua-evolutiva, ao jogo de forças que esses fatores m a n d n h a m entre si. Esse jogo, n a t u -
Do q u e acaba de ser exposto decorre n a t u r a l m e n t e u m a conclusão: os fatores atura r L
.. alrnentè; obedeceu, p o r sua vez, às regras do crescimento.espontâneo próprio do siste-
autos na organização e evolução do e n s i n o , quais sejam o sistema econômico, a h e r a o |

46
^ n a Capitalista. E a crise se manifestou s o b r e t u d o p d a i n c a p a c i d a d e de as camadas d o m i - CAPÍTULO 3
nantes reorganizarem o sistema educacional, de forma que se atendesse h a r m o n i c a m e n -
te. tanto à d e m a n d a social de educação q u a n t o às novas necessidades-de formação de re-
A EDUCAÇÃO'E O DESENVOLVIMENTO
cursos h u m a n o s exigidos pela economia em transformação. Nesse processo, a herança BRASIbEH^O-APÓS 1 9 3 0
cultural atuou désTavoravêlmeliui na mentalidade, tanto dos dirigentes que d™
a escola q u a n t o das próprias camadas q u e passaram a pressionar o sistema escolar. Os
aspectos q u e o desequilíbrio apresentou foram, então, de duas ordens.
a) de o r d e m quantitativa, representados pela pequena oferta, pelo baixo rendi-
3.1. O significado da Revolução de 1930 p a r a o d e s e n v o l v i m e n t o b r a s i l e i r o
m e n t o e pela discriminação social do sistema;
3.1.]. Rápido esboço dos fatos ocorridos entre 1930 e 1964
b) de o r d e m estrutural, r e p r e s e n t a d o s pela expansão de um tipo de ensino que já
não correspondia às novas necessidades criadas c o m a expansão econômica e estratifi- Em o u t u b r o de 1930, o governo do Presidente W a s h i n g t o n Luiz era d e r r u b a d o
cação social mais diversificadas. por um m o v i m e n t o a r m a d o que se iniciava ao sul do país e tivera repercussões em vá-
rios p o n t o s do território brasileiro. Esse m o v i m e n t o era um dos aspectos a s s u m i d o s
pela crise do desenvolvimento; crise que vinha de longe, a c e n t u a n d o - s e nos ú l t i m o s
anos da década de 1920. Na verdade, o que se c o n v e n c i o n o u chamar Revolução de
1930 foi o p o n t o alto de u m a série de revoluções e m o v i m e n t o s a r m a d o s q u e , d u r a n t e
o período c o m p r e e n d i d o entre 1920 e 1964, se e m p e n h a r a m em p r o m o v e r vários r o m -
pimentos políticos e econômicos com a velha o r d e m social oligárquica. F o r a m esses
movimentos que, em seu conjunto e pelos objetivos afins q u e p o s s u í a m , iriam caracte-
rizara Revolução Brasileira, cuja meta maior tem sido a implantação definitiva do ca-
pitalismo no Brasil. Através desses m o v i m e n t o s e, s o b r e t u d o , através da Revolução de
1930, o q u e se p r o c u r o u foi um reajustamento c o n s t a n t e dos setores n o v o s da sacieda-
de com o setor tradicional, do ponto de vista i n t e r n o , e, destes dois, c o m o s e t o r inter-
1
nacional, do p o n t o de vista externo .
E c o n o m i c a m e n t e falando, a crise se a c e n t u o u q u a n d o a política e c o n ô m i c a do go-
verno, q u e visava a proteger os preços do café no m e r c a d o internacional, já n ã o pôde
ser sustentada, devido às bases sobre as quais se vinha p r o c e s s a n d o . A s u p e r p r o d u ç ã o
chegara a tal p o n t o , que as retiradas do mercado de parte da p r o d u ç ã o , p r o c e s s o q u e se
jBona realizando, havia m u i t o tempo, com financiamentos v i n d o s do exterior e que
2
f i a r i a lucros a o p r o d u t o r e "socializava o s prejuízos" , n ã o p u d e r a m m a i s ser leva-
a efeito. E isto por dois motivos: primeiro, p o r q u e a crise e c o n ô m i c a m u n d i a l de
| y 2 9 subtraía ao governo a possibilidade de c o n t i n u a r a o b t e n ç ã o dos financiamentos
a a
BB'f compra dos estoques invendíveis e, s e g u n d o , p o r q u e esses estoques haviam
ido uma quantidade suiicientemente alta para se ter a certeza de que j a m a i s seriam
E g p n b u í d o s . A saturação do mercado m u n d i a l ^ p o r t a n t o , a c a b o u acarretando -a q u e d a

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jR- R T A D O , C. Formação econômica do Brasil *J


iiuuc. i ais lunçoes eram exercidas por aqueles q u e praticavam o ,joiualLmio ou a polí- A dualidade do sistema educacional brasileiro, se, dc: uni lado, representava a d t
tica, razão pela qual as camadas em ascensão ou as camadas dirigentes revelaram p r e - lidade da própria sociedade escravocrata, de onde acabara de sair a República, de o
ferência especial pelas Faculdades de Direito. tro, representava ainda, no fundo, a continuação dos a n t a g o n i s m o s em torno da cc
A cultura transmitida pela escola guardava, pois, o timbre aristocrático". E o .iralização.e.descenlralizaçáo do p o d e r . A vitória dos princípios federalistas q u e c o n s
guardava emYünçaò'das "exatas necessidades da sociedade escravista' -.-Enquanto não :
grou a autonomia dos-poderes estaduais fez- com que o G o v e r n o F e d e r a l / r e s e r v a i
p r e d o m i n a v a m nessa sociedade relações de teor capitalista, n e n h u m a contradição d e do-se u m a parte da tarefa de p r o p o r c i o n a r educação ã nação, não interferisse de 'mor.
caráter excludente pôde ocorrer entre as c a m a d a s q u e p r o c u r a v a m a educação: a aris- algum nos direitos de a u t o n o m i a reservados aos Estados, na c o n s t r u ç ã o de seu sisten:
tocracia rural e os estratos médios. de ensino. Como um n ã o interferia na jurisdição do o u t r o , as ações eram c o m p l e u
A Constituição da República de 1891, q u e instituiu o sistema federativo de gover- mente independentes e, o que era natural, dispares, em m u i t o s casos. Isso acabou gt
no, consagrou também a descentralização do ensino, ou melhor, a dualidade dc siste- rando uma desorganização completa na construção do sistema educacional, ou me
c
m a s , já que, pelo seu artigo 3 5 , itens 3° e 4 , ela reservou à União o direito de "criar ins- lhor, dos sistemas educacionais brasileiros.
a
tituições de ensino superior e secundário nos Estados" e "prover a instrução secundá- A par dessa dualidade, a 1 República lentou várias reformas, sem êxito, para a so
ria no Distrito Federal", o que. c o n s e q u e n t e m e n t e , delegava aos Estados competência lução dos problemas educacionais mais graves. A primeira delas, a dc Benjamin C o n s
para/.prover e legislar sobre educação primária A prática, p o r é m , acabou gerando o se- tatam. a mais ampla, n ã o chegou s e q u e r a ser posta em prática, a n ã o ser cm alguns as
guinte sistema: à União cabia criar e controlar a instrução superior em ioda a nação, pectos. Tentou a substituição do c u r r í c u l o acadêmico por um c u r r í c u l o enciclopédico
b e m c o m o criar e controlar o ensino secundário acadêmico e a instrução em iodos os com inclusão de disciplinas científicas, consagrou o ensino seriado, d e u m a i o r organt-
níveis do Distrito Federal, e aos Estados cabia criar e controlar o ensino primário e o cidade ao sistema todo. atingindo a reforma as escolas primárias, as escolas n o r m a i s , as
ensino profissional, que. na época, compreendia principalmente escolas normais (de secundárias (através da reforma do Distrito Federal), além "do e n s i n o superior, artísti-
nível médio) para moças e escolas técnicas para rapazes. co e técnico, em todo território do p a í s " " e da criação do Pedagogium, centro de aperfei-
Era, p o r t a n t o , a consagração do sistema dual de e n s i n o , q u e se vinha m a n t e n d o çoamento do magistério e "impulsor das relormas". Faltava, p o r é m , para a execução da
desde c Império. Era também uma forma de oficialização da distância que se mostrava, reforma, alem de uma inlraestrutura institucional que pudesse assegurar-lhe a implanta-
na pratica, e n t r e a educação da classe d o m i n a n t e (escolas secundárias acadêmicas e es- ção, o apoio político das elites, que viam nas idéias do reformador uma ameaça perigosa
colas superiores) e a educação do povo (escola primária e escola profissional). Refletia à formação da juventude, cuja educação vinha, até então, s e n d o pautada nos valores e
essa situação u m a dualidade que era o próprio retrato da organização social brasileira. padrões da velha mentalidade aristocrático-ntral. Era toda uma estrutura social e econô-
O q u e , no entanto, não ocorria ao sistema assim consagrado era o fato de a nova socie- mica entrando no processo de formação do povo e colocando-se c o m o entrave à renova-
d a d e brasileira, que despontava c o m a República, já ser mais complexa do que a anteri- ção pedagógica. Se a reforma Benjamin C o n s t a m teve o mérito de r o m p e r "com a antiga
or sociedade escravocrata. Havia vários estratos sociais emergentes. O povo já não tradição do ensino humanístico". não teve, porém, o cuidado de pensar a educação a
abrangia apenas a massa homogênea dos agregados das fazendas e dos p e q u e n o s artífi- partir de uma realidade dada, pecando, portanto, pela base e sofrendo d o s males de q u e
ces e comerciantes da zona urbana: transparecia a heterogeneidade da composição so- vão padecer quase.todas as reformas educacionais que se tentou implantar no Brasil.
cial popular, pela divergência de interesses, origens e posições. Existia ja uma pequena Ademais, é preciso que se leve em conta o nível de preocupação q u e o governo vinha
burguesia, em si mesma heterogênea, u m a camada média de intelectuais letrados ou manifestando para com a reconstrução do sistema educacional. A p r ó p r i a criação do
padres, os militares em franco prestigio, u m a burguesia industrial, ensaiando seus pri- Ministério da Instrução, Correios e Telégrafos, de curta d u r a ç ã o , r e u n i n d o n u m só ór-
m e i r o s passos, e lodo um contingente de imigrantes q u e , na zona urbana, se ocupavam gão a administração de coisas tão dispares, denunciava o grau de i m p o r t â n c i a q u e as-
de profissões q u e definiam classes médias c, na zona rural, se ocupavam da lavoura. sumia, para as classes dirigentes do m o m e n t o , a educação do p o v o .
Estes últimos eram, tanto no q u e respeitava ao nível cultural quanto ao que caracteri-
Outras reformas se seguiram a essa, mas não lograram acarretar n e n h u m a m u d a n -
zava os interesses, bastante diferentes das camadas camponesas que se ocupavam da
ça substancial ao sistema. Algumas delas, como a Lei Orgânica Rivadávia Corrêa, no
economia de subsistência e, mais diferentes ainda, do contingente saído da escravidão.
Governo do Marechal Hermes da Fonseca, em 1911, chegaram até a ocasionar um re-
' T o d o esse complexo organismo -social já não podia compartar-.se.,em i n s m u i ç õ e s de tr
oc£sso na"evolução"do s i s t é r a e'autonomia
caráter simplista. A pressão n ã o tardaria, pois, a provocar a r u p t u r a das limitações im-
- estabelecimentos é suprimir o caráter oficial do ensino, o q u e t r o u x e resultados d e -
postas pela Constituição. B a -instituição da escola,- calcada no,priugspia de .dualidade
social, iria aos poucos ter seus alicerces comprometidos pelo crescimento e complcxi-

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