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c o n t ra a m u l h e r

m o e a v i o l ê n c i a
Como o m a c h i s e E ?
d a s c l a s s e s C , D
v i d a d a s j o v e n s
afetam a
REALIZAÇÃO:
A Énois I Inteligência Jovem, em parceria Descobrimos, entre tantas coisas, que o
com o Instituto Vladimir Herzog e o Instituto machismo ainda está muito presente na base:
Patrícia Galvão, conduziu uma pesquisa com da divisão das tarefas domésticas à relação que
2.285 jovens de 14 a 24 anos, com renda menino e menina estabelecem com o espaço
APOIO: familiar de até R$6.000, moradoras de 370 público. E que, a despeito dos avanços
cidades brasileiras, para descobrir o que é ser conquistados, as meninas ainda são educadas
menina no Brasil, sob a ótica do machismo e num ambiente onde o machismo é velado. 

da violência contra a mulher. A boa notícia? Elas já enxergaram isso 

e querem mudança.
Conversamos com as jovens por meio de
entrevistas em profundidade e de um Veja, nas próximas páginas, 

questionário online. E, além de pesquisarmos o desenrolar dessa história.
a que tipo de violência essa garota já foi
exposta, buscamos compreender
o que ela considera violência.
índice
COISA DE MENINA 03 5.RELACIONAMENTOS 15 e 16

1.RUA = MEDO 04 6. MEDO DA VIOLÊNCIA 17

2. QUANDO TUDO COMEÇA? 05 7.PRECONCEITO 18

3. OS PADRÕES DE COMPORTAMENTO 06 8. CRIAÇÃO 19

4. QUEM MANDA AQUI 07 9. MÍDIA 20

5. TÔ NA MÍDIA 08 10. COMO O MACHISMO 21


AFETOU A SUA VIDA?

DE DENTRO PRA FORA 09


COMO MUDAR? 22
PERFIL 10
O QUE AS MENINAS DIZEM? 23
1. AGRESSÃO FÍSICA 11
NO FUTURO 24
2. AGRESSÃO VERBAL 12
ALGUMAS EXPERIÊNCIAS 25
3. ASSÉDIO SEXUAL 13 PIONEIRAS
4. ASSÉDIO SEXUAL VERBAL 14
coisa
de menina
Não dá pra negar que a mulher conquistou Parece coisa do século passado. Mas 

muita coisa no último século. Da presidência do a verdade é que, para as mulheres, no caso
Brasil ao funk, o empoderamento feminino está desta pesquisa, todas menores de 24 anos,
em pauta. No entanto, dentro de casa, e nos ainda existe uma espécie de certo e errado
primeiros anos de vida, as meninas continuam que dita posturas, aparências,
aprendendo que há "coisas de menino" que comportamento sexual e até anseios de vida.
não devem fazer, que há lugares aonde ela não
pode ir e roupas que ela não deve usar.
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RUA=MEDO
1 "Rua" foi a palavra mais citada nas 2.285 respostas às
perguntas "A violência contra a mulher aparece em
seu dia a dia? Como?". O espaço público é visto, pela
Essa atmosfera de vulnerabilidade tem implicações
importantes na rotina das garotas. “Se vou pegar
transporte público, vou de calça, mesmo que esteja
maior parte das entrevistadas, como um local em que muito calor. Não posso ir de vestido ou shorts porque
não há segurança ou respeito pelas mulheres. 94% com certeza vou ter algum problema no caminho”,

coisa delas já foram assediadas verbalmente e 77%, afirma uma universitária de 19 anos, que todos os dias

de menina
fisicamente. Dos episódios de assédio sexual físico, vai de Taboão da Serra, Grande São Paulo, para o
72% se deram com desconhecidos. São as centro da capital. Outra garota, moradora do bairro de
"encoxadas" no transporte público, o tapa na bunda Heliópolis, em São Paulo, acredita que suas escolhas
durante um passeio, o beijo forçado na balada. 
 são limitadas por esse medo. “Já deixei de ir a muitos
O resultado disso? Medo. lugares e isso é horrível. Você perde parte da sua vida.”

"Sair de casa é sempre uma aventura", afirma uma


jovem de 24 anos, moradora do Rio de Janeiro, que
se lembra de ter ouvido a primeira cantada aos
9 anos. Depois disso, os episódios sempre foram
frequentes. "O medo cresce com a gente.”

Esse sentimento faz parte da realidade das jovens:


90% já deixaram de fazer algo por medo da violên-
cia, especificamente por serem mulheres. E essas
restrições acontecem justamente no espaço público:
elas deixam de sair à noite, de usar determinadas
roupas ou de responder a uma cantada. “Ando na rua
com medo. Se vejo uma moto com dois caras ou um
carro com vidro mais escuro, já fico recuada, sem
saber o que fazer”, conta uma jovem de 20 anos,
moradora de Benevides, no Pará.
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QUANDO TUDO COMEÇA?


2 Cabe perguntar: onde começa essa relação desigual
com o espaço público? Porque homens se sentem tão
à vontade, a ponto de abordar desconhecidas na rua,
Várias entrevistadas relataram ser proibidas
de brincar na rua ou de certas coisas, consideradas
masculinas. Se desafiavam essa imposição, sofriam
e as mulheres se sentem acuadas? preconceito por familiares ou vizinhos: eram
chamadas de "maria machinho”.

coisa É claro que a resposta para essa questão remete a

de menina
anos de disparidade entre os gêneros e exploração A diferença na relação com a brincadeira e
do corpo feminino. Entretanto, chamam a atenção os com o esporte também acontece no espaço escolar.
depoimentos sobre a relação com o espaço público Uma adolescente de 14 anos, de Belém do Pará,
desde a infância. conta que aos 9 anos foi impedida de participar de
um campeonato de futebol. “Perguntei ao professor 

Enquanto meninos são habituados e até incentivados e ele disse que era porque eu era menina”.
a brincarem na rua - jogando bola, empinando pipa
ou andando de skate -, as meninas geralmente têm “Ser menina” limita as possibilidades de escolha
sua circulação restrita. Devem ficar dentro de casa e mesmo quando se é criança, mesmo num ambiente
brincam de casinha ou boneca, que já antecipam as que deveria ser de aprendizado. “Eu nem pude
tarefas domésticas. descobrir se gostava de futebol, se eu era boa. Quem
sabe eu não poderia ser uma jogadora?”, comenta
“Eu e minhas irmãs ficávamos presas, enquanto os outra jovem, moradora de Itaquera, São Paulo.
meninos brincavam na rua, na liberdade. Aí as pessoas
crescem achando que é assim mesmo”, opina uma A relação com o corpo, já nas brincadeiras, também 

jovem de 21 anos, moradora da periferia de Salvador. é diferente. Os meninos "podem" se machucar 

e andam sem camisa. As garotas, mesmo muito
A história se repete em Heliópolis, São Paulo: “Eu pequenas, não participam de jogos mais arriscados
sempre tinha que ficar dentro de casa e os meninos (afinal, isso não é “coisa de menina”), têm que
podiam ir pra rua. Eu gostava de empinar pipa, mas esconder o corpo e já são alertadas sobre qual 

minha mãe não deixava, porque era coisa de menino. a maneira correta de andar e se sentar.
Às vezes ia escondido e, se ela me encontrasse, me
pegava e me botava pra dentro".
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OS PADRÕES DE COMPORTAMENTO
3 Os conceitos do que é certo e errado também são
diferentes para garotos e garotas, principalmente
quando se trata de um contexto afetivo e sexual. Ter
Mesmo com toda a hiperssexualização do corpo
feminino na mídia, com a popularização do funk, com
todos os avanços desde a revolução sexual nos anos
mais de um parceiro pode ser motivo de orgulho para 1960, a liberdade sexual de uma jovem, no Brasil, é
eles, mas quase sempre causa vergonha às meninas. vista com maus olhos. O ideal de castidade ainda

coisa “São dois pesos, duas medidas. Se é um cara que faz ronda as mulheres.

de menina
algo, 'faz parte de sua natureza'; se é a mulher, é
'culpada'”, opina uma entrevistada de 24 anos, “Tenho medo da reação da minha família quando
de São Paulo. souberem que não sou mais virgem, tenho medo,
muito medo, de ser abandonada por eles”, revela uma
Essa culpabilização da mulher aparece em diferentes garota de 21 anos, de São Luís do Maranhão.
cenários. Do assédio na rua ao comportamento
sexual. Uma jovem de 18 anos, moradora de Campo Essa visão faz com que muitas meninas sejam presas
dos Goytacazes, Rio de Janeiro, resume: “Minha mãe dentro de casa. “Meus irmãos começaram a sair muito
me impede de usar certas roupas porque estarei ‘me mais cedo do que eu, acho isso errado”, conta uma
insinuando’. Também me sinto oprimida por não adolescente de Brasília. “Os pais seguram ao máximo
poder expor meus desejos porque serei chamada as meninas em casa. E, se possível, só as deixam sair
de ‘puta'”. se for com um namorado fixo, em quem confiem. É
uma propriedade: antes ela é dos pais, depois do
Um exemplo de como o comportamento sexual das namorado”, opina uma universitária de Franco da
mulheres ainda é tabu é o “Top 10 do Whatsapp”, Rocha, São Paulo.
uma lista com nomes e fotos de 10 meninas e
comentários difamatórios, todos de cunho sexual, O homem, ao contrário, pode – e deve – ter e expor
sobre elas. Aconteceu com uma garota de 18 anos, seu desejo sexual, seja com as parceiras, seja com
de Heliópolis. “Eles ficam passando um pro outro, desconhecidas, por meio das cantadas. “Uma frase
pelo celular. Fiquei muito mal, passei alguns dias que acho horrível, que já ouvi da minha própria mãe, é
fechada em casa, sem ir pra escola. As pessoas ‘Segurem suas cabras porque meus bodes estão à
mexiam comigo na rua.” solta’”, conta uma jovem de 19 anos. Fala que reforça
que a educação familiar alimenta estereótipos e pode
cercear a liberdade das jovens.
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QUEM MANDA AQUI


4 Essa diferenciação tem resultados nos relaciona-
mentos, nos homens que percebem as parceiras
como propriedade. “Aos 14 anos comecei a namorar
A pressão pra se ter um companheiro, também
muito citada entre as entrevistadas, é outro
estímulo. “A mulher, principalmente na periferia, tem
um cara de 18, que fazia questão de dizer que tinha que ter homem, se não ela perde seu valor, é vista
me ‘pegado pra criar’. Desde o início, ele me proibia como um ser desprotegido. Acho que muitas

coisa de fazer diversas coisas, como sair com amigas, ter aceitam relações assim porque não querem ficar

de menina
amigos homens, sair sem ele”, conta uma estudante sozinhas”, relata uma jovem do Rio de Janeiro.
de jornalismo de 19 anos, de São Paulo. Quando ela
começou a enfrentar o parceiro, as brigas se
intensificaram e ele acabou batendo nela. “Só depois
fui perceber que aquele controle já era algo violento”.

Justamente por crescerem em uma sociedade


extremamente desigual, muitas jovens não percebem
que estão em um relacionamento abusivo, mesmo
que não envolva agressão física. Muitas vezes, a
violência psicológica está dentro de casa: “Minha mãe
vive uma violência que acaba me afetando. Meu pai
deturpa tudo em sua mente, diz que quando ela sai
pra trabalhar é pra se prostituir, que eu e meus irmãos
não somos filhos dele. Ela é serva dele, escrava sexual
e se algo não está bom é motivo para quebrar a casa”,
conta uma adolescente de 17 anos, moradora de
Bebedouro, São Paulo.
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TÔ NA MÍDIA
5 Além da educação familiar, outro fator importante na
criação e reprodução de estereótipos femininos é a
mídia. Se no dia a dia a mulher ideal é “casta”, tem
“Desde os 10 anos, tenho crises com o meu peso.
Emagreci drasticamente, fiz regimes doidos, já vomitei
muito depois de comer. A reprodução da mulher na
poucos parceiros ao longo da vida e “se dá o mídia tem grande papel na minha história com meu
respeito”, na mídia seu corpo é objetificado e corpo, onde não há (e não acho que vá haver) paz”,

coisa hiperssexualizado. desabafa uma jovem de 23 anos.

de menina 86% das entrevistadas afirmam não se sentirem


representadas na mídia e os motivos são os mais
E, mais uma vez, as garotas que saem do padrão
estabelecido sofrem preconceito. É o que vive, dentro
de casa, uma jovem de Cotia, depois que decidiu
diversos. “O que mais incomoda são as propagandas
que usam o corpo da mulher pra vender um produto. deixar crescer os pelos das pernas e das axilas.
Um clássico, claro, são as de cerveja”, afirma uma “Sempre surgem perguntas como 'o que você quer
universitária de São Paulo. com isso? Virar homem?'. Também sou duramente
atacada por ter cortado o cabelo tão curto, porque
A estereotipação não se limita ao corpo: “[Na mídia,] com isso eu estou 'espantando os rapazes’.”
a mulher está sempre como a que gosta de casar, ter
filhos, cuidar da casa, faz ‘coisas de mulher’. É a que
não entende de ciências exatas e não sabe trocar uma
lâmpada”, afirma jovem de São Paulo.

“Todas brancas são ricas. Pobre e/ou negra é a


empregada”, comenta uma jovem de 21 anos, sobre o
racismo na dramaturgia televisiva. Alimenta-se, então,
um ideal de cor, cabelo e corpo que implicam um
enorme sacrifício por parte das mulheres e problemas
de autoestima.
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DE DENTRO PRA FORA


O que os números desta pesquisa – detalhados Podemos perceber uma evolução, entretanto,
nas páginas a seguir – revelam é um cenário de no que diz respeito à percepção do machismo.
machismo muito forte, mesmo entre as mulheres Para essas jovens, a violência vai muito além
mais jovens, e principalmente dentro de casa. do tapa na cara. Ela está nos atos mais sutis, no
Esses padrões de comportamento acabam por preconceito, na impossibilidade de executar
naturalizar atos de violência, como o assédio no certas tarefas, no medo de sair sozinha.
espaço público e o abuso dentro de relaciona-
mentos afetivos. Essa percepção é extremamente importante,
porque mostra que situações antes tidas como
Além disso, essa desigualdade impede que normais estão sendo questionadas e criticadas
meninas tenham certas experiências e explorem justamente por quem sofre com elas.
seu potencial, seja para brincar, estudar ou O primeiro passo para a mudança.
explorar sua sexualidade. E, claro, o machismo
também traz consequências para os meninos,
impelidos a terem um comportamento mais
agressivo e sexual.
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DAS ENTREVISTADAS
| 11

3.
2. AGRESSÃO
AGRESSÃO VERBAL
FÍSICA
1. AGRESSÃO FÍSICA

41% JÁ SOFRERAM AGRESSÃO


FÍSICA POR HOMEM

desses, os mais citados foram: “Quando tinha 16 anos, o então marido da “Um ex-namorado, no meio
minha avó, bêbado, a agrediu e eu tentei de uma briga, me deu um chute.”
defendê-la. O atingi com uma caneca de 19 anos, São Paulo, SP
51% por algum familiar porcelana que estava ao meu alcance e ele
me deu um soco.” “Nunca sofri nada em casa, mas na rua e em

38% por parceiro 24 anos, Macapá, AP

“Eu tenho um tio muito violento, que


festas, sim. Já levei um soco por não querer
beijar um menino.”
18 anos, Santa Maria, RS
23% por amigo/colega já foi pra cima da minha vó. Mas na
favela é diferente, não dá pra “Eu apanhava do meu namorado em todas
por professor ou
3% superior da escola
chamar a polícia.”
18 anos, Rio de Janeiro, RJ
as brigas. Hoje, com a distância, ele só
pratica a psicológica, mesmo…”
por chefe ou 
 19 anos, Blumenau, SC
3% colega de trabalho
3% por desconhecido
| 12

3.
2.AGRESSÃO
AGRESSÃO VERBAL
FÍSICA
2. AGRESSÃO VERBAL

JÁ SOFRERAM
84% AGRESSÃO VERBAL
POR HOMEM

"Na rua, por mais de uma vez fui agredida. “Hoje, sofro violência psicológica vinda
Uma vez um homem ameaçou jogar um do meu companheiro. Já fui agredida por
saco de cimento em mim." ele mas não consegui terminar.”
24 anos, São Paulo, SP 18 anos, Porto Alegre, RS

“Acontece muito de um cara mexer na rua “Meu tio me chamava de várias coisas:
e, se você não dá atenção, vira a cara ou inferior, pateta, merda. Se eu saísse com
reage, o cara te xinga, chama de acabada, um vestido mais curto, ele dizia que eu era
vagabunda, coisas bem fortes. Às vezes vulgar, não prestava. Eu tinha 12 anos,
eles perseguem, vão atrás, mesmo.” ficava muito pra baixo.”
21 anos, Salvador, BA 14 anos, Belém, PA
| 13

3.
2. AGRESSÃO
AGRESSÃO VERBAL
FÍSICA
3. ASSÉDIO SEXUAL

AFIRMAM JÁ TER
77%
POR CONHECIDO
SIDO ASSEDIADAS
SEXUALMENTE
NO ESPAÇO PÚBLICO
desses, desses,
“Quando eu tinha cinco anos, fui abusa- “Um cara já chegou a passar a mão em

10% da e nunca contei a ninguém. Cresci


com o sentimento de culpa e o pior foi 72% minhas nádegas e xingou, ameaçando
me bater quando protestei. Estava com
quando tinha uns oito anos e escutava minha mãe e meu irmão, de 4 anos na
por familiares muito que 'quem usa roupa pequena já foram época, numa tarde de sábado,
pede pra ser estuprada'. E na minha assediadas por voltando do mercado.”
6% cabeça eu pensava 'mas eu tinha cinco
anos, era uma criança’.” desconhecidos 24 anos, São Paulo, SP

16 anos, São Paulo, SP “Quando tinha uns 16 ou 17 anos


pelo parceiro “Assédio no ônibus ou estava no ônibus sentada quando um
“Fui molestada quando criança metrô sempre acontece. imbecil, ao passar por mim, aproveitou
9% por um homem idoso.”
16 anos, Campinas, SP
Antes não reagia, come-
cei a reagir agora, por-
para apalpar meu seio, e em seguida
desembarcou. Lembro que não tive
“Sofri um abuso na infância, pelo que passei a me valo- reação, não sabia se gritava ou falava
por amigo meu padrasto. Mas minha mãe não rizar. É uma questão de alguma coisa, olhava incrédula pras
ou colega acreditou, disse que eu provavel- autoestima. Meu corpo pessoas ao redor que não perceberam
mente tinha provocado ele.” não é público.” ou fingiram não ver.”
20 anos, São Paulo, SP 21 anos, São Paulo, SP 23 anos, Curitiba, PR
| 14

4. 3.
2. AGRESSÃO
AGRESSÃO VERBAL
FÍSICA
ASSÉDIO SEXUAL VERBAL

FORAM
94% ASSEDIADAS
VERBALMENTE

“Aos 9 anos de idade ouvi o meu primeiro VOCÊ CONSIDERA ESSE TIPO DE "CANTADA" OU ELOGIO,
"te chupo todinha". Ir ao trabalho, ao FEITO POR DESCONHECIDOS, UM TIPO DE VIOLÊNCIA?
mercado, à faculdade, é sempre uma
aventura, você nunca sabe o que vai ouvir,
com quem vai lidar, se vai sair calada ou
se um dia vai botar tudo pra fora e gritar
com o desgraçado. Se está segura ou não.
73% SIM 5% NÃO
“Acho que é, mas é difícil ter noção de “Chamar de “gostosa” não é violência,
O medo cresce com a gente.” que é violência quando você está é falta de educação. Acho que o povo
24 anos, Rio de Janeiro, RJ acostumado com isso. Acontece toda dá mais importância a isso do que
hora, com todo mundo, amigas, minha realmente tem. Se eu tô com shortinho
“Uma vez, dois caras de bicicleta irmã. Só depois você percebe o que apertadinho, decotão, eu tô querendo
passaram por mim e um deles falou: ‘Que aconteceu e que você não fez nada.” chamar a atenção.”
delícia de novinha’. O outro notou minha 19 anos, Taboão da Serra, SP 24 anos, São Paulo, SP
aliança e falou ‘Ei, para com isso, a guria é
casada’. Então eu não mereço respeito,
mas meu namorado sim?”
15 anos, Paranaguá, PR
22% DEPENDE DO CASO
| 15

3.
2. AGRESSÃO
AGRESSÃO VERBAL
FÍSICA
5. RELACIONAMENTOS

É VIOLÊNCIA?
A. Em um relacionamento, seu 
 B. Em um relacionamento, seu c. Em um relacionamento, seu
parceiro já quis controlar suas amizades parceiro já quis que você trocasse parceiro já quis acessar ou acessou
ou os lugares em que você ia? de roupa pra sair? seu celular/e-mail/redes sociais?

57% SIM 39% SIM 55% SIM


43% NÃO 61% NÃO 45% NÃO
69% consideram que esse
tipo de controle é um
ato violento
“Eu tinha que viver pra ele, só olhar pra ele.
72% consideram que esse
tipo de controle é um
ato violento
“Já ouvi de namorado que ele ia passar
64% consideram que esse
tipo de controle é um
ato violento
“A partir do momento que você começa
Se eu falava com outras pessoas ele já vergonha por causa da roupa que eu estava investigar uma pessoa, ver se ela tá
fechava a cara, não podia falar com usando, porque todo mundo ia ficar olhando mentindo ou não, isso é uma violência.”
ninguém.” pra mim e seria ruim para ele.” 19 anos, Taboão da Serra, SP
21 anos, Salvador, BA 20 anos, Benevides, PA
| 16

3.
2. AGRESSÃO
AGRESSÃO VERBAL
FÍSICA
5. RELACIONAMENTOS

JÁ FORAM FORÇADAS
47% O SEXO NÃO CONSENTIDO
A TER RELAÇÕES SEXUAIS
COM O PARCEIRO

“A gente acha que tem que satisfazer o “Fiz porque achei que tinha “Minha mãe vive um violência psicológica 

parceiro. Aconteceu algumas vezes do que agradá-lo.” e verbal que acaba me afetando. Meu pai
meu ex-namorado me pegar contra minha 19 anos, São Paulo, SP deturpa tudo em sua mente, diz que quando 

vontade. Na época eu não sabia que ela sai pra trabalhar é pra se prostituir e se
aquilo estava errado.” encontrar com amantes, que eu e meus irmãos
“Sinto que é violência quando meu não somos filhos dele. Ela é serva dele, escrava
21 anos, Salvador, BA
parceiro acha que eu tenho que sexual e se algo não está bom é motivo para
fazer sexo.” quebrar a casa.”
“Os caras insistem no sexo mesmo 21 anos, Osasco, SP 17 anos, Bebedouro, SP
sabendo que eu bebi ou que não estou
em condições de decidir.”
18 anos, Macapá, AP
| 17

3.
2.AGRESSÃO
AGRESSÃO VERBAL
FÍSICA
6. MEDO DA VIOLÊNCIA

JÁ DEIXARAM DE FAZER

O QUÊ?
90% ALGUMA COISA COM
MEDO DA VIOLÊNCIA

31% SAIR A NOITE


“Eu tenho medo de sair de casa à noite,
de ficar em locais fechados sozinha com
“Aqui no Pará está acontecendo
muito de homens em carros raptarem
homens e até mesmo receio em me mulheres. Então, ando na rua com medo.
aproximar deles. Fazia engenharia Se vejo uma moto com dois caras ou um
27% USAR DETERMINADA ROUPA
mecânica e, sendo um ambiente majori-
tariamente masculino, eu era constan-
carro com vidro mais escuro, já fico
recuada, sem saber o que fazer.”
temente ‘bullinada’ por ser mulher, negra 20 anos, Benevides, PA
23% RESPONDER A UMA CANTADA
e lésbica, até mesmo por meus ‘amigos’.”
20 anos, Curitiba, PR “Já deixei de sair à noite ou passar em
determinado lugar. Tem um lugar aqui

1% SE CANDIDATAR A UMA
"Se vou pegar transporte público, vou
de calça, mesmo que esteja muito calor.
perto que foi apelidado de 'beco do
estupro' porque é superescuro e fica do
VAGA DE EMPREGO Não posso ir de vestido ou shorts porque lado de um matagal.”
com certeza vou ter algum problema 24 anos, São Paulo, SP

12% OUTROS
no caminho. Meus pais também
reclamam se eu for.”
“A gente anda com medo na rua, não se
sente confortável. Outro dia um cara me
19 anos, Taboão da Serra, SP
seguiu até em casa, falando coisas.”
14 anos, Belém, PA
| 18

3.
2.7AGRESSÃO
AGRESSÃO VERBAL
FÍSICA
. PRECONCEITO

DISSERAM QUE JÁ

ONDE?
82% SOFRERAM PRECONCEITO
POR SER MULHER

desses, “O chefe pede pra limpar o “Sinto o machismo principalmente em


chão só porque você é a única questões profissionais, por essa coisa da

39% 14% mulher presente.”


20 anos, Foz do Iguaçu, PR
mulher engravidar. Minha mãe é motorista
e sempre tem problema com isso. Eu
estou fazendo um curso de manutenção
na escola no trabalho “Durante a faculdade, já dei de cara com em computadores e sou a única mulher, aí
ou faculdade aqueles professores machistas que soltam os caras falam que eu não devia estar lá.”
pérolas como 'vocês mulheres são 20 anos, Benevides, PA
depósitos de esperma’.”
23 anos, Alagoinhas, BA “Eu tenho uma banda e fazia judô. Nos
dois casos, não botavam fé em mim, não
acreditavam que eu podia ser boa porque
eu era mulher.”
18 anos, São Paulo, SP
| 19

3.
2.AGRESSÃO
AGRESSÃO VERBAL
FÍSICA
8. CRIAÇÃO

74% SENTIRAM TRATAMENTO


DIFERENCIADO DENTRO DE
CASA, POR SER MULHER

“Meu pai sempre considera que quem “Por ser mulher, devo sempre servir ao “É uma casa com três mulheres e um
deve arrumar a casa sou eu, minha irmã meu irmão mais velho e ao meu pai. Me homem, meu irmão mais novo. A opres-
ou minha mãe, e nunca ele ou meu calar perante às falas deles, não posso são aparece na forma como a minha mãe
irmão. Meus tios comentam que acham falar sobre política, futebol, não posso e a minha tia se sujeitam aos papéis
incrível eu 'ser tão inteligente' mesmo jogar sinuca.” femininos tradicionais e em como tentam
sendo mulher...” 22 anos, Crato, CE estabelecê-los a mim (controlando
23 anos, Salvador, BA roupas, pelos, comportamentos, etc).”
“Eu não tive infância. Com seis anos, tive 24 anos, Florianópolis, SC
“Quando chego em casa tarde por que cuidar do meu irmão, de 5, e da
qualquer motivo, sou vítima de insultos minha irmã, de 2. Então tive que largar a
por estar 'vadiando', 'não ajudando em escola, não brincava, não criei laços de
casa' ou simplesmente ouço 'isso não é amizade. Cuidava deles e da casa, tinha
hora de menina estar na rua’.” que ir pra beira do fogão.”
20 anos, São Paulo, SP 20 anos, Benevides, PA
| 20

3.
2.AGRESSÃO
AGRESSÃO
9. MÍDIAVERBAL
FÍSICA

86% NÃO SE SENTEM


REPRESENTADAS
NA MÍDIA

"Me sinto alheia, pois a mulher está “A maneira como a mulher é retratada e "Desde os 10 anos, quando notei que
sempre como a que gosta de casar, ter tratada nas mídias. Pois isso só era gordinha, tenho crises com o meu
filhos, cuidar da casa, faz 'coisas de reforça a imagem dela na sociedade, peso. Emagreci drasticamente, fiz
mulher'. É a que não entende de ciências como o sexo frágil, que necessita de regimes doidos, já vomitei muito depois
exatas e não sabe trocar uma lâmpada.” 'proteção' do homem e por isso pode de comer, e até hoje se não estou (no
21 anos, Santos, SP ser tratada como uma propriedade.” mínimo) 10 quilos abaixo da minha altura
24 anos, Belo Horizonte, MG em centímetros, vou fazer alguma dieta
"Todas brancas são ricas. Pobre e/ou restritiva. A reprodução da mulher na
negra é a empregada." mídia tem grande papel na minha
21 anos, Rio de Janeiro, RJ história com meu corpo, onde não há (e
não acho que vá haver) paz."
23 anos, São Paulo, SP
| 21

10. COMO 3.
2.AGRESSÃO
AGRESSÃOVERBAL
FÍSICA
O MACHISMO AFETOU A SUA VIDA?

77% ACHAM QUE O


MACHISMO AFETOU SEU
DESENVOLVIMENTO

“Minha família é muito machista e sempre “Fazem uma lista de 'top 10' do “Acho que afetou minha vida porque
fez distinção entre o que eu podia fazer e Whatsapp, com nomes de meninas e eu poderia ter tido outras vivências,
o que meus irmãos podiam. Eu nunca coisas sobre elas, mesmo que não seja coisas que não fiz por viver em uma
pude desenvolver as mesmas atividades verdade e ficam passando um pro outro. sociedade machista.”
ou frequentar os mesmos lugares, e isso Aconteceu comigo, há alguns meses. 21 anos, Salvador, BA
acabou impactando muito em minhas Fiquei muito mal, passei alguns dias
escolhas e comportamento, tanto fechada em casa, sem ir pra escola. As
profissional quanto pessoal. Pra mim, de pessoas mexiam comigo na rua.”
certa forma, isso é violência contra a 18 anos, São Paulo, SP
mulher, pois é uma obstrução de quem
você é e do que pode fazer.” “Já deixei de ir a muitos lugares
20 anos, Guarulhos, SP e isso é horrível, você perde parte
da sua vida.”
“Eu não confio em homens. Tenho 18 anos, São Paulo, SP
dificuldade de me relacionar com eles.”
21 anos, Franco da Rocha, SP
| 22

COMO MUDAR?
COMO MUDAR? | 23

“Eu tô cansada de viver isso! Li 
 “Na escola, os professores são


uma vez que ao invés de você tentar machistas. Acho que a escola
mostrar a um homem o que é o deveria discutir isso, falar de
movimento feminista, você deve igualdade de gênero, porque
trocá-lo por empoderar duas ela é a base, é ela que forma
mulheres, e é isso que eu busco 
 cidadãos, então deveria
fazer todos os dias.” cumprir esse papel.”
18 anos, Campo dos Goytacazes, RJ 14 anos, Belém, PA

O que
“Uma educação menos machista, de
igualdade. É preciso que existam mulheres

as meninas
pensando políticas públicas para mulheres, e
mulheres dirigindo empresas também. Que
as mulheres estejam em todos os espaços.”

dizem? 20 anos, São Paulo, SP

“Acho que a gente tem que preparar


mais as mulheres para que elas não
criem filhos machistas e que não
tolerem maridos machistas também.
E acho que o feminismo deveria ser
abordado na escola.”
20 anos, São Paulo, SP
COMO MUDAR? | 24

Transformar uma cultura não é tarefa mite que a informação seja


simples. O machismo está disseminada de forma ampla e
impregnado nos hábitos mais irrestrita. O outro – ainda que
simples, nos comentários mais sutis. subutilizado – é a escola.
Mas, como a escritora nigeriana
Chimamanda Ngozi Adichie nos De um lado, é preciso que

no futuro
lembra, “A cultura não faz as pessoas. professores e coordenadores sejam
As pessoas fazem a cultura”. orientados a não reproduzir
É possível mudar, e é preciso estereótipos dentro do ambiente
trabalhar para isso todos os dias, escolar. Dentro de salas, quadras e
atacando cada um dos hábitos e laboratórios, não pode haver coisas
comentários que, por mais inocentes de menino ou de menina. E, quando
que possam parecer, perpetuam uma surgirem conflitos relacionados a
condição desigual e violenta para gênero, o assunto deve ser abordado
todas as mulheres. de forma clara, para que sejam
convertidos em aprendizado. Mas,
“Nós ensinamos as meninas a Esta pesquisa apontou que muitas além disso, é preciso que o tema seja
sentirem culpa. ‘Feche as pernas’, ‘Se famílias ainda reproduzem, com suas tratado de forma transversal e como
cubra’. Fazemos com que elas sintam filhas e filhos, o preconceito, que política pública.
acaba por alimentar e permitir que a
que, por nascerem mulheres, elas já
violência contra a mulher ocorra. Algumas experiências pioneiras
são culpadas de algo. Então, garotas
Ainda assim, existem espaços onde apontam caminhos:
se transformam em mulheres que essa discussão está sendo feita. Prova
não conseguem enxergar que têm disso é a percepção das jovens sobre
desejos. Mulheres que se calam.” o tema – mesmo nas famílias com
Chimamanda Ngozi Adichie culturas extremamente machistas. Um
desses espaços é a internet, que per-
COMO MUDAR? | 25

algumas experiências pioneiras


Coletivo Não sou 
 Gênero
matrimanas uma gracinha na escola
1 2 3
Na Escola Técnica Estadual Albert Na Escola Nossa Senhora das Graças, Um grupo de jovens do segundo ano
Einstein, zona norte de São Paulo, em São Paulo, alunas do Ensino do ensino médio da escola Lourenço
um grupo de 20 alunos - homens e Médio criaram o Coletivo Eu não Sou Castanho, em São Paulo, organizou 

mulheres - se encontra semanalmente uma Gracinha, em referência ao um projeto que trabalha temas
para debater questões como gênero, apelido do colégio. Entre outras relacionados a gênero e feminismo 

feminismo negro e aborto: o Coletivo atividades, as meninas organizam em formato de monografia.
Feminista Matrimanas. aulas para os estudantes do Ensino E agora, um coletivo feminista formado
Fundamental, em que debatem pelas alunas e algumas professoras
feminismo, machismo e preconceito. está se reunindo para discutir gênero
E, uma vez por mês, elas convidam os com as crianças.
meninos para conversarem sobre o
papel do homem dentro do
feminismo.
COMO MUDAR? | 26

algumas experiências pioneiras


É tudo Professora Política 

brincadeira, feminista pública
4 #sqn 5 6
A pedagoga Edna Telles, que dedicou Ileana Jiménez, fundadora do blog A Austrália lançou, em 2010, um plano
seu mestrado a estudar os significa- Feminist Teacher, trabalha há 13 anos nacional chamado Respectful
dos de gênero nas práticas escolares, dando aula de literatura inglesa em Relationships para trabalhar a violência
desenvolveu uma iniciativa em uma uma escola de Nova York. Os títulos contra a mulher dentro das escolas,
escola municipal da periferia de São dos livros que seleciona, no entanto, como forma de política pública. Na
Paulo, com alunos do 1º ao 5º ano do são todos dentro de temas como cartilha, o governo apresenta uma
Ensino Fundamental. Duas vezes por feminismo, gênero e literatura LGBT. base teórica sobre feminismo para que
semana, cada turma saía da sala para A partir da leitura, ela propõe os professores utilizem o tema de
brincar, mas com um detalhe: em um discussões que promovem o debate forma transversal no currículo escolar.
dia, todos brincavam com bonecas e sobre equidade e justiça nas salas de
utensílios domésticos; no outro, se aula.
divertiam com carrinhos e bonecos.
O objetivo era justamente descons-
truir, por meio dos brinquedos, a
ideia de que há coisas “de menino”
e “de menina”.
REALIZAÇÃO: APOIO:

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