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MECÂNICA QUÂNTICA

FORMALISMO
(Parte 1)

Parte de notas de aulas relacionadas à disciplina FIS 660-Mecânica Quântica,


do curso de Mestrado em Física da Universidade Federal de Viçosa durante os
anos de 2001 a 2005. O conteúdo é equivalente a aproximadamente 6 aulas. O
texto é baseado no livro “Modern Quantum Mechanics” de J.J. Sakurai,
adotado nessa disciplina durante o período acima mencionado.

Prof. Afrânio Rodrigues Pereira


Departamento de Física, Universidade Federal de Viçosa,
Viçosa, 36570-000, Minas Gerais.
Email: apereira@ufv.br

1
MECÂNICA QUÂNTICA
(Aulas 3 e 4: Introdução ao Formalismo Matemático da Teoria)
Na aula passada vimos, com o exemplo do experimento de Stern-
Gerlach em seqüência, que é impossível determinarmos (medirmos)
simultaneamente as componentes Sx , Sy ou Sz do spin do elétron. Mais
precisamente, podemos dizer que a seleção do feixe Sx (ver figura abaixo) pelo
segundo aparato SGx destruirá completamente qualquer informação prévia a
respeito de Sz . Deve ficar claro na cabeça do estudante que a limitação
encontrada na determinação de duas componentes do spin ( Sx e Sz por
exemplo) não é devida à incompetência do Físico experimental . Tal limitação é
inerente ao próprio experimento e ao fenômeno microscópico.
Sx+
Sz+

Sz+ SGz
SGx Sz -

Forno SGz Sx -

Sz - Fig.1. Experimento
SG em seqüência.

Para tratar esse fenômeno (sem análogo na Física clássica) de uma


maneira quantitativa, o livro do Sakurai introduz uma matemática bastante
conhecida de soma vetorial aplicada à polarização da luz. Essa analogia entre
o problema dos spins apresentado acima e a polarização da luz é apenas
matemática e servirá para indicar o caminho a seguir para tratarmos de
fenômenos quânticos.
A teoria eletromagnética de Maxwell considera a luz , bem como todas
as demais radiações eletromagnéticas, uma onda transversal ( isso significa
que os campos elétricos e magnéticos estão vibrando em uma direção
perpendicular à direção de propagação da luz ; ver figura 2).

Fig. 2. “Fotografia” instantânea


de uma onda plano-polarizada
mostrando os vetores campos
elétrico (setas azuis) e
magnético (setas vermelhas)
ao longo de um raio.

Um feixe de luz polarizado pode ser obtido deixando-se passar luz não
polarizada (ver figura 3) por um filtro polaróide (placa polarizadora). Filtro que
seleciona um feixe polarizado na direção x, é chamado filtro–x. Obviamente, se
rodarmos o filtro-x por 900 sobre a direção de propagação z, ele se torna um
filtro-y (para uma revisão desse assunto, consulte os seus livros de Física
básica). Consideremos uma onda de luz se propagando na direção z. Um feixe
de luz linearmente polarizado com vetor polarização na direção x (onda x-
polarizada), tem vetor campo elétrico oscilando na direção x dado por
2
r
E = E 0 xˆ cos(kz − ωt ) , (1)
e da mesma forma, uma onda de luz y-polarizada , também se propagando n
direção z tem
r
E = E 0 yˆ cos(kz − ωt ) . (2)

r
E

**

Fig.3. Luz polarizada (esquerda) e luz não polarizada (direita)

Um fato bastante conhecido é o seguinte : quando deixamos um feixe de


luz não polarizada passar através de um filtro-x e subseqüentemente ele
atinge um filtro-y, nenhuma luz resultará atrás das placas, é claro, se as placas
polarizadoras tiverem 100% de eficiência ( ver fig. 4 ).

Polarizador 1
(filtro-x)

Polarizador 2
(filtro-y)

Fig. 4. A luz não polarizada não é transmitida através de placas cruzadas

A situação é mais interessante quando inserimos um terceiro filtro entre os


filtros x e y . Se chamarmos esse polarizador de filtro-x’ e considerarmos que
ele faz um angulo de 450 com a direção x no plano xy, temos a seguinte
representação (Fig. 5):
3
Luz não polarizada

Luz x-polarizada

Luz x’-polarizada

Luz y-polarizada

Fig. 5. Um terceiro filtro-x’ destruirá qualquer informação prévia sobre a polarização da luz.

Podemos então concluir que a seleção do feixe x’-polarizado feita pelo


segundo polarizador (filtro-x’) destruirá qualquer informação prévia sobre a
polarização da luz. Note que essa situação é bastante parecida com a situação
encontrada anteriormente com o experimento de Stern-Gerlach, se fizermos a
seguinte correspondência :

Átomos Sz ± Luz polarizada x , y

Átomos Sx ± Luz polarizada x’ , y’

Y
Y’
ŷ X’
yˆ ′ xˆ ′
Fig.6. Sistema de
coordenadas
x̂ X

Usando a figura acima, é fácil ver que

⎡ 1 1 ⎤
E 0 xˆ ′ cos(kz − ωt ) = E 0 ⎢ xˆ cos(kz − ωt ) + yˆ cos(kz − ωt )⎥ , (3)
⎣ 2 2 ⎦

⎡ 1 1 ⎤
E 0 yˆ ′ cos(kz − ωt ) = E 0 ⎢− xˆ cos(kz − ωt ) + yˆ cos(kz − ωt )⎥ . (4)
⎣ 2 2 ⎦
Assim, no arranjo de três polarizadores mostrado na figura 5, o feixe saindo do
primeiro polarizador é um feixe x-polarizado, que pode ser considerado como
uma combinação linear de um feixe x’-polarizado e um feixe y’-polarizado . O
4
segundo polarizador seleciona um feixe x’-polarizado , que novamente pode
ser considerado como uma combinação linear de um feixe x-polarizado e um
y-polarizado. Finalmente o terceiro polarizador seleciona uma componente y-
polarizada.
A aplicação da correspondência para a experiência de Stern-Gerlach em
seqüência sugere que podemos ser capazes de representar o “estado-spin”
dos átomos de prata por algum tipo de vetor em um novo tipo de espaço
vetorial bidimensional, um espaço vetorial abstrato. Assim, da mesma forma
que x̂ e ŷ são vetores bases unitários usados para decompor o vetor
polarização xˆ ′ da luz x’-polarizada, é razoável representar o estado Sx + por
um vetor, que chamaremos ket. Tais vetores ket’s serão nossos instrumentos
de trabalho dentro da notação de Dirac que será desenvolvida mais tarde. Nós
denotaremos esse vetor ket pelo símbolo ⎜Sx ; + > e o representaremos como
uma combinação linear de dois vetores base ⎜Sz ; + > e ⎜Sz ; − > fazendo a
seguinte conjectura

1 1
? ⎜Sx ; + > = ⎜Sz ; + > + ⎜Sz ; − >, (5)
2 2

1 1
? ⎜Sx ; −> = − ⎜Sz ; + > +
⎜Sz ; − >, (6)
2 2
em analogia com as equações (3) e (4) para o campo elétrico. Assim, a
componente não bloqueada que sai do segundo aparato (que sai de SGx) será
considerada como uma superposição de Sz + e Sz – no sentido expresso pelas
equações (5) e (6). Matematicamente, é por essa razão que as duas
componentes emergem do terceiro aparato (SGz).

ESPAÇO BIDIMENSIONAL (X,Y) ESPAÇO VETORIAL ABSTRATO 2D

1) Vetores da base: xˆ , yˆ 1) vetores da base : ⎜Sz ; +>, ⎜Sz ; −>


2) Qualquer vetor pode ser 2) Qualquer vetor nesse espaço pode
escrito como combinação ser escrito como uma combinação
linear dos vetores da base. linear desses vetores da base.

Agora devemos saber como escrever ⎜Sy ; +> e ⎜Sy ; −>. Note que as
possibilidades de combinação linear com uma base 2D já foram esgotadas
nas equações (5) e (6). Será mesmo?! Na realidade, foram esgotadas
apenas as possibilidades com coeficientes reais ! Aqui, Sakurai fará outra
analogia com a polarização da luz. Vejamos!

Polarização Circular
Matematicamente, como podemos representar uma luz circularmente
polarizada? Veja a figura 7! Imagine duas ondas plano-polarizadas, uma x-
polarizada e outra y-polarizada, defasadas por 900. O campo elétrico
resultante pode ser escrito como :

5
r ⎡ 1 1 π ⎤
E = E0 ⎢ xˆ cos(kz − ωt ) + yˆ cos(kz − ωt ± )⎥ . (7)
⎣ 2 2 2 ⎦
Essa equação é mais elegantemente escrita empregando a notação
complexa:
r ⎡ 1 i ⎤
E = Re E 0 ⎢ xˆe i ( kz −ωt ) ± yˆ e i ( kz −ωt ) ⎥ , (8)
⎣ 2 2 ⎦
onde usamos i = e iπ / 2 .
X

Y 1
2

3
4

5
6

7
x
y

1
2
3
4
5
Fig.7. Uma onda circularmente polarizada 6
à direita. Note o giro do vetor campo 7
elétrico representado nos quadrados de 1 8
a 8 e compare com a figura. Considere
que o feixe caminhe em sua direção.

Podemos definir :

Luz circularmente polarizada Luz circularmente polarizada


à direita à esquerda
quando o fim do vetor campo quando o fim do vetor campo elétrico
elétrico (se a luz vem em nossa (se a luz vem em nossa direção)
direção) circula no sentido anti- circula no sentido horário.
horário.

6
(observação: não existe unanimidade na definição de luz circularmente
polarizada à esquerda e à direita. A convenção adotada aqui segue o padrão
usado em física de partículas).

Da equação (8) podemos fazer a seguinte analogia com os átomos de prata :

Átomos Sy + Feixe circularmente polarizado à direita

Átomos Sy - Feixe circularmente polarizado à esquerda,

Pois dessa forma temos mais uma maneira de escrever um vetor em termos de
xˆ , yˆ , só que dessa vez os coeficientes são complexos. Assim, os vetores
⎜Sy ; ± > podem ser facilmente escritos usando a equação (8)

1 i
⎜Sy ; ± > = ⎜Sz ; + > ±
⎜Sz ; −> (9)
2 2
Logo, a analogia com um problema físico concreto, nos deu um
importante discernimento sobre como tratar matematicamente os incríveis
resultados da experiência de Stern-Gerlach, e ainda mostrou que para
descrevermos os estados de spin dos átomos de prata, devemos trabalhar em
um espaço vetorial complexo.

ESPAÇO VETORIAL BIDIMENSIONAL ABSTRATO


(ESPAÇO SPIN)

1- Vetores da base : ⎜Sz ; + > , ⎜Sz ; −>


2- Qualquer vetor arbitrário nesse espaço vetorial é escrito como uma
combinação linear desses vetores da base com coeficientes
complexos em geral.

O fato de ser necessário o uso de números complexos nesse exemplo


elementar é bastante notável e já demonstra que a nossa matemática daqui
para frente estará contida no conjunto dos números complexos. Vocês
devem estar lembrados do curso de estrutura da matéria, que a equação de
Schrödinger é uma equação diferencial com a presença números
complexos e que apenas o quadrado da função de onda (solução da
equação) tem um significado físico, já que o quadrado de um número
complexo é um número real.

7
FÍSICA QUÂNTICA I
(Aulas 5 e 6: Conceitos Fundamentais)

4. INTODUÇÃO

Já vimos através de um exemplo simples relacionado ao sistema


de spins que temos que mudar radicalmente nossa maneira de pensar se
quisermos nos aventurar no mundo microscópico. A Física clássica não
consegue dar conta desses novos fenômenos e necessariamente
precisamos de uma nova teoria. Começaremos nessa aula o estudo
detalhado da teoria quântica não relativística. Como o próprio nome indica,
essa teoria não pode tratar de fenômenos microscópico relativísticos e
portanto seu alcance de aplicação é limitado. Uma união entre teoria
quântica e relatividade leva a uma teoria muito mais satisfatória da natureza
com um poder de previsão fantástico de forma que podemos dizer que o
todo (teoria quântica relativística) é maior que a soma das partes ( Física
quântica e relatividade). Mas existem muitos fenômenos em que as
partículas quânticas se movem a baixas velocidades e assim a teoria
desenvolvida aqui se aplica e com grande precisão.
Quando se fala em uma teoria, pensamos de inicio sobre os seus
postulados (um postulado é uma sentença aceita sem demonstração. É
claro que ele pode ser testado através da comparação entre suas
conseqüências e os fatos experimentais). Aqui, nós não colocaremos todos
os postulados da mecânica quântica de uma só vez e depois
apresentaremos os teoremas (proposição científica que pode ser
demonstrada. Formulação fechada de uma teoria, que pode ser obtida a
partir dos postulados desta teoria através de uma seqüência finita de
aplicação das regras de dedução) e corolários (proposição que se deduz
imediatamente de outra já conhecida. Conseqüência necessária e
evidente). Iremos apresentando os postulados e alguns teoremas à medida
que formos familiarizando com os novos conceitos e com a nova
matemática de espaços vetoriais abstratos.

4.2 KETS E OPERADORES


Já vimos a necessidade de considerarmos um espaço vetorial
complexo. Agora vamos formular as bases matemáticas de espaços
vetoriais como são usadas na mecânica quântica. Usaremos a notação de
Dirac.

4.2.1 ESPAÇO KET


Consideraremos um espaço vetorial complexo. Dessa forma, precisamos
saber qual a dimensão desse espaço e os tipos de vetores presentes. Com
relação à dimensão de nosso espaço, podemos fazer algumas considerações
se lembrarmos do experimento de Stern-Gerlach discutido nas aulas passadas.
Vimos naquele caso particular dos átomos de prata, que quando um feixe de
átomos saindo de um forno passava através de um campo magnético,
emergiam apenas dois feixes que denotamos de spin-up e spin-down. Um
8
breve raciocínio nos indica que o feixe original deva ser alguma combinação
dos dois feixes emergentes. Assim, podemos escrever o feixe original como
uma combinação linear dos feixes emergentes e devemos estabelecer as
regras para essa combinação. Vimos que a idéia de um espaço vetorial se
encaixa perfeitamente bem nessa história dos spins. Logo, se o feixe original
de átomos de prata, que deve ser o feixe mais geral possível (pois apareceu de
circunstâncias onde não havia qualquer controle com relação aos spins), pode
ser escrito como uma combinação linear de apenas dois feixes “vetores” (up e
down), então concluímos que esse espaço vetorial deva ter dimensão 2. Mas
experimentos com outros tipos de átomos ou partículas levam a apenas um
feixe emergente, ou três feixes emergentes etc, de maneira que é fácil concluir
que em cada situação a dimensão do espaço vetorial deva ser diferente. De
fato, a dimensão do espaço vetorial complexo em mecânica quântica é
especificada de acordo com a natureza do sistema físico em questão.
Podemos então fazer o seguinte resumo:

ESPAÇO VETORIAL COMPLEXO EM MECÂNICA QUÂNTICA


1. DIMENSÃO : depende da natureza do sistema físico em consideração.
2. UM VETOR NESSE ESPAÇO : representa um estado físico (por exemplo,
um átomo de prata com orientação de spin definida). É chamado vetor
estado e na notação de Dirac é denominado KET e simbolizado por ⎜α > .

Em nosso curso não iremos mais simbolizar um vetor por uma seta ou negrito.
Estamos em um espaço vetorial abstrato e o vetor será simbolizado por um ket
tal como ⎜α > . Com as definições acima estamos pronto para enunciarmos o
primeiro postulado.

Primeiro Postulado: O estado KET contém toda a informação sobre o estado


de um sistema físico.

Mas, já que estamos tratando com um espaço vetorial abstrato,


precisamos estabelecer as regras que relacionam os diferentes vetores que
formam esse espaço, isto é, precisamos de uma álgebra para esses vetores
kets.

ÁLGEBRA
a) soma : ⎜ α > + ⎜ β > = ⎜ γ >
b) produto por um número (complexo) : c ⎜ α > = ⎜ β > , c ⎜ α > = ⎜ α >c.
Se c = 0, temos o KET NULO.

Aqui cabe mais um postulado, relacionado ao primeiro e que concerne à


álgebra dos kets. Portanto, não acho conveniente enumera-lo e assim apenas
o enunciarei e o sublinharei com cor diferente do que foi feito com o primeiro
postulado.

Postulado : Os KETS ⎜ α > e c ⎜ α > , c ≠ 0 representam o mesmo estado


físico.

9
Em outra palavras, somente a “direção” nesse espaço vetorial é de significado.
Devido a essa falta de importância do “tamanho” do vetor na teoria, e para
distingui-los das situações ordinárias, os matemáticos preferem dizer que
estamos tratando com raios em vez de vetores.
Para continuarmos estabelecendo a álgebra dos kets, precisamos de
mais algumas definições e postulados. Como estamos tratando de sistemas
físicos, precisamos encaixar os observáveis (grandezas a serem medidas no
laboratório) dentro dessa nova notação. Aqui eu introduzo o segundo postulado
da mecânica quântica.

Segundo Postulado: Toda quantidade física mensurável é descrita por um


operador, tal como A, atuando no espaço vetorial em questão; esse operador
é um observável.

Devemos frisar aqui um pouco da notação a ser empregada. Um observável


(posição, momento, componentes do spin etc) será sempre representado por
um operador cujo símbolo é, em geral, uma letra latina maiúscula tal como A.
Estamos prontos para continuarmos a álgebra do nosso espaço vetorial
introduzindo nas regras o operador. Podemos agora definir o produto de um
operador e um ket. Em geral, o operador atua à esquerda do ket.

ÁLGEBRA (continuação)
c) produto ket e operador: A. (⎜α> ) = A ⎜α>.

Note que a atuação de um operador em um ket, levará a outro ket. Mais tarde
consideraremos mais definições sobre operação de multiplicação. Por
enquanto, temos que tecer alguns comentários sobre o item (c) da álgebra do
nosso espaço vetorial. Em geral, A ⎜α> ≠ a ⎜α>, onde a é um número
complexo (em nossa notação, enquanto operadores são representados por
letras latinas maiúsculas, números serão representados por letras latinas
minúsculas). Entretanto, existem kets especiais de grande importância na
teoria, conhecidos por autokets do operador A, denotados por ⎜a’ > , ⎜a’’ >,
⎜a’’’ > , ... , com a propriedade A ⎜a’ > = a’ ⎜a’ >, A ⎜a’’ > = a’’ ⎜a’’ >, A
⎜a’’’ > = a’’’ ⎜a’’’> , ..., onde a’, a’’ , ..., são apenas números. Note que a
aplicação de A em um autoket, apenas reproduz o mesmo ket aparte de um
número multiplicativo. O conjunto de números {a’, a’’,...}, mais compactamente
{ a’ } é chamado autovalores do operador A. Note que os kets são
representados por letras gregas, enquanto os autokets por letras latinas
minúsculas com linhas. Os autovalores também são representados por letras
latinas minúsculas com linhas, mas quando for necessário ordenar, é melhor
usar { a(1), a(2) , a(3) ,...}. O estado físico correspondente a um autoket é
chamado autoestado.
A discussão proposta neste parágrafo pode ser evitada pelo estudante
sem o comprometimento do assunto (o conteúdo envolverá algumas idéias
sobre spins já estudada em seu curso de estrutura da matéria). Antes de
continuarmos com a álgebra, vamos fazer uma associação das idéias
desenvolvidas até agora com o caso de sistemas de spin 1/ 2, relacionado com
a experiência de Stern-Gerlach . Um experimento desse tipo pode ser usado
para medirmos o spin de uma determinada partícula e quando falamos
“spin1/2”, “spin 1” etc, queremos dizer que o valor do spin de determinada

10
1
partícula vale respectivamente h , 1 h etc, onde h é a constante de Planck
2
dividido por 2π. No caso particular do experimento de Stern-Gerlach, podemos
dizer que os átomos de prata tem spin ½ e se quisermos determinar o valor da
1
componente-z desse spin, encontramos os valores ± h (o valor positivo se
2
refere ao feixe superior que emerge do campo magnético aplicado ao longo do
eixo z, enquanto o valor negativo se refere ao feixe inferior). Visto que não
existe uma direção preferencial no espaço, Isso também é verdadeiro para as
componentes x e y. No caso de partículas de spin 1, devem emergir do campo
magnético SGz três feixes (ver figura 8 abaixo) , um dos quais não sofre
nenhum desvio, indicando que sua componente de spin Sz deva ser zero e os
outros dois feixes carregam Sz = ± 1h . Note que a dimensão do nosso espaço
vetorial para o sistema físico de partículas de spin 1 é três. Conclusões
análogas podem ser estabelecidas para outros valores de spin. É bom lembrar

Sz +

Sz=0
forno SGz

Sz -

Fig. 8. Experimento de Stern-Gerlach para partículas de spin 1.

que a dimensionalidade do espaço vetorial é determinada pelo número de


alternativas do experimento. Um espaço de dimensão N será expandido por N
vetores que formam a sua base. Voltemos ao caso de spin ½. Quando
medimos a componente Sz do spin, usando o aparato SGz encontramos os
valores ± h / 2 (ver Fig. 1). Como associar esse experimento físico com a
matemática da mecânica quântica introduzida até agora? Vimos que um Ket
representa um estado físico. Assim, cada um dos dois feixes que emergem do
aparato SGz e que apresentam estados físicos diferentes (um tem spin up e
outro spin down) devem ser representados por kets diferentes. Iremos denotá-
los por ⎜Sz ; +> e ⎜Sz ; - >. E o que é um operador nessa história toda?
Obviamente, o que se mede num experimento como esse, é a componente de
spin. Assim, esses observáveis serão representados pelos operadores Sz, Sx,
Sy.. Agora suponha que queiramos medir a componente-z do spin. Para isso
usamos um aparato SGz do qual emergirão dois feixes, e então bloqueamos o
feixe de baixo (ver Fig. 9) . Para o feixe que sobrou (o feixe
superior),representado pelo ket ⎜Sz ; +> , usamos novamente um aparato SGz
e notamos que apenas um feixe emergirá desse segundo SGz, isto é, irá
emergir exatamente um feixe no mesmo estado ⎜Sz ; +>. Assim, ao fazermos
uma medida do observável “componente–z do spin” representado pelo
operador Sz sobre um estado previamente conhecido denotado por ⎜Sz ; +>,
notamos que a medida não alterou o estado ⎜Sz ; +> e obtivemos o valor
h / 2 para Sz. Nesse sentido, dizemos que h / 2 é um autovalor e que ⎜Sz ; +> é
um autoket (auto-estado) do operador Sz . O mesmo acontece com o estado
11
⎜Sz ; - >, só que nesse caso o autovalor é − h / 2 . Em termos de nossa
linguagem matemática podemos escrever para os sistemas de spin ½ :

1 1
Sz ⎜Sz ; + > = h ⎜Sz ; +> Sz ⎜Sz ; - > = - h ⎜Sz ; - >
2 2
Operador Autoket Autovalor Autoket Operador Autoket Autovalor Autoket

Sempre que uma medida de um observável for realizada sem que se altere o
estado físico do sistema, dizemos que esse estado (que não foi alterado) é um
auto estado do operador correspondente ao observável que está sendo
medido. Se você está achando isso um tanto confuso, espere mais um
pouquinho que as coisas tenderão a se encaixar. Com relação aos observáveis

Estado selecionado

Forno SGz 1 SGz 2

Fig.9. Dois aparatos SGz em seqüência. Essa figura tenta ilustrar o fato de que se você mede um
observável sem alteração do estado físico, então o sistema se encontrava (antes da medida) em um
autoestado (autoket) do operador representando o observável que está sendo medido. Note que a
segunda medida da componente-z do spin através de SGz 2, não alterou o estado inicial selecionado .

Sx e Sy, relações semelhantes serão válidas:

1 1
Sx ⎜Sx ; + > = h ⎜Sx ; +> Sy ⎜Sy ; + > = h ⎜Sy ; +>
2 2

1 1
Sx ⎜Sx ; - > = - h ⎜Sx ; - > Sy ⎜Sy ; - > = - h ⎜Sy ; ->
2 2

Já comentamos que a dimensão do espaço vetorial é determinada pelo


número de alternativas do experimento. No caso de sistemas de spin ½ só
existem duas alternativas e consequentemente a dimensão é dois. Sistemas de
dois estados (dimensão 2) são muito importantes e se você compreende bem
tais sistemas não terá nenhum problema com sistemas de dimensões maiores
(pois estes envolvem uma generalização). Um espaço vetorial de dimensão N
é expandido por N autokets de um determinado observável A. Nesse espaço N-
dimensional, qualquer ket poderá ser escrito como

⎜ α >= ∑c
a′
a′ ⎜ a’ > , com a’, a’’ . a’’’, ..., a(N) e ca’ são coeficientes complexos.

A questão da unicidade de tal expansão será adiada até ser provado a


ortogonalidade dos autokets.

12
4.2.2 ESPAÇO BRA

Para prosseguirmos com a nossa álgebra, precisamos definir um novo


espaço, chamado espaço BRA, que é “dual” ao espaço KET. Assim, vamos
enunciar mais um postulado relacionado ao nosso espaço vetorial.

Postulado: Para todo KET ⎜α > existe um BRA, denotado por < α ⎜, neste
espaço “dual”, ou espaço BRA.

A correspondência é de um para um entre o espaço KET e o espaço BRA.


Com isso queremos dizer que:

⎜α > CD <α⎜

⎜a’ > , ⎜a’’ >, ... CD < a’ ⎜ ,< a’’ ⎜, ...

⎜α > + ⎜β > CD <α⎜+<β⎜

onde CD é a abreviação de correspondência dual. Podemos dizer que o


espaço BRA é a imagem no espelho do espaço KET.

⎜α > <α⎜

Relacionado a essa correspondência, enunciamos mais um postulado


matemático (até agora só enunciamos dois postulados da mecânica quântica,
os quais foram coloridos de azul. Os demais são postulados relacionados à
álgebra e foram coloridos de amarelo).

Postulado: O BRA “dual” a c ⎜α > é c* < α ⎜, (e não c < α ⎜ ). Assim, de


maneira geral, temos

cα ⎜α > + cβ ⎜β > CD cα* < α ⎜ + cβ* < β ⎜

4.2.3 PRODUTO INTERNO DE UM BRA E UM KET

Por definição, num produto interno de um BRA por um KET, o BRA fica à
esquerda e o KET fica à direita e assim temos o BRAKET :

< β ⎜α > = (< β ⎜) • (⎜ α >)

Este produto é em geral um número complexo. A seguir, postulamos mais duas


propriedades do produto interno:

13
Postulado: O produto interno obedece às seguintes propriedades :
10) < β ⎜α > = < α ⎜β >*
0
2) < α ⎜α > ≥ 0

Fica claro, usando a primeira propriedade acima que < α ⎜α > é um número
real. A segunda propriedade é algumas vezes conhecida como postulado da
métrica definida positiva.
Dois KETS ⎜α > , ⎜β > são ditos ortogonais se < α ⎜β > = 0. Essa é a
condição de ortogonalidade. Com as definições acima, dado um ket não nulo
⎜α > , podemos formar um KET normalizado ⎜ α~ >, fazendo

⎜ α~ > = [ 1 / (< α ⎜α >) 1/2 ] ⎜α >.

O termo (< α ⎜α >) ½ é conhecido como a norma de ⎜α >, análogo ao modulo


rr
de um vetor a.a no espaço Euclidiano. Visto que apenas a direção é
importante em nosso espaço KET, é conveniente requerer que todos KET’s
que usaremos para os estados físicos sejam normalizados.
Como estamos ainda no inicio do desenvolvimento de novos conceitos e
nova matemática, teremos que esperar um pouco mais para fazermos
problemas relacionados e fixar essas novas idéias. Enquanto isso, eu sugiro
que os estudantes façam uma revisão da equação de Schrödinger aprendida
no curso de Estrutura da Matéria e particularmente aconselho os seguintes
problemas (que serão úteis em nosso estudo) :

4.3 PROBLEMAS (UMA REVISÃO)


PROBLEMA 1: Resolva a equação de Schrödinger para um oscilador
harmônico encontrando as autofunções (autoestados) e autovalores da
Hamiltoniana.

PROBLEMA 2: Resolva a equação de Schrödinger para o átomo de hidrogênio


encontrando as autofunções e os autovalores da Hamiltoniana.

PROBLEMA 3 (Desafio) : O análogo relativístico da equação de Schrödinger


para um elétron de spin 0 ( e portanto, não aplicável ao elétron real) é a versão
de operadores da equação
(E −V ) 2 = p 2 c 2 + m 2 c 4 ,
isto é,
2
⎛ E Ze 2 1 ⎞
2
⎛ mc ⎞
⎜⎜ − ⎟⎟ ψ = −∇ 2ψ + ⎜ ⎟ ψ
⎝ hc hc r ⎠ ⎝ h ⎠
(a) Justifique as duas equações acima (a segunda equação é conhecida como
equação de Klein-Gordon).
(b) Determine a equação radial.
(c) Determine o espectro de autovalores. (Sugestão: note a estreita conexão
entre a equação radial obtida no item (a) e a equação radial do problema do
átomo de hidrogênio do problema 2.

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FÍSICA QUÂNTICA I
(Aula 7: Conceitos Fundamentais; continuação)

5.1 OPERADORES

Dois operadores são iguais, X = Y, se X ⎜ α > = Y ⎜ α > para todo KET


⎜ α >. Um operador é chamado operador nulo se X ⎜ α > = 0 , com ⎜ α >
arbitrário. A adição de operadores é comutativa e associativa, isto é :
X + Y = Y + X (propriedade comutativa)
X + ( Y + Z ) = ( X + Y ) + Z (propriedade associativa ) .
Dizemos que um operador é linear quando
X (cα ⎜α> + cβ ⎜β> ) = cα X ⎜α> + cβ X ⎜β> .
Na aula passada, vimos que um operador atua num KET pela esquerda.
Em um BRA, o operador atua pela direita , (< α ⎜).X = < α ⎜ X . O resultado é
outro BRA. Em geral, o KET X ⎜ α > e o BRA < α ⎜ X, não são duais.
Definiremos o símbolo Xƒ tal que

X⎜α> CD < α ⎜ Xƒ (5.1)


onde Xƒ é chamado de Adjunto Hermitiano ou Adjunto de X . No caso especial
em que X = Xƒ , X é denominado Operador Hermitiano.

5.2 MULTIPLICAÇÃO
Uma importante propriedade relacionada à multiplicação de operadores
é que, em geral, ela não é comutativa : XY ≠ YX. No entanto, ela é
associativa : X ( Y Z ) = ( X Y ) Z = X Y Z. Além disso temos:
X ( Y ⎜ α > ) = ( X Y ) ⎜ α >.
( < β ⎜X ) Y = < β ⎜( X Y )= < β ⎜ XY .
Com o que foi visto até agora podemos provar que ( X Y )ƒ = Yƒ Xƒ .
Prova : Lembramos que o produto de dois operadores é também um
operador e portanto podemos escrever ( X Y ) = Z. Usando a propriedade (5.1)
para Z temos: Z ⎜α > CD < α ⎜ Zƒ , segue: ( X Y) ⎜α > = < α ⎜( X Y )ƒ.
Mas
X Y ⎜α > = X ( Y ⎜α > ) CD (< α ⎜ Yƒ ) Xƒ = < α ⎜ Yƒ Xƒ e portanto
( X Y )ƒ = Yƒ Xƒ.
Até agora definimos os produtos < β⎜α >, X ⎜α >, < α⎜ X e X Y. Podemos
então perguntar: existem outros tipos de produtos? A resposta é sim e vamos
definir o chamado produto externo , onde o KET fica à esquerda do BRA, isto é:
( ⎜ β > ) (< α ⎜) = ⎜ β > < α ⎜. Note que o produto externo é um operador, pois

( ⎜ β > < α ⎜) ⎜ γ > = ⎜ β > (< α ⎜ γ> ) = < α ⎜ γ > ⎜ β >


(produto externo) (KET) (KET) (número )

Abaixo nós consideramos alguns exemplos de produtos ilegais, ou


seja, produtos que não são permitidos em nosso formalismo. Os ilegais tem as
seguintes formas: ⎜α > X , X ⎜α > , não são nem BRA , nem KET e nem
operador ; os produtos ⎜α >⎜β > e < α ⎜< β ⎜ são considerados ilegais quando
os KET’s ( BRA’s ) pertencem ao mesmo espaço vetorial.
15
5.3 O AXIOMA ASSOCIATIVO DA MULTIPLICAÇÃO
Quando estivermos tratando com multiplicações legais entre BRA’s ,
KET’s e operadores, a propriedade associativa é postulada ser válida em geral.
Como uma ilustração, escrevemos :
( ⎜ β > < α ⎜) . ⎜ γ > = ⎜ β > . (< α ⎜ γ >), onde (< α ⎜ γ >) é apenas um número.
Logo, o produto externo atuando sobre um KET é só outro KET e portanto
⎜ β > < α ⎜ pode ser considerado um operador. Note que o operador ⎜ β > < α ⎜
gira ⎜ γ > na direção de ⎜ β >.
É fácil ver que se o operador X = ⎜ β > < α ⎜, então Xƒ = ⎜ α > < β ⎜.
Prova : X ⎜γ > CD < γ ⎜Xƒ . Mas X = ⎜ β >< α ⎜, de maneira que

⎜ β >< α ⎜γ > CD < γ ⎜(⎜ β >< α ⎜)ƒ. Mas o primeiro membro


pode ser escrito como (< α ⎜γ >) . ⎜β >, pois < α ⎜γ > = c é só um número e
pode ser colocado em qualquer posição. Assim, (< α ⎜γ >) . ⎜β > = c ⎜β >.

Lembrando que c ⎜β > CD < β ⎜ c , e que c ∗ = (< α ⎜γ > ) ∗ = < γ⎜α >
(ver postulado sobre o produto interno), segue que (< α ⎜γ >) . ⎜β > tem o
seguinte correspondente dual: < β ⎜. (< γ ⎜ α >) = (< γ ⎜ α >). < β ⎜. Mas pelo
axioma associativo, a última expressão (< γ ⎜ α >). < β ⎜= < γ ⎜ (⎜ α >< β⎜) e
portanto mostramos que (⎜ β >< α ⎜)ƒ = ⎜ α >< β ⎜.

Com o axioma associativo podemos ver também que


(< β ⎜). ( X ⎜α >) = (< β ⎜ X ). (⎜α >). Visto que os dois lados são iguais, podemos
usar a forma compacta : < β ⎜X ⎜α >. Com essa notação segue ainda:

< β ⎜ X ⎜α > = < β ⎜ ( X ⎜α >) = { (< α ⎜ Xƒ ). ⎜β >)} ∗ = < α ⎜ Xƒ ⎜β > ∗ e se X é


Hermitiano < β ⎜X ⎜α > = < α ⎜ X ⎜β > ∗ .

5.4 BASE DE KETS E REPRESENTAÇÃO POR MATRIZES


5.4.1 AUTOKETS DE UM OBSERVÁVEL

Consideremos os autokets e autovalores de um operador Hermitiano A.


Aqui o símbolo A ,que foi reservado anteriormente para um observável, será
usado para operadores Hermitianos, pois em mecânica quântica, operadores
Hermitianos freqüentemente representam algum observável físico. Com esse
operador Hermitiano em mente e com as regras estabelecidas até agora,
vamos demonstrar o primeiro teorema.

TEOREMA: Os autovalores de um operador Hermitiano A são Reais; Os


autokets de A correspondendo aos diferentes autovalores são ortogonais.

PROVA: Lembrando que A ⎜a’ > = a’ ⎜a’ > , e sabendo que A é Hermitiano (enunciado),

temos o seguinte dual para a equação de autovalores acima : < a’’ ⎜Aƒ = < a’’ ⎜A = a’’ < a’’ ⎜,
onde a’, a’’ , ... são os autovalores de A. Multiplicando ambos os lados de A ⎜a’ > = a’ ⎜a’ > por
*
< a’’ ⎜ pela esquerda, e ambos os lados de < a’’ ⎜A = a’’ < a’’ ⎜por ⎜a’ > pela direita, temos :

16
< a’’ ⎜A ⎜a’ > = a’< a’’ ⎜a’ >, (5.2)

< a’’ ⎜A ⎜a’ > = a’’ < a’’ ⎜a’ > . (5.3)
Subtraindo as equações ( 1 ) – ( 2 ) segue

(a’ – a’’ ) < a’’ ⎜a’ > = 0. (5.4)
Mas a’ e a’’ podem ser considerados iguais ou diferentes. Primeiro, consideremos a situação
em que eles são iguais. Neste caso, < a’’ ⎜a’ > deve ser não nulo, pois estamos considerando
∗ ∗
os autokets não nulos e portanto, da equação ( 3 ) a’ – a’’ = 0, ou a’ = a’’ e assim, os
autovalores de A são Reais. Visto que esses autovalores são Reais, podemos escrever a
equação ( 3 ) como (a’ – a’’) < a’’ ⎜a’ > = 0. Agora, se considerarmos que os autovalores são
diferentes, segue da equação acima que < a’’ ⎜a’ > = 0 ( se a’ ≠ a’’ ). Logo, os autokets são
ortogonais.

Nós esperamos do ponto de vista físico que um observável tenha


autovalores Reais, um ponto que ficará mais claro na próxima aula, onde
discutiremos o processo de medida em mecânica quântica. Este teorema
garante que os autovalores são Reais se o operador é Hermitiano. Esse é o
motivo de falarmos em observáveis Hermitianos em mecânica quântica.
É conveniente normalizar os autokets ⎜a’ > de maneira que {⎜a’ >} forme
um CONJUNTO ORTONORMAL :

< a’’ ⎜a’ > = δ a’’ a’ . (5. 5 )

Desde o inicio de nossa discussão sobre o espaço KET, estamos


dizendo que tal espaço é expandido pelos autokets de um operador Hermitiano
A. Então, por construção, os autokets de A formam um conjunto completo de
nosso espaço KET.

5.4.2 AUTOKETS COMO UMA BASE

Vimos que os autokets normalizados de A formam um conjunto completo


ortonormal (ver eq. (5.5)). Assim, um KET arbitrário pode ser expandido em
termos dos autokets de A como segue:
⎜ψ > = ∑ c a ' ⎜a’ > . (5.6)
a'
r
Isso é semelhante a expansão de um vetor arbitrário V em termos dos vetores
unitários e mutuamente ortogonais êi no espaço Euclidiano. Consideremos o
KET abaixo
⎜α > = ∑ c a ' ⎜a’ >. (5.7)
a'

Multiplicando (5.7) por < a’’ ⎜ pela esquerda e usando a propriedade de


ortonormalidade (4), podemos obter imediatamente os coeficientes da
expansão,
< a’’ ⎜α > = < a’’ ⎜ ∑ c a ' ⎜a’ > = ∑ c a ' < a’’ ⎜a’ > = ∑ c a ' δa’a’’
a' a' a'
e o segundo termo é não nulo apenas quando a’ = a’’ . Logo

ca’ = < a’ ⎜α > . (5.8)

17
Inserindo (5.8) em (5.7) temos, ⎜α > = ∑c a'
a' ⎜a’ > = ∑
a'
a' c a ' = ∑
a'
a' a' α > .

Logo um determinado KET pode ser escrito em termos dos autokets de um


operador A como segue:

⎜α> = ∑a'
a' a' α > . (5.9)

r
A expressão acima é análoga à expansão de um vetor V no espaço Euclidiano
Real
r r r
V = ∑ eˆ i (eˆ i • V ) , eˆ i • V = Vi .
i

Note que os autokets ⎜ a’> sendo normalizados, indicam apenas uma direção
no espaço KET, da mesma forma que os vetores unitários êi indicam as
direções x,y e z no espaço Euclidiano. Voltando à equação (5.9) e usando o
axioma associativo da multiplicação temos que
( ⎜a’ >) (< a’⎜α > ) = (⎜a’ > < a’⎜) ⎜α >.
( KET ) (número ) (operador ) (KET)
Visto que ⎜α > é arbitrário, segue ⎜α> = ( ∑
a'
a ' a ' ) ⎜ α > e portanto, o termo

entre parêntesis deve ser o operador identidade , isto é


a'
a ' a ' = 1, (5.10)

onde o 1 (em negrito) deve ser entendido como operador identidade. A relação
(5.10) é conhecida como relação de completeza ou relação de clausura. Essa
relação é muito útil, pois dada uma cadeia de KETS, BRAS e operadores
multiplicados de maneira legal, a eq. (5.10) pode ser inserida em qualquer
posição nessa cadeia, conforme a nossa conveniência. Considere, por
exemplo, o produto BRAKET < α ⎜α > ,
< α ⎜α > = < α ⎜( ∑ a ' a ' ) ⎜α > = ∑ ( α a' a ' α ) = ∑ á ' α a' α , ou seja
a' a'

a
( )

2
< α ⎜α > = a' α (5.11)
a'

Aqui, vocês podem fazer uma analogia com a norma de um vetor no espaço
v2
Euclidiano, V = V x + V y + V z .
2 2 2

A eq. (5.11) mostra que se ⎜α > é normalizado, então os coeficientes ca’


dados pela expressão (5.8) devem satisfazer
∑ ∑c
2
a' α
2
1 = < α ⎜α > = = = a' , ou seja :
a' a'

∑c
2
a' =1 . (5.12)
a'

18
Na eq. (5.10), existe um produto externo e portanto um operador
⎜a’ ><a’⎜, o qual daremos o nome de operador projeção pela razão que se
apresenta a seguir. Deixemos esse operador atuar sobre um KET ⎜α >
qualquer.
( ⎜a’ >< a’ ⎜) . ⎜α> = ⎜a’ >(< a’ ⎜α>) = ca’ ⎜a’ > . (5.13)
Note que a eq.(5.13) indica ( ⎜a’ >< a’ ⎜) seleciona aquela porção do KET ⎜α>
que é paralelo a ⎜a’ >. Dessa forma, o operador ⎜a’ >< a’ ⎜ é conhecido como
operador projeção na direção do ket da base ⎜a’ > e é denotado por Λa’.

Λa’ ≡ ⎜a’ >< a’⎜ , operador projeção . (5.14)


Usando a relação de clausura, segue

∑Λ a'
a' = 1 . (5.15)

5.4.3 REPRESENTAÇÃO POR MATRIZES

Tendo especificado uma base de autokets { ⎜a’ > } do operador A,


vamos agora mostrar como representar um operador qualquer, digamos X,
por uma matriz quadrada nessa mesma base. Vejamos ! Na base { ⎜a’ > } , X
pode ser escrito como

X= ∑∑
a '' a'
⎜a’’ ><a’’ ⎜X ⎜a’ ><a’ ⎜, (5.16)

onde usamos a relação de clausura duas vezes. Note que se N é a dimensão


do nosso espaço KET (isto é, existem N autokets de A ), então existirão N2
números da forma <a’’ ⎜X ⎜a’ >. Por exemplo, se N =2, teremos quatro números
do tipo : <a’ ⎜X ⎜a’ >, <a’ ⎜X ⎜a’’ >, <a’’ ⎜X ⎜a’ >, <a’’ ⎜X ⎜a’’ >. Obviamente, esses
números podem ser arranjados em uma matriz quadrada N × N como segue
<a’’ ⎜X ⎜a’ >. (5.17)
linha coluna
Explicitamente:
⎡ a (1) X a (1) a (1) X a ( 2 ) K⎤
⎢ ( 2) ⎥
X =& ⎢ a X a (1) a ( 2 ) X a ( 2 ) K⎥ , (5.18)
⎢ M M ⎥
O⎥
⎢⎣ ⎦
onde o símbolo =& significa “é representado por “ .
Já vimos que < a’’⎜X ⎜a’ > = < a’⎜Xƒ ⎜a’’ > ∗ . Logo, a operação adjunto
Hermitiana, originalmente definida por X ⎜α > CD < α⎜ Xƒ, está relacionada
ao conceito mais familiar de “transposto conjugado complexo”. Note que para
um outro operador Hermitiano B temos < a’’⎜B ⎜a’ > = < a’⎜B ⎜a’’ > ∗ .
A maneira de arranjarmos < a’’⎜X ⎜a’ > em uma matriz quadrada está em
acordo com a regra usual de multiplicação de matrizes. Veja o exemplo: se
Z= XY, < a’’⎜Z ⎜a’ > = < a’’⎜ XY ⎜a’ > =
∑ < a’’⎜X ⎜a’’’ >< a’’’ ⎜Y ⎜a’’ >,
a '''
(5.19)

onde inserimos o operador identidade (dado pela relação de clausura (5.10) )


entre os operadores X e Y. Faça um teste e verifique que (5.19) obedece a
mesma regra de multiplicação de matrizes.
19
Vejamos agora o seguinte produto de um operador e um KET:
⎜γ > = X ⎜α > (5.20)
Essa relação também pode ser escrita em termos dos nossos kets da base
{ ⎜ a’> } . A expansão dos coeficientes ⎜γ > pode ser obtida por multiplicar < a’⎜
à esquerda de (5.20) : < a’⎜ γ > = < a’⎜X ⎜α > , ou
< a’⎜γ > = ∑ < a’ ⎜X ⎜a’’ >< a’’⎜α > . (5.21)
a ''
A relação acima pode ser vista como uma aplicação da regra de multiplicar
uma matriz quadrada < a’ ⎜X ⎜a’’ > por uma matriz coluna < a’ ⎜α >. Assim, os
coeficientes da expansão de ⎜α > e ⎜γ > podem se arranjados na forma de
matrizes coluna como mostramos abaixo:
⎡ a (1) α ⎤ ⎡ a (1) γ ⎤
⎢ ( 2) ⎥ ⎢ ( 2) ⎥
⎢ a α ⎥ ⎢ a γ ⎥
α =& ⎢ ⎥
, γ =&
⎢ a ( 3) γ ⎥
. (5.22)
⎢ a ( 3)
α ⎥ ⎢ ⎥
⎢⎣ M ⎥
⎦ ⎣ M ⎥⎦

Assim, os coeficientes de expansão dos KETS em termos de uma base {⎜a’ >}
formam uma matriz coluna. Igualmente, o BRA <γ ⎜ = <α ⎜X pode ser
representado por uma matriz linha como segue :
[
γ =& γ a (1) γ a ( 2) γ a (3) K = ⎡⎢ a (1) γ


] a ( 2) γ

a ( 3) γ

K⎤
⎥⎦
(5.23)
Note o aparecimento da conjugação complexa quando os elementos da matriz
coluna são escritos como (5.23).
A idéia de matriz pode ser vista mais claramente considerando
<a’⎜γ > = ∑ < α ⎜X ⎜a’’ > < a’’ ⎜α >
a ''
matriz coluna Nx1 matriz quadrada NxN matriz coluna Nx1

<γ ⎜ a’ > = ∑a ''


< α ⎜a’’ > < a’’⎜X ⎜a’ >
matriz linha 1x N matriz linha 1xN matriz quadrada NxN
Fica claro que o produto interno < β ⎜α > pode ser escrito como o
produto de uma matriz linha, representando < β⎜, por uma matriz coluna,
representando ⎜α > :
⎡ a (1) α ⎤
⎢ ⎥
β α =& ∑ β a ' a ' α = ⎡⎢ a (1) β K⎤ ⎢ a ( 2) α ⎥ ,
∗ ∗
a ( 2) β (5.24)
⎣ ⎥⎦
a' ⎢ M ⎥
⎣⎢ ⎦⎥
Note que se multiplicarmos a matriz linha ,representando < α ⎜ pela matriz
coluna, representando ⎜ β >, obtemos exatamente o conjugado complexo da
expressão (5.24), o que é consistente com a propriedade fundamental do
produto interno < α⎜β > = < β⎜α > ∗ .
Finalmente, consideremos o produto externo ⎜β >< α ⎢. Como podemos
representa-lo por matrizes ? Vejamos!
⎜β>< α⎜ = ∑ ∑ a ' a β α a ' ' a ' ' , ou seja
a' a ''

20
⎡ a (1) β a (1) α ∗ K⎤

a (1) β a ( 2) α
⎢ ∗ ∗


β α =& a β a α( 2) (1)
a ( 2)
β a α
( 2)
K⎥ . (5.25)
⎢ ⎥
⎢ M M O⎥
⎣ ⎦
A representação por matriz de um observável A é particularmente simples se
os autokets de A são os próprios autokets usados como a base. Assim temos
A = ∑ ∑ a ' ' a ' ' A a ' a ' . No entanto, obviamente a matriz a' ' A a' é
a á ''

diagonal, a' ' A a' = a' ' A a' δ a 'a '' = a' δ a 'a '' . Assim,
A = ∑ a' a' a' = ∑ a' Λ a ' . (5.26)
a' a'

5.4.4 EXEMPLO COM SISTEMAS DE SPIN ½

Aqui será instrutivo darmos um exemplo de como toda essa matemática


se relaciona com problemas físicos. Consideraremos mais uma vez o caso
especial de sistemas de spin ½ . Lembramos que
1) vetores da base : ⎜Sz ; +>, ⎜Sz ; −> ( espaço vetorial de dimensão 2 )
3) Essa base é formada pelos autokets do operador Sz .
Por uma questão de simplicidade, representaremos os vetores da base de Sz
por ⎜+> , ⎜−> ( isto é, usamos ⎜Sz ; + > = ⎜+> e ⎜Sz ; - > = ⎜−> ). O operador mais
simples no espaço KET expandido pelos kets da base ⎜+> e ⎜−> é obviamente
o operador identidade
1 = ⎜+><+⎜ + ⎜−><−⎜ . (5.27)

De acordo com a expressão (5.26), podemos expandir Sz em termos de seus


autokets como
h
Sz = ( ⎜+><+⎜ - ⎜−><−⎜ ) . (5.28)
2

A relação autoket-autovalor segue imediatamente da propriedade de


ortonormalidade de ⎜+>, ⎜−> . Exemplo: apliquemos Sz dado por (5.28) no KET
⎜+>. Assim, temos
h h h h
Sz ⎜+> = ( ⎜+><+⎜ - ⎜−><−⎜ ) ⎜+> = ⎜+><+⎜+> - ⎜−><−⎜+> = ⎜+>.
2 2 2 2
É instrutivo considerar dois operadores não Hermitianos definidos por
S+ ≡ h ⎜+><−⎜ , S− ≡ h ⎜−><+⎜. (5.29)

Exercício: mostre que os operadores em (5.29) não são Hermitianos.

Note que da definição (5.29) temos S+ ⎜−> = h ⎜+><−⎜−> = h ⎜+>, isto é, o


operador S+ atuando sobre o ket spin-down ( ⎜−> ) , o transforma em um ket
spin-up ( ⎜+> ) multiplicado por h . Por outro lado S+ ⎜+ > = 0. A interpretação
física desse resultado, é que S+ levanta a componente de spin por uma
unidade de h ; se a componente de spin não puder mais ser levantada,
automaticamente S+ levará a um ket nulo. Da mesma forma, S− pode ser
interpretado como um operador que abaixa a componente de spin por uma

21
unidade. Mais tarde nesse curso, mostraremos que S ± = S x ± iS y .
Para construirmos as representações matriciais dos operadores de
momento angular, é costume indicar a coluna (linha) na ordem decrescente das
componentes de momento angular. Assim, no caso de spin ½ , temos
⎡1⎤ ⎡0 ⎤
+ =& ⎢ ⎥ , − =& ⎢ ⎥
⎣0 ⎦ ⎣1⎦

h ⎡1 0 ⎤ ⎡0 1 ⎤ ⎡0 0 ⎤
S z =& , =
& h , S − =& h ⎢
2 ⎢⎣0 − 1⎥⎦ ⎢0 0 ⎥ ⎥
S +
⎣ ⎦ ⎣1 0⎦

22
MECÂNICA QUÂNTICA
FORMALISMO
(Parte 2)

Parte de notas de aulas relacionadas à disciplina FIS 660-Mecânica Quântica do


curso de Mestrado em Física da Universidade Federal de Viçosa durante os anos
de 2001 a 2005. O conteúdo é equivalente a aproximadamente 6 aulas. O texto é
baseado no livro “Modern Quantum Mechanics” de J.J. Sakurai, adotado nessa
disciplina durante o período acima mencionado.

Prof. Afrânio Rodrigues Pereira


Departamento de Física, Universidade Federal de Viçosa,
Viçosa, 36570-000, Minas Gerais.
Email: apereira@ufv.br
FÍSICA QUÂNTICA I
(Aulas 8 e 9: Medidas e Observáveis )
6.1 MEDIDAS

Já desenvolvemos a matemática do espaço-ket e agora estamos prontos


para discutir a teoria quântica dos processos de medida. Um dos objetivos
primários de um experimento é determinar informação suficiente sobre o estado
de um sistema, em um dado instante de tempo , para capacitar a previsão do
comportamento subseqüente do sistema. Isto é, nós gostaríamos de medir
observáveis suficientes em um tempo tM para sermos capazes de prever a
evolução do sistema em t > tM .
No entanto, em mecânica quântica, tais previsões são impossíveis, a não
ser que saibamos o que a medida pode fazer com o estado KET (lembre-se do
primeiro postulado: o estado KET contém toda a informação sobre o sistema
físico). Diferente do físico clássico, o físico quântico tem que conviver com uma
inevitável interação observador- observado que pode ser resumida na seguinte
regra: é impossível realizar uma medida sobre um sistema microscópico que não
perturbe o sistema de uma maneira significante, imprevisível e incontrolável.
A definição de medida sobre um sistema microscópico é tão crucial para o
nosso presente interesse que faremos uma discussão mais detalhada. Uma idéia
central para a interpretação da mecânica quântica é o conceito de “ensemble” de
sistemas microscópicos. A palavra inglesa “ensemble” significa conjunto. Um
“ensemble” é uma coleção contendo um número muito grande de sistemas
idênticos e que não interagem, todos preparados no mesmo estado quântico.
Sistemas individuais em um “ensemble” são denominados membros. Assim, de
acordo com o primeiro postulado, qualquer estado do “ensemble” pode ser
representado por um KET ⎜α > . Aqui nós consideraremos apenas “ensembles”
nos quais todos os membros podem ser caracterizados pelo mesmo KET ⎜α >. Tal
“ensemble” é denominado ensemble puro. Para exemplificar um ensemble puro,
podemos usar o já badalado experimento de Stern-Gerlach. Um feixe de átomos
de prata que sobrevive ao primeiro aparato SG-z com a componente Sz–
bloqueada é um bom exemplo de ensemble puro, pois todos os átomos do feixe
(existem muitos átomos no feixe e cada átomo é um membro ) são caracterizados
pelo mesmo KET ⎜Sz ; + >.
Quando falamos em “uma medida de um observável A no instante de tempo
tA “, queremos dizer que realizamos uma medida simultânea de A sobre todos os
membros do ensemble. Sabemos que a medida deve mudar o estado do sistema.
Agora podemos nos perguntar: o que muda em um sistema, quando realizamos
uma medida de um observável A? Seguindo Dirac, respondemos: “Uma medida
sempre fará com que o sistema salte para um dos autoestados da variável
dinâmica que está sendo medida”. Assim, antes que uma medida de um
observável A seja feita, assumimos que o sistema seja representado por alguma
combinação linear dos autokets de A, como segue
α = ∑ c a ' a' = ∑ a a' α . (6.1)
á' a'
Quando a medida é realizada, o sistema é atirado em um dos autoestados
(autokets), digamos a ' , do observável A. Em símbolos,
⎜α > ⎜a’ >
medida de A
No experimento Stern-Gerlach, um átomo de prata do feixe que sai do forno com
orientação de spin arbitrária (que é um sistema físico) mudará para ⎜Sz ; + > ou
⎜Sz ; - > quando passar por um aparato do tipo SG-z. Logo, a medida usualmente
muda o estado. A única exceção a essa regra aparece quando o estado já estava
em dos autoestados do observável que está sendo medido. Nesse caso

⎜a’ > ⎜a’ >


medida de A
Quando a medida muda ⎜α > em ⎜a’ >, dizemos que o resultado da medida de A é
a’.
Dado a expressão (6.1), que representa o estado KET de um sistema físico
antes da medida, não poderemos saber de antemão em qual dos vários ⎜a’ > ‘s o
sistema será atirado como resultado da medida. A teoria quântica poderá nos dar
uma resposta apenas probabilística, isto é, poderemos saber a probabilidade do
sistema ser encontrado, após a medida, em algum ⎜a’ > particular. Com isso em
mente, introduzimos o terceiro e o quarto postulados da mecânica quântica:

Terceiro Postulado: O único resultado possível de uma medida de um observável


físico representado pelo operador A é um dos autovalores desse operador.

Quarto Postulado: Quando um observável físico é medido em um sistema descrito


pelo KET normalizado ⎜α >, a probabilidade de encontrarmos um autovalor a’ do
correspondente operador A é ⎜< a’ ⎜α >⎜2 , onde ⎜a’ > é um autoket normalizado
de A associado ao autovalor a’ .

Agora fica claro porque definimos um ensemble contendo um grande


número de sistemas físicos idênticos. A razão está na interpretação probabilística
resumida no quarto postulado. Se estamos falando em probabilidade, então
temos que fazer muitos experimentos idênticos para testarmos as previsões da
teoria. Com isso em mente, fica surpreendentemente fácil ver que uma medida
deve mudar o estado do sistema. Imagine que queremos medir um observável
representado por um operador A. Suponha que o arranjo experimental é tal que o
estado antes da medida não seja um auto-estado de A, i.e., existe uma incerteza
com relação ao observável A, que denotaremos por ΔA (mais tarde definiremos tal
incerteza). Em termos de um ensemble, essa condição significa que em um
instante antes da medida, os membros do ensemble não têm um valor definido
para o observável; nessa situação, seus estados podem ser os vários possíveis
valores do observável, qualquer um dos quais pode aparecer na medida. Esses
valores, agora sabemos, estão entre os autovalores do operador A. Agora pense
sobre o que acontece ao ensemble quando medimos o observável A: cada
membro exibe um dos possíveis autovalores de A. Após a medida, cada membro
exibirá um autovalor de A, o valor que ele exibe na medida, e assim estará em um
auto-estado de A. Mais tarde faremos uma análise crítica da estrutura da teoria
apresentada até agora.
Obviamente a probabilidade para o acontecimento de qualquer coisa deve
ser não negativa. Mais ainda, as probabilidades para as várias possibilidades
alternativas devem ser adicionadas à unidade. Ambas essas expectativas estão
contidas no quarto postulado.
Iremos agora definir o valor esperado de A tomado com respeito a ⎜α > ,
como segue:
< Α >α ≡ < α ⎜ Α ⎜ α > . (6.2)
A expressão acima é uma definição. No entanto ela concorda com a nossa noção
intuitiva de “valor médio”, pois
∑∑ α a' ' a' ' A a' a' α = ∑ a' a' α
2
< Α >α ≡ < α ⎜ Α ⎜ α > = . (6.3)
a' a '' a'
Note que no último termo, temos o valor medido a’, multiplicado pela probabilidade
de obte-lo. Basicamente temos uma média ponderada, onde os coeficientes de
ponderação são as probabilidades.
Observação: não confundir autovalores com valor esperado.
Para exemplificar todo esse formalismo, usaremos novamente o sistema de
dois estados que temos analisado ao longo do curso, i.e., o sistema de spin ½ .
Nossa análise anterior só nos levou à expressão e autokets do operador Sz. Os
resultados do experimento de Stern-Gerlach em seqüência combinados com os
postulados da mecânica quântica discutidos até agora são suficientes para
determinarmos também os autokets e expressões para os operadores Sx e Sy.
Veja a figura abaixo!

⎜Sz ; + >
⎜Sx ; +>
⎜α> iguais intensidades
Forno SGx SGz
⎜Sz ; −>

Fig. 6.1. Experimento de Stern-Gerlach em seqüência. O autoket ⎜Sx ; −> foi bloqueado.

Este resultado experimental mostra que a probabilidade do estado


⎜Sx ; +> ser atirado em ⎜Sz ; ± > ( que denotaremos por ⎜ ± > como anteriormente)
é ½ . Logo, usando o formalismo matemático escrevemos esse resultado
experimental como

+ S x ;+ = − S x ;− = 1 / 2 (6.4)
Lembrete: < β⎜α > pode ser lido como a amplitude de probabilidade de um
determinado sistema que está no estado ⎜α > ser atirado (por algum aparato de
medida) em um estado ⎜β >.
Com o experimento esquematizado na figura (6.1) e a expressão (6.4) em
mãos perguntamos: quais os autokets ⎜Sx ; +> e ⎜Sx ; −> ? Se o feixe
⎜Sx ; +> se divide em dois feixes ⎜Sz ; +> e ⎜Sz ; −> com iguais intensidades ,
então podemos escrevê-lo como uma combinação linear de ⎜Sz ; +> e ⎜Sz ; −>
(usaremos a representação ⎜+> e ⎜ −> para esses dois autokets de Sz ) da
seguinte forma :
⎜Sx ; +> = a ⎜+> + b ⎜−> , com a =b. (6.5)
Mas a teoria nos diz que < Sx ; +⎜Sx ; + > = 1, onde < Sx ; + ⎜= a ∗ + + b ∗ − . Sendo
os autokets ⎜+> e ⎜−> ortonormais e usando (6.5) temos

< Sx ; +⎜Sx ; + > = aa ∗ + + + a ∗ b + − + b ∗ a − + + bb ∗ − − = 1 , ou a + b = 1 , ou


2 2

ainda 2 a = 1 → a = b = 1 / 2 . Lembrando que a e b são números complexos,


2

podemos então escrever


1 1
b= e iδ 1 ou a = e iδ 1 , (6.6)
2 2
onde δ1 é um número Real. Usando o fato de que a fase não tem importância
física, escolhemos o coeficiente do autoket ⎜+> como sendo Real e positivo por
convenção. Assim
1 1 iδ 1
⎜Sx ; + > = + + e − . (6.7)
2 2
O ket ⎜Sz ; -> deve ser ortogonal a ⎜Sz ; +>, visto que eles são mutualmente
exclusivos. Esse requerimento nos leva a
1 1 iδ 1
⎜Sx ; - > = + − e − , (6.8)
2 2
onde novamente o coeficiente de ⎜+> foi escolhido Real e positivo. Com (6.7) e
(6.8) em mãos podemos rapidamente construir uma expressão para o operador Sx
bastando usar a equação (5.26). De (5.26) temos
S x = [ S x ;+ S x ;+ − S x ;− S x ;− ] , e após usarmos (6.7) e (6.8) obtemos :
h
2
[ h
S x = e − iδ 1 + − + e iδ 1 − + .
2
] (6.9)
Note que, como esperado, Sx é Hermitiano. A prova já foi feita em sala de aula,
mas seria interessante que você demonstrasse isso novamente. Um argumento
similar ao anterior com Sx trocado por Sy leva a
1 1 iδ 2
⎜Sy ; ± > = + ± e − , (6.10)
2 2
e
h − iδ 2
Sy =
2
e [
+ − + e iδ 2 − + . ] (6.11)
Nossa solução ainda não está completa, pois não conhecemos os números
Reais δ1, δ2 que aparecem nas expressões (6.7) a (6.11). Para determinarmos tais
constantes devemos usar uma informação ainda não explorada, a saber, a
invariância dos sistemas físicos sob rotações. Os resultados dos experimentos de
Stern-Gerlach em seqüência seriam análogos aos da figura (6.1) se giramos o
campo magnético que aponta ao longo de z, por 900, fazendo-o apontar ao longo
da direção y (ver fig. (6.2) ).
⎜Sy ; + >
⎜Sx ; +>
⎜α> iguais intensidades
Forno SGx SGy
⎜Sy ; −>

Fig. 6.2: invariância das leis físicas com relação a rotações.

Aqui também teremos:


S y ; ± S x ;+ = S y ;± S x ;− = 1 / 2 . (6.12)
Usando (6.8) e (6.10) e inserindo em (6.12) obtemos:
1 1
1 ± e i ( δ 1 −δ 2 ) = . (6.13)
2 2
A equação acima tem solução somente se δ 1 − δ 2 = ±π / 2 . Fica fácil ver então que
os elementos de matriz de Sx, Sy não podem ser Reais. Se um deles for Real, o
outro deve ser puramente Imaginário. Esse exemplo mostra novamente que a
introdução de números Complexos em mecânica quântica é uma característica
essencial. Com o resultado (6.13), é conveniente escolhermos Sx como Real e
usar δ 1 = 0 . O segundo angulo de fase δ 2 deve então ser ± π / 2 . Mas ainda existe
uma ambigüidade e isso não é surpresa. Quando escolhemos δ 1 = 0 ,
especificamos apenas as direções x̂ e ẑ , mas não a direção ŷ , i.e., não
especificamos o sistema de coordenadas. A escolha δ 2 = π / 2 é consistente com o
sistema de coordenadas tradicionalmente usado, esquematizado abaixo.

Z
Fig.6.3: Sistema de coordenadas
consistente com nossas
convenções.
Y
X
Abaixo fazemos um quadro resumindo o que deduzimos até agora, escrevendo as
expressões para os operadores Sx e Sy , além de seus autokets na base de Sz.
Lembramos novamente que todos os resultados se basearam no experimento de
Stern-Gerlach e nos postulados da mecânica quântica.

Resumo
1 1
⎜Sx ; ± > = + ± −
2 2

1 i
⎜Sy ; ± > = + ± − ,
2 2

Sx =
h
[ + − + − + ].
2

Sy =
h
[− i + − + i − + ].
2

Os operadores S ± definidos por S + ≡ h + − e S − ≡ h − + podem também


ser escritos em termos de Sx e Sy como segue
S ± ≡ S x ± iS y . (6.14)
Essas relações podem ser facilmente verificadas usando o quadro acima.
Agora iremos definir algumas relações que serão extremamente
importantes em nosso curso. Primeiro definiremos o comutador de dois
operadores A e B:
[A, B] ≡ AB − BA. (6.15)
O anticomutador é definido como:
{A, B} ≡ AB + BA . (6.16)
Para o nosso sistema de Spin ½ é fácil checar que :
[ ]
S i , S j = iε ijk hS k , (6.17)
e
{S , S } = 1 h δ
i j
2
ij . (6.18)
2
Para fecharmos todos os operadores que podemos trabalhar nesse sistema
de dois estados, podemos definir mais um operador Hermitiano como segue
r rr
S 2 = S .S ≡ S x + S y + S z .
2 2 2
(6.19)
Esse operador é associado ao quadrado do momento angular de spin. Usando a
relação de anticomutação (6.18), vemos facilmente que
r 3
S 2 = h2, (6.20)
4
r
isso é, para sistemas de spin ½ o operador S 2 é uma constante vezes o operador
identidade. Sendo assim esse operador comuta com as três componentes de spin
Sx, Sy e Sz , ou seja
r
[
S 2 , S i = 0. ] (6.21)
r2
No final do curso, mostraremos que para sistemas de spin maior que ½ , S não
será múltiplo do operador identidade. Entretanto, a relação (6.21) continuará
válida.
r
Note que a equação (6.20) pode ser escrita como S 2 = s ( s + 1)h 2 , onde
s=1/2 . Assim, embora classicamente pensaríamos que o maior valor possível da
r
componente-z (ou qualquer outra componente ) de S seja exatamente S _isto é,
rr
S .S _ em mecânica quântica o máximo de Sz será sempre um pouco menor que
S , pois sh (ou seja, h / 2 ) é sempre menor que s ( s + 1)h = 3h / 2 . “O momento
angular não está nunca apontando completamente ao longo da direção-z ”!

PROBLEMAS

1. Mostre que os operadores Sz, Sx e Sy, têm as seguintes representações por


h h h
matrizes: S z =& σ z , S x =& σ x , S y =& σ y , onde as matrizes σ z , σ x , σ y são as
2 2 2
matrizes de Pauli dadas por:
⎡1 0 ⎤ ⎡0 1 ⎤ ⎡0 − i ⎤
σz =⎢ ⎥ ; σx =⎢ ⎥ e σy =⎢ ⎥.
⎣0 − 1⎦ ⎣1 0⎦ ⎣i 0 ⎦
Algumas vezes usaremos os índices 1, 2 e 3 para x, y e z respectivamente.
Obtenha as relações de comutação entre esses operadores usando essa
representação.

2. Vocês já podem fazer praticamente todos os problemas do livro envolvendo


espaços KET discretos. Obs: nos problemas 2 e 3 aparecem as matrizes de
Pauli.

3. Problema Resolvido ( Livro texto Sakurai , pagina 61, problema 9 )

Encontre | S . n ; + > tal que

S . n̂ | S . n̂ ; + > = ( h / 2) | S . n̂ ; + >

onde n̂ é caracterizado pelos ângulos α , β ( mostrados na figura do livro , pag. 62 ) . Expresse sua
resposta como uma combinação linear de | + > e | − > .
Solução : n̂ é um vetor unitário arbitrário , apontando em certa direção do espaço físico tridimensional . Desta forma
podemos escrever n̂ = n x iˆ + n y ĵ + n z k̂ , com n x = sen β cos α , n y = sen β sen α ,
r r
n z = cos β . Sendo S = Sx iˆ + S y ĵ + S z k̂ , temos : S . n̂ = sen β cos α Sx + sen β sen α S y +
cos β S z . Mas o ket | S . n̂ ; + > também pode ser expandido em termos da base de S z , { | +> ,| − > } , ou seja
| S . n̂ ; + > = a | + > + b | − > , onde | a | 2 + | b | 2 = 1 ( condição de normalização ) . Assim , lembrando que Sx
= ( h / 2 ) ( | + >< − | + | − >< + | ) , S y = ( i h / 2 ) ( - | + >< − | + | − >< + | ) e
S z = ( h / 2 ) ( | + >< + | - | − >< - | ) , temos

S . n̂ | S . n̂ ; + > = ( h / 2) | S . n̂ ; + >
ou
( sen β cos α Sx + sen β sen α S y + cos β S z ) ( a|+> + b|−> ) = ( h/2)( a|+> + b|−> )

da qual obtemos as seguintes relações :


( sen β cos α - i sen β sen α ) b + ( cos β ) a = a (1)
( sen β cos α + i sen β sen α ) a - ( cos β ) b = b (2)
O complexo da primeira equação do sistema acima é ( sen β cos α + i sen β sen α ) b* + ( cos β ) a* = a* .
Multiplicando essa equação por a e a equação (2) por b* , temos

( sen β cos α + i sen β sen α ) b* a + ( cos β ) | a | 2 = | a | 2 (3)


( sen β cos α + i sen β sen α ) a b* - ( cos β ) | b | 2 = | b | 2 (4)
Subtraído ( 3 ) e ( 4 ) e usando a condição de normalização , vem | a | - | b | = cos β . Usando novamente a
2 2

condição de normalização, obtemos

|a| = ( cos β + 1 ) / 2 , ou a = cos( β / 2 ) e i θ .


2
( Aqui usamos a identidade
cos( β / 2 ) =[ ( cos β + 1 ) / 2] ½ e o fato de a ser complexo. Desta forma b = sen( β / 2 ) e i ν .Precisamos
determinar as fases θ , ν . É fácil ver da equação ( 1 ) que a também pode ser escrito como

a = [ ( sen β ) e- i α ] b / ( 1 - cos β ) . Usando os valores obtidos de a e b , isto é, a = cos( β / 2 ) e i θ, b=


sen( β / 2 ) e i ν , vem

e i α = e i ( ν - θ ) , isto é , α = ν - θ . Escolhendo θ = 0 segue ν = α . Logo

| S . n̂ ; + > = cos( β/ 2 ) | + > + sen( β/ 2 ) e i α | − >.

Fim do problema 9 do livro texto.


4- Mostre que ,se L e M são operadores Hermitianos, então os operadores

F = (1/2) (LM + ML ) e G = (i/2) (LM – ML ),


também são Hermitianos.

5- Para os operadores L e M satisfazendo a condição LM – ML = 1,encontre LM 2 – M 2 L .

6- Para os operadores L e M satisfazendo a condição LM – ML = 1,(ver problema 5),


encontre f( L ) M – M f (L) , onde f (L) é uma função qualquer do operador L .

7- PROBLEMA RESOLVIDO: (mais uma colher de chá ! Livro texto Sakurai, página
62, problema 10).
O operador Hamiltoniano para um sistema de dois estados é dado por
H=a (|1><1| - |2><2| + |1><2| + |2 ><1| ),
onde a é um número com unidade de energia. Encontre os autovalores e os
correspondentes autokets de energia (como combinação linear de | 1 > e | 2 > ).

SOLUÇÃO : neste espaço bidimensional , a base é formada pelos autokets de algum operador Hermitiano sendo dada
por { | 1 > , | 2 > }. Este conjunto é ortonormal. Fica claro que esta base não é a base de H (basta apenas
olhar a expressão para o operador H ). Como queremos calcular os autovalores e autovetores de H ,
devemos considerar a seguinte equação:
H |ψ > = e |ψ >, (1)
onde e representa os autovalores e | ψ > representa os autokets. Pelo formalismo matemático da Mecânica Quântica
podemos expandir | ψ > em uma combinação linear da base. Assim, escrevemos

| ψ > = c1 | 1 > + c2 | 2 > . (2)


Com a condição de que | ψ > seja normalizado (< ψ | ψ > = 1 ) , temos | c1 | + | c2 | = 1. Vamos primeiro
2 2

obter os autovalores e1 e e2 . Usando a definição do operador H dada no problema e as Eqs. ( 1 ) e ( 2 ), temos :


a ( | 1 > < 1 | - | 2 > < 2 | + | 1 > < 2 | + | 2 > < 1 | ) . ( c1 | 1 > + c2 | 2 > ) = e c1 | 1 > + e c2 | 2 > . (3)
Fazendo o produto explicitamente, obtemos duas equações do tipo :
a ( c1 + c 2 ) = e c1 , a ( c1 – c2 ) = e c2 . (4)
Lembrando que os números a e e são Reais, pois estão relacionados com os autovalores da energia (o operador H é
Hermitiano), podemos escrever as equações ( 4 ) tomando suas complexas conjugadas :

a ( c1* + c 2* ) = e c1* , a ( c1* – c2*) = e c2* . (5)


Multiplicando a primeira das Eqs. (4) com a primeira das Eqs. (5) e a segunda das Eqs. (4) com a segunda das
Eqs. (5) e usando | c1 | 2 + | c2 | 2 = 1 , obtemos outras duas equações da forma :

a2 [ 1 + c1 c2* + c2c1* ] = e2 | c1 | 2
, a2 [ 1 - c1 c2* - c2c1* ] = e2 | c2 |2 . (6)
Somando as equações ( 6 ) , obtemos os dois autovalores de H : e = ± 2 a . Para determinarmos os correspondentes
autovetores , podemos usar qualquer uma das equações ( 4 ). Usando a primeira , temos :
a ( c1 + c 2 ) = e c1 ⇒ c1 ( a – e ) = - a c2 . Para o primeiro autovalor e = 2 a ,segue c1 ( a – 2 a) = - a c2 , ou

c1 = c2 / ( 2 - 1 ) .Usando novamente | c1 | 2
+ | c2 | 2
= 1, podemos obter c1 e c2 que substituídos na Eq.(2) levam a

|ψ 1 > = ( 2 (2 - 2 ) – 1/ 2 ( | 1 > + ( 2-1)|2>), para e= 2a. Da mesma forma

|ψ 2 > = ( 2 (2 + 2 ) – 1/ 2 ( | 1 > - ( 2 +1 ) | 2 > ) , para e = - 2a. Tentem fazer este mesmo problema
usando a representação por Matrizes!

Fim do problema 10 do livro texto.

8. Dado os operadores (matrizes de Pauli)


⎛0 1⎞ ⎛0 − i⎞ ⎛1 0 ⎞
σ x = ⎜⎜ ⎟⎟, σ y = ⎜⎜ ⎟⎟, σ z = ⎜⎜ ⎟⎟,
⎝1 0⎠ ⎝i 0 ⎠ ⎝ 0 − 1⎠
prove as seguintes relações:
(a) sen (σ x ϕ ) = σ x sen ϕ ;
(b) cos (σ z ϕ ) = cos ϕ .

9. Encontre as autofunções e autovalores para os operadores σ x e σ y .


Os problemas a seguir envolvem espaços contínuos que vocês começarão a estudar na aula
de 09/04/2000 (isto é, na aula em que essa lista será entregue . Portanto, podem colocar a
mão na massa! )
10. Encontre as relações de comutação para os seguintes operadores:
d r r r ∂
(a) x e ; (b) ih ∇ e A (r ) ; (c) e f (r , θ , ϕ ) .
dx ∂ϕ

11. Encontre a relação explícita para os seguintes operadores:


2 2
⎛d ⎞ ⎛ d ⎞
(a) ⎜ + x ⎟ ; (b) ⎜ x ⎟ .
⎝ dx ⎠ ⎝ dx ⎠

12. Ache o operador translação que mapeia ψ (x) em ψ ( x + a) .

A Estrutura da Mecânica Quântica


(resumos e comentários)

Anteriormente, tivemos a oportunidade de ver quatro postulados da


Mecânica Quântica. Falta ainda um postulado e o objetivo dessa seção será
colocá-los todos juntos e fazer uma analise crítica da teoria. O postulado que
está faltando poderia ser colocado como o terceiro e então mudaríamos a
ordem estabelecida no nosso raciocínio inicial. Trata-se do postulado que
determina a evolução temporal, isto é, a dinâmica do Ket, introduzido no
primeiro postulado. Mas antes de apresentarmos definitivamente a estrutura da
mecânica quântica, vamos rever alguns conceitos primitivos que são comuns
em teorias físicas. Em geral, o assunto de uma teoria é denominado sistema
físico, o qual toma o lugar do que ordinariamente chamamos “coisa”. Um
sistema pode consistir de muitas partes; sistemas de uma única parte são
chamados simples (individual). O estado de um sistema físico nos dá um
resumo abstrato de todas as suas características num tempo específico sem
se comprometer com qualquer tipo específico de caracterização.
Caracterizações definidas são feitas pelas variáveis dinâmicas. Pode existir
muitas variáveis que descrevem o mesmo estado. O estado e as variáveis
dinâmicas são igualmente importantes em teorias físicas. Um sistema pode
assumir diferentes estados em tempos diferentes. Todos os estados possíveis
do sistema estão englobados em seu espaço de fase. Por exemplo, o espaço
de fase de uma partícula clássica (sistema simples) é uma multiplicidade
diferenciável de seis dimensões. Quando as variáveis dinâmicas específicas
são escolhidas, o estado da partícula pode ser definitivamente descrito,
digamos, em termos de sua posição e momentum. A partícula é governada
pela equação de movimento de Newton, e a variação temporal de seu estado
traça uma curva no espaço de fase.
A estrutura da mecânica quântica tem mais elementos. Mais
especificamente, suas variáveis dinâmicas (como já vimos, chamadas
observáveis), têm uma estrutura conceitual mais complicada. Além de
descrever o estado, uma propriedade que ele divide com as variáveis
dinâmicas clássicas, um observável também nos dá os possíveis resultados de
uma medida. Mecânica quântica prevê a probabilidade de obter cada
resultado. Nessa seção, consideraremos apenas estados puros de sistemas
físicos simples (individual) e observáveis com espectros não degenerados.
Com os conceitos primitivos expostos acima, consideremos agora os
postulados da mecânica quântica. Vou escrevê-los novamente, agora de uma
maneira completa, introduzindo o que estava faltando e, portanto, mudando a
ordem estabelecida nas seções anteriores. Abaixo de cada postulado faremos
comentários.

Postulado 1. Um estado de um sistema quântico é representado por um


vetor (raio) unitário α em um espaço de Hilbert complexo H.
O assunto da mecânica quântica é um sistema isolado, cujas interações
com o resto do mundo, incluindo instrumentos para a sua medida, são
negligenciadas. Com muita freqüência, sistemas simples (individuais) são
considerados. Tais sistemas não são meramente ideais; recentes
experimentos têm produzido estados de um único fóton e “capturado” átomos
individuais para registrar suas transições. Algumas vezes, um sistema pode
também estar em um ensemble de itens tratados como uma unidade, tal como
uma coleção de elétrons preparados em algum modo definido (por exemplo,
em um estado de spin up).
Sistemas quânticos são geralmente microscópicos, mas apenas a
dimensão não é um critério suficiente. Por exemplo, o fenômeno da
supercondutividade pode ser bem extenso, e a barra de Weber elaborada para
experimentos com objetivo de detectar ondas gravitacionais pesa quase uma
tonelada e mesmo assim ambos os sistemas podem ser representados por um
vetor estado quântico (Ket). Em cosmologia quântica, todo o universo é
representado por um estado quântico. Podemos então considerar o mundo
quântico em regiões onde a Física clássica falha. Tal qualificação impõe um
limite sobre a validade da mecânica quântica; não existe ainda evidencia de
que ela se aplique diretamente a entidades clássicas. O limite é “embaçado”;
não temos critérios satisfatórios que separam sistemas quânticos de clássicos.
Um estado quântico é o resumo máximo e completo das características do
sistema quântico em um momento do tempo. Para efeito de comparação, a
qualificação acima tem o mesmo significado que a frase “em mecânica
Newtoniana, a equação de movimento com condições iniciais nos dá uma
descrição completa e máxima da trajetória de uma partícula clássica”. A
descrição do estado consiste de constantes características tais como a massa
e a carga do sistema, e as variáveis características que mudam no tempo. A
coleção de todos os estados permissíveis para um sistema quântico é
representado teoricamente por seu “espaço-estado” (ou espaço de fase), o que
é um espaço de Hilbert complexo. Um espaço de Hilbert H é uma
generalização do espaço Euclidiano familiar. Ele é um espaço linear cujos
elementos ⎜β > são chamados vetores (ou raios). Ele é também equipado com
um produto interno, que mapeia um par de vetores ⎜βi > e ⎜βj > em um número
complexo < βi ⎢βj >. Dois vetores ⎜βi > e ⎜βj > são ortonormais se < βi ⎢βj > = δij
e um conjunto ortonormal de vetores { ⎢βi >} formam uma base de H se cada
vetor em H pode ser escrito como uma combinação linear de seus membros.
Uma base de H é análoga a um sistema de coordenadas na geometria
cartesiana. O número de vetores da base nos dá a dimensão de H.
Como já vimos, um estado quântico é representado por um vetor unitário
α , mas lembrando que um vetor unitário é aquele cuja a norma ou magnitude
é igual a 1, α α = 1 , segue que se α representa um estado, então e iθ α ,
onde θ é um número arbitrário chamado fator de fase, também representa o
mesmo estado. As características de um estado são mais obvias a partir de
suas relações com outros estados. Um vetor pode ser representado como uma
combinação linear de outros vetores; similarmente, um estado pode ser
expandido em uma superposição linear de outros estados. Este é o princípio
de superposição quântico. O princípio pode ser entendido da seguinte maneira:
a adição ou subtração de quantidades geralmente levam a uma quantidade do
mesmo tipo; a soma de dois comprimentos é um comprimento, a superposição
de dois estados quânticos é um estado quântico. Mecânica quântica é peculiar
no sentido que seu próprio espaço de fase possui a estrutura requerida para
suportar as operações de adição e subtração.
Mais especificamente, α pode ser escrito em termos de um conjunto de
α = ∑ φ i α φ i = ∑ ci φ i ; ∑
2
estados da base { φ i } como ci = 1,
i i i

é unitária quando α
2
onde a soma ci é um vetor unitário. Os números
complexos ci ≡ φ i α são chamados amplitudes, ou amplitudes de
probabilidades para distinguirmos de outras amplitudes familiares na mecânica
2
clássica. Não podemos fazer confusões: o quadrado absoluto c i é uma
probabilidade; c i não. A raiz quadrada de uma quantidade não é, em geral,
uma quantidade do mesmo tipo; a raiz quadrada de uma área é um
comprimento, mas a raiz quadrada de um comprimento eu não sei o que é.
Assim, o significado de c i não precisa ser conferido.

Postulado 2. Um observável associado com um sistema quântico é


representado por um único operador hermitiano A atuando sobre seu espaço
de Hilbert.

Um observável é uma variável dinâmica. Exemplos familiares de


observáveis são energia, posição e momentum. Eles não devem ser
confundidos com seus xarás clássicos. O momentum quântico tem uma
estrutura mais rica que o momentum clássico. Alguns observáveis, como o
spin, não tem nem análogo clássico.
Um operador A é uma transformação linear do espaço de Hilbert H nele
próprio. Muitos operadores são empregados em teorias quânticas, mas apenas
os operadores hermitianos representam observáveis. Os operadores
hermitianos se distinguem por possuírem um espectro consistindo somente de
números reais. Para um observável A, o espectro Λ(A) do operador que o
representa compreende o conjunto de todos os possíveis valores obtidos em
uma medida de A. Suponha que o observável A tenha um espectro puro,
sendo que Λ ( A) = { a i } , onde os números reais a i são chamados auto valores
de A. Os auto valores podem ser resultados diretos de experimentos. A
estipulação explicita de algumas quantidades que podem ser medidas
justificam o nome observável, embora os auto valores ou valores espectrais
são somente parte da estrutura dos observáveis.
Como uma transformação, um operador geralmente muda (mapeia) um
estado em outro. Entretanto, existem estados ⎢ai > tais que, para um
observável A, temos A ⎢ai > =ai ⎢ai >. Os estados ⎢ai > são denominados
autoestados de A. Eles são invariantes sob a operação de A, visto que, tudo o
que A faz é multiplicar o estado ⎢ai > por um fator numérico ai . O conjunto de
estados { ⎢ai > } constitui uma base de H : em termos da base, podemos
expressar qualquer estado ket ⎢φ >. Para observáveis com espectro não
degenerado, cada autovalor é associado com um autoestado. Já vimos que é
muito direto derivar o valor esperado de um observável A no estado ⎢φ >, <A>φ
=< φ ⎢A ⎢φ >.
Um estado ⎢φ > não está “amarrado” a um observável ou uma base
particular. Suponha que B seja outro observável com um conjunto de
autoestados { ⎢bi > }. Já sabemos que sempre podemos encontrar um operador
unitário U que faz uma mudança de base de ⎢ai > para ⎢bi >. As diferentes
bases associadas com os diferentes observáveis formam representações do
estado, por exemplo, a representação das posições ou a dos momenta. A
amplitude na representação das posições é chamada função de onda.
Dois operadores A e B comutam se AB = BA. Operadores, em geral, não
comutam. A ordem das operações são importantes porque o estado final de
uma operação é o estado inicial da próxima. Para um conjunto de operadores
que comutam mutualmente A,B,C,..., podemos encontrar uma representação
cuja a base é formada por autovetores simultâneos de A,B,C,... . Dois
observáveis são compatíveis se os operadores que os representam comutam,
e incompatíveis se eles não comutam. Observáveis incompatíveis não admitem
autoestados simultâneos e são peculiares em mecânica quântica. Exemplo
famoso de observáveis incompatíveis são o momentum Px e o observável
posição X. Sua relação de comutação [X , Px ] = ih , foi denominada condição
quântica fundamental por Dirac. Procurem rever um pouco mais as seções
anteriores para fixar as idéias aqui resumidas.
Postulado 3. A evolução temporal do estado (ket) é governada pela

equação de Schrödinger ih ψ = H ψ , onde i = − 1 , h é a constante de
∂t
Planck dividida por 2π , e H é o operador Hamiltoniano representando a
energia total do sistema.

A equação de Schrödinger é uma equação diferencial do tipo das equações


de movimento clássicas. Se o estado (ket) do sistema é dado em um instante
de tempo inicial t = t0, então ele é determinado para todo t > t0. Assim, o estado
quântico evolui deterministicamente no sentido que o movimento de uma
partícula clássica é determinístico. De fato, os estados quânticos são ainda
bem mais comportados. Mecânica quântica não admite movimentos caóticos
como em mecânica clássica, por que a equação de Schrödinger é linear e suas
soluções são periódicas ou quase periódicas.

Postulado 4. O único resultado possível de uma medida de um observável


físico representado por um operador A é um dos autovalores desse operador.

Postulado 5. Quando um observável físico é medido em um sistema


descrito pelo KET normalizado ⎜α >, a probabilidade de encontrarmos um
autovalor a’ do correspondente operador A é ⎜< a’ ⎜α >⎜2 , onde ⎜a’ > é um
autoket normalizado de A associado ao autovalor a’ .

Este é o postulado de Born da mecânica quântica. Ele não diz


absolutamente nada sobre a probabilidade que o estado tem ou sobre a
probabilidade de que o observável possui um certo autovalor ; a probabilidade e
o autovalor pertencem aos dados observados ou resultados de experimentos. O
conceito de probabilidade é apropriado, pois estamos falando sobre o resultado
observado de um estado puro simples, o qual pode ser apenas um “click” de um
contador Geiger.
Um evento único nos diz muito pouco sobre o sistema quântico em estudo.
Assim, o postulado de Born é sempre complementado com explicações que o
converte em asserções estatísticas. Diz-se que experimentos envolvem
observações repetidas ou observações sobre um ensemble de sistemas simples.
Desta forma, o postulado 5 é convertido para a seguinte forma:

Postulado 5’. Em um número muito grande de medidas de um observável


A, cada medida sendo feita em um ensemble de N sistemas todos no mesmo
estado ⎜α >, então, se N é grande, nos resultados de quase todas as medidas,
uma fração ⎜< a’ ⎜α >⎜2 dos dados tem o valor a’.

Este é um enunciado fenomenológico que pode ser verificado


empiricamente. Ele não nos diz nada sobre o resultado de um sistema simples.
O resultado de cada medida sobre um ensemble constitui uma amostra, o qual
é uma distribuição de N dados entre os valores a’. Ele não descreve nem o
resultado de um sistema simples nem o resultado de uma amostra simples,
mas sim, a estatística de um grande número de amostras. Na pra’tica, fazemos
apenas poucas medidas ou , como os estatísticos dizem, tomamos algumas
poucas amostras. Em cada amostra, a fração de dados com um determinado a’
pode desviar de ⎜< a’ ⎜α >⎜2. Entretanto, este postulado nos assegura que se a
quantidade de amostras ou a dimensão do ensemble for suficientemente
grande, então, mesmo que se fizermos somente uma medida sobre um
ensemble, a probabilidade é quase 1 de que teremos uma distribuição onde
uma fração ⎜< a’ ⎜α >⎜2 dos dados tenha o valor a’.
O termo valor esperado < A >α é melhor entendido no contexto de um
sistema simples, onde isto ocorre com probabilidade. Quando convertemos a
situação para o enunciado estatístico, < A >α é mais apropriadamente
interpretado como o valor médio da distribuição de dados.

Comentários

A estrutura da mecânica quântica apresentada acima mostra uma


peculiaridade: Os conceitos nos postulados 1 a 4 são completamente
diferentes dos conceitos contidos no postulado 5, e pouca explicação é dada
para a mistura dos mesmos. Mecânica quântica nos dá duas descrições que
diferem em natureza, assunto e tratamento. As características descritas pelo
vetores estado (kets) são não-clássicas ; elas são extremamente complexas e
estranhamente emaranhadas quando expressa em termos clássicos. Além da
sua “não-classicalidade” , a descrição do ket é apropriada; ela é
essencialmente a descrição de um sistema simples evoluindo de acordo com
uma equação de movimento. A descrição oferecida pela estatística dos
autovalores é exatamente o oposto. As características que ela descreve são
clássicas e familiares. Mas apesar de sua “classicalidade”, ela tem a aparência
de um bastardo; ela se aplica não a um sistema simples, mas somente a
ensembles, e é abruptamente “atirada” sem qualquer palavra sobre suas leis
de movimento; ela é meramente o resultado do “colapso” das características
não clássicas. O ponto crucial é que mecânica quântica não fornece nenhuma
correlação substancial entre as duas descrições. A única relação entre elas é
formal e abstrata. Tal relação é fornecida pelo observável, cujos auto- estados
contribuem para a descrição do estado e cujos autovalores para a descrição
estatística.
Bibliografia
1. J.J. Sakurai, Modern Quantum Mechanics, Addison-Wesley Publishing
Company, New York, 1994.
2. S.Y. Auyang, How is Quantum Field Theory Possible? , Oxiford University
Press, New York, 1995.

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