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Química

Farmacêutica

Ferramenta para o desenvolvimento


de novos fármacos. Interdisciplinar, é
responsável pela síntese de farmácos
mais eficazes e menos tóxicos.

Rubens de Oliveira Santos

Ciências Farmacêuticas

Janeiro,
Página | 0 2018
Química Farmacêutica
A Química Farmacêutica, Química Farmacêutica Medicinal ou Química
Medicinal dedica ao estudo das bases moleculares de ação de fármacos, a
relação entre sua estrutura química e atividade farmacológica com o
planejamento e desenho estrutural de novos compostos que tenha utilidade no
tratamento de doenças. A Química medicinal, por pesquisar a relação entre
substâncias químicas naturais e sintéticas com os sistemas biológicos, é uma
ciência multidisciplinar e complexa.

Este módulo foi elaborado numa sequência coerente buscando a apresentação


de sessões com assuntos de diferentes áreas das Ciências Biológicas e Exatas.
Inicia com a definição de conceitos os fundamentais da Farmacologia, a
farmacocinética e farmacodinâmica, sendo que o primeiro estuda o movimento
dos fármacos pelo organismo e o segundo aborda os fundamentos do
mecanismo de ação dos fármacos através da interação com receptores
biológicos. A segunda parte trata das características físico-químicas dos
fármacos que afetam sua farmacocinética e farmacodinâmica decorrente das
interações intermoleculares entre o fármaco, os tecidos e os receptores
biológicos. Nesta parte o leitor já tem esboça a ideia de como alterações na
molécula dos fármacos podem alterar o efeito desejado e diminuir os efeitos
indesejáveis. Em sua última parte, são abordadas as estratégias de síntese
orgânica empregadas para a criação artificial dos fármacos, o conceito de
protótipos e análogos.

Os objetivos deste módulo é apresentar as estratégias químicas empregada para


a descoberta de novos fármacos, síntese de compostos com maior seletividade
biológica com a redução de efeitos indesejáveis.

Objetivo – apresentar as estratégias químicas empregada para a descoberta


de novos fármacos, síntese de compostos com maior seletividade biológica
com a redução de efeitos indesejáveis.
Sumário
Química Farmacêutica ....................................................................................... 1

1. Princípios gerais .......................................................................................... 4

1.1. Farmacocinética .................................................................................... 4

1.1.1. Absorção ............................................................................................ 4

1.1.2. Distribuição ........................................................................................ 5

1.1.3. Metabolização .................................................................................... 6

1.1.4. Excreção ............................................................................................ 6

1.2. Farmacodinâmica .................................................................................. 6

1.2.1. Fármacos específicos ........................................................................ 7

1.2.2. Estereoquímica .................................................................................. 9

2. Efeito farmacológico e propriedades físico-químicas ................................ 10

3. Descoberta de fármacos ........................................................................... 11

4. Síntese de fármacos ................................................................................. 12

4.1. Simplificação molecular ....................................................................... 13

4.2. Síntese de séries homólogas .............................................................. 15

4.3. Latenciação ......................................................................................... 16

Leitura Complementar ............................................................................... 16

5. Atividades de aprendizagem ..................................................................... 18

6. Bibliografia Consultada [Arial, 12] ............................................................. 21

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1. Princípios gerais
Fármaco é definido como uma substância química utilizada para tratamento ou
diagnóstico de estados patológicos, buscando o benefício de pessoa ou animais
em que é administrado (BRASIL, 2013). Para exercer efeito, o fármaco deve
percorrer um caminho desde a sua entrada no organismo até o local onde
manifestará ação. Apesar de simples, fatores relacionados ao organismo e às
propriedades físico-químicas fármaco influenciam a intensidade da ação
esperada. O estudo do movimento do fármaco no organismo é denominado
farmacocinética e estudo da forma que o mesmo interage com locais específicos
do organismo é conhecido como farmacodinâmica (BRUNTON, 2012).

1.1. Farmacocinética

Um fármaco pode ser introduzido no organismo pela via enteral, ou seja, através
do trato gastrintestinal, pela via parenteral representada pelos medicamentos
injetáveis ou por sua aplicação sobre a pele e mucosas, conhecida por via tópica.
A farmacocinética divide o movimento do fármaco pelo organismo em quatro
fases: absorção, distribuição, metabolização e excreção (BRUNTON, 2012).

1.1.1. Absorção

A administração de medicamentos pela via oral é a mais usada por ser prática,
cômoda, segura e não invasiva. Um medicamento ingerido passa pela boca,
garganta, esôfago, estômago, intestino delgado, intestino grosso, podendo ser
eliminado pelas fezes. Para atingir o local de ação no organismo, o fármaco deve
passar do trato gastrintestinal para o sangue ou linfa, tendo como obstáculo a
membrana plasmática das células que revestem o trato gastrintestinal. A
passagem do local onde o fármaco é administrado para o sangue é denominada
absorção (THOMAS, 2003).

Como a membrana plasmática é de natureza lipídica, fármacos lipossolúveis são


absorvidos com muita facilidade, o mesmo não ocorrendo com fármacos
hidrossolúveis. O tamanho da molécula também interfere na absorção, pois
quanto menor o tamanho, maior a absorção. A presença de cargas elétricas na
molécula de fármaco é outra característica que diminui a absorção (BRUNTON,
2012). Apesar da lipossolubilidade, tamanho e cargas elétricas afetarem a

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absorção, os fármacos podem atravessar a membrana celular por proteínas
conhecidas como poros (figura 1).

Figura 1: modelo da membrana plasmática

Fonte: http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/biologia/glicocalice.htm

1.1.2. Distribuição

Após a absorção, o fármaco é distribuído pelo organismo através do sangue. O


sangue é formado por células dispersas na parte líquida denominada plasma,
uma solução de proteínas, minerais e outros nutrientes. Os fármacos
hidrossolúveis circulam dissolvidos no plasma ou ligados a proteínas
plasmáticas. Os fármacos lipossolúveis têm baixa solubilidade no plasma e são
transportados ligados às proteínas plasmáticas. A principal proteína
transportadora de fármacos é e albumina (THOMAS, 2003).

Do sangue os fármacos chegam aos diferentes tecidos do organismo, porém,


atingem concentrações diferentes conforme a taxa de irrigação sanguínea e

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composição do tecido. Tecidos bastante irrigados recebem maior quantidade de
fármaco. Órgãos com alta concentração de lipídios acumulam fármacos
lipossolúveis, como o cérebro e tecido adiposo e os fármacos hidrossolúveis
atingem altas concentrações de fármacos hidrossolúveis. Dessa forma, a ação
dos medicamentos é maior ou menor de acordo com a concentração do mesmo
em cada tecido (PATRICK, 2013).

1.1.3. Metabolização

Ao mesmo tempo em que o fármaco alcança o local onde exercerá o efeito


desejado, ele também chega ao fígado, o principal local de metabolização de
fármacos do organismo. Outros órgãos também fazem metabolização em taxas
menores que o fígado. Os produtos da metabolização são denominados
metabólitos, podendo apresentar ação maior, menor ou nula que o fármaco. Uma
quarta possibilidade é que o metabólito apresente toxicidade. A metabolização
tem como finalidade a eliminação do fármaco do organismo. Via a regra,
fármacos hidrossolúveis são eliminados com facilidade e os lipossolúveis são
transformados em metabólitos hidrossolúveis e então eliminados (PATRICK,
2013).

1.1.4. Excreção

Excreção é a eliminação de um fármaco do organismo. O fígado e os rins


assumem importante papel nesta etapa, eliminando pela bile ou urina,
respectivamente, o fármaco ou seus metabólitos. Fármacos lipossolúveis são
transformados em metabólitos hidrossolúveis que são eliminados pela bile ou
lançados para o sangue, que após passagem pelos rins, são eliminados pela
urina. Os fármacos hidrossolúveis são eliminados prontamente através da urina
(PATRICK, 2013).

1.2. Farmacodinâmica

Em nível molecular, o fármaco deve interagir com locais específicos da célula


para alterar sua função e produzir um efeito biológico desejado. Como visto em
farmacocinética, o fármaco tem distribuição por todo o organismo, provocando
efeito tanto sobre o órgão desejado quanto em outros locais, onde provoca os
efeitos indesejáveis. Os locais específicos de interação do fármaco são

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conhecidos como sítio de ação, divididos em três categorias: enzimas,
receptores específicos e sítios inespecíficos (NADENDLA, 2005).

As enzimas são proteínas que aceleram a velocidade de uma reação bioquímica.


O fármaco pode inibir a atividade da enzima e diminuir a velocidade da reação
catalisada. Os receptores específicos são proteínas presentes na superfície
externa da célula e regulam uma série de eventos bioquímicos intracelulares
necessários para o metabolismo celular. São ativados, em condições normais,
quando uma substância endógena (hormônio, neurotransmissor ou outras
substâncias específicas) interagem quimicamente com eles. Os fármacos
interagem com os receptores. Se provocar o mesmo efeito da substância
endógena é denominado agonista e se impedir o efeito provocado pela
substância endógena e chamado antagonista (BARREIRO, 2001ª).

A ação sobre sítios inespecíficos se dá por meio físico ou químico na superfície


externa das células, como a simeticona na eliminação de gases ou do efeito
neutralizante de antiácido no estômago (NADENDLA, 2005).

1.2.1. Fármacos específicos

O desenvolvimento de fármacos específicos é um dos principais objetivos da


Química Farmacêutica Medicinal. A interação do fármaco com receptores
semelhantes em diferentes órgãos, além do órgão afetado, provoca os efeitos
indesejáveis. O reconhecimento do fármaco pelo receptor depende da estrutura
de ambos e determinada pelo arranjo espacial dos grupos químicos funcionais.
É preciso a complementaridade entre os grupos num sistema específico
semelhante do tipo chave-fechadura. A figura 2 representa este sistema e
apresenta uma comparação entre os grupos funcionais do ácido acetilsalicílico
(AAS) e os dentes da chave (BARREIRO, 2001b).

Figura 2: Sistema chave-fechadura

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Fonte: Barreiro, 2001b

O nível de interação do fármaco com o receptor determina a resposta biológica


como agonista ou antagonista (figura 3). A nafazolina é um fármaco agonista da
adrenalina usado como descongestionante nasal. O estímulo dos receptores
presentes na musculatura lisa dos capilares nasais que resulta em
vasoconstricção e descongestionamento. Se usado em excesso, a nafazolina é
deglutida e absorvida, agindo sobre a musculatura lisa das artérias e aumento
da pressão arterial. Já o propranolol interage com os receptores de adrenalina e
não produz efeito fisiológico, além de impedir a ligação da adrenalina, sendo seu
antagonista (FRAGA, 2001).

Figura 3: Interação fármaco-receptor

Fonte: Fraga, 2011

A interação fármaco receptor é regida pelas seguintes forças intermoleculares:


forças eletrostáticas, forças de dispersão, interações hidrofóbicas, ligações de

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hidrogênio e ligação covalente. Tais forças determinam a intensidade da
interação e a potência de fármacos específicos ou inespecíficos (BARREIRO,
2008).

1.2.2. Estereoquímica

Isômeros espacial ocorre quando dois compostos que têm a mesma fórmula
estruturas, mas a disposição espacial dos átomos ou grupos funcionais possuem
diferentes posições espaciais. Considera o arranjo tridimensional das moléculas.
Os receptores biológicos, no conceito de chave-fechadura, demonstram
especificidade para um dos isômeros em virtude de sua própria estrutura
tridimensional e composição química. A geometria espacial é dividida em
geométrica e ótica (LIMA, 1997).

A isomeria geométrica (figura 4) ocorre em ligações carbônicas insaturadas e


dois radicais diferentes ligados aos carbonos e os dois isômeros recebem o
prefixo de cis ou trans (FRAGA, 2011).

Figura 4: isomeria geométrica

Fonte: Fraga, 2011

A isomeria ótica ocorre em moléculas que possuem pelo menos um carbono


assimétrico, ou seja, cada uma de suas quatro ligações é com átomos ou radicais
diferentes (Figura 5). Os isômeros desviam a luz polarizada para esquerda ou
direita, chamados levogiros ou dextrogiros, respectivamente (FRAGA, 2011;
COELHO, 2001).

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Figura 5: isomeria ótica

Fonte: http://mundodabioquimica.blogspot.com.br/2012/12/enantiomeros.html

2. Efeito farmacológico e propriedades físico-químicas


O efeito desejado de um fármaco é influenciado por suas características
intrínsecas: o grau de ionização (pKa) e o coeficiente de partição (P). A
movimento pelo organismo e a interação com o receptor de fármacos com o
mesmo efeito varia de acordo com essas propriedades. Consequentemente, a
Química Farmacêutica Medicinal pode alterar moléculas para aumentar os
efeitos desejáveis e minimizar os efeitos indesejáveis (BARREIRO, 2008).

O grau de ionização (pKa) é um parâmetro que varia de acordo com o meio em


que o fármaco se encontra. Indica a proporção entre a razão entre parte ionizada
e não ionizada, sendo que a primeira, com carga elétrica, tem dificuldade em
atravessar as barreiras biológicas e movimentar-se pelo organismo. Para um
fármaco ácido, a forma não ionizada predomina quando o pH do meio é menor
que seu pKa e a forma ionizada quando o pH é maior que o pKa. Para fármacos
básicos, a forma ionizada predomina quando o pH do meio for menor que seu
pKa e a não ionizada quando o pH for maior. A figura 6 apresenta o valor de pKa
de alguns fármacos (SOUZA, 2012).

Figura 6: pKa de alguns fármacos

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Fonte: Souza, 2012

O coeficiente de partição (P) traduz o grau de solubilidade em lipídeos ou água.


É a razão entre a solubilidade do fármaco na fase orgânica (apolar) pela
solubilidade na fase aquosa (polar). Se o valor é maior que 1, o fármaco é mais
solúvel em lipídeos que em água e se menor que 1, maior solubilidade em água
que em lipídeos. Como visto em farmacocinética, maior a lipossolubilidade, maior
é a passagem do fármaco pelas membranas celulares, facilidade de absorção e
dificuldade de eliminação (SOUZA, 2012).

3. Descoberta de fármacos

Antes do século XX, a os remédios eram baseados uso de plantas, partes de


animais, minerais e poções. Em meados do século XIX é que os esforços
levaram ao isolamento das substâncias quimicamente ativas responsáveis pelas
propriedades desses remédios, que foram chamadas de princípios ativos. O
êxito dos esforços levou ao nascimento da indústria farmacêutica de hoje. Desde
então, muitos fármacos de ocorrência natural foram obtidos e suas estruturas
químicas determinadas, como a morfina a partir do ópio extraído da papoula, a
cocaína das folhas de coca e o quinino da casca da quina (ALVES, 2001).

Esses compostos naturais serviram como molde para os químicos


desenvolverem milhares de análogos na tentativa de melhorar o que a natureza
forneceu. Muito trabalho se deu pela tentativa e erro que forneceram muitos
princípios para o design dos fármacos sintéticos. Os mecanismos moleculares

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pelos quais os fármacos agem raras vezes foram conhecidos e as pesquisas
concentravam nos efeitos dos protótipos, substâncias químicas naturais ou
sintéticas com atividade biológica (PATRICK, 2013).

Atualmente a Química Farmacêutica Medicinal promove uma mudança


revolucionária. Os avanços tecnológicos resultaram num melhor entendimento
do funcionamento da célula e do organismo em nível molecular. Como resultado,
muitos projetos de pesquisa na indústria farmacêutica e universidades procuram
identificar o alvo (receptores) dos fármacos no organismo e desenhar a molécula
que interage com esses alvos. Identificar a estrutura e função dos receptores é
e a maneira que o potencial fármaco interage crucial para lançar um novo
medicamento no mercado. A descoberta, design e desenvolvimento de um novo
fármaco segue as etapas descritas a seguir (NADENDLA, 2005).

A descoberta do fármaco inicia pela escolha da doença e passa pela escolha


do receptor, os tipos de testes biológicos a serem usados, a seleção, purificação
e determinação da estrutura do protótipo. Segue a etapa de design do fármaco,
onde estabelece a relação entre a estrutura química e atividade biológica,
identificação da porção da molécula que interage com o receptor (farmacóforo),
melhoria da interação com o receptor e melhoria nas propriedades
farmacocinéticas (PATRICK, 2013).

Após estas fases, entra na etapa de desenvolvimento, onde o fármaco é


patenteado e os testes clínicos em animais são realizados. Os testes consistem
em estudos do metabolismo, toxicidade, formulação, estabilidade e
farmacológicos. Então é desenvolvido o processo de produção industrial, testes
clínicos em humanos, registro de mercado e venda do medicamento. A
descoberta, design e desenvolvimento de um novo fármaco dura, em média, 15
anos, envolve a síntese de mais de dez mil compostos químicos e consome
cerca de 800 milhões de dólares (PATRICK, 2013).

4. Síntese de fármacos
Os fármacos sintéticos representam a maioria dos princípios ativos dos
medicamentos da atualidade e a Química Farmacêutica Medicinal é a ferramenta
para o desenvolvimento de novos fármacos, empregando inúmeros processos

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na obtenção, desde modificações das moléculas até modelos computacionais de
modelagem de fármacos (CADD – computer aided drug design). Após a
descoberta do protótipo, alterações moleculares produzem novos compostos
com propriedades terapêuticas melhoradas, seja pelo aumento da
biodisponibilidade, diminuição da toxicidade, prolongamento da ação, aumento
da seletividade nos receptores e escolha de um transportador adequado. Tais
moléculas alteradas são denominadas análogos. Os processos de modificação
molecular de fármacos são métodos clássicos da síntese orgânica: a
simplificação molecular, a síntese de séries homólogas e a latenciação (CERA e
. PANCOTE, 2013)

4.1. Simplificação molecular

Nesta estratégia, a modificação molecular consiste na simplificação da molécula


do protótipo com a obtenção de um análogo mais simples. No exemplo abaixo
(Figura 7), a simplificação da cocaína, que possui efeito anestésico local, levou
à descoberta da procaína, conservando a propriedade anestésica local e
eliminando as propriedades narcóticas do protótipo (CERA e PANCOTE, 2013).

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Figura 7: simplificação molecular da cocaína

Fonte: Cera e Pancote, 2013

Moléculas que contêm sistemas de anel fechado são simplificados por abertura,
expansão, contração ou até mesmo retirados (figura 8). Dessa forma é possível
determinar qual parte da molécula interage com o receptor. Tal estratégia é
conhecida como dissociação de anel (CERA e PANCOTE, 2013).

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Figura 8: Dissociação de anel

Fonte: Cera e Pancote, 2013

4.2. Síntese de séries homólogas

Nesta estratégia ocorre a inserção de um grupo presente na molécula de forma


repetida (Figura 9). Quando o é o grupo metileno, origina um homólogo linear e
se for um anel, um homólogo cíclico. Cada homólogo difere do outro pela
quantidade de grupos inseridos (CERA e PANCOTE, 2013).

Figura 9: séries homólogas

Fonte: Cera e Pancote, 2013

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4.3. Latenciação

Muitos fármacos podem ser transformados em pró-fármacos para melhorar suas


propriedades farmacocinéticas e efeitos adversos. Pró-fármaco é um composto
formado pela ligação do fármaco com outra molécula para melhorar a absorção,
prolongar a ação e reduzir seus efeitos tóxicos. Quando metabolizado, libera o
fármaco ativo. É uma das estratégias mais empregadas. A figura 10 mostra a
latenciação do naproxeno, um anti-inflamatório que produz irritação gástrica. O
produto formando o pró-fármaco naproxeno 2-glicerídeo, com menor irritação e
é melhor absorção (CERA e PANCOTE, 2013).

Figura 10: latenciação do naproxeno

Fonte: Cera e Pancote, 2013

Leitura Complementar

A natureza como fonte de inspiração

A Humanidade aprendeu a usar as plantas utilizando chás de origem vegetal


para curar ou como bebida sagrada, em rituais e festividades pagãs,
identificando suas propriedades alucinógenas ou afrodisíacas. De fato,
inúmeros alcalóides indólicos ocorrem em plantas empregadas pelos índios

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em suas comemorações. Muitos dos componentes químicos destas plantas
foram identificados, posteriormente, como substâncias extremamente ativas
no sistema nervoso central (SNC), como o harmano e a harmina. Esta
atividade central deve-se à semelhança existente entre suas estruturas e a
serotonina, um neurotransmissor que possui um núcleo indólico.

Para caçar ou pescar, os ameríndios sabiam empregar poções capazes de


envenenar ou simplesmente imobilizar sua presa, sem que houvesse
manifestação de efeitos tóxicos ao comê-la. Como exemplo temos as plantas
com propriedades ictiotóxicas conhecidas pelos índios da Amazônia, que as
empregavam como timbós. O curare, alcalóide tetraidroquinolínico originário
da flora da América do Sul, inspirou os bloqueadores ganglionares
representados entre outros pelo hexametônio.

Talvez uma das plantas mais antigas empregadas pelo homem seja a Papaver
somniferum, que originou o ópio e contém alcalóides e substâncias como a
morfina. O ópio era conhecido das civilizações antigas, havendo relatos que
confirmam seu uso desde 400 aC. Os estudos químicos sobre o ópio
começaram no século XIX, e em 1804 Armand Séquin isolou seu principal
componente, a morfina, batizada em homenagem ao deus grego do sono,
Morpheu. Esta substância, com estrutura química particular, tornou-se o mais
poderoso e potente analgésico conhecido e em 1853 e estrutura química da
morfina foi elucidada em 1923 por Robert Robinson e colaboradores. Sua
síntese foi descrita em 1952, cento e quarenta e oito anos após seu isolamento
por Séquin. A partir da estrutura química da morfina, identificaram-se potentes
analgésicos centrais de uso mais seguro, representados pela classe das 4-
fenilpiperidinas.

A imensa flora americana deu significativas contribuições à terapêutica, como


a descoberta da lobelina em Lobelia nicotinaefolia, usada por tribos indígenas
que fumavam suas folhas secas para aliviar os sintomas da asma. A quinina,
um dos principais componentes da casca de Cinchona officinalis, há muito
tempo era conhecida pelos amerindíos como antitérmico. Este alcalóide
quinolínico originou os fármacos anti-maláricos como a cloroquina e
mefloquina. Os primeiros anti-maláricos descobertos possuíam em sua

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estrutura um sistema azo-heterocíclíco, inicialmente acridínico (por exemplo a
quinacrina) ou quinolínico, imitando aquele presente no produto natural. Os
derivados quinolínicos originais pertenciam à classe das 4-amino ou 8-
aminoquinolinas (como a cloroquina, primaquina). A mefloquina, também um
derivado anti-malárico que possui o sistema quinolínico, descoberto mais
recentemente, tem um maior índice de similaridade estrutural com o produto
natural, apresentando em sua estrutura o sistema quinolinil-piperidinometanol,
oriundo do esqueleto rubano da quinina, substituído por dois grupamentos
trifluormetila nas posições C-2 e C-8. Esta substância foi descoberta no
Instituto Walter Reed do exército americano, nos EUA, para ser administrado
em uma única dose diária.

O mais espetacular exemplo de complexidade molecular em um produto


natural não-proteico é a palitoxina, isolada de corais Palythoa tuberculosa. Em
concentrações picomolares a palitoxina é capaz de modificar
significativamente a permeabilidade de cátions pela membrana celular,
atuando, aparentemente, como uma ATPase de membrana, inibindo a bomba
de Na+/K+.

5. Atividades de aprendizagem
1. A farmacocinética estuda o movimento dos fármacos pelo organismo.
Assinale a alternativa correta:
a) A distribuição é definida como a passagem do fármaco do local de
administração até o tecido em que exerce efeito
b) A passagem do fármaco do trato gastrintestinal para o sangue ou linfa
é denominada absorção
c) A passagem do fármaco do sangue para os tecidos é denominada
absorção
d) A distribuição não depende da polaridade dos fármacos
e) Fármacos lipossolúveis acumulam em tecidos com grande conteúdo
de água, como os rins
2. Sobre a absorção de fármacos é correto afirmar:
a) Fármacos com carga elétrica são absorvidos com maior facilidade

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b) Fármacos com polares são facilmente absorvidos
c) Os fármacos lipossolúveis são melhor absorvidos
d) Os fármacos são todos absorvidos, independente de carga,
polaridade ou lipossolubilidade
e) Todos os fármacos são absorvidos por poros presentes na membrana
plasmática
3. Analise as estruturas abaixo e assinale a alternativa correta:

a) A primeira molécula melhor interage com o receptor


b) A segunda molécula melhor interage com o receptor
c) A terceira molécula melhor interage com o receptor
d) Nenhuma molécula interage com o receptor
e) Todas as moléculas têm a mesma interação com o receptor
4. São os principais órgãos de metabolização de fármacos:
a) Rins e bexiga
b) Pulmões e fígado
c) Fígado e rins
d) Pulmões e rins
e) Pele e pulmões
5. É correto afirmar sobre a relação entre a estrutura do fármaco e seu
efeito no receptor:
a) Os dois isômeros óticos de um fármaco interagem da mesma forma
com o receptor específico
b) Os dois isômeros geométricos interagem da mesma forma com o
receptor específico

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c) A interação do fármaco com o receptor específico acontece apenas
com um dos isômeros, seja geométrico ou ótico
d) A disposição espacial dos grupos ligados a um carbono assimétrico
não influencia a ligação com o receptor específico.
e) A ligação com o receptor depende apenas de dupla ligação ou
carbono assimétrico.
6. O fármaco A tem um pKa de de 2,7 e o fármaco B um pKa de 8,1.
Considerando que no estômago o pH é abaixo de 1,0, assinale a
alternativa correta:
a) O fármaco B encontra-se totalmente ionizado no estômago e é melhor
absorvido.
b) O fármaco B encontra-se totalmente não-ionizado no estômago e é
melhor absorvido.
c) O fármaco B encontra-se totalmente ionizado no estômago e não é
absorvido.
d) O fármaco A encontra-se totalmente ionizado no estômago e é melhor
absorvido.
e) O fármaco A encontra-se totalmente não-ionizado no estômago e é
melhor absorvido.
7. Na descoberta de novos fármacos, assinale a alternativa que, na
atualidade, é responsável pela maioria das descobertas:
a) Plantas
b) Animais
c) Minerais
d) Síntese orgânica
e) Todas as fontes naturais
8. A reação abaixo é uma estratégia para a síntese de fármacos. Assinale
a alternativa que a representa :

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a) Hibridização molecular
b) Simplificação molecular
c) Síntese de séries homólogas
d) Latenciação
e) Simplificação e latenciação
9. A simplificação molecular tem como objetivos:
a) A síntese de um pró-fármaco
b) Síntese de um protótipo a partir de um análogo
c) Aumentar a lipossolubilidade
d) Eliminar as propriedades indesejável de um protótipo com a
manutenção do efeito farmacológico desejado
e) Reduzir a toxicidade e aumentar a absorção
10. Assinale a alternativa correta:
a) O protótipo é uma molécula que atua apenas como antagonista
b) O protótipo é uma molécula que atua como agonista apenas
c) Protótipo é uma molécula natural ou sintética que serve de modelo
para a síntese de análogos
d) Um análogo tem a mesma estrutura química, isomeria geométrica e
ótica, maior efeito biológico e lipossolubilidade do protótipo
e) Os protótipos são sintetizados a partir da inserção de séries
homólogas num análogo

6. Bibliografia Consultada [Arial, 12]


ALVES, H. M. A diversidade química das plantas como fonte de fitofármacos.
Cadernos Temáticos de Química Nova na Escola, n. 3, 2001. Disponível em:
<http://qnesc.sbq.org.br/online/cadernos/03/divers.pdf>. Acesso em: 04 jan.
2018.

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BARREIRO, E. J. Química medicinal: as bases moleculares da ação de
fármacos. Porto Alegre: Artmed, 2008.

BARREIRO, J. B. Introdução à química dos fármacos. Cadernos Temáticos de


Química Nova na Escola, n. 3, 2001. Disponível em:
<http://qnesc.sbq.org.br/online/cadernos/03/introd.pdf>. Acesso em: 04 jan.
2018.

BARREIRO, J. B. Sobre a química dos remédios, dos fármacos e dos


medicamentos. Cadernos Temáticos de Química Nova na Escola, n.3, 2001.
Disponível em: <http://qnesc.sbq.org.br/online/cadernos/03/remedios.pdf>.
Acesso em: 04 jan. 2018.

BRASIL. Agencia Nacional de Vigilância Sanitária. Manual das denominações


comuns brasileiras. 6 ed. São Paulo: Sindusfarma, 2013. Disponível em:
<http://portal.anvisa.gov.br/dcb/conceitos-e-definicoes>. Acesso em: 04 jan.
2018.

BRUNTON, L. L. Goodman & Gilman: As Bases Farmacológicas da


Terapêutica. 19ª ed. Rio de Janeiro: McGraw-Hill, 2012.

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