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http://www.ebah.com.br/content/ABAAAA8O8AC/introducao-a-microbiologia
A Microbiologia era definida, até recentemente, como a área da ciência que dedica-se ao estudo dos
microrganismos, um vasto e diverso grupo de organismos unicelulares de dimensões reduzidas, que podem ser
encontrados como células isoladas ou agrupados em diferentes arranjos (cadeias ou massas), sendo que as
células, mesmo estando associadas, exibiriam um caráter fisiológico independente.
Assim, com base neste conceito, a microbiologia envolve o estudo de organismos procariotas (bactérias,
archaeas), eucariotas inferiores (algas, protozoários, fungos) e também os vírus.
Esta área do conhecimento teve seu início com os relatos de Robert Hooke e Antony van Leeuwenhoek, que
desenvolveram microscópios que possibilitaram as primeiras observações de bactérias e outros
microrganismos, além de diversos espécimes biológicos. Embora van Leeuwenhoek seja considerado o "pai"
da microbiologia, os relatos de Hooke, descrevendo a estrutura de um bolor, foram publicados anteriormente
aos de Leeuwenhoek. Assim, embora Leeuwnhoek tenha fornecido importantes informações sobre a
morfologia bacteriana, estes dois pesquisadores devem ser considerados como pioneiros nesta ciência.
Hooke para o desenvolvimento da Microbiologia
Recentemente foi publicado um artigo discutindo a importância de Robert
Esquema do microscópio construído por Robert Hooke e um esquema de um fungo observado por este pesquisador. (Adaptado de
Tortora et al., Microbiology - 8 ed)
Réplica do microscópio construído por Leeuwenhoek e de suas ilustrações, descrevendo os "animálculos" observados. (Adaptado do
livro Brock Biology of Microorganisms, 10 Ed., 2003)
De acordo com a definição tradicional da microbiologia, esta é uma ciência que até recentemente, era
responsável pelo estudo de organismos classificados em três reinos distintos: Monera, Protista e Fungi. No
entanto, a partir dos estudos de Carl Woese, a microbiologia passou a estar relacionada a três domínios de
seres vivos.
Sistemas de classificação dos seres vivos:
Linnaeus (séc. XVIII): reinos Animal e Vegetal
Haeckel (1866): introdução do reino Protista
Whittaker (1969): 5 reinos, dividos principalmente pelas características morfólogicas e fisiológicas:
Monera: Procariotos
Protista: Eucariotos unicelulares - Protozoários (sem parede celular) e Algas (com parede celular)
Fungi: Eucariotos aclorofilados
Plantae: Vegetais Animalia: Animais
Classificação dos seres vivos, de acordo com Whittaker (1969) (Adaptado de Pommerville, J.C.(2004) Alcamo's Fundamentals of
Microbiology)
No entanto, a partir dos estudos de C. Woese (1977), passamos a dispor de um sistema de classificação
baseado principalmente em aspectos evolutivos (filogenética), a partir da comparação das sequências de
rRNA de diferentes organismos. Com esta nova proposta de classificação, os organismos são agora subdividos
em 3 domínios (contendo os 5 reinos), empregando-se dados associados ao caráter evolutivo.
Archaea: Procariotos
Bacteria: Procariotos Eukarya: Eucariotos
Classificação dos seres vivos, de acordo com Woese (1977) (Adaptado de Pommerville, J.C.(2004) Alcamo's
Fundamentals of Microbiology)
A princípio, acredita-se que estes 3 domínios divergiram a partir de um ancestral comum. Provavelmente os
microrganismos eucarióticos atuaram como ancestrais dos organismos multicelulares, enquanto as bactérias e
archaeas correspondem a ramos que não evoluíram além do estágio microbiano.
Archaea: são organismos procariotos que, freqüentemente são encontrados em ambientes cujas condições são
bastante extremas (semelhantes às condições ambientais primordiais na Terra), sendo por isso, muitas vezes
considerados como sendo “ancestrais” das bactérias. No entanto, hoje em dia considera-se as archaeas como
um grupo “intermediário” entre procariotos e eucariotos.
Muitos destes organismos são anaeróbios, vivendo em locais "inabitáveis" para os padrões humanos - fontes
termais (com temperaturas acima de 100°C), águas com elevadíssimos teores de sal (até 5M de NaCl - limite
de dissolução do NaCl), em solos e águas extremamente ácidos ou alcalinos (espécies que vivem em pH 0,
outras em pH 10) e muitas são metanogênicas.
Genericamente, podemos dizer que as Archaeas definem os limites da tolerância biológica às condições
ambientais.
Bacteria: Corresponde a um enorme grupo de procariotos, anteriormente classificados como eubactérias,
representadas pelos organismos patogênicos ao homem, e bactérias encontradas nas águas, solos, ambientes
em geral. Dentre estas, temos as bactérias fotossintetizantes (cianobactérias) e outras quimiossintetizantes (E.
coli), enquanto outras utilizam apenas substratos inorgânicos para seu desenvolvimento.
Eukarya: No âmbito microbiológico, compreende as algas, protozoários e fungos (além das plantas e animais).
As algas caracterizam-se por apresentarem clorofila (além de outros pigmentos), sendo encontradas
basicamente nos solos e águas.
Os protozoários correspondem a células eucarióticas, apigmentados, geralmente móveis e sem parede celular,
nutrindo-se por ingestão e podendo ser saprófitas ou parasitas. Os fungos são também células sem clorofila,
apresentando parede celular, realizando metabolismo heterotrófico, nutrindo-se por absorção.
Como mencionado anteriormente, os vírus são também assunto abordado em microbiologia, embora,
formalmente, não exibam as características celulares, no sentido de não apresentarem metabolismo próprio, de
conterem apenas um tipo de ácido nucléico, etc.
A Microbiologia na atualidade
A definição clássica de "microbiologia" mostra-se bastante imprecisa, e até mesmo inadequada, frente aos
dados da literatura publicados nesta última década. Como exemplo pode-se citar duas premissas que já não
podem mais ser consideradas como verdade absoluta na conceituação desta área de conhecimento: as
dimensões dos microrganismos e a natureza independente destes seres.
Em 1985 foi descoberto um organismo, denominado Epulopiscium fischelsoni que, a partir de 1991, foi
definido como sendo o maior procarioto já descrito, exibindo cerca de 500 µm de comprimento. Esta bactéria
foi isolada do intestino de um peixe marinho (Surgeonfish, peixe barbeiro ou cirurgião), encontrado nas águas
da Austrália e do Mar Vermelho. Além de apresentar dimensões nunca vistas, tal bactéria mostra-se
totalmente diferente das demais quanto ao processo de divisão celular, que ao invés de ser por fissão binária,
envolve um provável tipo de reprodução vivíparo, levando à formação de pequenos “glóbulos”, que
correspondem às células filhas.
Comparação entre o tamanho de uma célula de Epulopiscium e 4 paramécios (Adaptado do livro Brock Biology of Microorganisms,
10 Ed., 2003)
Mais recentemente, em 1999, outro relato descreve o isolamento de uma bactéria ainda maior, isolada na costa
da Namíbia. Esta, denominada Thiomargarita namibiensis, pode ser visualizada a olho nú, atingindo até cerca
de 0,8 m de comprimento e 0,1 a 0,3 m de largura.
Microscopia de luz polarizada, revelando os grânulos de enxôfre no interior da bactéria Thiomargarita
namibiensis.
Comparação entre a bactéria Thiomargarita namibiensis e uma Drosophila.
(Adaptado de Schulz, H. N. et al. (1999). Science, 284:493-495 - Clique no autor, caso deseje ler o artigo
original)
Como analisar a questão do tamanho dos microrganismos?
Durante muito tempo se acreditava que o tamanho das bactérias era imposto pelo seu próprio metabolismo, ou
seja, se a bactéria aumentasse muito em tamanho, ela seria incapaz de se manter viável e morreria. Tal fato
decorre da seguinte dedução: A área superficial da membrana citoplasmática seria o fator limitante para a
eficiência das trocas com o meio externo.
Sabendo-se que a área de uma esfera é calculada pela fórmula e que o volume de uma esfera é obtido pela
fórmula , a medida que a área aumenta, seu volume aumenta muito mais rapidamente. Assim, se uma bactéria
começasse a crescer, aumentando sua área, a proporção área/volume diminuiria. Isto faria com que a célula
passasse a apresentar um volume muito grande, sendo que sua área superficial seria insuficiente, em termos de
trocas através da membrana, para manter sua viabilidade.
A partir dos isolados de bactérias “gigantes”, o conceito da limitação de tamanho bacteriano vem sendo
abandonado, pois não há mais como questionar a existência e viabilidade destas bactérias e, possivelmente,
novos relatos serão incorporados, deixando de ser meras curiosidades.
Uma das explicações mais prováveis para tal fato reside na existência de grandes mesossomos nestes tipos
bacterianos, refutando assim a hipótese de que tais estruturas seriam meros artefatos de microscopia. Novos
estudos vêm sendo realizados, os quais estão trazendo informações sobre outras estratégias desenvolvidas
pelos microrganismos para que sobrevivam, quando apresentam dimensões extremamente maiores que os
microrganismos "convencionais".
Microrganismos atuando como seres multicelulares
Outro aspecto que vem sendo demonstrado refere-se ao caráter “multicelular” das bactérias. Embora estas
exibam a capacidade de sobreviver como uma célula única, realizando os processos metabólicos necessários à
sua perpetuação, quando as bactérias encontram-se associadas, formando colônias, ou biofilmes (estruturas
rígidas, adesivas, de natureza geralmente polissacarídica, que encontram-se fortemente ancoradas às
superfícies, criando um ambiente protegido que possibilita o crescimento microbiano), estas passam a se
comportar de forma social, exibindo divisão de tarefas e alterando seu perfil fisiológico de forma a apresentar
uma cooperação que reflete-se em diferentes níveis metabólicos.
Sabe-se que muitos genes de virulência são expressos somente quando a densidade populacional atinge um
determinado ponto. Da mesma forma, a capacidade de captar DNA do meio externo, a bioluminescência, etc,
envolvem a percepção da densidade populacional por parte das bactérias.
Este tipo de mecanismo de comunicação é denominado “sensor de quorum” (quorum sensing) e vem sendo
amplamente estudado nas mais diferentes áreas da Microbiologia, uma vez que foi descrito tanto para
bactérias como para fungos.
Estudos com bactérias primitivas
Ainda em relação às novas pesquisas desenvolvidas na área de
Microbiologia, temos o cultivo de bactérias pré-históricas, visando a busca de compostos com atividade
antimicrobiana ou de interesse comercial. Neste sentido, empresas foram criadas (“Ambergene”),
especializadas na reativação de formas bacterianas latentes, isoladas de insetos preservados em âmbar. Os
resultados obtidos revelam a reativação de mais de 1200 espécies bacterianas, apresentando de 2 a até 135
milhões de anos. Em 2000, foi publicado um relato descrevendo o isolamento e cultivo de uma espécie
bacteriana a partir do líquido contido em um cristal de sal de 250 milhões de anos. Os estudos de
seqüenciamento do DNA que codifica o RNA ribossomal 16S indicam que o organismo pertence ao gênero
Bacillus, uma bactéria em forma de bastonete, Gram positiva, com a capacidade de formar endósporos. Até o
momento, esta corresponde à espécie bacteriana mais antiga.
Inseto de onde foi retirada a bactéria (provavelmente Bacillus), de 135 milhões de anos
Aspecto das colônias crescidas em meio sólido (Adaptado de Cano et al., (1995) Science, 268:1060-1064)
A questão da vida em marte
Em 1997, foram publicados relatos de expedições da NASA a Marte, sugerindo a presença de possíveis
microrganismos (“nanobactérias”) em espécimes minerais, sendo que achados semelhantes foram também
detectados em partículas de meteoritos de Marte, que atingiram a Terra. A favor desta hipótese há o achado de
microrganismos que decompõem minerais, frequentemente isolados das profundezas marinhas (A cerca de 1,5
km abaixo do solo).
Os meteoritos apresentam carbono, fósforo, nitrogênio, além da presença de água. Já em relação às condições
ambientais de Marte (muito frio), temos como contra-argumento o isolamento de Archaea a partir de
ambientes absolutamente inóspitos, inicialmente comsiderados como inadequados à vida.
De acordo com alguns pesquisadores, não é absurdo considerar que a vida surgiu em Marte, pois estudos com
o meteorito Nakhla, que caiu em 1911 no Egito, com aparentemente de 1,3 bilhões de anos, revelam a
presença de elementos cocóides, potenciais fósseis bacterianos, variando de 0,25 a 2,0 µm de tamanho, o que
seria correspondente ao tamanho médio atual das bactérias. Curiosamente, estas formas ovais apresentam um
teor maior de carbono no seu interior que nas áreas ao seu redor. Além disso, exibem também um elevado teor
de óxido de ferro, um composto comum em células fossilizadas.
Recentemente, a NASA enviou outra sonda para Marte e os dados recebidos reforçam cada vez mais a idéia
da existência anterior de vida em Marte, devido aos achados da possível ocorrência de água naquele planeta.
Comparação entre possíveis "microrganismos" presentes em rochas de Marte e microrganismos que compõem
a placa dental ho homem. (Adaptado de An Electronic Companion to Beginning Microbiology)
Assim, com base nestes novos achados e principalmente com estudos envolvendo as Archaea, a microbiologia
vem levantando uma série de questões quanto à fisiologia e o metabolismo celular, além de questionar
permanentemente os limites das condições de vida.
Microscopia óptica, utilizando um procedimento de impreganção com sais de prata, revelando a bactéria
causadora da sífilis, Treponema pallidum (observe os grandes neutrófilos próximos às bactérias)
bactéria com morfologia retangular bactéria com morfologia semelhante a uma estrela
(Adaptado de Tortora et al., Microbiologia, 1998)
Aspecto das paredes celulares de organismos Gram positivos e negativos (Adaptado de Madigan et al., Brock
Biology of Microorganisms, 2003)
Composição da parede celular
Peptideoglicano (mureína ou mucopeptídeo): Composto exclusivamente encontrado no domínio Bacteria,
sendo o responsável pela rigidez da parede celular. O peptideoglicano corresponde a um enorme polímero
complexo que, em bactérias Gram positivas pode formar até 20 camadas, enquanto em células Gram negativas
está presente, formando apenas uma ou duas camadas.
O peptideoglicano corresponde a um esqueleto, formado por dois derivados de açúcares, a N-
acetilglicosamina (NAG) e o ácido N- acetilmurâmico (NAM), unidos alternadamente, através de ligações do
tipo ß-1,4. O grupo carboxil de cada molécula de NAM liga-se a um tetrapeptídeo, composto por aminoácidos
que alternam-se nas configurações L e D. Destes aminoácidos, o D-glutamato, D-alanina e o ácido
mesodiaminopimélico não são encontrados em qualquer outra proteína conhecida. Acredita-se que sua
presença confira maior resistência da parede contra a maioria das peptidases.
Assim, em cada resíduo de NAM há um tetrapeptídeo associado. A enorme rigidez da da parede celular é
resultante das ligações entre os tetrapeptídeos de cadeias adjacentes. Neste aspecto, há uma grande diferença
entre as bactérias Gram positivas e negativas. Nas bactérias Gram negativas (Ala- Glu-DAP-Ala), a ligação
entre os tetrapepídeos é direta, ocorrendo entre o grupamento amino do DAP subterminal (posição 3) e o
grupamento carboxi da D-Ala terminal (posição 4). Já nas Gram positivas (Ala-Glu-Lys-Ala), a ligação é
indireta, sendo mediada por uma ponte interpeptídica de natureza variável (cinco glicinas em S. aureus). A
análise das figuras abaixo deixa clara a grande estruturação do peptídeoglicano, em virtude das inúmeras
ligações cruzadas existentes ao longo da molécula. Assim, devido a esta complexa estruturação física, o
peptideoglicano confere rigidez à parede, embora exiba certo grau de elasticidade e também porosidade.
peptideoglicano de células Gram positivas peptideoglicano de células Gram negativas
Nas bactérias Gram positivas, cerca de 90% da parede celular é composta pelo peptídeoglicano, que
geralmente forma cerca de 20 camadas. O restante da parede é composto essencialmente por ácido teicóico.
Nas bactérias Gram negativas, apenas cerca de 10% da parede corresponde ao peptideoglicano, existindo
geralmente como uma camada única ou dupla. Os demais componentes da parede celular de bactérias Gram
negativas serão analisados posteriormente.
Esquema ilustrando o espesso peptideoglicano de bactérias Gram positivas (Adaptado de Madigan et al.,
Brock Biology of Microorganisms, 2003)
Ácidos Teicóicos: Juntamente com peptideoglicano, os ácidos teicóicos compõem a parede celular das
bactérias Gram positivas. Estes compostos, presentes em grandes quantidades, correspondem a polímeros de
glicerol ou ribitol ligados a açúcares ou aminoácidos e conectados entre si por meio de grupamentos fosfato.
Os ácidos teicóicos associam-se ao peptideoglicano pela ligação do grupamento 6 hidroxil do ácido N-
acetilmurâmico, podendo alternativamente associar-se aos lipídeos da membrana citoplasmática, quando
passam a ser denominados de ácidos lipoteicóicos. Devido à sua carga negativa, os ácidos teicóicos
contribuem com o caráter negativo da superfície celular de Gram positivas. Seu papel fisiológico é ainda
desconhecido, mas especula-se que estes possam participar nos processos de passagem de íons pela parede, ou
ligar-se a prótons, mantendo um pH celular relativamente baixo. Em casos de escassez de fosfato, os ácidos
teicóicos podem ser substituídos por ácidos teicurônicos, deixando assim os fosfatos livres para comporem
ATP ou DNA, por exemplo.
Fórmula de um ácido teicóico, contendo ribitol (Adaptado de Madigan et al., Brock Biology of
Microorganisms, 2003)
O componente adicional da Parede Celular de Gram negativos
Membrana Externa: Esta, embora denominada "membrana"externa é um componente da parede celular,
presente apenas nas bactérias Gram negativas. A membrana externa corresponde a uma segunda bicamada
lipídica (semelhante à membrana plasmática), localizada acima do peptideoglicano, contendo fosfolipídeos,
lipoproteínas, proteínas e também lipopolissacarídeos. Quando comparada à membrana citoplasmática, a
membrana externa exibe maior permeabilidade a pequenas moléculas, tais como glicose ou outros
monossacarídeos. Sua face interna geralmente é rica em pequenas lipoproteínas (7,2 kDa), denominadas
lipoproteínas de Braun, que ligam-se covalentemente ao peptideoglicano, ancorando firmemente a membrana
externa à camada de peptideoglicano. Estudos indicam que a membrana externa e a membrana citoplasmática
mantém contato em algumas discretas regiões celulares, denominadas sítios de adesão. Acredita-se que estas
regiões de junção podem conferir maior rigidez à parede celular das bactéria Gram negativas, além de fixar
melhor a membrana externa, não deixando-a frouxa, associada somente ao peptideoglicano. Os sítio de adesão
foram também denominados junções de Bayer e acredita-se que possam ser importantes locais de passagem de
compostos citoplasmáticos, seja componentes envolvidos na síntese da membrana externa ou diferentes
nutrientes.
Esquema da parede celular de organismos Gram negativos (Adaptado de Madigan et al., Brock Biology of
Microorganisms, 2003)
A face externa da membrana externa é rica em lipopolissacarídeos
(LPS), inexistentes na membrana citoplasmática. Estes componentes são também denominados de endotoxina,
uma vez que provocam febre, choque e eventualmente morte, quando injetados em animais. O LPS é uma
molécula complexa, composta por 3 regiões distintas: lipídeo A, polissacarídeo central e cadeia
polissacarídica lateral O, ou Antígeno O.
Micrografia óptica, empregando a tácnica de coloração negativa, revelando células capsuladas. (Adaptado de
Tortora et al., Microbiologia, 1998)
Micrografia eletrônica de transmissão, revelando a delgada cápsula circudando a célula (Adaptado de "An
eletctronic companion to microbiology")
Fímbrias e Pili - Muitas bactérias Gram negativas apresentam apêndices finos (3 a 10 nm), retos e curtos,
denominados fímbrias. Geralmente estas são bastante numerosas, podendo atingir números de 1000 ou mais
por célula. Como são muito pequenas e delgadas, somente podem ser visualizadas pela microscopia
eletrônica. As fímbrias s ão de natureza protéica, compostas por subunidades repetitivas de uma proteína
denominada genericamente de pilina. As fímbrias possuem, geralmente em sua extremidade, e algumas vezes
ao longo da estrutura, proteínas distintas, denominadas adesinas, as quais mediam a adesão específica da
célula bacteriana a diferentes substratos.
Bactéria monotríquia
(Adaptado de Atlas, 1997 - Principles of Microbiology)
Bactéria anfitríquia (Adaptado de Tortora et al., 1998 - Microbiology)
Bactéria lofotríquia
(Adaptado de Tortora et al., 1998 - Microbiology)
Bactéria lofotríquia
(Adaptado de Atlas, 1997 - Principles of Microbiology)
Bactéria peritríquia
(Adaptado de Tortora et al., 1998 - Microbiology)
Bactéria peritríquia (Adaptado de Tortora et al., 1998 - Microbiology)
Estrutura - Estruturalmente, o flagelo pode ser subdivido em 3 regiões: filamento, corpo basal e gancho, sendo
estas duas últimas importantes para a inserção e movimentão do filamento. O filamento dos flagelos apresenta
estrutura helicoidal, com comprimento de onda constante para cada espécie. Este corresponde a um cilindro
longo e oco, composto por unidades repetitivas de uma proteína denominada genericamente de flagelina, que
pode variar de 30 a 60 kDa, dependendo do microrganismo. Sua extremidade distal é revestida por uma
proteína seladora. Algumas bactérias apresentam bainhas de diferentes naturezas revestindo o filamento, tal
como em Vibrio cholerae, ou Bdellovibrio. O gancho apresenta maior espessura que o filamento, sendo
composto por diferentes subunidades protéicas. O corpo basal corresponde à porção mais complexa do
flagelo, apresentando 4 anéis ligados a um bastão central em bactérias Gram negativas, enquanto em Gram
positivas são observados apenas 2 anéis. Os anéis externos L e P associam-se ao LPS e peptidioglicano,
respectivamente, enquanto os anéis S e M estão associados à membrana citoplasmática.
Detalhe ampliado da estrutura de um flagelo de células Gram negativas (Adaptado de Madigan et al., Brock
Biology of Microorganisms, 2003)
Síntese flagelar - Muitos genes estão envolvidos na síntese do flagelo e na mobilidade celular. Em E. coli e
Salmonella foram identificados mais de 40 genes (fla), que codificam proteínas estruturais, de exportação de
componentes para o exterior e de regulação de muitos eventos bioquímicos envolvidos na síntese de novos
flagelos. A síntese de flagelos é fortemente regulada, tanto por fatores metabólicos como por sinais emitidos
durante a divisão celular. Acredita-se que as subunidades de flagelina sejam transportadas ao longo do
filamento e se autoarranjam espontaneamente, quando atingem a ponta. Movimentação - A movimentação dos
flagelos ocorre através de um mecanismo de rotação do filamento, em velocidades que podem atingir até 270
ou 10 rps, o que permite uma locomoção de até 100 µm/segundo, correspondendo a 100 vezes o seu
comprimento/minuto. Os flagelos atuariam de maneira análoga a propulsores de um barco, sendo o sentido da
rotação importante para o tipo de movimentação resultante. Em muitas células monotríquias, a rotação no
sentido anti-horário promove a movimentação para frente, enquanto a rotação no sentido horário faz com que
a célula se locomova no sentido oposto.
Em outras monotríquias, quando o flagelo gira no sentido horário promove a locomoção.
Esquema proposto para a movimentação deslizante de Flavobacterium (Adaptado de Madigan et al., Brock
Biology of Microorganisms, 2003)
Morfologia e ultraestrutura bacterianas (Parte 3)
Periplasma (gel periplasmático) - Corresponde a um espaço situado entre a membrana externa e membrana
citoplasmática, encontrado em células Gram negativas. Embora questionáveis, relatos esporádicos descrevem
a existência de um espaço observado entre o peptideoglicano e a membrana citoplasmática de organismos
Gram positivos. O periplasma apresenta consistência de gel, provavelmente devido ao grande número de
proteínas presentes nesta região. Em virtude disto, este "espaço" passou a ser denominado gel periplasmático.
O periplasma pode atingir de 1 a cerca de 70 nm de espessura, correspondendo a até 40% do volume total da
célula.
Em Gram negativas, tem grande importância, pois várias enzimas e outras proteínas estão localizadas,
incluindo hidrolases, proteínas de ligação envolvidas no transporte e quimiorreceptores. Bactérias
quimiolitotróficas e denitrifcantes apresentam muitas vezes proteínas transportadoras de elétrons no
periplasma, outras apresentam enzimas envolvidas na síntese de peptideoglicano. A presença do periplasma
bactérias Gram positivas é ainda motivo de controvérsias, devido ao enorme potencial secretor que este grupo
apresenta.
Membrana Citoplasmática - Estrutura delgada, com cerca de 8 nm, composta por uma bicamada fosfolipídica
(podendo apresentar 7 tipos de fosfolipídeos diferentes), entremeada de proteínas (cerca de 200 tipos
distintos), atuando como importante barreira osmótica, altamente seletiva. Normalmente, as membranas de
organismos procariotos apresentam maiores concentrações de proteínas que as membranas eucarióticas, tendo
em vista a ausência de organelas citoplasmáticas nas bactérias.
A bicamada fosfolipídica é composta por glicerol ligado a duas cadeias de ácidos graxos, através de ligações
do tipo éster, com proteínas entremeadas. Tanto as proteínas como os fosfolipídeos podem mover-se
lateralmente ao longo da membrana. Esta é estabilizada principalmente por interações hidrofóbicas e por
pontes de H.
Paralelamente, os íons Ca+2 e Mg+2 também participam, interagindo ionicamente com as cargas negativas
dos fosfolipídeos. Via de regra, os fosfolipídeos bacterianos contém ácidos graxos com cadeias não
ramificadas de 16 a 18 átomos de carbono. Esta composição pode ser variável, de acordo com as condições
ambientais. Assim, quando cultivadas em temperaturas baixas, há um aumento da proporção de ácidos graxos
insaturados, aumentando consequentemente a fluidez da membrana. Por outro lado, aumetando o grau de
saturação, as cadeias tornam-se mais rígidas, pois as moléculas têm maior capacidade de associação.
Similaridade estrutural entre os esteróis (a), colesterol (b) e hopanóides (c) (Adaptado de Madigan et al.,
Brock Biology of Microorganisms, 2003)
Mesossomos - correpondem a extensas invaginações da membrana citoplasmática, em forma de vesículas,
lamelas ou túbulos. Geralmente são encontrados com maior abundância em Gram positivos, mas também
presentes em Gram negativos. Até hoje, sua existência e funções são ainda debatidas pelos pesquisadores.
Diversas funções têm sido atribuídas aos mesossomos, tais como a participação na segregação dos
cromossomos durante a divisão, papel respiratório, papel na esporulação, ou até mesmo como sendo um mero
artefato decorrente dos procedimentos utilizados para a preparação microscópica dos espécimes. A partir do
acahado de extensos mesossomos em bactérias de grandes dimensões, acredita-se que sua principal função
seja de aumentar a superfície da membrana, aumentando assim o conteúdo enzimático das células.
Matriz Citoplasmática - É composta por cerca de 70% de água, além dos demais compostos celulares, tais
como o DNA, inclusões e plasmídeos. Caracteristicamente, o citoplasma celular apresenta um grande
concentração de ribossomos e proteínas, tais como proteínas atuando como um sistema de citoesqueleto.
Nucleóide e plasmídeos- Os procariotos são organismoshaplóides, geralmente apresentando apenas 1 único
cromossomo não envolto por carioteca. Eventualmente, algumas bactérias podem apresentar 2 ou 3
cromossomos. O cromossomo bacteriano é normalmente cirucular e encontra-se bastante enovelado, em uma
região celular denominada nucleóide. Em bactérias, o cromossomo não apresenta-se associado a histonas,
sendo estabilizado por outras proteínas de natureza básica. Geralmente o DNA cromossomal corresponde a
uma molécula bastante grande, podendo ser 1000 vezes maior que a própria célula. Em E. coli, o DNA possui
cerca de 4,7 Mb, exibindo aproximadamente 1 m de comprimento, quando linearizado.
(Adaptado de An Electronic Companion to Microbiology)
Várias bactérias apresentam também moléculas de DNA extracromossomal, denominadas plasmídeos, as
quais são geralmente circulares, contendo muitas vezes genes que conferem características adaptativas
vantajosas ao microrganismo. Seu número e dimensões são bastante variáveis.
Corpúsculos de inclusão - São grânulos de armazenagem, de diferentes naturezas, sendo geralmente utilizados
como fonte de material de reserva ou energia, muitas vezes insolúveis. Estes podem apresentar-se sem
qualquer envoltório ou envoltos por uma única camada lipídica delgada (diferente de uma membrana), ou por
proteínas.
Dentre os compostos orgânicos armazenados temos o glicogênio, o amido e poliidroxibutirato. Já dentre os
inorgânicos temos polifosfatos (volutina ou metacromáticos) e enxofre.
Árvore filogenética universal, apresentando os três domínios da vida (Adaptado de Madigan et al., 2003 -
Brock Biology of Microorganisms)
Esta árvore revela claramente que as "arqueobactérias" não correspondem aos ancestrais das bactérias atuais,
visto que sua possível origem ocorre quase que concomitantemente à origem das bactérias mais primitivas.
Outro aspecto que a árvore permite deduzir é o fato das "arqueobactérias" ocuparem uma posição
intermediária entre os domínios Bacteria e Eucarya, sugerindo que estas correspondem a um grupo de
organismos diferentes de bactérias e de células eucarióticas. De fato, estudos genéticos e fisiológicos
posteriormente revelaram que tais organismos apresentam características de bactérias, de eucariotos, além de
características exclusivas, não encontradas em qualquer outro domínio. Por esta razão, deixaram de ser
denominadas "arqueobactérias", recebendo a denominação archaea.
Uma questão ainda não elucidada refere-se ao porquê de encontrar-se um grande variedade de archaea
extremófilas, habitanto ambientes de altas temperaturas, salinidade, ou extremos de pH. Por outro lado, o
acúmulo de conhecimentos sobre este grupo vem mostrando que as archaea podem ser encontradas nos mais
diversos ecossistemas, desde ambientes aquáticos frios, sistema digestório do homem e outros animais, em
tecidos vegetais. Certamente não é absurdo cogitar que no futuro sejam descobertas archaea patogênicas ao
homem ou outros seres vivos.