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Biologia Microbiana

Licenciatura em Biologia, 2º ano, 2º semestre


Prof. Regente da cadeira:
Dr. Rogério Tenreiro

Apontamentos elaborados por Pedro Miguel Agostinho Escudeiro

NOTA IMPORTANTE:

Estes apontamentos são uma reprodução literal (o mais fidedigna possível), das aulas teóricas
leccionadas pelo Prof. Regente da cadeira, tendo na sua complementação expressões e
resumos da matéria presente na Bibliografia recomendada.
Biologia Microbiana Prof. Rogério Tenreiro

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Apontamentos elaborados por Pedro Escudeiro
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INT – Introdução á Microbiologia - Cap. 1, 2, 11 – Brock Biology of Microorganisms. 10th ed.

Considerações básicas sobre a cadeira


A Disciplina de Biologia Microbiana, como o termo sugere, pretende pôr-nos em contacto com
o estudo, a nível básico, dos microrganismos.
O micróbio ou microrganismo é de natureza diminuta (como o próprio nome indica), e por este
motivo necessita de aparelhos auxiliares de observação, em ordem a ser estudado com
minuciosidade. De entre estes aparelhos destacam-se o microscópio electrónico de varrimento
e de transmissão.
A diversidade microbiana é tão vasta que se torna impossível fazer uma abordagem desta
disciplina do ponto de vista sistemático.
Ignorando os reinos Plantae, Animalia, e parte do reino Fungi (só os fungos macroscópicos),
todo o resto da biodiversidade no nosso planeta pertence aos microrganismos. Os cogumelos
são estruturas reprodutoras de um organismo miceliano.

Principais grupos de estudo de organismos microbianos


→ Bactéria
→ Archaea (arqueobácterias)
→ Fungos (microscópicos)
→ Vírus (organismos acelulares)
As bactérias são tanto benéficas como prejudiciais:
- São benéficas tendo em conta todas as aplicações industriais e biotecnológicas que
delas podemos tirar proveito.
- São prejudiciais na medida em que se podem revelar patogénicas para o homem ou
para espécies relevantes comercialmente para o mesmo (espécies pecuárias, agrícolas, etc).
Todos estes atributos tornam a Microbiologia numa das áreas de maior expansão e
investimento com contribuições tanto para a ciência básica como para a indústria
biotecnológica e bem-estar humano.

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Contributos Importantes para a Microbiologia


Tabela dos principais investigadores na área da microbiologia:

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Embora a existência de criaturas demasiado pequenas para serem contempladas á vista


desarmada tenha sido sempre suspeitada, a sua
descoberta está ligada com a invenção do
microscópio. Robert Hooke já havia descrito as
estruturas frutificantes de bolores em 1664, mas
a primeira pessoa a observar microrganismos
com algum detalhe foi o amador de microscopia
Antoni van Leeuwenhoek, que usou microscópios simples, construídos pelo próprio, como se
pode observar na figura. Ele reportou as suas observações numa série de cartas endereçadas á
Royal Society de Londres, que as publicou numa tradução em Inglês. As observações deste
notável pioneiro foram confirmadas por outros estudiosos, mas o progresso na compreensão
da natureza e importância destes pequenos organismos foi surgindo muito lentamente.
Foi apenas no séc – XIX que se verificou a emergência de microscópios melhorados,
juntamente com a sua ampla distribuição.
A microbiologia como ciência não se desenvolveu até á última metade do séc – XIX. Esta
demora observou-se, porque alem da situação referida anteriormente, respeitante aos
microscópios, algumas técnicas de estudo de microrganismos necessitavam de ser
melhoradas.
No séc – XIX, a postulação de duas perguntas, que na época deixavam os investigadores
perplexos, levaram ao desenvolvimento de técnicas e ao consequente estabelecimento das
ciências microbiológicas:
1) Será que a geração espontânea ocorre?
2) Qual a natureza das doenças contagiosas?

Nos finais deste século ambas as questões haviam sido respondidas, e a microbiologia como
ciência havia sido fortemente estabelecida.
Abordando a primeira pergunta, a ideia temática referente á geração espontânea implicava
que a vida poderia surgir de algo não vivo, e muitos estudiosos da época não conseguiam
imaginar como é que uma estrutura tão complexa como a célula poderia surgir
espontaneamente de matéria inerte.
O maior opositor da teoria de geração espontânea foi o químico francês Louis Pasteur. Pasteur
foi o primeiro a demonstrar que existiam estruturas presentes no ar que se assemelhavam aos
microrganismos verificados em matéria em decomposição. Assim concluiu que os
microrganismos presentes nos materiais em putrefacção tinham sido transportados e
depositados pelo ar. Pasteur usava o calor para eliminar contaminantes existentes nas suas

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soluções, visto já se ter provado na altura que o calor


matava eficientemente organismos vivos. Assim
Pasteur utilizava matrazes de vidro fechados e
esterilizava-os utilizando o calor, verificando que após
muito tempo que nestas condições não se formariam
colónias de microrganismos. Contudo, os defensores
da teoria da geração espontânea argumentavam, que
não se desenvolviam microrganismos porque estes
necessitavam de ar fresco para o fazerem. Assim
Pasteur contra-argumentou com uma experiencia
célebre e brilhante que se mostra esquematizada na
imagem lateral.

Abordando a segunda questão, salientamos dentro da


temática, o famoso e brilhante médico que era Robert
Koch. Este havia-se debruçado sobre a questão
mencionada, e dedicara grande parte da sua carreira
científica a tentar desvendar os segredos e
mecanismos da transmissão de doenças, e os
microrganismos que as causavam. Maior parte do seu trabalho havia sido dedicado ao estudo
exaustivo da tuberculose, bem como da bactéria causadora da maleita que afligia tantas
pessoas na época – Mycobacterium tuberculosis. Contudo, ao longo da sua investigação
publicou os seus importantes postulados – que ficaram conhecidos como postulados de Koch:
1) O microrganismo patogéneo suspeitoso, deve estar presente em todos os casos de
enfermidade, bem como ausente em caso de saúde;
2) O microrganismo suspeitoso deve cultivar-se em ambiente axénico;
3) As células de cultivo axénico de um microrganismo suspeitoso isolado devem causar a
enfermidade em organismos sãos;
4) Os microrganismos re-isolados a partir do portador inoculado devem ser iguais aos
originalmente isolados.
Com os postulados de Koch assim enunciados procede-se á visualização de uma imagem e
esquema ilustrativos, referentes á temática presente, e com o objectivo de explicitar e
consolidar a matéria:

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Nos dias de hoje, os postulados de Koch têm outras versões que nos permitem usar
alternativas á experimentação animal, nomeadamente através de métodos de biologia
molecular que nos assegura o nível de patogeneidade de um microrganismo sem a
necessidade da inoculação num animal de laboratório.

Outra personagem histórica que merece menção é Sergei Winogradsy. Este pioneiro da
microbiologia dos solos estudou bactérias referentes aos ciclos do Azoto e Enxofre. Alem do
mais foi um dos primeiros a estudar as implicações metabólicas e ecológicas incutidas nestes
ciclos biogeoquímicos, enunciando e desenvolvendo o conceito de ciclo da Vida.
Este ilustre cientista debruçou-se arduamente sobre a temática da nitrificação, bem como foi o
postulador do termo Quimiolitotrofismo.

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História Evolutiva dos Microrganismos


O facto de se ter descoberto que a historia evolutiva dos microrganismos fica registada em
algumas regiões do DNA dos seres vivos, e a possibilidade de comparação dessas regiões
genómicas, permitiu-nos inserir essa mesma história evolutiva na já definida anteriormente,
posteriormente levando á construção de uma árvore filogenética que nos fornece informações
sobre a diversidade e descendência entre os organismos.
Archaeas → Bactérias metanogénicas. O conceito de archaea foi introduzido por Carl Woese e
George Fox em 1977.
Utilizando a sequenciação do gene ribossomal 5S, foi-nos permitido a construção de uma
árvore filogenética com uma dicotomia no sistema de organização de matéria viva (Procariotas
vs Eucariotas), verificando-se mais tarde que esta dicotomia correspondia na verdade a uma
tricotomia:

Graças a estes dois investigadores referidos acima, tudo aponta para que em termos de
evolução, a partir duma raiz universal, tenha surgido uma linha que levou ás bactérias tais
como as conhecemos, e outra que se diversificou levando ás archaeas e aos eucariotas.
A descoberta da PCR (Polimerase Chain Reaction) por Luc Montaigner em 1983, revolucionou a
microbiologia em termos de detecção e identificação de microrganismos.
Através da PCR podemos detectar, caracterizar e estudar microrganismos sem ter que fazer o
isolamento destes em cultura.

Filogenias moleculares
Estas filogenias moleculares encontram-se validadas pois foram inicialmente feitas com
organismos cujos registos fosseis por si só indicavam a respectiva história evolutiva. Visto que
não existem grandes possibilidades de reconstruir a história evolutiva de microrganismos a

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partir de registos fósseis, as anteriormente referidas filogenias moleculares tornaram-se uma


valiosa ferramenta de estudo.
→ A única hipótese que existe actualmente, de construir uma filogenia microbiana reside nos
marcadores moleculares, nomeadamente marcadores filogenéticos.
Um marcador filogenético é uma região do DNA, que pode codificar para uma dada proteína,
ou não, marcador esse que está sujeito durante a sua evolução a restrições compatíveis ou
correlacionadas com todos os fenómenos que direccionaram o próprio processo evolutivo, ou
seja, se for possível encontrar uma molécula que ao longo da evolução dos vários grupos, se
tenha diversificado na sua sequência de modo condicionado e semelhante á evolução global
dos organismos, estamos perante um marcador molecular, que por efeito nos relata a história
evolutiva dos organismos.
→ Um dos marcadores moleculares mais utilizados é sem dúvida a sequência de DNA que
codifica para o RNA ribossomal, visto que todos os organismos celulares possuem ribossomas
e que a síntese proteica é um processo altamente conservado ao longo da evolução.

Ao longo da ocorrência de mutações, consoante a zona genómica onde ocorrem, podem se


expressar por um efeito de gravidade variável. As regiões onde a mutação se torna crítica não
conseguem ser transmitidas á descendência porque se tornam letais.
Existem organismos com uma taxa de mutação mais rápida que outros:
- Braditélicos: taxa de mutação (e consequentemente de evolução) reduzida;
- Taquitélicos: taxa de mutação (e consequentemente de evolução) elevada;
Organismos com menor número de cópias de genes ribossomais são Braditélicos.

As filogenias moleculares têm um suporte conceptual. Para se construir uma filogenia


molecular válida é necessário um gene com uma sequência definida, que corresponde ás
mesmas restrições que foram impostas ao processo evolutivo em si. Diferentes moléculas
podem ter evoluído de maneira diferente ao longo da história evolutiva.
Outro marcador molecular bastante utilizado é o gene que codifica para a ATP-sintetase, visto
que é uma proteína que está presente em todos os organismos celulares.
Cada marcador molecular usado no nosso estudo funciona como um filtro que aplicamos á
história evolutiva. Utilizando vários marcadores conseguimos constatar várias perspectivas da
história evolutiva.

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Filogenias multigénicas → construção de uma filogenia, não apenas com base na sequência de
um gene, mas sim usando sequências de vários genes.
Em ordem a se construir uma história evolutiva completa teríamos de comparar o genoma
inteiro de um organismo, sendo necessário sequenciar o genoma a priori.
Actualmente podemos identificar funções de um organismo isolado ou de um ecossistema –
amostra mista – extraindo o RNA total dessa amostra, convertendo-o prontamente em cDNA
(DNA complementar), e por fim sequenciando-o. A sequência final irá corresponder a todos os
genes transcritos dos organismos contidos na amostra → Transcriptoma
Traduzindo a amostra integral desses genes obtemos o Proteoma (amostra total de todas as
proteínas presentes no ecossistema em questão).

NOTA: esta abordagem bastante integrativa é do domínio da Biologia de Sistemas.

Origem da Vida. Evolução e Diversidade Microbiana

Existem inúmeras hipóteses para


explicar a origem da vida. Dentro
das versões de origem da vida que
se baseiam na hipótese química de
origem da vida, admite-se que terá
havido, depois da formação da Terra
um período de evolução química,
que terá originado
espontaneamente diversas
moléculas básicas. Várias
experiências (Miller), têm vindo a
confirmar esta hipótese. Em 1929,
em separado, dois cientistas,
Alexandre Oparin e John Haldane,
publicaram a mesma hipótese (à excepção de alguns pormenores) sobre a origem da vida.
Segundo estes cientistas, aquando da formação da Terra, a atmosfera era formada
essencialmente por quatro gases: hidrogénio, vapor de água, amoníaco e metano. Estes
compostos teriam reagido de forma espontânea e, no decorrer dessas reacções, os átomos de

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carbono, hidrogénio, oxigénio e azoto ter-se-iam recombinado formando, por síntese abiótica,
os primeiros composto orgânicos. A energia necessária a estas reacções tinha origem em
radiações solares (sobretudo ultravioletas), descargas eléctricas de relâmpagos, radiações de
elementos radioactivos, calor proveniente de zonas vulcânicas. Após a sua formação na
atmosfera primitiva, os primeiros compostos teriam sido transportados pela chuva para rios,
lagos e oceanos onde se acumularam em grandes quantidades. Dada a elevada concentração,
as moléculas chocavam entre si dando-se reacções espontâneas. Por evolução molecular ou
química (a transformação de moléculas simples em moléculas mais complexas), surgiram
todos os tipos de moléculas orgânicas necessárias ao aparecimento da vida. Algumas destas
moléculas, que se encontravam no que Haldane designou por "sopa primitiva", ter-se-iam
aglomerado espontaneamente formando pequenos grupos e isolado através de uma
membrana semi-permeável (permitiu troca de substâncias com o meio), originando formas
pré-biológicas (proto-célula). Nestas formas dar-se-iam já reacções químicas importantes para
a vida. As formas pré-biológicas teriam originado então formas cada vez mais complexas que
seriam capazes de realizar trocas com o meio, de crescer e obter energia a partir de
substâncias do meio (muito provavelmente, no meio onde se desenvolveram, ter-se-ia
formado glicose e o processo de obtenção de energia teria, certamente, sido a fermentação,
dada a ausência de oxigénio). Através de evolução subsequente e termos estratégicos, fora
surgindo as primeiras linhas evolutivas das primeiras formas de vida: as células - seriam
bactérias anaeróbias, que se alimentavam de substâncias orgânicas de origem abiótica do
meio. A maior parte da história da vida na Terra, passa-se sob a forma de organismos
procariontes.
Nos anos 50, esta hipótese foi testada por Stanley Miller e Harold Urey, construindo um
aparelho que simulava o que eles teorizavam ser as condições atmosféricas da terra primitiva.
Estes cientistas injectaram
electricidade através do dito
aparelho em ordem a simular as
cargas eléctricas presentes numa
atmosfera tumultuosa. Uma
semana mais tarde, após terem
deixado a experiência correr
ininterruptamente, verificaram
que se tinham formado
aminoácidos e outras moléculas

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orgânicas.
Desde essa altura, várias experiências semelhantes foram desencadeadas, com variáveis
múltiplas e diferentes combinações de gases, que produziram uma inúmera variedade de
moléculas orgânicas incluindo as bases nucleotídicas do DNA e RNA.
Embora o registo fóssil de microrganismos seja escasso, existem fósseis de cianobactérias
primordiais, e de facto grande parte do registo fóssil encontra-se sob a forma de
estromatólitos, que corresponde a uma fase em que a Terra já caminhava para uma atmosfera
com oxigénio. (ver fig - 1 e 2).
Os estromatólitos actuais são comunidades de cianobactérias e algas microscópicas, que se
vão mineralizando á medida que estas células vão morrendo.

Figura 1 – estromatólitos. Figura2 – fóssil de cianobactéria geralmente presente em


estromatólitos

Observa-se ainda, no que toca a respeito de estruturas fósseis, a existência de Banded Iron
Formations( fig 3), que correspondem a indicadores do período em que começou a oxigenação
terrestre. Estas formações são de facto fósseis de moléculas.

Figura 3 – Banded Iron Formations.

Para se estudar o registo fóssil microbiano recorre-se á utilização de Opanóis (no caso das
bactérias)→ são compostos detectáveis em estratos geológicos antigos, ex:

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Por volta dos 3,9 eons estima-se terem aparecido as primeiras formas de vida (proto-células),
aparecendo as primeiras cianobactérias só por volta dos 3 eons.
A partir desta data verificou-se uma radiação adaptativa do ponto de vista microbiano,
estimando-se a origem dos eucariotas apenas quando a atmosfera primitiva tinha uma
percentagem de oxigénio, inferior á actual, mas compatível com a existência de vida eucariota.
Teoriza-se que os primeiros eucariotas tinham muito provavelmente um tipo de metabolismo
anaeróbio.
O facto de se ter detectado fósseis moleculares que provavelmente correspondem a grupos de
bactérias fotorredutoras com uma idade muito mais antiga do que os outros encontrados de
grupos mais recentes, leva a supor que estes grupos já teriam divergido nesta altura,
comparando com outros grupos que teriam divergido em épocas anteriores.
Isto leva-nos a crer que:

Devem ter existido organismos primitivos destes grupos anteriormente, mas ainda não foram
encontrados fósseis moleculares que corroborem esta suposição.

O ponto basal da raiz filogenética de descendência de todos os organismos vivos é


frequentemente designado por LUCA – Last Universal Common Ancestor. Embora não haja
garantias que de facto toda a descendência orgânica seja baseada num único ancestral
comum.
Existem várias teorias que tentam explicar a origem deste (s) ancestral (ancestrais) comum (s).
Uma das primeiras a surgir foi a de que o ancestral dos organismos vivos seria um organismo
fototrófico – Hipótese fototrófica da origem da vida → admite que como a energia luminosa
estaria totalmente disponível, faria sentido que os organismos primordiais usassem a fonte de
energia que se encontra-se mais pronta a utilizar. No entanto, embora esta hipótese tenha
existido durante muito tempo, a complexidade dos sistemas fotossintéticos mesmo em
procariotas (que são bem mais simples que eucariotas), a necessidade de uma série de
transportadores e os mecanismos das várias enzimas associadas ao processo, não suportam a

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hipótese que este tenha sido o primeiro mecanismo de produção de energia, e que tenha
tampouco existido nos primeiros seres orgânicos.

Surgiram Hipóteses alternativas:

A hipótese mais aceite hoje em dia, é a chamada Hipótese Quimiolitotrófica de Origem da Vida
→ admitiram que os primeiros organismos primordiais iriam recolher energia a partir de
compostos inorgânicos.
Em todos estes modelos, desde sempre se basearam na ideia de que estes organismos
primordiais eram seres vivos com DNA incluso, mais tardiamente surgindo o RNA e as
proteínas. No entanto, a estrutura do DNA comparativamente ao RNA é muito mais complexa,
e alem disso as enzimas responsáveis pela replicação do DNA são enzimas muito mais
complexas do que as enzimas responsáveis pela replicação do RNA. Apesar destas importantes
considerações, não faria muito sentido que primeiro tivesse surgido RNA e depois DNA,
porque o RNA como o conhecemos é obtido a partir de transcrição do molde de DNA.

NOTA: Já há alguns anos se descobriu que certas moléculas de RNA tinham


propriedades autocatalíticas. Ou seja, a própria molécula de RNA pode realizar uma reacção do
tipo enzimática de clivagem de ligações entre nucleótidos. Essas moléculas de RNA foram
designadas por Ribozimas (de modo semelhante ás enzimas).

Cada vez urge-se mais a compreensão dos vários papeis do RNA a nível molecular, e das suas
funções diversas.
Retomando o tema principal, existe ainda outra hipótese que sugere baseada nos últimos
conceitos esquematizados, e que detém inúmeros defensores, que teoriza o aparecimento da
vida como organismo detentor de RNA e não de DNA. Desenvolvendo esta hipótese, também
se postula que este RNA primordial seria auto-replicativo, e ao mesmo tempo desempenhando
um papel de proteína básica, visto que também deveria possuir propriedades autocatalíliticas.
Neste modelo de vida baseado em RNA, este mesmo poderia codificar para um polipéptido e
este polipéptido desempenharia as funções que atribuímos ás proteínas, podendo até
funcionar como enzima de replicação da molécula de RNA inicial. No entanto, estas enzimas de
replicação de RNA têm uma taxa de erro bastante elevada, se pensarmos que esta taxa de erro
geraria um aumento de diversidade e portanto daria a probabilidade de surgirem sequências
que poderiam ser seleccionadas favoravelmente para desempenhar variadas funções, este

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papel poderia assim ter contribuído para aumentar a taxa de diversificação destas moléculas
primordiais.

ASSIM:

A partir do momento em que esta molécula simples de RNA se deixou envolver por uma
membrana, teria surgido o primeiro ser vivo, detentor de RNA.
Seguidamente, ao longo da evolução, a molécula de RNA no seu papel repositório de
informação, foi substituída pela molécula de DNA, cuja regulação, sendo mais controlada, e
por associação, tendo uma taxa de erro mais baixa garantiu a manutenção da informação em
si contida, e a sua propagação á descendência.
Assim, integrando todos estes conceitos, a teoria da vida primordial com informação de
carácter genético baseada na molécula de RNA, constata que esta mesma molécula deteve um
papel de intermediário, na passagem de informação genética de grau básico, para um carácter
integral como o que o DNA detém.
Outro aspecto interessante desta teoria, assenta no facto de existirem vírus com genoma de
DNA, bem como de RNA.
Existem várias hipóteses para explicar a origem dos vírus, mas muitas delas falham na
explicação da origem de vírus baseada num genoma unicamente ribonucleotídico. Esta teoria
abordada da vida primordial baseada em RNA poderia explicar a existência de vírus como
remanescentes das moléculas iniciais pré-bióticas que se postula terem existido numa Terra
primitiva.

NOTA: o modelo acabado de referir não passa de uma teorização visto que não se
encontra suportado por evidências experimentais.

Em termos do local de origem do tipo de organismos primitivos, a hipótese quimiolitotrófica foi


baseada atendendo a que cada parte dos organismos que surgiam junto da raiz da árvore
filogenética eram organismos que hoje em dia são termofílicos, ou seja, adaptados a
ambientes de temperaturas elevadas e de grande concentração de minerais, admitindo-se que
esses organismos quimiolitotróficos teriam surgido em zonas onde existiriam substratos
inorgânicos disponíveis, foram surgindo e utilizando a energia contida nesses compostos
inorgânicos. Um dos principais minerais que se pensa estarem envolvidos no
quimiolitotrofismo primitivo seriam minerais do tipo das pirites – ou seja – estes organismos
iriam retirar energia destes minerais a partir do sulfureto de ferro (FeS).

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NOTA: equação de formação do Sulfureto de Ferro: S8(s) + 8Fe(s) → 8FeS(s)

Mais tarde descobriram-se que nos fundos oceânicos existem formações denominadas fontes
hidrotermais, que no fundo representam pontos onde o magma vai ascendendo directamente,
ao mesmo tempo que solidifica, libertando gases diluídos e minerais, e formando camadas que
se vão depositando formando torres. Dependendo do tipo de coloração dos químicos
libertados que se encontram dissolvidos na água do mar, detêm duas principais conotações:

- Black Smokers & - White Smokers

Estas duas fontes hidrotermais, têm sido bastante estudadas do ponto de vista
Geomicrobiológico. Apresenta-se uma esquematização do processo de reciclagem dos
elementos inorgânicos:

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Nestas fontes, a partir de Fe libertado, pode-se dar a oxidação deste composto, através da
acção da energia de radiação UV, produzindo-se hidrogénio, que possivelmente se teria
começado a acumular na atmosfera primitiva. Este hidrogénio, poderia servir de fonte de
energia para os primeiros organismos, alem do Fe e S.

UV

NOTA: equação da reacção acima referida: 2Fe2+ + 4H+→ 2H2 + 2Fe3+

Nos ecossistemas presentes nas fontes hidrotermais, as cadeias ou redes tróficas são
principalmente quimiolitotróficas.
As temperaturas existentes na cavidade de saída destas fontes podem atingir mais de 300ºC,
mas a cerca de 10 – 20cm até 50cm, a temperatura da água do mar ronda os 4ºC. Assim, o que
temos em torno de uma fonte hidrotermal, é de facto um gradiente térmico. Este gradiente
térmico tem condições muito específicas e leva ao aparecimento de organismos
quimiolitotróficos, quer do mundo procariota, quer do mundo eucariota, que têm sido objecto
de estudo de vários investigadores. Estes organismos referidos, têm sido ultimamente objecto
de interesse biotecnológico, visto apresentarem potencial elevado do ponto de vista desta
disciplina de ciência aplicada.
Considerando estas características das fontes hidrotermais, bem como a origem da vida
baseada no quimiolitotrofismo, e
detentora de informação genética
focando a molécula de RNA, com um
ambiente envolto em temperaturas
mais elevadas, uma das hipóteses
mais aceites actualmente é sem
duvida a que sumariza todos estes
factores e os explica tendo em conta
o aparecimento de vida sediado
nestas referidas fontes hidrotermais.
Seguem-se dois esquemas com o
objectivo de explicitar estes factores:

Assim, ao longo da evolução foram ocorrendo os vários processos de evolução biológica


referidos até agora (como podemos observar na segunda imagem em cima).

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Mini-introdução ao metabolismo da célula procariota


Uma das características de todos os organismos vivos conhecidos, referente a uma abordagem
celular, é de que todas as células são detentoras de uma membrana. Essa membrana funciona
como uma barreira de permeabilidade extremamente importante para a manutenção do
estado energético celular, agindo como uma bateria de carga iónica acumulada – conferindo
energia potencial – que pode ser transformada em vários tipos de energia. Ao longo da
membrana existe uma disposição desigual de cargas, sendo o interior negativo, e o exterior
positivo. A partir deste facto conclui-se que existe um potencial de energia eléctrica
acumulado em torno da célula, sendo separado pela membrana plasmática, que na prática é
impermeável a estas cargas. Estas cargas para atravessarem a membrana necessitam de
componentes auxiliares, com vista a se dar a deslocação vectorial de protões.
Estas cargas podem passar de dentro da célula para fora e vice-versa, mas estando sempre
associadas a um transportador especifico que providencie este transporte.
Um gradiente eléctrico é gerado visto que as células transportam protões para o exterior,
gerando uma carga eléctrica negativa no interior → gera-se um potencial electroquímico:
O ião associado é o protão, logo a sua acumulação na parte externa, cria um ambiente ácido
no exterior, e consequentemente, alcalino no interior.
Todos os processos celulares são baseados nesta energia de potencial de membrana.
A célula não utiliza directamente estes protões como fonte de energia. A fonte básica de
energia celular, que é utilizada nos processos de metabolismo e catabolismo é o ATP. O ATP é
sintetizado pela enzima membranar, ATP-sintetase, que sintetiza esta molécula a partir de ADP
e Pi. Para a síntese de ATP é necessária a translocação de 3 protões, que dão energia suficiente
para a síntese de uma molécula de ATP.
Este mecanismo existe em todas as células – procariotas e eucariotas. Em organismos
fermentativos, a ATPase membranar funciona no sentido inverso, ou seja, o ATP que vai sendo
sintetizado por uma via glicolítica é hidrolizado em ADP e Pi, e os protões saem no sentido
oposto.
O primeiro organismo quimiolitotrófico, em ordem a conseguir produzir energia, apenas
necessitava de duas proteínas rudimentares:
→ Uma Hidrogenase (primitiva)

→ Uma ATPase (primitiva)

Integrando o substrato essencial utilizado no quimiolitotrofismo – FeS (sulfureto de ferro) –


com estas moléculas referidas acima, podemos teorizar que o primeiro organismo
quimiolitotrófico, utilizava o sulfureto de ferro como reagente com o H2S, gerando hidrogénio.

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Outra fonte alternativa de H+, é a referida anteriormente onde é utilizada a radiação UV (2Fe2+
+ 4H+→ 2H2 + 2Fe3+).
A imagem seguinte tem como objectivo ilustrar estes conceitos:

A acumulação de protões permitia que uma ATPase primitiva funciona-se e que a partir de
ADP e Pi sintetizasse ATP, sendo este ATP utilizado nos vários processos celulares.
Partindo do princípio de que os primeiros organismos eram quimiolitotróficos, a vida teria
surgido, os organismos teriam começado a multiplicar-se, e verificava-se uma acumulação de
compostos orgânicos. Estes compostos orgânicos promoviam uma via mais rápida de obtenção
de energia, sendo aproveitada por outros organismos que até então se tinham começado a
diferenciar → Começaram a fermentar e a oxidar estes compostos.

Inicio da diferenciação metabólica dos Microrganismos:

Á medida que a diversidade de compostos orgânicos aumentou, começara a surgir organismos


capazes de fermentar - Açúcares;

- Aminoácidos.

- Outros tipos de compostos.

Mas, para o sucesso da diversificação metabólica microbiana, foi necessário o aparecimento


de uma molécula bastante particular → O anel de porfirina: quatro anéis pirrólicos, com um
núcleo detentor da propriedade de poder dilatar o seu interior e associa-lo a um átomo de
metal. Pode-se encontrar este núcleo de porfirina com quatro metais principais:

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→ Ferro;
→ Magnésio;
→ Cobalto;
→ Níquel;
Segue-se um esquema ilustrativo da evolução da diversidade metabólica associada aos vários
tipos de anéis porfíricos resultante das várias associações destes quatro anéis pirrólicos com
diferentes metais:

Os primeiros organismos procarioticos fotossintéticos seriam não - produtores de oxigénio. Só


mais tarde quando surgiram as cianobactérias com síntese de oxigénio, é que este mesmo se
pôde acumular, surgindo as vias de fotossíntese oxigénica.

Existe um grupo muito importante dentro das archaeas, que são as bactérias metanogénicas.
Estes organismos produzem metano, a partir de carbono e hidrogénio.

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Modelos explicativos da origem da célula eucariota


Do ponto de vista da origem dos eucariotas, um dos modelos mais aceite pela comunidade
científica em geral, é a chamada Hipótese ou Teoria da Origem Endossimbiótica dos eucariotas,
postulada por Lynn Margulis em 1967, que suportando esta ideia do ponto de vista
microbiológico e molecular, afirmou que a célula eucariota resultaria de uma célula primitiva,
em que através da evolução da própria houve o agrupamento do material genético com
consequente desenvolvimento de núcleo, e a partir deste ponto, através de fenómenos de
endossimbiose de uma bactéria primitiva tinha-se dado origem á linha celular dos eucariotas:

Nesta hipótese explicativa surgem dois acontecimentos de endossimbiose considerados cruciais


para este processo evolutivo:

→ O primeiro teria levado, os eucariotas á aquisição de uma bactéria primitiva com capacidade
metabólica de produzir respiração aeróbia, que teria dado origem às mitocôndrias;

→ O segundo acontecimento, refere que uma cianobactéria primitiva teria-se adaptado por
essa linha celular, e teria originado os cloroplastos.

Este eucariota teria evoluído no sentido de efectuar compartimentação celular, e a par deste
acontecimento, realizou-se também o inicio da compartimentação funcional da célula.
Têm-se postulado que os eucariotas divergiram juntamente com as archaeas a partir do
ancestral comum.
Do ponto de vista temporal, ou seja referente á pergunta de “Quando terão surgido estes
acontecimentos de endossimbiose?”, não há dúvida de que a endossimbiose levou ao
aparecimento dos primeiros cloroplastos, diferenciando-se estes componentes da célula com
vista a evoluir e por conseguinte dar origem aos primeiros seres vegetais, sendo esta fase
evolutiva relativamente fácil de localizar na escala de toda a história geológica. No entanto,

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dirigindo-nos ao momento preciso de ocorrência do fenómeno endossimbiotico que levou ao


aparecimento das primeiras mitocôndrias, existem duas hipóteses:
→ Poderia ter ocorrido já depois da separação dos eucariotas relativamente às archaeas, ou
seja, mais tardiamente.

→ Poderia ter ocorrido mais próximo da origem dos eucariotas, ou seja, mais próximo do
tronco comum de origem da vida.

No entanto, um outro modelo para a origem dos eucariotas é o modelo proposto por Gupta e
Singh em 1994, considera que a célula eucariota é uma quimera, não tendo uma origem única,
e resultando de linhas evolutivas diferentes. De acordo com este modelo de origem quimérica
dos eucariotas, a partir do ancestral universal (LUCA), os eucariotas teriam resultado de uma
fusão de duas linhas celulares com origem filogenética independente:

- Uma derivada das Archaeas;

- Outra derivada das bactérias Gram-negativas.

Portanto, o que este modelo admite é que o genoma dos eucariotas é uma quimera porque
parte dos genes que contem têm uma origem da linha ancestral das Archaeas, enquanto que
outros genes têm uma origem ancestral do domínio das bactérias Gram-negativas.

NOTA: este modelo tenta explicar a origem dos eucariotas, não por endossimbiose mas
por fusão dos genomas, onde houve uma duplicação destes com posterior selecção adaptativa,
em que para uns genes encontra-se a derivação da linha das archaeas, e para outros encontra-
se uma derivação para a linha das bactérias Gram-negativas.

Se assumirmos este modelo, e escolhermos um marcador molecular cuja origem vem da linha
das archaeas, vamos obter uma filogenia com as archaeas mais próximas dos eucariotas.
Enquanto, que se escolhermos como marcador filogenético um gene cuja origem remonta às
bactérias Gram-negativas, vamos afastar os procariotas do grupo dos eucariotas.
Aconselha-se a observação da seguinte imagem com vista a elucidar os conceitos por fim a ter
uma visão esquemática deste modelo:

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Este mesmo autor (Gupta), desenvolveu outro modelo explicativo para a origem eucariota, em
que considera que primeiro surgiram as archaeas, depois as bactérias Gram-positivas, sendo as
bactérias Gram-negativas um acontecimento de evolução mais recente derivado da linha
evolutiva das Gram-positivas. Gupta também sugere que as primeiras Gram-positivas já
produziam metabólitos capazes de inibir o crescimento de outros organismos, ou seja a
estratégia de produção de antibióticos já existia desde os tempos primordiais. E como resposta
á pressão selectiva pela produção destes compostos teria surgido um mecanismo de protecção,
que seria o aparecimento de membrana externa → Gram-negativas.
Para construir este modelo, Gupta ao invés de utilizar genes de RNA, trabalhou com
sequências de proteínas, fez o alinhamento de sequências de aminoácidos. A vantagem que
surge desta preferência, é a de que as filogenias construídas a partir de proteínas tendem a ser
mais fidedignas do que as que são inteiramente construídas em nucleótidos.
Gupta trabalhou como referido, apenas com proteínas, em ordem a estabelecer a sua filogenia
proposta, mas o próprio só utilizou regiões de proteínas que tivessem sofrido mutações indel
(inserção ou delecção). Mesmo assim, Gupta apenas utilizou mutações indel, cujas margens da
sequência nucleotídica tivessem sido conservadas:

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Se as sequências flanqueantes são conservadas em todos os organismos que estamos a


analisar, o indel não é ocasional, torna-se pois importante do ponto de vista evolutivo.
Com tudo isto, Gupta conseguiu separar todos os ramos filogenéticos na sua sequência de
separação, a partir de indels. Todas as bactérias Gram-negativas, numa determinada posição
duma proteína de resistência ao stress térmico, possuem uma inserção num fragmento do
gene codificante para a proteína em questão, que nenhuma Gram-positiva contém. Assim
consegue-se determinar que a separação das Gram-negativas a partir das Gram-positivas
ocorreu. Da mesma maneira, Gupta encontrou indels que permitem separar claramente as
archaeas das bactérias Gram-positivas.
A filogenia criada por Gupta, é a única que nos permite hoje em dia separar com alguma
fiabilidade os diversos grupos filogenéticos de procariotas:

Todos os ramos filogenéticos observados na figura acima parecem ter emergido quase ao
mesmo tempo, não existe resolução filogenética para saber exactamente o primeiro grupo a

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separar-se. Porém, com o sistema de Gupta, todos estes ramos ficam separados pela sua
utilização de indels para mapear a evolução de determinada proteína.
A partir das archaeas primitivas, terá surgido uma primeira célula (designada no esquema
ilustrativo do modelo de Gupta por Eocito) que por um lado levou às archaeas actuais, e por
outro teria tido uma fusão com uma bactéria Gram-negativa primitiva, tendo este
acontecimento levado á origem da primeira proto-célula eucariota observada no modelo de
Margulis.
Aproveita-se, assim, com os devidos conceitos definidos para se apresentar uma imagem
explicativa da filogenia das archaeas:

Ainda referente ao modelo de Gupta, consegue-se distinguir cianobactéria de proto-bactéria


(também designadas por α-bactérias púrpura) porque quer nas mitocôndrias quer nos
cloroplastos existem ribossomas.

NOTA: Considera-se este facto inferindo que as α-bactérias púrpura originaram as


mitocôndrias primitivas e que as cianobactérias originaram os primeiros cloroplastos.

Quando se sequencia o RNA 16S da mitocôndria e o RNA 16S do cloroplasto, deparamo-nos


com o facto de que o RNA 16S da mitocôndria fica filogeneticamente ligado às α-bactérias, e
que o RNA 16S do cloroplasto fica filogeneticamente ligado às cianobactérias.

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Outra das características do modelo proposto por Gupta é a de que este classifica os
procariotas como:

→ Monodérmicos: Archaeas, e Gram-positivas;

→ Didérmicos: Gram-negativas.

Sistemas de Classificação dos Seres Vivos


Actualmente considera-se como aceite o sistema de classificação dos três Domínios (Eukarya,
Bacteria, Archaea). Contudo a história dos sistemas de classificação do mundo vivo é
extensíssima, remontando aos tempos de Linneu.
O primeiro sistema de classificação de seres vivos foi o Sistema de Três Reinos proposto por
Haeckel em 1866. Muito resumidamente passámos pelo sistema de classificação de Cinco
Reinos, proposto por Whittaker e Margulis em 1978:

E como já referido, actualmente encontramo-nos na época do sistema de classificação da


Árvore Filogenética da Vida, ou dos três Domínios proposto por Woese:

No que toca á classificação de Procariotas, a nomenclatura é bastante diferente. Neste caso


temos Filo, seguido de Género, e por fim Espécie. A dimensão estrutural de cada filo é
completamente diferente, visto que cada filo é definido com base no seu posicionamento
filogenético.

NOTA: As bactérias Gram-positivas correspondem, curiosamente, a uma pequena


porção da diversidade procariota hoje conhecida. Assim sendo, concluí-se que as bactérias
Gram-negativas tiveram um maior sucesso evolutivo que as bactérias Gram-positivas, obtendo
uma maior radiação adaptativa.

Hoje, em dia conhecem-se dois grupos principais de bactérias Gram-positivas:

→ Bactérias Gram-positivas com alto teor em Guanina-Citosina;

→ Bactérias Gram-positivas com baixo teor em Guanina-Citosina.

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Junto da base do ancestral comum (LUCA), encontram-se fila de bactérias termofílicas ou


hipertermofílicas, que se pensam ser os actuais descendentes das bactérias primitivas
existentes na Terra primitiva, enquanto que as mais evoluídas se encontram na fase de
radiação adaptativa.

No caso das Archaeas, considera-se dois grandes grupos:

→ Crenarchaeota: representam organismos capazes de sobreviver a temperaturas acima dos


100ºC (termofílicas ou hipertermofílicas) – crescem a grandes profundidades com condições de
pressão elevadíssimas;

→ Euryarchaeota: representam organismos metanogénicos, e Archaeas que são Halófilos


extremos.

Estes grupos são do ponto de vista científico bastante interessantes pois possuem adaptações
morfológicas e fisiológicas que lhes permitem sobreviver a estas condições extremas.

NOTA: Hoje existe evidência de organismos Mesofílicos que quando comparados


filogeneticamente, parecem ter derivado do grupo Crenarchaeota. Actualmente adicionam-se
Archaeas, filogeneticamente separadas das já referidas anteriormente, como sejam os
Korarchaeota. E mais recentemente, com filogenias baseadas em genomas completos,
verificou-se que estas Crenarchaeota marinhas estão filogeneticamente separadas dos outros
grupos, assim criou-se outro grupo designado por Thaumarchaeota, mas ainda não se tornou
consensual do domínio científico geral.

No caso dos Eucariotas, ou melhor, Microeucariotas, existem alguns exemplos de fungos e


líquenes. No esquema em seguida representado, encontra-se a endossimbiose que levou às
mitocôndrias, a endossimbiose que levou aos cloroplastos. Estudos moleculares já mostraram
que para além destes acontecimentos primários de endossimbiose, terão ocorrido também
acontecimentos secundários de endossimbiose, que levaram a que alguns destes grupos
tenham relações filogenéticas próximas com grupos que na realidade estão afastados.

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Dentro dos microeucariotas, alguns dos ramos são constituídos por organismos anaeróbios,
não possuindo por conseguinte mitocôndrias. Hoje tudo aponta para que estes organismos
tenham tido mitocôndrias e que as tenham perdido por evolução e selecção adaptativa, isto
porque os estudos moleculares referem a existência de reminiscências de genes mitocôndriais
dentro do genoma destes organismos.

Tabela geral de Comparação fisiológica entre os três Domínios:

Um dos problemas que se põe á classificação dos procariotas em particular, centra-se na


unidade classificativa básica. O conceito biológico de espécie não é transponível para os
procariotas, e durante muito tempo foi apenas uma definição operacional, isto é, do ponto de
vista prático, nos consideramos e agrupamos as bactérias de acordo com características
básicas e funcionais de cada grupo, apenas deste ponto de vista e não do ponto de vista da
história evolutiva. A classificação de procariotas quanto á espécie, é assim observada, do
ponto de vista dos taxonomistas, como artificial.
Os organismos procariotas estão sujeitos a pressões selectivas (mecanismos de especiação)
como os organismos eucariotas. Assim, se num determinado ambiente microbiano existirem
duas variantes de uma determinada população bacteriana, ou seja dois Ecotipos (variações
ecológicas de uma mesma população), num deles poderá surgir uma mutação. Se esta
mutação se revelar adaptativa, ou seja, se conferir uma vantagem como ocupar naquele
habitat uma função disponível, este mutante vai ter uma vantagem adaptativa e do ponto de

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vista evolutivo vai multiplicar-se e consequentemente ganhar um espaço que o outro ecotipo
não ocupa. Várias inferências moleculares explicitam que o genoma dos procariotas está
sujeito, como já atrás referido, às mesmas forças de evolução que o genoma dos eucariotas,
através da aquisição de novos genes. Esta aquisição pode ser feita por:

→ Duplicação de genes existentes seguida por mutação;

→ Aquisição de genes por transferências laterais;

→ Tendência para fenómenos de delecção;

Assim, nos procariotas, embora não seja aplicável o conceito biológico de espécie, tudo aponta
para que os mecanismos de especiação conferidos a estes sejam os mesmos.
Os conceitos actuais para definição de espécie em procariotas são todos baseados em
métodos de Biologia Molecular. Sendo assim, possível definir espécies de procariotas
exclusivamente com bases moleculares.

Revisitando o conceito de espécie em Procariotas, toma-se em nota que a sua classificação


taxonómica torna-se ainda mais complicada visto o facto de estes não possuírem reprodução
sexuada.
A pergunta que durante muito tempo se postulou foi: “Será que faz sentido aplicar o conceito
biológico de espécie em Procariotas?”. E para esta pergunta conseguiu-se chegar ao consenso
de que faria sentido apenas se os factores de especiação verificados em eucariotas fossem
também aplicáveis em organismos procariotas.
Como já anteriormente referido, visto que em procariotas existe uma certa tendência para
fenómenos de delecção, o genoma bacteriano está sujeito a uma redução progressiva. Existe
uma perda de DNA por inactivação de genes que se transformam em pseudo-genes, sendo por
vezes perdidos por deixarem de ser necessários. Existe portanto, uma especialização integral
dos genomas em ordem a ficarem adaptados a cada nicho ecológico específico.
Como é que é então possível definir espécie em Procariotas?
Hoje em dia, os conceitos para definição de espécie estão regulamentados pelo Comité
Internacional de Sistemática de Procariotas.
Relativamente aos critérios base para a classificação de espécie em procariotas, todos eles são
baseados em dados moleculares. Sendo o critério standard:

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→ Determinação da percentagem de semelhança do DNA total de uma estirpe de uma


nova espécie com as espécies mais próximas. Considerando-se que os organismos que
constituem uma nova espécie detêm uma percentagem de hibridação de DNA-DNA inferior a
70%. Para determinar esta percentagem de hibridação é necessário realizar a extracção de
DNA genómico da nova espécie, e da espécie com a qual queremos comparar, posteriormente
fragmenta-lo, e desnaturar os mesmos fragmentos:

→ Seguidamente um dos DNA’s é marcado (com marcação radioactiva por ex.), e após
a desnaturação dos fragmentos (desnaturação térmica ou química) mistura-se em partes
iguais os dois DNA’s (organismo 1-marcado, e organismo 2-não marcado). Para finalizar deixa-
se os dois tipos diferentes de DNA renaturar:

→ Assim, após a conclusão deste procedimento faseado, mede-se a percentagem de


DNA híbrido no total de DNA em cadeia dupla que se forma. Se a percentagem de DNA híbrido
for igual ou superior a 70%, dizemos que o organismo que estamos a testar pertence á mesma
espécie do organismo de contra-teste. Se for inferior, constitui em princípio uma nova espécie:

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Ao admitirmos que o RNA 16S, é um marcador evolutivo que nos separa a espécie, surge uma
tentativa de utilização deste mesmo RNA como critério para classificação de espécie. Sendo
hoje em dia o critério baseado em RNA 16S o seguinte:

→ Considera-se a classificação de espécie em procariotas a um grupo de organismos


(estirpes) que partilham um grau de homologia de sequências de rRNA 16S superior a 97%.
Apresentam-se assim dois critérios para a definição de espécie em procariotas: o standard,
baseado em hibridações DNA-DNA; e o baseado em homologia de rRNA 16S.
Quando dois organismos têm mais de 70% de hibridação DNA-DNA, de certeza que as usas
sequências de rRNA têm mais do que 97% de homologia. Hoje em dia podem-se cruzar os dois
critérios com vista a ter uma leitura mais fidedigna.
Ao sequenciar o rRNA 16S de uma estirpe, em vista a compara-la com as espécies mais
próximas, consulta-se uma base de dados de rRNA 16S, e cria-se uma filogenia.
A partir dos métodos descritos torna-se possível aplicar o conceito de espécie a procariotas.
Assim, os níveis hierárquicos (taxonómicos) presentes nos procariotas são os mesmos, no
entanto, nem todas as bactérias têm uma classificação taxonómica tão completa (podemos
passar de Filo directamente para Género).
Para estudarmos organismos procariotas padrão é-nos necessário consultar colecções de
organismos bacterianos, seja a nível nacional ou internacional. São importantes as estirpes
padrão como representantes oficiais de determinada espécie.

BCP – Biologia da Célula Procariotica - Cap. 4, 6, 8 – Brock Biology of Microorganisms. 10th ed.

Morfologia Bacteriana
Do ponto de vista morfológico todos os organismos microbianos têm dimensões relativamente
pequenas, embora estes seres em população possam constituir um agregado visível a olho nu
(colónias numa caixa de Petri, por ex). Existem numerosos tipos morfológicos de bactérias
sendo aqui abordados os principais:

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→ Coccus:
esféricos;

→ Bacillus: em
forma de
bastonete;

→ Espirillus;

→ Espiroquetas;

→ Bactérias
Pedunculadas;

→ Filamentosas:
Lineares ou
Ramificadas;

A morfologia nas bactérias é um critério com valor taxonómico muito reduzido, porque
existem milhares de espécies representantes de cada forma morfológica.

Plano Estrutural da Célula Procariota Típica


No interior da célula procariotica encontramos uma ausência total de sistemas membranares,
com algumas excepções.
O DNA da célula encontra-se mais ou menos compactado, sendo na sua forma funcional um
típico cromossoma. É tipologicamente circular, estando no interior da célula enrolado sobre si
próprio.

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Membranas citoplasmáticas bacterianas


Existem várias bactérias sem parede celular, como é o caso do Mycoplasma, bem como todas
as outras bactérias ou archaeas com nomenclatura a terminar em – plasma.
Na maior parte dos procariotas temos uma parede celular, exterior, localizando-se
imediatamente abaixo a membrana citoplasmática de tipo unitário, segundo o Modelo do
Mosaico Fluído, proposto por S. J. Singer e Garth L. Nicolson, em 1972:

Estes fosfolípidos não estão ligados entre si por ligações covalentes, daí a fluidez deste
modelo. Do ponto de vista de barreira, esta membrana constitui uma praticamente total a
compostos polares e a compostos apolares. Os compostos apolares não conseguem penetrar
na membrana visto que as cabeças dos fosfolípidos têm carga, repelindo os mesmos. E os
compostos polares não entram pois as caudas dos ácidos gordos são altamente hidrofóbicas
impedindo a sua passagem.

NOTA: existem dois tipos estruturais de ácidos gordos presentes na membrana:

- Saturados:

- Insaturados:

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→ Se existir grande número de ácidos gordos insaturados, estas moléculas ficam mais
afastadas.

→ Se existir grande número de ácidos gordos saturados, a membrana torna-se menos


permeável e mais densa, devido á quantidade de ligações extra que se formam entre estas
moléculas.

Os procariotas conseguem regular a proporção de ácidos gordos saturados e insaturados na


sua membrana, como resposta a estímulos ambientais.

As membranas das células procariotas possuem mecanismos de detecção de sinal, transdução


de sinal, e resposta a um estímulo. Os mecanismos de detecção de sinal são geralmente
proteínas membranares, que quando estimuladas sofrem uma alteração conformacional, que
por sua vez vai desencadear um conjunto de respostas intra-celulares, a nível molecular, que
levam a uma alteração funcional, estrutural e/ou fisiológica de resposta a esse mesmo
estímulo. Assim, quando as bactérias são colocadas numa temperatura mais elevada,
naturalmente a sua membrana torna-se mais fluida, mas não demasiado fluida, pois em caso
de fluidez extrema a bactéria sintetiza imediatamente ácidos gordos saturados para conferir
rigidez á membrana.
No caso das archaeas, a sua composição
química membranar é ligeiramente
diferente, em vez de lípidos éster:

Possuem lípidos éter:

Estes lípidos referidos em último irão


providenciar maior rigidez á membrana do
que os lípidos éster. Assim, não é de admirar,
que vamos encontrar este tipo de
conformação membranar em archaeas termofílicas ou hipertermofílicas.
Nos procariotas encontramos lípidos semelhantes aos que se encontram presentes nas
membranas eucariotas, embora com proporções diferentes.

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Associados a estes fosfolípidos, na membrana dos eucariotas encontramos esteróis, uma


família de compostos com uma cauda lateral hidrofóbica, mais ou menos complexa e um
grupo hidroxilo, conferindo-lhes características interessantes:
→ Cabeça polar, que permite a coexistência com fosfolípidos;

→ No caso dos procariotas, à excepção daqueles que


são desprovidos de parede celular, não encontramos
esteróis na membrana plasmática.
Estrutura típica de um Esterol (neste caso colesterol):

No caso dos procariotas, os hopanóis, funcionam como


substitutos membranares dos esteróis em termos de
regulação da fluidez e grau de compactação da
membrana citoplasmática. Apresenta-se assim uma
imagem ilustrativa de um Hopanol tipo:

Associadas á membrana plasmática encontramos um grupo de funções base que por esta são
desempenhadas:

- Barreira de permeabilidade, impermeável a protões;

- Preservar as cargas iónicas, em potência, que se encontram em ambos os lados da célula;

- Transporte, através de moléculas especializadas, geralmente proteínas membranares;

Tipos de transporte membranar existentes (é de notar que todos estes sistemas necessitam de
um transportador, mais ou menos específico):

→ Simples: (Transporte Secundário) dirigido pela energia resultante da força motriz de


protões:

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→ Translocação de grupos: (Transporte Primário) modificação química da substância


transportada (quando chega ao interior da célula) a partir do fosfoenolpíruvato (dador de
grupos fosfato):

→ Sistema ABC (ATP-Binding-Cassete): (Transporte Primário) participação de proteínas


periplásmicas (três componentes proteicos: componente A, B, e C) e energia derivada do ATP:

NOTA: O transporte primário utiliza ATP, enquanto que o transporte secundário utiliza
a força proto-motriz, proveniente do gradiente electroquímico.

O Transporte Simples (Secundário) possui três tipos diferentes de mecanismos e


consequentemente de transportadores. Sejam eles:

NOTA: Diferentes espécies de bactérias podem usar diferentes tipos de transporte


para o mesmo tipo de compostos. Além deste facto, também se observa que a mesma célula

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pode usar diferentes tipos de transporte para o mesmo soluto, dependendo do seu estado
fisiológico, fase do ciclo celular, ou condições ambientais.

Em E. coli existem dois sistemas de transporte de potássio:

→ Um constitutivo: sistema de transporte primário, de baixa afinidade – sistema KDP;

→ Sistema indutivo: sistema de transporte ABC, de maior afinidade, em que só é induzido


quando a concentração de potássio no meio diminui – sistema TRK.

Sumário dos principais tipos de transporte membranar simples (conceito de revisão da aula
anterior):

Estes sistemas de transporte só funcionam quando há energia membranar.


No caso do simporter de fosfato, visto que este anião entra com um protão, o conjunto de
moléculas que chegam ao interior da célula é neutro, logo não altera o gradiente
electroquímico.
No antiporter de sódio-protão, a bactéria faz a troca do ião sódio do interior da célula por um
protão extra-celular. Estes sistemas de transporte são cruciais para procariotas que habitam
ambientes de alta salinidade, porque necessariamente o sódio vai entrar na célula associado a
outros solutos, necessitando estas de regular o balanço de iões pagando um preço energético
de um protão.

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O sistema de translocação de grupos é também designado por sistema PTS (Phospho-


Transferase-System), porque de facto, neste sistema de transporte há toda uma série de
reacções em cadeia em que um grupo fosfato é transferido entre diferentes proteínas ou
enzimas interactuantes neste processo:

Nos sistemas de translocação de grupos, como por exemplo o sistema de translocação da


glucose (como podemos observar na imagem acima), a molécula de glucose é transportada
para o interior. Quando chega ao interior da célula está convertida em glucose-6-fosfato,
existindo portanto uma molécula dadora deste grupo fosfato, sendo este dador sempre o
fosfoenolpiruvato (intermediário da glicolise). Normalmente, quando o fosfoenolpiruvato é
convertido em piruvato, é sintetizada uma molécula de ATP, a partir de ADP + Pi. A partir do
momento em que o grupo fosfato do fosfoenolpiruvato não é usado para tal efeito (neste
sistema), torna-se claro que o custo energético deste processo é equivalente ao consumo de
uma molécula de ATP, assim, este é um sistema de transporte primário.
Estes sistemas de translocação de grupos têm sempre uma estrutura equivalente á
apresentada na imagem acima, existindo duas componentes – as duas primeiras – que são
comuns a todos os sistemas de translocação de grupos: a Enzima I, e a proteína HPR. A Enzima
I, é aquela que reconhece o fosfoenolpiruvato, sendo fosforilada, posteriormente fosforilando
uma segunda proteína, a proteína HPR.
Existem muitos sistemas PTS – glucose, manitol, aminoácidos. Em cada um destes sistemas a
Enzima II (possui várias componentes), varia consoante o substrato transportado. Assim,
conclui-se que é a Enzima II que dá a especificidade ao sistema de transporte.
Esta Enzima II tem normalmente três componentes (podendo ter mais) sendo um deles
citosólico (componente IIa), que é fosforilado pela proteína HPR. Uma vez fosforilada a Enzima
IIa consegue reconhecer a Enzima IIb fosforilando-a, ficando a Enzima IIa disponível para ser
fosforilada outra vez. A Enzima IIb fosforilada vai interagir com a componente IIc, que é sempre

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uma componente transmembranar, e que funciona como um tranportador físico propriamente


dito, e quando a Enzima IIc é fosforilada altera a sua estrutura tridimensional, a glucose passa
a membrana e quando a está a atravessar o grupo fosfato é-lhe adicionado.
NOTA: Qual a vantagem deste sistema de transporte, em relação a outro transportador
qualquer, que coloque glucose dentro da célula consumindo ATP?

Uma célula que possua este tipo de transporte membranar gasta (em teoria) um ATP para
transportar a glucose para dentro da célula e para a fosforilar em glucose-6-fosfato, enquanto
que uma célula com outro sistema de transporte membranar necessita de um ATP para
transportar a glucose para dentro da célula, e outro ATP para a fosforilar.
Assim, torna-se obvio que o sistema de translocação de grupos é mais rentável energicamente
para a célula que o possua.

Vários tipos de Transportadores PTS:

Observando a imagem, na Enzima II no caso da glucose a componente IIa é citosólica,


enquanto que a componente IIc é membranar e a IIb está associada á componente IIc. No caso

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do manitol, as três componentes da Enzima II estão associadas entre si atravessando a


membrana citoplasmática. No caso da mannose, a componente IIa e a componente IIb, estão
associadas entre si e no seu conjunto são um dímero citosólico, e o componente membranar
em vez de ter uma proteína constituinte, tem duas.

Estão representados na imagem por S1 e S2, substratos energéticos alternativos, como por
exemplo lactose ou galactose. Se inserirmos uma estirpe de E.coli num meio contendo glucose
e lactose, e seguirmos a sua curva de crescimento, deparamo-nos com uma curva difásica. Este
fenómeno de crescimento em que a curva de crescimento se duplica tem o nome de Diauxia.
Se dosearmos a glucose e a lactose ao longo do crescimento, verificamos que numa primeira
fase a glucose é consumida e a lactose não, e após esta primeira fase com o esgotamento de
glucose no meio, passa a ser consumida a
lactose. Este fenómeno de Diauxia, corresponde
á utilização preferencial de um substrato em
relação ao outro. A utilização da lactose é
controlada por sistemas de utilização da
glucose. Chama-se a este fenómeno de
repressão por catabolito. Apresenta-se um
gráfico tipo ilustrativo do processo de
crescimento Diauxico:

Este fenómeno existe porque a glucose é transportada pelo sistema da fosfodíesterase. Assim,
explicitando o processo, podemos observar que a Enzima IIa é o elemento regulador deste
processo, alternando entre o estado fosforilado e não-fosforilado, encontrando-se não-
fosforilada quando existe muita glucose no meio, pois está constantemente a ceder o grupo
fosfato às moléculas de glucose que se encontram a atravessar a membrana. A Enzima IIa pode
interagir directamente com outros transportadores, ou com a enzima membranar adenilato-
ciclase, logo se pelo contrário não existe glucose no meio a Enzima IIa vai ficar
predominantemente fosforilada, então activa a adenilato-ciclase membranar, que por sua vez
leva á síntese de cAMP, que é um mensageiro indutor de transcrição dos genes
transportadores da galactose ou da lactose. Assim conclui-se que quando a glucose é
totalmente consumida do meio, são activados outros sistemas de transporte através de
activação de transcrição dos seus genes, via componente IIa fosforilada.

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Todos estes sistemas funcionam de modo articulado, portanto no caso dos outros compostos
como é o caso do manitol ou a mannose, estando a célula em ausência de glucose, os
compostos referidos são detectados por sensores membranares, traduzindo-se este processo
numa cascata de sinal que leva á transcrição dos genes do sistema PTS específico para esses
mesmos transportadores.
Todas as bactérias têm os seus sistemas de transporte associados á membrana, sejam estes
sistemas de transporte referentes á fotossíntese, respiração aeróbia, ou respiração anaeróbia.
Organização da cadeia de transportadores da fotossíntese anoxigénica em bactérias púrpura:

É um sistema de transporte de electrões em que a energia luminosa vai ser convertida num
processo de translocação de protões para o exterior, aumentando a energia potencial da
membrana, e consequentemente a força proto-motriz, permitindo que a ATPase membranar
utilize três protões em média para sintetizar uma molécula de ATP. Este tipo de fotossíntese é
anoxigénica, visto não haver produção de oxigénio no final.
Outras das funções associadas á membrana plasmática têm que ver com todos os sistemas de
recepção e transdução de sinais. Sendo a membrana celular a barreira que delimita a célula do
meio exterior é isso que localiza a interface de comunicação com este meio e
consequentemente todos os estímulos externos. Todos os estímulos ambientais são
reconhecidos pela célula através de proteínas na membrana que funcionam como sensores
desencadeando a resposta que na maior parte dos casos envolve também uma cadeia de
fosforilação sucessiva.

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Outras funções associadas á referida membrana prendem-se com a síntese de proteínas. As


proteínas que a célula produz quer para integração na membrana, quer para exportação para
o meio têm de ter algo que funcione
como sinal para a célula saber qual o
destino das mencionadas. Isto
corresponde ao facto de que os genes
codificantes para as proteínas têm uma
curta sequência numa das extremidades,
que nas proteínas sintetizadas
corresponde á sequência sinal. Sempre
que uma proteína é sintetizada (no
citosol), e for uma proteína membranar,
ela possui sempre na sua extremidade
N-terminal uma curta sequência de
aminoácidos, que funciona como
sequência de reconhecimento e que lhe
permite que se insira na membrana,
sendo depois a sequência sinal que
indica aonde esta se deve dirigir
(membrana, excreção, etc):

Do ponto de vista do processo de síntese há vários tipos de tradução, existindo três sistemas
mais frequentes:
Sistemas associados a Chaperones. Dependem destes
→ Translocação associada á tradução componentes proteicos celulares para impedir o
colapso hidrófobo proteico característico da
→ Translocação pós-transcripcional implementação de estrutura tridimensional á proteína
neo-sintetizada. Estes componentes impedem que a
proteína adquira uma conformação tridimensional
definitiva e globular, visto que se as proteínas que
estão a ser sintetizadas correspondem a elementos
para exportação, não irão conseguir passar nos canais
membranares se possuírem uma estrutura complexa.
As chaperones podem funcionar durante o próprio
processo de síntese, ou após este ter sido concluído.

→ Translocação co-transcripcional: á medida que ocorre a tradução, a proteína neo-sintetizada


encontra-se a ser simultaneamente exportada da célula. O complexo membranar responsável

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pela translocação desta proteína para o exterior, reconhece a sequência sinal assim que esta
emerge do ribossoma, liga-se á mesma e assim que a proteína é formada, insere-se na
membrana ou é exportada.

Segue-se uma ilustração de todos os processos referidos:

Existem dois sistemas principais de chaperones que participam nestes processos de controlo
de estrutura terciária de proteínas:

→ Sistemas direccionados a proteínas citoplasmáticas:

- DnaK-DnaJ : funcionam quando a proteína tem aminoácidos hidrofóbicos expostos


no exterior da proteína, visto que deveriam estar no interior. Este processo utiliza ATP.

- GroEL-GroES: funcionam quando a proteína já foi sujeita a rearranjo por parte do


sistema DnaK-DnaJ, mas continua a ser detectada como mal-estruturada.

→ Sistemas direccionados a proteínas de exportação:

-Partícula de reconhecimento de sinal: este complexo funciona reconhecendo


proteínas com sequência sinal específica de proteínas membranares, reencaminhando-a para a
membrana citoplasmática.

- Sistema SecA: reconhece proteínas com sequências sinal distintas, reencaminhando-a


para o sistema Sec membranar, permitindo a sua posterior secreção.

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Paredes Celulares Bacterianas

Nas bactérias encontramos dois tipos de parede celular, e assim são classificadas segundo as
características apresentadas por estes dois tipos de parede:

→ Gram-positivo:
possuem uma camada
espessa electrodensa,
que corresponde a
uma camada espessa
de peptidoglícano.

→ Gram-negativo:
possuem por fora da
membrana
citoplasmática uma
segunda membrana,
também unitária, e entre as duas um espaço (espaço periplasmático) onde aparece uma
camada electrodensa correspondente a uma camada mais fina de peptidoglícano. A segunda
membrana (membrana externa) é também formada por lípidos, mas é assimétrica. O folheto
interno da membrana externa é constituído por fosfolípidos, mas a camada externa da
membrana externa é formada por um lípido modificado – o Lipopolisacárido (LPS). Nem toda a
face externa da membrana é constituída por Lipopolissacáridos, a concentração em LPS varia
conforme o meio – é uma resposta adaptativa.

NOTA: O método de Gram não corresponde a mais do que uma


técnica de coloração, o que nos permite inferir as características de uma
parede celular bacteriana a partir da classificação nominal (Gram-
negativa/positiva). Foi concluído apenas á generalização do conceito de
que a um certo tipo de coloração está associado um certo tipo de
organização estrutural e molecular da parede celular.

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O Peptidoglícano
O peptidoglícano, ou mureína, ou ainda
muro-péptido, é um gluco-péptido
constituído por cadeias lineares do polímero
formado por dois monómeros: o NAM
(ácido N-acetylmurâmico) e NAG (N-
acetylglucosamina):

O Peptidoglícano é formado por cadeias


lineares paralelas, formadas
alternadamente, que em alguns pontos têm ligações cruzadas através de resíduos específicos –
os resíduos M (NAM). A componente glucídica do peptidoglícano é formada por resíduos M e G
(NAG). Estes açucares têm uma conformação piranósica, e estão ligados entre si por uma
ligação β-glucosídica (é sempre do tipo β-1,4 → ligação entre o grupo hidroxilo do carbono-1,
com o grupo hidroxilo do carbono-4). As pontes de cruzamentos são formadas por
aminoácidos ligados por ligações peptídicas, que correspondem á componente peptídica do
peptidoglícano. Nestes aminoácidos geralmente a sequência dos cinco primeiros é conservada
(como ilustrado na figura acima) – pentapéptido (aquando da síntese), que acaba por se
converter num tetrapéptido no exterior da célula.

NOTA: o peptidoglícano também contém aminoácidos da série D.

Nesta estrutura o NAG e o NAM estão


ligados entre si, e ao NAM está ligado um
curto péptido de quatro ou cinco
aminoácidos, existindo na molécula
adjacente outro igual, estabelecendo-se
assim entre estes péptidos uma ligação
peptídica cruzada, conferindo uma
estrutura de rede resistente ao
peptidoglícano:

NOTA: uma bactéria Gram-positiva consegue resistir a uma pressão de


turgescência da ordem das 20atm.

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Retomando as considerações feitas, revemos que existe um pentapéptido no momento da


síntese do peptidoglícano, que posteriormente se converte num tetrapéptido no exterior da
célula por remoção do último aminoácido que é reciclado, voltando a ser utilizado pela célula.
A ligação cruzada existente entre os aminoácidos costuma ser entre o terceiro e o quarto
embora se verifique em determinadas situações entre o segundo e o quarto.

NOTA: Por vezes a ligação entre os dois aminoácidos não é directa, existindo
entre eles uma ponte peptídica (ex: em Staphylococcus aureus existe uma ponte de cinco
glicinas).

Embora a sequência de aminoácidos seja normalmente conservada, em casos especiais nota-


se o terceiro aminoácido a ser conservado:
→ Gram-negativas: D-Aminopimélico (nas espiroquetas é a L-Ornitina);
→ Gram-positivas: L-Lisina.

Biossíntese e Metabolismo do Peptidoglícano


Como podemos observar na última imagem, esta estrutura de malha do peptidoglícano forma-
se no exterior da célula, e o grau de pontes cruzadas vai definir a abertura dessa malha e o
grau de compactação. As bactérias têm a possibilidade de regular esta estrutura de pontes
cruzadas aumentando ou diminuindo o grau de compactação do seu peptidoglícano → é uma
estrutura bastante dinâmica, estando em constante degradação parcial e renovação:

Iremos abordar este tema de uma maneira bastante esquemática, com o intuito de se
compreender em pleno, todos os passos dados na Biossíntese deste composto:

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Passo 1

Um grupo de enzimas bacterianas


denominadas autolisinas, quebram as pontes
glicosidicas entre os monómeros de
peptidoglícano no ponto de crescimento, ao
longo do peptidoglícano existente. Estas
também quebram as ligações peptídicas das
pontes cruzadas que ligam as fileiras de
açúcares juntas. Desta maneira, novos
monómeros de peptidoglícano podem ser
inseridos e permitir o crescimento bacteriano.

Passo 2

Nova síntese de Peptidoglícano ocorre no plano


de divisão celular por vias e colecções de
maquinarias de divisão celular conhecidas como
divisoma.

Passo 3

Monómeros de peptidoglícano são sintetizados


no citosol da bactéria, onde se associam a um
transportador membranar denominado
bactoprenol-fosfato. Estes transportadores
transportam os monómeros de peptidoglícano
através da membrana citoplasmática e ajudam
a inseri-los nas cadeias crescentes de

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peptidoglícano. Este passo desenvolve-se através das seguintes fases:


1) Primeiro, o NAG liga-se á uridina difosfato
(UDP) para formar o complexo UDP-NAG. Alguns
NAG são enzimáticamente convertidos em NAM,
formando UDP-NAM.
2) Cinco aminoácidos são adicionados
sequencialmente ao UDP-NAM, formando o
pentapéptido. Os últimos dois são de D-alanina,
produzidos a partir de L-alanina modificada por
enzimas.
3) O NAM-pentapéptido associa-se ao
bactoprenol-fosfato presente na membrana
citoplasmática, sendo a energia fornecida por um dos altamente energéticos grupos fosfato da
molécula de UDP.
4) O NAG é adicionado ao NAM-pentapéptido associado ao bactoprenol-fosfato em ordem a
completar o monómero de peptidoglícano.
5) O bactoprenol-fosfato de seguida insere os
monómeros de peptidoglíano nas quebras
existentes no próprio no ponto de crescimento da
parede bacteriana.
6) o bactoprenol-fosfato perde o seu segundo
grupo fosfato (doado pelo primeiro UDP) - por
acção da pirofosfatase que cliva esta ligação -
quando volta para a membrana citoplasmática
após depositar o monómero que tinha associado
na cadeia de peptidoglícano em crescimento.

Passo 4

As enzimas Transglicosilases catalisam a formação de


pontes entre NAM e NAG dos monómeros neo-
sintetizados, e entre NAM e NAG presentes no
peptidoglícano já existente.

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Passo 5

Por fim, enzimas Transpeptidases formam


ligações peptídicas de ponte cruzada, entre as
fileiras e camadas do peptidoglícano em ordem
a fortalecerem a parede bacteriana.

Nos coccus a síntese de peptídoglicano ocorre na zona que rodeia o septo – zona de divisão
celular. Enquanto que em bastonetes (bacillus), a síntese de peptidoglícano ocorre
intersticialmente em toda a estrutura da parede:

Diferenças estruturais na parede celular de Gram-positivas e Gram-negativas

Nas Gram-positivas, existe uma parede mais simples, do ponto de vista químico. Para além do
peptidoglícano encontramos associado á parede, proteínas – desempenhando papéis diversos
tais como a síntese e degradação do peptidoglícano (quer as autolisinas quer as enzimas de
síntese) – e encontramos alguns compostos designados por ácidos teícoicos e ácidos
lipoteícoicos.

Estrutura química de um ácido teícoico:

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O ácido teícoico é um homopolímero – os monómeros que se repetem são praticamente


idênticos. Este ácido é composto por ribitol-fosfato, ou glycerol-fosfato com substituintes
glucídicos ou aminoacídicos. Estas moléculas são extensas, e como têm substituintes laterais –
que são polares – vão dar á parede um grau de hidrofília bastante grande. Assim a parede das
bactérias Gram-positivas é fundamentalmente hidrofílica. Podemos concluir que as Gram-
positivas, geralmente não têm problema em excretar ou absorver solutos através da parede
celular.
O papel dos ácidos lipoteícoicos é participar no processo de manter o peptidoglícano mais ou
menos compactado em torno da célula.
Nas Gram-negativas, existe a particularidade destas mesmas terem uma membrana externa,
que permite que se defina claramente, um espaço entre a membrana externa e a membrana
citoplasmática – periplasma.
Nas Gram-negativas o peptidoglícano forma uma rede que envolve toda a célula, de tal
maneira que com algumas técnicas torna-se possível isolar (intacta) toda esta rede de
peptidoglícano – sáculo de peptidoglícano.
A membrana externa é uma dupla camada constituída por lípidos, mas os lípidos da face
interna são fosfolípidos enquanto que os da face externa são fosfolípidos e um lípido
modificado denominado Lipopolisacárido – vulgarmente designado por LPS.

Apresenta-se uma ilustração mais detalhada dos componentes estruturais das membranas e
parede celular de uma bactéria Gram-negativa:

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Como esta membrana é de natureza lipídica é obvio que a membrana externa forma uma
barreira quase impermeável a tudo o que é compostos hidrofílicos e a tudo o que é compostos
hidrofóbicos. Assim, as Gram-negativas para poderem absorver solutos ou excretar produtos
do metabolismo têm de ter sistemas que atravessem a membrana – proteínas
transmembranares, normalmente formadas por três subunidades (trímeros) – sendo estes
sistemas proteicos as Porinas:

Estas proteínas formam uma estrutura tubular no seu interior, e funcionam como um poro.
Podem constituir três canais independentes paralelos uns aos outros, ou pode haver alguma
confluência de canais, ou seja, na face externa os canais são separados e depois fundem-se
formando um canal único para o interior da célula. Estas porinas, podem ser:

→ Não-específicas: constituem a maior parte das porinas. Não funcionam por reconhecimento
de substrato, funcionam antes como poros de exclusão molecular – passa tudo o que couber
no seu diâmetro.

- Dentro destas porinas não-específicas OmpC- diâmetro mais pequeno – mais


predominam normalmente dois tipos de porinas: restritiva na passagem de compostos.

OmpF- diâmetro maior.

NOTA: Omp – Outer Membrane Estas duas porinas coexistem na


Protein. mesma célula, sendo a sua proporção
regulada pela célula em função das
condições ambientais.

→ Específicas: constituem a minoria das porinas. Podem ser específicas para a captação dos
fosfatos ou outros substratos.

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Estas porinas, no fundo, estabelecem a comunicação entre o exterior e o espaço


periplasmático. Chegados ao espaço periplasmático estes compostos passam através da malha
do peptidoglícano, e vão atingir os transportadores específicos localizados na membrana.

Esta membrana externa está ligada á camada de peptidoglícano através de uma proteína
modificada denominada lipoproteína – proteína com uma componente lípidica com ácidos-
gordos que a inserem na face da membrana externa, estando a parte proteica covalentemente
ligada ao peptidoglícano (através duma ligação peptidíca entre o último aminoácido da
componente proteica da lipoproteína e um dos aminoácidos do peptidoglícano). O número de
moléculas de lipoproteínas por célula é muito elevado, e portanto permite que esta camada
externa esteja de certa forma ancorada ao peptidoglícano.

LPS – Lipopolisacárido
O lipopolisacárido é um componente da membrana externa das Gram-negativas que carece de
uma certa complexidade. Apresenta-se assim a sua estrutura pormenorizada:

É constituído por três partes:

→ Lípido A – está inserido na membrana e é formado por duas moléculas de glucosamina


fosfatada, que lhe confere a polaridade necessária para se inserir entre as cabeças dos
fosfolípidos, e tem ligado ácidos-gordos. Este lípido A, quando em contacto com o sistema
imunitário de um hospedeiro desencadeia uma reacção alérgica, e por este motivo é
considerado um antigénio. É considerado uma toxina (desencadeia febre e outras reacções),
mas como é um componente estrutural endógeno da bactéria, é também designado por
endotoxina.

→ Núcleo Oligosacarídeo – a sua estrutura é altamente conservada em Gram-negativas. É um


polisacárido com particularidades interessantes como o facto de possuir uma heptose (açúcar
com sete carbonos, raro no mundo biológico), tem também na sua estrutura três KDO – ácido
cetodesoxioctónico. Esta estrutura do Núcleo Oligossacarídeo tem componentes moleculares

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que só é possível encontrar neste composto biológico. É de salientar que quer o KDO, quer as
heptoses funcionam como marcadores moleculares de bactérias Gram-negativas.

→ Polisacárido O específico - com várias repetições monoméricas (variável na mesma espécie,


de estirpe para estirpe). Pode ter até trinta unidades monoméricas repetidas, que se estendem
para fora da célula podendo fragmentar-se, sendo também reconhecido como antigénio –
antigénio O - por organismos hospedeiros.

O LPS é sintetizado, na sua maioria, no exterior da célula bacteriana. Este é sintetizado em


duas fases:
- Numa fase inicial é sintetizado o lípido A, e é-lhe adicionado o Núcleo – que é a parte
conservada.
- Numa segunda fase são produzidos os monómeros do Polisacárido O específico,
sendo o rearranjo das suas subunidades feito no exterior.

Espaço Periplasmático (estrutural)


O espaço periplasmático (estrutural) encontramo-lo apenas em bactérias Gram-negativas. No
entanto, em bactérias Gram-positivas na zona entre a face externa da membrana
citoplasmática e a camada de peptidoglícano, que tem um limite físico definido, existe uma
região de acumulação de várias proteínas e vários compostos, ocorrendo assim funções
equivalentes às que ocorrem no periplasma das Gram-negativas. Existe também uma diferença
a nível funcional, que reside no facto das bactérias Gram-negativas terem uma maior taxa de
conservação de moléculas e de reutilização das mesmas, visto que o seu periplasma permite
uma maior conservação de compostos utilizados existentes neste mesmo.
Sendo o espaço periplasmático, a zona estrutural fisicamente definida entre a membrana
interna e a membrana externa das bactérias Gram-negativas, do ponto de vista da sua
composição, existe uma série de proteínas, umas solúveis, outras em interacção directa quer
com a membrana citoplasmática, quer com a membrana externa. Além destas proteínas
acabadas de referir, existe ainda no espaço periplasmático uma grande concentração de
oligosacáridos, que são sintetizados a nível da membrana citoplasmática através da associação
de monómeros pelo ciclo do bactoprenol-fosfato. Estes oligosacáridos que existem no espaço
periplasmático são designados de MDO’s (Membrane Derived Oligosaccharides) – são
originados por uma via em que os monómeros são sintetizados no citoplasma e activados por
uma ligação a um transportador nucleotídico – UDP-glucose (Uridina-difosfato-glucose) –

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sendo estas unidades posteriormente transferidas para o Bactoprenol-fosfato, que por sua vez
transfere estes monómeros para a face externa em ordem a serem polimerizados.

Papel desempenhado pelos MDO’s:

A acumulação no periplasma de MDO’s vai levar a um aumento da pressão osmótica do


mesmo, e a uma consequente acumulação de moléculas de água por solvatação e hidratação
destas moléculas.
Um dos problemas apresentados em Gram-negativas, refere-se aos sensores estarem
localizados na membrana citoplasmática, ou seja, “Como é que um sinal consegue activar um
sensor membranar, tendo em conta que estas bactérias possuem duas membranas delimitadas
por um espaço periplasmático?” – respondendo á pergunta postulada, pensa-se que a
passagem e transdução de sinal, da membrana externa para a membrana citoplasmática seja
feito a partir de um receptor que especificamente detecta moléculas associadas ao sinal que
vai desencadear a resposta, e esse receptor quando se liga á molécula alvo sofre alterações
conformacionais que vão induzir, por sua vez, alterações conformacionais numa proteína
membranar de grandes dimensões, que em resposta se estende e atravessa o espaço
periplasmático – estamos pois, a falar da proteína TonB. Esta proteína funciona como um
transdutor de sinal entre a membrana externa e a membrana citoplasmática, como se pode
observar no esquema seguinte:

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Podemos assim, resumir os principais processos levados a cabo pelo Periplasma:

→ Controlo da pressão osmótica

→ Produção de energia, a nível de cadeias respiratórias ou cadeias fotossintéticas

→ Participação nos processos de detecção e transdução de sinal

→ Hidrólise dos compostos, pela acção de enzimas hidrolíticas secretadas pela célula

→ Produção de enzimas, que destroem compostos nocivos para a célula

O periplasma é sem dúvida, quer nas Gram-negativas ou nas Gram-positivas, uma estrutura
altamente dinâmica, crucial para a resposta celular a variações ambientais.

Pequena conceptualização acerca da parede celular das


Mycobactérias

São um grupo particular de bactérias Gram-positivas com


bastante relevância do ponto de vista da saúde pública,
nomeadamente são bactérias pertencentes a várias
espécies do género Mycobacterium, sendo de salientar a
espécie Mycobacterium tuberculosis (agente da
Tuberculose). Estas bactérias possuem a característica de
terem um crescimento muito lento, e verificou-se que detêm uma parede que devia ter uma
modificação química, visto terem uma grande dificuldade em absorver nutrientes. Embora
ainda não se saiba hoje em dia qual o modelo estrutural da parede em mycobactérias, não há
dúvida que este tipo específico de bactérias tem uma estrutura de parede que se assemelha a
algo intermédio entre uma Gram-positiva típica e uma Gram-negativa típica. Em
Mycobacterium existem vários polímeros que só encontramos na parede destes mesmos
organismos, nomeadamente um tipo de ácidos-gordos extremamente longos, com trinta ou
quarenta átomos de carbono na sua cadeia e pertencentes ao grupo químico das sedas, são
altamente hidrofóbicos e insolúveis em água – são designados de ácidos mycólicos. Estes
ácidos mycólicos constituem uma camada que forra tipicamente a parede das mycobactérias.
Existem outros compostos existentes nesta parede bacteriana, como os LAM
(Lipoarabinomannan) – muito equivalentes aos ácidos teicóicos, são polímeros
fundamentalmente de arabinose e manose, que têm na sua extremidade, uma componente
lipídica formada por ácidos-gordos. Todos estes componentes contribuem para que a parede
das mycobactérias seja praticamente impermeável. Verificou-se também que na parede das

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mycobactérias, existiam estruturas proteicas tubulares, muito alongadas, sendo em tudo


equivalentes funcionais das porinas das Gram-negativas. O número destas estruturas
alongadas é muito reduzido, portanto a grande dificuldade de penetração de soluto, justificam
as baixas taxas de crescimento que estes organismos têm.
Em suma, as Mycobactérias representam assim, um tipo intermédio de parede celular
bacteriana, quando comparadas com bactérias Gram-positivas e Gram-negativas:

Estrutura da parede celular nas Archaeas

Como exemplo inicial apresenta-se uma fotografia de microscopia electrónica da parede


celular de Methanospirillum sp:

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Assim, em Methanospirillum temos uma membrana citoplasmática com dois folhetos


electrodensos e um mais claro, e depois externamente é como se existissem duas paredes –
duas camadas electrodensas – que constituem o que geralmente se denomina uma parede
interna e uma parede externa. Surge uma grande problemática, visto que em archaeas temos
uma grande diversidade de estrutura e composição da parede celular. Se aplicarmos a reacção
de coloração de Gram a uma archaea verificamos que se pode comportar como Gram-positiva,
ou como Gram-negativa, tendo sempre um destes dois resultados.
Em algumas archaeas podemos encontrar um polímero que se assemelha ao peptidoglícano –
Pseudomureína - , na sua composição possui N-acetylglucosamina como um peptidoglícano
normal, mas ao invés de possuir ácido N-acetylmurâmico, possui ácido N-acetyl-
talosaminurónico (NAT), sendo este ácido derivado de outro açúcar – ao invés de ser a glucose
– e a ligação entre estas duas moléculas não é uma ligação β-1,4, mas sim β-1,3, o que significa
que esta associação de moléculas é resistente á acção da Lisozima. Ligado a este substituto
molecular do NAM, temos também um péptido curto, com a diferença dos aminoácidos serem
mais conservados e serem todos pertencentes á série L. Mais em pormenor, o NAG em certas
archaeas pode ser substituído por N-acetylgalactosamina. Existe também um pentapéptido
formado por L-glutâmico, L-alanina, L-lisina, L-glutâmico, L-alanina – por esta ordem
respectivamente. O processo de formação é equivalente: formam-se pontes cruzadas entre o
3º e o 4º, sempre no exterior da célula por enzimas semelhantes às transpéptidases
bacterianas.

Em termos de organização estrutural, são conhecidos até á actualidade seis modelos


estruturais diferentes na parede celular de archaeas:

Reacção Gram Estrutura Géneros Representantes


1)
Negativa Halobacterium
Methanococcus
Thermoproteus
2)
Negativa Methanospirillum

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3)
Negativa Thermoplasma

4)
Positiva ou Methanosarcina
Negativa

5)
Positiva Halococcus
Methanobacterium

6)
Positiva Methanothermus

Sendo: SL – Surface Layer (S-layer); CM – Membrana Citoplasmática; HP – Heteropolisacárido;


PM – Pseudomureína; PS – Camada Proteica; MC – Metanocondroitina.

NOTA: não há correlação entre estrutura de parede e adaptação a um


determinado habitat.

As archaeas podem ter exclusivamente como


parede celular aquilo a que nós chamamos de S-
layer → camada de proteínas que estão
compactadas formando um arranjo cristalino, de
tal maneira que quando observadas em
microscopia electrónica a imagem que obtemos é
esta:
Esta camada de proteínas forma uma estrutura
protectora da membrana celular. Pode ser
destacada em fracções como uma película que cobre a superfície celular.

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Outro tipo de parede que podemos encontrar é equivalente á primeira, consistindo numa S-
layer, e por fora desta com algumas proteínas agregadas, dispersas – Bainha proteica.
Thermoplasma sendo o equivalente em archaeas do Mycoplasma em bactérias, é uma archaea
desprovida de parede celular, só possui membrana citoplasmática, mas sendo termofílica tem
alguma adaptação a esse ambiente – tem uma densidade muito elevada de proteínas na sua
membrana plasmática → impedindo a desagregação da membrana pelo aumento de
temperatura.
Em Methanosarcina encontramos uma membrana citoplasmática, um S-layer, e por fora uma
camada de um polímero designado por Metanocondroitina. Este polímero tem a designação
apresentada por duas razões: porque tem sido encontrado (quase exclusivamente) em
archaeas metanogénicas; e porque a sua composição química é fundamentalmente composta
por ácidos urónicos (derivam de glúcidos por aquisição de um grupo carboxilo no carbono
terminal), que são encontrados em tecidos cartilaginosos de animais. Á semelhança dos
tecidos cartilaginosos, este composto de Metanocondroitina é altamente hidratável,
adquirindo uma consistência de gel espesso, constituindo uma parede de protecção que
permite a passagem de compostos hidrosolúveis, mas constituindo uma barreira eficaz contra
compostos hidrofóbicos.
No caso das restantes archaeas, encontra-se principalmente a pseudomureína, e um S-layer
proteico associado á face externa da pseudomureína. É de notar que no quadro apresentado
há pouco, os únicos géneros cuja reacção de Gram é positiva são também os únicos
possuidores de pseudomureína. Sendo que a reacção positiva com Metanocondroitina depende
do grau de compactação deste polímero.

Cápsulas Bacterianas e Matrizes extracelulares

Por vezes, as bactérias segregam compostos para fora da


parede celular que se acumulam, podendo formar
matrizes com graus de diferente densidade, e compostas
por variados tipos de moléculas. Apresenta-se uma
ilustração referente ao contexto actual:

Todos estes polímeros que são encontrados fora da parede celular são hexopolímeros, muitos
deles de natureza polisacarídica, também por isso denominados hexopolisacáridos. Nestes
casos em que a estrutura que reveste as células apresenta um aspecto mucilaginoso

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denominamos a estrutura de matriz mucilaginosa. Noutros casos em que a estrutura é


perfeitamente distinguível ao microscópio óptico denomina-se de cápsula. A existência de
cápsulas é importante para as bactérias por duas razões:

→ Sendo as cápsulas normalmente de natureza polisacarídica, e sendo os polisacáridos


altamente hidratáveis, estas cápsulas funcionam como uma reserva de água – impedem a
dessecação (pode constituir uma resposta por parte das células contra a dessecação);

→ As estirpes capsuladas são normalmente mais virulentas do que as estirpes não-capsuladas,


visto que as cápsulas protegem as bactérias dos mecanismos de defesa do hospedeiro,
conseguindo desencadear estados de doença mais graves do que as não-capsuladas.

Algumas espécies bacterianas (Leuconostoc mesenteroides, por exemplo) têm uma


particularidade bastante interessante: se uma estirpe for crescida num meio normal com
glucose como fonte de carbono forma colónias puntiformes. Mas se crescermos a mesma
estirpe num meio com sacarose como fonte de carbono, a mesma estirpe dá colónias
altamente mucilaginosas, que consistem em células com cápsulas formadas por Dextrano –
polímero de glucose. Este tipo de cápsula só se forma dependendo da existência ou não de
sacarose no meio de cultura, representando uma adaptação á utilização da sacarose como
fonte de carbono. Seguem-se duas imagens referentes aos dois tipos de colónias formadas por
Leuconostoc mesenteroides – puntiformes e mucilaginosas, respectivamente:

Estas bactérias utilizam a sacarose da seguinte maneira: libertam para o meio de cultura uma
enzima que vai utilizar as moléculas de sacarose,
hidrolizando-as. Isto funciona porque a enzima
reconhece duas moléculas de sacarose, cortando uma
das moléculas, e sendo a energia libertada utilizada para
que a glucose fique livre, e possa ser utilizada. Tendo

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em conta a estrutura da sacarose:


Podemos inferir o modo de actuação destas enzimas, visto que elas cortam a ligação entre
estes dois compostos presentes na sacarose, utilizando a glucose (entra na célula) e
polimerizando a frutose existente formando um polímero de frutose com uma glucose terminal
- Levamo. Outras bactérias partem duas moléculas de sacarose, mas ao invés do caso agora
apresentado, utilizam a frutose polimerizando a glucose, formando um polímero de glucose
com uma frutose terminal – Dextrano.

NOTA: Porquê a nomenclatura de Levamo e Dextrano? Porque a Glucose era


inicialmente designada por Dextrose, e a Frutose por Levulose, visto terem propriedades
de inversão do plano rotacional da luz (Dextrogira e Levogira).

Tabela de exemplos da composição química das cápsulas que se podem encontrar em


bactérias:

Espécie Composição Habitat comum*


Streptococcus salivarius Levanos Boca humana
Streptococcus pneumoniae Polisacáridos complexos Tracto respiratório humano
Haemophilus influenzae Poly-ribitol fosfato Tracto respiratório humano
Bacillus anthracis Poly-D-glutamato Solo
Azotobacter vinelandii Polímeros de ácido urónico Solo
Leuconostoc mesenteroides Dextranos Solo, matéria vegetal
* A formação de cápsula pode não ocorrer na maioria dos habitats comuns.

É de notar que a maioria destes compostos é de natureza polisacarídica. Refere-se a espécie


Bacillus anthracis em particular, porque produz uma cápsula que é das poucas que se conhece
de natureza não-polisacarídica, é um polímero de ácido D-glutâmico, sintetizado por síntese
não-ribossomal.

A estrutura que se encontra por fora da parede


celular da bactéria patogénica Streptococcus
pyogenes, agente de infecções do tracto
respiratório superior, forma fibrilas á superfície das
células (como podemos observar na imagem). Estas
fibrilas são de natureza exclusivamente proteica, e funcionam como estruturas de adesão
destas bactérias ao epitélio respiratório. Muitas bactérias patogénicas produzem estas

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estruturas denominadas Fimbria ou Pilli, que são usados na adesão a superfícies. Estas fibrilas
são constituídas por uma proteína designada proteína M.

Mobilidade Procariota
Alguns procariotas são móveis, e dentro das células procariotas com mobilidade verificamos a
existência de flagelos, que são estruturas inseridas na parede celular que impulsionam a célula
por rotação, constituindo este o principal mecanismo de deslocação presente dentro dos
procariotas móveis.
Se observarmos uma preparação com bactérias ao microscópio óptico elas parecem mover-se
todas, mas na realidade muitas destas bactérias aparentemente móveis estão na verdade a ser
transportadas por correntes de convecção da água – movimentos brownianos – não
correspondendo assim, a bactérias com aparelhos celulares indutores de movimento activo.
Outros procariotas conseguem obter mobilidade através de um mecanismo totalmente
diferente: só se movem se estiverem aderentes a uma superfície, e seguindo o movimento
destes procariotas parece que estes mesmos estão a deslizar sobre a superfície:

Chama-se a este mecanismo –


movimento por deslizamento, e os
mecanismos para este tipo de
deslocamento são diversos, sendo os mais importantes: 1) o referente á excreção de
compostos de natureza polisacarídica (com gasto de ATP), sendo um polímero sintetizado para
o exterior pela bactéria, que gelifica, e quando presente em meio aquoso vai empurrando a
bactéria no sentido contrário ao da síntese do polímero; 2) e o referente ao deslocamento da
bactéria através do processo de rodar sobre si própria. Neste último processo refere-se a
existência de proteínas na membrana externa, e
proteínas na membrana citoplasmática que
interagem passando por entre as malhas do
peptidoglícano, sendo que a energia para este
deslizamento resulta da própria energia potencial
de membrana. Esta energia é necessária para a
interacção destas proteínas umas com as outras,
modificando as suas conformações e
proporcionando o deslizamento da bactéria, como
se observa no esquema.

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Na prática é como se a membrana externa deslizasse sobre a própria membrana


citoplasmática. O sentido do movimento da célula é o oposto do sentido do movimento das
proteínas motrizes da membrana.
Sendo assim, falta-nos abordar o outro tipo de bactérias móveis, que são as bactérias
flagelares. Uma das características dos flagelos ditos procariotas, é de que estes são
exclusivamente de natureza proteica não possuindo nenhuma membrana a revesti-los. O
arranjo flagelar (ou flagelação) é o limite de distribuição de flagelos:

Flagelação: Descrição: Representação:


Polar Um único flagelo num pólo da célula.

Perítrica Vários flagelos a toda a volta da célula.

Lofótrica Acumulação de flagelos num pólo da


célula.

Os flagelos apresentam uma dimensão da ordem dos nanómetros, logo, em microscopia óptica
normal não se conseguem ver flagelos. Apenas se tornam visíveis em microscopia óptica
fazendo uma coloração especial com Nitrato de Prata (AgNO3), depositando-se estas
moléculas sobre a proteína flagelar, dando cor aos flagelos, e permitindo a sua visualização em
microscopia óptica. Todo o flagelo é formado por monómeros de uma proteína denominada
flagelina, dispostos em hélice, formando um tubo.

Estrutura do Flagelo
A estrutura observável na imagem corresponde ao corpo basal do flagelo, constituído pelos
monómeros de flagelina, formando propriamente um tubo. O corpo basal do flagelo constitui
uma estrutura inserida na parede e membrana, e tipicamente o que conhecemos na estrutura
do flagelo é o filamento (a amarelo na imagem) propriamente dito (formado pelas moléculas
de flagelina) que na parte de inserção do corpo flagelar detém outras proteínas associadas que
formam uma estrutura em gancho → Gancho Flagelar. Este gancho flagelar insere-se na
membrana através duma estrutura denominada bastonete, existindo em torno desta estrutura
quatro anéis no caso das bactérias Gram-negativas:

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- O anel L está inserido a nível da


membrana externa;
- O anel P está inserido a nível do
peptidoglícano;
- O anel MS localiza-se inserido a nível da
membrana citoplasmática, sendo este
composto por duas subunidades (M e S).
Em torno do anel MS, existem proteínas
denominadas Mot, ou proteínas do Motor
Flagelar, sendo estas constituídas por dois
tipos distintos: a MotA, e a MotB. Estas
proteínas (como o nome indica) estão
associadas ao movimento flagelar.
Dentro deste complexo existem outros
tipos de proteínas. Neste caso
denominadas proteínas Fli, sendo três: Fli
M, Fli N, FliG – constituem o “interruptor” do Flagelo.
O motor flagelar é rotacional, podendo caracterizar-se (o sentido de rotação) como directo ou
retrógrado → CW (Clock-Wise) ou CCW (Counter-Clock-Wise), respectivamente. O que as
proteínas Fli fazem é permitir a rotação num sentido, ou interromper o sentido presente para
que o flagelo possa rodar no sentido oposto.
As proteínas motrizes (Mot) estão associadas á rotação, sendo a energia fornecida para essa
mesma rotação proveniente do gradiente protónico. Cada vez que o motor roda, há protões
que entram dentro da célula através das proteínas MotA e MotB, á semelhança do que ocorre
nos processos levados a cabo pela ATPase. Através desse consumo de protões, as proteínas
intervenientes fazem com que o motor rode sobre si próprio, através da componente rígida do
flagelo – anéis – e da componente móvel que roda no seu eixo – gancho. Este mecanismo
permite, assim, que a bactéria fique imóvel enquanto o flagelo roda. Há medida que o flagelo
roda no seu eixo, cria-se uma corrente de convexão homologa ao movimento de rotação
flagelar.
Em termos de organização estrutural, todas as proteínas intervenientes na própria estrutura e
função flagelar são codificadas por mais de quarenta genes distintos.

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Biogénese do Flagelo Bacteriano


Sempre que uma bactéria flagelada se divide, necessita que seja criado um novo flagelo para a
célula filha. O flagelo que se encontra a ser neo-sintetizado na bactéria filha começa sempre
pela produção e inserção das proteínas constituintes do corpo basal do flagelo. Assim, os genes
codificantes para as várias proteínas que constituem o corpo basal começam a ser expressos, e
á medida que as proteínas se vão formando, começam-se a inserir nos vários pontos
característicos da célula (membrana citoplasmática, peptidoglícano e membrana externa),
juntando-se até constituírem o corpo basal completo.

Na última imagem, observa-se, muito resumidamente, os passos de associação do flagelo


bacteriano, sendo que no penúltimo passo, pode-se observar com clareza a existência de uma
proteína terminal – cap. Esta proteína terminal é extremamente importante para a síntese
completa do flagelo, visto que impede que a flagelina neo-sintetizada, se liberte
posteriormente para o meio. Permite assim, que esta se vá agregando na ponta do gancho
flagelar, depositando-se continuamente, até formar o filamento completo.

NOTA: Foi descoberta a importância desta proteína terminal, através de experimentação


contínua de mutações aleatórias de bactérias. Esta experimentação permitiu compreender a
importância da proteína terminal através de um mutante que não conseguia sintetizar a mesma –
este mutante deixava escapar flagelina para o meio, em vez de a acumular na ponta terminal do
gancho, em ordem a que posteriormente se formasse o filamento flagelar completo.

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Na figura acima observam-se todos os passos da auto-associação completa do flagelo


bacteriano, bem como todos os genes intervenientes em cada passo, respectivamente.
Após a inserção do corpo basal, encontramo-nos na fase de síntese da flagelina, para a
inserção do gancho e filamento flagelar. Sendo a flagelina um monómero, cada molécula é
sintetizada no citoplasma, e é exportada através do corpo basal ligando-se á face exterior da
membrana externa da célula:

O flagelo vai crescendo, como esquematizado na imagem acima, não pela base mas pela
ponta.
Todas estas fases da biogénese do flagelo, bem como todos os genes associados, foram
descobertos por análise de mutantes, compreendendo-se o fenótipo associado, e a estrutura
em termos de microscopia electrónica do flagelo bacteriano.

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Mobilidade das Bactérias com Flagelo

Uma bactéria que possua flagelação polar possui um flagelo que roda sobre si próprio,
podendo rodar em dois sentidos – CW e CCW – como já anteriormente observado.
O movimento destas bactérias é aleatório, porque está sujeito á rotação do flagelo com a
condicionante das forças do meio.
O mesmo sucede com as bactérias com flagelação perítrica, os seus flagelos rodam
simultaneamente no sentido CW ou CCW. Quando estes flagelos rodam num sentido, eles
enrolam-se num aglomerado, que funciona como um flagelo mais grosso, que empurra a
bactéria no sentido desejado.
Quando os flagelos mudam de direcção de rotação a bactéria para – dá-se uma queda –
ficando assim sujeita às correntes de convecção presentes no meio.
Quando uma bactéria se encontra em movimento – período de corrida – e devido ao disparo
dos motores flagelares pára, dá-se uma queda, está fica imóvel e sujeita às correntes de
convecção já referidas: assim o movimento das bactérias flagelares é feito através de períodos
de corrida, quedas e transporte devido a correntes de convecção.

Quimiotáxia
Quando existe um composto que é atractivo para as bactérias, seja este um nutriente ou outro
composto qualquer, estas parecem deslocar-se muito aleatoriamente, através de quedas e
períodos de corrida, na direcção do mesmo:

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Chama-se a este fenómeno


Quimiotáxia.
A bactéria regula o seu movimento
em direcção á maior concentração
da substância atraente, bem como
na direcção inversa caso a
substância seja um repelente,
controlando sempre os períodos de
queda, ou seja, a bactéria não
consegue controlar a direcção
precisa do sentido desejado, mas consegue entrar em queda se a direcção não for própria,
quer seja para se aproximar duma fonte de nutrientes, quer seja para se afastar de um
repelente nocivo para a mesma. O que de facto é regulado pela bactéria é a frequência de
quedas consoante a direcção. Assim, o princípio de regulação da Quimiotáxia consegue-se
explicar:
→ Quando a bactéria se encontra na direcção correcta, a frequência de quedas diminui;
→ Quando a bactéria se encontra na direcção errada, a frequência de quedas aumenta;

Revisitando os últimos conceitos:


Postule-se um composto no meio para o qual a bactéria tem sensores específicos, na ausência
desse composto, o movimento flagelar é tipicamente caracterizado por períodos de corrida
com quedas espontâneas, em que a direcção do movimento depende da direcção em que a
bactéria fica no momento da queda, mas sendo sempre globalmente aleatório.
Na presença de um gradiente dum composto que funciona como atraente este movimento
aleatório continua, mas verifica-se que a bactéria se desloca no sentido de maior concentração
de nutrientes. Na presença dum repelente repete-se o mesmo processo mas no sentido
inverso – o de afastamento do ponto de maior concentração do composto repelente.
O mecanismo basal de funcionamento deste fenómeno é caracterizado pela alteração da
frequência de quedas.
Este processo designado de Quimiotáxia pode ser medido de uma maneira bastante simples
como se mostra esquematizado na próxima imagem:

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Esta experiência consiste na


utilização de quatro
recipientes com bactérias
móveis, e quatro tubos com
diferentes graus de
concentração de atraente,
sendo que o primeiro tubo –
controlo – contem água, e o
ultimo tubo contem um
repelente. Assim, nos
compostos que se verificarem
atraentes, a concentração de
bactérias no tubo aumenta,
enquanto que no composto repelente, se observa um afastamento das bactérias
relativamente ao tubo contendo a solução a testar.
Pode-se depois construir um gráfico, em que se observa as proporções e o efeito do número
de células por tubo
relativamente ao controlo:
Podemos observar que a
concentração de bactérias no
tubo que contem a substância
atraente aumenta ao longo do
tempo comparativamente ao
controlo; e que a concentração
de bactérias no tubo que
contem a substância repelente diminui ao longo do tempo comparativamente ao controlo.

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Fototáxia
Este mesmo fenómeno pode ocorrer não em
resposta a estímulos químicos como na
quimiotáxia, mas em resposta a outro tipo de
estímulo – estímulo luminoso.
No caso das bactérias fototróficas móveis, estas
→ podem deslocar-se em função da direcção de
maior intensidade de estímulo luminoso:

→ Ou em função do comprimento de onda


óptimo para o seu tipo de fotossíntese:
Na última imagem podemos observar uma
lâmina na qual estão a incidir diferentes
comprimentos de onda, onde foi inserida uma
população mista de bactérias, que ao longo do tempo se acumularam na sua zona preferencial
do espectro, de acordo com o seu comprimento de onda óptimo específico para o seu tipo de
fotossíntese e correspondentemente para o tipo de pigmentos que possuem.
Assim sendo, as bactérias têm de possuir um sistema de detecção de sinal e transdução do
próprio, em ordem a o controlar o seu movimento em função do agente externo.

Regulação da Quimiotáxia

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Todos estes processos de recepção de sinal e controlo, baseiam-se na existência fundamental


deste tipo de sistemas de regulação, a nível biomolecular, denominados de sistemas
reguladores de dois componentes.
Nestes sistemas existe sempre um sensor membranar – detecta o sinal – que é uma proteína
com actividade cinásica (capaz de hidrolizar ATP). Quando uma molécula é detectada, ao se
ligar á cinase sensora, verifica-se hidrólise de ATP ficando esta cinase fosforilada, uma vez
fosforilada esta cinase sensora, pode interagir com o segundo componente do sistema que é o
regulador de resposta. Este regulador de resposta é uma proteína que se pode ligar á região
operadora do gene alvo, a nível de DNA, posteriormente permitindo que a RNA-polimerase se
ligue, e que haja transcrição deste gene. Para que este regulador de resposta se possa ligar ao
operador do gene é necessário que esteja fosforilado, existindo uma cascata de fosforilação.
Assim, por ligação do sinal ambiental a cinase sensora é fosforilada, interagindo com o
regulador de resposta fosforilando-o, podendo este interagir com a região operadora do gene,
permitindo a transcrição do mesmo e portanto a resposta correspondente. É evidente que
este sistema embora se denomine de dois componentes, exista um terceiro componente
sendo este o que permite que o sistema volte a funcionar. Para que o regulador de resposta
volte a funcionar é necessário que retome o seu estado não-fosforilado, e portanto existe uma
fosfatase, que normalmente não é tão específica.
Recordando a estrutura do motor flagelar, começamos então com a abordagem dos
mecanismos de regulação da Quimiotáxia:
A proteína CheY interage com as proteínas do “switch” (FliM, FliG, FliN), introduzindo a
passagem de sentido CCW para CW ou vice-versa, ou seja, em E.coli o motor flagelar roda
normalmente no sentido CCW, e quando esta proteína CheY se liga ao “switch” o motor passa
a rodar no sentido oposto – CW – e se esta proteína se desliga, o motor volta a rodar no
sentido CCW. Para que esta mudança ocorra é necessário que a proteína CheY interaja com o
“switch”, e para esta proteína interagir com o referido tem de se encontrar no seu estado
fosforilado.
Todas as proteínas apresentadas no diagrama em cima, têm o nome Che, visto que são
reguladoras da Quimiotáxia → Chemotaxis.
Como anteriormente observado, existem a nível da membrana moléculas sensoras – cinases
sensoras – que funcionam como sensores e transdutores de sinal. Estas proteínas
membranares têm uma estrutura complexa, sendo vários péptidos associados, e ligados a
estes sensores temos duas proteínas: CheW e CheA. A proteína CheW é uma proteína que
funciona como sendo de ligação, ou seja, tal como observado no diagrama, ela faz a ligação
entre o sensor transdutor e a proteína CheA, sendo que esta última mencionada fica activa,

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desencadeando a resposta. Esta proteína CheA pode existir no estado fosforilado ou não
fosforilado. Quando esta se auto-fosforila, passando para o estado Che-fosforilado, pode
fosforilar duas proteínas deste sistema: A proteína CheY e a proteína CheB.
Como já mencionado, a proteína CheY quando recebe o grupo fosfato da proteína CheA passa
ao estado Che-fosforilado, ligando-se posteriormente ao “switch” alterando o sentido de
rotação do motor. Ao mesmo tempo que CheY pode ser fosforilada, também pode ser
desfosforilada por uma fosfatase que se denomina CheZ. Assim: CheA fosforilada, e CheZ
regulam os estados de fosforilação de CheY.
A proteína CheA fosforilada por sua vez pode interagir com outra proteína – CheB – sendo que
esta (CheB) quando fosforilada pode interagir com o receptor e desmetilar o próprio. Esta
proteína CheB quando fosforilada retira grupos metilo, sendo que se esta proteína, como
mencionado, retira grupos metilo, é porque algum componente neste sistema de regulação
adiciona grupos metilo. Existe pois uma metilase – proteína CheR – que está continuamente a
metilar o receptor. Assim o estado final de metilação do receptor depende da acção da
proteína CheB-fosforilada, ou seja, se esta não estiver fosforilada, o receptor encontra-se
continuamente metilado; por outro lado se a proteína CheB estiver predominantemente no
estado fosforilado então ela vai desmetilando o receptor.
Podemos concluir que existe uma variação do estado de metilação do receptor.

NOTA: revisitando conceitos da disciplina de Bioquímica, podemos


relembrar no âmbito da acção da proteína CheR, que esta ao adicionar grupos
metilo (CH3) ao receptor, altera a sua conformação tridimensional, visto que este
grupo não tem polaridade, assim as interacções hidrofóbicas ou hidrofílicas que
existem numa conformação normal são alteradas, modificando a sua zona de
reconhecimento da molécula de atraente em questão.

Quando o sistema se encontra na presença de um atraente, este liga-se ao sensor modificando


a sua conformação proteica, e fazendo com que este afaste a proteína CheW da proteína
CheA. Em termos práticos, quando o atraente se liga, a proteína CheA reduz a sua fosforilação,
e se este fenómeno ocorre, consequentemente CheY vai deixar de estar fosforilada, não
interagindo com o motor flagelar, e fazendo com que a bactéria se mantenha no sentido CCW.
Ao mesmo tempo, quando CheA deixa de estar fosforilada, também CheB não se pode
fosforilar, logo não pode desmetilar o receptor, sendo que se este permanecer metilado
reconhece menos eficientemente o atraente.
Concluindo esta cogitação:
→ Se a bactéria se está a deslocar no sentido do atraente (na qual há mais
concentração do mesmo), não há alteração do sentido de rotação porque CheY não se

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fosforila, e ao mesmo tempo o sensor deixa de reconhecer o atraente, traduzindo-se este


fenómeno, (a alteração do grau de metilação do receptor) pelo facto de que a bactéria vai
comparando o nível de concentração de atraente no instante antes e no instante seguinte –
porque se o grau de metilação aumenta é porque esta se encontra continuamente na presença
de atraente.
→ No caso da bactéria se encontrar no sentido oposto – diminuição do nível de
concentração de atraente – existe menos atraente para se ligar ao sensor, assim podem existir
sensores sem atraente ligado, logo a proteína CheA fica fosforilada e vai fosforilar CheY, que
por sua vez vai causar inversão do sentido de rotação ao se ligar ao “switch”. Ao mesmo tempo
CheA vai fosforilar CheB, que ao ficar na forma Che-fosforilada vai desmetilar o receptor.

NOTA: A especificidade dos receptores aos compostos, sejam eles atraentes ou


repelentes, pode ser uniespecífica ou pluriespecífica.

No caso de um sistema baseado em receptores transdutores de repelentes funciona no


sentido inverso ao dos receptores transdutores de atraentes, tanto para uma vertente como
para outra.

Inclusões e Substâncias de Reserva em Procariotas


Numa célula bacteriana existe um elevado número de Ribossomas por célula, dependendo
esta concentração do estado fisiológico em que a célula se encontra. Existe um sistema de
regulação biomolecular que permite á célula procariota regular o número de Ribossomas.
Quando a bactéria se encontra em fase activa de crescimento, necessitando de síntese
proteica, o número de ribossomas aumenta, bem como quando a bactéria está em fase
estacionária, o número de ribossomas diminui. O regulador de resposta neste mecanismo é
um Tetranucleósido de Guanina (na imagem encontra-se um Tetranucleósido alterno):
Este processo de regulação permite á célula não
despender energia a fazer síntese de proteínas com
rRNA quando menos necessita.
Para além dos ribossomas, em alguns grupos
bacterianos encontramos estruturas nas células que
não se denominam organelos mas sim Inclusões
Citoplasmáticas. No entanto, embora o padrão seja a
não existência de organitos com membrana unitária,
pode-se encontrar numa célula procariota
membranas que seguem o modelo do mosaico fluido. Um bom exemplo desta ocorrência é

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verificado em Nitrosomonas europaea. Se observarmos


junto á membrana citoplasmática desta bactéria podemos
visualizar estruturas que aparentam ser vesículas ou
corpos tubulares. Admite-se que todas estas inclusões em
Nitrosomonas sp, são expansões da membrana
citoplasmática, existindo uma densa camada de
membranas que seguem o modelo unitário do mosaico
fluido (ver imagem lateral). Nitrosomonas é um
quimiolitotrófico que retira a sua energia a partir da
oxidação de compostos de amónia (sendo este processo uma cadeia respiratória), e
acrescenta-se que a quantidade de energia que este retira por molécula de amónia é muito
diminuta, relativamente aos organismos que utilizam glucose como fonte de energia, logo em
ordem a este conseguir a quantidade de energia que necessita para as suas funções
metabólicas tem de retirar uma grande quantidade de moléculas de amónia do meio. Como a
taxa de oxidação de amónia está dependente da cadeia respiratória, para este organismo
aumentar a taxa tem de aumentar o número de cadeias activas, assim a estratégia de evolução
adaptativa adoptada por esta bactéria foi a invaginação da membrana citoplasmática com o
intuito de aumentar a densidade de membranas activas com componentes da cadeia
respiratória, permitindo-lhe que oxide simultaneamente centenas ou milhares de moléculas de
amónia.
Um outro organismo que merece ser mencionado é Azotobacter vinelandii (ver imagem
lateral), cujas fotografias a microscopia electrónica
permitiram inferir que possui também expansões
da membrana citoplasmática. Azotobacter é uma
bactéria fixadora de azoto aeróbia, o que levanta
uma questão – Como é que esta bactéria consegue
fixar azoto em condições aeróbias visto que a
enzima Nitrogenase não actua estando exposta ao
oxigénio?
Em ordem a resolver este problema fisiológico, Azotobacter aumenta a sua membrana
citoplasmática de tal maneira que as suas cadeias respiratórias são á semelhança dass
Nitrosomonas em grande número. Assim, relembrando que para a fixação de uma molécula de
azoto são necessárias muitas moléculas de ATP, esta tem de ter um grande número de cadeias
respiratórias activas. Mas alem disso, ao ter uma grande densidade de cadeias respiratórias
activas esta garante que a concentração de oxigénio intracelular se encontra sempre abaixo

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dos níveis inibitórios da nitrogenase. Visto isto, podemos então concluir que esta bactéria
mantém um ambiente anaeróbio intracitoplasmático, produzindo ao mesmo tempo a
quantidade de ATP necessária para a fixação de azoto.
A bactéria Pelodictyon apresenta vesículas elípticas
em contacto íntimo com a membrana citoplasmática
– que aparentam ser aderentes – sendo revestidas de
membrana, que no entanto não é unitária (tem
proteínas e galactolípidos). Estas vesículas estão
associadas ao processo de fotossíntese, contendo
parte do sistema fotossintético, e são designadas de
vesículas de Chlorobium ou Clorossomas.
Estas estruturas são delimitadas por uma membrana
com uma função especializada – só não pertence á classificação de organito porque esta
classificação pressupõe que a estrutura seja delimitada por uma membrana unitária.
Noutras bactérias como é o caso de Rhodovibrio sodomensis, existem uma espécie de vesículas
que não possuem de facto membrana própria, representam uma acumulação de um composto
lípidico que é a principal forma de armazenamento de carbono em procariotas. Estes ao invés
de acumularem amido ou glicogénio, acumulam um ou mais compostos de natureza lípidica
que pertencem ao grupo dos PHA’s – polihidroxialcanoatos –, dos quais o PHB – poli-β-
hidroxibutirato – é um exemplo.
Os polihidroxialcanoatos são ácidos orgânicos
derivados de alcanos, só com ligações simples, e com
um grupo COH terminal, mas visto que é polihidroxi,
significa que tem vários grupos COH terminais. Esta
molécula é a principal fonte de reserva destas
bactérias, e podem metaboliza-la sempre que
necessitem de uma fonte de carbono.

Via de síntese de poli-β-hidroxibutirato:


1) É sintetizado a partir de acetil-coenzima A;
2) A condensação de duas moléculas de acetil
resulta num acetoacetato;
3) Sendo depois convertido em β-hidroxibutírico;
4) Este composto é condensado através da acção da sintetase de PHB;
5) Libertando-se a Coenzima A, dá origem ao polímero poli-β-hidroxibutírico;

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Via de degradação de poli-β-hidroxibutirato:


1) Dá-se a hidrólise desta molécula a partir de uma ponta;
2) Vão-se libertando moléculas de β-hidroxibutirato;
3) É convertido em acetoacetato;
4) É convertido em acetil-coenzima A;
5) Entra via ciclo de Krebs por metabolismo normal;

Algumas bactérias, mas sendo muito raras, podem ter glicogénio como fonte de reserva, sendo
este não revestido de membrana. O ciclo de síntese e degradação deste composto em
bactérias é semelhante ao que se observa em eucariotas, com a diferença de que a activação
do precursor glucídico – glucose – é feita por ligação a ADP, e não a UDP, como se observa
noutros organismos.
Nas bactérias fotossintéticas anoxigénicas, que
dependem de compostos com enxofre – compostos
sulfurados como dador de electrões, normalmente
ao fazerem a oxidação desses compostos o
subproduto pode ser enxofre, sendo este
normalmente acumulado no interior da célula,
formando grânulos de coloração amarela, como se
observa em Chromatium buderi.
Outro exemplo particular de inclusões são os cristais de Magnetite – tetróxido de ferro – que
se podem encontrar em bactérias muito particulares,
que detêm a característica de serem magnéticas,
como é o caso de Aquaspirillum magnetotacticum,
funcionando os referidos como um dípolo, e
respondendo como tal, face ao campo magnético
terrestre. Estes cristais chegam a deter uma
dimensão considerável, dando a ilusão de ocuparem
toda a célula.

Inclusões Gasosas
Numerosos procariotas que vivem em lagos ou no mar, apresentam vesículas de gás, que são
responsáveis pela capacidade de flutuar a diversas alturas na coluna de água (em função dos

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factores microambientais). Estas curiosas estruturas observam-se em cianobactérias, bactérias


fototróficas púrpura, e algumas archaeas.
As vesículas de gás são estruturas fusiformes, ocas e rígidas, com largura e comprimento
variável. Localizam-se no citoplasma também em número variável, desde algumas por célula
até várias centenas.
A membrana constituinte das vesículas de gás é totalmente proteica, sendo impermeável a
água e solutos, mas permeável a gases.
Os constituintes moleculares da membrana das vesículas de gás são duas proteínas:
→ A proteína GvpA – uma proteína muito pequena, muito hidrófoba e muito rígida, sendo
esta rigidez essencial para que as vesículas resistam às pressões exercidas sobre a mesma a
partir de fora. Acrescenta-se também que esta
proteína constitui 97% da membrana das
vesículas de gás;
→ Existe uma segunda proteína - GvpC,
minoritária, cuja função é reforçar a vesícula de
gás.
As membranas das vesículas de gás são formadas por ligações entre estas duas proteínas
mencionadas, formando uma estrutura semelhante á representada na imagem.
Estas vesículas são uma excelente estratégia para procariotas fototróficos, visto que permitem
ajustar a sua flutuabilidade, de modo a inserirem-se nas condições óptimas de iluminação da
coluna de água vertical.

Diferenciação celular em Procariotas


Como clarificado no título, os processos de diferenciação celular pressupõem que numa
bactéria específica possa existir um tipo celular preexistente que sofre alterações que o
transformam noutro tipo celular, sendo estas alterações condicionadas do ponto de vista
genético. De facto a nível de alguns procariotas encontramos processos de diferenciação
celular (por ex, em Mixobactérias) diversos. Mas sem sombra de dúvidas, o processo de
diferenciação celular mais comum em procariotas é o processo da esporulação, ou mais
concretamente o processo de formação de endósporos. Algumas bactérias, em determinada
fase do seu ciclo vegetativo são capazes de se modificar em estruturas específicas
denominadas endósporos, que são estruturas altamente refringentes, não corando com
técnicas normais (não coram com a coloração de Gram), podendo aparecer fora ou dentro da
célula, como se pode observar na imagem seguinte:

77
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Estas estruturas que denominamos de endósporos têm a particularidade de serem


termoresistentes. Os endósporos são uma forma de sobrevivência das bactérias a condições
altamente adversas.

NOTA: já foi possível recuperar bactérias, por germinação destes endósporos, que
Doforam
pontorecolhidas
de vista prático,
de locais
estas
queestruturas
datam vários
foram
milhares
facilmente
de anos
descobertas
– por exemplo
por microscopia
sarcófagos
egípcios
óptica, – não existindo
verificando-se que por esta razãoem
só apareciam uma data limite
alguns gruposimposta á sobrevivência
de bactérias, sendo até destes
hoje só
endósporos.
observável a presença de endósporos em bactérias Gram-positivas.
Existem fundamentalmente dois grandes Géneros em que se encontram endósporos:

→ Bacillus; Ambos estes Géneros são bastonetes Gram-positivos.


→ Clostridium.

Quando estas bactérias produtoras de endósporos são colocadas num meio em que existe
escassez de nutrientes, ou que possua condições ambientais desfavoráveis, é induzido o ciclo
de esporulação, permanecendo estas em endósporos por um longo período de tempo, até
encontrarem novamente condições favoráveis que permitam que estas células germinem e
originem novas células vegetativas.

NOTA: Bacillus é aeróbio ou anaeróbio facultativo, dependendo da espécie,


enquanto que Clostridium é um anaeróbio estrito.

Outros Géneros em que se observa a presença de endósporos:


→ Sporolactobacillus (baixo teor de G-C);
→ Desulfotomaculum (baixo teor de G-C);
→ Sporosarcina (baixo teor de G-C);
→ Thermoactinomycetes (alto teor de G-C).

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Sempre que um endósporo se encontra presente


numa preparação, existe a necessidade de o
- Central
classificar, em termos do processo de
esporulação, quanto á sua forma – esférico,
elíptico, cilíndrico – e quanto á posição do - Terminal

endósporo dentro da célula (ver quadro lateral).


Alguns endósporos do Género Clostridium têm a - Subterminal
particularidade de que na zona da célula em que
se forma o endósporo, esta aumenta de tamanho, relativamente ao seu tamanho original –
endósporo com dilatação. Estas características morfológicas são úteis no que toca á
classificação e identificação da espécie.
Do ponto de vista estrutural, um endósporo
representa uma estrutura altamente compactada,
reestruturada, e organizada de modo a subsistir e
prevalecer face a condições altamente adversas.
Num endósporo maduro – fase final – encontramos
um interior altamente compacto, muito refringente,
DNA e ribossomas altamente compactados, com
toda a estrutura citoplasmática parcialmente
desidratada e com alto grau de compactação. A
estrutura que reveste o endósporo – parede do endósporo – é altamente hialina e refringente,
sendo denominada de Córtex. Por fora do endósporo aparecem as Capas do endósporo, que
são várias camadas de natureza proteica, aparentando ser membranas modificadas,
resultando da antiga membrana citoplasmática, e ainda por fora desta uma camada mais laxa,
separada do endósporo propriamente dito que se dá pelo nome de Exosporium. O endósporo
permanece por um período de tempo indefinido sem alterações morfológicas ou fisiológicas,
até ser colocado em condições apropriadas para a sua germinação, aí este hidrata-se, modifica
a sua estrutura, e a partir deste momento forma-se uma espécie de gemulação que dá origem
a uma célula vegetativa reassumindo o seu crescimento. Apresenta-se assim o ciclo de
esporulação das bactérias formadoras de endósporos:

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Abordando o ciclo de esporulação a partir de um endósporo recém-formado, podemos


começar por postular que a partir da capa do endósporo se liberta uma célula vegetativa. Esta
célula cresce, divide-se, e a partir de um determinado tempo a célula vegetativa entra no ciclo
de esporulação (necessitando de um estimulo que condicione este fenómeno). No inicio do
ciclo de esporulação, a primeira coisa que ocorre é uma duplicação do cromossoma, que se
localiza no centro da célula formando um estado que é designado de estado de filamento axial.
Seguidamente existe um mecanismo que forma um septo assimétrico de modo a que a célula
fique dividida em dois compartimentos – um maior e um menor, sendo que é o
compartimento menor que vai dar origem ao endósporo. Posteriormente dá-se o
invaginamento das membranas, resultando numa compactação celular que dá origem ao pré-
esporo. Seguidamente é sintetizado o córtex, que vai aumentando, formando-se as capas do
esporo. Deste modo o esporo vai amadurecendo, até que finalmente a célula lisa e o
endósporo liberta-se.
Os endósporos detêm várias propriedades, sendo as principais apresentadas no quadro
abaixo:
Característica Célula Vegetativa Endósporo
Estrutura Célula Gram-positiva típica Córtex grosso, capa do
endósporo, exosporium
Aparência ao microscópio Não-refringente Refringente
Conteúdo em Ca Baixo Alto
Ácido Dipicolínico Ausente Presente

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Actividade enzimática Alta Baixa


Metabolismo (entrada de O2) Alto Baixo ou inexistente
Síntese Macromolecular Presente Ausente
mRNA Presente Baixo conteúdo ou ausente
Resistência ao calor Baixa Alta
Resistência á radiação Baixa Alta
Resistência a químicos Baixa Alta
Coloração (apetência a Pode ser corada Corada só com técnicas
técnicas de coloração) especiais
Acção de Lisozima Sensível Resistente
Conteúdo em água Alto, 80-90% Baixo, 10-25% no córtex
Pequenas proteínas ácido- Ausentes Presentes
solúveis (produtos dos genes
ssp)
pH citoplasmático pH 7 pH 5,5-6,0 no cortéx

Todo o processo de formação de endósporos é regulado por uma série de sensores, á


semelhança do que se observa no processo da Quimiotáxia, que regulam o estado da célula e
induzem o processo de esporulação.
O ácido Dipicolínico, como visto na tabela, encontra-se no
endósporo mas não se encontra na célula vegetativa. Tendo
feito uma introdução resumida, apresenta-se a estrutura
molecular do ácido Dipicolínico:

Este ácido apresenta como observado dois grupos COOH, que na presença de iões cálcio
formam o Dipicolinato de Cálcio, que é um sal, acumulando-se este composto no endósporo.
Apresenta-se, assim, a sua estrutura:

Retomando o conteúdo informativo da tabela, podemos observar que no endósporo


encontramos pequenos péptidos acídicos, que são denominados proteínas SASP – Small Acid
Soluble Protein – que se acumulam no referido, ligando-se ao DNA e desempenhando o papel

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de protecção do endósporo. Pensa-se que são elas as responsáveis pela resistência do


endósporo á radiação UV e á radiação γ. No fundo elas impedem que ocorram quebras nas
cadeias de DNA, no caso da radiação γ, ou impedem que ocorra a formação dos dímeros de
timina, no caso da acção da radiação UV.
O processo de esporulação nas bactérias Gram-positivas é controlado por uma série de genes,
genes esses ditos estruturais, porque codificam para uma enzima que participa
especificamente no processo de formação da estrutura do endósporo – como os genes ssp.
Estes genes existem no cromossoma da bactéria e não são normalmente expressos a não ser
que haja o referido sinal ambiental para o início da esporulação. A transcrição destes genes
está dependente de factores σ-específicos, ou seja, os genes da esporulação – funcionais ou
estruturais – não respondem á RNA-polimerase ligada ao factor σ-70.
Quando se inicia o processo de esporulação, existe uma alteração completa do sistema de
transcrição da célula, sendo que a maquinaria de transcrição passa a responder
exclusivamente aos factores σ-específicos da esporulação.

NMM – Nutrição e Metabolismo Microbiano - Cap. 5, 17 – Brock Biology of Microorganisms.


10th ed.

Numa determinada célula, seja ela eucariota ou procariota, existe uma membrana
citoplasmática, com parede ou sem parede consoante o caso, constituindo isso mesmo, um
limite que integra um sistema fechado que é a célula. Esse sistema fechado recebe do exterior
uma fonte de energia e nutrientes. Esta fonte de energia pode ser química ou luminosa, em
maior parte dos casos, e através de um processo metabólico, parte desta energia é
transformada e armazenada na célula sob a forma de ATP, em ordem a depois ser
metabolizada para construir todo o tipo de macromoléculas estruturais e reguladoras que a
célula necessita para sobreviver.
Temos assim vias de anabolismo (ou biossíntese) e vias de catabolismo. Nesta fase de
catabolismo, parte da energia é utilizada para os processos biossintéticos, sendo outra parte
utilizada para processos que também requerem energia, nomeadamente transporte de
nutrientes, mobilidade ou motilidade (se existirem estruturas móveis na célula como flagelos).
Todos os produtos químicos não utilizados – produtos finais do metabolismo – são excretados
para o exterior, podendo estes ser compostos orgânicos, CO2, etc.
Parte da energia que a célula armazena, é guardada de duas maneiras:
→ Sob a forma de ATP;

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→ Acumulada a nível da membrana citoplasmática através da chamada força proto-motriz


membranar, tendo esta por sua vez duas componentes:
- Potencial de membrana;

- Gradiente de pH.

Os dois últimos componentes resultam da já mencionada translocação vectorial de protões.

Tomando um exemplo: postulemos uma via metabólica, em


que no processo de conversão da molécula A no seu produto
final surgirem intermediários ricos em energia – sendo
sempre moléculas fosforiladas – parte desta energia vai ser
utilizada para a partir de uma molécula de ADP e um grupo
fosfato, ser sintetizada uma molécula de ATP – ver imagem
lateral. Este processo ocorre por exemplo na Glicolise, e é
geralmente conhecido por fosforilação a nível do substrato.
Existem outros dois tipos de fosforilação:
→ Fosforilação Oxidativa – é realizada pela ATP-sintetase membranar, e baseia-se na energia
potencial contida na membrana, sendo que quando a ATP-sintetase move protões para o
interior parte dessa energia é utilizada para a síntese de uma molécula de ATP.
→ Foto-fosforilação – é um processo de todo equivalente ao descrito acima, mas sendo a
energia utilizada para a síntese de ATP proveniente dos fotões da luz.
Do ponto de vista deste processo de biossíntese, uma célula precisa de sintetizar vários tipos
de macromoléculas – proteínas, polisacáridos, lípidos, ácidos nucleícos. Apresenta-se um
exemplo, em E.coli, da percentagem de peso seco
celular dos componentes referidos:
Como podemos observar, grande parte do peso seco
celular é composto por proteínas, polisacáridos e
RNA. Na parte dos lípidos fundamentalmente
encontramo-los a nível membranar, associados às
várias estruturas de revestimento. Sendo o DNA o
componente que representa as proporções mais
pequenas.

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Do ponto de vista nutricional, todos os organismos vivos são dependentes de vários elementos
químicos que são fornecidos sob a forma de compostos, que são utilizados para a
estruturação, crescimento, desenvolvimento e divisão celular.
Apresentam-se duas tabelas que nos indicam os macro-elementos, que são necessários em
maior quantidade, fazendo-se a distinção dos micro-elementos, que são apenas necessários
em quantidades vestigiais.

Tabela dos Macro-elementos:


Elemento Fonte Função Metabólica
C Compostos orgânicos, CO2.

O2, H2O, compostos


O orgânicos.
Constituintes principais do material celular.
H2, H2O, compostos
H orgânicos.
NH4+, NO3-, N2, compostos
N orgânicos.
SO42-, HS-, S0, S2O32-, Constituinte da cisteína, metionina, pirofosfato de
S compostos orgânicos. tiamina, coenzima A, biotina, e ácido α-lipóico.

Constituinte de ácidos nucleícos, fosfolípidos, e


P HPO42- nucleótidos.
Principal catião inorgânico presente na célula,
K K+ cofactor de algumas enzimas, regula a pressão
osmótica intracelular.
Cofactor de várias enzimas, presente em paredes
Mg Mg2+ celulares, membranas, ribossomas, e ésteres de
fosfato.
Presente em exozimas, presente em paredes
Ca Ca2+ celulares; Dipicolinato de Cálcio é um importante
componente dos endósporos.
Fe Fe2+, Fe3+ Presente em citocromos, ferredoxinas, e outras
proteínas; cofactor enzimático.
Presente em vários processos de transporte. Em
Na Na+ alguns organismos halófilos extremos, este é o ião

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que move as ATP-sintetases membranares.


Cl Cl- Anião importante na célula. Compensa as cargas
positivas do ião K+ presentes na célula.

Tabela dos Micro-elementos:


Elemento Fonte Função Metabólica
Zn Zn2+ Presente na álcool desidrogenáse, fosfatase alcalina, aldolase, RNA e
DNA polimerase.
Mn Mn2+ Presente na superóxido-dismutase bacteriana e mitocondrial,
fotossistema II, cofactor de algumas enzimas.
Mo MoO42- Presente na nitrato-redutase, nitrogenase, xantina-desidrogenase, e
formato-desidrogenase.
Se SeO32- Presente em glicina-reductase e formato-desidrogenase.
Co Co2+ Presente em enzimas que contenham a coenzima B12.
Cu Cu2+ Presente na citocromo-oxidase, nitrito-reductase de bactérias
desnitrificantes , e oxigenases.
2+
Ni Ni Presente em urease, hidrogenase, e factor F430.
W WO42- Presente em algumas formato-desidrogenases.

Em archaeas metanogénicas existe a produção de energia


sob a forma de ATP a partir da síntese de metano:
Nestas archaeas é particularmente relevante o cobalto e o
níquel, porque vários cofactores de enzimas participantes na
metanogénese têm estes elementos na sua estrutura.

Para além de macro e micro-elementos, os organismos também necessitam de uma fonte de


carbono, uma fonte de energia, e podem ser necessários vários compostos orgânicos que
caem sobre a denominação de vitaminas. Estas vitaminas na maior parte dos casos são
também cofactores de várias reacções enzimáticas. Com este tema brevemente enunciado
apresenta-se uma lista das principais vitaminas e o seu papel em termos funcionais, estando
assinaladas as mais relevantes para um maior número de organismos. Salienta-se ainda o facto
de que existem organismos capazes de sintetizar todas estas vitaminas – crescem num meio
mínimo apenas com glucose como fonte de carbono – são denominados prototróficos.

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Segue-se outra tabela que nos elucida acerca dos custos energéticos – quantidade de ATP em
mmoles – necessários para formar, usando como meio de cultura um meio mínimo, um grama
de células secas, em E. coli:

Referente á última tabela é de notar, que o maior custo apresentado é referente ao processo,
não de síntese de aminoácidos, mas de polimerização dos mesmos

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Um dos elementos que é essencial para muitos organismos é o ferro. Em particular no caso das
bactérias patogénicas, um dos grandes problemas que se observa é de que uma vez dentro do
hospedeiro (neste caso animal, ex: homem) têm uma imensa disponibilidade de ferro. No
entanto, o ferro contido no nosso organismo
encontra-se disponível sob a forma de
hemoglobina, daí que muitas bactérias tenham
desenvolvido mecanismos específicos de captação
do ferro do meio. Esses mecanismos ocorrem sob
a forma de moléculas complexas sintetizadas por
estas bactérias, que as excretam, sendo estas
capazes de quelatar o ferro, transportando-o
posteriormente de volta á célula bacteriana,
ficando este disponível para as mesmas. O
primeiro grande grupo de compostos é chamado
de Hidroxamatos. As bactérias produzem estes
compostos para o exterior da célula, sendo este
convertido a Hidroxamato férrico na presença de Fe3+, retomando depois ao interior da célula,
sendo seguidamente reduzido – passa a Fe2+ - sendo utilizado para constituir o grupo Heme
dos citocromos. A molécula de Hidroxamato é reciclada e reutilizada.
Algumas bactérias do grupo das Enterobacteriácias
(Gram-negativas, ex: E. coli), produzem compostos
de natureza fenólica bastante complexos, que
quelatam o ferro no seu interior. Estas moléculas
receberam a denominação geral de Enterobactinas,
sendo produzidas por diversas espécies de
Enterobacteriácias.
Mais recentemente, descobriu-se que também
existiam quelinas nas membranas das bactérias Gram-negativas, que funcionam como canais
de água, mais especificamente como
poros especiais para o transporte de
água, recebendo por esse facto a
nomenclatura de Aquaquelinas.
Posteriormente veio-se a verificar que
de facto estas Aquaquelinas têm locais

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de fixação de ferro, funcionando como um mecanismo para a aquisição de ferro presente no


meio.
Do ponto de vista nutricional, podemos inferir a classificação nutricional evolutiva dos
organismos:

Todas as classificações acima explicitadas referem-se á principal forma de obtenção de energia


num dado organismo, podendo não constituir a única forma de obtenção de energia.
Pode-se também olhar para a classificação nutricional de um modo menos generalista e mais
completo. Atendendo aos critérios principais podemos inferir que para um dado organismo,
este necessita de:

→ Fonte de Carbono:
- Autotróficos – CO2 como fonte de C;
- Heterotróficos – substâncias orgânicas como fonte de C;

→ Fonte de Energia:
- Fototróficos – luz como fonte de energia;
- Quimiotróficos – compostos orgânicos/inorgânicos como fonte de energia;

→ Natureza do dador de electrões:


- Litotróficos – compostos inorgânicos (natureza inorgânica);
- Organotróficos – compostos orgânicos (natureza orgânica).

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Podemos ainda explicitar mais o conteúdo destes tópicos observando a tabela seguinte:

Considerando os microrganismos Quimioorganotróficos, temos um composto orgânico que


funciona por um lado como fonte de C para a biossíntese, e por outro como matéria-prima
para a produção de energia através de um de dois processos:
- Fermentação;
- Respiração: processo que envolve uma cadeia de transporte de electrões.
Pode ser respiração Aeróbia:

ou Anaeróbia:

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No processo de respiração Aeróbia podemos observar que o aceitador final de electrões é o


oxigénio, que os recebe sob a forma de H+, convertendo-os juntamente com O2, a H2O.
No entanto existem organismos que vivem na ausência de oxigénio. Estes organismos –
anaeróbios – recorrem a outros tipos de aceitadores finais de electrões, como os ilustrados na
imagem.
Podemos então concluir que para um dado microrganismo, além de uma fonte de carbono, de
energia e de um dador de protões, este também necessita de um aceitador de electrões final.
No caso dos Quimiolitotróficos, estes usam directamente o CO2 – têm vias metabólicas
próprias para a fixação de CO2 – como o ciclo de Calvin. Existem microrganismos que como
estratégia de fixação de CO2, fazem um ciclo inverso ao de Krebs.
Nos Quimiolitotróficos existe portanto uma autotrofia de fixação de CO2, sendo o processo de
produção de energia também através de cadeias de transporte electrónico, existindo um
composto inorgânico que cede electrões aos aceitadores de electrões finais:

Os Quimiolitotróficos também têm cadeias de respiração aeróbia, tendo outros, cadeias de


respiração anaeróbia. Estes organismos obtêm energia através da oxidação de compostos
inorgânicos, tal como os seres humanos obtêm energia da oxidação de compostos orgânicos.
Abordando os Fototróficos, podemos inferir que o processo de obtenção de energia é a partir
da luz, e mais uma vez, como são processos de fotofosforilação, também está envolvida uma
cadeia de transporte de electrões:

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O processo de fotossíntese não é mais que um processo de produção de ATP.


Todo este processo de produção
de energia associado a cadeias de
transporte electrónico, seja ele
com respiração aeróbia,
anaeróbia, ou fotossíntese, tem
sempre como elemento chave na
síntese de ATP → ATPase ou ATP-
sintetase membranar, que pode
ser na membrana citoplasmática –
no caso de uma bactéria – ou
pode ser na membrana
mitocôndrial no caso de um
organismo eucariota.
Posta esta breve introdução, apresenta-se assim a estrutura da ATP-sintetase:
Esta é formada por diversas proteínas, sendo cada uma destas referidas, codificada por um
gene diferente no genoma do organismo. Este complexo multi-proteico tem duas
subunidades:
→ F0 – inserida na membrana citoplasmática; é formada por vários polipéptidos, entre os quais
se salienta a existência da componente polipeptídica c, componente a, e componente b2,
estando a última mencionada estendida ao longo da ATP-sintetase.
→ F1 – subunidade catalítica; é onde ocorre a síntese de ATP; está virada para a face
citoplasmática. Esta subunidade é composta por um componente γ, um componente ε, três
componentes α, e três componentes β.
Estas duas subunidades – F0 e F1 – estão interligadas por um lado através da componente b2
(que pertence á subunidade F0), e por outro através das componentes γ e ε (que pertencem á
subunidade F1).
Do ponto de vista da síntese de ATP pela ATP-sintetase observamos que os protões entram
através da subunidade F0, passam através desta e dirigem-se ao citoplasma, e ao passarem a
componente c roda, provocando uma torção na componente γ (componente ε + componente
γ = Rotor). Ao sofrer esta torção, vai afastar as componentes α e β, que por sua vez permitem
a ligação dos dois substratos – ADP e Pi – e consequentemente a síntese de ATP.
Este processo assemelha-se ao já abordado mecanismo do motor flagelar. Assim, há uma
grande homologia, a nível dos genes correspondentes, entre a subunidade F0 da ATP-sintetase
e o motor flagelar.

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A ATP-sintetase funciona nos dois sentidos, ou seja, no sentido inverso os protões deslocam-se
do interior do citoplasma para fora, á custa da hidrólise de uma molécula de ATP, aumentando
a energia potencial de membrana. Todo o processo inverso ocorre com o Rotor a girar no
sentido inverso.

Cadeias Respiratórias em Mitocôndrias e em Procariotas


Todos os organismos que utilizam o processo de fosforilação associado às membranas
citoplasmáticas ou no caso dos eucariotas mitocôndriais – têm uma série de transportadores
membranares, através dos quais se faz a transferência de electrões, como já mencionado
anteriormente. Existe um dador que é tipicamente um composto que cede átomos de
hidrogénio, sendo os protões translocados para o exterior da célula e os electrões são
transferidos através de transportadores, e finalmente têm um aceitador final: se for em
respiração aeróbia trata-se do O2; e se for em respiração anaeróbia serão sulfatos, nitratos ou
outros compostos, sendo estes mesmos reduzidos.
Os protões acumulados são usados pela ATPase membranar para a síntese de ATP, como se
pode observar na imagem seguinte:

Esta imagem é referente aos sistemas de translocação de protões, e á ATP-sintetase que os


utiliza para a síntese de ATP, estando estes compostos presentes na membrana citoplasmática

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de uma bactéria Gram-negativa – visto existir referência, no esquema, á existência de


Periplasma.
Verifica-se assim, observando a imagem, uma sequência de transportadores de electrões,
sendo neste caso o O2 o aceitador final. Neste esquema apresentado, encontramos vários
componentes membranares entre os quais: Flavoproteínas, Proteínas de Ferro não-hémico,
Coenzima Q, Citocromo bc1, Citocromo c (é móvel podendo deslocar-se para o espaço
periplasmático), Citocromo c oxidase, e uma ATP-sintetase. Salienta-se que as proteínas de
Ferro não-hémico (também designadas Proteínas de Ferro e Enxofre), apresentam Ferro na
sua estrutura molecular mas sem ser sobre a forma de um anel de Porfirina, ao contrário dos
Citocromos. Outro transportador que se observa na figura aparece-nos designado por
Coenzima Q, este transportador pertence ao grupo das Quinonas – existem Ubiquinonas e
Menaquinonas. Estes transportadores vão recebendo electrões e cedem-nos ao seu aceitador,
havendo simultaneamente translocação de protões para o exterior.

Porquê é que, havendo um dador de Hidrogénio, se consegue que os protões sejam


translocados e os electrões sejam cedidos?
Na prática o segredo do sucesso das cadeias respiratórias está na alternância de
transportadores de átomos de Hidrogénio com transportadores apenas de electrões. O
primeiro é um aceitador de átomos de Hidrogénio (protão + electrão), mas por exemplo estas
proteínas podem ser só aceitadoras de electrões. Nessa altura os protões são libertados para o
exterior. O mesmo se passa com a Coenzima Q – transportador de hidrogénio – enquanto que
os Citocromos são apenas transportadores de electrões. Quando a Coenzima Q cede os
electrões aos Citocromos (na cadeia de Citocromos), os protões são translocados para o
exterior. Esta alternância entre transportadores de Hidrogénio e transportadores de electrões,
garante que sempre que um transportador de Hidrogénio tem á sua frente na cadeia um
transportador de electrões, os protões são libertados para o exterior.

Que tipos de transportadores encontramos nas cadeias respiratórias microbianas?


O primeiro grupo de transportadores são os nucleótidos NAD – Nicotinamina adenina
dinucleótido:

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O NAD funciona como transportador de


Hidrogénio, podendo oscilar entre dois
estados: a forma de NAD+, ou a forma de
NADH + H+. Se compararmos, podemos
observar que há a adição de um Hidrogénio, e
que um segundo protão fica nas imediações
da molécula. Assim, conforme o NAD é
oxidado ou reduzido oscila entre estas duas
formas.
Outro transportador que encontramos é
também um dinucleótido designado de FAD –
nucleótidos de Flavina, sendo Flavina Adenina
Dinucleótido ou Flavina Adenina
Mononucleótido. Este composto pode aceitar
um ou dois electrões. Quando este está completamente hidrogenado, transporta dois átomos
de Hidrogénio. Verificamos assim, uma diferença importante entre FAD e NAD: o NAD
transporta um Hidrogénio completo e um protão associado (em termos de carga), enquanto
que o FAD oscila entre FAD e FADH2 – acontecendo o mesmo com o FAM.

Outro tipo de transportador existente nas cadeias respiratórias são as Quinonas, que
constituem dois grupos como previamente verificado:

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Uma Quinona pode oscilar entre o estado Quinona e o estado Quinol. É um transportador de
átomos de Hidrogénio.
Existem diferentes formas de nomenclatura de Quinonas. Estabelece-se assim uma relação de
sinónimo para futura compreensão dos termos:
→ Ubiquinonas ou Mesoquinonas;
→ Menaquinonas ou Naftoquinonas;

Estes compostos podem oscilar entre os estados:


- Totalmente hidrogenado;
- Parcialmente hidrogenado (só com um átomo de Hidrogénio associado);
- Desidrogenado.

NOTA: Tanto o NAD como o FAD são cofactores


de Enzimas membranares. Enquanto que as
Ubiquinonas e Menaquinonas são moléculas
independentes solúveis entre a dupla camada
fosfolípidica.

Outros transportadores que existem na membrana são os Citocromos - são proteínas


membranares que possuem como grupo prostético o grupo Heme:

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Observa-se na imagem a parte


proteica do citocromo, ligada
por resíduos de cisteína (por
ligação covalente) ao grupo
Heme. O grupo Heme é
constituído por um anel Porfírico
com um núcleo de átomo de
Ferro, cujo estado de oxidação
pode oscilar entre Fe2+ e Fe3+,
consoante receba ou não um
electrão adicional. Consoante o
seu estado de oxidação ou
redução, os citocromos
adquirem propriedades
espectrais em termos de
absorvância diferentes, podendo
ser facilmente identificados os
estados entre os quais estes
oscilam consoante os picos de absorção máxima a
diferentes comprimentos de onda – ver imagem á
direita.
Cada citocromo é uma proteica, com grupos Heme
que têm associadas cadeias laterais. Todos estes
constituintes dos citocromos referidos, são os
factores indutores de nomenclatura dos próprios,
visto que devido a estes, cada citocromo adquire
uma estrutura própria, capaz de reconhecer e de
aceitar electrões de um certo dador ou não.
Este fenómeno deve-se ao facto de toda a transferência de electrões entre compostos se fazer
de acordo com o potencial de redução dos mesmos.
Há algo importante a reter nesta fase da unidade temática que se dá pelo nome de Torre de
Potenciais Electroquímicos ou Potenciais de Redução:

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O que se observa na imagem é uma escala de


potenciais de redução, que vai do mais negativo
para o mais positivo. Para que um composto
possa receber electrões de outro, o dador tem
de possuir um potencial mais negativo do que o
aceitador, ou seja, os electrões viajam
naturalmente do composto mais negativo para
o mais positivo. Quando os electrões viajam ao
contrário, no sentido inverso dos potenciais, o
transporte diz-se transporte electrónico
reverso, e sempre que este ocorre quer dizer
que existe uma fonte externa de energia que
está a ser consumida para que esse transporte
possa ser efectuado. Muitas vezes o sistema de
fornecimento de energia acopla essa reacção
com uma exergónica o suficiente para que as
duas juntas se realizem naquele sentido. O
importante a reter deste tema centra-se no
facto de que se existirem moléculas com
potenciais redox sucessivamente mais positivos,
esta sequência de moléculas pode ir cedendo
electrões por ordem de aumento de
positividade.
Quando um microrganismo cresce a partir da
glucose, e tem uma respiração aeróbia, o
aceitador final de electrões é o O2, tendo este
um potencial de +0,80V. Visto que a glucose
tem um potencial de +0,50V, observa-se que os
electrões fluem desta para o O2, criando um desnível de energia suficientemente grande para
permitir a síntese de várias moléculas de ATP acopladas a este processo.
Com toda esta abordagem podemos concluir que toda a sequência de transportadores
obedece á hierarquia de potenciais electroquímicos progressivamente mais positivos, desde o
inicio da cadeia respiratória até ao fim da mesma.
Voltando á temática dos citocromos, podemos inferir que os vários representados na imagem
que se segue têm cadeias laterais diferentes:

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A parte proteica também é


diferente, significando isto
que embora o núcleo
activo seja idêntico, cada
tipo de citocromo devido á
sua estrutura vai ter um
potencial electroquímico
mais negativo ou mais
positivo, logo os vários
tipos de citocromos
também se podem
distinguir pelo seu
potencial electroquímico.
Outro tipo de
transportadores, já
mencionados
anteriormente, são as Proteínas de Ferro não-hémico. Estas proteínas, á semelhança dos
citocromos, também possuem uma estrutura proteica definida, bem como um centro activo
ligado a resíduos de cisteína. Este centro activo pode ter dois tipos de conformação:

- Dois átomos de Ferro e dois átomos de Enxofre


na primeira associação observada na imagem (a) -
(as proteínas com este tipo de centro activo são
denominadas Fe2S2);

- Quatro átomos de Ferro e quatro átomos de


enxofre, neste arranjo organizado e cristalino
observado na imagem (b).
Os átomos de Ferro presentes nestes centros
activos podem variar o seu estado de Oxidação-
Redução (de Fe2+ a Fe3+, e vice-versa),
funcionando estas proteínas como
transportadores de electrões.

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Apresenta-se um diagrama exemplificativo da cadeia respiratória mitocondrial:

Os átomos de Hidrogénio entram na cadeia, através da glicolise e ciclo de Krebs, sob a forma
de NADH – este funciona como dador de Hidrogénio. O primeiro complexo da cadeia
respiratória mitocondrial denominado complexo I, é formado pela NADH desidrogenase, por
outras flavoproteinas e proteínas de Ferro não-hémico, formando um complexo composto por
vários tipos de proteínas, sendo a mais importante a NADH desidrogenase pois é ela que
reconhece o NADH cedendo os electrões correspondentes ao transportador seguinte,
libertando protões para o exterior, e reoxidando o NAD.
No ciclo de Krebs existe uma enzima que não é NADH-dependente, mas sim FAD-dependente,
sendo esta a succinato desidrogenase. Assim, a maior parte dos electrões vêm via NADH
desidrogenase, mas alguns vêm via succinato desidrogenase, cedendo esta última os electrões
não ao complexo I mas ao ponto imediatamente a seguir na cadeia respiratória – o complexo
II. Isto funciona como se a cadeia respiratória mitocondrial tivesse duas entradas: uma através
da NADH desidrogenase, e outra através da succinato desidrogenase.
Neste outro esquema (potenciais de
ponto médio) conseguimos concluir
que os electrões provenientes da
NADH desidrogenase têm um
potencial redox mais negativo, logo
o desnível de energia é maior,
portanto é espectável que se
formem mais moléculas de ATP
quando os electrões vêm via NADH,
do que quando vêm via succinato.
Quando os electrões vêm para a
cadeia respiratória via NADH são

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sintetizadas três moléculas de ATP, enquanto que quando vêm via succinato são apenas
sintetizadas duas. É importante reter, que se possuem duas entradas para a cadeia
respiratória, seguindo estas posteriormente a mesma via, mas visto que não são no mesmo
ponto, uma é mais energética (NADH), e a outra é menos energética (succinato).
Regressando á estrutura da cadeia respiratória mitocondrial: Ambas as entradas cedem os
seus electrões aos complexos respectivos – I e II – sendo estes electrões posteriormente
cedidos a uma Ubiquinona (UQ no esquema da cadeia respiratória). Seguidamente, como
observado no esquema, os electrões da Ubiquinona são enviados para o complexo III
(complexo bc1), que é formado por citocromos, nomeadamente um citocromo de tipo b e um
citocromo de tipo c, denominado citocromo c1. Este complexo III vai ceder os seus electrões ao
citocromo c (que é móvel), funcionando o último como um “vai-e-vem”, cedendo os electrões
ao último complexo da cadeia respiratória – complexo IV, formado pelos citocromos a e a3,
também designado por citocromo oxidase, visto que cede os electrões directamente ao O2.
Relembrando que todas estas reacções são enzimáticas, nas quais estão envolvidas
transferências de electrões, podem também designar-se por reacções de desidrogenação, ou
de óxido-redução.
Assim, todos os complexos abordados nesta última temática podem também ser designados
por óxido-redutases:

NOTA: sempre que uma óxido-redutase tem como aceitador final o O2, denomina-se oxidase.

Para que a ATP-sintetase produza uma molécula de ATP, é necessária a translocação de três
protões. Isto significa que tem de ser acumulado, previamente, o nível necessário de energia
na membrana citoplasmática, podendo esta energia ser medida em mV. Normalmente em mV,

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a quantidade de energia necessária para que se possa sintetizar uma molécula de ATP, é de
200mV.
Retomando o esquema dos potenciais de ponto médio, conseguimos observar que os
electrões conseguem viajar no sentido apresentado porque estão a favor do gradiente
electroquímico, sendo assim translocados ao longo de toda a cadeia passando pelos vários
constituintes já mencionados. Quando os electrões passam do interior do complexo I para o
final deste, o desnível é da ordem dos 200mV. Assim, verifica-se um desnível de energia
suficiente para que possa ser sintetizada uma molécula de ATP – sendo este complexo I um
ciclo de acoplamento, entre o transporte electrónico, a fosforilação e a síntese de ATP.
Dentro do complexo II não se verifica um desnível energético suficiente para se dar a mesma
reacção, mas este já se verifica novamente dentro do complexo III, e no aceitador final, o O2.
Por isso, quando os electrões entram na cadeia, passam por três desníveis energéticos
suficientes, cada um deles, para a síntese de uma molécula de ATP.
Como observado nesta imagem lateral, o
NADH + H+ vai ceder electrões ao complexo I,
ocorrendo durante este transporte a captação
de protões do interior do citoplasma que são
translocados para fora. Estes electrões vão ser
cedidos á molécula de Ubiquinona, mas visto
que esta se trata de um aceitador de
Hidrogénio e não de electrões, por cada
electrão que recebe tem também de receber
um protão, assim, na prática mais dois
protões vão do interior do citoplasma para a
Ubiquinona. Quando esta cede os electrões
ao complexo III, os protões são libertados no
lado externo. Seguidamente, este complexo III
cede os electrões ao citocromo c, e o referido
por sua vez ao citocromo a + a3, que
posteriormente os vai ceder ao O2, havendo o consumo de protões para a síntese da molécula
de água.
Alguns destes complexos, dependendo da espécie microbiana ou do tipo de complexo, podem
funcionar em simultâneo como bombas protónicas, isto é: quando transportam um electrão
que receberam, simultaneamente translocam protões para o exterior, contribuindo assim para
aumentar o rendimento deste processo. Um transportador de electrões que tenha a função de

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bomba protónica, é mais eficiente do ponto de vista energético, que um transportador que
apenas transloque os electrões para a molécula seguinte.
Na cadeia respiratória mitocondrial, observamos assim, duas entradas possíveis de electrões
mas só um aceitador final. No caso das cadeias respiratórias dos procariotas, o que verificamos
é que essa mesma cadeia é ramificada, isto é, há mais do que uma saída possível. A
ramificação ocorre a um de dois níveis: ou a nível da Quinona, ou a nível do citocromo c:
A segunda ramificação só pode
ocorrer a nível do citocromo c
porque estes são os únicos
móveis.
Podemos generalizar as cadeias
respiratórias dos procariotas da
seguinte maneira:
→ Há uma desidrogenase inicial, que recebe o hidrogénio do substrato, cedendo-o a uma
quinona. Esta por sua vez, pode ceder ao citocromo b, ao bc1, ou alternativamente, ao
citocromo oxidase terminal.
→ Ou a cadeia respiratória pode ser ramificada apenas a nível do citocromo c, que pode ceder
a duas oxidases terminais diferentes.
No caso do aceitador final não ser o oxigénio:

O que se observa no final não é uma


oxidase, mas sim uma redutase.
Podemos observar que as cadeias respiratórias em procariotas são muito mais variáveis, mas
também são mais plásticas do ponto de vista funcional, porque se verificam ramificações no
que toca aos percursos que os electrões podem seguir. É obvio que se as bactérias têm
diferentes cadeias respiratórias possíveis, é porque detêm mecanismos que lhes permitem
tirar partido de umas ou de outras consoante as suas necessidades energéticas.
Segue-se o exemplo em E.coli:
A cadeia respiratória em E.coli é muito
simples, como se pode observar na
imagem. Assim, cogitamos que existe
uma desidrogenase, que cede á
Ubiquinona, podendo esta ceder electrões ao citocromo bo, ou ao citocromo bd, ambos
cedendo por sua vez ao O2.
Quando em E.coli se verificam condições anoxigénicas, esta modifica a sua cadeia respiratória:

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Na ausência de O2, mas presença


de nitrato, E.coli passa a sintetizar
a nitrato redutase que
prontamente integra na
membrana. E nessa altura a
desidrogenase cede á Ubiquinona
e esta á nitrato redutase, que por
sua vez cede os electrões ao nitrato (NO3-) – passando assim a respirar anaerobiamente
nitrato, reduzindo-o a nitritos.
Na ausência de O2, mas presença de aceitadores orgânicos como o DMSO ou TMANO, E.coli
passa a sintetizar redutases específicas para estes aceitadores.
O cenário mais frequente em condições anoxigénicas, é a presença de fumarato. Nessa altura,
a desidrogenase vai ceder electrões a uma fumarato redutase que a célula sintetiza e integra
na membrana.
Quando em E.coli verificamos a ausência de O2, mas presença de fumarato, presenciamos um
problema: o NADH a ceder ao fumarato não pode ser por via Ubiquinona. Isto porque a
Ubiquinona tem um potencial mais positivo que o par succinato/fumarato. Então nessa altura,
sempre que a célula se encontra na ausência de O2, sem nitrato e com fumarato disponível,
esta sintetiza dois componentes da cadeia respiratória: a fumarato redutase (como já visto
anteriormente), e uma Menaquinona, que tem um potencial mais negativo, podendo
funcionar como um dador de electrões para a fumarato redutase.
Este esquema celular é de tal maneira regulado que se verifica uma preferência de aceitadores
de electrões. Em primeiro lugar, desde que exista oxigénio no meio, E.coli utiliza-o como
aceitador final preferencial. Se este se esgotar, e existir no meio Nitrato e Fumarato disponível,
primeiro utiliza o nitrato, só na ausência de O2 e nitrato é que esta utiliza o fumarato. Quando
nenhum destes três aceitadores finais se encontra disponível, E.coli faz fermentação.
É evidente que para que isto aconteça, têm de existir sensores e transdutores que detectem a
presença ou ausência destes compostos, traduzindo-se este fenómeno pelos reguladores de
resposta por indução ou levantamento da repressão de genes da síntese de proteínas
membranares aceitadoras de electrões de compostos vários.
Toda esta seriação hierárquica de aceitadores finais rege-se pela disponibilidade dos próprios
no substrato, e pelo rendimento energético relativo resultante de cada um dos aceitadores
finais de electrões da cadeia respiratória.
Retomando o conceito de cadeia respiratória em E.coli, verificamos que também possui duas
entradas possíveis:

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Tem duas desidrogenases


alternativas, que podem
ceder á Ubiquinona, e
duas saídas possíveis.
As duas NADH
desidrogenases diferem
na sua estrutura: a
NADH-1, é composta por um complexo proteico mais elaborado do que a NADH-2. A vantagem
é de que a NADH desidrogenase 1, tem associada uma função de bomba protónica.
Normalmente por cada par de electrões transferido são translocados para o exterior um par de
protões, mas no caso da NADH desidrogenase 1, são translocados para o exterior dois pares de
protões. Seguidamente no processo respiratório tanto a NADH-1 como a NADH-2 cedem á
Ubiquinona, tendo esta, dois mecanismos de funcionamento: a chamada Q-loop –
funcionamento normal (chegam dois átomos de Hidrogénio, esta recebe-os, cede dois
electrões ao citocromo, e liberta dois protões para o exterior); e o ciclo-Q – cada vez que
chegam dois electrões, são envolvidas duas moléculas de Quinona, sendo uma delas
regenerada. Se existir um ciclo-Q, a nível das Ubiquinonas, vamos observar quatro protões
translocados por cada dois electrões.
A citocromo oxidase bo, tem baixa afinidade para o O2, enquanto que a citocromo bd tem alta
afinidade para o mesmo, isto é, se existir muito oxigénio disponível a citocromo oxidase bo
funciona perfeitamente bem, visto ter baixa afinidade; mas quando a concentração O2 diminui,
esta começa a falhar. Assim, entra em funcionamento o citocromo bd, por indução genética,
que consegue funcionar nestas condições.
A citocromo oxidase bo, é também provida de actividade de bomba protónica, assim quando
existe quantidade de O2 suficiente, a célula induz a acção desta citocromo oxidase bo, visto
que é a mais energética do ponto de vista do produto.
Segue-se uma tabela dos vários rendimentos energéticos consoante as quatro vias disponíveis:

Via Electrões Rendimento


A-C 8H+/2e- 8/3 ATP = 2,7 ATP/2e-
A-D 6H+/2e- 6/3 ATP = 2 ATP/2e-
B-C 4H+/2e- 4/3 ATP = 1,3 ATP/2e-
B-D 2H+/2e- 2/3 ATP = 0,67 ATP/2e-

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Assim concluímos que a célula regula a utilização de NADH-1 ou NADH-2, consoante a sua
disponibilidade em ATP - se tem reservas de ATP maiores induz a NADH-2; se tem reservas de
ATP menores induz a NADH-1 -, e das condições ambientais em termos de concentração em O2
– se existir alta concentração em O2 no meio, induz a NADH-1; enquanto que se existir uma
baixa concentração de O2, induz a NADH-2.
Mesmo que a célula possua grandes concentrações de ATP, precisa sempre de manter em
funcionamento a cadeia respiratória visto que necessita de oxidar o NADH.

Cadeia Respiratória em Paracoccus denitrificans


Paracoccus denitrificans é uma bactéria Gram-negativa, que faz a
desnitrificação total, isto é, é capaz de reduzir nitratos até azoto
molecular. Faz este processo através da sua actividade
respiratória. Assim, vemos que reduz o nitrato a nitrito; o nitrito a
óxido-nítrico; o óxido-nítrico a óxido-nitroso; e este último a azoto molecular.
Paracoccus é bastante interessante visto que consoante esteja na presença de O2, ou ausência
do mesmo, adquire um comportamento bastante diferente:
→ Em presença de O2 é heterotrófico – crescendo a partir de glucose ou outros compostos
orgânicos – e tem uma cadeia respiratória aeróbia, com o O2 como aceitador final:

→ Na ausência de O2, é autotrófico, fixando CO2 – tipo ciclo de Calvin – além disso faz
desnitrificação total:

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Assim explicitamos mais um pouco a temática:


Num crescimento em condições aeróbias, na sua respiração observamos uma desidrogenase
que cede a uma Ubiquinona, esta por sua vez pode ceder ao citocromo bc1 ou ao citocromo
bb3 – é este processo que observamos na cadeia respiratória mitocondrial. Mas esta respiração
é ramificada a nível a Ubiquinona, e a nível do citocromo c. Os electrões podem vir via
Ubiquinona – bc1 – citocromo c; ou via Ubiquinona – bb3. Podemos observar e cogitar que os
vários caminhos são utilizados consoante as várias necessidades energéticas celulares.
Outra vantagem encontrada neste organismo, é a de que este pode crescer – em presença de
O2 – com metanol como única fonte de carbono. Isto deve-se ao facto deste organismo possuir
no seu periplasma uma metanol desidrogenase, que converte o metanol em ácido-fórmico
(CO2 dissolvido, que segue o ciclo de Calvin) libertando protões. Esta metanol desidrogenase
transloca protões para o exterior e cede electrões ao citocromo seguinte na cadeia
respiratória. Salienta-se o facto de na oxidação-redução do metanol haver libertação de
energia, visto que por cada molécula de metanol são libertados dois protões no periplasma,
aumentando o potencial electroquímico membranar conferindo-lhe energia.
Quando o organismo se encontra em meio anaeróbio funciona como autotrófico, sendo
sintetizadas redutases terminais. Paracoccus sintetiza várias enzimas – várias redutases – uma
do nitrato (converte nitrato a nitrito); uma do nitrito (converte o nitrito a óxido-nítrico); uma
do óxido-nítrico (converte óxido-nítrico a óxido-nitroso); e por fim uma redutase de óxido-
nitroso (converte óxido-nitroso a azoto molecular, N2). Comparando com E.coli verificamos
que esta apenas converte nitratos a nitritos, por acção de uma nitrato redutase, enquanto que
Paracoccus faz a desnitrificação total através de inúmeras redutases especializadas nos vários
compostos resultantes deste processo.

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Fotossíntese Bacteriana

(Chloroflexus)

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As cianobactérias, também designadas bactérias verdes-azuis, têm uma fotossíntese


oxigénica com produção de oxigénio.
Todos os grupos bacterianos apresentados são Gram-negativos. Existe outro grupo de
bactérias fotossintéticas, sendo este grupo composto por bactérias Gram-positivas:
Heliobactérias → Anaeróbios – Fotoheterotróficos obrigatórios.

Heliobacterium:
→ Gram +
→ Anaeróbios
→ Fotoheterotróficos obrigatórios
→ Possuem bacterioclorofila G, e poucos carotenóides
→ Algumas possuem endósporos
→ É o único grupo de procariotas Gram +, fotossintéticos

O principal factor que distingue os grupos das bactérias sulfúreas das não-sulfúreas são
os dadores de electrões para a fotossíntese. Globalmente o que podemos inferir é que as
bactérias sulfúreas são capazes de receber electrões a partir de um substrato que contenha
enxofre, nomeadamente o H2S ou S molecular; enquanto que as bactérias não-sulfúreas são
sensíveis aos compostos sulfurados, recebendo electrões, normalmente, do H2.

NOTA: é de salientar que existem bactérias púrpura não-sulfúreas


que conseguem utilizar o H2S como dador de electrões, sendo no
entanto um fenómeno incomum.

Observando o posicionamento filogenético dos vários grupos de bactérias


fotossintéticas, conseguimos constatar que estes grupos, incluindo as cianobactérias, estão
dispersos ao longo da árvore filogenética → o que é indicativo de que:
- OU o processo de fotossíntese ocorreu muito cedo durante a evolução biológica;
- OU cada um destes grupos representa o resultado de um acontecimento
independente de evolução destes sistemas fotossintéticos.

Não deixa de ser interessante que dentro destes quatro grupos, o único que tem
características diferentes, em termos de processos metabólicos, é o das bactérias verdes-
sulfúreas: Têm um processo de fotossíntese distinto pelo qual fixam o CO2 por um ciclo reverso
ao dos ácidos-tricarboxílicos; enquanto que as restantes fixam-no através do Ciclo de Calvin.

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Podemos concluir assim, que as referidas possuem uma origem filogenética


independente dos outros grupos do ponto de vista da origem dos processos fotossintéticos.
Em termos das estruturas onde estão localizados todos os pigmentos fotossintéticos e
pigmentos acessórios, observamos que em Chlorobium e Chloroflexus, todo o sistema
fotossintético se encontra armazenado em vesículas especiais (inclusões), que embora
contenham membrana, essa mesma não é de natureza fosfolípidica – é formada por
galactolípidos e proteínas, não constituindo um organito – estas inclusões surgem em contacto
íntimo com a membrana citoplasmática e são denominadas por clorossomas ou vesículas de
Chlorobium, visto terem sido descobertas pela primeira vez no género Chlorobium.
Nas bactérias púrpura o aparelho fotossintético aparece associado á membrana
citoplasmática ou em invaginações que derivam da membrana citoplasmática → como
processo adaptativo para aumentar a superfície membranar, em ordem a elevar a quantidade
de sistemas fotossintéticos activos.

NOTA: A quantidade de inclusões ou de aparelhos fotossintéticos activos pode variar


consoante a fase do ciclo celular.

A fotossíntese, como já foi referido, é um processo de produção de energia: A energia


luminosa é convertida em energia química sob a forma de ATP. Sendo o princípio geral muito
simples → A energia contida num fotão é transmitida a uma molécula de pigmento
fotossintético no seu centro activo, que no caso destes grupos anoxigénicos aparece sob a
forma de uma bacterioclorfila. A energia fornecida pelo fotão leva a que a molécula de
bacterioclorofila aumente de energia a nível de um electrão

Seguidamente este electrão fica excitado aumentando o seu nível de energia electroquímica,
sendo a energia contida neste electrão transmitida ao longo de uma cadeia de
transportadores, utilizando-se parte desta energia para a síntese de uma molécula de ATP,
através das ATP-sintetases membranares.

No processo de transporte electrónico fotossintético vai haver, através da cadeia de


transportadores associados á membrana, translocação de protões para o exterior, com criação
de uma força proto-motriz, sendo esses protões utilizados posteriormente, pela ATP-sintetase
membranar, com fim á produção de uma molécula de ATP.

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Tal como nas cadeias de transporte associadas a um processo de respiração aeróbio ou


anaeróbio encontramos uma série de transportadores, no processo fotossintético também
encontramos transportadores de diversos tipos:
 Quinonas
 Citocromos
 Proteínas que cedem enxofre
 Ferredoxinas

E ainda,

 Pigmentos fotossintéticos:
→ Activos:
- Bacterioclorofila, no caso da fotossíntese anoxigénica.
- Clorofila a e b, no caso das cianobaterias.
→ Acessórios:
- Carotenóides.
- Xantofilas.
- Ficobilinas.

Estes pigmentos acessórios têm um papel duplo:


→ Protecção dos pigmentos do centro de reacção para impedir a sua foto-oxidação,
formando uma camada protectora que recebe energia e a transfere por ressonância para o
centro activo;
→ Ao possuírem espectros de absorção diferentes, aumentam a eficiência do processo
fotossintético.

NOTA: Estes pigmentos acessórios fazem parte da chamada antena colectora do


aparelho fotossintético destes organismos.

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Apresenta-se assim, a estrutura da Clorofila a,


presente nas cianobactérias e nos eucariotas
fotossintéticos:

Bem como a estrutura da Bacterioclorofila a,


presente na maior parte das bactérias
fotossintéticas anoxigénicas (com a excepção das
Heliobactérias que contêm bacterioclorofila g):

Estas moléculas apresentadas são derivados porfírinicos como já mencionado


anteriormente, que contêm Mg quelatado no seu interior, estando as mesmas ligadas a um
hidrocarboneto de 20 átomos de carbono denominado Phytol, que funciona como um sistema
de fixação á membrana, sendo de natureza lipídica, servindo de “pé” de fixação deste
pigmento que se insere na membrana citoplasmática, ou na membrana das estruturas onde se
encontra o centro fotossintético.
Um dos electrões da molécula de bacterioclorofila é excitado e dá origem a todo o
processo de transferência de energia.
As duas moléculas apresentadas diferem fundamentalmente na estrutura dos vários
substituintes laterais associados ao grupo porfírinico que contem Mg no seu interior. O facto
da estrutura destas moléculas ser diferente (de bacterioclorofila para bacterioclorofila, ou para
clorofila a) leva a que estas moléculas tenham um espectro de absorção claramente distinto.

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Cada pigmento caracteriza-se:


- pela sua estrutura química;
- pelo seu espectro de absorção.

NOTA1: Os vários tipos de bacterioclorofila distinguem-se pelos seus radicais laterais.

NOTA2: Como pigmentos acessórios ás bacterioclorofilas temos carotenos e xantofilas.

Os carotenoídes são derivados do isopreno, e podem ser cíclicos nos seus terminais ou não:

As xantofilas não são mais do que carotenoides oxidados:

E contêm grupos hidroxilo terminais como no caso da luteína.

Observa-se também a presença de outros componentes acessórios como é o caso da


ficoeritrobilina, e da ficocianobilina, que pertencem ao grupo das ficobiliproteínas – ou seja,
estes pigmentos estão ligados a uma porção peptídica, através de um aminoácido que é a
cisteína. Estes pigmentos acessórios são constituídos por um tetrapyrrol não cíclico. Á
semelhança dos outros pigmentos fotossintéticos, as ficoeritrobilinas e as ficoeritrocianinas
diferem umas das outras pela variação dos seus radicais laterais.

Em termos de organização, no caso das bactérias verdes (sulfúreas e não-sulfúreas)


encontramos os pigmentos fotossintéticos associados nas estruturas em contacto íntimo com
a membrana citoplasmática, que se dão pelo nome de Clorossomas:

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No interior da membrana de um clorossoma encontramos os pigmentos da antena colectora,


nomeadamente os pigmentos acessórios, que recebem a luz e que a transferem, ao centro de
reacção que está associado em íntimo contacto com a membrana citoplasmática, sendo este
contacto fundamental para permitir que haja a transferência de energia dos electrões
presentes na bacterioclorofila para os outros elementos da cadeia de transporte.

NOTA: O processo de produção de energia através da fotossíntese está associado a


uma ATPase membranar.

No caso das cianobactérias, a fotossíntese é de tipo anoxigénico, e possuem uma


estrutura organizativa semelhante ao que encontramos nos tilacoides das plantas superiores.
Em termos de estrutura encontramos membranas invaginadas para o interior da célula que
correspondem, em função, aos tilacoides das plantas superiores.
Nos tilacoides das cianobactérias vamos observar bastonetes formados por moléculas
de ficocianina que formam uma camada protectora, e depois moléculas de aloficocianina que
estão em contacto directo com o centro de reacção:

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O sistema referido funciona assim, como uma antena colectora, em que a energia vai
sendo continuamente transferida para o centro de reacção – sempre localizado na membrana.
Sendo neste caso localizado na membrana tilacoidal, e no caso das bactérias anoxigénicas, na
membrana citoplasmática. Sendo a fotossíntese um processo de produção de energia,
observamos o centro de reacção bem como os pigmentos acessórios e todo o mecanismo
acoplado a este processo:

A energia é recolhida através dos pigmentos acessórios – LH → Light Harvesting – e é


transferida para o centro de reacção que contem moléculas de bacterioclorofila activas – onde
ocorre a excitação de um electrão.

Observando-se em termos de uma escala de gradiente electroquímico:


Notamos que o electrão na molécula de
bacterioclorofila está com uma determinada
energia, e ao receber energia luminosa – directa ou
através dos pigmentos acessórios – este é excitado
e o seu nível energético aumenta.
A energia luminosa é assim convertida em
energia de excitação deste electrão, visto que o
referido aumentou o seu estado energético.
Seguidamente este electrão ao ser excitado, vai ser
transferido para outra molécula que funciona como
transportador.

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Existe assim, na fotossíntese (á semelhança dos processos de respiração) uma cadeia


de transportadores, em que um electrão quando é excitado fica com um nível de energia
suficientemente alto para poder ser cedido ao primeiro transportador → Bacteriofeofitina
(Bph), que corresponde a uma molécula de Bacterioclorofila sem o átomo central de Mg. Este
electrão excitado é seguidamente cedido a uma cadeia de Quinonas, passando pela “Quinone
pool” e terminando no complexo de Citocromos bc1. Sendo as Quinonas transportadores de
átomos de H2, recebem 2H+ e exportam-nos para a membrana citoplasmática aumentando a
força proto-motriz, antes de ceder electrões ao complexo bc1.
O electrão que se encontra no complexo bc1 vai ser cedido ao citocromo c2, que
seguidamente o cede de novo ao centro activo. Resumindo sucintamente o processo: existe
um electrão que se encontra numa molécula de Bacterioclorofila, que é excitado, e como fica
com energia maior do que a que tinha anteriormente vai seguir uma via, através de
transportadores, regressando posteriormente ao centro activo → Não há perda de electrões.

NOTA: Durante a ocorrência deste processo, parte da energia do electrão excitado é


utilizada para a translocação de protões com vista a aumentar a força proto-motriz.
Assim, por cada fotão (desde que se libertem 3 protões para o exterior) pode ser
sintetizada uma molécula de ATP.

Este ciclo é controlado do ponto de vista do rendimento por moléculas presentes no


centro activo que possam sofrer deslocamento, bem como pelo número de moléculas de
quinona que estejam disponíveis.
Também se observa um controlo exercido neste processo por parte das necessidades
energéticas em ATP que a célula detenha no momento.

NOTA: A produção de ATP pelo processo acabado de abordar – Fotofosforilação – não requer um dador
de electrões, visto que o electrão é o mesmo, sendo excitado e regressando ao local de partida → Há
como se viu um movimento cíclico de electrões. No entanto é necessário um dador externo de electrões
para a redução do NAD(P)+ a NAD(P)H, visto este ser necessário para os processos de biossíntese.

Nas bactérias púrpura súlfureas e não-súlfureas, e nas bactérias verdes não-súlfureas,


observa-se que o dador externo de electrões, e a produção de poder redutor de NADP+ a
NADPH resulta de fluxo electrónico reverso: (ver pág. seguinte)

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Se compararmos com as bactérias verdes súlfureas, observamos que o processo é muito


semelhante:
Observamos um centro activo
diferente, pertencente a um grupo
bacteriano distinto – as moléculas de
bacterioclorofila são diferentes.
O princípio continua a ser o mesmo:
ocorre excitação; existe uma série de
transportadores; proteínas de Ferro e
Enxofre; uma Ferredoxina; uma
MenaQuinona; um complexo bc1; e
um citocromo c555.
O que se observa, tal como nas outras cadeias, é uma excitação de electrões que
percorrem um fluxo electrónico cíclico até ao “Quinone pool”, sendo depois cedidos ao
complexo bc1 que possui uma bomba protónica, aumentando a força proto-motriz (Δp) →
levando á síntese de ATP via ATP-sintetase.
Para os equivalentes redutores, os electrões seguem para o NAD(P)+, existindo a
diferença que consiste na presença de uma Ferredoxina que tem um potencial redox entre a
proteína de Ferro e Enxofre anterior e o NAD(P)+ que se segue. Neste caso os electrões podem
seguir directamente para o NAD(P)+ sem consumo adicional de energia.

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Visto que estamos a abordar bactérias súlfureas, o dador de electrões é o H2S, que os
cede ao citocromo c555. Este citocromo c é essencial para a existência deste processo, pois
permite fazer o “shuttle” entre os vários componentes.
Na prática, a grande diferença é de que existe uma Ferredoxina que permite que na
fase de produção de equivalentes redutores, o electrão possa ser cedido directamente a uma
molécula de NAD(P)+ para produzir uma molécula de NAD(P)H.
Assim, a diferença em termos de processo fotossintético anoxigénico:

Nas bactérias púrpura sulfúreas e não-sulfúreas e bactérias verdes não-sulfúreas
temos fluxo electrónico cíclico associado á síntese de ATP, e fluxo electrónico reverso para a
síntese de equivalentes redutores; enquanto que no caso das bactérias verdes sulfúreas,
temos uma cadeia de transporte diferente que inclui a já mencionada ferredoxina, que
permite que a transferência de electrões para o NAD(P)+ seja directa sem a necesidade de uma
fonte adicional de energia para que ocorra transporte reverso.

NOTA: As bactérias verdes sulfúreas são mais eficientes do ponto de vista energético,
visto que não necessitam de consumir parte da força proto-motriz para o transporte
electrónico reverso.

Fotossíntese Oxigénica

Este tipo de fotossíntese ocorre quer nas cianobactérias quer nos eucariotas
fotossintéticos e é conhecida como fotossíntese do tipo vegetal. A diferença que se observa
traduz-se na existência de dois fotossistemas → sendo o fotossistema I muito semelhante ao
fotossistema encontrado nas bactérias verdes sulfúreas.
A vantagem evolutiva que surge deste processo foi o aparecimento de uma molécula
de clorofila com um potencial redox capaz de receber electrões directamente da água. Este
potencial redox mais positivo permite assim, utilizar um composto mais abundante como
dador de electrões, observando-se como resultado deste fenómeno a produção de O2.

Neste tipo de fotossíntese observamos dois tipos de circuito: (ver pág. seguinte)

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Assim, temos que um electrão proveniente da água vai sendo cedido ao longo dos
transportadores do Fotossistema II, sendo depois cedido ao longo dos transportadores do
Fotossistema I, até chegar ao NADP+ - constituindo-se assim o fluxo acíclico.
Mas o Fotossistema I, quando excitado, o electrão aumenta a sua energia, passa pelos
vários transportadores, e depois através da Ferredoxina presente no sistema pode regressar
ao Citocromo bf, perfazendo um fluxo electrónico cíclico.
Concluímos portanto que o Fotossistema I pode estar a funcionar em contínuo,
produzindo apenas a síntese de ATP acoplada a protões translocados para o exterior. O
Fotossistema II, leva portanto á produção de equivalentes redutores - existe de facto uma
grande vantagem do ponto de vista da acessibilidade ao dador de electrões.

NOTA: É de notar a semelhança entre o Fotossistema I – que é o mais primitivo dos dois
presentes neste sistema – e o Fotossistema das bactérias verdes sulfúreas.

Do ponto de vista da produção de energia, todos estes organismos produzem ATP por
fotofosforilação, estando associada a este processo a produção de equivalentes redutores
(NADP+ ou NADPH), sendo para isso necessário um dador externo de electrões.

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Os organismos abordados além de fototróficos são também autotróficos, capazes de


fixar CO2, produzindo matéria orgânica a partir deste composto, via Ciclo de Calvin:

Como se pode observar no diagrama brevemente apresentado, o Ciclo de Calvin tem


como enzima chave a RuBisCo → Ribulose-bifosfato-carboxilase.
Tendo em conta a quantidade de ATP necessária para levar a cabo este ciclo, não
admira a existência do transporte cíclico de electrões em organismos fotossintéticos.
Encontramos este ciclo em cianobactérias, bactérias púrpura sulfúreas e não-sulfúreas,
e nas bactérias verdes não-sulfúreas.

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As bactérias verdes sulfúreas fixam o CO2 por um processo diferente → Ciclo Reverso
ao de Krebs, ou Ciclo dos Ácidos Tricarboxílicos (ciclo redutor), como se observa na imagem
seguinte:

Estes organismos conseguem fazer a fixação do CO2 pelo reverso do ciclo de Krebs
porque surgiram três enzimas novas: citrato-liase; α-cetoglutarato-sintetase; e a fumarato
redutase.
Em ordem a concluir esta secção da matéria, cogitamos que bactérias púrpura,
sulfúreas e não-sulfúreas, e bactérias verdes não-sulfúreas, possuem o mesmo tipo de cadeia
de transporte fotossintético, em que há síntese de NADPH para transporte electrónico reverso.
Bactérias verdes sulfúreas possuem uma via fotossintética diferente, mais eficiente e com uma
ferredoxina que permite a transferência electrónica directa ao NADP+

Em termos de fixação de CO2, temos que:

Bactérias púrpura → Ciclo de Calvin


Bactérias verdes sulfúreas → Ciclo dos Ácidos Tricarboxílicos
Bactérias verdes não-sulfúreas → Ciclo de Calvin
OU
via do Hidroxi-propionil-CoA

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Quimiolitotrofismo
No caso dos quimiolitotróficos, temos vias de produção de energia através da oxidação
de compostos inorgânicos, sendo essa mesma oxidação executada por uma cadeia de
transportadores electrónicos. Compara-se este processo á respiração aeróbia, visto o O2
também ser usado, por estes organismos, como aceitador final de electrões.
Neste processo a formação de biomassa é por fixação de CO2. Á semelhança dos
organismos fototróficos é também o ciclo de Calvin que faz esta fixação.
Olhando para os procariontes quimiolitotróficos, conseguimos verificar que os
organismos que caem sob esta designação são maioritariamente pertencentes ao Domínio
Bactéria, embora existam procariotas do Domínio Archaea, que por serem metanogénicos
também caem sob esta designação.
Segue-se uma tabela com organismos típicos Quimiolitotróficos/Quimioautotróficos:

É de notar que grande parte das espécies aqui representadas possui o O2 como
aceitador final de electrões, funcionando este processo de quimioautotrofismo como uma
cadeia de respiração aeróbia, no caso das espécies que possuam o O2 como aceitador final.
Salienta-se também que o dador de electrões varia bastante consoante o grupo de bactérias
apresentado:

Estes dois grupos são


Bactérias que oxidam Amónia a Nitritos → Nitritantes
considerados Nitrificadores em
geral, quando em abservação do
Bactérias que oxidam Nitritos a Nitratos → Nitratantes ciclo do Azoto (ver próxima
ilustração).

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Os organismos quimiolitotróficos têm um rendimento energético (por molécula de


substrato) muito inferior ao dos quimioorganotróficos. Assim a estratégia de sobrevivência
destes organismos baseia-se na oxidação de quantidades brutais de substrato inorgânico.

Mecanismo das bactérias oxidantes de Amónia

Este processo de oxidação de amónia


é feito por um complexo enzimático
membranar – AMO (Amonium-mono-
oxidase) – este complexo é capaz de
converter a amónia em hidroxilamina.
A amónia entra dentro do citoplasma e
é oxidada pelo complexo AMO, como
resultado produz-se hidroxilamina,
havendo durante este processo
consumo de protões a nível
intracelular – a força proto-motriz vai
aumentar. Seguidamente a
hidroxilamina vai-se difundir através da
membrana, passando para o espaço
periplasmático, e quando no

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periplasma é submetida á acção da enzima HAO (Hidroxilamina-oxidoredutase, que converte a


hidroxilamina em NO2 – ao se fazer a conversão de amónia a nitritos há libertação de protões
no periplasma. Esta HAO vai ceder electrões a um citocromo c. Este citocromo é móvel no
espaço periplasmático possuindo um duplo papel:
→ Por um lado, parte dos electrões podem ser cedidos a um citocromo c membranar, que os
cede a uma citocromo oxidase terminal (cyt aa3) que tem uma função de bomba protónica;
→ Por outro lado, pode ceder electrões ao elemento Q, presente na membrana, que os recicla
visto que a AMO necessita de um input constante de electrões.
Por fim, temos uma ATPase membranar, que como já referido, por cada 3H+ consegue
sintetizar uma molécula de ATP.

Mecanismo das bactérias oxidantes de Nitritos

o nitrito é transportado para


dentro da célula, e uma vez
dentro desta é oxidado a
nitratos.
Durante este processo de
oxidação verifica-se a acção de
uma Notrato-oxidase
membranar, que transloca
electrões para uma citocromo c
que por sua vez os transfere a
um citocromo oxidase terminal,
sendo o O2 o aceitador final, e
havendo produção de água.
Comparando os dois processos acabados de esquematizar, observamos que o
rendimento energético é maior na oxidação de amónia a nitritos do que na oxidação de
nitritos a nitratos.
Podemos concluir assim, que todo o ATP é sintetizado via ATP-sintetase membranar
graças ao processo de oxidação destes compostos inorgânicos, que são oxidados a nível da
membrana por cadeias de transporte electrónico, que por sua vez levam ao aumento de
protões extracelulares.

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Mecanismo das bactérias oxidantes de H2

Estas bactérias possuem duas


Hidrogenases (enzimas capazes de
oxidar o H2 a H2O) distintas:
→ Uma hidrogenase membranar;
→ Uma hidrogenase citosólica.
Sendo cada uma delas detentora
de funções diferentes:
- A Hidrogenase
membranar oxida o H2, cede o
átomo de H ao pool de Quinonas,
sendo este posteriormente cedido a uma cadeia de citocromos: cyt b → cyt c → cyt a
(oxidase), observando-se o O2 como aceitador final.
Visto haver alternância entre transportadores de átomos de H e de transportadores de
electrões, estamos perante translocação de protões para o exterior, com consequente
aumento da força proto-motriz.
- A Hidrogenase citosólica tem a função de oxidar o H2 a partir de electrões, e ao fazer
transfere electrões e protões (de H2) directamente para o NAD+. Podemos assim concluir que
esta hidrogenase apenas apresenta a função de reduzir o NAD+ a NADH, que é necessário para
o funcionamento do ciclo de Calvin.

NOTA: Esta última Hidrogenase a ser abordada faz o reconhecimento do NAD+ e de H2, e
prontamente reduz o NAD+ a NADH. Este fenómeno não é algo comum entre procariotas.

Mecanismo das bactérias oxidantes de Ferro


Este mecanismo de oxidação apresentado é
verdadeiramente simples, sendo composto
por duas proteínas transportadoras:
- Citocromo c;
- Citocromo a (oxidase).
O citocromo c apresenta mobilidade dentro
da membrana, podendo assim, ceder
electrões directamente á citocromo oxidase

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terminal, sendo que esta os vai ceder ao O2 (aceitador final).


Os electrões que alimentam esta cadeia são provenientes do Fe2+ que é oxidado a Fe3+,
sendo esta oxidação levada a cabo por uma proteína ligada a face externa da membrana
citoplasmática, a Rusticianina, que possui um pigmento associado.
Esta cadeia de transporte de electrões envolve na sua totalidade três proteínas: a
Rusticianina, Cyt c, e Cyt a (oxidase).
Estas bactérias oxidantes de ferro têm uma particularidade: são Acidófilas (ou pelo
menos ácido-tolerantes). Visto que o pH extracelular é de 2.0, e o intracelular é de 6-6.5. Deste
modo existe uma grande abundância de protões no meio para a síntese de ATP, existindo
consumo de protões intracelulares para a redução do O2 a H2O, criando consequentemente
carga negativa dentro da célula. Na prática, este consumo de protões para formar H2O garante
a formação de uma força proto-motriz membranar necessária, para que a ATP-sintetase possa
funcionar.

FERMENTAÇÃO

Fermentação Alcoólica: Uma Introdução


Um organismo que faça a fermentação
alcoólica converte a glucose em etanol.
Nestes organismos, este processo de
conversão pode ser dividido em duas fases:
1ª Fase: conversão de glucose em piruvato,
denominada via da glicolise, ocorrendo
durante esta fase a síntese de ATP a nível de
duas cinases.
2ª Fase: conversão de piruvato em etanol por via de uma álcool-desidrogenase.
O balanço em termos de ATP desde a glucose até ao piruvato é de 2ATP, isto porque
ocorre a produção de quatro moléculas de ATP na via glicolítica, mas consumo de duas
moléculas no inicio dessa mesma via (ver imagem seguinte):

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Retomando o contexto das


fermentações, observamos que a
fermentação é um processo energético,
mas não produz ATP na 2ª Fase
(conversão do piruvato em etanol). Os
organismos sujeitam-se a este
processo, mesmo não produzindo ATP
na fase final, pois necessitam de
regenerar o NADH em NAD+, visto que
se todo o NAD+ da célula fosse reduzido
a NADH ela não poderia voltar a oxidar
moléculas de glucose. Podemos assim
cogitar que apenas na 2ª Fase é que se
presencia o processo fermentativo
propriamente dito. Assim, a
fermentação corresponde, no fundo, ao
processo de reoxidação do NADH,
produzido (neste caso em particular)
pela via glicolítica.
Para se reoxidar o NADH em NAD+ é necessária a remoção de electrões do mesmo. Em
ordem a este processo progredir tem de se verificar a aceitação de electrões do NADH, por
parte de algum composto, que neste caso é o produto final da fermentação: seja ele o etanol
ou o lactato. Funcionando estes produtos finais como escoadores de electrões, sendo
posteriormente escoados pela célula.
Outros tipos de organismos podem converter o piruvato em acetato e formato, sendo
posteriormente transformados em H2+CO2.

NOTA: A diversidade de processos fermentativos é muito grande, mas no entanto verifica-


se que a mesma tem sempre lugar em condições anoxigénicas, visto ser um processo
anaeróbio.

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Fermentação Láctica

Com a observação dos esquemas podemos concluir que existem duas “versões” da
fermentação láctica: Homoláctica e Heteroláctica. Que diferem nos produtos:
→ Na Fermentação Homoláctica observa-se que o produto é apenas lactato;
→ Na Fermentação Heteroláctica observa-se que o produto é lactato, etanol e CO2.

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Na Fermentação Homoláctica, a partir de uma molécula de glucose formam-se duas


moléculas de lactato; enquanto que na Fermentação Heteroláctica, a partir de uma molécula
de glucose forma-se uma molécula de lactato, uma de etanol e uma de CO2.
As bactérias lácticas Heterofermentativas não possuem o gene que codifica para a
Aldolase, e consequentemente não conseguem clivar a frutose-1,6-bifosfato. No entanto,
possuem uma outra enzima, a Fosfocetolase.
Assim, estas bactérias seguem uma via metabólica diferente denominada via do ácido-
6-fosfoglucónico, tendo esta via intermediários como a ribose-5-fosfato, e a xylulose-5-fosfato,
que são pentoses comuns á via bioquímica das pentoses. Estas pentoses podem ser
directamente fermentadas pelas bactérias Heterolácticas, bem como as hexoses; enquanto
que as bactérias Homofermentativas apenas conseguem fermentar hexoses.

NOTA1: Repare-se que:


Homofermentativo → organismo Homoláctico;
Heterofermentativo → organismo Heteroláctico.

NOTA2: A via Heteroláctica é menos energética que a via Homoláctica, visto que embora na
via Heteroláctica exista maior disponibilidade de número de substratos, existe também
menor ganho de ATP por molécula de substrato fermentada.

Fermentação Ácido-mista e Fermentação Butanodiólica

A fermentação ácido-mista e a fermentação butanodiólica são as duas fermentações


características do grupo das enterobacteriáceas (Enterobacteriaceae é uma família taxonómica
de bactérias Gram negativas, onde se incluí Escherichia coli. Sendo esta família pertencente ao
grupo das proteobactérias).
A diferença fundamental entre estas duas fermentações, é de que no caso de uma
bactéria possuir fermentação ácido-mista, como é o caso de E.coli, vai-se verificar uma
acidificação do meio, visto que esta fermentação produz grandes quantidades de ácido para o
meio externo. Assim, E.coli necessita de desenvolver mecanismos que mantenham o seu pH
inalterado, mesmo estando na presença de um meio ácido. No caso da fermentação
butanodiólica, visto que os produtos do metabolismo são neutros, não apresentam este
problema de pH ácido no meio.

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Na fermentação ácido-mista um dos produtos é o acetato, sendo que para a formação


de acetato é necessário o seu precursor acetil-fosfato, existindo uma Acetato-cinase que cliva
um Fósforo, criando-se uma molécula de ATP por fosforilação ao nível do substrato.
Tendo em conta que a molécula de glucose tem 6 carbonos, o acetato 2, o etanol 2, o
formato 1, o lactato 3, e o succinato 4, prontamente se conclui que da mesma molécula de
glucose não se podem formar todos estes produtos. Assim, na fermentação ácido-mista, umas
moléculas de glucose podem seguir a via do succinato, enquanto que outras podem seguir a
via do acetato, outras a via de produção do etanol, e outras ainda a via do lactato. No final,
observa-se uma mistura destes ácidos, em que as proporções variam dependendo dos fluxos
que as moléculas de glucose seguiram:

NOTA: Grande parte das Enterobacteriáceas, quando na síntese de formato, param nesta molécula, mas E.coli
possui um gene adicional que codifica para a Formato-H2-liase, sendo que esta enzima consegue converter o
formato em CO2 + H2. Visto que o hidrogénio não é um gás solúvel, quando se coloca E.coli a fermentar num
tubo, esta vai produzir gás. Sendo que este fenómeno descrito funciona como um teste para a presença de E.coli
em determinados compostos alimentares e etc.

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Na fermentação butanodiólica, verifica-se que á semelhança da fermentação ácido-


mista, também as várias moléculas de glucose podem seguir diferentes vias:

No entanto existe a particularidade de que parte das moléculas de glucose seguem a


via do α-acetolactato, que vai dar origem a um intermediário denominado acetoína, sendo
esta posteriormente convertida em butanodiól.

Testes de Identificação Bacteriana

Os dois testes cuja explicitação se segue (Teste do Vermelho de Metilo e teste de


Voges-Proskauer) dão-nos informação sobre o tipo de fermentação. Sendo a bactéria em causa
uma enterobacteriácea, consoante o resultado destes testes, conseguimos saber se a
fermentação levada a cabo pela bactéria em questão é ácido-mista ou butanodiólica.

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Teste do Vermelho de Metilo:


O teste do Vermelho de Metilo é um teste de análise ao pH, usado para identificar
bactérias que produzam ácidos estáveis para metabolização da glucose via fermentação ácido-
mista. Este teste faz uso das propriedades químicas do Vermelho de Metilo que é um corante
indicador que se torna vermelho em soluções ácidas. É um corante azóico, e apresenta-se
como um pó cristalino vermelho escuro.
Todas as eneterobacteriáceas produzem inicialmente piruvato para metabolismo da
glucose. Mas algumas bactérias entéricas usam a via da fermentação ácido-mista em ordem a
metabolizar o piruvato, convertendo-o noutros ácidos, tais como o acético, fórmico e láctico.
Estas bactérias são denominadas vermelho-de-metilo-positivas (ex: Escherichia coli e Proteus
vulgaris). Outras enterobacteriáceas usam a via do butileno para metabolizar o piruvato e
transforma-lo em elementos neutros, estas bactérias caem sob a designação de vermelho-de-
metilo-negativas (ex: Serratia marcescens e Enterobacter aerogenes).

Teste de Voges-Proskauer:
O teste de Voges-proskauer ou VP é utilizado para detectar acetoína numa cultura
bacteriana. O teste em si consiste na adição de α-naphtol e hidróxido de potássio a uma
solução de VP que tenha sido inoculada com bactérias.
Este teste depende da metabolização da glucose a acetilmetilcarbinol. Se a glucose
estiver a ser metabolizada irá reagir com o α-naphtol (reagente VP nº 1) e hidróxido de
potássio (reagente VP nº 2), e forma uma cor avermelhada. Acrescenta-se que tanto o α-
naphtol como o hidróxido de potássio são químicos detectores de acetoína.

Resumindo os dois Testes: Teste Vermelho de Metilo Teste Voges-Proskauer

Reagentes: → Vermelho de Metilo → α-naphtol


→ hidróxido de potássio
Detecta: Metabolização da glucose via Metabolização da glucose via
fermentação ácido-mista. fermentação butanodiólica.
Reacção positiva: Cor vermelha Cor vermelho-cereja
Reacção negativa: Cor amarela Cor amarelo-acastanhada
Organismos com reacção Escherichia coli Vibrio damsela
positiva (ex):
Organismos com reacção Enterobacter aerogenes Salmonella sp.
negativa (ex):

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Concluindo esta temática:


→ Existem ATP-sintetases membranares nas bactérias lácticas, embora estas sejam
fermentativas. Isto deve-se ao facto de parte do ATP sintetizado pela fermentação ser utilizado
pela ATPase membranar, para, ao trabalhar inversamente, aumentar o gradiente protónico
membranar, garantindo assim, o funcionamento de todos os transportes secundários
dependentes da força proto-motriz.
Existem outras estratégias produtoras de energia por parte de bactérias anaeróbias:
→ Embora na fermentação láctica não haja síntese de ATP na fase final, funcionando o
lactato apenas como escoador de electrões, existem bactérias lácticas que conseguem retirar
mais um pouco de energia para sintetizar ATP adicional, fazendo-o através da exportação de
lactato com um simporter de protão, sendo o lactato exportado na forma neutra. Deste modo,
por cada molécula de lactato exportada, também irão ser exportados 2H+, sendo estes depois
utilizados pela ATPase membranar para perfazer 2/3 de uma molécula de ATP.
→ Outras bactérias possuem enzimas membranares de descarboxilação de ácidos
orgânicos. Os ácidos orgânicos que entrem em contacto com uma destas enzimas serão
descarboxilados, produzindo piruvato + CO2. Esta Descarboxilase membranar, cada vez que
descarboxila uma molécula de ácido orgânico coloca 2 iões de Na no exterior, existindo nestas
bactérias uma ATPase membranar movida a Na, sendo o referido utilizado para a produção de
ATP.

CMC –Crescimento Microbiano e seu Controlo - Cap. 6, 27 – Brock Biology of Microorganisms.


10th ed.

Crescimento Microbiano

As células procariotas não possuem


mecanismos de divisão celular iguais aos das
células eucariotas (mitose). Assim, nas células
procariotas o processo ou mecanismo de divisão
celular é a fissão binária – que é o mecanismo pelo
qual uma célula mãe se divide dando origem a
duas células filhas com dimensão
aproximadamente idêntica, como se pode
observar na imagem lateral:

132
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Desta maneira observamos uma fase de alongamento celular, com consequente


aumento de biomassa, tendo este aumento ocorrido após a replicação do cromossoma
bacteriano.
Seguidamente ocorre a formação de um septo e as duas células filhas separam-se.

NOTA: Se existirem elementos genéticos não cromossomais (presentes no citosol), das duas
uma:
- Ou o ciclo de replicação do plasmídeo coincide com o ciclo de fissão binária e ambas as
células filhas herdam o plasmídeo.
- Ou o ciclo de replicação do plasmídeo não coincide com o ciclo de fissão binária e apenas
uma célula filha herda o plasmídeo.

Há algumas diferenças no processo de divisão celular em procariotas consoante a


morfologia da célula em questão; existindo tipicamente dois grandes grupos:
→ Coccus, esféricos.
→ Bacillus, bastonetes.
No caso dos coccus, o septo vai formar-se aparecendo um estrangulamento no síntese
do septo, dividindo a célula mãe em duas células filhas diferentes. Fazendo-se assim, a síntese
de parede localizada numa região que circunda a célula, que se vai afastando da parede
central, que por sua vez inclui o septo. Sendo a adição de material constituinte da nova parede
celular feita para o lado interno.
No caso dos bastonetes, verifica-se a formação de um septo a meio da célula,
enquanto que a síntese de parede forma uma
estrutura helicoidal, composta por proteínas
associadas ao processo de divisão celular, que
crescem junto da parede, sendo que nos pontos de
contacto entre a membrana e a parede celular
ocorre a adição de novo peptidoglícano.
A zona de septação é sempre central na
célula, e o septo ocorre neste local específico
porque quando se ocorre o processo de fissão
binária, verifica-se uma acumulação de uma
proteína muito importante: FtsZ – Filamentous
Temperature Sensitive).

NOTA: Esta proteína foi descoberta em mutantes em que o gene codificante para a mesma não
estava funcional. Assim as células mutantes iam crescendo mas não se dividiam, não formavam
septo, adquirindo uma morfologia filamentosa.

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Esta proteína FtsZ, acumula-se no anel que circunda ou o coccus, ou o bastonete, e é


nessa zona que ocorre a síntese especializada de parede celular em ordem a que se forme o
septo. No resto da célula, estas zonas de crescimento activo, seja nos coccus ou bastonetes,
estão associadas às proteínas que participam na síntese de peptidoglícano, que garantem a
evolução do processo de crescimento de uma maneira regulada e concertada.

Quando se estuda o crescimento microbiano, não se consegue abordar esta temática


ao nível da célula. Assim quando mencionamos crescimento microbiano, de facto referimo-nos
a crescimento populacional.
Assim observamos numa colónia de células hipotética, que cada célula pertencente a
essa mesma colónia, desde que possua os nutrientes essenciais ao seu metabolismo, vai iniciar
o seu ciclo de divisão celular, e passado certo tempo iremos ter o dobro do número de células
que tínhamos inicialmente; passado 2x esse tempo de duplicação iremos ter 22 nº de células, e
por aí fora. Com tudo isto, conseguimos concluir que o número de células ao longo do tempo
vai aumentando de uma maneira exponencial, sendo teoricamente uma exponencial de base2.
Consequentemente, se partirmos de um nº qualquer N0 inicial, o que esperamos é de
que ao fim de certo tempo (t) tenhamos um nº exponencial de células (Nt), igual a:

Nt = N0 x ekt OU N0 x eµt, sendo 𝜇 a taxa de crescimento:

log 𝑁𝑡 − log 𝑁0
𝜇 = 𝑁𝑡
log 𝑒𝑡
Sendo que esta taxa de crescimento é
característica de cada espécie de microrganismo.
Alem do mais, se representarmos o crescimento não
sob a forma exponencial, mas sim sob a forma
logarítmica, espera-se observar uma recta de
crescimento como a representada na figura lateral.
Conseguimos representar o crescimento
populacional microbiano sob a forma de logaritmos
através das duas seguintes expressões:

log Nt = log N0 + µt log e


e
log (2N0) = log N0 + µg log e

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E se resolvermos a última equação em ordem ao tempo de geração g obtemos a expressão:


0,693
𝑔=
𝜇
De modo a que se o g for expresso em unidades de tempo, o 𝜇 irá ser o inverso dessas mesmas
unidades de tempo.
Em ordem a podermos analisar o crescimento microbiano em laboratório
necessitamos de um parâmetro que seja uma medida directa do crescimento, sendo a mais
evidente o número de células. Deste modo, podemos proceder á contagem directa do nº de
células ao longo do tempo numa câmara de contagem ao microscópio, em ordem a podermos
traçar um gráfico do crescimento microbiano.
Um método que consiste num parâmetro indirecto de medida de crescimento
microbiano é a utilização de um espectrofotómetro em ordem a medir a absorvância de uma
suspensão de células, várias vezes ao longo do tempo. Assim, á medida que a absorvância vai
aumentando ao longo do tempo, conseguimos concluir que há mais células em suspensão.
Existem ainda outros parâmetros para medir o crescimento, tais como:
→ Extracção e doseamento de constituintes celulares:
- Proteínas;
- Ácidos nucleícos (RNA, DNA); NOTA: Podemos utilizar qualquer parâmetro que
- Outros constituintes celulares. esteja directamente relacionado com o nº de células, e
por conseguinte com o aumento de biomassa. Sendo
→ Medição de peso seco;
que estes parâmetros variam normalmente em função
→ Medição de peso fresco; do nº de células com algumas limitações.
→ Plaqueamento em meio de cultura.

Apresenta-se assim um gráfico que nos mostra curvas de crescimento microbiano:

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Quando seguimos uma curva de crescimento microbiano observamos várias fases


típicas, como se pode observar no gráfico, sendo elas:
→ Fase de latência, ou fase de adaptação ao novo meio de cultura. Sendo aquela em que se
observa um aumento muito reduzido do crescimento.
→ Fase exponencial, corresponde ao período de tempo em que as células já se adaptaram ao
novo substrato, começando as mesmas a alongar-se, a dividir-se á sua taxa máxima.
→ Fase estacionária, é aquela em que deixou de haver divisão celular e por isso o número de
células mantém-se constante. Esta fase vai-se revelar um balanço de dois factores, em
primeiro a disponibilidade de nutrientes, e em segundo a acumulação de sub-produtos do
metabolismo que tenham um efeito negativo e inibitório do crescimento.
→ Autolíse, algumas estirpes quando em fase estacionária começam a acumular produtos do
metabolismo que são nocivos para as células, entrando as mesmas em lise celular.

NOTA: Existem células na fase de Autolíse que não podem entrar em lise, mas também não se
podem replicar, estando por isso, do ponto de vista de viabilidade celular, mortas.

O próximo gráfico diz respeito á variação da composição macromolécular de E.coli


crescida a diferentes taxas, variando a concentração e composição de substrato:

Assim observamos que á medida que a taxa de crescimento aumenta, aumenta o número de
duplicações. E á medida que aumenta a velocidade de crescimento, aumenta também a
quantidade de DNA por célula.

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Este gráfico também nos mostra que consoante o parâmetro que utilizamos para
medir o crescimento, obtemos diferentes curvas de resposta.
Contudo, apresenta-se ainda outro gráfico correspondente a outro fenómeno
relacionado com o crescimento, que encontramos em vários microrganismos, que é
denominado fenómeno de Diáuxia:

Este gráfico apresentado ilustra a curva de crescimento em E.coli, quando colocada


num meio que desde inicio tem glucose + lactose.
Assim, verificamos que a curva de crescimento apresenta duas fases exponenciais
interrompidas por uma fase estacionária. Durante a fase de latência as concentrações de
glucose e lactose mantêm-se constantes – não está a haver consumo. Quando se inicia a
primeira fase exponencial, a glucose começa a ser consumida, decrescendo a sua concentração
no meio de cultura ao longo do tempo. Quando se esgota a glucose, termina a fase
exponencial, e as células entram em fase estacionária, que na verdade é uma fase de latência
da próxima curva de crescimento. Este é o tempo necessário para que sejam induzidos os
sistemas de captação e transporte de lactose, e todas as enzimas para a sua utilização.
Assim, a partir do momento em que estes sistemas induzidos começam a trabalhar,
inicia-se outra fase exponencial, e a lactose começa a ser consumida, consequentemente
decrescendo a sua concentração no meio de cultura.
Deste modo concluí-se que:
1ª Fase de crescimento → consumo de glucose.
2ª Fase de crescimento → consumo de lactose.

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NOTA: Este último sistema observado classifica-se como sistema de repressão por
catabolito, ou seja, enquanto se encontrar glucose presente no meio, a lactose não é
degradada e metabolizada.

Tal como a composição do meio afecta o crescimento, todos os outros factores


ambientais vão condicionar o crescimento, e os microrganismos reagem, sofrendo o efeito
desses mesmos factores. Mas no entanto estes possuem mecanismos que lhes permitem
responder á variação dos factores ambientais, tentando manter as suas características
próprias. Este processo é designado por Homeostasia.
Dos vários factores que afectam o crescimento, destacam-se os mais importantes:
→ Concentração de O2;
→ Temperatura;
→ Pressão osmótica;
→ pH.
Começando por abordar a Temperatura, verificamos que os microrganismos vão ter
uma resposta em termos de grupo, que significa que para cada microrganismo, haverá as
chamadas temperaturas cardinais, ou seja, a temperatura mínima – abaixo da qual, aquele
organismo não consegue crescer – a temperatura máxima – acima da qual aquele organismo
não consegue crescer – e entre estas duas existe a chamada temperatura óptima, á qual o
organismo cresce de maneira mais eficiente, como se observa na imagem seguinte.
Tendo em conta esta abordagem conseguimos classificar os microrganismos quanto á variação
de temperatura que conseguem
tolerar e quanto ao posicionamento
da sua temperatura óptima de
crescimento relativamente ao
espectro de temperaturas presentes
no ambiente. Assim temos:
- Estenotérmicos, que suportam uma
menor variação de temperatura.
- Euritérmicos, que suportam uma
maior variação de temperatura.

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NOTA: É de notar que quanto á curva de crescimento observada em relação á temperatura,


nos microrganismos, a referida é assimétrica, ou seja, a temperatura óptima está mais próxima
da temperatura máxima do que da temperatura mínima.

É obvio que o crescimento microbiano vai ser o somatório de todas as reacções


enzimáticas que se passam dentro da célula bacteriana. E como a temperatura influencia a
cinética das reacções enzimáticas, vai consequentemente influenciar a cinética de
crescimento, e a velocidade do mesmo.
Nota-se que não há crescimento abaixo da temperatura mínima, porque á medida que
a temperatura baixa, a fluidez da membrana plasmática vai-se reduzindo (de acordo com o
modelo do mosaico fluido) tornando-se a membrana mais gelificada sendo os processos de
transporte dificultados, e a partir de certa temperatura a membrana gelifica totalmente,
parando os sistemas de transporte e consequentemente o crescimento microbiano.
Quanto ao efeito da temperatura máxima, observa-se que a temperaturas muito
elevadas as enzimas desnaturam. Logo um organismo terá como temperatura máxima, aquela
que representa um limite dos efeitos aditivos desnaturantes sobre as suas proteínas mais
críticas.
Contudo, existem microrganismos que conseguem crescer a temperaturas muito altas,
e outros a temperaturas muito baixas.
Em função das temperaturas óptimas, os microrganismos são classificados em vários
grupos consoante as temperaturas cardinais apresentadas. Assim temos:

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→ Psycrófilos, vivem a temperaturas baixas;


→ Mesófilos, vivem a temperaturas intermédias;
→ Termófilos, vivem a temperaturas elevadas;
→ Hypertermófilos, vivem a temperaturas muito elevadas;
→ Hypertermófilos extremos, vivem a temperaturas absurdamente elevadas.

Apresenta-se, assim uma tabela informativa quanto aos microrganismos termófilos,


hypertermófilos, e hypertermófilos extremos:

NOTA: É no grupo dos procariotas


e em particular nas archaeas que
encontramos os organismos mais
hypertermofílicos de todos.

Quanto aos mecanismos de adaptação e


protecção contra a temperatura baixa ou
alta, observamos por exemplo em E.coli
(mesófilo), que maior parte das suas
adaptações às variações de temperatura
têm que ver com a variação da
proporção de ácidos-gordos saturados e
insaturados na sua membrana
citoplasmática. Normalmente, como
resposta á temperatura baixa, aumenta
a proporção de ácidos-gordos insaturados, porque estes compensam a acção de gelificação da
membrana citoplasmática a baixa temperatura. E ao contrário do referido, quando se verifica
um aumento de temperatura, os ácidos-gordos presentes na membrana passam a ser
substituídos por ácidos-gordos saturados, aumentando as interacções hidrofóbicas na
membrana, ficando esta mais compacta, compensando o aumento de toda a agitação
molecular resultante do aumento de temperatura.
No entanto, para além destas alterações na conformação membranar, outras formas
observáveis de resposta às variações de temperatura são a síntese de compostos
estabilizantes intracelulares, que no caso do aumento de temperatura vão gelificando o
citosol, compensando o já referido efeito de agitação molecular.

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Do ponto de vista das adaptações á termofília e hypertermofília existem mais


mecanismos específicos, visto que nestas condições existem novos obstáculos ao crescimento,
como a desnaturação de proteínas, e a ruptura da dupla cadeia de DNA.
Assim os mecanismos de adaptação á termofília envolvem muitas vezes a síntese de
proteínas protectoras, que se ligam às proteínas mais críticas impedindo a sua desnaturação.
Em termos de protecção do DNA, temos também nestes organismos a ligação de proteínas –
ou polianinas – que ao se ligarem, neutralizam as cargas dos grupos fosfato, impedindo a
desnaturação das duas cadeias.
Nas archaeas hypertermofílicas ou hypertermofílicas extremas, verificou-se que existe
um outro mecanismo de protecção contra as altas temperaturas que consiste na utilização de
uma DNA-girase-reversa, que ao contrário da DNA-girase comum, faz super-enrolamentos
positivos, ou seja, no mesmo sentido da dupla-hélice, o que compensa o efeito da
desnaturação térmica ao compactarem o DNA de uma maneira não-convencional.

Relação dos Microrganismos quanto ao teor/disponibilidade em O2

Do ponto de vista ecológico, os diferentes microrganismos podem ser classificados em


termos da sua correlação com o oxigénio, de acordo com os seguintes grupos:

Tendo em conta o gráfico acima, podemos concluir que os Aeróbios obrigatórios necessitam de
O2 porque todo o seu metabolismo se baseia em condições de aeróbiose.
Os Aeróbios facultativos podem performar respiração aeróbia na presença de O2, e na
sua ausência podem performar respiração anaeróbia ou fermentação (dependendo de outros
factores intrínsecos ao metabolismo). Estes organismos conseguem crescer na ausência de O2,
no entanto o crescimento na presença do mesmo é melhor.

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Os organismos Microaerofílicos são estritamente aeróbios mas têm uma maior


sensibilidade ao O2, ou seja, nas concentrações normais de O2 presentes na atmosfera, estes
organismos não conseguem crescer, visto ser tóxica para os mesmos. Só conseguem
sobreviver em ambientes em que a concentração de O2 é abaixo do normal.
Tendo em conta os Anaeróbios, verificamos que não necessitam de O2 para o seu
metabolismo. Também verificamos que os Aerotolerantes são organismos que embora não
necessitem de O2, conseguem viver na presença do mesmo, bem como multiplicar-se.
Enquanto que os Anaeróbios obrigatórios são aqueles em que o O2 é nocivo, ou mesmo letal.
Significa pois, que estes organismos não têm mecanismos para protecção contra os efeitos
nocivos do O2.

Microrganismos e o O2: estratégias enzimáticas

Superóxido Dismutases (SOD) – são uma classe de enzimas que catalisam a dismutação do ião
superóxido, em O2 e H2O2. São extremamente importantes como defesas antioxidantes em
quase todas as células expostas ao O2.
Reacção:
O2- + O2- + 2H+ → H2O2 + O2

Catalases – são enzimas encontradas em praticamente todos os organismos expostos ao O2.


Catalisam a decomposição de H2O2 em H2O e O2.
Reacção:
2H2O2 → 2H2O + O2

Peroxidases – têm como substrato o NADH, ou outro substrato qualquer que funcione como
redutor e que forneça o H2 necessário para a formação de água.
Reacção:
H2O2 + AH2 → 2H2O + A
H2O2 + NADH + H+ → 2H2O + NAD+

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Superóxido Redutases – são enzimas que catalisam a conversão de ião superóxido em


peróxido de hidrogénio. Encontram-se em archaeas anaeróbias, que graças a estas enzimas
conseguem viver na presença de O2.
Reacção:
O2- + 2H2 H2O2

Citocromo c (Reduzido) Citocromo c (ou Rubredoxina FeS) (Oxidado)

Complexos Mu2+ não-proteícos – estes complexos do ião manganês, presentes em bactérias


ácido-lácticas (anaeróbios aerotolerantes), fazem a conversão do ião superóxido em peróxido
e O2.
Reacção:
O2- → H2O2 + O2

O pH e os Microrganismos

Imagine-se uma célula de E.coli com


determinado pH intracelular, estando adaptada a viver
num meio com pH próximo da normalidade.
Se esta célula for colocada num meio que
contenha um pH ácido ou alcalino, o resultado é de
que o seu pH intracelular irá variar de acordo com o
pH do meio. Seguem-se dois gráficos que explicitam o
processo de homeostasia que se observa em E.coli:
Neste gráfico verificou-se que células de E.coli
em crescimento activo foram colocadas num meio com
pH 8,3; e ao longo de 20min estabilizaram o seu pH
intracelular para um valor próximo da normalidade:
7,8.

Verificou-se uma resposta homeostática!

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Neste segundo gráfico obtemos valores


que dizem respeito á variação do pH
intracelular ao longo do tempo em
células de E.coli.
[Chama-se á atenção para a leitura da
legenda, que proporciona uma melhor
compreensão do gráfico bem como da
experiência em si.]

Verifica-se uma tentativa de


alcalinização do citoplasma!

Resposta Homeostática

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Em termos das relações com o pH, os microrganismos podem ser classificados em 3


grandes grupos, consoante o pH habitual do seu ambiente:
pH out pH in ΔpH (in – out)
Acidófilos 1a4 6,5 a 7 (+) → Potencial de membrana invertido
Neutrófilos 6a8 7,5 a 8 (+)
Alcalífilos 9 a 12 8,4 a 9 (-)

Segue-se um esquema que serve para exemplificar que os microrganismos se podem


desenvolver em toda uma gama de valores de pH, que em prática variam do pH 1 ao 13:

Recordando conceitos anteriores:


A força proto-motriz membranar
resulta de duas componentes,
sendo uma delas a translocação de
protões para o exterior que leva á
criação de um excesso de cargas
positivas no exterior da
membrana, e um excesso de
cargas negativas no interior. Temos
assim uma diferença de potencial,
Δϕ ou potencial de membrana.
Como este potencial resulta da
translocação de protões, também
se irá verificar um gradiente de pH
(ΔpH): ácido no exterior, e alcalino
no interior, que corresponde á segunda componente constituinte da força proto-motriz. Estas
duas componentes – Δϕ e ΔpH – adicionadas constituem a força proto-motriz membranar, ou
seja, á energia conservada na membrana.
Apresenta-se assim os mecanismos de homeostasia, performados pelos 3 grandes grupos de
bactérias, em relação ao pH onde habitam:

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Bactérias Neutrófilas:

Com a observação do último diagrama, concluímos que as bactérias neutrófilas habitam locais
com pH entre 6 e 8, mantendo-se o pH intracelular entre 7,5 e 8.
Estas células para o seu funcionamento têm de colocar protões para o exterior. Esta
translocação de protões é compensada pela entrada de potássio. A troca de K+ por H+, é o que
garante que o pH intracelular se mantenha próximo da neutralidade.
Assim, o mecanismo de Homeostasia das bactérias neutrófilas quanto ao pH é de que
se houver uma acidificação do meio extracelular, estas aumentam a captação de K+ para
poderem por fora da célula o excesso de H+ que entrou.

NOTA: Nestas bactérias, a maior parte da força proto-motriz vem do potencial de membrana
visto que o ΔpH é fraco.

Bactérias Acidófilas:

As bactérias Acidófilas têm bombas de influxo massivo de K+, e estas funcionam de tal maneira
que a quantidade de K+ intracelular é tão elevada, que a membrana possui um potencial
invertido. Logo, como estas invertem o potencial de membrana, a saída de protões de um
meio altamente positivo, para um meio menos positivo, passa a ser um processo facilitado.
Assim, o mecanismo de Homeostasia das bactérias acidófilas consiste na inversão do potencial

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de membrana através do influxo massivo de K+, permitindo que os protões sejam postos no
exterior.
Bactérias Alcalífilas:

Nestas bactérias o pH intracelular não é tão próximo da neutralidade como nas outras já
observadas, sendo este ligeiramente alcalino.
Estas bactérias especializaram-se em ordem a viver nestes ambientes, tendo um
sistema de antiporte sódio-protão. Que funciona pondo protões dentro da célula, trocando
por sódio que põe no exterior.
Cada vez que estas bactérias transportam um soluto para dentro da célula,
transportam também um ião de Na. Este sistema de trocas não se verifica ser difícil de
executar, visto existir muito Na+ em ambientes alcalinos.
Sumariza-se assim, estes mecanismos de homeostasia com um esquema que os engloba:

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Tendo em conta a ilustração anterior:


O efluxo de protões associado a um influxo de potássio, permite alcalinizar o
citoplasma, sendo este mecanismo usado sempre que é preciso aumentar o pH intracelular.
Pelo contrário, os processos 3 e 4, antiporte sódio-protão, e antiporte potássio-protão,
respectivamente, são mecanismos que permitem com que as bactérias possam trocar um
protão para o interior da célula, por um catião intracelular, funcionando estes mecanismos em
ordem a baixar o pH intracelular, acidificando-o. Estes mecanismos necessitam de funcionar
acoplados a um outro mecanismo que faça o influxo de Na+ → 5, nomeadamente o
mecanismo 3, visto que necessita de Na+ intracelular para o poder trocar por um protão.
Referente ao mecanismo 1, verificamos que consiste numa bomba primária de
protões, que gera um potencial de membrana; e mencionando o mecanismo 2, notamos que é
alusivo ao influxo de iões potássio, que dissipam o potencial de membrana permitindo o
escape de protões via bombas transportadoras, e consequente alcalinização do citosol.

Efeito da concentração salina nos Microrganismos

de acordo com o gráfico acima


representado podemos verificar que
temos 4 tipos diferentes de
microrganismos tendo em conta a
sua tolerância, ou ausência da
mesma, ao Na+:
→ Não-halófilos: são organismos que
assim que a concentração do meio
aumenta um pouco, a sua taxa de
crescimento diminui, e a baixas
concentrações de Na+ são incapazes
de crescer.
→ Halotolerantes: são organismos que conseguem tolerar concentrações médias de Na+ no
meio, tornando-se as concentrações altas nocivas para os mesmos.
→ Halófilos: são organismos que apresentam uma taxa de crescimento óptima para
concentrações do meio em Na+ na ordem dos 5%.
→ Halófilos extremos: são organismos que necessitam de 15% de Na+ no meio para se
poderem duplicar, não crescendo abaixo desta concentração, e não sobrevivendo em
concentrações mínimas de Na+ no meio.

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Quando um microrganismo é colocado num meio em que a pressão osmótica é maior


ou menor do que o habitual, vai haver uma resposta homeostática por parte deste organismo
face ás alterações presentes no meio. Assim, quando se coloca um procariota num meio com
elevada pressão osmótica, verificamos que este perde H2O. Do mesmo modo, se colocarmos
uma bactéria num meio de baixa pressão osmótica, verificamos que vai entrar água para
dentro da mesma.
Cogitando um pouco sobre esta temática verificamos que existem alterações
fisiológicas por parte dos microrganismos em resposta ao aumento ou diminuição da pressão
osmótica do meio, como já anteriormente observado. Assim, quando aumenta a pressão
osmótica extracelular, as bactérias respondem a esta variação aumentando a sua pressão
osmótica intracelular, em ordem a reterem água:

No gráfico apresentado decorreu o posicionamento de uma colónia de E.coli, num


meio rico com uma pressão osmótica superior á intracelular.
Verificou-se que logo no inicio ocorreu um influxo maciço de K+, o que vai levar a um
aumento de pressão osmótica intracelular. Verificou-se também que estas células de E.coli, á
medida que importam potássio vão sintetizando glutamato, que por sua vez vai neutralizando
as cargas de K+, visto que o ácido glutâmico é um anião.

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Após certo tempo observou-se que os níveis de K+ começaram a diminuir, e que o


glutamato vai sendo degradado, mas a par destes acontecimentos a célula começa a sintetizar
um composto denominado trehalose, que sendo neutro não vai afectar o equilíbrio
electroquímico. Conclui-se assim que a resposta imediata (S.O.S) da célula face ao aumento da
pressão osmótica do meio consiste no influxo massivo do ião potássio, e síntese de glutamato,
sendo feita em seguida a síntese de trehalose.
Na continuação da experiência, e a par da síntese de trehalose, adicionou-se ao meio
prolina, verificando-se o influxo da mesma por parte das células, degradando-se a trahalose
que havia sido sintetizada.
Concluindo: glutamato, trehalose e prolina são solutos que podem funcionar como
osmoreguladores. Estes compostos que os procariotas utilizam para controlar a pressão
osmótica são denominados osmorreguladores. No caso das substâncias inorgânicas e muitas
vezes captadas do exterior, são denominadas osmólitos. Na eventualidade de serem de
natureza orgânica, e produzidos pela célula, são também designados de osmoprotectores, em
adição ao termo de osmoreguladores.
No caso da diminuição da pressão osmótica no exterior, verifica-se que as Gram-
positivas aguentam relativamente bem a pressão de turgescência, mas as Gram-negativas
levantam um problema, pelo que têm de osmoconformar-se através de um mecanismo
homeostático. Esse mecanismo revelou-se por ser o aumento da concentração de MDO’s
(Membrane Derived Oligossacharides) no espaço periplasmático, aumentando a pressão
osmótica do mesmo, quebrando o diferencial existente entre o exterior e o citosol.

Controlo do Crescimento Microbiano

Muitas vezes em Microbiologia Médica e Industrial (resumidamente, vertentes


aplicadas), é do nosso interesse, não crescer microrganismos mas sim matá-los. Para este
efeito é necessária a utilização de um agente letal, sendo este um agente químico ou físico,
que é capaz de produzir a morte celular, sendo este conceito em microbiologia, a perda da
capacidade de divisão por parte de um certo microrganismo.
Um microrganismo é considerado morto, quando colocado num meio de cultura com
todas as condições óptimas, não se consegue replicar.
Por vezes um microrganismo encontra-se apenas injuriado, necessitando de elementos
químicos que normalmente não necessitaria, para poder “ressuscitar”; diz-se por isso que os
organismos microbianos que se encontram nesta situação, estão no estado VBNC (Viável Mas
Não Cultivável – Viable But Not Cultivable).

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Sempre que são utilizados métodos de esterilização ou de desinfecção, possui-se uma


margem de segurança, mas na prática nunca se consegue matar todas as células existentes
numa cultura que se pretende esterilizar, visto que:
Nt = N0 x e-kt , sendo –k a taxa de morte, então temos:
N0 x e-kt contínua até + ∞, visto ser uma exponencial negativa.
Assim, não há esterilidade absoluta, sendo a esterilidade um conceito
meramente probabilístico.

O que acontece a uma população microbiana quando submetida a um agente letal?

Usando várias amostras, cada


uma a uma temperatura
diferente, e sabendo que, na
ausência de agente letal, e
determinado por
plaqueamento, a população
tem um N0=108 cfu/mL.
Pegou-se numa amostra e
deixou-se 14 minutos a 90ºC.
Depois desse tratamento, fez-
se diluições, plaqueamentos e
conta-se quantas colónias se
formaram. Houve uma redução (morte) e o número de células que ficou é próximo de zero. Se
aumentarmos o tempo, vai-se matar mais células. Normalmente, uma curva de morte
(resposta ao agente letal) é uma curva exponencial negativa. Então, para interpretar mais
facilmente, aplica-se o logaritmo, e fica uma recta de declive negativo.
O ponto em que a recta de logaritmo encontra o eixo das abcissas (14min) é a dose letal que
inactiva a população.
Se a resposta é exponencial negativa, a dose que tem de ser aplicada de agente letal, para
matar N0 de células, encontra-se no ponto em que a curva encontra o eixo no infinito. Quer
dizer que, do ponto de vista teórico, nunca se consegue matar a população toda.
Esta dose é menor se a população inicial for menor (Ex.: se tivermos 106 em vez de 108 a dose é
menor para 106).

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Biologia Microbiana Prof. Rogério Tenreiro

A dose letal é uma dose que leva o número inicial (N0) a 100 – ponto de inactivação (D0).
Se dermos uma dose exactamente igual a D0, temperatura a 90ºC e durante 14.3 minutos,
vamos ter um número de células de, por exemplo, 10-3, que é menor que 1. Logo, não existem
células. Embora não seja uma dose que, teoricamente, mata as células todas, qualquer dose
superior a D0 já nos dá uma fracção de células possível, assim, na prática, matou-se as
unidades viáveis todas.

Qual seria a resposta se tivéssemos partido de 1011, em vez de 108?


A resposta era semelhante, paralela, mas mais acima. Quer dizer, se tivesse-mos 1011 células e
desse-mos a dose que 108 levou, não ficaríamos com 100 células.
O efeito letal depende do efectivo populacional. Para a mesma dose, quanto maior a efectivo
populacional maior a probabilidade de haver sobreviventes. Uma maneira alternativa de
interpretar os dados é: se tínhamos 108 células e D0, que sabemos que possui, logo, qualquer
dose imediatamente a seguir, na prática, garante que não há nenhuma célula viável. Assim, se
dermos uma dose maior que D0, e sabendo que isto corresponde a 10-3, conseguimos matar,
não 108, mas sim 108x103, ou seja, 11 vezes mais. Na prática, esta dose indica que, quando se
aplica esta dose a probabilidade que há de haver uma célula viva é de 1 em cada 1000 (10-3).
Isto é o que chamamos de margem de segurança do processo (SAL – Safety assegurances
level). O que vamos ter não é o valor absoluto de morte, mas uma probabilidade de
diminuição dos organismos.

Se esta é uma curva de resposta da bactéria


que queremos eliminar, e sabemos que, para
aquele número de células, se dermos a dose
letal temos probabilidade 1, então sabemos
que, dando D1, passamos a ter a
probabilidade de 0,001. Logo, se queremos
ter maior segurança no processo de morte,
esterilização do material por exemplo,
aumenta-se a dose.
As doses aplicadas ao material clínico são
calculadas de forma a garantir que a margem
de segurança do processo é, no mínimo, 10-6,
ou seja, cada lote de material clínico que é esterilizado a nível industrial, vem com uma
probabilidade de 10-6 de não estar estéril. Isto significa que, por exemplo, em cada milhão de

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seringas, uma pode estar contaminada. Aumentamos a margem de segurança aumentando a


dose, higienizando o produto e diminuindo, assim, a carga microbiana do produto.
Esterilização é a ausência de microrganismos viáveis.
Descontaminação é o acto de redução ou remoção de microrganismos.
Cada microrganismo tem uma resposta diferente, consoante o agente letal e a sua dose.
D10 é a dose que reduz a população inicial a 10%. Quanto maior for esta dose, menos letal é
o agente.
Para além dos agentes esterilizantes, há outros tipos de agentes ou processos que são
designados por desinfectantes e anti-sépticos. Estes agentes actuam ou por desnaturação
proteica ou por alteração da permeabilidade membranar. A diferença entre um desinfectante
e um anti-séptico, é que os anti-sépticos podem ser usados em contacto com o corpo humano,
enquanto que os desinfectantes são sempre usados em superfícies inanimadas, o que quer
dizer que estes compostos são tóxicos para o organismo humano. Têm mecanismos de acção
semelhantes e o mesmo objectivo, que é reduzir a carga microbiana.
Dentro deste combate ao crescimento dos microrganismos, o que nos interessa mais é
impedir a multiplicação e o crescimento de microrganismos no nosso organismo, ou seja,
combater organismos patogénicos. Esse combate pode ser feito com alguns anti-sépticos.

Porque é que quando nos espetamos com um prego, desinfectamos com água oxigenada?
Porque o grande problema é o agente do tétano, que é Clostridium tetanica, que é um
esporulado e anaeróbio estrito. Portanto a utilização de água oxigenada significa que, mesmo
que C. tetanica tenha a enzima catalase, não tem superóxido dismutase (SOD), e aquela água
oxigenada vai entrar para dentro das células e criar diferenças no potencial, morrendo as
mesmas.
Para além dos anti-sépticos são utilizados um conjunto de compostos que têm uma
terapêutica anti-microbiana, que são os antibióticos.

FIM

Agradecimentos a Tomás Gomes e a Cláudia

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