Você está na página 1de 106

Os Direitos

das Crianças e
dos Adolescentes
em Análise
Os Direitos das Crianças e dos Adolescentes em Análise

Realização
Forum Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente - FMDCA
Fundação Irmão José Otão-FIJO

Organizadoras
Rosa Maria Castilhos Fernandes
Ana Lúcia Suárez Maciel

Revisão
Beatriz Aranchipe Kloss

Projeto Gráfico e Capa


Dora Bragança Castagnino
www.agenciasocial.org.br

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

O direito das crianças e dos adolescentes em análise / organizadoras Rosa Maria


Castilhos Fernandes, Ana Lúcia Suárez Maciel - Porto Alegre: Fundação
Irmão José Otão, 2012.
120 p.

Esta publicação faz parte do processo de pesquisa das entidades que compõem o
CMDCA e do FMDCA, em parceria com a Fundação Irmão José Otão.
ISBN 978 85 64048 04 1

1. Políticas Sociais Públicas. 2. Programas Sociais. 3. Controle Social- Pesquisa.


4. Crianças e Adolescentes-Direitos I. Conselho Municipal dos Direitos da
Criança e do Adolescente (CMDCA). II. Fórum dos Direitos da Criança e do
Adolescente (FMDCA). III. Fundação Irmão José Otão. IV. Fernandes, Rosa
Maria Castilhos. V. Maciel, Ana Lúcia Suárez. VI. Título.

CDD 309.213
CDU 304.44

Bibliotecária Responsável
Marialva M. Weber CRB 10/995
“É preciso observar que o estudo dos princípios e das diretrizes da
Política Nacional dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes,
requer um olhar apurado para as comunidades onde estão se
desenvolvendo políticas que atendem às necessidades desse
segmento populacional. Somente assim é possível adequar a gestão
das políticas às demandas territoriais e fazer jus ao que chamamos
de defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes’’.
As organizadoras
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO...................................................................................... 009

PARTE 1
Programas Sociais e Educação Infantil: reflexões e proposições ................................ 011

O marco jurídico da proteção, promoção e defesa dos direitos da criança e do adolescente


no Brasil...................................................................................................... 013
Rodrigo Stumpf González

Controle Social: o papel dos Conselhos de Direito e Fóruns Municipais na garantia e


ampliação de recursos para execução de políticas sociais........................................... 023
Léa Maria Ferraro Biasi

A gestão como estratégia técnica e política no âmbito das políticas públicas.................... 033
Ana Lúcia Suárez Maciel

Proteção à Infância e à Adolescência: fragmentos de uma realidade da política de


assistência social............................................................................................ 039
Rosa Maria Castilhos Fernandes e Maria da Glória de Paula

O Direito à Educação Infantil: os desafios do acesso e da qualidade............................... 051


Silvia da Silva Tejadas

Direitos das Crianças e dos Adolescentes com Deficiência: diversidade e acessibilidade em


perspectiva................................................................................................... 061
Idília Fernandes e Humberto Lippo

A Pesquisa Social: notas acerca da sua aplicação no âmbito das políticas sociais públicas..... 073
Ana Lúcia Suárez Maciel e Rosa Maria Castilhos Fernandes

PARTE 2
A Pesquisa – Avaliação dos Recursos Materiais e Humanos: identificação dos custos dos
programas sociais e da educação infantil de Porto Alegre/RS .................................... 079

Notas metodológicas da pesquisa ........................................................................ 081


Análise dos resultados ..................................................................................... 083
Perfil das entidades da pesquisa ......................................................................... 083
Custo médio geral por programas ....................................................................... 087
Identificação dos recursos humanos e dos recursos materiais ...................................... 097
APRESENTAÇÃO devido compromisso do Estado e a eficácia de suas
ações, para a construção de soluções concretas ao
Participarmos de um processo investigativo fim de que haja o desenvolvimento das crianças e
demandado pelo controle social, neste caso, as dos adolescentes e a defesa de seus direitos.
instâncias que atuam em defesa dos direitos das A iniciativa do controle social das entidades
crianças e dos adolescentes – Conselho Municipal que fazem parte do CMDCA e do FMDCA deflagrou
dos Diretos da Criança e do Adolescente (CMDCA) e um processo de pesquisa que teve como objetivos
Fórum dos Direitos da Criança e do Adolescente identificar os recursos humanos e materiais mensais
(FMDCA) da cidade de Porto Alegre –, é uma necessários para o atendimento adequado da
oportunidade de construção de conhecimentos que Educação Infantil e dos Programas Sociais
emerge de um processo democrático e participativo realizados pelas entidades da sociedade civil da
e que contribui para a formação da agenda das cidade de Porto Alegre; elaborar uma Planilha de
políticas públicas. Por isso, a apresentação desta Custo por Programa, especificando as despesas
experiência, protagonizada pela sociedade civil médias de cada categoria analisada.
organizada, significa reconhecimento da Os resultados da pesquisa foram divulgados
importância do controle social na condução das em reuniões do FMDCA e do CMDCA e discutidos com
políticas públicas, voltadas para a proteção das as entidades envolvidas com os referidos programas
crianças e dos adolescentes. em análise. Entretanto, os gestores e profissionais

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
Todos sabemos que a construção de um país das entidades que participaram desse processo de
para crianças, adolescentes e jovens, baseado no pesquisa e da discussão dos dados reivindicaram
desenvolvimento sustentável e em princípios uma publicação. O livro que ora apresentamos é,
democráticos, de igualdade, de não discriminação, então, uma publicação demandada pelas entidades
de justiça social e universalidade, é uma tarefa que fazem parte das, já citadas, instâncias de
complexa e desafiadora. Ela exige a articulação de controle social, em parceria com a Fundação Irmão
diferentes atores sociais para que se possam José Otão, que foi responsável pelo processo de
promover as mudanças necessárias que queremos investigação.
no âmbito da própria sociedade e do governo; A articulação das entidades que atuam em
estruturas interdisciplinares e intersetoriais, defesa da criança e do adolescente na cidade
capazes de dialogar, de forma articulada, na busca demonstra a capacidade destas de acompanhar os
da resolutividade das demandas dos usuários dos aspectos que afetam a qualidade de vida e os
diferentes programas voltados para as crianças e os direitos dessa população. São movimentos que
adolescentes. Exige, também, que se possa tornam possível rever os arranjos institucionais das
promover o controle social das ações em benefício políticas públicas voltadas para esse segmento
da criança e do adolescente, como forma de populacional, otimizando, assim, os recursos
consolidação da proteção dos direitos e da públicos em seu beneficio. A questão dos custos e do
promoção de políticas públicas. Nessa perspectiva, orçamento disponibilizado para a proteção social,
é preciso que a sociedade atue defendendo, embora seja um assunto polêmico, requer ajustes
debatendo, propondo, questionando e buscando o permanentes em sintonia com a capacidade
orçamentária dos diferentes níveis de gestão: 009
federal, estadual e municipal. Contudo, é preciso aplicação no âmbito das políticas sociais públicas”,
reconhecer que são ações de controle social que de Ana Lúcia Suárez Maciel e Rosa Maria Castilhos
podem levar de fato à edição de leis e à Fernandes. Esse último artigo procura situar o leitor
implementação de políticas públicas orientadas por no contexto investigatório com base em alguns
critérios de eficiência e eficácia com o devido fundamentos os quais subsidiaram os caminhos
envolvimento dos atores sociais, comprometidos percorridos pelos pesquisadores. A segunda parte
com a garantia da proteção à infância e à juventude trata da “Pesquisa – avaliação dos recursos
deste país. materiais e humanos: identificação dos custos dos
Para o enriquecimento das análises dos dados programas sociais e da educação infantil de Porto
e informações da pesquisa e da reflexão crítica Alegre/RS.” Em seguida, as notas metodológicas e
sobre a temática, contamos com a participação de os resultados da pesquisa são publicizados para haja
autores e autoras com uma significativa trajetória acesso ao conhecimento produzido.
profissional, acadêmica e de militância em defesa Pa r a f i n a l i z a r e s t a a p r e s e n t a ç ã o ,
dos direitos sociais; suas contribuições tornaram ressaltamos que o protagonismo dos agentes do
possível esta publicação em um curto período de controle social da efetivação dos direitos das
tempo. Aproveitamos para agradecer a prontidão e crianças e dos adolescentes da cidade de Porto
o compromisso de todos e todas para com a pauta Alegre se destaca no cenário nacional, uma vez que
proposta; os artigos que escreveram compõem a deflagram um processo de investigação para
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

primeira parte deste livro denominada “Programas subsidiar não somente o planejamento e a avaliação
Sociais e Educação Infantil: reflexões e dos recursos para implementação das ações
proposições”. Nesta parte, o leitor encontrará os específicas de cada Programa analisado mas
seguintes textos: “O marco jurídico da proteção, também para contribuir com o diálogo democrático
promoção e defesa dos direitos da criança e do entre as entidades, o Estado e os usuários dos
adolescente no Brasil”, de Rodrigo Stumpf programas. Boa Leitura a todos e a todas!
González; “Controle Social: o papel dos Conselhos
de Direito e Fóruns Municipais na garantia e Porto Alegre, fevereiro de 2012.
ampliação de recursos para execução de políticas Rosa Maria Castilhos Fernandes
sociais”, de Léa Maria Ferraro Biasi; “A gestão como Ana Lúcia Suárez Maciel
estratégia técnica e política no âmbito das políticas
públicas”, de Ana Lúcia Suárez Maciel; “Proteção à
infância e à adolescência: fragmentos de uma
realidade da política de assistência social”, de Rosa
Maria Castilhos Fernandes e Maria da Glória de
Paula; “O direito à educação infantil: os desafios do
acesso e da qualidade”, de Silvia da Silva Tejadas;
“Direitos das crianças e dos adolescentes com
deficiência: diversidade e acessibilidade em
perspectiva”, de Idília Fernandes e Humberto
010 Lippo; “A Pesquisa Social: notas acerca da sua
1
PARTE

Programas Sociais e Educação Infantil:


reflexões e proposições
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

012
O marco jurídico da proteção, promoção
e defesa dos direitos da criança
e do adolescente no Brasil
Rodrigo Stumpf González¹

Ao discutirmos os direitos da criança e do cuja base, também chamada de norma


adolescente, estamos falando de um sistema fundamental, é a Constituição Federal. Da
complexo de normas e dispositivos internacionais e Constituição Federal de 05 de outubro de 1988,
nacionais, que envolvem três aspectos: a definição emanam as normas e princípios que sustentam o
dos direitos de forma geral, as formas de sua funcionamento das instituições brasileiras. Todas as
proteção, promoção e defesa, por meio de políticas demais normas devem estar de acordo com a

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
públicas e procedimentos administrativos e Constituição, cabendo ao Poder Judiciário e, em
judiciais e o funcionamento das instituições, última instância, ao Supremo Tribunal Federal,
públicas ou privadas, cujo objetivo é o de pôr em velar pela manutenção dessa concordância.
prática essas políticas e procedimentos. O Brasil, porém, não se encontra isolado no
Este texto busca apresentar um panorama mundo; é membro da Organização das Nações
geral dessas normas e procedimentos, permitindo Unidas (ONU), da Organização dos Estados
ao leitor situar-se nesse universo e buscar outras Americanos (OEA) e de uma série de outras
fontes de aprofundamento. Cada um dos segmentos instituições internacionais. Como membro dessas
a serem apresentados, por si só, constitui um instituições, ou na relação direta com outros
campo com sua própria lógica e complexidade. A países, o Brasil firma tratados e convenções que o
tentativa de esgotar a profundidade de cada um obrigam a cumprir normas internacionais. Essas
deles geraria a produção, talvez, não de uma, mas normas em geral são tratadas no mesmo nível das
de várias bibliotecas. leis ordinárias federais, mas, em determinadas
situações, os tratados e convenções sobre direitos
humanos, conforme previsto no artigo 5º da
Estrutura e hierarquia das normas Constituição, poderiam ter o mesmo nível da norma
O Brasil, como muitos outros países, é um constitucional. Porém, até o momento, essa
Estado que se rege pelo princípio da legalidade, situação não se aplicou a nenhuma das convenções

¹ Doutor em Ciência Política. Advogado e Professor do Departamento de Ciência Política da UFRGS. 013
que envolvem os direitos da criança. constituído pela Declaração Americana de Direitos
Como uma República Federativa, nosso país e Deveres do Homem da OEA, de 1948,
tem três esferas administrativas: a União, os complementada pela Convenção Americana de
Estados e os Municípios. Cada uma tem seus poderes Direitos Humanos, de 1968, cuja implementação é
executivo e legislativo e cria leis e outras normas controlada pela Comissão Interamericana de
que regulam aspectos de suas áreas de Direito Humanos e pela Corte Interamericana de
competência. As competências mais amplas são da Direitos Humanos.
União, cujas leis e normativas são aplicadas em A necessidade de uma proteção especial à
todo o país e abrangem temas que não são infância foi reconhecida na esfera internacional,
acessíveis às outras duas esferas. entre outros documentos, pela Declaração
Além da diferenciação entre os entes Universal dos Direitos da Criança, de 1959,
federativos, também há uma hierarquia entre as posteriormente regulada pela Convenção das
normas, sendo as mais comumente utilizadas para Nações Unidas sobre os Direitos da Criança,
regular as relações a Constituição, as Leis aprovada em 1989. Também pode ser destacada a
Ordinárias e os Decretos, mas se incluem também Convenção Relativa à Proteção das Crianças e à
outros atos de autoridades públicas, como, por Cooperação em Matéria de Adoção Internacional,
exemplo, as resoluções dos Conselhos de Controle de 1993.
de Políticas Públicas, como os existentes na área da Porém, mesmo antes da fundação da ONU, a
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

infância, da saúde, da assistência social, da Organização Internacional do Trabalho já havia


educação, entre outras. promovido a criação de normas visando à proteção
de crianças e jovens contra a exploração do
trabalho. Entre essas normas cabe destacar a
As normas internacionais sobre a Convenção 138, de 1973, sobre a Idade Mínima de
Infância Admissão ao Emprego e a Convenção 182, de 1999,
Dentro do sistema internacional de proteção sobre a proibição das piores formas de trabalho
aos direitos humanos, existem normas gerais, que infantil.
se aplicam a todos, independentemente da idade, e Embora se constituam em diretrizes
normas específicas destinadas à proteção da importantes na definição de direitos, as normativas
infância e juventude. internacionais são referidas de forma pouco
A base do sistema é a Declaração Universal frequente no cotidiano da promoção dos direitos da
dos Direitos Humanos, de 1948. Também fazem criança em nosso país. Se, por um lado, isso se deve
parte desse sistema geral os Pactos da ONU sobre ao fato de que a Constituição e as leis brasileiras
Direitos Civis e Políticos e sobre Direitos incorporaram grande parte de suas definições, por
Econômicos, Sociais e Culturais, de 1966. Dentro outro, ainda há um grande desconhecimento de seu
desse sistema geral, existem convenções de temas conteúdo, além de resistência nos tribunais em
específicos, como os de promoção da mulher, reconhecer um valor diferenciado a esses
contra a escravidão, contra a tortura, que também dispositivos.
protegem os jovens.
014 Existe, além desses, um sistema regional
A definição dos direitos da criança e do entrou em vigor em 13 de outubro do mesmo ano.
adolescente no Brasil Em 21 de novembro de 1990, o Decreto nº 99.710
Desde o período colonial, a legislação promulgou a Convenção das Nações Unidas sobre os
brasileira referente à infância, de uma forma geral, Direitos da Criança, que havia sido aprovada em
seguiu a orientação de que a lei civil é para os ricos 1989 pela ONU, passando a valer também no Brasil a
e a lei penal é para os pobres. partir dessa data.
A orientação discriminatória pode ser Aplicam-se às crianças e aos adolescentes a
encontrada nas Ordenações do Reino e no Código maioria dos dispositivos legais que garantem
Penal do Império e foi mantida no período direitos às pessoas adultas, na legislação, sendo
republicano, sendo seus símbolos maiores os apenas limitadas, em alguns casos, as formas de
códigos de Menores de 1927 e de 1979, sob a égide exercer esses direitos, que necessitam da
da doutrina da situação irregular. intervenção de um adulto como responsável. As
Na década de 1980, com a redemocratização, normas específicas concentram-se no Estatuto da
no entanto, em aproximadamente três anos houve Criança e do Adolescente.
uma mudança radical da estrutura jurídica Nas últimas duas décadas, ocorreram poucas
aplicável à infância no Brasil. A Constituição de mudanças profundas na legislação brasileira. Novas
1988 incluiu dois artigos específicos sobre a leis surgidas no período serviram, em geral, para
proteção da infância, o 227 e o 228. O caput do regulamentar e para pôr em prática determinados

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
Artigo 227 é praticamente uma declaração de princípios contidos na Constituição e no ECA ou
direitos e de adoção da doutrina da proteção fazer correções de pequena monta, embora a
integral como fundamento da legislação brasileira: possibilidade de retrocesso não possa ser
Art. 227 – É dever da família, da sociedade totalmente afastada.
e do Estado assegurar à criança e ao Na legislação do trabalho, a Constituição
adolescente, com absoluta prioridade, o Federal foi alterada pela emenda nº 20, ampliando
direito à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao lazer, à profissionalização, à
a idade mínima para o trabalho de 14 para 16 anos
cultura, à dignidade, ao respeito, à e, para o aprendiz, de 12 para 14 anos. Após o Brasil
liberdade e à convivência familiar e subscreveu as Convenções 138 e 182, da OIT, sobre a
comunitária, além de colocá-los a salvo de idade mínima para o trabalho e o combate às piores
toda forma de negligência, discriminação,
formas de trabalho infantil, respectivamente.
exploração, violência, crueldade e
opressão. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)
permanece vigente na sua maior parte, mas foi
Após a aprovação da nova constituição, ampliada a possibilidade de participação de
promulgada em 05 de outubro de 1988, passou-se à entidades não governamentais sem fins lucrativos
discussão das constituições estaduais e das leis na manutenção de programas de aprendizado,
orgânicas municipais. Em muitas, foram também desfazendo o monopólio do sistema S, pela lei
incluídos dispositivos específicos sobre a infância. 10.097/00.
Em 13 de julho de 1990, foi sancionado pelo
Presidente da República, sem vetos, o Estatuto da No campo penal, permanece vigendo o
Criança e do Adolescente (ECA), Lei nº 8069/90, que Código Penal de 1940; as mudanças de sua parte 015
geral não afetam diretamente as crianças e os definição do artigo 2º, que diferencia crianças como
adolescentes, devido ao dispositivo do artigo 228 da sendo os sujeitos com até 12 anos incompletos e
Constituição. O ECA foi alterado para o adolescentes como os sujeitos entre 12 anos
agravamento de penas e para a criação de novos completos e 18 anos incompletos.
tipos penais de crimes de adultos contra crianças, Essa distinção não existia no Código de
em especial, pelas leis nº 10764/03 e nº 11.829/08. Menores, nem estava presente na Convenção da
Em relação às disposições civis, entrou em ONU sobre os direitos da Criança. Em ambos os
vigor, em 2002, um novo código civil que substituiu casos, o critério é a aplicação para menores de 18
o de 1916. Em aspectos relativos à guarda, tutela e anos.
adoção, o Código manteve, embora detalhando O maior efeito do dispositivo está no
mais, os mesmos princípios encontrados no ECA. tratamento a ser dado no caso de ato infracional,
Antes disso, em 1999, o Brasil já havia subscrito a em que se distingue o procedimento e as
Convenção Relativa à Proteção de Crianças e a consequências de acordo com a faixa etária. Dessa
Cooperação em Matéria de Adoção Internacional forma, retomou-se parcialmente um modelo
Convenção das Nações Unidas. presente no Código Penal de 1890, distinguindo uma
Como grande mudança, foi diminuída a idade inimputabilidade absoluta e uma responsabilização
para a maioridade civil, que passou a ser 18 anos, por procedimento especial. Esse tema será
unificando no Brasil a maioridade civil, penal e retomado adiante quando da discussão do ato
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

trabalhista. infracional.
Por outro lado, o parágrafo único do artigo 2º
amplia excepcionalmente a aplicação do Estatuto
Os direitos no Estatuto da Criança e do para a faixa etária entre 18 e 21 anos. Esta
Adolescente disposição serve para permitir a aplicação de
O Estatuto da Criança e do Adolescente medida socioeducativa para maiores de 18 anos que
adotou uma estrutura assemelhada à da cometeram o ato infracional antes desta idade.
Constituição Federal, iniciando pelos dispositivos Os artigos 3º a 6º, claramente inspirados no
que descrevem os direitos e as garantias atribuídos texto constitucional, dão a característica
às crianças e aos adolescentes. preambular a esse título já que tem caráter
O ECA é dividido em dois livros: parte geral e claramente programático, dispondo sobre
parte especial, subdivididos em títulos, capítulos e princípios gerais que devem ser utilizados na
sessões. A parte geral dispõe sobre os direitos e a interpretação desta e de outras leis, mas sem a
parte especial, sobre a política de atendimento, presença de mecanismos concretos para sua
procedimentos judiciais e tipificação de infrações exibilidade.
administrativas e crimes contra a infância. É o caso do artigo 4º, que praticamente
O título I da parte geral é constituído de reproduz o caput do Art. 227 da Constituição
disposições gerais que apresentam princípios e Federal.
Art. 4º É dever da família, da comunidade,
dispositivos que reproduzem, em parte, o texto
da sociedade em geral e do poder público

016 constitucional, funcionando como um preâmbulo.


Um dos aspectos importantes deste título é o da
assegurar, com absoluta prioridade, a
efetivação dos direitos referentes à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao assistência religiosa do jovem privado de liberdade.
esporte, ao lazer, à profissionalização, à Essa é uma diferença marcante entre uma lei
cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e
que via as crianças e os adolescentes como menores
comunitária. incapazes, sujeitos à tutela do Estado e outra que os
O título II dispõe sobre os direitos trata como sujeitos de direitos com peculiaridades
fundamentais, dividindo-se em capítulos que por estarem em processo de desenvolvimento.
agrupam disposições, sem que seja possível Classificando os dispositivos quanto à
identificar um critério claro de distinção em natureza dos direitos reconhecidos, a maior parte
relação à sua natureza, pois há capítulos que dos dispositivos se enquadra na categoria de
envolvem direitos civis junto a direitos sociais. direitos sociais, que, embora possam ser exercidos
Aparentemente, a divisão relaciona-se mais com a individualmente, são previstos para a coletividade.
estrutura de políticas públicas destinada à sua Esse é o caso dos capítulos I, IV e V do Titulo II.
efetivação. O nome dos capítulos praticamente Essa prioridade dada à definição dos direitos,
reproduz a enunciação de direitos presente na no entanto, não pode ser interpretada como
Constituição e no Art. 4º do ECA. isenção total de responsabilidade pelos seus atos.
Dessa forma, sucedem-se os capítulos Grande parte do Livro II do Estatuto é destinada à
referentes aos direitos: (I) à vida e à saúde; (II) à definição de procedimentos e competências das
liberdade ao respeito e à dignidade; (III) à autoridades na responsabilização de crianças e

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
convivência familiar e comunitária; (IV) à adolescentes no caso de cometimento de atos
educação, ao esporte e ao lazer e (V) à infracionais.
profissionalização e à proteção do trabalho.
O título III, que trata da Prevenção, dispõe A proteção, promoção e defesa dos
sobre normas referentes ao acesso de crianças e direitos da criança e do adolescente no ECA
adolescentes a espetáculos, publicações, produtos O Estatuto da Criança e do Adolescente abre
perigosos e também sobre a autorização para viajar. seu Livro II – a parte especial –, com as disposições
Reproduz, com algumas modificações, disposições referentes à política de atendimento,
que já existiam no Código de Menores de 1979. apresentando diretrizes gerais e normas para o
Parece deslocado, inclusive porque inclui funcionamento das entidades de atendimento.
atribuições da autoridade judiciária. Seu conteúdo As diretrizes gerais são inspiradas no capítulo
está mais relacionado com o Livro II do que com o da Ordem Social da Constituição Federal, embora
livro I do Estatuto. com maior detalhamento. Estão presentes, por
Praticamente todo o primeiro livro do exemplo, a diretriz de municipalização do
Estatuto, até o artigo 69 e incluindo o artigo 71, é atendimento e a hierarquização entre políticas
destinado à disposição sobre os direitos de crianças sociais básicas, de caráter universal, políticas e
e adolescentes. Não é muito, se for considerado que programas de assistência, de caráter supletivo e
a lei tem 265 artigos e essa parte compõe menos de serviços especializados para situações específicas
25% do total. Mas é imensamente maior do que o de ameaça ou violação de direitos.
Código de Menores de 1979, cujo único artigo que
dispunha sobre direitos era o relativo ao direito à
Dos artigos 204 e 227 da Constituição vem o
fundamento para a previsão da criação dos 017
Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente, Adolescente, que ocorrem periodicamente, como
nas três esferas administrativas, como órgãos mecanismo de avaliação, debate e orientação sobre
responsáveis pela deliberação e pelo controle das as políticas.
políticas públicas na área da infância, nos quais é Dentro do espírito da doutrina da proteção
assegurada a partilha de poder entre a integral, o ECA prevê uma série de direitos cuja
representação pública e de organizações sociais. provisão é responsabilidade da família, da
Vinculados aos conselhos devem existir Fundos dos comunidade, da sociedade e do Estado. Entretanto,
Direitos da Criança e do Adolescente. tendo em vista que não vivemos em um mundo
O Estatuto também deu aos Conselhos ideal, nem sempre esses direitos são garantidos em
Municipais uma competência administrativa de alta sua integralidade, por diversas circunstâncias.
responsabilidade: a inscrição de programas de Com esse fundamento, o Estatuto substitui o
organizações governamentais e não antigo conceito de situação irregular pelos
governamentais e o registro de organizações não conceitos de ameaça ou violação de direitos,
governamentais para seu funcionamento regular. circunstâncias em que devem ser aplicadas medidas
Essa competência é exclusiva da esfera municipal, de proteção. O artigo 98 prevê três motivações para
independentemente da abrangência da entidade de a ameaça ou violação de direitos: ação ou omissão
atendimento, que pode ser estadual ou federal. Por da sociedade ou do Estado, falta, omissão ou abuso
isso, uma organização pertencente ao poder dos pais ou, ainda, em razão da própria conduta.
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

público estadual deve inscrever seus programas em O artigo 101, em seus incisos, elenca uma
cada um dos municípios onde possua unidades em série de medidas de proteção, que podem ser
funcionamento. aplicadas de forma isolada ou cumulativa, de
A inscrição e o registro permitem aos acordo com as necessidades de cada caso.
conselhos definir os parâmetros mínimos a serem Há duas autoridades públicas encarregadas
exigidos para os programas de atendimento que da aplicação de medidas de proteção. Em regra, a
funcionam em sua esfera de competência, podendo sua aplicação é da competência do conselho
limitar o funcionamento de programas ou entidades tutelar, o que ocorre em relação às duas primeiras
que não atendam a esses requisitos. situações previstas no artigo 101 tanto para
Uma vez aceitos o registro e a inscrição, o crianças quanto para adolescentes.
Conselho deve informá-los ao Conselho Tutelar e ao No caso do inciso III – em razão de sua conduta
Ministério Público, que são responsáveis pela – é necessário diferenciar as situações em que a
fiscalização de seu funcionamento. Porém isso não conduta está tipificada como crime ou
limita os poderes de controle do Conselho de contravenção penal. Nesta situação, a competência
Direitos, que podem acompanhar o funcionamento do atendimento da criança é do conselho tutelar,
das entidades, exigindo o cumprimento de suas mas a competência do atendimento do adolescente
normativas. em relação ao ato infracional é do Poder Judiciário.
Além das disposições específicas dos Embora o Estatuto seja da criança e do
conselhos, outras formas de articulação e discussão adolescente, ele prevê, para algumas situações,
da política de atendimento foram desenvolvidas. medidas aplicáveis a adultos. Esse é o caso das
018 Uma delas são as Conferências da Criança e do medidas aplicáveis aos pais ou responsáveis,
previstas no artigo 129. Várias dessas medidas são Civil, Penal e de Processo Penal. As medidas
semelhantes às de proteção ou de complemento aplicadas judicialmente podem ter caráter civil,
desta. As do inciso I ao VII são da competência do sancionatório ou administrativo.
conselho tutelar e as do VIII ao X, da autoridade Os tipos de procedimento que envolvem
judiciária. processo judicial são os que se relacionam à
As medidas dos incisos I a IV, do artigo 129, convivência familiar, guarda, tutela e adoção; ao
aparentemente se destinam a enfrentar possíveis ato infracional e às medidas socioeducativas; à
causas da ameaça aos direitos da criança, aplicação de penas e sanções administrativas e às
provocadas pelo comportamento dos pais. Os falhas de oferta de serviços e à ação civil pública.
incisos V e VI são o complemento necessário à Os principais atores nos procedimentos
execução de algumas medidas de proteção que judiciais previstos no ECA são o Poder Judiciário, o
necessitam da intervenção do responsável legal Ministério Público e os advogados, seja de forma
pela criança ou adolescente. particular, seja por meio da Defensoria Pública. Em
Os incisos VIII a X correspondem a medidas a alguns casos, há a possibilidade de intervenção do
serem tomadas pela autoridade judiciária como Conselho Tutelar.
parte de possível encaminhamento para a família
substituta. Essas medidas têm um caráter
parcialmente sancionatório, já que levam à As políticas públicas e o atendimento

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
restrição de direitos, mas seu caráter é civil. aos direitos da infância
O Conselho Tutelar foi proposto como parte Para que os direitos garantidos nas leis sejam
de dois objetivos fundamentais do Estatuto: vivenciados na prática é preciso que haja o
desjudicializar o tratamento de questões sociais, funcionamento de um conjunto de políticas
retirando-as da alçada do Poder Judiciário e públicas destinadas a promover o acesso das
ampliar o comprometimento da comunidade com a crianças, adolescentes e suas famílias aos serviços
proteção e a promoção dos direitos da criança e do necessários à sua garantia.
adolescente. Essas políticas estão organizadas em áreas
O resultado foi a previsão de um órgão não como saúde, educação, assistência social, trabalho
jurisdicional com campo de atuação na esfera e geração de renda, que possuem suas próprias
municipal. O Conselho Tutelar tem caráter normativas e estruturas institucionais.
permanente, mas seus membros têm um mandato A Constituição Federal de 1988 traz diretrizes
de três anos, que deve ser renovado de universalização de acesso e municipalização do
periodicamente, com limitações para o tempo de atendimento das políticas sociais, que deveriam
permanência, de dois mandatos consecutivos. estar acessíveis no próprio local de moradia das
Em alguns casos, a aplicação do ECA exige a pessoas.
manifestação da autoridade judiciária. Para isso, a Esses princípios foram regulados por leis
lei dispõe sobre os procedimentos e as especiais em cada área, como a Lei Orgânica da
competências dos atores que deles participam. Saúde, Lei nº 8080/90, que regula o funcionamento
Esses dispositivos são complementados pelas leis
mais gerais, como os Códigos Civil, de Processo
do sistema único de saúde (SUS), a Lei de Diretrizes
e Bases da Educação (LDB), Lei nº 9394/96, que 019
regula o funcionamento dos estabelecimentos de fiscais, como a isenção de contribuições para a
ensino, a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) seguridade social. Para serem consideradas
Lei nº 8.742/93, que regula os programas de entidades beneficentes de assistência social, as
Assistência Social. Há casos em que a legislação é instituições têm de seguir uma série de requisitos,
anterior à Constituição, tendo se adaptado a ela, previstos na LOAS, entre os quais não remunerar
como a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), dirigentes e destinar a maior parte de seus recursos
que é de 1943 e regula as relações de trabalho para a prestação de serviços gratuitos.
assalariado e a aprendizagem profissional. As instituições sem fins lucrativos executam
Essas leis são complementadas por outras programas com o apoio de doações de apoiadores e
formas de regulamentação, como as resoluções de associados ou por financiamento mediante
Conselhos de Controle de Políticas Públicas nas convênios com o poder público. Mas, mesmo que
respectivas áreas. Os Conselhos Nacionais e não recebam verbas públicas, a maior parte das
Estaduais criam normas gerais, cabendo aos atividades de atendimento à criança e ao
municiais, em geral, a definição de requisitos para o adolescente são reguladas por leis e resoluções,
funcionamento de instituições e programas de exigindo, para seu funcionamento, a manutenção
atendimento públicos e privados. de requisitos dispostos pela legislação e pelas
Em muitos casos, os serviços públicos resoluções dos conselhos. Estes podem ter
executados pela administração direta e indireta são variações entre os Estados e entre os Municípios,
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

complementados pela atuação de instituições nos aspectos que estes têm liberdade para
privadas sem fins lucrativos. Embora seja comum regulamentar os dispositivos gerais nacionais.
chamá-las de Organizações Não Governamentais, A criação ou manutenção de um programa de
ou ONGs, este é um termo impreciso, que pouco atendimento à criança e ao adolescente exige,
informa sobre as características da instituição, portanto, um conhecimento básico de todo este
afora o fato de que não faz parte do Estado. sistema complexo, desde a definição dos direitos,
Essas organizações, em geral, constituem-se passando pelas normas de funcionamento civis,
sob a forma de associações civis ou fundações. Uma tributárias e administrativas aplicadas às entidades
associação é uma reunião de pessoas, que, pela de atendimento. Ainda que essas normas tenham se
aprovação de um estatuto de colaboração comum, mantido relativamente estáveis ao longo do tempo,
constituem uma pessoa jurídica. Uma fundação é tendem a exigir uma constante atualização de
uma forma de pessoa jurídica de direito privado na cadastros e documentos para que seja mantida a
qual um instituidor destina um patrimônio a um sua regularidade legal.
determinado fim, nomeando pessoa para
executarem essa vontade.
As instituições de educação ou assistência
social sem fins lucrativos são isentas de impostos,
de acordo com o Artigo 150, Inciso IV, letra “d” da
Constituição Federal.
Algumas instituições, devido à natureza de
020 seu trabalho, podem obter outros benefícios
REFERÊNCIAS
Referências na Internet
ABMP. Associação Brasileira de Magistrados, Promotores de Justiça e Defensores Públicos da Infância e da Juventude.
http://www.abmp.org.br/
CIESPI. Centro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância http://www.ciespi.org.br/
REBIDIA. Rede Brasileira de Informação e Documentação sobre Infância e Adolescência. http://www.rebidia.org.br/
SICON - Sistema de Informações do Congresso Nacional http://www6.senado.gov.br/sicon/

Referências bibliográficas
CURY, Munir. SILVA, Antonio. F. A. & MENDEZ, Emílio. G. (Orgs.). Estatuto da criança e do adolescente comentado. São
Paulo: Malheiros, 1992.
GONZÁLEZ. Rodrigo Stumpf. Saiba como dizer não à violência. Orientações para a defesa dos direitos da criança e do
adolescente. Porto Alegre, MNMMR, 1994.
LIBERATI, Wilson Donizeti e CYRINO, Públio Caio Bessa. Conselhos e Fundos no Estatuto da Criança e do Adolescente.
São Paulo, Malheiros, 1993.
MENDEZ, Emílio Garcia e COSTA, Antônio Carlos Gomes da. Das Necessidades aos Direitos. São Paulo, Malheiros,
1992.
OLIVEIRA, Oris de. O Trabalho da Criança e do Adolescente. São Paulo, LTr, 1994.
PEREIRA, Tânia da Silva. Direito da Criança e do Adolescente – uma proposta interdisciplinar, 1996.
PILOTTI, Francisco RIZZINI, Irene. A arte de governar crianças: a história das políticas sociais, da legislação e da

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
assistência à infância no Brasil. Rio de Janeiro, Editora da Universidade Santa Úrsula. 1995.
RIZZINI, Irene A criança no Brasil hoje. Rio de Janeiro; Editora da Universidade Santa Úrsula ; 1993.

021
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

022
Controle social: o papel dos Conselhos de Direito e
Fóruns Municipais na garantia e ampliação de
recursos para execução de políticas sociais

Léa Maria Ferraro Biasi¹

O tema proposto remete ao debate sobre o não suficientes. Novas formas do exercício de
desempenho e as possibilidades de os Conselhos de participação política foram criadas como as
Direitos e os Fóruns Municipais exercerem o práticas conselhistas, a audiência pública, o
controle social. Eles possuem instrumentos e plebiscito, a tribuna popular, com vistas a
mecanismos que possibilitem a programação e a possibilitar à sociedade civil um maior controle
deliberação de recursos financeiros previstos para sobre os governantes.

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
execução das políticas sociais? Contrapondo-se à lógica da
A realidade demonstra que os recursos centralização, da ausência de participação da
financeiros estão aquém do necessário à execução sociedade, instâncias de controle social têm sido
dos programas e serviços de políticas sociais, criadas e encontram seu fundamento legal na
Constituição Federal e nas Legislações Específicas
tornando-se demanda constante, de modo
Complementares, como a Lei Orgânica da
especial, nos âmbitos municipal e estadual. Este
Assistência Social – LOAS, o Estatuto da Criança e do
artigo propõe uma reflexão sobre questões que Adolescente – ECA, o Sistema Único de Saúde – SUS,
interferem no exercício do controle social e que o Estatuto do Idoso – EI, entre outras políticas
desafiam os Conselhos e Fóruns na efetivação das sociais públicas.
políticas públicas. Se nos anos 1980, o Brasil vivia um
processo democratizante, no plano internacional,
A Caminhada ocorria o oposto, como explicita Raichelis (2000,
p.41),
Enquanto no Brasil estávamos aprovando
A proposta de criação dos Conselhos está uma Constituição que incorpora
diretamente vinculada ao processo de mecanismos democratizadores e
democratização do Brasil, na década de 1980, uma descentralizadores das políticas sociais,
vez que as formas clássicas de participação da que amplia direitos sociais, fortalecendo a
responsabilidade social do Estado, os
população – votar e ser votado – foram consideradas
modelos de Estado Social entram em crise

¹Assistente Social, Mestre em Serviço Social. 023


no plano internacional, tanto os Estados de no Brasil.
Bem-Estar Social quanto o Estado A existência de Conselhos na sociedade
Socialista. E deste processo emerge uma
brasileira não é algo novo, o que pode ser
crise mais ampla, que desemboca no
chamado projeto neoliberal e nas comprovado pela farta literatura (GOHN, TATAGIBA,
propostas de redução do estado e do seu DAGNINO, LUCHMANN, TEIXEIRA). Porém, é a partir
papel social. Isto vai ter um impacto muito da Constituição que os Conselhos, “passam a fazer
grande na nossa experiência de parte de uma nova institucionalidade, inserindo-se
democratização das políticas sociais.
dentro do arcabouço político jurídico brasileiro”
(NAHRA, 2006, p4).
Nesse cenário, militantes e trabalhadores
Teixeira (2000.p.103), destaca que o
sociais se organizam para conquistar o
processo de formação dos Conselhos,
reconhecimento de políticas sociais como direitos se insere num movimento maior de
do cidadão, como dever do Estado, bem como a constituição de uma esfera pública, que
criação de instâncias de participação e de controle poderia ser melhor caracterizada como
social. esfera ampliada, uma vez que é uma
extensão do Estado até a sociedade através
Embora a Carta Magna tenha incorporado, há da representação desta regida por critérios
23 anos, a diretriz da descentralização político- diferenciados da representação
administrativa, da participação popular e da parlamentar ou mesmo sindical.
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

implantação de Sistemas Únicos de Gestão, com o


objetivo de possibilitar à sociedade civil o exercício Tatagiba e Teixeira (2007, p.62 -63), ao
do controle social sobre o Estado, as práticas analisarem o desenho institucional de cada
conselhistas brasileiras refletem dois movimentos conselho, apresentam uma definição geral:
Os conselhos gestores são instituições
contraditórios: o processo de construção de participativas permanentes, definidas
espaços participativos, democráticos e a legalmente como parte da estrutura do
continuidade da tradição autoritária, da lógica Estado, cuja função é incidir sobre as
privatista e do assistencialismo. políticas públicas em áreas específicas,
produzindo decisões (que algumas vezes
Do ponto de vista histórico da sociedade
podem assumir a forma de norma estatal) e
brasileira, o tempo de existência de práticas que contam em sua composição com a
conselhistas é relativamente pequeno se for participação de representantes do Estado e
comparado com as práticas autoritárias e da sociedade na condição de membros com
igual direito à voz e voto.
clientelistas que marcaram e ainda marcam nosso
Brasil. Segundo Pontual (2008, p.8),
Neste contexto a criação relativamente Nahra (2006), Teixeira (2000), Tatagiba e
recente de diversos canais institucionais Teixeira (2007) explicitam que os conselhos
de participação popular nas políticas gestores são criados por legislação específica,
públicas, dentre os quais os conselhos são fazem parte da estrutura do Estado, têm caráter
os de maior expressão numérica e obrigatório para o repasse de recursos federais e
capilaridade social, deve ser vista, como constituem-se em espaços nos quais o governo e a
parte do longo e complexo processo de sociedade civil se encontram para debater e
024 construção da democracia e da cidadania
deliberar sobre determinada política social.
Cada Conselho apresenta uma caminhada sociedade civil na afirmação de sua autonomia e
própria, fases de desenvolvimento e de independência em relação ao Estado. Visam a
funcionamento diferenciado. Segundo Pontual valorizar, fortalecer e publicizar o trabalho
(2008, p.10), efetivado pela Política Social ao qual possuem
Os estudos sobre os conselhos de saúde, vínculo, além de serem espaços de apoio, de
criança e adolescente, assistência social e orientação e de respaldos aos representantes da
habitação, publicados em 2007 pelo sociedade civil que participam das instâncias de
Observatório, mostraram que tais controle social.
conselhos se encontram em diferentes
Os fóruns se constituem em espaços de
estágios de desenvolvimento e
debates na elaboração de propostas,
consolidação. Pode-se observar que, nas
políticas, ações e serviços a partir das
diferentes gestões de um mesmo conselho,
demandas dos movimentos sociais; em
percebem-se variações no que se refere à
instâncias políticas de articulação e
capacidade de incidir sobre as políticas, a
pressão nas negociações com os Poderes
forma de diálogo com o Estado, a dinâmica
Executivo e Legislativo; em espaços
participativa, a relação com outros atores
privilegiados de formação de lideranças e
políticos etc., sem que qualquer alteração
de avaliação da prática e compromisso dos
no seu padrão institucional tenha sido
conselheiros. (COLIN apud SILVA, 1994,
verificada.
p.30)

Embora os estudos tenham sido publicados Espaços coletivos que articulam e congregam

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
em 2007, o seu conteúdo permanece atual, pois entidades sociais, movimentos e redes para
explicita as tensões permanentes no efetivação de uma política social, os Fóruns apoiam
funcionamento das instâncias colegiadas. e fortalecem os representantes da sociedade civil
A dinâmica dos Conselhos demonstra nas instâncias colegiadas visando à defesa, à
que conflitos de interesse permeiam a
promoção e à ampliação de direitos sociais.
representação dos diversos segmentos, mas,
mesmo assim, podem ser espaços de discussão e De acordo com Caty (2011), os fóruns são
elaboração de propostas, como destaca Teixeira autênticos espaços de controle social, ou seja, de
(1996, p.7), controle específico dos cidadãos organizados sobre
não são espaços neutros, imunes a a máquina de governo.
conflitos, contradições e manipulações,
mas podem constituir-se em instrumentos
abertos ao debate público, às proposições
de estratégias para efetivar direitos já Controle Social
conquistados ou a construir.
Quando se fala em controle social,
Simultaneamente à constituição dos identificam-se dois atores, os cidadãos e as
Conselhos, têm sido criados Fóruns, coordenados organizações da sociedade civil, aos quais cabe
pela sociedade civil de caráter permanente, vigiar o cumprimento dos atos do Estado. Na
espaços públicos legítimos de representação, de Constituição Federal de 1988, o artigo 1º, § Único, e
participação, de mobilização e de protagonismo no o artigo 204 são bases legais que explicitam o
processo de conquista e de defesa de direitos. princípio da soberania popular e a diretriz da
Os Fóruns são um esforço coletivo da participação dos cidadãos organizados com vistas 025
ao controle social sobre o Estado. – PPA, à Lei Orçamentária Anual – LOA e à Lei de
A participação do cidadão, na gestão pública, Diretrizes Orçamentárias – LDO, uma vez que órgãos
é uma ferramenta de fortalecimento da cidadania e governamentais defendem que a elaboração, a
um complemento indispensável ao controle aprovação, a execução e o controle são de
institucional exercido pelos órgãos fiscalizadores competência exclusiva dos poderes Executivo e
(CGU, 2008). Ainda segundo a Controladoria Geral Legislativo.
da União (2008, p.16), “o controle social pode ser Em reuniões de Conselhos, são feitas citações
entendido como a participação do cidadão na frequentes da frase: “ao conselho cabe apreciar o
gestão pública, na fiscalização, no monitoramento orçamento e não deliberar, pois o Legislativo tem
e no controle das ações da Administração Pública”. esse poder”.
A participação não é algo natural, não é Santos (2005, p.108) destaca que
criada ou outorgada por lei; não basta somente infelizmente, a maioria dos Conselhos
Municipais não consegue interferir nas
participar de reuniões e comissões; ela exige
políticas de programação e na execução
direção política, construção coletiva, pois implica orçamentária. Afirmar o caráter
disputa de poder. Demo (2001, p. 20) afirma que deliberativo dos Conselhos implica garantir
“[...] participação não é ausência, superação, que a sociedade participe da elaboração,
eliminação do poder, mas outra forma de poder”. do acompanhamento e da aprovação das
contas dos governos, principalmente
O exercício do controle social pelos públicas.
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

Conselhos na implantação de serviços e programas


e, principalmente, na elaboração e execução do
É essencial analisar as condições que a
orçamento, continua a ser um desafio para os que
militam e trabalham nas políticas sociais, pois é sociedade civil tem para o exercício do poder de
vigente, em diferentes esferas de governo, a deliberação, de modo especial, em relação à
concepção de controle social do Estado sobre a questão orçamentária. A ausência de
sociedade. De acordo com Raichelis (2000, p.43), transparência, a linguagem tecnicista agregada ao
O que incomoda os governos na questão dos pouco preparo de parcela da sociedade civil sobre
Conselhos não é a sua existência, mas
as questões orçamentárias contribuem para que a
exatamente a natureza das suas
atribuições, o fato de terem um caráter discussão sobre a previsão e a execução
deliberativo garantido legalmente, pois os orçamentária não ocorram, ou que ocorram, mas
procedimentos são muitas vezes mais sem um maior aprofundamento nos Conselhos.
demorados e abertos ao debate e conflitos Todos que participam da construção de
de posições por terem que passar pela
aprovação dos Conselhos. Os recursos do espaços coletivos necessitam refletir sobre o
orçamento e os fundos de financiamento quanto interferem na efetivação das políticas
para as áreas da Assistência Social, da públicas, pois segundo Correia (2003, p.71),
Saúde, da Criança e Adolescente são O 'controle social' envolve a capacidade
obrigatoriamente submetidos à aprovação que os movimentos sociais organizados na
dos conselhos. sociedade civil têm de interferir na gestão
pública, orientando as ações do Estado e os
A análise de Raichelis (2000) explicita as gastos estatais na direção dos interesses da
026 dificuldades que os representantes da sociedade
civil encontram para ter acesso ao Plano Plurianual
maioria da população. Consequentemente,
implica o 'controle social' sobre o fundo
público. determinado assunto, ficam constrangidos e não
fazem nenhuma indagação ou observação.
Em algumas instâncias colegiadas, as Em outras ocasiões, quando representantes
questões orçamentárias são remetidas, num da sociedade civil têm conhecimento teórico e/ou
primeiro momento, para análise da comissão de prático sobre o orçamento e apresentam
finanças a qual, na maioria das vezes, é priorizada questionamentos, representantes governamentais
pelo governo. Embora as Comissões devam ter demonstram impaciência, descaso; além disso,
composição paritária, verifica-se a presença de um alegam que as perguntas “atrasam e atrapalham a
maior número de representantes governamentais reunião”. Teixeira (2002, p.34) diz que:
com objetivo de “garantir” a indicação de parecer (...) o realismo elitista, ao negar a
favorável à Plenária do Conselho. competência do cidadão comum, nega
aspectos considerados centrais no conceito
Tatagiba e Teixeira (2007, p.64), ao
de democracia: autodeterminação,
analisarem os processos de deliberação de um participação, igualdade política, influência
conselho, manifestam que: da opinião pública sobre a tomada de
Enquanto o conceito de decisão remete ao decisão.
resultado de um processo que envolve a
eleição ou escolha entre alternativas, a Assim, conhecer o Processo Orçamentário e o
noção de deliberação diz respeito à
qualidade do processo que leva à decisão. Ciclo Orçamentário permite saber qual a direção

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
O conceito de deliberação remete a um política, os compromissos e as prioridades de um
processo decisório que é precedido de um governo. É preciso que os representantes da
debate bem informado acerca das sociedade civil saibam diferenciar os dois
alternativas postas à definição dos
problemas e às formas de intervenção.
conceitos, pois comumente causam confusão.
O orçamento público não se reduz a uma peça
Em função de sua dinâmica e composição, financeira, burocrática; ele retrata uma
muitas vezes, os representantes da sociedade civil articulação necessariamente política; indica quais
decidem mais pela persuasão do governo em setores ou grupos da sociedade serão beneficiados.
demonstrar que “as contas fecham” e “que tudo Em outras palavras, o orçamento é uma peça
está de acordo” do que pela compreensão das política, um instrumento que identifica as
razões da aplicação ou não de recurso financeiro em prioridades de um governo em razão do volume de
determinado serviço ou programação. recursos financeiros alocados, bem como reflete a
Um dos aspectos correntes no processo relação de forças na sociedade civil e a quem os
deliberativo é o da tendência de o gestor reduzir a parlamentares eleitos estão representando.
paridade a uma questão meramente numérica, A sociedade civil tem o direito e o dever de
“esquecendo” que ela abrange, também, a participar da elaboração dos seguintes
paridade do conhecimento, do acesso à instrumentos de planejamento do Estado (CGU,
informação. Assim, muitos conselheiros da 2008, p.18):
(...) o PPA (Plano Plurianual) faz o
sociedade civil, por não desejarem demonstrar
planejamento das políticas públicas e
desconhecimento ou falta de informação sobre programas de governo para o período de 04
anos (...). A LDO (Lei de Diretrizes 027
Orçamentárias) orienta ano a ano como responde a uma exigência legal.
essas políticas e programas devem ser Balcão e Teixeira (2003.p.18) deixam claro
realizados e a LOA (Lei Orçamentária
Anual) aloca os recursos necessários
que
anualmente para a concretização das Pa r a q u e h a j a t r a n s p a r ê n c i a n a
metas estabelecidas. administração pública, o poder Executivo
deve dar ampla publicidade para alguns
instrumentos básicos de gestão
O conhecimento da receita, da despesa e do orçamentária. Isso significa publicá-los em
montante de recursos alocados nos Fundos dos meios que sejam de fato acessíveis ao
Conselhos são conteúdos (além de outros) que público.
devem compor a Lei Orçamentária Anual,
fundamentais para o exercício do controle social Os Fundos Especiais reúnem recursos
sobre a questão orçamentária. financeiros para ações de sua área de atuação,
É fundamental a participação ativa dos centralizando os recursos financeiros numa unidade
representantes da sociedade civil; assim, podem orçamentária, o que, em tese, facilita o controle
verificar se o conteúdo dos planos de cada política social. Todavia, quando a totalidade dos recursos de
social, em cada esfera de governo, consta no PPA e determinada política social não está alocada
LOA. somente na Unidade Orçamentária – Fundo, mas
Balcão e Teixeira (2003, p.12) deixam claro também em outras unidades orçamentárias, os
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

que Conselhos têm de analisar o conjunto dos


Sempre que o movimento social reivindica documentos.
verbas para determinada ação, ou exige do Outro aspecto é que o Fundo, ao permitir a
Estado investimentos em áreas, programas
ou equipamentos sociais, está disputando
captação de recursos provenientes da iniciativa
uma parcela dos recursos públicos que são privada, pode provocar uma desresponsabilização
geridos pelo poder público. O atendimento do poder público na destinação de um volume maior
efetivo a essas reivindicações implica, de recursos. Igualmente, o direcionamento dos
primeiro, na destinação de recursos no
recursos de empresas, para determinada ação de
orçamento para atendê-las e, depois, na
aplicação real desses recursos. seu interesse, retira a importância do poder de
planejamento e de decisão dos Conselhos sobre o
São responsabilidades dos Conselhos a Fundo.
orientação, o controle e o monitoramento do Magalhães, Teixeira e Teixeira (2004, p.7)
Orçamento dos Fundos Municipais, Estaduais e também salientam que,
muitas vezes, o pouco recurso disponível
Nacional, os quais devem estar previstos na coloca as entidades sociais, operadores da
proposta da LOA. política pública, em uma situação de
Questão que deve ser objeto de competição e faz com que Conselhos se
reivindicação dos Conselhos e Fóruns é a da transformem em espaços de loteamento
do dinheiro público e os conselheiros não
publicização das peças orçamentárias em
efetivem suas atribuições no
instrumentos de fácil acesso dos conselheiros. É planejamento da política e no
comum os governantes alegarem que a publicação acompanhamento da execução.
028 no Diário Oficial apresenta um custo menor e que
O Conselho e as instâncias de poder parlamentares, visando a apresentar propostas ou
alterações com vistas à defesa e à efetivação da
Como já foi citado em tópico anterior, a respectiva política social. A iniciativa do Legislativo
relação entre o Poder Executivo e o Conselho é, em em convidar o Conselho para participar de alguma
muitos momentos, permeada por tensão, pois há reunião com objetivo de ouvir suas demandas ou
dificuldade de o governo aceitar que a política, o propostas é pequena, limitada a alguns momentos.
orçamento, os serviços e programas tenham que ser
submetidos a um processo de discussão, de Considerações
deliberação de uma instância composta de
representantes da sociedade civil. No período de mais de 20 anos, várias
Muitas vezes, os governantes discursam sobre conquistas foram alcançadas, por meio da luta dos
a importância da colaboração da sociedade civil, cidadãos brasileiros, dos Conselhos de Direito e dos
mas Silva, Medeiros, Fonseca, Pestano (2008, Fóruns. Para criar e implantar instâncias de
p.262), ao analisarem a dinâmica dos conselhos no controle social, os desafios enfrentados pela
que se refere à postura de alguns governantes, sociedade civil exigem muita energia diante da
destacam que: c u l t u r a d o f a v o r, d o a u t o r i t a r i s m o e d o
... em alguns casos, segundo respostas patrimonialismo vigentes na sociedade brasileira.
dadas por conselheiros da sociedade civil,
Mesmo que considerados por alguns

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
percebe-se uma atuação persuasiva ou
coercitiva por parte de alguns gestores em estudiosos como uma “instituição híbrida”, os
relação aos conselhos. Desta forma, pode- Conselhos têm desempenhado o papel de
se perceber que há, também, gestores que democratizar o Estado, de constituir-se num espaço
exercem o controle sobre os conselhos, o de interlocução com a sociedade civil, em que esta
que produz uma atuação conselhista
atrelada e pautada por uma participação pode expor suas proposições e posições.
passiva e não propositiva, ficando limitada Simultaneamente, por ser parte da
apenas a discussões e opiniões sobre instituição estatal, os Conselhos possuem
projetos apresentados pelo executivo. autonomia limitada, restrita em relação à
elaboração e ao controle de políticas e recursos
Pode-se constatar, também, que o perfil do orçamentários. Dessa forma, o avanço das políticas
Conselho se modifica de acordo com as trocas de sociais depende da mobilização e da participação
comando político dos governos, pois o padrão de ativa das entidades sociais, dos movimentos sociais
gestão se altera e expressa-se no maior ou menor e da representação da sociedade civil nos
compromisso com a democratização da gestão respectivos Conselhos.
pública. O apoio de Fóruns municipais, estaduais e
Do lado da sociedade civil, a unidade, o grau nacional aos conselheiros da sociedade civil é
de engajamento e a qualidade da representação são fundamental para aumentar a autonomia e o poder
variáveis importantes no processo de intervenção de negociação com o Estado. Ao congregarem
nos Conselhos. entidades da sociedade civil com trajetória de
Quanto ao Poder Legislativo, a iniciativa tem militância político-técnica, os Fóruns tornam-se
sido da sociedade civil em contatar com os referências pelo grau de unidade, de pressão e de 029
força política de seus membros. linguagem e com termos técnicos, a articulação nos
A existência de Fóruns com ampla conselhos setoriais, a participação e o
representação e participação social e política não acompanhamento do Ciclo e do Processo
institucionalizados são mecanismos dinamizadores Orçamentário, a busca de acesso à informação e a
e ativadores dos Conselhos no sentido de garantir participação em processos de formação com vistas
que estes possam ganhar maior representatividade à qualificação da representatividade.
e legitimidade social. (Raichelis, 2000). Não se deve superestimar o papel dos
Assim, a efetivação de políticas sociais Conselhos e dos Fóruns, pois, enquanto espaços de
depende da intervenção da sociedade civil nos luta, de negociação e articulação, são repletos de
Conselhos e dos Fóruns, sendo estes espaços de limitações e ambiguidades. Embora com obstáculos
apoio, de estímulo à participação popular na gestão de ordem política e funcional, os Conselhos são
pública e de sustentação da sociedade civil nas importantes instrumentos de democratização do
instâncias colegiadas. Estado e contribuem para uma nova cultura do
A sociedade civil deve desenvolver sentido de público, desafiando a sociedade civil à
mecanismos de controle social, tais como: o participação e ao exercício da cidadania com vistas
aprendizado coletivo, a familiarização com a ao controle do Estado.
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

REFERÊNCIAS
BALCÃO, Nilde; TEIXEIRA, Ana Claudia (Org.). Controle social do orçamento público. São Paulo, Instituto Pólis, 2003.
CGU. Controle Social. Programa Olho Vivo no Dinheiro Público. Controladoria Geral da União, Brasília, DF, 2008.
COLIN citado por Silva, Marcia Santos. O Conselho Municipal de Assistência Social da Cidade de São Paulo. Instituto
Pólis /PUC – São Paulo, 2002.
CORREIA, Maria Valéria Costa. Que Controle Social? Os conselhos de saúde como instrumento. 1ª Reimpressão. Rio
de Janeiro: Fiocruz, 2003.
DEMO, Pedro. Participação é conquista. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2001.
GOHN, Maria da Glória. Conselhos gestores na política social urbana e participação popular. Cadernos Metrópole/
Grupo de Pesquisa PRONEX,
7ª edição. São Paulo: EDUC, 2002.
NAHRA, Clicia Maria Leite. Os Conselhos Municipais Gestores de Políticas Públicas em Porto Alegre. Um Panorama.
Prefeitura Municipal de Porto Alegre, Secretaria Municipal de Coordenação Política e Governança Local ' Projeto:
Conselhos Municipais – Potencializando a Gestão Participativa. Porto Alegre: 2006. Disponível Http://
www.obervapoa.com.br. Acessado em 21/11/2011
PONTUAL, Pedro. Desafios à construção da democracia participativa no Brasil: a prática dos conselhos de gestão das
políticas públicas. Nº. 14, volume 12, Coleção Cadernos do Centro de Assessoria e Estudos Urbanos, Porto Alegre/RS:
CIDADE, 2008.
RAICHELIS, Raquel. “Os Conselhos de gestão no contexto internacional” in: Conselhos Gestores de Políticas Públicas.
Revista Pólis, nº 37, São Paulo: 2000.
..............Democratizar a Gestão das Políticas Sociais – Um Desafio a Ser Enfrentado pela Sociedade Civil. Serviço
Social e Saúde: Formação e Trabalho Profissional. Disponível no http://www.fnepas.org.br. Acessado em 11/2011.
SANTOS, Mauro Rego Monteiro. Como Exercer o Controle Social sobre o Orçamento. Cadernos Metrópole n. 7, FASE –
IPPUR/UFRJ. Rio de Janeiro: FASE, 2002.

030 SILVA, Vini Rabassa et al. Controle social no Sistema Único de Assistência Social: propostas, concepções e desafios.
Textos &Contextos, Vol. 7, Nº 2, Porto Alegre: PUCRS, 2008.
TATAGIBA, Luciana e Teixeira, Ana Claudia Chaves. O papel do CMDCA na Política de Criança Adolescente em São
Paulo. (Cadernos do Observatório, 28) São Paulo: Pólis/PUC-SP, 2007.
TATAGIBA, Luciana e Teixeira, Ana Claudia Chaves. O papel do CMS na Política de Saúde em São Paulo. (Cadernos do
Observatório, 29). São Paulo: Pólis/PUC-SP, 2000.
TEIXEIRA, Elenaldo Celso. “Conselhos de Políticas públicas: efetivamenteuma nova institucionalidade participativa?”
In: Conselhos Gestores de Políticas Públicas Revista Pólis, nº 37, São Paulo, 2000.
.......................Movimentos Sociais e Conselhos.Cadernos ABONG nº 15. São Paulo, 1996.
.......................O local e o global: limites e desafios da participação cidadã. 3. Ed. São Paulo: Cortez, 2002.

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
031
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

032
A gestão como estratégia técnica e
política no âmbito das políticas públicas
Ana Lúcia Suárez Maciel¹

INTRODUÇÃO pela Fundação Irmão José Otão (FIJO) em parceria


A questão da gestão é um tema fundamental com as instâncias do controle social da referida
para as organizações, para a intervenção dos cidade (CMDCA e o FDMCA).
profissionais que nelas atuam e para o
desenvolvimento de projetos institucionais que O processo de gestão e a sua dimensão
venham a se constituir em um diferencial de técnica e política

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
qualidade que seja capaz de promover mudanças na
realidade na qual ela incide. Nesse sentido, Etimologicamente, o termo gestão
partimos do pressuposto de que a gestão abarca provém do latim gerere e significa gerir,
desde a definição do posicionamento estratégico da administrar, dirigir, reger, entre outros. Assim,
organização até a avaliação de impacto dos podemos afirmar que a gestão engloba a técnica, a
ciência e a aptidão necessária ao bom
projetos institucionais.
funcionamento de uma organização, mas não
A temática da gestão se constitui, cada vez
somente isso. Gestão, segundo Prates (2006:39),
mais, em um requisito fundamental para a significa também um
perenidade das organizações e em uma exigência Processo que articula forma e conteúdo,
para a qualificação na prestação de serviços que se pensamento e ação na condução de ações
queiram atribuir como públicos no sentido lato do e/ou organizações com determinados fins,
de acordo com determinados interesses de
termo, ou seja, de interesse da coletividade. Para indivíduos, grupos, organizações ou
dar conta dessa reflexão, o texto que ora classes.
apresentamos discorre sobre os desafios da gestão e
faz referência à pesquisa intitulada “Avaliação de A gestão se concretiza, ainda, segundo a
recursos materiais e humanos: identificação dos autora referida, a partir de uma visão de homem,
custos dos programas sociais e da educação infantil de sociedade e de finalidade.
de Porto Alegre/RS”, desenvolvida no ano de 2011, Portanto, a gestão é uma forma de agir,

¹Doutora em Serviço Social (PUCRS); Professora e Pesquisadora da Faculdade de Serviço Social da PUCRS (Cursos de Graduação e
Pós-Graduação); Vice-Presidente da Diretoria Executiva da Fundação Irmão José Otão – FIJO. E-Mail: ana.suarez@pucrs.br. 033
inspirada por uma maneira de mentalizar o mundo, planejamento é conduzido, mas é inegável que é
que se orienta, basicamente, em duas perspectivas: por meio dele que se direciona a ação; identifica-se
1) instrumental e técnica, centrada no como gerir a forma como as mudanças devem ocorrer,
e no uso da técnica da gestão como uma reduzindo, ao máximo, o impacto negativo que,
ferramenta; 2) crítica, centrada na reflexão acerca porventura, elas venham causar, permitindo a
do para quê, para quem e por que gerir, com ênfase avaliação prévia dos riscos, mas também, das
no processo e no produto do planejamento. Com oportunidades que elas podem trazer para o
essa perspectiva teórica, gostaríamos de ressaltar contexto em que serão implementadas.
aos leitores que a gestão não pode ser vista somente As organizações são estruturas institucionais
como uma ferramenta técnica, embora seus que agrupam pessoas, portanto, conhecimento e
instrumentos o sejam, mas essencialmente como interesse, associados a recursos materiais e
uma ferramenta política, pois a tomada de decisão financeiros, objetivando produzir bens e/ou
dos gestores e a implementação de políticas, serviços com uma determinada direção,
programas ou projetos supõem uma forma de normalmente, declarada na missão e visão
responder a uma determinada demanda, por isso institucional. Ao analisarmos a forma como as
expressa uma intencionalidade política. organizações atuam, a partir dos serviços que
Nesse sentido, cabe questionar: e quando a executam, podemos identificar, notadamente, o
gestão é aplicada no âmbito social? Trata-se de uma modelo de gestão que utilizam. Até mesmo aquelas
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

simples sobreposição de ferramentas de gestão no que não possuem um planejamento “formal”, que
campo social ou de uma expressão da tensão e da se materializa em documentos (planos, programas
disputa por um projeto societário de e/ou projetos), possuem alguma forma de
desenvolvimento? Para responder a essa questão, é organizar a sua ação. Evidentemente que, nessas
preciso refletir acerca da concepção de gestão últimas, o resultado das suas ações deverá ter
social, pois, para alguns, ela é vista como um mero impacto reduzido ou poderá ser obra do acaso, o
sistema gerencial; para outros, como um processo que não se espera de nenhuma organização, mesmo
social. Neste artigo, partimos do princípio de que das que atuam na área social, pois todas elas estão
estamos atuando no campo das políticas públicas, incidindo nas demandas da sociedade,
com a perspectiva de que a gestão é um processo consequentemente, com grande responsabilidade
social, pois responde às demandas dos cidadãos e para com as pessoas que utilizam as suas estruturas.
considera, nesse sentido, o social como um fim para
o desenvolvimento societário. Um dos maiores desafios das organizações é a
sua sustentabilidade a médio e longo prazo. Na
tentativa de vencer esse desafio, as organizações
Conceito de gestão social têm buscado, ao longo dos últimos anos,
alternativas de geração de renda, de diversificação
Evidentemente precisamos reconhecer que de fontes de recursos e de desenvolvimento de
os sistemas de gestão variam conforme o tipo de novos produtos e serviços. No entanto, precisamos
organização e os objetivos a serem atingidos. Boa reconhecer que, para realizar mudanças sociais e
034 parte deles depende da forma como o deflagrar impacto social nos territórios em que
atuam, elas necessitam de habilidades técnicas e desenvolvida pela organização.
conhecimento profundo da realidade social para Na natureza da conformação das
alcançar a sua sustentabilidade, ou seja, precisam organizações sociais está o compromisso com os fins
tanto de inovação e criatividade quanto de públicos, o que demarca a identidade dessas
profissionalização para desenvolverem as ações a organizações. Logo, elas são “o espaço onde as
que se propõem. pessoas empregam suas competências, para
Ao recorrermos ao Dicionário Aurélio, o realizar, com a utilização de diversos recursos, as
termo profissionalização significa “dar o caráter de atividades que concretizam a finalidade de cada
coisa profissional a (...)” designando profissão empreendimento” (FISCHER, 2004, p.77). Assim,
como “atividade ou ocupação especializada e que um dos desafios da gestão nas organizações sociais é
supõe determinado preparo”, ou ainda, “meio de o de conseguir com que as diversas pessoas da
subsistência remunerado resultante de um organização compreendam e, especialmente,
trabalho, de um ofício”. Entretanto, a tradução da comprometam-se com a missão e com os objetivos
expressão profissionalização em organizações estabelecidos, buscando a sua realização, e
sociais tem sido tratada como parte do modelo de utilizando, para isso, “seus conhecimentos,
gestão adotado que vai incidir no seu inteligência, energia e dedicação” (FISCHER, 2004,
desenvolvimento institucional e na sua p.77).
sustentabilidade, no que diz respeito ao alcance da Também a profissionalização tem sido uma

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
sua missão. exigência posta em função das parcerias firmadas
A reflexão sobre a profissionalização no não somente com as empresas, mas,
referido setor também diz respeito às fundamentalmente, com a esfera estatal. Não há
competências, aos conhecimentos, às habilidades e como negar que as Normas Operacionais Básicas de
às atitudes das pessoas que atuam na busca dos Recursos Humanos – NOB/RH das políticas públicas
objetivos propostos pelas organizações com fins do campo da assistência social, da saúde ou, ainda,
públicos. “Todos os empreendimentos humanos em da educação, citando essas como exemplos, vêm,
todas as épocas, sempre dependeram da de alguma forma, influenciando a
capacidade de trabalho das pessoas e da eficiência profissionalização no setor, uma vez que, para
em organizá-los para atingir os objetivos firmar determinadas parcerias e convênios, a
estabelecidos” (FISCHER, 2004, p.77). Essa organização deverá ter um quadro técnico
“capacidade de trabalhar” necessita, em específico para desenvolver determinados
determinadas situações e momentos, de programas e projetos sociais, a fim de atender as
conhecimentos específicos pertinentes a uma demandas da organização.
determinada profissão, permitindo a concretização Nesse sentido, no próximo item, trataremos
da eficiência, o que vai além do espírito solidário de problematizar alguns resultados da pesquisa
presente na conformação das organizações sem fins apresentada neste livro, com o objetivo de
lucrativos. A concretização da eficiência está identificar nexos entre os dados que emergiram
relacionada com o grau de resolutividade dos dessa pesquisa e os apontamentos feitos acerca do
serviços prestados e com o atendimento das processo de gestão.
necessidades sociais dos beneficiados com a ação 035
A realidade da gestão no âmbito das avaliação dos operadores é de que os recursos são
políticas públicas: a pesquisa em debate insuficientes, como essas organizações estão
garantindo um atendimento de qualidade? Se
A fim de problematizar alguns dos resultados recebem recursos públicos, são parceiras do Estado
decorrentes da pesquisa “Avaliação de recursos na execução da política pública; por conseguinte,
materiais e humanos: identificação dos custos dos refletem um modelo de gestão pública que, pelos
programas sociais e da educação infantil de Porto dados informados, não atende à demanda dos
Alegre/RS”, na sua interface com a gestão das cidadãos, comprometendo a qualidade do serviço
políticas públicas, lançaremos mão de alguns dos prestado. Lembramos que esse serviço se propõe a
dados que nela são apresentados.. incidir na demanda de milhares de crianças e
Iniciamos destacando o item financiamento adolescentes, que são públicos prioritários das
das organizações pesquisadas e as diferentes políticas públicas, o que, portanto, traduz a forma
origens dos recursos mobilizados, pois a pesquisa precária como esse serviço vem se efetivando na
aponta que 33 (56%) entidades possuem recursos realidade municipal, independentemente de ser
próprios; 25 (42%) recebem doações de pessoas operado por organizações conveniadas.
jurídicas – direto; 29 (49%), doações pessoas de Reportando-nos ao custo médio despendido
pessoas jurídicas – via FUNCRIANÇA; 31 (52%), pelas entidades, constatamos, na totalidade dos
doações de pessoas físicas – direto; 17 (29%), sete programas pesquisados, que o maior custo é
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

doações de pessoas físicas – via FUNCRIANÇA; 26 com recursos humanos e com os seus respectivos
(44%), contribuição dos pais na Educação Infantil; 9 encargos. Esse dado não é novidade para quem tem
(15%), 54 (91%), recursos públicos municipais; 15 familiaridade com a elaboração de orçamentos,
(25%), recursos públicos federais; 4 (7%) mobilizam pois a maior parte deles se destina ao pagamento
recursos internacionais; 34 (57%) recebem doação dessa rubrica.
do banco de alimentos; 32 (54%), doação do Cruzando esse dado com o quadro 2 (página
Programa Mesa Brasil e 9 (15%) obtêm recursos de 25 do relatório da pesquisa), observamos a
diversas fontes. Com base nesses dados, prevalência de profissionais de nível superior e
constatamos a dependência das fontes de médio, o que é altamente positivo, pois evidencia
financiamento externas para a sustentabilidade que o atendimento das demandas das crianças e
financeira das organizações e a prevalência de adolescentes vem sendo feito por profissionais com
recursos públicos para a execução de suas habilitação para tal. Também se destaca o número
atividades. significativo de profissionais com nível de formação
Acerca dos recursos repassados pela restrito ao ensino fundamental, o que pode
Prefeitura de Porto Alegre aos programas, comprometer a execução qualificada do trabalho.
observamos, na tabela 8 (página 30), a avaliação Chama-nos a atenção, igualmente, o alto
dos pesquisados que declaram a insuficiência número de voluntários envolvidos com os referidos
desses recursos em seis dos sete programas. Nesse programas, o que pode gerar descomprometimento
sentido, cabe fazermos o seguinte questionamento: com as organizações ou altos índices de
se a sustentabilidade desses programas tem como rotatividade. Entretanto, reconhecemos que esse
036 principal fomentador o gestor público e se a tipo de profissional, conforme os dados da
pesquisa, possui um nível de formação que oscila os custos médios e a disponibilidade de material
entre o superior e o técnico, o que pode garantir um permanente e de consumo para o desenvolvimento
atendimento qualificado, mesmo que eles não dos programas pesquisados, constatamos o quanto
recebam remuneração pelo desenvolvimento das a gestão dessas organizações pode estar
atividades que, espera-se, sejam no ramo de comprometida, pois há uma defasagem
conhecimento do voluntário. significativa entre a demanda e a possibilidade de
Pe n s a m o s q u e o d a d o r e f e r e n t e à atendê-la de forma qualificada.
disponibilidade de material permanente para a
execução do trabalho das entidades também
merece destaque, pois 61% das organizações indica Conclusão
que esses materiais são insuficientes, bem como o
dado acerca da disponibilidade de material de A pesquisa trazida a público com este livro e a
consumo, com 64% dos respondentes afirmando breve reflexão empreendida neste texto sinaliza
serem insuficientes. Ora, sabemos que a execução que a gestão dos programas pesquisados pode ter
das atividades cotidianas depende sua efetividade comprometida, dada a defasagem
significativamente dos recursos materiais e de do orçamento destinado para a execução das
consumo e, com os dados informados, torna-se atividades, e revela uma opção política do gestor
muito difícil reconhecermos que um serviço de público, já que o orçamento é um dos itens que

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
qualidade possa ser ofertado apenas com os compõem a tomada de decisão no atendimento de
recursos humanos. Assim, reiteramos que seja uma determinada demanda da sociedade. Não é,
ampliado o orçamento desses materiais, o que portanto, apenas uma questão técnica (que se
garantirá uma melhoria nas condições de trabalho sustenta na existência do recurso financeiro), mas
dessas organizações, revertendo na garantia de da vontade política em priorizar esses programas na
atendimento qualificado ao público-alvo. . condução da política pública municipal.
O orçamento de uma organização é uma das
ferramentas fundamentais da sua gestão, pois A gestão, nessa perspectiva, requer um forte
expressa a forma como o plano, os programas, os compromisso com a missão institucional e com a
projetos e as atividades serão viabilizados, além de natureza das organizações que, sendo públicas,
ser um instrumento de planejamento e controle que precisam estruturar a sua atuação com base no
permite avaliar os resultados entre o previsto e o planejamento (de todos os seus processos) e no
realizado. É um instrumento de natureza compromisso com o desenvolvimento mais amplo
econômica, elaborado com o objetivo de prever da sociedade.
determinadas quantias que serão necessárias para o Complementando, enfatizamos a
alcance de determinados fins. É um conjunto necessidade de que haja, na gestão das
sistemático, ordenado e classificado das despesas organizações públicas, transparência no
previstas e das receitas projetadas para cobrir as cumprimento da responsabilidade da organização
despesas. em prestar contas perante os diversos públicos com
Ao analisarmos a origem dos recursos, os os quais elas interagem, bem como a garantia da
recursos repassados pelo Poder Público Municipal, qualidade de serviço que se expressa pela exigência 037
do uso eficiente dos recursos; pensamos ser planejamento, no desenvolvimento das pessoas que
imprescindível a avaliação adequada do que deve nelas atuam e em recursos materiais e
ser priorizado, em função dos recursos disponíveis, permanentes, rompendo com a visão idealista que
das necessidades dos cidadãos e das alternativas se ancora na máxima de que a existência de uma
existentes. A sustentabilidade, entendida como a causa é o suficiente. Até o momento, as
competência em perpetuar a organização e organizações pesquisadas têm superado,
permitir o alcance dos seus objetivos, deve ser certamente, um conjunto de dificuldades para
perseguida, assim como a capacidade de permanecerem prestando o atendimento ao seu
articulação institucional expressa pela formação de público-alvo, mas, se a realidade do seu
alianças, de parcerias e de redes. financiamento permanecer como está, dificilmente
A pesquisa, nesse sentido, é uma forma elas poderão dar continuidade ao atendimento.
promissora de revelar informações que, Reconhecerem que essa é a sua realidade parece
comumente, são de acesso exclusivo dos entes mais ser o primeiro passo para enfrentá-la e, para que
diretamente envolvidos com uma determinada possam superá-la, urge que haja vontade política, o
realidade. Por isso, é preciso brindar os resultados que se expressa pela feliz iniciativa das instâncias
desta pesquisa, mesmo que eles não sejam do controle social. Resta-nos aguardar pela
promissores, pois, a partir deles, esperamos que resposta do poder público, a partir dos resultados
gestores, instâncias de controle social, da pesquisa e das reflexões dos profissionais que se
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

organizações e sociedade possam rever prioridades propuseram a problematizá-los, com o desejo de


no atendimento das crianças e dos adolescentes da que eles possam ser revertidos e que as
nossa cidade. organizações possam ter condições dignas para
Por fim, afirmamos que a gestão requer que continuar o atendimento de forma qualificada e
as organizações assumam que, para atingir a sua comprometida com uma gestão pública que atenda
missão institucional, devem investir no aos interesses da coletividade.

REFERÊNCIAS
CARVALHO, Maria do Carmo. Gestão social: alguns apontamentos para o debate. In: RICO, Elizabeth de Melo &
RAICHELIS, Raquel (orgs.). Gestão Social: uma questão em debate. SP: EDUC, 1999.
FISCHER, Rosa Mª. Gestão de Pessoas nas Organizações do Terceiro Setor. In: VOLTOLINI, Ricardo. Terceiro Setor:
planejamento e gestão. São Paulo: Editora SENAC, 2004.
FUNDAÇÃO IRMÃO JOSÉ OTÃO/Observatório do Terceiro Setor. Relatório da Pesquisa “Avaliação de Recursos Materiais
e Humanos: Identificação dos custos dos programas sociais e da Educação Infantil de Porto Alegre/RS”. Porto Alegre:
2011 (Disponível em: http://www.fijo.org.br/docs/Relatorio_Final_Avaliacao_Recursos.pdf)
PRATES, Jane. Gestão como processo social. In: Mendes, Prates e Aguinsky (Orgs.). Capacitação sobre PNAS e SUAS:
no caminho da implantação. POA: EDIPUCRS, 2006.
WANDERLEY, Luiz Eduardo. Enigmas do Social In: Bógus, Yasbek e Wanderley (Orgs). Desigualdade e a questão social.
2. ed. SP: EDUC, 2000.

038
Proteção à Infância e à Adolescência:
fragmentos de uma realidade da política
de assistência social
Rosa Maria Castilhos Fernandes¹
Maria da Glória de Paula²

A estruturação e o redesenho institucional da serviços socioassistenciais voltados para esse ciclo


política de assistência social no Brasil têm sido de vida, requerem modelos de gestão
objeto de mobilizações e esforços contínuos nos comprometidos com a premissa da proteção social.
últimos anos. A materialização desses esforços se Isso significa considerar a construção coletiva de
dá, por um lado, pelas conquistas legais e um desenho institucional, abrangendo diferentes
institucionais e, por outro, pela ampliação do atores sociais, envolvendo-os com um modo de

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
conjunto de programas, projetos, benefícios, gestão da política de assistência social que seja
serviços e transferências de renda, dirigidos, capaz de priorizar a implementação de ações e
fundamentalmente, à população que se encontra investimentos (financeiros, organizacionais e de
em situação de vulnerabilidade social e violação de relação público-privado) compatíveis com as
direitos (IPEA,2011). Como consequência dos exigências das necessidades sociais postas no
caminhos trilhados, a política de assistência social contexto da rede socioassistencial. Desta rede,
rompe com o status assistencialista para incorporar além da esfera governamental, fazem parte as
a perspectiva socioassistencial, condição para a sua entidades vinculadas à esfera pública não
efetivação como direito social. governamental; estas, por meio de convênios e
É nesse cenário que a proteção à infância e à parcerias, têm se destacado na operacionalização
adolescência se constitui em um dos maiores dos serviços e programas socioassistenciais, o que
desafios no processo de consolidação da política de caracteriza um modelo de gestão das políticas
assistência social, em tempos de implementação do públicas que requer vigilância e reflexão crítica
Sistema Único de Assistência Social (SUAS) em todo permanentes sob pena de assistirmos à
território nacional. A implementação de políticas desresponsabilização do Estado para com a
públicas que assegurem garantia dos direitos das efetividade das políticas de proteção social.
crianças e dos adolescentes, e, nesta reflexão, os De fato, essas parcerias firmadas entre o

¹Doutora em Serviço Social. Docente do Mestrado de Memória Social e Bens Culturais e do Mestrado em Educação da UNILASALLE.
Coordenadora da Pesquisa pela FIJO, 2011.
²Mestranda em Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul –PUCRS. 039
Estado e as entidades não governamentais, Aprendiz, incluindo, neste contexto, a atenção às
reconhecidas como típicas de assistência social, crianças e aos adolescentes com deficiência.
destacam-se na gestão da política na cidade de Além dessa reflexão introdutória, este artigo
Porto Alegre e isso tem sido acompanhado pelos discorre sobre as mudanças institucionais e legais
conselhos e fóruns locais. em transição no âmbito da Política Nacional de
Destes espaços democráticos de Assistência Social com foco na configuração dos
fortalecimento de participação e controle social serviços e programas de proteção social às crianças
das políticas de proteção social às crianças e aos e aos adolescentes. Agrega-se, nesta reflexão, o
adolescentes, emergem movimentos e contínuas desenho institucional vigente na gestão municipal
reivindicações em prol da garantia dos direitos das da cidade de Porto Alegre, com destaque para a
crianças e dos adolescentes. Destacam-se, por análise de alguns dados extraídos da pesquisa que
exemplo, as iniciativas em defesa da qualidade dos permitem uma aproximação com o cenário local e,
serviços prestados em parceria com o município, fundamentalmente, com a avaliação dos gestores
tendo este último a primazia da condução da das entidades pesquisadas sobre os recursos
política de assistência social. O Fórum Municipal humanos e materiais necessários para efetivação da
dos Direitos da Criança e do Adolescente (FMDCA) e defesa dos direitos das crianças e adolescentes.
o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do
Adolescente (CMDCA) da cidade de Porto Alegre, 1. Tópicos sobre os serviços de proteção à
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

protagonistas quanto à iniciativa de deflagrar um criança e ao adolescente


processo investigatório de avaliação e de Considerando o artigo 227 da Constituição
identificação dos recursos humanos e dos recursos Federal de 1988, a Lei Orgânica de Assistência
materiais dos programas sociais, desenvolvidos Social (LOAS) aponta a criança e o adolescente
pelas entidades da chamada rede conveniada, da como público-alvo de suas ações de proteção e
qual fazem parte as entidades da esfera não amparo (LOAS, art. 2º, inc. I e II). Em atenção às
governamental, marcam o processo sócio-histórico deliberações da VI Conferência Nacional de
do controle social democrático local. Assistência Social e do Plano Decenal de Assistência
Ao reconhecer a dimensão desta iniciativa, Social que assinalavam como meta o
de realização de uma pesquisa, é condição a estabelecimento de bases de padronização
socialização dos dados e a análise destes. Para nacional dos serviços e equipamentos físicos do
tanto, o recorte para esta reflexão refere-se aos SUAS, em 2009, foi aprovada a Resolução nº 109 do
programas operacionalizados no âmbito da Política Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), a
de Assistência Social, voltados para o atendimento qual padroniza os serviços socioassistenciais no
das crianças e dos adolescentes inseridos nos Brasil³.
serviços e programas, até então denominados: Com a finalidade de garantir a qualidade,
Serviço de Apoio Socioeducativo (SASE), Programa continuidade e permanência dos serviços de
Trabalho Educativo (TE), Acolhimento Institucional, proteção social, a Resolução apresenta orientações
Programa Ação Rua, Programa Adolescente gerais referentes aos objetivos, às condições, à

040 ³Resolução do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) nº 109, de 27 de novembro de 2009.
infraestrutura, à frequência e aos resultados das educação infantil e tampouco trata de um espaço
ações a serem desenvolvidas. No entanto, não se de cuidado de crianças; esse serviço aponta para
fecha à criatividade dos agentes/instituições, às uma nova proposta, a qual prevê um espaço de
especificidades de cada região/população e às atendimento simultâneo e interativo de crianças,
necessidades particulares dos sujeitos atendidos. de seus familiares, bem como de nutrizes. Realiza
Desse modo, as ações de proteção social à criança e variadas atividades com o objetivo de contribuir
ao adolescente, no âmbito da assistência social, para o desenvolvimento saudável da primeira
concretizam-se por meio de serviços específicos, infância; para o fortalecimento de vínculos
divididos conforme as duas modalidades de familiares, socioafetivos; da função protetiva; é
proteção: proteção social básica e proteção social também um trabalho preventivo à ocorrência de
especial. Para dar conta dos diferentes programas situações de risco pessoal e social, entre outros. As
de proteção, faz-se referência às orientações da atividades têm duração aproximada de 1h30min
Resolução do CNAS (Resolução nº 109); entretanto, (CNAS, 2009).
considera-se a nomenclatura utilizada, até então, Re f e r e n t e a o S C F V p a r a c r i a n ç a s e
na cidade de Porto Alegre. adolescentes de 06 a 15 anos ou SASE, como tem
De acordo com a Resolução nº 109 do CNAS, sido denominado em Porto Alegre, trata-se de um
dentre os serviços de proteção social básica, espaço de proteção social, o qual realiza
destinados a crianças e adolescentes, encontra-se o atendimento a crianças e adolescentes em situação

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
Serviço de Convivência e Fortalecimento de de vulnerabilidade e risco social, bem como faz o
Vínculos (SCFV), cuja distribuição e organização acompanhamento deles. Está voltado,
acontecem por faixa etária, considerando o ciclo de prioritariamente, às famílias com ocorrência de
vida dos participantes: SCFV para crianças de 0 a 06 situação de trabalho infantil. Neste caso,
anos, SCFV para crianças e adolescentes de 06 a 15 apresenta-se, também, como uma ação
anos e SCFV para adolescentes e jovens de 15 a 17 complementar à proposta de acompanhamento
anos. Até então 4, esses serviços eram denominados sociofamiliar. As atividades acontecem em dias
Serviço de Atendimento Socioeducativo (SASE) e úteis, em turno inverso ao da escola, durante todo o
Trabalho Educativo (TE), nomenclaturas estas que, ano, sem interrupção. São oferecidas oficinas
aos poucos, foram sendo extintas, assim como as lúdico-pedagógicas, esportivas, artísticas,
dos demais serviços. Embora a Resolução nº 109 culturais, atividades de lazer, interação com outros
apresente descrição específica de cada um dos grupos, visitas e alimentação.
serviços, destacamos alguns aspectos que nos Quanto ao SCFV para adolescentes e jovens
parecem relevantes. de 15 a 17 anos, antigo Trabalho Educativo (TE),
No que se refere ao SCFV de 0 a 6 anos, a entre seus objetivos está o de contribuir para o
proposta de atendimento não se confunde com a da desenvolvimento de habilidades e competências

4É importante destacar que todas as instituições de assistência social, públicas e privadas de todo o país têm prazo até 30/04/2012

para reordenar suas ações conforme a LOAS e Resolução nº109. Para que tais ações sejam reconhecidas como de Assistência Social,
no pedido de inscrição, no relatório anual, no plano de atividades e nos demais documentos a serem apresentados ao CMAS devem
constar a identificação e descrição dos serviços socioassistenciais de acordo com a tipificação nacional (Resolução nº 109). Tal
orientação justifica adoção da nomenclatura dos citados programas e serviços nesse artigo. 041
básicas voltadas para o mundo do trabalho, além de certos serviços e programas sociais, os quais não
orientações sobre direitos humanos e cidadania. sempre estão adaptados para atender a todos de
Para tanto, são realizadas diversas oficinas: modo equitativo; pela ruptura e fragilização dos
padaria, confeitaria, informática, teatro, vínculos familiares e comunitários; pela
reciclagem de computadores, conserto de precarização e/ou escassez dos próprios serviços;
bicicletas, jogos cooperativos, debates, reflexões e pela fragilidade da rede de atendimento no
outras atividades socioculturais. O atendimento acolhimento destas crianças e adolescentes; pela
acontece em dias úteis, em turno inverso ao da inadequação das propostas de trabalho à realidade
escola. Assim como o SCFV de 06 a 15 anos, as ações da população atendida, entre outros fatores. De
desse serviço são desenvolvidas em Centros de acordo com a Resolução, os SCFV devem incluir
Referência de Assistência Social (CRAS) e em também crianças e adolescentes com deficiência.
Organizações Não Governamentais; algumas No que diz respeito ao Programa Adolescente
destas últimas possuem convênio com o Poder Aprendiz, trata-se de um programa de
Público Municipal, por intermédio da Fundação de aprendizagem voltado para a “formação técnico-
Assistência Social e Cidadania (FASC). Conforme profissional, metódica de adolescentes na faixa
dados, em 2009, havia, em Porto Alegre, 342 vagas, etária de quatorze aos dezoito anos incompletos”. A
na rede própria, e 946 na rede conveniada 5. proposta engloba o nível básico de educação
De modo geral, o SCFV visa a atender e a profissional e educação não formal6 (Resolução nº
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

acompanhar a criança e o adolescente nas 084/2008/CMDCA, art. 2º e art. 3º) . Entre seus
diferentes etapas do seu processo de objetivos está o de contribuir para a promoção e
desenvolvimento, considerando o seu ciclo de vida. para a integração do adolescente ao mercado de
Entretanto, em função da complexidade e das trabalho, respeitada a Lei nº 10.097, de 19
diferentes situações vivenciadas pelas crianças e dez/2000. Neste programa, o adolescente
adolescentes, muitos deles interrompem o vínculo desenvolve atividade remunerada, em condição de
com esse sistema de proteção. O ideal seria que, aprendiz, em uma instituição empregatícia e
por exemplo, depois de finalizar o período no SCFV atividades de aprendizado teórico e
de 0 a 06, a criança fosse vinculada ao SCFV de 06 a acompanhamento em instituição de atendimento
15 anos, e, assim, sucessivamente. Há diferentes educacional ou socioassistencial. A carga horária e o
razões que podem ser identificadas, neste contexto plano pedagógico são previamente definidos, sem
de risco social, para o rompimento: pelo prejuízo das atividades escolares. A natureza do
envolvimento de jovens e crianças com o tráfico de programa atende também a um dos objetivos da
drogas; pelo fato de não atingirem uma assistência social, referente à promoção da
escolaridade ou desenvolvimento cognitivo que integração ao mundo do trabalho (LOAS, Lei nº
lhes dê condições de acompanhar as exigências de 8.742/dez, 1993, art. 2º inc. III).

5FUNDAÇÃO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E CIDADANIA/FASC. Projetos e Ações. Trabalho Educativo: preparação para o trabalho. Portal da
Prefeitura Municipal de Porto Alegre. Disponível em: http://www2.portoalegre.rs.gov.br/fasc/default.php?p_secao=86. Acesso em:

042 05/02/2012.
6Disponível em: http://www.portoalegre.rs.gov.br/cmdca/. Acesso em: 08/02/2012.
Os serviços de proteção social especial se judicial é contrária, caso em que se procura a
dividem em média e alta complexidade. No âmbito colocação em família substituta.
da média complexidade, está previsto o Serviço
Especializado de Abordagem Social, que se refere 2. O cenário dos programas sociais na rede
ao antigo Programa Ação Rua, o qual atende conveniada
também crianças e adolescentes. O trabalho realiza A produção de conhecimento e a significativa
abordagem e busca ativa, visando a identificar a bibliografia que vem sendo sistematizada no âmbito
ocorrência de trabalho infantil, exploração sexual e da política de assistência social, seja pela
situação de rua, entre outros. Como exemplo, de mobilização do Ministério de Desenvolvimento
acordo com o relatório de avaliação, apresentado Social e de Combate à Fome (MDS), seja pelos
na reunião da Comissão Regional de Assistência espaços acadêmicos, por meio de pesquisas ou
Social–CORAS/Partenon, pela equipe de abordagem pelas parcerias firmadas com os órgãos
social, no ano de 2009, foram abordadas em Porto governamentais 9 , é, sem dúvida, reveladora dos
Alegre, aproximadamente, 6.400 crianças e avanços nesse campo no cenário brasileiro.
adolescentes que utilizavam as ruas (espaços Entretanto, embora os desafios para
públicos) como forma de moradia e/ou de implementação do SUAS venham sendo tratados,
sobrevivência (CORAS, 2010)7 . não podemos negar a importância do trato sobre as
Dentre os serviços de proteção social questões relativas ao financiamento dos recursos

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
especial de alta complexidade são oferecidos o destinados à operacionalização dos programas
Serviço de Acolhimento Institucional e o Serviço de sociais, sejam eles em parceria com as entidades
Acolhimento em Família Acolhedora. Ambos os não governamentais ou não. No caso desta
serviços são organizados a partir dos princípios, pesquisa, trata-se de recursos repassados pelo
diretrizes e orientações do Estatuto da Criança e do gestor público governamental às entidades não
adolescente (ECA) e do documento nacional de governamentais por meio de parcerias e convênios
“Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para a execução dos serviços e programas citados
para Crianças e Adolescentes 8 ” . Interessa-nos, na primeira parte deste artigo.
neste artigo, o Serviço de Acolhimento O relatório da pesquisa sobre a “Avaliação
Institucional, o qual é desenvolvido em abrigo dos recursos materiais e humanos: identificação dos
institucional ou casa-lar. O acolhimento é de custos dos programas sociais e da educação infantil
caráter provisório e visa a preservar vínculos com a de Porto Alegre/RS”, realizada pelo FMDCA e pelo
família de origem, exceto quando a determinação CMDCA da cidade de Porto Alegre, revela dados

7 Informações socializadas pela equipe de abordagem social em reunião de avaliação da CORAS/Partenon. Ata de reunião
extraordinária de 11 de março de 2010. Porto Alegre, 2010.
8 O objetivo do documento é o de regulamentar, no território nacional, a organização e a oferta de Serviços de Acolhimento para

Crianças e Adolescentes, no âmbito da política de Assistência Social. Para maiores informações acessar:
http://www.mds.gov.br/cnas/noticias/cnas-e-conanda-orientacoes-tecnicas-servicos-de-acolhimento-para-criancas-e-adolescentes-1.
Trata-se de uma ação já prevista no Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à
Convivência Familiar e Comunitária.
9 Como exemplo ver em: MENDES, Jussara; PRATES, Jane; AGUINSKY, Beatriz. O Sistema Único de Assistência Social: entre a

fundamentação e o desafio da implantação. Porto Alegre: EDIPUCRS,2009. 043


acerca de aspectos quantitativos e qualitativos que em fase de execução, como o Programa
descrevem o cenário das entidades não Acolhimento Institucional (abrigagem), por
governamentais que desenvolvem serviços e exemplo. Essa questão dos espaços físicos é
programas sociais os quais fazem parte da política salientada, pois, para atender com qualidade a
de assistência social. Para tanto, são destacados demanda específica por 'institucionalização', sem
alguns tópicos do relatório final de pesquisa que prejuízo do direito ao convívio familiar e
desvelam a avaliação dos gestores sobre a situação comunitário, à privacidade, à moradia em
atual quanto à satisfação dos recursos municipais condições de habitabilidade e salubridade, entre
repassados às entidades. Todas as entidades que outros, as instituições devem dispor de estrutura
desenvolvem os programas sociais possuem adequada, conforme os propósitos de acolhimento
inscrição no Conselho Municipal de Assistência e o caráter socioeducativo do programa executado.
Social, assim como a Certificação de Entidades Nos Programas Adolescente Aprendiz, TE e
10
Beneficentes de Assistência Social – CEBAS, Ação Rua, destaca-se, entre os resultados, a
concedido às pessoas jurídicas de direito privado, necessidade de equipamentos como computadores
sem fins lucrativos, que prestem serviços nas áreas e acessórios de informática. Somente uma
de assistência social, saúde e/ou educação. entidade, entre as 59 participantes, respondeu ao
Um dos tópicos da pesquisa refere-se à questionário, afirmando que dispõe de todo
suficiência dos espaços físicos disponíveis na material necessário: “Dispomos de todos os
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

entidade. A partir das informações coletadas, materiais necessários” (Programa SASE). Outra
observamos que predomina a indicação de que tais entidade respondeu: “No momento não há
espaços são insuficientes para atender as demandas necessidade de aquisição de novos equipamentos.
dos Programas SASE, Trabalho Educativo e Ação Fazem-se necessários recursos para a manutenção
Rua¹¹, conforme resposta das instituições/gestores dos equipamentos existentes.” (Programa TE). Na
entrevistados: área de consumo, destaca-se a necessidade de
Reformar as salas e telhado, por questões aquisição dos seguintes alimentos: carnes de gado e
de goteiras. Aquisição de mais uma sala frango, citados pelos Programas SASE e TE (e
para a equipe. Adequar parte do espaço
para atendimento de pessoas com
Educação Infantil, embora não seja o foco deste
deficiência. Não são. O local que possuímos artigo).
hoje poderia ser reestruturado com o valor O Programa SASE apresenta, nos resultados,
que devolvemos para poupança (Programa a avaliação mais crítica em relação aos Recursos
Ação Rua).
Humanos, pois 100% entidades¹² respondentes
citam a necessidade de contratação de um maior
Nos resultados, são indicadas necessidades
número de funcionários para o atendimento da
de melhorias no espaço físico; algumas obras estão
demanda atual. Nesse programa, foram citados,
10 Lei nº 12.101, de 27 de novembro de 2009, e o Decreto nº 7.237, de 20 de julho de 2010. Disponível em: www.planalto.gov.br.
11 Para análise dos dados, utilizaremos a nomenclatura sob a qual se executou a pesquisa. No entanto, destacamos que, a partir da
Resolução nº 109 do CNAS, tais programas foram reordenados e caracterizados, respectivamente, como Serviço de Convivência e
Fortalecimento de Vínculos para crianças e adolescentes de 06 a 15 anos; Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos para

044 adolescentes e jovens de 15 a 17 anos e Serviço Especializado de Abordagem Social, conforme já mencionado neste artigo.
12 Isto é, as 20 entidades que desenvolvem SASE e que participaram da pesquisa.
por ordem de prioridade de contratação: contratados diretamente, com um salário
psicólogos, assistentes sociais, oficineiros e digno para poderem exercer a função de
educador e não de monitor. As demais
educadores sociais. despesas, que representam o dobro do
Observando a amostra total da pesquisa (59 valor conveniado, dependem de
entidades), percebemos que 56 participam contribuições espontâneas do grupo de
respondendo à questão que tem como objetivo apoiadores. Para que haja um trabalho com
resolutividade, isto é, que dê conta das
captar a avaliação de cada uma das entidades
necessidades de cada criança/adolescente
referente à insuficiência dos recursos, para o são necessários profissionais qualificados.
atendimento das metas conveniadas com o órgão Na educação, por exemplo, é preciso que
municipal responsável pela política de assistência se contrate profissional em
social na cidade. Sendo assim, o Programa psicopedagogia, para identificar e
trabalhar os bloqueios ou traumas que
Adolescente Aprendiz, por não possuir metas impedem o jovem de aprender; em alguns
conveniadas (na ocasião da realização da pesquisa), casos, é ainda preciso que o jovem
não será considerado nesse item para frequente uma escola especial ou
contabilização dos resultados. Das 56 entidades particular, por causa da defasagem escolar.
Em relação à saúde mental, é necessário
respondentes, 03 (5%) indicam ser suficiente o que o abrigo contrate um psiquiatra, que
repasse dos recursos conveniados; 40 (71%) indicam conheça muito bem cada jovem que

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
ser insuficientes; 02 (4%) indicam que é suficiente necessite de medicação, e não apenas que
em parte e 11 (20%) não responderam à questão. olhe para o jovem de 2 em 2 meses, como é
comum na rede pública de saúde. Há
Observamos que, mesmo entre as diferentes também necessidade de algum trabalho na
unidades de análise pesquisadas, que são os área musical ou teatral, ou artes, para que
programas sociais SASE, TE, Acolhimento os jovens possam expressar seus talentos
Institucional e Ação Rua, há uma coerência entre as ou buscá-los. Os itens listados são
considerados pelos técnicos e dirigentes
avaliações, embora reconheçamos diferenças e
deste abrigo como de necessidades básicas
necessidades específicas desses programas, bem para recuperar o jovem que sofreu
como, em um mesmo programa; um exemplo é o do abandono, negligência e maus tratos dos
Acolhimento Institucional que possui modalidades adultos que dele deveriam cuidar e
de atendimento diferenciadas. p r o t e g e r. ( Pr o g r a m a a c o l h i m e n t o
institucional, 2011).
No caso do programa Acolhimento
Institucional (abrigagem), observamos, na Outro aspecto que destacamos diz respeito
avaliação dos gestores, a necessidade de que esse às entidades que acolhem crianças e adolescentes
espaço se consolide enquanto atendimento com deficiência e que possuem uma trajetória
especializado na proteção integral a crianças e/ou sócio-histórica marcada pela mobilização da
adolescentes, mas, devido à complexidade e às sociedade civil na luta não somente pelos direitos
exigências quanto à metodologia de acolhimento, das crianças e adolescentes, mas também pela
têm surgido muitas dificuldades para que isso se inclusão social por meio da acessibilidade. Essas
concretize. entidades revelam uma parceria ainda incipiente
Não são suficientes. O repasse conveniado
com a FASC cobre somente as despesas com
a folha de pagamento dos funcionários
com a esfera governamental, e, ao mesmo tempo,
têm sido responsáveis majoritariamente pelo
045
atendimento dessas crianças e adolescentes. Constam, nos resultados da pesquisa,
Os recursos repassados não são suficientes conteúdos que dizem respeito à reformulação das
para absorver os custos dos serviços metas conveniadas com a PMPA, pois mostram a
prestados. (...) os editais da Prefeitura, via
CMDCA, não cobre 3% de nossas
necessidade de novas contratações de recursos
necessidades. O último Edital pagou para humanos, bem como de revisão dos salários
nossa Instituição pouco mais de R$ adequados para a equipe que operacionaliza os
13.000,00, para uma matrícula com mais programas.
de 120 crianças com deficiência. A instituição vem buscando formas para
(Programas com Crianças e Adolescentes a d m i n i s t r a r e m a n t e r o Pr o g r a m a
com Deficiência, 2011). atendendo às metas conveniadas, porém,
fazem-se necessários os reajustes
O SASE (nº 20) traz alguns elementos que adequados do repasse a fim de manter a
indicam os motivos pelos quais os recursos qualidade do atendimento e manutenção
repassados são considerados insuficientes. Existem do programa, tendo em vista que o
reajuste é inferior aos índices de aumento
entidades que possuem técnicos, como assistentes
de pessoal, prestação de serviço e consumo
sociais e/ou psicólogos, que dão suporte às (Programa SASE).
demandas que surgem oriundas do SASE, mas essa
não é uma realidade na maioria das entidades, e é A necessidade de contratação de
muito importante o trabalho desses profissionais profissionais que possam atender às especificidades
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

com essa população. Elas também fazem referência de cada programa, quanto aos conteúdos e quanto
aos salários dos profissionais e à necessidade de às rotinas, é um item tratado como uma dificuldade
reajuste, principalmente dos educadores. pelas entidades: “Enfrentamos dificuldades de
A avaliação é negativa, pois os recursos não encontrar educadores de módulo básico.
são suficientes; temos que contar com Acreditamos que seja pelo fato de o Trabalho
recursos próprios e doações. Sendo que
essas doações não seguem muitas vezes
Educativo ser três vezes por semana e pelos
uma sistemática e acaba fazendo falta conteúdos específicos” (Programa TE, 2011). No
durante o mês. Assim como a questão da trabalho educativo, também há indicativos de
remuneração de Educadores, levando à revisão dos recursos conveniados.
rotatividade deles dentro da Instituição.
As questões relativas às famílias dos
Os recursos conveniados são insuficientes.
Temos necessidade do aumento do repasse adolescentes ficam prejudicadas, segundo os
efetuado por meio do convênio, pois o gestores: “Consideramos que o recurso é
reajuste do convênio nunca se equipara ao insuficiente para atender às demandas, já que as
dissídio obrigatório sindical que as
questões familiares dos adolescentes ficam
entidades devem repassar aos seus
funcionários (...). O valor dos recursos prejudicadas” (Programa TE, 2011). A necessidade
conveniados para o SASE deve ser de atender a matricialidade familiar, conforme
reajustado, para melhor qualificação das preconiza o SUAS, exige não somente o repasse de
ações, melhor remuneração dos recursos recursos financeiros, mas também a efetivação de
humanos e mais verba para compra de
alimentos e, assim, efetivar a proteção arranjos intersetoriais e interdisciplinares que
comprometam os gestores municipais para garantia
046 social para crianças e adolescentes entre
07 e 14 anos com mais qualidade. desse suporte para a rede conveniada.
Não. Aparentemente os recursos do insuficientes para atender às metas e/ou à
trabalho Educativo parecem alcançar o demanda conveniada. De uma maneira geral, as
objetivo, mas são escassos para algumas
atividades, como a da remuneração dos
entidades indicam que, para suprir o atendimento
profissionais. A estrutura do Centro absorve das necessidades da demanda conveniada, é
outras demandas necessárias ao projeto, fundamental a parceria firmada com diferentes
como, por exemplo, facilidade na segmentos e as doações recebidas, o que não ocorre
manutenção, emergências de saídas, apoio
com todas as entidades, pois, predomina, como
de pessoal em situações adversas, apoio
quanto aos custos fixos. principal parceiro e origem do recurso, a esfera
pública municipal. Cada Programa indica
Entre as X entidades participantes desse necessidades específicas para atender à demanda,
programa, uma (01) entidade considerou suficiente conforme os objetivos das atividades
o repasse, mas fez ressalvas: desenvolvidas; entretanto, destacam-se, entre os
Acreditamos que hoje seja suficiente, resultados, as seguintes: aumento de salário para
porque temos outros convênios e dividimos algumas categorias profissionais, como os
os custos gerais entre eles. Também o
recurso é engessado; muitas vezes não
educadores sociais (dado predominante); repasse
podemos comprar aquilo que necessitamos para cobrir os encargos sociais; incremento e
como materiais permanentes, mesmo que aquisição de materiais pedagógicos e recreativos;

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
de pequeno porte. qualificação e educação continuada dos
profissionais, entre outros aspectos tratados no
No Programa ação Rua (nº 3), foi considerada Relatório Final da Pesquisa em questão.
a necessidade de aumento do repasse atual de 25%,
assim como a flexibilidade nas rubricas para a Para finalizar
execução dos recursos devido às diferentes A reflexão proposta neste artigo parte de
exigências demandadas no atendimento. Mais uma uma realidade que vem sendo vivenciada pelas
vez aparece a afirmação de que o reajuste no entidades que operacionalizam a política de
repasse, por meio do convênio, nunca se equipara assistência social em parceria com a esfera pública
ao do dissídio sindical que as entidades devem municipal na cidade de Porto Alegre. Embora não
repassar aos seus funcionários. tivéssemos a pretensão de tratar da dimensão e dos
Os recursos repassados são insuficientes. elementos que caracterizam esse modo de gestão,
Necessitamos de um reajuste no repasse
efetuado por meio do convênio, pois o tanto naquilo que pode ser identificado como um
reajuste do convênio nunca se equipara ao modo de gestão ideal, que porventura seja
dissídio obrigatório sindical que as considerado por alguns dos atores sociais
entidades devem repassar aos seus envolvidos, quanto nas diversas situações
funcionários. Em geral, o dissídio é de 8%, e
o reajuste do convênio varia entre 5 e 6%,
problemáticas e contraditórias que emergem desse
ficando sempre abaixo. arranjo institucional, observamos uma clara opção
por um modo de gestão compartilhado no campo da
Predomina, entre os resultados sobre os política de assistência social.
recursos repassados por meio dos convênios
firmados com a PMPA, a indicação de que eles são
O objetivo deste artigo foi o de publicizar
parte dessa experiência investigativa que trata da
047
avaliação dos recursos humanos e materiais dos nacional, a construção de um novo modelo de
programas sociais e da educação infantil na cidade financiamento do SUAS, impulsionado pela
de Porto alegre. Para tanto, precisamos reconhecer chamada tipificação; entretanto, a questão da
que avaliar políticas públicas exige que sejam adequação dos custos de acordo com as
desencadeados processos democráticos e necessidades e com as demandas sociais e
participativos que possam envolver diferentes organizacionais locais é motivo suficiente para a
atores sociais, presentes nessa arena política, para mobilização de diferentes setores que compõem a
a reformulação e o aprimoramento daquilo que for rede socioassistencial de Porto alegre.
necessário para implementação do SUAS na cidade. A pesquisa em questão desvela os custos (das
Entretanto, para que isso ocorra, é imprescindível entidades conveniadas com a Prefeitura de Porto
ter, como principal referência, a qualidade da Alegre) por programas e categorias analisados:
política pública e, nesse caso, a garantia dos recursos humanos, encargos, manutenção e
direitos das crianças e dos adolescentes, no campo alimentação, entre outros, mas, para um estudo
da política de assistência social, deve estar acima comparativo, seria necessário analisar os custos
de qualquer interesse que esteja fora dessa desses programas na rede socioassistencial da
prioridade. esfera governamental. Essas análises representam
Outra questão importante que colocamos em mais um desafio para o controle social, incluindo-se
pauta trata dos custos necessários para a aí o papel do Estado na condução dessa pauta, uma
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

adequação dos serviços a serem prestados no vez que a qualidade do serviço prestado depende do
âmbito da assistência social, principalmente, em compromisso do gestor municipal para garantia da
tempos de conformidade dos serviços com base na implementação de uma política que defenda os
tipificação nacional dos serviços socioassistenciais. direitos das crianças e dos adolescentes.
Como vimos nesta pesquisa, as entidades Cabe-nos registrar que os resultados desta
conveniadas referem ser insuficientes os recursos pesquisa demonstram o importante papel social das
repassados pela esfera pública estatal. Portanto, é entidades da esfera não governamental na
latente a necessidade de revisão dos custos e, condução das políticas de proteção social integral
sobretudo, a discussão destes; até porque é preciso para crianças e adolescentes na cidade de Porto
considerar que, na divisão de responsabilidade Alegre e não eximem (ou não podem eximir), de
quanto às relações federativas no campo da maneira nenhuma, a primazia do Estado na
assistência social, o governo federal assume quase condução e garantia da proteção social à infância e
que exclusivamente os custos das iniciativas no à juventude e da consolidação do Sistema Único de
campo da garantia de renda, por exemplo, o Assistência Social. Portanto, a construção de uma
Programa Bolsa Família (PBF) e o Benefício da agenda pública exige diálogo e publicização daquilo
Prestação Continuada (BPC), enquanto a que são os nós críticos que, muitas vezes, impedem
manutenção dos serviços é compartilhada pelas a execução com qualidade do serviço prestado,
três esferas de governo. Assim, os serviços tornando-o frágil ou violando a própria garantia dos
socioassistenciais devem ser compartilhados entre direitos das crianças e dos adolescentes.
todos os entes federados, conforme Por fim, podemos afirmar que o controle
048 regulamentação do SUAS. Vislumbra-se, no cenário social da cidade de Porto Alegre, por meio do
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição: Republica Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, Centro Gráfico, 1988; Assembleia
Legislativa: Texto consolidado, Fev/ 2010. Disponível em: http://www.al.rs.gov.br. Acesso em: 29/05/2010.
11h30min.
______. Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Ministério da
Educação, Assessoria de Comunicação Social. Brasília: MEC, ACS, 2005.
______. Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS: anotada. Lei nº 8.742 de 07 de dezembro de 1993. Ministério do
Desenvolvimento Social e combate à Fome. Governo Federal. Brasília, 1993.
CARVALHO, Maria do Carmo Brant. Gestão Social: alguns apontamentos para o debate. In: RICO, Elisabeth;
RAICHELIS, Raquel (orgs.). Gestão Social; uma questão em debate. São Paulo: EDUC, 1999.
CONSELHO NACIONAL DE ASSISTÊNICA SOCIAL - CNAS. Resolução nº 109, de 27 de novembro de 2009. Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Brasília, 2009.
CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – CONANDA; CONSELHO NACIONAL DE
ASSISTENCIA SOCIAL – CNAS. Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e
Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária. Brasília, DF, 2009. Disponível em:
http://www.mds.gov.br/gestaodainformacao/biblioteca/secretaria-nacional-de-assistencia-social-snas/livros/plano-
nacional-de-convivencia-familiar-e-comunitaria. Acesso em: 03/12/2011.
COMISSÃO REGIONAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL - PARTENON. Porto Alegre. Ata da reunião extraordinária: relatório
equipe ação rua. 11 de março de 2010. Porto Alegre, 2010.
FERNANDES, Rosa Maria Castilhos; MACIEL, Ana Lucia; TAMBORENA, Xênia. Relatório Final de Pesquisa: Avaliação de
Recursos Materiais e Humanos: identificação dos custos dos programas sociais e da educação infantil de Porto
Alegre/RS. Porto Alegre: Fundação Irmão José Otão, 2011. Disponível em: www.fijo.org.br

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
FUNDAÇÃO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E CIDADANIA/FASC. Projetos e Ações. Trabalho Educativo: preparação para o
trabalho. Portal da Prefeitura Municipal de Porto Alegre. Disponível em:
http://www2.portoalegre.rs.gov.br/fasc/default.php?p_secao=86. Acesso em: 05/02/2012.
Instituto de Pesquisa Aplicada - IPEA. Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. Políticas
Sociais: acompanhamento e análise. 2011. Disponível em: http://www.ipea.gov.br

049
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

050
O direito à educação infantil:
os desafios do acesso e da qualidade
Silvia da Silva Tejadas ¹

O direito à educação infantil é uma conquista abordagem do tema é dividida em dois tópicos:,no
recente da sociedade brasileira, rompendo com a primeiro deles, são enfocados os fundamentos da
história de atendimento à criança, na qual os educação infantil; no segundo, o contexto nacional
cuidados, na faixa etária abrangida pela educação e gaúcho em termos de acesso e algumas reflexões
infantil, eram promovidos pela família, por sobre a garantia da qualidade. Por fim, são tecidas
cuidadores domiciliares ou, ainda, por creches considerações gerais.

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
alocadas no âmbito da Assistência Social.
Atualmente, a partir da normativa legal, o A educação infantil como direito
entendimento em torno da atenção educativa às A história brasileira demonstra que o
crianças vem sendo alterado, chegando-se à atendimento das crianças em creches foi
compreensão de que a educação infantil é aquela capitaneado, durante muitas décadas, pela extinta
oferecida por instituições de ensino e que visa à Legião Brasileira de Assistência (LBA). O ápice da
integral formação da criança na faixa etária dos expansão do atendimento em creches vinculadas a
zero aos cinco anos de idade, constituindo-se na instituições privadas sem fins lucrativos ocorreu em
primeira etapa da educação básica. Tal perspectiva 1977, com o Projeto Casulo, coordenado pela LBA.
articula as necessidades de cuidar/educar, Em 1995, quando ocorreu a extinção daquele órgão,
rompendo com a concepção anterior, focada apenas os convênios existentes passaram a ser
no cuidar. administrados pela área da Assistência Social
A materialização do direito à educação (BRASIL, 2006c).
infantil exige avanços em duas direções: a da Esse contexto vem sendo alterado a partir do
garantia do acesso à educação e a da qualidade da final da década de 1980, no âmbito legal. Desse
educação. Este artigo aborda essas dimensões da modo, as legislações brasileiras vêm
efetivação do direito à educação infantil, tendo por acompanhando o avanço do debate em torno dos
base experiências concretas do Ministério Público benefícios da educação infantil ao desenvolvimento
na perspectiva da garantia deste. Para tanto, a da criança. É no bojo dessa construção que a

¹Assistente social do Ministério Público do Estado do Rio grande do Sul, Doutora em Serviço social. E-mail: silviast@mp.rs.gov.br 051
Constituição Federal de 1988 reconhece, no seu apartadas, a do cuidado e a da educação, propondo
artigo 6º, a educação como um dos direitos sociais. um modo de atenção às necessidades das crianças
Especificamente quanto à educação infantil, o quanto à alimentação, à saúde, à higiene, à
artigo 208 garante o “atendimento em creche e pré- proteção e ao acesso ao conhecimento
escola às crianças de zero a seis anos de idade” sistematizado.
(BRASIL, 1988, p. 138). Ta l p e r s p e c t i v a e s t á p a u t a d a n a
Observa-se que a Constituição Federal aloca compreensão de que a criança é um sujeito
a educação infantil na política educacional, o que histórico e social, dependente dos cuidados dos
se constituiu em avanço, visto que, até então, era adultos que a cercam e fortemente influenciada por
confundida com ações assistenciais, cujo foco era o eles, ao mesmo tempo em que influi no contexto no
cuidado, e não a educação. Dessa maneira, a qual interage. Assim, não é possível dissociar as
educação infantil se constitui na primeira etapa da dimensões cognitivas e afetivas das interações
educação básica, sendo regida pelos princípios e desenvolvidas pela criança. Trata-se de uma fase
diretrizes da educação em geral. de intensas mudanças e de crescimento físico e
O Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei psíquico, por isso
n.º 8069/1990, nos artigos 53 e 54, por sua vez, [...] crianças expostas a uma gama
ratifica o ordenamento já previsto na Constituição ampliada de possibilidades interativas têm
seu universo pessoal de significados
Federal. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

ampliado, desde que se encontrem em


(LDB), da mesma forma, no artigo 29, mantém as contextos coletivos de qualidade. Essa
linhas gerais da Constituição Federal, definindo a afirmativa é considerada válida para todas
educação infantil como a as crianças, independentemente de sua
[...] primeira etapa da educação básica, origem social, pertinência étnico-racial,
tem como finalidade o desenvolvimento credo político ou religioso, desde que
integral da criança até seis anos de idade, nascem (BRASIL, 2006b, p. 15).
em seus aspectos físico, psicológico,
intelectual e social, complementando a A qualidade das interações a que a criança,
ação da família e da comunidade (BRASIL, desde bebê, estará exposta, atribui à política
1996, s.p.). educacional, no que concerne à educação infantil,
um papel relevante que pode elevar os patamares
Ao mesmo tempo, delimita que essa
de desenvolvimento físico e socioafetivo das
modalidade de ensino será oferecida em creches ou
crianças brasileiras. Essa possibilidade adquire
entidades equivalentes para crianças de até três
importância ainda maior para aquelas crianças
anos de idade e, em pré-escolas, para aquelas de
expostas a situações de vulnerabilidade, quer
quatro a seis anos (BRASIL, 1996, art. 30)², além de
devido aos contextos de pobreza, quer pelos limites
definir como competência dos municípios a oferta
existentes nos cuidados oferecidos no âmbito da
da educação infantil (art. 11).
família e do grupo social no qual vive.
A concepção de educação infantil
Nessa contextura, a educação infantil
contemporânea integra perspectivas que estavam
pressupõe que elas sejam auxiliadas naquilo que

052 ²A Faixa etária para a educação infantil foi redefinida pela Emenda Constitucional nº 53/2006, para crianças de 0 até 5 anos.
não podem realizar sozinhas, atendidas em deficiências e correlatos; formação continuada dos
necessidades básicas físicas, psicológicas e professores; aprendizado da Língua Brasileira de
educacionais, e que, além disso, recebam atenção Sinais;
em momentos peculiares da vida. - proposta pedagógica desenvolvida com
Os professores e os demais profissionais autonomia: as concepções, metodologias e
que atuam nessas instituições devem, estratégias pedagógicas devem respeitar as
portanto, valorizar igualmente atividades
de alimentação, leitura de histórias, troca
“Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
de fraldas, desenho, música, banho, jogos Infantil”.
coletivos, brincadeiras, sono, descanso,
entre outras tantas propostas realizadas Orienta-se, quanto à gestão da educação
cotidianamente com as crianças (BRASIL,
infantil, o seguinte (BRASIL, 2006b):
2006b, p. 28).
- funcionamento durante o dia (parcial ou
A proposta pedagógica das instituições de integral): atendimento parcial deverá contar com,
e d u c a ç ã o i n f a n t i l , p a ra a t e n d e r a u m a no mínimo, quatro horas diárias; período integral
perspectiva integral de formação, prevê (BRASIL, com, no máximo, dez horas diárias; horários de
2006b): entrada e saída flexíveis; calendário letivo deve
- aspectos éticos, políticos e estéticos: respeitar os dias de descanso semanal e os feriados
nacionais, bem como garantir período anual de

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
formação para o exercício da autonomia,
responsabilidade, solidariedade e respeito; dos férias para crianças e funcionários;
direitos e deveres da cidadania; da sensibilidade, - organização flexível por turmas: grupos
criatividade, ludicidade; organizados por faixas etárias e características de
- cuidado e educação integrados: desenvolvimento; mistos; presença do professor
organização intencional das atividades das crianças para cada grupo; um professor para cada 6 a 8
(estruturadas/livres), com articulação das diversas crianças de 0 a 2 anos, um para cada 15 crianças de
áreas do conhecimento; 3 anos; um para cada 20 crianças acima de 4 anos; a
- interação entre instituição escolar e quantidade máxima de crianças é proporcional ao
família: espaços e tempos para conhecimento tamanho das salas (parecer CNE/CEB n.º 22/98 de
mútuo de educadores e família; acolhimento 17/12/98);
inicial; oferta de informações sobre o - gestão: é responsabilidade de profissionais
desenvolvimento da criança; participação dos pais que exercem cargos de direção, administração,
na gestão da escola; coordenação pedagógica ou coordenação-geral, os
- reconhecimento da identidade do aluno e quais devem ter, no mínimo, curso Normal e,
da unidade educacional: orientação contra a preferencialmente, o de pedagogia;
discriminação de gênero, etnia, opção religiosa; - foco na qualidade do trabalho: as crianças
respeito à diversidade cultural; assegurado às são o foco das ações e decisões tomadas;
comunidades indígenas a educação bilíngue; encaminhar aos serviços específicos os casos de
- inclusão das crianças com necessidades vítimas de violência ou maus-tratos; divulgação
transparente de normas e regras; utilização de
educacionais especiais: orientações e materiais
específicos para o trabalho com crianças com supervisão externa; incentivo à formação 053
continuada da equipe. diferentes dimensões poderá ser oferecido acesso à
educação infantil com a qualidade requerida à
Aos professores de entidade de educação atenção das necessidades das crianças.
infantil, são dadas as seguintes orientações
(BRASIL, 2006b):
- formação: nível normal, no mínimo, sendo 3. Os desafios do acesso e da qualidade na
preferível a formação em pedagogia; professores da educação infantil
rede pública devem ser selecionados por meio de
concurso público; Nos últimos anos, tem havido crescimento na
- para o bem-estar das crianças: assegurar oferta de vagas em educação infantil,
que os bebês sejam atendidos em suas necessidades evidenciando-se que essa etapa da educação básica
de saúde (nutrição, higiene, descanso, tem começado a fazer parte das pautas de políticas
movimentação); que as crianças tenham a proteção de governo em distintas esferas. Todavia, esse
necessária no acolhimento inicial e em momento processo ainda está distante de fazer frente às
peculiares de suas vidas; auxiliar os bebês e as históricas lacunas construídas.
crianças naquilo que não podem fazer sozinhos; No plano federal, por exemplo, a meta de
garantir a expressão de sentimentos e ampliação da educação infantil faz parte do
pensamentos; atividades desafiadoras, Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 2),
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

diversificadas, favoráveis à construção do por meio do Programa Pró-infância, que visa à


autoconceito e da identidade, que valorizem ampliação da oferta da educação infantil de 0 a 5
atitudes de cooperação, tolerância, respeito à anos, com construção de prédios, aquisição de
diversidade; equipamentos e mobiliários (VIEIRA, 2010).
- interações de professores, gestores e Essa tendência está amparada nas previsões
demais profissionais: encontros coletivos do Plano Nacional de Educação (PNE), 2001-2010,
periódicos; respeito às regras estabelecidas nas Lei nº 10.172/2001, no qual a educação infantil foi
instituições; contemplada em 25 metas, as quais abarcavam,
- infraestrutura das instituições: os espaços, entre outras, a formação de professores e a
materiais e equipamentos devem atender às destinação de recursos financeiros para a oferta
necessidades de saúde, alimentação, proteção, pública da educação infantil.
descanso, interação, conforto, higiene e O Plano Nacional de Educação mencionado, a
aconchego, adequados à Lei da Acessibilidade com partir da realidade constatada acerca da não
espaços para atividades com os familiares e para disponibilidade da política para todas as crianças
serviços de apoio. em faixa etária destinatária da educação infantil,
A partir das orientações do Ministério da previu como meta
Educação aqui expostas, identifica-se uma visão [...] ampliar a oferta de educação infantil
integral em torno da implementação da educação de forma atender, em 5 anos (2006), a 30%
da população de até três anos de idade e
infantil, na qual a proposta pedagógica se encontra 60% da população de quatro e seis anos e,
articulada ao espaço físico e à adequada formação
054 dos educadores. Somente com a articulação dessas
até o final da década (2011), alcançar a
meta de 50% das crianças de zero a três
anos e 80% das de quatro e cinco anos. As segmento, com acesso praticamente
crianças de 6 anos nesta última data devem universalizado, sendo de 77,1% para o segundo
estar matriculadas no ensino fundamental
(BRASIL, 2006c, p. 12).
segmento de renda” (VIEIRA, 2010, p. 819). São
apontadas, ainda, desigualdades relativas à cor,
Em que pesem os avanços no investimento tendo as crianças negras menores taxas de acesso, e
público na área e as metas previstas no PNE, a a prevalência do atendimento à população urbana
cobertura ainda é baixa no país, conforme segue: em detrimento da população rural.
Os dados da PNAD (IBGE, 2009) mostram Ainda, se for observada a procedência da
que a taxa de escolarização das crianças na oferta da educação infantil, constata-se a
faixa de idade de 0 a 6 anos ainda é baixa, prevalência do Poder Público Municipal, 65,6% em
tendo atingido a cobertura de 45,8%, em
creche e 75,3% em pré-escola. Como afirma Vieira
2008. No entanto quando analisamos esse
índice de forma desagregada, verificamos (2010), esse achado confere complexidade à gestão
que é cada vez mais generalizado o acesso da política da educação infantil, dadas a diferença
à pré-escola, para crianças a partir de 4 nos arranjos políticos municipais, com maior ou
anos de idade. Ao lado disso, verificamos
menor consonância com o marco legal e, ao mesmo
taxas persistentemente baixas para
segmento das crianças menores de 3 anos tempo, retrata a proximidade com os princípios
de idade (VIEIRA, 2010, p. 818). federativos previstos na Constituição Federal.

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
No caso do estado do Rio Grande do Sul, têm-
No caso das crianças de 0 a 3 anos, em 2001, se enormes desafios a vencer. A taxa geral de
apenas 10,6% frequentavam creches. De 2001 a atendimento em educação infantil, em 2010, é de
2008, o atendimento cresceu 8,7%, chegando ao 35,6%, localizando-se no ranking nacional na 17ª
patamar de 18,1%; portanto, distante da meta do posição. Na creche, a taxa de atendimento é de
PNE (VIEIRA, 2010). 21,4% e, na pré-escola, é de 61,6% (RIO GRANDE DO
Além disso, deve-se destacar que o índice de SUL, 2010).
inserção na educação infantil aumenta nas camadas Estudo do Tribunal de Contas do Estado do Rio
com maior renda e diminui nas mais pobres (BRASIL, Grande do Sul aponta 398,5 mil crianças, no Estado,
2006a). Vieira (2010) aponta que a frequência à sem acesso à creche e 106,2 mil sem acesso à pré-
creche, em 2008, de crianças provenientes de escola. No Estado, dos 496 municípios, 26,6% (132)
famílias com renda per capita de até meio salário não possuem nenhum equipamento de atendimento
mínimo, foi 3,2 vezes menor do que aquelas em creche. As necessidades de criação de vagas
oriundas de famílias com renda de três ou mais atingem o seguinte patamar: 145 mil em creche e
salários mínimos. A mesma tendência, embora com 50,8 mil em pré-escola, com um investimento
menor intensidade, é observada no caso da pré- projetado em 830 milhões de reais em novas
escola: desde o início da década, o atendimento às instalações físicas (RIO GRANDE DO SUL, 2010).
crianças na faixa etária de 4 a 6 anos, cujas famílias O quadro é preocupante, na medida em que,
têm rendimento médio familiar acima de três para além das questões orçamentárias que estão
salários mínimos, está próximo da universalização. envolvidas na estruturação de uma política de
Conforme a autora, “em 2008, as respectivas taxas
de frequência foram de 98,8% para o primeiro
educação infantil, aparentemente ainda há uma
cultura da sociedade que não incorporou este como 055
um direito social. cuidados, distante da atenção a qualquer
Ao verificarmos os dados de oferta de regramento.
educação infantil das maiores cidades do O próprio Ministério da Educação reconhece
RS, percebemos que além de Porto Alegre
(que atende 30,1%, em creche, e 67,1%, na
que “temos ainda uma quantidade indefinida de
pré-escola), Municípios como Canoas (12% instituições funcionando à margem dos sistemas
e 35,2%), Caxias (19,6% e 47,8%), Viamão educacionais, alheias aos mecanismos de
(4,7% e 28,9%), Gravataí (5,1% e 33,5%) e supervisão e sequer identificadas nas estatísticas
Alvorada (5,8% e 11,1%), não atingiram as
oficiais” (BRASIL, 2006a, p. 43).
metas de atendimento da educação
infantil na década da educação, de 2001-
2010. Ocorre que a sociedade pouco se Os movimentos direcionados à garantia do
preocupa com esses dados, tanto que os acesso, ou seja, à materialização do direito à
governos não foram cobrados com
educação infantil necessitam estar sintonizados
veemência, em aumentar a oferta de
educação infantil de qualidade (ROSA, com a defesa da qualidade. O século XX se encerrou
2011, p. 10-11). tendo como centro das discussões, no campo do
direito à educação, a questão da permanência do
Em levantamento realizado pelo Ministério aluno na escola, evidenciando o debate sobre a
Público, na cidade de Porto Alegre, nas regiões da qualidade da educação. Deve-se considerar,
Lomba do Pinheiro e do Eixo Baltazar, o qual será contudo, que a qualidade é um conceito que se
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

abordado com maiores detalhes no decorrer do constrói na sociedade, não havendo consensos
texto, identificou-se uma enorme demanda absolutos sobre o assunto.
reprimida (rede própria e conveniada) para Assim, no contexto brasileiro, discutir
atendimento; seria preciso duplicar as redes de qualidade da educação na perspectiva do
atendimento existentes. Além disso, a faixa etária respeito à diversidade implica
de 0 a 1 ano é a mais prejudicada, visto que 35,29% necessariamente enfrentar e encontrar
caminhos para superar as desigualdades no
(12) das escolas visitadas não atendem a esse grupo,
acesso a programas de boa qualidade, que
tendo em vista a necessidade de maior número de respeitem os direitos básicos das crianças e
recursos humanos e de infraestrutura com de suas famílias, seja qual for sua origem
requisitos específicos (RIO GRANDE DO SUL, 2008; ou condição social, sem esquecer que,
2010). Esse dado evidencia particularidades no entre esses direitos básicos, se inclui o
debate do atendimento em creche, pois nem direito ao respeito às suas diversas
sempre a existência da escola infantil configura o identidades culturais, étnicas e de gênero
pleno atendimento da faixa etária, já que as vagas (BRASIL, 2006a, p. 23).
são ofertadas de modo parcial nas diferentes faixas
de idade. Com o fito de trazer alguns elementos
Ainda, considerando que a rede disponível é concretos da realidade para a discussão da
insuficiente, há outros problemas que se qualidade, buscou-se informação, no Ministério
identificam no âmbito da educação infantil, Público do Rio Grande do Sul, quanto à fiscalização
relativos à precária qualidade daquilo que é de escolas infantis na cidade de Porto Alegre³.
056 ofertado e a existência de uma rede informal de Foram realizadas visitas a 34 escolas infantis da
Prefeitura Municipal de Porto Alegre e conveniadas regiões visitadas. Esse dado demonstra que o Poder
com o Poder Público Municipal, localizadas em duas Público Municipal tem optado por expandir essa
microrregiões da cidade, Lomba do Pinheiro e Eixo política pública por meio de convênios com
Baltazar, nos anos de 2008 e 2009. Tratou-se de organizações não governamentais em detrimento
escolas localizadas em bairros periféricos, dotados da construção de equipamentos tipicamente
de precária infraestrutura de serviços públicos; estatais. Assim, identifica-se que a sociedade civil
esses aspectos motivaram a escolha dessas regiões vem substituindo a ação do poder público (RIO
para as vistorias (RIO GRANDE DO SUL, 2008; 2010). GRANDE DO SUL, 2008; 2010).
Foram realizadas, durante as vistorias, Tal estrutura traz efeitos ao desenho da
entrevistas com os coordenadores das escolas, por política e ao tipo de atendimento acessível à
meio de roteiro previamente estruturado, com população. Dentre eles, destacam-se as
questões relativas à identificação e caracterização discrepâncias entre as escolas municipais e as
da entidade, gestão institucional, proposta conveniadas, pois, comparativamente, as últimas
pedagógica, recursos humanos, infraestrutura apresentam menor qualidade quanto à estrutura de
institucional e aspectos gerais. Os dados obtidos recursos humanos, à sua qualificação e à
foram devidamente documentados e discutidos remuneração; à qualidade da estrutura física e ao
com o gestor público municipal, assim como foi caráter público da política, uma vez que as
realizada audiência pública na região da Lomba do conveniadas, de modo geral, realizam a cobrança

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
Pinheiro para apresentação e compartilhamento da de taxas para a manutenção das crianças nas
realidade conhecida. escolas.
Tal experiência permite configurar alguns As famílias que têm seus filhos nas escolas
determinantes para a qualidade na educação conveniadas pagam mensalidades pelo serviço, o
infantil nas seguintes dimensões: modalidade de que se constitui em desrespeito ao direito
financiamento; recursos humanos; estruturas positivado, já que se trata de uma política pública e
físicas e concepção de educação. as organizações conveniadas recebem
No caso de Porto Alegre, os dados apurados sistematicamente recursos do Poder Público
nas regiões mencionadas permitem apontar que a Municipal. Assim, a população que não acessa as
modalidade de financiamento e o decorrente escolas públicas municipais é perversamente
arranjo administrativo apresentam preponderância prejudicada, pois acaba por receber serviços com
sobre os demais aspectos. O modo como a política qualidade inferior, e ainda tem de participar do seu
vem sendo expandida na capital desenhou um custeio diretamente (RIO GRANDE DO SUL, 2008;
quadro no qual se evidencia a desproporção entre o 2010).
número de equipamentos comunitários Desse modo, a incorporação da educação
conveniados e o de públicos municipais, na ordem infantil como direito ocorre em meio às tendências
de 73,53% (25) de escolas infantis comunitárias e macroeconômicas de matiz neoliberal que resultam
26,47% (9) de escolas públicas municipais nas em repasses de responsabilidades estatais para

³O referido trabalho foi coordenado pela Promotora de Justiça Synara Butelli e contou com o assessoramento de profissionais
do Serviço Social da Instituição, lotados na Divisão de Assessoramento Técnico/Unidade de Assessoramento em Diretos Humanos. 057
entidades comunitárias com os prejuízos âmbito nacional; o “Relatório dos trabalhos
mencionados, afetando o caráter público da r e a l i z a d o s p e l o G T c r i a d o p e l a Po r t a r i a
política e os direitos das crianças que se encontram interministerial nº 3.219” (BRASIL, 2006c) aponta
na rede conveniada. também a formação deficiente dos professores. O
Tais aspectos vão de encontro à Lei nº Censo Escolar de 2004 constatou que 7,26% dos
11.494/2007 que regulamenta a distribuição dos profissionais tinham apenas o ensino fundamental
recursos do FUNDEB e prevê a presença da rede e, nas pré-escolas, o número era de 2,3% (essa
conveniada na prestação de serviços educacionais: informação refere-se a instituições cadastradas no
I - oferecer igualdade de condições para o sistema, podendo ser mais elevado na realidade).
acesso e permanência na escola e Tais dados encontram justificativa na história da
atendimento educacional gratuito a todos
os seus alunos;
atenção às crianças nesta faixa etária, visto que, na
IV - atender a padrões mínimos de área da Assistência Social, não havia exigência de
qualidade definidos pelo órgão normativo uma habilitação específica aos cuidadores.
do sistema de ensino, inclusive, Conforme Vieira (2010), estudo do INEP, de 2003,
obrigatoriamente, ter aprovados seus
demonstrou que 22,3% dos docentes atuando na
projetos pedagógicos;
V - ter certificado do Conselho Nacional de pré-escola tinham formação superior, tendo havido
Assistência Social ou órgão equivalente, na crescimento na formação superior na ordem de
forma do regulamento (Brasil, 2007, s.p.). 37,2% nas creches e 45,5% na pré-escola. Todavia, o
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

PNE previa 70% dos professores com formação


As discrepâncias mencionadas têm lugar, superior, meta ainda muito distante.
também, na estrutura de recursos humanos sobre a
qual são visíveis as diferenças entre o quadro Os aspectos relacionados à infraestrutura dos
próprio da Prefeitura Municipal de Porto Alegre e os prédios merecem destaque, visto que a
recursos humanos das conveniadas. O Poder Público implementação da proposta pedagógica depende
Municipal, em suas escolas próprias, atende aos das condições físicas para tanto. Especialmente
parâmetros indicados pelo Conselho Municipal de quando se busca efetivar a transição do modelo
Educação, contando com equipes numericamente assistencial para o educacional, é fundamental
significativas, quanto ao quadro de professores, superar a visão de que qualquer espaço é adequado
assistentes e estagiários. Quanto à formação, tem, para que as crianças permaneçam. Sabe-se que os
entre seus professores, profissionais com nível espaços devem promover a construção do
superior e com pós-graduação. No âmbito das conhecimento, de modo agradável e lúdico, ao
conveniadas, tem-se um espectro diferente, com mesmo tempo em que precisam favorecer os
equipes enxutas; de modo geral, adequadas quanto movimentos necessários a cada faixa etária.
à proporção adulto-criança, porém insuficientes Muitos dos prédios visitados eram adaptados
com relação ao número de professores disponíveis; para a função educacional, tratando-se de espaços
além disso, em muito locais ,os educadores originalmente utilizados pelas associações de
assistentes ainda estão em formação (RIO GRANDE moradores para finalidades comunitárias, ou
DO SUL, 2008; 2010). prédios residenciais. Esse contexto acarreta
058 Esse fato, aliás, é um problema relevante no inúmeras inadequações; muitas foram as
adaptações feitas ao longo do tempo. Além disso, os um dos pontos de tensão na
espaços nem sempre são exclusivos para a educação implementação do novo PNE (VIEIRA, 2010,
p. 827).
infantil; acolhem outros serviços da área da
Assistência Social, por exemplo (RIO GRANDE DO
O conhecimento de parte da realidade da
SUL, 2008; 2010).
cidade na educação infantil permite constatar que
As lacunas no espaço físico, de modo geral,
a cultura assistencial ainda se faz presente nos
eram as seguintes: falta de ambientes separados
serviços prestados. Nunes (2005) argumenta que
para a sala de repouso e para a realização
muitos dos problemas vividos referem-se a uma
atividades com crianças de zero a um ano; ausência
“passagem” entre dois sistemas que coexistem,
da sala multiuso e de refeitório; pátios com poucos
mas são antagônicos, um deles aquele proveniente
brinquedos e sem ambientes diversificados com
das pré-escolas e outro das instituições que
terra e grama; falta de acessibilidade arquitetônica
migraram da Assistência Social. Para a autora, ainda
(RIO GRANDE DO SUL, 2008; 2010).
não se tem a política pública, fundada nos
Em síntese, a realidade de Porto Alegre
princípios da transparência, publicização de
chama a atenção para o tema do conveniamento e
critérios e mecanismos de monitoramento e
suas decorrências, o que é coerente com um debate
avaliação. Esse é o desafio da década que se iniciou.
nacional, que aponta a necessidade de
redimensionamento da relação público-privado.

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
Considerações gerais
Há, Inclusive, definição pelo congelamento das
O acesso à educação infantil constitui-se em
matrículas conveniadas até 2014.
direito a ser garantido pela Política Pública de
A universalização da pré-escola, agora de
frequência obrigatória, a proposta de Educação, contudo trata-se de uma conquista
congelamento das matrículas conveniadas recente que ainda necessita de materialização.
em 2014 e a sua extinção em 2018 Observa-se movimento do Poder Público Municipal
requerem, certamente, passos a serem
no sentido de expandir a política de educação
estabelecidos, e ainda muitos debates e
estudos, com estreito acompanhamento do infantil, todavia em amplitude aquém das
MEC. As análises sobre as situações de necessidades da população, o que faz com esse
atendimento nos municípios, que exibem direito não esteja disponível a todos. Assim, tem-se
realidades muito diversas, devem levar em o desafio do acesso como essencial, requerendo a
conta que as creches comunitárias e
filantrópicas também se constituem em mobilização da sociedade, dos órgãos incumbidos
nicho de mercado de trabalho de pela defesa de direitos, entre eles, o Ministério
coordenadoras, professoras ou Público, que recentemente instituiu as Promotorias
educadoras, mulheres das classes de Justiça da Educação, incumbidas de atuar
populares, que protagonizaram, desde a
década de 1980, a expansão da educação
especificamente em temas atinentes à política de
infantil no Brasil. As creches comunitárias e educação na esfera do direito difuso e coletivo.
filantrópicas são também instâncias de Entretanto, é tarefa que extrapola uma instituição
exercício do poder local (prefeitos, líderes isoladamente, necessitando da atuação conjunta
comunitários, vereadores, filantropos),
de todos os órgãos de defesa de direitos, de
que trazem retorno eleitoral, prestígio e
influência. Isso leva a considerar ser este é controle social e do Poder Executivo nas suas
059
distintas esferas. Requer, ainda, a participação qualidade, relacionados à estruturação da política
ativa da sociedade, a mesma que fez com que, nas pública e à contradição entre a velha perspectiva
décadas de 1970 e 1980, o sistema de creches fosse exclusiva do cuidado e a nova dimensão da
delineado. educação integral. A contribuição que a política de
O direito à educação infantil não se esgota no educação infantil dará à formação das crianças
acesso; é preciso que a preocupação com qualidade brasileiras depende da seriedade em torno da
acompanhe esse processo. Este texto apresenta qualidade da política ofertada à população.
alguns dados que sugerem diversos entraves à

REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, Centro Gráfico, 1988.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Parâmetros nacionais de qualidade para a educação
infantil. Volume 2. Brasília: 2006a.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Parâmetros nacionais de qualidade para a educação
infantil. Volume 1. Brasília: 2006b.
BRASIL. Relatório dos trabalhos realizados pelo GT criado pela portaria interministerial n.º 3.219, de 21 de
setembro de 2005, e proposta de prorrogação das suas atividades. Brasília, 2006c.
BRASIL. Lei n.º 9.394/1996 que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm>, acesso em 17/12/2011.
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

BRASIL. Lei 8069/90, Estatuto da Criança e do Adolescente. In: RIO GRANDE DO SUL. Ministério Público. Centro de
Apoio Operacional da infância e Juventude. Estatuto da criança e do adolescente e legislação pertinente. Porto
Alegre: Procuradoria-Geral de Justiça, 2007.
BRASIL. Lei nº 11.494/ 2007 que regulamenta o FUNDEB. Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/Lei/L11494.htm>, acesso em 18/12/2011.
NUNES, Deise Gonçalves. Integração ou apartação? O acesso à educação infantil no contexto dos sistemas municipais
de ensino. Katálysis. Florianópolis: v. 8, n. 1, p. 78-85, jan/jun 2005.
VIEIRA, Lívia Maria Fraga. A Educação Infantil e o Plano Nacional de Educação: as propostas da CONAE 2010. Educ.
Soc., Campinas, v. 31, n. 112, p. 809-831, jul.-set. 2010.
RIO GRANDE DO SUL. Ministério Público. Relatório Parcial de Visitas às Escolas Infantis de Porto Alegre: Microrregião
Lomba do Pinheiro (DOC 0300/2008). Porto Alegre: Ministério Público, 2008.
RIO GRANDE DO SUL. Ministério Público. Relatório Parcial de Visitas às Escolas Infantis de Porto Alegre: Microrregião
Eixo Baltazar (DOC 0042/2010). Porto Alegre: Ministério Público, 2010.
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Contas do Estado. Execução orçamentária educação infantil, subfunção 365 (slides).
Porto Alegre: TCERS, 2011.
ROSA, Rosangela Corrêa da Rosa A garantia do direito humano à educação de qualidade: a oferta da educação
infantil no Rio Grande do Sul como novo desafio do Ministério Público. Santo Ângelo: 2011.

060
Direitos das crianças e dos
adolescentes com deficiência: diversidade
e acessibilidade em perspectiva

Idília Fernandes¹
Humberto Lippo²

O artigo que segue tem como finalidade materiais e humanos: identificação de custos dos
propiciar a reflexão sobre a condição de acesso da programas sociais e da educação infantil de
criança e do adolescente com deficiência às POA/RS³, podemos chegar a que conclusões em
instâncias sociais, colocando em questão a relação às condições construídas de acesso das
possibilidade do convívio com as diferenças crianças e dos adolescentes com deficiência aos

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
pessoais e a materialidade do acesso universal ou programas e demais serviços? Para o debate sobre
acessibilidade do meio. Nossa sociedade os direitos das crianças e dos adolescentes com
contemporânea tem oferecido às crianças e aos deficiência, apresentamos primeiramente o
adolescentes condições de acessibilidade aos bens conceito sobre a condição da deficiência e da
sociais, às políticas públicas? acessibilidade, como um aspecto da humanidade
Na perspectiva de análise, a partir do nos processos sociais. Em seguida, discorremos
relatório final de pesquisa: avaliação de recursos brevemente sobre aspectos históricos da educação

¹Assistente Social e pesquisadora da Fundação de Articulação da Política Pública para pessoas com deficiência e altas habilidades do
Rio Grande do Sul (FADERS). Mestre e Doutora em Serviço Social pela PUCRS, professora na graduação e pós-graduação da Faculdade
de Serviço Social da PUCRS. Especialista em Grupo, Família e Política pelo Instituto Pichon Rivière. Coordenadora do Grupo de
Estudo e Pesquisa em Acessibilidade e Diversidade (GEPAD – FSSPUCRS). Membro do Núcleo de Estudo e Pesquisa em Violência, Ética
e Direitos Humanos (NEPEVEDH – FSSPUCRS). Membro do Comitê de Ética da Escola de Saúde Pública do RS. Acesse seus artigos na
revista eletrônica do curso de pós-graduação da Faculdade de Serviço Social da PUCRS, revista online Textos & Contextos.
²Sociólogo e professor. Coordenador do Comitê da Acessibilidade da Universidade Luterana do Brasil (ULBRA), militante do
movimento social das pessoas com deficiência há 40 anos, tendo exercido as funções de Secretário Nacional de Promoção de
Direitos da Pessoa com Deficiência, Vice-Presidente do Conselho Nacional de Direitos da Pessoa com Deficiência (CONADE), Diretor-
Presidente da Faders no Governo do Estado/RS e Assessor de Políticas Públicas para Pessoas com Deficiência além de Coordenador
de Direitos Humanos na Prefeitura de Porto Alegre. Autor de diversos artigos na área da acessibilidade e políticas públicas.
³Este relatório apresenta os resultados da pesquisa “Avaliação dos recursos materiais e humanos: identificação dos custos dos
Programas Sociais e da Educação Infantil de Porto Alegre/RS”. Desenvolvida pela Fundação Irmão José Otão – FIJO, sob a forma de
prestação de serviços, demandada pelo Fórum Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (FMDCA) e pelo Conselho
Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA). A pesquisa foi realizada na cidade de Porto Alegre, entre os meses de
dezembro de 2010 e junho de 2011, e contou com a participação e a mobilização das entidades que fazem parte da esfera não
governamental e que executam, por meio de convênios firmados ou não, com órgãos da esfera pública municipal, programas
vinculados à Política de Assistência Social e à Política da Educação Infantil. Fonte: Fundação Irmão José Otão. POA: julho de 2011. 061
e a inclusão das crianças e adolescentes com como a arquitetura social é planejada e executada;
deficiência. Em um terceiro momento, trazemos parece não condizer com a realidade da natureza
para a reflexão alguns dados de realidade e humana. O ser humano é imperfeito por natureza, é
expectativas para as crianças e adolescentes com incompleto, é inacabado; portanto, cada pessoa se
deficiência em nossa sociedade. No que caracteriza, também, por apresentar inúmeras
avançamos, no que ainda poderemos avançar em limitações em áreas diversas. Não é possível aos
direitos e em sociabilidade para o convívio com as indivíduos, enquanto seres humanos, realizarem
diferenças? toda a potência universal que está disposta no
universo. A ideia de perfeição é um sonho; talvez
1.1 A condição da deficiência e da um forte desejo, impossível de realização plena, no
acessibilidade plano concreto da vida humana.
As pessoas com alguma “diferença
O mundo ao redor parece mesmo ter sido flagrantemente visível” demonstram o
todo ele construído para seres humanos perfeitos, inacabamento, a incompletude do que é humano,
sem diferenciações mais acentuadas e num padrão de forma peculiar e, na maioria das vezes,
único, sem distinções. Nós, humanos, achamos irrevogável. Quando falamos em considerar o
linda a natureza, admiramos sua diversidade; suas cotidiano dos sujeitos que têm alguma deficiência,
cores, formas, texturas, enfim, sua diferenciação. estamos incluindo a necessidade de o contexto
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

No entanto, quando essa diversidade acontece apresentar condições para essa vivência ser
entre a nossa espécie, reagimos de forma diversa e possível de ser exercida com toda a dignidade que
estabelecemos preconceitos que afastam as merece a vida humana, em respeito a sua
pessoas com diferenças mais acentuadas de nosso singularidade e a sua incompletude. As barreiras
convívio. Organizamos o mundo em padrões de arquitetônicas desconsideram essa prática peculiar
normalidade, e quem não está enquadrado nesses das diferenças, pois o planejamento urbano é
padrões está fora de nossa aceitação. pensado para o homem-padrão, e não para o
“homem em carne e osso”. Observa-se que não são
O contexto em que as pessoas vivem suas apenas as pessoas com deficiência que sofrem
vidas parece ter sido construído de forma a restrições com as barreiras do espaço construído:
ressaltar o déficit daquelas com diferenças ... também há os chamados 'deficientes
acentuadas. As pessoas com deficiência têm temporários', ou seja, aqueles que
momentaneamente têm reduzida sua
características que as fazem diferir de um padrão capacidade de locomoção, tais como:
cultural criado e adotado como “normal”, como se fraturados, gestantes, enfermos,... os
a naturalidade para os seres humanos fosse um idosos, crianças e aqueles com problemas
estilo comum a todos os indivíduos. Esse estilo orgânicos: cardíacos, hipertensos,
reumáticos, diabéticos, etc. (LIPPO, 1997,
tende à perfeição; é uma estética imaginada para
p. 153).
um ser perfeito, sem limitações físicas, psíquicas e
de interação com seu meio social. Transformar essa lógica da “homogeneização

062 Essa estética imaginada se reproduz na forma


artificial do ser humano” e reconhecer
politicamente as diferenças é um desafio, uma
necessidade premente para a construção de uma sociabilidade é o da perspectiva do aprendizado
sociedade democrática e humana. Para que isso quanto à possibilidade real do convívio com as
possa se dar, será preciso uma profunda revisão do diferenças e da legitimidade política da
conceito de normalidade, que, por si mesmo, diversidade. A partir disso, haveria a construção de
coloca-se como uma fronteira, um muro que separa um espaço concreto, em todas as instâncias do
os “ditos normais”, dos “não normais”. Essa social, para cada pessoa poder conviver,
fronteira, tendo em vista a perspectiva da independentemente de sua peculiaridade pessoal,
singularidade humana e não a da massificação e sem barreiras, sem interdições e para poder
padronização, é irreal; portanto, tal prerrogativa usufruir de todos os bens sociais. A consequência
coloca o “excepcional” em oposição ao “normal”; o aqui, para crianças e adolescentes, seria a do
“desviante” em oposição ao padrão estabelecido. acesso a um mundo menos interditado e livre de
Essa terminologia expressa uma lógica excludente, barreiras para não reproduzirem todo esse mundo
em que alguns seres humanos ficam de fora do que é de exclusões.
considerado normal, aceito e acolhido pela vida em
sociedade.
2.2 Sobre Educação e Inclusão de Crianças
Esse tipo de imaginário social impacta e Adolescentes com Deficiência
sobremaneira a vida das crianças e dos

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
adolescentes que estão entrando para vida em Historicamente, crianças e adolescentes com
sociedade ao se depararem com todas essas deficiência foram educadas na chamada escola
normativas e essa construção social de identidades especial e ficaram fora da escola regular. Essa
e projeções de como deve ser a vida em sociedade. separação é típica do lugar social simbólico e
Assim, são criados padrões de normalidade e concreto relegado às pessoas com deficiência: lugar
perfeições que não condizem com a realidade da do especial, da diferença como algo
condição humana de diversidade e imperfeição. A desqualificante, como algo que merece destaque
consequência é que, para as crianças e negativo e que precisa estar em separado dos
adolescentes, por vezes, é difícil se enquadrar e demais. A perspectiva simbólica de "menoridade"
fazer parte de um mundo imaginado para o que é atribuída às pessoas com deficiência
perfeito, especialmente, se forem crianças e atravessa e permeia o entendimento do significado
adolescentes com algum tipo de deficiência. histórico dado à educação especial. Quando
A principal contribuição da diversidade ao falamos em educação especial, o que fica
social é que as sociedades só se desenvolvem a subentendido é uma "educação menor”, inferior à
partir das diferenças. Onde tudo é igual não há educação "normal". O traço de "educação menor" se
movimento, não há crescimento; cada qual apresenta na característica de um sistema de
contribui com sua diferença, com seu jeito peculiar, ensino que tem sua tônica mais na assistência do
com as formas alternativas e criativas para o viver. que na escolarização. Há toda uma preocupação em
Assim, o mundo vai sendo criado e recriado em cada assistir a criança muito mais do que em investir nas
tempo histórico, a partir da dinâmica de seus condições para que ela possa aprender o que deve
movimentos contraditórios. O grande salto de ser aprendido em uma escola. A educação especial 063
tem um caráter de "apêndice indesejável" ou obra Diretrizes e Bases (LDB)" (BRIZOLA, 2000, p. 38). A
de pessoas "abnegadas" que assistem os educação especial é tema da LDB em 1961, uma lei
"deficientes". O que acontece nessa área é que que é prescrita para educadores da época e que já
muitas ações são realizadas de acordo com a "boa vinha sendo gestada desde 1946. É uma lei que
vontade", e não em um planejamento político que coloca a educação especial em contraste com a
projete a inclusão das características peculiares educação comum, geral, "normal" (ver no anexo 2, o
das pessoas com deficiência no ensino. Parecer nº 658/77). A crítica que se faz à educação
especial é a do fato de ela ter se tornado um
As escolas, por muito tempo, tiveram subsistema à parte, uma "superestrutura" que
práticas excludentes com ênfase no déficit, não nas segrega o processo educativo em geral, criando uma
possibilidades e no dinamismo próprio da condição cisão entre o ensino comum e o ensino especial.
de ser humano. Pensarmos em uma escola inclusiva
significa considerarmos a convivência plena entre O que era para ser uma metodologia de ensino
as diferenças, sem medo de incluirmos a ou para ser tratado como construção de técnicas,
diversidade e as formas alternativas de abordagens específicas e peculiares às condições dos
aprendizagem. Significa considerarmos que, além portadores de deficiência, torna-se um sistema de
dos métodos tradicionalmente conhecidos para o ensino que cria uma "duplicidade de educações".
ensino, outros métodos podem ser usados, métodos Nesse caso, objetivos e finalidades do ensino são
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

que correspondam às peculiaridades de sujeitos feitos de acordo com as características do usuário da


que não são iguais aos outros. É importante educação, e não em função do fim educacional que é
entendermos aqui que não ser igual não significa ser educar.
incapaz de aprender.
Em 1994, a Declaração de Salamanca, na
É muito recente (em países em Espanha, preconiza a "educação para todos", isto é,
desenvolvimento) o movimento pela inclusão, data uma escola de boa qualidade para todos: uma escola
da década de 1990 (século XX), momento em que inclusiva. O objetivo dessa Declaração é o da
começou a ter maior força. Na década de 1980, já inclusão de grupos tradicionalmente excluídos da
havia um movimento incipiente em países escola regular. Há a ideia de deslocar a atenção às
desenvolvidos e há uma projeção para os primeiros pessoas com deficiência do eixo da educação
dez anos do século XXI, o seu desenvolvimento em especial e colocá-la no âmbito da educação comum.
todos os países (SASSAKI, 1997, p.17). Uma educação em nova perspectiva, que esteja
qualificada para abarcar os diferentes grupos
No plano Nacional de Educação, consolidado (meninos de ruas, mulheres, vítimas de guerras,
no II Congresso de Educação (1997), o diagnóstico pessoas com deficiências, altas habilidades etc.). A
realizado acerca das condições da educação segregação dos alunos com dificuldades de
especial pontua que: "a educação especial sempre aprendizagem passa a ser questionada e
foi tratada como apêndice da educação regular, desenvolvem-se conceitos que remetem à escola a
com caráter assistencialista, discriminatório e responsabilidade de ser "exitosa para todos". É
064 excludente e continua com tal conotação na Lei de firmado um debate em torno da necessária
superação das atitudes discriminatórias e Sistema de Ensino Brasileiro". Este anuncia o
excludentes para com aqueles alunos que sempre esforço de implementar medidas para que as
foram rotulados como "problemáticos". pessoas com deficiência (temporária ou
permanente) tenham o direito à educação.
Na proposta da escola inclusiva, abrem-se Entretanto, esse cabedal legal não tem sido capaz
espaços para a aceitação e o reconhecimento das de gerar mudanças mais concretas (BRIZOLA, 2000,
diferenças. Os alunos com deficiência passam a p.57).
estudar junto com os alunos sem deficiência.
Segundo Brizola, apesar das “superações No cotidiano de instituições que trabalham
conceituais e reflexivas deste debate, que já vem com crianças e adolescentes com deficiência,
desde a década de 70 e culmina na Declaração de apresenta-se constantemente a expressão dessa
Salamanca, os avanços concretos são lentos e dificuldade de inclusão escolar. Para aqueles que
graduais, mesmo nos dias de hoje” (2000, p.56). conseguiram entrar na escola, é, por vezes, difícil
Outro problema apontado pela autora é o fato de permanecer no ambiente escolar. Outro aspecto
que esse Documento, apesar dos avanços, não traz considerável a realizar, no que tange à questão da
uma declaração incisiva e radical para que as inclusão escolar, expressa-se na dificuldade de se
escolas especiais deixem de existir; o que faz é trabalhar com a inclusão de forma qualificada, e
destacar a preocupação com a proliferação das não como depósito de alunos nas salas de aula, sem

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
escolas especiais, como espaço segregador. Essa o devido preparo dos professores, sem
autora faz uma significativa reflexão acerca do equipamentos especializados e sem estar de acordo
processo histórico de exclusão escolar e da com as necessárias demandas de cada aluno e
ineficácia do ensino especial; além disso, aluna.
demonstra as dificuldades atuais de se incluir na Os governos precisam investir na educação
escola. de recursos, e não utilizar a “inclusão” como
pretexto para reduzir custos orçamentários na área
A tendência à educação inclusiva é um da educação especial. Uma grande e importante
debate internacional e, da mesma forma, as polêmica que vem à tona, em diversos debates
medidas para sua implementação. Diversos países entre profissionais da área da educação e das
têm feito esse debate em torno da necessidade de demais áreas que se envolvem na questão, remete à
uma "escola para todos", sem discriminações que preocupação de que a inclusão possa ser igual a um
pudesse colocar fim aos estigmas e a segregação. modelo inconsequente, sem o preparo que as áreas
No Brasil, a Constituição de 1988 e a Política especializadas sempre tiveram com a educação
Nacional de Educação Especial de 1994 especial. A segregação nas práticas institucionais e,
oficializaram as pretensões de "integração escolar e especialmente nas escolas, é secular; em vista
social das pessoas com deficiências". O Ministério disso, será uma tarefa nada simples de executar,
de Educação e Cultura (MEC), órgão do governo haja vista o despreparo destas diante dessa
Federal Brasileiro, em 1995, lançou um documento necessidade de mudança, porém: “... nenhum
que dispõe sobre o "Processo de Integração Escolar destes argumentos pode realmente justificar a
dos Alunos Portadores de Necessidades Especiais no segregação dos alunos com deficiência ou de 065
qualquer outro aluno da escola regular e da vida há muito para que possamos aprender e avançar
comunitária” (STAINBACK, 1999, p. 433). quanto aos conceitos e práticas sociais, referentes
à questão das diferenças.
Portanto, a escola, as instituições em geral,
os professores, os profissionais das diversas áreas, As décadas de 1960, 1970 e 1980 (século XX)
os pais, os familiares, os diversos setores da propiciaram o desenvolvimento dos princípios da
sociedade deverão aprender a se comunicar com as integração social. A partir de 1980 e durante a
diferenças. Isso significa, em última análise, década de 1990, é que se começa a repensar e a
aprender a se comunicar com a sua própria construir outros princípios que vão orientar a
condição de pessoa, ou seja, com a característica concepção da inclusão social. Um importante
da diversidade que é peculiar à espécie humana. A princípio que orientou a perspectiva da integração
mudança que deverá ocorrer é cultural, no que diz social foi o chamado princípio de “normalização”
respeito ao olhar para as diferenças. Uma nova que pressupunha um ambiente mais comum ou
visão e uma nova prática que desenvolvam novos normal à cultura das pessoas com deficiência. Dá-se
processos sociais, nos quais pertencer a seu próprio início ao processo de ruptura com a ideia de que
grupo humano não seja mais uma questão para o tudo tem que ser “especial”. O outro princípio
debate, e sim uma prática comum à vivência dessa perspectiva é o da inserção, ou seja, as
humana. pessoas devem estar inseridas no seu meio, e não
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

É certo que as diferenças e a pluralidade em instituições fechadas.


da vida não têm encontrado lugar na
escola: é como se as crianças, jovens e
adultos, ao desfrutarem das atividades
Quando se começa a pensar nas implicações
escolares, tivessem de se despir de suas dos processos sociais na questão das diferenças,
singularidades, peculiaridades e, mesmo outros importantes princípios vão sendo
suas semelhanças, para compor um todo propagados e vão orientar a perspectiva da
homogêneo, estável, previsível e quiçá,
inclusão, tais como:“autonomia”, “independência”
imutável (BRIZOLA, 2000 p.123).
e “equiparação de oportunidades”. Esses princípios
estão presentes no relatório da ONU (1994). A
Não aprendemos desde crianças a valorizar a
origem desse documento está nos movimentos
vida em sua plenitude natural e singular.
sociais, liderados por grupos de pessoas com
Aprendemos a adorar o belo, e o belo é o imediato
deficiência que já vinham trabalhando com o
produtivo do momento atual. É uma questão
movimento de vida independente e reivindicando o
sociocultural não sabermos valorizar as conquistas
direito de reconhecimento dessas questões
pessoais que serão sempre particularizadas e
(SASSAKI, 1997, p.36) Os documentos
diferenciadas. Aprendemos a cultuar um padrão de
internacionais da ONU, que apresentam relatórios
exigência de uma supercompetência para
com representações de vários países, instituem, em
podermos acompanhar o ritmo de uma sociedade
1992, “um programa de ação mundial para as
que não para de se desenvolver, do ponto de vista da
pessoas com deficiência”; esse programa é
tecnologia e seu aprimoramento. Entretanto, do
orientado pelos princípios da “igualdade” e da
066 ponto de vista da humanicidade das relações sociais
“equiparação de oportunidades” (ONU, 1992). O
principio de “equiparação de oportunidades” oportunidades com as demais crianças.
pressupõe um ajuste do meio ambiente ao sujeito, 2. Em todas as ações relativas às crianças
com deficiência, o superior interesse da
uma vez que requer dos diversos setores da criança receberá consideração primordial.
sociedade uma maior disponibilidade para todos. 3. Os Estados Partes assegurarão que as
Pessoas com deficiência são aquelas que crianças com deficiência tenham o direito
têm impedimentos de longo prazo, de de expressar livremente sua opinião sobre
natureza física, mental, intelectual ou todos os assuntos que lhes disserem
sensorial, os quais, em interação com respeito, tenham a sua opinião
diversas barreiras, podem obstruir sua devidamente valorizada de acordo com sua
participação plena e efetiva na sociedade, idade e maturidade, em igualdade de
em igualdade de condições com as demais oportunidades com as demais crianças, e
pessoas”. (Convenção sobre os Direitos das recebam atendimento adequado à sua
Pessoas com Deficiência, Artigo 1, 2008, deficiência e idade, para que possam
p.27). exercer tal direito. (artigo 7) 4

Isso demonstra que, de forma internacional, Os d i re i tos a c i m a a sse g u ra d os p e l a


já se faz presente nos debates, a questão das Convenção internacional são extremamente
interdições contextuais, como um fator importante significativos, embora ainda não materializados na
a ser considerado na organização das cidades. As prática social e cotidiana das escolas da maioria das
barreiras físicas, culturais, sociais deviam ser crianças e adolescentes de nosso país. A questão

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
pensadas como impedimento e eliminadas em um que se coloca é que crianças e adolescentes com
processo que possibilitasse aos sujeitos uma maior deficiência, por apresentarem diferenças
acessibilidade à vida em sociedade. Sintetizando, marcantes, inúmeras vezes passaram por processos
as deficiências estão nas estruturas do social que de classificação, categorização, hierarquização.
padroniza e segrega; com as pessoas, estão as Tais processos reforçaram a segregação e os
diferenças. diversos preconceitos por que passam as pessoas
nessas condições. Por conta dessas classificações:
“os seres são categorizados segundo o problema
3.3 Realidade e perspectivas para crianças que causam à sociedade: pobreza, delinquência,
e adolescentes com deficiência loucura, deficiência e tantos outros” (TOMASINI,
1998, p.114). Sendo assim, o indivíduo que é
A convenção sobre os direitos da pessoa com responsabilizado pelo “fracasso” de uma limitação
deficiência (2008) assegura sobre a criança com é retirado do espaço de direito ao usufruto da vida,
deficiência o que segue: por ser considerado culpado pelos possíveis
1. Os Estados Partes tomarão todas as transtornos que “causa” ao seu meio.
medidas necessárias para assegurar às
crianças com deficiência o pleno exercício
de todos os direitos humanos e liberdades Em circunstâncias como essas, as crianças
fundamentais, em igualdade de não só não têm seu direito assegurado como são

4 Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Extraído de: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-

2010/2009/decreto/d6949.htm. Consultado em 30/01/2012. 067


apartadas da escola, do meio onde as demais Com tal ênfase, a pessoa reduz, por uma questão de
crianças circulam, ficando segregadas em método, sua aprendizagem ao aspecto manual, à
consequência da discriminação pela sua diferença. mera execução de tarefas. O indivíduo quando não
Um exemplo de situação que comprova o dito é estimulado, em sua capacidade de pensar, de
acima, bastante comum, é o da criança que não refletir, de participar dos grupos com opiniões,
acompanha o ritmo de aprendizagem da turma de acaba limitando a expressão de sua individualidade
alunos da qual faz parte. O que acontece na maioria (TOMASINI, 1998, p.127).
das vezes? Essa criança é excluída, é deixada de
lado; não se investe em sua potencialidade. O Esses equívocos, quanto à potencialidade das
sistema de relações escolares é geralmente crianças com deficiência, provavelmente se
segregador. Aqueles que não se encaixam num devam, entre outras coisas, ao desconhecimento, à
padrão geral de desenvolvimento são retirados do limitação do conhecimento acerca das
processo. singularidades. Singular é o oposto de plural, que
significa vários. Singular é um, único, não passível à
Não é o mais comum ao sistema de ensino reprodução, à igualificação; é um só nome, uma só
uma prática inclusiva, ou seja, a utilização de pessoa, uma única forma de ser e o que é distinto
metodologias alternativas, no sentido adequá-las dos demais. Singular é o que diferencia e distingue
às peculiaridades dos alunos com deficiência. No os seres uns dos outros apesar de todos fazerem
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

ensino regular, dificilmente uma criança com algum parte da mesma espécie.
determinado tipo de déficit permanece sem ser
encaminhada ao ensino especial. Constituem-se Crianças com ou sem deficiência, se assim
determinados padrões de normalidade, como se pudessem ser classificadas, seriam distintas,
fossem parâmetros para o pertencimento ou não diferenciadas entre si, porém pertencentes ao
pertencimento. Se o parâmetro estabelecido conjunto humano social. Na perspectiva da
socialmente não for acompanhado pelos sujeitos, singularidade, é estranho refletir sobre a enorme
estes ficarão de fora daquele contexto, serão tendência das normativas sociais que buscam uma
"jogados" para outro lugar, o “lugar do diferente”, padronização dos seres humanos, que criam uma
do “especial”. Isso significa classificar e colocar em moldura social na qual todos devam se enquadrar a
segundo plano tudo que for diferente. TOMASINI despeito de sua singularidade. Por conta de tal
fala da classificação entre o “cidadão de primeira tendência, cria-se um sistema opressor nas relações
classe” e o “cidadão de segunda classe”, sendo esse da sociedade, que classifica as pessoas, que
último mais um dos estigmas relegados às pessoas consolida muralhas separatistas e que limita o
com deficiência. espaço de expressão das subjetividades. Além de
todas essas muralhas do preconceito e dos
Outra contraprova de tal estigma e conceitos separatistas entre o mundo dos ditos
(des)qualificação é a do teor histórico dado, por normais e dos ditos não normais, há as barreiras
exemplo, para as atividades das classes e das concretas da arquitetura. Nesse sentido, o relatório
escolas especiais: a ênfase é dada às atividades de pesquisa: “Avaliação dos Recursos Materiais e
068 manuais em detrimento das atividades intelectuais. Humanos: identificação dos custos dos Programas
Sociais e da Educação Infantil de Porto Alegre/RS” desenvolvido pela Fundação Irmão José Otão (2011)
aponta o gráfico que segue, quanto às entidades que atendem pessoas com deficiência:

Gráfico1: Número de entidades adaptadas com recursos de acessibilidade para o acolhimento


e/ou atendimento de pessoas com deficiência (RELATÓRIO DE PESQUISA, 2011, p. 25).

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
Fonte: Fundação Irmão José Otão- FIJO/OTS– Pesquisa CMDCA/FMDCA, 2011.

Quanto ao fato de a entidade encontrar-se adaptada para receber pessoas com deficiência, 30 (50%)
não estão adaptadas; 21 (35%) estão parcialmente adaptadas; 5 (8%), totalmente adaptadas e 3 (5%) não
responderam à questão. (RELATÓRIO DE PESQUISA, 2011, p. 25).

069
A igualdade de direitos para todas as pessoas
O gráfico apresentado mostrou que o demanda investimento em acessibilidade para
número de entidades que está de fato apta para incluir as diversas questões das diferenças. A
receber pessoas com deficiência, ou seja, livre de acessibilidade pode se traduzir pela inclusão da
barreiras, é de apenas 8%, um número bastante escrita em Braille, da língua dos sinais e da
limitando diante de um universo de 50% de acessibilidade arquitetônica. Inicia-se, assim, a
entidades sem condições de acessibilidade. Por implicação dos segmentos sociais no processo de
outro lado, a sociedade vai avançando em propiciar a qualidade de vida e a possibilidade de
legislações, em programas e em políticas públicas expansão das potencialidades daqueles sujeitos
para alcançar a acessibilidade universal, a até então considerados “incapazes”,
materialização da inclusão e a realização dos "desajustados”. Quando falamos em direitos das
direitos das crianças e dos adolescentes com crianças e dos adolescentes com deficiência,
deficiência. Uma das perspectivas que se coloca no estamos falando em direito de acesso a um mundo
horizonte para melhorar a condição de acesso das que foi historicamente interditado e que precisa se
crianças e dos adolescentes com deficiência do tornar acessível por meio das políticas públicas, da
Brasil está disposta no Programa: “Viver sem iniciativa privada e da organização de toda a
Limites”, Coordenado pela Secretaria Nacional de sociedade em conjunto e em parceria.
Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência/
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da A inclusão se pauta no princípio de


República; só para citar alguns itens que se reconhecimento da diversidade da condição
referem mais particularmente às áreas que humana, pois repensa a condição contextual dos
demandam serviços de atenção às crianças e aos sujeitos, aceitando suas diferenças, considerando-
adolescentes, no que refere acesso à Educação: as, incluindo-as na organização da vida social. A
partir desses conceitos, vai se delineando uma
BPC na Escola nova perspectiva de olhar para o ser e o seu
- 378.000 crianças e adolescentes contexto, em que o pertencimento de cada um a
Transporte Escolar Acessível sua comunidade passa ser visto como um direito.
-2.600 ônibus acessíveis Todas as pessoas têm o direito de fazer parte deste
Escola Acessível todo no qual se desenvolvem enquanto seres do
-42 mil escolas mundo.
Salas de Recursos Multifuncionais
-45 mil salas novas/atualizadas Considerações Finais
Língua Brasileira de Sinais Toda a dinâmica que caracteriza o
-Contratação de 1.296 professores e movimento do real comporta a diversidade tanto
tradutores intérpretes quanto os seres humanos em suas peculiaridades.
-27 cursos Letras/Libras - 2.700 vagas/ano Historicamente, entretanto, não tem havido
-12 cursos de Pedagogia, com ênfase na espaço para expressão, neste social, para aqueles
educação bilíngue - 480 vagas/ano PRONATEC que foram marcados por uma singularidade que
070 -150 mil vagas . foge aos parâmetros. Que problema se coloca aqui?
A grande deficiência parece se localizar na tempo de muros e interdições sociais, foram
ignorância dos atores sociais que fazem a história, criados os direitos a fim de que as pessoas que
desconhecendo as reais características daqueles foram segregadas pudessem ter algum acesso ao
que constituem a sociedade humana, ou seja, os mundo como as demais sempre tiveram. Na
seres humanos. O que esteve e está deficiente de Constituição Brasileira (1988), bem como na
fato? As estruturas da sociedade, as bases que Convenção Internacional sobre os Direitos da
sustentam essa estrutura não estiveram Pessoa com Deficiência de (2008), às crianças e aos
preparadas para comportar a diversidade, para se adolescentes é concedida prioridade máxima,
moldar ao múltiplo, ao diverso, a tudo que não se consideração primordial, exercício pleno de todos
enquadra num padrão preestabelecido. os direitos humanos, igualdade de oportunidade
A consequência direta da realidade com as demais crianças. Legislações e tratados
retratada aqui é o fato de que crianças e internacionais não nos faltam para assegurar
adolescentes com deficiência não encontraram um direitos; o que precisamos é fortalecer o exercício
mundo que acolhesse sua realidade diversa, e do controle social, da participação popular e da
processos severos de exclusão e de segregação organização da sociedade civil em geral para
começaram a ser criados, separando as pessoas, construirmos e consolidarmos espaços que possam
classificando os sujeitos. Para recuperar esse garantir a efetividade das leis e dos direitos.

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
REFERÊNCIAS
CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA. Extraído de:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.htm. Consultado em 30/01/2012.
BRASIL: VIVER SEM LIMITES. Plano Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência 2011 – 2014, Extraído de:
http://www.direitoshumanos.gov.br/destaques/viver-sem-limite/view. Consultado em 31/01/2012
BRIZOLA, Francéli. Educação Especial no Rio Grande do Sul: análise de um recorte no campo das políticas públicas.
Dissertação de mestrado. V.1. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul/Faculdade de Educação,
2000.
DECLARAÇÃO INTERNACIONAL DE MONTREAL SOBRE INCLUSÃO. Tradução Romeu Kazumi Sassaki. Congresso
Internacional 'Sociedade Inclusiva'. Montreal: 2001.
DIRETRIZES NACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO ESPECIAL NA EDUCAÇÃO BÁSICA. Parecer N. º: 17/2001. UF: Conselho
Nacional de Educação, 2001.
FERNANDES, Idilia. A Diversidade da Condição Humana: deficiências/ diferenças na perspectiva das relações
sociais. Tese de Doutorado. POA: Faculdade de Serviço Social / PUCRS, 2003.
FERNANDES, Idilia. Diversidade da Condição Humana e a Deficiência do Conhecimento: no convívio com as
diferenças e singularidades individuais. TEXTOS & CONTEXTOS. (Revista Online Pós-Graduação da FSSPUCRS). N. º2
ano II, 2004.
FERNANDES, Idilia. O lugar da Identidade e das Diferenças nas Relações Sociais. Textos & Contextos. (Revista
Online Pós-Graduação da FSSPUCRS). N.º 6, ano VI dezembro.
LIPPO, Humberto e FERNANDES, Idilia. Sociologia da Acessibilidade. Canoas: IBPEX, 2009.
LIPPO, Humberto Pinheiro. Os Direitos Humanos e as 'Pessoas Portadoras de Deficiência' In: Relatório Azul,
Assembleia Legislativa, Porto Alegre: 1997.
MARX, Karl. Manuscritos Econômicos e Filosóficos de 1844. In: Fromm, Erich. A Concepção Marxista do Homem. 8
ed. Zahar Editores, Rio de Janeiro: 1983. 071
RESENDE, Ana Paula e Vital, Flávia M. de Paiva. A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência: versão
comentada. Brasília: CORDE. 2008.
SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. Rio de Janeiro: WVA, 1997.
SKLIAR, Carlos (Org.). Educação e Exclusão: abordagens socioantropológicas em educação especial. 2. ed. Porto
Alegre: Editora Mediação, 1999
STAINBACK, Susan e STAINBACK, William. Inclusão: um guia para educadores. Tradução de Magda França Lopes.
Porto Alegre: Artes Médicas, 1999.
TOMASINI, Maria Elisabete Archer. Expatriação Social e a Segregação Institucional da Diferença: reflexões. In: Um
olhar sobre a Diferença. São Paulo: Papirus, 1998.
TOMAZ, Tadeu da Silva (org.). Identidade e Diferença: a perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis, Rio de
Janeiro: Vozes, 2000.
______________________. A produção Social da Identidade e da Diferença. In: Identidade e Diferença: a
perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 2000.
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

072
A Pesquisa Social:
notas acerca da sua aplicação no âmbito
das políticas sociais públicas

Ana Lúcia Suárez Maciel¹


Rosa Maria Castilhos Fernandes²

Considerações Introdutórias contribuir para a reflexão sobre o papel da pesquisa


social como um dos dispositivos que podem
Pesquisar “constitui uma atitude e uma favorecer e alavancar mudanças necessárias na
prática teórica de constante busca e, por isso, tem condução das políticas públicas, no caso deste
a característica do acabado provisório e do contexto, dos programas e serviços que se voltam
inacabado permanente” (MINAYO, 2006, p.47). para a garantia dos direitos das crianças e dos
Nesse argumento, encontram-se fundamentos que adolescentes. Nesse sentido, a pesquisa social,

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
embasam o entendimento dos pesquisadores que particularmente, tem a potencialidade de
participaram do processo de investigação, sistematizar conhecimentos que possam subsidiar
demandado pelo Conselho Municipal dos Diretos da as organizações e os sujeitos na compreensão mais
Criança e do Adolescente (CMDCA) e pelo Fórum dos ampliada da realidade em que vivem e, com isso,
Direitos da Criança e do Adolescente (FMDCA) da transformá-la.
cidade de Porto Alegre. Trata-se de uma pesquisa O artigo ora apresentado se estrutura da
social que está relacionada com uma necessidade seguinte forma: inicia-se com alguns apontamentos
que emerge das instâncias do controle social para básicos acerca da pesquisa social e, depois, reflete-
fortalecer as entidades que hoje operacionalizam, se sobre a necessidade e o sentido de pesquisar,
por intermédio de seus projetos e programas, a tendo como referência o protagonismo das
proteção integral às crianças e aos adolescentes no instâncias de controle social das políticas públicas.
município de Porto Alegre/RS.
Com essas considerações introdutórias 1-Apontamentos básicos da pesquisa social
acerca da pesquisa social e sua importância no
cenário da política social, em particular, das Inicialmente, é preciso esclarecer a
instâncias do controle social, tem-se a intenção de compreensão que se tem sobre pesquisa social: é
destacar alguns fundamentos teóricos que entendida como “os vários tipos de investigação
sustentaram os caminhos percorridos nesta que tratam do ser humano em sociedade, de suas
investigação. Além disso, tem-se a intenção de relações e instituições, de sua história e de sua

¹Doutora em Serviço Social (PUCRS); Professora e Pesquisadora da Faculdade de Serviço Social da PUCRS (Cursos de Graduação
e Pós-Graduação); Vice-Presidente da Diretoria Executiva da Fundação Irmão José Otão – FIJO. E-Mail: ana.suarez@pucrs.br.
²Doutora em Serviço Social. Docente do Mestrado de Memória Social e Bens Culturais e do Mestrado em Educação da UNILASALLE.
Coordenadora da Pesquisa pela FIJO, 2011. 073
produção simbólica” (MINAYO, 2006, p.47). E, visto que se trata de uma ação governamental ou da
ainda, segundo NEVES (1996), a pesquisa social sociedade (MINAYO, 2006). Esta modalidade se
valoriza a descrição e a explicação dos fenômenos, torna apropriada para o conhecimento e para a
permitindo o avanço do conhecimento na busca do
avaliação de demandas e políticas sociais, no caso
nexo causal entre os seus condicionantes e a análise
do contexto onde o fenômeno se expressa. deste processo, o campo da assistência social, com
Portanto, como qualquer fenômeno social, esta os programas voltados às crianças e aos
investigação – foco deste livro –, solicitada pelas adolescentes e ao campo da educação, com o
instâncias de controle social das políticas de atendimento às crianças na educação infantil.
proteção às crianças e aos adolescentes, está Os fenômenos sociais, ao contrário do que o
relacionada “a interesses e circunstâncias
senso comum sugere, no campo das Ciências
socialmente conectadas” (MINAYO, 2006, p.47).
Havia, na demanda pela referida pesquisa, Sociais, “não falam por si mesmos” (BAQUERO,
objetivos claros: identificar os recursos humanos e 2008, p.40), pois exigem uma explicação sobre os
os recursos materiais mensais necessários para o fatos dentro de molduras teóricas. Dessa forma, é
atendimento adequado da Educação Infantil e dos necessário organizar os fatos, analisá-los
Programas Sociais de Porto Alegre e, também, sistematicamente, submetê-los a testes de
elaborar uma Planilha de Custo por Programa, validade e avaliar, posteriormente, as implicações
especificando as despesas médias de cada categoria
analisada. De fato, ficou evidente o interesse social não somente na construção do conhecimento mas
e político dos representantes públicos e dos também na sua relevância para o desenvolvimento
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

pesquisadores em prol da qualificação das políticas social do país.


públicas na cidade de Porto Alegre. Pesquisar é um conjunto de operações
O processo de investigação instaurado sucessivas e distintas, mas todas interdependentes,
emergiu de uma necessidade das entidades da realizadas por um ou mais pesquisadores que têm o
esfera não governamental de avaliarem as despesas desafio de coletar informações válidas sobre um
atuais e imprescindíveis para a efetivação dos fenômeno observável, para, então, compará-lo e
programas sociais e da educação infantil, compreendê-lo. Portanto, não se trata somente de
desenvolvidas em parceria com a Prefeitura uma simples coleta de dados, já que exige,
Municipal de Porto Alegre. Esta foi, portanto, uma fundamentalmente, coletar dados e analisá-los à
pesquisa estratégica, pois se orientou para luz de uma teoria, de um método e de uma
problemas concretos e teve como finalidade lançar organicidade entre as questões formuladas e a
luz sobre aspectos da realidade. Os instrumentos realidade abordada (BAQUERO, 2008).
utilizados nesta investigação foram os mesmos da Outro aspecto importante de salientar é o de
pesquisa básica³ tanto em termos teóricos como que nesta investigação não se estabeleceu nenhum
metodológicos, mas a sua finalidade foi distinta, tipo de superioridade entre os dados quantitativos e

³ Minayo (2006) aborda tipos de pesquisa que dão visibilidade e legitimidade a diferentes formas de abordar a
realidade.A pesquisa básica, por exemplo, “preocupa-se com o avanço do conhecimento por meio da construção de
teorias e testes delas ou também com a satisfação da curiosidade científica. Ela não tem um objetivo prático em seu

074 projeto inicial, embora as descobertas advindas dos dados gerados possam influenciar e subsidiar tanto políticas
públicas(...) como avanços na consciência social”(MINAYO, 2006, p.50).
qualitativos. Isso significa que esses dados estão contexto dentro do qual a pesquisa ocorre
intimamente ligados uns aos outros e que a leitura (BAQUERO, 2008). Neste caso, ocorreram reuniões
da realidade desvelada foi feita de forma com as instâncias demandantes da investigação,
contextualizada, ou seja, os dados quantitativos, para que, coletivamente, fossem construídas as
no caso valores e frequências das respostas trilhas metodológicas do processo, o que se tornou
enunciadas pelas entidades, poderão deflagrar condição para a realização da pesquisa e demarcou
processos de reflexão sobre as condições das a importância dada pelos pesquisadores aos
relações entre Estado e entidades conveniadas, sujeitos que demandaram tal conhecimento.
sobre os processos interventivos, por meio das No Brasil, atualmente, verifica-se um
ações desenvolvidas com as crianças e com os conjunto de temas que são considerados relevantes
adolescentes, sobre a resolutividade das ações, e atuais para serem investigados e isso se chama de
sobre a história das entidades e sua identidade metagenda. Geralmente os órgãos financiadores de
atual, entre tantos outros aspectos que se pesquisa priorizam aquelas iniciativas que fazem
constituirão em desdobramentos desse processo. parte da metagenda. Por outro lado, é preciso
Portanto, a questão das relações entre os reconhecer que muitos estudos acabam ficando de
dados quantitativos e qualitativos tem a ver com o fora, em determinados contextos, pois não são
caráter do objeto específico de conhecimento prioritários. Evidentemente que, em um olhar mais
tratado, pois “com o entendimento dos fenômenos crítico acerca dessa prioridade, constata-se que

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
sociais há possibilidade de se analisarem nem sempre o que se pesquisa é de relevância para
regularidades, frequências, mas também relações a sociedade e, ainda, pouco incide na possibilidade
históricas, representações, pontos de vista e lógica de transferência desse conhecimento para a
interna dos sujeitos em ação” (MINAYO, 2006, qualificação dos modos de vida, das organizações
p.63). Assim, pode-se dizer que “uma boa pesquisa, sociais, das políticas públicas, entre outros. Assim,
ou seja, uma pesquisa científica pode ser é importante sublinhar que a pesquisa apresentada
quantitativa ou qualitativa. Todo e qualquer dado neste livro se origina de uma demanda; portanto,
quantitativo está baseado em julgamentos do interesse da própria sociedade, representada
qualitativos, e todos os dados qualitativos podem pelas organizações de controle social. Nessa
ser descritos e manipulados numericamente” demanda, verifica-se a identificação dessas
(BAQUERO, 2008, p.8). Complementando, é organizações com pesquisadores que atuam
importante reconhecer as diferenças entre a alinhados com a perspectiva da pesquisa como uma
pesquisa quantitativa e a qualitativa, mas o desafio estratégia de sistematização de um conhecimento
parece estar em empregá-las em benefício do crítico e capaz de subsidiar a tomada de decisão
estudo, combinando ambas para um alinhada com o interesse público.
enriquecimento acerca da compreensão e análise Nessa perspectiva, é importante destacar
do objeto de estudo. que, nos últimos anos, “uma quantia significativa
Os processos de pesquisa envolvem sempre de recursos tem sido destinada a projetos que visam
um conjunto de elementos que irão definir aquilo introduzir mecanismos de fiscalização de gastos
que é relevante e significativo para ser investigado. públicos; a promoção da equidade social e o
Um desses componentes é o que diz respeito ao monitoramento da aplicação de políticas públicas” 075
(BAQUERO, 2008, p.48). São iniciativas que podem importantes dispositivos para as mudanças
contribuir, ou que, pelo menos, deveriam necessárias na condução das políticas públicas em
contribuir, para a consolidação das políticas questão. Tem-se aqui um estudo que não pode ser
públicas e para a promoção dos direitos sociais, sob condenado ao “ostracismo no fundo de alguma
pena de se restringirem a denúncias, que acabam biblioteca” (BAQUERO, 2008, p.14), como se
por legitimar a lógica de modelos de gestão que não observa em muitas situações do campo científico.
valorizam e promovem a eficaz participação Ao contrário, espera-se que ele possa ser
cidadã. Entre a crítica, necessária no compartilhado, problematizado e desdobrado em
desenvolvimento da pesquisa social, e a sua futuras pesquisas que demarquem a necessidade de
aplicação na resolução das demandas sociais, sistematização permanente do conhecimento
característica da pesquisa em ciências sociais acerca da realidade e que inaugurem pesquisas
aplicadas, é que se situou a condução política, demandadas pelos órgãos de controle social os
teórica e metodológica dos pesquisadores que se quais, em tese, representam os interesses da
responsabilizaram por ela. sociedade no âmbito das políticas públicas.
Essa iniciativa indica, portanto, o
2- A necessidade e o sentido de pesquisar: o protagonismo dos agentes do controle social na
protagonismo das instâncias de controle social busca pela efetivação dos direitos das crianças e
das políticas públicas dos adolescentes da cidade de Porto Alegre e
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

Na esteira dessas iniciativas, é preciso destaca-se no cenário nacional, uma vez que
reconhecer que a pesquisa, demandada pelo CMDCA deflagra um processo que poderá subsidiar o
e FMDCA, caracteriza um importante processo de planejamento e a avaliação dos recursos para
monitoramento e avaliação de políticas públicas; implementação das ações específicas de cada
logo, de conexão com a efetividade, eficiência e programa analisado e também contribuir para que
eficácia de qualquer gestão pública. Faz parte do haja o diálogo democrático entre as entidades, o
processo democrático do desenho institucional e Estado e os usuários dos programas. Entretanto,
constitucional da gestão das políticas públicas desvelar a realidade local, por meio de uma
desencadear processos avaliativos com a pesquisa, não é uma tarefa fácil, pois as entidades
participação de todos os segmentos e atores sociais desse contexto possuem histórias e estruturas que
envolvidos. se diferenciam, contudo, alinham-se no trabalho
Entretanto, há uma limitação e variados em defesa dos direitos das crianças e dos
argumentos de que esses processos não são eficazes adolescentes, em sintonia com os diferentes
e/ou não contribuem para a gestão; há ainda movimentos nacionais em prol dos direitos
aqueles casos em que os estudos e diagnósticos, humanos.
realizados em órgãos públicos, pouco colaboram No cenário brasileiro, o reconhecimento da
para mudar a situação de onde partem e, criança e do adolescente como sujeitos de direitos é
tampouco, desvelam e/ou apontam necessidades resultado de um processo historicamente
de mudanças. O que há de novo nesta investigação construído, marcado por transformações ocorridas
não é só o protagonismo dos demandantes mas a no Estado, na sociedade e na família. O Plano
076 possibilidade de os resultados se constituírem em Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito
de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e princípios da Política Nacional dos Direitos
Comunitária incorpora, na sua plenitude, “a Humanos de Crianças e Adolescentes no Brasil,
doutrina da proteção integral”, que constitui a base destacam-se aqui aqueles que correspondem aos
da Convenção sobre os Direitos da Criança e do direitos humanos “exclusivos” de crianças e
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA – Lei nº adolescentes, tais como a proteção integral para
8.069/90), (CONANDA, 2011). crianças e adolescentes, a prioridade absoluta para
De acordo com essa doutrina jurídica, a crianças e adolescentes e o reconhecimento de
criança e o adolescente são considerados “sujeitos crianças e adolescentes como sujeitos de direitos.
de direitos”. O fato de terem direitos significa que No que se refere à prioridade absoluta para crianças
são beneficiários de obrigações por parte de e adolescentes, deve-se considerar que essa
terceiros: a família, a sociedade e o Estado. É, garantia de prioridade absoluta implica a primazia
então, neste cenário que se torna imprescindível a de receberem proteção e cuidados, a precedência
participação do controle social, principalmente, no atendimento e a preferência na formulação e
diante do atual modelo de gestão de políticas execução de políticas, bem como na destinação de
públicas, na medida em que pode contribuir para a recursos públicos (CONANDA, 2011).
consolidação do processo democrático e ampliar o Para tanto, é preciso observar que o estudo
acesso da população aos direitos garantidos na dos princípios e das diretrizes da Política Nacional
legislação brasileira. dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
Com a Constituição Federal de 1988, foram precisa de um olhar apurado para as comunidades
instituídos os conselhos de políticas públicas, entre onde estão se desenvolvendo as políticas que
eles o Conselho Municipal dos Direitos das Crianças atendem às necessidades desse segmento
e dos Adolescentes – CMDCA, a partir da populacional. Somente assim é possível adequar a
regulamentação do ECA. Nesse sentido, observa-se gestão das políticas às demandas territoriais e fazer
que o CMDCA e o FMDCA, instâncias de controle jus ao que chamamos de defesa dos direitos das
social representativas das entidades que crianças e dos adolescentes. Afinal, a gestão dos
operacionalizam suas ações voltadas para o Programas Sociais e da Educação Infantil, que
atendimento de crianças e adolescentes, vêm ocorre por intermédio das parcerias firmadas, é um
orientando suas ações de forma a incidir sobre a processo por meio do qual uma ou mais ações são
gestão pública, naquilo que diz respeito aos planejadas, organizadas, dirigidas, coordenadas,
programas e serviços voltados à infância e à executadas, monitoradas e avaliadas, tendo em
juventude de Porto Alegre. Isso demonstra que os vista a eficiência, que requer recursos e o uso
conselheiros do CMDCA e as entidades do FMDCA, racional destes; a eficácia, que pressupõe a
atores políticos desse processo, compreendem a realização dos objetivos planejados, e a
importância do seu papel nesse contexto, tornando efetividade, que produz os impactos esperados
essas instâncias espaços democráticos, sobre a realidade local.
participativos e de tomada de decisões, mas,
fundamentalmente, de construção de uma política Considerações Finais
de proteção social de forma compartilhada.
Em que pese a relevância e a interlocução dos Os resultados que emergiram com a pesquisa 077
e o processo participativo desencadeado por ela ser a principal lição aprendida nesse processo, pois,
evidenciam a importância desse dispositivo no na pesquisa social e na ciência contemporânea, o
âmbito das políticas públicas, uma vez que os seus conhecimento só tem sentido se puder ser
resultados poderão vir a qualificar o atendimento transferido para a sociedade, respondendo as suas
das necessidades das crianças e dos adolescentes da demandas e tornando visível a realidade.
nossa cidade. Entretanto, esse conhecimento só pode ser efetivo
Igualmente cabe referir que o interesse se for crítico e propositivo, assentado em firmes
político dos pesquisadores em sistematizar este bases epistemológicas, teóricas e metodológicas.
breve artigo se originou da percepção de que, Recomenda-se, igualmente, que novas
muitas vezes, reproduz-se o distanciamento entre pesquisas possam vir a ser desenvolvidas, a fim de
os pesquisadores – normalmente localizados em constituir uma agenda de pesquisa social própria da
estruturas acadêmicas – e os sujeitos cidade de Porto Alegre, e que nela orbitem redes de
demandatários, no caso desta pesquisa, cooperação compostas por pesquisadores,
representantes da sociedade na instância do gestores, operadores e usuários das políticas
controle social de uma política pública. Romper públicas alinhados com as concepções brevemente
com essa percepção, aproximando pesquisadores e elencadas neste artigo.
sujeitos que operacionalizam as políticas parece
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

REFERÊNCIAS
BAQUERO, Marcello. A pesquisa quantitativa nas Ciências Sociais: uma introdução. Porto Alegre: UFRGS, 2008.
CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DOS ADOLESCENTES-CONANDA, 2011. Disponível em:
http://www.direitoshumanos.gov.br/conselho/conanda
MATTOS, Pedro Lincoln. Sobre a ética do pesquisador: uma dimensão pouco explorada. In: Gestão.Org. Revista
Eletrônica de Gestão Organizacional. V.3, Nº3, Set/Dez 2005. Disponível em: www.gestaoorg.dca.ufpe.br.
MINAYO, Maria Cecília. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. São Paulo: HUCITEC, 2006.
NEVES, José Luis. Pesquisa qualitativa – características, usos e possibilidades. In: Caderno de pesquisas em
administração. São Paulo, V.1, Nº3, 2º Sem./1996.

078
PARTE 2

A PESQUISA:

Avaliação dos Recursos Materiais e Humanos:


identificação dos custos dos Programas Sociais
e da Educação Infantil de Porto Alegre/RS.
NOTAS METODOLÓGICAS DA PESQUISA estudada. Para tanto, foram consideradas as
entidades que fazem parte do CMDCA do município
A pesquisa procurou responder a questão de Porto Alegre e que possuem convênio com a
central: Como as entidades vinculadas ao CMDCA e Prefeitura de Porto Alegre, mais especificamente,
ao FMDCA, pertencentes à Rede Conveniada da com a Fundação de Assistência Social e Cidadania –
Educação Infantil e dos Programas Sociais, levando FASC, nos casos do Programas Sociais e com a
em consideração o mês de outubro de 2010, vêm Secretaria Municipal de Educação – SMED, no caso
operacionalizando, com seus recursos humanos e da Educação Infantil. Para compor a amostra,
materiais, as ações de proteção integral a crianças conforme o demonstrado no quadro 1, foram
e adolescentes na cidade de Porto Alegre? sorteadas 15% das entidades conveniadas por
programa, exceto o Programa Aprendizagem, cujas
A definição do plano amostral da pesquisa se entidades que dele participaram não possuem,
deu com base nas informações (listagens dos ainda, convênio com órgão governamental, mas não
Programas Sociais e da Educação Infantil) foram excluídas, pois foi considerado em função da
repassadas pelo CMDCA à FIJO, por meio de uma relevância dos dados, o interesse delas em
amostra probabilística estratificada, assegurando, participar do processo.
dessa forma, a representatividade da população

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
Quadro 1: Moldura Amostral da Pesquisa FMDCA/CMDCA

TOTAL DA AMOSTRA QUANTITATIVO FINAL


PROGRAMAS
POR ESTRATO DA AMOSTRA
Educação Infantil 31 22
SASE 26 20
TE 08 05
APRENDIZAGEM** 03 03
ABRIGAGEM 03 03
PCD’S 03 03
AÇÃO RUA 03 03
TOTAL 76 59
**Programa sem convênio com a esfera pública municipal.
Fonte: Fundação Irmão José Otão- FIJO/OTS– Pesquisa CMDCA/FMDCA, 2011.

Após a definição da amostra, iniciou-se o quantitativa e qualitativa, o instrumento de coleta


processo de sensibilização das entidades para dos dados contempla questões fechadas e abertas.
participação do processo de pesquisa que se deu por Para cada um dos sete programas que integram a
meio de contatos telefônicos, e-mails e reuniões do amostra desta pesquisa (SASE, Abrigagem
FMDCA. (Acolhimento Institucional), Aprendizagem,
Alinhado com o tipo de pesquisa, de natureza Pessoas com Deficiência, Ação Rua, Trabalho 081
Educativo e Educação Infantil), foi elaborado um para que as entidades realizassem o preenchimento
q u e s ti o n á r i o ( d i s p o n í v e l e m online das informações na entidade. Todos
www.fijo.org.br/eixos_atuação.php) com objetivo receberam o link do questionário e a senha
de contemplar as diversidades dos programas. Os (conforme o programa), por e-mail, para ser
questionários dividem-se em três partes: a Parte I, preenchido e encaminhado à FIJO, o que consistiu
refere-se aos dados de identificação da entidade; a na segunda etapa do processo de coleta dos dados.
Parte II, refere-se à planilha de custo por Programa, Houve o monitoramento por parte da FIJO
e a Parte III, refere-se à identificação dos Recursos esclarecendo dúvidas e, em algumas situações, as
Humanos e dos Recursos Materiais das entidades. O entidades utilizaram o equipamento da FIJO para
mês de referência para o fornecimento dos dados preencher o questionário.
solicitados foi o de outubro de 2010. Todos Quando encerrado o prazo limite para o
participantes preencheram o termo de término de preenchimento do questionário online
consentimento livre e esclarecido para o pelas entidades, os participantes que não o
atendimento dos requisitos éticos da pesquisa. Para finalizaram foram excluídos da pesquisa.
validação do instrumento de coleta de dados, um
pré-teste foi realizado com três entidades (uma de O processo de tratamento estatístico dos
Educação Infantil e duas de Programas Sociais); resultados se deu por meio do processamento dos
A aplicação dos questionários consistiu em dados mensurados, a partir das frequências de
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

duas etapas: a orientação para autopreenchimento ocorrências, e por meio da análise dos conteúdos
do questionário, que ocorreu na FIJO, em pequenos com relação às questões qualitativas. No que se
grupos, e que contemplou a diversidade dos refere à planilha de custos de cada programa em
Programas, com data e horário preestabelecidos; análise, foi considerada a média de cada item
todos os participantes receberam ajuda de custo preenchido, pois o cálculo está embasado de acordo
para o deslocamento da entidade até a FIJO. As com os respondentes e com o critério de possuir
entidades da amostra foram contatadas (por convênio com a Prefeitura Municipal de Porto Alegre
telefone e por e-mail) e, para cada uma, foi ( PMPA) nos Programas indicados.
disponibilizada a participação de, no mínimo, duas Os questionários preenchidos, em cada
e d e , n o m á x i m o, trê s p e s s oa s ( G e s tor- programa, foram revisados. Nos casos em que houve
representante da Direção, Contador e/ou Técnico necessidade, contatos telefônicos foram feitos com
do Programa). Ao final dessa orientação, os os responsáveis de algumas entidades pelo
participantes receberam uma versão impressa do preenchimento do questionário para fins de
instrumento de coleta. confirmação dos dados e das informações
Posteriormente, foi disponibilizada uma disponibilizadas no material.
plataforma online (www.fijo.org/cmdca) com
características idênticas às do material impresso

082
ANÁLISE DOS RESULTADOS Programa Aprendizagem, configurando 54
entidades.
O número final das entidades participantes
configura a amostra de 59 entidades (n:59). Estas 1 PERFIL DAS ENTIDADES
são oriundas de diversas microrregiões do município
de Porto Alegre/RS, com registro no Conselho Esta parte do estudo considera o perfil das
Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente – entidades que compõem a amostra da pesquisa. Os
CMDCA, que operacionalizam pelo menos um dos 7 responsáveis pelo preenchimento do questionário
programas considerados neste estudo. São eles: ocupam os seguintes cargos dentro das entidades:
Educação Infantil, Serviço de Apoio Socioeducativo– presidência, diretoria, coordenador(a)
S A S E , Tr a b a l h o E d u c a t i v o , J o v e m pedagógico(a), coordenador(a) de programas
Aprendiz/Aprendizagem, Pessoas com Deficiência – sociais, responsável técnica pelo programa,
PCD's, Ação Rua e Abrigagem (Acolhimento gerente financeiro, técnico contábil, diretor
Institucional). administrativo, assistente social, pedagoga,
Para a análise dos resultados referentes às superintendente, entre outros.
parte 1 e 3 do questionário, foi considerado a Conforme o gráfico 1, no que se refere à
amostra de 59 entidades, porém, para fins de forma jurídica das entidades que compõem a
cálculo da planilha de custo, que se refere à parte amostra da pesquisa, os resultados indicam que 53

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
2, foram consideradas apenas as entidades que (90%) entidades são associações e que 6 (10%) delas
possuem convênio com a Prefeitura Municipal de são fundações.
Porto Alegre – RS, exceto as três entidades do

Gráfico 1: Percentual das Entidades, conforme a forma jurídica

Fonte: Fundação Irmão José Otão- FIJO/OTS– Pesquisa CMDCA/FMDCA, 2011. 083
Com relação ao tipo de título e/ou e esforços de pessoas em torno de um propósito que
certificação, de acordo com o gráfico 2, pode-se não tenha finalidade lucrativa e que vise a
aferir que, das 59 (100%) entidades entrevistadas, beneficiar outras pessoas – benefício público. Tais
20 (33%) delas referem possuir o Certificado de iniciativas demonstram a organização das
Entidade Beneficente de Assistência Social associações em territórios onde emergem as
(CEBAS¹) e 67% não possuem CEBAS. Predomina, nos demandas atendidas nos Programas Sociais e na
resultados, a natureza jurídica associação, que são Educação Infantil, foco desta pesquisa.
pessoas jurídicas criadas a partir da união de ideias

Gráfico 2: Número de Entidades, segundo o tipo de título e/ou certificação


O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

Fonte: Fundação Irmão José Otão- FIJO/OTS– Pesquisa CMDCA/FMDCA, 2011

¹A certificação das entidades beneficentes de assistência social e a isenção de contribuições para a seguridade social serão
concedidas às pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, reconhecidas como entidades beneficentes de assistência
social com a finalidade de prestação de serviços nas áreas de assistência social, saúde ou educação, e que atendam ao disposto
nesta Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993. A Lei Nº 12.101, de 27 de Novembro de 2009, modificou a forma de concessão do
Certificado de Entidades Beneficentes de Assistência Social (CEBAS). Agora, a emissão e renovação da certificação não serão mais
responsabilidade do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), mas dos ministérios do Desenvolvimento Social e Combate à
Fome, da Saúde e da Educação, de acordo com a finalidade de cada instituição (Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à

084 Fome – MDS, disponível em http://mds.gov.br/falemds/perguntas-frequentes/assistencia-social/assistencia-social/gestor/gestor-


cnas-conselho-nacional-de-assistencia-social. Consultado em 03 de maio de 2011).
Nesta pesquisa, como critério de inclusão, CMDCA , Conselhos Estadual de Educação, Conselho
foram consideradas as entidades que possuem Municipal de Saúde, Conselho Municipal Desportos,
registro no CMDCA. Além deste, 39 (66%) entidades Conselho Estadual de Assistência Social – CEAS,
têm Utilidade Pública Municipal; 30 (50%) entidades Certidão de Registro Secretaria da Justiça e
têm Utilidade Pública Estadual; 22 (37%) entidades Desenvolvimento Social, entre outros,
têm Utilidade Pública Federal²; 28 (47%) entidades demonstrando que as entidades participantes estão
possuem credenciamento no Conselho Municipal de inseridas em diferentes conselhos e espaços de
Educação – CME; 48 (81%) entidades possuem controle social democrático. Observa-se, nos
credenciamento no Conselho Municipal de resultados apresentados no gráfico 2 que 20 (33%)
Assistência Social – CMAS; 3 (5%) não sabem entidades possuem a Certificação de Entidades
informar e 26 (44%) entidades responderam ao item Beneficentes de Assistência Social - CEBAS³,
“outro” e disponibilizam as seguintes informações: concedido às pessoas jurídicas de direito privado,

Gráfico 3: Percentual do tipo de qualificação das Entidades

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
Fonte: Fundação Irmão José Otão- FIJO/OTS– Pesquisa CMDCA/FMDCA, 2011.

²Importante destacar que a declaração de utilidade pública, regulamentada pela Lei nº 91/35 e pelos decretos nº 50.517/61 e nº
3.415/00, é pré-requisito para a solicitação do CEBAS. A declaração é outorgada pelo Ministério da Justiça à entidade que
desenvolve atividades úteis ao público, de relevante valor social, que realiza o bem em prol da coletividade e que cumpre os
requisitos legais para fazer jus a tal titulação.
³Lei 12.101 de 27 de novembro de 2009 e o Decreto 7.237 de 20 de julho de 2010. Ver em: www.planalto.gov.br 085
sem fins lucrativos, que prestem serviços nas áreas qualificação e 17 (29%) assinalam o item “não sabe
de assistência social, saúde ou educação. informar” e 6 (10%) não responderam ao item.
Com relação aos resultados sobre a O gráfico 4 demonstra a questão dos recursos
qualificação 4 das entidades, conforme o gráfico 3, financeiros mobilizados pela entidade para atender
registra-se que 2 (3%) se qualificam como às demandas dos projetos operacionalizados. Esta
Organizações da Sociedade Civil de Interesse é uma questão de múltipla escolha; cada entidade
Público Federal (OSCIP), 2 (3%), como OSCIP pode, portanto, ter assinalado mais de uma origem
Estadual, 21 (35%), como Organização Social (OS), do recurso.
11 (18%) das entidades referem não ter registro de

Gráfico 4: Número de Entidades, segundo a origem dos recursos financeiros mobilizados


O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

Fonte: Fundação Irmão José Otão- FIJO/OTS– Pesquisa CMDCA/FMDCA, 2011.

4
Sobre a qualificação é importante esclarecer que OSCIP é uma qualificação destinada a organizações que se qualificam como de
interesse público e podem firmar Termo de Parceria com o Estado, sendo o Ministério da Justiça o órgão que avalia, reconhece e
expede o certificado de OSCIP – Lei nº. 9790/99; OS é uma forma de qualificação para as organizações que realizam
especificamente atividades dirigidas ao ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, meio ambiente, cultura e saúde,

086 até então desempenhadas, diretamente, pelo Poder Público. Essas organizações firmam contrato de gestão com o Estado para
prestação de serviços – Lei nº. 9637/98.
Os resultados e as diferentes origens dos 2 . C U S TO M É D I O G E R A L P O R
recursos mobilizados pelas entidades apontam que PROGRAMAS E PLANILHAS DE CUSTO
33 (56%) entidades possuem recursos próprios; 25
(42%) recebem doações de pessoas jurídicas –
Para fins de cálculo, nesta etapa da pesquisa,
direto; 29 (49%), doações pessoas de pessoas
foram consideradas somente as planilhas
jurídicas – via FUNCRIANÇA; 31 (52%), doações de
preenchidas pelas entidades que referiram ter
pessoas físicas – direto; 17 (29%), doações de
metas conveniadas com Prefeitura Municipal de
pessoas físicas via FUNCRIANÇA4 ; 26 (44%),
Porto Alegre/PMPA – RS, exceto o Programa
contribuição dos pais na Educação Infantil; 9 (15%),
Aprendizagem, conforme já informado
recursos públicos estaduais; 54 (91%), recursos
anteriormente nas notas técnicas deste relatório.
públicos municipais; 15 (25%), recursos públicos
No processo de tratamento dos dados, no
federais; 4 (7%) mobilizam recursos internacionais;
item referente aos encargos sociais, observou-se
34 (57%) recebem doação do banco de alimentos; 32
que os dados informados por mais de 50% das
(54%), doação do Programa Mesa Brasil 5. Referente
entidades não atendiam ao enunciado da questão,
ao item “outros", 9 (15%) entidades marcaram-no e
pois os cálculos para fornecimento da informação
disponibilizaram as seguintes informações: Igreja
não seguiram a lógica indicada no enunciado. Com
Santa Teresinha do Menino Jesus, Rede de Parceria
base nessa constatação, foi utilizado um percentual
Social, Mensalidade Ensino Médio,

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
pré-fixado sobre os encargos sociais para o cálculo
Promoções/eventos, Associação Funcionários do
destes (foram considerados os valores informados
Banco do Brasil, Cooperativa dos Pequenos
pelos participantes sobre os Recursos Humanos
Produtores, Portal Social (Fundação), Alimentos da
tanto nos gastos atuais, quanto nos recursos
Secretaria Municipal de Educação (SMED) da PMPA.
necessários), conforme legislação em vigência no
A amostra final da Educação Infantil,
País. Para as entidades que referiram ter o CEBAS, o
referente às etapas 1 e 3, é de 22 entidades, porém
cálculo foi realizado em coerência com esse
26 sinalizam que recebem contribuição dos pais.
benefício. O apêndice B demonstra os valores pré-
Isso pode ocorrer em função de uma entidade, que
fixados; foi aplicado o percentual de 36,13% para as
participou do preenchimento de questionário de
entidades com filantropia (CEBAS) e, para as
outro Programa Social, operacionalizar também a
entidades sem filantropia, o percentual de 60,63%.
Educação Infantil. É comum uma entidade
Para fins de demonstração dos resultados da
desenvolver Programas Sociais e o Programa da
Planilha de custo por Programa, apresenta-se,
Educação infantil, concomitantemente, embora
nesta parte do relatório, o cálculo do custo médio
isso não esteja demonstrado nesta pesquisa.
(média dos subtotais) de todos os programas,

4O Fundo Municipal da Criança e do Adolescente – FUNCRIANÇA – é um fundo público, de âmbito municipal, financiador da
implementação de políticas voltadas para a garantia de direitos da criança e do adolescente. Ele é previsto pela Lei Federal 8069/90 –
Estatuto da Criança e Adolescente e Lei Municipal 6787/91. Disponível em:
http://ong.portoweb.com.br/mestrejesus/default.php?p_secao=11&PHPSESSID=26f73c46b932aeee472ba39b574bc2e6 . Consultado
em 15 de junho de 2011.
5
O Programa Mesa Brasil SESC é um Programa de Segurança Alimentar e Nutricional. 087
considerando a respectiva amostra; e a planilha de resultados em valores médios, estas se constituem
custo médio, considerando o nº de respostas por em importante subsídio para adequação dos custos
item do questionário; os respectivos resultados, de acordo com cada categoria por programa.
discriminados por programa, considerando todas as São 22 as entidades que compõem a amostra
variações por item explorado no questionário, da Educação Infantil; porém, desse quantitativo,
encontram-se na parte: Tabelas de Resultados das duas entidades optaram por não preencher as
Planilhas de Custo (a partir da página 38) que se planilhas e uma informou não ter metas
caracterizam como um instrumento consultivo dos conveniadas. Sendo assim, a amostra final
recursos materiais e humanos acionados pelas referente aos custos da Educação Infantil é
entidades. Embora as Planilhas apresentem os composta por 19 entidades.

Tabela 1: Custo Médio do Programa Educação Infantil(n 19)


O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

Fonte: Fundação Irmão José Otão- FIJO/OTS– Pesquisa CMDCA/FMDCA, 2011.

088
Três entidades compõem a amostra do Programa Acolhimento Institucional (abrigagem).
Tabela 2: Custo Médio do Programa Acolhimento Institucional (Abrigagem) (n 3)

Fonte: Fundação Irmão José Otão- FIJO/OTS– Pesquisa CMDCA/FMDCA, 2011.

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
Três entidades compõem a amostra do Programa Pessoas com Deficiência – PCDs.
Tabela 3: Custo Médio Programa PCDs (n 3)

Fonte: Fundação Irmão José Otão- FIJO/OTS– Pesquisa CMDCA/FMDCA, 2011.


São 20 as entidades que compõem a amostra do Programa Serviço de Apoio Socioeducativo – SASE;
porém, desse quantitativo, duas entidades referiram não ter metas conveniadas. Sendo assim, a amostra
final referente aos custos do SASE é composta por 18 entidades. 089
Tabela 4: Custo Médio por Programa SASE (n 18)

Fonte: Fundação Irmão José Otão- FIJO/OTS– Pesquisa CMDCA/FMDCA, 2011.

Cinco entidades compõem a amostra do Programa Trabalho Educativo – TE.


O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

Tabela 5: Custo Médio do Programa Trabalho Educativo (n 5)

Tabela 5: Custo Médio do Programa Trabalho Educativo (n 5)

Fonte: Fundação Irmão José Otão- FIJO/OTS– Pesquisa CMDCA/FMDCA, 2011.

Três (3) entidades compõem a amostra do Programa Ação Rua. Destaca-se, que neste Programa, em
vez de metas conveniadas, os dados aqui informados sobre os custos das entidades referem-se a um
090 núcleo conveniado.
Tabela 6: Custo Médio do Programa Ação Rua (n 3)

Fonte: Fundação Irmão José Otão- FIJO/OTS– Pesquisa CMDCA/FMDCA, 2011.

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
Três entidades compõem a amostra do Programa Aprendizagem/Jovem Aprendiz. Importante destacar
que esses programas, atualmente, não têm metas conveniadas com a PMPA. Nesse caso, os programas foram
mantidos intencionalmente no estudo para que se possam desvelar os gastos dessas entidades para a
operacionalização dessa demanda.

Tabela 7: Custo Médio do Programa Aprendizagem/Jovem Aprendiz (n 3)

Fonte: Fundação Irmão José Otão- FIJO/OTS– Pesquisa CMDCA/FMDCA, 2011. 091
3 Identificação dos Recursos Humanos e dos Recursos Materiais

Com relação à situação do imóvel da entidade entrevistada, observa-se que 27 (46%) entidades
referem ter imóvel próprio; 6 (10%) referem que o imóvel é alugado; em 21 (35%) entidades, o imóvel é
cedido; 5 (8%) entidades não responderam ao item e, no campo “outros”, consta, no resultado, a seguinte
informação: “imóvel construído com recurso próprio em terreno cedido pela PMPA” e comodato.

Gráfico 5: Número de Entidades, conforme a situação do imóvel da entidade


O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

Fonte: Fundação Irmão José Otão- FIJO/OTS– Pesquisa CMDCA/FMDCA, 2011.

092
De acordo com o gráfico 6, os materiais utilizados na estrutura das entidades respondentes são os
seguintes: 51 (86%), alvenaria; 1 (2%), madeira; 4 (7%), misto e 3 (5%) não responderam à questão.

Gráfico 6: Número de Entidades e o respectivo material utilizado na estrutura das entidades

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
Fonte: Fundação Irmão José Otão- FIJO/OTS– Pesquisa CMDCA/FMDCA, 2011.

Sobre a disponibilidade de materiais permanentes, necessários às atividades, 36 (61%) entidades


consideram que estes são insuficientes; 20 (33%), suficientes e 3 (5%) entidades não responderam à questão.

093
Gráfico 7: Percentual sobre a disponibilidade de materiais permanentes necessários às atividades da entidade

Sobre a disponibilidade de materiais de consumo, necessários às atividades, 38 (64%) entidades


consideram que estes são insuficientes; 18 (30%), suficientes e 3 (5%) não responderam à questão.
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

Gráfico 8: Número de Entidades, segundo avaliação sobre a disponibilidade


de materiais de consumo necessários às atividades da entidade

Fonte: Fundação Irmão José Otão- FIJO/OTS– Pesquisa CMDCA/FMDCA, 2011.


Quanto ao fato de a entidade encontrar-se adaptada para receber pessoas com deficiência, 30 (50%)

094 não estão adaptadas; 21 (35%) estão parcialmente adaptadas; 5 (8%), totalmente adaptadas e 3 (5%) não
responderam à questão.
Gráfico 9: Número de Entidades adaptadas com recursos de acessibilidade para
o acolhimento e/ou atendimento de pessoas com deficiência

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
Fonte: Fundação Irmão José Otão- FIJO/OTS– Pesquisa CMDCA/FMDCA, 2011.

Sobre os resultados referentes aos Recursos Humanos das entidades, o número de pessoas que
atuam nos programas é descrito de acordo com a formação e o regime de contrato; consideram-se os
seguintes âmbitos: Nível Superior, Nível Médio Técnico, Nível Médio e Ensino Fundamental. Observa-se que,
com nível superior, há 263 funcionários, 65 voluntários, 31 estagiários; 29 prestadores de serviços e 9 que são
cedidos, conforme os resultados demonstrados no quadro 2.

095
Quadro 2: Número de pessoas que atuam nos programas de acordo
com a formação e regime de contrato

Quanto às pessoas com formação no nível pelos órgãos municipais da PMPA. Observa-se que há
médio técnico (técnico agrícola, técnico em uma especificidade de necessidades e de avaliação
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

informática, magistério, técnico de segurança e por programas.


saúde do trabalho, entre outros), os resultados
indicam 119 funcionários, 33 voluntários, 17
estagiários e 1 prestador de serviço. Com relação às Sobre os espaços físicos disponíveis
pessoas com formação em nível médio, há 218 na entidade
funcionários, 27 voluntários, 9 prestadores de
Quando questionados sobre os espaços
serviço e 3 estagiários. Sobre os funcionários com
físicos disponíveis na entidade, se são suficientes
formação no ensino fundamental, verifica-se que
ou insuficientes, predomina a indicação de que são
há 152 funcionários, 12 voluntários, 10 prestadores
insuficientes, nos Programas Educação Infantil,
de serviço, 1 estagiário e 1 cedido. O número total
SASE, Trabalho Educativo e Ação Rua; foram
de pessoas que atuam nas atividades dos programas
indicadas as seguintes necessidades:
das 59 entidades participantes é de 1000 pessoas. Reformar as salas e telhado, por questões
Na parte III do questionário, as questões de goteiras. Aquisição de mais uma sala
abertas desvelam dados pertinentes aos espaços para a equipe. Adequar parte do espaço
físicos disponíveis na entidade; melhorias para atendimento de pessoas com
deficiência. Não são. O local que possuímos
necessárias no espaço físico para atender à hoje poderia ser reestruturado com o valor
demanda atual; principais recursos materiais que devolvemos para poupança (Programa
(permanentes ou de consumo) que precisam ser Ação Rua).
adquiridos; avaliação da situação atual dos recursos
Necessidade urgente de um salão para
096 humanos disponíveis na entidade, e sobre os
recursos financeiros (conveniados), repassados
eventos e uma sala nova para atender as
crianças do jardim A e B que estão ficando demanda da educação infantil. Porém,
no mesmo espaço físico; os espaços são temos a necessidade de construir uma
insuficientes. As melhorias seriam adequar rampa de acesso ao salão de eventos e na
as salas já existentes, cozinhas e pracinha para evitar quedas das crianças.
banheiros. E também construir mais 5 ou 6 São necessárias também melhorias no
salas. Não são suficientes. Construção de estacionamento e reformas no prédio
um refeitório. Brinquedoteca, uma sala (Programa Educação Infantil).
para assistir televisão, uma biblioteca e um
espaço para atividades recreativas e Os espaços físicos são suficientes. Serão
brinquedos de praça (Programa Educação necessárias pinturas, rebocos, isto é,
infantil). manutenção programada. Serão
necessárias também reforma das
instalações elétricas, hidráulicas e uma
As entidades do Programa correspondente ao
grande reforma estrutural (Programa
atendimento de PCDs indicaram que o espaço físico SASE).
existente é suficiente para atender a demanda
atual. O Programa Aprendizagem refere que:
Sobre os principais recursos materiais
Atende a demanda atual. No caso de novas
contratações, precisaríamos de (permanentes ou de consumo) necessários
adaptações; os espaços disponíveis são Com relação aos resultados sobre os

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
suficientes parcialmente. As melhorias principais recursos materiais (permanentes ou de
necessárias seriam: quadra poliesportiva
consumo) necessários de serem adquiridos para
coberta e laboratório de informática
(Programa Aprendizagem). atender a demanda atual dos referidos Programas,
destacam-se (em todos os questionários) os
Nos resultados, são indicadas necessidades materiais didáticos e pedagógicos, incluindo
de melhorias no espaço físico; algumas estão em brinquedos, jogos, acessórios esportivos e livros. No
fase de execução, como no caso do Programa Programa Educação Infantil, além dos citados
Acolhimento Institucional (abrigagem); outras, a anteriormente, predominam os seguintes itens:
serem implementadas, inclusive para dar conta da colchonetes, lençóis, cobertores, berços, cadeira
demanda existente e para ampliar o atendimento à d e p a p á , e n t r e o u t r o s . N o s Pr o g r a m a s
demanda reprimida que há na comunidade das Aprendizagem, TE, Ação Rua destacam-se, entre os
entidades: resultados, a necessidade de equipamentos tais
como: computadores e acessórios de informática.
As melhorias necessárias para que possa Somente uma entidade, entre as 59 participantes,
ser colocado à disposição um número de respondeu ao questionário, afirmando que dispõe
vagas que hoje já existe previsão seria as de todo material necessário: “Dispomos de todos os
de: reformar salas já atuantes, uma área
coberta que pode se dispor de sala, e uma
materiais necessários” (Programa SASE); e uma
sala de recreação; obras e reparos de entidade respondeu que: “No momento não há
adequação dos espaços, propiciando necessidade de aquisição de novos equipamentos.
melhor acessibilidade e atendimento aos Fazem-se necessários recursos para manutenção
educandos; os espaços físicos disponíveis
na entidade são suficientes para atender a
dos equipamentos existentes.” (Programa TE). Na
097
área de consumo, destaca-se a necessidade de situação dos recursos humanos, embora cite a
aquisição dos seguintes alimentos: carnes de gado e necessidade de contratação de profissionais. As
frango, citados pelos Programas: Educação Infantil, entidades respondentes do Programas Educação
SASE e TE. Infantil avaliam que a situação dos recursos
humanos, nesses programas, é boa, embora
Sobre a avaliação da situação atual dos indiquem necessidade de aprimoramento com a
recursos humanos nas entidades contratação de pessoal para dar conta da demanda
Quanto à questão que avalia a situação atual atual, bem como a revisão dos salários
dos recursos humanos nas entidades, predominam, (principalmente no caso dos educadores),
entre os resultados, a preocupação com a compatíveis com a carga horária e com a
qualificação profissional e com a formação competência profissional exigida para o
continuada dos profissionais que estão atuando nas atendimentos das crianças.
Péssimo! A primeira que deve ser revista é
entidades. Diferentes investimentos têm sido feitos
baixa remuneração de funcionários com
(e são citados como permanentes) pelas entidades, ensino médio a nível superior; a segunda
promovendo a formação, para melhor atender às seria mais suporte da parte governamental
necessidades das crianças e dos adolescentes para continuar/melhorar a qualidade do
beneficiados com as ações dos Programas Sociais e atendimento.
c o m a E d u c a ç ã o I n f a n t i l . O s Pr o g r a m a s
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

Contamos com uma equipe muito boa,


Acolhimento, Aprendizagem e PCDs apresentam, pessoas qualificadas e dispostas.
em seus resultados, um nível de maior satisfação Funcionárias que com certeza se realizam
com os recursos humanos existentes, embora com o trabalho que fazem com as crianças.
Um exemplo é que temos funcionários com
indiquem a necessidade do trabalho mais de 20 anos de casa; outros já
multidisciplinar: “Os recursos humanos são passaram dos dez e continuam buscando
suficientes, porém, para um atendimento mais aperfeiçoamento para progredirem no que
eficaz, faz-se necessária uma equipe fazem.
multidisciplinar com psicólogo e assistente social”
Nossa situação é satisfatória; conseguimos
(Programa Aprendizagem). atender, de modo geral, normalmente e
Na especificidade do Programa Acolhimento, conforme nosso PPP e regimento. Até
há uma dificuldade e, ao mesmo tempo, porque temos nosso projeto de Formação
Continuada e estamos sempre em
necessidade de contratação do chamado cuidador
constantes estudos. Necessitamos de mais
residente, conforme o citado: “Nossa grande um funcionário para abrirmos outro
dificuldade é referente ao corpo de colaboradores, maternal, pois nossa demanda para essa
em especial, as cuidadoras residentes, profissionais faixa etária é muita e mais um funcionário
estas que, pela exigência dentro do Sistema de para os serviços gerais, pois temos uma
escola grande e muito serviço para uma só
Competências Desenvolvimento e Resultados, são (Programa Educação Infantil).
difíceis de encontrar neste perfil. No entanto, nossa
maior prioridade é a contratação de cuidadoras O Programa SASE apresenta, nos resultados,

098 residentes”.
O Programa TE avalia positivamente a
a avaliação mais crítica em relação aos Recursos
Humanos, pois todas as 20 entidades respondentes cultural.
citam a necessidade de contratação de um maior Sobre a avaliação das entidades quanto aos
número de funcionários para o atendimento da recursos repassados pelos órgãos municipais da
demanda atual. Neste programa, foram citados, PMPA
por ordem de prioridades de contratação: A questão referente à avaliação das
psicólogos, assistentes sociais, oficineiros e entidades sobre os recursos repassados para a
educadores sociais. gestão dos Programas pelos órgãos municipais da
Observa-se que, entre os resultados das 59 PMPA serem suficientes ou não será apresentada de
entidades, destaca-se a necessidade de acordo com cada Programa, considerando as
contratação de psicólogos, seguida da de diferenças dos valores repassados e os critérios dos
assistentes sociais e de educadores sociais. Há uma convênios firmados. Para fins de análise, os dados
ênfase na necessidade de implementação do serão quantificados (suficientes, insuficientes, não
trabalho interdisciplinar, para o atendimento resposta (NR), em parte) e na tabela 8 estão os
integral das crianças e dos adolescentes. Também resultados, com base no conteúdo descrito pelas
são citadas, como prioridades, a contratação de entidades no questionário.
oficineiros que desenvolvam atividades voltadas
para o esporte, artes, música, dança, entre outras
atividades socioeducativas, com foco no aspecto

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
Tabela 8: Avaliação das entidades sobre os recursos repassados pelos órgãos municipais da PMPA

Observando-se a amostra total da pesquisa metas conveniadas, não será considerado neste
(59 entidades), evidencia-se que 56 participam item para contabilização dos resultados. Das (56
respondendo à questão que tem com objetivo entidades respondentes), 3 (5%) indicam ser
captar a avaliação de cada uma delas no que se suficiente o repasse dos recursos conveniados; 40
refere ao fato de os recursos serem suficientes para (71%) indicam ser insuficiente; 2 (4%) indicam que é
o atendimento das metas conveniadas; sendo suficiente em parte e 11 (20%) não responderam à
assim, o Programa Aprendizagem, por não possuir questão. 099
Quadro 3: Resultados qualitativos da avaliação das entidades sobre os
recursos repassados pelos órgãos municipais da PMPA. Conteúdo: extratos das respostas das entidades.

Programa: Educação Infantil (nº 22)

Os recursos humanos não são suficientes e deveríamos ter condições de contratar pessoas com magistério e
pedagogia e remunerá-las de acordo com sua formação.

Com certeza não são o suficiente. O restante para a sustentabilidade de nossa casa vem através de outros meios
de doações de empresas ou pessoas físicas.

Insuficientes, pois não contemplam todo o trabalho desenvolvido pelas entidades; a maior parte dos recursos
são gastos com encargos e folha de pagamento.

O repasse não é suficiente para a demanda atendida, a instituição trabalha com recursos próprios, com o intuito
de manter a qualidade do trabalho oferecido.

São insuficientes; é claro que sem ele não estaríamos mais trabalhando, mas, se fosse melhor, as crianças teriam
melhorias na alimentação, no conforto em sala de atendimento e brinquedos suficientes para todos, assim como
melhores salários para os educadores.
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

Não é suficiente; acreditamos que nossos funcionários merecem ganhar mais, pois se dedicam oito horas por dia
para com as crianças, e com o repasse temos que dividir um pouco para cada item; poderíamos oferecer mais a
nossas crianças, mas fazemos milagres.

Os recursos não cobrem as despesas com capacitação de funcionários. Por exemplo: Uma educadora faz
faculdade, se forma e não temos como continuar com esta profissional, pois devemos pagar-lhe dignamente seu
piso salarial que vai além das nossas possibilidades.

São Suficientes.

Programa: Acolhimento Institucional (nº 3)

Não são suficientes. O repasse conveniado com a FASC cobre somente as despesas com a folha de pagamento dos
funcionários contratados diretamente, com um salário digno para poderem exercer a função de educador e não
de monitor. As demais despesas, que representam o dobro do valor conveniado, dependem de contribuições
espontâneas do grupo de apoiadores. Para que haja um trabalho com resolutividade, isto é, que dê conta das
necessidades de cada criança/adolescente são necessários profissionais qualificados. Na educação, por
exemplo, é preciso que se contrate profissional em psicopedagogia, para identificar e trabalhar os bloqueios ou
traumas que impedem o jovem de aprender; em alguns casos, é ainda preciso que o jovem freqüente uma escola
especial ou particular, por causa da defasagem escolar. Em relação à saúde mental, é necessário que o abrigo
100
contrate um psiquiatra, que conheça muito bem cada jovem que necessite de medicação, e não apenas que olhe
para o jovem de 2 em 2 meses, como é comum na rede pública de saúde. Há também necessidade de algum
trabalho na área musical ou teatral, ou artes, para que os jovens possam expressar seus talentos ou buscá-los.
Os itens listados são considerados pelos técnicos e dirigentes deste abrigo como de necessidades básicas para
recuperar o jovem que sofreu abandono, negligência e maus tratos dos adultos que dele deveriam cuidar e
proteger.

Programa: PCDs (nº 3)

Os recursos repassados não são suficientes para absorver os custos dos serviços prestados.
(...) os editais da Prefeitura, via CMDCA, não cobre 3% de nossas necessidades. O último Edital pagou para nossa
Instituição pouco mais de R$ 13.000,00, para uma matrícula com mais de 120 crianças com deficiência.

Programa: SASE (nº 20)

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
 Não, necessitando ampliação do repasse em, no mínimo, 100%, com o objetivo de melhorar a qualidade do
atendimento nas áreas pedagógica, psicológica e atendimento individual e familiar. Contratação de mais
educadores técnicos: educação física, artesanato, dança, capoeira, música, formação religiosa.
 A avaliação é negativa, pois os recursos não são suficientes; temos que contar com recursos próprios e
doações. Sendo que essas doações não seguem muitas vezes uma sistemática e acabam fazendo falta
durante o mês. Assim como a questão da remuneração de Educadores, levando à rotatividade deles dentro
da Instituição.
 Os recursos conveniados, por meio do repasse dos órgãos municipais da PMPA, são insuficientes, tendo em
vista que não atendem inclusive despesas com folha de pagamento e encargos sociais.
 Os recursos conveniados são insuficientes. Temos necessidade do aumento do repasse efetuado por meio do
convênio, pois o reajuste do convênio nunca se equipara ao dissídio obrigatório sindical que as entidades
devem repassar aos seus funcionários. Em geral, o dissídio é de 8%, e o reajuste do convênio varia entre 5 e
6%, ficando sempre abaixo. O valor dos recursos conveniados para o SASE deve ser reajustado, para melhor
qualificação das ações, melhor remuneração dos recursos humanos e mais verba para compra de alimentos
e, assim, efetivar a proteção social para crianças e adolescentes entre 7 e 14 anos com mais qualidade.
 Sentimos a necessidade de que os profissionais de Nível Superior, como Assistente Social e Psicóloga, sejam
contemplados pelo recurso.
 Não são um recurso adequado, visto que um adolescente come mais, usa outros tipos de recursos para se
desenvolver, requer um atendimento qualificado, e a verba me parece tão irrisória perto do que se pretende
oportunizar ao desenvolvimento de cidadania social.
 Considerando que o repasse é suficiente somente para gastos com recursos humanos e material pedagógico,

101
o convênio não é suficiente para cobrir os gastos. O restante das despesas como alimentação, água, luz, são
todas mantidas pela entidade.
 Os recursos são suficientes, só os critérios para prestação de conta são limitados, exemplo: precisamos
investir mais em materiais de construção ou de primeiros socorros e não se obtém aprovação.

Programa: TE (nº 5)

Não. Aparentemente os recursos do trabalho Educativo parecem alcançar o objetivo, mas são escassos para
algumas atividades, como a da remuneração dos profissionais. A estrutura do Centro absorve outras demandas
necessárias ao projeto, como, por exemplo, facilidade na manutenção, emergências de saídas, apoio de pessoal
em situações adversas, apoio quanto aos custos fixos.
Consideramos que o recurso é insuficiente para atender às demandas, já que as questões familiares das
adolescentes ficam prejudicadas.
Acreditamos que hoje seja suficiente, porque temos outros convênios e dividimos os custos gerais entre eles.
Também o recurso é engessado; muitas vezes não podemos comprar aquilo que necessitamos como materiais
permanentes, mesmo que de pequeno porte.
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

Programa: Ação Rua (nº 3)

Para atender à demanda atual, os recursos são insuficientes; o ideal seria ter um aumento de 25% do repasse
atual. Também deveria haver uma maior flexibilidade nas rubricas para a execução dos recursos devido às
diversas exigências demandas no atendimento. Os recursos repassados são insuficientes. Necessitamos de um
reajuste no repasse efetuado por meio do convênio, pois o reajuste do convênio nunca se equipara ao dissídio
obrigatório sindical que as entidades devem repassar aos seus funcionários. Em geral, o dissídio é de 8%, e o
reajuste do convênio varia entre 5 e 6% ficando sempre abaixo.

Programa: Aprendizagem (nº3)

Nossa entidade não possui metas conveniadas com a Prefeitura, mas, pelo número de jovens desempregados e a
falta de recursos das entidades que desenvolvem aprendizagem, podemos afirmar que ainda são insuficientes,
mesmo com recursos do Funcriança.

102
Predominam, entre os resultados sobre os de pessoal, prestação de serviço e consumo
recursos repassados por meio dos convênios (Programa SASE).
firmados com a PMPA, a indicação de que eles são
insuficientes para atender às metas e/ou à A necessidade de contratação de
demanda conveniada. De uma maneira geral, as profissionais que possam atender às especificidades
entidades indicam que, para suprir o atendimento de cada programa, quanto aos conteúdos e quanto
das necessidades da demanda conveniada, é às rotinas, é um comentário tratado como uma
fundamental a parceria firmada com diferentes dificuldade pelas entidades:
Enfrentamos dificuldades de encontrar
segmentos e as doações recebidas, o que não ocorre
educadores de módulo básico. Acreditamos
com todas as entidades, pois, conforme o gráfico 4, que seja pelo fato de o Trabalho Educativo
predomina, como principal parceiro e origem do ser três vezes por semana e pelos
recurso, a esfera pública municipal. Cada Programa conteúdos específicos (Programa TE).
indica necessidades específicas para atender à
demanda, conforme os objetivos das atividades Algumas peculiaridades são comentadas
desenvolvidas; entretanto, destacam-se, entre os como no caso do programa Acolhimento
resultados, necessidades, tais como: aumento de Institucional (abrigagem), que observa a
salário para algumas categorias profissionais como necessidade de que esse espaço se consolide
para os educadores sociais (dado predominante); enquanto atendimento especializado na proteção

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
repasse para cobrir os encargos sociais; reposição e integral a crianças e/ou adolescentes, mas, devido
aquisição de equipamentos para o atendimento das à complexidade e às exigências quanto à
crianças na educação infantil; incremento e metodologia de acolhimento, tem encontrado
aquisição de materiais pedagógicos e recreativos; muitas dificuldades para que isso se concretize.
qualificação e educação continuada dos O jovem em situação de abrigagem,
quando não possui mais família ou laço
profissionais, entre outros.
familiar consistente, que é o caso da
Sobre os comentários e observações, maioria, necessita que o abrigo seja sua
constam, nos resultados desta parte da pesquisa, casa; o espaço de abrigagem, o abrigo deve
conteúdos que dizem respeito ao reajuste das ser um lugar agradável, onde haja
profissionais que estejam convictos na
metas conveniadas com a PMPA, evidenciando a
implementação de valores como respeito,
falta de alinhamento com a necessidade de novas verdade, relação saudável e que esses
contratações de recursos humanos bem como de profissionais sejam os primeiros a dar o
revisão dos salários adequados para a equipe que exemplo. Os jovens precisam se sentir
operacionaliza os programas. seguros nessa relação que substitui a
relação familiar, pois assim como há jovens
A instituição vem buscando formas para
que não deveriam estar abrigados porque
a d m i n i s t r a r e m a n t e r o Pr o g r a m a
possuem laços familiares, também existem
atendendo às metas conveniadas, porém,
jovens que não possuem mais ninguém e
fazem-se necessário os reajustes
têm no abrigo sua única possibilidade de
adequados do repasse a fim de manter a
convívio familiar. Por isso, é que o abrigo
qualidade do atendimento e manutenção
precisa ser um espaço qualificado que
do programa, tendo em vista que o
reajuste é inferior aos índices de aumento
ajude o jovem a se desenvolver
plenamente em todos os sentidos, com o 103
máximo de possibilidades disponíveis, pois, por meio de convênios, pois:
senão, qual será o caminho que sobrará a O Programa deveria ser ampliado para este
esse ser? Na falta de família, a sociedade e público da assistência social, uma vez que
o poder público têm o dever de se os resultados (permanência no mundo do
responsabilizar por estes jovens trabalho) são plenamente satisfatórios. O
(Acolhimento Institucional). pequeno número de entidades que executa
o Programa se deve a não existência de
As entidades sinalizaram a importância de convênio, imprescindível para contratação
sua participação neste processo de pesquisa; de coordenação e recursos humanos para o
desenvolvimento dos cursos para os
também mostraram a crença neste instrumento adolescentes de acordo com a legislação
como avanço para as políticas públicas voltadas à vigente (Programa Aprendizagem).
proteção das crianças e dos adolescentes. Os
resultados desta parte da pesquisa indicam a Por último, este espaço do questionário foi
compreensão e a clareza que os participantes do utilizado como forma de manifestação por parte
processo de investigação tiveram sobre o objeto das entidades, e os resultados indicam a
deste estudo, conforme o citado: importância da pesquisa no processo de gestão das
Penso ter sido importante e de grande valia políticas públicas voltadas para as crianças e para
participar desta entrevista, mas mais
os adolescentes da cidade de Porto Alegre. Com
ainda por poder dizer o quanto estamos nos
esses resultados, emergem as possibilidades de
O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E

esforçando para manter uma qualidade de


atendimento aos adolescentes e quanto contribuição, para que sejam desenhadas as
não somos reconhecidos e que a verba iniciativas estratégicas por todos agentes
destinada ao programa conveniado é mal
envolvidos, para as melhorias necessárias dos
pensada e articulada pela prefeitura
(Programa SASE). segmentos em questão: Programas Sociais e
Esperamos que com esta pesquisa o Educação Infantil. Ao finalizar este relatório de
governo se convença da real necessidade pesquisa, o extrato aqui destacado, descrito por
para o atendimento de qualidade nas uma entidade, fica como conteúdo-síntese das
escolas infantis (Programa Educação
Infantil). considerações finais desse processo de
Espero, através desta pesquisa, contribuir investigação, instaurado pelo FMDCA e pelo CMDCA
com o avanço destas políticas públicas da cidade de Porto Alegre.
visando um melhor desenvolvimento
destas e que a PMPA possa rever estes
Caros colegas: todos sabemos que nossas
problemas enfrentados pelas entidades
casas devem fazer por receber do governo
sociais. (Programa Educação Infantil).
municipal o reconhecimento devido; não
Esperamos que esse questionário sirva de
cabe mais a máxima de que temos
alguma ajuda e que os órgãos municipais se
obrigação de trabalhar abaixo da linha do
sensibilizem e revejam os cálculos
impossível, temos que buscar o mínimo de
repassados (Programa Educação Infantil).
R$ 16,00 por dia para cada criança
matriculada em nossas instituições. Este
Também foi observada a necessidade de formulário, se bem respondido, deve ser a
investimento e ampliação das ações voltadas aos ferramenta legal para mostrar ao governo o
quanto nós estamos fazendo o governo
104 jovens, como no caso do Programa Aprendizagem,
economizar. Vamos dar um basta nesta
situação; temos que receber o justo, pois o possam assegurar a prioridade absoluta aos
que melhor fazemos é formar pessoas de mesmos, de receberem proteção e cuidados
bem. Minha instituição agradece pela
oportunidade de participar desta pesquisa;
preconizados pela Política Nacional dos direitos
os dados aqui informados são verdadeiros Humanos de Crianças e Adolescentes dos Brasil.
(Programa Educação Infantil).
MÉDIA GERAL DE CUSTO POR PROGRAMA E CUSTO
Cabe registrar que os resultados desta POR CRIANÇA/ADOLESCENTE ATENDIDO (n 54)
pesquisa demonstram o importante papel social das Referência: Mês de Outubro de 2010
entidades da esfera não governamental na
condução das políticas de proteção integral para Para demonstração dos resultados desta
crianças e adolescentes na cidade de Porto parte da pesquisa, considera-se a média do custo
Alegre/RS. Fica claro que o desempenho destas geral dos programas. O cálculo considera a amostra
entidades na operacionalização da Educação de 54 entidades que responderam a parte II da
Infantil e dos Programas Sociais se torna possível pesquisa, que refere-se à planilha de custo por
em função das parcerias e convênios firmados, programa. O valor total do custo médio referente
predominantemente com a esfera pública ao mês de outubro de 2010, dividido pelo número
municipal. Estado e Sociedade Civil, de posse dos médio de crianças/adolescentes atendidas resulta
dados desta pesquisa estão desafiados a dialogarem no custo por criança/adolescente atendido por

O S D I R E I TO S D A S C R I A N Ç A S E D O S A D O L E S C E N T E S E M A N Á L I S E
democraticamente e com maturidade ético- programa; o mesmo procedimento foi realizado
político necessária, para construção de uma agenda com o valor necessário médio, resultando no custo
de políticas públicas, voltadas à garantia dos necessário por criança/adolescente.
direitos das crianças e dos adolescentes, que

Quadro 4: Média geral de custo atual e necessário por programa e o respectivo custo por
criança/adolescente atendido por programa (n 54).

Fonte: Fundação Irmão José Otão- FIJO/OTS– Pesquisa CMDCA/FMDCA, 2011.

²O programa Aprendizagem não possui convênio com a PMPA.


³No programa Ação Rua é considerado o número de “núcleos” conveniados com a PMPA. 105

Você também pode gostar