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Nós somos, todos os dias, interpelados por imagens, textos, afirmações, enfim,
discursos de todos os tipos. E, na maioria das vezes, tomamos esses discursos como verdades
absolutas, transparentes. Talvez por hábito, talvez por descuido, costumamos não questioná-
los: eles nos vêm como a representação verossímil da realidade, e essa representação é, por
vezes, tida como a própria realidade.
É pelo viés da negação de uma realidade representada que Michel Foucault, em seu
livro Isto não é um cachimbo (1988 [1973]), desestabiliza aquilo que nos parecia
inquestionável e noz faz refletir a realidade como algo mediado por representações que não
podem ser tomadas como substitutivas dos objetos que representam.
Com o livro, Foucault (1988 [1973]) dá notáveis contribuições ao estudo da arte. Sua
discussão de divide em seis capítulos. No primeiro capítulo, “Eis dois cachimbos”, Foucault
(1988 [1973]) levanta incertezas acerca de duas pinturas de Magritte. No segundo capítulo,
“O caligrama desfeito”, o filósofo francês conjectura que a “diabrura” (FOUCAULT, 1988
[1973], p. 21) da pintura de Magritte consiste na desfacção de um caligrama. Essa operação,
contudo, é responsável pelos entrecruzamentos da escrita/texto e do desenho/figura. O
capítulo seguinte, “Klee, Kandinsky, Magritte”, apresenta-nos uma análise de Foucault (1988
Além disso, embora seja uma obra sobre arte e filosofia que parece se voltar, mais
especialmente, a estudantes e especialistas dessas áreas de conhecimento, acreditamos que o
texto, salvo certo esforço de leitura, pode ser acessado por um público mais amplo, que dele
pode tirar valiosas reflexões acerca do mistério envolvido na arte – mais especialmente, na
arte surrealista de Magritte, que, como um “pintor pensador”, segundo define Bernardo (2016,
s/p), desautomatiza nosso pensamento acerca das certezas que cultivamos em relação à
aparência de verdade e transparência das imagens que, como já dito, nos interpelam
cotidianamente.
Buscando, assim, a partir das reflexões de Foucault (1988 [1973]), operar uma leitura
acerca de como a sexualidade é vista em nossa sociedade e, dessa forma, representada de uma
determinada forma, tomamos como aporte para essa leitura Santos Filho (2012), que, com
base em pensadores como o próprio Foucault (1988), além de Bozon (2004) e Giddens (1993),
defende que os comportamentos e identidades sexuais são contextuais e históricos e que há
havido uma mudança nos relacionamentos e comportamentos sexuais contemporaneamente.
Da mesma forma, podemos refletir, a partir de Borba (2015 [2006]), que aquelxs que se
insurgem contra as normas sociais tanto de gênero quanto de sexualidade são considerados
sujeitos abjetos. Nos termos de Bauman (1998), seriam os estranhos, dissidentes do mapa
cognitivo e moral – e, diríamos também, sexual – do mundo.
REFERÊNCIAS
BAUMAN, Zugmunt. A criação e anulação dos estranhos. In:______. O mal-estar da pós-
modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998 (pp. 27-48).
BERNARDO, Gustavo. Desde quando um cachimbo não é um cachimbo? Revista
Eletrônica do Vestibular UERJ. Ano 9, n. 25, 2016. Disponível em:
<http://revista.dses.uerj.br/coluna/c
oluna.php?seq_coluna=80> Acesso em: 06 out 2018.
BORBA, Rodrigo. Linguística Queer: uma perspectiva pós-identitária para os estudos da
linguagem. Entrelinhas, v. 9, n. 1, jan./jun. 2015 (pp. 91-107).
DELEUZE, Gilles. A literatura e a vida. In:______. Crítica e clínica. São Paulo: Ed. 34,
1997 (pp. 11-16).
SANTOS FILHO, Ismar Inácio dos. A construção discursiva de masculinidades bissexuais:
um estudo em linguística queer (Tese de Doutorado, UFPE). Recife: O Autor, 2012.
______. Linguística Queer: na luta discursiva, como/sobre prática de ressignificação. In:
SILVA, Danillo da C. P.; MELO, Iran Ferreira de; CASTRO, Lorena G. F. De (Org.).
Questões de linguagem e sociedade. Aracaju: Criação, 2017 (pp. 153-184).