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MIGRAÇÃO

INTERNACIONAL
NA
PAN-AMAZÔNIA
Esta publicação foi impressa com recursos do
Programa Sul-Americano de Apoio às Atividades de Cooperação
em Ciência e Tecnologia com países da América do Sul-PROSUL,
do Ministério de Ciência e Tecnologia
Processo CNPq Nº 490469/2007-8

This publication was printed with support of the UNESCO

“Cooperación financiera y técnica de la Oficina Regional de Ciência de la UNESCO para América Latina
y el Caribe, Representación de la UNESCO ante el MERCOSUR”

Os autores são responsáveis pela escolha e pela apresentação dos fatos contidos nesta publicação e pelas opiniões aqui expressas, que
não são necessariamente as da UNESCO ou do NAEA/UFPA e não comprometem as Instituições. As designações empregadas e a
apresentação do material não implicam a expressão de qualquer opinião que seja, por parte da UNESCO ou do NAEA/UFPA, no que
diz respeito ao status legal de qualquer país, território, cidade ou área, ou de suas autoridades, ou no que diz respeito à delimitação de
suas fronteiras ou de seus limites.

Esta publicação integra as atividades do Grupo de pesquisa do NAEA, “Meio Ambiente, População e Desenvolvimento da Amazônia
- MAPAZ”. O Grupo de Pesquisa desenvolve projetos com apoio do Programa de Cooperação Sul-Sul da UNESCO/UNU/TWAS, do
MCT/PROSUL, do CNPq e do NAEA/UFPA.
MIGRAÇÃO
INTERNACIONAL
NA
PAN-AMAZÔNIA

Luis E. Aragón
(Organizador)

UFPA NAEA
Belém
2009
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ (UFPA)
Reitor: Carlos Edilson de Almeida Maneschy
Vice-Reitor: Horacio Schneider
Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação: Emmanuel Zagury Tourinho

NÚCLEO DE ALTOS ESTUDOS AMAZÔNICOS (NAEA)


Diretor Geral: Armin Mathis
Diretor Adjunto: Fabio Carlos da Silva
Coordenadora do PPGDSTU: Ana Paula Vidal Bastos
Vice-Coordenadora do PPGDSTU: Oriana Trindade de Almeida

CONSELHO EDITORIAL DO NAEA


Armin Mathis
Fabio Carlos da Silva
Edna Maria Ramos de Castro
Juarez Carlos Brito Pezzuti
Luis Eduardo Aragon Vaca
Marilia Ferreira Emmi
Nirvia Ravena
Oriana Trindade de Almeida

APOIO TÉCNICO
Revisão editorial: Albano Rita Gomes
Editoração: Israel Gutemberg
Capa: Hélio Marques de Araújo de Almeida e Márcio Ribeiro Arede

BOLSISTAS DE INICIAÇÃO CIENTIFICA


Kellem Cristina Prestes Moreira
Mônica Maria Queiroz de Freitas
Jonatha Rodrigo de Oliveira Lira

BOLSISTAS DA PROAD/UFPA
Laryssa de Cássia Tork da Silva
Pauleandro Silva Nunes

Depósito Legal na Biblioteca Nacional, conforme lei 1825, de 20/12/1907

Migração internacional na Pan-Amazônia /Luis E. Aragón (organizador). –


Belém: NAEA/UFPA, 2009.
336 p.: il.; 21 x 29,7 cm

Texto em português, espanhol e inglês.


Inclui bibliografias
Reúne artigos apresentados no Seminário Migração
Internacional na Amazônia, realizado em Belém, de 13 a 14 de
novembro de 2008.

ISBN 978-85-7143-084-6

1. Migração. 2. Amazônia – População - Estatísticas. 3. Amazônia –


Migração. I. Aragón, Luis E. II. Título.
CDD 21. ed. 304.89811

Catedra UNESCO de Cooperação Sul-Sul para o Desenvolvimento Sustentável


Universidade Federal do Pará
Núcleo de Altos Estudos Amazônicos
Campus Universitário do Guamá
Rua Augusto Correa, 1 • CEP: 66075-900 - Belém, Pará, Brasil
Tel.: (+55-91) 3201-7951/8526 • Fax: (+55-91) 3201-7677
E-mail: catedraunesco@ufpa.br • Homepage: www.ufpa.br/catedraunesco
APRESENTAÇÃO

O livro agora apresentado complementa os dois primeiros, publicados em 2005 e 2007, conforme os
objetivos do Projeto Meio Ambiente, População e Desenvolvimento da Amazônia (MAPAZ), que trataram
respectivamente do perfil sócio-demográfico da população da Pan-Amazônia e das relações população e meio
ambiente nessa região. Os documentos desta coletânea, que resultou dos trabalhos apresentados e debatidos
durante o Seminário Migração Internacional na Pan-Amazônia, realizado em Belém, de 13 a 14 de novembro
de 2008, expõem ao debate a complexidade do fenômeno da migração internacional na Amazônia em suas
diversas dimensões; onde os padrões e as tendências discutidas aqui se tornarão mais dinâmicas e complexas
no andamento de políticas de desenvolvimento na busca da integração regional e econômica.
Partindo de uma síntese das diversas abordagens teóricas relacionadas com a migração, o livro descreve
e analisa a migração internacional na Pan-Amazônia, e em cada Amazônia nacional, à luz dos censos dos
países amazônicos; discute a problemática da migração transfronteiriça e a fuga de cérebros; e recupera a
história da imigração de italianos, portugueses e japoneses na Amazônia brasileira, analisando sua contribuição
para o desenvolvimento da região e do país. Os estudos realizados representam somente indícios que merecem
aprofundamento, mas que dão a oportunidade de refletir sobre a questão e analisar a migração como um
sistema complexo que não se reduz simplesmente a migrantes, países de origem e destino ou fatores de atração
e repulsão.
A migração internacional tornou-se hoje um fenômeno de relevância mundial tanto para os países de
destino como de origem ou de trânsito, o que requer uma melhor gestão e não somente medidas de controle. Na
Pan-Amazônia a maioria de migrantes são originários dos próprios países amazônicos, a migração ilegal é
frequente, e a migração transfronteiriça ocorre ao longo da fronteira do Brasil, mas também nas fronteiras dos
demais países.
Os países amazônicos estão passando por um período de intensa emigração internacional principalmente
para países desenvolvidos. Enquanto as brutais desigualdades mundiais se maniverem, as regiões e os países
menos favorecidos continuarão sendo fornecedores de mão-de-obra para o mundo desenvolvido
independentemente das barreiras impostas. Daí a explosão migratória do Sul para o Norte. A pergunta que
emerge para o caso da Amazônia é: que medidas de cooperação intra-amazônica seriam necessárias para
mitigar o problema? Organismos como a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), a
Associação de Universidades Amazônicas (UNAMAZ), e a cúpula de chefes de estado e de governo da
América do Sul deverão jogar papel protagonista neste assunto.
Este livro integra as atividades desenvolvidas no âmbito da Cátedra UNESCO de Cooperação Sul-Sul
para o Desenvolvimento Sustentável da Universidade Federal do Pará. As Cátedras UNESCO são concebidas
como “tanques de ideias” e “construtoras de pontes” entre o mundo acadêmico e a sociedade civil, as comunidades
locais, a pesquisa e a elaboração de políticas públicas, fortalecendo a cooperação Norte-Sul, Sul-Sul e Norte-
Sul-Sul, criando polos de excelência e inovação em nível regional e sub-regional e reforçando o dinamismo de
redes e parcerias. A Cátedra UNESCO de Cooperação Sul-Sul para o Desenvolvimento Sustentável foi criada
na Universidade Federal do Pará em setembro de 2006, com o propósito de produzir conhecimento científico e
melhorar a cooperação Sul-Sul para o desenvolvimento sustentável através da realização de atividades e parcerias
relacionadas com a educação superior, a pesquisa, a documentação, e, em particular, com temáticas tão
importantes, como os de população e meio ambiente na Amazônia e nos Trópicos Úmidos e o Programa de
Reservas da Biosfera da UNESCO. Nesse sentido a Cátedra UNESCO de Cooperação Sul-Sul para o
Desenvolvimento Sustentável representa um esforço de cooperação para o fortalecimento da capacidade científica
na Amazônia e o Trópico Úmido, e o Projeto MAPAZ é um exemplo.
Resta agradecer às instituições e às pessoas que fizeram possível a realização deste projeto e a publicação
deste livro. Primeiramente deve-se reconhecer o apoio recebido do Programa Sul-Americano de Apoio às
Atividades de Cooperação em Ciência e Tecnologia do Brasil com os Países da América do Sul (PROSUL) do
Ministério de Ciência e Tecnologia do Brasil, que alocou recursos para o desenvolvimento do projeto, e ao
CNPq que outorgou uma bolsa de pesquisa ao coordenador do projeto, e bolsas de Apóio Técnico e de Iniciação
Científica.
Agradecimentos especiais ao ex-Reitor da UFPA, Prof. Alex Bolonha Fiúza de Mello e na UNESCO
aos drs. Miguel Clüsener-Godt do Programa de Cooperação Sul-Sul/Programa MAB e Ishwaran Natarajan,
Diretor da Divisão de Ciências Ecológicas e da Terra (em Paris), e ao pessoal de UNESCO/Montevidéu, pelos
esforços realizados na consecução de recursos adicionais e o apoio técnico recebido durante a execução deste
projeto. Agradece-se também o apoio recebido na realização do seminário que deu origem aos textos aqui
publicados, do Ministério de Meio Ambiente e Meio Rural e Marinho da Espanha, do Núcleo de Altos Estudos
Amazônicos (NAEA) da Universidade Federal do Pará, da Associação de Universidades Amazônicas
(UNAMAZ), e de outros organismos.
Finalmente, mas não menos importante, agradece-se a todos os expositores, pessoal técnico-
administrativo, participantes do Seminário, e principalmente aos autores, que tornaram esta obra realidade.

Luis E. Aragón
Organizador
Coordenador da Cátedra UNESCO de Cooperação Sul-Sul
para o Desenvolvimento Sustentável
Universidade Federal do Pará
SUMÁRIO

Apresentação

PRIMEIRA PARTE - Introdução


Aproximação ao estudo da migração internacional na Pan-Amazônia
Luis E. Aragón ........................................................................................................................................ 11

Migração: Abordagens teóricas


Aurélia H. Castiglioni ............................................................................................................................ 39

SEGUNDA PARTE - O que Dizem os Censos


Inmigración internacional de países amazônicos: El caso de Bolivia
Melvy Aidee Vargas Bonilla ................................................................................................................... 61

Procesos migatorios en la Amazonía Peruana: Una mirada a las migraciones intenacionales


Luis Limachi Huallpa ............................................................................................................................. 97

Migración internacional en la Amazonía, Ecuador


Claudio Gallardo León, Francisco Pérez Mogollón, Gabriela Arellano Caicedo .......................... 115

Migración internacional en la Amazonía colombiana: A portes del censo de población 2005


Oscar Sandino ........................................................................................................................................ 145

Migração internacional e desenvolvimento: O caso da Guiana


Hisakhana Corbin .................................................................................................................................. 163

International migration in Suriname


Andrea Jubithana-Fernand ................................................................................................................... 185

A migração estrangeira recente na Amazônia Legal Brasileira


Roberto Luiz do Carmo, Alberto Augusto Eichman Jakob ................................................................ 205

TERCEIRA PARTE - Migração Transfronteiriça e Fuga de Cérebros


Configuração migratória no lugar Guayana: Uma análise da migração na tríplice
fronteira Brasil-Venezuela-Guiana
Francilene dos Santos Rodrigues ......................................................................................................... 223

Por uma “Sociologia da clandestinidade” no estudo da presença de brasileiros na Guiana Francesa


Manoel de Jesus de Souza Pinto. ......................................................................................................... 237

The impact of human capital flight in Guyana


Paulette Bynoe, Marlon Bristol ............................................................................................................. 255
QUARTA PARTE - Histórias de Migração Internacional na Amazônia Brasileira
Fluxos migratórios internacionais para a Amazônia brasileira do final do século XIX ao
início do século XX: O caso dos italianos
Marília Emmi ........................................................................................................................................... 263

Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX:


O caso dos portugueses de Belém do Pará
Edilza Joana Oliveira Fontes ................................................................................................................ 281

A imigração japonesa na Amazônia (1929-2009): Passado, presente e futuro


Alfredo Kingo Oyama Homma ............................................................................................................... 321

8
PRIMEIRA PARTE

INTRODUÇÃO
Aproximação ao estudo da migração internacional na Pan-Amazônia • Luis E. Aragón

APROXIMAÇÃO AO ESTUDO DA MIGRAÇÃO


INTERNACIONAL NA PAN-AMAZÔNIA

Luis E. Aragón1

INTRODUÇÃO

Na medida em que os países completam sua transição demográfica, alcançando taxas de fecundidade
iguais ou inferiores aos níveis de reposição, tornando sua população mais envelhecida, a migração tende a
torna-se um fator extremamente importante da dinâmica demográfica. Tal problemática demanda pesquisa
aprofundada e abordagens que incorporem nas análises fenômenos novos que trouxeram a globalização, a
modernização e a ampliação das comunicações, a melhoria dos transportes, os desequilíbrios econômicos
mundiais, as perseguições políticas, os conflitos bélicos, o terrorismo, a violência, e as mudanças ambientais em
curso, entre outros.
A migração internacional tornou-se um fenômeno de relevância mundial tanto para os países de destino
como de origem ou de trânsito. Apesar da falta de consenso sobre o número de migrantes, a Organização
Internacional para as Migrações estima para 2008 mais de 200 milhões de pessoas residindo fora de seu país de
nascimento, o que representaria 3% da população mundial, sendo entre 20 e 30 milhões migrantes ilegais (10 a
15% do total) (IOM, 2009). A esse estoque de migrantes agregam-se outros 42 milhões de pessoas forçadas
no mundo inteiro a deixar seus lugares de origem, incluindo 15,2 milhões de refugiados, 827 mil casos pendentes
de asilo, e 26 milhões de desplazados internos2 (UNCHR, 2009). Algumas previsões destacam que a população
migrante internacional poderia chegar a 1 bilhão de pessoas ao final do presente século (HILY, 2003).
Há consenso entre os estudiosos que o atual processo de globalização acelerou e alterou
significativamente os padrões migratórios internacionais. A expansão do capitalismo, o empobrecimento de
alguns países europeus, e as políticas favoráveis a imigração europeia e o fim da escravidão, entre outros
fatores, levaram a um aumento impressionante dos fluxos migratórios internacionais nas últimas décadas do
século XIX e primeiras do século XX, período conhecido como a era das grandes migrações.
Os fluxos se dirigiam principalmente da Europa para o Novo Mundo, destacando-se como destinos principais
Estados Unidos, Canadá, Argentina, Brasil e Austrália. Somente Estados Unidos, o maior receptor, acolheu
entre 1870 e 1920, mais de 26 milhões de imigrantes, chegando a representar mais de 10% da população total

1
Professor/pesquisador do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da Universidade Federal do Pará e Coordenador da Cátedra UNESCO de
Cooperação Sul-Sul para o Desenvolvimento Sustentável. E-mail: aragon_naea@ufpa.br.
2
Conforme a Agência das Nações Unidas para Refugiados (UNHCR), desplazados internos são “pessoas ou grupos de indivíduos que têm
sido forçados a deixar suas casas ou lugares habituais de residência, particularmente como resultado de, ou com o objetivo de evitar os
efeitos de conflitos armados, situações generalizadas de violência, violação dos direitos humanos ou desastres, naturais ou causados pelo
homem, e que não tenham cruzado uma fronteira internacional” (UNHCR, 2009, p. 5). Muitas vezes, entretanto, os desplazados são
forçados a atravessar fronteiras internacionais em busca de proteção e refúgio. É o caso dos colombianos mencionados aqui.

11
Migração internacional na Pan-Amazônia

do país (CEPAL, 2002). Esses fluxos tradicionais transformaram-se profundamente nas últimas décadas. Segundo
Martine (2005) em 1960, a maioria de migrantes internacionais residiam em países em desenvolvimento; mas
em 2000 tal proporção inverteu-se, 63% dos migrantes registrados residiam nos países desenvolvidos,
destacando-se em 20053, Estados Unidos, Federação Russa, Alemanha, França, Reino Unido, Canadá, Espanha,
Itália, e Japão (RENAULD et. al. , 2007); sendo que os maiores fluxos se dão de países em desenvolvimento
para países desenvolvidos. E nesse contexto, a América Latina e Caribe converteu-se na região de maior
mobilidade internacional, um de cada dez migrantes internacionais nasceu num país dessa região, sendo os
Estados Unidos “a Meca dos migrantes” (MARTINE, 2005, p. 10).
O Brasil foi um dos destinos favoritos das grandes migrações de finais do século XIX e inícios do
século XX, mantendo-se como um país receptor de migrantes até meados do século XX. Estima-se em mais de
5 milhões o número de imigrantes entre 1872 e 1972, vindos principalmente de Portugal, Itália, Japão, Alemanha,
e Espanha (LEVY, 1974). O censo brasileiro de 1900 registrou 1.074.511 estrangeiros (6.16% da população do
país), aumentando, em 1920, para 1.565.961 (5,11% da população total), quando o país registrou o maior número
de estrangeiros de sua história conforme os censos. A partir deste ano a população estrangeira diminui
constantemente até chegar a 651.226 pessoas no censo de 2000 (0.38% da população), a mais baixa da história
(PATARRA; BAENINGER, 2006). Entre 1950 e 1980 o Brasil foi considerado pelos especialistas como sendo
de uma população fechada, ou seja, com crescimento populacional resultando quase que exclusivamente da
relação entre nascimentos e mortes dada a inexpressiva representação da migração internacional (baixíssima
imigração e emigração). Mas a partir de 1980 o país passou a enviar uma quantidade cada vez maior de
pessoas a outros países. Entre 1980 e 1990, estima-se uma perda líquida internacional de aproximadamente 1,8
milhão de pessoas com 10 anos ou mais de idade e entre 1991 e 2000 de 550 mil da mesma idade, convertendo-se
Brasil num país não mais receptor mas expulsor de migrantes internacionais (CARVALHO; CAMPOS, 2006).
De fato, conforme os registros consulares, em 2002, foram contabilizados 1.887.895 brasileiros residentes no
exterior, principalmente nos Estados Unidos (42%), no Paraguai (24%), e no Japão (11%) (PATARRA;
BAENINGER, 2006).
A reversão do fluxo migratório internacional obedece a múltiplos fatores incluindo, entre outros, a
defasagem na transição demográfica do bloco de países desenvolvidos em relação ao bloco de países em
desenvolvimento, do processo de globalização, e de redes sociais criadas ao longo da história da migração do
país. Essa reversão vem acompanhada de novos padrões migratórios internacionais para e de o país: aumenta
a proporção de imigrantes latino-americanos e norte-americanos, intensifica-se a migração entre blocos sub-
regionais, como, por exemplo, entre os países do Mercosul, a imigração concentra-se nas metrópoles globais de
São Paulo e Rio de Janeiro, e a migração líquida torna-se positivamente mais seletiva para o Brasil em termos
educacionais e ocupacionais (PATARRA; BAENINGER, 2006; BAENINGER, 2001).
Nesse contexto de mudanças, a mobilidade transfronteiriça, especialmente envolvendo países amazônicos,
se intensifica (AROUCK, 2001; ARAGON; OLIVEIRA, 2009), e apresenta características que a diferenciam da
migração internacional do país. Ela é muitas vezes prolongamentos de processos migratórios internos, como no
caso da fronteira Brasil/Paraguai (DO CARMO; JAKOB, nesta coletânea) ou Brasil/Bolívia (VARGAS, nesta
coletânea); da circulação de mão de obra na fronteira Brasil/Guiana/Venezuela (RODRIGUES, nesta coletânea);
da presença irregular de garimpeiros brasileiros nas Guianas (PINTO; CORBIN; FERNAND, nesta coletânea);
ou de desplazados colombianos na Amazônia brasileira (MONTEIRO, 2009; SANTOS, et. al., 2001).

3
Estados Unidos (38,4 milhões, 20,2% do total e 12,9% da população do país), Federação Russa (12,1 milhões, 6,4% do total e 8,5% da
população do país), Alemanha (10,1 milhões, 5,3% do total e 12,2% da população do país), França (6,5 milhões, 3,4% do total e 10,7%
da população do país), Reino Unido (5,4 milhões, 2,8% do total e 9,1% da população do país), Canadá (6,1 milhões, 3,2% do total e 18,9%
da população do país), Espanha (4,8 milhões, 2,5% do total e 11,2% da população do país), Itália (2,5 milhões, 1,3% do total e 4,3% da
população do país), e Japão (2,0 milhões, 1,1% do total e 1,6% da população do país) (RENAULD, et.al., 2005, p. 18).

12
Aproximação ao estudo da migração internacional na Pan-Amazônia • Luis E. Aragón

Contudo e apesar da importância que a migração internacional alcançou na mídia e na academia no


mundo inteiro, existem somente uns poucos estudos esparsos sobre a migração internacional na Amazônia.
Como se apresenta o processo de migração internacional na Amazônia e qual é sua importância nos destinos da
região? A coletânea que agora se publica é uma aproximação a essa pergunta. O livro representa os resultados
de pesquisa realizada pelo Grupo de Pesquisa Meio Ambiente, População e Desenvolvimento (MAPAZ), do
NAEA, e agrega resultados anteriores incluídos nos livros de 2005 e 2007 (ARAGÓN, 2005; 2007) e outras
publicações.
Partindo de uma síntese das diversas abordagens teóricas relacionadas com a migração (CASTIGLIONI,
nesta coletânea), o livro descreve e analisa o fenômeno da migração internacional na Pan-Amazônia conforme
dados dos censos dos países amazônicos; discute a problemática da migração transfronteiriça e a fuga de
cérebros; e recupera a historia de casos de migração internacional na Amazônia brasileira analisando sua
contribuição para o desenvolvimento da região e do país4.

O QUE DIZEM OS CENSOS

Os países amazônicos contam hoje com censos realizados na presente década e permitem sistematizar
alguns dados para traçar uma radiografia da migração internacional na Pan-Amazônia e suas peculiaridades
em cada Amazônia nacional. Contudo é fundamental esclarecer desde o princípio que essa radiografia será
forçosamente parcial, dadas as limitações dos censos em seu conjunto e em cada país.
Primeiramente há de se considerar os baixos níveis de cobertura. No Brasil, por exemplo, há estimativas
de que a imigração internacional ilegal ou clandestina na Amazônia pode representar muitas vezes aquela
reportada pelo censo (SANTOS et. al., 2001), e é consenso de que a menor cobertura dos censos nos diversos
países se dá na Amazônia. Há que se reconhecer também que a Amazônia têm-se convertido numa área de
escape de muitos desplazados colombianos e palco de diversas formas de migração ilegal como tráfico de
narcóticos, armas e seres humanos, além do conflito armado que se desenrola dentro da Amazônia colombiana,
e até pouco tempo atrás os enfrentamentos bélicos entre Peru e Equador em disputa territorial da Região
Amazônica. Por essas e outras razões, portanto, os números calculados pelos censos representariam, na realidade,
somente uma “amostra” da população total.
Em segundo lugar, o ano dos censos difere consideravelmente, o que limita as comparações entre
países: Brasil, 2000; Bolívia e Venezuela, 2001; Guiana, 2002; Suriname, 2004; Colômbia, 2005; Guiana Francesa,
2006; e Peru, 2007.
Em terceiro lugar, os quesitos referentes à migração internacional diferem entre os censos e se incluem
novos em alguns deles. Por exemplo, os censos do Peru, do Equador, e da Colômbia, incluem informação
sobre emigrantes na base de respostas de membros de domicílio residindo no exterior no momento do censo,
facilitando a quantificação dos fluxos, a caracterização das pessoas envolvidas, o cálculo das remessas enviadas,
e a comparação entre as características dos domicílios com ou sem membros no exterior, entre outros aspectos.
Obviamente a confiabilidade deste quesito depende da capacidade dos entrevistados de informar sobre os
membros dos domicílios morando no exterior, e são excluídos os domicílios onde todos seus membros emigraram.
Em quarto lugar, deve-se considerar a disponibilidade e acessibilidade da informação contida nos censos.
Nos casos do Brasil, Bolívia, Peru, Equador, Colômbia e Venezuela, as informações mais detalhadas podem ser
acessadas através do programa REDATAM, mas no caso do Brasil é uma amostra (com as ponderações

4
Os estudos incluídos na coletânea foram primeiramente apresentados e discutidos no seminário internacional “Migrações Internacionais
na Pan-Amazônia”, realizado em Belém, de 13 a 14 de novembro de 2008, como parte das atividades do Grupo de Pesquisa MAPAZ.

13
Migração internacional na Pan-Amazônia

respectivas), enquanto nos demais países é o universo. O censo da Guiana está parcialmente processado e uma
síntese pode-se consultar pela internet. O censo do Suriname está disponível em forma impressa (em holandês,
com alguns resumos em inglês), e o censo da Guiana Francesa está disponível no site do Instituto Nacional de
Estatística e Estudos Econômicos da França (INSEE).
Sem embargo, essas e outras limitações dos censos não devem impedir que essas informações possam ser
utilizadas. Pelo contrário é importante extrair o máximo delas; isso permitirá não somente uma aproximação ao
estudo do fenômeno em pauta, mas ter uma visão mais crítica dessas fontes expondo sua utilidade e limitações, para
melhorarem no futuro. Na realidade os dados dos censos, especialmente na Amazônia, oferecem somente “indícios”,
“pistas”, “insigths”, para pesquisas mais aprofundadas, mas que são extremamente relevantes, para o descobrimento
de elementos específicos que expliquem o fenômeno. Como afirmam Patarra e Baeninger (2006, p. 84):
A importância do fenômeno migratório internacional reside hoje muito mais em suas
especificidades, em suas diferentes intensidades e espacialidades e em seus impactos
diferenciados (particularmente em nível local) do que no volume de imigrantes envolvidos em
deslocamentos populacionais.

O que dizem, pois, os censos sobre a migração internacional na Pan-Amazônia? Após revisar o conteúdo
dos censos e os estudos realizados para cada país (capítulos a seguir), constata-se que existe mais informação
sobre cada Amazônia nacional do que sobre a região como um todo. Isto é, poucos dados podem ser agregados,
pelas dificuldades apontadas acima. Contudo, uma análise comparativa dos documentos produzidos, e consultas
complementares aos censos e a outros materiais, permitem identificar alguns padrões e tendências para a
região como um todo e para cada Amazônia em particular.

GRANDE AMAZÔNIA

Uma primeira aproximação revela que, no mínimo, residiriam na Pan-Amazônia 175.617 pessoas nascidas
no exterior, o que representaria 8,07% da população estrangeira dos países amazônicos em seu conjunto
(Tabela 1). O país amazônico com a maior população de estrangeiros é a Venezuela, com quase o dobro de
estrangeiros do Brasil. No Brasil, o país mais populoso, e que concentra 72% da população de toda a região, a
população estrangeira da Amazônia representa 4,57% do total de estrangeiros do país, e 16,94% da população
estrangeira da Pan-Amazônia, após a Guiana Francesa e o Suriname, que têm as menores populações totais
entre os países amazônicos. Suriname, Guiana Francesa e Brasil juntos acolhem aproximadamente 80% de
todos os estrangeiros que habitam a região.

Tabela 1 - População estrangeira dos países amazônicos e na Amazônia no ano do censo


População amazônica População estrangeira

País Ano População Na Amazônia


do do Absoluta % do % da No país % da % da
censo país país região Absoluta pop. estr. pop. estr.
do país da região
Bolívia 2001 8274325 805101 9,73 2,75 94391 6879 7,28 3,91
Peru 2007 27412157 4574375 16,69 15,63 81636 7319 8,96 4,17
Equador 2001 12156608 548419 4,51 1,87 104130 7036 6,76 4,00
Colômbia 2005 41468384 747267 1,80 2,55 109971 2673 2,43 1,52
Venezuela 2001 24915902 113722 0,46 0,39 *1014938 *2244 0,22 1,28
Guiana 2002 751223 751223 100,00 2,56 9451 9451 100,00 5,38
Suriname 2004 492829 492829 100,00 1,68 32569 32569 100,00 18,55
Guiana Francesa 2006 205956 205956 100,00 0,69 77705 77705 100,00 44,25
Brasil 2000 169872856 21073967 12,41 71,88 651226 29741 4,57 16,94
Total 285550240 29312859 10,26 100,00 2176017 175617 8,07 100,00
Fonte: Censo de cada país. *Não inclui a população indígena

14
Aproximação ao estudo da migração internacional na Pan-Amazônia • Luis E. Aragón

De onde vêm esses estrangeiros? Em geral observa-se uma forte influência mútua entre os países
amazônicos, especialmente entre os vizinhos, ou fronteiriços5. O padrão encontrado por De Marco e Jakob
(nesta coletânea), para o caso da Amazônia brasileira, parece se repetir nos demais países. A maioria de
migrantes nasceu nos países amazônicos, mostrando sempre a predominância de algum país, quase sempre
com reciprocidade. A Amazônia brasileira acolhe principalmente bolivianos (15,31%) e peruanos (13,65%), e a
Amazônia boliviana concentra principalmente brasileiros (64,43%) e peruanos (6,68%), enquanto a Amazônia
peruana recebe principalmente brasileiros (21,87%) e colombianos (20,26%), mas também alguns
norte-americanos e europeus, envolvidos com a exploração de petróleo abundante na região. Equador não faz
fronteira com o Brasil, e carrega tradição de desavenças políticas com Peru. Acolhe poucos migrantes desses
países e a recíproca é também verdadeira; enquanto que concentra na sua Amazônia uma enorme proporção
de colombianos (75,75%), localizados principalmente na província de Sucumbíos que faz fronteira com a Colômbia,
e no lado colombiano, há também em certo número de equatorianos mas em proporção muito menor (6,29%),
localizados sobretudo no departamento de Putumayo que limita com a província equatoriana de Sucumbíos. A
Colômbia recebe majoritariamente peruanos (21,85%) e brasileiros (12,04%), localizados principalmente na
tríplice fronteira (Letícia). Certamente o padrão migratório da Amazônia colombiana está fortemente influenciado
pelo conflito armado que vive o país. A Amazônia colombiana recebe poucos venezuelanos (1,23%), mas os
imigrantes na Amazônia venezuelana são na sua maioria colombianos (68,45%) e brasileiros (6,15%). A migração
de colombianos à Venezuela é histórica e a Amazônia desse país não foge à regra. Finalmente, as Guianas
recebem grande impacto do Brasil, mas a Amazônia brasileira acolhe poucos migrantes vindos das Guianas. Na
Guiana 27,82% dos migrantes são brasileiros, e proporções semelhantes se apresentam no Suriname (17,88) e
na Guiana Francesa (15,40), mas a presença de migrantes desses três territórios na Amazônia brasileira é de
somente 5,00% nascidos na Guiana, 0,38% nascidos no Suriname e 1,97% nascidos na Guiana Francesa.
A presença de brasileiros nas Guianas somente rivaliza com aqueles vindos das próprias Guianas e do Caribe,
e no caso do Suriname da Holanda, pelos laços culturais existentes. A relação entre a Amazônia brasileira e as
Guianas se dá principalmente na fronteira e nas áreas de garimpo (AROUCK, 2001; CORBIN, 2007; PINTO,
nesta coletânea). Só no Suriname se estimam 20.000 imigrantes brasileiros, a maioria ilegal (FERNAND, nesta
coletânea).
Os dados dos censos também revelam traços da história migratória da Amazônia. Por exemplo, na
Guiana há imigrantes que nasceram na Índia e na China; no Suriname na Holanda; e na Amazônia brasileira
aparecem imigrantes nascidos em Japão, Itália, Espanha e Portugal. Essas peculiaridades desaparecem nos
casos que se permite estabelecer o lugar de residência cinco anos antes do censo; emergindo como mais
importante o número de imigrantes procedentes de outros países amazônicos ou da América do Sul.
Os documentos da Amazônia peruana e equatoriana se detêm na análise da emigração. Especialmente
o Equador experimenta na atualidade alta emigração internacional, especialmente para Espanha, Itália e Estados
Unidos. O Peru conta com estudos detalhados recentes da emigração internacional em nível nacional e apresenta
traços similares aos do Equador, em termos de países de destino (INEI, 2007; 2008). No caso da Amazônia,
ainda que se mantenham essas tendências em nível geral, em nível de províncias ou departamentos da região os
padrões se alteram. Por exemplo, o grosso da emigração da Amazônia equatoriana se dirige aos destinos
seguidos pelo país, mas a emigração da província fronteiriça da Colômbia (Sucumbíos) se dirige majoritariamente
para Colômbia. O impacto das remessas enviadas por membros de domicílios residentes no exterior, em ambos
os países, se refletem nas melhorias dos domicílios com membros morando no exterior em relação aos demais.

5
Para cifras específicas consultar os trabalhos elaborados para cada pais. Não foram elaborados estudos referentes à Guiana Francesa e
Amazônia venezuelana. Dados sobre imigrantes internacionais na Venezuela foram extraídos diretamente do censo de 2001, e da Guiana
Francesa do censos de 2006 e 1999 e dos estudos realizados por Barret (2005) e Guillemet (2005).

15
Migração internacional na Pan-Amazônia

Certamente muitas outras coisas poderão ser ditas sobre os padrões e processos de migração internacional
da Pan-Amazônia explorando melhor os dados disponíveis nos censos, especialmente utilizando os quesitos
novos. O retorno de nacionais é um tema emergente que carece de estudos aprofundados. A maioria dos
censos permite identificar nacionais que moravam no exterior cinco anos antes do censo ou que tiveram sua
última residência no exterior. Como se processa este movimento, quem são esses indivíduos, e qual é o impacto
para o desenvolvimento do país e da região, e a melhoria da qualidade de suas vidas e de suas famílias? Porque
uns voltam e outros ficam? Comparações com censos anteriores permitirão traçar tendências desse fenômeno.
Muitos países realizarão censos em 2010, inclusive o Brasil, incluindo novos quesitos que abrirão novas
oportunidades de estudo. Enfim, os censos, com suas limitações, são ainda uma das melhores fontes, e em
alguns casos a única, para analisar a migração internacional e seus impactos.
O panorama apresentado acima permite identificar quatro padrões da migração internacional na Pan-
Amazônia: 1) Guianas, 2) países andinos, 3) Brasil, e 4) migração transfronteiriça, que serão analisados a seguir.

GUIANAS

Há uma intensa mobilidade entre as três Guianas, mas com influência do Caribe e do Brasil e da
Holanda no caso do Suriname. Os documentos elaborados deixam claro, também, que Guiana e Suriname
sofrem enormemente da fuga de profissionais, principalmente para Estados Unidos e Europa (BYNOE;
BRISTOL; CORBIN; FERNAND, nesta coletânea).

Guiana6

A Guiana Britânica tornou-se independente em 26 de maio de 1966. Tem uma superfície de 214.999
2
km e uma população de 751.223 habitantes (2002). Ao longo da história da colônia britânica e do país houve
sucessivas ondas de imigração de portugueses, indianos, chineses e africanos, que juntamente com os indígenas
constituem hoje os maiores troncos étnicos do país.
A formação histórica da Guiana gerou uma distribuição populacional extremamente desigual no país.
Quatro regiões localizadas no interior, correspondendo a 75% do território nacional, abrigam somente 10% da
população, o resto se concentra ao longo da costa.
Os efeitos sociais e econômicos perversos do Programa de Recuperação Econômica (ERP) implantado
no país, a partir de 1989, seguindo os princípios liberais da globalização, geraram emigração em massa para
países desenvolvidos e do Caribe, chegando o país a perder população absoluta entre 1980 e 1990, sem que
ainda tenha sido recuperada.
A emigração da população qualificada da Guiana é considerada uma das mais elevadas do mundo.
Corbin (nessa coletânea) documenta que em 1990, 70% dos indivíduos com mais de 13 anos de escolaridade
saíram do país, só para Estados Unidos, e durante 1965-2000, cerca de 43% dos trabalhadores do país com
ensino secundário e 89% com educação superior migraram para países membros da OCD.
Além dessa alta emigração para países desenvolvidos a Guiana apresenta também importante mobilidade
proveniente dos países limítrofes. Essa mobilidade relaciona-se a um fluxo migratório contínuo de brasileiros
para Guiana, o qual se intensificou a partir do início da construção da rodovia Guiana-Brasil em 1989 e do
acordo diplomático entre Guiana e Brasil em 2003 que eliminou o requisito de visto para brasileiros viajar à
Guiana. A Guiana é um país de alta concentração de venezuelanos e surinameses, que, conjuntamente com os
brasileiros, superam a concentração da população proveniente das ilhas do Caribe.

6
Síntese extraída dos estudos de Corbin e Bynoe e Bristol, nesta coletânea.

16
Aproximação ao estudo da migração internacional na Pan-Amazônia • Luis E. Aragón

Suriname7

Conforme o censo de 2004, o Suriname tem uma extensão de 163.820 km2 e uma população de 492.829
pessoas. O país é dividido em dez distritos e a população se concentra nos distritos da costa. A população é
composta de vários grupos étnicos, sendo os principais: indígenas, maroons, creoles, indianos, brancos, javaneses,
chineses e douglas (mistura de diversas etnias).
No ano da independência do país (1975) cerca de 40 mil pessoas (10,48% da população total) emigrou
para Holanda, com medo de represálias. Entre 1972 e 2005 o saldo migratório foi negativo. Em 1980 houve
um golpe militar, o que gerou uma segunda onda emigratória, ainda que menor do que a de 1975, principalmente
por razões políticas. Em 1987 foi restaurada a democracia no país, embora de 1986 a 1990, o país tenha sido
devastado por uma guerra civil, causando intensa migração interna e internacional. Somente a partir de 1994 a
emigração apresentou sinais de declínio, mas o saldo migratório se torna positivo somente a partir de 2006,
devido, em grande parte, à imigração de brasileiros atraídos pela febre do ouro. Tradicionalmente a emigração
e a imigração internacional ocorriam principalmente com a Holanda, mas a partir de 1999 os imigrantes de
outras nacionalidades ultrapassaram os holandeses, e mais recentemente aumentou o número de brasileiros,
chineses e guianeses, mesmo que a emigração se mantenha principalmente para Holanda, Antilhas Holandesas
no Caribe, Guiana Francesa, e Estados Unidos.
É interessante notar que entre emigrantes do Suriname predominam as mulheres. É um tema que
merece aprofundar-se. Fernand (nesta coletânea) aponta como possíveis razões o elevado número de famílias
no país chefiadas por mulheres e a fuga de profissionais, principalmente de enfermeiras, professoras, e pessoas
com educação superior.

Guiana Francesa

A Guiana Francesa é um departamento ultramarino francês de 84.000 km2. Segundo o censo da


França de 2006 tinha 205.956 habitantes com praticamente proporções iguais em termos de sexo. Do total
da população em 2006, 77.705 eram estrangeiros8 (37,73%), sendo um pouco mais de mulheres, tanto entre
estrangeiros como entre nacionais (Tabela 2). Comparando as cifras referentes à condição de nacionalidade
com as de condição migratória aparecem diferenças significativas de idade na faixa de menores de 15 anos.
A população migrante dessa faixa etária representa somente 3,56% da população total, enquanto que a população
estrangeira representa 13,83% (Tabela 3). Essa diferença significa um elevado número de estrangeiros nascidos
em território francês (ver nota de rodapé n. 8).
O território mantém, desde a década de 1960, altas taxas de crescimento demográfico, especialmente
durante a década de 1980 quando chegou a 5,8% ao ano, devido principalmente ao elevado saldo migratório.
Entre 1999 e 2006, a taxa de crescimento demográfico foi de 4% ao ano (o mais alto da Pan-Amazônia), mas
o impacto da migração diminuiu consideravelmente em relação à década de 1980 (Tabela 4).

7
Síntese extraída do estudo de Fernand, nesta coletânea.
8
As definições de imigrante e estrangeiro não coincidem. Conforme o censo, “Segundo a definição adotada pelo Alto Conselho da
Integração (Haut Conseil à l’intégration), um imigrante é uma pessoa nascida estrangeira no estrangeiro e residente na França. As pessoas
nascidas francesas no estrangeiro e que vivem na França não são contadas. À inversa, certos imigrantes podem converter-se em franceses,
os demais ficam como estrangeiros. As populações estrangeiras e imigrantes não se confundem: Um imigrante não é necessariamente um
estrangeiro e reciprocamente, certos estrangeiros são nascidos na França (essencialmente menores). A condição de imigrante é permanente:
Um indivíduo continua pertencendo à população imigrante mesmo que se converta em francês por aquisição. É o pais de nascimento e não
a nacionalidade ao nascer o que define a origem geográfica de um imigrante” (tradução livre do francês. INSEE). Na Guiana Francesa o
numero de estrangeiros (77.705) é maior que o de imigrantes (60.821).

17
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabela 2 - População da Guiana Francesa por sexo, grandes grupos etários e condição de nacionalidade, 2006
Estrangeiros Franceses Total
Idade
Homens Mulheres Total Homens Mulheres Total Homens Mulheres Total
-15 14338 14138 28476 22651 22313 44964 36989 36451 73440
15-24 5866 6466 12332 10895 10699 21594 16761 17165 33926
25-54 15287 16796 32083 23501 24284 47785 38788 41080 79868
55+ 2609 2205 4814 6785 7123 13908 9394 9328 18722
Total 38100 39605 77705 63832 64419 128251 101932 104024 205956
Fonte: INSEE, censo de população de 2006. Tabulação própria.

Tabela 3 - População da Guiana Francesa por sexo, grandes grupos etários e condição migratória, 2006
Imigrantes Não-imigrantes Total
Idade
Homens Mulheres Total Homens Mulheres Total Homens Mulheres Total
-15 3696 3630 7326 33293 32821 66114 36989 36451 73440
15-24 5381 6168 11549 11380 10997 22377 16761 17165 33926
25-54 16831 18947 35778 21957 22133 44090 38788 41080 79868
55+ 3248 2920 6168 6146 6408 12554 9394 9328 18722
Total 29156 31665 60821 72776 72359 145135 101932 104024 205956
Fonte: INSEE, censo de população de 2006. Tabulação própria.

Tabela 4 - Taxa anual de crescimento demográfico da Guiana Francesa, e outros indicadores demográficos, 1967-2006
Indicador 1967-1974 1974-1982 1982-1990 1990-1999 1999-2006

Taxa de crescimento total (%) 3.1 3.9 5.8 3.5 4.0


Devido ao crescimento natural (%) 2.3 1.9 2.3 2.7 2.6
Devido ao saldo migratório (%) 0.8 2.0 3.5 0.8 1.3
Taxa Bruta de natalidade (por mil) 31.7 25.2 28.9 31.8 30.2
Taxa Bruta de mortalidade (por mil) 8.5 6.5 5.5 4.4 3.8
Fonte: INSEE.

A análise da condição de nacionalidade pelas atividades9 realizadas no momento do censo deixa ver
algumas diferenças entre nacionais e estrangeiros e entre homens e mulheres (Tabela 5). O fato mais importante
a ser notado é que o número de chômeurs é muito maior entre os estrangeiros que entre os nacionais, 16,54%
e 7,45% respectivamente. Essa relação se alarga entre mulheres, e se mantêm de forma ampliada quando se
considera a condição migratória (Tabela 6).

Tabela 5 - População da Guiana Francesa por sexo, condição de nacionalidade e atividade, 2006
Estrangeiros Franceses Total
Atividades
Homens Mulheres Total Homens Mulheres Total Homens Mulheres Total
Empregados 9135 4199 13334 23104 19535 42639 32239 23734 55973
Chômeurs 5715 7135 12850 4317 5238 9555 10032 12373 22405
Pensionistas e
Aposentados 724 532 1256 3526 3934 7460 4250 4466 8716
Estudantes e
estagiários 2810 3112 5922 7611 7943 15554 10421 11055 21476
Atividades
do lar 791 6148 6939 243 3449 3692 1034 9597 10631
Outros
inativos 18925 18479 37404 25031 24320 49351 43956 42799 86755
Total 38100 39605 77705 63832 64419 128251 101932 104024 205956
Fonte: INSEE, Censo da França, 2006. Tabulação própria.

9
Segundo o censo “O tipo de atividade divide a população em ativos e inativos. Entre os ativos se distinguem aqueles que têm um emprego
(e incluem as pessoas que estão estudando ou realizando uma prática remunerada), também se chamam ativos ocupados os chômeurs
(aqueles que recebem ajuda econômica do governo quando estão desempregados). Entre os inativos se podem distinguir alunos, estudantes
e estagiários não remunerados, os aposentados ou pré-retirados (préretraités), e os homens e mulheres dedicados ao lar” (tradução livre
do francês. INSEE).

18
Aproximação ao estudo da migração internacional na Pan-Amazônia • Luis E. Aragón

Tabela 6 - População da Guiana Francesa por sexo, condição migratória e atividade, total e faixa etária de
25-54 anos, 2006
Imigrantes Não-imigrantes Total
Atividades
Homens Mulheres Total Homens Mulheres Total Homens Mulheres Total
Empregados 10670 5620 16290 21569 18114 39683 32239 23734 55973
Chômeurs 5948 7617 13565 4084 4756 8840 10032 12373 22405
Pensionistas e
Aposentados 997 805 1802 3252 3661 6913 4249 4466 8715
Estudantes e
estagiários 2225 2679 4904 8195 8376 16571 10420 11055 21475
Atividades do lar 770 6596 7366 264 3002 3266 1034 9598 10632
Outros inativos 8546 8348 16894 35412 34450 69862 43958 42798 86756
Total 29156 31665 60821 72776 72359 145135 101932 104024 205956
25-54 anos
Empregados 8525 4499 13024 17040 14786 31826 25565 19285 44850
Chômeurs 4387 6016 10403 2471 3234 5705 6858 9250 16108
Pensionistas e
Aposentados 43 63 106 127 149 276 170 211 381
Estudantes e
estagiários 65 142 207 151 244 395 216 387 603
Atividades do lar 500 4923 5423 120 1987 2107 620 6910 7530
Outros inativos 3311 3304 6615 2048 1733 3780 5359 5037 10396
Total 16831 18947 35778 21957 22133 44090 38788 41080 79868
Fonte: INSEE, censo de população da França, 2006. Tabulação própria.

Essas evidências reforçam a hipótese da grande atração migratória que exercem os benefícios sociais
na Guiana Francesa. Aparentemente, um número significativo de imigrantes sobrevive do seguro desemprego
(chômeurs). Com respeito à idade e atividade, teve-se somente acesso a informações sobre a condição migratória.
Analisando a variável idade, a hipótese mensionada acima fica mais evidente. Quando se comparam as atividades
da faixa etária de 25 a 54 anos se percebe que o número de chômeurs entre os imigrantes é quase o dobro dos
não migrantes, sendo essas proporções ainda maiores entre as mulheres, como se pode apreciar no painel
inferior da Tabela 6.
Não foi possível identificar nos censos os países de nascimento dos estrangeiros, mas o estudo de
Ghaislane Barret (2005) recupera essa informação para o ano de 1999. Nota-se uma concentração dos nascidos
no Haiti, no Suriname, no Brasil e na Guiana, com tendência de prevalecer mulheres entre os nascidos no
Caribe (Tabela 7).

Tabela 7 - População estrangeira na Guiana Francesa, por país de nascimento e sexo, 1999

Sexo
Lugar de nascimento % do total
Homem Mulher Total

Suriname 9004 8650 17654 40,12


Haiti 6693 7450 14143 32,14
Brasil 3671 3500 7171 16,30
Guiana 1149 1223 2372 5,39
Europa 501 345 846 1,92
Dominica 164 509 673 1,53
Santa Lúcia 263 262 525 1,19
Outros 297 323 620 1,41
Total 21742 22262 44004 100,00
Fonte: Barret (2005, p. 138)

19
Migração internacional na Pan-Amazônia

PAISES ANDINOS

A Amazônia dos países andinos experimenta frequente mobilidade bilateral, excetuando Venezuela e
Colômbia que apresenta alta participação de colombianos na Amazônia venezuelana, mas não à inversa.

Bolívia 10

Conforme o último Censo Nacional de População, realizado em 3 de julho de 2001, residiam na Bolívia
94.391 estrangeiros (1,14% da população total do país), 49,4% dos quais chegaram na década de 1990, embora
as chegadas se remontem a inícios do século XX. Os estrangeiros capturados pelo censo nasceram em 170
países, embora 46,5% pertençam somente a dois países (Brasil e Argentina). 27.315 estrangeiros do país
(28,9% do total) nasceram nos países amazônicos, predominando os brasileiros e peruanos. Aqueles nascidos
nas Guianas totalizam somente 10 pessoas em todo o país. Os estrangeiros se distribuem em todo o território
nacional, mas estão concentrados principalmente nos departamentos de Santa Cruz, La Paz e Cochabamba,
que albergam juntos 74% dos estrangeiros do país.
A Amazônia boliviana compreende 52 municípios, cobrindo a totalidade dos departamentos de Pando e
Beni e parte dos departamentos de La Paz, Santa Cruz e Cochabamba. Foram registrados 6.879 estrangeiros
residindo na Amazônia boliviana no momento do censo, que representam 7,28% da população estrangeira do
país e 3,91% da população estrangeira da região. Desse total, 5.118, ou mais de 74%, eram originários dos
países amazônicos, sendo 4.532 brasileiros (88,6%).
A imigração na Amazônia boliviana ocorre principalmente ao longo da fronteira com Brasil e Peru. 84%
dos brasileiros residem nos departamento de Pando e Beni e se localizam nos municípios que fazem fronteira
com o Brasil. 40% desses imigrantes brasileiros são menores de 15 anos, enquanto aqueles dos demais países
amazônicos, ao redor de 80% tem entre 15 e 64 anos, fato que permite deduzir que os brasileiros pertencem a
famílias assentadas. Igualmente pode-se constatar que 48,4% do total de imigrantes que residem na Amazônia
boliviana são produtores e trabalhadores do setor primário da economia e que essa proporção é mais acentuada
entre os brasileiros.

Peru 11

A Amazônia peruana abrange 65% do território nacional e concentra aproximadamente 16% da população
do país (4 milhões de habitantes). Nessa área estão compreendidos total ou parcialmente 16 departamentos e
400 distritos (municípios). Embora a migração para a Amazônia peruana tenha suas origens desde a época
colonial, os maiores fluxos ocorreram durante os últimos cinquenta anos, principalmente vindos das zonas
andinas do Peru, mas paralelamente a esse processo se desenvolveram migrações internacionais tanto de
entrada como de saída.
A primeira grande onda migratória para a Amazônia ocorreu como consequência do auge da economia
da borracha que se estendeu desde 1862 até os primeiros 20 anos do século XX, quando grande número de
pessoas chegaram à região provenientes do norte do país e do exterior.
Dois casos de migração estrangeira no século XIX repercutem até hoje na Amazônia peruana: a dos
alemães na Amazônia central, e a dos japoneses na zona de Madre de Dios, no sul da região.

10
Síntese extraída do estudo de Vargas, nesta coletânea.
11
Síntese extraída do estudo de Limachi, nesta coletânea.

20
Aproximação ao estudo da migração internacional na Pan-Amazônia • Luis E. Aragón

A imigração de alemães à Amazônia peruana surgiu dum projeto do governo peruano de colonizar a
selva central para conseguir uma via de transporte multimodal que unisse o Oceano Pacífico ao Atlântico
através da calha do rio Amazonas. Para isso o governo peruano oferecia uma série de incentivos para os
colonizadores da região. Acolhendo-se a esse projeto o Barão alemão Cosme Damián Freiherr von Holzhausen
assinou contrato com o governo em 1855 comprometendo-se a trazer às cidades amazônicas de Pozuzo e
Mairo, dez mil alemães no prazo de seis anos; ao governo peruano correspondia cobrir os gastos de transporte
e alimentação, a construção de vias de acesso, e a doação de viveres, sementes, e terra titulada. Mas a guerra
com Chile frustrou este projeto, chegando-se a trazer somente uns 500 colonos, que foram abandonados a sua
própria sorte. Hoje Pozuzo e Oxapampa, povoadas por esses colonos, são duas pequenas cidades prósperas
onde se mantêm ainda muitos costumes europeus.
O caso da imigração japonesa surgiu da necessidade de trazer mão-de-obra estrangeira para atender à
industria do açúcar da costa peruana após da abolição da escravatura no final do século XIX. Os primeiros
japoneses chegaram ao país em 1889 para trabalhar nas plantações de cana na zona da costa, mais tarde 91
deles foram contratados por seringalistas para trabalhar na Amazônia, na zona de Madre de Dios ao sul da
região. Com o tempo alguns destes japoneses prosperaram e se localizaram ao redor de Porto Maldonado até
que na década de 1930, Jorge Mazuko funda a cidade que hoje leva seu nome e apesar da perseguição que
sofreram durante a Segunda Guerra Mundial, conseguiram manter-se no lugar e prosperar, sendo que hoje seus
descendentes se destacam na vida social e política de Madre de Dios. Nas décadas de 1980 e 1990 muitos
descendentes migraram para o Japão, na onda de emigração do país. O dinamismo da construção civil que
atualmente vive a cidade de Porto Maldonado se deve às remessas desses emigrantes.
A partir da década de 1970 se intensifica a exploração de ouro no departamento de Madre de Dios e de
petróleo no norte da região, e na década de 1980 se eleva o cultivo de coca na Amazônia. Esses fatores
atraíram grande quantidade de imigrantes para a Amazônia, principalmente nacionais, mas também estrangeiros.
Por outro lado, nas décadas de 1980 e 90 a economia peruana sofre uma série crise econômica
generalizada que aliada à luta terrorista expulsa população sobretudo da região andina para outros lugares do
país e do exterior. Por esses motivos o Peru tem experimentado durante as últimas décadas um processo de
emigração massiva para o exterior. Se estima que cerca de 3 milhões de peruanos residam atualmente no
exterior, enquanto somente cerca de 81 mil estrangeiros moram no país (0,3% da população). Os principais
países de destino são Estados Unidos, Argentina, Espanha, Itália, e Chile. Os emigrantes se concentram nas
idades mais produtivas e não apresentam diferenças de sexo significativas.
Os processos de migração internacional na Amazônia seguem as tendências nacionais, mas concentram
mais homens. O censo de 2007 registra 7.319 estrangeiros na Amazônia peruana, originários principalmente
dos países fronteiriços, Estados Unidos, Canadá e Europa, estes últimos vinculados principalmente à exploração
do petróleo.
Através do censo de 2007 foi possível calcular pelo menos 177.535 pessoas nascidas na Amazônia
residindo nesse ano no exterior. Os destinos mais frequentes de peruanos que saíram da Amazônia para o
exterior são Estados Unidos, Canadá, países europeus, Japão, Brasil, Chile, Argentina, e Venezuela. O censo
deixa ver que aqueles domicílios com residentes no exterior apresentam melhores condições de moradia que os
demais, o que permite deduzir que isso se deve às remessas enviadas do exterior. Estima-se em cerca de 40
milhões de dólares o montante anual que os estrangeiros enviam para suas famílias na Amazônia.

21
Migração internacional na Pan-Amazônia

Equador12

O Equador tem uma extensão de 256.730 km2. A Amazônia equatoriana ocupa seis províncias:
Sucumbíos, Napo, Orellana, Pastaza, Morona Santiago e Zamora Chinchipe, correspondendo a 45% da área
do país. A população do Equador em 2008 foi estimada em 13.805.095 pessoas e a da Amazônia em 679.498
(4,9% do país).
As províncias de Sucumbíos e Orellana foram criadas nas décadas de 1980 e 1990, respectivamente,
acompanhando o crescimento da cidade de Lago Agrio (Nueva Loja), capital de Sucumbíos, que foi o centro
inicial da administração da exploração petroleira iniciada em 1974. Essas duas províncias do norte têm sofrido
com a imigração de desplazados colombianos.
Igualmente as províncias amazônicas do sul, fronteiriças com o Peru, sofreram os efeitos do conflito
armado que por vários anos envolveu Equador e Peru e cuja paz foi obtida recentemente (1999).
A Região Amazônica registrou 7.036 estrangeiros no momento do censo de 2001. Os maiores fluxos de
imigrantes na Amazônia procedem da Colômbia, país vizinho e se localizam principalmente na província de
Sucumbíos. Depois da Colômbia, mas em proporções bem menores, os Estados Unidos, o Peru e a Espanha
são os países de origem mais frequentes. Esse padrão revela que a imigração internacional na Amazônia
equatoriana é influenciada pela exploração de petróleo na área e pelo conflito armado da Colômbia.
O Equador é um dos países com maior emigração da América Latina. Estima-se que o número de
equatorianos morando no exterior representa ao redor de 10% da população total do país. Os dados sobre
domicílios com membros no exterior mostram que os padrões de emigração da Amazônia acompanham os
padrões do país. A maioria de emigrantes se dirge para Espanha, Estados Unidos e Itália, mas em nivel de
províncias, na Amazônia, a de Sucumbíos envia emigrantes principalmente para a Colômbia. Os anos de maior
emigração da Amazôía foram 1999, 2000 e 2001, devido fundamentalmente à crise econômica que assolou o
país nesses anos.
Comparando as ocupações desenvolvidas pelos emigrantes antes de sair do país e no país de destino,
constata-se que a maioria travalhava no Equador antes de partir e que no destino se ocupa em trabalhos aquém
de suas competências, embora melhor remunerados que no Equador. Dados sobre remessas constatam que
três quartas partes delas são utilzadas com gastos correntes (alimentação, educação, saúde, moradia), cerca de
21% é investido e muito pouco é poupado.
Outra importante descoberta é o aumento da emigração como consequência da própria migração; a
saída de membros de domicílios para o exterior estimula outros membros também a sair.

Colômbia13

Integram a Amazônia colombiana a totalidade dos territórios dos departamentos de Caquetá, Putumayo,
Amazonas, Vaupés, Guaviare e Guainía, mais os municípios de La Macarena (Meta), Piamonte (Cauca) e
Cumaribo (Vichada), totalizando 477.772 km2 (42% do país). O censo de 2005 registrou uma população total na
Amazônia de 747.267 pessoas (36% do país), mas pelos erros de cobertura na região, a mais alta do país, se
estima um total de 1.016.743 pessoas. Há uma diferença significativa na composição da população amazônica
em relação à população do país. A Amazônia conta com uma população predominantemente masculina e mais
jovem que a nacional, fato que resulta coerente com a história da região que tem sido povoada principalmente
por homens em idade de trabalhar.

12
Síntese extraída do estudo de Gallardo, et. al., nesta coletânea.
13
Síntese extraída do estudo de Sandino, nesta coletânea.

22
Aproximação ao estudo da migração internacional na Pan-Amazônia • Luis E. Aragón

A migração desde e para a Amazônia colombiana tem suas origens recentes ligadas à economia da
borracha que se desenvolveu a partir dos primeiros anos do século XX e que atraiu muita gente do país e alguns
do exterior, mantendo a Amazônia como uma região receptora. Mas a partir dos anos 1990, a região vem
sofrendo impactos de diversa ordem que tem invertido essa tendência, convertendo-a numa região expulsora.
O censo de 2005 revela um acentuado declínio do saldo migratório já identificado nos censos de 1973 e 1993.
Esse fenômeno obedece fundamentalmente à decadência que a economia da coca vem experimentando a
partir da década de 1980, como resultado da implantação do Plano Colômbia de combate ao narcotráfico e à
guerrilha. Nesse sentido é significativo que os saldos migratórios nacionais se apresentem negativos nos
departamentos de Caquetá e Guaviare que são os focos mais importantes da luta armada.
O censo de 2005 registrou 2.673 estrangeiros morando na Amazônia no momento do censo (3,6% da
população amazônica do país), originários principalmente de Peru, Brasil e Equador. O fato de 54% deles não
terem revelado seu país de nascimento pode indicar uma alta proporção de pessoas interessadas em ocultar sua
origem numa região ainda vivendo com forte presença do narcotráfico e da guerrilha.
A distribuição espacial dos estrangeiros na Amazônia colombiana revela proximidade à fronteira de
seus países de origem. Por exemplo, a maioria de equatorianos se encontra localizada nos municípios fronteiriços
e a maioria de brasileiros se encontra no município de Letícia, cidade gêmea de Tabatinga.
Pode-se concluir que o desplazamento forçado é a principal causa do processo migratório na Amazônia
colombiana e que a região deixou de ser atrativa tanto para nacionais como para estrangeiros, convertendo-se
atualmente numa região de expulsão.

Venezuela 14
Em nível nacional a Venezuela é, entre os países amazônicos, o que tem a população estrangeira mais
numerosa (1.014.938 pessoas). Segundo Pellegrino (2003, p. 15), a Venezuela
atravessou um período de transformações associadas ao aumento dos preços do petróleo e
colocou em marcha práticas políticas objetivando recrutar imigrantes profissionais e
trabalhadores especializados. A situação de quase pleno emprego durante grande parte da
década de 1970, os altos salários pagos aos profissionais qualificados que igualavam seus
salários ou em muitos casos superavam aos de países desenvolvidos, e a fortaleza de sua
moeda em relação ao dólar dos Estados Unidos, faziam que as remessas e a poupança dos
imigrantes se multiplicassem em termos reais em seus países de origem. A população de
outros países da América Latina na Venezuela entre os censos de 1970 e 1980 se triplicou, e
como fenômeno novo, captou imigrantes de todas as regiões do subcontinente.

O padrão de imigração internacional da Venezuela analisado acima é ilustrado pela acumulação de


imigrantes ao longo do tempo captados pelo censo de 2001 conforme os anos de chegada ao país (Figura 1).
O estado do Amazonas15 localiza-se no extremo sul do país, cobre uma área de 183.500 km2 (20%
do país) e em 2001 tinha uma população total de aproximadamente 114 mil pessoas16 (0,46% da população do
país) (FREITES, 2005). O censo de 2001 registrou 2.244 estrangeiros no estado17, o que representa 0,22% da
população estrangeira do país, e 1,28% dos estrangeiros da região como um todo.

14
Agradecimentos especiais ao professor Mário Amin pelo apoio no processamento dos dados do censo da Venezuela utilizados neste
trabalho.
15
Não existe consenso sobre a definição da Amazônia venezuelana. Para alguns a região se refere somente ao estado de Amazonas, para
outros deve-se agregar a esse território o estado Bolívar que limita com Roraima no Brasil, e ainda para outros a Amazônia venezuelana
deve cobrir o estado do Amazonas e toda a parte ao Sul do Rio Orinoco ou região Guayana, que envolve os estados de Amazonas, Bolivar
e Delta Amacuro (ACOSTA; PÁEZ-ACOSTA, 2008; EVA; HUBER, 2005). Neste texto e em documentos anteriores produzidos no
âmbito do Grupo MAPAZ, se analisam dados do censo de 2001 referentes ao estado de Amazonas (FREITES, 2005; 2007). Na elaboração
deste texto não se teve acesso ao censo indígena realizado paralelamente ao censo geral. As informações se referem, portanto, somente
à população não-indígena.
16
Incluindo a população indígena.
17
Incluindo 70 venezuelanos nascidos no exterior e 863 naturalizados. Não se inclui a população indígena.

23
Migração internacional na Pan-Amazônia

Os estrangeiros residentes no estado do Amazonas no momento do censo eram originários de mais de


40 países, mas se destacam os nascidos na Colômbia (68,45%) e no Brasil (6,15%) (Tabela 8). Sobressaem
também os sírios, e dos países amazônicos (peruanos (62), equatorianos (40) e bolivianos (10)), mas não
apareceu ninguém do Suriname ou da Guiana Francesa e somente dois da Guiana. Nota-se certa presença de
pessoas nascidas na República Dominicana (35) e em Cuba (11). Isto se explica pelos laços históricos da
Venezuela com esses países caribenhos de fala espanhola. Após desses países surgem outros países da América
do Sul, Espanha, Itália e Estados Unidos.
É importante destacar que a imigração de colombianos no país segue o padrão nacional. Contudo há
uma menor presença deles durante o primeiro ciclo migratório nas décadas de 1950 e 1960 (Figura 2).
A migração de colombianos para Venezuela é histórica, atraídos pelos altos salários, estabilidade econômica e
valorização da moeda, relações comerciais entre os dois países, proximidade, e facilidade da língua. Ultimamente
a queda do valor da moeda e os acontecimentos políticos nesse país, têm diminuído a atração migratória em
nível nacional, mas no caso da Colômbia os efeitos da luta contra o terrorismo e o plano Colômbia, expulsaram
um grande número de colombianos, alguns deles para a Amazônia venezuelana, o que tem mantido em alta a
migração para esse território (Figuras 3 e 4).
No Amazonas os migrantes, no total, se localizam principalmente nos municípios de Atures (capital do
estado) e Atabapo, fronteiriços com Colômbia. Os colombianos se concentram, majoritariamente, nesses e
outros municípios fronteiriços (Autana e Moroa) e os brasileiros, além da capital do estado, nos municípios
fronteiriços de Rio Negro e Manipiare. Os demais estrangeiros se localizam quase na totalidade na capital do
estado e em Atabapo (Tabela 9, Mapa 1).

Figura 1 - População de Venezueala nascida no exterior, por Figura 3 - População do Amazonas nascida no exterior por
ano de chegada, 2001 ano de chegada, 2001
Fonte: INE, Censo 2001. Elaboração própria. Fonte: INE, Censo 2001. Elaboração própria.

Figura 2 - População de Venezuela nascida na Colômbia, Figura 4 - População do Amazonas nascida na Colômbia,
por ano de chegada, 2001 por ano de chegada, 2001
Fonte: INE, Censo 2001. Elaboração própria. Fonte: INE, Censo 2001. Elaboração própria.

24
Aproximação ao estudo da migração internacional na Pan-Amazônia • Luis E. Aragón

Tabela 8 - Estado Amazonas (Venezuela): População nascida no exterior por país de nascimento, 2001*

País de Nascimento Absoluto % % Acumulado

Colômbia 1.536 68,45 68,45


Brasil 138 6,15 74,60
Síria 70 3,12 77,72
Peru 62 2,76 80,48
Espanha 56 2,49 82,97
Chile 52 2,32 85,29
Itália 43 1,92 87,21
Estados Unidos 42 1,87 89,08
Equador 40 1,78 90,86
República Dominicana 35 1,56 92,42
Líbano 24 1,07 93,49
Uruguai 20 0,89 94,38
Portugal 20 0,89 95,27
Cuba 11 0,49 95,76
Argentina 11 0,49 96,25
Bolívia 10 0,44 96,69
Canadá 6 0,27 96,96
Alemanha 5 0,22 97,18
Bahamas 4 0,18 97,36
Coréia do Sul 4 0,18 97,54
China 3 0,13 97,67
Costa Rica 2 0,09 97,76
México 2 0,09 97,85
Panamá 2 0,09 97,94
Guiana 2 0,09 98,03
Hungria 2 0,09 98,12
Países Baixos 2 0,09 98,21
Hong Kong 2 0,09 98,30
Outros países 12 0,54 98,84
Sem declaração 26 1,16 100,00
Total 2.244 100,00
Fonte: INE, Censo 2001. Tabulação própria.
* Incluindo 70 venezuelanos nascidos no exterior e 863 naturalizados. Não se inclui a população indígena.

Tabela 9 - População do estado do Amazonas (Venezuela) nascida no exterior por país de nascimento e município de
residência, 2001

Pais de Municípios de residência


Total
nascimento Alto Orinoco Atabapo Atures Autana Maroa Manapiare Rio Negro
Colômbia 4 66 1406 17 23 11 9 1536
Brasil 1 9 87 0 7 12 22 138
Outros países 7 27 512 4 3 6 1 560
Total 12 102 2005 21 33 29 32 2234
Fonte: INE, Censo 2001. Tabulação própria.

25
Migração internacional na Pan-Amazônia

Mapa 1 - Municípios do estado do Amazonas, 2001.


Fonte: Instituto Nacional de Estadística de Venezuela. XIII Censo General de Población y Vivienda: Primeros Resultados. Caracas: INE, 2001, p. 9

Mapa 2 - Estados da Venezuela, 2001.


Fonte: Instituto Nacional de Estadística de Venezuela. XIII Censo General de Población y Vivienda: Primeros Resultados. Caracas: INE, 2001, p. 3

26
Aproximação ao estudo da migração internacional na Pan-Amazônia • Luis E. Aragón

A migração internacional para o Amazonas aumentou consideravelmente nos últimos dez anos,
especialmente de colombianos, o que fortalece o argumento de que muitos desses colombianos são desplazados
do conflito armado (Tabela 10). Se considerarmos os países e os estados venezuelanos de residência cinco
antes do censo (1996), verifica-se que poucos migrantes fizeram parada intermediária em outros estados da
Venezuela; nesse ano, 73,08% moravam no próprio estado do Amazonas (Tabela 11). Percebe-se, entretanto,
que além do Amazonas, aqueles estados fronteiriços com o próprio estado (Bolívar), mas especialmente Apure
e Táchira, fronteiriços com a Colômbia, além do Distrito Federal e estados próximos, foram os mais representativos
como residências em 1996 (Mapa 2).
Pode-se pensar que esses estados fronteiriços serviriam de parada intermediária de colombianos e,
efetivamente, a grande maioria dos colombianos que fizeram parada em Venezuela o fizeram nos estados
fronteiriços, no estado Bolívar, ou na capital do país e estados próximos dela. Contudo parece ser que a maioria
veio diretamente (Tabela 12).
Essas considerações permitem concluir que os padrões migratórios internacionais no país estão mudando.
Os efeitos da crise econômica e as mudanças políticas por que passa a Venezuela se fazem sentir nos movimentos
migratórios internacionais. Os fluxos imigratórios em geral perderam força a partir da década dos 1980 e alguns
analistas consideram que o país segue atualmente a mesma tendência dos demais países andinos (exceto Chile)
de alta emigração (PELLEGRINO, 2003). Contudo o fluxo de colombianos para a Venezuela aparentemente
se mantém, embora por causas de segurança no país de origem, e este processo afeta diretamente os processos
migratórios na Amazônia venezuelana. Nesse sentido, é significativo que 38,46% dos estrangeiros residentes
no estado do Amazonas sejam naturalizados, sendo 63,04% deles colombianos, o que representa 31,42% da
população das pessoas nascidas na Colômbia residindo nesse estado, conforme o censo.

Tabela 10 - População do estado do Amazonas nascida no exterior, por período de chegada, 2001.

Período de chegada
País de nascimento
Antes de 1970 1971-1980 1981-1990 1991-2001 Total
Colômbia 218 389 247 404 1258
Brasil 53 23 12 16 104
Outros países 98 161 104 123 486
Total 369 573 363 543 1848
Fonte: INE, Censo 2001. Tabulação própria.

27
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabela 11 - População estrangeira no estado do Amazonas, por país ou estado de residência em 1996*

País ou ESTADO de residência em 1996 Absoluto % % Acumulado

AMAZONAS 1.640 73,08 73,08


Colômbia 268 11,94 85,02
BOLIVAR 52 2,32 87,34
DISTRITO FEDERAL 31 1,38 88,72
ARAGUA 19 0,85 89,57
APURE 18 0,80 90,37
TÁCHIRA 17 0,76 91,13
Estados Unidos 16 0,71 91,84
CARABOBO 14 0,62 92,47
Síria 13 0,58 93,04
Brasil 12 0,53 93,58
Cuba 7 0,31 93,89
MÉRIDA 5 0,22 94,11
MIRANDA 5 0,22 94,34
NUEVA ESPARTA 5 0,22 94,56
ANZOÁTEGUI 4 0,18 94,74
GUÁRICO 4 0,18 94,92
YARACUY 4 0,18 95,09
Equador 4 0,18 95,27
Peru 4 0,18 95,45
Canadá 4 0,18 95,63
Espanha 4 0,18 95,81
BARINAS 3 0,13 95,94
LARA 3 0,13 96,07
ZÚLIA 3 0,13 96,21
VARGAS 3 0,13 96,34
Lesoto 3 0,13 96,48
República Dominicana 2 0,09 96,56
México 2 0,09 96,65
Bolívia 2 0,09 96,74
Líbano 2 0,09 96,83
OUTROS ESTADOS 3 0,13 96,96
Outros países 6 0,27 97,20
Sem declaração 62 2,76 100,00
TOTAL 2.244 100,00
Fonte: INE, Censo 2001. Tabulação própria.
Incluindo 70 venezuelanos nascidos no exterior e 863 naturalizados. Não se inclui a população indígena.

28
Aproximação ao estudo da migração internacional na Pan-Amazônia • Luis E. Aragón

Tabela 12 - Pessoas nascidas na Colômbia residindo no estado do Amazonas (Venezuela) por país ou estado de
residência, em 1996.

País ou ESTADO de residência em 1996 Absoluto % % Acumulado

AMAZONAS 1.120 72,92 72,92


Colômbia 257 16,73 89,65
BOLIVAR 29 1,89 91,54
TÁCHIRA 17 1,11 92,65
APURE 15 0,98 93,62
CARABOBO 11 0,72 94,34
ARAGUA 10 0,65 94,99
DISTRITO FEDERAL 6 0,39 95,38
MÉRIDA 4 0,26 95,64
MIRANDA 3 0,20 95,84
NUEVA ESPARTA 3 0,20 96,03
ANZOÁTEGUI 2 0,13 96,16
LARA 2 0,13 96,29
OUTROS ESTADOS 7 0,46 96.75
Outros países 3 0,20 96,94
Sem declaração 47 3,06 100,00
TOTAL 1.536 100,00
Fonte: INE, Censo 2001. Tabulação própria.

BRASIL18

O Brasil exerce influência sobre os demais países amazônicos, inclusive nas Guianas, onde se concentra
grande número de brasileiros vinculados à exploração de ouro. A maioria de migrantes na Amazônia brasileira
procede dos países amazônicos fronteiriços e apresenta padrões de localização característicos de cada país.
A Amazônia Legal brasileira integra os estados de Acre, Rondônia, Mato Grosso, Amazonas, Roraima,
Amapá, Tocantins e Maranhão19 e ocupa 59% do território nacional. De acordo com o censo de 2000 a
Amazônia Legal brasileira alberga 21 milhões de pessoas (14% do país), sendo 29.741 estrangeiros, originários
principalmente de Bolívia, Peru, Japão, Portugal e Paraguai. Esses países de nascimento revelam correntes
migratórias antigas como as dos japoneses, dos portugueses e dos italianos. Esse padrão sofre grandes
modificações quando se considera o país ou estado brasileiro de residência cinco anos antes do censo (1995).
Desaparecem das primeiras colocações Japão, Portugal e Itália e emergem em seu lugar os países amazônicos
e dentro do país nota-se uma mobilidade entre os estados da própria Amazônia Legal. O que essa mudança
indica é que a mobilidade entre países amazônicos é recente, e que, internamente, a mobilidade internacional
acompanha o aumento da migração intrarregional. Os dados revelam também que os migrantes provenientes
de outros países no quinquênio 1995-2000 são em sua maioria naturais desses mesmos países: Peru (98,5% são
naturais do Peru), Bolívia (95,4%), Colômbia (90,9%), Paraguai (98,9%), Venezuela (83,7%), Guiana (96,7%)
e Estados Unidos (87,3%).

18
Síntese extraída do estudo de Do Carmo e Jakob, nesta coletânea.
19
No caso do Maranhão, mesmo que a definição da Amazônia Legal determine que faz parte somente a parte do estado a oeste do Meridiano
44, para facilitar a agregação de dados se considerou todo o estado. Esse procedimento não altera os resultados da análise.

29
Migração internacional na Pan-Amazônia

Outra característica da migração internacional na Amazônia brasileira é a distribuição espacial dos


migrantes conforme a sua origem. Os migrantes provenientes do Peru se agrupam principalmente nos municípios
ao longo da fronteira com esse país e nos maiores centros urbanos da região; os bolivianos ocupam quase que
exclusivamente municípios fronteiriços de Acre, Rondônia e Mato Grosso; e os colombianos se situam em
Tabatinga, cidade gêmea de Letícia, e em Manaus. Outros estudos revelam que os migrantes procedentes de
Venezuela e Guiana situam-se principalmente em Roraima e os do Suriname e Guiana Francesa em Amapá e
Pará (LOBO et. al., 2005). Finalmente, os migrantes com origem no Paraguai (que não é país amazônico) se
localizam principalmente nos estados do Mato Grosso e Rondônia em municípios com alta concentração de
população rural.
Com referência à idade, os migrantes mais jovens são os paraguaios. Essa composição etária permite
aos autores levantar a hipótese de que a imigração de paraguaios na Amazônia brasileira poderia ser constituída
fundamentalmente de crianças e adolescentes nascidos no Paraguai, filhos de pais brasileiros, que retornaram
ao Brasil. A alta porcentagem de imigrantes residentes no Paraguai em 1995 e nativos desse país reforçam
ainda mais essa hipótese. A elevada presença de brasileiros em áreas agrícolas paraguaias ao longo da fronteira
e os constantes conflitos com populações locais que essa presença tem gerado podem ter causado o retorno de
famílias brasileiras, procurando áreas da fronteira agrícola no lado brasileiro.
O estudo revela que a migração internacional na Amazônia brasileira passa por mudanças importantes
no que se refere a seus padrões de origem, de distribuição e de seletividade. As melhorias dos transportes e
condições de comunicação, os acordos bilaterais, os planos de cooperação internacional como os da Organização
do Tratado de Cooperação Amazônica, e de integração física como a Iniciativa de Integração da Infra-estrutura
Regional Sul-Americana (IIRSA) poderão acelerar este processo com desdobramentos significativos para o
desenvolvimento da Amazônia brasileira e da Amazônia dos demais países.

MIGRAÇÃO TRANSFRONTEIRIÇA

A migração transfronteiriça ocorre ao longo da fronteira brasileira com nuances particulares na fronteira
com cada país, mas o fenômeno esta presente também nas fronteiras da Colômbia com o Equador e o Peru e
deste país com a Bolívia ou entre as guianas.
Melhoria das vias de acesso, iniciativas de integração regional, acordos diplomáticos bilaterais e precária
fiscalização são alguns dos fatores que fortalecem a migração transfronteiriça. Esse processo pode envolver
tanto mudanças longas ou permanentes, mobilidade frequente de pessoas que se dirigem a outro país apenas
para trabalhar ou utilizar-se de melhores serviços; ou mudança de residência com constantes movimentos de
ida e vinda ao país de origem.
No caso das fronteiras da Pan-Amazônia, como se apontou acima, os movimentos se dão de diversas
formas, incluindo o prolongamento de processos migratórios internos, a presença irregular de garimpeiros
brasileiros nas Guianas, e as rotas do narcotráfico, mas também nichos de trabalho como os analisados por
France Rodrigues (nesta coletânea) na tríplice fronteira de Brasil, Venezuela e Guiana.
Nesse contexto, como argumentam Patarra e Baeninger (2006, p. 99):
espaços geográficos contíguos, o que chamamos de fronteiras transnacionais, vão
constituindo pontos particularmente vulneráveis aos efeitos perversos da globalização e dos
acordos comerciais sobre as condições de vida de grupos sociais envolvidos. Onde
anteriormente observava-se a extensão de questões agrárias não resolvidas, hoje observa-se
uma crescente vulnerabilidade, com maior insegurança em face dos efeitos paralelos das
rotas do narcotráfico, do contrabando e dos procedimentos ilícitos de lavagem de dinheiro e
outras modalidades de corrupção que aí encontram seu nicho de ação.

30
Aproximação ao estudo da migração internacional na Pan-Amazônia • Luis E. Aragón

Os textos de Pinto e Rodrigues incluídos nesta coletânea analisam processos de mobilidade transfronteiriça
e condições de vida das pessoas envolvidas. France Rodrigues estuda a fronteira roraimense com Venezuela e
Guiana, detalhando os intercâmbios econômicos entre os três países e abordando questões sociais resultantes
desses movimentos como o empoderamento das mulheres e os conflitos de identidades. Manoel Pinto, por sua
vez, analisa um quadro dramático da situação de brasileiros trabalhando em condição ilegal na Guiana Francesa,
apresentando as rotas mais frequentes seguidas pelos brasileiros, a rudeza das autoridades francesas face a
esse fenômeno, os riscos que assumem os migrantes e os retornos compensadores ou não da aventura que
significa penetrar e trabalhar ilegalmente nesse território francês. Mas o tema é abordado também nos demais
textos. Na Guiana e no Suriname garimpeiros brasileiros têm desenvolvido estratégias migratórias que lhes
permitem circular entre o Brasil e os lugares de exploração do ouro, assim como entre os garimpos das próprias
Guianas conforme são mais ou menos rígidos os controles das fronteiras. Fernand (nesta coletânea), por exemplo,
documenta casos de garimpeiros brasileiros no Suriname expulsos pelas autoridades da Guiana Francesa, e
Corbin (nesta coletânea) encontrou brasileiros na Guiana rumo a garimpos do Suriname.

HISTÓRIAS DE MIGRAÇÃO INTERNACIONAL NA AMAZÔNIA BRASILEIRA

A Amazônia brasileira acompanhou o período das grandes migrações do fim do século XIX e primeiras
décadas do século XX. O fluxo internacional de migrantes para o Brasil se robustece a partir de 1870 e,
sobretudo, após a abolição da escravatura em 1888, como resultado de diversas transformações socioeconômicas
e demográficas da Europa, da expansão do capitalismo, e de políticas estatais do Brasil para atrair europeus
para suprir a escassez de mão-de-obra deixada pela libertação dos escravos, principalmente na agricultura, e
com isso construir uma “civilização” nos moldes europeus seguindo a ideologia eugenista da época. Os imigrantes
procediam essencialmente de Portugal, Itália, Espanha, Alemanha e Japão, estes últimos após 1900.
Os censos de 1872 a 1950, como constata Emmi (2008, p. 80), deixam ver que os estrangeiros, embora
se tenham concentrado no centro-sul do país, espalharam-se por todo o país “com maior ou menor intensidade
e em ‘tempos’ diferentes.” Para a Amazônia se dirigiram principalmente portugueses, italianos, espanhóis, e
sirio-libaneses, atraídos pela economia da borracha, e na década de 1930 japoneses, por outras razões; mas
também havia, na época da borracha, ingleses, franceses, norte-americanos, e de muitas outras regiões e
países. Mas ao contrário do que geralmente se pensa, a imigração internacional para a Amazônia se manteve
após a decadência da economia da borracha, sendo que foram os estrangeiros, especialmente comerciantes,
pequenos industriais e trabalhadores em geral, os grandes responsáveis por sustentar a economia nos anos
imediatos após da derrocada da economia da extração do látex. Esses novos migrantes, junto com aqueles que
permaneceram, instalaram pequenas fábricas e estabelecimentos comerciais para abastecer o mercado local
substituindo produtos que não mais podiam ser importados do mercado europeu (EMMI, nesta coletânea).
O censo de 1920, quando a economia da borracha estava em plena decadência, registra no Pará 2,25%
e no Amazonas 4,66% de estrangeiros em relação à população total (983.507 e 363.166, respectivamente).
Após da Segunda Guerra Mundial os padrões das migrações internacionais da região começam a transformar-
se acompanhado o que acontece no país.
No caso da Amazônia, e mais especificamente no Pará, apesar dos esforços dos governos da província
no período da borracha para estabelecer colônias agrícolas com mão-de-obra europeia, os projetos não
prosperaram e a migração internacional se deu principalmente de forma espontânea e concentrou-se
majoritariamente nas cidades.
Os três casos incluídos nesta coletânea resgatam as histórias da migração de italianos e portugueses
durante o período áureo da borracha, e de japoneses.

31
Migração internacional na Pan-Amazônia

Marília Emmi20 expõe como se deu o processo da migração da Itália para a Amazônia e destaca a sua
contribuição ao processo de desenvolvimento regional.
Além da vinda de religiosos, arquitetos, pintores, músicos e outros artistas, cuja presença deixou marcas
em hospitais, escolas e monumentos, o grosso da imigração de italianos que se dirigiram à Amazônia percorreram
diversas trajetórias conseguindo aqui se integrar à economia e à sociedade. A imigração italiana na Amazônia
apresenta dois segmentos contemporâneos (ultimas duas décadas do Século XIX), porém por razões e objetivos
diferentes: (1) a imigração subsidiada dirigida para as colônias agrícolas e, (2) a imigração espontânea dirigida
às cidades.
A tentativa de estabelecer quatro colônias agrícolas no Pará com mão-de-obra italiana (Benevides,
Anita Garibaldi, Outeiro e Ianatema) estava inserida dentro do projeto de colonização do Império e primeiros
anos da República, para suprir a escassez de mão-de-obra que produziu a abolição da escravatura. Essas
iniciativas foram efêmeras, e consideradas fracassadas; mas mesmo assim sua contribuição é notada até hoje.
Paralelamente a essa imigração existiu outro segmento de italianos constituído fundamentalmente de
famílias que migraram de forma espontânea e que se dirigiram para as cidades amazônicas e aqui se fixaram.
Vieram da Itália setentrional, das regiões do Veneto, Lombardia, Emilia Romagna, Piemonte e Ligúria; da Itália
central, da região do Lazio e da Toscana, e da Itália insular, da região da Sicília. À diferença da grande
migração que se dirigiu ao Sul do país constituída majoritariamente por pobres e analfabetos, e cujo deslocamento
era subsidiado pelo Estado, o segmento que se dirigiu para as cidades amazônicas era formado principalmente
por pequenos proprietários e artesãos que traziam pequenas economias e possuíam habilidades específicas
(sapateiros, funileiros, ourives, pintores) e algum grau de instrução.
Aqui não se identificaram famílias de imigrantes italianos possuidoras de grandes fortunas, embora seus
negócios tenham prosperado e perdurado por várias gerações e tenham ocupado posições de destaque na vida
profissional, artística e política que repercutem até hoje.
Edilza Fontes21 discute a imigração portuguesa, o mercado de trabalho, e a formação da classe operária
de Belém, na virada do século XIX para o século XX. É um estudo sobre imigrantes portugueses pobres,
trabalhadores de pequenos estabelecimentos na época áurea da economia da borracha, moradores duma cidade
onde os bancos, as casas aviadoras e as empresas vinculadas à prestação de serviços urbanos demandavam
um mercado de trabalho que se formou na base da força de trabalhadores vindos de diversas partes do mundo.
O estudo se baseia em intensa pesquisa de fontes primárias incluindo o acervo de registros de portugueses
do Consulado de Belém na época, jornais e arquivos de diversa natureza.
A imigração portuguesa no Brasil na virada do século XIX para o século XX foi a mais numerosa. Em
1890, estimam-se entre 150.000 e 200.000 imigrantes portugueses no Brasil. Aqui os portugueses se espalharam
por diversas regiões do país. A imigração portuguesa para a Amazônia não teve a mesma amplitude que aquela
que se dirigiu para o Rio de Janeiro ou São Paulo, mas não foi desprezível do ponto de vista da sua importância
e contribuição à economia da região.
Os migrantes para o Pará eram originários principalmente das Províncias de Douro, Minho, Beira Alta,
e Beira Baixa. A maioria partia de Lisboa, Leixões, e Porto e poucos paravam no Rio de Janeiro e São Paulo
antes de chegar ao Pará. Em Belém estabeleciam redes de convivência, vizinhança e ajuda mútua e eram
preferidos em ocupações como caixeiros, padeiros, leiteiros ou aguadeiros e as portuguesas como amas-de-
leite. Eles se concentravam nos bairros do Comércio, Cidade Velha e Campina e muitos moravam nos mesmos
lugares de trabalho.

20
Síntese extraída de Emmi, nesta coletânea.
21
Síntese extraída de Fontes, nesta coletânea.

32
Aproximação ao estudo da migração internacional na Pan-Amazônia • Luis E. Aragón

Era uma migração constituída principalmente de homens solteiros que migraram sozinhos e muitos
sabiam ler e escrever, demonstrando sua aptidão com um trabalho urbano. O mercado de trabalho em Belém
era perpassado por relações de gênero e de raça. Para as mulheres, o mercado de trabalho fora do lar era
baseado nos serviços de casa.
O estudo documenta detalhadamente o envolvimento de portugueses na luta por melhores salários, na
organização de sociedades beneficentes, ou na origem dos sindicatos em Belém. É um contato com o passado,
com o quotidiano dos imigrantes portugueses em Belém, de suas relações e lutas.
Finalmente Alfredo Homma22 resgata a história da imigração japonesa na Amazônia e sua contribuição
principalmente para o desenvolvimento agrícola. A migração japonesa para a Amazônia se deu mais tardiamente
e apresenta características próprias. Está vinculada principalmente a atividades agrícolas embora seu impacto
seja visto hoje praticamente em todos os setores da economia, da cultura e da sociedade.
A imigração japonesa na Amazônia foi iniciada duas décadas depois da vinda dos primeiros imigrantes
do Kasato Maru em 1908, chegando ao Pará (Tomé-Açú) em 1929 e ao Amazonas em 1929 (Maués) e 1930
(Parintins).
A entrada de migrantes japoneses no Brasil foi para trabalhar nas lavouras de café, sobretudo no
estado de São Paulo. No Brasil entraram aproximadamente 188 mil japoneses antes da Segunda Guerra Mundial
e 62 mil após o término do conflito e na Amazônia, ocorreu o inverso, entraram 3 mil antes da Guerra e 7 mil
depois.
O sucesso da colonização japonesa, segundo Alfredo Homma, decorreu da introdução de recursos da
biodiversidade exógena, a qual era normal na época, cujas técnicas de cultivo e beneficiamento introduzidas
pelos migrantes japoneses foram aprendidas rapidamente pelos caboclos da Amazônia. Hoje o desenvolvimento
agrícola induzido pelos descendentes de japoneses está baseado no aproveitamento da biodiversidade local,
principalmente de frutas, associado com plantas exóticas introduzidas no passado, e outras mais recentes, e do
aproveitamento de áreas desmatadas.
A imigração de japoneses para o Brasil gerou também uma migração de retorno de seus descendentes,
bastante divulgada em diversos meios. Ainda segundo o autor, até antes da eclosão da crise de 2008, trabalhavam
no Japão cerca de 330 mil descendentes de japoneses, número superior ao contingente que imigrou para o
Brasil. Este contingente provocou importante influência cultural brasileira no Japão.

CONCLUSÕES

A região da América Latina e Caribe se destaca hoje como a grande fornecedora de capital humano
em nível mundial (MARTINE, 2005). Nos cinco séculos de história desde a chegada de Colombo, argumenta
Pellegrino (2003, p. 11), esta região passou por quatro grandes etapas migratórias. A primeira, da conquista à
independência, caracterizou-se pela ocupação do território pela população que vinha dos países colonizadores
e pela população escrava africana. A segunda correspondeu à época das grandes migrações europeias para o
Novo Mundo durante a segunda metade do século XIX e princípios do século XX, quando a região recebeu
grande quantidade de pessoas desse continente. A terceira, de 1930 a 1960, apresentou retração dos fluxos
internacionais tradicionais e aumento das migrações internas para as grandes cidades e a migração internacional
adquiriu um caráter regional e fronteiriço. A quarta fase, ou contemporânea, se inicia nas últimas décadas do
século XX, com o aumento constante da emigração tornando negativos os saldos migratórios de muitos países.

22
Síntese extraída de Homma, nesta coletânea.

33
Migração internacional na Pan-Amazônia

A pergunta que surge é, e a próxima etapa? O Instituto das Migrações Internacionais da Universidade
de Oxford tenta uma previsão (IMI, 2006, p. 13):
O declínio mundial das taxas de natalidade poderá vir a colocar em questão a hipótese de
existência de um viveiro inesgotável de migrantes laborais, prontos a deslocar-se para os
países industrializados, com vista a prover as necessidades econômicas. À medida que os
países forem avançando na transição demográfica, as suas taxas de dependência aumentarão
nos próximos decênios. A médio e longo prazos, uma concorrência acrescida no acesso a
mão-de-obra poderá transformar radicalmente as migrações mundiais e as respostas políticas
de maneira dificilmente imaginável. Por exemplo, a fraca taxa de natalidade da China, novo
gigante industrializado, poderia criar um déficit de mão-de-obra importante, e, a mais longo
prazo, déficits similares poderiam emergir em outras regiões clássicas de emigração como o
Norte da África e a América Latina, onde as taxas de natalidade tiveram um rápido decréscimo.

Os documentos apresentados nesta coletânea dão indicações de que o processo migratório internacional
na Amazônia passou pelas etapas identificadas por Pellegrino (2003), com nuances específicas em cada país.
São ainda indícios que merecem aprofundamento, mas que dão a oportunidade de refletir sobre a questão e
analisar a migração não como um problema a ser resolvido, mas sim como um fenômeno a ser gerido.
Os documentos deixam transparecer que a migração traz uma série de prejuízos para os países e os
atores envolvidos, mas também uma série de benefícios, que no balanço final podem pesar mais que os prejuízos,
como bem o aponta Martine (2005). Tratar a migração como um sistema complexo que não se reduz simplesmente
a migrantes, países de origem e destino ou fatores de atração e repulsão, demanda novas interpretações onde
todas as dimensões sejam contempladas. E esse sistema adquire contornos específicos conforme a história, o
ambiente, e a escala onde ele ocorre. Na Amazônia os padrões e as tendências discutidas aqui se tornarão mais
dinâmicas e complexas no andamento de políticas de desenvolvimento na busca da integração regional e
econômica. Aceitar a migração internacional como um fenômeno necessário e inevitável do processo de
globalização requer uma melhor gestão e não somente medidas de controle (HILY, 2003). Na previsão da
CEPAL (2002, p. 267):
Em matéria de políticas públicas sobre migração, a globalização tornará cada vez mais necessário
o trânsito do controle migratório para a gestão migratória num sentido amplo, o que não
significa que os Estados abandonem sua atribuição de regulamentar a entrada de estrangeiros
e acautelar suas condições de radicação, mas que aceitem formular políticas razoáveis de
admissão, que contemplem a permanência, o retorno, a reunificação familiar, a revinculação, o
trânsito fronteiriço e o traslado de indivíduos a outros países.

O que foi feito aqui foi apresentar ao debate a complexidade do fenômeno da migração internacional
na Amazônia em suas diversas dimensões. É a ponta do iceberg, a radiografia ainda incompleta que se falou no
início. Perguntas foram formuladas que orientarão o caminho para novas iniciativas de pesquisa.
Os censos têm ainda muito mais a mostrar em questões relacionadas à seletividade migratória, mobilidade
intra-amazônica, migração de retorno, tanto interna como internacional, e mudanças de padrões ao longo dos
anos, entre outros assuntos. Novos quesitos como aqueles referentes a membros de domicílio residentes no
exterior, já incluídos nos censos do Equador, do Peru e da Colômbia, serão correntes e melhorados nas próximas
rodadas dos censos, convidando os pesquisadores a realizarem novas descobertas. O Peru e a Venezuela
realizaram censos específicos da população indígena. Essas informações são crucias para Amazônia.
Considerando a dimensão que tomou a emigração internacional, alguns países têm desenvolvido
programas especiais para estudar esse fenômeno em busca de uma melhor gestão ao invés de pôr ênfase
somente no controle. É o caso dos trabalhos que vêm sendo realizados no Peru (INEI, 2007; 2008) e no
Equador (GALLARDO, et. al., nesta coletânea), e nesse contexto, como tornar mais eficiente a integração das
remessas à economia nacional. Precisa-se ver como se comporta a Amazônia nesses processos.

34
Aproximação ao estudo da migração internacional na Pan-Amazônia • Luis E. Aragón

A síndrome do brain drain que tanto assola a Guiana e o Suriname, mas que é uma realidade comum
aos países em desenvolvimento e que se tem aprofundado como consequência da globalização, é outro assunto
que merece atenção especial na Amazônia à luz de novos debates e propostas. Para alguns a extremada ênfase
no lado negativo da problemática da fuga de cérebros ou de capital humano tem obscurecido possíveis benefícios
e gerado ações que têm produzido poucos resultados, sugerindo uma virada de foco da análise de “drenagem de
cérebros” para “circulação de cérebros” (PELLEGRINO, 2003, p. 26), tomando vantagem de redes de diáspora,
intercâmbios acadêmicos, programas de professores, pesquisadores e profissionais visitantes recorrentes e de
“remessas de conhecimento” e outras formas de fortalecimento das capacidades em países em desenvolvimento,
que o próprio processo de migração internacional tende a fortalecer.
Enquanto as brutais desigualdades mundiais se mantenham, as regiões e os países menos favorecidos
continuarão perdendo seu melhor capital humano. A globalização, como afirma Martine (2005, p 3), “dispensa
fronteiras, muda parâmetros diariamente, ostenta luxos, esbanja informações, estimula consumos, gera sonhos
e, finalmente, cria expectativas de vida melhor”. Daí a explosão migratória do Sul para o Norte. A pergunta que
emerge para o caso da Amazônia é se a síndrome do brain drain é um problema isolado da Guina e do
Suriname ou se afeta também o resto da região e em que dimensões, e nesse sentido, que medidas de cooperação
intra-amazônica seriam necessárias para mitigar o problema. Organismos como a Organização do Tratado de
Cooperação Amazônica (OTCA), a Associação de Universidades Amazônicas (UNAMAZ), e a cúpula de
chefes de estado e de governo da América do Sul deverão jogar papel protagonista neste assunto.
Literatura recente demonstra que a imigração internacional para a Amazônia brasileira continuou após
a queda da economia da borracha trazendo à luz a importante contribuição dos estrangeiros no comércio, na
indústria, na cultura e noutros setores durante esse período. Tais evidências merecem pesquisas mais aprofundadas
ao mesmo tempo de comparar se esse fenômeno é exclusivo da Amazônia brasileira ou se ele se repete nos
demais países.
A participação da mulher em fluxos de migrações internacionais é cada vez mais reconhecida
(MARTINE, 2005), o que tem levado a redefinir relações de gênero e ao empoderamento das mulheres,
migrantes e “ficantes”. Essas relações ficam evidentes no estudo de Rodrigues (nesta coletânea). É um tema
que merece maiores aprofundamentos.
Finalmente, a migração internacional contemporânea vem acompanhada de processos ilícitos que
precisam ser mais bem conhecidos e tratados. A Amazônia não pode ficar ausente desses debates.

35
Migração internacional na Pan-Amazônia

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Aproximação ao estudo da migração internacional na Pan-Amazônia • Luis E. Aragón

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37
Migração: abordagens teóricas • Aurélia H. Castiglioni

MIGRAÇÃO: ABORDAGENS TEÓRICAS

Aurélia H. Castiglioni1

INTRODUÇÃO

A migração sempre fez parte das vidas das populações. A decisão de migrar, que implica trocar o
ambiente familiar e social por uma situação muitas vezes desconhecida, é movida por forte motivação, que
traduz a insatisfação do indivíduo com sua situação na região de origem como também seu desejo de encontrar
uma nova terra, na qual todas as suas aspirações serão concretizadas.
A migração é um processo complexo em suas características, mensuração, causas e efeitos. O estudo
da migração é relevante não só para a compreensão dos seus determinantes políticos, sociais e econômicos,
como também para o conhecimento dos efeitos que ocorrem em várias esferas: o processo afeta a vida e o
comportamento dos migrantes, suas famílias e suas redes parentais e comunitárias, e, em termos da estrutura
da sociedade, por seu caráter bilateral, a migração provoca modificações na distribuição, na dinâmica e na
composição da população, interferindo na vida econômica, política e social das comunidades de partida e de
chegada dos migrantes. O estudo da migração representa um grande desafio, e somente pesquisas específicas
permitem apreender esse componente em uma dimensão mais ampla.

DIFICULDADES DO ESTUDO

Nos últimos tempos, uma literatura abundante tem focalizado as múltiplas dimensões da migração.
Os resultados desses estudos colocam em evidência a dificuldade de construção de uma teoria geral para
medir, explicar e prever a mobilidade espacial. Ravenstein (1889, p. 241), em seu trabalho precursor sobre as
leis da migração, abordou essa problemática, advertindo que “[...] as leis da população, e as leis econômicas
não têm, em geral, o rigor das leis físicas [...]”.
O processo de teorização da migração é caracterizado por uma grande heterogeneidade de enfoques, e
nenhuma teoria completa foi ainda validada. A dificuldade de integrar os conhecimentos acumulados é qualificada
pelos autores como “impasse”, “paradoxo”, “crise” (SIMMONS, 1987; ZELINSKY, 1980). Para Simmons
(1987), a teoria da migração não constitui um conjunto coerente de reflexões, as diferentes teorias para predições
e interpretações da migração são, muitas vezes, discordantes, concorrentes ou divergentes.

1
Demógrafa. Professora da Universidade Federal do Espírito Santo. E-mail: aureliacastiglioni@gmail.com

39
Migração internacional na Pan-Amazônia

Vários fatores contribuem para dificultar a apreensão e a explicação da migração:

a) a própria definição do tema é, em geral, restringida por problemas conceituais e técnicos (NATIONS
UNIES, 1971). Se os fenômenos demográficos que caracterizam o crescimento natural, mesmo com
definições concretas, apresentam problemas de conceituação e medida, o que não se dizer da dinâmica
migratória, impossível de ser razoavelmente apreendida em muitos dos países do mundo, devido à
multiplicidade de conceitos e critérios a sua base? Com efeito, a definição da migração varia segundo os
objetivos do estudo e até mesmo segundo a percepção do fenômeno (CUNHA; PATARRA, 1987). O
estudo empírico da migração requer a precisão de certos critérios, que, se, por um lado, facilitam a
operacionalização da definição, por outro, impõem certas restrições.

b) Um dos maiores limites para o estudo e a compreensão desse componente é, certamente, a dificuldade de
obtenção de dados adequados para testar as teorias formuladas e produzir indicadores (GOLDSTEIN,
1980; MARTINE, 1980). A medida da intensidade da migração é difícil mesmo para os países que dispõem
de estatísticas mais precisas.

Para a medida dos movimentos internacionais, os países de chegada tentam levantar as imigrações, para
controlar e, frequentemente, limitar as entradas. Mas esses dados são imprecisos, uma vez que não é
possível apreender a imigração clandestina e há uma dificuldade crescente em distinguir as entradas definitivas
das entradas temporárias.

Para as migrações internas, existem dois tipos principais de fontes: as declarações das mudanças de domicílio
e o recenseamento. No Brasil, não existe nenhum registro obrigatório para mudança de residência, nem no
local de origem, nem na destinação. Por outro lado, as informações produzidas pelo censo sobre a migração
possibilitam uma medida parcial, que não revela a verdadeira intensidade da mobilidade, muito mais complexa
que a dos outros componentes do crescimento. A mortalidade é um evento não-renovável e ocorre,
necessariamente, uma vez para cada indivíduo; a fecundidade é renovável e é restrita às mulheres em idade
de procriação; a migração, no entanto, pode ser realizada em qualquer idade, para ambos os sexos, sem limite
de tempo e de número de deslocamentos. Além disso, as fontes produtoras de dados fornecem uma visão
estática do fenômeno, que impossibilita apreender as modificações das características que podem estar
relacionadas com a migração, como o estado civil, a instrução, o salário, a atividade econômica.

c) A migração é um fenômeno reflexo, isto é, “[...] uma manifestação de processos e de transformações


sociais e econômicas mais profundas, que lhe são subjacentes” (MOURA, 1980, p. 11). O fenômeno
representa uma resposta da população ao processo de mudanças socioeconômicas que opera em um
contexto específico durante um determinado tempo. Existe uma heterogeneidade de modelos de migração,
o que torna difícil a generalização e a construção de um quadro conceitual geral. A mesma situação de
desenvolvimento, no mesmo contexto e durante o mesmo tempo, produz fluxos migratórios diferenciados
em termos de composição, direção e intensidade. A compreensão da migração implica o conhecimento da
realidade histórica, socioeconômica, política e cultural da sociedade considerada, donde a necessidade de
construir-se um modelo explicativo adaptado à situação particular que é estudada, colocando o movimento
migratório em relação com o processo de transformação da sociedade do qual ele é, ao mesmo tempo,
consequência e causa.

d) A migração é condicionada não só por fatores estruturais, situados em um nível macro, mas também por
fatores pessoais que agem em um nível micro. Os modelos agregados permitem a predição da intensidade
dos fluxos, enquanto que os modelos individuais são úteis para a explicação das causas da migração
(GOLDSTEIN, 1980). Parece ser difícil integrar os resultados dos dois níveis de análise.

40
Migração: abordagens teóricas • Aurélia H. Castiglioni

e) A migração é um fenômeno simétrico. Enquanto que os componentes do crescimento natural produzem


modificações na região de residência dos indivíduos que nascem ou morrem, os impactos da migração
afetam sempre as regiões relacionadas ao processo, a de origem e a de destino.

f) Outra dificuldade para construir uma teoria geral emana da natureza multidisciplinar do fenômeno migratório.
A pesquisa do tema engloba uma heterogeneidade de abordagens realizadas por pesquisadores de formações
diversas. O demógrafo se interessa pela dimensão e composição dos fluxos e pelas consequências da
migração sobre o tamanho, a estrutura e a dinâmica das populações das regiões de origem e de destino.
O economista aborda as relações entre migração e crescimento econômico. O historiador procura situar a
migração no tempo, relacionando-a com a evolução econômica e política. O sociólogo se interessa, sobretudo,
pelos determinantes e pelas consequências da migração para o indivíduo e para a coletividade. Já o
psicólogo se apega às motivações dos indivíduos. O político se interessa pela regulamentação sobre a
imigração (CASTIGLIONI, 1989).2 A natureza complexa da migração requer, para a compreensão do
fenômeno, a construção de uma teoria robusta que incorpore uma multiplicidade de abordagens em diversos
níveis de análise.

Assim, a construção de uma teoria geral para explicar a natureza e as forças que provocam a migração
apresenta-se como um objetivo considerado impossível.3 No entanto, não obstante a complexidade do fenômeno,
os comportamentos migratórios nas diferentes comunidades apresentam certas similaridades, regularidades e
repetições que justificam alguma generalização e, em particular, a formulação de princípios de base do quadro
teórico de análise da migração (ZELINSKY, 1971).

TEORIAS

A explicação e a predição da migração foram objetos de um número expressivo de trabalhos cuja


diversidade reflete a enorme abrangência do tema. As abordagens variam, no tempo, de trabalhos precursores
a teorias mais atuais e, na forma, de modelos matemáticos e estatísticos a abordagens explicativas que focalizam
a migração como resultado de escolha individual, a formulações mais complexas, que condicionam a migração
a fatores econômicos e sociais, à mudanças estruturais e à sistemas onde tudo está em interação. São
apresentados a seguir eixos de teorias preditivas e/ou explicativas da migração, que utilizam instrumental teórico
proveniente de diversas disciplinas, sem a pretensão de aprofundar e esgotar o tema, cuja amplitude vai além do
escopo desse trabalho.

2
Jansen (1969 apud PEIXOTO, 2004) ressalta os vários aspectos dessa interdisciplinaridade: “A migração é um problema demográfico:
influencia a dimensão das populações na origem e no destino; é um problema econômico: muitas mudanças na população são devidas a
desequilíbrios econômicos entre diferentes áreas; pode ser um problema político: tal é particularmente verdade nas migrações internacionais,
onde restrições e condicionantes são aplicados àqueles que pretendem atravessar uma fronteira política; envolve a psicologia social, no
sentido em que o migrante está envolvido num processo de tomada de decisão antes da partida, e porque a sua personalidade pode
desempenhar um papel importante no sucesso com que se integra na sociedade de acolhimento; e é também um problema sociológico, uma
vez que a estrutura social e o sistema cultural, tanto nos lugares de origem como de destino, são afetados pela migração e, em contrapartida,
afetam o migrante”.
3
Os autores têm tendência a ressaltar os aspectos do processo, pertinentes a objetivos orientados pela sua formação, e, em consequência,
o poder explicativo de suas abordagens fica limitado por uma visão parcial ou simplificada do fenômeno. A natureza inerente ao ser
humano e as funções da sociedade afastam a possibilidade de construção de uma teoria rigorosa para descrever, explicar e prever
completamente e precisamente qualquer fase significativa da atividade humana no mundo real (GRAHAN, 1976 apud ZELINSKY, 1971).

41
Migração internacional na Pan-Amazônia

AS LEIS DA MIGRAÇÃO

Na base das pesquisas sobre a migração, encontra-se o trabalho de Ravenstein (1885), geógrafo e
cartógrafo inglês, que observou as regularidades segundo as quais as migrações eram realizadas, e propôs uma
série de generalizações sobre a ocorrência das migrações. Esse trabalho constituía uma resposta à tese do
Dr. William Far, segundo a qual as migrações pareciam ocorrer sem qualquer lei definida. Para elaborar seu
trabalho, Ravenstein se baseou no recenseamento britânico de 1881, e a análise, nessa primeira etapa, restringiu-
se à migração ocorrida dentro do Reino Unido. Em 1889, Ravenstein (1889) retomou o tema, baseando-se em
pesquisas realizadas em um contexto de observação mais amplo, que incluía a Inglaterra e mais vinte países.
Ao verificar que a segunda observação havia confirmado as observações anteriores, ele propôs uma série de
generalizações e intitulou seu trabalho de “As leis da migração”. As leis são sete e, dentre elas, figuram as
relações entre a migração e a distância, o crescimento urbano, a atividade econômica, a distribuição por sexo,
a situação de domicílio, a formação de contracorrentes.4
O estudo de Ravenstein se baseia nas informações empíricas então disponíveis e não é respaldado por
bases teóricas mais sólidas. No entanto o autor é sempre citado não só por seu caráter precursor, como
também pelos princípios teóricos anunciados em seu trabalho que inspiraram os vários modelos preditivos e de
atração-repulsão.

MODELOS EXPLICATIVOS/PREDITIVOS

Os modelos matemáticos, estatísticos e gravitacionais ou de interação espacial abordam as relações


existentes entre a migração e um número reduzido de variáveis diretamente mensuráveis, relativas ao espaço
geográfico (distância, população, superfície). Eles se assemelham às abordagens frequentemente utilizadas
pelas ciências físicas e tratam o movimento migratório com equações matemáticas que possibilitam a descrição
do fenômeno e de suas variações no tempo e no espaço e são utilizados para estimar e explicar os fluxos
migratórios.
Nos modelos gravitacionais a região é considerada como uma massa, e as relações inter-regionais são
percebidas como a interação entre massas, subordinadas aos princípios gerais que governam suas frequências
e intensidades. De acordo com o conceito de gravitação, aplicado nessas abordagens, as correntes migratórias
são concebidas como sendo diretamente proporcionais aos efetivos das populações das regiões de origem e de
destino e inversamente proporcionais à distância que as separa.5
Courgeau (1970) distingue os modelos que utilizam a distância generalizada, medida em termos de distância
física, dos que consideram a distância social.

4
As leis sugeridas por Ravenstein (1885 e 1889) são:
- a maioria dos migrantes se desloca a curta distância;
- as pessoas que habitam uma zona em torno de uma cidade que passa por um processo de crescimento rápido migram para essa cidade e são
substituídas por pessoas de regiões mais distantes, até o ponto no qual a força de atração dessa cidade é neutralizada pela força de uma outra;
- os processos de dispersão de uma população, a partir de uma zona de emigração, são inversos aos observados em uma zona de imigração,
e obedecem a leis simétricas;
- cada corrente de migração produz uma contracorrente inversa, compensatória;
- os migrantes que percorrem longas distâncias vão, preferencialmente, para os grandes centros industriais e comerciais;
- as pessoas nascidas nas cidades migram menos que as nativas das zonas rurais do país; e
- as mulheres migram mais que os homens.
5
Muitas críticas foram feitas à natureza determinista dos conceitos de distância e de gravitação e à explicação simplista que esses modelos
produzem, utilizando a população e a distância como variáveis explicativas.

42
Migração: abordagens teóricas • Aurélia H. Castiglioni

As abordagens em que a migração intervém como função decrescente da distância baseiam suas formulações
na generalização do modelo de Pareto.6 O número de migrantes entre as áreas i e j é estimado por:

Mij = k Pi Pj
d ij n
onde:

Pi e Pj : populações das áreas i e j


d ij : distância entre as áreas i e j
k e n: constantes.

Dentre as formulações que consideram a distância física7, o trabalho de Stewart (1948) mostrou o
significado dos conceitos físicos nas ciências humanas. De acordo com o autor, as relações entre as unidades
sociais podem ser descobertas procurando largos agregados dessas unidades por analogia com as leis que
governam a densidade, a pressão e a temperatura dos gases que foram descobertas somente a partir da
investigação da substância como uma massa. Stewart (1948) apresentou três conceitos primários baseados na
física de Newton. Baseando-se na força gravitacional, ele definiu a força demográfica, a energia demográfica
e o potencial demográfico. Partindo da analogia entre o modelo de Zipf e a lei de Newton, Stewart e Warntz
(1958) adotaram essa formulação para elaborar mapas de potencial de população.
O postulado fundamental do modelo gravitacional, a relação inversa entre o volume da migração e a
distância, é especificado na “hipótese P1.P2/D” proposta por Zipf (1946). Ele postula que a repartição da
população é determinada pelo equilíbrio entre duas economias, uma resultante da concentração da população
nas proximidades da fonte imediata de materiais primários e outra, da concentração da população em uma
grande cidade onde se realizam todas as manufaturas. A primeira economia é denominada “força de
diversificação” por produzir um grande número de pequenas comunidades, e a segunda, “força de unificação”,
porque ela representa um grande conjunto formado por uma grande cidade. O movimento de bens e de pessoas
depende da minimização do trabalho de transportar uma massa por meio da distância, com o equilíbrio entre as
duas forças opostas de diversificação e de unificação. Zipf (1946) aplicou sua teoria ao número de indivíduos e
de tarifas globais nas viagens por rodovias, ferrovias e aerovias, nos Estados Unidos. A partir dessas idéias, as
contribuições de numerosos autores se multiplicaram (ZIPF, 1946; COURGEAU, 1970)8.

6
O economista italiano Vilfredo Pareto constatou, em seus trabalhos realizados no século XIX, que a maior parte da riqueza se concentrava
nas mãos de um número reduzido de pessoas. A Lei de Pareto (também conhecida como princípio 80-20), inspirada nos resultados
observados pelo autor, considera que, em muitos outros fenômenos que ocorrem na sociedade, a maioria das conseqüências (80%) advém
de um pequeno número de causas (20%).
7
Contribuíram para a formalização dessa escola os trabalhos de Carey, Young e Reilly, Stewart e Warntz, Zipf, Olsson, Wilson, Stillwell,
dentre outros (POULAIN, 1981). Carey observou a presença da força gravitacional nos fenômenos sociais, a qual é proporcional à massa
(população) e inversamente proporcional à distância. De acordo com o conceito de gravitação, que está na base do modelo gravitacional,
as correntes migratórias são concebidas como sendo proporcionais ao produto das populações das regiões e inversamente proporcionais
a uma potência da distância que as separa. A contribuição de Young foi a formulação algébrica do conceito de gravitação aplicado às
migrações. A idéia central apresentada por Young é que as correntes migratórias variam proporcionalmente à força de atração do lugar de
destino e de maneira inversa ao quadrado da distância entre os lugares de origem e de destino. Reilly aplicou o conceito de gravitação ao
transporte de mercadorias de varejo. Ele postula que a atração que uma cidade exerce sobre um cliente em seu hinterland é proporcional
ao efetivo da população e inversamente proporcional à distância que separa o cliente do centro da cidade.
8
Estudando os movimentos migratórios entre centros urbanos de diferentes grandezas, Olsson conclui que os migrantes originários de
grandes centros urbanos percorrem distâncias maiores que os provenientes dos pequenos centros, e que cada corrente migratória tem
estreita relação com sua contracorrente. Com uma ótica mais probabilista, Wilson propõe uma teoria estatística da distribuição espacial
baseada numa analogia com diferentes ramos da física e da mecânica estatística. Wilson introduziu a noção de entropia que, no caso das
migrações, é considerada como a distribuição mais provável das correntes. Seu método fornece as regras gerais para derivar modelos de
distribuição mais provável dos deslocamentos em uma larga variedade de situações. Stillwell (1978) aplicou a teoria de Wilson ao
fenômeno demográfico. Ele estudou a migração interna na Grã-Bretanha durante os períodos de 1965-1966 e 1961-1966 e testou o
modelo em duas unidades administrativas.

43
Migração internacional na Pan-Amazônia

De acordo com a tipologia proposta por Courgeau (1970), um segundo eixo é composto por abordagens
interdisciplinares do fenômeno migratório que consideram a distância social, buscando determinar que variável
ligada à distância possa explicar a lei de distribuição das migrações. As abordagens propostas por Stouffer e
Hagerstrand se enquadram nesse eixo, mas fundamentam-se também na escolha racional, característica dos
modelos econômicos centrados na escolha individual.
A primeira formulação desse tipo foi apresentada por Stouffer (1940), que argumentou que o número de
pessoas que se deslocam a uma distância determinada é diretamente proporcional ao número de oportunidades
de empregos oferecidos no local de destino e inversamente proporcional ao número de “oportunidades
intermediárias” (intervening opportunities) que existem entre as áreas de origem e de destino. Essa abordagem
se fundamenta no princípio de racionalidade econômica: o indivíduo busca minimizar os custos do deslocamento
e interrompe sua busca quando encontra uma ocasião satisfatória.
Mais tarde, Stouffer aprimorou seu modelo, introduzindo uma nova variável: os migrantes competitivos
para os postos oferecidos. O movimento migratório entre duas regiões i e j é diretamente proporcional ao
número de postos oferecidos em j, e inversamente proporcional ao número de postos intermediários oferecidos
entre i e j, assim como ao número de pessoas em competição para os postos oferecidos em j.
Hagerstrand (1957) propôs um modelo semelhante ao de Stouffer para a previsão a curto prazo das
migrações suecas. O autor postula que a migração entre duas regiões não é ligada apenas aos postos intermediários
de oferta, mas também à informação que circula entre elas. Baseou-se em observações realizadas durante dois
períodos (1860-69 e 1930-39), na comunidade de Asby, Suécia, para mostrar o papel representado pela distância
durante períodos históricos diferentes e a tendência ao alargamento do campo migratório com o aumento do
número de pessoas migrando a longas distâncias. Hagerstrand observou também as diferenças de relações
entre migração e distância segundo os grupos sociais.

TEORIAS ECONÔMICAS

A Economia neoclássica forneceu as bases para a construção de teorias sobre a migração as quais se
baseiam na assunção da “escolha racional” do indivíduo, considerado como o ator principal do processo
migratório. Segundo as hipóteses que norteiam essas abordagens, a migração resulta de uma decisão individual
para maximizar o lucro.

A teoria de Everett S. Lee

Os modelos de push-pull se fundamentam na existência de fatores que impelem e que atraem os migrantes
e na avaliação dos custos e benefícios propiciados pela migração. Lee (1966), na teoria sobre as migrações,
argumenta que a migração resulta de uma resposta dada pelos indivíduos a dois conjuntos de forças: os fatores
pessoais, que atuam em um nível micro, e os fatores estruturais, que compreendem estímulos econômicos,
políticos e sociais. As regiões de origem e de destino possuem uma série de fatores positivos, negativos e
neutros que atraem, empurram ou deixam as pessoas indiferentes. Esse conjunto de fatores estimula o indivíduo
a deixar um lugar (push factor) ou atraí-lo para outro (pull factor). O indivíduo decide migrar quando, em sua
avaliação, os benefícios esperados superam os custos. Segundo Lee (1966), os fatores que influenciam a
decisão a migrar e os processos migratórios podem ser resumidos em quatro categorias:
a) fatores associados à região de origem;
b) fatores associados à região de destino;
c) obstáculos intermediários; e
d) fatores pessoais.

44
Migração: abordagens teóricas • Aurélia H. Castiglioni

A escolha racional do indivíduo se pauta na avaliação dos fatores positivos e negativos associados às
regiões de origem e de destino, que estão à base do processo de decisão. Pesam, também, na decisão a migrar
ou a permanecer, os obstáculos, que são as dificuldades existentes entre as duas regiões. Eles limitam a migração
às pessoas que podem afrontá-los. As características pessoais do migrante diante desses obstáculos atuam
facilitando ou impedindo a migração.
Lee (1966) retomou as leis da migração de Ravenstein e formulou hipóteses sobre os fatores do ato
migratório, o volume das migrações, o estabelecimento de correntes e contracorrentes e a seletividade migratória.

Diferenciais de renda e de oferta de emprego

As abordagens de Todaro (1969) e de Harris e Todaro (1970) foram inspiradas nos problemas do
desemprego e do subemprego generalizados e crônicos que caracterizam as regiões urbanas dos países em
desenvolvimento. A elevada proporção da força de trabalho urbana que permanece excluída do setor econômico
“moderno” é consequência do número crescente de migrantes rurais que se dirigem para as regiões urbanas,
associado à incapacidade da economia de criar empregos permanentes para toda essa mão-de-obra.
Objetivando entender o comportamento da migração rural-urbana, os autores formularam modelos para
descrever e analisar a estrutura e os mecanismos por meio dos quais as variáveis econômicas influenciam os
mercados de trabalho das regiões urbanas dos países menos desenvolvidos.
No modelo de Todaro (1969), a decisão de migrar de uma área rural para uma urbana depende da
percepção, por parte do migrante potencial, do lucro esperado, que é função de duas variáveis: o diferencial
rural-urbano de renda real e a probabilidade de obter um emprego urbano. A migração rural-urbana, baseada
nos diferenciais de salário, produz uma grande reserva de mão-de-obra urbana em situação de desemprego e
de subemprego, a qual afeta a probabilidade de inserção do imigrante nos empregos do setor moderno da
economia. Todaro (1969) argumenta que, os diferenciais salariais entre as regiões rurais e urbanas perdem seu
poder atrativo quando as taxas de desemprego do meio urbano aumentam. Em modelo posterior, Harris e
Todaro (1970) consideram que as transferências de população do campo para a cidade continuarão ocorrer
enquanto a renda real urbana esperada for superior à produtividade agrícola real.
Essas abordagens são aplicáveis à migração de mão-de-obra internacional, que, assim como a interna,
é considerada como decorrente dos diferenciais entre oferta e demanda de trabalho e entre diferenciais de
salário que existem espacialmente. Regiões com excesso de mão-de-obra, situação prevalente nas regiões
menos desenvolvidas, apresentam um mercado de salários pouco equilibrado, ao passo que regiões que apresentam
oferta de mão-de-obra limitada, com relação ao capital, são caracterizadas por altos salários. Os diferenciais de
oportunidades de emprego e de salário provocam o deslocamento de fluxos de trabalhadores provenientes das
regiões em que a mão-de-obra é abundante em direção àquelas que apresentam escassez de trabalhadores e
mercados mais atrativos (MASSEY et al., 1993).

A teoria do capital humano - análise de custos-benefícios

A explicação dessa abordagem se fundamenta na teoria neoclássica do investimento. O “investimento


em capital humano” é definido como a aplicação dos recursos em escolarização, formação profissional, cuidados
médicos, migração, os quais resultam, em um horizonte mais longo, na melhoria do rendimento monetário e
psíquico das pessoas. A aquisição de capital humano, por elevação dos níveis de escolarização, de formação e
de experiência profissional, aumenta as qualificações, o conhecimento e promove a melhoria da saúde,
favorecendo as possibilidades de mudança de emprego, de renda e de nível de vida do migrante (BECKER
apud PEIXOTO, 2004).

45
Migração internacional na Pan-Amazônia

O movimento migratório é considerado, também nesta perspectiva, como um investimento pessoal que
será realizado, se os retornos desse comportamento forem considerados satisfatórios. A análise dos custos-
benefícios feita pelo migrante potencial não se limita aos fatores do momento, mas considera também os efeitos
futuros, e a tomada de decisão a migrar pode resultar da avaliação positiva das perspectivas, a um prazo maior,
da melhoria das condições futuras das famílias, mesmo que os custos do deslocamento sejam muito elevados
para o migrante.
Sjaastad (1962) propôs uma teoria que focaliza os custos e os retornos da migração, visando situar a
migração no contexto de investimento e formular hipóteses a respeito do comportamento migratório. Sua ideia
de base é que o movimento migratório é uma resposta às diferenças inter-regionais de remuneração.
A racionalidade econômica é considerada como a força que condiciona a decisão a migrar. Sjaastad (1962,
p. 83) trata a migração, na ótica de um problema de alocação de recursos, “[...] como um investimento que
aumenta a produtividade dos recursos humanos, um investimento que possui custos, mas que também envolve
retornos”. Os custos e retornos são divididos em privados monetários, privados não-monetários e sociais.
Os custos privados monetários incluem os custos realizados para o deslocamento: transporte, alojamento,
alimentação; e os custos privados não-monetários incluem os custos de oportunidade (as remunerações não-
ganhas durante o período da viagem, de procura de um emprego ou de aprendizagem de uma nova ocupação),
e os custos psicológicos, inerentes à mudança do ambiente familiar (separação da família, dos amigos, dos
conhecidos). Os retornos privados monetários da migração compreendem o incremento (positivo ou negativo)
na renda resultante: das variações das remunerações, dos custos do emprego e dos preços ocorridos com o
deslocamento entre regiões. Dentre os retornos não-monetários, estão a preferência por determinado local de
residência, relativamente ao local anterior, a satisfação ou insatisfação que o migrante experimenta com sua
nova situação. Sjaastad (1962) focaliza também os custos e retornos sociais que a migração provoca sobre a
sociedade como um todo.
Sjaastad (1962) conclui, com seu estudo, que a migração não pode ser considerada isoladamente, mas
deve ser complementada com investimentos em capital humano, em educação ou formação, que possibilitam
maximizar os retornos propiciados pelo deslocamento.

TEORIA HITÓRICO-ESTUTURAL: A TRANSIÇÃO DA MIGRAÇÃO

Zelinsky (1971), inspirado na teoria da transição demográfica, fez uma análise da transição da mobilidade
nas diferentes fases do processo de desenvolvimento9. A hipótese de base dessa teoria é que: “Há regularidades
definitivas e sistemáticas no crescimento da mobilidade pessoal através do tempo e do espaço durante a história
recente, e estas regularidades representam um componente essencial do processo de modernização”
(ZELINSKY, 1971, p. 221-222).
O autor ressalta a associação estreita existente entre o processo de transição migratória e o processo de
transição demográfica. O processo compreende cinco fases. A primeira fase, the premodern traditional
society, que corresponde à primeira fase da transição, na qual a fecundidade e a mortalidade são elevadas e
não-controladas, e, em consequência, a taxa de crescimento é baixa, a sociedade é espacialmente limitada por
práticas econômicas tradicionais, e a migração é limitada. Na segunda fase, the early transitional society, a
decalagem entre a mortalidade, que declina rapidamente, e a fecundidade, que se mantém quase constante,

9
Zelinsky distingue, na mobilidade territorial, a migração convencional considerada como mudança de residência da circulação, que
compreende todos os movimentos de curto período, repetitivos ou cíclicos, caracterizados pela não-intenção de mudança permanente de
residência.

46
Migração: abordagens teóricas • Aurélia H. Castiglioni

provoca o aumento da taxa de crescimento, e disso resulta um excedente populacional, sobretudo nas regiões
rurais, que se dirige para as cidades, para as colônias de povoamento das fronteiras e para o exterior, enquanto
que todos os tipos de circulação apresentam um crescimento significativo. Na terceira fase, the late transitional
society, a fecundidade diminui e se aproxima do nível da mortalidade, provocando uma diminuição da taxa de
crescimento natural. Esse estado de equilíbrio provoca a redução da migração rural-urbana, enquanto que,
paralelamente, ocorre o crescimento do volume e da complexidade das diversas formas de circulação.
Na quarta fase, the advanced society, o crescimento natural é limitado devido ao controle da fecundidade e da
estabilização da mortalidade em um nível muito baixo, enquanto que a mobilidade é caracterizada por um
aumento da intensidade das migrações interurbanas e intra-urbanas e pela aceleração dos diversos tipos de
circulação, sobretudo a circulação por motivos econômicos e de lazer. A migração rural-urbana apresenta uma
redução tanto em termos absolutos como relativos. Durante a quinta fase, denominada the future advanced
society, a taxa de mortalidade atinge o mínimo biologicamente possível, e o controle da fecundidade mantém a
população estável. A migração residencial decresce, enquanto que algumas formas de circulação diminuem,
devido ao desenvolvimento dos sistemas de circulação e de distribuição, ao passo que se registra uma
intensificação de novas formas de mobilidade.
A intensidade da migração interna e internacional acentua-se nas fases 2 – the early transitional
society – e 3 – the late transitional society –, que correspondem às fases da transição demográfica, nas quais
se forma um excesso de população.10

TEORIAS SOCIOLÓGICAS

O trabalho precursor desse eixo é a obra clássica de Thomas e Znaniecki, publicada em 1918 “The
Polish Peasant in Europe and America”, que, em uma perspectiva sociológica, aborda a identidade cultural e
o processo de adaptação social na comunidade de poloneses que imigraram para os Estados Unidos da América,
entre 1880 e 1910 (THOMAS; ZNANIECKI, 1984).
Os estudos pioneiros de Thomas e Znaniecki (1984) serviram de base para o desenvolvimento de
numerosos estudos realizados por cientistas sociais sobre os processos de adaptação, aculturação e assimilação
dos grupos de imigrantes nos Estados Unidos que levaram ao desenvolvimento da área de sociologia urbana e
à criação da Escola de Chicago.

Complementaridade dos processos de imigração-emigração

A interpretação explicativa apresentada por Sayad (1998) destaca os aspectos sociais que caracterizam
o migrante nos dois pontos extremos, o de partida e o de destino, e se baseia em estudos escritos entre 1975 e
1988, tendo como interlocutores os imigrantes argelinos radicados na França e também aqueles que retornaram
ao país de origem.
O argumento fundamental do trabalho é a complementaridade dos processos de imigração e de emigração,
duas faces de uma mesma realidade, como escreve o sociólogo:

10
Restrições feitas à teoria da transição da mobilidade evocam a impossibilidade de construção de um modelo universal que apreenda os
aspectos complexos da migração. Além disso, a transição da mobilidade e a transição demográfica são inspiradas na experiência do
ocidente (Europa e América do Norte), que não são, necessariamente, inteiramente reproduzidas pelos países em desenvolvimento.

47
Migração internacional na Pan-Amazônia

Na origem da imigração encontramos a emigração, ato inicial do processo [...]. [...] o que
chamamos de imigração, e que tratamos como tal em um lugar e em uma sociedade dados, é
chamado, em outro lugar, em outra sociedade ou para outra sociedade, de emigração [...], a
outra vertente da imigração, na qual se prolonga e sobrevive, e que continuará acompanhando
enquanto o imigrante, como duplo do emigrante, não desaparecer ou não tiver sido
definitivamente esquecido como tal [...] (SAYAD, 1998, p. 14).

Sayad (1998, p. 15) ressalta que a única concordância na comunidade científica a respeito da imigração
é que ela é “um fato social completo” e, como tal, se coloca em um ponto de interrelação entre as diversas
disciplinas do campo das Ciências Sociais. O movimento migratório constitui um deslocamento que se dá num
espaço não apenas físico, mas, sobretudo, em “[...] um espaço qualificado em muitos sentidos, socialmente,
economicamente, politicamente, culturalmente [...]”. O autor considera que, para falar-se da imigração, “fato
social total”, deve-se situá-la na sociedade como um todo numa perspectiva histórica e também do ponto de
vista das estruturas presentes da sociedade e de seu funcionamento.
A abordagem de Sayad aporta novas dimensões ao estudo do processo migratório (PATARRA, 2006),
sobretudo no que diz respeito à migração internacional, na qual o emigrante-imigrante transita entre modelos
culturais diferentes e afronta uma série de implicações que a “distância cultural” produz no percurso que
ultrapassa as simples fronteiras e as datas do início e do fim do movimento.

Redes migratórias

Vários estudos, no âmbito dos estudos sociológicos, preconizam que os imigrantes não devem ser
considerados individualmente, mas como integrantes de estruturas sociais mais amplas, cujos atores realizam
conjuntamente as várias etapas do empreendimento migratório.
Os trabalhos desse eixo argumentam que o processo migratório não se restringe a uma decisão individual,
mas de uma estratégia que envolve outros atores sociais, como a família ou grupos mais extensos que
compreendem amigos e conhecidos (STARK, 1991). Segundo essa abordagem, os integrantes do grupo
participam em conjunto das diversas fases do processo de tomada de decisão: na busca da informação, na
análise dos custos e benefícios do movimento, na realização da migração e, também, no processo de integração
que ocorre na região de destino, buscando as melhores alternativas para melhorar a renda, minimizar os
riscos e superar os problemas que podem ocorrer durante a migração e no processo de inserção na região de
destino. As várias etapas do processo migratório são consideradas no âmbito das relações que ocorrem nos
grupos étnicos, e redes sociais, o que favorece o entendimento da complexidade do processo migratório
(PORTES, 1995).
Os mecanismos sociais aportam elementos fundamentais para a compreensão das cadeias de tomadas de
decisão que se propagam entre os componentes de grupos e das estratégias utilizadas pelos migrantes para
realizar as mudanças decorrentes do movimento migratório. Os migrantes se organizam em redes sociais para
suplantar mais facilmente as dificuldades associadas ao deslocamento e preencher suas necessidades afetivas e
psicológicas. A solidariedade, a coesão, a amizade subjacentes às redes de parentesco, de amizade e de pertença
à mesma comunidade de origem permitem aos migrantes fortalecer-se e ajudar-se mutuamente para enfrentarem
as tensões que se apresentam ao longo de todas as etapas do processo migratório (CASTIGLIONI, 1999).
Nas redes migratórias, o motivo econômico pode não atuar como a principal causa da migração de
grupos. O princípio de solidariedade, subjacente a essas redes locais, transcende, por vezes, o motivo econômico
(PEIXOTO, 2004). Os laços de natureza social, étnica, profissional, podem propiciar a concentração espacial

48
Migração: abordagens teóricas • Aurélia H. Castiglioni

desses grupos nas sociedades receptoras. É fato amplamente observado que os fluxos migratórios dirigidos a
uma região tendem a apresentar um número importante de parentes, amigos, conhecidos e pessoas provenientes
do mesmo local. Na região de destino, os migrantes procuram estabelecer-se em locais próximos para se
fortalecerem e reproduzirem as características da sociedade de origem. As relações que ligam os emigrantes
aos que permaneceram em suas regiões de origem são de importância fundamental para a compreensão dos
mecanismos que intensificam os fluxos entre determinadas regiões e das estratégias utilizadas pelos migrantes
que compõem as redes.

TEORIAS QUE CONSIDERAM NÍVEIS ELEVADOS DE AGREGAÇÃO

Com uma perspectiva mais ampla de explicação do fenômeno migratório, este eixo congrega as abordagens
que condicionam as migrações aos fatores estruturais dos contextos de origem e de destino do movimento.

O mercado de trabalho dual

Distanciando-se dos modelos de escolha racional, feita por indivíduos ou grupos, esta abordagem considera
que a tomada de decisão de migrar se fundamenta em forças que operam em níveis mais elevados de agregação,
associadas à demanda do mercado de trabalho das modernas sociedades industriais (MASSEY et al., 1993).
De acordo com Piore (1979), o mercado de trabalho bifurcado, caracteriza as economias industriais avançadas
devido à inerente dualidade entre trabalho e capital.
O mercado de trabalho denominado “dual” é formado, segundo os conceitos dessa teoria, por dois
segmentos principais: o mercado “primário”, característico das grandes empresas capitalistas, constituído por
postos de trabalho que requerem alta qualificação, e propiciam estabilidade do emprego, salários elevados e
perspectivas de ascensão hierárquica; e o mercado “secundário”, composto por empregos que exigem pouca
qualificação, e oferecem baixos salários, poucas oportunidades de promoção, e assistência social precária ou
mesmo inexistente (PEIXOTO, 2004). Os trabalhadores do setor primário têm trabalhos estáveis, especializados
e dispõem dos melhores e mais sofisticados equipamentos e ferramentas. Nesse setor, de capital intensivo, o
custo do trabalho é elevado, pois os empregadores devem investir no treinamento especializado e na educação
da mão-de-obra. No setor secundário, de trabalho intensivo, os trabalhadores com empregos instáveis e sem
especialização têm pequeno ou nenhum custo para o empregador.
Esses princípios econômicos foram aplicados ao estudo das migrações internacionais, que, segundo os
fundamentos da teoria do mercado dual, seriam provocadas pela demanda permanente de trabalho imigrante
que caracteriza a estrutura econômica das nações desenvolvidas. As migrações resultam da ação de fatores
estruturais existentes nas regiões desenvolvidas, os quais propiciam a oferta de empregos, e não na avaliação,
por parte do migrante, dos fatores atrativos e repulsivos (PIORE, 1979).
Os fatores que impulsionam as migrações internacionais em massa estão relacionados aos mercados
secundários, cujas atividades, não obstante suas condições econômicas deficientes atraem migrantes vindos de
países mais pobres, sobretudo logo após sua chegada ao local de destino (PEIXOTO, 2004). Essas oportunidades
de emprego são atrativas para estes migrantes porque criam expectativas de ganhos, desenvolvem a habilidade
para superar riscos e habilitam chefes de família a conquistar ganhos suplementares para enviar para membros
da família que permaneceram na região de origem (MASSEY et al., 1993).

49
Migração internacional na Pan-Amazônia

Teoria do sistema-mundo

O trabalho de Wallerstein (1979) constituiu a base que inspirou a produção de várias teorias que consideram
que as causas da migração internacional decorrem da estrutura do mercado global de capital e mercadorias
(MASSEY et al., 1993).
A teoria do sistema-mundo argumenta que a migração internacional é uma consequência natural da
formação do processo de desenvolvimento capitalista. O traço principal do sistema-mundo é a criação de um
mercado de trabalho global, no qual, as forças estruturais da economia mundial geram os diferenciais econômicos
responsáveis pela existência de “zonas salariais” diferenciadas. A expansão das relações do mercado econômico
global a partir de seu núcleo situado no mundo desenvolvido em direção às regiões periféricas, não-capitalistas,
e o controle dos recursos dessas sociedades não-capitalistas, terra, matérias-primas e trabalho, constituem o
estímulo para a intensificação dos movimentos migratórios internacionais (MASSEY et al., 1993).
O sistema-mundo caracteriza-se pela polarização entre centralidade e perifericidade. As nações estão
classificadas em: região central, que dispõe do poder dominante, regiões semiperiféricas, muito ligadas ao
centro, mas providas de certa autonomia; e regiões periféricas, as que têm pouco poder. Os mecanismos
subjacentes a esses sistemas – forte, intermediário e fraco – levam à criação de excedentes de mão-de-obra e
baixos salários nas periferias, a qual contrasta com a oferta de salários elevados nos países do “centro”. Como
nos modelos push-pull, são esses diferenciais que impulsionam a migração (PEIXOTO, 2004).
Segundo Simmons (1995, p. 347, tradução nossa), essa teoria

[...] identifica como ponto central do sistema mundial a amplitude com a qual as nações ricas
e poderosas retiram sua opulência e seus poderes das nações pobres e fracas, das quais
elas exploram os trabalhadores, tirando proveito dos mecanismos de troca. Esse sistema
produz, segundo a teoria do ‘sistema-mundo’, uma polarização com o surgimento de um
pequeno número de nações cada vez mais ricas, separadas da massa de nações pobres. As
tensões entre os estados constituem uma fonte constante de crises, de conflitos e de
guerras potenciais [...].

SELETIVIDADE, DETERMINANTES E CONSEQUÊNCIAS

SELETIVIDADE

A migração é um processo seletivo: as pessoas que respondem aos fatores à base do processo apresentam
certos traços comuns que as diferenciam das que não reagem (BOGUE, 1963). Esses traços estão ligados,
sobretudo, à idade, a característica mais universal, à instrução e à especialização, ao estado civil, às aspirações,
ao sexo, à atividade econômica (CASTIGLIONI, 1989). O estudo das características dos migrantes e dos
não-migrantes é importante para a compreensão tanto dos determinantes como das consequências do movimento
migratório.
O tipo de seleção é condicionado pelas causas que provocam o movimento. Os migrantes que respondem
principalmente a fatores positivos predominantes na região de destino tendem a constituir uma seleção positiva.
Por exemplo, os indivíduos com elevado grau de instrução ou uma boa situação econômica migram para melhorar
seus padrões de vida. A predominância de fatores negativos existentes na região de origem tende a produzir
uma seleção negativa; no caso das regiões onde os fatores expulsores são desestimulantes para grupos inteiros
da população, a migração pode perder seu caráter seletivo (LEE, 1966; LIPTON, 1980).

50
Migração: abordagens teóricas • Aurélia H. Castiglioni

A idade é a única característica universal da migração. A propensão mais intensa a migrar, em certas
etapas da vida, é importante na seleção migratória, e essa relação foi largamente verificada com dados empíricos.
Segundo a teoria da análise de custos-benefícios, a decisão de migrar será tomada se os benefícios parecerem
superiores aos custos associados ao movimento (SJAASTAD, 1962). Nessa ótica, o balanço entre os custos e
os benefícios favorece os jovens. Estes se encontram na idade de entrar na vida profissional ou de mudar de
profissão e têm mais tempo para maximizar os benefícios de seu investimento. Os custos são menos importantes
para este segmento, visto que os jovens são menos susceptíveis de terem responsabilidades familiares e
comunitárias ou de estarem apegados a uma ocupação. A avaliação dos custos-benefícios explica a diminuição
da migração quando a idade aumenta: o peso dos custos fica cada vez mais importante, enquanto que o período
para retorno dos investimentos fica cada vez mais curto.
A composição da corrente migratória por sexo varia, primeiramente, segundo a distância, relação já
destacada nas “leis” de Ravenstein. Segundo as hipóteses teóricas, as mulheres predominariam na migração de
curta distância, enquanto que os homens seriam majoritários nas de longa distância. As relações entre a
característica sexo e a direção do fluxo migratório indicam que a seletividade por sexo está relacionada à oferta
de trabalho. As mulheres predominam nas migrações das regiões rurais para as urbanas. Isto porque as condições
de trabalho são desfavoráveis para elas nas regiões rurais, onde acumulam as ocupações domésticas com o
trabalho agrícola sem direito a um salário pessoal, ou com salários inferiores aos dos homens, enquanto que o
crescimento urbano abre um leque de empregos para mão-de-obra feminina. Já a migração para as zonas
rurais apresenta predominância masculina. A seletividade segundo o sexo pode ser relacionada também ao
estágio de desenvolvimento da região. Nos primeiros estágios de desenvolvimento, a migração é
predominantemente masculina, mas, com a modernização, os papéis que a mulher desempenha na sociedade se
modificam, e a migração se banaliza.
Os resultados dos trabalhos empíricos indicam que, com relação à característica “estado civil”, os solteiros
têm uma mobilidade mais intensa que os casados, porque eles têm menos responsabilidades familiares e podem
mais facilmente afrontar situações instáveis. Quanto ao grau de instrução, as pessoas mais instruídas são mais
propensas a migrar para procurar ocupações compatíveis com suas qualificações. No entanto as situações de
grande dificuldade encorajam a migração de pessoas de todas as categorias de estado civil e de todos os níveis
de instrução.
A seletividade do movimento migratório produz modificações importantes na composição da população
tanto nas regiões de origem quanto nas de destino.

DETERMINANTES

Outro eixo relevante no estudo da migração diz respeito aos fatores que impulsionam os migrantes e os
fluxos migratórios, que podem ser positivos ou negativos.
Os estudos empíricos têm evidenciado que o determinante principal da migração é de ordem econômica
e traduz o desejo de segurança e de estabilidade. As pessoas migram, em geral, para melhorar o seu nível de
vida e o de seus descendentes. Todavia, são vários os determinantes não-econômicos, dentre os quais, o desejo
de se instruir; a atração exercida pelas cidades; os motivos políticos, religiosos, etc. O fenômeno migratório, por
sua diversidade, abrange muitas dimensões em suas motivações, que podem interagir no processo de tomada
de decisão. Como ressalta Emmi (2008, p. 254), em seu estudo sobre os italianos na Amazônia: “O fenômeno
migratório é muito complexo e não é redutível mecanicamente a causas estritamente econômicas, outras
motivações, como por exemplo, os aspectos culturais têm peso significativo”.

51
Migração internacional na Pan-Amazônia

Segundo a teoria das redes migratórias o processo de decisão a migrar não decorre de uma decisão
racional individual, mas sim de ações coletivas que ocorrem no seio de unidades mais amplas, redes familiares
e sociais, cujas ações coletivas levam em consideração não somente os motivos econômicos, mas também as
expectativas do grupo (SASAKI; ASSIS, 2000). Nesse processo, as diferenças de renda não são necessariamente
determinantes do processo decisório, mas sim as relações sociais, uma vez que os migrantes podem contar com
o apoio e a solidariedade dos integrantes dessas redes para minimizar os riscos associados ao empreendimento
migratório, sobretudo a migração que ocorre a longa distância (MASSEY et al., 1997).
No nível macro, existe uma heterogeneidade de modelos, uma vez que as migrações representam respostas
da população a processos mais amplos, envolvendo contextos desiguais. A causa principal das migrações, nesse
nível, é atribuída às disparidades de oportunidades socioeconômicas entre as regiões.
Causas expulsoras como a miséria, a falta de trabalho, as crises econômicas podem ser apontadas como
causas prevalentes da emigração em massa, como ocorre no êxodo rural e na migração internacional dos
países mais pobres em direção aos de desenvolvimento avançado.

CONSEQUÊNCIAS

Há ainda que ressaltar, pela relevância, os impactos produzidos pela migração, entre os quais existem
consequências que ocorrem para as pessoas e os contextos envolvidos. A migração produz não só efeitos de
ação imediata, mas também transformações que operam a curto, a médio e a longo prazo. Seus efeitos são
múltiplos e complexos: embora a transferência de população produza efeitos quantitativos imediatos, inúmeros
impactos qualitativos propagam-se no tempo e se fazem presentes depois de passadas várias gerações.
Quanto aos efeitos para os migrantes, muitos podem ser os desdobramentos verificados, numa escala
que vai do sofrimento, da penúria, do isolamento e do fracasso, para uns, à concretização das aspirações que
motivaram a migração, para outros. Os efeitos da migração são mais importantes para os filhos dos migrantes,
que podem dispor de melhores oportunidades de educação e dos serviços sociais da cidade. Entre outros, a
migração favorece a modificação dos costumes e dos valores (CASTIGLIONI; REGINATO, [2009?]).
As consequências da migração sobre as regiões relacionadas ao movimento são múltiplas, inter-
relacionadas e passam também a atuar como determinantes da continuidade do processo. A natureza dos
efeitos varia de um contexto a outro, segundo a forma específica do processo de desenvolvimento local, que
condiciona a intensidade e a composição dos fluxos migratórios. A migração produz efeitos sobre o plano
demográfico, cultural, político e socioeconômico das regiões relacionadas ao movimento.
No eixo demográfico, além do impacto quantitativo direto, aportado pela modificação do efetivo
populacional, devem ser considerados os efeitos qualitativos produzidos pela seletividade do fluxo – modificações
nas estruturas por sexo, idade, mão-de-obra, instrução, etc. –, e, ainda, os efeitos indiretos ocasionados pela
fecundidade dos migrantes após o movimento (CASTIGLIONI, 1989). Nas regiões de forte atratividade, os
efeitos positivos são importantes: a migração aporta um contingente de pessoas jovens que concorre para
rejuvenescer a população e aumentar a oferta de mão-de-obra. Mas as consequências da migração não são
sempre benéficas para as regiões relacionadas ao movimento. Nas regiões atrativas, a migração massiva
provoca problemas de desequilíbrios entre o crescimento urbano e a criação de empregos e de serviços de
infra-estrutura urbana. Para as regiões de forte emigração, as consequências demográficas, sociais e econômicas
são, sobretudo, desfavoráveis, devido à perda de população e às consequências provocadas pela seletividade
do processo. Nas regiões rurais e pequenas cidades, a partida do segmento jovem provoca a redução do
número de pessoas em idade de procriar, a diminuição da nupcialidade e da natalidade e o aumento da proporção
de pessoas idosas. Em consequência, essas regiões conhecem a redução das taxas de crescimento natural, o
aumento das taxas de mortalidade e o envelhecimento da população.

52
Migração: abordagens teóricas • Aurélia H. Castiglioni

As consequências da seletividade da migração por idade são desfavoráveis às regiões de emigração.


O dinamismo e a inovação que caracterizam a juventude constituem a fonte potencial das modificações que se
produzem na sociedade e a emigração de jovens reduz a capacidade das regiões de origem de gerar o progresso.
A partida da parcela jovem e dinâmica da população e, frequentemente, também a mais instruída e a mais
especializada, produz em geral efeitos negativos nas regiões de forte emigração, que perdem o dinamismo
demográfico e econômico que seria propiciado pela população que emigra. No plano econômico, a diminuição
da população, sobretudo de sua parcela mais dinâmica, provoca a redução da população ativa, a diminuição dos
investimentos, a retração e a estagnação econômica. Se as fronteiras internacionais fossem abertas, os países
em desenvolvimento teriam perdas significativas de potencial humano devido à seletividade da migração.

RELAÇÕES ENTRE OS PROCESSOS TRANSICIONAIS

Durante a segunda metade do século XX, os países em desenvolvimento passaram por importantes
transformações demográficas, em consequência dos processos transicionais, relacionando fecundidade,
mortalidade, migração e urbanização, a exemplo do que ocorrera anteriormente nos países do norte.
As transformações do crescimento e da composição etária da população resultam da evolução do processo
denominado transição demográfica, cujo modelo clássico consiste na passagem de uma situação de baixo
crescimento demográfico, caracterizada por níveis elevados de natalidade e mortalidade, a uma outra fase de
baixo crescimento ou mesmo de estabilização, em que os níveis dos dois componentes do crescimento são
baixos. Durante o processo, há uma defasagem entre o declínio dos dois componentes, que tem como
consequência o aumento do crescimento demográfico.
A transição urbana descreve as fases da mudança progressiva da repartição espacial da população, que,
partindo de um baixo nível de urbanização, se eleva progressivamente até atingir um nível estável, bastante elevado.
Nesse modelo, a evolução do nível de urbanização, representado pela proporção de população urbana, apresenta-
se sob a forma típica de uma curva logística cujas fases são caracterizadas por contribuições diferentes dos
componentes do crescimento demográfico. A primeira fase reflete, sobretudo, o crescimento natural, pois o outro
componente, a migração, apresenta-se pouco intenso. O processo de transição propriamente dita se inicia quando
o ritmo de crescimento da taxa de urbanização se acelera rapidamente. É a contribuição do êxodo rural, crescente,
que passa a determinar o crescimento do tipo exponencial da curva nessa fase. A partir de um ponto máximo, o
ritmo do êxodo rural diminui e, com ele, também o crescimento urbano, mas a representação dos habitantes das
cidades continua sua evolução crescente, porém mais lenta, até atingir níveis de urbanização elevados, a partir dos
quais ocorre a estabilização da distribuição populacional (PUMAIN, 2003, VERON, 2006).
Podem-se observar ligações entre as fases da transição demográfica, os níveis de urbanização e a
migração, embora não se possa relacioná-las de maneira unívoca.11 No curso da transição demográfica, a fase
caracterizada pela queda da mortalidade e manutenção de níveis elevados de natalidade corresponde à segunda

11
Na medida em que a migração, a mortalidade e a fecundidade estão relacionadas às transformações econômicas e sociais, é natural que haja
uma certa correspondência das evoluções, mas não se pode supor uma correspondência estrita entre os comportamentos dos fenômenos.
A esse respeito, Tapinos (1985, p. 267-268) argumenta: “Comparando os movimentos migratórios e o processo de transição demográfica,
somos conduzidos a nos interrogar sobre a simultaneidade e a interdependência das evoluções. Certos autores (ZELINSKY, 1971, 1979)
acreditaram identificar regularidades na evolução histórica das formas de mobilidade, em sincronia com as fases da transição demográfica
[...]. Se é verdade que o período intermediário da transição, marcado por um forte crescimento demográfico, tem sido associado às grandes
migrações internacionais e ao êxodo rural, os períodos que precederam essa fase tiveram movimentos migratórios intensos [...].
Contrariamente à idéia comum, as sociedades tradicionais conheceram uma grande variedade de deslocamentos cuja intensidade é
relativamente elevada. Da mesma maneira, durante o período que segue a transição, é difícil definir um modelo migratório típico associado
à queda da fecundidade” (Tradução nossa).

53
Migração internacional na Pan-Amazônia

fase da transição urbana, quando se produz um excesso de mão-de-obra na região rural, que é impulsionado a
transferir-se para outras regiões. Deve-se ressaltar que, à medida que o processo da transição demográfica
avança, ocorre um decréscimo progressivo da participação dos componentes do movimento natural, natalidade
e mortalidade, sobre o crescimento da população, enquanto que a migração passa a ser a principal responsável
pelas modificações do efetivo populacional, em especial pela rápida urbanização dos países em desenvolvimento.
Nas regiões propulsoras dos fluxos, a migração é a responsável por mudanças demográficas que levam,
frequentemente, ao declínio ou à estagnação da população.
A Figura 1 mostra a ocorrência do processo de transição demográfica nos países de desenvolvimento
mais avançado e nos países em desenvolvimento ao longo do tempo.

Figura 1 - Evolução do processo da transição demográfica nos países


desenvolvidos e em desenvolvimento.
Fonte: Adaptado do INED, citado por Merlin (1997).

A aceleração da urbanização, consequente do êxodo rural, e as migrações internacionais em massa


ocorrem durante a fase de aumento do ritmo do crescimento populacional, quando se produz um excesso de
mão-de-obra que é impulsionado a migrar.
Essa fase foi vivenciada pelos países mais desenvolvidos no século XIX e parte do século XX, a época
da grande migração européia, tanto interna, rural-urbana, quanto a internacional. A migração do século XIX
promoveu a transferência de população entre contextos que apresentavam grandes diferenças quanto ao estágio
de desenvolvimento e à evolução demográfica. A teoria neoclássica interpreta o movimento migratório, nesse
caso, como um meio de promover o equilíbrio econômico e demográfico, graças à transferência do excesso de
mão-de-obra dos setores menos produtivos aos setores em expansão. Os países da Europa não tinham condições
de absorver o excedente de mão-de-obra criado pelo crescimento elevado da população e apresentavam, em
consequência, falta de terras, de trabalho, de alimentos. Nos países do continente americano, ao contrário, a
necessidade de povoar o território e de prover mão-de-obra para desenvolver as atividades econômicas demandava
uma população abundante. A migração transoceânica possibilitou, por um lado, a diminuição da pressão
populacional na zona de origem e, por outro, o povoamento das regiões receptoras. Nesse tipo de situação, a
migração é percebida pela teoria neoclássica como uma atividade de maximização do lucro: seu papel era o de
ajustar a distribuição da população ao crescimento econômico, e suas consequências eram benéficas tanto para
os migrantes quanto para os contextos de origem e de destino.

54
Migração: abordagens teóricas • Aurélia H. Castiglioni

O crescimento atual dos países em desenvolvimento é caracterizado pela existência de um excesso de


mão-de-obra que transita entre dois setores de fraca produtividade. A mão-de-obra pouco qualificada liberada
pela agricultura produz um desequilíbrio entre oferta e demanda de trabalho urbano, e a consequência disso é o
crescimento de subempregos que provoca a inchação do setor terciário. O principal efeito da migração interna
é a transferência de uma situação de miséria de um meio a outro. Simmons (1984) denominou esse tipo de
migração de “estratégia de sobrevivência”, uma vez que ela transfere a mão-de-obra ocupada nas atividades
pouco produtivas do campo àquelas que caracterizam as favelas e periferias das grandes cidades dos países
em desenvolvimento. A emigração internacional reaparece, no caso dessas populações, como uma alternativa
para a concretização de suas aspirações, como aconteceu no passado. No entanto as mudanças subjacentes
aos processos demográficos modificaram os modelos, e já não há lugar para programas imigratórios, incentivo
ao movimento, concessão de benefícios, medidas que propiciaram no passado, na época da transição demográfica
européia, a diminuição da pressão populacional nas regiões de origem.
É importante ressaltar aspectos comparativos dos processos de transição. Nos países desenvolvidos, a
transição demográfica se estendeu por um longo período, de quase dois séculos e com um efetivo menor: a
população do mundo atingiu, nos meados do século XIX, o patamar de um bilhão de habitantes. A transição dos
países em desenvolvimento ocorre com um ritmo muito mais rápido e com um efetivo muito maior: a população
do mundo, a maioria da qual vive nos países em desenvolvimento, cresceu de três bilhões de habitantes, em
1959, a seis bilhões, em 1999. Ao lado das disparidades socioeconômicas, esses números são indicativos das
tendências crescentes das correntes internacionais originárias dos países mais pobres cujos migrantes, por sua
vez, continuam a vislumbrar a migração como a única alternativa viável de concretizar suas aspirações e
melhorar seus padrões de vida.

55
Migração internacional na Pan-Amazônia

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57
SEGUNDA PARTE

O QUE DIZEM OS CENSOS


Inmigración internacional de paises amazónicos: el caso de Bolivia • Melvy Aídee Vargas Bonilla

INMIGRACION INTERNACIONAL DE PAISES


AMAZONICOS: EL CASO DE BOLIVIA

Melvy Aídee Vargas Bonilla1

INTRODUCCION

En el marco del Proyecto “Medio Ambiente, Población y Desarrollo de la Amazonía (MAPAZ, 2005-
2008)”, se ha realizado entre el 22 al 25 de junio del 2004 en la ciudad de Belém de Brasil, el Seminario
Internacional Poblaciones de la Pan-Amazonía: Bases para un Programa de Cooperación Sur-Sur, con
la participación de investigadores brasileños y de los demás países amazónicos (Bolivia, Colombia, Ecuador,
Guyana, Perú, Surinam y Venezuela) y de la Guyana Francesa en el campo de la geografía humana y demografía.
La Universidad Autónoma Gabriel René Moreno (UAGRM) representó Bolivia en el evento. Los delegados
participantes de cada país presentaron la situación demográfica de su territorio amazónico, lo que permitió
calcular de forma consistente la población de la Pan-Amazonía y composición demográfica, con la posibilidad
de elaborar un mapa de la Pan-Amazonía con las divisiones administrativas mínimas (municipios).
En septiembre del 2006, se realizó el Seminario Internacional “Población y Medio Ambiente en la
Pan-Amazonía”. En esta oportunidad la UAGRM también participó presentando el documento Migración y
expansión agrícola en la Amazonía boliviana. Como producto de estos seminarios se han publicado los
libros Populações da Pan-Amazônia (ARAGÓN, 2005) y População e Meio Ambiente na Pan-Amazônia
(ARAGÓN, 2007).
En el marco del mismo proyecto se ha solicitado a la Universidad Gabriel René Moreno, la continuación
de trabajos de investigación sobre la inmigración internacional en la Amazonía boliviana, con particular interés
de los que provienen de países amazónicos.
La presente investigación está referida al estudio de los inmigrantes internacionales, denominados también
población extranjera residente en Bolivia, particularmente de los que provienen de los países amazónicos.
El trabajo se desarrolla con la información de los Censos de Población y Vivienda, en especial del último
realizado en el 2001, dado que se cuenta con la base de datos y es posible obtener tabulados a través del
procesamiento con el programa Recuperación de Datos para Áreas Pequeñas por Microcomputador
(REDATAM) para Windows, creado por el Centro Latinoamericano de Demografía (CELADE). En este
sentido esta investigación contiene abundante información cuantitativa de los inmigrantes extranjeros, aunque
con la utilización de algunas variables se puede aproximar a una caracterización cualitativa.

1
Magister en demografía. Docente de demografía, Universidad Autónoma “Gabriel René Moreno”, Santa Cruz de la Sierra, Bolivia. E-mail:
melvy1956@hotmail.com.

61
Migração internacional na Pan-Amazônia

En el presente trabajo la categoría de “extranjero” o “inmigrante” corresponde a toda persona que en el


momento del empadronamiento, declara haber nacido en un país distinto a Bolivia, además que su estadía en el
país implica un cambio de residencia.
Cabe señalar que la población extranjera empadronada en el 2001, es un contingente acumulado de
personas sobrevivientes que inmigraron en distintos momentos cuyas cifras son aproximativas dado que
algunos han podido eludir el empadronamiento o tergiversar información sobre el lugar de nacimiento y
condición de residencia. Se debe tener en cuenta que en el levantamiento de información censal, no se
discrimina al inmigrante por la condición jurídica (es decir, por su legalidad o no, como tampoco por su
situación de permanencia en el país).
Dado que el estudio se realizará con la información del censo realizado en Bolivia, la población extranjera
identificada corresponde sólo a los inmigrantes en el país y no así a los intercambios migratorios que se dan
entre los diversos países; tampoco será posible analizar las motivaciones que llevaron a la migración de las
personas empadronadas, como tampoco será posible conocer los desplazamientos que hayan realizado en el
territorio nacional y los cambios demográficos, sociales y económicos que se hayan producido en el transcurso
de su estadía en el país. Sólo será posible caracterizar al inmigrante en el momento del censo y su ubicación
territorial.
En el primer apartado se reseña la magnitud, tendencia en el tiempo y el lugar de residencia del total de
los extranjeros empadronados en el territorio nacional.
En el segundo apartado se presta atención a los extranjeros que provienen de los países amazónicos,
cuantificando por país de nacimiento y el período de llegada.
En el tercer apartado se examinan los atributos de los inmigrantes extranjeros, de acuerdo a la información
censal disponible. Se analizan los aspectos demográficos, el perfil educativo y la participación laboral.
En el cuarto apartado se introduce la cuantificación de los inmigrantes nacidos en países amazónicos y
que residen en el área de la Amazonía boliviana, mostrando algunos atributos demográficos y laborales.

LOS INMIGRANTES EN EL TERRITORIO BOLIVIANO

MAGNITUD Y PERIODO DE LLEGADA

De acuerdo al último Censo Nacional de Población y Vivienda, realizado el 3 de Julio del 2001, en
Bolivia residen 94.391 extranjeros, cantidad superior a los 59.804 empadronados en el censo de 1992.
Con la información censal del 2001, sobre el año de llegada de los extranjeros, se constata la existencia
de un número reducido de personas que habrían ingresado al país desde 1911, aunque se debe tener en cuenta
que son los sobrevivientes de los que inmigraron hasta ese año (Figura 1).
Los datos consignados en la misma figura y Tabla 1, muestran un incremento rápido de extranjeros
empadronados que reportan su llegada desde la década de los cincuenta, particularmente en el período de
1991 a 2001, cuyo contingente es de 46,6 mil personas y que representan 49,4% del total de inmigrantes
existentes en el país.
Cabe señalar sin embargo que se tienen 19.372 inmigrantes que no han declarado año de llegada
durante el empadronamiento que representan el 20,5%, es decir de uno de cada cinco inmigrantes se desconoce
su año de ingreso al país.

62
Inmigración internacional de paises amazónicos: el caso de Bolivia • Melvy Aídee Vargas Bonilla

10.000

9.000

8.000

7.000

6.000

5.000

4.000

3.000

2.000

1.000
0
1911 1921 1931 1941 1951 1961 1971 1981 1991 2001

Año de llegada

Figura 1 - Bolivia: Población extranjera por año de llegada.


Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

Tabla 1 - Bolivia: Población extranjera por período de llegada

Sexo
Período de llegada Total extranjeros Hombres Mujeres
Antes de 1950 1.139 507 632
1950-1960 1.700 851 849
1961-1970 5.437 2.696 2.741
1971-1980 9.053 4.516 4.537
1981-1990 11.079 5.650 5.429
1991-2001 46.611 24.498 22.113
Sin declaración 19.372 9.883 9.489
Total 94.391 48.601 45.790
% 100,0 51,5 48,5
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia

La mayor presencia de extranjeros desde la década de los 50, puede ser atribuida a una legislación
especial que posibilitó el ingreso de familias campesinas extranjeras, como ser de los asentamientos de menonitas
alemanes, canadienses y mejicanos (de 1954 a 1977 un total aproximado de 10.000 personas) y de japoneses
(desde 1954 aproximadamente 3.000 personas) (KOSTER, 1983).
Haciendo una referencia a la historia de la inmigración japonesa2, en 1899 habían llegado al
país 93 hombres atraídos por la popularidad de la extracción de la goma. Se estima que
aproximadamente 2000 personas fueron en busca de trabajo a los departamentos de Pando
(Cobija) y Beni (Riberalta, Cachuela Esperanza). Después de la desaparición de la popularidad
de la goma, juntamente con la finalización de la Primera Guerra Mundial en 1917, algunos se
fueron a vivir a grandes ciudades, como Oruro, Cochabamba, La Paz, Trinidad, Santa Cruz, y
otros emigraron a países vecinos como Brasil, Argentina y Perú.
Después de la Segunda Guerra Mundial, se presentó un proyecto de inmigración de agricultores
a la región del oriente boliviano, parte norte de la ciudad de Santa Cruz. De Okinawa inmigraron
a la actual Colonia Okinawa 49 grupos formados por 3.385 personas (584 familias y personas
solas) desde el año 1954 a 1988. De otros lugares de Japón inmigraron 1679 personas, desde
el año 1955 hasta 1992, divididos en 53 grupos, que actualmente viven en la Colonia San Juan.
Por problemas de infraestructura vial y el poco apoyo en la apertura de montes para crear un
lugar para vivir, se dice que casi tres cuartas partes de los inmigrantes se fueron a vivir a las
ciudades como Santa Cruz y La Paz y otros a Brasil y Argentina.

2
Historia de la inmigración japonesa. Libro Conmemorativo Centenario de Inmigración “Bolivia ni Ikiru”.

63
Migração internacional na Pan-Amazônia

LUGAR DE NACIMIENTO

De acuerdo a la información proporcionada por los empadronados sobre el lugar de nacimiento, los
93.948 extranjeros pertenecen a 170 países diferentes, aunque la mayoría de los países aportan con un reducido
número de migrantes.
Las cifras presentadas en la Tabla 2, muestran que más de 82 mil personas provienen de 12 países, que
representan el 87,5% del total de extranjeros. Asimismo, cabe resaltar que más de 43 mil inmigrantes se
originan sólo en dos países, que representan el 46,3% del total.
Las cifras de la Tabla 3 y la Figura 2, muestran que la mayor población de inmigrantes son de nacionalidad
Argentina, los mismos que representan 30,3% del total de extranjeros residentes en el país. Brasil es la segunda
población en cifras de inmigrantes concentrando el 16%, seguido de Perú y México con alrededor de 9,5 mil
migrantes. Cabe resaltar que son doce países de origen que aportan con más de un millar de extranjeros,
representando el 87,5% del total de inmigrantes internacionales.

Tabla 2 - Bolivia: Cantidad de países según número de extranjeros residentes

Cantidad de países de origen Rango de inmigrantes Población extranjera


91 con 1 a 9 262
40 con 10 a 99 1.346
18 con 100 a 499 3.974
9 con 500 a 999 6.164
10 con 1.000 a 10.000 38.516
2 con más de 10.000 43.686
170 93.948
Sin declaración 443
Total 94.391
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

Tabla 3 - Bolivia: Extranjeros según país de nacimiento.

País de nacimiento Población extranjera Distribución relativa

Argentina 28.612 30,3


Brasil 15.074 16,0
Perú 9.559 10,1
México 9.495 10,1
Chile 4.469 4,7
Estados Unidos 3.723 3,9
Paraguay 3.296 3,5
Alemania 1.713 1,8
Canadá 1.703 1,8
España 1.671 1,8
Japón 1.520 1,6
Colombia 1.367 1,4
Otros países 11.746 12,4
Sin declaración 443 0,5
Total países 94.391 100,0
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

64
Inmigración internacional de paises amazónicos: el caso de Bolivia • Melvy Aídee Vargas Bonilla

30.000

25.000

20.000

15.000

10.000

5.000

EE.UU .

Colom bia

R es to
M ex ic o

Alem ania

J apo n
P ara guay

Can ada

E s paña
Ar gentina

P er u
Br as il

Chile
País de nacimiento

Figura 2 - Bolivia: extranjeros según país de nacimiento.


Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

De los restantes 158 países han llegado 11.746 personas que representan el 12,4% del total de inmigrantes
residentes en el país. Asimismo se tiene a 443 inmigrantes sin identificación de país de nacimiento que representan
una fracción muy pequeña del total (0,5%).

DISTRIBUCION EN EL TERRITORIO

Los extranjeros se distribuyen en todo el territorio nacional, sin embargo existe una alta concentración en
los departamentos de Santa Cruz con el 42,7%, seguido por orden de importancia en La Paz con el 17,9% y en
Cochabamba con el 13,3%, sumando el 73,8% de extranjeros en los tres departamentos (Tabla 4).
De la comparación de las cifras del censo de 1992 y 2001, se constata que el mayor incremento de
población extranjera se ha dado en el departamento de Santa Cruz, pasando de tener 23,6 mil en 1992 a 40,2 mil
según el censo del 2001.
La Paz también concentra un contingente importante (16,9 mil) cifra superior a la que tenía en el censo
de 1992, aunque en valores relativos bajó de 20,4% a 17,9% en el período intercensal.

Tabla 4 - Bolivia: Población extranjera por departamento de residencia, según censos de 1992 y 2001.

Población Extranjera Distribución relativa (%)


Departamento de
Censos Censos
residencia
1992 2001 1992 2001
Chuquisaca 1.725 3.503 2,9 3,7
La Paz 12.221 16.900 20,4 17,9
Cochabamba 7.963 12.522 13,3 13,3
Oruro 860 1.133 1,4 1,2
Potosí 3.566 6.018 6,0 6,4
Tarija 5.160 8.877 8,6 9,4
Santa Cruz 23.600 40.284 39,5 42,7
Beni 1.672 2.682 2,8 2,8
Pando 3.037 2.472 5,1 2,6
Total en Bolivia 59.804 94.391 100,0 100,0
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda de 1992 y 2001. Elaboración propia

65
Migração internacional na Pan-Amazônia

Cochabamba se ubica en el tercer departamento por la cantidad de inmigrantes residentes, habiendo


aumentado la cifra de 7,9 mil a 12,5 mil extranjeros, manteniendo su importancia relativa en 13,3% en los dos
censos. A excepción de Pando, donde la población extranjera disminuyó de 3.037 a 2.472 de un censo a otro, en
los demás departamentos se constata un incremento, que en algunos casos ha logrado duplicar la cifra, pero en
términos relativos los valores están por debajo del 10%.

INMIGRANTES DE PAISES AMAZONICOS

MAGNITUD

Según el censo del 2001, se empadronaron 27.315 extranjeros de países amazónicos (Colombia, Brasil,
Ecuador, Guyana, Perú, Surinam, Venezuela y Guayana Francesa), que representan el 28,9% del total de
extranjeros existentes en el país.
Cabe anotar que las cifras presentadas en la Tabla 5 y Figura 3, constituyen una aproximación de la
verdadera cuantía de los inmigrantes según el país de nacimiento, por cuanto algunos extranjeros han podido
eludir el empadronamiento (o tergiversar la información del lugar de nacimiento y condición de residencia en el
país), por temor a ser identificados dada su condición de ilegalidad en el país, particularmente de los que
provienen de países vecinos, aunque en los censos no se discrimina su situación jurídica.

Tabla 5 - Bolivia: Extranjeros nacidos en países amazónicos, 2001

Sexo
País de nacimiento Total
Hombre Mujer

Brasil 15.074 7.794 7.280


Perú 9.559 5.297 4.262
Colombia 1.367 695 672
Ecuador 752 369 383
Venezuela 553 264 289
Guyana 7 4 3
Guayana Francesa 2 1 1
Surinam 1 1 -
Total países amazónicos 27.315 14.425 12.890
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

Entre los inmigrantes de países amazónicos, se reconoce que el flujo de brasileños es el de mayor
cuantía, superando las 15 mil personas que representan el 55,2% del total de inmigrantes de países amazónicos,
seguido por el flujo de peruanos con más de 9,5 mil. Cabe señalar que estos flujos provienen de los dos países
vecinos con los cuales se comparte una extensa frontera, por lo cual se puede pensar que el total registrado
constituye una aproximación y no la magnitud real de inmigrantes, además de ello, es probable que entre esta
población exista una proporción importante de personas con residencia ilegal en el país.
Los flujos de menor cuantía corresponden a los que provienen de Colombia con cerca de 1,4 mil personas,
de Ecuador y Venezuela con 752 y 553 personas respectivamente. Los extranjeros nacidos en Guyana, Guayana
Francesa y Surinam apenas alcanzan en conjunto a 10 personas.

66
Inmigración internacional de paises amazónicos: el caso de Bolivia • Melvy Aídee Vargas Bonilla

Figura 3 - Bolivia: Distribución relativa de los inmigrantes por país amazónico de nacimiento.
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

DISTRIBUCION EN EL TERRITORIO NACIONAL

Los datos de la Tabla 6 y la Figura 4, reflejan la distribución territorial de los inmigrantes de países
amazónicos en Bolivia. Puede verse que el 40,9% se encontraban residiendo en el departamento de Santa Cruz,
seguido por el 22,8% en La Paz y en Cochabamba el 15,1%, departamentos que se caracterizan por tener las
mayores poblaciones del país con elevadas tasas de crecimiento poblacional. Asimismo, por su ubicación en el
eje troncal y sus particularidades son los departamentos con mayor dinamismo económico del país.

Tabla 6 - Bolivia: Extranjeros nacidos en países amazónicos por departamento de residencia

Departamento de residencia
País de
nacimiento Chuquisaca La Paz Co c ha - Oruro Potosí Tarija Santa Beni Pando Total en
bamba Cruz Bolivia

Brasil 318 1.238 1.924 59 43 94 7.593 1.607 2.198 15.074


Colombia 24 372 197 13 9 40 678 32 2 1.367
Ecuador 20 236 156 12 22 30 264 8 4 752
Guayana Fr. 1 1 2
Guyana 2 1 4 7
Perú 443 4.154 1.730 117 71 202 2.461 208 173 9.559
Surinam 1 1
Venezuela 5 229 124 1 3 8 181 2 553
Total países 810 6.232 4.133 202 148 375 11.181 1.857 2.377 27.315
amazónicos
% 3,0 22,8 15,1 0,7 0,5 1,4 40,9 6,8 8,7 100,0
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

67
Migração internacional na Pan-Amazônia

12000

10000

8000

6000

4000

2000

0
Chuquisaca La Paz Cbba Oruro Potosí Tarija Santa Beni Pando
Cruz

Brasil Perú Colombia Ecuador Venezuela

Figura 4 - Bolivia: Inmigrantes de países amazónicos por departamento.


Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

En todos los departamentos se constata que las mayores poblaciones de extranjeros son los brasileños
y peruanos. Sin embargo, se evidencia la presencia de los brasileños con mayor preferencia en los departamentos
del oriente (Santa Cruz, Beni y Pando) que concentran el 75,6%, lo que puede ser atribuido a la extensa
frontera que tiene nuestro país y que involucra a los tres departamentos, aunque no es posible desmerecer la
magnitud de brasileños en La Paz y Cochabamba. Los peruanos optan por la residencia principalmente en el
departamento de La Paz donde se concentran el 43,5% que puede deberse principalmente a la proximidad con
el vecino país de Perú.
Cabe señalar que por la poca presencia de extranjeros de Guayana Francesa (2), Guyana (7) y de
Surinam (1), en el resto del documento no se los tomará en cuenta para el análisis cuando se desagregue a nivel
de país de nacimiento.

PERIODO DE LLEGADA

De la información de las personas empadronadas presentada en e la Figura 5 y Tabla 7, se constata la


existencia de inmigrantes sobrevivientes que llegaron al país antes de 1950, entre los cuales existe un mayor
número de peruanos y brasileños. Sin embargo, es recién desde inicios de los años setenta que se experimentó
un aumento de población inmigrante de Brasil y Perú, acelerando su intensidad en la última década, en cuyo
caso se manifiesta la superioridad en las cifras de los brasileños.
Asimismo, con menor intensidad, se constata el incremento de inmigrantes colombianos, ecuatorianos y
venezolanos en la década anterior al censo (1991-2001).
En la misma Tabla 7 y Figura 6, se reflejan las diferentes magnitudes e importancia relativa de los
inmigrantes recientes respecto al total de extranjeros empadronados en Bolivia provenientes de cada uno de los
países amazónicos.
Con la información censal del lugar de residencia cinco años antes del momento del empadronamiento
de cada uno de los extranjeros, se realizó el procesamiento correspondiente tomando en cuenta además que
su país de nacimiento sea el mismo que el lugar de origen de la migración. Este grupo se identifica como
migración reciente y corresponde en este caso a los que llegaron entre 1996 y 2001.

68
Inmigración internacional de paises amazónicos: el caso de Bolivia • Melvy Aídee Vargas Bonilla

1.400

Brasil
1.200
Colombia
Ecuador
1.000
Perú
Venezuela
800

600

400

200

0
<1950 53 57 61 65 69 73 77 81 85 89 93 97 2001
Año de llegada

Figura 5 - Bolivia: extranjeros por país amazónico de nacimiento según año de llegada.
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

Tabla 7 - Bolivia: extranjeros nacidos en países amazónicos por período de llegada

Período de Total Países País de nacimiento


llegada amazónicos Brasil Colombia Ecuador Perú Ve n e z u e l a Otros*
Inmigrantes absolutos
1911-1920 11 0 0 0 11 0 0
1921-1930 51 9 0 0 42 0 0
1931-1940 121 29 0 0 92 0 0
1941-1950 217 85 1 4 125 2 0
1951-1960 310 147 9 4 149 1 0
1961-1970 606 325 38 8 219 16 0
1971-1980 1.369 682 89 22 535 41 0
1981-1990 3.321 1.929 105 51 1.129 104 3
1991-2001 15.388 8.164 914 541 5.486 278 5
Sin respuesta 5.920 3.704 211 122 1.771 111 1
To t a l 27.314 15.074 1.367 752 9.559 553 9
Inmigrantes recientes
1986-2001 9.863 4.937 707 421 3.603 195 4
% 36,1 32,8 51,7 56,0 37,7 35,3 44,4
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia
* Guayana Francesa, Guyana y Surinam.

1951-60
9.000 1961-70
8.000 1971-80
7.000 1981-90

6.000 1991-01

5.000
4.000
3.000
2.000
1.000
0
Brasil Colombia Ecuador Perú Venezuela

Figura 6 - Bolivia: Extranjeros por país amazónico de nacimiento según período de llegada.
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

69
Migração internacional na Pan-Amazônia

Los inmigrantes recientes de Brasil, Perú y Venezuela con magnitudes diferentes que van desde 4,9 mil
del Brasil a 195 de Venezuela, representan más del 30% del total de extranjeros de cada uno de los países. En
el caso de los inmigrantes recientes de Colombia con 707 personas y de Ecuador con 421, superan el 50% del
total, lo que puede significar la importancia reciente que está teniendo Bolivia como destino de los flujos migratorios
originados en estos dos países.

CARACTERIZACION DE LOS EXTRANJEROS

Hasta ahora se ha presentado un conjunto de antecedentes sobre las magnitudes por país de nacimiento,
la tendencia a través del tiempo como también su distribución en el territorio nacional.
Sin embargo, es necesario analizar los principales rasgos de los inmigrantes extranjeros, en este caso de
los que provienen de los países amazónicos, por supuesto a partir de la información censal disponible, que
comprende a los aspectos demográficos, educativos y de participación laboral.
Es importante reiterar que la información se refiere a los inmigrantes acumulados a lo largo del tiempo
y cuyas características están referidas a la fecha del censo y de ninguna manera al perfil de los inmigrantes al
momento de su llegada al país.

LAS CARACTERISTICAS DEMOGRÁFICAS

En general, la migración internacional se compone de altas fracciones de personas adultas en


edades reproductivas y laborales, lo que le da atributos de selectividad respecto de las poblaciones de
origen y de destino.
Los datos presentados en la figura 7 sobre la estructura por edad del total de los inmigrantes de los
países amazónicos, permite visualizar una presencia mayoritaria de personas en edades centrales principalmente
entre las edades de 20 a 30 años, edades en las cuales se da la mayor intensidad de la migración por diversas
razones entre las que sobresalen por lo general la búsqueda de mejores oportunidades de trabajo y posibilidades
de acceso a universidades, entre otros motivos.

Figura 7 - Bolivia: Estructura por sexo y edad del total de población inmigrante de países amazónicos, 2001
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

70
Inmigración internacional de paises amazónicos: el caso de Bolivia • Melvy Aídee Vargas Bonilla

Si bien la característica anotada anteriormente para el total de inmigrantes se mantiene en términos


generales en las poblaciones por país de nacimiento, se observan diferencias en cuanto a magnitudes pero
principalmente en la distribución relativa, cifras que muestran la mayor o menor presencia de menores de edad
y de personas de la tercera edad (Tabla 8).

Tabla 8 - Bolivia: extranjeros nacidos en países amazónicos por grupos de edades, 2001

Total países País de nacimiento


Grupos de edades
amazónicos Brasil Colombia Ecuador Perú Ve n e z u e l a

Población ambos sexos


0-14 5.922 4.465 204 147 951 155
15-64 20.447 10.279 1.116 593 8.058 392
65 y más 344 331 47 12 550 6
Total 26.713 15.075 1.367 752 9.559 553
Distribución Relativa
0-14 22,2 29,6 14,9 19,5 9,9 28,0
15-64 76,5 68,2 81,6 78,9 84,3 70,9
65 y más 1,3 2,2 3,4 1,6 5,8 1,1
Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

Entre los colombianos y peruanos, el porcentaje de personas entre 15 y 64 años es superior al 80%, en
tanto que entre los brasileños y venezolanos se aprecia un importante porcentaje de menores de 15 años, hecho
que puede explicar una inmigración familiar (padres con hijos menores).
También hay diferencias en el porcentaje de inmigrantes extranjeros por país de nacimiento de la tercera
edad. Los venezolanos registran porcentajes menores (1,1%) y los peruanos la máxima participación (5,8%).
En lo que se refiere al sexo, en las cifras que se presentan en la Tabla 9, no se encuentra una característica
generalizada en las diferentes poblaciones de extranjeros por país de nacimiento. Con excepción de los
ecuatorianos y venezolanos se puede visualizar una tendencia mayoritaria de presencia masculina, particularmente
entre los peruanos cuya relación asciende hasta 124 hombres por cada 100 mujeres y la menor cifra se da entre
los venezolanos (91 hombres por cada 100 mujeres).
Si bien las cifras de la distribución relativa de las poblaciones por grandes grupos de edades mencionadas
anteriormente muestran una tendencia generalizada, ocultan las diferencias que se presentan en la estructuras
por sexo y grupos de edades de los inmigrantes por país de nacimiento como se puede visualizar en la Figura 8.
Los colombianos y peruanos presentan una preponderancia de personas de edades centrales, signo de
una inmigración motivada por razones de tipo laboral y ambas poblaciones con una predominancia masculina.
En el caso de los inmigrantes brasileños, se constata una mayor presencia relativa entre las edades que
puede ser considerada en el inicio de la incorporación a la actividad económica o también, puede ser este el
caso, de la migración por razones de estudios en el nivel superior teniendo en cuenta que existen convenios de
convalidación de estudios y las ventajas económicas para los brasileños para realizar estudios superiores en
universidades privadas y públicas en Bolivia, sin que se observe además mayores diferencias por sexo.3

3
Del 15 al 19 de julio de 1974 se celebró en la ciudad de México la Conferencia Internacional de Estado para aprobar el Convenio Regional
sobre Convalidación de Estudios, Títulos y Diplomas de Educación Superior o de Enseñanza Superior en América Latina y el Caribe,
convocada por la UNESCO. Al término de la conferencia, firmaron el convenio los siguientes países: Argentina, Bolivia, Brasil, Colombia,
Costa Rica, Cuba, Chile, Ecuador, El Salvador, Guatemala, Haití, Honduras, México, Panamá, Uruguay, Perú y Venezuela.

71
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabla 9 - Bolivia: Extranjeros nacidos en países amazónicos por sexo, grupos de edades e índice de masculinidad

Total países País de nacimiento


Grupos de edades
amazónicos Brasil Colombia Ecuador Perú Ve n e z u e l a

Hombres
0-14 2.988 2.285 102 72 450 79
15-64 10.952 5.340 580 292 4.552 183
65 y + 167 170 13 5 295 2
To t a l 14.107 7.795 695 369 5.297 264

Mujeres
0-14 2.934 2.180 102 75 501 76
15-64 9.495 4.939 536 301 3.506 209
65 y + 177 161 34 7 255 4
To t a l 12.606 7.280 672 383 4.262 289

Índice de Masculinidad
0-14 101,8 104,8 100,0 96,0 89,8 103,9
15-64 115,3 108,1 108,2 97,0 129,8 87,6
65 y + 94,4 105,6 38,2 71,4 115,7 50,0
To t a l 111,9 107,1 103,4 96,3 124,3 91,3
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

Los ecuatorianos presentan una estructura concentrada en las edades centrales con una predominancia
femenina, con excepción en el grupo de edades de 20 a 24 años que alcanza elevados porcentajes particularmente
de hombres, situación que puede ser atribuida a razones laborales más que de estudios.
Los inmigrantes venezolanos presentan rasgos diferentes, comparados con sus similares de los otros
países amazónicos, por cuanto destacan un predomino de niños y población joven sin una tendencia generalizada
de la relación por sexo en los diferentes grupos de edades.
Cabe señalar que las estructuras presentadas anteriormente corresponden a toda la población de
extranjeros, si bien por país de nacimiento, ellos constituyen al conjunto de sobrevivientes independientemente
del año de llegada. Por ello en el Tabla 10, se presenta la población de inmigrantes recientes por grupos de
edades a fin de tener una mayor claridad en su composición al llegar al país, dado que se limita a los inmigrantes
entre 1996 y 2001.
Los datos revelan que los inmigrantes recientes, exceptuando a los que provienen de Venezuela, se
componen de más del 80% de personas en edades centrales (15 a 64 años), sin embargo, se observa una
relativa heterogeneidad al interior de este grupo, principalmente entre los más jóvenes (15 a 29 años). Entre los
inmigrantes de Brasil y Perú esta población representa más del 50%, el 45,6% entre los ecuatorianos y sólo
alrededor del 30% entre los colombianos y venezolanos.
Entre los colombianos resalta el peso que tienen los inmigrantes recientes de 30 a 64 años de edad
(50,9%) lo que se puede deducir que el motivo de la migración es fundamentalmente por razones de trabajo. Se
destaca también, que entre los inmigrantes venezolanos se registran los mayores porcentajes de niños (29,2%).
Respecto a la relación de masculinidad entre los inmigrantes recientes de cada país, exceptuando a los
venezolanos, en todos se constata la superioridad masculina.
En cuanto a la composición por estado conyugal, cifras que se presentan en la Tabla 11, visualizan
diferencias en las cifras relativas de personas casadas o convivientes comparadas con las de solteros, las
mismas que pueden estar relacionadas con la estructura por edad analizada anteriormente, además por los
motivos de la migración.

72
Inmigración internacional de paises amazónicos: el caso de Bolivia • Melvy Aídee Vargas Bonilla

BRASIL COLOMBIA

ECUADOR PERU

VENEZUELA

Figura 8 - Estructura por sexo y edad de la población extranjera según país amazónico de nacimiento, 2001
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda, 2001

73
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabla 10 - Bolivia: inmigrantes recientes por grupos de edades, según país amazónico de nacimiento

Total países País de nacimiento


Grupos de edades amazónicos Brasil Colombia Ecuador Perú Ve n e z u e l a

Inmigrantes recientes
(1986-2001)
5-14 1.359 812 96 62 332 57
15-29 4.945 2.652 235 192 1.804 62
30-64 3.399 1.412 360 163 1.391 73
65 y más 160 61 16 4 76 3
To t a l 9.863 4.937 707 421 3.603 195

Distribución relativa (%)


5-14 13,8 16,4 13,6 14,7 9,2 29,2
15-29 50,1 53,7 33,2 45,6 50,1 31,8
30-64 34,5 28,6 50,9 38,7 38,6 37,4
65 y más 1,6 1,2 2,3 1,0 2,1 1,5
To t a l 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

Índice de masculinidad
To t a l 116,5 114,4 126,6 117,0 119,6 85,7
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

Tabla 11 - Bolivia: Población extranjera por estado civil según país amazónico de nacimiento (15 y más años de edad)

Población extranjera Distribución relativa (%)


País de nacimiento Ambos Ambos
Estado civil sexos Hombre Mujer sexos Hombre Mujer

Brasil
Soltero/a 4.763 2.765 1.998 44,9 50,2 39,2
Casado/conviviente 5.250 2.482 2.768 49,5 45,0 54,3
Separado/divorciado/viudo 597 263 334 5,6 4,8 6,5
To t a l 10.610 5.510 5.100 100,0 100,0 100,0

Colombia
Soltero/a 483 266 217 41,5 44,9 38,1
Casado/conviviente 619 305 314 53,2 51,4 55,1
Separado/divorciado/viudo 61 22 39 5,2 3,7 6,8
To t a l 1.163 593 570 100,0 100,0 100,0

Ecuador
Soltero/a 298 154 144 49,3 51,9 46,8
Casado/conviviente 291 139 152 48,1 46,8 49,4
Separado/divorciado/viudo 16 4 12 2,6 1,3 3,9
To t a l 605 297 308 100,0 100,0 100,0

Perú
Soltero/a 3.489 1.959 1.530 40,5 40,4 40,7
Casado/conviviente 4.581 2.672 1.909 53,2 55,1 50,8
Separado/divorciado/viudo 538 216 322 6,3 4,5 8,6
To t a l 8.608 4.847 3.761 100,0 100,0 100,0

Venezuela
Soltero/a 223 112 111 56,0 60,5 52,1
Casado/conviviente 155 69 86 38,9 37,3 40,4
Separado/divorciado/viudo 20 4 16 5,0 2,2 7,5
To t a l 398 185 213 100,0 100,0 100,0

Total países amazónicos


Soltero/a 9.259 5.259 4.000 43,3 46,0 40,2
Casado/conviviente 10.902 5.669 5.233 51,0 49,6 52,6
Separado/divorciado/viudo 1.232 509 723 5,8 4,5 7,3
To t a l 21.393 11.437 9.956 100,0 100,0 100,0
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

74
Inmigración internacional de paises amazónicos: el caso de Bolivia • Melvy Aídee Vargas Bonilla

LAS CARACTERISTICAS EDUCATIVAS4

Se ha mostrado anteriormente la fuerte concentración de los inmigrantes en las edades centrales, por lo
que es posible esperar que los mismos presenten sus propias características educativas relacionadas también
por los motivos de la migración (continuación de estudios superiores o trabajo).
Los datos consignados en la Tabla 12 revelan los contrastes en los grados de escolaridad de la población
inmigrante de cada uno de los países amazónicos. Cabe señalar que las cifras que se presentan corresponden
a la población de 15 años y más de edad a efectos de comparación.

Tabla 12 - Bolivia: Características educativas de los extranjeros nacidos en países amazónicos (de 15 y más
años de edad)

Población extranjera Distribución relativa (%)


País de nacimiento Ambos Ambos
Grado de escoloaridad* sexos Hombre Mujer sexos Hombre Mujer

Brasil
Bajo 2.382 1.339 1.043 23,1 25,1 21,0
Medio 2.959 1.431 1.528 28,8 26,8 30,8
Superior 3.991 1.977 2.014 38,8 37,1 40,6
Ninguno 960 586 374 9,3 11,0 7,5
To t a l 10.292 5.333 4.959 100,0 100,0 100,0

Colombia
Bajo 89 45 44 7,7 7,6 7,7
Medio 307 147 160 26,5 24,9 28,1
Superior 756 393 363 65,2 66,6 63,8
Ninguno 7 5 2 0,6 0,8 0,4
To t a l 1.159 590 569 100,0 100,0 100,0

Ecuador
Bajo 34 16 18 5,7 5,4 5,9
Medio 228 93 135 38,1 31,6 44,4
Superior 335 185 150 56,0 62,9 49,3
Ninguno 1 1 0,2 0,0 0,3
To t a l 598 294 304 100,0 100,0 100,0

Perú
Bajo 1.076 519 557 12,7 10,8 15,1
Medio 2.742 1.575 1.167 32,3 32,9 31,6
Superior 4.412 2.611 1.801 52,0 54,6 48,7
Ninguno 251 80 171 3,0 1,7 4,6
To t a l 8.481 4.785 3.696 100,0 100,0 100,0

Venezuela
Bajo 20 13 7 5,1 7,1 3,3
Medio 121 53 68 30,6 28,8 32,2
Superior 251 118 133 63,5 64,1 63,0
Ninguno 3 3 0,8 0,0 1,4
To t a l 395 184 211 100,0 100,0 100,0

Total países amazónicos


Bajo 3.578 1.923 1.655 17,1 17,2 17,0
Medio 6.383 3.309 3.074 30,5 29,6 31,6
Superior 9.750 5.287 4.463 46,6 47,2 45,8
Ninguno 1.222 671 551 5,8 6,0 5,7
To t a l 20.933 11.190 9.743 100,0 100,0 100,0
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.
* Grados de escolaridad: Bajo (de 1 a 8 años de educación), Medio (de 9 a 12 años) y Superior (más de 12 años)

4
Tomando en cuenta los años de estudio según la clasificación MERCOSUR, presentada en la base de datos del Censo Nacional de Población
y Vivienda del 2001

75
Migração internacional na Pan-Amazônia

Los brasileños y los peruanos son los que presentan un elevado porcentaje de personas con bajo nivel
de educación, a diferencia de las restantes poblaciones, cuyas cifras no alcanzan al 10%.
En el caso de los inmigrantes con educación superior los contrastes también son muy marcados. Los
inmigrantes con niveles superiores se manifiestan entre los colombianos y venezolanos que superan el 60%,
algo más del 50% entre los ecuatorianos y peruanos y con cifras por debajo los brasileños con el 38,8%.
Asimismo, se constata que entre los brasileños, además de presentar un elevado porcentaje de personas
con bajo nivel de instrucción, también muestran cifras elevadas de personas sin instrucción (7,5%), seguido por
los peruanos con el 4,6%, en tanto que entre las otras poblaciones las cifras se sitúan alrededor del 1%.
Considerando a los inmigrantes recientes, cifras que se presentan en el la Tabla 13, permiten observar
que independientemente del país de origen existe la predominancia de personas con niveles superiores de
educación (más del 50%) particularmente entre los colombianos y venezolanos con cifras por encima del 60%.
Por lo anterior se puede deducir que en general existe una selectividad en la población inmigrante, dado
que las personas con bajos niveles de instrucción constituyen pequeños porcentajes del total de inmigrantes de
cada país, las mismas que son superadas por las de niveles superiores.

Tabla 13 - Bolivia: Características educativas de los inmigrantes recientes por país amazónico de nacimiento
(de 15 y más años de edad)

País de nacimiento
Grado de escolaridad
Total Brasil Colombia Ecuador Perú Ve n e z u e l a
Bajo 12,6 17,0 6,5 5,6 9,2 8,1
Medio 31,9 28,6 29,3 40,7 35,8 29,4
Superior 52,9 50,7 63,0 53,7 53,2 62,5
Ninguno 2,6 3,7 1,1 0,0 1,8 0,0
To t a l 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

LA PARTICIPACION LABORAL

La elevada concentración de las personas en edades centrales entre los diferentes flujos migratorios de
los países amazónicos, supone el carácter laboral como el principal motivo de la migración, por lo que es
importante analizar su participación en la actividad económica del país. Para ello es necesario aludir a la
proporción de personas en edades activas que declararon desarrollar una actividad económica la semana
anterior al momento del empadronamiento. Si bien en Bolivia se indaga la actividad económica a partir de los 7
años de edad, para el presente análisis se toma como referencia a los inmigrantes a partir de los 15 años de
edad, para reducir los efectos de las diferencias en las estructuras por edad.
Los datos de la Tabla 14 revelan que existe heterogeneidad en los niveles de participación. Los colombianos
tienen tasas de participación elevadas (66,2%) que puede ser atribuido a su estructura por edad (mayor
concentración entre 30 a 45 años de edad) y a las características educativas que presentan (65% de los
inmigrantes poseen educación superior).
Los peruanos y los ecuatorianos presentan niveles de participación muy cercanas (60,4% y 58,2%
respectivamente), aunque difieren en su estructura y las características educativas, como se vio anteriormente.
Los brasileños y venezolanos tienen las menores tasas de participación.
En las tasas de participación laboral según el sexo de los extranjeros, se comprueban patrones que
reproducen la menor participación entre las mujeres, aunque con distintas intensidades, siendo las colombianas
las que presentan cifras mayores y las de Brasil las menores en la participación en la actividad económica.

76
Inmigración internacional de paises amazónicos: el caso de Bolivia • Melvy Aídee Vargas Bonilla

Tabla 14 - Tasas de participación de los extranjeros por país amazónico de nacimiento. Población de 15 años y
más de edad.

Tasas de participación * (por 100)


País de nacimiento
Ambos sexos Hombres Mujeres

Brasil 47,9 61,9 32,7


Colombia 66,2 77,3 54,5
Ecuador 58,2 71,1 45,7
Perú 60,4 71,1 46,5
Venezuela 44,6 54,1 36,3
Total países amazónicos 54,2 66,7 39,7
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.
*
Tasa de participación = (Población Económicamente Activa/ población de 15 y más años de edad).

Desde luego que los niveles descritos anteriormente, para el total y por sexo, son promedios que ocultan
comportamientos disímiles en las tasas de participación de los extranjeros por grupos de edades independientemente
del sexo. Los hombres alcanzan las mayores tasas de participación después de los 30 años de edad sin mayores
diferencias por país de origen. Entre los menores de 30 años, las tasas de participación en la actividad económica
muestran marcadas diferencias por país de nacimiento y grupo de edad (Figura 9).
En la misma Figura 9 se constata que las máximas tasas de participación de las extranjeras es 60%
variando el grupo de edad según el país de origen, si embargo entre esas edades los hombres habían superado
el 80%. No se puede descartar que alguna fracción de mujeres no está reconociendo su actividad como económica,
engrosando de este modo la población de inactivas.
En términos generales, las brasileñas presentan las menores tasas de participación en la actividad
económica, en tanto que las colombianas tienen las mayores tasas, lo que estaría estrechamente relacionado a
la existencia de una importante fracción de las inmigrantes con niveles de educación superior y cuyo motivo de
la migración puede haber sido fundamentalmente el laboral. Tasas elevadas también se observan entre las
peruanas, principalmente entre los 30 y 40 años de edad.
Sin duda que la participación de las inmigrantes está relacionada con las posibilidades de inserción, dado
que las condiciones de los mercados de trabajo difieren en gran medida por departamento y área de residencia
(urbana o rural), asimismo, de los niveles económicos alcanzados por sus parejas teniendo en cuenta que una
fracción mayoritaria de la mujeres inmigrantes se encuentra en la condición de casadas o concubinas.
Se ha constado, que las mayores diferencias en las tasas de participación se producen entre la población
joven por país de origen, lo que está estrechamente relacionado con la fracción de población que declaró su
condición de estudiante (inactivo económicamente) en el momento de la indagación sobre la actividad realizada
la semana anterior al momento del empadronamiento.
En la Figura 10 y Tabla 15, se muestra claramente la correspondencia inversa entre la condición de
estudiante y de económicamente activo. En el grupo de edades 20 a 24 años, alrededor del 60% de los brasileños
y los peruanos se encuentran estudiando y en cifras menores están participando en la actividad económica en
Bolivia, en tanto que un comportamiento distinto muestran los colombianos y ecuatorianos, donde ya desde este
grupo de edad su participación en la actividad económica es notoriamente elevado.

77
Migração internacional na Pan-Amazônia

Hombres

100,0

90,0

80,0

70,0
Brasil
Ta s a s (% )

60,0 Colombia
50,0 Ecuador
40,0 Perú
Venezuela
30,0

20,0

10,0

0,0
15-19 20-24 25-29 30-34 35-39 40-44 45 y más

Mujeres

100,0

90,0

80,0

70,0
Brasil
Ta s a s (% )

60,0
Colombia
50,0 Ecuador
40,0 Perú
Venezuela
30,0

20,0

10,0

0,0
15-19 20-24 25-29 30-34 35-39 40-44 45 y más

Figura 9 - Tasas de participación por grupos de edad según sexo y país amazónico de nacimiento de los inmigrantes.
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia

78
Inmigración internacional de paises amazónicos: el caso de Bolivia • Melvy Aídee Vargas Bonilla

Figura 10 - Bolivia: % de estudiantes y % de económicamente activos entre los extranjeros de países amazónicos, de 20
a 24 y 25 a 29 años de edad.
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

79
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabla 15 - Bolivia: % de estudiantes y % de económicamente activos entre los extranjeros de 20 a 29 años de


edad, por sexo según país amazónico de nacimiento.

Sexo % de estudiantes Tasas de participación económica


País de nacimiento Grupos de edades Grupos de edades
20-24 25-29 20-24 25-29
Ambos sexos
Brasil 66,8 49,7 25,1 42,0
Colombia 8,7 10,5 60,9 76,3
Ecuador 3,8 3,1 76,9 75,0
Perú 61,5 31,9 27,5 59,1
Venezuela 50,0 42,9 50,0 57,1
Total países amazónicos 61,4 39,4 28,5 51,6
Hombres
Brasil 62,2 49,0 33,8 46,9
Colombia 5,3 4,0 57,9 80,0
Ecuador 5,6 0,0 83,3 93,8
Perú 53,8 28,1 35,2 65,2
Venezuela 50,0 50,0 50,0 50,0
Total países amazónicos 55,1 37,3 36,6 57,0
Mujeres
Brasil 74,7 51,8 10,2 29,5
Colombia 25,0 23,1 75,0 69,2
Ecuador 0,0 6,3 62,5 56,3
Perú 75,0 43,1 14,0 40,8
Venezuela 50,0 33,3 50,0 66,7
Total países amazónicos 72,5 44,8 14,0 37,2
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

En el grupo de edades de 25 a 29 años, el porcentaje de estudiantes disminuye considerablemente y


aumenta la fracción de inmigrantes insertados en la actividad económica, resaltando las mayores cifras que se
observan de estudiantes entre los brasileños y menor participación en la actividad económica, situación que
demuestra que en estos grupos de edad el motivo de la migración puede ser fundamentalmente realizar estudios
superiores, dadas las ventajas que pueden ofrecer las diferentes universidades y las correspondientes
convalidaciones en su país de origen.
Hasta el momento nos hemos referido al nivel de participación de los inmigrantes en la actividad económica,
mostrando que existen marcadas diferencias por sexo, edad y país de nacimiento, sin embargo es también
necesario referirse a las características de su inserción productiva. Para ello, la información censal proporciona
datos sobre las ocupaciones declaradas en el momento del empadronamiento, la rama de actividad económica
y las categorías de ocupación.

Ocupación

Si bien la información sobre la ocupación puede ser presentada para su análisis a nivel desagregado, se
ha visto por conveniente utilizar los datos agregados a un dígito de la clasificación utilizada por el INE y que se
presenta en la Tabla 1 del anexo. Con esta información ha sido posible conocer la importancia relativa de las
ocupaciones en las cuales se insertan los trabajadores mejor calificados provenientes de cada país.
Las cifras de la Tabla 16, permiten distinguir que los inmigrantes calificados de cada país registran
proporciones que varían desde un 27,6% de los ocupados brasileños hasta un 71,5% entre los venezolanos.

80
Inmigración internacional de paises amazónicos: el caso de Bolivia • Melvy Aídee Vargas Bonilla

Tabla 16 - Bolivia: Trabajadores inmigrantes calificados por país amazónico de nacimiento. Población de 15
años y más de edad

Trabajadores calificados* % sobre la población ocupada


País de nacimiento Ambos Sexo Ambos Sexo
sexos Hombre Mujer sexos Hombre Mujer
Brasil 1.345 785 560 27,6 24,0 35,2
Colombia 499 286 213 67,5 65,1 71,0
Ecuador 208 129 79 61,7 64,2 58,1
Perú 1.893 1.315 578 37,7 39,5 34,2
Venezuela 118 68 50 71,5 73,9 68,5
Total países amazónicos 4.067 2.585 1.482 36,5 35,2 39,1
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia
________________
* Corresponde a los siguientes grupos de ocupación:
• ocupaciones de dirección en la administración pública y empresas
• ocupaciones de profesionales científicos e intelectuales
• ocupaciones de técnicos y profesionales de apoyo

Los peruanos se sitúan en un nivel cercano a los brasileños en tanto que entre los colombianos y ecuatorianos
los porcentajes superan el 60%. Asimismo se constata el mismo comportamiento por país en la importancia
relativa que tienen los trabajadores calificados entre las poblaciones ocupadas de hombres o mujeres, aunque
las mayores cifras se presentan entre los inmigrantes de Venezuela y entre las inmigrantes de Colombia.

Sectores de actividad

Las cifras de la Figura 11 y Tabla 17 revelan que exceptuando a los brasileños, el predominio del sector
terciario es acentuado entre las diferentes poblaciones de trabajadores extranjeros Son actividades vinculadas
a los servicios y que se relaciona con la elevada presencia de trabajadores calificados (no manuales), cifras que
alcanzan el 80% entre los ocupados ecuatorianos, 76% entre los venezolanos y entre los colombianos y peruanos
alrededor del 70%, observando además que la participación de la mujer en este sector es mayor que entre los
hombres.

90

80

70

60

50

40

30

20

10

0
Brasil Colombia Ecuador Perú Venezuela Total

Primario 35,1 10,4 7,1 6,4 9,7 19,3


Secundario 11,2 11,9 8,9 16,8 6,1 13,6
Terciario 48,4 71,0 80,1 72,5 76,4 62,2

Figura 11 - Bolivia: Población ocupada por sectores de actividad entre los inmigrantes por
país amazónico de nacimiento.
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

81
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabla 17 - Bolivia: Distribución de la población ocupada por grandes sectores de actividad entre los inmigrantes
por país amazónico de nacimiento

País de Nacimiento Población extranjera Distribución relativa (%)


Sectores de actividad Ambos Sexo Ambos Sexo
sexos Hombre Mujer sexos Hombre Mujer
Brasil
Primario 1.710 1.534 176 35,1 46,8 11,1
Secundario 543 418 125 11,2 12,8 7,9
Terciario 2.358 1.207 1.151 48,4 36,8 72,3
No especificado 257 118 139 5,3 3,6 8,7
To t a l 4.868 3.277 1.591 100,0 100,0 100,0
Colombia
Primario 77 68 9 10,4 15,5 3,0
Secundario 88 54 34 11,9 12,3 11,3
Terciario 525 290 235 71,0 66,1 78,3
No especificado 49 27 22 6,6 6,2 7,3
To t a l 739 439 300 100,0 100,0 100,0
Ecuador
Primario 24 22 2 7,1 10,9 1,5
Secundario 30 21 9 8,9 10,4 6,6
Terciario 270 150 120 80,1 74,6 88,2
No especificado 13 8 5 3,9 4,0 3,7
To t a l 337 201 136 100,0 100,0 100,0
Perú
Primario 319 226 93 6,4 6,8 5,5
Secundario 842 694 148 16,8 20,8 8,8
Terciario 3.642 2.291 1.351 72,5 68,8 79,9
No especificado 217 119 98 4,3 3,6 5,8
To t a l 5.020 3.330 1.690 100,0 100,0 100,0
Venezuela
Primario 16 12 4 9,7 13,0 5,5
Secundario 10 5 5 6,1 5,4 6,8
Terciario 126 69 57 76,4 75,0 78,1
No especificado 13 6 7 7,9 6,5 9,6
To t a l 165 92 73 100,0 100,0 100,0
Total países amazónicos
Primario 2.146 1.862 284 19,3 25,4 7,5
Secundario 1.515 1.194 321 13,6 16,3 8,5
Terciario 6.923 4.008 2.915 62,2 54,6 76,9
No especificado 550 278 272 4,9 3,8 7,2
Total 11.134 7.342 3.792 100,0 100,0 100,0
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia

En el caso de los inmigrantes brasileños, si bien el 48% del total se encuentran ocupados en el sector
terciario, esta cifra se debe principalmente a la elevada participación de las mujeres en este sector de la
economía (72,3%), por cuanto el 46,8% de los hombres están ocupados en el sector primario.
Cabe señalar que las cifras mostradas por sectores pueden también ocultar particularidades que en la
práctica son visibles al considerar individualmente la inserción de los ocupados por rama de actividad. La Tabla
2 del anexo muestra que entre los brasileños el 21,6% de las mujeres están trabajando en la rama de servicios
comunales, sociales y personales, y el 14,5% en el comercio al por mayor y al por menor. Estas dos ramas
también muestran una fracción de participación masculina aunque en menor proporción, considerando que el
35,5% está en la rama de la agricultura, ganadería, caza y silvicultura.
En el caso de los inmigrantes de Colombia, los servicios comunales, sociales y personales representan
el 16% de la fuerza de trabajo masculino y la explotación de minas y canteras el 14,8%; en tanto que las
inmigrantes se concentran en la rama de la educación (14,2%), seguido por la industria manufacturera (13,4%)
y servicios inmobiliarios, empresariales y de alquiler con el 12,6%.

82
Inmigración internacional de paises amazónicos: el caso de Bolivia • Melvy Aídee Vargas Bonilla

La rama de servicios comunitarios, sociales y personales tiene mayor concentración entre los ecuatorianos
(18,2% entre los hombres y 30,9% entre las mujeres). El comercio al por mayor y al por menor y los servicios
inmobiliarios, empresariales y de alquiler representan el 13% y 13,7% respectivamente en la fuerza de trabajo
masculino, en tanto que las trabajadoras están en la rama de la educación (13,2%).
El comercio al por mayor y al por menor tiene la mayor concentración entre los inmigrantes ecuatorianos
(32,4% de los hombres y 23,6% de las mujeres). Asimismo se constata que el 17,3% de los hombres se emplea
en la industria manufacturera y entre las mujeres ocupadas el 18,2% están trabajando en la rama de servicios
a los hogares y servicios domésticos.
Cabe destacar que el 26,3% de la fuerza laboral de venezolanos se encuentra en explotación de minas
y canteras y una misma fracción en los servicios inmobiliarios, empresariales y de alquiler; en tanto que las
trabajadoras venezolanas se encuentran con la misma fracción en educación y servicios inmobiliarios,
empresariales y de alquiler (18,8%), y el 12,5% en los servicios sociales y de salud.

Categoría de ocupación

Se ha mostrado anteriormente la heterogeneidad en el nivel de participación de los inmigrantes según el


país de origen, como también la importancia que tienen los trabajadores calificados en cada grupo y su inserción
en el sector o rama de actividad en el cual están desarrollando sus actividades económicas. Sin embargo, es
importante considerar las condiciones en que los inmigrantes económicamente activos se desarrollan en sus
labores, por lo cual se utiliza la clasificación por categoría ocupacional.
Las cifras presentadas en e la Figura 12 y la Tabla 18 muestran marcadas diferencias por país de origen
de los inmigrantes activos económicamente. Los trabajadores brasileños y peruanos alrededor de 48% son
asalariados (obrero o empleado) y en fracciones menores son trabajadores por cuenta propia. Se observan
leves diferencias por sexo pero se mantiene la tendencia en ambos casos.
Los datos correspondientes a los inmigrantes colombianos y venezolanos señalan la existencia de una
modalidad predominante de inserción en forma asalariada (más del 60%), categoría seguida de lejos por los
inmigrantes trabajadores por cuenta propia, es decir aquellos que desarrollan actividades independientes y sin
personas ocupadas a su cargo (alrededor del 25%). Asimismo se constata la existencia de una fracción importante
de los que se encuentran en la condición de patrón, socio o empleador (alrededor del 12%).

70

60

50

40

30

20

10

0
Brasil Colombia Ecuador Perú Venezuela Total

Obrero/empleado Cta. Propia Patrón/socio/empleador Traj. Por cta. Propia

Figura 12 - Bolivia: Población ocupada por categoría ocupacional entre los inmigrantes por país amazónico de nacimiento.
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

83
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabla 18 - Bolivia: Distribución de la población ocupada por categoría ocupacional entre los inmigrantes por
país amazónico de nacimiento

País de Nacimiento Población extranjera Distribución relativa (%)


Categoría ocupacional Ambos Sexo Ambos Sexo
sexos Hombre Mujer sexos Hombre Mujer

Brasil
Obrero, empleado 2.150 1.467 683 47,6 47,9 46,8
Cuenta propia 1.785 1.202 583 39,5 39,3 40,0
Patrón, socio, empleador 425 296 129 9,4 9,7 8,8
Cooperativista 22 16 6 0,5 0,5 0,4
Trabajador familiar 138 80 58 3,1 2,6 4,0
To t a l 4.520 3.061 1.459 100,0 100,0 100,0

Colombia
Obrero, empleado 422 249 173 60,2 58,9 62,2
Cuenta propia 173 107 66 24,7 25,3 23,7
Patrón, socio, empleador 86 55 31 12,3 13,0 11,2
Cooperativista 2 1 1 0,3 0,2 0,4
Trabajador familiar 18 11 7 2,6 2,6 2,5
To t a l 701 423 278 100,0 100,0 100,0

Ecuador
Obrero, empleado 174 103 71 54,5 53,6 55,9
Cuenta propia 102 61 41 32,0 31,8 32,3
Patrón, socio, empleador 23 16 7 7,2 8,3 5,5
Cooperativista 4 2 2 1,3 1,0 1,6
Trabajador familiar 16 10 6 5,0 5,2 4,7
To t a l 319 192 127 100,0 100,0 100,0

Perú
Obrero, empleado 2.283 1.470 813 47,8 45,9 51,8
Cuenta propia 1.988 1.392 596 41,7 43,4 38,0
Patrón, socio, empleador 366 279 87 7,7 8,7 5,5
Cooperativista 17 13 4 0,4 0,4 0,3
Trabajador familiar 119 51 68 2,5 1,6 4,3
To t a l 4.773 3.205 1.568 100,0 100,0 100,0

Venezuela
Obrero, empleado 97 54 43 61,8 62,8 60,6
Cuenta propia 39 23 16 24,8 26,7 22,5
Patrón, socio, empleador 20 9 11 12,7 10,5 15,5
Cooperativista 1 1 0,6 0,0 1,4
To t a l 157 86 71 100,0 100,0 100,0

Total países amazónicos


Obrero, empleado 5.130 3.345 1.785 49,0 48,0 50,9
Cuenta propia 4.088 2.786 1.302 39,0 40,0 37,1
Patrón, socio, empleador 920 655 265 8,8 9,4 7,6
Cooperativista 46 32 14 0,4 0,5 0,4
Trabajador familiar 291 152 139 2,8 2,2 4,0
To t a l 10.475 6.970 3.505 100,0 100,0 100,0
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia

En el caso de los trabajadores ecuatorianos, el 54,5% son asalariados y el 32% desarrollan sus actividades
económicas por cuenta propia y sólo el 7,2% como patrón o empleador, comportamiento similar al que muestran
los otros inmigrantes aunque con cifras menores, dado que toman importancia los trabajadores familiares
concentrando el 5% de la fuerza laboral ecuatoriana.
Para concluir en lo que se refiera a la participación de los inmigrantes en la actividad económica se
puede señalar que los inmigrantes provenientes de los países amazónicos se insertan mayoritariamente en la
economía formal, por la elevada fracción de los trabajadores asalariados.

84
Inmigración internacional de paises amazónicos: el caso de Bolivia • Melvy Aídee Vargas Bonilla

INMIGRANTES DE PAISES AMAZOICOS EN EL AREA DE LA AMAZONIA BOLIVIANA

En los apartados anteriores se han presentado las cifras del total de inmigrantes en Bolivia y de los que
provienen de los países amazónicos, tratando de mostrar las características más generales de esta población y
las diferencias existentes según el país de nacimiento. Sin embargo, es necesario aproximarnos en la cuantificación
de los inmigrantes de países amazónicos que se encuentran residiendo en la Amazonía boliviana.
Cabe señalar que el área de la Amazonía boliviana involucra a cinco departamentos, Pando y Beni en su
integridad y parte de La Paz, Santa Cruz y Cochabamba5, como se muestra en el Mapa 1.
Los datos consignados en la Tabla 19 muestran que en el área de la Amazonía boliviana se encontraban
residiendo 5.118 inmigrantes de países amazónicos, lo que representa el 18,7% del total de extranjeros de estos
países que declararon residir en Bolivia en el momento del censo del 2001, el 20,3% de los hombres y el 17% de
las mujeres inmigrantes.

Tabla 19 - Amazonía boliviana: Inmigrantes por país amazónico de nacimiento

Inmigrantes en la % sobre el total de inmigrantes


País de Nacimiento amazonía boliviana de países amazónicos
Ambos Ambos
sexos Hombre Mujer sexos Hombre Mujer

Brasil 4.532 2.559 1.973 30,1 32,8 27,1


Colombia 61 28 33 4,5 4,0 4,9
Ecuador 52 35 17 6,9 9,5 4,4
Perú 470 310 160 4,9 5,9 3,8
Venezuela 3 1 2 0,5 0,4 0,7
Total 5.118 2.933 2.185 18,7 20,3 17,0
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

Asimismo, las cifras de la Tabla 19 muestran que 4.532 brasileños fueron empadronados como residentes
en el área de la Amazonía, que constituyen el 30,1% del total de inmigrantes de Brasil que se encuentran en
Bolivia. La segunda población en cuanto a tamaño es de 470 peruanos que representan el 4,9% el total de
peruanos, seguidos por 61 colombianos, 52 ecuatorianos y sólo 3 venezolanos que representan una pequeña
proporción del total de residentes en el país. Por lo tanto, los brasileños son la población mayoritaria que se
encuentran residiendo en la Amazonía boliviana, puesto que representan el 88,6% del total, seguidos por el 9,2%
que representan los peruanos, concentrando entre ambos el 97,8% del total y sólo el 2,2% sería el aporte de los
inmigrantes de Colombia, Ecuador y Venezuela (Figura 13).

5
En el marco del Proyecto “Amazonia 21”, se han elaborado diversos estudios entre los que se encuentra el informe técnico del Sector
Forestal (Iporre, J; Proyecto Amazonia 21. Sector Forestal. UAGRM/CIMAR. Santa Cruz, agosto de 1999), en el cual se especifica que
la región Amazónica de Bolivia, comprende un territorio relativamente homogéneo, para cuya delimitación desde el punto de vista
ecológico se han considerado los siguientes parámetros:
Altitud: 150 a 1000 m.s.n.m.
Clima: Megatermal, variable entre húmedo a subhúmedo, con un límite inferior de precipitación pluvial de 1.200 mm/año y
temperaturas de 24º a 27ºC.
Fisiografía: Lo conocido como “Tierras bajas” constituida por llanura aluviales, planicies onduladas, colinas, serranías y piedemonte.
Vegetación: Cobertura de bosques y sabanas, los primeros mayormente perennifolios o siempre verdes y semi caducifolios.

85
Migração internacional na Pan-Amazônia

Mapa 1 - Área de la Amazonía boliviana.


Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

Mapa 2 - Inmigrantes brasileños en los municipios fronterizos.


Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

86
Inmigración internacional de paises amazónicos: el caso de Bolivia • Melvy Aídee Vargas Bonilla

Ecuador; 52; Perú; 470;


1% 9%
Venezuela; 3;
0%

Colombia; 61;
1%

Brasil; 4.532;
89%

Figura 13 - Distribución de los inmigrantes residentes en la Amazonía boliviana


por país amazónico de nacimiento.
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

La mayor presencia de brasileños y peruanos sin duda se debe a la colindancia de la extensa frontera entre
estos países, particularmente con el vecino país de Brasil. Las cifras de la Tabla 20 muestran que 3.805 brasileños
residen en los departamentos de Beni y Pando que representan el 84% y menor cantidad en Santa Cruz.
Entre los peruanos también se constata su presencia mayoritaria en los departamentos de Beni y Pando
(Tabla 20).
De los 52 ecuatorianos en la Amazonía boliviana, 38 se encuentran residiendo en el área que
corresponde al departamento de Cochabamba, en tanto que los colombianos están en los departamentos
Beni y Santa Cruz.

Tabla 20 - Amazonía boliviana: Inmigrantes en los departamentos de residencia por país amazónico de nacimiento

Departamento de Total países País de nacimiento


residencia amazónicos Brasil Colombia Ecuador Perú Ve n e z u e l a

Inmigrantes
La Paz 32 21 11
Cochabamba 82 24 5 38 15
Santa cruz 770 682 22 2 63 1
Beni 1.858 1.608 32 8 208 2
Pando 2.376 2.197 2 4 173
Total amazonía boliviana 5.118 4.532 61 52 470 3

Distribución relativa
La Paz 0,6 0,5 2,3
Cochabamba 1,6 0,5 8,2 73,1 3,2
Santa cruz 15,0 15,0 36,1 3,8 13,4 33,3
Beni 36,3 35,5 52,5 15,4 44,3 66,7
Pando 46,4 48,5 3,3 7,7 36,8
Total Amazonía boliviana 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia

Como se constata en el Mapa 2, los brasileños se encuentran principalmente residiendo en los municipios
fronterizos con el vecino país del Brasil. En el departamento de Pando el 91,3% de los brasileños se encuentran
en los municipios de Cobija, Bolpebra, Porvenir, Bella Flor y Santa Rosa del Abuná.
En el caso de los brasileños residentes en el departamento de Beni, el 52,9% se encuentra residiendo en
el municipio de Guayaramerín, el 15,3% en Riberalta y el 8,7% en Baures, concentrando entre los tres municipios
el 76,9% de total de inmigrantes del Brasil.

87
Migração internacional na Pan-Amazônia

En lo que se refiere a las características sociodemográficas y económicas de los inmigrantes de países


amazónicos residentes en el área de la Amazonia boliviana, se puede observar que no existen mayores
particularidades con lo analizado para el total de extranjeros residentes en el territorio nacional.
En lo que se refiere a la estructura por edad, las cifras consignadas en la Tabla 21, muestran que entre
los inmigrantes brasileños el 40% son menores de 15 años, con lo que se deduce la presencia de familias
asentadas, en tanto que entre los inmigrantes de los restantes países amazónicos alrededor del 80% tienen entre
15 y 64 años, edades de mayor participación en la actividad económica.

Tabla 21 - Amazonía boliviana: Inmigrantes por grupos de edad según país amazónico de nacimiento.

País de nacimiento
Grupos de edad Total
Brasil Colombia Ecuador Perú Ve n e z u e l a
Inmigrantes en la amazonía boliviana
0-14 1.898 1.811 10 10 67
15-64 3.082 2.603 50 41 385 3
65 y más 138 118 1 1 18
Todos los grupos 5.118 4.532 61 52 470 3
Distribución relativa (%)
0-14 37,1 40,0 16,4 19,2 14,3
15-64 60,2 57,4 82,0 78,8 81,9 100,0
65 y más 2,7 2,6 1,6 1,9 3,8
Todos los grupos 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia

La Tabla 22 muestra las cifras de extranjeros que participan en la actividad económica, las mismas que
guardan relación con la mayor o menor presencia de extranjeros en el área. Sin embargo, independientemente
del país de nacimiento se constatan las elevadas tasas de participación particularmente entre los hombres,
resaltando sin embargo, el nivel de participación de las mujeres colombianas 62,1%.

Tabla 22 - Amazonía boliviana: Inmigrantes que participan en la actividad económica según país de nacimiento

PEA * Tasas de participación** (%)


País de nacimiento
Total Sexo Total Sexo
Hombre Mujer Hombre Mujer

Brasil 1.746 1.359 387 66,0 86,8 35,7


Colombia 36 18 18 70,6 81,8 62,1
Ecuador 29 25 4 69,0 75,8 44,4
Perú 301 249 52 74,7 87,1 44,4
Venezuela - -
Total en Amazonía boliviana 2.112 1.651 461 67,2 86,5 37,1
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia
* Población Económicamente Activa de 15 y más años de edad
** (PEA/Población de 15 y más años de edad) *100

El 48,4% del total de inmigrantes que participan en la actividad económica en la Amazonía boliviana son
productores y trabajadores en la agricultura, pecuaria, agropecuaria y pesca, cifra que está fuertemente
influenciada por la magnitud de brasileños y la fracción que se encuentra en esta ocupación (54,9%). Entre los
brasileños le siguen en orden de importancia los ocupados en la industria extractiva, construcción, industria
manufacturera y otros oficios relacionados, con el 12,8% de los ocupados (Tabla 23).

88
Inmigración internacional de paises amazónicos: el caso de Bolivia • Melvy Aídee Vargas Bonilla

Tabla 23 - Amazonía boliviana: Trabajadores inmigrantes por ocupación principal, según país amazónico de
nacimiento.

País de nacimiento
Ocupación principal
Total Brasil Colombia Ecuador Perú

Inmigrantes en la Amazonía boliviana


Fuerzas armadas 3 1 2
Ocupaciones de dirección en la administración pública y empresas 60 45 6 1 8
Ocupaciones de profesionales científicos e intelectuales 66 26 9 5 26
Ocupaciones de técnicos y profesionales de apoyo 127 73 4 8 42
Empleados de oficina 19 13 6
Trabaj. de los servicios y vendedores de comercio 169 121 4 5 39
Productores y trabajadores en la agricultura, pecuaria,
agropecuaria y pesca 1.021 958 3 5 55
Trabajadores de la industria extractiva, construcción,
industria manufact. y otros oficios 284 223 3 3 55
Operadores de instalaciones y maquinaria 90 74 2 14
Trabajadores no calificados 182 137 1 1 43
Sin especificar 87 75 4 1 7
To t a l 2.108 1.746 36 29 297

Distribución relativa (%)


Fuerzas armadas 0,1 0,1 0,0 0,0 0,7
Ocupaciones de dirección en la administración pública y empresas 2,8 2,6 16,7 3,4 2,7
Ocupaciones de profesionales científicos e intelectuales 3,1 1,5 25,0 17,2 8,8
Ocupaciones de técnicos y profesionales de apoyo 6,0 4,2 11,1 27,6 14,1
Empleados de oficina 0,9 0,7 0,0 0,0 2,0
Trabaj. de los servicios y vendedores de comercio 8,0 6,9 11,1 17,2 13,1
Productores y trabajadores en la agricultura, pecuaria,
agropecuaria y pesca 48,4 54,9 8,3 17,2 18,5
Trabajadores de la industria extractiva, construcción,
industria manufact. y otros oficios 13,5 12,8 8,3 10,3 18,5
Operadores de instalaciones y maquinaria 4,3 4,2 5,6 0,0 4,7
Trabajadores no calificados 8,6 7,8 2,8 3,4 14,5
Sin especificar 4,1 4,3 11,1 3,4 2,4
To t a l 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia

Entre los peruanos, la segunda población de extranjeros residiendo en el área de la Amazonía boliviana,
no existe una concentración mayoritaria en alguna de las ocupaciones, en cifras iguales (18,5%) se encuentran
ocupados como productores y trabajadores en la agricultura, pecuaria y pesca, y en la industria extractiva,
construcción e industria manufacturera. También se observa, en cifras muy cercanas a las anteriores, los
trabajadores no calificados (14,5%), seguidos por los trabajadores en ocupaciones de técnicos y profesionales
de apoyo y de los servicios y vendedores de comercio.
De los datos de la Tabla 24 se constata que el 51% de los brasileños se encuentran trabajando por cuenta
propia y el 39% como obreros o asalariados. Entre los trabajadores peruanos se constata una leve superioridad
en las cifras de asalariados (48,6%) comparado con los por cuenta propia (45,4%). Entre los trabajadores
inmigrantes de los otros países, toma mayor importancia su participación como asalariados, alcanzando el
65,4% entre los ecuatorianos.
La elevada concentración de los brasileños en ocupaciones como productores y trabajadores en la
agricultura, pecuaria, agropecuaria y pesca, además de estar desarrollando sus actividades mayoritariamente
por cuenta propia, está reflejando su concentración en el sector primario, particularmente en la rama de agricultura,
ganadería, caza y silvicultura que concentra el 58,1% de su fuerza laboral. En el caso de los restantes inmigrantes,
no se observa una concentración mayoritaria en alguna de las ramas de actividad (Tabla 25).

89
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabla 24 - Amazonía boliviana: Inmigrantes de países amazónicos ocupados por categoría ocupacional.

Categoría ocupacional
País de Total Obrero Cuenta Patrón Trabajador
nacimiento ocupados empleado propia socio Cooperativista familiar
empleador
Inmigrantes en la
amazonía boliviana
Brasil 1.546 603 788 86 6 63
Colombia 27 14 11 2
Ecuador 26 17 7 2
Perú 280 136 127 10 7
To t a l 1.879 770 933 98 8 70
Distribución relativa (%)
Brasil 100,0 39,0 51,0 5,6 0,4 4,1
Colombia 100,0 51,9 40,7 7,4
Ecuador 100,0 65,4 26,9 7,7
Perú 100,0 48,6 45,4 3,6 2,5
To t a l 100,0 41,0 49,7 5,2 0,4 3,7
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia.

Tabla 25 - Amazonía boliviana: Inmigrantes ocupados por rama de actividad según país amazónico de nacimiento

Rama de actividad Total País de nacimiento


Brasil Colombia Ecuador Perú

Agricultura, ganadería, caza y silvicultura 1.093 1.014 5 10 64


Pesca 10 9 1
Explotación de minas y canteras 34 33 1
Industria manufacturera 154 117 3 1 33
Electricidad, gas y agua 5 2 3
Construcción 92 69 1 22
Comercio al por mayor y al por menor 206 145 5 3 53
Hoteles y restaurantes 59 44 2 13
Transporte, almacenamiento y comunicaciones 60 43 2 1 14
Servicios inmobiliarios, empresariales y de alquiler 30 7 3 20
Administración pública, defensa y seguridad social 20 12 1 7
Educación 35 14 7 1 13
Servicios sociales y de salud 39 23 4 1 11
Servicios comunitarios, sociales y personales 95 63 7 3 22
Servicios a los hogares y servicio doméstico 71 61 1 1 8
Servicio de organizaciones extraterritoriales 3 3
Sin especificar 102 87 2 1 12
Total 2.108 1.746 36 29 297
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia

90
Inmigración internacional de paises amazónicos: el caso de Bolivia • Melvy Aídee Vargas Bonilla

REFERENCIAS

FEDERACIÓN NACIONAL DE ASOCIACIÓN BOLIVIANO-JAPONÉS. Historia de la inmigración japonesa. Libro


Conmemorativo Centenario de Inmigración “Bolivia ni Ikiru”. www: fenaboya.com.libros/l_boliiki.htm.

INSTITUTO NACIONAL DE ESTADÍSTICA. Censo Nacional de Población y Vivienda de 1992. Base de datos para PC.
La Paz: INE.

INSTITUTO NACIONAL DE ESTADÍSTICA. Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Base de datos para PC.
La Paz: INE.

IPORRE, J. Proyecto Amazonia 21. Sector Forestal. Santa Cruz de La Sierra: UAGRM/CIMAR, 1999.

KOSTER, G. Santa Cruz de la Sierra, desarrollo, estructura interna y funciones de una ciudad de los llanos trapicales.
La Paz: Instituto de Ecología/Convenio UMSA-Goettingen; Cochabamba: Centro Pedagógico y Cultural de Portales, 1983.

91
Migração internacional na Pan-Amazônia

ANEXO

Tabla 1 - Bolivia: distribución de la población ocupada por grupos de ocupación entre los inmigrantes por país amazónico
de nacimiento

País de nacimiento Sexo


Ocupación principal Total Hombre Mujer
Brasil
Fuerzas armadas 9 9 -
Ocupaciones de dirección en la administración pública y empresas 305 207 98
Ocupaciones de profesionales científicos e intelectuales 440 218 222
Ocupaciones de técnicos y profesionales de apoyo 600 360 240
Empleados de oficina 158 55 103
Trabajadores de los servicios y vendedores de comercio 660 325 335
Productores y trabajadores en la agricultura, pecuaria, agropecuaria y pesca 1.384 1.230 154
Trabajadores de la industria extractiva, construcción industria manufacturera y otros oficios 556 461 95
Operadores de instalaciones y maquinaria 195 191 4
Trabajadores no calificados 368 134 234
Sin especificar 193 87 106
To t a l 4.868 3.277 1.591
Colombia
Fuerzas armadas 1 1 -
Ocupaciones de dirección en la administración pública y empresas 119 72 47
Ocupaciones de profesionales científicos e intelectuales 204 109 95
Ocupaciones de técnicos y profesionales de apoyo 176 105 71
Empleados de oficina 42 19 23
Trabajadores de los servicios y vendedores de comercio 76 45 31
Productores y trabajadores en la agricultura, pecuaria, agropecuaria y pesca 17 14 3
Trabajadores de la industria extractiva, construcción industria manufacturera y otros oficios 34 26 8
Operadores de instalaciones y maquinaria 24 24 -
Trabajadores no calificados 17 8 9
Sin especificar 29 16 13
To t a l 739 439 300
Ecuador
Ocupaciones de dirección en la administración pública y empresas 48 27 21
Ocupaciones de profesionales científicos e intelectuales 79 55 24
Ocupaciones de técnicos y profesionales de apoyo 81 47 34
Empleados de oficina 8 1 7
Trabajadores de los servicios y vendedores de comercio 61 26 35
Productores y trabajadores en la agricultura, pecuaria, agropecuaria y pesca 9 9 -
Trabajadores de la industria extractiva, construcción industria manufacturera y otros oficios 25 22 3
Operadores de instalaciones y maquinaria 2 2 -
Trabajadores no calificados 12 4 8
Sin especificar 12 8 4
To t a l 337 201 136
Perú
Fuerzas armadas 6 6 -
Ocupaciones de dirección en la administración pública y empresas 430 329 101
Ocupaciones de profesionales científicos e intelectuales 756 491 265
Ocupaciones de técnicos y profesionales de apoyo 707 495 212
Empleados de oficina 229 95 134
Trabajadores de los servicios y vendedores de comercio 1.274 851 423
Productores y trabajadores en la agricultura, pecuaria, agropecuaria y pesca 218 131 87
Trabajadores de la industria extractiva, construcción industria manufacturera y otros oficios 649 538 111
Operadores de instalaciones y maquinaria 129 126 3
Trabajadores no calificados 497 206 291
Sin especificar 125 62 63
To t a l 5.020 3.330 1.690
Venezuela
Fuerzas armadas 1 1 -
Ocupaciones de dirección en la administración pública y empresas 17 8 9
Ocupaciones de profesionales científicos e intelectuales 65 35 30
Ocupaciones de técnicos y profesionales de apoyo 36 25 11
Empleados de oficina 15 5 10
Trabajadores de los servicios y vendedores de comercio 11 8 3
Productores y trabajadores en la agricultura, pecuaria, agropecuaria y pesca 2 - 2
(continúa...)

92
Inmigración internacional de paises amazónicos: el caso de Bolivia • Melvy Aídee Vargas Bonilla

Tabla 1 - Bolivia: distribución de la población ocupada por grupos de ocupación entre los inmigrantes por país amazónico
de nacimiento
(conclusión)

País de nacimiento Sexo


Ocupación principal Total Hombre Mujer

Trabajadores de la industria extractiva, construcción industria manufacturera y otros oficios 2 1 1


Operadores de instalaciones y maquinaria 4 4 -
Trabajadores no calificados 3 1 2
Sin especificar 9 4 5
To t a l 165 92 73
Total países amazónicos
Fuerzas armadas 17 17 -
Ocupaciones de dirección en la administración pública y empresas 921 644 277
Ocupaciones de profesionales científicos e intelectuales 1.546 909 637
Ocupaciones de técnicos y profesionales de apoyo 1.600 1.032 568
Empleados de oficina 452 175 277
Trabajadores de los servicios y vendedores de comercio 2.082 1.255 827
Productores y trabajadores en la agricultura, pecuaria, agropecuaria y pesca 1.630 1.384 246
Trabajadores de la industria extractiva, construcción industria manufacturera y otros oficios 1.267 1.049 218
Operadores de instalaciones y maquinaria 354 347 7
Trabajadores no calificados 897 353 544
Sin especificar 368 177 191
To t a l 11.134 7.342 3.792
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia

93
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabla 2 - Bolivia: Distribución de la población ocupada por rama de actividad entre los inmigrantes por país
amazónico de nacimiento

País de nacimiento Sexo


Ocupación principal Total Hombre Mujer
Brasil
Agricultura, ganadería, caza y silvicultura 1.579 1.413 166
Pesca 13 13 -
Explotación de minas y canteras 118 108 10
Industria manufacturera 353 244 109
Electricidad, gas y agua 12 11 1
Construcción 178 163 15
Comercio al por mayor y al por menor 701 441 260
Hoteles y restaurantes 199 88 111
Transporte, almacenamiento y comunicaciones 211 175 36
Intermediación financiera 29 15 14
Servicios inmobiliarios, empresariales y de alquiler 158 94 64
Administración pública, defensa y seguridad social 54 30 24
Educación 187 42 145
Servicios sociales y de salud 216 83 133
Servicios comunitarios, sociales y personales 411 218 193
Servicios a los hogares y servicio doméstico 171 5 166
Servicio de organizaciones extraterritoriales 21 16 5
Sin especificar 257 118 139
To t a l 4.868 3.277 1.591
Colombia
Agricultura, ganadería, caza y silvicultura 28 24 4
Explotación de minas y canteras 49 44 5
Industria manufacturera 70 40 30
Electricidad, gas y agua 2 1 1
Construcción 16 13 3
Comercio al por mayor y al por menor 89 55 34
Hoteles y restaurantes 16 8 8
Transporte, almacenamiento y comunicaciones 44 33 11
Intermediación financiera 18 13 5
Servicios inmobiliarios, empresariales y de alquiler 78 48 30
Administración pública, defensa y seguridad social 18 12 6
Educación 74 18 56
Servicios sociales y de salud 65 23 42
Servicios comunitarios, sociales y personales 111 75 36
Servicios a los hogares y servicio doméstico 8 3 5
Servicio de organizaciones extraterritoriales 4 2 2
Sin especificar 49 27 22
To t a l 739 439 300
Ecuador
Agricultura, ganadería, caza y silvicultura 15 15 -
Explotación de minas y canteras 9 7 2
Industria manufacturera 20 13 7
Construcción 10 8 2
Comercio al por mayor y al por menor 55 39 16
Hoteles y restaurantes 14 5 9
Transporte, almacenamiento y comunicaciones 5 4 1
Intermediación financiera 7 6 1
Servicios inmobiliarios, empresariales y de alquiler 37 25 12
Administración pública, defensa y seguridad social 9 7 2
Educación 32 12 20
Servicios sociales y de salud 18 5 13
Servicios comunitarios, sociales y personales 82 45 37
Servicios a los hogares y servicio doméstico 8 - 8
Servicio de organizaciones extraterritoriales 3 2 1
Sin especificar 13 8 5
To t a l 337 201 136
Guyana
Industria manufacturera 2 2 -
Educación 1 - 1
Servicios sociales y de salud 1 1 -
Sin especificar 1 - 1
To t a l 5 3 2
(continúa...)

94
Inmigración internacional de paises amazónicos: el caso de Bolivia • Melvy Aídee Vargas Bonilla

Tabla 2 - Bolivia: Distribución de la población ocupada por rama de actividad entre los inmigrantes por país
amazónico de nacimiento
(conclusión)

País de nacimiento Sexo


Ocupación principal Total Hombre Mujer
Perú
Agricultura, ganadería, caza y silvicultura 254 162 92
Pesca 3 3 -
Explotación de minas y canteras 62 61 1
Industria manufacturera 686 542 144
Electricidad, gas y agua 14 13 1
Construcción 142 139 3
Comercio al por mayor y al por menor 1.479 1.054 425
Hoteles y restaurantes 221 111 110
Transporte, almacenamiento y comunicaciones 185 149 36
Intermediación financiera 79 58 21
Servicios inmobiliarios, empresariales y de alquiler 347 267 80
Administración pública, defensa y seguridad social 79 53 26
Educación 283 129 154
Servicios sociales y de salud 318 188 130
Servicios comunitarios, sociales y personales 423 257 166
Servicios a los hogares y servicio doméstico 212 13 199
Servicio de organizaciones extraterritoriales 16 12 4
Sin especificar 217 119 98
To t a l 5.020 3.330 1.690

Ve n e z u e l a
Agricultura, ganadería, caza y silvicultura 4 1 3
Explotación de minas y canteras 12 11 1
Industria manufacturera 7 3 4
Electricidad, gas y agua 1 - 1
Construcción 2 2 -
Comercio al por mayor y al por menor 17 9 8
Hoteles y restaurantes 6 1 5
Transporte, almacenamiento y comunicaciones 9 8 1
Intermediación financiera 8 5 3
Servicios inmobiliarios, empresariales y de alquiler 32 19 13
Administración pública, defensa y seguridad social 5 4 1
Educación 22 9 13
Servicios sociales y de salud 11 6 5
Servicios comunitarios, sociales y personales 12 6 6
Servicios a los hogares y servicio doméstico 1 1 -
Servicio de organizaciones extraterritoriales 3 1 2
Sin especificar 13 6 7
To t a l 165 92 73
Total países amazónicos
Agricultura, ganadería, caza y silvicultura 1.880 1.615 265
Pesca 16 16 -
Explotación de minas y canteras 250 231 19
Industria manufacturera 1.138 844 294
Electricidad, gas y agua 29 25 4
Construcción 348 325 23
Comercio al por mayor y al por menor 2.341 1.598 743
Hoteles y restaurantes 456 213 243
Transporte, almacenamiento y comunicaciones 454 369 85
Intermediación financiera 141 97 44
Servicios inmobiliarios, empresariales y de alquiler 652 453 199
Administración pública, defensa y seguridad social 165 106 59
Educación 599 210 389
Servicios sociales y de salud 629 306 323
Servicios comunitarios, sociales y personales 1.039 601 438
Servicios a los hogares y servicio doméstico 400 22 378
Servicio de organizaciones extraterritoriales 47 33 14
Sin especificar 550 278 272
To t a l 11.134 7.342 3.792
Fuente: INE: Censo Nacional de Población y Vivienda del 2001. Elaboración propia

95
Procesos migratorios en la Amazonía peruana: ... • Luis Limachi Huallpa

PROCESOS MIGRATORIOS EN LA AMAZONIA PERUANA:


UNA MIRADA A LAS MIGRACIONES INTERNACIONALES

Luis Limachi Huallpa1

INTRODUCCION

La Amazonía peruana constituye el 65% del territorio nacional y concentra aproximadamente un 16%
de la población peruana, con cerca de 4 millones de habitantes2. En términos político-administrativos, dentro de
este territorio están comprendidos, total o parcialmente, 400 distritos y 16 departamentos del Perú (Mapa 1).
Aunque las migraciones humanas hacia la Amazonía peruana han sido una constante desde los inicios
de la ápoca colonial, la mayor densificación poblacional de esta región se produce, fundamentalmente, en las
últimas cinco décadas, como consecuencia de las migraciones masivas provenientes de las zonas alto andinas
del Perú. Paralelo al proceso migratorio interno del país, también se aceleraron los procesos migratorios hacia
y desde el exterior del país.
El propósito del presente artículo es analizar, de manera resumida, los procesos migratorios en la
Amazonía peruana, particularmente las migraciones internacionales, en el contexto de los procesos demográficos
globales que se suscitan en el país. Las fuentes de información que sustentan el documento son: los datos
procesados de la Dirección General de Migraciones y Naturalización - DIGEMIN; los resultados de los sucesivos
censos nacionales de población desde 1940 hasta 2007; y, diversos estudios sobre la inmigración de extranjeros
hacia diversos ámbitos de la Amazonía peruana.

LAS MIGRACIONES INTERNAS EN LA AMAZONIA PERUANA

En la época colonial, las primeras migraciones a la Amazonía peruana se producen como consecuencia
de las incursiones militares y religiosas de los españoles. Aunque el flujo de migrantes en este período parece
haber sido muy limitado, se conoce que en el período colonial se fundaron alrededor de 80 centros poblados en
el territorio amazónico peruano, siendo los más importantes: Moyobamba fundada en 1539; Chachapoyas en
1566; Borja en 1634; Jeberos en 1640; Yurimaguas en 1709; entre otros (RODRIGUEZ, 1994).

1
Investigador del Instituto de Investigaciones de la Amazonia Peruana (IIAP). E-mail: llimachi@iiap.org.pe
2
Según los resultados de los Censos Nacionales 2007 (XI de población y VI de vivienda), la Amazonía peruana cuenta con 4.563.566
habitantes que corresponden a la población censada de los 400 distritos incluidos en este ámbito. 50% de la población es urbana. En la
Amazonia peruana habitan más de 300 mil pobladores indígenas, asentadas en 1.500 comunidades nativas reconocidas pertenecientes a
65 grupos étnicos y 14 familias lingüísticas. El Perú tiene una extensión de 1.285.215 km2 y una población total de 28 millones de
habitantes.

97
Migração internacional na Pan-Amazônia

Mapa 1 - Ambito de la Amazonía peruana.


Fuente: Rodríguez, 2007.

No existe información demográfica exacta para la Amazonía peruana al término de la colonia, sin
embargo, las estimaciones para la provincia de Maynas (que en esa época abarcaba gran parte de la Amazonía
peruana), indican que la población censada en 1814 oscilaba alrededor de 25 mil habitantes3. Estas estimaciones
excluyen, sin embargo, una buena proporción de población indígena que por su dispersión no ha sido registrada.
Desde la independencia del país, y en diversos períodos, el proceso migratorio a la Amazonía peruana
ha estado vinculado a: las políticas gubernamentales de incentivo a la migración y colonización; los cambios en
la dinámica económica provocados por el auge de determinados productos como el caucho, pieles y petróleo;
las políticas de descentralización administrativa y articulación vial desde la costa; y, en las últimas décadas, la
subversión terrorista, el narcotráfico y la acentuación de la pobreza en la región de sierra del Perú.

POLITICAS DE INCENTIVO DE LA MIGRACION HACIA LA AMAZONIA PERUANA EN LA EPOCA


REPUBLICANA

El poblamiento de la Amazonía peruana y el fomento de la inmigración hacia dicho territorio fue una de
las constantes de la política peruana desde los primeros años de la vida republicana del país. Con este propósito
se dictaron una serie de dispositivos legales, que se inicia con la promulgación de la Ley del 21 de noviembre de
1823 concediendo títulos de posesión gratuitos a todas las personas (sean nacionales o extranjeras) que se

3
Según el Censo de la provincia de Maynas, realizado en mayo de 1814, la población de esta provincia ascendía a 25,641 habitantes y para
1824, el cuadro de parroquias y aldeas de la prov. de Maynas estima una población de 21.210 habitantes (RODRIGUEZ, 1994).

98
Procesos migratorios en la Amazonía peruana: ... • Luis Limachi Huallpa

estableciesen en la Amazonía peruana (LARRABURRE, 2006). Después de la Ley de 1823, se promulgaron


una sucesión de 8 decretos más hasta 1909, en los que se estipulaban desde las facilidades de transporte, pago
de pasajes, donación de materiales y herramientas de trabajo, exoneraciones de impuestos, cesión de áreas
para cultivos y hábitat para los colonos, hasta el pago de onerosas primas para los introductores de colonos
extranjeros4.
Las políticas de fomento de inmigración a la Amazonía en este período, al menos en lo que respecta a
la atracción de inmigrantes extranjeros, no tuvieron los resultados esperados. Los colonos europeos que llegaron
en pequeñas proporciones colonizaron restringidas zonas de la Amazonía y muchos se quedaron en las ciudades
ya constituidas (SAN ROMAN, 1994). En cuanto a los inmigrantes nacionales, es difícil emitir un juicio valedero
en vista de que los cuatro censos nacionales del siglo que se levantaron entre 1836 y 1876 no consideraron esta
variable, y por otro lado, no se levantó ningún otro censo entre 1876 y 1940.

EL BOOM DEL CAUCHO Y LOS PROCESOS MIGRATORIOS

El primer impacto económico de grandes dimensiones en la Amazonía peruana es provocado por el


boom de la explotación del caucho. Este auge se inicia con las primeras exportaciones realizadas desde el país
en 1862 y se prolonga hasta los primeros 20 años del siglo XX. Según las referencias históricas de la época, en
las últimas décadas del siglo XIX la Amazonía peruana empezó a poblarse de gran número de puestos caucheros,
con la llegada de inmigrantes procedentes principalmente del norte del país y también extranjeros atraídos por
el afán de enriquecimiento mediante la explotación de este recurso.
La población de la Amazonía, que había permanecido casi constante en las décadas previas al boom
cauchero, empezó a crecer a tasas elevadas en las últimas décadas del siglo XIX. Así por ejemplo, entre 1862
y 1896 Amazonas y Loreto, los dos departamentos más importantes de la Amazonía peruana, incrementaron su
población en 117 y 93% respectivamente (Tabla 1). Si se tiene en cuenta que la explotación del caucho ha
significado el exterminio de numerosa población nativa, el incremento de la población es explicado principalmente
por los flujos migratorios hacia la selva en esa época.

Tabla 1 - Evolución de la población de los departamentos de Amazonas y Loreto, 1862-1896

Años Incremento (%)


Departamentos
1862 1876 1896 1862-96

Amazonas 32.562 34.284 70.676 117


Loreto 52.124 61.125 100.596 93
FUENTE: Rodríguez, 1994.

LOS ULTIMOS 100 AÑOS Y TENDENCIAS ACTUALES

Después del declive del boom del caucho a partir de 1910, la Amazonía peruana siguió recibiendo
migrantes, esta vez como consecuencia del mejoramiento de las comunicaciones entre la costa y la selva así
como por otros factores tales como: la acentuación de la pobreza y la subversión terrorista en la sierra del Perú;
el descubrimiento y la explotación del oro y el petróleo; y, el auge del cultivo de la coca en la selva alta del Perú
(ARAMBURU, 1982; MARTINEZ, 1961; 1972).

4
Los mencionados decretos se promulgaron respectivamente en los años de 1845, 1849, 1853, 1868, 1872, 1873, 1893 y 1909.

99
Migração internacional na Pan-Amazônia

Las políticas de integración vial promovidas desde el Estado peruano

Pasada la época del caucho y frente a los pocos resultados de las políticas de inmigración del siglo XIX,
las estrategias para el poblamiento de la Amazonía se apoyan en la construcción de vías de penetración de la
costa hacia la región5. Con ello, ingresan a la selva miles de campesinos y comerciantes en un proceso de
colonización espontánea y desordenada. Los focos de mayor concentración de estas migraciones son
principalmente: el área de influencia de la carretera Federico Basadre, en el departamento de Ucayali; y, los
valles del Mayo y Huallaga en el departamento de San Martín (CAPELO, 1895; BEDOYA, 1981).

La acentuación de la pobreza y la subversión terrorista en la sierra del Perú

En la década de 1980 y los primeros años de la década de los 90 del siglo pasado, la economía peruana
entró en un proceso de hiperinflación y crisis económica generalizada con el consecuente empobrecimiento de
las poblaciones rurales, particularmente de la sierra. A esto se aúna el surgimiento de la subversión terrorista,
que se inicia en la sierra y posteriormente se expande hacia Lima. Ambos procesos actuaron como factores
expulsores de la población andina del Perú, tanto hacia la costa como hacia la Amazonía peruana (ARAMBURU,
1981; MANRIQUE, 2002; VERDERA, 2000).

El descubrimiento y la explotación de los recursos minero energéticos en la Amazonía peruana

En el departamento de Madre de Dios, la explotación del oro adquiere importancia en la economía regional
desde la década del 70 del siglo pasado, atrayendo paulatinamente a miles de inmigrantes para la extracción
artesanal de este metal6. Paralelo a este proceso, desde 1970, en la parte norte de la Amazonía peruana, se inicia
la etapa de las exploraciones petroleras en las que miles de hombres son requeridos para integrar las brigadas.

El auge del cultivo de la coca en la selva alta

A partir de la década de 1980, se incrementa vertiginosamente el cultivo de la coca, provocando una


abundancia económica en las principales ciudades como Iquitos, Pucallpa y Tarapoto (SAN ROMAN, 1994).
Esto trajo una oleada de migrantes de la costa y sierra del país así como de extranjeros de diversa procedencia
hacia la región (INEI, 1995).
Es difícil establecer cuál de los factores mencionados facilitaron más los flujos migratorios hacia la
selva, pero está claro que la conjunción de todos ellos determinó la recomposición geográfica de la población
peruana desde 1940, en el que la costa y selva adquirieron paulatinamente mayor importancia demográfica,
mientras que la sierra la fue perdiendo. A este proceso, se le ha denominado como la “litoralización y selvatización”
de la población peruana (INEI, 1995). En el caso de la Amazonía, esto significó el surgimiento y consolidación
de importantes ciudades como: Iquitos y Tarapoto en la parte norte; Pucallpa y Tingo María en la parte central;
y, Puerto Maldonado en el sur. En términos porcentuales, entre 1940 y 2007, la participación de la Amazonía
en la población nacional pasó del 6.7% registrada en el censo de 1940 al 16.6% estimada a partir del censo del
2007. En este lapso, los sucesivos censos han registrado, para la selva peruana, tasas de crecimiento superiores
al promedio nacional (Figura 1).

5
En el año 1933 se aprueba el proyecto de la carretera Lima-Pucallpa que inicia su construcción en 1937, y se termina en 1943; en 1944,
se inaugura la carretera Chiclayo-Jaén; entre los años 1951 y 1952, se construye la carretera Tarma-San Ramón-La Merced; el 30 de
enero de 1960, mediante Ley Nº 13416, el Estado peruano declara de utilidad y necesidad nacional la construcción de la carretera Olmos-
Bagua-Chachapoyas-Rioja-Moyobamba-Tarapoto-Yurimaguas; en el año 1965 se concluye la construcción de la carretera Urcos-Quincemil-
Puerto Maldonado; entre los años 1968 y 1973 se construye la carretera Atalaya–Salvación–Shintuya por parte del Ejército Peruano; en
las décadas del 70 y 80 del siglo pasado se continúan con la construcción de diversos ramales de las vías principales mencionadas.
6
En los ríos Inambari y Caychive de Madre de Dios, el oro era explotado en pequeñas cantidades desde 1930, sin embargo, es a partir de
1970 que adquiere importancia exorbitante a causa de la subida de los precios internacionales de este metal.

100
Procesos migratorios en la Amazonía peruana: ... • Luis Limachi Huallpa

70.0%

60.0%

50.0%
Costa

Porcentajes
40.0% Sierra

30.0% Selva (Amazonia)

16.6%
20.0% 12.8%
9.9% 10.6%
8.7%
10.0% 6.7%

0.0%
1940 1961 1972 1981 1993 2007
Años

Figura 1 - Evolución porcentual de la población peruana según regiones naturales


(1940-2007)
Fuente: Censos nacionales de población y vivienda del Perú.

En la actualidad, algunas zonas de la Amazonía peruana, siguen siendo receptores netos de migrantes
nacionales, siendo el saldo migratorio positivo para los principales departamentos selváticos. Sin embargo, otras
zonas de esta región, se han empobrecido y son expulsores netos de población. Según los resultados del censo
del 2007 (INEI, 2007), las zonas que alimentan el flujo migratorio hacia la selva peruana son aquellas que están
articuladas por carreteras hacia esta región, tales como: Cajamarca y Piura por el norte; Huánuco, Junín y
Ayacucho por el centro; y, Cusco y Puno por el sur. Por otro lado, los departamentos de destino de los emigrantes
amazónicos son los departamentos de la costa, siendo los principales: Lima y Callo; la Libertad; Lambayeque y
Tumbes, entre otros (Tabla 2). En general, la población que llega a la Amazonia peruana proviene de la región
andina; y la población que sale de este territorio, va hacia la costa, principalmente Lima.

LOS FLUJOS MIGRATORIOS INTERNACIONALES HACIA Y DESDE LA AMAZONIA


PERUANA

En términos generales, la Amazonía peruana tiene un rol menos protagónico que la costa en los flujos
migratorios internacionales del país. En el siglo XIX, las inmigraciones internacionales hacia esta región fueron
promovidas por el propio Estado peruano, mediante intentos de colonización; posteriormente, fueron espontaneas,
inducidas por el auge de la explotación de los recursos naturales como el caucho, pieles, madera y el petróleo.

LAS COLONIZACIONES Y MIGRACIONES EXTRANJERAS EN LA AMAZONIA PERUANA DEL


SIGLO XIX

Dos casos de migración extranjera en el siglo XIX fueron importantes en el desarrollo de ciertos
sectores de la Amazonia peruana7. Estos casos fueron: las migraciones inducidas de austro-alemanes a la selva
central; y, la migración japonesa a la zona de Madre de Dios, en la parte sur de la Amazonia peruana8.

7
Se citan estos dos casos debido a las implicancias posteriores en términos económicos y culturales.
8
Además de estos casos, existen migraciones dirigidas de italianos a la zona de Chanchamayo; migraciones de ingleses a la cuenca de
Perené; de franceses a la zona de Satipo; entre otras experiencias.

101
Tabla 2 - Perú: Matriz de migración interna entre departamentos, 2002-2007.

102
Migração internacional na Pan-Amazônia

Fuente: INEI (2009), p. 130.


Procesos migratorios en la Amazonía peruana: ... • Luis Limachi Huallpa

Los inmigrantes austro-alemanes en la selva central

La inmigración austro-alemana hacia la selva central tiene sus raíces en la política de articulación de la
costa peruana con la cuenca del río Amazonas promovida por el gobierno peruano. La idea central de este
proyecto se gesta durante el gobierno del General Rufino Echenique9 y toma fuerza durante el gobierno del
presidente Ramón Castilla y consistía en la colonización de la Selva Central peruana para obtener, a través de
ella, una conexión vial multimodal entre el puerto del Callao, situado en el Océano Pacífico, y el Océano
Atlántico, pasando por el río Amazonas. Para ello, el gobierno ofrecía tierras gratuitas, además de otros beneficios,
para los colonizadores de la selva10 (HABICHER-SCHWARTZ, 2008; GALVEZ, 1872; GERBER, 2006;
PADILLA, 1971).
El promotor de la inmigración de campesinos y artesanos austro-alemanes a la selva central del Perú,
específicamente a la zona de Pozuzo, fue el noble alemán Barón Cosme Damián Freiherr von Holzhausen,
quien, el 5 de Diciembre de 1855, firmó un contrato con el presidente Ramón Castilla comprometiéndose a
traer al Perú diez mil colonos alemanes en un plazo de seis años con destino a las ciudades de Pozuzo y Mairo.
El gobierno peruano, por su parte, se comprometía a pagar los gastos de transporte y alimentación desde
Europa hasta Pozuzo; la construcción de un nuevo camino de Cerro de Pasco a Pozuzo; víveres y semillas
durante el primer semestre; pago del 30% de adelanto por persona; asignación de tierras cultivables equivalentes
a 25,5 hectáreas por cada hombre casado y 15,3 hectáreas por cada hombre soltero mayor de 15 años; así
como la propiedad definitiva de estas tierras después de dos años de explotación (SOBREVILLA, 2001;
SCHULZE SCHENIDER, 1995).
Sin embargo, el surgimiento de la guerra del Pacífico, en cuya contienda estuvieron Perú y Chile,
truncó parcialmente este proyecto. El gobierno peruano no pudo cumplir con varios de los compromisos y de la
cantidad de colonos inicialmente previstos, lograron llegar algo más de quinientos (5%).
De los 304 emigrantes que arribaron al Perú en el primer viaje, solo pudieron establecerse 165 colonos
en Pozuzo, después de haber pasado una serie de vicisitudes y sufrimientos. Posteriormente, llegarían 270
colonos más, que se establecieron al norte de Pozuzo, en la zona de Mairo. Un grupo de estos colonos, después
de algunos años, se establecieron en la zona de Oxapampa (SOBREVILLA, 2001).
Los colonos comenzaron a poblar esta zona en condiciones de extrema pobreza, aislados y abandonados.
Con el pasar del tiempo el gobierno peruano olvidó a Pozuzo, y los colonos quedaron prácticamente incomunicados.
Recién, en el primer gobierno del presidente Fernando Belaúnde Terry, a mediados de la década de 1960 (más
de un siglo después de la llegada de los colonos), se construye una carretera de acceso desde la Carretera
Central hacia Oxapampa y Pozuzo.
En la actualidad, Pozuzo y Oxapampa son dos prósperas y pequeñas ciudades donde se mantienen
muchas costumbres de origen europeo. Otras han sido perdidas parcialmente. Por ejemplo, el idioma que fue
prohibido durante la Guerra Mundial (NOVAK, 2004).

La inmigración japonesa hacia la selva de Madre de Dios

Este proceso, no obstante haberse desarrollado en la misma época, tuvo orígenes distintos a la colonización
de los valles de Pozuzo y Oxapampa. A fines del siglo XIX, la industria azucarera de la costa peruana afrontaba
problemas de mano de obra como consecuencia de la abolición de la esclavitud de negros y la disminución de
mano de obra china por enfermedades y vencimiento de contratos. Frente a este problema se buscó traer
peones japoneses (IRIE, 1951).

9
Entre los años 1851 y 1855.
10
Sin embargo, la guerra con Chile motivó un cambio de planes y desvió los presupuestos asignados para este plan a la compra de
armamentos.

103
Migração internacional na Pan-Amazônia

Los primeros inmigrantes japoneses llegaron en 1889. Posteriormente fueron llevados a las plantaciones
de azúcar de la hacienda San Nicolás en la costa norte de Lima. Pero en corto tiempo, a causa de la dureza de
los trabajos y los múltiples abusos, estalló un motín que terminó con la liberación 119 peones japoneses. De
éstos, 91 peones fueron contratados por empresarios caucheros para trabajar en la selva de Madre de Dios, en
las actividades de extracción de la Shiringa (Hevea brasiliensis).
Con el tiempo, muchos de los inmigrantes se quedaron en Madre de Dios; otros pasaron a Bolivia,
algunos murieron debido al inhóspito clima y los abusos de los patrones caucheros. Los que se quedaron en este
lugar, sufrieron la resistencia de los “huarayos”, etnia local de indígenas, que defendía su territorio. Algunos
laboraron más, en chacras al estilo feudal y lograron imponerse en este lugar; otros establecieron comercio de
telas, carpinterías, hojalatería, como también incursionando en la pesca, agricultura, avicultura, etc., demostrando
ser excelentes cultivadores de hortalizas y de arroz (STÓLZEMBACH, 1993).
Se establecieron, principalmente en las cercanías de la actual ciudad de Puerto Maldonado, como: La
Pastora; Bajo Tambopata; y, Tambopata. En la década de 1930 Jorge Mazuko se instalaba sobre la margen
derecha del rió Inambari e inicia su actividad agrícola, produciendo diversas variedades de hortalizas que luego
vendería a los campamentos mineros asentados en las playas auríferas. Al fallecer en 1942, los pobladores
pusieron a este lugar el nombre de Mazuko, donde actualmente se erige el poblado con ese nombre.
En pocos años, el número de descendientes japoneses se incrementó considerablemente, pero entre
1940 y 1945, durante el gobierno de Manuel Prado Ugarteche, muchos japoneses de Madre de Dios fueron
conducidos a Estados Unidos de Norteamérica como prisioneros de la Segunda Guerra Mundial y recluidos allí
hasta el término de la conflagración11.
En la actualidad, los descendientes de segunda, tercera y cuarta generación se destacan en la vida
social y política de Madre de Dios, siendo bastante comunes los apellidos japoneses en esta zona del Perú.
Muchos de los descendientes de japoneses emigraron a Japón durante las décadas de 1980 y 1990
aprovechando las ventajas que esta nación ofrecía para los descendientes de segunda y tercera generación.
Parte importante del desarrollo de la actividad de construcción en Puerto Maldonado en las últimas décadas,
se debe a las remesas que los inmigrantes Nisei12 y Sansei13 envían desde Japón a sus familiares radicados
en esa ciudad.

LAS INMIGRACIONES Y EMIGRACIONES RECIENTES

Ambito nacional

En las últimas cinco décadas, como consecuencia de diversos procesos suscitados en el país como: la
reforma agraria promovida por el gobierno militar de Juan Velasco Alvarado a partir de 1970; el surgimiento de
la subversión en las décadas del 80 y 90; la hiperinflación y la crisis económica generalizada a finales de la
década del 80; entre otros factores, se inicia un proceso de emigración masiva de peruanos al exterior. Se
estima que unos 3 millones de peruanos viven actualmente en el exterior (INEI, 2008), de los cuales, las dos
terceras partes han salido del país en los últimos 20 años (Figura 2).

11
Se estima que 1.800 japoneses radicados en el Perú fueron llevados, entre estos estuvieron varios inmigrantes radicados en la zona de
Puerto Maldonado (STÓLZEMBACH , 1993).
12
Descendiente japonés de segunda generación.
13
Descendiente japonés de tercera generación.

104
Procesos migratorios en la Amazonía peruana: ... • Luis Limachi Huallpa

350000
291500
300000

250000
217153
200000

150000
109771
100000
58789 58122 69110
46596 49964
37956
50000

0
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007

Figura 2 - Emigración internacional de peruanos, 1990-2007


Fuente: OIM, 2008.

A nivel del Perú, el saldo migratorio internacional es claramente negativo, dado que en el último censo
nacional (2007) se registran apenas 81,636 personas nacidas en el extranjero, lo cual constituye el 0.3% de la
población nacional y es significativamente inferior a la cantidad de peruanos residentes en el exterior estimada
en tres millones de personas.
El principal destino de los emigrantes peruanos es Estados Unidos, donde viven unos 593.165 peruanos
(equivalentes al 30,6% del total de peruanos en el exterior). Le siguen en importancia: Argentina con 271.995
(14%); España con 252.817 (13%); Italia con 199.557 (10,3%); y, Chile con 180.544 (9,3%) peruanos
(Figura 3) y los emigrantes se concentran en la edades más productivas sin diferencia significativa de sexo
(Figura 4) (OIM, 2007; OIM, 2008).

(%) 80 a más Hombre 0,4% 0,5%


30,6 Total:
75-79 Mujer 0,3% 0,4% 1688139
30
70-74 0,4% 0,7%
65-69 0,6% 0,9%
25
60-64 0,9% 1,3%
55-59 1,4% 1,5%
20
50-54 2,2% 2,7%
Grupos de Edad

14,0 45-49 3,3% 3,7%


15 13,0
40-44 4,5% 4,7%
10,3
9,3 35-39 5,7% 5,8%
10
30-34 6,7% 6,9%
25-29 7,0% 7,0%
5 3,7 3,1 2,7 2,9
2,0 1,7 20-24 6,2% 5,9%
1,4 0,8 0,7 0,6 0,6 0,4 0,4 0,4 0,4
15-19 3,7% 3,5%
0
Estados Unidos

Argentina

España

Itália

Chile

Japón

Venezuela

Bolívia

Brasil

Ecuador

Alemania

Canadá

Francia

Austrália

México

Colombia

Suíça

Suecia

Paises Bajos

Reino Unido

Otros Paises

10-14 2,1% 1,9%


is 5-9 1,8% 1,8%
0-4 1,7% 1,7%

Figura 3 - Países de destino de emigrantes peruanos, 1990-2007 Figura 4 - Pirámide de edades de los emigrantes peruanos, 1994-2007
Fuente: OIM, 2008. Fuente: OIM, 2008.

Ambito amazónico

Los procesos de migración internacional en el ámbito de la Amazonía peruana tienen similares


características a los de ámbito nacional, caracterizándose, entre otros aspectos, por el contraste abismal entre
las altas tasas de emigración y las casi nulas tasas de inmigración.

105
Migração internacional na Pan-Amazônia

Inmigraciones a la Amazonía Peruana

El censo del 2007 (INEI, 2007) reporta 7.319 personas nacidas en el extranjero que en ese año vivían
el ámbito de la Amazonía peruana (Tabla 3)14. Esto representa apenas el 0.16% de la población total censada
en este año.

Tabla 3 - Población de la Amazonia peruana, según lugar de nacimiento (2007)*

Ámbito geográfico Casos %


Extranjero 7.319 0,16
Amazonia peruana (todos los distritos) 4.032.111 88,35
Otros distritos del Perú 524.136 11,49
Total 4.563.566 100,00
Fuente: INEI, Censos Nacionales 2007.
* Estimado en base a las preguntas del censo siguientes: Cuando Ud. Nació ¿Vivía su madre en este distrito?; y, ¿En qué distrito y departamento vivía su madre?

De los inmigrantes extranjeros a la Amazonía peruana, los provenientes de países fronterizos


amazónicos (Brasil, Colombia, Bolivia y Ecuador) representan el 54% del total de extranjeros residentes en
esta región. Los europeos y norteamericanos (Estados Unidos y Canadá) representan el 22% y 9%
respetivamente (Figura 5). Los costos de desplazamiento y los flujos comerciales fronterizos parecen ser
factores importantes para la llegada de migrantes extranjeros de países limítrofes a esta región. En el caso
de Brasil, los diversos megaproyectos que se vienen madurando e implementando en la Amazonía peruana
con intervención de capitales brasileños, podría explicar parte de los flujos inmigratorios de dicho país hacia
la selva peruana15; igualmente, en el caso de Colombia, el comercio fronterizo así como las actividades
vinculadas al narcotráfico que se da en ambos países, pueden explicar la presencia de colombianos en el
territorio amazónico peruano. Los provenientes de estos dos países, representan respectivamente, el 21.87%
y 20.26% de inmigrantes extranjeros al ámbito amazónico peruano (Tabla 4).

1,624
Europa
1,382

1,601
Brasil 722

1,483
Colombia 754 SEGÚN LUGAR
DE NACIMENTO
Otros paises de 871
latinoamerica 900

Estados Unidos de 684


America y Canadá 729
SEGÚN
RESIDENCIA
Bolivia 541
279 HACE 5 AÑOS

495
Asia y Oceanía
469

Africa 20
13

Figura 5 - Inmigrantes extranjeros a la Amazonía peruana, según lugar de


nacimiento y según residencia hace 5 años, 2007
Fuente: Censos nacionales de población y vivienda 2007 (INEI, 2007).

14
La Amazonia peruana, para este estudio comprende 400 distritos correspondientes a 16 departamentos, localizados en el ámbito
geográfico del bosque tropical de la cuenca amazónica.
15
Los principales proyectos con intervención de capitales brasileños son; la Carretera Interoceánica Sur, que atraviesa el departamento de
Madre de Dios en el Sur del Perú; el correo IIRSA norte, que conecta la costa peruana con el río Amazonas; exploraciones petroleras;
proyectos hidroeléctricos, entre otros.

106
Procesos migratorios en la Amazonía peruana: ... • Luis Limachi Huallpa

Tabla 4 - Residentes extranjeros en el ámbito de la Amazonía peruana, según país de nacimiento, 2007.

País de origen Número de inmigrantes %

Brasil 1.601 21,87


Colombia 1.483 20,26
Estados Unidos y Canadá 684 9.,5
Bolivia 541 7,39
España 351 4,80
Ecuador 334 4,56
Alemania 250 3,42
Argentina 192 2,62
Francia 190 2,60
Reino Unido 157 2,15
China 156 2,13
Otros 1.380 18,86
Total 7.319 100,00
Fuente: INEI, 2007

Entre los inmigrantes extranjeros, pueden distinguirse tres tipologías ocupacionales: 1) los profesionales
calificados, provenientes principalmente de Europa y Norteamérica que están a cargo de filiales de transnacionales,
cooperantes de instituciones vinculadas a dichos países o realizando trabajos independientes; 2) los comerciantes,
conformados por los residentes asiáticos, mayormente chinos que han focalizado su residencia en la ciudad de
Iquitos; y, trabajadores poco calificados, conformados por residentes extranjeros de origen latinoamericano.
Estos últimos están, a su vez focalizados, en las zonas fronterizas respectivas a excepción de los residentes
colombianos que tiene presencia en la selva central del Perú.
En general, la Amazonía peruana, a la luz de las estadísticas, no es una zona de atracción para la
emigración extranjera, a excepción de actividades muy puntuales como la petrolera, los proyectos viales, la
extracción maderera y comercio especializado como es el caso de los chinos.

Emigraciones al exterior

La Amazonía peruana juega un doble papel en los flujos migratorios demográficos: por un lado, sigue
siendo un foco de atracción para las poblaciones pobres de la sierra del país, principalmente para la población
rural que paulatinamente se viene asentando en diversos sectores de la selva peruana; por otro lado, la Amazonía
peruana es expulsora de la población, principalmente urbana, hacia otras regiones del país y al extranjero.
En base a la información del censo del 2007 (INEI, 2007), se estima que por lo menos 177.535 personas
nacidas en la Amazonía peruana viven en el exterior16. Al igual que en el ámbito nacional, esta cifra es
abismalmente superior al número de inmigrantes extranjeros de toda la vida que apenas superan los 7.5 miles
de personas. Según las estadísticas nacionales de emigración tomadas entre 1990 y 2007, el 3% de los emigrantes
peruanos que salieron al exterior en este periodo provenía de la región amazónica. Es decir, en estos 18 últimos
años, unas 58 mil personas provenientes de la Amazonía peruana emigraron al extranjero (Tabla 5).

16
Estimado en base a la pregunta formulada en el Censo: ¿Cuántas personas que pertenecían a este hogar, están viviendo permanentemente
en otro país? Es de suponer que, esta estimación es parcial debido a que no captura a los hogares completos que emigraron, sin embargo,
es la única aproximación con que se cuenta.

107
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabla 5 - Emigración internacional de peruanos, por sexo, según departamento de última residencia, 1990 - 2007.

% sexo
Área de última residencia Absoluto %
Mujeres Hombres
Lima 603.594 31,1 48,3 51,7
Otros departamentos 1.278.998 65,9 43,9 56,1
Amazonia peruana 58.225 3,0 39,5 60,5
Total 1.940.817 100,0 45,6 54,4
Fuente: OIM, 2008.

Tal como se muestra en la Tabla 6, el 6,35% de los hogares de la Amazonía peruana tiene algún
miembro viviendo en el extranjero. En algunos departamentos, este porcentaje es mucho mayor, como es el
caso de Madre de Dios, que como se dijo en la sección anterior, en la décadas de 1980 y 1990 experimentó un
éxodo de descendientes de japoneses nacidos en dicho departamento hacia el Japón. En este departamento,
complementan también las migraciones por cuestiones laborales o estudios hacia el estado del Acre en Brasil,
lo cual es facilitado por la vinculación vial carretero entre ambos países.

Tabla 6 - Hogares con miembros en el extranjero y número estimado de emigrantes al exterior, según
departamento de origen (2007)

Departamento con Número de Número de hogares % de hogares con Número de


extensión en el ámbito hogares con algún miembro algún miembro en personas en el
amazónico en el extranjero el extranjero extranjero*
Amazonas 90.645 4.107 4,53 9.730
Apurímac 58.897 4.494 7,63 11.199
Ayacucho 36.499 2.237 6,13 7.113
Cajamarca 78.484 4.189 5,34 11.884
Cusco 64.267 3.938 6,13 9.765
Huancavelica 12.832 433 3,37 1.116
Huánuco 67.240 2.952 4,39 7.523
Junín 105.181 5.715 5,43 14.752
La libertad 345 6 1,74 6
Loreto 176.046 13.779 7,83 37.648
Madre de Dios 27.494 3.011 10,95 8.046
Pasco 25.725 1.369 5,32 3.590
Piura 20.355 754 3,70 1.545
Puno 26.488 838 3,16 1.997
San Martín 173.646 11.546 6,65 29.337
Ucayali 97.191 8.050 8,28 22.284
Total 1.061.335 67.418 6,35 177.535
Fuente: INEI, 2007.
* Estimado en base a la pregunta ¿Cuántas personas que pertenecían a este hogar, están viviendo permanentemente en otro país?

La información censal no contiene información sobre el país de destino de los emigrantes amazónicos,
sin embargo, las estadísticas de la Dirección Nacional de Migraciones del Perú (OIM, 2008), confirman que
los destinos de mayor afluencia de emigrantes peruanos son: Estados Unidos y Canadá; Europa; y Japón así
como algunos países sudamericanos como Chile, Argentina, Venezuela y Brasil.
Los motivos de emigración de los pobladores amazónicos son diversos, pero principalmente se fundamentan
en la falta de posibilidades para el desarrollo personal. En las últimas décadas, el desenvolvimiento económico
de la Amazonía peruana, no ha sido promisorio, a excepción de algunas zonas vinculadas a la producción del
oro, la coca y cultivos de exportación como café y caco. El aporte de la Amazonía peruana al producto bruto
interno (PBI) nacional ha ido decreciendo paulatinamente del 11% hasta niveles de 6,7% entre los años 1980 y
2007, concordante con ello, los indicadores sociales son bastante alarmantes, denotando altas tasas de pobreza,
desnutrición y desempleo. Este panorama, hace prever que en los próximos años, la emigración de los amazónicos
peruanos seguirá con tasas altas.

108
Procesos migratorios en la Amazonía peruana: ... • Luis Limachi Huallpa

ALGUNOS IMPACTOS DE LAS MIGRACIONES INTERNACIONALES EN LA AMAZONIA


PERUANA

Los impactos ambientales y socioeconómicos de los procesos de ocupación humana de la Amazonía


peruana han sido ampliamente documentados por diversos estudios (ARAMBURU, 1981; BEDOYA, 1981;
PERZ et al, 2002; RODRIGUEZ, 2007). En esta sección sólo esbozamos algunos impactos más visibles de las
migraciones internacionales.

APORTE CULTURAL

En las principales ciudades de la Amazonía peruana, especialmente Iquitos, el aporte cultural de los
chinos, ha sido y es importante. En la actualidad, gracias a este aporte, la gastronomía urbana de las ciudades
amazónicas peruanas ha incorporado a la comida china. Igualmente, algunas expresiones culturales de los
inmigrantes austro-alemanes en la selva central todavía se mantienen, algunas se han fusionado con las
costumbres locales, surgiendo un conjunto de expresiones particulares que constituyen la identidad de las ciudades
de Pozuzo y Oxapampa, en la selva central del Perú.

APORTE TECNOLOGICO

Este aspecto se evidencia fuertemente en la selva central con los descendientes de inmigrantes austro
alemanes del siglo XIX que han innovado las tecnología agrícolas y ganaderas en esta zona.

IMPACTO ECONOMICO

Está relacionado, principalmente, con la transferencia de remesas al país de residentes peruanos en el


extranjero. Según los reportes del INEI, en los últimos 18 años, ingresaron al país alrededor de 14 mil millones
de dólares como remesas de peruanos residentes en el exterior, beneficiando a unas 407 mil familias peruanas
(OIM-INEI, 2007). En el caso de la Amazonía peruana, unos 67 mil hogares tienen algún miembro en el
exterior, sin embargo, sólo 18.750 familias reciben remesas17. Considerando que cada familia recibe en promedio
179 dólares mensuales (OIM-INEI, 2007), el monto de estas remesas para el ámbito amazónico peruano
ascendería a 40,2 millones de dólares anuales.
Estos impactos pueden ser corroborados en cierto modo por los resultados del censo del 2007, en los
que se reporta que los hogares que tienen algún miembro viviendo en el exterior, se diferencian sustancialmente
del resto en términos de mejores viviendas, mejores accesos a los servicios, mejor equipamiento, entre otros
(Tabla 7, Figuras 6 y 7).

A MANERA DE CONCLUSIONES

En la Amazonia peruana, las migraciones internas son las que explican mayormente la densificación
poblacional de esta parte del territorio. No obstante, algunas zonas están empobrecidas y, por lo tanto, son
expulsoras de población, algunos valles de la selva alta, así como la selva sur de Madre de Dios, siguen siendo
focos de atracción para los migrantes nacionales. En general los flujos migratorios internos en la Amazonía
tiene la siguiente secuencia: Inmigración hacia la Amazonía, tiene origen en las zonas altoandinas; la emigración
desde la Amazonia peruana, tiene como destino a Lima y ciudades costeras.

17
OIM-INEI (2007), basado en la Encuesta Nacional Continua del 2006, estima que del total de familias perceptoras de remesas en el Perú
(407 mil), sólo el 4,6% de ellos vive en la región selva.

109
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabla 7 - Acceso a los servicios, equipamiento, y calidad de vivienda de los hogares de la Amazonia peruana,
según condición de miembro en el extranjero.

Hogares sin ningún Hogares con algún miembro


Características miembro en el extranjero en el extranjero
Hogares % Hogares %
Forma de abastecimiento de agua
Red pública Dentro (Agua potable) 283.482 28,52 30.902 45,84
Red pública fuera, pilón de uso público 125.206 12,60 8.675 12,87
Camión, cisterna, pozo, río, acequia 564.846 56,83 26.322 39,04
Otro 20.383 2,05 1.519 2,25

Tipo de servicio higiénico al cual acceden


Red pública dentro de la vivienda 210.734 21,2 25.642 38,0
Red pública fuera de la vivienda. 62.307 6,3 5.821 8,6
Pozo, río, acequia 495.793 49,9 26.912 39,9
No tiene 225.083 22,6 9.043 13,4

Acceso del hogar al alumbrado eléctrico


Cuenta con alumbrado eléctrico 524.950 52,8 48.979 72,6
No cuenta con alumbrado eléctrico 468.967 47,2 18.439 27,4

Equipamiento del Hogar


Hogares sin ningún equipo 259.054 26,1 11.483 17,03
Sólo tienen – Radio 348.516 35,1 15.819 23,46
Otros equipos de mayor valor 386.347 38,9 40.116 59,50

Piso de la vivienda
Tierra o madera 690.429 69,5 34.629 51,0
Cemento, loseta o similares 300.484 30,2 29.589 43,6
Otros 3.004 0,3 2.732 4,0

Material de la pared de las viviendas


Ladrillo o Bloque de cemento 207.075 20,8 23.472 34,8
Adobe, tapia, madera, quincha o similar 786.842 79,2 43.946 65,2

Energía que más utiliza para cocinar


Electricidad, gas o kerosene 268.733 27,0 30.377 45,1
Carbón, leña o similares 694.489 69,9 34.229 50,8
No cocinan 30.695 3,1 2.812 4,2

Número de habitaciones o piezas que


ocupa el hogar
2 o menos habitaciones 645.191 64,9 35.210 52,2
3 o más habitaciones 348.726 35,1 32.208 47,8
Fuente: INEI, 2007 (Sistema de consulta de datos. Censos Nacionales 2007)

80.00% 70.00%
69.72% 64,90%
70.00%
60.00%
52,20%
60.00%
50.00%
50.64% 47,80%
50.00%
45.06% Hogares sin ningun
40.00% miembro en el extranjero
Hogares sin ningun 35,10%
40.00% miembro en el extranjero
30.00%
27.04% Hogares con algun miembro
30.00%
Hogares con algun miembro en el extranjero
en el extranjero 20.00%
20.00%
10.00%
10.00%
3.24% 4.30%
0.00%
0.00%
Electricidad, gas Carbon, leña, Otro o no 2 a menos 3 o mas
o kerosene bosta, estiercol cocinan habitaciones habitaciones

Figura 6 - Tipo de energía utilizada por los hogares amazónicos, Figura 7 - Número de habitaciones de los hogares amazónicos,
según condición de miembro en el extranjero según condición de miembro en el extranjero.
Fuente: INEI, 2007. Fuente: INEI, 2007.

110
Procesos migratorios en la Amazonía peruana: ... • Luis Limachi Huallpa

En lo referente a los flujos migratorios internacionales, la Amazonía peruana presenta un contraste


significativo entre las tasas de inmigración que son bastante reducidas y las altas tasas de emigración hacia el
exterior. Los datos del censo de población del 2007, permitem estimar que por cada inmigrante extranjero a la
Amazonia peruana, emigran al exterior 23 personas. Estos datos, corroboran las desventajas de esta parte del
territorio, respecto a otras ciudades o zonas del extranjero, para el desarrollo personal de sus habitantes.
Entre los diversos impactos de los flujos migratorios internacionales en la Amazonia peruana, es importante
resaltar el envió de remesas por parte de residentes peruano-amazónicos en el exterior a familiares radicados
en la Amazonía. Los hogares amazónicos, que tienen a algún miembro residiendo en el extranjero, tienen
mejores condiciones de vivienda, mejor accesos a los servicios básicos y mejor equipamiento.
Dos retos de política surgen como consecuencia de la información presentada en el documento: 1) la
regulación de las migraciones y ocupación desordenada en los focos de auge económico temporal de la Amazonía
peruana como son las zonas cocaleras, las de extracción informal del oro, así como las zonas de expansión de
la frontera agrícola; y, 2) cubrir la demanda de las necesidades de servicios, sobre todo, asistenciales y educativos,
que en el caso de la Amazonía peruana se han estado implementando de manera más lenta en relación al
crecimiento poblacional de este ámbito.

111
Migração internacional na Pan-Amazônia

REFERENCIAS

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113
Migracion internacional en la Amazonía, Ecuador • Claudio G. León, Francisco P. Mogollón, Gabriela A. Caicedo

MIGRACION INTERNACIONAL
EN LA AMAZONIA, ECUADOR

Claudio Gallardo León1


Francisco Pérez Mogollón
Gabriela Arellano Caicedo

INTRODUCCION

El presente análisis trata de caracterizar la migración internacional de la Amazonía de Ecuador; se


presenta evidencia empírica del período de 1990 a 2007. La migración internacional puede entenderse como
una inversión de recursos (humanos, sociales y económicos) que realizan los hogares para alcanzar mejores
ingresos y oportunidades, en otro país o viceversa. En ese contexto es difícil de entender, que la región amazónica,
la más biodiversa y rica del país tenga bajos niveles de vida que motivan a sus pobladores a emigrar.

FUENTES DE DATOS

Este estudio se basa principalmente en datos de dos fuentes oficiales: (1) el VI Censo de Población y
V de Vivienda de 2001 del Instituto Nacional de Estadística y Censos (INEC) y (2) la Encuesta Nacional de
Empleo, Desempleo y Subempleo (ENEMDU) de Diciembre de 2007.

EL CENSO

El censo es realizado con dos objetivos fundamentales: (1) dotar de información sobre la magnitud,
estructura, crecimiento y distribución de la población y de sus características económicas, sociales y demográficas,
que sirva de base para la elaboración de planes generales de desarrollo y la formulación de programas y
proyectos a cargo de organismos de los sectores público y privado; y (2) determinar el volumen y características
de las unidades de vivienda en que habita la población ecuatoriana, con miras a evaluar las condiciones de vida
y los requerimientos de vivienda y servicios inherentes (INEC, 2001).

1
Técnico del Instituto Nacional de Estadística y Censos (INEC). E-mail: claudiogallardo@inec.gov.ec

115
Migração internacional na Pan-Amazônia

El censo recopila un sin número de variables económicas, sociales y demográficas que permiten evaluar
ciertos aspectos de la sociedad. El tema de la migración también fue incluido en el censo. Para este estudio se
tomaron en cuenta las siguientes variables:

• Datos de emigrantes al exterior: número, sexo, edad, año de salida, motivo de viaje, país de destino.

• Características migratorias: lugar de nacimiento, lugar de residencia habitual, tiempo de la residencia


habitual, residencia habitual hace 5 años.

LA ENCUESTA

La ENEMDU es parte del Sistema Integrado de Estadísticas de Hogares (SIEH) y constituye el


medio estadístico más importante y oportuno que dispone el país en la obtención de información estadística
social, demográfica, de infraestructura social de empleo, desempleo y subempleo, que permite elaborar los
diferentes indicadores relacionales al nivel de estas variables en la población, con el fin de que el Gobierno
cuente con indicadores que sean el insumo necesario para el diseño de políticas y ejecución de programas a
aplicarse en el país.
La ENEMDU es realizada con tres finalidades fundamentales: (1) la finalidad principal es conocer la
actividad económica y las fuentes de ingreso de la población. La información recolectada está orientada a
entregar datos de las principales categorías poblacionales en relación con el mercado de trabajo; activos (ocupados,
desocupados) e inactivos y a obtener clasificaciones de estas categorías según diversas características. También
posibilita confeccionar series temporales homogéneas de resultados. Además, al ser las definiciones y criterios
utilizados coherentes con los establecidos por los organismos internacionales que se ocupan de temas laborales,
permite la comparación con datos de otros países; (2) suministrar a las autoridades, organizaciones sindicales,
empleados y público en general, datos e indicadores sobre el empleo, desempleo y subempleo; y (3) contribuir
de manera permanente a la información de una base de datos que facilite los estudios y seguimiento de políticas
de empleo (INEC, 2008).
De la ENEMDU 2007 fue utilizada la información de la Sección 6: Migración Internacional para
caracterizar a las y los emigrantes ecuatorianos. Esa sección tiene dos partes: (A) Emigración y (B) Remesas.

Datos de emigración

El universo es constituido por todos los ecuatorianos ex – miembros de hogar que se encuentran
residiendo en el extranjero. El informante es el jefe del hogar o su cónyuge y la cobertura es nacional, urbano/
rural, regional y provincial.
El objetivo es caracterizar a los emigrantes con respecto a variables de vivienda, socio demográficas, y
económicas. Las variables investigadas son:

• Miembros del hogar que piensan migrar


• Número de miembros del hogar que viven en el extranjero
• Parentesco con el jefe de hogar
• Sexo

116
Migracion internacional en la Amazonía, Ecuador • Claudio G. León, Francisco P. Mogollón, Gabriela A. Caicedo

• Edad
• Nivel de instrucción
• Estado conyugal
• Dejan hijos menores de 18 años
• Número de hijos menores de 18 años que deja
• A que se dedicaba antes de salir del país
• Rama de actividad (país de origen y destino)
• Grupo de ocupación (país de origen y destino)
• Categoría ocupacional (país de origen y destino)
• Lugar de nacimiento y residencia emigrante antes de viajar
• País de destino: España, Estados Unidos, Italia, Resto América, Resto Europa, Asia, África, Oceanía
• Motivo de emigración
• Año de salida del país: 1960 a 2007

Datos de remesas

Estos datos se refieren a las personas que enviaron remesas en dinero proveniente del exterior.
El universo es constituido por todos las personas mayores de 18 años que en los últimos 12 meses (Diciembre
de 2006 a Noviembre de 2007) enviaron dinero del exterior. El informante es el jefe del hogar o su cónyuge.
La cobertura es nacional.
El objetivo específico es caracterizar el destino de las remesas, montos y forma de gasto. Las variables
investigadas son:

• Valor de las remesas promedio mensual enviadas por el emigrante: 0.01- 800.01 dólares y más
• Primer destino que se da a la ayuda monetaria (remesas)
• Segundo destino que se da a la ayuda monetaria (remesas)

ASPECTOS GENERALES DEL PAIS Y DE LA AMAZONIA

Para iniciar el estudio es necesario acercarse a algunas características del territorio, población y
pertenencia de las distintas jurisdicciones de la Amazonía suramericana y en este caso del Ecuador.
La República del Ecuador está ubicada al noroeste de América del Sur, limitada al norte por Colombia,
al sur y este con Perú y al oeste con el océano Pacífico. Posee cuatro regiones geográficas: Costa, Sierra,
Amazonía y Región Insular o Archipiélago de Galápagos. Tiene una extensión total de 256.730 km2. Política y
administrativamente se divide en provincias, cantones y parroquias. La Amazonía ecuatoriana se extiende a
todo lo largo del oriente del país y se compone de seis provincias que de norte a sur son: Sucumbíos, Napo,
Orellana, Pastaza, Morona Santiago y Zamora Chinchipe, cubriendo en total 115.745 km2, que corresponde a
45% del territorio nacional (Anexo 1).
Según las proyecciones de población del INEC-CELADE, al año 2008, el Ecuador tiene 13.805.095
habitantes de los cuales 679.498 pueblan la Amazonía, que corresponde a 4,9% de la población del
país (Figura 1).

117
Migração internacional na Pan-Amazônia

100
90
80
70 45
100 100
60
50
40
30 4,92
20
10
0
Población Extensión

Población Extensión

Figura 1 - Población y extensión de la Amazonía en relación al total nacional


Fuente. VI Censo de Población y V de Vivienda 2001, INEC

En las seis provincias amazónicas se encuentran 41 cantones, 43 parroquias urbanas y 142 parroquias
rurales (Tabla 1). Por su extensión las provincias con mayor territorio son Pastaza, Morona Santiago y Orellana,
las más pobladas son Sucumbíos y Morona Santiago y las mas chicas Pastaza y Zamora Chinchipe (Figura 2).

Tabla 1 - División político administrativa de la Amazonía ecuatoriana

Provincias Cantones Parroquias Urbanas Parroquias rurales

Morona Santiago 12 13 45
Napo 5 5 18
Pastaza 4 4 16
Zamora Chinchipe 9 10 21
Sucumbíos 7 7 26
Orellana 4 4 16
Total Amazonía 41 43 142
Fuente: VI Censo de Población y V de Vivienda 2001, INEC

17% 20%

14%
25%

11%
13%

Morona Santiago Napo Pastaza

Zamora Chinchipe Sucumbios Orellana

Figura 2 - Población de la Amazonía según provincias.


Fuente: VI Censo de Población y V de Vivienda 2001, INEC

118
Migracion internacional en la Amazonía, Ecuador • Claudio G. León, Francisco P. Mogollón, Gabriela A. Caicedo

El Ecuador tiene una población que va al ritmo de la tendencia latinoamericana en cuanto al proceso
de urbanización territorial y de población2. Desde el Censo de 1950 en que la población urbana constituyó
el 29%, hasta el censo de 1990 en que alcanza al 55%, en el 2001 la población urbana llega al 62%. Según
las proyecciones de población a partir del último periodo intercensal, para 2008 la población urbana constituiría
el 65.1% del total y estaría concentrada en las regiones costa y sierra donde se asientan las ciudades más
grandes del país (Figura 3).

13.805.095

14.000.000

12.000.000 8.993.796
10.000.000

8.000.000
4.811.299
6.000.000

4.000.000

2.000.000

0
TOTAL URBANA RURAL

Figura 3 - Población urbana y rural nacional.


Fuente: VI Censo de Población y V de Vivienda 2001, INEC

En la Amazonía en cambio se asientan ciudades pequeñas y su población es mayoritariamente mestiza


producto del proceso de colonización de la región. El 56.6% de la población se distribuye en las zonas dispersas
de la región y está compuesta por distintos grupos étnicos y nacionalidades (Figura 4).

679.498
700.000

600.000
384.647
500.000
294.851
400.000

300.000

200.000

100.000

0
TOTAL URBANA RURAL

Figura 4 - Población urbana y rural de la Amazonía.


Fuente: VI Censo de Población y V de Vivienda 2001, INEC

La población de la Amazonía tiene características demográficas muy similares a la de toda la Amazonía


suramericana, con una base muy amplia. La Figura 5, de población por grupos de edad en la Amazonía, muestra
una mayor aglutinación de población joven3.

2
Sobre características de la población de América Latina, ver entre otros: Feres y Mancero (2001), Lara Ibarra (2004), Leigh y D´Auberterre
(2000), Martinez (2003), CEPAL (2007), Molinas (1999).
3
Informaciones detalladas sobre la población de la Amazonía ecuatoriana se encuentran en Gallardo León (2005).

119
Migração internacional na Pan-Amazônia

80 y más

75 - 79

70 - 74

65 - 69

60 - 64

55 - 59

50 - 54

45 - 49

40 - 44

35 - 39

30 - 34

25 - 29

20 - 24

15 - 19

10 - 14

5 - 9

1 - 4

< 1 año

0 20.000 40.000 60.000 80.000 100.000

Figura 5 - Población de la Amazonía por grupos de edad, 2001.


Fuente: VI Censo de Población y V de Vivienda 2001, INEC

ASPECTOS CONCEPTUALES

Son muchas las visiones sobre los motivos que impulsan a los ecuatorianos de la Amazonía a emigrar
principalmente a otros países u otras provincias de Ecuador con un desarrollo mayor y son muchos los factores
que en ello inciden4. En este trabajo se pretende avanzar en dicho problema a través de conocer cuáles son los
factores explicativos a nivel socioeconómico de la migración en la Amazonía. Presentamos evidencia empírica
sobre la migración en la Amazonía en el período 1990 – 2007.
La teoría y evidencia hacen necesario que el análisis se realice a nivel de migración internacional y
nacional. La investigación muestra que la existencia de redes y aumento en el tiempo del flujo de emigrados
disminuye los costos asociados a la migración (capital social), incrementando así la emigración. La probabilidad
de emigrar aumenta cuando se es joven, se tiene bachillerato, no se tiene unión conyugal, y hay emigrantes en
el hogar (experiencia migratoria, redes). La migración es principalmente realizada por jóvenes con cierto nivel
educativo superior al promedio de la zona de origen, por lo que en este caso la Amazonía estaría perdiendo
capital humano.
Por tanto, la emigración es fruto de las expectativas de los hogares por maximizar su utilidad esperada
dada una acumulación de capital humano y social (redes), para aumentar su flujo de ingresos esperados en el
tiempo.
Por un lado la emigración representa una pérdida de capital humano para el Ecuador, pero por otro lado
representa un ingreso por remesas que se destinan principalmente al gasto y dinamiza la economía, aunque
poco son invertidas o ahorradas. La pregunta es: ¿qué medidas se tomarán cuando este flujo disminuya fruto de
la crisis financiera de EE. UU. y Europa y sus efectos en los próximos meses se hagan sentir?

4
Ver entre otros: El Comércio (2007), Ortiz Moya y Guerra Páez (2008), Pérez Mogollón (2008), Cevallos, Maluf y Sánchez (2004).

120
Migracion internacional en la Amazonía, Ecuador • Claudio G. León, Francisco P. Mogollón, Gabriela A. Caicedo

CONCEPTO DE MIGRACION Y SINTESIS TEORICA

Según la Organización Internacional para las Migraciones (OIM, 2008), la migración es el movimiento
que se realiza a través de fronteras nacionales o internacionales por personas que se dirigen a cualquier lugar,
por causas diferentes. Tales personas pueden ser refugiados, personas desplazadas, personas radicadas y
migrantes económicos.
Los términos inmigración y emigración se utilizan para referirse a los movimientos entre los países,
mientras que en la migración interna especifican el movimiento entre diferentes lugares de un mismo país
(POPULATION REFERENCE BUREAU, 1991). Toda persona que se moviliza desde su lugar de procedencia
a otro, posee la calidad de emigrante respecto al lugar que deja y de inmigrante respecto al lugar que llega.
Los movimientos migratorios pueden ser definitivos o temporales, voluntarios o forzados, e internos o
internacionales. Hay otro tipo de migración conocida como pendular que se refiere a los desplazamientos que
se hacen a diario entre el lugar de residencia y el de trabajo.
La migración ha sido objeto de estudio para muchos economistas que, tomando factores de otras
disciplinas como demografía y sociología, han buscado formular una explicación para este fenómeno. Los
primeros intentos ocurren a finales del siglo XIX con Ravenstein (1885, 1889) cuando enuncia su teoría de los
factores push y pull, como las condiciones que atraen y que empujan a migrar a las personas. Sin embargo los
primeros modelos teóricos de migración comienzan a mediados del siglo XX5.
Lewis (1954) explicaba el fenómeno migratorio como una consecuencia de dos sectores bien
diferenciados en la economía (el sector tradicional agrícola y el sector urbano). Suponiendo oferta de mano de
obra rural ilimitada, analizó el mecanismo por el cual un país basado en la agricultura evolucionaba a una
economía moderna. La causa de la migración que Lewis identificó fue la diferencia de salarios entre los
sectores (CARRASCO, 1998). Ranis y Fei (1961) amplían su estudio tomando en cuenta una curva de oferta
laboral ascendente y Raj y Sen (1962) continúan con el modelo añadiendo el análisis del sector externo.
El “modelo del capital humano” surge en 1962 con Sjaastad quien calcula el valor actualizado neto de la
decisión de quedarse o migrar. Suponiendo neutralidad al riesgo e información perfecta concluye que el costo
de migrar tendrá mayor peso mientras más tiempo le tome a la familia recibir la mejoría de vida (SJAASTAD,
1962); así una persona más joven o con mayores estudios será propensa a migrar (dado un mayor flujo esperado
de ingresos en el país de destino) (CARRASCO, 1998).
En 1969 Michael Todaro sigue esta línea de pensamiento pero supera la idea de mercados perfectos y
toma en cuenta el desempleo urbano (TODARO, 1969). Harris y Todaro (1970) concluyen que la decisión de
migrar depende del diferencial de los ingresos esperados basados en un análisis costo-beneficio que toma en
cuenta la probabilidad de no encontrar trabajo entre su lugar de residencia y el de destino potencial6.
Años más tarde llega la “nueva economía de la migración”, en donde el objetivo de migrar deja de verse
como una solución a un problema de maximización de beneficios y pasa a ser uno de minimización de riesgo del
ingreso esperado; además la decisión ya no se considera individual, sino como tomada por el grupo familiar; la
familia compara su situación con el grupo de referencia al que pertenece y se ubica a sí misma de acuerdo a su
“pobreza relativa” (STARK, 1993)7.

5
Sobre el tratamiento teórico de las migraciones ver entre otros: Appelyard (2003), Barron (2005), Becker (1975), Deaton (1997),
García y López (2005), Larraín y Sachs (2002), Mora y Taylor (2006), Taylor (1986).
6
Hicks (1932) es el primero en identificar que el diferencial salarial reconocía implícitamente la existencia del costo de migrar.
7
Originalmente es un concepto utilizado por sociólogos y psicólogos. Runciman (1966) dice que hay 4 condiciones para que un individuo
experimente pobreza relativa de “x”: 1.- No tiene “x”. 2.- Ve a alguien que tiene “x” 3.- Quiere “x” 4.- Considera posible a tener “x”.

121
Migração internacional na Pan-Amazônia

El modelo de red de apoyo es uno de los enfoques más recientes de la migración y se basa en la idea de
que las personas que emigraron en períodos anteriores sirven como un apoyo para los nuevos emigrantes
reduciendo así los costos de entrada y la incertidumbre, haciendo más factible la migración (MASSEY, 1993).

FACTORES IMPORTANTES PARA EL ESTUDIO DE LA MIGRACION

Se ha encontrado que en la mayoría de países existen variables que son claves en la determinación de
la migración, las cuales son:
Edad: la migración es un fenómeno más común entre los trabajadores más jóvenes. La explicación que
ofrece la teoría del capital humano es que los jóvenes tienen más posibilidades de tener un flujo de ingresos
esperado mayor, ya que su período de recuperación es mayor. Además, los jóvenes tienen menos costos sicológicos
(son aquellos asociados con la pérdida de lazos familiares, amigos y de la comunidad en donde vive el individuo)
porque es más probable que con el aumento de la edad aumenten las responsabilidades ya sea familiares o
laborales y es más difícil y costosa la decisión de irse.
Escolaridad: La relación entre escolaridad y migración es positiva, es decir, entre mayor sea el nivel
educativo del individuo mayor será la probabilidad de migrar. Un mayor nivel educativo implica una reducción
de los costos de obtención de la información de oportunidades de trabajo o estudio, y de una mayor probabilidad
de que un individuo migre ya con un trabajo seguro en el lugar de destino.
Distancia: La relación entre distancia y migración es negativa, esto implica que distancias más grandes
disminuyen los flujos migratorios porque entre mayores sean las distancias mayores son los costos de migrar.
Aunque se observa también que entre mayor sea el nivel educativo mayor será la probabilidad de incurrir en
viajes de mayor distancia (FOLGER; NAM, 1967).

LA EMIGRACION INTERNACIONAL EN ECUADOR8

El Ecuador y sus habitantes, desde los últimos 40 años del siglo XX hasta la fecha son testigos de tres
olas o procesos emigratorios. En los años 60 se identifica una peculiar y muy fuerte emigración de gente del
austro hacia los Estados Unidos de Norteamérica, especialmente hacia la ciudad de Nueva York. Este tipo de
emigración, motivada por la comercialización de artesanías y de los famosos sombreros de paja toquilla, también
se da entre los indígenas de la región de Otavalo que con sus artesanías van hacia Estados Unidos y algunos
países de Europa occidental.
En los años ochenta se presenta una nueva ola emigratoria principalmente de los habitantes de las
provincias de Azuay y Cañar; siendo básicamente de campesinos, luego vendrían procesos de reunificación
familiar propios de esa época.
La tercera ola, o “nueva ola emigratoria”, de fines de los noventa e inicios del nuevo milenio, impulsada
por la crisis del sistema financiero ecuatoriano, persistente y altísima inflación, ingreso a la dolarización y sus
secuelas de impacto (crisis social, política y económica, precios internacionales, desempleo, pérdida de los ahorros
y pensiones, tasas de interés de usura, elevado costo de la vida, etc.) prácticamente empuja y expulsa a varios
cientos de miles de ecuatorianos a buscar trabajo, mejores oportunidades y mejores ingresos en el exterior.

8
Este aparte es tomado del documento “Apuntes de migración” producido por un equipo técnico interinstitucional del Sistema Estadístico
Nacional SEN (CEIEME, 2008).

122
Migracion internacional en la Amazonía, Ecuador • Claudio G. León, Francisco P. Mogollón, Gabriela A. Caicedo

STOCK O NUMERO DE EMIGRANTES ECUATORIANOS

Con base en fuentes oficiales como INEC, Censos poblacionales, 1990 – 2001, Encuesta de Condiciones
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CELADE/Proyecciones de Población, 20049; y luego de aplicar métodos indirectos de cálculo con pruebas
para hipótesis altas y bajas, realizados por INEC, se estiman entre 1,4 y 1,6 millones de emigrantes, lo que
implica que entre 10,2% y 10,8% de la población nacional residiría en el extranjero.
Para iniciar el análisis se identifican las provincias de residencia habitual en Ecuador de las y los
emigrantes a nivel nacional. La variable indica la provincia de residencia, donde vivía el jefe de hogar al
momento de la entrevista, la misma que se le asignó a la persona emigrante que fue miembro de ese hogar. Así
la Tabla 2 da cuenta de la población total por provincia y por sexo y la contribución de cada provincia a la
emigración internacional (miembros de hogar reportados viviendo en el exterior).

Tabla 2 - Población total y miembros de hogar reportados viviendo en el exterior (emigrantes) por provincia y
sexo, 2001

Población Emigrante
Provincia Población Total (miembros de hogar en el exterior)
Hombres Mujeres Total Hombres Mujeres Total

Azuay 279.792 319.754 599.546 23.630 10.432 34.053


Bolívar 83.156 86.214 169.370 1.008 934 1.942
Cañar 95.010 111.971 206.981 12.376 5.249 17.625
Carchi 75.834 77.105 152.939 685 638 1.323
Cotopaxi 169.303 180.237 349.540 3.044 2.701 5.745
Chimborazo 190.667 212.965 403.632 6.691 5.029 11.720
El Oro 266.716 259.047 525.763 11.494 11.074 22.568
Esmeraldas 197.150 188.073 385.223 2.030 3.177 5.207
Guayas 1.648.398 1.660.636 3.309.034 39.941 49.403 89.344
Imbabura 167.818 176.226 344.044 5.405 4.514 9.919
Loja 197.595 207.240 404.835 14.526 9.676 24.201
Los Ríos 335.279 314.899 650.178 3.292 4.726 8.018
Manabí 596.502 589.523 1.186.025 7.638 8.491 16.174
Morona Santiago 57.425 57.987 115.412 4.016 1.754 5.770
Napo 40.284 38.855 79.139 401 431 832
Pastaza 31.988 29.791 61.799 800 658 1.458
Pichincha 1.167.332 1.221.484 2.388.817 50.621 48.658 99.279
Tungurahua 213.513 227.521 441.034 8.002 6.586 14.588
Zamora Chinchipe 39.662 36.939 76.601 2.673 1.598 4.271
Galápagos 10.204 8.436 18.640 115 117 232
Sucumbíos 70.139 58.865 128.995 1.033 779 1.812
Orellana 46.798 39.695 86.493 403 315 718
Zonas no delimitadas 37.788 34.800 72.588 562 547 1.109
Total 6.018.353 6.138.255 12.156.608 200.430 177.478 377.908
Fuente: INEC. Censo 2001

9
Además de los documentos citados fueron también consultados los siguientes: INEC (2003, 2007abc, 2008).

123
Migração internacional na Pan-Amazônia

El Censo de Población del 2001, conforme la Tabla 3, muestra que los mayores porcentajes de emigrantes
corresponden a las provincias de Pichincha (26,3%), Guayas (23,6%), Azuay (9%), Loja (6,4%) y El Oro (6%),
representando el 71,3% de la emigración del país; prevaleciendo los hombres principalmente en las provincias
de Azuay (11,8%), Cañar (6,2%) y Loja (7,2%), y las mujeres en El Oro (6,2%), Guayas (27,8%) y Pichincha
(27,4%). Los porcentajes presentados confirman que las provincias de la Sierra (Pichincha, Azuay, Loja y
Cañar) y de la costa (Guayas y El Oro) se caracterizan por ser las que más aportan a la emigración internacional.

Tabla 3 - Provincias de residencia habitual del emigrante (%).

Provincias Total Hombres Mujeres

Azuay 9,0 11,8 5,9


Bolívar 0,5 0,5 0,5
Cañar 4,7 6,2 3,0
Carchi 0,4 0,3 0,4
Cotopaxi 1,5 1,5 1,5
Chimborazo 3,1 3,3 2,8
El Oro 6,0 5,7 6,2
Esmeraldas 1,4 1,0 1,8
Guayas 23,6 19,9 27,8
Imbabura 2,6 2,7 2,5
Loja 6,4 7,2 5,5
Los Ríos 2,1 1,6 2,7
Manabí 4,3 3,8 4,8
Morona Santiago 1,5 2,0 1,0
Napo 0,2 0,2 0,2
Pastaza 0,4 0,4 0,4
Pichincha 26,3 25,3 27,4
Tungurahua 3,9 4,0 3,7
Zamora Chinchipe 1,1 1,3 0,9
Galápagos 0,1 0,1 0,1
Sucumbíos 0,5 0,5 0,4
Orellana 0,2 0,2 0,2
Zonas no Delimitadas 0,3 0,3 0,3
Total 100,0 100,0 100,0
Fuente: INEC. Censo 2001

Como puede verse, la estructura de la Tabla 3 guarda proporción con el tamaño de la población de cada
una de las provincias. Por ello es necesario acudir a tasas específicas donde el denominador es solamente la
población de la provincia. Esta variable muestra el porcentaje de emigrantes en cada provincia respecto a su
población total, permitiendo disponer de información de emigrantes al interior de cada provincia.
Según el Censo de Población del 2001, al considerar las poblaciones provinciales y el número de
emigrantes en cada una de ellas, se observa que entre las cinco provincias con mayores tasas específicas de
expulsión de migrantes: Cañar (8,5%), Loja (6,0%), Azuay (5,7%) Zamora Chinchipe (5,6%) y Morona Santiago
(5,0%), dos son de la Amazonía (Morona Santiago y Zamora Chinchipe) (Tabla 4). Con respecto a los hombres
estas mismas provincias se mantienen en los primeros lugares de emigración y respecto a las mujeres aparecen
como provincias más expulsoras Cañar, El Oro, Loja, Pichincha y Zamora Chinchipe.

124
Migracion internacional en la Amazonía, Ecuador • Claudio G. León, Francisco P. Mogollón, Gabriela A. Caicedo

Tabla 4 - Tasas específicas de emigración internacional por provincias de residencia habitual de los emigrantes

Provincias Total % Hombres% Mujeres%

Azuay 5,7 8,4 3,3


Bolívar 1,1 1,2 1,1
Cañar 8,5 13,0 4,7
Carchi 0,9 0,9 0,8
Cotopaxi 1,6 1,8 1,5
Chimborazo 2,9 3,5 2,4
El Oro 4,3 4,3 4,3
Esmeraldas 1,4 1,0 1,7
Guayas 2,7 2,4 3,0
Imbabura 2,9 3,2 2,6
Loja 6,0 7,4 4,7
Los Ríos 1,2 1,0 1,5
Manabí 1,4 1,3 1,4
Morona Santiago 5,0 7,0 3,0
Napo 1,1 1,0 1,1
Pastaza 2,4 2,5 2,2
Pichincha 4,2 4,3 4,0
Tungurahua 3,3 3,7 2,9
Zamora Chinchipe 5,6 6,7 4,3
Galápagos 1,2 1,1 1,4
Sucumbíos 1,4 1,5 1,3
Orellana 0,8 0,9 0,8
Zonas no Delimitadas 1,5 1,5 1,6
Total 3,1 3,3 2,9
Fuente: INEC. Censo 2001

AÑO DE SALIDA DE LOS EMIGRANTES

Según la ENEMDU de diciembre 2006, 59,4% de los hombres y 60,9% de las mujeres emigrantes
salieron del país en el periodo 2000-2004 superando en mucho los porcentajes de salida en el periodo anterior
(1995-1999), confirmando así que la mayor salida de población para el exterior se da durante el período de
2000-2004, siendo los porcentajes de salida semejantes para mujeres y hombres (Figura 6).

70,0
60,0 59,4 60,9
60,0

50,0
PORCENTAJE

40,0

30,0
16,9 17,1
20,0 16,8 12,3 12,6
12,4
7,0
4,0 6,3
10,0 3,9 5,5
3,8
0,0 0,0 0,1 0,3 0,4 0,2
0,0

1960-1969 1970-1979 1980-1989 1990-1994 1995-1999 2000-2004 2005 y más

NACIONAL HOMBRES MUJERES

Figura 6 - Período de salida del emigrante.


Fuente: INEC. ENEMDU Diciembre 2006

125
Migração internacional na Pan-Amazônia

PAIS DE DESTINO DE LA POBLACION EMIGRANTE

La Tabla 5 muestra el país al que emigraron las personas que salieron del Ecuador. Cabe señalar que la
ENEMDU 2006 proporciona información del país en el que vive actualmente la persona emigrante. El principal
país de destino de los y de las emigrantes es España con datos que sobrepasan el 47% del total de emigrantes,
seguido por Estados Unidos (36,6%) e Italia (8,2%).

Tabla 5 - País de destino del emigrante (%)

País de destino Total Hombres Mujeres

España 47,0 45,1 49,4


Estados Unidos 36,6 40,7 31,5
Italia 8,2 5,3 11,8
Resto América 4,7 5,3 3,9
Resto Europa 3,4 3,5 3,4
Asia 0,1 0,2 0,0
No Informa/No sabe 0,0 0,0 0,0
Total 100,0 100,0 100,0
Fuente: INEC. ENEMDU Diciembre 2006

Con referencia al sexo, las emigrantes se encuentran mayormente concentradas en Italia, superando en
el doble el porcentaje de hombres emigrantes radicados en ese país. Por otro lado en Estados Unidos, hay una
mayor presencia de emigrantes hombres, mientras que en España la población emigrante femenina es ligeramente
mayor que la masculina.

LA MIGRACION INTERNACIONAL EN LA AMAZONIA ECUATORIANA

CARACTERISTICAS DEL POBLAMIENTO DE LA AMAZONIA

La población urbana de la Amazonía se concentra en las pequeñas ciudades capitales de provincia y


algunas más pequeñas aún; las cuales han tenido procesos variados de urbanización. Las provincias de Sucumbíos
y Orellana, fueron creadas en la década de los 80 y 90 respectivamente, al calor del crecimiento poblacional de
Lago Agrio (Nueva Loja), capital provincial de Sucumbíos, que fue el centro inicial de la administración para la
explotación petrolera iniciada en 1974. De la misma manera, Orellana debe su provincialización y crecimiento
poblacional a causa de la mencionada explotación del petróleo.
Por otro lado, estas dos provincias en los últimos años afrontan un problema de inmigración de desplazados
por la violencia a causa del conflicto político militar de la vecina Colombia, generándose problemas de disputa
de tierras y trabajo; más aún, se disputa la pobreza, ya que paradójicamente, estas provincias productoras de
petróleo están entre las provincias más pobres del país.
Adicionalmente, las provincias amazónicas fronterizas del sur, sufrieron constantemente los efectos de
los choques armados de los ejércitos del Ecuador y Perú, cuya paz se logró recién en 1999, por lo que tienen
extensas zonas sembradas de minas personales que no han podido ser desactivadas en su mayoría, constituyendo
un peligro constante para la población de esas zonas.
Una constante regional es que la Amazonía fue poblada por oleadas migratorias de colonos que reclamaron
tierras para la explotación agrícola y ganadera, lo que trajo aparejada la explotación maderera y la consecuente
deforestación de la selva amazónica, como efecto de la extensión de su frontera agrícola.

126
Migracion internacional en la Amazonía, Ecuador • Claudio G. León, Francisco P. Mogollón, Gabriela A. Caicedo

El otro sector de la población se constituye de grupos indígenas nativos de la región los que se distribuyen
en varias nacionalidades y pueblos, los que numéricamente son pocos en relación a la población mestiza, pero
representan la diversidad cultural de la región y del país.

CARACTERISTICAS DE LA MIGRACION INTERNACIONAL

Se analizará el fenómeno de los flujos migratorios en la Amazonía en base de los dominios del módulo
de migración10 de la ENEMDU de 2007 y del VI Censo de Población y V de Vivienda de 2001. Una limitación
importante es que ni el Censo ni la ENEMDU recogen información acerca de hogares de los cuales han
emigrado todos sus miembros.

La inmigración internacional

La Amazonía del Ecuador como la de los demás países, por su biodiversidad y atractivo turístico,
climático y étnico - además de riqueza petrolera- también es fuente de atracción de inmigrantes europeos y
norteamericanos. Adicionalmente, por su condición fronteriza recibe una gran inmigración de pobladores de
Colombia y, en proporción mucho menor, de Perú (Figura 7).

Figura 7 - Principales corrientes inmigratorias a la Amazonía.


Fuente. VI Censo de Población y V de Vivienda 2001 INEC.

10
Ver especificaciones técnicas de la ENEMDU, Diciembre 2007.

127
Migração internacional na Pan-Amazônia

Los mayores flujos de personas a la Amazonía vienen de Colombia, el país vecino (Figura 8). La mayor
cantidad de colombianos está en la provincia de Sucumbíos, por el hecho de ser la provincia fronteriza. Una
gran proporción de colombianos se encuentra en calidad de refugiados en el Ecuador. Después de Colombia,
Estados Unidos, Perú y España son los mayores emisores de personas a la Amazonía, pero con mucho menos
cantidad. Los estadounidenses vienen con el interés de trabajar en las petroleras ubicadas en la Amazonía o de
ubicarse en centros de investigación científica de los parques naturales de la región. El comportamiento de la
frontera sur, es similar al de la frontera norte; en la provincia de Zamora Chinchipe, ciudadanos/as del Perú
llegan en busca de mejores oportunidades de vida y trabajo.

Colombia 5330

Estados Unidos 271

Peru 106

España 116

América Latina 228

Europa 183

Asia 68

Oceania 12

0 1000 2000 3000 4000 5000 6000

Figura 8 - Inmigración internacional a la Amazonía.


Fuente: VI Censo de Población y V de Vivienda 2001 INEC.

La emigración internacional

Como contraparte, la población de la Amazonía – que en buena parte es producto de la migración


interna por la colonización, adjudicación de tierras y los ingresos de la explotación petrolera- por sus contactos
con las personas de sus provincias de origen también han optado por la emigración internacional en busca de
mejoras en las condiciones de trabajo e ingresos.
El destino preferido de la migración de las provincias amazónicas australes fue Estados Unidos de
Norteamérica, siguiendo la tradición de las provincias australes vecinas de la región andina (Azuay y Cañar);
sin embargo este polo de atracción cambió a España fundamentalmente en la oleada migratoria del año 2000 en
adelante. El 57% de los migrantes se dirigen a España y el 30% a USA, el resto de países tiene porcentajes
menores (Figura 9).
El comportamiento de los emigrantes de la Amazonía es similar a los emigrantes a nivel nacional,
presentando una mayor expulsión de personas a España, Estados Unidos e Italia (Figura 10). La provincia
con mayor número de personas emigrantes a Colombia es Sucumbíos, por ser la provincia fronteriza
(Figura 11). Las personas que salen del país, lo hacen principalmente por buscar mejores plazas de trabajo
que les permita sustentar a sus familias, a pesar de que existen otras razones de emigración, el trabajo es la
principal motivación.

128
Migracion internacional en la Amazonía, Ecuador • Claudio G. León, Francisco P. Mogollón, Gabriela A. Caicedo

Figura 9 - Destino de la emigración de la población amazónica.


Fuente. VI Censo de Población y V de Vivienda 2001 INEC

371 223 344 261


590

8214
4341

España
Estados Unidos
Italia
Colombia
Resto de América
Resto de Europa
Resto del Mundo

Figura 10 - Países de destino de la emigración de la Amazonía, 2001.


Fuente: VI Censo de Población y V de Vivienda 2001 INEC.

129
Migração internacional na Pan-Amazônia

Orellana

Sucumbíos

Zamora Chinchipe

Pastaza

Napo

España
Estados Unidos
Italia
Morona Santiago
Colombia
Resto de América
Resto de Europa
0 20 40 60 80 100 Resto del Mundo

Figura 11 - Emigración por provincia según país de destino.


Fuente: VI Censo de Población y V de Vivienda 2001 INEC.

Es importante observar que a diferencia del mayor porcentaje de migrantes mujeres a España que se
muestra a nivel nacional, en la Amazonía es clara la mayor migración de hombres. En parte este fenómeno
debe explicarse por los comportamientos demográficos de la población misma: en la Amazonía se alcanzan
niveles altos del índice de masculinidad que van desde 104 a 117 hombres por cada cien mujeres (Tabla 6).

Tabla 6 - País de destino de los emigrantes de la Amazonía por sexo.

País de destino Total Hombres Mujeres Total %

España 8214 4822 3392 57


Estados Unidos 4341 3239 1102 30
Italia 590 248 342 4
Colombia 371 266 105 3
Resto América 223 128 95 2
Resto Europa 344 178 166 2
Resto do mundo 261 153 108 2
Total 14344 9034 5310 100
Fuente. VI Censo de Población y V de Vivienda 2001 INEC.

Se puede observar que el rango de edades de las personas emigrantes es de 15 a 44 años, lo que
concuerda con los principales motivos de migración que son de residencia y trabajo (Figura 12). Los padres
salen a buscar nuevas oportunidades para sustentar a sus familias. Aunque la proporción de jóvenes emigrantes
es elevada, es importante considerar que su principal motivo de migración son los estudios en el marco de la
reagrupación familiar.
El motivo fundamental de la migración no cambia tanto para la inmigración como para la emigración:
mejorar los ingresos del trabajo en busca del bienestar familiar. Los datos muestran que los motivos “trabajo y
residencia”, suman el 83%, vale decir que el tema de residencia tiene algunas variantes como reagrupación
familiar que tiene detrás el funcionamiento de las redes que permiten ubicar “trabajos” para hijos hermanos
etc., con trámite de residencia, solo en caso de niños es que se trata de reagrupación familiar en su más estricto
sentido (Figura 13).

130
Migracion internacional en la Amazonía, Ecuador • Claudio G. León, Francisco P. Mogollón, Gabriela A. Caicedo

Figura 12 - Grupos etarios de las personas emigrantes.


Fuente: VI Censo de Población y V de Vivienda 2001 INEC.

Figura 13 - Motivos de la emigración.


Fuente: VI Censo de Población y V de Vivienda 2001 INEC.

Hay que considerar, sin embargo, una limitación en la fuente de información. La pregunta del censo fue
“A partir de noviembre de 1990, ¿una o más personas de las que fueron miembros de este hogar viajaron
a otro país y todavía no retornan?” Las informaciones son por consiguiente indirectas; se trata de lo que
declararon los familiares que fueron objeto del censo nacional sobre los miembros del respectivo hogar que
emigraron. Para no perder declaraciones se aceptaron diversos motivos distintos al trabajo para salir del país.
Para el caso de turismo, fue declarado que los miembros del hogar emigrantes se fueron de turismo pero se
quedaron trabajando. Lo que se pierde definitivamente son las declaraciones sobre hogares cuya totalidad de
miembros emigraron, sea por reagrupación familiar u otros motivos, y que por lo tanto, no quedaron miembros
en el país que pudieran dar las informaciones solicitadas.
Con relación al año de salida, en la Figura 14 se puede apreciar un crecimiento constante de la emigración,
principalmente de hombres. Los años de mayores corrientes emigratorias de la Amazonía son 1999, 2000 y
2001; esto se debió fundamentalmente a la crisis económica que vivió el país. Sin duda esta crisis desató una
gran ola de emigración a nivel nacional.

131
Migração internacional na Pan-Amazônia

35,00 31,20

30,00
25,56
23,35
25,00
19,94

20,00 16,66
14,30
15,00 11,25
10,28 9,06
8,90
10,00 6,32
4,50 5,10
2,78 2,98 3,97
5,00 1,72 2,12

0,00
1996 1997 1998 1999 2000 2001

Amazonía Hombres Mujeres

Figura 14 - Año de salida del país de la persona emigrante de la Amazonía.


Fuente: VI Censo de Población y V de Vivienda 2001 INEC.

Algunos elementos analíticos actualizados de la emigración de la Amazonía

A continuación algunos elementos elaborados con información de la Encuesta ENEMDU de diciembre


2007. Uno de los temas fundamentales es conocer la actividad que desarrollaba en el país la población
emigrante, esto puede, como se ve, desmitificar el supuesto de que los emigrantes no tenían trabajo en el país
y que por eso emigraron. En realidad sucede lo contrario, migra principalmente una mano de obra que estaba
trabajando en el Ecuador y que por tanto tiene alguna destreza productiva, lo que significa una pérdida de
mano obra para el país (Figura 15).

16%

25% 59%

Trabaja Estudia Ni estudia, ni trabaja

Figura 15 - Actividad que tenían en Ecuador los emigrantes de la Amazonía.


Fuente: ENEMDU, Diciembre 2007.

Confrontando esas cifras con la actividad en el destino (Figura 16), los emigrantes que “no trabajaban
ni estudiaban” en Ecuador son el 16%, en cambio en el país de destino esta población es de solamente 2,5%, lo
que indica la falta de mejores oportunidades en la Amazonía como uno de los factores para emigrar. El 59% de
los emigrantes de la Amazonía, estaban trabajando antes de emigrar, y en el país de destino 94,1% trabaja.

132
Migracion internacional en la Amazonía, Ecuador • Claudio G. León, Francisco P. Mogollón, Gabriela A. Caicedo

3,5% 2,5%

94,1%

Trabaja Estudia Ni estudia, ni trabaja

Figura 16 - Actividad de los emigrantes de la Amazonía en el país de destino.


Fuente: ENEMDU, Diciembre 2007.

En el destino, las destrezas laborales muchas veces se inutilizan y los migrantes deben absorber los
trabajos disponibles en el mercado europeo o norteamericano, como única fuente de ingresos posible en esos
países. Comparando la actividad económica del emigrante en Ecuador (Figura 17) y la actividad económica
ejercida en el país de destino (Figura 18), se nota que los emigrantes de la Amazonía ejercían en Ecuador
principalmente actividades del sector de la agricultura (27,3%) y en el país de destino ingresan principalmente
a los sectores de la construcción (47,6% ) y Comercio (16,2%). Esos números indican que los emigrantes de la
Amazonía calificados para otras actividades económicas (77,2%), trabajan en el exterior como trabajadores no
calificados (48,0%).

Enseñanza 8,9
Administr pública y defensa seguridad social 8,9
Transporte, almacenam. y comunicaciones 5,6
Comercio, reparac. vehíc. y efect. personales 4,6
Construcción 6,5
Industria manufacturera 19,2
Explotación de minas y canteras 19,0
Agricultura,ganadería y caza 27,3

0 5 10 15 20 25 30

Porcentaje

Figura 17 - Actividad económica en Ecuador del emigrante de la Amazonía.


Fuente: ENEMDU, Diciembre 2007

Otras activ comunit sociales y personales 2,4


Transporte, almacenam. y comunicaciones 2,2
Hoteles y restaurantes 12,2
Comercio, reparac. vehíc. y efect. personales 16,2
Construcción 47,6

Industria manufacturera 11,2

Agricultura,ganadería y caza 8,2

0 10 20 30 40 50

Porcentaje

Figura 18 - Actividad económica en el país de destino del emigrante de la Amazonía.


Fuente: ENEMDU, Diciembre 2007

133
Migração internacional na Pan-Amazônia

Como se constata, la actividad económica que desarrollan los emigrantes en el país de destino, no se
compagina con la que desarrollaban en el Ecuador. Sin embargo la adaptabilidad de los migrantes permite que
estos asuman las tareas concernientes a la demanda de trabajo de los países receptores, generalmente en
trabajos que las personas de esos países no realizan, dejándolos para mano de obra migrante.
Por grupos de ocupación, los emigrantes de la Amazonía no calificados representaban el 22,8% en
Ecuador, pero en el exterior los trabajadores no calificados representan el 48%; o sea que la mayoría de
migrantes se emplean en el exterior en trabajos que exigen baja o ninguna calificación (Figura 19). Es notorio
el peso de operadores e instaladores de maquinaria (obreros) en Ecuador (26,6%) en relación a su baja
proporción en el exterior (5,5%), al igual que empleados de oficina y trabajadores agrícolas calificados. Este
traspaso de ocupación indica una menor condición de trabajo en el exterior a pesar de una “mejor” remuneración
por el mismo.

60 50 40 30 20 10 0 10 20 30 40

Figura 19 - Grupo de ocupación de emigrantes de la Amazonía en el país de destino y en el Ecuador.


Fuente: ENEMDU, Diciembre 2007

La Figura 20 revela la importancia de las redes sociales en el proceso migratorio. Las primeras
emigraciones de los hogares de la Amazonía se dieron en su grande mayoría en el período 1990-1999 (33,8 %
del total en comparación a la migración dada luego de la primera: 1,3%); y se nota que en el período siguiente
(2000-2007), los hogares que experimentaron una primera migración lo hicieron en una proporción igual al
periodo anterior (33,8%). Lo significativo, sin embargo, es que en este último período aumentó grandemente la
proporción de hogares con experiencia migratoria luego de la primera (31,2%). Esta última constatación verifica
el impacto de la crisis económica de 1999 y el efecto de las redes sociales.

Figura 20 - Migración y experiencia migratoria (1990-2007)


Fuente: ENEMDU, Diciembre 2007.

134
Migracion internacional en la Amazonía, Ecuador • Claudio G. León, Francisco P. Mogollón, Gabriela A. Caicedo

En migración la velocidad de la misma tiene que ver con la duración de los ciclos. En el caso de los
pobladores de la Amazonía se muestra una movilidad muy acelerada, la mayor en el país. Como se percibe en la
Figura 21, el tiempo promedio de salida de los emigrantes de la Amazonía es de 4 años, o sea el ciclo de salida más
corto a nivel nacional, por tanto el proceso de emigración en la Amazonía es más acelerado que en el resto del país.

Figura 21 - Tiempo promedio de salida de los emigrantes.


Fuente: ENEMDU, Diciembre 2007

MIGRACION Y REMESAS

En cuanto al envío de remesas se observa que el promedio de remesas es de 200 a 500 dólares, con
frecuencia mayor de 1 a 3 veces por año; sólo el 30,2% realiza remesas mensuales (12 veces al año o más), la
mayoría lo hace menos de seis veces por año (60%) (Figura 22). El porcentaje de migrantes que envía 200 dólares
por remesa o más es de 56,4%, el resto envía menos de esa cantidad (Figura 23). Las cifras de menos de 100 dólares
(22%), pueden deberse a la frecuencia y al destino dado a la remesa (debe ser mensual y para consumo corriente).

Figura 22 - Frecuencia de envío de remesas.


Fuente: ENEMDU, Diciembre 2007

Figura 23 - Valor de las remesas (2006 – 2007).


Fuente: ENEMDU, Diciembre 2007.

135
Migração internacional na Pan-Amazônia

Estas remesas son por tanto de dos tipos: unas con carácter permanente mensual o bimensual; y otras
más esporádicas que seguramente son de mayor monto y con intenciones de inversión en construcción de
vivienda, pequeños negocios etc. De cualquier manera, la economía de la zona se alimenta en parte de las
remesas vía consumo y menor porcentaje vía inversión (Figura 24). Las tres cuartas partes de los envíos se
destinan al gasto corriente, es decir, alimentación, educación, salud, vivienda, etc., mientras el 21,9% de ellos se
destinan a la inversión y muy poco al ahorro. O sea falta de parte de las familias receptoras y de los entes
financieros la captación de esos fondos para inversión de largo plazo.

Figura 24 - Uso o destino de las remesas


Fuente: ENEMDU, Diciembre 2007.

Finalmente, analizando la relación entre remesas y emigración a nivel nacional puede identificarse el
beneficio económico que puede recibir una zona por efecto positivo de la migración. La emigración de la
Amazonía constituye 3,9% de la emigración del país, pero la región recibe 5,7% del total de las remesas hechas
por los emigrantes (2007) (Mapas 1 y 2). En este sentido las provincias amazónicas de Morona Santiago y
Pastaza estarían beneficiándose del proceso, presentando la primera 1,5 % de la emigración y 4,0% de las
remesas y la segunda 0,4% de la emigración y 0,6% de las remesas. A nivel nacional las provincias que
presentan una mayor relación entre el porcentaje de remesas y porcentaje de recepción de remesas son Morona
Santiago (2,7)11, Cañar (2,6), Azuay (2,0), Loja (1,8), Pastaza (1,5), Chimborazo (1,3) e Imbabura (1,1) y las que
presentaron las menores relaciones son Zamora Chinchipe (0,8), Esmeraldas (0,5), Orellana (0,5), Sucumbios
(0,2) y Galápagos (0,0). Esto implica, como ya se dijo, una considerable inyección de dinero fresco a la
economía de algunas provincias, inclusive en la Amazonía12.
Pero la emigración también genera diversos impactos negativos. Por ejemplo, la separación de los miembros
de los hogares, trae serias consecuencias negativas en lo que se refiere al desarrollo infantil ya que la mayoría
de emigrantes tiene hijos menores que se quedan en el país a los cuidados de uno solo de los padres, de los
abuelos o de otras personas familiares o no.

11
Porcentaje de emigrantes dividido por el porcentaje de remesas. En el Caso de Morona Santiago, 4,0/1,5=2,7.
12
Para ampliar el análisis sobre remesas consultar entre otros: Romero Sánchez (2004) y los Boletines mensuales, notas técnicas e
información de remesas, disponible en el sitio web del Banco Central del Ecuador (www.bce.fin.ec).

136
Migracion internacional en la Amazonía, Ecuador • Claudio G. León, Francisco P. Mogollón, Gabriela A. Caicedo

Mapa 1 - Mapa político del Ecuador.


Fuente: División política administrativa en base al VI Censo de Población y V de Vivienda 2001, INEC

Mapa 2 - Porcentaje de población total, emigración internacional y remesas, por provincias.


Fuente. Información remesas BCE, VI Censo de Población y V de Vivienda 2001 INEC.

137
Migração internacional na Pan-Amazônia

CONCLUSIONES

Del estudio realizado puede concluirse lo siguiente:

1. Las condiciones sociales y económicas de la población de los países pobres y en especial de zonas
económicamente deprimidas, refuerzan la “necesidad” de migrar de miembros del hogar en busca
de mejores oportunidades laborales.
2. Las remesas constituyen una inyección de recursos frescos a las economías locales cuando existe
repatriación de divisas.
3. Las remesas no se invierten, en su mayoría se destinan al consumo corriente.
4. El desmembramiento familiar constituye un problema social por la crianza de los hijos de los
migrantes.
5. La existencia de experiencia migratoria en el hogar aumenta las probabilidades de que otra persona
del hogar decida emigrar (Capital Social).
6. En términos específicos, la Amazonía ecuatoriana recibe migración de población de países vecinos
como Colombia y Perú.
7. Las corrientes emigratorias internacionales tienen como destino principalmente España, Estados
Unidos e Italia.
8. La provincia amazónica con mayor tradición y volumen de emigración internacional es Morona
Santiago.

138
Migracion internacional en la Amazonía, Ecuador • Claudio G. León, Francisco P. Mogollón, Gabriela A. Caicedo

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140
Migracion internacional en la Amazonía, Ecuador • Claudio G. León, Francisco P. Mogollón, Gabriela A. Caicedo

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HISTORIA ACTUAL. www.historia-actual.com

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141
Migração internacional na Pan-Amazônia

Anexo 1 - Provincias amazónicas del Ecuador

Fuente: Geografía Estadística, INEC.

Fuente: Geografía Estadística, INEC.

142
Migracion internacional en la Amazonía, Ecuador • Claudio G. León, Francisco P. Mogollón, Gabriela A. Caicedo

Fuente: Geografía Estadística, INEC.

Fuente: Geografía Estadística, INEC.

143
Migração internacional na Pan-Amazônia

Fuente: Geografía Estadística, INEC.

Fuente: Geografía Estadística, INEC.

144
Migración internacional en la Amazonia colombiana: aportes del censo de población 2005 • Oscar Sandino

MIGRACION INTERNACIONAL EN LA AMAZONIA


COLOMBIANA: APORTES DEL CENSO DE POBLACION 2005

Oscar Sandino 1

INTRODUCCION

La migración desde y hacia la Amazonía colombiana ha sido un proceso de larga duración que ha tenido
impacto definitivo en el anillo de poblamiento amazónico. Sabemos, gracias a anteriores investigaciones, que
sus orígenes recientes están ligados a la explotación del caucho en la primera mitad del siglo XX y que de allí en
adelante ha tenido un comportamiento bastante variable, generalmente atado a actividades de economía extractiva.
El estudio de las migraciones en la región, sin embargo, ha sido escaso por cuanto las fuentes de información
con las que se ha contado en el pasado, y al parecer en el presente también, son insuficientes para dar cuenta
de la dinámica del fenómeno. Los trabajos de Camilo Domínguez y Augusto Gómez han sido los más visibles en
la materia y han marcado el camino para la investigación en el tema a través de aportes metodológicos y
conceptuales de la región, sus dinámicas generales y sus dinámicas poblacionales en particular. Además de
ellos, el Instituto de Investigaciones Científicas Amazónicas - SINCHI - ha adelantado investigaciones de alto
nivel con toda una serie de publicaciones sobre la población de la región.
La revisión de la evolución a través del tiempo de las dinámicas de la migración nos revela diversos
matices del fenómeno. A pesar de unos primeros procesos inmigratorios identificados tan temprano como el
siglo XVII y XVIII, es durante el siglo XX cuando la región se consolida como un importante receptor de
población, gravitando esta inmigración en torno al anillo de poblamiento amazónico. En época más reciente
(última década del siglo XX y lo corrido del siglo XXI) la región ha estado sometida a fuertes movimientos
migratorios que han alterado rápidamente la tendencia pasada, convirtiendo a la región en un expulsor neto de
población. Frente a este fenómeno un grupo de fuentes de información nos ofrece algunas respuestas, por lo
menos en cuanto a volumen y características de las migraciones, siendo a nuestro juicio el último Censo General
de Población 2005 - CGP- aquel que podría ofrecer las mejores respuestas.
A primera vista el CGP 2005 permitiría, por el carácter de las preguntas, hacerse una buena aproximación
al tema, aunque son bien conocidas las limitaciones en términos de cobertura de la información y en particular
hemos experimentado problemas al utilizar variables como lugar de nacimiento con desagregación municipal.
Sin embargo se trata de la fuente oficial para muchos temas de población en el país y por su alcance hace
necesaria la revisión de sus resultados.

1
Facultad de Ciencias Sociales y Humanas. Universidad Externado de Colombia. E-mail: oscarsandino@hotmail.com/
oscar.sandino@gmail.com.

145
Migração internacional na Pan-Amazônia

En el marco de estas reflexiones decidimos adelantar la investigación que se presenta a través de este
documento, centrada en el procesamiento y análisis de los resultados del CGP 2005 para la temática migratoria en
la región amazónica. Una experiencia previa de gran utilidad para la preparación de este artículo fue la preparación
y presentación de la ponencia Migraciones en la Amazonía colombiana: aportes del censo de población de
2005, presentada en Belém do Pará en Noviembre de 2008 en el marco del Seminario “Migración Internacional
en la Pan-Amazonía” de la Cátedra UNESCO de Cooperación Sur-Sur para el Desarrollo Sostenible.
El documento que acá presentamos centra su atención en la migración internacional. Por ser la fuente
principal el CGP 2005 únicamente poseemos información sobre los inmigrantes extranjeros, pues los emigrantes
colombianos solo pueden ser captados en los censos de población de los países receptores.

LA AMAZONIA COLOMBIANA Y SU POBLACION ACTUAL

El marco espacial abordado en este artículo corresponde a la delimitación espacial de la Amazonía


colombiana utilizada por el SINCHI para la caracterización socioeconómica de la región (SINCHI, 2007, p.
35). Dentro de esta configuración, componen la Amazonía colombiana la totalidad del territorio de los
departamentos de Caquetá, Putumayo, Amazonas, Vaupés, Guaviare y Guainía más los municipios de La
Macarena (Meta), Piamonte (Cauca) y Cumaribo (Vichada) (Mapa 1). Se trata en total de 62 unidades político-
administrativas locales (municipios y corregimientos departamentales) que totalizan 477.772 Km2 o casi 42%
del territorio continental colombiano. Esta delimitación espacial se encuentra bastante avanzada gracias a los
aportes del SINCHI, en los cuales se han expuesto las distintas maneras de delimitar la región y los resultados
se encuentran disponibles en la mayoría de las publicaciones del SINCHI que abordan el tema de asentamientos
humanos en la Amazonía (SINCHI, 2004; 2006ab; 2007ab).
De acuerdo al CGP 2005, la región de la Amazonía colombiana tenía una población de 747.267 personas.
El ajuste censal produjo un total de 1.016.743 personas, significando un ajuste del 36,06%. Esta primera aproximación
sustenta la observación inicial de que la cobertura del CGP2005 en la región no fue óptima (Mapa 2). El universo
censal para la región cubrió 187.859 viviendas, con un número de hogares de 182.134, lo que corresponde a 4,1
personas por hogar, cifra ligeramente superior a la media nacional, cercana a 3,9 personas por hogar.
La distribución urbana rural resultante del censo es de 61% de la población en cabeceras y 39% en el
resto. Esta distribución predominantemente urbana es resultado del proceso continuo de migración rural-urbano
presente de igual manera en el resto del país. La totalidad de la población es en promedio más joven que la del
resto del país, situándose en 25,2 años frente 29,5 años del total nacional. De la misma manera, el índice o razón
de masculinidad es superior, alcanzando 103,73 hombres por cada 100 mujeres, frente al total nacional de 96,23
hombres por cada 100 mujeres (Figura 1).

Distancia al equilibrio 100 hombres x 100 mujeres


30 20 10 0 -10 -20 -30

80 años o más
70 a 74 años
60 a 64 años
50 a 54 años
Grupo

40 a 44 años
30 a 34 años
20 a 24 años
10 a 14 años
0 a 4 años

10% 8% 6% 4% 2% 0% 2% 4% 6% 8% 10%

Hombres Mujeres IM

Figura 1 - Pirámide de la población total de la región amazónica, 2005.


Fuente: DANE, Censo de población 2005. Sistema de consulta Redatam.

146
147
Migración internacional en la Amazonia colombiana: aportes del censo de población 2005 • Oscar Sandino

Mapa 1 - La Amazonía colombiana Mapa 2 - Censo 2005. Omisión censal por municipios en Colombia.
Fuente: Mapa elaborado y proporcionado por SINCHI Fuente: Mapa elaborado por el autor, con base en DANE: Ajustes de población, Censo 2005.
Migração internacional na Pan-Amazônia

Estos indicadores dan cuenta de una diferencia radical en la composición de la población de la región
respecto de la del resto del país. Así, la Amazonía cuenta con una población predominantemente más joven y
con más hombres que mujeres en una proporción alta. Esta configuración resulta coherente con la construcción
más cualitativa de una región poblada por hombres en edad de trabajar, colonos sujetos a las dinámicas de la
economía extractiva en un proceso de continua expansión selva adentro.
Tradicionalmente la región amazónica ha sido un laboratorio para el estudio de las sociedades en distintos
niveles de incorporación del modelo occidental de ocupación del territorio. Estas poblaciones, autorreconocidas en
el censo de población como pertenecientes a alguna etnia indígena totalizaron en el CGP 2005 el número de 93.840
personas, equivalentes a un poco más del 12% del total de población de la región, pero apenas el 6,7% de la
población indígena del país (1.392.623 personas). Coincidentemente, la composición por sexo y edad refleja las
mismas diferencias respecto al total de indígenas de Colombia: Más hombres por cada mujer y en promedio más
jóvenes. Mientras que el conglomerado de indígenas censado en la región presenta un índice de masculinidad de
103,58% y una edad media 24,0 años, en el total nacional de indígenas estos indicadores son de 101,95 y 24,6 años.
En cuanto a la cobertura, es necesario tener en cuenta que el porcentaje de omisión censal promedio en
los 62 municipios que constituyen la región fue del 37,8%, lo que generó un factor de ajuste global de 1,3606.
A nivel de casos particulares, la mitad de los municipios tienen omisión superior al 30%, oscilando entre una
omisión mínima de 0,46% y una omisión máxima de 99,69% (Mapa 2). La omisión es más alta en las zonas
rurales que en las zonas urbanas, así como en las zonas más alejadas del anillo de poblamiento amazónico.
En cuanto a la calidad de los resultados, es necesario considerar que en buena medida, los problemas de
cobertura de la información se derivan de barreras naturales de la región. Adicionalmente, el hecho de que se
trate de un censo continúo sin inmovilización de la población, con un periodo censal de un año, aumenta la
probabilidad de que se presente subregistro (si se acepta la hipótesis de que las preguntas de control sobre
censo previo funcionaron correctamente), especialmente en las poblaciones con alta movilidad y emigrantes
próximos al censo que no alcanzaron a quedar censados en otros municipios.

ANTECEDENTES MIGRATORIOS DE LA REGION

Tal como se dijo atrás, la migración ha sido un fenómeno de larga data en la región, si bien ha tenido
características e intensidades diferentes a través del tiempo, su peso sobre la población residente en la región
ha sido siempre determinante. Esta historia de las migraciones es tan antigua como la llegada de los primeros
pobladores al trapecio amazónico, en épocas anteriores a los censos de población y los instrumentos de registro
modernos. La práctica de la comunicación escrita ha permitido a otros investigadores, a través de la consulta de
los archivos históricos, una reconstrucción sucinta pero bien estructurada de los movimientos de población
hacia la Amazonía desde el siglo XVIII2. Cuentan los documentos antiguos que por aquella época la Amazonía
constituía una especie de frontera de evasión, tierra salvaje que garantizaría para los esclavos huidos de las
minas y plantaciones caucanas el refugio la oportunidad de una vida distinta. Similar percepción debían tener los
exiliados políticos del siglo XIX e indígenas y campesinos sin tierra expulsados de regiones céntricas que
establecieron asentamientos en la región durante la primera mitad del siglo XX. Esta visión de frontera de
evasión coexistió (y quizá hoy en día lo siga haciendo) con una imagen de frontera de expansión, potenciada
inicialmente por la explotación de las quinas silvestres iniciada hacia la década de 1870.

2
Este aparte del documento sigue la exposición de GÓMEZ, Augusto. “Estructuración socioespacial de la Amazonía colombiana, siglos
XIX-XX. En Desplazados, migraciones internas y reestructuraciones territoriales. Universidad Nacional de Colombia – Ministerio del
Interior. Bogotá, 1999.

148
Migración internacional en la Amazonia colombiana: aportes del censo de población 2005 • Oscar Sandino

Esta dinámica se vio reforzada posteriormente por la explotación cauchera, la colonización para tierras
de cultivo y ganadería y la constitución de los primeros espacios permanentes de asentamiento en la Amazonía
occidental, más puntualmente en los ahora departamentos de Caquetá y Putumayo, primeros cimientos del
anillo de poblamiento amazónico. Esta zona particular experimentaría el crecimiento de las actividades de la
economía extractiva determinante en la región, que ha vivido los ciclos especialmente notables de la extracción
cauchera, después del petróleo y más recientemente de la coca.
Desde una perspectiva demográfica, los mejores registros para el estudio de estas dinámicas de
poblamiento son los censos de población, en particular los de 1973 y 1993. A pesar de las dificultadas propias del
tratamiento de estas fuentes de información, es posible utilizar los resultados de los componentes migratorios de
cada uno de estos censos para construir un marco de interpretación de las migraciones desde y hacia la región
amazónica. De acuerdo al documento de Ciro Martínez (2006) sobre las migraciones en Colombia según los
censos de 1973 y 1993, los resultados de migración tanto interna como internacional en esos censos son los
siguientes (Tabla 1).

Tabla 1 - Censo de 1973. Saldo de migración nacional e inmigración internacional.


Condición Valores absolutos
Migratoria Caqueta Putamayo Amazonas Guainia Vaupes Total

Migracion Neta Col 61.848 19.802 -876 1.438 8.007 90.219


Migrantes Internac 141 220 1.003 65 166 1.595
Fuente: Martinez, 2006.

De acuerdo a estos resultados, el principal receptor de inmigrantes internacionales era el departamento


del Amazonas, seguido por el departamento del Putumayo. En total, vivían en la región unos 1.595 extranjeros
cuyo peso sobre el balance migratorio resulta pequeño, apenas el 1,7% (Mapa 3).
Al momento del censo de 1993, el número de extranjeros viviendo en la región se había duplicado,
alcanzando 3.537 personas (Tabla 2). La participación de estos sobre el balance migratorio de la región se
mantuvo baja, pero alcanzó un 2,6%. El departamento del Amazonas continuó siendo el principal receptor,
ahora seguido de cerca por el Putumayo (Mapa 4).

Tabla 2 - Censo de 1993. Saldo de migración nacional e inmigración internacional.


Condición Valores absolutos
Migratoria Caqueta Putamayo Amazonas Guainia Guaviare Vaupes Total

Migración Neta Col 43.127 59.519 -438 1.642 26.632 -1.769 128.713
Migrantes Internac 163 1.176 1.351 295 171 381 3.537
Fuente: Martínez, 2006.

MIGRACION SEGUN EL CENSO DE 2005

El análisis de los resultados del CGP 2005 muestra un escenario diferente al de la tendencia marcada
por los censos de 1973 y 1993 para la migración total de la región. Primero que todo, aunque la tasa neta de
migración sigue la tendencia decreciente de los dos censos anteriores, decrece muy notoriamente hasta 102 por
1.000 residentes.

149
Migração internacional na Pan-Amazônia

Mapa 3 - Balances migratorios de 1973

Mapa 4 - Balances migratorios de 1993

Mapa 5 - Migración acumulada hasta 2005

150
Migración internacional en la Amazonia colombiana: aportes del censo de población 2005 • Oscar Sandino

Los departamentos del Caquetá, Amazonas y Vaupés se convierten en expulsores netos de población
y la relación de inmigrantes/emigrantes en la región disminuye a 1,5 (Tabla 3). Mientras que el número de
inmigrantes acumulados se mantiene casi estático respecto de 1993, el número de emigrantes nacionales
aumentó en una proporción superior al 50%. El número de extranjeros en la región disminuyó a 2.673 y
fueron censados mayoritariamente en el departamento del Putumayo, seguido por Amazonas (Figura 2).
No obstante, el peso de los extranjeros sobre el balance migratorio aumentó a 3,5%, debido a la notoria
disminución del saldo migratorio nacional (Mapa 5).

Tabla 3 - Censo 2005. Saldos migratorios nacionales por lugar de nacimiento e inmigración interncional.
Condición Valores absolutos
Migratoria Caqueta Putamayo Amazonas Guainia Guaviare Vaupes Total

Migración Neta Col -2.005 60.849 -1.342 2.731 13.907 -171 73.969
Migrantes Internac 112 1.377 937 121 69 57 2.673
Fuente: Censo 2005

1600

1400

1200

1000

800

600

400

200

0
Caquetá Putumayo Amazonas Guainía Guayiare Vaupés

Figura 2 - Departamentos de asentamientos de los extranjeros acumulados en la Amazonía


colombiana, 2005
Fuente: Censo 2005

Los cambios en el saldo migratorio a 2005, respecto de los observados en los censos de 1973 y 1993,
revelan que la región se ha venido transformando desde un receptor de población hacia un expulsor, denotando
grandes cambios en la situación de la región (Mapa 6). En efecto, la bonanza cocalera que había venido
atrayendo números importantes de pobladores (tanto nacionales como extranjeros), especialmente durante
los últimos años de la década de 1980 y los primeros años de la década de 1990 empezó a desvanecerse por
la implementación del Plan Colombia a finales del decenio y las fumigaciones y combates con los grupos
armados al margen de la ley empezó a desplazar población hacia distintas regiones del país. El impacto de la
apuesta del gobierno central por reestablecer el control militar en la región y frenar el avance de los cultivos
ilícitos se evidencia en las cifras relativas a la emigración evidenciada en el estudio de la migración según los
resultados de la comparación entre lugar de residencia 5 años antes del censo y la residencia al momento del
censo (Mapa 7, Tabla 4).

151
Migração internacional na Pan-Amazônia

Mapa 6 - Emigrantes acumulados hasta 2005

Mapa 7 - Emigrantes de 2000 a 2005

Mapa 8 - Imigrantes de 2000 a 2005

152
Migración internacional en la Amazonia colombiana: aportes del censo de población 2005 • Oscar Sandino

Tabla 4 - Censo 2005. Saldos migratorios nacionales del periodo de los cinco años anteriores al censo e
inmigración internacional.
Condición Valores absolutos
Migratoria Caqueta Putamayo Amazonas Guainia Guaviare Vaupes Total

Migración Neta Col -14.276 3.921 -1.071 -108 -6.373 178 -17.731
Migrantes Internac 106 366 183 31 69 17 772
Fuente: Censo 2005

Este procesamiento de información, con restricción temporal a los movimientos ocurridos únicamente
durante los cinco años previos al momento censal (2000 o 2001 dependiendo de la fecha de realización del
operativo censal en cada municipio), evidencia el cambio en el patrón migratorio de la región (Figura 3).

400

350

300

250

200

150

100

50

0
Caquetá Putumayo Amazonas Guainía Guayiare Vaupés

Figura 3 - Departamentos de asentamientos de los extranjeros llegados a la Amazonía


colombiana durante los cinco años antes del censo.
Fuente: Censo 2005

En cuanto a la migración nacional, el saldo de la región se vuelve negativo, siendo muy llamativas las
pérdidas de población en los departamentos del Caquetá y Guaviare, epicentros de la lucha armada. El Putumayo,
por el contrario, aumenta su población en proporción considerable, posiblemente como receptor de algunos de
los emigrantes nacionales provenientes de los otros departamentos de la región (Mapa 8).
Habiendo completado la revisión de los números absolutos de extranjeros en el territorio es pertinente
revisar las características de estos inmigrantes, utilizando las principales variables captadas por el CGP 2005.
La primera de las características de alta relevancia es el país de origen de los inmigrantes. De acuerdo
a la Figura 4 y Tabla 5, el principal país emisor de inmigrantes extranjeros a la Amazonía colombiana es el Perú,
seguido por Brasil y Ecuador.
Lamentablemente la proporción de personas que reportan tener un país de nacimiento distinto a Colombia
pero no especifican su país de origen introduce problemas para el análisis de la información. En caso de
haberse clasificado correctamente a este número de personas, 1.448 para ser exactos, el escenario podría ser
muy diferente.
En la Tabla 5 se presentan los casos en valores absolutos, así como el cálculo de la participación de los
países tomando como total solo los casos válidos (con información completa). Desde esta perspectiva, casi la
mitad de los inmigrantes extranjeros a la Amazonía Colombiana vienen del Perú y una cuarta parte del Brasil.

153
Migração internacional na Pan-Amazônia

60,00%

50,00%

40,00%

30,00%

20,00%

10,00%

0,00%

Perú Brasil Ecuador Venezuela Bolivia Otros No


países informa

Figura 4 - Países de origen de los extranjeros de la Amazonía colombiana, llegados a la


Amazonía en cualquier año.
Fuente: Censo 2005

Tabla 5 - Países de origen de los extranjeros de la Amazonía


colombiana, llegados a la Amazonía en cualquier año.
Pais Casos % Validos

Perú 585 47,7


Brasil 322 26,3
Ecuador 185 15,1
Venezuela 33 2,7
Bolivia 7 0,6
Otros países 93 7,6
No informa 1.448

Total 2.673
Fuente: Censo 2005

Esta participación se mantuvo durante los cinco años previos al censo. El recuento de aquellos que llegaron
a la región durante este periodo muestra una distribución similar a la del acumulado, siendo el Perú el principal país
de origen, seguido por Brasil y el Ecuador, aunque las proporciones varían notablemente (Tabla 6).
La distribución por sexo de los inmigrantes de acuerdo a su país de origen muestra algunas diferencias
entre los lugares de origen, aunque en todos los casos considerados válidos la relación se acerca al equilibrio.
El balance final es de 1,3 hombres por cada mujer, pero este resultado está afectado por los casos sin información
del país de origen, en los cuales la relación alcanza 1,7 hombres por cada mujer (Figura 5).
En cuanto a la distribución de los inmigrantes de acuerdo al país de origen y grandes grupos de edad, los
resultados muestran una concentración en las edades productivas, de 15 a 64 años, en todos los casos. Resulta
de gran interés acá el caso de Venezuela, donde los inmigrantes son mucho más jóvenes, cerca de un 30% son
menores de 15 años y no se registró a nadie de más de 64 años. En el caso del Perú, la población en edades de
15 a 64 años representa cerca del 80% del total de inmigrantes, cifra similar a la de Brasil, en el que representan
el 70% y Ecuador, donde equivalen al 75%. En el total de casos con información de lugar de origen válida, la
proporción es de 18% menores de 15 años, 75% entre los 15 y los 64 años y 7% de mayores de 64 años (Figura 6).

154
Migración internacional en la Amazonia colombiana: aportes del censo de población 2005 • Oscar Sandino

Tabla 6 - Países de origen de los extranjeros llegados a la Amazonía


colombiana durante los cinco años antes del censo.
Pais Casos % Validos

Perú 116 27,1


Ecuador 69 16,1
Brasil 98 22,9
Venezuela 28 6,5
Bolivia 3 0,7
Otros países 114 26,6
No informa 344

Total 772
Fuente: Censo 2005.

1000
900
800
700
600
500
400
Hombres
300
Mujeres
200
100
0
Perú Brasil Ecuador Venezuela Bolivia Otros No
países informa

Figura 5 - Inmigrantes acumulados por país de origen y sexo.


Fuente: Censo 2005

500

450

400

350

300
0-14
250
15-64
200
65+
150

100

50

Perú Brasil Ecuador Venezuela Bolivia

Figura 6 - Inmigrantes acumulados por país de origen y grandes grupos de edad. Países con
fronteras amazónicas
Fuente: Censo 2005

155
Migração internacional na Pan-Amazônia

Con un mayor nivel de detalle, la pirámide de población de todos los extranjeros censados en la región
(2.673 personas) evidencia el desequilibrio en los sexos, con prevalencia de hombres sobre mujeres en todos los
grupos quinquenales (Figura 7). La concentración de inmigrantes en las edades productivas tiene gran relación
con la migración en busca de oportunidades económicas, las cuales en muchos casos se hacen en grupos
familiares completos, pues también se registra casi un 4% de los inmigrantes en cada sexo en los grupos de
edad desde 0 hasta 19 años. La mayor proporción de los inmigrantes está concentrada entre las edades de los
15 y los 39 años, edades especialmente aptas para labores manuales que demandan grandes esfuerzos físicos.
Por lo pequeño de los grupos específicos de países, las pirámides de cada caso son de difícil interpretación, por
esa razón no se presentan en este documento.

Distancia al equilibrio 100 hombres x 100 mujeres

Figura 7 - Pirámide de la población de extranjeros censados en la región amazónica, 2005.


Fuente: Censo 2005

El CGP 2005 incluyó como parte del componente de migración, la pregunta sobre razón para migrar y la
aplicó solamente a los casos de migración de los cinco años antes de la realización del censo. Las categorías
válidas para respuesta en esa pregunta abordaban dificultad para conseguir trabajo, riesgo de desastre natural,
amenaza para su vida, necesidad de educación, motivos de salud, razones familiares, miembro de pueblo nómada.
Aunque los resultados de esta pregunta tienen cierto grado de complejidad en su interpretación debido a la
frecuencia con que los movimientos migratorios son multi-causales y al hecho de que las categorías “razones
familiares” y “miembro de pueblo nómada u otra razón” concentraron más del 70% de las respuestas a nivel
nacional para cualquier tipo de migración, para el caso de los inmigrantes internacionales a la Amazonía colombiana,
la pregunta produjo resultados coherentes con lo que venían mostrando otras variables.
Al igual que en el caso de la migración interna en todo el país, un porcentaje muy alto de respuesta se
concentró en razones familiares y miembro de pueblo nómada u otra razón, acumulando el 58%. Más allá de
esto, es importante señalar que el 26% de los inmigrantes manifestaron haber migrado por dificultad para
conseguir trabajo, el 7,1% lo hicieron por necesidades de educación y el 5% migró aduciendo motivos de salud.
Las dos categorías restantes tuvieron participación inferior al 3% (Figura 8).
A diferencia que en el caso de la causa del movimiento migratorio, la pregunta sobre la actividad en la
cual ocupó la mayor parte del tiempo durante la semana antes del censo se aplicó a la totalidad de la población
de 5 años o más de edad. En el caso de los inmigrantes internacionales a la Amazonía colombiana, los resultados
muestran una notoria concentración de la población que declara haber trabajado; alcanza un 40%, el 21%
declaró haberse dedicado a los oficios del hogar, el 10% declaró haberse dedicado a estudiar exclusivamente.
Las demás categorías tienen participaciones inferiores al 10% y el no informa para esta variable fue del 17%.

156
Migración internacional en la Amazonia colombiana: aportes del censo de población 2005 • Oscar Sandino

Es importante resaltar que para los casos de Perú, Brasil y Ecuador, la participación de la población dedicada al
trabajo muestra diferencias importantes, siendo de 44%, 36% y 56% respectivamente. En el caso de la dedicación
a los oficios del hogar, las participaciones son de 31%, 30% y 17% para cada uno de ellos (Tabla 7).

90

80

70

60
Perú
50
Brasil

40 Ecuador

30 Venezuela

Bolivia
20
Otro país
10

Dificultad Riesgo de Amenaza Necesidad Motivos Razones Miembro


conseguir desastre para su de de familiares pueblo
trabajo natural vida educación salud nómade

Figura 8 - Inmigrantes acumulados por país de origen y causas de migración*


* Se presentaron 21 casos sin información en esta variable
Fuente: Censo 2005

Tabla 7 - Inmigrantes acumulados por país de origen y ocupación la semana antes del censo*.

Actividad Perú Brasil Ecuador Venezuela Bolivia Otro país No informa Total
No Informa 22 7 5 0 0 0 383 417

Trabajó 245 108 94 12 4 57 446 966


No trabajó pero tenía
trabajo 7 1 0 0 0 1 3 12
Buscó trabajo pero
había trabajado antes 9 4 5 0 0 0 1 19
Buscó trabajo por
primera vez 4 2 0 1 0 0 0 7
Estudió y no trabajó ni
buscó trabajo 25 32 18 7 1 16 146 245
Realizó oficios del
hogar y no trabajó ni
buscó trabajo 172 90 29 6 1 5 221 524
Incapacitado
permanentemente
para trabajar 12 6 1 0 0 1 4 24
Vivió de jubilación o
renta y no trabajó ni
buscó trabajo 2 6 0 1 0 2 0 11
Estuvo en otra
situación 57 45 14 2 1 4 121 244

Total 555 301 166 29 7 86 1325 2469


* Esta pregunta no se aplicó a 204 personas por ser menores de 5 años de edad
Fuente: Censo 2005

157
Migração internacional na Pan-Amazônia

El análisis detallado para las principales ocupaciones, con énfasis en los países que tienen frontera
amazónica con Colombia hace más evidentes estas diferencias. La inserción de los inmigrantes a actividades
laborales y educativas es un proxi indicador de su condición en territorio colombiano. De acuerdo a esto, los
inmigrantes tendrían un alto nivel de integración y de participación en las actividades e instituciones del país. Sin
embargo, es necesario aclarar que este es el caso de aquellos que reconocieron su condición de extranjeros en
el censo, la situación de aquellos que no desean ser identificados puede ser muy diferente (Figura 9).

Realizó oficios del hogary no


trabajó ni buscó trabajo

Otro país
Estudio y no trabajo ni busco
trabajo Bolivia

Venezuela

Trabajo Ecuador

Brasil

Perú
No Informa

0 50 100 150 200 250 300

Figura 9 - Inmigrantes acumulados por país de origen y principales ocupaciónes la semana


antes del censo.
Fuente: Censo 2005

Otra de las variables que se aplicó fue la de nivel educativo (población de 3 años o más de edad).
Los resultados revelan una concentración del 36% de la población en la categoría de básica primaria, seguido
por un 21% con educación básica secundaria, un 9% sin educación y un 8% con media académica clásica.
El nivel de no respuesta en esta variable fue del 14% y todas las demás categorías tienen participaciones
menores a 3% (Figura 10).

1000

900

800
Perú
700
Brasil
600
Ecuador
500
Venezuela
400

300 Bolivia

200 Otro país

100 No informa

0 Total
Preescolar Básica Básica Media Ninguno
primaria secundaria académica
clasica

Figura 10 - Inmigrantes acumulados por país de origen y principales niveles de educación


completados*
* Esta pregunta no se aplicó a 115 personas por ser menores de 3 años de edad.
Fuente: Censo 2005

158
Migración internacional en la Amazonia colombiana: aportes del censo de población 2005 • Oscar Sandino

Para el caso de los países que tienen frontera amazónica con Colombia, la participación en Perú, Brasil
y Ecuador de población con básica primaria es del 40%, 42% y 40% respectivamente. La población con
educación básica secundaria representa 23%, 22% y 20% para los mismos países, mientras que en la categoría
de ningún nivel de educación completado los porcentajes son de 9%, 16% y 10% en cada caso (Tabla 8).

Tabla 8 - Inmigrantes acumulados por país de origen y máximo nivel de educación completado*.
Nivel completado Perú Brasil Ecuador Venezuela Bolivia Otro País No informa Total
Preescolar 8 16 7 2 0 3 37 73

Básica primaria 229 131 71 9 1 5 489 935

Básica secundaria 128 69 36 5 1 13 291 543


Media académica
clasica 79 19 22 4 1 17 72 204

Media técnica 19 9 2 2 0 2 14 48
Normalista 17 3 0 0 0 0 0 20
Técnica profesional 4 5 3 1 0 5 6 24
Tecnológica 1 1 3 0 0 4 3 12
Profesional 11 5 12 4 4 16 11 63
Especialización 2 0 2 0 0 28 6 38
Maestría 0 0 0 0 0 2 0 2
Doctorado 2 0 0 0 0 2 2 6
Ninguno 49 50 18 3 0 3 120 243
No Informa 17 3 4 0 0 0 323 347
Total 566 311 180 30 7 90 1374 2558
* Esta pregunta no se aplicó a 115 personas por ser menores de 3 años de edad.
Fuente: Censo 2005

Por último, la distribución detallada de los extranjeros de la Amazonía colombiana revela diferencias
importantes, las cuales al parecer están asociadas a la proximidad con las fronteras de los países de origen.
Todos los municipios con mayor concentración están ubicados en la zona sur de la frontera amazónica y a
excepción de los municipios del departamento del Amazonas, todos hacen parte del anillo de poblamiento
amazónico. El municipio con más población extranjera es Leticia, especialmente debido a su cercanía con la
ciudad de Tabatinga, del lado brasileño de la frontera y su importancia como centro de comercio y servicios en
esa zona de la Amazonía (Tabla 9).

Tabla 9 - Inmigrantes acumulados por sexo y municipio de la Amazonía colombiana donde fueron censados.
Nobre del Município y Departamento Hombre Mujer Total

Leticia (Amazonas) 283 357 640


San Miguel (Putamayo) 342 170 512
Vale del Guamuez (Putumayo) 232 110 342
Puerto Asis (Putumayo) 133 75 208
Puerto Nariño (Amazonas) 73 61 134
Puerto Arica (Amazonas) 76 50 126
Orito (Putamayo) 68 51 119
Inirida (Guainía) 48 34 82
Florencia (Caquetá) 30 35 65
San José del Guaviaera (Guaviare) 23 27 50
Otros municipios con menos de 50 extranjeros 211 184 395
Total 1.519 1.154 2.673
Fuente: Censo 2005

159
Migração internacional na Pan-Amazônia

Leticia concentra el 24% de los extranjeros de la región, seguida por San Miguel, donde habita el 19%
y Valle del Guamuez con un 12%. Todos los demás municipios tienen participaciones inferiores al 10% y los
municipios con comunidades de extranjeros inferiores a 50 personas acumulan el 15% de la población total de
extranjeros en la región.

REFLEXIONES FINALES

La migración internacional en la Amazonía colombiana ha ganado importancia rápidamente durante los


últimos años, pero no en términos equilibrados, sino adoptando la emigración hacia los países vecinos como un
mecanismo de supervivencia. Lamentablemente la cuantificación de este fenómeno es difícilmente alcanzable
a través de las fuentes de información tradicionales (censos y registros administrativos) debido a las condiciones
en las que se produce el fenómeno. Además, la sensibilidad política al respecto dificulta el abordaje coordinado
por parte de los gobiernos involucrados. En el caso específico del censo de 2005, la inclusión de la pregunta
sobre causa del último movimiento migratorio, con la posibilidad de señalar como causa “Amenaza o riesgo
para su vida, su libertad o su integridad física, ocasionada por la violencia”, no produjo los resultados esperados.
A nivel nacional, la cifra registró aproximadamente 470.000 casos de personas que señalaron esta causa como
el motivo de su último cambio de residencia, cifra muy inferior a las estimaciones de entre dos y cuatro millones
de desplazados en el país.
El desplazamiento forzado constituye el principal aportante de emigración nacional e internacional de la
región. Se trata de un fenómeno más sentido que documentado. Se desconoce la cantidad de personas en esta
situación, fuentes no oficiales estiman alrededor de 500.000 colombianos desplazados hacia el Ecuador y Perú.
Se sabe que la emigración por desplazamiento aumentó drásticamente durante los últimos años debido al conflicto
armado. Es imposible determinar por cuanto tiempo más se prolongará esta situación, pues está íntimamente
ligada a la duración e intensidad del conflicto.
En términos generales, e incluyendo las dinámicas de la migración interna, la región ha dejado de ser un
atractor de población para convertirse en un expulsor de la misma (Figuras 11 y 12). No solo la inmigración
nacional e internacional han disminuido sino que el número de personas originarias de la región viviendo por
fuera de ella está creciendo rápidamente. Este fenómeno está muy ligado con la dinámica del conflicto armado
entre el estado y grupos al margen de la ley. El periodo 2002-2008 ha estado marcado por una fuerte ofensiva
militar en la región, lo cual ha generado procesos de expulsión/reubicación de la población en otras zonas del
país. Los efectos de estos fenómenos en términos de emigración internacional de la región se harán visibles en
los censos de la ronda 2010 en los países vecinos, los cuales probablemente captarán grandes poblaciones de
colombianos viviendo en sus territorios, especialmente en el Ecuador, principal destino de los colombianos
expulsados por la violencia en el sur del país.

250.000 35.000
200.000 30.000
150.000 25.000
100.000 20.000
50.000 15.000

0 10.000
1973 1993 2005 5.000
0
Saldo migratorio acumulado Caq Put Guv Ama Gun Vau
Inmigración acumulada
Emigración acumulada Inmigración 2000-2005 Emigración 2000-2005

Figura 11 - Migración acumulada en la Amazonía colombiana, Figura 12 - Migración reciente en la Amazonía colombiana,
1973-2005. por departamentos
Fuente: Censos 1973, 1993 e 2005 Fuente: Censo 2005

160
Migración internacional en la Amazonia colombiana: aportes del censo de población 2005 • Oscar Sandino

REFERENCIAS

ARAGÓN, Luis E. (Org.). Populacões da Pan-Amazônia. Belém: NAEA/ Universidade Federal do Pará, 2005.

CUBIDES, Fernando; DOMINGUEZ, Camilo (Eds.). Desplazados, migraciones internas y reestructuraciones territoriales.
Bogotá: Observatorio Socio-Político y Cultural/ Centro de Estudios Sociales/Universidad Nacional de Colombia/Ministerio
del Interior, 2009.

GONZALEZ, Alejandro. Elementos de análisis demográfico para el estudio de las migraciones internas. Bogotá:
Universidad Externado de Colombia, 2002.

GONZALEZ, Alejandro. Conceptos y técnicas básicas de análisis demográfico. Bogotá: Universidad Externado de
Colombia, 1998.

MARTINEZ, Ciro. Las migraciones internas en Colombia: Análisis territorial y demográfico según los censos de 1973 y
1993. Bogotá: Universidad Externado de Colombia, 2006.

SINCHI - Instituto Amazónico de Investigaciones Científicas. Perfiles Urbanos en la Amazonía Colombiana. Bogotá:
SINCHI, 2004.

SINCHI - Instituto Amazónico de Investigaciones Científicas. Guainía en sus asentamientos humanos. Bogotá: SINCHI,
2006a.

SINCHI - Instituto Amazónico de Investigaciones Científicas. Entre la colonización y las fronteras. Bogotá: SINCHI,
2006b.

SINCHI - Instituto Amazónico de Investigaciones Científicas. Balance anual sobre el estado de los ecosistemas, 2006.
Bogotá: SINCHI, 2007a.

SINCHI - Instituto Amazónico de Investigaciones Científicas. Sur del Meta, territorio amazónico. Bogotá: SINHCI, 2007b.

161
Migração internacional e desenvolvimento: o caso da Guiana • Hisakhana Corbin

MIGRAÇÃO INTERNACIONAL E
DESENVOLVIMENTO: O CASO DA GUIANA

Hisakhana Corbin 1

INTRODUÇÃO

Neste artigo discutimos os impactos da emigração e da imigração para o desenvolvimento da Guiana.


Começamos com uma discussão sobre o povoamento da Guiana Britânica que se tornou independente no dia
26 de maio de 1966. Na base de dados primários e secundários, apresentamos uma discussão sobre as tendências
migratórias da Guiana, país que se caracteriza por ser país de origem, de trânsito e de destino de migrantes de
diversas categorias. Quanto à emigração, ressaltamos a importância de fatores sociais, econômicos e políticos
que levam os indivíduos a emigrar. Quanto à consolidação do Caribbean Single Market and Economy da
Comunidade Caribenha, acordo que facilita a circulação de mão-de-obra qualificada, ele é discutido principalmente
em relação àqueles aspectos que tornam a Guiana cada vez mais vulnerável.
Considerando que a Guiana integra o Tratado de Cooperação Amazônica, salientamos as tendências de
migração recíproca na fronteira Guiana-Brasil. Discutimos os impactos sociais, econômicos e as externalidades
ambientais na Guiana, resultantes da migração de brasileiros e analisamos a contribuição dessa migração para
o fortalecimento do Produto Interno Bruto (PIB) da Guiana. Estudamos diversas maneiras como países com
tendências migratórias semelhantes às da Guiana podem maximizar os benefícios da migração internacional,
por exemplo, através de remessas, políticas públicas e diversos arranjos institucionais. Finalmente recomendamos
alguns temas que merecem ser aprofundados.

HISTÓRIA DEMOGRÁFICA DA GUIANA

A Guiana está localizada no norte da América do Sul, entre a Venezuela, o Brasil, o Suriname, e o
oceano Atlântico. É o único país anglofônico da América do Sul e tem uma população aproximada de 751.223
habitantes (GUYANA BUREAU OF STATISTICS, 2005; GINA, 2001). Geologicamente a Guiana está
situada dentro do Cráton amazônico que forma o norte do continente sul-americano, o qual inclui partes de
Brasil, Guiana, Guiana Francesa, Suriname e Venezuela (GUYANA GEOLOGY AND MINES
COMMISSION/GGMC, 2005).

1
Mestre em planejamento do desenvolvimento e doutorando em desenvolvimento sustentável do Trópico Úmido, Universidade Federal
do Pará. E-mail: hisacorbin@hotmail.com

163
Migração internacional na Pan-Amazônia

Ainda que permaneçam controvérsias sobre a origem do povoamento do território atualmente ocupado
pela Guiana, há evidências de que grupos horticultores da etnia Arawak teriam chegado à região na época de
Cristo, rodeando a porção da Guiana que se estende a oeste do rio Corentyne (Figura 1) (WILLIAMS, 2003).

Figura 1 - Possíveis trajetórias de povoamento das Guianas


Fonte: Williams (2003, p. 411)

Sendo os indígenas os primeiros povoadores do território que hoje se caracteriza como a República
Cooperativista da Guiana, eles foram as primeiras testemunhas da chegada dos colonizadores europeus no
século XVII. Os primeiros assentamentos de colonizadores holandeses se estabeleceram em Kyk-over-al, na
confluência dos rios Essequibo e Mazaruni, em 1616, e em Berbice em 1627. Isto lhes permitiu comercializar
bens de consumo com os povos nativos.
Na década de 1650 houve uma redefinição dos interesses econômicos para iniciar o cultivo de cana-de-
açúcar e a produção de açúcar (MC GOWAN, 2006). Apesar do potencial econômico desta colônia, historiadores
apontam que o número de escravos na Guiana permaneceu pequeno em relação às outras Guianas – Suriname
e Guiana Francesa – e aos demais países (ilhas) caribenhos (MC GOWAN, 2006). No momento em que os
holandeses cederam suas colônias aos britânicos, em abril de 1776, foi necessário contabilizar a população de
escravos. Nesse ano a colônia de Berbice registrou cerca de 8.232 escravos, e a Colônia Unida (United
Colony), que abrangia as colônias de Demerara e Essequibo, 38.000. Diferentemente do período de dominação
holandesa, o domínio britânico foi caracterizado por um notável aumento do trabalho escravo em função das
demandas de mão-de-obra para ampliar a produção de cana-de-açúcar, algodão e café. Contudo, apesar desse
aumento da população de escravos no período britânico, a população total da colônia no momento da abolição
da escravidão em 1834, era de 83.000 escravos, 8.000 negros e mestiços livres e 7.000 brancos (não havia
registro do número de indígenas) (MC GOWAN, 2006).
Outro momento importante na história demográfica e socioeconômica de Guiana foi o período de
dominação francesa. Em fevereiro de 1782, as colônias de Essequibo, Demerara e Berbice foram entregues a
Comte de Kersaint (DALY, 1975), mas depois de dois anos, as colônias foram, pela segunda vez, cedidas aos
britânicos que as dominaram até a abolição da escravidão. Posteriormente houve sucessivas ondas de imigração
para a Guiana de portugueses, indianos, chineses e africanos (alguns destes libertados em alto mar).
Essas ondas de imigração que seguiram o período da abolição da escravidão marcaram um ponto de
inflexão na história cultural e demográfica da Guiana moderna. Segundo alguns autores, pessoas dessas origens
foram escolhidas estrategicamente para negar aos escravos libertos qualquer poder político ou socioeconômico

164
Migração internacional e desenvolvimento: o caso da Guiana • Hisakhana Corbin

após a abolição da escravidão nos países sul-americanos e nas ilhas caribenhas (AUGIER et al., 1960; MC
GOWAN, 2006; BASSANEZI, 1995; DALY, 1975).
Apesar da preferência pela fixação na Guiana de imigrantes oriundos da Índia, China, Portugal e da
Europa em geral, a imigração portuguesa foi, várias vezes, suspensa devido à carência de finanças, às
preocupações das autoridades de Madeira sobre a perda dos melhores trabalhadores do setor agrário e às
preocupações entre grupos humanitários a respeito da alta taxa de mortalidade entre imigrantes portugueses
(DALY, 1975). Os colonizadores, entretanto, desconsideravam a origem europeia e branca dos imigrantes
portugueses; tratando-os simplesmente como portugueses, sendo que até hoje são considerados como grupo
étnico aparte.
Em maio de 1838, a Guiana Britânica recebeu os primeiros imigrantes procedentes da Índia. Algumas
fontes revelam que os maus tratos sofridos por esse grupo de trabalhadores forçaram as autoridades indianas
a suspender várias vezes a imigração de trabalhadores para a Guiana Britânica. Em 1917, um total de 238.960
trabalhadores indianos teria entrado no país para trabalhar por um período de cinco anos, sendo liberados depois
para retornar à sua terra de origem (DALY, 1975). Em 1953, a colônia da Guiana Britânica recebeu os primeiros
trabalhadores da China (AUGIER et al, 1960). Houve duas outras tentativas subsequentes de entrada de
chineses na Guiana britânica, sendo ambas de curta duração em função das exigências do governo chinês para
que os trabalhadores recebessem passagens de retorno à China depois de trabalharem por um período de cinco
anos nessa colônia.
Em 1966, a Guiana alcançou a independência. Hoje coexistem no país seis grupos étnicos: (1) africanos,
(2) asiáticos, (3) europeus, (4) indianos, (5) indígenas e (6) portugueses. Desses grupos, os afro-descendentes
e os descendentes de indianos predominam (Tabela 1). Essa predominância demográfica se reflete também na
religião, com o hinduísmo e o cristianismo sendo as religiões mais frequentes.

Tabela 1 - Concentrações demográficas dos grupos étnicos na Guiana, 2002

Cor/ Etnia % da População Total


Africana 30,2
Branca 0,1
Chinesa 0,2
Indiana 43,4
Indígena 9,2
Mestiça 16,7
Portuguesa 0,2
Total 100,0
Fonte: 2002 Census Summary. Guyana Bureau of Statistics, 2005.

A formação histórica da Guiana gerou uma distribuição populacional extremamente desigual no país.
Quatro regiões (1, 7, 8 e 9), localizadas no interior, correspondem a 75% do território do país, mas abrigam
somente 10% da população (composta predominantemente de etnias indígenas) (Mapa 1, Tabela 2).

165
Migração internacional na Pan-Amazônia

VENEZUELA

SURINAME

BRASIL

Mapa 1 - Divisão regional da Guiana


Fonte: 2002 Census Summary. Guyana Bureal of Statistcs (2005, p. 23)

Tabela 2 - Distribuição Regional da população da Guiana, 1980-2002

Região População (1980) % População (1990) % População(2002) %


Região 1 18 329 2,4 18 428 2,5 24 275 3,2
Região 2 42 341 5,6 43 455 6,0 49 253 6,6
Região 3 104 750 13,8 95 975 3,3 103 061 13,7
Região 4 317 475 41,8 296 924 41,0 310 320 41,3
Região 5 53 898 7,1 51 280 7,1 52 428 7,0
Região 6 152 386 20,1 142 541 19,7 123 695 16,5
Região 7 14 390 1,9 14 790 2,0 17 597 2,3
Região 8 4 485 0,6 5 615 0,8 10 095 1,3
Região 9 12 873 1,7 15 057 2,1 19 387 2,6
Região 10 38 641 5,1 39 608 5,5 41 112 5,5

Total 759 568 100,0 723 673 100,0 751 223 100,0
Fonte: 2002 Census Summary. Guyana Bureau of Statistics (2005, p. 17).

Entre 1980 e 2002, essas regiões interioranas registraram as taxas de crescimento demográfico
mais altas do país devido à elevada fecundidade, sobretudo das mulheres indígenas, e da intensificação da
imigração, principalmente, no setor da mineração (sobretudo na década de 1980) (GUYANA BUREAU
OF STATISTICS, 2005).

166
Migração internacional e desenvolvimento: o caso da Guiana • Hisakhana Corbin

TENDÊNCIAS MIGRATÓRIAS RECENTES

GUIANA COMO PAÍS DE ORIGEM, DE TRÂNSITO, E DE DESTINO DE MIGRANTES

Até 1988, as políticas econômicas de Guiana foram caracterizadas pelo socialismo cooperativo
(Cooperative Socialism) (ALFRED, 1998; WORLD BANK, 1993). Mas em 1989 foi lançado um Programa
de Recuperação Econômica (ERP), adotando os princípios da globalização econômica e objetivando a liberalização
do sistema de comércio, a remoção total do controle de preços e subsídios, a exclusão das restrições da
mobilidade de capital, e a reformulação do sistema administrativo e das políticas de impostos (GINA, 2001).
Essas reformas incorporaram a Guiana à economia mundial, mas trouxeram impactos devastadores na
economia, sobretudo no Produto Interno Bruto (PIB) que diminuiu 5% ao ano entre 1989 e 1991, culminando
com uma alta taxa de inflação em 1991. Em função disso, o desemprego aumentou drasticamente refletindo-se
na deterioração da condição de vida da população guianesa (GINA, 2001).
Esses efeitos perversos na economia e na sociedade geraram emigração em massa para países
desenvolvidos e países (ilhas) do Caribe. Segundo o Banco Mundial as taxas de emigração, que resultaram da
implantação do Programa de Recuperação Econômica causaram uma perda absoluta de população no país
(Tabela 3) (WORLD BANK, 1993).

Tabela 3 - Guiana – Saldo migratório, 1995-1999

Anos Chegadas Saídas Saldo migratório Perdido por 1000


1995 184 879 192 390 -7511 -104
1996 170 885 183 483 -12598 -175
1997 161 061 177 377 -16316 -227
1998 152 834 163 178 -10344 -144
1999 178 982 191 146 -12164 -169
Fonte: Bernard (2005, p. 108)

Em consequência, a população total do país experimentou declínio, invertendo a tendência de crescimento


acelerado que se vinha experimentando desde 1950. Até 2002 o país não tinha alcançado o tamanho da população
de 1980 (Figura 2).

800000
700000
600000
População

500000
400000
300000
200000
100000
0
1831 1851 1871 1891 1921 1946 1970 1991
Anos do Censo

Figura 2 - População total da Guiana, 1831 – 2002


Fonte: 2002 Census Summary. Guyana Bureau of Statistics, 2005, p. 14

167
Migração internacional na Pan-Amazônia

Carrington e Detragiache (1998) demonstraram que a emigração da população altamente qualificada


da Guiana é uma das mais elevadas do mundo: 70% de indivíduos com mais de 13 anos de escolaridade foram
deslocados da Guiana para os EUA no ano de 1990. Da mesma forma, Mishra (2006) relata que, durante 1965-
2000, cerca de 43% dos trabalhadores da Guiana com ensino secundário e 89% com educação superior migraram
para os países membros da OCDE.
Mesmo com melhorias macroeconômicas e lentas melhorias das condições de vida da população guianesa
nos anos seguintes, o Programa de Recuperação Econômica não tem sido capaz de reter no país números
significativos de guianeses, os quais continuam a emigrar. Em nível estrutural, esse êxodo de guianeses é
também atribuído ao acordo internacional que permitiu livre circulação de mão-de-obra e mercadorias na
Comunidade Caribenha. Nesse sentido a Guiana tem estabelecido diversos vínculos comerciais com países
caribenhos procurando, conjuntamente, consolidar o bloco comercial do Caribe para responder aos desafios
impostos pelo comércio mundial. Por isso, a Comunidade Caribenha especificou claramente que:
O Mercado Consolidado e a Economia Caribenha (CSME) continuam sendo a plataforma
para enfrentar os desafios da globalização por estabelecer uma base para aumentar a
competitividade de nossos produtos e serviços. [...] a mobilidade de pessoas na comunidade
é necessária para destravar a riqueza dentro da região (CARIBBEAN COMMUNITY
SECRETARIAT, 2005a, p. 5)2.

Para alcançar essa meta, alguns Estados caribenhos (Antigua e Barbuda; Barbados; Belize; Dominica;
Granada; Guiana; Jamaica; São Cristóvão e Névis; Santa Lúcia; São Vicente e Granadinas; Suriname; Trinidad
e Tobago) já aderiram ao acordo que permite a livre circulação de mão-de-obra na região; mas apesar dessa
iniciativa de aproveitar totalmente a mão-de-obra da região, a migração extra-regional ainda é uma grande
preocupação da Comunidade Caribenha (CARIBBEAN COMMUNITY SECRETARIAT, 2001; 2005b; 2007).
Os programas oriundos das políticas de imigração de diversos países desenvolvidos incluindo Canadá e
Reino Unido provocam ondas migratórias de mão-de-obra qualificada de diversas categorias profissionais dos
países do Caribe, principalmente de Guiana e Jamaica (GOVERNMENT OF CANADÁ, 2009; CEPAL, 2006;
THOMAS-HOPE, 2002). Quanto as causas deste êxodo de profissionais, diversos estudos apontam fatores
sociais, econômicos e políticos (STARITZ, et. al., 2007; THOMAS-HOPE, 2002; ALFRED, 1998). Stubbs e
Reyes (2004) confirmam que 1,4 milhões de pessoas emigraram do Caribe para os Estudos Unidos entre 1989
e 2001, questionando até que ponto a emigração representa um caminho para o desenvolvimento da região
caribenha. Para esse mesmo período, os autores observaram que 60% dos graduados da Universidade da
Guiana emigram para os EUA. E segundo o Banco Mundial (2008) até 2005, 55,6% da população do país
tinham emigrado principalmente para EUA, Canadá, Reino Unido, Barbados, Brasil, Holanda, Antigua e Barbuda,
Guiana Francesa, Trinidad e Tobago e Venezuela. Segundo a mesma fonte em 2000, a Guiana perdeu 85,9% da
população com educação superior. A situação alcançou proporções alarmantes, expressa pelo Ministro de
Educação durante a 34 Conferencial Geral da UNESCO de 2007, que salientou que anualmente a Guiana
perde 15% dos professores altamente treinados o que representa um enorme desafio para o país alcançar as
metas educacionais estabelecidas no Dakar Framework de 2000 (BAKSH, 2007). Como resultado a qualidade
de educação nas escolas públicas da Guiana é severamente prejudicada; segundo o Ministro 300 professores
emigram anualmente enquanto o país consegue formar somente 791 profissionais dessa categoria a cada 2
anos. Devido a esse êxodo, até 2006, as escolas públicas contavam em conjunto escassamente com 60% de
professores treinados (CARIBBEAN COMMUNITY SECRETARIAT, 2006).

2
Tradução livre do original: “The Caribbean Single Market and Economy (CSME) continues to be the platform for facing the onslaught
of globalization by creating the framework for increased competitiveness of our goods and services. […] the movement of people within
the Community is necessary to unlock the richness within the Region.” (CARIBBEAN COMMUNITY SECRETARIAT, 2005a, p. 5).

168
Migração internacional e desenvolvimento: o caso da Guiana • Hisakhana Corbin

Enquanto a Guiana perde seus cérebros principalmente para países desenvolvidos, se desenha uma
onda de imigração dos países limítrofes: Brasil, Suriname e Venezuela. Apesar de não existir uma política
explícita de migração tranfronteristiça na Pan-Amazônia, especialmente considerando a existência do Tratado
de Cooperação Amazônica, assinado em 1978 com o intuito de promover o desenvolvimento harmônico da
Amazônia e fortalecer a cooperação internacional entre os países amazônicos (MRE, 1978), a migração ou
mobilidade transfronteriça merece ser incluída na agenda da gestão sustentável dos recursos naturais
principalmente nas Guianas as quais são receptoras de uma alta concentração de garimpeiros brasileiros. Esse
fluxo migratório de brasileiros às Guianas se intensificou a partir do início da construção da rodovia Guiana-
Brasil que surgiu do protocolo de 1989 e do acordo diplomático entre Guiana e Brasil em 2003 (e efectivado em
2006) para a insenção parcial de vistos – para turistas de ambos países. Nesse sentido uma análise estrutural
permite um entendimento mais amplo sobre o papel das instituições neste processo. Ao final, são as instituições
que têm o poder de permitir ou restringir o flúxo migratório à Guiana.
A Guiana é um país receptor de alta concentração de venezuelanos e surinameses, que, conjuntamente
com os brasileiros, superam a concentração da população proveniente das ilhas caribenhas (Tabela 4).

Tabela 4 - População estrangeira na Guiana, 2002

Países de origem População %

Barbados 235 2,5


Brasil 1.169 12,6
Canadá 219 2,4
China 641 6,9
Guiana Francesa 126 1,4
Índia 112 1,2
Jamaica 106 1,1
Suriname 2.573 27,9
Santa Lúcia 293 3,2
Reino Unido 314 3,4
Estados Unidos 675 7,3
Trinidad e Tobago 475 5,1
Venezuela 1.168 12,6
Outros 1.143 12,4
Total 9.249 100,0
Fonte: Guyana Bureau of Statistics (2005)

Quanto à distribuição regional desses migrantes, o censo de 2002 destacou a concentração mais alta de
brasileiros na região 9 que faz fronteira com o estado de Roraima no Brasil seguida pelas regiões 4 (Capital) e
8 que também faz fronteira com o Brasil (Tabela 5). Nos casos dos surinameses e venezuelanos, embora a
concentração de migrantes seja nas regiões fronteiriças com esse países (1, 6, 7), há também migrantes
localizados em outras regiões, o que indica que a mobilidade espacial dos migrantes desses países não se limita
as regiões de fronteira. Com a exceção da região 4, onde Georgetown está localizada, as outras regiões estão
localizadas no interior do país, onde a mineração é uma das principais atividades econômicas.

169
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabela 5 - Distribuição regional de estrangeiros na Guiana naturais de Brasil, Guiana Francesa,


Suriname, e Venezuela, 2002

Região Brasil Guiana Francesa Suriname Venezuela Total


Região 1 26 0 1 146 173
Região 2 22 0 43 184 249
Região 3 63 9 377 308 757
Região 4 264 89 1 109 304 1 766
Região 5 6 1 140 17 164
Região 6 15 15 821 23 874
Região 7 40 1 9 142 192
Região 8 186 2 7 12 207
Região 9 512 0 2 4 518
Região 10 35 9 64 28 136
Total 1. 169 126 2. 573 1. 168 5. 036
Fonte: Guyana Bureau of Statistics (2005).

Quanto ao sexo da populção estrangeira, nota-se uma alta concentração de homens, sendo essa
concentração extremamente elevada na região 8, o que pode refletir a atividade mineradora nessa região
(Tabela 6). Quando se considera a razão de sexo por nacionalidade, Suriname, apresenta uma maior concentração
de mulheres em relação aos demais países (Tabela 7). Mas poucos estudos tratam da relação entre gênero e
migração internacional na Amazônia que possam explicar essa diferença.

Tabela 6 - População estrangeira por sexo e região de residência, 2002

Região Homens Mulher Total Razão de sexo*


Região 1 126 90 216 140,0
Região 2 165 168 333 98,2
Região 3 582 560 1142 103,9
Região 4 2.302 2.041 4.343 112,8
Região 5 179 160 339 111,9
Região 6 679 679 1.358 100,0
Região 7 167 110 277 151,8
Região 8 228 62 290 367,7
Região 9 299 259 558 115,4
Região 10 212 181 393 117,1
Total 4.939 4.310 9 249 114,6
Fonte: Guyana Bureau of Statistics (2005).
* Número de homens por cada 100 mulheres.

170
Migração internacional e desenvolvimento: o caso da Guiana • Hisakhana Corbin

Tabela 7 - População estrangeira por sexo

Países de origem Homem Mulher Razão de sexo*

Barbados 120 115 104,3


Brasil 693 476 145,6
Canadá 109 110 99,1
China 374 267 140,1
Guiana Francesa 63 63 100,0
Índia 69 43 160,5
Jamaica 57 49 116,3
Suriname 1.242 1.331 93,3
Santa Lúcia 169 124 136,3
Reino Unido 167 147 113,6
Estados Unidos 360 315 114,3
Trinidad & Tobago 257 218 117,9
Outros 672 471 142,6
Venezuela 587 581 101,0
Total 4.939 4.310 114,6
Fonte: Guyana Bureau of Statistics (2005).
* Número de homens por cada 100 mulheres.

Contudo, algumas pesquisas indicam que existe uma intensa migração ou mobilidade entre as Guianas
e Brasil, incluindo frequentemente mulheres (AROUCK, 2000; SIMONIAN; FERREIRA, 2005).
O estudo de Arouck (2000) revelou que a maioria de brasileiros na Guiana Francesa era oriunda do Pará e do
Amapá, apontando fatores econômicos como a principal razão da migração de brasileiros para a Guiana Francesa,
estabelecendo uma forte rede migratória. Diversos pesquisadores têm observado que as redes familiares e de
amigos jogam uma dupla função: por um lado elas permitem a transferência rápida de informação de modo que
os migrantes potenciais podem melhor avaliar tanto os custos quanto os benefícios antes de migrar e, por outro
lado, as redes permitem uma adaptação mais fácil no lugar de destino, considerando a discriminação que os
imigrantes sofrem em terras estrangeiras (CORBIN, 2008; CORBIN, 2007b; CEPAL, 2006; SOARES, 2002;
ARAGÓN, 1986).

GUIANA COMO PAÍS RECEPTOR DE IMIGRANTES BRASILEIROS

Desde a década de 1970, a Guiana tem estabelecido diversos acordos e protocolos com Brasil nas
áreas de saúde, transporte aéreos, educação e cultura, ciência e tecnologia, agroindústria e comércio (MRE,
2009). Apesar de não existir um acordo para a livre mobilidade de mão-de-obra com Brasil – como no caso dos
países caribenhos –, a mobilidade recíproca na fronteira Guiana-Brasil, é observada desde a década de 1960
(PEREIRA, 2006), e intensificada hoje com a construção da ponte sobre o rio Takutu. Algumas fontes revelam
que a mobilidade populacional nessa fronteira pode ter sido intensa desde muito tempo.
Atualmente, muitos jovens nascidos na Guiana frequentam escolas de Bonfim no Brasil. Geralmente,
esses jovens são de famílias que ainda hoje mantêm vínculos ancestrais no outro lado da fronteira. O resultado
dessa mobilidade internacional entre os que habitam a região fronteiriça de Guiana-Brasil são uniões matrimoniais
que contribuem para a formação de um grupo de pessoas que se identifica como guy-braz. Essa denominação
significa que esse grupo de pessoas possui um tipo de identidade dupla, com valores culturais de ambos os
países em questão.

171
Migração internacional na Pan-Amazônia

Atualmente a mobilidade populacional nessa fronteira não se restringe somente aos grupos indígenas e
aos guy-braz. Dados extraídos dos registros do Departamento de Imigração da Polícia Nacional da Guiana
situada na fronteira de Lethem-Bonfim revelam que 1.723 e 1.504 pessoas de 42 nacionalidades entraram e
saíram, respectivamente do país, durante um período de 60 dias consecutivos (1º de março a 30 abril de 2006).
Por mais que a maioria dessas pessoas seja oriunda de países amazônicos, houve também mobilidade de
europeus, africanos, asiáticos e caribenhos nessa fronteira (Tabela 8).

Tabela 8 - Entradas e saídas, Lethem - Bonfim (1 de março a 30 de abril de 2006).

Nacionalidade Entradas Saídas Total


Brasileiro 1 000 701 1 701
Colombiano 2 - 2
Guianês 591 635 1 226
Peruano 6 1 7
Surinamês 6 8 14
Venezuelano 10 14 24
Outros 108 145 253
TOTAL 1 723 1 504 3 227
Fonte de dados: Guyana Immigration Department Registers (Lethem), 2006

Como se pode notar na Tabela 8, a maioria dos indivíduos que saiu e entrou durante o período em
questão foi de nacionalidade guianesa e brasileira. A maioria dessas pessoas em movimento concentrava-se na
faixa etária de 21 a 60 anos, ou seja, mão-de-obra em movimento (CORBIN, 2007a).
A maioria dos brasileiros identificou como lugar de destino Georgetown ou o Suriname, e 77,6% indicaram
que em Georgetown se hospedariam em pousadas e hotéis, tais como Rockies International Hotel and Bar,
Sunflower Hotel, e Hotel Ailton antes da sua jornada ao interior de Guiana ou para o Suriname via fronteira
Guiana-Suriname. Os dados do Departamento de Imigração ainda revelam que 61,7% dos 1.000 brasileiros que
entraram na Guiana vinham do estado de Roraima.
De maneira igual, resultados agregados sobre a entrada e a saída de guianeses mostram que 29,1% e
21,3% dos 1.226 são procedentes de Georgetown e Lethem, respectivamente. Apesar de ir para o Brasil à
procura de atendimento na área de saúde, guianeses que habitam na fronteira, procuram também trabalho não
qualificado que é mais fácil encontrar em Boa Vista do que em Lethem. Porem, os registros do Departamento
de Imigração em Lethem mostram que a maioria dos guianeses que foram para o Brasil declarou o turismo
como sendo a razão principal da viagem, igualmente como os brasileiros que viajaram para Guiana.
Contudo, esses dados não permitiram análises mais aprofundadas quanto aos processos de migração e
retorno, nem possibilitaram traçar um perfil sociodemográfico desses migrantes. Com esse intuito foi aplicado
um questionário diretamente a 200 brasileiros para completar as informações do Departamento de Imigração.
140 ou 70% dos 200 imigrantes já tinham vivido fora dos seus estados de nascimento antes de migrar para a
Guiana pela primeira vez, sendo o estado do Pará, e principalmente o de Roraima, os mais citados como locais
de última residência. Observe-se que enquanto o estado de Roraima sustenta percentual mínimo de nascimentos
(4%), este estado foi registrado como lugar de residência por 46% das 140 pessoas que viviam fora dos seus
estados de nascimento antes de migrar para Guiana. Esse padrão migratório indica a importância da migração
interna para a internacional. Os migrantes brasileiros procuram tirar vantagem de novas oportunidades para
aumentar sua renda trabalhando na Guiana. Apesar da importância de Roraima, 28% do total de migrantes é
proveniente diretamente de seus estados de nascimento. Estes são principalmente maranhenses, indicando

172
Migração internacional e desenvolvimento: o caso da Guiana • Hisakhana Corbin

assim dois padrões de migração de maranhenses para a Guiana. Um primeiro padrão se caracteriza por uma
migração por etapas, parando em sua trajetória principalmente no Pará, Amazonas e Roraima. E um segundo
padrão caracterizado pela migração direta desde seu lugar de nascimento. De forma semelhante aos
maranhenses, 51,7% dos paraenses migraram para Guiana diretamente do Pará, mas não necessariamente a
partir dos municípios de nascimento. Por tanto, o Pará foi identificado como um estado de trânsito, principalmente
para maranhenses em rota para a Guiana, e também como um estado de origem de outros migrantes que se
deslocam para Guiana diretamente ou com paradas nos estados do Amazonas e Roraima, o que reforça a
importância que representa a migração interna para a internacional. Este movimento interestadual também
indica que estes estados brasileiros podem ser considerados como estados de origem, trânsito e destino para os
brasileiros que migram internamente.
Motivos econômicos foram reportados pela maioria (85,5%) como razão principal da migração para a
Guiana. Efetivamente, o estudo mostra que 56,5% dos migrantes (todos homens) se ocupam em atividades de
mineração. Assim como cresce a população de garimpeiros, crescem também suas exigências de bens e
serviços brasileiros, atraíndo trabalhadoras do sexo, trabalhadoras domésticas e até mesmo comerciantes, que
começam a tomar vantagens dos acordos comerciais entre a Guiana e o Brasil, que facilitam a circulação de
pessoas e bens através das fronteiras geopolíticas. O número de pessoas que migram para trabalhar em atividades
mineradoras tem aumentado significativamente: 87% do total de migrantes migraram pela primeira vez para a
Guiana entre 2000 e 2006. Com a abertura da estrada Bonfim-Georgetown, a Guiana também passa a ser um
importante país de trânsito para brasileiros em rota para o Suriname.
Após chegar ao estado do Pará (geralmente de ônibus), provenientes do Maranhão, o maior volume de
migrantes parte de Santarém (geralmente de barco) rumo ao Amazonas. Após chegar ao Amazonas, os migrantes
vão de Manaus ao estado Roraima (Boa Vista) (geralmente de ônibus). Deixando Boa Vista, de ônibus ou de
táxi, o maior volume de migrantes se dirige, em seguida, para a travessia Bonfim-Lethem, onde são submetidos
a controles de segurança em matéria de imigração, procedendo logo para Guiana, quer a pé ou de barco quando
o nível das águas do rio Takutu está elevado. Os imigrantes posteriormente se dirigem a Georgetown, seja
como ponto de destino ou de trânsito para o interior da Guiana ou para o Suriname.
Retornando por esta rota bem definida, os migrantes se dirigem das regiões do interior da Guiana e
Paramaribo (Suriname), para Georgetown (Guiana), de onde viajam principalmente para Boa Vista (Brasil),
através da rota Lethem-Bonfim. Embora tenham nascido em outros estados, a maioria dos migrantes retornaram
ao estado de Roraima onde geralmente moravam antes de migrar para a Guiana.
Foram identificados quatro grupos de migrantes brasileiros na Guiana. O primeiro grupo é constituído
por migrantes de primeira viagem, sendo a maioria maranhenses com residência fixa no estado do Roraima.
Apesar dessa primeira viagem para a Guiana, eles anteriormente realizaram migração interna no Brasil à
procura de melhores condições de vida. Nesse processo migratório, o migrante se apoia em uma forte rede
entre famílias, parentes e amigos residentes na Guiana, através da qual adquire informações adequadas sobre
lugares de trânsito e destino, para poder reduzir custos e incertezas.
Os residentes fazem parte do segundo grupo e desempenham um papel importantíssimo nos processos
de migração e adaptação para os recém-chegados sejam eles garimpeiros, comerciantes, trabalhadores domésticos
ou trabalhadoras de sexo. Esses novos migrantes são ajudados economicamente, pelos que já estão instalados
há algum tempo. Eles providenciam as condições necessárias e adequadas para facilitar a migração de famílias,
parentes e/ou amigos, que, mais frequentemente, já se encontram no processo de migração intra-estados brasileiros
em direção ao estado de Roraima.

173
Migração internacional na Pan-Amazônia

Nessa trama o sucesso de novos grupos de brasileiros no processo de migração depende, em grande
medida, do sucesso dos garimpeiros. Os residentes, por já conhecerem um pouco mais a Guiana, conseguem
avaliar as oportunidades econômicas e situações ambientais e políticas do país, para melhor informar migrantes
potenciais sobre o melhor momento para atravessar a fronteira ou repetir a migração.
O terceiro grupo é caracterizado pelos brasileiros que retornam para Guiana, ou seja, repetem uma e
outra vez a migração internacional. Sendo a mineração uma atividade sazonal, os trabalhadores brasileiros
voltam para o Brasil para reencontrar parentes e pessoas conhecidas, transferir capital, e voltam para a Guiana
novamente.
No longo prazo, após arrumar dinheiro suficiente, os migrantes retornam definitivamente ao Brasil
(quarto grupo) e os migrantes de retorno para a Guiana, assumem o status de migrantes residentes, estabelecendo
as condições necessárias de contratação dos recém-chegados, iniciando um novo ciclo migratório.
Fatores climáticos influenciam diretamente a mineração feita nos rios e/ou em terra, o que
subsequentemente provoca ondas de retorno entre os diversos grupos em momentos oportunos. Ou seja, cada
fluxo é seguido por um contrafluxo sazonal, quando os migrantes aproveitam para reunir-se com suas famílias
e amigos. Diferentemente do que Lee (1966) observou, os dados empíricos revelam que os lugares frequentados
podem ser lugares de nascimento, trânsito e/ou destino tanto internamente (no Brasil) como no exterior. Isso
levou a modificar o modelo de Lee (1966) conforme a Figura 3.
Onde:

Obstáculos
Estados brasileiros de trânsito e destino
no processo migratório intervenientes

0 0 0 0
+-0 +- +0 0- + 0
- -++0 0- +- 0+ 0 + + + +
+- -+0 0+ -- +0 0 +-- +0 +0 -- 0+ 0
+ + + + 0 -- +
+ 00 -- ++ 0
0- -++ 00 -- ++0
Estados de - _ _ _ Guiana: paí s
Guiana:
Estados de
nascimento _ _ _ _ de destino e
nascimento
no Brasil ) trânsi to de
país
destino e
no Brasil Estados brasileiros
Estados de tr de ân
brasileiros sito e destino
trânsito e destino
no processo do retorno
trânsito
no processo de retorno

Figura 3 - O processo migratório de brasileiros para a Guiana, baseado na representação


esquematizada de Lee (1966)

1. representa o processo migratório;

2. representa o processo de retorno;

3. representa os obstáculos intervenientes no processo migratório – que foram reduzidos


desde a construção da estrada Lethem-Georgetown; a eliminação de vistos para turistas brasileiros, e a
falta de aplicação das leis ambientais na Guiana;
4. + são os fatores de atração nos lugares de origem e destino. Os maiores fatores de atração nesse processo
são: melhores oportunidades de emprego na Guiana, migração acompanhada (accompanied migration)
em que crianças migraram juntos com seus pais, e uma forte rede social que permite a redução de custos
e incertezas;

174
Migração internacional e desenvolvimento: o caso da Guiana • Hisakhana Corbin

5. – representa os fatores de expulsão de um dado local. Os fatores de maior importância responsáveis são:
carência de melhores oportunidades de emprego no Brasil; clima adverso que provoca a sazonalidade da
migração e do retorno; a seletividade no mercado de trabalho que às vezes resulta em decepções na
Guiana e retorno ao Brasil;

6. O representa fatores que não afetam a decisão de migrar;

As análises anteriores deixam claro que a migração não se limita somente a uma análise racional, no nível
individual, dos custos e benefícios individuais de migrar; a diferença entre oportunidade de emprego em lugares de
origem ou destino como argumentavam os economistas (KUZNETS, 1964; YAP, 1976; SCHULTZ, 1962;
SJAASTAD, 1962). Este estudo mostra a importância de fatores estruturais no processo, como os papéis que
desempenham os acordos e protocolos entre diversos países e blocos regionais para a livre mobilidade de mercadorias
e pessoas e circulação de mão-de-obra. O CARICOM deixa bem claro que a necessidade da circulação de mão-
de-obra no Caribe é principalmente para enfrentar os desafios da globalização por estabelecer uma base para
aumentar competitividade da região. Nesse sentido como argumentam Portes e Bach (1985) a gênese da migração
internacional pode ser considerada como consequência da forma como os países em desenvolvimento estão se
integrando à economia mundial. Esse argumento é ampliado por Sassen (1988) ao afirmar que as mudanças
estruturais em nível mundial seriam responsáveis pela mobilidade transnacional massiva de trabalhadores, capital,
bens, serviços e informação principalmente durante as décadas de 1970 e 1980.
Dessas análises é visível que não existe um conceito único de migração o suficientemente completo
para enquadrar as diferentes perspectivas teóricas. Diversos pesquisadores têm observado que essas limitações
se referem, entre outros, aos seguintes fatores (ARAGON, 1984 entre outros): (1) dificuldades para conceber
um modelo aceitável tanto para regiões desenvolvidas quanto para regiões subdesenvolvidas, (2) falta de dados
válidos e confiáveis para a elaboração de testes empíricos de teorias e hipóteses tanto em países desenvolvidos
quanto em países subdesenvolvimento, (3) falta de estudos que relacionem migração interna e internacional
(CORBIN, 2007b) e (4) dificuldade para integrar num único modelo fatores sociais e econômicos e motivos
pessoais do ato migratório. Neste sentido, o CELADE (2006) ressalta a importância de pesquisas que abordem
outras dimensões da migração na América Latina e o Caribe como: migração de retorno, migração pendular,
tráfico de pessoas, remessas, e mobilidade temporal.

IMPLICAÇÕES DA MIGRAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DA GUIANA

Como a Guiana é um país receptor, de trânsito e emissor de migrantes, os impactos da migração para
o desenvolvimento sustentável podem ser tanto positivos quanto negativos.
No lado positivo, a emigração tem trazido remessas que contribuem significativamente ao PIB
da Guiana. Estatísticas do Banco Mundial em 2009 revelaram altas quantidades de remessas emitidas
aos países Amazônicos (Figura 4) e quando se consideram as suas contribuições para o PIB dos
respectivos países, essas remessas têm maior importância no caso da Guiana (em 2007) (Figura 5).
Consequentemente, a Guiana foi identificada como mais vulnerável na previsão do BID considerando
que as remessas para a America Latina e o Caribe deverão cair cerca de 11% em 2009 devido à crise
economia mundial (BID, 2009).

175
Migração internacional na Pan-Amazônia

Remessas recebidas

2008
2007

2006
A n os (1998-2008)

Venezuela
2005
Suriname
2004 Peru
Guiana
2003
Equador
2002 Colômbia
Bolívia
2001 Brasil
2000
1999
1998

- 1.000 2.000 3.000 4.000 5.000 6.000


Valores de remessas em milhões de US$

Figura 4 - Remessas recebidas pelos países amazônicos, 1998-2008


Fonte de dados: World Bank (2008).

Contribuições de remessas para o PIB, 2007

30,0%
% d o P IB d e 20 07

25,8%
25,0%
20,0%
15,0%
10,0% 7,1% 7,0% 6,2%
5,0% 2,2% 2,0%
0,3% 0,1%
0,0%
a
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Países Amazônicos

Figura 5 - Contribuições de remessas ao PIB dos países amazônicos, 2007


Fonte de dados: World Bank (2008)

Porém, essa contribuição de remessas deve ser vista e analisada com cautela quanto a sua verdadeira
contribuição para o crescimento econômico e desenvolvimento. Em termos macroeconômicos, as remessas entram
no país em valores pequenos e não têm o mesmo efeito para o crescimento econômico que investimentos
provenientes do exterior. As remessas entrando diretamente na renda das famílias, elas logo as gastam com o
consumo de bens e serviços. O próprio fato da Guiana importar muitos dos seus bens de consumo, essa injeção de
recursos oriundos das remessas na economia é logo esvaziada para a aquisição desses bens. Em consequência,
países como a Guiana importam mais do que exportam, e usam as remessas para obter produtos importados que

176
Migração internacional e desenvolvimento: o caso da Guiana • Hisakhana Corbin

no caso da Guiana atengiram a cifra de 317 milhoes de US$ em 2008, asim superando o valor de remessas que
alcançaram 278 milhões de US$ no mesmo ano. Contudo, alguns estudiosos argumentam que a longo prazo, a
emigração traria também benefícios para os países de origem incluindo além das remessas monetárias, remessas
não-monetárias, formação de migrant hometown associations, estabelecimento de redes na diáspora, e circulação
de cérebros, que seriam benéficos para o desenvolvimento dos países de origem (KIRTON, 2006; STUBBS E
REYES, 2004; OROZCO, 2000; 2004).
No lado negativo, a perda principalmente de professores e profissionais atuando no setor de saúde pode
ter implicações devastadoras na “quantidade e qualidade” de serviços prestados ao público em termos de
educação e atendimento de saúde. A carência de estudos detalhados sobre esses temas no contexto da migração
internacional na Guiana restringe uma análise mais profunda do impacto dessa variável demográfica no alcance
das Metas do Milênio, principalmente para as provisões de educação e saúde para assegurar o desenvolvimento
humano sustentável. Segundo o BID (2008) a falta de recursos humanos suficientes e a alta taxa de emigração
de guianeses colocam o país em sério risco para a concretização da estratégia de desenvolvimento. Com o
pressuposto de que uma força de trabalho altamente qualificada e produtiva é necessária para o melhoramento
do desempenho nos setores produtivos, o acordo que permite a livre mobilidade de mão-de-obra qualificada no
Caribe, atualmente, não parece ser vantajoso para as economias caribenhas mais pobres, considerando o êxodo
desse tipo de mão-de-obra, como é o caso de Guiana. Em seu estudo, Staritz et. al. (2007) salientam que a
emigração dos mais capacitados e empreendedores e, o declínio da acumulação de capital foram os fatores que
mais restringiram o crescimento econômico na Guiana. O crescimento da força de trabalho diminuiu de 0,6%
durante 1991-1997 para -0,4% durante 1998-2004, enquanto a acumulação de capital caiu de 5,8% em 1991-
1997 para menos de 2% entre 1998-2004.
No que diz respeito aos impactos sociais potenciais originados com essa livre mobilidade dos mais
capacitados, algumas preocupações foram levantadas sobre os valores da cidadania, soberania e nacionalidade
nos estados autônomos da região caribenha. Considerando que os países permanecem independentes e
autônomos, cada um procura metas diferenciadas para promover o seu próprio desenvolvimento, o que pode
gerar processos migratórios incontroláveis na região, resultando em uma distribuição desigual de profissionais
qualificados, o que estaria na contramão da meta principal do acordo para a livre mobilidade de mão-de-obra,
porque atrasaria os países economicamente mais débeis e estimularia o brain drain.
Por outro lado, o processo de imigração de brasileiros tem trazido benefícios econômicos e externalidades
ambientais que têm gerado preocupações quanto à mobilidade populacional e a sustentabilidade ambiental na
Região Amazônica (CORBIN, 2007a). No que diz respeito ao benefício econômico, a tecnologia avançada da
mineração, que acompanha os garimpeiros, contribui significativamente para o melhoramento do desempenho do
setor da mineração na área da produção de ouro e diamante. No ano de encerramento no país, da mineração de
grande escala em 2005, a pequena e média mineração praticada por brasileiros e guianeses, contribuiu com 62%
do total de exportação de ouro (em 2005), o que corresponde a uma receita equivalente a 69,3 milhões de dólares
americanos (LIVAN, 2006). O alto preço do ouro no mercado internacional, as condições climáticas favoráveis
para a mineração e o aumento em investimentos são reconhecidos como fatores responsáveis para o crescimento
contínuo da exploração em escala pequena e média e suas contribuições representaram 6,9% do PIB real do país
em 2008. Esse ano marcou um ponto de inflexão em virtude da presença brasileira que se tornou mais visível em
anos recentes. Considerando a vulnerabilidade da economia guianesa devido à queda de produtos como arroz e
açúcar, o encerramento da mineração do ouro em grande escala e a emigração dos mais capacitados, é inevitável
que haja uma maior dependência do investimento e mão-de-obra brasileira para fortalecer o PIB.
Com os investidores brasileiros oferecendo poucas oportunidades de trabalho para guianenses, moradores
das comunidades de mineração, muitos são da opinião de que uma indústria brasileira de mineração está se

177
Migração internacional na Pan-Amazônia

consolidando no território da Guiana (CORBIN, 2007a). Concomitantemente com o aumento da participação


brasileira no setor de mineração durante os anos 2000-2006, observa-se, durante esse período, um sensível
crescimento no número de migrantes; o que indica que a tecnologia não é o único determinante para o aumento
da produção de ouro e diamante, houve também um aumento da mão-de-obra brasileira na atividade em questão.
Foi também nesse período que os registros de licença de operação no setor de mineração aumentaram de 300
para 1.500 (CORBIN, 2007a).
O aumento na intensificação e extensão da mineração nesse período trouxe externalidades ambientais
graves como a retirada da cobertura vegetal e outras mudanças ambientais (Fotografia 1). Os impactos ambientais
são intensificados pelas incertezas relacionadas a falta de surveys geológicos antes de se iniciar a atividade de
mineração. Muitas vezes se descobre que as áreas não são produtivas só depois da vegetação ser derrubada.
No decorrer de cinco anos, estimativas conservadoras revelam que a Guiana pode perder 206.250 acres de
florestas primárias e secundárias devido à mineração em terras não produtivas3. Esse panorama representa
uma falha das políticas voltadas para a alocação de recursos naturais; o que está resultando no esgotamento de
recursos florestais em curto prazo. Além disso, a falta de aplicação da legislação ambiental e monitoramento
ambiental inadequado também são causas motrizes da degradação ambiental (BYNOE, et. al., 2008; CORBIN,
2007a; LOWE, 2006). Observando que 3,66% do território da Guiana está degradado pela mineração, Bynoe,
et. al. (2008) salientaram uma relação positiva entre a expansão das atividades de mineração e o aumento na
taxa de degradação ambiental. Esse estudo também revelou que na mineração praticada por brasileiros não se
pratica reabilitação ambiental; eles são obrigados a pagar um título ambiental (environmental bond) que varia
entre 250 e 500 dólares. Esta baixa valoração do meio ambiente permite aos garimpeiros fugir sem reabilitar as
terras degradadas (Fotografia 2). E os povos indígenas são os mais afetados pelas externalidades ambientais
(CORBIN, 2007a; LOWE, 2006).

Fotografia 1 - A retirada de cobertura vegetal para iniciar a Fotografia 2 - Terras abandonadas sem reabilitação
mineração, Mahdia, 2006 ambiental, Kuraparu, Guiana
Fonte: Corbin, 2006 (Região 7), Guiana Fonte: Glasgow, DPMC, 2008

3
A perda da floresta em terras não produtivas/ano = 27,5 acres/operação multiplica por 1.500 operações.

178
Migração internacional e desenvolvimento: o caso da Guiana • Hisakhana Corbin

No que se refere aos impactos sociais o Ministério do Interior da Guiana manifesta muita preocupação
com o elevado número de pedidos recebidos em nome de jovens mulheres brasileiras que procuram emprego
nas comunidades de mineração (CORBIN, 2007a). Expressando ainda mais preocupações quanto à exploração
dos imigrantes ilegais, o Ministério insiste que os imigrantes ilegais devem ser registrados, para que possam ser
elegíveis para viver e trabalhar legalmente. Também têm ocorrido esforços de colaboração entre a Embaixada
Brasileira, a Polícia Nacional e o referido Ministério para que todos os brasileiros que visitam ou trabalham na
Guiana sejam registrados (GINA, 2005a). Mas apesar das repetidas chamadas, a maioria de brasileiros ilegais
se recusam apresentar os documentados requeridos por várias razões, incluindo a tentativa, de alguns brasileiros,
de ocultar atividades econômicas ilegais, escapando assim do pagamento de impostos. Outra razão é que os
migrantes simplesmente ignoram o processo de documentação, porque pretendem trabalhar na Guiana apenas
por poucos meses, para logo regressar ao seu país e, em seguida, voltar à Guiana se considerar necessário.
Uma estratégia adotada para fugir dos impostos é o envio de remessas. Esses migrantes estabeleceram
um forte sistema de rede entre os empresários do Brasil e da Guiana, através da qual os migrantes depositam
dinheiro em dólares guianeses em agências brasileiras na Guiana, que posteriormente mandam ordem, por
telefone ou pela Internet, para a agência no Brasil depositar o equivalente na conta do cliente em reais. Outra
razão para não querer a legalização está relacionada a burocracia no Ministério do Interior para os migrantes
obterem autorizações de trabalho e os elevados custos para permanecer em Georgetown. Em alguns casos,
imigrantes clandestinos “mal comportados” foram detidos para a prisão (STABROEK NEWS, 2005), antes de
serem deportados à custas da Embaixada do Brasil em Georgetown. Essa situação causa preocupação aos
funcionários da Embaixada Brasileira em Georgetown. No entanto, a deportação de brasileiros da Guiana é
menos frequente do que Arouck (2000) constatou na Guiana Francesa. Sobre esses assuntos o Ministério do
Interior manifestou preocupação pelas atividades ilegais como o tráfico transfronteiriço de estupefacientes,
comércio de armas, mineração ilegal por garimpeiros de ouro brasileiros e comércio de produtos domésticos
incluindo motocicletas (STABROEK NEWS, 2006a).
Mais um motivo para não querer ser documentados está relacionado ao elevado número de autorizações
de trabalho solicitadas em nome de jovens mulheres brasileiras. As mulheres brasileiras com idade superior a
30 anos são, geralmente, contratadas como cozinheiras nas minas, assim, qualquer nova tentativa para patrocinar
um grande número de mulheres jovens, estaria relacionada com tráfico de mulheres. Na verdade, esse tráfico
de jovens mulheres brasileiras tem sido uma preocupação entre a comunidade guianesa, como foi noticiado pela
imprensa:
De acordo com relatos, em um determinado dia em cada semana, os conhecedores sabem
que à noite, certos clubes oferecem jovens strippers brasileiras para satisfazer o prazer de
seus fregueses. E há algumas pessoas que, pela consideração, podem adquirir uma “menina”,
muitas vezes menor de idade para trabalhar, como empregada doméstica, babá, garçonete,
bem como em outras profissões não identificadas, bem abaixo do salário mínimo ou de
graça, se alimentação e alojamento são providos [...] (STABROEK NEWS, junho 10, 2006b–
tradução livre).4

Entrevistas com homens que frequentam esses estabelecimentos de strip-tease em Georgetown revelam
que as brasileiras trabalhadoras do sexo muitas vezes não sabem falar inglês, mas que são orientadas por
alguém a “recitar” um preço, dependendo do serviço prestado (CORBIN, 2007a).

4
O original em ingles: According to reports, on a given night each week, the connoisseurs know which night it is, certain night-clubs offer
young Brazilian strippers for its patrons’ pleasure. And there are certain people, who, for a consideration, can procure “a girl”, often
under-age, to work as a housemaid, nanny, waitress as well as at other unmentionable professions at well below the minimum wage or for
nothing at all if food and board are provided […] (STABROEK NEWS, June 10, 2006b).

179
Migração internacional na Pan-Amazônia

Há também preocupações jurídicas quanto a mulheres brasileiras envolvidas em strip-tease em


Georgetown, como no caso reportado em 2006:
Cinco mulheres de programa (strippers) brasileiras compareceram ontem perante o
Magistrado encarregado do Tribunal de executar atos indecentes após policiais invadirem
o Dragão Vermelho Clube de Esporte na sexta-feira passada. Apesar de longas observações
e argumentações de seus advogados, Aurelaide de Souza, Maria Karlene de Vodoso,
Patrícia Conarata da Silva, Kenis de Sausa Paira e Cristyelen Barros Pimenta foram detidas
pelo Magistrado Gordon Gilhuys. Todas elas se confessaram inocentes. É alegado que,
em 8 de setembro, no bar localizado na Robb Street, um local de público acesso, elas
dançaram e tiraram suas roupas em plena vista dos fregueses [...] (STABROEK NEWS,
setembro 12, 2006c).5

Preocupada com a situação em que se encontravam as jovens brasileiras, a igreja evangélica ofereceu
serviços espirituais para salvá-las.

CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÕES

Em conclusão, importa sublinhar que a migração internacional apresenta um grande desafio principalmente
para países economicamente pobres, como a Guiana, os quais tem maior dependência de remessas. Com a
altíssima emigração dos mais capacitados e aproximadamente com 55,9% da população fora do país, políticas
visando aumentar a participação da diáspora no desenvolvimento da Guiana são cruciais. A carência de
professores treinados que é atribuída à emigração, demanda mudanças estruturais nos programas de educação
para melhor aproveitar o emigrante através de circulação de cérebros. No caso especial da educação superior,
E-learning deve ser mais reconhecido nos programas de reformas em educação como uma saída para mitigar
as dificuldades e aumentar as vantagens da emigração de professores e cientistas, já que eles podem tutorar
online – enriquecendo, assim, os conteúdos das disciplinas devido suas experiências e maior acesso a informação
e equipamentos de pesquisas nas universidades no exterior. Arranjos institucionais ainda podem ser intensificados
para a circulação de alunos, pesquisadores e professores entre as instituições internacionais por curta duração
para capacitação e formação de recursos humanos– os quais são fundamentais para o fortalecimento institucional
e o desenvolvimento sustentável.
Contudo, a falta de incentivos (monetários e não monetários oferecidos pelo Estado) e a instabilidade e
discriminação política podem minar os objetivos dessas tentativas de mitigar os impactos da emigração dos
mais capacitados, prejudicando o desenvolvimento do país. Dessa forma, a economia da Guiana fica cada vez
mais dependente da mão-de-obra proveniente dos países limítrofes. Contudo, apesar de que as potencialidades
econômicas emergentes da abertura da ponte entre Guiana-Brasil sejam grandes, a Guiana ainda não parece
estar preparada nem institucionalmente nem infraestruturalmente para aproveitar os benefícios provenientes
do comércio internacional. De maneira igual, vários são os questionamentos quanto à circulação de armas e
atividades ilegais ao longo da fronteira (CORBIN, 2007). Consequentemente, são necessárias políticas para o
controle da fronteira. O foco central dessas políticas devem ser planos e ações de cooperação internacional
para gestão e controle das fronteiras com Venezuela, Brasil e Suriname. Considerando a tendência crescente

5
O original em ingles: Five Brazilian strippers yesterday appeared in the Georgetown Magistrate’s Court charged with performing indecent
acts after police swooped down on the Red Dragon Sports Club last Friday. Despite lengthy submissions and pleas by their lawyers,
Aurelaide de Souza, Maria Karlene de Vodoso, Patricia Conarata de Silva, Kenis de Sausa Paira and Cristyelen Barros Primienta were
remanded to prison by Magistrate Gordon Gilhuys. They all pleaded not guilty to performing an indecent act. It is alleged that on
September 8 at the bar located on Robb Street, a place to which the public has access, the defendants danced and stripped off their clothing
in full view of patrons. […] (STABROEK NEWS, September 12, 2006c).

180
Migração internacional e desenvolvimento: o caso da Guiana • Hisakhana Corbin

da presença de garimpeiros provenientes do Brasil, é urgente um monitoramento mais rigoroso da Guyana


Environmental Protection Agency e da Guyana Geology and Mines Commission. Os valores dos títulos
ambientais devem ser revistos para que os verdadeiros custos das externalidades ambientais sejam devidamente
compensados.
Tanto como os brasileiros na Guiana, os guianeses no Caribe estão sujeitos a discriminação e assédio;
um problema que demanda maior cooperação internacional para a proteção de imigrantes e fazer respeitar os
diversos acordos que buscam permitir a livre mobilidade de mão-de-obra na região caribenha e a fácil mobilidade
de guianeses e brasileiros através das fronteiras. Quanto ao desenvolvimento regional essa mobilidade de
pessoas pode ser vista como um aspecto positivo para países de origem e destino considerando os impactos
positivos das remessas, os laços comerciais e redes estabelecidos e a transferência de conhecimento que
podem aumentar o crescimento econômico. Como as remessas entram ao país em quantidades pequenas e vão
direto para suprir necessidades básicas, arranjos institucionais devem ser elaborados para a redução dos custos
de transação para a emissão das mesmas.
Considerando a importância da migração internacional na Guiana, futuros estudos deveriam ser realizados,
enfatizando, entre outros aspectos, os seguintes:
• Estudos de caso sobre os impactos da emigração e da imigração sobre o crescimento econômico e
desenvolvimento sustentável da Guiana e outros países com tendências migratórias semelhantes;
• Estudos aprofundados sobre os desafios do êxodo de professores e enfermeiras na qualidade da
educação e dos serviço de saúde para o desenvolvimento humano em países como a Guiana;
• Estudos mais aprofundados sobre a participação feminina no processo migratório e trafico de mulheres
para a Guiana. Considerando a sensibilidade do tema e a ilegalidade de muitos imigrantes em
terras estrangeiras, precisa-se de novas abordagens metodológicas para a coleta de dados válidos e
confiáveis;
• Elaboração de novos modelos baseados em proposições teóricas interdisciplinares e multidisciplinares
para estudar melhor a migração internacional e sua relação com o desenvolvimento.
• Pesquisas mais acuradas que permitam identificar e quantificar os custos e os benefícios da migração
internacional;
• Estudos comparativos das relações entre migração internacional, migração interna e mobilidade
populacional em geral;
• Estudos sobre a migração internacional e o uso dos recursos naturais e desenvolvimento sustentável
na Pan-Amazônia visando a formulação de políticas regionais em conformidade com as metas e os
objetivos do Tratado de Cooperação Amazônica.

181
Migração internacional na Pan-Amazônia

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184
International migration in Suriname • Andrea Jubithana-Fernand

INTERNATIONAL MIGRATION IN SURINAME

Andrea Jubithana-Fernand 1

INTRODUCTION

DATA

This paper is based principally on interviews with civil servants of the ministries involved in migration
and foreign policy, namely the Ministry of Justice and Police, the Ministry of Labor, Technological Development
and Environment, the Ministry of Interior, the Ministry of Defense and the Ministry of Foreign Affairs; and
statistical data provided by those ministries and the General Bureau of Statistics (GBS). In addition, for writing
the section on Brazilian migration, an opportunity sample with 22 Brazilians living in Suriname was used, applying
a questionnaire with 21 questions.

DEFINITION AND TYPES OF MIGRATION

Every country has to do with the phenomenon of migration. From ancient times till the present, people
have moved in many directions. Migration means the movement of humans from one place to another. The
different types of migration include, among others, seasonal, permanent, local, regional, rural to urban, urban to
rural, internal, and international migration. In this paper, the focus will be on international migration in Suriname.
According to Wikipedia “International migration occurs when persons cross state boundaries and stay in the host
state for some minimum length of time”2, and for Pulido (2004), “An international migrant is someone living in a
country other than its own for longer than one year”. Within the scope of industrialization three types of migration
can be considered: labor migration, refugee migration, and urbanization. In the case of international migration in
Suriname, it can be taken as labor migration, because most of the immigrants come to Suriname to work.
It is important to stress that the International Labor Organization (ILO) has established an ILO Multilateral
Framework on Labor Migration, containing non-binding principles for a rights–based approach of labor migration
which could guide governments to manage labor migration. According to Juan Somavio, Director General of the
ILO, “Migrant workers are an asset to every country where they bring their labor. Let us give them the dignity
they deserve as human beings and the respect they deserve as workers”3.

1
MSc, Professor of the Anton de Kom University of Suriname. E-mail: a.jubithana-fernand@uvs.edu
2
http://en.wikipedia.org/wiki/International _migration.
3
http://www.ilo.org.

185
Migração internacional na Pan-Amazônia

CAUSES OF MIGRATION

Migration has clear causes which can be understood as push and pull factors. “Push and pull factors
are those factors which either forcefully push people into migration or attract them”4, although a factor can be
at the same time a push and a pull factor. Table 1 presents examples of push and pull factors.

Table 1 - Examples of push and pull factors

Push factors (emigration) Pull factors (immigration)

Few opportunities Better living conditions


Not enough jobs Job opportunities
Political fear Security
Primitive conditions Education
Discrimination Better medical Care
War and Terrorism Family Links
Natural Disasters/Pollution Clean, Healthy Environment
Lower chances of finding courtship Better chances of finding courtship

International migration occurs in both developing and developed countries, generating movements in
different directions: north- north, south- south, south-north, and is caused by multiple factors. One of the most
frequent reasons for international migration lies in the sphere of economics and finance. Labor migration is a
consequence of lack of job opportunities in the country from which a person migrates while for the countries to
which workers migrate, their labor can be considered an asset. The awareness of people about job opportunities,
better standard of living and welfare are also causes for increasing migration. In this context, globalization and
industrialization play important roles. In general, however, the causes of migration can be grouped into two main
dimensions: (1) the security dimension of migration, such as natural disasters, threats to individual´s safety,
poor political prospective and other conflicts; and (2) the economic dimension of migration, such as poor
situation of national markets and poor economic situation (Figure 1).

Socio-Economic,
Socio – Economic ,
Cultural, Political,
Political,
Migration
Environmental
pproblems
roblems

Figure 1 - General causes of migration.


Source: Own elaboration

CONSEQUENCES OF MIGRATION

The consequences of migration are diverse and depend on the profiles of the migrants (for example,
age and education), the development of the country to which the person goes or the development of the country
from which the person comes. For example, migration affects the population distribution and the demography of
both countries of origin and destination. In general, migrants are young people in productive ages, so the impacts

4
http://en.wikipedia.org/wiki/Human_migration.

186
International migration in Suriname • Andrea Jubithana-Fernand

of international migration can be positive or negative in the country of origin and destination. For instance, it
affects social security schemes (pensions, social assistance and health care), because of demographic, economic,
social, behavioral, and fiscal changes.
Countries of origin benefit from remittances and acquired skills during the period of migration when
migrants return, but migrants quite often suffer with abuses and exploitation at countries of destination. Figure 2
presents a scheme of the main relations between the causes and consequences of international migration.

· Demographic
factors
· Economic Population
factors Social Security Distribution
· Fiscal factors Schemes and
· Social Culture
bahavioral
factors

International Economic and


Social
Migration
Development

Socio-Economic,
Cultural,
Political Barriers and
Environmental Obstacles
problems

Figure 2 - A scheme of causes and consequences of international migration.


Source: Own elaboration.

Figure 2 indicates that international migration has impact on Social Security Schemes of the country where
migrants live. The economic and social situation of these countries is also affected. As a result of international
migration, population distribution changes and at the long-run the culture of the countries can also be modified.
It is important to notice that there are strong and complex linkages between international migration and
the Millennium Development Goals, especially with reference to poverty reduction (goal 1), gender and equality
(goal 2), prevention of HIV/AIDS, malaria and other infectious diseases (goal 6), environmental sustainability
(goal 7), and creation of global partnership for development (goal 8), for whose achievement international
migration can be an important asset.

INTERNATIONAL MIGRATION IN SURINAME

AREA AND POPULATION SIZE OF THE COUNTRY

According to the 2004 seventh Population and Housing Census, Suriname has 163,820 km2, and 492,829
inhabitants. Suriname is divided into ten districts: Paramaribo, Wanica, Coronie, Nickerie, Saramacca,
Commewijne, Marowijn, Sipaliwini, Brokopondo and Para; and each district is divided into ressorts (Map 1).
Most of the population lives along the coastal districts (Table 2 and Figure 3).

187
Migração internacional na Pan-Amazônia

Map 1 - Districts of Suriname.


Fonte: www.suriname.nu.

188
International migration in Suriname • Andrea Jubithana-Fernand

Table 2 - Suriname: Total Population and Area by District and Ressort, 2004

District/Ressort Population Area, km2 % of Total % of Total District/Ressort Population Area, km2 % of Total % of Total
Population Area Population Area

Paramaribo 242946 182 49.30 0.11 Commewijne 24649 2353 5.00 1.44
Blauwgrond 28436 Margaretha 781
Rainville 28853 Bakkie 541
Munder 8202
Nieuw Amsterdam 5489
Centrum 29274
Alkmaar 4213
Beekhuizen 19783
Tamanredjo 5510
Weg naar Zee 13172
Meerzorg 8115
Welgelegen 23709
Tammenga 14313
Marowijne 16642 4627 3.38 2.82
Flora 15346
Moengo 9662
Latour 26148
Pontbuiten 19477 Wanhatti 346

Livorno 8386 Galibi 671


Moengo Tapu 427
Wa n i c a 85986 443 17.45 0.27 Albina 5114
Kwatta 10091 Patamacca 422
Saramaca Polder 7789
Kwarasan 16161 Para 18749 5393 3.80 3.29
Nieuwe Grond 20219 Para-Noord 6442
Lelydorp 15945 Para-Oost 7349
Houtuin 10227
Para-Zuid 4403
Domburg 5554
Bigi Poika 335
Carolina 220
Nickerie 36639 5353 7.43 3.27
Wageningen 3428
Brokopondo 14215 7364 2.88 4.50
Groot Henar 3545
Kwakoegron 259
Oostelijke Polders 6778
Marechlilkreek 1001
Nieuw Nickerie 13842
Westelijke Polders 9046 Klaaskreek 1317
Brokopondo Centrum 2854

Coronie 2887 3902 0.59 2.38 Brownsweg 3871


Welgelegen 605 Sarakreek 4913
Totness 1684
Johanna Maria 598 Sipaliwini 34136 130567 6.93 79.70
Tapanahony 13805
Saramacca 15980 3636 3.24 2.22 Boven-Suriname 15057
Calcutta 1918 Boven- Saramacca 1537
Tijgerkreek 2899
Boven-Coppename 595
Groningen 2825
Kabalebo 1843
Kampong Baroe 1948
Coeroeni 1299
Wayambo 1582
Jarikaba 4808 TOTAL 492829 163820 100.00 100.00
Source: General Bureau of Statistics (2004).

189
Migração internacional na Pan-Amazônia

45000
40000
35000
Paramaribo
Brokopondo 30000

Mi gra nts
Para 3% Sipaliwini
Marowijne Wanica
Commewijne 3%
4% 7% Paramaribo 25000
50% Nickerie
5%
Saramacca Coronie 20000
3%
Saramacca 15000
Commewijne 10000
Marowijne
Coronie
5000
1% Para
Nickerie Brokopondo 0

2 00 6
19 72
197 4
1 976
19 78
198 0
1 982
19 84
198 6
1 988
19 90
199 2
1 994
19 96
199 8
2 000
20 02
20 04
7%
Wanica Sipaliwini
17%

Years immigration
emigration

Figure 3 - Population by District Figure 6 - Suriname emigration and immigration, 1972-2007


Source: General Bureau of Statistics Source:Central Bureau of Citizens Administration and Central Bureau of Statistics of the
Netherlands

3000
Other.Nation

2500 Antil/Aruba
No answer 6% Indegenous 4%
Do not know, 0%
Im m ig ra n t s

Haitian
Others 0% Javanese 15% 2000
Mulat 12% French
White 1% 1500
Guyanese
Chines 2%
1000 American

Dutch
500
Maroon 15% Creole 18% Surinamese
0
19 92

199 4

1 995

19 97

1 998
1993

1996

1999
Indian 27%

Years

Figure 4 - Suriname Population by ethnic group, 2004 Figure 7 - Immigrants by nationality, 1992-1999
Source: General Bureau of Statistics Source: Central Bureau of Citizens Administration

5000
0 French
1 99 0
19 72

1 975

197 8

198 1

19 84

1 987

199 3

19 96

1 999

2 002

200 5

-5000 Other.Nation
net migration

3000
-10000 Indonesian

2500
Im m ig r a n t s

-15000 Surinamese

2000 Indian
-20000
1500 Brasilian
-25000
Chines
-30000 1000

Haitian
-35000 500
Guyanese
-40000 0
200 0

20 01

2 002

200 5

2 006
2003

2004

2007

American
years
Years Dutch
net migration

Figure 5 - Suriname Net migration, 1972-2007 Figure 8 - Immigrants by nationality, 2000-2007


Source: Central Bureau of Citizens Administration and Central Bureau of Statistics of the Source: Central Bureau of Citizens Administration
Netherlands

190
International migration in Suriname • Andrea Jubithana-Fernand

Mean age of death for men is 56.4 years and for women 61.9. The population is composed of different
ethnic groups5, including Indigenous people, Maroons, Creoles6, Indians (India´s descents), Whites, Javanese,
Chinese, “Douglas”7 people, and other groups (Figure 4). 5,822 Brazilians were counted by the census, but the
president of the Cooperation of Brazilian Garimpeiros in Suriname, Jose Cardoso Neto (GBS, 2006, p. 27),
estimated that some 13,000 Brazilians (2.64 % of the total population of the country), were living in Suriname at
the year of the census, most of them men working in gold mines in the south-east and south-west of the country.

HISTORICAL OVERVIEW

International migration in Suriname can be traced back to the 18th century. Between 1853 and 1873
Chinese contracted workers came to the country and after the abolition of slavery in 1863, the Dutch government
brought to Suriname on 05 June 1873 the first group of contracted workers from India; the last group of Indians
arrived in 1917. Also, the first contracted workers from Indonesia were brought to Suriname on 09 August
1890. The contracted labor was mainly the result of lack of workers on the plantations after the abolition of
slavery. After those years a migration flow emerged because of the “gold fever” of 1905.
After the Second World War, many people of Suriname went to the Netherlands for study and for
economic reasons. In those days there was a great necessity of workers in the Netherlands, because of the
destruction caused by the War. Dutch people came to Suriname to contract people to work in the Netherlands.
With the independence of the country in 1975 (15 November) the international migration patterns
changed. In 1975 some 39,699 persons (about 10.48% of the total population) emigrated to the Netherlands
because people feared the independence, encouraged by politicians, who argued about the possibility of oppression.
Only 1.05% of the population immigrated from that country.
Data from the Central Bureau for Citizen Administration (CBB) of the Ministry of Interior of Suriname
and the Central Bureau of Statistics of the Netherlands (CBSN) permit to estimate the net migration of the
country between 1972 and 20078.
Between 1972 and 2005 emigration was higher than immigration, resulting in negative net-migration,
being 1975 the year that experienced the highest negative number (-35,740) (Figure 5). According to the
Central Bureau of Citizen Administration (CBB) in 2004 (the year of the census), net migration was -1,488, and
only 0.32 % of the population censed were immigrants.
On 25 February 1980 there was a military coup in Suriname, generating a second wave of emigration,
although minor that the one of 1975 (Figure 6). The exodus of people after the coup was given mainly because
of political reasons. Seven years after the coup (1987) democratic elections were held. From 1986 to 1990, a
civil war took place primarily in the interior of Suriname causing migration of local people (maroons) from those
places. In 1994 emigration started to decline and the difference between emigration and immigration became
smaller, but net-migration became positive only in 2006 and 2007.

5
Self identification.
6
Descendants of slaves not living in the interior of Suriname.
7
Children born of interracial marriages.
8
Those data capture legal migration only. CBB uses the records of the Netherlands in their own statistics because Surinamese emigrants
do not always provide this information to CBB.The Netherlands provides the information of emigration every year of the year before.

191
Migração internacional na Pan-Amazônia

Those figures portray three periods of emigration: (1) between 1973 to 1976, related to the independence;
(2) between 1976 and 1981, related to the aftermath of the independence and the military coup; and (3) between
1989 and 1993 related to restoration of democracy and increase of Brazilian immigration (especially after 1990).
International increase of gold prices has pushed the migration stream of Brazilians to Suriname during
the last 20 to 25 years. So, a new period of “gold fever” started again.
Also a historical migration flow exists in Suriname, coming from Guyana and Haiti. The flow coming
from Haiti (first country in the Caribbean to get independence, in 1852), is due mainly because of political
instability, low economic standards, and vulnerability to natural disasters. The flow coming from Guyana is
favored by historical factors. Guyana and the Netherlands were parts of the colonial council, resulting in the
presence of Guyanese in Suriname for a long time. Guyanese arrived first in Nickerie, the westernmost district
of Suriname that borders Guyana. Nowadays, Guyanese come to Paramaribo, the capital of Suriname, with a
permit to stay or residency permit, but illegal routes are also frequented.

NATIONALITY OF IMMIGRANTS

Figures 7 and 8 represent the number of immigrants by nationality from 1992 to 2007. In total, in both
periods, most of legal immigrants where Dutch, although between 1992 and 1994, the Guyanese overcome
them; and in 1999 the group of other nationalities (including Brazilians) were also more numerous than the
Dutch. More recently the number of Brazilians, Chinese, and Guyanese, increased.
Immigrants are located in all 10 districts, but they are concentrated in the capital Paramaribo, Wanica and
Nickerie (Figure 9). About 75% of the immigrants live in Paramaribo. The districts of Paramaribo and Wanica, are
the urban-coastal regions of the country; Sipaliwini, Brokopondo and Marowijne are the rural interior districts, and
Nickerie, Coronie, Saramacca, Commewijne and Para are the rural coastal districts of Suriname.

ILLEGAL IMMIGRATION

It is important to notice that many illegal migrants are located in the interior, mainly Brazilians involved
in gold mining, which the census and other official sources were unable to capture. Although data presented
here about illegal immigrants are incomplete, the Ministry of Justice and Police estimated to be about 15,031
illegal immigrants in the country in 2008, being 8,180 Brazilians (54.43%), 3,023 Guyanese (20.12%) and 2.658
(17.86%) Chinese. A smaller but also significant group of illegal immigrants, working mainly in agriculture, are
Haitians, 422 (2.81%) (Figure 10).
Illegal Brazilians are mainly concentrated in the districts of Paramaribo, Brokopondo, Sipaliwini and
Marowijne; the Guaynese in Nickerie and Coronie (districts close to the western boarder) and the Chinese in
Commenwijne, although they are practically everywhere (Figure 11).

MIGRANTS PROFILE

In many countries, migration is becoming an important component of population change; so, migration
may have significant impacts on the development of a country. It is important, therefore, to know the profiles of
migrants, which can vary according to the society where they live. Components of the profile of migrants
include, among others, age, sex, education, religion, language, health, and income.
In Suriname, the characteristics of emigrants are different of the characteristics of immigrants.

192
International migration in Suriname • Andrea Jubithana-Fernand

250
100.00 Sipaliwini
Brokopondo
200
80.00
Pe rce nta ge s

2002
Marowijne

I m m ig ra n t s
2003
60.00 Commewijne 150
2004
Para 2005
40.00 100
Saramacca 2006

20.00 Coronie 2007


50

Nickerie
0.00 0
199 2

19 94

1 996

199 8

20 00

2 002

200 4

20 06

3 0-3 4

3 5-3 9

4 0-4 5

4 6-5 0
Wanica

10 -14

15 -19

20 -24

25 -29

51- 55

55- 59

60- 64

65 -69

70 -74

75 -79

80 +
0-4

5-9
Paramaribo
Years
Age groups

Figure 9 - Immigrants by district, 1992-2007 Figure 12 - Immigration by age group of men from 2002 to 2007
Source: Central Bureau of Citizens Administration Source: Central Bureau of Citizens Administration

60.00

50.00 160

40.00 140
P e rc e n t a g e s

120 2002
30.00
Im m ig ra n t s

100 2003
20.00
2004
Percentages 80
10.00
2005
60
0.00 2006
C h in e s

D u tc h
G uy anes e

D o m in ic a n
B r a z il ia n

40
O t hers
H a it ia n

2007
20

0
1 0-1 4

4 0-4 5
4 6-5 0

7 5-7 9
15 -19
20 -24
25 -29
30- 34
35-3 9

51 -55
55 -59
60 -64
65- 69
70-7 4

8 0+
0 -4
5 -9

Nationality
Age group

Other nationalities are from some countries of Africa, Asia, Caribeean, South and
North America

Figure 10 - Percentage of illegal immigrants by nationality, 2008 Figure 13 -Immigration by age group of women from 2002
Source : Ministry of Justice and Police to 2007
Source: Central Bureau of Citizens Administration.

90.00 250

80.00
Brazilian
70.00 200
Chines 2003
P e rc e n t a g e s

60.00 2004
Emigrants

Guyanese 150
50.00 2005
Haitian 2006
40.00 100
Dutch
30.00 Dominican
50
20.00 Others
10.00
0
10 - 1 4
15 - 19
20 - 2 4
25 - 29

30 -3 4
35 - 39
40 - 4 4
45 - 49
50 - 5 4
55 - 59
60 - 6 4
65 - 69
70 - 7 4
75 - 79
5 - 9
1 - 4

80+
<1

0.00
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

Districts age group

1 - Paramaribo; 2 - Wanica; 3 - Nickerie; 4 - Coronie; 5 - Saramacca; 6 - Para;


7 - Commewijne; 8 - Marowijne; 9 - Brokopondo; 10 - Sipaliwini

Figure 11 - Percentage of illegal immigrants by districts, 2008 Figure 14 - Emigration by age group of men 2003 - 2006
Source: Ministry of Justice and Police Source: Central Bureau of Citizens Administration

193
Migração internacional na Pan-Amazônia

Age and sex

Immigrants in Suriname, men and women, are in general young (in labor productive age groups). For
men and women, immigration increases from age group 20-24 to 30-34 and starts decreasing in age group 35-
39, for all the years considered (2002-2007). For the age groups 55-59 to 80+ of both sexes the immigration for
all the years is low and the difference between the years is small (Figures 12 and 13).
In the case of emigration, it is noticed that with the exception of the age group of 10-14 among men and
women in 2003, outmigration presents a decreasing pattern for both sexes in all other age groups during the
period considered (2003-2006) (Figures 14 and 15). But independently of this pattern, emigration is concentrated
within the 10-14 and 45-49 age brackets among both men and women. The pick is the age group 30-34. For age
groups 50-54 and over emigration for men and women are practically the same for all the years considered.
The relation between emigration and immigration according to sex differs. While 53% of the immigrants
were men 53% of the emigrants were women (Figures 16 and 17). More immigrant men than women is related
to the availability of jobs in the mining sector, which are mostly jobs for men.
No study exists that explain the reasons for higher concentration of women among emigrants. Some possible
explanations could be the large number of households in Suriname headed by women and migration selectivity of
professionals. In this regard it is important to stress that brain drain is occurring, although financial remittances to
Suriname increase. The emigration from Suriname is primarily to the Netherlands, the Dutch islands, French Guyana,
and the United States of America. The groups of professionals leaving Suriname are principally of nurses, teachers,
and those who have a university degree. The reasons for emigration of these highly qualified professionals are mainly
because unequal income distribution between Suriname and the countries of destination.

Labor market

One of the tasks of the Ministry of Labor, Technological Development and Environment is to organize
the labor activities of foreigners in Suriname9. One-year work permits are provided to foreigners. Even when
foreigners have permanent stays it is necessary that he/she requests an extension of the work permit every
year. Not all applications for work permits are granted. Figure 18 represents the proportion of work permits
granted in relation to the applications. Since 2002 the proportion of applications approved remained practically
constant (around 0.80).
With a work permit granted, a foreigner can apply for a stay permit, but if the stay application is rejected
the work permit is also refused. Work permits are also refused if foreigners provide incorrect information or if
the work permit is not used for the purpose that was granted. Work permits are also refused for foreigners
considered undesirable, or if Surinameses are looking for the specific job of the application or are waiting to
receive the position.
Concerning age and sex, most of the work permits were granted to men between 15 and 23 years old,
all along the period between 1999 and 2003, varying between 31% and 45%, followed by the age brackets of
41-50 and 24-30 in this order; the lowest percentage of work permits were granted to men over 60 (Figure 19).
For women, during the first two years of the period, most of the work permits were granted to those between
31 and 40 years (35% to 40%), followed by those of age bracket 24-30, proportions that were inverted in the
following two years, with a tendency to reverse again in the last year (Figure 20). Similarly than men, work
permits for women over 60 were very rare.

9
Work permits are provided in the districts Paramaribo and Nickerie. There is a proposal for extension of work permits for foreigners for
a maximum of 3 years, depending on the circumstances. To acquire a work permit the employer has to fill a request on behalf of the
worker, and deposit USD 200,00 per year per foreigner on the account of the Ministry of Labor, Technological Development and
Environment, case the foreigner works in the city. If the foreigner works in the countryside the deposit is USD 350, 00 per year per
worker. But illegal immigrants and employers do not make the proper registration, so there are many immigrants participating of the
labor market, working mainly without paying taxes.

194
International migration in Suriname • Andrea Jubithana-Fernand

1.20

300
1.00

250
0.80

f ra c t io n
200
Emigrants

2003 0.60
2004
150 0.40
2005
2006
100 0.20

50 0.00
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007
0
10 - 14

15 - 19

20 - 24

25 - 29

30 -34

35 - 39

40 - 44

45 - 49

50 - 54

55 - 59

60 - 64

65 - 69

70 - 74

75 - 79
1 - 4

5 - 9

80+
<1

Years

age group relation granted and request work permit

Figure 15 - Emigration by age of women from 2003-2006 Figure 18 - Relation between granted and requested work
Source: Central Bureau of Citizens Administration permits from 1999 to 2007
Source: Ministry of Labor, Technological Development and Environment

50.00

70.00 45.00
40.00
60.00 15-23
P e rc e n t a g e s
P e rc e n t a g e s

35.00
50.00 24-30
30.00
40.00 Man 31-40
25.00
30.00 Woman 41-50
20.00
20.00 51-60
15.00
10.00 10.00 60+
0.00 5.00
4
2

0.00
0
9

0
9

0
1

1999 2000 2001 2002 2003


Years Years

Figure 16 - Percentage of immigrants by sex from 1992 to 2007 Figure 19 - Percentage of work permits provided to men by
Source: Central Bureau of Citizens Administration age group from 1999 to 2003.
Source: Ministry of Labor, Technological Development and Environment

45.00
70.00
40.00 15-23
60.00 35.00
P e rc e n t a g e s

24-30
Per cen tag es

50.00 30.00
31-40
man 25.00
40.00 41-50
Woman 20.00
30.00 51-60
15.00
20.00 60+
10.00
10.00 5.00
0.00 0.00
1999 2000 2001 2002 2003
4
2

6
9

0
9

0
0

0
9

0
1

Years
Years

Figure 20 - Percentage of work permit provided to women


Figure 17 - Percentage of emigrants by sex from 1992 to 2007 by age group from 1999 to 2003
Source: Central Bureau of Citizens Administration
Source: Ministry of Labor, Technological Development and Environment

195
Migração internacional na Pan-Amazônia

With respect to the labor force participation, according to the 2004 census, 56% of the population in
Suriname is economically active, and among the economically active population, 7.42% are foreigners. Of the
economically active foreigners 64.19% were employed in 2004. Men are occupied mainly in mining (sector 2),
agriculture, forestry, hunting and fisheries (sector 1) and great and small trade, restaurants, bars and hotels
(sector 6). Their participation in sector 4 (electricity, gas and water) is negligible (Figure 21). Foreign women
were more represented in the sectors of trade, restaurants, bar and hotels (sector 6), transport, storehouse and
communication (sector 7), financing, insurance, broker in immoveable properties and commercial services
(sector 8) and community, social and personal services (sector 9) (Figure 22). Only in 1999 and 2000 large
number of women were working in the mining sector. A possible explanation for this may be that women were
working in mining but providing community, social and personal services.

IMMIGRATION AND POPULATION POLICY

On December 7, 2007, the Ministry of Planning and Development (PLOS) installed a commission in
charge of proposing to the government a population policy for Suriname, integrated by eleven people from
different ministries. This policy should be focused on the implementation of the Millennium Development Goals.
Migration should be considered within the scope of that policy. Regardless of the efforts of the
Ministry of Foreign Affairs in regulating immigration, the lack of a clearly defined migration policy, has
resulted in a serious problem with respect to the presence of a great number of illegal migrants in the country,
mainly from Brazil, China and Guyana. Besides the Ministry of Foreign Affairs, the Ministry of Justice and
Police, the Ministry of Defense (Immigration Service), the Ministry of Labor, Technological Development
and Environment, and the Ministry of the Interior are also involved in aspects related to migrants and foreigners.
One of the responsibilities of the Ministry of the Interior is to register immigrants and emigrants, to follow the
changes of the population of the country. The Ministry of the Interior defines immigrants as persons who
come to live in Suriname and emigrants as persons who leave Suriname to live in another country. The
Ministry of Justice and Police has the responsibility of controlling the legal status of foreigners and migrants.
The Ministry of Labor, Technological Development and Environment is responsible for the provision of work
permits to foreigners and immigrants10. Foreigner is everyone, who is not Surinamese according to the
legislation (S.B. 2002, No. 3, Article 3).
Since October 01, 2008, the Ministry of Justice and Police is executing new alien immigration procedures.
Foreigners coming from countries for which visa is required need to request a MKV (Authorization for a short
stay), if they want to stay for longer then three months in the country (Figure 23). Foreigners who stay for a
shorter time are either tourists or students. Table 3 lists the countries for which Suriname does not require visa
based on reciprocity. Foreigners who live for a long time in the country can become immigrants or gain Surinamese
nationality (Figure 24). Foreigners, who want to stay for an indefinite period, need to request permission for
residency. To get a residency permit it is required, among others things, that the foreigner lives for at least four
and a half year in the country. Foreigners coming from countries that not require visa, become illegal after a
month of stay in the country. Foreigners from Brazil and Guyana do not need a visa to stay less than one-month
in Suriname.

10
The following foreigners do not need work permits: members of diplomatic missions, those working for the government of Suriname,
those married to Surinamese, emigrants of Suriname’s origin and their family members with foreign nationality, those who got the status
of “refugee” from the Surinamese government, and CARICOM citizens (media-workers, persons with a university degree, sports men
and women, artists, managers, technical persons of commercial enterprises).

196
International migration in Suriname • Andrea Jubithana-Fernand

70.00 70.00

60.00 60.00
1999
50.00 1999
P e rc e n t a g e

2000 50.00

P e rc e n t a g e
2000
40.00 2001 40.00
2001
30.00 2002
30.00 2002
20.00 2003 2003
20.00

10.00
10.00

0.00
0.00

S e c to r 7 /8 /9
S e c to r 4
S e c to r 1

S e c to r 2

S e c to r 3

S e c to r 5

S e c to r 6

S e c to r 6
S ec tor 1

S e c to r 2

S e c to r 3

S e c to r 4

S e c to r 5

S e c to r
7 /8 / 9
Economic Sector
Economic Sector

Sector 1: Agriculture, Forestry, Hunting and Fisheries Sector 1: Agriculture, Forestry, Hunting and Fisheries
Sector 2: Mining and Stone quarry Sector 2: Mining and Stone quarry
Sector 3: Fabrication Sector 3: Fabrication
Sector 4: Electricity, Gas and Water Sector 4: Electricity, Gas and Water
Sector 5: Construction Sector 5: Construction
Sector 6: Great and small Trade, Restaurants, Bars & Hotels Sector 6: Great and small Trade, Restaurants, Bars & Hotels
Sector 7: Transport, Storehouse and Communication Sector 7: Transport, Storehouse and Communication
Sector 8: Financing, Insurance, broker in immoveable properties and commercial services Sector 8: Financing, Insurance, broker in immoveable properties and commercial services
Sector 9: Community, Social- and personal services Sector 9: Community, Social- and personal services

Figure 21 - Percentage of foreign men participating on the Figure 22 - Percentage of foreign women participating on
labor market, by economic sector, 1999-2003 the labor market, by economic sector, 1999-2003
Source: Ministry of Labor, Technological Development and Environment Source: Ministry of Labor, Technological Development and Environment

Picture 1 - Not rehabilitated mining field in the interior of Picture 3: Brazilian Store in Paramaribo, in the neighborhood
Suriname of Anamoestraat also known as “small Brazil”
Source: Robert Kross, Lecturer at the Anton De Kom University of Suriname Source: Andrea Jubithana-Fernand

Picture 2 - Working area of the garimpeiros. Picture 4 - Location of living of garimpeiros in the Interior
Source: Robert Kross, Lecturer at the Anton De Kom University of Suriname of Suriname
Source: Robert Kross, Lecturer at the Anton De Kom University of Suriname

197
Migração internacional na Pan-Amazônia

Control
Post of Request for
Request for for
Request for
Military workpermit
work permit permit ofofstay
stay
Police

Figure 23 - Legal immigration process from countries from which visa is not required.

Table 3 - Countries with which Suriname does not require visa based on reciprocity

• Antigua & Barbuda


• Bahamas (maximum 90 days)
• Barbados
• Belize
• Brazil
• Chile
• Costa Rica (only for holders of a diplomatic or service passport)
• Colombia (only for holders of a diplomatic or service passport)
• Cuba (only for holders of a diplomatic or service passport)
• Dominica
• Philippines
• Gambia
• Guyana
• Grenada
• Hong Kong (only for holders of passports emitted by Hong Kong Special Administrative Region of the People’s
Republic of China. For others, tourist visa is required after a stay of 14 days)
• Israel
• Jamaica
• Japan
• Malaysia (maximal 30 days)
• Montserrat
• Netherlands Antilles (only for those with a Dutch passport)
• St. Kitts & Nevis
• St. Lucia
• St. Vincent & the Grenadines
• Singapore
• Trinidad & Tobago
• Venezuela (only for holders with a diplomatic passport)
• South - Korea
Source: Ministry of Foreign Affairs

198
International migration in Suriname • Andrea Jubithana-Fernand

Request
Requestfor
forMKV
MKVatat
Embassy
embassyor orGeneral
General Ministry Ministry of
Consulate
consul ateofof of Justice and
Surinameinina acountry
Suriname Foreign Police in
with visawith vi sa
country affairs in Suriname
obligation
obligation Suriname

Request
Req uestwork
workpermit
permitatat
Ministry
MinistryofofLabor,
Labor,
Technological
technological Development
and Environment
Development andof
Suriname
Environment Suriname

: Request
Request
for for
staystay
andand work
work permit
permit

: Answer
Answerwith
withrespect
respecttowork
workpermit
permitand
andstay
stay

Figure 24 - Legal immigration process from countries from which visa is required (for stay of more than three months).
Source: Own elaboration based on information of the Ministry of Exterior.

With the purpose of regulating illegal immigration, the Ministry of Justice and Police opened the opportunity
of illegal migrants register in the Ministry during December 2007 and January 2008. Registered illegal immigrants
received a document of registration, which allowed them to apply for a permit to stay, having two years to
arrange their documents and regulate their situation. The process is illustrated in Figure 25.

Mandatory
Mandatory Application for
Application for
Illegal Registration permit to
permit to stay atatthe
Foreigner at Ministry
Minis tryof the Minisof try
Ministry of
Justice
of Justice
Justice and Justice and
and Police
and Police
Police Police

Registration Permit of stay


Legal Permit of stay
at the ministry of acquired
Immigrant acquired at the
Interior - CBB at the Ministry of
Ministry of Justice
Just ice and
and Police
Police

Figure 25 - From illegal foreigner to legal immigrant.


Source: Own elaboration based on information of the Ministry of Justice and Police.

199
Migração internacional na Pan-Amazônia

Foreigners can require a permit to stay for one or two years. If the foreigner can prove that has a job,
he/she receives a permit to stay for one year. If the foreigner can prove that has his/her own means to survive,
a permit to stay for two years is granted.
In Suriname there are two types of foreigners: (1) foreigners of Surinamese origin; and (2) other
foreigners. Foreigners of Surinamese origin pay USD200.00 for a “residency permit”. All foreigners pay USD
150.00 for a permit of stay or extension. Payments are done at the Central Bank of Suriname or the Agriculture
Bank. The duration of the application and granting of a permit of stay is about three to four months.
Since 1980, the Ministry of Defense is responsible for the admission of immigrants. There are border
control posts at JAP international airport, district of Para, and De Nieuwe Haven, Albina and South Drain in the
district of Nickerie, but there are green borders without control services due to high costs of technology to
monitor these green borders.

PUSH AND PULL FACTORS

The reasons for migration from Suriname to foreign countries are generally related to economic (job
opportunities), health care, and educational reasons. According to the Central Bureau for Citizens Administration,
emigration from Suriname is mainly to the Netherlands, The United States of America, Guyana, French Guyana,
India, and Dutch islands.
Emigration has advantages and disadvantages for migrants, for Suriname and for the arriving country.
In most countries and in Suriname, migrants are considered as welfare providers, investors, and even as knowledge
communities. Table 4 lists some of the advantages and disadvantages of migration for departing and arriving
countries.

Table 4 - Advantages and disadvantages of migration for departing and arriving countries.

Departing countries Arriving countries


Advantages Disadvantages Advantages Disadvantages
Remittances increase Disturbance of families Increase of production Over population

Economic pressure decreases Brain drain Increase of the consumption Possibility of social conflicts,
power due to the composition of the
population

Population density decreases Fiscal income decreases Increase of fiscal income Increase of expenditure of the
government regarding social benefits

Possibility for human Increase of cheap labor force Possibility of


trafficking increasing unemployment

Possibility of increasing crime

The list of advantages and disadvantages of migration presented above also applies for the case of
Suriname. However, more specific advantages and disadvantages of immigration can be added, such as the
ones listed in Table 5. According to the Central Bureau for Citizens Administration, most of immigrants in
Suriname come from China, Brazil, Haiti, Guyana, The Netherlands, India and Indonesia.

200
International migration in Suriname • Andrea Jubithana-Fernand

Table 5 - Advantages and disadvantages of immigration in Suriname

Advantages Disadvantages

Enrichment of culture No fiscal income of the informal sector


Population density increases Increase of crime
Know-how in certain economic sectors Increase of the informal sector
(Gold and Bauxite sector) increases
Filling of vacancies in certain sectors Increase of financial outflow to countries of origin
(Fishery and construction) where there is lack of interest
among Surinamese workers
Increase of fiscal income

Migration brings also advantages and disadvantages for migrants. In the case of Suriname the reasons
for immigration are mainly economic (job opportunities in the mining sector, trade, agriculture, construction and
domestic sector), social, environmental and educational reasons, as shown in Table 6.

Table 6 - Advantages and disadvantages for migrants from/to Suriname.

Emigrants Immigrants
Advantages Disadvantages Advantages Disadvantages
Better social benefits Social problems with Positive change of live Problems in acquiring a
adaptation stay permit/permit for
establishment
Study possibilities Problems with respect to Possibility to participate in the Problems in acquiring the
stay permit informal sector (labor market) Surinamese Nationality
Better career opportunities Housing problems Problems with the Dutch language
Risk of not getting a better job High cost to begin a new life
Risk of a worse future

BRAZILIAN MIGRANTS IN SURINAME

A SMALL SURVEY

According to the Brazilian Embassy in Suriname, there are approximately 20,000 Brazilians living in
Suriname (legally and illegally)11. The survey with 22 Brazilians, 12 men and 10 women, living mostly in the
countryside, provides some insights, about their working and living conditions in Suriname.
The Brazilians included in the survey have low educational level (most of them without finishing primary
school and hardly knowing how to write their names). No one has private health care insurance or pension
arrangements. The length of stay varies between one and 16 years, and many have lived for years without a
permit of stay, and only registered in 2008 because of the call for registration of the Ministry of Justice and
Police. Mean age is 42 years varying between 17 and 54 years.
The men work mainly in small scale gold mining (garimpeiros) in Suriname and French Guyana and the
women in the domestic and personal sector (even sex workers). Those that work in French Guyana live in
Suriname because here is easier to stay illegally and the costs of living are lower in Suriname than in French
Guyana. French Guyanese authorities are more rigorous and frequently expel Brazilians out of their country.

11
The Brazilian Embassy requested to the Ministry of Foreign Relations of Brazil a study about the Brazilians living in Suriname with the
purpose of identifying their problems and help to solve them, but no answer has been received yet.

201
Migração internacional na Pan-Amazônia

Garimpeiros visit Paramaribo frequently for several reasons including: (1) health (there are no medical
doctors or nurses in the gold fields); (2) to make remittances to their families in Brazil; (3) to buy food and
stuffs for consumption at the gold fields; (4) to sell gold; (5) family and social reasons (visit children left in the
city). They stay from 2 to 30 days depending on the circumstances. In general, the Brazilians of the survey
integrate families that vary from one to three generations. When they have children and/or wife in Brazil, they
send remittances, on regular bases or occasionally. Not all the children in school age go to school.
The Brazilians enter Suriname via the JAP International airport Zanderij, through French Guyana and
Guyana, coming mainly from Belém and the State of Maranhão. From the responses of these 22 Brazilians, it
is clear that the main reason of migrating to Suriname is the economic situation in Brazil. With all difficulties and
risks of the movement they usually earn more in Suriname than in Brazil. For example a cook (generally a
woman) earns on average 50 grams of gold a month, and a man working in a machine for four persons earns
net 7.5% of the production costs.

IMPACTS OF BRAZILIAN MIGRATION IN SURINAME

In Suriname, the impacts of Brazilian migration are visible and tangible. The extraction of gold using
mercury causes serious environmental and health problems, including big holes in extracting areas, fish
contamination in rivers, and health complications among the local population (Picture 1). Environmental
disturbances may cause, in the long run, climate changes in Suriname. Also when migrants come with children,
they cannot receive education because there are not schools in those areas.
The local population in the interior of Suriname used to extract gold with simple and primitive instruments
before the arrival of the Brazilian garimpeiros causing little damage to the environment. Afterwards the exploitation
of gold uses dig machines and suction pumps resulting in larger damages to the environment (Picture 2).
Notwithstanding those problems, there are also positive effects of Brazilian migration in Suriname.
Brazilians are warm and hard working people. They are integrated in several activities of the Surinamese
society such as the educational system for their children (when schools are available), the religion activities, the
marriages with Surinamese and the learning of “taki taki” (the “local language” or lingua Franca). Trough the
Centro de Estudos Brasileiros (CEB) Brazilian culture is learned and passed on to students. In the capital
Paramaribo, few Brazilian stores (Loja Transamerica and Supermercado Atacado) can be seen (Picture 3).
In comparison with Chinese immigrants, although their integration in the Surinamese society is visible
by the presence of cheap articles stores, for example, Chinese are considered a more closed community than
the Brazilian community. Guyanese immigrants are less visible and their integration is easier because they
speak English, the language that most Surinamese speak.

OPERATION “CLEAN SWEEP”


The Ministry of Justice and Police initiated in July 2008, in cooperation with the Ministry of Natural
Resources and the Ministry of Regional Development, the operation “Clean Sweep” with the purpose of
stopping illegal activities in the interior of the country (south-east and south- west), such as illegal gold and wood
extraction, drugs trafficking and abuse, and illegal possession of weapons. Police and military forces executed
the operation. Operation “Clean Sweep I” started in the village of Brownsberg and operation “Clean Sweep
II” occurred in Benzdorp, and the Lawa river, where a big number of illegal immigrants (most of them Brazilians)
extract gold together with the local population using mercury. Operation “Clean Sweep III” happened in the
area of Matawai. Other places with large concentration of Brazilians in the interior of the country are Langatabiki,
Drietabiki, Sarakreek, Matawai, Snesikondre, Alimonie, and Vila Brazil (Picture 4, Map 2).
The ministries involved in Operation “Clean Sweep” and legal specialists made an evaluation of the
results of the operation in February 2009, and concluded that the operation brought the central authority to these
illegal gold mining areas, and that a structural approach is necessary to solve the problems in those areas.

202
International migration in Suriname • Andrea Jubithana-Fernand

CONCLUSION AND RECOMMENDATIONS

For Suriname, as a developing country seriously impacted by migration, it is important and urgent to
have a policy on this area, involving ministries and other organisms concerned with this issue. Among the issues
to be considered are: (1) the role of migration in achieving the millennium development goals in Suriname; (2)
migration and poverty reduction in Suriname; (3) the effects of migration on health of the population in Suriname;
(4) the effects of migration on environment in Suriname.
Within the scope of globalization and the position of Suriname in the Caribbean Community and in Latin
America, the Surinamese government should promote social integration and inclusion, through the implementation
of policies and programs to combat and prevent racism and improve labor market conditions of migrant workers.
Furthermore, the government should protect migrant workers by reinforcing legislation and adopting, implementing
and pursuing policies to eliminate all forms of discrimination against migrants and forced labor. It is also important
for Suriname, that employers, non-governmental organizations and workers’ organizations provide accurate
information about the real possibilities and conditions of work for migrants in the country.
Further information and urgent measures are needed about illegal immigration in the country. With the
initiatives of the Ministry of Justice and Police at the end of 2007 and beginning of 2008, an effort was made to
legalize illegal immigrants within 2 years. They have two years to put their documents in order since some of
them do not have any personal documents, not even passport or birth certificate, which indicate that controlling
mechanisms of the presence of foreigners in the country are not working effectively.

PAKIRA
AFOBAKA
VILLA
BRASIL
SNESIKONDRE
LANGATABIKI

SARAKREEK

BENZDORP

Map 2 - Small Scale Goldmining in Suriname.


Source material: Landsat – Satellite figures 1999-2000.

203
Migração internacional na Pan-Amazônia

REFERENCES

CBB - CENTRAL BUREAU OF CITIZENS ADMINISTRATION/MINISTRY OF THE INTERIOR. Demografische Data in


Suriname 2003 en 2004. Paramaribo, August, 2006

GBS - GENERAL BUREAU FOR STATISTICS CENSUS OFFICE. Seventh General Population and Housing Census in
Suriname, Country results; Volume I. Demografische en Sociale karakteristieken. Paramaribo, November, 2005

GBS - GENERAL BUREAU FOR STATISTICS CENSUS OFFICE. Seventh General Population and Housing Census in
Suriname, Country results; Volume II. Werkgelegenheids – en Onderwijsstatistieken. Paramaribo, November, 2005

GBS - GENERAL BUREAU FOR STATISTICS CENSUS OFFICE. Census 2004 Coverage and Evaluation. November, 2006.

GBS - GENERAL BUREAU FOR STATISTICS CENSUS OFFICE. Statistical Yearbook 2006. Paramaribo, November 2007

ILO – INTERNATIONAL LABOUR ORGANIZATION. Multi lateral Framework on Labour Migration: Non-binding
principles and guidelines for a rights-based approach to labour migration. Geneva, 2006

MINISTRY OF LABOR, TECHNOLOGICAL DEVELOPMENT AND ENVIRONMENT. Arbeidsmarkt informative 1999-


2003. Paramaribo, November 2004

PULIDO, D. S. Impact of International Migration: The Colombian Case. Maastricht (Netherlands): University of Maastricht,
2004 (Doctoral thesis)

UNFPA – UNITED NATIONS POPULATION FUND. Selected Papers of the UNFPA Expert Group Meeting, International
Migration and the Millennium Development Goals. Marrakech, Morocco, 11-12 May 2005

Newspapers

Dagblad Suriname

De Ware Tijd

204
A migração estrangeira recente na Amazônia legal brasileira • Roberto Luiz do Carmo, Alberto Augusto Eichman Jakob

A MIGRAÇÃO ESTRANGEIRA
RECENTE NA AMAZÔNIA LEGAL BRASILEIRA

Roberto Luiz do Carmo1


Alberto Augusto Eichman Jakob2

INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como objetivo apresentar uma avaliação da imigração internacional recente na
Amazônia, considerando especificamente a situação evidenciada pelo Censo Demográfico de 2000 do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os dados deste censo, especificamente aqueles referentes à
migração internacional na Amazônia acabaram sendo pouco abordados, o que justifica a discussão mais detalhada
dessas informações, mesmo considerando a proximidade do censo de 2010.
Dentre os componentes da dinâmica demográfica, os processos migratórios são os de mais difícil
apreensão e aferição. A definição de um espaço e de um tempo específico é fundamental para caracterizar os
tipos de fluxos migratórios, assim como para identificar as diferentes etapas do processo migratório. No caso
das migrações internacionais, a questão ainda é bem mais complexa, pois envolve questões como a subenumeração
de população, em decorrência da falta de declaração das pessoas que residem na situação de indocumentados,
além de dizer respeito ao movimento entre países, o que dificulta a identificação dos emigrantes.
As migrações internacionais passaram ao longo das últimas duas décadas do século XX por um processo
significativo de expansão. Os fluxos migratórios ocorreram principalmente dos países menos desenvolvidos
para os países mais desenvolvidos. As demandas por mão-de-obra nos países do hemisfério norte, que
especificamente na Europa derivaram de um processo de envelhecimento populacional decorrente da transição
demográfica, alimentaram os fluxos. Entretanto, a sucessão de crises econômicas e as dificuldades em termos
de manutenção e geração de novos postos de trabalho têm alimentado as situações de conflito e de xenofobia.
As redes sociais que sustentam grande parte dos fluxos têm se mostrado eficazes, até certo ponto, para
enfrentar esta situação, sustentando e mantendo pelo menos parte dessa mobilidade populacional.
No caso da migração entre os países da América do Sul, nota-se que existe também uma tendência de
aumento das trocas entre eles, conforme apontam os trabalhos de CELADE (2002), Pellegrino (2003), Castillo
(2003), Pizarro (2008), dentre outros. A situação econômica um pouco melhor de alguns países, mesmo com a
recorrência dos ciclos de crise, faz com que se alterem os principais destinos ao longo do tempo. O Brasil, por
sua extensão territorial e por seu potencial econômico, e a Argentina se configuram como destinos importantes.

1
Professor do Departamento de Demografia do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas (IFCH/
UNICAMP) e pesquisador do Núcleo de Estudos de População (NEPO/UNICAMP). E-mail: roberto@nepo.unicamp.br
2
Pesquisador do Núcleo de Estudos de População (NEPO/UNICAMP). E-mail: alberto@nepo.unicamp.br

205
Migração internacional na Pan-Amazônia

Considerando a situação específica da Amazônia, além dos deslocamentos de curta distância nas áreas de
fronteira internacional, observou-se a chegada de estrangeiros em várias partes do território. Nos próximos
anos, com os investimentos que estão sendo realizados no desenvolvimento das malhas de transporte, aumentam
as possibilidades desses fluxos virem a ser mais significativos. Principalmente considerando que os nós iniciais
das redes migratórias já estão estabelecidos, conforme será apresentado ao longo desse texto.
Neste artigo são exploradas algumas das possibilidades permitidas pelo Censo 2000 em termos de
identificação dos migrantes. Inicia-se com uma análise sobre o local de nascimento do imigrante internacional.
Com essa abordagem é possível identificar os chamados life time migrants, ou migrantes da vida inteira, que
são aqueles que compõem o estoque de migrantes da região. Nesse caso, o migrante internacional é definido
como sendo aquela pessoa que nasceu em um país estrangeiro.
Em seguida é realizada uma discussão utilizando o quesito censitário referente à data fixa para elaborar
uma série de caracterizações dos imigrantes internacionais residentes no ano 2000 na Amazônia Legal.

MIGRAÇÃO INTERNACIONAL E AMAZÔNIA LEGAL

Segundo Pellegrino (2003), a migração internacional é um aspecto essencial da história da América


Latina. Segundo a autora, nos quinhentos anos transcorridos desde a ocupação dos territórios americanos pelos
reinos europeus é possível identificar quatro grandes etapas no processo migratório. A primeira etapa se inicia
com a conquista do território americano, realizada pelos europeus, e termina com a independência das nações
americanas, sendo caracterizada pela incorporação de população proveniente das metrópoles e de populações
africanas trazidas através do regime da escravidão. A segunda etapa é aquela na qual os países da América
Latina, e principalmente do sul do continente, receberam uma parte da grande corrente emigratória européia da
metade do século XIX e início do século XX. A terceira fase ocorreu entre 1930 e meados da década de 1960,
sendo que nesta o fenômeno dominante diz respeito aos movimentos internos de população em direção às
grandes metrópoles; a migração internacional adquiriu neste contexto um caráter regional e fronteiriço, funcionando
como complemento à migração interna. A quarta fase ocorre nas últimas três décadas do século XX, quando o
saldo migratório dos países da América Latina tornou-se negativo, e a emigração para os Estados Unidos e
outros países desenvolvidos passou a ser o fato dominante do panorama migratório da região.
Pode-se dizer que a Amazônia teve reflexos dessas quatro etapas históricas, sendo que no período mais
recente, ao qual se restringe este trabalho, as trocas migratórias com os países vizinhos se intensificaram.
A delimitação do espaço ao qual se refere o movimento migratório é uma etapa fundamental. Nesse
sentido, optou-se neste trabalho por adotar como referência espacial os limites definidos pela Amazônia Legal,
fazendo, entretanto, uma adaptação em termos de abrangência, que se justifica em termos de comparabilidade
das informações e de operacionalização da manipulação dos dados, além de não incorporar mudanças
significativas em termos dos resultados numéricos.
Assim, a Amazônia Legal é definida como sendo os estados que compõem a região Norte, mais o
estado de Mato Grosso e o estado do Maranhão a oeste do Meridiano 44 (ROCHA, 2005, p. 141). Essa
definição, aparentemente clara, envolve situações bastante complexas em termos sociais e ambientais, sujeitas
a frequentes pressões políticas e administrativas para sua redefinição, conforme apontam Hogan, D´Antona e
Carmo (2008).
O Mapa 1 mostra a delimitação da Amazônia Legal utilizada neste trabalho. Note-se que o estado do
Maranhão foi incluído em sua totalidade, para facilitar uma comparabilidade com as divisões oficiais do país, e
em vista de que a adição dos 37 municípios a leste do meridiano 44 graus, conforme definido no Mapa 2, não
altera em nada as análises que se realizam aqui.

206
207
A migração estrangeira recente na Amazônia legal brasileira • Roberto Luiz do Carmo, Alberto Augusto Eichman Jakob

Mapa 1: Localização da Amazônia Legal brasileira na América do Sul em 2001 Mapa 2: Divisões municipais do estado do Maranhão em 2001
Migração internacional na Pan-Amazônia

Segundo o Censo Demográfico, a Amazônia Legal possuía 29.741 pessoas não naturais do Brasil em
3
2000 . A Tabela 1 mostra os estrangeiros segundo seu país de nascimento. Bolívia destaca-se como o país que
mais enviou migrantes à Amazônia Legal (15,3% do total, e 4.550 migrantes), seguido por Peru (13,6%), Japão
e Portugal (pouco mais de 10% cada).

Tabela 1 - Imigrantes internacionais da Amazônia Legal em 2000 segundo local de nascimento

Migrantes acumulados Migrantes dos últimos 10 anos


Local Volume % Local Volume %

BOLÍVIA 4.554 15,31 PERU 2.512 17,33


PERU 4.059 13,65 BOLÍVIA 2.043 14,09
JAPÃO 3.093 10,40 PARAGUAI 1.573 10,85
PORTUGAL 2.979 10,02 JAPÃO 860 5,93
PARAGUAI 2.941 9,89 COLÔMBIA 765 5,27
GUIANA 1.486 5,00 GUIANA 731 5,04
COLÔMBIA 1.375 4,62 ESTADOS UNIDOS 696 4,80
ITÁLIA 1.240 4,17 ITÁLIA 633 4,37
ESTADOS UNIDOS 973 3,27 VENEZUELA 569 3,93
VENEZUELA 837 2,82 PORTUGAL 560 3,86
GUIANA FRANCESA 587 1,97 GUIANA FRANCESA 400 2,76
ARGENTINA 556 1,87 ALEMANHA 349 2,41
ALEMANHA 525 1,77 ARGENTINA 269 1,85
Outros países Ásia 454 1,53 FRANÇA 262 1,81
País estrangeiro sem especificação 399 1,34 Outros países Europa 251 1,73
LÍBANO 376 1,26 País estrangeiro sem especificação 229 1,58
FRANÇA 373 1,25 Outros países Ásia 218 1,50
CHILE 316 1,06 Outros países América 182 1,26
Outros países América 282 0,95 CUBA 178 1,23
ESPANHA 282 0,95 CHILE 174 1,20
Outros países Europa 265 0,89 ESPANHA 173 1,19
HOLANDA 210 0,71 Outros países África 137 0,94
URUGUAI 208 0,70 LÍBANO 121 0,83
Outros países África 198 0,66 HOLANDA 100 0,69
ANGOLA 185 0,62 ANGOLA 92 0,64
CUBA 178 0,60 EQUADOR 89 0,61
ÍNDIA 131 0,44 ÍNDIA 87 0,60
CORÉIA DO NORTE/ SUL 118 0,40 GRÃ-BRETANHA 81 0,56
GRÃ-BRETANHA 117 0,39 URUGUAI 72 0,50
SURINAME 114 0,38 SURINAME 71 0,49
BÉLGICA 108 0,36 AUSTRÁLIA 23 0,16
SUÍÇA 101 0,34 Total 14.501 100
EQUADOR 100 0,34
AUSTRÁLIA 23 0,08
Total 29.741 100

Fonte: FIBGE, Censo Demográfico de 2000. Tabulações especiais Nepo/ Unicamp.

A Tabela 1 apresenta os migrantes acumulados, ou seja, aqueles que chegaram à Amazônia em qualquer
época e lá estavam estabelecidos no momento do Censo 2000. Apresenta também aqueles que chegaram nos
últimos 10 anos ao município de residência. Os dados evidenciam a importância ainda grande do Peru e da
Bolívia e a redução da participação dos países europeus, de 20,8% no acumulado para 16,6% da migração mais
recente. Os principais países de origem, em termos de volume de migrantes, deixam claro este panorama,
sendo que Portugal é emblemático neste sentido (redução da participação de 10% para 3,9% do total de
migrantes).
Em relação aos países da Ásia, o Japão também sofre desta redução de importância ao se comparar os
migrantes acumulados e aqueles que chegaram recentemente (de 10% para 5,9%).

3
Souchaud e Fusco (2008) atentam para o fato de que existem diferenças importantes entre estimativas de órgãos que trabalham com
migrantes e os dados censitários: “A Pastoral do migrante, por exemplo, estima que em Corumbá residam de 7.000 a 8.000 bolivianos,
quando o censo do IBGE registra 1.098 indivíduos em 2000. Em São Paulo, a Pastoral do Migrante estima que existam 80.000 bolivianos
residentes, enquanto o Censo 2000 aponta 7.722 pessoas”. Essa discrepância seria resultado de duas situações: volatilidade dessas
correntes migratórias e provável desconhecimento dos números reais.

208
A migração estrangeira recente na Amazônia legal brasileira • Roberto Luiz do Carmo, Alberto Augusto Eichman Jakob

Percebe-se, assim, que a migração para a Amazônia Legal está se tornando cada vez mais de
curta distância, com o aumento de importância dos países da América do Sul em detrimento daqueles da
Europa e da Ásia.
Outra possibilidade de análise migratória a partir dos dados censitários é dada pela análise da questão
sobre a etapa anterior de residência dos estrangeiros que residiam a menos de 10 anos no município em que
foram recenseados, mostrada na Tabela 2, em termos de seu país ou unidade da federação (UF).

Tabela 2 - Imigrantes internacionais da Amazônia Legal em 2000 com menos de 10 anos de residência no
município segundo país ou UF anterior.

País de residência anterior Unidade da federação anterior


Local Volume % Local Volume %
PERU 1.433 19,09 SÃO PAULO 607 16,48
BOLÍVIA 1.272 16,94 PARÁ 344 9,34
COLÔMBIA 577 7,68 PARANÁ 330 8,95
PARAGUAI 504 6,72 RONDÔNIA 251 6,81
GUIANA 501 6,68 MATO GROSSO DO SUL 236 6,42
ESTADOS UNIDOS 425 5,66 AMAZONAS 218 5,93
VENEZUELA 401 5,34 BRASIL SEM ESPEC. 210 5,70
GUIANA FRANCESA 306 4,07 MINAS GERAIS 171 4,63
JAPÃO 263 3,50 MATO GROSSO 154 4,19
País estrangeiro sem especificação 258 3,44 RIO DE JANEIRO 147 3,98
ITÁLIA 217 2,90 RORAIMA 140 3,79
FRANÇA 189 2,52 MARANHÃO 131 3,57
Outros países América 137 1,82 RIO GRANDE DO SUL 94 2,55
CUBA 133 1,77 GOIÁS 86 2,33
Outros países Europa 131 1,74 DISTRITO FEDERAL 81 2,19
ALEMANHA 115 1,53 CEARÁ 71 1,92
Países da África 101 1,34 PIAUÍ 70 1,91
ARGENTINA 99 1,32 BAHIA 66 1,80
EQUADOR 89 1,19 PERNAMBUCO 60 1,62
Outros países Ásia 89 1,18 AMAPÁ 51 1,38
ÍNDIA 87 1,16 SANTA CATARINA 50 1,35
PORTUGAL 67 0,89 PARAÍBA 36 0,99
CHILE 47 0,63 ACRE 36 0,98
SURINAME 45 0,61 ESPÍRITO SANTO 25 0,67
AUSTRÁLIA 21 0,28 RIO GRANDE DO NORTE 19 0,51
Total 7.507 100 Total 3.683 100

Fonte: FIBGE, Censo Demográfico de 2000. Tabulações especiais Nepo/ Unicamp.

Obs1: Deve-se acrescentar a esta tabela 486 imigrantes internacionais que ignoravam sua origem anterior.
Obs2: Nesta tabela não aparecem 2.825 imigrantes internacionais que já tinham mais de 10 anos na UF em 2000.

A Tabela 2 aponta que, dos 29.741 imigrantes internacionais da Amazônia, 7.507 vieram nos últimos 10
anos diretamente de outros países e perto de 3.683 de outras Unidades da Federação de fora da Amazônia ou
de outros municípios de UFs de dentro da Amazônia, ou seja, realizaram ao menos uma etapa migratória antes
de chegar ao município de residência na época do censo de 2000. Os demais, ou já estavam em suas UFs no
decorrer da última década (2.825 migrantes), ou aparecem nos dados como ignorada a sua origem anterior (486
migrantes). Peru e Bolívia vão, cada vez mais, assumindo posições de destaque, e os países europeus perdendo
participação, o que comprova o caráter cada vez mais regional da migração internacional para a Amazônia
Legal, assim como acontece com as demais regiões do país.
São Paulo, Paraná e Mato Grosso do Sul também merecem destaque como as únicas UFs não
pertencentes à Amazônia Legal entre as seis primeiras colocadas na Tabela 2, o que destaca o caráter atrativo
de migrantes nacionais e mesmo internacionais destas UFs na última década. São Paulo por ser visto como o

209
Migração internacional na Pan-Amazônia

grande centro de oportunidades de trabalho e Mato Grosso do Sul pela proximidade com Mato Grosso, estado
incluído na Amazônia Legal4.
Para especificar ainda mais a migração de estrangeiros na Amazônia, a Tabela 3 traz as informações a
respeito daqueles migrantes internacionais que lá chegaram no qüinqüênio 1995-2000, provenientes de outros
países ou UFs do Brasil5.
A Tabela 3 mostra que a migração recente dos estrangeiros para a Amazônia possui um caráter regional
muito forte. Por um lado, a participação dos países europeus caiu muito na colocação geral, sendo que os seis
primeiros colocados (exceto Paraguai) possuem limites com a Amazônia brasileira, e por outro, a participação
de São Paulo caiu para a quarta posição, sendo superado por Pará, Mato Grosso e Rondônia, enquanto Paraná
caiu para a nona posição.

Tabela 3 - Imigrantes internacionais da Amazônia Legal no período 1995-2000


País de Residência em 1995 UF de residência em 1995
Local Volume % Local Volume %

PERU 805 18,11 PARÁ 643 15,88


BOLÍVIA 686 15,43 MATO GROSSO 505 12,47
COLÔMBIA 401 9,02 RONDÔNIA 491 12,13
PARAGUAI 347 7,81 SÃO PAULO 408 10,09
VENEZUELA 339 7,63 AMAZONAS 332 8,19
GUIANA 334 7,52 RORAIMA 258 6,38
ESTADOS UNIDOS 240 5,41 MARANHÃO 246 6,07
Outros países América 178 4,01 ACRE 182 4,50
GUIANA FRANCESA 151 3,39 PARANÁ 121 2,99
CUBA 146 3,28 MATO GROSSO DO SUL 112 2,77
Outros países Europa 141 3,18 RIO DE JANEIRO 97 2,39
ALEMANHA 103 2,32 TOCANTINS 78 1,93
País estrangeiro sem especificação 94 2,12 DISTRITO FEDERAL 78 1,93
JAPÃO 93 2,09 MINAS GERAIS 76 1,87
CHILE 84 1,89 BRASIL SEM ESPEC. 63 1,55
FRANÇA 82 1,84 SANTA CATARINA 51 1,26
Outros países Ásia 67 1,51 RIO GRANDE DO SUL 51 1,26
ITÁLIA 63 1,42 AMAPÁ 50 1,23
ÍNDIA 62 1,39 CEARÁ 43 1,07
Austrália/ Oceania 25 0,56 GOIÁS 42 1,03
ANGOLA 3 0,06 PARAÍBA 30 0,73
Total 4.443 100 BAHIA 28 0,69
ESPÍRITO SANTO 21 0,53
PIAUÍ 20 0,48
PERNAMBUCO 16 0,40
RIO GRANDE DO NORTE 8 0,19
Total 4.050 100

Fonte: FIBGE, Censo Demográfico de 2000. Tabulações especiais Nepo/ Unicamp.

Os países fronteiriços da Amazônia apresentaram uma importância crescente da migração recente


para aquela região, apontando para a possibilidade de um possível aumento deste tipo de migração na próxima
década ou ainda um aumento da circularidade destes migrantes na região6. Dados do censo de 2010 servirão
para verificar estas possibilidades. Tomando como exemplo o Peru, as Tabelas 1 a 3 mostram que este país

4
Pellegrino (2003) destaca a importância das “cidades globais” como concentradoras da recepção dos migrantes internacionais. Os dados
apresentados aqui mostram que esta migração é importante também para áreas que se encontram fora dos principais eixos econômicos,
o que faz pensar na migração internacional também como acompanhando uma fronteira de ocupação, ou fronteira de oportunidade de
inserção econômica que é configurada pelos estados da Amazônia Legal.
5
Uma tabulação adicional dos dados mostrou que os migrantes provenientes de outros países no quinquênio 1995-2000 são realmente em
sua grande maioria naturais destes países, a saber: Peru (98,5% são naturais do Peru), Bolívia (95,4%), Colômbia (90,9%), Paraguai
(98,9%), Venezuela (83,7%), Guiana (96,7%) e Estados Unidos (87,3%).
6
Maneta (2009) mostra a importância da migração fronteiriça na região de Corumbá, fronteira com a Bolívia. Rodrigues (2006) tangencia
a questão da mobilidade populacional na fronteira com a Colômbia.

210
A migração estrangeira recente na Amazônia legal brasileira • Roberto Luiz do Carmo, Alberto Augusto Eichman Jakob

enviou no total 4.059 migrantes para a Amazônia, 2.512 deles chegaram nos últimos 10 anos (55% deles), sendo
que 1.433 vieram diretamente do Peru (35%). Destes que vieram diretamente do país, 805 chegaram no
qüinqüênio 1995-2000 (ou 56% dos 1.433).
A Bolívia apresenta situação distinta da apresentada para o Peru, enquanto somente 45% dos bolivianos
chegaram ao norte na década de 1990, 62% destes vieram diretamente para o local de residência em 2000, e
54% destes no período 1995-2000.
Já a Colômbia e o Paraguai deixam clara a possibilidade de um aumento da migração nos próximos anos
para a Amazônia Legal. E em situações distintas. Enquanto boa parte dos migrantes colombianos dos anos
1990 vieram diretamente de seu país (75%), no caso do Paraguai este valor foi de apenas 32% mostrando a
importância do Mato Grosso do Sul como destino inicial dos paraguaios antes da vindo ao Mato Grosso. Mas
tanto na Colômbia quanto no Paraguai perto de 70% dos migrantes dos últimos 10 anos em relação ao Censo
2000 vieram no período 1995-2000.
Para se ter uma ideia melhor destes principais fluxos migratórios internacionais com destino à Amazônia,
os migrantes naturais do Peru, Bolívia, Colômbia e Paraguai foram selecionados para um maior detalhamento
de suas características principais, o que é realizado no tópico a seguir.

CARACTERIZAÇÃO DOS MIGRANTES DOS PRINCIPAIS PAÍSES DE ORIGEM

Este tópico tem como objetivo principal detalhar as características dos migrantes estrangeiros com origem
nos países com maior participação no envio de pessoas para a Amazônia, que no período considerado foram Peru,
Bolívia, Colômbia e Paraguai. Serão tratadas características como sexo, idade, escolaridade e renda.
Os municípios da Amazônia que receberam migrantes originários dos países citados estão apresentados
na Tabela 4.
Os Mapas 3, 4, 5 e 6 mostram a localização geográfica dos municípios que receberam migrantes
provenientes do Peru, da Bolívia, da Colômbia, e do Paraguai, no período 1995-2000.
O Mapa 3 mostra os dois eixos de deslocamento dos migrantes com origem no Peru: um com direção ao
município de Manaus, capital do Amazonas, e outro com destino a Guajará-Mirim e Porto Velho, em Rondônia,
passando por outros municípios no Acre, mais próximos à região de fronteira. Com exceção de Manaus, que
concentra 20,7% da migração do período 1995-2000 (Tabela 4), outros municípios, que não capitais, apresentaram
importante participação na migração de origem peruana, evidenciando certa diversificação dos destinos. Pode-se
afirmar que são dois grupos diferentes de movimentos. Por um lado, os movimentos realizados nas áreas de
fronteira, principalmente nos estados do Acre, do Amazonas e de Rondônia; e, por outro lado a mobilidade em
direção a centros urbanos maiores, como é o caso de Manaus.
Com relação aos migrantes do quinquênio 1995-2000 provenientes da Bolívia, o Mapa 4 deixa claro o
grau de concentração destes em municípios próximos, em Rondônia, no Acre e no Mato Grosso, os três estados
amazônicos fronteiriços a este país. O único município fora destes três estados que recebeu migrantes no
período foi Miracema do Tocantins (TO), mas com pouca significância (apenas 2,6% dos migrantes bolivianos
para a Amazônia).
O Mapa 5 traz os migrantes com origem na Colômbia no período 1995-2000. Os municípios de
Tabatinga e Manaus, no Amazonas, foram os que mais atraíram migrantes de origem colombiana. Tabatinga
com 265 (66,1%) e Manaus com 48 (12%), segundo a Tabela 4. Os demais municípios apresentaram pouca
expressão.

211
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabela 4 - Municípios de destino na Amazônia em 2000 segundo os principais países de origem dos migrantes

Peru Bolívia
Município Volume % Município Volume %
Manaus (AM) 167 20,74 Guajará-Mirim (RO) 121 17,63
Tabatinga (AM) 77 9,53 Epitaciolândia (AC) 99 14,46
Guajará-Mirim (RO) 67 8,28 Costa Marques (RO) 80 11,61
Benjamin Constant (AM) 56 6,96 Cáceres (MT) 70 10,22
São Paulo de Olivença (AM) 52 6,44 Rio Branco (AC) 51 7,48
Novo Airão (AM) 43 5,29 Porto Velho (RO) 39 5,68
Assis Brasil (AC) 39 4,79 Pimenteiras do Oeste (RO) 32 4,65
Sena Madureira (AC) 36 4,51 Várzea Grande (MT) 23 3,29
Porto Velho (RO) 32 3,94 Cerejeiras (RO) 20 2,90
Atalaia do Norte (AM) 29 3,59 Miracema do Tocantins (TO) 18 2,65
Cruzeiro do Sul (AC) 26 3,22 Rondonópolis (MT) 18 2,63
Juruti (PA) 21 2,63 Chapada dos Guimarães (MT) 16 2,37
Rio Branco (AC) 21 2,59 Acrelândia (AC) 16 2,33
Coari (AM) 21 2,57 Cuiabá (MT) 15 2,21
Boa Vista (RR) 20 2,52 Plácido de Castro (AC) 14 2,10
Belém (PA) 20 2,45 Sena Madureira (AC) 10 1,42
Santo Antônio do Içá (AM) 15 1,90 Brasiléia (AC) 9 1,31
São Gabriel da Cachoeira (AM) 11 1,39 Cabixi (RO) 6 0,90
Tonantins (AM) 10 1,24 Capixaba (AC) 6 0,85
Manacapuru (AM) 10 1,23 Senador Guiomard (AC) 6 0,83
Ipixuna (AM) 8 1,04 Porto Esperidião (MT) 5 0,76
Santa Rosa do Purus (AC) 8 0,99 Nova Olímpia (MT) 5 0,66
Juruá (AM) 6 0,73 Araputanga (MT) 4 0,59
Alvarães (AM) 5 0,62 Marcelândia (MT) 2 0,27
Marechal Thaumaturgo (AC) 4 0,55 Assis Brasil (AC) 1 0,19
Porto Walter (AC) 2 0,28 Total 686 100
Total 805 100

Colômbia Paraguai

Município Volume % Município Volume %


Tabatinga (AM) 265 66,15 São Miguel do Guaporé (RO) 38 11,06
Manaus (AM) 48 12,00 Marcelândia (MT) 38 10,94
Cuiabá (MT) 23 5,85 São João da Baliza (RR) 22 6,35
Boa Vista (RR) 14 3,52 Altamira (PA) 21 5,95
Santa Isabel do Pará (PA) 11 2,65 Nova Ubiratã (MT) 19 5,41
Santana (AP) 10 2,38 Vera (MT) 19 5,37
Rio Branco (AC) 9 2,31 Nova Brasilândia D'Oeste (RO) 18 5,09
Sapezal (MT) 7 1,78 Várzea Grande (MT) 16 4,51
São Gabriel da Cachoeira (AM) 7 1,73 Paranatinga (MT) 15 4,38
Atalaia do Norte (AM) 3 0,82 Brasnorte (MT) 12 3,38
Presidente Figueiredo (AM) 3 0,80 Cáceres (MT) 11 3,26
Total 401 100 Nova Lacerda (MT) 11 3,19
Itaituba (PA) 10 3,00
Ouro Preto do Oeste (RO) 9 2,58
Alta Floresta (MT) 9 2,53
Rondonópolis (MT) 8 2,42
Sorriso (MT) 8 2,32
São Francisco do Guaporé (RO) 8 2,19
Juara (MT) 8 2,19
Santo Antônio do Leverger (MT) 7 1,98
Tapurah (MT) 7 1,87
Cotriguaçu (MT) 6 1,79
Campo Novo do Parecis (MT) 6 1,59
Feliz Natal (MT) 5 1,53
Nova Bandeirantes (MT) 5 1,46
Cláudia (MT) 5 1,38
Nova Mutum (MT) 4 1,20
Chupinguaia (RO) 4 1,07
Total 347 100

Fonte: FIBGE, Censo Demográfico de 2000. Tabulações especiais Nepo/ Unicamp

212
Venezuela Guiana Guiana Francesa

Venezuela
Suriname
Guiana Guiana F rance sa Colômbia Ú
Ê

Suriname RR AP
Colômbia Ú
Ê
Ú
Ê
RR
AP Equador Ú
Ê
Ú
Ê
Ú
Ê
Equador Ú
Ê Ú
Ê
Ú
Ê AM PA
Ú
Ê MA

Peru MA
AM PA

AC Ú
Ê TO

AC Ú
Ê Ú
Ê
TO Peru RO Ú
Ê
80 6
806 Ú
Ê Ú
Ê
RO

MT
MT

Ú
Ê
Ú
Ê
Bolívia 686
686

Ê C a pitais Am a zônia
Ú Ú
Ê Capitais Amazônia
Imigrant e s do Peru : Imigrantes da Bolívia:
Bolívia
2 - 10 1 - 10
11 - 30 Paraguai 11 - 23
31 - 45 N 30 - 51
50 - 80 Chil e Paraguai
W E
70 - 100 Chile N
1 67 Argentina
Países 121 Argentina
S W E
U F s Am azôn ia Países
UFs Amazônia S
Brasil
Brasil
0 500 1000 Kilometers Fonte: FIBGE, Censo Demográfico de 2000. Tab. especiais NEPO/UNICAMP.
0 500 1 000 Kilometers Fonte : FIB GE, C e nso D emográfic o de 2 000 . Tab. especiais NEPO/ UNICA M P. Malha digital do Brasil de 2001
Ma lha digita l do Brasil de 2 001.

Mapa 3 - Migrantes do Peru com destino à Amazônia Legal em 1995-2000. Mapa 4 - Migrantes da Bolívia com destino à Amazônia Legal em 1995-2000.

213
Guiana Guiana Francesa
Venezuela
Suriname
Colômbia Ú
Ê
RR
ô
Colômbia Venezuela AP
Guiana Guiana Francesa
401
401 Ú
Ê
Suriname Equador
Ú
Ê
Ú
Ê
PA Ú
Ê
RR AM Ú
Ê
AP
Ú
Ê MA
Equador Ú
Ê
Ú
Ê
AM Ú
Ê
PA AC Ú
Ê
MA Peru
TO
Ú
Ê Ú
Ê
RO

AC Ú
Ê MT
TO
Peru Ú
Ê Ú
Ê
RO

Ú
Ê
MT Bolívia

Ú
Ê
Bolívia
Ú
Ê Capitais Amazônia
Ú
Ê Capitais Amazônia
Imigrantes da Bolívia:
Imigrantes da Bolívia:
3 - 10
347
347
4 - 10 Chile
11 - 23 11 - 22 Paraguai
48 N
Paraguai 38
265 N Argentina
Chile Argentina Países W E
Países W E UFs Amazônia S
UFs Amazônia
Brasil S Brasil

0 600 1000 Kilometers Fonte: FIBGE, Censo Demográfico de 2000. Tab. especiais NEPO/UNICAMP.
0 500 1000 Kilometers Fonte: FIBGE, Censo Demográfico de 2000. Tab. especiais NEPO/UNICAMP.
Malha digital do Brasil de 2001 Malha digital do Brasil de 2001
A migração estrangeira recente na Amazônia legal brasileira • Roberto Luiz do Carmo, Alberto Augusto Eichman Jakob

Mapa 5 - Migrantes da Colômbia com destino à Amazônia Legal em 1995-2000. Mapa 6 - Migrantes do Paraguai com destino à Amazônia Legal em 1995-2000.
Migração internacional na Pan-Amazônia

Em termos dos migrantes com origem paraguaia, o Mapa 6 mostra que grande parte destes se destina
aos estados do Mato Grosso e de Rondônia (mais próximos ao Paraguai). Porém, um fato interessante é que os
quatro principais municípios de destino estão localizados em quatro diferentes estados: São Miguel do Guaporé
(RO) e Marcelândia (MT), com 38 migrantes, São João da Baliza (RR) e Altamira (PA), com perto de 22
migrantes. Itaituba também aparece no Pará, com 10 migrantes recebidos do Paraguai entre 1995 e 2000. A
característica rural desses municípios pode ser um indicador de que estes paraguaios sejam, na verdade, filhos
de brasileiros, retornados depois de uma experiência de trabalho nas áreas agrícolas do Paraguai. Essa hipótese
é retomada quando se trabalha a composição etária dos imigrantes, no item seguinte. Outro aspecto importante
a se considerar é a característica específica da mobilidade dos paraguaios, que se direcionam para os municípios
que podem ser caracterizados como pertencentes a regiões de fronteira agrícola.
Como o volume de migrantes do período 1995-2000 é relativamente baixo com relação aos principais
países de origem, de 805 peruanos, 686 bolivianos, 401 colombianos e 347 paraguaios, não é possível se fazer
muitas desagregações de migrantes com respeito a sexo, idade, escolaridade e renda ao nível dos municípios de
destino da Amazônia. Sendo assim, as análises a seguir serão feitas com relação ao total destes migrantes sem
considerar diferenças entre os municípios de destino.

A IDADE DOS MIGRANTES RECENTES INTERNACIONAIS

As análises com respeito à idade dos migrantes são baseadas na Tabela 5, que traz a idade média,
mediana e participação masculina dos migrantes dos quatro principais países de origem no período 1995-2000.

Tabela 5 - Idade média, idade mediana e participação masculina dos


migrantes da Amazônia Legal segundo países de origem
no período 1995-2000.
Idade Peru Bolívia Colômbia Paraguai
Média (anos) 29,5 24,1 26,8 15,1
Mediana (anos) 27,0 21,0 28,0 11,0
% Homens 52,2 49,0 51,6 50,3
Fonte: FIBGE, Censo Demográfico de 2000. Tabulações especiais Nepo/ Unicamp.

A Tabela 5 mostra que, em média, os migrantes mais jovens são os com origem paraguaia (15,1 anos de
idade), seguidos pelos bolivianos (24,1 anos de idade), e os mais maduros os provenientes do Peru (29,5 anos).
A idade mediana não se distanciou muito da média, denotando uma variabilidade não muito grande dos dados.
As exceções ficaram por conta da Bolívia, com uma diferença de 3 anos e Paraguai, com 4 anos a menos de
idade mediana, chegando a impressionantes 11 anos de idade dos migrantes. Esta composição extremamente
jovem da imigração paraguaia evidencia a hipótese levantada anteriormente de que os imigrantes originários do
Paraguai são crianças e adolescentes nascidos naquele país, filhos de pais brasileiros, que retornaram ao Brasil.
A experiência de trabalho no Paraguai, em uma situação de iminência de conflito com as populações locais,
pode explicar o retorno de um grupo significativo de famílias, que por sua experiência acumulada buscam os
municípios de expansão da fronteira agrícola na Amazônia.
Em se tratando da composição dos grupos migratórios por sexos, a Tabela 5 mostra que os migrantes
recentes de Peru e Colômbia são em geral um pouco mais do sexo masculino (perto de 52% de homens) e da
Bolívia do sexo feminino (51% de mulheres). Já no caso do Paraguai a divisão por sexos é bem igualitária. Ou
seja, não há um aparente diferencial por sexos entre os migrantes recentes destes principais países de origem.
A migração não é seletiva por sexo.

214
A migração estrangeira recente na Amazônia legal brasileira • Roberto Luiz do Carmo, Alberto Augusto Eichman Jakob

Conforme abordado anteriormente, fica difícil (e até não indicado) fazer a comparação dos migrantes
por sua composição de sexo e idade se as categorias a serem analisadas tiverem menos de 50 casos cada uma.
Assim, foi elaborada uma pirâmide etária apenas para o Peru, país com o maior número de migrantes recentes
na Amazônia. A Figura 1 traz esta pirâmide etária.

60 a 64

55 a 59

50 a 54 Mulheres
Homens
45 a 49

40 a 44
Faixa Etária

35 a 39

30 a 34

25 a 29

20 a 24

15 a 19

10 a 14

5a9

15 10 5 5 10 15
Participação no total

Figura 1 - Pirâmide Etária dos migrantes do Peru com destino à Amazônia em 1995-2000

Esta pirâmide etária mostra o problema da falta de dados nas faixas etárias. Em geral, cada categoria
possui menos de 100 pessoas, e diversas já com menos de 50, o que dificulta a análise dos dados. De qualquer
forma, destacam-se dois grupos com peso relativo bastante significativo em relação aos demais: os homens na
faixa de 40 a 44 anos e as mulheres entre 20 e 24 anos.

A ESCOLARIDADE DOS MIGRANTES RECENTES INTERNACIONAIS

A escolaridade dos imigrantes internacionais do quinquênio 1995-2000 que tiveram como destino os
municípios da Amazônia brasileira foi avaliada em termos dos anos de estudo daqueles com mais de 14 anos de
idade. A Tabela 6 traz a participação dos migrantes em cada categoria de anos de estudo, assim como os anos
médios e medianos de estudo destes.
Os dados da Tabela 6 mostram que os migrantes provenientes do Peru foram os mais uniformemente
distribuídos em termos de anos de estudo. Enquanto 56% dos migrantes com mais de 14 anos de idade possuíam
menos de 12 anos de estudo, a média e a mediana dos anos de estudos eram próximos a 11. Já os outros países
apresentavam grandes diferenças em termos de escolaridade. Para os migrantes com origem boliviana, 73%
possuíam menos de 11 anos de estudo. A média de anos de estudo foi de menos de 8 anos.
No caso dos migrantes provenientes da Colômbia, perto de 83% estavam abaixo de 13 anos de estudo.
A escolaridade média e mediana revela uma situação melhor dos colombianos migrantes em comparação com
os bolivianos, mas pior em relação aos peruanos.

215
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabela 6 - Porcentagem de migrantes com destino à Amazônia Legal, no período 1995-2000, maiores de
14 anos de idade, dos principais países de origem, segundo anos de estudo, média e mediana
de anos de estudo.

Anos de Estudo Peru Bolívia Colômbia Paraguai


<1 1,0 7,3 - 28,9
1 1,0 1,9 - 9,1
2 1,6 4,3 2,6 2,3
3 3,5 3,7 3,7 14,8
4 0,3 7,4 2,5 15,6
5 6,3 7,9 11,2 6,0
6 2,6 7,1 5,1 -
7 3,2 5,0 13,4 3,7
8 8,0 20,3 5,9 -
9 2,7 1,9 6,6 -
10 2,1 6,0 6,4 -
11 23,1 21,9 25,1 16,5
12 6,8 - - -
13 1,7 - - -
14 3,7 1,8 - -
15 15,2 - 3,1 -
16 3,4 1,7 1,8 3,1
17+ 13,7 1,8 12,5 -
Total 682 504 327 135
Média (anos) 11,2 7,3 9,4 4,1
Mediana (anos) 11,0 8,0 9,0 3,0

Fonte: FIBGE, Censo Demográfico de 2000. Tabulações especiais Nepo/ Unicamp.

Já com relação ao Paraguai, a escolaridade é muito baixa. Perto de 97% dos migrantes tinham menos
de 12 anos de estudo, e 29% menos de 1 ano de estudo. A mediana chegou a apenas 3 anos de estudo, o que
pode significar também uma presença importante de crianças que ainda se encontravam nos estágios iniciais de
sua formação escolar, que certamente deve ter sido afetada pelos deslocamentos entre as áreas rurais do
Paraguai e do Brasil.

A RENDA DOS MIGRANTES RECENTES INTERNACIONAIS

A renda mensal dos migrantes internacionais do quinquênio 1995-2000 da Amazônia é analisada neste
tópico em termos de porcentagem de migrantes em categorias de renda em salários mínimos, assim como a
renda média e mediana dos migrantes do Peru, Bolívia, Colômbia e Paraguai. A Tabela 7 traz estas informações.
A Tabela 7 mostra que não havia muita seletividade migratória com relação à renda dos migrantes
recentes do Peru. Perto de 56% de chefes de família ou indivíduos sozinhos em domicílios coletivos possuíam
até 5 salários mínimos de renda mensal, sendo a mediana de 3 salários. Destaca-se que cerca de 26% de
migrantes com origem peruana declararam receber mais de 20 salários mínimos mensais, o que certamente
deve decorrer de sua inserção laboral, conforme será observado adiante.
Da mesma forma que para a escolaridade, com relação à renda os migrantes recentes provenientes dos
outros países também apresentaram uma distribuição desigual. Havia somente 11% de chefes migrantes ganhando
mais de 5 salários mínimos. A grande parte ganha até 2 salários (55%). Os bolivianos são os migrantes recentes
com a menor renda média e mediana entre os migrantes destes principais países de origem, chegando a apenas
1,3 salário mínimo de mediana.

216
A migração estrangeira recente na Amazônia legal brasileira • Roberto Luiz do Carmo, Alberto Augusto Eichman Jakob

Tabela 7 - Porcentagem de migrantes com destino à Amazônia Legal, no período 1995-2000, chefes de família
ou indivíduos sozinhos, dos principais países de origem, segundo renda mensal, renda média e mediana
em salários mínimos.

Renda (SM) Peru Bolívia Colômbia Paraguai


Sem Renda 15,4 17,0 8,1 5,3
+0 a 2 31,0 55,5 42,7 36,3
+2 a 5 9,5 16,4 28,8 22,8
+5 a 10 14,4 7,5 4,5 7,8
+10 a 20 4,1 - 7,1 27,7
+20 25,6 3,6 8,9 -
Total 258 247 131 53
Média (SM) 9,7 3,1 8,6 5,8
Mediana (SM) 2,7 1,3 2,0 3,0

Fonte: FIBGE, Censo Demográfico de 2000. Tabulações especiais Nepo/ Unicamp.

Entre os colombianos, sua renda é melhor que a dos bolivianos, apresentando uma mediana de 2 salários
mínimos e uma média de quase 9 salários. O que houve foi uma ligeira desconcentração do grupo de até 2
salários em prol das categorias de maior renda. A média de renda chegou a quase 9 salários, embora a mediana
fosse de apenas 2 salários. Estas diferenças entre a média e a mediana existem em função de que, no caso da
média, alguns poucos valores extremos (outliers) nos grupos de maior renda fazem com que o valor da média
se eleve, o que não ocorre com a mediana, um divisor de 50% dos casos.
Os paraguaios, por fim, são os que apresentaram a maior renda mediana, de 3 salários, e com uma
média mais próxima, de 5,8 salários. Os chefes paraguaios são aqueles com as menores participações na
categoria de “sem renda”, e uma distribuição um pouco mais uniforme nos demais grupos. É interessante se
notar que os migrantes deste país são os mais jovens, menos escolarizados, mas aqueles com as maiores rendas
em geral. Talvez uma possível explicação para este fato resida na ocupação destes migrantes. A Tabela 8 tenta
elucidar isto.

Tabela 8 - Porcentagem de migrantes com destino à Amazônia Legal, no período 1995-2000, chefes de família
ou indivíduos sozinhos, economicamente ativos, dos principais países de origem, segundo posição na
ocupação.

Posição na Ocupação Peru Bolívia Colômbia Paraguai


Não tinha trabalho na semana de referência 5,4 0,0 0,0 6,8
Trabalhador doméstico sem carteira trabalho assinada 0,0 14,2 10,2 0,0
Empregado com carteira trabalho assinada 10,2 0,0 30,8 37,4
Empregado sem carteira trabalho assinada 51,5 57,3 43,7 35,2
Empregador 0,0 5,1 0,0 0,0
Conta-própria 33,0 23,4 15,3 20,7
Total 230 196 101 41

Fonte: FIBGE, Censo Demográfico de 2000. Tabulações especiais Nepo/ Unicamp.

Percebe-se, com a Tabela 8, que os chefes economicamente ativos migrantes de Peru, Bolívia e Colômbia
possuem uma participação maior na categoria de empregados sem carteira de trabalho assinada. Já os paraguaios,
possuem uma maior representatividade no grupo dos empregados com carteira assinada, o que faz um diferencial
na renda, uma vez que possuem um acesso maior ao mercado formal de trabalho. Estes eram basicamente
garçons, barmen ou copeiros (38% dos 41 chefes).

217
Migração internacional na Pan-Amazônia

Uma concentração maior de médicos foi verificada entre os peruanos (31% dos 230 chefes), mas
entre os bolivianos e os colombianos não houve tal concentração, sendo que as maiores participações não
excederam os 15%.
No caso dos bolivianos, apontados como os de menor renda na Tabela 7, verifica-se a partir da Tabela
8, que nenhum era empregado com carteira de trabalho assinada, embora 5% sejam empregadores, 14%
empregados domésticos e 23% trabalhavam por conta própria.
E entre os colombianos, quase 75% eram empregados, 15% trabalhavam por conta própria e 10%
empregados domésticos.
Deve-se ressaltar que é difícil fazer mais conclusões sobre a ocupação destes migrantes, uma vez que
na maioria das categorias foram verificados menos de 20 casos, e já com a expansão da amostra. Assim, não
é possível fazer um detalhamento maior sob pena de agregar um erro muito grande às análises.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Destaca-se de início que os volumes relativamente pequenos dos contingentes de imigrantes internacionais
na Amazônia apresentados nesse trabalho podem ser decorrência de dois fatores. Por um lado, problemas
relativos à cobertura do levantamento censitário. Por outro lado, a possibilidade de não identificação dos imigrantes,
por se encontrarem no país como indocumentados.
Quando se considera o estoque de imigrantes, observa-se uma tendência de que no período mais recente
acontece uma predominância da chegada de imigrantes de países da América do Sul, enquanto em décadas
anteriores a chegada de imigrantes europeus foi mais significativa.
Os dados censitários permitem identificar três situações distintas em termos de entrada dos imigrantes
internacionais nos estados da Amazônia Legal no período recente. Um primeiro movimento acontece nas áreas
de fronteira internacional, onde a circulação de pessoas é regulada por um conjunto específico de regras. Esse
é o caso principalmente dos bolivianos, e em menor escala dos peruanos e colombianos.
Um segundo movimento se caracteriza pela busca, por parte dos imigrantes, de centros urbanos maiores,
como as capitais estaduais e alguns polos regionais. É o que acontece de maneira mais evidente com peruanos
e colombianos.
O terceiro movimento tem como característica a busca por áreas de ocupação de fronteira de ocupação
do território, o que ainda existia na Amazônia Legal durante a década de 1990. Neste grupo se encaixam
principalmente os paraguaios.
O trabalho apresenta também um conjunto de características dos imigrantes internacionais residentes
na Amazônia Legal. Destacam-se alguns aspectos principais. O primeiro diz respeito à composição etária dos
grupos. Nesse caso observa-se que os imigrantes paraguaios possuem média de idade muito baixa, o que pode
ser decorrência da migração de retorno de famílias de brasileiros que foram residir no Paraguai e retornaram
com filhos que nasceram naquele país.
Em termos de renda, destacam-se os peruanos com um percentual elevado de chefes de domicílio com
renda superior a 20 salários mínimos (25%), sendo que este grupo de migrantes apresenta também uma importante
concentração em termos de ocupação como “conta própria”. Em termos de ocupação, entretanto, os imigrantes
dos quatro grupos de nacionalidade considerados se encontravam na situação “empregado sem carteira de
trabalho assinada”, o que revela uma inserção precária no mercado de trabalho.
A imigração internacional na Amazônia já foi, historicamente, muito significativa. O período recente
mostra mudanças importantes em termos da origem dos imigrantes. As melhorias das condições de comunicação
e transportes com os países vizinhos podem vir a ser importantes no recrudescimento da mobilidade populacional
com os países vizinhos. Pela própria extensão das fronteiras internacionais da Amazônia Legal, certamente
esse processo terá desdobramentos significativos para essa região.

218
A migração estrangeira recente na Amazônia legal brasileira • Roberto Luiz do Carmo, Alberto Augusto Eichman Jakob

REFERÊNCIAS

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MORAN, E. F.; ALVES, D. S. (Org.). Amazônia: natureza e sociedade em transformação. São Paulo: EDUSP, 2008. 304p.

MANETA, A. Dinâmica populacional, urbanização e ambiente na região fronteiriça de Corumbá. Campinas: Dissertação
(Mestrado em Demografia) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, 2009. 110f.

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PELLEGRINO, A. La migración internacional en América Latina y el Caribe: tendencias y perfiles de los migrantes. Serie
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PIZARRO, J. M. (Ed.). América Latina y el Caribe: migración internacional, derechos humanos y desarrollo. Santiago de
Chile: CEPAL, sep., 2008.

ROCHA, G. M. Aspectos recentes do crescimento e distribuição da população da Amazônia Brasileira. In: ARAGÓN, L. E.
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SOUCHAUD, S.; CARMO, R. L.; FUSCO, W. Mobilidade populacional e migração no Mercosul: a fronteira do Brasil com
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SOUCHAUD, S.; FUSCO, W. Diagnóstico das migrações internacionais entre Brasil, Paraguai e Bolívia. In: FAUSTO, B.;
BAENINGER, R. (Org.). População e políticas sociais no Brasil: os desafios da transição demográfica e das migrações
internacionais. Brasília: CGEE (Centro de Gestão e Estudos Estratégicos), 2008.

219
TERCEIRA PARTE

MIGRAÇÃO TRANSFRONTEIRIÇA
E FUGA DE CÉREBROS
Configuração migratória no lugar Guayana: uma análise da migração na tríplice fronteira: ... • Francilene dos Santos Rodrigues

CONFIGURAÇÃO MIGRATÓRIA NO LUGAR GUAYANA:


UMA ANÁLISE DA MIGRAÇÃO NA TRÍPLICE FRONTEIRA
BRASIL-VENEZUELA-GUIANA

Francilene dos Santos Rodrigues1

INTRODUÇÃO

Este texto tem como objetivo abordar as configurações migratórias na fronteira norte do Brasil.
Os dados aqui apresentados foram apresentados no Seminário Migração Internacional na Pan-Amazônia
promovido pelo NAEA/UFPA, no mês de novembro de 2008. Esses dados são resultado da pesquisa
Deslocamentos populacionais na tríplice fronteira Brasil-Venezuela-Guiana2, iniciada em agosto de 2007
e foi concebida a partir da necessidade em compreender a complexidade dos processos migratórios intrarregional
e fronteiriço, tanto em seus aspectos sociais, como simbólicos.
Neste sentido, a fronteira é o locus privilegiado para examinar o quadro das dinâmicas sul-americanas
decorrentes das migrações, dos encontros culturais, dos jogos de identidades e dos acordos entre as nações
relativos ao trânsito de informações, mercadorias e força de trabalho.
A essa tríplice fronteira - Brasil/Venezuela/Republica da Guiana3, recorte espacial da pesquisa que aqui
denomino de Lugar Guayana, considerando que é um microcosmo do Planalto das Guianas que, configurou-se,
desde o século XVI como uma fronteira de expansão europeia e tem sido o cenário de muitas disputas desde os
tempos coloniais até a atualidade. O Planalto Guianense denomina, desde o século passado, toda a ilha
marítimo-fluvial ao norte da América do Sul, localizada entre o oceano Atlântico e o curso dos rios Orinoco e
Amazonas, abrangendo o leste e o sul da Venezuela, a Guiana, o Suriname, a Guiana Francesa e os estados do
Amapá, Pará e Roraima no Brasil. Desde a segunda metade do século passado, esse planalto tem sido pensado
enquanto fronteira de expansão e de conservação de recursos naturais pelos governos dos respectivos países.
O Lugar Guayana se construiu a partir dos encontros de populações muito diferentes e continua a ser
um lugar de grande complexidade onde vivem populações indígenas de diversas etnias, migrantes regionais e
imigrantes de todos os continentes.

1
Doutora em Ciências Sociais e professora da Universidade Federal de Roraima. email: francerodrigues@yahoo.com.br.
2
O projeto Deslocamentos populacionais na tríplice fronteira Brasil-Venezuela-Guiana, conta ainda com a pesquisadora Dra. Mariana
Cunha Pereira (UFG); a aluna de especialização em Historia Regional, Iana Santos Vasconcelos e com as alunas de graduação Alessandra
Santos Rufino, Carla Regina Host, Andrea Estevam Dias, Vanderlisa de Souza Ribeiro e Cristina Nascimento de Oliveira.
3
Mais especificamente, o recorte espacial da pesquisa são os territórios do município venezuelano de Gran Sabana, no estado Bolívar; dos
municípios brasileiros de Pacaraima, de Bonfím e a capital Boa Vista, no estado de Roraima e o distrito guianense de Rupunini/Demerari,
mais especificamente, a cidade fronteiriça de Lettem.

223
Migração internacional na Pan-Amazônia

A complexidade deste lugar está relacionada, também, ao fato de constituir-se em múltiplas fronteiras,
tanto no sentido de limite territorial e de soberania entre os Estados nacionais, como fronteira interna no sentido
de área de expansão da ordem econômica e social dessas nações, que tanto precisa ser desenvolvida como
conservada enquanto reservatório de recursos. É ainda, uma fronteira cultural produzida pela e na diversidade
tanto nacional quanto internacional, manifestada nas identidades étnicas, nas linguagens, nos credos e nas
culturas que geram conflitos e alianças entre as populações locais e migrantes.
Entendo que a especificidade do Lugar Guayana é constituir-se em espaço de múltipla fronteira e,
portanto, requer a compreensão dos fenômenos sociais relacionados aos processos migratórios, tanto internos
como internacionais.
Na primeira parte deste texto apresentarei um quadro da conformação da tríplice fronteira internacional
e da fronteira interna em Roraima e sua relação com os deslocamentos populacionais e as configurações sócio-
culturais construídas no Lugar Guayana. Na segunda parte, abordarei o fluxo migratório de brasileiros para a
Venezuela e a Guiana e a constituição das redes sociais nesse processo. Na terceira parte, a imigração de
estrangeiros para Roraima, com destaque para a imigração guianense. Por fim, algumas considerações finais.

RORAIMA E A CONFORMAÇÃO DA FRONTEIRA INTERNACIONAL E DE EXPANSÃO

Nos últimos anos, tem-se verificado que o que caracteriza as migrações contemporâneas têm sido os
deslocamentos populacionais de uma maior diversidade étnica, de classe e de gênero, como também uma
multiplicidade das relações que os imigrantes estabelecem entre a sociedade de destino e a de origem dos
fluxos (ASSIS, 1999).
Até meados do século passado, os deslocamentos davam-se prioritariamente do continente europeu
para o americano, no entanto, atualmente, a conjuntura demográfica mundial indica uma tendência da migração
dos países latino-americanos para a Europa, a Ásia e a América do Norte, em especial, para os EUA. Outra
tendência verificada é o aumento da migração intrarregional e fronteiriça de migrantes em busca de melhores
oportunidades de trabalho.
Nos últimos anos essa tendência da mobilidade transfronteiriça tem se tornado mais enérgica na tríplice
fronteira ao norte do Brasil (Pacaraima e Boa Vista), sul da Venezuela (Gran Sabana/Santa Elena do Uairén)
e sudoeste da República da Guiana (Rupunini/Lettem). Essa tríplice fronteira é marcada pelo cotidiano dos
grupos étnicos e nacionais que, desde longos anos, desenham fluxos migratórios diários e transfronteiriços
criando e fortalecendo redes sociais que se estendem por intermédio das relações de comércio, de trabalho, de
serviços públicos, de lazer, de parentesco, de vizinhança e de religiosidade. Esse trânsito transfronteiriço é um
dos aspectos que dá forma e cor à tríplice fronteira ao norte do Brasil. Se as estruturas sociais desenvolvidas
nesses lugares de fronteira enquanto áreas relativamente isoladas e juridicamente ambíguas tendem, de um
lado, a desenvolver estruturas sociais de caráter local e também inovadoras, em virtude do hibridismo e/ou
multiculturalismo que as caracterizam, de outro lado, constituem-se onde o Estado omite-se deliberadamente e
onde pode transgredir suas próprias estruturas (RIBEIRO, 1997).
O fato de o Lugar Guayana constituir-se em fronteira de expansão de Brasil, Venezuela e Guiana
representa não apenas o lugar de expansão do capital, mas também de orientação dos fluxos migratórios
internos, especialmente das populações rurais. A fronteira é o locus da recriação da produção camponesa
expulsa das regiões mais desenvolvidas, o destino dos pequenos produtores expropriados e dos excedentes
populacionais, especialmente do Nordeste, do Sul e do Sudeste do Brasil. A fronteira também funciona como
uma espécie de “armazém regulador” dos preços de gêneros alimentícios de primeira necessidade consumidos
pela população urbana, especialmente a de mais baixa renda, ao mesmo tempo em que tem sido a “válvula de
escape” das tensões sociais no campo (GRAZIANO DA SILVA, 1982, p. 118).

224
Configuração migratória no lugar Guayana: uma análise da migração na tríplice fronteira: ... • Francilene dos Santos Rodrigues

A migração entre as fronteiras nacionais de Brasil, Venezuela e Guiana é um contínum das migrações
internas, principalmente em Roraima. As fronteiras agrícolas significam terra e trabalho, que absorve a massa
excedente de nordestinos e sulistas que não encontram lugar nos centros urbano-industriais. O desbravamento
de novas áreas, além de deslocar os históricos conflitos sociais e as demandas por terra agravado pelo processo
de modernização, significou ocupação e trabalho, amenizando também a pressão sobre as cidades e a oferta de
empregos em outros setores.
Roraima vivenciou um crescimento significativo da população, principalmente, a partir dos anos 1970.
Nessa década, a população que era de 40.885 habitantes saltou para 79.159 habitantes na década seguinte. A
taxa média de crescimento populacional deste período foi de 6,83% ao ano, a maior apresentada até aquele
momento. Pela primeira vez também a população urbana superava a população rural. Em 1980, 61,56% da
população concentravam-se nos núcleos urbanos, principalmente na capital Boa Vista (Tabela 1).

Tabela 1 - População residente. Roraima - 1950/2000

Rural Urbana
Anos Total
Habitantes (%) Habitantes (%)
1950 18.116 12.984 71,67 5.132 28,33
1960 28.304 16.156 57,08 12.148 42,92

1970 40.885 23.404 57,24 17.481 42,76


1980 79.159 30.425 38,44 48.734 61,56
1991 217.583 70.814 32,54 146.769 67,46

2000 324.397 77.381 23,85 247.016 76,15


Fonte: Censos IBGE.

Os principais motivos do crescimento populacional em Roraima foram o incentivo à imigração através


dos projetos de assentamento e colonização agrícola, implantados a partir de meados da década de 1970 e a
descoberta de novos garimpos, principalmente, a partir de 1980.
A atividade de mineração vai se configurar, a partir deste período, no principal atrativo à imigração,
verificada durante toda a década de 1980. O resultado deste fluxo migratório refletiu-se, em 1990, na taxa de
crescimento demográfico de 10,64%, a maior do Brasil (Tabela 2).

Tabela 2 - Crescimento populacional nos estados da região Norte - 1950/2000

Estados 1950/1960 1960/1970 1970/1980 1980/1991 1991/2000

Rondônia 6,39 4,76 11,03 7,87 2,24


Acre 3,20 3,13 3,43 3,01 3,29
Amazonas 3,33 3,03 4,12 3,57 3,31

Roraima 4,65 3,75 6,83 10,64 4,58


Pará 3,11 3,55 4,62 3,46 2,54
Amapá 6,14 5,37 4,36 4,65 5,77

Tocantins - - - 2,01 2,61


Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1950/2000. In: Portela (2008, p. 30).

225
Migração internacional na Pan-Amazônia

A expansão da atividade de mineração foi consequência, de um lado, do esgotamento das jazidas secundárias
nos garimpos de outras regiões da Amazônia, principalmente da província garimpeira de Tapajós e Serra Pelada,
no Pará, de outro lado, do aumento significativo do preço do ouro a partir de 1979 (RODRIGUES, 1996).
A descoberta de ouro e diamantes na porção setentrional de Roraima, em meados dos anos 1980, trouxe
milhares de garimpeiros ao estado. Em 1988, o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) estimou
em 30.000 pessoas, a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e a União dos Sindicatos e Associações de Garimpeiros
da Amazônia Legal (USAGAL) estimavam em 45.000 pessoas no mesmo ano, sem contar aqueles que se
envolveram indiretamente com o garimpo, trabalhando em atividades de apoio (RODRIGUES, 1996).
No início de 1990, o Governo Federal iniciou a remoção dos garimpeiros e proibiu a atividade mineradora,
tendo em vista que era conduzida de maneira clandestina em parques nacionais e reservas indígenas, ao mesmo
tempo em que os organismos internacionais e as grandes mineradoras faziam pressão ao governo brasileiro
para barrar tal atividade. Com isso, Roraima viveu uma significativa diminuição nas taxas de crescimento entre
1991 e 2000 que, decresceu de 10,64% para 4,58%, mas permanecendo em segundo lugar entre os estados da
região Norte, ficando atrás apenas do Amapá (Tabela 2).
Esses fluxos migratórios internos vão se refletir diretamente nos fluxos internacionais e, principalmente
na emigração de brasileiros para o estado Bolívar na Venezuela, cujo processo deu-se em três períodos: o
primeiro período iniciou-se em meados dos anos 1970, com o declínio da mineração na região do Tepequém e
região nordeste do estado de Roraima. Grande parte dos brasileiros emigrou para atuar diretamente nas áreas
de mineração ao sul da Venezuela. Esses brasileiros estabeleceram-se na Gran Savana, em Maturin e Ciudad
Bolívar. Caracterizou-se por uma emigração predominante masculina, que constituiu família já como imigrante.
Um segundo período teve início nos anos 1990, também estimulado pelo declínio da mineração nas áreas de
garimpagem em Roraima e pelo fracasso dos projetos de colonização e assentamento. Esse período caracterizou-
se por uma emigração de homens, mas também de mulheres para reunificação familiar, mas também, para
atuarem nas atividades indiretas da mineração, tais como cozinheiras, lavadeiras nos próprios garimpos ou nos
restaurantes nas vilas e centros de apoio. O terceiro período iniciou-se nos anos 2000, após a transformação de
Pacaraima em município. Caracteriza-se por um incremento na emigração de mulheres para trabalharem no
comércio local, nos restaurantes de brasileiros, no ramo do embelezamento e por uma migração para o trabalho
diário tanto no serviço doméstico, como no comércio e na construção civil (empreitada). Outra característica
deste período é uma migração de retorno como consequência da intensa fiscalização e fechamento dos garimpos
na Venezuela.

A MULTIPLICIDADE CULTURAL DA FRONTEIRA

Pode-se constatar que os imigrantes estão distribuídos espacialmente nas localidades e cidade de Santa
Elena do Uairén expressando um processo de hierarquização e segregação étnica e de gênero. A feira livre,
que ocorre todas as sextas-feiras em Santa Elena, expressa a complexidade do fenômeno migratório em espaços
de fronteira. A feira constitui-se o microcosmo de um espaço de encontros de múltiplas culturas e também de
diferenciação sociocultural. Os vendedores de hortaliças e legumes são predominantemente brasileiros que
residem em Pacaraima. Os vendedores de frangos, peixes, queijos, frutas, mandioca, pimentas e ervas são
venezuelanos, entre eles, indígenas que têm um espaço próprio e bem delimitado, “segregado” na rua onde
ocorre a feira. Os colombianos são vendedores de roupas; os chineses, vendedores de objetos e utensílios de
plásticos produzidos nos países asiáticos; os guianenses sao vendedores de malta, sorvetes, sucos.

226
Configuração migratória no lugar Guayana: uma análise da migração na tríplice fronteira: ... • Francilene dos Santos Rodrigues

Na cidade de Santa Elena, os brasileiros também estão presentes nas lojas de confecção, tanto como
proprietários como vendedores; no ramo alimentício; nos restaurantes como proprietários que inovam introduzindo
uma experiência brasileira, a comida por quilograma. Os restaurantes de comida brasileira atendem principalmente
brasileiros e turistas de uma maneira geral. Há os restaurantes criollos frequentados pela população local e
indígena. Os trabalhadores de lojas, casas de compra e venda de ouro e restaurantes são prioritariamente
brasileiros. As brasileiras são vistas como boas manicures e depiladoras enquanto as venezuelanas são
reconhecidas como boas profissionais no corte e na arrumação dos cabelos. As brasileiras também estão no
emprego doméstico, mas diferentemente de outras imigrantes como as guianenses, haitianas e hondurenhas,
vivem em Pacaraima e todo dia cruzam a fronteira para trabalharem em Santa Elena, predominantemente em
casa de brasileiros. Os brasileiros estão no serviço de transporte de pessoas - atividade que cresce a cada dia.
São taxistas que pegam passageiros em Boa Vista e trazem para Pacaraima ou Santa Elena.
Ainda em Santa Elena a venda de combustível no câmbio negro é monopólio de venezuelanos e
colombianos. Os guianenses chegam a Santa Elena via Ciudad Bolívar, capital do estado Bolívar e estão
concentrados nos setores de produção agrícola, madeireira, mineira e de serviços. Os imigrantes guianenses
são considerados bons agricultores e em Santa Elena podem ser vistos no comércio ambulante de sorvetes e
malta e as mulheres no emprego doméstico.

EMIGRAÇÃO DE BRASILEIROS E BRASILEIRAS PARA A VENEZUELA

Como apresentado anteriormente, os fluxos migratórios internacionais no Lugar Guayana tem relação
direta com o processo de expansão da fronteira amazônica, uma vez que se constitui como espaço de migração
circular, ou seja, os brasileiros imigram dos estados do Nordeste e do Norte do Brasil para Roraima e daí para
a Venezuela e a Guiana, primeiramente para atuarem nos garimpos e nas atividades de apoio à mineração.
A imigração de brasileiros para a Venezuela, desde os anos 1970, determinou a formação de uma
geração de venobras, ou seja, de filhos de brasileiros imigrantes permanentes4 e que possuem dupla
nacionalidade, por descendência. Muitos ainda vivem na Venezuela, mas mantêm fortes vínculos com o Brasil.
Outra fase do fluxo migratório do Norte do Brasil para a Venezuela é mais recente e constitui-se de uma
migração laboral temporária e de trânsito e de uma imigração feminina.
Essa migração é constituída a partir da formação e fortalecimento das redes sociais e tem a capacidade
de produzir modos de organização que ultrapassam as fronteiras de um Estado nacional. A migração de trânsito,
seja por temporada, diária, semanal ou mesmo mensal, é melhor visibilizada no crescente número de brasileiras
que emigram para a Venezuela, para trabalharem como cozinheiras nos restaurantes, no comércio como
vendedoras ou autônomas, no serviço doméstico, e como cabeleireiras e manicures.

AS REDES SOCIAIS E AS MIGRANTES BRASILEIRAS

O uso social das redes sociais de parentesco e amizade são estratégias migratórias utilizadas
diferentemente por homens e mulheres refletindo também os impactos nas estruturas familiares desses migrantes.
Em face a isso é possível identificar aspectos importantes que revelam a influência nos papéis de gênero e suas
novas configurações nesse cenário. Sendo assim, observa-se nos discursos das migrantes, que o processo
migratório é apoiado pela cooperação de membros da família, o que se deve à formação familiar constituída por
uma extensa rede de parentela. Esse apoio vai desde a aquisição da passagem rodoviária, moradia e alimentação
que perdura até o estabelecimento na sociedade de destino.

4
A LEY DE EXTRANJERÍA Y MIGRACIÓN N° 37. 944 de 24 de Mayo, 2004 define como migrantes permanentes os que tenham
autorização para permanecer indefinidamente no território venezuelano.

227
Migração internacional na Pan-Amazônia

O relato de Raquel5, brasileira, casada, 2 filhos, comerciante e vivendo há 16 anos em Santa Elena do
Uairén é significativo para explicitar as redes sociais e trajetórias migratórias:
De Teresina, eu vim para Boa Vista. Eu vim com uma família, com uma senhora para ajudar
ela na casa dela. Aí eu trabalhava e estudava à noite. Me lembro que parte desse dinheiro
mandava para o meu pai e ficava com um pouco pra mim. Com dois anos que estava em Boa
Vista mandei buscar o meu pai. Aí veio meu pai, minha madrasta e os meus dois irmãos e
outro filho da minha madrasta que meu pai criou, veio a família inteira. Na verdade, não foi
só eu que mandei buscar. Tava um outro irmão meu em Boa Vista que tinha vindo com outra
família. (....) Em 1990 fiquei desempregada e aí em 1991 eu vim pra cá (Santa Elena do
Uairén). Eu tinha uma amiga que morava no BV8 (Pacaraima). Aí eu resolvi vim para o
BV8 porque me disseram que era bom pra conseguir trabalho. Pura ilusão! Aqui (Santa
Elena) que a gente conseguia trabalho. Ficava na casa da minha amiga no BV8 e vinha
todo dia trabalhar. Comecei a trabalhar aqui. Eu vinha e voltava todos os dias. Passei uma
semana assim, só que o dinheiro só dava para as passagens e a comida. Ai uma senhora me
chamou para trabalhar num restaurante (na Venezuela), para trabalhar e morar com ela,
uma colombiana. Depois fui trabalhar com uma venezuelana, morei na casa dela, só sai
quando arrumei um lugar.

Observa-se que a decisão pela busca de novas alternativas de sobrevivência em um lugar desconhecido,
bem como o processo de transição entre o país de origem e o estabelecimento no país de acolhimento se
distingue de acordo com o modelo familiar. As novas formas e conteúdos de casamentos, conforme Waitsman
(1994), conformaram-se em uma tendência pós-moderna6 onde a tônica, tanto no casamento como na família é
a heterogeneidade, a pluralidade, a flexibilidade, a instabilidade e a incerteza como regra. A chamada família
moderna baseada na distinção dos papéis entre o público e o privado, atribuída segundo o gênero7 foi ressignificada
e as mulheres passaram a redefinir sua posição na sociedade e agora, decidem a estratégia migratória e tomam
a iniciativa de irem em busca de trabalho e de acomodação para a família.
Em um primeiro momento da trajetória migratória deixam os filhos e retornam em feriados ou a cada
dois meses para revê-los. Os vínculos dessas mulheres com os filhos, de certa forma, mantêm-se, mas outros
membros da família, geralmente as avós ou tias assumem uma educação compartilhada e muitas vezes conflitivas.
Isso tem um impacto na configuração social familiar e na articulação dos inúmeros papéis e identidades que
essas mulheres (re)constroem no processo da migração. Os depoimentos abaixo demonstram esse processo de
redefinição dos papéis de mulher e mãe por parte dessas mulheres que emigram deixando seus filhos:
Vim pra cá (Santa Elena) para conhecer e acabei ficando. Eu vim trabalhar, logo que eu me
saparei, quando fez dois anos que o meu ex-marido sumiu e não deu mais notícias, nem
mandou dinheiro, nada. Lá (Manaus) eu sempre trabalhei como cabeleireira, que dizer,
depois que eu casei, porque antes eu trabalhava em fábrica. Meu marido não apareceu.
O meu filho mais velho tem 12 anos, o do meio tem 08 anos e a pequeninha tem 06 anos.
Estão com minha avó. Agora não tem como eles ficarem aqui comigo, eu tô trabalhando,
moro com a minha sogra, então ainda não dá. Vou de três em três meses, passo um mês ou
duas semanas, eu vim de lá agora! Tô trabalhando com roupa, vendo e espero um mês que
me paguem para voltar. Compro aqui e revendo lá. Mas é só eu me estabilizar direito e
resolver umas coisinhas que vou trazer eles8.

5
Nome fictício.
6
Para Waitsman (1994, p.18) os conflitos entre os valores igualitários e as práticas hierárquicas presentes na estrutura da família conjugal
moderna afloraram e favoreceu o surgimento da crise que a levou a transformar-se. Ou seja, à medida que as relações que estruturam a
família conjugal moderna – a divisão sexual do trabalho, a dicotomia entre papéis instrumentais e expressivos segundo o gênero –
tornaram-se rarefeitas ou transformam-se, este tipo de família abre passagem para outro tipo de família.
7
Os papéis atribuídos a homens e mulheres não obedecem mais ao padrão tradicional, hierárquico, do homem provedor e associado ao
espaço público e as mulheres à satisfação das necessidades afetivas da família e associada ao espaço privado.
8
Ângela, nome fictício de uma brasileira, amazonense e que vive em Santa Elena do Uairen. Entrevista concedida em 29.05.2008.

228
Configuração migratória no lugar Guayana: uma análise da migração na tríplice fronteira: ... • Francilene dos Santos Rodrigues

As mulheres emigram por várias razões. Para algumas mulheres, sair do seu país de origem em busca
de espaço no mercado de trabalho possibilita não apenas a emancipação econômica, mas também o acesso a
uma qualidade de vida e mudança na relação de opressão e discriminação que limitam a sua liberdade e suas
potencialidades. A migração é uma forma de obter liberdade de circulação e autonomia das repressões e
amarras comunitárias e familiares. As mulheres quando obtêm sucesso nos seus projetos migratórios refazem
seu papel no seio da família, na comunidade e no ambiente de trabalho. Tomam o controle de seus próprios
assuntos, de sua própria vida, de seu destino, adquirem consciência da sua habilidade e competência para
produzir, criar e gerir, enfim, para empoderar-se. As narrativas abaixo demonstram alguns desses aspectos do
empoderamento:
Depois que mantive um relacionamento com venezuelano, mudei! Agora eu não sou mais
besta como era antes com meu marido. Agora tem que ser do meu jeito, se não vai embora.
Mudei muito, chorava por homem, hoje eles que choram por mim. Ia atrás de homens, agora
eles que vêm atrás de mim; tinha ciúmes, agora não tenho mais, eles que têm. Amar... agora
acabou isso pra mim; eu agora gosto, curto a vida. A Venezuela pra mim foi um
amadurecimento de vida. Aprendi a me amar mais9.

Não é que penso em não voltar para o Brasil. Bom, não vou dizer não, eu tenho vontade,
mas pra começar do zero de novo? Pra começar do zero não, aqui eu já tenho a minha vida
feita, já tenho meu mundo construído. Ir pra lá é como se eu fosse começar do zero10.

Quando as oportunidades sociais e econômicas apresentam-se particularmente favoráveis, com


possibilidades de ascensão social no país de acolhimento, “a precariedade da família de origem” – econômica,
social e cultural- é substituída por outra imagem no processo de individuação. A individuação, neste sentido, se
faz a partir da incorporação de vários sentidos: não apenas a separação física da família, mas também o
afastamento de seu universo cultural, vivenciado como atrasado, tradicional, preconceituoso, oposto a diversidade
cultural e estilos de vida desenvolvidos na transfronteira.
Nesse processo de cruzar fronteiras e transitar entre culturas distintas, as mulheres são forçadas a
manejar e negociar situações de forma criativa e melhorar seus status no interior das relações familiares, ao
mesmo tempo em que surge a oportunidade para repensar a própria identidade. O deslocamento entre um país
e outro, representa uma possibilidade de sobrevivência, mas também uma escolha ou um projeto individual tanto
social como identitário. Neste sentido, a identidade é uma opção, uma construção do próprio sujeito em função
de suas trajetórias e das escolhas que o meio social lhe oferece, ou melhor, as escolhas individuais ocorrem
dentro de um “campo de possibilidade” dado.

IMIGRANTES EM RORAIMA

O deslocamento populacional no Lugar Guayana é mais significativo de brasileiros para a Venezuela


e para a Guiana em decorrência, como já dito, das possibilidades de atuarem nas atividades de mineração11, no
comércio local e no setor de transportes, além das atividades ilegais como o tráfico de mulheres para exploração
sexual, contrabando de combustível e câmbio ilegal de moeda.

9
Renata (nome fictício), brasileira, cearense, há cinco anos em Santa Elena do Uairén, dois filhos. Entrevista concedida em 29.05.2008.
10
Roberta (nome fictício), brasileira, de Boa Vista, 24 anos e um filho. Entrevista concedida em 29.05.2008.
11
O Sindicato dos Garimpeiros do Estado de Roraima estimava em 2005 a existência de dois mil garimpeiros que transitavam entre os
garimpos dos estados de Roraima, Bolívar e a região do Rupunini.

229
Migração internacional na Pan-Amazônia

Em Roraima, a imigração de estrangeiros de maior representatividade, nos 1960 a 1990, foi de guianenses,
principalmente em decorrência da crise política e econômica daquele país. Entretanto, a partir de meados dos
anos 1990, ocorreu uma imigração induzida de mão-de-obra qualificada para atuar nas áreas de saúde e de
educação, prioritariamente de cubanos, seguida de uma imigração espontânea de peruanos, de colombianos e
de venezuelanos. Ademais desses imigrantes de mão-de-obra qualificada, identificou-se uma imigração
significativa de peruanos e bolivianos atuando no mercado informal, normalmente trabalhando na comercialização
de produtos artesanais, CD e DVD, materiais de cozinha e os mais diversos produtos de “quinquilharias”.
Os espaços ocupados por esses imigrantes são os das feiras (do Produtor e dos Garimpeiros), das praças
(das Águas e Aírton Senna), dos bares da Orla, do centro comercial e da lixeira pública da Prefeitura.
No entanto, o quadro de imigrantes ainda tende para os de origem guianense, seguido do de cubanos,
peruanos, bolivianos, colombianos e venezuelanos12. Podemos afirmar que cubanos, peruanos, bolivianos e
venezuelanos, portadores de certo poder aquisitivo e qualificação profissional, geralmente são homens e imigram
com as famílias ou as constituem quase que imediatamente, como forma de regularizar sua permanência no
Brasil. Os dados obtidos demonstram que a imigração de cubanos, um fenômeno desde 1997 é uma imigração
induzida para a obtenção de mão-de-obra qualificada para atuar nas áreas de saúde e de educação.
Segundo dados coletados junto aos órgãos públicos e cooperativas de pessoal da área de saúde e
educação, no estado de Roraima13, as nacionalidades dos profissionais estrangeiros inseridos no mercado formal
em Boa Vista são: cubanos (35%); peruanos (34%); colombianos (10,3%); bolivianos (5%); venezuelanos
(4%); sírios, libaneses, guatemaltecos, salvadorenhos, argentinos, chilenos, paraguaios, guianenses e alemães,
cada um representando 1,3% do total. Quanto a faixa etária desses migrantes 81,6 tem entre 40 e 59 anos; os
que tem entre 20 e 39 anos representam 13,2% e os com mais de 60 anos representam 5,2% do total. Quanto
ao gênero desses imigrantes com qualificação em nível superior 29% é de mulheres e predominam na faixa
etária de 20 a 39 anos (70%). Esse quadro confirma a hipótese na mudança do perfil dos imigrantes, cuja
tendência é aumento da migração feminina e cada vez mais jovem.
O aumento da participação das mulheres nos deslocamentos populacionais internacionais tem colocado
questões significativas para as teorias sobre migrações e a necessidade de analisar e compreender a incorporação
dessas mulheres imigrantes à força de trabalho nos países receptores. Alguns autores, como Assis (1999) tem
verificado que esta inserção tem sido vista no contexto de uma progressiva desindustrialização e de um mercado
de trabalho étnico e sexualmente segregado.
Em Boa Vista, grande parte dos migrantes estão inseridos no mercado informal e os espaços dessas
atividades são as feiras, o centro comercial e as áreas de lazer. Grande parte dos imigrantes é de nacionalidade
guianense, peruana e boliviana. Outra caracteristica dos migrantes de menor poder aquisitivo (buhoneros) é que
imigram, frequentemente, sozinhos. Esses seguem uma trajetória migratória que percorre vários países ao longo
dos anos. Essa trajetória dá-se a partir de seus países para os países vizinhos. Alguns vêm para o Brasil, entrando
pelo estado do Amazonas e, depois, seguindo para o estado de Roraima e, posteriormente, para a Venezuela.
Já os guianenses imigram, predominantemente, com suas famílias principalmente por já terem uma
rede de parentesco mais antiga, desde os anos 1960, bem como pelos processos históricos e socioculturais que
se desenvolvem entre os povos indígenas Makuxi e Wapichana que habitam a fronteira internacional entre a
Guiana e o Brasil.

12
Esses dados foram extraídos a partir das informações das secretarias dos governos estadual e municipal da pesquisa de campo, realizada
em janeiro de 2008.
13
Esses dados foram extraídos a partir das informações das secretárias de Administração e Pessoal dos governos estadual e municipal, da
Universidade Federal de Roraima e da COOPEBRAS - Cooperativa Brasileira de Serviços Múltiplos de Saúde. Dados referem-se a janeiro
de 2008.

230
Configuração migratória no lugar Guayana: uma análise da migração na tríplice fronteira: ... • Francilene dos Santos Rodrigues

Segundo Baines (2004) essas etnias se configuraram num processo transnacional, em que nacionalidades
distintas e etnias diversas se sobrepõem em complexas manifestações de identidade. Em 2001 o município fronteiriço
de Bonfím tinha uma população de migrantes internacionais em torno de 3,4% (BARCELOS, 2001). Em Boa
Vista os guianenses estão presentes no mercado informal, no emprego doméstico e na construção civil.
A imigração em Roraima também é hierarquizada espacialmente. Os bairros de maior frequência e
moradia dos estrangeiros com menor qualificação profissional, que vivem em situação irregular são os bairros
periféricos, principalmente o Monte das Oliveiras, bairro Brigadeiro e 13 de Setembro. Os estrangeiros com
certo poder aquisitivo estão localizados na chamada região nobre de Boa Vista, ou seja, nos bairros Caçari e
Paraviana.
Essa migração transfronteiriça e as configurações sociais decorrentes desse processo podem ser
percebidas na utilização dos serviços de saúde pública em Boa Vista. Os dados das secretarias de saúde
estadual e municipal indicam que a maior parte dos estrangeiros que procuram atendimento na rede hospitalar
pública é de nacionalidade guianense e venezuelana (Tabela 3). Isso se deve ao fato de que as cidades de Santa
Elena do Uairén e Lettem estão distantes dos centros urbanos com infraestrutura adequada para tratamentos
de média e alta complexidade.

Tabela 3 - Atendimento no hospital municipal Santo Antônio em 2006

País 2006 2007

Republica Cooperativista da Guiana 28 31


Republica Bolivariana de Venezuela 42 46
Fonte: Secretaria Municipal de Saúde -SAME/Hospital Santo Antônio (2008)

Apesar das fontes oficiais serem precárias, uma vez que a maioria vive em situação de clandestinidade
e irregularidade, os dados acima demonstram as tendências da configuração dos fluxos migratórios nessa
tríplice fronteira.

GUIANENSES EM RORAIMA

Como dito anteriormente, a imigração de guianenses para Roraima e, em especial, para Boa Vista data
dos anos 1960, configurando-se como uma das migrações transfronteiriças mais consolidadas. Ela tem o caráter
de reunificação familiar e, mais recentemente, um fluxo de mulheres que imigram sozinhas.
Através das entrevistas foi constatado que as guianenses, em grande parte, encontram-se trabalhando
nas casas das famílias nos bairros de classe média e residem nos bairros periféricos. Outro espaço de trabalho
das mulheres migrantes é a Cooperativa dos Amigos Catadores e Recicladores de Resíduos Sólidos –
UNIRENDA14, cooperativa ligada ao município, que desenvolvia a coleta de lixo reciclável no aterro sanitário
do município.
O perfil dessas imigrantes é de mulheres na faixa etária entre 20 e 45 anos, possuem baixa escolaridade,
estão, em sua maioria, inseridas no serviço doméstico, sem carteira assinada e o tratamento que recebem das
famílias onde trabalham é muitas vezes de exploração e maus tratos. Uma das imigrantes relatou que ela

14
A Cooperativa dos Amigos, Catadores e Recicladores de Resíduos Sólidos do Estado de Roraima (UNIRENDA) - foi criada em 30 de
novembro de 2002. A iniciativa foi resultado do processo de desativação da lixeira pública, com a inauguração do Aterro Sanitário.
Atualmente, 34 famílias vivem da coleta, triagem e venda de resíduos sólidos.

231
Migração internacional na Pan-Amazônia

morava com uma família que a tratavam bem, como se fosse família deles, e que comia tudo que eles comiam.
Relatou que fazia de tudo na casa e eles não lhe pagavam salário, só mesmo comida e dormida. Mas, um belo
dia a patroa, disse que não precisava mais morar lá, que procurasse um lugar para morar e que ela receberia o
pagamento de duzentos e cinquenta reais (R$ 250,00)15. A vulnerabilidade e os riscos a que estão sujeitos os
migrantes é mais agravante quando se referem às mulheres, muito mais sujeitas à violação dos direitos humanos.
As histórias dessas imigrantes são muito semelhantes, quase todas elas viviam em seu país de origem
sem emprego, dependendo do esposo ou da família. O rompimento da dependência é um dos principais motivos
para emigrar, segundo relatos das mesmas. Essas guianenses viam na emigração a possibilidade de mudar de
vida, poder trabalhar, realizar seus sonhos e ter uma vida digna. Mas, ao chegarem no Brasil deparam-se com
dificuldades que decorrem, principalmente, da diferença na língua. Uma das mulheres guianenses entrevistadas
relatou que quando via pessoas na rua, se escondia, pois sentia vergonha, por não saber falar, aí entrava
em casa e não falava com ninguém. Outro problema que logo fica visível para elas é a xenofobia. As pessoas
ainda têm uma grande dificuldade em aceitar bem os imigrantes. Com o tempo, essas diferenças vão amenizando,
apesar de sempre estarem presentes nas sociabilidades. Elas vão adaptando-se e incorporando novos elementos
da cultura local e recriando uma nova identidade social (HALL, 2003).
Nos relatos de muitas delas, expressavam o sentimento de sentirem-se estigmatizadas pela sociedade
local. Ao serem questionadas como se sentiam sendo estrangeiras em Roraima, reportaram não sentir muito a
descriminação por serem estrangeiras, e sim por serem negras ou indígenas. No entanto, pode-se observar na
narrativa de uma das guianenses que afirma todo tempo me sinto estrangeira e que apesar de se sentirem
estranhas e diferentes gostam de morar em Roraima (HALL, 2000).
Entretanto, nota-se uma preocupação por parte dessas mulheres em manterem os elementos da sua
cultura, reafirmando os valores identitários da cultura nacional. Uma das mulheres guianenses disse não gostar
de ser reconhecida como brasileira:
Quando perguntam quanto tempo estou aqui, e respondo 22 anos, eles dizem, há você já é
roraimense. Então eu sempre digo assim: Não, eu sou guianense, mas gosto de morar no
Brasil. E sempre procuro não perder o meu sotaque. Nossa! Gosto demais dele!

Outro traço dessa migração recente principalmente de mulheres é que, uma vez estabelecidas, mantêm
relações com a sociedade de origem e tecem conexões com a sociedade de destino, construindo redes de
migração que estimulam novas migrações. O aumento da participação feminina, a partir de 1970, ocorre em um
contexto de crescimento das migrações internacionais a partir da segunda metade do século XX. Os migrantes
contemporâneos contam com um sistema de comunicações e transportes mais barato e eficiente.
Com relação às motivações para a migração há outros fatores além dos econômicos como: a transgressão
dos limites sexuais impostos pela sociedade, os problemas conjugais e a violência física, a impossibilidade de
divorcio, os casamentos infelizes e desfeitos, a discriminação contra grupos femininos específicos e a ausência
de oportunidades para as mulheres.
As mulheres migram não apenas por razões econômicas, mas também por rompimento com sociedades
discriminatórias, nas quais estariam em posição subordinada. Nos fluxos contemporâneos, as mulheres tendem
a migrarem sozinhas ou como primeiras em suas famílias. Enquanto os homens têm tido cada vez menos
oportunidades no mercado de trabalho, perdem autonomia e, por isso desejam retornar à origem para o
restabelecimento da antiga configuração familiar, as mulheres passam por um processo de empoderamento,

15
O salário mínimo regional, em março de 2008, data dessa entrevista era de R$ 415,00 (quatrocentos e quinze reais).

232
Configuração migratória no lugar Guayana: uma análise da migração na tríplice fronteira: ... • Francilene dos Santos Rodrigues

ou seja, ganham autonomia pessoal e independência financeira, passam a contribuir com o sustento do domicílio,
a lidar com o controle dos gastos domiciliares e a participar das tomadas de decisão familiares. Essa mudança
de status é refletida no desejo das mulheres em permanecerem no destino, uma vez que nos países de origem
eram submissas e dependentes. A mobilidade e o acesso a recursos sociais e econômicos dessas mulheres
fazem com que a esfera doméstica mude de posições. Ou seja, o processo migratório muda a forma patriarcal
tradicional de organização social para homens e mulheres.
Podemos afirmar que nesta tríplice fronteira ocorre um processo que ainda não pode ser denominado
de feminização, porém acompanha a tendência das migrações internacionais que é o crescimento do número de
mulheres que migram não apenas para acompanhar ou juntar-se ao cônjuge e, assim reorganizar a chamada
família conjugal moderna, mas, também, para fugir de relações violentas ou de estruturas familiares patriarcais,
buscando uma emancipação que não é apenas econômica.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES FINAIS

O atual processo migratório internacional vem se caracterizando pelo desenvolvimento e constituição


de sociedades em redes, favorecido, entre outros fatores, pela evolução dos transportes que proporcionou um
aumento dos movimentos e deslocamentos populacionais. Esses, por sua vez, trazem à tona a porosidade das
fronteiras nacionais, étnico-culturais e identitárias, bem como as transformações no mundo do trabalho uma vez
que nos terrenos das trocas materiais e simbólicas se confrontam indivíduos e culturas muito diferentes.
As redes sociais construídas na migração têm a capacidade de produzir modos de organização que
ultrapassam as fronteiras de um Estado, de um território definido por uma linha geopolítica ou dois lados
separados e vigiados arbitrariamente, mas também ligados por práticas legais e ilegais de cruzamentos, trocas
e comunicações (CLIFFORD, 1999, p.13).
O tema migração transfronteiriça configura-se como um problema de investigação de alto grau de
complexidade. Os dados estatísticos ao mesmo tempo em que revelam o fenômeno da migração, paradoxalmente
o negam. É grande a dificuldade em se fazer uma estimativa da presença quantitativa e qualitativa desses
migrantes internacionais que transitam nessa tríplice fronteira, seja para estabelecerem-se, seja pela migração
temporária, ou mesmo como um dos momentos dessa trajetória migratória.
As pessoas que saem de seus países de origem, geralmente, vão em busca de emprego e melhor
qualidade de vida, mas também de liberdade, justiça e igualdade de oportunidades. Migram por que não encontram
as condições mínimas para o o exercício de seus direitos tanto econômicos, quanto sociais, ou seja, de exercerem
plenamente sua cidadania.
O que vem caracterizando o recente fluxo de migrantes é a alta incidência de indocumentados, de
modalidade de inserção informal no mercado de trabalho e a crescente presença de mulheres e crianças. Se o
crescimento da presença de mulheres no quadro da migração internacional, por um lado, indica uma certa
melhoria no desempenho social e na ampliação do poder em nível doméstico e público, por outro, aponta para o
fato de estarem sujeitas à perpetuação de padrões de desigualdade de gênero e, portanto, muito mais expostas
à violações extremas de seus direitos sociais.
Na configuração da migração na tríplice fronteira, os dados apontam para dois processos de migração
mais consolidados: o primeiro, o de brasileiros para a Venezuela e para a Guiana decorrente da migração
interna e da exploração da garimpagem; o segundo, a imigração de guianenses para Roraima e do processo
transnacional de sobreposição de nacionalidades e etnias, característico dessa área transfronteiriça.

233
Migração internacional na Pan-Amazônia

O trânsito nessa transfronteira é caracterizado por deslocamentos diários e contínuos que apresentam
especificidades determinadas pelas exigências da conjuntura socioeconômica dos estados regionais e do país.
São deslocamentos diários, impulsionados pela busca de serviços públicos e pelas redes de comércio que
demandam certo tipo de trabalhador de baixo nível de qualificação profissional como o emprego doméstico e o
comércio ambulante em feiras livres, no centro da cidade.
As redes sociais não-estruturadas que se organizam com base no comércio na região de fronteira
Brasil-Venezuela-Guiana caracterizam-se pela ilegalidade, imprevisibilidade e não institucionalidade. Essas
redes articulam demandas locais porque respondem a interesses específicos dos povos que vivem na
fronteira. As redes de comércio ali são constitutivas de circulação de informações sobre câmbio monetário,
de fofocas e rumores sobre a vigilância da fronteira e de troca de experiência sobre a situação dos
mercados vizinhos. Esta configuração está de acordo com valores e normas tradicionais e com as estratégias
diante da diversidade cultural.
No trânsito entre fronteiras as pessoas se deslocam, levam consigo universos simbólicos e estabelecem
pontes entre as sociedades de origem e destino. Ao mesmo tempo em que constroem novos espaços além das
fronteiras geográficas, desconstroem a identidade original e a reconstroem em outras bases. Ser migrante
possibilita ao sujeito circular entre as várias identidades e implica a manutenção de uma identidade em trânsito,
em aberto, inconstante. Esse trânsito é resultado de complexos processos de negociação da realidade com
outros sujeitos e indivíduos coletivos. Em decorrência desta complexidade do intercâmbio material e simbólico
entre sujeitos sociais de culturas diferentes, surgem vários aspectos no processo de construção de identidades
que possibilitam a redefinição de papéis sociais de homens e mulheres e a própria relação de gênero.
Ao buscarem a sobrevivência em outro país as mulheres se deparam com o surgimento de conflitos
familiares, em face de disputa permanente de prioridades entre um projeto de vida e modelos/valores tradicionais,
que enquadram a mulher em posição subalterna dentro da família e outros projetos e valores que identificam
inúmeros “campos de possibilidades” no qual se possa desenhar uma trajetória individual e singular. A busca de
oportunidades no exterior exprime o desejo de desvencilhar-se de uma cultura discriminatória, sexista e opressiva.
A mobilidade é parte da cultura. O migrante derruba fronteiras, transita entre mundos. A imigração abre
a oportunidade para repensar a própria identidade, a manejar situações entre poderes assimétricos, racismo e
discriminações, refazer sua auto-imagem. Ser estrangeiro ou estrangeira implica a manutenção de uma identidade
em aberto, sem fixidez, sempre prestes a ser negociada.

234
Configuração migratória no lugar Guayana: uma análise da migração na tríplice fronteira: ... • Francilene dos Santos Rodrigues

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236
Por uma “Sociologia da clandestinidade” no estudo da presença de brasileiros na Guiana ... • Manoel de Jesus de Souza Pinto

POR UMA “SOCIOLOGIA DA CLANDESTINIDADE”


NO ESTUDO DA PRESENÇA DE BRASILEIROS
NA GUIANA FRANCESA

Manoel de Jesus de Souza Pinto1

INTRODUÇÃO

Este artigo, além da questão da clandestinidade, pretende focalizar vários aspectos da presença de
brasileiros na Guiana Francesa, tomando como ponto de partida o momento em que eles cruzam a fronteira pelo
município de Oiapoque. Parece-nos relevante neste momento entender o quadro geral desta realidade, que
dependendo de cada momento histórico, responde por novas conjecturas e demandas, sejam elas diplomáticas,
comerciais, políticas, históricas ou mesmo culturais. Do processo de criminalização das migrações pelo governo
francês à letargia do Estado brasileiro na forma de entender as fronteiras amazônicas, tem-se mensalmente
uma série de acontecimentos, que especialistas dizem, ferem nossa soberania nacional. Os fatos e as notícias
sobre os incidentes que ocorrem na faixa de fronteira entre o estado do Amapá e a Guiana Francesa podem ser
compreendidos a partir da lógica do “esquecimento-histórico” que o Estado brasileiro tem para com uma região
que nunca teve a visibilidade política que merece. Além desse esquecimento em relação à região, tem-se, o que
é mais grave, a falta de atenção com o homem amazônico, que pela ausência de políticas públicas em algumas
áreas, é obrigado a lutar por direitos que não são reconhecidos em seu próprio país. Koltai, citando Todorov
lembra:

Arrancado de seu meio, todo homem começa a sofrer. É mais agradável sofrer com os seus.
Mas em seguida, o expatriamento pode se tornar uma experiência proveitosa. Permite que se
pare de confundir o real com o ideal, cultura com natureza. O homem desenraizado, caso
consiga ultrapassar o ressentimento pelo desprezo ou hostilidade, descobrirá a curiosidade e
praticará a tolerância. Minha passagem de um país a outro me ensinou ao mesmo tempo ser
relativo e absoluto (KOLTAI apud TODOROV, 2000, p. 20).

Obviamente que não podemos afirmar se a experiência pela qual os brasileiros passam no território
francês seja capaz de fazê-los mais tolerantes culturalmente, ou mesmo superar o ressentimento com o Brasil;
no entanto, através de vários relatos colhidos, a experiência da clandestinidade, frequentemente, de “longo
prazo”, acaba marcando muitas trajetórias de vida para sempre. Em linhas gerais, neste artigo, gostaríamos de
apresentar as estratégias, os receios, a coragem e até mesmo a ousadia de brasileiros para lidar com situações

1
Doutor pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA/UFPA) e professor adjunto da Universidade Federal do Amapá. Atualmente
desenvolve pesquisa sobre as dinâmicas sociais na faixa de fronteira entre o estado do Amapá e a Guiana Francesa. E-mail: manoel-
pinto@uol.com.br.

237
Migração internacional na Pan-Amazônia

de grande complexidade, como é o caso da clandestinidade. Quer seja no meio da floresta, nos garimpos, nos
centros de detenções ou na periferia de Caiena, o trabalhador clandestino está deslocado, errante, em contra-
lugares, ainda que, no entanto, eles sejam efetivamente localizáveis. Além da malária, da fome, do trabalho
escravo, das humilhações, das prisões, dos roubos, dos calotes, dos açoites, do medo, do frio, tem-se ainda a
solidão, a perda da auto-estima e muitas vezes a morte (PINTO, 2008). O seguinte depoimento2 é extremamente
valioso para começarmos a dimensionar as dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores que procuram emprego
na cidade de Caiena:

Caiena, 20 de abril de 1995


Estou tendo pela primeira vez a oportunidade de escrever para dar notícias minhas. Mamãe,
a vida aqui não é fácil. Desde que nós chegamos, eu e mais cinco amigos, vivemos escondidos.
A saudade de vocês é muito grande, choro todos os dias, e rezo por mim e por vocês.
A viagem até aqui foi um pesadelo. Pagamos para nos deixarem até Caiena, mas devido ao
mal tempo, isso não foi possível, e assim largaram a gente numa praia de água salgada e
que tem muita lama. Tivemos que rastejar na mata e andar com água no pescoço, e para
quem não sabe nadar é pior. Perdi todos os meus documentos junto com minha roupa que
estava na mochila; a sensação era de morte.
Inclusive, um rapaz que conheci na viagem por nome de Beto morreu assim que chegamos
na mata. Ele tava com malária e no desembarque, já muito fraco, não resistiu. Tivemos que
enterrar o corpo dele ali mesmo, além disso ninguém sabe do parentesco dele para avisar
sua família. Mas graças a Deus, comigo está tudo bem. Já consegui um emprego em uma
obra como ajudante de pedreiro, e durmo na própria obra. Como sou clandestino, não
posso sair por aí dando bobeira, porque os policiais ficam sempre nos arredores do local
em que estou; pois quando chega a polícia “preta” temos que nos esconder. A vida aqui é
muito humilhante, mas eu sei que vou vencer.
O pouco que eu ganho tá dando pra guardar, que é pra chegar em Macapá com um dinheiro
a mais e comprar uma casa para meus filhos. Um abraço nos meus irmãos e um grande beijo
em você.
Eu estou mandando 700 francos pra vocês [...] Dá um jeito de trocar e comprar roupas para
as crianças e pagar as contas, saudades [...]

José Carlos da Silva

A questão das migrações por trabalho para a Guiana Francesa foi e continua sendo expressiva nos dias
atuais. Cada vez mais, milhares de pessoas das regiões Norte/Nordeste de forma clandestina cruzam a fronteira
em busca de trabalho, desencadeando uma série de situações de violência que têm se tornado cotidianas na
vida, principalmente dos imigrantes ilegais. No dia 13 de dezembro de 2007, morreu em Caiena o jovem Maílson
Castro Dourado no Centro de Detenção de Rouchabour. Ele era clandestino e ao chegar à prisão começou a
passar mal, pois segundo amigos, sofria de “mal de chagas”. Na ocasião seus pais tentavam levar o corpo para
Palmeirândia – MA, mas as despesas chegavam em torno de 11 mil euros (cerca de 28 mil reais à época). No
dia 19 de abril de 2008, a vítima foi Nerize Dias de Oliveira. Ela estava sendo deportada para a fronteira do
Amapá com a Guiana Francesa, quando ocorreu o incidente. Seu corpo foi encontrado no dia 26, nas águas do
Rio Maná, e tinha um corte profundo na cabeça, indicando que, provavelmente, ela foi atingida pela hélice do
mesmo barco que deportava um grupo de brasileiros. Nerize teria caído na água em uma manobra da embarcação.
A hélice do motor atingiu a cabeça da brasileira que morreu logo em seguida. No entanto, toda a celeuma em
torno desse episódio diz respeito ao fato de que a polícia francesa não teria prestado socorro nem permitido o

2
Depoimento extraído do documentário “A fronteira da ilusão”, produzido como trabalho de conclusão de curso (TCC) pelos alunos Jorge
Cardoso e Reginaldo Macedo, da Faculdade SEAMA–AP.

238
Por uma “Sociologia da clandestinidade” no estudo da presença de brasileiros na Guiana ... • Manoel de Jesus de Souza Pinto

resgate da mulher pelos brasileiros. O caso mais recente que fez esquecer o anterior se deu durante um tiroteio
entre policiais da Guiana Francesa e brasileiros suspeitos de explorar ouro ilegalmente no departamento francês
ao norte do Brasil. Na madrugada de domingo, 8 de fevereiro de 2009, duas embarcações onde os brasileiros
estavam foram interceptadas por uma patrulha francesa. Houve troca de tiros e um brasileiro conhecido até
o momento como “Joca” acabou morrendo após ser alvejado3.
Os imigrantes de todos os tempos evocam diversas imagens. A partida, a viagem, o trajeto, os dramas,
as dificuldades, a chegada a uma nova terra constrói um fio e uma trajetória que nos inquieta (SASAKI; ASSIS,
2002). Perguntamos-nos por que migraram, quem deixaram, o que mudou em suas vidas e se todas as dificuldades
vivenciadas estão valendo ou mesmo se valeram a pena. Estas imagens, quando associadas aos imigrantes da
virada do século XX, sugerem desagregação social, trabalho precarizado, economia informal e clandestinidade.
A carta acima, escrita por José Carlos da Silva, poderia ser muito bem assinada por milhares de
trabalhadores brasileiros que vivem nos garimpos ilegais ou em Caiena. Mesmo sendo datada do ano de 1995,
as dificuldades de se chegar, de se trabalhar, e de se viver sob o espectro da clandestinidade continuam iguais;
e em alguns casos se intensificaram ainda mais. A ideia de fazer uma “etnografia da ilegalidade” tem como
objetivo detalhar o desespero, a ansiedade, o medo, a revolta, a coragem, e acima de tudo, a resignação de
milhares de trabalhadores que já “escolheram” o que querem fazer da vida: lutar pela sobrevivência em situações
limites. A maioria das pessoas que desconhece “o que é ser imigrante”, quando ouve que “fulano de tal” já foi
deportado 5, 10 ou mais vezes da Guiana Francesa, tende a achar engraçado a relutância por tanto sofrimento.
Mas pelo que presenciamos em nossa pesquisa, a partir dos próprios relatos dos trabalhadores e trabalhadoras,
a insistência em voltar/retornar não são escolhas e sim quase uma obrigação de continuar lutando pela
sobrevivência. Em uma das entrevistas, um imigrante em tom de brincadeira disse uma grande verdade: voltar
para o Brasil significa morrer mais cedo; pelo menos aqui jogamos com a sorte (PINTO, 2008). Neste
momento gostaria de contar uma situação que presenciei em meu retorno de Caiena, na primeira viagem que fiz
ao departamento ultramarino francês:
No dia do meu retorno para a cidade de Macapá, acordei cedo e me dirigi às adjacências do
Mercado Central da cidade de Caiena, com objetivo de pegar uma van e ir até Saint-Georges,
cidade que faz fronteira com o Oiapoque-AP/BR. Ao chegar no local, fui informado pelo
proprietário do veículo que até aquele momento tinha apenas uma pessoa confirmada para
viajar; no entanto, o mesmo me garantiu que assim que o carro completasse sua lotação, a
gente partiria. Foi neste momento que puxei conversa com o primeiro passageiro, cujo nome
era Antônio do Rosário. Sua aparência física tinha um ar de cansaço e seu rosto uma palidez
acentuada. De forma perceptível apresentava uma certa preocupação no ar. Logo depois ele
me informou que era clandestino, tinha trabalhado 10 meses em Caiena e que estava voltando
para sua casa que ficava em Macapá, no Distrito da Fazendinha-AP. Nesse período de trabalho,
conseguiu poupar cerca de 7 mil euros, mas para isso enfrentou diversas situações de perigo
e altas jornadas de trabalho. Me informou ainda que estava retornando por causa das festas
de fim de ano, mas que pensava em voltar logo no início do mês de janeiro/2007. Conforme as
horas iam passando, mais brasileiros chegavam para viajar. Por volta de 12h, finalmente a
lotação estava completa e partimos. Antes porém, o dono do transporte solicitou o pagamento
das passagens. Ao perguntar se todos tinham “papel”, as respostas foram positivas, menos
uma: do passageiro que chegou mais cedo. Obviamente que nem todos que falaram que
possuíam “papel” estavam dizendo a verdade. Contudo, o único que falou a verdade pagou
caro, em todos os sentidos, por esse ato. Ao saber de sua ilegalidade, o dono da van pediu 10
euros a mais; e argumentou dizendo que transportar clandestinos envolvia riscos. Sem meias
palavras, avisou também que ele não se responsabilizaria pelo que acontecesse ao longo da

3
Como a maioria dos trabalhadores que atuam na Guiana Francesa são ilegais, até a conclusão deste artigo a polícia francesa não havia identificado
o corpo deste brasileiro que trabalhava de forma clandestina na Guiana Francesa, identificado apenas pelos seus colegas como Joca.

239
Migração internacional na Pan-Amazônia

viagem, em caso de blitz da polícia. Todos entramos no carro e partimos em direção a Saint-
Georges/Oiapoque-AP. Ao chegarmos no trevo da cidade de Reginà, o passageiro clandestino
foi obrigado pelo motorista a descer da van e aguardar o retorno, já que iríamos passar pelo
centro da cidade e que ele não queria ter surpresas desagradáveis, se referindo às autoridades
policiais. Nesta cidade, mais 2 passageiros pegaram à lotação. No retorno, no mesmo local que
tinha ficado, subiu novamente na van, o único clandestino declarado, Antonio do Rosário.
Mas o pior estava por vir [...] Próximo à cidade de Saint-Georges, o motorista do veículo foi
avisado por outro colega que havia policiais na estrada. Imediatamente, estacionou a van no
acostamento e praticamente obrigou Antonio a descer do veículo. Sem saber muito bem o que
dizer, acatou as ordens. Desolado, Antonio ficou à beira da estrada entregue a própria sorte.
Mais adiante passamos pelo carro dos policiais da PAF. Muitos passageiros que inicialmente
se declararam legalizados, abaixaram-se no assoalho da van. Passamos devagar pela viatura
policial. Para a sorte de muitos e azar do Antônio, os policiais não mandaram o veículo parar.
Já em Oiapoque, não conseguia esquecer as cenas chocantes da viagem; além do fato de me
sentir um pouco responsável pelo que aconteceu. Ninguém dentro da van disse: “Ei, motorista;
ele não precisa sair; caso a polícia apareça ele deita no assoalho do carro”. Até hoje não
esqueço esta viagem e lamento profundamente minha própria omissão (PESQUISA DE
CAMPO, 2006).

Algumas informações complementares ainda precisam ser ditas sobre o nosso personagem real (Fotografias
1 e 2). Consciente dos riscos que estava correndo, ao tentar sair da Guiana Francesa de forma ilegal, ele viajava
com pouco dinheiro na carteira. A maior parte da poupança que guardara nos meses que trabalhou em Caiena,
depositou em uma conta bancária no Brasil. Além das festas de final de ano - que é um período que os brasileiros
ficam bastante eufóricos para regressar aos seus estados de origem no Brasil - Antônio também estava querendo
se tratar de malária; pois considerava o tratamento em Macapá melhor do que em Caiena, além de que na
condição de clandestino era um pouco arriscado procurar ajuda no serviço público de saúde francês.
Segundo informações de pessoas mais experientes que viajavam na van, provavelmente uma dessas
três hipóteses pode ter ocorrido com Antonio: 1- Entrou na mata e ao anoitecer seguiu viagem a pé até o
município de Saint-Georges; e logo em seguida cruzou a fronteira para Oiapoque; 2- Caminhou pela mata
(margem da estrada), logo em seguida após descer da van, até o município de Saint-Georges; 3- Foi detido pela
polícia francesa, levado novamente para Caiena e, de lá, deportado para Macapá ou Belém.
Se alguém for até Caiena e perguntar a qualquer brasileiro legalizado ou não, se eles conhecem a história
de Isaías Souza dos Santos, com certeza todos dirão que sim. Símbolo da dor, do sofrimento e das humilhações
de centenas de trabalhadores brasileiros na Guiana Francesa, este trabalhador brasileiro é responsável por um
dos maiores testemunhos vivos do que significa ser clandestino em território francês, e até onde vai o desejo de
um cidadão brasileiro por trabalho e melhores condições de vida. Esta entrevista, na integra, foi transcrita do
Jornal O Pioneirinho, ano 2, junho de 2006, ligado à Assembléia de Deus na cidade de Caiena, com o título
“Vida ou ouro: qual o mais valioso?”
Muitos investem a própria vida nos lugares mais hostis deste mundo em busca de ouro. Foi
o caso de Isaías Souza dos Santos, um maranhense garimpeiro que saiu do Brasil no ano de
1999 tentado pelo ouro dos garimpos de Suriname/Guiana Francesa mas não sabia que ali
estaria investindo a própria vida, ilusão de ficar rico. Instalou-se num garimpo ao leste de
Suriname, fronteira com a Guiana Francesa, perto de aldeias indígenas. Trabalhou um ano e
meio; porém, sem nenhum sucesso. Para sobreviver teve que matar caças para vender para os
índios, com quem manteve boas relações. Resolveu descer o rio Maroni com outro garimpeiro,
conhecido como “Maranhão”, os índios o alertaram do perigo que correriam ao descer aquele
rio, mas não deu ouvidos. Numa pequena canoa conduzida por um índio, chegaram a uma
certa localidade para comprar alimentos; foi quando foram abordados por seis homens, que
os acusaram de assaltantes, não policiais, nem autoridades, eram bandidos. Então os
conduziram até uma casa isolada da cidade. Lá foram torturados psicologicamente; após,
foram levados numa canoa para a outra margem do rio. Lá os prenderam com fitas em uma
árvore, atiraram em suas pernas e foram embora deixando-os à mercê do sofrimento e da morte.

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Por uma “Sociologia da clandestinidade” no estudo da presença de brasileiros na Guiana ... • Manoel de Jesus de Souza Pinto

P- O que atraiu você para garimpos fora do Brasil?


R- Eu morava em Roraima e tinha uma vida tranquila, mas por
influências de conhecidos, acerca da facilidade que havia
no Suriname para tirar ouro; resolvi vender minhas coisas e
deixar o resto para trás e partir com a ilusão de ficar rico.
P- E qual foi sua primeira impressão quando lá chegou?
R- Logo no início me entusiasmei, mas no decorrer do tempo,
vi que nada daquilo que me falaram era verdade, tudo
começou a se tornar assustador.
P- Como assim, assustador?
R- Devido às quadrilhas criminosas que havia lá. Roubavam
e matavam cruelmente espalhando terror na região.
P- Foi por isso que você veio embora?
R- Não. Eu não vinha embora. Tinha planos de ficar lá, apesar
Fotografia 1 - Antônio descendo pela primeira vez da van,
do terror. Estava preso pela ilusão de ficar rico. Só vim embora
por solicitação do motorista. Foto: Pinto (2006) por causa do que aconteceu comigo. Se não estaria lá até
hoje talvez, como muitos ainda estão e não ficaram ricos. Na
verdade agora vejo que garimpo é obsessão diabólica, que
prende o homem; apesar dele ver com os próprios olhos o
que acontece com os companheiros, mas acha que nunca
vão acontecer com ele. Só Jesus pode libertar. É o pior do
que o vício do jogo.
P- Os homens que abordaram vocês, os abordaram para
roubar?
R- Aparentemente não... Apesar de terem ficado com os nossos
pertences. Em nenhum momento eles anunciaram roubo.
Pediram apenas uma importância para comprar uma garrafa de
cachaça, para fazer uma espécie de “drinque ritual”. Todos
tomaram um gole e deram para mim também. Nos meus
pensamentos eu disse: “o último gole da minha vida”.
P- Depois para onde vocês foram conduzidos?
R- Nos colocaram numa catraia e no meio do rio nos
amarraram com as mãos para trás. Ao chegar na outra margem,
Fotografia 2 - Antônio pela segunda vez é obrigado a levei dois tiros, um na perna direita e outro no pé; depois
descer da van. De forma definitiva, agora ele fica sozinho à fomos amarrados com fita isolante, desde os pés até a cabeça,
beira da estrada. Foto: Pinto (2006) dentro da mata, cada um numa árvore aproximadamente oito
metros um do outro. Deram dois tiros na perna esquerda do
Maranhão que quebrou o fêmur e outro na minha perna
esquerda que também quebrou o fêmur e logo em seguida
foram embora. Quando o meu fêmur quebrou, meu corpo
ficou pendurado e minha boca na altura de uma das voltas
da fita onde comecei a roer e assim que eu partia uma volta
da fita meu corpo caía e minha boca ficava na altura de outra
volta; e assim durante uma hora, consegui me soltar. Minhas
mãos continuavam amarradas. Estava muito escuro, me rolei
em direção ao meu companheiro e também consegui lhe soltar
roendo todas as voltas que lhe amarrava na árvore, também
de suas mãos. Depois pedi para ele me soltar, mas como a fita
era muito lisa, não dava para ser desamarrada com as mãos e
então depois de uma hora ele conseguiu roer e liberar minhas
mãos. Livre, me arrastei até a margem do rio durante toda a
noite, cheguei às sete horas da manhã, meu amigo chegou
as dez completamente debilitado; foi preciso eu lhe dar água
na boca. Deixei-o lá e sai me arrastando de costas em busca
de socorro. Senti fome e me alimentei de folhas e limão e
guardei as cascas para comer depois. No outro dia quando
Fotografia 3 - O pesquisador na entrada do Centro de voltei com muito esforço para levar esses alimentos para ele,
Detenção de Rochambeau (PAF). Foto: Lopes (2006) o encontrei morto.

241
Migração internacional na Pan-Amazônia

P- O que você sentiu quando viu seu companheiro morto?


R- Primeiramente pensei que ia morrer também e ia ser comido pelos bichos da mata; também
um sentimento estranho tomou conta de mim, quando vim observar, só naquele momento, que
o homem não tem nenhum poder. Então dei o verdadeiro amor a vida. Olhando aquele homem
morto naquela situação, me voltou à mente quem ele era: uma pessoa que se achava capaz,
prepotente, auto-suficiente, achando que não precisava de Deus, agora estava ali naquela
situação. Minha consciência me dizia: Cadê o ouro? Cadê o diamante? Não lutastes tanto por
eles? Não lhe destes maior valor? E agora, nem ouro, nem diamantes e nem vida.
P- Como você sobreviveu?
R- Fiquei mais dois dias dentro da mata à margem do rio me arrastando procurando socorro.
As catraias passavam, mas não ouviam meus gritos. Estava me alimentando com as cascas
dos limões que havia guardado, mas aconteceu um milagre. Às nove horas da manhã do
quarto dia começou a aparecer em minha volta coquinhos descascados e limpos, prontos para
serem comidos. Não sabia de onde vinham, simplesmente apareciam em meu alcance. Quanto
mais eu comia, mais coquinhos apareciam inexplicavelmente. Tinha gosto de leite. Fiquei
neste local um bom tempo. De repente tive uma visão: um homem com uma vara comprida na
mão e uma esponja na ponta, me tocava as costelas, eu senti, mas não queria abrir os olhos,
pois aquilo era muito lindo. Mas com a insistência, resolvi abrir os olhos e então vi uma catraia
com três homens que estava passando apenas alguns metros de onde eu estava deitado. Eles
me levaram para onde estavam outros amigos meus, que me encaminharam para o Hospital.4

Não resta dúvida que após apresentarmos estes casos repletos de acontecimentos trágicos, seria pertinente
fazermos algumas reflexões. Tanto na Guiana Francesa quanto em outros contextos internacionais (Estados
Unidos, Europa) a questão da clandestinidade é um problema ético e humano. Na verdade, milhares de homens
e mulheres deslocam-se, em muitas partes do mundo, sem cartografia definida. Parece que em relação ao caso
de Isaías dos Santos, pode-se dizer que sob as figuras do desemprego, da deslocação, do refúgio e da errância,
a violência e a barbárie se desenvolveram sob uma estética da crueldade na qual se perdeu qualquer vínculo de
alteridade e reconhecimento pelo outro. Vilela (2001) lembra ainda que acontecimentos exteriores, como no
caso de Isaias, colonizam a consciência; “e o desespero é apenas o momento onde já se transcendeu o grito; a
dor é opaca e indivisível”. O mesmo autor ainda pergunta: mas como dar visibilidade à voz daqueles que não
possuem outra escrita senão a da sua história concreta? A dor concreta do corpo em sofrimento. De homens
em sofrimento (VILELA, 2001).
Na Guiana Francesa, como em tantos outros lugares do mundo, homens e mulheres morrem todos os dias,
todas as manhãs e todas as noites. No entanto, seria essencial recuperar a história de seus corpos como uma
memória viva de suas batalhas pela sobrevivência. Infelizmente, nem isso está acontecendo mais para centenas
de trabalhadores clandestinos que morrem em busca de seus sonhos, atrás do Eldorado. Inclusive, muitos cadáveres
de brasileiros encontrados pela polícia francesa são enterrados no mesmo local em que são achados mortos.
A novidade, sobre esses acontecimentos trágicos, é que as autoridades policiais francesas estão utilizando o GPS
como forma de registro do lugar onde essas pessoas são enterradas; pois caso alguém se interesse pelo cadáver,
pelo menos a localização da cova na floresta fica demarcada, registrada (PESQUISA DE CAMPO, 2006).
Os corpos de muitos trabalhadores brasileiros poderiam afirmar materialmente, pelo menos às pessoas mais
próximas, a lembrança dos entes queridos mortos. Talvez seja por isso, além de outros fatores, é claro; o motivo de
muitas famílias lutarem contra a burocracia francesa - quase sempre sem sucesso - para terem seus mortos devolvidos
e levados para seus estados de origem no Brasil. Diariamente, no Consulado Brasileiro em Caiena, é possível ver e
ouvir cenas de desespero de parentes e familiares buscando a liberação de brasileiros que perderam a vida na Guiana
Francesa. Como essas pessoas encontravam-se em condições ilegais em território guianense, os entraves diplomáticos
para resolver este tipo de problema são extremamente complexos. As dificuldades para repatriar um corpo para o
território brasileiro são de toda ordem: econômicas, burocráticas e técnicas.

4
Após esse trágico acontecimento, Isaías Sousa dos Santos tornou-se evangélico. É perceptível durante a entrevista, pelo menos em alguns
momentos, um componente religioso no seu relato. No entanto, essa dimensão religiosa não diminui a importância da narrativa, que de
fato atesta os dramas vividos por centenas de trabalhadores clandestinos brasileiros, que geralmente passam por situações similares, e
quase sempre sem a mesma sorte de nosso personagem.

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Por uma “Sociologia da clandestinidade” no estudo da presença de brasileiros na Guiana ... • Manoel de Jesus de Souza Pinto

Como o Consulado brasileiro não dispõe de verbas para esse fim, quando ocorre algum sinistro com
brasileiros em território guianense o modus operandi é extremamente complicado e geralmente o problema só
é resolvido no âmbito humanitário. Há casos em que a família recorre ao poder público (ex: estado do Amapá)
a fim de garantir os recursos financeiros necessários para o translado do corpo; em outras situações os familiares
fazem coleta familiar para pagar as despesas legais, que por sinal são altas. A luta de mães, pais, irmãos,
esposas e filhos de terem pelo menos a possibilidade de enterrarem seus entes queridos, tem uma relação com
o espaço íntimo da memória. Memória esta que está deixando de existir, devido aos enterros sumários, realizados
pela polícia francesa, pelos amigos e principalmente pelo tempo (PESQUISA DE CAMPO, 2006).

IMIGRANTES FORA DA LEI: AS DEPORTAÇÕES E O RETORNO INESPERADO PARA CASA

A maioria dos trabalhadores brasileiros na Guiana Francesa, quando se sentem seguros, geralmente
contam muitas histórias, falam bastante sobre suas aventuras em território francês; principalmente aquelas
relacionadas à travessia e à chegada. São narrativas que possuem doses elevadas de subjetividade, na medida
em que cada pessoa valoriza acontecimentos diferenciados que marcaram este momento inicial, seu nascimento
como imigrante ilegal. Por outro lado, ninguém fala espontaneamente sobre o retorno, sobre as prisões e as
deportações. Estes temas são mais difíceis de serem assimilados e requerem um ambiente mais adequado para
estas lembranças. Para inúmeros brasileiros, ser deportado virou rotina (Tabela 1); e este fato deve ser encarado
num contexto mais amplo de seus projetos de vida e de permanência em solo guianense. Ser expulsos da
Guiana Francesa e retornar imediatamente, para milhares de trabalhadores brasileiros que tentam a sorte neste
DUF, é apenas uma questão procedimental. Apesar de a situação envolver uma série de questões complexas,
principalmente no que concerne às violações dos direitos humanos, ser detido e deportado para o Amapá ou
Belém, para muitos não significa o “fim”. Como me disse uma mulher, um tanto aborrecida, quando perguntei
se ela iria voltar: moço, já moro aqui há cerca de 20 anos. São vinte anos que estou nessa vida. Vou fazer
o que no Brasil? Eu conheço mais gente aqui do que lá. Assim que chegar a Belém retorno na mesma
hora; não tenho outra opção (PINTO, 2008).

Tabela 1 - Deportações de brasileiros da Guiana Francesa


(Amostra de cem imigrantes brasileiros
entrevistados)
Quantidade de vezes %

Nenhuma vez 21

Uma vez 24

Duas vezes 24

Três vezes 14

Quatro vezes 9

Mais de cinco vezes e menos de dez 6

Mais de dez vezes 2


Total 100
Fonte: Survey realizado durante esta pesquisa nos anos de 2005/2006

243
Migração internacional na Pan-Amazônia

Nos últimos anos, a França vem implementando uma política de “tolerância zero” contra os imigrantes
ilegais, e de forma geral, com a migração clandestina. Anualmente, o Governo Francês investe ainda mais na
área da segurança, aumentando de forma significativa seu aparato militar na região. Apesar do acordo sobre
fronteira entre Brasil e França não ser novo, ele ultimamente vem sendo adequado às mudanças e aos interesses
estratégicos franceses na Guiana. Lembrando que o termo “deportação” talvez não seja o mais adequado para
estes casos; já que a França entende que os brasileiros apanhados ilegalmente em seu território são “reconduzidos”
para o seu país de origem. Assim não estão impedidos de retornarem à Guiana Francesa, desde que voltem
documentados. Pelo acordo firmado entre os dois países, a França tem que reconduzir os ilegais até a fronteira,
e nada mais além disso. Agora no caso de algum imigrante praticar delitos graves5 em território guianense, ele
será julgado de acordo com as leis locais; e se por ventura for extraditado para o Brasil, não poderá retornar
mais, sob nenhuma hipótese, para este departamento ultramarino.
Por exigência legal das leis francesas, depois de detidos, os imigrantes clandestinos devem ser reconduzidos
em até 48 horas para a fronteira de seu país. Atualmente, todos os imigrantes ilegais detidos em território
guianense são colocados no Centro de Detenção Administrativa Rochambeau, da PAF (Policia Aduaneira
Francesa). Através de uma prática padrão pelos órgãos de segurança locais, chegam ao aeroporto internacional
de Caiena algemados e em grupos, geralmente escoltados pela polícia. As únicas coisas que levam são as
roupas do corpo e as Autorizações de Retorno ao Brasil (ARB) (PINTO, 2006).
Por ocasião do trabalho de campo que estava realizando para minha tese de doutorado, recebi autorização
por parte do Consulado Brasileiro em Caiena para visitar o Centro de Detenção de Rochambeau (Fotografia 3).
No dia 06.11.2006, juntamente com dois funcionários do Consulado, presenciei a dura realidade dos trabalhadores
brasileiros em processo de recondução ao Brasil. Com um aparato de segurança sofisticado, inclusive com
câmeras e portões eletrônicos, entramos nas dependências internas do prédio. O barulho e o mau-cheiro são as
primeiras características reconhecidas do local. Não fosse pelas grades e pela situação, poderíamos compará-lo
como um grande alojamento de um canteiro de obras. Após alguns procedimentos burocráticos, entramos numa
sala e passamos a aguardar os brasileiros detidos, que iriam retornar ainda naquele dia ao Brasil. Para os dois
funcionários do Consulado Brasileiro, mais uma rotina de trabalho, para mim uma oportunidade rara de registro
e de observação sobre o tema pesquisado. Logo em seguida aparece o primeiro. O tempo das entrevistas com
cada imigrante girava em torno de 8 minutos. Neste dia retornaram 13 brasileiros, sendo 10 homens e 3
mulheres (PESQUISA DE CAMPO, 2006).
A primeira ficha preenchida foi de Maria do Socorro Silva, 40 anos, natural de Teresina. Era a primeira
vez que estava sendo deportada da Guiana Francesa. Foi detida pelos policiais franceses em Saint Laurent du
Marroni. Depois foi a vez de Maria Valdirene, 27 anos, paraense. Estava sendo expulsa pela 4ª vez. Também
foi presa em Saint Laurent du Maroni.
Logo em seguida veio Eliana Mara Braga do Nascimento, 40 anos, paraense. Foi detida em plena Praça
das Palmeiras, área central de Caiena. Ela nos relatou que já mora na Guiana Francesa há 20 anos. Recentemente
seu visto perdeu a validade (carte de séjour) e após uma briga como o marido (que acabou em separação), o
mesmo não se interessou mais pela renovação do documento. Não teve tempo de pegar nenhum pertence.
Outro trabalhador que estava retornando ao Brasil era José dos Santos, maranhense, 28 anos. Sua
aventura em território guianense foi curta (16 dias). Nos poucos dias que esteve na Guiana, conseguiu somente
ser roubado. Desesperado, resolveu fazer o percurso Caiena/Saint-Georges (cerca de 280 km) a pé. No meio
da viagem foi preso pelos policiais.

5
Segundo dados oficiais do Consulado Brasileiro na Guiana Francesa, existiam até 06.11.2006 cerca de 129 brasileiros cumprindo pena no
sistema carcerário guianense, sendo 123 homens e 06 mulheres. Todos têm direito a defensores públicos. A maioria desses brasileiros
cometeram infrações leves (roubos), cuja pena gira em torno de 2 anos de reclusão.

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Por uma “Sociologia da clandestinidade” no estudo da presença de brasileiros na Guiana ... • Manoel de Jesus de Souza Pinto

Mais um maranhense, agora da cidade de Açailândia. Depois de 2 anos trabalhando em garimpo, foi
apanhado na fronteira entre Guiana Francesa e Suriname. Antônio Alves Ferreira afirmou que não iria voltar.
Entre todos os que seriam repatriados para o Brasil naquela segunda feira, grave era a situação de Francisco José
Batista de Souza, 49 anos, maranhense e pai de 3 filhos. Sentindo muita dor de cabeça, foi preso perto de Saint
Laurent quando procurava atendimento médico para combater a malária. Para dificultar sua situação ainda estava
com um problema no braço, uma inflamação. Perguntado se sabia ler e escrever respondeu: desenho meu nome
como placa de hotel.
Valber Pereira Reis, 23 anos, maranhense. Devido à malaria, estava com febre e passava mal na hora
da entrevista. Disse que se iludiu com a Guiana Francesa. Decepcionado com sua situação lembrava que
estava dormindo no chão. Seu irmão também estava preso, por isso fazia o seguinte pedido: por favor, gostaria
de ir com meu irmão.
Valdeci dos Santos Ferreira, 26 anos, foi preso em São Sabbá quando levava seu irmão Válber para ser
tratado de malária. Estava preocupado, pois estava deixando filhos pequenos na Guiana. Por ocasião da prisão
tinha 90 gramas de ouro, que ficaram em poder dos policiais franceses.
Junior Rayol da Costa, 21 anos, paraense, com família em Santarém. Queria arranjar dinheiro para
comprar uma moto-táxi, justificava-se.
Francisco dos Santos, 36 anos, maranhense. Era a primeira vez que estava sendo deportado. Já residia
na região há 06 anos, trabalhando como garimpeiro.
Paulo da Silva, 34 anos, natural de Mato Grosso do Sul. Analfabeto, não lembra mais nem do nome do
pai. Foi preso na fronteira com o Suriname. Avisou que vai voltar essa e outras vezes.
Luis Antônio Portela da Silva, 40 anos, de Codó-MA. Foi preso na estrada. Como toda sua família morava
em Paramaribo, lembrou que nesse país não se pede visto por isso iria voltar novamente. Para ele foi expedida
a ARB n. 585; ou seja, no ano de 2006, até 06.11.2006, cerca de 585 imigrantes sem documentos já tinham sido
expulsos/reconduzidos para o Brasil.
Apesar das autoridades francesas falarem que os brasileiros apanhados sem documentos são somente
detidos e reconduzidos à fronteira; essas declarações significam apenas uma parte da verdade. Segundo relatos
de muitos brasileiros que já passaram por esta situação, inúmeros abusos são cometidos no momento destas
detenções, a saber, espancamento, humilhações; além de que praticamente todos objetos de valor (principalmente
ouro) encontrados pelos policiais por ocasião dessas prisões acabam “desaparecendo”. Quase 100% dos
imigrantes ilegais que foram expulsos da Guiana Francesa, afirmam que os policias franceses cometem excessos
de toda ordem no momento dessas abordagens, principalmente quando elas ocorrem em áreas de garimpo,
longe da cidade. Muitos imigrantes às vezes não resistem e morrem. Os brabos e os valentes são os que
sofrem mais, disse-me um brasileiro no mercado de Caiena.
Essas denúncias nunca são levadas a sério, pois dificilmente as vítimas, no caso os imigrantes ilegais,
podem provar estes fatos. O chavão popular “calados estão errados” faz com que tanto o Consulado Brasileiro
quanto as autoridades francesas façam “vista grossa” para esses graves fatos de violação dos direitos humanos.
Vale a pena registrar neste momento que do período da detenção até a deportação, a maioria dos presos não
possui nenhum tipo de assistência médica, já que alguns se encontram enfermos. É comum ver brasileiros no
Centro de Detenção de Rochambeau, com malária ou outros tipos de doenças tropicais, passando mal (quase
morrendo mesmo) sem que as autoridades locais façam nada para aliviar o sofrimento dessas pessoas. Neste
local não temos direito a nada, nem a um comprimido para febre ou dor de cabeça. Eles [policiais] até
acham graça quando ouvem falar em ‘remédio’, ‘médico’ e mandam a gente morrer, informou um imigrante
brasileiro prestes a ser deportado (PESQUISA DE CAMPO, 2006).

245
Migração internacional na Pan-Amazônia

Em média, por mês, passam pelo Centro de Detenção de Rochambeau cerca de 80 brasileiros6.
A maioria desses trabalhadores retorna para Guiana Francesa, via Oiapoque, em menos de uma semana.
Quase sempre os detidos optam aonde querem chegar: Macapá ou Belém.

A DIFÍCIL CONDIÇÃO DA CLANDESTINIDADE: MEDO, ANONIMATO E DIREITOS HUMANOS

A primeira lição que um imigrante ilegal deve aprender ao chegar a Caiena é assumir sua invisibilidade,
sua inexistência, seu anonimato. Experientes, os policiais franceses facilmente identificam muitos imigrantes
clandestinos, às vezes, somente pelo vestuário, pelas roupas que vestem. Por isso, os imigrantes mais antigos
orientam os novatos a não usarem camisas de clubes e da seleção brasileira; bermudas, sandálias, e outros
símbolos nacionais que chamem a atenção dos policiais. A discrição deve ser levada muito a sério nestes
momentos iniciais; pois se assim não procederem, os riscos de serem abordados pela polícia francesa são
consideráveis. Em uma série de entrevistas realizadas em Macapá, Oiapoque e em Caiena (bairro do Cabassou,
da Matinha e em outras vilas guianensas), onde a presença de brasileiros é intensa, ouvimos vários relatos dos
trabalhadores brasileiros sobre como é levar a vida neste DUF na situação de clandestinos. A seguir vamos
apresentar uma série de relatos obtidos em nossa pesquisa, sobre este assunto (PINTO, 2008):
Cheguei pela mata, com fome. Morei literalmente debaixo de árvores. A pessoa que me
aguardava já tinha retornado para o Maranhão, e aí fiquei numa situação difícil. Aos
poucos fui fazendo amizade e esses novos colegas me prometeram arranjar emprego através
de seus patrões. Atualmente, faço bicos para esse pessoal brasileiro, praticamente em troca
de comida. Tenho medo de sair sozinho, pois acho que vão desconfiar do meu jeito e me
mandarem de volta para o Brasil. Na verdade é como se eu ainda não tivesse ainda em
Caiena, sei lá [...] tou e não tou (Benedito dos Santos, 35 anos, maranhense).
Até hoje morro de medo de sair de casa e ir ao mercado, ou mesmo a um china. Felizmente
nunca fui parada pela polícia francesa. Mas todas as vezes que vejo um policial, fico
gelada, achando que ele vai solicitar meus documentos. São quase 4 anos vivendo nesta
situação. Cada ano que passa, a situação dos clandestinos piora. Eu sinceramente não sei
o que vai acontecer comigo (Célia Costa, 33 anos, apesar de um dos seus filhos ser cadastrado
no programa social).
Há dois anos fui para Caiena. A primeira vez tinha 16 anos. Não gosto de trabalhar lá, fui
pelo dinheiro. Ganhava bem. Fiquei com medo de ser presa. Tive que voltar. Eu preciso do
dinheiro. No Brasil não tem condições. No exterior ganho 3 vezes mais, chego a fazer 50
euros por um programa. Eu tenho pai, mãe, irmãos, uma família inteira que depende de
mim. Sustento uma irmã que faz pedagogia. A necessidade me faz passar por cima do medo,
passar por cima do orgulho, por cima de tudo. Eu trabalho na rua e nas boates 106, Samba
Club e Acropolys. Minha família acha que eu trabalho num restaurante (Lucia, 17 anos*7).
A Guiana pode ser um verdadeiro paraíso para quem é registrado, quem tem documentos,
para quem trabalha regularizado. Para o clandestino, nos tempos atuais, não tem mais
regularização. Os brasileiros chegam clandestinos, ficam clandestinos e voltam clandestinos
[...] e a vida para um clandestino é um inferno (Stephane Granger, francês, professor de
história na Guiana Francesa*).
A vida dos brasileiros aqui na Guiana Francesa não é muito fácil; se alguns gostam daqui
é pelo dinheiro, pela ilusão do dinheiro. Eu tiro isso pela minha experiência: estou com 7
anos de Caiena. Nesse tempo já comi o pão que o diabo amassou; pois já passei fome, já
entrei aqui de pés, já entrei de canoa, já entrei pelo mato [...] tudo por causa do dinheiro,
que tem mais valor do que no Brasil (Seu Dogival, deportado 12 vezes da Guiana Francesa*).

6
Dados obtidos junto ao Consulado Brasileiro em Caiena.
7
Todas as entrevistas marcadas por este símbolo* foram extraídas do documentário “A travessia da ilusão” dos jornalistas Jorge Cardoso
e Reginaldo Macedo.

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Por uma “Sociologia da clandestinidade” no estudo da presença de brasileiros na Guiana ... • Manoel de Jesus de Souza Pinto

Rapaz, eu vivo em Caiena [...] viver mesmo a gente vive. Mas é complicada a vida aqui
dentro. A gente não tem diversão. Sinto muita vontade de ir embora e retornar ao Brasil; no
entanto, não queria trabalhar mais no pesado como faço aqui (Doriedison, clandestino,
construtor de barcos*).
O dia-a-dia dos trabalhadores ilegais começa mais cedo do que para os legalizados. Cerca
de 3 e meia a 4 horas da manhã já estão acordados para poder pegar a condução e chegar
cedo em seus locais de trabalho, antes que a polícia comece a fazer a revista nas ruas. Além
disso alimentam-se mal, porque não podem se deslocar para comprar uma refeição na
esquina. Muitos levam sua alimentação de casa. Quem não tem nada come pão com sardinha
e água. Também são os que saem mais tarde do trabalho, aguardando o número de policiais
reduzir nas ruas. Nessas horas eles aproveitam para voltar para casa (Maurenice, comentando
sobre a vida dos clandestinos em Caiena*).
O clandestino vive aqui meio prisioneiro [...] Existe um ditado aqui que “em Caiena,
clandestino é igual a tatu: só sai da toca no final de semana”. Se bem que tatu não sai da
toca somente no final de semana, vive entocado (Cássia, estudante*).
Olha, a vida aqui é um pouco complicada. Muitos brasileiros levam sorte. A vida dos
brasileiros na Guiana Francesa é como se fosse um jogo, entende? Você joga, você perde,
você ganha. A vida é quase assim, como se tivesse jogando na loteria. Alguns, por exemplo,
as vezes trabalham e o patrão não paga, às vezes voltam para o Brasil com pouco dinheiro,
a vida é assim mesmo como você ta vendo (João, legalizado, garimpeiro*).
Para quem não tem documento, a Guiana Francesa é vida pra doido, sabe? Eu por exemplo
só penso no pior, por isso vivo com medo, meio atormentado. Às vezes a gente finge que tá
tudo bem, mas na verdade não tá não. Não poder ir no china comprar um cigarro, um
refrigerante, é revoltante. Se pudesse, voltaria agora para o Brasil. Como não posso, já que
lá também não tem emprego, o jeito é sofrer na terra dos outros (Antônio João da Cunha,
amapaense, 30 anos, clandestino).

Não resta dúvida que uma das questões mais difíceis para milhares de trabalhadores brasileiros na
Guiana Francesa é lidar com o problema da ilegalidade. Tanto na mata quanto nas cidades que compõem o
departamento ultramarino francês, esta situação é marcada por sofrimento, ansiedade e revolta. Como já
tivemos oportunidade de nos reportar em momentos anteriores neste trabalho, a queixa de preconceito identificada
em muitas ocasiões por brasileiros neste DUF tem uma relação muito próxima com essa situação. As humilhações
constantes por que passam muitos brasileiros na Guiana são justificadas, principalmente de acordo com as
vítimas, pela falta de documentação. Além disso, o trabalho escravo e o tráfico de pessoas para exploração
sexual são estimulados pela condição de ilegalidade. É como se os indocumentados fossem seres humanos
inferiores, sem direito a voz e a liberdade de expressão.
O preconceito quanto à origem geográfica, e parece que isto ocorre com os brasileiros na Guiana
Francesa, é justamente aquele que marca alguém pelo simples fato deste permanecer ou advir de um território,
de um espaço, de uma vila, de uma nação, de um país, de um continente considerado por outro ou outra, quase
sempre mais poderoso ou poderosa, como sendo inferior, rústico, bárbaro, selvagem, atrasado, subdesenvolvido,
menor, menos civilizado, inóspito, habitado por um povo cruel, feio, ignorante, racialmente ou culturalmente
inferior (JUNIOR, 2007). Além do preconceito, é importante neste momento lembrar que os grupos estrangeiros
e distintos também são vítimas do discurso da estereotipia, já que este se reveste como assertivo, imperativo,
repetitivo e caricatural. Segundo Junior (2007, p. 14):
O estereótipo nasce de uma caracterização grosseira, rápida e indiscriminada do grupo estranho
[...] ele pretende dizer a verdade do outro em poucas linhas e desenhar seu perfil em poucos
traços, retirando dele qualquer complexidade, qualquer dissonância, qualquer contradição.
O estereótipo lê o outro sempre de uma única maneira, de uma forma simplificadora e acrítica,
levando uma imagem e uma verdade do outro que não é passível de discussão ou
problematização.

247
Migração internacional na Pan-Amazônia

Esses comentários acerca de preconceitos e estereótipos podem ser considerados bons pontos de
partida para refletir um pouco sobre a presença dos trabalhadores imigrantes brasileiros na Guiana Francesa.
Uma ideia bastante atrelada aos brasileiros pela sociedade local e pelas autoridades francesas diz respeito à
clandestinidade. Mas os estereótipos não param por aí. Segundo uma pessoa pesquisada, os brasileiros são
tidos pelos guianenses como cachaceiros e que adoram gastar dinheiro em farra. Na verdade, os processos
migratórios nunca foram tão intensos como hoje. As informações sobre outros povos e lugares nunca foram
tão abundantes. Será que isso estaria pondo fim aos preconceitos relacionados à origem geográfica das
pessoas?, pergunta Junior (2007). Segundo este autor, tudo indica que não. Pelo contrário, o que assistimos
é, muitas vezes, o recrudescimento deste preconceito, motivado justamente pelo contato mais próximo, pela
convivência, muitas vezes indesejada e conflituosa, de uma cada vez maior diversidade de grupos humanos
em um mesmo lugar.
O recrudescimento do medo do “outro”, devido a inúmeros fatores, é uma realidade dos tempos atuais.
Essa fobia interplanetária acaba atingindo de maneira fatal a confiança, sustentáculo da convivência humana.
Sem a confiança, a rede de compromissos humanos se desfaz, tornando o mundo um lugar ainda mais perigoso
e assustador. A confiança é substituída pela suspeita universal. Presume-se que todos os vínculos sejam precários,
duvidosos, semelhantes a armadilhas e emboscadas (BAUMAN, 2005). Em Caiena, por exemplo, brasileiros
desconfiam de brasileiros. Sentimentos de solidariedade e de alteridade somente em casos especiais, em tragédias
extra-cotidianas. A mesma nacionalidade não pode mais ser traduzida por laços de confiança e reciprocidade.
Mais de 10 informantes afirmaram categoricamente, que os brasileiros na Guiana Francesa não são unidos e
muito menos organizados.
Neste início de século, estamos assistindo a uma transição espetacular do Estado de bem-estar para o
Estado de segurança, e a Guiana Francesa talvez seja o melhor exemplo dessa transformação, mutação política.
Ao perder seu papel na economia devido à hegemonia neoliberal, o Estado contemporâneo encontra sua única
razão para existir na promoção da segurança (BAUMAN, 2005). No caso guianense, a preocupação está na
defesa do Estado francês na região, nos direitos dos cidadãos locais, e não nos direitos humanos.
Teresa Sales em seu livro clássico “Brasileiros longe de casa” (1999) ensaia uma reflexão capital sobre
a questão da clandestinidade. Ela na verdade explora a hipótese de que os imigrantes ilegais/indocumentados
não são clandestinos, no sentido de se contraporem às leis vigentes, mas sim excluídos dos direitos a que
deveriam fazer jus. Sociologicamente, eles estão em situação de ilegalidade, mas não de ilegitimidade.
Antes de fazer novos comentários acerca desse tema, Sales (1999) lembra de uma entrevista que fez
com o deputado John Stefanini, nos Estados Unidos. Neste relato o parlamentar lembra que testemunhou em
favor de um brasileiro ilegal junto ao Serviço de Imigração e Naturalização (INS) americano, argumentando
com a juíza do caso o porquê desta defesa. Ao ser indagado pela magistrada se ele [o deputado] sabia que o
imigrante clandestino tinha infringido leis de imigração; e se mesmo assim ele ainda o considerava uma pessoa
boa, a ponto de testemunhar em seu favor? Como resposta, disse que sim; já que o mesmo não era acusado de
crimes contra a pessoa nem à propriedade; e que além disso, os Estados Unidos eram uma nação, historicamente
reconhecida, de imigrantes (SALES, 1999).
Segundo esta autora, o pressuposto desse argumento é que o imigrante está excluído da legislação não
por sua vontade, mas por defeito dessa legislação. O argumento usado pelo deputado era de que aquele imigrante
estava ali, de boa fé, querendo se integrar na sociedade americana, arriscando tudo para poder continuar a
viver ali com sua família e com o seu negócio próprio, e declarando de livre espontânea vontade sua contravenção
para que lhe fosse dada uma nova oportunidade (SALES, 1999).

248
Por uma “Sociologia da clandestinidade” no estudo da presença de brasileiros na Guiana ... • Manoel de Jesus de Souza Pinto

Na verdade, quanto mais o processo de globalização se radicaliza, mais as fronteiras territoriais se


estabelecem de forma fixa. Por outro lado, as populações (principalmente por causa de trabalho) mantêm-se
móveis e dinâmicas, criando e recriando áreas de contatos, trocas e conflitos. Esses dilemas globais precisam
ser urgentemente resolvidos, do contrário, esses fenômenos para o futuro tendem a ser legislados pela
imprevisibilidade e pelas máfias que administram o mundo, como disse Bauman (2005).
Apenas como uma forma de registro, é importante lembrar que existe um movimento mundial, encampado
pelas Nações Unidas, de fazer valer a Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os
Trabalhadores Migrantes e dos Membros de suas Famílias8. Neste documento são definidos os direitos humanos
desses trabalhadores, independentemente do seu estatuto jurídico9.
A Convenção abriu um novo capítulo na história da ação desenvolvida para estabelecer os direitos dos
trabalhadores migrantes e garantir a proteção e o respeito destes direitos. Trata-se de um tratado internacional
de caráter global, inspirado em acordos juridicamente vinculativos, em estudos sobre direito humanos elaborados
no quadro das Nações Unidas, em conclusões e recomendações adotadas em reuniões de peritos e nos debates
da última década, sobre a questão dos trabalhadores migrantes. À semelhança dos outros acordos internacionais
relativos aos direitos humanos, a Convenção estabelece normas que servem de modelo à legislação e aos
procedimentos judiciais e administrativos dos diferentes Estados. Os governos dos Estados que ratificam a
Convenção, ou a ela aderem, comprometem-se a aplicar as suas disposições, adotando as medidas para esse
efeito. De igual modo, obrigam-se a garantir o acesso a via de recursos aos trabalhadores migrantes cujos
direitos tenham sido violados (NAÇÕES UNIDAS, 2002)10.
Sobre as “expulsões arbitrárias e regresso voluntário” e a “migração ilegal e clandestina”, o documento
faz as seguintes considerações:

1 - Alguns instrumentos jurídicos internacionais estabelecem a proteção dos trabalhadores


migrantes contra expulsões arbitrárias, no caso de cessação do contrato de trabalho, por
exemplo, prevendo também o direito de recurso contra ordens de expulsão. Nos artigos 22 e 56
da Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores
Migrantes e dos Membros das suas Famílias aborda-se a questão da expulsão e da expulsão
arbitrária. O n. 1 do artigo 22 proíbe, expressamente, as medidas de expulsão coletiva. Uma
decisão de expulsão deverá ser tomada por uma autoridade competente, em conformidade
com a Lei (art. 22, n. 2) e somente por razões definidas na legislação nacional do Estado de
emprego (art. 56, n. 1). No n. 4 do artigo 22 estabelece-se que, excetuado o caso de haver uma
decisão definitiva emanada de uma autoridade judicial, “o interessado tem o direito de fazer
valer as razões que militam contra a sua expulsão e de recorrer da decisão perante a autoridade
competente, salvo imperativos de segurança nacional”. Os trabalhadores imigrantes têm o
direito a regressar, se assim o desejarem. Em debates internacionais, tem sido manifestada a
opinião de que esta questão deveria ser tratada através da cooperação entre o Estado de
origem e o Estado de acolhimento. Os emigrantes que regressaram devem dispor de serviços
de orientação e ter a possibilidade de utilizar os conhecimentos que hajam adquiridos no
estrangeiro.

2 - Os trabalhadores migrantes correm sérios ricos de ver infringidos os direitos humanos e as


liberdades fundamentais que lhe são reconhecidos, quando são contratados, transportados
e empregados ilegalmente. A pobreza generalizada, o desemprego e o subemprego, que se
verificam em muitos países em desenvolvimento, oferecem uma boa oportunidade de
recrutamento a empregadores e agências privadas sem escrúpulos; o transporte clandestino
de trabalhadores migrantes constitui, por vezes, um ato criminoso. Destituído de estatuto

8
Esta Convenção foi adotada pela Resolução 45/158 da Assembléia Geral, de 18 de dezembro de 1990.
9
A expressão “trabalhador migrante” designa a pessoa que vai exercer, exerce ou exerceu, uma atividade remunerada num Estado de que
não é nacional.
10
Este texto em brochura corresponde à tradução de uma publicação das Nações Unidas sobre os direitos dos trabalhadores migrantes (N.
24), feita pelo Centro Scalabriniano de Estudos Migratórios (CSEM).

249
Migração internacional na Pan-Amazônia

jurídico ou social, o trabalhador migrante ilegal é um alvo natural de exploração. Fica à mercê
do seu empregador e pode ver-se obrigado a aceitar todo tipo de trabalho, sem condições de
trabalho e de vida. No pior dos casos, a situação dos trabalhadores migrantes assemelha-se
à escravatura ou ao trabalho forçado. O trabalhador ilegal raras vezes procura a justiça, com
medo de ser descoberto e expulso e, em muitos países, não tem direito a recorrer das decisões
administrativas que o afetam (NAÇÕES UNIDAS, 2002).

Em relação à Guiana Francesa, especificamente, o Estado francês vem gradativamente restringindo a


migração legal de trabalhadores para este DUF, sejam estes brasileiros ou pertencentes a outros grupos étnicos.
Essas políticas restritivas à migração legal podem ser percebidas no aumento da burocracia francesa para a
liberação de documentos; e segundo empresários locais, pelo aumento das exigências fiscais aos patrões que
por ventura queiram contratar trabalhadores estrangeiros. No entanto, ao agir dessa forma, a França não
percebe que o aumento dos entraves e das barreiras à entrada legal de trabalhadores imigrantes acaba provocando
a intensificação dos fluxos migratórios ilegais, clandestinos. Apesar de o atual governo francês ter como meta
a instrumentalização de novas políticas anti-migratórias, percebe-se claramente o aumento dos ilegais em Caiena.
A Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos
Membros das suas Famílias11 convida aos Estados Partes12 a cooperar a fim de prevenir e eliminar os movimentos
e os trabalhos ilegais ou clandestinos de trabalhadores migrantes em situação irregular. Neste documento, pede-se
concretamente a todos os países que subscreveram a Convenção que adotem medidas apropriadas para combater
a difusão de informação enganadoras respeito à migração. E que possam impor sanções eficazes às pessoas,
grupos ou entidades, que participem em tais movimentos ou recorram à violência, à ameaça ou à intimidação
contra os trabalhadores migrantes em situação irregular. Na verdade, não será possível acabar com o tráfico
clandestino de mão-de-obra estrangeira, sem atacar as causas remotas da migração de trabalhadores, nomeadamente
o subdesenvolvimento econômico e o subemprego crônico. Assim, parece evidente que a forma de ajudar a
resolver o problema será adotando medidas que promovam o desenvolvimento econômico e que reduzam o fosso
existente entre os países industrializados e as regiões em desenvolvimento (NAÇÕES UNIDAS, 2002).
Em debates internacionais, foram sublinhados três aspectos da migração ilegal, que dizem respeito ao
migrante ilegal, enquanto infrator das leis de imigração, trabalhador e ser humano. Chegou-se à conclusão de
que cada uma destas situações tem as suas próprias consequências jurídicas que não se devem confundir em
detrimento dos direitos individuais dos trabalhadores. Em um artigo intitulado “Por uma nova lei de migração: a
perspectiva dos direitos humanos”, Rosita Milesi (s.d.) faz uma análise pontual sobre este documento tão
importante para os trabalhadores migrantes:

11
Em 1990, aos 18 de dezembro, pela Resolução 45/158, a Assembléia Geral das Nações Unidas aprovou a “Convenção Internacional sobre
a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e Membros de suas Famílias”, a qual entrou em vigor no dia 1º de julho de
2003, quando alcançou o total de ratificações necessárias para tanto, isto é, de 20 países. Em 1997, organizações asiáticas de migrantes,
lideradas pelas Filipinas, começaram a celebrar a data da aprovação da Convenção pelas Nações Unidas – 18 de dezembro – como Dia
Internacional de Solidariedade com os Migrantes. A partir desta iniciativa, em 1999, agora sob a liderança do Comitê Coordenador da
Campanha Global pela ratificação da Convenção sobre os Direitos dos Migrantes e com a participação de inúmeras outras organizações,
iniciou-se uma campanha mundial pela designação oficial por parte das Nações Unidas do Dia Internacional do Migrante. A mobilização
culminou, finalmente, em 4 de dezembro de 2000, quando as Nações Unidas proclamaram 18 de dezembro o Dia Internacional do
Migrante. Esta proclamação representa, desde sua origem, um convite das Nações Unidas a todos os Estados Membros e às organizações
governamentais e não-governamentais a fortalecerem as ações de sensibilização e mobilização pela proteção aos direitos humanos e
liberdades fundamentais dos migrantes, no intercâmbio de experiências e no desenvolvimento de ações que assegurem a proteção ao ser
humano migrante. O Dia Internacional do Migrante significa, antes de tudo, uma oportunidade para reconhecer a contribuição de
milhões de migrantes no bem-estar e na economia tanto dos países de residência quanto de seus próprios, e para promover o respeito aos
seus direitos humanos e à cidadania universal de que são detentores como cidadãos membros da família humana (MILESI, s.d.] (www.
migrante.org.br).
12
Até o final do ano de 2006, o governo brasileiro ainda não tinha ratificado a Convenção dos Direitos dos trabalhadores imigrantes,
inclusive era o único país do Mercosul que estava nesta situação. Segundo informações extra oficiais há um impasse interno entre o
Itamaraty, a Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH), O Ministério do Trabalho e o Ministério da Justiça. O que tem impedido
o consenso do Governo Federal é um parecer do Departamento de Estrangeiros do Ministério da Justiça, que faz uma série de ressalvas
a Convenção (Agência Carta Maior, 18.12.2006).

250
Por uma “Sociologia da clandestinidade” no estudo da presença de brasileiros na Guiana ... • Manoel de Jesus de Souza Pinto

Aprovada pela Assembléia Geral da ONU em 1990, defende e protege os direitos humanos
dos trabalhadores e trabalhadoras migrantes e membros de suas famílias, que abre um novo
capítulo na história das migrações internacionais, reconhecendo e protegendo sua dignidade
independentemente de sua condição migratória. Nesse sentido, a Convenção vai além da
simples estruturação de interesses de Estados nacionais buscando a humanização das relações
internacionais.
A base da Convenção é considerar o trabalhador migrante como sujeito de direitos, pessoa
digna perante a ordem internacional. Ressaltam-se alguns pontos:
1 – A Convenção dá uma definição internacional de trabalhador migrante prevista no art. 2º, o
qual prescreve que a expressão “trabalhador migrante” é a pessoa que vai exercer, exerce ou
exerceu uma atividade remunerada num Estado de que não é nacional.
2 – Conceitua diferentes situações: trabalhadores migrantes fronteiriços, sazonais, marítimos,
itinerantes, vinculados a um projeto empresarial ou independentes. Reconhece mulheres e
homens em pé de igualdade como trabalhadores. Considera os migrantes a partir de uma ótica
diferente da de meros sujeitos econômicos, trata-os como seres sociais, que têm mais direitos
do que os que lhe correspondem como trabalhadores.

3 - A parte III retrata um amplo elenco de direitos assegurados a todos os trabalhadores


migrantes e seus familiares, estejam eles documentados ou não, em situação regular ou não:
sair e regressar ao próprio país; direito à vida; à dignidade humana, à liberdade, não submissão
a torturas ou penas cruéis; não submissão à escravidão ou trabalhos forçados; liberdade de
pensamento, consciência e religião; respeito à vida privada; segurança pessoal e proteção do
Estado; direito a tratamento humano; igualdade com os nacionais perante Tribunais e Cortes
de Justiça; não ser encarcerado pelo simples fato de não cumprir obrigação contratual; vedação
à expulsão coletiva; igualdade aos nacionais no que tange à remuneração, acesso à educação,
o direito inalienável de viver em família, entre outros. Estabelece, igualmente, obrigações,
como, cumprir as leis e regulamentos do país e respeitar a identidade cultural do país de
residência.

A convenção traduz o novo paradigma dos direitos humanos, uma vez que considera o
migrante como sujeito de direito, independentemente de estar em situação regular ou não, de
sua nacionalidade, sexo, cor, etnia ou condição econômica. Traduz ainda, os valores éticos da
cidadania universal, por reconhecer e afirmar que os migrantes, antes de serem deste ou
daquele país, são pela sua condição de pessoa humana, titulares de direitos e do respeito a
sua dignidade humana.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em um artigo muito interessante sobre os “Conflitos do Outono de 2005 na França”, Fassin (2006) fez
um comentário que faço questão de evidenciar neste momento: diz ele que não compete às Ciências Sociais,
até mesmo por que as mesmas não estão habituadas, reagir a fatos que tomam formas de acontecimento (grifo
meu). Essa espécie de reticência em tratar da atualidade, que deveria ser cuidada pelos jornalistas, tem um
propósito importante: a distância do olhar científico e a duração da pesquisa sociológica/etnográfica. O tempo
sociológico é o das mutações profundas e o das transformações estruturais; e não do acontecimento, que
tendemos a ver apenas como espuma superficial das mudanças sociais. No decorrer de todo este artigo, não
tivemos como nos afastar dos acontecimentos, das informações veiculadas pela mídia, às vezes abusando do
“espetáculo”. No entanto, a rotatividade dos incidentes envolvendo brasileiros na faixa de fronteira entre o
Estado do Amapá e a Guiana Francesa é tão acentuada que as tragédias se retroalimentam de outras tragédias.
Apesar de lutarmos muito, sempre acabamos reféns dos acontecimentos, mas com um detalhe: os
mesmos não são tratados como uma realidade acessória entregue ao tratamento jornalístico, mas como realidades

251
Migração internacional na Pan-Amazônia

essenciais, na medida em que revelam fenômenos dissimulados ou ocultos em toda essa questão. Falar e
analisar realidades ainda não consolidadas sempre causou um grande mal-estar às Ciências Sociais, e em
especial à Sociologia. Mas também não podemos esquecer que um dos desafios enfrentados por essa disciplina
em “tempos tão complexos”, como o que estamos vivendo, seria de traçar/desenhar, pelo menos no campo das
probabilidades, o mapa dos futuros acontecimentos nesta faixa de fronteira.
Este artigo procurou, mesmo sem se lançar numa perspectiva teórica, abrir caminhos para a construção
de uma Sociologia da Clandestinidade, a partir da análise das relações de trabalho de brasileiros na Guiana
Francesa e dos dramas que esses trabalhadores vivem tendo como pano de fundo o fato de serem ilegais. Ficou
patente em nosso estudo que o modus operandi de integração dos imigrantes brasileiros no mercado de
trabalho local ocorre praticamente de maneira informal e ilegal. Atraídos pelo desejo de emprego, muitos
trabalhadores não percebem as frágeis relações de trabalho a que são submetidos, muitas vezes com um
grande grau de exploração. A necessidade de mão-de-obra do mercado de trabalho guianense, responsável
pelos primeiros ciclos migratórios, hoje talvez não seja a única explicação para a grande presença de estrangeiros
nesta verdadeira Babel dos Trópicos Úmidos, que é a cidade de Caiena. Outros fatores concorrem diretamente
para que este território ultraperiférico da Europa tenha se transformado na última esperança dos excluídos de
trabalho das regiões Norte/Nordeste. A moeda forte, o sistema previdenciário, os benefícios sociais, as
possibilidades reais de trabalho e a febre do ouro são os grandes responsáveis por aventuras dramáticas e
situações de desespero vivenciadas por homens e mulheres no território francês.
O processo de globalização implica, dentre outras coisas, o desenvolvimento de uma nova divisão
transnacional de trabalho. Tudo que antes se apresentava como nacional desempenha, agora função global. O
capital, a tecnologia, a força de trabalho, a divisão internacional do trabalho, o mercado, o trabalho precarizado,
o planejamento e a violência organizada e concentrada expandem-se por diferentes lugares no mundo (SILVA,
2000). É importante destacar que simultaneamente, seja em Caiena ou noutra parte do mundo, desenvolvem-se
classes sociais e grupos étnicos em âmbito transnacional. Todos são desafiados pelas transformações dos
imaginários tradicionais de referências abertos com a mundialização das relações, processos e estruturas reabrindo
uma nova etapa da história.
Enquanto isso, os imigrantes ilegais/legais, por exemplo, são desafiados a ajustar-se a uma nova realidade
social, econômica, política e cultural. É assim que a questão das mobilidades humanas por trabalho adquire
dimensões globais. As relações de trabalho, condições de organização, técnicas de reivindicação e horizontes e
de luta sociais se lançam em nível planetário. Vale à pena lembrar ainda que a globalização da questão social,
que de certa forma tentamos mostrar nesta pesquisa, complica as intolerâncias e os preconceitos raciais.
Os conflitos se multiplicam com os movimentos migratórios transnacionais.
Segundo Souza Silva (2000) trata-se de um novo palco da história onde se movem indivíduos, grupos,
classes sociais, nações. Neste sentido, podemos perceber as relações entre capital e trabalho, mercado e
planejamento, assalariados e proprietários, mulheres e homens, nativos e conquistadores, negros e brancos,
africanos e europeus, orientais e ocidentais, islâmicos e cristãos. As inúmeras identidades e alteridades,
diversidades e desigualdades podem ser vistas como diferentes configurações da metáfora hegeliana do servo
e senhor.
Para Tedesco (2006) tem-se a impressão de que o capitalismo global conseguiu inventar, em meio aos
direitos do trabalho, trabalhadores sem direitos, processo esse fundamental para a aceitação e a inserção de
mão-de-obra nas fronteiras transnacionais, impondo novos padrões gerais e privados de acumulação de capital.
A valorização ou desvalorização da presença migratória no horizonte do trabalho depende muito das relações e
dos fenômenos aos quais ela se associa. Ao mesmo tempo, diz este autor, percebemos também que a mobilidade

252
Por uma “Sociologia da clandestinidade” no estudo da presença de brasileiros na Guiana ... • Manoel de Jesus de Souza Pinto

populacional revela a importância do trabalho como categoria-chave para o processo de reprodução do capital
através do viés (e)(i)migratório. A reprodução do capital se serve também de alguns elementos sócio-culturais
para reproduzir-se (redes sociais, relações de parentesco e de conterraneidade, tipos de mão-de-obra, relações
de gênero, formas precárias de integração social, grupos étnicos e nacionais).
Pensar numa Sociologia da Clandestinidade, sem dúvida significa apresentar todos esses acontecimentos
descritos neste texto numa perspectiva da ética, da política, dos direitos humanos, da economia, da geografia,
da antropologia. Desafiada constantemente pelas dinâmicas sociais e pelas novas configurações do mundo do
trabalho, a Sociologia não pode e não deve jamais renunciar uma de suas mais potentes armas: a imaginação.

253
Migração internacional na Pan-Amazônia

REFERÊNCIAS

AROUCK, Ronaldo de Camargo. Brasileiros na Guiana Francesa: fronteiras e construções de alteridades. Belém: NAEA/
UFPA, 2002.

ASSIS, Gláucia de Oliveira; SASAKI, Elisa Massae. Teoria das migrações internacionais. In: ENCONTRO NACIONAL DA
ABEP, 22. Anais… GT de Migração, 2000.

BAUMAN, Zygmunt. Vidas desperdiçadas. Rio de Janeiro: Zahar, 2005.

FASSIN, Didier. Conflitos do Outono de 2005 na França. Tradução: Paulo Neves. Tempo Social, Revista de Sociologia da
USP, v. 18, n. 2, nov. 2006.

JUNIOR, Durval Muniz Albuquerque. Preconceito contra a origem geográfica e de lugar: as fronteiras da discórdia. São
Paulo: Cortez, 2007.

KOLTAI, C. Desamparo e a questão do estrangeiro. Psyché Revista de Psicanálise, São Paulo, n. 6, p. 95-100, 2000.

MILESI, Rosita. O estatuto do estrangeiro e as medidas compulsórias de deportação, expulsão e extradição. Disponível
em: www. migrante.org.br (Instituto Migrações e Direitos Humanos) [s.d.].

NAÇÕES UNIDAS. Os direitos dos trabalhadores migrantes. Série das Nações Unidas, n. 24, 2002.

PINTO, Manoel de Jesus de Souza. O fetiche do emprego: um estudo sobre relações de trabalho de brasileiros na Guiana
Francesa (Tese de Doutorado). Belém: NAEA/UFPA, 2004.

PESQUISA DE CAMPO. Projeto de pesquisa intitulado: O fetiche do emprego: um estudo sobre relações de trabalho de
brasileiros na Guiana Francesa, realizado em Macapá, Oiapoque e Caiena, tendo como orientadora a professora Edna
Maria Ramos de Castro, junto ao NAEA/UFPA, Belém, 2006.

SALES, Tereza. Brasileiros longe de casa. São Paulo: Cortez, 1999.

SILVA, Karine de Souza. Globalização e exclusão social. Curitiba: Juruá, 2000.

TEDESCO, João Carlos. Imigração e integração cultural: interfaces – brasileiros na região de Vêneto – Itália. Passo
Fundo: Editora UPF/EDUNISC, 2006.

254
The impact of human capital flight in Guyana • Paulette Bynoe, Marlon Bristol

THE IMPACT OF HUMAN CAPITAL FLIGHT IN GUYANA

Paulette Bynoe1
Marlon Bristol2

INTRODUCTION

The intensity of human capital flight (otherwise referred to as the brain drain) from Guyana is estimated
to be among the highest in the world at 89% (DOCQUIER; MARFOUK, 2004). Capturing the size of the brain
drain earlier Carrington and Detragiache (1998) also provided estimates for Guyana that were relatively high,
77.5%. Most empirical analysis pronouncing on the brain drain used these databases for example Mishra
(2006) and Castellani (2007). The existing deficiencies of data and sources do not lend itself to properly analyzing
the issue (DOWNES, 2006; ECLAC, 2007; PASTOR, 1985; THOMAS-HOPE, 2002). Investigated from the
perspective of the potential emigrant with tertiary level education, Bristol et al (2007) found that only 45% of the
respondents attending the University of Guyana indicated they were going to emigrate. The same was revealed
by potential emigrants in a national survey (of the political culture of democracy in Guyana in 2006) (BYNOE
et al, 2007). The key to explaining the disparity in the estimates is interestingly the source (s) of data, an Achilles
heel of solving the issues of accuracy surrounding estimates of the brain drain. Resolving the methodological
(including data collection) issues or applying an appropriate technique therefore is essential to explaining the
problems associated with capital flight, and possibly its impact.
Migration estimates in general may not adequately reflect the severity of the situation currently, much to
do with measurement techniques, definitional issues and the difficulty of capturing illegal migration in official
statistics (ECLAC, 2005). More specifically, existing brain drain estimates do not distinguish where the tertiary
level education is acquired and it is taken as a proportion of the labour force born in the sending country.
Consequently, in the sending country the source of census data and other surveys are essentially potential
emigrants, in some cases, giving information on household members who emigrated. In the receiving country
immigration data are taken from the emigrants themselves on their educational attainment and originating
country, not sufficient to assess the reason for leaving and effects/impact on the sending country.
In the context of Guyana (like most developing countries) why human capital is depleting, and the
effects of such depletion is still to be resolved?. The literature suggests socio-economic push and pull factors
which offer some explanations for the estimates: low absorptive capacity due to slow employment creation,
insufficient remuneration, family-ties, etc. The timing and sequencing of events also offer some clues as is
sometime reflected in population trend data or arrival and departure data. International developments and the
system of governance offer some evidence as well, for example the oil crisis of the 1970’s; political ideology

1
Dr. Paulette Bynoe is Director (ag) of the School of Earth and Environmental Sciences, University of Guyana. E-mail: bynoep@yahoo.com
2
Mr. Marlon Bristol is a Researcher 1 in the Institute of Development Studies, University of Guyana.

255
Migração internacional na Pan-Amazônia

practiced, elections outcomes, environmental events and disasters such as floods, inter alia. These explanations
are often treated as anecdotal evidence as no documentation empirically or otherwise (in the case of Guyana)
make a direct and significant correlation. Hence, the jury is still out on consequences and effects, within the
context of Guyana.
Essentially, most of the debate on human capital depletion from Guyana, like so many other countries,
suffers from acute data deficiencies. Even in cases where the impact is visible the habit of collecting the data
and quantifying effects is not normally pursued. Further, in cases where the data is collected by default the
tendency to report on such issues are far from priority in relation to other problems the country faces. Nevertheless,
visible evidence exists in specific sectors, for instance, education and health.
What this paper seeks to do therefore, is to pilot a snowball technique to collect data from those in the
Diaspora as most direct mechanism of ascertaining why Guyanese with tertiary level education emigrated.
Moreover, by observation catalogue the visible and potential or assumed impacts.

GUYANA: PROFILE OF A STATE IN TRANSITION

Guyana’s real GDP growth averaged above 3% in the 1960s, 1.4% in the 1970s, negative 2.5% in the
1980s, above 7% per annum during 1991 to 1997, and between 1998 to 2008 above 2% (ARMENDARIZ, et
al, 2007; BUDGET SPEECH, 2009). Existing poverty data show some reduction in absolute poverty from
42.3% in 1992/93 to 36.3% in 1999, most of the poverty (77%) is rural based, with the rural interior, which the
indigenous Amerindian people principally inhabit, showing virtually no change between the 1992/1993 survey
date and 1999 (GSLC, 2000; THOMAS, 1999; WORLD BANK, 1994). With a total real GDP at factor cost
of 847.9 million US dollars, per capita GDP was 1111$US in 2007 this total makes for a small total market size.
The country is one of the top five most open economies in the world as exhibited by a ratio of total trade to GDP
of 270%. The main exports are primary products: sugar, rice, gold, diamonds, forest products, fish products,
bauxite and silica.
Guyana is culturally and ethnically heterogeneous. The total population estimated to be 763.2 thousand
in 2007 is subdivided into Indian-Guyanese (43.3%) followed by African-Guyanese (30.3%), Mixed (16.2%),
and Amerindian (9.2%). In terms of religious affiliation over nine different Christian or Christian-related faiths
account for 59.2% of the population, with Hindus 28.4% and Muslims 9.2%. The “Other category”, which
includes non-believers only accounts for 5.2%. A former British colony it is part of the English-Speaking Caribbean;
its main language is English, often spoken as creoles (Amerindian dialects predominate in much of the interior
where they reside).
The country became Independent in 1966 and in 1970 (supported by the Constitution) was the first
Republic in the Caribbean Community (CARICOM). Based on its development ideology of import substitution
at that time under the umbrella goals to Feed, House and Clothe the nation a process of nationalization began.
This was supported by other austerity measures that essentially closed the economy (ARMENDARIZ, et al,
2007). In the initial stages, of the heavy intervention, economic growth was positive; by 1980 more than 80% of
all the activities were conducted by the Government. The country collapsed by mid-1980s and subsequently
renewed its relationship with the international donors by 1989 negotiating an Economic Recovery Programme.
Elections were subsequently held in 1992, which ushered in a new Part and since then Guyana has been trying
to make the transition to a democracy. Notwithstanding, voting patterns are ethnically polarized, social unrest
has usually followed elections outcomes (LAPOP, 2006). In fact, ethnic divisions and social strife has always
existed, escalating into physical conflict in the streets.3

3
See Da Costa (2007) and DGIA (2008) for detail on Institutional and other developments in Guyana.

256
The impact of human capital flight in Guyana • Paulette Bynoe, Marlon Bristol

Despite all the issues arising from whence Guyana gained independence, individuals’ emigration whether
the economy was closed or opened persisted. Additionally, skills creation as demonstrated by education
expenditure in the national budget (both in comparison to other sectoral expenditures or GDP), school enrollment
and literacy rates for Guyana has been consistently high. So too it is true, despite lack of hard figures, that
capital flight has been and continues to affect the development of the country, whether it’s managerial skills in
the 1970s or teachers and nurses in the 21st century.

METHODOLOGY AND DATA

We explored several sources of data and recognized that the data hardly reflected the views of those
who emigrated and/or if it did was limited in scope to understand any peculiarity of the issue as it relates to
Guyana. Indeed the problem we investigate is not unique to Guyana, but the rates at which the brain drain has
been estimated for Guyana is among the highest in the world and given the country’s development challenges
this is a critical issue in this context. After exploring options of who to engage Guyanese in the diaspora we
found that the internet is one of the most effective mediums for reaching out and extracting information from
the Guyanese all over the world. The limitation we faced is the representativeness of the data collected.
A non-probability technique snowball survey method was adapted to conduct a survey of Guyanese in
the diaspora. In this case while there is some level of randomness, representativeness can hardly be claimed.
However, this technique is useful for collecting the type of data we seek and with that we can cross-reference
the feedback with anecdotal justifications, views from potential emigrants, and household members giving
information on other members who would have emigrated.
A questionnaire was developed for the survey and a cut-off point of 30 days was established. At the end
of the cut-off point we received 53 responses and proceeded to conduct our analysis.

ANALYSIS OF RESULTS

The data collected revealed that of the educated Guyanese in the diaspora most individuals’ highest
educational attainment was a master’s degree (Figure 1). In Guyana, the University of Guyana (the only
University in the country) is constrained to offer graduated level education. Most often graduate level education
is offered with the Arts and Humanities, and the Social Sciences. Seldom there are situations where they have
partnership programmes with external universities. And, when graduate programmes are offered normally, the
revealed demand is high. In essence the responses generally show a significant demand for tertiary education
beyond the baccalaureate degree. This is consistent with what the domestic demand suggests whenever
programmes are offered by the University.

Figure 1 - Educational Attainment

257
Migração internacional na Pan-Amazônia

The results also show that most of the tertiary level Guyanese responding to this survey acquired their
tertiary level education in the USA followed by Guyana (Table 1). If this were to be true in a broader and more
representative consensus of tertiary educated Guyanese in the diaspora, then it would be hard to claim that the
brain drain is a sap public resource even though many of these individual would have acquired some form of
education (depending on the age they emigrated) resulting from public subsidies.

Table 1 - Source Country of Tertiary Education

Country No. of Respondents

UK 10
Guyana 12
Canada 4
Italy 1
Belgium 1
Brazil 1
Germany 1
USA 19
Netherlands 3
Ukraine 1
Total 53

Clearly, most of the respondents reside in the USA, LA&C, the United Kingdom and Canada (Figure 2).
This evidence is consistent with Castellani (2007) evidence that emigrants are concentrated by location. Hence,
cost recovery measures, for recipients of education in the sending country, who are liable for education cost can
be worked out. It might even be argued today that the type of skills that leaved can easily be tracked also and
this forthcoming evidence sets the bases for the type of training that has to be intensified and possibly specific
countries that can be called upon to help the intensification of training.

Figure 2 - Location of respondents

258
The impact of human capital flight in Guyana • Paulette Bynoe, Marlon Bristol

Exploring the reasons why the educated are leaving Guyana and has been doing so for quite some time
can help to understand what and if the problem of stemming the outflow is a possibility. The results, in Table 2,
show that most respondents emigrated because of family ties, despite the wide range of possible explanations.
While a better standard of living, social cohesion, political stability etc can all potentially mitigate the problem of
capital flight, and also act as incentives for return, another problem can emerge. On the one hand domestic
products for exports depend on diasporic market demand. On the other hand, it can be argued that results of
harnessing an innovation and creative society might far outweigh the trade-off between the gains from trading
to disaporic market with the gains from having the skills return. The reality however, is that Guyana does not
have the agglomeration of infrastructure and other complementarities to optimize the benefits of highly skilled
working age population. The past and present evidence in fact shows that the difficulty does not lie in creating
skills but retaining it.
Family ties emerging as the most significant reason why the skills go suggest that the redress action lies
in intensifying training to fill the local demand gaps. This has been somewhat reflected by government expenditures
on education. However the focus of those expenditures has been on satisfying the millennium development goal
of primary education and additional secondary level education; the focus on tertiary education does not seem to
be a priority.

Table 2 - Reason for emigrating

Reasons No. of Respondents


Family ties 14
Economic 3
Political 5
Political and Economic 6
Political and Social 1
Economic and Social 2
Economic and Family Ties 4
Political and Social 2
Educational Advancement and Political 1
Political, Economic and Social 3
Educational Advancement 5
Educational Advancement, Economic and Security 1
Educational Opportunity and Economic Instability 1
Family Ties, Personal and Health Care Access 1
All 4

CONCLUSION

The paucity of data on emigration has somewhat led to a lack of understanding the issue and proposing
a mechanism for its solution. Of course, priority is given to what might be perceived as more prominent
issues, but the problem of capital flight, inter alia, goes to the root of Guyana’s development problems. To
date an assessment of its impact is yet to be quantified. Acknowledging that Guyana’s history, structural and
induce problems are essentially to explaining the flight, and as the evidence shows the reasons can be many.
The evidence shows from the literature on potential emigrants that economic factors weigh heavily as an
explanatory variably. However, to develop and treat an explanation of emigrating individuals due to family
ties is far more complex.

259
Migração internacional na Pan-Amazônia

REFERENCES

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260
QUARTA PARTE

HISTÓRIAS DE MIGRAÇÃO
INTERNACIONAL NA
AMAZÔNIA BRASILEIRA
Fluxos migratórios internacionais para a Amazônia brasileira do final do século XIX ... • Marília Ferreira Emmi

FLUXOS MIGRATÓRIOS INTERNACIONAIS PARA


A AMAZÔNIA BRASILEIRA DO FINAL DO SÉCULO XIX
AO INÍCIO DO SÉCULO XX: O CASO DOS ITALIANOS

Marília Ferreira Emmi1

INTRODUÇÃO

Refletir sobre os fluxos migratórios internacionais que se dirigiram para a Amazônia a partir da segunda
metade do século XIX implica em ter presente diferentes motivações que os países de origem e os países de
destino apresentaram nesse período, resultando na ocorrência das grandes migrações internacionais para a
América. Os países europeus vivenciaram ao longo do século XIX diferentes processos de transição demográfica,
caracterizados pelo contemporâneo aumento das taxas de natalidade e o decréscimo das taxas de mortalidade
trazendo como consequência a aceleração do crescimento demográfico. Esses processos aliados às mudanças
pelas quais passava o capitalismo, em decorrência da Segunda Revolução Industrial, ocasionaram uma acentuação
nas emigrações europeias, a partir da segunda metade do século XIX.
Os principais países de destino dos 31 milhões de imigrantes que chegaram à América de 1881 a 1915,
foram Estados Unidos que receberam 21 milhões, Argentina (4,2 milhões), Brasil (2,9 milhões) e Canadá (2,5
milhões). Esse período vai marcar importante mudança na origem desses imigrantes. Apesar de os países
europeus tradicionais no movimento emigratório, como a Irlanda e a Alemanha continuarem a ter posição
destacada, alguns países do Sul e do Leste europeu passaram a emergir como exportadores de trabalhadores.
Da Itália vieram cerca de 7,7 milhões de trabalhadores, do Império Austro-Húngaro 4,2 milhões, da Espanha
3,2 milhões, da Rússia e Polônia 2,5 milhões e, de Portugal um milhão, que se dividiram entre os Estados Unidos
e o Brasil que recebeu cerca de 80% dos emigrantes portugueses (KLEIN, 2000).
Essa onda migratória atendia tanto os interesses dos países de origem na transferência de excedentes
populacionais como as demandas dos países de destino, entre eles o Brasil, que via na absorção desses fluxos
humanos um modo de resolver seus problemas de povoamento e de carência de mão-de-obra, privilegiando a
população branca, por fatores ideológicos. Os interesses dos imigrantes estavam centrados nos subsídios, nas
possibilidades de trabalho e de acesso à terra, alimentados por intensa propaganda oficial ou particular; fatores
que pesavam positivamente na decisão de emigrar por parte de grupos de estrangeiros de várias nacionalidades.
Segundo Levy (1974), no período compreendido entre 1820, quando são encontrados os primeiros dados
sobre entradas de estrangeiros no Brasil, e 1871, ano anterior à realização do primeiro recenseamento geral do

1
Doutora pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA/UFPA) e professora do NAEA. E-mail: mfemmi@ufpa.br

263
Migração internacional na Pan-Amazônia

Brasil, foram registradas 250.487 entradas de imigrantes de diversas nacionalidades. O censo de 1872 registra
a presença de 389.459 estrangeiros, o que leva, segundo a pesquisadora, à conclusão de que já havia estrangeiros
residindo no Brasil antes de 1820, ou que os dados referentes às entradas entre 1820 e 1871 estavam
sub-estimados. Por ordem decrescente de importância numérica, as principais nacionalidades eram a portuguesa,
a italiana e a espanhola. No início do século XX foi promulgado na Itália o decreto Prinetti (1902). Esse decreto
proibiu a migração subsidiada de italianos para o Brasil, devido às precárias condições a que esses emigrantes
eram submetidos no estado de São Paulo. A migração de italianos sofre a partir desse momento redução
significativa e é durante esse período que os imigrantes japoneses chegam ao Brasil (1908), através de imigração
subsidiada por companhias japonesas (LEVY, 1974).
Embora mantendo as peculiaridades de cada onda migratória, existem traços comuns entre os principais
fluxos migratórios europeus para o Brasil, destacando aqueles de portugueses, espanhóis e italianos. Esses
fluxos resultam da não-absorção pelos respectivos mercados nacionais do grande contingente de camponeses
expulsos de suas terras em decorrência do desenvolvimento das relações capitalistas e respondiam, por
outro lado, à solicitação de mão-de-obra assalariada para substituição da escrava, pelos países da América.
A mediação ideológica estimuladora da emigração residia, portanto, na esperança de adquirir a propriedade
rural (PEREIRA, 2002).
Por outro lado, analisar a motivação de cada fluxo migratório necessita ter presente o movimento de
emigração e imigração em sua dupla dimensão de fato coletivo e de itinerário individual, ou seja, a trajetória e
as experiências singulares dos emigrantes/imigrantes. A imigração é, pois, um processo social de mobilidade de
grupos que se origina em estruturas sociais espacialmente delimitadas. Mas, esse processo social contempla e
nele têm lugar diferentes trajetórias com suas particularidades, permitindo desse modo que se perceba a
diferenciação entre e dentro dos vários fluxos migratórios, na qualidade de emigrante e na situação de imigrante
(SAYAD, 1998). Nesse sentido as áreas de origem e de destino, o momento histórico da migração e os
condicionantes socioeconômicos, ideológicos, políticos e demográficos ganham importância diferenciada para
cada fluxo considerado

A AMAZÔNIA BRASILEIRA COMO DESTINO DE IMIGRANTES EUROPEUS E ASIÁTICOS

Pensar na presença italiana na Amazônia do fim do século XIX às primeiras décadas do século XX
significa situar este segmento no conjunto das correntes migratórias que se dirigiram para a região, tendo como
principal motivação a busca pelas apregoadas riquezas decorrentes da exploração da borracha.
Um retrato da imigração internacional na Amazônia pode ser obtido através dos dados sobre o movimento
imigratório no porto de Belém, no início do século XX, registrados no Anuário Estatístico do Brasil. Segundo
essa fonte, entre 1908 e 1910, entraram no porto de Belém cerca de 13.500 estrangeiros de várias nacionalidades,
destacando-se os portugueses (48,67%), os espanhóis (15,98%), os ingleses (7,18%), os turco-árabes (4,69%)
e os italianos (4,15%). O crescimento econômico da Amazônia, decorrente da elevação dos preços da borracha
nesse período pode ter constituído fator motivador dessa expressiva imigração.
Os imigrantes vincularam-se a diversas atividades dando, portanto, importante contribuição tanto no
domínio econômico, quanto no técnico, profissional e cultural. Os ingleses teriam se destacado na construção
de portos, produção de energia, telefonia, telegrafia, saneamento básico, além de significativa participação no
setor de comercialização e do crédito, setor do qual compartilhavam ainda os americanos e os franceses.
A participação de judeus, espanhóis e norte-africanos foi principalmente nas atividades de escritório e
contabilidade comercial, e dos portugueses no comércio por atacado e varejo. Os estrangeiros de um modo

264
Fluxos migratórios internacionais para a Amazônia brasileira do final do século XIX ... • Marília Ferreira Emmi

geral deram significativa contribuição na organização dos serviços terciários de natureza privada, numa região
que dava os primeiros passos na esfera do capital mercantil (SANTOS,1980). A contribuição dos italianos, com
suas pequenas fábricas de calçados e de bebidas e no comércio de atacado e varejo, sobretudo na exportação
de produtos regionais, atividade em que se associavam a comerciantes portugueses, é registrada por Aliprandi
e Martini (1932).
Entretanto, mesmo após o colapso da borracha, imigrantes continuaram chegando. É o que se pode
deduzir do número significativo de estrangeiros que residiam na Amazônia por ocasião do censo de 1920,
quando a economia da borracha amazônica já estava decadente em consequência do avanço da produção
asiática que se tornara crescente desde 1913. Tanto as novas entradas, como a permanência de grupos de
imigrantes que passaram a instalar pequenas fábricas para abastecer o mercado local iniciaram um processo
de substituição de importação de produtos que não mais podiam ser importados do mercado europeu. A partir
da década de 1940 assiste-se uma diminuição no ritmo das imigrações no Brasil e os censos de 1940 e 1950
revelam acentuada queda na imigração internacional na Amazônia (Tabela 1).

Tabela 1 - População estrangeira no Pará e no Amazonas conforme a nacionalidade (1872-1950)

1872 1920 1940 1950


Origem
PA AM PA AM PA AM PA AM

EUROPA 5.076 814 19662 9963 8268 3801 5744 2501


Portugal 4.463 689 14211 7615 5657 2863 4113 1844
Espanha 158 35 3355 986 1065 322 778 198
Itália 37 12 1114 726 566 342 376 279
França 210 13 316 92 177 45 70 29
Inglaterra 93 56 310 363 363 99 126 59
Alemanha 64 5 163 72 186 64 114 25
Outros países – 3 193 109 154 66 167 67
AMÉRICA 177 1246 559 5807 662 2169 712 1733
ÁSIA – – 1463 843 1310 760 1027 519
Turquia Asiática – – 1460 811 27 36 19 5
Líbano e Síria – – – – 821 424 586 314
Japão – – 3 32 458 297 413 195
Outros países – – – – 4 3 2 5
ÁFRICA 1.256 88 – – 126 64 68 33
Sem identificação 19 15 399 323 7 2 12 11

TOTAL 6.529 2199 22083 16936 10373 6796 7563 4797


Fonte: Emmi (2007).

No contexto dessa Amazônia multicultural, tiveram maior representatividade numérica três fluxos
migratórios de europeus: portugueses, espanhóis e italianos e dois fluxos asiáticos: libaneses e mais tardiamente
o de japoneses, cada qual mantendo suas peculiaridades.
A forte presença portuguesa na Amazônia vem desde os tempos coloniais quando a província do
Grão-Pará era diretamente ligada à Coroa portuguesa, situação que só vai mudar em 1823, com a adesão do
Pará à independência. A imigração portuguesa que teve no Brasil a quase exclusividade de destino se intensifica
no final do século XIX e se mantém em números significativos nas primeiras décadas do século XX. As marcas
portuguesas na Amazônia estão no comércio, nas associações esportivas e recreativas, além da arquitetura e
da denominação portuguesa de várias cidades amazônicas. Segundo Fontes (2002) os grupos que se direcionaram
ao Pará constituíam imigração não subsidiada, composta em sua maioria por homens solteiros. A procedência
dos imigrantes era principalmente das regiões do Douro, Minho e Beira Alta. Eles direcionaram-se para as
cidades onde desempenhavam atividades ligadas principalmente ao comércio.

265
Migração internacional na Pan-Amazônia

A imigração espanhola direcionada à Amazônia está relacionada com o projeto de colonização agrícola
implantado no Pará a partir de 1896 ao longo da estrada de ferro Belém-Bragança. Os primeiros imigrantes
chegaram ao Pará em várias levas vindas principalmente da Galícia, províncias de Pontevedra, Ourense e
Lugo. O fluxo imigratório espanhol era formado por grupos familiares que subsidiados pelo governo paraense
vieram povoar os núcleos coloniais de Benjamim Constant, Jambuassu, Marapanim, José de Alencar, Santa
Rosa, Ferreira Pena e Couto de Magalhães. Novos grupos chegaram em decorrência da Guerra Civil (1936-
1939). Além da agricultura, dedicaram-se ao setor de serviços nas cidades (MARTINEZ, 2000).
O fluxo de libaneses dirigido ao Brasil vinha do campo e destinava-se principalmente aos centros
urbanos de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia, todavia espalharam-se como mascates em várias
cidades brasileiras (KARAAN, 1998). Refletindo sobre a presença do fluxo “sírio-libanês” na Amazônia,
Benchimol (1999) registra que esse segmento era formado por grupos familiares oriundos de Batroun, Baalbeck,
Ghazzir, Dimen, Ghosta, Jbeil e Beirute (Líbano) e de Ayo, Hamma e Damasco (Síria) e vinham tentar a vida
como comerciantes em Belém, Manaus, Porto Velho, Rio Branco no rastro da economia da borracha. Era uma
imigração familiar. Quando vinham solteiros mandavam buscar suas noivas na região de origem, geralmente
com algum grau de parentesco, mantendo a coesão na vida familiar e nos negócios. Por outro lado, Zaidan
(2001) assinala que ao chegarem ao porto de Belém os libaneses tomavam o caminho do interior do estado, seja
por meio fluvial chegando a Cametá, Monte Alegre, Óbidos, Santarém, seja pela estrada de ferro de Bragança,
onde se encontram muitos descendentes. O sucesso comercial desse fluxo pode ser avaliado, segundo esse
autor, pelo registro de um número significativo de firmas nas juntas comerciais dos estados do Pará e do
Amazonas no início do século XX.
A imigração japonesa para a Amazônia pode ser considerada tardia se comparada com a de outros
fluxos migratórios. Foi somente a partir de 1908 que desembarcaram os primeiros japoneses no Brasil.
Na Amazônia essa imigração se estabeleceu no final da década de 1920 no estado do Pará e no início da
década de 1930 no estado do Amazonas. Era uma imigração subsidiada pelo governo japonês formada de
famílias de agricultores e que foram responsáveis pela introdução da cultura de pimenta-do-reino e da juta na
região (HOMMA, 2007).

ITALIANOS NA AMAZÔNIA

Nessa Amazônia, terra de imigrantes, é a corrente italiana que para cá se dirigiu e suas contribuições
para o processo de desenvolvimento regional que constitui nosso foco de análise. Entre os italianos, um grupo
significativo foi formado por religiosos que vinham atender determinações específicas de suas respectivas
congregações. Eles deixaram as marcas de sua presença em estabelecimentos de ensino e em hospitais. Outro
grupo importante era composto por arquitetos, pintores, músicos e outros artistas. A presença desses artistas foi
de grande relevo pelas marcas que deixaram nas cidades amazônicas e a propaganda de suas obras na Itália
pode ter constituído um estímulo para outros grupos emigrarem espontaneamente.
A pesquisa foi direcionada para as famílias de imigrantes italianos que elegeram a Amazônia como
região de destino percorrendo diferentes trajetórias que se iniciavam do outro lado do Atlântico aqui se fixaram
e se integraram à economia e à sociedade amazônicas. Embora o número de imigrantes vindos para a Amazônia
seja menor, se comparado com os que vieram para o Sul e o Sudeste do Brasil, evidências empíricas permitem
agrupar os imigrantes italianos em dois grandes segmentos: (1) imigração subsidiada dirigida para as colônias
agrícolas e, (2) imigração espontânea dirigida às cidades. A imigração dos dois segmentos foi contemporânea,
ou seja, ambos começaram a chegar nas duas últimas décadas do século XIX, se diferenciaram quanto às
razões norteadoras da migração, à composição social, à origem regional e às áreas de destino dentro da Amazônia.

266
Fluxos migratórios internacionais para a Amazônia brasileira do final do século XIX ... • Marília Ferreira Emmi

ITALIANOS NAS COLÔNIAS AGRÍCOLAS

A imigração dirigida para as colônias agrícolas está inserida no projeto de colonização inaugurado pelo
Governo Imperial e que teve continuidade nos primeiros anos da República, visando o povoamento de algumas
regiões do território nacional por agricultores estrangeiros. O objetivo da política era atrair imigrantes
principalmente do continente europeu para povoar os considerados vazios demográficos, neles estabelecendo
colônias agrícolas, o que permitiria tanto a posse do território, como a produção de riquezas. Por isso, o imigrante
desejado era o agricultor ou artesão que aceitasse viver em colônias e não o aventureiro que preferisse viver
nas cidades (OLIVEIRA, 2001).
Embora tenha sido referida na literatura como uma iniciativa fracassada e por isso de menor importância,
é relevante recuperar a memória da experiência de implantação de colônias agrícolas com imigrantes estrangeiros
na Amazônia. Apesar da curta existência desta corrente, as colônias representaram a porta de entrada para a
fixação de famílias italianas no interior da Amazônia e sua contribuição econômica e social é notada até hoje.
No estado do Pará, das experiências do período imperial, a mais expressiva foi a criação da colônia de
Benevides onde foram introduzidas 180 famílias de várias nacionalidades: franceses, italianos, espanhóis, alemães,
belgas, ingleses e suíços. Entretanto foi a partir do período republicano, iniciado em 1889, que essa política se
intensificou com a criação de 10 núcleos agrícolas situados ao longo da estrada de ferro Belém-Bragança e que
se destinavam a receber imigrantes europeus.
O fluxo migratório de italianos direcionado para as colônias agrícolas foi composto por grupos familiares
de agricultores que em 1899, em navios da companhia La Ligure Brasiliana deixaram a Itália destinando-se
a povoar as colônias agrícolas de Anita Garibaldi, Ianetama e Outeiro, localizadas no estado do Pará. Esse
povoamento se daria através de contratos firmados entre o Governo do Estado e concessionários que se
responsabilizavam pela vinda e instalação dos colonos.
Foram grandes as dificuldades para encontrar dados que permitissem a identificação e a análise desse
segmento. Em primeiro lugar, porque a esparsa literatura que se refere às colônias agrícolas destinadas a
receber imigrantes italianos no Norte do Brasil apenas registra que essas foram experiências mal sucedidas,
mas não existe qualquer discussão sobre as causas desse insucesso (TRENTO, 1989; CENNI, 2003). Por
outro lado, os dados sobre esses imigrantes são escassos e localizá-los demandou um grande esforço de pesquisa
em manuscritos do acervo da antiga Repartição de Terras e Colonização que se encontra no Arquivo Público
do Pará. Esses registros permitem reconstituir uma listagem desses imigrantes, que embora incompleta, fornece
pistas sobre a origem regional, a composição familiar, a idade de imigração, a data de chegada, o navio que os
transportou e outras informações importantes que ajudaram situar essa corrente migratória no contexto da
imigração italiana na Amazônia.

Colônia Anita Garibaldi

A colônia Anita Garibaldi originou-se de um contrato, assinado em dezembro de 1898, entre o Governo
do Estado e o cidadão italiano Mario Cataruzza. Pelo contrato, esse concessionário se comprometia em fundar
uma colônia para introduzir no Pará, duzentas famílias de agricultores italianos, originários das regiões do
Veneto, Lombardia, Piemonte e Emilia Romagna, localizadas na Itália Setentrional. A colônia situava-se numa
área de 5000 hectares localizada próximo ao atual município de Castanhal.
De acordo com o contrato, os lotes agrícolas seriam destinados à plantação de cereais e produtos
comerciais como cana, café e algodão, conforme as normas estabelecidas pela Sociedade Paraense de
Agricultura. Entre outras exigências, esse contrato obrigava o concessionário a fazer a discriminação dos lotes,

267
Migração internacional na Pan-Amazônia

abrir estradas, efetuar derrubada e queimada, construir uma casa para cada família, construir escolas, ir buscar
as famílias pessoalmente na Itália, fornecer alimentação aos colonos nos seis primeiros meses e entregar a
colônia totalmente emancipada ao Estado dentro do prazo de um ano, quando as 200 famílias tivessem sido
instaladas (CRUZ, 1955).
Como se pode deduzir da organização espacial da colônia apresentada por Penteado (1967) esperava-se
um empreendimento de grande envergadura para época, mas as exigências do contrato eram realmente incomuns
para a época. O contratante não conseguiu cumpri-las. Das 200 famílias previstas, só conseguiu introduzir 19,
totalizando 95 pessoas. O contrato foi rescindido em dezembro de 1899, o que praticamente eliminou a entrada
de mais estrangeiros na colônia. Mesmo assim, em 1900 a população da colônia havia aumentado para 917
pessoas, o que representa um salto de mais de 900%. Mas, destas apenas 37 eram italianas, outras eram
espanholas, belgas e a maioria brasileiras. Com o contrato rompido a colônia passou a ser administrada pela
Repartição de Colonização e Imigração. O núcleo se notabilizou durante vários anos pela produção de farinha
de mandioca, onde havia 18 fornos de cobre para a fabricação desse produto (CRUZ, 1955).
Com a expansão do município de Castanhal, as terras da antiga colônia foram incorporadas a esse
município. No momento da pesquisa, em 2006, não foi encontrado nessa área nenhum descendente dos agricultores
italianos trazidos por Cataruzza. Supõe-se que os italianos abandonaram a colônia e espalharam-se por vários
municípios da região bragantina.

Colônia Modelo de Outeiro

O surgimento da colônia de Outeiro parece estar diretamente relacionado com a criação em 1895 da
Hospedaria dos Imigrantes (Fotografia 1). Em terras ao lado dessa hospedaria foi criado um Núcleo Modelo,
que receberia imigrantes de várias nacionalidades, entre os quais os italianos (MUNIZ, 1916).
Com base num acordo firmado em 1899 com o governo da Itália, foi feita uma tentativa de instalar
imigrantes dessa nacionalidade na colônia de Outeiro. Pelo acordo, cada família receberia um lote de 25 hectares,
dos quais 10 metros quadrados já estariam desmatados e receberia ainda salário durante três dias por semana
para desmatar o resto do terreno; receberia também, ferramentas de trabalho, utensílios de cozinha e alimentação
gratuita nos primeiros seis meses. O acordo garantia ainda o repatriamento após seis meses, para os colonos
que não tivessem se adaptado ao clima (TRENTO, 1989). O historiador informa que apenas três das 12
famílias que aqui chegaram permaneceram no Pará. Outras foram repatriadas.
No Arquivo Público do Pará encontramos informações parciais sobre nove dessas doze famílias.
Localizou-se uma Declaração contendo a assinatura de nove chefes de família, todos do Veneto, que em 15 de
junho de 1899, pelo vapor Rio Amazonas, da companhia Ligure Brasiliana, sob a responsabilidade do senhor
Gustavo Gavotti, teriam vindo para Belém com a finalidade de se estabelecer em Outeiro. No documento
constam assinaturas dos chefes de família Pietro Montagnini, Giorgio Montagnini, Sisto Montagnini, Ângelo
Moi, Francesco Moi, Secondo Zapparoli, Ângelo Palachini, Antonio Gilioli e Ascanio Balavato. Observa-se que
além de pertencerem à mesma região, Vêneto (norte da Itália), a lista apresenta 3 chefes de famílias com o
mesmo sobrenome Montagnini e 2 com o mesmo sobrenome Moi. A relação familiar é evidente, uma vez que
eram provenientes da mesma região, talvez da mesma comuna e emigraram no mesmo navio, tendo em comum
a mesma área de destino. Em 1900, havia na colônia 11 famílias totalizando 47 pessoas, das quais apenas 7
eram italianas, outras eram espanholas, portuguesas e brasileiras. Em 1902, no governo de Augusto Montenegro,
o Núcleo Modelo de Outeiro foi declarado extinto e em 1904 foram expedidos títulos gratuitos de terra para
antigos ocupantes e 6 foram adquiridos por compra (MUNIZ, 1916).

268
Fluxos migratórios internacionais para a Amazônia brasileira do final do século XIX ... • Marília Ferreira Emmi

Fotografia 1 - Famílias de imigrantes italianos e espanhóis em


frente à Hospedaria de Imigrantes de Outeiro/PA, 1898.
Fonte: Caccavoni (1898 apud EMMI, 2008, p. 136)

Colônia Ianetama

A colônia Ianetama foi outro núcleo agrícola especificamente destinado a receber imigrantes
italianos. Ficava localizado à margem da estrada de ferro de Bragança a 19 km de Castanhal. Surgiu em
virtude de um contrato assinado entre o estado do Pará e o armador italiano Salvador Nicosia, em janeiro
de 1899, para a introdução de 200 famílias de agricultores italianos. Visava a criação de um estabelecimento
pecuário regular e a instalação de maquinismos especiais para o fabrico de banha e artigos que pudessem
ser produzidos com suínos (MUNIZ, 1916). A colônia, que totalizava aproximadamente 5.000 hectares, foi
preparada pelo Serviço de Terras do Pará, para receber os imigrantes. Com essa finalidade foram
demarcados 200 lotes de aproximadamente 25 hectares, construíram-se casas e foram abertas linhas e 12
travessas (PENTEADO, 1967).
Salvador Nicosia trouxe para a colônia 48 famílias. No Arquivo Público do Pará, encontram-se as listas
nominais dos membros dessas famílias que totalizavam 295 pessoas que embarcaram no porto de Gênova em
1899, com destino a Belém nos navios Rio Amazonas e Rei Umberto da companhia La Ligure Brasiliana.
Os documentos encontrados no Arquivo Público do Estado do Pará dão pistas das características pessoais
desses emigrantes, através das informações contidas no certificado de embarque assinado pelo chefe da família,
nos certificados de notoriedade onde se declarava a profissão (sempre de agricultor), de boa conduta, de residência,
certificados médicos e de condição familiar (certificados de pobreza). Das 48 famílias trazidas por Salvador
Nicosia para a colônia de Ianetama, foi possível recuperar informações sobre 29 famílias (Tabela 2) .
A Tabela 2 permite pontuar algumas evidências: tratava-se de uma imigração familiar. Na Itália, como
nas demais sociedades agrárias europeias, a família constituía a unidade principal da organização do trabalho.
A vinda para colônias agrícolas propiciava a preservação do trabalho familiar. Essas famílias vieram da Itália
em grupos nos mesmos navios, e no mesmo período. Quanto às regiões de origem, observa-se que esses
imigrantes formavam três grupos: do Vêneto (Itália Setentrional), vieram 32% enquanto que 58% vieram da
Campânia (Itália Meridional) e 10% da Sicília (Itália Insular) (Mapa 1). Observa-se ainda que muitos eram
provenientes das mesmas províncias e até mesmo das mesmas localidades, sugerindo migração em grupos.
As províncias com maior número de emigrantes foram Caserta e Nápoles (Campânia) e Padova (Vêneto).
A predominância dos vênetos e dos campanos entre os imigrantes italianos que vieram para o Brasil no fim do
século XIX já foi evidenciada por Trento (1989).

269
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabela 2 - Origem das famílias da colônia Ianetama

No. de Origem
Família pessoas Região Província Comuna

Penzo 5 Campânia Benevento Morione


Ruzzo 5 Campânia Benevento Morione
Monza 9 Campânia Caserta Gricignano
Russo 6 Campânia Caserta Gricignano
Trabbuco 3 Campânia Caserta Carniola
Torrecio 6 Campânia Caserta Carniola
Sinvaci 5 Campânia Caserta Aquino
Tersigni 4 Campânia Caserta Aquino
Ceraldi s/i Campânia Caserta Serra Aurunca
Reale 6 Campânia Caserta Serra Aurunca
Suppapola 4 Campânia Caserta Serra Aurunca
Vernile 5 Campânia Caserta Serra Aurunca
Di Ruzza 8 Campânia Caserta Castrocielo
Palermo 5 Campânia Nápoles Secondigliano
Viviano 6 Campânia Nápoles Secondigliano
Armênio 6 Campânia Nápoles Antimo
Accardo 13 Campânia Nápoles Boscotecrase
Pallavicino 11 Sicília Siracusa Scieli
Arrabito 9 Sicília Siracusa Scieli
Carbone s/i Sicília Siracusa Scieli
Sachetto 6 Veneto Rovigo Aobeia
Panavati 8 Veneto Rovigo Papaezze
Antrighess 9 Veneto Treviso Nervesa
Narciso 11 Veneto Padova S/I
Palazzo 4 Veneto Padova S/I
Civetta 5 Veneto Padova S/I
D’Angio 4 Veneto Padova S/I
Guagliariello 6 Veneto Padova S/I
Della Ciopa 5 Veneto Verona S/I
Fonte: Emmi (2008)

Das listas de colonos trazidos para Ianetama que se encontram no Arquivo Público do Pará infere-se
ainda que as unidades familiares trazidas por Salvador Nicósia eram nucleares, ou seja, formadas pelo casal
com filhos solteiros. Havia casos em que não correspondiam a esse padrão e traziam como agregados, pai ou
mãe do chefe, irmãos, sobrinhos, cunhados e em alguns casos sogro ou sogra do chefe. As famílias eram
numerosas, havia famílias com 9, 11 e até 13 membros. Mas, além da família nuclear pais e filhos, com frequência
eram relacionados outros parentes e até mesmo agregados. A família Accardo, por exemplo, era composta por
13 pessoas além da esposa e dos 6 filhos, estavam relacionados irmão, cunhada e sobrinhos (na realidade eram
duas famílias). A família Pallavicino (11 pessoas) era formada pela esposa, 5 filhos, sogros e cunhados; a
Pavanati, além de esposa e dos 2 filhos são relacionados 4 conviventes (agregados, todos adultos parecendo
compor outra família). Os chefes de família tinham em média 42 anos, as esposas 34 anos. Os casais tinham
em média 4 filhos, com idade variando entre 1 e 19 anos.

270
271
Fluxos migratórios internacionais para a Amazônia brasileira do final do século XIX ... • Marília Ferreira Emmi

Mapa 1 - Origem regional de imigrantes italianos que vieram para as colônias agrícolas. Mapa 2 - Regiões e províncias de maior incidência de imigrantes italianos para as
Annita Garibaldi, Ianetama e Modelo de Outeiro. cidades amazônicas.
Fonte: Emmi (2008, p. 145) Fonte: Emmi (2008, p. 160)
Migração internacional na Pan-Amazônia

Apesar dos esforços e gastos efetuados, Salvador Nicosia não conseguiu satisfazer o compromisso
com o Estado, que previa a introdução de 200 famílias, o que deu motivo à rescisão do contrato em 1899.
Passando a dirigir o funcionamento da colônia, o Estado destinou o restante dos lotes a imigrantes espanhóis e
a nacionais (nordestinos). Em 1900 nele viviam 99 famílias das quais 89 eram nacionais, 7 espanholas e apenas
3 italianas (MUNIZ, 1916).
As terras da antiga colônia de Ianetama hoje fazem parte da área urbana do município de Castanhal,
onde não se encontrou na pesquisa de campo qualquer referência a descendentes das famílias trazidas por
Nicosia. No final de 1899, com a rescisão dos contratos que haviam criado as colônias de Anita Garibaldi e
Ianetama, o governo paraense não concedeu mais autorização para a criação de novos núcleos. Continuava
haver apenas imigração espontânea, sem ônus para o tesouro do Estado.
Como uma primeira conclusão pode-se afirmar que as raízes das famílias italianas nas colônias do Pará
podem ser identificadas no período imperial, na colônia de Benevides, a qual não sobreviveu até 1900, e no
período republicano nas colônias de Anita Garibaldi, Ianetama e Outeiro. Entretanto a maioria das famílias não
permaneceu por muito tempo nesses núcleos coloniais, como nos casos analisados acima. Deduz-se que se
espalharam por vários municípios paraenses, sobretudo da região bragantina onde é fácil identificar descendentes
de italianos.
Em 1902, argumentando medidas de economia e o insucesso na fixação dos estrangeiros nas colônias
agrícolas, o governador do Pará, Augusto Montenegro, decidiu emancipar todas as colônias agrícolas. Esse foi
o fim da colonização agrícola com europeus no Pará. Todavia, ainda que a política de colonização tenha sido
redirecionada e não se incentive mais a vinda de estrangeiros, um segmento de italianos que desde o fim do
século XIX se direcionava às cidades amazônicas, continua chegando, às vezes em grandes levas, conforme
registram os jornais da época. Agora eles vêm por iniciativa própria, muitas vezes, motivados pelas “cartas de
chamada” de parentes que tiveram sucesso, sobretudo no comércio. Esses comerciantes vão chegando e se
localizando preferencialmente em Belém e Manaus e um segmento particular desses imigrantes vai se espalhar
por várias cidades amazônicas principalmente na região do baixo Amazonas.

ITALIANOS NAS CIDADES AMAZÔNICAS

Se os projetos de colonização agrícola do fim do Império e do início do período republicano constituíram


a porta de entrada dos italianos na Amazônia, há evidências de que paralela a essa imigração e além dela se
firmou uma imigração não dirigida pelo Estado, constituída por diferentes grupos de italianos que vieram se
fixar em cidades da Amazônia. Denominamos esse segmento de imigração espontânea de italianos para
cidades amazônicas.
A procedência regional dos italianos que vieram para as cidades amazônicas apresenta-se diversificada.
Algumas famílias vieram da Itália setentrional, das regiões do Veneto, Lombardia, Emilia Romagna, Piemonte
e Ligúria, como as famílias Calliari, Macola, Schivazappa, Urbinati, de Boni, Grandi, Dinelli, Bisi, Biondin e
Aliverti. Da Itália central, região do Lazio, vieram as famílias Del Pomo e Biolchini e da Toscana, as famílias
Cei, Camarlinghi, Ricci, Cardelli e Desideri. Da Itália insular, região da Sicília vieram as famílias Aita, Conti,
Emmi, Filipo, Malato e Renda.
Embora a origem regional possa pontualmente ser diversificada, a maioria dos imigrantes veio da Itália
meridional, principalmente de três regiões, Calábria, Basilicata e Campânia. Entre os meridionais, um grupo se
distingue dos demais que por motivações diversas aportaram na Amazônia. Esse grupo apresenta características
que o aproximam de uma corrente migratória que na literatura recente sobre imigração italiana vem sendo

272
Fluxos migratórios internacionais para a Amazônia brasileira do final do século XIX ... • Marília Ferreira Emmi

chamada de imigração calabro-lucano-campana (CAPPELLI, 2007). Esse segmento seria formado por
pequenos proprietários e artesãos originários da Calabria, Campânia e Basilicata (antiga Lucânia) que com
recursos próprios emigraram e se instalaram nas capitais e cidades do Norte e do Nordeste do Brasil. Constituiu
um grupo mais numeroso do que o da colonização dirigida para as colônias agrícolas e teve maior continuidade.
Seus descendentes ainda são encontrados em várias cidades amazônicas
Segundo Cappelli (2007) a corrente migratória calabro-lucana-campana tem particularidades que a
distinguem dos grupos que caracterizaram a grande imigração de massa em direção à América Latina.
Em primeiro lugar, por não ter procurado as grandes metrópoles como Buenos Aires e São Paulo, regiões
tradicionais de imigração italiana de massa, pelo contrário, dirigiu-se às áreas periféricas sem grande tradição
imigratória como Cuba, República Dominicana, Guatemala, Costa Rica, Colômbia, Equador e ainda regiões
periféricas como o Norte e o Nordeste do Brasil. Em segundo lugar, diferente dos grupos da grande migração
que se caracterizavam geralmente por serem segmentos constituídos por pobres e analfabetos - cujo
deslocamento era subsidiado pelo Estado – esse segmento era formado em sua maioria por pequenos
proprietários, e artesãos, pessoas que traziam pequenas economias e possuíam habilidades específicas (sapateiros,
funileiros, ourives, pintores) e algum grau de instrução.
A motivação de emigrar não estava, portanto, ligada diretamente a uma situação de miséria, mas se
circunscrevia dentro de uma vasta estratégia de mobilidade geográfica e social de grupos, na qual pesavam
fatores culturais. Em terceiro lugar, nas cidades de destino, esses imigrantes em sua maioria artesãos e pequenos
proprietários excluíam de seus horizontes a perspectiva de trabalho agrícola e do isolamento em ambiente rural.
Por outro lado evitavam, se possível, as grandes capitais, preferiam pequenos centros urbanos, onde exerciam
suas atividades artesanais aliadas a atividades comerciais. É preciso, portanto, compreender as lógicas e as
estratégias dessa corrente migratória a qual estruturando espontaneamente seus vínculos, ligações familiares e
parentais, valia-se da proteção de redes de amigos e de vizinhos, lembrando a identidade dos vilarejos, das
aldeias. Havia tendência de concentrar o fluxo migratório de cada localidade de origem em poucas destinações,
onde era possível de qualquer modo reproduzir os laços de solidariedade que deram vida ao projeto migratório,
para proteger e tornar produtivo o investimento inicial.
Os estudos sobre imigração italiana no período das grandes migrações apresentam uma constatação
comum: as dificuldades econômicas vividas pela Itália e o correspondente interesse das elites econômicas na
colonização (caso do Rio Grande do Sul e do Espírito Santo) ou em braços para a lavoura e o consequente
processo de proletarização dos imigrantes italianos em São Paulo (ALVIM, 1986). Todavia esses estudos não
podem ser generalizados para a Amazônia, uma vez que a corrente migratória dirigida às colônias agrícolas
teve existência efêmera, embora tenha deixado suas marcas na agricultura paraense. Por outro lado, a imigração
espontânea para as cidades não pode ser caracterizada como constituída por mão-de-obra assalariada; ela foi
composta predominantemente por pequenos proprietários e artesãos que aqui se dedicaram a vários tipos de
atividades como sapateiros, alfaiates, funileiros e se firmaram, sobretudo exercendo atividades comerciais.
Essa migração direcionada às cidades amazônicas é, pois, diferente da que foi para o Centro-Sul quanto aos
grupos envolvidos, expressão numérica, motivações, composição social, estratégias migratórias e atividades
econômicas exercidas. O papel dos italianos nas cidades amazônicas guardaria relativa aproximação com os
estudos de Constantino (1991) sobre os moraneses (calabreses) em Porto Alegre, com o diferencial sobre a
composição regional dessa corrente e sua localização em municípios distantes das capitais.
A existência na Amazônia de um segmento dessa corrente migratória originária da Calábria, Basilicata
e Campânia pode ser deduzida a partir de dados sobre cerca de cem famílias relacionadas por Emmi (2008,
p. 168-170) que teriam chegado à região nas últimas décadas do século XIX e se localizado em várias cidades

273
Migração internacional na Pan-Amazônia

onde seus membros se firmaram principalmente como comerciantes. Dados levantados no Vice-Consulado da
Itália em Belém, nas entrevistas realizadas com filhos de alguns desses imigrantes, aliados às informações de
relatórios de viajantes italianos do início do século XX, como Ronca (1908) e Aliprandi e Martini (1932) permitiram
uma relativa aproximação com o universo dessa imigração. Pode-se deduzir dessas informações que nas últimas
décadas do século XIX e início do século XX começaram a chegar à região famílias de pequenos proprietários
e artesãos italianos que, vindo com algum recurso, montaram suas casas comerciais em cidades amazônicas,
uma vez que o comércio era a principal atividade econômica impulsionada pela valorização da borracha no
mercado internacional.
O segmento de italianos que se dirigiu às cidades amazônicas fixou-se nas capitais do Pará e do Amazonas,
Belém e Manaus, e em alguns municípios localizados ao longo do rio Amazonas e de seus principais afluentes,
por onde circulava o capital mercantil decorrente da economia da borracha. Mas, mesmo com o declínio dessa
economia muitos permaneceram nessas cidades.
As cem famílias relacionadas certamente representam somente uma amostra do fluxo de italianos
originários desses lugares que procuraram as cidades paraenses e amazonenses como destino final de sua
migração, refere-se apenas aos imigrantes que compareceram ao vice-consulado para solicitar registro ou
documento, ou ainda aos que foram citados nas entrevistas e fontes consultadas.
Quanto à região de origem, a maioria das famílias veio da Basilicata (60%), todas da mesma província
(Potenza), e principalmente da comuna de Rivello (localidade de San Costantino) e da comuna de Castelluccio
Inferiore (Mapa 2).
Quanto às cidades de destino, as famílias que vieram de Castelluccio Inferiore localizaram-se
principalmente em Belém e Manaus, enquanto as que vieram de San Costantino di Rivello, localizaram-se
preferencialmente em municípios do baixo Amazonas onde se fixaram alguns grupos familiares que
posteriormente através de “cartas de chamada”, faziam vir da Itália parentes e amigos, como demonstra a
existência dos mesmos troncos familiares que se fixaram em várias cidades. Quanto às famílias que vieram da
Calábria (24%), todas eram da província de Cosenza, principalmente das comunas de Papasidero e Laino
Borgo e localizaram-se em Belém e em Manaus. Da Campânia (16%) as famílias das províncias de Salerno
localizaram-se preferencialmente em Belém, as originárias de outras províncias fixaram-se em cidades do
interior do Pará. Essas evidências tomam força na literatura especializada que ressalta a proximidade geográfica
no destino de migrantes originários das mesmas regiões onde é possível reproduzir os laços de solidariedade e
contar com a proteção de redes familiares e vicinais (CONSTANTINO, 1991; CAPPELLI, 2007).

TRAJETÓRIAS E ESTRATÉGIAS MIGRATÓRIAS

As trajetórias foram diversificadas. Embora boa parte das famílias italianas tenha vindo diretamente
para cidades amazônicas, sobretudo aquelas que já contavam com a presença de um parente ou amigo na
cidade de destino, outros passaram por cidades do Centro-Sul ou do Nordeste, antes de se fixarem na Amazônia.
Mas, houve imigrantes que saindo da Itália, seguiram trajetória diversa que incluía passagem por outros países
da América Latina, como Venezuela e Colômbia.
A emigração dos italianos com destino às cidades amazônicas, seja ela direta ou com paradas
intermediárias, de um modo geral dava-se por etapas. Primeiro vinham os homens (chefes de família ou solteiros),
depois de estabelecidos mandavam buscar suas esposas e filhos ou ainda, voltavam à pátria para buscá-los. Se
solteiros, voltavam à Itália para contrair matrimônio ou para completar o serviço militar e em alguns casos

274
Fluxos migratórios internacionais para a Amazônia brasileira do final do século XIX ... • Marília Ferreira Emmi

partiam como voluntários para lutar na guerra. Em alguns casos, os imigrantes economicamente bem sucedidos,
chamavam parentes e amigos para auxiliarem em seus empreendimentos. Esse convite era formalizado através
da “carta de chamada”, na qual quem desejava promover a vinda de um parente ou amigo, comprometia-se
diante do governo brasileiro, através do Delegado de Polícia do Município, a fornecer os recursos necessários
a sua subsistência durante todo o tempo da sua permanência no Brasil, ou repatriá-lo se não pudesse tê-lo sob
sua responsabilidade. Esse documento era exigido pelo consulado para emissão do passaporte. Foi através
desse mecanismo, que segundo as entrevistas, um número significativo de pessoas da localidade de San Costantino
de Rivello, gradativamente foram chegando para diversas cidades do baixo Amazonas.
As “cartas de chamada” também eram utilizadas quando por algum motivo o imigrante pretendia voltar
para a Itália e desejava deixar seus negócios nas mãos de um parente, que posteriormente podia também
chamar outros parentes. O sentimento de família era muito forte, sendo comum que esses imigrantes geralmente
se casassem com noivas italianas que haviam deixado na própria terra quando da sua viagem para o Brasil, ou
com filhas de outros italianos que já se encontravam radicados no país. Os casamentos na própria comunidade
contribuíam para manter as tradições e costumes e consequentemente, para olhar a região para qual emigrou
como uma extensão da Itália (ANDRADE, 1992; BASSANEZZI, 1996). Estes elementos mostram claramente
uma estratégia social de integrar famílias que teceram laços econômicos e matrimoniais. Alguns entrevistados
relatam casamentos frequentes entre famílias que emigraram juntas, as quais muitas vezes já possuíam relações
de parentesco em seu lugar de origem, ou seja, membros de famílias emigrantes eram casados entre si já na
Itália. Outros casamentos aconteceram no Brasil entre seus descendentes, reforçando a rede de parentesco.
Nas cidades, os italianos procuravam morar em ruas do centro comercial. A motivação principal dos
primeiros imigrantes seria a proximidade do local de trabalho, ou ainda, porque a casa tinha geralmente a dupla
função de comércio e residência. Os que chegavam depois preferiam também essa localização porque podiam
contar com uma rede de apoio nos primeiros anos de imigração. Segundo informantes, os italianos radicados
em Belém davam suporte a outros italianos que chegavam à capital; aqueles que não tinham parentes na cidade
se hospedavam nas pensões de senhoras italianas, geralmente localizas no centro comercial, ou nas casas de
outros italianos.
Os depoimentos registrados na pesquisa indicam que muitos italianos que se fixaram nas cidades
amazônicas trouxeram além da experiência de sua pátria, outros elementos culturais, econômicos e sociais
acumulados ao longo da viagem por vários estados brasileiros e países da América Latina. Essa bagagem
acumulada certamente produziu um diferencial em sua condição de imigrante e de certo modo, favoreceu não
só o exercício de atividades econômicas, como também propiciou melhor integração na sociedade local. Por
outro lado as diferentes estratégias migratórias – migração por etapas, casamentos endogâmicos, proximidade
da localização das moradias – serviram para o estabelecimento de redes familiares ou vicinais onde buscavam
apoio, sobretudo nos primeiros anos de imigração. As fortes ligações que os originários das mesmas localidades
mantinham nos países de destino não constituíram, entretanto, obstáculo ao processo de integração desses
italianos nas cidades amazônicas, ao contrário, foram muito rápidos graças às limitadas dimensões quantitativas
das comunidades de imigrantes.

CONTRIBUIÇÃO DA IMIGRAÇÃO DE ITALIANOS À ECONOMIA AMAZÔNICA

Com as riquezas decorrentes da borracha, o poder público direcionava parte dos recursos financeiros
para a implementação de um processo de modernização das cidades. Os italianos inseriram-se em diferentes
setores da economia. Houve uma experiência na colonização agrícola, entretanto, o crescimento urbano

275
Migração internacional na Pan-Amazônia

propiciava condições favoráveis e criava um mercado de atividades de prestação de serviços que atraiu boa
parte dos imigrantes que chegavam às cidades. Por outro lado os que traziam algumas economias, geralmente
empregaram seus capitais na criação de estabelecimentos comerciais nas capitais e em cidades por onde
circulavam as riquezas que a economia da borracha propiciava. Houve casos em que a habilidade artesanal
evoluiu para a criação de fábricas de sapatos ou proporcionou a criação de alfaiatarias e ourivesarias; ao lado
destes, alguns permaneceram exercendo atividades de menor qualificação como engraxates, jornaleiros,
marceneiros, pedreiros, entre outras.
A experiência de implantação de colônias agrícolas com imigrantes italianos foi datada (final do século
XIX) e pontualmente localizada às margens da estrada de ferro de Bragança e em áreas próximas a Belém. Se
essa experiência não resultou no fortalecimento do setor agrícola na região, de acordo com os objetivos que
nortearam a criação das colônias agrícolas, ainda assim pode-se avaliar um saldo positivo no sentido de permitir
a introdução de novos processos de tratar a terra com os conhecimentos que os europeus traziam resultando
num incremento da produção e desenvolvimento agrícola (CRUZ, 1963).
Nem todos os imigrantes destacaram-se no plano econômico. Para uma parcela dos imigrantes a vida
nas cidades amazônicas foi permeada de dificuldades e para sobreviverem desempenhavam funções consideradas
subalternas. Na construção da sociedade amazônica também contribuíram muitos imigrantes com seu trabalho
anônimo de engraxates, jornaleiros, verdureiros, carregadores, estivadores, ferreiros, vendedores ambulantes e
outras profissões de menor prestígio social. Uns ofereciam seus serviços de porta em porta como consertos de
sombrinhas e utensílios domésticos; outros tinham banca de engraxate próximo do terminal do trem ou no
comércio, onde também consertavam sapatos.
Todavia nas cidades amazônicas a principal atividade econômica exercida pelos calabreses, lucanos e
campanos foi o comércio. Por que de pequenos proprietários e artesãos tornaram-se principalmente comerciantes?
A resposta a esta questão necessita situar historicamente a estrutura econômica da Amazônia que acolheu
esses imigrantes.
O panorama econômico do Pará em 1870 era de relativa prosperidade, uma vez que exportava uma
quantidade significativa de produtos extrativos como cacau, castanha, algodão, couros e peles. A partir de 1877
quando a exploração extrativa da borracha passa a registrar acentuada subida de preços e os capitais e força
de trabalho são canalizados para essa exploração é o momento em que se assiste uma corrida em direção à
Amazônia e no bojo dessa corrida vem também um seguimento de imigrantes italianos que conseguem se
firmar embora de maneira subordinada, ao capital mercantil predominante na época.
Em Belém, o comércio dos italianos era mais direcionado ao atendimento das necessidades das populações
urbanas, principalmente gêneros alimentícios, materiais de construção, joias, confecções e calçados que muitas
vezes eram produzidos nas fábricas dos comerciantes, ou seja, aliavam a fabricação ao comércio.
O sucesso comercial desses italianos, as redes familiares que os apoiavam e a sua integração na
sociedade local, estimularam outros imigrantes que mesmo com a crise da borracha, conseguiram permanecer
no comércio, fundaram novas casas comerciais e nelas se mantiveram atuantes por muitas décadas.
Os imigrantes italianos também tiveram participação significativa nos primórdios da indústria paraense.
O recenseamento industrial de 1920 registra a existência de 15 estabelecimentos industriais pertencentes a
italianos, nos estados do Pará e do Amazonas, empregando 166 operários. Entretanto, Costa (1924) chama
atenção para empreendimentos de maior porte, pertencentes a italianos que haviam se instalado no Pará no
início do século XX. Destaca, por exemplo, a importância da participação de italianos na indústria de
beneficiamento de sementes oleaginosas para a economia paraense na década de 1920, quando foram criadas
duas usinas em Belém, a Victoria e a Conceição.

276
Fluxos migratórios internacionais para a Amazônia brasileira do final do século XIX ... • Marília Ferreira Emmi

A literatura destaca também a importância dos italianos na instalação das primeiras fábricas de calçados
na Amazônia. Nesse setor destacou-se a fábrica Boa Fama em Belém que era de propriedade do senhor Nicola
Conte, natural de Casteluccio Inferiore, província de Potenza, região da Basilicata. Tendo chegado ao Pará em
1907, Nicolau começou a trabalhar de forma artesanal e em 1912 montou sua fábrica adquirindo máquinas movidas
a eletricidade. A Boa Fama foi considerada como a primeira fábrica de sapatos do Norte do Brasil.
O estabelecimento tinha cerca de 200 empregados de ambos os sexos, sendo alguns italianos e a maioria constituída
por brasileiros. A produção diária era de 1.500 pares de sapatos que eram exportados não somente para os estados
do Norte e do Nordeste do Brasil como também para a Guiana Francesa e o Peru (COSTA, 1924).
Os italianos que se radicaram no Pará montaram seus estabelecimentos comerciais não somente em
Belém, mas em varias cidades do interior paraense, principalmente na região do baixo Amazonas: Santarém,
Juruti, Óbidos, Oriximiná, Alenquer, Terra Santa e Faro
Tal como em Belém, a empresa comercial dos italianos no baixo Amazonas era familiar. Os negócios
eram tocados pelos proprietários, filhos e muitas vezes pela esposa e filhas. Os sócios geralmente tinham algum
grau de parentesco: irmãos, primos, cunhados, tios ou ainda amigos da mesma província/localidade de origem,
o que reforçava os laços e as redes familiares. Mas, a clientela desses estabelecimentos não se restringia aos
patrícios, pois era composta também por moradores da região. Havia italianos que vinham trabalhar com
amigos e parentes e ao melhorar suas condições econômicas, se instalavam como comerciantes, com casas
próprias ou em sociedades com amigos e parentes. Alguns comerciantes bem situados funcionavam como
intermediários entre comerciantes de menores posses e as firmas comerciais localizadas em Belém.
Os que tinham maiores posses iam várias vezes à Itália em visita a familiares, o que não aconteceu com
a maioria deles. Havia certa hierarquia entre esses comerciantes que era não só marcada pelo pioneirismo na
penetração na região como também pelo porte e pela solidez da firma no fornecimento de mercadorias aos
aviados que criavam certas relações de dependência. Passavam muitas vezes por esses “patrões” italianos a
obtenção de créditos de comerciantes do baixo Amazonas junto às casas aviadoras localizadas em Belém,
entre as quais, Ferreira Costa & Cia, Ferreira D’Oliveira & Sobrinho e A. Monteiro da Silva, de comerciantes
portugueses que também eram proprietários de navios e barcos utilizados pelos italianos do baixo Amazonas em
suas viagens a Belém (ALIPRANDI; MARTINI, 1932).

CONCLUSÕES

A reconstrução da história social da imigração italiana na Amazônia do final do século XIX à primeira
metade do século XX, privilegiando as relações sociais, econômicas e políticas desse processo constituiu o
principal foco desta pesquisa. Na compreensão dessa realidade regional é importante investigar a participação
desses imigrantes como um dos agentes da história regional, elementos da estrutura social vigente. Não se
conhecem famílias de imigrantes italianos possuidoras de uma grande fortuna na Amazônia, embora seus negócios
tenham perdurado por várias gerações assegurando uma continuidade de tradição familiar e de trajetórias que
definem seu campo. Alguns conseguiram amealhar pequenas fortunas e ocupar posições de destaque na vida
profissional, artística e política.
Com longa trajetória no processo histórico é impossível perceber todos os passos dos italianos, todas
suas formas de inserção social, todos os mecanismos utilizados na construção e reconstrução da identidade. Ao
identificar-se com a região de destino o italiano passou a inserir com sua presença, no conjunto do quadro
étnico-cultural da população amazônica, um novo elemento, diversificando e enriquecendo esse quadro étnico-
cultural. A presença italiana é reconhecida pela importância econômica e cultural que representou. Sendo em

277
Migração internacional na Pan-Amazônia

número pequeno, esses italianos não constituíram núcleos fechados nas cidades amazônicas e rapidamente
passaram a fazer parte delas. Hábitos de poupança e de operosidade concorreram para o êxito dos imigrantes
e para sua integração. Por outro lado, o papel esperado de estrangeiro é de indutor de novidades. Nesse
sentido, novos hábitos foram introduzidos, inclusive na culinária com o uso de massas e o consumo de verduras
e legumes, produto de suas hortas caseiras.
A entrada dos italianos, nesse espaço de tempo, foi marcada por momentos de maior ou menor intensidade
de fluxos e pelo ingresso de grupos oriundos de diferentes regiões e províncias, com trajetórias distintas. Essa
imigração é, de um modo geral, explicada como decorrente de transformações sócio-demográficas e de mudanças
provocadas pelo capitalismo na pátria-mãe. Entretanto, a identificação de diferentes grupos deste processo
migratório, impulsionados por diversas motivações, levou a alargar a compreensão sobre as causas da emigração.
O fenômeno migratório é muito complexo e não é redutível mecanicamente a causas estritamente econômicas,
outras motivações, como por exemplo, os aspectos culturais têm peso significativo.
Deste modo, sob uma ótica interdisciplinar procurou-se compreender as razões dos vários segmentos
de italianos que, no contexto das grandes migrações, se deslocaram para a Amazônia. As grandes explicações
teóricas que privilegiam as causas econômicas dão conta da motivação do deslocamento de uns segmentos, a
exemplo do formado por agricultores que vieram subsidiados pelo Estado para as colônias agrícolas. No
deslocamento do grupo de artesãos e pequenos proprietários, que vieram com recursos próprios e se instalaram
com estabelecimentos comerciais em cidades amazônicas, outras motivações, além das econômicas, nortearam
esse processo. A pesquisa também mostrou a propriedade de analisar o fenômeno migratório na sua dupla
dimensão, de fato coletivo e itinerário individual (SAYAD, 1998). Mesmo levando em conta a força das
circunstâncias históricas e das condições socioeconômicas embutidas no processo que motivaram as populações
a emigrar, havia espaço para as decisões e ações dos sujeitos históricos envolvidos (indivíduos e/ ou famílias)
nesse processo, como testemunham os depoimentos dos entrevistados. Esses depoimentos revelaram que a
decisão de emigrar era geralmente tomada em conjunto com a família. Mesmo quando se tratava de uma
partida individual, a decisão de partir raramente se configurava como uma atitude isolada. Aliás, no contexto da
vida familiar de províncias italianas originárias da maioria dos imigrantes, a emigração era uma estratégia
praticada de longa data, tendo em vista a melhoria das condições de vida, do padrão profissional e econômico
dos indivíduos e/ ou famílias e algumas vezes da própria sobrevivência.

278
Fluxos migratórios internacionais para a Amazônia brasileira do final do século XIX ... • Marília Ferreira Emmi

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279
Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX: ... • Edilza Joana Oliveira Fontes

IMIGRAÇÃO E MERCADO DE TRABALHO


NA AMAZÔNIA DO FIM DO SECULO XIX:
O CASO DOS PORTUGUESES EM BELÉM DO PARÁ

Edilza Joana Oliveira Fontes1

INTRODUÇÃO

Este texto objetiva discutir a imigração portuguesa, o mercado de trabalho, e a formação da classe
operária de Belém, capital do Pará, na virada do século XIX para o século XX, no período de 1884 a 1914. É um
estudo sobre imigrantes portugueses pobres, trabalhadores de pequenos estabelecimentos num período específico
da história de Belém.2
A escolha desse período surgiu da necessidade de entender a conjuntura da efervescência da sociedade
amazônica no período áureo da economia da borracha do ponto de vista da formação de um mercado de
trabalho urbano. Esse é um tema pouco explorado pela historiografia sobre a região. A maioria de estudos
disponíveis sobre essa época concentra-se na discussão da urbanização de Belém, deixando de lado as profundas
mudanças ocorridas em relação à formação da classe operária e às organizações sindicais.
A escolha de imigrantes portugueses se deu em virtude de pensar a formação do mercado de trabalho
em Belém como fruto de diversidades múltipas inclusive do ponto de vista das nacionalidades. A historiografia
local da época apresenta Belém como uma urbe cosmopolita e lócus de variadas experiências, onde se cruzaram
e se re-elaboraram novas identidades. Os portugueses viveram nessa época numa cidade portuária, que era
ponto de partida de todo tipo de mercadorias para o interior do estado e da região, e “porta de saída” das
exportações da borracha para o mundo. Uma cidade onde os bancos, as casas aviadoras e as empresas
vinculadas à prestação de serviços urbanos exigiram um mercado de trabalho que se formou dialogando com
trabalhadores vindos de diversas partes do mundo, que traziam na bagagem suas experiências de vida e lutas
sindicais.
Abordam-se elementos de uma cultura do trabalho vinculada a imigrantes portugueses pobres buscando
entender suas lógicas, como eles articularam suas lutas, e como viveram a defesa do que eles consideravam
seus “direitos.” Uma cultura do trabalho, possível de analisar tendo como um dos objetos de estudo as
manifestações públicas, onde se expressaram especificidades dos processos de trabalho de várias categorias.
Procurou-se descobrir os significados que estes imigrantes deram a suas vidas. Estudo difícil de realizar, já que
os sujeitos pesquisados deixaram poucos registros sobre suas experiências, o que obrigou a “ouvi-los” a partir

1
Doutora em história, professora da Faculdade de História da Universidade Federal do Pará. E-mail: edilzafontes@yahoo.com.br.
2
Este texto sintetiza a tese de doutorado defendida na UNICAMP em 2003 (FONTES, 2003).

281
Migração internacional na Pan-Amazônia

de fontes esparsas, ainda que as mesmas, quando produzidas, não tivessem por objetivo registrar os desejos e
pensamentos desses trabalhadores (GUINZBURG, 1984).
Começa-se com uma discussão dos projetos imigrantistas dos diversos governos da província do Pará
de atrair europeus para suprir a falta de mão-de-obra na agricultura deixada pela abolição da escravatura e
formar uma civilização calcada na sociedade europeia da época, e da propaganda elaborada e divulgada para
atrair esses imigrantes para a Amazônia. Posteriormente se tecem considerações sobre o processo de imigração
portuguesa para o Pará nesse período (1894-1914) tentando identificar suas particularidades em relação à
imigração portuguesa no país. Esta parte se vale principalmente de registros inéditos feitos pelo Consulado de
Portugal em Belém e existentes no Grêmio Literário Português de Belém. Em seguida se analisa a inserção da
mão-de-obra portuguesa na formação do mercado de trabalho urbano em Belém da época. Finalmente, se
discorre sobre o quotidiano dos portugueses residentes em Belém, destacando suas lutas, reivindicações e a
condição da mulher portuguesa na sociedade belenense.

PROJETOS IMIGRANTISTAS NO ESTADO DO PARÁ E PROPAGANDA

No momento histórico da crise gerada pelo fim da escravidão brasileira, os debates acerca das relações
de trabalho foram acalorados. No Pará, o debate sobre a falta de braços foi intensificado no período após a
Cabanagem, quando autoridades e fazendeiros exerceram políticas de controle e de reorganização do trabalho,
legislando sobre os chamados corpos de trabalhadores, que estabeleciam formas compulsórias de recrutamento
e aplicação da força de trabalho não escrava.
A analise dos projetos apresentados pelos vários setores econômicos no parlamento indica diversos
caminhos para a constituição de um mercado de trabalho assalariado ou não escravo no Pará. Uma das
propostas apresentadas foi a substituição do trabalho escravo pelo trabalho do imigrante europeu3.
A possibilidade de atrair para a região Norte parte da corrente imigratória que se dirigia para outros estados
vinha ao encontro do sonho de construir na Amazônia uma civilização nos moldes das sociedades da Europa
ocidental. Diversos governos da província, ao longo de muitos anos, discutiram a decadência da agricultura,
e a consequente carência de produtos alimentícios para a população, como resultado da escassez de
mão-de-obra para aquele fim.4
A elite política e agrária do Grão-Pará pretendia solucionar o problema da falta de braços pela constituição
de um mercado de trabalho numeroso, disciplinado e dependente. Para alcançar este objetivo, os vários governos
da província procuravam implantar uma série de políticas públicas, que iam desde a promoção da imigração
subvencionada pelo Estado, passando pela tentativa de utilização do indígena e da mão-de-obra nordestina, a
elaboração de códigos de postura municipais destinados a controlar os hábitos e profissões na cidade,
regulamentação de contratos para subvenção de imigrantes, e a administração de colônias agrícolas. Conforme
constata Weinstein (1993) a elite política do Pará não pensava em um só projeto para obtenção de braços,
divergindo apenas sobre que setor produtivo seria prioritário para alocação dos trabalhadores: o extrativo
(borracha) ou o agrícola.

3
A diminuição da dependência do trabalho escravo é tema de debate, desde meados do século XIX entre plantadores de café da Baixada
Fluminense e do Oeste Paulista (STOLCK; HALL, 1984). No Pará, sobre o debate da falta de braços para a agricultura após o fim da
Cabanagem, ver Fuller (s.d).
4
Por exemplo, no Relatório de Governo do Presidente da Província de Ângelo Thomaz Amaral (1861, p. 62), o presidente pedia ajuda para
o caso, pois “necessitava-se tirar a agricultura da rotina que a entorpece”. Ver também o Relatório apresentado à Assembleia Legislativa
Provincial na segunda sessão da 17ª Presidência da Província (PARÁ, 1871. p. 68).

282
Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX: ... • Edilza Joana Oliveira Fontes

Os debates nos jornais paraenses da época indicam que os defensores da imigração europeia para o
Pará eram acusados de obterem vantagens econômicas e políticas com a entrada de novos colonos (QUEIROZ,
1998). A província era também vista com pouco poder político junto ao Império para garantir verbas para
subvenção da imigração, alem de que a extração do látex era vista como a principal fonte econômica, e as
atividades advindas desta economia eram pouco atrativas ao imigrante europeu.
A imigração espontânea era defendida por setores vinculados à economia da borracha que eram contra
o sistema de núcleos de coloniais agrícolas, por entenderem que estes espaços seriam centros conservadores
das tradições dos imigrantes, criando dificuldades de assimilação para o fortalecimento da nação5.
Em 05 de dezembro de 1885, a lei nº 1.232 autorizava à presidência realizar o embarque de imigrantes
para a província. Com base nesta lei, o cônsul brasileiro na Inglaterra foi autorizado a proceder ao embarque de
famílias escocesas, bem como a divulgar propaganda em prol da imigração para o Grão-Pará6. Buscava-se
certo tipo de imigrante: “honesto, trabalhador, imaculado, não o lixo das cidades europeias.”7
Através das notícias dos jornais percebe-se que existia uma relação entre nacionalidade e trabalho.
Alguns consideravam o português como o único que se aclimataria e se fixaria na Amazônia, muito embora não
gostasse do trabalho agrícola. Percebe-se um projeto de vinculação do imigrante ao trabalho no campo.
A discussão de um mercado de trabalho assalariado e industrial não seria o objetivo da imigração, não é para
este setor que se deveriam dirigir os imigrantes. O comércio e o trabalho do porto já estariam satisfeitos com os
imigrantes portugueses.

5
O Diário de Belém era contra a instalação de trabalhadores europeus na colônia de Benevides, onde havia demasiado favor do governo
provincial para os imigrantes. Comparando São Paulo ao Pará, o redator afirmava: “Aqui tudo é achatado, estreito e pequeno, por que
tudo e todos são dominados pelas considerações pessoais e datados nos interesse dos partidos e da capangagem; em São Paulo, procura-se
um objetivo levantado e nobre e as ideias substituem os homens, sobrepondo o interesse das causas públicas ao dos partidos. Procedemos
por modo idêntico, e, deixamos na sombra os indivíduos, cogitamos do que interessa a coletividade, preparando o futuro da província e
lançando os fundamentos de sua civilização. As gerações que passam não são mais do que administradores de gerações por vir” (Diário de
Belém, 1886, 4 de abril).
6
“Com os documentos que agora são remetidos ao Sr. Silva de Paranhos, esta sua excelência habilitado para uma propaganda discreta como
é necessária para que tenhamos bons imigrantes. A grande escolha na matéria esta no sucesso completo dos primeiros imigrantes para
consegui-lo tão inteiro, como o convenio não é suficiente a nossa lealdade para com os imigrantes e sim, que estes sejam escolhidos no
seio do trabalho em círculos honestos, gente imaculada, conforme a expressão do Sr. Sant’Anna Nery, porque ao lixo das cidades européias,
aos deslocados da dignidade e da honra, não há o que satisfaça. E por isso que deve ser discreta a nossa propaganda na Europa e mais discreta
ainda a aceitação de imigrantes. E neste sentido que mais precisamos do Sr. Silva de Paranhos e de todos nossos agentes na Europa, é neste
empenho solicitamos o seu concurso” (Diário de Belém, 1886, 12 de fevereiro).
7
Mas não todos concordavam com a propaganda ostensiva. No dia 8 de julho de 1887, em artigo transcrito pelo Diário de Notícias, o
redator afirmava que era preciso não fazer grande propaganda pela imprensa, por brochuras, mas estabelecer agências, fazer conferências,
exposições de produtos amazônicos coordenados por pessoas habilitadas. A discussão sobre qual imigrante seria melhor para a província
do Pará era outro debate na Sociedade local: “Somos pelo povoamento d’esta fértil região, seja de que modo for. Que se faça o
povoamento, eis a nossa idéia, seja pela imigração estrangeira, seja pelo elemento nacional. Nós de modo algum, combatemos a imigração
estrangeira, mas as experiências de muitos annos, os factos observados, a opinião de pessoas competentes por nós citadas, demonstram
cathegorigcamente que a Amazônia será povoada pelo elemento nacional antes que pelo estrangeiro. Mas, perguntamos, que se atreverá
a negar esta nossa asserção, filha da experiência e da observação, e não emittida levianamente, com o fim único de fazer écho?...O único
estrangeiro, que vem para o Pará e que aqui se acclimata, é o portuguez; o portuguez não estranha o clima, adopta os nossos costumes e
não tarda em fazer família com a nossa família. Mas não passa d’isso, o portuguez ou é commerciante, ou é catraieiro. O francez, inglez,
allemão, etc., etc., esses não são nada. Quando muito, empregam-se em industrias, aliais muito preciosas, como relojoarias, etc., etc. Os
brazileiros, emigrados de outras Províncias, é que tem dado impulso benéfico á nossa população. O que era a colônia Benevides? Essa
colônia foi creada pelo presidente Benevides, que mandou vir, á custa de enorme sacrifício do Estado, immigrantes allemães, italianos,
francezes, etc., etc. Instalados na colônia, não tardaram a zarpar para esta capital abandonando todos os largos favores do governo, para
virem aqui esmolar á caridade pública ou empregar-se na gatunagem, com raras excepções. Em 1878, estando na presidência o exm sr. Dr.
Bandeira de Mello, nós, que ora redigimos este diário, pedimos-lhe pela imprensa, que encaminhasse os retirantes cearenses para essa
colonia, distribuindo-lhes lotes de terra. Elle assim o fez, e o resultado foi o mais satisfactorio, não deixando nada a desejar. Eis porque nós
aconselhamos ao governo, a que se aproveite da população nacional, em preferência a estrangeira, porque nós fundamos na experiência
e na observação dos factos. Entretanto, não somos contra a immigração estrangeira; tomaremos nós que ella viesse em grande escala”
(Diário de Notícias, 1889, 17 de agosto).

283
Migração internacional na Pan-Amazônia

Os defensores da imigração estrangeira para o Pará não eram contrários à extração da goma elástica.
O presidente da província Tristão Araripe afirmava em 1886:
A Província do Pará é uma das que, no vasto território brasileiro, se acha em melhores condições
para receber uma forte corrente de imigração estrangeira... pois sempre me pareceu muito
exclusiva a opinião de que só a agricultura constitui a riqueza e felicidade dos povos.
A extração da borracha é incontestavelmente trabalho mais bem remunerado que qualquer
agrícola. Plante o colono o arroz, o milho, o algodão e outros produtos agrícolas, que para
todos encontrará preços muito superiores aos de qualquer Província do Brasil. Mas plante
também a goma elástica, porque bastar-lhe-à plantar 100 árvores, o que é muito pouco, em
cada ano, para ao cabo de 20 anos ter uma grande fortuna (ARARIPE, 1886, p. 21).

A fala de Araripe é simbólica em relação a esta questão, pois defendia a economia extrativa e a vinda
de imigrantes ao mesmo tempo em que defendia um projeto para o trabalho destes imigrantes que não estavam
vinculados à extração da goma elástica por entender que nos seringais, aonde se destinavam os cearenses
havia papéis bem definidos para cada trabalhador. Ao seringal deviam ir os nordestinos, para as colônias
agrícolas os imigrantes.
Os setores econômicos e políticos que pretendiam uma diversificação da economia local não encaravam
a extração da borracha como um obstáculo para o desenvolvimento da agricultura no Pará. Não há indícios de
qualquer ação política por parte dos governos, no Império ou na República, de tolhimento das atividades extrativas,
ações de cerceamento, de controle dos espaços dos seringais, ou de controle da exploração da força de trabalho
dos nordestinos. Pelo contrário, o setor extrativista esteve sempre muito à vontade para exercer suas atividades.
Os defensores da atividade agrícola chamavam muita atenção para a dependência da economia paraense em
relação à extração da borracha, e propunham um desenvolvimento agrícola que viesse socorrer a falta de
alimentos no estado. Para esse setor, o trabalhador paraense era culpado pela decadência da economia.8
Os setores ligados à agricultura reclamavam sempre da falta de investimentos na área. Eles tentavam
mostrar a importância da produção de alimentos para o mercado consumidor, principalmente para a capital.
O discurso de crítica às atividades extrativistas era um argumento político para a obtenção de verbas do erário
público. Esse argumento era também elemento diferenciador em relação aos “outros”, ou seja, era através da
agricultura que se pressupunha a consolidação definitiva de uma sociedade civilizada. A extração da borracha
seria uma atividade “passageira”, não traria futuro para a região. No rastro desses dois projetos havia um
consenso: a falta de braços para a extração da borracha e para a agricultura. Os projetos de trazer imigrantes
estrangeiros estariam de acordo com o setor vinculado a agricultura enquanto a vinda de cearenses atenderia
ao setor extrativo. Os dois projetos não eram excludentes.
Nesse sentido o governo paraense desenvolveu algumas estratégias para atrair migrantes europeus.
O conselheiro Francisco José Cardoso Junior afirmava em 1887 que, como todos os países da América Latina,
o Brasil necessitava de “Uma corrente bem dirigida de imigrantes, que venha explorar as nossas riquezas
naturais, dando-hles valor perante os grandes mercados do mundo pellas transformações que nella opera um
trabalho inteligente e uma indústria de ação com os progressos científicos” (PARÁ, 1871, p. 49).

8
“Em vez de cuidarem da lavoura, que daria vida, energia e influencia as povoações, obrigando a capital a remeter-lhes avultadas somas de
dinheiro em troca dos gêneros cultivados: os habitantes desprezam esses poderosos recursos a pretexto de falta de braços; aplicam o que
lhes restam unicamente a extração de drogas, principalmente da borracha, sem reservarem nenhum para lavoura. Não há duvida que a
borracha, em quanto reservar o preço excepcional a que tem chegado, dá de sobra aos habitantes, para se vestirem e se alimentarem, mas
esta vantagem para o tempo presente trás consigo um grande mal inevitável para o futuro da Província. Já hoje começa a descobrir-se
parte d’esse grande mal futuro; os habitantes do interior, compram na capital a farinha, o arroz, o café, o açúcar, o peixe, enfim todos os
gêneros alimentícios, que cada um podia ter de sobra em sua casa! E isto nada menos de que uma demonstração da decadência da economia
da Província; e como em alguns municípios já a agricultura esta extinta, e a própria capital já importa de outras Províncias quantidades
consideráveis de farinha, milho, arroz e café que outrora ella recebia do interior, pode-se ter uma idéia dos resultados futuros reser4vados
a Província, si a população continuar, como é provável, a entregar-se exclusivamente na extração de produtos naturais com completo
abandono da agricultura” (PARÁ, 1871, p. 49).

284
Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX: ... • Edilza Joana Oliveira Fontes

Para ele não era necessário insistir na importância da imigração e todos deveriam cuidar para que ela
ocorresse. A região estaria “à espera” do trabalho inteligente da indústria que aqui deveria ser implantada.
Discorda da idéia de que só as províncias do Sul do Império estariam preparadas para receber a imigração
europeia, principalmente devido ao clima, “impossibilitando a região Norte do Brasil para servir de centro ao
desenvolvimento da população estrangeira”. O conselheiro discordava de que a região amazônica fosse inóspita,
cheia de moléstias, epidemias e endemias que, para ele, eram doenças exportadas, e criticava o governo do
Império por priorizar somente a imigração para o Sul do país “de modo que a nossa província ficaria condenada
a esperar que a ação lenta do tempo viesse influenciar no desenvolvimento dos variadíssimos gêneros de
indústrias que offerece a explloração das imensas riquezas que produz em seu seio” (PARÁ, 1871, p. 49).
Contudo, uma política de colonização agrícola e de imigração na província do Grão-Pará, no fim do
Império, só seria possível com subsídios do governo central, dada a situação econômica da província que
arrecadava pouco em relação à exportação da borracha que crescia todo ano, embora a taxação dos impostos
beneficiasse principalmente os cofres do Império. Mas a província tomou medidas próprias para estimular esta
migração. No Relatório do Governo à Assembleia Legislativa Provincial, em 1871, se afirmava que,
Felizmente a iniciativa provincial tomou para si a honrosa tarefa de constituir-se “poderoso
propulsor do movimento” e a Assembléia Legislativa do Pará, compreendendo todo o alcance
da questão, vota no orçamento de 1886 a verba de 100 contos de réis para imigração, verba
que foi conservada no orçamento hoje em vigor (PARÁ, 1871, p. 49).

Os governos provinciais do Pará tentaram estabelecer núcleos coloniais e deram início à construção da
estrada de ferro de Bragança para viabilizar a imigração, mas não foi possível desenvolver grandes projetos
dada a falta de recursos, advinda da centralização fiscal do Império. O desejo de maior autonomia e de maior
participação nas receitas advindas da exportação da borracha e a falta de atenção do governo central para com
a região fizeram com que as críticas ao governo imperial fossem acirradas.
Em 15 de julho de 1887 foi criada a Sociedade Central de Imigração com a qual o governo da província
tentou demonstrar que o Pará e o Amazonas tinham condições de atraírem uma corrente de imigrantes europeus
e comunicou ter contratado ao sr. José Sant’Anna Nery9, para fazer a propaganda na Europa, na qualidade de
agente da imigração. O sr. Sant’Anna Nery era obrigado a fazer a propaganda necessária para atrair os
imigrantes e tornar conhecidas as condições da província por meio de conferências, publicações e de um guia
para os imigrantes. Estabeleceu-se também que deveria haver uma exposição permanente dos produtos paraenses
em Paris e o governo imperial se comprometia em pagar a passagem da Europa até o Brasil.
Mas Santa’Anna Nery não recebeu os recursos necessários do governo imperial e a Assembleia
Legislativa Provincial tampouco aprovou o contrato para alocação de imigrantes feito com ele. Uma reportagem
do Diário de Noticias de 3 de outubro de 1887 permite perceber que na Europa a imagem que se tinha da
região era de que aqui se morria de moléstias, que era terra de índio, que não era possível viver neste clima e
que os costumes religiosos não respeitavam a diferença:
deixemos que a onda imigratória do estrangeiro venha espontaneamente, quando se a capacitar
de que a Amazônia vem encontrar todos os benefícios; quando se convencer de que o nosso
clima não atrofiador, o nosso território não é pestilento, a nossa civilização não é semi-
bárbara, a nossa religião não é intolerante.

9
Frederico José Sant’Anna Nery (1848-1901), fundador na Europa (Paris), da Sociedade Internacional de Estudos Brasileiros. Paraense e
conhecido por Barão Sant’Anna Nery. Bacharel em Letras e Artes na França e em Direito pela Universidade de Pádua, na Itália, jornalista
e diplomata. Autor de várias obras entre elas: La Civilization dous l’Amazonas, 1884 e Lê Pays dês Amazonie, 1885.

285
Migração internacional na Pan-Amazônia

O debate sobre a imigração foi, pois, intenso e levantou uma série de questões. Entre elas a disputa por
um mercado de trabalho europeu. Isto levou os estados do Sul do país a realizarem intensa propaganda contra
a imigração para o Norte, visto que essa era a saída para a lavoura do Sul e do Sudeste do país. Havia uma
disputa pelas verbas destinadas a subvenção da imigração no final do Império e depois nos primeiros governos
republicanos.
A preocupação em construir uma imagem positiva da região foi uma questão central na virada do século
XIX, e colocou governos, jornalistas, intelectuais, seringalistas, comerciantes e agricultores expressando suas
opiniões sobre a região e suas necessidades. Em 1900, o governador do estado do Pará, Dr. José Paes de
Carvalho10, mandou organizar uma brochura chamada O Pará em 1900, para comemorar os 400 anos de
descobrimento do Brasil. Os estudos dessa brochura foram produzidos de forma que os homens de letras e
ciências do final do século XIX, falassem sobre o Pará, e foi organizada com o objetivo de divulgar o estado,
tentando acabar com a imagem de que no Pará era impossível prosperar uma sociedade “civilizada”11.
Os intelectuais procuram demonstrar o grau de progresso e civilidade alcançada pelo estado, contrapondo-se
a uma imagem distorcida e ignorante da Amazônia projetada do sul, como terra de índio, insalubre e pestilenta.
Nos documentos produzidos, Belém é apresentada como uma cidade onde o acesso ao mar era fácil,
com praças ajardinadas e ruas arborizadas e iluminadas pela eletricidade. Suas praças são apresentadas como
as mais belas da América do Sul, suas vias públicas largas eram ladeadas por mangueiras, amendoeiras e
palmeiras. “As estalagens e cortiços, tendendo a diminuir, estão sujeitos a rigorosa vigilância”. A empresa de
limpeza pública seria responsável por varrer diariamente todas as ruas e praças já calçadas e remover para o
forno crematório o lixo de toda a cidade e os animais mortos, assim como manter limpas as bocas de lobo e as
calhas das ruas. O forno crematório é apresentado como um dos grandes símbolos da modernidade de Belém.
Construiu-se, enfim, uma imagem de Belém com ruas largas e compridas, iluminadas e com a brisa da baía, de
um espaço urbano higienizado, sadio e fora dos perigos de infecções, sem possibilidade de haver contato direto
com o chão, com a terra, e com as impurezas advindas do solo.
A imagem da cidade também é construída como um espaço urbano que teria um governo eficiente,
administrada por um conjunto de princípios para torná-la “civilizada”. Fica claro que o controle da cidade e do
espaço urbano passa por uma estrutura a ser montada com organismos e seções responsáveis por tomar
decisões sobre as políticas públicas a serem aplicadas no meio urbano, não deixando transparecer os sujeitos
históricos interessados em controlar a cidade. Há uma “despolitização” da realidade histórica em nome da
técnica (CHALHOUB, 1996).
Belém nesse momento é o espaço urbano remodelado para servir de palco a uma elite exportadora do
látex; de um mercado de trabalho sem conflito. Os discursos dos intelectuais da época expressam um projeto
para construir uma civilização nos trópicos e, para executá-lo, se propõem políticas públicas em nome da mais
moderna ciência. Era o jogo político no sentido da disputa pelo poder para implementar variadas “políticas
públicas” que vinham beneficiar uma parte das elites econômicas do Pará.

10
José Paes de Carvalho era médico, foi Governador do Pará, presidente do partido republicano e senador federal em 1890. Quando da
proclamação da república era presidente do clube dos republicanos e junto com Justo Chermont e o capitão Marco Antônio Rodrigues,
impôs que o presidente da província Dr. Silveira Cavalcante de Albuquerque entregasse o governo do estado por uma junta governativa.
11
A introdução foi feita pelo Barão de Sant’Anna Nery, a parte geográfica física, pelo Barão de Marajó, a de reinos da natureza, pelo
Dr. Emilio Goeldi, a sessão sobre Metereologia e climatologia foi escrita pelo Dr. Gonçalo Lagos, uma outra parte sobre Natalidade,
Nupcidade e mortalidade pelo Dr. Godinho, a parte sobre higiene foi descrita pelo Dr. Américo Campos, que escreveu também notícias
sobre a Patologia médica no Pará; sobre Etimografia quem escreve é José Verissimo e a parte sobre Geografia política do Pará, pelo
Dr. Inácio Moura. Há ainda uma sessão sobre Notícias históricas assinada por Arthur Viana e, por fim, uma parte sobre a Imprensa do Pará,
de Paulinho de Brito (PARÁ, 1900).

286
Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX: ... • Edilza Joana Oliveira Fontes

Na brochura O Pará em 1900, o Pará foi apresentado como um território vasto, com uma grande
costa, com fácil comunicação dada pela natureza através do sistema hidrográfico, fazendo contato com outros
estados e países da América Latina. Os campos de pastagens do estado são expostos como promissores para
a criação de gado, podendo, em um futuro ultrapassar, os do Rio Grande do Sul e a floresta como grande fonte
de oportunidades de extração vegetal e de terras disponíveis para plantação. Reforça-se a ideia da utilização da
caça de animais silvestres como fator econômico, dada a venda de peles nos mercados consumidores da
América do Sul, como as de pacas, capivaras, onças pintadas, cutias, antas, veados, alem de galináceos e o pato
bravo. Apresentava-se uma floresta disponível às ações humanas, à espera da civilização; uma floresta a ser
“domesticada”. A mata seria um celeiro pronto à ação daquele que se dispusesse a trabalhar e usufruir das suas
benesses. A floresta não apresentaria perigo e sim um espaço completamente desabitado e cheio de riquezas.
A proximidade geográfica com a Europa, a facilidade de comunicação com o continente americano e
com o resto do Brasil, era um argumento forte para demonstrar a possibilidade de escoamento da produção e
para comunicação com o mundo civilizado. Era necessário convencer que a vinda para a região não pressupunha
o isolamento do mundo. Informava-se que não faltaria alimentação, que não haveria perigo de ataques de
animais selvagens, e que os ventos, os rios e a umidade do ar contribuíam para amenizar o calor e viabilizar a
vida nos trópicos.
A insistência em detalhar as vias de comunicação, a navegabilidade dos rios, os produtos nativos, a
possibilidade de produção e escoamento das mercadorias, e os demais argumentos a favor da habitabilidade da
região deixam ver que havia uma tese central na elaboração da brochura O Pará em 1900, que era a construção
permanente do estado do Pará como terra do “progresso” e do “poder vir”. Era “o paraíso na terra” com um
espaço possível de o europeu viver que estaria à espera de suas atividades.

A IMIGRAÇÃO PORTUGUESA PARA O BRASIL

Pereira (1993, p. 11) comenta o tardio reconhecimento da problemática da imigração portuguesa para
as Américas como um campo de análise, em relação a outras nacionalidades:
Por motivos vários, um deles muito surpreendente, era a falta de consciência, que até uns dez
anos atrás existia no principal país americano de destino, o Brasil, acerca da dimensão da
componente portuguesa na imigração: não faltavam estudos sobre os italianos, espanhóis,
até japoneses ou iugoslavos. A imigração portuguesa era, pelo contrário, mal conhecida e a
componente demográfica de origem portuguesa era encarada como uma espécie de herança
dos tempos coloniais.

Nessa mesma linha de raciocínio Scott (2000) justifica o tardio estudo da imigração portuguesa para o
Brasil pela não utilização dos “mesmos mecanismos de inserção na sociedade receptora que eram empregados
pelos outros imigrantes”, acrescidos da língua comum entre brasileiros e portugueses e a rede informal de
solidariedade e inserção no mercado de trabalho constituído por imigrantes portugueses. Estes elementos,
entretanto, não explicam a lacuna dos estudos, mas a aceitação nos meios acadêmicos da noção de “irmandade”,
que possibilitou, por algum tempo, não se pensar a imigração portuguesa como um tema dentro dos estudos
sobre estrangeiros no Brasil. O português não era pensado como um “outro”.12
Os estudos da imigração portuguesa no Brasil se intensificam somente na segunda metade do século
XX. Leite (2000) aponta que entre 1880 e 1900 entraram no país cerca de 332.293 portugueses, e que houve

12
Acerca da noção do “outro” ver vários trabalhos de antropologia cultural, entre eles Da Matta (1991) e Geertz (1989).

287
Migração internacional na Pan-Amazônia

grandes picos de imigração portuguesa em 1883 (12.509), 1891 (32.349), 1893 (28.986), 1895 (36.055), 1889
(15.240) e 1890 (25.174).
Alguns estudos apontam como uma das razões para a imigração o “mito da fortuna” (PEREIRA, 1993).
Muitos vinham ganhar a vida no Brasil, fazer fortuna, com o objetivo de voltar para Portugal. A imigração
portuguesa no fim do século XIX trouxe para o Brasil pessoas pobres, originárias do norte e do nordeste de
Portugal, vindas do Minho, D’Ouro e Trás-os-Montes. Segundo Matoso (1988), havia um Portugal no Brasil
formado pelos imigrantes. Nos anos de 1912 e 1913 a emigração das províncias do norte de Portugal provocou
taxas negativas de crescimento demográfico, sendo que a maioria dos emigrantes (82%) se dirigia para o
Brasil. Aqui procuravam construir um grupo fechado mais ou menos organizado, que buscava manter uma
identidade e fortes ligações com o país de origem. Segundo a mesma fonte, daqueles que aqui chegavam 30%
retornava. Predominavam os homens adultos, solteiros, com ocupação no comércio a retalho das grandes
cidades. Os portugueses foram, dentre os imigrantes, os que menos casavam com brasileiras; fundaram escolas,
jornais, hospitais, bibliotecas, clubes e outros tipos de associações. Entre 1860 e 1890, teriam saído de Portugal
cerca de 400.000 pessoas, e só na década de 1890, 305.000. Em 1890, Vianna (1922) calculava entre 150.000
e 200.000 imigrantes portugueses no Brasil.
A emigração de Portugal era uma das mais elevadas da Europa. Em 1888 ultrapassava 200.000 o número
de emigrantes para o Brasil, devido a crise na agricultura portuguesa; vinham fugindo da proletarização (KLEIN,
1989). O fim da escravidão no Brasil, a facilidade da língua e os laços históricos, a proclamação da República,
os salários mais altos que os de Portugal, a crença que poderiam ser pequenos proprietários agrícolas, e a fuga
do serviço militar em Portugal foram fortes incentivos para a vinda para o Brasil. Conforme Klein (1989):
Deve-se ainda considerar que, além de o Brasil oferecer as vantagens da mesma língua e
religião, os salários eram mais altos no Rio de Janeiro do que em São Paulo (os dois mercados
de mão-de-obra mais dinâmicos do Brasil) e do que em Portugal. A dificuldade de acesso à
terra, a limitada oportunidade de trabalho urbano, em virtude do lento processo de instalação
do capitalismo, a precária condição de vida e de saúde pública, o risco do serviço militar no
país natal e os atrativos já mencionados do Brasil, faziam o imigrante arrostar a exploração nos
preços das passagens, os riscos da travessia do oceano em condições de falta de higiene,
espaço e alimentação adequados, os abusos dos agentes e companhias de engajamento nos
preços do transporte e nos contratos de trabalho, a dificuldade de controle do cumprimento
das leis e contratos no Brasil, pelos cônsules portugueses. No caso da migração clandestina,
os riscos e abusos ainda eram maiores.

A análise da população de Portugal em 1896 indica que 67,5% da mão-de-obra era agrícola. Esta
característica continua até 1911, quando a mão-de-obra desce a 57,4% de agricultores. Os portugueses que
emigravam eram, prioritariamente, das províncias do norte. A província do Minho, considerada o centro da
nacionalidade portuguesa, era a mais importante área de emigração, seguida pela Beira Litoral e o Distrito do
Porto (LOBO, 2001).
Os portugueses que vieram dessas províncias estavam já semi-proletalizados, eram também trabalhadores
artesanais com atividades em manufaturas e indústrias localizadas próximo de suas posses agrícola e desenvolviam,
também, atividades nas oficinas das fazendas. Os emigrantes, já com laços bastante corroídos em relação a sua
condição camponesa, eram principalmente adultos do sexo masculino que costumavam mandar para Portugal
remessas de dinheiro da sua poupança para ajudar a família.
Esses imigrantes recusaram-se a trocar de nacionalidade quando da proposta do Governo Republicano
em 1890. Em janeiro desse ano pode-se perceber o exaltado patriotismo dos imigrantes portugueses no Brasil.
À notícia do ultimato seguira-se uma gama de reuniões das associações portuguesas dos vários estados, que
chegou a Portugal sob forma de mensagens e notícias. O cônsul de Portugal em Belém emitiu diversos

288
Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX: ... • Edilza Joana Oliveira Fontes

comunicados avisando que o Consulado ficaria aberto o dia inteiro e daria toda a assistência para os súditos
portugueses que quisessem continuar com a nacionalidade lusa13.
No Brasil, os portugueses se espalharam por diversas regiões do país. Em 1929 o Pará era o quinto e
Amazonas o sexto estado de maior concentração portuguesa no país com 15.631 e 8.376 pessoas respectivamente,
representando juntos cerca de 4% do total; e em nível de cidades, Belém se manteve como o terceiro maior
destino dos portugueses no Brasil, só ficando atrás do Rio de Janeiro e Santos, indicando assim, a atração que
a economia da borracha exerceu para a vinda de imigrantes ao Pará neste período; mas, ao contrário do que
apontam alguns autores (LOBO, 2001; VENÂNCIO, 2000), a imigração portuguesa para a Amazônia continuou
mesmo após a decadência da economia da borracha.

PORTUGUESES NO PARÁ

Sem dúvida a imigração lusa para a Amazônia não teve a mesma amplitude que aquela para o Rio de
Janeiro ou São Paulo no início do século XX, mas não foi desprezível do ponto de vista da sua importância.
A imigração portuguesa para a região era antiga e se ampliou com o advento da exploração da borracha
(FONTES, 1993). Durante o período de 1870 a 1920 a imigração, não só de portugueses, mas de espanhóis,
italianos e árabes, foi intensa, principalmente para as capitais do Pará e do Amazonas (EMMI, 2008).
Existe no Grêmio Literário Português de Belém um acervo de vários códices de habilitações dos
portugueses residentes no Pará de 1858 a 195914. São fichas individuais registradas pelo Consulado português
contendo: nome, número de habilitação, idade, estado civil, emprego no Brasil, data da habilitação, transporte
utilizado na viagem, características físicas, documentos apresentados, data da primeira e segunda chegada,
província, conselho e distrito de origem e procedência, residência no Brasil e contrato. Ainda que representem
somente uma amostra, já que nem todos os portugueses poderiam ter se habilitado, esses registros permitem
detalhar o perfil dos portugueses no Pará com dados que os censos e outras fontes não apresentam. É o que se
faz a seguir.

ORIGEM

Esses imigrantes eram originários principalmente das províncias de Douro, Minho, Beira Alta, e Beira
Baixa (Tabela 1). Segundo Pereira (1993), em geral, a emigração portuguesa era “muito elevada” nas Ilhas,
“elevada” no Nordeste de Portugal e “baixa” na região Sul. No caso do Pará, era da região Norte de onde os
imigrantes mais vinham.

13
Consulado de Portugal. “Em virtude do art. 1º do Decreto de 15 do corrente mês, aplicativo de 15 de dezembro do ano passado, ambos do
governo provisório do Brazil. Este consulado avisa aos súditos que se achavam nesta província no dia 15 de novembro passado e queiram
manter a sua nacionalidade e ainda não tenham feito declaração respectiva na Intendência Municipal, o podem fazer neste consulado até
dia 15 de junho próximo vindouro, data da terminação do prazo, para cujo effeito o expediente deste consulado começará às 8 horas e
terminará às 5 horas da tarde nos dias úteis. Consulado do Pará, 21 de maio de 1890 – O Chanceler vice-cônsul encarregado do Consulado”.
14
Este período conta com algumas interrupções como o volume de 1894, devido à quebra de relações diplomáticas entre Portugal e Brasil
e do ano de 1912, que foi extraviado. As habilitações reiniciam no ano de 1913, indo até 1959. As habilitações encontradas foram
preenchidas no período de 13 de fevereiro de 1858 até 1959. O primeiro códice inicia com o número 323 e termina em 10 de dezembro
de 1860 com a habilitação de No 1000. As primeiras habilitações podem ter ocorrido num período próximo a 1858, apesar de existir
informações da organização do Consulado Português ao tempo da Cabanagem. De 1844 a 1914 houve um total de 3.580 habilitações. Este
acervo representa uma importante fonte para reproduzir a historiografia paraense, e não se tem notícia de nenhum outro pesquisador
tê-lo utilizado até o momento.

289
Migração internacional na Pan-Amazônia

A maioria partiu de Lisboa, Leixões, e Porto; e uns poucos fizeram parada em Rio de Janeiro ou outros
lugares (Tabela 2). A pouca incidência de portugueses que já teriam passado pelo Rio de Janeiro, se comparada
com a imigração massiva de portugueses para essa região do Brasil, indica que os imigrantes já faziam as suas
escolhas no embarque em Portugal, sendo pouco frequente a mobilidade interna dentro do Brasil.
A atração da mão-de-obra se dava diretamente no exterior, através de agenciadores ou mesmo migrando
clandestinamente.15 O “engajador” era um personagem que atuava entre o imigrante e as companhias ou
entidades ligadas diretamente ao recrutamento da mão-de-obra.

Tabela 1 - Províncias de origem dos portugueses Tabela 2 - Lugar de procedência dos portugueses
habilitados no estado do Pará, 1884-1914 habilitados no estado do Pará, 1884-1914

Província Número absoluto % Lugar de procedência Número absoluto %

Douro 1.249 34,89 Lisboa 1.888 54,25


Minho 479 13,38 Leixões 606 17,41
Beira Alta 337 9,41 Rio de Janeiro 121 3,48
Beira Baixa 272 7,60 Porto 96 2,76
Traz dos Montes 148 4,13
Outros lugares 95 2,73
Extremadura 116 3,24
Pernambuco 40 1,15
Alentejo 12 0,34
Funchal 13 0,37
Algarves 7 0,20
Vigo 13 0,37
Madeira 7 0,20
Manaus 11 0,32
Oriental dos Açores 2 0,06
Ilha de São Miguel 1 0,03 Madeira 10 0,29

Açoure 1 0,03 Maranhão 6 0,17

Arquipélago de Cabo Verde 1 0,03 Bahia 5 0,14


Sem informação 948 26,48 Sem informação 676 16,55
Total 3.580 100,00 Total 3.580 100,00
Fonte: Elaborada a partir de dados retirados das Fichas de Habilitação de Portugueses residentes Fonte: Elaborada a partir de dados retirados das Fichas de Habilitação de Portugueses residentes
no Pará/Consulado Português. Grêmio Literário Português, Belém. no Pará/Consulado Português. Grêmio Literário Português, Belém.

LUGAR DE RESIDÊNCIA EM BELÉM

A maioria dos imigrantes registrados no Consulado, durante o período estudado, se concentrava no município
de Belém, mas também se encontraram alguns de Abaetetuba (2), Anajás (1), Benevides (1), Bragança (2),
Porto de Mós (1), Óbidos (4), Oeiras (1), Melgaço (1), Gurupá (1), Curralinho (1), Irituia (1), Ourem (1), São
Miguel do Guamá (2), Macapá (5), Maracanã (1), Monte Alegre (1), Mosqueiro (3), Cametá (4), Rio Madeira
(4), Santarém (2) e Vigia (1). O registro de imigrantes nestes outros lugares justamente na época de efervescência
da economia da borracha, mesmo sendo pouco representativos, é relevante, já que muitos desses lugares
detinham seringais e extraíam a goma elástica (PARÁ, 1900)

15
Um auto de Chefatura de polícia de Belém registra que no dia 23 do mês de junho de 1888 chegou a Belém José do Carmo Benthalo da
Matta, de 30 anos de idade, natural de Villas Bons, da freguesia de Santa Maria Madalena do Reino de Portugal. Declarou que vivia da
lavoura e da venda de vinhos. Ele foi acusado de chegar sem passaporte ao viajar no vapor inglês “Lisbonense”, vindo de Portugal.
Declarou também que não tinha passaporte porque este seria entregue pelo capitão do navio dentro do vapor (Auto de Chefatura de
Polícia de 1888. Doc. n. 50. Autos de crimes de diligências policiais relativamente a ter o português José do Carmo Benthalo da Matta).

290
Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX: ... • Edilza Joana Oliveira Fontes

Analisando os lugares de moradias de 3.154 habilitações catalogadas no Consulado de Portugal em Belém,


no período estudado, foram registrados 2.539 endereços em Belém, sendo os bairros de maior concentração o
Comércio, a Cidade Velha e a Campina (Tabela 3) e os endereços mais frequentes eram nas ruas do Comércio
(Santo Antonio, Rua Conselheiro João Alfredo, Rua 15 de Novembro) (Tabela 4).

Tabela 3 - Barrios com maior frequência de moradores portugueses


habilitados em Belém, 1884-1914*

Bairro Número absoluto


de endereços %
Bairros de maior incidência de endereços
Comércio 878 34,58
Cidade Velha 333 13,12
Campina 289 11,38
Reduto 174 6,85
Umarizal 145 5,71
Nazaré 100 3,94
Jurunas 14 0,55
Canudos 13 0,51
Cóndor 11 0,43
Pedreira 5 0,20
Batista Campos 2 0,08
Bairros de menor incidência de endereços 575 22,65
Total 2.539 100,00
Fonte: Elaborada a partir de dados retirados das Fichas de Habilitação de Portugueses residentes no Pará/Consulado
Português. Grêmio Literário Português, Belém.
*Total de habilitações analisadas por endereço 2.539.
Total de habilitações com maior incidência de endereços 1.964.
Total de habilitações de menor incidência de endereços 575.

Os bairros e as ruas mais frequentados eram os mais movimentados de Belém na época. Na década de
1900, Belém tinha na zona portuária, onde abundavam trapiches de madeira, uma zona comercial subdividida
pela disposição das casas de comercio, bancos, companhias de seguro e outros estabelecimentos. Havia
calçamento na maior parte das ruas da Cidade Velha e do Comércio e algumas delas do bairro do Reduto eram
calçadas com paralelepípedos de granito. As ruas do bairro do Comércio eram largas e grandes, parte das
calçadas eram feitas com pedras vindas de Portugal. O bairro da Campina era o novo bairro de moradia
beneficiado pelas linhas de bondes à tração animal, mas era também bairro de moradia de trabalhadores
imigrantes e onde se localizavam ruas destinadas ao comércio e à prática da prostituição (TRINDADE, 1999).
Percebe-se que os trabalhadores do comércio, caixeiros e comerciantes, procuravam morar no bairro onde
trabalhavam, ou seja, Cidade Velha, Comércio, Reduto, Umarizal e Campina (Tabela 5). Sobressai a Rua 15 de
novembro com 117 moradores em total, dos quais 54 (45,15%) eram de trabalhadores do comércio. Outro
endereço importante era a Avenida Conselheiro João Alfredo (antiga Rua dos Mercadores), com 2 trabalhadores,
35 trabalhadores do comércio, 19 caixeiros e 21 comerciantes. Provavelmente esses caixeiros moravam nas
casas comerciais dividindo por vezes o espaço de moradia com os seus patrões; constituindo, todos juntos,
redes de solidariedade e uma cultura do trabalho.

291
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabela 4 - Ruas mais frequentes dos endereços das moradias dos portugueses habilitados em Belém, 1884-1914

Rua Número absoluto % Bairro


Endereços

Tv. Santo Antônio 124 4,88 Comércio


Rua 15 de Novembro (ou Imperatriz) 117 4,61 Comércio
Tv. de São Matheus 102 4,02 Campina
Rua Conselheiro João Alfredo (ou Mercadores) 87 3,43 Comércio
Tv. 28 de Setembro (Rua dos Mártires) 85 3,35 Reduto
Av. São Jerônimo (ou José Malcher) 80 3,15 Umarizal
Rua da Indústria 76 2,99 Comércio
Rua de Bragança 66 2,60 Cidade Velha
Tv. Frutuoso Guimarães 53 2,09 Campina
Rua Assis de Vasconcelos 51 2,01 Cidade Velha
Tv. Campos Salles 47 1,85 Comércio
Tv. Padre Prudêncio 44 1,73 Comércio
Tv. 7 de Setembro 43 1,69 Comércio
Rua Lauro Sodré 40 1,58 Cidade Velha
Av. 16 de Novembro 40 1,58 Comércio
Rua Senador José Malcher 36 1,42 Umarizal
Rua Paes de Carvalho 35 1,38 Comércio
Av. Boulevard (ou República) 35 1,38 Comércio
Av. da Independência (Magalhães Barata) 34 1,34 Nazaré
Av. São João 29 1,14 Cidade Velha
Av. Conselheiro Furtado 28 1,10 Nazaré
Tv. Ocidental do Mercado 27 1,06 Comércio
Tv. das Mercês 26 1,02 Campina
Tv. Primeiro de Março 23 0,91 Campina
Tv. Primeiro de Março 23 0,91 Comércio
Rua Aristides Lobo 23 0,91 Reduto
Av. Almirante Tamandaré 22 0,87 Campina
Tv. Marquês de Pombal 22 0,87 Cidade Velha
Tv. Benjamin Constant 22 0,87 Reduto
Av. Nazaré 21 0,83 Nazaré
Praça Saldanha Marinho (Largo dom Quartel ou Praça da Bandeira) 20 0,79 Comércio
Rua Boaventura da Silva 20 0,79 Umarizal
Rua da Trindade 19 0,75 Campina
Rua do Norte (ou Siqueira Mendes) 19 0,75 Cidade Velha
Rua General Gurjão 19 0,75 Comércio
Rua do Imperador 19 0,75 Comércio
Tv. 22 de Junho 17 0,67 Cidade Velha
Tv. Demétrio Ribeiro 17 0,67 Cidade Velha
Rua Arypreste Manoel Theodoro 16 0,63 Campina
Tv. São Pedro 16 0,63 Cidade Velha
Est. de São José 16 0,63 Comércio
Largo do Palácio 16 0,63 Comércio
Tv. 15 de Agosto 16 0,63 Reduto
Est. do Arsenal 15 0,59 Cidade Velha
Praça da República 15 0,59 Reduto
Rua Nova de Santa Anna (Manoel Barata) 14 0,55 Comércio
Tv. do Passarinho 12 0,47 Campina
Estrada da Constituição 12 0,47 Nazaré
Travessa da Piedade 12 0,47 Reduto
Tv. 14 de Março 11 0,43 Condor
Tv. Santo Amaro 10 0,39 Cidade Velha
Bairros de menor incidência de endereços ou endereços não identificados 747 29,42
Total 2539 100,00
Fonte: Elaborada a partir dos dados retirados das Fichas de Habilitações de Portugueses Residentes no Pará. Consulado Português. Grêmio Literário Português.

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Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX: ... • Edilza Joana Oliveira Fontes

Tabela 5 - Trabalhadores habilitados como profissionais do comércio, por rua de moradia em Belém, 1884-1914
Profissões
Rua do endereço Bairro Trabalhador
Trabalhador Caixeiro Comerciante Total
do comércio
Tv. S. Matheus Campina 11 22 03 16 52
Tv. Frutuoso Guimarães Campina 08 13 01 08 30
Rua Bragança Cidade Velha 11 11 02 02 26
Rua Conselheiro João Alfredo Comércio 02 35 19 21 77
Rua 15 de Novembro Comércio - 54 06 18 78
Tv. 28 de Setembro Reduto 09 25 07 17 58
Av. S. Jerônimo Umarizal 06 10 03 10 29
Indústria Comércio 11 22 02 10 45

Total 62 228 57 112 459


Fonte: Elaborada a partir de dados retirados das Fichas de Habilitação de Portugueses residentes no Pará/Consulado Português. Grêmio Literário Português, Belém.

As redes de solidariedade ou de vizinhança foram responsáveis pela introdução e alocação de imigrantes


no Pará. Muitos vinham aos cuidados de um tio, de um irmão, do pai, ou recomendados a antigos vizinhos ou
amigos. A importância destas redes de solidariedade pode ser observada na análise de autos policiais. Neles
vários portugueses demonstram sua inclusão em diversas redes de convivência estabelecidas no mundo do
trabalho e no espaço de moradia.
Um caso exemplar é a acusação feita por Clemente de Souza, português, artista, morador da Travessa
Pedro I, ao subdelegado de polícia do 4º Distrito, em 188916. Segundo o depoente, ele teria sido ameaçado
diversas vezes pelo português João Pinto dos Reis que morava na rua da Municipalidade. Clemente afirmava
que João:
[...] é um homem truculento, que vive continuadamente embriagado, espancando a mulher
com quem mora, incomodando os vizinhos que quer dia e quer noite (...) no dia 16 do corrente,
as 5 horas da tarde, o referido Reis foi ao estabelecimento onde trabalha o queixoso armado e
dizendo que onde o encontra-se havia de pica-lo [...] querendo viver em paz e sossego, requer
a vossa senhoria que depois de ser interrogado as testemunhas, seja João Pinto obrigado
assinar termo de bem viver.

Clemente de Souza apresentou à polícia três testemunhas para depor a seu favor: Augusto Belo, Domingos
Pereira e Manoel Ferreira, todos portugueses como Clemente e amigos de trabalho do queixoso.
Augusto Belo era caixeiro e morava na Municipalidade e defendeu Clemente dizendo que este foi
protegido pelos seus companheiros de serviço, quando João foi até a cerâmica onde Clemente trabalhava,
tentando feri-lo. Reafirma também que João era dado ao vício da embriaguez, perturbava a tranquilidade
pública dos seus vizinhos, ofendendo por sua vez a moral e os bons costumes e que, por mais de uma vez, o viu
embriagado, armado de um terçado para matar e ferir seus vizinhos. João discordou do depoimento e questionou
que Augusto não era seu vizinho como disse.
Domingos Pereira trabalhava na mesma cerâmica que Clemente e afirmou ter visto João entrar no
estabelecimento embriagado à procura de Clemente para sangrá-lo. Afirmou também que João costumava
embriagar-se e que era homem rixoso e turbulento.

16
Fundo de Segurança Pública: Chefatura de Polícia Série: Autos (1889); doc. n. 6; 2 de janeiro de 1889.

293
Migração internacional na Pan-Amazônia

Manoel Ferreira, oleiro, trabalhava também junto com Clemente na cerâmica e afirmou que tinha
conhecimento que João procurou por Clemente para feri-lo.
As testemunhas de João Pinto Reis foram Manoel Canelas, José Francisco Natal, Domingos Dias dos
Santos e Marcelino José da Silva. Manoel, José e Domingos eram portugueses, enquanto Marcelino era paraense.
Manoel Canelas afirmou que o acusado sempre viveu bem e que nunca o viu embriagado; que quando
foi para a Europa João cuidou de sua família a qual foi muito bem tratada; disse também que era vizinho de João
há três anos e que morava próximo, e que nunca viu João provocar seus vizinhos, afirmou também que as
testemunha de Clemente eram todas testemunhas de trabalho com quem morava e comia junto. Clemente,
questionando o depoimento de Manoel, diz que o mesmo não merecia fé por ser ele protegido de João a quem
devia favor.
José Francisco afirmou no seu depoimento que conhecia João desde Portugal quando ainda era criança,
e que sabia que tinha bom comportamento, que nunca o viu embriagado ou provocando barulho.
Domingos trabalhava na cerâmica e afirmou que o conhecia fazia mais de dois anos e que também
nunca o viu embriagado ou fazendo barulho e que era seu vizinho. Segundo ele João só teria ido à cerâmica a
cobrar uma dívida. O depoimento de Domingos Dias dos Santos foi questionado por Clemente por este ser
amigo da família do acusado.
Marcelino afirmou em seu depoimento que morava na Travessa Dom Romualdo de Seixas e que nunca
viu e nem lhe constava que João se dera ao vício da embriaguez ou que tivesse por costume ofender por atos
ou palavras seus vizinhos.
O auto acima relatado deixa ver claramente o convívio de patrões e empregados e as ajudas mútuas
estabelecidas, mas também revela conflitos entre os mesmos portugueses, o que indica que a comunidade
portuguesa não era totalmente coesa. É também interessante notar que a disputa entre os sujeitos envolvidos
não coloca em questão elementos constituídos de uma identidade nacional, tais como língua, símbolos,
representações culturais ou territorialidade; discute outras identidades construídas em uma relação situacional
que nesse momento articulam-se em torno de ser ou não bom trabalhador.

ALGUMAS CARACTERÍSTICAS DOS IMIGRANTES

As habilitações do Consulado Português demonstram uma imigração constituída principalmente de


homens solteiros. Em todo o período que vai de 1884 a 1914 foram registradas 57 mulheres, 2.058 solteiros, 883
casados, 58 viúvos, 1 divorciado e 4 separados. As mulheres eram, na sua maioria, casadas e desenvolviam
trabalhos domésticos (44 indicações de domésticas e 1 lavadeira).
Uma tendência comumente indicada na literatura é de uma “desqualificação” da mão-de-obra portuguesa
que vinha para o Brasil, medida pelo elevado número de imigrantes analfabetos. Em 1901, a percentagem de
analfabetos entre os imigrantes portugueses do Brasil era de 47% para os homens e de 79% para as mulheres
e em 1912, de 59% para os homens e 82% para as mulheres (KLEIN, 1989).
No caso do Pará, os registros do Consulado deixam ver que a quantidade de portugueses que sabiam ler
e escrever era bem superior em relação aos analfabetos. Das 2.908 pessoas habilitadas no período (1844-1914)
com informação neste item 82% sabia ler e escrever, o que indica que os portugueses que vieram para o Pará,
provavelmente representavam uma mão-de-obra urbana, que devia viver no interior dos distritos de Porto e
Coimbra, já que a maioria embarcava pelos portos de Lisboa e Porto. Os registros revelam também que os
portugueses que se dirigiam ao Pará o faziam, em sua maioria, sozinhos, demonstrando sua aptidão com um
trabalho urbano sem vínculo com a terra.

294
Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX: ... • Edilza Joana Oliveira Fontes

Com referência à idade, no caso da cidade do Rio de Janeiro em 1906, a média dos homens e mulheres
portugueses era de 30 a 35 anos, enquanto a média dos brasileiros era de 15 a 20 anos (KLEIN, 1989). No caso
dos portugueses que vieram para o Pará, a idade média era de 27 anos, mas nos anos de maior exportação de
látex (1907, 1908 e 1909), a faixa etária de 26 a 40 anos dispara, chegando a representar, respectivamente,
83,33%, 59,56% e 49,24% dos registros.

ESTRUTURA OCUPACIONAL DOS PORTUGUESES EM BELÉM

Analisando a estrutura ocupacional dos portugueses habilitados no Consulado de Belém (1894-1914),


se observam muito poucos lavradores (14), mas havia um número expressivo de comerciantes (425), trabalhadores
no comércio (712), caixeiros (320) e marítimos (188). As profissões ligadas à pesca, os marítimos, os pedreiros
e os carpinteiros tiveram uma presença relativa nas habilitações no Pará, talvez demonstrando a crise por que
passava o setor pesqueiro e da construção civil em Portugal nessa época (Tabelas 6 e 7).

Tabela 6 - Profissões de prestação de serviços exercidas por portugueses habilitados em Belém, 1884-1914

Profissão N. de portugueses Profissão N. de portugueses

Trab. do comércio 713 Embarcadiço 2


Caixeiro 320 Estocador 2
Marítimo 188 Feirante 2
Doméstica 59 Livreiro 2
Horteleiro 54 Trab. de Farmácia 2
Carregador 42 Aspirante a Farmácia 1
Leiteiro 33 Bancário 1
Criado 28 Boleiro 1
Guarda livros 22 Bombeiro 1
Carreiro 20 Caçador 1
Carroceiro 19 Caldeiro 1
Hoteleiro 15 Coupeiro 1
Pescador 14 Dentista 1
Açougueiro 12 Diretor 1
Vendedor 11 Estacador 1
Jornaleiro 10 Estivador 1
Catraieiro 9 Estufador 1
Negociante 9 Faxineiro 1
Vaqueiro 9 Fotógrafo 1
Ator 7 Funcionário Público 1
Couveiro 7 Garapeiro 1
Choufer 5 Garimpeiro 1
Cozinheiro 5 Gerente 1
Garajeiro 5 Guarda Civil 1
Jardineiro 5 Intérprete 1
Músico 4 Jornalista 1
Peixeiro 4 Lava Carros 1
Agências 3 Lavadeira 1
Canoeiro 3 Limpeza Pública 1
Capinador 3 Machador 1
Encadernador 3 Médico 1
Professor 3 Mestre de Bordo 1
Barbeiro 2 Motorneiro de Bonde 1
Calafate 2 Papeleiro 1
Carteiro 2 Restaurante 1
Caseiro 2 Subgerente 1
Conductor 2 Trab. de Casa de Pensão 1
Costureiro 2 Veterinário 1
Fonte: A tabela foi elaborada a partir dos dados retirados das Fichas de Habilitação de Portugueses Residentes no Pará/Consulado Português. Grêmio Literário Português, Belém.

295
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabela 7 - Profissões da indústria exercidas por portugueses habilitados em Belém, 1884-1914

Profissão N. de portugueses Profissão N. de portugueses

Padeiro 92 Refinador 6
Carpinteiro 66 Sorveteiro 6
Alfaiate 48 Oleiro 5
Pedreiro 41 Operário 5
Chapeleiro 28 Eletricista 4
Ferreiro 24 Pasteleiro 4
Serrador 16 Relojoeiro 4
Lavrador 14 Taberneiro 4
Farmacêutico 13 Torneiro 3
Sapateiro 13 Torrador 3
Tanoeiro 13 Funileiro 2
Fogueteiro 12 Interessado 2
Ourives 12 Ajudante de pedreiro 1
Marceneiro 11 Aprendiz de funileiro 1
Tabaqueiro 11 Aprendiz de ourives 1
Pintor 10 Aprendiz de relojoeiro 1
Artista confeiteiro 9 Estudante 1
Industrial 6 Faqueiro 1
Maquinista 6
Fonte: A tabela foi elaborada a partir dos dados retirados das Fichas de Habilitação de Portugueses Residentes no Pará/Consulado Português. Grêmio Literário Português, Belém.

A estrutura ocupacional apresenta um número alto de “trabalhadores” que seriam destinados ao trabalho
braçal. O elevado número de caixeiros e trabalhadores do comércio indica uma acentuada presença dos setores
comercial e de prestação de serviços, mas não se sabe se os 425 comerciantes eram grandes ou pequenos
capitalistas e se os interessados eram imigrantes que nunca tiveram uma profissão ou emprego. Houve uma
generalização muito grande na categoria trabalhador e mesmo na categoria trabalhador do comércio, o que
indica uma indiferenciação social vinda de trabalhadores mais proletarizados.
Essas cifras demonstram que a imigração para o Pará se manteve no mesmo padrão da imigração da
época colonial do Brasil, na qual predominavam caixeiros, solteiros, poucos lavradores e poucas mulheres
(KLEIN, 1989).
A análise das profissões dos portugueses registradas no Consulado revela certa relação entre as profissões
e as províncias de origem. Foi possível cruzar 1.715 registros de profissões conforme a província de origem
(Tabela 8). A província do Douro era a grande região dos caixeiros, guarda livros, trabalhadores do comércio,
trabalhadores em geral, carpinteiros, carregadores, carreiros, carroceiros e comerciantes. As domésticas vinham
também de Beira Alta e Trás-os-Montes e os poucos lavradores vinham principalmente do Minho. Há províncias
inexpressivas nas diversas profissões como Alentejo, Algarves, e a região das ilhas.
Os resultados apontados acima mostram que a forte propaganda realizada pelos governos paraenses
para atrair migrantes europeus para trabalhar na agricultura não teve o impacto esperado e que a maioria de
portugueses registrados no Consulado Português em Belém eram migrantes espontâneos vinculados
fundamentalmente ao mercado urbano. Essa migração espontânea para as cidades da Amazônia, nessa época,
e vinculada ao mercado urbano, é também observada entre outros grupos de imigrantes, especialmente entre os
italianos (EMMI, 2008).

296
Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX: ... • Edilza Joana Oliveira Fontes

Tabela 8 - Profissões de portugueses habilitados em Belém, por província de origem, 1884-1914

Profissão
Província Carpina e Carreiro, Guarda
carpinteiro carregador e Doméstica Lavrador livros, Trabalhador Comerciante Total
carroceiro caixeiro e
comércio
Alentejo - - - - 7 - 1 8
Algarves 1 - - - 1 - 2 4
Beira Alta 5 18 3 2 83 65 47 223
Beira Baixa - 23 1 - 91 38 41 194
Douro 38 25 5 3 395 100 174 740
Extremadura 1 - 2 - 52 6 14 75
Ilha de São Miguel - - - - - 1 - 1
Madeira - - - - - 6 - 6
Minho 5 4 - 5 219 55 79 367
Oriental dos Açores - - - - - 1 - 1
Traz dos Montes 1 - 3 3 51 21 17 96
TOTAL 51 70 14 13 899 293 375 1715
Fonte: A tabela foi elaborada as partir dos dados retirados das Fichas de Habilitação de Portugueses Residentes no Pará/Consulado Português. Grêmio Literário Português, Belém.

FORMAÇÃO DO MERCADO DE TRABALHO EM BELÉM

Busca-se aqui analisar a constituição de um mercado de trabalho urbano em Belém, tratando de resgatar
o cotidiano dos trabalhadores portugueses inseridos no contexto da construção de Belém, como cidade moderna
e civilizada, conforme uma estratégia desenvolvida pelos grupos dominantes em torno da figura do trabalhador
morigerado e pacífico. Mais do que identificar o imigrante português procurou-se aprender suas ações autônomas,
suas aspirações e os significados que suas experiências de vida forneceram para a constituição de relações
sociais que por vezes os colocavam como membros de sua cultura no trabalho.
Há enorme dificuldade para estudar os imigrantes, decorrente dos poucos registros sobre suas práticas,
exigindo um trabalho exaustivo de garimpagem nas fontes que tratam de trabalhadores em geral. Procurou-se
colher pistas desses migrantes nos passaportes e nos anúncios publicados nos jornais, onde se acharam notícias
sabre o cotidiano de imigrantes portugueses na cidade de Belém. Encontraram-se dados nos obituários publicados
nos jornais que possibilitaram tomar conhecimento da existência de mulheres portuguesas, em sua maioria
solteiras e maiores de vinte anos. Outras fontes foram os autos-crimes consultados que revelam o nome, a
nacionalidade, a idade, a moradia, o trabalho e as relações estabelecidas por esses imigrantes com seus patrícios
e com a sociedade de Belém. No Arquivo Estadual do Pará, levantaram-se nos passaportes existentes dados
sobre a vinda de imigrantes para discutir as relações de gênero na perspectiva de uma história social, conforme
Dias (1992). Trabalhou-se também com os jornais Diário de Notícias, A República e O Liberal do Pará, e
com a Série Autos do Arquivo do Tribunal de Justiça, Secretaria de Polícia do Pará, envolvendo portugueses.

CONSTRUINDO UMA CULTURA DO TRABALHO

Os imigrantes portugueses do início do século XX constituíam um grupo com um projeto determinado de


integração social. Como grupo buscaram a historicização de sua etnia (CUNHA, 1985). Eles
Apresentavam marcas primordiais, interesses e objetivos comuns, que os qualifica e os
distinguem no grupo étnico. Inventada, porque a etnicidade nasce relacionalmente, assumindo
conformação política, em certo espaço e em determinada situação histórica [...]. entretanto,
embora permeados pela visão dominante, a posição do grupo, as pressões e a estigmatização
que sofrem, fazem de sua prática, resistência e impõe a construção de uma forma construtiva
e diferenciada de vida na nova sociedade (BACELAR, 1994, p. 56)

297
Migração internacional na Pan-Amazônia

Discutir as relações desses sujeitos dentro de uma cultura do trabalho, onde o trabalhador imigrante
labutava diariamente de doze a catorze horas, sem horário de trabalho, sem escolha de serviço e sem descanso
nos fins de semana, permite entender uma relação permeada por traços paternalistas que possibilitavam uma
maior exploração do próprio trabalhador.
Os portugueses, o maior grupo imigrante da cidade, sofreram devido certo antiluzitanismo, e por deterem
monopólio sobre a venda de gêneros alimentícios e outras ocupações. Os botequins, as mercearias, as padarias
e os quiosques eram pequenas unidades produtivas e comerciais que necessitavam de um pequeno capital e de
um esforço grande dos seus proprietários e empregados para se obter algum lucro. Estabeleceu-se então uma
cultura de trabalho que juntava pequeno capital, horário de trabalho ostensivo e nacionalidade entre os envolvidos
no negócio que expressava preferência por portugueses na hora de selecionar os empregados desses
estabelecimentos, ou seja, havia certa nacionalização do mercado de trabalho.
A exigência da nacionalidade portuguesa para certas ocupações e ofícios aproximava as pessoas
facilitando o controle e a exploração da força de trabalho. Ser de uma mesma nação possibilitava construir uma
identidade quando fosse necessário se contrapor aos trabalhadores nacionais e, ao mesmo tempo, vinculava
mais ainda trabalhadores e patrões camuflando as relações de exploração que existiam entre eles, permitindo
assim estabelecer traços paternalistas no mundo do trabalho.
A identidade cultural e os laços de solidariedade nacionais diminuíam a distância social e constituíam
por vezes relações de fidelidade entre os donos de seus estabelecimentos e seus trabalhadores. A organização
do trabalho nesses estabelecimentos permitia contato permanente entre patrões e empregados, com duras
jornadas de trabalho, com cobrança de fidelidade, dedicação, submissão e obediência. Por exemplo, um auto do
Tribunal de Justiça de 1881 registra que Manoel da Costa Pinto, 30 anos de idade, solteiro, sócio da firma Silva
Pinto e Companhia, sabendo ler e escrever, tinha um menor como caixeiro que fora demitido por não cumprir
com seus deveres. O menor demitido de nome Pedro Lener Duarte, apanhou duas bofetadas do sócio de Costa
Pinto. Eles o mandaram embora e estava desaparecido. Havia uma queixa por parte do irmão do menor de que
os dois portugueses tinham castigado barbaramente o caixeiro17.
O trabalho infantil era muito utilizado nesses estabelecimentos. São frequentes os anúncios de jornais
solicitando caixeiros de doze a catorze anos. A utilização da mão-de-obra infantil era buscada como garantia de
uma fidelidade e obediência ao patrício dono do negócio, sendo frequente que os menores morassem nos locais
de trabalho, o que facilitava seu controle e exploração.
A prática de morar no lugar de trabalho não se restringia aos menores. Diversos autos da Chefatura da
Polícia registram a prática de trabalhadores dormirem em quiosques, mercearias, padarias e/ou botequins de
trabalho. Essa prática era especialmente frequente nas padarias, considerada pelos donos uma necessidade do
processo de trabalho, já que o pão era produzido na madrugada. A utilização da necessidade de “prontidão dos
trabalhadores” era um argumento usado pelos patrões para justificar a exploração e a extensa jornada de
trabalho, mas essa prática permitiu também constituir laços de solidariedade entre os trabalhadores e foi um dos
elementos utilizados para identificar as diferentes posições sociais dentro do processo de trabalho e a vida
privada desses trabalhadores por parte dos donos dos negócios.
Os donos de estabelecimentos buscavam uma ética do trabalho, que pressupunha a necessidade do
trabalho exaustivo, sem ter hora para o descanso, tendo como objetivo acumular para estabelecer laços de
confiança com seus “criados” construindo uma cultura de “preferem-se portugueses” em estabelecimentos de
portugueses. Existia uma verdadeira rede entre imigrantes portugueses. Os imigrantes quando chegavam sempre

17
PARÁ. Arquivo do Tribunal de Justiça. Autos de Chefatura de Polícia, 1881.doc. n.31.

298
Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX: ... • Edilza Joana Oliveira Fontes

tinham um ponto de contato, o que fechava o mercado de trabalho para a nacionalidade portuguesa e criava
conflitos como os trabalhadores nacionais. Por vezes, esses imigrantes portugueses já vinham com passagens
compradas por comerciantes portugueses estabelecidos em Belém. A relação de fidelidade entre patrões e
empregados assumia uma “ética” do trabalho nos marcos que os donos dos pequenos negócios estabeleciam.
Um exemplo elucidativo é o auto envolvendo Luis Ferreira. Conforme o auto no dia 22 de setembro de 1904,18
chegou em Belém o português Luis Ferreira, de 39 anos de idade, casado e foi morar no Arraial de Nazaré, em
um botequim, cujo dono era José Pinto dos Reis, português. Seis dias depois já era caixeiro do referido botequim
e no dia 16 de outubro do mesmo ano foi investigado pela polícia sob suspeita de praticar naquela casa jogos de
roleta. Na Chefatura de Polícia Luis Ferreira declarou-se surpreso por terem encontrado os instrumentos de
jogo no forro do botequim. No botequim havia um outro caixeiro de nome Alexandre dos Santos, também
português, de 25 anos de idade, morando no Arraial de Nazaré, nº 80, próximo ao botequim e que era empregado
de José Pinto do Reis, dono do botequim há dois meses e meio.
A pesquisa dos registros dos autos permite ver que os laços de fidelidade cobrados no trabalho começam
a ser construídos antes mesmo da chegada dos imigrantes em Belém. A cadeia se consolida considerando que
o imigrante português pobre, principalmente, se fosse menor, ficava totalmente dependente do seu patrão que
aqui passava a ser a única referência familiar do mesmo. Esta fidelidade era muito cobrada e quando não
exercida da forma que o pequeno comerciante português exigir o trabalhador imigrante sofria as consequências,
por vezes com violência. Essa cultura de tentar empregar só portugueses criou vários conflitos em Belém com
trabalhadores nacionais.

CONFLITOS ENTRE TRABALHADORES NACIONAIS E PORTUGUESES

Nos arquivos aparecem frequentemente manifestações de divergências entre portugueses e brasileiros


indicando uma possibilidade de radicalização das relações de trabalho nas formas de convivência em Belém.
O português Joaquim Pedro Carneiro perante o escrivão e o prefeito de segurança da Comarca declarou que:
Estando a fazer um roçado com cinco homens sob sua direção em um terreno que atribui ser
de sua propriedade [...] foi surpreendido por Desiderio Gomes Rodrigues e mais dez homens
que o intimidaram com um machado e cacetes a mão e o impediram de continuar com os
trabalhos do roçado e sem motivo que justificasse, sofreu ameaças e por ver sua vida em risco
[...] ameaças dizendo: português deve ficar no tronco de cabeça para baixo, vai para tua terra,
aqui não tem nada, isto é nosso19

Joaquim Pedro argumenta em seu depoimento que foi agredido e que ouviu ofensas em relação a sua
origem portuguesa. Seus agressores recorrem a um passado colonial e identificam João Pedro como colonizador,
sem dúvida, seus agressores não faziam parte da elite dominante local, pois a referência à escravidão é explícita
quando colocam João Pedro num tronco de cabeça para baixo. Isso seria inverter a representação social que
estava na memória dos agressores de João Pedro em relação ao cativeiro.
Afirmar que João Pedro deveria ir para a sua terra serve como argumento para reivindicar o pedaço da
terra em disputa, “essa terra é nossa porque não seria mais dos portugueses”; essa é a ideia que passa como
elemento de diferenciações sociais nesse momento. Houve aí uma conveniência em se estabelecer uma distinção
entre brasileiros e portugueses.

18
PARÁ. Chefatura de Polícia. Autos, 1904, Autos de Perguntas feitas a Luis Ferreira e Alexandre dos Santos.
19
PARÁ. Arquivo Público do estado. Fundo: Autos da Chefatura de Polícia. 1899. Doc. 15.

299
Migração internacional na Pan-Amazônia

Na fala de Desiderio Rodrigues, é estabelecida uma distinção social que pretende marcar uma relação
de pertencimento dele para com a terra e o país, e de estranhamento em relação a João Pedro. Discutindo um
passado colonial e de domínio do Império português, os brasileiros envolvidos neste conflito estabeleceram uma
identidade, através da utilização de valores étnicos, naquele momento, para expressar a diferença numa
determinada situação.
Episódios como esses refletem a antipatia que alguns círculos de Belém mantinham com relação aos
imigrantes portugueses. O jornal Diário de Notícias reportava em 26 de julho de 1894 a organização do Clube
dos Brasileiros Natos do Pará, que visava defender a República e a nacionalização do trabalho e do comércio
no Pará20. Afirmando-se vinculado aos jacobinos do Rio de Janeiro, este Clube promoveu na cidade de Belém
manifestações de apoio a Floriano Peixoto, bem como questionou o predomínio dos portugueses nas atividades
comerciais no estado do Pará (RIBEIRO, 1987).
O “nativismo” era a fase culturalmente radical do republicanismo no Brasil, misturado com o ressentimento
popular contra os lojistas portugueses. A imprensa ocupava-se com os gritos de “abaixo aos galegos” com que
os nativistas brasileiros recusavam suas raízes europeias (RIBEIRO, 1987).
Mas antes da República houve conflitos entre trabalhadores portugueses e nacionais que expressavam
noções de identidade a partir de experiências históricas que as duas nações tinham construído no período da
colonização e do Império no Brasil.
Em 1894 o Diário de Notícias21 reportava:
A pacífica população desta capital tem despertado nestas últimas noites pelo estridor da cavalaria
posta em movimento pela notícia dos conflitos. Indagando a causa e procurando conhecer a
determinante da bélica intervenção, somos informados de que há dias os bombeiros, pondo-se
em camaradagem com os marinheiros, levaram-nos a provocar os portugueses da estrada do
Arsenal. Imprevidentes, desprecavidos, ignorando o fim, os marinheiros, fogosos e bravos
tomaram depressa a parte ativa da luta enquanto os bombeiros maquiavelicamente se arredavam.
Sendo assim o fato ao que se trata é simplesmente um ardil para indispor a colônia portuguesa
com a marinha. Por mais degradante que esta seja, tem seus usos de veracidade, que teria sua
base da precária situação do governo antinacional que nos oprime e cujas circunstancias mais
se agravam pelo desfavor dos generosos estrangeiros, compadecidos, como outrora nos dos
paraguaios e argentinos. Ora são inegáveis os grandes favores da colônia portuguesa no Rio de
feitos a causa da nossa liberdade, defendida pelo Almirante Custódio de Melo. Armar uma
intriga, entre a Marinha e os portugueses, não é belo, é curto, mas é possível a um governo que
não hesita nos meios e que tudo faz para se manter no poder.

A notícia dá conta do conflito entre marinheiros e bombeiros, contra carroceiros da estrada do Arsenal.
Na notícia expressam-se os conflitos políticos vivenciados pela República brasileira no início de 1894. Era ano
de disputa eleitoral, no qual os adeptos de Floriano Peixoto não conseguirem eleger para presidente um militar
vinculado aos setores do Exército (QUEIROZ, 1986).
Não é de se estranhar, então, que o articulista do jornal expresse suas opiniões favoráveis a uma
mudança nas políticas de rumo do Governo Federal e critique o governo de Floriano Peixoto como antinacional.
Percebe-se também que há uma vinculação nos interesses da Marinha, na figura do Almirante Custódio de
Melo22 junto à colônia portuguesa, criando assim, uma identidade entre ambos que se contrapõem a outras
Forças Armadas, no caso, os Bombeiros que teriam articulado, para quebrar essa aliança.

20
Diário de Notícias. Belém, 26 de julho de 1894.
21
Conflitos. Diário de Notícias. Belém, 1894.
22
Melo, Almirante Custódio de (Salvador, 1840 – Rio de Janeiro, Militar e Político). Atuou durante a guerra do Paraguai. Fez depois estudos
de artilharia na Europa, organizou os serviços de armamentos da Guerra da Marinha. Deputado constituinte (1890-1891). Chefiou a
Revolta da Marinha (1891). Ministro da Marinha.

300
Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX: ... • Edilza Joana Oliveira Fontes

Esta linha de identidade que o articulista construiu deve passar pela identificação do almirante Custódio
de Melo e da Marinha do Brasil como monarquistas, contrários aos republicanos e jacobinos que desejavam
uma República forte, centralizada; e a nacionalização do mercado de trabalho, o que os indispunha com a
colônia portuguesa, considerada monarquista pelos republicanos jacobinistas.
Mas os conflitos entre portugueses e brasileiros se viviam também no dia-a-dia. Bernardino da Costa,
português, morador da Cruz das Almas, foi ferido no dia 11 de junho de 1881, por um cearense chamado
Francisco que o cortou três vezes. Felizardo José Pereira Guimarães, testemunha de Bernardino, declarou na
Chefatura de Polícia que nesse dia foi à casa de Bernardino saber o que tinha acontecido e que ouviu do
cearense Manoel Ferreira, que estava trepado em um mamoeiro apanhando frutas e que embaixo encontravam-
se duas mulheres que juntavam. Bernardino reclamou de que não dera ordem para apanhar frutas no seu
terreno, no que foi insultado por Manoel Ferreira. Outra testemunha, Inocência Jerônimo de Araújo, de 33 anos
de idade, solteira, empregada em serviços domésticos, declarou que uma das mulheres que apanhava as frutas
era a esposa do acusado e que os insultos que Manoel Ferreira dirigiu a Bernardino foi chamá-lo de “galego” e
“patife”. Esmeralda Pereira de Araújo, de 13 anos de idade, solteira, maranhense, irmã de Inocência, afirmou
na polícia que viu Manoel Ferreira fazer o ferimento em Bernardino, depois dele ter lhe chamado de “marinheiro”,
“galego e patife23.
Neste depoimento, o português Bernardino da Costa, ferido pelo cearense Manoel Ferreira, era identificado
por este como “galego”, “patife” e “marinheiro”. Por outro lado, Manoel Ferreira aparecia como “violento”,
“agressivo”, “desbocado”, “usurpador”, “aventureiro” e não respeitador da propriedade alheia. As testemunhas
de Bernardino o identificavam como trabalhador pacífico e respeitador de propriedade. O português Bernardino
demonstrava pelos autos ter relações de solidariedade que ultrapassavam as noções de nacionalidade e que neste
momento de conflito asseguram-lhe a identidade de “honesto”, “trabalhador”, “morigerado” e “pacífico”.
O termo “galego”, alcunha dada aos portugueses residentes no Brasil, era muito utilizado por membros
do movimento republicano e pelos jacobinos, contra os imigrantes. A vinculação de “galego” e “marinheiro”
como parte dos insultos, pode ser interpretada como a tentativa de associar Bernardino ao movimento monarquista,
que contava com a participação de vários imigrantes portugueses e com a simpatia da Marinha do Brasil, no
final do século XIX.
Noutro auto de 190324 se registra que Pedro Peregrino, brasileiro, 22 anos de idade, solteiro, estando às
8 horas da noite, na mercearia que ficava na Rua Tiradentes, canto da Travessa Piedade, comprando cigarros,
entraram três portugueses, entre eles Antônio Pereira da Silva, que falavam que o português era homem que
“fazia e acontecia” e que sendo ele, respondente brasileiro, questionou os portugueses “que Diabo era aquilo”.
Segundo Pedro nem bem ele acabou de pronunciar as palavras foi agredido pelos três portugueses e “corrido à
acha de lenha”, pelo que foi obrigado a puxar uma faca e se defender de seus agressores. Foi quando entrou na
padaria o praça Manoel da Rocha do 1º Corpo e efetuou a prisão de Pedro Peregrino e do português Antônio
Pereira da Silva, tendo os outros dois portugueses se evadido. Do auto constam os exames do corpo de delito
procedidos em Antônio Pereira da Silva e Pedro Peregrino, comprovando que ambos sofreram agressões,
sendo a primeira vítima de facada e o segundo de pauladas.
Esses dois casos revelam enfrentamentos do dia-a-dia. A identidade nacional a qual se referem os
sujeitos passa por uma origem histórica que se expressa a partir de enfrentamentos na forma de se auto-
identificar, e nas formas de se apresentar como membros de um grupo, tentativas de mostrar a cultura recorrendo
às tradições e à origem do grupo (CUNHA, 1985).

23
PARÁ. Arquivo Público do Estado. Fundo: Secretaria de Polícia da Província, doc. N. 13, 12 de junho de 1881.
24
PARÁ. Chefatura de Polícia. Autos de 1903. Autos de perguntas feitas a Pedro peregrino. 28. nov., 1903.

301
Migração internacional na Pan-Amazônia

O capital e o trabalho de portugueses consolidaram um grupo na economia da cidade. Estes imigrantes


estabeleceram um método de trabalho que exigiu muito sacrifício e, muitas vezes, condições subumanas de
sobrevivência. Geralmente eram pessoas pobres, homens solteiros, com pouca roupa, malas velhas e que
chegavam a Belém com endereço de algum patrício para ganhar a vida. Eram anos de trabalho acumulando
dinheiro, tentando se tornar sócios de pequenos negócios, cuja única forma de acumular capital advinha por
muitas vezes de um trabalho exaustivo, onde patrão e empregado tinham quase sempre as mesmas condições
de sobrevivência.

CONDIÇÕES DE TRABALHO: O CASO DAS PADARIAS

O repórter Julio Lobato acompanhou o inspetor geral da profilaxia da febre amarela de Belém Dr. Dias
Júnior, durante sua visita à cidade em 1916, tentando discutir entre outras coisas a higiene das padarias da
capital. O argumento do inspetor era a melhoria da fabricação do pão em Belém, via controle dos “verdadeiros
focos da imundície” (LOBATO, 1916, p. 51). Desta visita resultou uma relação de 46 padarias, com dados
sobre as condições de trabalho nas padarias de Belém na segunda década do século XX .
Das quarenta e seis padarias, quatorze tinham no seu nome de fantasia alguma relação com a
nacionalidade portuguesa25 (data da proclamação da república de Portugal, nome de membros da Monarquia
Portuguesa, de lugares de Portugal, de santos portugueses, e de homens de letras de Portugal como Camões).
Isso é indício de uma forte presença portuguesa nesse setor do comércio
Pelo número de empregados registrados em cada padaria pode-se concluir que todas elas eram de
pequeno porte, não sendo encontrada nenhuma delas com mais de dez trabalhadores. A Padaria Vienense, que
era a que tinha mais trabalhadores (dez), na verdade, não fabricava só pão, fabricava também macarrão e
biscoitos.
Com respeito à produção diária de pão, a maioria das padarias eram pequenas unidades produtoras, que
vendiam, basicamente, para uma pequena clientela, provavelmente, os moradores no entorno da unidade produtiva.
Sobre o maquinário e os instrumentos de trabalho nessas padarias artesanais, percebe-se que a maioria
das masseiras era de madeira com espelho de mosaico, só a Padaria Estrela do Minho e a Fábrica Palmeira26,
contavam com masseiras elétricas. Os balcões onde se depositava a massa do pão já batida para descansar, na
sua grande maioria eram balcões de madeira; algumas padarias revestiam essas mesas com mosaico ou mármore.
Todas as padarias tinham cilindros manuais para passar a massa com exceção das padarias Anjo da Guarda,
Estrela do Minho, e Fábrica Palmeira que possuíam cilindros elétricos.
Percebe-se que essas padarias não possuíam ainda um sistema fabril de produção, uma divisão social
do trabalho, e nem controle rígido, por parte do patrão, do tempo gasto para a produção. A informação sobre a
iluminação das padarias indica o uso de lamparinas no salão das padarias. A higiene nessas padarias era
inadequada a deduzir pela informação de que se encontraram panos encardidos cobrindo a massa do pão e
pessoas trabalhando de peito nu, ou totalmente nuas. O hábito de ficar nu ou de peito nu na hora da fabricação
do pão foi adquirido pela necessidade de fazer um grande esforço físico na hora de bater a massa do pão
manualmente; era um exercício físico exaustivo, acumulado à existência de convivência na sua maioria junto do
forno a lenha que assava o pão. Estes fornos, como indica a reportagem, muitas vezes ficavam dentro ou na

25
Das padarias investigadas, somente quatro indicam relações com outra nacionalidade: Padaria Espanhola, Francesa, Frank Furt e Japonesa.
26
A fábrica Palmeira era uma unidade produtiva com 90 trabalhadores divididos em diversas seções e produzindo pão de forma bem diferente
das pequenas padarias que compõem a lista dos estabelecimentos visitados pelo Dr. Dias Júnior. Na verdade é um contraponto a elas e serve
como elemento de comparação.

302
Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX: ... • Edilza Joana Oliveira Fontes

frente do salão onde se fabricava o pão, o que elevava consideravelmente a temperatura no interior do salão,
obrigando os trabalhadores a suportarem o calor, ao mesmo tempo de fazer grande exercício físico para poder
bater a mão quilos e quilos de massa.

BRIGAS PELA FREGUESIA

No dia 11 de novembro de 189327, às nove horas da manhã, o padeiro José Maria da Silva, de 22 anos
de idade, português, foi agredido por outro português, também padeiro de nome Manoel Marques de Oliveira,
de 25 anos, solteiro, e que sabia ler e escrever, por causa de uma freguesia de pão. José Maria avisou à
freguesia que não pagasse o pão para Manoel Marques, e que só ele ou seu patrão, poderim receber o dinheiro.
Neste momento Manoel Marques chegou na freguesia, que era na estrada da Independência, e questionou José
Maria. A briga pelo direito de cobrar o pão que era vendido na padaria Floresta de Santa Clara foi violenta,
chegando Manoel Marques a quebrar a cabeça de José Maria, com uma estaca de cercado.
Neste processo pode-se observar que existia a prática de vender pão em domicílio e que o padeiro
“fazia sua freguesia”, o que gerava muito desconfiança por parte dos patrões em relação às prestações de
contas. É possível que Manoel Marques tenha sido demitido da padaria; o dono desta, preocupado em não
perder a freguesia iniciou uma tentativa de controle do mercado introduzindo alguém de sua confiança na
freguesia de Manoel Marques. O patrão de Manoel Marques ao levar outro padeiro para a freguesia deste,
quebra uma cultura estabelecida pelos trabalhadores da área; havia um código de conduta entre os padeiros e
sua freguesia. A compra ou repasse de uma freguesia para alguém era como passar a responsabilidades pelos
seus fregueses. Era necessário conhecer o comprador, fazer as apresentações para os fregueses e só depois
vender à freguesia; fica claro que o patrão de Manoel Marques tenta quebrar essa cultura, o que irrita
profundamente o padeiro, que agride José Maria, pois o identifica como alguém que está quebrando uma ética
no trabalho e está solidário com o patrão e não com seu colega de nacionalidade e profissão.
No dia 9 de abril de 189628, compareceu à Chefatura de Polícia José Nunes Gomes, 42 anos de idade,
casado, padeiro, português, apresentando ferimentos leves. Declarou que no dia anterior estando às 7 horas da
manhã “apreendendo” a freguesia em companhia do seu patrão Antônio Oliveira e chegando à travessa do
Jurunas, em casa de um freguês que não sabe o nome, mas que é vendedor de garapa, perguntou ao seu patrão
quantos pães havia de deixar. Segundo José Nunes seu patrão respondeu com palavras ofensivas, o que retrucou
dizendo que não havia necessidade de ser tratado mal e que aquele serviço não lhe servia mais. Nesta hora,
entregou o balaio de pão, sendo agredido por Antônio Oliveira. No dia seguinte, Antônio Oliveira, 30 anos de
idade, casado, padeiro, português, prestou depoimento na Chefatura de Segurança da Trindade e declarou que
tinha saído para ensinar a freguesia ao seu empregado José Nunes Gomes e chegando à casa de um garapeiro,
José Nunes disse que não fazia a conta da venda e que não queria mais o serviço. Declarou também, que se o
patrão quisesse o podia mandar embora. José Nunes, segundo Antônio de Oliveira, lhe disse isto por ter ele,
Antônio de Oliveira, reclamado por não ter aprendido a freguesia e ter se queixado aos seus empregados.
Afirma também Antônio de Oliveira que José Nunes não estava “bem da cabeça” e que ele tomou o balaio da
mão deste e foi embora, não sabendo como este se feriu.

27
PARÁ. Arquivo do Tribunal de Justiça. Autos Crimes de Ferimentos Graves. Doc. 2. Belém, 22. nov. 1893.
28
PARÁ. Auto de Chefatura de Polícia – 1896. Doc. 21. Autos de perguntas feitas a José Nunes Gomes.

303
Migração internacional na Pan-Amazônia

Neste auto o patrão de José Nunes quis lhe ensinar a freguesia, ou seja, lhe apresentar para os
fregueses de uma determinada área que compram os pães de sua padaria. A freguesia deveria ser feita pelo
padeiro e, pelo auto, já tinha começado antes das 7 horas da manhã. Nessa época a venda em domicílio era
uma forma encontrada pelos donos de padaria para escoar sua produção. Ao mesmo tempo a venda do pão
em domicílio era uma forma de exploração de mão-de-obra dos padeiros que completavam sua renda com o
comércio de pão.
Percebe-se que José Nunes não quer fazer a freguesia, e que está sendo obrigado pelo seu patrão a
fazer contas, requisito fundamental para ser um vendedor de pão. José Oliveira, o dono da padaria, é homem
que controla sua freguesia nas ruas do Jurunas, e quer continuar controlando parte deste mercado.
Fazer a freguesia estabelecia uma relação de confiança entre o entregador e os moradores de uma rua,
um bairro ou uma área grande da cidade. A confiança em deixar o pão para ser cobrado na semana, em “fiar”
quando o freguês não estava com dinheiro ou a confiança em comprar o pão sempre quente estabelecia laços
de solidariedade. Cada distribuidora tinha a sua área demarcada. Essas práticas eram peças fundamentais para
o escoamento da produção das padarias em uma cidade sem uma rede de distribuição instalada nos bairros da
cidade. Por outro lado deveria haver uma relação de confiança entre os donos de padarias e os seus distribuidores.
Deles dependiam as vendas e os patrões sabiam que parte do seu capital passava pela mão do distribuidor.
“Fazer a freguesia” não era só uma atividade de padeiro, ela está presente na atividade do leiteiro, do
vendedor de frutas, no vendedor de hortaliças e em outras atividades comerciais. Muitas vezes as relações de
amizade se constituíam no espaço do trabalho e eram transferidas para momentos de lazer.
A venda em domicílio estabeleceu hábitos de consumo que os donos de padarias queriam acabar. Nas
greves dos padeiros de 1914, a divergência central além do aumento de salário e da diminuição da jornada de
trabalho, era o preço do pão para revenda. Na greve de 1917, os donos de padarias decretam o fim da venda do
pão em domicílio. Muitos destes padeiros distribuidores eram também os padeiros masseiros, ou seja, os mestres
de ofício que fabricavam o pão. Quando distribuíam o pão, os padeiros distribuidores tiveram uma visão ampliada
do capital acumulado dos seus patrões, o que provavelmente deve ter influenciado para que eles fossem os
organizadores das greves da categoria em 1914.

A VIOLÊNCIA DA POLÍCIA

Vitório Manoel Martins era um português vendedor ambulante de 33 anos de idade, solteiro, que sabia
ler e escrever. Foi agredido em 1904 por um marinheiro quando vendia frutas e ovos em domicílio. O marinheiro
exigiu de Vitorio a licença para vender e quis exigir a matrícula do ambulante. O marinheiro, na tentativa de
prender Vitorio, usou de uma navalha para obrigá-lo a ir à delegacia29. Vitório é um bom exemplo dos perigos
que corriam os vendedores ambulantes em Belém, no início do século XX. As divergências com as autoridades
policiais eram das mais variadas formas. Nos autos e processos criminais, percebe-se que o uso da violência
por fiscais de Intendência, policiais, guardas municipais e marinheiros era algo corriqueiro. O uso da força, do
arbítrio, do poder de polícia é expressivo nos relatos envolvendo portugueses.
Eduardo de Oliveira Gonçalves no dia 3 de agosto de 1906, leiteiro de 19 anos, residia na estrada de
São Jerônimo. Sofreu agressão pelo praça da brigada militar do Estado de nome Manoel Ribeiro Guimarães.
Eduardo declarou que estava na estrada do Marco tirando leite para um freguês quando se aproximou uma
mulher e começou a insultá-lo e que foi preso pelo ordenança do subprefeito do Marco, junto com a mulher. As
agressões físicas do ordenança em Eduardo estavam expressas em várias partes do corpo30.

29
PARÁ. Fundo. Auto de Chefatura de Polícia de 1904. Doc.n. 42. Auto de perguntas feitas a Victório Manole Martins
30
APEP. Chefatura de Polícia. Autos de 1906. Auto de diligencias policiais procedidas a cerca do espancamento de Eduardo Gonçalves.

304
Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX: ... • Edilza Joana Oliveira Fontes

A extrema violência sobre Eduardo revelada no auto demonstra que a repressão policial era um
instrumento usado contra vendedores ambulantes. No auto o subprefeito do Marco justifica a agressão a
Eduardo dizendo que ele reagiu à prisão. Neste auto Eduardo revela que era hábito tirar o leite da vaca na porta
do freguês, o que obrigava também o leiteiro a cuidar das vacas e expor-se às reclamações dos moradores
quando estes animais sujavam as roupas estendidas nas cercas dos quintais das casas.
A violência policial era praticada com o propósito de estabelecer normas e referendar uma hierarquia
no espaço urbano. Na tentativa da Intendência regulamentar a venda no espaço, os vendedores ambulantes
eram os primeiros alvos da polícia.

MORAR JUNTO E TRABALHAR COM PATRÍCIOS

Os portugueses quando não moravam no local de trabalho viviam juntos em uma mesma casa, estância,
ou cortiço. Francisco Machado da Mota31, português, guia de cego, brigou no cortiço onde morava ele e outros
portugueses e cujo dono era o português José Francisco Alves, carreiro, 30 anos de idade, analfabeto, morador
da estrada do Arsenal. José Francisco denunciou na polícia que Francisco Machado da Mota junto com o cego
de quem era guia, moravam em um dos quartos de sua propriedade e que toda vez que chegavam em casa
usavam uma “linguagem pouco decente”. No dia 30 de março de 1890, José Francisco reclamou quando a
discussão entre o cego e seu guia começou. Saindo de seu quarto foi até o quarto de Francisco Machado e
reclamou do seu procedimento, pedindo que se recolhessem e tratassem de se mudar, e recebeu em troca uma
bofetada, o que fez com que José Francisco voltasse para o seu quarto. Momentos depois os moradores da
estância avisaram que Francisco Machado estava armado, o que fez com que José Francisco apitasse, chamando
a polícia. Ouvindo os apitos, Francisco Machado recolheu-se para o seu quarto. Quando a polícia chegou, ele
abriu a porta, apagou a luz e esperou que os soldados entrassem. Quando estes tentaram prender Francisco
Machado, teve um dos praças feridos, Francisco Machado ainda fugiu e foi perseguido e posteriormente preso.
As testemunhas desse processo quase todas moravam na mesma estância. Da leitura desse auto
pode-se constatar que os moradores dessa estância, que pela legislação vigente à época poderia ser considerada
um cortiço32, se identificam perante o poder público como trabalhadores, com profissões definidas: carreiros,
alfaiates, ajudante de cego ou agenciador. Essas identidades contrapõem-se às identidades atribuídas aos
moradores de cortiços feitas pela imprensa, pelo intendente e pela legislação. Não se percebe no auto, a
estância (cortiço) como lugar de imoralidades “cheios de messalinas do mais alto degrau”.
Observam-se nos autos muitos portugueses proprietários de diversos cortiços em Belém e, por vezes,
morando neles. Esses locais de moradia, para os seus habitantes, tinham outros significados que se contrapunham
à identidade atribuída a esses espaços pelos higienistas de plantão, que advogavam pelo seu fechamento.
Este hábito de morar junto possibilitava a prática de se divertir junto, de estar junto na hora do lazer e
indica a construção de uma identidade social que passava por laços de nacionalidade e que no mundo do
trabalho constituía relações de solidariedade.
Nos vários autos analisados observa-se grupos de leiteiros, carroceiros, caixeiros, peixeiros, boleeiros,
padeiros, morando juntos, quando o local de moradia não era no próprio local de trabalho. Os laços de

31
PARÁ. Arquivo do Tribunal de Justiça. Autos Crimes de 1890. Processo n. 5 nov., 1894. Comarca da Capital. Ferimentos Graves.
32
Segundo o Código de Polícia Municipal de 1900: “2°.- Entende-se por cortiço um série de quartos, geralmente de madeira, dando todos
para um pátio ou corredor comum, pelo qual se comunicam com a vida pública, sem o conforto e as exigências de boa higiene, servindo
de residência a muitos indivíduos e não dispondo de banheiros, cozinhas e latrinas em número correspondente aos seus habitantes”.

305
Migração internacional na Pan-Amazônia

nacionalidade juntavam os portugueses para uma mesma moradia e constituía-se em espaços de relações
sociais de proteção. Estavam juntos enfrentando os “brasileiros”, os “policiais” e, algumas vezes, brigavam
entre si.
Carroceiros portugueses moravam juntos em cocheiras e por vezes brigavam entre si. Foi o que aconteceu
em 190233 com Antônio Dias Lourenço, 42 anos de idade, português, casado, que morava em uma cocheira no
arsenal da marinha e que foi agredido com bofetadas e depois com uma paulada por um “companheiro de
trabalho” de nome José Viana, o que foi assistido por mais quatro trabalhadores da cocheira, todos portugueses.
Um processo do Tribunal de Justiça do Estado mostra um crime de resistência34. Neste processo, foi
preso um boleeiro por infração do regulamento de veículos na noite do dia 19 de outubro de 1873. No momento
da prisão outros boleeiros fizeram resistência à polícia, conseguindo tirar do poder dos praças o boleeiro preso.
Este processo envolveu autoridades e um grande número de boleeiros. Estes não deixaram que se efetivasse a
prisão do seu companheiro de trabalho, argumentando que se ele fosse preso, eles também queriam ir junto.
Resistindo à prisão e desobedecendo a ordem do subdelegado do Arraial de Nazaré, os boleeiros foram presos
somente com auxílio de um batalhão do quartel e no momento em que eram conduzidos, deixaram de mencionar
os seus nomes e local de trabalho. Ao todo estavam envolvidos quinze portugueses. Todos eles foram soltos
após pagar fiança.
Este processo revela que as condições de trabalho possibilitaram a construção de laços de solidariedade
entre portugueses estabelecendo uma identidade política e articulando um campo onde dialogavam com uma
identidade atribuída. A partir de situações conjunturais, reinventavam os termos de sua nacionalidade e foram
delimitando contornos no mundo do trabalho de ser português no Pará. A formação dessa “identidade portuguesa”
em Belém, deu-se a partir de experiências no trabalho, que articulavam novas formas de vivenciar o ser
português aqui. Através de conjunturas bem delimitadas procuravam tirar partido para conseguir seus objetivos,
dialogando com as leis que sem dúvida nenhuma lhes impunha limites. A forma com que estes portugueses
estruturaram suas experiências no mundo do trabalho articulou um campo de luta de classes, um campo de
conflito. A partir disso problematizaram suas experiências, expressando significados sociais gerais nos momentos
de disputas.
A rotina do trabalho, a luta entre o capital e o trabalho, se apresentou para estes imigrantes portugueses
como a arena de luta de classes, na medida em que construíram elementos que configuraram política de
domínio, estabelecendo um campo de conflito. Diversos autos consultados descrevem o hábito de imigrantes
portugueses morarem juntos, empregarem portugueses nos seus estabelecimentos ou devsenvolverem as mesmas
profissões, o que criou formas de convivência e solidariedad, que das lutas travadas no dia-dia construíram
laços de identidades por vezes de classe que eram perpassados por elementos de nacionalidade.
Os trabalhadores imigrantes portugueses que trabalhavam como leiteiros construíram sem dúvida uma
cultura específica advinda do trabalho. Esta cultura estava relacionada à identidade social destes trabalhadores
que expressavam as formas de organização do seu trabalho. Os leiteiros por usarem um espaço urbano na
cidade, por diversas vezes entravam em choque com os moradores.
Morar e trabalhar juntos constituía uma forma de se relacionar entre os trabalhadores imigrantes
portugueses e deles para com os “outros”. A identidade que eles construíram foi se moldando e permitiu que
eles fossem visibilizados como grupo no espaço urbano, com uma identidade bem demarcada advinda de formas
de convivências e presença em certos ramos de trabalho.

33
PARÁ. PARÁ. Arquivo Público Estado. Fundo.Chefatura De Policia. Autos, 1902. Auto de Declaração que fez Antônio Dias Lourenço.
34
PARÁ. Notação: Doc. 1. Tribunal De Justice Do Estado. Comarca Do Grão-Pará (2° Vara ). Crime de Resistência. Autora: Justiça Pública.
Réus: Manoel Gomes e outros, Ano De 1873.

306
Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX: ... • Edilza Joana Oliveira Fontes

O PAPEL DA MULHER

Os projetos imigrantistas dos governos paraenses do fim do século XIX e início do século XX foram
imbuídos da ideologia eugenista da época que considerava a raça branca superior para colonizar e povoar o
mundo; daí a necessidade da imigração europeia para “embranquizar” a sociedade brasileira e com isso alcançar
a civilização. Nesses projetos, a figura da mulher passa a ser fundamental. A mulher portuguesa é pensada
como portadora de uma postura de mulher civilizada, que tinha possibilidade de “purificar a raça” e como
trabalhadora, a mulher em geral, ajudava a baixar os salários. Após a abolição, por exemplo, tentou-se excluir
as libertas de um mercado de trabalho dominado por elas.
Havia um incômodo que os artigos de jornais deixavam transparecer, que era o medo do mercado de
trabalho se constituir fora do controle dos donos do capital comercial no período, o que implicava estabelecer
outras relações de exploração da força de trabalho. A necessidade de disciplinar a mulher pobre, branca,
estrangeira ou a mulher negra nacional, para as elites da época, fazia parte de um projeto que garantia a
sobrevivência de um poder institucionalizado.
Pretende-se analisar as relações de trabalho e de gênero vivenciadas por imigrantes portuguesas no
espaço de trabalho e no espaço de moradia em Belém, buscando entender de que maneira a construção de
identidades se processava, no início do século passado, entre sujeitos diferentes.
Registros nos autos do Tribunal de Justiça do Pará dão pistas de como se davam esses processos. No
auto qualificado feito a Joaquina Gomes da Costa em 188135, observam-se algumas condições de trabalho e
moradia vivenciadas por imigrantes portuguesas em Belém. Joaquina tinha trinta e nove anos, solteira, brasileira,
preta, trabalhava em serviços domésticos e morava perto do Chafariz da cidade. Na noite de 18 de julho de
1881 escutou e viu seu vizinho chamar sua companheira de “vaca preta devassa”. Joaquina foi testemunha a
favor de sua vizinha e contra Manoel Pereira Lopes, de 33 anos, português, casado e pedreiro. Manoel afirmou
que Joaquina era sua inimiga, desconhecendo qualquer afinidade e revelando possíveis desavenças anteriores.
Ao testemunhar contra Manoel, Joaquina, mesmo sendo brasileira e negra, estabeleceu uma relação de
solidariedade com sua vizinha, opondo-se a um patrício dela.
Noutro caso, Joana Maria Richael, portuguesa, empregada doméstica e que morava na casa de um
senhor Francisco na praça Batista Campos, queixou-se, em 1889, de ter sido roubada por um português de
nome José Soares que lhe levou cento e oitenta e cinco escudos36. Este e outros depoimentos permitem pensar
que as mulheres portuguesas chegavam a Belém sem dinheiro e necessitavam de contatos com seus patrícios
para garantirem moradia e alimentação. Quando vinham desacompanhadas, geralmente se empregavam para
serviços domésticos ou vendendo frutas. Foi o caso de Serafina que em 1905, quando veio de Manaus para
Belém necessitou alojar-se na casa de um patrício, provocando desavenças conjugais na casa deste37.
Quando as imigrantes acompanhavam o marido, na sua chegada eram registradas e identificadas como
donas de casa, mesmo que trabalhassem nos negócios da família, geralmente servindo no balcão da mercearia
ou do botequim, sujeitas a longas horas de trabalho. Elas não eram reconhecidas como capazes de administrar
os negócios da família. Francisca de Jesus, uma portuguesa viúva que tentou dirigir uma taberna sozinha teve
a mesma invadida por um grupo de guardas urbanos na tarde do dia 2 de julho de 1885, exigindo o fechamento
da porta do estabelecimento. Diante da ameaça, Francisca correu para o quintal e ameaçou soltar os cães
bravos, mas os guardas revidaram ameaçando-a com os sabres. Após a retirada dos guardas, Francisca foi
aconselhada pelos vizinhos a fechar a taberna já que não tinha marido para protegê-la38.

35
Pará. Arquivo do Tribunal de Justiça. Secretária de Polícia, Autos, 1881.
36
Desordeiros. Diário de Notícias. 4 dez.1889.
37
Pará. Arquivo do Tribunal de Justiça. Segurança Pública: Chefatura de Polícia. Autos - 1905.
38
Mulheres de Má Vida: Diário de Notícias, 10 set.1885.

307
Migração internacional na Pan-Amazônia

Apesar da repressão contra a população pobre de Belém, negros, homens, mulheres, brancos, nacionais
e estrangeiros continuaram a frequentar as tabernas, os botequins e as ruas. Divertiam-se, compartilhavam do
espaço da rua com os vizinhos e parentes, para beber, namorar, negociar e resolver seus assuntos pessoais que
por vezes terminavam em brigas39.
Várias formas de repressão foram usadas, tais como exigir perante o Juiz de Paz a assinatura de um
termo de bem viver, prisão de pessoas suspeitas que estivessem nas ruas à noite, prisão de bêbados que fossem
encontrados nas ruas e prender as armas dos negros capoeiristas e os vadios que estivessem nas ruas sem
justificativa aceitável para a polícia. Estes “vadios” incluíam mulheres pobres que moravam sozinhas acusadas
de saírem à noite em companhia de “libertinos” promovendo “orgias” 40.
Apesar das pressões das políticas governamentais, as mulheres criavam laços de solidariedade e de
convivência marcando presença no espaço público da cidade. Esta presença é relatada nos jornais de Belém,
associada à desordem e à indisciplina. Os discursos jornalísticos denunciavam a permanência de mulheres
negras e imigrantes portuguesas em tabernas, botequins, cortiços e ruas41.
Os autos do Tribunal de Justiça permitem identificar relações de trabalho e afetivas que mulheres
pobres portuguesas estabeleciam em Belém na época da economia da borracha. Por exemplo, no auto de
Emília Ferreira se observa que esta portuguesa de trinta e cinco anos, solteira e analfabeta morava na casa do
seu patrão quando sofreu um acidente com revólver.
Neste auto transparecem relações de trabalho estabelecidas por Emilia e Resende de Souza Lima, seu
patrão, um cearense, solteiro, comerciante, de vinte e dois anos que jura não ter atirado em Emilia, o que é
testemunhado por Antônia dos Santos Lima, uma cearense que se diz amiga e afilhada de Emília. Resende não
assume qualquer relação afetiva com Emília.
Em diversos casos as relações de trabalho intercalam-se com as relações amorosas, mas essas relações
afetivas, muitas vezes, encobriam relações de exploração dessas imigrantes e excluíam do espaço público dos
negócios a presença dessas mulheres, permitindo seus registros e referências somente quando acompanhadas
por seus maridos.
Nos registros de óbitos publicados nos jornais os nomes das mulheres imigrantes são acompanhados da
idade e da causa da morte. A maioria dessas mulheres era maior de vinte anos e morria principalmente de
tuberculose e febre amarela.
Os discursos dos governos da província do Pará estavam todos pautados para um interlocutor masculino
que poderia trazer sua família para uma “nova terra”, não discutindo, por exemplo, as possibilidades de vinda de
mulheres imigrantes. Nessas condições, não é surpresa que o mercado de trabalho para mulheres portuguesas
em Belém não fosse muito amplo.
De um total de 673 anúncios de emprego em jornais de Belém, de 1884 a 1903, 64 (10%) indicavam
preferência por portugueses ou portuguesas, ou seja, existia certa relação entre mercado de trabalho e
nacionalidade. Esta prática ajudava esconder o preconceito racial que existia em uma parcela da população que
preferia trabalhadores disciplinados brancos. Nas ofertas de emprego para mulheres a preferência era quase
sempre por mulheres sadias e sem filhos. No total as profissões femininas mais solicitadas eram criadas,
amas-de-leite, ama-seca, cozinheiras e costureiras.

39
Troços de Vadios. Diário de Notícias. 18 out. 1885.
40
A República, 1892.
41
Desordeiros. Diário de Notícias. 4 dez.1889.

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Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX: ... • Edilza Joana Oliveira Fontes

O mercado de trabalho para homens tinha como profissões mais procuradas caixeiro, padeiro, criado,
cigarreiro, cozinheiro, alfaiate, professor, forneiro, maquinista, barbeiro, jardineiro, serrador, sapateiro, funileiro,
comerciante e tipógrafo; sendo os caixeiros os mais procurados.
O trabalho doméstico era o grande mercado assalariado para mulheres pobres brancas e negras.
Muitas dessas mulheres tiveram que sobreviver da venda ambulante, dos serviços domésticos e da prostituição.
Seus trabalhos eram marginalizados socialmente, sendo excluídas de um mercado de trabalho diversificado do
ponto de vista de várias profissões.
O mercado de trabalho em Belém era perpassado por relações de gênero na medida em que se definiam
trabalhos sexualizados, estabelecendo hierarquia e alteridade nas relações de trabalho. Para as mulheres, o
mercado de trabalho fora do lar era baseado nos serviços de casa, ou seja, não havia ofertas de empregos para
mulheres fora do espaço das atividades domésticas e de venda de doces e artesanatos nas ruas.
O mercado de trabalho feminino em Belém, naquela época, enquanto trabalho fora de casa, era uma
extensão do espaço doméstico, ou seja, há um papel feminino construído historicamente e que naquele momento
definiu o lugar do trabalho feminino e do trabalho masculino. O que seria trabalho de mulheres não se contrapõe
à imagem feminina ligada ao lar.
Analisando os anúncios de pedidos de ama-de-leite e ama-seca, entre 1873 e 1896, observa-se que o
local de trabalho das mulheres poderia ser nas casas dos seus patrões ou nas suas (Tabela 9) (GRAHAM,
1992). As prestações de serviços davam-se diretamente ou a partir de agenciadores que alugavam escravas
para casas de famílias (antes da abolição). As exigências ou habilidades escritas nos anúncios colocam a
preocupação com a saúde e a nacionalidade portuguesa é cada vez mais evidente.
A preferência por mulheres morigeradas, ou seja, que tivessem bons costumes e vida exemplar, exige
que pobres, brancas ou negras se enquadrem no modelo moral das famílias abastadas de Belém, para que
pudessem entrar nos seus lares. Exigências como a de dormir no emprego reafirmam a necessidade do controle
dos patrões sobre a vida de suas criadas.
Uma das estratégias utilizadas por imigrantes portuguesas pobres que queriam voltar para Portugal era
empregar-se como criadas para famílias que iriam para o exterior, já que nesses casos se preferiam portuguesas
ou brasileiras brancas42. Outra vantagem que as mulheres portuguesas poderiam utilizar era alfabetizar-se e ter
experiência de prendas domésticas. Isto as colocava em vantagem perante trabalhadoras nacionais, já que
podiam garantir moradia nas casas dos patrões, que preferiam portuguesas para dormir nos empregos.
O perfil deste mercado de trabalho está carregado de preconceitos raciais. A preferência por empregadas
domésticas portuguesas pode ser explicada pelo temor que as donas de casa sentiam em empregar ex-escravas,
tendo em vista não poderem mais controlar suas “mal-criações” e provavelmente não quererem conceder
exigências agora feitas por essas libertas. Outra explicação era a exigência de que criadas e amas-de-leite
tinham que ter boa saúde, afirmando-se cada vez mais a defesa de um tipo de família que acreditava que
mulheres moradoras de cortiços ou negras em contato com seus filhos poderiam passar doenças e costumes
não condizentes com o ideário de crianças sadias e de bons hábitos (brancas). O perigo de contágio de doenças
por parte de amas-de-leite diretamente para a criança era um medo concreto, tanto que a partir de 1889 se
passa a exigir exame médico destas mulheres. As famílias acreditavam que os riscos de contágio, tanto de
doenças como de hábitos, seriam menores na medida em que as criadas ou amas-de-leite fossem substituídas
por imigrantes brancas europeias. Também a crença de que a mulher negra (ex-escrava) não era sensível para
com as crianças, na medida em que a escravidão tornava a pessoa sem relação social e sem sentimentos para
com os filhos, possibilitou práticas racistas nas preferências por amas-de-leite brancas.

42
Eram comuns na época avisos como o publicado na Folha do Norte de 17 de abril de 1896 que solicitava: “Ama Seca: precisa-se de uma
portuguesa ou brasileira branca para fazer viagem com uma família, que vai para o estrangeiro. A tratar no Hotel América, com D. Emília
Chaves”.

309
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabela 9 - Anúncios de jornais solicitando ama-de-leite ou ama-seca, em Belém, 1873-1896

Ano e local
Exigências e habilidades
de trabalho
1873 Casa/família Sem filhos
1879 Casa/família Sem filhos, preta
1879 Sem filhos, mulata, alugada, boa de leite, carinhosa e com criança
1880 Sadia, carinhosa com as crianças, alugada
1882 Alugada, trabalhar em casa, sadia, boa de leite, casada, portuguesa, prefere criança e família ou de casa expostos
1884 Casa/família Sem cria
1885 Alugada sem filho
1885 Alugada
1885 Casa/família Sadia, bastante leite, portuguesa
1885 Alugada, sem filho
1885 Casa/família Sadia, bastante leite, portuguesa
1885 Queira ir para fora
1887 Casa/família Sadia, sem filhos
1887 Amamentar até a Europa
1887 Alugada, forte, sadia, sem filhos
1887 Casa/família Sem filhos
1887 Casa/família Sem filhos
1888 Casa/família Sem cria
1891 Casa/família Boa ama, portuguesa, durma no emprego
1891 Casa/família Exigências e habilidade
1881 Casa/família Ama de uma criança, quem tiver e quiser alugar, 10 a 12 anos
1881 Companhia de duas meninas. Senhoras para viajar para Europa, boa condutora
1896 Trabalhadora estrangeira, portuguesa, brasileira, branca
Fonte: A tabela foi elaborada a partir dos dados retirados dos jornais do Pará (1873-1896): Diário de Noticias, A Republica, O Liberal do Pará e o Diário de Belém.

A exigência de boa conduta e mulheres morigeradas impunha às mulheres pobres, um mercado de


trabalho clivado também por valores morais. A valorização dos bons costumes e vida exemplar feita pelas
famílias que empregavam as criadas não incluía mães solteiras, mulheres que estabeleciam laços afetivos fora
do casamento, que moravam sozinhas ou em cortiços ou que andavam na rua desacompanhadas. Estes valores
morais serviram para marginalizar ainda mais a mulher negra ex-escrava.

ORGANIZAÇÕES DE TRABALHADORES

AS ASSOCIAÇÕES BENEFICENTES
Salles (1992) indica a formação das primeiras sociedades de mutuários no estado ainda nos anos
sessenta do século dezenove. Algumas dessas sociedades tiveram atuação política mais abrangente, como a
Sociedade Beneficente 28 de Setembro, organizada em 1872 pelos catraieiros do porto de Belém que teve
destacada atuação na campanha de abolição da escravidão no Pará. Em 1884, os catraieiros tomaram a decisão
de não mais transportar escravos embarcados ou desembarcados no porto de Belém e a Sociedade ficou
conhecida como uma organização abolicionista.

310
Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX: ... • Edilza Joana Oliveira Fontes

Muitas associações de mutuários no Pará foram organizadas a partir de grupos de operários que se
identificavam como artífices e/ou artísticas. As denominações, expressas nos nomes das sociedades, procuravam
ressaltar o trabalho qualificado. Por exemplo, os estatutos da Sociedade Beneficente dos Sapateiros, aprovados
em 09 de agosto de 188143, determinavam como objetivo auxiliar os seus associados nos casos de doença,
prisão e invalidez total para o trabalho. Só poderiam ser sócios efetivos desta sociedade os indivíduos que
exercessem ou tivessem exercido profissão de sapateiro, coureiro, surrador, bauleiro ou tamanqueiro, fossem
cidadãos que tivessem bom comportamento, não sofressem de moléstia crônica ou incurável, tivessem menos
de 45 anos, e não tivessem cometido crime pelo qual tivessem sido condenados. As esposas, os irmãos e os
filhos dos sócios eram considerados sócios dependentes, gozando dos mesmos direitos dos efetivos. A Sociedade
dava auxílio na doença e no caso do sócio estar preso e sujeito a processo criminal.
No estatuto da Associação Beneficente dos Sapateiros consegue-se observar como os seus trabalhadores
pensavam a divisão do trabalho no interior da categoria, abrangendo desde os trabalhadores que manejavam o
couro até o tamanqueiro. A Sociedade se considerava artística e assim atribuía uma identidade a seus membros,
que estava simbolizada pelo exercício do oficio e pela devoção aos seus santos. Aliavam assim dois elementos
para se identificar em defesa da profissão via organização por oficio, diferentemente da Associação Internacional
dos Socorros Mútuos44 que se declarava aberta a todos aqueles que tinham mais de 12 anos, ocupação honesta
e bom comportamento. Outra associação beneficente era a dos Artífices dos Pedreiros e Carpinteiros que
afirmava em seus estatutos “Promover pelos meios ao seu alcance o bem estar de seus associados e os
interesses das classes de seus membros em geral”45
A Sociedade Artística dos Pedreiros e Carpinteiros tinha como padroeiros São José e São Procópio e
comemorava anualmente seus dias. Nesta Sociedade fica explícita a afirmação de uma identidade de classe
por categoria e admitia “promover os interesses das classes de seus membros em geral”. O termo classe foi
usado no plural, mas, pressupõe que as classes poderiam ter interesses comuns o que leva a pensar na possibilidade
da sociedade não estar preocupada só com os “socorros mútuos”. A defesa do oficio era a base da Associação
e seus estatutos entendiam a profissão subdividida por pedreiro, carpinteiro, estucador, marceneiro e torneiro, já
parecendo uma preocupação com o controle do mercado de trabalho, como o determinava seus estatutos:
“O sócio arrematante de qualquer obra pública ou particular terá por obrigação preferir e aceitar para seus
trabalhos os sócios, que lhe solicitaram ocupação”.
Nessa consideração já transpareciam elementos das sociedades de resistência e valorização do trabalho
manual, na medida em que na defesa do emprego dos associados previa a defesa da profissão e construía a
unidade dos sócios pelo exercício do oficio.
A Sociedade Beneficente Protetora dos Caixeiros teve seu estatuto aprovado em 18.03.1882, e
acrescenta aos “socorros mútuos” a obrigação de promover instrução aos seus membros46.
Avaliando esses estatutos percebe-se que o termo mais utilizado era o de operários ou artistas. Todas
elas propunham uma série de auxílios para seus membros, na doença, na invalidez e socorros jurídicos caso
fossem presos. Propunham pensão aos familiares de seus sócios, até mesmo ajuda para viajar ao exterior.
As questões relacionadas à instrução foram muito discutidas entre os caixeiros, mas não aparece nos estatutos
das outras associações de socorros mútuos.

43
Atos do Governo da província do Grão-Pará, que forma a segunda parte da coleção das leis do ano de 1881. Tomo LXII. Belém Typ. do
Diário de Noticias, 1883, Portaria de 9 de agosto de 1881.
44
Atos do Governo da Província do ano de 1882. Tomo XLVI. Typ. do Diário da Tarde, 1883. Portaria de 4 jan., 1882.
45
Atos do Governo da Província do ano de 1882. Tomo XLVI. Typ. do Diário da Tarde, 1883. Portaria de 28 de jan., 1882.
46
Atos do Governo da Província do ano de 1882. Tomo XLVI. Typ. do Diário da Tarde, 1883. Portaria de 18 mar., 1882.

311
Migração internacional na Pan-Amazônia

Essas sociedades de auxílios mútuos com base em ofícios manuais tiveram importância no Pará
nas três ultimas décadas do século XIX. A qualificação profissional era preocupação destacada dessas
associações, elas, por vezes, juntaram assistência e defesa de condições de trabalho como elementos
constituidores da sua identidade. Pode-se perceber então que a concepção mutualista e a perspectiva classista
estavam incorporadas nas práticas e discursos dessas associações beneficentes (BATALHA, 1998).
A presença portuguesa é marcante nas organizações de beneficência. Vários dos fundadores destas
associações eram portugueses e a própria colônia portuguesa no Pará, tinha como uma das suas preocupações
a situação dos imigrantes portugueses no estado. Em um livro publicado em 1920, Assis Brasil pretendeu
“contribuir para honrar Portugal” dando informações sobre a colônia portuguesa no Pará, fundada em 15 de
março de 1920. A Sociedade Portuguesa de Beneficência foi fundada a oito de outubro de 1854 por um grupo
de negociantes portugueses. Esta sociedade deveria servir de amparo aos seus membros, nas prevenções da
vida como as enfermidades. Exigia-se para a entrada na sociedade que o proposto fosse cidadão português no
gozo dos seus direitos, tivesse bons procedimentos, residisse no Pará ou no Amazonas e ganhasse em emprego
lícito a sua subsistência. A Beneficência construiu o hospital D. Luiz I, para atendimento de todos os habitantes
do Pará que necessitassem de ajuda e em 1875 a diretoria do Asilo Português da Infância Desvalida propôs à
beneficente a incorporação do mesmo à sociedade. Outras sociedades de socorro mútuo, de origem portuguesa,
foram a Caixa de Socorro D. Pedro V e a Associação Vasco da Gama. Esta se instituiu a 20 de maio de 1898
e a maioria de seus sócios era de empregados do comércio (ASSIS, 1920).
No período anterior à Republica, as formas mutualistas de organização dos trabalhadores são incentivadas.
Em 1865, surgiu a Sociedade Beneficente Artística Paraense e em dezembro de 1886 foi fundada a Sociedade
União Paraense, com 17 membros entre artistas e intelectuais.
Os tipógrafos fundaram a Associação Tipográfica Paraense em agosto de 1871, que foi dissolvida em
setembro de 1881. No segundo semestre de 1883 apareceu a Liga Operária, cujo presidente foi José Agostinho
dos Reis, que queria unir os interesses das várias associações mutualistas então existentes. Estas sociedades já
apresentavam uma perspectiva de unidade das várias categorias de trabalhadores no Pará, construindo um
discurso de união dos trabalhadores.

AS GREVES

A República no Pará trouxe logo decepções àqueles que lutaram pelas melhorias das condições de
trabalho e pelas garantias de direitos políticos e sociais através da organização dos trabalhadores. Os movimentos
contestatórios à Republica expressavam os interesses de vários setores sociais em ultrapassar o projeto republicano
vencedor. No Pará os trabalhos em ofícios artesanais e de prestação de serviços se organizaram em sociedades
de socorros mútuos, buscando exercer a solidariedade e reforçar os laços de identidade construídos no espaço
do trabalho. Estas organizações eram por vezes contestadoras dos governos republicanos e em outros momentos
auxiliaram a implantação da República no Pará.
Diferentemente do que afirma Batalha (1998), a maioria das greves em Belém foram principalmente de
categorias de serviços urbanos feitas contra posturas municipais. No dia 04 de julho de 1883, foi noticiada uma
greve de leiteiros47. A greve era contra a nova postura municipal que proibia a venda de leite impuro adicionado
com água. Os fiscais dos distritos impediram a venda em domicílio, sem a presença da vaca à porta do comprador,
o que levou a categoria à greve.

47
Diário de Noticias. 4 jul. 1883. p. 2.

312
Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX: ... • Edilza Joana Oliveira Fontes

A greve dos aguadeiros de 11 de dezembro de 1883 foi notícia na imprensa paraense que criticou
o governo da província, pela falta de trato com os aguadeiros. A greve era a segunda vez que ocorria48 e seu
desenrolar permite conhecer um pouco sobre as condições de trabalho dos vendedores de água em domicílio de
Belém, e suas relações com o poder municipal.
Conhecedores do precário sistema de distribuição de água em Belém, no fim do século XIX, os aguadeiros
que eram, em sua maioria portugueses (CRUZ, 1963, p. 540), saíam em grande número para atender toda a
cidade. Não havia local apropriado para as carroças destes trabalhadores, o que criava conflitos com os condutores
de bondes por deixarem as ruas cheias de carroças, as quais dificultavam o trânsito. Os terrenos do Paul
D’água foram desapropriados pelo poder municipal em 1865,49 ficando também o serviço de venda d’água a
cargo do Tesoureiro Provincial.50 Até 1867, os serviços d’água potável não tinham sido implementados na
cidade. Em 1883, apenas 100 unidades urbanas, aí incluídas as casas comerciais, possuíam canalização. Havia
também torneiras onde o público podia comprar água, mas a compra diretamente dos aguadeiros era a prática
mais frequente (CRUZ,1963).
Belém, nessa época, contava com 120.000 habitantes, ou seja, o número de residências e casas
comerciais servidas com água encanada era muito reduzido. No momento da greve nas praças e casas particulares
onde havia torneiras da Companhia das Águas, ficaram com filas enormes (CRUZ, 1963). A população reclamava
do número escasso de torneiras públicas e questionava se a Companhia não deveria fornecer gratuitamente
alguns litros d’água.
A greve dos aguadeiros era contra o poder municipal, não era dirigida contra um patrão, mas contra
uma norma, uma lei, que restringia o trabalho da categoria, e esta experiência deve ter criado elementos de
consciência de classe, que levaram a pensar o Estado como um possível adversário. Os aguadeiros demonstraram
para a população de Belém que eram senhores de suas vontades, donos de suas pipas, donos de seus bois e
burros, assim como de suas carroças. Como prestadores de serviços sabiam que estavam enfrentando um
poder constituído que os colocava em conflito com a cidade. Os trabalhadores portugueses foram representados
como membros da anarquia, da desobediência às leis, como donos da liberdade ilimitada, assim como bêbados
e sujos. A greve foi uma ação contra o poder municipal e não houve a presença de qualquer organização
reivindicando a direção do movimento. Todas as notícias dão conta de comissões de trabalhadores negociando
com o poder municipal. A repressão à greve foi grande mas não se encontraram autos de prisões realizadas.
O sequestro dos carros e bois de alguns aguadeiros, “ficando os animais muito maltratados no deposito”
(CRUZ, 1963, p. 551) foi outro motivo para a greve. O confisco de seus bens por parte do poder público foi a
negação do controle do seu trabalho e de seu oficio. Para os aguadeiros, a greve foi o instrumento para exigir
maior liberdade para dispor de seu tempo e de seus bens.
Assim como a greve dos aguadeiros, houve muitas outras envolvendo diversas categorias, sendo as
mais notórias as greves dos condutores de bondes e de marinheiros da Companhia do Amazonas em 1892, dos
trabalhadores da Companhia de Estivadores da Borracha e dos magarefes do matadouro público em 1894, dos
peixeiros em 1902, dos carroceiros em 1907, e dos horteleiros de 1908.
As experiências das greves criaram vínculos de solidariedade que permitiram que, no final do século
XIX, categorias de trabalhadores de serviços com predominância de trabalhadores portugueses expressassem
elementos de uma consciência de classe em formação. As greves, no fim do século XIX, em Belém, eram na
sua maioria, em setores de prestação de serviços que de alguma forma se opunham às posturas ou aos impostos

48
Diário de Noticias. 12 dez. 1883. p. 2.
49
Oficio datado de 11 jan. 1865.
50
Oficio datado de 10 jan. 1865.

313
Migração internacional na Pan-Amazônia

municipais. Neste tipo de greve, o imigrante português é visualizado como o organizador dos movimentos e o
próprio trabalhador é típico das categorias em greve. Esses elementos de aglutinação foram possíveis porque
estes trabalhadores já tinham somatizado várias experiências no mundo do trabalho, que agrupou seus interesse
com as lutas contra a violência policial. Estas experiências muitas vezes vivenciadas em uma oficina, na rua
contra os trabalhadores nacionais ou se contrapondo aos policiais, foram elementos aglutinadores para
expressarem uma identidade coletiva nos momentos de conflito.
A presença de imigrantes nos movimentos de contestação à administração municipal foi uma constante
no período da administração do intendente Antônio Lemos. A postura de colocar-se contra as leis municipais
levou o imigrante português ao confronto com o poder municipal e com os agentes da fiscalização. Foram
conflitos que possibilitaram construir uma memória de imigrantes portugueses como anti-lemistas feita por
historiadores paraenses de época e na própria construção da memória que Antônio Lemos fez do seu governo
na cidade de Belém (SARGES, 2000).
Para Antonio Lemos não havia necessidade da organização de operários no Pará. Para ele as ideias de
contradição no capitalismo, ou mesmo os protestos frente às péssimas condições de trabalho, eram ideias
estranhas à boa índole do trabalhador paraense. Ele não via a “questão operária” no estado, aqui se vivia a
“harmonia social”, pensamento que foi compartilhado por Augusto Montenegro. Tal harmonia não foi vivenciada
pelos trabalhadores de Belém; as organizações de sociedades beneficentes e as greves foram de questionar as
relações de trabalho de formas diferenciadas na cidade da Belle Époque.
A tentativa do poder municipal de estipular regras para executar vários trabalhos, estabelecer postos
municipais em locais específicos, e aplicar multas ou taxar51, foram motivos para vários movimentos de contestação
à Intendência.
Nessa conjuntura foi criada uma cultura de oposição ao intendente Antônio Lemos. A presença de
imigrantes portugueses nesses movimentos de protesto foi grande o que faz pensar que o grau de insatisfação
com a administração municipal foi crescendo a ponto dos portugueses serem citados como responsáveis pelos
distúrbios contra Antônio Lemos e pela sua própria queda em 1910.

AS UNIÕES OU SINDICATOS

A análise dos estatutos das uniões operárias e sindicatos do início do século XX52 permite ver que os
movimentos de protesto conduziram a uma organização mais estruturada da classe operária de Belém originando
os primeiros sindicatos no início da segunda década desse século (1913), quando os estatutos consultados
foram aprovados.
A proximidade das datas de aprovação, a apresentação estética, a linguagem utilizada, os embasamentos
filosóficos e os objetivos descritos indicam uma possível articulação de vários fundadores dessas organizações
com algum grupo anarquista.
As classes operárias eram pensadas como sujeitos capazes de impulsionar sua própria história, como
projetos definidos. As greves e os estatutos das uniões apresentam uma organização nos locais de trabalho, o
que revela uma expressão de ação planejada dos trabalhadores.
As greves não foram somente contra um dos ramos de produção, o que demonstra a abrangência das
atuações anarquistas, assim como um programa revolucionário nos estatutos. O sindicalismo de ação direta não

51
Coleção de Leis, Resoluções e Actos da Executiva - Conselho Municipal, Códigos de Policiamento Municipal (1900) p. 18-70 (1916).
P. 19-50, Arquivo Público Municipal.
52
Teve-se acesso aos seguintes estatutos: “Estatuto do Sindicato dos Carroceiros”, “Estatutos e Regulamentos Interno da União dos
Chouffeur”, “Estatutos da União dos Operários Sapateiros”, “Estatuto da União dos Manipuladores de Pão”, “Estatutos do Sindicato dos
Cigarreiros e Cigarreiras”, “Sindicato dos carroceiros”, “União dos Vendedores Ambulantes” e “Sindicato dos Carpinteiros”.

314
Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX: ... • Edilza Joana Oliveira Fontes

falava somente a uma minoria militante, eles preocupavam-se com um público mais geral. A leitura dos estatutos
indica a vontade de construir um sindicalismo com base em uma escolha livre e consciente.
Discutiam-se também outros aspectos da vida do trabalhador. Recusavam-se a aderir ao jogo político
institucional buscando, a partir de suas lutas, ampliar os direitos dos trabalhadores na medida em que obrigaram
os governos e patrões a cederem parte de seus lucros.
As organizações sindicais eram vistas como as melhores formas associativas para unir e irmanar a
todos. Os estatutos consideram a organização sindical como uma organização de resistência e a elevação da
educação do trabalhador. O objetivo é a organização sindical das classes envolvidas, para defesa do que eles
consideravam como direitos dos trabalhadores.
A democracia interna dos sindicatos colocava a assembleia geral como o fórum máximo, sendo a
diretoria substituída por uma comissão administrativa. Os estatutos indicam preocupação com a instrução de
seus membros e para isso planejavam diversas iniciativas educativas. Se manifesta crítica à sociedade industrial
e aos males do capitalismo, fruto do momento histórico do início do século XX. A solidariedade entre os proletários
era um elemento de unificação dos diferentes sindicatos.
Os estatutos sindicais analisados parecem reafirmar os ensinamentos revolucionários que defendiam a
participação dos anarquistas nos sindicatos e que estes deveriam ser um instrumento para libertação operária.
Fica claro o caminho proposto para que os trabalhadores adquirissem a “consciência da sua exploração”. Este
caminho seria pela luta coletiva e pelo exercício da solidariedade.
Percebe-se a relação estreita com os ensinamentos anarquistas na forma de organizar os sindicatos e
greves, de prepararem a ação direta, como princípio norteador dos estatutos dos sindicatos. Esta relação entre
doutrinas anarquistas e sindicatos era visível, na medida em que membros das comissões administrativas dos
sindicatos eram anarquistas e foram presos e deportados como perigosos.
Neste sentido, as greves eram experiências, meios educativos, preparação moral que construía uma
identidade maior: a identidade de revolucionários. A exigência dos sindicatos para que organizassem bibliotecas,
por exemplo, era a tentativa de propagandear as ideias anarquistas e preparar a classe por dentro da estrutura
sindical para o embate pela transformação da sociedade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pesquisar sobre a experiência dos trabalhadores em Belém no período da Belle Époque é um trabalho
árduo. Esta dificuldade passa pelo verdadeiro “mito” existente no estado sobre uma “Belém da Saudade”.
A historiografia paraense53 se mostra mais preocupada em demonstrar como o espaço urbano de Belém foi
modernizado, colocando, inclusive, a administração do intendente Antônio Lemos como ausente de relações
conflituosas do seu governo com diversos trabalhadores da cidade. Está mais preocupada em demonstrar como
o espaço urbano de Belém foi modernizado e como Lemos foi um grande urbanista. Esta historiografia teima

53
O levantamento historiográfico sobre o tema é extenso. Veja algumas indicações apontadas por Aldrin Moura de Figueiredo em sua
dissertação de mestrado (ALDRIN, 1996): “Entre os viajantes vide Coudreau, Henri. Les Français em Amazonie. Paris: Picard-Bernheim
ET. Cie., 1887, L’Avenir de La Capitale Du Pará. Annaes da Biblioteca e Archivo Publico do Pará. V.8. Belém, 1913. Sobre administração
Municipal, vide Carlos Roque. Antônio Lemos e sua Época. Belém, Amazônia, 1973. Leandro Tocantins. O Velho Lemos, transformador
da cidade. In: Santa Maria de Belém do Grão Pará. 3. ed. Belo Horizonte, Itatiaia, 1987 (1967). Clóvis Corrêa Pinto. Belém: imagens
e evocações. Rio de Janeiro (s. Ed.), 1968. Vide também os romances de Vick Baun. Arvore que chora: o romance da borracha. Porto
Alegre: Globo, 1946; Ferreira de Castro. A selva econômica da Amazônia (1800-1920) São Paulo, 1980; Barbara Weinstein. The Amazon
Rubber Boom (1850-1920). Standford University Press, 1983. Sobre Estética da Belle-Époque Paraense, ver Célia Bassalo. O art
Nouveau no Pará. Belém: Grafisa, 1984. Sobre os significados do francesismo, vide Geraldo Mártires Coelho. Um pouco aquém da Belle
Époque ou quanto o Francesismo se insinua no Pará Novecentista. In: José C. Cunha. Ecologia, Desenvolvimento e Cooperação na
Amazônia. Belém: UNAMAZ/UFPA, 1992 (1990) e Maria de Nazaré Sarges. Riquezas produzindo a Bella-Époque: Belém do Pará
(1870-1910). Dissertação de mestrado. Recife: Universidade Federal de Pernambuco, 1990.

315
Migração internacional na Pan-Amazônia

em esquecer o cotidiano das camadas populares e quando se refere a elas é para mostrar a diferença destes
sujeitos “fora de lugar”, de uma Belém europeizada. As agruras de trabalhadores urbanos que habitavam a
periferia de uma cidade pretensamente moderna não mereceram estudo. A historiografia regional do período
procura justificar um discurso civilizador, e por isso uma história centrada nos sujeitos trabalhadores, e seus
movimentos contestatórios das ordens vigentes é inteiramente neofita. Na paisagem da Belle Époque não há
lugar para discussão das condições de trabalho de imigrantes pobres e contestadores. A partir dessa historiografia
construiu-se uma tradição inventada (HOBSBAWN, 1984), que teve como último filho prodigo o álbum Belém
da Saudade (SECULT, 1998).
No caminho trilhado pela historiografia local as noções de civilidade, de progresso, e de ordem são
preciosas para garantir a memória construída. Esta historiografia evolucionista e positivista (CRUZ, 1969) não
poderia ter produzido uma análise crítica da história social sobre a Amazônia na virada do século XIX.
Os estudos clássicos sobre a presença portuguesa na Amazônia centram-se na história da empresa colonial
portuguesa no Norte do Brasil. Estes estudos analisaram a polarização entre colonizadores e colonizados, e
indicam que as maiores fortunas pertenciam a portugueses que moravam em Belém.
Existe uma discussão sobre as animosidades entre paraenses e lusos residentes no Pará, devido à luta
pelo poder no estado54. A dominação portuguesa no estado é o eixo explicativo dos conflitos sociais que construíram
aos portugueses como dominadores e exploradores e aos nacionais como valorosos, lutando por sua liberdade
(BORGES, 1970). Essa disputa foi estudada como projetos políticos de grupos homogêneos, sem diferenciação
de classe e de cultura e sim como grupos rivais por serem de nacionalidades distintas.
Os autores não fazem diferenciação dentre os portugueses e construíram uma história primando por um
discurso nacionalista sem considerar os imigrantes portugueses em suas diferenciações sociais. A historiografia
regional não analisou os instrumentos de sociabilidade – as associações, as beneficentes, os grêmios – como
expressões do cotidiano dos imigrantes portugueses e como um dos mecanismos asseguradores de suas
identidades sociais, que a partir delas estabeleceram outras identidades e construíram novas relações sociais.
O livro de Palma Muniz (1916) sobre a imigração e a colonização da Amazônia é uma obra de cunho
estatístico que revela a preocupação em informar a entrada dos imigrantes de várias nacionalidades e sua
alocação nas colônias agrícolas da região. Muniz não faz uma analise das condições de trabalho e da vida que
estes imigrantes enfrentaram. O autor nos revela muitos dados estatísticos, mas não discute as origens culturais
destes imigrantes e os conflitos advindos de sua condição de “novos habitantes”. Entretanto, é um trabalho
pioneiro ao conter dados que permitem outra leitura desses imigrantes.
Arthur César Ferreira Reis, em sua obra Aspectos econômicos da dominação lusitana na Amazônia
(1969) relata aspectos do domínio dos portugueses nas atividades econômicas da região, sem fazer uma discussão
sobre o trabalho destes imigrantes e sua identidade cultural. Ernesto Cruz em sua obra História do Pará
(1963) discute sobre a chegada dos portugueses no Maranhão e a disputa pelo território amazônico. Relata as
atividades agrícolas que se implantaram na região, as lutas políticas entre portugueses e nacionais – pelo poder
no Pará, as missões religiosas e catequese dos índios, as lutas pela independência política sobre a Cabanagem
e certa “evolução histórica do estado”. Assim Ernesto Cruz e Arthur César Ferreira Reis representam, a partir
da segunda metade do século XX, a historiografia paraense preocupada com a síntese da história política do
estado, cujos sujeitos disputavam, em momentos variados, o aparato do poder estatal. Esses historiadores
trabalharam essencialmente com documentos oficiais, elaborando explicações históricas que excluíam importantes
sujeitos sociais, como os trabalhadores imigrantes portugueses.

54
Ver: ARANHA, Bento de Figueiredo Ferreira. Cenas da Cabanagem no Amazonas (Província do Grão Pará). IHGP. Belém 1 (1): 20-25,
1900; BAENA, Antônio Ladislau. Compêndio das Eras da Província do Pará. Belém: UFPA, 1969; BARATA, Manoel. A Antiga
Produção Exportação do Pará. Belém: tipografia da livraria Gillet, 1915; BOITEX, Lucas Alexandre. Marinha Imperial Versus Cabanagem.
1ª Ed. – Rio de Janeiro: Imprensa Naval, 1943; As disputas entre portugueses e nacionais é ainda relatada em nível do conflito armado
(HURLEY, 1936).

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Imigração e mercado de trabalho na Amazônia do fim do século XIX: ... • Edilza Joana Oliveira Fontes

Pode-se afirmar que há um único livro sobre o pensamento político revolucionário no Grão-Pará que
discute uma história das ideias políticas contestatórias ao capitalismo desde o tempo da Cabanagem (SALLES,
1998). Nesse livro encontra-se informações sobre associações, sindicatos, greves, manifestações de protesto
dos trabalhadores, notícias sobre os jornais de oposição etc., porém não é um livro que tenha como sujeitos os
trabalhadores urbanos e suas formas de organização no Pará. A discussão sobre o processo de trabalho, sobre
a formação da mão-de-obra urbana é outro assunto que é esquecido. Roberto Santos, em seu livro História
econômica da Amazônia (1880-1920) (1980) introduz a discussão sobre os movimentos sociais dos
trabalhadores e as condições de reprodução social da sua força de trabalho.
Avalia-se que a discussão feita neste texto sobre os vários projetos imigrantistas em disputa no Estado,
diferenciando-os dos projetos desenvolvidos principalmente no estado de São Paulo, acrescenta um pouco mais
de conhecimento sobre a Região Amazônica e suas especificidades históricas. Tentou-se demonstrar que a
propaganda desenvolvida pelos primeiros governos republicanos foi com o objetivo de construir uma imagem da
região como uma terra possível de ser civilizada ao mesmo tempo em que pregava o mito do espaço vazio.
O interesse neste assunto foi de demonstrar como os vários argumentos foram organizados em um discurso
científico que tinha como objetivo a atração de imigrantes para a região. Não bastava saber que o objetivo dos
governos era a atração de mão-de-obra estrangeira, buscava-se entender como vários discursos científicos
foram “encaixados” dentro de uma visão peculiar da Região Amazônica. Nesse sentido, a análise da brochura
O Pará em 1900 (PARÁ, 1900) foi fundamental para compreender como os homens de letras e ciência
pensaram a Amazônia no início do século XX.
Buscou-se mostrar que o sindicato de ação direta foi uma opção política dos trabalhadores urbanos de
Belém na segunda década do século XX e que se fez presente em vários movimentos grevistas, procurando-se
mostrar que eram imigrantes portugueses os que estavam à frente desses movimentos.
Pretendeu-se demonstrar que os imigrantes portugueses tinham dois caminhos opostos, um indicando o
confronto com o Estado republicano brasileiro e propondo a sua destruição e outro propondo uma convivência
com este Estado por mais que em alguns momentos conflituosa. Buscou-se demonstrar que no início do século
XX havia uma conjuntura de luta de mercado de trabalho onde os imigrantes portugueses se debateram com
trabalhadores nacionais e com as posturas municipais, e que essa conjuntura era outra na década de 1910.
Buscou-se também demonstrar que esta cultura do trabalho foi a base, num primeiro momento, para
disputas acirradas entre trabalhadores por postos no mercado de trabalho na medida em que esta cultura era
utilizada pelos patrões para estabelecer critérios de seletividade da mão-de-obra.
Um dos fatores que explicam essa luta foi a experiência advinda do mundo do trabalho que criou certa
cultura que identificava como exploração a forma como se davam as relações trabalhistas em Belém. Mais
precisamente buscou-se demonstrar que no início do século XX, a cultura de um trabalhador urbano era
diferente da que existe hoje, e que estas diferenças podem ter criado bases para uma postura libertária de
alguns trabalhadores.

317
Migração internacional na Pan-Amazônia

REFERÊNCIAS

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A imigração japonesa na Amazônia (1929-2009): .... • Alfredo Kingo Oyama Homma

A IMIGRAÇÃO JAPONESA NA AMAZÔNIA (1929-2009):


PASSADO, PRESENTE E FUTURO

Alfredo Kingo Oyama Homma1

INTRODUÇÃO

A imigração japonesa na Amazônia foi iniciada 21 anos depois da vinda dos primeiros imigrantes do
Kasato Maru, cujo centenário foi comemorado em 18 de junho de 2008. Os primeiros colonos vieram para
Tomé-Açu (1929), no estado do Pará e, para Maués (1929) e Parintins (1930), no estado do Amazonas (HOMMA,
2008).
No estado do Pará o acordo para a vinda de imigrantes japoneses foi iniciado pelo embaixador Shichita
Tatsuke, em 1923, atendendo ao pedido do governador do Pará Antônio Emiliano de Sousa Castro (1875-1951).
Este acordo foi concretizado na gestão do governador Dionísio Ausier Bentes (1925-1929), em 1925, permitindo
que Hachiro Fukuhara (1874-1943) e com o apoio do financista Sanji Muto (1867-1934), iniciassem as atividades
da Nambei Takushoku Kabushiki Kaisha (Companhia Nipônica de Plantações do Brasil S.A.), conhecida como
Nantaku, com a vinda dos primeiros imigrantes em 1929.
Já no estado do Amazonas a vinda dos imigrantes japoneses foi iniciada também pelo embaixador
Shichita Tatsuke, atendendo ao pedido do governador Ephigênio Ferreira de Salles (1926-1930), fazendo com
que em 11 de março de 1927, concedesse a Genzaburo Yamanishi e Kinroku Awazu (1893-1979) a concessão
de um milhão de hectares, que foi transferida para Tsukasa Uyetsuka (1890-1978), iniciando a imigração
japonesa no município de Parintins.
Na época em que foi iniciada a imigração japonesa na Amazônia, a economia regional era essencialmente
extrativista e em estagnação, devido à crise da borracha, que chegou a participar como terceiro produto de
exportação do país. Rio de Janeiro era a capital do Brasil que permaneceria até 1960, quando foi transferida
para Brasília. O extrativismo da borracha tinha também destruído a incipiente agricultura que existia na Região
Amazônica.
Quando a imigração japonesa foi iniciada na Amazônia ainda prevalecia a saga do imaginário amazônico,
que serviu de relato de diversos exploradores, cientistas e escritores. Em 1800, o barão alemão Friedrich
Wilhelm Karl Heinrich Alexander von Humboldt (1769-1859) alcunharia a Amazônia como sendo o “Celeiro do
Mundo’’, que iria contrapor a do pernambucano Alberto do Rego Rangel (1871-1945), de “Inferno Verde”, em
1904; do clássico “A Selva”, do escritor português José Maria Ferreira de Castro (1898-1974) em 1930 e da

1
D.Sc., Economista Agrícola, Pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental, Caixa Postal, 48, CEP 66095-100, Belém, Pará,
homma@cpatu.embrapa.br, (91) 3204-1082.

321
Migração internacional na Pan-Amazônia

“Amazônia misteriosa”, do carioca Gastão Cruls (1888-1959), em 1935 (HOMMA, 2003). A Amazônia era
uma região desconhecida pelos próprios brasileiros, no qual os relatos dos viajantes constituíam a literatura
científica existente e com acesso muito limitado.
Hoje com as facilidades do celular, aviões a jato e internet, a Amazônia se tornou um espaço virtual,
cujos acontecimentos, como o assassinato da freira norte-americana Dorothy Mae Stang (1931-2005), em 12
de fevereiro de 2005, são conhecidos imediatamente no mundo inteiro. A primeira ligação telegráfica de Belém
ao sul do país foi efetuada em 1886 e somente em 1896, Manaus foi conectado com Belém.
Valorizar as dificuldades que os imigrantes japoneses enfrentaram no Brasil, como tem sido a tônica de
muitos textos, não tem nenhum sentido, pois a tragédia e a perda da condição humana, têm sido mais trágicas
para os próprios migrantes brasileiros na Amazônia, mesmo na época contemporânea.
A Amazônia, até a década de 1950, era uma “civilização das várzeas”, que dependia do transporte
fluvial, das cidades alinhadas ao longo da calha dos principais rios navegáveis, cujas cidades lembravam as
cidades portuguesas. A ocupação de terra firme restringia a periferia dos principais núcleos urbanos. Este
modelo de ocupação seria quebrado em 1960, com a abertura da rodovia Belém-Brasília, quando a “civilização
da várzea” muda para a “civilização de terra firme”, passando a se estabelecer ao longo das estradas que
começaram a rasgar a Amazônia em todos os sentidos. Entre estes dois extremos, ocorreu a construção de três
estradas-de-ferro: a fracassada tentativa para vencer o trecho encachoeirado do rio Tocantins (1908-1944), a
mais importante ligando Belém a Bragança (1883-1908) e a famosa Madeira-Mamoré (1907-1912), constituíam
três riscos que existiam nos mapas da Amazônia no início do século XIX. Hoje as estradas abertas na Amazônia
somam mais de 240 mil quilômetros, equivalente a seis voltas ao redor do planeta.
Com a “civilização da terra firme” que passou a constituir no modelo de ocupação predominante, os
portos e as estações ferroviárias perderam a importância sendo substituídas pelas rodoviárias, na busca de
sonhos e esperanças. A imigração em Parintins era apoiada na ocupação das áreas de várzeas e no transporte
fluvial enquanto em Tomé-Açu, a ocupação era nas terras firmes e, até 1973, dependente do transporte fluvial.
No cenário político, quando foi iniciada a imigração japonesa na Amazônia os governos ditatoriais
ensaiavam o domínio no mundo, no prenúncio dos tambores de guerra: Adolf Hitler (1889-1945), governou a
Alemanha no período de 1933 a 1945, Benito Mussolini (1883-1945), governou a Itália no período 1922 a 1943
e no Japão, o militarismo simbolizado no general Hideki Tojo (1884-1948), governou no período 1941 a 1944,
formavam o Eixo, que teve grandes consequências negativas nos destinos da humanidade. Na URSS, Joseph
Stalin (1879-1953), governou com mão-de-ferro durante o período de 1922 a 1953, na Espanha, o general
Francisco Franco (1892-1975), dirigiu o país no período 1939 a 1973 e, em Portugal, Antônio de Oliveira Salazar
(1889-1970), conduziu o governo no período de 1933 a 1974. No Brasil, o ditador Getúlio Vargas (1882-1954),
governou o país no período de 1930 a 1945, no qual nutria uma simpatia disfarçada pelos nazistas e japoneses,
que preocupava os americanos e aproveitava para angariar benefícios. Inclusive na colonização na Amazônia
não se descarta o interesse geopolítico dos militares japoneses, pela obtenção de 600 mil hectares de terra em
Acará, 400 mil hectares em Monte Alegre, e 3 lotes de 10 mil hectares, em Marabá, na zona da estrada de ferro
de Bragança e até em Conceição do Araguaia, para a imigração japonesa (CRUZ, 1958). Quanto às terras em
Marabá e Conceição do Araguaia, os japoneses não estavam interessados no estabelecimento de colônias ao
longo do Rio Tocantins, mas receberam apenas para ter terras em diferentes lugares que depois foram
abandonadas.

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A imigração japonesa na Amazônia (1929-2009): .... • Alfredo Kingo Oyama Homma

A POPULAÇÃO QUE VIVIA NA AMAZÔNIA

Quando a imigração japonesa iniciou na Amazônia a população brasileira era inferior a 40 milhões de
habitantes, menos do que a atual população do estado de São Paulo, com 70% da população vivendo no meio
rural (Tabela 1). Ocorreu uma grande mudança do perfil da população brasileira. Em 1960, o Brasil tinha uma
população de 70 milhões de habitantes dos quais 55% viviam no campo. Já em 1970, enquanto o Brasil sagrava-
se tricampeão mundial de futebol, com a famosa marchinha do Miguel Gustavo (1922-1972) “noventa milhões
em ação”, que na realidade eram 93 milhões de habitantes, houve uma reversão, onde 56% da população
passaram a viver nos centros urbanos. Dez anos depois, o Censo Demográfico de 1980, mostrava o crescimento
da participação urbana que atingiu 62%. Mas o fenômeno mais importante é que a população rural perdia não
só a sua importância relativa, mas também em termos absolutos. De uma população rural de 41 milhões de
habitantes em 1970, caiu para 39 milhões de habitantes em 1980. Isso significava que um Brasil rural desaparecia
para dar lugar a um Brasil urbano, apesar do sucesso das duplas caipiras. O Censo Demográfico de 1991
mostrou a permanência dessa tendência, com 75,5% da população vivendo nos centros urbanos e o decréscimo
da população rural para 36 milhões. A Contagem Populacional de 1996 mostrou que a população urbana passou
para 78,4% e a população rural caiu para 34 milhões e a Contagem Populacional de 2007 mostrou a redução da
população rural para menos de 31 milhões de habitantes. A Contagem Populacional de 2007 mostrou que na
Amazônia Legal vivem 23.596.953 habitantes, onde 73,5% vivem nos núcleos urbanos, sendo o Amapá o mais
urbanizado com 93,7% e o Maranhão o menos urbanizado com 67,0%.

Tabela 1 – População dos estados do Pará e do Amazonas, da Amazônia Legal e do Brasil

Ano Pará Amazonas Amazônia Legal Brasil

1872 275.237 57.610 753.904 9.930.478


1890 328.455 147.915 1.000.051 14.333.915
1900 445.356 249.756 1.312.445 17.438.434
1920 983.507 363.166 2.560.001 30.635.605
1940 960.000 438.008 3.129.854 41.236.315
1950 1.142.846 514.099 3.993.075 51.944.397
1960 1.529.293 708.459 5.943.460 70.070.457
1970 2.167.018 955.235 8.193.628 93.139.037
1980 3.403.391 1.430.089 11.015.403 119.002.706
1991 4.950.060 2.103.243 16.988.040 146.825.475
1996 5.510.849 2.389.279 18.746.274 157.070.163
2000 6.192.307 2.812.557 21.056.532 169.799.170
2007 7.065.573 3.221.939 23.596.953 183.987.291
Fonte: Anuários estastísticos do IBGE

A entrada dos emigrantes japoneses no Brasil foi para trabalhar nas lavouras de café, sobretudo no
estado de São Paulo. Na década de 1900 as exportações de café representavam 65% do valor das exportações
nacionais, que aumentou para 70% em 1920 e caiu com a quebra da Bolsa de Nova Iorque, em 1929, para 40%
em 1931. A crise da cafeicultura paulista facilitou a aquisição de terras por imigrantes japoneses, induzindo a
formação de pequenos proprietários que se estabeleceram na periferia dos núcleos urbanos. No Brasil entraram
aproximadamente 188 mil emigrantes japoneses antes da Segunda Guerra Mundial e 62 mil após o término do
conflito. Na Amazônia, ocorreu um movimento inverso, sendo 3 mil antes da Segunda Guerra Mundial e 7 mil
após o conflito atraídos pelo lucro da pimenta-do-reino. Não existem estatísticas de deslocamentos de imigrantes
japoneses e seus descendentes provenientes de outros estados extra-Amazônia.

323
Migração internacional na Pan-Amazônia

A AGRICULTURA NA AMAZÔNIA ANTES DA IMIGRAÇÃO JAPONESA

O sucesso da transferência de sementes de seringueiras por Henry Alexander Wickham (1846-1928),


em 1876, para o Sudeste asiático fez com que em 1913, a produção asiática fosse igual à da Região Amazônica.
A borracha era o terceiro produto da pauta das exportações nacionais, vindo logo após o café e o algodão. Foi
o maior sucesso de domesticação na época contemporânea. Em 1908, a produção de borracha amazônica
representava 94,4% da produção mundial e dez anos depois, em 1918, apenas 10,9%. Foi a maior crise econômica,
social e política que a Região Amazônica sofreu, com a biopirataria de um produto ativo da economia.
O extrativismo da seringueira foi responsável pelo processo de povoamento dos altos rios, da anexação do Acre
(1903) a soberania nacional antes pertencente a Bolívia e da geração de riquezas transferidas para o Sul do
país, dos gastos supérfluos e da construção de diversas “pirâmedes”, como o Teatro da Paz (1878) e o Teatro
do Amazonas (1896), entre outros palácios e prédios e obras de infraestrutura como o Porto Flutuante de
Manaus (1902), a Estrada de Ferro Bragança (1908) e a Estrada Madeira-Mamoré (1912), entre outros.
Contudo antes do ciclo da borracha, outro ciclo importante foi a do extrativismo e a semi-domesticação
do cacau nas áreas de várzeas dos estados do Pará e do Amazonas. As exportações de cacau chegaram a
representar mais de 90% do valor das exportações e perdurou até a época da independência do Brasil em 1822.
A perda da importância do cacau foi decorrente da transferência do cacaueiro para a Bahia, efetuada em 1746,
por Francisco Warneaux, para a fazenda de Antônio Dias Ribeiro, no município de Canavieiras, fazendo com a
expansão dos plantios racionais, que a Amazônia perdesse a competitividade. É interessante realçar que da
Bahia o cacaueiro foi levado para a África Ocidental e para o Sudeste asiático, transformando-se em importante
cultura nesses novos locais.
Com a crise da borracha, a população da Amazônia ficou estagnada no período de 1920 a 1940, quando
outros produtos extrativos tentaram ocupar o espaço, como a da extração do óleo essencial de pau-rosa e da
castanha-do-pará, mas nunca conseguiram recuperar a primazia da seringueira. As atividades agrícolas e a
população rural se distribuíam ao longo dos rios, onde o transporte fluvial era o mais importante.
Foi nesse ambiente que foi iniciada a imigração japonesa na Amazônia, onde se buscavam novas
alternativas econômicas, decorrentes da crise da borracha (Tabelas 2 e 3). Dessa forma os governantes da
época nutriam grandes esperanças com o empreendimento da Ford Motor Company, iniciado em 1927, nas
margens do rio Tapajós e com o início da imigração japonesa em 1929, onde não se observava nenhum sentido
xenófobo.
Em termos de agricultura, por ocasião da entrada dos primeiros imigrantes japoneses na Amazônia, esta
se restringia a pequenas roças de tocos ao longo das várzeas da calha do rio Amazonas e de terra firme no
Nordeste Paraense (Tabela 4). Ocorria contínua falta de alimentos básicos, inclusive a nível do país. Produtos
como arroz, em alguns anos, eram importados para complementar a produção nacional, razão da preocupação
de todos os imigrantes japoneses, que tem essa cultura como sendo o alimento básico (CASTRO; RAMOS,
2009). O plantio de arroz em larga escala fazia parte dos planos dos imigrantes japoneses, que se defrontaram
com as dificuldades de mão-de-obra para o preparo da área, tratos culturais e para a colheita e de severos
ataques de pássaros e até de macacos destruindo os plantios.

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A imigração japonesa na Amazônia (1929-2009): .... • Alfredo Kingo Oyama Homma

Tabela 2 – Estimativa da renda interna da região Norte, segundo ramos de atividade, 1890/1980.

Ano Setor primário Setor secundário Setor terciário

1890 58,8 0,5 48,7


1900 48,8 1,7 49,5
1910 44,9 4,0 51,1
1920 35,8 7,1 57,1
1939 35,49 16,65 47,86
1947 32,92 9,38 57,70
1948 31,29 10,54 58,17
1949 28,53 11,57 59,90
1950 30,09 11,34 58,57
1951 31,40 9,71 58,89
1952 28,91 13,84 57,25
1953 29,94 13,89 56,17
1954 29,60 14,89 55,51
1955 28,33 15,12 56,55
1956 28,29 14,28 57,43
1957 24,11 19,85 56,04
1958 23,44 20,04 56,52
1959 23,45 18,39 58,16
1960 25,12 18,35 56,53
1961 25,90 17,23 56,87
1962 23,22 19,13 57,65
1963 22,09 17,72 60,19
1964 25,08 15,65 59,26
1965 25,13 15,73 59,15
1966 22,24 16,24 61,52
1967 22,24 15,41 62,45
1968 17,6 16,7 65,7
1969 17,2 16,9 65,9
1970 18,4 15,1 65,5
1971 15,3 14,7 70,0
1972 14,6 15,2 70,2
1973 15,5 14,1 70,4
1974 16,6 16,7 66,7
1975 14,0 19,0 67,0
1976 13,1 20,4 66,5
1977 11,4 20,9 67,7
1978 9,4 22,4 68,2
1980 16,11 37,21 46,68
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325
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabela 3 - Participação percentual do extrativismo vegetal, lavoura e pecuária no Valor Bruto da Produção
Agropecuária da Região Norte, 1890/1980

Ano Extrativismo vegetal Lavoura Pecuária

1890 70,28 15,09 14,63


1900 78,15 11,51 10,34
1910 90,62 4,39 4,39
1920 46,30 25,30 28,40
1939 35,22 37,13 27,65
1947 54,94 25,25 19,81
1948 44,90 28,57 25,53
1949 53,17 33,27 13,56
1950 48,88 28,70 22,42
1951 55,13 28,87 16,00
1952 48,84 27,88 23,28
1953 52,96 33,77 13,27
1954 45,03 31,59 23,38
1955 44,64 31,53 23,84
1956 46,09 29,00 24,91
1957 50,85 26,48 22,67
1958 36,74 32,60 30,66
1959 39,38 33,26 27,36
1960 41,15 32,61 26,24
1961 33,16 30,32 36,52
1962 34,19 35,95 29,86
1963 33,95 38,95 27,10
1964 30,81 30,42 38,77
1965 28,76 37,14 34,10
1966 25,41 38,19 36,40
1967 22,37 35,05 42,58
1968 23,95 36,20 39,85
1969 22,61 36,98 40,41
1970 29,79 35,08 35,13
1971 25,81 36,87 37,32
1975 19,90 62,10 18,00
1980 23,35 53,23 23,42
Fonte: HOMMA (1989). Referente aos anos 1890, 1900, 1910 e 1920 em SANTOS (1980); 1939 e 1947/1967 em CONJUNTURA ECONÔMICA (1971); 1970, 1971 e 1975 em SUDAM (1982)
e 1980, estimativa baseada no Censo Agropecuário.

Tabela 4 - Média de produção agrícola no quinquênio 1928/32

Produtos Amazonas Pará Brasil

Arroz (sc 60kg) 12.420 222.651 17.243.775


Mandioca (t) 33.200 168.200 5.028.600
Milho (sc 60kg) 54.535 96.548 85.027.148
Feijão (sc 60kg) 57.716 8.912 12.171.700
Farinha de mandioca (sc 60kg) 142.865 565.080 17.131.567
Açúcar (sc 60kg) 10.430 10.583 16.893.118
Aguardente (litros) 181.200 1.304.220 123.603.862
Álcool (litros) 74.890 48.750.271
Cana-de-açúcar (t) 8.610 11.115 15.556.372
Abacaxi (frutos) 417.000 2.871.000 74.000.000
Banana (cacho) 323.250 1.027.350 62.640.000
Cacau (sc 6okg) 7.096 21.862 1.290.988
Côco (fruto) 121.200 130.687.332
Laranja (caixa) 57.000 164.300 15.200.000
Fumo (kg) 262.400 817.200 96.195.963
Caroço algodão (t) 4.746 238.615
Rama algodão (t) 2.034 102.469

Fonte: Anuários estatísticos do IBGE.

326
A imigração japonesa na Amazônia (1929-2009): .... • Alfredo Kingo Oyama Homma

O MODELO DE DESENVOLVIMENTO BASEADO NA TRANSFERÊNCIA DE RECURSOS


GENÉTICOS

O desenvolvimento das atividades agrícolas no Brasil foi decorrente de forte transferência de recursos
genéticos provenientes de outras regiões do mundo realizada pelos colonizadores portugueses. De forma idêntica
diversos produtos do Novo Mundo e da Amazônia foram transferidos para outras partes do país e do mundo,
transformando-se em importantes atividades econômicas nestes novos locais.
A principal riqueza agrícola do país, o café, foi introduzida por Francisco de Melo Palheta (1670 - ?), em
1727, no estado do Pará, proveniente de Caiena. O próprio brasão da República Federativa do Brasil, tem um
ramo de café e outro de fumo. O primeiro rebanho bovino foi introduzido em 1534, por Ana Pimentel, esposa de
Martin Afonso de Souza (1490/1500-1564/1571), em São Paulo, tornando o Brasil com um rebanho superior a
207 milhões de cabeças, no maior exportador de carne bovina e com o maior rebanho do planeta. O búfalo que
se tornou no símbolo da ilha de Marajó, foi introduzido por Vicente Chermont de Miranda (1849-1907), em
1882, proveniente de matrizes provenientes da Guiana Francesa.
A posição destacada do Brasil como maior exportador de suco de laranja e como segundo maior produtor
e maior exportador de soja do mundo, decorrem de duas plantas que têm sua origem na China. A banana que
tem sido o símbolo da tropicalidade brasileira, tornando-se o segundo maior produtor do mundo, é uma planta
exótica trazida pelos portugueses do Sudeste asiático. Outras plantas cultivadas na Amazônia como jambeiro,
mangostão, rambutan, durian, acerola, noni, entre dezenas de outras espécies vegetais, foram introduzidas de outros
países tropicais. A mangueira que se constitui no ícone da cidade de Belém foi trazida pelos portugueses da Índia.
Em sentido inverso diversas plantas brasileiras tomaram o caminho inverso como a mandioca, que foi
levada pelos portugueses para a África e a Ásia, tornando-se em importante fonte de alimento em vários países
que passaram a liderar a produção mundial, como a Tailândia e a Nigéria. O cajueiro, foi levado para a Índia e
a Tanzânia, tornando-se em grandes produtores mundiais dessa fruta.
Além da transferência externa da seringueira e do cacaueiro, que causaram grandes prejuízos à economia
regional e do país, ocorreu também a transferência de recursos genéticos nativos ou exóticos para outras partes
do país. Pode-se mencionar pimenta-do-reino, guaraná, açaí, pupunha, jambu, mamão hawai, melão, que são
cultivados no Sudeste do país, retirando oportunidades de geração de renda e emprego para a população
amazônica, à medida que são cultivados em outras partes do país.
A imigração japonesa introduziu o cultivo da juta nas várzeas amazônicas, atingindo o seu apogeu na
década de 1960 com mais de 60 mil famílias se dedicando à lavoura de juta e representando mais de um terço
do Produto Interno Bruto do estado do Amazonas. No estado do Pará a lavoura da pimenta-do-reino nas áreas
de terra firme chegou a participar com mais 35% do valor das exportações na década de 1970 e mais de 25 mil
hectares cultivados. Estas duas lavouras marcaram uma fase agrícola na economia da Amazônia, com grandes
repercussões sociais, políticas e ambientais.

RAZÕES DO SUCESSO DAS LAVOURAS DE JUTA E PIMENTA-DO-REINO

O sucesso da lavoura da juta não teria sido possível se não tivesse ocorrido a Segunda Guerra Mundial,
ao impossibilitar a importação de fibra de juta indiana, pela inexistência de transporte marítimo. Os industriais
paulistas não creditavam grande confiança no sucesso da juticultura nas várzeas amazônicas em suprir a
demanda de sacaria para os produtos agrícolas, sobretudo para a exportação de café.
Outra razão decorreu da existência de mão-de-obra liberada com a crise da borracha, que decorrente
dos baixos preços da borracha e da inexistência de mercado passou a viver da caça, pesca e da reduzida
agricultura de subsistência ao longo das várzeas (Tabela 5).

327
Migração internacional na Pan-Amazônia

Tabela 5 - Quantidade extraída de borracha e mão-de-obra empregada na extração em décadas de 1910 a 1930

Quantidade Diárias Diminuição de trabalho


Década
extraída (t) utilizadas* Absoluta Relativa

1910-1919 343.715 81.449 - -


1920-1929 212.147 50.271 31.178 38,3%
1930-1939 117.866 27.930 22.341 44,4%
Total 673.728 152.710 53.519 -
Nota: Considerou a produtividade física média de 4,22kg e 100 dias de trabalho durante o ano.
Fonte: Junqueira (1972)

A facilidade de multiplicação das sementes de juta, após o desânimo de todos os colonos japoneses,
houve a decisão de Ryota Oyama (1882-1972) de levar adiante o salvamento de dois pés de juta, apesar do
descrédito geral, foi que levou a criação do ciclo da juta. Se a juta fosse uma planta com poucas sementes o
sucesso não teria sido possível. No caso da lavoura da pimenta-do-reino, de forma idêntica a decisão de trazer
as mudas por Makinossuke Ussui (1896-1993) e depois cultivar para manter as mudas efetuadas por Tomoji
Kato (1898-1956) e Enji Saito (1891-1958), sem nenhum valor econômico na época e sem previsão futura, para
que somente duas décadas depois, tornar-se em um recurso econômico cabe o mérito do sucesso da lavoura de
pimenta-do-reino.
A falta de resultados de pesquisas locais que resultou no fracasso dos plantios de seringueira da Ford
Motor Company, iniciados em 1927 e encerrados em 1945, foi também a razão do sucesso das atividades de
imigração japonesa na Amazônia e no país. O conhecimento e a experiência agrícola dos imigrantes japoneses
na época suplantavam a da agricultura de derruba e queima que era praticada no país, da falta de mão-de-obra
e da aversão do trabalho manual, decorrente do resquício da escravidão. A pesquisa agrícola se concentrava
em poucas instituições como no Instituto Agronômico de Campinas (1887) e nas Escolas de Agronomia, como
a de Pelotas (1883), Cruz das Almas (1887), Piracicaba (1898), Lavras (1908) e Viçosa (1927). É interessante
mencionar que na região amazônica chegou a funcionar a Escola Agronômica de Manaus fundada por volta da
década de 1910 e fechada em 1943 e, em Belém, da Escola de Agronomia do Pará que funcionou no período
1918-1941. A chegada dos imigrantes japoneses trazendo novas ideias e culturas permitiu que se criassem
novas atividades e de substituição de importações. Mais tarde a criação da Embrapa, em 1973, provocou uma
competição com as universidades agrícolas, que prevaleceu pela hegemonia por três décadas, evidenciando as
incertezas quanto aos rumos futuros e do seu gigantismo.

AS CONSEQUÊNCIAS DA INTRODUÇÃO DAS LAVOURAS DE JUTA E PIMENTA-DO-REINO

A introdução de novas atividades econômicas, como foi o caso das lavouras de juta e pimenta-do-reino,
provoca a criação, a reorganização, a formação ou a destruição de estruturas institucionais e informais, que se
refletem no aparato jurídico, visando apropriar o excedente econômico criado. Entre estas transformações
podem ser mencionadas:

Impactos socioeconômicos

A lavoura da pimenta-do-reino iniciou a agricultura de NPK e da mecanização na Amazônia, antes


baseada somente nas cinzas das queimadas, criando um mercado de venda de insumos agrícolas. Os solos
pobres de terra firme deram início à “agricultura de vasos”, cavando-se uma cova e enchendo-se com a
terra superficial mais rica em matéria orgânica e complementando com fertilizante químico e adubo orgânico

328
A imigração japonesa na Amazônia (1929-2009): .... • Alfredo Kingo Oyama Homma

(ROSSINI, 2008). Esta atividade antes inerente aos agricultores japoneses, com o tempo, suas técnicas de
cultivo passaram a ser dominadas pelos trabalhadores braçais, que passaram a desenvolver plantios próprios,
ou trabalhando como empregados de agricultores brasileiros, ligadas às mais diferentes atividades profissionais,
como médicos, advogados, políticos, etc.
Dessa forma, com a lavoura da pimenta-do-reino, a partir da década de 1970, começa o processo de
mimetismo pelos agricultores brasileiros, nas áreas de terra firme, ao longo das estradas existentes, da imitação
das atividades dos agricultores japoneses. Isso demonstrou que os agricultores brasileiros não eram avessos a
inovações, mas reagindo positivamente quando sinais de preços e de mercado são favoráveis.
Trata-se de uma atividade altamente intensiva em mão-de-obra necessária para tratos culturais e,
sobretudo, por ocasião da colheita, com envolvimento de homens, mulheres e crianças. Numa época em que a
legislação trabalhista não fazia nenhuma cobrança com relação ao emprego de mão-de-obra infantil, a colheita
de pimenta-do-reino era uma oportunidade de auferir uma renda familiar extra, onde passavam o dia inteiro nos
pimentais. Nas feiras nos finais de semana e no comércio nas localidades onde a pimenta-do-reino se expandia
notava-se a circulação de dinheiro. Formou-se, também, uma complexa rede de compradores de pimenta-do-
reino, prepostos de exportadores, com demarcação de espaços informais e controle de preços, bem como na
venda de insumos como adubos orgânicos e químicos e de maquinaria utilizada nos pimentais.
Quanto à lavoura da juta, a rede de aviamento existente no tempo dos seringais foi rapidamente adaptada
para atender o complexo da produção de fibra de juta, com a instalação de prensas e de compradores de fibra
e do adiantamento de crédito em forma de ferramentas e gêneros de primeira necessidade. A economia da
Região Amazônica que então se baseava apenas na exportação de matéria-prima, como foi no caso da borracha,
pau-rosa, madeira e peles de animais silvestres e do beneficiamento primário da castanha-do-pará, com a
produção de fibra de juta foi dado início à instalação de fábricas de fiação e tecelagem em Castanhal, Belém,
Santarém, Parintins e Manaus e a produção de sacarias para atender as exportações de produtos agrícolas
sulistas. No interregno entre a pós-economia da borracha (década de 1910) e a economia pré-Zona Franca de
Manaus (1967), foi a lavoura da juta que garantiu o sustentáculo socioeconômico do estado do Amazonas.
A dificuldade inicial para a expansão dos plantios de juta decorreu da oferta de sementes, onde os
próprios agricultores japoneses reservavam uma área para a produção de sementes. Era frequente o roubo de
sementes de juta daqueles que produziam sementes pelos próprios japoneses e agricultores brasileiros.
Posteriormente, foi implantado um centro de produção de sementes em terra firme no município de Alenquer,
no estado do Pará, pelo Instituto Agronômico do Norte, no período de 1948 a 1966, viabilizando a produção de
sementes de juta com o plantio de milho. A expansão desses plantios provocou considerável desmatamento em
áreas de terra firme com grande ocorrência de castanheiras.

Impactos ambientais

As várzeas são faixas estreitas que acompanham o curso do rio Amazonas e de seus afluentes, sujeitos
a inundações anuais. Em decorrência dessas inundações são solos de elevada fertilidade, que representam 6%
da superfície da Amazônia Legal. A lavoura da juta, ao se tornar uma atividade econômica, provocou o
desmatamento das florestas de várzeas, permitindo o cultivo por 2 a 3 safras e o consequente abandono, pelo
praguejamento com ervas daninhas ou o seu retorno depois de 5 a 10 anos com a recuperação parcial da
vegetação primitiva. Muitas dessas áreas foram ocupadas pela pecuária que se acentuou com a decadência da
juta. Uma das limitações da lavoura de juta era a sua dependência de sementes que eram produzidas nas áreas
de terra firme no município de Alenquer, no estado do Pará, mediante desmatamento de floresta densa.
A defasagem entre a época de colheita de sementes de juta e o plantio mais cedo no Amazonas era motivo de
constantes conflitos entre o Governo do Estado do Amazonas, produtores, industriais de fibra, comerciantes e

329
Migração internacional na Pan-Amazônia

compradores de fibra. Para superar esse problema em 1971 a cultura da malva foi introduzida nas várzeas do
estado do Amazonas, trazendo as sementes do Nordeste Paraense, com muito mais facilidade.
No caso da lavoura de pimenta-do-reino a devastação se fez sentir nas áreas de terra firme, com a
derrubada de floresta densa ou da vegetação secundária para uma utilização entre 8 a 10 anos e a mudança
para novo local. Os gastos com estacões, especialmente de jarana (Holopyxidium jarana (Huber) Ducke),
aquariquara (Minquartia guianenses Aublet), acapu (Vouacapoua americana Aubl.) e maçaranduba
(Manilkara huberi), constituem as mais utilizadas, por serem madeiras duras e pesadas, com alta resistência
mecânica e média retratibilidade e alta resistência natural ao ataque de insetos e de fungos apodrecedores.
Como um hectare de pimental utiliza em torno de 1.000 a 1.600 estacões e uma estimativa média de 25 mil
hectares cultivados e uma vida útil de 10 anos, ter-se-á uma estimativa de área plantada anualmente de no
mínimo 2 mil hectares, que tem alcançado até 4 mil hectares em anos de preços favoráveis. Considerando uma
estimativa de que uma árvore daria para obter 100 estacões e uma densidade de 1.500 estacões/hectare,
indicaria que cerca de 30 mil árvores seriam abatidas anualmente para a produção de estacões. Devido à
contaminação dos estacões pelo Fusarium, a reutilização era evitada, a não ser após muitos anos de repouso ou
utilizados para o plantio de maracujá e para cercas de arame farpado. Dessa forma a expansão das pimenteiras
no estado do Pará implicou na retirada de considerável contingente de árvores dessas espécies madeireiras
duras ao longo destes últimos 50 anos.

Impactos políticos

O sucesso da lavoura da juta, antes da pimenta-do-reino, fez com que os emigrantes japoneses ganhassem
respeito regional e nacional. Tanto que encerrada a Segunda Guerra Mundial, Kotaro Tsuji (1903-1970) e
Tsukasa Uyetsuka foram recebidos pelo presidente Getúlio Vargas, em 1951, autorizando a vinda de 5 mil
famílias japonesas para a Amazônia.
A influência política das atividades produtivas introduzidas pelos imigrantes japoneses se fizeram sentir
na criação de legislações específicas para os diversos produtos que passaram a ser desenvolvidos. Estas
legislações, além de estabelecerem padrões normativos, dando vida jurídica para as atividades produtivas,
fazem parte do controle capitalista visando apropriar o excedente do processo produtivo.
A presença de descendentes de japoneses na vida política da Região Amazônica se faz sentir na
ocupação de cargos de Secretários de Estado, como de Agricultura, Indústria e Comércio, deputado estadual,
presidentes de estatais estaduais e federais sediadas nos estados, prefeitos e vereadores dos municípios,
principalmente nos locais onde se destaca a presença de agricultores nipo-brasileiros.
Em Manaus, decorrente da implantação da Zona Franca de Manaus, ocorreu uma grande afluência de
empresários japoneses e dos países desenvolvidos e com isso modificou drasticamente o comportamento do
empresariado local e das autoridades públicas daquele estado. Enquanto na maioria dos estados da Amazônia
Legal predomina o clientelismo e o apanágio à dependência do Estado e o culto ao atraso, em Manaus, verifica-se
uma agressividade empresarial mais forte. Noutros estados como o Pará e o Maranhão, apesar da presença de
capitais e executivos japoneses no setor mínero-metalúrgico, não há reflexos positivos com relação a essas
mudanças no processo administrativo.
Verifica-se a forte presença de descendentes de japoneses, ocupando profissões liberais, seja na esfera
pública federal, estadual ou municipal ou na iniciativa privada. Descendentes de japoneses são cientistas da
Embrapa, do Museu Paraense Emílio Goeldi, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, professores das
universidades federais, estaduais e privadas, funcionários de órgãos federais, estaduais e municipais, advogados,
médicos, odontólogos, engenheiros etc. Alguns se tornaram grandes empresários no setor de construção civil,
comércio, exportação etc.

330
A imigração japonesa na Amazônia (1929-2009): .... • Alfredo Kingo Oyama Homma

RAZÕES DA PERDA DA IMPORTÂNCIA DAS LAVOURAS DE JUTA, PIMENTA-DO-REINO


E DE OUTRAS CULTURAS INTRODUZIDAS PELOS IMIGRANTES JAPONESES

A lavoura da juta por ser altamente intensiva em mão-de-obra, de ser uma cultura anual e das condições
inóspitas de trabalho, da premência de corte com a subida das águas e da impossibilidade de mecanização
dificultou a sua expansão em larga escala pelos agricultores japoneses. Estes foram gradativamente abandonando
o plantio de juta, pela perda da rentabilidade, passando para os ribeirinhos e mudando-se para outros locais e
atividades mais rentáveis. A falta de mão-de-obra para efetuar a coleta de produtos extrativos e mais tarde no
desenvolvimento das atividades agrícolas, sempre foi um fator restritivo na Amazônia, que só seria quebrado a
partir da década de 1970, com a abertura de grandes eixos rodoviários. Mudou-se a concepção da importância
dos portos, para as estações ferroviárias e depois para as estações rodoviárias.
A criação da Suframa, em 1967, promoveu forte migração rural urbana no estado do Amazonas com o
inchamento da cidade de Manaus, abandonando as atividades agrícolas das várzeas com consequente reflexo
na queda da produção de fibra de juta. A falta de sementes de juta constituía um problema crônico, que levou à
entrada do cultivo da malva, a partir de 1971, nas várzeas do estado do Amazonas, mas que não refletiu na
melhoria da lucratividade.
A busca de emprego na Zona Franca de Manaus tornou-se mais atrativo para os jovens do meio rural,
com a possibilidade de adquirir novidades eletrônicas japonesas, consideradas como ícones de consumo da
época. Isso forçou o crescimento do setor de serviços e da prostituição, permanecendo apenas os mais idosos
no meio rural.
No estado do Pará, com o sucesso da pimenta, que ocorreu duas décadas depois do início da imigração,
os agricultores japoneses sobreviviam combinando atividades de roçados e de hortaliças. Apesar da reduzida
população das capitais (Belém e Manaus), os imigrantes japoneses mudaram o hábito de alimentação da região
e do país com a introdução do consumo de hortaliças. A abertura da rodovia Belém-Brasília, em 1960, ampliou
as importações de hortifrutigrangeiros, desestimulando essa atividade. Em Manaus, a criação de aves
complementava o fornecimento de adubos para o cultivo de hortaliças e de pimenta-do-reino, até no final da
década de 1970.
A entrada da doença nos pimentais, identificada pela primeira vez em 1957, que passou a ganhar
intensidade no início da década de 1970, promoveu a reorganização dessa atividade, com mudança para novos
locais e o início do aproveitamento dessas áreas (antes) e após a morte das pimenteiras.
Mesmo com a adoção de plantios sequenciais como mamão, melão, maracujá e pimenta-do-reino, antes
da formação dos Sistemas Agroflorestais (SAFs) definitivos, com a transferência de muitas dessas atividades
(mamão, melão, acerola, pupunha, guaraná etc.) para locais mais próximos de centros consumidores (Pernambuco,
Bahia, Espírito Santo e São Paulo). Dessa forma, o estado do Espírito Santo tornou-se o maior produtor e
exportador de mamão hawai e a Bahia no maior produtor de guaraná. Com isso reduzem as possibilidades de
lucro e de alternativas dos produtores da Amazônia.

A NOVA REALIDADE AGRÍCOLA E A CONTRIBUIÇÃO DA IMIGRAÇÃO JAPONESA NA


AMAZÔNIA

A entrada do Fusarium promoveu a mudança dos sistemas produtivos baseados no monocultivo da


pimenta-do-reino e com a formação de SAFs tendo o cacaueiro como principal cultura base. A premonição do
crescimento da importância do cupuaçuzeiro foi pressentida no início da década de 1980 com o início dos
plantios dessa planta. A eclosão da questão ambiental, cujo ápice ocorreu com o assassinato de Chico Mendes
(1944-1988) em 22.12.1988, promoveu a divulgação das frutas amazônicas na mídia nacional e internacional,
com ampliação do consumo.

331
Migração internacional na Pan-Amazônia

Dessa forma, as frutas regionais que antes tinham um consumo local e na época da safra, passaram a
ser exportadas para outras partes do país e do exterior e com o processo de beneficiamento da polpa passaram
a serem consumidas durante todo o ano. Isso provocou a elevação dos preços e, no caso do açaí, a exclusão de
um produto alimentar das camadas mais pobres da população regional.
O grande crescimento da agricultura nacional que começa se evidenciar a partir da década de 1970 e o
desenvolvimento da pesquisa agrícola nacional nas universidades, instituições de pesquisa locais e a criação da
Embrapa, em 1973, reduziu o valor e a importância dos agricultores descendentes de japoneses na oferta de
novidades para o setor agrícola. As novidades estão concentradas em determinados segmentos de horticultura,
avicultura e fruticultura de clima temperado.
O interesse do governo japonês pelo cerrado brasileiro decorreu de acordo assinado em 1974 durante o
Governo Geisel (1974-1978), cujo Ministro da Agricultura Allyson Paulinelli (1936-), teve destacado papel na
criação do Programa Nipo-Brasileiro de Cooperação para o Desenvolvimento Agrícola da Região do Cerrado
(Prodecer). Este programa que pode ser considerado o maior projeto agrícola do país, resultou numa joint
venture, a Companhia de Promoção Agrícola (CAMPO), resultante da união da empresa brasileira Companhia
Brasileira de Participação Agrícola (Brasagro) que detém 51% do capital e da japonesa Japan-Brazil Agricultural
Development Corporation (Jadeco), que ficou com 49%. Entre as 24 empresas que formaram a Brasagro na
época estão: Banco do Brasil, Bamerindus, Banco Econômico, Banco Nacional, Cica Norte, Manah, Eucatex,
Solorrico, Brahma, Florestal Acesita, Nutricia, CVRD. Já a holding japonesa tinha 48 empresas, destacando-se
entre elas a Mitsubishi, o Bank of Tokyo, a Central das Cooperativas do Japão, a Mitsui, a Ishikawagima, a
Toshiba e principalmente a Japan Internacional Cooperation Agency (JICA), que detinha 50% do capital do
lado japonês. A JICA foi responsável pelo repasse dos investimentos japoneses no projeto. A CAMPO, portanto,
funcionava como uma empresa multinacional. O Prodecer I teve um enfoque maior nos municípios mineiros de
Paracatu, Irai de Minas e Coromandel durante o período de 1979 a 1982. As culturas de soja, milho e arroz
foram cultivadas em 48.315 hectares desses municípios com resultados bastante positivos, com investimentos
de 60 milhões de dólares. O Prodecer II teve início em 1985 com atuação nos municípios de Formosa do Rio
Preto na Bahia e Tapurá e Lucas do rio Verde em Mato Grosso cobrindo uma área de 66.749 hectares. Houve,
em seguida, uma expansão do Prodecer II para municípios de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso do Sul
cobrindo uma área de 138.936 hectares. Os resultados dessa segunda fase superaram as expectativas iniciais,
em termos de produção e produtividade. Foram investidos 375 milhões de dólares nessa fase. O Prodecer III
teve início em 1995 com ênfase nos municípios de Balsas no Maranhão e Pedro Afonso no Tocantins. Mais de
80 mil hectares de cerrado foram transformados em terras produtoras de alimentos com investimento na ordem
de 140 milhões de dólares (OLIVEIRA, 1996; ALVES, 2008). Há certo equívoco por parte dos técnicos e
políticos japoneses em acreditarem que a expansão da soja no Brasil foi decorrente do Prodecer. A capacidade
de resposta dos empresários brasileiros a estímulos de preços e mercados, dos investimentos do governo
brasileiro em ciência e tecnologia, de infraestrutura produtiva e de crédito rural, em resposta ao crescimento do
mercado mundial, são as razões principais do Brasil tornar-se o segundo produtor e o primeiro exportador
mundial desse produto.
No estado do Amazonas com a criação da Zona Franca de Manaus, existem 52 empresas de capital
nipo-brasileiro, sendo 24 na área industrial (eletroeletrônica, fotográfico, farmacêutico, relojoeiro, polo de
duas rodas) e 28 na área comercial. Outra área onde se verificam pesados investimentos estão relacionados
com o setor mineral e minero-metalúrgico nos estados do Pará e do Maranhão, representam a terceira onda
migratória, que poderá ser ampliado no futuro. A crise financeira mundial iniciada em setembro de 2008,
mostrou a fragilidade desse modelo, com pequena diversificação da economia do estado do Amazonas,
provocando grande desemprego.

332
A imigração japonesa na Amazônia (1929-2009): .... • Alfredo Kingo Oyama Homma

CAMINHOS PARA A COOPERAÇÃO NIPO-BRASILEIRA NA AMAZÔNIA

A cooperação técnica japonesa na Amazônia é bastante antiga, tendo iniciado em 1963, com o Instituto
de Pesquisa e Experimentação Agropecuária do Norte (Ipean), visando apoiar os colonos japoneses estabelecidos
na Amazônia. A preocupação do governo japonês com os produtores japoneses, abalados com a crise da
doença nos pimentais, traduziu-se com a instalação do Instituto Experimental Agrícola Tropical da Amazônia
(Inatam), fundado em 1974, e reinaugurado com a presença do ministro da Agricultura, Alysson Paulinelli, em
5 de novembro de 1977. O alto custo da manutenção do Inatam e da presença exclusiva de pesquisadores
japoneses levaram ao fechamento da instituição e a entrega das instalações para a Embrapa no final da década
de 1980. Outros convênios se seguiram, mas os resultados foram pouco promissores, levando ao encerramento
das atividades na Embrapa Amazônia Oriental em 2003. As bolsas de estudo de curto e de longo prazo para
estudos no Japão sempre se constituíram em atrativo, inclusive com a criação de Associações dos Bolsistas da
JICA em diversas capitais, Associação dos Bolsistas do Governo Japonês e Associação Brasileira de Ex-Bolsistas
no Japão, entre as principais, denotam o interesse dos descendentes de japoneses e de brasileiros no treinamento
recebido e adaptação cultural. Uma avaliação mais aprofundada precisa ser efetuada sobre estes treinamentos,
no qual, salvo melhor juízo, os de longo prazo, para mestrado e doutorado são os que efetivamente deixaram
contribuições efetivas, a exemplo da cooperação norte-americana nas décadas de 1960 e 1970.
Todos estes aspectos ensejam um novo modelo de cooperação nipo-brasileira para a Amazônia. Não se
quer com este texto esgotar o assunto, mas os pressupostos básicos que precisam ser considerados, dizem
respeito aos seguintes tópicos:
- a cooperação nipo-brasileira não pode vislumbrar o lucro imediato se quer atuar a longo prazo.
Propostas unilaterais têm a exata duração dos convênios a serem assinados, uma vez que os benefícios
precisam ser mútuos. O respeito à soberania amazônica, tema muito sensível para as populações
regionais, no qual a cobiça internacional sempre esteve ameaçada e a população regional e os
brasileiros colocam em alto grau, desde os tempos do Brasil colônia no século XV;
- as cooperações internacionais tendem a provocar mudanças nas prioridades internas dos países
beneficiados, de tal sorte que precisam ser amplamente analisadas;
- a Amazônia não pode ser considerada como simples fonte de matéria-prima e de entrada de produtos
industrializados via Zona Franca de Manaus visando atingir o vasto mercado interno nacional;
- o crescimento dos movimentos sociais no país implica quanto à necessidade de promover uma ampla
discussão das propostas de desenvolvimento a serem implementadas na Região Amazônica.
No que concerne a agricultura, meio ambiente e recursos naturais, os principais tópicos de cooperação
de interesse para a sociedade local, a participação japonesa na Amazônia deve ser expressa em termos de
ajuda financeira, investimentos produtivos e técnicos especializados, nos seguintes campos de atuação:
- utilização parcial das áreas desmatadas na Amazônia que até 2007 representavam aproximadamente
duas vezes a superfície do Japão, com atividades produtivas adequadas, para evitar a contínua
incorporação de novas áreas;
- recuperação de áreas que não deveriam ter sido desmatadas, tais como margens de rios, áreas
montanhosas, pedregosas, interesse da biodiversidade, entre outras, passíveis de aproveitamento
econômico, com atividades produtivas adequadas;
- recuperação de áreas que não deveriam ter sido desmatadas, sem possibilidade de aproveitamento
econômico, mediante recuperação pela própria natureza ou induzida;

333
Migração internacional na Pan-Amazônia

- programas de recuperação de rios da bacia amazônica, tanto em nível nacional, como de países
vizinhos nos quais se concentra a maioria das nascentes do rio Amazonas e de seus afluentes, na
formação de um condomínio dos países da bacia amazônica. Os dejetos das cidades ao longo da
bacia hidrográfica são canalizados para o curso principal do rio Amazonas, com sérias consequências
para a flora e a fauna e da qualidade da água;
- programas de recuperação de estoques pesqueiros do rio Amazonas e de seus afluentes e da
embocadura com interface com o oceano Atlântico;
- implantação de indústrias integradas de papel, celulose e beneficiamento de madeira e sua
industrialização mediante plantios florestais;
- programas integrados de produção de biodiesel a partir de plantas oleaginosas perenes;
- programas integrados de pecuária de alta produtividade, com a recuperação de ecossistemas
destruídos;
- nichos específicos (fruticultura, bambu comestível, plantas medicinais, aromáticos, inseticidas
naturais etc.).

O Japão poderia ajudar muito a Amazônia, mediante convênios técnico-científicos que sejam
complementares, na recuperação das áreas degradadas e da fauna pesqueira, controle da poluição dos rios,
tecnologia de madeira, aproveitamento dos recursos da biodiversidade na área de cosméticos, fármacos, corantes
naturais, entre os principais. Quanto às exportações há necessidade de equilibrar a balança comercial dos
estados do Amazonas, do Pará e do Maranhão com o Japão, desfavorecida pelas importações da Zona Franca
de Manaus e dos baixos preços dos produtos da natureza que são exportados.
No caso da agricultura em si, o Brasil avançou muito transformando-se em uma potência agrícola e os
japoneses deveriam contribuir com maiores investimentos para os produtos agrícolas de exportação, cujos
benefícios retornam para os países importadores com produtos de melhor qualidade, menores preços, com
qualidade e segurança ambiental, na robótica na agricultura, recuperação de ecossistemas destruídos,
industrialização da madeira, recuperação da fauna pesqueira, entre os principais. Dessa forma, para que a
presença japonesa no país não seja perdida ao longo do tempo, uma nova modalidade de cooperação precisa
ser desenhada, que seja benéfica para ambos os países. Essa nova cooperação deve estar baseada na migração
do conhecimento e de capitais japoneses viabilizando atividades produtivas e ambientais na Região Amazônica.

COMENTÁRIOS FINAIS

O sucesso da colonização japonesa decorreu do modelo baseado na introdução de recursos da


biodiversidade exógena, no qual era um comportamento normal para a época. Recursos genéticos da Amazônia
(cinchona, cacau, seringueira) foram levados para outras partes do país e do mundo e por sua vez plantas (café,
juta, pimenta-do-reino) e animais (bovinos, búfalos) foram introduzidos de outros locais para a região. Verificou-
se uma rápida aprendizagem das técnicas de cultivo e beneficiamento de juta e pimenta-do-reino pelos caboclos
da Amazônia, mesmo na carência de instituições voltadas para assistência técnica e extensão rural. Mostrou
que os agricultores brasileiros não são avessos às inovações, quando condições de preços e mercados encontram-
se à disposição.
A introdução das atividades produtivas pelos imigrantes japoneses e da indução na agricultura regional
provocou também desmatamento na Amazônia. A imagem de uma agricultura equilibrada creditada aos imigrantes
japoneses e seus descendentes escondem efeitos colaterais quanto à destruição dos recursos naturais da

334
A imigração japonesa na Amazônia (1929-2009): .... • Alfredo Kingo Oyama Homma

Amazônia. Este aspecto é comum para qualquer atividade produtiva na Amazônia, uma vez que não existem
atividades sustentáveis.
O novo enfoque de desenvolvimento induzido pelos descendentes dos japoneses está baseado no
aproveitamento da biodiversidade local (cupuaçu, açaí, castanha-do-pará, puxuri, uxi, bacuri etc.) associado
com plantas exóticas introduzidas no passado e outras mais recentes e do aproveitamento das áreas desmatadas
(HOMMA, 2005; HOMMA et al., 2007).
A discussão sobre a destruição da Amazônia, que passou a se acentuar no final da década de 1960,
enfatizando a perda da biodiversidade e, a partir da década de 1990, com o perigo das mudanças climáticas,
enfatiza que este modelo de colonização não seria viável nos dias atuais. A incapacidade das instituições
nacionais em responderem aos anseios da população constitui a mais grave ameaça para a segurança dos
empreendimentos agrícolas dos descendentes dos japoneses e do capital japonês investido no país.
O episódio do registro do nome “cupuaçu” como marca registrada para várias classes de produtos
(incluindo chocolate) no Japão, na União Europeia e nos Estados Unidos pela Asahi Foods Co. Ltd. que somente
foi cancelada no dia 01/03/2004, pelo Escritório de Marcas do Japão (JPO) em Tóquio, cuja ação foi impetrada
pelo Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), Amazonlink, APA Flora e outros, protocolada em 20 de março de
2003, só tende a envergonhar os imigrantes e seus descendentes e não pode seguir essa lógica no futuro. A
Amazônia constitui um tema sensível para os brasileiros, desde os primórdios de sua ocupação, tanto que o caso
do cupuaçu mobilizou a opinião pública nacional, levando o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (1945), a
sancionar a Lei nº 11.675, de 19 de maio de 2008, designando o cupuaçu como fruta nacional.
Até antes da eclosão da crise de 2008, existiam cerca de 330 mil descendentes de japoneses que
trabalhavam no Japão, superior ao contingente que imigrou para o país. Este contingente provocou uma influência
brasileira no Japão, perceptível nos produtos comercializados, nos hábitos e costumes, muitos deles negativos.
A permanência no Japão não pode ser apenas para adquirir benefícios salariais, mas do aprendizado quanto as
novas maneiras de trabalhar, de administrar e de gerenciamento de atividades produtivas e dos recursos naturais.
Em 2108, quando será comemorado o bicentenário da imigração japonesa no Brasil, a participação dos
descendentes japoneses, com o rápido processo de assimilação na sociedade brasileira, os sobrenomes japoneses
e a participação relativa nas atividades econômicas, será confundida com o contexto nacional decorrente da
diluição. Ficará, contudo, a cultura representada pelas comidas japonesas com as adaptações, os esportes, as
artes, a religião e o espírito de gestão empresarial.

335
Migração internacional na Pan-Amazônia

REFERÊNCIAS

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