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UNIVERSIDADE PAULISTA

VICE-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO

A Coleção CADERNOS DE ESTUDOS E PESQUISAS – UNIP


destina-se à divulgação de textos em discussão na Universidade
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Série: DIDÁTICA
Ano: IX Nº:2-002/03
ISSN 1517 - 9230

O PAPEL DO PSICÓLOGO NAS ORGANIZAÇÕES

Laura Cristina Foz Rodrigues Alberto


A AUTORA

Laura C. F. R. Alberto é professora de Psicologia Organizacional do curso de Psicologia


da Universidade Paulista e de Recursos Humanos da Universidade Anhembi-Morumbi.
Psicóloga pela Universidade de São Paulo, com pós-graduação em Administração de
Empresas, na Pontifícia Universidade Católica e na Faculdade de Economia e
Administração da Universidade de São Paulo, adquiriu seu título de mestre em Psicologia
do Trabalho no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo.
É consultora de empresas, depois de quase vinte anos de atuação em grandes
corporações. Seu foco de estudos é a relação do hoje com o trabalho ao longo de sua
vida, de um modo geral em sua carreira, de um modo particular, em busca da felicidade
através do seu fazer.
O PAPEL DO PSICÓLOGO NAS ORGANIZAÇÕES1

Laura Cristina Foz Rodrigues Alberto

Resumo: Este texto pretende apresentar e propor algumas considerações sobre a ação
da Psicologia nas organizações e o papel do psicólogo organizacional e do trabalho. Este
tem sido um objeto de discussões, principalmente nos cursos de Psicologia
Organizacional, especialmente por parecer difícil, aos estudantes, exercer um papel que
implica em intermediar duas forças que caminham em direções opostas, no que diz
respeito a seus interesses – o empregador e o empregado, capital e trabalho, em um
contexto capitalista. Associa-se a essa dificuldade o próprio preconceito dos psicólogos
em geral e a dificuldade da própria Psicologia lidar com esse objeto. Apresenta uma
discussão sobre um paradigma multidisciplinar para enfrentar o problema que se
apresenta para a Psicologia do Trabalho e as áreas mais freqüentes e escopos de
atuação do psicólogo nas empresas. Coloca também à reflexão dos psicólogos a
identidade profissional do psicólogo organizacional, como a forma de pensar um dos
lados de sua relação com o seu objeto de trabalho – a relação dos indivíduos e o seu
trabalho, o seu fazer.

Palavras chave: Psicologia organizacional, psicologia industrial, psicologia do trabalho,


papel do psicólogo, atuação do psicólogo, paradigmas da psicologia do trabalho,
muldisciplinaridade na Psicologia, muldisciplinaridade nas organizações.

Abstract: This paper intends to contribute to the discussion about the Industrial-organization
physiologist’s role focusing the man-work relationship. That subject has been an important agenda
in Psychology courses because most of Psychologists students use to considerate very difficult to
deal with the employer/employee interests dilemma in the capitalism context. At first this work
presents a multidisciplinary paradigm in order to discuss the I-O psychologists role and their
possible actions in organizations. Afterwards this paper presents an I-O physiologist identity
discussion and their most usual tasks in organizations..

Keywords: Organizational Psychology, Industrial Psychology, organizational psychologists’ role,


man-work relationship paradigms, man-work Psychology, multidisciplinary references in
organizations.

INTRODUÇÃO

Discutir o papel do psicólogo nas organizações no início deste século XXI tem sido
interessante e desafiador se não relativamente difícil. Interessante principalmente para

1
Texto desenvolvido com o envolvimento e participação dos docentes da área de Psicologia Organizacional para as
disciplinas de Psicologia Organizacional I e II da UNIP.
professores dessa disciplina em cursos superiores de Psicologia, que se deparam com
observações e questões do tipo “porque todos têm que estudar isso e não apenas os que
optam por trabalhar com nessa área? “Isso não é Psicologia!” etc. Para os estudantes de
Psicologia, a colocação dessa questão parece natural, pois a disciplina os remete a
assuntos como a evolução da Teoria das Organizações e uma gama de temas como
poder, cultura, que não estão habituados a encontrar nos seus compêndios de psicologia,
mas viram com certa superficialidade nas ciências que não tratavam dos indivíduos, nas
do coletivo, como a Política, a Sociologia e a Antropologia. Mesmo as disciplinas voltadas
à Psicologia Social, de certa maneira, uma bem delimitada divisão da psicologia, não os
levaram a pensar na organização social e econômica que cerca o indivíduo e a sua
ocupação, esta uma concretização de caráter ontológico, social e psicológico.Certamente
aqueles que vêm atuando nas organizações e em empresas de assessoria e consultoria,
além dos mencionados professores e estudiosos do assunto vêm se perguntando, desde
os últimos anos do século XX: “o que é a Psicologia Organizacional e do Trabalho,
afinal?” E isso nos remete aos adjetivos difícil e desafiador que atribuímos a esta
discussão, pois como é possível definir um papel profissional em um meio tão caótico
como o mundo em que vivemos nestes tempos, sob os aspectos político, sócio-
econômico, e ecológico?

Com essa finalidade, devemos ressaltar alguns aspectos que cercam o ambiente em que
se desenrola o papel do psicólogo organizacional nos nossos tempos. O primeiro deles
seria uma indubitável ampliação dos campos de atuação da própria Psicologia, que se
vem libertando, depois de mais de um século, dos paradigmas clínico e experimental,
extremamente cristalizados e responsáveis pela sua evolução; em segundo lugar, do
ponto de vista das organizações e do trabalho em si, uma falta de paradigmas, frente a
mudanças que permitem ao observador enxergar um cenário sem contornos visíveis,
nebuloso, que não permite ao cientista conhecer o seu fenômeno a partir de um quadro
de referências restrito à sua ciência, exigindo uma abordagem multidisciplinar no estudo e
na sua aplicação.

Há indícios de que vivemos o fim da era do capitalismo como o conhecemos ao longo


último século. Suas estruturas econômicas e monetárias se mostram frágeis e ainda são
pressionadas pela reafirmação das nações, das etnias e dos movimentos ecológicos,
como numa reação à globalização da produção da riqueza, mas não de sua distribuição e
da falta de sentido do trabalho, um mero meio para alcance desse fim. Ao mesmo tempo
em que observamos uma parcela da comunidade econômica mundial lutar pela
manutenção do status quo e de uma hegemonia nas relações comerciais e de poder,
inclusive bélico, em detrimento de qualidade de vida de grandes populações e, até, da
sobrevivência do planeta, uma outra parcela vem trabalhando para encontrar uma nova
ordem, abraçando as diferenças étnicas, preservando a natureza, garantindo o direito
individual do homem e a soberania das nações.

Nesse contexto indefinido, de limites maleáveis, de constante “por vir”, compreender e


trabalhar com o homem tornou-se muito mais importante e imprescindível que estudar e
planejar os método e processos de trabalho, uma vez que plenamente dominados pela
tecnologia. Somando-se a isso há, ainda, o cenário do não trabalho, do desemprego e as
perspectivas de um futuro sem empregos e marcado pelo ócio, como nos apontam Rifkin
(1996) e De Masi (2000), ou ainda com possibilidades de novas formas de organização do
trabalho, como alguns exemplos discutidos em Souza Santos e seus colaboradores
(2002), que pretende apresentar “caminhos da produção não capitalista, em um livro
intitulado “Produzir para Viver”, resgatando o mais básico dos objetivos do trabalho
humano – a sobrevivência e a forma historicamente mais elementar de ação em favor
desse objetivo – a ação solidária, contra a ação individual e competitiva do trabalho no
modo de produção capitalista, que necessita e estimula uma sociedade caracterizada pelo
consumo.

Assim, as ciências humanas e as ligadas à saúde do homem são cada vez mais
chamadas a tentar compreender, explicar e intervir no comportamento organizacional e na
relação particular do homem com o seu trabalho, nos diversos contextos, procurando dar
conta, ainda, da situação do não trabalho.

É essa situação que nos permite constatar, especificamente no âmbito da Psicologia


Organizacional e do Trabalho, o mesmo movimento de ampliação de ação a que vem se
submetendo a Psicologia. Ao mesmo tempo em que “as psicologias” reconhecem sua
inter-relação com outras ciências, ampliam sua contribuição e sua compreensão do
homem. Claro é que o mesmo movimento levou a Psicologia a fazer parte da agenda de
outras disciplinas, também interessadas no homem, na organização e igualmente sujeitas
à abrangência e complexidade desse fenômeno.

Nas organizações, a presença da Psicologia, além das delimitações dos cargos e das
funções desenvolvidas pelos psicólogos, acentuou-se. A idéia da empresa holográfica, em
que cada resultado está relacionado a ações extremamente inter-relacionadas de todas
as áreas e de todos os indivíduos que compõem direta ou indiretamente a organização
leva a uma multidisciplinaridade maior, o que aconteceu nos últimos anos. Na esteira
dessa multidisciplinaridade, o conhecimento psicológico vem-se aplicando a contribuições
em diversos campos no contexto organizacional, este, por sua vez, cada vez mais
abrangente, uma vez que não se pensa nenhuma ação empresarial sem levar em conta,
ao mesmo tempo, o fornecedor, o cliente, o trabalhador, a sociedade, o meio-ambiente, a
nação e a geografia econômica e política. No que diz respeito ao trabalho propriamente
dito, e sua posição nessa conjuntura, distinguimos um cenário marcado por:

- taxas crescentes de desemprego e do nível de trabalho informal;


- profissões em decadência ou em extinção;
- evolução mais lenta dos instrumentos formadores de profissionais do que a evolução
tecnológica, que caminha em velocidade extraordinária;

e, no que diz respeito ao homem que trabalha:

- desenvolvimento de doenças profissionais e estresse


- perda do sentido do trabalho (Sievers, 1990) e de perspectivas para os dias futuros
- banalização do sofrimento no trabalho (Dejours,2000)

A construção e evolução do papel do psicólogo nas organizações

O que é comumente lembrado quando mencionamos atuação do psicólogo nas


empresas? Certamente a resposta mais comum esbarra nas funções de Recursos
Humanos em que se marcou a atuação desse profissional, chamado a prestar seu auxílio,
por força de sua competência específica, ao administrador a aperfeiçoar a organização do
trabalho, via ação sobre o trabalhador. Diríamos que são lembradas atividades clássicas
nas organizações, como recrutamento e seleção e treinamento de pessoal, assim como
quando se pensa em psicólogo, genericamente ainda se lembra do consultório, quando
não do divã, acentuando a marca psicanalítica que a Psicologia conseguiu em sua
trajetória.

Há uma tendência, hoje, de denominar de Comportamento Organizacional aquelas


atividades, que, poderíamos dizer, sob uma visão da organização formal, de staff, através
das quais um especialista das ciências humanas, como o psicólogo, atua no nível dos
processos organizacionais que afetam e são conseqüências da relação do homem com o
trabalho institucionalizado, e de Recursos Humanos a atividade de linha que dá conta de
administrar a atração, a manutenção e o desenvolvimento das pessoas na empresa, para
o que conta com o uso e técnicas específicas, baseadas nos entendimentos do
comportamento organizacional e ministradas também por especialistas.

Wagner III e Hollenbeck (2000) apresentam o comportamento organizacional em três


dimensões:

Comportamento microorganizacional

Nesta dimensão estão os aspectos que se expressam a partir do indivíduo. Estaríamos


abordando, assim, os aspectos das aptidões e das características pessoais, além da
motivação, que influenciam o desempenho, o comportamento e o bem-estar de ordem
psicológica e física do indivíduo. Desse modo, os especialistas estariam compreendendo
e agindo na busca da melhor relação entre as expectativas dos indivíduos, suas
competências e características e o ambiente organizacional, marcado pelos processos,
divisão de tarefa e de responsabilidade.

Comportamento Mesoorganizacional

Esta é a dimensão do indivíduo nos grupos e das relações intermediadas pelos grupos
nas organizações; trata de compreender e agir sobre o comportamento do indivíduo nos
grupos e o comportamento do próprio grupo, incluindo questões da dinâmica dos grupos e
da liderança, além da comunicação interpessoal.

Comportamento macroorganizacional

Esta dimensão é a que trata do comportamento da empresa como um todo e a sua


relação com o comportamento individual; aborda tal fenômeno a partir da estrutura
organizacional, da organização formal e informal, além dos jogos de poder, das relações
entre grupos, dos conflitos, da cultura organizacional, da competição e das relações entre
a empresa e seu meio-ambiente.

A abordagem desses problemas, ao longo dos anos, pela Psicologia, a partir das
necessidades dos administradores, e a evolução de seu quadro de referências, acrescido
de bases de conhecimento provenientes de outras ciências, levou a Psicologia
desenvolvida nas organizações a uma maior abrangência do seu objeto e maior amplitude
nas bases de sua compreensão desse objeto e de sua ação. Isso trouxe como
conseqüência denominações diferentes, parecendo naturalmente mais pertinentes ao que
acontecia na prática. Tais denominações mantêm certa propriedade com as dimensões do
comportamento organizacional apresentadas acima. Lembrando do que foi tratado no
primeiro capítulo deste trabalho, vejamos quais as diferenças e evoluções podemos
salientar entre as chamadas Psicologia Industrial, Psicologia Organizacional e Psicologia
do Trabalho, acentuando o papel de seus agentes.

Psicologia Industrial

Como essa denominação deixa claro, o que se chamou de Psicologia Industrial, nome
que até há não muito tempo, designava a disciplina em alguns currículos universitários,
nasceu com o advento das grandes indústrias, que puderam lançar mão do especialista
para auxiliá-las a compreender e, então, melhor coordenar as ações e reações do homem
nas fábricas. Poderíamos afirmar que é a Psicologia do comportamento
microorganizacional, dimensão então entendida como a responsável pela eficiência no
trabalho, ao lado do desenvolvimento da engenharia dos métodos e processos e da
perfeita divisão de tarefas.
Tratava-se da influência da ciência psicológica, de natureza experimental e individual, de
caráter clínico, aplicada à organização do trabalho. Assim, a Psicologia das diferenças
individuais, expressas nos testes de aptidão e de personalidade, da questão da
motivação, como força impulsionadora da iniciativa do homem , das atitudes, poderia
auxiliar na busca do”homem certo para o lugar certo”, o melhor ocupante para
determinada função, maneiras de garantir desempenho satisfatório e adaptação às
condições do ambiente organizacional. O homem é visto, então, como uma peça
fundamental, mas não insubstituível, bastando, para o bom funcionamento da máquina
organizacional, garantir a perfeição da peça, a diminuição da possibilidade de defeitos,
em outras palavras, sua adequação ao perfil de habilidades exigidas pela função e sua
capacidade de adaptação ao ambiente imposto. Uma certa preocupação com a influência
dos grupos e das características da liderança na atuação individual aproximam essa
abordagem às questões do comportamento mesoorganizacional, com alguma influência
da Dinâmica de Grupo e da Psicologia Social. Os processo de seleção de pessoal e de
avaliação de desempenho e ações de treinamento técnico e de supervisores, foram
práticas desenvolvidas por psicólogos, sob esse arcabouço, subsidiadas pelo
conhecimento que se desenvolvia a partir das ações de estudiosos nas empresas.

Psicologia Organizacional

Nos Estados Unidos, no momento, a disciplina chama-se I-O Psychology – Industrial and
Organizational Psychology, Psicologia Industrial e Organizacional. Podemos, a respeito
dessa denominação, observar que não abandonou a referência à indústria, ambiente
clássico e significativo em seu desenvolvimento, mas se apropria de instituições de outra
natureza, além de adequar-se a uma visão sistêmica das organizações.

Essa denominação abraça os comportamento meso e macroorganizacional, conforme


descritos acima, inicialmente com influência maior da Psicologia Social e Dinâmica de
Grupo, da Sociologia, posicionada no comportamento mesoorganizacional e, mais tarde,
no nível macroorganizacional, marcando forte interdisciplinaridade entre a psicologia dos
grupos e conhecimentos provenientes da Antropologia e da ciência política. Como lembra
Zanelli (2002), referindo-se a essas outras ciências e enfatizando a necessária visão e
ação, precedidas de adequada formação multidisciplinar do psicólogo organizacional,
também aplicadas à organização, essas ciências também trabalham nas três dimensões
citadas, segundo seus quadros de referências próprios, mas também devem buscar sua
justaposição com a Psicologia Organizacional.
Sob essa dimensão, a Psicologia estuda e atua sobre os processos grupais, as relações
entre grupos, as relações entre empresa e meio-ambiente, incluindo assim os processo
de cultura e clima organizacionais, comunicações, poder, conflito e negociação.

Psicologia do Trabalho

Quando surge, então, a denominação de Psicologia do Trabalho, a partir de meados da


década de 1980, mas com maior força na década de 1990, e mais no Brasil, com
influência européia, a concentração dos estudos e da ação do psicólogo organizacional
parece estar na relação do homem com o seu fazer, com o seu trabalho, apropriadamente
contextualizado e observado sob o olhar multidisciplinar. Claro que isso atende a uma
mudança visível dos padrões de trabalho do mundo chamado pós-moderno – que se
seguiu ao mundo das grandes organizações modernas, pós-fordistas.

Não se perde com essa denominação a ação sobre os três níveis do comportamento
organizacional, mas ela se amplia para abarcar uma organização do trabalho mais
flexível, menos estruturada, que inclui trabalho feito em casa, terceirizações, part-time,
desemprego e o que chamamos de não trabalho - a ausência do trabalho para a
subsistência, que, sem dúvida, implica em um fazer diferente, atendendo outras
necessidades psicológicas e, talvez, físicas. É forte a influência do que se denominou de
Psicopatologia do Trabalho (Dejours, 1987), que nasceu a partir de estudos sobre a saúde
do trabalhador e aprofundou – se nas questões do sofrimento no trabalho
institucionalizado.

A Psicologia do Trabalho, ao mesmo tempo que procede a essa ampliação, volta seu foco
para a relação individual e única do homem com o seu trabalho, este relativisado pelo
contexto, que se define como extremamente diversificado, tornando tal relação um
fenômeno extremamente multifacetado e complexo, impossível de ser compreendido a
partir de uma abordagem reducionista. Não se trata, assim, de um reducionismo nos
moldes do paradigma da simplicidade, cartesiano, causal, mecanicista, que reduz à
mínima parte para compreender o todo (esse, a Psicologia deixou para trás nos
primórdios da Psicologia, ou sob a referência da Psicologia Industrial), mas de re-
enxergar a relação do homem com seu trabalho sob um paradigma que o sociólogo e
filósofo Edgard Morin (1999), citado por Tratenberg (1999) chama de paradigma da
complexidade, que permite a compreensão do fenômeno como a visão de uma holografia
– uma visão tridimensional, única, mas multifacetada, com possibilidades de ser vista a
partir de vários ângulos.

Trata-se, assim, de focar a relação do homem com o trabalho, influenciada pela relação
íntima com sua consciência e seu corpo e pela inter-relação com outros indivíduos,
grupos, instituições sociais e, particularmente, do trabalho, cercada por uma ordem
econômica, uma conjuntura política, uma pressão do desenvolvimento tecnológico e da
disseminação da informação.

Cabe ao psicólogo do trabalho a tarefa de vencer o desafio de encarar o ser humano um


fenômeno múltiplo. Mas estará ele preparado para isso, tanto do ponto de vista de suas
expectativas em relação ao objeto de estudo e trabalho, quanto em termos de uma
formação multidisciplinar? O que leva e garante ao psicólogo desempenhar de forma
pertinente seu papel nas organizações e na ação sobre a relação do indivíduo com seu
trabalho?
A identidade profissional do psicólogo organizacional e do trabalho.

Se tratamos aqui do papel do psicólogo organizacional e, para isso, discorremos sobre o


que, poderíamos dizer, tem sido o papel da Psicologia Organizacional e do Trabalho, cabe
fazermos algumas observações e colocarmos alguns pontos para reflexão sobre a
identidade profissional do psicólogo organizacional.

A questão da identidade é bastante freqüente em estudos de Psicologia, sob as mais


diversas óticas. Encontramos essencialmente esse assunto em textos de psicologia
clínica e psicologia social, cada qual com referenciais teóricos pertinentes e específicos.

Aqui, interessa-nos uma visão abrangente, ou até, convergente, a partir de um


entendimento de que a identidade profissional é um resultado de fatores psicodinâmicos
e, portanto, dependentes da história de vida do indivíduo e de fatores de natureza social
ou, ainda, psicossocial.

A identidade como representação social

A identidade e o auto-conceito do indivíduo

“têm sido entendidos como a forma pela qual o indivíduo se vê e analisa sua relação com
os acontecimentos externos, a posição em que se coloca frente ao mundo que o cerca.
São importantes para dar características especiais, ímpares e independentes ao rumo e
ao conteúdo de sua trajetória profissional, na medida em que auxiliam na percepção dos
seus verdadeiros anseios e das possibilidades internas e externas.” ( Alberto, 2000,p.39).

Se a identidade é uma preocupação do psicólogo, deve ser objeto de atenção do


psicólogo do trabalho a chamada identidade profissional. No exercício de seu ofício, seja
atendendo atividades funcionais de linha, como treinamento e recrutamento e seleção,
higiene do trabalho, seja atuando com diagnósticos diversos, individuais ou grupais, como
na orientação profissional e de carreiras, na identificação da cultura ou no
desenvolvimento organizacional, o psicólogo necessita apreender e compreender os
aspectos da identidade profissional dos indivíduos e até dos grupos, sob um certo
aspecto. Certo é que essa identidade profissional não está longe dos consultórios de
psicoterapia, onde os adultos buscam apoio na solução de suas aflições ligadas à sua
atividade assim como se mostra presente nos ambientes de formação profissional e
educacional – entre adolescentes e adultos. Poderíamos dizer que na maioria das vezes é
com a (re)construção dessa identidade que o psicólogo trabalha e esse é um dos
aspectos em que se mostra mais presente a interdisciplinaridade nas áreas da Psicologia.

E quanto à própria identidade do psicólogo organizacional?

A identidade profissional, pode ser entendida como algo que é construído ao longo da
relação dos fatores subjetivos com as condições objetivas da realidade, como a
representação e o papel assumido no ambiente social. Isso leva-nos a refletir sobre o que
dá forma a uma escolha por uma atuação do psicólogo na organização. Conforme o que a
literatura aponta, a imagem que leva os jovens a escolher essa profissão, a representação
social do psicólogo é a de alguém que ajudará as pessoas, que tentará minimizar o seu
sofrimento, que lhes trará alguma cura (Tescaroli,1999), algo que parece muito distante da
organização do trabalho, da empresa, distante do conhecimento e do interesse da
Psicologia, conforme o estereótipo vigente, inclusive nos meios acadêmicos.
No texto de Zanelli (2002), encontramos depoimentos que apontam o conflito da imagem
e representação do psicólogo estabelecida no meio profissional e o contraste desta com o
ambiente organizacional e o objeto de trabalho do psicólogo do trabalho. Zanelli observa:

“o modelo de intervenção e a estratégia difundida nos cursos de Psicologia conduzem a


uma análise do comportamento do indivíduo ou do grupo com características de prática
de consultório. Quando transportada para o contexto organizacional, tal prática, à
semelhança do que ocorre na situação escolar, também mostra-se insatisfatória para
atender aos problemas da área.”(p.119)

Podemos nos propor a pensar o que leva o psicólogo a procurar esse campo de
conhecimento da Psicologia. Poderíamos questionar qual seria sua âncora profissional. O
termo âncora profissional foi apresentado por Edgar Schein (1978), como um modelo de
categorias de preferência e identidade profissional.

Para Schein,

“a âncora profissional foi definida como o ‘padrão auto-percebido de talentos, motivos e


valores que guiam, restringem, estabilizam e integram’ o indivíduo à sua carreira,
proporcionando-lhe a satisfação e a sensação de realização’ (Schein, 1978, p. 125).
Schein acredita que a âncora se define depois de alguns anos de trabalho e tende a se
manter a mesma ao longo da vida, servindo para o indivíduo organizar e classificar suas
experiências profissionais e estabelecer seus planos e critérios de sucesso. As âncoras
apresentadas em seus estudos foram os padrões mais encontrados nos profissionais
pesquisados, normalmente vinculados a organizações, porém o conceito poderia,
segundo o próprio autor, aplicar-se amplamente, com a definição de outras âncoras, a
todos os indivíduos inseridos nos mais diversos contextos de trabalho e de atividade,
como, por exemplo, indivíduos com âncoras ligadas a uma capacidade de auxiliar o outro,
tais quais os trabalhos de cunho assistencial.” (Alberto,2000, p.34).

Movendo-nos por um livre pensar, poderíamos refletir a respeito de que âncora representa
a maioria dos psicólogos do trabalho. Seriam diferentes das dos outros psicólogos? Em
uma das categorias – “senso de serviço e dedicação à causa” (Dutra, 1996, p.48), Schein
identificou preferencialmente pessoas ligadas a profissões que tendem a ajudar as outras
pessoas, como as ligadas à saúde, à religião e ao bem estar dos indivíduos. Em outra
âncora – “competência técnica e funcional” - observou pessoas que buscam acima de
tudo compreender melhor o seu objeto de estudo e trabalho, aperfeiçoando-se e
trabalhando como suporte e apoio técnicos, incluindo atividades de consultoria e
aconselhamento. Há, ainda, a âncora denominada “competência gerencial” que implica
em inclinações a atividades de foco abrangente, com constantes tomadas de decisões,
resistência a frustrações e bom relacionamento com as pessoas. Por mais que
entendamos que nessa zona se encontrariam os psicólogos organizacionais e do
trabalho, é certo que não poderíamos adequadamente apontar uma como a sua âncora,
universal e definitiva, pelo menos até obtermos resultados de muitas pesquisas. Âncoras
diferentes poderiam levar o indivíduo a buscar essa especialidade, dependendo do
contexto em que vier a aplicá-la e às expectativas que essa aplicação atende, por
exemplo, se a atuação se dará como consultoria, ou como gerência de Recursos
Humanos em uma grande empresa, ou, ainda, se acontecerá como pesquisa aplicada, ou
aplicação de técnicas e avaliação para dar conta de uma atividade de seleção de pessoal.
O que podemos acentuar no entanto, é que como padrão auto-percebido de interesses,
valores e aptidões, a âncora pode ser um modelo que nos auxilia a compreender a
identidade profissional de um indivíduo e suas expectativas quanto à sua atuação
profissional. Outros aspectos podem ser observados com o intuito ainda de melhor
compreender a identidade do psicólogo do trabalho.

A identidade profissional como identidade vocacional e ocupacional

Para Rodolfo Bohoslawsky, a formação da identidade profissional segue uma espécie de


expiação, ou de compensação, a partir de carências ou de caracteres adquiridos na
formação da personalidade. Tratando da relação do homem com o trabalho a partir dos
mecanismos psicodinâmicos da personalidade, explica a escolha profissional como a
resposta para questões como:

por que? - relacionada a que tipo de reparação psicológica a atividade escolhida irá
proporcionar, definindo assim a identidade vocacional;
e
com que? quando? e onde? - relacionadas ao objeto e ao contexto da atividade;
à maneira de quem?, - relacionada à imagem de profissional a ser seguida,

definindo a identidade ocupacional (Bohoslawsky, 1977).

Segundo entendemos,

“ao longo de sua vida, a pessoa tem que enfrentar essas questões repetidas vezes, ao
reagir a modificações do ambiente, premidas por fatores sócio-econômicos, muitas vezes
de ordem macroeconômica, como o desemprego; terá, então que reavaliar a definição do
objeto de satisfação de suas emoções, aquele que corresponde, no meio, às respostas
que dá àquelas questões. Não procederá, nesse processo, a uma mudança na estrutura
de sua identidade profissional, esta definida pelas respostas às referidas questões, mas
modificará o campo onde se dará, possivelmente, a busca da realização de sua expiação,
da canalização de sua energia psíquica, direcionada uma atividade social específica, que
é o trabalho.” (Alberto, 2000, p.37)

Ao escolher Psicologia como ocupação, o futuro psicólogo esboçou respostas


especialmente às perguntas “por que?” e talvez à “maneira de quem?”, definido o
caráter individual e subjetivo de sua escolha. Ao especializar-se, possivelmente encontrou
respostas para as questões que definem o ambiente e o objeto específico de seu
trabalho. O psicólogo do trabalho escolheu a instituição como “onde?” e a relação do
homem com o trabalho como o “com que?” No momento em que faz tais opções - e
elabora o luto pelas outras que deixou, não parece estar buscando uma ação ambientada
em um consultório e limitada a uma relação dual cliente-psicólogo. Seus “por que?”,
“onde?”, “à maneira de quem?” e “com quem?” levam-no a uma ocupação de
referencial e campo mais abrangentes, ao mesmo tempo em que deixar as outras
possíveis ocupações que tratam mais especificamente de algumas facetas humanas,
implicadas no homem completo e complexo com que trabalha, torna-se bastante
doloroso, como se estivesse deixando de ser psicólogo, ou estivesse tornando-se um
psicólogo “em menor escala”.

O psicólogo do trabalho enfrenta, ainda, um certo estigma, quanto a essa atuação, como
já apontava, no início da década de 1980, Codo (1984) ao discutir as críticas dirigidas ao
psicólogo industrial, no ambiente acadêmico e profissional, resquícios das quais ainda
hoje atingem tais profissionais. Codo utiliza-se da metáfora do lobo mau, para ilustrar a
imagem que deles faziam seus colegas em atividades tidas como mais nobres, mais
éticas e isentas de ideologia. Parece que só uma resposta fortemente definida às
questões colocadas por Bohoslawsky, como as que processam as escolhas, afirmando
uma definição de identidade profissional madura, pode levar a um enfrentamento, por
esses profissionais, da força da opinião do grupo social, do preconceito de sua própria
categoria profissional, força bastante presente e decisiva para os psicólogos em geral.

Identidade como pertença a uma profissão

A identidade profissional poderia ser pensada como uma identidade da profissão, da


representação dessa profissão na sociedade e da representação da profissão entre os
profissionais. Elliot Freidson (1998) escreve a respeito do “esoterismo” das profissões
assinalando que, aos olhos do leigo, a profissão se torna algo inatingível,
incompreensível, metafísica, ao mesmo tempo em que para o profissional garante uma
matriz de referências, aspectos que contribuem para a legitimação da profissão na
sociedade como uma marca, um campo delimitador de poder e influências em uma rede
de proteção para os seus representantes.

Enquanto, por um lado, isso pode favorecer o exercício da profissão e garantir certas
diretrizes e regras gerais que preservam os clientes, por outro, pode também favorecer
um estereótipo e até um estigma.

Freidson (1998,p.55) afirma, ainda, que a estratégia para se estudar e definir uma
profissão deve ser de caráter fenomenológico, uma vez que não há uma definição
absoluta de uma profissão, mas a determinação de “como as pessoas de uma sociedade
determinam quem é o profissional e quem não o é, como eles ‘fazem’ ou ‘constroem’
profissões através de suas atividades e quais são as conseqüências da maneira que eles
vêem e realizam o seu trabalho”
Assim, está se referindo a uma imagem e uma representação da profissão na sociedade,
que é construída tanto do lado do profissional, quanto do lado dos usuários de seus
conhecimentos.

Em edição de agosto de 2001 do jornal do Conselho Regional de Psicologia de São


Paulo, discute-se certa queixa dos psicólogos quanto à desvalorização da profissão e o
órgão em questão argumenta o quanto a falta de oportunidades é global e abrangente
para todas as ocupações e o quanto que, no que diz respeito aos psicólogos, está ligada
à manutenção de uma atuação estereotipada e presa às áreas clássicas. Afirma, então,
que deve haver uma ação de esclarecimento à população quanto“a vasta área de
atuação que a Psicologia pode contribuir com a sociedade – bem mais ampla que a
imagem que se tem do psicólogo, imagem essa alimentada pela mídia e pelos próprios
profissionais.”
E, quanto à imagem, afirma que, “na verdade, é construída a partir do compromisso de
seus profissionais com a própria área de conhecimento e com a sociedade.”

Nesse sentido afirma que:

“ Há muitos (psicólogos)... que banalizam a profissão quando, por exemplo, a ela


associam outras práticas exteriores ...(ao seu campo)... e/ou criam regras alheias ao
contesto em que o serviço é prestado. Todo profissional deve ser flexível o suficiente para
saber se adequar à estrutura de trabalho na qual se insere, e não o contrário. A
dificuldades para uma maior valorização da Psicologia não se referem, então, somente ao
mercado de trabalho e à sociedade, mas também a como o profissional da área se insere
e qualifica sua atuação. A valorização da profissão e o seu reconhecimento social são
uma via de mão dupla, pela qual a sociedade e profissionais podem convergir, ou não a
um ponto comum.”

Se para os próprios psicólogos há dificuldades em entender a abraçar as atividades do


psicólogo organizacional como Psicologia, natural seria uma certa estranheza do
administrador, sob um referencial mecanicista, frente a uma possível contribuição do
psicólogo para a melhora dos processos e dos resultados da organização. Natural,
também, que o psicólogo, para os outros, na organização, é aquele que representa o
papel estereotipado e difundido na sociedade. Seriam os papéis relacionados ao
profissional que cura, que ajuda, que compreende e, no ambiente organizacional, avalia
as profundezas da alma humana? Seriam os que estão relacionados ao estereótipo ou à
imagem que a sociedade faz do psicólogo em geral? Qual a representação do psicólogo
organizacional, na empresa, para o corpo de dirigentes e para os empregados? Parece-
nos que esse papel vem-se construindo e, sem ser extirpado da profissão da Psicologia e
sem ser delimitado como um campo estanque e inacessível, caracterizando-se como uma
atuação realmente multifacetada, como os olhos de um inseto, para enxergar o seu
fenômeno de caráter abrangente e comportamento ecológico – a relação do homem e seu
fazer, em um ambiente de relações sistêmicas de toda ordem.

A atuação do psicólogo organizacional.

A Society for Industrial and Organizational Psychology Inc., uma divisão da American
Psychological Association, lista uma série de áreas ou funções desempenhadas pelos
psicólogos organizacionais (Industrial-Organizational Psychologists, como chamam),
acentuando que sua esfera de atuação implica em atividades de pesquisa, consultoria e
aplicação de ferramentas e programas.
Emprestamos dessa lista as áreas que identificamos, no Brasil, como atuação dos
psicólogos organizacionais, costumeiramente ligados às funções da área de recursos
humanos, como atividades tanto de linha como de staff. Tratam-se de atividades que
apóiam as funções de atrair, manter e desenvolver as pessoas na organização e que se
dão nos níveis macro, meso e microorganizacionais, como comentados acima. Cabe
acentuar que tais atividades podem desenvolver-se em caráter de consultoria e
assessoria.
Recrutamento e seleção de pessoal
Definição e identificação de meios adequados de recrutamento
Desenvolvimento de processos de seleção, colocação e promoção de empregados.
Validação de instrumentos e testes utilizados para essas finalidades
Acompanhamento de resultados de seleção
Análise de potencial

Treinamento e desenvolvimento de Recursos Humanos


Identificação de necessidades de treinamento e desenvolvimento
Formulação e implementação de programas de treinamento técnico e desenvolvimento
gerencial
Formulação e aplicação de programas de desenvolvimento de novas atitudes e novos
conceitos
Avaliação da efetividade dos programas de treinamento frente a produtividade e
satisfação dos empregados

Planejamento de Recursos humanos


Avaliação do mercado de trabalho
Análise de cargos e de conjunto de atividades
Acompanhamento de movimentação de pessoal
Planejamento de carreiras e planos de sucessão
Apoio na definição de salários e benefícios
Redesenho de cargos

Desenvolvimento organizacional
Análise e redesenho da estrutura organizacional
Diagnóstico organizacional
Diagnóstico de clima e cultura organizacionais
Facilitação e monitoração de mudanças organizacionais
Desenvolvimento e implantação de ações para incremento na satisfação e na efetividade
de indivíduos e grupos

Avaliação de desempenho
Desenvolvimento de instrumentos e critérios de avaliação do desempenho individual,
grupal e da organização
Acompanhamento de desempenho dos empregados
Desenvolvimento de programas de reconhecimento dos resultados alcançados

Qualidade de vida e saúde no trabalho


Identificação de fatores associados à satisfação no trabalho e ações para o seu
incremento
Identificação de fatores causadores de stress e doença mental no trabalho e implantação
de ações para sua minimização
Apoio com a sensibilização e educação para a higiene e segurança do trabalho
Aconselhamento e orientação profissional

Comunicação interna e endomarketing


Identificação de necessidades dos diversos segmentos internos de profissionais
Apoio na elaboração de instrumentos e de conteúdo para veículos de comunicação
interna.
Ainda podemos citar ações ligadas a ergonomia, como

Desenho de ambientes organizacionais


Desenhos de equipamentos e sistemas apropriados ao homem.

O órgão norte-americano citado inclui atividades ligadas a Marketing, no que diz respeito
à Psicologia do consumidor e atendimento e acompanhamento de consumidores.
Tendemos a não considerar essas atividades como Psicologia do trabalho e
organizacional, pois o objeto de estudo e foco de ação são diferentes. São, sem dúvida,
oportunidades de trabalho oferecidas aos psicólogos, baseadas no seu conhecimento do
comportamento humano, atreladas aos objetivos organizacionais, mas não voltadas à
relação do indivíduo com o trabalho, nem às relações de trabalho nas organizações.
Assim, preferimos entender esse campo como uma área específica de aplicação da
Psicologia e não integrá-lo à Psicologia Organizacional ou do Trabalho.

Essas atividades concentram tudo que o psicólogo faz desde os primeiros tempos nas
organizações até o que mais recentemente vem sendo objeto de seus estudos e
aplicação nas empresas. O bom resultado desse trabalho não provem certamente apenas
do que aprende na disciplina Psicologia Organizacional na Universidade, mas da
aplicação convergente de todos os conhecimentos do comportamento e dos desejos
humanos que aprendeu ao longo de todo o seu curso. Do mesmo modo, é com esse
arcabouço que pode marcar sua presença nas organizações, oferecendo um saber
particular, específico e aprofundado sobre uma das facetas do ser humano, desde que
aprenda a integrar o seu saber a tantos outros que também estão sendo chamados a
melhorar a relação do ser humano com o trabalho.

CONCLUSÕES

Vamos responder, então, ás perguntas iniciais, elaboradas pelos estudantes. Por que
temos que estudar isso? Isso não é Psicologia.

Parece que não podemos pensar e fazer psicologia em qualquer aspecto sem a dimensão
ou o paradigma do trabalho. Jacques (1998) propõe “o resgate do significado de alguns
conceitos psicológicos à luz desse paradigma”); possivelmente os mesmos conceitos que
poderiam ser encarados à luz dos paradigmas clínico, experimental, do desenvolvimento,
social. Todos são psicologia a psicologia é todos ao mesmo tempo.Essa é a noção da
holografia que tanto se tem propagado nos dias de hoje, como um modelo para atender
ao paradigma da complexidade, conforme Morin (1999), que, ao referir-se ao paradigma
causal, linear, o quadro de referências simples que reinou até meados do século XX,
afirma que “quando a simplicidade não funciona mais, è preciso passar ao elo, à espiral, a
outros princípios do pensamento”. Ele insiste que não se abandone o paradigma
cartesiano, nem o sistêmico, que revolucionou o pensamento anterior das ciências
fechadas, mas que o pensamento seja tridimensional, incluindo a terceira teoria – a da
complexidade. Ora, essa nos parece uma visão convergente e abrangente que, se
submetida à Psicologia, não permitirá grandes divisões, ou pelo menos que elas sejam
apenas operacionais e, sim, permitirá grandes confluências na compreensão do ser
humano. A Psicologia do Trabalho é a psicologia do homem adulto e assim, perpassa a
todas as “outras psicologias” e relaciona a Psicologia com muitas outras ciências
humanas, na medida em que trata do fazer do homem. Com essa missão, não pode
deixar de conhecer a amplitude das outras ciências que dizem respeito a esse fazer, o
que inclui a ciência administrativa, para lamento dos psicólogos presos ao paradigma
clínico. Não foi só a psicologia que viveu isso, a medicina do trabalho é outro exemplo, a
administração, a sociologia especialmente.

Parece que nossa missão, enquanto psicólogos, em qualquer especialidade, seja resgatar
os pedaços em que dividimos o objeto de estudo e de aplicação de nossa ciência e,
ainda, entendermos que esse objeto inteiro é só parte de outros tantos outros objetos de
estudos e ciências diversas. Isso implica em tanto o psicólogo cuja especialidade é a
organização ou o trabalho, estudar e compreender o homem sob os outros paradigmas de
sua ciência, como também os outros especialistas preocuparem-se com o paradigma da
psicologia do trabalho. Caberá a todos uma tarefa mais difícil e que também tem que ser
levada a cabo por tantos outros cientistas e profissionais – munir-se de um quadro de
referências complexo, em que coexistem e justapõem-se todas as tentativas de
compreender e agir sobre os homens.

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