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15/11/2019 O estelionatário

EDIÇÃO 158 | NOVEMBRO_2019

anais da gatunagem

O ESTELIONATÁRIO
O brasileiro que enganou um mafioso italiano, políticos panamenhos e Donald Trump
ALLAN DE ABREU

Depois de fugir da Espanha, do Panamá e do Brasil com documentos falsos, Alexandre Nogueira viveu em sete países. “Eu
procuro lugares que não estão tão conectados com o mundo.” CREDITO: JORGE FERNANDEZ_CORTESIA DE LA
PRENSA_REUTERS

M
ais de mil convidados circulavam pelo salão de festas de Mar-a-
Lago, resort luxuoso do bilionário Donald Trump em Palm Beach,
na Flórida. Aquela noite de meados de janeiro de 2008 marcava o
lançamento do projeto Trump Ocean Club, edifício de setenta andares em
forma de vela náutica que seria construído na Cidade do Panamá, com
hotel, apartamentos residenciais, salas comerciais e um cassino.

Entre os convidados, havia um brasileiro de 33 anos, loiro de olhos


verdes, nariz proeminente e maçãs do rosto marcadas pela acne da
juventude: Alexandre Henrique Ventura Nogueira. Coube ao sócio de
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Nogueira, o empresário panamenho Roger Khafif, apresentá-lo a Trump


durante a festa. “Esse é o nosso vendedor-estrela no Panamá”, disse.
“Parabéns, continue assim”, respondeu o futuro presidente dos Estados
Unidos, com um sorriso mecânico e um aperto de mão protocolar. Em
seguida, os três posaram para fotos.

Dois anos antes, tão logo soube que Khafif estava em Nova York para
fechar uma parceria com a Organização Trump, o brasileiro embarcou às
pressas do Panamá, onde vivia, para os Estados Unidos. Hospedou-se no
mesmo hotel e, no dia seguinte, uma segunda-feira, postou-se no lobby
até que o empresário aparecesse. “Eu vim atrás de você”, disse a Khafif,
ao encontrá-lo pela primeira vez. “Gostaria de oferecer os meus serviços
para cuidar da representação do projeto Trump no Panamá, antes que
qualquer outra imobiliária tome a iniciativa.”

O panamenho de início recusou a parceria. Mas, como Nogueira insistiu,


Khafif fez uma proposta. “Por enquanto, só sei o nome do projeto: Trump
Ocean Club. Não tenho mais detalhes. Se mesmo assim você fizer
contratos de reserva de cem apartamentos até o fim desta semana, o
projeto é seu.”

Nogueira imediatamente contatou seus funcionários no Panamá e


acionou uma rede de investidores. Os interessados assinavam um pré-
contrato, pagando 10 mil dólares de adiantamento. Em três dias, ele
conseguiu bater a meta e conquistou a chance de ser sócio de Khafif nas
vendas do primeiro empreendimento de Trump na América Latina.

A base de vendas foi montada em uma sala comercial batizada de Trump


Plaza. Como estava à frente do negócio, Ivanka Trump, filha do
bilionário, foi quatro ou cinco vezes ao Panamá para reuniões, uma delas
para tratar do preço que seria cobrado por unidade. Quando ela propôs
que cada apartamento fosse negociado pelo valor mínimo de 120 mil
dólares, Nogueira a interrompeu:

– Não, está errado.

– Errado por quê?, questionou Ivanka.

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– Porque é Trump! Desculpe, sei que você é filha dele, mas vocês não
estão dando o devido valor ao nome de Donald Trump. Tem que ser
vendido por pelo menos 220 mil dólares, para começar.

Ivanka gostou da proposta e se aproximou de Nogueira – eles chegaram


a contracenar em um vídeo promocional do Trump Ocean Club, segundo
o brasileiro. Entre um terço e metade das 920 unidades do edifício foi
vendida pelo brasileiro para compradores os mais variados, como
milionários ligados à máfia russa e um misterioso empresário colombiano
mais tarde acusado de lavar dinheiro do narcotráfico. As vendas fizeram
de Nogueira um milionário, com patrimônio estimado por ele em 100
milhões de dólares – ou entre 50 e 60 milhões, como calculam, mais
modestamente, advogados e promotores de Justiça panamenhos. Levou
um bom tempo até que Trump, Ivanka, Khafif e boa parte dos clientes,
incluindo os russos mafiosos, descobrissem ter sido vítimas de um
grande golpe tramado por Nogueira: de acordo com o Ministério Público
do Panamá, ele vendera parte dos apartamentos para dois ou três clientes
distintos, ao mesmo tempo.

Trapacear patrões e clientes, driblar credores e corromper políticos são a


tônica da vida empreendedora de Nogueira no Panamá, no Brasil, na
Inglaterra, na Alemanha e na Espanha. Em pouco mais de vinte anos,
além de enganar Trump, o brasileiro caloteou um mafioso italiano – e
quase foi morto por causa disso –, traiu a confiança de um empresário
alemão, associou-se ao pior da política panamenha e ludibriou credores
no interior paulista, escapando por pouco de ser sequestrado por eles.

Muita ousadia, bons contatos no mundo dos negócios e consideráveis


doses de mentira fizeram de Nogueira um dos maiores golpistas – se não
o maior – que o Brasil já produziu. Em muitos aspectos, sua vida lembra
a de Frank Abagnale Jr., o multivigarista que Leonardo DiCaprio
encarnou no filme Prenda-me Se For Capaz. Mas, diferentemente do
norte-americano, o brasileiro continua impune, porque nunca teve em
sua cola alguém como Carl Hanratty, o fictício agente do FBI que
capturou Abagnale Jr. Uma vida inteira de golpes resultou para Nogueira
em pouco mais de sete meses atrás das grades e, embora tenha contra si
dois mandados de prisão, ele nem sequer consta da lista de procurados
da Interpol. Investigações frágeis da polícia e do Ministério Público

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permitem que continue em liberdade, vivendo às escondidas em alguma


parte do mundo, pois teme tanto a Justiça como algumas de suas vítimas,
que ameaçaram matá-lo. Seu paradeiro é um mistério, mas, após seguir
seus rastros durante um ano e meio, eu consegui entrevistá-lo.

O
nome do pai biológico de Alexandre Henrique Ventura Nogueira é
um segredo de família. Quando sua mãe, Lúcia Maria Ventura
Venâncio, estava grávida, engatou namoro com o cirurgião-geral e
obstetra Marcello Nogueira da Silva, vinte anos mais velho e pai de seis
filhos de outros dois relacionamentos. Médico respeitado no Recife e
dono de um hospital particular na cidade, Silva fora, no início dos anos
1960, prefeito de Nazaré da Mata (PE) e aliado do governador Miguel
Arraes. Por isso mesmo, com o golpe militar de 1964, perdeu o emprego
como servidor público estadual, foi preso e torturado. Quando Alexandre
nasceu, em 28 de abril de 1974, Silva o registrou como filho, deu a ele um
dos sobrenomes e, junto com Lúcia Venâncio, duas irmãs: Marcela e
Paloma.

Os conflitos com a mãe marcaram a infância de Alexandre. Segundo


familiares, Venâncio sempre privilegiou as meninas, a ponto de proibir o
filho de comer as mesmas guloseimas dadas às irmãs, como iogurte e
chocolate. Ela também costumava agredi-lo fisicamente e submetê-lo a
castigos constantes. “Ele foi uma criança muito triste. Detestava a mãe”,
afirmou um parente que não quis ser identificado. Segundo Alexandre, a
mãe chegou a queimá-lo com cigarro, entre outros maus-tratos, dos quais
guarda até hoje uma cicatriz nas costas. “Ela me disse várias vezes que

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tentou me abortar”, afirmou. Venâncio nega tudo. “Ele foi criado com
muito amor e carinho. Só que era muito levado.”

Quando o menino tinha 9 anos, Silva e Venâncio se separaram. Alexandre


Nogueira e as meias-irmãs foram morar com o pai delas e ganharam uma
madrasta, pois Silva casou de novo – só recentemente Alexandre soube
que não era filho biológico do médico. Desde a separação dos pais, o
menino passou a repelir qualquer tentativa de contato com Venâncio.
Certa vez, no fim de 2012, quando visitava o sogro de uma de suas meias-
irmãs num hospital no Recife, a mãe entrou no quarto. Ao vê-la,
Nogueira ficou em estado de choque, descreveu um parente. “Ele dizia:
‘Me tira daqui.’ Parecia ter visto um fantasma. Quando a mãe chegou
perto, ele se afastou dela e saiu correndo.”

Desde cedo, Nogueira abusou das traquinagens. Na escola, era conhecido


pela inteligência, mas também pelo pouco apego ao estudo. “Eu achava
que sabia tudo, fazia pergunta difícil para complicar a vida do professor.”
Quando tirava nota baixa, fraudava o boletim escolar, que na época era
feito de cartolina: inseria notas mais altas e falsificava a assinatura da
madrasta. Quando Silva descobriu, resolveu mandar o menino para um
colégio militar. A mudança parecia promissora: o jovem melhorou as
notas, deixou as encrencas de lado e cogitou seguir carreira na
Aeronáutica. Silva, entretanto, não permitiu.

Aos 18 anos, Alexandre Nogueira começou a cursar administração de


empresas na Universidade de Pernambuco. Certo dia, como presente de
aniversário, seus amigos de faculdade o convidaram para uma noitada
num prostíbulo na periferia do Recife. Lá, o rapaz conheceu uma garota
de programa de 14 anos, por quem se encantou. Os dois começaram a
namorar, e pouco depois a jovem ficou grávida. Alexandre decidiu casar-
se com ela e a levou para conhecer os familiares, que rejeitaram o
relacionamento. O rapaz, então, fugiu de casa e passou a morar com a
adolescente – procurada pela piauí, ela não quis ser entrevistada.

A
pesar da aversão que o filho sentia pela mãe, o jovem casal, sem ter
para onde ir, morou dois meses na casa dela. Na época, Alexandre

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A
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Nogueira trabalhava em uma revendedora de baterias automotivas e


começou a desviar dinheiro da empresa – segundo ele, para sustentar a
mulher e o filho. Acabou demitido. Também deixou a faculdade, faltando
apenas dois semestres para concluir o curso.

O casal mudou-se do Recife para Fortaleza, onde Nogueira abriu seu


primeiro negócio, em outubro de 1994 – poucos meses depois, em
fevereiro, nasceria seu filho. Na descrição dele, tratava-se de uma loja de
produtos para computador. Mas familiares afirmam que era uma escola
de informática, empreendimento muito comum nos anos 1990, quando o
computador pessoal começou a se difundir no Brasil. Após receber o
dinheiro das matrículas, Nogueira retirou do local todos os
computadores e desapareceu. Foi com a mulher e o filho para Anápolis,
em Goiás, onde passou a vender equipamento de informática trazido do
Paraguai. O negócio afundou depois que, em uma das viagens, toda a
muamba foi apreendida na fronteira. Nogueira fez um empréstimo
bancário e retomou as viagens, agora contrabandeando cigarros do
Paraguai até Palmas, no Tocantins. “Era uma rotina muito cansativa e
acabei desistindo.”

Em 1997, o casal foi para Salvador, onde abriu uma loja de produtos
importados. Enquanto ela cuidava da loja – que teve vida curta –, ele se
aventurou no resgate de títulos de capitalização, como os jogos Tele Sena
e Papa-Tudo, que estavam no auge da popularidade e tinham como
garotos-propaganda Silvio Santos e Xuxa, respectivamente. O dono de
uma casa lotérica da capital baiana alertou Nogueira para um possível
filão: poucas pessoas sabiam que, um ano depois de adquiridas, as
cartelas, por serem títulos de capitalização e ao mesmo tempo loteria,
poderiam ser resgatadas pela metade do valor da compra (3 reais, na
época). “No subúrbio, as pessoas mal tinham o que comer, mas debaixo
do colchão guardavam duzentas, trezentas cartelas”, lembrou.

Nogueira comprou uma perua Kombi com alto-falante, confeccionou


camisetas com as logomarcas da Tele Sena e do Papa-Tudo para ele e
para as garotas que contratou na periferia de Salvador. Todos juntos, eles
percorriam a cidade, oferecendo a troca de cartelas velhas por novas –
uma nova para cada vinte ou trinta antigas. Os títulos eram resgatados
por Nogueira na lotérica, que ficava com 10% do valor. “Muitos diziam

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que queriam jogar, mas não tinham dinheiro. Aí eu inventei um bordão:


‘A sorte está batendo na sua porta, e a sorte é como a morte, só bate na
porta uma vez.’”

Ele me deu a receita do sucesso do negócio: “Você usa um pouco a


ignorância das pessoas. Alguns me perguntavam: ‘Você conhece o Silvio
Santos e a Xuxa?’ E eu respondia: ‘Claro, eu encontro com eles todo
domingo.’” Nessa época, fim da década de 1990, ele esteve com o pai
adotivo pela última vez – o médico Marcello Nogueira da Silva morreria
de câncer em 2006, aos 74 anos. Quando as próprias lotéricas começaram
a orientar as pessoas sobre como resgatar as cartelas, o negócio de
Nogueira veio abaixo. Seu casamento também não resistiu. A jovem
voltou para o Recife com o filho e ele foi para São Paulo. Morou por
algum tempo em uma república de pilotos perto do Aeroporto de
Congonhas, decidido a tornar-se comissário. Enquanto fazia o curso –
que ele de fato frequentou, como a assessoria da Aeronáutica confirmou à
piauí –, trabalhou em uma loja de eletroeletrônicos em um shopping. Ele
jamais pilotou um avião, mas disse ter licença para conduzir pequenas
aeronaves em modo visual.

Em abril de 2000, Nogueira leu na revista Veja a reportagem Aventura na


Rede: Legião Estrangeira Usa Site para Recrutar Mercenários. O texto
citava as vantagens de integrar a milícia francesa: salário de 1 392 reais
mensais (4,5 mil reais, em valores corrigidos) e a possibilidade de
requerer naturalização como francês após três anos. “Quem tem na
biografia delitos leves, dívidas impagáveis ou foge de perseguições
políticas ganha a chance de reconstruir a vida em troca de lealdade ao
governo francês. […] É a profissão certa para quem deseja aventura e, de
quebra, passaporte francês”, concluía a reportagem. Ele pediu demissão
do emprego no shopping e, com o dinheiro da rescisão, comprou uma
passagem aérea para Paris. Era o início de suas peripécias pelo mundo.

A
o desembarcar no Aeroporto Charles de Gaulle, em Paris, Nogueira
conheceu uma brasileira recém-chegada de Londres cuja mala se
extraviara. Como precisava retornar à capital britânica, mas não
falava inglês, a mulher propôs a Nogueira pagar a passagem dele em

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troca de ajuda para recuperar a bagagem. Mesmo com seu pouco


conhecimento de inglês, ele conseguiu ajudar a mulher. Resolveu passar
dois dias em Londres, onde conheceu um carioca a caminho de uma
fazenda de batatas e morangos em Hereford, a cerca de 200 km da
capital. “Ele disse que tinha trabalho para quem quisesse na plantação.
Abandonei o projeto da Legião Estrangeira e fui para lá.”

Na fazenda havia cerca de 2 mil trabalhadores estrangeiros, estima ele,


dos quais quatrocentos eram brasileiros, entre eles Catherina Sharon
Ukstin Peruzzi, loura de olhos miúdos, uma descendente de bielorrussos
nascida em Americana, no interior de São Paulo. Começaram a namorar.
Ele contou que, após três dias de trabalho pesado na lavoura, foi
convidado a trabalhar no escritório da fazenda, cuidando da
contabilidade, o que lhe dava o direito de ocupar um apartamento e
dirigir um carro da propriedade. O casal morou ali quase um ano, até que
foram demitidos, pois descobriu-se que, para engordar os vencimentos,
Nogueira estava fraudando o cartão de ponto da namorada.

Os dois então procuraram a instituição equivalente ao Ministério do


Trabalho na Inglaterra para reivindicar verbas indenizatórias. Depois de
ouvi-los, a atendente pediu para regressarem dois dias mais tarde.
Quando voltaram, dois policiais detiveram o casal, pois eles estavam
usando carteiras de trabalho falsificadas, nas quais apareciam com
nacionalidade portuguesa. Foram deportados para o Brasil.

Nogueira deixou a namorada na casa dos pais dela, em Americana, e


voltou a Paris. Em seguida, pegou carona em um ônibus repleto de
marroquinos a caminho da Espanha, de onde planejavam seguir viagem
até seu país. “Foram muito acolhedores, até comida me deram”, recordou
o brasileiro. Desembarcou em um vilarejo na Andaluzia, onde trabalhou
por uma semana em plantação de brócolis. Lá, soube que um restaurante
argentino de Almería estava à procura de um garçom fluente em inglês.
Ele não atendia inteiramente ao pré-requisito, mas acabou contratado
como maître: recepcionava os clientes estrangeiros, indicava os pratos e
os melhores vinhos da casa.

Certa manhã apareceu no restaurante um alemão que jantara ali na noite


anterior. Ele chamou Nogueira para uma conversa.

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– Meu nome é Hanz e trabalho com importação e exportação de móveis


de madeira – disse. – Preciso de alguém que fale português para um
empreendimento no Brasil. Você entende de madeira?

– Claro que entendo! Fui praticamente criado na Amazônia – respondeu


o brasileiro, que nunca havia posto o pé na região.

Na semana seguinte, Nogueira foi a Düsseldorf para se encontrar com


Hanz – cujo sobrenome o brasileiro não se lembra –, dono de uma fábrica
terceirizada pela Landmann Peiga, na época uma das maiores indústrias
alemãs de móveis de madeira e churrasqueiras. Juntos, os dois foram a
Hong Kong para se reunir com um dos donos da Landmann, Jürgen
Wennersbusch. Como este mesmo me contou, foi seduzido pelo carisma
do brasileiro e decidiu que Nogueira trabalharia diretamente para ele, e
não mais para a empresa de Hanz.

Depois de visitar as fábricas de móveis da Landmann na China e no


Vietnã, Nogueira regressou ao Brasil com a tarefa de abrir uma filial da
empresa encarregada de exportar madeira bruta para a Ásia e móveis e
carvão para a Alemanha. Ele e Peruzzi escolheram viver em São Bento do
Sul, tradicional polo moveleiro de Santa Catarina.

Problemas não demoraram a surgir. Em outubro de 2002, quando não


havia completado um ano no novo emprego, ele contratou com uma
empresa de Porto Alegre o fornecimento de 9 mil m3 de eucalipto, que
também seriam exportados para a Ásia, ao custo total de 115 mil dólares.
Entretanto, apenas metade da madeira foi embarcada, segundo consta de
ação cível impetrada pela empresa contra a Landmann Peiga na 7ª Vara
Cível de Porto Alegre.

Em fevereiro de 2003, Nogueira recebeu 90 mil dólares da indústria


alemã para entregar a uma fornecedora de madeira no Pará – a empresa
era fictícia, como a Landmann descobriu mais tarde. Nogueira contou à
piauí uma história diferente: “Fui até a empresa e percebi que eles tinham
fechado as portas. Entrei em desespero.” Com 90 mil dólares em mãos,
ele abandonou às pressas o hotel de Belém onde se hospedara com
Wennersbusch e retornou a São Bento do Sul. “Para mim, Alexandre
disse que um homem o havia roubado e que ele não tinha como repor o

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dinheiro para a empresa do alemão”, disse Catherina Peruzzi. O casal


pegou um voo no meio da noite em Florianópolis e desembarcou em
Curitiba, de onde seguiu de ônibus até Americana. “Deixamos a nossa
filha com a minha mãe e fomos para a Costa Rica. Ele falava que era um
bom país, em crescimento.”

Quando soube dos negócios obscuros feitos em nome da Landmann e do


sumiço do brasileiro, Wennersbusch o denunciou à Delegacia de Polícia
de São Bento, pois Nogueira não tinha poder para assinar, sozinho,
contratos em nome da empresa alemã. (Tempos depois, o inquérito seria
arquivado, e o imbróglio com a fornecedora, resolvido, pois a ação
judicial movida contra a Landmann foi julgada improcedente.)

Wennersbusch decidiu também caçar o brasileiro pelo mundo e


contratou a Kroll, consultoria norte-americana especializada em
investigações corporativas e em cibersegurança, para a tarefa. Nogueira
estava vivendo em San José, capital da Costa Rica, onde negociava carros
e importava móveis de jardim fabricados na China.

Certa noite, o empresário alemão bateu à porta da casa de Nogueira com


o relatório da Kroll em mãos. “Isso é para provar que eu consigo te achar
em qualquer lugar”, disse. As conversas travadas entre os dois duraram
dois dias, até que, por fim, reataram a amizade. “Terminamos em um
prostíbulo, onde consegui umas mulheres para ele”, contou Nogueira.
Wennersbusch, que está aposentado e vive em Essen, na Alemanha, disse
à piauí que ainda tem estima pelo brasileiro, mas ressalva: negócios com
ele, nunca mais. “Ele me deu grande prejuízo. Traiu a minha confiança.”

Os negócios de Nogueira na Costa Rica não prosperaram e, em 2003, com


Peruzzi grávida do segundo filho, o casal decidiu regressar ao Brasil.
Instalaram-se em Americana, onde Nogueira abriu uma loja de produtos
vendidos a 1,99 reais, a Mil Itens Comércio de Atividades Domésticas.
Em poucos meses, o comércio naufragou em dívidas com fornecedores e
funcionários.

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o fim de 2004, o casal e os dois filhos mudaram-se para Almería, no Sul

N
da Espanha, a mesma cidade onde Nogueira trabalhara como
maître. Ele reatou contato com o dono do restaurante, o argentino
Ruben Ramón Ocaña, e juntos abriram a Recifemotor, uma loja de
carros de luxo das marcas Ferrari, Lamborghini, BMW e Mercedes-
Benz. Os clientes, a maioria deles empresários, atletas de renome e
políticos espanhóis, escolhiam o modelo nos catálogos e pagavam
adiantado. Os veículos eram encomendados diretamente às fábricas.
Enquanto isso, o argentino cuidava das finanças da loja. A Polícia
Nacional e a Guarda Civil chegaram a investigar a Recifemotor por
lavagem de dinheiro, mas o inquérito acabou arquivado.

Em pouco tempo a revendedora tornou-se a maior do ramo na cidade de


200 mil habitantes. O repórter espanhol Javier Pajarón entrevistou alguns
clientes da loja. “O Nogueira te atendia muito bem, tinha um trato cordial
e amistoso que te convencia. Rapidamente entrava na internet e
começava a montar o carro do jeito que você queria”, disse um deles,
Enrique Fernández, ao jornalista.

Entre os principais clientes, estava o italiano Giuseppe D’Amico, um


homem tido como muito perigoso, com passagens pela polícia por
narcotráfico e porte ilegal de armas. Ligado à Camorra, a máfia
napolitana, D’Amico controlava parte do tráfico de drogas na região de
Almería e lavava o dinheiro arrecadado em boates de sua propriedade no
Sul da Espanha. Nogueira disse que, durante uma visita à casa do
italiano, se deparou com mais de vinte pessoas contando dinheiro em
máquinas no porão.

Embora os negócios da Recifemotor progredissem, a loja começou a


atrasar a entrega dos carros aos clientes. Entre os mais de cinquenta
compradores lesados estava o italiano, que entregara 600 mil euros para
Nogueira e Ocaña, mas não vira a cor do automóvel encomendado. Em
retaliação, D’Amico ameaçou tomar todos os carros expostos na vitrine
da loja.

Enquanto enrolava os compradores, o brasileiro percebeu que ele próprio


estava sendo trapaceado pelo sócio argentino. “Pelo volume de carros
que vendíamos, era para eu ter mais dinheiro”, disse. Ao solicitar uma

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auditoria nas contas da loja, notou um desfalque de mais de 1 milhão de


euros. “Essa foi a única vez em que fui passado para trás – as outras
vezes, admito, fui eu quem passei os outros.”

Depois de uma discussão ríspida entre eles, Ocaña viajou para Madri, de
onde telefonou para Nogueira: “Compadre, pegue as suas coisas e vá
embora. Acabou tudo.” No mesmo dia, um grupo de homens armados
com pistolas entrou na loja procurando pelo argentino. “Vamos voltar
amanhã. Se ele não aparecer, começamos cortando a sua orelha.”

Nogueira sacou todo o dinheiro do banco e viajou às pressas para Madri


com a mulher e os filhos. Ao desembarcar na capital espanhola, o
brasileiro foi até o balcão da primeira companhia aérea que viu e
perguntou:

– Para onde é o próximo voo?

– Para Casablanca.

O casal amanheceu no Marrocos, onde permaneceu uma semana, em


setembro de 2005. Nogueira e Ocaña deixaram para trás dezenas de
clientes lesados – a maior parte deles ingressou com ações judiciais contra
a dupla. D’Amico buscou um caminho alternativo: tomou um sítio de
Ocaña nos arredores de Almería e obrigou o argentino, que fugira para
sua terra natal, a regressar à Espanha e a responder a uma ação penal por
estelionato, na qual ele seria condenado a dois anos de prisão. Nogueira
nunca mais voltou à Espanha e ainda vigora contra ele no país um
mandado de condução coercitiva –, ele precisa ser primeiro interrogado
para só então o juiz decidir se deverá ser preso ou se poderá responder
aos processos em liberdade. Em setembro de 2006, um ano depois da
fuga dos sócios da Recifemotor, D’Amico foi morto por narcotraficantes
rivais de Almería.

N
o Marrocos, Nogueira definiu o novo destino do casal: Panamá. “Li
que era um país em crescimento, cheio de oportunidades”, me disse
o brasileiro.

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De fato, entre 1993 e 2018, nenhum outro país latino-americano crescera


tanto: no período, o PIB panamenho aumentou 5,9% ao ano, em média.
Em 2018, o país tinha renda per capita de 25 676 dólares, a segunda maior
da América Latina, depois do Chile. Essa prosperidade se deve, entre
outras razões, aos baixíssimos impostos cobrados pelo governo
panamenho, à facilidade de se criar empresas de fachada em nome de
terceiros, ocultando seus verdadeiros proprietários, e às frágeis regras de
compliance dos bancos.

Todos esses fatores somados converteram o Panamá em um dos mais


conhecidos paraísos fiscais do mundo. Apesar de esforços recentes para
melhorar sua imagem, sobretudo após o escândalo dos Panama Papers,
em 2016 – quando o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos
revelou milhares de documentos de offshores mantidas pelo escritório de
advocacia Mossack Fonseca –, o país ainda apresenta um ambiente
favorável à lavagem de dinheiro. No relatório de 2018 do Índice de
Percepção da Corrupção (IPC), da ONG Transparência Internacional, o
Panamá ocupa a 93ª posição entre 180 nações – ainda assim, melhor
situado que o Brasil, que aparece na 105ª posição.

No Panamá, Nogueira fez sua pós-graduação como estelionatário.


Primeiro, investiu na importação de carros da Alemanha. Mas, já na
virada de 2005 para 2006, embarcou no boom imobiliário que varria as
Américas e abriu a Homes Real Estate. Em fevereiro de 2006, soube que
haveria uma feira de imóveis em Dubai e propôs vender no evento
apartamentos de uma construtora espanhola na Cidade do Panamá. “Eu
tenho um estande lá”, mentiu. “Me deem uma maquete do projeto que eu
ofereço na feira.”

A proposta foi aceita e Nogueira conseguiu alugar um espaço no evento.


“Vendi mais de dez apartamentos e fiquei conhecido como o empresário
que vendeu o Panamá em Dubai. Quando retornei, consegui uma
representação do projeto.”

Na época, ele conheceu o grego Nikolas Papadimas, de quem comprou a


primeira casa para sua família. Papadimas era procurado pela Justiça da
Grécia, acusado de desviar 700 mil dólares da Igreja Ortodoxa Grega em
Jerusalém e vender sem autorização dois hotéis na cidade pertencentes a

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essa mesma instituição, da qual fora diretor financeiro. Embora não fosse
judeu, era casado com uma russa-israelense e tinha trânsito fácil entre a
comunidade judaica na Cidade do Panamá.

As relações com Papadimas permitiram que Nogueira viajasse a Israel a


fim de atrair investidores para empreendimentos imobiliários
panamenhos. Durante a viagem, conheceu um grupo de judeus oriundos
da antiga União Soviética, entre eles o trio Alexander Altshoul, Stanislau
Kavalenka e Arkady Vodovosov, todos de passado pouco recomendável.
Altshoul fora processado no Canadá por fraude hipotecária – acusação
posteriormente retirada. Kavalenka chegou a ser acusado pelo governo
canadense de cafetinagem e sequestro de prostitutas russas – o caso foi
arquivado depois que as vítimas se negaram a depor em juízo.
Vodovosov havia sido condenado a cinco anos de prisão por sequestro
em Israel. Os três decidiram investir nos imóveis da Homes Real Estate
no Panamá, e posteriormente Altshoul e Kavalenka se tornariam sócios
de Nogueira.

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m ano e meio depois de sua fundação, a Homes Real Estate havia se

U
tornado a maior imobiliária do Panamá, com setenta funcionários e
escritórios em Miami, Nova York, Toronto, Madri, Bogotá e
Caracas. Clientes estrangeiros chegavam em jatinhos particulares à
Cidade do Panamá, transitavam em limusines com a logomarca da
empresa e eram levados de helicóptero para conhecer as atrações
turísticas do país. Para agregar valor aos imóveis à venda, Nogueira
chegou a fechar parceria com a linha de móveis e decoração de Giorgio
Armani – a assessoria da empresa confirmou as tratativas –, mas o
projeto não foi adiante.

O novo sócio Altshoul teve a ideia de atrair milionários russos para um


projeto imobiliário no Panamá em parceria com a Versace. “Os russos
gostam de decorações mais chamativas, no estilo da marca italiana”,
contou Nogueira. O brasileiro disse que foi à Itália para tratar
pessoalmente com o presidente do grupo, Santo Versace, dos detalhes do
projeto, batizado de Vita by Versace – a empresa italiana não respondeu
ao pedido de entrevista da piauí.

Para lançar o projeto, a Homes fez uma festa de 250 mil dólares para
quinhentos convidados em Moscou. Os planos não prosperaram, mas
permitiram que Nogueira montasse uma lista de potenciais clientes.
“Toda semana eu recebia no aeroporto da Cidade do Panamá uma leva
de investidores russos.” A Homes acabou abrindo um escritório em Kiev,
capital da Ucrânia, chefiado por Igor Anopolskiy, que seria preso em
março de 2007, acusado de tráfico de pessoas em território ucraniano.

Entre os negócios mais visados pelos russos e ucranianos estava a Trump


Ocean Club, a joia mais cobiçada do portfólio da Homes. O
empreendimento inaugurado em 2011, com 996 unidades residenciais e
comerciais, geraria um lucro de 75 milhões de dólares ao grupo do
presidente dos Estados Unidos. A Homes vendeu entre 350 e 400 dessas
unidades. A parceria da imobiliária com a Organização Trump, selada
naquela festa em Mar-a-Lago, renderia reportagens na imprensa norte-
americana no final de 2017. Ivanka Trump e o Brasileiro Fugitivo do
Panamá é o título do texto da Reuters. Na ocasião, o grupo empresarial
disse que “nunca teve nenhum relacionamento contratual nem
negociações significativas” com o brasileiro.

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15/11/2019 O estelionatário

Perguntei a Nogueira se, ao atrair russos e ucranianos para investir em


imóveis no Panamá, a Homes teria contribuído para branquear dinheiro
da máfia, como ele próprio havia admitido em entrevista à Reuters e à
emissora de tevê norte-americana NBC, em 2017. “Se era lavagem de
dinheiro, não sei. Se me pagam por transferência bancária, e não em cash,
o que você faz ou deixa de fazer não é problema meu. Não sou padre.”

Enriquecido, Nogueira mudou-se para um condomínio fechado e passou


a desfilar pelas ruas da Cidade do Panamá com Ferraris, Lamborghinis e
Maseratis. Comprou três casas na Flórida, tirava férias regulares nos
Estados Unidos, na Europa e no Caribe. Ele e a mulher adotaram uma
típica vida de nouveaux riches. Segundo amigos, o casal tinha uma
coleção de relógios Rolex avaliada em 500 mil dólares e dezenas de joias
caras – numa ocasião, Nogueira presenteou Peruzzi com um colar de
diamantes avaliado em 120 mil dólares. Os ternos Giorgio Armani que
ele usava eram feitos sob medida e tinham bordadas as iniciais do seu
nome, AVN. O brasileiro gostava especialmente dos sapatos Dolce &
Gabbana, e chamava a atenção quando calçava um modelo verde
cintilante. Peruzzi, por sua vez, colecionava bolsas da marca Versace e
tinha como principal passatempo as compras nos shoppings da capital
panamenha – nos quais chegava a gastar 10 mil dólares por dia, afirmou
o marido. Nessa época, os dois se casaram formalmente no Panamá e ela
ficou grávida pela terceira vez.

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15/11/2019 O estelionatário

Encontrei 36 empresas em nome de Nogueira na capital do Panamá,


concentradas em três endereços, todos eles escritórios de advocacia, algo
comum no país, onde se utilizam pessoas jurídicas para tudo, até a
compra de veículos. Além de possuir vários imóveis, o brasileiro teve
uma frota de táxis. Parte de sua fortuna estava guardada em offshores
nas Ilhas Cayman e nas Ilhas Turks e Caicos, paraísos fiscais no Caribe.

Capitalizada, a Homes Real Estate começou também a comprar terrenos e


a construir seus próprios imóveis. Nogueira entrou para a lista dos
empresários mais bem-sucedidos do Panamá. Até que seu caminho
cruzou com o de um misterioso colombiano, protagonista de uma
história de sucesso tão fulgurante quanto a dele. “Esse encontro foi a
minha ruína”, lamentou.

O
homem misterioso era David Helmut Murcia Guzmán, um jovem
milionário que um dia declarou à imprensa que seu maior sonho
era acabar com a fome na Colômbia. Por ser de família pobre e ter
alcançado imenso sucesso empresarial, vivia cercado de aplausos,
sobretudo dos mais humildes. Guzmán era originário de um vilarejo

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15/11/2019 O estelionatário

perto de Bogotá. Em 1994, aos 14 anos, mudou-se para a capital a fim de


completar os estudos, mas nunca fez curso superior. Trabalhou como
empacotador em supermercado, montou uma pequena produtora de tevê
e vendeu rifas de automóveis. Por fim, criou uma pequena rede de lojas
de eletrodomésticos, que daria origem ao Grupo DMG. Nessa rede, as
compras podiam estar vinculadas a um cartão de crédito pré-pago
exclusivo, que permitia ao cliente receber de volta, seis meses depois,
entre 10% e 20% do valor da compra. Os clientes também tinham a
chance de atuar como vendedores da “família DMG”. O lucro vinha do
volume assombroso de vendas – estima-se que o grupo chegou a ter 2
milhões de clientes. “Eu me considero uma pessoa inteligente, mas o
David me supera”, comparou Nogueira.

O colombiano foi apresentado ao brasileiro em meados de 2008. Na


época, Guzmán expandia os seus tentáculos empresariais na capital
panamenha, onde abrira uma filial da DMG e passara a investir no
mercado imobiliário, incluindo o Trump Ocean Club – segundo
Nogueira, ele pagou 300 mil dólares à Homes para reservar dez salas no
empreendimento. Seis meses depois, os dois se reencontraram na
Colômbia e fecharam sociedade: o brasileiro seria o responsável pela
DMG no Panamá. “Contratei uma advogada para analisar os negócios
dele e a conclusão foi que eram lícitos”, disse Nogueira.

O que nenhum dos dois sabia era que tanto a polícia colombiana quanto a
norte-americana investigavam Guzmán por prática de pirâmide
financeira, captação ilegal de recursos e lavagem de dinheiro. Em duas
oportunidades, em agosto e outubro de 2007, a polícia colombiana
apreendeu, da DMG, um total de 4,3 milhões de dólares em espécie
transportados em ônibus. Havia fortes indícios de que o grupo lavava
dinheiro dos maiores cartéis do tráfico do país, num sofisticado esquema
triangular de dólar-cabo. Os cartéis vendiam a cocaína em dólares nos
Estados Unidos e no México, mas precisavam de pesos na Colômbia para
alimentar a produção da coca. Procuravam, então, doleiros, que lhes
entregavam pesos em troca dos dólares no exterior. Feito isso, o doleiro
vendia os dólares para terceiros, como a DMG, que desejava enviar
lucros, em dólares, para os Estados Unidos. Para a DMG, a vantagem dos
doleiros eram as taxas mais baratas do que as do sistema bancário. Após
receber o equivalente em pesos, o doleiro depositava os dólares

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15/11/2019 O estelionatário

comprados do tráfico no banco norte-americano indicado pela DMG –


calcula-se que pelo menos 2,2 milhões de dólares ingressaram nos bancos
dessa maneira. Segundo a polícia colombiana e a DEA, a polícia
antinarcóticos dos Estados Unidos, Guzmán lavou dinheiro para o
traficante colombiano Juan Carlos Ramírez Abadía, preso em 2007 em
São Paulo.

No dia 18 de novembro de 2008, Nogueira e um grupo de advogados


viajaram a Bogotá para uma coletiva de imprensa em que anunciariam a
nova filial da DMG no Panamá. Ao desembarcar na capital colombiana, o
brasileiro estranhou o carro blindado e os dez seguranças à disposição
dele. “Na coletiva, nunca vi tanto jornalista. Perguntavam sobre a
legalidade do negócio da DMG e detalhes que eu desconhecia.” Por volta
das cinco da manhã do dia seguinte, uma chamada telefônica acordou
Nogueira no hotel. Do outro lado da linha, um locutor da rádio Caracol,
em transmissão ao vivo, perguntou: “O que o senhor tem a dizer sobre a
ordem de prisão contra David Murcia Guzmán?” Nogueira correu para o
aeroporto e embarcou de volta para o Panamá no avião da própria DMG.
Guzmán foi preso à noite ao tentar atravessar a fronteira do Panamá com
a Costa Rica.

Enquanto a DMG fechava as portas e Guzmán era extraditado para a


Colômbia, Nogueira começou a articular a criação da Fundação dmg, que
atuaria na defesa do sócio. O brasileiro defendeu a legalidade do negócio
de Guzmán e disse que ele só foi preso porque concorria com o sistema
bancário colombiano. “O erro dele foi não ter comprado um banco.”
Guzmán retribuía o apoio do brasileiro com cartas enviadas da prisão, às
quais piauí teve acesso. “De verdade, não deixo de me surpreender com
você, é um homem com uma fortaleza impressionante. Obrigado pelo
apoio incondicional. Hoje estou aqui, mas amanhã espero ser eu que
cuide de você e dos seus filhos. Conte comigo sempre. […] Seguiremos
trabalhando, pois nós dois sabemos o grande negócio que significa esse
modelo [da DMG]”, escreveu Guzmán, em 7 de dezembro de 2008.

À sua mulher, Joanne Ivette León Bermúdez, na época foragida, pois


acusada dos mesmos delitos do marido, Guzmán pediu que confiasse no
sócio brasileiro. “Alex vai trabalhar em todos os países, organizaremos
duas holdings empresariais na Colômbia onde os [clientes] afetados e os

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novos sócios poderão participar. Alex tem muita experiência


empresarial.” Na mesma época, enviou cartas ao tesoureiro da DMG no
Panamá cobrando o sumiço de 8 milhões de dólares. “Não quero recorrer
a outros meios”, ameaçou. O dinheiro, segundo ele, deveria ser entregue
a Nogueira. Anos depois, em conversa com um parceiro de negócios no
interior paulista, gravada secretamente, o brasileiro citou transações
obscuras dos tempos de Panamá – não está claro se envolvem a DMG. A
conversa foi revelada pela Reuters: “Mais importante do que o dinheiro
de imóveis era poder lavar o dinheiro das drogas – havia quantias muito
maiores envolvidas”, disse Nogueira na gravação.

Joanne Bermúdez foi presa no início de 2009, no Uruguai. A mulher de


Nogueira, Catherina Peruzzi, disse ter viajado três vezes a Montevidéu
para visitá-la na cadeia. “O Alexandre me disse que o colombiano devia
dinheiro para ele. Um funcionário da Homes foi ao Uruguai e trouxe 200
mil dólares em notas, mais joias de ouro e diamantes.” Em 2010, Guzmán
foi extraditado para os Estados Unidos, onde cumpriu pena de nove anos
de prisão. Em junho deste ano, foi levado de volta à Colômbia, onde deve
passar mais 22 anos na cadeia. Seu advogado, Robert Abreu, não
respondeu aos pedidos de entrevista da piauí.

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A
lexandre Nogueira não chegou a ser processado pela Justiça
panamenha no escândalo da DMG. Entretanto, todos os seus bens,
incluindo contas bancárias, foram bloqueados pela Justiça durante o
trâmite da ação penal contra Guzmán por lavagem de dinheiro. “Eu tinha
seis projetos de imóveis em construção, mas os bancos cortaram todos os
financiamentos. Tudo ficou parado.” Nessa época, pipocaram as
primeiras ações penais contra o brasileiro por estelionato. Nogueira
começou a emitir cheques sem fundos e, tanto no Trump Ocean Club
quanto nos demais empreendimentos da Homes, ele vendia mais
apartamentos do que de fato havia nesses edifícios.

A imobiliária chegou a vender quatro apartamentos no Trump Ocean


Club a um investidor indiano, que pagou por eles 880 mil dólares e, um
ano depois, descobriu que as unidades já tinham dono. O comprador foi
atrás de Nogueira, que prometeu a ele outros quatro apartamentos no
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15/11/2019 O estelionatário

mesmo empreendimento, mas esses novos imóveis simplesmente não


existiam, e o indiano ingressou com uma ação contra o brasileiro e seus
sócios por estelionato. Atualmente, Nogueira é réu em catorze ações
penais no Panamá, todas por estelionato e falsidade ideológica – uma
delas impetrada por Roger Khafif, seu sócio nas vendas do
empreendimento do Grupo Trump. Em uma das ações há uma ordem de
prisão decretada contra o brasileiro.

Nogueira defende-se. Diz que, em vez de dinheiro, pediu a Khafif que a


bonificação à Homes pelas vendas do empreendimento fosse paga em
unidades do Trump Ocean Club. Dessa maneira, teria ganhado quarenta
apartamentos. “Revendi todos. Mas aí a construtora mudou o projeto, e o
número do apartamento não era mais aquele, e além disso já havia sido
vendido”, ele disse. “Por sorte, ainda consegui negociar com a maior
parte dos meus credores. Do contrário, hoje teria mais de quinhentas
ações contra mim no Panamá.” Procurada pela piauí, a assessoria do
Grupo Trump não se manifestou.

O brasileiro começou a utilizar documentos com nomes falsos para


driblar a Justiça. Tive acesso a cópias de passaportes e cartões de crédito
utilizados por ele com o nome de Alexander Ukstin (um dos sobrenomes
de sua mulher), um pretenso cidadão israelense; Alexander Guerrero e
Alexander Guerrero Martinez, ambos supostamente dominicanos; e Juan
Maciel, um hipotético brasileiro nascido em Americana. Nessa época, o
grego Nikolas Papadimas, uma das primeiras pessoas com quem
Nogueira travara amizade no Panamá, ofereceu-lhe por 30 mil dólares
uma certidão de nascimento nos Estados Unidos – primeiro passo para
adquirir o cobiçado green card. “Adiantei a ele 5 mil dólares, mas o
negócio não foi adiante”, afirmou. Papadimas negou que tenha falsificado
documentos para o brasileiro. “O Nogueira inventa histórias”, ele me
disse.

Para escapar da prisão e da falência iminentes, o brasileiro lançou mão da


última carta que tinha na manga: as cenas pouco republicanas que
presenciara entre Murcia Guzmán e a cúpula da política panamenha.

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15/11/2019 O estelionatário

N
o início de 2009, antes das eleições do futuro presidente do Panamá e do
prefeito da capital do país, Nogueira reuniu-se com um dos
principais articuladores da campanha do candidato Ricardo
Martinelli, o militar Gustavo Pérez de la Ossa, que tivera papel
proeminente na ditadura de Manuel Antonio Noriega, entre 1983 e 1989.
Dono da maior rede de supermercados do país, Martinelli concorria à
Presidência pelo partido liberal Câmbio Democrático (CD), em coligação
com o Partido Panameñista (PPa). Sua principal rival na disputa era
Balbina Herrera, do Partido Revolucionário Democrático (PRD), de
centro-esquerda, então no poder. A disputa foi replicada na capital: pelo
Panameñista concorria o radialista Bosco Vallarino; pelo PRD, Bobby
Velásquez.

Em nome de Martinelli, Ossa propôs a Nogueira protegê-lo das várias


ações penais em que era réu no Panamá. Aproveitando o fato de o
candidato presidencial contar com o apoio político do governo norte-
americano, também o levou a uma reunião com policiais da DEA na
Embaixada dos Estados Unidos. “Disseram que não havia nenhuma
investigação em curso contra mim, o que me deixou mais aliviado”,
afirmou Nogueira, que temia ser preso por causa dos vínculos com o
colombiano Murcia Guzmán.

Como retribuição, o brasileiro deveria obter de Guzmán um depoimento


dizendo ter entregue dinheiro vivo para Herrera e Velásquez. Nogueira
foi à prisão em Bogotá falar com o colombiano, que aceitou gravar uma
entrevista para o maior canal de tevê panamenho relatando os repasses.
Os depoimentos foram veiculados na tevê e no jornal La Prensa, o
principal do país. Nogueira me disse ter recebido ameaças inclusive do
ex-amigo Nikolas Papadimas. “Pense na sua família”, ele teria dito –
Papadimas negou tê-lo coagido. Nogueira, a mulher e os filhos
começaram a andar com escolta armada, e ele próprio passou a portar
uma pistola Glock após ter aulas de tiro. As revelações de Guzmán
causaram enorme estrago no partido governista: no dia 3 de maio de
2009, Martinelli venceu a disputa presidencial, e Vallarino levou a
Prefeitura da Cidade do Panamá.

Em maio, cerca de quarenta dias antes de os dois eleitos assumirem seus


cargos, o Ministério Público intimou Nogueira a depor em uma das ações

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penais em que era acusado de estelionato. Logo após, ele foi algemado e
levado para a sede da Polícia Nacional – só então saberia que a Justiça
havia decretado sua prisão preventiva. No prédio da polícia, porém, o
que era para ser uma cela transformou-se em escritório: o brasileiro tinha
à disposição computador com internet e recebia visitas de quem quisesse,
a qualquer hora. “Pode parecer estranho, mas aqueles foram dias de
muita paz para mim. Eu vinha sendo muito pressionado.” Coincidência
ou não, tão logo Martinelli assumiu a Presidência, a Justiça determinou a
soltura, sob fiança de 1,4 milhão de dólares – a quantia, me disse o
brasileiro, nunca foi paga.

Martinelli retribuiu então os serviços prestados durante a campanha.


Nogueira ganhou escolta do Serviço de Proteção Institucional, tropa de
elite da polícia panamenha responsável por acompanhar presidentes e
ministros do país, e transformou a própria casa no consulado da Guiné-
Bissau no país, tendo Catherina Peruzzi, sua mulher, como cônsul – a
imunidade diplomática impediria eventual blitz policial. Ele também
conseguiu uma sala nos fundos do Serviço Nacional de Migração, ao qual
compete emitir os chamados “vistos restritos”, ou seja, dados a cidadãos
de determinados países, como China, Índia, Cuba e Haiti, que almejam
obter a cidadania panamenha apenas para, em seguida, solicitar o
ingresso nos Estados Unidos.

O Serviço Nacional de Migração passou a ser alvo de cobiça entre os


governantes do país desde a ditadura Noriega, quando se instalou a
prática de exigir propinas em troca de vistos. Nogueira e a então diretora
do órgão, Maria Cristina González, passaram a cobrar 25 mil dólares para
cada visto concedido. Tive acesso a listas com os nomes de milhares de
indianos, além de cópias de pedidos de vistos por parte de chineses,
armazenados em um computador de Nogueira. “Aquilo não era legal,
não estava certo. Mas ele respondeu: ‘Não tem problema nenhum, é para
ajudar as pessoas a entrarem aqui’”, afirmou Peruzzi.

Para facilitar o esquema, o brasileiro colocou um dos seus advogados de


confiança como embaixador do Panamá no Haiti, no segundo semestre
de 2009. “Eu disse a ele: ‘O salário é seu, mas o negócio é meu’”, contou
Nogueira, cujo quinhão nos subornos, cerca de 3 mil dólares em cada
visto, era depositado a partir da China, da Índia ou do Haiti em uma

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15/11/2019 O estelionatário

offshore dele nas Ilhas Turks e Caicos. Depois, o dinheiro era transferido
para contas em bancos panamenhos – parte das operações foi feita em
nome do israelense Alexander Ukstin, um dos pseudônimos dele. Foram
pouco mais de 2 milhões de dólares no período de doze meses. Com o
dinheiro, ele abriu uma nova empresa e tentou retomar os investimentos
imobiliários, agora em regime mais modesto, na periferia da capital
panamenha. “O problema foi que o embaixador na Índia era muito burro
e depositava na offshore a partir da conta bancária oficial da embaixada.
O banco de Turks e Caicos descobriu e, tempos depois, encerrou a minha
conta”, disse.

O esquema começou a ruir com o terremoto que devastou o Haiti, em


janeiro de 2010. A demanda por vistos do Panamá cresceu ainda mais, e
os haitianos começaram a protestar contra o pagamento de propina em
frente à embaixada panamenha em Porto Príncipe. Pressionado, o
presidente Martinelli substituiu o advogado de Nogueira na embaixada e
restringiu o número de vistos concedidos. Maria Cristina González e
mais três servidores do Serviço Nacional de Migração foram alvos de
ação penal – ela acabou absolvida por falta de provas, segundo seu
advogado. Apesar do protagonismo no esquema, o brasileiro não chegou
a ser alvo de denúncia pelo Ministério Público do Panamá. “Tínhamos
muitas falhas de investigação naquela época. Atualmente estamos
buscando saná-las”, contemporizou o promotor Marcelino Aguilar na
sede acanhada do MP em Santiago de Veraguas – cidade a 250 km da
capital –, onde ele me recebeu numa tarde de agosto.

Em meados de 2011, o então vice-presidente do Panamá, Juan Carlos


Varela, do Partido Panameñista, rompeu com o presidente Martinelli e
passou a atacá-lo na imprensa, tendo também o brasileiro como um dos
alvos. “Não sei como o senhor Nogueira conta com a proteção da guarda
presidencial”, disse na ocasião. Pressionado, Martinelli retirou a proteção
policial de Nogueira e se afastou dele até novembro daquele ano, quando
um emissário do presidente bateu à sua porta. “Ele lhe pede um favor. E
esse é o jeito de você se reaproximar dele”, descreveu o brasileiro. O que
veio a seguir foi o último capítulo da saga de Nogueira no Panamá.

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E
ncontrei-me com o ex-prefeito Bosco Vallarino num fim de tarde de
agosto deste ano no restaurante El Brasero, um dos mais
tradicionais de Obarrio, porção chique da capital panamenha. O ex-
prefeito estava acompanhado de seu advogado, um sujeito mal-encarado
que, durante a conversa, ficou procurando informações a meu respeito no
celular, não sem antes pedir que a piauí pagasse pela entrevista, o que a
revista se recusou a fazer. Radialista popular na cidade, Vallarino disse
ter conhecido Nogueira quando foi contratado para fazer propaganda da
imobiliária Homes numa tevê local. Pouco antes de se tornar prefeito, os
dois foram vizinhos em um condomínio fechado.

Em setembro de 2011, Nogueira havia recebido a seguinte incumbência,


feita por um emissário de Martinelli: reunir-se com Vallarino e oferecer
propina a ele em nome de um pretenso pool de empresas que desejava
construir um estacionamento subterrâneo na Cidade do Panamá. O plano
do presidente era gravar a cena e forçar Vallarino a renunciar. Assim,
assumiria a vice-prefeita, do Câmbio Democrático, e o partido de
Martinelli teria o controle do país e da capital.

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15/11/2019 O estelionatário

Nogueira seguiu as ordens. Convidou o então prefeito para um encontro


em sua casa, no fim da manhã de 1º de outubro de 2011 – duas horas
antes, agentes do serviço de inteligência do governo panamenho haviam
instalado câmeras e microfones no local. Após vinte minutos de conversa,
Nogueira pegou uma bolsa e retirou dela um envelope. “Eu tenho um
compromisso contigo”, disse o brasileiro, e acrescentou: “Então você fica
com 8 [mil dólares].” Vallarino pôs o envelope no bolso do paletó.

À noite, Martinelli reuniu-se com Nogueira e pediu que ele chamasse o


prefeito para uma conversa no Palácio de las Garzas, sede do governo
panamenho. Segundo o relato do brasileiro, quando Vallarino chegou,
Martinelli virou a tela do computador para que o prefeito visse a
gravação e ameaçou: “Ou você renuncia ou divulgamos o vídeo.”
Martinelli já estava com uma carta de renúncia pronta. Vallarino
começou a chorar. Na manhã seguinte, internou-se em um hospital e,
passados dois dias, renunciou ao cargo de prefeito, alegando motivos de
saúde. No lugar dele assumiu, como previsto, a aliada política de
Martinelli.

Vallarino regressou ao emprego no rádio e na tevê. Não voltou a disputar


eleições. O vídeo só seria divulgado quatro anos depois, em 2015, quando
o ex-prefeito admitiu em entrevista a uma tevê panamenha ter recebido 6
mil dólares, e não 8 mil, como o brasileiro disse na gravação. Depois,
mudou a versão, dizendo que o envelope continha fotos de alguns de
seus secretários tendo relações sexuais com prostitutas em uma boate da
cidade. Vallarino e Nogueira foram denunciados por corrupção pelo
Ministério Público panamenho, mas até setembro último a ação penal não
havia sido julgada e caminhava para a prescrição. “Me custa perdoar o
Nogueira. Eu ajudei em tudo, protegi a família dele. Mas ele me traiu da
pior maneira”, disse Vallarino no restaurante, entre goles de água e nacos
de pudim.

Dias depois da renúncia do prefeito, Nogueira viajou a negócios à


Nicarágua, com nome falso, uma vez que estava impedido de deixar o
país por causa das ações penais por estelionato. Foi quando recebeu uma
ligação de um assessor do presidente: “Se eu fosse você, não voltava para
o Panamá. Se voltar, será preso.” Em 2017, três anos após deixar a
Presidência, Ricardo Martinelli foi detido nos Estados Unidos e um ano

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15/11/2019 O estelionatário

mais tarde extraditado para o Panamá, onde era acusado de comandar


um esquema de interceptações telefônicas ilegais de mais de 150 pessoas,
a maioria opositores políticos. Em agosto deste ano, foi absolvido pela
Suprema Corte de Justiça panamenha. À piauí, o ex-presidente disse que
não conhecia o brasileiro e, por isso, não comentaria o caso.

Nogueira vagou por alguns dias pela América Central até decidir voltar
ao Brasil, no final de 2011. Sua mulher permaneceu algumas semanas no
Panamá para se desfazer da casa e dos automóveis. Ao encontrar num
armário pacotes com cerca de trezentos passaportes de chineses, indianos
e haitianos, herança do esquema dos vistos, ela telefonou ao marido:

– O que eu faço com isso, Alexandre?

– Deixa aí.

Ela empilhou os documentos na grama do quintal e ateou fogo.

U
m parecer contábil apresentado por Catherina Peruzzi à Justiça
brasileira aponta que, no fim de 2011, o marido possuía 3,9 milhões
de dólares em ativos no Panamá. No início do ano seguinte,
Peruzzi e os três filhos juntaram-se a ele no Brasil e mudaram-se para
Americana. Nogueira passou a comprar postos de combustível na região
com parte do capital que tinha no Panamá – cerca de 1,2 milhão de
dólares foram transferidos para suas contas no Brasil. Seis
estabelecimentos formavam a rede JNC (iniciais dos nomes dos filhos):
dois em Americana, um em Paulínia, um em Nova Odessa, um em
Piracicaba e um em Araraquara.

O negócio prosperou. “Fiz crescer o movimento nos postos com ações de


marketing, era benquisto na Rede Ipiranga”, disse Nogueira, que recheou
sua garagem com carros novos, como um Camaro amarelo e um Porsche
Cayenne. Ele também passou a frequentar restaurantes caros, retomando
assim parte dos luxos que tinha no Panamá. Entre os funcionários dos
postos, era tido como bom patrão – costumava sortear viagens para o
Nordeste entre os frentistas mais eficientes. “Ele era respeitoso e sempre

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nos pagou direitinho”, me disse uma delas. Nessa época, Nogueira


conheceu Heloísa Geremias Tiburcio, uma promotora de eventos de
cabelos loiros, catorze anos mais nova que ele. Os dois engataram um
namoro. Quando Peruzzi ficou sabendo do caso, seu casamento
terminou.

Nogueira entrou no radar da Polícia Federal quando o Coaf, unidade de


inteligência financeira do governo federal, identificou movimentações
atípicas na conta bancária de um de seus postos, com depósitos a partir
de conta do empresário nos Estados Unidos. O Ministério Público Federal
foi informado e determinou à PF a abertura de inquérito para investigar
possível lavagem de dinheiro e crime contra a ordem tributária. O fisco
estadual paulista também detectou suspeitas na declaração do imposto
de renda, com “inexplicável progressão desde 2009, em vista da ausência
de rendimentos apropriados”. Para a Receita, “ou a declaração [de
Nogueira] foi simulada ou houve rendimentos não declarados,
eventualmente de origem irregular”.

Mas a investigação da PF seria falha do início ao fim. Discretamente,


agentes federais foram até os postos com a missão de identificar possíveis
atos de lavagem de dinheiro. “Claro que não foi visto nada de suspeito,
porque é impossível constatar lavagem de dinheiro por meio de
vigilância. Para isso, seria necessário solicitar à Justiça a quebra do sigilo
bancário e a interceptação telefônica do investigado”, me disse um dos
policiais que participou do caso.

Em 2018, o inquérito foi arquivado em relação à lavagem de dinheiro.


Restava a apuração quanto a possível crime contra a ordem tributária. O
Ministério Público Federal solicitou à Receita Federal a abertura de uma
investigação fiscal contra Nogueira e suas empresas, o que nunca
ocorreu. Em face da inércia do fisco, o MPF determinou o arquivamento
da investigação, no início de 2019. Alegando sigilo fiscal, a assessoria da
Receita não comentou o caso, ao ser procurada pela reportagem.

N
ogueira começou a enfrentar os primeiros problemas de caixa com
sua rede de postos de combustível no início de 2014. “Eu

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N
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movimentava muito dinheiro, mas ganhava pouco. Vendia 200 mil reais
por dia, mas só tinha 30 mil no caixa, o resto era cartão de crédito ou
débito. E no dia seguinte precisava comprar mais combustível.” A saída
que ele encontrou foi retomar a trajetória de golpes. Passou a atrasar as
parcelas do aluguel da casa onde vivia e do terreno de parte dos postos
de combustível. Também começou a emitir cheques sem fundo. Fumante,
aumentou a cota diária de cigarros para dois maços.

Em março daquele ano, Nogueira comprou seu sexto e último posto por
800 mil reais, parcelado. Em seguida, falsificou um documento da Junta
Comercial em que aparecia como dono do negócio, já com todas as
parcelas quitadas – embora só tivesse pagado duas ou três prestações – e
vendeu o posto por 2 milhões de reais, à vista. A fraude só foi descoberta
dois anos depois, quando o último comprador tentou revender o posto e
descobriu que o estabelecimento não estava em nome de Nogueira. Esse
último passou a ser investigado pela Polícia Civil de São Paulo por
falsificação de documento, inquérito que, em setembro deste ano, seguia
em andamento.

Para driblar a falta de capital, Nogueira recorreu a dois investidores de


Americana: Dennis Wilson de Oliveira e Raphael Fernando Poeta. Como
garantia dos empréstimos, com juros entre 10% e 15% ao mês, ambos
ingressaram como sócios em dois dos postos de combustível. Procurei
Oliveira em maio passado. Enquanto eu o esperava no lobby de um hotel
em Americana, apareceu um homem grisalho com barba espessa, botas
pretas de cano alto e jaqueta com camuflagem. Ele pediu para eu lhe
mostrar minha carteira de identidade e minha credencial de jornalista da
piauí. Olhou os documentos e se foi. Minutos depois, surgiu Oliveira, de
barba bem aparada, cabelos ligeiramente longos, roupas pretas e um anel
com a cruz de malta que lhe davam um aspecto de vilão de filmes de
ação. “Aquele era meu segurança. Preciso me certificar de tudo”,
justificou, quando lhe perguntei quem era o homem que me pedira os
documentos.

Oliveira conviveu diariamente com Nogueira durante cerca de um ano,


tempo que durou a sociedade entre eles. Encontravam-se no fim de noite
em um dos postos de Americana e conversavam madrugada adentro.
“Naquela época ele evitava aparecer nos postos durante o dia, porque já

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era procurado pelos credores. Comecei a desconfiar de que também


perderia o meu investimento, cerca de 150 mil reais”, disse. As ameaças
contra Nogueira surgiram na época da Copa do Mundo no Brasil, em
junho de 2014, segundo Nogueira. “O Raphael me dizia que havia
pessoas por trás dele que eram perigosas e estavam com muita raiva de
mim”, afirmou. “E eu não reajo bem diante de ameaças.”

No dia 3 de outubro daquele ano, sexta-feira, um grupo de credores de


Nogueira reuniu-se em Americana. O objetivo, segundo Oliveira, era
sequestrá-lo e mantê-lo em cativeiro até que ele pagasse as dívidas, que
àquela altura ultrapassava 8 milhões de reais. Mas não houve tempo para
pôr o plano em prática. Na noite de sábado, Nogueira percorreu os
postos um a um e raspou todo o dinheiro dos cofres. Na manhã seguinte,
fugiu com Heloísa Tiburcio, deixando para trás a ex-mulher, os três
filhos, uma fila de credores – ele é réu em dezessete ações judiciais de
cobrança no total de 927 mil reais, em valores não corrigidos –, além de
um passivo tributário milionário, por sonegação de impostos federais nos
postos. Sua dívida ativa com a União alcança 5,7 milhões de reais.

Nogueira e Tiburcio embarcaram em um avião em São Paulo para


Assunção – ele com o nome de Alexander Guerrero Martinez. Depois,
voaram para Santo Domingo, na República Dominicana, onde ficaram
cerca de um ano, até decidirem cruzar o globo terrestre rumo a Manila,
nas Filipinas. No país asiático, o casal abriu uma casa de shows, onde
uma das atrações foi a cantora norte-americana Gloria Gaynor, “artista
com cachê barato que ainda faz muito sucesso no Oriente”, afirmou
Nogueira.

As Filipinas seriam seu último destino conhecido. Há três anos, seu


paradeiro é incerto. Ex-funcionários dos postos no interior paulista dizem
que ele está na Rússia; credores suspeitam que se esconda no Haiti;
familiares citam algum lugar nos Bálcãs, no Leste Europeu.

N
o início de abril deste ano, consegui uma pista que me levaria até
Nogueira. Quatro meses antes, a atual mulher dele, Heloísa
Geremias Tiburcio, ao solicitar um novo passaporte na embaixada

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do Brasil em Londres, citou a Kennington Road, no Sul da cidade, como


seu endereço na capital inglesa. A PF repassou os dados a Catherina
Peruzzi, com quem obtive a informação. A piauí pediu à jornalista
brasileira Carolina Chagas, radicada em Londres, que visitasse o local, no
primeiro andar de um típico sobrado inglês no estilo georgiano, com
tijolos escuros à mostra e janelas brancas. Não havia ninguém no
apartamento. Com uma foto do brasileiro, a repórter abordou o
funcionário de uma loja de conveniência em frente ao sobrado. “Sim, eu o
conheço. É um cliente regular aqui.”

Na manhã do dia 25 de abril, quinta-feira, desembarquei em Londres. À


tarde, Chagas e eu fomos ao endereço na Kennington Road. Novamente,
ninguém atendeu a campainha. Atravessamos a rua e aguardamos por
quase três horas que alguém entrasse no sobrado, ou saísse dele. Fomos à
loja de conveniência. Outro funcionário, a quem exibimos a foto de
Nogueira, nos disse: “Ele esteve aqui alguns dias atrás.”

Na sexta-feira, às dez e meia da manhã, voltamos ao sobrado. Uma


mulher eslovaca chamada Verônica atendeu a campainha e nos convidou
a entrar no apartamento, uma quitinete em mau estado com menos de 30
m2. Ela disse que morava no local com o filho, um bebê, havia oito meses
e que não conhecia nem Nogueira nem Tiburcio. Mas nos mostrou
correspondências já abertas enviadas à brasileira naquele endereço. Eram
cobranças de dívidas contraídas por ela em bancos londrinos – no total de
6,8 mil libras esterlinas, ou 35 mil reais, na cotação de setembro último.

Naquela noite, descobri na internet outro possível endereço de Tiburcio:


um sobrado na Coldharbour Lane, Sul de Londres. No sábado pela
manhã, quem nos recebeu lá foi um brasileiro, Ilair, que afirmou não
conhecer Tiburcio, mas nos mostrou correspondências de uma tevê a
cabo em nome dela. Exibimos a foto do casal a vários comerciantes das
imediações, em vão.

Como o funcionário da loja de conveniência disse ter visto Nogueira


poucos dias antes, achamos mais provável que o casal ainda morasse
perto do sobrado da Kennington Road. Regressamos então ao primeiro
endereço e visitamos os estabelecimentos comerciais da região: cafés,
restaurantes, pizzarias, barbearias. Até que, no fim da tarde, um

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cabeleireiro na mesma Kennington Road, em um salão distante pouco


mais de 100 metros do sobrado, reconheceu Tiburcio na foto: “Ela é nossa
cliente.” Nogueira e Tiburcio habitavam as redondezas, mas não
sabíamos o endereço exato.

Lancei mão de um último recurso. Eu tinha o endereço de e-mail de


Nogueira, ao qual já havia recorrido para enviar vários pedidos de
entrevista, sem obter resposta. Mandei então uma nova mensagem,
detalhando todos os meus passos em Londres. Para minha surpresa, meia
hora depois ele respondeu. “Olá Allan. Em que posso ajudar? Que tipo de
reportagem? Que tema? Como você sabe já dei entrevistas no passado.
Infelizmente não posso ajudar nada em Londres.” Voltei a insistir. Nova
resposta: “É uma situação um pouco complicada. Primeiro não estou
mais em Londres há um certo tempo. Como você deve conhecer um
pouco da minha trajetória, nunca fico muito tempo no mesmo lugar. […]
Não sei qual é o foco principal da reportagem e se posso acrescentar
alguma coisa. De repente, poderíamos conversar e ver se é possível.”

Agendamos uma conversa para a segunda-feira seguinte, dia 29, quando


eu já estaria de volta ao Brasil. “Como você chegou ao endereço de
Londres?”, ele perguntou (e insistiu nisso duas vezes). Depois de eu me
certificar de que a pessoa com quem eu falava era de fato Alexandre
Henrique Ventura Nogueira, pedindo a ele seus dados pessoais, como
data de nascimento e CPF, conversamos quatro horas e meia, apenas por
áudio, pois ele não quis ligar a câmera do Skype.

Nogueira admitiu ter morado no sobrado da Kennington Road, mas disse


ter deixado Londres no início de 2018. “Foi um erro [viver na capital
britânica], é muito chamativo”, afirmou. “Eu fui naquela loja de
conveniência quatro ou cinco vezes. Mas já tem dois anos. Como posso
ser um cliente regular, se faz dois anos que eu não piso lá? Quando você
mostra foto minha, você induz a pessoa a falar algo que não é verdade.”
Ele negou que tenha morado na Coldharbour Lane. “Deve ter sido só a
Heloísa. Nós nos separamos em 2018. Não é fácil a vida que eu levo: não
posso ter amigos, não posso falar da minha vida para ninguém. Precisei
colocar uma pedra sobre quem eu fui. Ela não aguentou.” Nogueira não
quis falar sobre o paradeiro de Tiburcio. “Ela quer voltar ao Brasil, mas
não sei quando.”

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Ele disse que viveu em sete países desde que fugiu do Brasil, em 2014.
“Eu procuro países em que eu possa fazer negócios, mas que, de certa
forma, não estão tão conectados com o mundo.” Em um desses destinos,
na Ásia, Nogueira foi detido por seis meses: a polícia local constatou que
ele utilizava documentos falsos, mas, como não descobriram sua
verdadeira identidade, acabou liberado. Quando perguntei se subornou
alguém para deixar a prisão, desconversou. Nogueira me disse ter
retomado o trabalho com compra e venda de madeira e que ganha o
equivalente a 2 mil reais por mês.

Depois dessa primeira conversa, voltei a entrevistá-lo três vezes, sempre


por Skype. Nogueira é verborrágico: gosta de se estender em detalhes ao
narrar suas histórias. Vangloria-se da própria inteligência e se diz um
bom negociador. “Se você me der um pedaço de gelo para vender no
Alasca, eu vendo”, afirmou. Mas admitiu algumas falhas. “Sou péssimo
administrador. Nasci para trabalhar para alguém, não para ter meu
próprio negócio.” Seu tom de voz é monocórdio, com forte sotaque
pernambucano e pequenas pausas para tragar um cigarro. Nas mais de
oito horas de entrevista, em nenhum momento ele riu ou demonstrou
emoção na voz, nem mesmo quando falou dos três filhos que teve com
Catherina Peruzzi e que vivem no Brasil. Disse apenas isto: “As últimas
vezes que eu falei com eles, estavam envenenados pela mãe. Sinto muita
saudade, todos os dias. Isso dói bastante.” Sobre o filho com a ex-garota
de programa, ele afirmou: “Pelo primeiro não sinto nada, porque não
convivi com ele.”

Peruzzi contou que passa dificuldades financeiras para criar os filhos. “A


menor nem se lembra do pai”, disse, chorando. Depois que Nogueira
deixou de enviar dinheiro regularmente, ela ingressou com ação na
Justiça, exigindo o pagamento de pensão alimentícia – por causa disso,
existe um mandado de prisão em aberto contra ele, o único no Brasil.

Nogueira me confessou que tem mais medo das vítimas que fez em
várias partes do mundo do que da polícia. “Ser preso não é tanto
problema. Eu já levo uma vida de quase prisão. Às vezes penso em me
entregar e ir para a cadeia logo, porque aí poderia tocar minha vida
sossegado, depois. Mas nem sei de tudo que eu sou acusado.” Seu maior
receio é ser assassinado, e ele teme particularmente as pessoas com quem

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se relacionou no Panamá. “Eu sei do que eles são capazes. Tenho muito
mais coisas contra empresários e políticos de lá que eu nunca disse a
ninguém.” Com certeza, ele guarda as informações para alguma ocasião
proveitosa.

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