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Teresina
2016
GABRIEL ALEXSANDRO DOS SANTOS
Monografia apresentada ao
Seminário Teológico do Nordeste
como requisito para obtenção de grau
de Bacharel em Teologia.
Teresina
2016
GABRIEL ALEXSANDRO DOS SANTOS
Monografia apresentada ao
Seminário Teológico do Nordeste
como requisito para obtenção de grau
de Bacharel em Teologia.
BANCA EXAMINADORA
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Ao meu bondoso e misericordioso Deus, por ter nos sustentado com Sua mão graciosa,
Sua providência, nos assistindo em tudo, tanto espiritualmente como fisicamente.
A minha amada esposa, Ivanilda, que tem sido uma exímia auxiliadora, me apoiando e
suportando em amor, me ajudando e confortando incansavelmente.
A minha amada filha, Sophia Gabrielly, por seu carinho e atenção, por muitas vezes ter
que suportado a ausência nas brincadeiras, e poucas atividades em família.
A minha mãe, Dona Fátima, que, mesmo distante, tem nos suportado com suas orações.
Ao Pastor Paulo Andrade, por seu empenho em nos conduzir a está casa de profetas, e
por nos apoiar naquilo que fora necessário.
A Igreja Presbiteriana de Parelhas, que, por todos esses anos, tem nos sustentado com
recursos físicos e espirituais; ao conselho da igreja, pelo suporte e auxílio em todo
tempo; a tesoureira da igreja, irmã Socorro Ribeiro, pelo constante cuidado para
conosco; e a todos os irmãos por suas orações e carinho dispensado a nós.
Ao meu tutor, Pastor Francisco Moura, por acompanhar-nos nesse último ano de
caminhada, bem como aos pastores que nos acompanharam anteriormente, a saber:
Pastor Eugênio Honfi Neto, e Pastor José Pedro.
Ao meu presbitério, Presbitério Seridó do Rio Grande do Norte – PSRN, por atestar a
nossa vocação e enviar-nos para esta casa de profetas, bem como pelo acompanhamento
durante toda a caminhada.
A Igreja Presbiteriana do Calvário e ao Pastor Rogério Cunha, por nos acolher como
filhos e cuidar de nós durante toda essa jornada.
Ao meu orientador e capelão, Pastor Jefté Alves de Assis, pelo constante cuidado e
atenção, pela solicitude e satisfação em servir em todo tempo.
Aos amigos e irmãos que trilharam juntos comigo essa jornada aqui no STNe.
A todos que contribuíram direta e indiretamente com seus recursos e com suas orações.
“Ora, a certeza é um ato reflexo de
uma alma cheia de graça; por esse
ato a alma crente se vê num estado
benigno, abençoado e feliz; é um
sentimento palpável, um
discernimento experimental do fato
de que o crente está num estado de
graça e de que tem legítimo direito
de receber uma coroa de gloria”.
(Thomas Brooks)
RESUMO
Essa pesquisa, nasceu de um desejo pastoral de resgatar, no púlpito e nos gabinetes de
aconselhamento pastoral, a exposição e aplicação da doutrina da segurança e certeza da
salvação. Tendo em vista o cenário que circunda a Igreja de Cristo, e, a pouca ênfase dada
a essa importante doutrina, vê-se a necessidade de resgatar a urgência que os puritanos
tinham de conduzir a congregação a um estado de consolo e verdadeira segurança. Assim
como se vê na Confissão de Fé, em seu capítulo XVIII, resgatar e dar a doutrina a
proeminência e centralidade dada a ela na reforma e na pós-reforma. Isso por meio de
uma devida fundamentação bíblico-teológica, onde se vê a proeminência e centralidade
dessa doutrina; por meio de uma demonstração histórica do desenvolvimento dessa
importante doutrina; e, por fim, por meio de uma exposição das ênfases pastorais dos
puritanos, como se tem na Confissão de Fé de Westminster e nos escritos dos seus
principais defensores e promotores.
This research arises from a pastoral desire to rescue, in the pulpit and in the pastoral
counseling offices, the exposition and application of the doctrine of assurance and
certainty of salvation. Given the setting surrounding the Church of Christ, and the little
emphasis given to this important doctrine, one sees the need to rescue the urgency that
the Puritans had to lead the congregation to a state of comfort and true assurance. As we
see in the Confession of Faith in its eighteenth chapter, to rescue and give doctrine the
prominence and centrality given to it in reform and postretirement. This is through a
proper biblical-theological foundation, where the prominence and centrality of this
doctrine is seen; by means of a historical demonstration of the development of this
important doctrine; and, finally, through an exposition of the pastoral emphases of the
Puritans, as in the Westminster Confession of Faith and in the writings of its principal
advocates and promoters.
INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 13
1.4 Conclusão.............................................................................................................. 51
2.4 Conclusão......................................................................................................... 88
3.3.4.2 O crente não fica totalmente privado da semente de Deus .................... 125
O início do século XVII foi marcado por grandes turbulências na Inglaterra. Uma
dessas turbulências foi a guerra civil, travada entre o Rei Carlos I e seu Parlamento,
originada por motivos econômicos, políticos e religiosos, a qual trouxe destruição dos
anos 1642 até 1651. Uma das causas da oposição ao rei era em favor da causa da liberdade
religiosa. O Parlamento sai vitorioso em 1651, e passa a ser liderado por Oliver Cromwell
(1599-1658), dentre outras coisas ele trabalha em prol da liberdade religiosa e por meio
de decretos, trouxe a Inglaterra e ao País de Gales, a maior liberdade religiosa jamais
vista. Em decorrência da morte de Oliver Cromwell, em 1658, seu filho Henrique assume
o governo, mas não consegue dar continuidade a forma de governo de seu pai. Por conta
da falta de alguém capacitado que assumisse o lugar de Cromwell, a Inglaterra estava
sendo conduzida a anarquia por conta dos dois partidos dominantes formados pelos
Presbiterianos e os Independentes. Diante disso eles chamaram de volta Carlos II, que
havia fugido logo depois de assumir o reino, para assumir o comando. Carlos II declarou
que manteria a liberdade religiosa, mas não manteve sua promessa, começando assim
uma grande perseguição as congregações cristãs independentes.1
É nesse contexto, que nos idos de 1628, nasceu em Eslow, Bedford, Inglaterra,
John Bunyan, o qual se tornaria um renomado teólogo batista. Era filho de pais humildes
e foi criado na ignorância. Aprendeu e exerceu o ofício do seu pai, que era funileiro e
teve, por algum tempo, uma vida desregrada e rebelde. Desde criança passou por
problemas relacionados ao peso que sentia por seus pecados, mas mesmo assim passou
um período em total depravação.2 Após a sua conversão dedicou-se ao ministério da
pregação da Palavra, sendo considerado, por conta do seu histórico de vida, um fenômeno
da literatura cristã. Por conta dessa vocação, e por não querer abrir mão dela, foi levado
para prisão, onde viveu por doze anos encarcerado. Produziu obras de grande
importância,3 sendo uma delas “O Peregrino”4, obra que foi e ainda continua sendo de
1
Para mais informações relacionadas ao contexto ver: GONZALEZ, Justos L., A Era dos Dogmas e das
Dúvidas, 1. ed. São Paulo: Mundo Cristão, [s.d.], p. 51–80.
2
BEEKE, Joel R.; PEDERSON, Rendall J., Paixão Pela Pureza: Conheça os Puritanos, 1. ed. São Paulo:
Publicações Evangélicas Selecionadas, 2010, p. 170.
3
Ibid., p. 176–178.
4
BUNYAN, John, O Peregrino, 19. ed. São Paulo: Imprensa Metodista, 1992. O Peregrino, é uma obra
alegórica onde um sonho é narrado. Encontramos vários personagens, sendo o principal deles cristão, um
homem que começa a ler um livro que o faz ter pesadelos e faz crescer um grande fardo em suas costas.
Cristão, por conta do que lê no livro, passa a ver a destruição que virá por conta da infidelidade e
grande valor para literatura cristã. No ano de 1688, Bunyan morre vítima de uma
enfermidade.
desobediência dos cidadãos daquela cidade se tornando então um peregrino em busca da Cidade Celestial.
Esta é uma obra prima, escrita há tanto tempo, mas que retrata a caminhada do cristã de forma precisa, com
os autos e baixos, com as disciplinas e recompensas, com as tentações e provações, com o companheirismo
encontrado na igreja.
5
BUNYAN, John, Graça Abundante ao principal dos pecadores, 1. ed. São Paulo: Editora Fiel, 2012.
6
Ibid., p. 51.
7
Ibid., p. 34.
8
Ibid., p. 113–115.
9
Ibid., p. 121–123.
14
eleitos, em tempo oportuno, sejam reconduzidos aos pés do Senhor em arrependimento
sincero. Outro grupo de cristãos é composto por aqueles que possivelmente já passaram
por estas etapas anteriormente citadas, mas agora conseguem viver em paz, certos de que
nada pode os separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus. Esse cristão, que nutre
esta plena e genuína certeza, garantida pelo penhor do Espírito Santo, vive buscando
desenvolver sua salvação com temor e tremor, buscando viver o céu na terra para depois
gozar em plenitude da glória eterna.
A ênfase pastoral puritana coloca essa doutrina como uma doutrina central e
altamente importante para a vida dos crentes. Há um grande destaque para a interação que
há entre essa doutrina e as demais doutrinas soteriológicas, bem como seus maravilhosos
frutos que ajudam o crente nessa árdua jornada da vida cristã. Mas não só isso, a tratativa
dos puritanos a está matéria vem também para desfazer os erros direcionados a ela e
colocar alguns pontos que foram tratados pelos reformadores, de forma que traz consolo
aos crentes mais fracos que são cheios de dúvida e desprovidos de segurança e certeza da
salvação.
15
A presente pesquisa, no intento de responder os grandes questionamentos da
maioria dos crentes, como por exemplo, a possibilidade de se ter verdadeira segurança e
certeza, bem como a situação daqueles que não possuem a segurança, também acerca da
situação daqueles que vivem envolto em profundas dúvidas se são verdadeiros crentes ou
não, quanto a perda da segurança e a restauração da mesma. Nesse sentido, a pesquisa irá
apresentar, por meio de um estudo bíblico-teológico, exegético e bibliográfico, as
respostas para esses questionamentos, conduzindo o querido leitor a entender a ênfase
pastoral puritana contida no capítulo XVIII da Confissão de Fé de Westminster.
A pesquisa tem como objetivo chamar a atenção para a ênfase pastoral puritana
na tentativa de conscientizar o prezado leitor da importância de resgatar essa urgência que
aqueles homens de Deus tiveram no trato dessa matéria, tornando-a cada vez mais
presente e clara na vida da igreja.
16
1 FUNDAMENTAÇÃO BÍBLICA DA DOUTRINA
1.1 Introdução
É possível ter certeza da salvação? Posso dizer que sou salvo? Como eu posso ter
genuína certeza?1 Há tempos essas são algumas das grandes interrogações que costumam
pairar sobre a cabeça de muitos cristãos. Muitos crentes, até mesmo no meio dito
reformado, não são devidamente instruídos acerca dessa doutrina tão importante que, por
sua vez, foi tão bem desenvolvida por homens de Deus ao longo da história da Igreja, em
especial os puritanos do século XVI e XVII, os quais a sistematizaram de forma
maravilhosa na Confissão de Fé de Westminster. Suas obras objetivavam provar que o
eleito de Deus pode, à luz da Escritura e da iluminação do Espírito Santo, gozar desta
segurança e certeza e declarar com base na sua união com Cristo que é salvo e assim viver
como um cidadão do céu.
1
O grande teólogo puritano William Perkins, referência no desenvolvimento desta doutrina, interagiu muito
bem com estes questionamentos, como mostra Joel Beeke. BEEKE, Joel R., A Busca da Plena Segurança
- O Legado de Calvino e Seus Sucessores, 1. ed. Recife-PE: Os Puritanos, 2003, p. 121, 122.
2
Vale destacar a forma como Calvino trata a ideia de segurança mostrando que ela pode ser objetiva e
subjetiva. Como destaca Paulo Anglada, para Calvino, a certeza da salvação faz parte da essência da fé.
Com isso ele mostra que a segurança objetiva está ligada à veracidade das promessas de Deus e sua
fidelidade em cumpri-las, enquanto a segurança subjetiva está ligada a convicção de que essas promessas
nos dizem respeito. ANGLADA, PAULO R. B., A Confissão de Fé de Westminster é realmente calvinista?
Uma avaliação crítica de “A modificação Puritana da Teologia de Calvino,” de R. T. Kendall, Fides
Reformata, n. 3/2, 1998.
3
BEEKE, Joel R., Espiritualidade Reformada - Uma Teologia Prática para a Devoção a Deus, 1. ed.
São José dos Campos, SP: Fiel, 2014, p. 231.
pecado, da graça, da expiação e da união com Cristo. É inseparável das marcas
e passos da graça. Ela toca a essência da soberania divina e da responsabilidade
humana; é intimamente conectada com a Santa Escritura; flui da eleição, das
promessas de Deus e da aliança da graça. Ela é fortificada pela pregação, os
sacramentos e a oração.4
Assim, vê-se como é importante a tratativa dessa doutrina, que não só se relaciona
com as demais importantes doutrinas soteriológicas, mas também pode ser evidenciada
no decorrer da revelação pactual de Deus.
Nesta seção, a pesquisa visa pontuar os principais textos que apontam para a
fundamentação da doutrina da segurança e certeza da salvação, observando de forma
progressiva o desenvolvimento bíblico, acerca da doutrina e suas implicações para o povo
da aliança dentro da sua relação pactual.
4
Ibid.
5
FEINBERG, John S., Salvation in the Old Testament Tradition and Testament. Essays in Honor of
Charles Lee Feinberg, Chicago: Moody Press, 1981, p. 39. JOHN S. Feinberg (MA, Ph.D., University of
Chicago; M. Div, Talbot Theological Seminary, Th.M., Trinity Evangelical Divinity School) é professor
de teologia sistemática na Liberty Seminário Batista, Lynchburg, Virginia.
6
CHAMBLESS, Jeff, Testamentum Imperium an international Theological Jornal, Evidence of the
Security of the Believer in the Old Testament, v. 1, n. 2005-2007, .
18
1.2.1 Fundamentação da doutrina na relação pactual na eternidade
O ponto de partida para entender essa relação pactual, que gera segurança e certeza
de salvação, está no pacto feito desde toda a eternidade pelas três pessoas da trindade, o
qual é conhecido como “pactum salutis” - conselho da redenção. Como declara Kuiper,
a verdade expressa no conselho da redenção é que “o Pai, o Filho e o Espírito Santo, antes
que o mundo existisse, planejaram juntos a salvação dos pecadores”. 7 Kuiper mostra
ainda que essa doutrina está fundamentada na Escritura, apontando textos que mostram
que houve, de fato, esse conselho da redenção. Em 1Jo 4.10, ele destaca que o Pai é
mencionado como tendo enviado o Filho; em Jo 17.4, o Senhor Jesus fala de uma
comissão que lhe fora dada pelo Pai; Is 53.12 menciona a recompensa dada pelo Pai ao
Filho pela realização da Sua obra; Jo 14.26; 15.26, mostram que o Espírito Santo é
enviado pelo Pai e pelo Filho.8 Kuiper resume dizendo:
Antes que o mundo existisse, o Trino Deus elaborou um plano de salvação para
ser executado em várias partes, reciprocamente distribuídas pelo Pai como
Enviante e Diretor, pelo Filho como Enviado, Mediador e Enviante, e pelo
Espírito Santo como Enviado e Aplicador.9
Partindo desse pressuposto, é possível olhar para a relação pactual de Deus com
seu povo escolhido desde antes da fundação do mundo, e ver a segurança que esse povo
demonstra, que, por sua vez, é fruto da graça e misericórdia de Deus que concede o dom
da fé para que essa certeza da salvação seja real.
7
KUIPER, R. B., Evangelização Teocêntrica, 2. ed. São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas,
2013, p. 9.
8
Ibid., p. 9–10.
9
Ibid., p. 10.
10
A Puritan’s Mind » Smith on Covenant Theology – by Dr. Morton Smith.
11
Ibid. (Tradução do google).
19
1.2.2 Fundamentação da doutrina na relação pactual temporal
Aqui observar-se-á, dentro dessa relação pactual de Deus com seu povo, desde
Adão até Davi e o anúncio da nova aliança nos profetas, as evidências que fundamentam
a doutrina da segurança e certeza da salvação no Antigo Testamento.
O não cumprimento dessas obrigações, ou seja, desse pacto, por parte do homem,
o levou a sofrer as sanções que Deus havia colocado anteriormente caso houvesse quebra
do pacto das obras. Essa desobediência trouxe consequências eternas terríveis para a
humanidade. Mas, mesmo diante dessa situação, Deus, por sua misericórdia e amor, dá
ao homem a promessa de redenção por meio daquele que viria da semente da mulher e
esmagaria a cabeça da serpente (Gn 3.15). Entra em cena, no tempo e no espaço a aliança
da graça. Essa é a promessa central, conhecida como o protoevangelho. Van Groningen
diz que na mensagem, em Gênesis 3.15, encontra-se a primeira revelação redentora no
12
GRONINGER, Gerard Van, Criação e Consumação - O Reino a Aliança e o Mediador, 1. ed. São
Paulo: Cultura Cristã, 2002, p. 23.
13
Ibid., p. 24.
20
Antigo Testamento.14 A partir daí pode-se observar, na vida daqueles que são alvo dessa
relação graciosa com Deus, atitudes que demonstram segurança e certeza de salvação.
14
Ibid., p. 134.
15
GRONINGEN, Gerard Van, Revelação Messiânica no Antigo Testamento, 2. ed. São Paulo: Cultura
Cristã, 2003. Existem interpretações divergentes com relação ao verdadeiro sentido desse texto,
principalmente quanto à tradução da expressão “”אֶ ת־יְ הוָֽה. João Calvino, comentando esse texto apresenta
alguns desses posicionamentos. O primeiro deles traduz essa expressão da seguinte maneira: “com o
SENHOR”, isto é, pela bondade ou pelo favor do SEHOR, a ideia é que Eva remete a bênção recebida da
prole ao SENHOR, como é dito no Sl 127.3. O segundo grupo traduz da seguinte forma: “do SENHOR”, e
a versão de Jerônimo traz: “através do SENHOR”. Diante dessas três possíveis traduções destacadas por
Calvino ele vai dizer: “Estas três leituras, eu digo, tendem a este ponto, que Eva dá graças a Deus por ter
começado a levantar uma posteridade através dela, embora ela era merecedora de esterilidade perpétua,
bem como de destruição total”. Calvino ainda destaca a ideia de outros que, com maior sutileza, tentaram
explicar a expressão “יתי ִאיׁש אֶ ת־יְ הוָֽה
ִ ִ ”קנda seguinte forma: “eu tenho obtido o homem do Senhor”; como
se Eva tivesse compreendido que ela já possuía aquele conquistador da serpente, que tinha sido divinamente
prometido a ela. Diante dessa proposta Calvino diz que “eles celebram a fé de Eva, porque ela abraçou,
pela fé, a promessa relativa ao esmagador da cabeça do diabo através de sua descendência; apenas eles
pensam que ela estava enganada na pessoa ou o indivíduo, vendo que ela restringiria a Caim que havia sido
prometido a respeito de Cristo. Calvino posiciona-se da seguinte maneira: “Para mim, no entanto, este
parece ser o sentido genuíno, que, enquanto Eva felicita-se pelo nascimento de um filho, ela lhe oferece a
Deus, como os primeiros frutos de sua raça. Portanto, eu acho que deveria ser traduzido, ‘tenho obtido um
homem do Senhor’, o que se aproxima mais de perto da frase hebraica. Além disso, ela chama de um recém-
nascido um homem, porque ela viu a raça humana renovada, que tanto ela e seu marido tinham arruinado
por sua própria culpa”. CALVINO, João, Genesis 4 Calvin’s Commentaries, disponível em:
<http://biblehub.com/commentaries/calvin/genesis/4.htm>, acesso em: 14 maio 2016.
16
GRONINGER, Gerard Van, Criação e Consumação - O Reino a Aliança e o Mediador, 1. ed. São
Paulo: Cultura Cristã, 2008, p. 143.
21
Sete (Gn 4.25), mais uma vez, Eva expressa gratidão a Deus ao dizer que “Deus me
concedeu outro descendente em lugar de Abel, que Caim matou”. Aqui percebe-se que
Eva não perde a esperança na promessa da semente, e que ela vê na pessoa de Sete a
continuação dessa semente. Na genealogia de Adão, apresentada por Moisés, é
interessante notar que a descendência de Adão parte de Sete, e não de Caim (Gn 5.3).
Moisés coloca da seguinte forma: “Viveu Adão cento e trinta anos, e gerou um filho à sua
semelhança, conforme a sua imagem, e lhe chamou Sete”. Logo, Sete é aquele que dará
continuidade à semente da mulher, a promessa de Deus foi preservada e, agora, Adão e
Eva podiam descansar seguramente no SENHOR vendo o fruto da fidelidade de Deus à
sua frente.
17
GRONINGER, Gerard Van, O progresso da revelação no Antigo Testamento, 1. ed. São Paulo:
Cultura Cristã, 2006, p. 34.
18
LAWSON, Steven J., Fundamentos da graça: 1.400 A.C. - 100 D.C., 1. ed. São José dos Campos, SP:
Editora Fiel, 2012, p. 97–98.
22
sustentada mesmo se o reino parasita satânico se tornasse, novamente,
poderosamente influente nas vidas dos descendentes de Noé. 19
19
GRONINGER, Gerard Van, Criação e Consumação - O Reino a Aliança e o Mediador, 1. ed. São
Paulo: Cultura Cristã, 2006, p. 480.
20
VOS, Geerhardus, Teologia Bíblica: Antigo e Novo Testamento, 1. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2010,
p. 72.; GRONINGER, Gerard Van, Criação e Consumação - O Reino a Aliança e o Mediador, p. 170–
171.
21
Os termos utilizados neste texto, כרת ברית, são os mesmos utilizados nas demais situações em que o
SENHOR entra em aliança com o seu povo, e também para reafirmar a aliança de Deus com seu povo no
decorrer de toda a história da redenção. O termo ( כרתcortar, fazer) aparece praticamente em todos os livros
do Antigo Testamento, em 246 ocorrências e o termo ( בריתaliança, pacto) aparece por 277 vezes,
normalmente, quando aparecem vinculados têm o propósito de caracterizar o pacto de Deus com o seu
povo. O Termo כרת, também indica o sentido de cortar o prepúcio, cortar uma árvore, eliminar do meio do
povo. O sentido do termo é bem abrangente. HOLLADAY, William L., Léxico Hebraico e Aramaico do
Antigo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 2010, p. 233. O termo ברית, também é usado para dirigir-se a
acordos entre homens, bem como para caracterizar a aliança de Deus com o homem. Ibid., p. 65,66.
22
GRONINGER, Gerard Van, O progresso da revelação no Antigo Testamento, p. 41.
23
Ele sabia e creu que ‘Deus era poderoso até para ressuscitá-lo dentre os mortos’ Hb
11.19”.23
23
Ibid., p. 45.
24
ROBERTSON, O. Palmer, Alianças, 1. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 42.
25
Ibid., p. 43.
26
Ibid.
24
Jacó, dando-lhe doze filhos, preservando sua semente, conduzindo-o ao Egito com toda
sua família, pela mediação de seu filho José, considerado também como um tipo de Cristo,
que, pela sua fé e segurança no SENHOR, foi exaltado no Egito com o propósito de trazer
preservação ao povo de Israel.27 Vê-se, portanto, que ambos também demonstram, por
meio das suas atitudes de obediência, essa segurança e certeza da salvação no SENHOR
do pacto.
Geerhardus Vos, trabalhando com essa ideia, diz que “A Lei foi dada depois que
a redenção de Israel foi efetuada, e o povo já havia entrado no gozo de muitas das bênçãos
do berith”.28 Ele mostra ainda que “a guarda da Lei não consta naquela conjuntura, como
base meritória para herdar a vida eterna. Ela é baseada na graça somente, e, de modo não
menos enfático Paulo baseia nela a Salvação”.29 A segurança do povo de Israel não estava
nas suas próprias obras, mas sim nas promessas de Deus, as quais são mantidas
independente da desobediência do povo. A condução do povo ao cativeiro por conta da
apostasia é a grande prova disso. Depois de ser o povo disciplinado e tratado, conduzido
ao arrependimento, Deus o conduziu de volta ao seu favor. Diante disso, Vos, declara que
27
GRONINGER, Gerard Van, O progresso da revelação no Antigo Testamento, p. 46.
28
VOS, Geerhardus, Teologia Bíblica: Antigo e Novo Testamento, p. 159–160.
29
Ibid., p. 160.
25
“essa é a prova mais convincente de que a observância da Lei não é a base meritória da
bênção”.30
Van Groningen destaca que, diante da Lei de Deus que fora exposta ao povo, esse
povo agora, tinham uma responsabilidade de responder positivamente à Lei, uma vez que
ela fora dada pelo próprio Deus. E foi isso que o povo fez, respondendo, a uma só voz
dizendo que tudo que o SENHOR falou iria fazer (Êx 19.8), embora não tivesse cumprido
esse compromisso, o que também aponta para incondicionalidade de Deus manter o pacto.
Yahweh estava iniciando com Israel o sistema de Teocracia regulamentado pela Sua
Lei.31
Depois da morte de Moisés, Deus coloca Josué para dirigir o seu povo, e a
promessa de Deus para o seu servo é a seguinte: “como fui com Moisés, assim serei
contigo; não te deixarei, nem te desampararei”. (Js 1.5). Josué também demonstra
segurança e certeza de salvação por meio da sua obediência às ordenanças do SENHOR,
bem como a sua firmeza diante daqueles que estavam se afastando do SENHOR (Js
24.15), e Deus, o SENHOR, demonstra sua fidelidade, graça e misericórdia para com ele
e para com o seu povo.
Com a morte de Josué, o povo de Israel acaba se distanciando de Deus, e por conta
da desobediência e rebeldia acaba sofrendo duras consequências. Entra em cena o período
dos Juízes, os quais eram levantados por Deus para libertar o povo por causa da opressão
sofrida por causa da constante apostasia do povo. Deus demonstra sua graça e
misericórdia, levando homens para trazerem o povo à lucidez e retorná-los à submissão
ao SENHOR. O fato é que, por não haver um rei em Israel, cada um fazia o que achava
30
Ibid., p. 161.
31
GRONINGER, Gerard Van, Criação e Consumação - O Reino a Aliança e o Mediador, p. 365–366.
26
mais reto (Jz 21.25). Todo esse quadro aponta para a necessidade de que a monarquia
fosse implantada.
Van Groningen destaca ainda evidências que mostram que Davi tinha segurança
em Deus, uma vez que ele estava ciente do relacionamento de Deus Yahweh com ele
(2Sm 23.5), com isso ele mostra que Davi confiava totalmente no cuidado protetor de
Yahweh sobre si, destacando eventos como a luta de Davi contra o gigante filisteu. Os
Salmos escritos por Davi estão repletos de evidências dessa segurança e certeza de
salvação, a saber: Segurança na proteção de Deus – Sl 3; 18.2; segurança na certeza de
que Deus o ouve – Sl 4.3; 116.1, por isso ele podia clamar, como se vê em Sl 5.2; 6.4;
segurança na certeza de que o SENHOR não desampara os que o buscam – Sl 9.7-10; 27.
32
Ibid., p. 539–542.
33
VANGEMEREN, Willem, The progress of redemption: The story of salvation from creation to the
New Jerusalem, 1. ed. Grand Rapids, MI: Baker Books, 1988, p. 230.
34
GRONINGER, Gerard Van, Criação e Consumação - O Reino a Aliança e o Mediador, p. 550.
27
Destacam-se também outros Salmos como o Sl 16.8-11, que traz uma das mais belas
declarações de segurança da Escritura, a qual aponta para Cristo Jesus, o Salvador. No Sl
18, é reiterado o aspecto da segurança e certeza da salvação com base na promessa do
reinado eterno de Davi por meio da sua posteridade. Ainda nos Salmos 23, 24 e 27, tem-
se expressões belíssimas da segurança e certeza de Davi em sua salvação e que Deus o
manteria seguro em cada circunstância da vida.35 Assim também, vê-se a segurança
expressa por Davi no Sl 46, bem como na maioria dos Salmos de sua autoria.
No Livro do profeta Jeremias, Deus fala por boca do profeta que estabeleceria
uma Nova Aliança (Jr 31.31), ou seja, como pontua VanGemeren: “uma mensagem de
conforto e restauração para comunidade pós-exílica e no tempo do nosso Senhor Jesus
Cristo”.36 VanGemeren afirma ainda que, na Nova Aliança, Deus reafirma Sua intenção
de restaurar a humanidade para si mesmo e também os céus e a terra, como fica claro nos
textos de (Mt 11.28; 26.28; 1Co 11.25; 2Co 3.6; Hb 8.8-12).37 O profeta Jeremias profere
uma aliança eterna que o SENHOR faz com seu povo, de nunca deixar de fazer o bem
para ele e, colocar nos corações de cada um deles o temor para que nunca se afastasse
35
Ibid., p. 551.
36
VANGEMEREN, Willem, The progress of redemption: The story of salvation from creation to the
New Jerusalem, p. 272.
37
Ibid.
28
dEle (Jr 32:40). Os termos utilizados neste texto, כרת ברית, são os mesmos utilizados nas
demais situações em que O SENHOR entra em aliança com o seu povo, e também para
reafirmar a aliança de Deus com seu povo no decorrer de toda a história da redenção. Isso
Ainda olhando para os escritos proféticos, vê-se nos escritos do profeta Malaquias
grande ênfase em um dos grandes pilares dessa doutrina, que é a o atributo da
38
Perseverança na Santidade, disponível em: <http://www.romans45.org/spurgeon/sermons/2108.htm>,
acesso em: 16 nov. 2015.
39
Ibid.
40
LAWSON, Fundamentos da graça: 1.400 A.C. - 100 D.C., p. 287.
41
VANGEMEREN, Willem, The progress of redemption: The story of salvation from creation to the
New Jerusalem, p. 274.
29
imutabilidade de Deus (Malaquias 3:6). O próprio SENHOR, por boca do profeta, declara
sua imutabilidade, ressaltando que, por conta dessa imutabilidade, os filhos de Jacó não
eram consumidos. Diante de um contexto onde o povo estava sendo infiel, deixando de
cumprir com suas obrigações no que toca a manutenção da casa do SENHOR, ele mesmo
faz esta declaração que atesta sua imutabilidade. O texto faz referência à promessa que o
SENHOR fez a Jacó (Gn. 28.10-17)42, a qual fora repetida em (Gn. 35.11-12). Por conta
dessa promessa os filhos de Jacó poderiam descansar certos de que não seriam
abandonados pelo SENHOR. Outro texto que expressa o atributo da imutabilidade de
Deus e traz segurança ao seu povo é Números 23.19. Comentando esse texto, Wenhan
ressalta que pelo fato de não ser homem, “Deus não pode ser manipulado por mágica,
nem recebe ordens videntes”.43 Van Groningen declara a invencibilidade do povo por
causa da presença de Deus no meio deles em decorrência da Sua aliança. 44 João Calvino
comentando este texto vai mostrar a disparidade entre Deus e o Homem. Ele aponta, na
figura de Balaque, a tendência errada que o homem tem de formar suas estimativas de
Deus a partir de suas próprias disposição e hábitos.45 Louis Berkhof, ao tratar o atributo
da “veracidade de Deu”, declara: “Ele é também a verdade num sentido ético e, como tal,
revela-se como realmente é, de modo que a sua revelação é absolutamente confiável”.46
Logo, o fato de Deus não mentir nem se arrepender traz total segurança nas Suas
promessas. A mesma ideia é encontrada em 1Samuel 15.29 quando Samuel declara a
sentença de Saul, por haver ele transgredido a Lei, declarando a fidelidade de Javé em
cumprir suas promessas. O Ellicott's Commentary for English Readers aponta uma
tradução possível para “A Força de Israel” como: “O imutável de Israel”.47 A qual reforça
a ideia da imutabilidade no texto. Diante disso, a declaração do profeta emana e inspira
42
Van Groningen, falando a respeito de aliança diz: “O Deus Yahweh garantiu aos patriarcas que ele seria
seu Deus, e Deus dos seus descendentes, de geração em geração (Gn 17.7). Ele havia prometido a Abraão
que lhe daria muitos descendentes e que, por meio deles, as nações seriam abençoadas (Gn 22.17, 18). O
Deus Yahweh havia dito a Jacó que todos os povos da terra seriam abençoados por seus descendentes. Jacó
foi assegurado de que o Deus Yahweh estaria com ele e cuidaria dele (Gn 28.14, 15). Essas promessas
haviam sido repetidas aos descendentes em várias circunstâncias. GRONINGER, GERARD VAN, Criação
e Consumação - O Reino a Aliança e o Mediador, p. 480.
43
WENHAN, Gordon J., Números introdução e comentário, São Paulo: Edições Vida Nova e Editora
Mundom Cristão, 1991, p. 183.
44
GRONINGER, Gerard Van, Criação e Consumação - O Reino a Aliança e o Mediador, p. 442.
45
Números 23 Comentários de Calvino, disponível em:
<http://biblehub.com/commentaries/calvin/numbers/23.htm>, acesso em: 19 nov. 2015.
46
BERKHOF, Louis, Teologia Sistemática, 4. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, p. 67.
47
1 Samuel 15 Ellicott’s Commentary for English Readers, disponível em:
<http://biblehub.com/commentaries/ellicott/1_samuel/15.htm>, acesso em: 7 dez. 2015.
30
total segurança e certeza de que a salvação viria para o povo de Deus, o SENHOR do
pacto.
48
HODGE, Charles, Teologia Sistemática, 1. ed. São Paulo, SP: Hagnos, 2001, p. 1105,1106.
31
Jesus, em Mt 1.1-16,49 vê-se a fidelidade e incondicionalidade de Deus em manter o seu
pacto, independente dos pecados cometidos por aqueles que são listados na genealogia e
pelos prosélitos que foram convertidos, como é o exemplo de Raabe e Rute. Também
percebe-se claramente a providência de Deus na preservação do seu povo no Egito, no
deserto, na posse da terra, no cativeiro, no retorno, até a chegada do Messias prometido,
cumprindo assim o que fora dito em (Gn 3.15), o chamado “Protoevangelho”.50 O Cristo
é apresentado como Filho de Abraão - filho da promessa por meio de quem a promessa a
Abraão seria concretizada, Filho de Davi – por meio de quem o Reinado Perpétuo seria
concretizado.51 O próprio Evangelho Segundo Mateus, na sua estrutura, mostra o
cumprimento das promessas do Senhor por meio da frase que se repete por todo Livro
dando ideia de cumprimento do que fora dito por intermédio dos profetas acerca do
Messias.52 Com isso, vê-se o progresso da revelação do Antigo Testamento, tendo sua
culminância no Novo Testamento com a vinda do Messias e a instauração do reino. Tudo
isso atesta a imutabilidade de Deus e sua fidelidade em cumprir suas promessas, trazendo
plena segurança e certeza de salvação aos eleitos.
Em Mt 6.9, o Senhor Jesus ensina os seus discípulos a orar, e vê-se que Ele os
manda orar ao Pai que está nos céus. Logo, ter o Deus todo poderoso como Pai, saber que
está sendo guardado por Ele, traz plena segurança aos seus filhos. 53 De posse dessa
segurança, os eleitos precisam descansar inteiramente no Senhor, assim como Mateus
mostra no restante do capítulo. Na narrativa do jovem rico e em seguida, quando o Senhor
fala do perigo das riquezas (Mt 19.16-30), observam-se evidências da doutrina da
segurança, pois a declaração de Jesus aos discípulos mostra que a salvação é uma obra
49
Van Groningen apreciando esta porção destaca que Jesus era o descendente de Davi. Ele apresenta um
breve resumo da obra de Cristo: “Veio como Mediador real que exerceu seu poder real, sua soberania sobre
a água vinho, peixes e pão, as tempestades no mar, a ressurreição dos mortos, a expulsão de demônios, ao
pisar a cabeça de Satanás na cruz e tendo ele próprio ressuscitado dentre os mortos”. GRONINGER, Gerard
Van, Criação e Consumação - O Reino a Aliança e o Mediador, p. 536.
50
GRONINGER, Gerard Van, Criação e Consumação - O Reino a Aliança e o Mediador, p. 134.
51
Matthew 1 Barnes’ Notes, disponível em: <http://biblehub.com/commentaries/barnes/matthew/1.htm>,
acesso em: 9 dez. 2015.; Matthew 1 Gill’s Exposition, disponível em:
<http://biblehub.com/commentaries/gill/matthew/1.htm>, acesso em: 9 dez. 2015; Matthew 1 Jamieson-
Fausset-Brown Bible Commentary, disponível em:
<http://biblehub.com/commentaries/jfb/matthew/1.htm>, acesso em: 9 dez. 2015.
52
Mt 1.22; 2.5, 15, 17, 23; 3.3; 4.14; 8.17; 12.17; 13.35; 21.4; 27.9. Bíblia de Estudo de Genebra, 2. ed.
Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil; Cultura Cristã, 2009.
53
Matthew 6 Matthew Poole’s Commentary, disponível em:
<http://biblehub.com/commentaries/poole/matthew/6.htm>, acesso em: 9 dez. 2015.; Matthew 6
Jamieson-Fausset-Brown Bible Commentary, disponível em:
<http://biblehub.com/commentaries/jfb/matthew/6.htm>, acesso em: 9 dez. 2015.
32
impossível ao homem (Mt 19.26); essa obra é diretamente realizada pelo próprio Deus,
ou seja, não depende do homem. Em seguida, Jesus mostra que aqueles que foram
chamados herdarão a vida eterna (Mt 19.29). Certamente, essa fala do Mestre trouxe plena
segurança para aqueles discípulos, pois diante da fala de Cristo eles puderam ver a
incondicionalidade da salvação, assim como demonstrado acima (Nm 23.19).54 Outro
evento que, dentre outros, também demonstra essa maravilhosa doutrina é a Ceia do
Senhor (Mt 26.26-28), onde o Senhor Jesus declara para os discípulos que eles haveriam
de beber de novo com Ele no reino do Seu Pai (Mt 26.29)55. Em seguida vem a
ressurreição de Cristo, que é o evento tido como uma das maiores evidências da doutrina
da segurança e certeza da salvação. Sandy Wilson declara acerca da ressurreição de Jesus:
54
Ver 1.2.2.6 p.27,28
55
Henry E. Dosker, comentando esse evento, diz que “ele estava apontando para a plena realização e
consumação do Reino de Deus no fim dos tempos, quando a refeição seria retomada no ‘banquete
messiânico’”. Lord’s Supper | Free online library at BiblicalTraining.org, disponível em:
<https://www.biblicaltraining.org/library/lords-supper>, acesso em: 9 ago. 2016.
56
CARSON, D. A.; KELLER, Timothy, O Evangelho no Centro: Renovando nossa fé e retomando
nossa prática ministerial, São José dos Campos, SP: Fiel, 2013, p. 184.
57
Ver 1.2.2.6 p. 27
58
Ver 1.2.2.5 p. 25,26
33
Testamento, bem como para a fidelidade de Deus em cumprir Suas promessas de maneira
incondicional. O evangelista, escrevendo para um público, em sua maioria, gentia, tem
como objetivo apresentar a verdadeira identidade de Jesus. Por meio de suas ações, o
autor busca atestar sua divindade. Ele mostra que Jesus tem o poder de perdoa pecados
(Mc 2.7,10), mostra que Jesus se apresenta como o noivo da nação de Israel (Mc 2.19,20)
e também mostra Jesus declarando-se Senhor do Sábado (Mc 2.28).59 Em Mc 10.45, o
próprio Senhor Jesus declarou sua missão messiânica da seguinte maneira: “Pois o
próprio Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em
resgate por muitos”. Tem-se, aqui, o cumprimento da profecia de Isaías, como se vê em
Is 53.60
59
DEVER, Mark, A mensagem do Novo Testamento, 1. ed. Rio de Janeiro, RJ: Casa Publicadora das
Assembleias de Deus, 2009, p. 66.
60
Ibid., p. 72.
61
MACGREGOR, K. R., Mark, Gospel of, in: The Bible Dictionary Lexham, 1. ed. Bellingham, WA:
Lexham Press, 2016. Nesse artigos encontra-se uma apresentação crítica, que vem sendo questionada desde
1901, relacionada a esse Segredo Messiânico, apontando como uma ideia que teria sido inventada por
Marcos para suprir a lacuna deixada por Jesus por Ele não ter declarado para ninguém que era o Messias.
Por sua vez, essa teoria acaba sendo desmentida por estudos mais recentes que apontam que a
intencionalidade de Jesus em querer manter sua identidade messiânica em segredo era para que Ele pudesse
desempenhar com tranquilidade seu ministério e em tempo oportuno revelar-se a todos como o messias
prometido e esperado.
62
O ato de Cristo, de tocar no leproso, apontava para sua obra redentiva, para aquilo que Ele veio para
fazer, tomar sobre si a miséria e enfermidade e, em trocar, dar Sua abundante vida.
63
DEVER, A mensagem do Novo Testamento, p. 66,67.
34
consonância com Dn 7, aponta para figura do Messias, como se vê em Mc 14.61,62.64
Como ressalta Beale e Carson, quanto a identidade de Jesus no Evangelho de Marcos lê-
se:
Vindo ao mundo para levar a efeito o novo êxodo de Isaías, esperado havia
tanto tempo (1.2,3), ele não apenas é o Messias e Servo dos judeus, segundo
Davi e Isaías, o qual encarna tudo que se esperava de Israel (1.10,11), mas
também, como as palavras de abertura de Marcos dão a entender de maneira
misteriosa, a presença do próprio Deus (1.2,3).65
64
Ibid., p. 69.
65
BEALE, G. K.; CARSON, D. A., Comentário do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento,
1. ed. São Paulo: Vida Nova, 2014, p. 141.
35
segurança no Livro de Lucas são as aparições do Senhor aos seus discípulos, após sua
ressurreição. O diálogo de Jesus com os discípulos no caminho de Emaús é um relato que
comprova a veracidade da Escritura e conformidade de Jesus com os relatos contidos nela
(Lc. 24-48),66 bem como a Sua ascensão (Lc 24.53), atestando a veracidade de todas as
suas Palavras. Todas essas evidências deixam mais do que firmes as bases da segurança
e certeza da salvação para os discípulos, que puderam atestar sua divindade e ver a
veracidade das suas promessas, comprovando assim a sua divindade e autenticando todas
as suas Palavras. Isso fica evidente na atitude obediente dos discípulos ante a ordem dada
por Jesus de que eles permanecessem na cidade (v. 49) até que fossem revestidos de
poder, e eles prontamente foram para Jerusalém (v. 52).
Isso é explicado mais à frente na conversa de Jesus com Nicodemos, pois esse é o
tema da conversa, “novo nascimento”, ou seja, é preciso nascer do Espírito. (Jo 3.3-7).
João 3.16, uma das passagens mais conhecidas e citadas da Escritura, também atesta esta
necessidade de crer para que se seja salvo. Caso se perca essa informação inicial de João,
que o homem precisa nascer da vontade de Deus criar-se-á um problema. Ao ver a
repetição da frase “todo aquele que nele crer” ou “todo aquele que crê”, na Escritura,
relacionada à salvação, pode-se achar que isso é algo que vem do homem, mas o ato de
crer para salvação é algo que só é possível por meio da fé que é dada por Deus como um
dom. Por tanto, é uma ação totalmente monergística, uma vez que aquele que crer para
salvação é aquele que foi escolhido desde antes da fundação do mundo e foi regenerado
por Deus e capacitado a crer nele, ou seja, aquele que nasceu do Espírito.
66
Ibid., p. 644.
36
Um evento de grande importância também é o encontro de Jesus com a mulher
samaritana (Jo 4). Nesse encontro o Senhor apresenta-se como Aquele que veio cumprir
as promessas da Antiga Aliança e inaugurar a Nova Aliança – “Eu sei, respondeu a
mulher, que há de vir o Messias, chamado Cristo; quando ele vier, nos anunciará todas as
coisas. Disse-lhe Jesus: Eu o sou, eu que falo contigo”. (Jo 4.24,25). Essa forte declaração
de Jesus fundamenta e confere segurança e certeza da salvação aos eleitos.
67
LAWSON, Fundamentos da graça: 1.400 A.C. - 100 D.C., p. 426.
68
MOUCE, William D., Léxico Analítico do Novo Testamento Grego, São Paulo: Vida Nova, 2013,
p. 450. Mouce vai explicar essa construção que visa dar uma forte ênfase. MOUCE, WILLIAM D.,
Fundamentos do Grego Bíblico, São Paulo: Vida Nova, 2009, p. 354. Daniel, também cometa este tipo
de construção. WALLACE, Daniel B., Gramática Grega: Uma sintaxe exegética do Novo Testamento,
São Paulo: Editora Batista Regular do Brasil, 2009, p. 468–469.
69
MOUCE, William D., Léxico Analítico do Novo Testamento Grego, p. 214.
70
MOUCE, William D., Fundamentos do Grego Bíblico, p. 100.
71
Ibid., p. 118.
72
Ibid., p. 110.
37
vez, ele aponta para o fato de a salvação vir inteiramente de Deus, incondicionalmente,
dependendo apenas da sua Santa vontade.
Destaca-se, ainda, outra célebre expressão do Senhor Jesus, “ἐγώ εἰμι”. Essa
expressão é bem recorrente no livro de João e, por sua vez, aponta maravilhosamente para
segurança. Em 4.25, ele declara ἐγώ εἰμι – “Eu sou messias”; em 6.35 ἐγώ εἰμι – “Eu sou
o pão da vida”; em 6.41 ἐγώ εἰμι – “Eu sou o pão que desceu do céu”; em 8.12 ἐγώ εἰμι
– “Eu sou a luz do mundo”; em 8.24, 28,58 e 13.19 ἐγώ εἰμι – “EU SOU” (referência a
Êx 3.14; At 7.32); em 10.7,9 ἐγώ εἰμι – “Eu sou a porta”; em 10.11,14 ἐγώ εἰμι – “Eu sou
o bom pastor”; em 11.25 ἐγώ εἰμι – “Eu sou a ressurreição e a vida”; em 13.13 ἐγώ εἰμι
– “Eu sou Mestre e Senhor”; em 14.6 ἐγώ εἰμι – “Eu sou o caminho, e a verdade, e a
vida”; em 15.25 ἐγώ εἰμι – “Eu Sou a videira”. Todas essas referências conferem
evidências à doutrina da segurança e certeza da salvação.
73
Strong’s Greek: 4100. πιστεύω (pisteuó) -- 244 Occurrences, disponível em:
<http://biblehub.com/greek/strongs_4100.htm>, acesso em: 10 dez. 2015.
38
coisas, trabalhando assim, com intrepidez, por meio da ação do Espírito Santo, para a
propagação e expansão do Reino inaugurado de Cristo Jesus.
Lucas retoma sua narração pela ascensão de Jesus (At 1.6-11), cumprimento de
Daniel 7.13 e 14, o que, por sua vez, é confirmado na visão de Estêvão (At 7.56). Lucas
intenciona mostrar continuidade com o que havia narrado no seu Evangelho a respeito da
assunção do Senhor (Lc 9.51). No evento da Sua assunção, o Senhor confirma e ratifica
a promessa do envio do consolador. Tem-se nessa profecia o cumprimento da profecia de
Joel (Jl 2.28,29), a qual tem o seu cumprimento no dia de Pentecostes (At 2.1-4, 33). Esse
evento, em menor proporção, acontece novamente com a casa de Cornélio, o qual era
gentil (At 10.44). Veem-se, portanto, as evidências da fidelidade de Deus mais uma vez
presentes no cumprimento das promessas, bem como o tema da universalização da
promessa feita a Abraão, atingindo todas as nações, como se percebe no itinerário dado
pelo Senhor de como Sua Palavra deveria progredir (At 1.8).
Neste versículo, somos informados das razões por que a esperança é firme e
segura. Não se trata de uma esperança que nos envergonhará, tampouco é uma
40
esperança na qual precisemos nutrir qualquer vergonha. Pelo contrário, é uma
esperança da qual podemos nos gloriar e protestar contra todos os adversários.
Ela jamais nos desapontará e se mostrará ilusória. Por quê? Por que o amor de
Deus é derramado em nosso coração, pelo Espírito Santo que nos foi
outorgado.74
Murray vai ainda enfatizar que esse amor de Deus (v.5) é o que vai garantir a
eficácia e dar plena segurança ao homem, pois se dependesse do amor do homem para
com Deus essa certeza e segurança seriam destruídas. E quem propicia essa certeza é o
Espírito Santo que nos foi dado, e por esta razão Ele nos governa. E, assim, ele testemunha
com o espírito dos crentes que estes são filhos de Deus (Rm 8: 16).75
Fica totalmente clara a segurança de Paulo por meio das suas exposições e
aplicações do Evangelho às doutrinas da regeneração, justificação e santificação. No
capítulo 6, o Apóstolo mostra que o homem é liberto do pecado pela graça, apontando,
na doutrina da Justificação, a doutrina da segurança. No versículo 23, Paulo enfatiza que
por merecimento o homem merece a morte, mas Deus, inteiramente de graça lhe dá a
salvação. Isso mostra que a vida eterna é um dom de Deus, o que confirma o ponto de
que o crente pode sentir-se seguro porque a salvação vem inteiramente de Deus.76 No
capítulo 8, Paulo diz que “nenhuma condenação há para os que estão em Cristo”. Aqui
vê-se a doutrina da justificação pela fé conduzindo o eleito à plena segurança. O Apóstolo
Paulo também direciona o eleito à plena segurança, mostrando o paralelo antitético entre
aquele que procede da carne e aquele que está no Espírito, assim ele declara que “o
próprio Espírito testifica com o nosso Espírito que somos filhos de Deus” (Rm 8: 16).77
Ainda neste capítulo dos versículos 31 ao 39, encontram-se os principais fundamentos da
doutrina da segurança.78 Aqui ele mostra o progresso da revelação, no que toca à
fidelidade de Deus no curso da história da redenção, mostrando que se Deus está do lado
daqueles a quem ele escolhe, nada poderá abalá-los. Com isso ele vai mostrar que nada
poderá separá-los do amor de Deus, que está em Cristo Jesus. Assim como já visto na
declaração de Jesus no Evangelho de João 6: 37, aqui o Apóstolo atesta essa verdade. No
74
MURRAY, John, Romanos, São José dos Campos, SP: Editora Fiel, 2012, p. 190–191.
75
Ibid., p. 191.
76
BERKHOF, Louis, Teologia Sistemática, p. 498.
77
Garantia, disponível em: <http://biblehub.com/library/watson/a_body_of_divinity/6_assurance.htm>,
acesso em: 9 dez. 2015.
78
LAWSON, Fundamentos da graça: 1.400 A.C. - 100 D.C., p. 209.
41
versículo 38, Paulo expressa sua certeza na intenção de nutrir certeza nos seus leitores.
Tudo isso fiado no amor de Cristo para com os seus eleitos.79
A carta aos Efésios, também é outra carta onde o apóstolo apresenta muitas
evidências que fundamentam a doutrina da segurança e certeza do crente. No capítulo
primeiro (vv. 3-14), Paulo mostra a necessidade que a Igreja tem de bendizer ao Senhor,
ressaltando a ação monergística de Deus na salvação.80 A Economia da Trindade é
destacada, quando se apresenta a função de cada pessoa da Trindade na salvação81: O Pai
elege; o Filho redime; o Espírito Santo aplica, sendo o Espírito o selo e penhor que dá a
garantia de segurança e plena certeza da salvação para o crente.82 Nos versículos 15-23,
o Apóstolo ora para que os crentes pudessem ser iluminados para ver a obra da Trindade
aplicada às suas vidas, e os resultados de estarem unidos a Cristo. As doutrinas
enfatizadas nessa perícope conduzem à plena segurança, pois mostram que aquele que
está unido a Cristo foi ressuscitado com Ele, foi entronizado com Ele, exaltado com Ele,
tudo que Cristo conquistou é herança do eleito.
Os temas desenvolvidos pelo Apóstolo na epístola aos Efésios são trabalhados por
ele nas demais epístolas com maior ou menor ênfase. Contudo, o que se percebe é o
cuidado do Apóstolo em fortalecer os crentes para que, de posse das verdades do
Evangelhos, pudessem descansar no Senhor e nutrir a verdadeira certeza da salvação, não
fiados em si mesmos, mas na obra gloriosa da Trindade.
79
Ibid., p. 21.
80
LLOYD-JONES, D. M., O Supremo Propósito de Deus, São Paulo: Publicações Evangélicas
Selecionadas, 1996, p. 50–51.
81
LAWSON, Fundamentos da graça: 1.400 A.C. - 100 D.C., p. 50.
82
Ibid., p. 608.
83
Philippians 1 Barnes’ Notes, disponível em:
<http://biblehub.com/commentaries/barnes/philippians/1.htm>, acesso em: 11 abr. 2016.
42
sua “clara compreensão da natureza da vida cristã, seu entendimento quando um homem
se torna cristão e do poder e da vida que constituem a Igreja Cristã. É seu profundo
conhecimento do plano divino de salvação que leva a essa sua confiança”.84 Paulo conduz
aqueles irmãos à certeza de que foram salvos e que eles podiam descansar nessa certeza.
O termo “πείθω” traz ainda a ideia de estar tranquilo e estar confiante.85 Pelo exemplo o
Apóstolo ensina aqueles irmãos a confiarem na fidelidade e imutabilidade de Deus,
demonstrando assim a sua plena segurança e certeza da salvação. Isso fica evidente em
tantas passagens dos seus escritos, como por exemplo em Fl 1.21; 2Tm 1.1286.
A supremacia de Cristo é testificada, por diversas vezes nessa carta, para mostrar
que ele é maior do que os anjos (Hb 1), maior do que Moisés (Hb 3), do que os profetas
e sacerdotes (Hb 5; 7). Sendo Ele a expressão perfeita do ser de Deus, é também o antítipo
perfeito de todos aqueles que apontaram para Ele desde Adão até o Seu nascimento (Hb
8; 9). As bases da segurança estão lançadas na obra de Cristo Jesus e o autor da epístola
deixa isso muito evidente por meio da sua exposição cristocêntrica (Hb 2.14-18). O autor
exalta a justiça e a imutabilidade de Deus (Hb 6.13-20). Os teólogos de Westminster
destacaram esse atributo de Deus de maneira gloriosa. O Catecismo Maior de
Westminster, na sua pergunta de número sete, cita vários atributos de Deus e entre os
atributos citados, encontra-se o atributo da imutabilidade. Johannes Geehardus Vos, em
seu comentário do CMW87, levanta a grande questão que está relacionada a esta
afirmação: “Se Deus é imutável, então por que a Bíblia fala que ele ‘se arrependeu’ ou
84
LLOYD-JONES, D. Martyn, A Vida de Alegria comentário sobre Filipenses, 1. ed. São Paulo:
Publicações Evangélicas Selecionadas, 2008, p. 37.
85
MOUCE, William D., Fundamentos do Grego Bíblico, p. 475.
86
LAWSON, Fundamentos da graça: 1.400 A.C. - 100 D.C., p. 658.
87
VOS, Johannes Geehardus, Catecismo Maior de Westminster Comentado, 1. ed. São Paulo: Os
Puritanos, 2007, p. 49–54.
43
que mudou de ideia, como por exemplo no caso da cidade de Nínive (Jn 3: 10)?”88 Ele
vai mostrar que Deus não muda o seus decretos, mas apenas a forma de tratar com o seu
povo. No caso dos ninivitas a narrativa mostra que eles mudaram o seu modo de agir, se
convertendo ao SENHOR.89
O autor vai mostrar, nessa porção, que, de fato, a segurança do eleito está na
Palavra que Deus empenhou ao pactuar com os Seus. Ele começa citado o pacto de Deus
com Abraão, no qual fica clara a incondicionalidade para o cumprimento, uma vez que o
próprio Deus “se interpôs com juramento” (v.17). Nos versos 17-20, temos o ápice da
fundamentação da segurança e certeza da salvação na carta:
Por isso, Deus, quando quis mostrar mais firmemente aos herdeiros da
promessa a imutabilidade do seu propósito, se interpôs com juramento, para
que, mediante duas coisas imutáveis, nas quais é impossível que Deus minta,
forte alento tenhamos nós que já corremos para o refúgio, a fim de lançar mão
da esperança proposta; a qual temos por âncora da alma, segura e firme e que
penetra além do véu, onde Jesus, como precursor, entrou por nós, tendo-se
tornado sumo sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque.92
Ao tratar de Cristo Jesus como mediador da Nova Aliança (Hb 8.6), o autor aponta
mais um aspecto que fundamenta a segurança e certeza do crente. Aqui o autor remete os
seus leitores à profecia dada por intermédio de Jeremias (Jr 31.31-34). A forma como o
autor coloca a suficiência do sacrifício é também outro fundamento para a segurança e
certeza do crente (Hb 9.11-14). Mais uma vez é ratificado que Cristo Jesus é o Mediador
da nova aliança, o qual confere segurança e esperança àqueles que têm sido chamados
por meio da promessa de herança (v.15), por fim ele ressalta a segunda vinda de Cristo o
último dia. Os que são alvo dessa “expiação limitada” (v.28) podem descansar seguros de
88
Ibid., p. 51.
89
Ibid., p. 52.
90
HODGE, A. A., Confissão de Fé de Westminster Comentada, São Paulo: Os Puritanos, 1999, p. 75.
91
Ibid., p. 81.
92
Bíblia de Estudo de Genebra, p. 1652.
44
que o sacrifício apresentado por Cristo santifica-os de uma vez por todas (Hb 10.10),
mostrando assim a incondicionalidade da salvação, mostrando também a impossibilidade
de o verdadeiro crente perder a salvação, tema que será tratado nesta pesquisa com mais
apreço posteriormente. Ainda no capítulo 10, partindo verso 19, é conferida ao crente o
privilégio de achegar-se à presença gloriosa de Deus. Nessa porção, o eleito, mais uma
vez, encontra firme fundamento para a segurança e certeza da salvação, tanto que dele é
requerido que apresente certeza de fé93:
Tendo, pois, irmãos, intrepidez para entrar no Santo dos Santos, pelo sangue
de Jesus, pelo novo e vivo caminho que ele nos consagrou pelo véu, isto é, pela
sua carne, e tendo grande sacerdote sobre a casa de Deus, aproximemo-nos,
com sincero coração, em plena certeza de fé, tendo o coração purificado de má
consciência e lavado o corpo com água pura. Guardemos firme a confissão da
esperança, sem vacilar, pois quem fez a promessa é fiel. (Hb 10.19-22)94
93
Esse tema também será desenvolvido pela pesquisa com maior atenção posteriormente.
94
Bíblia de Estudo de Genebra, p. 1661.
95
LAWSON, Fundamentos da graça: 1.400 A.C. - 100 D.C., p. 96.
45
Ao olhar para a porção que se encontra em Tiago 2.14-26, é necessário entender
a ação das obras na segurança e certeza do crente. As obras, como colocado por Tiago,
não contrariam a doutrina da salvação pela fé somente, ensinada por Paulo. É preciso que
a forma como Tiago coloca seja vista em paralelo, com o que Paulo ensina, entendendo
as obras como resultado da verdadeira fé. Como será desenvolvido no decorrer da
pesquisa as boas obras são frutos da certeza do verdadeiro crente. Outro ponto na carta
que aponta o fundamento da doutrina é a certeza demonstrada pelo autor de que o Senhor
vem. A declaração de que “a vinda do Senhor está próxima”, confere total segurança e
certeza ao verdadeiro crente.
De forma maravilhosa Pedro assegura aos eleitos que sua salvação não dependia
da obediência deles, mas daquilo que o Senhor Jesus fez – já antes da fundação do mundo
– derramando seu sangue para remir os pecados dos escolhidos (v.19,20). Aqui Pedro
estabelece um forte argumento da salvação pela graça, mediante o sangue do cordeiro
96
Ver argumentação em Atos...
97
LAWSON, Fundamentos da graça: 1.400 A.C. - 100 D.C., p. 468,482.
46
derramado antes da fundação do mundo, o qual é aplicado pela fé, tanto no Antigo
Testamento como no Novo Testamento.98 Logo no verso 25, ele ressalta a fidelidade e
imutabilidade de Deus em cumprir suas palavras: “a palavra do Senhor permanece para
sempre”. De maneira maravilhosa Pedro, usado pelo Espírito Santo, fortalece a segurança
e certeza dos seus leitores ao declarar as seguintes palavras (2.9,10) 99:
Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade
exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou
das trevas para a sua maravilhosa luz; vós, sim, que, antes, não éreis povo, mas,
agora, sois povo de Deus, que não tínheis alcançado misericórdia, mas, agora,
alcançastes misericórdia.
98
Calvino comentando está porção vai dizer que: “Uma vez mais, ele (Pedro), por meio de uma comparação,
amplia a graça de Deus, com a qual ele favorece peculiarmente os homens daquela época. Porquanto não
era um favor comum e pequeno o fato de Deus deferir a manifestação de Cristo àquele tempo, quando no
conselho eterno ele já o havia ordenado para salvação do mundo. Entretanto, ao mesmo tempo, ele os
lembra que algo não era algo novo nem repentino para Deus que Cristo entrasse em cena como Salvador;
e é especialmente isto que deve ser conhecido”. CALVINO, JOÃO, Epístolas Gerais, 1. ed. São José dos
Campos, SP: Fiel, 2015, p. 167,168.
99
Ibid., p. 191–194.
47
Nas epístolas gerais, escritas por João, também estão presentes evidências que
fundamentam a doutrina da segurança e certeza da salvação. Uma vez seguro e certo de
sua salvação o crente goza de completa alegria. Logo, João mostra que essa alegria é
possível por meio da comunhão do crente, proporcionada por Cristo, com o Pai (vv. 1-4).
Mais uma vez, a incondicionalidade da salvação é colocada apontando para uma obra
monergística que, ao mesmo tempo, é irrevogável. João declara que Cristo é o advogado
dos crentes junto ao Pai, e que se o crente pecar Ele advogará a sua causa. João vai
também estabelecer diretrizes para o verdadeiro crente aferir sua verdadeira eleição. O
cristão que está seguro e certo da sua salvação vai buscar viver de acordo com um cidadão
do céu. No capítulo 3, João apresenta os benefícios que o crente tem em ser filho de Deus,
bem como na verdade da glorificação que ocorrerá no último dia. Outro aspecto muito
forte nessa Epístola é a exposição que João faz acerca do amor de Deus para com o eleito.
Aqui se tem mais um dos grandes fundamentos da doutrina da segurança e certeza da
salvação (3.7-21). João declara que “no amor não existe medo; antes o perfeito amor lança
fora o medo” (v.8a). Logo, diante dessa afirmação o crente repousa seguro no perfeito
amor de Deus, o qual nos faz amar a Ele.
100
LAWSON, Fundamentos da graça: 1.400 A.C. - 100 D.C., p. 751.
101
Ibid., p. 752.
102
BEALE; CARSON, Comentário do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento, p. 1318.
48
Ezequiel e Daniel.103Dentre outros, os principais temas que se harmonizam com a
pesquisa são o tema do novo céu e nova terra e o tema do triunfo e vitória sobre a besta,
onde se vê fortemente a ligação da literatura profética, como por exemplo, Dn 7, com Ap
12.104 A universalização do cumprimento profético também é um tema que interessa a
nossa pesquisa, uma vez que aponta para o cumprimento da promessa feita a Abraão –
“Em ti serão benditas todas as famílias da terra.” Beal e Carson, com relação a essa
universalização, dizem que:
103
Ibid., p. 1319.
104
Ibid.
105
Ibid., p. 1322–1323.
106
Ibid., p. 1323.
49
ressaltados. Diante desses primeiros versos do livro, o crente verdadeiro é conduzido a
segurança e certeza salvação ao ver a ratificação das promessas, bem como a confirmação
da eficácia da obra de Cristo ao seu favor, sendo assim, conduzido à certeza da
entronização obtida, na escatologia inaugurada, em Cristo Jesus, sua morte, e
ressurreição. Ainda no capítulo primeiro, nos versos 17 e 18, as palavras de Jesus a João
são altamente confortadoras: “...Não temas; eu sou o primeiro e o último e aquele que
vive; estive morto, mas eis que estou vivo pelos séculos dos séculos e tenho as chaves da
morte e do inferno”. Essa declaração do Senhor confere total segurança e certeza da
salvação ao verdadeiro crente.
Olhando para as sete cartas, escrita as sete igrejas, percebe-se uma repetição ao
final de cada carta – à igreja em Éfeso é dito: “Ao vencedor, dar-lhe-ei que se alimente
da árvore da vida que se encontra no paraíso de Deus” (2.7); à igreja em Esmirna é dito:
“o vencedor de maneira alguma sofre dano da segunda morte”. (2.11); à igreja em
Pérgamo é dito: “Ao vencedor, dar-lhe-ei do maná escondido, bem como lhe darei uma
pedrinha branca, e sobre essa pedrinha escrito um nome novo, o qual ninguém conhece,
exceto aquele que o recebe”. (2.17); à igreja em Tiatira é dito: “Ao vencedor, que guardar
até ao fim as minhas obras, eu lhe darei autoridade sobre as nações” (2.26); à igreja em
Sardes é dito: “O vencedor será assim vestido de vestiduras brancas, e de modo nenhum
apagarei o seu nome do Livro da Vida;” (3.5); à igreja em Filadélfia a dito: “Ao vencedor,
fá-lo-ei coluna no santuário do meu Deus, e daí jamais sairá;” (3.12); à igreja em
Laodiceia é dito: “Ao vencedor, dar-lhe-ei sentar-se comigo no meu trono, assim como
também eu venci e me sentei com meu Pai no seu trono.” (3.21). Cada expressão dessa é
acompanhada da exortação para ouvir o que o Espírito diz. O fato é que, em cada uma
dessas declarações de recompensa, vê-se a segurança do crente de que ele receberá sua
herança, uma vez que esse “vencedor” é o mesmo que fala, o próprio Senhor Jesus, o
representante federal, Ele que venceu e conquistou tudo isso para o seu povo, e também
é Ele quem garante que o crente prevaleça no caminho até o fim.
50
perseverar na fé.107 Ainda na perspectiva de fundamentação da doutrina da segurança ao
olhar para o capítulo 19, João mostra o triunfo e júbilo no céu por conta da vitória do
Senhor (vv. 7-10); no capítulo 20 ele mostra a vitória final sobre Satanás (vv. 11-15), bem
como a aplicação do juízo sobre os ímpios.
Para finalizar, os dois últimos capítulos do livro de Apocalipse trazem ainda mais
evidências que fundamentam a segurança e certeza do crente, uma vez que, João mostra
o cumprimento final, bem como o cumprimento do novo céu e nova terra. No versículo 5
e 6 do capítulo 21, percebe-se um retorno ao que fora dito no início do livro, o Senhor
testifica a veracidade das Suas palavras (21.5 – 1.1,2) e o tema do vencedor é retomado
mais uma vez (21.6,7 – 2.7,11,17,26; 3.5,12,21). No capítulo 22, João descreve a Nova
Jerusalém, destacando suas características de templo, onde se percebe uma forte alusão
ao Éden, ao citar a presença da árvore da vida, dos rios. No verso 4, tem-se a gloriosa
promessa de que os crentes verão a face do Senhor e no verso 6, tem-se a coroação da
segurança e certeza do crente, a saber a autenticação do Senhor às suas palavras: “Disse-
me ainda: Estas palavras são fiéis e verdadeiras. O Senhor, o Deus dos espíritos dos
profetas, enviou seu anjo para mostrar aos seus servos as coisas que em breve devem
acontecer”.
1.4 Conclusão
Ao finalizar esta investigação em busca da fundamentação da doutrina da
segurança e certeza da salvação no Antigo e Novo Testamento, a pesquisa encontra em
todo o cânon, sobejas evidências que apontam para essa maravilhosa doutrina.
Respondendo assim os questionamentos levantados inicialmente e mostrando que a
segurança e certeza da salvação é possível de ser obtida à luz da Palavra de Deus, observa-
se a fidelidade do SENHOR em manter o seu pacto eterno; bem como de manter o pacto
com o homem nas suas dispensações com Adão, Abraão, Isaque, Jacó, Moisés, Davi,
Cristo e a igreja; observa-se também a imutabilidade do SENHOR e a incondicionalidade
da realização das bênção redentivas do pacto; o grande amor de Deus e a tratativa com o
seu povo; o cumprimento das promessas em Cristo, bem como a obediência de Cristo e a
perfeita execução da sua obra da redenção, a saber sua vida, morte, ressurreição e
ascensão; a garantia do descanso final e o selo do Espírito Santo. Tudo isso é visto em
107
LAWSON, Fundamentos da graça: 1.400 A.C. - 100 D.C., p. 789.
51
toda à Escritura e, totalmente, suficiente para conduzir o crente a gozar da segurança e
certeza da sua salvação.
52
2 DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO E CONFESSIONAL DA DOUTRINA
2.1 Introdução
Com o crescimento das seitas e heresias que tentavam invadir a igreja, foram
surgindo as formulações de fé. Nesse período levantaram-se homens, os chamados
apologistas. Um destaque é dado aos pais anti-ginósticos, Irineu (130 – 202), Hipólito
(170 – 236) e Tertuliano (160 – 220). Esses formularam doutrinas sobre Deus, o homem
e a história da redenção, sobre a pessoa e obra de Cristo e sobre a salvação, a igreja e as
1
BERKHOF, Louis, A História das Doutrinas Cristãs, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas,
1992, p. 38–40.
2
Ibid., p. 40.
3
LAWSON, Steven J., Pilares da graça: AD 100 - 1564, 1. ed. São José dos Campos, SP: Editora Fiel,
2013, p. 84.
4
Ibid.
5
Ibid., p. 100.
54
últimas coisas. No que toca à salvação, que é o nosso maior foco nesta pesquisa, vê-se
que: Irineu enfatizou a necessidade da fé como pré-requisito para o batismo, a qual incluía
rendição da alma e, conduzia a uma vida santa e, por sua vez, o homem seria regenerado
pelo batismo. Tertuliano, não apresenta muitas mudanças quanto ao que fora
desenvolvido por Irineu, mas foca no ponto de vista de que o homem, através do
arrependimento, obtém a salvação, levando ao desenvolvimento da penitência como
forma de expurgar os pecados, ou seja, para que os pecados fossem satisfeitos diante de
Deus.6
Pelágio (354 – 430)10 é um nome que tem grande destaque pelas distorções às
doutrinas quanto à aplicação da redenção. Berkhof diz que: “Sua concepção do pecado e
seus resultados levaram-no a negar a absoluta necessidade da graça de Deus em Cristo
6
BERKHOF, Louis, A História das Doutrinas Cristãs, p. 63.
7
Ibid., p. 68–69.
8
LAWSON, Pilares da graça: AD 100 - 1564, p. 180.
9
Ibid., p. 266.
10
LOPES, Edson, Fundamentos da teologia da salvação, 1. ed. São Paulo: Mundo Cristão, 2009, p. 15–
20.
55
para a salvação e a considerar ser perfeitamente possível a um homem atingir a salvação
mediante a guarda da lei”.11 Para ele, a graça, consiste no bem da natureza, bem como da
pregação e o exemplo de Cristo, sendo o primeiro essencial e o segundo não tão
necessário à salvação, embora pudesse facilitar a condução do homem.
Berkhof destaca na teologia de Agostinho, que tudo ele atribuía à graça de Deus,
no que toca a seu sistema doutrinário. Entre as doutrinas agostinianas e pelagianas, surgia
a posição intermediária, que ficou conhecida como semi-pelagianismo. Quanto às
posições semi-pelagianas, Berkhof mostra que suas posições intermediárias negavam a
total incapacidade do homem para realizar o bem, ao mesmo tempo que admitiam serem
incapazes em cumprir obras salvadoras sem a assistência da graça. Segundo o pensamento
deles, a graça de Deus dá o apoio necessário sem jamais comprometer o livre-arbítrio do
homem. Com isso, o que prevalece, no final, é a vontade do homem determinando o
11
BERKHOF, Louis, A História das Doutrinas Cristãs, p. 185.
12
MCGRATH, Alister E., Teologia Histórica: Uma introdução à história do pensamento cristão, 1. ed.
São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 49–51. O autor vai apresentar os contrastes entre o pensamento de
Agostinho e as posições heréticas de Pelágio.
13
BERKHOF, Louis, A História das Doutrinas Cristãs, p. 186.
14
BEEKE, Joel R., A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, 1. ed. Recife-
PE: Os Puritanos, 2003, p. 29.
56
resultado, crer e continuar na fé, sendo que a graça se faz mister apenas para fortalecer a
fé. Com esse tipo de pensamento se nega por completo a graça irresistível.15
Como bem se vê, a doutrina da segurança é tratada apenas de forma muito tímida
e, de certa forma, indefinida, deixando margem para uma insegurança que mais tarde vai
ser substituída por o “Cativeiro Babilônico da Igreja”, como trata Lutero em seu livro que
carrega esse título, mostrando as atrocidades cometidas pela Igreja na Idade Média.19
McGrath declara acerca dessa obra:
15
BERKHOF, Louis, A História das Doutrinas Cristãs, p. 187.
16
LAWSON, Pilares da graça: AD 100 - 1564, p. 440.
17
Ibid., p. 464.
18
Ibid., p. 485,486.
19
LUTERO, Martinho, Do Cativeiro Babilônico da Igreja, São Paulo: Martin Claret Ltda., 2006.
57
A igreja havia se transformado em senhora do evangelho quando, na verdade,
devia ser sua serva.20
Martinho Lutero é um dos grandes expoentes que vai surgir para lutar contra as
distorções doutrinárias que imperavam naquele período.23 No que toca à doutrina da
segurança e certeza da salvação, vê-se que a segurança de sua salvação era algo que o
preocupava profundamente. Edson Lopes, fazendo uma leitura de Lutero, diz: “Sua
preocupação central na vida era com a salvação de sua alma”.24 Beeke aponta o insucesso
de Lutero ao procurar segurança por meio da igreja, isto é, dos sacramentos e do sistema
penitencial, mostrando que ele só consegue encontrar na “graça de Deus em Cristo,
mediante quem o perdão dos pecados é pleno e não depende do mérito humano”.25 Entre
as noventa e cinco teses afixadas por Lutero está a tese de número 52, onde o reformador
combate a doutrina herética da “segurança por carta de perdão (indulgência)”26 dizendo:
“A certeza da salvação por cartas de perdão é vã, mesmo que o comissário, ou melhor,
mesmo que o próprio papa desse sua alma sobre ela.”27
Beeke segue mostrando, em sua leitura de Lutero, que sua doutrina da segurança
é pautada na experiência religiosa, ou seja, “a abordagem de Lutero à fé e à segurança
centrada em Cristo, tinha raízes na experiência pessoal”.28 Nisso vê-se que na teologia de
Lutero a doutrina da segurança está intimamente e imediatamente ligada à doutrina da fé.
Beeke, declara que “Lutero apresentou o Cristianismo como uma crença segura no Deus
vivo, que revela a si mesmo e abre o seu coração, em Cristo, aos pecadores”. 29 A
20
MCGRATH, Teologia Histórica, p. 183.
21
BETTENSON, Henry (Org.), Documentos da Igreja Cristã, 5. ed. São Paulo: Aste, 2007, p. 192.
22
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 31.
23
Ibid., p. 40.
24
LOPES, Fundamentos da teologia da salvação, p. 24.
25
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 39,40.
26
MCCRATH, Alister E., Teologia sistemática, histórica e filosófica: Uma introdução a teologia cristã,
1. ed. São Paulo: Shedd Publicações, 2005, p. 97–98.
27
LUTHER, Martin; JACOBS, Henry Eyster; SPAETH, Adolph, Works of Martin Luther, with
introductions and notes, [s.l.]: Philadelphia, A.J. Holman company, 1915, p. 34.
28
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 40.
29
Ibid.
58
semelhança de Agostinho que desafiou o pelagianismo, Lutero também desafiou o semi-
pelagianismo, resultado da junção feita pela Igreja Católica das posições de Pelágio e
Agostinho, afirmando que “a segurança reside no direito inato de todo cristão, uma vez
que é privilégio do crente saber subjetivamente que Deus é gracioso para com ele em Seu
Filho”.30
Ainda dentro dessa leitura, Beeke mostra que além da doutrina da fé, está também
atrelada à segurança a doutrina da predestinação, as quais, por sua vez, são inseparáveis
das promessas de Deus.31 Com relação à fé ele mostra que “a fé se apega à promessa de
Deus, concorda com ela e assegura ao crente que Deus é graciosamente inclinado a ele
em Cristo Jesus”.32 Outro ponto importante do entendimento de Lutero quanto a essa
doutrina é também destacado por Beeke em sua tese, que é a postura firme de Lutero de
que “a falta de segurança é incompatível com o fato de ser um cristão autêntico”.33
Embora tenha essa posição, Lutero evitava dizer que o duvidoso não era um cristão, mas
aponta a o comportamento do duvidoso como um comportamento semelhante ao de um
incrédulo, quando esse não tem segurança.34 Lutero entedia também que essa segurança
ou certeza podia ser, por causa do pecado contumaz na vida do crente, enfraquecida e até
mesmo perdida.35 Lutero ainda faz uma distinção entre segurança (securitas) e certeza
(certitude). Quanto à segurança, ele mostra que “visa ao conforto à parte de Deus”36 e,
com isso, “poderia significar uma falta de cuidado, uma vez que a preocupação com a
justiça e a glória divina seriam secundárias”.37 Com relação à certeza, ele diz que “é um
dom divino recebido pela fé”.38 Mesmo com esse posicionamento experimental, Lutero
evitou dizer que “a falta de segurança poderia ameaçar, muito menos destruir a graça
salvadora”.39 Por fim, Beeke ainda destaca a relação que Lutero faz entre a segurança e
as obras, mostrando que ele entendia que “a segurança deve também ser apoiada pelo
30
Ibid.
31
Ibid., p. 41.
32
Ibid.
33
Ibid., p. 42.
34
Ibid., p. 43.
35
Ibid., p. 43,44.
36
Ibid., p. 43.
37
Ibid., p. 44.
38
Ibid.
39
Ibid., p. 45.
59
testemunho de uma boa consciência baseada nas obras”,40 sem que isso fira a
proeminência da fé.
Lawson vai também fazer uma leitura da teologia de Lutero e destacar a relação
da segurança com as doutrinas da eleição e da perseverança dos santos.41 Ele declara que
“Lutero era confiante sobre a eterna preservação de cada crente. Ele entedia que nenhum
dos eleitos pode ser arrebatado da mão do Pai”.42 Lawson afirma também que Lutero
sabia que “os que estão em Cristo jamais perderão sua salvação”,43 bem como sabia que
os eleitos são mantidos seguros por Deus, uma vez que “a eleição faz o povo de Deus
eternamente seguro, por que Deus completa o que começa”.44
40
Ibid., p. 45,46.
41
LAWSON, Pilares da graça: AD 100 - 1564, p. 532,533.
42
Ibid., p. 532.
43
Ibid.
44
Ibid., p. 533.
45
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 48.
46
Ibid., p. 49.
47
Livro de concórdia, 6. ed. Porto Alegre: Concórdia, 2006, p. 548. Já na introdução à fórmula de
concórdia essa divisão fica evidente, onde lê-se: “Na esteira da morte de Lutero (1546) e com a derrota
militar dos príncipes luteranos (1547), uma série de controvérsias sobre a pura doutrina da Reforma
ameaçava dividir os luteranos em dois partidos: um partido cada vez mais isolado, o gnesioluterano (gnesio,
do grego: autêntico), que se pretendia defensor dos ensinamentos originais de Martinho Lutero,
inicialmente liderado por Mathias Flacius, e o outro, o filipista, composto por seguidores de Filipe
Melanchthon, que levaram a extremos as coisas discernidas por seu mentor.”
60
2.2.4.2 Reforma na Inglaterra
I. Huldrych Zuínglio
Há ainda outra forte ênfase que caracteriza a teologia de Zuínglio, que é a ação do
Espírito Santo nessa interação de segurança e certeza do crente, também destacada por
Beeke. A leitura feita por Beeke mostra que Zuínglio além de mostrar a ação do Espírito
testificando as verdades salvíficas no coração do crente, também fortalece a segurança
por meio da santificação e das boas obras.55
48
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 49.
49
Ibid.
50
Ibid., p. 50.
51
Ibid.
52
Ibid., p. 53.
53
Ibid., p. 50.
54
Ibid., p. 51.
55
Ibid., p. 52.
61
II. Heinrich Bullinger
56
LAWSON, Pilares da graça: AD 100 - 1564, p. 608–614.
57
Ibid., p. 612.
58
Ibid., p. 614.
59
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 54.
60
LAWSON, Pilares da graça: AD 100 - 1564, p. 607.
61
Documentos históricos do protestantismo, disponível em: <http://www.anglicandiocese.com.br/wp-
content/uploads/2015/04/Documentos-Historicos-do-Protestantismo.pdf>, acesso em: 5 set. 2016, p. 208.
62
BULLINGER, Heinrich, Segunda Confissão Helvética, disponível em:
<http://www.monergismo.com/textos/credos/seg-confissao-helvetica.pdf>, acesso em: 3 out. 2016.
63
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 56.
64
Ibid., p. 58.
62
certeza de Bullinger o aspecto das boas obras como evidência da fé. Beeke diz que para
Bullinger “a fé é a fonte de toda graça; isso se evidencia na prática de boas obras”. 65
Ora, visto que o conhecimento da bondade de Deus nos serve bem pouco, a
não ser que nela nos faça descansar, excluído deve ser o conhecimento
misturado de dúvida, o qual não esteja firmemente em acordo consigo próprio;
pelo contrário, se põe em conflito consigo próprio. Com efeito, mui longe está
a mente do homem, visto ser cega e entenebrecida, de penetrar e se elevar até
o ponto de perceber a vontade de Deus! E também o coração, uma vez que
flutua em perpétua hesitação, longe está de permanecer seguro nesta
convicção! Daí importa, de outro lado, não só que a mente nos seja iluminada,
mas também que nos seja firmado o coração, para que a Palavra de Deus
obtenha pleno crédito entre nós.69
Calvino diz que “a segurança é parte integrante da fé”.70 Essa relação fica explicita
em sua definição de fé, onde se percebe a forte interação entre fé e segurança:
Portanto, podemos obter uma definição perfeita de fé, se dissermos que ela é o
firme e seguro conhecimento da divina benevolência para conosco, fundado
sobre a veracidade da promessa graciosa feita em Cristo, não só é revelado à
nossa mente, mas é também selado em nosso coração mediante o Espírito
Santo.71
65
Ibid.
66
LAWSON, Pilares da graça: AD 100 - 1564, p. 6637–648.
67
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 61.
68
Ibid.
69
CALVINO, João, As Institutas, 2. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2006, p. 31.
70
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 65.
71
CALVINO, As Institutas, p. 31.
63
Daí já se veem algumas das ênfases dadas pelo reformador quanto à relação – fé
e segurança atrelada, também, a outras essenciais doutrinas. McWilliams72 destaca essa
íntima interação apontando também para outro ponto onde Calvino define que “a fé é uma
confiança firme e sólida do coração, por meio do qual nós descansamos certamente na
misericórdia de Deus, que nos é prometido através do Evangelho”.73 McWilliams foca
nesse entrelaçamento da fé e segurança e passa a mostrar as interações disso com as outras
doutrinas, a saber: fé e a Palavra; fé e os sacramentos; o testemunho do Espírito;
segurança e eleição; a interação com a ação do homem, trabalhando aqui o silogismo
prático de Calvino; a interação da doutrina de Calvino e a Confissão de Fé de
Westminster.74 Beeke comentando essa definição de fé, proposta por Calvino, diz que
“nessa definição, Calvino asseverou uma estrutura trinitariana. A fé é a certeza da
promessa de Deus em Cristo, aplicada pelo Espírito”.75
72
MCWILLIAMS, David B., Calvin’s Doctrine of the Assurance of Faith, disponível em:
<http://www.sounddoctrine.net/Modern_Day_Reform_Teaching/David%20B.%20McWilliams/Calvin_as
suarance_of_faith.htm>, acesso em: 6 set. 2016.
73
CALVIN, John, Instruction in Faith (1537), [s.l.]: Westminster John Knox Press, 1949, p. 40.
74
MCWILLIAMS, Calvin’s Doctrine of the Assurance of Faith.
75
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 64.
76
Ibid., p. 61.
77
Ibid., p. 61,62.
78
CALVINO, As Institutas, p. 29.
79
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 62.
80
Ibid.
64
também: “Portanto, a fé, apreendendo o amor de Deus, tem as promessas da vida presente
e da vida futura [1Tm 4.8], bem como a firme certeza de todas as coisas boas, a qual,
porém, pode ser depreendida da Palavra”.81 Essa interação com as promessas centradas
em Cristo conduzem e fundamentam a fé, segurança e certeza do crente, uma vez que
Calvino expressa que “a fé se concentra nas promessas de Deus e é expressão do seu
amor, cujo cumprimento se acha em Cristo”.82
Beeke mostra também que Calvino confere forte ênfase ao testemunho do Espírito
Santo.83 Calvino afirma que o Espírito não só inicia a fé, mas também faz com que ela
crença.84 Beeke, em sua leitura de Calvino acerca da essência da fé, diz que:
Nessa perspectiva da aplicação da obra do Espírito, ele ainda afirma que: “Para
Calvino, a confiança objetiva de um crente, posta sobre as promessas de Deus como base
primária da segurança, deve ser subjetivamente selada pelo Espírito Santo”.86 Quanto a
esse selo, Calvino diz: “[...] o Espírito faz as vezes de um selo para marcar em nosso
coração estas mesmas promessas cuja certeza antes nos imprimiu à mente e ele toma o
lugar de um penhor para confirmá-las e estabelecê-las”.87
81
CALVINO, As Institutas, p. 52.
82
Ibid., p. 57.
83
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 63.
84
CALVINO, As Institutas, p. 59.
85
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 64.
86
Ibid., p. 93.
87
CALVINO, As Institutas, p. 62.
65
Deus, esse não é um crente verdadeiro”.88 Calvino diz “[...] os fiéis bem sabem ser filhos
de Deus [1Jo 3.2]. E de fato o sabem com certeza, porém firmados mais pela persuasão
da verdade divina do que instruídos por demonstração racional”.89 Mais adiante Calvino
diz que:
Afirmo que ninguém é fiel senão aquele que, arrimado na certeza de sua
salvação, zomba confiadamente do Diabo e da morte... somente
compreendemos realmente a bondade de Deus quando estamos plenamente
seguros dela.91
Essas asseverações de Calvino, como afirma Beeke, são motivo para controvérsias
e ataques incautos contra o reformador de Genebra da parte de William Cunningham 92 e
Robert Dabney93. Ambos afirmam categoricamente que Calvino errou ao fazer tais
asseverações. No entanto, Calvino também apresenta em seus escritos várias asseverações
qualificadoras que acabam lançando luz a esse ponto. Isso, portanto, dá ideia de uma
possível contradição. Para resolver essa questão basta olhar para a forma como Calvino
as sistematiza.94 Primeiramente, é importante observar que Calvino vai admitir que a
segurança é constantemente assaltada por dúvidas, tentações, lutas e provas normais, por
Satanás e a carne, e ainda, que a confiança em Deus é restringida pelo medo. 95 Calvino
também admite que não existe segurança perfeita nesta vida, isso ocorre por conta da
perseguição da dúvida. Nessa perspectiva ele vai admitir também variáveis graus de fé.
Sendo assim Calvino mostra que “a fé, o arrependimento, a santificação e a segurança são
progressivos”.96 Por admitir tais posições depois de ter asseverado que “se alguém crê,
88
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 64.
89
CALVINO, As Institutas, p. 39.
90
Ibid., p. 41.
91
Ibid.
92
CUNNINGHAM, William I., The reformers; and the theology of the reformation: Edited by his
literary executors, [s.l.]: Clark. London: Hamilton, Adams & C., 1862, p. 119–122.
93
DABNEY, Robert Lewis, Discussions: Evangelical and Theological, [s.l.]: Banner of Truth Trust,
1967, p. 216.
94
BEEKE, A Busca da Plena Segurança - O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 67.
95
Ibid., p. 67.
96
Ibid., p. 68.
66
mas não tem convicção de que é salvo por Deus, esse não é um crente verdadeiro”,97 surge
a acusação de ser contraditório, como defendido por Cunningham.98
Mesmo quando os crentes são atormentados por dúvidas carnais, seu espírito
confia na misericórdia de Deus, invocando-o em oração e descansando nele
por meio dos sacramentos. Especialmente pela oração e pelos sacramentos que
serve como instrumento para a segurança, a fé é fortalecida nas lutas contra a
descrença.104
97
Ibid., p. 64.
98
Ibid., p. 70.
99
Ibid., p. 71.
100
Ibid.
101
Ibid., p. 73.
102
Ibid., p. 74.
103
CALVINO, As Institutas, p. 43.
104
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 76.
105
Ibid., p. 79.
106
Ibid., p. 82.
107
Ibid., p. 85.
67
soteriológicas que promovem a segurança e certeza na vida do crente, a saber: a eleição
e preservação do Pai em Cristo; bem como a união do crente com Cristo; e ainda a
confirmação das promessas de Deus em Cristo por meio da ação do Espírito.108
108
Ibid., p. 85–91.
109
Ibid., p. 97.
110
BEEKE, Joel R., William Perkins sobre a predestinação, a pregação e a conversão, in: Calvinismo na
prática, 1. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, p. 141.
111
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 100.
112
Ibid., p. 102.
113
Ibid., p. 103.
114
MCCRATH, Alister E., Teologia sistemática, histórica e filosófica: Uma introdução a teologia
cristã, p. 115,116; GONZALEZ, Justos L., Uma história do pensamento cristão: da reforma
protestante ao século 20, 1. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p. 273,274.
68
ensinos.115 McGrath, por sua vez, afirma que Beza, em sua obra composta de três volumes
“Tratados Teológicos”, produzida entre 1570 – 1582, afirma que, nessa obra, Beza “faz
uma exposição bem fundamentada e racionalmente defensável da teologia de Calvino, na
qual algumas pendências dessa teologia (principalmente a doutrina da predestinação e
expiação) são esclarecidas”.116 Beeke, por sua vez, diz que Beza foi um apoiador
incondicional da teologia de Calvino. Embora isso fosse verdade Beza, por ser mais
racionalista do que Calvino, estava disposto a ir além do mesmo.117
115
GONZALEZ, Justos L., Uma história do pensamento cristão: da reforma protestante ao século 20,
p. 274.
116
MCGRATH, Teologia Histórica, p. 191. Embora faça essa asseveração, McGrath também aponta que
essa questão gera controvérsias entre os historiadores, uma vez que alguns, como Gonzalez, afirmam que
Beza na verdade distorceu a teologia de Calvino, enquanto que outros dizem que ele apenas concluiu
questões que Calvino deixou em aberto.
117
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 106,107.
118
Ibid., p. 108.
119
Ibid., p. 108,109.
69
faltoso, Beeke destaca que para Beza “os crentes cuja a fé é fraca não obtêm segurança
porque são incapazes de responder à questão: ‘Como posso saber se sou eleito’”.120 Com
isso ele vai além do estabelecido por Calvino dando mais ênfase no testemunho exterior
de santificação e do testemunho interior do Espírito, colocando-os como dois pilares
equiparando-os a aplicação das promessas de Deus em Cristo, sendo portanto, maior a
ênfase no testemunho exterior de santificação.121 Logo, Beeke diz que, quanto ao
duvidoso, com base na sua leitura de Beza, o que se tem é:
O crente duvidoso que não pode negar que ama a Deus e ao próximo, e que
odeia o pecado e deseja a justiça, pode ser assegurado de sua eleição por causa
da continua obra de Deus em sua vida, mesmo quando não sente qualquer
recurso pela fé nas promessas de Deus ou pelo testemunho direto do
Espírito.122
Quanto ao uso do silogismo prático, Beza se utiliza com mais liberdade do mesmo,
conferindo assim uma ênfase mais aprofundada do que Calvino nas boas obras quanto
evidências da eleição eterna para encorajar e trazer segurança e certeza ao crente
duvidoso.123
120
Ibid., p. 111.
121
Ibid.
122
Ibid., p. 113.
123
Ibid., p. 114.
124
MATOS, Alderi Souza, Fundamentos da Teologia Histórica, 2. ed. São Paulo, SP: Mundo Cristão,
2008, p. 171.
125
Ibid., p. 173.
70
O Concílio de Trento, em resposta à doutrina da justificação defendida por Lutero,
apresentou quatro seções que versavam respectivamente quanto à natureza da
justificação, à natureza da justiça justificadora, à natureza da fé justificadora e por fim, à
certeza da salvação.126 No que toca ao último ponto, a certeza da salvação, como bem
resume McGrath, Lutero e os reformadores defendiam que:
Uma pessoa podia ter certeza da sua salvação. A salvação era alicerçada na
fidelidade de Deus às suas promessas de misericórdia; deixar de ter certeza da
salvação era, na verdade, o mesmo que duvidar da confiabilidade de Deus. E,
no entanto, essa certeza não deve ser vista como uma confiança suprema de
Deus sem nenhum traço de dúvida. Fé não é o mesmo de certeza; apesar do
alicerce teológico da fé cristã permanecer firme, a percepção humana desse
alicerce e seu compromisso com o mesmo podem vacilar. 127
[...]quando cada qual olha para si mesmo e para sua fraqueza e falta de
preparação, pode recear e temer pela sua remissão [cân. 13], visto ninguém
poder saber com certeza de fé, a qual não pode estar sujeita a erro algum, que
sele conseguiu a graça de Deus.131
126
MCGRATH, Teologia Histórica, p. 210.
127
Ibid., p. 213.
128
Concílio Ecumênico de Trento - MONTFORT, disponível em:
<http://www.montfort.org.br/bra/documentos/concilios/trento/#sessao6>, acesso em: 26 set. 2016.
129
Ibid.
130
Ibid.
131
Ibid.
71
revelada de maneira especial e rara, enquanto que para Calvino é especial e normativa,
por ser essência da fé; para o Concílio e Trento ela é separada da Palavra, enquanto que
para Calvino ela está sempre envolvida com a Palavra.132
I. William Perkins
William Perkins (1558 – 1602),134 foi um grande teólogo e escritor prolífico, que
mesmo tendo tido uma morte prematura, aos 44 anos, por doença renal, deixou um legado
literário que suplantava a obra de Calvino, Beza e Bullinger combinados. É considerado
como um elo de transição da teologia dos reformadores ao pensamento puritano que
posteriormente é sistematizado na Confissão de Fé de Westminster. Em especial, ele
promove esse diálogo entre o pensamento de Beza e a Confissão de Westminster.135
Perkins ficou conhecido por sua preocupação com a salvação dos homens pecadores
promovendo a ligação da segurança e certeza da salvação com a doutrina da
132
BEEKE, Joel R., Espiritualidade Reformada - Uma Teologia Prática para a Devoção a Deus, 1. ed.
São José dos Campos, SP: Fiel, 2014, p. 80.
133
Para mais sobre os Puritanos ver: MCCRATH, Alister E., Teologia sistemática, histórica e filosófica:
Uma introdução a teologia cristã, p. 117,118; MATOS, Fundamentos da Teologia Histórica, p. 87–91;
MCGRATH, Teologia Histórica, p. 193; GONZALEZ, Justos L., Uma história do pensamento cristão:
da reforma protestante ao século 20, p. 295–302.
134
BEEKE, William Perkins sobre a predestinação, a pregação e a conversão, p. 121–145.
135
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 119.
72
predestinação, a qual fora o seu carro chefe. Beeke escrevendo acerca de Perkins e esse
compromisso diz:
Perkins acreditava que uma concepção bíblica da soberana graça de Deus, era
vital para o consolo e a segurança espiritual. Ele acreditava que a predestinação
que operava experimentalmente na alma dos crentes era inseparável da
predestinação soberana em Cristo. Longe de ser severa e insensível, a
predestinação soberana era a base para sobre a qual a fé experimental poderia
ser construída. Ela era a esperança, a expectativa e a garantia de salvação para
o verdadeiro crente.136
Perkins foi grandemente influenciado por Beza. Ele fez uso do método de Beza
para tratar de forma confortante pessoas em situação de dúvida quanto à sua salvação.
Assim como Beza em relação a Calvino, Perkins vai mais além, chegando a desenvolver
uma ordo saluts (ordem da salvação) experiencial que dava ao duvidoso a capacidade de
examinar seu coração quanto à fé e à dúvida para assim poder buscar uma mínima
evidência de predestinação, baseada no fundamento da obra de Cristo.137 Essa ordem da
salvação proposta por Perkins, a qual é um desenvolvimento da doutrina proposta
inicialmente por Beza, fica conhecida como supralapsarianismo,138 a qual propõe que
“Deus primeiramente decidiu o fim – a manifestação de sua glória na eleição e na
reprovação – antes de considerar os meios, tais como criação e queda”.139 Como citado
acima, Perkins desenvolve essa doutrina asseverando sempre a centralidade de Cristo. Ele
também dá grade ênfase na pregação como sendo o meio de quebrar o coração do pecado,
bem como assevera a teologia do pacto mostrando, como diz Beeke, que “o principal
meio que Deus usa para executar seus decretos é a aliança”.140
136
BEEKE, William Perkins sobre a predestinação, a pregação e a conversão, p. 123.
137
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 120,121.
138
GONZALEZ, Justos L., Uma história do pensamento cristão: da reforma protestante ao século 20,
p. 280–281. Nesse ponto Gonzalez destaca os mais importantes teólogos da ortodoxia calvinista, da Suíça,
os quais surgiram com a morte de Beza. São eles Benedito e Francisco Turretin (pai e filho). Turretin vem
a ser o grande opositor a ordem dos decretos proposta pelo supralapsarianismo e sustenta a posição de que
Deus decretou primeiro criar a humanidade; depois permitir a queda; em seguida eleger alguns da massa
de perdição, enquanto permitindo a outros permanecer em sua corrupção e miséria; depois enviar Cristo ao
mundo como salvador do eleito; e por fim chamar estes para fé, justificação, santificação e final
glorificação. A posição é chamada de infralapsarianismo.
139
BEEKE, William Perkins sobre a predestinação, a pregação e a conversão, p. 125.
140
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 121.
73
Segurança objetiva habilita o pecador a ver seus pecados como perdoáveis à
parte do entendimento pessoal de tal perdão. O segundo tipo, a segurança
subjetiva, é a plena segurança que habilita o crente a crer que Deus, por causa
de Cristo, pessoalmente nos perdoa de todo os pecados. 141
141
Ibid., p. 124.
142
Ibid., p. 129.
143
BEEKE, Espiritualidade Reformada - Uma Teologia Prática para a Devoção a Deus, p. 129.
144
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 129.
145
BEEKE, William Perkins sobre a predestinação, a pregação e a conversão, p. 141.
146
Ibid.
147
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 131.
148
KEDDIE, Gardan J., Unfallible Certenty of the Pardon of Sinne and Life Everlasting, The Evangelical
Quarterly, p. 230–244, p. 243. Nessa publicação o autor destaca que por conta dessa ênfase dada por
74
base primária da salvação, a saber, a obra soberana do Pai, a obra redentora do Filho e a
obra aplicativa do espírito.149 Reconhecendo a fraqueza e falta de fé do crente, Perkins
declara acerca da segurança que “pouco a pouco é concebida em uma forma de raciocínio
ou silogismo prático enquadrado na mente pelo Espírito Santo”150. Segue-se um exemplo
do silogismo prático de Perkins:
Perkins vai pontuar ainda o lugar dos frutos (ou boas obras) na vida do eleito,
deixando claro que são fruto do decreto divino e da segurança pessoal. Dentro desses
frutos ele coloca: Arrependimento, obediência e oração. Como agentes fortalecedores ele
destaca a importância dos sacramentos na vida do eleito. Contudo, assim como é visto em
Calvino, Perkins também admite a possibilidade de enfraquecimento da certeza por
decorrência de forte tentação na vida do crente.
Perkins a experiência é interpretada por alguns teólogos como um “pietismo incipiente”, uma vez que a
premissa menor aponta um sentimento ou convicção sobre a condição própria do sujeito.
149
BEEKE, William Perkins sobre a predestinação, a pregação e a conversão, p. 141.
150
PERKINS, William, The work of William Perkins, 1. ed. London: John Legatt, 1626, p. 547.
151
Ibid.
75
2.3 Sistematização confessional da doutrina da segurança e certeza da
salvação
O Credo Niceno, que por sua vez, sofre alterações para suprir algumas questões
de cunho apologético, o qual fora primeiramente apresentado no Concílio de Nicéia (325)
por Eusébio de Cesaréia, como sendo o credo de sua própria igreja; nesse concílio é
152
TRUEMAN, Carl R., O imperativo confessional, 1. ed. Brasília, DF: Editora Monergismo, 2012,
p. 120–123.
153
BETTENSON, Henry (Org.), Documentos da Igreja Cristã, p. 60–61.
154
TRUEMAN, O imperativo confessional, p. 121.
76
apresentado, por fim, como Credo de Nicéia, sendo assim um aperfeiçoamento do credo
proposto por Eusébio com a finalidade de combater a heresia do arianismo; por fim tem
sua formulação final em 451, no Concílio de Constantinopla, onde fora lido e aprovado,
ficando conhecido como Credo Niceno-constantinopolitano. 155
O Credo Atanasiano,156 embora diferindo dos outros credos por não ter sido
formalizado em um concílio ecumênico, o credo atanasiano tem grande importância para
a cristandade, tanto na igreja do Oriente quanto na igreja do Ocidente. Schaff destaca
nesse credo que “ele começa e termina com a declaração solene de que a fé católica na
Trindade e da Encarnação que aqui se apresenta é a condição indispensável de salvação,
e que aqueles que o rejeitam serão perdidos para sempre”157. A ideia de Schaff é mostrar
que o credo atanasiano “requer de todo aquele que seria salvo a crença no único Deus
verdadeiro e, Pai, Filho, e Espírito Santo, um em essência, três em pessoas, e em um Jesus
Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem vivendo em uma pessoa”158.
155
BETTENSON, Henry (Org.), Documentos da Igreja Cristã, p. 61–64.
156
TRUEMAN, O imperativo confessional, p. 139–141.
157
PHILIP SCHAFF, Creeds of Christendom, with a History and Critical notes. Volume I. The History
of Creeds. - Christian Classics Ethereal Library, disponível em:
<https://www.ccel.org/ccel/schaff/creeds1.iv.v.html>, acesso em: 6 out. 2016, p. 39.
158
PHILIP SCHAFF, Creeds of Christendom, with a History and Critical notes. Volume I. The History
of Creeds. - Christian Classics Ethereal Library.
159
TRUEMAN, O imperativo confessional, p. 47–48.
77
Luterana; as Três formas de unidade, das Igrejas Reformadas; os Símbolos ou Padrões de
Westminster, da Igreja Presbiteriana.
Como destaca Trueman, o anglicanismo da reforma, “não era um meio termo entre
o protestantismo e o catolicismo, mas entre o catolicismo e o movimento anabatista”160.
Logo, “os Trinta e Nove Artigos da Religião, foram estabelecidos, em 1563, e estão
definindo a doutrina anglicana, em relação às controvérsias da Reforma Inglesa” 161. No
que toca à segurança e certeza da salvação, como é o foco dessa pesquisa, observa-se a
ligação dessa doutrina a duas fundamentais doutrinas, a saber, a doutrina da justificação
e a doutrina da predestinação.
Somos reputados justos perante Deus, somente pelo mérito de nosso Senhor e
Salvador Jesus Cristo pela Fé, e não por nossos próprios merecidos e obras.
Portanto, é doutrina mui saudável e cheia de consolação que somos justificados
somente pela Fé, como se expõe mais amplamente na Homilia da
Justificação.162
160
Ibid., p. 152.
161
CRANMER, Thomas, Os 39 Artigos da Igreja Anglicana.
162
Ibid.
163
Ibid.
164
Ibid.
78
É interessante também a observação quanto à adoção dos credos, tal qual se vê no
artigo 8, onde diz que os credos “devem ser inteiramente recebidos e cridos; porque se
podem provar com autoridades inegáveis das Sagradas Escrituras”.165 Isso aponta para
preocupação de ligar-se a herança credal católica da igreja primitiva.166
Creio que Jesus Cristo, verdadeiro Deus, gerado do Pai desde a eternidade, e
também verdadeiro ser humano, nascido da virgem Maria, é meu Senhor. Ele
perdoou a mim, pessoa perdida e condenada, e me libertou de todos os pecados,
da morte e do poder do diabo. Fez isto não com dinheiro, mas com seu santo e
precioso sangue e sua inocente paixão e morte. Fez isto para que eu lhe
pertença, seja obediente a ele em seu reino e lhe sirva em eterna justiça,
165
Ibid.
166
TRUEMAN, O imperativo confessional, p. 154.
167
Ibid., p. 155.
168
Confissão de Fé de Augsburgo, disponível em:
<http://www.monergismo.com/textos/credos/confissao_augsburgo.htm>, acesso em: 7 out. 2016.
79
inocência e felicidade, assim como ele ressuscitou da morte, vive e governa
eternamente. Isto é certamente verdade.169
[...] sabermos que fomos eleitos em Cristo para a vida eterna puramente
de graça, sem qualquer mérito nosso, e que ninguém pode arrancar-nos de sua
mão. Essa graciosa eleição, ele não apenas a promete com meras palavras, mas
também a protesta com juramento, e a selou com os santos sacramentos, dos
quais podemos lembrar-nos em nossas maiores tentações, com eles podemos
consolar-nos e, assim, apagar os dardos inflamados do diabo. 173
169
Documentos históricos do protestantismo, p. 46.
170
Para mais informações quanto ao contexto histórico ver introdução em: Livro de concórdia, p. 498–
501.
171
Ibid., p. 510.
172
Ibid.
173
Ibid., p. 534.
80
Ainda tratando de trazer esclarecimento por conta das antíteses e doutrinas
contrárias, falando da Justiça da fé, no capítulo III, é dito acerca da relação do Espírito
com a fé e consequentemente, de forma implícita, a segurança e certeza do crente:
Começando com a Confissão Belga, escrita em 1561, observa-se que sua origem
parte de um único homem, a saber, o protestante francês Guido de Brès. Essa confissão
fora adota como um dos padrões confessionais das igrejas reformadas continentais no
Sínodo de Dort, que aconteceu entre 1618-1619. Aqui encontram-se asseverações
importantes quanto à doutrina da segurança e certeza da salvação. Como visto nas demais
confissões apresentadas, há também uma aceitação integral aos credos ecumênicos, como
posto no artigo 9, que diz: “Por isso aceitamos de boa vontade, nessa matéria, os três
credos ecumênicos, a saber: o Apostólico, o Niceno e o Atanasiano; e aceitamos também
o que a igreja antiga determinou em conformidade com esses credos”175.
A forma como a confissão é composta já remete o leitor à segurança, uma vez que
os artigos são, em sua maioria, escritos em forma de credo, iniciando com a expressão
“cremos”. Diante disso, ao ler esse documento e fazer dele uma confissão pessoal, o
crente expressa plena confiança, segurança e certeza de salvação.
174
Ibid., p. 580.
175
DE BRÈS, Guido; URSINUS, Zacarias, Confissão Belga e Catecismo de Heidelberg, 3. ed. São Paulo:
Cultura Cristã, 2011, p. 12.
81
segurança com base nas obras, onde é dito: “[...] sempre duvidaríamos da nossa salvação,
levados de um lado para outro, sem certeza alguma, e nossa pobre consciência estaria
sempre aflita, a não ser que se apoiasse no mérito do sofrimento e da morte de nosso
Salvador”.176 Também no artigo 26, mostrando a eficácia de Cristo como advogado do
crente, ele cita textos que são chave para segurança e ponta para a necessidade que o
crente tem de dirigir-se a Deus com plena certeza do favor dele para com os seus filhos.177
176
Ibid., p. 23.
177
Ibid., p. 23–25.
178
TRUEMAN, O imperativo confessional, p. 164.
179
Ibid.
180
Ibid., p. 168.
181
DE BRÈS; URSINUS, Confissão Belga e Catecismo de Heidelberg, p. 39.
182
Ibid., p. 50.
82
tem-se asseveração de certeza, a saber: “[...] até nas minhas mais duras tentações tenho a
certeza de que ele me libertou da angústia e do tormento do inferno”.183 A pergunta 86,
traz em sua resposta a essa asseveração pela manifestação das obras como fruto da certeza
da fé verdadeira: “[...] para que, pelos frutos da fé, tenhamos a certeza de que nossa fé é
verdadeira”.184
Agora faz-se necessário que se abra um parêntese para trazer uma breve fala
acerca do que foram as reações por parte dos arminianos, que por sua vez, resultou nos
artigos dos remonstrantes.
183
Ibid., p. 51.
184
Ibid., p. 65.
185
TRUEMAN, O imperativo confessional, p. 164–165.
186
Ibid., p. 165.
187
Ibid., p. 164–165.
83
Com relação à segurança e certeza da salvação, percebe-se, como nos outros
documentos, a interação com outras doutrinas essenciais da sotereologia, como a eleição
e perseverança. No capítulo 1, artigo 12, é posto quanto à eleição:
Em oposição ao erro dos ensinos arminianos no que toca à eleição, como posto a
seguir: “Erro 7 - Nesta vida não há fruto, consciência ou certeza da eleição imutável para
glória, exceto a certeza que depende de uma condição mutável e incerta”,189 o documento
apresenta as seguintes refutações, as quais são de grande importância para promoção da
segurança e certeza do crente:
Refutação - Falar acerca de uma certeza incerta é não apenas absurdo, mas
também contrário à experiência dos santos. Sentindo sua eleição, eles se
regozijam junto com o apóstolo e glorificam este benefício de Deus (cf. Ef
1:12). Conforme o mandamento de Cristo, se regozijam junto com os
discípulos por seus nomes estarem escritos nos céus (Lc 10:20). Eles colocam
a consciência de sua eleição contra os dardos inflamados das tentações do
diabo, quando perguntam: Quem intentará acusação contra os eleitos de
Deus? (Rom 8:33).190
Os crentes podem estar certos, e estão certos, desta preservação dos eleitos para
salvação e da perseverança dos verdadeiros crentes na fé. Esta certeza ocorre
de acordo com a medida de sua fé, pela qual eles creem, com certeza, que são
e permanecerão verdadeiros e vivos membros da Igreja, e que têm o perdão
dos pecados e a vida eterna.191
188
Bíblia de Estudo de Genebra, 2. ed. Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil; Cultura Cristã, 2009,
p. 1775.
189
Ibid., p. 1777.
190
Ibid.
191
Ibid., p. 1783.
84
Seguindo a estrutura do documento, ele apresenta os erros relacionados a essa
afirmativa de que haja certeza de perseverança dos santos, isso como destacado a seguir:
“Erro 6 - Por sua própria natureza a doutrina da certeza da perseverança e da salvação
causa falsa segurança e prejudica a piedade, os bons costumes, orações e outros santos
exercícios. Ao contrário, é louvável duvidar desta certeza”.192 Para mais esse erro o
documento apresenta sua refutação:
Nesse ponto, tendo em vista a apreciação mais cuidadosa que será feita no
próximo capítulo, a pesquisa pontuará apenas as principais declarações contidas nesses
documentos que apontam diretamente para a doutrina da segurança e certeza da salvação.
192
Ibid., p. 1784.
193
Ibid.
194
Ibid., p. 1749.
195
Ibid., p. 1785.
196
WHITAKER, William, Os Artigos de Lambeth (1595), Monergismo, disponível em:
<http://www.monergismo.com/textos/credos/artigos-lambeth.pdf>, acesso em: 11 out. 2016. Nos Artigos
de Lambeth (1595) vê-se a doutrina da segurança e certeza da salvação sendo tratada com muita semelhança
ao que se tem nos Cânones de Dort. O Artigo 5, lê-se: “Uma fé verdadeira, viva e justificadora, e a
85
foi também grandemente influenciado pelo documento produzido por John Knox, a saber,
a Confissão Escocesa.197. De forma não tão direta percebe-se a consonância marcante
com as Três formas de Unidade da Igreja Holandesa. O fato é que o que se tem nos
Símbolos de Westminster é o suprassumo da teologia Reformada.
santificação do Espírito de Deus, não são perdidas nem extinguidas total ou finalmente do eleito”; e no
Artigo 6, lê-se: “O homem verdadeiramente fiel – isto é, alguém que recebeu a fé justificadora, está certo,
pela plena certeza de fé (‘plerophoria fidei’), da remissão dos pecados e da sua salvação eterna por meio
de Cristo”.
197
MATOS, Alderi Souza, Portal Mackenzie: História da Confissão de Fé de Westminster, disponível
em: <http://www.mackenzie.br/7060.html>, acesso em: 11 out. 2016. Nesse artigo o Dr. Alderi apresenta
um histórico bastante esclarecedor da composição dos Símbolos de Fé de Westminster, lançando luz ao
contexto histórico-político que, de certa forma, influenciou grandemente as resoluções principalmente pela
inclusão ativa dos escoceses.
198
Bíblia de Estudo de Genebra, p. 1793.
199
Ibid., p. 1795.
86
A segunda seção trata do fundamento da segurança:
II. Esta certeza não é simples persuasão conjectural e provável, fundada numa
falsa esperança, mas uma infalível segurança da fé, fundada na divina verdade
das promessas de salvação, na evidência interior daquelas graças nas quais
essas promessas são feitas, no testemunho do Espírito de adoção que testifica
com os nossos espíritos sermos nós filhos de Deus, sendo esse Espírito o
penhor da nossa herança e por quem somos selados para o dia da redenção.200
A terceira seção, por sua vez, traz a ideia da responsabilidade do crente buscar a
certeza, bem como a necessidade de gerar frutos provenientes dessa certeza. Aqui tem-se
o ponto de tenção entre a teologia dos reformadores e a teologia de Westminster, no que
toca a segurança da salvação ser ou não da essência da fé.201 Assim lê-se:
III. Esta segurança infalível não pertence de tal modo à essência da fé, que um
verdadeiro crente, antes de possuí-la, não tenha de esperar muito e lutar com
muitas dificuldades; contudo, sendo pelo Espírito habilitado a conhecer as
coisas que lhe são livremente dadas por Deus, ele pode alcançá-la sem
revelação extraordinária, no devido uso dos meios ordinários. É, pois, dever de
cada crente fazer toda a diligência para tornar certas a sua vocação e eleição, a
fim de que, por esse modo, seja o seu coração, no Espírito Santo, confirmado
em paz e deleite, em amor e gratidão para com Deus, em firmeza e alegria nos
deveres da obediência, que são os frutos próprios desta segurança. Este
privilégio está, pois, muito longe de predispor os homens à negligência. 202
Por fim, o último ponto tratado pela Confissão, diz respeito aos que podem ter a
segurança abala, estabelecendo que o eleito nunca ficará privado da semente de Deus e
da vida de fé, e será devidamente restaurado pelo Espírito Santo, em tempo oportuno,
como se lê:
IV. Por diversos modos, os crentes podem ter a sua segurança de salvação
abalada, diminuída e interrompida – negligenciando a conservação dela,
caindo em algum pecado especial que fira a consciência e entristeça o Espírito
Santo, cedendo a fortes e repentinas tentações, retirando Deus a luz do seu
rosto e permitindo que andem em trevas e não tenham luz mesmo os que
temem; contudo, eles nunca ficam inteiramente privados daquela semente de
Deus e da vida da fé, daquele amor a Cristo e aos irmãos, daquela sinceridade
de coração e consciência do dever; dessas bênçãos, a certeza de salvação
poderá, no tempo próprio, ser restaurada pela operação do Espírito, e por meio
delas eles são, no entanto, suportados para não caírem no desespero
absoluto.203
200
Ibid.
201
Esse ponto será explicado e desenvolvido no próximo capítulo, onde a teologia de Westminster será
melhor explanada.
202
Bíblia de Estudo de Genebra, p. 1795.
203
Ibid.
87
Pergunta 80: Os crentes verdadeiros poderão ter certeza infalível de que estão
no estado da graça e de que, neste estado, perseverarão até a salvação?
Resposta: Aqueles que verdadeiramente creem em Cristo, e se esforçam por
andar perante Ele com toda a boa consciência, podem, sem uma revelação
extraordinária, ter a certeza infalível de que estão no estado de graça e de que,
neste estado, perseverarão até a salvação, pela fé, baseada na verdade das
promessas de Deus, e pelo Espírito, que os habilita a discernir em si aquelas
graças às quais são feitas as promessas da vida, testificando ao seu espírito que
eles são filhos de Deus.204
Pergunta 81: Todos os crentes sempre têm a certeza de que estão no estado da
graça e de que serão salvos?
Por fim, no Breve Catecismo, pergunta 36, vê-se a segurança e certeza da salvação
em conexão direta com a santificação:
2.4 Conclusão
204
Ibid., p. 1811.
205
Ibid.
206
Ibid., p. 1830.
88
controvérsias, tanto por parte da Igreja Católica Romana como por grupos dissidentes do
protestantismo, como é o caso do Arminianismo. Contudo, é também animador ver como
ela foi tão bem defendida por sínodos e concílios que trabalharam para sedimentar o
entendimento correto da mesma.
89
3 A ÊNFASE PASTORAL DOS PURITANOS À DOUTRINA DA
SEGURANÇA E CERTEZA DA SALVAÇÃO NA CONFISSÃO DE FÉ
DE WESTMINSTER
3.1 Introdução
Assim sendo, neste capítulo final, a pesquisa trará considerações quanto a unidade
de pensamento que havia entre os puritanos acerca da segurança e certeza da salvação;
em seguida, seguirá com uma exposição de cada seção do capítulo XVIII da Confissão
de Fé de Westminster, apresentando um breve comparativo com o pensamento dos
teólogos protestantes e reformados; pontuado as suas ênfases com base no pensamento
de puritanos como Antony Burgess, Thomas Goodwin, os quais foram delegados na
Assembleia de Westminster, Thomas Brooks, John Owen e Thomas Watson, que também
contribuíram grandemente para o desenvolvimento da doutrina; trará ainda apresentação
do pensamento de teólogos que foram importantes para o desenvolvimento dessa
doutrina; e, por fim, exibirá uma breve apresentação da interação prática e pastoral da
doutrina proposta pelos puritanos.
É exatamente isso que é posto no capítulo XVIII da Confissão, que é o fruto dessa
unidade e urgência pastoral para o ensino e tratamento do povo de Deus. Em seguida a
pesquisa mostrará de forma mais detalhada essas ênfases, as quais estão diluídas nas
quatro seções do referido capítulo, em paralelo com o pensamento dos reformadores e
dos que vieram posteriormente.
1
BEEKE, Joel R., A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, 1. ed. Recife-
PE: Os Puritanos, 2003, p. 155.
2
Ibid., p. 155–163.
3
Bíblia de Estudo de Genebra, 2. ed. Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil; Cultura Cristã, 2009,
p. 1795.
91
A primeira seção desse capítulo começa apresentando três possibilidades de
segurança. A intenção, proposta nessa seção, é direcionar o povo de Deus a fugir da falsa
segurança e buscar à verdadeira segurança, bem como, direcionar aqueles que vivem sem
essa segurança e, conduzi-los ao consolo, à medida que, apresenta ao crente que é possível
que ele seja verdadeiramente salvo, embora não tenha consciência de segurança.
Há também aqueles que vão além, porque não só têm a Palavra de Deus por
oráculo certíssimo, nem negligenciam totalmente seus preceitos, mas até de
certa forma se deixam afetar pelas ameaças e promessas. A tais, na verdade,
atribui-se o testemunho da fé, mediante κατάχρησιν [Katáchrēsin – uso
impróprio], uma vez que não resistem à Palavra de Deus em manifesta
impiedade, nem a rejeitam nem a desprezam; pelo contrário, antes lhe exibem
certa aparência de obediência.6
4
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 164.
5
LEOPOLDO HEIMANN (Org.), Lutero o escritor, 1. ed. Canoas: Editora da ULBRA, 2005, p. 32. Aqui
o autor assevera que para Lutero, Tetzel representa uma figura antitética à figura do pastor verdadeiro, uma
vez que o mesmo, ao invés de pregar a reforma e o arrependimento, pregava falsa segurança espiritual.
6
CALVINO, João, As Institutas, 2. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2006, p. 33.
7
Ibid., p. 34.
8
Ibid.
92
displicência, de sorte que não examinam devidamente o próprio coração, como
seria de esperar. É provável que tais tenham sido aqueles em quem, conforme
o testifica João, ‘Nem mesmo Jesus confiava neles, porque conhecia a todos;
e não necessitava de que alguém testificasse do homem, porque ele bem sabia
o que havia no homem’ [Jo 2.24, 25].9
9
Ibid., p. 37.
10
TURRETINI, François, Compêndio de teologia apologética: volume 2, 1. ed. São Paulo: Cultura Cristã,
2011, p. 742.
11
BEEKE, Joel R.; PEDERSON, Rendall J., Paixão Pela Pureza: Conheça os Puritanos, 1. ed. São Paulo:
Publicações Evangélicas Selecionadas, 2010, p. 183–186.
12
BURGESS, Anthony, Spiritual refining: or A treatise of grace and assurance, [s.l.: s.n.], 2006, p. 27–
31.
13
Ibid., p. 31.
14
BEEKE; PEDERSON, Paixão Pela Pureza, p. 164–165.
15
BROOKS, Thomas, Céu na terra: um tratado sobre a certeza cristã, 1. ed. São Paulo: Publicações
Evangélicas Selecionadas, 2014, p. 151.
16
Ibid.
17
BEEKE; PEDERSON, Paixão Pela Pureza, p. 722–724.
93
saber, a falta de humilhação de espírito, ou seja, o réprobo não sente peso pelo seu pecado,
mas vive tranquilamente, não há arrependimento genuíno nele.18
J. C. Ryle, dedica algumas páginas do seu livro “Santidade” para tratar o assunto
da falsa segurança trazendo a memória “A mulher de Ló”. Nesse capítulo, ele faz um
grande alerta, principalmente aqueles que gozam de privilégios religiosos, que vivem
envoltos em uma capa de piedade, mas que, na verdade, não são nascidos de novo.22
18
WATSON, Thomas, A fé cristã: estudos baseados no Breve Catecismo de Westminster, 1. ed. São
Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 291.
19
LLOYD-JONES, D. Martyn, O Combate Cristão, 1. ed. São Paulo: Publicações Evangélicas
Selecionadas, 1991, p. 199.
20
Ibid., p. 200–203.
21
Ibid., p. 205.
22
RYLE, J. C., Santidade: sem a qual ninguém verá o Senhor, 2. ed. São José dos Campos, SP: Editora
Fiel, 2009, p. 218–238.
94
que todos são salvos e vão para o céu. Ele mostra a inconsistência dessa corrente
apontando para realidade do julgamento final (Hb 9.27). O segundo problema é o
legalismo, que, por sua vez, ensina que basta viver uma vida boa e cumprir a Lei de Deus
para ir para o céu. De igual modo, Sproul combate o Legalismo, apontando para Escritura
lembrando que ninguém pode ser salvo por obras da Lei (Rm 3.20; Gl 3.11). O terceiro e
último problema destacado por Sproul é sacerdotalismo, corrente que ensina que a
salvação é realizada por meio do sacerdote, por meio dos sacramentos e ou, por meio da
igreja. Combatendo esse ponto, Sproul aponta para os fariseus, que se apegavam as
ordenanças, mas agiam de maneira que demonstrava um mero cuidado com a forma, ou
seja, com o exterior.23
23
SPROUL, R. C., Posso Saber se Sou Salvo?, 1. ed. São José dos Campos, SP: Fiel, 2013, p. 40–51.
24
HODGE, A. A., Confissão de Fé de Westminster Comentada, São Paulo: Os Puritanos, 1999, p. 324.
25
Ibid.
26
Ibid.
27
Ibid., p. 325.
95
3.3.1.2 A possibilidade de verdadeira segurança28
Os crentes podem não só ter certeza de sua fé e de sua confiança e certeza, com
uma certeza não humana e falível, mas divina e infalível (que é maior ou menor
conforme a fé se veja mais forte ou mais fraca); mas tanto podem como devem
estar certos da graça de Deus e da remissão dos pecados, visto que, em sincera
contrição por seus pecados mediante fé genuína, apreendem a promessa da
misericordiosa graça em Cristo, repousam nele fiducialmente e assim tornam
seguros seus corações.31
28
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 166.
29
CALVINO, As Institutas, p. 31.
30
Ibid., p. 35.
31
TURRETINI, Compêndio de teologia apologética, p. 739.
32
BROOKS, Céu na terra, p. 21.
96
que vivem envoltos em falsa presunção, logo em seguida, dedica um sermão a solução
para resolver esse problema, mostrando evidências que atestam a verdadeira segurança.33
Diante disso, vê-se que a preocupação pastoral dos puritanos quanto a verdadeira
segurança do crente, é fruto de uma preocupação que vem de longe, fundamenta-se na
Escritura e toma seus exemplos dela, bem como alinha-se com o pensamento dos
reformadores. O cristão precisa crer que, de fato, a segurança é verdadeira e, assim, venha
usufruir dessa bênção maravilhosa e exclusiva dos verdadeiros eleitos.
33
BURGESS, Spiritual refining, p. 33–37.
34
BEEKE; PEDERSON, Paixão Pela Pureza, p. 558–565.
35
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 254.
36
LLOYD-JONES, D. M., O Supremo Propósito de Deus, São Paulo: Publicações Evangélicas
Selecionadas, 1996, p. 354.
37
RYLE, Santidade: sem a qual ninguém verá o Senhor, p. 146.
38
Ibid.
39
HODGE, Confissão de Fé de Westminster Comentada, p. 325.
40
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 167.
41
Ibid., p. 42.
97
acusações contra o reformador. Em Calvino lê-se: “Afirmo que ninguém é fiel senão
aquele que, arrimado na certeza de sua salvação, zomba confiadamente do Diabo e da
morte”.42 No que o pensamento do reformador se desenvolve, vê-se que há nos seus
escritos uma atenção para os qualificativos da segurança, assumindo que a fé tem graus
diferentes, ou seja, pode ser fraca ou forte, sendo assim podem existir pessoas que, por
terem uma fé fraca, não se sintam seguras como outras que tem a fé mais forte. Calvino
mostra ainda a impossibilidade de que alguém consiga, por causa da incidência do pecado,
uma segurança infalível e que nunca vacila, como já citado nessa pesquisa.43
42
CALVINO, As Institutas, p. 41.
43
Ibid., p. 43.
44
TURRETINI, François, Compêndio de teologia apologética: volume 1, 1. ed. São Paulo: Cultura Cristã,
2011, p. 486.
45
BROOKS, Céu na terra, p. 49.
46
WATSON, A fé cristã, p. 290.
47
Ibid., p. 291.
48
SPROUL, Posso Saber se Sou Salvo?, p. 25–36.
98
nenhuma de suas passagens, a Escritura diz que temos que saber o tempo exato de nossa
conversão”.49 Ele desenvolve seu argumento mostrando que a exortação de Pedro, em
1Pe 1.3-11, está indicando que: “pessoas podem estar em um estado de salvação sem
terem realmente a segurança de salvação”.50
Mais uma vez o que se tem é uma consistência contagiante do ensino dos
puritanos, mostrando que é possível que a pessoa esteja em estado de graça mesmo que
ela não tenha consciência disso em sua vida. A ênfase dos puritanos nesse ponto é, além
de consolar os duvidosos, motivar o crente de fé fraca a obter, no Senhor, a plena certeza
e gozar dos seus benefícios nessa vida.
49
Ibid., p. 30.
50
Ibid., p. 32.
51
Bíblia de Estudo de Genebra, p. 1795.
99
12, diz que os papistas torcem esse versículo “com o fim de estabelecer seu ímpio dogma
de que devemos viver sempre num estado de incerteza no tocante a fé”.52
Positivamente Turretini mostra que o eleito deve expressar essa certeza infalível.
Assim ele declara:
Ou ele deve (não com base numa consideração de sua dignidade pessoal, mas
da estima de Deus e de sua custódia poderosa) expressar um ato de certeza,
não apenas provável e conjetural (que admite engano), mas de fé genuína
acerca de sua eleição e salvação.54
Ainda de maneira bem clara e objetiva, ele afirma que: “os crentes podem saber
que são filhos de Deus e crentes; portanto, podem saber que são eleitos, porque a adoção
e a fé são os efeitos e frutos infalíveis da sua salvação e eleição”.55
J. C. Ryle, escrevendo sobre essa matéria diz que “a segurança é algo verdadeiro
e bíblico”. E dedica-se a discorrer sobre a matéria para estabelecer essa importante
verdade de que se trata de algo infalível.57 Lloyd-Jones, em seu comentário de Efésios,
52
CALVIN, Jean, Gálatas - Efésio - Filipenses - Colossenses, 1. ed. São José dos Campos, SP: Editora
Fiel, 2015, p. 353. Vê-se essa argumentação também em Jones: LLOYD-JONES, O Combate Cristão,
p. 209–210.
53
TURRETINI, Compêndio de teologia apologética, p. 479.
54
Ibid., p. 481.
55
Ibid.
56
BROOKS, Céu na terra, p. 21.
57
RYLE, Santidade: sem a qual ninguém verá o Senhor, p. 146.
100
chama a atenção para o pensamento de John Wesley e como a doutrina da segurança e
certeza da salvação era central para ele e os metodistas, no que toca sua infalibilidade:
John Wesley disse muitas vezes que Deus tinha levantado os metodistas em
grande parte para pregar essa doutrina especial da certeza. Ele cria tão
intensamente nessa verdade, que a princípio, tendia a dizer que se você não
tem certeza, você não é um cristão.58
Comentando 2Pedro 1.10, Jones mais uma vez afirma essa ênfase no ensino do
apóstolo, mostrando a força dessa doutrina.59
Observa-se também na teologia dos reformadores esse consenso de que uma das
bases da segurança são as divinas verdades das promessas de salvação. Lutero não
enfatiza muito esse fundamento, mas Zuínglio dá forte ênfase a esse ponto em sua
teologia. Como já citado, Beeke diz que “até mais do que Lutero, Zuínglio baseou fé e
segurança na eleição soberana de Deus e na obra de Cristo no cumprimento do pacto da
graça”.60 Beeke coloca também que na teologia de Zuínglio, no que toca essa base, existe
uma “impossibilidade de separar a eleição, as promessas de Deus, Cristo, a fé e a
segurança, da doutrina da providência de Deus”.61 Calvino coloca às promessas em total
ligação com a ação do Espírito que a autentica, para assim afastar a insegurança do
coração do eleito. Quanto a isso ele diz: “o Espírito Santo enaltece com tão nobres títulos
a autoridade da Palavra de Deus, a fim de fornecer remédio a esta enfermidade e para que
demos total crédito a Deus em suas promessas”.62 Ele também deixa claro em seus
escritos a importância de olhar para as promessas de Deus, a quais conferem segurança
58
LLOYD-JONES, D. M., O Supremo Propósito de Deus, p. 271.
59
LLOYD-JONES, D. Martyn, 2 Pedro Sermões Expositivos, 1. ed. São Paulo: Publicações Evangélicas
Selecionadas, 2009, p. 51.
60
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 50.
61
Ibid., p. 51.
62
CALVINO, As Institutas, p. 39.
101
ao crente.63 Em seu Comentário de 1Coríntios, versículo 12, ele afirma que a base
primária da segurança está nas promessas de Deus, encorajando o crente a enfrentar
Satanás e o pecado, mostrando, por fim, Rm 8.33.64 Turretini aponta as promessas como
sendo a base primária e objetiva, onde o Espírito aponta, externamente, por meio da
Palavra essa veracidade e confere segurança ao crente.65
Brooks credita forte ênfase as promessas como base para a segurança do crente.
Tomando como base o Salmo 84.11, ele escreve: “Deus, mediante promessas,
comprometeu-se a assegurar a seu povo a sua felicidade e bem-aventurança”.68 Diante
disso ele conclui: “Se ele não nega bem algum, certamente nunca negará certeza, que é o
grande bem, o único, o principal, o bem peculiar que os crentes buscam”.69
63
Ibid., p. 40.
64
CALVIN, Gálatas - Efésio - Filipenses - Colossenses, p. 353.
65
TURRETINI, Compêndio de teologia apologética, p. 145.
66
BEEKE, Joel R., Espiritualidade Reformada - Uma Teologia Prática para a Devoção a Deus, 1. ed.
São José dos Campos, SP: Fiel, 2014, p. 239.
67
Ibid., p. 242.
68
BROOKS, Céu na terra, p. 25.
69
Ibid.
102
mais o homem entende as alianças de Deus, olha para suas promessas, sua segurança é
fortalecida.70
Hodge, de maneira bem prática, diz que a segurança repousa sobre essas verdades
divinas das promessas de salvação.71 O ponto central aqui nesta matéria é olhar para o
fato de que a o soberano e imutável Senhor, que fez as promessas, irá certamente cumpri-
las. O crente verdadeiro descansa nessa verdade e, consequentemente gera a esperança
que conduz a plena certeza. Beeke afirma categoricamente que: “as promessas de Deus
devem ocupar sempre o primeiro lugar porque são a base primária e final da segurança
mediante uma fé viva”.72
Esse é um ponto que precisa estar bem estabelecido no coração dos crentes, o que
fica evidente na preocupação dos puritanos em trazê-lo e enfatiza-lo neste capítulo. Há
de se notar a grande interação entre esse fundamento com os demais, bem como a
interação do pensamento dos reformadores com as proposições posteriores dos puritanos.
Calvino, ainda falando das promessas, estabelece que elas são fundamento tanto
externo como interno. Calvino declara:
Aqui se revolve o principal gonzo da fé, a saber, que não julguemos que as
promessas de misericórdia que o Senhor nos oferece são verdadeiras somente
fora de nós; ao contrário, que antes as façamos nossas, abraçando-as
interiormente.73
70
LLOYD-JONES, D. M., O Supremo Propósito de Deus, p. 358–359.
71
HODGE, Confissão de Fé de Westminster Comentada, p. 326.
72
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 173.
73
CALVINO, As Institutas, p. 40.
103
O fato de Cristo habitar no interior do crente, e isso ser apreendido por ele, confere
ao eleito essa evidência interior de que ele está devidamente unido a Cristo. Calvino
coloca isso da seguinte maneira:
E isso é tão certo que de modo algum devemos apartar Cristo de nós, nem nós
dele, mas manter solidamente esta comunhão pela qual intimamente nos uniu
a si. Desta forma nos ensina o Apóstolo: ‘O corpo, na verdade, está morto por
causa do pecado, mas o Espírito de Cristo, que habita em vós, é vida por causa
da justiça’ [Rm 8.10]... Cristo não está fora de nós, mas habita em nós; não só
se nos apega por um laço indiviso de associação, mas, mediante certa
comunhão maravilhosa, dia a dia, mais e mais se une em um só corpo conosco,
até que se faça conosco inteiramente um. 74
[...] é possível extrair um argumento sólido para a consolação dos crentes pelo
uso de um silogismo prático (cuja premissa maior se fundamenta na Escritura
e a menor é elaborada no testemunho do coração dos crentes) nestes termos:
as promessas evangélicas pertencem a todos os crentes e a cada um deles; ora.
eu creio; logo, elas pertencem também a mim. 77
Beeke, em sua tese, expõe essa fundamentação de forma bastante interessante.
Beeke começa dizendo que os puritanos tinham grande anseio por evidenciar a presença
interior de Cristo em suas vidas e que, além disso, “os puritanos criam que tudo o que
Cristo fez no exterior do crente tem sua contraparte no seu interior”; logo de forma
74
Ibid., p. 49.
75
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 114.
76
KEDDIE, Gardan J., Unfallible Certenty of the Pardon of Sinne and Life Everlasting, The Evangelical
Quarterly, p. 230–244, .
77
TURRETINI, Compêndio de teologia apologética, p. 267.
104
maravilhosa acontece uma troca entre o objetivo e o subjetivo, ou seja, entre Cristo e o
Cristão, em relação as promessas de Deus.78 Ele sintetiza a questão dizendo:
Hodge, defende que a certeza é promessa de Deus para o crente. Ele coloca a
questão da seguinte forma:
[...] as Escrituras prometem que todo aquele que crê terá a vida eterna. O crente
cuja a fé é vigorosa e inteligente tem uma evidência distinta em sua própria
consciência de que ele, pessoalmente, crê. Daí ser obvia a conclusão de que ele
terá a vida eterna.85
78
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 177–178.
79
Ibid., p. 178.
80
Ibid.
81
BURGESS, Spiritual refining, p. 672.
82
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 179.
83
Ibid.
84
Ibid., p. 85–88.
85
HODGE, Confissão de Fé de Westminster Comentada, p. 326.
105
Portanto, é exatamente isso que se observa na ênfase pastoral dos puritanos que
trabalharam para conduzir o crente ao consolo verdadeiro e, afastá-lo da falsa presunção
de confiar em si mesmo. Thomas Watson, na sua definição de certeza faz uso do silogismo
para explicar, de forma prática, essa verdade. Ele diz:
Sobre esse ponto, Turretini mostra a perfeita interação do Espírito, tanto nas bases
primárias quanto nas secundárias, interagindo ativamente na segurança e certeza do
crente. Sendo assim, acerca do testemunho do Espírito, ele resume de forma clara e
objetiva dizendo que:
86
WATSON, A fé cristã, p. 290.
87
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 52.
88
CALVINO, As Institutas, p. 22.
106
expresso na Escritura; o segundo, em seu testemunho interno impresso na
consciência e falando no coração. Pois, como duas coisas são necessárias à
geração da fé (a apresentação da verdade na Palavra e sua aplicação no
coração), o Espírito Santo opera em ambos (i.e., na Palavra e no coração).
Portanto, lemos que ele testifica apropriadamente na Palavra, objetivamente,
segundo o método de um argumento em virtude do qual cremos. No coração,
lemos também que ele (mas com menos propriedade) testifica eficientemente
e segundo o método de um primeiro princípio, por cujo poder cremos. 89
Lawson declara que Ambrósio via o Espírito Santo como o selo assegurador do
crente e mostra ainda que “Ambrósio via em Jo 10.27-30 a verdade de que Deus Pai e
Deus Filho mantêm todos os crentes eternamente seguros em suas mãos salvífica”.94
Quanto ao pensamento dos reformadores, em Calvino vê-se que há um entendimento
acerca dessa prerrogativa do Espírito. Calvino diz:
89
TURRETINI, Compêndio de teologia apologética, p. 145.
90
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 192.
91
Ibid.
92
Ibid., p. 193.
93
Ibid., p. 197.
94
LAWSON, Steven J., Pilares da graça: AD 100 - 1564, 1. ed. São José dos Campos, SP: Editora Fiel,
2013, p. 266.
107
toma o lugar de um penhor para confirmá-las e estabelecê-las. “Depois que
crestes”, diz o Apóstolo, “fostes selados com o Santo Espírito da promessa, o
qual é o penhor de nossa herança” [Ef 1.13]. Vês como nesta passagem Paulo
ensina que os corações dos fiéis são gravados pelo Espírito, como se por um
selo, e que o chama Espírito da promessa, porque ele nos faz o evangelho
indubitável?95
[...] é chamado Penhor e Selo de Nossa Herança [2Co 1.22; Ef 1.13, 14],
porque a nós, peregrinos no mundo e semelhantes a mortos, assim do céu nos
vivifica, para que estejamos certos de que sob a fiel custódia de Deus em
segurança nos está a salvação.99
95
CALVINO, As Institutas, p. 62.
96
CALVIN, Gálatas - Efésio - Filipenses - Colossenses, p. 221.
97
Ibid.
98
CALVIN, Jean, 2 Coríntios, 1. ed. São José dos Campos, SP: Editora Fiel, 2008, p. 55.
99
CALVINO, As Institutas, p. 21.
108
chamadas de invioláveis os que são selados com a primeira chancela. Daí os
pais chamarem esse selo indissolúvel (akatalyton).100
No tocante a esse selo, Sibbes vai desenvolver seu ensino com base na perspectiva
de que “o papel do Espírito como selo da alma dos Crente é muito parecido com examinar
o trabalho dele em favor da segurança pessoal de fé e salvação”.106 Sibbes via o selo do
Espírito como duas questões distintas, a saber: “Ele distinguia entre o oficio ou função do
Espírito como selo dado ao pecador na regeneração, de um lado, e, de outro, a obra em
que o Espírito aplica aquele selo à consciência do crente”.107 Sendo assim, ele imagina o
selamento do Espírito de duas maneiras: primeiramente o selamento em um único ato; e
segundo, um selamento que ocorreria mais tarde, de acordo com a obtenção da maturidade
da vida cristã. Dessa maneira, o selo inicial serve para sinal de autenticidade, enquanto
que o segundo aspecto está relacionado a um processo, ou seja, aponta uma
progressividade.108 De acordo com ele, esse selo fortalecedor, dá aos crentes a
100
TURRETINI, Compêndio de teologia apologética, p. 482.
101
BEEKE; PEDERSON, Paixão Pela Pureza, p. 645–648.
102
BEEKE, Joel R.; JONES, Mark, Teologia Puritana, 1. ed. São Paulo: Vida Nova, 2016, p. 817.
103
Ibid., p. 819.
104
Ibid., p. 820.
105
Ibid., p. 822.
106
Ibid., p. 823.
107
Ibid.
108
Ibid., p. 824.
109
possibilidade de se “apropriarem da plena certeza mediante a obra de cada pessoa da
Trindade, mesmo a ênfase estando no Espírito e em sua obra salvadora”.109 Ele descreve
essa relação trinitária, mostrando que o Pai estabelece o decreto sobre a obra da salvação,
o Filho executa e o Espírito aplica e atesta, levando a alma do crente a nutrir a certeza da
salvação.110
John Owen, por sua vez, discordava da distinção proposta por Sibbes. Owen
defendia que o crente é selado na hora em que é regenerado. Nesse sentido, o pensamento
de Owen está alinhado ao de Calvino.113 Como destaca Ferguson, Owen inicialmente
defendia que eram as promessas e não as pessoas que estavam em vista nesse selo.114
Posteriormente, como ressalta Beeke, Owen vai definir que o selo se aplica diretamente
a pessoa e não às promessas, diferentemente do que Calvino defendia.115 Sendo assim o
selo serve como base da segurança e certeza do crente. Logo, ele coloca que o selo não é
a segurança em si, mas produz segurança.116
109
Ibid., p. 825.
110
Ibid., p. 25–26.
111
Ibid., p. 823.
112
Ibid., p. 824.
113
Ibid., p. 823.
114
FERGUSON, Sinclair B., A devoção trinitária de John Owen, 1. ed. São José dos Campos, SP: Editora
Fiel, 2015, p. 103.
115
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 273.
116
Ibid., p. 274.
117
LLOYD-JONES, D. M., O Supremo Propósito de Deus, p. 234–267.
110
para com os crentes. Nessa primeira parte, quanto a aplicação do termo, ele mostra qual
o significado de estar selado:
Obviamente deve significar para nós o que significou para o Senhor. Significa
que podemos ser autenticados, que pode ser estabelecido por sinais inteligíveis
que realmente somos filhos de Deus, herdeiros de Deus e coerdeiros com o
nosso bendito Senhor e Salvador Jesus Cristo. 118
Eles asseveram que as Escrituras ensinam que, conquanto seja verdade que
ninguém pode crer sem a influência do Espírito Santo, não obstante, não é a
mesma coisa que ser selado com o Espírito, e que o ser selado com Espírito
nem sempre acontece imediatamente quando a pessoa crê. 121
Jones fundamenta sua argumentação em passagens como: João 14; 16; 20.20; At
1.4,5; At 2; At 8.2,12,16; At 9; At 15; At 19.2,4-5,6; Ef 1.13. Nessas passagens, ele mostra
várias experiências onde pessoas que já eram crentes receberam posteriormente o selo do
Espírito Santo.122 Quanto as implicações de estar selado com o Espírito Santo, Jones
começa estabelecendo que o crente é selado com o Espírito Santo da promessa (Is 40; Ez
37 e 38; Jl 2; Lc 3.16-17; Jo 7.37-39; 14; 15;16; At 1.4-8; 2.33; Gl 3.14) – Jones mostra
que todas estas passagens apontam para a intenção do apóstolo acerca do Espírito Santo
da Promessa.123 Jones esclarece que isso não quer dizer que o Espírito Santo não estava
nos santos antes de pentecostes, pelo contrário, ele esclarece que o Espírito Santo estava
118
Ibid., p. 239.
119
Ibid.
120
Ibid., p. 239–240.
121
Ibid., p. 240.
122
Ibid., p. 240–244.
123
Ibid., p. 246–248.
111
em todos os santos do Antigo Testamento, e, com isso, declara que: “Nenhum homem
pode estar no reino de Deus a não ser que seja filho de Deus; e não pode ser filho de Deus
sem o Espírito”.124 Entretanto, Jones volta-se para o fato de que o Espírito Santo da
Promessa ainda não havia sido derramado, da forma que havia sido prometido, antes de
Pentecostes, onde essa promessa é cumprida.
De forma mais direta, Jones passa a mostrar as implicações na vida do crente. Ele
começa mostrando o que o selo do Espírito não é: primeiro ele estabelece que o Selo do
Espírito não é regeneração;125 em seguida ele mostra que o selo do espírito não é uma
unção;126 esclarece também que não é santificação;127 em seguida mostra que o selo do
Espírito não é um fruto do Espírito;128 bem como estabelece que não é a certeza da
salvação resultante de fé na Palavra, bem como de argumentos extraídos dela;129 também
esclarece que não é plenitude do Espírito.130 No que toca a certeza da salvação, como é o
foco dessa pesquisa, é importante notar que Jones destaca os meios de obtenção da certeza
– promessas e silogismo – mostrando que os dois dão forte base para a segurança; depois
ele sugere que o selo do Espírito está muito acima do que tem sido considerado até esse
ponto. Ele diz que o selo do Espírito
[...] é uma forma de certeza mais forte e mais elevada. Inclui as bênçãos
mencionadas, mas vai além delas. É o Espírito em nós que nos capacita a fazer
o que já descrevi; no entanto, o selo do Espírito é algo adicional a isso, e é algo
que nos é feito pelo Espírito”.131
124
Ibid., p. 249.
125
Ibid., p. 250.
126
Ibid.
127
Ibid., p. 250–251.
128
Ibid., p. 251.
129
Ibid., p. 252.
130
Ibid., p. 253.
131
Ibid., p. 252.
112
fortuito, mas com uma conclusão legítima indubitável de evidência para um
determinado fim.132
Todos os que creem em Cristo como seu Senhor e Salvador pessoal recebem
definitivamente o Espírito Santo, o ‘Santo Espírito da Promessa’, sendo
selados para o dia do juízo. A fé é selada pelo Espírito. Ele, que fora prometido
pelo Pai e pelo Filho, e agora habita em nós, sendo o agente do cumprimento
das promessas (Ef 1.13; At 1.4-5; 2.33) e parte do cumprimento daquilo que
Jesus Cristo prometeu (Jo 14.26; 16.7).133
III. Esta segurança infalível não pertence de tal modo à essência da fé, que um
verdadeiro crente, antes de possuí-la, não tenha de esperar muito e lutar com
muitas dificuldades; contudo, sendo pelo Espírito habilitado a conhecer as
coisas que lhe são livremente dadas por Deus, ele pode alcançá-la sem
revelação extraordinária, no devido uso dos meios ordinários. É, pois, dever de
cada crente fazer toda a diligência para tornar certas a sua vocação e eleição, a
fim de que, por esse modo, seja o seu coração, no Espírito Santo, confirmado
em paz e deleite, em amor e gratidão para com Deus, em firmeza e alegria nos
deveres da obediência, que são os frutos próprios desta segurança. Este
privilégio está, pois, muito longe de predispor os homens à negligência.135
Essa seção apresenta uma das questões que foram motivo de grandes debates
quanto a Confissão de Fé ser ou não ser um documento calvinista. Nessa seção fica claro
a urgência pastoral dos puritanos em esclarecer pontos importantes e fundamentar
devidamente a questão da segurança. Não só isso, mas também se vê nessa seção, a ênfase
puritana em conduzir o crente na busca pela verdadeira certeza e gozar dos seus frutos
em sua vida.
132
HODGE, Confissão de Fé de Westminster Comentada, p. 328.
133
COSTA, Herminsten M. P. da, O Deus bendito. 1. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, p. 114.
134
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 197.
135
Bíblia de Estudo de Genebra, p. 1795.
113
3.3.3.1 A segurança não pertence à essência da fé
Como supracitado, esse ponto é um dos pontos de tenção entre a doutrina dos
reformadores que por muito tempo trataram a segurança como parte da essência da fé.
Lloyd-Jones, analisando a posição de Lutero e dos reformadores protestantes, quanto a
matéria, diz que o Diabo usa de estratagema para tentar conduzir o crente de um extremo
a outro, e nesse caso, tenta persuadir o crente a pensar que “não se pode ser cristão se não
se tem segurança da salvação”.136 Ele ressalta que Lutero, como já fora destacado no
capítulo anterior, ensinava que “não se pode ter fé sem segurança da salvação, que
verdadeiramente não se pode ver tal doutrina e crer nela sem automaticamente regozijar-
se nela e ter absoluta certeza dela”.137 Jones, por sua vez propõe uma refutação ao
pensamento dos reformadores protestantes com base em 1Jo 5.13, mostrando, por fim,
que “é possível uma pessoa ser verdadeiramente crente, e, todavia, por diversas razões,
não ter segurança da salvação”.138
Ainda que essa certeza seja necessária para a consolação dos crentes, quanto à
veracidade da fé propriamente dita, não há necessidade de seu ato explícito a
todo momento, nem se deve dizer que está sem fé quem ainda não está
confirmado nessa certeza.142
136
LLOYD-JONES, O Combate Cristão, p. 211.
137
Ibid., p. 212.
138
Ibid.
139
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 56.
140
Ibid., p. 64.
141
Ibid., p. 67–68.
142
TURRETINI, Compêndio de teologia apologética, p. 486.
114
A seguinte fala de Turretini expressa bem essa ideia: “Nossa segurança não
consiste no afeto de nossa disposição, mas no efeito infalível da graça divina”.143
A grande preocupação pastoral dos puritanos fez com que, praticamente um século
depois, essa proposição surgisse para trazer paz aos mais fracos, apontando para a
segurança como sendo fruto da fé salvadora invés de essência da fé salvadora, embora a
segurança seja, organicamente, parte da fé.144 Brooks declara abertamente que “a certeza
não pertence à essência do cristão”.145 Em seguida, ele coloca em termos bem práticos
essa ênfase pastoral dos puritanos com respeito a essa matéria, dizendo: “É necessário
para o bene esse (o bem-estar), o conforto e a alegria do cristão – não é indispensável para
que alguém seja cristã. Um homem pode ser um verdadeiro crente, e toda via, daria o
mundo inteiro, se pudesse, para saber que realmente é crente”.146
John Owen também concorda com essa proposição. Como demonstrado por
Beeke, para ele aqueles que veem “a segurança da salvação e os seus fenômenos
acompanhantes de alegria e de gloriar-se no Senhor, como a essência da fé, resultaria em
engano”147. J. C. Ryle, também sustenta essa verdade dizendo: “Uma pessoa pode ser
possuidora da fé salvadora, e, no entanto, nunca usufruir de uma firma esperança”.148 Ryle
destaca em seu ensino sobre essa matéria, que é muito importante deixar estabelecida essa
distinção entre fé e segurança.149 Ele enfaticamente declara:
Lloyd-Jones também assevera essa verdade com grande ênfase em sua teologia,
considerando estratagema do Diabo fazer com que o crente pense que sem certeza ele não
pode ser um cristão verdadeiro.151
143
Ibid., p. 484.
144
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 156–157.
145
BROOKS, Céu na terra, p. 20.
146
Ibid.
147
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 254.
148
RYLE, Santidade: sem a qual ninguém verá o Senhor, p. 152.
149
Ibid., p. 154.
150
Ibid.
151
LLOYD-JONES, O Combate Cristão, p. 211.
115
subjetiva, estabelecendo que a certeza objetiva da fé é parte integrante da essência da fé,
enquanto que a certeza subjetiva, ou segurança da graça e da salvação, não é da essência
da fé. Em seguida Berkhof destaca o pensamento dos reformadores que tinha a segurança
e certeza como um elemento mais importante da essência da fé, tomando o cuidado de
fazer a ressalva de que eles também admitiam graus diferentes de fé, que por sua vez
poderia levar a pessoa a sofrer grandemente com dúvidas quanto a sua salvação. Berkhof
mostra também a variação de pensamento contido nos padrões confessionais, destacando
que o Catecismo de Heidelberg admite a segurança como essência da fé; os Cânones de
também comungam dessa posição, deixando a abertura para aqueles que tem dificuldades
e sofrem com dúvidas; a Confissão de fé de Westminster, assevera que a segurança não é
da essência da fé. Berkhof ainda mostra o posicionamento de três grupos que apresentam
pensamentos divergentes, começando pelos antinomistas, que defendiam que a segurança
é parte da essência da fé; seguido pelos nomistas pietistas que defendiam que esta não
fazia parte da essência da fé; os metodistas também não defendem essa posição, tendo em
vista que eles creem que os santos podem decair totalmente da graça, ou seja, perder a
salvação. Por último, ele ressalta que entre os teólogos reformados, ainda há diferentes
opiniões quanto a matéria.152
Um ponto importante a ser estabelecido aqui, quanto a ênfase dada pelos puritanos
a essa matéria, é que, como declarado por A. A. Hodge, essa proposição está diretamente
relacionada a segurança subjetiva, a qual confere ao crente uma certeza pessoal de que de
fato ele está em Cristo, seus pecados foram perdoados e que ele está realmente salvo.153
Com isso a declaração de Beeke lança luz ao pensamento puritano ao dizer que:
“Felizmente, a certeza da salvação não depende do crente... Pastoralmente, é crucial
afirmar que a dúvida pode acompanhar até mesmo a fé justificadora”.154
152
BERKHOF, Louis, Teologia Sistemática, 4. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, p. 467–468.
153
HODGE, Confissão de Fé de Westminster Comentada, p. 331.
154
BEEKE, A Busca da Plena Segurança: O Legado de Calvino e Seus Sucessores, p. 157.
116
Calvino trata dessa questão mostrando que de fato muitos crentes precisam lutar
para serem persuadidos daquilo que professam: “Ora, a incredulidade tão profunda e
arraigadamente se nos apega ao coração e a tal ponto lhe somos propensos, que sem árduo
embate cada um não se persuade daquilo que todos confessam com a boca: que Deus é
fiel”.155 Outra demonstração na teologia de Calvino está no seu desenvolvimento acerca
da fé crescente, onde ele ensina que a fé cresce em contínuo vigor e certeza:
Quando inicialmente é instilada em nossa mente, mesmo que seja apenas uma
gota mínima de fé, começamos então a contemplar a face de Deus, plácida,
serena e propícia para conosco. É verdade que isto à distância; contudo, com
visão de tal modo segura, saibamos que de maneira alguma estamos sofrendo
de alucinação. Além disso, quanto mais avançamos – uma vez que nos importa
avançar continuamente –, atendendo a um progresso de antemão estabelecido,
mais nos vamos aproximando da visão dele; e já um tanto mais segura, e até
pela própria continuidade, mais familiar ele se nos torna.156
Mas não é assim com a certeza que o crente tem sobre a remissão de seus
pecados. Isto não é imediatamente revelado na Palavra, mas provém da
experiência interior e do senso do coração. Depende de nós e às vezes pode ser
duvidoso e incerto, não menos que o princípio sobre o qual ela repousa. Daí
ser falso que o verdadeiro crente por certo tempo pode e deve estar certo da
remissão de seus pecados, mesmo quando esteja em pecado e se entregue às
luxúrias da carne, porque (como já dissemos) a certeza não é outorgada sem o
uso de meios.157
155
CALVINO, As Institutas, p. 39.
156
Ibid., p. 42.
157
TURRETINI, Compêndio de teologia apologética, p. 753.
117
18.4), e, montra ainda, que o crente deve esperar também, porque Deus prometeu a certeza
aos seus filhos (Is 49.23).158
Com relação a esse ponto, Turretine, demonstra que existe uma grande
necessidade de cada crente atentar para essa questão tão importante. Diante das diversas
situações em que o crente pode se encontrar, por causa de diversos motivos,
principalmente situações de pecado, o crente que se vê nessa situação deve, não só busca,
mas implorar a Deus por plena segurança. Quanto a isso ele declara:
Caso algumas vezes ele (o crente) fique sem esse senso dela, não deve
considerar-se pertencente ao rol dos réprobos e nutrir dúvidas sobre a
158
WATSON, A fé cristã, p. 296.
159
BROOKS, Céu na terra, p. 41–47.
160
Ibid.
118
misericórdia divina. Antes, deve buscá-la e implorar por ela com o máximo
ardor junto a Deus, e (de sua parte) é obrigado a usar todos os esforços com o
fim de estimulá-la e enraizá-la mais e mais fundo em seu coração pela prática
da fé e das boas obras.161
Anthony Burgess, assevera que o crente pode possuir a segurança, e deve buscar
obtê-la, embora haja severa acusação por parte dos papistas, ou seja, dos grandes
opositores à doutrina.162 Outro puritano que se empenha na tarefa de impulsionar as suas
ovelhas nessa busca é Thomas Watson. Watson, além de incentivar o crente a buscar a
segurança e certeza da salvação, assevera que essa busca deve ser árdua. Quanto a isso
ele diz: “Lute para obter a certeza”.163 Sendo assim, ele vai direcionar o crente a aferir
algumas questões cruciais, a saber: se tem a verdadeira obra da graça em sua vida; se de
fato tem grandes sentimentos por Cristo; se tem a presença do Espírito Santo em sua
vida.164
Thomas Watson, afim de direcionar o crente nessa luta pela obtenção da certeza,
vai mostrar algumas coisas que o crente deve buscar fazer nessa caminhada:
primeiramente o crente deve manter sua consciência pura (Hb 10.22); Em segundo lugar
o crente precisa se exercitar na piedade (1Tm 4.7); o crente precisa alegrar-se no Espírito
do Senhor, pois “o Espírito é o consolador que sela a certeza” (Sl 51.11; 2Co 1.22);
precisa também, fazer correto uso dos meios de graça, pois “o sacramento é uma
ordenança seladora”.165
Brooks, de igual modo, não deixa de trazer à tona o imperativo para que os crentes
busquem a segurança e certeza da salvação. Para isso ele aponta o texto de 1Pe 1.10, para
dizer que o Espírito Santo exorta os crentes por meio dessa passagem. Ele assevera essa
verdade dizendo: “É especialmente necessário; é de importância interna e eterna fazer
firme e segura diligência por sua alma, irmão”.166 Brooks ainda instiga os crentes a
161
TURRETINI, Compêndio de teologia apologética, p. 486.
162
BURGESS, Spiritual refining, p. 17.
163
WATSON, A fé cristã, p. 295.
164
Ibid.
165
Ibid., p. 297–298.
166
BROOKS, Céu na terra, p. 30.
119
buscarem a certeza uma vez que Deus assim promete em sua Palavra.167 Com isso ele
defende que “é propósito das Escrituras ajudar os crentes a obter a certeza”.168 Assim ele
assevera essa verdade dizendo ainda que: “É propósito da Escritura em geral levar as
almas, primeiro, a um conhecimento de Cristo, depois, a aceitarem a Cristo, e depois, a
edificarem em uma serena certeza do seu real interesse por Cristo”.169 Ele mostra inda as
fontes para obtenção dessa certeza, destacando com isso que todos os crentes podem obter
a certeza. Quanto a isso, ele ensina que a fé cristã é uma das fontes da certeza, seguida
pela esperança, a boa consciência e o verdadeiro amor aos santos.170 Depois de mostrar
as fontes ele também mostra os meios, destacando textos chave como: 2Pe 1.5; 1Co 11.28;
2Co 13.5.171 Brooks não deixa de apontar para o sacramento da Ceia do Senhor um
instrumento para conduzir o crente a fortalecer a certeza. Nesse sentido ele diz: “O
principal fim para o qual Cristo instituiu a ordenança da Ceia foi que a mesma torne os
crentes certos e seguros do Seu amor, e ponha neles o selo do perdão dos seus pecados,
da aceitação divina de suas pessoas e da salvação de suas almas (Mt 26.27-28)”.172
Lloyd-Jones, não só assevera que é possível ser cristão sem ter certeza da salvação,
mas juntamente com essa asseveração, ele declara positivamente o dever de o cristão
buscar nutrir essa gloriosa certeza:
Você pode ser cristão sem segurança de salvação, mas deve tê-la, e não deve
dar-se por satisfeito enquanto não a tiver. Você dar-se conta de que é um cristão
muito defeituoso sem ela, defeituoso do ponto de vista de sua experiência
pessoal e mais defeituoso ainda do ponto de vista do seu testemunho. 173
Jones, apresenta ainda forte ênfase nesse ponto em seu comentário da segunda
Epístola de Pedro, capítulo 1, versículo 10. Nesse comentário ele declara: “Bem, que
exortação é essa? É que eu e você estejamos certos de nossa salvação”174. Jones assevera
que aqui Pedro está exortando os cristãos a terem plena certeza. Jones aponta também
para 1Jo 5.13, onde o apóstolo declara “Estas coisas vos escrevi, para que saibais que
tendes a vida eterna”.175 Ele ainda aponta, acertadamente e concordemente com o ensino
167
Ibid., p. 25.
168
Ibid., p. 22.
169
Ibid.
170
Ibid., p. 26–30.
171
Ibid., p. 32.
172
Ibid., p. 33.
173
LLOYD-JONES, O Combate Cristão, p. 213.
174
LLOYD-JONES, 2 Pedro Sermões Expositivos, p. 51.
175
Ibid.
120
dos puritanos, que o crente deve buscar a certeza porque o próprio Deus oferece essa
certeza aos seus filhos, ou seja não é uma invenção do homem. Jones diz ainda: “Podemos
argumentar com muita facilidade no sentido de que o objetivo de cada particular epístola
do Novo Testamento é dar certeza e às pessoas, dar-lhes o conhecimento dessa
segurança”.176
Ryle, acerca dessa matéria, dedica-se a mostrar a grande importância desse ponto.
Em concordância com a ênfase dos puritanos ele também declara sua urgência em
conduzir o crente no dever de buscar a plena segurança:
De todo coração desejo que a segurança seja buscada pelos crentes, muito mais
do que tem sido. Um grande número daqueles que creem começa a duvidar e
continuará duvidado, viverá e morrerá na dúvida, e assim irá para o céu como
que em meio a uma névoa.177
Nesse sentido, há também uma forte demonstração e cuidado pastoral, por parte
dos puritanos, de que a certeza do crente seja evidenciada por meio de frutos. Isso fica
bem evidente na obra de Thomas Watson. Ele mostra alguns frutos ou evidências que
acompanham de perto aqueles que tem a plena segurança e certeza em suas vidas. Diante
176
Ibid., p. 55.
177
RYLE, Santidade: sem a qual ninguém verá o Senhor, p. 156.
178
HODGE, Confissão de Fé de Westminster Comentada, p. 332.
121
disso, Watson, destaca os seguintes frutos que a segurança e certeza vão gerar na vida do
crente:
Thomas Brooks, também apresenta alguns frutos que são evidenciados na vida
daqueles que nutrem plena segurança e certeza da salvação. Ele começa sua empolgante
lista dizendo que a segurança produz “o céu na terra”, ou seja, “a segurança espiritual fará
o céu descer a seus corações”.181 Em seguida, ele mostra que a segurança espiritual
abranda as mudanças que ocorrem nesta vida (2Co 4.16-18). E, quanto a isso ele declara:
“Enquanto o homem viver consciente e seguro do amor de Deus derramado em seu
coração, nenhuma mudança externa ou circunstancial poderá causar considerável
mudança em sua vida”.182 Outras vantagem cita por Brooks é que essa segurança freia o
desejo do homem pelas coisas deste mundo; ajuda na comunhão com Deus; impede que
o crente se desvie; produz santa ousadia; prepara o crente para a morte; dá às
misericórdias o sabor de misericórdias; dá vigor ao crente no serviço cristão; e por fim,
conduz a alma do crente ao gozo de Cristo.183
179
WATSON, A fé cristã, p. 291–295.
180
Ibid., p. 298–300.
181
BROOKS, Céu na terra, p. 167.
182
Ibid.
183
Ibid., p. 168–175.
122
Lloyd-Jones, enfatiza que a certeza na vida do crente gera alguns desejáveis frutos.
Primeiramente ele mostra que a certeza gera regozijo. Diante disso, ele declara que: “se
não temos certeza, não podemos nos regozijar-nos, de modo que a obra de Deus em nós,
pela graça, está incompleta, a não ser que tenhamos certeza”.184 Em segundo lugar, ele
mostra que a certeza faz com que o crente se torne uma melhor testemunha de Cristo.185
IV. Por diversos modos, os crentes podem ter a sua segurança de salvação
abalada, diminuída e interrompida – negligenciando a conservação dela,
caindo em algum pecado especial que fira a consciência e entristeça o Espírito
Santo, cedendo a fortes e repentinas tentações, retirando Deus a luz do seu
rosto e permitindo que andem em trevas e não tenham luz mesmo os que
184
LLOYD-JONES, 2 Pedro Sermões Expositivos, p. 56.
185
Ibid., p. 56–57.
186
RYLE, Santidade: sem a qual ninguém verá o Senhor, p. 156–163.
187
HODGE, Confissão de Fé de Westminster Comentada, p. 333.
123
temem; contudo, eles nunca ficam inteiramente privados daquela semente de
Deus e da vida da fé, daquele amor a Cristo e aos irmãos, daquela sinceridade
de coração e consciência do dever; dessas bênçãos, a certeza de salvação
poderá, no tempo próprio, ser restaurada pela operação do Espírito, e por meio
delas eles são, no entanto, suportados para não caírem no desespero
absoluto.188
Ora, o coração piedoso sente em si tal distinção, uma vez que, em parte, é
inundado de dulçor ante o reconhecimento da bondade divina; em parte é
sufocado pelo amargor ante o senso de sua calamidade; em parte, reclina-se na
promessa do evangelho; em parte, se inflama pelo testemunho de sua
iniquidade; em parte, exulta com a expectação da vida; em parte, se apavora
com a morte. Variação esta que decorre da imperfeição da fé, uma vez que no
curso da presente vida nunca as coisas vão tão bem conosco que, curados de
todo ataque de desconfiança, somos plenamente plenificados e possuídos de
fé. Daqui esses conflitos: quando a desconfiança que se apega aos
remanescentes da carne se insurge para atacar a fé que foi interiormente
concebida.189
188
Bíblia de Estudo de Genebra, p. 1795.
189
CALVINO, As Institutas, p. 43.
124
abalo da segurança e certeza. Sendo assim ele diz: “[...] (é) possível que o senso do amor
divino por algum tempo se entorpeça e seja suprimido nos filhos de Deus”.190
Thomas Brooks demonstra com clareza essa ênfase pastoral da teologia puritana,
expressando que a possibilidade de abalo, diminuição e perda, são totalmente reais. É
importante notar que esse ponto Ele diz: “As almas seletas que têm a certeza da fé cristã
podem perdê-la”.191 Brooks mostra ainda que todos os crentes então sujeitos a isto, até
mesmo os melhores crentes. Alguns motivos são elencados por ele, dentre os quais os
principais deles são: dúvidas e temores.192
Ryle também destaca esse ponto dizendo que o crente não deve “sentir-se
surpreendido se for assaltado por dúvidas ocasionais, mesmo após haver obtido a
segurança da salvação”.193 Ryle traz à lembrança que, até mesmo “o crente mais
animado”, pode perder a segurança da salvação, se não tomar os devidos cuidas.194
Com isso, vê-se que a ênfase pastoral dos puritanos nesse ponto, começa por
assumir a possibilidade de que um crente verdadeiro pode ter a sua segurança e certeza
abaladas por diversas ocasiões que assaltam diretamente a fé dos crentes. Os puritanos,
deixam bem clara essa possibilidade da perda da segurança, para, assim, direcionar o
crente ao entendimento que que a negligencia ao que foi posto, quanto ao dever de buscar
a segurança, é um passo para a insegurança e incerteza. Uma grande luz de alerta é acesa
aqui para que o povo de Deus esteja em plena segurança, confiado e consolado pelo
Senhor.
É importante notar esse ponto, uma vez que, aquilo que é estabelecido aqui nessa
proposição dos puritanos é algo que já estava bem estabelecido nos reformadores. O ponto
central aqui é a grande ênfase consoladora que se mostra entrelaçada com a doutrina da
perseverança. Apesar do que já foi mostrado quanto ao posicionamento firme e duro da
190
TURRETINI, Compêndio de teologia apologética, p. 484.
191
BROOKS, Céu na terra, p. 60.
192
Ibid., p. 61.
193
RYLE, Santidade: sem a qual ninguém verá o Senhor, p. 172.
194
Ibid., p. 173.
195
HODGE, Confissão de Fé de Westminster Comentada, p. 333.
125
maioria dos reformadores, nota-se que essa situação se firma grandemente na providência
e imutabilidade de Deus. Calvino, demonstra bem essa verdade entendendo que, por mais
que seja abalado sua fé não é arrancada totalmente de seu coração. Quanto a isso ele
afirma que:
Embora seja possível que o senso do amor divino por algum tempo se
entorpeça e seja suprimido nos filhos de Deus (quanto ao segundo ato, nos
maus por falta ou castigo, de modo que sejam perturbados com várias dúvidas),
jamais se abala quanto ao primeiro ato. Por fim, certamente se desvencilham
daquelas tribulações pela graça de um Deus que elege e sustém, pelo que
sucede que Deus restaura neles a alegria de sua salvação e tomam a regozijar-
se os ossos quebrados (SI 51.8,12). Visto que Deus é fiel, ele deveras deseja
provar os crentes, porém não deseja que sejam vencidos. Ele tolera que
resvalem, porém não permite que sejam destruídos. Se ele julga conveniente
que, às vezes, sejam premidos, jamais deseja que sejam oprimidos, porém
sustenta e soergue aqueles que resvalam (2Co 4.8,9).197
Ao considerar os escritos dos puritanos, observa-se que esse é um ponto que não
deixa de ser trabalhando. Thomas Goodwin, discorrendo sobre esse ponto, também vai
demonstrar em sua teologia, essa ênfase, declarando que:
Embora o crente caia em severos pecados, como os maiores luzeiros têm o seu
eclipse, ainda assim a certeza de fé não é totalmente perdida; porque, como a
semente da fé permanece nele, como ainda não sacudidos (1Jo 3.9), o firme
estabelecimento da fé permanece também inabalável (1Jo 2.1).198
196
CALVINO, As Institutas, p. 46.
197
TURRETINI, Compêndio de teologia apologética, p. 484.
198
GOODWIN, Thomas, The Works of Thomas Goodwin, 1. ed. Carlisle, Pennsylvania: Banner of Truth,
1985, p. 396.
126
Vê-se nesse posicionamento de Goodwin, que a ênfase pastoral puritano ressalta
essa verdade para trazer consolo a alma que anda sofrendo, assaltada por temores e
tentações. Esse ponto é um perfeito desdobramento do que foi estabelecido no ponto que
mostra que a segurança e certeza é parte integrante da essência da fé. Logo, é possível
assumir que mesmo sem nutrir essa segurança, ainda assim a semente da fé salvífica
permanece no crente, a tal ponto de ela sofrer amargamente por causa das dúvidas, mas
não é totalmente abandonado por Deus, sendo, em tempo oportuno, reconduzido a um
estado de graça e segurança.
Tudo isso que vem sendo tratado até agora nessa última seção, vai conduzir a essa
possibilidade que se vê nesse último ponto. Os puritanos vão encerrar essa seção,
mostrando que a segurança pode ser restaurada. Nos reformadores, vê-se que há esse
entendimento, e percebe-se que eles já defendiam esse ponto. Calvino demonstra esse
entendimento ao declarar que:
Essa citação de Calvino, mostra mais uma vez, que esse processo de renovação da
segurança, envolve um diligente trabalho por parte do crente. O coração do crente é
movido por Deus a trabalhar diligentemente afim de reverter o dano causado pelo pecado
e a negligência aos meios de graça, os quais, como já mostrado, são os principais motivos
que corroboram para que o crente perca a segurança.
199
HODGE, Confissão de Fé de Westminster Comentada, p. 333–334.
200
CALVINO, As Institutas, p. 42.
127
ênfase no empenho diligente do crente em lutar para sair desse abismo que é a vida de
insegurança por causa da fraqueza demonstrada por muitos crentes. Assim fica evidente
nas seguintes palavras:
Fica evidente, portanto, que o pensamento puritano não se afasta daquilo que foi
proposto pelos reformadores. O que há é uma ênfase acentuada nessas questões como se
vê em seguida no pensamento de Thomas Brooks que, representando os demais,
desenvolve tão bem essa verdade.
Brooks, de maneira bem direta apresenta não só a raiz do problema, mas também
a solução para o mesmo. Ele mostra, primeiramente, que não ter ou perder a esperança de
se obter misericórdia é um dos principais motivos que trazem problemas a vida do crente.
Para esse primeiro problema ele propões, à luz da Escritura, fazer com que o crente que
está enfrentando tal situação olhe para a misericórdia de Deus dispensada na vida de
tantos homens que cometeram pecados horrendos, assim como o rei Manassés, o qual
Brooks se refere como sendo “um monstro, um demônio encarnado” – Manassés, mandou
cerrar o profeta Isaías ao meio, abandonou Deus e praticou idolatria, ofereceu seus filhos
aos deuses pagãos, fez com que sangue inocente fosse derramado em Jerusalém (2 Cr
33.1-15).202
201
TURRETINI, Compêndio de teologia apologética, p. 742.
202
BROOKS, Céu na terra, p. 109–111.
203
Ibid., p. 113.
128
Depois de discorrer amplamente sobre o crente cujo a alma está em desespero,
Brooks também apresenta outros empecilhos que, por sua vez, também são a causa de
abalo, interrupção e da perda da segurança e certeza na vida do crente. Para cada uma
delas Brooks apresenta a solução para renovação do coração desse crente.204
Ainda acerca dessa matéria, de maneira bastante consoladora, Hodge apoia essa
afirmativa da confissão, dizendo que: “Através da bênção de Deus no diligente uso dos
meios apropriados, ela (a segurança) pode ser fortalecida quando enfraquecida, e
recobrada quando perdida”.
Aqui nesse último ponto dessa seção, vem o consolo mais substancial para os
crentes que enfrentam tais crises e tais sofrimentos, mostrando assim a graciosa
possibilidade de renovação na vida daquele que é verdadeiro crente. Observa-se aqui que,
esse recobrar da segurança, é algo que é fruto da ação do Espírito que move o crente a
buscar, diligentemente, essa restauração. Vê-se também, que a ênfase dada pelos
puritanos nessa seção final, revela a urgência pastoral em direcionar a alma daqueles
crentes que sofrem assaltados por constantes dúvidas de que realmente são alvo da
misericórdia de Deus e conduzi-los a um estado de consolo e segurança e certeza, para
que eles possam gozar cada vez mais da graça de Deus em suas vidas e, como fruto dessa
certeza restaurada, prestarem uma adoração sincera e cada vez mais graciosa a Deus.
3.4 Conclusão
Esse último capítulo revela a consonância, em grande parte das proposições, entre
o pensamento reformado e o pensamento puritano. Percebe-se como as ênfases pastorais
dos puritanos, expostas no capítulo XVIII da Confissão de Fé de Westminster, expressam
a urgência em ensinar e fortalecer os crentes, conduzindo-os a atentar paras as bases
primarias e secundárias, e, assim, confiados no Senhor e na sua fidelidade, fiados em
Cristo e auxiliados pelo Espírito, buscar diligentemente essa segurança e certeza. E ainda
consolam os fracos na fé, os quais ainda não possuem essa certeza plena de salvação ou
estão sendo constantemente abalados por pecados e tentações constantes, encorajando-os
a correr pra Cristo, a Rocha eterna que dá total segurança aos Seus.
204
Conf. Ibid., p. 123–178.
129
CONCLUSÃO
Olhar para o modo como Deus conduziu a história e, na sua providência, preservou
Sua semente e Seu povo, a igreja, conduz o crente a plena segurança. Mesmo em meio a
perseguições, lutas e tormentos, o povo de Deus é vitorioso. E a garantia dessa vitória,
dada por Deus, selada pela obra gloriosa de Cristo, conduz o crente à verdadeira
segurança e certeza de salvação.
Diante disso, essa pesquisa, que nasceu motivada pela observação de tão pouca
ênfase nessa doutrina, a qual se mostra tão central na Escritura que, embora não seja
essencial para salvação é tão essencial para consolação do crente. Tendo apresentado esse
panorama bíblico-teológico, esse panorama histórico, credal e confessional, a pesquisa
chama a atenção para a urgência e dedicação dos puritanos em trazer assa doutrina para
o seu devido lugar, mostrando sua importância e a necessidade de ser ensinada e
consolidada da mente e no coração de todo o povo de Deus.
130
Falsas doutrinas têm invadido os púlpitos das igrejas, os gabinetes pastorais de
aconselhamento, a psicologia tem tomado cada vez mais espaço, cada vez mais os crentes
estão ansiosos, depressivos, apresentando apego as coisas desse mundo, inseguros quanto
a salvação, insatisfeitos e desorientados. Essa é a agenda do Diabo, não é interesse dele
que o povo de Deus esteja em plena segurança de sua salvação, pois, assim sendo, o povo
de Deus fica fraco e vulnerável, tornando-se presas fáceis para o inimigo cirandar.
O plano de Deus para o Seu povo é que cada crente seja conduzido nessa jornada
em segurança e certeza de sua salvação. Deus ordenou em Sua Palavra que assim fosse,
e não só isso, Ele prometeu a segurança ao Seu povo. É necessário que essa doutrina
esteja presente no púlpito das igrejas de Cristo, que ela esteja sedimentada na vida dos
pregadores, que ela esteja nos gabinetes pastorais, que ela direcione o crente, à luz da
Escritura e na dependência do Espírito, em plena segurança, para que assim, o povo de
Deus seja fortalecido e plenamente munido para a batalha. Afim de que o povo de Deus
possa gozar dos frutos dessa certeza e viver o céu na terra, em quanto aguarda o grande
Dia do Senhor.
Os puritanos entenderam isso, e por esse motivo, essa doutrina foi enfatizada na
Confissão de Fé de Westminster e nos escritos de tantos homens piedosos, e é por isso
que tantos homens piedosos derramaram seu sangue por amor a Cristo com um sorriso na
face, louvando e exaltando a Deus certos de que seriam recebidos em Seus braços. É
preciso resgatar esse ensino na igreja contemporânea, essa confiança plena nas promessas
de Deus, na aplicação interna da obra de Cristo e no testemunho do Espírito Santo, para
conduzir os crentes em firmeza e total consolo, mesmo que, por um momento ou outro,
essa segurança possa vacilar, mas certamente ela será renovada e, de novo, esse crente se
regozijará grandemente na segurança e certeza de sua salvação.
Só a Deus a Glória.
131
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