Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Os direitos humanos são vistos como o desafio do século XXI. Existe um esforço
internacional em formular uma base jurídica mínima de direitos humanos que
possam ser utilizados por todos os seres humanos e formas de vida, formulando
uma concepção abstrata de humanidade. (p. 23)
“Temos os direitos como algo que nos impulsiona à criação de direitos, com o
objetivo de outorgar-lhes um reconhecimento e uma aplicação universal (ou seja,
o que os direitos significam para tal perspectiva tradicional).”. (p. 26)
“Poucos parágrafos depois, nos famosíssimos artigos 1 e 2 da Declaração, já
não se fala de um “ideal a conquistar”, mas de uma realidade já alcançada [...].Os
direitos, portanto, são algo que já temos pelo fato de sermos seres humanos
absolutamente à margem de qualquer condição ou característica social.”. (p. 27)
“Os direitos humanos, mais que direitos “propriamente ditos”, são processos; ou
seja, o resultado sempre provisório das lutas que os seres humanos colocam em
prática para ter acesso aos bens necessários para a vida. Como vimos, os
direitos humanos não devem confundir-se com os direitos positivados no âmbito
nacional ou internacional.”. (p. 28)
“Os direitos virão depois das lutas pelo acesso aos bens. [...] essas lutas poderão
se apoiar em sistemas de garantias já formalizados (e aí a luta jurídica se une à
luta social de um modo importante), mas, outras vezes, as lutas não poderão se
apoiar em uma norma e se situar em planos de “alegalidade”.” (p. 28-29)
“O acesso aos bens, sempre e em todo momento, insere-se num processo mais
amplo que faz com que uns tenham mais facilidade para obtê-los e que a outros
seja mais difícil ou, até mesmo, impossível de obter.”. (p. 30)
“[...] o conteúdo básico dos direitos humanos será o conjunto de lutas pela
dignidade, cujos resultados, se é que temos o poder necessário para isso,
deverão ser garantidos por normas jurídicas, por políticas públicas e por uma
economia aberta às exigências da dignidade.”. (p. 33)
“[...] essa complexidade se agrava quando vemos que o fundamento que justifica
a “universalidade” dos direitos se sustenta em um pretendido conjunto de
premissas empíricas: os seres humanos têm todos os direitos reconhecidos nos
textos internacionais pelo mero fato de haver nascido.”. (p. 37)
“Pode ocorrer que a norma não possa ser aplicada por falta de meios
econômicos. Pode ocorrer que não se queira aplicar por falta de vontade política.
Ou quiçá ocorra que uma pessoa ou grupo partam de coordenadas culturais e
sociais que impeçam sua colocação em prática.”. (p. 38-39)
“Uma norma nada mais pode fazer por si só, já que sempre depende do conjunto
de valores que impera em uma sociedade concreta. [...] Se tal sistema de valores
– e de posições sociais – defende o público como um espaço necessário de
intervenção institucional para procurar uma satisfação igualitária de tais
necessidades e expectativas, assim serão as normas que os atores que
defendem tal sistema buscaram impor. [...] Porém, se o sistema de valores que
predomina é contrário a tal satisfação igualitária e afirma que a melhor forma de
satisfazer as necessidades é se integrando ao marco da competência privada
para a acumulação crescente de benefícios (o que agora se denomina
neoliberalismo), os atores que tenham o poder e que defendam tal sistema de
valores buscarão enfaticamente impor as normas – quer dizer, a forma de
satisfazer as necessidades e expectativas humanas – que mais lhes convenham
para reproduzi-lo o máximo possível.”. (p. 40)
“[...] os direitos humanos não possam ser compreendidos fora dos contextos
sociais, econômicos, políticos e territoriais nos quais e para os quais se dão.
Assim, para se conhecer um objeto cultural, como são os direitos humanos,
deve-se fugir de todo tipo de metafísica ou ontologia transcendentes.”. (p. 46-47)
“Os direitos humanos, como geralmente todo fenômeno jurídico e político, estão
permeados por interesses ideológicos e não podem ser entendidos à margem
de seu fundo cultural e contextual.”. (p. 49)
“Uma teoria crítica do direito deve se sustentar, então, sobre dois pilares: o
reforço das garantias formais reconhecidas juridicamente, mas, igualmente, o
empoderamento dos grupos mais desfavorecidos ao lutar por novas formas,
mais igualitárias e generalizadoras, de acesso aos bens protegidos pelo direito.”.
(p. 59)
“[...] ser crítico exige afirmar os próprios valores como algo necessário a
implementar lutas e garantias com todos os meios possíveis e, paralelamente,
mostrar as contradições e as fraquezas dos argumentos e as práticas que a nós
se opõem.”. (p. 60)
“Em terceiro lugar, a reciprocidade, como base para saber devolver o que
tomamos dos outros para construir os nossos privilégios [...].” (p. 61)
“Em quarto lugar, a responsabilidade. [...] devemos deduzir e assumir com toda
a valentia possível, primeiro, a nossa responsabilidade na subordinação dos
outros e, segundo, a nossa responsabilidade de exigir responsabilidades aos
que cometeram o saqueio e a destruição das condições de vida dos demais.”.
(p. 62)
“Segundo, uma abertura intercultural: não há uma só via cultural para alcançar
tais objetivos. Em nosso mundo coexistem muitas formas de luta pela dignidade.
[...].”. (p. 62)
“E, terceiro, uma abertura política: [...] criar as condições institucionais que
aprofundem e radicalizem o conceito da democracia, complementando os
necessários procedimentos de garantia formal com sistemas de garantias
sociais, econômicas e culturais nos quais a voz e o voto sejam efetivados por
meio da maior quantidade possível de participação e decisão populares.”. (p. 62-
63)
2. Construindo a alternativa
“1.º) Os direitos humanos não podem ser entendidos separados do político. [...]
todo produto cultural é sempre uma categoria impura, contaminada de contexto
e sempre submetida às iniludíveis relações fáticas de poder.”. (p. 74)
“Para construir uma teoria crítica e complexa dos direitos, necessitamos de [...]
ontologia da potência, que significa a ação política cidadã sempre em tensão
com as tendências dirigidas a reivindicar, quer dizer, a coisificar caras relações
sociais.”. (p. 75)
“Tal pretensão de pureza levaria, portanto, a uma tripla fobia: 1) fobia da ação;
2) fobia da pluralidade; e 3) fobia do tempo.”. (p. 81)
“2) A segunda fobia nos conduz à aparência de pluralidade. [...]. O mental está
acima do corporal; o sujeito é superior ao objeto, o individual é mais prezado que
o coletivo, etc. [...] Colocam-nos diante de pretendidas oposições insolúveis, que
não encontram outra saída além da que impõe uma como boa, a melhor ou a
universal, e deslocam a outra para o ruim, o pior e o particular/irracional.
Definitivamente, a dualidade é disjunção, desgarramento, escolha entre polos
fictícios e redutores de toda complexidade.”. (p. 82)
“Essas razões nos induzem, num exemplo atual, a rechaçar todo tipo de
reducionismo economicista que somente veja os seres humanos como produtos
da tendência natural dos indivíduos a maximizar suas preferências, suas
utilidades e seus benefícios, sem levar em consideração os contextos nos quais
a atividade econômica se realiza.”. (p. 86)
“Mais que um saber sistemático, devemos nos dirigir a um saber estratégico, que
não somente – que nos efeitos ou nas consequências das atividades e discursos
sociais, mas que se aprofunde nas causas deles e nos traga argumentos para
atuar e gerar disposições críticas e antagonistas em face da estrutura ou da
ordem social hegemônica.”. (p. 95)
“O conhecimento, tal como a natureza, é um bem social que deve ser protegido
da tendência privatizadora imposta pela ideologia e pela política neoliberais.”. (p.
100)
“[...] a nossa definição opta por uma delimitação dos direitos em função de uma
escolha ética, axiológica e política: a da dignidade humana de todos os que são
vítimas de violações ou dos que são excluídos sistematicamente dos processos
e dos espaços de positivação e reconhecimento de seus anseios, de seus
valores e de suas concepções a respeito de como deveriam ser entendidas as
relações humanas na sociedade.”. (p. 107)
“A maior violação aos direitos humanos consiste em impedir que algum indivíduo,
grupo ou cultura possa lutar por seus objetivos éticos e políticos mais gerais;
entre os quais, se destaca o acesso igualitário aos bens necessários ou exigíveis
para se viver dignamente.”. (p. 113-114)
“Nosso diamante tem três camadas, cada uma delas com seus diferentes pontos
de conexão mútua. Não estamos ante uma figura estática. O diamante nada mais
é que uma imagem em três dimensões e que sempre está em movimento.”. (p.
114)
Elemento espaço:
“[...] o terceiro elemento desta terceira camada do “diamante” nos situa ante a
perspectiva do desenvolvimento. [...] Somente haverá desenvolvimento e,
portanto, direitos humanos quando se chegar a uma distribuição igualitária não
somente de recursos monetários, mas também de técnicas e meios de
aprendizagem que permitam criar condições adaptáveis aos entornos dos
diferentes povos [...].”. (p. 136-137)
“[...] nosso diamante pode ser usado para o ensino e a prática dos direitos de
diferentes modos: 1) escolhendo relações concretas entre diferentes elementos
(por exemplo, ideias, valores, práticas sociais); 2) estudando camadas inteiras
(a posição, a disposição, a narração e a historicidade de um determinado direito
ou prática social); 3) entrecruzando diferentes camadas do diamante (por
exemplo, as relações entre determinadas políticas de desenvolvimento dos
direitos e as relações sociais de produção que predominam em espaços ou
instituições concretas).”. (p. 139)
“[...] o diamante suporá uma sintaxe cultural dos direitos que facilite três tarefas:
a) propor sentidos à investigação e à práxis; b) ordenar o trabalho e a
investigação; e c) conformar um ethos complexo e relacional.”. (p. 140)