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MANCAIS DE BUCHA – ESCOLHA DA

TOLERÂNCIA DO COLO DO MANCAL


1. OBJETIVO
O objetivo deste trabalho é a escolha da tolerância para o colo do mancal conforme
DIN31690.
Não é objetivo substituir as eventuais recomendações que o fabricante venha a fazer
complementarmente, mas, guiar e conferir para a correta seleção da tolerância, visto
que o prejuízo em uma eventual falha é enorme, fora a indisponibilidade do
equipamento.

2. POR QUE MANCAIS DE BUCHA?


Abaixo, uma ilustração com exemplo dos rolamentos de padronizados mais comuns
(são os que possuem maior capacidade de carga):

Figura 1 (Fonte: Springer Handbook of Mechanical Engineering, Grote and Antonsson,


2008, pag. 463 Fig.6.160a-f).
A seguir, exemplos de mancais de bucha padronizados conforme DIN 31690:

Figura 2 (Fonte: Catálogo RENK RH1009 3.11 página 4).


Comparando a capacidade de carga de dois conjuntos de mancais com 200mm de
diâmetro.
Conjunto 32040XDF, conforme SKF:

Figura 3 – site SKF


Capacidade máxima estática 1.372.000 N
Considerando um mancal de bucha com 200mm de diâmetro:

Figura 4 – Catálogo Renk RH1009 3.11 página 9.


Força radial máxima: 68000N.

Considerando 66% da força radial máxima: 45.333N


Máquina elétrica girante de 4 pólos síncrona, 60Hz, 1800rpm
Qual seria a vida útil se fosse utilizado rolamento 32040XDF nestas condições?

Recorrendo à vida útil estimada (método “SKF”):


1.000.000 1.372.000 (10)
𝐿10ℎ = ∗( ) 3
60 ∗ 1800 45.333
Vida útil 800.000h
Funcionamento contínuo: 91 anos.
Se a vida útil estimada para o rolamento é longa, por que utilizar mancais de
deslizamento (ou bucha)?
Gustav Niemann, em sua obra clássica Maschinenelement (na versão em português
Elementos de Máquina, Niemann, Volume 2:1971, pág. 1) enumera as seguintes
limitações ao uso de rolamentos:
1. O ruído é inconveniente;
2. Choques e impactos (Geradores p/PCH’s, Laminadores, Máquinas Rotativas
dedicadas a mineração, por exemplo);
3. Eixos de grandes dimensões e baixas rotações;
4. Aplicações onde um mancal bi-partido é necessário

Abaixo, um exemplo de onde um mancal de bucha bi-partido teve a sua aplicação


necessária:

Figura 5 – Catálogo Renk RH1009 3.11 página 8 (foto: GEC Alstom, F-Belfort).

Se fosse um mancal de rolamento, além do rotor ter que possuir mais uma chaveta e
um acoplamento, a sua substituição se tornaria um problema real (ferramentas de
extração, remoção de acoplamento).
Já que está aplicado um mancal bi-partido, basta apoiar corretamente o rotor e
desmontar somente o mancal. Isto mesmo, ao substituir a bucha, somente intervenção
no mancal.
3. Qual a tolerância a ser utilizada para o colo do mancal
É CRUCIAL a correta execução dos colos do mancal, não somente nas dimensões,
como também respeitar as tolerâncias geométricas estabelecidas pela DIN31690 e
pelos fabricantes. Obviamente, a rugosidade recomendada deve ser obedecida, para
uma longa vida útil das buchas e vedações:

Figura 6 – Catálogo Renk RH1009 3.11 página 13.


Quanto ao diâmetro e tolerâncias a serem escolhidos, faz necessidade recorrer aos
conceitos de mecânica dos fluídos.
Dimensões básicas a serem consideradas, e esboço do diagrama de pressões:

Figura 7 – Dubbel – Taschenbuch für den Maschinenbau, 23.Auflage, Seite 516, Bild.1.
B=largura apoiada pela bucha
D=diâmetro interno da bucha;
DJ=diâmetro do eixo
e=excentricidade entre a bucha e o eixo
F=força radial
h(φ)=espessura do filme de óleo em função do ângulo
hmin=espessura mínima do filme de óleo
p(φ,z)=pressão do óleo em função do ângulo e da posição em relação a coordenada z;
pmax=pressão máxima do óleo;
_
p=pressão distribuída.
z=coordenada z (-B/2≤z≤B/2)
φ=ângulo
β=ângulo onde ocorre a espessura mínima do filme de óleo;
ωB=velocidade angular da bucha
ωF=velocidade angular da força de rolamento
ωJ=velocidade angular do eixo
Da relação de Newton entre tensão transversal, viscosidade dinâmica, velocidade e
folga:

Figura 8 – Dubbel – Taschenbuch für den Maschinenbau, 23.Auflage, Seite 110,


Bild.25.a.
Equação de Newton:
𝛿𝑣
𝜏=𝜂∗
𝛿𝑦
τ=tensão de cisalhamento do líquido;
η=viscosidade dinâmica
δv=variação de velocidade
δy=folga radial (ou espessura do filme)
Conforme o equacionamento acima, falta de folga ocasiona tensões excessivas no
fluído. Excesso de folga poderá ocasionar pressão insuficiente para lubrificação.
Recordando, o objetivo principal deste trabalho é a escolha da tolerância para o colo do
mancal conforme DIN31690.
A DIN31690 recomenda 5 valores de folga relativa (ψm), dependentes do diâmetro e da
velocidade periférica do mancal:

Figura 9 – Catálogo Renk RH1009 3.11 página 18

Figura 10 – Catálogo Renk RH1009 3.11 página 18


Observar que a tolerância é IT6, conforme ISO 286.
Quanto a rugosidade, a recomendação é Ra=0,63μm, entre N5 (0,4μm) e N6 (0,8μm).
O furo da bucha do mancal é padronizado com tolerância H7.
Utilizando o exemplo do mancal de 200mm de diâmetro, 45.333N de carga, para
rotações síncronas a 60Hz em máquinas elétricas de 2 a 12 polos.
A velocidade tangencial é obtida:
𝜋∗𝐷∗𝑛
𝑣𝑡 =
60 ∗ 1000
Onde:
vt: velocidade tangencial em m/s
D: diâmetro do colo do mancal em mm
n: rotação síncrona em rpm.
120 ∗ 𝑓
𝑛=
𝑁𝑃
f: frequência da rede de alimentação em Hz
NP: número de pólos.
Obs.: para máquinas assíncronas, a rotação é obtida determinando a rotação síncrona
e multiplicando pelo fator de escorregamento. Para motores com rotor de gaiola, por
exemplo, o escorregamento fica entre 3% e 5%. Portanto, o fator de escorregamento
fica entre 0,97 (1-0,03) e 0,95 (1-0,05).
pólos 2 4 6 8 10 12
rotação
3600 1800 1200 900 720 600
(rpm)
vt (m/s) 37,7 18,8 12,6 9,4 7,5 6,3
ψm (0/00) 1,9 1,6 1,6 1,32 1,32 1,12

diâmetro do
colo em mm 199,676 199,733 199,733 199,787 199,787 199,825
(máximo)

diâmetro do
colo em mm 199,647 199,714 199,714 199,758 199,758 199,806
(mínimo)

diâmetro
interno da
bucha em 200,046 200,046 200,046 200,046 200,046 200,046
mm
(máximo)
diâmetro
interno da
bucha em 200,000 200,000 200,000 200,000 200,000 200,000
mm
(mínimo)
folga
máxima em 0,399 0,332 0,332 0,288 0,288 0,240
mm
folga
mínima em 0,324 0,267 0,267 0,213 0,213 0,175
mm
Em vermelho, as dimensões limites para o colo de mancal diâmetro nominal 200mm,
para as rotações (em rpm) de 3600, 1800, 1200, 900, 720 e 600.
Como adicional, será determinado o aquecimento do óleo em um minuto de operação,
para as 6 condições de velocidade síncrona e nas viscosidades ISO VG32, 46 e 68.
O primeiro passo é determinar o coeficiente de Sommerfeld. O formulário está indicado
a seguir, os cálculos via planilha eletrônica:

p=pressão média distribuída


ψeff=folga diametral relativa efetiva
ηeff=viscosidade dinâmica efetiva
ωeff=velocidade tangencial efetiva
Viscosidade efetiva:

Com:

ρ15=densidade do fluído a 15ºC


VG=índice de viscosidade ISO VG
No gráfico abaixo, é obtida a excentricidade relativa ε:

Figura 11 – Dubbel – Taschenbuch für den Maschinenbau, 23.Auflage, Seite 516, Bild.3
(nach DIN 31652)

O filme mínimo de óleo (a ser usado na equação de Newton para determinar a tensão
cisalhante no fluído e, por consequência o torque e a potência que o óleo dissipa):
Figura 12 – EXCENTRICIDADE RELATIVA - Dubbel – Taschenbuch für den
Maschinenbau, 23.Auflage, Seite 516, Bild.3 (nach DIN 31652)
A potência de atrito gerada no mancal é dada por:

(conforme “Dubbel – Taschenbuch für den Maschinenbau,


23.Auflage, Seite 518“ – equação 9)
f=coeficiente de atrito
F=força radial
UJ=velocidade tangencial do eixo
UB=velocidade tangencial da bucha (UB=0 para quase a totalidade dos mancais de
bucha)
O fator de atrito:

(conforme “Dubbel – Taschenbuch für den Maschinenbau,


23.Auflage, Seite 518“ – equação 10)
DIÂMETRO (m) 0,2 0,2 0,2 0,2 0,2 0,2
COMPRIMENTO
0,2 0,2 0,2 0,2 0,2 0,2
(m)
rotação (rpm) 3600 1800 1200 900 720 600
velocidade
37,7 18,8 12,6 9,4 7,5 6,3
tangencial (m/s)
Força (N) 45333 45333 45333 45333 45333 45333
ψeff (max) 0,00200 0,00166 0,00166 0,00144 0,00144 0,00120
ψeff (min) 0,00162 0,001335 0,001335 0,001065 0,001065 0,000875
ψeff (med) 0,00181 0,00150 0,00150 0,00125 0,00125 0,00104
ISO VG 32 32 32 32 32 32
ISO VG 46 46 46 46 46 46
ISO VG 68 68 68 68 68 68
dens VG32 (kg/m³) 863 863 863 863 863 863
dens VG46 (kg/m³) 869 869 869 869 869 869
dens VG68 (kg/m³) 874 874 874 874 874 874
n40 (VG32) Pa*s 0,027 0,027 0,027 0,027 0,027 0,027
n40 (VG46) Pa*s 0,039 0,039 0,039 0,039 0,039 0,039
n40 (VG68) Pa*s 0,058 0,058 0,058 0,058 0,058 0,058
nef (VG32) Pa*s 0,027 0,027 0,027 0,027 0,027 0,027
nef (VG46) Pa*s 0,039 0,039 0,039 0,039 0,039 0,039
nef (VG68) Pa*s 0,058 0,058 0,058 0,058 0,058 0,058
L*D (m²) 0,04 0,04 0,04 0,04 0,04 0,04
pmed (Pa) 1133325 1133325 1133325 1133325 1133325 1133325
b VG32 163,952 163,952 163,952 163,952 163,952 163,952
b VG46 165,957 165,957 165,957 165,957 165,957 165,957
b VG68 169,165 169,165 169,165 169,165 169,165 169,165
a VG32 0,008 0,008 0,008 0,008 0,008 0,008
a VG46 0,012 0,012 0,012 0,012 0,012 0,012
a VG68 0,017 0,017 0,017 0,017 0,017 0,017
So VG32 3,6 5,0 7,4 6,9 8,7 7,1
So VG46 2,5 3,4 5,1 4,8 6,0 4,9
So VG68 1,7 2,3 3,5 3,2 4,0 3,3
ε VG32 0,78 0,84 0,9 0,88 0,9 0,89
ε VG46 0,75 0,77 0,84 0,83 0,85 0,84
ε VG68 0,65 0,64 0,77 0,63 0,8 0,63
β VG32 (°) 35 32 26 27 26 26
β VG46 (°) 40 37,5 32 32 32 32
β VG68 (°) 45 45 37,5 45 45 45
β VG32 (rad) 0,611 0,559 0,454 0,471 0,454 0,454
β VG46 (rad) 0,698 0,654 0,559 0,559 0,559 0,559
β VG68 (rad) 0,785 0,785 0,654 0,785 0,785 0,785
f VG32 0,003 0,002 0,002 0,001 0,001 0,001
f VG46 0,004 0,003 0,002 0,002 0,002 0,001
f VG68 0,005 0,003 0,002 0,002 0,002 0,001
Pf VG32 (W) 4981 1778 994 617 440 343
Pf VG46 (W) 6619 2138 1150 746 522 412
Pf VG68 (W) 8312 2558 1414 790 677 426
hmin VG32 (m) 3,977E-05 2,396E-05 1,497E-05 1,503E-05 1,252E-05 1,141E-05
hmin VG46 (m) 4,519E-05 3,444E-05 2,396E-05 2,129E-05 1,879E-05 1,660E-05
hmin VG68 (m) 6,326E-05 5,391E-05 3,444E-05 4,634E-05 2,505E-05 3,839E-05
volume de óleo
0,0175 0,0175 0,0175 0,0175 0,0175 0,0175
(m³)
massa óleo VG32 15,103 15,103 15,103 15,103 15,103 15,103
massa óleo VG46 15,208 15,208 15,208 15,208 15,208 15,208
massa óleo VG68 15,295 15,295 15,295 15,295 15,295 15,295
Cp óleo (J/kg*K) 1785 1785 1785 1785 1785 1785
Calor transferido
em 1 min/60s (J) 298837 106660 59652 36998 26396 20553
para VG32
Calor transferido
em 1 min/60s (J) 397143 128252 69017 44761 31332 24740
para VG46
Calor transferido
em 1 min/60s (J) 498708 153495 84853 47408 40612 25549
para VG68
Aumento de
temperatura para 11,1 4,0 2,2 1,4 1,0 0,8
VG32 (K)
Aumento de
temperatura para 14,6 4,7 2,5 1,6 1,2 0,9
VG46 (K)
Aumento de
temperatura para 18,3 5,6 3,1 1,7 1,5 0,9
VG68 (K)
O aumento da viscosidade aumenta a perda, que gera calor.
A diminuição da folga também aumenta a perda, que gera calor.
Alguns fabricantes de máquinas fixam a folga relativa em 0,001, especialmente os que
não adotam normas DIN.
Somente com esta alteração de parâmetro, é observado os novos aumentos de
temperatura em 1min:

Aumento de
temperatura para 18,1 5,4 3,0 1,6 1,1 0,8
VG32 (K)
Aumento de
temperatura para 24,4 6,5 3,5 1,9 1,3 0,9
VG46 (K)
Aumento de
temperatura para 31,1 7,9 4,3 2,1 1,7 1,0
VG68 (K)

Além do risco de dano, os sistemas de arrefecimento sofreriam um aumento substancial


nos custos e espaços necessários para instalação.

4. CONCLUSÃO

A DIN31690 (que recorre a DIN31652) tem o devido embasamento físico, mostrando-


se adequada e prática na escolha não só do mancal, como também nas tolerâncias para
os respectivos colos. Reforçando, os furos das buchas são padronizados em H7.

5. REFERÊNCIAS

Catálogo Renk RH1009 3.11

www.skf.com

Springer Handbook of Mechanical Engineering, Grote and Antonsson, 2008

Dubbel – Taschenbuch für den Maschinenbau, 23.Auflage: 2011

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