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Desenvolvimento regional: uma análise sobre a estrutura de um

consórcio intermunicipal

Thiago Reis Xavier


Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)
Milton Luiz Wittmann
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)
Raoni de Oliveira Inácio
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)
Juliana Kern
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)

O desenvolvimento regional compreende um esforço das sociedades locais na formulação de políticas


regionais com o intuito de discutir as questões que tornem a região sujeito de seu processo de desen-
volvimento. O presente trabalho tem como objetivo descrever, por meio da análise da estrutura de
governança, como o Consórcio de Desenvolvimento Sustentável da Quarta Colônia (Condesus) pro-
move a articulação dos municípios da Quarta Colônia em prol do desenvolvimento regional. Para tal,
realiza-se uma pesquisa qualitativa, de natureza exploratória descritiva e delineamento de estudo de
caso. Como resultados, obteve-se que o Condesus representa um caso no qual predomina a adminis-
tração pública, constituindo uma associação pública de direito privado, cuja estrutura administrativa é
composta pela Presidência; Conselho de Prefeitos e Secretaria Executiva. O mesmo desenvolve projetos
focados no desenvolvimento da Quarta Colônia, a partir do cooperativismo municipal. Conhecer a
estrutura de governança do Condesus possibilita entender uma dinâmica original mediante a qual se
espera compreender o processo de desenvolvimento regional.

P a l av r a s - c h av e : desenvolvimento regional; governança; administração pública; consórcio; Conde-


sus.

Desarrollo regional: un análisis de la estructura de un consorcio entre municipios


El desarrollo regional comprende un esfuerzo de las sociedades locales en la formulación de las políticas
con el fin de debatir las cuestiones que hacen la región el sujeto pincipal en su proceso de desarrollo. Em
este artículo se pretende describir como el consorcio para el desarrollo sostenible de la Cuarta Colonia

Artigo recebido em 27 ago. 2012 e aceito em 16 abr. 2013.

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(Condesus) promueve la articulación de los municipios en favor del desarrollo regional. Para tanto, se
realiza una investigación cualitativa, de naturaleza exploratoria-descritiva y con bosquejo del método
estudio de caso. Como resultado, se obtuvo que en el Condesus es una asociación publica de derecho
privado, cuya estructura administrativa está compuesta por la Presidencia; El Consejo de intendetes
y la Secretaría Ejecutiva; y que el mismo desarrolla proyectos enfocados en el desarrollo de la Cuarta
Colonia, a partir de las cooperativas municipales. Conocer la estructura de gobernanza del Condesus
posibilita el ententimiento de una dinámica original por medio de la cual se espera comprender el
proceso de desarrollo regional.

Palabras c l av e : desarrollo regional; gobernanza; administración pública; consorcio; Condesus.

Regional development: an analysis about the structure of a consortium of municipalities


The regional development comprises an effort of local societies in the formulation of regional policies
in order to discuss the issues that make the region responsible for its development process. This paper
aims to describe, through the analysis of the governance structure, how the Consortium for Sustaina-
ble Development of Quarta Colônia (Condesus) promotes the coordination of the cities for regional
development. For this, it was developed a qualitative research, with an exploratory and descriptive
nature, and the design of a case study. As the result, it was found that the Condesus represents a case
in which predominates the public administration, constituting a public association of private law, whose
administrative structure consists in the Presidency, Council of Mayors and Executive Secretariat, and
develops projects focused on the development of the Quarta Colônia, from the municipal cooperati-
vism. Knowing the governance structure of Condesus, is possible to understand the original dynamics
by which is expected to understand the regional development process.

K e y w o r d s : regional development; governance; public administration; consortium; Condesus.

1. Introdução

Os estudos envolvendo o desenvolvimento regional vêm ganhando relevância desde os anos


1990, em decorrência de uma estratégia europeia que visa reforçar programas de descentra-
lização econômica regional, a partir da valorização das potencialidades endógenas (Tapia,
2005). Essa estratégia trouxe como consequência mudanças nas estruturas das redes infor-
macionais de produção, distribuição e consumo. Além do incremento de sistemas econômicos
localizados, a exemplo de sistemas locais de produção e governança de cadeias produtivas.
Partindo desse contexto, passa-se a compreender o desenvolvimento regional não
apenas atrelado ao crescimento econômico, mas também a fatores sociais, culturais, am-
bientais e políticos, acompanhado da melhoria na qualidade de vida (Oliveira, 2002). Tais
premissas podem ser salientadas por meio de análises que possibilitem a inclusão das alte-
rações da composição da sociedade e da alocação de recursos pelos diferentes setores da
economia, de forma a melhorar os indicadores de bem-estar econômico e social (pobreza,
desemprego, desigualdade, condições de saúde, alimentação, educação e moradia) (Vas-
concellos e Garcia, 1998).

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Sob uma percepção mais ampla acerca do tema em epígrafe, considera-se que, nos
processos endógenos de desenvolvimento regional, são os atores da própria localidade que,
ao adotarem estratégias, a partir do potencial desenvolvimentista existente em seu território,
controlam o processo de transformação local visando aumentar o bem-estar da comunidade
da qual fazem parte (Vázquez Barquero, 2001). O que leva à percepção de que o conjunto de
recursos econômicos, humanos, institucionais e culturais regionais constitui o ponto de parti-
da para o desenvolvimento de uma comunidade territorialmente localizada.
No entanto, faz-se necessário lembrar que, para promover o desenvolvimento, os planos
regionais necessitam estar relacionados a estruturas de governança regional, resultantes da
ação coletiva dos atores públicos e privados que interagem dentro de um contexto espacial,
institucional, político e cultural específico (Tapia, 2005).
O termo governança regional refere-se às iniciativas ou ações que expressam a “capa-
cidade de uma sociedade organizada territorialmente, para gerir os assuntos públicos a par-
tir do envolvimento conjunto e cooperativo dos atores sociais, econômicos e institucionais”
(Dallabrida, 2000:46), dentre as quais se podem citar: os fóruns ou conselhos regionais de
desenvolvimento, as agências ou consórcios de desenvolvimento local ou regional, os grupos
de interesse e as associações.
No Brasil, um caso no qual se observa a ocorrência de políticas de desenvolvimento
regional por meio da articulação dos atores regionais através de um plano de governança ter-
ritorial pode ser observado na Quarta Colônia no Rio Grande do Sul, cuja região encontra-se
localizada no centro-oeste do estado (Xavier, 2012).
Na Quarta Colônia, há evidências sobre a existência de ações compartilhadas entre os
municípios: Agudo, Dona Francisca, Faxinal do Soturno, Ivorá, Nova Palma, Pinhal Grande,
Restinga Seca, São João do Polêsine e Silveira Martins. Este compartilhamento de ações tor-
na-se possível devido às características geográficas e culturais locais que favorecem a busca
por estratégias conjuntas capazes de minimizar as precariedades e maximizar as potenciali-
dades da região (Xavier, 2012).
Todavia, mesmo diante dessas potencialidades locais, por muito tempo notou-se na
Quarta Colônia a carência por uma sintonia entre os interesses do homem da cidade e o do
campo. O que proporcionou questionamentos acerca da construção e conduções de estratégias
para minimizar a precariedade da região. Tal cenário estimulou, em 1996, o surgimento do
Consórcio de Desenvolvimento Sustentável da Quarta Colônia (Condesus), formado por nove
municípios pertencentes à região, que consorciados constituem uma aliança estratégica em
busca do desenvolvimento sustentável da região (Battistella, Erdmann e Wittmann, 2008).
Essa aliança intermunicipal constitui uma associação pública de direito privado e
sem fins econômicos, cuja administração é realizada pelos prefeitos dos municípios envol-
vidos, com o apoio de uma Secretaria Executiva (Quarta Colônia, 2011). Tais predicados
caracterizam o consórcio como um caso no qual predomina a existência de uma adminis-
tração pública.
O presente artigo tem como objetivo descrever, por meio da análise da estrutura de
governança, como o Condesus promove a articulação dos municípios da Quarta Colônia

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em prol do desenvolvimento regional. A relevância do estudo se evidencia a partir do mo-


mento no qual se observa que a experiência de valorização das potencialidades territoriais
da Quarta Colônia leva a questionamentos acerca de como os atores locais cooperam e se
mobilizam na busca pela construção e condução de estratégias conjuntas visando minimi-
zar as precariedades da região. E de como ocorreu o processo de criação, planejamento e
implementação do Condesus.
A indagação desses preceitos faz com que o Condesus seja escolhido como unidade de
estudo, já que representa um caso no qual os atores locais (econômicos, políticos e sociais) se
uniram na tentativa de promover o desenvolvimento da Quarta Colônia, a partir da valoriza-
ção de potencialidades endógenas da região.
Partindo dos pontos destacados, considera-se que o tema do artigo é desenvolvimento
regional. Para discutir a temática, realiza-se o estudo de caso de um consórcio intermunicipal
(o Condesus), cujo propósito é promover a cooperação entre nove municípios pertencentes a
uma mesma região (a Quarta Colônia). Considera-se que conhecer a estrutura de governança
do Condesus possibilita entender uma dinâmica original por meio da qual se espera compre-
ender o processo de desenvolvimento regional.
O artigo encontra-se estruturado em sete seções, incluindo a introdução. A seção dois
apresenta uma revisão bibliográfica acerca do tema desenvolvimento regional e suas relações
com o termo governança. A seção três apresenta três metodologias de análise nas quais se pro-
curou basear a coleta de dados e a análise de resultados. A quarta apresenta os procedimentos
metodológicos adotados. A quinta discute e analisa os resultados apontados em relação ao es-
tudo de caso. Por fim, a seção seis expõe as considerações finais, enquanto a sétima apresenta
referências bibliográficas.

2. Desenvolvimento regional e governança

Nesta seção, são apresentados os pressupostos teóricos relacionados ao desenvolvimento


regional de sua perspectiva endógena, conforme abordado na pesquisa. Busca-se, também,
aproximar o tema ao conceito de governança, visando esclarecer como a compreensão do
termo pode facilitar no entendimento da estrutura de funcionamento do Condesus, mediante
um plano de governança regional.
O desenvolvimento regional compreende o crescente esforço das sociedades locais na
formulação de políticas territoriais. O que ocorre com o intuito de discutir questões que inclu-
am alterações da composição da sociedade e a alocação de recursos pelos diferentes setores
da economia, de forma a melhorar os indicadores de bem-estar econômico e social (pobreza,
desemprego, desigualdade, condições de saúde, alimentação, educação e moradia) (Vascon-
cellos e Garcia, 1998).
Nesses preceitos, compreende-se o desenvolvimento regional como um processo de
“mudança social sustentada que tem como finalidade última o progresso permanente da re-
gião, da comunidade regional como um todo e de cada indivíduo residente nela” (Boisier,

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1996:33). O mesmo resulta de um crescente esforço das sociedades locais na formulação de


políticas territoriais com o intuito de discutir as questões centrais da complexidade contem-
porânea capazes de tornar a região o sujeito de seu próprio processo de desenvolvimento
(Dallabrida, 2000).
Ampliando a discussão, Scott e Storper (2003) ponderam que o processo de desenvol-
vimento regional envolve uma discussão a respeito de fatores endógenos e exógenos. Sobre
esse debate, Leydesdorff, Cooke e Olazaran (2002) destacam a dificuldade de promover o de-
senvolvimento por meio da atração de investimentos externos. Panorama que levou, a partir
da década de 1990, à consolidação de uma concepção que visa envolver os atores regionais,
na busca pela superação dos problemas de uma perspectiva endógena.
Com base nesses argumentos, considera-se que o desenvolvimento regional, de uma
perspectiva endógena, pode ser observado no caso do Condesus (unidade de análise do estu-
do), pois o mesmo busca promover a articulação dos municípios pertencentes à Quarta Colô-
nia, a partir das potencialidades internas da região.
Ampliando a discussão acerca do desenvolvimento regional de uma perspectiva endó-
gena, Tapia (2005) ressalta que o sucesso desse processo dependente da articulação de forças
do próprio território. Para Boisier (1996), o mesmo deriva do envolvimento direto dos agen-
tes regionais (econômicos, sociais e políticos) na concepção e execução de um projeto próprio
de desenvolvimento endógeno.
Por sua vez, Vázquez Barquero (2001) destaca que, no processo de desenvolvimento
endógeno, a região passa a ser um agente de transformação e não um suporte dos recursos
e atividades econômicas, uma vez que há interação entre empresas e os demais atores, que
se organizam para desenvolver a economia e a sociedade. De acordo com esse pensamento,
o ponto de partida para uma comunidade territorial reside no conjunto e no inter-relaciona-
mento entre os recursos (econômicos, humanos, institucionais e culturais) formadores de seu
próprio potencial de desenvolvimento.
Partilhando do mesmo pensamento, Sotarauta (2005) descreve que o processo de
desenvolvimento regional perpassa por uma agenda de mobilização de recursos e atores pro-
motores (instituições, lideranças sociais, organizações) que proporcionem a aprendizagem
e troca de conhecimento. Sob esse ponto de vista, Vázquez Barquero (2001) considera que
no desenvolvimento endógeno são os atores locais que, ao adotarem estratégias a partir do
potencial de desenvolvimento existente em seu território, controlam o processo de transfor-
mação econômica e social visando aumentar o bem-estar da sociedade.
De forma complementar, Normann (2012) salienta que o desenvolvimento endógeno
deve contemplar preceitos como a inovação e processos de colaboração entre os setores so-
ciais de uma determinada localidade. Tal conjuntura geralmente é permeada pelo surgimento
de lideranças locais oriundas de uma base democrática.
A partir das considerações expostas, pondera-se que a articulação dos diversos atores
representativos de uma localidade é fundamental para o desenvolvimento. Esses são repre-
sentados pela sociedade civil, as organizações não governamentais, as instituições privadas e

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o próprio governo. Nesse processo, cada um dos envolvidos tem seu papel para contribuir com
o desenvolvimento regional (Buarque, 2006).
Ressaltada a importância da participação ativa dos atores locais para o desenvolvimen-
to endógeno, Coe e colaboradores (2004) destacam que tal concepção envolve aspectos de
governança, como forma de viabilizar o inter-relacionamento. Sobretudo para que seja possí-
vel contemplar os pressupostos ressaltados por Vázquez Barquero (2001), Sotarauta (2005),
Buarque (2006) e Normann (2012). No presente estudo, remete-se à governança como o
termo utilizado por Willianson (1996), segundo o qual as decisões tomadas no âmbito de uma
organização estão diretamente relacionadas ao seu ambiente institucional.
Sob esse entendimento, Bobbio (2005) aponta que governança se baseia em acordos
e contratos negociados junto a uma multiplicidade de atores. Partilhando da mesma visão,
Moreiras, Tambosi Filho e Garcia (2012) a compreendem como o conjunto de processos, cul-
turas, políticas, normas e leis que regulam o modo como uma relação interorganizacional é
administrada. Enquanto Suzigan, Garcia e Furtado (2007) relacionam o termo à capacidade
de coordenação que agentes (empresas, organizações, instituições) exercem sobre as inter-
relações produtivas, comerciais, tecnológicas e outras, influenciando diretamente o desenvol-
vimento de um arranjo local.
Nesses preceitos, Storper e Harrison (1991) salientam que a governança é estruturada
pelas relações de cooperação existentes, pelo grau de hierarquia, liderança e comando pre-
sente entre os participantes do sistema. Enquanto Gilpin (2002) ressalta que a mesma resulta
de redes formadas por organizações públicas e privadas em um nível regional, nacional ou
internacional, que contêm em si uma função social. Contexto no qual o governo passa a atuar
mais como um mediador num processo de negociação política.
De forma mais aprofundada, Humphrey e Schmitz (2000) apontam para as ações de go-
vernança visando à criação de sistemas voltados à promoção do desenvolvimento dos produto-
res locais, centros de prestação de serviços tecnológicos e associações/agências governamentais
voltadas para este fim. Abordagem que se aproxima do propósito do presente estudo.
Mais especificamente, no que diz respeito às associações e agências locais de desenvol-
vimento, Humphrey e Schmitz (2000) apontam que tais instituições atuam como elementos
viabilizadores do processo de desenvolvimento regional por meio de ações de fomento à com-
petitividade e de promoção do conjunto das empresas.
A partir dos pressupostos apresentados, pode-se aproximar o termo governança da te-
mática do desenvolvimento regional. Sobre essa aproximação, Albertin (2003:93) salienta
que a governança regional “tem sido usada como forma de trabalhar em conjunto e usar o
poder coletivo na busca de soluções para problemas comuns”. Quando relacionada com seu
objetivo, a mesma é definida por ações coletivas de diversos atores na busca do seu desenvol-
vimento.
Dallabrida (2000:46) ressalta que a governança regional é utilizada para se referir às
“iniciativas ou ações que expressam a capacidade de uma sociedade organizada territorial-
mente, para gerir os assuntos públicos a partir do envolvimento conjunto e cooperativo dos
atores sociais, econômicos e institucionais”. Para Löffler (2001:212), a mesma tem como ob-

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jeto “a ação conjunta, levada a efeito de forma eficaz, transparente e compartilhada, pelo
Estado, pelas empresas e pela sociedade civil, visando uma solução inovadora dos problemas
sociais”. O que pode criar possibilidades de um desenvolvimento sustentável futuro para to-
dos os participantes.
Para Dallabrida e Becker (2003), as articulações inerentes à governança regional in-
cluem todos os processos que se dão com o objetivo de diagnosticar a realidade, definir priori-
dades, planejar ações e determinar como os recursos financeiros, materiais e humanos devem
ser alocados. Visando a dinamização das potencialidades e a superação dos desafios, a favor
do desenvolvimento regional.
Nessa visão, considera-se que a governança regional pode atuar como um mecanismo
de “aprofundamento democrático e de desenvolvimento como ‘expansão das liberdades’, mas
também pode ser mecanismo de socialização dos custos e privatização dos ganhos do desen-
volvimento” (Rover, 2007:114).
Ressaltada a função da governança regional, alerta-se para o fato de que, junto à elabo-
ração de um plano/programa compartilhado por atores locais, emerge a necessidade de veri-
ficar quem realmente participa, toma decisões e se beneficia das ações realizadas. Sobre esse
argumento, salienta-se que a existência de um plano de governança não garante que todos os
problemas, necessidades e interesses de uma região sejam contemplados, seja pela ausência
de recursos ou assimetrias na distribuição de poder (Rover e Henriques, 2006).
A partir das argumentações destacadas, acredita-se que boa parte dos aspectos aborda-
dos por Dallabrida (2000), Humphrey e Schmitz (2000), Albertin (2003), Dallabrida e Becker
(2003), Rover (2007), Suzigan, Garcia e Furtado (2007) e Moreiras, Tambosi Filho e Garcia
(2012) remetem ao Condesus. Dessa forma, considera-se pertinente observar se os pressupos-
tos pelos autores em questão encontram-se presentes na unidade de análise da pesquisa.
Além disso, conforme aspectos apontados por Rover e Henriques (2006), torna-se rele-
vante compreender a estrutura de governança do Condesus como mecanismo mediador das
relações e interesses entre os municípios associados a favor do desenvolvimento endógeno.

3. Metodologias de análise do desenvolvimento regional

Na presente seção são apresentadas metodologias de análise mostradas pelo Instituto Latinoa-
mericano y del Caribe de Planificación Económica y Social (Ilpes, 1998) e por dois autores que
estudam o desenvolvimento regional: Boisier (1996) e Buarque (2006). Esses esquemas/me-
todologias são vislumbrados como possibilidades de análise de um plano de desenvolvimento
regional, uma vez que se observa uma dificuldade em encontrar um consenso a respeito de
modelos de análise validados sobre o tema.
Baseando-se na análise dessas três metodologias, se pretende destacar preocupações co-
muns presentes em projetos regionais exitosos. As características, aspectos e dinâmicas apre-
sentados a seguir serviram como base para a elaboração dos procedimentos metodológicos
adotados e a determinação de pontos iniciais a serem observados na análise de resultados.

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Como primeira metodologia de análise a ser destacada, o Ilpes (1998) propõe um pro-
cesso, baseado em algumas características comuns à maioria dos processos de desenvolvimen-
to que, juntas, poderiam conferir solidez ao processo de desenvolvimento regional. Sob essa
forma de análise, a vantagem da gestão local do desenvolvimento reside na capacidade de
se conhecer quais são os recursos que estão disponíveis — recursos naturais de cada lugar —
e estabelecer um canal direto e dinâmico de interação entre os agentes econômicos e o terri-
tório.
Aprofundando o estudo sobre o método em destaque, considera-se que o desenvolvi-
mento regional supõe uma série de pré-requisitos ou dinâmicas, tais como: a) compromisso
mínimo entre os atores; b) busca de um diálogo entre os representantes políticos e econômi-
cos; e c) superar a incompreensão mútua que aparece na ausência de locais de reunião entre
as esferas econômica e social.
Partindo dos pressupostos destacados, o Ilpes (1998) ressalta que o alcance do desen-
volvimento regional resulta de um processo que se baseia em um princípio simples: devem-se
tomar as medidas necessárias para resolver os problemas e promover potencialidades locais.
Este princípio é formulado por meio de diferentes fases, conforme apresenta o quadro 1.

Quadro 1
Fases e conteúdo da dinâmica de desenvolvimento regional
I. Coleta de dados, análise e diagnóstico: informação Proporciona o conhecimento da capacidade de desenvolvimento,
as oportunidades e potencialidades, como os recursos disponíveis
para tanto.

II. Definição de uma estratégia Estabelecimento dos objetivos gerais. Decide-se onde e como se
quer chegar.

III. Elaboração do plano de ação Permite pré-avaliar os projetos separadamente, identificar sua
estrutura e estudar sua viabilidade.

IV. Seleção e gestão de projetos Definem-se e selecionam-se os projetos de desenvolvimento.

V. Implementação As ideias se convertem em ações práticas.

VI. Avaliação Reflexão avaliativa dos impactos das ações.

Fonte: Elaborado pelos autores, adaptado do Ilpes (1998).

A observação das considerações e características apresentadas pela metodologia de


processo de desenvolvimento regional proposta pelo Ilpes (1998), especialmente no que diz
respeito às fases do planejamento destacadas pelo quadro 1, permite realizar um paralelo
com a metodologia de planejamento proposta por Buarque (2006), que divide o processo
de planejamento em quatro etapas sequenciais e interligadas entre si. Estas quatro etapas
do planejamento, que, segundo o autor, podem possibilitar o desenvolvimento regional, são
expostas a seguir.

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a. Conhecimento da realidade ou diagnóstico:


a.1. Delimitação do objeto: delimitação da região que se pretende planejar;
a.2. Diagnóstico: auxilia na compreensão da realidade atual da região e os fatores em ma-
turação;
a.3. Prognóstico: busca antecipar possíveis desdobramentos futuros da realidade.
b. Tomada de decisões:
b.1. Visão de futuro: quando a sociedade define aonde se pretende chegar com a implemen-
tação de um plano, o que se define por meio de uma descrição quantitativa e qualita-
tiva da realidade futura. Segundo o autor, a visão de futuro divide-se em:
i. Futuro desejado: estado futuro desejado pela sociedade atemporal e livre de restri-
ções, sinalizando para uma imagem objetivo a longo prazo que serve de referência
para as decisões estratégicas;
ii. Objetivos: que serão perseguidos pelo plano de desenvolvimento;
iii. Metas: representam a quantificação dos objetivos, explicando os resultados quan-
tificáveis pretendidos e que podem ser gerados com estratégia ou com plano em
determinados prazos.
b.2. Formulação das opções estratégicas: indicam onde devem ser concentradas, de modo a
mostrar o caminho geral a ser seguido e organizar a sociedade em torno dos eixos de
atuação definidos. Esta etapa deve resultar de uma análise da relação dos problemas e
potencialidades endógenas com as oportunidades e ameaças exógenas;
b.3. Elaboração dos programas e projetos: consiste na desagregação das opções estratégicas
em programas, políticas e projetos específicos por outros setores ou dimensões da
realidade;
b.4. Definição dos instrumentos: momento no qual devem ser definidos e viabilizados ins-
trumentos (meios financeiros, legais, organizacionais, institucionais), que permitirão
a execução do plano;
b.5. Formulação do modelo de gestão: é a definição da forma como a sociedade e o Estado
(setor público) devem se organizar para a implementação das ações, da gestão dos
instrumentos e programas, e para avaliação dos seus resultados.
b.6. Construção da adesão e sustentabilidade políticas: significa discutir com a sociedade o
plano e divulgá-lo.
c. Execução do plano:
c.1. Momento no qual se coloca em prática o planejamento elaborado durante as etapas a e b.

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d. Acompanhamento:
d.1. Controle e avaliação das ações implementadas.
Além dessas quatro etapas do planejamento do desenvolvimento, Buarque (2006) res-
salta que, para ter sucesso, um plano precisa responder a questões tais como: a) O que somos?
(realidade atual); b) De onde viemos? (história da evolução recente); c) Onde estamos situa-
dos? (contexto externo); d) Aonde queremos chegar com o plano de ação? (visão de futuro);
e) O que se deve e pode fazer para chegar aonde queremos?; f) Onde concentrar as ações?;
g) Com que meios se podem implementar as ações?; e h) Como se organizar para executar e
acompanhar as ações?

Além das metodologias propostas pelo Ilpes (1998) (quadro 1) e por Buarque (2006),
Boisier (1996) sugere o hexágono de desenvolvimento regional como uma metodologia ca-
paz de articular inteligentemente seis vértices. O autor em questão defende o pensamento de
que o desenvolvimento de um território organizado depende da existência, da articulação e
das condições de manejo de seis elementos, que normalmente estão presentes em qualquer
território organizado: a) atores, b) instituições, c) cultura, d) procedimentos, e) recursos, e
f) entorno; conforme resume o quadro 2.

Quadro 2
Hexágono do desenvolvimento regional
Elementos Descrição
Atores Consiste em identificá-los por categorias (membros da sociedade civil, agrupamentos empresa-
riais, movimentos sociais e outros) e definir o papel de cada um no plano de desenvolvimento e
governança local.
Cultura Refere-se ao potencial cultural da região no que diz respeito à capacidade de promover a cooperação,
à solidariedade, à autorreferência e à identificação da sociedade com o próprio território.
Recursos Consiste em definir quais os recursos que serão trabalhados pelo plano de desenvolvimento (hu-
manos, financeiros, materiais e/ou psicossociais).
Instituições Consiste no exame do ambiente institucional da região e na identificação de quais instituições
exercem influência e poder na governança local.
Procedimentos Refere-se à natureza de gestão do governo territorial, sendo importante destacar o conjunto de ações
que representam o exercício da autoridade, a capacidade de liderança e a tomada de decisões de
curto e longo alcance.
Entorno Relaciona-se com tudo o que é externo à região ou à província. É o meio externo, configurado pela
multiplicidade de organismos, sobre os quais não se tem controle, mas com os quais a região como
um todo se articula necessariamente.

Fonte: Elaborado pelos autores, a partir de Boisier (1996).

A partir das análises dos elementos comuns ao desenvolvimento regional apresentados


por Boisier (1996), Ilpes (1998) e Buarque (2006) pôde-se conhecer a trajetória e aspectos
que precisam ser considerados.

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Tais aspectos são evidenciados quando se procura estudar a dinâmica do processo de


desenvolvimento regional, pois permitem a sustentação das análises realizadas a respeito do
consórcio, conforme mostra a figura 1.

Figura 1
Dinâmica do processo de desenvolvimento regional

Processos ex ante

PLANEJAMENTO PROJETO POLÍTICO DE


DESENVOLVIMENTO

Coleta de dados Entorno

Tomada de decisões
Cultura local Instituições

Acompanhamento, controle
e avaliação

Recursos Procedimentos
locais

Atores locais

Fonte: Elaborado pelos autores, a partir de Boisier (1996), Ilpes (1998), Buarque (2006) e dos dados
coletados.

A dinâmica apresentada pela figura 1 sistematiza que o processo através do qual se


pretende analisar o desenvolvimento regional e governança existente no Condesus, dividi-
se em duas etapas interdependentes (planejamento e projeto político de desenvolvimento).
Salienta-se que essas etapas são originárias dos processos ex ante ao seu surgimento, os quais
envolvem precedentes históricos que levaram à sua criação.
De acordo com a figura 1, a primeira etapa representa o momento no qual o plane-
jamento regional é elaborado e orienta as ações de governança territorial. Nesse momento,
são percorridas as fases de coleta de dados (delimitação da região/território, elaboração de
diagnóstico e prognóstico); tomada de decisões (formulação de estratégias, definição de instru-
mentos burocrático-legais, e adesão e diálogo com a sociedade); e acompanhamento, controle
e avaliação (resultados alcançados e impasses/obstáculos encontrados).
Verifica-se que planejamento origina o projeto político de desenvolvimento, que cons-
titui a segunda etapa dinâmica regional, na qual é levada em conta a relação existente entre
o consórcio e: o entorno (elementos externos à região, mas que a influenciam direta ou indi-

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retamente), a cultura (cooperação, identificação e reconhecimento por parte da sociedade),


as instituições (públicas e privadas locais), os recursos (financeiros, humanos e sociais), os
procedimentos (gestão, autoridade, liderança, tomada de decisões e procedimentos adminis-
trativos) e os atores (membros da sociedade civil, agrupamentos empresariais e movimentos
sociais da região).
Ao dimensionar a compreensão dessa dinâmica, torna-se possível alcançar o objetivo
principal proposto pelo estudo, que se delineia por meio da proposta de analisar a estrutura
de governança existente no Condesus e como o consórcio proporciona a articulação dos mu-
nicípios da Quarta Colônia em prol do desenvolvimento regional.

4. Método de estudo

Esta seção apresenta a estrutura metodológica utilizada que permitiu a operacionalização da


pesquisa e encontra-se dividida em: tipo e delimitação da pesquisa; técnicas e instrumentos
de coleta de dados; e tratamento, análise e interpretação dos dados.

4.1 Delimitação da pesquisa

O estudo constitui-se em uma pesquisa qualitativa, de natureza exploratória descritiva e com


o delineamento de estudo de caso. Esta opção decorre do fato de se pretender realizar uma
análise compreensiva do processo de governança no contexto de um consórcio intermunicipal
(o Condesus). Segundo Minayo (1994), é o método qualitativo que melhor permite responder
a esta questão.
A pesquisa qualitativa apresenta características como: tem o ambiente natural como
fonte direta de dados; o pesquisador como instrumento fundamental de coleta de dados;
utilização de procedimentos descritivos da realidade estudada; busca do significado das si-
tuações para as pessoas e os efeitos sobre as suas vidas; preocupação com o processo e não
simplesmente com os resultados e o produto; e privilégios ao enfoque indutivo na análise dos
dados (Triviños, 1987).
O delineamento da pesquisa como um estudo de caso se deve à possibilidade de
compreen­der um fenômeno social complexo por meio de um método que permitiu uma in-
vestigação que possibilitou preservar as características holísticas e significativas dos aconteci-
mentos da vida real (ciclo de vida dos indivíduos, processos organizacionais e administrativos,
mudanças ocorridas em regiões urbanas, relações internacionais e a maturação de setores
econômicos) (Yin, 2005).
Essas características são inerentes ao Condesus — unidade de análise da presente pes-
quisa —, que representa uma dinâmica original de um consórcio que visa promover a coope-
ração intermunicipal, sob a forma de associação pública de direito privado, através da qual se

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Desenvolvimento regional: uma análise sobre a estrutura de um consórcio intermunicipal 1053

espera compreender o processo de desenvolvimento regional. Casos semelhantes a esse são


pouco recorrentes na literatura.
Tais premissas possibilitaram a seleção do delineamento do estudo de caso, pois este
método se diferencia devido à sua capacidade de lidar com uma ampla variedade de evidên-
cias, como documentos e entrevistas com as pessoas nele envolvidas (Yin, 2005).

4.2 Fontes da pesquisa

A presente pesquisa foi realizada em duas etapas subsequentes, sendo a primeira uma pesqui-
sa documental e bibliográfica e a segunda a realização de entrevistas semiestruturadas junto
aos grupos de atores (gestores) que integram a estrutura administrativa do caso.
No que se refere à pesquisa documental e bibliográfica, Yin (2005) destaca que, para os
estudos de caso, o uso mais importante de documentos é corroborar e valorizar as evidências
oriundas de outras fontes, o que permite que sejam feitas inferências a partir de documentos.
As inferências devem ser tratadas somente como indícios que valem a pena ser investigados
mais a fundo, passíveis de ser falseadas em pesquisas futuras. Destacada a importância dessa
etapa, para a presente pesquisa foram consultados, além de materiais bibliográficos: sites da
internet, livros, estatutos, relatórios e materiais técnicos disponibilizados pelo consórcio que
contêm informações históricas e atuais sobre o caso em estudo.
Posteriormente, na segunda etapa da pesquisa foram realizadas entrevistas semiestru-
turadas, que, segundo Yin (2005:116), constituem “uma das mais importantes fontes de in-
formações para um estudo de caso”. Esse procedimento foi aplicado ao conjunto de atores
formais que integram o Condesus, separados em dois grupos, cuja divisão, sintetizada pelo
quadro 3, foi estabelecida a partir da estrutura de cargos que compõe o consórcio.

Quadro 3
Grupos de atores (gestores) entrevistados durante a pesquisa
Grupos Descrição
Secretaria Executiva (G1) Secretário executivo do Condesus
Conselho de Prefeitos (G2) Prefeitos dos nove municípios integrantes do Condesus

Fonte: Elaborado pelos autores.

As entrevistas possibilitaram acesso ao conhecimento e ao contexto das pessoas propor-


cionando uma maior profundidade dos elementos a serem coletados, o que foi feito por meio
da elaboração de um roteiro com perguntas preestabelecidas. O roteiro serve, além de coletar
as informações básicas, como um meio para o pesquisador se organizar para o processo de
interação com o informante, e durante a realização das mesmas foram feitas adequações per-
tinentes que não foram inicialmente previstas (Lakatos e Marconi, 1992).

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Destaca-se que, para a condução das entrevistas, foram considerados aspectos ressal-
tados por Gil (2009), tais como: preparação do roteiro de entrevista, estabelecimento do
contato inicial, formulação das perguntas, estímulo a respostas em profundidade, registro das
respostas e conclusão da entrevista.
O protocolo de entrevistas foi dividido em cinco blocos. Os primeiros quatro blocos
buscaram identificar a etapa de planejamento regional que, segundo os pressupostos teóricos
apresentados por Ilpes (1998) e Buarque (2006), deve orientar as ações de governança ter-
ritorial, que ocorrerão nos seguintes momentos: coleta de dados (delimitação da região/terri-
tório, elaboração de diagnóstico e prognóstico); tomada de decisões (elaboração da visão de
futuro, demarcação de estratégias, programas e projetos, definição de instrumentos e formu-
lação de modelos de gestão); execução (momento no qual aquilo que foi planejado é colocado
em ação); e avaliação (reflexão sobre os impactos e resultados das ações executadas).
Finalmente, o quinto bloco foi objeto da averiguação da pesquisa em relação à dinâmica
existente entre as seis variáveis apresentadas por Boisier (1996): entorno, cultura, instituições,
recursos, procedimentos e atores, que juntas caracterizam o projeto político de desenvolvimen-
to resultante do planejamento regional elaborado.
Com relação ao tempo de duração das entrevistas, ressalta-se que a realizada com o
secretário executivo do Condesus (G1) durou 2h30min, enquanto as realizadas junto aos nove
prefeitos membros do Conselho de Prefeitos (G2) tiveram em média 45 minutos de duração,
cada uma. Salienta-se que a entrevista com o G1 teve maior duração em relação às demais
pelo fato de o secretário executivo estar diretamente envolvido desde os momentos preceden-
tes à origem do consórcio até o momento atual. No mais, considera-se importante frisar que
nenhum dos autores do artigo possui qualquer tipo de envolvimento com o caso em estudo.

4.3 Análise e interpretação dos dados

Após a realização das entrevistas semiestruturadas e coleta das fontes secundárias, foram
rea­lizadas a tabulação e a análise de dados. Nesse momento, as entrevistas foram gravadas
e transcritas, o que facilitou a categorização das informações e a identificação de elementos
necessários para a análise.
O tratamento dos dados qualitativos foi feito seguindo o método da análise de conteúdo
(Bardin, 1977), com o auxílio do software NVivo 8.0, com o qual foi possível codificar, filtrar,
fazer buscas, questionar e categorizar os dados para responder ao problema de investigação.
A análise de conteúdo tem por objetivo identificar o que foi relatado sobre o tema em
estudo. O método de análise de conteúdo possibilitou ao pesquisador definir um conjunto de
elementos que, por meio de procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo
das mensagens, geraram indicadores que permitiram a inferência de conhecimentos relativos
às condições de produção destas mensagens (Bardin, 1977).
O método de análise de conteúdo seguiu as indicações de Bardin (1977), as quais des-
crevem que se devem percorrer três principais etapas, conforme descrito a seguir:

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a) Pré-análise: momento no qual devem ser definidos e preparados os documentos/materiais


a serem analisados, formuladas as hipóteses e/ou objetivos, e identificados os indicadores
que irão fundamentar a interpretação final;
b) A exploração do material: nessa etapa os materiais devem ser codificados, recortados,
classificados e categorizados; e
c) Tratamento, inferência e interpretação dos dados.

Os dados qualitativos do presente estudo foram obtidos e analisados na seguinte ordem:


a) revisão bibliográfica sobre os temas que envolvem o caso estudado; b) pesquisa de fontes
secundárias; c) definição dos blocos integrantes do protocolo de entrevistas; d) elaboração do
roteiro de entrevistas; e) agendamento das entrevistas; f) realização da pesquisa de campo;
g) exploração do material coletado; h) tratamento, inferência e interpretação dos dados; e i)
análise dos resultados.

5. Discussão e análise dos resultados referentes ao Condesus

Nesta seção são apresentados os resultados obtidos pela pesquisa, que viabilizaram que fosse
alcançado o objetivo de descrever, através da análise da estrutura de governança, como o
Condesus promove a articulação dos municípios da Quarta Colônia em prol do desenvolvi-
mento regional.
No entanto, ressalta-se que, durante a realização e análise das entrevistas, identificou-
se que seria insuficiente analisar a estrutura de governança do Condesus sem que antes se
buscasse conhecer o contexto de surgimento do mesmo. Percebe-se que se torna importante
elencar a compreensão dos momentos que precederam e influenciaram diretamente a origem
do consórcio, ou seja, como destaca Yin (2005), há a necessidade de relevar fatos que o tor-
nam um fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto da vida real e caracterizam o estu-
do como um estudo de caso. O que foi feito no primeiro momento da discussão dos resultados,
para que, em seguida, fossem feitas as demais análises, visando atingir ao objetivo proposto.

5.1 Processos ex ante a formação do Condesus

A partir das considerações apresentadas pelo secretário executivo do Condesus e das fontes
secundárias observadas, procurou-se compreender os processos ex ante ao planejamento e
consolidação do consórcio, subdivididos em duas etapas: a) processos ex ante: precedentes; e
b) processos ex ante: dificuldades.
No que diz respeito aos precedentes, por meio dos dados observados, verificou-se que
houve momentos preponderantes que levaram ao surgimento do consórcio e que, de certa
forma, influenciaram diretamente a maneira pela qual se configura a estrutura de governança
do Condesus, identificados na figura 2, em ordem cronológica:

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Figura 2
Processos ex ante: precedentes à criação do Condesus

Fonte: Elaborado pelos autores, a partir dos dados coletados.

Além dos precedentes, outros pontos importantes e influentes foram observados para
a análise da atual estrutura de governança do Condesus. Tais pontos se referem aos aspectos
que caracterizam dificuldades enfrentadas pelos agentes regionais durante os momentos ex
ante à criação do consórcio. Seguindo o mesmo critério adotado para a análise dos prece-
dentes, foram analisados pontos evidenciados especialmente pelo secretário executivo, o que
se deve ao fato de ele ser, dentro do universo dos entrevistados, aquele que acompanhou o
processo de surgimento do Condesus desde o começo.
Observou-se por meio da análise das entrevistas realizadas que houve dificuldades en-
frentadas para que o consórcio fosse implementado e que as estratégias propostas pelo mesmo
fossem postas em prática. Dentre os empecilhos, destacaram-se: a) problemas conjunturais
relacionados à superficialidade dos projetos de futuro para os municípios da região; b) carên-
cia por planos que buscassem a transformação e a valorização da realidade e cultura local; c)
resistências ideológicas em relação à integração regional; d) fragilidade das relações locais;
e) necessidade de construção de uma identidade regional; f) lutas políticas nos e entre os
municípios da região; g) entraves burocrático-legais; h) cobrança por resultados que se refle-

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tissem nas atividades econômicas; e i) deficiência por programas de governo que visassem o
desenvolvimento a médio e longo prazo (quadro 4).

Quadro 4
Processos ex ante: elementos dificultadores ao surgimento do Condesus
Processos ex ante
Inexistência de um projeto futuro
Superficialidade e fragmentação das ações propostas
Desvalorização da realidade e da cultura local
Resistência à visão regional
Fragilidade das relações locais e regionais
Dificuldades Lutas políticas na região
Aspectos burocrático-legais
Período eleitoral
Ausência de cooperativismo
Visão economicista
Imediatismo

Fonte: Elaborado pelos autores, a partir dos dados coletados.

Os elementos destacados no quadro 4 identificaram obstáculos enfrentados pelos agen-


tes regionais durante a criação do Condesus, especialmente no que diz respeito ao empenho
em prol da construção de uma identidade regional, valorização da cultura local, elaboração
de um projeto de futuro e surgimento de um sentimento de cooperação entre os atores locais.
Suprir essas carências é apontado por autores como Boisier (1996), Ilpes (1998), Vázquez
Barquero (2001), Sotarauta (2005), Tapia (2005), Buarque (2006) e Normann (2012) como
alguns dos pontos de partida para que se possa propiciar o desenvolvimento regional.

5.2 O Condesus e sua governança

O Condesus é o resultado de um processo histórico anterior (processos ex ante) que contem-


plou diversos momentos que promoveram o resgate da identidade local, a partir dos Fóruns
de Cultura da Quarta Colônia e, consequentemente, da elaboração de projetos de âmbito
regional (caso do Prodesus), propiciando o surgimento de uma visão regional, baseada no
cooperativismo e na valorização da cultura regional.
Atualmente, o consórcio constitui uma associação pública de direito privado que tem
suas ações delimitadas na região da Quarta Colônia (Agudo, Dona Francisca, Faxinal do So-
turno, Ivorá, Nova Palma, Pinhal Grande, Restinga Seca, São João do Polêsine e Silveira
Martins). O consórcio possui sua estrutura administrativa composta por: a) Presidência (presi-

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dente e vice-presidente); b) Conselho de Prefeitos; e c) Secretaria Executiva, conforme mostra


a figura 3.

Figura 3
Governança no Condesus

Fonte: Elaborado pelos autores, a partir dos dados coletados.

Sobre a estrutura administrativa do Condesus, cujo Conselho é composto pelos prefei-


tos dos municípios da Quarta Colônia, e a eleição da presidência ocorrendo a cada dois anos,
a Secretaria Executiva é composta por um secretário executivo (contratado como cargo de
confiança) e por uma secretária (empossada via concurso público), e estes representam os
únicos atores que possuem cargos de poder, autoridade e liderança dentro do consórcio.
A Secretaria Executiva do Condesus, além dos procedimentos administrativos, é o setor
responsável pela elaboração de estratégias e proposição de projetos, que são submetidos à
aprovação por parte do Conselho de Prefeitos e da Presidência. Os projetos e ações desenvol-
vidos pelo consórcio, e seus respectivos resultados, são divulgados para a sociedade por meio
do Caderno da Quarta Colônia, vinculado junto à Zero Hora e em rádios locais.

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Desenvolvimento regional: uma análise sobre a estrutura de um consórcio intermunicipal 1059

Para tomada de decisões, o Condesus diagnosticou as principais potencialidades da re-


gião, tais como a agricultura/agroindústria familiar, o turismo, o patrimônio e a proximidade
cultural e geográfica dos municípios integrantes, o que favorece a busca por ações conjuntas
visando o desenvolvimento regional da Quarta Colônia.
Devido ao foco das ações desenvolvimentistas na Quarta Colônia, nota-se que o consór-
cio não possui projetos e ações voltadas para o desenvolvimento das comunidades do entorno
(distritos e municípios vizinhos que fazem limites com os integrantes da região), estando o
relacionamento com esse ambiente externo restrito a parcerias com instituições e empresas, e
à busca de recursos financeiros junto a órgãos do estado e do governo federal.
Nota-se, também, uma fragilidade do consórcio no que diz respeito ao relacionamento
do mesmo com as comunidades dos municípios da região, que não participam da elaboração
dos projetos propostos pelo Condesus e, consequentemente, não reconhecem a importância
deste para o desenvolvimento da Quarta Colônia.
Nesses preceitos, conforme resume a primeira coluna do quadro 5, infere-se que o Con-
desus proporciona a articulação dos municípios da Quarta Colônia em prol do desenvolvimen-
to regional a partir do momento no qual: a) promove o surgimento de uma identidade regio-
nal, baseada no cooperativismo entre os agentes envolvidos; b) desenvolve, mediante projetos
elaborados e propostos pela Secretaria Executiva, ações que visam beneficiar e desenvolver a
todos os seus integrantes; c) restringe os interesses individuais determinantes para a tomada
de decisões locais e regionais; d) favorece o desenvolvimento regional a partir da valorização
das potencialidades locais; e) possibilitou o fortalecimento da “marca” Quarta Colônia; e f)
viabiliza a estruturação de um plano de desenvolvimento, baseado nos interesses regionais.

Quadro 5
Pontos propulsores e restritivos do desenvolvimento relacionado às ações do Condesus,
na região da Quarta Colônia
Pontos propulsores do desenvolvimento Pontos restritivos do desenvolvimento
− Surgimento de identidade regional − Baixo relacionamento com as comunidades/regiões do
entorno
− Cooperativismo
− Baixa participação de atores econômicos e sociais
− Prioriza ações que beneficiam a todos os integrantes
− Pouco relacionamento entre o consórcio e as instituições
− Não prioriza os interesses individuais
− Necessidade de qualificação e retenção de recursos
− Valorização das potencialidades locais
humanos
− Fortalecimento da “marca” Quarta Colônia
− Carência por obras de infraestrutura relacionada à
− Plano de desenvolvimento, baseado nos interesses recepção de turistas
regionais

Fonte: Elaborado pelos autores, a partir dos dados coletados.

No entanto, observa-se na segunda coluna do quadro 5 que, mesmo diante dos aspec-
tos positivos ressaltados, o Condesus carece de melhorias no que diz respeito a aspectos tais

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como: a) aprofundamento das relações com as comunidades e regiões do entorno; b) parti-


cipação dos atores econômicos e sociais da região, tanto na elaboração dos projetos, quanto
na tomada de decisões; c) relacionamento entre o consórcio e o apoio institucional do qual
ele faz parte; d) possibilidade de o consórcio realizar planos visando qualificar os recursos
humanos da região e desenvolver meios capazes de reter essa mão de obra nos municípios
integrantes; e e) melhoria de infraestrutura local, especialmente relacionada à recepção de
visitantes nos municípios.

6. Considerações finais

Diante dos objetivos estabelecidos, observou-se que o Condesus constitui uma associação pú-
blica de direito privado, que conta com uma estrutura administrativa composta pela a) Pre-
sidência; b) Conselho de Prefeitos e c) Secretaria Executiva. O consórcio tem seus projetos
focados no desenvolvimento da Quarta Colônia, com suas ações determinadas pelo cooperati-
vismo envolvendo os nove municípios da região, conforme ilustra a figura 3.
As principais estratégias e projetos propostos pelo Condesus são elaborados pela Secre-
taria Executiva, que também é a responsável pelos procedimentos administrativos dentro do
consórcio, executando funções tais como manejo orçamentário, gestão de projetos e relações
públicas. Como principais fontes de obtenção de recursos financeiros por parte do consócio,
destacam-se as mensalidades pagas pelos associados e os recursos adquiridos junto a órgãos
federais e estaduais. Tais observações fornecem as bases para que o objetivo principal da pes-
quisa tenha sido alcançado.
Ao se conhecerem os relatos sobre os momentos históricos que precederam a criação
do Condesus (figura 2), observou-se que o consórcio é resultante de seguidas ações que
tiveram como interesse principal o surgimento de um sentimento de valorização da cultura
local e, consequentemente, a conscientização dos envolvidos sobre a necessidade de se es-
tabelecer ações cooperativas que tenham como objetivo beneficiar a região como um todo.
Conforme destacado por Boisier (1996), Ilpes (1998), Vázquez Barquero (2001), Sotarau-
ta (2005), Tapia (2005), Buarque (2006) e Normann (2012), a cooperação constitui um
elemento central para que se possa obter êxito através de políticas integradoras visando o
desenvolvimento regional.
Apesar das dificuldades ex ante enfrentadas decorrentes da ausência de uma visão re-
gional viabilizadora de um projeto de futuro regional e dos impasses/obstáculos vivenciados
(quadro 4), nota-se que o consórcio trouxe para a região benefícios, tais como fortalecimento
da “marca” local, ascensão do turismo, planejamento regional e realização de obras de infra-
estrutura (especificamente estradas) (primeira coluna do quadro 5). O alcance desses resulta-
dos benéficos só foi possível devido ao fato de o consórcio ter construído entre seus membros
uma visão cooperativa e integradora, que favoreceu o surgimento de uma identidade regional
e o reconhecimento da região pelas pessoas de fora; resultados estes estreitamente relaciona-
dos ao elemento cultura ressaltado por Boisier (1996).

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Desenvolvimento regional: uma análise sobre a estrutura de um consórcio intermunicipal 1061

No entanto, mesmo diante dos resultados positivos destacados em relação ao Condesus,


nota-se que o mesmo possui pouco reconhecimento por parte da sociedade e da comunidade
local, que não enxerga o consórcio como um elemento viabilizador do desenvolvimento regio-
nal (segunda coluna do quadro 5). O que pode ser explicado pela estruturação da governança
no mesmo, que restringe a tomada de decisões aos atores políticos, limitando a participação
tanto dos atores privados quanto dos sociais nesse processo.
Essa restrição configura um ponto a ser melhorado em relação ao caso, pois conforme
ressaltam Boisier (1996), Ilpes (1998), Dallabrida (2000), Vázquez Barquero (2001), So-
tarauta (2005), Tapia (2005), Buarque (2006) e Normann (2012), a participação conjunta
dos atores públicos, privados e sociais é um dos fatores considerados como essenciais para
o desenvolvimento regional. Por outro lado, observando os resultados obtidos por meio do
estudo de caso, surge o questionamento: seria possível/viável estabelecer uma estrutura orga-
nizacional que permitisse a participação de todos os atores da sociedade? Ou realmente faz-
se necessário centralizar essas decisões em um determinado grupo de atores em específico,
conforme ocorre no Condesus?
Além da deficiência em relação à participação dos atores privados e sociais no consór-
cio, através dos resultados observa-se que as ações propostas pelo Condesus, em quase a sua
totalidade, têm como propósito buscar recursos financeiros junto às esferas estadual e federal.
Não sendo possível, no entanto, observar ações que demonstrem e caracterizem, efetivamen-
te, a promoção do desenvolvimento da região através do crescimento econômico, social e cul-
tural, atrelado à melhoria da qualidade de vida nos mesmos, ou seja, do bem-estar econômico
e social (pobreza, desemprego, desigualdade, condições de saúde, alimentação, educação e
moradia), requisitos destacados com centrais.
Tal consideração traz a necessidade por questionamentos sobre a real capacidade do
consórcio em promover o desenvolvimento regional, conforme sugerem os pressupostos teó-
ricos apresentados por autores como Vasconcellos e Garcia (1998) e Oliveira (2002), sendo
esse um ponto que fica em aberto para que possa ser investigado em pesquisas futuras.
Como outro ponto negativo, observa-se a necessidade por um melhor relacionamento
entre o Condesus e as instituições locais, destacando-se, principalmente, a carência por uma
aproximação do consórcio com as câmaras de vereadores dos municípios integrantes (segun-
da coluna do quadro 5). Esse ponto contraria a teoria apresentada por Boisier (1996), além de
autores tais como Dallabrida (2000), Humphrey e Schmitz (2000), Vázquez Barquero (2001),
Dallabrida e Becker (2003), Rover (2007), Suzigan, Garcia e Furtado (2007) e Moreiras,
Tambosi Filho e Garcia (2012), que salientam as instituições como importantes no que diz
respeito ao estabelecimento e controle sobre regras e normas locais.
Ademais, observa-se a necessidade por projetos que busquem desenvolver, em conjun-
to, as regiões/municípios do entorno, estando o relacionamento com esse ambiente limitado
à existência de parcerias com universidades e instituições tais como a Empresa de Assistên-
cia Técnica e Extensão Rural (Emater) e o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas
Empresas (Sebrae) (segunda coluna do quadro 5), sendo essa uma deficiência em relação ao
hexágono do desenvolvimento regional apresentado por Boisier (1996).

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Outro ponto relacionado ao hexágono de Boisier (1996) detectado como carente por
melhorias diz respeito à necessidade de definição de estratégias que visem qualificar a mão
de obra local (especialmente mediante cursos de capacitação continuada) e reter os recursos
humanos capacitados na região, inibindo a migração destes para outros centros (segunda
coluna do quadro 5).
Além dos aspectos levantados durante a etapa de análise de resultados, outra contri-
buição relevante relaciona-se ao caráter exploratório do estudo que, através de uma pesquisa
baseada em estudos anteriores, propõe uma dinâmica original por meio da qual se espera
compreender o processo de desenvolvimento regional (figura 1).
Como limitação da pesquisa, ressalta-se que foi considerada a inclusão de um grupo que
envolvesse os atores sociais dos municípios da Quarta Colônia (moradores, representantes de
associações de bairro e dos municípios) e outro que abarcasse os atores privados locais (re-
presentantes de associações empresariais/comerciais e industriais da região). Porém, durante
a realização da pesquisa, observou-se que a inserção desses grupos inviabilizaria a conclusão
do trabalho, sendo este ponto uma sugestão para a realização de pesquisas futuras.
Outra sugestão futura compete à possibilidade de replicar a metodologia utilizada em
outros casos, na tentativa de se obter resultados que venham a corroborar ou falsear as aná-
lises aqui realizadas e, consequentemente, contribuir com o avanço teórico de estudos envol-
vendo a mesma temática.

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Thiago Reis Xavier é doutorando e mestre do Programa de Pós-Graduação em Administração da Univer-


sidade Federal de Santa Maria (PPGA/UFSM). E-mail: thiago.adm.tur@gmail.com.
Milton Luiz Wittmann é doutor em administração pela Faculdade de Economia e Administração da
Universidade de São Paulo (FEA/USP) e professor associado IV da Universidade Federal de Santa Maria
(UFSM). E-mail: wittmann@profwittmann.com.
Raoni de Oliveira Inácio é mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade
Federal de Santa Maria (PPGA/UFSM). E-mail: raoni06@yahoo.com.br.
Juliana Kern é graduanda do Curso de Administração da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).
E-mail: julianakern@ymail.com.

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