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EDITORIAL FOLHA SOBRE FOLHA

OFICINA NO CAFÉ DOS VIZINHOS


André Vargas, Bruna Camargos e Gabriela Cyrne

Com imensa alegria apresentamos redesenhar o formato e a estrutura misturam às biografias de moradores
a segunda edição do jornal O Olhar atual, cujo projeto gráfico foi obra e trabalhadores desse território, como
dos vizinhos no jornal da zona, também de um vizinho, Augusto Dona Marly, atendente da Flórida
uma produção coletiva das pessoas Batista, frequentador assíduo do café. Restaurante desde 1981, que concedeu
envolvidas no programa Vizinhos do entrevista a Bruna Camargos; ou na
MAR, especialmente daquelas que O Café com vizinhos vem se memória de Iyá Davina, resgatada
fotos : : B e n oit Four n ie r
frequentam o Café com Vizinhos – estabelecendo também ao de um passado mais distante pela Com origem nas inquietações dos
encontro comunitário mensal, ícone longo do tempo como espaço de matéria de Luzia Rocha; no texto vizinhos em torno da relação entre
e principal ferramenta do programa, reconhecimento da comunidade de Norton Tavares, sobre as Docas arte, natureza e vida, a oficina Folha
cujas ações buscam estabelecer uma pela própria comunidade – não Pedro II, hoje conhecidas como o sobre Folha foi pensada como um
plataforma de diálogo, experiência apenas de relação com o MAR –, de Galpão da Cidadania; no glossário dispositivo de compartilhamento de
e ação conjunta entre o MAR, fortalecimento dos vínculos entre do livro Memórias de um sargento memórias. Num primeiro momento,
moradores, coletivos e instituições os moradores da região, de apoio, de milícias, de Manuel Antônio de quando nós, os educadores do MAR
da região portuária. compartilhamento e visibilidade das Almeida, e na história da fusão dos André Vargas, Bruna Camargos
inúmeras ações sociais e projetos bairros que formam a região, como e Gabriela Cyrne, nos reunimos
Nesse sentido, não é por acaso que culturais que têm lugar nessa constam nas matérias assinadas por durante o planejamento pedagógico,
iniciamos esse número do jornal vizinhança, conhecida também Paula Carriconde, a maior entusiasta nossa ideia estava atrelada ao ato
com a matéria da oficina Folha sobre como a Pequena África. do jornal! de caminhar, coletar e observar o
Folha, proposta dos educadores do cotidiano da rua na relação com
MAR André Vargas, Gabriela Cyrne Como não podia deixar de ser, Se historicamente a Pequena África folhas, plantas, Pancs (plantas
e Bruna Camargos. Os registros a efervescência da região fica está marcada por sítios de dor como alimentícias não convencionais)
dessa oficina, usados inclusive na evidente nas páginas do jornal, o Cais do Valongo, por onde milhões e outras ervas daninhas. O
capa do jornal, apresentam de forma seja na trajetória da Sociedade de africanos trazidos à força de suas recorte conceitual estava na não-
poética a dinâmica desses encontros Dramática Particular Filhos de terras chegaram ao Brasil para serem hierarquização dos saberes ou outro corpo enquanto os vizinhos do seguida essa memória expressa no
e introduzem o leitor nas trocas Talma, apresentada por Ricardo escravizados, é também a partir dessa submissão das plantas apenas aos MAR estivessem tomando o seu café. papel deveria ser trocada com outro
que têm lugar naquele contexto. Lens; na narrativa de Albino Neto região que a cultura desses africanos seus usos normalizados. Nosso Assim, o ato de fazer e experimentar participante. Com o registro do outro,
No café são deliberadas quase todas sobre o famoso acarajé feito por Leila em diáspora se enraizou em solo querer estava envolto pelo princípio as formas das folhas constitui-se a próxima ação estava na gravura,
as ações do Vizinhos do MAR: Leão na Casa Omolokum; ou em brasileiro e – conectada à herança dos democrático e pela valorização da como um elemento possível. um exercício de transferência da
são planejadas e realizadas visitas, projetos como o Galeria Providência povos indígenas – nos deu a seiva da memória ordinária, construindo um forma das folhas. Tinta, plantas e
oficinas, conversas protagonizadas e o Impacto das cores, mobilizados nossa brasilidade. Esse número do processo em que todos pudessem A mesa foi montada com variedades imaginação caminhavam juntas no
por vizinhos e convidados, encontros por Hugo Oliveira e Aline Mendes, jornal, feito com a colaboração de participar. O desafio era a própria de folhas de cheiro, exalando processo plástico em que palavra,
com artistas e curadores, entre outras respectivamente, jovens moradores muitas pessoas, vem também celebrar diversidade dos participantes, um perfume que invadia a sala papel, memória, adquiriam, então,
experiências. No café surgiu a ideia do Morro da Providência. essa conexão-seiva (como se lê no suas diferentes trajetórias, idades, e os corredores do museu. O uma dimensão coletiva. Ao final
de fazer o jornal, cujo primeiro desenho que está na capa do jornal), mobilidades. O tempo de duração da primeiro impacto era olfativo e do processo de gravura, a folha
número foi publicado em abril de A vida no Morro do Pinto também que na região afirma a sua vitalidade a oficina e o próprio ato de caminhar logo em seguida a visualidade deveria retornar para o participante
2018 no contexto das comemorações foi retratada nesta edição por um despeito de todas as adversidades! poderiam ser fatores limitantes das folhas frescas e secas evocava que escreveu a palavra. Em roda,
do aniversário de cinco anos do conjunto de fotografias feitas por para alguns sujeitos. Assim a ideia uma experiência das cores. Cada os participantes deveriam revelar,
MAR. Também no café formamos a Sandro Rodrigues, cria da região, Boa leitura a todos! E que venha o inicial foi se transformando, o que participante deveria escrever em já com as suas várias camadas, a
comissão editorial responsável por que inaugurou a seção “Ensaio”. próximo número! seria fora foi para dentro, o que seria uma folha de papel uma palavra memória disparadora da ação. Os
esta edição do jornal, avaliamos erros Nas páginas do jornal, a história e as caminhando tornou-se sentado, que expressasse uma lembrança registros a seguir resultam dessas
e acertos do primeiro número para transformações da região portuária se Izabela Pucu mas permaneceu o desejo por um do contato com a natureza, e em narrativas.

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Francisco de Souza na casa de uma amiga que tinha um da terra, a pessoa que fez a gravura
Palavra : REDE gramado na frente, nós estávamos captou. Meu avô passava horas
Lembro de um encontro que tive brincando de bambolê. Quando mexendo na terra. Esse pé de abacate
com uma pessoa em situação de nos cansamos, eu me sentei perto não existe mais, porque destruiu o
rua, essa pessoa dormia num lugar da parede da casa e comecei a sentir muro do vizinho e nós tivemos que
na Lagoa Rodrigo de Freitas, entre um comichão na perna, levantei cortar, mas enfim, fica a lembrança
duas árvores, numa rede. Eu achei rapidamente e comecei a comichar daquele momento de afeto, ele me
muito interessante a solução que inteira, eu tinha sentado na urtiga, ensinando a plantar da janela.
essa pessoa encontrou para viver na ardia muito.
rua, nós conversamos muito e essa Arleni Batista
memória ficou em mim, alguém que Ana Carla Palavra : FLORESTA
vai mudando de lugar pela cidade Palavra : AFETO A minha mãe é do Amazonas,
com sua rede e seus dois carrinhos. Eu coloquei afeto porque meu avô, as minhas raízes estão lá, mas
quando eu tinha quatro anos, me infelizmente eu ainda não conheço.
Paula Carriconde chamou para ficar vendo da janela ele Olhar todas essas plantas me trouxe
Palavra : ARDÊNCIA plantar o abacate. A vida toda eu comi uma forte lembrança da minha
Me lembro quando menina, acho esse abacate, eu adoro abacate, a fruta mãe, esse é o meu pensamento, eu
que uns nove ou dez anos, eu estava lembra o meu avô. Esse momento sou floresta.

Niara do Sol hortelã... Hoje eu tenho uma mini no interior de Minas Gerais, era
Palavra : PERSISTÊNCIA florestinha lá. Eu levei tudo o que muito movimentada por pessoas
Essa palavra se refere a minha foi plantado aqui no Museu de querendo a cura, um remédio.
família e ao todo. Quando eu Arte do Rio na época da exposição
era pequena meu avô dizia que tinha o mesmo nome que Celina Rodrigues (Mãe Celina de
“persistência”, dizia que nós minha horta, plantei lá e continuo Xangô)
estávamos vivos porque éramos plantando a cada dia mais, lá têm Palavra : CURA
tão persistentes quanto a natureza. batata-doce roxa, batata-doce Eu também coloquei a palavra cura
Somos indígenas, ele nos levava amarela, hibisco, eu faço geleia porque lá em casa eu fui criada por
na beira do rio, há quase setenta com o que a minha horta oferece. três mulheres fortes, minha mãe,
anos atrás, e dizia que o que estava minha avó e minha bisavó. Lá em
ali persistia na vida mesmo com Eliana Rosa casa também não entrava alopatia,
o homem tentando destruir. Palavra : CURA nós fomos criadas à base de ervas.
Ele levava a gente na montanha A minha mãe era curandeira, Eu tenho uma filha de 33 anos
e falava a mesma coisa. Passa a quando eu entrei aqui e vi essas e uma neta que são criadas com
vida, a gente estuda, faz novos plantas em cima da mesa fui ervas até hoje, eu fui criada pelas
conhecidos, amigos, hoje eu olho remetida a minha infância. Na ervas, eu fui curada pelas ervas e
para a minha horta Dja Guata Porã minha casa não entrava remédio crio com as ervas. Então eu vim lá
e vejo que venceu na persistência, de farmácia, essas ervas nós de trás, lembrando da minha bisa
porque quando eu fui morar tínhamos no quintal de casa, mas que era analfabeta mas tinha uma
naquele condomínio, Minha Casa para curar mesmo nós íamos para sabedoria ancestral, ia no mato,
Minha Vida, disseram para mim o cerrado, lá existiam plantas não sabia nem o que era, mas sabia
que não dava para plantar nem completamente diferentes de tudo que aquela erva ia fazer um bem
mesmo uma roseirinha, uma o que a gente conhecia. Minha casa, para algum de nós.

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Bruna Camargos Niara do Sol avó faziam isso durante sete dias, Norton Tavares
Palavra : REVIVER Intervenção: Posso ser intrometida treze dias ou 21 dias, dependendo Palavra : AMARGO
Escrevi reviver porque estou e apresentar uma coisa da da doença, e a pessoas se curava. É Minha família é nordestina e na
passando por muitos processos samambaia? Nós temos muitas um tipo de samambaia em que as minha infância tudo lá em casa
de reencontros, alguns que qualidades de samambaias, tem folhas são bem grandes e ela fica levava coentro, eu odiava aquele
nem imaginava que existissem. um tipo de samambaia que dá no bem no mato. Ricardo, você sabe negócio, aquele gosto. Mas na
Reviver, para mim, tem relação meio do mato. Quando éramos por que as mudas de samambaia que semana passada eu resolvi dar
com a alimentação, como crianças, se chegasse alguém lá em você tirava não pegavam? Porque uma chance ao coentro, olhei na
plantamos, o que plantamos, casa que tivesse algum problema você precisa esperar a folha ficar feira, comprei, e agora eu estou
porque plantamos, como e o com infecções, a minha mãe seca, quase seca e colocar num lugar colocando coentro em tudo. Estou
que comemos. A alimentação é mandava a gente no mato para úmido, as sementes estão nas folhas. me reconectando ao coentro, dá
também um ato político. Esse
pensamento está mudando o
meu corpo, o meu espírito e as
formas como me relaciono com
o mundo. Recentemente estive
num encontro de permacultura
e aprendi muito, toda a minha
relação com plantas foi evocada
nesse encontro, minha avó, minha
mãe, minha infância de conversas
com as plantas no quintal. Estou
caminhando nesses lugares do
cuidado e nascendo novamente,
a troca com todos vocês tem me do fruto, e era um lugar em que e comentava sobre a planta,
alimentado muito, porque cada ninguém ia nos aporrinhar. Eu sempre me pediam para levar uma
um tem um conhecimento e nunca mais vi um tamarindo no mudinha, eu tentava tirar a muda
eu vou juntando e aprendendo. Rio de Janeiro, se alguém souber da samambaia e não conseguia,
Minha última descoberta foi a de algum me avisa. eu levava e ela não pegava, e eu
importância da cobertura de solo, ficava me sentido extremamente
tem um tipo de capim, a Brachiara, Intervenção dos vizinhos: “Tem sim, culpado por ter tirado a muda da
que ajuda a nutrir o solo e manter a no Grajaú, em Vila Isabel, Campo de samambaia. Já nos anos 2000,
umidade, isso é muito importante Santana, Méier tem muito”. passei num desses quiosques que
para a sobrevivência das plantas e vendem plantas perto do metrô
para a nossa também. Ricardo de Aragão de Copacabana, vi uma placa de
Palavra : SAMAMBAIA venda de mudas de samambaia tirar a samambaia. Se fosse homem Augusto Batista vontade de colocar até no café...
Elcio Costa No final da década de 1970, na chorona a 5 reais, não sabia se tínhamos que colher de manhã cedo, Palavra : SAMAMBAIA rs. colocar num lugar úmido, as
Palavra : TAMARINDO minha casa meu padrasto arrumou era mesmo, porque as mudinhas às seis horas mais ou menos, se fosse A minha palavra também é sementes estão nas folhas.
Eu fui criado na Glória, na época uma samambaia chorona, ela de samambaias são parecidas, mulher a colheita era depois das samambaia. Quando eu era garoto
ainda existiam alguns terrenos crescia bastante, era só dar mas confiei e levei para casa. Fui seis horas da tarde. Preparávamos todo mundo tinha samambaia em Luziete Fernandes
que não tinham casas, terrenos altura, nós achávamos aquilo um regando todos os dias pela manhã um banho para a pessoa, quando casa, era algo muito popular. Palavra : HORTELÃ
abertos. Num desses terrenos máximo, eu acreditava que aquilo (planta só se rega pela manhã), elas esfria esse preparado parece uma Essa é uma das plantas mais fáceis
tinha um tamarindeiro imenso. valia uma fortuna, tínhamos foram crescendo e ficaram lindas, gosma, com ele ainda morno a gente Intervenção dos vizinhos: “Você de cuidar, até na parede da cozinha
Quando a gente jogava futebol, uma samambaia chorona, planta tão lindas que eu adotei como esfregava o líquido com uma bucha sabia que o coentro ajuda a eliminar ela cresce. Eu nasci no Ceará e
a gente se reunia sempre no rara, impressionante. Quando eu filhas, uma se chama Gisele e a por todo o corpo e deixava a pessoa metais pesados do organismo? Faz na minha casa tinham muitas
tamarindeiro por causa da sombra, estava na casa dos meus amigos outra Ludmilla. ali coberta. Minha mãe e minha muito bem comer coentro”. plantas. Atrás dos nossos quartos,

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minha mãe tinha um plantio de noção de que a babosa pudesse virar Sandro Rodrigues
hortelã e ela nunca molhava, eu suco, eu só conhecia de passar no Palavra : FELICIDADE
sempre pensava “como essa planta cabelo, porque minha mãe, minhas Felicidade me remete à infância.
sobrevive?”. Era exatamente tias usavam muita babosa para Existia um parque bem pertinho da
porque a fossa artesanal – nós não hidratar o cabelo. minha casa, a principal brincadeira
tínhamos banheiro com cimento da criançada era escorregar de
– passava ali perto. A umidade Robson Felix papelão no gramado. Tinha muito
que vinha da terra fazia com que a Palavra : FÉ mato em volta, nós ficávamos o
hortelã brotasse, eu tenho muito Além de suco, da cura de doenças dia inteiro escorregando, subindo
presente o cheiro da hortelã. Não com chás, a gente tomava muito e descendo ladeira. A primeira
precisa de muito para plantar, banho de ervas. Da alevante, abre lembrança que eu tenho com a
hoje aquela água saborizada que caminho, tem a ver com a matriz natureza é desse gramado, que não
está sobre a mesa eu fiz com o pé africana da religião. existe mais infelizmente.
de hortelã da minha casa, uma
mudinha que a Niara do Sol me Intervenção dos vizinhos: “Você Petrucio Anjos
deu. Uma coisa que eu descobri da junta abre caminho, arruda, alecrim, Palavra : VIDA E RESISTÊNCIA
hortelã é que toda vez que ela der esse banho potencializa a vida”. Na minha infância eu brincava
aquele galhinho, um fio marrom, muito dentro da mata, depois de um
você pode picar e colocar dentro Dauá Puri período vieram aquelas máquinas
do vaso da própria planta porque Palavra : FERRUGEM derrubando todas as árvores.
é adubo, o próprio galho dela se Ferrugem na folha quer dizer a cuidou muito da gente com Hugo Oliveira eu acessava pelo telhado, tinha
transforma num adubo. doença fúngica, que nós vamos Lili plantas em casa, mas esse cuidado Palavra : AMENDOEIRA uma mangueira que até hoje está
encontrar muito em função da Palavra : MÃE tem muita energia do amor que Eu lembrei o quanto que a goiabeira lá. Meus irmãos querem que
Leandro Rodrigues poluição do ar, da fraqueza da A minha palavra acho que é uma ela colocava em tudo, isso era o (na casa da minha avó) era importante tire, porque, como Ana disse
Palavra : INFÂNCIA terra. É importante tratar a terra coisa em comum com várias principal dessa cura toda. para mim, só que antes da goiabeira do abacateiro, a raiz vai para
Minha mãe trabalhava e me para que não tenhamos essa pessoas, esse poder, um amor a minha primeira árvore era a a cisterna. Eu dou um ataque
deixava na casa da minha avó, ferrugem nas folhas. maternal. Minha mãe sempre Gabriel Catarino amendoeira. Eu tive a oportunidade dizendo que vou me amarrar
que era uma casa muito grande e Palavra : ESPADA DE SÃO JORGE de fazer uma casa na árvore com os à mangueira. Quando éramos
tinha um jardim. O jardim dela O universo das plantas é riquíssimo, meus amigos, era uma casinha no pequenos, meu pai sempre dizia
era um pouco diferente, porque poderoso e merece de nós todo topo com madeira. Nós passávamos o que ia construir uma casinha
minha avó só plantava o que respeito. Talvez poucas pessoas dia inteiro roubando frutas no bairro na árvore, mas não construiu.
tinha espinhos. Quando minha saibam, mas uma árvore gera oxigênio e depois íamos para essa amendoeira Fazíamos diversas pontes, era
avó queria punir a gente, quando para vinte seres humanos, para você trocar ideia, falar das peripécias na mangueira que eu subia,
fazíamos alguma coisa que ela não entender a potência disso para todos que tínhamos feito, dos muros que atravessava uma pontezinha
gostava, ela dizia “menino vai nós. Mas eu queria falar aqui da espada tínhamos pulado, dos cachorros de para subir no telhado e acessar
brincar no jardim!”. Nós íamos e de são jorge, o santo todo mundo que tínhamos que fugir. a goiabeira. Então de alguma
voltávamos todos espetados. conhece, um grande guerreiro, ele maneira já havia uma casa ali pelo
tem três armas: um escudo que o Izabela Pucu nosso uso. Quando eu me casei
Hamilton defende dos golpes, a espada que Palavra : CONEXÃO-SEIVA vim morar no Rio, antes morava
Palavra : SUCO abre os caminhos e a coragem. Nós Escutando vocês, eu acho que em Niterói, fui morar em um
Desde criança eu sempre fui tratado seres humanos nascemos sem essas aqui é uma grande conexão-seiva, apartamento e sofri muito, porque
com ervas medicinais, quase não características, a nossa evolução acho que tem uma ecologia de tinha gente em cima, embaixo,
fico doente, o único problema vai nos ensinando isso: termos um saberes, uma costura das relações do lado da minha cabeça. Eu não
que tenho agora é de pressão, mas escudo que nos proteja, uma espada um com o outro a partir da relação tinha o céu, não tinha as plantas,
também já estou com 75 anos. Até para abrir nossos caminhos, e, acima com as plantas. Na minha casa então comecei a cultivar, eu tenho
os meus sessenta anos eu não tinha de tudo, a ter coragem. também tinha uma goiabeira que 5 palmeiras num apartamento,

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tenho uma série de ervas. Mas eu a gente ia tocando e cantando… crescimento da planta que, óbvio, barriga, resfriado, fazia um chá.
lembrei de uma memória mais “dorme, dorme, dormideira só me traz um conforto de proteção, Eu quis lembrar que as plantas ou
recente. Uma grande amiga, acorda sexta-feira”. Eu percebi também me faz caminhar com as a associação delas podem trazer
Eleonora Fabião, que vai ficar que eu tenho uma memória. minhas plantinhas em casa. benefícios para o nosso organismo.
sete meses fora do Brasil, por
causa dessa minha relação com Intervenção dos vizinhos: “Eu Matheus Fontinele Marcia Alves
as plantas, foi com uma comitiva conheço dorme, dorme, dormideira Palavra : CUIDAR DAS PLANTAS Palavra : Germinar
para minha casa levando todas só acorda segunda-feira”. Essa pintura eu fiz com muito Eu fiz um curso de horta na Ação da
as plantas dela para que eu cuide. prazer, também gosto das plantas. Cidadania, eu não tinha nenhuma
Estou hospedando as plantas, André Vargas Essas plantas são bonitas, eu acho planta em casa, agora tenho muitas
por conta disso nós cunhamos Palavra : CRESCER maneiro, fiz um desenho que diz e meu filho, meu parceiro, começou
a expressão conexão-seiva, que Essa palavra poderia ser uma que nós temos que cuidar das a se interessar por tudo o que eu
era a presença das plantas dela na palavra que apontasse o meu plantas, da natureza, ficou bonito, planto, ele me ajuda, cuida delas
minha casa, uma conexão-seiva crescimento pessoal, o meu ficou colorido. comigo, conversa com as plantas,
entre eu e ela lá longe, no frio, contato com as plantas como uma é muito bonito ver ele crescer com
num país como a Noruega, e eu forma de autoconhecimento, mas Luciana Coutinho essa conexão.
aqui no calor dos trópicos. na verdade ela aponta a minha Palavra : CURA
paixão pela minha comigo- Minha palavra também é cura. Aline Mendes
Gabriela Cyrne ninguém-pode, e ela parece Quando vejo uma mesa repleta Palavra : Cura de santo de umbanda do lado da 2002, ela era rezadeira e mãe de
Palavra : AUTOCUIDADO retribuir o amor que sinto por de diferentes espécies de plantas Eu também vou pegar o caminho minha casa, no terreiro tinha uma leite de metade do morro, ela teve
Eu ajudei a organizar essa ela. Porque eu gosto de chegar em lembro que cada uma tem uma da cura, porque na minha infância aroeira grande, quando tínhamos mais de dez filhos, ela cuidava de
atividade e o problema, desde o casa e perceber que mais um andar função, eu sou farmacêutica, então lembro da mamona. Nós usávamos algum problema íamos tomar porcos ali do lado dos ingleses,
começo, eu falei com o André, surgiu nela e isso renova o amor vejo o lado da cura mesmo. Isso as bolinhas para bater guerrinha banho de aroeira. Também tem também trabalhava com a reza
é que eu não tenho nenhuma que eu tenho. E ela também gosta me remeteu à infância quando lá no Morro da Providência. Mas essa história do chá de quebra- e com as plantas. Hoje em dia,
relação com plantas. E agora? de jogar uma folhinha para cima a minha mãe, sempre que a quando eu tive sarampo, a minha pedra para problemas nos rins. A a maior parte da minha família
A minha mãe consegue matar para me distrair. Essa relação do gente tinha algum problema de mãe fez o colar do talo da mamona, minha avó paterna, a dona Geralda paterna é evangélica e nega a
cactos, lá em casa é um cemitério eu tinha que usar esse colar com uma Preta, todo mundo do Morro memória dela. Eu sou pastor,
de plantas, onde eu morava era roupa vermelha, não lembro direito da Providência de cinquenta a mas eu sempre falo da minha avó
só cimento, o rio é podre, eu se era sarampo ou catapora, mas sei sessenta anos atrás conhecia ela. Geralda Preta, ela era macumbeira
jogava lixo no rio e dava tchau, que foi um dos dois e eu me curei. A minha avó morreu na Copa de e rezadeira.
era péssimo. Eu fiquei pensando
e nada me veio à cabeça. Quando Cosme Felippsen
eu vi a babosa aqui pensei “eu não Palavra : Consistência e Cura
entendo nada de plantas”, mas Minha palavra é consistência
eu entendo de cabelo, de cuidado e cura, quando eu cheguei
com a pele, me lembrei da babosa aqui eu não sabia o que estava
e a minha palavra foi autocuidado acontecendo, mas eu peguei esse
(eu adorei essa gravura inclusive). papel. Eu cheguei com o bonde
Enfim, só que ouvindo todo andando, mas papai do céu me
mundo falar eu lembrei de uma deixou esse papel aqui na cadeira,
planta que é a dormideira. Era alguém foi embora e deixou essa
tudo asfalto, cimento, coisas palavra não sei por quê. Mas as
esburacadas e não tinha muita plantas me remetem à cura porque
planta, mas no caminho da a minha avó e a minha mãe faziam
escola, quando eu tinha uns sete chá de boldo quando eu estava mal
anos, tinha muita dormideira e do estômago. E tinha uma mãe

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PERSONAGENS DA REGIÃO Arte do Rio (MAR)], ela falou com Conheci muita gente trabalhando, amada, tive muitos namorados,
o delegado, que era amigo do meu éramos três meninas no café e não dois no Cais do Porto, um na Rádio

DONA MARLI antigo patrão, o seu Joaquim. doze


horas de trabalho por dia, quarenta
dávamos conta. Seu Joaquim era um
pai para mim, nunca me negou nada
Nacional, um na 1ª DP, até no
Hospital dos Servidores, quando
Entrevista de Bruna Camargos minutos de almoço, 12 mil cruzeiros e esse patrão que comprou dele é um conheci o taxista fiquei com ele”.
de salário. Fui lá, conversei com o filho para mim, ele me chama de Lili. Ela conta dos programas assistidos
gerente que era espanhol, ele me disse na Rádio Nacional, de ter beijado o
“se agradar assinamos sua carteira”, Ao falar da atual Praça Mauá, Marli Martinho da Vila na boca no afã de fã.
no dia primeiro de setembro minha diz que é como uma página virada,
carteira foi assinada e lá se vão 38 mas ela não esquece de suas páginas Eu sempre tive amizade com o
anos. Todo mundo falava para não anteriores. A antiga rodoviária pessoal daqui, as meninas que
ir à Praça Mauá, que era um lugar de Mariano Procópio (cuja marquise trabalhavam na prostituição, o
perdição, muita boate, muita mulher pode ser vista na bilheteria do pessoal das casas comerciais, a
da vida. Nunca ia imaginar que um MAR), de onde tomava os ônibus galera dos Correios, do INPI, da
dia eu viria parar aqui, de tanto para a baixada fluminense: “São Rádio Nacional, isso aqui era uma
as pessoas falarem eu tinha medo. João de Meriti, Caxias, Mesquita, grande comunidade. Nunca ia direto
Eu sou carioca, mas vivia presa, as Nilópolis, Nova Iguaçu, era uma fila para casa, tinha um salão aqui na
pessoas falavam e eu nem sabia onde imensa, chegava em casa tarde por praça que eu frequentava muito.
ficava. Foi aqui que a minha vida boa causa do trânsito, agora melhorou No fins de semana, vínhamos para o
começou, minha liberdade. Criei meu muito com o VLT”. Existia uma
filho e minha filha trabalhando no banca de jornal logo em frente ao
Flórida, como balconista, comprei ponto dos ônibus:
minha casa própria.
No começo do trabalho eu não tinha
Dona Marli no Florida Restaurante em 1981. Acervo pessoal.
Inaugurado em 1969 como boate, dinheiro nem para ir embora para
o Flórida passou a ser frequentado casa, morava em São João de Meriti.
como babá em Copacabana. tive que aguentar meu marido por por prostitutas e chegou a Minha mãe tinha um quartinho
“O mar serenou quando
Casou-se aos dezesseis anos, com o nove anos. Saí do buraco, caí no funcionar como terma. Dona Marli aqui na 1ª DP, onde guardava os
ela pisou na areia primeiro namorado: abismo. Quando eu larguei ele, voltei revela que o Flórida começou produtos de limpeza, ela era servente.
para a casa do meu pai. A minha mãe como bar e lanchonete, no final No quartinho tinha uma cama, às
Quem samba na beira Minha mãe largou meu pai quando morava aqui no Rio, em Santa Cruz, da década de 1950, próximo ao vezes eu dormia com ela na delegacia
do mar é sereia nós ainda éramos crianças (eu, meu só que ela não procurava a gente, Edifício A Noite, na época sede para economizar a passagem, até
irmão mais velho e minha irmã mais com quinze anos eu reencontrei ela. do Departamento Nacional da que conheci um taxista que tinha
Clara Nunes nova). Meu pai queria me casar Minha irmã era danada, morreu de Propriedade Industrial (DNPI)2: ponto aqui na praça, quando eu
logo para que eu tomasse conta da Aids, minha mãe morreu do coração contei a minha história ele disse “de
Dona Marli Farias, de 67 anos de minha irmã menor, ele dizia que e eu tô aqui viva! Quando eu vim trabalhar aqui, hoje em diante você nunca mais vai
idade, é ilustre conhecida dos para os homens era mais tranquilo, o Flórida já estava onde está hoje dormir em delegacia”, quando ele
adeptos do pão de queijo e cafezinho não pegava nada! Meu irmão ficava Em agosto de 1981, após ter se [Praça Mauá, 9]. Meu antigo patrão, não me levava, me dava o dinheiro
do Flórida Restaurante, na Praça o tempo todo com ele, pensamento separado do marido, com dois o seu Joaquim, ficou ali por 33 anos, da passagem, ficamos juntos por dez
Mauá. Com um sorriso aberto e uma de outro tempo. A gente sempre filhos pequenos para criar, Marli depois vendeu para o Célio, que já anos, ele foi o amor da minha vida.
doçura no olhar, Marli navega pela se perguntava se ele não gostava conseguiu o trabalho no Flórida, por está na empresa há quinze anos;
história com o desejo de partilha, é o da gente. Eu fiquei mocinha, meu intermédio da mãe: vendeu com tudo, porteira fechada. Marli, na experiência de sua
tipo de pessoa que cultiva amizades, pai dizia que iria me casar com o Daquela época só ficamos eu e um liberdade na Praça Mauá, se recorda
que se importa com o outro. Criada primeiro namorado que eu tivesse. A mãe trabalhava no prédio da 1ª rapaz da cozinha que foi embora, dos prédios, das casas comerciais,
pelo pai, Marli saiu da escola aos Assim foi, foram três meses entre Delegacia de Polícia [prédio que hoje mas depois voltou. Eu ficava no café, assim como se recorda de seus
Dona Marli em frente à antiga rodoviária Mario Procópio,
nove anos de idade para trabalhar namoro, noivado e casamento. Eu abriga a Escola do Olhar – Museu de que antigamente era na beira da rua. amores: “amei muito e fui muito atual prédio da Escola do Olhar. Acervo pessoal.

12 PERSONAGENS DA REGIÃO PERSONAGENS DA REGIÃO 13


viajar num navio”. Depois que me
aposentei as coisas melhoraram, em IYÁ DAVINA 1

2018 eu fiz o sétimo cruzeiro, todo


Luzia Rocha
ano eu vou, é um vício que tenho. Eu
chego nos navios e todo mundo me
conhece pelo fato de eu estar há tanto
tempo aqui no Flórida.

Chegadas e partidas, navegações,


o mar seduz Marli que do
porto sempre observou os
deslocamentos. Com orgulho a
mãe fala do filho que realizou seu Quem tudo quer saber,
sonho de entrar para a Marinha do nada se lhe diz
Brasil: “Meu filho fez trinta anos
de marinha, já ganhou até medalha Iyá Davina
pelo tempo de casa, agora ele deve
Dona Marli dentro do taxi de seu ex-namorado em frente ao Florida. Acervo pessoal.
se aposentar, vai virar capitão,
restaurante que ficava embaixo da escrevesse o prefácio do seu livro chorei quando ele entrou, vou
1º DP (pilotis do MAR), beber, ouvir de memórias: chorar quando ele sair. Eu não me Maria Davina Pereira, conhecida
música, dançar. Eu tenho saudades arrependo de nada, eu fui feliz, como Iyá Davina, nasceu em
daquela época, tenho saudades Eu gosto de carnaval, já desfilei na ainda sou feliz! A Praça Mauá para Salvador em 1880. Foi iniciada
dos amigos. As boates eram todas Grande Rio, Viradouro, Acadêmicos mim é o símbolo do amor”. Com no candomblé em 1910 por Pai
nessa calçada do Flórida, existia a da Rocinha, na minha escola de orgulho de sua história, Marli, Lili, Procópio Xavier de Souza no
Escandinávia (onde hoje funciona o coração que é a Portela eu nunca Docinha é um museu do cotidiano, Ilê Ogunjá. Em 1920, mudou-
Restaurante Maravilhas do Porto), desfilei. Na minha juventude, eu ela olha para o seu álbum de se para o Rio de Janeiro junto
a Cowboy, a Broadway, Kalesa, saía da Sapucaí e vinha direto para fotografias e diz: com seu marido Theóphilo
Amsterdã (onde hoje funciona a o trabalho. Tinha um amigo que Marcelino Pereira, ogã da casa Ilê
Casa do Biscoito), a Flórida, que trabalhava comigo que me apelidou Se a gente não escrever aquilo vai Ogunjá, instalando-se na região
hoje funciona como boate gay. de Docinha, porque eu dormia passar, eu adoro tirar fotografias. da Zona Portuária no bairro da
Eu queria aproveitar tudo, fui em cima daqueles pacotes de 5 Cada foto é uma memória que volta, Saúde. Sua casa ficou conhecida
muito presa quando morava com quilos de açúcar, que não existem eu lembro do dia de cada foto dessas, como Consulado Baiano, onde
o meu pai, depois que casei ficou mais, aquilo era uma cama para é um pedaço de mim, da minha recebeu muitos irmãos de santo
pior, quando larguei tudo queria mim. Eu trabalhava cansada, com história. de mudança para a cidade. Nesse
aproveitar a liberdade. purpurina, mas não faltava! mesmo período existia o Terreiro
de João Alabá de Omolú, localizado
Nas ruas do porto, Marli se recorda Para terminar nossa entrevista, 1. Com o crescimento econômico da década na Rua Barão de São Félix. Junto
dos barracões das escolas de samba pergunto a Marli qual é o seu sonho, de 70, o DNPI foi transformado em Instituto com Tio Pedro (Manoel Rodrigues
e dos ensaios abertos na Avenida ela navega em seus pensamentos Nacional de Propriedade Industrial (INPI) Pontes), Tia Zazá e Tia Irinéia,
Venezuela, antes da existência e com os olhos de marinheira pela Lei número 5.648, de 11 de dezembro filhas de santo do Ilê Ogunjá, se
da Cidade do Samba: Estácio, responde: “fazer um cruzeiro de 1970. Atualmente está situado na Rua juntam ao Terreiro de Alabá. Após o
Unidos da Ponte, Império da internacional, nesses lugares que a Mayrink Veiga, 9, Centro. falecimento de Alabá em 1926, Iyá
Tijuca, entre outras. Ela conta que gente vê na televisão”. Davina, que também era filha do
desfilou por nove anos na Império Disponível em: http://www.inpi.gov.br/ orixá Omolú, junto de outras filhas
Iyá Davina. Foto
da Tijuca, onde conheceu Miguel Quando os navios chegavam eu noticias/inpi-chega-aos-45-anos-conheca-a- de santo, herda os assentamentos do acervo pessoal
Falabella, amigo que gostaria que ficava lá fora pensando “um dia vou historia-do-instituto de Alabá. E então “transfere-se”, da família.

14 PERSONAGENS DA REGIÃO PERSONAGENS DA REGIÃO 15


devido à crescente modernização como Tata Ludyamungongo. 1966 vai buscá-lo em Salvador ENSAIO VISUAL
da cidade, primeiro para Bento Participou da fundação de muitos na casa de Pai Procópio. Hoje,

MORRO DO PINTO
Ribeiro, onde se torna Mãe terreiros de candomblé do Rio Mãe Meninazinha segue o legado
Pequena da Casa, e depois de Janeiro, tais como: Terreiro deixado por sua avó no Ilê Omolu
para Mesquita, onde funda Bate Folha de João Lessengue; Ilê Oxum no bairro de São Mateus em
Sandro Rodrigues
a Casa Grande de Mesquita Axé Opô Afonjá (Mãe Agripina); São Jõao de Meriti.
(primeira comunidade/ terreiro Terreiro de São Gerônimo e Santa
de candomblé da Baixada Bárbara (Mãe Senhorazinha) e o Iyá Davina, assim como as outras
Fluminense). Em 1950, após o Ilê Nidê de Seu Ninô D’Ogum. Matriarcas, exerceu sua atividade
falecimento de Tia Pequena, de acolhimento aos seus e aos
torna-se a última Yálorixa da Casa. Em 1960, iniciou sua neta carnal necessitados. Assim como as
Iyá Davina sempre continuou Mãe Meninazinha de Oxum e outras, foi uma lutadora pelas suas Na zona portuária do Rio de
exercendo a sua atividade acolheu as iniciações de seus raízes religiosas e exerceu muito Janeiro, o Morro do Pinto
“consular”, recebendo e acolhendo outros filhos e filhas carnais da sua força feminina, propagando permanece praticamente
seus irmãos de fé. Nair D’Oxaguian, Tia Neném de para seus herdeiros a luta contra a desconhecido, apesar de toda a
Xangô, Tio Nozinho, Tia Roxinha intolerância religiosa e com todas efervescência em torno da região.
Iyá Davina possuía inúmeros e de seus netos e netas. as minorias, já propagada em seu
filhos pequenos em outros tempo e, infelizmente, ainda Ocupado desde os tempos coloniais,
terreiros, como nas Casas de Seu Iyá Davina faleceu em 1964 aos existente hoje. suas ruas, ladeiras e arquitetura
Tata Fomotinho (terreiro Kwé 84 anos. A jovem Meninazinha, guardam ainda hoje muito das
Cejá Nassô no Santo Cristo) e de agora Mãe Meninazinha, herda Portanto, encerro com as sábias tradições dos diversos elementos
Seu Ciriaco, também conhecido o assentamento de sua avó e em palavras de Mãe Meninazinha de constituintes da nossa sociedade.
Oxum: “Aos olhos dos Orixás
somos todos iguais”.
Como um tesouro a ser descoberto,
este pedaço da cidade é uma joia de
Bibliografia:
cuja existência poucos sabem.
NASCIMENTO, Maria do. História
de uma Meninazinha: O Legado Parafraseando aquele antigo rap,
Ancestral. Rio de Janeiro: Edição do vai que tu vai ver tu não vai mais
Autor, 2015. querer descer.
www.ileomolueoxum.org
___________
1 Texto originalmente publicado na página do
GRES Feitiço do Rio, em 16 de outubro 2018.
Disponível em: https://www.facebook.com/
feiticodorio/

Sandro Rodrigues é morador do Morro


do Pinto desde sempre. Com formação
Mãe Meninazinha de Oxum,
em História e fotógrafo, vem desde 2017
neta carnal de Iyá Davina. Foto
de Amanda Neri. registrando o bairro e sua gente.

16 PERSONAGENS DA REGIÃO ENSAIO VISUAL 17


18 ENSAIO VISUAL ENSAIO VISUAL 19
REGIÃO PORTUÁRIA HOJE - POLO DE CULTURA E ARTE artesanato, literatura, dança e tudo e mais de quinze expositores de feijão fradinho, cebola, dendê,
que compõe o segmento afro. afroempreendedores por edição. camarão e especiarias, que

CASA OMOLOKUM
Então, além de valorizar a cultura alimenta corpo e alma.
Não é um restaurante e sim um afro-brasileira, que era o nosso
espaço de vivência que vai desde o objetivo, o evento fazia circular A casa tem mais de quinze pratos,
Albino Neto entrevista Leila Leão aroma até o sabor da comida, o som dinheiro entre estes grupos. entre eles o acarajé, que é o queridinho
dos tambores, as cores das roupas e dos clientes. Por causa dele temos
fios de conta e todo o universo que se Posteriormente abrimos a Casa o Festival de Acarajé todo segundo
cria no espaço. Apesar de não ser uma Omolokum, espaço de vivência domingo do mês das 13h às 18h, com
casa religiosa, transmite toda a cultura localizado na Pedra do Sal, lugar muito acarajé e sabores variados
do candomblé, religião da qual eu, de grande força ancestral e de axé. de vatapá, como camarão, peixe,
chef e dona da casa, sou ativamente A casa abre em baixa temporada, bacalhau e frango, além de uma
participante e na qual fui iniciada de abril a outubro, todo domingo opção vegana. Neste dia, a casa tem
desde os catorze anos de idade. de 13h às 18h. Entre novembro e shows e expositores em uma grande
março, aos sábados e domingos das celebração da cultura afro e ancestral.
O projeto Omolokum nasceu 13h às 18h e, às segundas, das 19h
há cinco anos com a união de às 23h. Em outros dias da semana é Mais que resistir, a proposta da casa
meus trabalhos com o músico possível fazer reservas comigo para é existir e ser um ponto de encontro
percussionista Bruno Oliveira, meu grupos e festas com 48 horas de de irmãos e de todo aquele que quer
ex-companheiro, nós dois de axé. antecedência e ter uma experiência conhecer mais um pouco da história
Unimos nossos conhecimentos mais detalhada, que pode incluir de um povo que firmou a identidade
e firmamos um evento chamado desde workshops de culinária até cultural de posso país.
Omolokum, com etnoculinária percussão, turbantes ou dança.
e música, na Fundição Progresso, Valorizar o que é nosso é preciso e
grande casa de shows na Lapa-RJ. Omolokum é a comida da deusa urgente para que nossa voz não se cale.
O evento durou dois anos, com Oxum, senhora das águas doces e
edições mensais e um público frescas, da beleza, da fertilidade, é Venha para a Casa Omolokum
que variava de 150 a 700 pessoas, uma comida feminina composta alimentar corpo e alma.

Eu conheci a Casa Omolukum é a chef Leila Leão, que comanda Leila Leão, o que é Casa de
quando ela ainda estava localizada a cozinha de forma brilhante. Omolokum, seu significado,
no alto do Morro da Conceição, Cozinha com amor. sua história e como o leitor pode
na Rua do Jogo da Bola, ao lado da provar das suas iguarias?
Praça Leopoldo Martins. Hoje em Acredito que no início aborreci a
dia a casa está localizada na Pedra Leila, porque nos meus passeios A Casa Omolokum é uma casa de
do Sal, na Rua Argemiro Bulcão. De turísticos, quando apresentava cultura afro-brasileira que tem
cara, o local me chamou a atenção a Casa Omolokum, cometia como foco a valorização da comida
pela sua beleza e simplicidade. A um enorme engano: confundia de dendê, conhecida também
Casa Omolokum transmitia uma Omolokum com o Omolokô como comida de azeite, que é a base
paz imensurável, o sentimento da umbanda. Mas Leila Leão, de da culinária ancestral de matriz
era muito bom. Se o ambiente forma carinhosa, me explicou africana. Nós fazemos releituras
já era extremamente acolhedor, que eu estava completamente da comida de terreiro e comida
fui conquistado definitivamente enganado, me dando uma aula afro-brasileira de um modo geral.
quando experimentei o melhor sobre Omolokum. Portanto não Além da gastronomia, um grupo
acarajé que comi na minha vida. A há ninguém melhor para explicar a de afroempreendedores alimentam
responsável pelo preparo da iguaria você, leitor, senão a própria chef. o espaço com música, moda,

20 R E G I Ã O P O R T U Á R I A H O J E - P O L O D E C U LT U R A E A R T E R E G I Ã O P O R T U Á R I A H O J E - P O L O D E C U LT U R A E A R T E 21
GALERIA PROVIDÊNCIA Em uma cidade com índices de
violências que batem recordes todos
e Marcelo Ment, que utilizam as
artes para atuar na redução de
Seja nos forrós, pagodes, bailes
funk, churrasquinhos nas lajes,

ARTE E SAÚDE MENTAL, QUAL É A os anos, com políticas públicas


ineficazes para os problemas
alguns desses danos em discussão. bares ou na religião, na maioria
das vezes nos cultos evangélicos,

IMPORTÂNCIA DESSES TEMAS PARA A sociais mais básicos, a população


trabalhadora carrega por séculos, sem
O resultado gerou engajamento e
comentários positivos a respeito
missas católicas e/ou nos poucos
candomblés que ainda existem.

POPULAÇÃO DE FAVELA? muito questionar ou refletir, uma


série de sofrimentos cotidianos que
da transformação gerada pelas
cores, movimentação e festividade Diante de tamanha desigualdade
Hugo Oliveira a sobrecarregam. Como provocar ocorrida no local, resgatando histórica é preciso rever as maneiras
Cria do Morro da Providência e idealizador do Galeria Providência. um momento de atenção em que um pouco da esperança de dias de acesso da população que mais
seja possível falar dessas questões melhores dentro da favela. Essa é a sofre e as estratégias de valorização
fotos : : Walison Oliveira
de forma acessível, informativa e solução que moradores encontram e cuidado com a vida simbólica. Se
que possa auxiliar na diminuição dia após dia: pequenos momentos a saúde mental é direito de todas
da sensação de abandono e de de lazer no pouco tempo que resta as classes sociais, uma verdade é
sofrimento? Como encontrar para enfrentar seus dilemas. São sabida, é preciso tratar os menos
espaços para refletir sobre saúde situações ainda bem análogas ao favorecidos com urgência!
mental dentro da favela?

Esse foi o desafio enfrentado pela


equipe do Galeria Providência
no mês de julho. Na sua terceira
edição, o projeto deu continuidade
à proposta de construir uma galeria
de arte a céu aberto dentro do Morro
da Providência. E, conhecendo a
dinâmica social dos becos, vielas e
os sofrimentos enfrentados pelos
moradores, usou a temática como
uma estratégia para discutir e refletir
sobre a importância da arte e da saúde
mental para a população de favela.

O evento contou com a


participação de dez grandes nomes
do graffiti: Hanna Lucatelli, período de escravidão no Brasil,
O graffiti mudou a minha vida, porque
Quando refletimos sobre alguns dos ser humano. No que tange à saúde distante da população de favela, seja Marcelo Ment, Toz, Larissa Rocha, em que os cativos faziam suas eu estudo na escola Darcy Vargas, até a
direitos básicos de que a população mental, a ausência desses direitos, pelos valores altos, pelo preconceito Ian Raposo, Yaya Ferreira, Luna reuniões para cantar, dançar e minha escola quer que eu faça um graffiti
de favela também deveria usufruir somada a uma sociedade movida do vínculo à loucura ou mesmo Bastos, Raphael Cruz, Bendita beber cachaça para aliviar dores lá, mas eu estou aprendendo ainda, então
– como o direito de ir e vir, o direito pelo consumo e espetacularização, pelo pouco conhecimento sobre Gambiarra (Aline Besouro e Cali e enfrentar a dura realidade dos eu vou aprender. Eu faço fotos, jogo bola,
de igualdade perante a lei, o direito estruturam alguns dos fatores as possibilidades de tratamento. Nassar) e Mano Beiço. No meio deveres, sem nenhum direito. danço, ando de bicicleta todo dia (é o
que eu mais gosto de fazer), tenho 12
de intocabilidade do corpo, o direito que geram as angústias, tristezas e Aqueles que de alguma forma já do evento, rolou uma roda de
anos, sou cria da Providência. A Galeria
à moradia, o direito à intimidade medos, desaguando em depressão e ultrapassaram essas barreiras e conversa na rua onde ocorriam Apesar dos direitos conquistados
Providência é muito importante para
(não-invasão domiciliar), o direito outras patologias. encontraram auxílio nos CAPS as pinturas dos painéis, onde os e, como vimos, pouco acessíveis, mim porque todo ano é um aprendizado
à educação, o direito ao lazer, entre (Centro de Atenção Psicossocial) moradores convidados puderam ainda hoje são essas reuniões que e a gente consegue evoluir mais as coisas.
outros – vemos como são temas O acesso aos serviços de atendimento sofrem com a falta de vagas ouvir de artistas como Raul auxiliam na manutenção da saúde Walison Oliveira
de suma importância para todo psicológico ainda é uma realidade para o atendimento. Santiago, Rafa Eis, Diana Kolker mental dos moradores de favelas.

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O IMPACTO DAS CORES
INICIATIVA NA PROVIDÊNCIA UNE
SUSTENTABILIDADE E ARTE-EDUCAÇÃO

Fotos :: Ricardo Siqueira


Um ar de alegria tem colorido as comunidade. A primeira tentativa e autoestima nos moradores, tanto, pensa em fazer parcerias
casas e as ruas da Providência, não deu muito certo, houve pouca ajuda a diminuir os índices de com algumas empresas que se
comunidade mais antiga do Rio adesão de voluntários. Mas abriu violência. Afinal, alguns lugares se instalaram na região e também
de Janeiro. Sob os auspícios de um campo de possibilidades a tornam verdadeiros playgrounds conta com o apoio dos cidadãos do
Aline Miranda, o projeto Impacto ser explorado e, em 2013, Aline coloridos e convidativos. Rio de Janeiro que compreendam
das Cores teve sua sede oficial criou o Providência Sustentável: a importância desse tipo de
inaugurada em abril desse ano. O um projeto de conscientização Aline espera avançar e dar iniciativa para uma cidade com
grupo recebe doações de tintas que ecológica voltado para os continuidade ao projeto, mais alegria – principalmente
seriam descartadas incorretamente moradores da região. Três principalmente aumentando o nas regiões historicamente
e, com a ajuda de moradores da anos depois, em 2016, a líder número de doações de tinta. Para negligenciadas pelo poder público.
região, enche de cor praças e ruas comunitária foi convidada do
abandonadas pelo poder público. Favela Painting, projeto que levava
artistas do mundo todo para
A ideia que inspirou a iniciativa pintar murais nas comunidades
veio em um passeio de Aline do Rio de Janeiro. Nele, Aline
com sua filha há dez anos atrás. organizou, por conta própria, uma
Enquanto brincavam em uma intervenção artística no Morro da
praça, ela ouviu da filha diversas Providência. E, a partir daí, surgiu
reclamações quanto ao cuidado e o Impacto das Cores.
ao aspecto do lugar, que parecia
abandonado. Com isso, começou O projeto vem transformando
a prestar atenção em tudo a sua o ambiente da Providência e
volta e a elaborar modos de ajudar mobiliza um grande número
a própria comunidade – sua de crianças e adolescentes. A
família vive há mais de cem anos sede, recém-inaugurada, serve
na Providência. As primeiras como espaço mobilizador para
iniciativas começaram pouco inúmeras ações de educação
tempo depois, quando Aline fez ambiental e artística. O impacto
uma pesquisa para levantar os do projeto é evidente: espaços
dados necessários – como situação antes degradados e evitados pela
da água, esgoto, iluminação população local passaram a ser
etc. Com o resultado, tentou utilizados para os mais diversos
organizar grupos multitarefa que fins. Isso, além de despertar
realizariam pequenos reparos na um valor de pertencimento

24 R E G I Ã O P O R T U Á R I A H O J E - P O L O D E C U LT U R A E A R T E R E G I Ã O P O R T U Á R I A H O J E - P O L O D E C U LT U R A E A R T E 25
MEMÓRIAS DA REGIÃO PORTUÁRIA maxixe (mistura de polca com lundu) oficiais muito velhos vestidos de lilá tornou-se prisão comum no século
apareceu ali em 1876. Fechava-se o (antigo tecido de lã fino e lustroso) XIX. Os condenados à forca eram aí

A REGIÃO PORTUÁRIA NO LIVRO MEMÓRIAS DE dia com a queima de fogos de artifício


(dos tipos cobrinha, lágrimas, rodas
numa saleta no paço da Praça XV
logo à entrada da porta principal.
colocados e no dia marcado levados
para a forca que ficava na prainha

UM SARGENTO DE MILÍCIAS: UM GLOSSÁRIO de fogo, fragatas com fortalezas e


girondolas). O auge das Festas do Ucharia Real - era um departamento
(hoje Praça Mauá). Antes, passavam
pela Igreja de Santa Rita onde
Paula Carriconde Divino foi entre 1840 e 1855, sendo da corte real, uma despensa para ajoelhavam-se no portal e faziam
depois coibida até desaparecer por carnes ou depósito de mantimentos suas últimas orações.
volta de 1890, quando migrou para das casas reais e abastadas.
os teatros e apareceu numa peça do O autor Manuel Antônio de Almeida
grande ator Vasques em 1865. “Pô-lo na Conceição”- significava nasceu em dezessete de novembro
colocar alguém no serviço militar, de 1831 na Praia da Gamboa, Rua do
Não vou dar spoiler sobre o livro P. S.: Havia Festa do Divino em pois no Morro da Conceição havia e Propósito (casualmente 99 anos
delicioso de um Rio antigo, outros bairros, mas a mais popular ainda existe uma fortaleza militar. depois nasceria a cantora e grande
espero que os leitores tenham era a do Campo de Santana. compositora Dolores Duran, seu
curiosidade de lê-lo por si próprios. Acontecia também no Largo da Música de Barbeiros - constituíam- maior sucesso foi “A noite do meu
Quero apenas auxiliar os futuros Lapa, na Matriz de Santo Antônio se bandas de negros aprendizes ou bem”, mas isso é outra história).
leitores com a localização dos (hoje Largo da Carioca), no Largo de oficiais de barbeiros, que utilizam Depois sua família se mudou para a
acontecimentos do romance (vide Santa Rita e no Largo do Estácio. principalmente pistom e trompas Rua da Vala (atual Uruguaiana) quase
mapa) e um pequeno dicionário como instrumentos musicais. esquina com a Rua Estreita de São
de termos já há muito esquecidos, Canto dos Meirinhos - ficava na Joaquim (hoje Marechal Floriano). É
que garimpei por aí. Como não junção da Rua do Ouvidor com a Rua Manchete - cavaquinho. bem provável que ele tenha estudado
sou pesquisadora ou historiadora, da Quitanda (esse largo ainda existe, no que seria o Colégio Pedro II, depois
esqueci de anotar a bibliografia onde é redondo nas quatro esquinas). O Maganás - travesso, atrevido. fez desenho na Academia de Belas
achei estes fatos. Indico apenas o que mudou foi a arquitetura em volta, Artes (tudo próximo a onde morava).
romance editado pela Ediouro, em mas o resto sobreviveu: ficam os Pataca - moeda antiga de prata que Foi jornalista, estudou medicina,
edição de bolso. Ele deve existir em meirinhos sentados uniformizados valia 320 réis. trabalhou no jornal Correio Mercantil.
edições de outra inúmeras editoras A festa poderia durar das sete horas iluminada por centenas de copinhos em bancos de couro, esperando Em 1858 foi nomeado administrador
do Brasil. Espero ter ajudado e da manhã até às dez horas da noite. com velas. Pelo campo armava-se ordens de cobrança. O traje consistia Robição - sobrecasaca. da Tipografia Nacional, onde
contribuído pelo interesse por esta Na frente da Igreja de Santana era barracas de vários tamanhos. Na em calção (hoje bermudas) casaca e conheceu e ajudou Machado de
obra de um tempo antigo e com as montado um pau de sebo, com a barraca do “Gostoso”, por exemplo, meias pretas. Na cabeça um chapéu Fâmulo - criado, servo. Assis. Também foi segundo oficial da
cores de um Rio que não volta mais. pombinha no topo. Na lateral da vendia-se pão-de-ló e roscas, outras armado, mais fivelas no sapato e Secretaria dos Negócios da Fazenda.
Boa leitura! igreja era montada uma capela com ofereciam outros comes e bebes. Na espadim na lateral do quadril, além de Sarabanda - dança popular, ou Em 1861, no dia 28 de novembro,
um estrado e um trono, onde era barraca do “Bom Gosto” por cinco um círculo branco no outro quadril. tumulto. morre no naufrágio do navio Hermes
Festa do Divino: na frente da Igreja coroado um menino como imperador tostões podia-se ver: engolidores que bateu nos arrecifes indo para
de Santana, no Campo de Santana, divino (daí esta lateral ser chamada de de espadas, duetos de “meirinhos e Casa da Guarda - onde ficava o (Santa) Ferula - palmatória. Campos dos Goytacazes, onde
que se situava onde hoje é a saída imperial, onde nosso herói procura o pobre” ou outra opereta, ou peças comando do Major Vidigal (o terror tentaria uma eleição para a Assembleia
da Central do Brasil em direção à alguém). Em volta, músicos barbeiros como O juiz da paz na roça. Também dos bandidos), o equivalente a uma Escorrichar as galhetas - sacristão Provincial. Neste desastre morreram
Rodoviária Américo Fontenelle – faziam um quadrado e depois saíam havia barracas de prêmios (bonecas, chefatura de polícia, era no Largo da (depreciativo). 37 passageiros.
dentro da Central há uma pequena nesta formação levando a bandeira do flautas, ou gaitas). Para as crianças Sé, atual Praça XV.
capela onde ficava o altar-mor da Divino pelas ruas, entrando nas casas tinha teatro de marionetes na barraca Mestre de Cerimônia - clérigo O livro saiu em fascículos no
igreja. A Festa do Divino Espírito e recebendo ofertórios (esmolas). Na do “Teles”, aliás, nesta barraca Campo dos Ciganos - depois Largo ou padre que dirige o cerimonial suplemento do jornal Correio
Santo foi muito popular na primeira volta havia folias, prendas, leilões, acontecia também bailes com valsas, do Rossio e hoje Praça Tiradentes. litúrgico no século XIX. Mercantil, “na pacotilha”,
metade do século XIX, sendo depois bandas de música e pantomimas, polcas ou comédias, árias de operetas, semanalmente de 27 de junho de
perseguida até a extinção por ser a que o pequeno imperador e o duetos e espetáculos de ginasta. O dia Pátio dos Bichos - no Pátio dos Aljube - presídio para padres 1852 a 31 de julho de 1853. Foi lançado
considerada pouco civilizada.  público assistiam. A capelinha era terminava com lundus e batuques, o Bichos trabalhavam três ou quatro rebeldes construído no século XVII, em volume em 1854 e 1855.

26 MEMÓRIAS DA REGIÃO PORTUÁRIA MEMÓRIAS DA REGIÃO PORTUÁRIA 27


VILA VERDE E A HISTÓRIA DA FUSÃO DOS
BAIRROS NA REGIÃO PORTUÁRIA
Paula Carriconde

A curiosidade é como uma pulga achei um livro usado que falava


que de repente habita atrás da nossa sobre a região onde ficava a igreja,
orelha! Como tudo começou? Sei lá. chamada Vila Verde 1 , situada
Talvez uma notícia ouvida no rádio. entre o Valongo e a atual Avenida
Ou uma reportagem em algum jornal, Marechal Floriano, e da Rua
ou talvez pela TV. Só lembro que Teófilo Otoni até o início do Morro
uma referência a uma igreja dedicada da Conceição. Entre 1637 e 1642,
a São Joaquim, há muito derrubada, foi um antro de criminosos, onde
despertou a minha pulguinha. E a bandidos da pior espécie viviam.
cada nova peça do quebra-cabeça, ela O trecho mais pavoroso era o
picava com mais força. Volto à Igreja trecho chamado Valinha, próximo
de São Joaquim derrubada para fazer a à atual Igreja de Santa Rita. Era tão
ligação do Valongo (porto e mercado perigoso que os “quadrilheiros”
de escravos) com a Rua Larga de São (a polícia da época) não entravam,
Joaquim (hoje Avenida Marechal e nem perseguiam os fascínoras
Floriano). Havia ao lado um convento, que lá encontravam abrigo. Os
também dedicado a São Joaquim, maiores crimes ocorridos neste
que, no Segundo Império, foi período tiveram como autores
transformado em orfanato e depois criminosos desta região. Em Vila
em colégio (atual Pedro II). Tudo Verde a vida humana tinha pouco
isso foi reavivado com a construção valor, matava-se por um copo de
do VLT, quando encontraram nas cachaça. E isto deu ao Rio a triste (montada no Largo da Prainha, à cabeça quando lembro de um – atualmente ressuscitada pelo se alugavam carruagens no século
escavações para a colocação dos trilhos fama de ser uma cidade violenta hoje Praça Mauá) ajoelhavam e antigo filme dos anos 1950, sobre VLT – e o bairro Vila Guarany, XIX. Depois, o último bairro: a
os esqueletos da antiga aristocracia e onde se matava mais barato, em faziam suas últimas orações antes a vida de Francisco Alves, o rei da onde hoje está a Rodoviária Novo Praia dos Mineiros. Hoje esses
carioca que foi enterrada dentro da pleno século XVII. A Rua Larga de serem conduzidos ao patíbulo. voz – também chamado de Chico Rio. Vemos também a última bairros antigos, Vila Verde, Santa
igreja. Daí a pulguinha enlouqueceu de São Joaquim junto com a Rua Na frente da Igreja de Santa Rita Viola – com o ator Cyl Farney – galã estação de bondes puxados por Efigênia, Largo de Santa Rita,
e mordeu com desespero. Então o Estreita de São Joaquim faziam a eram enterrados os escravos. hoje esquecido, irmão do cantor mulas, precisando de restauro. Vila Guarany, Praia dos Mineiros,
destino ajudou. ligação da cidade do Rio de Janeiro O VLT achou os despojos, mas Dick Farney – e a atriz, então Até pouco tempo ainda havia o foram diluídos nos atuais bairros
com o chamado Sertão, ou seja, o decidiu não exumá-los, e tornou a iniciante, Eva Wilma. Refiro-me varal para amarrar os cavalos e o da Saúde, Gamboa e Santo Cristo.
Na Praça XV acontece todos os interior do estado. Na Rua Estreita seputá-los. Hoje, quando comemos ao bairro de Santa Efigênia, que bebedouro dos mesmos. Ainda na
sábados uma feira de antiguidades de São Joaquim ficava a Igreja de as famosas sardinhas de sexta-feira aparece logo no início do filme. mesma região tem a casa egípcia,
e, ao lado, a feira dos sem terra – Santa Rita, no principio Freguesia no Largo de Santa Rita estamos A cena mostra uma praia e um espetacular construção, uma 1 As referências citadas no texto sobre a Vila
chamo assim porque eles não têm do Ó, depois de Santa Rita, e onde acima de um cemitério de escravos. morro que desapareceram com grande casa em estilo holandês, Verde, foram retiradas do livro MACEDO,
barracas, colocam suas mercadorias rezava-se a missa dos enforcados. Há outro bairro desaparecido a construção do porto no início hoje restaurada. E a última cocheira Sergio D. T. Memórias do Rio. Rio de
no chão. Pois foi nesta última que Nela, os condenados à forca da zona portuária que me vem do século XX: a praia formosa totalmente descaracterizada, onde Janeiro: Record, 1964.

28 MEMÓRIAS DA REGIÃO PORTUÁRIA MEMÓRIAS DA REGIÃO PORTUÁRIA 29


DOCAS DOM PEDRO II
O GALPÃO DA CIDADANIA
Por Norton Tavares, morador do Morro da Conceição

Comigo-ninguém-pode, espada- tentativa de modernizar a região


de-são-jorge, arruda, alecrim, guiné, portuária que precisava de um local
manjericão e pimenta. A baiana, mais apropriado para armazenar
que chegou cedo ao Mercadão de cargas que antes eram estocadas
Madureira, subúrbio do Rio de em precários trapiches, feitos de
Janeiro, fez questão de escolher madeira, além de servir como local
pessoalmente as melhores folhas. para pequenos reparos navais.1
Pouco tempo depois, já em casa,
preparou com as ervas a água de Apesar de Rebouças ser um grande
cheiro que seria utilizada para a abolicionista, a razão pela qual
limpeza energética e espiritual não foi utilizada mão-de-obra
de um local sagrado para ela e escravizada na construção do
seus ancestrais. Junto com outras prédio foi que, desde a década de
mulheres, todas descendentes 1850, já era padrão a contratação de
dos que desembarcaram naquele trabalhadores livres para concessão
chão, trazidos à força da África, de subsídios governamentais.2
começaram o ritual com muita O local funcionou como doca até
cantoria e dança. O Cais do o início do século XX, quando
Docas Dom Pedro II. Foto de Juan Gutierrez, 189(?)
Valongo, ponto de chegada de foram iniciadas as obras que
aproximadamente um milhão originaram o atual Cais do Porto utilizava para confecção de alegorias Fome, que em 2018 distribuiu mais uma escolha estética do arquiteto 1 SOARES, Carlos Eugênio. Valongo,
de almas escravizadas, cantava. do Rio, adequando, então, a cidade e realização de oficinas de arte. de mil toneladas de alimentos para Hélio Pellegrino, já nos anos Cais dos Escravos: Memória da Diáspora
Do outro lado da rua, um prédio às novas necessidades do mercado famílias em situação de insegurança 2000, para a reforma realizada e Modernização Portuária na Cidade
do Rio de Janeiro, 1668 – 1911. Museu
opulento parecia assistir à festa. internacional que exigia a utilização Completamente abandonado e em alimentar em todo o Brasil. pela Ação da Cidadania.
Nacional, UFRJ, 2013. (Disponível
de navios de grande calado. péssimo estado de conservação,
em https://portomaravilha.com.
Apesar de não guardar mais suas foi cedido no ano 2000 à Ação da Apesar de não guardar mais Tombadas pelo Instituto do br/conteudo/estudos/academicos/
características originais, o Docas Com todo o entorno do prédio Cidadania, organização da sociedade suas características originais, Patrimônio Histórico e Artístico DOUTORAMENTO%20UFRJ%20
Dom Pedro II ainda traz em suas aterrado, o galpão, com 160 metros civil de combate à fome criada pelo modificadas no governo militar Nacional (Iphan) em 2016, o ARQUEOLOGIA%20.pdf)
fundações um pouco da história de extensão e 35 metros de pé- sociólogo Herbert de Souza, o – como o alinhamento da fachada Docas Dom Pedro II, também
de André Rebouças, primeiro direito, ficou abandonado por longos Betinho, que recuperou totalmente frontal à recém-criada Av. Barão conhecido como Galpão da 2 INSTITUTO DO PATRIMÔNIO
HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL.
engenheiro negro a atuar no períodos. Durante o regime militar, o prédio. Hoje ele é utilizado como de Tefé – o prédio traz aos seus Cidadania, tem hoje sua vocação
Ata da 84ª Reunião do Conselho Consultivo
Brasil. Finalizado em 1875, o foi ocupado e modificado pelo espaço de promoção da cidadania visitantes a falsa impressão de como espaço de preservação
do Patrimônio Cultural. Brasília, 24 nov.
armazém foi construído com a exército como garagem de veículos através de eventos, oficinas culturais, que ainda é do mesmo jeito que da memória afro-brasileira e 2016. (Disponível em http://portal.iphan.
mais moderna tecnologia inglesa blindados. E na década de 1990, pelo apresentações artísticas e como sede o deixado por Rebouças. Seus também de luta por um Brasil sem gov.br/uploads/atas/ata_da_84_reuniao_
de engenharia da época, em uma carnavalesco Joãozinho Trinta, que o nacional da campanha Natal Sem tijolos aparentes, porém, foram fome e sem miséria. conselho_consultivo.pdf)

30 MEMÓRIAS DA REGIÃO PORTUÁRIA MEMÓRIAS DA REGIÃO PORTUÁRIA 31


UM INOVADOR NA ARTE DA defensores do realismo no
cenário e na fantasia. Aluno da
ocorre um diálogo entre tradição
e modernidade e ele é encarnado,

INTERPRETAÇÃO TEATRAL Royal Dramatic School, em 1786


Talma possuía os dons físicos
no teatro, em uma mesma pessoa
e em um mesmo corpo: o do ator.

A SOCIEDADE DRAMÁTICA PARTICULAR FILHOS para capacitá-lo a se sobressair:


uma aparência marcante e uma Sua carreira (1763-1826) encarna

DE TALMA HOMENAGEIA O ATOR J. F. TALMA


voz de beleza e poder, que ele perfeitamente o diálogo entre
gradualmente treinou para a tradição e vanguarda, representando
perfeição. No início um pouco tanto a institucionalidade como
Ricardo Lens
empolado e monótono, passou a ruptura. Intérprete dos grandes
a ser considerado um modelo de papéis da tragédia clássica, ele
simplicidade. Iniciou mudanças permanece membro da Comédie-
nas formas de representação Française até sua morte, mas não é
atuante e com relação às roupas considerado pelos historiadores até
cênicas. Talma se casou com então um ator revolucionário no
Julie Carreau, uma senhora rica sentido político e artístico do termo...
e talentosa. O ator era um amigo É o primeiro comediante francês a ter
François Joseph Talma. Mas o Talma também é um dos primeiros íntimo de Napoleão Bonaparte, reivindicado em seus compromissos
que levou esse grupo de artistas atores franceses a desempenhar os que se deleitava em sua sociedade. políticos, assim como em seus
a adotar Talma como pai? papéis principais no repertório de escritos, o desejo de fazer parte de
Localizado em uma das artérias Shakespeare. Seu futuro será, na Uma nova proposta teatral uma vanguarda teatral.
mais nostálgicas da história da verdade, mais inf luenciado pela baseada em uma forma de
Gamboa, na Rua do Propósito nº descoberta do teatro elisabetano. militância estética parece ter Talma posou como modelo para O ator Tarma, escultura de David d’Angers na praça da galeria
20, na cidade do Rio de Janeiro, A época isabelina, que não se começado já no século XVIII, Delacroix quando atuava no David d’Angers. Wikimedia Commons

o prédio em estilo colonial está limitou a adaptar os modelos, quando atores e dramaturgos papel de Nero (óleo sobre tela, e conclamando-os para a luta.
situado na região do projeto renovou felizmente a métrica com derrubavam os códigos da 1853). Delacroix não constrói Diversos são os indivíduos
Porto Maravilha. Neste teatro o verso branco e introduziu, assim tradição teatral clássica. Já ali um discurso moral em sua que compõem a cena: vivos e
se apresentaram, um dia, a mesmo, uma série de técnicas representação, não há criação mortos, plebeus e intelectuais,
extrovertida Dercy Gonçalves, o teatrais de vanguarda que foram de heróis ou mártires. Sua jovens e velhos. A composição de
rei Roberto Carlos, a ternurinha utilizadas séculos mais tarde composição se pauta pelo uso das Delacroix unifica esses elementos
Wanderléa (antes de surgir a pelo cinema e a televisão. O cores quentes e vivas, é requintada turbulentos na tela.
Jovem Guarda), os Golden Boys, cenário inglês no fim do século e repleta de detalhes e elementos
a Orquestra Tabajara, Ed Lincoln, XVI (sobretudo em Shakespeare) que possuem um caráter solto Sendo auxiliado por um amigo
entre outros. apresenta uma frequente e rápida na pintura e intensificam o caos – o pintor Jaques-Louis David,
sucessão de cenas que fazem passar revolucionário.Tudo possui uma que iniciou suas primeiras
A reinauguração do espaço rapidamente de um lugar a outro, medida exata e um lugar certo. obras-primas de estética
François-Joseph Talma (1763-1826) em retrato de Aimée Perlet, de contou com a presença de Sueli saltando horas, dias ou meses com Mesmo com o desprendimento neoclássica, estilo com base no
1823. Wikimedia Commons
Azevedo, que em 1963 foi coroada uma agilidade quase igual à do dos traços, a pintura de Delacroix Iluminismo – estabeleceu um
L’acteur Favori de Napoléon! Esse legitimamente pelos artistas da cinema moderno. O verso branco é pensada. diálogo entre o real e o ideal.
era o enredo do bloco Cordão trupe a primeira Rainha da SDP. E, trabalha conferindo à poesia a Simpatizante da Revolução,
do Prata Preta para o carnaval plantando uma árvore genealógica espontaneidade da conversação e a A figura central que segura a dos ideais republicanos e amigo
de 2013. A Sociedade Dramática imaginária, considerando o naturalidade do recitado. bandeira, A Liberdade Guiando de Robespierre, David usa
Particular (SDP) Filhos de romance de Talma com a princesa o Povo, de 1830, mesmo elementos escultóricos gregos
Talma foi fundada em 1879 por da França, Pauline Bonaparte, Foi em uma liderança juvenil que possuindo caráter alegórico é em Marat Assassinado (1793),
Talma como Nero na peça Britannicus de Jean Racine, pintado por
brasileiros e portugueses como suscitaria real atribuir a Sueli um ele primeiro ganhou destaque: Eugène Delacroix (óleo sobre tela, 1982 ou 1983). Na coleção da um misto de realismo e retórica. onde figura músculos e tendões
Comédie-Française. Wikimedia Commons
homenagem ao ator francês título de nobreza artística? Talma foi um dos primeiros Vestida com as roupas do povo muito bem delineados e perfeitos,

32 MEMÓRIAS DA REGIÃO PORTUÁRIA MEMÓRIAS DA REGIÃO PORTUÁRIA 33


às suas ideias teatrais. Aparece em
cena sem peruca, sem declamar CRÉDITOS
versos trágicos; atropela as
convenções do espetáculo trágico
de tal maneira que a tragédia se
direciona para um outro estilo: o Edição geral Gabriela Cyrne Augusto Batista Matheus Fontinele
drama histórico e político. Izabela Pucu Hugo Oliveira Bruna Camargos Niara do Sol
Bruna Camargos Luzia Rocha Celina Rodrigues [Mãe Norton Tavares
O teatro foi então a caixa de Norton Tavares Celina de Xangô] Paula Carriconde
ressonância dos acontecimentos Comissão editorial Paula Carriconde Cosme Felippsen Petrucio Anjos
políticos, e é também visto como Arleni Batista Ricardo de Aragão Dauá Puri Ricardo de Aragão
um poderoso instrumento de Augusto Batista [Ricardo Lens] Elcio Costa Robson Felix
comunicação e educação do povo. Leonardo Tonan Sandro Rodrigues Eliana Rosa Sandro Rodrigues
Entoando cantos pictóricos, o galo, Paula Carriconde Francisco de Souza
um dos símbolos de valentia e da Ricardo de Aragão Entrevistas Gabriela Cyrne Revisão
França, servia de motivação aos Leila Leão Gabriel Catarino Lucas Hombeeck
ativistas revolucionários. Produção editorial Marli Farias Hamilton
Juliana Travassos Hugo Oliveira Design
Talma também era amigo de Participantes da Oficina Izabela Pucu Augusto Batista
Joseph Chérnier, Georges Colunistas Folha sobre folha Leandro Rodrigues
Danton, Camille Desmoulins e Albino Pereira Neto Aline Mendes Lili Impressão
outros revolucionários. Foi no Aline Mendes Ana Carla Luciana Coutinho WSM Gráfica
antimonárquico Charles IX, de André Vargas André Vargas Luziete Fernandes
Chenier, produzido em 4 de Bruna Camargos Arleni Batista Marcia Alves
novembro de 1789, do qual um
dístico (forma de apresentar um
mote em poema, que também
compõe o soneto shakespeariano)
profético sobre a destruição da
Bastilha fez a casa explodir em
Estátua de François-Joseph Talma na fachada da prefeitura de Paris, França. Wikimedia Commons
uma salva de aplausos, liderada por
Mirabeau. Essa peça foi responsável
resultado de sua observação e seus vestidos de acordo com seu pelas dissensões políticas na
estudos de arte da Antiguidade. tempo e não seguindo a moda Comédie-Française que resultaram
David constrói uma alegoria contemporânea para surpresa na criação, sob o comando de
moral enxuta e rigorosa para de uma plateia acostumada Talma, de um novo teatro.
os revolucionários, e a obra com o figurino do século XVIII
prima Marat se torna um ícone no palco, independentemente Recentemente foi lançado um selo
da Revolução Francesa. Talma de sua adequação ao papel postal comemorativo em euros de
aparece no pequeno papel de desempenhado. Ele é € 1,20 e, no passado, outro em
Proculus no Brutus, de Voltaire, frequentemente creditado por franco francês de Fr 0,30 com
com uma toga e um curto corte ter introduzido o penteado desenhos da imagem de Talma.
de cabelo romano, coturnos neoclássico masculino. Simbolicamente, haveria um
de época e, o que mais choca: significado especial se a SDP
braços e pernas nus! Propõe Pioneiro de uma revolução recebesse alguma correspondência
interpretar os personagens estética, adapta a revolução política com essas estampas.
foto :: Denoit Sournier

34 MEMÓRIAS DA REGIÃO PORTUÁRIA C R É D I TOS 35

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