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DISCIPLINAS COMPLEMENTARES

ECA
Paulo Lépore
Aula 01

ROTEIRO DE AULA

I. Direito Internacional da Criança

1. Caso Mary Ellen - 1874

Sociedade passa a voltar seus olhos para normas de proteção às crianças.

Não havia leis que protegessem as crianças e a garotinha Mary Ellen, que sofria maus tratos dos
pais.

Utilizou-se analogicamente a lei de maus tratos aos animais.

A partir de acontecimentos como a 1ª Guerra Mundial e revoluções sociais para proteger os


trabalhadores houve a edição de documentos internacionais que foram fundamentais para o
início dos direitos das crianças e adolescentes.

2. Convenções da OIT - 1919

Teve como fruto a Convenção 138/73 - estabelece idade mínima para o trabalho. Foi promulgada
no Brasil pelo Decreto 4134/2002. E a convenção 182/99 que tratou das piores formas de trabalho
infantil (decreto 3597/2000 promulgado no Brasil).

3. Declaração de Genebra / Carta da Liga de 1924

Documento produzido pelas dirigentes da associação internacional "salve as crianças" que até
hoje repercute no mundo da criança.

Primeiro documento internacional de proteção ampla e genérica, especialmente criadas para


proteção das Crianças e Adolescentes.

Essa proteção ainda considerava a criança como "objeto", alguém que poderia receber direitos a
partir do que existia de titularização de direitos no mundo adulto. Eram os adultos que deviam
proteger as crianças.
As crianças mereciam proteção, mas não titularizavam direitos.

4. Declaração dos Direitos da Criança de 1959

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Mudança de perspectiva sobre as crianças. Deixam de ser mero objeto de proteção e passam a
ser consideradas titulares de direitos, ou seja, podem exigir que seus direitos sejam cumpridos.
Crítica: falta de coercibilidade.

5. Convenção sobre os Direitos da Criança de 1989 - Ratificada pelo Brasil em 24/09/1990 e


promulgada pelo Decreto 99.710 em 21/11/1990 (Brasil ratificou e promulgou após o ECA).

Essa convenção considera a criança como verdadeiro sujeito de direito, assim como a de 1959,
mas é dotada de coerção.

As crianças eram titulares de direitos, mas os Estados que aderissem a essa Convenção poderiam
receber repressão caso descumprissem essa Convenção.

Essa Convenção foi a de mais rápida adesão, o único Estado nacional que não aderiu esta
convenção são os EUA.

Novidade nesta convenção:

Considera a criança todo menor de 18 anos, salvo se maioridade for atingida antes segundo
legislação interna.
- Não trabalha o conceito de adolescente, somente criança.
- Deixa a cada Estado estabelecer idade máxima para ser criança.

Trabalha com a ideia de que existe um superior (ou melhor) interesse da criança
- Passa a falsa ideia de que o interesse da criança sempre deve estar acima de qualquer outro, o
que nem sempre é verdade.
- O real objetivo do melhor interesse não é sobressair o direito das crianças sobre qualquer outro,
mas dizer que na interpretação do direito da criança deve-se olhar o que é melhor para a criança.
- A Convenção traz a ideia do Comitê dos Direitos da Criança - órgão responsável por analisar os
relatórios que os Estados que aderem a Convenção enviam dando conta de como está a proteção
à criança em seus territórios - esse é o mecanismo de controle da Convenção.

Protocolos vem para se ligar a documentos oficiais para versar sobre pontos especiais -
normalmente trazem pontos mais polêmicos.

Estratégia para ter maior adesão dos Estados à convenção. Estado pode aderir a convenção e não
aderir os pontos facultativos.

5.1 - Protocolo Facultativo sobre a venda de crianças, prostituição e pornografia infantil (2002) -
Brasil promulgou esse protocolo.

5.2 - Protocolo Facultativo sobre o envolvimento de crianças em conflitos armados (2002) - Brasil
promulgou esse protocolo.

5.3 - Protocolo Facultativo das Comunicações, Denúncias ou Petições Individuais (2011) - Brasil
ainda não promulgou esse protocolo.
Esse protocolo permite que a criança exerça pessoalmente o direito de comunicação individual
quanto ao descumprimento da convenção em determinados locais.

6. Doutrina das Nações Unidas de Proteção Integral à Infância

6.1 - Regras de Beijing - estabelece regras mínimas para Administração da Justiça da Infância e
Juventude - 1985

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É a mais importante entre as três. Estabelecem diversas normas para os procedimentos de
apuração de atos ilícitos graves praticados por infantes. Inspirou o ECA em alguns pontos.

6.2 - Diretrizes de Riad - Prevenção da Delinquência Juvenil - 1990


Não trouxe influência ao ECA. Traz mais normas de repressão.

6.3 - Regras de Tóquio - Regras mínimas para a Proteção de Jovens privados de liberdade - 1990
Traz normas sobre privação de liberdade.

Evolução da Criança e do Adolescente no Brasil

Fases de evolução:

1. Fase da absoluta indiferença: indiferença à infância; antes do Brasil receber uma influencia
ocidental que significou no estabelecimento de normas provenientes de um Estado para convívio
social.

2. Fase de mera imputação criminal: Após a colonização do Brasil, passou-se a utilizar a legislação
portuguesa. Brasil sai da indiferença e passa para a punição de crianças e adolescentes.

3. Fase Tutelar

3.1 Código Mello Matos de 1927

3.2 Código de Menores de 1979

Conferem tratamento especial para os infantes.


Eram forjados sob a ótica da doutrina menorista (do direito do menor)
Cuidavam das crianças, mas com objetivo de evitar que danos maiores fossem causados àquela
sociedade que poderia ser vítima dessas crianças que perambulavam pelas ruas praticando
pequenos furtos.
Esses códigos são responsáveis por uma mudança de fase no Brasil. Começa uma fase tutelar no
Brasil, mas foram fundados em uma doutrina menorista.

Código de Menores de 1979 - Doutrina da situação irregular. Menores que estavam em situação
irregular. Eram os abandonados (órfãos) e delinquentes. Todas as crianças que estavam em
situação irregular recebiam o mesmo tratamento

Essa linha de pensamento vem mudar somente no final do século XX na fase da proteção integral.

4. Fase da Proteção Integral -

4.1 - CF/88
4.2 - ECA (Lei 8069 de 13/07/1990)

As crianças e adolescentes são sujeitos de direitos, não são objetos de interesse.


Essa mudança ocorre apenas com a Constituição Federal de 1988 que inaugura a fase de proteção
integral no Brasil. Essa mudança passou a ser detalhada com a criação do ECA.

II. Disposições Preliminares do ECA

1. Doutrina da Proteção Integral - O artigo 1º diz que essa lei se rege pela doutrina da proteção
integral.

Art. 2º diz que os sujeitos desses direitos são a criança e o Adolescente.

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Trata-se de Estatuto - preocupação em estatuir/estabelecer direitos para crianças e adolescentes
sob a doutrina da proteção integral, o que quer dizer que por serem pessoas que estão em estágio
peculiar de desenvolvimento físico titularizam direitos especiais. A doutrina da proteção integral
traz um tratamento especializado para crianças e adolescentes.

2. Definição de Criança e Adolescente -

Definição do ECA - Criança 0 a 12 anos


12 anos completos aos 18 anos incompletos será adolescente
Completou 18 anos deixa de ser adolescente.

3. Reflexos da Lei da Primeira Infância (13.257/2016), do Estatuto da Juventude (Lei 12.852/2013)


e do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003)

Lei da Primeira Infância - corresponde aos 6 primeiros anos de vida

Estatuto da Juventude - EC 65/2010 inseriu na CF/88 a figura do jovem

Lei 12852 - instituiu o Estatuto da juventude para definir quem é o jovem - é a pessoa que possui
entre 15 e 30 anos.

Pessoa entre 15 e 18 anos será titular de direitos do ECA e do Estatuto da Juventude.

Estatuto do Idoso - a partir dos 60 anos de idade

4. Diferença de Tratamento entre Criança e Adolescente

4.1. Colocação em Família Substituta - aquela que tem lugar quando a família natural não esta
exercendo o seu poder familiar. Podem ser por meio de guarda, tutela ou adoção.
ECA diz que no que tange a colocação em família substituta, tanto a criança quanto o adolescente
devem ser ouvidos, tendo suas opiniões devidamente consideradas. No que tange ao adolescente,
este mais do que ser ouvido, deve consentir com sua colocação em uma família substituta, ou
seja, sua vontade deve ser respeitada.

4.2. Consequências pela Prática do Ato Infracional -

Ato infracional - é a conduta descrita em lei como crime ou contravenção penal praticada por uma
criança ou adolescente.

ECA diz que a criança que pratica conduta descrita como crime terá praticado ato infracional, mas
só poderá receber as chamadas "medidas de proteção", elencadas no artigo no artigo 101 do ECA.
A criança nunca poderá ser privada da liberdade por praticar um ato infracional.

Já o adolescente poderá receber, além das medidas de proteção, medidas socioeducativas, como
a internação.

4.3. Viagens Nacionais

Em regra, o adolescente pode viajar sozinho por todo o território nacional, enquanto a criança se
submete a uma série de limitações.

5. Sistema Valorativo do Direito da Criança e do Adolescente -

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Postulado Normativo - além de regras e princípios tem-se os postulados normativos. Estes não
estabelecem apenas comportamentos a serem respeitados (regras) e nem somente finalidades a
serem perseguidas (princípios). Eles trazem elementos que explicam o modo como determinada
disciplina jurídica deve ser interpretada. São valores estruturantes de determinadas disciplinas.

Quando transporta-se essa ideia para o direito da criança, consegue-se estabelecer que a ideia do
melhor interesse da criança ocupa justamente o papel de postulado normativo do direito da
criança, ou seja, o papel de ser uma norma que vai estruturar a aplicação do direito da criança.

Assim, chega-se a seguinte tabela:

6. Critérios de Interpretação do ECA

Princípios gerais de interpretação do ECA

1. Fins sociais a que ele se destina


2. Exigências do bem comum
3. Direitos individuais e coletivos
4. Condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento

FE - DI - CO

Direitos Fundamentais de Crianças e Adolescentes

III. Direito à vida – art. 6º do ECA

1. Dimensões
a) Existência
b) Integridade/Dignidade

O direito à vida não se resume ao direito de existir. Deve-se olhar para a vida sob o aspecto do
direito a dignidade. Para José Afonso da Silva a vida é a vida na perspectiva da existência e na
perspectiva da dignidade ou integridade, que subdivide em uma integridade física (corpórea e
psíquica) e sob o aspecto moral.

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Repercussões:

2. Proteção Jurídica do Embrião: Pesquisas com células-tronco embrionárias – ADI 3.510


(2008)

Embrião - alguns entendem que é o embrião é um organismo vivo que titulariza a vida, portanto,
não poderia se extrair dele as células embrionárias, pois isso seria uma violação à vida.

ADI 3510 – STF julgou improcedente e entendeu que a lei de biossegurança não violava o direito à
vida previsto na CF/88. Para o STF, o embrião não goza do direito à vida previsto na CF, pois é um
mero potencial de vida que depende ainda de uma condição sem a qual não gerará a vida humana,
que é a implantação no útero materno. Isto é, enquanto não implantado, é um mero organismo
vivo que não tem o mesmo status de vida do ser humano.

3. Aborto e Antecipação Terapêutica de Parto de Feto Anencéfalo – ADPF 54 (2012)

O aborto é considerado um atentado à vida. O Código Penal estabelece duas exceções em que o
aborto não será punido. Primeiro, se ele for um aborto necessário para salvar a vida da gestante. A
segunda exceção, é o aborto humanitário/sentimental, caso a mulher esteja grávida em razão de
estupro.

Os fetos anencéfalos são aqueles que tem um defeito de fechamento do tubo neural, ou seja, um
defeito de formação cerebral tão grave que inviabiliza a vida extrauterina autônoma.
Atualmente, se consegue diagnosticar a anencefalia quando o bebê ainda está no útero materno.
Diante disso, muitas mulheres passaram a solicitar autorizações judiciais para a “retirada” do feto
antecipada.

ADPF 54 – objetivo de manifestação do STF para definir se a antecipação terapêutica de parto


anencéfalo não poderia se considerar como um comportamento abortivo. ADPF foi julgada
procedente para definir que por força de decisão do STF os comportamentos dos profissionais de
saúde que realizam a antecipação terapêutica de parto anencéfalo, não podem se amoldar aos
crimes de aborto previstos no código penal.
Para a maioria dos ministros do STF, o fato de não haver viabilidade da vida extrauterina não
permite a equiparação da vida do anencéfalo com a vida de qualquer outro feto ou com a vida de
qualquer outra pessoa nascida. E mais, o STF entendeu que não estava em jogo apenas eventual
nascimento de um feto anecéfalo, mas também os direitos reprodutivos e sexuais da mulher.
Assim, com a decisão do STF há a garantia de facultar esse direito à gestante que pode exercê-lo ou
não.

4. Aborto nos Três Primeiros Meses de Gestação – Decisão da Primeira Turma do STF no HC
124.306 (Novembro de 2016)

O aborto realizado nos 3 primeiros meses de gestação poderia ser considerado como uma prática
lícita que o ordenamento jurídico deveria garantir à gestante como parte dos seus direitos sexuais.
Para o ministro Barroso, até os 3 primeiros meses de gestação não há a formação do córtex cerebral
que desengatilha duas potencialidades no feto, que são a capacidade de pensamento e a
sensibilidade à dor. Assim, até esse momento poderia se pensar em realizar procedimento de
aborto sem que houvesse configuração de crime, pois até esse momento não haveria necessidade
de proteção à vida desse feto que não gozaria do mesmo status de proteção da vida humana.

“Tal como a Suprema Corte dos EUA declarou no caso Roe v. Wade, o interesse do Estado na
proteção da vida pré-natal não supera o direito fundamental da mulher realizar um aborto [...]
praticamente nenhum país democrático e desenvolvido do mundo trata a interrupção da gestação
durante a fase inicial da gestação como crime, aí incluídos Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido,
Canadá, França, Itália, Espanha, Portugal, Holanda e Austrália. Nada obstante isso, para que não
se confira uma proteção insuficiente nem aos direitos das mulheres, nem à vida do nascituro, é

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possível reconhecer a constitucionalidade da tipificação penal da cessação da gravidez que ocorre
quando o feto já esteja mais desenvolvido.
De acordo com o regime adotado em diversos países (como Alemanha, Bélgica, França, Uruguai e
Cidade do México), a interrupção voluntária da gestação não deve ser criminalizada, pelo menos,
durante o primeiro trimestre da gestação . Durante esse período, o córtex cerebral – que permite
que o feto desenvolva sentimentos e racionalidade – ainda não foi formado, nem há qualquer
potencialidade de vida fora do útero materno. Por tudo isso, é preciso conferir interpretação
conforme a Constituição aos arts. 124 e 126 do Código Penal, para excluir do seu âmbito de
incidência a interrupção voluntária da gestação efetivada no primeiro trimestre. No caso em exame,
como o Código Penal é de 1940 – data bem anterior à Constituição, que é de 1988 – e a
jurisprudência do STF não admite a declaração de inconstitucionalidade de lei anterior à
Constituição, a hipótese é de não recepção (i.e., de revogação parcial ou, mais tecnicamente, de
derrogação) dos dispositivos apontados do Código Penal.” (STF. HC 124.706. Voto-vista do Ministro
Luís Roberto Barroso. 29/11/2016).

Essa questão ainda não foi definida pelo STF.

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