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CENTRO UNIVERSITÁRIO SENAC

Audiovisual

DÉBORA TABOADA DE CASTRO

Artigo:

“As novas produções cinematográficas sobre contos de fadas e a relação


psicológica com a sociedade contemporânea. ”

SÃO PAULO
2015/3º SEMESTRE
AS NOVAS PRODUÇÕES CINEMATOGRÁFICAS SOBRE CONTOS DE
FADAS E A RELAÇÃO PSICOLÓGICA COM A SOCIEDADE
CONTEMPORÂNEA.

Débora Taboada

RESUMO

Este trabalho aborda uma possível relação psicológica com as produções


cinematográficas sobre contos de fadas que possuem uma nova proposta de
produção onde cria-se uma atmosfera mais realista por serem live-actione o
motivo pelo qual estas tem sido tão frequentes e bem-sucedidas em suas
audiências.

Palavras chave: contos de fada, live-action, psicologia, sociedade


contemporânea.
1 INTRODUÇÃO

A partir de uma observação sobre as produções atuais cinematográficas de


contos de fada tive a curiosidade de pesquisar e falar sobre um possível motivo
para que estas estejam tão frequentes. A relação que criei, e talvez, a mais
óbvia foi a psicológica.

Além de conversas com o público deste tipo de produção e até uma reflexão do
meu papel como espectadora destas, tive como base a leitura do livro de Bruno
Bettelheimque dialoga com a função terapêutica dos contos para crianças na
psicologia e o papel essencial destas para a conquista da independência
emocional.

No livro também é abordado sobre a relação dos mitos e contos bíblicos e sua
semelhança e diferença com os contos de fada. São colocados contos de
origem oriental e a função destes contos nessas sociedades, onde são usados
há tempos como forma de tratamento psicológico através da meditação tanto
para adultos como para crianças. E mesmo com todo o pretexto “mágico”
exercem uma função sobre o psicológico de pessoas adultas quando estão
com problemas emocionais, mesmo que tenham um caráter mais religioso,
como por exemplo a história de Hare Krishna, estes são mais fantásticos e
menos julgadores que a Bíblia.

Este também compara como os contos de fada ocidentais tem uma certa
semelhança com Mil e Uma Noites. Dessa forma quando contados,após a
criança ter “superado” um dos contos lido, pois os conflitos emocionais de cada
conto se diferenciam em certas situações do desenvolvimento psicológico e se
assemelham pelas suas conquistas, assim como no conto oriental.
* “A psicanálise nos contos de fadas. ” (Rio de Janeiro 2004, Editora Paz e
Terra)

2 DESENVOLVIMENTO

Entre as mais novas produções de contos de fada vou propor a reflexão do


seriado “OnceUpon a Time”e sua semelhança coma a estrutura de Mil e Uma
Noites. E talvez da forma que desenvolverei a reflexão também consiga
explicar as outras produções principalmente dos estúdios Disneyacontecerem
uma seguida da outra e o seu sucesso, como Malévola, Cinderela e os que já
estão sendo produzidos como Tinker Bell, A Bela e A Fera e Mullan.

O seriado“Once Upon a Time”consiste no entrelaçamento entre diferentes


contos de fadas. Tudo começa com a história de Branca de Neve e os Sete
Anões onde gradualmente outros contos vão se envolvendo nesta mesma
história e alguns personagens assumem o papel de mais de um personagem
dos contos.

Aestrutura de Mil e UmaNoitesé narrada e desencadeada por uma de suas


personagens. Assim como no conto, no seriado todos os seus contos ligam-se
entre si. Branca de Neve dá o conhecimento aos contos para Henry, assim
como Sherazade que no lugar de alguém dar-lhe o conhecimento é embebida
por estes antes de encadearem os acontecimentos no reino, mas durante o
período de mil e uma noites reverte a descrença do rei Shariar no mundo
através dos contos, assim como Henry para sua mãe biológica Emma.

No seriado são usados também contos de Mil e Uma Noites como O Pescador
e o Gênio. O pescador seria o pai de Branca de Neve e o gênio o futuro
espelho da Rainha Má. Além da semelhança pelo entrelaçamento das histórias
e suas personagens pode-se dizer que o processo de desenvolvimento
psicológico é muito similar aos personagens e leitores com os personagens e
expectadores. Como por exemplo, o ego dominado pelo superego que se
separa do id egoísta em Sherazade e Henry capazes de fazer qualquer coisa
para libertar as personagens de suas histórias (Shariar, Emma e
consequentemente todos os outros personagens da série).

Quanto a nós, expectadores, nos aproximamos de Emma – sendo assim o rei


de Mil e Uma Noites – já que nosso lado criança “ressuscita” pois temos
conhecimento dos contos e eles começam a acontecer devido a introdução de
Emma na vida de Henry, o que nos estimula a continuar a assistir a série já que
queremos saber esse novo jeito, entre tantos outros que formamos na nossa
imaginação antes de serem assistidos.

Outra coisa a acrescentar na qual existe um paralelo na série e no livro de


Bettelheim é que Emma não quer acreditar no que Henry diz, pois acredita que
o incentivo da professora em ler os contos faça com que ele acredite em todas
aquelas histórias dos livros de forma a trazer à tona a sua realidade e não ver
as coisas de forma racional.

“ O conto de fadas é terapêutico porque o paciente encontra sua própria


solução através da contemplação do que a estória implica acerca de seus
conflitos internos neste momento da vida. ” (Bettelheim,1980, p.33).

Dessa forma conseguimos projetar na série nossos sentimentos pueris, pois


quando mais novos nos sentíamos aflitos com as nossas projeções nos contos.
Quando vemos na série um menino em que seus problemas internos são de
fato os contos e consegue arrumar uma solução para sua realidade com a
leitura dos mesmos, assim como Betrelheim propõe, nos evolvemos por ser
algo muito real e como expectadores, temos gradativamente o acesso de o que
Henry diz é verdade.
Descobrindo que sua felicidade pode ser reconstituída se ele encontrar sua
mãe biológica e assim desfazer a maldição existente na vida dele e de todos
que vivem na cidade, este entra em contato com a mesma e tem que fazer o
processo desta acreditar de novo nos contos para que assim ela possa ajuda-
lo, enquanto sua mãe de criação, a Rainha Má, e seu psicólogo, o Grilo Falante
desacreditam na solução encontrada por Henry e apenas sua professora, a
Branca de Neve acredita de certa forma no menino.Nos envolvemos mais
ainda com a verdade que o menino diz, pois nóssabemos que sua mãe de
criação sabe sobre a maldição, já que ela é a Rainha Má e por tanto a única,
tirando o Sr. Gold que sabem que aquela cidade inteira é um conto de fada.

Podemos então explicar então nosso envolvimento com a série com uma
afirmação de Bruno Bettelheim:

“Qualquer que seja nossa idade apenas uma estória que esteja
conforme aos princípios subjacentes a nossos processos de
pensamento nos convence. ” (Bettelheim,1980, p.59).

Sendo assim, podemos ainda adicionar o fato de que a estória está conforme
nossos princípios de pensamentos pois além de ser verídica psicologicamente
temos um fator adicional que nos envolve mais ainda pois a série é produzida
em live-action.

Apesar de que no livro Bruno dizer que as ilustrações e representações


cinematográficas são vazias para as crianças pois impedem o processo de
imaginação temos em contrapartida o fato de que nessas séries o público
maior é adulto, então de alguma forma já tivemos contato com os contos e
estamos revivendo nossa imaginação impressa de forma diferente a que nós
tínhamos quando eram lidos e por tanto renovando a forma de contar o que já
conhecemos. O autor adiciona em seu capitulo sobre “transformações” que:
“[...]. Um adulto que na sua própria vida é capaz de integrar a
ordem racional com a ilogicidade de seu inconsciente será
suscetível à forma como o conto de fadas auxilia a criança nesta
integração. Para a criança e para o adulto que, como Sócrates,
sabe que ainda existe uma criança dentro do indivíduo mais
sábio os contos de fadas exprimem verdades sobre a
humanidade a própria pessoa. ” (Bettelheim,1980, p.83)

Além da série foram produzidos inúmeros filmes sobre contos de fadas, o fato
de suas estreias serem muito próximas, faz com que nós voltemos ao mesmo
processo psicológico que a série desenvolve em 4 temporadas. Enquanto a
Disney está refazendo os mesmos por meio de longa-metragem, aqui não
temos a complexidade tão grande das personagens, mas retornamos ao nosso
ser pueril.

3 CONCLUSÃO

Como vimos, existe um processo psicológico nos contos que são exprimidas
verdades sobre a humanidade e a própria pessoa. Vivemos em um tempo onde
estamos sempre conectados as novas mídias, digerindo novas informações, a
procura do sucesso e sempre expostos ao excesso de racionalidade do mundo
adulto.

Bettelheim diz que pessoas expostas tardiamente a mágica dos contos se


interioriza na sua fantasia e isso o faz mal pois vê a vida de uma forma árdua,
podemos fazer o pensamento reverso para explicação das produções em
massa dos contos refletido na sociedade extremamente racional. Uma vez que
o excesso de racionalidade também o fará mal, e então essas novas produções
vem para enriquecer a vida real e ajudar nos processos inconscientes que
deixamos de lado. O autor coloca que:
“ A vida não é então nem um “prazer” nem “uma espécie de
privilégio excêntrico”. Com esta separação, o que quer que
aconteça na realidade não consegue oferecer uma satisfação
apropriada para as necessidades inconscientes. O resultado é
que a pessoa sente a vida incompleta. ” (Bettelheim, 1980, p.81)

As produções cinematográficas de contos de fada, têm por tanto seu peso não
somente por serem bem estruturadas e o expectador se interessar nas novas
possibilidades de contar a mesma história imageticamente de uma forma
diferente. Mas também porque vivemos um momento onde temos que cada vez
mais ser racionais e exprimir nossos sentimentos, mostrar o quão somos fortes,
estamos o tempo inteiro tensos, apreensivos e incompletos.

Podemos concluir este artigo com uma reflexão de Bruno sobre tensões e
então entender que o papel dessa nova onda cinematográfica talvez seja o de
retomar os bons sentimentos nas pessoas, a segurança e prazeres que vão
diminuindo sua frequência conforme ficamos mais velhos e atualmente mais
promiscuamente, além da cobrança por questões mais racionais, vemos uma
geração cada vez mais carente de afeição e sucesso nas relações
interpessoais.

“Nos períodos de tensão e escassez, o homem busca


conforto novamente na noção “infantil” de que ele e seu
lugar de moradia são o centro do universo” (Bettelheim,
1980, p.65)
Referências:

Livro:

BETTELHEIM, Bruno. A psicanálise nos contos de fadas. Editora Paz e Terra,


Rio de Janeiro, 2004.

Filmes:

MALÉVOLA. Direção: Robert Stromberg. Produtora: Walt Disney Studio Motion


Pictures. USA. 2014

CINDERELA. Direção: KennethBranagh. Produtora: Walt Disney Studio Motion


Pictures. USA.2015

Séries:

ONCE Upon a Time. Criação de: Edward Kitsis e Adam Horowitz. 4


temporadas. 89 episódios. Produção ABC. 2011-2015

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