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Constituição, soberania e Mercosul

CÁRMEN LÚCIA ANTUNES ROCHA

“Vapor Barato, um mero serviçal do narcotráfico


Foi encontrado na ruína de uma escola em cons-
trução
Aqui tudo parece que é ainda construção e já é
ruína
Tudo é menino e menina no olho da rua
O asfalto, a ponte, o viaduto ganindo para a lua
Nada continua
...
Eu não espero pelo dia em que todos os homens
concordem
Apenas sei de diversas harmonias bonitas
possíveis
Sem juízo final
Alguma coisa está fora da ordem
Fora da nova ordem mundial”.
Fora da Ordem – CAETANO VELOSO

SUMÁRIO

1. Introdução. 2. O constitucionalismo contem-


porâneo: sentido e funções da Constituição. 3. Cons-
tituição e direito supranacional. 4. Consituição e
soberania no Direito brasileiro. 5. A Constituição da
República Brasileira e o Mercosul. 6. Conclusão.

1. Introdução
O homem multiplica-se. Em sua versão indi-
vidual, em sua versão social, em sua aspiração
política, em sua conspiração voltada ao geral,
em seu eterno tornar-se. Democratiza-se o
homem; diversifica-se ele, amplia-se.
Não é que antes o homem não se modificasse
sempre. É que agora as mudanças fazem-se como
turbilhão incessante. Não há tempo para se
adquirir o hábito das coisas ou das instituições.
O que antes era novo já se fez velho antes
Cármen Lúcia Antunes Rocha é Advogada. mesmo de ser conhecido. E é, então, descartado.
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O próprio homem parece ver-se alvo de compor- Não é muito diferente e nem parece ter base
tamentos, especialmente no espaço dos escam- diversa o fenômeno que ocorre com o Estado.
bos mercantis, que o tratam, em grande parte, Reproduzem-se as organizações sociais ao lado
como algo descartável, suprimível, ou pelo do Estado, dentro do Estado, supra ou transna-
menos facilmente substituível. cionalmente. O poder político, antes soberana-
As criações humanas proliferam, desfazem- mente havido como exclusivo do Estado, atomi-
se, liquefazem-se. za-se, socializa-se. O Estado que se acreditara e
Antes, e durante séculos, houve um modelo se ensimesmara como essencial por si mesmo
de organização religiosa, projetada pela Igreja, vê-se apenas mais uma proposta, entre tantas,
a qual, conquanto não única nos diversos de forma de regulação do poder dos homens em
grupos humanos, adotava um mesmo formato, sua experiência social.
o mesmo paradigma de regras a fundamentar- Os elementos que, tradicionalmente, eram
lhe a estruturação. Mesmo quando novas tidos como essenciais ao Estado – povo, terri-
Igrejas eram instituídas – a protestante ou a tório e poder soberano – fazem-se cada vez mais
anglicana, para citar dois exemplos –, o modelo distintos em sua concepção e acolhimento teó-
inicial perseverava. rico e prático.
Todavia, a Igreja não foi capaz de superar a O povo, constitucionalmente conceituado e
incrível distância entre os seus postulados, ao qual se garantem direitos e se impõem deve-
dogmas e pompas e as indagações dos homens res, dota-se de novas definições (povo subs-
que lhe seguiam os mandamentos. O reino da tancial, por exemplo), de novos direitos ao lado
terra faz-se cada vez mais próximo e doído e e acima do Estado (direito de resistência às leis
requer respostas. O reino dos céus faz-se cada injustas, por exemplo) e de novas formas de
vez mais distante e os seus resultados não se organização (organizações não-governamentais,
mostram. O homem busca, então, novos cami- por exemplo).
nhos, atalhos que satisfaçam, mais proxima- O território faz-se cada vez mais virtual, para
mente, ou pelo menos lhe dêem a ilusão de saci- se usar de uma expressão corriqueira da atuali-
arem-se suas fomes, suas paixões, consolo ou dade. Fronteiras são menos valorizadas em sua
ouvidos para as suas lágrimas e lamentações, contingência física. As liberdades de pessoas,
que sempre há do que se lamentar na vida. O bens, capitais e serviços não se põem nem se
homem procura espaço para ensaiar o salto que afirmam nos limites territoriais. Mais e mais a
lhe acode transpor a cada instante. Daí a multi- tecnologia (especialmente as telecomunicações
plicação de igrejas. A que vêm, o que trazem e a teleinformática) desconhece limites, frontei-
são questões que não se há deixar de consi- ras ou sequer noção de território. Nem o planeta
derar. Mas, de pronto, pode-se atestar que as é mais considerado limite, que dirá uma parte da
novas e múltiplas igrejas, com seus formatos, terra... Aqueles que se perguntavam sobre o
nomes e propostas variados, carreiam multidões “terceiro mundo” – e que já não eram tantos –
em todos os lugares do mundo. Nem se há de hoje vêem-se às voltas com as indagações sobre
negar o poder que estas multidões, organiza- o “quinto mundo”, que é o dos refugiados e
das, sincronizadas em sua ação por um vínculo dos emigrantes acolhidos por Estados nos quais
que as une, ostentam e fazem valer. A diferença eles se mantêm com os seus mesmos costumes,
destas novas organizações havidas como reli- regras e comportamentos. Entretanto, a pessoa
giosas e o que antes se tinha é o modelo e os estatal que os recebe tem o seu próprio direito
fundamentos havidos em relação à Igreja tradi- positivo, conquanto a admissão faça-se gesto
cional. Esta ensimesmou-se, fechou-se e negou- de boa vontade com a multicultura e o multire-
se a ver que o povo conduz-se sem os parâ- gramento social. Os direitos humanos não têm
metros que lhe são firmados de fora no momento fronteiras. Sendo certo que os crimes também
mesmo em que estes não os contentam. Não há as desconhecem. As drogas firmam as suas
cabresto histórico que mantenha a cabeça de trilhas multinacionalmente, a corrupção é trans-
um povo num lugar que se lhe predetermine. nacional, o terrorismo é internacional. Logo, o
Não há mordaça que o faça sem voz quando o
direito tem de fazer face a estas novas contin-
impulso de gritar o acolhe. O ecumenismo im-
põe-se, as Igrejas convivem, os fiéis e não fiéis, gências, que nada têm de territoriais e fronteiriças.
crentes, descrentes ou ateus organizam-se se- O poder estatal que se qualificava e se distin-
gundo as suas conveniências momentâneas ou guia dos demais como soberano faz-se sempre
eternas, fugazes ou permanentes. mais socializado, repartido, reconfigurado se-
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gundo novos paradigmas ditados pelas novas riência agressiva da civilização do ter sugere o
organizações formadas e informadas pelas aparecimento de vozes ponderando pela vivên-
demandas políticas dos indivíduos agregados cia do ser. Contra a modernidade do ganho
em entidades que se fazem atores políticos ati- (donde vem a ganância) a eternidade do benefí-
vos e permanentes. O pluralismo político cio humano (donde vem a solidariedade). A
demonstra-se no plano interno e no plano tendência associacionista internacional pode se
externo. Em razão desse princípio, tem-se, de converter num veio promissor de novas possi-
uma parte, a possibilidade de serem admitidas bilidades de uniões entre os povos ou, confor-
opções políticas diferenciadas e coexistentes e, me a senda pela qual se decidirem as comunida-
de outra, a participação de organizações varia- des, numa anulação de identidades culturais,
das a dotarem-se de poderes e dinamizarem-se históricas e diferenciadoras para a garantia do
como atores partícipes do processo político. ser humano livre e único em sua condição
Nesse quadro, o Estado – tal como se dá pessoal.
com a Igreja tradicional e sobranceira – já não é Nesse quadro de tantas aventuras e des-
um modelo único e tido ou aceito como “o mais venturas velhas e novas, inéditas e repetidas,
perfeito” de organização política, nem talvez o alvissareiras e ameaçadoras, o Direito faz-se
soberano, pelo menos se pensarmos esta pala- objeto de mudanças radicais. Mais que qualquer
vra com o mesmo e idêntico conteúdo com que outro, é o Direito Constitucional que sente e se
a premiou Jean Bodin. O povo, tido como titular ressente primeiramente dessas mudanças, pela
do poder político, retoma, agora mais direta- circunstância mesma de ser a raiz donde brotam
mente, o exercício do poder soberano, fazendo- os demais ramos que integram o ordenamento
se presente e permanente no processo de reali- jurídico.
zação de seus interesses. A Constituição faz-se outra que não apenas
Mais importante ainda é que a organização aquela pensada nos últimos dois séculos. Mas
política da sociedade em grupos estruturados e continua a ser necessária por ser uma garantia
formalizados segundo normas jurídicas dotadas do homem sedimentada no Direito e na convi-
de eficácia afirma-se, não poucas vezes, como vência política democrática. Qual é a sua essên-
uniões multinacionais. Os homens encontram- cia ou a sua matéria é questão mutante, mais
se, reúnem-se, associam-se para a obtenção de discutível agora, pelo que é ainda difícil vislum-
seus objetivos comuns e que não se limitam a brar-se ela em sua inteira justeza. Só é certo que
fronteiras. Especialmente na matéria que con- seja ela qual for não se dá a sonegar o homem,
cerne à essência do ser humano, aos direitos sua alma mais composta e certa; não se lhe busca
fundamentais, aos deveres com o meio ambiente, desatender os fins para ceder preferencialmente
ao respeito aos princípios democráticos, entre a um fácil deus manon. É certo que se alteram as
outros, a convergência dos interesses e fins suas funções e as suas feições. Para ter a cara
buscados em todos os quadrantes do planeta do povo a que se dá a ser. Figurar-se sua nova
orientam e direcionam o homem em grandes fisionomia é o desafio. É tempo de reinventar o
encontros. processo civilizatório e, em seu fluxo, reinventar
o jurídico. Talvez seja o tempo mais propício de
Nas duas últimas décadas emerge e vira nos redescobrirmos, de nos ganharmos com os
moda o fenômeno rotulado de globalização. No quinhentos anos de história de tantas perdas
fluxo do processo que se firma sobre as bases sul-americanas, de nos fazermos com os ideais
de necessidades de mercados e de mais consu- da pátria grande dos tantos que não consegui-
midores para a produção empresarial voltada ao ram antes negar ou impedir a desconstrução nas
lucro empresarial mais que à necessidade social quais nos contiveram. Vislumbram-se, de par
se afinam interesses que discursam sobre novas com as dificuldades, as possibilidades que se
práticas políticas ou feitas em nome da política. oferecem ao estudioso do Direito e ao cidadão
No fluxo do processo, aliás, abrem-se tanto pos- que vivem esta nova revolução no planeta: a
sibilidades de uniões humanas e humanitárias que pretende alcançar a cidadania digna, huma-
quanto riscos de exclusões desumanas e segre- namente digna, a se fazer de todos e para todos
gadoras e até mesmo de novos quadros de apar- os homens e não apenas de e para pequenos
theid social. O colonialismo veste-se com a grupos; aquela que se dá a ser um momento no
indumentária daquele discurso globalizante. qual se pode propor a ser melhor para um mundo
Mas é certo que os direitos humanos forçam o mais perfeito para a universalidade dos homens.
seu reconhecimento e prática mundiais. A expe- Se há uma crise do Direito (ou no Direito) é que
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há uma crise dos sonhos do homem. Tanto Na base desta concepção do constituciona-
melhor se é preciso tanto para se viver ainda lismo firmou-se o princípio da supremacia da
esta certeza: a de que ele continua a sonhar e a Constituição e, por força de tal idéia e mesmo
fazer de suas utopias suas estrelas guias. dos ideais de justiça que nela se contém, cunha-
ram-se instrumentos que assegurassem a sua
eficácia, tais como o do controle da constitucio-
2. O constitucionalismo contemporâneo: nalidade das leis e o da reforma específica da
sentido e funções da Constituição Constituição dotada de rigidez formal. Essas
duas vias assecuratórias do princípio da supre-
“L’actualité déforme les problèmes, parce macia da Lei Fundamental não se fizeram como
qu’elle n’en retient qu’un aspect fugitif; elle les mera codificação de normas jurídicas, mas como
dramatise et, par conséquent, les écarte de la meio de se formalizar a garantia de eficácia dos
perspective scientifique...” direitos nela reconhecidos e a eficiência das
Georges Burdeau funções estatais para a realização dos fins
O conceito de Estado de Direito enraíza-se havidos como próprios no sistema, quer pela
no de Constituição traçado modernamente. O descrição do poder constituinte, quer pela inter-
fundamento daquele repousa mesmo no con- pretação dos poderes constituídos dotados de
ceito de Constituição, pois o movimento cons- tal competência.
titucionalista afirmou dois princípios, a saber, o
de que a liberdade (e mesmo os demais direitos Foi neste século XX e, basicamente, com o
posteriormente rotulados de primeira geração, surgimento do que se apelidou de “constitucio-
como querem alguns, ou de primeira dimen- nalismo social” que se teve a introdução da
são, como preferem outros) depende do seu referência ao Estado Constitucional, o qual se
reconhecimento e garantia firmados num sistema adicionou à menção feita ao Estado de Direito.
de direito soberanamente criado e positivado A República de Weimar contribuiu para o
em determinada sociedade e estruturado numa assentamento daquela expressão e foi nela que
hierarquia normativa rigidamente observada; e se sedimentou o controle da constitucionalidade
o de que, para que aqueles direitos sejam invul- das leis como instrumento garantidor da supre-
nerados e invulneráveis, é de se estruturar o macia da Lei Fundamental. Todavia foi na Ale-
poder político estatal de tal modo que haja um manha mesma que se praticaram os desmandos
sistema de funções e órgãos normativamente em nome do Estado Constitucional, tendo o
postos limitadores daquele exercício. Com esse período de nazismo oferecido ao mundo o
conteúdo é que se estabeleceu, no discurso modelo da legalidade sem juridicidade e da
revolucionário de 1789, que “toute societé dans normatividade sem legitimidade.
laquelle la garantie des droits n’est pas assurée Os traumas políticos e sociais causados pela
ni la séparation des pouvois determinée n’a experiência deste século durante os períodos
point de constitution” (art. 16 da Declaração dos das Grandes Guerras acabaram por forjar a
Direitos do Homem e do Cidadão). superioridade do conceito material de Consti-
O desenvolvimento do constitucionalismo tuição a se sobrepor ao conceito formal, que o
moderno de seus primórdios até a atualidade fetichismo da vontade geral e da lei como sua
fez-se, grandemente, somente como desdobra- manifestação excelente apregoava. Constituição
mento daquelas idéias e a sua revelação mais não é qualquer norma dotada deste rótulo. É
precisa e plural traduzida em outros princípios e aquela que, legitimamente posta, pode concre-
preceitos que multiplicaram as instituições e os tizar, na sociedade, a idéia de Justiça que nela se
instrumentos jurídicos nos sistemas normativos. guarda e garante e permite a realização das con-
O direito não apenas como regulação do poder dições materiais da democracia social. Não
limitado, mas principalmente prestante e desti- basta, pois, a partir de tal formulação, que o
nado a servir ao homem foi sendo conquistado Direito não seja afrontado pelo Estado; é preci-
no curso dos séculos que medem a denominada so que o Direito legítimo seja tornado possível,
modernidade. É certo que não se obteve, do
período setecentista e oitocentista até a atuali- inclusive pela prestação de serviços públicos
dade, transformação essencial do modelo polí- que materializem as condições sociais e instru-
tico que se apresentou e se representou no pri- mentalizem os indivíduos e que se cunham,
meiro esboço do Estado de Direito, firmado, prin- então, como direitos de todos.
cipalmente, no projeto liberal e liberalizante que As décadas de setenta e oitenta burilam uma
prevaleceu. nova onda no movimento constitucionalista que
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se projeta a partir da Segunda Grande Guerra. Se a Constituição não é uma obra construída
Não apenas novos direitos são constitucionali- ou fechada, mas um processo em construção
zados, mas há uma tentativa de se dar uma nova permanente (podendo mesmo ser entendida
dimensão ao conceito e à experiência constitu- como uma obra sempre inacabada até mesmo
cional. A necessidade de se engajar o Direito e, por ser aberta – como de resto o é a própria
basicamente, a Constituição às demandas democracia cuja realização continua a ser por
sociais e às novas práticas políticas e de torná- ela buscada), há de se considerar que os novos
la mais aberta e habilitada a responder aos rumos que se pretendem imprimir aos projetos
reclamos objetivos e cada vez mais expandidos do Estado contemporâneo e que seriam consi-
da sociedade forçam um novo momento do cons- derados pelo novo constitucionalismo seriam,
titucionalismo. As Constituições que se promul- em sua amostragem mais primária, menos políti-
gam, tanto na Europa quanto na América do cos, sendo o político menos juridicizado. Des-
Sul, e que sobrevêm a períodos negatórios do constitucionalizam-se direitos, desregulamen-
Estado de Direito e falhos de sistemas jurídicos tam-se relações econômicas e sociais, desesta-
democráticos, demonstram a imprescindibilidade tizam-se serviços e empresas que os prestavam
da experiência constitucional. por serem considerados públicos e necessários,
Mas a década de oitenta mostra um processo em sua fundamentalidade, à sociedade.
de mudanças no Estado, desenvolvidas no sen- Como processo que é – e é certo que todo
tido inverso ao que o constitucionalismo parecia processo é dinâmico –, o constitucionalismo
apontar. Se os direitos sociais e mais aqueles movimenta-se sem linearidade, tal como a dança
denominados de terceira dimensão, tais como o histórica da sociedade, havendo progressos e
direito ao meio ambiente saudável, o direito ao retrocessos em termos de conquistas de direitos,
desenvolvimento equilibrado, o direito à paz, o aperfeiçoamentos e atrasos nas estruturas
direito sobre o patrimônio comum da humani- esposadas nos sistemas. Mas o constituciona-
dade e o direito de comunicação, passaram a ser lismo aberto que se oferece a prevalecer presta-
buscados mesmo no plano constitucional, uma se à interpretação permanente, para se manter
proposta ou, o que é mais, uma nova imposição atualizado e coerente com as aspirações da so-
se começou a fazer sentir na ordem econômica: ciedade, mas ainda dotado de rigor que permita
a que forçava a lex mercatoria sem regulamen- impor-se como obra que oferece segurança –
tação e sem a presença do Estado no plano das ainda que à base da fluidez que se vive – como
experiências políticas. A prioridade dos merca- fim último e necessário do direito. A necessidade
dos e suas leis a enfatizar a presença de consu- de haver interpretação constitucional e a
midores para a obtenção de mais lucros, de um necessidade de se dotar o sistema normativo
lado, e a sua inserção na prática política dentro fundamental de instrumentos e de vias para a
do Estado ou mesmo acima dele, por outro,
ocorrência daquela interpretação oficial-estatal
ensejaram o que se deu a conhecer como a ten-
em caso de conflito na sociedade acabou con-
dência neoliberal do processo de globalização.
Note-se que não se cuida, aqui, de renegar o duzindo ao que já se chamou de neopositivismo,
mercado como organização que guarda inequí- qual seja, o positivismo jurisprudencial1.
voca importância na organização da sociedade Vozes alevantam-se pregando o Estado
ocidental e mesmo mundial e na dinâmica da mínimo, que o neoliberalismo tão bem casa com
vida econômica. O que se põe em relevo, contu- a globalização econômica, ensaiada de passo
do, é que o mercado há que estar a serviço de com o neocolonialismo a buscar mercados em
metas sociais e não a sociedade a serviço do praças nas quais os consumidores não estão
mercado. Nem a lei do mercado haverá que saturados de bens que se lhes oferecem segun-
dominar o homem e conduzir a sua necessidade. do as conveniências dos produtores e não de
Antes, ter-se-ia, então, uma lei totalitária e sem seus reclamos pessoais e sociais. Para um Estado
fundamento de humanidade ou de humanismo. mínimo... uma Constituição mínima. Tanto
E, no entanto, é o homem que deve livremente melhor para a proposta que a economia neolibe-
afirmar a sua necessidade para que em sua dire- ral sugere e busca impor. Quanto menos leis de
ção se conduza o mercado. Principalmente, Direito mais leis de mercado. De um mercado
haverá que se elaborar sempre um Estado de que fica mais fácil em seus fins sem leis que não
sejam aquelas que se afirmam pelo lucro. Mas a
Direito e um Direito do Estado no qual o homem
não seja a moeda, mas o proprietário dela. Seja o 1
CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitu-
homem o valor maior da vida social e não mero cional e teoria da Constituição. Coimbra : Almedina,
valor de troca por produtos. 1998. p. 1198.
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sociedade fica despojada de seus valores éti- Enfim, o novo constitucionalismo é o da ética
cos, que se convertem, no constitucionalismo, democrática justa e social, fundada nos princí-
em princípios de direito a garantir a dignidade pios da participação pluralista, solidária e ativa,
humana em sua dimensão mais plena e em sua organizada para absorver e não para excluir pes-
proposta mais universal. soas, grupos e povos. É o constitucionalismo
Por isso, mesmo vivendo uma transformação da ética da solidariedade de uma sociedade
no idêntico curso daquela que assoma a socie- pluralista, poder-se-ia afirmar, a dizer, aquele que
dade e o Estado, bem como todas as dimensões é libertador e igualizador, promovendo uma
e aspectos das relações sócio-políticas e econô- arquitetura jurídica que una pessoas e povos
micas, é certo que a Constituição, como Lei para resguardar a individualidade sem individua-
Fundamental de um Estado, continua a ser lismos e a identidade dos povos sem segregação
essencial. Se as mudanças que lhe contornam e isolacionismo de grupos. O constitucionalismo
contemporâneo expõe-se à abertura e ao inter-
novel e ainda pouco nitidamente as funções e câmbio e complementariedade com outros ramos
as feições são difíceis de ser vislumbradas com do conhecimento, como sejam, a política, a eco-
tranqüilidade por causa do seu inacabamento e, nomia, a bioética, entre outros. Não se faz, assim,
mais ainda, pela falta de distanciamento do uma interseção do Direito, como antes se
estudioso da tormenta histórica de que se é ator, pretendeu, mas a sua integração com os ramos
é imperioso notar que é esta agilidade a que se do conhecimento humano que sejam pertinentes
propõe ela que a torna dada à atualização inces- aos temas de seus cuidados.
sante. E esse processo que se inaugura no Esse novo constitucionalismo tem como um
tumulto de tantos novos conflitos, ideologias de seus mais tensos desafios as novas fórmulas
que se sobrepõem sem o pleno saber e sabor de de convivência entre os Estados. Os homens
quais seriam, do que aportam de novo e de reúnem-se, associam-se, viajam-se. Os Estados,
velho, do acabado e do já arruinado, da busca formados à sua imagem e semelhança, também.
de retorno a práticas liberais oitocentistas e As uniões e a integração de Estados sugerem
colonialistas quinhentistas, sugere a sua plasti- novas formas não apenas de convivência e
cidade para fazer-se obra que comporta que os cooperação das instituições, mas, para tanto,
conflitos e os embates ideológicos, sociais, prin- urge se cogitem e se dêem à prática novas formas
cipiológicos ainda se possam vivenciar sem que de elaboração e aplicação do Direito a prevalecer
a sociedade tenha que se despedir da civiliza- sobre as relações travadas nestas entidades
ção, o que seria o retorno à barbárie e ao caos. integradas.
O novo constitucionalismo, que mais pres- O de que se cogita é: estamos seguindo em
sente que sente uma onda inédita de sua experi- direção a uma nova idéia de Constituição, uma
ência (fase a que alguns denominaram de “pós- que teria natureza supra-estatal e que poderia
moderna” à falta de epíteto mais apropriado e estar na base do direito comunitário, quiçá do
preciso), começa a aparecer como uma mudança direito da integração? Para uma nova cidade
que pode reconfigurar os próprios fundamentos política supra-estatal e para uma nova cidada-
do direito até aqui experimentado. Teve-se por nia – a de cunho mundial – haverá que haver um
adjetivado um constitucionalismo liberal, um novo direito. A questão é saber se para esses
constitucionalismo democrático social, que direitos fundamentais supra-estatais haverá
superou, ampliando, aquela fase preliminar do também um direito constitucional europeu, um
período moderno, e o Estado de Justiça Consti- direito constitucional sul-americano, etc.
tucional veio dominar, com a sua proposta de O Parlamento europeu já adotou um “projeto
uma juridicidade social democrática, uma maior de Constituição para a União Européia”, enquanto
concretização daqueles valores no Direito. O a Corte de Justiça de Luxemburgo considerou
momento agora permite ou impõe a juridicidade que o Tratado de Roma deve ser visto como
democrática impregnada dos valores éticos, que “uma Carta constitucional de base”, mas o que
se orientam pela participação pluralista voltada aqui se tem é tão somente a adoção do nome
ao aperfeiçoamento do princípio da solidarie- por analogia material, vez que, formalmente, não
dade social. Este constitucionalismo é, essencial- se há falar em Constituição pela ausência de um
mente, integrativo e não excludente; é univer- poder constituinte elaborador da Lei Fundamen-
salista e solidário e não elitista e solitário como tal, mas de órgãos estatais competentes para a
já o foi no período do liberalismo, que agora se assinatura dos Tratados. Esses têm natureza
pretende reinaugurar travestido de globalização jurídica, matéria, forma e eficácia absolutamente
neoliberal. diversas daquela.
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Mas a abertura do direito constitucional para progressiva interconexão entre o direito interno
os atos constitutivos das entidades interna- e o direito internacional.
cionais, para as organizações regionais integra- Dois movimentos parecem dar suporte a tal
tivas de Estados e para as entidades consti- situação: por um lado, os sistemas internacio-
tuídas em comunidades supra-estatais e as nais, particularmente no que concerne aos
mudanças do direito internacional, que tem a direitos humanos, ampliam-se e amalgamam-se
sua matéria inserida no sistema normativo cons- de modo a dar-lhes maior eficácia; reforçam-se
titucional, também são dados inegáveis da no que é comum e complementam-se no que
realidade. algum guarda diversidade do outro, pois acaba
Novos direitos ou novas faces e formas de deste extraindo novas idéias e normas que
aplicação do Direito são postos no bojo das começam a ser adotadas nos ordenamentos
mudanças que ao estudioso do tema deve preo- nacionais. Doutra parte, a integração econômica
cupar e dominar a sua atenção. e política traduz-se em normas que se positivam
no plano das relações entre Estados, mas que
se realizam no plano interno de cada qual deles,
3. Constituição e direito supranacional donde a necessidade de ser harmoniosa e eficaz
Teve-se como certo, até há pouco, que o a interconexão entre os dois sistemas.
Estado Democrático de Direito era questão “in- Nota-se, então, a imprescindibilidade de o
terna”, pertinente a cada povo. O Direito toma- Direito Constitucional abrir-se não mais apenas
va-se como a manifestação mais própria do poder no plano interno – para as organizações sociais
estatal soberano titularizado por um povo. e políticas no Estado –, mas também no plano
Assim também a Democracia, que se acreditava externo – para a maior integração e coordena-
obra exclusiva e estanque de cada povo sem ção dos sistemas de direito diferenciados
tocar preocupações ou atenções de outro. (porque nacionais e próprios dos diferentes
Como acima encarecido, o sistema democrá- povos) numa nova ordem jurídica interestatal.
tico de vida fez-se direito fundamental não É, ainda, de se considerar que se tem por supe-
apenas de todos os povos, mas, principalmente, rada ou, pelo menos, desprezada a visão que se
de todos os cidadãos. Na terceira onda de admitira, anteriormente, de serem as normas
direitos fundamentais, a democracia aflora em internas ou internacionais meros fatos uma em
suas projeções e em seus princípios como pauta relação à outra.
preferencial inerente a todos. Como os demais Cogita-se, então, da constitucionalização do
direitos fundamentais, deixou o regime político direito internacional, pela qual os sistemas jurí-
de ser uma “questão interna” de cada sociedade dicos fundamentais passam a absorver normas
estatal. Tornou-se um ponto de importância daquela matéria, inclusive no que concerne à
transcendente para todos os homens, todos os forma de serem recebidas, no ordenamento in-
grupos, todos os Estados. terno, aquelas que advenham de tratados inter-
Quando o que se põe à preocupação e à nacionais ou de atos que se lhes sigam e, no
atenção de um Estado repercute em todos os plano do direito comunitário, aquelas que a elas
demais, todos se têm por atingidos na matéria se sobreponham.
com a qual guarda relevância a sua experiência. À parte idéias que se punham nas teorias
É o que ocorre com a Democracia. Atentados monistas, pelas quais se teria o princípio de iden-
praticados contra ela vêm em feixes e acabam tidade de Direito Internacional e de Direito
atingindo um conjunto de instituições e mesmo Interno, a formar bloco único de normas jurídi-
de Estados. cas, é certo que a coordenação das ordens faz-
O tema e a prática do Estado Democrático se mais e mais presente e necessária. Direito
de Direito passaram, então, a ser buscados em não comporta e nem suporta contradições, o
conjunto, em sistemas de direito que se aproxi- que lhe custaria, inclusive, a efetividade jurídica
mam quanto aos princípios e, inclusive, que se e social.
influenciam, na igual medida em que os povos Há quem se refira, ainda, à internacionali-
acabam por se irmanarem em suas desigualdades zação do direito constitucional, proposição
para se complementarem. segundo a qual as normas conformadoras do
Tal situação é a base de uma prática jurídica sistema de direito internacional passariam a ope-
que se apresenta e se acrescenta a cada dia mais rar e a dotar-se de eficácia no plano interno pela
acintosamente: aquela que mostra uma nítida e recepção automática do quanto regulamentado
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por meio de tratados, protocolos, acordos, etc. em determinado momento histórico não produz,
O direito constitucional internacional seria, contudo, normas, que, em sua hierarquia e
então, considerado mesmo um ramo do direito diversificação material e formal, fiquem acima
constitucional, o qual de dúvidas em sua incidência e em sua execução.
“não é um ramo autônomo da Ciência Pelo que a interconexão do sistema de direito
Jurídica, mas apenas uma divisão do constitucional e do direito internacional põe-se
Direito Constitucional...o Direito Consti- como objeto do tratamento do direito interno,
tucional Internacional tem um núcleo resguardada, ainda hoje, a questão da sobera-
mínimo: conclusão de tratados, declara- nia da vontade popular manifestada, incontras-
ção de guerra e celebração da paz. Enfim, tavelmente, em sede de poder constituinte, quan-
não se pode dizer que ele tenha um obje- do da elaboração das normas fundamentais.
tivo próprio.... O Direito Constitucional Muito se tem criticado a Constituição da
Internacional é a tentativa de adaptar a República brasileira no cuidado a ela dado ao
Constituição à ordem jurídica internacio- tema que pertine ao direito internacional4.
nal que se sobrepõe a ela. A Constitui-
ção é a manifestação da soberania estatal Os argumentos que se alevantam quanto ao
e o DIP a sua negação ou, pelo menos, a conservadorismo do modelo constitucional bra-
sua crescente limitação2”. sileiro repousam na circunstância básica de que
O Direito Constitucional, como o Direito se teria adotado, no sistema, princípios e pre-
Internacional, dota-se de conteúdo essencial- ceitos clássicos sobre as normas formuladas no
mente político. Ora, à medida que o político (e a plano internacional dos tratados, acordos e atos
política) nacional aproxima-se, cinge-se, soma- internacionais apenas mediante a prévia deci-
se, coordena-se, cada vez mais, com o político são de sua entronização no direito interno pelo
(e a política) internacional, em que as decisões Congresso Nacional (art. 49, I, da Lei Funda-
em um plano repercutem, imediatamente, no mental do Brasil).
outro, é certo que o direito interno, e, aí, basica- Parece que dois pontos merecem ser enfati-
mente, o constitucional, e o direito internacio- zados nessa passagem: a) o primeiro se refere
nal passam a constituir feições mais próximas às relações entre as normas constitucionais e
da matéria jurídica, a qual busca, fundamental- infraconstitucionais e aquelas havidas ou de-
mente, a unidade para maior eficácia e segu- correntes de tratados, acordos e atos interna-
rança. Muito própria é a ênfase que alguns cionais e b) o segundo concerne aos princípios
autores deram à unidade do Direito, o qual, no constitucionais brasileiros referentes às relações
dizer de Gerson Boson, entre outros autores, e aos atos internacionais.
“é o reflexo de uma dada época. O Direito a. 1) Quanto ao primeiro tópico, é de se con-
público e o Direito público internacional siderar a inexistência do princípio da recepção
são o produto de um mesmo ambiente automática das normas de direito internacional
histórico.... O homem não possui duas no sistema nacional. Diversamente do que
consciências jurídicas, lado a lado, uma ocorre em outros sistemas, tais como o alemão e
do Direito interno e a outra do Direito o português, entre outros, a Constituição brasi-
internacional. A consciência jurídica do
homem é uma só”3. 4
“Pode-se observar que a nossa Constituição con-
É certo que esta mesma e única consciência sagra uma das antinomias da ordem internacional: a
do Direito que uma sociedade possui e se põe soberania e a cooperação internacional vez que esta
só se realiza às expensas daquela...
2
MELLO, Celso de Albuquerque. Direito Cons- Como se pode concluir a Constituição do Brasil
titucional internacional. Rio de Janeiro : Renovar, não leva em consideração as novas tendências da ordem
1994. p. 31. Saliente-se que aquele autor entende que jurídica internacional.” (MELLO, op. cit., p. 122). O
“não existe um D. Constitucional Internacional por mesmo autor ainda enfatiza que “quanto à Constitui-
falta de um objeto definido e método próprio. O que ção brasileira no tocante às normas de alcance inter-
existe são normas constitucionais de alcance interna- nacional podemos dizer que é bastante falha e que
cional que devem ser analisadas em cada caso procu- quase sempre não se adapta às exigências das relações
rando compatibilizar os dois ramos da Ciência internacionais atuais. Nesta matéria a nossa Carta
Jurídica.”(Ibidem) Magna é tradicional e sem inovações”. (Ibidem)
3
BOSON, Gerson. Constitucionalização do Cf. também REZEK, Francisco. Direito Comu-
Direito internacional. Belo Horizonte : Del Rey, 1996. nitário do Mercosul. Porto Alegre : Livraria do
p. 155. Advogado, 1997. p. 52 - 61: Conferência.
290 Revista de Informação Legislativa
leira não permite que as normas do direito inter- independentemente de sua modificação formal
nacional geral ou comum e aquelas resultantes a partir de princípios que se reinterpretem e que
de tratados sejam diretamente aplicáveis no se dêem à renovação. A modificação da cultura
Estado brasileiro. Nos ordenamentos que ado- constitucional é importante para a permanente
tam aquele princípio, as normas de direito atualização da Constituição. A transformação
internacional vigoram internamente tão logo do pensamento jurídico pela abertura também
adquirem vigência no plano internacional, inde- do intérprete tem papel insubstituível no pro-
pendente de qualquer ato dos poderes públi- cesso de arejamento do sistema de Direito. Não
cos nacionais que as transformem em normas basta que uma Constituição tenha um texto aber-
de natureza interna5. to, que se oferece a interpretações constante-
No modelo abrigado na Constituição da mente renováveis; é, igualmente, necessário que
República brasileira, compete ao Congresso o intérprete seja aberto a novos contextos.
Nacional “resolver definitivamente sobre trata- A questão da interconexão do direito interno
dos, acordos ou atos internacionais que acarre- e do direito internacional põe-se, assim, no plano
tem encargos ou compromissos gravosos ao da hierarquia e das fontes das normas jurídicas,
patrimônio nacional” (art. 49, I). Mantém-se, por- a saber, aquelas que conformam o direito interno
tanto, no ordenamento brasileiro, o princípio da e aquelas que advêm do direito internacional.
superioridade do direito interno sobre o direito Freqüentemente se tem a questão da hierar-
internacional6. quia das normas para se optar pela teoria dua-
É certo que tal interpretação e aplicação do lista ou pela monista apenas se considerando a
direito interno em relação ao direito internacional qualidade soberana do Estado que elabora e
decorre não apenas da literalidade das normas positiva o direito constitucional.
do sistema, mas, principalmente, da interpreta- Ocorre que se há de considerar aquela con-
ção que a elas se dá especialmente pelos tribu- dição de soberania não apenas da pessoa esta-
nais7. Não que a presença de normas constitu- tal, que positiva o direito da entidade política,
cionais determinantes da sua supremacia e da mas principalmente do poder do qual se origina
primazia das demais normas que compõem o a Constituição do Estado. É que o exercício da
ordenamento jurídico pátrio possa ser descon- titularidade do poder constituinte tem a quali-
siderada pelos seus aplicadores, especialmente dade de soberano que o faz sobrepor-se aos
do Poder Judiciário. Mas parece, contudo, igual- poderes constituídos. É a esses que o poder
mente exato que a mutação constitucional pode constituinte confere, segundo os seus termos e
permitir a adaptação das normas do sistema limites, o direito de estabelecer as relações inter-
nacionais. Logo, enquanto as normas constitu-
5
A Constituição alemã estabelece, em seu art. 25, cionais derivam de um poder constituinte sobe-
que “as normas gerais do direito internacional públi- rano, as normas de direito internacional com as
co são parte integrante do direito federal. Estas nor- quais acordam os Estados nascem de atos do
mas possuem primazia perante as leis e constituem poder constituído. Esse é sempre limitado e con-
fontes diretas de direitos e obrigações para os habi- dicionado pela obra do constituinte e dele não
tantes do território federal”. pode desbordar.
Norma análoga se contém no art. 8º da Constitui- É certo, então, que, quando o poder consti-
ção portuguesa. tuinte determina que a resolução definitiva
6
BOSON, op. cit., p. 158, segundo o qual “a sobre tratados e atos internacionais deve ser
grande maioria dos doutrinadores e publicistas con- feita pela decisão do poder legislativo, por exem-
temporâneos defende, à luz de vários e ponderáveis plo, tal como se dá no caso brasileiro, parece
argumentos, a supremacia do Direito internacional certo considerar-se que a superveniência daque-
sobre o Direito interno.” les com a sua transformação em norma de eficá-
A jurisprudência dos tribunais brasileiros, inclu- cia interna, por força do cumprimento constitu-
sive o Supremo Tribunal Federal, reiteradamente tem cional relativo à decisão sobre o tema, importa
declarado a prevalência do direito interno sobre o di- em que não haja a superioridade de uma norma
reito internacional, declarando-se até mesmo a
inconstitucionalidade de tratado e a sua inaplicabili- de direito interno contra a qual aqueles não
dade quando contrariar norma infraconstitucional. possam prevalecer. Aqueles podem modificar a
7 norma jurídica de direito interno e sobre ela
Nesse sentido, e relativamente ao Mercosul,
afirma Francisco Rezek que “na cabeça, por exemplo, haverá de prevalecer.
dos juizes basileiros, até agora, nada mudou”. (Confe- Também não parece certo supor-se que a
rência cit.) superveniência de lei, que é elaborada por um
Brasília a. 35 n. 139 jul./set. 1998 291
órgão do poder constituído exatamente de igual implícito material ao seu exercício, mas não ape-
natureza e hierarquia daquele que resolve sobre nas, porque transformador da sua própria natu-
o tratado, atos e acordos internacionais, possa reza supralegal.
modificá-lo. É que a vertente do ato de direito Daí por que, no sistema constitucional bra-
internacional implica uma relação entre entida- sileiro, salvo nos casos em que a Constituição
des estatais que não podem recuar, singelamen- expressamente considere o tratado fonte do
te, numa primeira decisão por meio de um ato direito de nível constitucional, tal como se dá,
unilateral, como o é o legislativo, independente por exemplo, no art. 5º, § 2º, é certo que ele não
das condições e conseqüências que daí adve- pode ser considerado válido senão quando com-
nham para os demais participantes do tratado patível, adequado e coerente com a Lei Funda-
ou acordo. Se a retirada de um Estado de um mental.
tratado tiver que ser feita, tanto haverá que se
dar segundo os termos de direito internacional Daí também por que a Constituição brasileira
combinados com os de direito interno e não explicitamente estabelece o sistema de controle
mediante a simples elaboração e promulgação de constitucionalidade das leis e atos normati-
de uma lei pelo órgão competente. vos, inclusive daqueles havidos em tratados.
Tal controle, que se põe no plano da competên-
Não parece, pois, que o ato de direito interno cia concentrada, nos termos do art. 102, I, a, e,
prevaleça sobre o ato de direito internacional ainda, da competência difusa (art. 102, III, c),
ao ponto em que se pretende tornar esse mero
pode ensejar a apreciação da matéria pelo
fato sem qualquer obrigação dele advinda, por-
Supremo Tribunal Federal, demonstrando que
quanto produzido na pendência de uma relação
o princípio da sindicabilidade judicial dos atos
em que há interesses de outras entidades esta-
fundados em tratados também constitui direito
tais igualmente soberanas. Tanto vale mesmo
em sistemas como o brasileiro, que adota um público subjetivo fundamental do indivíduo no
rigoroso exame da compatibilidade das normas sistema brasileiro.
de direito internacional com as normas de direito Mais ainda, até mesmo o controle de legali-
interno. dade dos tratados vem sendo feito pelo Poder
Judiciário brasileiro, e é nesse ponto que surgem
Diversamente é a situação quando a inter- os principais conflitos persistentes até agora
conexão do direito interno com o direito inter- quanto à matéria.
nacional põe os olhos sobre uma situação de a. 2) Uma palavra há de ser dita relativamente
conflito entre as normas constitucionais e as à questão da interconexão entre normas de
internacionais. É que estas, como antes lembra- direito interno e normas supranacionais quando
do, decorrem do comportamento do poder cons- se trata do direito comunitário.
tituído, competente para formulá-las, aceitá-las
e adotá-las, enquanto aquelas decorrem do Característica do direito comunitário é, exa-
poder constituinte, que se põe com supremacia tamente, a de compor uma ordem supranacional
sobre aquele. (melhor, talvez, seria afirmar supra-estatal),
Mesmo no que concerne ao poder constitu- porém de imediata incidência no plano do orde-
inte derivado, como é o reformador, parece namento jurídico interno das entidades que com-
indisputável que a teoria da constituição, que ponham a comunidade.
se põe no fundamento do poder constituinte, É que esse é considerado um direito primá-
ficaria capenga se nela se introduzisse o enten- rio e não derivado, a dizer, não se o considera
dimento segundo o qual um ato simples e des- uma criação extra-estatal, mas uma elaboração e
pojado das garantias que o poder constituinte adoção do próprio Estado que é parte dos órgãos
impõe à ação do constituinte reformador pode- que o criam, à maneira do que se dá na Comuni-
ria desconhecer os limites formais para a mu- dade Européia, por exemplo. Daí por que não se
dança constitucional e acolhesse normas mate- há cogitar, na espécie, do princípio da recepção,
rialmente constitucionais sem o atendimento solucionando-se a questão referente à validade
dos pressupostos, condições e limites que se jurídica da norma pelo princípio da subsidiarie-
traçam para a reforma da Lei Fundamental. O dade. A autonomia decorrente da primariedade
poder constituinte derivado de reforma seria, da criação do direito caracteriza-o, dotando-o
então, hierarquicamente subordinado à compe- de positividade e eficácia direta como compo-
tência para a edição das normas de direito inter- nente do ordenamento jurídico vigente no
nacional internalizadas. Tanto seria um limite Estado.
292 Revista de Informação Legislativa
É de se considerar que o direito comunitário internacionais) e, pois, da perspectiva a partir
caracteriza-se pela ênfase no princípio da da qual se enfoca a situação cuidada.
igualdade dos Estados formadores da comuni- Não há confusão entre o direito comunitário
dade, no bojo da qual ele nasce; pelo princípio e o direito da integração. Aquele tem natureza,
da reciprocidade, porque, se não houver cor- fonte, objeto e características diversos do direito
respondência estrita entre as competências que internacional, porque próprio de uma Comuni-
cada qual das entidades-partes transfere ao dade de Estados que afirmam um elo formador
órgão supranacional do qual ele emana, haverá de uma composição política supra-estatal, po-
um desequilíbrio que descaracteriza a própria rém não-estranha ao Estado. Já o denominado
base da Comunidade; e pelo princípio da soli- direito da integração é, reafirme-se, o conjunto
dariedade pelo qual se fundamenta a busca de das normas de direito internacional formuladas
um conjunto de elementos que amainem as dife- e aplicáveis no processo de integração dos Es-
renças existentes nas diversas entidades. tados conformadores de uma pessoa jurídica de
Nesse ramo do direito que se realiza nas direito internacional derivada da integração das
Comunidades de Estados, formando uma nova partes e que são recepcionadas no ordenamento
condição supra-estatal diferenciada das meras interno.
reuniões eventuais tratadas entre entidades A cooperação e a integração afirmam-se,
estatais, não se discute o conflito entre direito inclusive, para que os objetivos comuns sejam
interno e direito comunitário, porque eles se superiormente cumpridos pelo conjunto das
coordenam à maneira de uma figura projetada entidades estatais. Para que se dê a integração,
em épuras que se compõem formando um núcleo haverá de serem racionalizadas e formalizadas
e um desdobramento afirmados pela unidade. aquelas finalidades, pois é delas que se extraem
De se notar que o Mercosul não produz os processos a serem adotados na estrutura e
direito comunitário, pelo que o conflito de na organização da pessoa jurídica de direito
normas aplicáveis aos Estados considerados internacional, a qual atuará para que se obtenha
partes dele não se resolve segundo os princípios a eficiência dos procedimentos tidos como
e características deste ramo jurídico, mas no próprios.
quadro próprio das relações de direito interno e
direito internacional, havendo, tão somente, um No processo de integração, os Estados-
encaminhamento diferenciado, em alguns casos, partes não se vinculam, necessária e automati-
quanto à interpretação e à aplicação das normas camente, às decisões, às quais se chega por con-
específicas da integração, que já vem sugerindo senso (cf., por exemplo, o art. 37 do Protocolo
a especialidade do seu tratamento, porém e de Ouro Preto, relativo ao Mercosul, pelo qual
ainda, no âmbito daquele. “as decisões dos órgãos do Mercosul serão
a. 3) Assim, diversamente do que ocorre tomadas por consenso e com a presença de
quanto ao direito comunitário, dá-se com o todos os Estados-Partes”).
denominado direito da integração ou direito A tomada de decisões por consenso e com
integracionista, considerado, por alguns, uma a presença de todos os Estados-Partes demons-
especialidade do direito internacional8, enquanto tra a carência de independência da entidade de
outros cogitam-no como especialidade do direito direito internacional que forma o Mercosul,
constitucional9. Os princípios e características diversamente do que se dá com a Comunidade
são, portanto, os destes ramos, internacional de Estados, conseqüentemente, para o direito
ou constitucional, sem qualquer autonomia ou prevalecente em um e os atos, mesmo que de
natureza normativos, estabelecidos no outro
singularidade das normas integracionistas. Note-
caso.
se que a referência à inserção do direito da inte-
gração em um ou outro ramo (do direito consti- Por conta mesmo desta condição de serem
tucional ou do direito internacional) depende, as decisões tomadas no processo de integra-
fundamentalmente, da fonte das normas refe- ção vinculadas às deliberações independentes
rentes ao tema de que se cuida (internas ou e soberanas dos Estados, não se forma um direito
supranacional de aplicação direta, automática e
8
MELLO, Direito internacional da integração. imediata em cada qual deles, como se dá no
Rio de Janeiro : Renovar, 1996. direito comunitário. Não se cria, no âmbito do
9
DROMI, Roberto, EKMEKDJIAN, Miguel, processo integracionista, um direito comum aos
RIVERA, Julio C. Derecho comunitario. Buenos Estados, mas uma criação comum de um direito
Aires : Ciudad Argentina, 1995. que cada qual dos Estados estudam e decidem
Brasília a. 35 n. 139 jul./set. 1998 293
quanto à vigência e aplicação na esfera de suas blica, especialmente no que concerne às
competências soberanas. Por isso as decisões relações entre o Estado brasileiro no plano do
adotadas pelos órgãos do Mercosul podem ser direito internacional.
formalizadas como normas, mas a sua natureza
distingue-se das leis, quer do ponto de vista da Inserido o tema no título I da Lei Fundamen-
fonte, quer do ponto de vista da forma, quer do tal, entre os princípios fundamentais do Estado
ponto de vista dos efeitos. Democrático de Direito em que se constitui a
República Federativa do Brasil, arrolam-se
Como o direito, para ser dotado de eficácia, aqueles que concernem às suas relações inter-
depende de órgão controlador de sua validade nacionais.
e aplicação que se dote de competência sancio-
nadora para a hipótese de seu descumprimento b. 1) Dispõe o art. 4º e seu parágrafo único:
e de competência impositiva de comportamen- “Art. 4º – A República Federativa do
tos em caso de inobservância de suas decisões, Brasil rege-se nas suas relações interna-
é imprescindível pensar-se, no direito comuni- cionais pelos seguintes princípios:
tário, em um órgão supranacional dotado de
competência jurisdicional definitiva, tal como se I – independência nacional;
dá com o Tribunal de Luxemburgo. Norma sem II – prevalência dos direitos humanos;
jurisdição de igual natureza e âmbito de inci- III – autodeterminação dos povos;
dência correspondente ao de sua fonte não tem IV – não-intervenção;
essência jurídica, não guarda o vigor que no V – igualdade entre os Estados;
Direito se deve conter e não produz os efeitos
que justificam a sua existência nessa condição. VI – defesa da paz;
No âmbito do processo de integração de Esta- VII – solução pacífica dos conflitos;
dos, como não se tem um direito comunitário, VIII – repúdio ao terrorismo e ao
também não se tem um órgão judicial que possa racismo;
dotar as suas decisões de vigor formalmente IX – cooperação entre os povos para
jurisdicional. Tal como, inexistindo um Parlamento o progresso da humanidade;
ou órgão legislativo dotado de competência para
criar o Direito, não se há de pensar em lei – com X – concessão de asilo político.
a qualificação e a caracterização que lhe são pró- Parágrafo único. A República Federa-
prias –, também sem um órgão judicante dotado tiva do Brasil buscará a integração econô-
de competência para firmar, em caráter definiti- mica, política, social e cultural dos povos
vo, uma decisão judicial, não se tem a garantia da América Latina, visando à formação
de eficácia daquelas decisões acolhidas supra- de uma comunidade latino-americana de
nacionalmente. nações”.
O Tribunal Internacional de Conciliação e As normas contidas no art. 4º da Constitui-
Arbitragem do Mercosul (TICAMER) tem com- ção da República não são as únicas que se refe-
petência para arbitramento, o que o distingue rem ao domínio das relações internacionais.
da jurisdição pensada e ainda hoje prevalecente Importantíssima nesta matéria é, por exemplo,
com a natureza definitiva que a sua prestação aquela que se contém na parte final do parágrafo
impõe. Daí por que também quanto a este ele- 2º do art. 5º, que oferece precioso subsídio para
mento se pode observar a distinção entre o a interpretação do sistema.
direito comunitário e o que ele provoca em Principalmente, é de se ter em conta, para a
termos de organização da estrutura e da organi- correta interpretação do dispositivo em causa,
zação da Comunidade de Estados e o direito que ele se insere em título de “princípios funda-
internacional da integração. mentais”, os quais têm que ser, necessariamente,
Repita-se: nesse quadro do processo de tomados em seu conjunto.
integração, eventuais conflitos entre normas de Ademais, não se há de desprezar o preâm-
direito interno e de direito integracionista solu- bulo da Constituição, o qual, conquanto não
cionam-se segundo as regras do direito interna- tenha natureza de norma constitucional, é uma
cional, apenas especializando-se a sua interpre- ótima bússola jurídica a guiar o intérprete pelos
tação e aplicação às condições que singularizam caminhos pré-traçados pelo poder constituinte.
a condição dos Estados-Partes. Assim, não se pode deixar de considerar a
b) O segundo ponto que reclama breve ênfase nele oferecida à circunstância de que a
passagem d’olhos refere-se ao conjunto de prin- elaboração constitucional destina-se a assegu-
cípios que se contêm na Constituição da Repú- rar o exercício dos direitos descritos e implícitos
294 Revista de Informação Legislativa
no sistema segundo “valores supremos de uma vo da integração também é posto de forma
sociedade fraterna, pluralista e sem preconcei- expressa, a saber, “a formação de uma comuni-
tos, fundada na harmonia social e comprometida, dade latino-americana de nações”. Significa
na ordem interna e internacional, com a afirmar que a integração é considerada opção
solução pacífica das controvérsias...”. constituinte originária delimitadora do modelo
As normas contidas no art. 4º da Constitui- de Estado acolhido. Não o Estado isolado ou
ção da República têm natureza de princípios, isolacionista, não o Estado mimetizado por
mas nem por isso se poderia considerar, por comunidades ultramarinas ou não-latinas, mas
mero e desarrazoado equívoco, serem elas de o Estado voltado à formação de uma comunidade
eficácia limitada ou sem vigor para produzir especificada pelo constituinte.
efeitos concretos. Do texto constitucional específico ressaem
Até se poderia alegar que não se teria instru- alguns elementos cuja ênfase se mostra neces-
mentalizado o cidadão para forçar os poderes sária: primeiramente, é de se relevar, com Rui
da República a dar concretude aos princípios ali Barbosa, que “quem dá os fins, dá os meios” e
incluídos. Talvez o cidadão não tenha, efetiva- que, também na fórmula daquele jurista, “a Cons-
mente, recebido instrumentos constitucionais tituição não dá com a mão direita para tirar com
específicos para forçar a tomada de uma ou outra a esquerda”. Se ela configurou, constitucional-
decisão numa direção predeterminada. Todavia, mente, em seus fundamentos, uma República
é certo que ele dispõe de instrumentos consti- Democrática de Direito afetada à integração para
tucionais e processuais para requerer dos a formação de uma comunidade latino-americana
poderes competentes a anulação de comporta- de nações, não se há de extrair, pela via de uma
mentos públicos que contrastem ou desaten- interpretação restritiva, os meios de que ela se
dam os princípios definidos no dispositivo em terá que valer para que a integração ocorra de
pauta. Destarte, qualquer regência das relações maneira eficiente e efetiva. Em segundo lugar,
internacionais firmadas pela República que seja saliente-se que a “formação de uma comunidade
contrária ou desconforme ao quanto constitu- latino-americana de nações” não significa ape-
cionalmente afirmado é inválida e tanto poderá nas um ato formal para se dar cumprimento à
ser obtido pelo cidadão. Nesse sentido, portanto, determinação normativa, antes é de se interpre-
o cidadão tem instrumentos jurídicos para tar que ali se contém a definição da obrigação
determinar a plena eficácia das normas do artigo, republicana brasileira de se buscar a integração
conquanto predominantemente para impedir a para que seja constituída, estruturada e realizada
validade de comportamentos que as afron- uma comunidade de nações latino-americanas.
tarem10. Também se há de relevar que a integração
b. 2) Cabe uma palavra especial, no presente buscada não se apega ao fator econômico – que
estudo, quanto ao parágrafo único do art. 4º da seria a abertura de mercados ou a atividade
Constituição da República brasileira. comercial integrada –, devendo se completar na
sua formação política, social e cultural, pelo que
Tem-se, ali, a constitucionalização do sonho não há o cumprimento da norma quando a aten-
da pátria grande latino-americana. Ela deixou de ção se voltar ou se se vier ater a um dos fatores,
ser apenas ilusão de idealistas para se conver- menos ainda aquele que não traz o dado caracte-
ter em diretriz fundamental da República no rizador da comunidade latino-americana das
sentido de se fazer real o quanto antes apenas nações.
pensado.
Aliás, a palavra “nação” – muito pouco em-
A norma do parágrafo único do art. 4º não pregada pela Constituição – denota uma reali-
contém apenas mais um princípio, mas uma dade distinta daquela do Estado, realçando-se
norma constitucional de conteúdo específico, nela, tal como se contém na teoria, uma comu-
trazendo uma ordem a ser cumprida pela Repú- nhão de história, de traços culturais, de crenças
blica, a qual “buscará a integração...”. O objeti- e uma perspectiva comum em face do passado
10
Opina Celso de Albuquerque Mello que “no aproximado em suas características.
Brasil a sensação que se tem é que os princípios (cons- Portanto, a integração buscada pela Repú-
titucionais) foram escolhidos de modo arbitrário.... A
inclusão destes princípios na Constituição não os blica com os demais Estados da América do Sul
torna mais obrigatórios no plano internacional, mas tem fundamento constitucional e embasamento
torna mais explícita ou reforça a aceitação deles por ético-jurídico, vez que posta para um aperfeiçoa-
parte do estado”. (op. cit., p. 159) mento conjunto das realidades econômica,
Brasília a. 35 n. 139 jul./set. 1998 295
política, social e cultural. Como ensinado por Estado concebido e vivido pelos gregos, cogi-
Pe. Inácio Neutzling, tava-se da natureza autárquica daquela cidade
“a integração sonhada pelos libertado- global. Aquele conceito, entretanto, diferencia-
res é o ponto culminante de um processo se grandemente do que o período moderno
de liberação e de desenvolvimento justo concebeu como soberania.
e equilibrado da América Latina... (e) cor- Também os Estados medievais, pluralmente
responde a um ‘processo de integração pensados pelos doutrinadores em razão da
solidário, que trate de corrigir em forma diversidade de sua organização e dinâmica, não
gradativa os desníveis econômicos entre conheceram o conceito moderno de soberania,
os países-membros”11. porque a Igreja é que exercia poder supremo em
Com base neste parágrafo único deste art. permanente disputa com o poder daquela orga-
4º, não se há, pois, considerar que a aplicação nização política. Mas é nesse período que
do direito internacional da integração do Mer- começa a se formar a idéia de que o poder esta-
cosul pode-se dispensar de atentar ao atendi- tal depende da imposição de sua condição
mento estrito dos objetivos ali especificados e superior para se impor aos demais poderes que
da determinação ali posta. Tanto eqüivaleria ao gravitavam em sede política, daí a expressão
descumprimento do comando constitucional. supremitas. Em 1283, Felipe de Beaumanoir
Daí por que, fundamentando-se nesse disposi- valia-se da palavra soberano para designar o
tivo, haverá que se dar à interpretação e à apli- poder supremo do barão em seu baronato.
cação dos atos, acordos e tratados firmados no Coube a Jean Bodin, em sua obra Os seis
sentido de se dar cumprimento às normas livros da república, datado de 1576, considerar
daquele parágrafo, a ênfase e o tom necessários e conceituar a soberania (do francês souverai-
para que as finalidades nelas postas sejam aten- neté12), um elemento essencial ao Estado13. Todo
didas. O direito internacional da integração do Estado teria que contar com aquele elemento
Mercosul tem base constitucional específica, para ser assim considerado. Aquele conceito
não se generalizando na principiologia das nor- dota-se de característica absoluta na visão do
mas relativas ao direito internacional comum. pensador francês, o que, entretanto, foi sendo
Constituição interpreta-se para que se lhe deixado para trás no Estado moderno, especial-
dê eficiência e efetividade e não para se conduzir mente desde o final do século XIX. Todavia,
à inocuidade, impossibilidade ou impropriedade mesmo no plano das relações internacionais pre-
de suas normas. A integração para a formação valeceu uma concepção de soberania absoluta,
de uma comunidade latino-americana de nações preconizada por Vattel no século XVIII e enfati-
é norma constitucional e a configuração consti- zada, ainda, no século subseqüente.
tucional mesma da República põe-se com esta Da doutrina aristocrática, na qual dormitou
condicionante no plano das relações regionais desde os seus primórdios até o conceito que
da América. elevou o termo à soberania popular, o que se
modificou, essencialmente, foi a entronização
4. Constituição e soberania 12
Para alguns autores a palavra adviria de “supe-
no Direito brasileiro ranus” do latim médio com o sufixo “anus” que a faz
remontar à sua origem popular, enquanto outros
“A soberania é o poder absoluto e perpétuo situam tal origem no baixo latim “superanitas”. Mas
de uma república.” qualquer que seja a sua vertente, é certo que o uso da
Jean Bodin palavra consolida-se no curso do século XII, tendo
enorme importância para a sedimentação do Estado
O conceito de soberania é polêmico, relativo, moderno que se contrapõe e se sobrepõe às relações
histórico e cada vez mais posto em questão em feudais características da Idade Média.
razão das condições políticas ocidentais atuais.
De se notar a lição de Dalmo Abreu Dallari,
Qualidade essencial do poder estatal que o segundo o qual “embora o conceito de soberania só
distingue dos demais que se exercem em deter- tenha aparecido a partir do século XVI, a ordem jurí-
minada sociedade política, a soberania não teve dica estatal sempre foi soberana” (O futuro do Estado.
o seu aproveitamento na experiência antiga. No São Paulo : Saraiva, 1972. p. 63).
13
“République est un droit de gouvernement de
11
NEUTZLING, Inácio. Mercosul : integração e plusieurs ménages et ce Qui leur est commun avec
impacto sócio-econômico. Petrópolis : Vozes, 1997. puissance souveraine” – livro primeiro, capítulo I, da
p. 107: O Mercosul e a integração latino-americana. obra Les six livres de la République.
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da democracia como regime político, cujos prin- que “não é exagero dizer-se que o inimigo da
cípios vinculam melhor os fins do Estado com o paz é o Estado soberano”16.
quanto buscado pelo indivíduo e pelo cidadão. Também se há de tomar em conta que a sobe-
Soberania é conceito que já foi tido, no con- rania popular vem sendo mais encarecida nos
ceito normativista, como relativo à ordem jurídica sistemas jurídico e político dos Estados demo-
nacional suprema e não-subordinada à elabora- cráticos, mantendo-se as suas características de
ção de outrem; como o poder político supremo unidade e indivisibilidade, irrevogabilidade e
de um Estado; como a independência da enti- intransferibilidade.
dade estatal em relação aos outros Estados. De Se de um lado o conceito tradicional e her-
qualquer forma, o que hoje se enfatiza é muito mético de soberania já não mais prevalece, até
mais os seus atributos e o exercício democrático mesmo porque desatende aos reclamos da socie-
do poder popular em caráter soberano. dade contemporânea, é certo que ela ainda é
Tanto no plano interno quanto no plano proclamada, inclusive nas Constituições, por
internacional, a soberania desempenhou e ainda resguardar o direito de cada povo de decidir
cumpre papel inapelavelmente importante, con- a sua forma política de ser e de fazer-se cons-
quanto hoje já não tanto quanto nos séculos truir em sua história de maneira a não se
anteriores e no âmbito das relações internacio- subordinar aos comandos de potências estran-
nais menos ainda. Mas a afirmação do Estado geiras.
como sociedade política diferenciada das demais No momento presente, em que a soberania é
organizações, aí incluída a Igreja, que também do povo e não de nações e em que as idéias e as
desempenhavam poderes políticos, constituiu ideologias podem irmanar mais que a identidade
elemento de importância incontestável para a do solo que constitui a pátria; no momento his-
informação e a afirmação do Estado moderno. tórico em que a terra se converte em pátria da
Desde o final do século XIX, e especialmente totalidade dos homens, em que o meio ambiente
no curso deste século, houve uma relativização atinge a vida de todos os seres do planeta, qual-
cada vez maior do conceito de soberania. Quer quer que seja o local que se tome por referência,
porque as idéias anarquistas e as marxistas há que se pensar, contudo, que a soberania
passaram a negá-la, ensejando o seu questio- repensada, relativizada e centrada na participa-
namento mesmo em outras sedes de pensamento, ção política livre e permanente do povo pode
quer porque a internacionalização de aspectos servir ao resguardo da identidade de cada grupo
políticos, econômicos e, mais recentemente, cultural sem perda da dimensão universal da
sociais e culturais determinam afinidades entre convivência política. Mas parece indubitável
Estados e a coordenação de políticas públicas, que a soberania não pode persistir como con-
quer porque a presença de organizações não- ceito que se ponha como bloqueio para que
governamentais internacionais apresentam-se venham as modificações que a nova ordem
como partícipes da experiência política de dife- internacional, as novas formas de solidariedade
rentes Estados, o certo é que a restrição da entre os homens nos diversos Estados e a expe-
soberania é um dado da atualidade14. riência de universalização e mundialização dos
A soberania referida por Bodin foi revisa- direitos fundamentais do homem propõem e
da15. Para alguns publicistas eminentes e influ- põem. Por isso é que se tem enfatizado a desma-
entes deste século, como Duguit por exemplo, terialização cada vez maior da soberania e a sua
haveria que se extinguir o conceito e a crença aceitação sempre mais como conceito formal,
na soberania para se ter uma nova concepção que não embaraça nem impede a internacionali-
de Estado. E ainda hoje há quem sustente zação dos contatos e relações entre os Estados
14
Acentua Celso de Albuquerque Mello que “esta e, principalmente, entre os sistemas garantidores
(a soberania) passa a ser uma noção quase que formal, dos direitos humanos.
vez que seu conteúdo é cada vez mais diminuído pela
16
criação e desenvolvimento das organizações interna- BOSON, op. cit., p. 134. Segundo aquele autor,
cionais. Muitas vezes, a própria palavra soberania é “em toda essa mistela da História, no fundo, com
evitada, como ocorre na Carta da ONU que prefere grandeza ou sem esta, sempre encontramos impávido
usar expressões como ‘jurisdição doméstica’ ou esse tradicional conceito de soberania, com a récua da
‘domínio reservado’” (op. cit., p. 122). estupidez humana, ainda mesmo quando cortados os
15 seus vínculos originários com a referida cosmovisão
BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. Rio de
Janeiro : Forense, 1993. p. 142. religiosa politeísta” (Ibidem).
Brasília a. 35 n. 139 jul./set. 1998 297
É de Celso de Albuquerque Mello a assertiva nômico, que se dá por uma ordem voltada a as-
de que segurar a independência do Estado nacional em
“na prática, não há Constituição ou juris- relação aos centros financeiros poderosos que
prudência de tribunal constitucional que pretendem ou propendem a subordinar a seus
permita a ‘alienação’ da soberania, por- particulares interesses o comando das políticas
que fazê-lo seria consagrar o fim do econômicas dos Estados subdesenvolvidos19.
Estado. (...) Os Estados ainda não estão O fortalecimento da soberania popular é que
preparados para o seu suicídio”17. se põe, na presente quadra histórica, como im-
No constitucionalismo brasileiro, o princí- portante. Soberano é o cidadão e não o Estado.
pio da soberania do Estado aparece, ainda que Atente-se a que a cidadania, por sua vez, é cada
não com o uso expresso da palavra, em todas as vez mais supranacional. O direito de participar
Constituições desde o Império18. do poder político não mais se restringe ao terri-
Na Constituição de 1988, o princípio da sobe- tório de um Estado, estendendo-se principal-
mente porque ele se exerce para assegurar a dig-
rania é não apenas expresso como o primeiro nidade da pessoa humana – princípio essencial
dos fundamentos da República Federativa do de qualquer ordenamento – e, onde esta tiver
Brasil no plano interno e no plano internacional sido atingida, há que haver um cidadão disposto
(art. 1º, I, e art. 4º, I), estendendo-se e reforçan- a colaborar com o ameaçado ou lesado em seu
do-se a sua condição democrática, pelo que a direito para a pronta defesa, independente da
soberania popular é realçada (art. 14) e a sobe- nacionalidade.
rania nacional cuidada de maneira explícita (art. Ademais, considerando-se que a democra-
170, I). cia é tida como direito fundamental da terceira
O conceito de soberania constitucional- onda (ou de terceira geração, como querem
mente abrigado no sistema brasileiro açambarca alguns autores), a soberania do povo cumpre a
não apenas o jurídico, vale dizer, a supremacia tarefa de assegurar que a sua participação não
do direito fundamental interno sobre o direito lhe seja negada, menos ainda afastada para se
internacional, como o político (daí o uso da substituir pelos eventuais governantes.
expressão “independência nacional”) e o eco- Nesse sentido, a soberania popular pode
17
MELLO, op. cit., p. 123. representar uma maior legitimidade das normas
18
jurídicas que passem a integrar e a incidir sobre
A Carta de Lei de 25 de março de 1824, obser- o povo de um Estado, mesmo quando formulada
vada como Constituição do Império, determinava, em
seu art. 1º, que “o Império do Brasil é a associação internacionalmente, porque esta elaboração
política de todos os cidadãos brasileiros. Eles formam contaria (e, quem sabe, contará brevemente)
uma nação livre e independente que não admite com mais com a participação dos cidadãos, o que,
qualquer outra laço algum de união ou federação, que até agora, ainda é muito frágil.
se oponha à sua independência.” Na interconexão do direito interno com o
A Constituição de 1891 cuidou da soberania direito internacional, é de se atentar a que a limi-
nacional no art. 15, afirmando serem seus órgãos os tação das competências do Estado pela atribui-
poderes legislativo, executivo e judiciário. A expres- ção conferida aos órgãos que produzem as
são teve, então, o sentido de poder e não mais de
independência no sentido de que se valera o consti- normas supranacionais constitui, iniludivelmente,
tuinte do Império. uma limitação à própria soberania do Estado, se
pensada esta em sua concepção mais vinculada
A Constituição de 1934 manteve, em seu art. 3º,
aquela expressão com o mesmo significado utilizado à idéia de capacidade suprema de produzir, por
naquela primeira da República. si e internamente, uma ordem jurídica. Se se põe
A Carta de 1937 estabeleceu, em seu art. 1º, que que o constitucionalismo contemporâneo privi-
“O poder político emana do povo e é exercido em legia a produção heterógena de normas para
nome dele e no interesse do seu bem-estar, da sua possibilitar uma maior composição de interes-
honra, da sua independência e da sua prosperidade”. ses dos povos integrados ou reunidos em comu-
A Constituição de 1946, a Carta de 1967 e a nidade com a participação popular soberana e
Emenda Constitucional nº 1, de 1969, não faziam efetiva, parece indubitável que se pode consi-
expressa referência à independência ou à soberania, derar a manutenção daquele conceito e até
mas cuidavam das competências da União para asse- mesmo o seu fortalecimento.
gurar a integridade do território nacional e o trânsito
19
de estrangeiros ou de forças estrangeiras no país, donde SILVA, José Afonso da. Curso de Direito
se extraía a adoção inequívoca, obviamente, daquele Constitucional positivo. São Paulo : Malheiros,
princípio. 1998. p. 724.
298 Revista de Informação Legislativa
A matéria dos direitos humanos, que domi- não se há cogitar de anular as identidades nacio-
nam o cenário jurídico nas últimas décadas, vem nais, pois então não há integração ou comu-
comprovar que a soberania estatal não se nhão, mas colonização ou dominação pura e
sobrepõe ao direito que resguarde o homem em simples.
sua condição universal. O cuidado daquele tema Afinal, como dizem os indianos, a universa-
constitui, irretorquivelmente, uma superação da lidade repousa na humanidade que se individua-
soberania estatal absoluta e intangível ao ques- liza, se marca e se faz irmã. Por isso “cantes a tua
tionamento do resto do mundo. aldeia se queres ser universal”. Há de se manter
É de se observar, porém, que a soberania é a aldeia para fazer surgir o canto...
repensada para se impor mais fortemente não
em sua verticalidade, mas em sua projeção hori-
zontal, e não em relação ao aparato burocrático 5. A Constituição da República
dos poderes que compõem os quadros de ação Brasileira e o Mercosul
do Estado, mas em respeito à atuação cidadã
permanente, intransferível e decisiva dos povos “Celso Furtado... enfatiza ser nossa tarefa
interessados. nada menos do que ‘mudar o curso da civiliza-
Nesse caso, a soberania cumpre também uma ção, deslocar o seu eixo da lógica dos meios a
função de pôr a claro as desigualações que serviço da acumulação num curto horizonte de
marcam as identidades dos povos, que devem tempo, para uma lógica dos fins em função do
ser respeitadas, vez que não se pretende aceitar bem-estar social, do exercício da liberdade e da
a uniformização totalitária dos grupos sociais cooperação entre os povos’. Enfrentar a crise
ou a unificação das culturas que acarretam o civilizatória exige um grande grau de coopera-
esfacelamento das individualidades em único ção em nível internacional, muito superior a tudo
proveito de interesses de mercados, sem qual- o que se fez até hoje”.
quer compromisso com as reais necessidades Mais além do mercado, mais além do Estado
dos diferentes conjuntos, garantindo-se, pela Armando de Melo Lisboa
participação popular, que se propiciem as con- O Mercosul busca realizar, no âmbito do
dições de aperfeiçoamento respeitoso das desi- Cone Sul, a integração, inicialmente econômica,
gualdades para a identificação e o respeito às dos Estados-partes, no fluxo do que se constrói
peculiaridades culturais e sociais. A comunhão ou se intenta produzir o direito da integração.
de Estados ou a integração de Estados não pode Releve-se: é o direito da integração, pois não se
significar a supressão, a eliminação ou a simples quer que se tenha por cá o direito da “entrega-
extinção das diferenças dos povos e de suas ção”. Quer dizer, no âmbito de uma globalização
culturas, pois elas devem se somar para acres- econômica sobre a qual se põem questões de
centar e se constituir objeto da união. Só há monta para a sobrevivência independente de
união quando há mais de um. Não há uma cultu- cada povo, a integração vem para ajustar socie-
ra ou opção política de um povo que seja a dades que se podem reunir para aperfeiçoar as
verdade absoluta ou que seja boa para todos. A suas instituições e se solidarizarem nas deci-
hegemonia é nefasta e negadora da liberdade sões em benefício de todos. Independência não
humana, que encarece a diferença que individua- significa isolacionismo, fechamento ou desco-
liza, torna o ser um indivíduo único, diferente nhecimento da realidade e da coordenação com
dos demais. Para haver a aproximação dos as políticas internacionais. Mas integração tam-
povos, há que se partir do respeito às suas di- bém não pode significar dependência, menos
versidades. É, aliás, a diferença que nos carac- ainda aquela que faz que um povo entregue a
teriza, quer dizer, dota-nos de singularidade para outro Estado os seus bens, os seus recursos, a
nos superarmos. A igualdade que se busca não sua história, o seu futuro. Integração faz-se com
suprime as singularidades, apenas se restringe soma para melhor distribuição com todos e não
a impedir que as diferenças decorrentes de pre- com a subtração para maior lucratividade de
conceitos nos inferiorize e marginalize. Não se alguns.
pretende um mundo de seres idênticos, desper- A globalização que se oferece como fatalida-
sonalizados. Antes, quer-se um mundo de de20 do atual momento histórico é a econômica
pessoas, que se qualificam pela sua condição
especial e única. O pluralismo político vale não 20
Quanto a ser considerado uma “fatalidade” do
apenas como fundamento da democracia interna momento atual, é de se anotar que a aids também é
dos Estados, mas também internacional. Portanto, uma fatalidade do momento atual e nem por isso há
Brasília a. 35 n. 139 jul./set. 1998 299
e não é um processo que titularize os Estados nômica de se ter direitos apenas se se puder
na condição de principais protagonistas. Antes, fazer por merecê-los. Aquele que não tiver opor-
ela vem como uma condição de realização de tunidade de “fazer” (o que se tem pelo trabalho)
capitais e interesses particulares, valendo-se dos não se vê incluído no processo sócio-econô-
agrupamentos humanos como manadas de con- mico.
sumidores que oferecem o cheiro do lucro a ser A esta lógica de mercado sem leis conjuga-
revertido em benefício dos empresários. Não é se o neoliberalismo de perfil individualista sem
um processo no qual atue predominantemente o resguardo das individualidades e a competiti-
o Estado, pelo que o seu ordenamento não sub- vidade com a paralela extinção de empregos e
mete tal atividade. Em verdade, este processo de trabalhos sob os quais se afirmava a organi-
de globalização econômica não dispõe de leis, zação social e, em grande parte, também a orga-
pois as denominadas “leis do mercado” são nização econômica23.
verdadeira e exclusivamente o domínio da
força21. No curso desta mercantilização das A mundialização dos direitos humanos e a
relações internacionais, há crescente presença universalização das garantias fundamentais do
dos Estados economicamente fortes sobre os homem são a tônica mais realçada e própria para
outros, que aqueles pretendem usar segundo a realização da dualidade internacional que se
as suas conveniências financeiras, num neoco- põe e segundo a qual os Estados se reúnem
lonialismo que não renega a história de explora- para se fortalecerem e se prestarem à solução de
ção de alguns países por outros e para o que se problemas comuns com a soma dos seus esfor-
pretende uma hegemonia contrária aos ideais ços, recursos e comportamentos, para o que,
de libertação e aos princípios da liberdade e da paralela e contrariamente, necessitam abrir mão
igualdade. Segundo Alain Tourraine, do sentido absolutista e exclusivista que o con-
ceito antigo de soberania abrigava. Mas sem o
“o que hoje chamamos de globalização, associacionismo internacional dos Estados,
há cerca de um século atrás era chamado especialmente dos mais fracos economicamente,
de imperialismo. Este conduziu a ruptu- ter-se-á o retorno ao imperialismo em sua feição
ras sociais e políticas que disseminaram mais perversa.
governos despóticos e, mais cedo ou mais A integração das nações do Cone Sul, as
tarde, paralisaram as economias submeti- quais precisam ainda realizar, primariamente, para
das ao poder totalitário”22. todos os seus cidadãos os direitosfundamen-
O autoritarismo econômico internacional tais – inclusive e ainda os denominados de pri-
ronda as relações entre os Estados. A arquite- meira onda ou de primeira geração, como sejam,
tura política globalizante neoliberal gera a desi- o direito à vida, o direito à liberdade, o direito à
gualdade. Esta, como se sabe, é produzida, não igualdade, entre outros –, deve apontar para
é gerada do nada. E a desigualação econômica alternativas da estabilização democrática segun-
vem gerando legiões de desempregados e de do as condições sócio-culturais e políticas a fim
não-trabalhadores, excluídos do processo social de obter, com segurança e sem retrocessos, a
e político porque não são agentes da lógica eco- estabilização econômica inclusive no plano das
parcerias internacionais.
que se deixar de lutar para exterminá-la; o câncer tam- A integração referida constitucionalmente
bém é uma fatalidade e continua a se buscar a sua pelas normas fundamentais da República Federa-
cura. O que chega ao homem como fatalidade nem tiva do Brasil (art. 4º e seu parágrafo único)
sempre é insuperável, menos ainda quando é fator busca a preservação das identidades nacionais
externo e criado por ele mesmo, como se tem com a
arquitetura globalizante e neoliberal da macro- 23
“A gravíssima crise que hoje vivemos é uma
economia. crise da possibilidade do ‘desenvolvimento’ latino-
21
Segundo George Soros, milionário que fez a sua americano, do sonho da modernização de nossas
fortuna exatamente com as “leis do mercado”, “atual- terras.... abre-se um vácuo quando se constata: seja
mente as finanças internacionais não obedecem a os limites do Estado na condução do processo social,
nenhuma lei. Quando uma atividade está fora do seja a irrevogabilidade dum mercado transnacional
alcance da lei, o que predomina é a força – e o estado devorador dos nossos recursos humanos e naturais,
de coisas em que a força predomina é chamado de seja a inadequação do projeto neoliberal necessaria-
barbárie”. Veja, n. 1442, p. 10. mente excludente da maioria da população, seja
quando se questiona a possibilidade da justiça e dum
22
TOURRAINE, Alain. Riscos do pensamento amanhã fraterno para nossos povos” (LISBOA,
único. Folha de São Paulo, 18. fev.1996. p. 5-7. Armando de Melo. op. cit., p. 134).
300 Revista de Informação Legislativa
que se devem somar para multiplicar e dividir Não se deseja negar o crescimento econô-
bens e não para aumentar as desigualdades, mico, menos ainda isolar-se o Estado sul-ameri-
menos ainda pagar com a pobreza maior ainda cano do processo econômico internacional-
de seus cidadãos o lucro particular de empresas mente dinamizado. O que se pretende é que este
descomprometidas com o homem sul-americano. modelo seja projetado e realizado em benefício
Por isso não se cogita da integração exclusiva- de todos os homens e não para o proveito de
mente econômica, conquanto seja certo que o alguns à custa da maioria dos mais e mais empo-
Mercosul é, hoje e ainda, fundamentalmente, um brecidos. O mercado, que é necessário, haverá
processo essencialmente econômico. que ser voltado para o atingimento das finalida-
O modelo de globalização econômica neoli- des sociais dos homens. Não são os homens
beral pode conduzir a uma mais crescente con- que se devem organizar para atender fins do
dição de miserabilidade de populações sul-ame- mercado. Por isso a democracia haverá que ser,
ricanas inteiras, que não dispõem de qualifica- rigorosamente, observada como base impres-
ção para a competição internacional com as cindível para a integração, pois somente ela pode
poderosas economias industrializadas e dotadas assegurar uma ordem social justa e solidária. A
da melhor e mais avançada tecnologia. A ordem ética democrática não pode ser desconsiderada
social proposta até mesmo nos sistemas consti- no processo de integração. É ela que pode afir-
tucionais dos Estados subdesenvolvidos não mar o acatamento rigoroso dos princípios cons-
tem conseguido, ainda, romper a desigualação titucionais democráticos dos diversos Estados
forjada pelo modelo econômico descomprome- integrados, garantindo-se, então, o pluralismo
tido com os homens. cultural, social e econômico e permitindo-se a
elevação dos membros destas sociedades à con-
Os fantasmas da pobreza indigna trazidos dição de cidadãos sul-americanos, iguais em
pela lex mercatoria24, sem fulcro social e sem direitos aos demais cidadãos do mundo. A assi-
finalidades humanas, andam pela casa e já não metria comercial, social, cultural e histórica dos
podem ser desconhecidos. Tropeçam-se em povos e Estados latino-americanos não pode
mãos estendidas à cata de um taco de pão. E, ser desconhecida ou renegada para se copiar,
como bem assinala o Pe. Inácio Neutzling, independente do chão latino-americano, mode-
“os pobres são os juízes da vida política los que se forjam em laboratórios outros inteira-
e econômica de uma nação. Portanto, a mente defasados da realidade de cá.
situação dos pobres em nossos países é É mister evitarem-se os projetos que condu-
o critério para medir a justiça, a bondade, zam ao dumping social de inegáveis conse-
enfim, a moralidade da integração que o qüências sociais malignas para os Estados do
Tratado do Mercosul pretende implemen- Cone Sul. Somente com o respeito e o engaja-
tar”25. mento às peculiaridades histórico-culturais das
A imposição, que vem de fora, de modelos sociedades latino-americanas é que se poderá
de Direito minimamente materializados, de des- evitar aquele resultado nefasto aos cidadãos.
constitucionalização e de desregulamentação Há de se atentar, então, à primazia absoluta
das matérias que são imprescindíveis para a dos princípios das Constituições dos Estados
garantia dos direitos fundamentais do povo sul- latino-americanos que resguardem, garantam e
americano, não pode ser aceita. realizem a democracia das sociedades que se
dão à integração no Cone Sul.
Não é possível, admissível ou aceitável que
A Constituição brasileira não determina a
o ciclo civilização/ desenvolvimento/ moderni- busca da integração sem a imprescindível
zação se faça ao custo da exclusão social e da observância dos princípios que informam e con-
marginalização política cada vez maior de povos formam o Estado brasileiro, na base do qual se
e de grupos sociais. O homem não é a taxa de põe superior e incontestavelmente a dignidade
lucro de empresa. da pessoa humana, bem como o da soberania
24
popular, o da cidadania e o do pluralismo político,
Já há quem alegue que a lex mercatoria é um entre outros (art. 1º).
novo direito (KEGEL, Patrícia Luíza. Advogado :
desafios e perspectivas no contexto das relações Ao contrário dos Estados europeus que ti-
internacionais. Brasília : OAB, 1998. p. 73 e 75: veram como fundamento preliminar da forma-
Internacionalização do Estado e sistemas jurídicos ção de sua comunidade a necessidade de se
nacionais). preservar a democracia para se assegurar a con-
25
NEUTZLING, op. cit., p. 125. tinuidade dos processos sócio-econômicos,
Brasília a. 35 n. 139 jul./set. 1998 301
econômicos e políticos de progresso e o respeito estatais, menos ainda sem um eficiente sistema
às nacionalidades com o fortalecimento das de aferição da juridicidade desse desempenho.
pessoas políticas, os Estados latino-americanos, Logo, é imperioso que se tenha a institucionali-
melancolicamente, têm como desafio a constru- zação dos mecanismos de participação direta
ção de uma democracia social e política estável ou indireta, porém democrática e com represen-
e permanente, que não se pode encontrar em tação específica, do cidadão na gestão da coisa
sua história. pública regionalmente integrada, tanto para a
Novas cópias de modelos estrangeiros, adoção de providências e decisões, quanto para
inclusive políticos; a submissão a ordens eco- o controle de sua execução.
nômicas, menos ainda incoerentes com os Há excessiva burocratização na institucio-
reclamos sócio-culturais dos povos; a aniquila- nalização do Mercosul, distanciando-se muito
ção das peculiaridades e riquezas culturais dos dos cidadãos. Estado como a República brasi-
povos latino-americanos para a absorção de leira, que já tem, internamente, tantas e tão
abúlicas fórmulas macdonalizadas de viver sob grandes diferenças, não chegará a suprir a exi-
o jugo imperialista de uma mídia cuja pátria é o gência democrática se não adotar uma política
lucro financeiro não são sendas próprias a se de divulgação e de aproximação de todos os
percorrerem. Nem a Constituição da República segmentos sociais e entidades federadas com o
Federativa do Brasil permite novas e sublimi- processo de integração, hoje muito restrito ao
nares formas de dependência a ordens interna- sul e sudeste do país.
cionais ou a entrega do país a interesses que Somente se terá o despertar da sensibilidade
não os prioritariamente nacionais. social do cidadão latino-americano quando se
Nesse sentido é que somente se pode con- adotar, efetivamente, uma agenda social e cultu-
siderar legítimo o processo de integração latino- ral como ponto fundamental do processo. Tal
americano para a criação da Pátria Grande sub- agenda é necessária por causa dos princípios
sumido aos paradigmas democráticos e voltado fundamentais da República Federativa Demo-
ao cumprimento de todos os fatores determi- crática do Brasil e dos direitos humanos que
nantes da reunião criativa e criadora da entidade hoje dominam o direito internacional. Sem o
de direito internacional, como se considerou homem sul-americano não há América do Sul.
protocoladamente o Mercosul (art. 34 do Proto- Sem povo não se faz Estado democrático. Sem
colo de Ouro Preto). O direito da integração, cultura popular não se promove integração por
forjado a partir dos atos, acordos e tratados afir- falta de objeto a ser reunido.
mados pelos Estados-partes do Mercosul, não O desemprego que vem assolando multi-
poderá desconsiderar qualquer daqueles prin- dões, se não é um caso isolado ou único da
cípios democráticos, pois, sem a sua observân- América do Sul, deve se constituir em preocu-
cia, não se poderá ter a base que alicerça uma pação específica do Mercosul, onde os desníveis
integração firmada no Direito. têm se acentuado de maneira disparada nesta
década de noventa. O ingresso de um contin-
Ademais, tendo-se como fundamento prin- gente de um milhão e quinhentos mil trabalha-
cipiológico da integração a democracia busca- dores ingressando, apenas no Brasil, no
da no princípio da soberania popular, é patente mercado de trabalho anualmente e sem encon-
que haverá de se preverem mecanismos e ins- trar geração correspondente de empregos pode
trumentos assseguradores da participação desaguar numa marginalidade sem precedentes
efetiva dos cidadãos no processo, sem o que se na história do Brasil.
terá dificuldades para possibilitar a legitimidade Os desníveis entre as condições dos traba-
política das decisões tomadas no âmbito dos lhadores dos Estados-partes do Mercosul e a
diferentes Estados e, de par com essa questão, desigualdade das formas e condições de pro-
a eficácia jurídica destas decisões na esfera de dução de bens e serviços (Estado como o Para-
competências de cada qual. guai é mais agrícola, enquanto o setor de serviços
Mais ainda, há de se anotar que a adoção de tem um desenvolvimento prioritário, por exem-
políticas públicas a serem concretizadas em plo, no Uruguai) podem criar fossos enormes a
relação às sociedades que participam do pro- separar e a estancar as realidades sócio-econô-
cesso integracionista depende do atendimento micas se não forem pensadas em conjunto e a
de um sistema de controle democrático da esfera tempo de se desenvolverem procedimentos que
pública, pois não há democracia sem a limitação conduzam à superação das diferenças de base
do exercício das competências pelos agentes sócio-econômica.
302 Revista de Informação Legislativa
A integração latino-americana determinada garante, em grande parte, a efetividade social
pela Constituição brasileira de 1988 não-estanca das decisões.
apenas um fator de reunião e coordenação – o Também não se pode desconhecer que os
econômico – como se tem reforçado até aqui. direitos humanos e os direitos sociais têm que
Urge se ampliem os fatores de integração para o ter prioridade absoluta no processo da integra-
cumprimento daquela meta e para o completa- ção, considerando-se uns e outros na contin-
mento do processo. gência latino-americana e não como se passa a
sua garantia em outros Estados.
6. Conclusão Afinal, há quinhentos anos de história para
se ganhar e que a integração poderá ajudar a
“Os outros latino-americanos são como nós converter numa nova América. Não é sem tempo
mesmos, povos novos, em fazimento. Tarefa in- que se construirá a Pátria Grande segundo os
finitamente mais complexa, porque uma coisa é ideais de solidariedade e justiça que animaram
reproduzir no além-mar o mundo insosso euro- os americanos dos últimos três séculos. Para
peu, outra é o drama de refundir altas civiliza- tanto, há de se pensar a integração lendo a nossa
ções, muito diferente, é o nosso, de reinventar o história com os nossos próprios olhos e pensá-
humano, criando um novo gênero de gentes, la com os nossos conhecimentos de chão.
diferentes de quantas haja”. Somos nós mesmos a nossa cartilha e o nosso
O povo brasileiro projeto de uma vida que atenda aos destinos
Darcy Ribeiro traçados para uma realidade que não tem retrato
A integração latino-americana do Mercosul, nos outros continentes. Somos, com as nossas
conquanto havida no fluxo de uma globalização agruras históricas e sociais presentes, o nosso
econômica desapegada de ideais humanitários próprio fardo, mas somos também a nossa maior
e universalmente comprometidos com os cida- esperança. Se aquele pesa mais na reunião de
dãos, enseja e enceta o surgimento de um mo- Estados, esta se multiplica na integração dos
mento inteiramente novo na América Latina. homens.
Essa integração, que a Constituição brasi-
leira determina seja buscada pela República e
que se põe no panorama internacional como uma Bibliografia
contingência do associacionismo dos povos e
dos Estados, deverá se desenvolver segundo ALMEIDA, Antônio José et al. Mercosul. Petró-
os princípios democráticos da ética, da liberda- polis : Vozes, 1997.
de, da solidariedade e da justiça social para ser BAPTISTA, Luiz Olavo. O Mercosul, suas
válida. Se não houver o fundamento do proces- instituições e ordenamento jurídico. São Paulo :
so nos princípios universais asseguradores da LTr, 1998.
dignidade da pessoa humana, qualquer forma BASSO, Maristela. Mercosul. Porto Alegre : Livraria
de atuação política das entidades estatais esta- do Advogado, 1997.
rá fadada ao insucesso social e ao fracasso jurí-
dico e político. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitu-
cional. São Paulo : Malheiros, 1998.
O Mercosul é uma realidade que tem um largo
caminho a percorrer. Não se há de aceitar desvios __________. Ciência Política. São Paulo : Malheiros,
que venham como propostas de povos que não 1993.
conhecem as contingências sócio-políticas e BOSON, Gerson de Britto Mello. Constitucionali-
econômicas da região integrada, nem se há de zação do Direito Internacional. Belo Horizonte :
fechar ao que venha de novo e de propício a um Del Rey, 1996.
aperfeiçoamento das instituições sociais. BURDEAU, Georges, HAMON, Francis, TROPER,
A ética social justa do processo da integra- Michel. Droit Constitutionnel. Paris : LGDJ,
ção passa pela democratização das instituições 1993.
e dos fins do Mercosul. Há de se convocar o CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e
cidadão latino-americano a participar politica- teoria da Constituição. Coimbra : Almedina,
mente das tomadas de decisões, de maneira efi- 1998.
ciente e permanente, mediante a prévia divulga- CARTER, Lief H. Derecho Constitucional contem-
ção dos temas, programas, projetos e delibera- poraneo. Buenos Aires : Abeledo-Perrot, 1985.
ções a serem discutidas e decididas, a fim de CASELLA, Paulo Borba. Integração jurídica intera-
que se assegure a legitimidade do processo que mericana. São Paulo : LTr, 1998.
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São Paulo : LTr, 1996. mundial. São Paulo : LED, 1996.
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