Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
PROGRESSISMO
A
DE SENECA
PUBLICAÇÕES DA FACULDADE DE FILOSOFIA DE
Assr
I
PU TILJ AÇ ô ES PERiôDTCAS
REVISTA DE LETR S
( E~t P BLT CAÇÃO )
II
EST ·nos E ENSAIOS
ç
O PROGRESSISMO DE S.ÊNECA
JOSt VA~ DE ~ BESSELAAR
LíMITES DE LA ESTILÍSTICA
(EL IDEARIUM CRÍTICO DO DÁMASO ALO NSO)
Direitos Reservados
FACULDADE DE FILOSOFIA 1 CI:ÊNCIAS E LETRAS DE ASSIS
I XSTITCTO ISOLADO DE E\"Sl \" 0 SUPERIOR DO GOVtR..l'W DO ESTA.ÚO
RUA 7 DE SETE~BRO, 14, ASSIS, S.AO PAULO , BRASIL
Procedenc; a
! / DOAÇÃO
íf{
JOSÉ VAN DEN BESSELAAR
DOUTOR PELA UNIVERSIDADE DE NIMEGA
PROFESSOR DE LtNGUA E LTTERA'T'TTRA
LATINA DA FACULDADE DE FILOSOFIA,
CH:NCIAS E LETRAS DE ASSIS
o
PROGRESSISMO
DE SÊNECA
PUBLICAÇÃO DA FACULDADE DE
FILOSOFIA, CH:NCIAS E LETRAS DE ASSIS
il~11i1llíl1ílfiílif
0-043.494-4 PRESERVE SUA FONTE
DE CONHECIMENTO
81BLI01ECA CE~THAL
19 UC- ~ ~- 0~
PREFACIO
...
CT\
;_va, c'"1Jl
· G"·
1-10 •~C, .:t, :::1
CO e) r
c.> : Or .,'. .):,,::,-z:.
1983
U made longa tradição quer que o professor, a quem cabe a honra
iniciar solenemente as atividades do novo ano acadêmico,
vincule sua aula inaugural à matéria que pretende expor aos
alunos no decurso do ano. Obedecendo a esta tradição, tomo
a liberdade de ocupar vossa atenção, durante algum tempo, com
Sêneca, o preceptor e ministro de Nero, autor que me proponho
a ler com os alunos do segundo ano . Como tema especial desta
aula escolhi o Progressismo de Sêneca, tendo em vista confrontá-lo
com o Progressismo moderno.
Há poucos autores clássicos que tanto falam no progresso das
ciências e das artes , tanto frisam o poder criador do espírito
humano, como Sêneca. Tornou-se célebre esta frase do nosso
autor : "Tempo virá em que a posteridade se admirará da nossa
ignorância em coisas tão óbvias " 1 . Não menos famosa tornou-se
uma passagem da sua tragédia "Medéia", em que parece ter
vaticinado o descobrime.~to do Novo Mundo2 , dizendo : "O
Oceano deixará de ser uma barreira, despontará uma região
enorme, e Thule 3 não será mais o limite do mundo" 4 • Sêneca
sabe perfeitamente bem que o cabedal do saber humano não é
coisa acabada , mas que cada geração tem a tarefa de ampliar,
emendar e aprofundar o patrimônio do passado; diz êle : "Os
antepassados legaram-nos não só muitas invenções, mas também
numerosos problemas não resolvidos ainda 5 . . • Nunca se desco--
brirá coisa alguma , se nos contentarmos com aquilo que já foi
descoberto. Aliás, quem segue outrem, não descobre nada ,
ou melhor nem sequer procura 6 • • • Vejo nos meus antecessores
não tiranos , mas guias 7 . . . A natureza nos doou a razão,
faculdade imperfeita, mas suscetível de aperfeiçoamentos ...
Procedamos como um bom pai de família e aumentemos o que
recebemos : os nossos herdeiros devem receber de nós um maior
patrimônio ainda. Resta fazer muito trabalho e restará futura--
mente; quem nascer daqui a mil séculos, ainda terá a possibi--
lidade de dar a sua contribuição9 • • . O mundo seria coisa insig--
nificante, se nêle não encontrassem tôdas as gerações um objeto
de estudo. Há certas iniciações que se fazem por graus;
assim como, em Elêusis, se guardam alguns objetos para serem
mostrados aos que regressam , assim a natureza não revela de
vez os seus mistérios" 10 •
.,.
10
n
----
19
21
. •tou esta tese 125 , mas no fim da sua vida, quando as circuns--
reJel
~ ·as da época Ih e d 1·f·1cu 1tavam ca d a vez mais
· a participaçao
· · -
tanc1 d . 1 , 'd
. na política, passou a ar maior va or a vi a reco ida, ao Ih · .
a t1va ,. d 1 U ·
otium, salientando outra tese ,es_t01ca , segun, º. a qua . ? mv_e;~º
, a verdadeira pátria do sab10 126 . O sabio servira a paLna
~nstituída pelos homens , quando lhe fôr possível e se puder
~ornar,. , se útil para ela 127 , mas êsse serviço da pátria humana é,
110 fundo , uma coisa indiferente, que com nada de essencial
contribui para a virtude ou a para a felicidade do sábio. O
sábio é útil para a comunidade por ser sábio; ou devemos julgar
que Zenão e Crisipo , que vi~iam a!ast~dos _da vida política,
mas legislavam para a humamdade mteira , nao prestaram um
serviço extremamente útil para o gênero humano ?128
Destarte chega Sêneca a elogiar cada vez mais o otium , o ócio , o
lazer que, quanto eu saiba , um só filósofo moderno teve a coragem
de defender: o alemão Josef Pieper 129 . Otium é a tradução
latina da palavra qrcÇJa axo'ATJ , que deu origem ao têrmo
moderno "escola" ( école, school, Schule, etc.); só quem tiver
axoÀTJ ( = "lazer" ) , só quem estiver livre de ocupações banais 130 ,
poderá pensar em aperfeiçoar . . se a si próprio como ser humano ,
em freqüentar a "escola " . Quer.o que me entendais bem: não
prentendo defender aqui um conceito nristocrático e irreparàvel-
rnente superado da escola; não é meu mtuito quebrar lanças pela
chamada elite pelas classes privilegiadas ( o abuso constante· das
palavras "elite" e "privilégios" em jornais e debates parlamentares
faz com que o homem moderno ignore quase por completo o
valor autêntico dêsses dois conceitos) . Pelo contrário , quereria
abrir a escola para todos os idôneos e para todos os aptos ,
qua1quer que seja a origem social dos alunos. Mas o que quero
frisar é que o otium dos antigos não é nem luxo nem preguiça 13I;
otium não é simples inatividade ou mero dolce f ar niente, tão
pouco como escola é viveiro de preguiça ou de inércia. Otiam
é suma atividade do homem enquanto homem; é atividade desin-
teressada; é atividade do espírito que se concentra na contem-
plação. Ora, a ação humana, para ser verdadeiramente humana ,
d:ve alimentar-se constantemente da contemplação: a cultura
nao pode subsistir sem um mínimo de contemplação. Uma es.-
cola superior e principalmente, uma Faculdade de Filosofia, trairia
sua vocação, se nela não se reservasse um lugar também para a
<Ty>-11.! isto é para estudos desinteressados, para a contem ..
~ ªi~º·
eh
Uma especialização meramente técnica, mesmo em matéria
iteratura e de filologia , sem uma reflexão aprofundada sôbre
0
.. ornem enquanto homem, - digamos: sem uma espécie de
antropologia filosófica" , - poderia levar-nos ao estado de uma
22
27
• .' 1·
. ----- -
28
...
►
mtern~s ,_ os astros se entrechocarão, e na conflagração de tôda
il
ª ~ateria , um imenso incêndio consumirá as estrêlas que agora
'• brilham numa ordem harmoniosa. Também nós , almas bem·
."•
l
~
aventu:adas e eternas , quando aprouver a Deus construir de
no:º est e mundo , seremos uma exígua parte da imensa ruina
► -\ universal e ret ornaremos aos antigos
.
t ..
.. . elementos2º1 . . • T~d
o as as
, "' coisas e_st ão concatenadas entre si num círculo de ferro ; tudo
.. .... passa, so_ para voltar. Não faço nem vejo nada de novo. Tamanha
•
"' ..
.-: ..
• ·.·
, ,
mm~no~onia acaba por causar enfado. A vida segundo muitos .
ao e amarg
de t
'
a, mas completamente supérflua"202. L'honzme, e es
' t
..... rop, como dizem 1 d mbora
. . .•. num conte tO d· ª guns existencialistas mo ernos, e
..-~.•:."·, • ·
• 11·
:.
x iferente.
....
.~.·•.-
•- •·•
29
►
.--
.......r... _ - -•
\ 30
32
t d d
a o os o s que te prece eram; 0 mes mo aconte .
. eus antepas · -id
e · ( os.
. d
qu e so b revierem e pois d e ti. O Uni ve rso cera t.
a todo
s os
d . b . es a ama rréldo a
um enca eamen to mqu e rave1 e tota lmente inalterá I d
deixando~se a rra s tar por e1as" 2Jo. ve e c-ius<1 s,
ate supenor aos deu ses 233 . In sensível aos golpes da Fortuna,
concentra tôdas as fôrças menta is em si próprio, tal como Júpiter
nos intervalos periódicos entre du as criações; no fundo, é um
grande solitário, condenado que está a monologar consigo em
vez de poder entrar num diálogo amoroso com o Outro 2.1 •1• Pode
ser que tudo lhe contrarie ou lhe seja hostil, êle se pertence a
si próprio: suus est 235 , sendo capaz de defender sua autonomia
contra todos e tudo. Em última análise, pode recorrer delihe-
radamente à morte vo1untária 236 , sôbre a qual o Destino cessa de
exercer seu domínio. A morte é ou o fim de tudo , ou então --
para o sábio ,. . . . . o início de uma vida melhor23 7 .
Estas poucas linhas foram suficientes para mostrar como são
consideráveis as diferen ças entre o id eal da sabedoria estóica
e o da santidade cristã. As convergências são mais apa:en~es
do que reais, visto serem fragmentos de duas mundi videncias
completamente diferentes : isolá-los do seu contexto seria violenta'.
. a e ta
os fatos. 239 O confronto mostrou ~nos também como Senec
longe da mentalidade modern a: n ele há pouco dinamis~o. pouc~
inquietude social, nada de profetismo, nada de confiança n
· l d. que sua
futuro da humanidade. O que não equiva e a izer •tor
ão de urn 1ei
o b ras e sua persona 1ida d e não mereçam a a enç t d ento
moderno. Tanto o homem como o autor constituem um ocum
impressionante da humanitas rom ana.
, , s apenas comparar
N o sso ass unto , pore m , era outro: quenamo ·tas outra
· - entre mUJ
d ua s menta 1id a des h istóricas. d uas pos1çoes ,......, ara encarar
que são poss íveis ..- qu e o espírito hum ano adotou P
s ua situaçã o no te mpo . ·d cornbi-
, ·co da v1 '1 , •
Em Sênec<1 n contrnmos grande sentimento tragi b iaguez roman-
nc1do com grande lucid ez intele tu a1; n~da d~ em :enos ]íri~º rnj;
tica, ou d e moleza e fe min a d a. Amor fatt gen uino .d Amerz-Lzed I'
18
tamb , m m nos for a do do que le mos no Ja -ttrl ,. , rta rnelartc 0 ·
Nie l·zsche; resignação viril, n ão d estitu ída d e uma ce
33
a\ n •r r- , ~ e, f
..V O ,_ l l) \ , .J . ~CQ. CO Q)~'-")r : :> ;:> .) ,
--