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AGENTE E ESCRIVÃO DA PF

Disciplina: Legislação Penal Especial


Prof. Silvio Maciel
Aula nº 16 de 17

MATERIAL DE APOIO - MONITORIA

Índice

1. Artigo Correlato
1.1 Definição de crime organizado e a convenção de Palermo
2. Jurisprudência Correlata
2.1 STJ – HC 77771 / SP
2.2 STJ – HC 41885 / RJ
3. Assista!!!
3.1 Gravação telefônica ou ambiental
4. Leia!!!
4.1 Crime organizado: que se entende por isso depois da Lei n. 10.217, de 11.04.01?
5. Simulados

1. ARTIGO CORRELATO

1.1 DEFINIÇÃO DE CRIME ORGANIZADO E A CONVENÇÃO DE PALERMO

Autor: Luiz Flávio Gomes; Doutor em Direito penal pela Universidade Complutense de Madri. Mestre
em Direito Penal pela USP. Diretor-Presidente da Rede de Ensino LFG. Co-coordenador dos cursos de
pós-graduação da Rede de Ensino LFG. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a
1998) e Advogado (1999 a 2001).

Publicação: Maio de 2009

Até hoje não temos, no Brasil, uma lei que defina (texto legal explicativo) o conceito (a ideia) de crime
organizado. Há uma corrente doutrinária que vem procurando se valer, para isso, da definição dada
pela Convenção de Palermo (sobre criminalidade transnacional), que é a seguinte: " (...) grupo
estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o
propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na Convenção, com a intenção de
obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material".

Apesar de ser um procedimento totalmente inconstitucional, o STJ, Quinta Turma, no HC 77.771-SP,


rel. Min. Laurita Vaz, j. 30.05.08, acabou aceitando tal definição, para uso no Direito penal interno
brasileiro: "HABEAS CORPUS. LAVAGEM DE DINHEIRO. INCISO VII DO ART. 1.º DA LEI N.º 9.613/98.
APLICABILIDADE. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. CONVENÇÃO DE PALERMO APROVADA PELO DECRETO
LEGISLATIVO N.º 231, DE 29 DE MAIO DE 2003 E PROMULGADA PELO DECRETO N.º 5.015, DE 12 DE
MARÇO DE 2004. AÇÃO PENAL. TRANCAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS
SUFICIENTES PARA A PERSECUÇÃO PENAL.

1. Hipótese em que a denúncia descreve a existência de organização criminosa que se valia da


estrutura de entidade religiosa e empresas vinculadas, para arrecadar vultosos valores, ludibriando
fiéis mediante variadas fraudes – mormente estelionatos –, desviando os numerários oferecidos para
determinadas finalidades ligadas à Igreja em proveito próprio e de terceiros, além de

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pretensamente lucrar na condução das diversas empresas citadas, algumas por meio de "testas-de-
ferro", desvirtuando suas atividades eminentemente assistenciais, aplicando seguidos golpes.

2. Capitulação da conduta no inciso VII do art. 1.º da Lei n.º 9.613/98, que não requer nenhum crime
antecedente específico para efeito da configuração do crime de lavagem de dinheiro, bastando que
seja praticado por organização criminosa, sendo esta disciplinada no art. 1.º da Lei n.º 9.034/95, com
a redação dada pela Lei n.º 10.217/2001, c.c. o Decreto Legislativo n.° 231, de 29 de maio de 2003,
que ratificou a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, promulgada
pelo Decreto n.º 5.015, de 12 de março de 2004. Precedente".

De três vícios padece o posicionamento do STJ que acaba de ser transcrito:

1º) a definição de crime organizado contida na Convenção de Palermo é muito ampla, genérica, e viola
a garantia da taxatividade (ou de certeza), que é uma das garantias emanadas do princípio da
legalidade;

2º) a definição dada, caso seja superada a primeira censura acima exposta, vale para nossas relações
com o direito internacional, não com o direito interno; de outro lado, é da essência dessa definição a
natureza transnacional do delito (logo, delito interno, ainda que organizado, não se encaixa nessa
definição). Note-se que a Convenção exige "(...) grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente
há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações
graves ou enunciadas na Convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício
econômico ou outro benefício material". Todas as infrações enunciadas na Convenção versam sobre a
criminalidade transnacional. Logo, não é qualquer criminalidade organizada que se encaixa nessa
definição. Sem a singularidade da transnacionalidade não há que se falar em adequação típica, do
ponto de vista formal;

3º) definições dadas pelas convenções ou tratados internacionais jamais valem para reger nossas
relações com o Direito penal interno em razão da exigência do princípio da democracia (ou garantia da
lex populi).

Vejamos: quando se trata das relações do indivíduo com organismos internacionais (com o Tribunal
Penal Internacional, v.g.), os tratados e convenções constituem as diretas fontes desse Direito penal,
ou seja, eles definem os crimes e as penas. É o que foi feito, por exemplo, no Tratado de Roma (que
criou o TPI). Nele acham-se contemplados os crimes internacionais (crimes de guerra, contra a
humanidade etc.) e suas respectivas sanções penais. Como se trata de um ius puniendi que pertence
ao TPI (organismo supranacional), a única fonte (direta) desse Direito penal só pode mesmo ser um
Tratado internacional. Quem produz esse específico Direito penal são os Estados soberanos que
subscrevem e ratificam o respectivo tratado.

Cuidando-se do Direito penal interno (relações do indivíduo com o ius puniendi do Estado brasileiro)
tais tratados e convenções não podem servir de fonte do Direito penal incriminador, ou seja, nenhum
documento internacional, em matéria de definição de crimes e penas, pode ser fonte normativa direta
válida para o Direito interno brasileiro. O Tratado de Palermo (que definiu o crime organizado
transnacional), por exemplo, não possui valor normativo suficiente para delimitar internamente o
conceito de organização criminosa (até hoje inexistente no nosso país).

Fundamento: o que acaba de ser dito fundamenta-se no seguinte: quem tem poder para celebrar
tratados e convenções é o Presidente da República (Poder Executivo) (CF, art. 84, VIII), mas sua
vontade (unilateral) não produz nenhum efeito jurídico enquanto o Congresso Nacional não aprovar
(referendar) definitivamente o documento internacional (CF, art. 49, I). O Parlamento brasileiro, de
qualquer modo, não pode alterar o conteúdo daquilo que foi subscrito pelo Presidente da República
(em outras palavras: não pode alterar o conteúdo do Tratado ou da Convenção). O que resulta
aprovado, por decreto legislativo, não é fruto ou expressão das discussões parlamentares, que não
contam com poderes para alterar o conteúdo do que foi celebrado pelo Presidente da República. Uma
vez referendado o Tratado, cabe ao Presidente do Senado Federal a promulgação do texto (CF, art.
57, § 5º), que será publicado no Diário Oficial. Mas isso não significa que o Tratado já possua

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valor interno. Depois de aprovado ele deve ser ratificado (pelo Executivo). Essa ratificação se dá pelo
Chefe do Poder Executivo que expede um decreto de execução (interna), que é publicado no Diário
Oficial. É só a partir dessa publicação que o texto ganha força jurídica interna. [01]

Conclusão: os tratados e convenções configuram fontes diretas (imediatas) do Direito internacional


penal (relações do indivíduo com o ius puniendi internacional, que pertence a organismos
internacionais – TPI, v.g.), mas jamais podem servir de base normativa para o Direito penal interno
(que cuida das relações do indivíduo com o ius puniendi do Estado brasileiro), porque o parlamento
brasileiro, neste caso, só tem o poder de referendar (não o de criar a norma). A dimensão democrática
do princípio da legalidade em matéria penal incriminatória exige que o parlamento brasileiro discuta e
crie a norma. Isso não é a mesma coisa que referendar. Referendar não é criar ex novo.

Notas

Cf. MAZZUOLI, Valério de Oliveira, Curso de Direito Internacional Público, 2. ed., São Paulo: RT, 2007,
p. 291 e ss.

Fonte: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=12957

2. JURISPRUDÊNCIA CORRELATA

2.1 STJ – HC 77771 / SP

HABEAS CORPUS
Relator: Ministra LAURITA VAZ
Órgão Julgador: QUINTA TURMA
Julgamento: 22/09/2008

Ementa: HABEAS CORPUS. LAVAGEM DE DINHEIRO. INCISO VII DO ART. 1.º DA LEI N.º 9.613/98.
APLICABILIDADE. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. CONVENÇÃO DE PALERMO APROVADA PELO DECRETO
LEGISLATIVO N.º 231, DE 29 DE MAIO DE 2003 E PROMULGADA PELO DECRETO N.º 5.015, DE 12 DE
MARÇO DE 2004. AÇÃO PENAL. TRANCAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS
SUFICIENTES PARA A PERSECUÇÃO PENAL. 1. Hipótese em que a denúncia descreve a existência de
organização criminosa que se valia da estrutura de entidade religiosa e empresas vinculadas, para
arrecadar vultosos valores, ludibriando fiéis mediante variadas fraudes – mormente estelionatos –,
desviando os numerários oferecidos para determinadas finalidades ligadas à Igreja em proveito
próprio e de terceiros, além de pretensamente lucrar na condução das diversas empresas citadas,
algumas por meio de “testas-de-ferro”, desvirtuando suas atividades eminentemente assistenciais,
aplicando seguidos golpes. 2. Capitulação da conduta no inciso VII do art. 1.º da Lei n.º 9.613/98,
que não requer nenhum crime antecedente específico para efeito da configuração do crime de
lavagem de dinheiro, bastando que seja praticado por organização criminosa, sendo esta disciplinada
no art. 1.º da Lei n.º 9.034/95, com a redação dada pela Lei n.º 10.217/2001, c.c. o Decreto
Legislativo n.° 231, de 29 de maio de 2003, que ratificou a Convenção das Nações Unidas contra o
Crime Organizado Transnacional, promulgada pelo Decreto n.º 5.015, de 12 de março de 2004.
Precedente. 3. O recebimento da denúncia, que se traduz em mera admissibilidade da acusação
diante da existência de sérios indícios de autoria e materialidade, mostra-se adequado, inexistindo a
alegada inépcia, porquanto preenchidos todos seus pressupostos legais. 4. Nesta fase inaugural da
persecução criminal, não é exigível, tampouco viável dentro do nosso sistema processual penal, a
demonstração cabal de provas contundentes pela acusação. Esse grau de certeza é reservado para a
prolação do juízo de mérito. Este sim deve estar calcado em bases sólidas, para eventual condenação.
5. Mostra-se, portanto, prematuro e temerário o acolhimento do pedido da defesa de trancamento da
ação penal, de maneira sumária, retirando do Estado, de antemão, o direito e, sobretudo, o dever de
investigar e processar, quando há elementos mínimos necessários para a persecução criminal. 6.
Ordem denegada.

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2.2 STJ - HC 41885 / RJ

HABEAS CORPUS
Relator: Ministro PAULO MEDINA
Órgão Julgador: SEXTA TURMA
Julgamento: 18/08/2005

Ementa: PROCESSUAL PENAL - HABEAS CORPUS - INSTRUÇÃO CRIMINAL - EXCESSO DE PRAZO


JUSTIFICADO - PROCESSO COMPLEXO - PLURALIDADE DE RÉUS E DE CRIMES - ENVOLVIMENTO DE
POLICIAIS MILITARES COM O CRIME ORGANIZADO - CRIMES HEDIONDOS - PRINCÍPIO DA
RAZOABILIDADE – CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO DEMONSTRADO - ORDEM DENEGADA. Excesso
de prazo que não configura constrangimento ilegal, eis que se tratam de mais de vinte e um acusados
em crimes diversos, onde se incluem a associação para o tráfico, o tráfico ilícito de entorpecentes
conexos a homicídios, cometidos por policiais militares envolvidos em crime organizado. O lapso
temporal para conclusão do processo criminal submete-se ao princípio da razoabilidade, não
constituindo uma simples soma dos prazos processuais. As características do feito conferem
razoabilidade à demora na formação da culpa, de modo a afastar, na hipótese, o alegado
constrangimento ilegal. ORDEM DENEGADA.

3. ASSISTA!!!

3.1. GRAVAÇÃO TELEFÔNICA OU AMBIENTAL (ASSISTA: 01'07'' - LUIZ FLÁVIO GOMES)

Fonte: http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20090409114825522

4. LEIA !!!

4.1 CRIME ORGANIZADO: QUE SE ENTENDE POR ISSO DEPOIS DA LEI N. 10.217, DE 11.04.01?

Autores: Luiz Flávio Gomes;


Data: 18/04/2003

A única lei que regia o crime organizado no Brasil, até pouco tempo, era a de n. 9.034/95. Em abril de
2001 ingressou no nosso ordenamento jurídico um novo texto legislativo (Lei 10.217/01), que modificou
os artigos 1º e 2º. A partir dessa lei, são três fenômenos absolutamente distintos: a quadrilha ou bando,
as associações criminosas e as organizações criminosas. As duas primeiras já estão conceituadas no
nosso Direito. Ninguém sabe o que é organização criminosa. Logo, grande parte da Lei 9.034/95 perdeu
eficácia.

QUESTIONÁRIO

1. Quais leis disciplinam o crime organizado no Brasil?

2. Perderam a eficácia vários dispositivos da Lei 9.034/95?

3. Existe em alguma parte do nosso ordenamento jurídico a definição de organização criminosa?

4. Qual é o conteúdo atual do conceito de "crime organizado"?

5. Não seria o caso de interpretação extensiva ou de aplicação analógica?

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6. Seria possível a integração do conceito de "organização criminosa" pelo Direito internacional?

7. Qual é hoje o âmbito de incidência da 9.034/95? Que se entende por quadrilha ou bando ou associação
criminosa "de qualquer tipo"?

8. As contravenções penais entram no conceito de crime organizado?

9. Que se entende por ilícitos decorrentes de ações praticadas por quadrilha ou bando ou organizações ou
associações criminosas?

10. Quando a lei fala em ações, estão compreendidas as omissões também?

11. Quais são as finalidades da Lei 9.034/95?

12. O crime organizado no Brasil constitui um "particularismo jurídico"?

13. Quais são as características criminológicas da organização criminosa?

14. Pode o juiz substituir o legislador na conceituação da organização criminosa?

1. Quais leis disciplinam o crime organizado no Brasil?

A única lei que regia o crime organizado no Brasil, até pouco tempo, era a de n. 9.034/95. Em abril de
2001 ingressou no nosso ordenamento jurídico um novo texto legislativo (Lei 10.217/01), que modificou
os artigos 1º e 2º do diploma legal acima citado, além de contemplar dois novos institutos investigativos:
interceptação ambiental e infiltração policial.

Nosso legislador, sem ter a mínima idéia dos (geralmente nefastos) efeitos colaterais de toda sua (intensa
e confusa) produção legislativa, talvez jamais tenha imaginado que, com o novo texto legal, como
veremos logo a seguir, estaria eliminando a eficácia de inúmeros dispositivos legais contidos na Lei
9.034/95.

Dentre eles (arts. 2º, II, 4º, 5º, 6º, 7º e 10º) acha-se o art. 7º, que proíbe a liberdade provisória "aos
agentes que tenham tido intensa e efetiva participação na organização criminosa".

Na esteira desse último diploma legal (que, doravante, já não poderá ter aplicação), a jurisprudência
vinha decidindo:

STJ - HABEAS CORPUS Nº 15.305 - RS (2000/0138747-2) (DJU 13.08.01, SEÇÃO 1, P. 288, J. 06.03.01)

RELATOR: MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO

IMPETRANTE: IVAN PARETA E OUTRO

IMPETRADO: JUIZ PRESIDENTE DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

PACIENTE: LUIZ CARLOS SCHNARNDORF RIBEIRO (PRESO)

PACIENTE: PEDRO OLIMAR ALMADA PIRES (PRESO)

EMENTA

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. ARTIGO 7º DA


LEI Nº 9.034/95. LIBERDADE PROVISÓRIA. INSUSCETIBILIDADE ÀQUELES QUE TENHAM TIDO EFETIVA E
INTENSA PARTICIPAÇÃO NAS CONDUTAS DELITIVAS. GARANTIA DE APLICAÇÃO DA LEI PENAL.
POSSIBILIDADE REAL DE FUGA DO PACIENTE PARA O EXTERIOR. CONCESSÃO DE FIANÇA.
IMPOSSIBILIDADE. EXCESSO DE PRAZO NA FORMAÇÃO DA CULPA. NÃO CARACTERIZAÇÃO.

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1. A vedação à liberdade provisória prevista no artigo 7º da Lei 9.034/95 constitui instrumental de que
dispõe o Estado para desarticular a organização criminosa. Trata-se, pois, de mecanismo político-jurídico
apto a combater a sofisticação e a ousadia do grupo, privando, ad cautelam, a liberdade daqueles que
nela tenham tido intensa e efetiva participação, preservando, por conseguinte, a ordem pública.

2. Caracterizada a intensa e efetiva participação dos agentes na organização criminosa - tendo-os como
responsáveis pelo transporte de mercadorias que ingressavam no território nacional sem a devida
fiscalização da autoridade competente, valendo-se de informações privilegiadas e, em contraprestação,
oferecendo vantagem indevida a agentes públicos -, há de se preservá-los sob custódia preventiva.

3. A real possibilidade de fuga para o exterior em face da existência de vultoso fluxo financeiro dos
agentes no Uruguai constitui óbice à concessão de liberdade provisória, tendo em vista a garantia da
aplicação da lei penal. Nessa hipótese, presta-se confiabilidade ao juízo da causa, máxime porque,
presidindo a ação penal, tem-se-no como órgão mais sensível às vicissitudes do processo.

4. Não será concedida fiança quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão
preventiva (artigo 324, inciso IV, do Código de Processo Penal). 5. Não correm os prazos se há força
maior ou obstáculo judicial oposto pela parte contrária (artigo 798, parágrafo 4º, do Código de Processo
Penal).

6. "Não constitui constrangimento ilegal o excesso de prazo na instrução, provocado pela defesa."
(Súmula do STJ, Enunciado nº 64).

7. Ordem denegada.

2. Perderam a eficácia vários dispositivos da Lei 9.034/95?

Com o advento da Lei 10.217/01 e tendo em vista o princípio da legalidade estrita, impõe-se aos juízes e
tribunais, que vinham dando certa efetividade a muitos dos dispositivos legais contemplados na Lei
9.034/95, revisarem seu anterior posicionamento em relação aos vários dispositivos legais mencionados.
Mais precisamente, todos que têm como base comum as organizações criminosas.

Todos perderam eficácia, após a referida lei, porque não se sabe (e tampouco agora existe qualquer
margem para uma possível interpretação construtiva), no ordenamento jurídico brasileiro, o que se
entende por organização criminosa. Vejamos:

A Lei 9.034/95, que dispõe "sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de
ações praticadas por organizações criminosas", não definiu o que se deve compreender por "organizações
criminosas". Foi feita para cuidar desse assunto, mas juridicamente continuamos sem saber do que se
trata.

Dir-se-ia que ficou por conta do intérprete e do juiz a tarefa de descobrir o real âmbito de incidência da
lei. Ocorre que definições como as que estão em destaque (crime organizado, organização criminosa)
constituem tarefa exclusiva do legislador, por força do princípio da legalidade (ou da reserva legal). E
nada mais inseguro que deixar sob a responsabilidade de cada juiz a incumbência de dar a moldura do
tipo penal. O princípio da anterioridade da lei criminal (não há crime sem lei anterior que o defina) obriga
que a lei (clara e inequívoca) delimite o âmbito do proibido previamente (leia-se: antes do cometimento
do fato). Sem lei prévia é impossível a incidência de qualquer medida restritiva dos direitos e liberdades
fundamentais.

Gimbernat Ordeig, em seu livro Conceito e método da ciência do Direito penal (trad. de J.C. Pagliuca; ver.
de L.F.Gomes, São Paulo: RT, 2002, no prelo) bem salienta o fundamento do princípio da legalidade: "fato
é que a comunidade, para proteger interesses jurídicos de suma importância, pode restringir a liberdade
do indivíduo; porém, esta intervenção é de uma transcendência tal que o cidadão pode exigir que lhe
digam, com clareza, quais são os comportamentos motivadores de uma reação estatal tão radical; pode
exigir que lhe seja garantido que não sucederá, de uma hora para outra, encontrar-se

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surpreendido com o fato de o Estado lhe privar de bens tão fundamentais como a liberdade, a honra, os
empregos e cargos públicos, que tiver o sujeito, por ações a respeito das quais não lhe informaram antes
de cometê-las que eram proibidas".

Em suma: é caso de perda de eficácia jurídica (por não sabermos o que se entende por organização
criminosa), não de revogação ou derrogação (perda de vigência). Parece muito útil aqui recordar alguns
conceitos: vigência, vigor, validade, eficácia jurídica, eficácia social e legitimidade da lei.

Vigência significa a existência (formal) de uma norma em determinada época, que é posta no mundo
jurídico para regular (com pretensão de obrigatoriedade) relações sociais aqui e agora (hic et nunc); vigor
é a qualidade do preceito normativo que revela sua força vinculante, ainda que a norma perca sua
vigência (muitas vezes, apesar da parda da vigência de uma lei, ela continua em vigor, leia-se, continua
produzindo efeitos para fatos ocorridos antes da revogação); validade consiste na coerência (vertical) da
lei com a Constituição; eficácia jurídica vem a ser a qualidade da lei vigente de produzir efeitos jurídicos
concretos e imediatos (o que pressupõe preenchidas todas as condições técnicas de aplicação); eficácia
social relaciona-se com o fato de se saber se os destinatários estão se motivando (se ajustando) aos
comandos normativos do texto legal; legitimidade diz respeito à correspondência do texto legal com os
fundamentos éticos e axiológicos de cada momento histórico[1].

Reitere-se: todos os textos legais que fazem referência à organização criminosa não contam com eficácia
jurídica, leia-se, não produzem efeitos jurídicos concretos e imediatos (não podem ser aplicados) porque
não preenchidas todas as condições técnicas de sua aplicação. No dia em que o legislador revelar
(juridicamente) o conteúdo desse conceito vago e poroso, tais dispositivos legais voltam a ter (ou terão)
eficácia jurídica plena.

Por ora continuam vigentes, mas não podem ser aplicados porque não são auto-executáveis (self-
executing; self-enforcing; self-acting), leia-se, ostentam eficácia jurídica limitada ou restrita ou contida
(são normas, em outras palavras, não auto-executáveis - not self-executing; not self-enforcing; not self-
acting).

Com base na redação original do artigo art. 1º da Lei 9.034/95 ("Esta Lei define e regula meios de prova
e procedimentos investigatórios que versarem sobre crime resultante de ações de quadrilha ou bando")
chegamos a sustentar que, numa interpretação construtiva (mas bastante questionável, como
reconhecíamos), o correto âmbito de incidência da lei em destaque estaria constituído pelas organizações
criminosas, de cuja composição fariam parte os dados típicos do delito previsto no art. 288 do CP
(quadrilha ou bando, que era mencionado no art. 1º primitivo) mais alguns requisitos extras
(organização, planejamento, hierarquia do grupo etc.) (cf. Gomes, Luiz Flávio e Cervini, Raúl, Crime
organizado, 2ª ed., São Paulo: RT, 1997, p. 89 e ss.).

Com a edição da Lei 10.217, de 11.04.01 (DOU de 12.04.01), o cenário é completamente diverso. A
interpretação que acaba de ser referida perdeu toda sua sustentação normativa, porque agora a lei nova
distingue com clareza insuspeitável a quadrilha ou bando das associações criminosas assim como das
organizações criminosas (são três coisas distintas).

O Art. 1º citado, com efeito, passou a ter a seguinte redação: "Esta Lei define e regula meios de prova e
procedimentos investigatórios que versem sobre ilícitos decorrentes de ações praticadas por quadrilha ou
bando ou organizações ou associações criminosas de qualquer tipo".

Observe-se que antes a lei só mencionava "crime resultante de ações de quadrilha ou bando"; agora fala
em "ações praticadas por quadrilha ou bando ou organizações ou associações criminosas de qualquer
tipo".

O texto anterior permitia, no mínimo, tríplice interpretação: (a) a lei só vale para crime resultante de
quadrilha ou bando; (b) a lei vale para o delito de quadrilha ou bando mais o crime daí resultante
(concurso material); [2] (c) a lei só vale para crime resultante de organização criminosa (que não se
confunde com o art. 288) (era a nossa interpretação, como já enfatizamos).

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Pelo texto atual a lei incide nos ilícitos decorrentes de: (a) quadrilha ou bando; (b) organização criminosa;
(c) associação criminosa.

Como se percebe, com o advento da Lei 10.217/01, estão perfeitamente delineados três conteúdos
diversos: organização criminosa (que está enunciada na lei, mas não tipificada no nosso ordenamento
jurídico), associação criminosa (ex.: Lei de Tóxicos, art. 14; art. 18, III; Lei 2.889/56, art. 2º: associação
para prática de genocídio) e quadrilha ou bando (CP, art. 288).

Quadrilha ou bando sabemos o que é (CP, art. 288); associações criminosas (ex.: Lei de Tóxicos, art. 14;
art. 18, III; Lei 2.889/56, art. 2º) sabemos o que é. Agora, que se entende por organização criminosa?

3. Existe em alguma parte do nosso ordenamento jurídico a definição de organização criminosa?

O conceito de organização, entre nós, é vago, totalmente aberto, absolutamente poroso. Considerando-se
que (diferentemente do que ocorria antes) o legislador não ofereceu nem sequer a descrição típica
mínima do fenômeno, só nos resta concluir que, nesse ponto, a lei (9.034/95) passou a ser letra morta.
Organização criminosa, portanto, hoje, no ordenamento jurídico brasileiro, é uma alma (uma enunciação
abstrata) em busca de um corpo (de um conteúdo normativo, que atenda o princípio da legalidade).

Se as leis do crime organizado no Brasil (Lei 9.034/95 e Lei 10.217/01), que existem para definir o que se
entende por organização criminosa, não nos explicam o que é isso, não cabe outra conclusão: desde
12.04.01 perderam eficácia todos os dispositivos legais fundados nesse conceito que ninguém sabe
(juridicamente) o que é. São eles: arts. 2º, inc. II (flagrante prorrogado), 4º (organização da polícia
judiciária), 5º (identificação criminal), 6º (delação premiada), 7º (proibição de liberdade provisória) e 10º
(progressão de regime) da Lei 9.034/95, que só se aplicam para as (por ora, indecifráveis) "organizações
criminosas".

É caso de perda de eficácia (por não sabermos o que se entende por organização criminosa), não de
revogação (perda de vigência). No dia em que o legislador revelar o conteúdo desse conceito vago, tais
dispositivos legais voltarão a ter eficácia. Por ora continuam vigentes, mas não podem ser aplicados.

4. Qual é o conteúdo atual do conceito de "crime organizado"?

Diante do que foi exposto até aqui indaga-se: hoje, que devemos entender por crime organizado no
Brasil?

Na nossa visão, o conceito de crime organizado agora envolve:

(a) a quadrilha ou bando (288), que claramente (com a Lei 10.217/01) recebeu o rótulo de crime
organizado, embora seja fenômeno completamente distinto do verdadeiro crime organizado;

(b) as associações criminosas já tipificadas no nosso ordenamento jurídico (art. 14 da Lei de Tóxicos, art.
2º da Lei 2.889/56 v.g.) assim como todas as que porventura vierem a sê-lo e

(c) todos os ilícitos delas decorrentes ("delas" significa: da quadrilha ou bando assim como das
associações criminosas definidas em lei).

Referido conceito, em conseqüência, de outro lado e juridicamente falando, não abrange:

(a) a "organização criminosa", por falta de definição legal;

(b) os "grupos" criminosos referidos por exemplo na Lei 10.409/02 (pela mesma razão);

(c) o concurso de pessoas (os requisitos da estabilidade e permanência levam à conclusão de que
associação criminosa ou quadrilha ou bando jamais podem ser confundidos com o mero concurso de
pessoas (que é sempre eventual e momentâneo).

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5. Não seria o caso de interpretação extensiva ou de aplicação analógica?

A Lei 9.034/95 tem cunho predominantemente processual. Enfocada como lei processual, não seria o caso
de se admitir interpretação extensiva ou aplicação analógica (CPP, art. 3º), estendendo-se o conceito de
quadrilha ou bando ou mesmo associação para as organizações criminosas ?

A resposta é negativa. O disposto no art. 3º do CPP só é válido para leis de conteúdo genuinamente
processual. Onde o CPP fala em denúncia pode-se também ler queixa; onde fala de prazo para
oferecimento da primeira pode-se estender para a segunda etc.

A lei processual deixa de ter caráter cristalinamente processual, dentre outras, em duas hipóteses: (a)
quando reflete diretamente no ius libertatis (lei que versa sobre regime de cumprimento de pena, sobre
fiança, liberdade provisória sem fiança etc.); (b) quando sua eficácia é dependente de um conceito de
Direito penal: é o que se passa justamente com todos os dispositivos legais da Lei 9.034/95 que fazem
expressa referência às organizações criminosas. São leis processuais (em geral), mas ao se referirem
explicitamente às organizações criminosas deixam de ter eficácia, por ora, por falta de um conteúdo
normativo para esse conceito.

Ler organização criminosa onde está escrito associação criminosa ou quadrilha ou bando seria uma
hipótese clara de analogia (contra o réu), não de interpretação analógica. Sobre a diferença entre elas
Gimbernat Ordeig (Conceito e método da ciência do Direito penal, trad. de J.C.Pagliuca, revisão de
L.F.Gomes, São Paulo: RT, 2002, no prelo) proclama:

"É perfeitamente possível distinguir aplicação analógica e analogia. E a delimitação entre ambas se
efetua, efetivamente, quando se pensa no 'sentido literal possível'. A interpretação analógica trata de
determinar o que diz o Direito penal em relação a uma questão duvidosa quando recorre à comparação de
outras figuras delituosas ou instituições penais similares. A interpretação analógica pode estender (como
o caso do conceito 'moradia' do art. 490 (hoje art. 202) ou a restringir (como no caso de roubo com
homicídio) o comportamento punível. Mas, tanto restringindo como estendendo, deve manter-se sempre
dentro do marco do 'sentido literal possível'. Assim sendo, este tipo de interpretação não viola o princípio
da legalidade.

A analogia (proibida), ao contrário, viola dito princípio: pois, também sobre a base da comparação de
figuras penais similares, chega-se a um resultado que excede os limites impostos pela letra da lei".

6. Seria possível a integração do conceito de "organização criminosa" pelo Direito internacional?

Outro caminho possível para se admitir a presença no nosso direito do conceito de organização criminosa
seria o do direito internacional. Sabemos que recentemente (final do ano 2000) dezenas de países
(incluindo o Brasil) assinaram a Convenção da ONU sobre Delinqüência Organizada Transnacional (cf. o
seu teor no site www.ibccrim.com.br). É verdade que o art. 2º da Convenção (cf. anexo) procura definir o
que se entende por crime organizado (mais de três pessoas, estabilidade, intenção de cometer crime
graves, intuito econômico). Crime grave é o punido com pena igual ou superior a quatro anos (no
máximo); a organização é transnacional quando envolve mais de um país (art. 3º) etc.

Mas há obstáculos intransponíveis para se admitir essa via integradora: (a) a Convenção da ONU ainda
não foi ratificada pelo Congresso brasileiro, portanto, não conta com existência jurídica no Brasil; (b) ela
cuida exclusivamente da organização criminosa transnacional (nada disciplinando sobre as nacionais).

Em conclusão:

(a) impossível aplicar, por ora, todos os dispositivos legais contidos na Lei 9.034/95 que foram idealizados
para terem incidência em relação às organizações criminosas (arts. 2º, II, 4º, 5º, 6º, 7º e 10º);

(b) os demais dispositivos da Lei 9.034/95 continuam vigentes e com eficácia, podendo ser aplicados sem
nenhum problema.

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7. Qual é hoje o âmbito de incidência da 9.034/95? Que se entende por quadrilha ou bando ou associação
criminosa "de qualquer tipo"?

O texto legal novo (art. 1º) diz mais: quadrilha ou bando ou associação criminosa de qualquer tipo. Que é
isso? Associação mafiosa ou não, violenta ou fraudulenta. Recorde-se que dentre tantas tipologias
mencionadas pela literatura especializada, merecem destaque: (a) há o crime organizado
predominantemente violento (roubo de cargas, v.g.), (b) há o crime organizado predominantemente
fraudulento (macrodelinqüência econômica, p.ex.) e (c) há também o crime organizado mafioso (máfia,
camorra etc.). Não importa o tipo de quadrilha ou bando ou de associação criminosa (já contemplada na
lei). Todas constituem objeto de incidência do novo art. 1º da Lei 9.034/95.

8. As contravenções penais entram no conceito de crime organizado?

De outra parte, antes a lei falava em crime resultante de quadrilha ou bando; agora em "ilícitos". Indaga-
se: aplica-se então também para as contravenções penais? Não, porque a quadrilha ou bando só existe
para a prática de "crimes" (CP, art. 288); o art. 14 da Lei de Tóxicos só existe para o cometimento dos
crimes previstos nos arts. 12 e 13; o art. 2º da Lei 2.889/56 só existe para a prática de genocídio. Se um
dia criarem um tipo penal de associação para a prática de contravenções, sim. Por ora, não vale a lei para
as contravenções penais.

9. Que se entende por ilícitos decorrentes de ações praticadas por quadrilha ou bando ou organizações ou
associações criminosas?

Isso significa, segundo nosso juízo, que o art. 1º da Lei 9.034/95 aplica-se tanto para a própria quadrilha
ou bando (até porque, o primeiro delito que decorre da ação praticada por quadrilha ou bando é o descrito
no art. 288 do CP), como para ilícitos decorrentes dela; aplica-se para as associações criminosas (art. 14,
v.g.), assim como delitos decorrentes dela. Ex.: tráfico de entorpecentes.

Exemplo: ao delito de tráfico de entorpecentes, portanto, considerado isoladamente, não se aplica a Lei
9.034/95 (cf. neste site o artigo Nova lei de tóxicosI); se decorrente de associação (art. 14) sim. Ao delito
de roubo não se aplica a citada lei; se se trata de roubo decorrente de quadrilha ou bando sim.

10. Quando a lei fala em ações, estão compreendidas as omissões também?

Considere-se ademais que a lei cuida de ilícitos decorrentes de "ações" praticadas por quadrilha ou bando
etc.; "ações", não de omissões.

11. Quais são as finalidades da Lei 9.034/95?

Aparentemente ela pretenderia definir e regular (tão-somente) "meios de prova" e "procedimentos


investigatórios". Na verdade, não é só isso: regula também prazo para a instrução criminal (art. 8º) e a
(inconstitucional) proibição de apelar em liberdade (art. 9º).

12. O crime organizado no Brasil constitui um "particularismo jurídico"?

No nosso ordenamento jurídico, em conclusão, o crime organizado [agora entendido como (a) quadrilha
ou bando, (b) associações criminosas definidas em lei e (c) ilícitos delas decorrentes] constitui um
particularismo jurídico (Sgubbi), isto é, conta com um estatuto jurídico próprio (específico ou ad hoc).
Permite meios de prova e de investigação próprios.

Em termos práticos, depois da Lei 10.217/01 temos o seguinte:

(a) a todos os crimes que acabam de ser mencionados (que entram, como vimos, no conceito de crime
organizado) poderemos, in thesi, aplicar: o art. 2º, inc. III (acesso a dados bancários, fiscais etc.), inc. IV
(interceptação ambiental), inc. V (infiltração policial), o art. 3º (juiz inquisidor, que o STF incorretamente
afirmou ser constitucional) e o art. 8º (prazo da instrução). Quanto ao art. 9º (proibição de apelar em
liberdade), em nosso entendimento, há que se ressaltar sua absoluta inconstitucionalidade:

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uma coisa é o duplo grau de jurisdição (assegurado na CADH, art. 8º, 2, "h") e outra completamente
distinta é a prisão cautelar. A decretação desta última jamais pode impedir a realização plena da garantia
do duplo grau no âmbito criminal.

(b) perderam eficácia (por se referirem exclusivamente às organizações criminosas, que ninguém sabe o
que é) os arts. 2º, II, 4º, 5º, 6º, 7º e 10º.

A conclusão "a" supra encontra apoio na redação atual do Art. 2º, que diz: "Em qualquer fase de [da]
persecução penal são permitidos, sem prejuízo dos já previstos em lei, os seguintes procedimentos de
investigação e formação de provas".

De notar-se que antes o art. 2º somente se aplicava para "ação praticada por organizações criminosas";
agora houve supressão dessa parte. Por isso é que o art. 2º, incisos III, IV e V têm aplicação imediata.

No caput do art. 2º o legislador eliminou a referência que fazia às organizações criminosas. Não a
proscreveu, entretanto, nos outros artigos (2º, II, 4º, 5º etc.).

O art. 2º, por isso mesmo, aplica-se para o que se entende (hoje) por crime organizado [(a) quadrilha ou
bando; (b) associações criminosas já tipificadas em lei; (c) crimes decorrentes delas], mas evidentemente
não incide nas organizações criminosas (por falta de definição legal).

13. Quais são as características criminológicas da organização criminosa?

A ciência criminológica, de qualquer modo, já conta com incontáveis estudos sobre as organizações
criminosas. Dentre tantas outras, são apontadas como suas características marcantes: hierarquia
estrutural, planejamento empresarial, claro objetivo de lucros, uso de meios tecnológicos avançados,
recrutamento de pessoas, divisão funcional de atividades, conexão estrutural ou funcional com o poder
público e/ou com o poder político, oferta de prestações sociais, divisão territorial das atividades, alto
poder de intimidação, alta capacitação para a fraude, conexão local, regional, nacional ou internacional
com outras organizações etc.

14.Pode o juiz substituir o legislador na conceituação da organização criminosa?

Ao legislador incumbe a tarefa urgente de definir, em lei, o que devemos entender por ela (aliás, no
"pacote" da segurança anunciado ontem, 29.01.02, pelo Governo, inclui-se um projeto para definir o que
se entende por crime organizado e organização criminosa). Enquanto isso não ocorrer, como vimos, boa
parte da Lei 9.034/95 passou a ser letra morta. A não ser que algum magistrado venha a usurpar a tarefa
do legislador e diga do que se trata. Mas até onde vão os limites da Constituição vigente, não se
vislumbra a mínima possibilidade de qualquer juiz desempenhar esse anômalo papel.

Fonte: http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20041008101145566

5. SIMULADOS

5.1 Com relação às ações praticadas por organizações criminosas, assinale a opção correta segundo a
legislação que rege a matéria.

a) Em caso de condenação, o réu pode apelar em liberdade.


b) Os condenados por crime decorrente de organização criminosa podem iniciar o cumprimento da pena
em regime aberto ou semiaberto.
c) A identificação criminal de pessoas envolvidas com a ação praticada por organizações criminosas não
será realizada se já houver identificação civil.
d) Se a autoridade policial estiver diante da realização do crime praticado por organização criminosa, pode
retardar a realização da prisão, sob o fundamento de aguardar o momento oportuno para tanto,
colhendo-se mais provas e informações.

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e) Independentemente de autorização judicial, o agente policial pode ingressar, como se fosse um
autêntico membro, em organizações criminosas de qualquer tipo, a fim de colher dados e provas para o
combate ao crime organizado.

5.2 A respeito do crime organizado e com base na legislação respectiva, assinale a opção correta.

a) O réu pode apelar em liberdade, se for primário e portador de bons antecedentes.


b) Os condenados por crime decorrente de organização criminosa iniciam o cumprimento da pena em
regime fechado.
c) O civilmente identificado não deve ser submetido a identificação criminal.
d) O participante de organização criminosa tem sua pena reduzida em um a dois terços, ainda que sua
colaboração não tenha sido espontânea.
e) Não se concede liberdade provisória, com ou sem fiança, a qualquer participante de organização
criminosa.

5.3 Considerando a Convenção das Nações Unidas contra o crime organizado transnacional, julgue os
seguintes itens.

I Grupo criminoso organizado é conceituado como o grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente
há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves
ou enunciadas na convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico
ou outro benefício material.

II A infração será considerada de caráter transnacional se for cometida em um só Estado, mas envolver a
participação de grupo criminoso organizado que pratique atividades criminosas em mais de um Estado.

III Os Estados-partes que aderiram à convenção cumprirão as obrigações dela decorrentes com respeito
aos princípios da igualdade soberana e da integridade territorial dos Estados, bem como da não ingerência
nos assuntos internos dos demais.

IV A convenção prevê a responsabilidade das pessoas jurídicas, respeitando-se o ordenamento jurídico de


cada Estado-parte, responsabilidade que poderá ser penal, civil ou administrativa e não obsta a
responsabilidade penal das pessoas físicas que tenham cometido as infrações.

Assinale a opção correta.

a) Apenas os itens I e III estão certos.


b) Apenas os itens I e IV estão certos.
c) Apenas os itens II e III estão certos.
d) Apenas os itens II e IV estão certos.
e) Todos os itens estão certos.

GABARITO:

5.1 – D
5.2 – B
5.3 – E

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