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COMUNICA ÃO

Uso do Viscosímetro Brookfield


em Determinações Reológicas
Carlos Alberto da Silveira

Resumo - Oviscosímetro Brookfield, frequentemente disponível em laboratórios de controle de qualidade,


pode ser usado com vantagens na caracterização reológica de fluídos Newtonianos enão-Newtonianos. A
atual disponibilidade de sistemas de medida operacionais amplia ainda mais sua faixa de utilização.
Énecessário, contudo, o uso de métodos de cálculo que transformam os resultados fornecidos diretamente
pelo aparelho em grandezas reológicas adequadas.

INTRODUÇÃO

oviscosímetro Brookfield é, sem dúvida, um dos instru- newtoniana


la
pseudoplástico
lb
mentos mais utilizados mundialmente na medida de visco-
sidade. Devido a seu custo, modesto em relação a outros
viscosímetros de velocidade variável, encontra grande apli-
cação nos laboratórios de controle de qualidade das indús-
trias químicas, alimentícias ede cosméticos, entre outras.
Apesar de sua relativa simpl icidade, este aparelho la lb
pode realizar estudos reológicos bastante avançados. Gra- dilatante fluido de Casson
ças à aplicação de técnicas de cálculo relativamente re-
centes [1,2,3]. é possível a determinação dos gradientes
de velocidade correspondentes a uma série de valores de
rotação N (rpm) e construir-se assim a curva viscosidade
(11) em função de y necessária à caracterização reológica
de um fluido. Neste tipo de gráfico, um fluido Newtoniano
apresentar-se-á como uma reta paralela ao eixo das abcis-
sas (fig. 1a), enquanto que um fluidonão-Newtoniano obe- a) variar a velocidade de rotação N de um sistema sensor,
decerá a um outro tipo de curva (fig. 1b, 1c e 1dI. b) determinar o gradiente de velocidade y= dv/dy corres-
Oviscosímetro Brookfield, além de seu custo relativa- pondente a esta rotação.
mente reduzido, oferece ainda uma série de vantagens, c) calcular a viscosidade correspondente.
como por exemplo: As técnicas descritas a seguir serão divididas, para
- Alta sensibilidade da mola sensora de torque (sobretu- maior facilidade de compreensão, em três categorias:
do nos modelos LVT e RVT); a) Estado Estacionário ("steady-state") com sensores de
- Disponibilidade de sistemas concêntricos opcionais, disco (também chamados de "standard");
além dos sistemas de disco "standard" fornecidos junto b) Estado Estacionário com sensores tipo cilindros concên-
com oaparelho; tricos;
- Os novos modelos digitais permitem o registro gráfico cl Relaxação de mola (com sensores de disco, somente).
de medidas esua apresentação direta, oque elimina o uso
de tabelas ecálculos de conversão. FUNDAMENTOS TEÓRICOS
De forma geral, o problema das determinações reológi-
cas utilizando o viscosímetro Brookfield consiste em uma 1: Estado Estacionário com sensores "standard" de disco:
série de técnicas que permitem: São os sensores que acompanham todo viscosímetro

Carlos Alberto da Silveira - Divisão Pesquisa Básica- Tintas Coral S/A



Polímeros: Ciência e Tecnologia - Nov/Dez-91 41
Brookfield. Teoricamente podem ser considerados como constante M do aparelho é válido somente para fluidos
um disco girando em torno de seu centro, imerso em um newtonianos. Como no sistema cilindrico yvaria dentro do
fluido infinito (isto é, o recipiente que o contém deve ser espaço anular entre os cilindros em função da distância ao
suficientemente grande para que suas paredes não interfi- eixo do sensor, a viscosidade de um fluido não-Newtonia-
ram na medida). Nestas condições, verifica-se [1] que o no também irá variar de acordo com esta distância. Neste
gradiente de velocidade corrigido para escoamento não- caso, é necessário introduzir uma correção que possibilite
Newtoniano é dado por: o cálculo de y na superfície do cilindro interno.
Y= 4. n. N/(60.K) (1) Esta correção é aplicada da seguinte forma:
onde K=fator de correção de gradiente de velocidade, da- Y=Ya/k' (9)
do por: e K' =(1- s2)/[n. (1- S2)] (10)
K= d In 'tI d In y= d In SI d In N (2) emque s=Ri/R e (11)
em que 't =tensão de cisalhamento, MPa (ou dinas/cm 2) e n=dlny/dln't=dlnN/dlnS (12)
S= leitura na escala do aparelho Se ofluido obedece à chamada 'lei das Potências"
Se ofluido em questão é Newtoniano, K= 1. y=k't n (13)
Caso disponhamos de valores de viscosidade apa- e n é uma constante, passível de ser calculada através
rente (isto é, aquela fornecida diretamente pelo apare- de regressão linear logarítmica dos dados de S e N. Se o
lho) etabelados em função da rotação N, Kpode ser cal- fluído em estudo for Newtoniano, n=1e K'=1.
culado por: Finalmente, tendo-se ofator de correção K' pode-se calcu-
K=[1 +d In11a/d In N]-' (3) lar a viscosidade corrigida 11 combinando-se as equações
Uma aproximação satisfatória de Ké dada por: 7 e 8:
K= [1 + (In11 ai+l - ln 11 ai)/(ln Ni+1 -In Ni)]" (4) 11=A.S/Y (14)
onde (N j, 111) e (N j +l' 11j +1) são dois pontos experimen- Novamente, o gráfico 10911 . logypara vários valores de
tais consecutivos, obtidos fazendo-se variar N conforme N servirá para caracterizar o comportamento reológico de
as velocidades disponíveis no aparelho (0,5 - 1,0 - 2,5 - 5 - fluidos.
10 - 20 - 50 -100 rpm, para omodelo RVT) e registrando-se
as viscosidades aparentes 11a indicadas pelo aparelho. 3: Relaxação de Mola com Sensores de Disco:
Como Ké calculado para cada intervalo [N j, Nj+1], admite- Esta técnica, descrita inicialmente por Patton [5] em
se que o último y será corrigido com o Kcalculado no in- 1966 e adaptada por Smith [6] em 1982, permite a exten-
tervalo anterior. são da faixa de gradientes de velocidade explorável pelo
As viscosidades corrigidas 11 serão obtidas apartir dos viscosímetro Brookfield até valores muito baixos (tipica-
11a por: mente da ordem de 0,01 S"). Esta faixa de valores interes-
11 =11a/k (5) sa aos fabricantes de revestimentos, pois está relaciona-
Os valores corrigidos 11 eysão levados aum gráfico log- da com importantes características reológicas de tintas
log, que servirá para a caracterização reológica do fluido (nivelamento, escorrimento e sedimentação). Este méto-
em estudo. do baseia-se na variação contínua da velocidade de rota-
Além do método acima exposto, descrito por Pierce (1), é ção do sensor provocada pela tensão da mola medidora
também empregado o método de Mitschka (2), que apesar de torque do aparelho, com o motor desligado. Em termos
de utilizar uma técnica matemática diferente, conduz a re- práticos, o operador gira manualmente o sensor até a po-
sultados próximos. sição, de máximo torque (100% na escala) e solta-o, ao
mesmo tempo que aciona um cronômetro (nos modelos di-
2: Estado Estacionário com Sensores Cilindros Concêntri- gitais, que são providos de saída analógica para registra-
cos: dor gráfico x-t, édispensada amedida de tempo). Enquan-
Apesar de o sistema de cilindros concêntricos para me- to a leitura Sda escala vai se deslocando com o tempo, a
didas de viscosidade poder ser descrito de forma bastante velocidade de rotação N (proporcional a dS/dt) também
aprofundada [3,4], podemos dizer, de forma simplificada, vai diminuindo gradualmente, tendendo a zero. Desta for-
que a viscosidade e o gradiente de velocidade são deter- ma, consegue-se obter velocidades de rotação baixíssi-
minados em tal sistema através das equações: mas, que convertidas a gradientes de velocidade dão va-
Ya =M. N (6) lores na faixa de 0,01 a 0,2 S" (para os sistemas de disco).
't=A. S (7) Existe, contudo, anecessidade de considerar a inércia dos
e11a ='tI Ya (8) sensores, que poderá causar um erro (sobretudo no início
onde M eA são constantes do aparelho, Sé ovalor liao da curva de relaxação).
na escala (geralmente em porcentagem do torque máximo No caso dos sistemas de disco, também deve-se calcu-
mensurável no aparelho) e 't é a tensão do cisalhamento lar o fator de correção Kpara cada ponto tomado na curva
(em MPa ou dinas/cm 2). A equação 8 nada mais é do que a de relaxação. Contudo, devido à relativa complexidade dos
equação de Newton da viscosidade. cálculos envolvidos, estes não serão descritos no presente
O cálculo do gradiente de velocidade Ya a partir da trabalho.

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Esta técnica também é aplicável aos sistemas de cilin- (newtoniana) corresponde ao valor constante do rótulo do
dros concêntricos. Énecessário, contudo, dispor-se de um produto. Deve-se ressaltar que, apesar de conhecer-se a
sistema adequado para medir precisamente baixas ten- priori a natureza newtoniana deste material. o procedi-
sões de cisalhamento, como por exemplo oAdaptador UL mento e os cálculos utilizados foram exatamente os mes-
da Brookfield. mos aplicados aos fluidos não-newtonianos.
3) A tinta látex testada mostrou uma queda acentuada
EXEMPLOS DE MEDIDAS REALIZADAS de viscosidade com o gradiente de velocidade, oque a ca-
As técnicas descritas neste trabalho foram aplicadas a racteriza como um fluido pseudoplástico. Podemos con-
diversos fluidos Newtonianos e não-Newtonianos, fixan- cluir também que o tratamento prévio adotado (diluição e
do-se atemperatura a25QC. Os cálculos necessários foram cisalhamento) praticamente eliminou o valor de escoa-
efetuados em microcomputador, através de programas es- mento ("Yield value") normalmente existente neste tipo de
critos em BASIC. Apresentamos a seguir duas curvas que produto. Isto favorece onivelamento após aaplicação, me-
demonstram a uti- lhorando portanto
lidade destes mé- ÓLEO DE SILlCONE o aspecto final da
gráfico log G VEL x log vise
todos na caracteri- Fig. 2 pintura.
5 log VISC,cP
zação reológica de
fluidos: CONCLUSÃO:
4,5 .
a) Óleo de silicone
(padrão Brookfield x
.
Como vimos
.
para aferição de aCima, o VISCO-
viscosímetros, com 3,5 símetro Brookfield
viscosidade indica- é um aparelho de
3 '--------'-----'-----'-------'
da no rótulo 11950 -2 -, o 2 custo bastante
cP). Este é um flui- log G VEL,s-1 acessível. que
do tipicamente - LITERATURA + STEADY-STATE 1 * STEDY-STATE 2 pode ser utilizado
o RELAXAÇÃO x CIL CONCENTR
Newtoniana, no com vantagens na
qual a viscosidade caracterização
não deve apresen- reológica precisa
tar variação com o de fluidos. Para
gradiente de velo- tal, é recomendá-
cidade TINTALATEX vel (mas não indis-
gráfico log GVEL x log vise
b) Tinta látex, pre- Fig. 3 pensável) o uso
viamente diluída log vlse,cP
5,------------------, dos sistemas cilín-
com 15% de seu dricos atualmente
peso em água e : ~'+
41..· · ·•·•• ,; · ·..· ·..· I
disponíveis. Suge-
agitada por 1minu- .T~+"+~ re-se também o
to a 750 rpm com emprego de pro-
3 · · ..................................................~ ~ ""0""x~ "" ..
agitador tipo disco ~<>t. lC04. gramas de compu-
Cowles. Este trata- tador para efetuar
2'-------------------'
mento teve por ob- -2 -1 o 2
o grande número
jetivo simular as log G VEL,s-1 de cálculos envol-
condições de apli- RELAXAÇÃO-' + RELAXAÇÃO-2 * ST-STATE-' o ST-STATE-2 vidos nas corre-
cação da tinta, a x ST-STATE-3 • CIL CONC-' • CIL CONC-2
ções necessárias.
qual o pintor nor-
malmente dilui previamente ecisalha através do pincelou REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
rolo.
Os resultados obtidos nos dois casos são descritos res- 1 - PIERCE, P. E., Journal of Paint Technology, 43, n· 557
pectivamente nas figuras 2 e3. Devemos observar que: (Jun 1971) p. 35
1) Todas as medidas, apesar de realizadas empregando 2- MITSCHKA, P., Real. Acta, 21, (1982) p. 207
diferentes métodos, produziram resultados bastante coe- 3 - PAnON, T. C., "Paint Flow and Pigment Dispersion",
rentes; as curvas obtidas são praticamente contínuas, com 2nd ed., John Wiley (1979)
uma dispersão de pontos relativamente pequeno. A parte 4 .. Contraves Industrial Products Ltda., "Measurement of
da curva determinada por relaxação superpõe-se à parte Rheological Properties"
obtida no estado estacionário, o que comprova a validade 5.. PAnON, T. C., Journal of Paint Technology, 38 (1966). n°
dos cálculos efetuados. 502,p.656
2) A viscosidade determinada para o óleo de silicone 6 .. SMITH, R. E., JCT. 54, n° 694 (Nov. 1982) p. 21

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