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O r d e m dos A d v o g a d o s do Brasil

Criação, Primeiros Percursos e Desafios (1930 - 1945)

Rubens A p p ro b a to M achado
P re s id e n te da O A B

H e r m a n n Assis Baeta
C oordenador

Lúcia M aria Paschoal G uim arães


Tânia Bessone
A u to ra s - P e s q u is a d o r a s
_______ H i s t ó r i a da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil
C ria ç ã o , P r im e ir o s P e rc u rs o s e D e sa fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )
História da O rd em dos Advogados do Brasil; Criação, Prim eiros Percursos e Desafios (1930-1945)

C o p y r ig h t © 2 0 0 3 , OA B - O r d e m d o s A d v o g a d o s d o Brasil

C o n s e l h o Federal da OAB
SAS Q u a d r a 5 B lo c o M Lote 1 Edifício S e d e d a O A B
7 0 0 7 0 - 9 3 9 B rasilia DF

T o d o s o s d ireito s re se rv a d o s. A r e p ro d u ç ã o n ã o - a u to riz a d a d e s ta p u b lic a ç ã o ,


n o t o d o o u e m p a r t e , c o n s t i t u i v i o l a ç ã o d e d i r e i t o s a u t o r a i s . (Lei n ° 5.988)

r E d iç ã o • 2 0 0 3

C o n s e l h o C o n su l t iv o
Ru b e n s A p p r o b a t e M a c h a d o - P r e s id e n te d a O A B / CF
Ivan A lk im in - P r e s i d e n t e d o lAB
H e r m a n n Assis B aeta - C o o r d e n a d o r - P ro je to H istó ria d a OAB

José G e r a l d o d e S o u s a J ú n io r - A d v o g a d o
A n n a M a ria B ian c h in i B a eta - P e d a g o g a

Projeto gráfico, c a p a e d ia g ra m a ç ã o : 2 D ocum ento apreendido na residência


do Dr. Jarbas Loretti, anexado no processo n® 69 do TSN.

S tu d io C r e a m c ra c k e rs

Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP)


Elaborada pela Bibliotecária Maria Helena de Amorim
CRB 14/018

História d a O rd e m d o s A dvogados d o Brasil /


Herm ann Assis Baeta, coo rd en ad o r, - Brasília :
H 673 OAB-Ed.,2003
V. 4

C o n t e ú d o : v .4 , C r i a ç ã o , P r i m e i r o s P e r c u r s o s e
Desafios (1930-1945)
/ L ú c ia Maria Paschoal G uim arães, T ânia MariaTavares
Bessone da C ruz Ferreira.

1. O r d e m dos A dvogados d o Brasil - História


2 . Advogados - Brasil - Império I. Baeta, H erm an n Assis
C D D -1 8 .ed .

340.06081
_______ H i s t ó r i a da
O r d e m dos A d v o g a d o s do Brasil
C ria ç ã o , P r im e ir o s P erc urs os e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

Diretoria da Ordem dos Advogados do Brasil

Rubens A p p ro b a to M a c h a d o - Presidente
Roberto A n to n io Busato - Vice-Presidente
G ilb e rto Gomes SecretáriO'Ceral
-

Sergio Ferraz Secretârio-Geral A d ju n to


-

Esdras Dantas de Souza Diretor^Tesoureiro


-
AS AUTORAS

Lucia Maria Paschoal Guimarães

Professora Titular de Historiografia do D epartam ento de História e do


Programa de Pós-Graduação de História do Instituto de Filosofia e Ciências
H um anas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. D outora em História
Social pela Universidade de São Paulo. Pesquisadora do CNPq. Publicou diversos
artigos e capítulos de livros n o exterior e no B ra sil Dentre estes últim os,
destacam -se “Debaixo da Imediata Proteção de Sua Majestade Imperial: O
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (1 8 3 8 -1 8 8 9 )”, in Revista do Instituto
Histórico e Geográfico Brasileiro, n® 388, Rio de Janeiro, 1995; “O tribunal da
posteridade", in O Estado conto vocação (R io de Janeiro: ACCESS, 1999,
organização Maria Emilia Prado); “Francisco A dolfo de Varnhagen - História
geral do Brasil”, in Introdução ao Brasil. Um banquete no trópico (São Paulo:
Editora SENAC, 2001, organização Lourenço D antas M ota); “Liberalismo
moderado: postulados ideológicos e práticas políticas no período regencial
(1 8 31 -1 8 37 )”, m O liberalismo no Brasil imperial: origens, conceitos eprática (Rio
de Janeiro: Editora Revan, 2001, organização de Lucia Maria Paschoal Guimarães
& Maria Emilia Prado). Colaboradora do Dicionário do Brasil Imperial (Rio de
Janeiro: Editora Objetiva, 2002, organização de Ronaldo Vainfas).
Tania Maria T. Bessone da Cruz Ferreira

Professora Adjunta do D epartam ento de História, do Programa de Pós-


Graduação em História e Vice-diretora do Instituto de Filosofia e Ciências
H umanas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). D outora em
História Social pela Universidade de São Paulo (USP). Pesquisadora do CNPq.
Publicou livro, artigos e capítulos de livros no exterior e no Brasil destacando-
se: Palácios de destinos cruzados: bibliotecas, homens e livros (1999, Prêmio
Arquivo Nacional de Pesquisa de 1997); colaboradora n o Dicionário do Brasil
Imperial 1822-1889, (2002), Ronaldo Vainfas (org). “As bibliotecas cariocas; o
Estado e a constituição do público leitor”, m M. E. Prado (org.): O Estado como
vocação: idéias e práticas políticas no Brasil oitocentista (1999); “Bibliotecas de
médicos e advogados: dever e lazer num só lugar” in Márcia Abreu (org.): História
da leitura e do livro no Brasil (1999); “le publique et le privé dans les relations
culturelles entre le Brésil e t le Portugal, 1808-1922” com Lúcia Maria Bastos P.
das Neves, in Katia Maria Queirós M attoso e Rolland D enis (org.): Le Brésil,
VEurope et les équilibres internacionaux, X V P a u X X ‘ siècle (1999); “circulação
de idéias nas bibliotecas privadas do Rio de Janeiro no final dos oitocentos” in
T roncoso, H u g o C a n cin o e o u tr o s (org.): N u eva s p e rsp e c tiv a s teóricas y
metodológicas de la Historia intelectual de América Latina (1999).
SUMÁRIO

A presentação _______________________________________________________________09

N o ta E x p lic ativ a____________________________________________________________ 13

I n t r o d u ç ã o _________________________________________________________________ 15

C ap ítulo I - A C riação d a O rd e m dos A dvogados do B r a s i l ____________________ 19

1.1 U m verdadeiro m ila g r e ___________________________________________________ 19

1.2 A O rd em com o obra da revolução ________________________________________ 31

1.3 A im plantação da O rd em ________________________________________________ 39

1.4 O Conselho F ederal______________________________________________________ 44

C ap ítulo II - A O rd e m e a R epública N o v a ____________________________________55

2.1 As Relações da OAB com o Governo P ro v isó rio _____________________________55

2.2 A OAB e a C onstituin te de 1934 ___________________________________________65

C ap ítulo III - A OAB n a defesa dos direitos civis ______________________________81


3.1 A lei de Segurança N acional e o Tribunal de Segurança Nacional: novas condiçoes
de repressão ________________________________________________________________81

3.2 A OAB e o Estado Novo ________________________________________________ 99

C onsiderações F i n a i s ______________________________________________________ 125

Foníes e B ibliografia________________________________________________________129

B iblio grafia________________________________________________________________134

índice O n o m á s tic o _________________________________________________________141

A nexo I - C riadores da OAB _______________________________________________ 151

A nexo II - Biografia dos P re s id e n te s ________________________________________ 157

A nexo III - Im agens H is tó r ic a s _____________________________________________ 165

A nexo IV - A dvogados que se destacaram com o defensores de presos e perseguidos


políticos do T S N ___________________________________________________________ 171

A nexo V - C arta e discurso de A ndré de Faria Pereira sobre a Criação d a OAB _ 175

A nexo VI - C ópia d a via original d o h istó rico “HABEAS C O R PU S” im p e tra d o pelo


advogado Sobral P into em favor de H a rry B e rg e r____________________________ 185

Anexo VII - D o cu m en tos relativos à criação e organização d a OAB ___________ 197

A nexo VIII - D ocum entos referentes à instituição e funcionam en to do TSN ___243

Anexo IX - Código de É tic a ________________________________________________ 283


V o lu m e 4 C r ia ç a o , P rim eiro s Percursos c D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

APRESENTAÇÃO

A criação da Ordem dos Advogados, nos termos do art. 17 do Decreto n° 19.408,


de 18 de novembro de 1930, marca uma nova era para a Advocacia no Brasil.
C om o já vim os no volu m e n° 2 - Luta pela Criação e Resistências, os advo­
gados, através de seu Instituto, fundado em 1843, lutaram durante 89 anos,
quase um século, sem que tivesse sido possível a criação por m eio de diplom a
legal, oriundo de proposta formal do Instituto dos Advogados, que, certam en­
te, estabeleceria, de pronto, princípios, normas e regras para a sua implantação
e funcionam ento.
A criação se deu graças ao espírito lúcido de ANDRÉ DE FARIA PEREIRA,
que, ao redigir esboço de decreto destinado à reorganização da Corte de Apela­
ção do Distrito Federal, inseriu um artigo - o de n® 17 - no texto do referido
diplom a legal, e, assim, foi criada a ORDEM D O S ADVOGADOS D O BRASIL.
As autoras-pesquisadoras Lúcia Guim arães e Tânia Bessoni, nas suas
CONSIDERAÇÕES FINAIS, em texto conciso e claro (página 125), registram
o fato histórico que elim ina qualquer dúvida, merecendo transcrição:

“y4 criação da Ordem dos Advogados do Brasil, p o r meio do Decreto 19.408,


de 18 de novembro de 1930, deveu-se a um a iniciativa do então procurador-
geral do Distrito Federal, o Dr. André de Faria Pereira. Como ele mesmo fez
questão de esclarecer, encarregado pelo ministro da Justiça, o Dr. Oswaldo
Aranha, de preparar a m in u ta d o projeto que reorganizava a Corte de Apela­
ção do Distrito Federal, em butiu no referido documento um dispositivo, o de
número 17, que instituía a Ordem.
Durante muito tempo, p o r sinal, o estabelecimento da entidade seria atribu­
ído a personagens e instituições diversas. Houve quem a imputasse ao Insti­

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______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

tuto da Ordem dos Advogados Brasileiros, ao qual a OAB esteve intim am en­
te articulada nos primeiros tempos. Houve, também , quem a atribuísse ao
Dr. Levi Carneiro, seu prim eiro presidente, a exemplo do advogado Antônio
Baptista dos Santos, em pronunciam ento realizado no Conselho Federal em
1938. Levi Carneiro, p o r sua vez, em parecer p o r ele exarado em 15 de no­
vembro de 1931, creditou-a à Revolução de 30, pois no seu entendera Ordem
constituía um a das medidas revolucionárias que deveriam contribuir para
remodelar a nacionalidade.
Para André de Faria Pereira a criação da O rdem parecia um milagre, pois, se
po r um lado, o Governo Provisório desprezava boa p a rte da Constituição de
189} e decretara a falência das instituições democráticas, concentrando nas
mãos de Getúlio Vargas form idável soma de poderes, p o r outro, um a semana
mais tarde, em 18 de novembro, concedia à classe dos advogados, prerrogati­
vas de se auto-regulamentar, eximindo-os da centralização dominante''.

Lembramos, apenas, o trabalho construtivo de SOLANO RIBEIRO DA


C U N H A , que, diante da hesitação d o m inistro O sw aldo Aranha, e na condição
de am igo do referido ministro e do procurador Faria Pereira, aproxim ando-se
de am bos na hora em que se discutia o assunto, influiu decisivamente n o senti­
do de incluir-se o dispositivo que criou a Ordem dos Advogados, isto é, o art.
17, no texto do decreto reformador da Corte de Apelação do Distrito Federal.
C om efeito, não paira mais nenhum a dúvida quanto a esta questão, que nos
parece fundamental para a análise e reflexão sobre o que aconteceu na história.
D epois da criação, coube a Levi Carneiro, presidente do lOAB e primeiro
presidente da OAB - aí sim - o trabalho hercúleo de estruturação da nova en ­
tidade. Para esse fim, foi baixado o D ecreto n° 22.478/33, que aprovou o Regu­
lam ento consolidado.
As ilustres autoras-pesquisadoras inform am que Levi Carneiro e Attílio
Vivácqua, presidente e secretário-geral, respectivamente, “concentraram-se em
suas gestões nas tarefas de organização da instituição, de interpretação” do re­
ferido Regulamento.
Releva considerar que a Ordem foi criada num m o m en to de extrema
efervescência nacional, visto que se defrontou, nesse período de 1930/45, de
que trata este livro, com a elaboração de duas Constituições - a de 1934 e a de
1937 - bem co m o com a edição do C ódigo Eleitoral de 1932, que contribuiu
para o início do aperfeiçoam ento político-eleitoral do país.

10 OAI
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Importa destacar o surgimento da 2® Guerra Mundial (1939-1945), que, na


sua fase mais sangrenta, provocou pronunciamentos de membros da OAB, no ple­
nário de seu Conselho Federal, aprovando mensagens de condenação a atos violen­
tos e cruéis com o o torpedeamento de navios de passageiros nas costas brasileiras.
Destaque-se, ainda, a ocorrência de agitações e conflitos políticos entre
grupos ideológicos e radicais, com o a cognom inada Intentona Com unista (1935)
e o Putsch Integralista (1937), que, se não tiveram a participação direta da ins­
tituição, não ficaram im unes à observação e ao conhecim ento dos advogados.
Esses m ovim entos, de conotação nitidam ente político-partidária, servi­
ram de pretexto para a instauração d o Estado N ovo, que interrom peu drastica­
m ente o processo de democratização nacional.
Foi exatamente no limiar do Estado N ovo que se deu o surgimento do Tribunal
de Segurança Nacional - TSN, criado pela Lei n® 244, de 11 de setembro de 1936, que
serviu de palco para a subversão dos direitos e para a prática de graves injustiças.
N esse tribunal arbitrário, destacaram-se, na defesa de presos e persegui­
dos políticos, pelo núm ero de casos sob seu patrocínio, pela com petência e
bravura, os advogados Evandro Lins e Silva e Sobral Pinto.
Presos os comunistas Luiz Carlos Prestes e Harry Berger, o presidente da
OAB do antigo Distrito Federal e vice-presidente do Conselho Federal, no Rio de
Janeiro, Dr. Targino Ribeiro, designou Sobral Pinto, através do Ofício n° 20, de 8
de janeiro de 1937, para ser o advogado dos referidos presos. Contam que os
advogados da área criminal da época receavam assumir o patrocínio de cliente
nessa situação, tendo em vista o caráter repressor e rancoroso do TSN, pois era
com u m confundir-se a pessoa do acusado com a pessoa do advogado. Targino
Ribeiro, habilmente, observando que Sobral Pinto era u m líder católico convicto
e praticante, e, além disso, um dos fundadores e presidente do Centro D o m Vital,
n o m eo u -o defensor dativo dos referidos réus. Sobral Pinto agigantou-se na defe­
sa, utilizando todas as suas forças mentais e criativas, a ponto de invocar a lei de
proteção aos animais para reivindicar um a cela condigna para os seus clientes
que se encontravam jogados num espaço im próprio a u m ser hum ano, nu m vão,
abaixo de um a escada, que não lhes permitia ficar em pé.
C o m o se verifica da pesquisa realizada e constante deste livro, no declínio
do Estado N ovo, registram-se várias manifestações do C onselho Federal de co m ­
bate à ditadura, que eram provocadas pelos advogados mais destem idos da é p o ­
ca, c o m o H aroldo Valadão, Dario de Alm eida Magalhães, Adauto Lúcio Cardo­
so e Sobral Pinto, entre outros.

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______________História da
Ordem dos Advogados do Brasil

Sobral Pinto, por exem plo, não se limitava a protestar no plenário do C o n ­


selho Federal, um a vez que aproveitava sua influência na imprensa para divul­
gar suas m ensagens de condenação à ditadura, c o m o aconteceu n o artigo p u ­
blicado n o Jornal d o C om m ercio, em setembro de 1945:

[...] A ambição, porém, p o d e mais do que 0 dever. O E xm oSr. Getúlio Vargas,


no dia 10/11/1937, esqueceu para seu deslustre que o exemplo de obediência
à Constituição e às leis deve pa rtir precisamente do chefe de Estado. D o m i­
nado pelo dem ônio do m ando e do orgulho. S. Exa. não trepidou na hora
mais negra da sua carreira política em se afastar deliberadamente do cam i­
nho austero da legalidade, ousando praticar o m aior crime político da nossa
história cívica, e que era assim definido no artigo 57 da Constituição de 16/
07/1934 - São crimes de responsabilidade os atos do presidente da Repúbli­
ca, definidos em lei que atentarem contra a existência da União, a Constitui­
ção e a form a de governo federal, o livre exercício dos poderes políticos...

As pesquisadoras registram, finalmente, que, com a queda da ditadura, a


Ordem dos A dvogados prosseguiu na luta pelo restabelecimento do estado de
direito. Por esta razão, talvez, é que a C onstituinte, de de fevereiro de 1946,
fora presidida pelo advogado Fernando de M elo Viana, m em bro honorário e
ex-presidente da O rdem dos A dvogados do Brasil.
D eposto G etúlio Vargas pelo alto com ando do Exército, em 29 de o u tu ­
bro 1945, o C on selh o Federal, no dia 30 do m esm o m ês, aprovou m oção
congratulatória pelo térm ino do regim e ditatorial.
É preciso ressaltar que, quando o m inistro do STF, Dr. José Linhares,
assum iu a presidência da República, poucas instituições não-governam entais
foram convidadas e estiveram presente ao ato. Entre as instituições convidadas,
destacava-se a Ordem dos Advogados, que fora representada por seu conselhei­
ro federal, Dr. Raul Fernandes.
C om o se vê, a O rdem dos A dvogados viveu, nesses quinze anos, um a vida
rica, acumulando experiências, que vem transmitindo a seus membros, por m eio
de lições valiosas e de grande utilidade, em toda sua trajetória histórica.

H erm ann Assis Baeta


Coordenador

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NOTA EXPLICATIVA

A Coleção História da O rdem do Advogados do Brasil, coordenada pelo


ex-presidente da OAB, H erm m an Assis Baeta, teve parte de seu plano de
trabalho alterado no correr da produção, prevista, originalm ente, para ser d e­
senvolvida por duas equipes, integradas por autores-pesquisadores do Rio de
Janeiro e de Brasília, de acordo com a localização dos arquivos da instituição. O
projeto teve de ser reformulado, em virtude do afastamento por m otivos pro­
fissionais do P ro f Estevão Rezende Martins, supervisor da equipe de Brasília.
Para que a Coleção não viesse a sofrer solução de continuidade, o coorde­
nador decidiu dividir as tarefas de supervisão da equipe de Brasília entre os
autores-pesquisadores do Rio de Janeiro, Lucia Maria Paschoal Guimarães, Ta­
nia Bessone, Aurélio Wander Bastos e Marly da Silva Motta. Assim , coube às
professoras Lucia Maria Paschoal Guimarães e Tania Bessone a responsabili­
dade pela estrutura deste livro, as respectivas disposição dos capítulos e desig­
nação dos títulos, bem c o m o assinar a redação do texto final. Esse trabalho foi
realizado a partir de pesquisa d ocum ental e de texto preliminar elaborado por
Lilian Maria M enezes Lima, da equipe de Brasília, a quem as autoras agrade­
cem a colaboração. D o m esm o m odo, são gratas a Maria Sebastiana da Silva
Oliveira e Alexandra Daibert, que contribuíram na investigação de fontes e
iconografia, junto aos arquivos no Rio de Janeiro.

OAI 73
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O r d e m d o s A d v o g a d o s d o Brasil

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INTRODUÇÃO

Alguns pensavam que fosse obra dos associados do Instituto da O rdem


dos A dvogados Brasileiros. Outros viram -na com o feito da “revolução” de 30.
Mais tarde, concebida com o um verdadeiro milagre, a criação da Ordem dos
A dvogados do Brasil, denom inada originalm ente O rdem dos Advogados Bra­
sileiros, vinha sendo desejada desde 1843, quando u m grupo de jurista, lidera­
d os p elo conselheiro Francisco Alberto Teixeira resolveu fundar o Instituto dos
Advogados Brasileiros, conhecido co m o a Casa de M ontezum a.
As narrativas hoje existentes acerca das origens da O rdem dos Advogados
do Brasil são todas de autoria de filiados. D e u m m o d o geral, esses textos a co m ­
panham a versão de André de Faria Pereira, a cuja iniciativa se deve a criação da
Ordem , de que o seu estabelecim ento, em pleno contexto pós-revolucionário, a
18 de novem bro de 1930, pelo Decreto n° 19.408, assinado pelo Chefe do G o ­
verno Provisório, teria sido um verdadeiro milagre. Vale notar que, som ente em
1950, Faria Pereira veio a público, pela primeira vez, esclarecer a sua participa­
ção naquele episódio. Aliás, as fontes dem onstram que a criação da O rdem foi
atribuída a personagens e instituições diversas.
Este livro Criação, primeiros percursos e desafios (1930-1945) trata justamente
da gênese da OAB. O título, por si só, dispensa maiores justificativas. N o entan­
to, não se pode tratar da história de um a instituição sem abordar a sua gênese. E,
no caso da Ordem, m uito se tem para explicar, até porque o contexto onde se
insere o seu aparecimento assim o determina. Afinal, há consenso entre os espe­
cialistas de que o ano de 1930 constitui um a espécie de divisor de águas na h istó­
ria do país. (...) É como se existisse um Brasil antes e outro depois.
Por outro lado, pode até se afigurar contraditório o aparecim ento da O r­
dem naquele m o m en to histórico, em face do caráter de excepcionalidade

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O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

institucional que o país atravessava. Portanto, o estudo da origem da corporação


dos advogados, dos personagens envolvidos e da sua atuação exige um esforço
perm anente de contextualização da pesquisa documental,p<3npassu aos acon­
tecim entos políticos e dem ais transformações por que passaram as instituições
republicanas.
A pesquisa básica concentrou-se nas Atas do C onselho Federal da OAB,
além de docum entos similares das Seccionais do então D istrito Federal, e do
estado de São Paulo. Foi tam bém compulsada a publicação Boletim do Instituto
da Ordem dos Advogados Brasileiros. D ecidiu-se por examinar este últim o acer­
vo, em virtude de haver u m forte entrelaçamento entre a Casa de M ontezum a e
a Ordem, n os seus prim eiros tempos.
Essa intim idade, por assim dizer, nos levou a um a observação m uito inte­
ressante, que será explorada ao longo do texto, sobretudo se considerarm os as
circunstâncias históricas da época, marcadas pelo regime autoritário que se
instalou no país, co m a subida de Getúlio Vargas ao governo. Basta lembrar a
com posição do prim eiro C onselho Federal da Ordem. Por força do Regula-
mento da Ordem dos A dvogados do Brasil, daqui por diante denom inado ape­
nas Regulamento, dos 21 m em bros do Conselho Federal, 11 deveriam ser esco­
lhidos entre os integrantes do C onselho Superior do Instituto. Constatam os
que esses hom ens, à frente das duas instituições, adotaram u m posicionam ento
ambíguo: enquanto na Ordem, sob o escudo da neutralidade e da defesa dos
interesses corporativos, abstinham -se do debate político, n o Instituto em itiam
pronunciam entos de natureza política, respeitosos por certo, mas beirando o
enfrentam ento com o poder. Mais tarde, durante o Estado N ovo, essa prerroga­
tiva crítica transferiu-se para a Seccional do D istrito Federal.
Para com plem entar a pesquisa d o conjunto das fontes oficiais da OAB,
incorporam os outros testem unhos, sobretudo da imprensa do Rio de Janeiro.
Porém, nosso foco principal repousou sobre os mem orialistas, a começar por
Getúlio Vargas, no seu Diário, cujos registros nos serviram de contraponto para
construirm os o panoram a político-institucional, on d e a O rdem se inseriu e
atuou. Levi Carneiro, A fonso Arinos de M elo Franco, Heráclito Sobral Pinto e
até m esm o o poeta e escritor Carlos D rum m on d de Andrade nos ofereceram
com entários, críticas e, porque não dizer, alguma inconfidências. Suas narrati­
vas foram fundam entais para com preenderm os o papel desem penhado pela
corporação dos advogados. Podem os desde já antecipar que, em bora o seu Re­
gulamento registre c om o finalidade principal (...) seleção, defesa e disciplina da

16 ®Ái
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classe dos advogados em toda a República, a entidade extrapolou esse propósito


e participou de m o m en to s cruciais da história brasileira, com o a elaboração da
Constituição de 1934, a defesa dos direitos civis durante o Estado N ovo e a luta
pela restauração do estado de direito.
Assim , n o prim eiro capítulo, tratamos da criação da Ordem dos Advoga­
dos do Brasil. A bordam os sua estrutura e funcionam ento, a organização dos
quadros dirigentes e seus diplom as legais. Esta análise nos permitiu acom pa­
nhar a im plantação n o território nacional e o início da vigência do Regulamen­
to, deten do-n os especialm ente na atuação do C onselho Federal, um a vez que
no período estudado quase todas as decisões do C onselho Federal referiam-se a
processos de inscrição, exercício profissional, organização das Seções e Subseções
ou de interpretação do Regulamento.
N o capítulo seguinte, exam inam os as relações da Ordem com o Governo
Provisório e a presença do seu representante na segunda Assembléia Nacional
Constituinte. Outro aspecto relevante neste capítulo diz respeito à crise que
sobreveio à volta ao estado de direito com a prom ulgação da C onstituição Fe­
deral e a eleição indireta de Vargas para a presidência da República. Estudamos,
tam bém , as principais contradições da Carta de 1934, articulando-as à precipi­
tação dos acontecim entos que levariam ao golpe de 10 de novem bro de 1937.
D este m o d o , no terceiro capítulo analisamos o processo de concentração
de poderes nas m ãos de Getúlio Vargas, a prom ulgação da Lei de Segurança
Nacional e a criação e instalação do Tribunal de Segurança N acional, que tor­
naram mais difíceis as intervenções dos m em bros da OAB na vida política na­
cional. Por outro lado, as leis de exceção constituíram -se na primeira prova de
fogo, segundo a expressão de Evandro Lins e Silva, enfrentada pela corporação.
Neste sentido, privilegiam os a resistência ao período discricionário, por m eio
da atuação em blem ática de Heráclito Sobral Pinto. Finalmente, nos detivem os
no processo de enfraquecim ento da ditadura de G etúlio Vargas e o papel de­
sem penho pela OAB não só nos estertores do regime, m as tam bém na restaura­
ção da ordem jurídica do país.

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O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

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CAPÍTULO I
A Criação da O rd e m dos Advogados d o Brasil

1.1 U m v e rd a d e iro m ilag re

Assim se expressou o Desembargador André de Faria Pereira, reportando-


se à instituição da Ordem dos Advogados do Brasil, denom inada originalmente
Ordem dos Advogados Brasileiros', através do Decreto n° 19.408, de 18 de n o ­
vembro de 1930, no relato que ofereceu ao Conselho Federal da OAB, por oca­
sião do vigésim o quinto aniversário da entidade^. O estabelecimento da Ordem
foi u m dos primeiros atos assinados por Getúlio Vargas, após a promulgação da
Lei Orgânica do Governo Provisório^, instaurado com a vitória do m ovim ento
armado de outubro de 1930, que marcou o fim da Primeira República:

(...) A criação da Ordem dos Advogados, naquele m om ento histórico, coristi-


tuiu um verdadeiro milagre, em que hoje eu mesm o custo a acreditar. Em
verdade, ao mesmo tempo em que a derrocada das instituições rasgava, pela
revolução vitoriosa, a Constituição e as leis e concentrava nas mãos do dita ­
dor os três poderes constitucionais da República, ferindo o próprio Poder
Judiciário, no momento em que a insânia do po d er pessoal se instalava no
país, com todas as agravantes do arbítrio e da violência, foram subtraídas à

‘ C ab e a q u i esclarecer que, n o s te rm o s d o art. 17, d o D ecreto n° 19.408, d e 18 d e n o v e m b ro d e 1930, a


e n tid a d e o rig in a lm e n te c h am ava-se O rd e m d o s A dvogados Brasileiros. Pelo D ecreto n ° 20.784, de 14 de
d e z e m b ro d e 1931, que a p ro v o u o seu Regulam ento, pa sso u a se d e n o m in a r O rd e m dos A d vogados do
Brasil. A alteração p ro c e d id a a te n d ia a u m a sugestão d o C lube dos A dvogados.
^ Cf. A n d ré de Faria Pereira, Exposição e n c a m in h a d a ao C o n se lh o Federal d a O rd e m dos A dvogados do
Brasil, e m n o v e m b ro de 1955. A rquiv o d o C o n se lh o Federal d a OAB. O texto a lu d id o e n c o n tra -se tr a n s ­
c rito n a o b ra d e A lb erto V enancio Filho, N o/ícia histórica da O rd em dos A dvogados do Brasil (I9 3 0 -I9 8 0 ).
B rasüia; OAB, 1982, p. 25-30.
^ A Lei O rgânica d o G o v e rn o P ro visório foi p ro m u lg a d a em 11 d e n o v e m b ro de 1930.

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centralização dom inante e entregues a órgãos da própria classe a disciplina e


seleção de seus membros'^.

O debate em torno do significado da chamada “revolução de 30,” e seus


desdobram entos, é assunto polêm ico, que ainda hoje provoca divergências e n ­
tre os estudiosos, que se propõem a avaliar suas repercussões na formação do
Estado brasileiro. Para o historiador Boris Fausto, o m ovim en to pod e ser inter­
pretado com o fruto de uma aliança transitória entre as oligarquias desvinculadas
do café, os tenentes e o Partido D em ocrático Paulista, cujo (...) inconformismo
correspondia ao descontentamento no plano político contra o núcleo cafeeiro^.
Já o poeta e escritor m ineiro Carlos D ru m m o n d de Andrade apresenta-
nos um a outra versão, m uito curiosa por sinal, daquele episódio. N um a espécie
de diário, cujas notas mais tarde foram reunidas sob o título O observador no
escritório, D ru m m o n d refere-se a um diálogo casual, travado em 12 de dezem ­
bro de 1962, num a rua do centro do Rio de Janeiro, com seu conterrâneo, o ex-
m inistro Francisco Campos. A conversa derivou para a política e as reminis-
cèncias de 1930:

(...)Campos diz que a revolução foi uma bobagem. Getúlio não queria nada.
Quem fez a revolução foi Washington Luís, com sua rigidez: não quis mandar
visitar 0 presidente eleito de Minas, Olegário M aciel hospedado em hotel do
Rio. Se 0 fizesse, Olegário retribuiria a visita, e os dois se entenderiam. Ofendi-
do, 0 velho Olegário voltou para M inas e desfechou a Revolução, que antes ele
não queria(...) D iz ex-ministro estarem condições de indicar o exato mom en­
to em que Olegário foi escolhido para ser presidente de M inas Gerais ^.

As conjecturas de Chico Cam pos, com o era mais conhecido, certamente


m erecem crédito. Afinal, ele foi o representante de M inas Gerais na reunião
realizada no Rio de Janeiro, em junho de 1929, que acertou o apoio daquele
estado a uma candidatura gaúcha à presidência da República, primeiro passo
para o lançam ento do nom e de Getúlio Vargas pela Aliança Liberal. C om a
derrota de Vargas n o pleito, Cam pos participou das articulações que deflagraram
0 m ovim en to armado de outubro, que pôs fim à Primeira República. Indicado
* A n d ré d e Faria Pereira, Exposição, op. cit.
®Cf. B oris Fausto, Revolução de 1930: história e historiografia. São Paulo: Brasiliense, 1970, p. 74.
^ C arlos D r u m m o n d de A ndrade, “ Francisco C am po s, o político” I n ; ________ , Carlos D n im m o n d de Andrade:
prosa seleta: v o lu m e ú n ic o /selecion ad as pe lo autor. Rio dc Janeiro: N o va Aguilar, 2003, p. 1064-1065.

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com o representante m ineiro no Governo Provisório por Olegário Maciel, as­


sum iu a recém-criada pasta da Educação e Saúde.
Entretanto, em que pesem as credenciais do ex-m inistro Francisco C am ­
pos, há consenso entre os especialistas de que o ano de 1930 constitui uma
espécie de divisor de águas na história do país^: (...) É como se existisse um
Brasil antes e outro depois. O primeiro, im plantado com a Constituição de 1891,
liberal, descentralizado e sustentado pelas oligarquias agroexportadoras. O segun­
do, caracterizado pela centralização, perda das autonomias estaduais e incorpora­
ção de novos segmentos sociais nas esferas do poder^.
O D ecreto n.® 19.398, de 11 de no v em b ro de 1930, que in stitu iu o G o ­
verno P rovisório, c o n ced eu -lh e poderes d iscricion á rio s em toda a sua p le ­
nitu de, co n fia n d o -lh e as atribuições do Executivo e do Legislativo, até que a
eleição de u m a A ssem bléia N acion al C o n stitu in te viesse restabelecer a or­
ganização c o n stitu cio n a l do país. D eterm in o u , ta m b ém , u m con ju n to de
m ed id as destinadas a garantir a vigência do n o v o regim e, entre as quais
destacavam -se a disso lu çã o d o C ongresso, das A ssem bléias Legislativas Es­
ta d u a is e d as C â m a ra s M u n ic ip a is . S u b s t it u iu o s g o v e r n a d o r e s p o r
interventores de sua confian ça su bordinados ao p o d er central. L im itou a
a u to n o m ia d os Estados, p r o ib in d o -o s de contrair em préstim os externos sem
a utorização expressa d o gov ern o federal. S u spen deu as garantias c o n s titu ­
c io n a is e exclu iu da apreciação judicial o s decretos e atos do G overno P ro­
v isó r io o u d os interventores, em bora m antivesse o Poder Judiciário em
fu n c io n a m e n to , exercido em con form id a d e c o m as leis vigen tes, s u b m e ti­
das a eventu ais m o d ifica çõ es. C riou, ainda, u m Tribunal Especial para o
ju lg a m en to de crim es de natureza p olítica, bem c o m o de atos de corrupção
n o s n e g ó c io s p ú b licos. Esboçava-se, assim , a estrutura d o governo a utoritá­
rio, responsável pela organização do Estado em novas bases, e que iria per­
m anecer n o p o d er p elos p r ó x im o s qu in ze anos, n o enten der da h isto r ia d o ­
ra Em ilia V io tti da Costa^.
À vista dos daqueles dispositivos, a criação da Ordem dos A dvogados do
Brasil pode até parecer um milagre, conform e as palavras de André de Faria

’ Ver, José M u rilo d e C arvalho, “M a rc h a acelerada (193 0 -1 9 6 4 )”. I n : ______, Cidadania no Brasil: o longo
cam inho. 2 “ edição. R io d e Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p. 87-88.
^ Cf. M ax im iiiano M a rtin Vicentc, O Afe/íêíío Catete: a m oldagem do Estado auioriiário. Tese de d o u to ra m e n to
aprese n ta d a ao D e p a rta m e n to d e H istória da FFLCH d a U niversidade de São Paulo. São Paulo 1996, p. 7.
’ E m ilia V io tti d a C o sta , O Suprem o Tribunal Federal e a construção d a cidadania I E m ilia V io tti d a Costa',
o rg a n iz a çã o A lb in o A dvogados Associados- São Paulo; IKJE, 2001, p.64-65.

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Pereira. Pois, se por u m lado, o G overno Provisório, desprezara boa parte da


C onstituição de 1891 e decretara a falência das instituições dem ocráticas, c o n ­
centrando nas m ãos de G etúlio Vargas formidável som a de poderes, por outro,
um a semana mais tarde, em 18 de novem bro, concedia à classe dos advogados
prerrogativas de auto-regulamentar, ex im ind o-os da centralização dominante.
Voltaremos a essa questão mais adiante.
O relato do Dr. André de Faria Pereira constitui u m excelente testem u­
nh o das circunstâncias históricas em que ocorreu a criação da Ordem. Além
disso, explicita com clareza o papel que desem penhou naquele episódio. Afinal,
partiu dele a iniciativa que deu origem à OAB, sem que houvesse qualquer
interveniéncia do Instituto da O rdem dos Advogados Brasileiros (lO A B), com o
se supôs durante m uito tem po, o u por influência d o então presidente do Insti­
tuto, Levi Carneiro, co m o in su nuou A n tônio Baptista dos Santos, em discurso
pronunciado na Ordem em 1938

(...). Aproveitando essa situação, que o destino m e reservou, e a circunstância


de acolher o M inistro m inha sugestão de reformar os serviços da Corte de
Apelação, então desorganizados, resolvi incluir no decreto, sem insinuação
de nin% uém ,opreceitodoart. 17, único que sofreu impugnação do Ministro,
sob 0 fundam ento de que a revolução não concedia privilégios. M as o idealis­
mo e espirito público de Oswaldo Aranha cederam à minha argumentação,
reforçada pela oportuna e eficiente intervenção do autorizado Solano Car­
neiro da Cunha, que deu nota fin al ao assunto Tive, assim, a fortuna de
transformar em realidade o sonho quase secular da classe, praticando o ato
de que mais m e orgulho na m inha longa vida profissional" (o grifo é nosso).

O advogado André de Faria Pereira pertencia ao quadro social do lOAB. Exo­


nerado pelo ex-presidente Washington Luís das funções de procurador-geral do
Distrito Federal, fora reintegrado no cargo por determinação da Junta Revolucio-

E m 21 d e n o v e m b ro d e 1950, A n d ré d e F aria P ereira, a p ó s a so len id ad e c o m e m o ra tiv a d o 20.<> aniversário


d a O rd e m , n o ta n d o essa im p re c is ã o n o s d iscu rso s ali p ro n u n c ia d o s s o b re a gênese d a e n tid a d e , enca­
m in h o u u m a c a rta a o C o n se lh o F ederal d a O rd e m esclarecendo a s u a p a rtic ip a ç ão n o episódio . Cf.
A n dré d e Faria Pereira, “C arta” d a ta d a d e 21 de n o v e m b ro de 1950, dirigida a o pro fesso r H a ro ld o Valladão,
p re sid en te d o C on se lh o F ederal d a O rd e m d o s A dvogados d o Brasil. A rquivo d o C o n se lh o F ederal da
OAB. E m 1955, n o ju b ile u d e p ra ta d a OAB, A n d ré d e Faria Pereira re ite ro u e a m p lio u a quelas in fo r m a ­
ções, em u m o u tr o d o c u m e n to , a “ E xposição” q u e ofereceu a o C o n se lh o Federal d a O rd e m . Ver a n exo o
d o c u m e n to integral.
“ A n d ré de F aria Pereira, “ E xposição”. O p. cit.

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nária em 30 de outubro de 1930'^. Tão logo Getúlio Vargas assumiu o poder e deu
posse ao ministério'^, ele dirigiu-se ao recém-nomeado titular da pasta da Justiça -
Oswaldo Aranha, aconselhando-o a promover a reorganização da Corte de Apela­
ção do Distrito Federal. A sugestão foi bem acolhida e o ministro encarregou-o de
preparar um anteprojeto a esse respeito. O procurador valeu-se da oportunidade e
inseriu n o documento o seguinte dispositivo: (...)Art. 17. Fica criada a Ordem dos
Advogados Brasiléros, órgão de disciplina e seleção da classe dos advogados, que se
regerá pelos estatutos que forem votados pelo Instituto da Ordem dos Advogados Brasi­
leiros, com a colaboração dos Institutos dos Estados, e aprovados pelo Governo " . Anos
mais tarde, ele justificaria as motivações que o levaram a agir daquela forma:

(...) Ninguém melhor do que eu, (...}, sentira a necessidade da moralização


da classe dos advogados, notadamente quando exerci, pela prim eira vez, o
cargo de procurador-geral do Distrito Federal, na luta tremenda que travei
contra os maus elementos da Justiça, da Polícia e da classe dos advogados.
(...), não havia egresso das penitenciárias ou comerciante falido que não se
julgasse com o direito desobraçar uma pasta e afrontar o pretório no exercí­
cio da mais degradante rabulice. A consciência coletiva repelia os intrusos,
mas seus malefícios desmoralizavam o ambiente a tal pon to que a função de
advogado era suspeitada como de traficantes irresponsáveis. Os advogados
dignos sofriam a concorrência dos aventureiros ousados e não havia meios de
evitar a intoxicação causada no meio social pelos elementos claudicantes,
que prosperavam à sombra de generalizada irresponsabilidade.^^

Segundo André de Faria Pereira, apenas um a pessoa teve acesso à m inuta


que redigira - o juiz Edgard Costa, que lhe ofereceu sugestões n o sentido de
extinguir os julgam entos secretos na Corte de Apelação'^. A proposta foi sub­
m etida ao ministro O sw aldo Aranha que a contestou, justam ente o artigo 17,

A Junta R evolu cion ária era fo r m a d a pelos generais A ugusto Tasso Fragoso e João de D e u s M en a Barreto,
e o c o n tra -a lm ir a n te Isaías d e N o ro n h a .
" G etúlio Vargas c o n stitu iu o G o v e rn o P ro v isó rio com os s eg uintes m in istro s: Justiça, O sw aldo A ranha;
E xterior, A frânio d e M elo F ranco ; Fazenda, José M a ria W h ita k er; G u e rra , general Leite de C astro; M a r i­
n h a , a lm ira n te Isaías de N o ro n h a ; Viaçâo, Juarez T á vora; A g ric u ltu ra, Assis Brasil; E ducação, Francisco
C am pos. D ias m ais ta rde, L ind o lfo C o llo r foi desig n a d o pa ra a re c é m -in s titu íd a p a sta d o Trabalho.
Ver, em anexo, a tra n s c riç ã o in te g ra l d o D e creto n.® 19.408, d e 18 d e n o v e m b ro d e 1930.
A n d ré d e F aria P e re ira ,“ E x posição”. O p. cit.
“ E d g a rd C osta seria desig nado, a in d a em n o v e m b ro d e 1930, juiz d a 1.» C â m a ra d a C o rte d e A pelação do
D istrito Federal. E m 1945, a sc e n d e u a o cargo de m in is tro d o S u p re m o T rib u n a l Federal.

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O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

alegando que a m edida favorecia à classe dos advogados e a revolução não con­
cedia privilégios. Faria Pereira respondeu-lhe, então, que (...) se privilégio hou­
vesse, seria o da dignidade e da cultura, pois (...) a instituição da Ordem traria,
ao contrário, restrição aos direitos dos advogados^^.
Tais argumentos ganhariam um reforço providencial, graças à chegada no
gabinete do ministro do ex-deputado Francisco Solano Carneiro da Cunha, que
interveio no diálogo. Membro do lOAB, partidário da Aliança Liberal desde a pri­
meira hora, 0 Dr. Francisco Solano integrava a comissão de sindicância encarrega­
da de realizar a devassa nas contas do Banco do Brasil e, juntamente com o Dr. Justo
de Morais, foi responsável pela elaboração do projeto que organizou o Tribunal
Especial para julgamento dos delitos do governo deposto. Figura muito acatada
entre os políticos aliancistas e que privava da intimidade de Getúlio Vargas'®, Solano
não só apoiou o pleito de Faria Pereira, com o também demonstrou a sua pertinência,
convencendo Oswaldo Aranha a aprovar o documento, que acabaria seguindo sem
qualquer alteração para assinatura do Chefe do Governo Provisório.
O estratagema utilizado pelo procurador-geral do Distrito Federal surti­
ra o efeito desejado. Concretizavam-se, assim, ainda que por cam inhos pouco
convencionais, as aspirações de M ontezum a, de Perdigão Malheiro, de Nabuco
de Araújo, de Saldanha M arinho e outros juristas brasileiros de nom eada, que
desde m eados d o século XIX vinham pleiteando a criação da O rdem dos A dvo­
gados. Estabeleceu-se a pretendida entidade, à revelia do Instituto da Ordem
dos Advogados Brasileiros, órgão especialm ente constituído para esse fim em
1843'^, por iniciativa do conselheiro Francisco Alberto de Aragão, e que duran­
te oitenta e sete anos havia pleiteado a sua consecução™ .
Por essa m esm a ocasião, no lOAB, voltara-se a debater a necessidade de
instituir a Ordem. A dem anda veio à tona na esteira da retórica reformista
entoada pelos vencedores da “revolução”. Já na sessão de 30 de outubro de 1930,
o Dr. Gualter Ferreira reivindicaria a reestruturação do funcionam ento do Ju­
diciário, reclamando, dentre outras providências, o fim dos julgam entos secre­
tos, a restauração das férias primitivas, a proibição dos juizes de aceitarem co-

OAB, Afa da sessão do Conselho Federal da O AB, 5 d e d e z e m b ro d e 1950.


Ver, G e túlio Vargas, Diário. A presentação d e C elina Vargas d o A m aral Peixoto; edição d e Leda Soares. São
Paulo: SicUiano; Rio de Janeiro; F und a ç ão G e tulio Vargas, 1995, v. 1, p. 26.
” Ver, Lucia M aria Paschoal G uim arães, “A casa d e M o n te z u m a ”. In; H e rm a n n Baeta (c o o rd .). H istória da
O rd em dos Advogados do Brasil - O lA B e os advogados n o Im pério, v, 1. Brasília: OAB, 2003, p. 17-42.
S o bre os p ro je to s ap rese n ta d o s n o lOAB p a ra a cria ç ão d a O rd e m d o s A dvogados, veja-se A urélio W a n d e r
Bastos, “ Luta pela criação e resistências” In; H e r m a n n Baeta (c o o rd .). História da O rdem dos Advogados
do Brasil, v.2. BrasiJia: OAB, 2003.

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m issões n o Poder Executivo, o provim ento de cargos por m eio de concurso de


títulos e a designação de peritos judiciais competentes.
Mas, o alcance das desejadas m udanças não poderia limitar-se apenas à
m oralização do aparato jurídico do Estado. Na ótica dos jurisconsultos, suben­
tendia tam bém a regulamentação d o exercício da profissão de advogado. N este
sentido, c o m o com plem ento ao indicativo de Gualter Ferreira, os sócios Prado
Kelly, A ugusto Pinto Lima e Letácio Jansen defenderam o estabelecim ento da
O rdem dos Advogados. A plenária do Instituto, contudo, decidiu que o m o ­
m ento político não se mostrava oportu no para levar avante tal iniciativa^'. Por
seu turno, o então presidente da Casa, o D r. Levi Carneiro, dava m ostras de
sintonia co m a onda reformista que varria o país, sinalizando a seus pares a
intenção de cooperar com o novo regim e que acabava de se instaurar:

(...) Creio bem que se po dem conciliar, nos momentos excepcionais de vida
nacional, que estamos vivendo, os dois princípios po r que tenho m e em pe­
nhado a nortear a ação deste Instituto; o alheamento completo e sistemático
das competições politico-partidárias; e o interesse constante e desvelado, p e ­
los altos problemas políticos, de que depende a felicidade do nosso povo e o
progresso de nossa Pátria (...) U m e outro nos hão de levar a cooperar, coleti­
va e individualmente, na m edida de nossas forças, em postos em que nos
sintamos capazes de agir com eficiência em face das circunstâncias do m o ­
mento, ou como simples cidadãos (...). Toda a nossa vida política tende, des­
de já, a preparar, a encaminhar essa reforma, proporcionar-lhe o ambiente
p ara que se inspire nos reclamos e nas necessidades da Nação (...) A ela
havemos todos de dar a contribuição de nossa experiência, de nosso saber e
de nosso patriotismo.^^

É im portante observar que o propósito declarado da classe dos advogados


de corrigir distorções no aparato judiciário apareceria, com outras palavras,
em u m dos dezessete pontos do cham ado programa de reconstrução nacional,
apresentado por G etúlio Vargas, ao assum ir a chefia da Nação em 3 de n o v em ­
bro de 1930. Dentre outras m edidas divulgadas, anunciava a intenção de reor­
ganizar o (...) aparelho judiciário no sentido de tornar realidade a independência

lO A B .A fa d a sessão de 30 d e o u tu b r o dc 1930. O s anexos com a in dicação e os respectivos p r o n u n c ia m e n ­


to s n ã o fo r a m e n co n tra d o s.
C onferir, ta m b é m , Levi C arn eiro , “A c o la b o ra ç ã o d o s advo gados n o m o m e n to político ”. I n : ____ , O Uvto

de u m advogado. Rio de Janeiro; A. C oelho B ra n co Filho, Editor, 1943, p. 186-187.

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______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

moral e m aterial da magistratura, que terá competência para conhecer do proces­


so eleitoral em todas a sfa s e f^ .
Consta que, ao tom ar conhecim ento daquele am bicioso programa, que
prom etia até realizar a reforma agrária, e logo ganhou o apelido de heptálogo,
A ntônio Carlos de Andrada, político m ineiro m u ito sagaz, confidenciou ao
conterrâneo Afrânio de M elo Franco, ministro das Relações Exteriores dó novo
governo, (...) ta lv e z, dentro de dez anos, deveriam os mineiros fazer outra revolu-
ção, desta vez para arrancar Vargas dopoder^"*.
D e qualquer maneira, não se pode deixar de reconhecer que havia uma
forte convergência de interesses entre as reivindicações dos filiados da Casa de
M ontezum a e a pauta de trabalho apresentada pelo chefe d o Governo Provisó­
rio. Entretanto, um a declaração de O swaldo Aranha, publicada n o jornal Cor­
reio da M anhã, em 5 de novem bro de 1930 - data e m que assum iu a pasta da
Justiça, causou grande mal-estar na corporação dos advogados;

(...) A revolução não reconhece os méritos adquiridos. Esses direitos eram


decorrentes da Constituição: m as esta já não existe. (...) Estamos diante de
uma situação de fato e não de direito. Estamos, enfim, numa situação revo­
lucionária plenam ente vitoriosa. (...) O próprio Supremo Tribunal Federal,
a cujas portas se bate pedindo habeas corpus, está inibido de agir. Ele existe
em virtude d a Constituição. Estando esta suspensa, ele não poderá fazer sen­
tir sua ação. Repito: não reconhecemos direitos adquiridos. Temos que come­
çar vida nova, em tudo.^^

Sabe-se que Levi Carneiro, presidente do lOAB, procurou p essoalm en­


te O sw aldo Aranha para externar a sua insatisfação, e m virtude das op in iões
em itidas sobre o Suprem o Tribunal Federal. O titular da pasta da lustiça, ao
que parece, preocupava-se co m o resultado do julgam ento do pedido de habeas
corpus im petrado em favor d o presidente d ep osto W ashington Luís. As p o n ­
derações de Levi Carneiro, de que o Suprem o não tom aria conhecim en to do
pedido, concretizaram -se. D e fato, a decisão do Tribunal, cujo relator foi o

^ Ver a tra n s c riç ã o d o p ro g r a m a d e re c o n stru ç ã o na cio n al a p re se n ta d o p o r Vargas n o d ia d e sua posse n a


o b ra d e H é lio SiJva e M aria Cecfíia Ribas C arn eiro. O G o v em o Provisório: ]9 3 }-)9 3 3 . C oleção H istó ria
d a R epúb lica Brasileira, vol. 8. São Paulo; E d ito ra Três, 1975, p. 72-73.
^^Cf. A fonso A rin o s d e M elo Franco, U m estadista da República (A frânio de M elo Franco e seu tem po). R io de
Janeiro: E d ito ra N ov a Aguilar, 1977, p.1016.
Correio da M a n h ã , 5 d e n o v e m b ro d e 1930.

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ex-presidente do lOAB m inistro Rodrigo O távio, conhecida na tarde do m es­


m o dia 5, co n firm o u o argum ento em face da anorm alidade da situação p o lí­
tica do país^^.
O pronunciam ento de Oswaldo Aranha suscitou acalorados debates na
corporação dos advogados, por afetar as prerrogativas do Poder Judiciário. A
supressão do habeas corpus não era nenhum a novidade no passado recente da
história republicana brasileira. Mas tornar público que era inútil recorrer ao
Suprem o Tribunal Federal porque o órgão, em virtude de um a C onstituição
que não m ais vigorava, estava inibido de agir, soava com o um a manifestação de
desprestígio à classe jurídica, ainda que sob pretexto de inaugurar vida nova,
em tudo, inclusive na Justiça.
A historiadora Emilia V iotti da Costa, a propósito dos planos de Getúlio
Vargas, no livro em que exam ina a trajetória do Suprem o Tribunal Federal,
afirma que (...) nem bem chegara ao poder, Vargas deixou clara sua intenção de
intervir no Supremo^. D iga-se de passagem, o s setores m ais radicais da Aliança
Liberal criticavam asperamente a mais alta Corte de Justiça do país. Havia até
quem defendesse a sua extinção. Falava-se, m esm o, em vingança dos tenentes,
um a vez que a Corte Suprema negara vários habeas corpus im petrados em fa­
vor dos militares envolvidos nas insurreições de 1 92 2,1923 e 1924^®. O certo é
que o debate se intensificou, instigado pela imprensa, que censurava diaria­
m ente o desem penho de alguns m inistros do Supremo, sob as mais diversas
acusações, inclusive de corrupção.
Ainda sob o im p acto das declarações de O sw aldo Aranha, n o lO AB, na
sessão de 6 de novem bro de 1930, o só cio Gualter Ferreira apresentou um a
m oçã o de desagravo ao Suprem o Tribunal, onde “havia juizes distintos e
dignos”. N o seu p o n to de vista, o problem a não se resolvia cerrando as portas
do Suprem o, m as sim por m eio de um a depuração n o quadro dos seus m a ­
gistrados^^ .
Em seguida, mais um a vez, Gualter Ferreira insistiu na necessidade da
reforma da organização judiciária, voltando a sugerir que o Instituto represen-

“ H élio Silva e M aria Cecília Ribas C arneiro- O p . cit. p. 74.


Cf. E m ilia V iotti d a C osta, op. cit., p. 66-67.
Sobre o m o v im e n to s tene n tista, ver, d e n tre o u tro s , a clássica o b ra d e V irg ín io S a n ta Rosa, O sentido do
tenentism o. 3» edição. São Paulo: A lfa -ô m e g a , 1976. Ver, ta m b é m , E d g a rd C aro n e, O ten enúsm o. São
Paulo: DIFEL, 1975.
” A “d e p u ra ç ã o ” viria p o u c o s m eses m a is ta rde, q u a n d o G e túlio V argas re d u z iu o n ú m e r o de m in is tro s do
S u p re m o Trib una! d e q u in z e p a ra onze, e em seguida a p o s e n to u c o m p u ls o ria m e n te seis m e m b ro s da
C o rte . Cf. Em ilia V iotti da C o sta , op. cit., p. 66-67.

27
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

tasse ao Governo sobre “a criação imediata da Ordem dos Advogados, tam bém
para expurgar a classe dos advogados dos m aus elem entos”. Desta feita, em
tom solene, o indicativo recebeu aprovação da plenária, do m esm o m o d o que o
discurso proferido por Levi Carneiro, em que indagava: “Merece ser dissolvido
o Suprem o Tribunal Federal?”^” .
N o entendim ento do presidente do Instituto dos Advogados o Supremo
Tribunal deveria ser encarado co m o o órgão constitucional que m elhor se m an ­
tinha dentro dos lim ites das suas atribuições e deveres, pois não com etia abuso
de ingerências co m o o Poder Executivo, n em se anulava na passividade sub­
missa, tal qual o Poder Legislativo:

(...) A função do Tribunal é, sem dú vida, conservadora e, p o r isso mesmo,


corre o risco de parecer, em certos casos, reacionária. (...) Haveis, con tu ­
do, de p e r m itir que recorde o episódio do mês passado - quando o Poder
Executivo (...) chegou a f a z e r p re n d e r dois d epu tados federais, estando o
Congresso a funcionar, sem que p artisse deste u m a só p a la v ra de pro tes­
to; e 0 Suprem o Tribunal Federal se decidiu a conceder, em pleno estado
de sítio, 0 habeas corpus im p e tra d o em fa v o r daqueles dignos congressis­
tas (...) D e certo os hom ens que ali se reúnem não têm o m érito da infa­
libilidade. N em uns o teriam (...) Evitemos, porém , desprestigiar a “jó ia
das instituições republicanas'] na expressão de R ui Barbosa, e a té mesm o
o conjunto dos m agistrados que a com põem . A in da que, in d iv id u a lm e n ­
te, possam ter errado esses homens, ou alguns deles possam merecer c ríti­
cas - talvez mesmo, em p a r te pela influência, a té certo p o n to inevitável,
do am bien te político, ou p o r certos pendores inerentes à educação ju r íd i­
ca - não esqueçamos que representam a m ais bem -sucedida criação da
C onstituição de 1891.^'

A citação é longa, porém bastante esclarecedora. O pronunciam ento de


Levi Carneiro causou reações contraditórias. Na imprensa, as hostes m ais radi­
cais da Aliança Liberal lançaram graves incrim inações sobre o lOAB, acusan­
d o -o inclusive de manter-se solidário co m o governo deposto. O jornal A Es-

IOAB,i4ffl da sessão do /O AB, 6 d e n o v e m b ro de 1930. A rq uivo d o lOAB.


Id e m , ib id e m . Ver, ta m b ém , Levi C arn eiro , "Ü S u p re m o T rib u n a l e o m o m e n to político". I n : _______ , O
Livro de u m Advogado. O p. cit. p. 189-190.

28 •Ál
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

querda fez um a apreciação severa do discurso, que mereceu a vigorosa réplica


do jurisconsulto publicada no Jornal do Commercio^^.
Os setores moderados, por outro lado, pareceram recebê-lo com especial
agrado. E tudo leva a crer que o m esm o tenha ocorrido com o chefe do Gover­
no Provisório, pois de acordo com Barbosa Lima Sobrinho, (...) os tenentes que­
ria m reform as em ritm o acelerado. E G etúlio Vargas p referia ir devagar,
manhosamente^^. Aliás, no Diário de Vargas, nas anotações relativas ao dia 5 de
novem bro de 1930, percebe-se que o chefe do Governo Provisório andava m es­
m o preocupado em atenuar os rompantes dos seus correligionários:

(...) Almoço e, às 14 horas, desço ao salão de despachos. A í atendo os ministros da


Guerra, Marinha e Justiça. Combinamos várias medidas. É preciso combinar um
limite, ou antes, temperar os poderes ditatoriais que me confere a Revolução, para
que não atente contra os ideais da mesma com medidas restritivas da liberdade que
possam ser consideradas como continuação do antigo regime(o grifo é nosso)^.

Mas, se Vargas mostrava-se inquieto diante dos excessos de retórica e do


radicalismo de alguns correligionários, as ponderações do Instituto e de seu
presidente, em especial, pareciam vir de encontro ao desejo expresso no seu
Diário de temperar os poderes ditatoriais. N ão por acaso, dias depois do in ci­
dente, Levi Carneiro seria encarregado de redigir a Lei Orgânica do Governo
Provisório, editada em 11 de novem bro de 1930, e logo em seguida nom eado
para exercer as funções de Consultor-Geral da República” .
N ão vem ao caso repetir todas as medidas discricionárias dispostas naquele
documento. Já o fizemos nas páginas iniciais deste capítulo. Porém, é importante
frisar que, consoante as idéias defendidas no pronunciamento de Levi Carneiro^, a
Lei Orgânica manteve em funcionamento o Poder Judiciário Federal, dos Estados, do

" Cf. Le%i C arn eiro . “O In s titu to e o m o m e n to po litico" (C arta ao Jornal do C om m ercio, d a ta d a d e 9 de
n o v e m b ro d e 1930). Ver, ta m b é m , Levi C arn eiro , “A inda o S u p re m o T rib u n a l e o m o m e n to político ”
(C a rta d irigid a ao jo rn a l A Esquerda, d a ta d a de 11 de n o v e m b ro d e 1930). Id e m , p. 191-194.
" Cf. B arb osa Lima S o b rin h o , P reíen fd d e A lb e rlo Torres (Sua vida e pensam ento). Rio d e Janeiro: C ivilização
Brasileira, 1968, p. 505.
Cf. G e túlio Vargas, Diário. A p re se n ta ç ão d e CeJina Vargas d o A m a ra l Peixoto; edição d e Leda Soares. São
Paulo: Siciliano; Rio d e lan e iio ; F u n d a ç ão G etúlio Vargas, 1995, v. 1, p, 22.
A nos m ais tarde, d u ra n te o.s tra b a lh o s d a Assem bléia C o n stitu in te d e 1934, Levi C a rn e iro c o n firm aria
p u b lic a m e n te a re dação da Lei O rg â n ic a d o G o v e rn o Provisório. Cf. Levi C arn eiro , Pela N ova Cartslilui-
ção. Rio d e Janeiro; A. C o elh o B ra n co Filho, 1936, p. 608.
£ im p o r ta n te le m b ra r q u e Levi C a rn e iro foi responsável pe lo a n te p ro je to d e re o rg a n iz a çã o d o S u p re m o
T rib u n a l Federal. Ver, a in d a , E m ilia V io tti da C osta, op. cir., p. 68-70.

29
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Território do Acre e do Distrito Federal, exercido em conformidade com as leis em |


vigor, embora sujeitas a modificações que pudessem ser adotadas de acordo com I
aquela lei e a restrições que dela decorressem. D o m esm o m odo, preservou o instituto i
do habeas corpus, ainda que somente em favor dos réus ou acusados em processos de }
crimes comuns, salvo os funcionais e os da competência de tribunais especiais^^. ■
Ao que tudo indica, o m om ento tam bém se mostrava propício para postu- ;
lar junto ao Governo Provisório o estabelecimento da Ordem dos Advogados. A \
proposta deveria ser examinada pelo próprio presidente do Instituto, o Dr. Levi |
Carneiro, recém -nom eado consultor-geral da República^®. A lém disso, em face j
da situação de excepcionalidade, a demanda não corria o risco de sofrer qualquer |
interferência do Congresso, conforme ocorrera em outras oportunidades, a exem­
plo do projeto preparado em 1916 por Armando VidaJ, que permaneceu confi- |
nado na Comissão de Justiça e Legislação do Senado durante nove anos^^. ;
À luz dessas circunstâncias, não é de se estranhar que Edmundo de Miranda [
Jordão, na sessão ordinária de 13 de novembro, tivesse apresentado um projeto que :
criava a Ordem dos Advogados, assinado por ele, Gualter Ferreira, Edgard Ribas Car- j
neiro e Ricardo Rego. E, o que é mais sugestivo, obteve aprovação imediata na plena- ;
ria do Instituto, sem maiores discussões, ficando o próprio Levi Carneiro encarrega- [
do de encaminhá-lo ao ministro da Justiça. O documento, bem simplificado por ;
sinal, definia apenas quem poderia filiar-se à entidade e habilitar-se à profissão. Pre- j
via, também, os casos em que seria permitido aos provisionados advogar^.
Ao final daquela sessão, todavia, o Dr. Astolfo de Rezende propôs um voto
de louvor ao governo pela promulgação do D ecreto n.° 19.408, que reorganiza­
va a Corte de Apelação do D istrito Federal - e deveria ser publicado no Diário
Oficial do próxim o dia 18. Sem que ninguém de antem ão soubesse, a Ordem
dos Advogados já estava constituída"*'.
A historiografia, talvez influenciada pelas palavras de André de Faria Pe­
reira, de que a criação da Ordem foi um milagre^ diante do m om ento político

A rt. 3.° e a rt. 5.° § ú n ic o d o D e creto n.® 19.398, d e 11 d e n o v e m b ro d e 1930.


" Levi C arn eiro a b riu m ã o d a p re sid ên c ia d o lOAB, e m 27 de n o v e m b ro d e 1930, a leg and o in c o m p a tib ilid a ­
de d o cargo c o m as fu n ç õ e s q u e a ssu m ira de c o n su lto r-g e ra l d a R epública. A re n ú n c ia , to d av ia, n ã o foi
aceita p e la p le n á ria d o In stitu to .
” Cf. A u rélio W a n d e r Bastos, op.cit., p. 218.
S o m e n te n o s casos d os m u n ic íp io s o n d e n ã o h o uvesse m e m b ro s d a O rd e m , o u p o r im p e d im e n to c o m p ro ­
v a d o destes, seriam a d m itid o s a ad v o g ar os p ro v isio n a d o s pelo s T rib u n a is S u p erio res d o s respectivos
Estados.
■" Ver, à e n u e ouíro s, A lh e r to V e n a n c io Filho, N o tícia histórica íia O rdem dos A dvogados do Brasil {1930-]9S0).
Brasília; OAB, 1982, p. 21.

30 màM
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim e iro s Percursos o D esd tio s 11 9 3 0 - 1945)

que o país atravessava, costum a dar grande ênfase ao fato de que a entidade
nascera no bojo de um a das m uitas m edidas exceções, decretadas por G etúlio
Vargas, n o contexto pós-revolucionário. Todavia, se atentarmos para as p o si­
ções ocupadas no jogo político pelos principais atores envolvidos nesse ep isó­
dio, perceberem os que o milagre não foi tão extraordinário quanto se propaga.
A grande surpresa, por certo, foi a iniciativa do procurador Faria Pereira que,
por obra d o destino, acabou precipitando o s acontecim entos.

1.2 A Ordem como obra da revolução

D e acordo co m o art. 17 d o D ecreto n° 19.408, de 18 de novem bro de


1930, a O rdem dos Advogados deveria ser regida pelos estatutos votados pelo
Instituto da Ordem dos A dvogados Brasileiros, com a colaboração dos Institu­
tos dos Estados, e aprovados pelo governo. Para cum prir tal dispositivo, o pre­
sidente do Instituto, o Dr. Levi Carneiro, designou um a com issão especial, en ­
carregada de formular o anteprojeto do Regulamento. Integravam o grupo os
bacharéis M oitinho Dória (presidente), Edm undo de M iranda Jordão, A n tô ­
n io Pereira Braga, Edgard Ribas Carneiro, Gabriel Bernardes, Gualter Ferreira e
A rm ando Vidal, cabendo a este últim o desem penhar as funções de relator.
A rm ando Vidal possuía larga experiência na matéria, porquanto não só
participara da elaboração de u m projeto semelhante, encam inhado pelo Insti­
tuto ao Legislativo em 1916, co m o tam bém organizara um a coletânea dos prin­
cipais trabalhos relativos ao tema, publicada em 1925"*^. Isto possibilitou à c o ­
m issão concluir os seus trabalhos em duas semanas - um a jornada olím pica,
por assim dizer^^.
O anteprojeto foi exposto na sessão ordinária de 4 de dezembro de 1930. À
discussão do documento, que compreendia cinqüenta e oito artigos, seguiram-se o
exame e a votação das diversas emendas oferecidas. Dentre os indicativos aceitos
pela plenária, destacava-se a sugestão apresentada pelo Clube dos Advogados de
alterar o nom e da entidade para Ordem dos Advogados do Brasil. Por outro lado,
em m eio às emendas rejeitadas, salientava-se a que instituía a classe dos estagiários,
com o objetivo de acolher estudantes de Direito nos quadros da Ordem.

Ver A rm a n d o Vidal, "A criação d a O rd e m d o s A d v o gad o s (co letânea d os p rin c ip a is frab a ih o s relativos a
esse a ss u n to ). B oletim d o IOAB,n® 2, v. 1, 1925. Ver, ain da , A u rélio W an d e r Bastos, op. cit., p.219.
Cf. A lb e rto V en an cio Filho, N o líá a histórica áa O rd e m dos Advogados do Brasil, op. cit., p. 31.

31
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

A proposta dividiu a assembléia dos jurisconsultos. Encam inhando a v o ­


tação» pronunciaram -se a favor do estágio C ândido M endes, Miranda Jordão,
Letácio Jansen, Sérgio M acedo e H aroldo Valadão. M anifestaram-se contra os
associados Murgel de Rezende, Gualter Ferreira, A rm ando Vidal e Levi Carnei­
ro, corrente que acabou prevalecendo, com a tese sustentada por Levi Carneiro
de que (...) sem a exigência do estágio, melhor se acentuará afeição m oderna da
Ordem (...) de órgão de simples disciplina, que não estabelece gradações artifici­
ais, nem cria situações de dependência da pessoa p ara o exercício da profissão'^'^.
N os debates internos, realizados nas sessões extraordinárias de 9 e 18 de
dezembro, há que se notar, tam bém , a declaração de voto em separado do D r.
Eurico de Sá Pereira, pronunciando-se contrário ao estabelecim ento da Or­
dem , como órgão de seleção e disciplina dos advogados. N o seu entender, tratava-
se de (...) instituição de natureza anti-republicana, de caráter exclusivista tanto
mais revoltante quanto atinge uma profissão liberal. Para reforçar essas prem is­
sas, o D r. Sá Pereira iria ainda m ais longe, afirm ando que:

(...) Pelo projeto, queiram ou não, esiimula-se a form ação das mestrias,
corporações e ju izados de ofício, cuja natureza a O rdem dos Advogados pa r­
ticipa (...) o preconceito do diplom a acadêmico empresta autoridade de um
direito, está no projeto de seus Estatutos, onde a influência do interesse pes­
soal ou as prevenções injustificáveis já repontam em alguns dispositivos com
ataque mais forte à liberdade profissionaF .

Os argum entos de Eurico de Sá Pereira, que em última análise defendiam


o exercício prático da advocacia, foram vivam ente contestados na assembléia
do Instituto. E, diga-se de passagem, mais tarde, m ereceriam um a extensa ré­
plica de Levi Carneiro, com direito inclusive a citações eruditas, de consagra­
dos jurisconsultos estrangeiros, a exem plo de Laband e ZanardeUi, no parecer
que expediu sobre o projeto do Regulamento:

(...) Devo, aliás, acentuar que, se me parece indefensável, não só perante a


Constituição de 1891, mas perante os interesses coletivos, a noção de plena e
irrestrita liberdade profissional - muito mais absurdo se m e afigurou sempre

Cf- Levi C arn eiro , “ Parecer e m itid o c o m o C o n sid to r-G e ra l da R ep ú b lica so b re o p ro je to d c R egulam ento
d a O rd e m d o s A d v o gados”. I n : _______ , O Livro de u m A dvogado. O p . cit., p. 265-266.
Boletim do lO A B , n° 5, v. V III, d e ze m b ro d e 1930, p u b lic a d o em a b ril de 1931.

32 9A%
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiro s Percursos c D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

adm itido o chamado “privilégio acadêmico”, exigidas provas de habilitação


para o exercício das profissões liberais ficasse, entretanto, este mesmo exercí­
cio livre e desenfreado de qualquer condição de ordem m oral.

Mas, voltem os ao anteprojeto do Regulamento. Publicado na edição do


Jornal do Commercio de 18 de janeiro de 1931, foi encam inhado para a apreci­
ação dos vários Institutos de A dvogados n os Estados e recebeu, de sete deles -
São Paulo, M inas Gerais, Rio Grande do Sul, Bahia, Paraná, Espírito Santo e
M aranhão - num erosas observações e emendas'*^.
As contribuições das entidades estaduais foram divulgadas na imprensa
e incorporadas pela com issão do lO A B na redação final da proposta en cam i­
nhada ao m inistro da Justiça'*^. D e acordo com os trâmites burocráticos, o
m inistro deveria repassar o d o cu m en to ao consultor-geral da República, a
qu em incum bia estudar o processo, em itir o respectivo parecer e preparar a
m inuta do decreto de aprovação. Em term os práticos, isto significa dizer que
0 anteprojeto, novam ente, seria su bm etido ao crivo de Levi Carneiro, para os
ú ltim o s ajustes.
D e fato. O d o c u m e n to original levad o a o m in istr o da Justiça sofreu
significativas alterações, p assand o de cin q ü en ta e oito para cento e o ito ar­
tigos D e u m m o d o geral, Levi C arneiro, ao redigir o projeto final, p r e o c u ­
p o u -s e em acentuar os traços m ais característicos da O rdem : a u to n om ia
plena, recrutam ento rigoroso e disciplina severa. C o m o serviço pú blico fe-
deraly seus bens, serviços e o exercício de seus cargos ficavam isen tos de
im p o sto s ou contrib u ições. P orém , diferente das d em ais repartições p ú b li­
cas, órgão disp oria de p a trim ô n io próp rio, fo rm a d o por d on ativos, lega­
dos, subvenções, bens adquiridos, além da receita proveniente da c o n tr i­
b u içã o das taxas anuais e de inscrição dos filiados, m ultas e outras fontes de
arrecadação^®.
A entidade não se subordinava à magistratura, uma vez que era dotada de com ­
petência exclusiva para todos os atos disciplinares sem, contudo, excluir o recurso
judicial em casos de suspensão ou expulsão de advogado dos seus quadros, pois me-

“ Cf. Levi C arn eiro , O Itvro d e u m advogado, op. cit. p. 250 a 253.
A p e n as o In stitu to de P e rn a m b u c o d e ix o u de d is c u tir o assunto.
T a m a n h a m ob ilização , s u rp re e n d e u Levi C arn eiro , le v a n d o -o a a firm a r q u e ra ra m e n te a e la b o ração de
a lg u m a lei d esp ertav a tã o larga e interessad a p a rtic ip a ç ão . Id e m , p. 258-259.
S o b re a d istrib u iç ã o da re n d a e n tre as d iv ersas in stân cias d a O rd e m , ver a rtig o 7° d o Regulam ento d a OAB
n o Anexo.

33
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

recia proteção judicial (...) o direito de exercer a profissão - denegado, ou tolhido pela
recusa da inscrição, pela supressão temporária, ou pelo cancelamenü) definitive^ .
D o ponto de vista da estrutura e funcionamento, a instituição adotava uma
espécie de m odelo federativo, por assim dizer. Compreendia um a seção central,
com sede no Distrito Federal, seções em todos os estados e no território do Acre,
localizadas nas respectivas capitais. Cada seção teria personalidade jurídica própria,
gozando de autonom ia administrativa, podendo desdobrar-se em subseções, con­
soante as várias comarcas do seu território, de acordo com a quantidade de advo­
gados, provisionados o u solicitadores ali inscritos. Cabia aos governos federal e
estaduais providenciar instalações condignas para a Ordem e seus arquivos, de pre­
ferência no Palácio da Justiça, no fórum ou no prédio do Tribunal Superior.
Q uanto ao funcionam ento, no âm bito nacional, as atribuições da Ordem
seriam exercidas pelo C onselho Federal, e pelo presidente e secretário-geral;
nas seções peia assembléia geral e pelo conselho; na subseções, pela diretoria e
pela assembléia geral. Em todas as suas instâncias, a O rdem não poderia discu­
tir nem se pronunciar sobre assunto não atinente às respectivas finalidades,
ficando assim subentendido o seu caráter apolítico.
As norm as moralizadoras, com o já era de se esperar, ganharam especial
realce n o Regulamento. Aliás, o parecer de Levi Carneiro dava grande ênfase a
esse aspecto; (...) ]á escrevi que as maiores deficiências, que se poderiam n otar na
Constituição de 1892, são o exagerado amoralismo e o exagerado individualismo.
A O rdem - dom inada p o r preocupações evidentes de socialização e de moralização
- i a primeira criação com o intuito de corrigir essas ten dên cia^ '.
Os casos de proibição - ou de incapacidade perm anente de exercício da
advocacia - alcançavam o s juizes federais e locais, de tribunais administrativos,
militares ou especiais e, n o m esm o sentido, os m em bros do M inistério Público
em processos contenciosos ou administrativos, cuja matéria pudesse incidir
nas funções de seus cargos; os funcionários e serventuários da Justiça; autori­
dades e funcionários policiais e m matéria criminal; os funcionários da Fazen­
da, exatores ou fiscais; os inibidos de procurar em juízo, o u de exercer cargo
público, em virtude de sentença judicial transitada em julgado; o s corretores de
fundos públicos, de mercadorias, o u de navios, os agentes de leilões, trapicheiros
e empresários, o u administradores de armazéns gerais; as pessoas não habilita­
das segundo as norm as do Regulamento e as demais pessoas proibidas por lei.

^ Id em .
Levi C arn eiro , op. cií-, p. 257.

34
V o lu m e 4 C r ia ç a o , P rim e iro s Percursos e D c s a tio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

Já as situações de im pedim ento - ou incompatibilidade ocasional - atingi­


am os chefes do Poder Executivo, ministros ou secretários de Estado, da União,
dos Estados e do território do Acre; os chefes do Executivo Municipal, no territó­
rio respectivo; os juizes suplentes quando no exercício pleno da jurisdição, ou,
em qualquer caso, perante o juízo a que pertencessem; os funcionários públicos
administrativos e os m em bros do Poder Legislativo federal, estadual o u m unici­
pal, com o procuradores de empresa concessionária de serviço público, subvenci­
onada pelos cofres públicos, o u da qual a Fazenda Pública fosse acionista ou asso­
ciada, e em toda e qualquer causa contra a Fazenda Pública e as pessoas declara­
das impedidas pelas leis e regulamentos federais, estaduais o u municipais^^.
Para a admissão n os quadros da Ordem o Regulamento exigia, expressa­
m ente, que o candidato possuísse conduta ilibada na vida pública. Além dos re­
quisitos legais de capacidade civil, deveria ter o grau de bacharel, ou de doutor
em Direito, por faculdade reconhecida o u por faculdade de país estrangeiro le­
galmente reconhecida, confirmado o título no Brasil; deveria ser brasileiro, nato
ou naturalizado e alistado com o eleitor. Os estrangeiros eram admitidos nas m es­
mas condições estabelecidas para os brasileiros em seus respectivos países de ori­
gem, ressalvados os direitos dos que já exercessem a advocacia n o Brasil. Vedava-
se a inscrição aos que estivessem proibidos de exercer a advocacia, do m esm o
m o d o aos condenados por sentença de que não coubesse recurso ordinário por
crimes com o incêndio e outros de perigo com um , prevaricação, suborno, con­
cussão, peculato, abuso de autoridade, crimes de falsidade, contrabando, lenocínio,
hom icídio qualificado, destruição de livros e docum entos, furtos e apropriação
indébita, fraudes e estelionato, roubo, extorsão, crimes contra a independência, a
integridade e a dignidade da Pátria e, ainda, em quaisquer outros crimes e co n ­
travenções com etidos com agravantes do Código Penal, ou em qualquer crime
ou contravenção definido nas leis que ulteriormente viessem a modificar ou subs­
tituir os dispositivos acima citados, referentes às m esm as figuras delituosas .
A Ordem , entretanto, não poderia recusar o ingresso de m em bros a pre­
texto de convicções ou atitudes políticas, nem de indivíduos condenados por
crime de natureza política, salvo os expressamente indicados n o Regulamento.
Reprimia-se rigorosam ente, o uso indevido das insígnias e do título de advoga­
do. N este sentido, a carteira de identidade expedida pela OAB passava a ser o
docum ento que deveria acompanhar toda a vida profissional do advogado, apon-

" Cf. D ecreto n " 20.784, d e 14 d e d e z e m b ro d e 1931.


Id e m , ib id em .

35
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

tar as faltas e penalidades sofridas e habilitá-lo a exercer sua atividade, com o


título com probatório de inclusão n os quadros da entidade.
O R egulam ento reconhecida os direitos ad q u irid os d os provision ados
e solicitadores, ga ra n tin d o -lh es a inscrição na O rdem , p o rém em quadro
próprio, m ediante autorização da respectiva provisão, c o m prazo legal, as­
sinada pela autoridade judiciária federal o u local co m p e te n te e registrada
na Secretaria da Ordem^^. A par disso, concedia aos estudantes das facul­
dades de D ireito, após a con clu sã o do terceiro ano d o curso jurídico, a u to ­
rização para obter carta de solicitador^^. Tanto os p ro v isio n a d o s quanto os
solicitadores estavam sujeitos a to d o s os deveres e p en a lid a d es previstas,
em bora im p ed id o s de tom ar parte nas d iscu ssões e d elib erações da assem ­
bléia da entidade.
N o que se refere às penalidades e sanções, o poder de punir disciplinar-
m ente os advogados, provisionados e solicitadores era privativo do Conselho
da Seção em que estivessem inscritos, cabendo entretanto recurso ao C onselho
Federal. Por outro lado, dentre os direitos dos filiados, além da garantia do
sigilo profissional e dos atos pertinentes ao livre exercício da profissão, previa-
se a formação, em cada Seção, de um fundo de assistência, com o intuito de
auxiUar os m em bros necessitados, quando inválidos o u enferm os.
A nualm ente, em data previam ente agendada, os C on selhos de todas as
seções deveriam reunir-se em C onselho Federal, na capital da República, a
fim de expor relatório c o m as principais ocorrências d o exercício findo, d eci­
dir sobre providências a tom ar o u m edidas a sugerir aos poderes públicos.
Cabia ao C onselho Federai, dentre outras atribuições, eleger o Presidente e o
Secretário da O r d e m ^ , deliberar em grau de recurso sobre a aplicação e o
cancelam ento de pu n ições, bem com o sobre o ingresso de filiados. Votar e
alterar o cód igo de ética profissional, prom over diligências e adotar o m o d elo
das vestes talares - prerrogativa, aliás, concedida aos m em b ros do Instituto
da O rdem dos A dvogados Brasileiros por D. Pedro II, através d o D ecreto n®

" H o u v e in stitu to s, c o m o o d e São Pau lo , q u e p o s tu la ra m a e x tin ç ão d o s ad v o g ad o s p ro v isio n a d o s e dos


solicitadores, c o m ba se e m leis estad u ais que im p e d ia m a concessão d e n o v as provisões. E m c o n tra p a rtid a ,
d e o u tro s p o n to s d o p a h , s o b re tu d o d o e sta d o d e M in a s Gerais, a flu ira m reclam açõ es e a d v ertên cias em
favor d os interesses d os praxistas. Cf. Levi C a rn e iro ,“ Parccer e m itid o c o m o C o n s u lto r G eral da R ep ú b li­
ca so b re o p ro je to de R egulam ento d a O rd e m d os A d v o gados”. I n ; _______ , O livro de u m advogado. Op.
c it.,p . 267.
A rtigo 14 d o Regulam ento.
“ O p re sid en te e o sec retário -g eral seriam eiçitos b ie n a lm e n te p e lo C o n se lh o Federal, e m sessão esp ecial­
m e n te con v o cad a p a ra esta finalid ad e, d e n tre os ad v o g ad o s in scrito s n o s q u a d ro s d a O rd e m .

36 •Ál
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiro s Pcrcursos e D e s a fio s ( 1 9 1 0 - 19451

393, de 23 de novem bro de 1844, e que apesar do fim do regim e im perial não
fora revogada^^.
Também era de com petência exclusiva do C onselho Federal - exceto em
caso de urgência, quando a atribuição recaía sobre o Conselho da Seção do
D istrito Federal, subm etida, entretanto, à aprovação daquele em sua primeira
reunião - a votação e alteração do código de ética profissional, ouvidos os C on ­
selhos das seções e as diretorias das subseções; a prom oção de quaisquer d ili­
gências, ou verificações, relativamente ao funcionam ento da Ordem em qual­
quer Estado, adotando as m edidas que entendesse convenientes a b em da sua
eficiência e regularidade, inclusive com a possibilidade de designação da dire­
toria provisória; a organização do regim ento interno; a cassação ou revogação
de qualquer deliberação contrária ao Regulamento; e a uniform ização, tanto
quanto possível, dos regim entos internos das várias seções da Ordem^®.
Em síntese, o Regulamento, previsto a princípio para entrar em vigor em
1- de m aio de 1932, fixava os principais parâmetros éticos para o exercício da
profissão. Definia, tam bém , que a organização da Assistência Judiciária no D is­
trito Federal, nos estados e no território do Acre ficava sob a jurisdição exclusi­
va da Ordem. Finalm ente, nas disposições transitórias, determinava que o
Conselho da Seção do D istrito Federal desempenharia as atribuições do C o n ­
selho Federal, e o presidente daquele Conselho as do presidente da Ordem, até
que se instale o C onselho Federal. Indicava, ainda, que dos vinte e um m e m ­
bros do C onselho do D istrito Federal, dez deveriam ser eleitos em assembléia
geral e os onze restantes pelo C onselho Superior do lOAB^®.
A esse respeito, aliás, cumpre esclarecer que o estabelecimento da Ordem pro­
vocou alterações estatutárias no lOAB, bem com o nos Institutos estaduais^. Estas
agremiações tiveram suas finalidades redefinidas, passando a se dedicar ao estudo do
Direito em geral, especialmente do direito pátrio e das reformas que devam ser
introduzidas na legislação; a assistência judiciária; defesa dos interesses da classe dos
advogados e a difusão da cultura jurídica. Não vem ao caso entrar em detalhes sobre
todas alterações que se operaram; todavia, deve-se mencionar que foi instituído nos
Institutos um Conselho Superior, integrado por membros vitalícios, ao qual compe­
tia eleger parte dos Conselhos seccionais da Ordem.

Ver, Lucia M aria Pasch o al G u im a rã e s, op. cit., p. 27.


Cf. D ecreto n" 2 0 7 8 4 , d e 14 d e d e z e m b ro de 1931.
Sobre as alteraçõ es q u e se p ro c e ss a ra m n o lOAB, ver A urélio W an d e r Bastos, op. cit., p. 234.
^"Segundo Levi C arn eiro , h o u v e q u e m te m e sse q u e co m a criação d a O rd e m os in s titu to s estad u ais
fossem extintos, o q u e n ã o o c o rre u .

•41 37
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

A promulgação do Regulamento, aprovado pelo D ecreto n .“ 20.784, de 14


de dezembro de 1931, separou form alm ente a OAB dos Institutos, que se co n ­
verteram em órgão de natureza doutrinária, voltados para o desenvolvim ento
dos estudos jurídicos. Para tanto, a própria Ordem deveria garantir-lhes os meios,
contribuindo anualmente com um a parcela dos seus rendim entos^'.
Em estudo recente, o Prof. Aurélio Wander Bastos conclui que o ato de
criação da Ordem, do m esm o m o d o que os sucessivos dispositivos regulamen-
tares, editados ao longo da década de 1930, revelam estreita consonância com
as transformações institucionais prom ovidas pelo governo de G etúlio Vargas.
N a opinião de Wander Bastos, tais decretos (...) não propriam ente absorveram
as experiências históricas internacionaisy mas a evolução contextual e as circuns-
tâncias da vida profissional, dos estatutos, dos projetos e debates parlamentares
sobre a criação da Ordem dos Advogados no Brasil^^.
De qualquer m odo, não se pode deixar de registrar que a instituição da
Ordem dos Advogados do Brasil seria identificada co m o obra em blem ática da
“revolução de 30”. Considerada, inclusive, um a das m edidas revolucionárias
que deveriam contribuir para remodelar a nacionalidade, co m o se lê n o parecer
que Levi Carneiro, na qualidade de consultor-geral da República, assinou em
15 de novem bro de 1931, pronunciando-se pela aprovação do Regulamento:

Triunfante a revolução de outubro, menos de um mês depois, o Decreto n^


19.408, de 18 de novembro de 1930 (art. 17) criava a O rdem como órgão de
disciplina e seleção da classe dos advogados do país. A revolução deu-lhe,
assim, um alto significado. Enquadrou-a entre as reformas que devem re­
modelar a nacionalidade (...) E não terá errado. Porque a O rdem dos A d v o ­
gados é uma das criações necessárias à moralização da vida pública nacio­
nal, que todos sentimos urgente empreender. (...) A lei orgânica da Ordem
dos Advogados vai preceder no regime atual à própria lei orgânica do Judici­
ário, em que deve assentar a reforma eleitoral e a reorganização constituci­
onal do país. Pode considerar-se, assim, a prim eira das grandes leis orgâni­
cas que a Revolução determinará

Id e m , ibidem .
" Cf. A u rélio W an d e r Bastos, op. d i . , p. 234.
Cf-Levi C arn eiro , "Parecer e m itid o c o m o C o n su lto r-G e ra l d a R epública so b re o p ro je to de Regulam ento da
O rd e m d os A dvogados”. I n : _______ , O Livro de u m Advogado. O p . c i t , p. 257.

38
V o lu m e 4 C ria ç ã o . P rim eiro s Percursos c D esa fio s ! l ‘ ) 3 0 - 1 9 4 5 )

1.3 A implantação da Ordem

C om o já se m en cio n o u anteriorm ente, o Regulamento, no seu artigo 4®,


previa a criação de u m C onselho Federal para o exercício das atribuições da
OAB no âm bito nacional. C ontudo, até que se com pletasse a organização defi­
nitiva da entidade, tais funções seriam exercidas pelo C onselho da seção do
D istrito Federal e o presidente deste C onselho as do presidente da O r d e m ^ .
D e acordo com o Regulamento-, não é demais repetir: dos 21 m embros do
C onselho d o Distrito Federal, dez deveriam ser eleitos pela assembléia geral, e os
restantes pelo C onselho Superior do Instituto da Ordem dos Advogados Brasilei­
ros^^ . Em cum prim ento a esse dispositivo, o lOAB escolheu os m em bros do seu
C onselho Superior em sessão de 30 de dezembro de 1931. Integravam-no os ad­
vogados Armando Vidal, Justo de Moraes, Edm undo de Miranda Jordão, A ntô­
nio M oitinho Dória, N ilo C. L. Vasconcelos, Zeferino de Faria, Levi Carneiro,
A ntônio Pereira Braga, Gabriel Bernardes, Cândido Mendes de Almeida e Gualter
Ferreira. Esses conselheiros, por sua vez, elegeram, em 5 de janeiro de 1932, Levi
Carneiro para presidente do Conselho da Ordem da seção do Distrito Federal e,
por conseguinte, presidente provisório do Conselho Federal da OAB.
A primeira representação - que não dizia respeito à inscrição nos quadros
- dirigida à Ordem dos Advogados, foi encam inhada por Jacy de Assis, advoga­
do de Goiás que se dizia ofendido por um prom otor em u m processo. A repre­
sentação foi exam inada em 30 de dezem bro de 1931 e repassada ao C onselho
Superior do Instituto dos A dvogados de Goiás, sob a justificativa de que a c o m ­
petência para julgam ento da causa ainda não era da O rdem dos Advogados,
um a vez que o Regulamento ainda não começara a vigorar^®.
M uitos fatores dificultaram a im plantação da Ordem dos A dvogados nos
estados e no território do Acre. A com eçar pela grande extensão territorial do
país, com num erosos m unicípios e comarcas. Isto im pediu a observância do
prazo fixado para cum prir as determ inações regulamentares, o que levou o
C onselho a pedir ao G overno Provisório, em três ocasiões, o adiam ento da data
da entrada em vigor do Regulamento.
A lém disso, ficara estabelecido que nas capitais onde não houvesse insti­
tuto estadual a organização da Ordem seria confiada ao Poder Judiciário local.

” A rt. 102 § 5 d o D ecreto n “ 20.784, d e 14 d e d e z e m b ro de 1931.


A rt. 67 d o D ecreto n “ 20.784, d e 14 d e d e z e m b ro d e 1931.
“ A m da sessão da O A B /D F , 30 d e d e z e m b ro d e 1931.

«àB 39
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Tratava-se de uma deferência para com a magistratura e, ao m esm o tem po,


um a forma de limitar a ingerência estatal, ou seja, a ação dos interventores
designados por Getúlio Vargas. Procurava-se, desse m od o, preservar outro pre­
ceito fundamental da Ordem - o da autonom ia plena.
O artigo 104 estipulava que a organização da O rdem n os estados e
comarcas deveria estar concluída até 90 dias antes da data determ inada para a
vigência do Regulamento (1° de m aio de 1932). A consecução deste dispositivo
trouxe à tona o antigo problem a do relacionamento instável entre os juizes,
representantes do Estado, e os advogados, representantes da sociedade e m e d i­
adores entre interesses privados e interesses públicos. A intervenção dos juizes
foi inevitável, gerando um a série de conflitos. N este sentido, a Seção da OAB
do estado de São Paulo oferece u m exem plo bastante ilustrativo do contencioso
em relação à comarca de Cam pinas, que mereceu inclusive a manifestação de
Levi Carneiro, presidente provisório do C onselho Federal da Ordem.
O presidente da seccional paulista, D r. Plínio Barreto, na sessão de 23 de
m arço de 1932, acusou o recebim ento de u m ofício, datado de 12 de março e
redigido “em term os desatenciosos”, assinado pelos juizes das 1.® e 2." Varas de
C am pinas, resp ectivam en te N e ls o n de N o r o n h a G u stavo e V. Sm ith de
Vasconcellos. 0 docum ento contestava as deliberações tom adas pela Ordem,
em sessão do dia 4 daquele m ês, publicadas no jornal Estado de S. Paulo, a
saber; I - a organização da O rdem n o Estado em subseções que funcionari­
am nas comarcas designadas pela Seção; 2." - a obrigação de remeter ao tesou­
reiro da diretoria provisória toda a renda líquida das subseções; e 3.® - o estabe­
lecim ento da com petência da diretoria da Seção para deferir os requerimentos
de inscrição dos advogados de to d o o Estado.'^^
Os juizes de Campinas ponderaram que tais resoluções contrariavam o espí­
rito da lei e infringiam os preceitos do Regulamento baixado com o Decreto n.®
20.784, não podendo ser obedecidas. A primeira deliberação eles classificaram com o
precipitada, apontando a desorganização da Diretoria provisória da Seção, que nada
havia decidido sobre a questão das filiações de comarcas para constituição de
subseções. Quanto à questão da remessa da renda líquida, os juizes explicaram,
com ironia, que somente depois de formado o quadro local da subseção, eleita e
empossada sua Diretoria e com o início da cobrança das anuidades dos inscritos,
poderia haver a prestação de contas e, portanto, a remessa da renda líquida apurada
com a dedução correspondente às despesas de pessoal e expediente.

OAB/SP, Afíi da sessão da O A B /SP, 23 d e m a rç o d e 1932.

40 •Al
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiro s Percursos c D e s a fio s ( 1 S 3 0 - 1 9 4 5 )

Os dois magistrados invocaram , em seguida, o art. 103 do Regulamento,


que conferia aos “Institutos dos A dvogados dos Estados” as atribuições de im ­
plantar a Ordem na seção da Capital e nas subseções das diversas comarcas,
lim itando essa com petência, todavia, até 90 dias antes da data determinada, até
aquele m om ento, para início da vigência do Regulamento. C o m o o Instituto
dos A dvogados de São Paulo não prom oveu qualquer organização de subseções
no interior do Estado, argum entavam que tais com petências deveriam passar
autom aticam ente para o Poder Judiciário, na conform idade do art. 104.
O ofício foi tão severo com o Instituto dos A dvogados e com a Diretoria
provisória da seccional paulista, que vale a pena transcrever sua parte final:

(...) Em obediência a estes preceitos e em conseqüência da inércia do “Insti­


tuto dos Advogados de São Paulo’] o Poder Judiciário da comarca de C am p i­
nas assumiu o encargo legal da organização da Ordem na localidade e nesse
trabalho persistirá, p o r força de sua competência que exclui qualquer inter­
venção da Diretoria provisória, cuja competência cessou desde 1. ° de feverei­
ro último. (...) Assim, a comissão infra-assinada traz ao conhecimento da
Diretoria provisória da Seção da Ordem dos Advogados do Brasil no estado
de São Paulo o que está fazendo e o que fará, segundo a competência que lhe
fo i atribuída pela lei federal, e espera que essa Uma. Diretoria provisória
aguarde a organização da O rdem na localidade, escusando-se de agir onde o
Poder Judiciário assumiu os serviços que o Regulamento lhe cometeu pela
competência autom aticam ente adquirida p o r força da própria inércia do
Instituto dos Advogados, que não agiu dentro do lim ite de tempo que lhe foi
traçado p o r lei. O contrário será a anarquia de um serviço que exige rápido
desembaraço, a benefício da classe dos que labutam no foro (.../*

A réplica do presidente da seccional paulista seria ainda mais enérgica. N o


m esm o diapasão Levi Carneiro respondeu aos magistrados, desautorizando-
os, c o m o presidente em exercício do C onselho Federal da Ordem . Os dois d o ­
cum entos acham -se transcritos na íntegra ao final deste capítulo, e constituem
u m b om testem unho das dificuldades que permearam o processo de organiza­
ção da OAB em todo o território nacional.
Mas os problemas enfrentados nos primeiros m om entos da OAB não se
restringiam apenas aos casos de interpretação do Regulamento. N o estado do

^ Id em , ib id em .

41
______________ Historia da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Rio Grande do Sul, os práticos da advocacia - cerca de dez m il segundo os


cálculos de Levi Carneiro - haviam representado ao chefe do Governo Provisó­
rio o direito de continuar procurando em juízo, apesar de não cum prirem as
exigências m ínim as estabelecidas pela Ordem. A dem anda envolvia tam bém
aspectos de natureza política, pois havia um a lei estadual que lhes facultava tais
direitos. D e mais a mais, a questão dizia respeito aos conterrâneos de Getúlio
Vargas. Assim, co m o já era de esperar, o pleito foi atendido.
A atitude do Governo Provisório seria interpretada co m o u m golpe às
prerrogativas da OAB. Interpelado por seus pares, Levi Carneiro m inim izou o
incidente, assegurando-lhes que o M inistério da Justiça havia respeitado ape­
nas (...) uma situação constituída legitimamente, ou pelo menos de boa fé. Acres­
centou, também, que foi consultado a propósito da elaboração do ato regula­
m entando a matéria, por interm édio d o titular interino da Justiça, o D r. Fran­
cisco Campos. O decreto n® 21.592, exarado a 1° de julho de 1932, garantiu o
direito dos praxistas, m as restringiu-lhes a atuação aos lim ites geográficos do
estado do Rio Grande do Sul. Determinava, tam bém , que se m atriculassem no
Tribunal Superior do Estado e na seccional de Porto Alegre de acordo com as
norm as estipuladas pela Ordem^^.
À guisa de inform ação, cabe m encionar que os desdobram entos do referi­
do decreto n° 21.592 ainda se fizeram sentir na Ordem por u m b o m par de
anos. Revendo as atas do C onselho Federal, relativas ao exercício de 1933, ape­
nas na sessão de 11 de março, por exem plo, dentre o rol dos processos exam ina­
dos, encontram -se recursos de sete praxistas do Rio Grande do Sul, todos
reclamando da decisão da subseção de Porto Alegre que lhes negara matrícula
n o q u a d ro d o s a d v o g a d o s , m a n d a n d o - o s in sc r e v e r -se na c la sse dos
provisionados .
O certo é que diante de tantos percalços a entrada em vigência do Regula­
mento seria adiada por sucessivas vezes. O Decreto n* 22.266, de 28 de dezembro
de 1932, transferiu de 1.° de maio de 1932 para 31 de março 1933. A par disso, o
Decreto n^22.478, de 20 de fevereiro de 1933, aprovou e m andou consolidar os
dispositivos regulamentares da Ordem dos Advogados do Brasil, com as m odifi­
cações realizadas pelos Decretos n^ 21.592, de 1 de julho de 1932e n^22.039,de 1“

Levi C a rn e iro ,“D iscu rso ”, p ro fe rid o n a p re sid ên c ia d a O rd e m , e m sessão de 14 d e d e z e m b ro d e 1932. Cf.
Levi C arn eiro . O livro de u m advogado. O p . cit., p. 272.
O s a u to re s d os recu rso s e ra m A rm a n d o P o rto C o elh o , E uryd es C astro , H e n riq u e C ó rd o v a , J. G alvão Á lva­
res de A breu, Isaias R ô m u lo P in to , João F ran ç a e M á rio C in co Paes. Cf. OAB, A ía da sessão do Conselho
Federal da O AB, 11 d e a g o sto de 1933.A rq u iv o d a OAB.

42 • âm
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s Percursos c D esa fio s d 9 3 0 - 1 9451

de novem bro de 1932^', que procuravam corrigir dispositivos cuja aplicação se


verificou inconveniente, em virtude das diversidades regionais^^.
A estruturação da O rdem dos A dvogados do Brasil só foi con cluída em
1933, quand o se instalou o C onselho Federal. Este fu n cio n o u , a princípio, no
prédio do Silogeu Brasileiro, nas instalações do Instituto da O rdem dos A d­
v o g a d o s Brasileiros^^. A p rim eira sessã o preparatória de in sta la ç ã o foi
convocada para 6 de m arço de 1933; em 9 de m arço, na segunda sessão pre­
paratória, escolh eu -se a prim eira diretoria da O rdem dos A dvogados do Bra­
sil, sen d o eleitos Levi Carneiro para a Presidência e A ttílio Vivácqua para a
Secretaria-GeraF'*.
N aquela m esm a data, realizou-se a solenidade oficial de instalação do
C onselho Federal da OAB, a qual compareceram o ministro da Fazenda, Oswaldo
Aranha, representantes do chefe do Governo Provisório, dos titulares das pas­
tas da Justiça, do Trabalho, da M arinha e das Relações Exteriores, bem com o
dos Interventores do Pará, Piauí, Pernam buco, Alagoas, Sergipe, Bahia, Espírito
Santo, M inas Gerais, Rio Grande do Sul, Goiás e Paraná, além de advogados,
magistrados e do Presidente da Corte de Apelação do Distrito Federal, Dr. Elviro
Carrilho. Quatro dias mais tarde, o R egim ento Interno do C onselho Federal
seria aprovado, definindo a sua estrutura administrativa” .
N a primeira sessão ordinária do C onselho Federal, realizada em 11 de
agosto de 1933, Levi Carneiro apresentou u m circunstanciado relato aos seus
pares, referindo-se à etapa vencida pela instituição. Lem brou que o Regulamen­
to estava em execução há apenas quatro m eses e m eio, e que naquele curto
espaço de tem po a grande estrutura da O rdem entrava em função, (...) suave,
serena, regularmente, em todo o País. Passados os atropelos dos m o m en tos inici-

C o n fe rir, e m an exo, a ín te g ra d o D ecreto n.° 2 2.478, d e 20 d e fevereiro de 1933.


OAB, O ficio n.° 114, d irig id o a o m in is tro d a Justiça, d a ta d o d e 18 d e ju n h o d e 1932. A rq u iv o CF/OAB.
" In ic ia lm e n te , e n tre 6 de m a rç o e 16 de o u tu b r o d e 1933, o C o n se lh o Federal d a OAB fiin c io n o u nas
d e p e n d ê n c ia s d o lOAB, n o p ré d io d o Silogeu B rasileiro, ru a A u gusto Severo, n® 4 . 0 a n tig o p alacete foi
d e m o lid o e ab rig a h o je o I n s titu to H istó ric o e G eo gráfico B rasileiro e o C e n tro C u ltu ra l d o In s titu to dos
A d v o g ad o s Brasileiros. Em 9 d e ja n e iro de 1934, o C o n se lh o F ederai fez s u a p rim e ir a re u n iã o n a sede da
Seção d o D is trito Federai, in sta lad o n o 4° a n d a r d o Palácio d a Justiça, ru a D. M an o e l, n ° 29, aí p e rm a n e ­
c e n d o a té 18 d e m a io de 1954. D e 1954 até a in a u g u ra ç ã o da sede exclusiva n a capital d a R epú b lica, em
d e z e m b ro de 2000, o C o n se lh o Federal f u n c io n o u e m m ais q u a tro end ereço s: n o R io d e Janeiro, na C asa
d o A d vogado, Av. M arech al C â m a ra , n ° 160, 6° a n d a r e n a Av. M arech al C â m a ra , n° 210. 6 " a n d ar. Em
B rasilia, n a s ed ed aO A B -D F .A v . W 3 N o rte , Q , 516, B loco B, lo te 07. A p a r tir d e d e z e m b ro d e 2000, n a sua
sed e p ró p ria , localizada n a SAS, Q 05, L ote 02, B loco ‘N ’- Edifício O rd e m d os A dv o gados d o Brasil.
" N o e sc ru tín io verificou-se o seg u in te resu ltad o ; p a ra p re sid en te, Levi C arn eiro , 8 v o tos e A zevedo M arques,
l v o to : p a ra secretário -g eral, A ttílio V ivácqua, 7 v o to s, A rn o ld o M ed eiro s, 1 v o to e L uiz G allo tti, 1 voto.
^*OAB, Affl da sessão de instalação d o C o n se lh o Federal, d a ta d a de 9 de m a rç o d e 1933. A rq u iv o da OAB.

43
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

ais, pela primeira vez, (...) os homens de um a profissão - se reuniram, em todo o


Brasil, submetendo-se a uma regra rigorosa, a um regime de severa moralidade,
sob a direção dos seus próprios colegas p o r eles mesmos escolhidos^^.
N a percepção de Levi Carneiro, instituiu-se u m regime uniform e, o qual
transformou o exercício da advocacia em atividade (...) m uito mais nobre, m ais
elevada e mais dignificante do que até então vinha sendo praticada e do que
ameaçava tornar-se. (...) O suposto privilégio acadêmico, nas palavras do presi­
dente da OAB, desassombrosamente fraudado, as condescendências pessoais e as
tolerâncias cam arárias, que incitavam as concessões que classificou co m o
leizinhas estaduais, assinalavam a diferença que distinguia o regime anterior do
da vigência do Regulamento. Arrematando o relato sobre aqueles primeiros meses
atividades, o D r. Levi concluiria: (...) N ão direi que tudo se tenha transmudado
p o r um golpe de mágica. M as alguma coisa já mudou, e todos sentimos que um
novo espírito se está formando, e desenvolvendo, no seio dos advogados .

1.4 O Conselho Federal

A aparelhagem da O rdem dos Advogados do Brasil encerrou-se com a


instalação do C onselho Federal. C om o órgão suprem o da entidade, além das
consultas e de questões pertinentes à estrutura e funcionam ento da Ordem , e
ao exercício da advocacia, o C onselho era freqüentemente acionado para se
pronunciar sobre disputas entre os poderes executivo e judiciário nos estados e
m unicípios, arbitrariedades com etidas por interventores estaduais e atentados
contra advogados, co m o verem os m ais adiante.
A com petência do C onselho Federal para representar aos poderes públi­
cos foi objeto de consulta, julgada logo na segunda sessão d o Conselho, realiza­
da em 11 de m arço de 1933, e tratava das garantias da magistratura, assunto
que tam bém dizia respeito ao livre exercício da advocacia. A representação era
uma denúncia, encam inhada a princípio à presidência da Seção do Distrito
Federal, a propósito de dois decretos expedidos pelo interventor de Mato Gros­
so, Leônidas Anthero de M attos. O prim eiro regulamentava o processo adm i­
nistrativo da dem issão, por suspeição, dos funcionários civis do Estado, m esm o

da sessão do Conselho Federal d a O A B , 1] d e ag o sto d e 1933. A rquivo d a OAB. Ver, ta m b é m , Levi


C arn eiro , O livro de u m advogado, op. cit., p. 282-293.
” Id em .

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V o lu m e 4 C r ia ç a o , P rim e ir o s Percursos c D esa rio s d 9 3 0 - 1 9 4 5 )

OS vitalícios; o segundo acrescentava aos casos de suspeição dos juizes a incotri'


patibilidade resultante de ato ou fato comprovado, atribuído ao ju iz de qualquer
categoria, consistente em manifestação preferencial p o r qualquer dos interessados
na m atéria sobre que sehaja de pronunciar o ju lg a d o f^ , determ inando que q uan­
do ocorresse essa hipótese, m esm o que as partes litigantes não averbassem a
suspeição do juiz, o governo poderia, conform e a gravidade do caso, suspendê-
lo de suas funções sem direito a vencim entos. Tais m edidas já haviam sido apli­
cadas aos juizes das comarcas m ato-grossenses de Maracaju e Aquidauana.
O conselheiro Alberto Rego Lins, em parecer aprovado pelo C onselho da
Seção do D istrito Federal, afirm ou que os decretos eram efetivam ente absur­
dos, m as escapavam à apreciação da O rdem , de acordo com o art. 8 do Regula­
mento. U m deles, entretanto, o de n úm ero 215, de 29 de dezembro de 1932, não
poderia passar sem reparos, porque atentava às leis processuais, constituindo
ameaça perm anente à segurança da magistratura, devendo a Ordem dos A dvo­
gados pedir a atenção do m inistro da Justiça. Em vista deste voto, o C onselho
do D istrito Federal oficiou ao m inistério, encam inhando-lhe a G azeta Oficial
de M ato Grosso, o nde o ato fora publicado, e determ inou a remessa d o proces­
so para a apreciação da mais alta instância da OAB.
N o C onselho Federal, a matéria seria exam inada por Gabriel Bernardes,
cujo parecer, aprovado por unanim idade, afirmava que tais decretos interessa­
vam , direta e insofismavelmente, à O rdem dos Advogados, porque regulavam
de form a inqualificável o assunto processual. Segundo Bernardes, a situação de
insegurança em que se encontrava toda a magistratura de M ato Grosso não
poderia ser tolerada pelo C onselho, porque daquele fato resultaria a im possib i­
lidade do livre e garantido exercício da advocacia. Neste sentido, os conselhei­
ros decidiram que cabia ao presidente da OAB perseverar junto ao ministro,
para que se fizesse cessar a situação de instabilidade criada para a magistratura
daquele Estado, incom patível co m a sua função de julgar.
Aliás, pelo que se pode depreender da docum entação do C onselho Fede­
ral, o furor legislativo do interventor Leônidas A nthero de Mattos deu bastante
trabalho à presidência da OAB. N a ata da sessão ordinária de 11 de agosto de
1933 há registro de outro decreto por ele assinado, desta feita concedendo aos
provisionados do estado de M ato Grosso o exercício pleno da advocacia. O
Superior Tribunal de Justiça do Estado recusou-se a cum prir tal ato. Inquirido
a r e s p e it o p e lo m in is tr o da Ju stiça , o in t e r v e n t o r e n v io u u m o f íc io

Boletim do C onselho Federal da O AB. A n o I, n .° I, a g o sto d e 1933, p. 55.

45
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

desautorizando a decisão do referido Tribunal, que representou à Ordem, re­


clam ando as providências cabíveis.
O presidente Levi Carneiro, mais um a vez, com prom eteu-se a intervir junto
ao m inistério para que o Regulamento fosse respeitado^^. O M inistério da Jus­
tiça, porém , ao contrário d o que fizera em relação aos práticos do Rio Grande
do Sul, tam bém beneficiados por decreto estadual, resolveu acatar o Regula­
m ento ao pé da letra. Afinal, os m atogrossenses não eram conterrâneos do ch e­
fe do G overno Provisório. O certo é a m edida baixada por Leonidas Anthero de
M attos que repercutiu por alguns anos na OAB, tendo suscitado a apresenta­
ção de num erosos recursos subm etidos ao C onselho Federal, todos denegados,
diga-se de passagem*°.
N o período com preendido entre 1933 e 1934, quase todas as decisões do
C onselho Federal referiam-se a processos de inscrição, exercício profissional,
organização das subseções o u interpretação do Regulamento. H ouve, no entan­
to, um a decisão que se destacou das demais: na sessão de 11 de março de 1933
o C onselho arbitrou que cada seccional deveria agir co m o entendesse conveni­
ente em relação a atentados, violências e outros crimes com etidos contra advo­
gados, ocorridos o u não durante o exercício da profissão. A resolução decorreu
da representação a respeito do assassinato de A ltino Cabral Botelho Benjamim,
advogado, m em bro da O rdem na Seção de M inas Gerais e Prom otor de Justiça
da comarca de Rio N ovo, por autoridades policiais.
D ois pareceres fundam entaram aquela deliberação. O primeiro, de 15 de
fevereiro de 1933, assinado pelo Conselheiro da Seção do D istrito Federal,
E dm undo de M iranda Jordão, que detalhava o caso, qualificando-o com o um
(...) grave acontecimento, que culminou no fuzilam ento pela polícia do represen­
tante da Justiça pública naquela comarca, em pleno dia, achando-se a vitim a f e ­
chada na sua própria residência”^^.
O conselheiro Edm undo de Miranda Jordão realizou m inucioso inquérito,
em que obteve os depoim entos do presidente da Subseção, do m édico que funci­
o n ou com o perito na autópsia, d o farmacêutico, do tabelião, enfim, ouviu m ora­
dores da cidade e outras pessoas importantes para o esclarecimento do episódio
- inclusive advogados de comarcas vizinhas. D enunciou o clima de insegurança
que dominava Rio N ovo, em virtude da m anutenção nos respectivos cargos das

Cf. OAB, A ta da sessão do Conselho Federal d a O AB, 11 de ag o sto d e 1933.A rquivo d a OAB.
“ Cf. O A B.A ífl da sessão do C onselho Federal-, 11 de ju lh o d e 1934. A rq u iv o OAB. Ver, ta m b é m , d e n tie o u tra s,
A ta d a sessão d o Conselho Federal, 20 d e a b ril d e 1934. A rq u iv o OAB.
OAB, Processo C. n.° 3-1933. A rq u iv o CF/OAB.

46
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim e iro s Percursos c D c s a íio s 11 9 3 0 - 19451

autoridades administrativas e policial, apontadas com o autores intelectuais do


crime, que teria sido praticado por soldados da força pública com o auxílio de
capangas, a conivência do Prefeito e d o delegado de polícia da cidade. Irregula­
ridades, portanto, que prejudicavam o b o m andam ento da Justiça, já que em
casos dessa natureza as primeiras medidas para a livre ação da Justiça consistiam
justamente no afastamento imediato das autoridades envolvidas e o desaforamento
do processo. Concluiu, finalmente, que a Ordem dos Advogados, enquanto ór­
gão de defesa da classe, não poderia ficar indiferente ao acontecim ento, mas que
caberia ao C onselho da Seção de M inas - e não ao C onselho da Seção d o Distrito
Federal, que exercia provisoriamente as atribuições do Conselho Federal - , a com ­
petência de se pronunciar sobre o processo.
O segundo parecer assinado por L eopoldo da Cunha M ello ratificava o
voto da Seção do Distrito Federal, com a ressalva,de que, apesar de bárbaro e
selvagem, não estava nas atribuições da Ordem dos Advogados do Brasil tom ar
qualquer deliberação sobre o caso, devendo-se presum ir “que as altas autorida­
des de M inas” não deixariam “im punes os bárbaros assassinos”®^. O C onselho
Federal resolveu devolver o processo à Seção de M inas Gerais, deliberando que
cada seccional deveria agir com o entendesse conveniente em relação a atenta­
dos, violências e outros crim es com etidos contra advogados, ocorridos ou não
durante o exercício da profissão.
Essa decisão do Conselho Federal, logo no início do seu funcionamento, seria
revista pouco tempo depois, quando aum entou a incidência de denúncias a respei­
to de violências e de perseguições sofridas por advogados no exercício da profissão.
A demanda por posições mais enérgicas do Conselho Federal cresceria na propor­
ção em que se firmava o prestígio da Ordem junto à sociedade de um m odo geral.
É inquestionável o papel desem p enh ado por Levi Carneiro e A ttílio
Vivácqua n o processo de consolidação da O rdem dos Advogados. Reeleitos su­
cessivam ente, eles perm aneceriam à frente d o C onselho Federal por três m a n ­
datos consecutivos. As gestões de am bos concentraram -se, sobretudo, nas tare­
fas de organização da instituição, a exem plo das questões relativas à interpreta­
ção do Regulamento, ao ordenam ento das seções estaduais, à organização do
Serviço de Assistência Judiciária, à elaboração do C ódigo de Ética e à participa­
ção da OAB na Assembléia Constituinte de 1934.
Em 9 de agosto de 1933 o secretário-geral, Attílio Vivácqua, ofereceu um
relatório sucinto dos trabalhos e ocorrências referentes ao prim eiro período de

O A B , B o letim do Conselho Federal da O AB. A n o I, n .° 1, ag o sto d e 1933, p. 53.

47
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

organização da Ordem. O docum ento, dentre outros levantam entos de dados,


indica que até aquela data o núm ero de Conselhos instalados chegava a vinte e
dois. Por sua vez, a matrícula geral na Ordem, um a estatística feita com as rela­
ções, algum as incom pletas, enviadas por 19 seções, alcançava cerca de 7.580
inscritos, sendo 312 provisionados e 472 solicitadores**. Apresentava, ainda,
u m balanço dos recursos de denegação de inscrição; representações e consultas
julgadas; prestações de contas e contribuições dos Conselhos seccionais, bem
com o dos respectivos repasses financeiros.
A lém d os casos recorrentes sobre a a dm issão de p rov ision a d o s, o rela­
tório de A ttílio V ivácqua dem on stra que o C o n selh o Federal recebia grande
incid ên cia de recursos tentando reverter decisões de seccio n ais, que não
p erm itiam o ingresso na O rdem de advogados form ados por estab elecim en ­
tos de e n sin o não recon h ecid os p elo s órgãos federais co m p eten tes. Situa­
ções, aliás, decorrentes da Lei Rivadávia, que perm itira a m u ltip licação d e­
senfreada de faculdades livres de D ireito, cuja validade d os dip lom as era
freq üentem en te question ada. Para se ter um a idéia do v o lu m e desses casos,
basta dizer que s o m en te u m certo Dr. José Lagreca, que se dizia p rofessor de
um a dita universidade brasileira de São Paulo, e n c a m in h o u diferentes p e ti­
ções ao C on selh o Federal con testan d o decisões da seccion al paulista, que
negara m a trícu la a seu s ex-alunos®^. Problem a sem elhan te ocorreu com
bacharéis form ados pela extinta Faculdade de D ireito Teixeira de Freitas,
no antigo estado do R io de Janeiro, cujos arquivos teriam sid o extraviados
na transferência para a Faculdade de D ireito de Niterói*^. Se, por u m lado,
tem -se a im pressão de que algum as dessas in stitu içõ es su m ia m sem deixar
rastro, dificu ltan d o a vida das pessoas que ali con clu íram seus estudos®^’,
por outro, percebe-se que sua extinção facilitava o registro de certidões e
dip lom as falsos, gerando toda a sorte de falcatruas, contra as quais a O r­
dem tentava se impor®^.
" O s d a d o s n ã o c o m p u ta v a m as Seções d e M a to G rosso, P a ra n á e te rritó rio d o Acre, cu jas relações a in d a n ã o
h a m r a sido e n c a m in h a d a s a o C o n se lh o a té aq u ela data. Cf. OAB, Boletim do C onselho Federal da OAB.
A n o I, n.° 1, agosto d e 1933.
" OAB, A ta da sessão do Conselho Federal da O AB, 9 de m a rç o d e 1933. Ver, a in d a , OAB, A ta s da sessões do
C onselho Federal, 16 d e ab ril d e 1934 e d e 11 d e ju lh o d e 1934. A rqu iv o OAB.
“•'OAB, A ía da sessão extraordinária do Conselho Federal da O AB, 23 d e a b ril d e 1934. A rq u iv o OAB.
OAB, A ta da.sessão do Conselho Federal da O AB, 20 a g o sto de 1934. A rq u iv o OAB.
" O A B , A la da sessão d e 19 d e n o v e m b ro d e 1934. Ver, ta m bém , a esse respeito, d e n tre o u tro s pareceres, Levi
C arn eiro , O livro de u m advogado, op. cit., p, 393-397. Sobre a n ecessidade d e e fe tu a r perícias n o s d ip lo ­
m as exped id o s p o r certas in stitu iç õ e s ver, OAB, A ta da sessão do Conselho Federal, d e 27 d e ag o sto de
1935. A rq u iv o OAB.

48 •ál
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim e iro s Percursos c D e s a fio s \ 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

Além dessas representações, há que se m encionar as consultas de estran­


geiros dom iciliados n o Brasil. Veja-se, por exem plo, a indagação sobre a possi­
bilidade do uso do título A ttorney a t law. A questão suscitou um a recom enda­
ção da Ordem de que o estrangeiro não inscrito nos seus quadros não poderia
anunciar-se com o advogado, de m odo a fazer crer que está habilitado para exer­
cer o o fíc io n o Brasil, em b o r a a d e n o m in a ç ã o de bacharel em D ireito
corresponda ao título obtido n o seu país de origem®*.
Por outro lado, o C onselho preocupava-se em defender as prerrogativas
da O rdem dos Advogados junto aos poderes governam entais. Em 14 de agosto
de 1933, o C onselho decidiu dirigir-se ao Governo Provisório, sugerindo que a
futura lei de Organização Judiciária, quando tratasse do exercício profissional
da advocacia, se limitasse a declarar que a matéria ficaria subordinada aos pre­
ceitos que regiam a OAB e suas eventuais modificações®^.
A organização da Assistência Judiciária foi outro assunto que mereceu a
atenção do Conselho Federal. Vale notar que a prestação desse serviço consti­
tuía um a tradição herdada da Casa de M ontezum a, por assim dizer. Instituída,
em 1860, a pedido do m inistro da Justiça Francisco de Paula Negreiros de Sayão
Lobato, a defesa gratuita dos réus pobres nos juízos crim inais seria incorpora­
da às finalidades do Instituto da Ordem dos A dvogados Brasileiros, por ocasião
da reforma do seu regim ento em 1888^ . D esde então o atendim ento vinha
sendo prestado ininterruptamente. Após a proclamação da República, durante
a gestão do D r. Am aro Cavalcanti naquela pasta, a prática foi oficialm ente re­
gulam entada pelo D ecreto n° 2.457 de 8 de fevereiro de 1897, que estabeleceu a
Assistência Judiciária do D istrito FederaP'.
O Governo Provisório manteve essa prática e, de certo m od o, am pliou-a,
pois ao regulamentar as com petências do Tribunal EspeciaP^, instituído pela
lei de 11 de novem bro de 1930, para julgar crimes p olíticos e atos de corrupção
do regime deposto, do qual já nos reportamos, determ inou que caberia ao lOAB
designar defensor perante aquele Tribunal para os acusados que não quisessem

*®OAB,y4fa da $e$são do Conselho Federal da O AB, 15 de agosto d e 1933. A rq u iv o OAB.


®’ OAB, Boletim do Conselho Federal da O AB . A n o II. n.° 2, d e z e m b ro d e 1934, p. 232.
^ Cf. Lucia M a ria Paschoal G u im a rã e s, “Â M a ç o n a ria de H o n ra ”, op. cit. p. 109-110.
” D ecreto n ° 2.457, de 8 d e fevereiro de 1897. D e n tre o u tra s p ro v id ê n c ia s, este disp o sitiv o d e te rm in a v a q ue
to d o s os in teg ran tes das com issõ es d e defesa g ra tu ita d e v eria m ser in d ic a d o s o b rig a to ria m e n te pelo
In stitu to , à exceção d o p re sid en te d a co m issão central, cuja n o m e a ç ã o c a b e ria a o p o d e r executivo
O T rib u n al Especial era c o n stitu íd o p o r cinco m e m b ro s de livre escolha d o G o v e rn o P rovisório —inclusive
profissionais liberais, excluída q u a lq u e r in co m p atib ilid ad e e n tre o exercício d e suas funções. O processos
e ra m referentes ao p e río d o d e te rm in a d o pela “ Revolução”, afastad o s os já afo ra d o s nas justiças ordinárias.

49
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

se defender, nem constituir advogado. Para tanto, esses causídicos receberiam


im unidade, não podendo sofrer qualquer coação por m otivo do seu patrocí­
nio. Se, por qualquer circunstância, os advogados se tornassem passíveis de penas,
0 Tribunal relataria o fato ao Instituto, que poderia, no prazo de cinco dias,
indicar a punição a aplicar. Caso contrário, o Tribunal aplicaria as sanções que
coubessem , segundo o direito com um .
N ão cabe no m om ento entrar e m maiores considerações a respeito das
sucessivas transformações por que passou o Tribunal Especial, que a partir do
Decreto n^ 19.811, de 28 de m arço de 1931, foi substituído por um a Junta de
Sanções - ainda mais centralizadora, com posta por três ministros de Estado.
N em discorrer sobre a C om issão de Correição Administrativa, criada em 21 de
setembro de 1931, com o objetivo de proceder à correição dos atos da adm inis­
tração pública, sugerindo às autoridades administrativas com petentes as m ed i­
das o u sanções previstas no decreto que a instituiu. Por ora, é im portante sali­
entar que destacados m em bros do Instituto da Ordem dos Advogados Brasi­
leiros, que foram convocados para defender os políticos da situação deposta,
ainda condenassem a existência do Tribunal Especial. O conselheiro Bulhões
Pereira, por exem plo, patrocinou os ex-senadores da República. Por solicitação
do m inistro Oswaldo Aranha, o lOAB designou Augusto Pinto Lima e Eurico
de Sá Pereira para defensores de W ashington Luís e Vianna do Castelo, respec­
tivamente. Mais tarde, em virtude da renúncia de Pinto Lima^^, o patrocínio do
ex-presidente ficou a cargo do advogado Eduardo Duvivier^"*.
C onstituída a OAB, o Regulamento determinava que a Assistência Judiciá­
ria passaria para a jurisdição exclusiva da Ordem em todo o território nacional,
no juízo cível, no criminal e n o militar. O patrocínio, que até então era ofereci­
do apenas aos réus pobres brasileiros, deveria estender-se aos estrangeiros,
independente de reciprocidade internacional.
Para dar cum prim ento àquele dispositivo, o Conselho Federal preparou um
ante-projeto denom inado “Regimento Especial”, uma espécie de m odelo que d e­
veria ser adaptado por todas as seções da Ordem. A proposta dilatou ainda mais

” P in to L im a r e n u n c io u a o seu m a n d a to p e ra n te a J u n ta d e Sanções, a leg an d o q u e o ex -p re sid en te d e claro u


n ã o d e se ja r defesa n a p re sen ç a d e trib u n a is q u e n ã o reconhecia. O s m e m b ro s d o I n s titu to a in d a t e n ta ­
ra m d issu ad i-lo , a o q u e ele a rg u m e n to u q u e n ã o p o d e ria d e fe n d er u m ré u c o n tra a su a d e te rm in a ç ã o
expressa, in sistin d o n a tese d e q u e o a to d e d a r a o r é u u m d e fe n so r c o n tra a su a v o n ta d e e ra ilegal, além
de le g itim a r o processo c o n tra W ash in g to n Luís. C o m o O sw ald o A ra n h a e n v io u n o v o ofício, so licitan d o
30 lO A B a designação d e o u tro advogado p a ra fu n c io n a r n o processo, a escolha so bre o adv o gad o E d u a rd o
D uvivier. C f lOAB, A ta da sessão do lO A B , 9 d e ju lh o d e 1931.
"Id em .

50 •A M
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s Percursos c Dosatio?. ( 19 j ü - 1 9 4 5 )

a amplitude da Assistência Judiciária, prevendo tam bém a sua concessão aos ín­
dios, e em quaisquer casos de processos administrativos, perante repartições p ú ­
blicas ou perante tribunais administrativos, com uns ou especiais.
Afora a gratuidade das atividades profissionais dos advogados e procura­
dores n os processos, as pessoas necessitadas poderiam beneficiar-se de parece-
res, de aconselham ento, amparo e proteção, para a segurança, conservação e
defesa dos seus direitos. A Ordem tam bém se encarregaria de providenciar ser­
v iço s de perícia, requisitando-os junto aos sindicatos de m édicos, engenheiros
e contadores, e peritos judiciais.
Na sessão de 23 de agosto de 1934, o anteprojeto foi aprovado e encam i­
nhado às seccionais para sugestões, acréscim os o u alterações. Vale lembrar que,
c o m o a nova C onstituição do país fora prom ulgada em 16 de julho daquele
ano, a matéria deveria ser objeto de exam e e aprovação da Câmara dos D eputa­
dos, antes de ser posta em vigor^^. R em etido ao Legislativo em 20 de novem bro
de 1934, o projeto sofreria um a longa tramitação, interrom pida com o advento
do Estado N ovo.
A concessão de Assistência Judiciária só veio a ser regulamentada n o G o ­
verno D utra pela Lei n .’^’ 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, sob a com petência dos
poderes públicos federal e estaduais. Apesar do e m pen ho d o Conselho Federal,
caberia à O rdem som ente, por suas seções e subseções, indicar advogado, nas
localidades onde não houvesse serviço de Assistência Judiciária organizado e
m antid o pelo Estado.
Outra grande questão que m ov im en to u o C onselho Federal nos prim ei­
ros anos de funcionam ento foi a aprovação d o C ódigo de Ética Profissional.
Antiga aspiração da classe, o assunto co m eço u a ser discutido n o Instituto da
O rdem dos Advogados Brasileiros, na década de 1920, por um a com issão inte­
grada por Levi Carneiro, relator, M agarino Torres, C ândido M endes, Pereira
Braga e Bartolom eu Portella. C om o o prazo para a conclusão do trabalho era
dem asiado curto, os m em bros da com issão resolveram recomendar ao lOAB o
exam e do código de ética profissional aprovado pelo Instituto dos Advogados
de São Paulo em 1921, considerado excelente. Aliás, outros Institutos, com o o
do Rio Grande do Sul, adotaram o código de São Paulo.
A idéia foi retomada no lOAB por Pam philo de Assunção em 1930, que
apresentou um a nova proposta, tam bém inspirada no m odelo de São Paulo. O
projeto definitivo foi aprovado em 1932 e rem etido ao C onselho Federal da

OAB, A ta da sessão d o C o n se lh o Federal d e 23 d e a g o sto d e 1934. A rq u iv o OAB.

51
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

OAB, que resolveu discuti-lo e votá-lo, em cum prim ento à com petência firm a­
da pelo art. 84, inciso III, d o Regulamento da Ordem. O trabalho final, apresen­
tado 14 m eses depois, devolvia algumas exclusões feitas por Pamphilo no c ó d i­
go de São Paulo, e aditava outras, que foram objeto de longas discussões no
Conselho Federal.
C om doze seções, o C ódigo de Ética Profissional entrou em vigor no dia
15 de novem bro de 1934, acrescentando aos preceitos éticas gerais as normas
que o advogado deveria rigorosamente observar, extensivas aos provisionados
e solicitadores. Os deveres fundam entais, objeto da 1.® Seção, obrigavam os
advogados a zelarem pelo prestígio da classe, pela dignidade da magistratura e
pelo aperfeiçoamento das instituições de Direito. Determinavam, ainda, a guarda
do sigilo, a prestação desinteressada de serviços profissionais aos miseráveis que
os solicitassem e a em issão pública de pareceres sobre questões jurídicas de
interesse geral. As interdições diziam respeito, sobretudo, à publicidade ilícita e
ao aliciam ento de clien tes^ .
Vale lembrar, que antes m esm o da vigência do C ódigo de Ética, a propósi­
to de um a consulta da seção de São Paulo, a respeito do uso do título de “d ou ­
tor” pelos bacharéis inscritos na Ordem, o C onselho Federal já havia delibera­
do que os profissionais form ados nos cursos de Direito não poderiam usar o
título em cartões, impressos, placas e anúncios, mas indicar-se apenas co m o
advogado, salvo aqueles que tivessem legitim am ente colado o grau de doutor.
Recomendava, ainda, aos provisionados e solicitadores que se apresentassem
com o tais porque, habitualm ente, exibiam -se c o m o advogados para se co n fu n ­
direm e equipararem no senso com u m aos bacharéis, o que tam bém motivava
o uso do título distintivo de doutor por advogados graduados^^.
O C ódigo de Ética, na 2.® seção, abordava as primeiras relações do advo­
gado com seu cliente, quando do aceite da causa, obrigando-o, por exem plo, a
recusar o patrocínio de causa ilegal, injusta ou imoral e informar ao cliente de
todos os riscos, incertezas o u circunstâncias que pudessem com prom eter o êxi­
to do processo. O declínio d o m andato, por razões com o desconfiança das par­
tes o u conflito de interesses, foi previsto na 7.® seção.
Em linhas gerais, o Código dava atenção especial a regras sobre o exercício
da advocacia, as relações pessoais com o cliente, as relações em Juízo e com a
administração pública. Estabelecia normas quanto ao exercício de cargos públi-

'"'OAB, da sessão do Conselho Federal da O A B , 11 de ag o sto d e 1934. A rq u iv o OAB.


®’ 0 A B , Aííi da sessão do C onselho Federal da O A B , 11 de ag o sto d e 1933. A rq u iv o OAB.

52 •ái
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

COS e à cobrança de honorários. Finalmente, determinava que em cada Seção da


Ordem haveria um Tribunal Especial, a fim de dirimir dúvidas sobre questões de
ética profissional que estivessem fora do alcance daquela compilação. Meses mais
tarde, o Conselho Federal decidiu modificar a denom inação deste organismo
para Tribunal de Ética Profissional. A alteração, sem dúvida, fora promovida com
o intuito de evitar qualquer equívoco com o repudiado Tribunal Especial, de tris­
te m em ória, instituído em 11 de novem bro de 1930, a propósito de julgar os
crimes políticos e atos de corrupção com etidos na República Velha.
Há no C ó d igo u m tó p ic o que n os parece m u ito sign ificativo, se levar­
m o s e m conta as circunstâncias h istóricas que o país atravessava, o da “O b ­
servância do C ó d ig o ”. O preceito determ inava que o a dvogado deveria levar
ao c o n h e c im e n to do órgão com p eten te da O rdem , com discrição, e f u n d a ­
m en talm en te, as transgressões das norm as deste Código, do R egulam ento da
O rdem , ou do R egim ento respectivo, com etida s p o r outro advogado em rela­
ções com 0 reclamante, ou cliente seu^^ (o grifo é n o s so ). A esse respeito,
en con tra m o s na d o cu m en ta çã o p esquisada apenas u m a con su lta dessa n a ­
tureza entre colegas de ofício. Trata-se de um a indagação de dois causíd icos
da com arca de Ipanem a (M inas G erais), sobre a m orada c o m u m de juizes e
advogados. O vo to do C o n selh o resu m iu -se a devolver o processo para a
seccional de M inas Gerais, co m a recom en d ação de que o p rocesso fosse
apreciado pelo Tribunal Especial daquela Seção, o u apresentado co m o queixa
contra m em b ro da Ordem^’ ,
A assinatura do C ódigo de Ética Profissional, em 25 de julho de 1934,
mereceu um a cerim ônia especial, ond e estiveram presentes, e tom aram assento
à mesa dos trabalhos, os juristas argentinos H on orio Silgueira, presidente da
Federação dos C olégios de Advogados da Argentina; Cezar Viale, juiz de m e n o ­
res na capital portenha; e Agustin M oyano, jurisconsulto. N a solenidade, o pre­
sidente da Ordem ressaltou que aquela era, possivelm ente, a primeira vez que
elem entos de um a classe se congregavam para acordar a sua subordinação a
u m conjunto de regras legais de ordem m oral, capazes de servir de roteiro se­
guro nas complexas e variadas relações da vida profissional'™.
Por sua vez, H on o rio Silgueira saldou a prom ulgação do Código e afir­
m o u que há nove anos acom panhava os trabalhos de elaboração daquele esta­
tuto, recordando as iniciativas d o advogado M agarino Torres na Casa de
Cf. Seção 9.», n.° I, Código de Ética Profissional dos Advogados, a p ro v a d o e m 25 d e ju lh o de 1934.
” OAB, Atfl da sessão do Conselho Federal d a O AB, 16 de n o v e m b ro d e 1934. A rq u iv o OAB.
O A B , i 4 í n da sessão do Conselho Federal da O A B , 25 de ju lh o d e 1934. A rq u iv o OAB.

53
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

M on tezu m a‘° '. Estabeleceu, ainda, u m paralelo entre a situação existente no


Brasil e nos demais países da América, salientando que na Argentina os precei­
tos éticos em relação ao exercício da advocacia não eram regulados com força
de lei, mas se achavam consubstanciados n um corpo de 46 regras de ética pro­
fissional.
Seja com o for, nas atas do C onselho Federal encontram -se diversas refe­
rências a consultas e p edidos de inform ações a respeito do C ódigo de Ética da
O rdem dos Advogados do Brasil, por órgãos congêneres, a exem plo do Colégio
deAbocados dei Peru, que oficiou àquele C onselho solicitando esclarecimentos
e a remessa de exemplares do C ódigo e isto nos leva a deduzir que a obra obteve
expressiva repercussão junto a outras corporações latino-am ericanas da m es­
m a natureza.

H o n o r io Silgueira e ra m e m b ro h o n o rá rio d o I n s titu to d a O rd e m d o s A d v o gados Brasileiros.

54 «àl
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiro s Percursos c D e s a fio s ( 1 9 > 0 - 1 9 4 5 )

CAPITULO II
A O rd e m e a República Nova

2.1 As relações da OAB com o Governo Provisório

A O rdem dos Advogados do Brasil manteve co m o Governo Provisório


relações cautelosas, amparadas pelo artigo 8 do Regulamento, que dispunha
que a diretoria, o conselho e a assembléia não discutiriam, nem se manifestari­
am sobre tem a que não fosse atinente aos objetivos da corporação. D e um
m o d o geral, pode-se dizer que esse escudo fora passado à Ordem pelo Instituto
da Ordem dos Advogados Brasileiros, que n o artigo 36 de seus Estatutos, proi­
bia os sócios de se pronunciarem sobre assuntos de natureza p o lítica '.
Por outro lado, com o já se viu no capítulo anterior, o Decreto que criou a Or­
dem dos Advogados determinava que seus estatutos deveriam ser votados pelo lOAB,
com a colaboração dos Institutos dos Estados, e aprovados pelo governo. Por conse­
guinte, enquanto se ajustavam os preceitos regulamentares para o funcionamento da
Ordem, objeto de deliberações entre o Instituto e o Governo Provisório, ainda cabia à
Casa de Montezuma externar o posicionamento da classe dos advogados sobre ques­
tões externas, doutrinárias e assuntos que afetassem a sociedade civil com o um todo.
Neste sentido, não seria exagero dizer que o Instituto, provavelmente, foi um espaço
público pioneiro, na capital federal, onde se postulou o restabelecimento do estado
de direito no país, conforme reconheceu, em 1933, Eurico de Sá Pereira:

(...) Este sodalicio foi o primeiro centro cultural que ergueu a bandeira da
reconstitucionalização da República. Foi deste recinto que partiu o prim eiro
grito em prol do restabelecimento da ordem jurídica (...) A ditadura encon­
trava-se no seu quinto mês de existência, em plena lua-de-mel, e havia ainda

' Cf. D e c re to n “ 2 0 7 8 4 , d e 14 d e d e z e m b ro d e 1931.

•àl 55
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

entre nós colegas que, iludidos, a consideravam um m aná celeste. Cedo f o ­


ram eles - mais cedo do que eu supunha - curados desse daltonismo^.

Porém, não se pod e deixar de observar um a certa am bigüidade nas ati­


tudes do Instituto em relação às primeiras medidas tom adas no período pós-
revolucionário pelo Governo Provisório. Sobretudo quando se sabe que até 16
de abril de 1931, o Dr. Levi Carneiro, exerceu as funções de presidente do Ins­
tituto concom itantem ente com o cargo de consultor-geral da República, res­
ponsável, inclusive, pela redação da Lei Orgânica que instituiu o n ovo regime,
com o ele m esm o reconheceu anos mais tarde^.
Nesse sentido, veja-se o posicionam ento da entidade a respeito da situa­
ção do Suprem o Tribunal Federal, a propósito da intenção manifestada por
alguns setores revolucionários de abolir o Supremo. C onform e já dem onstra­
m os no primeiro capítulo desta obra, a pretendida extinção m ereceu a repulsa
do lOAB e de seu presidente, Levi Carneiro. Entretanto, a corporação não se
pronunciou em relação ao D ecreto n.° 19.656, prom ulgado em 3 de fevereiro
de 1931, que m odificou a estrutura e o funcionam ento da m ais alta Corte de
Justiça do país, reduzindo o núm ero de m inistros de quinze para onze, e esta­
belecendo novas regras para abreviar os julgamentos"*. Levi Carneiro, inclusive,
já havia defendido o projeto n o Instituto, na sessão de 4 de dezem bro de 1930^.
Por outro lado, a decisão de Getúlio Vargas, de aposentar compulsoriamen-
te seis membros do Suprem o Tribunal, fato jamais visto até aquele m om ento na
história do judiciário brasileiro, provocou protestos na plenária do lOAB. N a ses­
são de 16 de abril de 1931, Edm undo de Miranda Jordão repudiou a jubilação
dos magistrados sem processo regular. Dirigiu-se ainda ao Governo Provisório,
consignado em ata com o manifestação pessoal, postulando a supressão da Junta
Especial (órgão sucessor do Tribunal Especial), que considerava um a afronta ao
aparelho judiciário nacional e às tradições das leis pátrias. Estendeu o apelo no

^ Cf. lOAB, Eurico d e Sá Pereira, “Discurso” proferido n a sessão in au g u ral de 20 de abril d e 1933. Boletim do
Instituto dos Advogados Brasiieiros.Vo\xançXl, n ° 1, Rio d e Janeiro: T ipografia d o Jornal d o C o m m e rd o , 1933.
^ Cf. Levi C arn eiro , Levi C arn eiro . Pela N ova Constituição. O p . cit. p. 4.
■*D e n tre o u tra s m e d id a s, o D e creto dividia as tu rm a s , to rn a v a o b rig a tó rio o reg istro ta q u ig rá fic o d o s tr a b a ­
lhos, revogava o § 2° d o art. 41 d a C o n stitu iç ão q u e d e te rm in a v a à su b stitu içã o d o P resid e n te d a R e p ú ­
blica p e lo p re sid en te d o S u p re m o T rib u n a l Federal. P ro ib ia os m a g is tra d o s e m e m b ro s d o M in istério
P ú b lico Federal d e a ce ita r e exercer cargo d e eleição, n o m e a ç ã o o u com issão , m e sm o g ra tu ito , o u q u a l­
q u e r o u tr a fu n ç ã o pú blica, salvo o m agistério.
*Cf. Levi C arneiro, O /ív ro de u m advogado, op. cit., p, 197-204. Ver, íam W m .E rn Ü iaV io tti d a C osta. O Suprem o
Tribunal Federal e a C onstrução da C idadania, op. cit., p. 66.

56
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s Percursos e D esa fio s 11 9 3 0 - 19451

sentido da convocação do eleitorado para a Assembléia Constituinte, a fím de


que esta promovesse a reorganização constitucional do país^.
D e u m m o d o geral, o Governo Provisório não se mostrava indiferente às
dem andas da Casa de M ontezum a. A tendendo à representação da entidade, o
M inistério da Justiça prorrogou os prazos para pagam ento das taxas nos feitos
sujeitos à Justiça Federal. O indicativo fora apresentado devido ao volum e de
processos acum ulados no Suprem o Tribunal, provocado pela aposentadoria
com pulsória de seis m inistros, pois as distribuições estavam suspensas e os pro­
cessos cujos relatores haviam sido jubilados perm aneciam parados. E, com o
não havia nenhum a previsão para a designação de n ovos titulares, m uitas cau­
sas se tornariam extintas por perempção, em virtude da falta de pagam ento das
respectivas taxas, o que deveria ser feito até 30 dias a contar da data do decreto
que regulou a matéria.
O G o v ern o P rovisório consultava o lO A B e, lo g o depois, tam bém , o
C on selh o Superior do Instituto, sobre q uestões jurídicas diversas. A lém disso,
n o m e o u diversos m em bros da corporação para ocupar cargos na a d m i­
nistração p ública. N a lista d os n ovos m in istro s n o m ea d o s por Vargas para o
S u p rem o T ribunal, p o r e x e m p lo , co n sta v a o presid en te d o lO A B , João
M artins de C arvalho M ourão, que ali to m o u p o sse em 8 de ju n h o de 1931.
N o âm bito político, os m em bros do Instituto ensaiaram algumas m ani­
festações que m erecem destaque. Dentre outras, vale lembrar as intervenções
de L etácio Jansen e de A u gu sto P in to , que q u estio n a ra m a d ecisão dos
interventores do A m azonas e de Pernam buco de extinguir nos dois estados o
Superior Tribunal de Justiça. A plenária, entretanto, resolveu não intervir o fici­
alm ente, sob a justificativa que o país estava em regime ditatorial e que tais atos
deveriam ser considerados de natureza política^.
Já o p ron u n ciam en to de Alberto Rego Lins, na sessão de 30 de abril de
1931, acerca da necessidade da reestruturação da Justiça na República N o v a e
da divisão d os poderes co m o elem en to básico da organização do Estado, m e ­
receu o ap o io do C onselho Superior do lOAB. Rego Lins condenava, sobretu­
do, as cham adas Juntas Especiais (sucessoras do Tribunal Especial) integra­
das por juizes poHticos para julgam ento de adversários vencid os pelas armas;
atacou a criação daquele Tribunal, que baniu as n orm as dos processos, sub-

‘ lO A B, Affl da sessão 16 d e a b ril de 1931. A rq u iv o lOAB.


^ S o b re o S u p e rio r T rib u n a l d o A m azo n as, L etácio Jansen ofereceu in d ic a tiv o n a sessão d o lOAB de 16 de
ju lh o de 1931. E m relação a P e rn a m b u c o , a re p re sen ta ç ã o foi p ro p o s ta p o r P in to Lim a e m 5 de ju n h o de
1931.

•Al 57
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

m etendo ao arbítrio dos juizes tanto a apreciação das responsabilidades quanto


a graduação das penas; fez com entários à C onstituição, recordando os d isp o ­
sitivos que proibiam a retroatividade das leis. Finalm ente, argu m entou que
to d o s os crim es deveriam ser sub m etidos à justiça co m u m , e não sujeitos a
um Tribunal que aberrava os princípios do D ireito e as tradições nacionais
em matéria de repressão.®
Outras m oções de natureza política tam bém foram encampadas pelo C on­
selho do Instituto. N a sessão de 16 de julho de 1931, por exemplo, aprovou-se o
indicativo de Eurico de Sá Pereira, no sentido do lOAB dirigir um a representação
ao chefe do Governo Provisório, reivindicando a promulgação da lei eleitoral,
com o medida preliminar à convocação de uma Assembléia Constituinte^.
N ão é demais lembrar que, no campo político, duas correntes dominavam
o debate. Havia os que desejavam apenas pôr em prática as propostas liberais da
Constituição de 1891, mas não efetivadas, defendendo maior autonom ia para os
estados da Federação, o que implicava im por limites aos poderes da União:

(...) que se dote o país de um a Lei Orgânica, que seja a Carta de 24 de feve­
reiro, apenas revista sob os conselhos da experiência brasileira e adaptada às
conquistas modernas do Direito, pois só assim ela respeitará a índole e as
tradições nacionais; Lei que seja liberal para ser conservadora; Lei, fin al­
mente, que esteja ao nível verdadeiro dos nossos sentimentos, como a de 1891,
para ser civilizada, e da nossa inteligência e cultura, para ser progressista”^.

Outros defendiam u m novo m o d elo de Estado, mais intervencionista e


autoritário, aspirando pôr em prática u m projeto m enos federalista e mais
centralizador. Para este grupo, o nd e se sobressaíam os próceres d o tenentism o,
a dem ocracia política pressupunha co m o pré-requisito fundam ental a im plan­
tação da democracia social. Porém, argumentavam logo em seguida, um a a m ­
pla participação política da sociedade só seria desejável após a realização de
reformas sociais que elevassem o nível educacional e possibilitassem a maior
consciência cívica da população:

* lO A B , Aífl da sessão do lO A B , 30 d e a b ril d e 1931.


’ IO A B ,A ííi da sessão do lO A B , 16 d e ju lh o d e 1931.
Este e ra o caso, p o r e x em plo d o ad v o g ad o E u ric o de Sá Pereira, m e m b ro d o C o n se lh o S u p e rio r d o lOAB.
Cf. lO A B, E u rico de Sá P e re ira ,“ D iscu rso ” p ro fe rid o n a sessão in a u g u ra l d e 2 0 d e a b ril d e 1933. Bolecim
do Instituto dos Advogados Brasileiros. V olum e XI, n« 1, Rio d e laneiro: T ipografia d o Jo rnal d o C om m ercio ,
1933.

58 •à B
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiro s Pcrcursos e D e s a fio s i l 9.50 - 1 9 4 5 )

(...)Enquanto muitos elementos civis da revolução pediam a constituáonalizaçào


imediata do país, nós, militares do Clube 3 de Outubro, entendíamos que era
muito cedo para se convocar a Constituinte. Era preciso haver um interregna
maior, a fim de que se pudesse deixar de lado o passado e pensar no fiituro. Era
preciso tempo para coordenar melhor as idéias, para que se pudesse apresentar
na Constituinte um programa que atendesse aos interesses nacionais” .

Segundo Dulce Chaves Pandolfi, na percepção do m ovim ento tenentista, um


dos mais graves problemas da República Velha tinha sido a influência n o governo
dos partidos políticos, que eram porta-vozes de interesses particulares e contrários
ao progresso da nação'^. Para os fundadores do Clube 3 de Outubro'^, a ameaça
maior à revolução não estava nos políticos decaídos, o u seja, nos representantes das
oligarquias derrotadas em 1930, mas sim nos chamados “políticos profissionais”,
quer dizer, entre os próprios vitoriosos, que defendiam um retorno imediato à
ordem legal. Deste m odo, os setores mais autoritários defendiam o prolongamento
do Governo Provisório e, por conseguinte, o adiamento da constitucionalização do
país e da convocação de eleições gerais para um futuro incerto.
A fo n so A rinos, na biografia que escreveu de seu pai, o m in istro Afrâ-
n io de M elo Franco, revela que veteranos h o m e n s p ú b lico s lo g o se aperce­
beram d o (...) prin cípio de in a m o vib ilid a d e que a n im a v a aquele p o d e r execu­
tiv o . D e n tr e essa s p e r s o n a lid a d e s , A f o n s o A r in o s d e sta c a o p o lít ic o
flu m in en se José T olentino, v elh o co rreligionário de N ilo Peçanha, adversá­
rio de A rtur Bernardes e indiferente a W ash in gton Luís. Em carta dirigida a
M elo Franco, datada de 27 de ju n h o de 1932, José T olentino, m u ito esp iri­
tu o so , teria vaticinado:

(...) N ão contrariarei a sua esperança, embora tenha para m im que não eu,
mas homens mais moços ou de mais saúde do que eu, hão de, daqui a muitos
anos, saber que o Dr. Borges (de M edeirosj e o Dr. Pila (Raul Pila) estarão
discutindo no outro m undo as alterações do “heptálogo” (Programa de Re­
construção Nacional), a fim de submetê-las, p o r intermédio do General Flores
" o d e p o im e n to é d e A u g u sto A m a ra l Peixoto, fu tu ro ge n ro de G e tú lio V argas, a p u d M ax im ilan o M a rtin
Vicente, O A leliê do Catcte: a m oldagem do estado autoritário, op. cit., p. 65-66.
Cf. D u lce Chaves P andolfi, “V o to e p a rtic ip a ç ã o po lítica nas d iv ersas rep ú b licas d o Brasil”.In: A ngela de
C astro G o m es, D u lce Chaves P andolfi, V erena A lb e rti (c o o rd .), A República no Brasil. R io d e Janeiro;
N o v a F ro n teira: C P D O C , 2002, p. 85.
O C lu b e 3 d e O u tu b r o e ra u m a o rg a n ização po lítica fu n d a d a e m fevereiro de 1931, n o R io de Janeiro, p o r
e le m en to s v in c u la d o s ao m o v im e n to te n e n tista , e m a p o io a o G o v e rn o P ro v isó rio d e G etúlio Vargas.

«àl 59
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

da Cunha, caduco ou desencarnado, à apreciaçao do Dr. Getúlio Vargas, com


as barbas já cor de neve, mas ainda no Catete''^.

Entretanto, as pressões para que o país voltasse ao estado de direito eram


igualmente fortes. Para seus partidários, a reconstitucionalização não excluía
pôr em prática o tal heptálogo, referido p or José Tolentino, ou seja, o programa
de reformas anunciado por Vargas em 3 de novem bro de 1930.
A par disso, a campanha m ovida pela imprensa e a constante introm issão
de Vargas, pela via da ação dos interventores, na política interna dos estados,
deram novo im pulso à idéia da volta ao regime constitucional. O certo é que
prem ido por esses fatores, o Governo Provisório editou o D ecreto 21.076, em
24 de fevereiro de 1932, prom ulgando o Código Eleitoral.
Em linhas gerais, o C ódigo Eleitoral introduziu, dentre outras novidades,
o sufrágio universal, direto, secreto; estendeu o direito ao vo to às mulheres,
em bora proibisse o alistamento de m endigos, de analfabetos e de praças de pré,
excetuados os alunos das escolas militares de ensino superior, deixando, por­
tanto, à margem do processo político um a parcela significativa da população.
Estabeleceu a Justiça Eleitoral e instituiu a representação profissional na As­
sembléia Constituinte, por m eio da eleição dos deputados classistas, repre­
sentantes das associações das profissões liberais e dos funcionários públicos,
sindicatos, empregados e empregadores.
Apesar dos avanços, o Código suscitou intensa polêmica. Discutiu-se desde a
exclusão dos analfabetos do processo eletivo, até a composição do Tribunal Superior
Eleitoral atrelada ao Executivo'^. Acrescente-se a isso: o Decreto n^ 21.076 tornou o
alistamento facultativo. Ao m esm o tempo, dificultava, por assim dizer, a inscrição
dos eleitores, uma vez que exigia uma documentação complexa para a época, ou seja,
três fotos, prova de qualificação, comprovante de qualificação e identificação'^.

Cf- A fonso A rin o s de M elo Franco , U m estadista da República (A frãnio de M elo Franco e seu tem po). O p.
c it..p .l0 I6 -1 0 1 7 ,
O Tribunal Superior Eleitoral deveria ser integrado p o r oito m inistros efetivos e oito suplentes, cab e n d o a presi­
dência ao vice-presidente d o S u p rem o Tribunal Federal. D os sete m inistros restantes, dois efetivos e dois
substitutos ta m b é m seriam sorteados d e ntre os m e m b ro s d o Suprem o. O u tro s dois, efetivos e suplentes,
selecionados d e ntre os desem bargadores d a corte de apelação d o Distrito Federal. O s três elem entos restantes
seriam escolhidos pelo chefe d o G overno Provisório- C onsiderando-se q ue os qu ad ros d o S u p rem o Tribunal
Federal haviam sido recentem ente renovados p o r Vargas, em v irtu d e da aposentadoria com pulsória im posta
a seis m inistros, a Justiça Eleitoral ficava atrelada ao Executivo. A p a r disso, na com posição dos Tribunais
Regionais, d e ntre os seis m em b ro s exigidos, dois deveriam ser designados p o r Vargas. Cf. D ecreto n° 21.076,
Ccleção de Leis do Brasil. A n o de 1933. Rio d e Janeiro: Im prensa Nacional, 1948, v. 1, p. 111-115,
Id e m , p. 230.

60 •ái
V o lu m e 4 C r i a ç ã o , P rim eiro s Percursos e D e s a fio s |1 9 J Ü - 1 9 4 5 )

Quanto à introdução da representação dassista, a controvérsia não seria m e­


nor. Ao m esm o tempo em que contrariava os políticos tradicionais, fazia a alegria
dos tenentes radicais e de Vargas, por certo inspirados nas premissas do pensamen­
to político de Alberto Torres, especialmente o seu Projeto de Revisão Constitucio-
m P . A novidade, porém, não passou sem protesto, identificada ao corporativismo
praticado pelo fascismo. Além disso, os críticos mais agudos percebiam-na com o
uma maneira do Estado interferir no Legislativo. Melhor dizendo, não descartavam
a possibilidade do governo, querendo ser mais representativo, manipular as elei­
ções classistas, o que por certo seria mais fácil do que nas eleições gerais'®.
A p ublicação do C ó d ig o Eleitoral acen tu ou o s debates em torn o da
reconstitucionalização do país. Sabe-se que o Clube 3 de Outubro manifestou-se con­
trário à realização de eleições. Getúlio Vargas, por sua vez, de diferentes maneiras
tentou contemporizar, demonstrando aos tenentes que o retorno do país ao regime
constitucional era irreversível. Neste sentido, chegou até a entabular um plano, previ­
amente acertado com seus aliados civis, propondo as seguintes medidas:

(...) revigoramento da Constituição Federal, menos quanto ao Poder Execu­


tivo, criação de um Conselho Consultivo Federal e constitucionalização, ou
antes, reconstrução da nova ordem legal, m ediante fases sucessivas até 30
meses. Aceitei, em pincípio, ficando para tratarm os do caso após o regresso de
Oswaldo e José Américo, um trazendo suas impressões do sul, e outro repre­
sentando 0 pensam ento do N orte‘S.

C o m o se vê, o arranjo engendrado por Vargas, que contou com a anuência


de im portantes líderes da política de Minas Gerais - Artur Bernardes, Venceslau
Brás, A ntônio Carlos de Andrada, Afrânio e Virgílio de M elo Franco - im plica­
va no fim d o Legislativo, o que em outras palavras significava cancelar a convo­
cação das eleições. A trama, todavia, não ficaria sem resposta, pois a pretensão
de tornar ainda m ais forte o poder central desagradava a m uitos segm entos da
sociedade, sobretudo a oligarquia paulista, parte da m ineira e da gaúcha.
Em São Paulo, acirrou-se a oposição contra o interventor, representante
do poder central. Vargas, por seu turno, procurou apaziguar os ânim os, c o m a

Cf. A lberto Torres, “ P rojeto d e Revisão C o n stitu c io n a l’’. I n : _________ , O problem a nacional brasileiro.
Prim eira Parte - A C onstituição. São Paulo; C o m p a n h ia E d ito ra N acio nal, 1933, p .4 3 5 -5 15.
Cf. F rancisco Iglésias, Trajetória política do Brasil (1500-1964). 2 “ re im pressão. São Paulo: C o m p a n h ia das
Letras, 1993, p. 234.
G e túlio Vargas, Diário, op. cit., v. 1, p. 101.

•ÁB 67
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

edição do Decreto 21.402, em 14 de m aio de 1932, marcando as eleições


constitucionais para 3 de m aio de 1933. Mas o s acontecim entos se precipita­
ram e, e m 9 de julho, os paulistas desencadearam o m ovim en to que ficou c o ­
nhecido co m o Revolução Constitucionalista^°.
N ão cabe neste livro tecer m aiores considerações sobre aquele m o v im e n ­
to, considerado hoje em dia a pior guerra civil vivida pelo país. Há inclusive
excelente bibliografia disponível a respeito^'. N o m om ento, im porta ressaltar
que m al o conflito irrompeu em São Paulo, Plínio Barreto - presidente do Ins­
tituto dos Advogados Paulistas e do C onselho Seccional de São Paulo, fez um
apelo radiofônico, convocando a classe dos advogados a pegar em armas e ade­
rir ao movimento^^. Da capital da República, em 14 de julho de 1932, respon-
deu-lhe o orador oficial do lOAB, Eurico de Sá Pereira.
O D r. Eurico de Sá Pereira proferiu u m discurso em ocionado, salientan­
do que desde a sessão inaugural do ano de 1931, a corporação do D istrito Fede­
ral vinha postulando junto ao Governo Provisório a reconstitucionalização do
país e o seu retorno aos quadros legais. Em n o m e do Instituto, Sá Pereira decla­
rou oficialm ente apoio aos confrades paulistas:

(...)no momento em que a alma de todo brasileiro se entristece com a perspectiva


de horrenda e lamentabilíssima luta fratricida, embora, ao mesmo tempo, se
orgulhe da bravura moral do povo de São Paulo batendo-se de armas nas mãos
pela Constituinte, imolando-se, assim, p o r um ideal jurídico, que é também o
nosso, fique certo o D r Plínio Barreto e certíssimo o nobre povo bandeirante de
que a atitude deste - dado o móvel superior que a inspira - é acompanhada com
toda simpatia pelos juristas membros desta Casa.(...) Encarada tal atitude sob
esse aspecto moral, cabe-nos o dever de levar o conforto da nossa solidariedade
aos ilustres colegas de São Paulo, reafirmando mais uma vez o nosso voto pela

N a ótica d o h is to ria d o r Boris Fausto, a revolução refletia a c o n te n d a político-ideológica e n tre a u to ritá rio s e
liberais. E n tre os objetivos d o m o v im e n to ( . . . ) - u m a revolta oligárquica, para seus in im ig o s-, encontravam -
se a garantia de autonom ia dos estados e a implantação do regime político liberal após a realização de eleições.
S o b re a “ R evolução C onstitu cio n alista " de 1932, ver, d e n tre o u tra s obras, Boris Fausto, O Brasil republica­
no. Sociedade epolítica (1930-1964), Ver, ta m b é m , M a r ii H elen a R o lim Capelato, O m o v im e n to d e 32. A
causa paulista. São Paulo: B rasüiense, 1981 e H o lie n B ezerra G onçalves, O jogo do poder: a revolução
p a u lista de 32. São Paulo; M o d e rn a , 1988.
“ O C o n se lh o Seccional de São P au lo fech ou suas p o rta s a p ó s a sessão d e 8 d e ju lh o de 1 9 3 2 .0 p re sid en te
P lín io B arreto e os C o nselh eiros F ran cisco M o ra to , W a ld e m a r F e rreira e V icente R ao, q u e a tu a r a m d ire ­
ta m e n te n o conflito, fo ra m presos e tra n s fe rid o s p a ra o R io d e Janeiro. M ais ta rde, Francisco M o ra to e
W a ld e m a r F e rreira seg uiram p a ra o exílio e m Lisboa, e n q u a n to V icente R ao foi p a ra a França. Plínio
B arre to re a ssu m iu a presidência d o C o n se lh o Seccional d e São Paulo n a sessão d e 2 d e ja n e iro d e 1933.

62 •AB
V o lu m e 4 C r i a ç ã o , P rim eiro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - J 9 4 5 )

imediata reintegração do pais no regime constitucional; e pedir a Deus para que


beneficie com a bênção da p a z a nossa pátria, uma vez que a ditadura não soube,
não pôde ou não quis fazê-lo^^.

Outras demonstrações de solidariedade aos rebeldes paulistas se sucederiam,


no decorrer do conflito. De um m odo geral, tais pronunciamentos se caracterizavam
pela censura à ditadura por infringir os preceitos da Lei Orgânica do Governo Provi­
sório. Apar disso, a plenária do lOAB aprovou uma série de indicativos conclamando
o governo a não mais fazer detenções por motivos de ordem política em prisão co­
m um , nem deportar concidadãos para lugares fora do território nacional.
N a esteira do movim ento Constitucionalista de São Paulo sobreveio uma onda
de repressão no Distrito Federal. Diversos advogados foram detidos e seus escritó­
rios devassados por elementos da polícia. Dentre os membros do Instituto afetados
por essas arbitrariedades, destacavam-se Targino Ribeiro, Sobral Pinto, Augusto
Pinto Lima, Nestor Massena, Silveira Martins, Renato Bittencourt, Lima Rocha,
Justo de Moraes, Álvaro Miranda, Antônio Souza, Iberê Bernardes, Otto Gil e Ary
Cunha Barbosa. Em vista dos acontecimentos, na sessão de 12 de setembro de
1932 , 0 Conselho Superior do lOAB apresentou um indicativo de veemente protes­
to ao chefe de Polícia do Distrito Federal, reclamando contra a prisão dos causídicos
e as buscas atentatórias do sigilo profissional efetuadas nos respectivos escritórios.
É b em verdade que essa deliberação causou controvérsias na Casa de
M ontezum a, em virtude da premissa levantada por Alceu de Sá Ferreira, de que
o lOAB não deveria representar contra as autoridades policiais, sem antes in ­
dagar os fundam entos que teriam determ inado aquelas prisões. A pós duros
apartes, o s trabalhos foram suspensos. Reaberta a sessão, Targino Ribeiro to ­
m o u a palavra e expôs os m otivos que deveriam garantir a liberdade do exercí­
cio da profissão, não no interesse pessoal do advogado, mas para o bem pú bli­
co, em benefício da coletividade, que era protegida em seus direitos pela ativi­
dade do advogado. A rgum entou que sua detenção e a de seus colegas sem ra­
zões justificadas, assim co m o a invasão de seu escritório por autoridades p oli­
ciais subalternas, constituíam atos que não poderiam ser aceitos passivamente.
C o m o desagravo, e em protesto contra o cerceamento da liberdade de opinar, o
lOAB resolveu suspender seus trabalhos por 24 horas, no dia 17 de setembro,
solicitando à magistratura que fizesse o mesmo^"*.

“ lO A B, Affl da sessão do lO A B , 14 de ju lh o d e 1932.


" lO A B, A/fl da sessão do lO A B , 12 d e se te m b ro d e 1932.

63
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Mas, se no Conselho Superior do Instituto as vozes se ergueram a favor da


volta do regime constitucional, o m esm o não ocorreu em relação à OAB - re­
presentada na ocasião pelo C onselho da Seção do Distrito Federal, que fu n cio­
nava tam bém co m o C onselho Federal provisório. Essa conduta contraditória
merece um a breve reflexão: à primeira vista, poderíam os argumentar que a
OAB não tom ou nenh um posicionam ento porque, na época, gravitava em tor­
no Levi Carneiro - h o m em identificado c om o regime e que desfrutava da co n ­
fiança de G etúho Vargas. O u, então, porque, e m fase de im plantação, as aten­
ções da Ordem estavam voltadas para a resolução dos problem as de interpreta­
ção do Regulamento, co m o se dem onstrou no capítulo anterior.
C ontudo, tais premissas não se sustentam, à m edida que se sabe que, d en ­
tre os vinte e u m conselheiros da Ordem, onze provinham dos quadros do Ins­
tituto. O que nos leva a supor que, para preservar as prerrogativas conquistadas
com a criação da Ordem , os h om en s que estavam à frente das duas instituições
teriam adotado, estrategicamente, um com portam ento ambíguo: na Ordem,
defendiam som ente os interesses da classe dos advogados, m anifestando neu­
tralidade e preocupação em zelar pelo b o m exercício profissional das bacha­
réis, enquanto no Instituto, esses m esm os indivíduos em itiam pronunciam en­
tos de natureza polítrica, respeitosos por certo, m as beiran do as raias do
enfrentam ento com o Governo Provisório, com o se observa no discurso de
Eurico de Sá Pereira, proferido na sessão inaugural do exercício de 1933:

(...) N ão fo i de rosas, bem sabeis, o caminho que o Instituto vingou nesses


dois anos transcorridos. FoÍ de certo m odo penosa a jornada, p o r ter muitas
vezes de condenar atos do Governo Provisório, mas sempre o f iz inspirado
p o r móvel superior, qual seja o de cumprir o seu dever, que lhe cabe por
destino, de defender e reivindicar as conquistas liberais da civilização, que
constituem o patrim ônio moral do país, sempre que negadas ou ofendidas.
(...) E num a representação respeitosa, que tive a honra de redigir, subscrita
p o r cerca de cem membros desta Casa, leva ao chefe do Governo Provisório o
apelo em prol da im ediata convocação da Constituinte (...) Essa campanha
está concluída, devemos supor, com a designação do dia 3 de maio próxim o
para as desejadas eleições (...)^^.

Cf. lO A B, E urico de Sá Pereira, “D iscu rso ” p ro fe rid o n a sessão in au gura] d e 20 d e abril de 1933. Boletim do
Instituto dos Advogados B r a s ile iro s .V o \u m e X l,n ‘^ l , R i o de Janeiro: Tip ografia d o Jorna l d o C o m m e rc io ,
1933.

64 • àm
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiro s Percursos e D e s a t i o s ' 19 3 0 - 1 9 4 .t )

2.2 A OAB e a Constituinte de 1934

Apesar da derrota militar sofrida, os revoltosos de São Paulo conseguiram


im portantes ganhos políticos, até porque suas dem andas pela volta ao estado
de direito eram compartilhadas por setores oligárquicos do Rio Grande do Sul
e de M inas Gerais. As eleições para a Assembléia N acional Constituinte foram
finalm ente realizadas em 3 de m aio de 1933, consoante o C ódigo Eleitoral pro­
m ulgado em 24 de fevereiro de 1932^^.
A cam panha eleitoral para a C onstituinte caracterizou-se por dois aspec­
tos relevantes: o im pulso na participação popular e a organização partidária.
Partidos das mais diferentes tendências surgiram nos estados, uns com bases
reais e outros sem qualquer consistência. Para se ter um a idéia, em São Paulo,
o Partido D em ocrático e o antigo Partido Republicano Paulista, aliados na Re­
volução Constitucionalista, formaram a legenda Chapa Única Por São Paulo
Unido, que, aliás, elegeria a primeira deputada mulher, a m édica paulista Carlota
Pereira de Queirós. À exceção dos com unistas, ainda que na ilegalidade e da
A ção Integralista, não houve a formação de partidos nacionais. As urnas, diga-
se de passagem, confirm ariam a força das elites regionais^^.
Em contrapartida, o m inistro da Justiça, A ntunes Maciel, prom oveu um a
intensa articulação política junto aos grupos oligárquicos regionais para a for­
m ação de um a base de sustentação ao governo. N o Rio Grande do Sul, Flores
da Cunha organizou o Partido Republicano Liberal; em M inas Gerais, Gustavo
Capanema e A n tônio Carlos de Andrada fundaram o Partido Progressista. A
Igreja Católica, por m eio do Centro D o m Vital, organizou a Liga Eleitoral Ca­
tólica. Os “tenentes” criaram no D istrito Federal o Partido A utonom ista e em
Pernam buco o Partido Social Dem ocrático.
Outro reforço com que se contava, em princípio, para emprestar apoio às
propostas governistas era a bancada classista. Cabe esclarecer que a Assembléia
Constituinte compor-se-ia de duzentos e cinqüenta e quatro deputados, sendo
duzentos e quatorze eleitos na forma prevista pelo Código Eleitoral e quarenta
deputados classistas. A representação profissional, as vagas destinadas aos traba­
lhadores, deveria se constituir num a espécie de massa de manobra do governo.
A escolha da representação classista foi regulamentada pelo D ecreto n®
22.653, de 20 de abril de 1933. D o s quarenta deputados eleitos, vinte represen-

D ecreto n ° 21.076, de 24 d e fevereiro d e 1934.


Cf. Boris Fausto. H istória do Brasil. São Paulo; E du sp, 1999, p. 351.

•Al 65
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

tariam os empregados e núm ero igual os empregadores, sendo que entre estes
últim os incluíam -se três representantes das profissões liberais e naqueles dois
da classe dos funcionários públicos. O direito a voto era assegurado som ente
aos sindicatos reconhecidos pelo m inistério do Trabalho e às associações de
profissionais liberais e de servidores públicos que estivessem legalm ente orga­
nizadas até 20 de m aio de 1933. As eleições classistas deveriam ser realizadas até
o dia 30 de junh o e delas sairiam os delegados encarregados de designar os
quarenta representantes à Constituinte^®.
O D ecreto provocou um a consulta do presidente do C onselho Federal da
OAB, em ofício datado de 17 de m aio de 1933, indagando ao M inistro do Tra­
balho, Indústria e C om ércio, a quem cabia regular o processo, n o caso da situ­
ação particular da classe dos advogados. A nos mais tarde, Levi Carneiro afir­
maria que o ofício fora um a insistência protocolar junto ao M inistro, porque as
ponderações ele já havia feito, pessoalm ente, em reunião reservada. N o seu
entender, deveria ser assegurado aos advogados o direito de ter pelo m enos um
representante na Assem bléia C onstituinte, escolhido pela OAB:

(...)A peculiaridade da condição legal da classe dos advogados e da Ordem dos


Advogados ~ criada, em boa hora, pelo Governo Provisório, exige que lhe caiba
tratamento especial na matéria de que se trata. (...) o Governo prestigiaria a
Ordem dos Advogados - criação de que pode se orgulhar—e obteria, com faci­
lidade e segurança, a representação idônea da classe dos advogados.^^

Justificava-se a pretensão, com o argum ento de que em bora a Ordem


não fosse precisamente u m a associação, ela abrangia, por força de lei, todos os
indivíduos que exerciam a advocacia n o território nacional, além de constituir
serviço público federal. Gozava, por conseguinte, de um a situação singular, que
não era desfrutada por nenhum a outra classe, associação o u sindicato no país.
D e mais a mais, não se pode esquecer que a OAB era vista co m o um a realização
do m ovim ento revolucionário, (...) D evem os ao governo do Sr. Getúlio Vargas
essa organização. O Governo Federal pode orgulhar-se de a haver conseguido pron­
tamente, com a cooperação devotada dos advogados^°.
S o bre as eleições d o s d e p u ta d o s classistas, ver, M a x im ilia n o M a rtin V ic e n te , O Ateliê do Cufeíe; a
do Estado autoritário, op. c it.,p . 73-74. Ver, ainda, os c o m e n tário s d e A ngela d e C astro G om es, “A re p re ­
sen tação d e classes n a C o n s titu in te d e 3 4 ”. I n ; __________ , Regionalism o e centralização política: partidos
e constituintes nos anos 30. R io d e Janeiro: N ova F ro n teira , p. 436.
" C f . Levi C arneiro- O livro de u m advogado. Rio d e Janeiro: A. C oelho B ra n co E ditor, 1943, p. 349.
’“ Idem , p. 83.

66
V o lu m o 4 C r ia ç ã o , P rim e iro s Percursos e D e s a fio s - 19 4 5 )

O certo é que o pleito da OAB foi acolhido e Levi Carneiro designado por
seus pares para representá-los na bancada das profissões liberais na Assembléia
Constituinte de 1933. A escolha, de certa forma, era coerente com o preceito
do art. 89 do Regulamento, onde se lê que cabe ao presidente da Ordem a repre­
sentação da entidade perante os poderes públicos, em juízo, e em todas as rela­
ções com terceiros, ativa e passivamente .
D e qualquer m o d o , a indicação do presidente da Ordem e ex-consultor
geral da República parece ter levantado a suspeita de que a base de apoio de
Vargas conquistara mais u m elem ento. Sintom aticam ente, o jornal Diário de
Notícias, logo que se anunciou a indicação de Levi Carneiro, procurou-o para
um a entrevista, indagando-lhe sobre o m o d o com o iria desem penhar o seu
mandato. Em resposta, o jurisconsulto procurou contem porizar afirmando:
(...) Advogado até a medula dos ossos, e representante dos advogados, terei de agir
com 0 sentim ento dos homens da minha profissão, conciliando as nossas melhores
tradições com os corretivos necessários aos males de que sofremo^^.
As eleições realizaram-se em 3 de m aio de 1933” . Apesar da confiança
que Vargas dem onstrava na costura política, que realizara para não perder o
controle do Congresso C onstituinte, na noite do pleito teve u m pesadelo, com o
se lê no seu Diário:

(...) Realizou-se 0 pleito. Está cum prida a palavra do Governo Provisóriof...)


Passei a noite com insônia. Com freqüência, vieram -m e ao pensam ento as
ameaças de um amigo, hoje rancoroso e despeitado inimigo, prom etendo es­
crever um livro contra m im , divulgando correspondência secreta. Trata-se de
um caso de chantagem^^.

Em 15 de novembro de 1933 instalou-se a segunda Assembléia Constituinte


Republicana, em solenidade realizada no Palácio Tiradentes. Vale lembrar que ca­
beria à Assembléia, além de elaborar a nova Constituição, julgar os atos do Gover­
no Provisório e eleger o presidente da República. Logo em seguida, n o dia 16, as­
sembléia recebeu oficialmente o anteprojeto constitucional, preparado pela comis­
são do Itamarati, texto que serviria de base para os trabalhos dos congressistas.

^‘ OAB, R egulam enío .op., d l . , p . 770.


” Cf. Levi C arn eiro . Pela N ova Constituição. Rio d e Janeiro: A. C o elh o B ranco Filho, 1936, p. 608.
" C o m p a r e c e r a m p a ra a v o ta ç ão cerca d e 1.200.000 eleitores, e m u m a p o p u la ç ã o de 40 m ilh õ e s d e h a b ita n ­
tes.
^^Cf. G e túlio Vargas, D iário, op. cit., v ,l, p. 208.__________________________________________________________

•Al 67
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

D e acordo com Regim ento Interno da C onstituinte, designou-se um a


com issão - que ficou conhecida com o a Comissão dos 2 6 - com o objetivo de
avaliar o anteprojeto governista e as em endas apresentadas pelos deputados
para alterá-lo. A Comissão dos 2 6 era integrada por u m representante de cada
bancada estadual e por u m m em bro de cada u m dos grupos profissionais. Os
deputados Carlos M axim iliano, Levi Carneiro e Raul Fernandes - este últim o
tam bém conselheiro da Ordem, foram escolhidos respectivamente para presi­
dente, vice-presidente e relator-geral dos trabalhos. C om o Levi Carneiro se pro­
nunciasse contrário ao estabelecim ento da vice-presidência, que qualificou de
m eram ente decorativa, Carlos M axim iliano d em oveu -o daquela atitude, afir­
m ando que, além de regimental, o cargo sendo por ele ocupado ganharia maior
prestígio e relevo, em virtude da posição que ocupava co m o presidente da Or­
dem dos Advogados do Brasil^^.
Os trabalhos da C onstituinte prolongaram -se por oito meses. N u m pri­
meiro m om ento, entre novem bro de 1933 e m arço de 1934, os deputados atua­
ram no sentido de reformular o projeto encam inhado por Getúlio Vargas, for­
m ulando em endas à redação e de substância. Aliás, o m o d o por que foram
organizados os trabalhos, bem c o m o a discussão do R egim ento Interno, retar­
daram a atividade legislativa, propriamente dita.
Levi Carneiro sugeriu alterar o encam inham ento das atividades. Propôs
que se concedesse prioridade às chamadas grandes questões, a exem plo da
organização federal, dos poderes da U nião e dos estados, da intervenção fede­
ral, da formação do Poder Executivo (eleição, tem po, prazo, com petência), da
com posição d o Poder Legislativo (sistema unicameral ou bicameral), enfim , os
postulados básicos da Carta. Som ente após cum prida essa etapa, os deputados
deveriam passar ao debate mais elevado, pois, no seu entender: (...) N ão é a
Comissão de Constituição que há de dizer à Assembléia quais as preferências p o ­
líticas do povo brasileiro; é a própria Assembléia que as há de indicar e, para isso,
não precisa da iniciativa da Comissão^^.
Diga-se de passagem, o governo e os grupos que com punham a Assembléia
tinham projetos e interesses diferentes em relação à reorganização jurídica do
país. Neste sentido, a tarefa da Comissão dos 26 foi bastante difícil, visto que a
quantidade de emendas apresentadas ao projeto ultrapassava a casa de mil.

A n a is da Assem bléia N a cional C onstituinte. V o lu m e X. R io d e Janeiro: Im p re n s a N acional, 1936, p. 7.


Cf- Levi C arn eiro , a p u d H élio Silva e M aria Cecília Ribas C arn eiro , H istória da República Brasileira - A lei
e a revolta (1934-1936). São Paulo: E d ito ra Três, 1975, p. 51-52.

68 Q4 B
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim e iro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 Ü - 1 9 4 5 )

A dem ais, as atividades do Congresso seriam afetadas pelas circunstâncias


políticas, com o por exem plo a crise provocada pela n om eação de Benedito
Valadares para a interventoria de Minas Gerais. A nom eação levou Afrânio de
M elo Franco a pedir exoneração da pasta das Relações Exteriores e Oswaldo
Aranha do M inistério da Fazenda, sendo que este últim o renunciou, tam bém , à
liderança da m aioria no Congresso, o que tu m ultuou o andam ento das sessões.
A saída intem pestiva de O swaldo Aranha seria lam entada por G etúlio Vargas:

Oswaído, até o último momento fazendo-m e declarações de am izade (...)


queixa-se de sua situação de incompatibilidade. Aguardo até tarde da noite
a intervenção espontânea de João Alberto e Góispara demovê-lo (...). M antida
intransigentemente a atitude de renúncia, mando, já pela madrugada, for­
necer uma nota aos jornais aceitando a exoneração. Perco dois bons colabo­
radores. Sinto principalm ente o afastamento de Oswaldo, cujas qualidades
excepcionais dificilmente podem ser supridas. Será definitivo esse afastamento^
Quais as suas conseqüências?^^

Os desdobramentos da crise chegaram à Assembléia Constituinte, o nde os


trabalhos ficaram praticamente paralisados, até que fosse indicado u m novo lí­
der da bancada governista. O impasse resolveu-se com a designação do deputado
M edeiros Neto. As atividades, a partir daí, se aceleraram. Para dar conta da siste-
matização das emendas apresentadas, alterou-se o m étodo de trabalho da C o­
m issão dos 26, que passou a contar com apenas cinco integrantes fixos, ficando
os demais divididos em grupos, cada qual encarregado de um tema específico.
O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, com o já era de se espe­
rar, d esem pen hou as funções de relator do capítulo que deveria tratar da orga­
nização d o Poder Judiciário. Mas outros m em bros da Ordem tam bém atuaram
com destaque no Congresso Constituinte, a exem plo dos conselheiros Odilon
Braga, N ereu Ramos, Alberto Roselli e Leopoldo Tavares da Cunha Mello. D o
m esm o m odo, há que se salientar a participação do D r. José Eduardo do Prado
Kelly, que viria a ser presidente da OAB em 1960, na apresentação de emendas
relativas à educação e à representação profissional.
A presença de diversos conselheiros da OAB na Assembléia Nacional C ons­
tituinte, aliada ao fato de que seu presidente ali ocupava im portantes funções,
provocou um certo esvaziam ento do C onselho Federal da Ordem. Tanto assim,

” Cf. G e túlio Vargas, D iário, op. cit., p. 257.

•Al 69
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

a últim a reunião do exercício de 1933 realizou-se em 16 de agosto daquele ano,


quando foi aprovado o indicativo proposto por Edm undo M iranda Jordão, re­
presentando ao governo sobre os inconvenientes da aplicação d o Decreto Fe­
deral n.° 23.055, de 9 de agosto de 1933, sobretudo o seu art. 1.°, que determ i­
nava o recurso ex officio, com efeito suspensivo, a ser requerido pelo presidente
do Tribunal o u o da Câmara respectiva ao Suprem o Tribunal Federal, sempre
que os julgam entos das justiças locais se fundam entassem em disposição ou
princípio constitucional, ou decidissem contrariam ente a leis federais, ou a
decretos e atos do G overno da União, dentro do prazo de três dias contados da
publicação do respectivo acórdão.
N o entender de Miranda Jordão, a redução d o núm ero de juizes do Supre­
m o Tribunal já era m otivo suficiente para condenar a criação de outra espécie de
recurso das decisões dos tribunais estaduais. Acrescente-se a isso a fixação do
prazo exíguo de três dias para interposição do recurso de ofício. A m edida im pu­
nha aos presidentes de tribunais locais novo encargo, dim inuindo assim o tempo
necessário para o exame detido de cada caso. Ademais, o decreto tam bém não
regulava a forma processual do recurso em qualquer instância, nem considerava
aspectos com o a segurança no deslocamento dos originais dos autos processados
nas justiças locais para a Capital, entre outros graves inconvenientes^®.
O C onselho Federal só se reuniria novam ente, por iniciativa d o presiden­
te interino Zeferino de Faria, em caráter extraordinário, nos dias 9 e 11 de ja­
neiro de 1934, em virtude de controvérsia existente sobre a data de expiração
dos m andatos dos m em bros dos Conselhos Seccionais eleitos pelo Conselho
Superior dos Institutos de Advogados locais. Assunto, aliás, que não estava pre­
visto nas norm as do Regulamento. O impasse resolveu-se, com a fixação dos
m andatos em dois anos, contados a partir de 31 de m arço de 1933. Naquela
m esm a ocasião, julgou-se a representação do advogado M iguel Quadros sobre
a prisão ilegal dos advogados paranaenses Walter Gastão Butel e M artins Costa,
atribuída às autoridades do Estado. A matéria foi encam inhada ao Conselho da
seccional do Paraná, para as providências que se julgassem acertadas.
C om os trabalhos constituintes ainda em curso, o Conselho Federal reu­
niu-se, mais uma vez em caráter excepcional, em 16 de abril de 1934. Nesta
ocasião a convocação veio assinada pelo próprio Levi Carneiro. A sessão desti­
nava-se ao estudo das matérias oferecidas à C onstituinte pelo conselheiro
H aroldo Valladão, a propósito de estabelecer garantias para a profissão de ad-

^*OAB, A ta da sessão do Conselho Federal da O AB, 13 d e agosto d e 1933. A rq uiv o OAB.

70
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiros Percursos c D e s a tio s 11 9 3 0 - 19451

vogado com o trabalhador intelectual, b em co m o de assegurar aos advogados


militantes, nas nom eações de acesso, vagas no quadro da magistratura para os
cargos de juizes singulares e de m em bros de Tribunais Superiores^^.
O C onselho rejeitou a primeira parte da sugestão oferecida por Haroldo
Valladão. Q uanto à segunda, decidiu que o preenchim ento das vagas por advo­
gado deveria ficar restrito apenas aos Tribunais Superiores. Aprovou, ainda,
u m indicativo de Levi Carneiro que pretendia assegurar à Ordem dos Advoga­
dos a prerrogativa de intervir na nom eação de juizes e nas com issões de co n ­
curso para preenchim ento de vagas da magistratura.
N o correr das discussões sobre o capítulo que dispunha sobre o Poder
Judiciário, Levi Carneiro levou ao Congresso C onstituinte as em endas aprova­
das pelo C onselho Federa] da Ordem. As propostas causaram polêm ica e foram
objeto de crítica por órgãos da imprensa. O Jornal do Commercio publicou ex­
tensa nota, atribuída ao seu correspondente no C ongresso, op ondo-se à incor­
poração daqueles preceitos ao texto constitucional, os quais no entender do
jornalista não passavam de m eros desejos do deputado classista de prom over a
O rdem dos Advogados, da qual era presidente.
N a opinião do Jornal do Commercio, não seria conveniente a intromissão
de advogados na formação dos tribunais. A rgum entava-se que a m edida p ode­
ria com prom eter a imparcialidade do juiz assim escolhido, principalm ente no
caso das justiças locais, onde os advogados tinham causas subm etidos a juizes
que deles dependeriam para futuras promoções'*®.
Em duas oportunidades, Levi Carneiro respondeu às críticas d o Jornal do
Commercioy justificando que as em endas resultaram da convicção da classe dos
advogados sobre a necessidade de restringir o arbítrio, o u a hipertrofia, do Po­
der Executivo. Q uanto à questão da desvantagem da intromissão dos advoga­
dos na com posição dos tribunais, Levi Carneiro rebateu o argum ento, adver­
tind o que tais premissas eram obsoletas.
Segundo o presidente da OAB, a citada intromissão, elevava e enobrecia as
relações entre a advocacia e a magistratura. Contribuía para a própria eficiên­
cia da Justiça, um a vez que não dava margem aos cambalachos, nem às trocas
de favores, o que tanto parecia recear o Jornal do Commercio-, a m enos que se
tratasse de juizes e de advogados (...) destituídos do sentimento de seus deveres,
capazes de venalidade ou de suborno. Nestes casos, replicava o deputado repre-

^’ OAB, Aí£J da sessão do Conselho Federa! de 16 d e ab ril de 1934. A rquivo OAB.


Jornal do C om m ercio. a p u d Levi C arn eiro , Peía N ova Consliluição. O p. cit., p. 675-680.

77
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

se n ta n te d o s bacharéis, não h a ve ria m eio de e v ita r-lh e as desca íd as. E,


complementava, (...) A verdade irrecusável é que ninguém conhece melhor os juizes
- nem distingue melhor o bom ju iz e o m au ju iz - do que o advogado. Arrem atan­
do a defesa das em endas, Levi Carneiro concluiria:

(...)A Ordem dos Advogados - há p o r a í quem não o saiba - é regulada p o r


lei, e abrange todos os que exercem a advocacia no Brasil Cada Estado cons­
titui uma “Seção”. Em cada Estado, todos os advogados inscritos elegem o
Presidente. Os Presidentes de todas as Seções constituem o Conselho Federal.
Será possível que se recusem idoneidade, isenção, critério, a esse conjunto de
advogados, escolhidos pelos seus colegas, para indicar um só nome dentre os
cinco que serão apreciados pelo Presidente? Q ual a influência individual que
se possa recear? Qual a dependência que se crie para o ju iz indicado? Será
m aior que a influência oculta, as dependências misteriosas das indicações
feitas ao ouvido do Chefe da Nação?^^

Na verdade, o sistema proposto não conferia a escolha dos advogados a


qualquer advogado individualm ente, mas atribuía ao C onselho Federal da OAB
o direito de indicar u m dos n o m es que integrariam um a lista quíntupla, a ser
apresentada ao Presidente da República. Em relação aos tribunais locais, os
Conselhos seccionais indicariam u m n om e para um a lista tríplice, a ser su b m e­
tida ao Governador.
A discussão prosseguiu, com a publicação de outras matérias contrárias
às pretensões da Ordem. N um a segunda carta dirigida ao Jornal do Commercio,
m u ito didática, por sinal, não se p ode deixar de apreciar o extrato em que Levi
Carneiro dá por encerrado o debate, com fina ironia:

Antes de concluir, devo assinalar que há ainda outro ponto, em que a d i ­


vergência do m eu generoso opositor é bem m enor do que eu im aginava. S.
Ex. declara que, no caso especial da Corte Suprema, não é “radicalmente
contrário à indicação de advogados, pelos advogados”. F az-m e a justiça de
reconhecer que m e inspirou o intuito de bem servir à causa pública - a d ­
m itin do a possibilidade de ter agido tam bém pelo desejo de elevara O rdem
dos Advogados. O nobre missivista considera “justificado” esse desejo, acres­
centando que eu fu i o criador da Ordem . Peço vê n ia p a ra retificar: não fui

41 Id e m , ibidem .

72 «▲I
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiros Percursos e D e s a fio s i l 9 3 0 - 1 9 4 5 )

eu 0 '‘criador" da O rdem . Apenas colaborei na sua organização. C riou-a o


anseio dos homens m ais em inentes de m inha profissão, através de 80 anos.
Tive, aliás, e tenho sem pre o propósito de “elevá-la” A té porque considero
que, assim, sirvo bem á causa pública. A Ordem dos Advogados p o d e v i r a
ser um a instituição da m aior benemerência, prestigiando e melhorando a
Justiça em nosso Brasil. E um dos meios p o r que p o d e agir mais eficiente­
m ente é pela seleção dos magistrados. Essa convicção influiu na emenda,
que apresentei. N ã o o escondo, nem m e arrependo disso - qualquer que
seja a sorte da m inha sugestão}^

À guisa de inform ação, vale observar que o dispositivo aprovado não as­
segurava à O rdem o direito de indicar u m dos nom es da lista tríplice para a
prom oção por m erecim ento dos juizes nos tribunais estaduais, do D istrito Fe­
deral e do território do Acre. Caberia aos tribunais, por votação em escrutínio
secreto, a organização da referida lista.
Apesar da redação do capítulo que dispunha sobre o Poder Judiciário ter
ficado sob a responsabilidade de Levi Carneiro, n em todas as em endas por ele
assinadas conseguiram obter a aprovação da Assembléia. Em que pese o em p e­
n h o d o presidente da OAB, foi rejeitada a proposta que concedia ao Poder Judi­
ciário autonom ia para decidir sobre a escolha do vice-presidente dos tribunais
e sobre as nom eações de serventuários e funcionários da Justiça. A m esm a de­
cisão ocorreria em relação ao indicativo que fixava os critérios para a n om ea­
ção de juizes do Suprem o Tribunal Federal - cuja denom inação foi alterada
para Corte Suprema - e dos tribunais superiores. A em enda oferecida dispu­
nha que a designação continuaria sendo da com petência do Poder Executivo,
porém fixava que a escolha dos juizes só poderia ser realizada a partir de listas
organizadas pela magistratura e pelos advogados.
N o que se refere às prerrogativas da Corte Suprema, a C om issão de C ons­
tituição rejeitou a proposta apresentada por Levi Carneiro que conferia à Corte
a salvaguarda de pronta intervenção, sempre que se fizesse necessário garantir a
observância dos preceitos constitucionais. A C om issão tam bém vetou a pro­
posta que pretendia outorgar à Corte Suprema a iniciativa legislativa em m até­
ria de processo e organização judiciária.
Foram ainda recusadas as m odificações sugeridas pelo representante da
classe dos advogados a respeito da regulamentação das relações entre os tribu-

Id e m , ib id e m , p. 677.

•Al 73
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

nais judiciais e os administrativos. A idéia era assegurar aos tribunais judiciais


a apreciação dos casos decididos pelos administrativos. Procedeu-se da m esm a
forma, com o dispositivo que pretendia introduzir norm as severas para repri­
m ir o retardamento na administração da Justiça.
Após oito meses de intensos debates, a Constituição, finalmente, foi promulga­
da em 16 de julho de 1934. Para o presidente da Ordem dos Advogados, o resultado a
que se chegou deixou a desejar. Ao que tudo indica, não foi só Levi Carneiro que se
ficara desapontado com a nova Carta Magna. Getúlio Vargas, no Diário, também não
se mostrava muito satisfeito, pelo que se pode depreender das suas reflexões: (...)
Parece-me que ela será mais um entrave do que uma fórmula de ação .
N o hvro Pela Constituição, publicado em 1936, Levi Carneiro oferece uma
exposição circunstanciada da sua participação na Assembléia e assevera que fora
vencido, o u desatendido, por numerosas vezes. Narra que, logo no início dos tra­
balhos, manifestara-se contrário à chamada “m oção Medeiros N eto” pela qual a
Assembléia deveria ratificar os poderes discricionários conferidos ao Governo
Provisório. Justificou a atitude tomada, com a autoridade de ex-consultor geral
da República, confirmando as prerrogativas do Governo Provisório:

(...) Tive a fortuna de redigir o anteprojeto da Lei Orgânica do Governo Pro-


visóriOy ainda há pouco aqui invocada, e no seu primeiro artigo fui quem
estabeleceu que o Governo Provisório conservaria a plenitude das funções e
atribuições executivas e legislativas, até que, eleita a Assembléia Constituin­
te, se restabelecesse a organização constitucional do País. Logo, pela lei básica
do Governo Provisório, ainda agora em vigor, até que se reorganize constitu­
cionalmente a Nação, o Governo Provisório se reserva esses poderes na sua
integralidade. À Assembléia Nacional Constituinte, a meu ver, não cabe
revalidar, ou delegar, ao atual Chefe da Nação esses poderes. Cumpre-lhe,
unicamente, reconhecer uma situação de fato, e para isso bastaria que, no
seu Regimento Interno, a propósito da aprovação dos atos do Governo Provi­
sório, se declarasse que essa aprovação recairia, tam bém , sobre os atos que
continuasse o mesmo Governo a praticar na constância dos trabalhos dessa
Assembléia, em virtude da autoridade de fato que exerce. Só no m om ento da
discussão de tais atos, teremos que apreciá-los, examinar-lhes a procedência,
a conveniência e o acerto. N ão temos que fazer delegação de poderes.^''

Cf, G e túlio Vargas, D iário, op.cit., v .l, p. 307.


" I d e m , ib id e m , p. 4,

74
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

Ele tam bém relata que não assinou o m anifesto em prol da candidatura
de G etúlio Vargas à presidência da República, nem fez declaração de vo to antes
da eleição presidencial. Os dirigentes da Assembléia chegaram até a propor a
inversão da pauta, para que antes m esm o do início dos trabalhos constituintes,
se procedesse à eleição do presidente da República. D o m esm o m o d o , revela
por que m anifestou-se contrário ao indicativo, referendado pela m aioria dos
m em bros das bancadas, explicando que tal proposta desprestigiaria não apenas
a Assem bléia, co m o tam bém o próprio chefe da N ação, criando um a situação,
segundo ele, “esdrúxula”
Curiosamente, no episódio da antecipação da eleição presidencial, percebe­
m os, mais um a vez, que a opinião do ex-consultor geral da República coincidia
com o pensam ento de Getúlio Vargas, externado n o Diário. N o s registros relati­
vos ao período de 21 a 24 de novembro de 1933, lê-se: (...) Continuam, na C âm a­
ra as demarches para eleger-me presidente. Aconselho a não se apressarem...*^.
Seja co m o for, no dia im ediato à prom ulgação da nova Carta, em 17 de
julho de 1934, por voto indireto da Assem bléia Constituinte, G etúlio Vargas foi
eleito presidente da República do Brasil. Deveria exercer o seu m andato até o
dia 3 de m aio de 1938, respeitando a realização das eleições diretas previstas
para janeiro de 1938, não fosse o golpe que instituiu o Estado N ovo, deflagrado
em 10 de novem bro de 1937.
Encerrado o trabalho no Congresso C onstituinte, na sessão do C onselho
Federal da OAB de 12 de julho de 1934, festejou-se a volta à presidência de Levi
Carneiro, que recebeu u m voto de congratulações pela sua atuação considera­
da brilhante, construtiva e patriótica, naquela Assembléia**^. Aliás, não foi s o ­
m ente a O rdem que apreciou o papel ali desem penhado por seu presidente.
Tudo leva a crer que G etúlio Vargas tam bém ficou bastante satisfeito, pois co n ­
v id o u -o para voltar ao governo, desta feita para assumir as funções de Procura-
dor-Geral da República. C ontudo, ele declinou de aceitar o cargo. Mais tarde,
justificaria sua atitude, afirmando:

(...) N ão haverá, talvez, posição mais sedutora para um advogado que essa,
de supremo advogado da Nação. (...) A Constituição de 34 estabelecia que o
Procurador-Geral não mais seria, como até então, um M inistro do Supremo
Tribunal. Ao fazer a prim eira nomeação, de sua livre escolha, o eminente

G e tú lio Vargas, Diário, op.cit., v .], p. 248.


■*"OAB,/4ía da sessão do Conselho Federal d e 12 d e ju lh o de 1934. A rquivo OAB.

75
____________ História iia
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

chefe da Nação teve a gentileza de lembrar-se de mim , que acabava de re­


nunciar à minha cadeira de deputado quando a Assembléia Constituinte
decidira converter-se em legislatura ordinária. (...) Os termos do convite se-
duziram -m e p o r um momento. Logo reconheci, porém, que precisamente os
meus hábitos inveterados de advogado, que escolhe os clientes, não m e p e r­
m itiram ser bom advogado de um cliente só, e de um tantos de tantos, tão
diversos, p o r vezes tão difíceis casos, como tem de ser a União FederaV^

C om o regresso à presidência do seu titular, o C onselho Federal retom ou o


ritm o habitual das suas atividades. Dentre outras providências imediatas, oficiou
à Imprensa Nacional, solicitando a remessa de exemplares da Constituição Fede­
ral, a fim de serem amplamente distribuídos pelos advogados, provisionados e
solicitadores inscritos^^. A princípio, além das consultas costumeiras, deu-se muita
ênfase em solucionar a preocupação externada por Attílio Vivácqua, a respeito da
morosidade do Instituto Nacional de Previdência de cumprir o disposto no art.
8®, letra j, do Decreto n^ 24.563, que assegurava a inscrição dos m embros da
Ordem, com o contribuintes facultativos na Previdência'*^.
Mas as atividades do C onselho Federal se intensificariam à m edida que
novas dem andas se apresentaram co m a entrada em vigor da Carta Magna. O
C o n se lh o da Seção da Bahia> p o r e x e m p lo , recorreu ao órgão m aior da
corp oração d os advogados in d agan d o sobre a legalidade das n o m ea çõ es
efetuadas pelo governador daquele estado, para preenchimento de vagas na Corte
de Apelação.
A m atéria fora regulam entada na C o n stitu iç ã o recém -p rom u lg a d a ,
p e lo art. 104, parágrafos 6° e 7®, alvo de d iscu ssão inten sa na im p ren sa e
na C o n stitu in te , a qual já n o s rep o rta m o s. O parágrafo 6® fixava qu e, na
c o m p o siç ã o d o s trib u n ais su p eriores, u m q u in to do to ta l de vagas deveria
ser p reen ch id o por a d vo g a d o s, o u m em b ro s d o M in istério P ú b lico , de
n o tó r io m e r e c im e n to e rep utação ilibad a, e sc o lh id o s e m lista tríp lice, o r ­
ganizada p elo s tribunais, p o r e sc r u tín io secreto. E ntretanto, o parágrafo
7° deixava u m a brecha que lo g o foi u tilizad a p e lo s g o v ern o s para in te r v i­
rem n o Judiciário, p o is d isp u n h a que ( . . . ) O s Estados p o d erã o criar ju iz e s
com in vestidu ra lim ita d a a certo te m p o e com petência p ara ju lg a m e n to de

'^C f. Levi C arn eiro , O livro cie u m advogado, op. cit., p. XLV-XLVI.
da sessão do Conselho Federal d e 23 d e agosto <de 1934. A rquivo OAB.
'” OAB, A w da sessào do Conselho Federal d e 3 d e se te m b ro de 1935. A rquivo OAB.

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V o lu m e 4 C r i a ç ã o , P rim eiro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

causas de p eq u en o valor, p re p a ro das excedentes da sua alçada e s u b s titu i­


ção de ju ize s vitalícios^'^.
N o caso das nom eações para a Corte de Apelação da Bahia, o C onselho
concluiu que houve transgressão dos preceitos acima referidos. A partir daí,
nas situações semelhantes, a O rdem passou a recomendar aos conselhos das
seccionais para agirem judicialm ente co m o entendessem m ais acertado^'. O u ­
tras casos se afiguraram. A costum ados a administrar por decreto, os don os do
poder pareciam não se dar conta da existência das norm as constitucionais.
Prado Kelly, a propósito da C onstituição da 1934, afirma que sua única
m issão foi legitimar o poder nascido da “revolução de 1930”. N o seu entender, a
Carta apresentava falhas e defeitos oriundos d o conflito entre as correntes d o u ­
trinárias que, à últim a hora, atuaram com “pugnacidade” e forçaram conces­
sões recíprocas. Assim, a Assembléia exibiu, ao preço de transações e compro­
missos, as suas duas faces: um a que espelhava o passado e outra que projetava o
futuro. Lá estavam, segundo Prado Kelly, representantes genuínos da Primeira
República:

(...) e, entre eles, os mais credenciados e influentes-A ntônio Carlos, Sampaio


Corrêa, Raul Fernandes, Calógeras, Assis Brasil, Carlos Maximiliano, Seabra,
Cincinato Braga, José Augusto... A lista completar-se-ia um ano depois com
A rtu r Bernardes, Borges de Medeiros, O távio Mangabeira, João Neves e tan­
tos outros cujos nomes haviam vincado a m em ória das duas últimas gera­
ções. No ângulo oposto, adensava-se o grupo da “rendição da guardaV^

N ão é da nossa intenção alongar a discussão sobre a Carta de 1934, que


dentre outras conquistas definiu os direitos políticos e o sistema eleitoral, adm i­
tindo 0 voto feminino; concedeu anistia aos presos políticos e exilados de 1930 e
de 1932; criou a Justiça Eleitoral, com o órgão do Poder Judiciário; instituiu ao
lado do Ministério Público e do Tribunal de Contas, os Conselhos Técnicos, com o
órgãos de cooperação nas atividades governamentais. Filha do seu tempo, a Car­
ta de 1934 conjugou a racionalização do poder, o federalismo e a liberdade, refle­
tindo o novo direito - obra de juristas e constituições posteriores à primeira Guerra,
especialmente o m odelo da República de Weimar. Ao lado da clássica declaração

^“ Brasil, Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil.


OAB, A la da sessão do Conselho Federal d e 29 d e ago sto de 1935. A rquivo OAB.
" P ra d o Kelly, c o m e n tário s iniciais, e m H é lio Silva. 1934 - A C onstituinte. R io d e Janeiro: Civilização B rasi­
leira, 1969-

•àl 77
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

de direitos e garantias individuais, incorporou um título sobre a ordem econ ô­


mica e social, e outro sobre a família, educação e cultura.
Entretanto é im portante realçar que, dentre as obras que exam inaram a
C onstituição de 1934, m uitas consideram que o sistema p olítico por ela insti­
tuído foi predom inantem ente liberal. Especialistas co m o Pontes de Miranda,
já naquela época, não escondiam suas dúvidas de que alguns políticos, inclusi­
ve Vargas, dificilm ente aceitariam de maneira democrática os princípios libe­
rais ali firmados” . Lemos de Brito, tal c o m o Pontes de Miranda, percebendo a
situação, vaticinou: (...) N o que toca, porém, à estrutura do Estado, continuamos
convencidos de que o novo Estado produzirá em breve, graves perturbações no
país, não só em virtude do ecletismo teórico, como na dificuldade da execução de
muitos dos seus raros princípios^^. Diante dos com entários desses estudiosos,
não fica difícil entender por que m al a C onstituição entrou em vigor, logo o
governo cogitou de alterá-la.
Convocadas as eleições ordinárias em 1934, a legislatura que se iniciou
em 1935 recebeu de boas-vindas o encargo de dar conta de um a pauta repleta
de tem as p o lê m ic o s, a c o m e ç a r p ela e la b o r a ç ã o das le is o rgâ n ica s e a
reestruturação da adm inistração pública. Integravam os quadros parlamenta­
res um a nova geração de políticos, inclusive os representantes classistas, e vete­
ranos hom ens públicos, que haviam voltado ao cenário do Palácio Tiradentes
beneficiados pela anistia, entre estes últim os ocupavam papel destacado os ba­
nidos de 1930 e 1932.
Organizaram-se as então denom inadas Oposições Coligadas. Encabeça-
vam -nas u m diretório de notáveis, conform e a expressão de um a testem unha da
época, integrado por políticos da envergadura de Artur Bernardes (M inas G e­
rais), Borges de M edeiros (Rio Grande d o Sul), Roberto Moreira (São Paulo),
Sampaio Corrêa (Distrito Federal), Rego Barros (Pernam buco), José Augusto
(Rio Grande d o N orte) e O távio Mangabeira (Bahia), antigo m inistro das Rela­
ções Exteriores da gestão de W ashington Luís.
A oposição, por sinal, subia à tribuna quase que diariamente, para enu­
merar os artifícios utilizados pelo poder central com o objetivo de fortalecer
suas bases. Cobrava coerência nas atitudes de Getúlio Vargas, a com eçar pelas
circunstâncias que cercaram a sua recente investidura. Sem maiores rodeios, o

Pontes d e M ira n d a , C om entários à C onstituição da República Federativa dos Estados Unidos do Brasil. Rio
de Janeiro: G u a n a b a ra , s.d., p. 19.
L em os de Brito, C om entários à C onstituição Brasileira, s.e., p. 76.

78 •Al
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 19451

deputado O távio Mangabeira apontava as contradições da República Nova,


declarando: (...) Sucessor de si mesmo (...) depois de ter feito um a Revolução em
nom e do princípio de que não p o d e o presidente intervir na escolha do seu suces­
sor, 0 chefe do Governo brasileiro viciou, nas origens, o próprio m andato presi-
denciaP^. Havia tam bém a denúncia da ingerência do Palácio d o Gatete no pro­
cesso eleitoral dos estados, cujos governadores foram escolhidos pela via ind i­
reta, por voto das assembléias legislativas locais. A esse respeito, aliás, vale a
pena rever no Diário de Vargas, nas notas relativas ao período de 11-14 de
outubro de 1935, o registro de um episódio envolvendo a indicação do nom e
do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil para desem penhar as fu n­
ções de interventor no antigo estado d o Rio de Janeiro, até que se processassem
as eleições para governador, conform e dispunha a nova Constituição:

(...) O caso do estado do Rio andou pouco. Havendo fracassado o entendimen­


to do senador Medeiros Meto e do prefeito Pedro Ernesto com o almirante
Protógenes, pus em contato o deputado Prado Kellys líder progressista, com o
mesmo. Aquele alvitrou o nome do Dr. Levi Carneiro, deputado pelo Partido
Radical e seu cunhado, como substituto, sem compromissos políticos para
constitucionalizar 0 estado epresidir nova eleição, apresentando ele, Protógenes,
sua renúncia. Os progressistas aceitaram. Falei então ao deputado Levi, que,
após alguma relutância, aceitou. Falta agora a aceitação dos coligados^^

A m anobra engendrada por G etúlio Vargas acabou sendo rejeitada, e Levi


Carneiro deixou de assumir a interventoria flum inense. D e u m m o d o geral, as
crises rondavam o Palácio do Catete. N o legislativo, enquanto a oposição co n ­
trariava de form a recorrente as pretensões de Vargas, a bancada governista
ameaça rachar, em nom e das chamadas franquias estaduais. N o s quartéis, a
situação tam bém se mostrava tensa. Os militares conspiravam contra o gover­
no e postulavam por melhores soidos. N as ruas, a Aliança Libertadora N a cio ­
nal realizava com ícios, incitando a população a combater o que denom inava
idéias fascistas do governo. Segundo Prado Kelly, na Câmara dos D eputados as
correntes democráticas se m ostravam em guarda, pois havia o receio de um a
ação instintiva de Getúlio Vargas para não deixar o poder, ao final do m andato.
Cf, O tá v io M an g a b e ira , “D iscurso p ro fe rid o na C â m a ra d o s D e p u tad o s, n a sessão d e 28 d e m a io d e 1935.
I n ; _______ , O tá v io Mangabeira, discursos p arlam entarei. Seleção e in tr o d u ç ã o d e )o s a p h a l M a rin h o .
Brasília: C â m a ra dos D e p u tad o s, 1978, p- 233. C oleção Perfis P a rlam entares, n ° 10.
^*Cf. G e túlio Vargas, D iá rio, op. cit., p. 428.

•àl 79
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Na defensiva, pressionado por tensões políticas das mais diversas nature­


zas, inclusive a deflagração de diversos m ovim entos grevistas n o Distrito Fe­
deral e na cidade de São Paulo, G etúlio Vargas responsabilizava a Constituição
e, por tabela, o Legislativo pelas dificuldades que enfrentava. A primeira, no seu
entender, revelara-se inexeqüível. O segundo representava u m obstáculo à ad­
ministração do país, justamente por causa das prerrogativas que a Constituição
lhe facultava.
A situação se agravou. N a chamada base democrática, grupos de direita e
de esquerda se enfrentavam nas principais capitais do país. A ação de u m desses
grupos, por ironia do destino, acabaria facilitando o cam inho para a reabilita­
ção de Vargas. Os levantes com unistas de novem bro de 1935, m ais conhecidos
c o m o Intentona C om unista, possibilitaram ao presidente a chance de cons­
truir 0 álibi que tanto desejava para se livrar dos estorvos que mais embaraça­
vam o seu caminho: a Carta de 1934 e o Legislativo.
A partir daí, através de sucessivas manobras, o Executivo conseguiria apro­
var no Congresso um a legislação repressiva, a propósito de combater os m o v i­
m entos sediciosos da esquerda. C onsta que o deputado O távio Mangabeira,
pressentindo essa situação, teria tido; (...) O comunismo é outro achado para o
atual governo^^. Aberta a brecha, de acordo com suas conveniências, Getúlio
iria valer-se dos m esm os instrum entos de exceção para combater a direita. O
golpe de 1937, que pôs term o à Segunda República, já estava pois em marcha,
precedido de arbitrariedades de to d o o tipo e, o era que pior, c o m a aquiescên­
cia dos deputados e senadores.

” C f O tá v io M an gabeira, op. cit, p. 274.,

80 •ÂM
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiro s Percursos e D e s a fio s < 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

CAPÍTULO III
A O A B na defesa dos direitos civis

1.1 A Lei de Segurança Nacional e o Tribunal de Segurança Naci­


onal: novas condições de repressão

A Constituição aprovada em 1934 revelava-se cada vez mais vulnerável


aos ataques de seus opositores e deixava brechas acessíveis aos seus próprios
articuladores. O executivo federal cada mais dem onstrava interesse em consti­
tuir u m projeto de lei que lhe desse m aior controle, marchando rápido para
atingir os m odelos autoritários mundiais. Em 1935 a proposta do executivo foi
encam inhada à Câmara dos D eputados pelo M inistro da Justiça Vicente Rao' e
viria a se constituir na Lei de Segurança N acional.
Q uando aprovada, a LSN ampliou a possibilidade de repressão aos dissiden­
tes, pois incluía entre os crimes contra a ordem pública qualquer tentativa de m u ­
dar, por meios violentos, a forma de governo estabelecida a partir da Constituição
de 1934, obstaculizar o livre funcionamento de quaisquer dos poderes políticos da
União, ameaçar a ação de agentes do Estado, impedir que funcionários públicos
tomassem posse de cargo para o qual já estivessem nomeados, ameaçá-los, e através
do uso de violência forçá-los a praticar qualquer ato do ofício, incitá-los à paralisa­
ção coletiva nos serviços públicos bem com o instigar militares à desobediência à lei
e à disciplina e provocar qualquer tipo de animosidade entre os militares, entre si,
o u contra instituições civis. Todos os indivíduos que espalhassem notícias falsas ou
traficassem materiais explosivos estariam também cometendo crimes, assim com o
aqueles que promovessem a incitação ao ódio entre as classes sociais, e a luta entre
elas. As tentativas de p rom over a alta o u a baixa de preços de p ro d u tos
comercializados, através de meios fraudulentos, também estavam inclusas entre os

' Cf. M a rie ta de M o ra es Ferreira. A República no Brasil, op. cit. p. 464-465.

•A B 81
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

crimes contra a segurança nacional. A imprensa era um alvo importante e também


foi enquadrada na lei, sendo proibido imprimir e fazer circular livros, gravuras,
panfletos, folhetos ou jornais que desobedecessem qualquer item citado na LSN.^
Ora, a partir daí qualquer atividade que envolvesse um a multiplicidade
de ações políticas incorria no risco de ser considerada fora da lei. O caso Prestes
seria em blem ático neste sentido. Luís Carlos Prestes ingressara n o Partido C o ­
m unista Brasileiro em agosto de 1934 - transform ando-o e estruturando-o
tendo sido escolhido presidente de honra da ANL. Passou a prom over passea­
tas antifascistas que se tornaram objeto de reação dos poderes públicos. O
enfrentam ento entre seus militantes e os do m ovim en to integralista foi a cada
dia mais acirrado, desdobrando-se em violentos choques, o m aior deles em
junho de 1935, na cidade de São Paulo, quando a LSN já vigorava/
O Congresso Nacional, pressionado pelo Governo Federal, e também refle­
tindo o seu conservadorismo, diante da presença incôm oda dos comunistas na
frente popular, ajudou o Executivo a combatê-los e a aqueles considerados com o
elementos insubordinados. Com o um a espécie de resposta ao clima de contestação
e desordem, a maioria parlamentar, liderada por Raul Fernandes, aprovou final­
mente 0 citado projeto de Lei de Segurança Nacional em 30 de março de 1935, em
seguida foi convertido na Lei n.° 38, de 4 de abril de 1935. Incluía a definição de
todos aqueles crimes já citados contra a ordem política e social e dava ao Governo
Federal, poderes especiais para reprimir múltiplas atividades políticas.
A lg u n s m e m b r o s da O rd em , iso la d a m e n te , p rotestaram contra a
tramitação da LSN no Congresso. Foi o caso de Adolfo Bergamini, conselheiro
pelo D istrito Federal e líder da m inoria n o Congresso, que apresentou inclusive
declaração de voto em separado contra o projeto e todas as em endas feitas ao
m esm o^. Mas nem a tramitação da lei, e tam pouco o ato de sua sanção, tiveram
repercussão mais explícita nas sessões da Ordem, apesar desta contar com in ­
fluentes conselheiros com o o próprio Raul Fernandes, e o então ministro da
Justiça Vicente Rao que apresentaram o projeto à Câmara. Eram tam bém lide­
ranças que já haviam participado dos m ovim entos pelo respeito à C onstitui­
ção, tal c om o O dilon Braga que fazia parte do Executivo, à frente do M inistério
da Agricultura.
N o entanto as ações do governo não cessavam. O decreto publicado em
11 de julho de 1935 dissolveu a ANL, em função do m anifesto de Prestes na
^ Em ilia V iotti da C osta. O Suprem o Tribunal Federal e a construção da cidadania. São Paulo; leje, 2001 p. 82-
83. A LSN foi p ro m u lg a d a e m 4 d e ab ril de 1935.
^ Em ilia V io tti d a C osta. op. cit. p. 38.

82 • àb
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiro s Percursos c D e s a fio s M 9 3 0 - 19451

com em oração de 5 de julho - aniversário da primeira revolta tenentista no


Forte de Copacabana - que conclamava à derrubada do “governo odioso” de
Vargas e à tom ada do poder por um governo revolucionário. O manifesto, que
marcou a radicalização da ANL, tam bém a fez perder inúm eros adeptos.
A pós o fecham ento da ANL, a tomada do poder pela insurreição armada
pareceu aos com unistas a fórm ula mais acertada para a derrubada de Vargas.
C om a direção de Prestes, do secretário-geral do PCB A ntônio Maciel Bonfim ,
conhecido co m o Miranda, de Harry Berger - ou Arthur Ernest Ewert, e do
argentino R odolpho G hioldi - os do is últim os no Brasil co m a m issão da Inter­
nacional C om unista de formar um a ampla frente de massas ligadas à classe
operária ~, em 23 de novem bro de 1935, ocorreu a sublevação por sargentos,
cabos e soldados, do 21- Batalhão de Caçadores em Natal. N o dia seguinte o
m ovim en to eclodiu em Recife, envolvendo civis e militares. Militares d o 3“ Re­
gim ento de Infantaria rebelaram-se no Rio de Janeiro na noite do dia 26, en ­
quanto outro foco se iniciava no Cam po dos A fonsos. Pela forma desordenada
e precipitada, os revoltosos foram logo dom inados no Rio de Janeiro e em Re­
cife. Em Natal a rebelião durou quatro dias, inclusive com a instalação de um
Governo Popular Revolucionário.
O G overno, por m eio de inform ante infiltrado, conhecia os planos dos
com unistas e nada fez para im pedir os levantes. Era o pretexto que queria e
conseguiu para desencadear a intensa reação que houve em seguida e conseguir
aprovar todas as m edidas necessárias para cercear a ação do Poder Legislativo.
C om o apoio da quase totalidade dos parlamentares, que acreditavam ser o
com u n ism o o m aior inim igo da Nação, Vargas conseguiu a decretação do esta-
■' “ D e cla ra m o s te r vo ta d o c o n tra o p ro je to d e lei c o g n o m in a d o pela m a io ria desta C asa c o m o de ‘Segurança
N a c io n a l’, b e m assim c o n tra to d a s as e m e n d as que lhe tb r a m oferecidas e c o m as quais se re s trin g iu a
lib e rd ad e d e p e n s a m e n to em q u a lq u e r de suas m anifestações. A C o n stitu iç ã o d a República - já la m e n ta ­
v e lm e n te esq u e c id a d a queles q u e a e la b o ra ra m - inscreve a igu a ld a d e d e to d o s p e ra n te a lei e assegura,
d e m o d o insofism ável, a m a nife staç ã o m ais a m p la e m a is livre d o p e n sa m e n to , p e rm itin d o a p ro p a g a ­
ção de to d a s as ideologias. Sob a alegação, e n tre ta n to , d e defesa d o re g im e e m q u e vivem os - que, aliás,
n ã o p e riga - v o to u a m a io ria da C â m a ra u m a lei q u e o u tro objetivo n ã o te m sen ã o o de g a ra n tir os q ue
ora d o m in a m c o n tra os p ró p r io s interesses da N ação, q u e deles, cedo, se fa rto u . A m in o r ia p a rla m e n ta r,
em vão, p r o c u r o u c h a m a r à ra z ã o os q u e n o m o m e n to d irig em a política n a cio n al. N ã o o conseguiu; não
q u iseram ouvi-la. Q u e fazer? A m a io ria , m a l c o m p re e n d e n d o a sua m issão, assim o quis. Q u e assim o
seja. Sua a lm a , su a p a lm a . C o m o nosso voto, e n tre ta n to , lei a lg u m a sacrificará a lib e rd ad e d o pov o
brasileiro. R este-nos, pe lo m e n o s, o c o nsolo de, in d e p e n d en te s, escravos tã o -s ó dos altos im perativ os
nacionais, te rm o s p o d id o assim votar. A lei q u e desta C asa h oje sai, será u m m al p a ra o Brasil; e, m ais
cedo, b e m m a is cedo q u e m u ito s esp e ra m , a N ação - p o r suas forças vivas - m o s tra rá que, nesta e m e r­
gência, nesta h o ra d e a p re en sõ e s e de incertezas, só e só a m in o r ia p a r la m e n ta r a re presentou . Sala das
Sessões, 29 de m a rç o de 1935 - A dolfo B ergam ini - A cúrcio Torres." D iário do Poder Legislativo - 30 de
março de 1935. A no 11, n.° 73, p. 2270. P ortal d a C â m a ra dos D e p u tad o s.

•Ál 83
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

do de sítio em todo o território nacional por 30 dias, prorrogado ao seu termo


por mais 90. Em dezembro pela Lei n.® 136, m odificaram -se vários dispositivos
da LSN, am pliando a sua ação, e em end ou-se a Constituição Federal. Podia
então declarar estado de guerra quando só houvesse com oção intestina; dem i­
tir, sumariamente, funcionários civis envolvidos em rebeliões; e cassar patentes
de oficiais que participassem de m ovim entos subversivos.
Teve início, então, a “caça às bruxas”, expressão que gostava de usar o ad­
v ogado Evandro Lins e Silva para se referir ao período.

...u m a agitação p o lítica no País levou a u m a revolução, a um m otim , a


um a quartelada, direi, porq u e fo i um erro histórico extraordinário dos
com u n istas, qu e decla ra ra m gu erra à d em ocra cia. U m a v erd a d eira
quartelada, porqu e não tinha sen tido nem p ossibilidade de sucesso! D a í
adveio um m o vim en to repressivo intensíssimo, u m a caça às bruxas, p r i ­
sões interm ináveis não apenas de opositores do regime, m as aos oposicio­
nistas de um m odo g era V

Em poucos meses, até m arço de 1936, as lideranças com unistas e aproxi­


m adam ente 901 civis e 2.146 militares foram presos apenas no D istrito Fede­
ral^ . C om a apreensão de im portantes docum entos nas buscas efetuadas, pois
apesar do sigilo, que envolvem ações deste tipo, as práticas de registro dos co­
m unistas eram sistemáticas e disseminadas, Vargas teve a justificativa para a
decretação, por 90 dias, da equiparação de com oção intestina grave ao estado
de guerra, pelo D ecreto n- 702, de 21 de m arço de 1936. Prorrogado por quatro
vezes, o estado de guerra vigorou até junho de 1937, dando ao governo poderes
de repressão praticamente ilimitados.
Atentos aos atos de exceção os m em bros da Ordem manifestaram sua in ­
satisfação. Adolfo Bergamini, um dos mais críticos conselheiros da Lei de Segu­
rança N acional, em sessão da OAB, tentou inserir em ata voto de protesto co n ­
tra o golpe que o direito de defesa sofria com a decretação do estado de guerra.
Foi negado, fundam entado no cum prim ento ao art. 59 § 2 do R egim ento Inter­
no - que proibia pronunciam entos sobre questões não atinentes às atribuições
da O rdem - , mas consignado em ata co m o manifestação pessoal. Augusto P in ­
to Lima, Lineu de Albuquerque M ello e Baptista Bittencourt declaram-se soli-
®E van d ro Lins e Silva. “Advocacia em Perspectiva”. Painel a p re se n ta d o n a X V C o n fe rê n cia N a cio n a l d a OAB.
A rquivo CF/OAB.
‘ Cf. E m ilia V iotti da C osta. O S uprem o Tribunal Federal... op. cit-, p. 85.

84 •Ál
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiro s Percursos e D esa fio s 1 1 9 3 0 - 1 9 4 5 ]

dários à proposta com a ressalva de que essa atitude não envolvia qualquer
solidariedade com a ideologia c o m u n ista /
A proposição de Bergam ini não era motivada só pelo espírito dem ocráti­
co. Pelo estado de guerra, estavam suspensas inclusive as im unidades parla­
mentares, 0 que ocasion ou a prisão, em 23 de m arço de 1936, do senador Abel
C herm ont e dos deputados oposicionistas João Mangabeira, O távio da Silveira,
D o m in g o s Velasco e Abguar Bastos - todos m em bros d o Grupo Parlamentar
Pró-Liberdades D em ocráticas, formado para combater a LSN, o u Lei Monstro.
Todos eles requereram habeas corpus e m favor dos oposicionistas presos a bor­
do do navio Pedro I e dos cabeças do m ovim en to arm ado de 1935. C om o qual­
quer atividade política que saísse da esfera explícita do poder era passível de ser
considerada subversão da ordem, foi facilitada a criação da C om issão Nacional
de Repressão ao C om u n ism o para investigar a possível participação de funcio­
nários públicos em atos e crim es contra as instituições políticas e sociais. Outra
form a de controle aos cidadãos foi a exigência de “atestado de ideologia” para
ocupantes de cargos públicos e sindicais. Portanto o governo tinha sob sua tu ­
tela várias formas de repressão que poderiam ser usadas, e foram, contra os
m em bros da ANL, os com unistas, os integralistas e tam bém contra qualquer
indivíduo que se opusesse ao regime.
N o bojo de todos estes conflitos alguns m em bros da Ordem dos Advoga­
d os do D istrito Federal repudiaram as ações com unistas, expressando, no e n ­
tanto, e m alguns m om entos admiração pela atitude do governo. Um a das atas
consigna esta atitude, sobretudo a partir d o discurso de Augusto Pinto Lima:

Requeiro que conste da ata da sessão de hoje o sentim ento com que este Con­
selho viu perturbada a ordem pública, po r elementos extremistas, pondo em
perigo as instituições políticas que regem o Brasil, num a atmosfera de confi­
ança e liberdade. Embora individualmente, não tenha ja m ais dado minha
solidariedade ao governo atual, deixo aqui consignados minha admiração e
m eu aplauso, pela calma e energia com que fora m abafados os focos da rebe­
lião comunista, repelida p o r toda a Nação.
O chefe de Estado e seus auxiliares neste grave m om ento para a vida consti­
tucional do País interpretaram com grande valentia moral e pessoal o pensa­
m ento brasileiro, sempre nobre e elevado.^

^ A ta s d a sessão da O AB /D F , 25 d e m a rç o d e 1936.
^ A ta s d a sessão da O AB /D F , 29 d e n o v e m b ro d e 1935.

85
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

N o m ês seguinte, na sessão do dia 27, o presidente do C onselho da Seção


do DF, Targino Ribeiro, com u n icou que havia visitado vários advogados presos
e subm eteu à apreciação daquele C onselho as providências que poderiam ser
adotadas. D ecidiu-se por renovar a delegação que previa a assistência aos advo­
gados presos, com a ressalva, incisiva, que vedava o exam e de idéias, as d e­
m onstrações de solidariedade, e quaisquer embaraços à ação da Justiça. N a de­
liberação da sessão seguinte - sobre carta recebida de José Piedade que relatava
seu cárcere a bordo do Pedro I, há mais de quarenta dias, sem que, ao m enos,
houvesse sido convidado a prestar declarações à autoridade com petente - , o
Presidente expôs longam ente as providências tomadas com relação aos advo­
gados presos, e obteve do C onselho plenos poderes para resolver o assunto.
Entretanto, nem a longa exposição n em a inform ação sobre quais m eios usaria
para resolver o “assunto”, foram consignadas em ata. Para caracterizar a p ostu­
ra de alguns m em bros a ata tam bém registra a aprovação de mais um voto de
aplauso ao Governo pela calma e energia com que foram abafados os focos da
rebelião com unista, form ulado pelos conselheiros: Rego Lins, Rodrigues N e ­
ves, Mayr Cerqueira e Figueira de Mello.^
Em 15 de julho de 1936 Vargas enviou m ensagem ao Poder Legislativo
solicitando o concurso do Congresso N acional para a criação de Tribunal que
fosse capaz de solucionar as necessidades im postas pela Lei de Segurança N aci­
onal e a em enda que equiparava a com oção intestina grave ao estado de guerra
e correspondesse, “por esse modo, aos reclamos da opinião pública, bem assim a
de colônias agrícolas e penais, para o cum prim ento das penas, além de outras m e­
didas que reputar necessáriasV°
Am parado pelo parágrafo 25 do art. 113 da C onstituição de 1934 - que
não permitia a existência de foro privilegiado nem tribunais de exceção, mas
adm itia a formação de juízos especiais em razão da natureza das causas, o C o n ­
gresso aprovou então, pela Lei n.° 244, de 11 de setembro de 1936, a criação do
Tribunal de Segurança Nacional - TSN. Instituído co m o órgão da /ustiça M ili­
tar para funcionar n o Distrito Federal, sempre que fosse decretado o estado de
guerra, e até que se ultimasse o processo dos crim es de sua com petência, que
eram os previstos na LSN e aqueles considerados conexos. Estes fatos acabaram
por ampliar o conceito de crime contra a segurança do Estado. U m a das poucas
vozes dissonantes foi João Neves, conhecedor d o direito e brilhante orador que

^A ta s da sessão da O AB /D F , 10 d e ja n e iro d e 1936.


A n a is da C âm ara dos D eputados. 8“ Volum e. Sessões d e 15 a 23 de ju lh o d e 1936, p. 4.

86
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiro s Percursos e D e s a fio s i l 9 3 0 - 1 9 4 5 )

defendia diariamente no Congresso a Constituição, fundam entando-se em ar­


gum entos técnicos. Mas foi um a ação que caiu no vazio."
O TSN nascia co m o u m órgão de exceção, contrariando o artigo 113 da
Constituição que determinava não haver foro privilegiado, nem tribuna de exce­
ção. N o artigo n'^4, Parágrafo único, ficava patente a supressão do benefício das
leis aos acusados, um a vez que os processos em andam ento deveriam ser remeti­
dos ao TSN, além de exigir que os acusados de todo o país devessem arcar com o
ônus da sua defesa n o Distrito Federal. O núm ero de testemunhas pró-réu tam ­
bém dim inuía enquanto a acusação não tinha limites estabelecidos, permitindo,
portanto a indicação de u m núm ero que fosse considerado b o m .‘^
Os primeiros processos de sua com petência foram de prisioneiros envol­
vidos na chamada Intentona C om unista, contrariando o preceito do parágrafo
27 do m esm o artigo 113 da Constituição, que estabelecia que a lei só poderia
retroagir em benefício do réu. Aliás, dos artigos da Lei n® 244, o mais flagrante­
m ente inconstitucional era o 4^, que atribuía ao TSN a com petência para o
processo e julgam ento dos crimes praticados em data anterior à vigência dá
própria lei que o criava. Em seu rastro vinha o parágrafo ú nico do art. 10®, que
dispunha que os m em bros do Tribunal julgariam co m o juizes de fato e por
livre convicção.
C om posto de cinco juizes livremente nom eados pelo Presidente da Repú­
blica - sendo dois oficiais do Exército ou da Armada, dois civis de reconhecida
com petência jurídica e u m magistrado civil ou militar, que o presidia - o Tribu­
nal nomeava advogados para os réus que não tivessem o u não quisessem consti­
tuir defesa. O prazo para oferecer a defesa era de três dias e com o os processos
tendiam a ser volum osos, com pluralidade de réus, havia u m prejuízo quanto ao
trabalho dos advogados, muitas vezes obrigados a prepararem a defesa em tempo
m uito exíguo. Pelo parágrafo terceiro do art. 9", ao C onselho da Seção da Ordem
dos Advogados cabia indicar defensor ao acusado ausente ou que ainda não ti­
vesse um , norm alm ente por não reconhecer o advogado indicado pelos juizes.
Para alguns advogados esta im posição ficou na m em ória de maneira indelével e
segundo Evandro Lins e Silva, este Tribunal “e uma mancha na história do nosso
País'' porque, caricato, e era tudo, m enos u m tribunal. “Era um ajuntamento des­
tinado a aplicar sanções a quem se opusesse aos detentores do poder de entãoV{

'' R eynaldo P o m p e u de C am p o s. Repressão jud icial no Estado Novo. Esquerda e direita no banco dos réus. Rio
d e Janeiro: A chiam é, 1982, p. 45.
" Id e m .ib id e m , p. 48.
Cf. E van d ro Lins e Silva. Advocacia e m perspectiva. Painel/C ongresso OAB.

•ái 87
______________Historia da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

N o entanto, apesar da discordância de alguns que pretendiam não reco­


nhecer o novo Tribunal, ignorando-o, a O rdem dos Advogados, fora do plano
em inentem ente corporativo, principiou sua trajetória em defesa dos direitos
hu m anos, apesar das pressões e da força dos acontecim entos, marcados a par­
tir das m edidas de execução do estado de guerra e da Lei de Segurança N a cio ­
nal, pelo Tribunal de Segurança Nacional.
Pois bem , ao designar o presidente da Ordem para nom ear advogados, o
que sucedeu foi aquilo que se podia esperar. Os advogados nom eados pelo pre­
sidente da Ordem eram h om en s livres, eram hom ens que não aplaudiam as
perseguições que se realizavam. Daí resultou a nom eação de um a grande figura
de advogado, que se destacou com o um líder, com o um sím bolo naquela o ca­
sião: Heráclito da Fontoura Sobral Pinto.

A í começa a vocação institucional da OAB a se tornar efetiva na prática, na


atividade judiciária, no dia-a-dia do foro, através de seus membros, daque­
les que foram designados para a defesa dos presos políticos de então, dos per­
seguidos daquela épocaJ'^

N a sessão do C onselho do D F de 6 de janeiro de 1937, Targino Ribeiro leu


três ofícios do Tribunal de Segurança N acional solicitando advogados para os
réus Luís Carlos Prestes, llvo Furtado de Meirelles, Harry Berger, H onório de
Freitas Guimarães, Léon Vallé, Carlos da Costa Leite, Lauro Reginaldo da R o­
cha e A delino Deicola dos Santos.
Foi um a com oção. A ugusto Pinto Lima reagiu energicamente ao pedido
por entender que o C onselho não deveria designar advogado algum , pois era
inconstitucional o Tribunal de Segurança. D e outro lado, mas não exatam ente
na contram ão das idéias de Pinto Lima, Rodrigues N eves afirm ou que não era
da com petência do C onselho Seccional afirmar a constitucionalidade o u não
do Tribunal, e som ente lhe cabia cum prir o disposto na lei criadora do m esm o.
Por fim , de forma apaziguadora, o conselheiro Lineu de M ello propôs que fos­
sem feitas as designações pedidas pelo TSN, ressalvando, porém , a posição do
Conselho da Seção em considerar a inconstitucionalidade do Tribunal de Se­
gurança Nacional, o que foi finalm ente aprovado na sessão. Foram então ind i­
cados advogados para os diversos réus e a trajetória destes advogados ex officio
ajudam a contar a história do Brasil: para Luís Carlos Prestes e Harry Berger foi

'^ E v a n d ro Lins e SiWâ. Advocacia e m perspectiva, op. cit.

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designado Sobral Pinto; para Ilvo Furtado Meirelles, Jorge Fontenelle; para
H o n ó rio de Freitas Guimarães, Raul da Cunha Ribeiro; para Léon Vallé, Álvaro
O n ety de Figueiredo da Rocha; para Carlos da Costa Leite, M iguel Tim poni;
para Lauro Reginaldo da Rocha, Penna e Costa; para A delino D eicola dos San­
tos, João Rom eiro Netto.
O advogado Heráclito Sobral Pinto aceitou o patrocínio da causa de Pres­
tes e de Berger nos term os da carta que enviou ao presidente Targino Ribeiro
em 12 de janeiro de 1937, já deixando exposto seu espírito aguerrido:

Prezado Colega D r. Targino Ribeiro.

A m inha designação, pelo C onselho da Ordem, ao Tribunal de Segurança


Nacional, para defensor dos acusados Luiz Carlos Prestes e Arthur Ernest
Ewert ou Harry Berger, de que m e dá notícia no seu o fício n.° 20, de 8 do
corrente, som ente ontem recebido, eu a acato co m o dever indeclinável da
nossa nobre profissão.
Lamento apenas não dispor dos dotes de inteligência necessários ao desem ­
penho de tão árdua, penosa e difícil missão, que o conselho da Ordem achou,
na sua soberania, que devia de lançar sobre os m eus frágeis ombros.
O que m e falta em capacidade sobra-m e, porém , em boa vontade, para
m e submeter às im posições do C onselho da Ordem; e em com preensão
hum ana, para, fiel aos im pulsos do m eu coração cristão, situar, n o m eio
da anarquia contem porânea, a atitude destes dois semelhantes, criados
com o eu e todos nós a im agem de Deus.
Quaisquer que sejam as minhas divergências do comunismo m ateria lista,- e
elas são profundas - , não m e esquecerei, nesta delicada investidura, que o
Conselho da Ordem m e impôs, que simbolizo, em face da coletividade brasi­
leira exaltada e alarmada, A DEFESA.
Espero que D eus m e ampare nesta hora grave da m inha vida profissional,
dando forças ao m eu espírito conturbado para mostrar aos Juizes d o Tri­
bunal de Segurança Nacional que Luiz Carlos Prestes e Arthur Ernest Ewert
o u Harry Berger são m em bros, tam bém , desta vasta e tão atribulada fam í­
lia humana.
A lim ento a fundada esperança de que encontrarei nesse reservatório im en ­
so que é a caridade cristã, recursos dignos e apropriados para, sem rene­

89
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

gar os princípios básicos da civilização brasileira, dem onstrar que os acu­


sad os, ora in d ic a d o s a o m e u m o d e s to p a tr o c ín io , a par de erros
fim estíssimos, alim entam -se, tam bém , de verdades generosas, para a di­
fusão das quais são capazes de grandes e respeitáveis renúncias.
Adotando, na defesa que irei fazer, essa orientação, penso, m eu caro presi­
dente, trabalhar para a manutenção, entre nós, das “tradições de desinteres­
se e am or ás liberdades públicas”, hoje em dia tão esquecidas no nosso meio.
C om estim a e alto apreço, sempre ao seu inteiro dispor,

Heráclito Fontoura Sobral Pinto.'^

Portanto não foi surpresa para aqueles que conheciam a trajetória de Sobral
sua coragem em enfrentar desafios, e tam bém o fato de ser u m dos primeiros a
aceitar a nom eação. A ssum iu a defesa dos indivíduos considerados com o lide­
ranças do m ovim ento, e lutou bravamente contra todos os obstáculos, e travou
duras batalhas em defesa da liberdade e contra a violência do regime, apelando
inclusive para a lei de proteção dos anim ais, na tentativa de resguardar a inte­
gridade física de seus clientes. Por outro lado m uitos estranharam tão pronta
resposta, pois pairava a pergunta: co m o u m a criatura, com as convicções religi­
osas de Sobral, aceitara defender comunistas?
Para destacar melhor a importância de Sobral Pinto e tentar delinear suas
escolhas profissionais e políticas é necessário fazer um a pequena biografia. Nas­
cido Heráclito Fontoura Sobral Pinto, em 5 de novem bro de 1893, em Barbacena,
Minas Gerais, era filho de Príamo Cavalcanti Sobral Pinto e Idalina Sobral Pinto.
Seu pai era agente da estação da Estrada de Ferro Central do Brasil e posterior­
m ente tendo sido nom eado para novo posto, dois anos depois de seu nascimen­
to, deslocou-se com a família para o sul de Minas, em Porto N ovo do Cunha.'^
D e família m uito católica, estudioso, Heráclito destacou-se no colégio Anchieta
de Nova Friburgo no qual foi interno, convivendo com colegas que viriam a ser
pessoas de destaque na vida política brasileira. Posteriormente a família m udou-
se para o Rio de Janeiro onde Heráclito iniciou seus estudos de Direito na Facul­
dade de Ciências Jurídicas e Sociais, e em dezembro de 1917 formou-se.
Pouco a pou co ganhou notoriedade em D ireito Criminal e foi convidado
para assumir, c om o interino, a Procuradoria d o Rio de Janeiro na qual, segun-
A rquivo CF/OAB.
J o h n W. F. Dulles. Sobral Pinto. A consciência Jo B rasil A cruzada contra o regime Vargas. (1930-1945). Rio
de Janeiro: N ova F ro n teira , 2001. p. 21-22.

90
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do suas próprias palavras “tinha sob a minha exclusiva responsabilidade a dire­


ção da repressão legal aos criminosos políticos, civis e militares que haviam aten­
tado contra a ordem constitucional”}'’ Sobral teve então sob sua tutela todas as
decisões que afetavam os presos políticos, sobretudo no D istrito Federal. Ape­
sar de viver freqüentem ente fustigado por noticias pou co favoráveis na im ­
prensa e em im portantes setores políticos, Sobral m anteve-se na fím ção, tendo
sido posteriorm ente convidado a ocupar o cargo de procurador crim inal da
República, um a vez que até o fim do governo Bernardes (1926) m anteve a co n ­
fiança do m inistro da Justiça Afonso Penna Júnior, e do próprio presidente.
Em novem bro de 1926 W ashington Luiz Pereira de Souza tornou-se pre­
sidente e m anteve Sobral com o procurador crim inal da República. O cargo era
espinhoso e Sobral guardava um a série de embates, em processos anteriores,
contra acusados de envolvim ento na “Conspiração Protógenes”, em casos c o n ­
tra com unistas e tenentistas, e tam bém em outros contra funcionários públicos
envolvidos em desfalques.'® N os desdobram entos da citada conspiração foi to­
m ado, no Rio de Janeiro, o encouraçado São Paulo que, sob o com ando do
tenente da M arinha H erculino Cascardo, dera fuga aos rebeldes até o Uruguai.
A partir de um a série de ações, alguns foram presos e em 1926 houve um a
decisão do juiz da r Vara, O lím p io de Sá e Albuquerque, recusando as d enún­
cias de Sobral, argum entando que elas eram frágeis, e que os acusados deveri­
am ser julgados pelo Tribunal de Justiça Militar, colocando ainda alguns réus
em liberdade. Sobral indignou-se e interpôs recurso ao Suprem o Tribunal Fe­
deral, que em janeiro de 1927 se pronunciou, m antendo a decisão de transferir
o caso de 44 dos envolvidos na “Conspiração Protógenes”, para a jurisdição do
Suprem o Tribunal Militar. Inconform ado, Sobral sustentou que os acusados
eram culpados de crim es políticos e que a decisão do juiz Albuquerque havia
sido tomada após “um estudo superftciar. Após troca de notas ásperas, o pro­
curador e o juiz deram conhecim ento à imprensa sobre suas opiniões a respei­
to do caso, mas a decisão do STF foi mantida.
Os advogados de defesa de cerca de 20 dos acusados que ainda iriam a
julgamento, sob a jurisdição do juiz Sá e Albuquerque, eram os m ais afamados
C o n fo rm e registro e m o b ra d e Sob ral P into. A p ud Jon h W. F. Dulles, op. cit., p. 29.
O ep isó d io c o n h e c id o c o m o “C o n sp ira ç ã o Protóg enes" o c o rre u em fins d e 1924 e foi d e n u n c ia d o p o r
policiais q u e e sp io n a v a m re u n iõ e s freq ü e n ta d a s p o r oficiais d a M a r in h a e civis q u e , seg u n d o os relatos
aca ta d o s p o r Sobral, co nsp irav a m , d u ra n te o govern o B ernardes. N a sua d e n ú n c ia So bral in c lu iu cerca
de 100 h o m e n s , qu e seriam lid e ra d o s pelo c a p itã o -d e -m a r-e -g u e rra P r o tó g en e s Pereira G u im a rã e s, e n ­
v olv en do ta m b é m o p rim e ir o -te n e n te A ry Parreiras e o u tro s . Cf. Jo h n W .R D ulles, op. cit., p. 29-30.
Joh n W. R Dulles, op. cit. p. 30-31.

•Al 91
____________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

e com petentes da época. Faziam parte desta equipe: Levi Carneiro, Targino Ri­
beiro, Justo Mendes de Moraes e Sobral. Este teve que enfrentá-los no tribunal
repleto de representantes da im prensa e u m público significativo. A argum en­
tação de Levi Carneiro considerou a ausência de provas consistentes e incorpo­
rou argum entos do próprio Sobral de que, durante o governo Bernardes tinha
crescido um “misticismo revolucionário”. N o entanto Levi atribuía isto a uma
reação aos atos governamentais que com prom etiam as liberdades individuais e
“deturpavam o regime republicano”, o que levava as pessoas a lutar “p o r melhores
diasV^ N o final do julgam ento tod os os acusados foram absolvidos, e Sobral
recorreu m ais um a vez ao Suprem o Tribunal, para revogação. Posteriormente,
toda sua apelação oral fundam entou-se na indignação contra atos que “nasci­
dos da ambição, arremessados contra toda a coletividade, num inconcebível des­
prezo pela vida de irmãos, pela integridade e pela honra da p á tria ” ficam sem
punição.^' N o entanto em 28 de m aio de 1928 o Suprem o Tribunal reuniu-se
em sessão secreta e deliberou pela absolvição de todos os envolvidos na “C ons­
piração Protógenes”.
A decisão foi com preendida pela imprensa co m o um a derrota de Sobral,
intensificando-se um a cam panha com sérias acusações contra o procurador.
N o O Jornal,^^ de propriedade de Francisco de Assis Chateaubriand, foi cham a­
do de reacionário e responsável por manter, por m eses a fio, pessoas na cadeia,
só pela sua satisfação em protelar julgam entos de determ inados acusados, e de
ser ágil apenas contra a im prensa oposicionista. Sobral, n o entanto, estava co n ­
victo de seu papel e pretendia m anter seus argum entos para responder aos
detratores do governo. Mas o que provocou um a reviravolta de cunho pessoal,
atingindo sua trajetória profissional e que m u d o u o rum o de sua vida foi o
episódio de adultério em que esteve envolvido. Católico, editor da revista A
O rdem e u m dos ex p o en tes do centro D o m Vital, esta era um a situação
impensável dentro de sua conduta de vida, e que pessoalm ente o constrangia
profundam ente. C om o ele m esm o adm itiu, estava envolvido am orosam ente
co m a esposa de u m am igo, o tenente-coronel Paulo G om ide, que, ao tomar
conhecim ento do relacionam ento, através de um a carta endereçada por Sobral
à mulher, o agrediu. O fato foi docum entado e divulgado pelo O Globo e O
Correio da M anhã e tornou impraticável a hom enagem planejada por correli-
A p u d Jo h n W. F. Dulles, op. cit., p.36, re fe rin d o -se a artig o n o O Jornal d e a u to ria d e Levi C arn eiro , e
p u b lic a d o em 8 d e m a io de 1927.
" Id em , ib id em , p. 37,
” Id em . Ibid e m , p. 38.

92
V o lu m e 4 C r ia ç a o , P rim e iro s Percursos c D esa fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

gionários, com a finalidade de lhe entregar a beca de procurador-geral do D is­


trito Federal. A divulgação do fato ocorreu em um dom ingo, e na segunda-feira
Sobral apresentou sua dem issão ao m inistro da Justiça Vianna do Castelo, aca­
tada posteriorm ente por W ashington Luís.
A partir daí voltou-se novam ente para suas atividades co m o advogado e
aprofundou suas relações com lideranças católicas, apoiado na confiança de
seu grande am igo Alceu A m o ro so Lima. A ssocio u -se p ro fissionalm ente a
R aim undo Lopes M achado e a Carlos Costa. Recebia indicações de clientes de
Targino Ribeiro e alguns adiantam entos financeiros de A fonso Penna Júnior,
m as m esm o em dificuldades, não deixava de aceitar ações de clientes que não
tinham co m o remunerá-lo. Em 3 de novem bro de 1930, com o início d o gover­
no provisório de Vargas assistiu preocupado, segundo expressou em várias car­
tas a am igos, às transformações no Brasil. Seu ativism o político prosseguiu com
conflitos de opinião, inclusive com m em bros do clero, e as preocupações au­
m entaram de maneira constante ao testem unhar o fato de antigos conspirado­
res estarem n o poder. Suas críticas a Vargas e ao novo regime eram recorrentes.
Em 11 de dezem bro de 1934 recebeu um a carta que lhe deu m uitas alegrias: foi
n otificado de sua aprovação co m o m em bro efetivo da OAB.^^
Suas atividades aproxim avam -no de pessoas ligadas ao poder, m as suas
convicções eram m uito firmes. N em quando foi convidado, em 1936, por seu
am igo Francisco Cam pos, então secretário de Educação do D istrito Federal, e
p elo deputado Adalberto Corrêa, presidente da C om issão de Repressão ao C o ­
m unism o, para participar com o juiz do Tribunal de Segurança Nacional (TSN )
que viria a ser formado. Recusou categoricam ente o convite, e os acontecim en­
tos posteriores mostraram que agiu de acordo com seus princípios, contra este
tribunal excepcional.
Por sua vez a OAB tam bém prosseguia na tarefa de conciliar suas concep­
ções pró-estado de direito com as necessidades da nova conjuntura política,
continuando a indicar nom es entre seus m em bros, para cum prir a dem anda
do TSN quanto a advogados ex officio. A adesão de m uitos seria necessária, pois
o acúm ulo de tarefas advindas de sucessivas prisões era cada vez mais freqüen­
te. N a sessão de 22 de janeiro incluía-se mais u m ofício do presidente do TSN
com nom es de novos acusados, solicitando indicação de advogados, e acres­
centando u m pedido de urgência a esta designação. Pinto Lima, m ais um a vez
de form a açodada, declarou que não tom ava conhecim ento do ofício devido

Jo h n W. F. Dulies. op. cit., p. 75-78.

93
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

aos termos em que fora redigido e se recusou, juntam ente com o conselheiro
Barros Cam peio, a fazer qualquer indicação. O C onselho, porém , aprovou as
indicações feitas pelo presidente, designando o advogado M úcio C ontinentino
para defesa dos acusados R odolpho Ghioldi, Adalberto Fernandes e José Medina
Filho; do advogado Letácio Jansen para substituir M anoel Valente na defesa de
Sócrates Gonçalves, e do advogado Paulo Faria da Cunha para os acusados
Durval M iguel de Barros e M ário de Souza.
Um a dificuldade adicional se apresentava para os m em bros da OAB. M ui­
tos tem iam o braço forte d o governo, principalm ente sobre aqueles que vies­
sem a ser indicados para os casos m ais espinhosos. Isto ficava patente nos regis­
tros de várias recusas para este tipo de incum bência. A lgumas indicações tive­
ram que ser revistas pelo C onselho porque m uitos advogados alegavam os mais
diferentes m otivos para recusar o patrocínio das causas, justificando seu im p e­
dim ento sob alegação de doenças, própria o u na família, viagem inadiável, in ­
clusive para acom panham ento da esposa no tratamento em águas termais, n o ­
meação para cargos públicos, e m esm o sobrecarga de trabalho.
Targino Ribeiro sustentou então a conveniência de estabelecer as norm as
da advocacia de ofício. O C onselho da Seção do DF aprovou unanim em ente as
seguintes conclusões que passaram a ser bases im portantes para os caos asse­
m elhados, concluindo que a defesa crim inal era um dever do advogado, por
mais ingrato que fosse o processo; o advogado que não cum prisse o dever de
defesa em matéria plural, quando para isso designado pelo C onselho da Or­
dem , tornar-se-ia passível de pena disciplinar; as escusas só poderiam ser por
m otivos graves, realmente, e o advogado deveria apresentá-los ao C onselho da
Ordem.^'*
Tendo sofrido na pele algumas arbitrariedades, Sobral P into sabia com o
tratar a questão seja sob o ponto de vista jurídico, o u sob o aspecto hum ano.
Enfrentou a nom eação co m tal convicção que posteriorm ente foi questionado
por vários m em bros de sua família e am igos de seu círculo católico. Para res­
ponder escreveu, além de cartas, tam bém um livro cham ado Porque defendo os
comunistas?^^ discutindo a legitim idade de suas ações. Na época de sua decisão
respondeu a um a m anifestação de sua irmã dizendo que “nunca m e firmei tão
nitidam ente cristão co m o quando aceitei o patrocínio”. ^

A tas da sessão da O A B /D F , 19 d e fevereiro de 1937.


” H e r á d ito F o n to u ra Sobral P into. Por q u e defendo os comunistas? Be\o H o riz o n te : U n iv ersid ad e C atólica de
M in as Gerais, 1979.
A p u d D ulles, op. cit., p. 97.

94 «41
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiro s Percursos e D esa fio s i M 3 0 - 1 9 4 5 ]

Apesar de seu interesse e aplicação nas tarefas iniciais exigidas para este
tipo de responsabilidade, sua boa vontade para com a causa não foi entendida
por seus novos constituintes, Prestes e Bergen A m bos partiam de pressupostos
pessoais a respeito do que seria ter um advogado contrário às suas convicções
políticas. A lém disto seguiam concepções no b ojo de posturas específicas do
PCB a respeito de com o deviam se conduzir dentro dos m oldes do julgam ento
e do próprio tribunal que os julgaria. Por isto Harry Berger não o reconheceu,
de início, co m o seu defensor, nem Prestes tam pouco.
N o entanto ele continuou lutando das formas possíveis para seguir levando
adiante suas funções. Em sessão secreta do Conselho do DF, realizada em 19 de feve­
reiro de 1937, foram lidas as cópias das petições dirigidas ao Tribunal de Segurança
Nacional por Sobral Pinto, ejq?licando a atitude que tomara com o curador do acusa­
do Luiz Carlos Prestes e pedindo melhoria de regime carcerário para Harry Bergen
Na primeira. Sobral informa que o acusado recusava formal e categoricamente qual­
quer defesa, que seria por ele futuramente desautorizada caso fosse apresentada.
A nunciou então que, não podendo desatender às determ inações de Pres­
tes, ficaria a sua d isposição para, em qualquer tem po, intervir em seu favon Em
seguida, ainda na m esm a petição em que se dizia desautorizado por seu paci­
ente, Sobral acrescentava que ele, Prestes, encontrava-se totalm ente segregado
do convívio h u m an o , estava im pedido de fazer quaisquer leituras e não podia
dispor de papel, lápis, o u caneta. Cercado som ente de policiais, dizia não poder
aceitar a apresentação de um a defesa que, naquela conjuntura, não se caracteri­
zava de m aneira rotineira e não era nem ampla, nem livre, e m enos ainda inde­
pendente. Além disso, repetia exaustivamente que, se o senador Abel Chermont,
apesar das im unidades parlamentares, fora preso só por ter requerido habeas
corpus em favor de Berger, co m o adm itir que outro advogado, que não gozava
de tão altas garantias, pudesse usar livrem ente da palavra e empregar os m eios
adequados a um a defesa eficiente?
Q uanto à p etição relacionada a Harry Bergen Sobral Pinto foi mais direto
e incisivo, p o is n em “a um cão lazarento das nossas casas” se permitiria d is­
pensar 0 tratamento que vinha sendo dado a Berger:

M etido no socavão do lance inferior de uma das escadas da Polícia Especial, aí


passa H arry Berger os dias e as noites, sem ar convenientemente renovado, sem
luz direta do sol, e sem o menor espaço para se locomover. Nem cama, nem

C arta d e Sob ral P in to a A g a m e n o n M agalhães, de 13 de fevereiro de 1937. A rquivo CF/OAB.

•Al 95
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

cadeira, nem banco. Apenas um colchão sobre o lajedo. De alfaias nenhuma


notícia. Absolutamente segregado de todo o qualquer convívio humano, a ou­
vir, de momento a momento, as passadas dos soldados em trânsito pela escada
- sobre a sua cabeça - não pode usufruir nem os benefícios do repouso, nem os
do silêncio. Nenhum a visita, nem de amigos, nem de parentes. Proibição de
toda e qualquer leitura, quer de jornais, quer de livros. Ausência total de cor­
respondência: se a ninguém escreve, ninguém tam bém lhe escreve. E como p o ­
deria ele, ainda, escrever se lhe sonegam tudo: papel, lápis e caneta. Assim,
entram os dias e as noites, vencem-se semanas sobre semanas, sobrepõem-se os
meses uns aos outros, e H arry Berger, num isolamento alucinante, se vê invari­
avelmente entregue ao seu só pensamento, na imobilidade trágica de sua ago­
nia sem fim, e do seu abandono até hoje sem remédio, apesar dos clamores
estridentes do seu defensor impotente. A roupa que tra z-c a lç a e paletó sobre a
pele ele não a m uda desde meses. Nela já não existe mais um a só superficie
disponível onde se possam fixar sujeiras. A vista só deste vestuário - se é que
tais andrajos podem ser assim qualificados provoca náuseas incoercíveis.
Tal é. Sr. Juiz, a prisão que destinaram para H arry Berger. Tal é, eminente
Magistrado, o tratam ento que lhe vem sendo dispensado.
Semelhante desumanidade precisa cessar, e de cessar imediatamente, sob pena
de deslustre p a ra o prestígio deste Tribunal de Segurança, que p a ra bem cum ­
p rir a sua árdua tarefa, necessita de p a u ta r a sua ação pelas normas inflexí­
veis da serenidade e da justiça.
Tanto m ais obrigatoriamente inadiável se torna a intervenção urgentíssima
de V. Exa., Sr. Juiz, quanto somos um p ovo que não tolera a crueldade, nem
mesmo para com os irracionais, como demonstra o Decreto n- 24.645, de 10
de Julho de 1934, cujo artigo 1." dispõe: “Todos os anim ais existentes no país
são tutelados pelo Estado."'
Para tornar eficiente tal tutela, esse mesmo decreto estatui: “Aquele que, em
lugar público ou privado, aplicar ou fize r aplicar m aus-tratos aos animais,
incorrerá em m ulta de 20$000 a 500$000 e na pena de prisão celular de 2 a
15 dias, quer o delinqüente seja ou não o respectivo proprietário, sem preju­
ízo da ação civil que possa caber” (art. 2.°).
E, para que ninguém possa invocar o benefício da ignorância nessa matéria,
0 art. 3.° do decreto supramencionado define: “Consideram-se maus-tratos:
(...); II - M anter anim ais em lugares anti-higiênicos ou que lhes impeçam a
respiração, o m ovim ento ou o descanso, ou os privem de ar ou luz.”

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V o lu m e 4 C r i a ç ã o , P rim eiros Percursos e D e s a fio s d 4 3 0 - 1 9 4 5 )

As dificuldades de contato entre Sobral e seus clientes foi objeto de várias


interm ediações para que houvesse possibilidades de contatos entre eles e o ad­
vogado. Em obra recente Vasco Leitão da Cunha^* declarou que na tentativa de
interferir positivam ente contra certas violências aos presos e perm itir o acesso
do advogado ao seu constituinte [...] com autorização do Getúlio, facilitei a ida
do Sobral Pinto ao Luiz Carlos Prestes. Sobral veio m e dizer que o Prestes estava
ficando tantã p or falta de ter com quem falar. N o despacho seguinte contei isto ao
presidente, ele m e autorizou a dizer ao Caneppa, que era o carcereiro do Prestes,
m uito g entil comigo, que deixasse o Sobral Pinto visitá-lo.
Cabe acrescentar que o senador Abel Cherm ont e os outros parlamentares,
presos juntamente com ele, em março de 1936 ^ porque impetraram habeas
corpus em favor de presos políticos, foram julgados pelo TSN em 12 de m aio de
1937. Segundo Evandro Lins e Silva, m uitos dos pedidos de habeas corpus foram
redigidos por ele próprio e requeridos por Mangabeira e seus colegas da Câmara
e do Senado. “Mas nessa oportunidade”, relatou Evandro, “tive a ventura de não
assinar nenhum habeas corpus”. Quem os assinava eram os congressistas. E acres­
centou: “Um dia eu disse: - Dr. João, eu gostaria de assinar... Ele respondeu: - Mão,
você não assina, porque não tem imunidades. Resultado: eles todos foram presos, e
eu não fui, porque não havia nenhum habeas corpus assinado p o r mim."'
N o dia 7 de junho Vargas registrou no seu diário o fato de estar realizando
0 prim eiro despacho com o m inistro da Justiça José Carlos de M acedo Soares, e
que haviam sido soltos cerca de trezentos presos políticos “para bem impressio­
nar a opinião, como bem desejava o novo ministro. N a verdade tratava-se de sim ­
ples batedores de carteira e punguistas que o estado de guerra p erm itia seqües­
tr a r”^^ Nesta época C herm ont e o deputado D om in gos Velasco foram absolvi­
dos. Mas o Tribunal con d en ou os deputados Abguar Bastos a seis m eses de
reclusão; João Mangabeira a três anos e quatro m eses e O távio da Silveira a
quatro anos de prisão. O távio da Silveira teve, em segunda instância, sua pena
reduzida a seis meses. Mangabeira, após incontestável erro judiciário decorren-

Vasco Tristâo Leitão d a C u n h a. D ip /o m a d a em alio-mar: depoim ento ao Ci^DOC. E ntrevista Aspásia C am argo,
Z a iro C h eib ub , Luciana N ó b re g a , ed ição d e te x to D o ra Rocha. Rio d e Janeiro: E d ito ra FGV, 2003, p.98.
” D e sd e 31 d e d e z e m b ro de 1936, o m in is tro d a Justiça, V icente Rao, já havia p e d id o e x o n eraç ã o d o carg o em
so lid a rie d a d e à c a n d id a tu r a de A rm a n d o Sales. Ver os c o m e n tá rio s de Vargas e m Getulio Vargas: Diário.
A p re se n ta ç ão de C elina Vargas do A m aral Peixoto. São Paulo: Siciliano; Rio de Janeiro: F u n d a ç ão G e tú -
lio Vargas, 1995, v, II, p. 9-11,
Cf. E v a n d ro Lins e Silva. O salão dos passos perdidos: depoim ento ao C PD O C . Rio d e Janeiro: N ova F ro n te i­
ra, Ed. FGV, 1997, p. 123.
^'D iário d e Vargas, op. cit., VIL p-52.

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______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

te do voto duplo do presidente do Tribunal, Frederico Barres Barreto - que


votara e, ante o em pate verificado no julgam ento, tam bém desempatara em
25 de junho de 1937 obteve a ordem de habeas corpus e foi posto em liberdade.
M as tinha razão Prestes ao afirmar que um sim ples advogado não teria
condições de fazer um a defesa eficiente dele e de Berger, naquela conjuntura.
Sobral procurou de todas as form as atenuar as penas im postas aos líderes c o ­
munistas, principalm ente depois que eles o reconheceram com o advogado.
Entretanto, som ente c om a decretação da anistia aos presos políticos em 1945,
é que Prestes e Berger - este já sem nenhum dom ínio de suas faculdades m en ­
tais conseguiram deixar a prisão. Outros acusados defendidos por Sobral
conseguiram absolvição m uito cedo. Foi o caso, por exemplo, de Aarão Moraes
Souto, que em 15 de setem bro de 1937 já estava posto em liberdade.
O C onselho da Seção do DF tentou ajudar Sobral e os dem ais advogados
encarregados da defesa dos presos políticos a desem penharem suas funções.
Targino Ribeiro indicava, a cada sessão, mais e mais advogados para funcionar
perante o Tribunal, oficiava tanto aos juizes quanto ao m inistro da Justiça para
alertar sobre a necessidade de facilitar aos advogados u m entendim ento reser­
vado com os presos, assegurando a livre com unicação dos advogados com os
seus constituintes; e no sentido de que fosse assegurado aos advogados o livre
direito de defesa, que costum avam passar pelos vexam es de revista quase ín ti­
ma à entrada dos tribunais e presídios.
Em 1.®de setembro de 1937, Sobral Pinto deu ciência ao Conselho da Seção
do DF da denúncia anônim a feita ao Ministro da Justiça de que estava a servir de
veículo para a correspondência de Luiz Carlos Prestes. Sobre o assunto, o C onse­
lho deliberou reafirmar a plena confiança na atuação profissional de Sobral Pinto
com o advogado de Luiz Carlos Prestes e Harry Berger, tendo em vista o zelo e
escrúpulo por ele dem onstrado n o desem penho do mandato que lhe fora confi­
ado pela Ordem em obediência à Lei de Segurança Nacional; e dirigiu ao m inis­
tro da Justiça ofício que dava a conhecer essa resolução, encarecendo também a
necessidade de providências por parte do ministro, que assegurasse aos advoga­
dos designados pela Ordem o desem penho cabal das suas atribuições.
Sobral defendeu também Graciliano Ramos, preso m esm o sem ter sido m em ­
bro da ANL. Inicialmente também o escritor tem uma reação negativa ao seu advo­
gado, julgando-o m uito rico e famoso para entrar na sua causa. Adquiriu confiança
logo no primeiro encontro quando perguntou a Sobral com o iria preparar a defesa,
pois não existia acusação. Resposta de Sobral: “São uns idiotas. Se eu fosse chefe de

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V o lu m e 4 C r i a ç ã o , P rim eiros Percursos e D e s a fio s i l 9 3 0 - 1 9 4 5 )

polícia, 0 senhor estaria aqui regularmente, com processo''. Ao que Graciliano retru­
cou: ‘'Muito bem. Onde é que o senhor ia achar matéria para isto, doutor?” E Sobral:
“Nos seus romances, homem. Com as leis que fizeram p o r ai, os seus romances dariam
para condená-ld‘\^^ Graciliano foi libertado em janeiro de 1937, e Sobral pôde pros­
seguir na luta pelos casos mais difíceis de Berger e Prestes.

3.2 A OAB e o Estado Novo

O regim e instaurado p or Vargas em 10 de novem bro de 1937 foi prepara­


do de m aneira a ser um “golpe silencioso” ” , e m esm o de sua decretação “repre­
sentou a vitória dos ideais autoritários e a derrota dos liberais que concorreram
desastradam ente para o g o l p e O novo regime estava assentado em critérios
que possibilitavam liberdade absoluta do chefe, sobretudo quanto à aplicação
dos decretos-lei. Além disso, tinha u m sustentáculo ativo apoiado no Departa­
m ento de Propaganda e D ifusão Cultural (D P D C ), criado em 1934 - e que em
1939 daria lugar ao D epartam ento de Imprensa e de Propaganda (DIP), braço
repressor, responsável pela difusão da ideologia do Estado N ovo que permitia
ao governo exercer o m áxim o controle sobre a informação. As práticas de contro­
le social im puseram e asseguraram um a dinâm ica adequada, à projeção sim b ó ­
lica do Estado nacionaUsta, e ao carisma de seu líder, prom ovido pela intensa
propaganda, fosse ela pessoal, ou corporativa.
A eficiência do trabalho secreto que invadia o m u n d o privado perseguia,
denunciava, reprimia, punia, amparava-se no sofism a da Lei de Segurança N a­
cional e reproduzia a criação de inim igos objetivos, contrários aos ideais da
grande nação-fam üia. Assegurada por u m aparato policial que se desenvolveu
dentro do Estado - c o m o elem ento essencial de m anutenção do poder e da
ação ditatorial - , a estratégia da violência legitim ou a m áxim a da preservação
do espírito da ordem , e preservou, acim a de tu d o, a integridade do m ito
salvacionista, criado em torno da figura de Vargas, para a aceitação com pulsó­
ria do regime^^. A preparação que iria im por o continuísm o se iniciou com as
m ovim entações do processo eleitoral que faria a sucessão presidencial em 1938.

^^/ohn W. F. DuJles. op. cit., p. 115.


^’ Cf. expressão de M arieta de M o ra es Ferreira e C arlo s E d u a rd o S a rm e n to “A R ep úb lica Brasileira: p a cto s e
r u p tu r a s ”, na o b ra A República n o Brasil, já citada, p. 468.
^B orisF a usto .O pe n sa m e n lo n a d o m lista a u to ritá rio . (1920-I940J. Rio d e Janeiro: Jorge Z ah ar Editor, 2001, p. 22.
Elizabeth Cancelli. O m u n d o da violénaa: a polícia d a Era Vargas. Brasília; E dU nB , 1994, p. 21.

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______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

A realização das eleições, cuja campanha estava delineada pelas candidatu­


ras do governador paulista Armando Sales de Oliveira - que ocasionou a saída de
Vicente Rao, seu maior partidário, do M inistério da Justiça em janeiro de 1937
Plínio Salgado, da AJB - que sabia e apoiava as intenções de Vargas e logo renunci­
aria à sua candidatura e José Américo de Almeida - que era apenas n om inal­
m ente apoiado pelos getulistas não estava nos planos do presidente. Preferiu
articular a anulação do pleito junto aos seus principais colaboradores: Eurico
Dutra, ministro da Guerra; Góes Monteiro, chefe do Estado-Maior do Exército;
Füinto Müller, chefe de Polícia do Distrito Federal; e Francisco Cam pos, o princi­
pal ideólogo do regime e que já em m eados de 1937 tinha ultim ado o substitutivo
à Constituição de 1934. Um a outra ação fez-se necessária: a desarticulação da
influência do governador gaúcho. Flores da Cunha, em virtude da ascendência
que ele tinha sobre uma poderosa brigada militar, e assim poderia alimentar im ­
portantes cisões no seio das Forças Armadas, inviabilizando o golpe.
Acrescida a toda esta tessitura houve uma estratégia que incorporou o uso da
violência e da ação simbólica para reafirmar o projeto de salvação nacional, o chama­
do Plano Coheru Tema amplamente divulgado pelo governo, em setembro de 1937,
tratava de um documento supostamente apreendido pelas Forças Armadas e atribu­
ído à Internacional Comunista, que continha um plano articulado para a tomada do
poder pelos comunistas. O falso plano soube-se mais tardiamente, fora forjado pelo
governo para implantar o terror e desencadear uma forte reação anticomunista. E,
para controlar o caos iminente, Vargas conseguiu facilmente que o Congresso, em 2
de outubro, mais uma vez decretasse o estado de guerra, que estava suspenso desde
julho. Usando então dos poderes que esse instrumento lhe atribuía, Vargas federalizou
a Brigada Militar do Rio Grande do Sul - que sustentava o governador gaúcho, for­
çando a sua renúncia - e, em seguida, para pôr termo às agitações, anunciou a nova
Constituição, que dissolvia a Câmara dos Deputados, o Senado Federal, as Assem­
bléias Legislativas dos Estados e as Câmaras Municipais e declarava o País em estado
de emergência. Odilon Braga, que se desligou do governo, foi o único ministro de
Estado que se recusou a assinar a carta constitucional então imposta à nação.
O preâmbulo da nova Carta, conhecida com o “Polaca”, justificava a queda
da ordem constitucional, sobretudo a partir da afirmação que declarava e n ­
contrar-se o país sob a im inência funesta da guerra civil, atribuída à crescente
agravaçào dos dissídios partidários, sujeitos a desem bocarem na luta de classes
e na radicalização de conflitos ideológicos. Ficaria o Brasil exposto, seria aberto
cam inho à violência e, sobretudo, à infiltração com unista, que era a cada dia

100 9ÀM
V o lu m e 4 C r ia ç a o , P rim e iro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 Ü - 1 9 4 5 )

m ais extensa, exigindo rem édios de caráter preventivo, radical e perm anente. A
Carta afirmava que o Estado não dispunha de m eios norm ais de preservação e
de defesa da paz, da segurança e do bem -estar do povo. Desta forma, invocando
o apoio das forças armadas o Estado se dispunha a preservar a unidade ameaçada
e evitar que se processasse a decom posição das instituições civis e políticas. Em
síntese A Polaca representaria u m ataque perm anente contra a identidade jurí­
dica a que foram subm etidos os indivíduos, pelo controle absoluto do Estado.
E a organização judicial, durante todo esse tem po, som ente pairou n o ar.

N em os acórdãos estavam imunes do desrespeito ou do desacato, nem os que


subscreviam tinham como evitar a exoneração ou a aposentadoria arbitrá­
rias, a não ser confiando na força im anente dos princípios, à qual se rende,
sem 0 querer, a vontade soberana. O Supremo Tribunal sofria a p io r conde­
nação - de viver cerceado em um m undo deficções remanescentes; em derre-
dor dele, haviam ruído todas as colunas da sociedade livre. D entro das con­
tingências em que passou a operar, cada ministro possuía apenas o escudo de
sua consciência p a ra opor ao m ando incontrastável e triunfante.^^

Esse era o pensam ento de Prado Kelly, que o expôs em h om enagem ao


m in istr o d o S u p rem o T ribunal F ederal, L audo de C am argo, e m 1952,
relem brando com o a ditadura varguista significou o m om en to de grandes de­
cepções e renúncias, pois os alicerces da organização judicial, em ruínas, abala­
vam e tornavam excepcionalm ente difícil o exercício da judicatura.
U m a das poucas m anifestações críticas da Ordem dos Advogados, neste
período, registrou-se em um a única decisão, de 17 de m aio de 1938 - na qual
aprovou unanim em ente a proposta de Orlando Ribeiro de Castro, para repre­
sentar junto ao governo sobre a necessidade de serem am pliados os prazos de
defesa estabelecidos no Decreto-Lei n^ 428. Este decreto fora sancionado no dia
anterior e regulava os julgam entos perante o TSN. O C onselho Federal, que
pou co se pronunciara sobre os dispositivos autoritários - notadam ente a LSN e
o TSN só viria a se manifestar sobre a quebra da ordem jurídica a partir de
1940. N o entanto, devido às prerrogativas do poder executivo o fazia tim ida­
m ente, m odificando a atitude consubstancialm ente quando da declaração o fi­
cial de solidariedade do Brasil aos “aliados” no decurso da 2- Guerra Mundial.

D an iel A arâo Reis. O S uprem o Tribunal Federal: notas e recordações. Rio de Janeiro; M a b ri, 1968. A pud.
F.mília V iotti d a C osta. O S uprem o Tribuna! I-cdera! e a construção da cidadania, op. cit., p. 65.

101
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Os registros das atas das sessões do Conselho concentravam-se em questões


relativas a problemas administrativos e mais duas novidades: a criação do Instituto
de Pensões e Aposentadorias e a solução da Caixa de Assistência dos Advogados,
que dependiam do Governo Federal. Quando o Conselho Nacional do Trabalho
aprovou o projeto de Instituto de Pensões dos Advogados, o secretário-geral do
Conselho Federal, Attüio Vivácqua, elogiando o Ministério do Trabalho, chegou a
afirmar que a Ordem, a partir daquele dia, estava a dever dois favores ao governo: a
própria criação e o Instituto de Pensões e Aposentadorias dos Advogados e
Serventuários da Justiça.^^
N o entanto, a nova organização do TSN - transform ado em órgão autô­
n o m o desvinculado da Justiça Militar pelo Decreto-Lei n“ 88, de dezembro de
1937 agilizava o seu funcionam ento e dava aos seus juizes a faculdade de
designar advogados, dentre os inscritos da Ordem, para a defesa dos réus que
não tivessem o u não quisessem indicar defensores, atribuição anteriormente
conferida ao C onselho da Seção do DF. A m edida não agradou, m as tam pouco
m odificou a rotina da Seccional, que continuava sua marcha em defesa dos
presos e perseguidos políticos. Na sessão de 4 de m aio de 1938, o Conselho
discutiu e votou favoravelmente o parecer de Moreira de Azevedo para que
fossem subm etidas ao recém -criado Tribunal de Ética Profissional as represen­
tações de Sobral P into contra a decisão do capitão Alberto Lemos Basto, juiz do
TSN, m andando que fosse riscado u m trecho das razões de defesa do acusado
Amarílio Vieira Cortez - decisão esta confirmada pelo juiz do m esm o tribunal
e relator de apelação, D r. Pedro Borges.
Em seguida, após o fracassado putsch que aliou integralistas que estavam na
ilegalidade desde dezembro de 1937, e opositores de Vargas no m ovim ento de
derrubada do regime, Álvaro Miranda propôs que o Conselho do DF prestasse
assistência judiciária aos m em bros da Ordem colhidos nos acontecim entos e que
se achassem presos ou na iminência de prisão. À tentativa frustrada de levante
sucederam-se inúmeras prisões e exílios e a Constituição foi emendada, esten­
dendo a aplicação da pena de morte aos casos de insurreição armada; prática de
atos destinados a provocar a guerra civil; atentado contra a segurança do Estado;
e quaisquer atos destinados a suscitar o terror. O Conselho resolveu que deveria
prestar a assistência que fosse necessária, ficando o presidente amplamente auto­
rizado a tomar medidas indispensáveis à eficácia dessa assistência^®.

A/íJ5 da sessão do Conselho Federal d a O A B , 11 d e ju lh o de 1939.


A tas da sessão da O A B /D F , 18 d e m a io de 1938.

102
V o lu m e 4 C r i a ç ã o , P rim e iro s Pcrcursos c Dosdtios ( 1 9 3 0 - 1 9 45)

Em sessão secreta de 3 de junho, a Seccional to m o u conhecim ento da


carta dirigida por Sobral P into ao presidente A ntônio Baptista Bittencourt, re­
latando o incidente que teve com o diretor da Casa de Correção, quando no
exercício das liinções de advogado de ofício de Luiz Carlos Prestes. A resolução
que teve o presidente ao deplorar o ocorrido, prestando solidariedade pela for­
m a digníssim a com a qual Sobral vinha desem penhando as m issões que lhe
foram responsabilizadas, deveriam servir com o m otivo de “exemplo de energia,
firm eza, dignidade profissional e pessoal a serviço da Justiça e em defesa das prer­
rogativas inalienáveis do advogado". Em seguida, o C onselho do DF colocou à
disposição de Sobral advogados para acom panharem o processo instaurado e
oficiou m inistro da Justiça e aos presidentes do STM e TSN, rem etendo cópia
da representação e solicitando providências e garantias indispensáveis ao exer­
cício da advocacia e segurança pessoal dos profissionais em penhados na defesa
de acusados de crimes políticos, a fim de que não mais se produzissem fatos da
gravidade dos que foram narrados.
O presidente do STM, em resposta, com unicou ter subm etido à apreciação
do Tribunal o ofício do presidente da Seção da OAB e remeteu ao ministro da
Justiça uma cópia dos m esm os docum entos para fins do artigo 213, do Código
de Justiça Militar. N ão satisfeito, o presidente da Seção tratou pessoalmente da
garantia de defesa dos presos políticos em conferência com o presidente do TSN,
desembargador Barros Barreto. Este alegou ter reservado lugares e m andado ins­
talar uma tribuna destinada aos advogados dentro do recinto do TSN, para que
fossem distinguidos e não mais sofressem constrangimentos desnecessários.^^
Há u m registro im portante na ata de 9 de novem bro de 1938. Sobral Pinto
foi eleito no C onselho Seccional do DF para ocupar a cadeira do Conselheiro
Villem or Amaral, que pediu licença. Ao assumir, proferiu discurso que com ba­
tia o regime instaurado com o golpe de 1937:

Eu não poderei investir-m e em silêncio na função para a qual m e elegestes.


Luziste, certamente, enaltecer o modesto advogado que, buscando louvar o
seu juram ento se dispôs, p or entre dificuldades quase insuperáveis, a ser fiel ao
servidor da Justiça num a época em que está, p o r toda a parte, ainda proscrita.
Sois, meus caros confrades, os testemunhos mais autorizados, das penas ep e ri­
gos a que fica sujeito, nos nossos dias, o advogado, que chamado para atuar
perante os Tribunais Políticos, tenha a noção exata das responsabilidades de

^'^Atasàa íessão da O A B /D F , 22 d e ju n h o d e 1938.

«▲B 103
______________História da
O r d e m d o s A d v o g a d o s d o Brasil

sua profissão. Os deveres ão Estado, que nos são impostos pela nossa vocação de
auxiliares da Justiça, nos obrigam, de m omento a momento, a invocar, para o
bem defendermos os nossos patrocinados princípios indeclináveis de natureza
moral e jurídica, em face de autoridades que só sabem cultuar a força física, ou
servir os interesses pessoais dos atuais dominadores do país. N ada está de pé
entre nós no domínio da administração da Justiça imparcial e serena. O D irei­
to perdeu suas características de força moral para se transformarem mera téc­
nica de opressão governamental. A lei, defendida como simples manifestação
de sabedoria acumulada nos séculos. A Justiça, deixando de ser atributo do
poder divino, não tem mais a nobre função d e pesar as responsabilidades e as
culpas em face de uma lei impessoal anteriormente decretada, mas é a simples
expressão da força física do Estado, ao serviço de homens ambiciosos e tomados
de vã cobiça de mandar. O exercício do mandato de advogado num clima desta
natureza requer da parte do m andatário sacrifícios inauditos, cujas conseqü­
ências em perigos e em renúncias são de tudo imprevisíveis. Até onde chegou a
minha paciência cristã a tudo me submeti, tomado de nobre pensamento de
salvaguardar ao menos ao lado da defesa, os imperativos perenes da Justiça e os
postulados imperecíveis do Direito. Sentinelas vigilantes da nossa profissão,
presenciastes Srs. membros do Conselho, o meu esforço e a minha dedicação
em prol da dignidade humana dos acusados que tiveram de comparecer peran­
te os nossos Tribunais Políticos. Se obrigastes algum mérito na minha atitude
este pertence, sobretudo, a vós, senhores membros do Conselho, cujos olhares
severos foram um estímulo no sentido de tudo fazer para honrar as tradições
da nossa gloriosa profissão. Assim, meus caros confrades, p erm iti que vos diga,
com a m inha habitual sinceridade: se algum a honra m e cabe p o r esta
investidura, ela, antes de atingir a minha pessoa, já passou por cada um de vós,
pois 0 que eu tenho nada mais é do que o reflexo apagado da vossa coragem e
do vosso zelo na defesa dos altos e superiores interesse do Direito e da Justiça.

Esse foi um dos poucos discursos contra a ditadura registrados nas atas do
C onselho da Seção do DF até o ano de 1940. Acredita-se que as atas da Seccional
e do Conselho Federal sofreram censura durante o período do Estado N ovo, o
que só pode, entretanto, ser comprovado para o ano de 1944. Mas eram realiza­
das, na Seccional, sessões secretas para discutir assuntos que poderiam ter algu­
m a repercussão negativa junto ao governo, co m o consta de alguns registros/®

^ Ver Reynaldo P om p e u d e C am po s. Repressão Judicial... op. cit., passim. Ver ta m bém atas d a OAB do período.

104
V o lu m e 4 Criac^ão, P rim e iro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 ‘ ) 4 5 l

Em m uitas ocasiões, as indicações apresentadas no C onselho da Ordem,


n o âm bito federal ou m esm o nas Seções, eram julgadas prejudicadas em face
do dispositivo do art. 8.® d o Regulamento, ou d o art. 2.° do Regim ento Interno
da Seção do DF. Este proibia o pronunciam ento da entidade sobre assunto im e­
diatam ente não atinente aos objetivos da Ordem - , principalm ente se iam de
e n c o n tr o a d e te r m in a ç õ es g o v e r n a m en ta is, sig n ific a n d o alg u m tip o de
posicionam ento político o u partidário - o que quase sempre ocorria com as
m anifestações de Sobral Pinto. O u se o assunto configurasse algum tipo de
constrangim ento à Casa, com o o sucedido em 1938, por exem plo. Na ocasião, o
dispositivo foi invocado para arquivar o pedido de João Clím aco da Silva, ad­
vogado inscrito na Seção do DF, referente à inauguração, na sala das sessões, do
retrato do presidente G etúlio Vargas, com o hom enagem ao fundador da O r­
dem que era, e tam bém ao advogado que fora “em outros tem pos”.
A nos depois, em 1941, o peticionário solicitou a reconsideração do p ed i­
do. Já passados os prim eiros e duros anos do regime de exceção, já editados
centenas de decretos-lei - m u itos inconstitucionais, inclusive - , já desrespeita­
dos vários dispositivos da C onstituição autoritária - que sem em bargo da e x ­
tensão de poderes que outorgava ao Executivo, estabelecia a convocação e o
funcionam ento do Legislativo Letácio Jansen, em discurso um tanto am bí­
guo, deu o seguinte voto:

N ã o m e parece que o art. 8^ do R egulam ento ved e a inauguração do re­


trato do chefe da N ação em nosso recinto. Essa hom enagem que a O rdem
prestasse ao seu fun dador, nada m ais seria que um p reito de ju stiç a a S.
Exa. {...JO Presidente G etúlio Vargas, que há m ais de um decênio dirige
os destinos de nossa P á tria , p ela sua tolerância, espírito justiceiro e alm a
a b erta às sugestões do d ireito é, bem , a encarnação do advogado e do
ju rista . A obra ju ríd ic a de S. Exa. é im ensa e útil. Em todos os setores da
adm inistração, sua ação legislativa tem se fe ito sentir, suave e eficiente­
m ente. D ispondo de todos os poderes, S. Exa. deles, como ju rista , não
abusou e entre as soluções drásticas ou violentas sem pre preferiu as solu­
ções legais e ju diciárias. Nessa a titu d e benevolente de S. Exa. sente-se a
sua form a çã o jurídica, sen te-se a vitalização do espírito de nossa p rofis­
são. D e todos os presidentes da República, fo i o Sr. G etúlio Vargas - e
m u itos bacharéis ocuparam a presidência - o m aior advogado do Brasil e
do foro. R ugindo os vendavais, em m eio de situações difíceis e sob rem a ­

•Ál 105
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

neira espinhosas, S. Exa. ja m a is se deixou se d u zir p e la idéia de força e


m esm o quando agiu energicam ente f o i procu rar nos Tribunais a sanção
p a ra os seus atos. N o regim e de S. Exa. aconteceu, até, o p a radoxo m ais
singular d e nossa nacionalidade: exercendo o p o d e r sem restrições, f o i o
m ais con stitucion al de todos os seus presidentes, f o i o m ais dem ocrata de
todos eles, fo i o m enos d ita d o r de todos os dirigentes dessa Terra. Tudo
isso p o rq u e S. Exa., a curul suprem a, não se despiu do espírito concilia­
dor do advogado, não se despiu d a tendência legalista do ju rista . N ão
bastassem todos esses fa to s p a ra ju stifica r a nossa hom enagem a S. Exa.,
e bastaria, p a ra ela, o m arcante evento de ter S. Exa. sido o fu n d a d o r
desta O rdem , aspiração de u m século dos lutadores do direito. Por isso,
m antenh o o despacho d o conselheiro Rodrigues Neves, que deferiu o p e ­
dido de reconsideração do advogado João C lim aco d a Silva, e voto f a v o ­
ravelm ente à inauguração do retrato do Sr. G etúlio Vargas no recinto das
nossas sessões.^'

Nestor Massena, m ais direto, historiou ocasiões em que o C onselho da


Seção se solidarizou com questões, segundo ele m uito m en os atinentes às atri­
buições da Ordem do que a de prestar as devidas hom enagens ao seu fundador,
e denunciou a utilização do “curioso” art. 8 ° co m o u m biom bo chinês, “detrás
do qual se realizam todos os atos que desejamos, mas que serve, também , para que
se combata tudo o que nos édesagradáveK^^ Enfim, o retrato de Getúlio foi inau­
gurado na Seccional d o DF, juntam ente co m o de Oswaldo Aranha.

Sobral Pinto m anteve-se sempre atento aos hum ores do C onselho à hora
de interpretar o Regulamento. Em sessão de 7 de dezembro de 1938, Sobral leu
um a indicação de sua autoria a propósito de uma entrevista publicada em jor­
nal vespertino do Rio de Janeiro sobre o Decreto-lei n“ 869, que retirou das
atribuições da Justiça Ordinária do país os julgam entos denom inados crimes
contra a econom ia popular. E, antes que o C onselho julgasse o m érito da ques­
tão - que poderia invocar o preceito do art. 8.° mas que foi, afinal, aprovada
Sobral fundam entou sua argumentação no art. n“ 76, inciso 1 do R egulamen­
to: ‘‘A o conselho compete velar pela conservação da honra e da independência da
Ordem, e pelo livre exercício legal dos direitos dos advogados, provisionados e

^'A ta s da sessão da O A B /D F , 29 de o u tu b r o d e 1941.


ibidem-

106 •á b
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim e iro s Percursos c D e s a fio s 11 9 3 0 - 1945)

so licita d o res^ Em outra oportunidade, afirm ou que u m dos objetivos da Or­


dem estava expresso no art. 27, XXI, do Regulam ento - que obrigava o cum pri­
m ento de todos os preceitos do Código de Ética Profissional, sob pena de rigorosas
sanções disciplinares - , e que, portanto, segundo a Seção I, do Código, que
estabelecia os deveres fundamentais, os advogados deviam zelar pelo prestígio de
sua classe, da Magistratura, do aperfeiçoamento das instituições do Direito e do
que interessasse à ordem jurídica. Dessa forma, competia então ao Conselho, nos
termos das suas leis regedoras e por todos os m eios ao seu alcance, trabalhar “para
que a vida da Nação, que pública quer privada, se processe dentro da ordem jurídica'."^
Pelo Decreto-lei n- 869, de 18 de novembro de 1948, os crimes contra a econo­
mia popular - com o vender mercadorias abaixo do preço de custo com o fim de
impedir a concorrência, ou provocar a alta ou baixa de preços, títulos públicos, valo­
res ou salários por meio de notícias falsas, operações fictícias ou qualquer ouro artifi­
cio passavam a ser inafiançáveis e seriam processados e julgados pelo TSN, sem a
suspensão da pena nem a possibilidade de livramento condicional. O citado decreto,
denunciado por Sobral, era a mais recente manobra do governo no sentido de garan­
tir e ampliar a permanência do Tribunal de Segurança Nacional, que exerceria o con­
trole sobre a população de uma forma diferente, e em certos casos até inusitada.
Para a Ordem , o ano de 1938 co m e ç o u c om um a notícia de im pacto. Na
reunião de 4 de m aio, o D r. Levi Carneiro apresentou sua renúncia, p ro ­
nunciando u m discurso considerado brilhante"’^ n o qual justificava a neces­
sidade de se afastar d os cargos de presidente da O rdem e do C onselho Fede­
ral, cargos que vinha exercendo há sete anos consecutivos, "'pela necessidade
de renovação dos postos da O rdem , cujos diversos valores terão assim a oportu ­
nidade de prestar nesses postos sua colaboração.” Em seguida agradece a cola­
boração dos con selh os seccionais e passa a presidência para seu substituto
legal. Sr. A n to n io Baptista Bittencourt. N o entanto em 6 de maio^^ ocorre
outra reunião extraordinária. Justo de M oraes com u n ica a to d o s que, junto a
um a com issão, procurou o Sr. Levi Carneiro solicitan d o para que perm ane­
cesse na presidência da O rdem "encarecendo os inconvenientes que adviriam
para os serviços da instituição caso persistisse na sua decisão”. A dem anda foi
aceita e tod os se congratularam .

A ta s da sessão da O A B /D F , 7 de d e ze m b ro de 1938.
**Atas da sessão do Cotfselho Federal da OAB, 27 de ju n h o d e 1947.
A ta da re u n iã o e x tra o rd in á ria d e 4 de m a io de 1938. CF/OAB. N a ata h á tra n s c riç ã o de seu discurso.
■'* Sobre o assu n to ver Anexos.
^ 'A ta da re un iã o e x tra o rd in á ria de 6 de m a io d c 1938. CF/OAB

107
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Em sessões seguintes prosseguem os debates a respeito das franquias postais a


que tinha direito a Ordem e as questões pertinentes à assistência judiciária. Houve
também uma representação do advogado George Haas contra a decisão da Associ­
ação Nacional Socialista da Alemanha, recomendando aos alemães residentes no
estrangeiro que só escolham advogados da raça ariana."’® 0 racismo seguia com
seus tentáculos bem distente d o palco europeu. A Ordem tam bém sistematiza, de
forma nacional, o número de advogados, provisionados e solicitadores, anuncia­
dos em reunião, por Attílio Vivácqua, sob forma de quadro estatístico.^^
Os tempos mudavam e as aparências tinham que se adaptar a eles. Em ata de
junho de 1938 foi discutida e aprovada a representação da Secção do Distrito Fede­
ral sobre as vestes talares. O relator. Sr. Ubaldo Ramalhete, sugeriu a adoção do
novo m odelo que todos os advogados inscritos na Ordem passariam a adotar, com
as modificações a partir da beca originária usada pelos membros do Instituto dos
Advogados (Decreto n^ 393, de 23 de novembro de 1844): a) supressão do arminho
do gorro, da gravata e da tira de renda pendente; b) inclusão de duas alças de cordão
^renaty grosso, pendentes sob a manga esquerda}° Foi aprovado sem discussões.
Em 18 de agosto de 1938 ocorreu u m fato divisor de águas. O Conselho
organizava os escrutínios para nova diretoria, registrando-se que, com o fim do
m andato do D r. Levi Carneiro, devia-se proceder a novas eleições. C oncluído o
procedim ento, verificou-se que todos os sufrágios haviam ficado para o sr. Levi
Carneiro. O presidente da sessão A ntônio Baptista dos Santos fez u m discurso
laudatório, destacando a atuação d o fundador, cham ando-o de “em inente ad-
vogado[...] organizador da ordem dos Advogados e também [...] ressaltando os
relevantes serviços prestados por Levi. N a sessão seguinte, em 25 de agosto, o
C onselho tom ou conhecim ento de um pedido do novo presidente, informando
que havia recebido a notícia da reeleição, agradecia m uitíssimo, mas mantinha
sua decisão de não prosseguir neste cargo, pedindo para ser dispensado, pelos
m otivos que reiterava em discurso, anexado à ata. Todos os presentes lam enta­
ram mas acabaram por acatar a decisão, enfatizando em seus pronunciamentos a
significativa contribuição do Dr. Levi Carneiro. Apesar de todos os apelos o pró­
prio Levi definia sua sucessão. Em outra sessão foi eleito Fernando de Mello Vianna.

" A t a d a re u n iã o e x tra o rd in á ria de 10 de m a io d e 1938. CF/OAB


^’ A ta da re u n iã o e x tra o rd in á ria d e 17 d e m a io d e 1938. CF/OAB
^"Ata d a re u n iã o ex tra o rd in á ria d e 21 d e ju n h o de 1938. CF/OAB. O us o das vestes talares estava p re v isto no
a rt. 28 n . IX do R egulam ento da O rd e m .
Ver, a este respeito, as discussões so b re a q u e stã o d o pa p el d e Levi C a rn eiro na criação da OAB.
" A t a d a re u n iã o o rd in á ria de 18 d e agosto d e 1938. CF/O AB.

7 08 •Al
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim e iro s Percursos c D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

D urante este período am pliaram -se as gestões para definir as novas insta­
lações do C onselho Federal. O presidente com u n icou que havia estado com o
m inistro da Justiça “tendo encontrado a m aior boa vontade para a concessão da
verba necessária para este fim . Foi-lhe comunicado ainda, terem sido tomadas
providências para que, no futuro Palácio da Justiça, sejam reservadas dependênci­
as p a ra a O rdem dos Advogados.” Os novos destinos da Ordem continuavam
a prevalecer.
N o entanto, apesar desta aparente calmaria, m esm o que de form a não
m u ito explícita, houve críticas às ações discricionárias do governo. Justo de
M oraes ao com entar a conferência proferida pelo professor H aroldo Valladão,
n o Instituto dos A dvogados, destacou o fato de, no estatuto do ju diciário p o r ­
tuguês, haver um a proibição de buscas em escritórios de advogados, salvo no
caso de crim e e com assistência de m em bro da O rdem . Sugeriu tam bém que o
DR. Valladão propusesse um a indicação ao C onselho para este fim. Foi a p o i­
ado pelo Dr Targino Ribeiro que m e n c io n o u a proposta feita p or ele n o C o n ­
gresso de D ireito Judiciário, tam bém a respeito de buscas e apreensões em
escritórios de a d v o g a d o s .T o d o s os tem ores revelaram-se mais tarde, de for­
m a m ais contundente.
Q uando, em 1939, o m u n d o entrou em guerra, o TSN teve u m papel mais
relevante, am pliando sua ação, absorvendo poderes do Superior Tribunal M i­
litar, c o m o o julgam ento de casos de espionagem e quaisquer outros relaciona­
dos com a guerra^^. A ordem colocou-se em relação aos aliados, m esm o que
estes pronunciam entos tenham se dado individualm ente. C om o contraponto
ao aum ento d o controle houve com entários e com parações no âm bito da OAB.
O Sr. N ilo Vasconcelos trouxe a notícia de um telegrama de Paris de que “a
ordem dos Advogados d a França funcionará naquela capital a despeito dos perigos
que oferecem as incursões dos aviões inimigos. D iante de tal exemplo o Dr. Justo de
MoraeSy numa das sessões do Conselho local, convocou os advogados brasileiros,
como os que têm responsabilidade na adm inistração pública, para m editarem so­
bre ele. O orador concluiu pedindo que conste de ata sua declaração de solidarie­
dade com esta manifestação que os m em bros do Conselho Federal apóiam indivi­
dualm ente.”

" A t a d a re u n iã o o rd in á ria d e 18 d e o u tu b r o d e 1938. CF/OAB


A ta da re u n iã o o rd in á ria d e 20 de ju n h o d e 1939. CF/OAB
^*Cf. E v a n d ro Lins e Silva. O salão dos passos perdidos, c p . cit,, p. 117.
A ta da re u n iã o e x tra o rd in á ria d e 19 d e se te m b ro d e 1939. CF/OAB

109
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Ao lo n go de 1940 discutiram -se as providências relativas ao fato das car­


teiras dos advogados se tornarem prova de identidade.” Também durante todo
o ano prom overam -se inúm eras hom enagens, criando-se um a com issão que
representaria a OAB junto à com issão organizadora que estava responsável pela
construção do m o n u m en to a Ruy Barbosa.^* Nesta m esm a sessão foi feito um
retrospecto sobre o instituto de Pensões e Aposentadorias dos Advogados, ten­
do D yonisio Silveira proposto ao presidente que exprimisse ao sr. ministro do
Trabalho vivo desejo com que o Conselho Federal espera ver a classe dotada de
uma organização de assistência eprevidência, m enção unanim em ente aprovada.
E mesmo dentro de um período de arbitrariedades, agravadas que foram em
função das novas prerrogativas do TSN, Getúiio patrocinou uma romaria cívica em
iiomenagem aos mortos no levante comunista de 1935, que teve larga adesão da soci­
edade.^ O Conselho Federal enviou seus representantes: Fernando de Mello Vianna,
presidente do Conselho Federal; Attílio Vivácqua, secretário-geral; Cristino Castelo
Branco; J. N . Máder Gonçalves; e Rego Lins. Mas as ações políticas não se sobrepu­
nham às razões de ordem prática. N a sessão ordinária de 10 de dezembro de 1940 o
conselheiro Rollemberg propõe que sejam notificados os Conselhos “para que de ora
em diante observem nas carteiras profissionais a função de carteira de identidade e que
[...] 0 Conselho está tomando as necessárias providências para o reconhecimento integral
destuprerrogativa l^aL” “ Na sessão de 17 de dezembro, Justo de Moraes, na ausência
justificada de Fernando de Mello Vianna, comunicou que, em face da deliberação do
Conselho Federal, declarando que as carteiras profissionais têm o mesmo valor de cartei­
ra de identidade, mandara publicar editais convidando os advogados a apresentarem
suas carteiras à respectiva secretaria, para as providências necessárias.^'
Após a derrota que im p ôs aos seus rivais - os ideólogos “extremistas” de
esquerda, o u com unistas; e de direita, os integralistas e os liberais de todos os
matizes, Vargas conseguiu o com ando de m aneira categórica. E, para isso, além
da suprema liberdade de legislar e do fato de estar o Judiciário co m a sua ação
cerceada em virtude do estado de emergência que vigorou durante todo o Esta­
do Novo, contou co m o precioso auxílio da polícia política e seu poderoso ser­
viço secreto de inform ações, do DIP, que im punha a censura prévia e enaltecia
os feitos do governo, e do DASP - órgão subordinado à presidência da Repúbli-

Ata da re u n iã o ex tra o rd in á ria d e 28 d e m a io d e 1940. CF/OAB.


^"Ata da re u n iã o ex tra o rd in á ria d e 18 d e ju n h o de 1940. CF/OAB.
” A ta da reu nião o rd in á ria de 26 d e n o v e m b ro de 1940. CF/OAB.
“ Ata d a reu nião o rd in á ria d e 10 d e d e z e m b ro d e 1940. CF/O AB.
" A t a d a reu nião o rd in á ria de 17 d e d e z e m b ro d e 1940. CF/O AB.

110
V o lu m e 4 C r i a ç ã o , P rim eiros Percursos o D e s a fio s ( 1 9 3 Ü -

ca, e criado em 30 de julho de 1938, com o objetivo de aprofundar a reforma


administrativa, destinada a organizar e a racionalizar o serviço público no país;
entre as suas finalidades, estava a prom oção, a seleção e o aperfeiçoam ento do
pessoal adm inistrativo por m eio da adoção do sistem a de m érito. O controle
do sindicalism o e a popularidade gerada pelas leis trabalhistas, notadam ente a
CLT, tam bém deixavam a figura do ditador em grande vantagem /^
Mas a década de 1940, que já se iniciara sob o estado de beligerância, pare­
cia ser som bria. Pelo m u n d o as democracias representativas e o que elas signi­
ficavam de mais caro, a liberdade, estavam am eaçados. As reações ao avanço
dos totalitarism os ressoaram ainda tim idam ente no Brasil. Em m aio e junho
de 1940, o C onselho Federal recebeu das Seções da Bahia, São Paulo, Piauí,
Pará, M inas Gerais e Sergipe, pedidos reiterados de que a O rdem , pelo seu ór­
gão m áxim o, solicitasse ao governo a consolidação das leis do país. Era um
prim eiro cham am ento.
O C onselho Federal já se mostrava mais aberto e disposto a discutir ques­
tões não necessariam ente atinentes aos objetivos da Ordem , além de tomar
para si a prerrogativa - exercida na m aioria dos. casos pelo C onselho da Seção
do DF - de representar ao governo sobre atentados e violências praticados sob
o escudo das leis autoritárias, m esm o que no início som en te em relação a advo­
gados, co m o no caso que ocorreu em novem bro de 1940, em que o Conselho
oficiou ao m inistro da lustiça e ao presidente da República condenando a ati­
tude do Interventor Federal do Acre que, am parado ilegalm ente por dispositi­
vo da Lei de Segurança recolhera à penitenciária o conselheiro José Lopes Aguiar,
que se achava no exercício de suas funções de advogado .
Os desdobramentos da 2.® Guerra Mundial, entretanto, ampliaram o leque.
Após o ataque japonês às bases americanas de Pearl Harbor e o posicionamento do
governo brasileiro ao condená-lo, o Conselho Federal deu início a uma intensa
campanha de apoio e solidariedade ao governo da República em face de sua atitude
diante da agressão imposta pelos países totalitários aos de regime democrático. Em
cada sessão se apresentava uma moção, o que ocorria igualmente com as Seccionais.
Segundo Letácio Jansen, a classe dos advogados deveria ser prestigiada e
defendida pela OAB contra aqueles que visavam, por tod os os m eios, tolher a

“ VferA República no Brasil. Â ngela de C a stra G om es, D u k e Pandolfi, V erena A lberti, co o rd e n aç ã o ; A m érico
Freire...(et ai.j Rio de Janeiro: N ova Fron teira: C P D O C ,2 0 0 2 e D icionário histórico-bibliográfico brasilei­
ro: 1930-1983. C o o rd e n a ç ã o d e Israel B eloch e Alzira Alves de A breu. R io de Janeiro: Ed. Forense U niver­
sitária: F G V /C P D O C : FINEP, 1984.
^^Atas da sessão do Conselho Federal d a O AB, 12 de n o v e m b ro d e 1940.

777
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

liberdade de açâo dos advogados. Essa era uma m anifestação contra a guerra
que acabava de atingir o país, “a política de força e de violência que estarrecia o
m undo com sua audácia e sua loucura’"^ . M as representava m uito mais, afinal,
existia um a ditadura. A posição do governo brasileiro em relação à guerra, por
isso m esm o, era bastante am bígua, definindo-se n o âm bito form al som ente
após o episódio do afundam ento de cinco navios brasileiros provocados por
subm arinos alemães, entre 5 e 17 de agosto de 1942. A pressão das m anifesta­
ções populares fez com que o país declarasse estado de guerra, ainda no mês de
agosto, ao lado dos aliados. A Ordem publicou seu pronunciam ento feito no
dia im ediato ao últim o ataque dos subm arinos alemães: “O Conselho Federal da
O rdem do Advogados do Brasil, solidário com o profundo sentim ento de revolta
da Nação diante da revolta do novo egravíssimo ultraje, praticado contra o Brasil,
confia mais nas enérgicas providências do Governo para o pleno desagravo da
honra, bandeira e independência nacionais^^^
O agravo foi realmente grande, m as no afã de representar ações contra o
inim igo com eteu-se algum exagero. C om o exem plo, destacamos o julgam ento,
n o C onselho do DF, do processo de exclusão do advogado de nacionalidade
alemã Peter Jurisch dos quadros da Ordem. O relator op in ou a favor, em vista
do decreto que declarou o Brasil na Guerra; Álvaro O nety de Figueiredo deu
seu voto n o sentido de ser o presidente da República consultado, porque no
referido decreto foram reservadas as m edidas em relação a assuntos dos países
do Eixo. Em discurso do dia 7 de setem bro de 1942, Vargas dissera que não se
deveria excluir o u expulsar do trabalho os hom ens de nacionalidade dos países
em guerra com o Brasil. E, tendo e m vista a portaria do m inistro do Trabalho
determ inando que não fossem dispensados empregados sem prévia autoriza­
ção do M inistério, o conselheiro votava contra a exclusão, porque não via peri­
go n o exercício da profissão do advogado em relação à Segurança N acional, e
entender que o governo tinha os m eios necessários para tornar inócua qual­
quer atuação. A decisão, entretanto, confirm ou o parecer do relator e a inscri­
ção de Peter Jurisch foi cancelada.
N o C onselho Federal, D io n ísio Silveira apresentou indicação na qual c o n ­
siderava o exercício da advocacia por súditos do Eixo, potencialm ente contrári­
os aos interesses da defesa e da segurança do país. Propôs que o C onselho Fede­
ral subm etesse à apreciação do governo a situação desses profissionais estran-

^*Atas da sessão da O AB /D F, 17 de d e z e m b ro de 1941.


‘'^Atas da sessão do Conselho Federal da O AB, 18 d e ag o sto d e 1942.

112
V o lu m e 4 C r i a ç ã o , P rim eiros Percursos e D e s a fio s d 9 ^ 0 - 1 9 4 5 )

geiros, encarecendo a consciência de lhes ser proibido advogar, enquanto d u ­


rasse 0 estado de guerra. N o seu entender, não poderiam continuar m ilitando
“com a mesma am plitude p erm itid a aos nacionais e aos naturais de países alia­
dos” sendo inadm issível que lhes fosse facultado o direito de discutir atos judi­
ciais dos juizes e tribunais nacionais, inclusive o Supremo Tribunal Federal.
N o caso hoje apreciado, o ilustre relator, Sr. O lím pio de Carvalho, reconhe­
ceu que não há lei proibindo a atividade profissional desses estrangeiros, m as en­
tende que 0 assunto deve ser previsto em norma legal, d e fo rm a a acautelar com ­
p letam en te 0 patrim ôn io e a segurança nacionais, p o r isso que, a té na produção de
provas e no exame dos autos, esses causídicos poderão prejudicar gravem ente os
interesses da economia na defesa do Brasil.^^
O Conselho Federal decidiu que deveriam ser mantidas as inscrições, ex<%to em
caso concreto de atentado à segurança nacional, acrescentando, entretanto, que não
seria compreendido que os brasileiros utilizassem os advogados “súditos do Eixo''.
Entretanto, a guerra agora contatava com a participação da Força Expedi­
cionária Brasileira, que em terras estrangeiras lutava contra os regimes fascis­
tas. A participação armada, n o conflito contra as potências do Eixo, não rendeu
frutos só para a econom ia. A lém de acender os fornos da siderúrgica de Volta
Redonda, alastrou pelo país o sentim ento libertário. Isso se fez sentir m uito
forte n o âm bito do C onselho Federal, que passou a denunciar perseguições e
prisões aos seus m em bros m ais engajados e que contestavam com m ais vigor o
regime. Cabe aqui acrescentar que, co m o Fernando de M ello Vianna, por m u i­
tas sessões dos anos de 1943 e 1944, teve que ser substituído por Augusto Pinto
Lima, presidente da Seção do DF, os dois C onselhos deliberaram juntos em
m uitos processos. Em 11 de agosto de 1944 se processaram as eleições no C on ­
selho Federal para o biênio 1944-1946, sendo eleitos para presidente Raul
Fernandes e secretário-geral, O sw aldo Trigueiro.
Perante o Tribunal de Segurança Nacional, os dois Conselhos apresentaram
defesa e se colocaram com o defensores não de um advogado, ou outro, processa­
dos por supostos delitos praticados no exercício da profissão, mas com o defensor
da classe. E em muitas ocasiões, partiram em com issões para diligenciar juntos
aos juizes do TSN. D ois casos da Seção do Ceará tiveram grande repercussão: o
primeiro, em relação à prisão do conselheiro Pedro de Alcântara Guimarães teve
solução rápida com a intervenção do conselheiro federal J. Murilo da Silveira. O
segundo envolveu Jader de Carvalho, vice-presidente da Seção, perseguido pelas

^''Atas da sesíão do Conselho Federal da O A B , 17 d e d e z e m b ro de 1942.

9ÀM
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

autoridades estaduais, preso no exercício da profissão em abril de 1944, condena­


do a vinte anos de prisão pelo TSN e libertado em m aio de 1945.
O Conselho Federal representou ao TSN exigindo garantias de ampla defe­
sa ao conselheiro preso, evitando que o patrono de sua causa sofresse qualquer
tipo de constrangimento que pudesse comprometer a sua atuação no caso. Tam­
bém designou o conselheiro N elson de Souza Carneiro para prestar assistência
em segunda instância na defesa de Jader de Carvalho e resolveu instaurar proces­
so disciplinar contra o prom otor H élio Carneiro Leal, pelas irregularidades que
praticou durante o processo. Por últim o, o Conselho oficiou ao M inistério da
Justiça sugerindo a conveniência de adaptar as leis relativas ao TSN a u m sistema
jurídico, sob o im pério de princípios que assegurassem o direito de defesa, e com
isso prestigiassem a dignidade das decisões daquele órgão julgador^^.
Adauto Lúcio Cardoso, na Seção da OAB/DF, com entou a atitude de exem ­
plar dignidade do C onselho Federal que unanim em ente protestou contra a
m onstruosa condenação de Jader de Carvalho a um a pena brutalmente inade­
quada com a infração atribuída a ele. C ongratulou-se com o C onselho pelo
'‘testemunho de independência e altivez do supremo órgão de defesa da classe, que
se demonstrava, assim, im une aos germes da decadência que nos últim os 14 anos
tinham atingido tantas forças vitais da nação". Foi então aprovado o v oto pro­
posto em louvor à atitude do C onselho FederaM . C ontudo, a ata que continha
esse pronunciam ento foi censurada e Adauto Lúcio Cardoso criticou a maneira
com o isso se processou. D e acordo com o conselheiro, seria demais que os cen­
sores da Imprensa N acional colocassem na boca dos m em bros do Conselho
Seccional pensam entos e frases que eles não disseram^’ .
A realização, em 1943, do 1.^ Congresso Jurídico N acional, fundam entou-
se na com em oração do prim eiro centenário da fundação do Instituto dos A d­
vogados e foi, possivelm ente, u m dos prim eiros m ovim entos de contestação
civil ao regime Vargas. Nele, discutiram -se a legitim idade do Estado N ovo e a
urgente necessidade de redemocratização. O C onselho Federal da OAB desig­
n ou uma com issão formada por D om in g os C. de Souza Leão, D em osthenes
Madureira de Pinho, O nofre M endes Júnior, A ugusto Pinto Lima e Arthur
Ferreira da Costa. Os conselheiros Adauto Lúcio Cardoso, A dolfo Bergamini e
André de Faria Pereira, representantes de M inas e d o D istrito Federal, por veri­
ficarem que o governo interferia n os pronunciam entos e tolhia todas as delibe-
Afas d a sessão do C o m elho Federal d a OAB, 31 d e o u t u b r o d e 1944.
da sessão d a O AB /D F, 8 de n o v e m b ro de 1944.
^^Atas da sessão d a O A B /D F , 6 de d e z e m b ro de 1944.

114 •Ál
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiros Percursos c D e s a fio s 11 9 3 0 - 1945)

rações do Congresso, retiram-se da representação da Ordem na C om issão de


Direito Constitucional, pelos m otivos constantes da com unicação dirigida à
C om issão Diretora daquele certame.
Na discussão que se processou n o C onselho Federal, A m érico M endes de
Oliveira Castro, do DF, apoiando a decisão, sustentou a im possibilidade da exis­
tência de u m Congresso Jurídico, onde se fazia necessária a m aior liberdade de
críticas, em u m regime que, por força de sua instituição, se via na contingência
de evitar a publicação da matéria debatida. Propôs voto de louvor pela atitude
assum ida pelos conselheiros n o Congresso. O dilon Braga falou que não p o d e­
ria ter outro desfecho o Congresso, porém , achava que talvez esta atitude dos
conselheiros, apesar de concordar com ela, poderia ser um a infração ao Regu­
lam ento, pois não era prudente envolver a responsabilidade do C onselho nos
atos praticados pelos conselheiros.
A atitude confígurou-se num dos antecedentes da elaboração d o M anifes­
to dos Mineiros^®, u m d ocum ento que explicitava as aspirações democráticas
de seus signatários, representantes não só do povo m ineiro, e exigia a libertação
do país do regime ditatorial. Os primeiros signatários foram justam ente os co n ­
selheiros que em protesto se retiraram do Congresso: Adauto Lúcio Cardoso,
A dolfo Bergam ini e A ndré de Faria Pereira; e foram segu id os por A stolfo
Rezende, Dario de Alm eida Magalhães, O dilon Braga e Pedro Aleixo.
Larga perseguição se processou a partir de então. Adolfo Bergamini sofreu,
juntamente com o presidente do Instituto dos Advogados da Bahia, violências por
parte da polícia baiana por ter feito uma conferência doutrinária no Instituto, e
respondeu a processo instaurado no TSN^'. Os advogados baianos, nesta ocasião,
em solidariedade aos advogados detidos, tornaram-se presos voluntários.
Edherval Figueiredo, da Seção do DP, foi preso no segundo regimento da
infantaria da vila militar, por tem po indeterminado e sem alimentação^^. Carlos
Bernardino Aragão Bozano, do Rio Grande do Sul, foi com pulsoriam ente afasta­
do da profissão^^. O C onselho im petrou ordens de habeas-corpus para garantir-
lhes a liberdade. Em 3 de outubro o Conselho Federal discutiu as violências de
que foi vítima o advogado e professor de direito pernambucano Nehem ias Gueiros.
Pedro Aleixo foi im pedido pela polícia de proferir palestra na Faculdade
de D ireito de São Paulo. Sobral Pinto foi im pedido de continuar a publicar no
’“In te g ra em anexo.
^ 'A ta s da sessão do Conselho Federal da O A B , 18 d e ju lh o de 1944.
^Mífls da sessão da O AB /D F, 9 d e fevereiro de 1944.
’^Atas da sessão da O A B /D F , 26 d e ju n h o de 1944.

775
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Jornal do C o m m erdo sua coluna que versava assuntos de natureza jurídica e,


sem nenhum a preocupação político-partidária, tam bém a natureza jurídica do
regim e instituído no Brasil pela C onstituição de 1937J* Esse caso teve ampla
repercussão na OAB. N a representação que Sobral encam inhou ao C onselho
Federal, para que se pronunciasse sobre a liberdade de crítica de problemas
jurídicos, o relator Dario de Almeida Magalhães teve aprovado seu parecer com
as seguintes conclusões: o C onselho deveria manifestar sua desaprovação ao
ato que im p ed iu o livre exam e doutrinário de um a questão jurídica, e de direi­
to público fundam ental; que m anifestasse o seu pesar por ver o Jornal do
C o m m erdo privado das crônicas de Sobral, co m prejuízo da cultura e do aper­
feiçoam ento das letras jurídicas do país; e, por últim o, que as deliberações do
C onselho fossem repassadas a todos os jornais, com votos para que a colabora­
ção do advogado fosse restabelecida, co m a plena segurança do livre exam e da
discussão doutrinária dos temas e problemas jurídicos de qualquer natureza/^
Em agradecim ento, Sobral Pinto apresentou m em orial sobre o caso na sessão
seguinte, acrescentando que na hora grave em que vivia a nação, era indispen­
sável que os juristas brasileiros pudessem exercer o direito de crítica e de debate
dos temas m ais importantes do Direito Público, porque grande ameaça pairava
sobre a soberania do país.
Sobral se referia à notícia inicialm ente denunciada pelo jornal carioca
Correio da M anhã, de que ura candidato à presidência norte-am ericana m ani­
festava a intenção de se apossar de bases estratégicas dos Aliados instaladas em
outros países. E acrescentava que o governo do Brasil não devia permitir que o
nosso território viesse a ser desm em brado para que nações, com indústrias e
arm am entos poderosos, se apoderassem “de pontos estratégicos adm iráveis do
nosso país, sobretudo para as rotas com erdais d a aviação do pós-guerraV^ Finali­
zou denunciando o posicionam ento de Assis Chateaubriand, que defendeu a
necessidade de bases interamericanas n o Brasil para a defesa continental.
Em sessão de 5 de dezembro de 1944, n o C onselho Federal, o incansável
Sobral Pinto denunciou a intervenção do governo de M inas Gerais no pleito
realizado para renovação do C onselho Seccional e a pressão exercida e m favor
de um a das chapas. A eleição foi anulada e o C onselho Federal n om eou o s sete

Para m e lh o r a p ro fu n d a r esta q u e stã o c o n su lta r a o b ra A República no Brasil, já citada, o D H B B . op. cit., e


H e r á d ito F o n to u r a Sobral Pinto. D o p r im a do do espírito nas polêmicas doutrinárias: as iras do sr. Cassiano.
R io d e Janeiro: Jornal d o C o m m e rc io , R odrigues & C., 1943, q u e é u m relato d e ta lh a d o d o caso.
^^Atas d a sessão do Conselho Federal da O AB, 27 de ju n h o d e 1944.
^^Atas da sessão do Conselho Federal da O AB, 18 d e ju lh o d e 1944.

776 •Ai
V o lu m e 4 C r i a ç ã o , P rim e ir o s Percursos o D esjitio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

m em bros eleitos pelo Instituto para com porem a diretoria provisória até a rea­
lização de novas eleições .
Ainda n o m esm o m ês, o escritório do conselheiro Evandro Lins e Silva foi
devassado, e revistado todos os seus arquivos por investigadores da polícia. Sem
nada encontrar que lhes servisse, levaram preso seu irm ão e colega de escritó­
rio, Sr. Raul Lins e Silva. Sobral Pinto requereu que o C onselho da Seção do DF
tom asse m edidas enérgicas contra este fato que, m ais que tudo, significava a
violação do segredo profissional do advogado, “sagrado em todos os tempos em
todos os po vos”. Augusto Pinto Lima declarou que entender-se-ia im ediatam en­
te com o chefe de polícia a fim de apurar as causas dessas providências e p ro ­
m over a defesa do colega violentado. Q uando Evandro Lins e Silva chegou à
sessão, inform ou que a polícia prom overa um a busca em seu escritório, e tam ­
bém realizou a prisão de seu irmão, alegando a existência de depoim ento de
u m preso, no qual afirmava ter entregue ao advogado um boletim contrário ao
governo .
Adauto Lúcio Cardoso, em 20 de dezem bro de 1944, com unicou ter tido
conhecim ento, por interm édio de pessoa fidedigna que, pedindo sigilo acerca
de seu nom e, declarou estarem detidos, desde m uitos dias, quatro advogados,
cujos n om es anunciou. Propunha que a presidência do C onselho do DF ficasse
autorizada a investigar sobre a realidade destas detenções, bem com o intervir
em favor dos m encionados colegas, se fosse o caso, de acordo com a concepção
de defesa da classe que tinha prevalecido no Conselho. Augusto Pinto Lima
declarou que tomaria providências junto às famílias dos advogados presos para
apurar a veracidade do narrado, b em com o junto às autoridades com petentes
da defesa dos colegas.
Na sessão seguinte, Augusto P into Lima com unicou aos presentes a prisão
d os conselheiros Adauto Lúcio Cardoso e D ario de Alm eida Magalhães, bem
com o dos doutores Virgílio de M elo Franco, Belarmino de Austregésilo de Ataíde
e Rafael Correia de Oliveira, não constando a existência de causa justificada
dessas prisões, o que levou à convocação de sessão extraordinária para que se
tom assem providências cabíveis e possíveis para a defesa dos presos. Inform ou
ainda que, tendo se com unicado com o presidente do C onselho Federal, Raul
Fernandes, este havia lhe delegado p lenos poderes para a solução do caso.

” Cf. Afuy da sessão do Conselho Federal da O A B , 17 e 24 d e ab ril de 1945.


’"Atas da sessão da OAB/DF, 13 d e d e z e m b ro de 1944. E m a nexo en c o n tra -se carta q u e So bral P in to escreveu
a M á r io B ulhões Pedreira re p lic a n d o a u m a e n tre v ista p o r cie co nce d id a a u m jo rn a l carioca re fu ta n d o
os c o nceito s nela em itid o s so b re o TSN.

777
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

O Conselho Seccional resolveu ficar em reunião permanente enquanto o


presidente Pinto Lima e os representantes do C onselho Federal, Oswaldo Tri­
gueiro, do lAB, Herm ano de Villem or Amaral e do Clube dos Advogados, Targino
Ribeiro, tomariam junto a quem de direito as providências necessárias. Impetrou-
se, então, habeas-corpus em favor dos presos, assinado por membros d o C onse­
lho e por advogados do foro do Distrito Federal, em núm ero de 92, e ofício soli­
citando providências ao chefe de polícia. N o dia 27, foi com unicado terem sido
soltos Adauto Lúcio Cardoso e Dario de Almeida Magalhães, obrigado este, bem
com o Austregésilo de Ataíde, porém , a permanecerem em Teresópolis durante
alguns dias até segunda ordem da polícia, e a sessão foi encerrada.
Em sessão do C onselho do DF de 3 de janeiro de 1945, Adauto Lúcio Car­
doso detalhou sua prisão e a preocupação que teve nessa ocorrência de som en ­
te apelar para o C onselho, a fim de que pelos m eio s legais e solidariedade de
seus colegas reagisse contra o ato que, sem m otivos de qualquer natureza, o
segregou do m eio social. D isse estar com sua consciência tranqüila, pois jamais
conspiraria contra o poder constituído, reafirmando sua fé nos princípios de­
m ocráticos. N a m esm a sessão, o conselheiro com unicou ainda estar presente o
advogado Gustavo Sim ões Barbosa, que estava preso sem qualquer m otivo e
p osto em liberdade tão lo g o foi seu n om e citado em ata dos trabalhos do C on­
selho. E Sobral P into apresentou proposta acerca da necessidade de se respeitar
à ordem jurídica, prestigiando o cidadão na segurança de seus direitos, e a jus­
tiça, no direito às suas decisões, garantindo im ediatam ente a restauração da
absoluta independência do poder judiciário.
Poucos dias depois, Adauto Lúcio Cardoso com unicou à Seccional terem
sido presos incom unicáveis os advogados Simão da Cunha Pereira e Humberto
Soares Pimenta, por ordem das autoridades do estado de Minas Gerais, salien­
tando a falta de justificativa para tais m edidas policiais. Foi aprovada a proposta
de se manifestar a solidariedade deste Conselho à Seção de Minas Gerais e aos
advogados, vítimas de prisão arbitrária e sujeitos a um a incomunicabilidade in ­
compatível com a dignidade da classe. Tão logo chegou às m ãos do governador
Benedicto Valadares o ofício enviado pelo Conselho, cessou a incomunicabilidade
dos advogados presos em Belo Horizonte. O próprio governador enviou ofício
inform ando terem sido postos em liberdade os advogados Simão da Cunha Pe­
reira e Hum berto Soares Pimenta, que foram presos sem comunicabilidade para
averiguações do envolvim ento em crime de natureza política.^

A tas da sessão da O A B /D F ,2 A de)aneÍTO a 21 de fevereiro de 1945.

118
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiros Percursos e D e s a fio s t l 9 ; U ) - T - M 5 I

O conselheiro, que ora representava o Distrito Federal, e ora o estado de


Minas apresentou uma página do Diário da Justiça de 2 de fevereiro de 1945, que
publicara a ata da 48" sessão extraordinária do C onselho do DF, realizada logo
após a sua prisão, em 22 de dezembro de 1944, que havia sido adulterada pela
imprensa nacional. O assunto foi discutido e considerado com o um ato lam entá­
vel e crim inoso de censura. O Conselho decidiu requerer as medidas necessárias
à punição do responsável, ou dos responsáveis, pela adulteração das atas, colo­
cando em prática os m eios legais; que se publicasse n o Jornal do Commercio todas
aquelas que tinham sido adulteradas ao ensejo da publicação no Diário da Justi­
ça; e que fosse enviado protesto ao chefe de governo e ao m inistro da Justiça.
E as perseguições contra advogados e opositores do regime não pararam.
Em 10 de janeiro de 1945, estando Oswaldo Aranha presente na Seção do DF
para prestar o com prom isso regulamentar de inscrição na Ordem, P into Lima
falou sobre as vantagens decorrentes da organização dos advogados, a seleção,
a defesa, e a disciplina da classe, m as deu destaque à posição da entidade com o
defensora do direito, da justiça e da liberdade. O swaldo Aranha já havia renun­
ciado ao cargo de m inistro das Relações Exteriores após o fecham ento, pelo
governo, de u m organism o de apoio aos Aliados - a Sociedade A m igos da A m é­
rica. O governo, aliás, co m o desenrolar da guerra e a certeza de vitória dos
Aliados estava já bem enfraquecido e isolado politicam ente. Para fazer frente às
pressões que recebia de todos os setores - principalm ente o militar, que esco­
lhera o brigadeiro Eduardo G om es com o sucessor de Vargas, em fevereiro da­
quele ano resolveu baixar a Lei C onstitucional n^ 9, que afirmava no preâm bu­
lo já haver as condições necessárias para que entrasse em funcionam ento o
sistema dos órgãos representativos previstos na Constituição.
Segundo a OAB, a citada Lei Constitucional procurava fazer sobreviver o regi­
m e totalitário contra as tradições e as tendências democráticas do povo brasileiro.
Contrariando as notícias dos jornais, que diziam ser u m membro da Ordem parti­
cipante da Comissão de Elaboração do novo Código Eleitoral - que marcava as
eleições para a presidência da República e o Parlamento no dia 2 de dezembro
daquele ano. Vargas poderia, entretanto, concorrer às eleições. Adauto Lúcio infor­
m ou ser isto incompatível com o posicionamento da Ordem, ao considerar ilegíti­
ma a Constituição de 1937 e, portanto, ilegítima a Lei Constitucional n^ 9.
E a OAB tin h a razão. As franquias d e m o c r á tic a s n ã o p o d ia m ser
restabelecidas sem que antes fossem recuperadas as liberdades públicas - que,

da sessão da O A B /D F , 1 de m a rç o de 1945.

•▲I T79
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

aliás, nunca estiveram asseguradas por leis de caráter excepcional. N enhum cida­
dão tinha qualquer garantia jurídica de direito à atividade política com a cons­
tante ameaça dos m ecanism os de arbítrio e leis de opressão: Lei de Segurança
Nacional, Tribunal de Segurança Nacional e Departamento de Imprensa e Pro­
paganda. Ademais, com o Executivo podendo editar e governar por decretos, não
havia nenhum a garantia de eleições livres, cujo processo transcorria em m eio à
p o ssib ilid a d e de d em issã o de fu n c io n á r io s p ú b lico s, civis e m ilitares, à
subalternização dos juizes e à elegibilidade dos agentes do poder ditatorial.
Mas a guerra chegava enfim ao seu termo. Em 11 de m aio, Pinto Lima
congratulou-se com o C onselho Federal pelo final da guerra na Europa, com a
vitória '‘das forças do bem e da civilização”. Disse interpretar o sentim ento de
todos desejando que, em um futuro próxim o, sobreviesse tam bém a derrota do
Japão, com o estabelecim ento com pleto da paz de que tanto necessitavam os
hom ens. Enalteceu os esforços das N ações Unidas, credoras da gratidão de todo
o m undo, e propôs, com aplauso geral, se lançasse u m voto de grande satisfação
pelo sucesso das armas aliadas e da Força Expedicionária Brasileira. O C onse­
lho resolveu ainda que fosse oficiado aos governos da Inglaterra, dos Estados
Unidos, da França, da Rússia e da China sobre a deliberação tomada.
O desfecho da guerra acentuou a mobilização da sociedade brasileira pela
redemocratização. Três partidos políticos, de âmbito nacional e que teriam gran­
de im portância até a ditadura seguinte, surgiram naquele m om ento: a U nião
D em ocrática Nacional (U D N ), que reunia grande parte das oposições e apoia­
va a candidatura de Eduardo Gomes; o Partido Social D em ocrático (PSD),
beneficiário da m áquina administrativa do Estado N ovo e que lançou o candi­
dato Eurico Dutra; e o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), que foi form ado a
partir da base sindical controlada por Vargas. Este grupo político iria, em se­
guida, juntamente com o Partido Comunista, na legalidade após a anistia prom o­
vida pelo D ecreto-lei n^ 7.474, de 18 de abril de 1945, iniciar o m ovim ento que
ficou conhecido c om o queremista: “Queremos Getúlio” e “Constituinte com Ge-
túlio'" eram suas palavras de ordem, em com ícios violentos.
A OAB apoiou inform alm ente a candidatura de Eduardo Gom es. Em ses­
são do C onselho do DF de 17 de outubro, Cid Braune disse que lera nos jornais
a notícia da existência, na tesouraria daquele Conselho, de um a lista de adesões
à candidatura do brigadeiro Eduardo Gomes. M anifestou estranheza pela n o tí­
cia, julgando que houvesse engano, porque ele, o tesoureiro, não autorizara a
colocação de lista alguma na dependência da Seção. D isse mais que, não p o ­

120 9ÀM
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiro s Percursos e DesaJios <1 9 3 0 - 19451

dendo a Ordem exercer atividades políticas, não se justificaria a existência da


lista na instituição. Adauto Lúcio Cardoso declarou que fora ele quem colocara
a lista na tesouraria, lugar onde habitualmente eram postas as listas de adesões
e que tinham interesses advogados militantes, esclarecendo que o docum ento
com eçara a correr em março, época em que a luta política apenas se iniciava.
Tendo em vista as proporções tomadas, entendia que a lista devia ser retirada, o
que só não ocorreu por "inadvertência s u a \ e o faria, fazendo igualmente pela
imprensa a com unicação respectiva. Foram aproximadamente 1.500 os advo­
gados que subscrevam a lista, encabeçados por Adauto Lúcio Cardoso, Augusto
Pinto Lima, Dario de A lm eida Magalhães, Sobral Pinto, Francisco Serrano N e ­
ves, Justo de M oraes, O dilon Braga, Targino Ribeiro e Jorge Dyott Fontenelle.
O m anifesto foi entregue ao Brigadeiro em cerim ônia realizada no Teatro M u ­
nicipal no Rio de Janeiro em outubro de 1945.
Pouco antes, o Conselho Federal se pronunciou contra o Decreto-lei n^ 7.666,
que dispunha sobre os atos contrários à ordem moral e econômica, por conside­
rar que 0 decreto era ofensivo à ordem pública, trancava as portas dos tribunais
às vítimas do poder, e prejudicava os interesses da classe dos advogados .
Em sessão do Conselho Federal de 28 de agosto. Augusto Pinto Lima falou
sobre cenas deprimentes que se passaram quando u m bando público, aos gri­
tos de '‘queremos Getúlio” apedrejou a Faculdade de Direito da Rua do Catete.
Protestou contra o lastimável acontecim ento, declarando que deixava (...) de
p edir outras providências, além do protesto que f a z (...) porque não quer d a r ao
triste acontecimento maiores proporções, bastando a repulsa pública já manifesta­
da em toda a imprensa livre.^^ Em outras ocasiões o Conselho Federal fez p ro­
testos contra atos de violência e vexames levados a efeito, por m otivos políticos,
contra advogados, professores e jornalistas.
Adauto Lúcio Cardoso referiu-se, em outra sessão, à m oção unanim em ente
aprovada no Conselho Federal da Ordem, em 18 de s e t e m b r o , q u e defendia a
ordem democrática e a soberania popular, considerando-a magnífica e ditada
por sadio patriotism o. D isse que a propaganda do partido com unista, financi­
ada pela ditadura, era até bem p ouco tem po dim inuta, tom ando, porém , d e­
senvolvim ento gigantesco. Concitava as massas populares para um com ício
m onstro e em que se exigiria do Catete a subversão do processo eleitoral. Sali­
entou que o m om en to era de reação contra esses abusos. Propôs que, a exem-
*'A ras da sessão do Conselho Federal da OAB, 26 d e ju n h o de 1945.
" A f a ; da sessão do Conselho fe d e ra l da OAB, 28 d e ago sto d e 1945.
da sessão do Conselho Federal da O A B , 18 d e se te m b ro d e 1945.

121
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

plo do Conselho Federal, o C onselho da Seção se dirigisse aos chefes militares,


entidades culturais, congregações de escolas, organizações estudantis, autori­
dades judiciárias e eclesiásticas, órgãos representativos das classes liberais, de
escritores e jornalistas, pedindo-lhes que som assem suas vozes autorizadas à
campanha nacional pelo respeito da legislação eleitoral^.
Ainda n o m ês de setembro Sobral Pinto publicou u m artigo n o Jornal do
Commercio, n o qual expunha suas duras críticas a Getúlio;

[...] A ambição, porém p o d e m as do que o dever. O E x.m o Sr. Getúlio Vargas,


no dia 10/11/19 37 esqueceu para seu deslustre que o exemplo de obediência
à Constituição e às leis deve p a rtir precisamente do chefe de Estado. D om i­
nado pelo dem ônio do mando e do orgulho, S. Ex° não trepidou na hora mais
negra da sua carreira política em se afastar deliberadamente do caminho
austero da legalidade, ousando praticar o m aior crime político da nossa his­
tória cívica, e que era assim definido no art. 5 7 da Constituição de 16/07/
1934 —São crimes de responsabilidades os atos do presidente da República,
definidos em lei que atentaram contra a existência da União, a Constituição
e a form a de governo federal, o livre exercício dos poderes políticos.

Na OAB as m oções se sucediam. Um a delas, aprovada unanim em ente pelo


Conselho Federal, proclamava que o governo, co m o D ecreto-lei n^ 8.063, de 10
de outubro de 1945, infringira a legislação eleitoral co m afronta aos mais sa­
grados direitos do p ovo brasileiro. O decreto antecipava as eleições para gover­
nadores e assembléias legislativas dos Estados para o dia 2 de dezembro, con ­
juntamente com as de presidente da República, C onselho de Estado e Câmara
dos Deputados, com a possibilidade de reeleição dos interventores e a outorga,
dentro de 20 dias da publicação do Decreto, das cartas constitucionais dos Es­
tados respectivos. Sobral Pinto leu então, no plenário do C onselho Federal, ex­
posição em que refutou os argumentos do m inistro da Justiça que procuravam
demonstrar que o decreto-lei não infringia a Lei C onstitucional n° 9.
Nesta ocasião, Pinto Lima afirmou que considerava os advogados em cru­
zada, apelando para que todos eles decididamente se empenhassem na campa­
nha de reintegração do país no regime da lei e do direito ^ . Esse decreto signifi-

*^Aias da sessão da O A B /D F , 19 d e se te m b ro d e 1945.


'^ A rtig o d e Sobral P in to n o Jornal do Cotnmercio, n a co lu n a Pelos d o m ín io s do Direito, in titu la d o O governo
de fa to e o direito cristão, em 1“ d e se te m b ro d e 1945, p. 2.
da sessão do Conselho Federal da O A B , 16 d e o u tu b ro d e 1945.

722
V o lu m e 4 C ria ç ã o . P rim eiro s Percursos o D e s .itios ( 1 9 1 U - 1 9 4 5 )

cou o golpe de m orte para Getúlio porque acelerou as articulações conspiratórias


entre o ministro da Guerra, general Góes Monteiro e o candidato do PSD à pre­
sidência da República Eurico Dutra, para retirá-lo d o poder. Q uando Vargas, em
25 de outubro, nom eou para a chefia de Polícia do Distrito Federal seu irmão
Benjamim Vargas, circularam os rumores de que preparava novo golpe para per­
manecer no poder, porque, ao assumir o cargo. Benjamim prenderia todos os
generais que estivessem conspirando contra o regime. Dias depois, em 29 de o u ­
tubro, Getúlio Vargas foi deposto pelo Alto C om ando do Exército.
N o dia 30 de outubro, o Conselho Federal aprovou m oção congratulatória
proposta por Raul Fernandes, referente ao térm ino do regime ditatorial e à
posse de José Linhares, presidente do STF, n o governo da República:

A O rdem dos Advogados saúda com profunda emoção a entrega do Poder


Executivo ao presidente do Supremo Tribunal Federal, ocorrida esta noite.
(...) É um prim eiro passo para a reentrada do Brasil na ordem e na legalida­
de; m as este prim eiro passo fo i dado com tal firm eza, com tanto decoro, sob
inspiração tão patente do mais puro e desinteressado devotam ento aos inte­
resses nacionais, que justifica a mais confiante segurança de que outros hão
de seguir para recompor a verdadeira fisionom ia de nossa Pátria, grosseira­
m ente deformada pelo regime execrado sob o qual temos vivido, oprimidos e
humilhados, desde o golpe soturno de 10 de novembro de 1937.(...) Honra as
Forças A rm adas que, ainda uma vez, no curso da história se mostraram com-
p a rte sd o nosso destino e servidoras da comunidade. (...) A Ordem dos A dvo­
gados se associa ao júbilo nacional consciente de não haver faltado aos seus
deveres durante os anos atormentados do regime ditatorial, e exprime os mais
ardentes votos à D ivina Providência para que, sob a égide da lei, a p a z e a
fraternidade reinem sobre os brasileiros.^^

Raul Fernandes, representando o Conselho Federal da OAB, esteve, às 16 h o ­


ras do dia 30 de outubro, presente à posse de José Linhares na presidência da Repú­
blica. Vale acrescentar que poucas instituições foram convidadas para este ato.
O C onselho Federal ainda se pronunciaria sobre o D ecreto-lei n® 8.403, de
20 de dezem bro de 1945, pedindo sua imediata revogação, por considerá-lo
atentatório, não som ente aos direitos da classe dos advogados, com o tam bém
da própria dignidade da magistratura. Tam bém decidiu fazer veem ente apelo

A ta s da sessão do Conselho Federal da O AB, 30 de o u tu b ro d e 1945.

•Al 123
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

ao presidente José Linhares, e ao m inistro da Justiça, Sampaio Dória, para que


fossem deixadas de lado as práticas legislativas usadas pelo governo deposto,
circunscrevendo-as aos interesses públicos imediatos.** Neste m esm o dia, apro­
v o u a indicação substitutiva à proposta de Alcino Salazar sobre a elaboração do
anteprojeto de Constituição que vigoraria em substituição à de 1937 nos se­
guintes termos:

A Ordem dos Advogados, desconhecendo aos governos de fato o p o d e r consti­


tuinte e, condenando não só p o r isso, mas tam bém p o r sua própria substân­
cia a Carta Constitucional de 1937, representa ao governo sobre a conveni­
ência de revogar essa Carta e, ouvido o Presidente da República eleito, decre­
tar um ato orgânico que autolim ite as atribuições do governo, até que se
decrete a Constituição e o Parlamento, j á eleito, assuma as suas funções de
legislatura ordinária; reportando-se esse ato orgânico, como norma fu n d a ­
mental, à Constituição de 1934, salvo as derrogações impostas pela carência
de um Poder Legislativo ordinário, de m odo a se investir o governo dos pode­
res indispensáveis ao provim ento do interesse geraV^

Em abril, na primeira sessão do C onselho Federal do ano de 1946, apro-


vou-se voto de regozijo pela abertura do Poder Legislativo da RepúbUca, com a
instalação, e m 1- de fevereiro de 1946, da Assembléia Constituinte, que seria
presidida por Fernando de M ello Vianna, m em bro honorário da entidade. A
realização da Assembléia marcou o fim de 15 anos de ditadura de Vargas.

**0 D ecreto-lei n= 8.403 revogava o item V I I - “O s m a g istra d o s ap o se n ta d o s, o u e m in a tiv id a d e r e m u n e r a ­


da, n o te rritó rio sujeito à ju risd iç ã o d o ju íz o o u trib u n a l e m q u e te n h a m fu n c io n a d o , até d o is an os
d e p o is d e seu a fa sta m e n to , c o m p re e n d e n d o - s e nessa p ro ib iç ã o a em issã o de p a re c e i so b re causas em
a n d a m e n to o u a serem p ro p o s ta s n o d ito te r r itó r io ” - , d o art. 1 1 q u e tratava d o s im p e d id o s de p ro c u r a r
e m juízo, da con so lid aç ã o dos dispositivos re g u ia m e n ta re s d a O rd e m d o s A dvogados d o Brasil. Ver ta m ­
bém D ecreto-lei n “ 4.803, d e 6 de o u tu b r o d e 1942.
da sessão do Conselho Federal da O A B , 26 d e d e ze m b ro d c 1945.

724 •àl
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiro s Percursos o D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A criação da O rdem dos Advogados do Brasil, por m eio do Decreto


19.408, de 18 de novem bro de 1930, deveu-se a um a iniciativa do então procu-
rador-geral d o Distrito Federal, o D r. André de Faria Pereira. C om o ele m esm o
fez questão de esclarecer, encarregado pelo ministro da Justiça, o D r. Oswaldo
Aranha, de preparar a m inuta do projeto que reorganizava a Corte de Apelação
do Distrito Federal, em butiu no referido docum ento u m dispositivo, o de
núm ero 17, que instituía a Ordem.
Durante muito tempo, por sinal, o estabelecimento da entidade seria atribu­
ído a personagens e instituições diversas. Houve quem a imputasse ao Instituto da
Ordem dos Advogados Brasileiros, ao qual a OAB esteve intimamente articulada
nos primeiros tempos. Houve, também, quem a atribuísse ao Dr. Levi Carneiro, seu
primeiro presidente, a exemplo do advogado Antônio Baptista dos Santos, em pro­
nunciamento realizado no Conselho Federal em 1938. Levi Carneiro, por sua vez,
em parecer por ele exarado em 15 de novembro de 1931, creditou-a à Revolução de
30, pois no seu entender a Ordem constituía uma das medidas revolucionárias que
deveriam contribuir para remodelar a nacionalidade.
Para André de Faria Pereira a criação da Ordem parecia um milagre, pois,
se por um lado, o Governo Provisório desprezara boa parte da Constituição de
1891 e decretara a falência das instituições democráticas, concentrando nas mãos
de Getúlio Vargas formidável som a de poderes, por outro, uma semana mais
tarde, em 18 de novem bro, concedia à classe dos advogados, prerrogativas de se
auto-regulamentar, exim in d o-os da centralização dominante.
Contudo, o exame da documentação disponível e a respectiva contextualização,
aliado ao estudo das posições ocupadas no jogo político pelos principais atores
envolvidos naquele episódio, nos levam a supor que o milagre não foi tão extraor­
dinário quanto parece. A questão já vinha sendo encaminhada no lOAB, que con­
siderava a criação da Ordem com o uma possibilidade muita próxima, no bojo das
reformas do Poder Judiciário, anunciado por Vargas, no seu Programa de Recons­

7 25
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

trução Nacional. A grande surpresa, por certo, foi a iniciativa do procurador Faria
Pereira que, por obra do destino, acabou precipitando os acontecimentos.
Se, por u m lado, é im portante reconhecer com o fundamental o estratage­
m a urdido por Faria Pereira, por outro, é inquestionável o papel desem penha­
do por Levi Carneiro e Attílio Vivácqua n o processo de consolidação da Ordem
dos Advogados. Reeleitos sucessivamente, eles permaneceriam à frente do C on ­
selho Federal por três m andatos consecutivos. As gestões de am bos concentra­
ram-se, sobretudo, nas tarefas de organização da instituição, a exem plo das
questões relativas à interpretação do Regulamento, ao ordenam ento das seções
estaduais, à organização do Serviço de Assistência Judiciária, à elaboração do
Código de Ética e à participação da OAB na Assembléia Constituinte de 1934.
A Ordem dos Advogados do Brasil m anteve com o Governo Provisório
relações cautelosas, consoante o Regulamento que vedava à diretoria, ao conse­
lh o e à assembléia qualquer discussão o u m anifestação sobre matéria não
atinente aos objetivos da corporação. D e u m m o d o geral, pode-se dizer que
esse escudo fora passado à Ordem pelo Instituto da Ordem dos Advogados
Brasileiros, que tam bém proibia os sócios de se pronunciarem sobre assuntos
de natureza política
Entretanto, apesar desse dispositivo, desde o início do Governo P rovisó­
rio, no C onselho Superior do Instituto, por reiteradas vezes, as vozes se er­
gueram a favor da volta do regim e constitucional, o m esm o não acontecendo
em relação à OAB - representada na ocasião pelo C onselho da Seção do D is ­
trito Federal, que funcionava tam bém c o m o C onselho Federal interino. Essa
conduta contraditória n o s perm ite inferir que, para preservar as prerrogati­
vas conquistadas com a criação da Ordem , os h om en s que estavam à frente
das duas instituições teriam adotado, estrategicam ente, um com portam ento
ambíguo: na Ordem , defendiam som ente os interesses da classe dos advoga­
dos, m anifestando neutralidade e preocupação em zelar pelo b om exercício
profissional dos bacharéis, en quanto n o Instituto, os m esm o s indivíduos
em itiam pronunciam entos de natureza política, respeitosos por certo, mas
beirando as raias do enfrentam ento co m os poderes constituídos. Aliás, essa
m esm a estratégia vai se repetir posteriorm ente, durante o Estado N ovo, entre
o Conselho Federal e a Seccional do Rio de Janeiro, que por vizinhança nas
instalações e com partilham ento de sessões, funcionavam juntas, m as delibe­
ravam autonom am ente.

726
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P r im e ir o s P e r c u r s o s o D e s n t i o s 119 3 0 - 19 4 5 )

A Constituição de 1934, da qual a Ordem foi signatária, por m eio de seu


presidente Levi Carneiro, deputado classista, revelou-se cada vez mais vulnerável
aos ataques de seus opositores, enquanto o executivo federal empenhava-se em
constituir u m projeto de lei que lhe permitisse maior controle político, consoante
os m odelos autoritários da época. Assim, a Lei de Segurança Nacional am pliou a
repressão aos dissidentes do regime, com o foi o caso, dentre outros, de Luiz Carlos
Prestes. Neste contexto, avulta o papel de Sobral Pinto, crítico contumaz do regi­
m e discricionário de Vargas. N om eado pelo próprio C onselho com o advogado
ex-ojfícioy teve brilhante atuação junto ao Tribunal de Segurança Nacional, outro
sím bolo da arbitrariedade em tempos da concentração de poder. Destacando-se
pelo papel desempenhado na defesa de Luiz Carlos Prestes e Harry Berger, entre
outros. Sobral se mantém com o um exemplo emblemático de defensor dos prin­
cípios do Direito e da liberdade dos indivíduos.
O golpe de 10 de novem bro de 1937, que instituiu o Estado N ovo, daria
m argem a representações diversas no âm bito da OAB, culm inando com a con ­
vocação do 2^Congresso Jurídico Nacional em 1943, a propósito de celebrar o
centenário da fundação da casa de M ontezum a. Este evento extrapolou o â m ­
bito da cultura jurídica, e tornou-se, possivelmente, u m dos primeiros m o v i­
m entos de contestação civil ao Estado N ovo. A partir daí, acentua-se a atuação
da Ordem em favor das liberdades, e da restauração do estado de Direito. Der­
rubada a ditadura, a Ordem prosseguiu na luta pela volta à democracia e o
restabelecimento da ordem jurídica. N ão por acaso, a Assembléia Constituinte
de 1946 seria presidida por Fernando de M ello Vianna, m em bro honorário e
ex-presidente da OAB.

127
____________________ H i . s t ó r i a d a
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

128 mâA
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiros Percursos c D esiitio s i l 9 . ) 0 - 194:,)

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Atas das Sessões (1930-1945)

1.3 lO A B /IN S T IT U T O D A O R D E M D O S A D V O G A D O S BRASILEIROS

Livro de A tas (1930-1945).


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1.4 IN S T IT U T O H IS T Ó R IC O E G E O G R Á F IC O BRASILEIRO

Coleção Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro


Coleção José Carlos Rodrigues

2 . IMPRESSOS
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de 14 de dezembro de 1931, n° 21.592, de 1 de julho de 1932, n° 22.039, de 01 de
novembro de 1932, e n° 22.266, de 28 de dezembro de 1932).

•ÁB 129
______________Historia da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

2 .2 . lO A B / IN S T IT U T O D A O R D E M D O S A D V O G A D O S BRASI­
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V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiros Percursos e Dcsdíios. - 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

ÍNDICE ONOMÁSTICO

Albuquerque, O lím pio Sá e, 91


Aleixo, Pedro, 115
Almeida, José A m érico de, 6 1 ,1 0 0
Amaral, H erm ano de Villemor, 103,118
Andrada, A ntônio Carlos de, 26, 6 1 ,6 5 , 77
Andrade, Carlos D ru m m o n d de, 16, 20
Aragão, Francisco Alberto de, 24
Aranha, O swaldo Euclides de Sousa, 9 ,1 0 ,2 2 ,2 3 , 2 4 , 2 6 ,2 7 ,4 3 ,5 0 ,6 1 ,6 9 ,
1 0 6 ,1 1 9 ,1 2 5
Araújo, Nabuco de, 24
Assis, Jacy de, 39
Assunção, Pam philo de, 51, 52
Ataíde, Belarmino de Austregésilo de, 117,118
Ataíde, Tristão de [Alceu A m oroso Lima, d ito ], 93

Barbosa de Oliveira, Ruy, 2 8 ,1 1 0


Barbosa, Ary Cunha, 63
Barbosa, Gustavo Sim ões, 118
Barreto, Frederico Barros, 9 8 ,1 0 3
Barreto, Plínio, 40, 62

141
______________H istória da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Barros, D urval M iguel de, 94


Basto, Alberto Lemos, 102
Bastos, Abguar, 8 5 ,9 7
Benjamim, Altino Cabral Botelho, 46
Bergamini, Adolfo, 8 2 ,8 4 , 8 5 ,1 1 4 ,1 1 5
Bernardes, Artur da Silva, 5 9 ,6 1 , 7 7 ,7 8 ,9 1
Bernardes, Iberê, 63
Bernardes, Gabriel, 31, 3 9 ,4 5
Bittencourt, A ntônio Baptista, 8 4 ,1 0 3 ,1 0 7
Bittencourt, Renato, 63
Bonfim , A ntônio Maciel, 83
Borges de Medeiros, A ntônio Augusto, 59, 77, 78
Borges, Pedro, 102
Bozano, Carlos Bernardino Aragão, 115
Braga, A ntônio Pereira, 31, 39, 51
Braga, Cincinato, 77
Braga, O dilon, 69, 8 2 ,1 0 0 ,1 1 5 ,1 2 1
Branco, Cristino Castelo, 110
Brás, Venceslau Pereira G om es, 61
Brasil, Assis, 2 3 ,7 7
Braune, Cid, 120
Brito, Lemos de, 78
Butel, Walter Gastão, 70

c
Calógeras, Pandiá, 77
Camargo, Laudo, 101
Campeio, Barros, 94
Cam pos, Francisco [Chico], 2 0 ,2 1 ,2 3 ,4 2 ,9 3 ,1 0 0
Capanema, Gustavo, 65
Cardoso, Adauto Lúcio, 1 1 ,1 1 4 ,1 1 5 ,1 1 7 ,1 1 8 ,1 1 9 ,1 2 1
Carneiro, Edgard Ribas, 3 0,31
Carneiro, Levi, 10,16,22,25,26,28,29,30,31,32,33,34,37,38,39,40,41,42,43,
44,46,47,48,51,56,64,66,67,68,70,71,72,73,74,75,76,79,92,107,108,125,126,127

142 QàM
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim e iro s Percursos e D e s d íio s - 194o)

Carneiro, N elson de Souza, 113


Carrilho, Elviro, 43
Carvalho, Jader de, 1 13 ,114
Cascardo, Herculino, 91
Castelo, Vianna do, 5 0 ,9 3
Castro, A m érico M endes de Oliveira, 115
Castro, Orlando Ribeiro de, 101
Cavalcanti, Amaro, 49
Cerqueira, Mayr, 86
Chateaubriand, Francisco de Assis, 9 2 ,1 1 6
C herm ont, Abel, 8 5 ,9 5 ,9 7
C ontinentino, M úcio, 94
Corrêa, Adalberto, 93
Corrêa, Sampaio, 7 7 ,7 8
Cortez, Amarílio Vieira, 102
Costa, Arthur Ferreira da, 114
Costa, Carlos, 93
Costa, Penna e, 89
Costa, Edgard, 23
Cunha, Francisco Solano Carneiro da, 10, 2 2 ,2 4
Cunha, José A ntônio Flores da, 59-60, 6 5 ,1 0 0
Cunha, Paulo Faria da, 94

Dória, M oitinho Antonio, 31, 39


D ória, Sampaio, 124
Dutra, Eurico Gaspar, 1 0 0 ,1 2 0 ,1 2 3
Duvivier, Eduardo, 50

Ewert, Arthur Ernest [Harry Berger], 11, 83, 88, 8 9 ,9 5 ,9 6 ,9 8 ,9 9 , 127

GAB 143
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Faria, Zeferino de, 39, 70


Fernandes, Adalberto, 94
Fernandes, Raul, 12, 68, 7 7 ,8 2 ,1 1 3 ,1 1 7 ,1 2 3
Ferreira, Alceu de Sá, 63
Ferreira, Gualter, 2 4 ,2 5 ,2 7 ,3 0 , 3 1 ,3 2 , 39
Figueiredo, Ederval, 115
Fontenelle, Jorge Dyott, 89,121
Franco, Afonso Arinos de Melo, 1 6 ,26 , 59, 60
Franco, Afrânio de M elo, 2 3 ,2 6 , 5 9 ,6 0 ,6 1 , 69
Franco, Virgílio de M elo, 6 1 ,1 1 7
FreitaSy Augusto Teixeira de, 48

Ghioldi, R odolpho, 8 3 ,9 4
Gil, Otto, 63
Gomes, Eduardo, 119,120
G om ide, Paulo, 92
Gonçalves, ]. N . Máder, 110
Gonçalves, Sócrates, 94
Gueiros, N ehem ias, 115
Guimarães, H on ório de Freitas, 8 8 ,8 9
Guimarães, Pedro de Alcântara, 113
Guimarães, Protógenes Pereira, 7 9 ,9 1 ,9 2
Gustavo, N elson de N oronha, 40

Haas, George, 108

144
V o lu m e 4 Cricição, P rim e iro s Percursos o Dcscitios (1 9 ) 0 - 19 4 o

Jansen, Letácio, 2 5 ,3 2 , 5 7 ,9 4 ,1 0 5 ,1 1 1
Jordão, Edm undo de Miranda, 30, 31, 32, 3 9 ,4 6 , 56, 70
Jurisch, Peter, 112

Kelly, José Eduardo do Prado, 2 5 ,6 9 ,7 7 ,7 9 ,1 0 1

Lagreca, José, 48
Leal, H élio Carneiro, 114
Leão, D o m in gos C. de Souza, 114
Leite, Carlos da Costa, 88, 89
lím fl, Augusto Pinto, 2 5 ,5 0 , 5 7 ,6 3 ,8 4 ,8 5 , 8 8 ,9 3 ,1 1 3 ,1 1 7 ,1 1 8 ,1 1 9 ,1 2 0 ,
1 21,122
Lim a Sobrinho, Barbosa, 29
Linhares, José, 1 2 ,1 2 3 ,1 2 4
Lins, Alberto Rego, 45, 57, 8 6 ,1 1 0
Lobato, Francisco de Paula Negreiros de Sayão, 49
Luís Pereira de Souza, Washington^ 20, 2 2 ,2 6 , 50, 5 9 ,7 8 ,9 1 ,9 3

M acedo, Sérgio, 32
Machado, Raim undo Lopes, 93
Maciel, Antunes, 65
Maciel, Olegário, 20, 21
Magalhães, Dario de Almeida, 11, 1 1 5 ,1 1 6 ,1 1 7 ,1 1 8 ,1 2 1
Mangabeira, João, 8 5 ,9 7
Mangabeira, Otávio, 77, 78, 79, 80

•▲B 145
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Marinho, Saldanha, 24
Martins Costa, 70
Massena, Nestor, 6 3 ,1 0 6
Mattos, Leônidas Anthero de, 4 4 ,4 5 ,4 6
M aximiliano, Carlos, 6 8 ,7 7
Medeiros N eto, A ntonio Garcia, 6 9 ,7 4 ,7 9
Medeiros, Borges de, 5 9 ,7 7 ,7 8
Medina Filho, José, 94
Meirelles, Ilvo Furtado, 8 8 ,8 9
M ello, Figueira de, 86
Mello, Leopoldo Tavares da Cunha, 47, 69
M ello, Lineu de Albuquerque, 84, 88
M endes de Almeida, Cândido, 32, 39, 51
M endes Jr., Onofre, 114
Menezes, Rodrigo Octavio Langaard de, 27
Miranda Jordão, Edm undo de, 30, 31, 32, 3 9 ,4 6 , 56, 70
Miranda, Álvaro, 6 3 ,1 0 2
Miranda, Pontes de, 78
Monteiro, Góes, 100,123
M ontezum a, Francisco Gê de Acaiaba e, 24
Moraes, Justo M endes de, 24, 39, 6 3 ,9 2 ,1 0 7 ,1 0 9 ,1 1 0 ,1 2 1
Moreira, Roberto, 78
Mourão, João Martins de Carvalho, 57
M oyano, Augustin, 53
Müller, Filinto, 100

Neves, Francisco Serrano, 121


Neves, João, 7 7 ,8 6
Neves, José Rodrigues, 86, 8 8 ,1 0 6

146
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiro s Percursos e D e s a fio s 11 5 0 - 1 94->)

Oliveira, A rm ando Sales de, 100


Oliveira, Rafael Correia de, 117
Onety, Álvaro, 8 9 ,1 1 2

Peçanha, Nilo Procópio, 59


Penna Jr., Afonso, 9 1 ,9 3
Pereira, André de Faria, 9, 10, 15, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 30, 31, 114, 115,
1 2 5,126
Pereira, Bulhões, 50
Pereira, Eurico de Sá, 32, 50, 5 6 ,5 8 ,6 2 ,6 4
Pereira, Simão da Cunha, 118
Pila, Raul, 59
Pimenta, H um berto Soares, 118
Pinho, D em óstenes Madureira de, 114
Pinto, H erádito da Fontoura Sobral, 1 1 ,1 2 ,1 6 ,1 7 ,6 3 ,8 8 ,8 9 ,9 0 ,9 1 ,9 2 ,9 4 ,
95, 97, 9 8 ,1 0 2 ,1 0 3 ,1 0 5 ,1 0 6 ,1 0 7 ,1 1 6 ,1 1 7 , 1 1 8 ,1 2 1 ,1 2 2
Pinto, Idalina Sobral, 90
Pinto, Priamo Cavalcanti Sobral, 90
Portella, Bartolomeu, 51
Prestes, Luís Carlos, 11,82, 88, 8 9 ,9 5 , 9 7 ,9 8 ,9 9 , 103, 127

Quadros, Miguel, 70

Ramalhete, Ubaldo, 108


Ramos, Graciliano, 98, 99

747
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Ramos, Nereu, 69
Rao, Vicente, 6 2 ,8 1 , 8 2 ,9 7 ,1 0 0
Rego, Ricardo, 30
Rezende, Astolfo, 3 0 ,1 1 5
Rezende, Murgel de, 32
Ribeiro, Raul da Cunha, 89
Ribeiro, Targino, 1 1 ,63, 85, 89, 9 2 ,9 3 ,9 4 ,9 8 ,1 0 9 ,1 1 8 ,1 2 1
Rocha, Lauro Reginaldo da, 88, 89
Rocha, Lima, 63
Romeiro Netto, João, 89
Roselli, Alberto, 69

s
Salazar, Alcino, 124
Salgado, Plínio, 100
Santos, Adelino D eicola dos, 88, 89
Santos, A ntônio Baptista dos, 1 0 ,2 2 ,1 0 8 ,1 2 5
Seabra, José Joaquim, 77
Silgueira, H onório, 53, 54
Silva, Evandro Lins e, 11,17, 84, 87, 8 8 ,9 7 ,1 0 9 , 117
Silva, João Clím aco da, 105,106
Silva, Raul Lins e, 117
Silveira Martins, 63
Silveira, D ionísio, 110,112
Silveira, J. M urilo da, 113
Silveira, Otávio da, 8 5 ,9 7
Soares, José Carlos de Macedo, 97
Souto, Aarão Moraes, 98
Souza, A ntônio, 63
Souza, Mário de, 94
Souza, Washington Luís Pereira de, 2 0 ,2 2 , 2 6 ,5 0 ,5 9 , 7 8 ,9 1 ,9 3

148
V o lu n iu 4 C r ia ç ã o , P rim eiro s Percursos c D e s a fio s i SO - T^)4.i)

Teixeira, Francisco Alberto, 15


Tim poni, Miguel, 89
Tolentino, íosé, 59, 60
Torres, Alberto de Seixas Martins, 2 9,61
Torres, M agarino, 5 1 ,5 3
Trigueiro, Oswaldo, 1 13,11 8

Valadares, Benedito, 6 9 ,1 1 8
Valente, M anuel, 94
Valladão, Haroldo, 1 1,22, 3 2 ,7 0 ,7 1 , 109
Vallé, Leon, 88, 89
Vargas, Benjamim, 123
Vargas, Getülio Dornelles, 10. 1 2 ,1 6 ,1 7 ,1 9 , 20, 22, 2 3 ,2 4 , 25, 2 6 ,2 7 , 29,
3 1 ,3 8 ,4 0 ,4 2 ,5 6 ,5 7 ,5 9 ,6 0 ,6 1 ,6 4 ,6 6 ,6 7 ,6 8 ,6 9 .7 4 ,7 5 ,7 8 ,7 9 ,8 0 ,8 3 ,8 4 ,8 6 ,9 3 ,
9 7 ,9 9 ,1 0 0 ,1 0 2 ,1 0 5 ,1 0 6 ,1 1 0 ,1 1 2 , 1 1 9 ,1 2 0 ,1 2 1 ,1 2 2 ,1 2 3 ,1 2 4 ,1 2 5
Vasconcelos, N ilo C. L , 3 9 ,1 0 9
Vasconcellos, V. Smith de, 40
Velasco, D om in gos, 85, 97
Viale, Cezar, 53
Vianna, Fernando de M ello, 1 2 ,1 0 8 ,1 1 0 ,1 1 3 ,1 2 4 ,1 2 7
Vidal, Armando, 30, 31, 32, 39
Vivácqua, Attüio, 1 0 ,4 3 ,4 7 ,4 8 ,7 6 ,1 0 2 ,1 0 8 ,1 1 0 ,1 2 6

149
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

150
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

ANEXO I
Criadores da O A B

151
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Osvaldo Aranha
M inistro da Justiça que subscreveu o D ecreto n o 19.408 de 18 de n o v em ­
bro de 1930, juntam ente com o presidente do G overno Provisório Getú-
lio Vargas.

7 52 9ÁM
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

André de Faria Pereira


Presidente da Corte de Apelação do Distrito Federal (na época no Rio de
Janeiro) e que propugnou pela inserção do artigo 17 no D ecreto n“ 19.408
(que cuidou da reorganização daquela Corte de Apelação).

153
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Levi Carneiro
Presidente do Instituto da O rdem dos A dvogados Brasileiros na ocasião e
que se tornou, sim ultaneam ente, Presidente da Ordem dos A dvogados
Brasileiros.

154 9àB
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s P ercursos e D e s a fio s { 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

C etu lio Vargas


Presidente da República que firm ou o D ecreto n° 19.408, de criação da
OAB, em 18 de novem bro de 1930.

155
______________Hislória_da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

756
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim e iro s P ercursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

ANEXO II
Biografia dos Presidentes da O AB

màM 157
____________ Histoáa da
O r d e m d o s A d v o g a d o s d o Brasil

LEVI FERNANDES CARNEIRO (1933-1938)

158
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s Percursos e D e s a fio s { 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

N asceu n o dia 8 de agosto de 1882 em N iterói, R io de Janeiro. Fez curso de


H um anidades no M osteiro de São Bento, n o Rio de Janeiro, e posteriorm ente
no Liceu de H um anidades, em N iterói. D ip lo m o u -se em 1902 pela Faculdade
D e C iências Jurídicas e Sociais do R io de Janeiro, então D istrito Federal. D u ­
rante o período em que cursou a Faculdade foi presidente da Federação dos
Estudantes Brasileiros e dirigiu a Revista Jurídica. Foi orador da turma e rece­
b eu o prêm io M achado Portela pela Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais
do R io de Janeiro. Foi advogado m ilitante, jornalista, legislador, professor e
C onsultor Jurídico da República de 1930 a 1932, retirando-se quando foi eleito
para a presidência da OAB. M em bro do lAB tornou -se Presidente de 1928 a
1930. Foi um dos fundadores e o 1®Presidente do C onselho Federal da OAB, de
m arço de 1933 a agosto de 1938, quando renunciou ao cargo eletivo. A ceitou a
nom eação para o cargo de consultor geral da República e tornou-se o autor do
texto do D ecreto n. 19.398, que regulam entou juridicam ente a existência do
governo Vargas. M em bro da C om issão Perm anente da C odificação do Direito
Internacional Público foi tam bém D eputado na Assem bléia C onstituinte, no
biên io 1933/34, e D eputado Federal p elo Estado do R io de Janeiro, d e l9 3 5 a
1937. de Janeiro. Recebeu tam bém a M edalha Teixeira de Freitas, em 1938
outorgada pelo lAB, co m o recom pensa por serviços prestados à cultura jurídi­
ca brasileira. M em bro da Academ ia F lum inense de Letras de N iterói.e tam bém
M em bro da Academia Brasileira de Letras no R io de Janeiro da qual, em 1941,
torn ou -se Presidente. Professor honorário da Faculdade de D ireito de N iterói.
Professor interino da faculdade de D ireito da Universidade do Brasil de 1938 a
1 9 4 0 . S ó c io h o n o r á r io d o lA B d e S ã o P a u lo e m 1 9 4 2 . D ir e to r e
vice-presidente do C onselho adm inistrativo da Caixa E conôm ica Federal do
R io de Janeiro. Integrou a C om issão Jurídica do I Congresso Brasileiro de Es­
critores e m São Paulo quando a ditadura Vargas já apresentava sinais de enfra­
quecim ento. Obras publicadas; D o Judiciário Federal em 1916, A N ova Legisla­
ção d a Infância em 1930, Federalismo e Judiciarismo em 1930, Problemas M uni-
cipais em 1931, Cótiigo de Processo C ivil e Comercial em 1936, Pela N ova Consti­
tuição e m 1936, O Livro de um advogado em 1943, O Direito Internacional e a
Democracia em 1945 e inúm eros estudos jurídicos e literários publicados em
revistas especializadas, e em jornais cotidianos. Em 1966 foi eleito Presidente
da C om issão Especial de Juristas que estudaria o problem a da revisão constitu­
cional. Autor do anteprojeto do novo C ódigo Civil Brasileiro, im presso n o m es­
m o ano. Faleceu n o Rio de Janeiro, em 5 de setem bro de 1971.

#ám 759
______________Históda da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

FERNANDO DE MELLO V IANA (1938-1944.)

160 9ÂM
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s P ercursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

N asceu em 1878 em Sabará, M inas Gerais. Estudou n o C olégio Caraça e


no G inásio de O uro Preto em M inas Gerais. Bacharelou- se em 1900 pela Fa­
cu ldade de D ireito de B elo H o rizo n te. Foi ad vogado m ilitan te. Indicado
Subprocurador geral, em M inas Gerais, no governo de Artur Bernardes entre
1921 e 1922. Em 1922 exerceu o cargo de Secretário d o interior n o governo do
P r e sid e n te R aul Soares. C o m a m o r te d este e le g e u -s e para o g o v e r n o
do seu Estado. Em 1926, n o governo do presidente W ashington Luís, foi esco­
lh id o para o cargo de vice-presidente da República. Em virtude da Revolução
de 1930 perm aneceu exilado na Europa durante 2 anos, só voltando a concor­
rer a cargos políticos em 1945, quando se elegeu senador por M inas Gerais. Foi
V ic e - p r e s id e n t e d o S e n a d o e P r e s id e n te da C o m is s ã o d as R e la ç õ e s
Exteriores. Foi o 2® Presidente d o C onselho Federal da O rdem dos Advogados
do Brasil, de agosto de 1938 a agosto de 1944. P ublicou diversos pareceres, ra­
zões, alegações finais e outros trabalhos jurídicos na im prensa cotidiana e em
revistas especializadas: Lançamentos feitos em livros comerciais de 190S,Aposen­
tadoria de funcionários em disponibilidades em 1919, Intransferibilidade sem
autorização do governo concedente da concessão-contrato, em 1921, D ireito
do magistrado a aposentadoria em 1922, Responsabilidade das estradas de ferro
em 1932, Honorários âe advogado em 1939, D a obrigação ão testamenteiro p u g ­
nar pela sua validade em 1939. Faleceu em 1954, n o Rio de Janeiro.

767
______________ História da
Ordem dos Advogados do Brasil

RAUL FERNANDES (1944-1948)


i

762
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s P ercursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

N asceu em 1877 em Valença, n o R io de Janeiro. Estudou em São João D ’


El Rey e m M inas Gerais, e n o C olégio G ilberto Brandão em Vassouras, R io de
Janeiro. Posteriorm ente fez estudos preparatórios n o curso anexo da faculdade
de D ireito de São Paulo. Bacharelou-se em ciências sociais em 1897 e em ciên ­
cias jurídicas e m l8 9 8 , pela m esm a faculdade. C oube-lhe o título de laureado e
u m prêm io de viagem à Europa p elo brilhantism o durante o curso. A dvogado
m ilitante foi tam bém D eputado em M inas Gerais, em 1903, e D eputado Fede­
ral em 1909, servindo ainda em outras legislaturas. Foi brilhante jurisconsulto
e tam bém D iplom ata. Participou c o m o C onselheiro da D elegação brasileira à
C onferência da Paz em 1919, sob a presidência d o M inistro Epitácio Pessoa.
Em 1923 elegeu-se Presidente do Estado d o R io de Janeiro. Fez parte da C om is­
são de Reparações de Guerra da Liga das N ações em Haia, H olanda, em 1920,
1921, 1924 e 1925. Em baixador Plenipotenciário na Bélgica, em 1926 e 1927.
T ornou-se o 4<> Presidente do C onselho Federal da Ordem d os A dvogados do
Brasil, de 1944 a 1948. Exerceu a função de Plenipotenciário junto à C onferên­
cia de Paris para a Paz co m a Itália, em 1946. M inistro das Relações Exteriores
de 1947 a 1951, n o governo de Eurico D utra, e em 1954 no governo Café Filho.
Foi um dos propugnadores da criação da Corte Internacional de Justiça em
Haia, na H olanda. M em bro da Academ ia de Legislação e Jurisprudência de
Madri, Espanha, e do Instituto para a U nificação do Direito Privado de Roma,
Itália. Foi C onsultor Geral da República e Professor honoris causa da U niversi­
dade de M ontevideo, Uruguai, e da Faculdade de D ireito de São Paulo, e m 1952.
Oficial da O rdem N acional do M érito M ilitar e da Ordem Rio Branco. Em 1967
foi Presidente do Congresso Jurídico Interam ericano, realizado no Rio de Ja­
neiro. Recebeu o título de D outor honoris causa da Universidade Federal do
Rio de Janeiro. Principais trabalhos jurídicos: A Paz pela Escola-, M oderno con­
ceito de soberania, Responsabilidade do Estado p o r dano a estrangeiro. Represen­
tação Parlamentar Profissional. Faleceu em 1968, n o Rio de Janeiro.

163
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

164 9áB
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

ANEXO III
Imagens H istóricas

165
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

TSN, símbolo da repressão judicial. Prédio onde funcionou o Tribunal de Segurança


Nacional sito na Av. Oswaldo Cruz, na zona sul do Rio de Janeiro.
Fonte: Luis Carlos. 2003.

766 9Ál
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim e iro s P ercursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

Flagrante da posse dos juizes do TSN.


Fonte: Foto extraída do livro Repressão Judicial no Estado N ovo de autoria de
Reinaldo Pompeu de Campos, op.cit., p. 40.

167

!
______________História da
O r d e m d o s A d v o g a d o s d o Brasil

Aspecto do tribunal pleno do TSN.


Fonte: Foto extraída do livro Repressão Judicial no Estado N ovo de autoria de Reinaldo
Pompeu de Campos, op.cit., p. 76.

168 9Ál
Sobral Pinto no TSN no dia 8 de julho de 1939, na defesa de Luís Carlos Prestes e
Harry Berger.
Fonte: Foto extraída do livro Repressão Judicial no Estado N ovo de autoria de Reinaldo
Pompeu de Campos, op.cit., p. 51.

7 69
______________História da
O r d e m d o s A d v o g a d o s d o Brasil

Evandro Lins e Silva em um a sessão de julgamento no TSN no período de


1936 a 1939.
Fonte: Foto do arquivo particular do advogado Clemente Hungria.

170 9ÁI
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s P ercursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

ANEXO IV
Fotos de A dvogados que se destacaram
c o m o defensores de presos e perseguidos
p o lítico s d o TSN
____________ História da
Ordem dos Advogados do Brasil

Evandro Lins e Silva, o advogado do século 20.


Fonte: Foto extraída do livro OAB, o desafio da utopia. 2000.

172
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

Sobral Pinto, símbolo dos advogados brasileiros.


Fonte; Foto extraída do livro O AB, o desafio da utopia. 2000.

173
______________Históda da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

174 9àM
V o lu m e 4 C ria (;à ü , P rim eiros Percursos e D e s a fio s (1 9 U) - 19 4 -))

ANEXO V
Carta e discurso de A n d ré de Faria Pereira
sobre a Criação da O AB

•àM 175
______________Historia da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Carta dirijida ao Professor Haroldo Valladão, presidente do Conselho


Federal da OAB, lida na sessão plenária de 21 de novembro de 1950.

Rio de Janeiro, 21 de N ovem bro de 1950.

Exmo. Sr.
Professor H aroldo Valladão
M .D. Presidente do C onselho Federal da O rdem dos A dvogados do Brasil
Nesta

Saudações atenciosas.

Distinguido p o r V. Excia., como convidado de honra, para assistir à sessão


comemorativa do 20.° aniversário da criação da Ordem dos Advogados do
Brasil, tive a grande satisfação de comparecer a essa solenidade prestigiada
pela presença de representantes de altos Poderes da República epelos expoen-
tes máximos da M agistratura e da Advocacia. Os eloqüentes discursos profe­
ridos, salientando o prestígio conquistado pela Ordem, nesses vinte anos de
profícua existência, fixaram os traços fundam entais da sua história e os no­
mes dos beneméritos advogados que, durante longos anos, lutaram pela sua
criação. Notei, entretanto, um a certa imprecisão dos oradores na fixação da
verdadeira origem do artigo 17 do Decreto n.° 19.408, de 18 de novembro de
1930, que criou a Ordem dos Advogados e, melhor esclarecendo, julguei do
meu dever trazer o meu testemunho pessoal, para que a história traduza a
verdade inteira dos fatos. Surpreendido com a m inha reintegração, p o r de­
creto da Junta Governativa de 30 de outubro de 1930, no cargo de procura-
dor-geral do D istrito Federal, de que fora ilegalmente exonerado pelo presi­
dente Washington Luiz, sugeri a Oswaldo Aranha, logo que ele assumiu o
cargo de ministro da Justiça, do Governo Provisório, a necessidade de se m o ­
dificar a organização da então Corte de Apelação, visando norm alizar os
seus serviços e aum entar a produtividade de seus julgamentos. Concordando
com a idéia, p ed iu -m e o ministro organizasse um projeto de decreto e eu,
conhecendo bem, como antigo sócio do Instituto dos Advogados a velha aspi­
ração dos advogados e as baldadas tentativas para sua realização, bem como,
impressionado com o desprestígio a que descera a classe, preparei o projeto e

176 9àM
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiro s Percursos c D e s a fio s 1 19 3 0 - l ‘J 4 5 )

incluí nele o dispositivo do art. 17, criando a O rdem dos Advogados e o sub­
m eti à crítica de um único colega, hoje respeitado ministro do Supremo Tri­
bunal Federal - Edgard Costa, que sugeriu algum as medidas, que foram
adotadas, entre elas a da supressão do julgam ento secreto na Corte de Apela­
ção, antes introduzida na legislação.
Levei 0 projeto a Oswaldo Aranha, que lhe fe z u m a única restrição, exata­
mente ao art. 1, que criava a O rdem dos Advogados, dizendo não dever a
Revolução conceder privilégios, ao que ponderei que a instituição da ordem
traria, ao contrário, restrição aos direitos dos advogados e que, se privilégio
houvesse, seria o da dignidade e da cultura.
Discutíamos, o ministro e eu, esseponto do projeto, quando chegou Solano
Carneiro da Cunha, como eu, depositário da am izade e confiança de Oswaldo
Aranha, que, felicitando-m e pela oportunidade da idéia, reforçou meus ar­
gumentos, aceitando o ministro integralmente o projeto, levando-o na mes­
m a tarde ao chefe do Governo Provisório, que o assinou imediatamente, sem
modificação de um a vírgula. Trazendo meu testemunho a respeito daquele
dispositivo, que criou a Ordem dos Advogados do Brasil, não viso reivindicar
glórias para meu nome, desde que a m inha intervenção resultou de mero
acidente na minha vida profissional, isto é, encontra-se na pasta da Justiça -
ao voltar eu ao cargo de que fora esbulhado e cuja reintegração estava pleite­
ando em Juízo - Oswaldo Aranha, a quem m e ligavam laços de fam ília e
velha am izade e a cujo espírito público e inteligência se devem a assinatura
daquele decreto com o dispositivo criando a O rdem dos Advogados do Brasil
Os serviços que a Ordem tem prestado - saneando, disciplinando e defen­
dendo a classe dos advogados e punindo membros faltosos - são notáveis e já
proclamados pela consciência coletiva, e o seu crescente prestígio constitui
m otivo de orgulho p ara todos que trabalharam p ara sua criação e colaboram
na realização de seus patrióticos objetivos.
Queira V. Excia. receber a segurança do alto apreço e distinta consideração
do colega, que se orgulha de pertencer à classe dos advogados brasileiros, depois
d e haver ocupado elevados cargos da Magistratura e do Ministério Público,

Amo. Admor.

A ndré de Faria Pereira

177
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Exposição feita pelo Desembargador André de Faria Pereira em sessão


do Conselho Federal da OAB, realizada em 22 de novembro de 1955.

Exmo. Sr. Presidente do C onselho Federal da Ordem dos A dvogados


Senhores Conselheiros

Ao completar a Ordem dos Advogados do Brasil um quarto de século de sua


existência, a 18 do corrente, recebi do nossopreclaropresidente a incumbên­
cia de proferir algumas palavras em comemoração a essa gloriosa efeméride
e, não se tendo realizado, naquele dia, pô r motivos óbvios, uma sessão especi­
al comemorativa, desempenho-me hoje desse grato dever.
Indagando de m im mesmo que motivos teriam levado o nosso eminente
bastonário a essa preferência, que a outros melhor credenciados deveria ca­
ber, só encontrei como justificativa os meus precedentes ligados à criação da
nossa Instituição e a minha devoção à nobre missão social do advogado e às
prerrogativas e ideais da classe, a que m e incorporei, ao deixar os bancos
acadêmicos, já lá se vão quarenta e oito anos, e na qual m e reintegrei, já no
fim da jornada, depois de ocupar destacadas posições na M agistratura e no
Ministério Público.
Dando desempenho hoje àquele mandato, que constitui para m im legítimo
título de honra, suponho corresponder aos seus objetivos procurando esclarecer
o marco inicial da nossa organização legal, embora, para tanto, tenha que vio­
lentar os sentimentos de invencível modéstia, que sempre orientaram minha
vida. Não viso, focalizando atos que pratiquei, exaltar o próprio mérito, nem
ostentar vaidade, que seria legítima, mas afastar dúvidas a respeito da criação
da Ordem dos Advogados e restabelecer a verdade histórica em assunto de ta­
manha magnitude para nossa classe. A idéia da criação da Ordem, nascida
com a fundação do centenário Instituto dos Advogados Brasileiros, perm ane­
ceu mais ou menos estática até que tomou vulto, já no regime republicano, com
a atuação de dois grandes advogados, de saudosa memória, Alfredo Pinto e
Aurelino Leal, e d o senador Fernando Mendes de Almeida, que apresentou na
Câmara Alta um projeto a respeito, logo impugnado sob o fundam ento de ser
contrário à Constituição, p or isso que, segundo se alegava, conferia privilégio à
classe dos advogados.

178 9AM
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P r im e ir o s P e r c u r s o s c D e s a fio s 11 9 3 0 - ) 945}

Coube, então, ao saudoso M oitinho Dória, campeão magnífico da idéia em


marcha, defendendo o projeto perante a Comissão de Legislação e Justiça do
Senado, a que foi adm itido, demonstrar a sua perfeita constitucionalidade.
Arquivado o projeto nas pastas das Comissões legislativas, não se cuidou mais
do assunto até que, poucos dias após a vitória da Revolução de 1930, foi
criada a Ordem dos Advogados pelo art. 17 do Decreto n.° 19.408, de 18 de
novembro de 1930. A í a m inha intervenção decisiva, ainda hoje ignorada
pela m aioria da nossa classe.
Ainda agora, repetindo o equívoco, a douta Comissão nomeada p o r esse colendo
Conselho para consolidara legislação reguladora da Ordem dos Advogados do
Brasil, constituída pelos eminentes conselheiros Nehemias Gueiros, Themístocles
Marcondes Ferrreira e Alberto Barreto de Melo, apresentando seu bem elabo­
rado anteprojeto, que está recebendo gerais aplausos, declarou, na sua exposi­
ção de motivos, que —o projeto de lei prim itivo para organização da Ordem dos
Advogados do Brasil foi oriundo do Instituto dos Advogados Brasileiros, de que
foi relator Edmundo de M iranda Jordão - e registrou, em primeiro lugar, entre
os maiores criadores da gratidão da classe, por esse memorável feito, o nome de
Levi Carneiro, seu primeiro presidente.
A douta Comissão traduziu, certamente, nessa declaração, um a impressão
generalizada nos meios jurídicos desde a criação da Ordem, m as o próprio
Levi Carneiro a contestou, quando, ao proferir o discurso comemorativo do
20.° aniversário da O rdem dos Advogados, em 18 de novembro de 1950, refe­
rindo-se ao citado Decreto n." 19.408, explicou que Edm undo de M iranda
Jordão, com apoio de outros colegas, lhe apresentara, em 13 de novembro
1930, um anteprojeto, com cinco artigos, sugerindo a criação da O rdem dos
Advogados do Brasil e declarou que - antes mesmo de chegar às mãos do
ministro da Justiça, Oswaldo Aranha, o ofício com que lhe apresentava a
indicação aprovada pelo Instituto, fora expedido o decreto reorganizando a
Corte de Apelação, um dos prim eiros emanados da revolução triunfante, em
cujo art. 17 fora criada a O rdem dos Advogados do Brasil.
Afastou, assim, Levi Carneiro, a autoria do Instituto dos Advogados, surpre­
endido, como foi, com a criação da Ordem, antes mesmo de chegar seu ofício
às mãos do ministro do Governo Provisório.
Diante da injustificável omissão de referência ao verdadeiro criador da Or­
dem e da estranheza causada tws meios forenses pela afirmação do orador
oficial, Levi Carneiro, —duplam ente credenciado, por ter sido àquela época,

•Al 779
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

presidente do Instituto e, depois, eleito prim eiro presidente da O rdem ~ de


que 0 providencial preceito do art. 17 fora ato espontâneo do governo revolu­
cionário e, ainda, à vista das vagas referências dos outros oradores da soleni­
dade, Jair Tovar e Décio M iranda, atribuindo-m e uma intervenção passiva
de simples apoio à iniciativa do ministro, resolvi quebrar o silêncio, em que
m antive durante vinte anos, e m andei uma carta restabelecendo a verdade, a
qual, em sessão deste egrégio Conselho, de 5 de dezembro 1950, fo i m andada
transcrever e ata, ficando, assim, oficializada a verdadeira história da cria­
ção da O rdem dos Advogados.
Anteriormente, na sessão do Conselho local de 2 8 de junho 1939, o seu em i­
nente presidente, Justo M endes de Morais, mandara transcrever em ata o seu
discurso em que declarou -graças à ação benfazeja do desembargador A ndré
de Faria Pereira, que pleiteou triunfantem ente a nossa criação pelo art. 17 j
do Decreto n.° 19.408, de 18 de novembro 1930 ~, afirmação essa repetida :
pelo em inente desembargador Vicente Piragibe, então presidente do Tribu- I
nal de Apelação, que falou em nome da Magistratura. \
N in g u é m m elh o r do que eu. Sr. P residente, sen tira a necessidade d e \
moralização d a classe dos advogados, notadam ente quando exerci, pela p ri- 1
meira vez, o cargo de procurador-geral do D istrito Federal, na luta trem enda I
que travei contra os maus elementos da Justiça, da Polícia e da classe dos i
advogados. Àquele tempo, não havia egresso das penitenciárias ou comerci­
ante falido que não se julgasse com o direito de sobraçar uma pasta e afron- i
tar o pretório no exercício da mais degradante rebolice. A consciência coleti- <
va repelia os intrusos, mas seus malefícios desmoralizavam o am biente a tal \
po n to que a função de advogado era suspeitada como de traficantes irrespon- ;
sáveis. O s advogados dignos sofriam a concorrência dos aventureiros ousa­
dos e não havia meios de evitar a intoxicação causada no meio social pelos
elem en to s clau dican tes, q u e p ro sp e ra v a m à so m b ra de g e n e ra liza d a
irresponsabilidade. Sentindo a vergonha de um a tão degradante situação, |
com as responsabilidades do cargo de chefe do Ministério Público e conhe- j
cendo os anseios da classe em criar a sua Ordem, como as frustradas tentati- !
vas objetivando-a, tive afortu n a de ser reintegrado no meu cargo pela Junta [
Revolucionária, assumindo, logo após, o cargo de ministro da Justiça o ilus- >
tre O swaldo Aranha, a quem m e prendiam laços de velha am izade e conftan- |
ça irrestrita. Aproveitando essa situação, que o destino m e reservou, e a cir- ;>
cunstância de acolher o ministro minha sugestão de reformar os serviços da }

180 I
V o lu m e 4 C r i a ç ã o , P rim e iro s Percursos e D e s a fio s l 1 9 3 Ü - 1 9 4 5 )

Corte de Apelação, então desorganizados, resolvi incluir no decreto, sem insi­


nuação de ninguém, o preceito do art. 17, único que sofreu impugnação do
ministro, sob afun dam ento de que a revolução não concedia privilégios. M as
0 idealismo e espírito público de O swaldo Aranha cederam à minha argu­
mentação, reforçada pela oportuna e eficiente intervenção do autorizado
Solano Carneiro da Cunha, que deu nota fin a l ao assunto. Tive, assim, a
fortuna de transformar em realidade o sonho quase secular da classe, p ra ti­
cando 0 ato de que m ais m e orgulho na minha longa vida profissional
A criação da Ordem dos Advogados, naquele momento histórico, constituiu um
verdadeiro milagre, em que hoje eu mesmo custo a acreditar. Em verdade, ao
mesmo tempo em que a derrocada das Instituições rasgava, pela revolução vito­
riosa, a Constituição e as leis e concentrava nas mãos do ditador os três poderes
constitucionais da República, ferindo o próprio Poder Judiciário, no momento
em que a insânia do poder pessoal se instalava no país, com todos os agravantes
do arbítrio e da violência, foram subtraídas à centralização dominante e entre­
gues a órgãos da própria classe a disciplina e seleção de seus membros.
Foram, assim, a autonomia efederalização da classe dos advogados um galardão
precioso para consolidação da sua independência e dignidade profissional.
D e como se houve a Ordem dos Advogados, nestes vinte e cinco anos vividos,
especialmente no regime ditatorial, reagindo contra violências, defendendo
profissionais perseguidos, expondo-se a riscos de toda a natureza em defesa do
direito e da liberdade, dão testemunho o prestígio conquistado no meio social e
acatamento pelos poderes constituídos, especialmente o Poder Judiciário, re-
manso tranqüilo dos anseios populares e asilo inviolável da liberdade e da lei.
O trabalho realizado pela Ordem dos Advogados, no aperfeiçoamento da disci­
plina da classe e elevação do seu nível moral e cultural, já permite que o profissi­
onal invoque com orgulho o título de alta honra, dizendo - sou advogado!
N ão devem este colendo Conselho e os Conselhos locais perm anecer estáticos,
embriagados pela glória dos louros colhidos, m as precisam, mas que nunca,
prosseguir na cam panha pela elevação do nível moral e cultural, pela disci­
plina e independência da classe dos advogados. A indisciplina e sentimento
de irresponsabilidade reinantes em todos os setores da vida nacional; a onda
crescente de corrupção, causando impressionante desagregação dos valores
morais: o desprezo a dogm as de tradicionais virtudes cívicas dos estadistas
que construíram a nacionalidade e nos transm itiram o prodigioso legado da
nossa unidade territorial e política; as ameaças de um a m entalidade dem a-

•àM 181
História da
Ordem dos Advogados do Brasil

gógica, perturbadora do equilíbrio social e político; estão a reclamar dos cul­


tores do direito a form ação de uma verdadeira cruzada cívica em defesa dos
bons costumes e dos postulados da ordem pública e sã moral.
A O rdem dos Advogados, entidade estatal reconhecida pela Constituição como
parte componente do órgão encarregado de selecionar candidatos ao ingresso
na Magistratura e fornecendo membros de seus quadros para formação dos
tribunais, se constitui parte integrante do Poder Judiciário e é colocada, assim,
à mesma altura do nível moral e intelectual que caracteriza os Magistrados.
A colaboração dos advogados, sempre solicitada para o trabalho de elaboração
das leis, não se pode fazer esperada, neste momento em que a consciência cole­
tiva reclama urgente reforma dos institutos do habeas corpus, recurso extraor­
dinário e mandato de segurança que, sendo criados para garantia dos direitos,
se transformou, pelo abuso, em fonte perm anente de negação de justiça. i
Restaurando a verdade histórica da criação da O rdem dos Advogados, deve- f
mos render homenagem especial aos advogados que lutaram pela realização \
desse nobre ideal da classe, entre 05 quais devem ser lembrados, além dos pio- |
neiros da idéia, desde épocas remotas, 0 seu primeiro bastonário, Levi Carnei- 5
ro, que dirigiu os trabalhos de regulamentação do texto criador da Ordem; |
A rm ando Vidal, autor do projeto do regulamento e seu relator; Edmundo |
Miranda Jordão, que formulara sugestão para sua criação; e os que mais se [
destacaram na elaboração do regulamento - Justo de Moraes, M oitinho Dória, J
Arnoldo Medeiros, Augusto Pinto Lima e Edgard Ribas Carneiro. j
Perdoem os nobres colegas se fu i forçado a focalizar meus próprios atos, mas |
para assim proceder, coloquei acim a de natural constrangimento 0 interesse I
da verdade histórica da nossa Instituição d e classe. [
A form a mais eloqüente para com emoramos condignamente um quarto de |
século de existência da O rdem dos Advogados do Brasil é firm arm os, Sr. Pre­
sidente, todos os profissionais da classe, sob os auspícios de V. Excia., seu dig­
no e autorizado bastonário, um pacto de honra para defesa das prerrogativas
e prestígios do Poder Judiciário, po d er sem arm as que tem resistido, com o só
escudo da sua força moral, a todos os vendavais que têm sacudido as nossas
instituições democráticas, e cuja autoridade cresce na confiança pública em {
proporção da dignidade e cultura de seus sacerdotes; para 0 aperfeiçoamento i
das normas de disciplina e seleção d a nossa classe; para segurança da prote- <
ção da honra, liberdade e propriedade dos cidadãos, entregues ao nosso p a - í
trocínio; para garantia da legalidade e dos dogmas do regime democrático

182 9àM I
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiro s Pcrcursos c D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

contra as ditaduras, contra o arbítrio e a tirania; para defesa do inestimável


p a trim ô n io que nos legaram nossos ancestrais - a unidade do Brasil -
ameaçada no m om ento som brio que estamos vivendo pelos desvarios das
ambições políticas e incompreensão dos homens; pelo culto aos dogm as eter­
nos da verdade, da m oral e d a Justiça.

183
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

184
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

ANEXO VI
Cópia da via original do histórico "HABEAS CORPUS"
im petrado (2.3.37) pelo advogado SOBRAL PINTO,
em favor de HARRY BERGER, atendendo a indicação do
Presidente da OAB-R], TAR C IN O RIBEIRO. A medida
vitoriosa foi requerida ao Presidente d o Conselho de Segu­
rança N acional e teve p o r fundam ento o decreto 24.645
(10.07.34), pelo qual "T O D O S OS A N IM A IS EXISTENTES
N O PAIS SÃO TUTEIADO S D O ESTADO "(art. 1V,
c o n fo rm e arquivos da O AB

Fonte: T ran s c rito d o livro Porque defendo os com unistas, de a u to ria de Sob ral Pin to , ed. C o m u n ic aç ã o , Belo
H o riz o n te , p. 221 -22 9 ,1 97 9 .

«41 TS5
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

EXMO. SR. DR. RAUL M ACHADO, JUIZ D O TRIBUNAL DE SEGU­


RANÇA NACIONAL

HERACLITO FO N T O U R A SOBRAL PINTO, advogado ex -o fficio de


Harry Berger, não se conform ando com o despacho de V. Exa., que ordenou
continuasse esse accusado na prisão onde se acha, vem , com a devida venia,
expôr e requerer ao espirito sereno e equilibrado de V.Exa.
Um dos mais constantes cuidados da civilisação christã tem sido o estabeleci­
mento, no seio dos povos que acatam os seus postulados, d’u m regimen carcerario
que dê aos detentos, independentemente da sua condição social e da sua cathegoria
profissional, a noção exacta de que não perderam, com a reclusão, as suas prerogativas
de creatura racional. Criminoso ou Innocente, rico ou pobre, correligionário ou
adversario politico, o encarcerado precisa de receber, nas prisões mantidas pelos
Estados que se dizem christãos, a impressão de que os poderes públicos continuam
a divisar nelle aquella característica constante e irremovivel, que o crime poderá ter
feito adormecer, mas não desapparecer totalmente: a sua espiritualidade, esta
scentelha do divino incrustada na ganga frágil do organismo hum ano. Só com a
submissão a esta lei da racionalidade da nossa natureza poderá o Estado engrande­
cer e nobilitar a sua ardua e penosa missão de punir e castigar.
Urge, assim, que os juizes e tribunaes façam dispensar aos detentos, que
vivem nas prisões e cárceres, sujeitos à sua acção e fiscalização, u m tratamento
que os impeça de se considerarem simples animaes hydrophobos ou empestados.
Por isto, todos os que dedicam o melhor dos seus esforços à organisação
dos regimens penitenciários nas sociedades m odernas, não cessam, - com o D.
C oncepcion Arenal (ESTÚDIOS PENITENCIÁRIOS - Vol. 2®, pág. 283) - , de
advertir: “O regimen material a que fica sujeito o detento póde resumir-se as­
sim: Ar. - Alim ento. - Vestuário. - Cama e alfaias. - Trabalho. - Exercício. -
Descanço. - Som no.”
“Ar. - A cella deve ter capacidade sufficiente e a ventilação necessaria, para
que o ar seja tão puro quanto é indispensável á saúde do que o tem de respirar
toda a noite e a maior parte do dia”.
Os effeitos do extrem o calor devem de ser attenuados por m eio de um
b o m systema de ventilação, e, no que se refere ao frio rigoroso, o aquecim ento

186
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poderá se conseguir por m eio do vapor, aproveitando o das m achinas motoras


das industrias estabelecidas”.
Pansando, então, a consagrada escriptora a exam inar a questão do vestu­
ário, diz que elle “C o m o o alim ento, tem de ser o necessário, porem de m o d o
que possam ” os detentos, com elle, contrahirem... hábitos de limpeza.
Assim , por exem plo, dar-se-ão m eias, lenços. Para os tecidos do trajo, há-de se
buscar a m aior duração e abrigo” (Ibid., pág. 289).
Tratando, por fim, de resumir tudo que lhe parece imprescindível ao tra­
tam ento dos detentos, conclue a m esm a publicista: “Todas as regras que se dêm
sejam m uito praticas, para que possam ser inflexíveis. O necessário physiologico,
para o alimento; o necessário para a limpeza, nas a lfa ia s, e o necessário para o
descanço, na cam a. Isto a justiça o exige, em harm on ia c o m os m eios de
correcção; torna-se duro o que é tratado com crueldade; não é m eio de corrigir
u m h o m em o tornal-o duro”. (Ibid., pág. 291).
Pois bem . Sr. Juiz, os responsáveis actuaes pela guarda de Harry Berger
parece que attentaram em todas estas ponderações, mas para applicar-lhe, pre­
cisamente, e com conh ecim en to de causa, o regime opposto ao que deflúe des­
tes postulados, hoje universalm ente acceitos e proclamados.
Metido no socavão do lance inferior de uma das escadas da Policia Especial, ahi
passa Harry Berger os dias e as noites, sem ar convenientemente renovado, sem luz
directa do sol, e sem o menor espaço para se locomover. Nem cama, nem cadeira,
nem banco. Apenas u m colchão sobre lagedo. De alfaias nenhuma noticia. Absoluta­
mente segregado de todo e qualquer convivio humano, a ouvir, de m om ento a m o­
mento, as passadas dos soldados em transito pela escaàa, - sobre a sua cabeça - , não
póde usurfruir nem os benefícios do repouso, nem os do silencio. Nenhum a visita,
nem de amigos, nem de parentes. Prohibição de toda e qualquer leitura, quer de
jornaes, quer de livros. Ausência total de correspondencia: se a ninguém escreve,
ninguém, tambem lhe escreve. E com o poderia elle, ainda, escrever, se lhe sonegam
tudo: papel, lapis e caneta. Assim, entram os dias e as noites, vencem-se semanas sobre
semanas, sobrepÕem-se os mezes uns aos outros, e Harry Berger, num isolamento
allucinante, se vê invariavelmente entregue ao seu só pensamento, na immobilidade
tragica de sua agonia sem fim, e do seu abandono até hoje sem remedio, apezar dos
clamores estridentes do seu defensor impotente. A roupa que traz, - calça e paletós
sobre a pelle elle não a muda desde mezes. Nella já não existe mais uma só superfície
disponível onde se possam fixar novas sujeiras. A vista só dante vestuário, - se é que
taes andrajos podem ser assim qualificados -, provoca nauseas incoerciveis.

187
______________Historia da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Tal é, Sr. Juiz, a prisão que destinaram para Harry Bergen Tal é, em inente
Magistrado, o tratam ento que lhe vem sendo dispensado.
Semelhante deshumanidade precisa de cessar, e de cessar im m ediatam ente,
sob pena de deslustre para o prestigio deste Tribunal de Segurança, que, para
bem cum prir a sua ardua tarefa, necessita de pautar a sua acção pelas normas
inflexiveis da serenidade, e da justiça.
Tanto mais obrigatoriamente inadiavel se torna a intervenção urgentissima
de V. Exa., Sr. Juiz, quanto som o s u m p ovo que não tolera a crueldade, nem
m esm o para com os irracionais, c o m o o dem onstra o decreto n° 24.645, de 10
de julho de 1934, cujo artigo 1® dispõe; “Todos os animaes existentes n o paiz
são tutelados do Estado”.
Para tornar efficiente tal tutela, esse m esm o decreto estatue: “Aquelle que,
em logar publico ou privado, applicar o u fizer applicar m áos tratos aos animaes,
incorrerá em m ulta de 20$000 a 500$000 e na pena de prisão cellular de 2 a 15
dias, quer o delinqüente seja ou não o respectivo proprietário, sem prejuízo da
acção civil que possa caber”, (art. 2°).
E, para que ninguém possa invocar o beneficio da ignorancia nessa materia, o
art. 3® do decreto supra m en cion ad o define: “C onsideram -se m áos tratos:
......................................... ; II - Manter animaes em logares anti-hygienicos ou que lhes
impeçam a respiração, o m ovim ento o u o descanço, ou os privem de ar ou luz”.
Baseado nesta legislação u m dos Juizes de Curityba estado do Paraná, Dr.
A ntonio Leopoldo dos Santos, co n d em n o u João M ansur Karan á pena de 17
dias de prisão cellular, e á m ulta de 520$000, por ter m orto a pancadas um
cavali 0 de sua propriedade (doe. junto).
Ora, n u m paiz que se rege por um a tal legislação, que os Magistrados
tim bram e m applicar, para, deste m od o, resguardarem os proprios anim aes ir­
racionais dos m áos tratos até de seus donos, não é possivel que Harry Berger
permaneça, co m o até agora, m ezes e m ezes a fio, co m a annuencia do Tribunal
de Segurança N acional, dentro de u m socavão de escada, privado de ar, de luz,
e de espaço, envolto, além do mais, em andrajos, que, pela sua im m undicie, os
proprios m endigos recusariam a vestir.
Estes factos, que o Supplicante está trazendo, por escripto, ao conhecim ento
de V.Exa., assumem, neste m om ento, aspecto de particular gravidade, porque são
de m olde a prejudicar o valor e a credibilidade da propria palavra oíficial.
C o m effeito , o E xm o. Sr. P residen te da R epública, d ir ig in d o -s e ao
C ongesso N acional, em M aio de 1936, dizia: “C om o se conduziram as autori­

188 9àM
V o lu m e 4 Criaçcio, P rim eiro s Percursos c D esa fio s M 9 . 5 Ü - 19451

d ades na difficil em ergen cia - a m od era ção qu e não exclue a energia, a


prudência que não d im in ue o zelo - está no espirito de tod os e na m em ória
da população. Apezar da insólita brutalidade dos attentados praticados c o n ­
tra a u nidade nacional, da felonia e perversa indifferença que revelaram os
am otin ad os, não h ou ve qualquer excesso por parte do Poder Publico que não
u tilisou siquer, em toda a sua am plitude, as franquias concedidas pelo Poder
Legislativo, procurando, apenas, deter e punir os responsáveis, declarados e
reconhecidos.
O Poder Executivo, deixando m esm o de attender á justa indignação das
classes conservadoras, m anteve-se sempre sereno, não im p ondo castigos nem
procurando servir-se do m o m en to para anniquilar os vencidos” (Publicação
n° 3 do D epartam ento Nacional de Propaganda, pág. 13).
Tem pos após, S.Exa voltando a tratar do assunto, asseverava no discurso
que, ao regressar de Petropolis, proferiu em Bemfica: “C om o procedeu o G o ­
verno, para salvaguardar as instituições, está no conhecim ento e na m em ória
de todos: - co m rigor sem deshum anidade, firme, sem excessos” (Publicação n®
4 do D epartam ento Nacional de Propaganda - pág. 6).
E para que nenhum a duvida pudesse pairar no espirito de todos os cida­
dãos, sobre a serenidade dos orgãos do Poder Executivo, o prim eiro Magistra­
do da N ação, com o peso de sua in contestado e incontestável autoridade,
accrescentou (Ibid., pág.10): “Posso affirmar-vos que, até agora, todos os d eti­
dos são tratados com benignidade, attitude esta contrastante com os processos
de violência que elles apregoam e system aticam ente praticam. Esse procedi­
m ento m agnanim o não traduz fraqueza. Pelo contrario, é próprio dos fortes
que nunca se am esquinham na lucta e sabem manter, co m egual inteireza, o
destem or e o sentim ento de justiça hum ana”.
Ora, Sr. Juiz, o Tribunal de Segurança N acional, mais do que qualquer
outra instituição do paiz, deve de honrar a palavra do Exm o. Sr. Presidente da
República, que, em circumstancias tão solem nes, - co m o já foi accentuado
assegurou, reiteradamente, a toda a Nação, que n en h u m preso politico seria
tratado com deshumanidade.
Entretanto, isto não vem acontecendo com Harry Berger. Posto á disposição
do Tribunal de Segurança Nacional, o tratamento que lhe estão dando, apezar do
esforço em contrario do Supplicante, attenta contra todas as normas da civüisaçào
O c c id e n t a l , pois, conforme foi já focalisado, infringe até dispositivos claros e termi-
nantes da legislação existente no paiz em favor dos proprios animaes irracionaes.

•Al 189
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

N ão se argumente, c om o já se fez com o Supplicante, que b em peior seria


o tratamento que Harry Berger faria dispensar aos burguezes brasileiros se
victoriosa tivesse sido a revolução de N ovem bro de 1935, da qual era um dos
chefes confessos.
Tal argumento, com ser especioso, é, com tudo, inequivocam ente falso e
improcedente.
Os communistas quando lançam m ão da violência contra os vencidos nada
m ais fazem do que applicar, co m logica, as leis do systema que preconisam.
A philosophia que adaptam e diffiindem é a d o m o n ism o , segundo o qual
o conjuncto de todas as cousas deve de ser reduzido ao só principio da meteria.
D entro deste systema, puram ente materialista, a sociedade é regida por leis tão
fataes e incoerciveis co m o as do m u n d o physico, que nos envolve e rodeia. A
sciencia social, assim, é, na sua natureza, idêntica ás sciencias physico-chim icas.
O que compete, pois, aos sociólogos é descobrir, - á maneira dos physicos e
dos chimicos - , as leis necessarias que regem, independentemente da vontade indi­
vidual do hom em , os factos sociaes. Esta é a doutrinação constante de Engel (ANTI-
DÜHRING - vol. 3°, págs. 23/24, ed. franco, de Alfred Gostes): “A concepção mate­
rialista da historia parte deste principio que a producção, e com a producção a troca
de seus productos, constituem a base de toda a ordem social; que, em cada uma das
sociedades apparecidas na historia, a repartição dos productos, e com ella a forma­
ção e a hierarchia social das classes ou ordens que a com põem , se regula de accôrdo
com a natureza e o m odo de producção, e de accôrdo com o m od o de troca das
cousas produzidas. Assim, as causas ultimas de todas as transformações sociaes e
revoluções politicas devem ser procuradas, não na cabeça dos homens, segundo a
medida crescente em que elles penetram a verdade e a justiça eternas, mas nas m u ­
danças de m odo de producção e de troca; ellas devem de ser procuradas não na
philosophia, mas na economia da época estudada, quando surge a idéia de que as
intituições sociaes existentes são irracionaes e injustas, que o racional se tornou
tolice e o beneficio, flagello, isto é unicamente um indicio de que se produziu, á
revelia de todos, nos methodos da producção e nas formas de troca, transforma­
ções com as quaes não se harmonisa mais a ordem social adaptadas ás condições
econômicas anteriores. Quer isto dizer, ao m esm o tempo, que os meios de supprimir
o mal estar descoberto devem necessariamente tambem se encontrar, - mais ou
m enos desenvolvidos nas condições modificadas da producção. Estes meios não
devem ser inventados pelo cerebro, mas, descobertos, atravez do cerebro, nos factos
materiaes existentes da producção”

790
V o lu m e 4 C r i a ç ã o , P rim eiro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

A ordem social, assim , é m ero reflexo da realidade e econom ica. E a desco­


berta desta, e das leis necessarias que a regem, o h o m em a faz, atravez da sua
intelligencia, da m esm a m aneira e pelos m esm os processos co m que descobre a
realidade physico chim ica, e as leis que a dom inam .
Desta m aneira, a analyse d o p henom eno social deixa de ser u m problema
de ordem norm ativa, para se transformar, consequentem ente, num a questão
de ordem especulativa. Em virtude desta transformação, os critérios de avalia­
ção dos m eios e instrum entos de governo da sociedade não serão julgados á
luz do qualitativo, m as, inversamente, sob a im posição do quantitativo. Dentro
deste systema, esses m eios e instrum entos governam entaes n ão serão mais d e­
finidos de acordo com as norm as da distincção entre o bem e o maL mas, ao
contrario, consoante os imperativos da distincção entre a verdade e o erro.
Por isto, do m esm o m od o , com o, no d o m ín io da astronom ia, ninguém
ousaria dizer que a lei da atracção universal é bôa lim itando-se apenas a affirmar
que é verdadeira, assim tam bem no d om in o da sociedade, ninguém poderá
dizer que a lei da socialisação da propriedade é bôa ou má, devendo tão so m en ­
te declara-la verdadeira o u errada.
N o dia em que o desenvolvim ento scientifico do pensam ento hum ano
conseguir emprestar á sciencia social este cunho de certeza e segurança de que
já desfructam as sciencias physico-chim icas, “o governo das p essoas” será
“substituido pela adm inistração das cousas e pela direcção das operações de
produção” (Engels - Ibid., pág. 47).
Embora já existam, n o m u ndo moderno, nos paizes de indusírialisação al­
tamente attingida, - sustentam os communistas - todas as condições para o esta­
belecim ento desta universal “administração das cousas” e desta gerai “direcção
das operações de producção”, continua, entretanto, a nelles vigorar “o governo
das pessoas”, porque a burguezia, empenhada em proseguir na sua obra de espo­
liação do proletariado, - que é o único productor da riqueza - , im pede a realiza­
ção desta transformação social, servindo-se, quaes outros tantos instrumentos de
compressão, precisamente do direito, da moral, e da religião, que nada mais re­
presentam, hoje em dia, senão meras creações artificiaes do pensam ento dos h o ­
m ens da classe oppressora. O Estado, nesta phase da evolução histórica da hum a­
nidade, é o orgam expressivo desta obra da oppressão systematisada.
N estas condições, cum pre derrubar este Estado burguez que esta a entor­
pecer a ascensão da hum anidade para uma phase mais elevada de bem estar
collectivo.

•Ai 191
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Ora, esta empreitada scientifica de destruição do Estado burguês só se tor­


nará possível atravez da violência, cuja m issão é assim definida por Engels (Ibid.,
vol 2®, pág. 72):".. a violência desem penha ainda u m outro papel na historia, um
papel revolucionário; ... ella é, segundo a palavra de Marx a parteira da velha
sociedade gravida de um a sociedade nova, o instrumento com o auxilio do qual
o m ovim en to social quebra e substitue formas políticas geladas e mortas...”.
Incum be, assim, á violência, na conceituação de philosophia com m unista,
pôr e m equação a ordem social c o m a ordem econom ica.
Urge, entretanto, não deturpar a natureza m esm a desta violência.
Esta não é u m acto h u m a n o bom o u m áo. Erraria qu em assim a classificasse,
porque, n o dizer de Engels (Ibid - vol. 3® págs. 44/45), “as forças sociaes de
acção agem absolutam ente co m o as forças da natureza: céga, violenta, e des-
truidoram ente desde que não as reconhecem os e com ellas não contam os
..................... E isto é particularmente verdadeiro das possantes forças productivas
de hoje. Em quanto nos obstinam os em reusar a comprehender dellas a nature­
za e o caracter, - e o m o d o de producção capitalista e os seus defensores se
op p õ em a que as com prehendam os estas fórmas agem apezar de nós, contra
nós, e n os dom inam ...”
Em face, pois, do systema social que os com m unistas preconisam para
reger a vida das sociedades hum anas, a violência por elles empregada encontra
um a justificação logica, e um a explicação politica.
Tal, porém , já não occorre com os governantes brasileiros, que partem do
postulado de que o h o m em é, antes de tudo, u m sêr moral, cuja consciência
psychologica é absolutamente irreductivel aos principios da materia organisada,
regendo-se por um a norma especificamente diversa das leis da natureza physica.
Na verdade, com o ensina Duguit (L'ÉTAT - LE DROIT OBJECTÍF ET LA LOI
POSITIVE, vol. 1®, pags. 16,17,18): “Esta regra social tal com o a concebem os, não
é um a lei no sentido das leis do m u ndo physico ou biologico, isto é, um a lei que
exprime a simples relação de succesão entre dois phenom enos. As leis do m undo
physico o u biologico são leis de causa; a regra social é uma lei de fim Falou-
se de um a biologia social. Falou-se m esm o de um a estatica ou de um a dinamica
sociaes. Estes systemas surgiram na sua hora, e prestaram serviços; mostraram o
nada da theoria dos direitos individuaes; estabeleceram que a sociedade não é
um facto querido e artificial, mas um facto espontâneo e natural. Elles erraram
querendo identificar os factos sociaes e os phenom enos physicos ou biologicos.
D ’ahi 0 seu descredito no actual m om ento. Por mais que se faça não se poderá

192 «Ái
V o lu m e 4 C r i a ç ã o , P rim e iro s Pcrcursos c D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

impedir que o factor essencial dos factos sociaes seja o proprio h om em , sêr cons­
ciente de seus actos, e que pode affirmar que tem delles a consciência. N ão se
poderá nunca demostrar que as forças da natureza e da vida sejam forças consci­
entes; ellas o são talvez; ninguém nada sabe a tal respeito; ninguém o saberá ja­
mais; é possivel que ellas o sejam; tudo é possivel; mas ninguém póde affirmal-o.
A cada acto hum ano a consciência individual se affirma. Esta força e livre?
N inguém o sabe. Mas, é certo que ella é um a força consciente. E’ certo, assim que
o h om em tem consciência de se determinar por um fim. Talvez, na realidade, o
acto hum ano é determinado por causas. Entretanto, o h om em age com o se elle
fosse determinado por u m fim. Escolheu elle livremente este fim? Talvez. Em
todo o caso elle o escolheu conscientemente. Os phenom enos do m undo natural
nos apparecem determinados por causas, necessarias ou contingentes, pouco im ­
porta. Os actos hum anos nos apparecem determinados por fins escolhidos livre­
m ente talvez, mas certamente escolhidos conscientemente. Eis porque a lei social
é um a lei de fim; todo o fim é legitim o, quando elle é conforme á lei social, e todo
o acto feito para attingir este fim tem um valor social, isto é, jurídico. A regra do
direito é, então, a regra da legitimidade dos fins, e por ahi ella é inteiramente
differente da lei physica o u biologica que é a lei das relações de causa para effeito.
A regra de direito póde então denom inar-se um a regra de conducta, pois que ella
se applica a vontades conscientes, pois que ella determina o valor relativo dos
actos conscientes do hom em ”.
Segundo os imperativos desta concepção, o direito, a moral, e a religião
são, na sua origem e nos seus fundam entos, manifestações psychicas tão reaes
em si quanto as da materia, e presisam de ser levadas em conta pela intelligencia
hum ana, - que tudo ordena e dispõe - , afim de que ás suas m anifestações, na
acção social, seja dada a primasia legitim a sobre as manifestações do m u n d o
physico.
N o s limites desta concepção, os governantes só têm a faculdade de prati­
car aquillo que é considerado licito pelo direito, pela moral, e pela religião que
d om in am e regem a consciência social e politica do m eio social em que vivem.
Ora o Brasil por ser u m paiz de civilisação christã organisou u m systema
jurídico que repelle, por iníquo e injusto, o em prego da violência physica e
m oral com m eio de governo, sobretudo quando é utilisado contra os detentos
politicos.
Pretender justificar, assim, com o exem plo dos governos com m unistas, a
deshum anidade implacavel com que está sendo tratado Harry Barger, é, - além

193
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

de contradizer todas as affirmações theoricas de nossa systematica jurídica


dar razão aos doutrinadores marxistas quando asseveram que o direito burguez
é mera invenção artificial do pensam ento explorador das classes possuidoras,
em penhadas em espoliar os proletários dos proveitos do producto industrial
que elles não cansam de crear com a sua só força de trabalho. Recorrendo, na
repressão legal aos inim igos d o regimen, á pratica da violência, que o seu direi­
to theoricam ente condem na, os governantes burguezes nada m ais fazem do
que confirmar a argumentação da doutrina com m unista, quando diz que esse
direito é simples ficção do pensam ento interesseiro das classes dirigentes, sem a
m enor base na realidade social do actual m o m en to historico.
Aliás, ninguém m elhor do que Chesterton (ALL TH IN G S CONSIDERED,
págs. 222/223) escalpellou este sophism a grosseiro, - só com prehensivel no seio
das nações barbaras de que a violência dos vencidos deve de ser punida pelos
vencedores com m edidas egualm ente violentas. Eis, a tal respeito, a m aravilho­
sa lição do saudoso e admirável moralista: “Qualquer que seja a verdade, é,
entretanto, absolutam ente errado empregar o argum ento de que n ós europeus
devem os fazer aos selvagens e aos asiaticos aquillo que os selvagens e asiaticos
n o s fazem , a nós. Eu ten h o visto, realm ente, alguns p olem istas usar esta
metaphora: “D evem os com batel-os com as suas próprias armas”.
Muito bem; deixemos estes polemistas applicar a sua metaphora, e applical-
a literalmente. Vamos com bater o sudanez co m suas próprias armas. Suas
próprias armas são grandes facas m uito grosseiras, e espingardas, no m om ento,
archaicas. Suas próprias armas são, tam bem , a tortura e a escravidão. Se nós os
com baterm os com a tortura e a escravidão, estaremos com batendo pessim a­
m ente, precisamente co m o se nós os com batessem os com facas grosseiras e
espingardas velhas. O que constitue toda a força de nossa civilisação christã, é
que ella nos leva a combater com as propias armas delia, e não com as armas
dos outros povos. N ão é de n enhu m m o d o verdadeiro que a superioridade jus­
tifica o ditado: “Para velhaco, velhaco e m eio”. N ã o é absolutam ente verdadeiro
que se u m m oleque p õ e a sua língua de fóra para o presidente da Còrte de
Justiça, o Presidente da Còrte de Justiça im m ediatam ente conclua que sua ú n i­
ca possibilidade de m anter a sua posição e pôr sua língua de fóra para o m o le­
que. O m oleque póde ter ou não ter, de maneira absoluta, nen hum respeito
para com o presidente da Còrte de Justiça; isto é materia que, gostosamente,
pod em os considerar com o authentico mysterio psychologico. Mas, se o m o le­
que que tem, absolutamente, algum respeito ao presidente da Còrte de Justiça,

194 «▲1
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim e iro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

este respeito é certam ente outorgado ao presidente da Côrte de Justiça unica­


m ente porque elle não põe a sua língua de fóra”.
Assim , se o Tribunal de Segurança N acional quer punir, com efFiciencia,
aquelles que em N ovem bro de 1935 usaram da violência contra os legitim os
orgãos da soberania nacional, necessita de afastar, firme e cathegoricam ente, da
sua acção punitiva todo e qualquer gesto de violência. Só á custa deste preço é
que as suas sentenças se valorisarão no seio da consciência christã do povo
brasileiro. Só assim, ellas poderão ser acatadas co m o obra de justiça serena.
Eis porque, M.M. Juiz, o Supplicante volta á presença de V.Exa. para reclamar,
em nom e da Justiça, contra o regimen carcerario, deshumano, que vem sendo applicado
a Harry Bergen Não é um favor que está a pleitear para o seu cliente. E’ um direito
indomável e incoercivel, que está a invocar, em nom e da propria condição de creatura
racional, de que nenhum tribunal póde demittir a pessoa de Harry Bergen
Im põe-se, assim, que, sem mais a delonga de u m m inuto, V.Exa ordene,
c o m a sua autoridade de m agistrado, que H arry Berger seja transferido,
im m ediatam ente, para um a cela condigna onde, a par de cama, roupa, vestuário,
e objectos proprios para escrever, - de que está carecendo para a sua defesa - ,
que lhe permitta fazer as leituras que bem lhe aprouver, tudo, para dentro das
norm as da vigilancia prudente, que a administração carceraria costum a, em
face dos detentos politicos, pôr em pratica, para evitar confabulações perigosas
dos encarcerados com os seus partidarios politicos ainda em liberdade.
Form ulando o presente requerim ento tem o Supplicante cum prido ape­
nas o seu dever, o fferecen d o , e n treta n to , c o m isto , a V.Exa., adequ ada
opportunidade para que, sob o s ditam es im periosos da sua conciencia de h o ­
m em e de Magistrado, possa V.Exa., cum prir o seu, com egual solicitude.
Requerendo a juntada da presente aos respectivos autos,

P. Deferim ento.

Districto Federal, 2 de m arço de 1937.

Heraclito Fontoura Sobral Pinto


Advogado ex-officio

•Al 195
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

196 9AB
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiros Percursos e D e s a fio s | 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

ANEXO VII
D o cu m e n to s relativos à criação
e o rganização da O AB

7 97
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

DECRETO N.° 19,408, DE 18 DE NOVEMBRO DE 1930

Reorganiza a Corte de Apelação e dá outras providências

O Chefe do Governo Provisório da República dos Estados U nidos do Brasil:

Atendendo à necessidade de prover ao m elhor funcionam ento da Justiça


local do D istrito Federal, fazendo eqüitativa distribuição dos feitos, norm ali­
zando o desem penho dos cargos judiciários, dim inuind o os ônus aos litigantes,
em busca do ideal da justiça gratuita, prestigiando a classe dos advogados, e
enquanto não se faz a definitiva reorganização da Justiça, decreta:

Art. 1.0 - A Corte de Apelação do Distrito Federal, constituída de vinte e


dois desembargadores, se com põe de seis Câmaras, sendo a primeira e a segunda
criminais, a terceira e a quarta cíveis e a quinta e a sexta de agravos, cada um a com
três membros e presididas pelos vice-presidentes originários da Corte.
Art. 2.® - A corte de Apelação será presidida por u m presidente, as Câm a­
ras criminais pelo primeiro vice-presidente, as cíveis pelo segundo e as de agra­
vo pelo terceiro.
Art. 3.® - O presidente, os vice-presidentes e os m em bros das Câmaras
serão eleitos pela Corte de Apelação, sendo aqueles pelo prazo de dois anos,
proibidas as reeleições.
Art. 4.° - As atribuições da Corte de Apelação e das Câmaras são as defini­
das na legislação vigente, distribuídos os processos alternada e obrigatoriamente
a cada câmara na esfera das suas atribuições criminal, cível e de agravos.
Parágrafo único. Os feitos serão processados e julgados de acordo com a
legislação vigente, aplicado aos julgam entos criminais o disposto no art. 1.169
e parágrafos do decreto n o 16.752, de 31 de dezembro de 1924, sendo sempre
julgados em sessão secreta os recursos criminais do M inistério Público, nos
processos de crim es inafiançáveis de réu solto.
Art. 5.® - Os acórdãos das Câmaras constituem decisão da últim a instân­
cia, salvo as exceções expressas n os arts. 100 e 102 do Decreto no 16.273, de 20
de dezembro de 1923, que ficam revigorados, e as decisões de recebim ento ou
rejeição de queixa ou denúncia nos processos da com petência da Corte.

198 mà»
V o lu m e 4 C r i a ç ã o , P rim eiro s Percursos c Dosnfios ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

Art. 6.° - Os em bargos e recursos aos acórdãos das Câmaras serão julga­
dos pelas duas Câmaras crim inais, cíveis e de agravo, respectivamente, em ses­
são conjunta, tendo o presidente voto de desempate.
Art. 7.° - Fica restabelecido o instituto dos prejulgados, criado pelo D e ­
creto n o 16.273, de 20 de dezem bro de 1923, destinado a uniform izar a juris­
prudência das Câmaras.
Art. 8.° - Todos os recursos para as Câmaras da Corte de Apelação serão
arrazoados na primeira instância.
Art. 9.® - As Câmaras se reunirão duas vezes por sem ana, no m ín im o, em
dias previam ente designados pelos seus presidentes.
Art. 10.° - N os im pedim entos ocasionais dos juizes das Câmaras, a substi­
tuição se fará pelos das outras, na ordem numérica das câmaras e de antigüida­
de dos juizes, sendo os da sexta Câmara substituídos pelos da primeira.
Parágrafo único. O Presidente da Corte será substituído pelos vice-presi-
dentes, na ordem num érica, e estes pelos desembargadores mais antigos nas
respectivas Câmaras conjuntas.
Art. 11.° - As férias dos magistrados e m em bros do M inistério Público,
limitadas a quarenta e cinco dias, serão gozadas de um a só vez, em qualquer
época do ano, tendo-se em consideração a conveniência do serviço público.
Art. 12.° - O presidente da Corte regulará o gozo das férias dos magistra­
dos, não perm itindo a ausência simultânea de mais de três desembargadores,
um de cada Câmara conjunta.
Parágrafo único. Os desembargadores em gozo de férias ou licenças serão subs­
tituídos pelos juizes de direito convocados pelo presidente da Corte de Apelação.
Art. 13.° - O C onselho Suprem o da Corte de Apelação, c o m a designação
de “C onselho de Justiça”, se constitui dos presidentes das três Câmaras, terá
com o presidente o da Corte e exercerá as atribuições que lhe são conferidas na
legislação vigente.
Art. 14.®- Os magistrados e m em bros do M inistério Público não poderão
exercer qualquer cargo de eleição, nom eação ou com issão, m esm o de natureza
gratuita, salvo o exercício do magistério.
Art. 15.°- Os funcionários e serventuários da Justiça (Decreto no 16.273,
de 20 de dezembro de 1923) são obrigados a exercer pessoalm ente as suas fun­
ções e só poderão se afastar de seus cargos em gozo de férias o u licenças por
m otivo de m oléstia, regularmente concedidas, casos em que serão substituídos
na forma da lei.

799
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Art. 16.® - Ao funcionário ou serventuário da Justiça que pedir mais de dois


anos de licença para tratamento de saúde será aplicado o preceito dos arts. 281 e
282 do Decreto no 16.273, de 20 de dezembro de 1923, se comprovada a invalidez.
Art. 17.® - Fica criada a Ordem dos Advogados Brasileiros, órgão de dis­
ciplina e seleção da classe dos advogados, que se regerá pelos estatutos que
forem votados pelo Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros, com a co­
laboração dos Institutos dos Estados, e aprovados pelo Governo.
Art. 18.® - Todos os feitos cíveis e crim inais e administrativos na Justiça
local do D istrito Federal serão distribuídos, alternada e obrigatoriamente, aos
respectivos Juízos, na esfera das suas atribuições, exercendo o M inistério Públi­
co severa vigilância para assegurar a igualdade nas distribuições.
§ 1.® - As petições iniciais dos feitos da competência das varas cíveis, uma
vez distribuídas, serão imediatamente remetidas pelo distribuidor, em protocolo,
com a precisa indicação do dia e hora da distribuição, ao respectivo escrivão.
§ 2.® - Se 0 interessado não prom over a diligência requerida no prazo de
três dias, o escrivão devolverá a petição p or protocolo, cancelando o distribui­
dor a distribuição e fazendo a devida com pensação com a primeira petição da
m esm a natureza que entrar.
Art. 19.°- Ficam revogados o Decreto no 18.393, de 17 de setembro de 1928, e os
arts. 2.®e 5.® do Decreto no 5.672, de 9 de março de 1929, e revigorado o regimento de
custas aprovado pelo Decreto no 10.291, de 25 de junho de 1913, com as restrições
contidas no art. 3.® do Decreto no 5.427, de 9 de janeiro de 1928,e parágrafo único do
art. 29 do Decreto no 5.053, de 6 de novembro de 1926, que continuam em vigor.
Parágrafo único. As custas devidas no Juízo de Acidentes do Trabalho se­
rão cobradas de acordo com as rubricas relativas aos juízos cíveis e curadorias
de órfãos.
Art. 20.® - A taxa judiciária será paga e m estampilhas, metade inutilizada
pelo distribuidor, ao distribuir os feitos, e a outra m etade pelo escrivão, ao fazer
os autos conclusos para julgamento.
Art. 21.® - Revogam-se as disposições e m contrário.

Rio de Janeiro, 18 de novem bro de 1930; 109.® da Independência e 42.® da


República.

GETÜLIO VARGAS
Osvaldo Aranha

200 9ÀM
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim e iro s Percursos c D e s a fio s 11 9 3 0 - 19451

Carta do Presidente da Seccional de São Paulo em resposta ao ofício enca­


minhado pelos juizes da Comarca de Campinas em 12 de março de 1932

São Paulo, 19 de m arço de 1932

Exm os. Srs. Drs. N elson N oronha Gustavo e


V. Sm ith de Vasconceüos
M .D. Juizes de Direito da Primeira e
Segunda Varas da Comarca de Campinas

Som ente agora, chegou às m ãos do presidente d o Instituto da O rdem dos


A dvogados de São Paulo e da diretoria da seção paulista da O rdem dos A dvoga­
dos Brasileiros, trazendo a data de 12 do corrente, u m ofício de W . Exas. sobre
a organização da O rdem dos A dvogados Brasileiros. Esse ofício já foi reprodu­
zido, antes que chegasse ao destinatário, por vários jornais, descortesia que não
posso, nem devo atribuir aos seus ilustres signatários, juizes em um a comarca
de alta cultura e adiantada civilização, m as que explico, para benefício de todos,
co m o u m abuso de confiança praticado por alguém ainda não versado e m c o i­
sas de polidez que, n o dia de hoje, são, na verdade, coisas reservadas ao co n h e­
cim en to de m uito poucas pessoas. D o s magistrados pauUstas, o Instituto, a que
tenho a honra de presidir, só tem recebido, até agora, as dem onstrações mais
inequívocas de apreço e consideração. D em onstrações dessa natureza está ha­
bituado, tam bém , a receber, freqüentem ente, não só do venerando Tribunal de
Justiça e do seu distinto presidente co m o de todas as autoridades do Estado.
Feita esta observação preliminar, p eço licença a V.V. Exas. Para adicionar
outra, antes de examinar as m últiplas questões suscitadas n o ofício público que
acaba de ser entregue ao Instituto. É a seguinte: o to m co m que V.V. Exas., neste
ofício, se referem ao Instituto da O rdem dos Advogados de São Paulo faz-me
supor, não sem alguma confusão, que qualquer lei recentíssima, cuja publica­
ção n o D iário Oficial m e houvesse escapado, tivesse considerado aquele Insti­
tuto, não obstante a sua personalidade jurídica autônom a, um a dependência
da com arca de Campinas, um a espécie de cartório sob a jurisdição direta dos

•Ál 201
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

juizes locais. Verifiquei, porém , e aí a confusão se m e foi, que a suposição não


tinha fundamento: nenhum a lei ainda apareceu, no D iário OficiaU subm eten­
do o Instituto da Ordem dos Advogados de São Paulo à jurisdição, direção,
fiscalização, tutela, curadoria, ditadura, interventoria o u que m elhor n om e te­
nha, dos nobres juizes da comarca de Campinas. A ausência dessa lei, fato que
pode ser lam entado, e sou eu o primeiro a lam enta-lo pela excelência das luzes
de que nos priva, dá-m e o direito de, com a devida vênia, estranhar a maneira,
dura e ríspida, co m que W . Exas. se endereçaram àquele Instituto do qual n e­
nhum agravo receberam até este m om ento, pois não acredito que V.V. Exas.
considerem tal o protesto que ele, há meses, form ulou contra o desrespeito
com que u m de V.V. Exas. foi tratado pela autoridade policial de Campinas.
Peço licença ainda para observar a V.V. Exas., co m o presidente de um a ordem
de advogados, que se estes devem aos juizes todo o acatam ento e cortesia, as
m esm as obrigações estão sujeitos os juizes em relação a eles.
Esta questão assaz desagradável, que, co m o particular, eu olharia com a
doce, indulgente e silenciosa filosofia com que, habitualmente, olho tudo quanto,
nos atos e nas palavras dos hom ens, acusam um a ruptura íntim a de equilíbrio
e m edida - contingência a que toda a hum anidade está sujeita - não a pude
contornar, nem desdenhar, com o presidente do Instituto, cujas prerrogativas e
melindres se acham, por algum tem po ainda, confiados à m inha confiança e
guarda. C om o particular, a aspereza da linguagem de V.V. Exas. m e soaria, ape­
nas, com o u m eco da violência geral da quadra e eu a tomaria, quando m uito
com o u m ensaio de adaptação às nuanças da época, com o um a tentativa para
afinar o instrum ento judiciário pela orquestra revolucionária, o que seria um
objetivo louvável, pelo m enos do p on to de vista musical; - e co m essa explica­
ção, satisfeito e tranqüilo, sem rancor o u ressentimento, sem m esm o qualquer
m em ória do acontecido, volveria, sem dizer palavra, à leitura de coisas provei­
tosas. C om o presidente do Instituto da Ordem dos A dvogados de São Paulo
não m e era perm itido, porém , deixar sem protesto - protesto delicado e respei­
toso, mais queixa amistosa que qualquer outra coisa - um a linguagem que p o ­
deria ser recebida pelos m eus com panheiros com o um a ofensa ao Instituto e à
classe dos advogados.
Liquidada esta questão, co m o a primeira, de caráter preliminar, entro, não
sem tem or da m inha fraqueza, no debate dos vários pontos que, num zelo en-
ternecedor pela sorte da Ordem dos Advogados Brasileiros, V.V. Exas. se digna­
ram de por em controvérsia.

202 9àJÊ
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiro s Percursos e Dosatio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

II
O capítulo da inércia

Explicam V.V. Exas. o que estão fazendo, em Campinas, em bem da orga­


nização da Ordem, pela inércia d o Instituto dos Advogados de São Paulo d ei­
xando que passasse, sem nada fazer, o prazo legal para início dos trabalhos
daquela organização. N a verdade, aos juizes das comarcas com pete a formação
das subseções quando delas não curar o Instituto dos Advogados. Posso afian­
çar a V.V. Exas. entretanto, que o Instituto nem é passível da pecha de inerte
nem censurou jamais o procedim ento que V.V. Exas. tiveram. Os prazos para
organização das subseções não foram largos. Nada poderia fazer o Instituto,
nesse particular, sem que, primeiro, obtivesse a lista de todos os advogados do
Estado. Para obtê-la, solicitou o concurso da secretaria da Justiça e o qual, gen­
tilmente, lhe foi concedido pelo secretário de então, o sr. Dr. Florivaldo Linhares.
Mas as listas não vieram com a rapidez necessária. D o s juizes do interior só um ,
que não é qualquer de V.V. Exas., enviou, espontaneam ente, ao Instituto, antes
de qualquer solicitação da secretaria, a referida lista. Essa e outras razões que
não interessam a V.V. Exas. im pediram o Instituto de, no tem po marcado, inici­
ar, em todas as com arcas, sim ultaneam ente, o serviço de organização das
subseções. Aliás, não se preocupou m uito com essa falta confiando, co m o se
achava, no zelo dos juizes. O que ele não pudesse fazer, fariam os juizes e fá-lo-
iam otim am ente. C ondenam V.V. Exas. o Instituto por essa prova de confiança
na magistratura?

III
O capítulo da com petência

N egam V.V. Exas. ao Instituto a atribuição de organizar a “Seção do Esta­


do de São Paulo”, isto é, a de repartir as subseções de maneira que lhe parecer
mais conveniente. C om o V.V. Exas. são hom ens de grande valor intelectual não
lhes faltarão, naturalmente, argum entos esmagadores para defesa desse ponto
de vista. Mas a diretoria da Seção de São Paulo está convencida de que, em face
da lei, é a ela e não aos juizes das comarcas, que com pete a organização da Seção
do Estado de São Paulo e, portanto, das subseções que a constituem . C onven­
ceu-se disso quando leu estes dispositivos d o Regulamento:

•Al 203
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

a) a Ordem com preende um a seção central, com sede no Distrito Fede­


ral, e um a seção em cada Estado e no Território do Acre, com sede na capital
respectiva;
b) cada seção terá personalidade jurídica própria, com inteira autonom ia
quanto à sua organização e administração, sob as norm as do presente Regula­
m ento;
c) as seções desdobram -se em subseções nas várias comarcas do seu terri­
tório;
d) cada subseção terá, p elo m enos, quinze advogados, provisionados, ou
solicitadores inscritos, p od en d o abranger m ais de um a comarca para com ple­
tar esse núm ero (art. 3.*, parágrafo 1 ,2 e 3);
e) nos Estados e no território do Acre as atribuições do art. 102, isto é, as
da organização da Ordem , serão exercidas nas capitais, pelos Institutos dos
Advogados existentes;
f) organizada a diretoria da seção na capital, promoverá esta a formação
das subseções (art. 103, parágrafo ú nico).

Diante desses dispositivos, a diretoria, que presido, convenceu-se e con ti­


nua convencida, de que é a ela, diretoria provisória da Seção de São Paulo e não
aos juizes de Campinas, que com pete dividir o Estado em subseções.
Parece que o b o m senso concorda, neste p onto, com aquela diretoria...
Criticam V.V. Exas. a distribuição que se fez. A crítica é u m direito sagra­
do, que respeito. Pondero, entretanto, que o que se tornou público, até agora,
foi, apenas, a designação da sede das subseções. Feliz ou infeliz, certa ou errada,
essa designação era da com petência da diretoria provisória da Seção de São
Paulo.

IV
O capítulo do dinheiro

Rebelam-se V.V. Exas. contra o assentado pela Seção de São Paulo a res­
peito da renda líquida das subseções.
V.V. Exas. rebelam-se contra a lei. Esta, no art. 7, parágrafo 3.®, diz, expres­
samente, o seguinte: “Toda a renda líquida arrecadada em cada subseção será
logo remetida ao tesoureiro da sessão respectiva”.

204
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s Percursos e D esa fio s il9 .'5 0 - 1 9 4 5 /

O que fez a diretoria provisória da Seção foi, apenas, nom ear um tesourei­
ro provisório para receber as remessas dessa renda líquida. Lim itou-se ela a
indicar a pessoa a quem deviam ser enviadas tais som as para que esse dever
pudesse ser cum prido facilmente por quem quisesse cum pri-lo. Nada mais. Se
V.V. Exas. não podem mandar as som as, que já receberam, porque não sabem
que despesas ainda os esperam, remetam o saldo quando elas estiverem co n ­
cluídas. A diretoria da Seção de São Paulo ainda não exigiu dinheiro algum,
m u ito em bora a lei determ ine que a remessa para a capital deve ser feita logo, e
deposita a m aior confiança na probidade de V.V. Exas., no que não lhes faz
favor algum.

V
O capítulo da inscrição na Ordem

D eterm inou a Seção de São Paulo que a inscrição na Ordem, quanto ao


Estado de São Paulo, se fizesse aqui, na capital. Sustentam V.V. Exas. que para os
advogados do interior, a inscrição deve ser efetuada nas subseções.
C om o devido respeito, parece-m e que V.V. Exas. não têm razão. Vários
juizes já se têm manifestado de acordo com a diretoria de São Paulo, cuja op i­
nião não é arbitrária mas assenta n os textos de lei que posso indicar:
a) ao a seção é que tem personalidade jurídica própria com inteira a uto­
n om ia quanto à sua organização e administração;
b) as seções desdobram -se em subseções nas várias comarcas do seu terri­
tório (art. 3.®, parágrafo 1.® e 2.®)
c) na secretaria de cada seção serão inscritos os m em bros da O rdem co n s­
tituindo o quadro dos advogados da m esm a seção (art. 12).

O que deve ser feito na subseção (art. 15) é, tão só, o pedido de inscrição,
o qual, recebido pela subseção, deverá ser encam inhado por ela, com o seu pa­
recer, à diretoria da seção. A esta é que com pete, na forma do art. 76, n.® 3,
enquanto não existe o Conselho, deliberar sobre a inscrição e cancelam ento
n os quadros da Ordem.
Se qualquer dúvida ainda pudesse subsistir a esse respeito, seria destruída
pela seguinte consideração: no regime criado agora, a inscrição, na Ordem, deve
ser provada pela carteira de identidade de que tratam os artigos 20 e 21 do
Regulamento. Sem essa carteira, o advogado não p ode exercer a sua profissão.

205
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Qualquer interessado tem o direito de exigir que ela seja exibida. A falta de
exibição autoriza o juiz a considerar inabilitado o advogado para exercer a pro­
fissão e a fazer intim ar a parte para constituir novo procurador, além de sujei­
tar o advogado a outras penalidades. Tão im portante é o papel que a carteira
desem penha na vida do advogado que, no caso de pena de suspensão ou cance­
lam ento de inscrição, o advogado é obrigado a restituir a sua carteira à secreta­
ria da Ordem. Pois bem: é a seção, unicam ente a seção, som ente a seção, quem
pode expedir as carteiras de habilitação aos advogados inscritos na Ordem {art.
20). Essas carteiras devem trazer a assinatura de dois diretores da seção, e não
da subseção (art. 20, § 2.®).
Por todos esses m otivos foi que a diretoria provisória da Seção de São
Paulo não reconheceu com petência, quer n os organizadores, quer nas próprias
diretorias provisórias das subseções, para deferirem inscrições. Aos advogados
que se contentarem com essa inscrição, que não o é, ela não expedirá carteiras
de identidade n em considerará inscritos na seção.
Cum pre-m e, ainda, lembrar a V.V. Exas que a seção tem o poder de dar
regulamento interno às subseções (art. 75, parágrafo 7) e de prover ao bom
funcionam ento delas, e nesse poder se inclui o de fixar o lugar das inscrições.
O ato da diretoria provisória da Seção de São Paulo assenta, portanto, em
textos claros de lei. N ão constitui um a exorbitância nem é extravagante.
Parece-me inútil aduzir mais justificações.

VI
O capítulo da conclusão

V.V. Exas. não foram justos com a diretoria provisória da Seção de São
Paulo n em c o m o Instituto da O rdem d os A d vogados. A ntes m esm o de
publicadas no D iário Oficial as atas daquela diretoria, guiados apenas pelos
resumos, aliás fiéis, do que se passou em u m a das suas reuniões, saíram a cam ­
p o V.V. Exas. apressadamente, sem necessidade alguma, contra aquela diretoria
e contra o Instituto dos Advogados.
Se houve precipitação em tudo isso, não foram n em o Instituto da Ordem
dos Advogados nem a diretoria da Seção de São Paulo que a revelaram...
Se V.V. Exas., seguindo exem plo de tantos ilustres magistrados paulistas,
houvessem com unicado à diretoria de São Paulo, em tom am istoso e cordial,
que é o tom natural de conversações entre juizes e advogados, teriam poupado

206
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiros Percursos c D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 19451

a si m esm o s e a nós, m em bros do Instituto da O rdem dos Advogados de São


Paulo, a tristeza deste debate público em tom que não realça o prestígio da
magistratura.
D eixando na m aior parte das comarcas aos juizes de direito a tarefa de
prom over a organização das subseções, o Instituto da O rdem dos Advogados
de São Paulo, repito, deu-lhes um a prova de confiança; e dessa prova se têm
m ostrado dignos. N u nca p en sou ele que o pudessem acoim ar de inerte por se
m ostrar confiante em juizes e, ainda m enos, que a argüição partisse de juizes de
um grande centro forense, c o m o é Campinas, n em tam p ouco que merecesse a
esses juizes a insinuação de que ele, Instituto dos Advogados, não estava cogi­
tando seriam ente do serviço de organização da Ordem no Estado de São Paulo.
N ão é de boa justiça julgar sem pleno conhecim ento de causa e condenar
sem ouvir o denunciado...
Tenho a honra de lhes enviar o presente ofício, em resposta ao de V.V.
Exas., em atenção ao elevado cargo que V.V. Exas. ocupam e à magistratura de
São Paulo, que sempre se m ostrou digna da nossa consideração e a quem pro­
curam os, sempre, por todos os m eios e m odos, cercar de respeito.
C om 0 m aior apreço, subscrevo-m e de V.V. Exas.
a) Plínio Barreto.

207
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

O fício do Presidente Provisório do Conselho Federal da OAB, Levi


Carneiro, em resposta ao o fício encam inhado pelos juizes da
Comarca de Campinas, em 12 de março de 1932, à Diretoria Pro­
visória da Seção de São Paulo

1 de abril de 1932

E x m o s. Srs. D rs. N e ls o n de N o r o n h a G u sta v o e V asco S m ith de


Vasconcellos, digníssim os Juizes de Direito da 1 / e da 2.® Varas de Campinas

Tom ou este C onselho con hecim ento do ofício, n.° 3 de 12 de m arço últi­
m o, em que V.V. Exas. representaram contra resoluções da Diretoria provisória
da Seção do Estado de São Paulo da O rdem dos Advogados.
Apresentaram V .V Exas. cóp ia d o o fício , dirigido por V .V Exas. àquela
D iretoria provisória, e m que im p u gn aram , destacadam ente: 1.° a divisão
do Estado em su b seções, que fun cionarão em diversas com arcas já d esig n a­
das; 1 ° a ordem de ser rem etida a o tesoureiro da D iretoria provisória toda
a renda líquida das subseções; 3.° o esta b elecim en to da co m p etên cia da
D iretoria da Seção para deferir o s req uerim en tos de in scrição dos a d voga­
dos de to d o 0 Estado.
Este Conselho, pela relevância das questões suscitadas, e pela alta con side­
ração devida a V.V Exas., in cu m b iu -m e de estudar o assunto, depois de ouvir a
digníssim a Diretoria da Seção deste Estado - e, exam inando o m eu parecer, e
aprovado, autorizou-m e a responde a V.V Exas. nos term os que se seguem:
A ntes de tudo, p e ç o vên ia para recordar que os autores do R egu lam en ­
to da O rdem dos A dvogados d o Brasil contaram , para a realização dessa
velha aspiração de to d o s o s n o sso s juristas, co m a colaboração de to d o s os
ad vogados e juizes. Ó rgão de discip lin a e m oralização, de fortalecim en to
do prestígio da advocacia e, p o rta n to , d o foro em geral, a O rdem , confiada
exclusivam ente aos ad vogad os não exclui, n o en tanto, a in terven ção dos
m agistrados, quer na fase preparatória, e m falta de Instituto de A dvogados,
(art. 104 d o R egulam ento n.® 2 0 .7 8 4 ), quer de m o d o p erm an en te (art. 9.*),
quer qu anto à p olícia das a ud iências e quanto aos escritos n o s autos (art.
3 0 ), quer, fin alm en te, para a d ecisã o d efin itiva sobre a recusa de a dm issão,
e sobre as penas de suspensão o u can celam en to (art. 4 8 ). A eficiência da

208
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiro s Percursos c D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

O rdem há de resultar, p o is, con tin u a d am en te, da co o p era çã o cordial e e s ­


treita de advogados e juizes - e ainda aí reside um a de suas m ais con siderá­
veis vantagens.
C om o sentim ento dos deveres que a uns e a outros, juizes e advogados,
assim nos incum bem , parece imprescindível que, m áxim e na fase atual, de ajus­
tam ento dessa cooperação para lançar os primeiros alicerces da grande con s­
trução, não avultemos as dificuldades do em preendim ento, m inudeando faltas
o u om issões que as próprias circunstâncias do m om en to bastam para explicar,
e que não é forçoso atribuir a propósitos desairosos.
Peço, com a devida vênia, a benévola apreciação de V.V. Exas. para o fato,
por isso m esm o que a solicitude com que V.V. Exas. prom overam a organização
da subseção da sua comarca, bem m ostra a exata com preensão da relevância da
Ordem dos Advogados e o propósito de cooperar na sua criação.
N o caso atual, todas as dúvidas parecem ter resultado da estreiteza do
prazo fixado para o cu m p rim en to das determ inações regulamentares - es­
treiteza que já levou este C on selh o a pedir ao G overno a prorrogação da data
inicial de obrigatoriedade do R egulam ento aludido. A m esm a circunstância
m otivou , em m uitas com arcas, a intervenção d os juizes na form a d o art. 104.
A D iretoria da Seção desse Estado contou , m u ito acertadam ente, com essa
intervenção - e ela ocorreu, ao que parece, sem incidente algum , a não ser o
que V.V. Exas. se dignaram a trazer ao n osso co n h ecim en to . Esse m e s m o não
avultará desde que, de parte a parte, se p o d em reconhecer os nobres intuitos
das iniciativas assum idas.
A intervenção d os j u iz e s , determinada n o art. 104, ocasional e supletiva
da ação do Instituto, não se confunde, aliás, com a do art. 9.® - que é de natureza
perm anente e mais prolongada. Naquele caso portanto (e o de que ora se trata
é dessa espécie), a intervenção dos juizes locais se condiciona, e conform a com
a da Diretoria da Seção da Ordem.
Ora - e passo assim a considerar a primeira questão suscitada por V.V.
Exas. - entre as atribuições da Diretoria da Seção está, sem diivida, a de organi­
zar as subseções, distribuindo-as pelas comarcas d o Estado, conform e os arts.
3.*> e 4.® do Regulamento n.° 20.784. É o que resulta, de m o d o inequívoco, do
art. 103 § único, d o m esm o Regulam ento - e foi o que fez a Diretoria da Seção
do Estado de São Paulo.
A presentam , p o rém V.V. Exas. pon d erações relevantes sobre a c o n d i­
ção da com arca de C am pinas - e argúem de precipitada a resolução adota­

•Ái 209
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

da, form ulan do dúvidas sobre a anexação de outras com arcas próxim as para
form arem um a única subseção. Q ualquer precipitação, que p udesse ter h a ­
v id o , será plenam ente desculpável pela estreiteza de tem p o , já acentuada.
A lém disso, p orém , é de notar que a d ivisão das su b seções não é inalterável.
C ircunstâncias supervenientes p o d e m exigir a sua alteração. P ode exigi-la,
m esm o , m elh or co n h e c im e n to das co n d içõ es locais. E, e m to d o caso, essa,
c o m o qualquer outra resolução da D iretoria da Seção, contrária ao R egula­
m e n to e aos interesses da O rdem , p oderá ser derrogada, o u revogada, pelo
C o n selh o Federal (art. 84 n."* V, VI - I X e X I). C aso a D iretoria da Seção de
São Paulo não atenda - nada ta m b ém im pedirá que elas sejam o p o r tu n a ­
m en te renovadas perante o C o n selh o Federal, q u a n d o este fique c o n stitu í­
do, e en tã o d efinitivam ente resolvidas. C o m o quer que venha a ser, merece
destaque o fato de, nesse grande e a d ia n tad íssim o Estado, só ter havido
im p u gn ação, contra a divisão de 120 com arcas, feita pela D iretoria da S e­
ção estadual, por parte de V.V. Exas. - e q uan to à com arca e m que tão d ig ­
nam en te exercem a m agistratura.
Quanto à segunda questão visada por V.V. Exas., parece perfeitamente acei­
tável o alvitre adotado por V.V. Exas., isto é, aguardar a eleição da Diretoria da
subseção local, prestar-lhe, então, contas da renda arrecadada, cabendo a essa
Diretoria enviar à Diretoria da Seção a dem onstração da renda líquida e a im ­
portância respectiva. Também parece, aliás, que nenhum a exigência imediata
fizera, nesse sentido, a Diretoria provisória da Seção. O em inente Presidente
dessa Seção declarou, expressamente, n o ofício dirigido a V.V. Exas., que - n e ­
nhum a exigência fora feita, e que a remessa do saldo poderá ser feita quando
concluídas as despesas de que dependia a sua apuração.
A terceira e última questão gira, ao que se m e afigura, em torno de um
pequeno equívoco, que se m e depara no ofício de V.V. Exas. N ão pod e haver,
nem há, ao que suponho, dúvida quanto a interpretação do Regulamento. Por
ele, é ao Conselho estadual, e não à Diretoria da subseção, que com pete deferir
o s pedidos de inscrição; a subseção apenas recebe os pedidos, e inform a-os,
transm itindo-os ao Conselho, que delibera (arts. 15 e seu § 20, e 76 n.‘* 3). Em
falta do C onselho cabem as suas atribuições à Diretoria respectiva (art. 78).
Entretanto, alegam V.V. Exas. que “o art. 103 do Regulamento deu aos Institu­
tos dos Advogados dos Estados a atribuição de organizar a Ordem na seção da
capital do Estado e nas subseções das diversas comarcas, limitando essa com petên­
cia até 3 1 de janeiro último”, data em que extinguiria - ao passo que o Instituto de

210 «ÁB
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiros Percursos c D e s a f i o s í 1 9 3 0 - 194:^1

São Paulo não promoveu “qualquer organização das subseções no interior do Esta­
do, 0 que se comprova desde logo, pois somente na reuniào de 4 de m arço a Direto­
ria provisória entendeu de tomar as providências a que vim os nos referindo”.
D evo salientar que há ligeiro equívoco, nessas afirmativas, ao m enos em
atribuírem aos Institutos d os A dvogados o encargo de organizar as subseções.
Esse encargo cabe, nos term os do § único do art. 103 do Regulamento, à D ire­
toria da seção da capital. E aos Institutos de Advogados caberia, apenas, eleger o
núcleo inicial desta Diretoria, isto é, a m aioria dos seus m em bros, conform e o
art. 102. Pode supor-se que o Instituto de São Paulo não tenha sido retardatário
no cum prim ento desse dever, pois não consta que os juizes da capital do Estado
houvessem exercido a atribuição correspondente, com o dispõe o art. 104.
D e qualquer m od o, não seria, pois, aos juizes locais que caberia deferia a
inscrição d os advogados, provisionados e solicitadores. Os juizes das comarcas,
com o V.V. Exas., exercitam as atribuições das diretorias das subseções;- mas, já
vim os que, entre essas atribuições, se não inclui a de adm itir nos quadros da
Ordem. A adm issão em tais quadros, isto é, o deferim ento dos pedidos de ins­
crição, cabe à Diretoria da seção, ou, em falta dela, aos juizes que a substituam,
na capital do Estado. Portanto, se o Instituto de Advogados de São Paulo não
tivesse exercido o encargo que o Regulamento lhe confere, n em por isso in ­
cum biria a V.V. Exas. deferir o pedido de inscrição - m as, sim, aos juizes que, na
capital d o Estado, exercessem as funções da diretoria provisória. Aliás, o fato
m esm o de estar funcionando a Diretoria eleita pelo Instituto dos Advogados,
m ostra que este cum priu o seu dever legal.
Parece pois, a este Conselho, que V.V. Exas. devem transmitir à Diretoria
da seção estadual os requerimentos de inscrição que lhes tenham sido apresen­
tados para que ela resolva sobre o seu deferimento. É, por igual, evidente que
V.V. Exas poderão declinar d o encargo de organizarem a subseção de sua
comarca, reclamando da Diretoria da seção estadual a designação de um a D i­
retoria provisória para a m esm a subseção, que tom e a si o encargo aludido.
N o ofício dirigido a este Conselho, assinalam ainda V.V. Exas. a irregulari­
dade de se não fazerem as publicações no D iário Oficial, c o m o determ ina o art.
96 do R egulam ento. Q uanto a esse ponto já o sr. dr. Presidente da Seção de São
Paulo declarou que as publicações estão se fazendo na folha oficial, tendo havi­
do, apenas, retardamento pela dem ora de aprovação de uma ata.
Antes de encerrar estas páginas, já por demais alongadas, devo com unicar
a V.V. Exas. que este C onselho resolveu agradecer a V.V. Exas. a solicitude com

«▲B 2 77
______________ História_da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

que cooperaram para a organização da Ordem na comarca a seu cargo, e m an i­


festar a esperança de que, por igual, auxiliem sempre o desenvolvim ento e o
prestígio do m esm o instituto.
Valho-m e desta oportunidade para apresentar a V.V. Exas. os protestos de
m inha m ais alta e respeitosa consideração.

Levi Carneiro
Presidente Provisório

212 9AI
V o lu m e 4 C r ia ç a o , P rim eiro s Percursos c D e s a fio s i l ‘ ) 3 0 - 1 9 4 5 )

DECRETO N,° 22.478, DE 20 DE FEVEREIRO DE 1933

Aprova e manda observar a consolidação dos dispositivos regula-


mentares da Ordem dos Advogados do Brasil

O Chefe do Governo Provisório da República dos Estados U nidos do Bra­


sil, usando das atribuições que lhe confere o artigo M d o D ecreto n.° 19.398. de
11 de novem bro de 1930, decreta;
Artigo único. Fica aprovada a Consolidação que a este acom panha, assi­
nada pelo M inistro de Estado da Justiça e N egócios Interiores, das disposições
dos Decretos n.° 20.784, de 14 de dezem bro de 1931; n.® 21.592, de 1 de julho;
n.° 22.039, de 1 de novem bro e n.° 22.266, de 28 de dezembro de 1932; revogadas
as disposições em contrário.
Rio de Janeiro, 20 de fevereiro de 1933; 112® da Independência e 45° da
República.

GETÚLIO VARGAS

Francisco A ntunes Maciel

•àl 213
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

CONSOLIDAÇÃO DOS DISPOSITIVOS REGULAMENTARES


DA OAB, DE 20 DE FEVEREIRO 1933

Consolidação das disposições dos D ecretos n.° 20.784, de 14 de dezembro


de 1931, n° 21.592, e 1 de julho de 1932, n “ 22.039, de 1 de novem bro de 1932
e n.® 22.266, de 28 de dezembro de 1932.

CAPÍTULO I
D a Ordem, seus fins e organização

Art. 1° A Ordem dos Advogados do Brasil, criada pelo artigo 17 d o D ecre­


to n.® 19.408, de 18 de novem bro de 1930, é o órgão de seleção, defesa e discipli­
na da classe dos advogados em toda a República.
Art. 2® A O rdem constitui serviço público federal, ficando, por isso, seus
bens e serviços e o exercício de seus cargos isentos de todo e qualquer im posto
o u contribuição.
Art. 3® A Ordem com preende 22 seções, sendo um a no distrito federal,
em cada estado e n o Território do Acre, com sede nas capitais respectivas.
§ 1° Cada seção terá personalidade jurídica própria, com inteira autonomia
quanto à sua organização e administração sob as normas do presente regulamento.
§ 2® As seções dividem -se em subseções, nas várias comarcas do seu terri­
tório, p od en do, todavia, por m otivo de circunstâncias especiais, dispensar-se
essa divisão.
§ 3® Cada subseção terá, pelo m enos, 15 advogados, provisionados, ou
solicitadores, inscritos, podendo abranger m ais de um a comarca para com p le­
tar esse número.
§ 4® Q u a n d o as c o n d iç õ e s lo ca is torn arem in co n ven ien te form ar a
subseção, abrangendo várias comarcas na forma d o § 3®, poderá o C onselho de
seção respectiva reduzir o núm ero m ín im o determ inado nesse parágrafo.
§ 5° O C onselho da Seção poderá, atendendo a conveniências locais, reu­
nir, criar, ou desdobrar subseções, adotando, todas as providências que en ten ­
der acertadas; e com unicando-as logo ao Presidente da Ordem.
Art. 4° A Ordem exercerá suas atribuições em todo o território nacional,
pelo Conselho Federal, e pelo presidente e secretário-geral; em cada seção, pela
assembléia geral, pelo conselho e pela diretoria; em cada subseção, pela direto­
ria e pela assembléia geral.

214 «▲I
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s Percursos c D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

Art. 5° Os governos federal e estaduais proverão à instalação condigna da


O rdem e seus arquivos, sempre de preferência no Palácio da Justiça, Forum ou
edifício do Tribunal Superior.
Art. 6® O patrim ônio da O rdem será form ado de donativos, legados, sub­
venções, bens adquiridos e da contribuição determinada n o artigo 87.
Art. O patrim ônio de cada seção da Ordem será constituído:
a) pelas taxas anuais e de inscrição;
b) pelas multas ou. contribuições im postas aos m em bros da Ordem, n o
term os deste regulamento;
c) p o r bens e valores adquiridos;
d) por subvenções oficiais;
e) por legados e doações;
f) por quaisquer valores adventícios.
§ 1® Em cada seção da Ordem será form ado u m fundo de assistência pela
quarta parte da renda líquida apurada, a fim de auxiliar seus m em bros necessi­
tados, quando inválidos ou enfermos.
§ 2") Um a oitava parte da renda líquida de cada seção será anualm ente
entregue, no Rio de Janeiro, ao Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros
e, nos Estados, ao Instituto existente na localidade, filiado àquele m esm o Insti­
tuto, a fim de ser aplicada e m prêm ios por estudos jurídicos.
§ 3*^ Toda a renda líquida arrecadada em cada subseção será logo remetida
ao tesoureiro da seção respectiva.
§ 4° Para os efeitos dos dispositivos supra, considera-se líquida a renda
total com a só dedução das despesas do pessoal e expediente.
Art. 8° A diretoria, o conselho e a assembléia não discutirão, n em se pro­
nunciarão sobre assunto im ediatam ente não atinente aos objetivos da Ordem.
Art. 9° N o s Estados, o u nas comarcas, em que se não formar, ou não funci­
onar a seção ou subseção da Ordem, o juiz togado de mais alta hierarquia e mais
antigo, que ai tenha sede, se houver, exercerá, na forma do presente regulamento,
todas as atribuições que caberiam ao conselho da seção, ou à diretoria da subseção.

CAPÍTULO II
D o s proibidos e dos im pedidos de procurar em Juízo

Art. 10. São proibidos de procurar em juízo, m esm o em causa própria:


1 — os juizes, federais ou locais, inclusive de tribunais administrativos e

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______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

militares, ou especiais, excluídos, porém , os juizes suplentes que não percebam


vencimentos dos cofres públicos, ressalvado o disposto no artigo 11, n.°s II e IV;
II — os chefes do Poder Executivo, m inistros o u secretário de Estado, da
U nião, dos Estados e do Território d o Acre;
III — os funcionários e serventuários — salvo os que exercerem cargos
periciais, nos juízos em que não funcionarem. Esta proibição atinge os fu n cio­
nários e empregados das secretarias e mais serviços dos tribunais e juízos, res­
tringindo-se em relação a esses à justiça federal o u estadual, de que faça parte o
m esm o tribunal o u juízo;
IV — as autoridades e funcionários policiais em geral, em matéria criminal;
V — os funcionários da Fazenda, exatores ou fiscais, em geral, não inclu­
ídos os incum bidos sim plesm ente da escrituração de rendas, sem encargo de
fiscalização direta de contribuintes, e os que só eventual, ou secundariamente,
exerçam tal fiscalização;
VI — os inibidos de procurar e m juízo, ou de exercer cargo público, em
virtude de sentença judicial transitada em julgado;
VII — os corretores de fundos públicos, de mercadorias, ou de navios, os
agentes de leilões, trapicheiros e empresários, ou administradores de armazéns
gerais;
VIII — as pessoas não habilitadas na form a deste regulamento;
IX — as demais pessoas proibidas por lei, decreto ou regulamento federal,
estadual o u m unicipal anterior ou posterior a este regulamento, especialmente
quando exerçam função pública, ainda que incluídas, de m o d o genérico, nas
perm issões de correntes do presente artigo.
Art. 11. São im pedidos de procurar em juízo, m esm o em causa própria:
I — os chefes do Executivo M unicipal no território respectivo;
II — os juizes suplentes referidos no art. 10, n.° I, quando n o exercício
pleno da jurisdição, ou, em qualquer caso, perante o juízo, a que pertençam; os
suplentes, que tenham direito a vencim entos, ficarão com preendidos neste dis­
positivo, quando renunciarem, definitivamente e por forma legal, aos ven ci­
m entos de seus cargos;
III — os peritos judiciários n os juízos em que funcionarem;
IV — os membros do Ministério Público, federal e local, e os juizes e funcio­
nários dos tribunais eleitorais, em processos contenciosos, ou administrativos, que
direta ou indiretamente incidam, o u possam incidir nas funções de seu cargo;
V — os funcionários públicos administrativos, e, bem assim, os membros

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V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiro s Percursos c D e s a fio s 11 9 3 0 - 1 9 4 5 /

do Poder Legislativo federal, estadual ou m unicipal - todos, com o procuradores


de empresa concessionária de serviço público, subvencionada pelos cofres públi­
cos, ou da qual, a Fazenda Pública seja acionista ou associada, e, ainda, em toda e
qualquer causa contra a Fazenda Pública, ou em que tenha interesse, principal e
direto, o ramo da Fazenda Pública a que, por seus cargos, se acham ligados;
VI — as dem ais pessoas im pedidas por lei, decreto, o u regulamento, fede­
ral, estadual ou m unicipal, anterior ou posterior a este regulamento, especial­
m ente quando exerçam função pública, ainda que incluídas, de m o d o genérico,
nas perm issões decorrentes do presente artigo.

CAPÍTULO III
Da adm issão à Ordem

Art. 12. Na secretaria de cada seção inscritos os m em bros da Ordem, co n s­


tituindo o quadro dos advogados da m esm a seção.
Parágrafo único. Serão tam bém inscritos os provisionados e solicitadores
em quadro distinto, não podendo, porém , tom ar parte nas discussões e delibe­
rações.
Art. 13. Para inscrição no quadro dos advogados da Ordem é necessário,
além dos requisitos legais de capacidade civil:
I — ser bacharel, ou doutor em direito, por faculdade reconhecida pelas
leis da República, o u sob fiscalização perm anente d o G overno Federal, ao te m ­
po da formatura ou ulteriorm ente (ficando entendido nessa conform idade o
disposto n o artigo 1° do Decreto n." 21.592, de 1 de julho de 1932); o u por
faculdade de país estrangeiro, legalm ente reconhecida, e confirm ado o grau no
Brasil, salvo o disposto em tratados internacionais relativos ao reconhecim ento
recíproco de títulos;
II — ser brasileiro, nato ou naturalizado, e estar alistado com o eleitor,
salvo enquanto o não puder ser p or m otivo de idade.
Os estrangeiros serão adm itidos nas m esm as condições estabelecidas para
os brasileiros em seus respectivos países de origem , ressalvados os direitos dos
quem , na data deste decreto, já exerçam a advocacia n o Brasil;
III — não ser, nem estar proibido de exercer a advocacia;
IV — não estar, nem Ter sido condenado por sentença, de que não caiba
recurso ordinário, por qualquer dos seguintes crimes: in cên d io e outros de p e ­
rigo com um (C ódigo Penal artigos 136,140 e 144 a 147), prevaricação (Código

277
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Penal, artigos 207 e 209), peita o u suborno (C ódigo Penal artigos 214 a 218),
concussão (C ódigo Penal artigos 219 e 220), peculato (Lei n.® 4.780, de 27 de
dezem bro de 1923), abuso de autoridade (Artigo 232, C ódigo Penal e Lei n.“
4.780, de 1923), m oeda falsa, falsidade de docum entos e demais crim es de falsi­
dade, punidos pela Lei n.° 4.780, de 1923, contrabando (C ódigo Penal, artigos
265), lenocínio (C ódigo Penal artigos 277 e 2q78 e Lei n.° 2.992, de 25 de
setembro de 1915), fingim entos definidos n o C ódigo Penal, artigos 287 e 288,
hom icíd io qualificado (C ódigo Penal, artigos 294, e 39, §§ 6 ° e 10.®), destrui­
ção de livros e docum entos (C ódigo Penal, artigo326), furtos e apropriação
indébita (C ódigo Penal, artigos 330 e 334), falência fraudulenta (Decreto n.®
5.746, de 9 de dezem bro de 1929, artigos 169 e 173), estelionato, abuso de co n ­
fiança e outras fraudes (C ódigo Penal, artigos 338 e 339), roubo (C ódigo Penal,
artigos 356 e 361), extorsão (C ódigo Penal, artigos 362 e 363), os definidos nos
artigos 1° e 5° da Lei n.® 4.294, de 6 de julho de 1921, contra a independência, a
integridade e a dignidade da Pátria (artigos 87 e §§ 88, 89 e 91, do Código
Penal), em geral qualquer crime com etido com a agravante do § 11 do artigo 39
do Código Penal, ou em quaisquer contravenções dos artigos 369, 373, 380 e
381 do Código Penal, ou em qualquer crime ou contravenção definido nas leis
que ulteriormente venham a m odificar ou substituir os dispositivos acima cita­
dos, referentes às m esm as figuras delituosas;
V — gozar de boa reputação por sua conduta pública atestada por trê
advogados inscritos na Ordem.
Parágrafo único. Os crim es políticos (salvo os acima enum erados), assim
co m o as convicções ou atitudes políticas, o u religiosas, por si sós, não im p edi­
rão a admissão no quadro da Ordem.
Art. 14. Para a inscrição no quadro dos provisionados e solicitadores da
Ordem , é necessário, além dos requisitos legais de capacidade civil:
I — ter a provisão respectiva, com prazo legal, passada pela autoridade
judiciária federal, o u local, com petente, e registrada na Secretaria da Ordem.
Os alunos das Faculdades de Direito reconhecidas pelo Governo Federal,
depois de concluírem o terceiro a no d o curso jurídico, poderão, m ediante sim ­
ples requerimento, obter carta de solicitador;
II — preencher os requisitos dos n.°s II, III, IV e V, do artigo 13.
Art. 15. A inscrição nos quadros da Ordem se fará m ediante requerimento
escrito, dirigido ao presidente da seção do Distrito Federal, ou da subseção,
instruído com os docum entos com probatórios do preenchim entos dos requi­

218 9AM
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 J 0 - 1 9 4 5 )

sitos dos artigos 13 e 14, e m enção de todas as localidades em que haja exerci­
do, anteriormente, a profissão, e da em que, esse tem po, tenha seu dom icílio
eleito, ou a sede principal da advocacia, o nde exercerá o direito de voto na Or­
dem.
Parágrafo único. O requerimento será logo encam inhado ao Conselho,
com 0 parecer da diretoria da sub-seção, ou da C om issão de Sindicância, no
D istrito Federal.
Art. 16. O pedido de inscrição será noticiado por aviso afixado na porta
da sede d o C onselho e pela imprensa, on de a houver, cin co dias úteis, pelo
m enos antes de deliberação do Conselho.
§ 1® Se o C onselho recusar a inscrição requerida, remeterá cópia d o pare­
cer, quando opinar pela recusa, e da decisão, com os m otivos, ao candidato
recusado.
§ 2® O candidato recusado poderá, dentro de quinze dias, da ciência da
decisão, contestar docum entadam ente os m otivos determ inantes da recusa e
pedir ao C onselho que a reconsidere.
§ 3° Se o C onselho mantiver a recusa, o candidato poderá recorrer da
decisão, dentro de quinze dias, após a ciência dela, para o C onselho Federal.
§ 4® Qualquer m em bro da Ordem, ou pessoa interessada, poderá represen­
tar docum entadam ente ao Conselho contra o candidato proposto ou recusado.
§ 5° O C onselho tomará, sim ultaneam ente, conhecim ento do pedido de
inscrição, o u de reconsideração, e de qualquer impugnação.
Art. 17. O disposto no artigo antecedente será aplicável ao cancelam ento
da inscrição em razão da falta por perda ou carência anterior, de qualquer dos
requisitos dos artigos 13 e 14 sendo com petente para prom over o cancelam en­
to da inscrição ou averbação de im pedim ento, superveniente, ou reconhecido
ulteriormente.
§ 1° Dar-se-á do m esm o m odo, a suspensão da inscrição, em caso da d o ­
ença mental do inscrito, devidam ente comprovada.
§ 2® Havendo pedido de reconsideração nos casos deste artigo e do prece­
dente, se o Conselho da Seção não o atender, mandará subir o processo desde
logo com recurso ao Conselho Federal, salvo desistência expressa do interessado.
Art. 1 8 .0 advogado, logo que passe a exercer, de m o d o perm anente, ativi­
dade profissional e m outra seção, requererá inscrição n o quadro respectivo, ou
para ele se transferirá, ficando, em tod o o caso, sujeito à jurisdição disciplinar
do Conselho-local pelos atos praticados em qualquer seção.

219
______________ HisíQríaLda
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Parágrafo único. Q uando alterar o dom icílio indicado, na forma do artigo


15, fará o advogado as com unicações necessárias.
Art. 19. Perante o presidente da seção, o u da subseção prestarão os advo­
gados, provisionados, e solicitadores, depois de inscritos no quadro da Ordem,
e antes de com eçar a exercer a profissão, o com prom isso de fielmente observar
as regras a que estão sujeitos por este regvilamento.
Parágrafo único. A prestação do com prom isso será apostilada no título de
habilitação profissional, a fim de que este possa ser registrado n os tribunais ou
juízos com petentes.
Art. 20. A Ordem, pela seção em que tenham d om icílio (artigo 15), expe­
dirá carteiras de identidade aos advogados inscritos em seu quadro, que habili­
tarão ao exercício da advocacia em todo o país salvo o disposto n o parágrafo
único do artigo 101, m encionando-se, na m esm a carteira, as seções em que
tam bém o façam, ou venham fazer, perm anentem ente.
§ 1®A O rdem tam bém pelas seções respectivas expedirá carteiras de iden­
tidade para os provisionados e solicitadores, inscritos, ali domiciliados, das quais
constará a zona em que poderão exercer os atos de sua profissão, conform e a
legislação aplicável.
§ 2° As carteiras serão assinadas por dois diretores, pelo m enos, e reco­
nhecidas as suas firmas por notório da m esm a localidade.
§ 3® Q uando o advogado, inscrito em qualquer subseção, ou seção d o D is­
trito Federal, tiver de funcionar, temporariamente, o u acidentalm ente, em o u ­
tra, apresentará ao presidente desta, sua carteira de identidade, que será por ele
visada, fazendo-se as necessárias anotações no quadro da seção.
§ 4® Q uando deixar, temporária ou definitivamente, de exercer a ativida­
de profissional em qualquer subseção, deverá o advogado provisionado, ou
solicitador, renovar a apresentação de sua carteira, procedendo-se nos termos
do parágrafo precedente.
§ 5® N a carteira de cada m em bro da Ordem, serão anotados o seu d om icí­
lio, na form a do artigo 15, e a proibição, ou im pedim ento, em que incorre nos
term os dos artigos 10 e 11.
§ 6® As anotações, a que se referem os parágrafos precedentes, com prova­
rão o exercício da advocacia para tod os os efeitos legais, e especialm ente para
os fins do artigo 61.
§ 7® A exibição da carteira pode ser, e m qualquer oportunidade, exigida
por qualquer interessado, a fim de verificar a habilitação profissional. Se, nesses

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V o lu m e 4 Criac^ão, P rim eiro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

casos, 0 procurador judicial não exibir a carteira exigida, ficará excluída sua
intervenção, podendo, conform e as circunstâncias, considerar-se por tal fato,
verificada a falta prevista no artigo 27, n.®s VI, VII e VIII.
Todavia, o procurador continuará a funcionar, se assinar logo o com pro­
m isso de exibir a carteira, dentro do prazo de cinco dias, prorrogável por mais
15, por despacho d o juiz do feito e m ediante prova de m otivo relevante. Se não
for apresentada nesse prazo a carteira, ou se, apresentada, se verificar que o
procurador não podia praticar o ato, será este anulado, incorrendo o advogado,
provisionado ou solicitador, em responsabilidade na form a deste regulamento.
§ 8° N o caso de expedição de nova carteira serão exaradas nesta todas as
anotações constantes dos livros da O rdem sobre o associado a que pertença.
§ 9® O Regim ento Interno do C onselho Federal determinará as form ali­
dades, 0 prazo e os em olum entos a pagar, para expedição de nova carteira, em
caso de perda, devidam ente justificada.
§ 10. Logo que requerida nova carteira, na form a do parágrafo preceden­
te, a Secretaria do C onselho expedirá certificado que assegure ao possuidor da
carteira o exercício da advocacia se não estiver sob proibição na forma deste
regulam ento, m encionando n o certificado qualquer im pedim ento ou restrição
existente.

CAPÍTULO IV
D o exercício da advocacia

Art. 21. A inscrição n o quadro de qualquer das seções da Ordem, com pro­
vada pela carteira de identidade (artigo 20), autoriza o exercício da profissão
conform e este regulamento.
Art. 22. Em qualquer Juízo, contencioso o u administrativo, cível o u cri­
m inal, salvo quando a habeas corpus, o exercício das funções de advogado,
provisionado ou solicitador, som ente será perm itido aos inscritos no quadro
da O rdem e no gozo de todos os direitos decorrentes, de acordo c o m este regu­
lamento.
§ 1° N o foro criminal, sempre, o próprio acusado se poderá defender pes­
soalm ente.
§ 2® Serão assinados por advogados, inscritos nos quadros da Ordem, to ­
das as petições iniciais e de recurso, articulados e arrazoados, com petindo-lhes
a sustentação oral em qualquer instância.

221
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

§ 3® N a primeira instância das justiças estaduais, é facultada a advocacia


aos provisionados segundo a legislação local, depois de inscritos n o quadro da
Ordem.
§ 4® C om pete aos solicitadores, inscritos n o quadro da Ordem, a assistên­
cia das causas em juízo, recebendo as intim ações para andam ento dos feitos,
assinando os term os de recurso e os escritos não enum erados n o § 2®, e prati­
cando os atos de audiência e cartório.
§ 5® É ilícito aos advogados e aos provisionados praticar todos os atos
perm itidos aos solicitadores.
§ 6® À Fazenda Estadual é facultada a representação nos processos adm i­
nistrativos, inclusive de falência, nos juízos de fora da capital, por funcionários
de justiça o u administrativos, no desem penho das atribuições regulamentares
de seus cargos o u quando habilitados para a m esm a representação, derrogado,
para esse feito, o disposto no artigo 10, n.° V, deste decreto.
Art. 23. É lícito, entretanto, às partes defenderem seus direitos, por si m es­
mas ou por procurador, m ediante licença d o juiz competente:
I — não havendo, ou não se achando presente, advogado ou provisionado,
ou solicitador, inscrito na Ordem na sede da comarca;
II — r e c u sa n d o -se a aceitar o p a tr o c ín io da causa o s ad vogad os,
provisionados, o u solicitadores, da comarca, ou estando impedidos;
III — não sendo estes, por m otivo relevante e provado, de confiança da
parte.
§ 1" Os advogados, provisionados e solicitadores, presentes na sede da
comarca, serão sempre ouvidos sobre o pedido de licença.
§ 2® Se a licença for requerida para dissimular o exercício da advocacia
por procurador não habilitado o u devido a qualquer outro m otivo de m á-fé, o
mandatário incidirá na proibição de exercer m andato judicial por tem po não
excedente de um ano, e o constituinte ficará sujeito ao pagam ento das custa em
dobro — em virtude da sentença judicial proferida de plano.
$ 3* Os procuradores licenciados não poderão cobrar honorários além
dos previstos no regim ento de custas, e ser lhes-ão aplicáveis, no exercício do
m andato judicial, as disposições concernentes aos solicitadores, salvo o pres­
crito neste artigo.
§ 4° N as hipóteses previstas neste artigo, tratando-se de matéria criminal,
qualquer cidadão idôneo, no gozo de seus direitos civis, poderá ser nom eado
defensor do réu.

222 9àM
V o lu m e 4 CJriação, P rim eiro s Percursos c- D e s a fio s ( 1 9 3 0 - ^ 9 4 j )

Art. 24. São nulos os atos praticados em juízo por pessoas proibidas de
procurar e m juízo (C ódigo Civil, artigo 145, n.° V);
§ 1° Q uando praticado por pessoa im pedida (artigo 11), o ato será anulá-
vel som ente a requerim ento de outra parte interessada no m esm o processo.
§ 2® N inguém poderá intervir com o advogado, provisionado, ou solicitador,
em processo em que deva funcionar, o u tenha funcionado, co m o juiz, perito,
o u em desem penho de qualquer outro encargo, o u serviço de justiça.

CAPÍTULO V
D o s direitos e deveres dos advogados, provisionados e solicitadores

Art. 25. São direitos dos advogados;


I — exercer os atos de sua profissão, de conform idade com as leis e os
regulam entos aplicáveis;
II — com unicar-se livremente com seus clientes, sobre os interesses judi­
ciais destes, ainda quando se achem em prisão;
III — guardar sigilo profissional;
IV — ingressar os cancelos dos Tribunais e Juízos;
V — tom ar assento à direita dos juizes de primeira instância; falar senta­
dos; requerer pela ordem de antigüidade, e reiterar-se das sessões e audiências,
independentes de licença;
VI — receber autos com vista, ou em confiança, na form a das leis de pro­
cesso;
VII — contratar, verbalmente, ou por escrito, honorários de acordo com
as praxes e taxas habituais no local, sendo, porém , vedado estipular, a título de
honorários, a participação em bens;
VIII — não ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgado,
senão em sala especial de Estado-Maior;
IX — usar vestes talares;
a) aos m em bros do Instituto da O rdem dos A dvogados Brasileiros é facul­
tado o u so das vestes talares privativas, outorgadas pelo D ecreto n.® 393, de 23
de novem bro de 1844.
§ 1° Aos provisionados e aos solicitadores aplica-se o disposto nos n.°s I a
III, VII a VIII.
§ 2® Nas audiências os provisionados e solicitadores tomarão assento à
esquerda dos juizes, falarão e requererão de pé.

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______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Art. 26. São deveres dos advogados, provisionados e solicitadores;


I — velar pela existência e fins da O rdem e cum prir as obrigações decor­
rentes deste regulamento, exercendo sua profissão co m zelo, probidade, dedi­
cação e espírito cívico;
II — observar os princípios da ética profissional, nos term os do Código
respectivo;
III — dar conhecim ento ao presidente do C onselho da incidência em qual­
quer dos casos dos artigos 10 e 11;
IV — aceitar e exercer, co m desvelo, os encargos com etidos pela Ordem,
pela Assistência Judiciária, o u pelos juizes com petentes.
Art. 27. C o n stitu i falta n o ex ercício da profissão, p elos advogados,
provisionados, o u solicitadores:
I — facilitar, por qualquer m eio, o exercício da profissão aos proibidos ou
im pedidos de procurar em juízo;
II— não prestar, no prazo determinado, as informações ou esclarecimentos
requisitos pelo Conselho ou pela diretoria da Ordem, o u por seu presidente;
III — faltar, de m o d o in e q u ív o c o , e j u s t if ic a d o , a o s d ev e r e s de
confraternidade com os demais advogados;
IV — violar sigilo profissional;
V — não observar o tratamento respeitoso habitualmente prestado aos
membros da magistratura, ministério público e às autoridades em suas fiinções;
VI — prejudicar, por dolo ou culpa, interesse confiado a seu patrocínio;
VII — acarretar conscientem ente, por ato próprio, a anulação o u nulida-
de do processo em que funcione;
VIII— exercer a advocacia não estando habilitado na forma deste regulamento;
IX — locupletar-se, por qualquer forma, à custa do cliente o u da parte
adversa, por si ou interposta pessoa;
X — estabelecer entendim ento co m a parte adversa, sem autorização ou
prévia, ciência do cliente, ou do advogado ex-adverso;
XI — recusar injustificadam ente prestar contas ao cliente de quantias re­
cebidas dele, o u de terceiro por conta dele;
XII — aceitar honorários, ou qualquer recompensa, quando funcionar
pela Assistência Judiciária, o u nos casos de nom eação pelo Juízo, de ofício salvo
se a parte contrária tiver sido condenada a satisfazê-los por decisão judiciária;
XIII — receber provento da parte contrária, ou do terceiro, sem prévia e
expressa aquiescência do seu cliente;

224 9àM
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiro s Percursos o D cs.itio s i1 '-)30 - 1 9 4 3 )

XIV — ou aceitar do cliente qualquer im portância para aplicação ilegal o


desonesta;
X V — assinar parecer, articulado, arrazoado, o u qualquer escrito destina­
do a processo judicial, que não tenha feito ou e m que haja colaborado;
XVI — advogar dolosam ente contra literal disposição da lei:
a) entender-se-á, sempre, de boa-fé, todo requerim ento o u alegação com
apoio e m julgado anterior;
XVII — revelar, oralmente ou por escrito, negociações, para acordo ou
transação, entaboladas com a parte contrária, o u seu advogado, desde que e n ­
volvam fato de natureza confidencial;
XVIII — prestar concurso ao cliente, a terceiro, para a realização de acor­
do contrário à lei o u destinado a iludi-la;
X IX — reter abusivamente, ou extraviar, autos recebidos com vista, ou em
confiança;
XX — solicitar, direta ou indiretamente, o patrocínio de qualquer causa
para auferir remuneração;
XXI — infringir qualquer preceito do código de ética profissional, ou des­
te regulamento.
Parágrafo único. As faltas serão consideradas graves, leves o u escusáveis,
conform e a natureza do ato e as circunstâncias de cada caso.

CAPÍTULO VI
Das penalidades e sua aplicação

Art. 28. O poder de punir disciplinarmente os advogados, provisionados e


solicitadores, compete ^clusivamente ao Conselho da Seção, em que estiverem ins­
critos ao tempo do fato punível, ou em que ocorreu, nos termos do artigo 20, § 3°.
Parágrafo único. Q uando se tratar de falta com etida perante o C onselho
Federal, o u constante de processo subm etido ao seu conhecim ento, poderão
m esm o C onselho aplicar, de plano, as penas do artigo 76, n.® 4 a e b, ou p ro m o ­
ver processos para im posição de qualquer outra penalidade.
Art. 29. A jurisdição disciplinar, estabelecida neste regulam ento, não
derroga a jurisdição co m u m quando o fato constitua crim e p u n id o em lei.
Art. 30. Os juizes e tribunais exercerão a polícia das audiências e correção
de excessos verificados em escrito n os autos.
§ 1° Pelas faltas disciplinares com etidas em audiências, os juizes e tribu-

•àl 225
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

nais poderão som ente aplicar as penas disciplinares de advertência e exclusão


do recinto. \
§ 2° Se as faltas em audiência forem graves, deverá o juiz o u tribunal, f
com petente, leva-las ao conhecim ento do C onselho da Ordem, que procederá j
n os term os deste regulamento. l
Art. 31. (Ds juizes devem representar a qualquer órgão da Ordem, com pe- {
tente para conhecer do caso, desde que tenham conhecim ento de fato, que co- s
lida ou atinja dispositivo deste regulamento. J
Art. 3 2 .0 Conselho da Ordem poderá liberar sobre falta grave cometida em ;
audiência, ainda quando as autoridades judiciárias respectivas, ou os interessados, [
não representem ao Conselho, e independente das penalidades impostas em juízo. |
Art. 33. Em matéria disciplinar, o C onselho deliberará de ofício, o u em 1
conseqüência de procedim ento da com issão de disciplina, ou do presidente da i
seção, ou da sub-seção, o u de representação de autoridade judiciária, do M inis- ^
tério Público, de qualquer m em bro da Ordem , ou de pessoa, estranha à Or- [
dem , interessada no caso. ]
§ 1® N o caso de representação, a C om issão de Disciplina, ou, se não h ou - |
ver, 0 relator designado pelo presidente, recebendo os papéis, examinará, antes í
de tudo se o caso é de aplicação de pena disciplinar. |
§ 2® A deliberação do C onselho precederá, sempre, audiência do acusado, ^
notificado para, dentro de cinco dias, apresentar defesa, que poderá ser susten- !
tada oralm ente por ocasião do julgamento. O prazo para defesa poderá ser pror- f:
rogado por m otivo relevante, a juízo do presidente do Conselho. í
§ 3° Se o acusado não for encontrado, o u for revel, ser-lhes-á nom eado |
curador. |
Art. 34. D a decisão condenatória, assim com o da absolutória no caso de quei- \
xa, ou representação, caberá ao interessado, e ao autor da representação, o recurso ?
de embargos, para o próprio Conselho, dentro de 10 dias após a ciência da decisão. |
Sobre os embargos será sempre ouvida a outra parte n o prazo de cinco dias. í
Art. 35. As penas de advertência e censura serão aplicadas, sem publicida- 1
de, verbalmente, o u por ofício do presidente da seção da Ordem, cham ando a j
atenção do culpado para o fato brandam ente n o primeiro caso energicam ente f
e com 0 em prego da palavra censura n o segundo. I
Art. 36. Em caso de nova falta, aplicar-se-á a pena de censura, quando *
com a advertência se haja punido a primeira falta. N o caso de terceira falta, [
infringir-se-á a pena de multa e, finalm ente, a de suspensão, que será sempre I

226 I
cabível na hipótese do artigo 27, n.® XIX, observando em todas as hipóteses o
disposto do artigo 47.
Art. 37. Em caso de retenção ilegítim a de autos, o juiz da causa, a requeri­
m ento da parte interessada, o u de seu procurador, mandará intim ar o retentor
para efetuar a entrega, dentro de três dias. Se a entrega se não realizar n o prazo
fixado, e certificando-o o escrivão, o juiz declarará suspenso n o exercício da
profissão o advogado, provisionado, ou solicitador, responsável, até à devolu­
ção d os autos, e, quando esta se faça, mandará cancelar o que nos autos for
escrito, com unicando a decisão ao presidente da seção da Ordem.
Parágrafo único. Se a retenção dos autos se prolongar por mais de trinta
dias, depois da suspensão, o juiz mandará instaurar, contra o retentor a c o m p e ­
tente ação criminal, o da sentença condenatória, se houver, enviará cópia ao
presidente da seção da Ordem, para este, por sua vez, agir c o m o de direito.
Art. 38. Se a falta for considerada grave (artigo 72, parágrafo único), será aplicá­
vel, desde logo, qualquer das penas enumeradas nas letras b, c e d, do artigo 76, n.° 4.
Art. 39. A pena de cancelam ento será im posta aos que, provadamente,
houverem perdido, ou não tiverem algum dos requisitos dos artigos 13 e 14,
para fazer parte da Ordem, inclusive aos que forem convencidos, perante a Or­
dem , o u em juízo, de incontinência pública e escandalosa, o u de em briaguez
habitual; e aos que, por faltas graves, já tenham sido três vezes condenados
definitivam ente, ainda que em seções diversas, à pena de suspensão.
Parágrafo único. N os casos acim a previstos, o Conselho, durante o pro­
cesso, poderá impor, desde logo, a pena de suspensão.
Art. 40. A pena de suspensão será im posta por m otivo de falta grave, de
pronúncia criminal, ou de prisão em virtude de sentença, tratando-se, nas duas
últim as hipóteses, de fato com preendido na enum eração ao artigo 13, IV.
§ 1® A pena de suspensão será im posta por tem po indeterm inado, até o
m áxim o de um ano, dobrada em cada nova infração punível.
§ 2° N o c a so de fa to p e r m a n e n t e , a s u s p e n s ã o será p o r te m p o
indeterm inado e enquanto durar o m esm o fato.
§ 3° Será tam bém suspenso o advogado provisionado, o u solicitador, que
deixar de pagar a contribuição anual, depois de convidado a fazê-lo p or carta e
por edital com o prazo de 30 dias, estes, sem m enção expressa da falta de paga­
m ento, mas apenas com referência ao presente dispositivo.
Art. 41. Em casos de faltas graves, ou erros reiterados, que denotem in ­
com petência do advogado, do provisionado, ou do solicitador, poderá o C o n ­

•41 227
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

selho da seção im por-lhe, de ofício, ou por tem po indeterm inado até à presta­
ção das provas de habilitação que exigir.
Art. 42. A pena de multa importará a suspensão do exercício da profissão
pelo prazo de três m eses, se não for paga dentro de vinte dias, a contar da data
da ciência da penalidade imposta.
Art. 43. Em caso de aplicação da pena de cancelam ento, poderá o cond e­
nado requerer ao C onselho da seção a revisão do respectivo processo decorrido
o prazo de dois anos de aplicação da pena.
§ 1® A requerim ento de qualquer dos m em bros do Conselho, far-se-á a
revisão, seja qual for a época o u a pena aplicada.
§ 2® Das decisões do C onselho da seção sobre a revisão, cabe recurso para
o Conselho Federal, nos term os do artigo 16, § 3®.
Art. 44. Todas as penas im postas a m em bros da Ordem serão anotadas na
respectiva carteira de identidade.
Art. 45. Em caso de suspensão, o u de cancelam ento, o m em bro da Ordem
restituirá à secretaria a sua carteira de identidade, sob pena de responsabilidade
civil e criminal.
Art. 46. Se não exibir a carteira, quando exigida pelo presidente da Or­
dem, da seção, ou da subseção, o u se a apresentar viciada, o m em bro da Ordem
incorrerá na pena de multa de 500$0000.
Art. 47. As penalidades aplicadas aos m em bros de cada um a das seções pe­
los Conselhos respectivos serão observadas pelos C onselhos das demais seções.
Art. 48. Para anular a recusa da admissão, o u a pena da suspensão, o u de
cancelam ento, poderá o interessado propor a ação sumária especial, regulada
pelo artigo 13 da Lei n.° 221, de 20 de novem bro de 1894, na Justiça Federal do
Estado respectivo.
Art. 49. Em caso algum caberá indenização, pela O rdem , ou por seus dire­
tores, em virtude de im posição de penalidade.
Art. 50. Os recursos das decisões do C onselho serão recebidos nos efeitos
devolutivo e suspensivo, exceto o de revisão do processo, que não terá efeito
suspensive.
Art. 51. Os m em bros do C onselho devem dar-se de suspeitos, e, se o não
fizerem, poderão ser recusados pelas partes, nos m esm os casos estabelecidos
pelas leis de organização judiciária local.
Parágrafo ún ico. A o C on selh o co m p ete decidir p erem p toriam ente a
suspeição, à vista das alegações e provas apresentadas.

228
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiro s Percursos c D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

Art. 52. Cada C onselho com unicará à mais alta autoridade judiciária na
localidade, e à secretaria perm anente n o D istrito Federal, a organização e todas
as alterações dos seus quadros, assim co m o as penalidades que aplicar.
Art. 53. Incorrerá nas penas do artigo 379 do C ódigo Penal, quem , sem o
ser, usar do título de advogado, de provisionado o u de solicitador, em anúncios
na imprensa, ou em avulso, e m palavras ou dísticos, n o escritório, na residên­
cia, o u em qualquer outro local ou por qualquer outra forma; ou, de vestes,
insígnias ou sím bolos, instituídos para o s advogados legalm ente habilitados;
o u sem o poder, nos term os deste regulamento, da carteira de identidade a que
se refere o artigo 20.
Art. 54. Em caso de ofensa a m em bro da Ordem, n o exercício de sua pro­
fissão, ou em juízo, por magistrado, m em bro do M inistério Público, o u qual­
quer funcionário, serventuário ou auxiliar da Justiça, o u conselho, sob repre­
sentação do ofendido, apreciará sumariam ente o caso, e poderá designar um ,
ou mais, de seus m em bros, para proceder à investigação necessária, prom oven­
do, conform e o resultado desta, as providências que entender cabíveis.
Art. 55. Cada Seção da Ordem, por seu presidente, e em virtude de delibe­
ração do conselho respectivo, assim co m o o C onselho Federal, e o presidente
da Ordem, tem qualidade para agir, m esm o crim inalm ente, contra os infrato­
res dos dispositivos deste regulamento, e, em geral, em tod os os casos que inte­
ressam, a dignidade, o prestígio o u as prerrogativas dos advogados.
Parágrafo único. Incluem -se no dispositivo supra a apresentação, ao juiz
com petente, sobre a conveniência de vedar o acesso, a determ inado cartório,
o u recinto de determ inado Tribunal, de pessoas conhecidas c o m o interm ediá­
rios de negócios ilícitos, ou reprováveis, ou que, por sua conduta, possam c o m ­
prometer o decoro da advocacia ou da magistratura.
Art. 56. Serão majorados da quarta parte as penas dos crimes de estelionato,
abuso de confiança, falsidade, e de todos os que haja fraude, quando aplicadas
a qualquer m em bro da Ordem.

CAPÍTULO VII
D a Assembléia Geral

Art. 57. C onstituem a assembléia geral de cada seção, ou subseção, os ad­


vogados inscritos, que se enchem em pleno gozo dos direitos conferidos por
este regulamento e tenham ai a sede principal de sua advocacia.

•▲1 229
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Art. 58. A assembléia geral será dirigida pelo presidente e os secretários do


conselho da seção o u da subseção.
Art. 59. À assembléia geral compete:
I — ouvir leitura e discutir o relatório e contas da diretoria; para esse fim se
reunirá, ao m enos um a vez por ano, sendo nos anos em que se tenha de realizar a
eleição do Conselho, de 30 a 45 dias antes da data fixada para esta eleição;
II — autorizar a alteração de im óveis do patrim ônio da seção;
III — m odificar o regim ento interno, organização pelo conselho (artigo
76, n.® 15);
IV — deliberar sobre as questões ou consultas subm etidas à sua decisão
pelo conselho, o u pela diretoria;
V — revogar, por voto expresso da maioria absoluta dos seus membros, o
m andato de qualquer m em bro do conselho, ou da diretoria, adm itindo para
esse efeito o voto por procuração com poderes especiais e expressos;
VI — tom ar quaisquer outras deliberações convenientes ao interesse da
Ordem, observando o disposto neste regulamento.
Art. 60. O quorum da assembléia geral será assim regulado:
I — para os efeitos do artigo 59, n.®s I, II, III, V e VI, a maioria absoluta de
advogados inscritos constituindo-se, porém , em 2" convocação, com intervalo
de sete dias, com qualquer núm ero de m em bro presentes;
II — para os efeitos do artigo 59, n.° IV, a assembléia deliberará com a
presença de 15 m em bros na seção do D istrito Federal, e, nas demais seções com
o núm ero determ inado n o respectivo regim ento interno, e, em 2." convocação,
nos term os do n.® I, do presente artigo.
Parágrafo único. As deliberações serão tom adas por maioria de votos dos
presentes, salvo o disposto no n.° V do artigo 59.
Art. 61. N ão poderão votar os que não estiverem efetivamente exercendo
a advocacia.
Art. 62. O voto é pessoal e obrigatório em toda eleição, salvo doença ou
ausência comprovadas plenamente.
§ 1® Por falta injustificada à eleição incorrerá o m em bro da Ordem na
multa de lOOSOOO, dobrada na reincidência.
§ 2° Nas assembléias das seções dos Estados e do Acre será admissível o voto
por procuração, nos casos e pela forma que o respectivo regulamento determi­
nar, pelos m em bros inscritos que residam em lugares distantes da Capital.
§ 3° Serão computadas as cédulas recebidas, com as formalidades do pará­

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V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s Percursos c D esa fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

grafo precedente, até o m om ento de encerrar-se a votação. A sobrecarta será aberta


pelo presidente, no ato de colocar a cédula na urna, sem violar o segredo do voto.
§ 4®As eleições serão anunciadas pela imprensa oficial e não oficial, e por com u­
nicação aos presidentes das sub-seções, com 30 dias de antecedência pelo menos.
Art. 63. Em cada eleição os votos serão recebidos durante seis horas contí­
nuas p elo m enos.
Parágrafo único. As eleições se procederão, por escrutínio secreto, perante
o conselho, o u a diretoria, conform e se tratar de eleição da seção, o u da sub­
seção, podendo, quando haja mais de 200 votantes, determ inarem -se vários
locais para o recebimento dos votos. Nesse caso, permanecerão, em cada local,
pelo m enos dois diretores, ou advogados inscritos, designados pelo conselho
ou pela diretoria, conform e o caso em sessão plena, a que serão levadas as urnas
e as respectivas listas de assinaturas.

CAPÍTULO VIII
D o Conselho e da Diretoria

Art. 64. N o D istrito Federal, o C onselho da Ordem com por-se-á de 21


m em bros, e estes, dentre si, elegerão os que, durante o mandato, constituirão a
diretoria, com posta dos cargos seguintes:
Presidente, vice-presidente, 1® e 2° secretários, tesoureiro, bem assim as
com issões de sindicância e disciplina, com três m em bros cada uma.
Os m em bros do Conselho, não escolhidos para qualquer dos cargos aci­
m a m encionados, serão vogais.
Parágrafo único. Se, em virtude de im pedim ento de u m ou mais m em ­
bros do Conselho, não se reunir quorum , serão convocados, pelo presidente,
segundo a antigüidade de inscrição, tantos advogados inscritos quantos neces­
sários para o conseguir. Se coincidir a antigüidade de inscrição, obedecer-se-á à
da formatura, e se ainda esta coincidir, seguir-se-á a de idade.
Art. 65. N os Estados e no Território do Acre, o Conselho, co m sede na
Capital, com por-se-á de três m em bros, quando a seção tiver até 15 advogados
inscritos: de 5, até 50 inscritos, de 10 até 150 inscritos, de 15 até 300 inscritos, e
de 21, quando excedido esse núm ero.
§ 1° O Conselho de cada seção estadual será form ado pelo presidente da
subseção da Capital e por presidentes das dem ais subseções do m esm o Estado,
na ordem decrescente do núm ero de advogados inscritos em várias subseções,

237
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

terá preferência o presidente mais antigo. Poderá declinar na investidura o pre­


sidente da subseção que não puder comparecer habitualm ente às reuniões do
Conselho. Esgotada a lista dos presidentes das subseções, se estes forem em
núm ero insuficiente, o u se, no Estado, não houver subseções será form ado ou
com pletado, o C onselho pelos m em bros da diretoria da subseção da Capital,
eleitos pelo Instituto dos A dvogados da localidade e pela assembléia da seção,
de acordo com o art. 68, ou, se não houver Instituto nessas condições, som ente
pela assembléia geral da seção.
§ 2® A diretoria da subseção da Capital e as das demais do Estado serão
eleitos pela assembléia geral respectiva, ressalvado o disposto do art. 68.
§ 3° A diretoria da subseção da capital do Estado, ou território do Acre,
tam bém o será da seção respectiva, quando diversamente não disponha o regi­
m ento interno da seção.
Art. 66. A diretoria da subseção se com porá do presidente, vice-presiden-
te, 1° e 2® secretários, e tesoureiro, p od en d o ser suprim idos os cargos de vice-
presidente e de l ° e 2 * secretários, ou de alguns destes, onde o quadro abranger
m enos de 20 advogados.
Parágrafo único. Nas subseções em que mais de 50 advogados tenham sua
sede principal, o regim ento respectivo poderá elevar o núm ero de m em bros da
diretoria na proporção estabelecida pelo artigo 65, cabendo aos diretores não
investidos em alguns dos cargos acima discrim inados, as atribuições e o voto
nas deliberações que o m esm o regim ento determinar.
Art. 67. D o s 21 m em bros do Conselho do D istrito Federal, dez serão elei­
tos pela assembléia geral, n os term os do art. 60, n.® I, e os restantes pelo C onse­
lh o Superior d o Instituto da O rdem dos A dvogados Brasileiros.
Art. 68. N os Estados, em que haja Instituto dos Advogados filiado ao Ins­
tituto da Ordem dos Advogados Brasileiros, com pete ao respectivo C onselho
Superior eleger a maioria da diretoria da sub-seção da Capital.
Art. 69. Som ente poderão ser eleitos m em bros do C onselho, o u da direto­
ria, os advogados brasileiros, natos ou naturalizados, inscritos, há mais de cin­
co anos, no quadro da Ordem dos Advogados Brasileiros.
Parágrafo único. A exigência do lapso de tem po de inscrição será dispen­
sada quando não houver advogados, com esse requisito, em núm ero superior
ao dobro dos que devam ser eleitos.
Art. 70. Cada com issão do C onselho será presidida pelo mais antigo de
seus membros.

232 «Al
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiro s Percursos e Dosdtios ( 1 9 3 0 - 19451

Art. 71. Os m em bros do Conselho e da diretoria são obrigados a exercer


suas funções e a comparecer às reuniões, considerando-se autom aticam ente
vagos seus cargos se faltarem a três reuniões consecutivas, salvo força maior
justificada; e devendo renunciar os cargos quando os não possam exercer com
dedicação e assiduidade, satisfazendo neste caso o disposto do artigo 80.
Art. 72. As funções dos m em bros d o Conselho, o u da diretoria, são abso­
lutam ente gratuitas.
Art. 73. N o caso de im pedim ento tem porário o u vaga por qualquer m o ti­
vo, no C onselho o u na diretoria, o Conselho elegerá, dentre os m em bros da
seção, o substituto, para servir pelo resto d o mandato.
Art. 74. Os cargos do C onselho são incom patíveis com os da C om issão
Diretora da Assistência Judiciária.
Art. 75. Para o Conselho, ou da diretoria funcionar, co m o para deliberar,
requer-se a presença da maioria absoluta de seus mem bros.
Art. 76. Ao C onselho compete:
1. Velar pela conservação da honra e da independência da O rdem , e pelo
livre exercício legal dos direitos dos advogados, provisionados e solicitadores;
2. Velar e promover, por todos os m eios a seu alcance, o perfeito desem pe­
nho técnico e m oral da advocacia e o prestígio e b o m conceito da profissão e
dos que a exercem;
3. deliberar sobre a inscrição e cancelam ento nos quadros da Ordem;
4. Aplicar aos m em bros da O rdem as penas disciplinares de:
a) advertência;
b) censura;
c) m ulta de 100$000 até 1:000$000;
d) suspensão do exercício da profissão;
e) cancelam ento da inscrição;
5. Rever anualmente os quadros da Ordem, fazendo necessárias alterações;
6. Deliberar sobre a aplicação, em casos concretos, das regras de ética pro­
fissional:
a) para esse efeito o C onselho poderá orientar e aconselhar os m em bros
da Ordem, nos casos, atinentes ao exercício da advocacia, que subm eter à sua
apreciação, ou que, de ofício, decida apreciar;
7. Organizar o regim ento interno das subseções do m esm o Estado e das
diretorias destas, dar instruções para os serviços e atribuições da Ordem da
seção, inclusive da Assistência Judiciária;

233
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

8. Prover ao b o m funcionam ento das subseções, designando-lhes direto­


ria provisória quando se não efetue oportunam ente a eleição necessária, e ado­
tando quaisquer outras providências convenientes;
9. Eleger a com issão diretora da Assistência Judiciária;
10. Deliberar sobre a conveniência de consultor e assembléia geral;
11. Aprovar o orçam ento anual da receita e da despesa organizado pelo
presidente;
12. Autorizar a aquisição de bens em geral e a alienação de bens móveis do
patrim ônio da Ordem;
13. Regular a aplicação d o fundo beneficente de que trata o artigo 7®, § 1*^,
e a distribuição dos prêm ios a que alude o artigo 7°, § 2®;
14. Organizar o seu regim ento interno, em que determinará, a ordem das
matrículas, respeitando o critério estabelecido no parágrafo único do artigo
64, forma de convocação, norm a dos trabalhos, e quorum , da assembléia geral
do conselho e da diretoria, atribuições dos m em bros desta, datas das reuniões
da assembléia geral, do pagam ento das contribuições, forma e com provação do
exercício da advocacia para os efeitos deste regulamento, e, em geral, tudo o
mais que convier para a regularidade dos serviços da O rdem e, para a boa apli­
cação do presente regulamento.
Art. 77. O presidente de cada seção, ou subseção, exercerá, em relação a
esta, as atribuições do presidente da Ordem, definidas no artigo 89, n o que for
aplicável.
Art. 78. Com pete à diretoria a adm inistração dos negócios da seção ou
subseção respectiva, a execução deste regulam ento e do regimento interno da
seção, a realização de tudo o que possa concorrer para o preenchim ento dos
fins da Ordem , representando para esse fim ao C onselho da seção ou ao C onse­
lho Federal.
Art. 79. O C onselho e a diretoria consignarão em ata as deliberações que
adotarem.
Art. 8 0 .0 m em bro da Ordem, que não puder exercer o cargo para que for
eleito, salvo por doença ou ausência com provada que iniba de exercer a advo­
cacia, pagará um a contribuição extraordinária de 2005000.
§ 1® A com provação de doença se fará por atestado.
§ 2° A dispensa será tam bém concedida independentem ente de contri­
buição, atendendo a serviços relevantes já prestados.
Art. 81. Os m em bros do C onselho poderão ser reeleitos, um a vez por

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V o lu m e 4 C ria ç a o , P rim e iro s Percursos e D esa fio s * 19.50 - 1 9 4 5 )

m aioria relativa e, ainda, segunda vez, por m aioria absoluta de votos dos m em ­
bros da seção.
Art. 82. O Conselho poderá constituir, pela forma que determinar no regi­
m ento interno, um tribunal especial, para que, perante ele, qualquer membro da
Ordem se justifique de imputação feita ou de procedimento suscetível de censura.

CAPÍTULO IX
D o C onselho Federal

Art. 83. Anualm ente, em data previam ente fixada, os Conselhos de todas
as seções reunir-se-ão em C onselho Federal, para apresentação do relatório das
principais ocorrências do ano em cada seção, e deliberação sobre providências
a tom ar o u m edidas a sugerir aos poderes públicos.
Parágrafo único. Os Conselhos com parecerão incorporados, ou por dele­
gações com postas de um ou mais m em bros do próprio Conselho, ou de qual­
quer seção da Ordem, cabendo a cada seção u m vo to nas deliberações.
Art. 84. Ao C onselho Federal compete:
I — eleger o presidente e o secretário geral da Ordem;
II — em grau de recurso, por provocação do C onselho de qualquer seção,
o u de qualquer interessado, deliberar:
a) sobre admissão de m em bros da Ordem;
h) sobre aplicação, aos m esm os, da pena de suspensão, ou de cancela­
m ento;
c) sobra penalidade im posta a m em bro da Ordem em qualquer seção,
quando não esteja inscrito nela perm anentem ente, o u esteja inscrito em algu­
m a outra seção;
á ) sobre casos om issos (artigo 95);
III — votar e alterar o código da ética profissional, ouvidos os C onselhos
das seções e as diretorias das sub-seções;
IV — adotar o m od elo das vestes talares a que se refere o artigo 25, n.° IX;
V — prom over quaisquer diligências, ou verificações, relativamente ao
funcionam ento da Ordem, em qualquer Estado, e adotar as médias que enten­
der convenientes a bem da sua eficiência e regularidade inclusive a designação
da diretoria provisória, quando necessário;
VI — tom ar todas as deliberações de caráter geral que entender conveni­
entes;

235
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

VII — propor ao Governo Federal a em enda ou alteração, do presente


regulamento;
VIII — organizar, o seu regim ento interno, em que regulará as suas reuni­
ões, o m odelo das carteiras de identidade e as taxas que por elas serão cobradas,
os prazos e form a para decisão dos recursos, a fórmula d o com prom isso referi­
d o n o artigo 19;
IX — cassar o u revogar qualquer deliberação, m esm o da assembléia das
sub-seções o u seções, contrária ao presente regulamento, ouvida sempre pre­
viam ente a autoridade de que em an ou a deliberação;
X — rever e uniformizar, tanto quanto possível, os regimentos internos
das várias seções da Ordem.
XI — resolver os casos om issos neste regulamento.
§ 1° N os casos acima, havendo urgência o C onselho Federal será logo c o n ­
vocado pelo presidente da Ordem, de ofício, ou por provocação do C onselho
interessado.
§ 2® Na ausência o u falta do C onselho Federal, as atribuições deste p o d e­
rão ser, em caso urgente, exercitadas pelo C onselho, da seção do D istrito Fede­
ral, subm etida, porém , qualquer resolução, adotada por este, a aprovação da­
quele em sua primeira reunião.
Art. 85. Presidirá o C onselho Federal o presidente da Ordem (artigo 89,
n.° 3), tendo co m o secretário o secretário geral.
Parágrafo único. O C onselho Federal poderá, por três quartos de votos,
alterar essa porcentagem, se reconhecer imprescindível.
Art. 86. O secretario geral terá a seu cargo a secretaria perm anente de
Conselho Federal e todos as relações com as secções dos Estados.
Parágrafo único. Em sua falta ou im pedim ento, o secretario geral será subs­
tituído sucessivamente pelo 1° e pelo 2° secretario da secção do D istrito Fede­
ral, ou pelo m em bro desta que o presidente da Ordem designar.
Art. 87. Para as despesas da secretaria permanente do conselho Federal,
cada secção estadual remeterá ao secretario geral d o C onselho do D istrito Fe­
deral 5 % das contribuições dos advogados provisionados e solicitadores, in s­
critos em seus quadros.
Parágrafo único. O C onselho Federal poderá, por três quartos de votos,
alterar essa percentagem, se reconhecer imprescindível.

236
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim e iro s Percursos c D c s d t i o s ; 1 - 19451

CAPÍTULO X
D o Presidente da Ordem

Art. 8 8 .0 Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil será eleito pelo


C onselho Federal, dentre os presidentes efetivos dos Conselhos; e o secretário
geral, d o m esm o m odo, dentre os demais m em bros d o C onselho Federal.
Art. 89. Ao presidente da O rdem compete:
1° representar a Ordem nas solenidades internas e externas, perante os
poderes públicos, em juízo, e em todas as relações com terceiros, ativa e passi­
vamente;
1° velar pela conservação do decoro e da independência da O rdem e pelo
livre exercício legal dos direitos dos seus membros;
3® convocar e presidir o C onselho Federal;
4° prom over a organização das seções e subseções, acom panhar-lhes o
funcionam ento, velar-lhes pela regularidade e pela fiel execução deste regula­
mento;
5® adquirir bens im óveis e m óveis com autorização do Conselho, alienar
bens im óveis com prévia autorização do C onselho Federal e administrar os
bens da Ordem, na conform idade deste regulamento e deliberação da assem ­
bléia e do Conselho;
6° superintender todos os serviços da Ordem, nom ear e demitir livremente
os empregados da Ordem;
7® promover, nas seções da Ordem , a organização de Institutos de A dvo­
gados que visem fins sem elhantes aos do Instituto da O rdem dos advogados
Brasileiros;
8° delegar alguma o u algum as de suas atribuições ao seu substituto.
§ O presidente da O rdem e o secretário geral residirão n o D istrito Fe­
deral durante todo o tem po de seus mandatos.
§ 2® O presidente da O rdem e o secretário geral não farão parte de qual­
quer delegação, cabendo-lhes, p orém , voto pessoal e m todas as deliberações, e
ao primeiro, ainda, voto de qualidade, quando ocorrer em pate em duas sessões
consecutivas.
Art. 90. O presidente da O rdem em suas faltas o u im pedim entos, será
substituído, sucessivamente, pelo presidente e pelo vice-presidente da seção do
Distrito Federal, e pelos dem ais m em bros do conselho da seção do D istrito
Federal, na ordem determinada n o parágrafo único do art. 64.

237
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

CAPÍTULO XI
A Assistência Judiciária

Art. 91. A Assistência Judiciária no D istrito Federal, nos Estado e n o Terri­


tório do Acre, fica sob a jurisdição exclusiva da Ordem .
Parágrafo único. A Assistência Judiciária será prestada às justiças federal e
militar e aos estrangeiros, independentes da reciprocidade internacional.
Art. 92. Salvo a designação do presidente e dem ais m em bros da comissão
diretora, que serão eleitos na forma do artigo 76, n.° 9, com petirão ao presiden­
te do C onselho todas as atribuições conferidas pela legislação anterior ao M i­
nistro da Justiça e N egócios Interiores ou a autoridades estaduais.
Parágrafo único. Os m em bros da com issão diretora elegerão entre si o
respectivo presidente.
Art. 93. N os Estados e no Território do Acre, a Assistência Judiciária se
regulará pelas leis e dispositivos em vigor, ou que venham a ser expedidos, o b ­
servadas as leis aplicáveis às convenções internacionais e às disposições deste
regulamento.

CAPÍTULO XII
D isposições Gerais

Art. 94. Os inscritos na Ordem pagarão à subseção respectiva, ou à seção


do Distrito Federal, conform e o caso, de um a só vez, a contribuição anual de
vinte m il réis.
Parágrafo único. O requerimento de inscrição fica sujeito à taxa de vinte mil
réis para os advogados, e de dez mil réis para os provisionados e os solicitadores.
§ 1° O inscrito, por m ais de três m eses contínuos, em um a subseção, pa-
gar-lhe-á a anuidade correspondente, m esm o que esteja inscrito em outra, ou
outras subseções.
§ V' As taxas e contribuições supra poderão ser alteradas pela assembléia
geral, sob proposta d o C onselho respectivo.
Art. 95. Os casos omissos no presente regulamento serão supridos pelo presi­
dente da seção em que a questão for levantada; dessa decisão haverá recurso neces­
sário para o Conselho respectivo, e, ainda, para o Conselho Federal da Ordem.
Art. 96. Todos os atos da Ordem, salvo quando secretos, serão publicados
no jornal oficial da seção respectiva.

238 9AI
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiro s Percursos c D e s a fio s (1 9 3 U - 1 9 4 5 )

Art. 97. As seções instaladas nas capitais dos Estados e do Território do


Acre organizarão e manterão a relação geral dos advogados provisionados e
solicitadores da respectiva circunscrição territorial, inclusive das subseções do
m esm o Estado o u Território, indicando nom es, residências atuais e anteriores,
datas da formatura o u da habilitação, m encion an do a Faculdade de D ireito ou
Tribunal, penas disciplinares aplicadas.
§ 1® Cada seção remeterá as inform ações acima indicadas ao secretário
geral do C onselho, e este as transmitirá às demais seções, e organizará o registro
geral dos advogados, provisionados e solicitadores de tod o o país.''
§ 2® As seções estaduais fornecerão ao secretário geral do C onselho da
O r d e m o s e s c la r e c im e n to s q u e este lh e p e d ir q u a n to a o s a d v o g a d o s,
provisionados e solicitadores que ai exerçam ou tenham exercido a profissão;
especialm ente para o fim de apurar os requisitos dos arts. 13 e 14.
§ 3° O secretário geral do C onselho da Ordem com unicará ao presidente
de cada seção as penas impostas, ou com unicadas por outras seções, assim com o
os quadros respectivos, alterações sobrevindas e quaisquer esclarecimentos ou
inform ações necessárias, e o presidente da seção transmitirá todos esse c o m u ­
nicados aos presidentes das suas seções do m esm o Estado.
Art. 9 8 . 0 Instituto da Ordem dos A dvogados Brasileiros e os institutos de
advogados a ele filiados tem qualidade para, por seus representantes legais, pro­
mover, perante o C onselho da Ordem, o que entenderem a bem dos interesses
dos advogados em geral o u de qualquer de seus m em bros.
Art. 99. Os dispositivos deste regulamento se aplicam ao exercício de ad­
vocacia perante o Suprem o Tribunal Militar, e se tornarão extensivos, à propor­
ção que for sendo possível, aos processos perante os dem ais Tribunais, ressalva­
dos os dispositivos especiais da legislação militar.
A rt. 1 0 0 . O s m e m b r o s da O rd em n ã o r e s p o n d e m s o lid á r ia n e m
subsidiariamente, por qualquer obrigação contraída em nom e dela ou no de
alguma de suas seções.

CAPÍTULO XIII
D isposições Transitórias

Art. 101. Para os advogados, provisionados e solicitadores, que tenham


atualm ente título registrado na Secretaria d o Suprem o Tribunal Federal ou do
Tribunal Superior do Estado do Acre, é suficiente a prova desse registro, por

•Ai 239
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

certidão o u publicação oficial, e a afirmação escrita de que preenche os requisi­


tos do artigo 13, III e IV, salvo, todavia, prova em contrário oferecida ulterior-
m ente por qualquer pessoa.
Parágrafo único. A os advogados inscritos nas condições deste artigo, que
não forem form ados por faculdade reconhecida pelo Governo Federal, ao tem ­
p o da formatura, c o m o exige o artigo 1 3 ,1, a carteira expedida nos term os do
artigo 20, só valerá n o território d o Estado respectivo, fazendo-se nesse sentido
a necessária averbação na m esm a carteira.
Art. 102. Logo que publicado este regulamento, o C onselho Superior do
Instituto da Ordem dos A dvogados Brasileiros elegerá os 11 m em bros do c o n ­
selho a que se refere o artigo 67, e estes, escolhendo dentre si o presidente pro­
visório organizarão o quadro do foro do Distrito Federal.
$ Organizado o quadro, será publicado por edital n o D iário Oficial,
devendo os interessados, dentro de 30 dias, apresentar ao presidente provisório
as reclamações que tiverem.
§ 2® À vista das reclamações, e depois de resolvidas pelo C onselho Provi­
sório, será o quadro definitivam ente organizado, convocando, o presidente pro­
visório, logo em seguida, a assembléia geral, nos term os do artigo 63, parágra­
fo único, eleger os dem ais dez m em bros do Conselho, e designará o dia para a
instalação oficial da Ordem.
§ 3° As reclamações, a que se referem os parágrafos antecedentes, não aten­
didas pelo Conselho, poderão ser apresentadas, de novo, ao Conselho, depois de
integralmente constituído, em forma de pedido de inscrição, ou com o impugnação
de inscrição, observando, esse, na decisão, o disposto nos artigo 16 e 17.
§ 4® Logo que instalado, o C onselho elegerá a sua diretoria e votará o
regim ento interno (artigo 76, n.® 14).
§ 5° O C onselho da seção do Distrito Federal exercerá as atribuições do
Conselho Federal, e o presidente daquele C onselho as do presidente da O rdem
até que se instale o C onselho Federal.
ArL 103. Nos Estados e no Território do Acre, as atribuições do artigo 102 serão
ocercidas, nas capitais, pelos Institutos de Advogados, existentes, nos termos do artigo
68, ou, se não houver, por uma comissão de advogados nomeados pelo presidente do
Tribunal Superior, procedendo-se nos demais termos do artigo precedente.
§ 1®Aplica-se ao C onselho provisório formado em cada Estado o u à D ire­
toria provisória da seção co m sede na Capital respectiva, o disposto nos §§ 1°
e4" do artigo 102.

240 «▲B
V o lu m e 4 C rin ç a o , P rim eiro s Percursos c D e s a fio s 1 19 3 0 - 194b)

§ 2° Organizada a diretoria da seção da Capital, prom overá esta a form a­


ção das subseções, e, logo que estas se tenham organizado em metade, pelo
m enos, das comarcas do Estado, promoverá a instalação do C onselho da seção,
nos term os do artigo 65.
Art. 104. N os Estados, o u nas comarcas, em que, até 29 de janeiro de cor­
rente ano, se não tenha ainda organizado em a O rdem dos Advogados, confor­
m e este regulamento, o juiz togado de mais alta hierarquia e mais antigo, com
dois outros, im ediatos em antiguidade, se houver, assumirá as atribuições cons­
tantes do artigo 9®, organizará o quadro da Ordem, o u com o C onselho Esta­
dual, e exercendo todos os deveres e prerrogativas constantes deste regulamen­
to, tudo de acordo co m os seus dispositivos e até que se realize a constituição
regular da Ordem, na localidade.
Art. 105. N os Estados em que se tenha eleito C onselho provisório da Or­
dem para a organização desta, será ele dissolvido logo que concluídos os traba­
lhos preparatórios e organizado o quadro definitivo, elegendo, então o C onse­
lh o Superior, ou a diretoria do Instituto dos Advogados, n o Estado, nos termos
do artigo 68, a maioria dos m em bros da diretoria definitiva, que presidirá a
eleição dos restantes m em bros da m esm a diretoria. Se não houver Instituto, a o
C onselho ou a diretoria, provisório, promoverá a assembléia geral para a elei­
ção definitiva, de acordo com o artigo 63.
Art. 106. Logo que instalados os Conselhos da Ordem em dez Estados,
pelo m enos, o presidente d o C onselho da O rdem do D istrito Federal prom ove­
rá a reunião do C onselho Federal, de acordo com os artigos 83 e seguintes, para
eleger o presidente da Ordem , votar o seu regulam ento interno, e para os de­
mais objetivos de com petência do m esm o Conselho.
Art. 107. Enquanto se não votar o Código de ética profissional, prevalece­
rão em cada seção as praxes reconhecidas pelo C onselho local.
Art. 108. Enquanto não for votado o regim ento de qualquer seção, ou
subseção será observado o da seção do D istrito Federal.
Art. 109. Para todos os efeitos, os prazos fixados por este regulamento
correrão da data e m que tiver início a sua obrigatoriedade.
Art. 110. As alterações introduzidas no regulam ento da Ordem não inva­
lidam os atos de organização da Ordem praticados na conform idade dos dis­
positivos primitivos.
Art. 1 1 1 . 0 presente regulam ento entrará em vigor em tod o o Território
N acional aos 31 de m arço de 1933.

•ái 241
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Art. 112. Revogam -se as disposições das leis gerais, federais, provinciais
ou estaduais, contrárias ao presente regulamento.

Rio de Janeiro, 20 de fevereiro de 1933, Francisco A ntunes Maciel.


Publicado n o D O de 2 de m arço de 1933 e retificado n o D O de 11 e 15 de
m arço de 1933.

242
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiro s Percursos c D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

ANEXO VIII
D o cu m e n to s referentes instituiçãoà

e fu n cio n am e n to d o TSN

•Al 243
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

LEI N° 244, DE n DE SETEMBRO DE 1936’

Institui o Tribunal de Segurança Nacional

O Presidente da República dos Estados U nidos do Brasil:


Faço saber que o Poder Legislativo decreta e eu sanciono a seguinte lei.

Art. 1® - Fica instituído, com o órgão da Justiça Militar, o Tribunal de Segu­


rança Nacional, que funcionará n o Distrito Federal, sempre que for decretado o
estado de guerra e até que ultim e o processo dos crimes de sua competência.

Art. 2° - O Tribunal com por-se-á de cinco juizes, sem parentesco entre si


até segundo grau, nom ead os livrem ente pelo Presidente da República.

§ 1° - D ois dos juizes serão oficiais do Exército ou da Armada, generais


o u superiores da ativa ou da reserva, dois serão civis, de reconhecida co m p e­
tência jurídica, e o quinto juiz u m magistrado civil, ou militar, todos de repu­
tação ilibada.

§ 2° - Durante o tem po que funcionar o Tribunal de Segurança Nacional


os juizes que o c om p õem não poderão ser dem itidos, nem os seus ven cim en ­
tos poderão ser reduzidos.

§ 3° - O Presidente será o magistrado, civil ou militar.

Art. 3® - C om pete ao Tribunal processar e julgar em primeira instância


os militares, as pessoas que lhes são assemelhadas e os civis:

1°, nos crimes contra a segurança externa da República, considerando-se,


com o tais, os previstos nas leis n°s 38, de 4 de abril e 136, de 14 de dezembro
de 1935, quando praticados em concerto, com auxílio ou sob a orientação de
organizações estrangeiras o u internacionais;

1 A p u d R eyn aldo P o m p e u de C am pos. Repressão judicial no Estado Novo. Esquerda e direita no banco dos
réus. Rio d e Janeiro: A chiam é, 1982.

244
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiros Percursos c D o s a lio s 11 9 1 0 - 1 9 4 .i)

2°, nos crim es contra as instituições militares, previstos n os arts. 10, pará­
grafo único, e 11 da lei n° 38, de 4 de abril de 1935;

3°, consideram -se com etidos contra a segurança externa da República e


contra as instituições m ilitares os crimes com finalidades subversivas das insti­
tuições políticas e sociais, definidos nas leis n®s 38, de 4 de abril, e 136, de 14 de
dezem bro de 1935, sem pre que derem causa a com oção intestina grave, seguida
de equiparação ao estado de guerra, o u durante este forem praticados.

Art. 4® - São tam bém da com petência do Tribunal na vigência do estado


de guerra, o processo e julgam ento de todos os crim es a que se refere o art. 3®,
praticados em data anterior à desta lei, e que não tenham sido julgados, caben­
do ao Supremo Tribunal Militar conhecer dos julgados e m primeira instância.

Parágrafo único - Os processos em andam ento na primeira instância


serão rem etidos ao Tribunal de Segurança Nacional para os fins da presente lei.
Para os m esm os fins serão encam inhados ao Suprem o Tribunal Militar os que
se acharem em andam ento na segunda instância, ou penderem de recurso.

Art. 5° - Os crim es não previstos no art. 3®, p orém conexos co m os m es­


m os, serão processados n o m esm o feito e julgados pelo Tribunal.

Art. 6° - Cada m em bro do Tribunal, inclusive seu Presidente, funcionará


co m o juiz preparador, cabendo, n o curso do processo, resolver todas as preli­
minares e questões incidentes. Podem funcionar no m esm o processo vários
juizes preparadores, revesadamente.

Art. 7° - Funcionará perante o Tribunal com o Prom otor de Justiça, um Pro­


curador nom eado pelo Presidente da República e com o seus adjuntos, os Prom o­
tores, os adjuntos da justiça local do Distrito Federal o u da Justiça Militar requi­
sitados por intermédio do M inistério da Justiça, o u do M inistério da Guerra.

Art. 8° - Na primeira reunião seguinte à da instalação, o Tribunal votará o


seu regimento interno, no qual poderá adotar norm as com plem entares ten­
dentes a assegurar o rápido andam ento dos processos.

•ái 245
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Art. 9® - N o processo e julgam ento dos crim es referidos no art. 3®, serão
observadas as seguintes disposições:

1®, apresentada a denúncia ao Presidente do Tribunal, pelo Procurador,


ou u m de seus adjuntos, será pelo m esm o presidente distribuída, a u m dos
m em bros do Tribunal, para funcionar c o m o juiz preparador;

2°, a citação inicial dos réus que forem encontrados far-se-á mediante
entrega da cópia autêntica da denúncia, impressa, m im eografada, datilografa­
da ou manuscrita, a que se anexará um a folha tam bém impressa, mimeografada,
datilografada ou manuscrita, contendo as perguntas para qualificação do cita­
do, com os claros necessários às respostas respectivas;

3®, o juiz mandará citar os denunciados, que não estiverem presos, ou não forem
encontrados, por edital, com o prazo de oito dias e dará curador aos que não compare­
cerem, nomeando advogado aos que não o tiverem ou não quiseram constituir.

Ao acusado ausente, ou que não tenha defensor, será nom eado advogado
indicado pelo Conselho da Secção da Ordem dos Advogados;

4°, n o dia marcado para início d o processo, cada réu apresentará ao juiz a
sua defesa e rol de testemunhas, em núm ero de cinco no m áxim o, com a res­
pectiva folha de qualificação, devidam ente respondidas todas as perguntas;

S°y nenhum a defesa será junta aos autos sem que a acom panhe a folha de
qualificação com as respostas necessárias, assinada pelo réu, o u por advogado
com poderes especiais, o u por alguém a seu rogo, com duas testem unhas caso
não possa escrever;

6°, apresentadas as defesas dos réus que comparecerem, começará, logo


em seguida, a inquirição das testem unhas arroladas na denúncia e apresenta­
das pela defesa, que será concluída dentro do prazo de 10 dias;

7°, as testem unhas de defesa com parecerão a juízo independente de n o ti­


ficação, entendendo-se que o réu desista do depoim ento daquelas que não apre­
sentaram espontaneam ente no m o m en to oportuno;

246 «Ái
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiro s Percursos e Dosiifios ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

8®, as testem unhas que houverem prestado depoim ento em inquérito p o ­


licial o u policial-militar, constante dos autos, poderão, depois de tom ado o seu
com prom isso pelo juiz preparador, reportar-se às declarações anteriores, que
serão precisamente m encionadas, sem reprodução, fazendo-se apenas os adita­
m entos o u retificações, que o depoente declarar, passando-se logo à reinquirição;

9®o Ministério Público poderá arrolar testemunhas que fundamentem a sua de­
núncia, ou, se quiser, pode dispensá-las preferindo apoiá-la só em prova documental;

10, o Juiz permitirá perguntas formuladas pela defesa, desde que sejam
pertinentes ao processo, evitando as im pertinentes ou protelatórias;

11,0 processo poderá fazer-se n o presídio, ou estabelecim ento a que este­


jam recolhidos os réus, observadas as formalidades legais e as determ inações
do juiz atinentes à ordem dos trabalhos;

12, findos os depoim entos das testemunhas, correrá em cartório o prazo


de três dias para defesa dos réus, devendo cada u m destes apresentar, com as
suas alegações escritas, a folha avulsa em que responda às perguntas do interro­
gatório, observando-se o disposto em o n° 5;

13, o juiz fica c o m a faculdade de ordenar as provas requeridas e determ i­


nar outras ex-officio, inclusive a acareação de testem unhas e audiência das au­
toridades policiais, peritos avaliadores, ou outros que hajam funcionado no
inquérito que preceder à denúncia;

14, o Tribunal, o u juiz preparador, poderá dispensar o com parecim ento


dos réus;

15, tendo sido o réu preso com arma na m ão por ocasião de insurreição
armada, a acusação se presum e provada, cabendo ao réu prova em contrário;

16, findo o prazo de três dias para a defesa dos réus, o processo, co m as
defesas e as provas produzidas, irá ao Procurador, o qual sobre as m esm as fala­
rá dentro de cinco dias, sendo os autos remetidos ao Presidente do Tribunal
que, ao recebê-los, designará dia para julgamento;

9ÁB 247
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

17, n o julgam ento funcionará com o relator o m em bro do Tribunal que


tiver sido designado originariamente para juiz preparador;

18, será perm itido a qualquer m em bro do Tribunal pedir vista dos autos
até 48 horas improrrogáveis, para proferir o seu voto;

19, o Tribunal não fica adstrito, no julgam ento, à qualificação do crime


feito na denúncia.

Art. 10 - As decisões do Tribunal serão tomadas por maioria de votos,


cabendo recurso para o Suprem o Tribunal Militar, sem efeito suspensivo.

Parágrafo único - Os m em bros do Tribunal de Segurança Nacional julga­


rão co m o juizes de fato, por livre convicção, quer o processo seja originário,
quer tenha v ind o de outro juízo.

Art. 1 1 - A aceitação da investidura e o exercício dos juizes do Tribunal de


Segurança N acional são considerados serviços públicos relevantes.

Art. 12 - O juiz preparador poderá deprecar aos juizes federais, o u locais


com petentes, nos Estados e n o Território do Acre, as diligências que reconhece­
rem necessárias. N esses casos, funcionará no processo, perante o juiz depreca-
do, o m em bro do M inistério Público federal o u local, o u advogado designado
para esse fim pelo Procurador.

Art. 1 3 - 0 Tribunal aplicará as penas com inadas pelas leis n°s 38, de 4 de
abril, e 136, de 14 de dezem bro de 1935, p odendo determinar que sejam c u m ­
pridas em colônias agrícolas e penais.

Art. 14 - Ficam criadas cinco colônias agrícolas e penais, que o Poder Exe­
cutivo localizará convenientem ente,

Parágrafo único - As pessoas internadas nas colônias agrícolas e penais


poderão ser acom panhadas pela família.

248
V o lu m u 4 C r ia ç ã o , P rim eiro s Porcursos c D e s a fio s 11930 - I 945)

Art. 1 5 - 0 Poder Executivo organizará o regim ento das colônias cuja ad­
m inistração ficará a cargo do M inistério da Justiça e N egócios Interiores.

Art. 16 - Os vencim entos dos juizes serão de 4:800$000 m ensais e o Presi­


dente terá mais 500$000 m ensais para sua representação. O Procurador terá os
vencim entos de 4:200$ m ensais. O Procurador, Promotores e adjuntos que ser­
virem em com issão no Tribunal terão, além dos vencim entos d o cargo efetivo,
um a gratificação m ensal correspondente ao terço dos respectivos vencim entos.

Art. 1 7 - 0 quadro do pessoal do Tribunal será assim constituído: um


secretário, um 1® oficial, dois segundos oficiais, um porteiro, u m contínuo e
dois serventes e o respectivo cartório terá dois escrivães e cinco escreventes. O
M inistro da Justiça designará, o u requisitará, de outras repartições, os fu n cio­
nários necessários ao preenchim ento dos cargos da Secretaria e do Cartório do
Tribunal, os quais perceberão os vencim entos correspondentes aos do cargo
efetivo, acrescidos de um a gratificação igual a u m terço daqueles.

Art. 1 8 - 0 pessoal de cada colônia agrícola e penal será contratado, de


acordo co m as necessidades do serviço.

Art. 19 - Fica o Poder Executivo autorizado a abrir, pelo M inistério da


Justiça e N egócios Interiores, que providenciará tam bém sobre a organização
do Tribunal a respectiva Secretaria, o crédito especial de 5.000:000$000 (cinco
m il contos de réis), para atender aos encargos da presente lei, n o atuai exercício,
podendo, para esse fim, realizar operações de crédito até aquele limite.

Art. 20 - Revogam -se as disposições em contrário.

Rio de Janeiro, 11 de setem bro de 1936, 115° da Independência e 48° da


República.

GETÚLIO VARGAS
João G om es -
H enrique A. Guilhem
Vicente Ráo

249
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

RELATÓRIO DA COMISSÃO DE jUSTlÇA


SOBRE A QUESTÃO D O BOICOTE
A O TRIBUNAL^

Para se chegar ao ponto essencial da questão é preciso que se mostre pre­


viam ente se o tribunal é fechado ao público.

Tribunal Fechado

O TSN é fechado. Para se chegar a essa convicção basta que se analisem e


se cotejem diversos dos artigos do projeto aprovado pela Câmara. Em seguida
para reforço da argumentação, poder-se-á comparar esse tribunal com as cor­
tes atualm ente em funcionam ento n o país; n o projeto aprovado encontram -se
as seguintes preceituações que com provam a nossa tese:

1) O processo poderá ser feito n o presídio ou estabelecim ento a que este­


jam recolhidos os réus {art. 9, n° 11). Comentário: O juiz tem a faculdade e que
lhe é conferida por lei de prom over o andam ento do processo em um presídio.
É claro que ao aparato policial e, sobretudo, aos percalços de um a audiência
pública, sob vigilância popular, o juiz preferirá o recesso calm o de u m cárcere.
Assim pois, é evidente que os julgadores se utilizarão e m larga escala, de facul­
dade que a lei lhes outorga. Acresce que há acusados cuja presença em públicas
audiências, tiraria a calma e o b o m hu m or de qualquer juiz. Esses acusados, por
certo, jamais aparecerão em qualquer sessão pública.

2) As alegações de defesa do réu serão sempre apresentadas por escrito.


Comentário: não há pois, lugar para qualquer alegação oral. M esm o porém ,
que a oratória fosse permitida, perderia por com pleto o seu caráter de possível
interesse, um a vez que o discurso deverá ser pronunciado entre as paredes si­
lenciosas de u m presídio.

3) O tribunal o u o juiz procurador poderá dispensar o comparecimento do


réu. Comentário: Por conseguinte, o ato do julgamento que é sempre solene, pela
sua própria essência, transcorrerá, sobretudo quando se tratar de acusados de

2 D o c u m e n to a p re en d id o n a residência d o Dr. Jarbas Loretti, an e x a d o a o processo n " 69 d o TSN.

250 «41
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s Percursos e D esa fio s 1 1 9 3 0 - 1 9 4 3 )

m uito destaque político, em franca sonolência. O juiz relator fará m on o ton a ­


m ente 0 resum o do que os autos registraram e proferirá o seu voto. Em seguida,
os demais julgadores irão repetindo displicentemente: - D e acordo com o senhor
relator! Alguns minutos bastarão para que se chegue ao resultado desejado, e o
presidente proclamará: - Fulano, condenado a tantos anos, devendo cumprir pena
na colônia 2! Veja-se, agora, a título de contraste, o que ocorre nos tribunais aber­
tos. N a sessão de julgamento são apregoadas as partes: O juiz concede a palavra
ao acusador e, por último, ao acusado. Os debates orais são travados à vista de
toda a gente. Há tolerância e concedem -se adiamentos, caso o defensor do acusa­
do não tenha podido comparecer. Encerrados os debates orais é que o relator fará
a narrativa do fato e das provas dos autos que confirmaram as suas observações.
A lém disso, ainda é facultado a qualquer dos juizes pedir aos advogados presen­
tes esclarecimentos sobre qualquer fato de interesse para decisão da causa. Só
então serão proferidos os votos, o que se faz publicamente.

Em conclusão: N ão só pelo que a lei criadora do TSN estabelece com o,


tam bém , pelo cotejo feito com outros sistemas e m vigor, o que se conclui, ine­
quivocam ente, é que o T SN é um tribunal fechado.

C om o se Faz o Boicote

Para se fazer o boicote é preciso: - 1) que o acusado, ao ser citado, isto é, ao


ser procurado pelo oücial de justiça (que lhe entregará uma contra-fé, com a
cópia da denúncia) nada declare nem escreva, lim itando-se a receber a contra-fé
e a folha de qualificação que o oficial de justiça deverá entregar juntam ente te
com a contra-fé (art. 8, n° 4); 2) que no início do processo o réu, ao invés da
defesa e rol das testemunhas (art. 9, 4) diga claramente os m otivos da repulsa
ao tribunal. Nesse sentido, deverá ser fornecida aos companheiros um a fórmula
geral. Todavia os companheiros de m aior responsabilidade, co m o é claro, não se
deverão limitar a essa fórmula; 3) que o réu não reinquira as testemunhas (art. 9,
n® 6); 4) que intimado a acompanhar o processo no presídio, o réu a isso se recu­
se, ou, com pelido a tanto, nada articule em presença do juiz e se recuse a assinar
qualquer papel; 5) caso seja intimado à sessão de julgamento, o réu não com pare­
ça e se co m o no caso precedente, for com pelido a tanto, permaneça silencioso,
indiferente e nada assine; que por último, o réu não ofereça alegações finais.

•Al 2 57
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Vantagens do Boicote Acima

1® - Sendo fato virgem na história judiciária do Brasil, o fato terá enorm e


repercussão, com grande agitação popular.

2® - O fato ecoará n o m u n d o inteiro, trazendo, em conseqüência, grande


desmoralização para o governo.

3® - Em qualquer tem p o será possível (em bora os elem entos necessários a


esse p on to sejam bastante falhos) pedir revisão do processo co m base nas ale­
gações feitas inicialm ente contra o tribunal.

Desvantagens do Boicote

1® - A sentença condenatória; desde que se torne irrevogável, impedirá o


pedido de indenização a que fazem jus os militares e os funcionários públicos.
Por outras palavras: quando as questões se acham decididas no crime não se
poderá mais questionar sobre elas.

2* - A lguns acusados comparecerão. O tribunal para deixar bem frisada a


sua m agnanim idade, absolverá alguns deles. Desse m o d o o governo lançará
m ão do argum ento para realçar a culpabilidade dos boicotadores, alegando que
estes repeliram o tribunal porque em verdade não tinham defesa.

3° - Os juizes tripudiarão livrem ente sobre a posição da ANL, frisando em


sentenças sucessivas que a ANL não passa de um a fachada do Partido C om u ­
nista.

4° - As sentenças em cada caso particular terão cam po aberto às aleivosias


contra os acusados, e para isso, terão sempre a oportunidade de lançar m ão do
argum ento legal da revelia.

5° - O tribunal, em bora a lei nesse particular seja obscura apesar das recu­
sas enérgicas do acusado, arranjará m eios e m o d o s de designar advogados que
acom panhem o processo e esses advogados, escolhidos a dedos, irão certam en­

252 9AB
\'c )!u m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s Percursos c D esa fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 j )

te escrever im ensas inconveniências com prom etedoras do ponto de vista p o lí­


tico dos acusados.

Deliberação sobre a Posição


A nte o Tribunal de Segurança N acional

A questão da nossa posição perante o TSN foi estudada sob os seguintes


pontos de vista:

1°) Utilização total do tribunal: a) com o m eio de defesa; b) com o m eio de


agitação.

2°)Utilização parcial do tribunal co m o m eio de agitação.

3°) Boicote: a) co m protesto nos autos; b) boicote absoluto.

Serviram de base técnica em nossa deliberação, o s inform es jurídicos s o ­


bre a natureza do tribunal e sobre o boicote ante o m esm o, fornecidos em rela­
tório por um a com issão jurídica de presos advogados que organizamos.

Utilização Total do Tribunal

Essa utilização com preende a participação do acusado em todas as fases


do processo, indicando testemunhas, inquirindo as de acusação, juntando to ­
das as possíveis provas docum entais de sua inocência, fazendo a defesa inicial e
final etc.

Utilização Total co m o M eio de Defesa

Da análise jurídica sobre a natureza do tribunal, da feição política e reaci­


onária deste e do m o d o pelo que foi criado, só se pode tirar um a conclusão: o
tribunal foi feito para castigar e condenar tod o aquele que a ditadura policial
julgar conveniente castigar e condenar. Ele não poderá ater-se a qualquer espé­

253
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

cie de prova porque é difícil à redação demonstrar a pseudoculpabilidade da


m aioria dos denunciados. A m esm a falta de critério racional que tem presidido
a ação da polícia na prisão e soltura dos presos, será seguida pelo tribunal:
alguns indiciados serão absolvidos por displicência governam ental o u por in­
fluência de pistolões, para que possam dizer que o tribunal não condena a uto­
m aticam ente. Mas, a grande m aioria dos acusados será condenada c o m provas
ou sem elas, com sim ples indícios ou sem eles. A própria criação do tribunal
reacionário corrobora a nossa afirmativa: se não fora para proceder dessa for­
m a, mais, que suficiente seriam os tribunais federais com uns.
O estudo jurídico da contextura de tribunal não pode deixar dúvidas a esse
respeito: ante ele não poderá haver possibilidade de defesa. O conhecim ento das
condições políticas em que foi feito o tribunal leva-nos a esta outra conclusão: só
será absolvida por ele uma pequena minoria de acusados e para essas absolvições
em nada concorrerá a ação dos indiciados dentro do processo.

Utilização Total com o M eio de Agitação

A agitação em geral com preende-se com duas finalidades: o u para aterro­


rizar a reação com o escândalo e abrir assim cam inho para u m a sentença mais
justa, pelo receio de desmoralização do tribunal, ou para propaganda ideológi­
ca ... Na 1® hipótese, dever-se-ia desmoralizar a prova apresentada pela acusa­
ção, a organização d o tribunal, a sua inconstitucionalidade etc., participando
de todas as fases do processo, inclusive na formação de culpa. Mas a nossa in ­
terferência, cerceada por todos os m odos, pou co ou coisa algum a adiantaria
em nosso favor. Julgamos que será difícil, se não im possível, destruir por c o m ­
pleto a prova de acusação, m esm o no caso em que todas as peças deste forem
inteiramente falsas, dada a dem onstrada im possibilidade de recursos da defesa.
Q uanto à 2® hipótese, utilização co m fins ideológicos, em nada n os adiantaria
participar das diversas fases do processo. Por todas essas razões, foram por nós
afastadas as hipóteses de utilização total do tribunal, quer co m o m eio de agita­
ção, quer c om o defesa.

254 9AM
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiro s Pcrcursos c D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 |

Utilização Parcial do Tribunal com o M eio de Agitaçao

D esde que n ão se participe do sum ário, desaparece a possibilidade de u ti­


lização do tribunal exclusivamente com o m eio de defesa, resta-nos estudar as
possibilidades para a agitação, compreendida esta agitação para fms de defesa
perante o próprio tribunal e com o agitação para fins de propaganda ideológi­
ca. Qualquer dessas agitações seria feita nas defesas escritas e estabelecidas pela
lei que criou o tribunal e, talvez, tam bém oralmente, q uando tal oportunidade
vier a surgir, o que é quase inadmissível, porque o réu em m uito casos não irá
ao tribunal. São m uito remotas e discutíveis as vantagens de um a agitação den ­
tro do processo para fms de absolvição o u dim inuição da pena. E há um a des­
vantagem digna de ponderação: não havendo, c o m o não há, a possibilidade de
utilizar o sum ário para destruir a acusação e estabelecer a defesa, não se poderá
fundamentar tal agitação em provas produzidas nos autos. Essa defesa será n a­
turalm ente falha, baseada em afirmativas não com preendidas no processo.
Q uanto à utilização parcial do tribunal para fms de agitação ideológica, con si­
deram os que serão m uito restritos os resultados, um a vez que o tribunal será
fechado e nem a im prensa legal talvez venha a ter conhecim ento. Resta-nos a
possibilidade de pubUcar essas defesas ilegalmente, fazendo grande agitação,
porém , tal agitação, tam bém se conseguirá com o boicote.

O Boicote

Por boicote entendem os o repúdio total de tribunal e do seu processo, a


negativa peremptória de reconhecê-lo e de com ele entrar em contato por qual­
quer form a e que qualquer protesto dentro dos autos seria u m a utilização par­
cial do tribunal, deixando nossa atitude de ser u m boicote. Resolvem os, por­
tanto, salvo manifestações contrárias dos com panheiros, caso em que nova­
m ente deliberamos, decidir-nos pelo boicote total, absoluto, co m o o mais enér­
gico e eloqüente protesto contra a odiosidade do tribunal que criaram especial
e unicam ente para a infam e tarefa de nos condenar de qualquer forma. Para
efetivar o boicote é necessário porém , que antes de iniciá-lo se faça um a c o m ­
pleta publicidade e m tod o o país e n o estrangeiro, da nossa resolução e d o n o s­
so protesto, am plo, claro e honesto e por todos assinado. Essa publicidade é
necessária, não só para que se faça agitação, com o ainda para que a reação não

•Al 255
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

diga que fugim os ao seu o d io so tribunal porque nos reconhecem os culpados.


O boicote teve ser absoluto. N os autos nada deve constar de nosso: nenhum a
assinatura, n en h u m recibo, n enh um visto, n enhum a defesa, nem m esm o a fo­
lha de qualificação preenchida por nós, nada enfim . D evem os nos negar a c o m ­
parecer ante o tribunal o u qualquer dos seus m em bros, e quando a tal forma
coagidos, protestaremos verbalmente o u teremos urna atitude de alheiam ento
e desprezo.
Ao com panheiro que acaba de ler pedim os tirar pelo m enos duas cópias e
dar o u m andar a duas pessoas de suas relações.

256
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiro s Percursos o D esa fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 o i

DECRETO-LEI 88, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1937

M odifica a lei n® 244, de 11 de setembro de 1936, que instituiu o, Tribunal


de Segurança. N acional, e dá outras providências.

O Presidente da República dos Estados U nidos do Brasil, usando da atri­


buição que lhe confere o art. 180 da Constituição.

Decreta:
Art. 1° - Até a organização da justiça de defesa do Estado, a que se refere a
Constituição, continuará a funcionar o Tribunal de Segurança Nacional, instituído
pela lei n° 244, de 11 de setembro de 1936; suprimida a limitação constante do art.l°.

Parágrafo único - O Tribunal terá sede n o D istrito Federal e jurisdição em


todo o país.

Art. 2® - O Tribunal com por-se-á de seis juizes, sem parentesco entre si até
2° grau e nom eados livremente pelo Presidente da República.

§ 1® - D ois deles serão magistrados civis, um , magistrado militar; um oficial


do Exército e u m da Armada, da ativa ou da Reserva de 1* classe; e, finalmente,
um advogado de notória competência jurídica; todos de reputação ilibada.

$ 2 ° - Enquanto em funcionam ento o Tribunal, não poderão os juizes ser


dem itidos n em reduzidos os seus vencim entos, continuando-lhes assegurados
os direitos e garantias dos respectivos cargos o u postos.

§ 3° - O Presidente será u m dos magistrados civis. Nas faltas ou im pedi­


m entos, substituí-lo-á u m dos demais juizes, na ordem descendente de anti­
guidade, o u de idade quando igual antiguidade.

Art. 3® - C om o órgãos d o m inistério público funcionarão junto ao Tribu­


nal u m procurador e até cinco adjuntos, de livre nom eação e demissão do Pre­
sidente da República, e com as atribuições definidas no regim ento interno.

257
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Art. 4® - Com pete privativamente ao Tribunal processar e julgar os cri­


mes:

a) contra a existência, a segurança e a integridade do Estado;


b) contra a estrutura das instituições;
c) contra a econom ia popular, a sua guarda e o seu emprego.

P arágrafo ú n ic o - C o m p e t e - lh e a in d a c o n h e c e r e d e c id ir so b r e
habeas-corpus im petrado e m favor de quem sofra ou se ache am eaçado de so ­
frer violência ou coação, por ilegalidade ou abuso de poder, em virtude de ato
ou fato que lhe seja atribuído com o crim e da com petência do Tribunal.

Art. 5® - Os crim es a que se referem as leis n® 38, de 4 de abril de 1935; n*


136, de 14 de dezembro de 1935, e 244, de 11 de setembro de 1936, são conside­
rados delitos contra a existência, a segurança o u integridade do Estado e a es­
trutura das instituições.

Art. 6° - O Tribunal continuará o processo e o julgam ento, n os termos


desta lei, dos crimes da com petência que lhe foi atribuída pela lei n® 244, de 11
de setembro de 1936.

Art. 7® - O processo e o julgam ento dos crimes da com petência do Tribu­


nal serão feitos em primeira instância por u m dos juizes, designado para esse
fim pelo presidente, na conform idade do regim ento interno.

Parágrafo único - Em casos especiais, o juiz designado para funcionar em pri­


meira instância poderá proceder à formação da culpa na circunscrição onde houver
ocorrido o crime. O juiz e os funcionários que o acompanharem terão, nessa hipóte­
se, direito a transporte e a uma diária arbitrada pelo ministro da Justiça.

Art. 8® - D a sentença proferida pelo juiz, na forma d o artigo anterior, ca­


berá recurso de apelação, sem efeito suspensivo, para o Tribunal pleno, im p ed i­
do no julgam ento o juiz prolator da sentença apelada. Mas não caberá recurso
da sua decisão sobre questões incidentes, podendo estas ser suscitadas nova­
m ente, com o preliminares nos julgam entos, pelo Tribunal.

258
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiros Percursos e D esü fio s ( 1 9 3 0 - 194.1)

P arágrafo ú n ic o - H averá sem p re a p ela çã o e x - o f íc io da se n te n ç a


absolutória.

Art. 9® - O juiz que reconhecer a existência de prelim inar o u questão in ci­


dente de relevância, que possa im portar a term inação do processo, deverá
declará-la, independentem ente de alegação da parte, rem etidos os autos ao pre­
sidente para que desde logo a subm eta à decisão do Tribunal.

Art. 10 - As sentenças do Tribunal são irrecorríveis e não suscetíveis de


embargos.

Art. 11 - Serão processadas e julgadas pelo Tribunal as revisões criminais


das condenações por ele proferidas.

Art. 1 2 - 0 Tribunal poderá reunir-se e julgar co m a m aioria dos juizes


inclusive o presidente.

§ 1° - Cada feito será distribuído a um dos juizes, que será o relator na


form a do regim ento interno.

§ 2® - O processo e o julgam ento dos feitos obedecerão ao disposto nesta


lei e no regim ento interno.

$ 3 * - O presidente terá voto nos julgam ento, não funcionando, porém ,


com o relator.

§ 4° - Q uando ocorrer em pate e não tiver votado, por ausente, algum dos
juizes desim pedidos e em exercício, será adiado o julgam ento para que o referi­
do juiz se manifeste. N ã o se pod en d o proceder por esta forma, entender-se-á
confirmada, nos recursos, a decisão ou ato recorrido; prevalecendo, nos pro­
cessos originários, o vo to do presidente.

§ 5° - Logo após o julgam ento, que será secreto, o presidente, se não h o u ­


ver inconveniente para a justiça, proclamará a decisão em sessão pública, p o ­
dendo conceder ao relator o prazo de cinco dias para lavrar o acórdão, que será
publicado, para os fins de direito, no Diário da justiça.

•Al 259
____________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Art. 13 - N o s processos dos crim es a que se refere o art. 4°, letras a e b, os


juizes que proferirem a sentença, e bem assim o Tribunal, em grau de recurso,
julgarão por livre convicção.

Art. 14 - Tratando-se de crime previsto, no art. 4° da presente lei, o Tribu­


nal, tendo em vista os elem entos inform ativos do processo, não ficará adstrito à
classificação do delito feita na denúncia. A desclassificação só se dará, porém ,
para outro da m esm a natureza, pod en d o o m inistério público, n o curso do
processo, editar o u m odificar a denúncia, quanto à desclassificação.

Art. 1 5 - 0 Tribunal e os juizes poderão dispensar a presença dos réus ou


determ inar o seu não comparecim ento, quando o entenderem necessário à or­
dem ou à segurança pública, ou por outro m otivo relevante, bem co m o prati­
car todos os atos de processo, inclusive a decretação de prisão preventiva.

Art. 16 - As declarações prestadas n o inquérito pelo réu os pelos co-réus e


aos depoim entos de testemunhas, a que for oposta contradita, dar-se-á n o jul­
gam ento o valor que merecerem, tendo e m vista os outros elem entos inform a­
tivos do processo.

Valerão contra o réu os d ocum entos apreendidos desde que lhe perten­
çam ou sejam de sua autoria.

Art. 17 - As alegações de acusação e defesa serão sempre escritas, não ha­


vendo debates orais.

Art. 18 - Os juizes e o Tribunal aplicarão as penas das leis n° 38, de 4 de


abril de 1935, e n° 136, de 14 de dezem bro de 1935, e de outras que definam
crim e de sua com petência, inclusive a de m orte, podendo mandar que as penas
temporárias sejam cumpridas em colônias penais agrícolas.

Parágrafo único - Considera-se circunstância agravante preponderante a


condição de estrangeiros, e agravante ou atenuante, conform e o caso, a m aior
o u m enor eficiência do réu na prática do delito.

260 •Al
V o lu m e 4 C ridÇ do, P rim e iro s Percursos o D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 19 4 5 )

Art. 19 - Os crimes conexos com os da com petência do Tribunal serão


processados e julgados no m esm o feito, de acordo com as leis penais em vigor
ao tem po do delito.

Art. 20 - N o processo dos crim es de com petência do Tribunal serão obser­


vadas as seguintes disposições;

1) o prazo para apresentação da denúncia, contado da data da abertura da vista


ao ministério público, é de dez dias se o réu estiver preso, e de quinze se estiver solto;

2) o m inistério público poderá arrolar testemunhas ou dispensá-las se lhe


parecer bastante a prova documental;

3) apresentada a denúncia, será esta distribuída pelo presidente e u m dos


juizes, que a receberá ou não;

4) não será recebida a denúncia que não contiver;


a) a narração de u m fato crim inoso;
b) a qualificação de delinqüente, o u sinais característicos no caso de ser
desconhecido;
c) as razões de convicção o u presunção de dehnqüência;
d) o tem po e o lugar em que foi praticado o crime;
e) a classificação do delito.

5) presum e-se provada a acusação, cabendo ao réu prova em contrário,


sempre que tenha sido preso co m arma na mão, por ocasião da insurreição
armada, ou encontrado com instrum ento ou docum ento do crime;

6) rejeitada a denúncia será a m esm a, juntamente com o inquérito o u os


docum entos, remetida ex-oficio ao conhecim ento e decisão do Tribunal, que
poderá ordenar o seu recebimento;

7) serão tam bém resolvidos pelo Tribunal os pedidos de arquivam ento de


inquérito ou exclusão da denúncia;

8) quando incluídos mais de dois réus na mesma denúncia, o processo.

•ÁB 261
____________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

por determ inação e a critério do juiz do feito, poderá ser distribuído, sem pre­
juízo da sua unidade, em volum es correspondentes a u m ou mais acusados;

9) se um a testem unha, ao prestar d epoim ento, fizer referência a u m ou


m ais réus cujos nom es tenham sido o u venham a ser incluídos em outro grupo
de acusados, poderão estes os seus advogados requerer a re-inquirição da teste­
m unha n o tocante à referência feita, logo que no processo se estiverem colhen­
do elem entos inform ativos da culpabilidade dos réus e m cujo grupo se achem
incluídos aqueles a que a testem unha haja aludido.

10) o juiz mandará citar por edital, co m o prazo de dez dias, para o pro­
cesso e julgam ento os denunciados que não estiverem presos o u não forem
encontrados;

11) a citação inicial dos réus que forem encontrados far-se-á mediante
entrega de cópia autêntica da denúncia, impressa, mimeografada, datilografa­
da o u manuscrita, contendo as perguntas para qualificação do citado, com o os
claros necessários as respostas;

12) o réu que não atender à citação por edital, o u que não tiver advogado,
por não o poder o u querer constituir, será defendido por advogado designado
pelo juiz de feito e escolhido dentre os inscritos na O rdem dos Advogados;

13) apresentado, na primeira audiência, o rol de testemunhas do réu, se as


houver, e em núm ero de três no m áxim o, proceder-se-á em seguida à inquirição
das testemunhas de acusação designando-se oportunam ente dia para a inquisição
das de defesa, que comparecerão e em juízo independentem ente de notificação e
entendido que o réu desiste do depoim ento das que se não apresentarem na au­
diência marcada, não cabendo, salvo em casos excepcionais, a critério do juiz, a
expedição de precatórias e rogatórias para a inquirição de testemunhas de defesa;

14) a testem unha que houver prestado dep oim en to em inquérito policial
ou policial-militar, constante dos autos, e depois de tom ado o seu com prom is­
so pelo juiz, poderá reportar-se às declarações anteriores, sem reproduzi-las,
feitos os aditam entos o u as retificações que o depoente declarar, passar-se-á
logo à reinquirição;

262
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s Percursos o D e s a f i o s ' 1' ) ] 0 - 1 9 4 5 )

15) O juiz permitirá que a defesa form ule perguntas, desde que pertinen­
tes ao processo, evitando as im pertinentes o u protelatórias; o representante do
m inistério público e o juiz poderão tam bém , por fim, fazer, sobre a matéria, as
perguntas que julgarem necessárias;

16) se faltar o juiz do feito no dia m arcado para o início o u o prossegui­


m ento d o sumário, o presidente poderá designar o que provisoriamente o subs­
titua;

17) o processo poderá fazer-se n o presídio o u estabelecim ento a que este­


jam recolhidos os réus, observadas as form alidades legais e as determ inações
atinentes à ordem dos trabalhos;

18) os juizes poderão deprecar a qualquer autoridade judiciária civil ou


militar;

19) o sum ário será concluído dentro de trinta dias, salvo m otivo justifica­
do nos autos; considerando-se justa causa para o excesso do prazo na formação
da culpa a circunstância de existirem mais de cinco réus denunciados no pro­
cesso o u a necessidade de publicação de edital de citação;

20) ouvidas todas as testem unhas arroladas, o juiz tem a faculdade de or­
denar provas requeridas ou ex-oficio, inclusive a acareação de testem unhas e a
audiência das autoridades policiais, peritos e avaliadores ou outros que hajam
funcionado n o inquérito, bem com o que seja ouvida qualquer testem unha re­
ferida, quando o depoim ento possa ser útil à inscrição do processo;

21) decorridos em cartório os prazos de três dias, abertos sucessivamente


à acusação e à defesa, para alegações finais, serão os autos conclusos ao juiz
para julgamento;

22) a sentença será proferida dentro de oito dias da conclusão dos autos;

23) a apelação será interposta, por petição, e acom panhada o u não das
respectivas razões, no prazo de cinco dias, contados da data da publicação da
sentença n o Diário da Justiça;

263
____________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

Art. 21 - Os processos que ainda não tenham sido julgados pelo Tribunal
serão sentenciados pelo juiz já designado pelo presidente, na conform idade do
art. 7®.

Art. 22 - Os processos-crim es da com petência do Tribunal que tenham


sido remetidos a outro juízo ser-lhe-ão devolvidos para os fms de direito.

Art. 23 - Em caso de acúm ulo de serviço, o presidente do Tribunal poderá


solicitar, por interm édio do m inistro da justiça, os funcionários que se torna­
rem necessários.

Parágrafo único - Por igual poderão ser designados, pelo ministro da Jus­
tiça ou pelo da Guerra, prom otores e adjuntos para auxiliar o procurador.

Rio de Janeiro, em 20 de dezembro de 1937,116® da Independência e 49®


da República.

GETÚLIO VARGAS
Francisco Campos

264 9AB
Volume? 4 C ria ç ã o , P rim eiro s Percursos o D esa fio s i M H O - 1 ‘M . t )

DECRETO-LEI N ° 4 28,DE 16 DE M A IO DE 1938

D ispõe, sobre o processo dos crimes definidos nas leis n®s 38 e 136, de 4 de
abril e 14 de dezem bro de 1935.

O Presidente da República, usando da atribuição que lhe confere o art.


180 da C onstituição, decreta:

Art. 1® - O processo e julgam ento dos crimes definidos nas leis n°s 38 e
136, de 4 de abril e 14 de dezem bro de 1935, será feito, pelo Tribunal de Segu­
rança N acional, na form a deste decreto-lei.

Art. 2" - Recebido o inquérito relativo ao crim e, o presidente do Tribunal


dará imediata vista do m esm o ao procurador ou a um dos adjuntos do procu­
rador, designando o juiz e o escrivão que devam funcionar no processo.

Art. 3° - N o m esm o m om ento, mandará citar o réu, ou os réus, para


defender-se e nom eará defensor para os que o não apresentarem dentro de
doze horas.

Parágrafo ú nico - A citação será feita pessoalm ente se o réu estiver preso,
o u quando solto o u foragido, por edital afixado à porta do Tribunal.

Art. 4° - D entro de vinte e quatro horas contadas da abertura da vista, o


representante do M inistério Público procederá à classificação do crime de acordo
com as leis m encionadas n o art. 1® indicando os seus autores, co-autores ou
cúm plices e as penas aplicáveis.

Art. 5® - Em seguida, o juiz designado na forma do art. 2® marcará, para


instrução e julgam ento do feito, um a audiência que terá início vinte quatro
horas após.

Parágrafo ú nico - D entro deste prazo o juiz dará em cartório, vista do


processo ao defensor o u defensores, do réu o u dos réus.

Art. 6° - Iniciada a audiência, feita a qualificação do réu ou dos réus, quando

•41 265
____________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

o juiz não decidir a contrário, e ouvidas as testem unhas de defesa, se tiverem


sido apresentadas, o representante d o M inistério Público sustentará oralmente
a acusação, em quinze m inutos, seguindo-se a defesa, do m esm o m o d o e por
igual tempo.

§ 1® - As testem unhas serão duas n o m áxim o, para cada réu, não podendo
o total exceder de dez se houver m ais de cinco réus.

§ 2® - A inquirição de cada testem unha não deverá durar m ais de cinco


m inutos.

§ 3® - Se a defesa estiver confiada a mais de u m advogado u m será dentre


eles escolhido para falar por todos. A escolha será feita pelos próprios advoga­
dos ou, não havendo maioria, pelo juiz.

§ 4° - O juiz poderá dispensar o com parecim ento do réu, e resolverá em


definitivo as questões preliminares e incidentes suscitadas na audiência.

Art. 7® - Logo a seguir, e dentro de trinta m inutos, o juiz proferirá a sen­


tença que mandará reduzir a escrito juntam ente com o resum o do debate e dos
depoim entos das testemunhas.

Art. 8® - Considera-se provado o que ficou apurado no inquérito, desde


que não haja elidido por prova em contrário.

Art. 9° - D a sentença do juiz poderá ser interposto pela defesa im ediato


recurso de apelação para o Tribunal pleno, que, convocado pelo presidente, se
reunirá dentro de quarenta e oito horas para julgá-lo.

$ 1® - D a sentença absolutória haverá sempre apelação ex-oficio, a qual só


terá efeito devolutivo.

§ 2 ®- N o ato da convocação, o presidente designará o juiz que deva relatar


o feito.

Art. 10 - Observados os prazos do art. 6® o relatório, a sustentação e a

266
Volume? 4 C ria ç ã o , P rim eiros Percursos e D e s a fio s ( 19 j O - 1 9 4 5 )

im pugnação do recurso serão feitos oralmente. A seguir, em sessão secreta, o


presidente tomará os votos dos juizes e votará em últim o lugar, proclam ando
depois a decisão em sessão pública se, a seu juízo, não houver inconveniente
para a justiça.

Parágrafo único - Em caso de empate, prevalecerá o voto do presidente.

Art. II - Esta lei entrará em vigor na data da sua publicação, revogadas as


disposições em contrário.

Rio de Janeiro, em 16 de m aio de 1938,117® da Independência e 50° da


República.
GETÚLIO VARGAS
Francisco Cam pos

267
____________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

DECRETO-LEI N° 474, DE 8 DE JU N H O DE 1938

D ispõe sobre o processo dos crim es da com petência do Tribunal de Segu­


rança Nacional.

O Presidente da República, usando da atribuição que lhe confere o art.


180 da Constituição, e

Considerando que posteriorm ente à entrada em vigor do decreto-lei n®


428, de 16 de m aio de 1938, que dispõe sobre o processo dos crimes definidos
nas leis n°s 38 e 136, de 4 de abril e 14 de dezem bro de 1935, o decreto-lei n®
431, de 18 de maio de 1938, definiu novos crimes da com petência do Tribunal
de Segurança N acional, decreta:

Art. 1° - O processo e julgam ento dos crim es da com petência do Tribunal


de Segurança Nacional será feito na form a desta lei.

Art. 2° - Recebido o inquérito relativo ao crime, o presidente do Tribunal


dará imediata vista do m esm o ao procurador, o u a um dos adjuntos do p rocu­
rador, designado o juiz e o escrivão que devam funcionar n o processo.

Art. 3® - D entro de quarenta e oito horas contadas da abertura da vista, o


representante do m inistério público procederá à classificação do crime, indi­
cando os seus autores, co-autores e cúm plices, e as penas aplicáveis.

Art. 4° - O juiz do feito mandará, “incontinente”, citar o réu, ou os réus,


para defender-se e constituir advogado dentro de vinte e quatro horas; n om ea­
rá defensor para os que o não apresentarem, e concederá à defesa vista dos
autos, em cartório, pelo prazo de quarenta e oito horas.

Parágrafo único - A citação será feita pessoalm ente se o réu estiver preso,
ou, quando solto ou foragido, por edital afixado à porta do Tribunal.

Art. 5° - Em seguida, o juiz marcará, para instrução e julgam ento do feito,


um a audiência que terá início dentro de três dias.

268
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim eiro s Percursos e D e s a fio s i l 9 iO - 1 ‘M >1

Art. 6° - Iniciada a audiência, feita a qualificação do réu, o u dos réus, quan­


do 0 juiz não a entender dispensável, e ouvidas as testem unhas de defesa, se
tiverem sido apresentadas, o representante do m inistério público sustentará
oralm ente a acusação em trinta m inutos, seguindo-se a defesa, pelo m esm o
m odo.

§ 1° - As testem unhas serão duas, no m áxim o, para cada réu, não devendo
a inquirição de cada u m a delas durar mais de quinze m inutos.

§ 2® - A defesa não excederá de meia hora quando estiver confiada a um só


advogado. Havendo vários advogados, cada um deles poderá falar durante quinze
m inutos.
Cada réu não terá, porém , mais de um advogado.

§ 3® - O juiz poderá dispensar o com parecim ento do réu e resolverá em


definitivo as questões preliminares e incidentes suscitadas na audiência.

Art. 7* - Na m esm a audiência, o juiz proferirá a sentença, que mandará


reduzir a escrito juntam ente com o resum o do debate e do depoim ento das
testemunhas.

Art. 8° - Tratando-se de crime com etido fora do D istrito Federal, a autori­


dade judiciária deprecada, nos autos que lhe couberem , observará, no que for
aplicável, o disposto nesta lei, tom ando por escrito o depoim ento das testem u­
nhas de defesa e rem etendo em seguida a precatória ao juiz deprecante.

Art. 9° - Considera-se provado, des'de que não elidido p or prova em c o n ­


trário, o que ficou apurado no inquérito. Mas o juiz poderá, ex-oficio, reinquirir
as testem unhas que neste depuseram.

Art. 10 - D a sentença do juiz poderá ser interposto, pela defesa ou pelo


m inistério público, im ediato recurso de apelação para o tribunal pleno, o qual
convocado pelo presidente, se reunirá dentro de cinco dias para juIgá-Io.

1° - Haverá sempre apelação ex-ofício, com efeito suspensivo, da sentença


absolutória.

269
____________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

§ 2° - N o ato da convocação o presidente designará o juiz que deva relatar


o feito.

Art. 11 - O bservados o s prazos do art. 6®, o relatório, a sustentação e a


im pugnação do recurso serão feitos oralmente.

Estando a defesa confiada a m ais de u m advogado, u m será dentre eles


eleito para falar por todos. A escolha será feita pelos próprios advogados, ou
pelo presidente d o Tribunal se não houver acordo da maioria.

§ 1® - A seguir, em sessão secreta, o presidente tomará os votos dos juizes


e votará em últim o lugar, proclam ando depois a decisão em sessão pública se, a
seu juízo, não houver inconveniente para a justiça.

§ -2® - Em caso de em pate, prevalecerá o voto do presidente.

Art. 12 - C ontinuam em vigor, n o que não for contrário às destas lei, as


disposições processuais e regulamentares relativas à instrução e ao julgam ento
dos crimes da com petência do Tribunal de Segurança Nacional.

Art. 13 - Esta lei entrará em vigor na data da sua publicação, revogadas as


disposições e m contrário.

Rio de Janeiro, em 8 de ju nho de 1938; 117® da Independência e 50® da


República.
GETÚLÍO VARGAS
Francisco Cam pos

270 «41
V o lu m e 4 C ria q ã o , P rim e iro s Percurç-os o D c s n íio s 11930 - 1 9 4 5 i

DOCUMENTOS ANEXADOS AO PROCESSO N° 1.381 do TSN

CARTA DE LUÍS CARLOS PRESTES AO DIRETOR D O PRESIDIO

Rio, 26/12/39

Sr. Diretor,

N ã o querendo deixar passar sem resposta a bondade e cavalheirismo do


seu gesto de hoje, m andando entregar-me um a carta recém-chegada, m esm o
antes de sua passagem pela Censura, e apesar dos acontecim entos desagradá­
veis destes últim os dias.
Voltam-se, assim, as esperanças de que tenha o senhor afinal, com preen­
dido o verdadeiro sentido de m inha atitude. A m im m e julgaria o mais despre­
zível e covarde dos indivíduos, se não protestasse, co m o protesto, contra a situ­
ação em que se encontra Bergen C onfesso-lhe m esm o que não consigo absolu­
tamente atinar com os m otivos pelos quais se obstinam os governantes de n o s­
sa Pátria em manter um a tão trágica situação. Que perderia o governo brasilei­
ro em m andar recolher Berger a u m hospital onde pudesse ter o tratam ento de
que necessita? Fazer mártires não deve ser o objetivo de nen hum governo sen­
sato, co m o m uito bem já dizia, há séculos, o grande Frederico da Prússia. Mas o
que se tem feito conosco, parece só ter este objetivo. N ã o teria o senhor prestí­
gio bastante para fazer sentir ao Sr. M inistro da Justiça que, afinal se declara
católico, o que há de irracional e inútil no regime penitenciário a que estamos
submetidos? É um a causa fácil de imaginar o que significam quatro anos de
rigorosa incom unicabilidade; não crê o senhor? A m im , por exem plo, que ain­
da não cheguei ao estado de Berger, porque não se m e dá algum trabalho, já que
não p osso partilhar da sorte dos outros com panheiros condenados pelo m es­
m o Acórdão do Tribunal de Segurança que m e condenou?
Mas não continuem os. M eu objetivo, por hoje, é sim plesm ente registrar o
seu gesto e testem unhar-lhe a esperança que ele m e trouxe de que o senhor já
tenha com preendido o que há de desum ano na situação em que nos encontra­
m os. U m remédio não deve tardar, portanto.

Creia-me sinceram ente grato,


Luís Carlos Prestes

•AB 271
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

CARTA DE LUÍS CARLOS PRESTES AO SECRETARIADO


NACIONAL D O PARTIDO COMUNISTA

19/2/36 - Com ps. do S. N . - Recebi ontem o bilhete de M. assim c o m o os


supostos bilhetes de Mir. Fui dolorosam ente surpreendido pela falta de resolu­
ção e vacilações de Vocês. Assim não se pode dirigir o Partido do proletariado
da classe revolucionária e conseqüente, (entrelinhas: “porque sup onho que o
M. tenha escrito em n om e do S. N .”). M esm o sem conhecer os originais dos
supostos bilhetes de Miranda, já ontem form ulei m inha opinião a respeito do
que precisam os fazer. Mas suponha que os bilhetes são realmente do p u nho de
M iranda (estou convencido do contrário, c o m o explicarei abaixo), co m o che­
gar às conclusões de Vocês? Por que m odificar a decisão a respeito da Garota?
Q ue tem a ver um a cousa com outra? Há ou não há traição por parte dela? É ou
não é ela perigosíssima ao Partido, com o elem ento inteiramente ao serviço do
adversário, conhecedora de muita cousa e testem unhas única contra u m gran­
de núm ero de com panheiros e simpatizantes? Se Vocês julgam que os bilhetes
são verdadeiros, c om o podem qualificar isto de “fraquezas” do “nosso com pa­
nheiro Mir.”? Traição é traição e tanto m aior quanto mais responsável o trai­
dor. Mas voltem os ao caso da pequena. C om plena consciência de m inha res­
ponsabilidade, desde os primeiros instantes tenho dado a Vocês m inha opinião
sobre o que fazer com ela. Em m inha carta de 16, sou categórico o nada mais
tenho a acrescentar n em creio que os últim os bilhetes possam m odificar uma
tal decisão. Por isso não com preendo as vacilações de Vocês. O S. N . é soberano
e suas decisões não devem ficar “à espera da opinião de V. que deve ser definiti­
va”. U m a tal linguagem não é digna dos chefes d o nosso Partido, porque é lin ­
guagem de m edrosos, incapazes de um a decisão, tem erosos ante a responsabi­
lidade. O u bem que vocês concordam com as m edidas extremas e neste caso já
deviam ter resolutamente posto em prática, ou então discordam mas não de­
fendem co m o devem tal opinião. N ão é possível dirigir sem assumir responsa­
bilidade. Por outro lado’, um a direção não tem o direito de vacilar em questões
que dizem respeito à defesa da própria organização. Vocês com preenderão a
veem ência destas linhas, porque elas traduzem com a franqueza necessária toda
a m inha tristeza frente às vacilações da direção em cujas m ãos está o futuro da
Revolução no Brasil”.

272 màM
V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim cirn s Percursos e D c s .iíio s 11 - I "-M il

DECRETO~LEI 869, DE 18 DE NOVEMBRO DE 1938

D efine os crimes contra a econ om ia popular, sua guarda e seu emprego.

0 Presidente da República, usando da atribuição que lhe confere o artigo


180 da Constituição.

DECRETA:
Art. 1«- Serão punidos na form a desta lei os crim es contra a econom ia
popular, sua guarda e seu emprego.

Art. 2® - São crimes dessa natureza:

1 - destruir ou inutilizar, intencionalm ente e sem autorização legal, com o


fim de determinar alta de preços, em proveito próprio o u de terceiros, matérias
prim as o u produtos necessários ao con su m o do povo;

II - abandonar o u fazer abandonar lavouras o u plantações, suspender ou


fazer suspender a atividade de fábricas, usinas ou quaisquer estabelecim entos
de produção, ou m eios de transporte m ediante indenização paga pela desistên­
cia da competição;

III - prom over o u participar de consórcio, o u convênio, ajuste aliança ou


fusão de capitais, com o fim de im pedir o u dificultar, para o efeito de aum ento
arbitrário de lucros, a concorrência em matéria de produção, transporte ou
comércio;

IV - reter ou açambarcar m atérias-primas, m eios de produção o u produ­


tos necessários ao consum o do povo, c om o fim dom inar o mercado em qual­
quer p on to do país e provocar alta dos preços;

V - vender mercadorias abaixo do preço de custo com fim de im pedir a


concorrência;

VI - provocar a alta ou baixa de preços, títulos públicos, valores ou salári­


os por m eio de notícias falsas, operações fictícias o u qualquer outro artifício;

273
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

VII - dar indicações o u fazer afirm ações falsas em prospectos o u anúnci­


os, para o fim de subscrição, com pra o u venda de títulos, ações o u quotas;

VIII - exercer funções de direção, adm inistração o u gerência de mais de


um a empresa ou sociedade do m esm o ramo de indústria ou com ércio co m o
fim de im pedir o u dificultar a concorrência;

IX - gerir fraudulenta ou temerariamente bancos ou estabelecimentos bancári­


os, ou de capitalização; sociedade de seguros, pecúlios ou pensões vitalícias; socieda­
des para empréstimos ou financiamento de construções e de vendas de imóveis e
prestações, com ou sem sorteio ou preferência por meio de pontos ou quotas; caixas
econômicas; caixas Raiffeisen; caixas mútuas, de beneficência, socorros ou emprésti­
mos; caixas de pecúlio, pensão e aposentadoria; caixas construtoras; cooperativas,
sociedades de.economia coletiva, levando-as à falência ou à insolvência, ou não cum ­
prindo qualquer das cláusulas contratuais com prejuízo dos interessados;

X - fraudar de qualquer m od o escriturações, lançam entos, registros, rela­


tórios, pareceres e outras inform ações devidas a sócios de sociedades civis ou
com erciais, em que o capital seja fracionado em ações o u quotas de valor
nom inativo igual o u inferior a l.OOOSOOO, com o fim de sonegar lucros, divi­
dendos, percentagens, rateios o u bonificações, o u de desfalcar ou desviar fu n­
dos de reserva o u reservas técnicas.

Pena: prisão celular de 2 a 10 anos e m ulta de 10:000$ a 50:000$.

Art. 3® - São ainda crimes contra a econom ia popular, sua guarda e seu
emprego:

I - celebrar ajuste para im por determ inado preço de revenda ou exigir do


com prador que não compre de outro vendedor;

II - transgredir tabelas oficiais de preços de mercadorias;

III - obter o u tentar obter ganhos ilícitos, e m detrim ento do povo ou de


núm ero indeterm inado de pessoas m ediante especulações o u processos frau­
dulentos {“bola de neve”, “cadeias”, “pichardism o” etc);

274
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim eiro s Percursos e D e s a fio s í 193Ü - 194S1

IV - violar contrato de venda a prestações, fraudando sorteios ou deixan­


do de entregar a coisa vendida sem devolução das prestações pagas, o u descon­
tar destas nas vendas com reserva de dom ínio, quando o contrato for rescindi­
do por culpa do comprador, quantia m aior do que a correspondente à depreci­
ação do objeto;

V - fraudar pesos o u m ed id as padronizados em lei o u regulam ento;


possu í-los o u detê-los, para efeito de comércio, sabendo estarem fraudados.

Pena- prisão celular de seis meses a dois anos e m ulta de 2:000$000 a


10 :000 $ 000 .

Art. 4® - C onstitui crimes da m esm a natureza a usura pecuniária ou real,


assim se considerando:
a) - cobrar juros superiores à taxa permitida por lei, com m issão ou des­
conto, fixo ou percentual, sobre a quantia m utuada, além daquela taxa;
b) - obter ou estipular, em qualquer contrato, abusando de premente n e­
cessidade, inexperiência o u leviandade da outra parte, lucro patrim onial que
exceda o quinto do valor corrente ou justo da prestação feita o u prometida.
Pena: seis m eses a dois anos de prisão celular e m ulta de 2:000$000 a
10:0000$000.

§ 1 * - Nas m esm as penas incorrerão os procuradores, mandatários ou


m ediadores que intervierem na operação usuária, bem com o os cessionários
do crédito usuário que, cientes de sua natureza ilícita, o fizeram valer em suces­
siva transm issão ou execução judicial.

§ 2° - São circunstâncias agravantes do crim e de usura:


I - ser com etido em época de grave crise econôm ica;
II - ocasionar grave dano individual;
III - dissim ular-se a natureza usuária do contrato;
IV - ser praticado;
a) por militar, funcionário público, m inistro de culto religioso; por pessoa
cuja condição econôm ico-social seja m anifestam ente superior à da vítima;
b) em detrim ento d e operário ou de agricultor; de m enor de 18 anos ou
de deficiente mental; interditado o u não.

275
____________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

V - a reincidência.

§ 3® - A estipulação de juros o u lucros usuários será nula, devendo o juiz


ajustá-los à m edida legal, ou, caso já tenha sido cum prida, ordenar a restituição
da quantia paga em excesso com os juros legais a contar da data do pagam ento
indevido.

Art. 5® - Q uando qualquer dos crim es definidos nesta lei for praticado em
n o m e de pessoa jurídica, o M inistro da Justiça e N egócios Interiores poderá
interditá-la, um a vez passada em julgado a sentença, sem prejuízo da sanção
im posta aos responsáveis.

Art. 6® - Os crim es definidos nesta lei são inafiançáveis e serão processa­


dos e julgados pelo Tribunal de Segurança N acional. Neles não haverá suspen­
são da pena n em livram ento condicional.

Art. 7° - Esta lei entra em vigor na data da sua publicação, revogadas as


disposições em contrário.

R io de Janeiro, 18 de novem bro de 1 9 38 ,1 1 7° da Independência e 5 0“ da


República.
GETÚLIO VARGAS
Francisco C am pos

276 9ÀM
V o lu m e 4 C riaç.V ), P rim eiro s PcrcLirsos e D es.D ios ( I ‘H O - 1 ‘) 4 3 i

DECRETO-LEI 7.474, DE 18 DE ABRIL DE 1945

C oncede anistia.

O Presidente da República, usando da atribuição que lhe confere o art.


180 da Constituição, decreta:

A rt. 1° - É c o n c e d id a a n istia a to d o s q u an tos ten h a m c o m e tid o c r i­


m es p o lític o s d esd e 16 -d e ju lh o de 1934 até a data da p u b lic a ç ã o deste
d e c r e to -le i.

§ 1® - N ã o se c o m p r e e n d e m n e sta an istia o s crim es c o m u n s n ã o


c o n e x o s c o m os p o lític o s, n e m o s pra tica d o s, em te m p o de guerra, contra
a seg u ra n ça d o E stado e d e fin id o s n o D e c r e to -lei n° 4 .7 6 6 , de 1 de o u t u ­
bro d e 1942.

§ 2° - Consideram -se conexos para os efeitos deste artigo os crim es c o ­


m u n s praticados com fins políticos e que tenham sido julgados pelo Tribunal
de Segurança Nacional.

Art. 2 ° - A reversão dos militares, beneficiados por esta lei, aos seus postos,
ficará dependente de parecer de um a ou m ais com issões militares, de n o m e a ­
ção do Presidente da República.

Art. 3® - Os funcionários civis poderão ser aproveitados nos m esm os car­


gos sem elhantes, à m edida que ocorrerem vagas e m ediante revisão oportuna
de cada caso, procedida por um a o u mais com issões especiais de n om eação do
Presidente da República.

Art. 4® - Em nenhuma hipótese, terão os beneficiados por este decreto-lei direi­


to aos vencimentos atrasados ou suas diferenças, e bem assim a qualquer indenização.

Art. 5® - Esta lei entrará em vigor na data da sua publicação.

Rio de Janeiro, 18 de abril de 1945,124° da Independência e 57° da República.

277
______________ HiqtnrÍA da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

GETÚLIO VARGAS
A gam enom Magalhães
Henrique A. Guilhem
Eurico G. Dutra
José Roberto de M acedo Soares
A. de Souza Costa
João de M endonça Lima
A polônio Sales
Gustavo Capanema
Alexandre M arcondes Filho
J. R Salgado Filho

278
V o lu m e 4 Cria(^:ã(), P rim eiro s Percursos e D e s a fio s U 9 3 0 - 1 9 4 5 )

LEI C O N S TITU C IO N A L N° 14, DE 17 DE NOVEMBRO DE 1945

Extingue o Tribunal de Segurança N acional e dispõe sobre a com petência


para o processo e julgam ento de crim es contra a existência, a segurança e a
integridade do Estado e a guarda e em prego da econom ia popular.

0 Presidente da República, usando da atribuição que lhe confere o art.


180 da C onstituição, decreta:

Art. 1° - Fica extinto o Tribunal de Segurança Nacional que se refere o art.


173 da Constituição, em endado pela Lei Constitucional n° 7, de 30 de setembro
de 1942.

Art. 2® - Serão processados e julgados na forma que a lei determinar, pelos


juizes e Tribunais referidos n o art. 90 da Constituição, os crimes que atentarem
contra.

1 - a existência, a segurança e a integridade do Estado;


II - a guarda e o em prego da econom ia popular.

Rio de Janeiro, 17 de novem bro de 1945,124° da Independência e 57° da


República.

JOSÉ LINHARES
A. de Sam paio D ória
Jorge D odsw orth Martins
R Góis M onteiro
R Leão Veloso
J. Pires do Rio
M aurício Joppert da Silva
Teodureto de Camargo
Raul Leitão da Cunha
R. Carneiro de M endonça
A rm ando R Trampowsky

279
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

N U M E R O DE C O N D E N A D O S PELO TRIBUNAL DE
SEGURANÇA N A C IO N AL, POR ESTADO^

Rio Grande do Sul 218


Santa Catarina 110
Paraná 126
São Paulo 782
Rio de Janeiro 125
Distrito Federal 1458
Minas Gerais 165
Mato Grosso 37
Espírito Santo 20
Bahia 70
Pernambuco 264
Alagoas 5
Sergipe 5
Rio Grande do N orte 318
Ceará 32
Maranhão 66
Pará. 34
Amazonas 7
Goiás 26
T. Ponta Porã 1
T. Rio Branco 1
T. do Acre 4
Paraíba 71
Piauí 46
Total 4099

^ E xtra íd o d o Livro de C ondenados, A rquivo N a cio na l, a p u d R einald o P o n p e u d e C am p o s, op. cit.

280
V o lu m e 4 CriaÇcic), P rim eiro s Percursos e D cs.ifios < 1 9 3 0 - 1 9 4 j )

RELAÇÃO DE JUIZES E PROCURADORES


Q U E A T U A R A M N O TSN^

JUlZES

Frederico Barros Barreto, Presidente - M agistrado


Alberto de L em os Basto - Cap.-de-M ar-e-Guerra
Raul M achado - civil
A n tonio Pereira Braga - civil
Luiz Carlos da Costa N eto - Coronel do Exército
Alfredo de Miranda Rodrigues - Cap.-de-Mar-e-Guerra
Augusto Maynard G om es - C oronel do Exército
Theodoro Pacheco Ferreira - C oronel do Exército
Pedro Borges da Silva - civil
Eronides Ferreira de Carvalho - Cap. do Exército.

PROCURADORES

H onorato Himalaya Virgolino


Paulo C am pos da Paz
José Maria M c D ow ell da Costa
Clovis Kruel de Morais Gilberto Goulart de Andrade
Francisco de Paula Leite e Oiticica Filho
Eduardo Jara
Joaquim da Silva Azevedo
Adhem ar Vitor de M enezes Vidal.

^ E x tra íd o d o Livro de Posse, A rquivo N acional, a p u d R einaido P o n p e u d e C am p o s, op. cit.

A4I 281
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

282 9àM
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim e iro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

ANEXO IX
C ódigo de Ética

283
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

284 «Al
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim e iro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

C ódigo de Ético Profissional

PREÂMBULO. — E ste Código a crescen ta às n o rm as ge­


ra is de é tica a s q ue o advogado deve especialm ente obser­
var. (1)

SEÇÃO 1$

Deveres fu n d a m e n ta is .

I — Os deveres do advogado com preendem , além da de­


fesa dos direitos e interesses que lh e são confiados, o zelo do
prestígio de su a classe (2), d a d ignidade d a m a g istra tu ra (3),
do aperfeiçoam ento das institu içõ es de D ireito, e, em geral,
do que interesse à ordem ju ríd ica.

n — Não se p erm ite ao ad v ogado:

a) a n g a ria r, d ire ta ou in d ire ta m e n te , serviços ou causas;


b) inculcar-se p a ra p re s ta r serviços, ou oferecê-los, sa l­
vo g ra tu ita m e n te e em benefício de pessoa necessita-
ta d a , ou de in stitu iç ã o de utilid ad e pública;
c) a n u n c ia r, im od eradam ente, ad m itid a ap en as a indica­
ção de títu lo s, especialidade, sede de escritório e cor­
respondentes;

(1) Cír. art. 1(8, Inciso I e XXIX, do Estatuto.


(2) Cír. art. 87, Inciso VII.
(3) Cír. art. 87, inciso IX.

535

GA# 285
______________ História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

d ) solicitar, provocar, ou su g e rir publicidade q ue im por­


te p ro p a g a n d a de seus m erecim entos o u aüvidades.

TTT — C um pre ao advogado:

a ) g u a rd a r sigilo, m esmo em depoim ento ju d icial, sobre


o que saib a em razão de seu ofício; (4)
b ) p re sta r, d esin teressad am ente, serviços profissionais
aos m iseráveis que os solicitarem . D esignado p a ra es­
se fim , n ão pode o advogado, sem m otivo ju sto , es­
cusar-se, cum prindo-lhe proceder com to d o o esfor­
ço e solicitude; (5)
c) em itir, publicam ente, qu an d o solicitado p or pessoa
idônea, e o con sid erar opo rtu no , p a re c e r fu n d am en ­
ta d o sobre questões ju ríd ic a s de in teresse geral, in s­
pirando-se nos princípios de D ireito, nos preceitos le­
gais e n o bem com um .

SEÇÃO 2»
P rim e ira s relações co m o c lie n te —
A ce ita çã o d a causa.

I — Deve 0 advogado:
a ) d en u n ciar, desde logo, a q u em lh e solicite p arecer, o u
p atro cín io , qu alq u er c irc u n stâ n c ia q u e possa in flu ir
n a resolução de lh e su b m e te r a c o n su lta o u co n fiar a
causa;
b) in te ira r-se de to das as c irc u n stâ n c ia s d o caso, a n te s
de em itir ju ízo sobre ele;
c) n ã o se p ro n u n c ia r sobre caso que sa ib a e n tre g u e ao
p a tro cín io de o u tro advogado, sem conhecer os fu n ­
d am en to s d a opinião, o u d a a titu d e , d o m esm o advo­
gado, e n a presença dele, o u com seu prévio e expres­
so a ssen tim en to ; (6)

(4) C ír.art. 87, Inciso V e XVI; e tb. art. inciso H e XIX.


(5) Ofr.art. 87. Inciso XI.
(6) Ofr.art. 87, inciso XV.

536

286 9ÁB
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim e iro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

d ) in fo rm ar o clien te dos riscos, incertezas e dem ais c ir­


cu n stân cias q ue possam com prom eter o êxito d a causa;
e) e v itar tu d o o que possa in d u z ir o clien te a dem an­
d ar, ressalvado o esclarecim ento dos seus direitos;
í) n ão assum ir, salvo em c lrcim stân cias especiais, o cu s­
teio d a causa;
g) re c u sa r o p atro cín io de ca u sa que considere ilegal, in ­
ju s ta ou im oral, (?) cum prindo-lhe, salvo im pedim en­
to relevante, m o tiv a r a re c u sa qu an do o cliente o so­
licite. É, tod av ia, d ireito e dever do advogado, a ssu ­
m ir a defesa crim in al, sem considerar su a p ró pria
o p in i ^ sobre a cu lp a do acusado;
h ) n ão a c e ita r p ro cu ração sem a an u ên cia do advogado,
com quem te n h a de colaborar, ou a quem su b stitu a ,
salvo, n e sta hipótese, p a ra revogação de m a n d a to a n ­
terior, p o r m otivo ju stificado ; (»)
i) verificar, com isenção, os m otivos d a resolução do cli­
ente, quando convidado p a ra su b stitu ir o utro advoga­
do con stitu íd o an te rio rm e n te , aconselhando, nesse ca­
so, o cliente a o b ter a desistência do m a n d a to a n te ­
rio r e a liq u id ar p reviam en te as co n tas de seu co­
lega; (9)
j) abster-se de p a tro c in a r ca u sa c o n trá ria à validade de
a to ju ríd ico em que te n h a colaborado, e de aconse­
lh a r, ou p ro c u ra r p o r u m a p a rte depois de aceitar
m a n d a to d a o u tra , ou de receber d esta segredos d a
causa. A m esm a ab sten ção se rá observada, a in d a que
o advogado te n h a sido a p en as convidado pela o u tra
p a rte , se e sta lhe h o u v er com unicado a orien tação
g eral da d em an d a e obtido seu p arecer sobre as
probabilidades de êxito, salvo sendo m alicioso o con­
vite, a fim de c ria r o im pedim ento;
k ) n ão assum ir o p atro cín io de in teresses que possam
e n tra r em conflito, salvo depois de esclarecidos os pró-

<7) Oír. art. 87, Inciso X H


(8) Cfr. art. 87, Inciso XIV.
(8) Cfr. art. 87. indso XIV.

537

287
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

prios interessados. C onsideram -se estes esclarecidos,


quando, cientem ente, co n stitu em o m esm o advogado.
II — Q u an d o se a p r e s e n ta r a p o ssib ilid ad e d e com posi­
ç ã o s a tis fa tó ria , d e v e rá o ad v o g ad o a c o n se lh a r o c lie n te a p re ­
fe ri-la , e v ita n d o a d e m a n d a , o u te rm in a n d o -a , se in ic ia d a .

SEÇÃO 3.»

E x e rcício d a advocacia
I — A plicará o advogado todo o zelo e diligência, e os re­
cursos de seu saber, em prol dos d ireito s q ue p atro cin ar.
I I — N enhum receio de d e sa g ra d a r a ju iz, o u de incor­
re r em im popularidade, d e te rá o advogado n o cum prim ento
de seus deveres. (lo)
I I I — Z elará o advogado p ela su a com petência exclusiva
n a o rien tação técn ica d a causa, reservando ao clien te a decisão
do que lhe in te re ssa r pessoalm ente.
IV — N ão a firm a rá o advogado, como arg u m en to , su a
convicção pessoal d a inocência do cliente ou d a ju stiç a d a
causa.
V — M a n te rá o advogado, em, todo o curso d a causa, p er­
fe ita cortesia em relação ao colega adverso, e e v ita rá fazer-lhe
alusões pessoais. (11)
V I — O advogado poderá publicar, n a im prensa, aleg a­
ções forenses, que n ão sejam d ifam ató rias, n ão devendo, po­
rém , provocar, o u e n tre te r, d eb ate sobre cau sas d e seu p a ­
trocínio. Q uando circu n stân cias especiais to m a re m conveni­
e n te a explanação pú b ü ca d a c au sa, p o derá fazê-Ja, com a
s u a a ss in a tu ra e responsabilidade, evitando referência a fa ­
to s estranhos.
v n — Nos m em oriais e o u tra s publicações, sobre cau­
sas que possam envolver escândalo público, especialm ente as

(10) Cfr. a r t 88 do Estatuto.


(11) Ofr. art. 87, Inciso yttt

538

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V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim e iro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

referen tes ao estado civil e as que interessem a h o n ra ou boa


fain a, o m itirá o advogado a indicação n o m in al dos litig an tes.

V III — É defeso ao advogado:

a ) advogar, p ro c u ra r o u acon selh ar c o n tra disposição li­


te ra l de lei;
b) d e sa m p a ra r os feitos, sem m otivo ju sto e ciência do
co iw titu inte;
c) fazer requerim entos, prom over diligências e, em ge­
ra l, p ra tic a r a to s desnecessários ao an d a m e n to da
causa, com o in tu ito exclusivo de perceber ou avolu­
m a r cu stas, o u u sa r m aliciosam ente de m eios protela-
tórios;
d ) fazer cota em peça dos au to s;
e) a lte ra r m aliciosam ente, ou d e tu rp a r, o te o r de depoi­
m en to , docum ento, alegação de advogado c o n trW o ,
citação de ob ra d o u trin á ria , de lei, ou de sen ten ça;
red ig ir infielm ente depoim ento ou declaração; em su­
m a, p or q u alq u er m odo, ilu d ir, ou te n ta r ilu d ir, o
adversário, ou o juiz d a causa;
f) ad q u irir, m esm o em h a s ta pública, bem penhorado,
o u arrecad ad o, no processo em que te n h a in terv en ­
ção;
g) ontenãer-se d ire ta m e n te com a p a rte adversa, one te ­
n h a p atro n o con stituíd o, sem o assen tim en to deste.

SEÇÃO 4.»

Relações pessoais com o clie n te

I — Deve o advogado:

a ) evitar, q u a n to possa, que o clien te p ratiq u e, em rela­


ção à causa, ato s reprovados por este Código. Se o cli­
e n te p e rsistir n a p rá tic a de ta is atos, te rá o advogado
m otivo fun d ad o p a ra desistir do p atro cín io da causa;
b) não e n tre g a r au to s jud iciais ao cliente;
c) co m un icar im ed iatam en te ao clien te o recebim ento
de bens, ou valores, a ele perten centes;

539

289
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

d) d a r ao cliente, quand o este as solicite, o u log^ que


concluído o negócio, c o n ta s p o rm en o ríj^d as do m a n ­
d ato. Não lh e é perm itid o re te r docum entos, nem
q u aisq u er q u a n tia s, bens ou valores, o u com pensá-los,
lo ra dos casos l^ a tó ;
e) in d en izar p ro n ta m e n te o prejuízo que c a u sa r, por n e ­
gligência, erro inescusável o u dole; (12)
f) expor ao c li« ite , a fim de que este resolva o que lh e
convier, o conflito d e opániões sobre p o n to c a já ta l do
feito, n o caso de divergência com o u tro advogado
co n stitu íd o co n ju n tam en te;
g) e v ita r receber do cliente, w n p rejuízo deste, segredo
o u revelação, q u e possa aprov eitar a o u tro cliente, ou
ao p ró prio advogado.

I I — É aconselhável que o advogado;

a ) re s titu a ao clien te os papéis de que n ão precise; (is)


b) dê recibo d as q u a n tia s que o clien te lh e p ag ue, ou e n ­
treg u e, a q u alq u er títu lo ;
c) n ão ap re se n te alegação grave» sobre m a té ria de fato
ou d eprim en te de q u alq u er das p a rte s litig a n te s, sem
que se fun d e, ao m enos, em prin cíp io de prova aten -
dível, ou que o clien te a au torize p o r escrito;
d ) n ã o aceite poderes irrevogáveis, o u em c a u ^ p ró p ria,
nem , em reg ra, os de tra n sig ir, confessar, desistir,
sem in dicação precisa do objeto, a in d a q u e fo ra do
in stru m e n to do m an dato.

SEÇÃO 5.»

Relações em Juízo

I — Deve 0 advogado:

a ) tr a ta r a s au to rid ad es e os fu ncionários do juízo, com


respeito, discrição e independência, n ão prescindindo

(13) Cfr. art. 87, indso X V m .


(13) Cír. art. 87, inciso XIX.

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V o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

de ig u a l tra ta m e n to p or p a rte deles e zelando a s p re r­


rog ativ as a q ue te m direito;
b) re p re se n ta r ao poder com peten te c o n tra au to rid ad e e
fun cion ário s do juízo p o r f a lta de exação no cum pri­
m en to do dever;
c) tr a ta r com u rb an id ad e a p a rte c o n trá ria e as teste­
m u n h a s, p erito s e o u tra s pessoas que fig urem no pro­
cesso, n ão co m p artin do n e m estim u land o ódios ou
ressentim entos; (i<)
d) abster-se de en ten dim en tos tendenciosos, o u de dis­
cussão, im rticu larm en te, com o Ju iz, sobre a c a u sa a
p ropor ou em an dam ento.

II — Não pode 0 advogado e n tra r, em com binações com


se rv en tu ário s de ju stiç a , ou seus aux iliares, p a ra desviá-los
do ex ato e fiel cum prim ento de seus deveres.

SEÇAO 6.9

E xe rcício de cargos p ú b lic o s e relações com a


a d m in is tra ç ã o

I — O advogado n ão se v alerá de su a in flu ên cia p olítica


em benefício do cliente, e deverá e v ita r q u alq u er a titu d e que
sign ifiq ue o ap ro veitam ento dessa in flu ên cia p a ra o m esm o
fim .

I I — O advogado investido de m a n d a to legislativo não


deve, n a corporação de que fa ç a p a rte , v o ta r m a té ria que fa­
voreça, pessoal e d iretam en te, a clie n te seu, nem d isc u tir as­
su n to s dessa espécie, salvo se revelar, desde logo, a circun s­
tâ n c ia aludida.

I I I — O advogado, que o cu p ar cargo n a ad m in istração


p úb lica, n ão pode p a tro c in a r in teresses de pessoa que te n h a

(14) Ofr. art. 87, inciso X m .

541

•àl 291
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

negócios d e q u alq u er n a tu re z a com os serviços em que ete


funcione.

IV — O advogado q ue não exerça fu n ç ã o d a adm inis­


tra ç ã o pública, ou m a n d a to legislativo, pode p re sta r serviços
profissionais p e ra n te corporações legislativas, ou repartições,
com a d ig nid ad e exigida p a ra o seu ofício em juízo.

SEÇÃO 7.»

D esistê n cia ão m a n d a to

I — D eclin ará o advogado do m a n d a to , ressalvadas es-


típ ulaçõ es c o n tra tu a is anterio res, logo que s in ta fa lta r-lh e
a con fian ça do cliente.

I I — Sobrevindo conflito de in teresses e n tre seus cons­


titu in te s, n ã o se aco rdan d o os interessados, re n u n c ia rá o ad­
vogado ao m a n d a to de u m a das p artes.

m — No caso de re n ú n c ia de m a n d a to , te r á o advogado
0 m aior cuidado em p reserv ar a defesa dos direitos a ele con­
fiados, e abster-se de declaração pública, ou nos au to s, sobre
o m érito d a causa.

SEÇÃO 8.»

H on o rá rio s

I — É recom endável que se c o n tra te , previam ente, por


escrito, a p restação dos serviços profissionais. (i5)

I I — O advogado n ão se associará com o clien te em c a u ­


sa q ue p atro cin e, podendo, no e n ta n to , c o n tra ta r ho no rário s
variáveis segundo o re su lta d o conseguido, o u consistentes em
p ercen tag em sobre o valor liquidado.

(15) Cfr. art. 89, Inciso XXII.

542

292 9AB
\'o lu m e 4 C ria ç ã o , P rim e iro s Percursos e D e s a fio s ( 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

m — Os h o norários profissionais devem ser fixados com


m oderação, aten did o s os d e m e n to s seguintes:
V
a ) a relevância, o vulto, a com plexidade e a dificuldade
d a s questões versadas;
b) o tra b a lh o e o tem po necessários;
c) a possibilidade de fic a r o advogado im pedido de in te r­
v ir e m o u tro s casos, o u de se desav lr com outros cli­
e n te s, ou terceiros;
d) o valor d a causa, a condição econôm ica do clien te e
o proveito p a ra ele re su lta n te do serviço profissional;
e) o c a rá te r da intervenção, c o n ío rm e se tr a te de servi­
ço a cliente avulso, h a b itu a l, o u p erm an en te;
í) o lu g a r d a p restação dos serviços, fo ra ou não, do do­
m icílio do advogado;
g) a com petência e o renom e do profissional;
h ) a p raxe do foro sobre tra b a lh o s análogos.

VI — O advogado subestabelecido com reserva de pode­


res deve a ju s ta r su a rem u neração com o colega que Ihos ou­
torgou.

V — É aconselhável que, ten d o de co b rar ju d icialm en te


honorários, o advogado se faça re p re se n ta r p o r um colega.

SEÇÃO 9.»

O bservância do C ódigo

I — Deve 0 advogado lev ar ao conhecim ento do órgão


com petente da O rdem , com discrição, e fu n d a m en tad am en te,
as transgressões d as n o rm as d este Código, do R egulam ento
d a O rdem , ou do R egim ento respectivo, com etidas p o r o u tro
advogado em relações com o reclam an te, o u cliente seu.

n — Q uando em dúvida sobre qu estão de é tica profis­


sion al, q ue considere não p rev ista n este código, o advogado

543

OAI 293
______________História da
O r d e m dos A d v o g a d o s d o Brasil

a n te s de q u a lq u e r a titu d e , a p re se n ta rá o caso, em term os ge­


ra is, ao T rib u n a l E special d a Seção. (i6) s e reco nh ecer que
a hipótese Aão estava precisam en te reg u lad a, o T rib u n a l co­
m u n ic a rá a decisão a d o ta d a ao presid en te d a Seção, e este
a tra n s m itirá com o p a re c e r do Conselho d a m esm a Seção»
e todos os votos em itidos, ao Ck)nselho F ederal, p a ra que a
considere em su a p rim e ira reu n ião subseqüente.

n i — Sem pre que te n h a conhecim ento de tran sg ressão


das n orm as deste Código, a Com issão com petente, o u o pre­
sid en te d a Seção, ou Subseção, c h a m a rá a a ten ção do resp on ­
sável p a ra o dispositivo violado, sem prejuízo d a s p enalid ades
aplicáveis.

SEÇÃO 10.9
E xte n sã o do C ódigo

As re g ra s d e ste Código o b rig am os provisionados e os so­


licitadores, no que Uies fo r ap licáv el

SEÇAO 11.9
M o d ific a ç ã o do Código

Q ualquer m odificação d este Código som ente se rá fe ita


pelo C onselho F ederal, em v irtu d e de p rop o sta do C onselho
d e alg u m a d a s Seções, co m unicada aos d em ais C onselhos
com an teced ên cia m ín im a de 90 dias.

SEÇAO 12.9
V ig ê n d a do C ódigo

O p resen te Código e n tra rá em vigor, em todo o te rri­


tó rio n acio n al, a 15 de novem bro do co rren te an o , cabendo

<16) Por determlnaç&o do Conselho Federal, o Tribunal Especial passou,


a denominar-se Tribunal de fitica Profissional

544

294 •Ál
V o lu m e 4 C r ia ç ã o , P rim e iro s Percursos e D e s a fio s { 1 9 3 0 - 1 9 4 5 )

aos presidentes d a s Seções e Subseções d a O rdem prom over


a su a m ais am p la divulgação.

Sala d a s Sessões do C onselho F ederal, aos 25 de ju lh o


de 1934. — Levi C arneiro, p resid ente; A tílio V lvacqua, se­
c re tá rio geral; Jo aq u im Ig nácio de A lm eida A m azonas, presi­
d e n te d a Seção de Pernam buco; N ereu R am os, presid en te d a
Seção d e S a n ta C a ta rin a ; F ran cisco B arb o sa de Rezende,
T arg in o R ibeiro, P hiladelph o Azevedo, delegação d a Seção
d o D istrito F ederal; Carlos de M oraes A ndrade, S. Paiüo;
Leopoldo T . d a C u n h a Mello, A m azonas; D em osthenes M a-
d u re ira de P inho. B ahia; Sanelva de R o h an A raujo Soares,
A lagoas; E urico V alle, P a rá e A cre; A larico d e F re ita s, Es­
p írito S an to ; A lberto Roselli, R io G ran d e do N orte; João
V illasboas, M ato Grosso; H aroldo V aladão, P a ra n á ; João Pe­
d ro dos S an tos, Sergipe; A rnaldo T avares, E stad o do Rio;
P ed ro Aleixo, M inas G erais; J. J . P o ntes V ieira, C eará.

•ál 295
S«ntB M irl« • RS • (55) 7 7 7 X ff\
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CZvn MmM fomècióos.
Este quai-lo volum e - C R IA Ç Ã O . PRIM EIROS PE R C U R SO S E
D E SA F IO S - refere-se a fatos de extrema importância no conjunto
da HISTORIA D A O R D E M D O S A D V O G A D O S D O B R A SIL, porque
registra acontecim entos surgidos imediatamente após a sua criação e m 19
de novem bro de 1930. É nesse primeiro embate, isto é. na década de trinta,
que se destacou, no cenário nacional, a figura singular de S O B R A L
PINTO, tom ando-se, por sua bravura, com petência e habilidade, o sím bolo
dos advogados brasileiros. Presos o s líderes com unistas Luiz Carlos Prestes
e H a n y Bergen o Presidente da O A B do antigo Distrito Federal e Vice-
Presidente do C onselho Federal, no R io de Janeiro. Dr. Targino Ribeiro,
designou Sobral Pinto, alravés d o O fício r f 20, de 08 de janeiro de 1937.
para ser o advogado dos referidos presos. Contam que os advogados
da área criminal da época receavam assumir o patrocínio de cliente nessa
situação tendo em vista o caráter repressor e rancoroso do T S N . pois já era
com um confundir-se a pessoa do acusado com a pessoa do advogado.
Targino Ribeiro, habilmente, observando que Sobral Pinto era um líder
católico convicto e praticante, seguidor da filosofia de S. Tomás de Aquino,
e, além disso, um dos fundadores e {^residentes do Centro D om Vital,
nom eou-o defensor dativo dos referidos réus. Sobral Pinto se agigantou
e se notabilizou na defesa, utilizando todas as suas forças mentais
e criativas a ponto de invocar a lei de proteção aos animais para reivindicar
celas condignas para o s seus clientes, que se encontravam
enclausurados num esp aço impróprio a um ser humano,
um deles fora jo ga d o num vão. debaixo
de uma escada, que não lhe permitia

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