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Por Um Cinema Imperfeito PDF
Por Um Cinema Imperfeito PDF
novelística latino-americana.
Por que nos aplaudem? Sem dúvida, se alcançou uma certa qualidade.
Por que nos preocupa que nos aplaudam? Não está, entre as regras do jogo
nossos povos?
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não é só de ordem ética, mas também, e sobretudo, estética, se é que se
termos.
Quando nos perguntamos por que nós somos diretores de cinema e não os
torna possível que esta deixe de ser privilégio de uns poucos, o que
contemporânea.
momento que sentido tem o que ele faz. O simples fato de que surge esta
inquietude demonstra que existem fatores que a motivam. Fatores que, por
qual tendência.
Entretanto, é mais fácil definir a arte pelo que não é, se é que se pode falar
ninguém se deixam fechar em um marco, por mais dourado que este seja.
Não é muito mais fácil para a natureza artística concebê-la com seu
próprio poder cognitivo? Isto quer dizer que a arte não é ilustração de
não sejam as artísticas? Talvez seu poder cognitivo seja como o do jogo
para a criança. Talvez o prazer estético seja o prazer que nos provoca sentir
nos enriquece de tal forma que seus resultados não são específicos, não se
podem aplicar para algo em particular. Daí que a podemos chamar de uma
intelectuais.
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que sente a necessidade de hipertrofiar a importância de sua atividade?
essas funções as devemos exercer todos, quer dizer, o povo? E por que
os riscos se tem a certeza de que sua obra não deixará de ser uma
expressão artística. O único risco que ele não aceita é o de que a obra não
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caso de que todavia hoje a Gioconda não a podem desfrutar todos. Deviam
"desinteressada"? Por que esta situação é hoje mais sensível que nunca?
Desde que o mundo é mundo, quer dizer, desde que o mundo é mundo
haverá pintores senão, quando muito, homens, que, entre outras coisas
pratiquem a pintura”. (Marx)
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contemporâneo. Os três sem ordem hierárquica, os três inter-relacionados.
Por que se teme à ciência? Por que se teme que a arte possa ser esmagada
complexo de inferioridade? É certo que lemos hoje com muito mais prazer,
um bom ensaio que uma novela. Por que repetimos então, com horror, que
disfarces com isso que tem se dado chamar de mundo poético? Com o
avanço da ciência a arte não tem o que perder, ao contrário, tem todo um
exercer a arte como atividade minoritária. Diz-se que a arte não pode
seduzir sem a cooperação do sujeito que faz a experiência. Está certo. Mas
o que fazer para que o público deixe de ser objeto e se converta em sujeito?
mais avançadas, tem feito possível, como nunca, a presença ativa das
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em nenhum outro momento da história. É a primeira fase de um processo
“alta cultura”, uma vez superada por ela mesma, não passa ao resto da
festim? Não tem sido esta uma eterna espiral convertida hoje, afinal, em
círculo vicioso? O camp (tendência que revaloriza o que está fora de moda.
diferença é que o camp os resgata como valor estético, apesar de que para
de que todos tenham o gosto de alguns, senão a de que todos possam ser
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criadores da cultura artística. A arte sempre foi uma necessidade de todos.
A arte popular não tem nada a ver com a chamada arte de massas. A arte
necessita que o público não tenha gosto. A arte de massa será na realidade
hoje em dia, é a arte que alguns poucos fazem para as massas. Grotowski
diz que o teatro de hoje deve ser de minorias porque é o cinema que pode
fazer a arte de massas. Não está certo. Possivelmente não existe uma arte
feito por uma minoria para as massas. Possivelmente seja o cinema a arte
que demore mais para chegar ao poder das massas. A arte de massas é,
pois, a arte popular, o que fazem as massas. Arte para as massas é, como
bem diz Hauser, a produção desenvolvida por uma minoria para satisfazer
consumidora.
A arte popular é o que tem feito sempre a parte mais inculta da sociedade.
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moderna não é mais que a conquista de um novo interlocutor: O próprio
mantida pela arte popular, conquistada pela arte culta, deve fundir-se e
única, específica, quer dizer, se desenvolve não como atividade senão como
realização de tipo pessoal. Eis aí o preço cruel de haver tido que manter a
doloroso para o artista e para a própria arte? Pretender a arte como seita,
esta é realizada como uma atividade dentro da vida, que o homem não
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possibilidade de superar essa tradicional dissociação. Não são sintomas
das infinitas cópias de um filme? Não existe um afã por saltar a barreira
da arte “elitária” nesses pintores que confiam a qualquer um, não já a seus
Não há toda uma tendência na arte moderna de fazer participar cada vez
deixará, então, de ser espectador? Não é este ou não deve ser este, ao
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individual que temos todos? Quando Grotowski fala de que o teatro de hoje
teatro tenha cada vez menos público não quer dizer que as condições
dada a pouca presença das massas na vida social, ainda assim este
única coisa que pode tornar possível a presença total e livre das massas.
fragmentária do homem.
Paradoxalmente pensamos que será uma nova poética e não uma nova
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propriedade campesina e a religião. Mas é certo que em matéria de política
agora se dita escola deverá ter uma vida limitada? O que perseguimos com
fazer algo para ir acabando com essa divisão entre cultura artística e
onde vem esse prestígio que, inclusive, torna possível monopolizar para si
prestígio que gozara sempre o espírito acima do corpo? Não se tem visto
elegantes, mais sérias, mais profundas? Não podemos, desde já, ir fazendo
algo para acabar com essa artificial divisão? Não podemos ir pensando
desde agora que o corpo e as coisas do corpo são também elegantes, que a
alma está no corpo, como o espírito na vida material, como – para falar
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(sem que deixem de atuar como tais, desde já), os próprios sociólogos,
massas ainda que exista a divisão entre as duas culturas, ainda que as
Uma nova poética para o cinema será, antes de tudo e sobretudo, uma
quando for o público quem faça à arte. A arte hoje deverá assimilar uma
da arte.
A divisa deste cinema imperfeito (que não há que inventar porque já foi
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como alívio, como pretexto ou, como diria Freud, como sublimação de seus
problemas. O neurótico pode fazer arte mas a arte não tem por que fazer
não estão nos sãos, mas nos doentes, não estão nos normais, mas nos
anormais, não estão nos que lutam, mas nos que choram, não estão nos
de 1937, do gênero drama, dirigido por George Cukor e estrelado por Greta
nossos dias. Só o que sofre, só o que está doente, é elegante e sério e até
que podem mudar, que, apesar dos problemas e das dificuldades, estão
mais “público” para um cinema desta natureza que cineastas para o dito
“público”.
O que nos exige este novo interlocutor? Uma arte carregada de exemplos
imitador. Por outro lado, os exemplos morais é ele que nos pode dar. Se por
acaso pode nos pedir uma obra mais plena, total, não importa se dirigida
demonstrar uma vez mais que é mau? Para quê se os que lutam já lutam
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cinema auto-suficiente e contemplativo. O contrário a um cinema que
narcisista não tem nada a ver com os que lutam). Mostrar um processo
objeto.
ou como expressão específica. Para ele é igual. Não são estas suas
alternativas, nem seus problemas, nem muito menos seus objetivos. Não
são estas nem as batalhas nem as polêmicas que lhe interessa libertar.
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O cinema imperfeito pode ser também divertido. Divertido para o cineasta
e para o seu novo interlocutor. Os que lutam não lutam à margem da vida
mas dentro. A luta é vida e vice-versa. Não se luta para “depois” viver. A
luta exige uma organização que é a organização da vida. Ainda que, na fase
nega.
cinema imperfeito pode fazer o mesmo com uma Mitchell ou uma câmera 8
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um artista é saber como responde à seguinte pergunta: Que faz para saltar
O cineasta dessa nova poética não deve ver nela o objeto de uma realização
pessoal. Deve ter também desde já, outra atividade. Deve hierarquizar sua
desaparecer como nova poética. Não se trata mais de substituir uma escola
por outra, um ismo por outro, uma poesia por uma anti-poesia, senão de
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Extraído de:
Texto traduzido por Luzilene Cardoso de Souza e Luciano José de Freitas, a partir de
original em espanhol publicado em 15/09/2010 na Revista Universitária do Audiovisual, e
disponível no endereço eletrônico: http://www.ufscar.br/rua/site/p=3065.
Sobre o autor:
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