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OBRAS HIDROVIÁRIAS

Estas Notas de Aulas sobre Hidráulica Marítima são um


extrato dos Capítulos 21 a 26, páginas 1113 a 1452 do Livro
Engenharia Portuária, Segunda Edição (2018), Editora Edgar
Blucher, 1504 páginas de autoria de Paolo Alfredini e Emilia
Arasaki.

PANORAMA HIDROVIÁRIO NACIONAL


O Brasil possui uma das maiores redes fluviais do mundo, com cerca de 20 mil quilômetros
em condições de navegação, sendo a malha navegável total estimada em 50 mil quilômetros,
destacando-se as hidrovias dos rios Madeira-Amazonas, Araguaia-Tocantins, São Francisco,
Paraguai-Paraná e Tietê-Paraná, sendo que o trecho Amazonas-Solimões permite o acesso de navios
marítimos até cerca de duas mil milhas náuticas da costa (em Iquitos no Peru), podendo ser
considerada prolongamento da via marítima.
A possibilidade de navegação cria uma alternativa de transporte de baixo custo para
minérios, grãos (soja, trigo, milho), combustíveis (álcool, gasolina, diesel), materiais de
construção, cana de açúcar, madeiras e carga geral (containers) entre o interior do país e as
principais áreas de consumo e exportação.
O frete é fator fundamental nas análises logísticas de transportes das matrizes de custos das
empresas e, portanto, a hidrovia, integrada a outros modais de transporte (multimodalidade) pode
concorrer com redução de frete de até 50%, principalmente em trechos longos, colaborando,
indubitavelmente, para a modernização da economia nacional. Assim, por exemplo, considerando-
se o desempenho de um caminhão graneleiro de 27 toneladas de capacidade nominal, uma
composição ferroviária com capacidade para 2000 toneladas e um comboio Tietê (empurrador de
850 HP e duas chatas de 1150 toneladas cada uma de capacidade de carga) constata-se a proporção
aproximada de 1:2:5 na composição dos custos modais por ton.Km, num percurso estimado de 1000
Km.
Apesar de uma série de implicações para a sua realização, como a necessária
intermodalidade, isto é a conexão com outro modal de transporte, como o transbordo de cargas
(elevação de carga ao se passar de um modal para outro) ou transposições de desnível, o transporte
hidroviário é o de menor gasto energético. De fato, estudos internacionais divulgados na década de
1990 mostram que a energia específica consumida pelo modo hidroviário é da ordem média de 0,6
MJ por ton.Km, enquanto que, em condições semelhantes, a ferrovia consome de 0,6 a 1 MJ por
ton.Km e os caminhões pesados de 0,96 a 2,22 MJ por ton.Km, sem considerar os custos ambientais
decorrentes. Quanto a este último aspecto, deve-se considerar que o modo hidroviário é o de menor
imposição de custos ambientais, isto é, de menores quantidades de energia necessárias para a
recomposição ambiental na obtenção do menor afastamento do equilíbrio pré-existente.
A navegação interior no Brasil está a exigir a necessidade de serem usufruídas as vantagens
do barateamento dos produtos básicos pelo transporte hidroviário, principalmente num quadro
mundial de economia globalizada, entretanto as condições da economia nacional e a conformação
das redes fluviais em relação às regiões produtoras dificultam a aplicação dos vultosos recursos em
obras que, em geral, somente tornar-se-ão viáveis em prazos relativamente longos.
Neste contexto da realidade nacional, a sistemática que vem sendo adotada em muitas
situações para o fomento à navegação interior tem sido a sua inserção em planos de aproveitamento
múltiplo dos recursos hídricos. Este método, adotado na canalização do Rio Tietê (SP) na segunda
metade do século passado, permite diluir o investimento necessário às obras de navegação, tornando
o empreendimento global rentável em menor prazo, sobretudo pela renda advinda da geração de
energia hidroelétrica.
A implantação da hidrovia numa canalização integral de curso d’água tem como principal
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investimento as obras de transposição de desnível, enquanto as demais obras de melhoramento,
balizamento, construção de portos, etc. são decorrência natural do desenvolvimento do tráfego. As
características das obras de transposição de desnível condicionam , em grande parte, as
embarcações que podem utilizar a hidrovia e, portanto, a própria economicidade do meio de
transporte.
Dentre as principais dificuldades para a livre navegação destaca-se a passagem de
embarcações por desníveis localizados, normalmente devidos às barragens para aproveitamentos
hidráulicos. As obras de transposição de desnível são fundamentais nas hidrovias interiores por
permitirem a continuidade da navegabilidade.

Hidrovias e terminais hidroviários brasileiros.


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I. DRAGAGEM E DERROCAMENTO

I.1 DRAGAGEM

I.1.1 Introdução

O serviço de dragagem consiste na escavação e remoção (retirada, transporte e deposição)


de solo, rochas decompostas ou desmontadas (por derrocamento) submersos em qualquer
profundidade e por meio de variados tipos de equipamentos (mecânicos ou hidráulicos) em mares,
estuários e rios.
As dragagens fluviais envolvem normalmente menores volumes do que as marítimas, pois as
profundidades são reduzidas (abaixo de 5 m), bem como são realizadas somente sob a ação de
correntes, o que consequentemente reduz o porte dos equipamentos. Dependendo da largura do
canal fluvial, pode ser realizada a escavação a partir da margem por escavadeiras, embora
preponderem os equipamentos flutuantes.
As dragagens de implantação, efetuadas para a implantação de um determinado gabarito
geométrico (profundidade, largura e taludes), diferem das dragagens de manutenção, efetuadas
sistematicamente para manter o gabarito. De fato, as primeiras acarretam um maior volume de
serviço, uma vez que na implantação existe a necessidade da acomodação do terreno ao gabarito
imposto, estando sujeita a deslizamentos de taludes até conseguir-se a estabilidade das rampas.

Comportamento dos sedimentos ao serem dispostos em águas expostas por meio de diferentes
processos.
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• I.1.2 Dragas mecânicas

I.1.2.1 Caracterização

As dragas mecânicas são caracterizadas pelo uso de alguma espécie de caçamba para
escavar e elevar o material do fundo.
No caso dos equipamentos terrestres o transporte para a área de despejo é normalmente
efetuado por caminhões.
As dragas flutuantes têm maior produtividade pelo fato de seu peso ao flutuar permitir maior
versatilidade de operação.
No caso dos equipamentos flutuantes estacionários dispõe-se de embarcações auxiliares de
reboque e os dragados são transportados para a área de despejo normalmente a partir do depósito
numa barcaça (batelão), a qual transporta o material para o destino final. As dragas estacionárias
são operadas com pontaletes (charutos, ou spuds), ou âncoras em locais mais fundos, movimentados
com sistema de elevação e guinchos para posicionamento e deslocamento (normalmente sistemas à
ré e sistemas à vante).

I.1.2.2 Pá de arrasto (dragline)

A pá de arrasto (dragline) trata-se de equipamento mecânico terrestre de guincho que se


desloca sobre esteiras que movimentam o conjunto de plataforma giratória, aonde está montada a
cabine de operação, a treliça (lança) do guincho, o motor e três tambores com dois cabos ligados à
caçamba (lançamento, içamento arrastamento) e um para movimentação da lança (ângulo vertical).
O ciclo completo de operação consiste no lançamento, arrasto, içamento, giro e descarga da
caçamba operada pelos cabos. É adequada para operação em terrenos moles, trata-se de
equipamento de baixa produtividade e indicado para serviços de abertura de calhas em várzeas ou
mangues, ou manutenções localizadas (por exemplo em confluências).

I.1.2.3 Draga mecânica de colher (escavadeira shovel)

A draga mecânica de colher (escavadeira shovel) trata-se de equipamento mais robusto do


que o anterior, permitindo penetração e corte em materiais mais duros, uma vez que a caçamba está
estruturalmente conectada à extremidade de um braço rígido. A lança é movimentada por cabo e
outro cabo opera o braço de escavação. Os comandos também podem ter acionamento hidráulico.
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(a), (b), (c) e (d) Pá de arrasto (dragline) num ciclo de operação.


(e) e (f) Draga mecânica de colher.

I.1.2.4 Draga de caçamba de mandíbulas (clamshell ou orange peel)

A draga de caçamba de mandíbulas trata-se de equipamento operado por três cabos, que
movimentam verticalmente a lança, movimentam verticalmente a caçamba e abrem ou fecham as
mandíbulas. Para solos moles utiliza-se o clamshell e para blocos de material duro utiliza-se a
caçamba orange peel.

(a) e (b) Draga de caçamba de mandíbulas operando no Complexo Portuário de Ponta da Madeira
da CVRD em São Luís (MA).
(c) Dragagem junto ao cais no Porto de Tubarão com transporte por batelões.
(d) Enchimento de gabiões.
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Draga de caçamba operando com pontão ancorado.

Vista lateral e planta de draga de caçambas flutuante e autotransportadora.

I.1.2.5 Draga de pá escavadora (dipper)


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A draga de pá escavadora (dipper) consiste fundamentalmente de draga mecânica de colher
montada em barcaça. Normalmente a caçamba está localizada no extremo do braço, o qual conecta-
se aproximadamente no meio do braço a um pivô e por um cabo à roldana no extremo do braço. Os
equipamentos mais modernos são dotados de atuadores hidráulicos e frequentemente podendo ser
dotado de retroescavador.

Vista lateral, corte, planta e foto (retroescavadeira) de draga de pá escavadora (“dipper”).

De um modo geral, são equipamentos escavadores de custo médio, com baixa a moderada
capacidade em áreas de operação mais amplas, e bom desempenho na escavação argila rija, areia
grossa, pedregulhos e materiais duros maiores e desagregados. Suas desvantagens estão na
recomendação de não operar com condições de agitação (principalmente a ondulação), na limitação
de operação em maiores profundidades, não sendo eficiente na dragagem de material muito fluido.

I.1.2.6 Draga de alcatruzes

A draga de alcatruzes utiliza uma cadeia sem fim móvel de caçambas (rosário), montada
numa lança, que escava o fundo próximo ao tombo inferior, roldana guia da lança movida pelo
rosário, e eleva o material para o tombo superior, de onde parte a geração do movimento do rosário,
aonde cada caçamba descarrega sua carga e retorna para outra. Abaixo do tombo superior situa-se a
caixa de lama que recebe a descarga das caçambas, estando dotada de dispositivo distribuidor que
descarrega os dragados para um bordo ou outro, conforme o posicionamento dos batelões que
transportam o material para o despejo.
A draga de alcatruzes estacionária opera posicionando-se com cabos presos em âncoras ou
em pontos nas margens.
De um modo geral, têm as vantagens de operarem continuamente, alta força de corte,
mínima diluição, aplicação em grandes projetos de implantação de canais e boa capacidade de
escavação (inclusive das partículas maiores) com maior rendimento para dragas de grande
capacidade dragando material homogêneo, sendo então indicadas para trechos fluviais de rios de
grande porte, flúvio-marítimos e estuarinos. Suas desvantagens consistem no alto custo de
mobilização e manutenção, na sua grande sensibilidade à ação de ondulação e na necessidade do
uso de batelões para o transporte, pois a operação destes é restrita para aterro em áreas rasas
marginais.
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Representação esquemática de uma draga de alcatruzes.


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I.1.3 Dragas hidráulicas

I.1.3.1 Caracterização

As dragas hidráulicas são caracterizadas pela misturação e transporte do material dragado


em escoamento hidráulico de alta velocidade. Desagregadores mecânicos podem ser usados quando
for necessário escavar ou raspar material mais consistente. Uma bomba de dragagem é utilizada
para criar a carga hidráulica e o escoamento necessários para transportar a mistura bifásica água-
solo ao longo de tubulação para o seu despejo.
Pode-se considerar basicamente dois tipos de dragas hidráulicas: draga estacionária de
sucção e recalque, que se desloca em maiores distâncias com auxílio de rebocadores, e
autotransportadora, montada em embarcação autopropelida que armazena os dragados em cisterna e
os despeja pelo fundo ou por bombeamento.

I.1.3.2 Draga estacionária de sucção e recalque

A draga estacionária de sucção e recalque é a forma mais simples de draga hidráulica.


Quando a draga não dispõe de desagragador o uso deste tipo de draga está limitado a escavar
materiais móveis e fluidos em áreas localizadas, podendo dispor de sistema de jatos d’água de alta
velocidade para facilitar a retirada de material.

Dragagem de um talude com draga de sucção e recalque.

(a) e (b) Esquemas operacionais de uma draga de sucção e recalque.


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A draga estacionária de sucção e recalque com desagregador é a mais comum e versátil


draga hidráulica. Esta draga é equipada com um desagregador rotatório que é um escavador que
envolve a boca da linha de sucção. O desagregador escava e translada os dragados para a área de
influência do escoamento de alta velocidade na boca de sucção, aonde os sedimentos são
misturados, passando pela bomba da draga para a linha flutuante e ou terrestre de recalque e para a
área de despejo.

(a) e (b) Draga de sucção e recalque com seu desagregador.

A operação de avanço e dragagem mostrada permite observar que a draga é mantida em


posição por dois charutos na popa do flutuante, sendo somente um afundado no leito enquanto a
draga gira. Há duas âncoras de fixação, uma da cada bordo, ligadas a guinchos de giro que recolhem
ou soltam dois cabos laterais que sustentam o giro. Assim, a draga gira alternadamente para
bombordo e boreste em torno dos charutos de bombordo e boreste e avança, enquanto corta o
material de fundo na profundidade exigida pelo gabarito de dragagem.

Método de avanço e dragagem de draga de sucção e recalque.


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(a), (b) e (c) Draga estacionária de sucção com sistema de carregamento de barcaças.

Recomenda-se que as dragas estacionárias de sucção e recalque convencionais somente


operem em áreas marítimas sob condições de vagas de altura abaixo de 0,75 m.

Draga autotransportadora de sucção e arrasto (Trailing suction ou Hopper)

A draga autotransportadora de sucção e arrasto consiste numa embarcação marítima


autopropelida em que os dragados são armazenados na cisterna para despejo posterior. A
configuração mais comum dispõe de duas tubulações articuladas em cada bordo do casco próximo
ao centro de flutuação para minimizar o efeito do estado do mar. Cada tubulação tem sua própria
boca de dragagem para contacto com o fundo, que normalmente está acoplada à sua própria bomba.

Draga de sucção e arrasto autotransportadora (“Hopper”).


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Boca de dragagem.

A draga de sucção e arrasto dispõe de sistema compensador de ondas acoplado à tubulação


de sucção para amortecer o efeito do estado do mar sobre a boca de dragagem. Os dragados são
bombeados para a cisterna na qual os sólidos tendem a decantar para o fundo. Uma vez cheia a
cisterna inicia-se o extravasamento para o mar, constituído de água contendo alguns sólidos em
função do tempo de decantação disponível. Assim que a carga economicamente proporcionada de
sólidos estiver completada, as tubulações de sucção são elevadas e o navio segue para a área de
despejo, frequentemente em grandes profundidades, aonde as portas de fundo são abertas e os
dragados são descarregados. A draga então retorna para a área de dragagem para outro
carregamento.

Draga autotransportadora de sucção e arrasto (“Hopper”).


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Draga autotransportadora (“Hopper”) de sucção e arrasto.

I.1.3.6 Embarcações auxiliares

A atividade de dragagem com dragas estacionárias utiliza-se de embarcações auxiliares,


fundamentalmente barcaças, rebocadores, lanchas de transporte de pessoal e lanchas para efetuar os
serviços de sondagem batimétrica.
As barcaças ou batelões lameiros são embarcações autopropelidas que dispõe de sistema de
abertura para descarga dos dragados no despejo. Uma vez descarregados os dragados voltam a
flutuar com calado leve e água na cisterna suficiente para lastreá-los.

(a) (b)
(c)
(a) Operação de batelões ou barcaças de dragagem. (b) Operação no Rio Tietê em São Paulo. (c)
Batelão lameiro no Porto de Santos (SP)

Os rebocadores são utilizados para conduzir o flutuante da draga e posicionar o sistema de


fixação da mesma.
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Embarcação auxiliar de dragagem. Rebocador.

I.1.3.7 Linhas de recalque

A linha de recalque de dragas de sucção e recalque em seu trecho flutuante é interligadaao


final de cada tubo, cujo compriemnto usual é de 6 a 12 m, por um mangote flexível, devendo dispor
de folga que permita a movimentação da draga.
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Juntas e flutuantes em tubulações de recalque flutuantes.

I.1.4 Medições dos volumes dragados

Para efetuar o pagamento e controlar o rendimento dos serviços de dragagem torna-se


necessário efetuar a medição dos serviços efetuados, que pode ser feita por:

•Medição no corte
Esta medição está sujeita a imprecisões oriundas de: assoreamentos, pelo retorno dos dragados
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ou pelo próprio transporte sólido natural, e empolamento de fundo, pelo alívio das pressões com
a retirada da camada dragada.

•Medição no despejo
A medição no despejo conduz normalmente a valores menores do que no corte por: perdas de
material em suspensão nas correntes, compactação do material diferente da natural e recalque do
leito.

•Medição na cisterna
A medição na cisterna é a forma mais direta de medição. Quando o transporte é feito em
batelões lameiros ou dragas autotransportadoras pode-se medir a espessura do material
decantado e a concentração de sedimentos em suspensão por amostragem na cisterna.

I.2 DERROCAMENTO

• I.2.1 Considerações gerais

O derrocamento é uma obra de melhoramento que atua na desagregação e remoção de


materiais submersos que afetam a navegação e cuja dureza inviabiliza a remoção por dragagem.
Podem ser consideradas as seguintes fases no derrocamento: desmonte, retirada, transporte e
deposição.
O desmonte por ondas de choque pode ser obtido por percussão direta (a frio) ou com o uso
de explosivos (a fogo).
Na retirada do material desagregado são usadas dragas mecânicas apropriadas para a retirada
de material duro e compatíveis com o método de desmonte utilizado, sendo o material transportado
por batelões para a área de despejo.
Diferentemente do processo de dragagem, são obras definitivas que aumentam as
velocidades e a declividade da linha d’água.

• I.2.2 Métodos de derrocagem

I.2.2.1 Desmonte mecânico

O desmonte mecânico utiliza-se da energia de impacto por percussões reiteradas, utilizando-


se para tanto basicamente o derrocador de percussão ou perfuratrizes. A energia utilizada no
equipamento é função da dureza, espessura e profundidade da camada, bem como da dimensão
máxima desejada para o material desagregado. A seguir descrevem-se os equipamentos mais
comumente empregados:

•Derrocador de queda livre


O derrocador de queda livre utiliza-se da percussão de uma haste de derrocagem de grande
peso constituída de um pontalete de forma tronco-cônica de aço de liga especial ultra duro, cuja
energia de impacto é função da altura de queda da haste (normalmente de 2 a 5 m). O equipamento
é montado num pontão aonde está instalada uma torre com um sistema de suspensão acionado por
guinchos de grande capacidade para elevarem o pilão, que pode pesar de 4 a 25 toneladas. Estes
equipamentos são indicados para espessuras a desmontar de 1 a 1,5 m e as profundidades em que
estes equipamentos são operados normalmente variam de 4 a 15 m. Para profundidades maiores do
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que 4 m é necessário usar um tubo de ferro estaiado por cabos de aço e apoiado no casco para servir
de guia ao pontalete na parte submersa.
A produção destes equipamentos é bastante variável, devendo-se substitui a ponteira e o
pilão após um determinado número de golpes, que variam em função das características das obras
efetuadas.

Cabos ligados a
guinchos de
estaiamento

Derrocador de 22 toneladas.

•Perfuratriz
O desmonte por perfuração utiliza-se de tubulões aonde é expulsa a água por instalação
pneumática de ar comprimido, permitindo operações a seco com perfuratrizes, marteletes, por ação
manual, somente em serviços de menor porte, ou mecânica. Os compressores de ar para os grandes
martelos pneumáticos são instalados em embarcações e permitem perfurações até mais de 20 m de
profundidade, com forças de choque de 3 a 10 toneladas em camadas de até cerca de 1,5 m de
espessura. Para camadas acima de 1,5 m de espessura é conveniente proceder à remoção do material
desagregado, por jato d’água ou ar injetados por orifícios existentes na própria broca, antes de
continuar a perfuração, evitando-se deste modo a redução da produtividade e o risco de ruptura da
haste da broca.
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1.2.2.2 Desmonte com explosivos

O desmonte com explosivos utiliza-se da introdução de cargas a serem detonadas em


perfurações previamente executadas, sendo atualmente mais usual o emprego de marteletes a ar
comprimido. Nas perfurações efetuadas a partir da superfície utilizam-se embarcações estacionárias
com várias torres, muitas vezes móveis sobre trilhos, dotadas de hastes perfuratrizes longas que se
movem no interior de tubos-guia solidários ao flutuante, o qual garante o seu posicionamento com
quatro charutos apoiados sobre o fundo e operados por guinchos.

II. DIMENSÕES BÁSICAS DAS HIDROVIAS E OBRAS DE


MELHORAMENTO PARA A NAVEGAÇÃO

• II.1 EMBARCAÇÕES FLUVIAIS

• II.1.1 Características das embarcações fluviais

A tendência atual para as embarcações fluviais é a de utilização de comboios de empurra,


compostos por rebocador empurrando chatas, com as maiores dimensões compatíveis com a via, e
automotores. Tem-se buscado também a padronização das dimensões, visando a otimização das
obras hidroviárias, a navegação ininterrupta com balizamento adequado e a unificação da carga
geral com containers.
As dimensões das embarcações fluviais estão ligadas às características da hidrovia
(dimensões, correnteza e obras), características da embarcação (tipo de carga, capacidade de carga,
local de operação, manobrabilidade e velocidade) e forma hidrodinâmica. Da análise econômica
operacional de minimização dos custos totais por tonelada (soma dos parciais investidos na hidrovia
e na embarcação) carregada em função da tonelagem da embarcação.
As características das embarcações são sintetizadas em:

•Comprimento (L): corresponde à distância entre as verticais que passam pelos extremos de popa e
proa
•Boca (B): corresponde à distância entre as verticais tangentes aos extremos de bombordo e boreste
da seção mestra (maior transversal).
•Calado (T): corresponde à distância entre a quilha e a linha d’água da seção mestra.
•Pontal (P): corresponde à altura entre a quilha e o convés principal.
•Deslocamento total, correspondente ao peso do volume de água deslocado pela embarcação.
•Porte bruto ou capacidade de carga, corresponde à diferença entre o deslocamento total e o peso
do casco, motor e equipamentos. Costuma ser citado em tpb (tonelagem de porte bruto)

• II.1.2 Automotores

Os automotores, graças à sua versatilidade, são embarcações apropriadas ao emprego nas


hidrovias pioneiras, aonde ainda a carga movimentada não atinja valores que compensem a adoção
de grandes comboios de empurra, bem como nas hidrovias consolidadas para cargas de rápida
movimentação, como os granéis líquidos, pois é possível com eles obter maiores velocidades
médias de percurso.
As embarcações fluviais automotoras assemelham-se à marítimas pela total independência
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de tráfego, por disporem de propulsão própria. A diferenciação está ligada ao menor calado
comparativamente ao comprimento e boca, à pequena borda livre entre a linha d’água e o convés
por navegarem em águas abrigadas e às baixas estruturas para facilitar a navegação sob estruturas
com pequenas alturas livres.
Podem-se citar como exemplos os automotores projetados para a Hidrovia Araguaia-
Tocantins: flúvio-marítimo (a jusante de Marabá) e fluvial. O primeiro tem dimensões L, B, T de
99,5 m, 15 m, 5 m (4700 tpb) e o segundo 47 m, 8 m, 1,7 m (340 tpb).

Automotor fluvial.

Configuração do automotor Araguaia operando como empurrador.


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Embarcação automotora operando no Rio Taquari (RS) na Hidrovia Taquari-Jacuí-Lagoa dos Patos.

Embarcação automotora operando no Rio Jacuí (RS) na Hidrovia Taquari-Jacuí-Lagoa dos Patos.
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Embarcação automotora operando no Rio Jacuí (RS) na Hidrovia Taquari-Jacuí-Lagoa dos Patos.

• II.1.3 Empurradores

Os empurradores são embarcações dotadas de meios próprios de propulsão e manobra e


destinados a deslocar chatas de empurra num comboio de empurra.
Os empurradores dispõem de uma ampla plataforma, aonde encontram-se as estruturas
suportes de sustentação compostas por perfis verticais, articulados com as embarcações que deverão
ser movimentadas pela pressão do barco automotor.
Como exemplo, o empurrador fluvial projetado para a Hidrovia Araguaia-Tocantins, com
capacidade para empurrar até 1484 tpb numa velocidade de 6,3 nós.
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Empurrador com cabine retrátil para passagem sob travessias de pontes muito baixas projetado para
o Rio Tietê e empurrador projetado para o sistema Tocantins-Araguaia.

II.1.4 Chatas

Constituem-se em embarcações com formas predominantemente retilíneas, propiciando


facilidade de construção a baixo custo e favorecendo o acoplamento em conjunto para o transporte
de cargas. As chatas acopladas a empurradores dispensam propulsão, leme e tripulação.
Três tipos básicos são empregados na navegação de empurra, dando origem aos comboios não
integrados, aos semi-integrados e aos integrados.
As chatas para comboios não integrados têm proa e popa carenadas e na fila apresentam em
cada junta de linha uma descontinuidade que reduz significativamente o rendimento propulsivo do
conjunto, fazendo com que as dimensões das chatas tenham importância por definirem o maior ou
menor número de descontinuidades do casco conjunto.
Chata de casco duplo para transporte de granéis sólidos. Para o transporte exclusivo de
granéis sólidos (grãos, minérios, materiais de construção, fertilizantes, etc.) as paredes do casco têm
sua estrutura reforçada. Dimensões características: L = 36 m, B = 8 m, T de 0,7 a 1,6 m, P = 2,0 m,
capacidades de carga nos porões de 52 a 286 tpb e deslocamento total de 137 t a 371 t.
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Chata de casco duplo projetada para transporte de granéis sólidos.

Para as vias fluviais canalizadas (dotadas de eclusas), ou canais artificiais, a tendência para
estas embarcações consiste em L = 50 m, B = 8 m e T de 1,8 m a 3,0 m.
As chatas para comboios semi-integrados têm uma face carenada e outra vertical, visando a
redução do número de juntas com descontinuidade. As faces verticais são acopladas umas às outras.
As chatas para comboios integrados têm proa e popa retangulares verticais de forma
paralelepipédica (chatas tipo caixa ou alvarenga), minimizando a descontinuidade nas juntas das filas,
com chatas especiais semi-integradas idênticas na proa e popa.
O sistema de ligação das chatas entre si e com o empurrados deve garantir a rigidez do
conjunto, devendo também ser de rápido desmembramento e rearranjo no caso da necessidade
destas operações. Os sistemas mais avançados são constituídos de engates mecânicos, que são bem
mais aperfeiçoados que o tradicional com cabos de aço cruzados em cabeços e tracionados por
cabrestantes.
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Navegação no Canal de Pereira Barreto na Hidrovia do Rio Tietê(SP).


OBRAS HIDROVIÁRIAS

Configuração do comboio tipo para o Rio Paraguai.


OBRAS HIDROVIÁRIAS

16,0
0
8,00
16,0
0

30,0 85,0 85,0


0 0 0
Comboio Araguaia com 2 ou 4 chatas. Calado máximo é 4,50 m; Calado garantido em 100% do
tempo é de 3,00.
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Características básicas do comboio-tipo para a Hidrovia do Rio Paraguai entre Ladário e Assunção.

II.1.5 Comboios de empurra

O comboio de empurra é constituído pelo agrupamento de um ou mais empurradores e de


uma ou várias chatas de empurra, formando um conjunto rígido. Os empurradores concentram toda
a capacidade de propulsão e manobra do comboio integrado.
Há sempre interesse de dispor-se do maior comprimento possível do comboio, com o
objetivo de obter-se maior velocidade para a mesma potência, condição esta limitada pela geometria
da hidrovia (raios de curvatura e vãos das pontes) e na condição de navegação a favor da corrente.
Quanto à largura máxima admissível do comboio, depende das características da via (larguras, vãos
livres das pontes e larguras das câmaras das obras de transposição). A disposição das chatas em
planta é caracterizada pela formação, sendo convencionada a nomenclatura de popa para proa com a
indicação de R (rebocador) e números indicativos do número de chatas em linha (lado a lado).
Assim, por exemplo, nas figuras podem ser vistos comboios com as formações, pela ordem: R,1,1;
R,2,2,2; R,3,3,3; R,1,1; R,2,2. Os maiores comboios de empurra em Hidrovias Brasileiras (Rios
Amazonas, Madeira e Tapajós), para transporte de soja, têm 275 m de comprimento, 44 m de boca e
capacidade para 34.000 tpb, com composição 5X5 do comboio).
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Comboio fluvial Paraná.

Comboio fluvial Paraguai.


OBRAS HIDROVIÁRIAS

Comboio fluvial Araguaia.

(a)

(b)
(a) (b) Comboio fluvial do Rio Madeira em Itacoatiara (AM) na Hidrovia do Rio Amazonas.
OBRAS HIDROVIÁRIAS
Os comboios integrados constituem o melhor aproveitamento de volume (maior coeficiente
de bloco: relação entre a capacidade volumétrica e o volume do paralelepípedo equivalente à seção
mestra com o comprimento total), menor custo das chatas e maior rendimento propulsivo, sendo
mais empregados para o transporte especializado entre destinos determinados (minérios e grãos) ou
combustíveis líquidos (de rápido manuseio nos terminais hidroviários), situações em que os
comboios mantêm-se íntegros no percurso. Os comboios semi-integrados e não integrados são mais
utilizados com cargas diversas movimentadas entre vários terminais.

II.2 DIMENSÕES BÁSICAS DAS HIDROVIAS

II.2.1 Considerações gerais

As hidrovias devem atender a certos requisitos visando garantir a navegação livre e segura
das embarcações tipo adotadas. A definição desta última está condicionada a estudos econômicos e
ambientais, uma vez que o custo de transporte é barateado quanto maior o porte da embarcação, o
que, em contrapartida, acarreta aumento no custo das obras de infra-estrutura da hidrovia.
Definidas as dimensões da embarcação tipo a hidrovia deve contemplar as diretrizes
dimensionais elencadas nos itens seguintes.

II.2.2 Profundidade mínima

A profundidade mínima da hidrovia deve corresponder ao calado da embarcação tipo


acrescido de uma folga mínima de 0,30 a 0,50 m, devendo ser admitido somente em trechos
restritos da hidrovia, pois profundidades inferiores a duas vezes o calado reduzem
significativamente o rendimento propulsivo, onerando o custo do transporte pelo maior consumo de
combustível para a manutenção de uma mesma velocidade.
A definição dos ciclos hidrológicos conduz a dois intervalos de classe notáveis para a
navegação: período hidrológico médio e período de estiagem, devendo este último ser considerado
com a probabilidade de ocorrência de até 10% do tempo.

II.2.3 Largura mínima

Em trechos retilíneos a largura mínima necessária para garantir-se o cruzamento seguro e


sem redução de velocidades de embarcações tipo é de 4,4 vezes a boca da embarcação tipo, sendo
que em não havendo cruzamentos a largura mínima deve corresponder a 2,2 a boca da embarcação
tipo.

II.2.4 Área mínima da seção molhada

Para que a hidrovia não produza significativa perda de rendimento propulsivo da


embarcação tipo, a área hidráulica do canal deve ser no mínimo de 5 a 6 vezes a área da seção
mestra da embarcação tipo. As seções transversais tipo de canais de navegação têm a forma
trapezoidal como a mais comum, com taludes laterais de inclinação variável desde material solto
com 1H:3V até rocha com 3H:1V.
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Canal de Pereira Barreto dimensionado para o Comboio Tietê.

II.2.5 Raio de curvatura

Para que não ocorra restrição de velocidade nas curvas, o raio mínimo de curvatura deverá
ser de 10 vezes o comprimento da embarcação (L).
Deve-se considerar em torno de 20º um ângulo de carregamento do leme máximo
recomendável, que em curvas e nas passagens exige os raios mínimos de curvatura acima
recomendados.

II.2.6 Vão e altura livres nas pontes

Em trecho retilíneo de canal as faces internas dos pilares devem ter distância mínima
correspondente à largura mínima do canal mais uma folga de 5 m.
Quanto à altura livre sobre o nível d’água recomenda-se 15 m como conveniente para a
passagem de grandes comboios de empurra. Pontes levadiças também podem ser adotadas nas
situações em que a altura mínima não possa ser obtida, havendo inconvenientes para os modais
terrestres e aquaviário. Outra alternativa é a cabine dos empurradores ser móvel, podendo ser
rebaixada ou rebatida por ocasião destas travessias.

II.2.7 Velocidade máxima das águas

Normalmente considera-se em 5 m/s a velocidade máxima da água em contra corrente ao


rumo de navegação, o que depende evidentemente da potência dos propulsores. A favor da corrente
a maior dificuldade encontra-se na manobrabilidade da embarcação, admitindo-se a mesma
velocidade máxima para navegação segura (em percurso longitudinal ao canal). Em média,
considera-se o valor limite recomendado de 2 m/s para que em grandes extensões o transporte não
se torne anti-econômico.

II.2.8 Gabaritos propostos pelo Ministério dos Transportes

Para a regulamentação do modal hidroviário, o Plano Nacional das Vias Navegáveis


Interiores – PNVNI/1989 – dividiu as hidrovias em classes, de acordo com o seu potencial de
transporte, especificando tipos de embarcações e gabaritos para a navegação.
OBRAS HIDROVIÁRIAS
Gabarito Características Tirante Vão Livre Profundidad Calado
de ar Horizontal e (m) Definitivo
(1) (m) (2)
75% 25%
tempo tempo
I "Especial" para nos onde a (3) (4) - - -
navegação marítima tenha acesso
II Para rios de grande Potencial de 15m 1 Vão de >2,50 2,0 - 4,50
Navegação 128m, ou 4B 1,50
Comboio tipo 32m de Boca 2 Vãos de
70m, ou 2,2B
III Para rios de Potencial Médio de 10m 1 Vão de >2,00 1,50 - 3,50
Transporte 64m, ou 4B 1,20
Comboio tipo 16m de Boca 2 Vãos de
36m, ou 2,2B
IV Rios de Menor Potencial 7m 1 Vão de >1,50 1,20 - 2,50
Embarcações de 11m de Boca 44m, ou 4B 0,80
2 Vãos de
25m, ou 2,2B
V "Reduzido" Rios Interrompidos, - - - - -
ou onde a navegação tenha
possibilidade Remota
(1) Referência - Rio em estado natural - Corresponde à enchente com período de recorrência de 10
anos (TR=10). Reservatório Barragem - Nível máximo normal de operação do reservatório
(2) Calado definitivo quando a hidrovia estiver canalizada
(3) Em função da maior altura do mastro da embarcação marítima
(4) Em função das embarcações marítimas

Gabaritos propostos no Plano Nacional das Vias Navegáveis Interiores - PNVNI / 1989.

O gabarito de vão livre horizontal é mais apropriado para pontes situadas em canais,
mostrando-se subestimada para vãos de pontes localizadas em reservatórios ou lagos, situações em
que se torna conveniente considerar as recomendações para canais de acesso marítimos.

II.3 ESTRUTURAS ESPECIAIS DE CANAIS ARTIFICIAIS PARA A NAVEGAÇÃO

Nos canais hidroviários de via singela é necessário prever bacias de evolução ou espera ao
longo do canal, localizadas nas margens e espaçadas de 15 a 30 Km. Tais bacias tornam-se
necessárias, inclusive eventualmente em canais de mão dupla, nas situações de inversão de curso,
ou quando do cruzamento com outra embarcação.
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Bacias de evolução para canais hidroviários.

Os canais hidroviários devem ser providos de abrigos, seja pela falta de sinalização noturna,
seja por condições hidrológico-meteorológicas desfavoráveis, que permitam, em trechos alternados
de margem, a arrumação das embarcações em trechos ribeirinhos dotados de cabeços de amarração.
Nos canais hidroviários deverão prever-se amplos locais de atracação nas áreas de
previsíveis congestionamentos, como nas bifurcações para outras vias navegáveis, nas quais possam
reunir-se os comboios de chatas. Estes locais devem situar-se fora da zona de navegação do canal,
com seção transversal com sobre-largura de uma ou mais bocas das maiores embarcações, que se
atracam justapondo costados. Nestes locais os taludes devem ter grande inclinação do canal e
devem estar revestidos para evitar danos às embarcações, bem como margens dotadas de cabeços de
amarração. Locais de transbordo devem ser dotados de equipamentos e instalações portuárias.
Nas áreas de movimentação de cargas, aonde as embarcações necessitam efetuar manobras,
devem existir as bacias de evolução, que possuam características semelhantes às já citadas
anteriormente.

II.4 OBRAS DE MELHORAMENTO DO LEITO PARA A NAVEGAÇÃO

Os rios em condições de serem considerados habilitados ao transporte de cargas em caráter


comercial devem permitir em trechos suficientemente longos o tráfego contínuo e seguro de
embarcações de porte. Este conceito de navegabilidade é relativo e está vinculado ao aspecto
econômico do transporte, dependendo o porte das embarcações dos modais de transporte
disponíveis.
Os embaraços à navegação que podem existir podem ser elencados como:

•Deficiências de profundidade, condição necessária de navegabilidade, pela presença de fundos


resistentes, alargamentos excessivos (perda de competência das correntes), corredeiras; sendo
dependentes dos níveis em função das vazões, de acordo com as condições hidrológicas.
•Deficiências planimétricas por larguras e raios de curvatura abaixo dos mínimos requeridos para
a passagem e evolução segura das embarcações.
•Outras deficiências como: correntes com velocidade excessiva ou direção inconveniente, falta de
fixação do canal de navegação e más passagens pela mudança brusca do talvegue nas inflexões
das curvas.

Uma alternativa para superar estas deficiências é a da regularização de vazões, implantando-


se obras a montante do trecho de interesse, visando normalmente aumentar as vazões, e
OBRAS HIDROVIÁRIAS
consequentemente os níveis, na estiagem, ou excepcionalmente diminuir as vazões das cheias.
Assim, normalmente são realizadas barragens nos afluentes e formadores do rio navegável, visando
evitar as condições desfavoráveis de tráfego das embarcações pelas variações de vazão.
Classicamente as obras de melhoramento do leito de rios para a navegação em ordem
crescente de complexidade e custo associado são a normalização, regularização do leito e a
canalização. As obras dos dois primeiros grupos mantêm o rio em corrente livre, enquanto o último
corresponde à construção de represamentos. São comuns as obras concomitantes, sempre visando a
economia do meio de transporte.
A normalização, ou melhoramentos gerais, caracterizam-se por serem obras localizadas
voltadas para questões específicas e, de um modo geral, não repercutem sobre o regime
hidomorfológico fluvial.
A regularização do leito constitui-se em conjunto de obras endereçadas a um melhoramento
sistemático de um trecho fluvial extenso, introduzindo novas conformações geométricas que
induzam conformações às linhas de corrente que melhorem as condições de navegação.
A canalização consiste na transformação do rio numa série de estirões por meio de barragens
sucessivas dotadas de obras de transposição de desnível, sendo as Hidrovias do Rio Jacuí e do Rio
Tietê exemplos desta sistemática. Estas obras apresentam as seguintes características:

•Possível em qualquer rio


•Maiores profundidades (maior calado das embarcações e menor resistência ao trânsito das
embarcações)
•Menor velocidade das águas (menor tempo de percurso)
•Menor percurso (retificação das sinuosidades)
•Raras interrupções de tráfego
•Facilidade para a implantação de terminais hidroviários
•Associação da navegação com obras de aproveitamento múltiplo dos recursos hídricos
•Custo em geral elevado
•Inundação das áreas ribeirinhas
•Dispêndio de tempo nas obras de transposição de desnível
•Capacidade de tráfego limitada
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Perfil de canalização do Rio Jacuí.

Perfil do Sistema Tietê-Paraná.

Definem-se canais de partilha ou de transposição como os destinados a prover condições de


OBRAS HIDROVIÁRIAS
navegação em ligações de bacias hidrográficas de vertentes opostas. Frequentemente estão
associados a obras de canalização, bem como exigem obras de aquedutos e túneis. Não existe
nenhuma obra deste tipo no Brasil.

(b)
(a)

(c) (d)
(a) Aqueduto Digoin no canal lateral do Rio Loire (França). (b) e (c) Aqueduto Edstone no Canal
Stratford (Reino Unido) com 226 m de extensão e 9,0 m de altura sobre curso d’água, rodovia e
linha férrea dupla. (d) Túnel Harecastle no Canal entre o Rio Trent e o Rio Mersey (Reino Unido)
com 2800 m de extensão.

III. OBRAS DE NORMALIZAÇÃO E REGULARIZAÇÃO DO LEITO

III.1 OBRAS DE NORMALIZAÇÃO

III.1.1 Considerações gerais

As obras de normalização tem como objetivo o melhoramento geral dos cursos d’água sendo
localizadas em trechos restritos e não alterando significativamente o regime fluvial, sendo por estes
motivos comumente utilizadas associadas a outros tipos de obras. Assim, destacam-se:

•Desobstrução e limpeza
•Limitação dos leitos de inundação
•Bifurcação fluvial e confluência de tributários
•Obras de proteção, ou defesa, de margens
OBRAS HIDROVIÁRIAS
•Retificação de meandros
•Obras de proteção de pilares de pontes
•Dragagens e derrocamentos
As obras de dragagens e derrocamentos já foram tratadas no item I em função de suas
especificidades.

III.1.2 Desobstrução e limpeza

Trata-se das operações periódicas de retirada de vegetação, troncos, matacões, restos de


construção e outros obstáculos estranhos ao leito da hidrovia visando o restabelecimento das
profundidades e larguras naturais. São utilizadas embarcações destocadoras com variados tipos de
guindastes.

III.1.3 Limitação dos leitos de inundação

Com a finalidade de concentrar o escoamento num leito bem definido para facilitar a
navegação, são implantados diques longitudinais impermeáveis, comumente com núcleo de argila,
no leito maior, tendo-se o cuidado de drenar as áreas isoladas e de proteger da maior capacidade
erosiva das correntes concentradas o leito e margens endicadas.

III.1.4 Bifurcação fluvial e confluência de tributários

III.1.4.1 Bifurcação fluvial

A existência de braços secundários ou falsos braços em rios de grande porte não alteram
significativamente as condições de navegabilidade, entretanto em rios de porte médio e pequeno
pode constituir embaraço à navegação. Nos casos em que a bifurcação ocorre em braços de
dimensões diferentes, o mais largo deve ser adotado para desvio do curso principal. É possível que
o braço de maior capacidade de vazão, e consequentemente maior dimensão de área molhada,
permita a navegação em águas médias e baixas, mantendo-se o outro para aliviar as vazões maiores.
O fechamento de braços secundários em hidrovias é uma obra implantada para aprofundar o
curso d’água principal, por exemplo em torno de uma ilha. Este fechamento pode ser realizado por
meio de barramentos normalmente galgáveis para as maiores vazões, com altura até a cota mínima
de navegação, podendo ser construídos em enrocamento ou terra e sendo protegidos da erosão em
sua superfície por blocos mais pesados ou estaqueamento, de forma a induzir um gradativo processo
de colmatação por assoreamento acompanhado de progressivo alteamento do barramento situado a
jusante do braço secundário. Outra alternativa de obra é a implantação de obras fixas guias-
correntes, que deverão ser construídas nos extremos a montante e jusante do braço secundário,
tendo o de montante cota de coroamento acima do nível de águas altas, visando garantir suficiente
vazão para manter as profundidades exigidas para a navegação nos níveis médios e baixos.
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Esquema de guia corrente (AB) no braço sujeito à sedimentação.

Nestas obras haverá incremento de tendência erosiva no canal principal, podendo vir a se
depositar material em trecho a jusante aonde o canal retorna a ser único.

III.1.4.2 Confluência de tributários

Os afluentes, dependendo de seu porte, declividade e disposição da embocadura, podem


criar embaraços grandes à navegação do curso principal. Hidrodinamicamente, ângulos de 20 a 25
são desejáveis. Invariavelmente formam-se bancos sedimentares a jusante da confluência, uma vez
que a declividade do afluente é frequentemente maior do que o rio principal, apresentando maior
capacidade de transporte. Por outro lado, o curso principal apresenta frequentemente deposição de
sedimentos antes da confluência devido à perturbação da singularidade. Nos rios de pequeno porte
ocorre a necessidade de dragagem para manter as profundidades, enquanto nos de maior porte
normalmente há maior capacidade de autolimpeza nas águas altas. Quando o leito principal tiver
sua seção limitada por diques, as cotas de coroamento destes deverão ser elevadas no ponto de
confluência, visando evitar que as águas do afluente, desembocando no rio principal, sobrelevem o
nível de coroamento pela turbulência produzida.

(a) (b)
(a) e (b) Regularização da embocadura de um afluente.

III.1.5 Obras de proteção de margens

III.1.5.1 Considerações gerais

A proteção das margens destina-se basicamente à sua defesa, propiciando a proteção ou


estabilização dos terrenos ribeirinhos sem alterar em planta e perfil as condições da corrente livre
do canal. A defesa das margens consiste na execução de obras que evitem o seu deslizamento por
ação dinâmica das correntes fluviais (distribuição das tensões na margem e fundo), ou pelo
OBRAS HIDROVIÁRIAS
solapamento produzido pela ação de vagas transversais geradas pelo vento (efeito mais importante
em trechos mais largos ou lagos) ou trânsito de embarcações (esteira produzida e turbulência do
hélice). Além destas causas hidrodinâmicas existem as originadas na redução da resistência do solo,
ligadas à oscilação do lençol freático: a saturação reduz o ângulo de equilíbrio dos solos, a
percolação por variação brusca do nível d’água pode produzir escorregamento de cunhas de solo e o
arrastamento de finos (piping) pode favorecer a desestabilização.
A margem pode ser considerada composta pela superfície de terreno em contacto direto com
a água ou imediatamente acima, assim tem-se de cima para baixo: a berma, que somente é atingida
por cheias excepcionais e pode corresponder aos diques de proteção contra inundações, o talude,
entre o nível de estiagem mínima e o das enchentes normais e o pé da margem, abaixo do nível de
estiagem e permanentemente submersa. Estas duas últimas porções são as mais solicitadas pelos
efeitos erosivos, sobretudo as mais inferiores de sustentação do talude. Assim, a defesa deve ser
projetada com maior resistência até o nível das máximas enchentes anuais, podendo ser
convenientemente aliviado para as cotas mais altas até a cota de máxima enchente e borda livre. É
fato conhecido dos estudos de morfologia fluvial que as cheias de águas altas mais frequentes, com
períodos de retorno entre um e dois anos, são as vazões modeladoras do canal, por terem maior
atuação no leito menor, comparativamente com as cheias excepcionais que extravasam em níveis
mais altos.
De um modo geral, as margens mais solicitadas pelas correntes são as de desenvolvimento
côncavo, nas quais torna-se necessário mitigar a ação erosiva oriunda da força centrífuga induzida
pelo escoamento.
A fixação das margens pelas obras de proteção preserva a integridade dos diques e diminui o
transporte de sedimentos, reduzindo a formação de bancos de areia e propiciando melhor fixação do
leito navegável.

III.1.5.2 Elementos básicos

Os elementos fundamentais que constituem o revestimento de margem são a fundação de


apoio, que tem a dupla função de sustentar o talude e absorver as cargas transmitidas ao leito (no
caso de fundo móvel a cota do leito é variável) sem permitir o deslizamento da margem, e o
revestimento de proteção, que evita a ação erosiva dos agentes hidráulicos e impede o fluxo
excessivo do lençol freático.

Elementos básicos de revestimento de margem.

III.1.5.3 Classificação dos métodos de proteção de margem

Os métodos de proteção de margem podem ser inicialmente subdivididos em:


OBRAS HIDROVIÁRIAS
•Métodos diretos, ou contínuos, executados sobre a margem são as mais usuais. Obras deste tipo
são as de adequação de um talude de sustentação mais reduzido (taludamento), vários tipos de
revestimentos e redes de drenagem para redução das infiltrações.
•Métodos indiretos, ou descontínuos, consistindo em obras executadas distanciadas da margem,
com o intuito de afastar a ação hidrodinâmica, sendo a solução em casos nos quais o solo não
suporte intervenções.

As obras de proteção de margem podem também ser subdivididas quanto à sua adaptação às
condições de variabilidade morfológica do canal em:

•Obras rígidas, que provêm defesa sem produzir grandes modificações na dinâmica do
escoamento.
•Obras flexíveis, indicadas nas situações de maior variabilidade da dinâmica morfológica do leito e
margens, sendo indicadas obras que se adaptem a estas possíveis alterações em planta e perfil.

III.1.5.4 Métodos diretos

As obras de proteção contínua da margem podem ser elencadas, em ordem crescente de


complexidade (entre parêntesis assinalam-se indicativamente as tensões de arrastamento críticas dos
diferentes revestimentos), em:

•Adequação de talude de sustentação, aplicando-se um taludamento mais abatido (até 1:3) com a
horizontal e compatível com o talude de equilíbrio de solos saturados. Esta obra é
frequentemente complementada nos trechos mais solicitados pela ação das correntes nos canais
pelos revestimentos de talude, sendo inviável em áreas com margens já ocupadas, ou de alto
preço dos terrenos.
•Revestimento simples por substituição com material mais resistente, como britas (1,5 Kgf/m2);
leivas constituídas de plantação de placas de vegetais (2,0 a 3,0 Kgf/m2); colchões de material
vegetal em faxinas (5,0 Kgf/m2); revestimento com pintura asfáltica para impermeabilização e
fixação dos grãos.
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Obras de proteção de margem para leitos fixos ou pouco variáveis e sujeitas a cheias de curta
permanência e pequeno transporte sólido.
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Obras de proteção de margem em fundos sujeitos a transporte sólido significativo.


OBRAS HIDROVIÁRIAS

Revestimentos de margem típicos em Hidrovias.


OBRAS HIDROVIÁRIAS
•Enrocamentos lançados (rip-rap variando com a maior dimensão dos blocos de16 a 21 Kgf/m2),
gabiões (em igualdade de dimensões de pedra, os gabiões suportam o dobro da tensão
tangencial das pedras soltas e os grandes gabiões atingem até 150 Kgf/m2) ou blocos artificiais
de concreto.
•Alvenaria ciclópica em pedra seca (60 Kgf/m2) ou rejuntada ou uso de lajotas pré-fabricadas.
•Lajes em concreto armado (de 80 a 100 Kgf/m2) ou não (60 Kgf/m2), moldadas in loco ou pré-
moldadas.
•Cortinas constituídas por muros de sustentação compostos por muros de gravidade, estacas
prancha ou paredes diafragma atirantadas ou não.

(a) Gabião caixa, (b) Gabião caixa com diafragma e (c) Gabião manta com diafragma.
OBRAS HIDROVIÁRIAS

(a), (b), (c) e (d) Defesa de margens com gabiões tipo caixa e colmatação natural com
incorporação a margem.
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Gabiões tipo manta.

(a) e (b) Revestimento de margens no Rio Tamanduateí em São Paulo (SP) com lajes de
concreto armado.

Ao se projetar os revestimentos devem ser considerados os seguintes fatores:

•Estabilidade do solo com o peso suplementar da obra de proteção, segundo métodos geotécnicos.
•Prover drenagem das subpressões nos revestimentos menos drenantes e impermeáveis.
OBRAS HIDROVIÁRIAS
•O talude natural de enrocamentos submersos é mais suave do que nas condições emersas.
•No caso de enrocamentos lançados, a faixa granulométrica em torno ao peso médio definido para
resistir aos agentes hidrodinâmicos deve variar de dimensões equivalentes a pesos entre 0,75 e
1,25 do peso médio para diminuir o índice de vazios e aumentar o embricamento entre os blocos
(maior capacidade de absorção de energia dos agentes hidrodinâmicos), com pelo menos duas
camadas de enrocamento de espessura.
•Na alvenaria ciclópica de blocos naturais arrumados o dimensionamento é feito de maneira
análoga à de enrocamentos lançados, mas com menor rugosidade, dispondo-se no entanto apenas
uma camada de blocos e camada de transição menos espessa, pois o embricamento garante maior
coeficiente de segurança.
•A proteção do pé do talude é função da erosão esperada em relação ao leito pré-existente, com um
mínimo de 2 m de comprimento e três camadas de enrocamento.
•Os gabiões formam estruturas monolíticas, flexíveis e drenantes, podendo ser impermeabilizadas
com argamassa de cimento e areia ou mastique asfáltico. Na fundação e proteção do pé do
talude são indicados os gabiões saco. Após a implantação do revestimento passa a ocorrer a
colmatação dos vazios das pedras contidas nas malhas por sedimentos e matéria orgânica, o que
favorece a incorporação natural da estrutura à margem protegida.

III.1.5.5 Métodos indiretos

As obras de proteção descontínua da margem vêm a constituir margens artificiais, alterando


em planta e perfil localmente a corrente livre do curso d’água, sendo por isso tratados com maior
detalhamento no item referente à regularização do leito. O afastamento da ação hidrodinâmica da
margem é normalmente conseguido com a implantação de espigões, que são obras transversais à
margem e nela enraizados.

III.1.6 Retificação de meandros

A correção de um percurso sinuoso de um curso d’água para fins hidroviários visa a


retificação do desenvolvimento do canal, uma vez que um meandro pode com frequência
representar alongamento de 10 a 20 %, mas podendo chegar a dobrar, a distância navegável entre
dois pontos do canal. Quanto mais acentuada for a curvatura dos meandros maior é a sua influência
no retardamento do escoamento, que poderá ser da ordem de 50%, estando o meandro muitas vezes
associado à presença de vegetação ou formações sedimentares ou resistentes no leito, que induzem
o curso d’água a desvio em busca de moldar o leito com menos dispêndio de energia. Assim, a
retificação muitas vezes dobra a capacidade de escoamento das águas.
A primeira possibilidade de obras de derivação é a de corte direto e fixação das margens.
Assim, a abertura do canal de retificação pode ser feita na estiagem com equipamento de
terraplenagem escavando a seção total prevista até o lençol freático com a área ensecada por dois
diques, ou mantendo as extremidades da alça como ensecadeiras; ou dragando-se de jusante para
montante. Uma sequência típica de fases para retificação de um meandro consiste nos barramentos
na sequência de alças por trechos de montante para jusante e empregando explosivos detonados de
jusante para montante nos cortes sucessivos. Uma vez a água passando pelo corte aberto, implanta-
se o barramento sucessivo e detona-se a carga de explosivos do corte sucessivo.
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Fases de retificação de um meandro.

Outra possibilidade de obras de derivação consiste em escavá-la a partir a partir de um


canal piloto de pequena seção e utilizar-se da capacidade de transporte da corrente, a qual depende
das características de resistência geotécnicas do leito, que será ampliado pela ação das águas.
Quando o braço de derivação é mais curto que o leito natural original, como ocorres nos meandros,
a declividade e, consequentemente, a velocidade do escoamento é significativamente maior no leito
artificial, produzindo-se no mesmo erosão de tal ordem a transformá-lo em braço dominante.

Modificações sucessivas do perfil das seções transversais das derivações.

Recomenda-se que os extremos do corte sejam alargados em cerca de 30% numa extensão
OBRAS HIDROVIÁRIAS
de 15% do comprimento total do corte para concordar da melhor forma possível com as margens
originais.
A resposta morfológica à esta alteração do perfil consistirá num rebaixamento do leito por
erosão a montante e num assoreamento a jusante do corte. Para melhor fixar a retificação torna-se
necessário revestir o trecho do corte (ABC)) e a montante de A, bem como aterrar a alça
abandonada. Este procedimento de fixação no caso de retificação por canal piloto é fundamental
que se inicie previamente, de forma a garantir a posição e largura do canal projetado, a delimitação
das margens por meio de enrocamento depositado em valas escavadas até o lençol freático, ou
estacas prancha cravadas, que constituirão o embrião do revestimento final.

Perfil longitudinal esquemático de uma derivação.

Planta e perfil longitudinal esquemáticos de retificação de meandro.


OBRAS HIDROVIÁRIAS
Finalmente, cabe ressaltar que nas retificações de extensos trechos sinuosos as obras devem
ser conduzidas de jusante para montante no curso d’água, uma vez que o aumento da capacidade de
transporte da corrente trará para jusante grandes volumes de sedimentos, bem como afetará a
propagação das ondas de cheias.

III.1.7 Obras de proteção de pilares de pontes

III.1.7.1 Considerações gerais

A aresta inferior de uma ponte deverá ficar num plano de cota mínima acima do nível
d’água, definindo o vão livre navegável vertical. Os vãos livres navegáveis horizontais entre as
fundações dos pilares das pontes não devem produzir estreitamento significativo da seção
hidráulica, devendo ser obedecidas as recomendações citadas, considerando a passagem de uma
embarcação por vez, devido ao alto grau de complexidade da manobra.

Grandezas verticais da seção transversal em seções de pontos rodo-ferroviárias.

III.2 OBRAS DE REGULARIZAÇÃO DO LEITO

III.2.1 Considerações gerais

As obras de regularização do leito visando profundidade suficiente e percurso satisfatório


para a navegação são efetuadas no leito menor, visando usar a própria energia do escoamento para
orientar as correntes para obter num traçado específico um leito estável, atendendo gabarito
geométrico especificado pelos requisitos hidroviários. É fundamental nortear o projeto destas obras
pelos princípios da Hidráulica Fluvial, compatibilizando as intervenções com as evoluções
morfológicas naturais nos casos de fundo móvel.
As obras podem ser implantadas em fundo fixo (argilas compactas ou rochas), em que as
modificações no escoamento não alteram o leito (condições atuantes muito inferiores às críticas
para início de movimento), ou em fundo móvel.
As obras de regularização do leito clássicas são constituídas de diques, espigões e soleiras de
fundo, complementadas por dragagens e derrocamentos.

III.2.2 Regularização em fundo fixo

III.2.2.1 Princípios gerais

A regularização em fundo fixo para melhoramento da navegação visa:

•Aumento de profundidade nas vazões mínimas.


OBRAS HIDROVIÁRIAS
•Controle das velocidades para valores normais entre 2 e 3 m/s e máximos de 5 m/s.
•Melhoria do traçado, como por exemplo em corredeiras.
O princípio básico da regularização é o do estreitamento das seções transversais para altear o
nível d’água sem aprofundamento sensível do leito.

III.2.2.2 Tipos de obras

As obras contemplam basicamente o confinamento das seções por diques, que são obras
contínuas longitudinais (margens artificiais), ou espigões, que devem ser dimensionados quanto à
estabilidade em função das vazões e níveis máximos, considerando o gabarito mínimo de navegação
e as velocidades máximas.
Frequentemente o confinamento não é suficiente para eliminar totalmente o efeito de topos
de afloramentos duros, sendo então necessário um derrocamento complementar dos afloramentos
mais significativos. Não se tendo que recorrer a um derrocamento generalizado do leito, este não é
tão caro, pode fornecer material para diques e espigões e administra-se melhor a sobrelevação a
montante.
O confinamento alteia o nível d’água, enquanto o derrocamento o rebaixa, sendo importante
verificar em vazões mínimas a subida do nível a montante, que pode resultar em problemas de
assoreamento ou geração de energia.

III.2.3 Regularização em fundo móvel

III.2.3.1 Princípios gerais

Os canais de fundo móvel são normalmente muito largos e pouco profundos. Assim, na
regularização em fundo móvel a maioria das obras no curso d’água consiste em confinar o
escoamento para aprofundar o leito ou direcionar o fluxo, tendo-se o cuidado de que a sobrelevação
a montante não produza assoreamento, nem que a capacidade de transporte a jusante com déficit
sedimentar com relação à situação original ocasionem erosões.
Deve-se lembrar que para as vazões contidas no leito menor o perfil da linha d’água
acompanha as irregularidades dos fundos, situação mais importante para a navegação, uma vez que
para as vazões mais altas a declividade é mais próxima da média no trecho, tendendo a uniformizar-
se.
As obras de definição do traçado com auxílio das obras de diques e espigões direcionam o
escoamento para atingir-se a estabilização do álveo. Classicamente, a implantação destas obras é
governada pelo Princípio de Girardon, que recomenda o direcionamento suave do escoamento,
atendendo às leis qualitativas de Fargue em planta e agindo sobre os perfis transversal e
longitudinal, orientando o escoamento com obras sucessivas atendendo aos seguintes critérios:

•Eliminação dos braços secundários, visando concentrar o escoamento num leito unificado. Com o
aumento da declividade da linha de energia num primeiro momento após o fechamento, associada
à elevação do nível d’água, aumenta-se a tensão atuante sobre o álveo, que se alarga.

•O método de Girardon recomenda então a eliminação das más passagens nas inflexões do talvegue
do canal, atuando sobre as soleiras formadas pelos bancos ali localizados por meio da suavização
da transição do alinhamento do talvegue entre uma margem côncava e a sucessiva.

•Melhoramento do traçado em planta para obter-se traçado estável:


OBRAS HIDROVIÁRIAS

A variação contínua da curvatura das margens na transição é importante para garantir-se a


continuidade necessária ao escoamento. As dimensões devem estar compatíveis com o gabarito
de navegação.

•Continuidade do talvegue:
Consiste na eliminação das más passagens por meio da implantação de obras de diques e
espigões. Visando obter a fixação das fossas e dos bancos de inflexão dentro dos parâmetros
planimétricos necessários para a navegação, preferencialmente diques longitudinais nas
margens côncavas (eventualmente complementados por serviços de dragagens) e espigões nas
margens convexas.

Sistema de estruturas combinadas.

III.2.3.2 Tipos de obras

Para a estabilização das profundidades, revestimento da margem côncava com diques e


espigões na margem convexa. Nas inflexões são normalmente utilizados espigões em ambas as
margens.

•Diques
Os diques são obras de desenvolvimento longitudinal ao curso d’água, constituindo
proteções de margem quando aderentes a estas. Quando o alinhamento do dique se afasta da
margem, constituindo margens artificiais, implantam-se muitas vezes estruturas complementares de
conexão (diques transversais ou espigões interiores) com o intuito de reforço e facilidade
construtiva. As extremidades do endicamento devem concordar com a margem segundo curvaturas
coerentes, ou devem ligar-se à margem por espigões reforçados seguindo-se campo de espigões
fornecendo a concordância.

Os diques podem ser construídos por seção plena ou mista. É muito usado o enrocamento,
ou os núcleos de terra com revestimento de pedras e faxinas. Também podem ser constituídos por
cortinas de concreto e estacas ou gabiões.
As vantagens deste tipo de obras consistem em: concluída a obra já definem o canal com
fixação da corrente na margem côncava, não obstrução ao escoamento e adaptação às curvaturas do
canal. As desvantagens deste tipo de obra são: por ser obra contínua tem custo elevado de
implantação e eventual correção de geometria, instabilidade dos taludes pela ação do escoamento,
que no caso de romperem pode trazer consequências desastrosas, e lenta incorporação das margens
artificiais à margem por assoreamento.
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Tipo de diques empregados em rios europeus.

•Espigões
Os espigões, como obras de proteção descontínua podem ser classificados em:

•Espigões isolados para afastamento do escoamento da margem são indicados somente em


condições específicas, como a proteção de encontros de pontes, pois podem ser provocadas
erosões na margem oposta.
•Espigões de repulsão impermeáveis (ou plenos) são constituídos por um campo de espigões
que se protegem mutuamente, induzindo a presença de uma massa de água estagnada entre a
margem e a corrente fluvial, desviando-a. O espaçamento dos espigões normalmente é maior
nos rios mais largos do que nos mais estreitos, adotando-se espaçamentos referenciados ao
comprimento do espigão: nas margens côncavas um comprimento, nas margens convexas de
2 a 2,5 comprimentos e nas inflexões de 1 a 2 comprimentos.

Todos os sedimentos acumulados nas áreas de sombra dos espigões originam-se das fossas
associadas à extremidade dos espigões.
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Esquema da mecânica hidrossedimentológica fluvial.

Os espigões podem ser classificados de acordo com a direção que formam com o
escoamento principal do curso d’água em: normais (normalmente utilizados nas curvas ou em
trechos flúvio marítimos sujeitos a correntes alternativas), inclinantes ou divergentes e declinantes
ou convergentes. A última disposição somente deve ser adotada em circunstâncias específicas, uma
vez que têm a tendência a convergir o escoamento com potencial erosivo para as margens, podendo
erodi-la, a menos que o espigão sucessivo esteja próximo. Os espigões inclinantes formam
normalmente ângulos de 10 a 30 com a normal da margem, guiando o escoamento para se
concentrar no centro do canal.

Classificação de espigões segundo sua direção.


OBRAS HIDROVIÁRIAS

(a) e (b) Esquema de um conjunto de espigões em defesa de margem côncava. (SALLES, 1993)

Os espigões são normalmente mergulhantes da raiz para o canal, visando reduzir seu
impacto de interferência no escoamento principal. O cabeço deve estar submerso em cheias
ordinárias, sendo a sua cota correspondente ao nível médio, enquanto a sua raiz de ligação à
margem deve estar em cota igual à máxima enchente conhecida, correspondendo normalmente a
declividades de 1:20 a 1:200. A declividade do talude do cabeço deve variar entre 1:4 a 1:20 e a dos
taludes laterais do corpo do espigão entre 1:1,5 a 1:3,0 (mais suave a jusante).

Alçado e planimetria de um espigão..

A distância entre os cabeços de espigões opostos deve ser ajustada de modo que ambos
influam na mesma intensidade sobre o escoamento, caso contrário poderá ocorrer deflexão da
posição central, o que poderá vir a concentrar corrente erosiva sobre outros espigões ou a margem
OBRAS HIDROVIÁRIAS
oposta.

Comportamento da corrente fluida entre espigões inclinantes.

Os espigões plenos podem ter seu núcleo de terra protegidos por enrocamento, gabiões ou
colchões ou rolos de faxinas com terra ou pedras, devendo ser mais robustos do que os permeáveis
pois estão sujeitos a fortes correntes.

Tipos de composição de seções transversais de espigões permeáveis com blocos naturais.


OBRAS HIDROVIÁRIAS

Locação de espigões de gabiões em margem fluvial.

Tanto o cabeço, como a raiz do espigão devem ser protegidos da erosão, visando evitar,
respectivamente, o flanqueamento nas cheias e o solapamento do pé da obra, sendo normalmente
executados revestimentos especiais em enrocamento da margem e tapete de fundo.
As vantagens deste tipo de obras comparativamente aos diques consistem em: custo mais
reduzido de implantação, embora requeiram trabalhos contínuos de manutenção, facilidade de
OBRAS HIDROVIÁRIAS
correção da geometria de implantação, menores riscos à margem em caso de danos às estruturas e
maior flexibilidade de atuação em regularizações em andamento e/ou com insuficiente informação
do regime hidrossedimentológico. As desvantagens deste tipo de obra comparativamente aos diques
são: divagação do leito entre os espigões nas águas baixas, não apropriados para fixação da margem
côncava, obstrução ao escoamento no período em que a margem ainda não estiver sedimentada pela
lentidão deste processo e maior perigo para a navegação.

Representação da regularização com a correção de margem convexa.

IV. ECLUSAS DE NAVEGAÇÃO E CAPACIDADE DE TRÁFEGO EM


HIDROVIAS

IV.1 PRINCÍPIO DE FUNCIONAMENTO DAS ECLUSAS DE NAVEGAÇÃO

IV.1.1 Considerações gerais

A eclusa de navegação consiste de uma câmara delimitada por duas portas (de montante e de
jusante) que dão acesso às embarcações e na qual, através de circuito hidráulico específico, o nível
d’água varia entre os níveis extremos de montante e jusante, vencendo o desnível necessário
(queda).

Planta e elevação do arranjo geral de eclusa simples.

A elevação ou abaixamento do nível d’água juntamente com as embarcações é efetuado por


meio de um conjunto de aquedutos interligados, sendo o controle do escoamento executado por
comportas ou válvulas instaladas nos aquedutos ou nas portas.
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Eclusa – Corte longitudinal esquemático dos principais elementos.


Lateralmente a câmara da eclusa é delimitada pelos muros de ala ou guias. Os trechos onde
OBRAS HIDROVIÁRIAS
movimentam-se as portas denominam-se de cabeças de montante e jusante. Nas extremidades da
câmara estendem-se os muros-guias e as garagens de barcos ou ante-portos que direcionam as
embarcações no acesso à câmara. Os canais de acesso interligam a hidrovia à eclusa.

Dimensões recomendáveis para acessos e garagens das obras de transposição destinadas a passagem
de grandes comboios de empurra.

Eclusa com porta levadiça.

Apesar dos progressos tecnológicos virem permitindo a construção de muros e portas cada
OBRAS HIDROVIÁRIAS
vez mais altos, acima de uma certa queda torna-se necessário subdividir o desnível em degraus
sucessivos. Nas situações em que o desnível a ser transposto supera o máximo economicamente
viável, a eclusa simples descrita acima pode ser substituída pela subdivisão do desnível em degraus,
como no caso da escada de eclusas, em que entre duas eclusas simples implanta-se um canal de
conexão que permite o cruzamento das embarcações, como em Tucuruí na Hidrovia do Rio
Tocantins (PA).

Planta da situação dos elementos da instalação de transposição de Tucuruí na Hidrovia do Rio


Tocantins (PA).

Eclusa de Bom Retiro (RS) no Rio Taquari na Hidrovia do Rio Taquari-Jacuí e Lagoa dos Patos.
Dimensão da câmara: comprimento de 120 m, largura de 17,00 m e profundidade de 3,00m.
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Eclusa de Barra Bonita (SP) na Hidrovia do Rio Tietê. Dimensões da Câmara: comprimento de
147,25 m, largura de 11,76 m, desnível máximo de 24,00 e profundidade mínima normal de 2,50
m.
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Eclusa da Barragem Engenheiro Souza Lima (ex Barragem do Bariri) na Hidrovia do Rio Tietê
(SP).
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Eclusa de Ibitinga na Hidrovia do Rio Tietê (SP).


OBRAS HIDROVIÁRIAS

Eclusa de Ibitinga (SP) na Hidrovia do Rio Tietê. Dimensões da Câmara: comprimento de 142,45
m, largura de12,04 m, desnível máximo de 23,30 m e profundidade mínima normal de 3,00 m.

Eclusa de Promissão (SP) na Hidrovia do Rio Tietê. Dimensões da Câmara: comprimento de 142,00
m largura de 12,00 m, desnível de 27,50 m e profundidade mínima normal de 2,50 m.
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Eclusa Nova Avanhandava na Hidrovia do Rio Tietê (SP).


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Eclusas de Nova Avanhandava (SP) na Hidrovia do Rio Tietê. Dimensões das Câmaras:
comprimento de 142,00 m, largura de 12,10 m, desnível máximo de 16,50 m e profundidade
mínima normal de 4,50 m.

Eclusa de Jupiá (SP) na Hidrovia do Rio Paraná. Dimensões da Câmara: comprimento de 210,0 m,
largura de 17,00 m, desnível máximo de 20,00 m e profundidade mínima normal de 5,00 m.
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Elementos descritivos da Eclusa de Sobradinho na Hidrovia do Rio São Francisco.


OBRAS HIDROVIÁRIAS

Eclusa de Sobradinho (BA) na Hidrovia do Rio São Francisco. Dimensões da Câmara:


comprimento de 120,00 m, largura de 17,00 m, desnível máximo de 33,5 m e profundidade mínima
de 4,00 m.
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Localização das eclusas de Tucuruí (PA) na Hidrovia do Rio Tocantins.

Eclusa de montante de Tucuruí (PA) na Hidrovia do Rio Tocantins.


OBRAS HIDROVIÁRIAS

Eclusa de jusante de Tucuruí (PA) na Hidrovia do Rio Tocantins.


OBRAS HIDROVIÁRIAS

Eclusa de Tucuruí (PA) na Hidrovia do Rio Tocantins.

IV.1.2 Critérios de projeto

O projeto de uma eclusa visa fundamentalmente que uma embarcação transponha com
segurança e no menor tempo possível um certo desnível. Assim, a agitação produzida no interior da
câmara deverá ser tolerável tanto para um comboio de grandes dimensões, quanto para pequenas
embarcações. O tempo de eclusagem corresponde ao critério econômico, que conflita geralmente
com as condições de segurança das embarcações, correspondente à agitação na câmara, e com
questões hidráulicas de cavitação a jusante das válvulas. A solução globalmente otimizada
normalmente exige um compromisso entre os critérios conflitantes. Dentre os aspectos de projeto
que são otimizados com menor prioridade hidráulica destacam-se:

• Localização

A disposição da eclusa esta vinculada a limitações mais abrangentes quanto à localização da


barragem, preponderando as condicionantes geológicas, quanto às fundações e custo das
estruturas, de navegabilidade, quanto à manobrabilidade.

• Altura de transposição (queda)

Neste caso os aspectos econômicos adquirem importância determinante. De fato, uma eclusa
de baixa queda minimiza os problemas hidráulicos oriundos das altas velocidades nos
OBRAS HIDROVIÁRIAS
aquedutos, sendo no entanto necessárias um maior número de eclusas para a transposição de
um mesmo desnível. Esta última situação apresenta diversos inconvenientes, pois as eclusas
consomem tempo, são obras caras e de manutenção operacionalmente onerosa, podendo vir a
ser um fator limitante com relação à capacidade máxima de tráfego da hidrovia. Tendo em
vista as implicações de desenvolvimento econômico associados a uma hidrovia, as eclusas de
alta queda têm sido a opção mais frequente, embora seu projeto seja mais complexo.
A altura de queda condiciona o sistema hidráulico de enchimento mais conveniente, que
podem ser agrupados em dois sistemas fundamentais: o de alimentação através de aqueduto
longitudinal ao eixo da câmara, posicionado abaixo ou ao longo das laterais da mesma, que é
adequado para eclusas de até 20 m de queda; e o sistema hidraulicamente balanceado,
adequado para as eclusas de alta queda. Estes sistemas apresentam diferenciada distribuição
de vazões pelos orifícios de saída da câmara, e consequentemente esforços solicitantes nos
cabos de amarração das embarcações eclusadas.

Sistema de enchimento/esvaziamento da Eclusa de Nova Avanhandava na Hidrovia do Rio Tietê


(SP).
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Aqueduto longitudinal da Eclusa de Nova Avanhandava na Hidrovia do Rio Tietê (SP).


OBRAS HIDROVIÁRIAS

Sistema de enchimento da Eclusa de Três Irmãos na Hidrovia do Rio Tietê (SP).

• Válvulas

O controle da operação de eclusagem é realizado por válvulas instaladas em aquedutos


independentes de enchimento e esvaziamento.
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Escoamento nos poços das comportas e instalação típica da comporta segmento invertida.
OBRAS HIDROVIÁRIAS
Em princípio, as válvulas funcionam no esquema todo aberto ou todo fechado, sendo fechadas
sempre sem carga. Normalmente usam-se válvulas iguais para montante e para jusante.
As válvulas de controle dos circuitos hidráulicos são o equipamento mais delicado das
eclusas, motivo pelo qual painéis de vedação são previstos para manutenção e reparo de cada
válvula.

Os critérios de projeto de eclusa de navegação podem ser elencados como segue:

• Os esforços nos cabos de amarração não deverão ultrapassar 1/600 do porte bruto da
embarcação eclusada, respeitando-se o limite superior de 5 Tf (critério PORTOBRÁS).
• Ausência de turbulências na câmara da eclusa que possam trazer riscos às embarcações.
Podem ocorrer ondas estacionárias na direção longitudinal e transversal ao eixo da câmara
e correntes recirculatórias transversais. O objetivo almejado é o de que o enchimento se
processe de modo simétrico e homogêneo em toda a câmara, principalmente nos instantes
de vazão máxima.
• O escoamento na aproximação da tomada d’água não acarretar problemas às menores
embarcações.
• As estruturas de restituição devem produzir reduzida turbulência, localizando-se
preferencialmente fora do percurso de navegação.
• Sistemas economizadores de água nas eclusas, em que pode-se recuperar até 60% da água
empregada em uma eclusagem, por meio de piscinas naturais, como nas novas eclusas do
Canal do Panamá.
• Os tempos de eclusagem devem ser reduzidos na proporção em que o aumento dos custos
gerados por esta condição sejam compatíveis com as vantagens oriundas de uma rápida
operação das válvulas.

IV.2 DIMENSÕES TÍPICAS DAS ECLUSAS BRASILEIRAS

Os muros de ala das câmaras das eclusas devem ser verticais, retilíneos e paralelos para
guiarem perfeitamente as embarcações na movimentação vertical da transposição de desnível,
mantendo-se as embarcações atracadas junto aos muros pelos cabos.
Os muros-guias são normalmente retilíneos e alinhados com os muros de ala, tendo
comprimento aproximadamente igual ao do comboio tipo, sendo que não deve ser mais curto do
que meio comboio.
Na região das cabeças da eclusa existe o espaço reservado à movimentação das portas, o
qual fica condicionado ao tipo destas.
O espaço útil para acomodar o comboio-tipo na câmara é um comprimento igual ao mesmo
mais 10 m de folga em eclusas de até 100 m de comprimento, podendo ser reduzido para 5 m em
eclusas mais compridas, e a folga mínima entre diferentes embarcações é de 5 m. Quanto à largura,
deve-se prever uma folga de 1,0 m com os muros de ala, e a folga mínima de 2,0 m na largura entre
embarcações lado a lado. A folga mínima no fundo da soleira da porta e câmara a ser considerada é
de 1,0 m em águas mínimas, para facilitar a entrada do comboio e reduzir o efeito de pistonamento
da água.
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Planimetria do setor de montante da Eclusa de Barra Bonita na Hidrovia do Rio Tietê (SP).
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Esquema da porta de montante da Eclusa de Barra Bonita na Hidrovia do Rio Tietê (SP).

A seguir apresentam-se algumas dimensões de eclusas de hidrovias interiores brasileiras


(comprimento útil/largura útil/profundidade mínima em m):

•Hidrovia do Rio Tietê (SP): 145/12,0/3,0


•Hidrovia do Rio Paraná: 210/17,0/4,5 (Eclusa de Jupiá)
•Hidrovia do Rio Jacuí (RS): 120/17,0/3,0
•Eclusa do Fandango no Rio Jacuí (RS): 85/15,0/3,0
•Hidrovia do Rio São Francisco: 120/17,0/4,5 (Eclusa de Sobradinho)
•Hidrovia do Rio Tocantins: 210/33,0/6,5 (Eclusas de Tucuruí)

IV.3 SEGURANÇA NAS ECLUSAGENS

As embarcações nas eclusagens não deverão estar sujeitas a riscos de acidentes maiores do
que os existentes em tráfego normal, não devendo produzir danos à própria obra. A segurança nas
eclusagens é uma questão diretamente vinculada à velocidade de transposição, que deve ser a maior
possível para propiciar maior capacidade de tráfego (menor perda de tempo) à hidrovia.
Nas entradas de montante e jusante, com o objetivo de evitar o avanço das embarcações em
direção às portas, são instalados os chamados freios de barcos. O dispositivo indicado consta de
dois cabrestantes situados nas laterais dos canais de acesso com grupos de motores redutores
alojados em poços. Próximo a cada cabrestante existe um cilindro fixo por onde o cabo de frenagem
deverá dar uma volta e atravessar o canal para ligar-se ao cabrestante da margem oposta, mantendo-
se o cabo a uma distância de 0,5 m do nível d’água por bóias que comandam os cabrestantes. A
frenagem é conseguida pelo atrito no cilindro e retenção do freio motor, liberando-se a passagem da
embarcação baixando-se o cabo abaixo do calado máximo com contrapesos que mantêm o cabo
esticado.
No interior da câmara o sistema de amarração impede que as embarcações se choquem
contra os muros ou portas, sendo este último maior risco, em função da agitação reinante na massa
líquida. Nas eclusas de pequena queda os cabos são fixos a cabeços de amarração engastados nos
OBRAS HIDROVIÁRIAS
muros. Para maiores quedas os cabos são presos a cabeços flutuantes que acompanham a variação
do nível d’água, deslocando-se apoiados em guias colocadas em ranhuras especiais nos muros de
ala. No Brasil adota-se o critério PORTOBRÁS quanto ao esforço máximo admissível por cabo.
Externamente à câmara as embarcações atracadas estão sujeitas, além da agitação da água a
correntes e ventos, adotando-se o mesmo critério de segurança adotado no interior da câmara.
Para as embarcações em navegação admite-se que nos acessos a velocidade da corrente não
deva ultrapassar 0,9 m/s no sentido de movimentação e 0,3 m/s no sentido transversal.

Esquema de flutuador para amarração de embarcações.

IV.4 EQUIPAMENTOS DAS ECLUSAS DE NAVEGAÇÃO

IV.4.1 Considerações gerais

O equipamento para funcionamento das eclusas é fundamentalmente composto de: portas (de
montante e jusante), válvulas (de montante e jusante), painéis de vedação das portas e seus sistemas
de movimentação e controle. Dos tempos de movimentação das portas e válvulas dependerá em
grande parte a capacidade de tráfego da eclusa.
Os equipamentos complementares são: cabeços de amarração (fixos ou móveis), escadas de
acesso às embarcações, freios de embarcação, sinalização luminosa e acústica, iluminação geral,
bombas para esgotamento total da câmara, elevadores de serviço para eclusas de alta queda, sistema
de gerador de emergência.

IV.4.2 Portas

Como regra geral, as portas somente são movimentadas com níveis d’água igualados nas
duas faces ou com carga mínima de alguns decímetros, o que garante grande simplificação no
sistema de movimentação e na sua estrutura.
As características que distinguem os tipos de portas residem nos movimentos de rotação em
torno de um eixo, sendo as mais comumente utilizadas as de busco, que são as mais utilizadas por
vantagens estruturais e de vedação em portas para grandes e pequenas dimensões, e as planas de
movimentação vertical.
OBRAS HIDROVIÁRIAS
As portas de busco são constituídas por um par de painéis que, ao girarem em torno de cada
um de seus eixos verticais junto aos muros de ala, encontram-se no eixo central da câmara
formando um ângulo com vértice voltado sempre para montante, apoiando-se no fundo num batente
(busco). Quando abertas as portas ficam encaixadas nos muros de ala. A vedação é conseguida pela
pressão hidrostática da água, lateralmente contra os muros, no fundo contra o busco e na junção
uma contra a outra. A movimentação nas obras maiores é mecanizada por guinchos, ou mais
usualmente por pistão hidráulico articulado na face interna da porta ou por sistema mecânico de
cremalheira-roda dentada motorizado por motor elétrico. O principal inconveniente deste tipo de
porta é o de exigir maior comprimento de muro de ala.

Tipos de portas de busco.


OBRAS HIDROVIÁRIAS

Porta de jusante da Eclusa de Barra Bonita na Hidrovia do Rio Tietê (SP).

Planta de situação da porta levadiça de jusante da Eclusa de Barra Bonita na Hidrovia do Rio Tietê
(SP).
OBRAS HIDROVIÁRIAS
As portas planas de movimentação vertical podem ser levadiças ou baixadiças. No primeiro
caso são movimentadas, em geral, por pórticos que devem ter grande altura para permitir a
passagem da embarcação. No caso de portas de jusante de eclusas de alta queda a movimentação
pode ser feita contra a máscara, pois somente este tipo de porta é bem adaptado ao uso da máscara
fixa. No segundo caso a porta desce contra o muro de queda, quando a eclusa é de queda
relativamente grande. As comportas planas são geralmente movimentadas por cabos, sendo quase
sempre possível dispor de sistemas de contra-peso, que reduzem a energia necessária para a
movimentação. Os maiores inconvenientes deste tipo de porta estão ligados à manutenção dos
cabos, que são solicitados por grandes esforços e devem ter grandes comprimentos, além do grande
peso comparativamente às portas de busco equivalentes.

IV.4.2 Válvulas

Atualmente são normalmente comportas segmento invertidas ou planas verticais (tipo gaveta),
havendo maior preferência pelas primeiras, por sua facilidade de acionamento (menor atrito e
vibrações), simplicidade, durabilidade e menor manutenção. As comportas segmento invertidas ,
isto é com a articulação a montante da face vedante, fecham a extremidade de jusante do poço de
comportas e, consequentemente, impedem a entrada de ar descontroladamente.

IV.5 FUNCIONAMENTO HIDRÁULICO DAS ECLUSAS

A eclusagem de enchimento apresenta dificuldades significativamente maiores


comparativamente à de esvaziamento: a energia residual que não foi perdida ao longo dos
aquedutos deverá ser dissipada no interior da câmara, numa condição em que o colchão d’água
ainda é baixo, pois, comparativamente, a aceleração do escoamento no esvaziamento ocorre de
maneira muito mais ordenada. No esvaziamento existem algumas condições que também merecem
verificação, como a cavitação a jusante das válvulas e a dissipação de energia a jusante dos
aquedutos (bacias de dissipação).
As condições de escoamento nas eclusas devem ser avaliadas visando minimizar as fontes que
contribuem para a turbulência na câmara e na restituição, seguindo-se para tanto um roteiro do tipo:

•Condições do comportamento do escoamento na aproximação ao emboque da tomada d’água.


•Condições de escoamento nos aquedutos.
•Condições de distribuição das vazões nos aquedutos de alimentação.
•Manobras das válvulas.
•As condições de restituição no escoamento de saída dos aquedutos de esvaziamento.

IV.6 CAPACIDADE DE TRÁFEGO DAS ECLUSAS

A capacidade de tráfego das hidrovias é definida pela tonelagem máxima anual que pode
transitar pela mesma em condições operacionais normais. Nos canais de navegação não eclusados
qualquer obra que limite a velocidade ou restrinja a passagem das embarcações reduz a capacidade
de tráfego: restrições de cruzamento, navegação somente diurna, pontes com vãos restritivos, fortes
correntezas, etc.. Nos rios canalizados a capacidade de tráfego está normalmente limitada pelas
obras de transposição de desnível. Assim, nas vias eclusadas a capacidade de tráfego é imposta pela
obra mais lenta, isto é a que obriga a um maior tempo de transposição (intervalo em que a obra deve
atender a um comboio ou embarcação), o que evidencia o interesse de projetar todas as obras de
transposição da mesma via otimizadas com a mesma capacidade de tráfego. A capacidade de
OBRAS HIDROVIÁRIAS
tráfego é um importante parâmetro econômico que é utilizado para exame da viabilidade das novas
vias navegáveis e para a justificativa de reformas e ampliações das vias existentes.

V. EXEMPLOS DE HIDROVIAS EUROPÉIAS CONSOLIDADAS

A tradição hidroviária européia remonta à Idade Média, tendo-se consolidado ao longo de


séculos com importantes obras de Engenharia Hidroviária, compreendendo: obras de transposição
de desnível, canais de partilha abrangendo aquedutos e túneis, travessias de pontes, sinalização
náutica e infraestrutura de suprimento ao longo dos canais e nos portos fluviais. O modal aquaviário
nestes países insere-se integralmente na matriz de transporte, o que deveria se constituir de
paradigma para as hidrovias brasileiras.

(a) (b)

(c)
Eclusagens no Rio Moselle (França). Saída de automotor com L=110 m, B=10m, T=2217 t. Estas
embarcações navegam de 10 a 12 nós.

(a) (b)
Eclusa com comporta plana levadiça em Ijzer (Bélgica) para compatibilização de níveis d’água.
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Eclusa de câmaras múltiplas de Fonserannes (França).

(a) (b)
(a) Portas de busco a montante de eclusa no Canal entre o Rio Marne e o Rio Reno (França) com
desnível aproximado de 15 m e enchimento por aquedutos. (b) Porta plana levadiça a jusante.

Elevadores Mecânicos (ver fotos), que não existem no Brasil, mas que poderão existir em
futuros Canais de Partilha, os canais que atravessam os Divisores de Águas entre Bacias
Hidrográficas, como seria viável entre a Hidrovia do Rio Paraguai e a Hidrovia dos Rios Paraná e
Tietê. A Hidrovia do rio Paraguai é a principal em movimentação de carga no Brasil, atravessa 5
países sul-americanos e se estende de Cáceres (MT) a Nueva Palmira no Uruguai (já no Estuário do
Prata), com extensão de 3.442 km, dos quais 1.270 em território nacional. Existem vários tipos de
elevadores hidráulicos, mas o princípio básico é o de conter a embarcação em uma cuba com água
que vence o desnível por planos inclinados (longitudinais ou transversais), elevadores verticais, que
OBRAS HIDROVIÁRIAS
chegam a mais de 60 m de desnível ou o da Barragem de Three Gorges no Rio Yang Tzé (China),
vencendo um desnível de 113 m de altura podendo receber embarcações de até 3.000 t. Tratam-se de
obras que concorrem com as eclusas nos canais de partilha, pois nos divisores entre Bacias
Hidrográficas a disponibilidade de água é reduzida e a perda d’água nas eclusagens somente pode ser
mitigada com sistemas economizadores de água, sendo uma sangria da água dos corpos d'água doce.

(a)
(b)

(c)
(d)

Seqüência de descida da cuba com embarcação do Plano Inclinado de Arzviller (França) no Canal
entre o Rio Marne e o Reno.
OBRAS HIDROVIÁRIAS

Aqueduto de Pontcysylte no Canal Llangollen (Reino Unido) com 300 m de comprimento.

Subterrâneos de navegação (Túneis) no Canal do Rio Marne ao Reno (França). Observe-se a


sinalização náutica luminosa e o limitador de calado aéreo.
OBRAS HIDROVIÁRIAS
Portas de Guarda (Ports de Garde em francês) em Canais de Partilha são imensas comportas
de prevenção de emergências, para, caso haja falha a montante em obras de transposição
(mecânicas, como os elevadores, ou hidráulicas, como as eclusas), com o risco de perda d'água
descontrolada para jusante, o que seria muito sério em Canais de Partilha (que estão nos trechos
mais altos das Bacias Hidrográficas e têm pouca água disponível para abastecer os canais) haja uma
retenção. Nesse caso a Comporta de Guarda é fechada imediatamente.

(b)
(a)

(c) (d)
Pontes basculantes de acionamento hidráulico em travessias no Canal Nieuwpoort-Ghent (Bélgica).
Observa-se a sinalização luminosa.

Ponte giratória em travessia no Canal Nieuwpoort-Ghent (Bélgica).

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