Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
1
PRECONCEITO
2
Copyright © 2018 Flávio Duncan
Edição.......................................Flávio Duncan
Capa..........................................Flávio Duncan
Diagramação e Programação
Visual.............................Editora Book express.
Fotos de Capa.....................Juliana Fontenelle
Maquiagens.........................Diego Brum
Produção.............................Douglas Duncan
Revisão..... Ed. Book Express e Flávio Duncan
Editoração Eletrônica......Editora Book Express
PRECONCEITO
POR FLÁVIO DUNCAN
ISBN: 978-85-8218-447-9
@flavioduncan
@fladuncan
Flávio Duncan
Pescador de Ideias
sociedadeamaro@gmail.com
flavioduncan@gmail.com
+55 21 99716-3568
PRECONCEITO
4
“O que me preocupa, não é o grito dos maus,
mas o silêncio dos bons”.
(Martin Luther King)
PRECONCEITO
5
Aproveite e leia também:
PRECONCEITO
6
Como fazer projetos e captar
recursos – A presente obra retrata
de forma clara, maneiras objetivas
de captar recursos para execução de
suas ideias e pôr em prática projetos
pessoais, de sua empresa ou
instituições voltadas ao Terceiro
Setor.
PRECONCEITO
7
Alguns dos depoimentos que a presente obra
retrata em seu conteúdo, (a pedido de algumas
vítimas), tiveram seus nomes mantidos sob
sigilo, adotando-se pseudônimos diante de
suas histórias, resguardando a dor e os
traumas daquilo que sofreram, respeitando
seus sentimentos e suas condições
psicológicas. Suas narrativas foram
preservadas, no entanto o autor utilizou de
licença poética para organizar, contextualizar e
roteirizar as narrativas e sentimentos contidos
nos depoimentos oferecidos dentro dos temas
propostos.
PRECONCEITO
8
AGRADECIMENTOS
PRECONCEITO
10
É neste momento que me dou conta do quão
sortudo sempre fui.
Em todas as obras que escrevo, tenho o
carinho de fazer alguma referência a amigos e
a verdadeiros anjos, com os quais acabei
esbarrando ao longo dos anos. Desta forma,
acredito que pessoas especiais merecem
tratamento especial em nossas vidas.
Assim, com todo carinho que seja possível
expressar, dedico a presente obra a: Douglas
Duncan, companheiro e fiel escudeiro de uma
vida inteira, Thonia Cardoso, Carol Borges,
Luciana Gomes e Andreza Andrezzo os
corações maiores que nós mesmos, Dyene
Galantini, o exemplo de uma vida, Márcia
Helena o maior orgulho que um filho poderia
ter, Letícia Fátima a melhor mãe que a vida
poderia ter me oferecido, Patrícia Bahia,
Yasmin Ribeiro, Ysabelle Ribeiro, João Pedro
Ribeiro, Arenaldo Nogueira, Jorge Luiz Matias,
Rafael Ribeiro, André Ramos, Fernanda
Moura, Flávia Julião, Marcos Melo, Viviane
Melo, Eli Marques, Pablo Marques, Leonardo
Marques, Bernardo Marques, Luciana Lima,
Sandra Regina, Gabi Trintini, Márcia
Magalhães, Caroline Borges, Daniel Xisto,
Carina Duarte, Márcio Guimarães, Sandro
Codorniz, Simone Codorniz, Berg Flores, Júlia
Marchi, Evandro Fontoura, Jorge Lopes Matias,
PRECONCEITO
11
Celia e Nair Matias, Priscila Carilo, Paula Nilo,
Ana Maria Lopes, Nildo Melquiades, Mariana
Portugal, Jessica Souza, Vanessa Toledo,
Silvio Cid, Viviane Toledo, Michele Telise, Jairo
Ribeiro, Ronaldo Mil, Rafael Rafick, Julie Alves,
Sandra Neves, Arminda e Patrícia Nery, Igor
Igarashi, Luciana Salgado, Lucina Beser,
Philippe Cassano, Bruno Cassano, Cláudio
Antônio Moura, Antônio Beser, Luiz Alberto
Gomes, Genimar Couto (in memorian), Wilane
Ouriques, Gesse Costa, Davi e Lívia Costa,
Fernanda Moren, Nailda Ribeiro, Eliane
Barbosa, Ediléia Pereira, Walcyr Junior,
Cristiane Brusdzenski, Deusa Guimarães,
Neide Lopes, Maria Muniz, Victor Hugo, Talia
Sobreira, André Gabeh, Luiz Lima, Marcela
Buzelin, Alexandra Melo, Caroline Alves, Denise
Ribeiro, Estevan Raya, Renata Magalhães,
Claudialice Cavalcante, Alexandre Henderson,
Leonardo Cândido, Eliane Benício, Nayla
Mohamad, Victor Hugo Almeida, Nanno
Santanna, Benício Garbazza, Caroline Cruz,
Bianca Bonanno, Ingrid Bicudo, Gabriela Bicudo,
Cássia Bicudo, Patrícia Boueri, Ana Carolina (in
memorian), Melissa Pires, Júnior Pires, Alan
Pires, Michele Pires, Sérgio Menezes, Antônio R.
de Freitas, Bianca Mendes, Michele Andrade,
Edna Martins, Elizandro Jarley, Marcos Oliveira,
Angela Longo, Aretha Oliveira, Tânia Baptista,
Patrícia Baptista, Tânia Bastos, Silvina Baptista,
PRECONCEITO
12
Maria Helena Albuquerque, Fátima Nascimento,
Beatriz Souza, Selma Vidal, Daniela Nascimento,
Luis Sousa, Camila Bottecchia, Ana Maria Lopes,
Paulo Botelho, Mariana Botelho, Ilda Botelho,
Maria Emília do Nascimento, Lucilia Rosa do
Nascimento, Cris Torquetti, Carina Duarte,
Thaiza Dias, Erika Sarmento, Fábio Bello, Breno
Farias, Guilherme Manier, Rhaysa Moura,
Andréa Silva, Maria Anita Alvarenga, Gal
Marques, Júlia Rosa do Nascimento (in
memorian), Camila Batista, Rayta Camarda, Naiá
Camarda, Thuilla Camarda, Flávia Braz, Ellen
Barroso, Fernanda Coutinho, Suelem Alves,
Cristina Pinheiro, Katrinne Carneiro, Debora de
Barros, Patrícia Vilches, Joaquim Calcado,
Gynna Mello, Iva Maria Carvalhaes, Marcela
Liboryo, Arethuza Dória, Natália Pinheiro, Bruna
Ildefonso, Janete Alves, Russeau Marques,
Junior Marques, Cidicley Marques, Chair
Marques, Valentina Duncan, Felícia Duncan,
Meia-Noite Duncan, Zélia Vaz, Kathe Fernandes,
Thomaz Julião, Breno Araújo, Luciano Ase
Cabuçu, Aimée Pinheiro, Elizangela Araujo,
Daniela Moreira, Maria Cristina Almeida, Hélio
Ribeiro, Enid Moura, Jorcelina Amaro, Deolinda
Amaro e Manoel Braga (in memorian) os
bálsamos de todos os dias e a todos aqueles que
comungam pelos ideais de um mundo melhor e
de uma sociedade mais justa.
PRECONCEITO
13
PRECONCEITO
14
Para Eli Bahia, com todo amor que há nessa e
em outras vidas...
PRECONCEITO
15
PRÓLOGO
PRECONCEITO
17
A coisa fica ainda mais preocupante, quando
percebemos representantes políticos com
discursos segregadores e discriminatórios,
encarando com naturalidade por grande parte
da população no mundo todo.
Temos encarado com naturalidade, discursos
emblemáticos, que segregam minorias agimos
com naturalidade, sobre a violência que
milhares de pessoas sofrem todos os dias sem
nos estarrecer e perceber que estamos
enfermos. É preciso refletir.
A sociedade adoeceu e parece ter ficado presa
a uma nuvem terraria, que a deixa cada vez
mais cega, intolerante, revolta e intransigente.
Precisamos entender, que a cura talvez esteja
na forma como estamos receptivos a olhar para
o outro, a ouvir, absorver, tentar entender,
argumentar e quando convencidos,
humildemente aprender, soltando-nos das
amarras comuns a crítica alinhada ao
conhecimento superficial sobre diferentes
temas, nos pondo no lugar que talvez não seja
tão confortável e bem mais distante de nosso
próprio umbigo.
Precisamos falar sim, sobre nosso papel diante
da: intolerância, preconceito, racismo,
homofobia, bullying, discursos de ódio e tantas
outras mazelas sociais, fruto do preconceito
PRECONCEITO
18
desenfreado, que ironicamente caminha lado a
lado com nossa evolução.
Apresentar propostas, construir caminhos
amparados pelo ponderamento, talvez seja um
dos caminhos ou nossa única alternativa para
construção de um mundo melhor.
Nesse sentido, independente dos temas que
costumo abordar ou interagir, acredito que o
peso da responsabilidade se torne cada vez
maior, diante da expectativa que os leitores
possuem depois do lançamento de outros
trabalhos publicados. Ainda assim, cá estamos.
Missão cumprida mais uma vez!
Espero que a presente obra possa de alguma
forma contribuir na jornada de cada um de
meus leitores na busca por um mundo melhor,
nos fazendo entender de uma vez por todas,
que essa mudança só é possível a partir de nós
mesmos, num pequeno e profundo ato de
reflexão e discussão sobre nossos atos,
posicionamentos e atitudes diante da vida e
principalmente, de nosso semelhante.
Com votos de que possamos juntos construir
um mundo melhor e uma sociedade cada vez
mais justa, com carinho;
Flávio Duncan
PRECONCEITO
19
Nota Sobre o Autor
PRECONCEITO
21
Sobre a definição de preconceito e
discursos de ódio:
PRECONCEITO
24
Contextualizando o preconceito no Mundo,
tomando o Nazismo como passagem
histórica:
PRECONCEITO
25
históricas que tangem a segunda guerra
mundial.
Para encerrar oficialmente a Primeira Guerra
Mundial, (1914 a 1918), a Alemanha foi forçada
a assumir os custos do conflito. Assim, em
1919 assinando o Tratado de Versalles. Com
isso, o país perderia 13% do território nacional,
75% de suas reservas de ferro, 26% de suas
reservas de carvão, além de todas as suas
colônias.
Ficou claro, que a incapacidade da sociedade
alemã em aceitar a derrota e as reparações que
eram necessárias a partir desse tratado,
deixaram caminho livre para disseminação de
discursos de ódio e preconceito, fazendo com
que em paralelo, houvesse um crescimento de
ideias nacionalistas, onde o “Nazismo”, termo
oriundo da criação do Partido: “Nazi”,
abreviação de Partido Nacional-Socialista dos
Trabalhadores Alemães (Nationalsozialistische
Deutsche Arbeiterpartei, em alemão), fosse o
veículo de expressão mais extremista desses
ideais.
Esses ideais nacionalistas, não eram, nem
nunca foram novidade na Alemanha. Desde o
século IXX, vários líderes alemães,
fomentavam um ardente nacionalismo entre o
povo, dando origem a identidade germânica.
PRECONCEITO
26
Amparado pelo descontentamento com as
reparações financeiras geradas e com a crise
que a Alemanha passou a viver, onde o índice
de desemprego ultrapassava a 30%, Adolf
Hitler, com grande poder de convencimento e
conhecido por grande carisma na época,
seguiu esses ideais nacionalistas, vendo
através dessa situação uma oportunidade.
Dessa forma, Hitler conseguiu chegar ao poder
em 1933, com promessas de políticas de
incentivo a indústria, baseada na produção de
bens de consumo e melhoria na qualidade de
vida das classes menos favorecidas, que eram
profundamente afetadas, pela situação difícil
econômica que a Alemanha vivia na época.
Assim surgiu, por exemplo, o Volkswagen
(“carro do povo”), conhecido na época no
Brasil, pelo automóvel: “Fusca”.
Nesse contexto, a sociedade Alemã já não via
com grande contentamento o regime
democrático, tendo em vista que culpavam os
governantes anteriores, responsabilizando-os
pelas condições humilhantes impostas pelo
tratado de Versalhes.
Dessa forma, o regime democrático já não
tinha muito apoio da população, que sofria com
os problemas econômicos que enfrentavam.
Os nazistas, se aproveitaram disso, para
PRECONCEITO
27
convencer a população de que a democracia
era altamente desestabilizadora e viram em
Hitler, a possibilidade de tomar as rédeas e
estabilizar o país, estabelecendo a ordem.
Aliado a isso, Hitler se valeu do antissemitismo
(aversão aos semitas, em especial aos
Judeus), enraizado a anos na Europa.
A cristandade medieval, havia fomentado mitos
e conceitos de que os Judeus eram aliados do
demônio, que não tinham pátria e que
possuíam um intento velado de dominar o
mundo. Esses conceitos discriminatórios,
foram adaptados aos propósitos de Hitler,
durante o regime nazista, deixando de ter
caráter religioso, passando a ter caráter de
preconceito racial, afirmando a imutabilidade
racial do povo judeu, como “degradantes”, sem
possibilidade alguma de reversão, em função
de sua raça, sua natureza biológica.
No início, a população Alemã não se sentia
ameaçada diante das atrocidades cometidas e
até se sentiam seguros, auxiliando na
perseguição ao povo judeu.
A política nazista não inspirava medo, mas
confiança, fazendo com que todos
colaborassem com a perseguição a judeus e
comunistas.
PRECONCEITO
28
Com o passar do tempo, a coisa foi ficando
cada vez mais séria, estabelecendo práticas
cada vez piores de perseguição e extermínio.
Isso tudo, com direito a propagandas do regime
nazista, que ensinavam a confinar, torturar e
matar judeus e outras raças, considerando:
“parasitárias”, “degradantes” e ameaçadoras,
tão comuns quanto exterminar ratos ou
bactérias, movidos pelo antissemitismo,
acreditando que isso era justo, correto e
necessário para preservação da sociedade
alemã e contribuição para um mundo melhor.
PRECONCEITO
29
A importância da ONU e de Instituições que
promovam a garantia de direitos e o
combate ao Preconceito no mundo:
A ONU - Organização das Nações Unidas, é
uma organização internacional com o objetivo
de facilitar a cooperação em termos de direito
e segurança internacional, desenvolvimento
econômico, progresso social, direitos humanos
e da paz mundial.
A II Guerra Mundial, devastou dezenas de
países e tomou a vida de milhões de pessoas.
Isso desencadeou no mundo inteiro o
sentimento de que seria necessário encontrar
uma forma de manter a paz entre os países. No
entanto a ideia de criar a ONU, não surgiu de
uma hora para outra.
Com intenção de impedir outro conflito daquela
magnitude, após a segunda Guerra Mundial,
em 24 de outubro de 1945, em substituição à
Liga das Nações Unidas foi estabelecida com
51 estados-membros, formalizando a fundação
da ONU.
Atualmente, com a adesão de 193 países, foi
possível estabelecer o crescimento político e a
força da ONU no mundo. Com isso, seus
objetivos também cresceram e agora ela se
dedica a manter a segurança no planeta,
construir relações amigáveis entre as nações,
PRECONCEITO
30
promover progresso social, desenvolvimento
humano, melhores condições de vida, proteção
e garantia de direitos.
Assim, estabeleceu-se o Conselho de
Segurança, um órgão da ONU, basicamente
responsável pela paz e segurança
internacionais.
Formado por 15 membros, dentre eles, cinco
permanentes, que possuem o direito a veto –
Estados Unidos, Rússia, Reino Unido, França
e China – e dez membros não-permanentes,
eleitos pela Assembleia Geral por dois anos.
Nesse sentido, amparada por todo o contexto
histórico de violência e desrespeito a vida,
promovido pelo preconceito, a ONU, entende
que o preconceito restringe direitos, fomenta no
mundo inteiro campanhas de esclarecimento e
conscientização, além do financiamento e
auxílio a centenas de projetos que possam
empoderar e fomentar a garantia de direitos,
aliados no combate ao preconceito,
segregação social e discriminação.
PRECONCEITO
31
Biologicamente o cérebro precisa
categorizar aquilo que ele identifica:
Uma das atividades mais espontâneas que
nossa mente faz, é identificar e categorizar
aquilo que ela identifica de imediato. Isso
acaba acontecendo, porque o cérebro não dá
conta de processar todas as informações e
estímulos que estão presentes num ambiente.
Assim, ele busca estratégias para categorizar e
classificar conceitos, imagens e vários pontos
de contato com o mundo ao nosso redor.
PRECONCEITO
36
Assim, há que se perceber, que o preconceito
tem relação direta com estereótipos, é a
identificação e não aceitação de diferenças
de determinado grupo, se baseando na
característica, no estereótipo para avaliar o
outro e adotar comportamento (ato)
discriminatório.
PRECONCEITO
38
O Preconceito na Literatura e na arte:
PRECONCEITO
40
responsabilidade da mulher a culpa por todas
as mazelas.
Se fizermos uma rápida busca em nossa
memória, as famosas marchinhas de carnaval,
uma festa tão libertária e mundialmente
famosa, traz consigo em sua história no Brasil,
o peso do preconceito, impresso em suas
rimas, contendo bordões como: “Maria
Sapatão”, fazendo alusão a uma mulher
lésbica, ou: “olha a cabeleira do Zezé”, fazendo
menção a sua orientação sexual, num claro
traço de homofobia, presente em suas
composições.
Há quem justifique que isso ocorria com mais
veemência a anos atrás e que a coisa é
completamente diferente nos dias de hoje, mas
acredite, não é.
Se pararmos para observar, isso é gritante e
está cada vez mais presente em nosso
cotidiano, inclusive na teledramaturgia. O modo
como as novelas brasileiras tratam as
personagens negras, reflete o que muitos
estudiosos já denominam, como: “preconceito
a brasileira”. Uma espécie de preconceito sutil,
velado, um preconceito disfarçado, talvez pela
vergonha de ser preconceito, pelo medo da
crítica advinda da pequena parcela da
PRECONCEITO
41
sociedade que hoje já se encontra em
militância sobre essas questões.
Isso se traduz, claramente, na criação de
papéis interpretados por atores negros soltos
na trama, sem base familiar, sem uma história.
Isso ocorre tanto no cinema, quanto na
televisão, cada vez mais presente nas séries e
novelas.
A coisa fica mais clara, quando observamos os
tipos mais comuns de personagens negras,
como: a negra fogosa, com a
hiperssexualização da mulher, como objeto de
desejo, a mulher negra doméstica, que
normalmente se fundamenta em três
características principais: o da empregada
sensual, que vive seduzindo o patrão tentando
enganar a patroa, o da mulher servil que é
quase que escravizada pelo bem estar dos
patrões, ou da caricata empregada, enxerida e
fofoqueira, disposta a qualquer coisa para
saber em primeira mão sobre tudo que
acontece na casa dos patrões e repassar
adiante.
Entre os tipos mais comuns, há ainda o papel
do “malandro”, o “safadão”, atribuído a
personagens negros, que vem de alguma
comunidade e representam o famoso “jeitinho
brasileiro”, dando o ar de esperteza, mudando
PRECONCEITO
42
os rumos e as regras da trama, com ações
levianas e até com práticas ilegais.
Não é difícil ainda, resgatarmos na memória, os
papéis das negras pobres, batalhadoras, que
vivem o dilema de viver o amor impossível
entre o ricaço branco, que se apaixona pela
mulher negra, (normalmente pobre e sem
condições, que tenta conquistar seu lugar ao
sol, (e na trama), com o dilema sobre o
romance entre diferentes classes sociais, como
se apenas isso pudesse atestar seu valor
diante da sociedade.
Ao expressarem conceitos preconceituosos,
ainda que de forma não tão explícita, a arte em
suas diferentes vertentes, acaba reforçando o
preconceito na sociedade e enfraquecendo
ações afirmativas que buscam a
conscientização das pessoas.
PRECONCEITO
43
A intolerância nos dias de hoje:
Não tolerar, não aceitar a existência, baseado
em algum tipo de conceito ou argumento
político, racial, religioso, estético, ou seja lá de
qual natureza for, já é tratado mundialmente,
como um dos principais elementos
dificultadores em busca da paz global.
Infelizmente, no mundo moderno, é comum
observarmos nos jornais, notícias de
agressões ou homicídios em função da falta de
tolerância diante do que fuja da “aceitação da
maioria”.
A sociedade moderna não tem tolerância com
aquilo que seja incomum. Independente do
argumento utilizado para o embasamento.
Preconceito no mundo:
A verdade é que infelizmente, não há projeto,
instituição ou solução mágica que possa mudar
o preconceito de uma hora pra outra.
Principalmente no mundo tão plural em que
vivemos, que antagonicamente, apesar de ser
tão diverso e ter isso a seu favor, nos
PRECONCEITO
44
desarmando para esse tipo de “chaga social”,
também traz consigo problemas multifatoriais,
ou seja, que tenham diferentes motivos para
existir.
O preconceito sempre existiu como base na
sociedade e muitas relações das mais variadas
formas e naturezas, infelizmente foram
construídas, tendo o preconceito como
alicerce, afinizando, agrupando, identificando
grupos, comportamentos, ideologias e
sentimentos.
Se pararmos por um segundo para refletir, a
concepção de que a natureza por si só, em sua
seleção natural em busca da sobrevivência e
da vida na terra, exclui os mais fracos, quando
adotamos a máxima de que: “só os mais fortes
sobrevivem”, perceberemos que o preconceito
faz parte da vida humana desde os primórdios.
Ainda amparados por esse prisma e sob essa
concepção, acreditar que só os mais férteis, os
mais belos, os mais fortes, os mais preparados,
os mais hábeis ou “escolhidos” na seleção
natural pela vida, já é uma forma de exclusão.
Há quem diga que o preconceito é fruto do
medo humano daquilo que não se conhece,
daquilo que de alguma forma causa estranheza
ou não se sabe tudo absolutamente a respeito.
PRECONCEITO
45
Particularmente eu acredito no contrário.
Preconceito é fruto daquilo que conhecemos
sim, (ou que achamos conhecer), só que
superficialmente, ou que nos foi passado
culturalmente, de forma que consideremos
como verdade absoluta o conceito limitado
sobre alguém ou alguma questão.
O temor na verdade não é pelo desconhecido
e sim pelo contraditório diante daquilo que se
assimilou ou pelo medo de destoar do senso
comum do grupo ou da cultura em que se está
inserido e afinizou entendimento sobre
determinado tema. Tem valoração ligada a
relação individual que cada um atribui a si e a
forma como se está posicionado socialmente.
É preciso desmistificar essa ideia de que
preconceito seja medo do desconhecido e
assumirmos de uma vez por todas, que ele é
fruto do conceito limitado, superficial, do
entendimento e valor que se tem e se atribui a
determinada coisa, situação ou alguém, em
que consideramos como verdade; E sim,
preconceito também está ligado a vaidade
humana e a necessidade de aceitação.
Historicamente, percebemos que o mundo
muda o tempo inteiro. Mudam suas vítimas,
mudam os conceitos, as convenções sobre
determinado tema, mudam os significados e o
PRECONCEITO
46
valor que atribuímos a tudo e nos são
repassados geração após geração, mas não
mudamos a forma como se estabelecem, o
mundo por si só, de que fazem parte e as
regras do jogo que lhe são atribuídos.
O preconceito faz parte da natureza humana e
está presente na vida do homem, desde que o
mundo é mundo. O problema são os efeitos
que eles causam e a forma como afetam a vida
das pessoas. Talvez não seja possível
exterminar os preconceitos do mundo, mas
seja possível amenizar seus efeitos e o
sofrimento que ele causa na sociedade por
todo o planeta.
Pensando sobre alguns dados e até sobre
alguns fatos que ocorreram em decorrência do
preconceito, isso me remete a uma matéria lida
a algum tempo atrás, onde narrava que um
casal gay, fora açoitado com 80 (oitenta)
chibatadas, na província de Aceh, na
Indonésia.
Embora a homossexualidade não fosse
considerada crime na Indonésia, o governo de
Aceh, um território indonésio, localizado na ilha
de Sumatra, costuma punir aqueles que são
denunciados por relações homoafetivas.
O problema maior, foi perceber que cerca de
cem mil pessoas assistiram o momento da
PRECONCEITO
47
tortura, filmando com seus aparelhos de
celulares, enquanto os dois homens, um com
20 e outro 23 anos, eram chicoteados.
Ensandecida e completamente fora de
controle, a população que assistia, pedia para
que os homossexuais fossem açoitados cada
vez mais fortes.
O que eu acho cada vez mais grave, é a reação
em cadeia, caracterizada por um ódio
descabido, a partir do preconceito, levando ao
sofrimento de milhares de pessoas pelo mundo
a fora.
Ainda falando sobre o preconceito contra
homossexuais, quando pensamos neste tema
mundo a fora, é comum nos remetermos a
Rússia, por exemplo.
O Governo Russo, alimenta a intolerância e
homofobia no país declaradamente. Canais
estatais, retratam homossexuais, como
pervertidos, agentes infiltrados e doentes.
Gays, lésbicas, bissexuais e transexuais
sofrem constante perseguição, agressões e
humilhações no país. Ainda que em 1993 a
homossexualidade tenha sido
descriminalizada, a situação só piorou desde
que a chamada “lei de propaganda gay” foi
aprovada pelos legisladores locais em 2013. A
norma proíbe a distribuição para menores de
PRECONCEITO
48
idade de conteúdos que defendam os
“LGBTQIA+” ou equiparem relacionamentos
heterossexuais a homossexuais em igualdade
de direitos e obrigações.
No Brasil, em fevereiro de 2017, houve um
caso que me chocou absurdamente. Uma
travesti, conhecida como Dandara dos Santos,
na cidade de Bom Jesus em Fortaleza, foi
assassinada por espancamento, com golpes
de enxadas, pedras e pauladas, enquanto
vídeos eram filmados a partir de celulares pela
população local e foram compartilhados nas
redes sociais, batendo recordes de
visualização. Até quando podemos aceitar que
isso seja normal? Qual o crime dessa pessoa?
Ir de encontro ao preconceito da sociedade em
que vivia.
A homossexualidade é considerada crime em
71 países e em 7 deles há previsão legal de
pena de morte. O problema é perceber que
estas pessoas estão fadadas ao extermínio,
com ou sem previsão legal, inclusive no Brasil,
que hoje é considerado o país que mais mata
homossexuais no mundo.
Outro fato importante é o crescente preconceito
contra doenças crônicas, por exemplo. Há
relatos científicos, que identificaram o México,
como país, onde teria surgido a gripe: “H1N1”,
PRECONCEITO
49
também conhecida como: “Influenza A”, que se
espalhou pelo mundo a alguns anos atrás. O
fato é que isso fez com que os mexicanos,
fossem vistos com receio, desconfiança e
reserva, durante muito tempo. O mesmo ocorre
em relação a pacientes com câncer, HIV e
tantas outras doenças, que são excluídos,
segregados em vários locais do mundo. Há
inclusive, relatos de pessoas que tiveram suas
roupas e utensílios separados pela própria
família.
Excluir as pessoas enfermas e doentes, não
acolhendo-as ao grupo em que se está
inserido, funciona para muitas pessoas como
uma espécie de “bálsamo psicológico”,
confortando a ilusão e fantasia, que desta
forma serão sadios e que estando afastados,
estarão imunes, mesmo que as doenças em
questão não sejam diretamente contagiosas.
Segregar e excluir essas pessoas, faz com que
a doença que tenha sido diagnosticada, passe
a ser incorporada a identidade da própria
pessoa, fazendo com que sejam constantes
comorbidades psicológicas e estejam cada vez
mais presentes, impondo barreiras e danos as
vezes irreparáveis, resultando em depressão,
isolamento social, distúrbios de humor, além de
sintomas físicos mais facilmente identificados,
como: obesidade, emagrecimento, fadiga e
PRECONCEITO
50
muitos outros, prejudicando seu tratamento,
potencializando sintomas, baixando imunidade
e capacidade de recuperação, adesão e
continuidade de tratamentos.
Se concentrarmos nossa atenção sobre a
máxima de que “ser mulher não é tarefa para
amadores” e tomarmos como exemplo os
dados divulgados pela OMS (Organização
Mundial da Saúde), perceberemos que a
situação do preconceito, detrimento de valor e
violência que as mulheres sofrem no mundo é
cada vez mais alarmante. Estima-se que 35%
das mulheres em todo o mundo já tenham
sofrido qualquer violência físico e/ou sexual
praticada por parceiro íntimo ou violência
sexual por um não-parceiro em algum
momento de suas vidas. Isso se torna cada vez
pior, quando observamos que estudos retratam
as mulheres e meninas, representam cerca de
70% das vítimas de tráfico humano no mundo.
Na União Europeia, uma em cada 10 mulheres,
relataram ter sofrido assédio pela internet,
incluindo ter recebido de forma indesejada
mensagens via SMS ou e-mails
explícitos, sexualmente ofensivos. Enquanto
no Brasil, cerca de 20% das mulheres
agredidas, vítimas de violência doméstica,
relatam terem sido vítimas de violência em pelo
menos 5 (cinco) vezes no decorrer de suas
PRECONCEITO
51
vidas. Isso é preocupante se observarmos o
impacto econômico que isso causa
socialmente. No mundo inteiro, os custos
sociais e econômicos da violência contra as
mulheres são enormes e têm efeito direto sobre
todas as classes sociais. Vítimas, as mulheres
sofrem vários tipos de incapacidade, sendo
transitórias ou permanentes em relação ao
trabalho, como: perda de salários, isolamento
social, falta de participação nas atividades
regulares, além de limitação da capacidade de
cuidar de si mesmas, dos filhos e de outros
membros de suas famílias;
Ainda falando sobre o Brasil, politicamente,
percebemos candidatos a cargos eletivos, de
grande importância, que tem discursos em
detrimento ao valor da mulher na sociedade, do
negro, índio e tantos outros, declarando
inclusive serem a favor de crimes de tortura e
extermínio de minorias.
Acrescidos a estes discursos, a coisa se
inflama, quando percebemos ainda que a
intolerância religiosa, com grupamentos
partidários e coligações que tentam impugnar a
prática de religiões evangélicas, coibindo a
existência e o direito religioso de outras
religiões é cada vez maior.
PRECONCEITO
52
Perceber que isso é considerado normal,
aceitável e plausível, com adesão a grande
parte da sociedade que se manifesta
euforicamente em favor dessas pessoas, nos
levam a perceber a importância da publicação
de obras como esta, que de alguma forma
possam fomentar a reflexão sobre a conduta
humana e sobre esses temas pelo mundo a
fora.
PRECONCEITO
53
TIPOS MAIS FREQUENTES DE
PRECONCEITO:
Preconceito Racial:
PRECONCEITO
54
Discriminação - Separar, reprimir, distinguir,
estabelecer diferenças, segregar; apartar,
separar pessoas consideradas diferentes;
PRECONCEITO
56
Para avaliar os indicadores da pesquisa, foram
entrevistados cerca de 15 mil pessoas em
ambos os sexos, os indicadores sinalizam, que
a diferença entre a vida dos brancos e de não
brancos é evidente no trabalho (71%), em
questões relacionadas à justiça e à polícia
(68,3%) e em relações sociais (65%).
PRECONCEITO
57
pela diferença de educação, oportunidade e
divisão de classes entre esses dois grupos.
O IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada, divulgou dados preocupantes. O
percentual de negros assassinados no Brasil, é
132% maior que os homicídios de pessoas
brancas; Com uma rápida pesquisa nos canais
de busca em internet, é possível observarmos
indicadores dos mais estarrecedores de
dezenas de instituições com grande
credibilidade. Economicamente falando,
daqueles que ganham menos de um salário
mínimo, cerca de 63% são negros/pardos e
34% são de cor branca. Dos brasileiros mais
abastados e economicamente estáveis,
apenas 11% são negros/pardos e 85% são
brancos.
No ano de 2000, ainda segundo dados
angariados pelo IPEA, cerca 93% dos
entrevistados reconheceram que
existe preconceito racial no Brasil, mas 87%
dos entrevistados afirmaram que mesmo assim
nunca sentiram tal discriminação. Isto indica
que os brasileiros reconhecem que há
desigualdade racial, mas o preconceito não é
uma questão atual, mas algo remanescente da
escravidão e período colonial. De acordo com
Um relatório divulgado pela ONU em 2014, o
Brasil ainda é um país absolutamente racista.
Com base em dados coletados no final do ano
de 2013, os indicadores apontavam, que os
PRECONCEITO
58
negros do país são os que mais são
assassinados, os que têm menor escolaridade,
menores salários, menor acesso ao sistema de
saúde e os que morrem mais cedo.
Além disso, também fazem parte do grupo
populacional, que mais está presente no
sistema prisional e o que menos ocupa postos
nos governos. Isto em diferentes escalas,
sejam municipais, estaduais ou federais.
Segundo o relatório, o desemprego entre os
afro-brasileiros é 50% superior ao restante da
sociedade, enquanto a renda é metade da
registrada entre a população branca.
Para quem acredita que tudo isso não passe de
dados irreais, as taxas que visam avaliar os
níveis de analfabetismo no Brasil, são duas
vezes superior ao registrado entre o restante
dos habitantes. Além disso, apesar de fazerem
parte de mais de 50% da população
(entre pretos e pardos), os negros
representam apenas 20% da produção
do produto interno bruto (PIB) do país.
Em grandes cidades, onde a diversidade
cultural (em tese), é maior, os índices de
violência e agressão contra pessoas negras,
principalmente em comunidades, bairros e
bolsões de pobreza, estes dados são ainda
mais assustadores. A violência policial contra
os negros e o racismo institucionalizado são
apontados em diversos relatórios oferecidos
PRECONCEITO
59
pelas Nações Unidas e são tema de
discussões a muitos anos.
A ONU- Organização das Nações Unidas,
declara explicitamente, que: "O uso da força e
da violência para o controle do crime passou a
ser aceito pela sociedade como um todo
porque é perpetuado contra um setor da
sociedade cujas vidas não são consideradas
como tão valiosas", obviamente, fruto do
preconceito, do valor e subjugamento que a
população negra sofre por todos esses anos.
Infelizmente, chamado mito, a: "democracia
racial" foi apontada por dezenas de
organizações internacionais, como um
impedimento para superar o racismo no país e
grave elemento dificultador pela conquista de
uma sociedade mais justa. Infelizmente, a
terminologia é frequentemente alvo de políticos
conservadores, que utilizando discursos de
efeito moral e em militância própria e partidária,
se aproveitam para desacreditar ações
afirmativas realizadas em todo país. A ONU
alerta em diferentes fóruns de discussão, que a
negação da sociedade brasileira, da existência
do racismo ainda continua sendo uma barreira
à Justiça, que se vê de mãos atadas diante do
problema que se agrava a cada dia, acrescido
de casos de extrema desigualdade e violência
em todo o país.
PRECONCEITO
60
Preconceito Social:
Preconceito Cultural:
PRECONCEITO
62
por parte de outros, de uma visão deturpada de
determinada cultura.
Preconceito Linguístico:
Preconceito Religioso:
PRECONCEITO
65
Ainda fruto do preconceito religioso, além de
intolerância religiosa, é possível observarmos
preconceito e julgamento depreciativo de
práticas dentro dos mesmos grupos que se
dividem internamente, adotando abordagens
pejorativas, discursos que menosprezam
adeptos as mesmas vertentes religiosas,
porém com origens e tradições distintas. O que
ao invés de valorização da cultura, pluralidade
e liberdade de crença, segrega, pune,
desempodera e principalmente: desune.
PRECONCEITO
66
religião não fosse mais usada para justificar a
violência.
PRECONCEITO
68
O que é identidade de gênero? É a forma
como a pessoa se vê. Na maioria das vezes, a
pessoa pode se identificar, com o sexo
biológico que nasceu, mas também existem
aqueles que nascem biologicamente com sexo
masculino, mas de identificam como sendo do
sexo feminino, ou vice e versa. Aqueles que se
identificam com o sexo biológico que
nasceram, são chamados: Cisgêneros.
Gênero fluido:
Pessoas que se identificam com aspectos
sociais de mais de um gênero em momentos
diversos de suas vidas, como em fases que ao
transcorrer, fazem sentido de uma forma ou de
outra, sentindo-se identificado como mulher, ou
na fase seguinte, identificado como homem,
por exemplo.
PRECONCEITO
71
toda a identidade de gênero que a pessoa tem,
ou apenas parte dela.
PRECONCEITO
73
Falando sobre homossexualidade, em
decorrência da absorção de conteúdo para
embasar a presente obra, se faz necessário
desmistificar algumas afirmações
preconceituosas, deixando claros alguns
posicionamentos a respeito deste tema. São
eles:
PRECONCEITO
74
diagnosticadas, por ser erroneamente,
considerado um transtorno mental.
PRECONCEITO
78
No Brasil a primeira parada gay, só foi realizada
em 1997. Essa demora, é facilmente
entendida, por todos os entraves políticos e
sociais que o país viveu, no período da ditadura
militar e suas consequências.
PRECONCEITO
80
A polêmica sobre o kit gay no Brasil:
PRECONCEITO
84
Sobre os temas que tangem ao preconceito
e permeiam os discursos sobre o
importante papel de transformação e o
grande valor da mulher na sociedade:
O preconceito e a discriminação,
historicamente, sempre foram as bases da
violência contra mulher, já que fazem parte de
um sistema sociohistórico, que as condicionou
a uma posição hierarquicamente inferior e sem
garantias dos mesmos direitos entre homens e
mulheres. Isso se torna cada vez mais
aparente, se observarmos a distinção de
políticas salariais e diferentes remunerações
entre homens e mulheres que ocupam os
mesmos cargos em milhares de empresas
espalhadas pelo mundo.
PRECONCEITO
86
Machismo – Obviamente, derivado da palavra
“macho”, se caracteriza pela supervalorização
das características, físicas, posturais,
comportamentais, culturais e masculinas,
atribuídas ao homem. É importante nos
atermos ao prisma, de que o machismo não é
apenas o preconceito que descrimina o
homem, mas nesse contexto, também os
homossexuais, metrossexuais e tudo aquilo
que se possa remeter ao universo feminino, de
forma pejorativa e com menor valor atribuído.
PRECONCEITO
87
Feminismo- É importante falar sobre o
feminismo, no sentido de afastar a confusão
que algumas pessoas fazem entre esta
terminologia, conforme citado anteriormente. É
um movimento filosófico, cultural, político,
empoderador, que visa garantir e equiparar
direitos iguais entre todos os sexos. Na
verdade, ao contrário do que se pensa, o
feminismo não tem oposto. Ainda que não seja
um tipo de preconceito, falar sobre este tema é
primordial, com a finalidade de afastar de vez
qualquer tipo de confusão que se possa fazer
nesse sentido.
PRECONCEITO
90
Preconceito quanto Aparência:
PRECONCEITO
95
Nesse sentido e olhando sobre o prisma
religioso, não podemos deixar de falar da
perseguição sofrida no Brasil, das religiões de
Matriz Africana, como Candomblé e Umbanda,
por alguns grupos evangélicos, impondo-lhes e
atribuindo-lhes posição também
menosprezada.
PRECONCEITO
98
O preconceito com relação a pessoas com
deficiência quase sempre, vem imbuído de um
profundo e velado sentimento de negação a
respeito da capacidade que o indivíduo possa
ter.
Neste contexto, a pessoa com deficiência de
locomoção é aquela que dará trabalho para se
adaptar e se locomover nos espaços comuns,
enquanto antagonicamente, os espaços
comuns não sejam em sua maioria adaptados
ou inclusivos de forma que se possa minorizar
as diferenças e possíveis dificuldades a esse
respeito. A pessoa com deficiência auditiva,
será sempre rotulada, como aquela que terá
dificuldade em ouvir e se comunicar e o mesmo
ocorre com a pessoa com deficiência visual.
Desta forma a sociedade, cada vez mais se
aproxima da negação, da exclusão e se afasta
da inclusão dessas pessoas, atribuindo-lhes
uma triste realidade separatista, marginalizada,
excludente e discriminada.
Em contrapartida, há ainda os que por
ignorância acreditam que a pessoa com
deficiência quer ou necessite de regalias, que
para a integração dessas pessoas no mercado
formal de trabalho e sua inclusão social, seja
necessário tratamento diferenciado, quando na
verdade o prisma deve ser outro. A mudança
PRECONCEITO
99
nas políticas de inclusão e atendimento não
são ferramentas de fomento a regalias ou
diferença e sim, na equiparação de
oportunidades, na garantia dos mesmos
direitos e em alternativas que possam
contribuir para uma vida com mais qualidade e
função social.
Preconceito contra Ex-presidiários:
Acredito que não seja novidade pra ninguém
que em muitos países do mundo, dentre eles,
infelizmente o Brasil, possuem um sistema
prisional falido, que ao invés de ressocializar as
pessoas que cometeram crimes e reinseri-los a
sociedade, os fazem viver realidades extremas
pela sobrevivência dos presídios, fazendo com
que saiam do sistema prisional, em situação
muito pior do que na época em que foram
presos e cometeram seus delitos.
O fato é que essa realidade não muda muito,
quando conseguem retornar ao convívio social
em liberdade. A falta de perspectiva e
possibilidade de ressocialização, deficiência de
formação e inserção no mercado formal de
trabalho, acompanhada de elos familiares
completamente enfraquecidos e do estigma do
preconceito por ser um ex-detento, não abre
muitas portas, gerando um efeito colateral em
massa, que cada vez mais só abre caminho
PRECONCEITO
100
para reincidência de práticas ilícitas,
fornecendo um número cada vez maior de mão
de obra para o crime, numa sociedade
excludente.
Deixar o passado de crimes pra trás, levar uma
vida honesta, se reinventar, apagando as
marcas do passado, num país como o Brasil,
vai muito além do que o que está escrito no
papel, ou das críticas de quem não sabe o que
é viver a realidade do sistema prisional
brasileiro. É fato de que todo aquele que pratica
algum tipo de crime, precisa pagar pelo que
cometeu. O intuito da presente obra, não tem
intenção alguma de aliviar, vitimizar ou
amenizar a prática ilícita de nenhum bandido,
assassino, ou seja lá o crime que se tenha
cometido. No entanto, depois de paga a sua
“dívida” com a sociedade, depois do
cumprimento da pena, com crime sentenciado,
julgado com punição devidamente cumprida,
não há caminho de volta.
Não há possibilidade de reconstrução. Não no
Brasil, sem uma boa parcela de sorte, fé e força
de vontade. Com a completa ausência de
políticas públicas eficazes de reinserção social,
se antes a sociedade era excludente, agora ela
é execrável e preconceituosa.
PRECONCEITO
101
Preconceito contra dependentes químicos
e/ou adictos e alcoólicos – Embora
considerada doença pela Organização Mundial
de saúde, a dependência é considerada
fraqueza de caráter, degradação moral e
normalmente dá origem a termos cada vez
mais pejorativo a suas vítimas. Critica-se,
aponta-se, faz-se piadas, chacotas, apelidos
chulos, sem critério, respeito, ou
contextualização da realidade que estas
pessoas enfrentam;
O preconceito e marginalização dessas
pessoas prejudica absurdamente o tratamento.
Além disso, há casos de negação, onde as
vítimas relutam em buscar ajuda, demorando
muito tempo para aderir aos tratamentos.
O preconceito também faz as famílias dessas
pessoas, reféns da vergonha, perante vizinhos,
parentes e amigos, quando precisam assumir
que vivem essa realidade.
PRECONCEITO
102
A diferença entre preconceito e estereótipo:
PRECONCEITO
104
Depoimentos vivenciais
PRECONCEITO
105
“Triste época! é mais fácil desintegrar
um átomo, do que um preconceito”.
(Albert Einstein)
PRECONCEITO
106
O dia em que aprendi que ser pobre e
estudar era motivo de agressão
– J.P.C. de Oliveira 28 anos
PRECONCEITO
111
Punida pela aparência
V.MS. -44 anos
PRECONCEITO
112
vivíamos, nas condições que tínhamos era
loucura sonhar com uma coisa assim...
Com o passar do tempo, meu corpo começou
a mudar, comecei a ter seios maiores, as
marcas de acne passaram a dar trégua e os
cabelos que viviam soltos por desleixo e
preguiça, na verdade pareciam adornar as
feições que começavam a desabrochar no
corpo que passava da transição de menina
para mulher.
Assim seguia meus dias, aplicada a minha
rotina, focada em meu propósito em estudar e
poder de alguma forma mudar a realidade em
que vivíamos, ajudando minha mãe e meu
irmão a terem uma condição melhor para nosso
sustento.
Tudo parecia correr bem, até que para minha
surpresa, no trajeto de casa para escola,
comecei a despertar o interesse dos “soldados
do tráfico”. Pessoas que viviam e trabalhavam
no tráfico do local onde eu morava. Mesmo
tentando me esquivar as coisas pareciam
piorar a cada dia. Recebia presentes em casa
e mesmo recusando, era assediada no trajeto
pra escola, tendo que mudar o caminho por
varias vezes, com a finalidade de passar
despercebida.
PRECONCEITO
113
O assédio era tanto, que passei a ser abordada
com ofertas das mais variadas, desde roupas,
dinheiro, tênis, relógios, celulares de ultima
geração e até cordões de ouro...
Infelizmente para meu azar, todo meu esforço
em fugir das investidas, parecia não surtir efeito
e quanto mais eu me esquivava, mais interesse
eu parecia despertar. Isso somando-se ao fato
de passar a maior parte do tempo sozinha, me
deixava cada vez mais vulnerável e
angustiada. O tempo foi passando e as coisas
piorando, até que eu passei a despertar a
atenção das mulheres que viviam do tráfico.
Meninas tão novas quanto eu, que mantinham
relacionamento com os traficantes e por sua
vez, temiam ser substituídas.
Passei a ter que fugir de vários problemas, da
violência do local onde eu morava, do interesse
dos traficantes que atuavam na localidade e do
preconceito que eu despertei nas meninas com
quem eles se relacionavam. Acompanhadas de
outras meninas, elas andavam pela
comunidade em grupos, ostentando jóias,
roupas caras e os mesmos telefones que eu
recusava.
Meses se passaram e com a adolescência,
minha vida parecia haver se tornado um
verdadeiro inferno. Mesmo caminhando a
PRECONCEITO
114
passos largos, tentando não ser percebida,
olhando fixamente para o chão, parecia que
tudo despertava o ódio dessas meninas em
relação a mim. Recebia ameaças, pedradas,
corria pelas vielas da localidade onde morava,
até que passei a ir cada vez menos a rua.
Passei a evitar sair de casa e ir menos a escola.
Meu sonho em me tornar médica, parecia cada
vez mais distante. Angustiada com a situação,
mas sem pode fazer muita coisa, minha mãe já
pensava em organizar (mesmo sem
condições), nossa mudança para outro lugar.
Em semana de provas na escola, eu não
poderia faltar, sem que isso me prejudicasse.
Já havia perdido tanto, perder um ano escolar
por ameaças seria mais um obstáculo em meu
caminho, até que decidi ir a escola. Aquele
talvez tenha sido o pior dia de minha vida. Na
volta pra casa, acabei encontrando três das
meninas que me perseguiam. Aos poucos, elas
começaram a gritar e fazer contato com outras
meninas pelo rádio que tinham preso a cintura
e dentro da comunidade, é símbolo de status e
poder.
Em poucos minutos eu já estava rodeada. Fui
cuspida, ganhei socos e pontapés nas costas,
puxões de cabelo e tapas no rosto, enquanto
algumas filmavam friamente com o celular nas
mãos. Tentei por várias fezes fugir, mas
PRECONCEITO
115
parecia impossível, até que uma delas, após
me bater sem piedade no rosto, grita para a
menina do lado e pede pra me imobilizar.
Presa no chão, meu cabelo era cortado pouco
a pouco, com cada mecha de cabelo que caía
em minhas pernas, eu sentia que parte de mim
ia embora. Talvez a inocência em achar que de
alguma forma eu poderia ter uma vida melhor,
ou a esperança de um dia mudar. Segundo os
gritos ao meu redor, eu estava pagando por
assediar o homem dos outros, por ser metida,
quando na verdade meu único pecado, era ter
sido diferente.
PRECONCEITO
116
Ora que melhora
P.P – 30 anos
PRECONCEITO
118
desejo e o verdadeiro eu, que se escondia
debaixo de tanto medo e preconceito.
Com o passar do tempo, fui me reprimindo
cada vez mais. Me tornei mestre na arte de
disfarçar a forma como eu era afeminado,
dando vazão a posturas, bordões e
comportamentos dignos de uma representação
televisiva, onde eu ensaiava todos os dias em
ser o machão e filho perfeito que toda família
evangélica deseja ter.
Chegada a adolescência, as cobranças por um
relacionamento dentro da religião começaram
a ocorrer. Evangélicos programam sua vida,
temendo aos ordenamentos da igreja muito
cedo. É comum, percebermos pessoas que se
casam com a primeira namorada e já investem
em noivados com as pessoas que conhecem
dentro da própria igreja. Talvez seja uma forma
de responder aos anseios do corpo e da idade,
sem que se torne uma pessoa promíscua ou
com comportamento reprovável pela igreja e
seus pastores.
Assim, tudo ia bem, evangélicos dificilmente
fazem sexo antes do casamento. Pelo menos
não de forma declarada. Há quem faça, e
muito, mas não revelam isso ou deixam que
isso seja descoberto. É preciso manter as
aparências de uma vida santa e aprovada pelo
PRECONCEITO
119
que pregamos. A moral, ainda que coletiva,
deve ser preservada acima de tudo, com isso,
as aparências se englobam nesse contexto.
Tudo corria bem, enquanto não havia sexo
envolvido. Eu e minha namorada, nos
tornamos noivos, éramos a resposta para tudo
aquilo que nossa igreja pregava. Ela com
sonhos de uma vida a dois, submissa ao
marido e eu, o varão que toda família espera
ter, sem que ninguém fizesse ideia de quanto
“pecado” existia dentro de mim.
Sempre achei que isso era coisa do diabo, ou
do inimigo, como dizem. Perdi as contas das
noites em claro, sob vigília e oração, pedindo a
Deus que afastasse de mim, quem eu
realmente era.
Enfim, o grande dia chegou. Me casei sob os
mandamentos de minha igreja, me tornei um
homem respeitado dentro de minha
comunidade. Era um soldado de cristo, um
bravo escudeiro de minha igreja, pregando
tudo que ela acredita como verdade absoluta.
PRECONCEITO
122
Ao mesmo tempo que isso aconteceu, caímos
em negação. No caminho de volta e nos dias
que se passaram a seguir não comentamos o
ocorrido e evitávamos ficar a sós.
Infelizmente, aqueles foram os piores dias das
vidas das pessoas que eu perseguia. Eu era
capaz de praticar atos cada vez mais cruéis,
expondo, humilhando e perseguindo a todos os
homossexuais que cruzavam meu caminho.
Embora essas sejam atitudes reprováveis, as
pessoas da minha igreja e os pastores que nos
conduziam, me consideravam como uma figura
exemplar. Eu só estava zelando pelos
ensinamentos e pela ordem em nossa
comunidade.
O tempo passou e outros encontros, ainda que
furtivos com outros homens acabaram
acontecendo. Embora eu os justificasse em
meu interior que isso era obra de satanás e
passasse noites em claro orando e dias
jejuando, o fato é que eu não podia conter isso
por muito tempo. Quanto mais tempo eu
reprimia, mais necessários, se tornavam esses
encontros.
O tempo passou, eu e minha esposa tivemos
dois filhos, me adonei das responsabilidade e
dificuldades que a vida apresentava, até que fui
PRECONCEITO
123
pego em pecado por um grupo de irmãos de
minha igreja.
Meus pastores e os mais próximos queriam
deixar o ocorrido em sigilo e culpavam o
demônio pelos meus atos. Afinal, tirar o peso
de quem eu era dos meus ombros e depositá-
los sobre o colo do demônio seria mais fácil.
Infelizmente, um dos homossexuais que eu
tanto perseguia, durante todos esses anos,
fazia parte do mesmo grupo e acabou tornando
público o que havia ocorrido. Passei de homem
respeitável a pecador em apenas um dia.
Tentamos de tudo. Desde encenações onde eu
acreditava estar endemoniado, me
contorcendo nos salões das igrejas a sessões
de oração por horas a fio.
Aquela altura, a depressão já havia feito parte
de mim e eu não tinha mais forças pra lutar
contra quem eu era. Decidi procurar ajuda
psicológica e hoje sou assumidamente gay.
Aprendi que isso não é uma escolha. Não se
pode escolher o que você é ou a forma como
você nasce, mas se pode escolher a forma
como nós administramos isso, sem causar mal
e sofrimento ao outro.
Minha família e meus filhos não falam comigo.
Fui banido, execrado... talvez seja de alguma
PRECONCEITO
124
forma reflexo de todo mal que eu causei a
tantas pessoas em nome da minha crença e
religião. Antes eu orava pra mudar, hoje eu oro
para que as pessoas que eu amo, mudem.
PRECONCEITO
125
Um dia da caça e outro do caçador
P. Meireles - 20 anos
PRECONCEITO
129
Sem que eu pudesse perceber e tivesse real
noção do que estava acontecendo, vi uma
senhora franzina, magra, de cabelos grisalhos,
cansada de um dia desgastante de trabalho se
transformar numa justiceira, digna de histórias
em quadrinhos. Essa pessoa era minha mãe.
Ela se levantou e aos gritos, discursava e
chamava atenção de todas as pessoas ao
redor, que nos acompanhavam na viagem,
expondo e repelindo a agressão que eu nem
sabia que estava sofrendo.
Aplaudida pela maioria das pessoas ao nosso
redor e apoiada pelo motorista que ordenava
que os rapazes descessem, caso contrário iria
chamar a polícia, os rapazes se viram
obrigados a descer do ônibus em silêncio.
Acho que nunca vou me esquecer desse dia. A
lição que levo comigo, é que: Nunca ameace
agredir alguém na rua, você não sabe se ele é
na verdade filho de uma heroína”.
PRECONCEITO
130
Diagnosticado pelo preconceito
A.C.L- 30 anos
PRECONCEITO
131
admiração e carinho, pautada pelo exercício
diário se por no lugar de outra pessoa.
Infelizmente, passivos diante dos problemas da
vida humana e cotidiana, descobri algumas
traições e com isso, percebi que de uma hora
pra outra, a pessoa com quem havia construído
tanto, amadurecido e vivido, talvez nunca
tivesse existido da forma que eu imaginava.
Isso com toda certeza me desestruturou
emocionalmente, o que àquela altura era
compreensível. Desta forma, não havia outro
caminho, senão seguir em frente.
Lamentavelmente nos separamos. Cada um foi
pro seu lado e com o término, resolvi retornar
para a casa dos meus pais. A separação
realmente foi algo muito doloroso. Com a
separação, a pessoa com quem me relacionei,
cometeu atos abomináveis, fazia questão de
obtenção vantagens financeiras das formas
mais inescrupulosas, o que acabei cedendo,
querendo me desprender daquela situação.
Perdendo por um lado, mas ganhando a
liberdade, entendi que precisava me
reconstruir, me reinventar, procurar um rumo
sólido, que de alguma forma me desse
condições de ser outra pessoa.
Agora, menos vulnerável, menos inocente.
Havia sepultado ali de uma vez por todas, o
PRECONCEITO
132
mundo cor de rosa que eu ainda acreditava que
pudesse existir.
Meses se passaram e quando tudo parecia
estar bem, adoeci gravemente. Sentia-me
fraco, sem explicação, não conseguia fazer
absolutamente nada. Manchas surgiram pelo
meu corpo inteiro.
Começava ali minha peregrinação por médicos
e exames sem fim, tentando entender o que
estava acontecendo. Não demorou muito, até
que pudesse ter acesso ao diagnóstico. Tinha
sido infectado pelo vírus HIV.
Acho que ninguém consegue receber uma
notícia dessas com tranquilidade. Milhões de
coisas passam pela cabeça da gente, mas no
fundo, eu só pensava nas pessoas que eu
amava e no quanto eu gostaria de protege-los,
no quanto eu não queria que sofressem por
mim. Tentei de todas as formas manter
segredo, mas dado ao meu estado de saúde,
um dos médicos que me atendeu, que na
época era próximo a minha família e revelou
meu diagnostico sem meu consentimento.
Sei que o que ele havia feito era crime, mas
aquela altura, eu não importava com nada
disso. Eu só queria passar por essa situação da
melhor forma possível e planejar algum tipo de
acalento para as pessoas que eu amava.
PRECONCEITO
133
Afinal, na minha mente, meu enterro já estava
marcado para alguns meses à frente.
A notícia se espalhou como um verdadeiro
rastro de pólvora entre minha família, sem que
eu pudesse conter. Com isso, pude presenciar
dezenas de reações diferentes. Tristeza, medo,
repulsa, raiva e infelizmente, preconceito.
Muito preconceito. Ouvia sussurros e assuntos
ao meu redor, sem que eles soubessem, com
coisas do tipo: “Vamos lavar as roupas
separadas”, ou ainda: “Posso beber no mesmo
copo?”.
Cheguei ao cúmulo de passar por críticas de
pessoas próximas, entre elas uma conversa
entre minha irmã e meu cunhado, que não se
atentaram ao fato de que eu havia sido
contaminado dentro de um relacionamento
estável, com alguém que me traia sem
preservativo. Na conversa, eles me julgavam,
sem saber que eu os ouvia no cômodo ao lado,
levantando hipóteses através da máxima:
“Imagine o que ele não fez pra ter se
contaminado?”
Como misto de sentimentos e bombardeios
que sofri, me concentrei no tratamento e
emocionalmente, fui me fechando, levava uma
vida normal, mas ninguém sabia o quão ferido
eu estava por dentro e nem o que passava pela
PRECONCEITO
134
minha cabeça. Só quem passa pelo tratamento
das toxinas que todo o paciente de HIV precisa
tomar todos os dias, sabe o quanto é difícil. O
medo, a revolta, a dor pelo que havia ocorrido,
a angústia nunca mais foram embora. Ainda
assim, com o passar dos meses e com o
tratamento, a doença estabilizou, até que de
uma hora pra outra, fiquei indetectável.
Começava ali a reconstrução da minha saúde.
Com a divulgação do meu diagnóstico pelo
médico, sem meu consentimento, imaginei que
por uma questão de preservação, tudo
pudesse ficar entre as pessoas mais próximas,
mas isso não ocorreu. A verdade é que eu não
gostaria de ficar dando explicação ou sendo
apontado, passar pelas chancelas que você
precisa passar quando é diagnosticado por
uma doença sexualmente transmissível.
Tendenciosamente, as pessoas acham que
você fazia parte de algum tipo de clube de
promiscuidade, onde se justifica ser infectado
por algo assim.
Sem que eu pudesse escolher, minha mãe,
talvez por fragilidade, tornou meu diagnóstico
público para seu ciclo de amigos. Naquele
momento eu percebi que entrara em mais um
ciclo de punição e expiação. Tentando passar
por aquilo da melhor forma possível, tentei
PRECONCEITO
135
cada vez mais me focar no tratamento. Quanto
mais difícil a recuperação e o uso das toxinas,
mais eu cumpria os horários até que a
indetecção do vírus no meu corpo também
estabilizou.
Comecei a ter uma vida normal. Voltei a sair
com amigos, participar de festas, ter uma vida
social ativa e caminhar ladeira acima de onde
eu havia caído. Talvez numa tentativa de me
reconstruir mais uma vez. No entanto,
enquanto fisicamente tudo parecia estar bem,
emocionalmente eu estava destruído. O
sofrimento era silencioso, como uma navalha
que corta a gente todos os dias e você faz o
maior de todos os esforços para que não
percebam o quanto você grita e chora por
dentro.
Milhares de coisas passavam pela minha
cabeça. Boas e ruins, receios, angustias e
decepções. Parecia que enquanto eu tentava
buscar alternativas pra acalentar as pessoas
que eu amava, me recuperando com rapidez,
elas não viam o que eu estava vivendo. Não
lhes era possível se colocar em meu lugar.
O tempo passou e em meio a essa triste
jornada, perdi meus avós. A verdade é que
todas essas bombas emocionais pareciam
eclodir sem fim dentro de mim e todos os dias
PRECONCEITO
136
eu abria os olhos, pedindo a Deus que fizesse
a dor parar.
Acho que até hoje ninguém sabe o quanto eu
sofri. Nunca havia falado disso pra ninguém tão
abertamente, quanto agora nesse depoimento.
Alguns meses haviam se passado e com todo
o abalo emocional que eu estava vivendo, um
dia percebi que eu precisava me abrir com
alguém. Colocar uma parte do que eu estava
vivendo pra fora. Dos poucos amigos que me
restavam, uma delas, que era psicóloga
inclusive, me parecia o pontapé inicial pra que
eu pudesse procurar ajuda e tentar curar a
ferida que silenciosamente sangrava por
dentro.
Numa crise de choro, num momento de
fragilidade, contei a ela sobre o diagnóstico.
Sempre tentei ser um bom amigo, desses que
você realmente pode contar pra tudo o que
precisar. Mesmo tendo sido tão bom com ela,
aquela altura, já não esperava muita coisa do
ser humano. Imaginei que ela fosse me dar as
costas. Ao invés disso, ela fez o caminho
contrário. Se levantou em minha direção e me
abraçou. Até hoje eu paro e penso, que talvez
aquele tenha sido um dos melhores momentos
da minha vida.
PRECONCEITO
137
Ela disse que nada mudaria e que ela estaria
ali sempre, pro que eu precisasse. Me orientou
a buscar ajuda profissional e eu me senti
aliviado e comecei a ver que tinha jeito. Que
finalmente eu poderia reverter aquela dor.
Seria um longo caminho, mas ainda assim, um
rumo possível.
Algumas semanas se passaram e pra minha
surpresa, recebo uma mensagem no meu
celular. Era a namorada dessa amiga, dizendo
que minha amiga havia desabafado com ela a
respeito do meu diagnóstico e querendo
explicações das relações sexuais que eu havia
mantido anteriormente com um de seus
amigos. Mais uma vez, havia sido traído pelo
preconceito. Havia sido julgado
sorrateiramente e me via dando explicações de
uma relação passageira e realizada
obviamente com proteção.
Talvez a maioria das pessoas não entendam o
quanto isso é invasivo e humilhante, o quanto
foi dolorido e angustiante não poder me
defender. Dado o estado emocional que eu me
encontrava, lembro de termos discutido por
mensagens e estagnado contato.
Com isso, acabei me afastando de todo o ciclo
de amizades próximo a essa pessoa. Inclusive,
também fui criticado, virei pauta de resenhas e
PRECONCEITO
138
fui julgado, apontado e discriminado por muitos
deles.
O sofrimento foi muito grande, houve um longo
e difícil caminho a ser trilhado para que eu me
recuperasse do que eu havia sofrido, até que
percebi que a única pessoa capaz de me
preservar era eu mesmo.
Hoje, todas as pessoas que eu conto o que
houve, ficam estarrecidas, porque além de
maldade, houveram vários crimes relacionados
a tudo que eu vivi, mas a verdade é que já não
importa. Estou bem, sereno e dessa vez,
fortalecido.
O tempo passou, me recuperei emocional e
fisicamente, me tornei novamente estável e
independente. Conquistei minha vida, fiz novas
amizades, construí minha família, ascendi
profissionalmente. Acho que sou uma pessoa
de sorte. Busquei meu espaço, me casei e me
realizei em absolutamente tudo que eu
gostaria.
Os dias de sofrimento e preconceito, ficaram
pra trás. Na verdade, eu mal lembro...
Perdoei a todas essas pessoas e jamais farei
qualquer movimento judicial para reparação de
danos, embora não tenha esquecido. Com o
passar do tempo, é natural que a gente
PRECONCEITO
139
esqueça a dor, mas as cicatrizes, essas ficam
e te fazem evoluir. Quanto a eles, bem não sei
muita coisa. Acompanho quando publicam algo
nas redes sociais, tiram fotos dos pratos que
comem, de pacotes de viagens parceladas ou
me enviam currículos pedindo emprego.
PRECONCEITO
140
Preso pela intolerância religiosa, na porta
de um Banco:
J. F. M. – 33 anos
PRECONCEITO
141
claras, preservação e utilização de
paramentas, inclusive em locais púbicos.
Assim, cumprido o período de iniciação, eu
precisava aos poucos retomar a vida cotidiana
e meu trabalho.
Tudo parecia correr bem. Amanheci cedo e
disposto, fiz um pequeno lanche, realizei
minhas rezas aos meus orixás e fui ao banco.
Com tantos dias fora de casa, era necessário
pagar algumas contas.
Já na entrada do banco, haviam um grupo,
aparentemente de evangélicos, com panfletos
que faziam menção a salvação promovida por
seu Deus em suas igrejas.
Ao me avistar a distância, talvez pelas roupas
típicas que eu estivesse vestindo, uma senhora
educadamente veio em minha direção,
estendeu a mão e me ofereceu o papel. Eu
agradeci, timidamente, olhando para baixo, (o
que é natural durante o período de preceito,
pós iniciação) e continuei meu caminho, com a
finalidade de entrar no banco.
Ouvi rispidamente atrás de mim, uma
enxurrada de gritos, promovidos pela mesma
senhora que havia me oferecido tão
educadamente o papel. Desta vez, parecia
transtornada com a negativa para aceita-lo.
PRECONCEITO
142
Completamente fora de si e aos gritos de:
“queima satanás”, “sangue de Jesus tem
poder”, “em nome do sangue do cordeiro”, fingi
não ouvir e continuei meu caminho para entrar
no banco.
Já na entrada, depositei alguns objetos
pessoais antes de arriscar a entrada pela porta
para detecção de metais.
Ao entrar, percebi uma senhora caminhando na
direção oposta a minha, empurrando a porta,
que era giratória com grande violência,
desconsiderando que pudesse me machucar.
Logicamente, pela velocidade com que foi
girada, a porta travou.
Ficamos eu e a senhora presos na porta, como
um casal de hamisters, separados pelo vidro,
enquanto ela gritava: “Sai, sai, sai, sai do meu
caminho, eu ando com Jesus, satanás anda
sozinho.” Completamente sem reação e
desarvorado diante da vergonha que aquela
situação me causava, me encolhi, olhando para
a parte oposta ao vidro e esperei o segurança
destravar a porta, enquanto ela gritava cada
vez mais alto. O homem destravou, consegui
entrar no banco e lembro-me de ficar quieto,
olhando pra baixo, com vergonha de olhar para
os lados e perceber que o banco inteiro me
avaliava, depois da vergonha que aquela
PRECONCEITO
143
senhora me expôs. Até hoje não entendo o
porque ela fez aquilo comigo. Sabe qual foi
meu crime? Exercer meu direito à liberdade
religiosa, num país intolerante, que se
denomina laico apenas no papel.
PRECONCEITO
144
Deficientes auditivos que entendem bem o
que é viver no Brasil. –
J. L. S- 26 anos
PRECONCEITO
145
rapaz que me atendeu na imobiliária, um
encontro para assinatura do termo de vistoria
do imóvel.
O dono do imóvel compareceu com o rapaz da
imobiliária, afim de acompanhar a assinatura.
Enquanto ele andava pelo imóvel,
acompanhado do irmão e do rapaz que havia
sido intermediário na locação, eu percebia que
eles estavam rindo enquanto meus pais
acompanhavam a vistoria.
Nesse momento, percebi o comentário em
meio aos risos: “ainda bem que são apenas
surdos, porque se fossem cegos, a vistoria
seria feita em braile”. Em meio as risadas sem
fim, achei aquilo tão grosseiro, que mesmo
sendo mulher, num país machista,
acompanhada apenas dos meus pais, um casal
de idosos, não me contive. Chamei a polícia e
fui até a delegacia local. Registrei um boletim
de ocorrência e hoje movo uma ação contra
todos eles. Pode ser que não resulte em
absolutamente nada, mas o fato é que eu não
poderia ficar inerte diante daquilo que eu
presenciei. Não posso me calar, diante das
atrocidades que várias pessoas com
deficiência são vítimas todos os dias.
PRECONCEITO
146
Aprendi desde cedo que é quase um crime
ser negro.
J. M.N – 47 anos
PRECONCEITO
150
Baleado pela Homofobia, na Parada Gay de
Copacabana
D.I.M – 27 anos
Pouca gente entende, mas a parada gay, não
é só um carnaval fora de época, é um evento
de celebração, onde só por acontecer, se torna
um ato político, representativo, de resistência e
afirmação. É realmente um símbolo de orgulho,
no país que mais mata homossexuais no
mundo, onde jovens tiram suas vidas,
contaminados por ideias de: “cura gay”, não
aceitação e repressão, seja por preconceito,
questões religiosas ou meramente por ações
discriminatórias.
Poder participar de um evento desses, é
mostrar a sociedade, que não importam as
bancadas religiosas, ou motivos de opressão
que somos obrigados a conviver todos os dias.
Nós existimos e sim, a sociedade é diversa.
Fazemos parte dela.
Lembro dos meus amigos cantando os “hits” da
época e planejando a roupa que usariam no dia
do evento. É comum acompanharmos nas
redes sociais e ficar empolgados com tudo que
o evento oferece, comentando em grupos e
trocando todo tipo de informação e curiosidade
a respeito das atrações.
PRECONCEITO
151
Saí cedo de casa, com a melhor roupa que eu
tinha. Calça e tênis novo, óculos escuros,
celular no bolso e cheiroso, muito cheiroso.
O evento foi tudo que eu esperava. Me diverti
demais. Encontrei muita gente, revi amigos que
não via a algum tempo, troquei telefone,
marquei Chopp, dancei e ri muito. Talvez tenha
sido um dos melhores eventos que eu tenha
participado.
Depois desses eventos de grande porte, é
natural que a multidão demore a se dispersar,
inclusive caminhando aos poucos pela orla,
indo para as boates próximas ou barezinhos.
Mesmo cansado, foi o que decidi fazer,
acompanhando alguns de meus amigos. Aos
poucos, o tênis novo machucava meus pés e
eu precisava encontrar um lugar pra sentar e
descansar o pouco.
Assim fizemos, caminhando até o Parque
Garota de Ipanema, onde encontrei um lugar
pra sentar e fiquei conversando com um de
meus amigos, enquanto o restante aproveitava
pra namorar, tocar telefones ou conversar
enquanto não íamos embora.
A essa altura, entardecendo, fomos
surpreendidos por militares armados com fuzis
que gritavam frases ofensivas, xingando as
PRECONCEITO
152
pessoas que estavam no local, com todo o tipo
de palavreado ofensivo. Sem entender direito o
que estava acontecendo, eu mal sabia que na
realidade, aqueles militares nem poderiam
estar ali. Afinal, o parque garota de Ipanema,
não era administrado pelo Forte de
Copacabana e os militares em questão,
estavam bem distantes de seus postos,
uniformizados, fora de seus horários de escala,
armados e praticando atos de violência e
homofobia, revistando, agredindo e intimidando
as pessoas presentes.
Com os pés doendo, eu permaneci onde
estava sentado, observando tudo o que
acontecia. A essa altura, muitos de meus
amigos, já agredidos, choravam pedindo pra ir
embora, com medo da violência que estavam
sofrendo.
Aos gritos de que “gays tinham que morrer”, os
militares conferiam as identidades das pessoas
que estavam presentes, enquanto puxavam
cabelos, davam socos, pontapés e tapas no
rosto.
Um dos meus amigos que estava me
acompanhando, estava sem identidade.
Apesar de já ter conferido meus documentos,
um dos militares me impediu de ir embora,
dizendo debochadamente: “você vai esperar
PRECONCEITO
153
seu namoradinho que está sem documento, ser
liberado”. A essa altura, em meio a agressões
físicas das mais variadas, grande parte das
pessoas ali presentes estava sendo liberada,
até que ficamos apenas nós dois. Eu e o rapaz
com o qual eu estava conversando e não tinha
documentos.
Com menos pessoas ao redor, os militares
começaram a pegar mais pesado, agredindo
com mais força e xingando o rapaz que estava
sem documentos. Sem possibilidade de
oferecer os documentos, os militares pediram o
telefone da casa do rapaz e começaram um
movimento de pressão psicológica,
ameaçando ligar para os parentes. Em
desespero, o rapaz se ajoelhou nos pés deles,
explicando que sua família não sabia de sua
homossexualidade, pedindo para que não
ligassem para seus parentes.
Até que o militar veio e minha direção, tentando
me puxar pela roupa, pedindo o telefone de
minha casa, alegando que fariam a mesma
coisa, ligando para meus parentes. Sem
problema algum, fornecei meu telefone, já que
minha família, sabia de minha
homossexualidade e aceitava sem nenhum
problema.
PRECONCEITO
154
A verdade é que eu não tinha motivo algum pra
temer aquele homem, afinal o que eu estava
fazendo de tão grave? Qual ato de ilegalidade
eu poderia estar cometendo pra enfurecer um
militar daquela forma e ser agredido, no que ele
poderia me prejudicar, falando a respeito de
minha homossexualidade, para minha família
que além de saber, aceitava?
Aos gritos e completamente enfurecido, o
homem pergunta: “Sua família sabe que você é
veado?”
Em meio ao choro e ao nervosismo do rapaz ao
meu lado, eu lembro de ter olhado bem nos
olhos dele e ter respondido:
- Sim, eles sabem e tem muito orgulho de mim.
Isso foi o suficiente pra ver o ódio nos olhos
daquele homem. Nesse momento ele
empunhou o fuzil, disse que eu era uma
vergonha para a sociedade, me empurrou no
chão e atirou contra minha barriga. Me levantou
pelo colarinho da camisa, sem que houvesse
possibilidade de defesa, me deu um chute por
trás e gritou: “vaza”.
Aquela altura, com o calor do corpo eu não
havia percebido que estava ferido, me dando
conta do que havia acontecido apenas alguns
PRECONCEITO
155
momentos depois, quando o sangue escorria
pelas minhas roupas sem trégua.
O fato é que isso tomou repercussão na mídia
no mundo inteiro, me lembro de ter sofrido
pressões das mais variadas, o exército se
manifestou negando que o disparo tivesse
ocorrido, o que foi comprovado após a perícia
no local e toda sorte de cuidados médicos e
internações que eu precisei me submeter.
A mídia, tentava explorar meu sofrimento, pra
vender notícia, além de tentar mudar a história,
argumentando que eu estivesse naquele local,
praticando sexo, ou algum tipo de ato
libidinoso; A verdade é que eu realmente não
estava, mas mesmo se estivesse, isso não é
motivo para justificar um tiro de fuzil na barriga
de alguém.
Minha família chegou a ser chantageada por
jornalistas que além de importunar,
ameaçavam não dar trégua e sossego, até que
pudéssemos falar a respeito.
Representantes do governo Estadual e
conhecidos militantes na causa LGBT, se
aproximaram tentando se autopromover, na
verdade militando em prol única e
exclusivamente de seus interesses.
PRECONCEITO
156
Testemunhas do caso foram ameaçados por
militares que os procuravam em suas casas,
tentando intimida-los, prejudicando as
investigações.
Meu agressor foi preso, mas hoje responde em
liberdade. Hoje eu vivo com medo pelo
preconceito que vivi injustamente e pelo receio
de perder a vida por ser homossexual e pelo
corporativismo militar, tão presente no Brasil.
PRECONCEITO
157
A difícil arte de ser mulher num ambiente
profissional:
M.C.R – 29 anos
PRECONCEITO
159
muito cansada, até que ele me convidou pra
beber alguma coisa e relaxar.
Ciente do que poderia vir a ocorrer e me
sentindo extremamente desconfortável, acabei
dando uma desculpa, justificando que
precisava ir pra casa. Tive receio de que aquela
situação fosse na verdade um caso de assédio
e não queria fazer parte disso.
Me rodeando com um olhar horrível, ele se
sentou, apoiando-se na mesa a minha frente e
disse:
- Você gosta de trabalhar aqui?
- Sim, gosto muito.
- Você sabe que por ser mulher, trabalhar na
posição em que trabalha é um voto de
confiança?
- Não. Sempre achei que fosse porque eu era
competente.
- Pois saiba que não é. Você trabalha numa
empresa com mais de mil funcionários, onde
boa parte deles são homens e gostariam de
estar no seu lugar.
- As pessoas desejam o melhor, independente
do sexo...
PRECONCEITO
160
- Pois é, mas sendo mulher, saiba que você tem
sorte na verdade. Assim, isso pode ser
retribuído de outras formas.
Percebi que estava acuada e que na verdade
estava sendo assediada. Acabei me
levantando, puxando o celular do bolso e
justificando que meu marido estava próximo
que precisava descer para encontra-lo, saindo
da sala.
Nos dias seguintes, evitava ficar depois do
horário, minhas roupas eram cada vez mais
discretas e falava com ele apenas o
necessário.
Os dias foram passando e infelizmente,
comecei a ser perseguida no ambiente de
trabalho. Minha vida profissional havia se
tornado um inferno. Ele via defeito em tudo, que
eu fazia e era supervisionada em
absolutamente todos os meus atos. O sonho de
ter uma carreira profissional sólida estava indo
pelo ralo.
Pouca gente sabe, mas quando uma mulher
denuncia um caso de assédio, isso parece ser
bom, porque combate a essas investidas, mas
na verdade, também funciona como uma
marca que persegue a mulher no seu ambiente
profissional.
PRECONCEITO
161
Você passa a ser vista como uma ameaça, os
homens que trabalham com você,
principalmente no ambiente empresarial, te
olham com receio e desvalor. A mulher
infelizmente é vista como objeto sexual e pra
grande maioria dos homens, ser mulher, é
sinônimo de estar disponível.
São ideias machistas e misóginas que
contribuem para a cultura do assédio sexual e
até estupro. Eu não tinha alternativa.
Completamente acuada, eu não tive outra
opção, senão abrir mão do meu trabalho,
conquistado depois de anos de investimento
em estudo. Acabei pedindo demissão e hoje,
infelizmente, estou a mais de um ano,
buscando um novo emprego, sendo sempre
preterida, quando disputo a vaga com um
homem, mesmo que ele não seja tão bem
preparado quanto eu.
PRECONCEITO
162
O sofrimento que o preconceito causa para
as famílias das vítimas:
João M. Souza – 46 anos
PRECONCEITO
163
desintoxicação. Será que essas pessoas já
foram realmente num hospital público?
Será que algum dia, suas vidas dependeram do
atendimento médico numa fila que dobra
quarteirões e quando muito, os deixava a
espera por dias num corredor de hospital com
falta até de algodão? Acredito que não.
Com o passar do tempo, meu pai que sempre
nos deu problemas e nos envergonhava diante
dos vizinhos, começou a usar drogas. As vezes
ele sumia por dias a fio. Eu até confesso, que
talvez seja horrível o que eu vou dizer, mas
quando ele sumia, eu me dividia entre a
preocupação com ele e o alívio por não ter ele
por perto. Eu tinha muita pena da minha mãe.
Além do sofrimento com a violência doméstica,
a gente mal tinha o que comer em casa. Meu
pai não tinha um emprego descente, éramos
pequenos, não tínhamos como fazer muita
coisa pra ajudar e minha mãe tinha muito medo
de perder a guarda dos filhos por conta de
denúncias de trabalho infantil ou coisas do tipo.
Ao contrário do que muita gente pensa, os
programas sociais, não são “coisa de
vagabundo”, como muita gente diz. Não fosse
o pouco que recebíamos, talvez não teríamos
o que comer, embora quase não desse pra
nada, ajudava e muito.
PRECONCEITO
164
O tempo foi passando, meu pai envelhecendo
e a saúde da minha mãe deixando de resistir a
tanto problema e tanta pobreza. Foi uma vida
de muito sacrifício e eu me emociono só de
lembrar em tudo que a gente passou.
Fui crescendo em meio a isso tudo e com tudo
que vivíamos, não pudemos fugir de ser
conhecidos no bairro, como os filhos do: “Zé da
pinga”. Ouvíamos coisas horríveis, com direito
a apelidos, além é claro do olhar de reprovação
dos vizinhos que se dividiam entre a pena e o
apontamento aos erros do meu pai.
As pessoas acham que a dependência é
realmente uma fraqueza de caráter e não uma
doença. Já ouvi de tudo, como: “usou agora
aguenta”, “usou porque quis”, “não tem Deus
no coração”, ou ainda: “Daqui a pouco vira
bandido”.
O fato é que, fui crescendo e precisei ajudar em
casa de alguma forma. Procurei emprego em
todo lugar que podia, mas infelizmente, o
estigma de ser filho do “Zé da pinga” me
perseguia por muito tempo. Pra nossa falta de
sorte, além de conhecidos no bairro, éramos de
uma cidade pequena, o que nos deixava ainda
mais expostos.
Sofri muito. Passei muita necessidade, muita
vergonha, pensei muitas vezes que eu era uma
PRECONCEITO
165
parte ruim da sociedade. Até na escola eu era
motivo de piada. Na adolescência a coisa só
piorou, o bullying era diário e viver com isso era
muito ruim. Eu me sentia o pior dos seres
humanos.
Na tentativa de ajudar em casa, percebi que eu
não encontraria oportunidade de emprego
onde eu morava, até que consegui emprego
numa cidade próxima. Abri mão do convívio
com minha mãe e vivia preocupado com ela,
porque não havia oportunidade onde eu
morava. Não sei explicar, mas acredito que as
pessoas tivessem receio de me dar uma
oportunidade por acreditarem que eu seria
como meu pai.
O dinheiro que eu ganhava não era lá grande
coisa, mas nos ajudou durante um bom tempo.
Minha mãe faleceu algum tempo depois e meu
pai, acabou perdendo contato conosco.
A vida passou, hoje tenho minha própria
família, mas as marcas do passado continuam
no meu peito. A única coisa que alivia em
pensar no passado, é que de alguma forma eu
tentei ser um bom filho pra minha mãe e até
mesmo pro meu pai. Ao contrário do que todos
ao redor acreditavam, provei que eu era um
homem bom, responsável e nunca bebi.
PRECONCEITO
166
A pérola que cresceu na lama e se tornou
uma jóia:
Pérola Negra – 27 anos
Me descobri como homossexual aos 8 anos de
idade. Morei numa cidade do interior com apoio
da minha avó, porque minha família não tinha
condições de sustentar a todos nós. Embora o
dinheiro da minha avó não desse para muita
coisa, eu sempre que podia ajudava.
Já fiz de tudo que você puder imaginar.
Trabalhei na roça cortei muita cana na minha
vida, mas sempre tive a cabeça erguida, com a
certeza de que eu fiz o que eu podia pra ajudar
as pessoas que eu amava. Nunca virei as
costas, nem para as pessoas que viraram as
costas para mim, quando eu mais precisei,
afinal, uma criança precisa sim de carinho, de
ajuda, de amparo em sua criação.
O tempo passou e eu fui crescendo com ideais
próprios e responsáveis. Talvez eu me sentisse
com a responsabilidade de ajudar em casa, de
ser provedor, de ajudar no que eu podia a
minha família.
O fato é que eu sempre fui afeminado. Hoje eu
sei e entendo, que é natural, que é normal, que
um menino antes de se tornar homem, passe
por fases de transição. Isso implica em
PRECONCEITO
167
alteração de voz, comportamentos e todo o tipo
de postura, mas antes eu nem fazia ideia de
que as coisas eram assim mesmo e confesso
que me sentia até com uma certa culpa.
Durante muito tempo, demorei pra encontrar o
eixo a respeito dessas questões ligadas a
postura. Existe muito preconceito, até nos dias
de hoje, quando a gente espera que diante de
tanta informação, as coisas sejam um pouco
mais leves.
Já perdi as contas dos amigos que apanhavam
por ser gays, dos amigos que perdi no decorrer
dos anos e sei bem o quanto é difícil sofrer
preconceito. É literalmente sofrer, ser punido
sem motivo. É deixar a lágrima cair do rosto,
sem certeza da culpa de absolutamente nada.
Me lembro de chegar do trabalho, cansado,
correr pra tomar banho e poder dormir e ganhar
um tapa no rosto do meu pai, sem motivo
algum. Talvez esse tenha sido um dos piores
momentos da minha vida. Além disso, era
comum ouvir frases do tipo: “Vira homem”,
“Gay tem que morrer”, “isso é falta de Deus”,
“procura a cura gay”, ou ainda: “devia ter
morrido ao invés de ser gay”.
Mesmo ajudando em casa, eu sofria
repressões por tudo. Desde coisas que eu
comia, a momentos em que eu simplesmente
PRECONCEITO
168
estava no mesmo ambiente que outras
pessoas da minha família. Foi muito difícil
passar por isso tudo e conseguir administrar o
peso emocional que essas coisas trazem pra
gente, é muito difícil.
Com o passar do tempo, eu percebi que meu
esforço para ajudar nas despesas de casa, na
verdade fazia mal ao meu próprio pai. Ele
parecia que não aceitava que um filho gay,
sustentasse a casa.
Demorei muito pra entender que eu não tinha
culpa de nada. Tentei de tudo, desde ajuda
religiosa a psicológica. Por mais que eu
brigasse, discutisse, eu achava que eu não
valia de muita coisa e que o problema estava
em mim. Com a maturidade, o entendimento
que o problema estava na forma
preconceituosa como o outro te enxerga
acabou chegando.
Hoje eu tenho orgulho de ser quem eu sou.
Tenho meu trabalho, faço shows travestido
como: “Drag Queen”, tenho uma religião que
não me condena pela minha orientação sexual,
sou do candomblé com muito orgulho e me
tornei um homem responsável, casado, amado
e feliz. Demorou muito, mas eu me considero
um vencedor.
PRECONCEITO
169
Ponderamentos a respeito do material
exposto através da presente obra:
PRECONCEITO
170
realidade, onde não lavemos nossas mãos
diante dessas questões, nem a deixemos sujas
pela mácula do preconceito.
Sigamos em frente nessa jornada, de mãos
dadas, rumo a um mundo melhor em combate
ao preconceito
PRECONCEITO
171
www.pescadordeideias.com.br
Envolva-se!
PRECONCEITO
172