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Niterói, 2019
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Niterói, 2019
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BANCA EXAMINADORA:
______________________________
Prof. Dr. Marcelo Badaró Mattos (UFF)
_______________________________
Prof. Dr. Marco Marques Pestana (INES)
_________________________________
Prof. Dr. Felipe Abranches Demier (UERJ)
___________________________________
Prof. Dr. Rafael Barros Vieira (UFF)
___________________________________
Profª. Drª. Virgínia Maria Gomes de Mattos Fontes (UFF)
5
Resumo
Essa tese tem como principal objeto as dissertações produzidas pelas três
Abstract
This research has as its object the theses produced by first three classes of the
chapters of Part 2 – New historians in Niterói, where it is introduced the theses and the
development”, we analyse the political and institutional dictatorial context and how it
The last part, “History of historiography”, intends to understand the theses of the
tensions.
Agradecimentos
Eduardo Daflon, Rafael Vieira, Fábio Frizzo, Paulo Jorge Campos e Larissa Viana. Na
UFF, ministrei uma disciplina sobre História da historiografia e tive com os graduandos
As pessoas que entrevistei, algumas dela abrindo as portas de suas casas para
mim, animaram muito essa pesquisa. Espero ter honrado sua história e suas memórias,
ainda que isso possa significar não estar de acordo com elas. Agradeço também os
gestos de Richard Graham, que teve o cuidado de me enviar pelo correio alguns
O Badaró, meu orientador, me causou desespero com as críticas que fazia aos
meus textos, mas foi um estímulo constante com sua inteligência e seu exemplo de
qualificação e defesa: Sonia Mendonça, Rafael Vieira, Virgínia Fontes, Felipe Demier,
Muito dessa tese veio da conversa e da biblioteca da Ludmila, e também por isso
Sumário
Introdução.....13
Considerações finais...416
Bibliografia.....421
Dissertações.....438
Entrevistas.....447
Outras fontes.....447
13
Introdução
posições nos espaços de poder institucionais, sua busca por prestígio, a relação do seu
campo com o campo político, etc., fere uma espécie de imagem oficial sobre o fazer
aqui com a compreensão teórica que entende ser a “cultura política” uma chave
cursos de História1 do Rio de Janeiro, desde os anos 1930, salientando sua heteronomia,
1
A polissêmica palavra “história” é grafada de duas formas diferentes nessa tese: quando referente à
disciplina ou produção científica, usamos a inicial maiúscula. Quando similar a passado, com minúscula.
14
História da UFF, e esta universidade de uma forma geral, foi um ambiente à parte, ou
curso. São elementos atravessados por disputas à época, mas também hoje, com
memórias divergentes sobre eles – o que também se torna tema de nossa reflexão.
delas. Esse número corresponde ao produzido pelas três primeiras turmas do curso (as
outras cinco pesquisas concluídas no período pertencem ao quarto grupo, fora de nosso
escopo). A nossa “parte 2” dedica cada um de seus capítulos a uma turma diferente e
seus trabalhos. Não se trata de uma divisão meramente formal, mas uma que ajuda a
evidenciar que nesses primeiros anos do curso, com uma alta rotatividade de docentes,
influências também distintas sobre sua produção historiográfica. Estes capítulos (que
sobre a influência de certo autor ou certa corrente) - e a nossa pesquisa, como se verá,
detectou incorreções nesse sentido2. É importante também para que não se pense a
2
A falta de embasamento empírico de trabalhos sobre história da historiografia com consequentes erros
15
partir dos dados levantados, que História foi contada pelos mestrandos da UFF, e pensar
brasileira. Por fim, são apreciadas posições políticas expressas nos escritos.
de análise já foi notada por MALERBA, Jurandir. “Em busca de um conceito de historiografia. Elementos
para uma discussão” IN: Varia Historia. n. 27, julho de 2002.
16
“Dois peixinhos estão nadando e cruzam com um peixe mais velho que
vem nadando no sentido contrário, que os cumprimenta dizendo: “Bom dia, meninos.
Como está a água?” Os dois peixinhos continuam nadando por mais algum
tempo, até que um deles olha para o outro e pergunta: “Água? Que diabo é isso?”.
(David Foster Wallace, “Isto é água”3)
formas de se compreender uma história das ideias, como são a história da ciência, da
ciência dessa forma é, segundo Bourdieu, Thomas Kuhn, para quem um paradigma se
texto seria “o alfa e o ômega” da leitura para fora da qual não há nada mais para ser
uma vez que não seria proveitoso ou mesmo possível empreender reflexão que associe o
3
WALLACE, David Foster. Ficando longe do fato de já estar meio que longe de tudo. Rio de Janeiro:
Companhia das Letras, 2012.
4
BOURDIEU, Pierre. Os usos sociais da ciência. Por uma sociologia clínica do campo científico. São
Paulo. Editora UNESP, 2004.
5
BOURDIEU, Pierre. “O campo científico” IN: ORTIZ, Renato (org.). Bourdieu – Sociologia. São Paulo:
Ática, 1983.
6
Sobre os pós-modernistas,“Esquematizo um pouco. Mas bem pouco.” BOURDIEU, Pierre. Os usos...p.
19.
7
ANKERSMIT, Frank. “Historiografia e pós-modernismo” IN: Topoi. Rio de Janeiro, março de 2011.
17
interessados (…) sobre como se relacionam ciência e sociedade.” 8. Seu foco, pela
científica em si”, pois “...a ciência e a informação são objetos de estudo independentes,
que obedecem às suas próprias leis”10. Dessa forma, o principal em uma análise sobre a
historiografia deve ser sua estética, seu estilo – e apenas assim o debate na História
Uma leitura idealista não necessariamente se apresentará sob forma tão radical,
explícita e autoconscientemente negando na sua teoria, seja por que motivo, contextos
idealismo pode se dar como forma de escamoteamento dos jogos de dominação de que
veicula uma visão irenista sobre a produção e o desenvolvimento das ideias – algo,
aliás, fundamental para o poder dos intelectuais dominantes12. Porém, se não quisermos
fazer denúncia, podemos também apontar que o idealismo se impõe quando tão
intelectual com outros elementos da vida social, pode-se resultar por exemplo, que as
referência dos historiadores simplesmente porque nos anos oitenta alguns foram
economia por parte dos historiadores estaria ligada à crise de 1929 que evidenciou
13
HOBSBAWN, Eric. “A história progrediu?” IN: Sobre História. São Paulo: Companhia das Letras,
1998.
14
BATALHA, Claudio, “A historiografia da classe operária no Brasil: trajetórias e tendências”, in
FREITAS, Marcos Cezar (org.), Historiografia brasileira em perspectiva,. São Paulo: Contexto, 2001.
15
DOSSE, François. A História em migalhas. Dos Annales à Nova História. Bauru: EDUSC, 2003.
19
seu tempo16; a queda do muro de Berlim e o fim da URSS seriam eventos sintomáticos
perde expressão17.
Mas não se trata de supor uma dicotomia entre idealismo e contextualismo, que foi
tradição intelectual. Entender que elementos do mundo social são determinantes das
História da Federal Fluminense ter sido criado durante a ditadura empresarial-militar lhe
mestra com a qual se abre todas as portas explicativas sobre as 51 dissertações, ou supor
capaz de revelar seu real significado como um derivado produto histórico. Antes, a
nossa muito pedestre proposta, a ser desenvolvida principalmente neste capítulo, mas
rejeita o que chama de Estado-Sujeito, que é aquele que teria sua vontade como
Estado, supondo-o instância que paira sobre o que abaixo seria a sociedade, uma
atuação viriam de dentro do próprio Estado que manteria sempre uma relação de
reduzido a uma classe ou grupo (a considerar o nosso caso, seriam, como queiram,
da sociedade civil, faz entender que as diferentes reproduções históricas do Estado são
19
GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere. Volume 3. Civilização Brasileira. Rio de Janeiro, 2000.
20
POULANTZAS, Nicos. O Estado, o poder, o socialismo. São Paulo: Paz e Terra, 2000.
21
permeadas de lutas políticas. Ou seja, esses embates não são posteriores ou externos ao
Estado, mas o permeiam e lhe são estruturantes. Entender teoricamente que o Estado
à leitura que ressalta o caráter burguês do golpe de 196423. Na esfera que nos interessa
Antônio Cunha, não seria nem mesmo adequado, com alguma exceção, chamar de
das estatais e que fez, de 1964 a 1984, as matrículas do ensino superior público caírem
de 75% para 25% do total nacional 25. A ditadura também continuamente propôs o
segundo Cunha, o movimento estudantil era mais frágil. Mas o ponto que mais nos
interessa - pela sua repercussão científica dentro da universidade pública e por melhor
ensino superior por um outro que levasse em conta a demanda dos três setores da
demandada pelo capital no que “...toda ênfase foi dada aos cursos de ciências (exatas?)
e de tecnologia, bem como de ciências econômicas, nas quais se ensinava uma das
órgão empresarial de grande atuação no golpe e nos governos militares 28. E também a
enorme participação dos EUA na formulação da reforma, o que nos remete à relação
25
CUNHA, Luiz Antônio & GÓES, Moacyr. O golpe na educação. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985.
p.49.
26
LEHER, Roberto. “Ditadura de 1964: uma universidade para o capitalismo dependente.” IN: IASI,
Mauro & COUTINHO, Eduardo Granja. (orgs.) Ecos do golpe. A persistência da ditadura 50 anos
depois. Rio de Janeiro: Mórula, 2014.
27
CUNHA, Luiz Antônio. A universidade reformanda. O golpe de 1964 e a modernização do ensino
superior. São Paulo: Editora Unesp, 2007 p. 67-8; 90; 287.
28
SOUZA, Maria Inez Salgado. Os empresários e a educação. O Ipes e a política educacional após
1964. Editora Vozes, 1981.
23
“segurança”. Para concretizar seus planos, não apenas para a universidade, mas também
para o país, precisaram lançar mão de uma violenta repressão e da criação de uma
estrutura centralizada e autoritária que implicava forte controle sobre reitorias, cargos de
podem ser apreciados quando se analisa, por exemplo, o fim do regime de cátedras
damos conta apenas, com as referências trazidas até aqui, de sentidos gerais da
construída na ditadura foi disputada por outras forças sociais com demandas e
29
PEREIRA, Ludmila. Nenhuma ilha da liberdade: vigilância, controle e repressão na Universidade
Federal Fluminense (1964-1987). Tese de Doutorado. UFF, 2016.
30
LEHER, Roberto. “Ditadura de 1964: uma universidade...” p. 137 e 138.
24
entre outros. Essa situação gera resultados como a contratação e a atuação de marxistas
professores que pouco tempo atrás haviam sido expulsos por motivos políticos ou mais
nacional e que em alguma medida poderiam até contribuir para a crítica do regime. São
que passem ao largo dos principais interesses do grupo no poder. Nas palavras de
Poulantzas,
“caóticos”. Em um extenso estudo, Rodrigo Motta enfrenta essa questão, que procura
31
POULANTZAS, Nico. O Estado... p. 137.
32
MOTTA, Rodrigo. As universidades... p. 13.
33
Idem. Ibidem. p. 12.
25
regime militar, essa cultura política teria se expressado como tendência à conciliação e à
acomodação, sendo assim estratégia utilizada para evitar conflitos agudos, além de ser
fidelidades pessoais34. Sem este conceito, diz Motta, iam nos parecer caóticos e
definições rígidas e a repulsa aos conflitos.36 “Cultura política” seria a grande síntese
rejeição da “cultura política” como eixo explicativo. Isto não porque cultura deva
ela está inserida e pretende explicar, conforme já observado por Ludmila Pereira em sua
apreciação do autor38.
34
Idem. Ibidem. p. 13.
35
Idem. Ibidem. p. 15.
36
Idem. Ibidem. p. 291-2.
37
Idem. Ibidem. p. 14.
38
PEREIRA, Ludmila. Nenhuma ilha...p. 18.
26
brutalidade? Um regime que se impôs pelas armas, que prendeu e torturou desde o dia
Motta não nega factualmente a violência e seu trabalho é uma grande referência
para conhecê-la, mas teoricamente ele a entende como algo que aconteceu em paralelo
aos “jogos de acomodação”, o que nos conduz a uma leitura contempladora de uma
suposta complexidade dos expedientes do poder: ora permissivo, ora repressivo. O erro
aqui nos parece ser desvalorizar a violência enquanto marca constituidora da relação
política dentro da instituição: ou seja, não deve ser o caso pensar que a repressão
ocorreu quando não houve a “conciliação” e a “flexibilidade” (ou vice-versa), mas que
vários momentos de seu texto, Motta se antecipa a críticas que poderiam lhe chegar
colocando que não pretende defender a ditadura nem “atenuar as violências” 39. Muito
apontar uma maior quantidade de repressão, mas de ajustar a compreensão teórica sobre
Como também já apontado por Pereira, a análise factual de Motta depõe contra o
seu postulado teórico: com elementos do seu próprio livro podemos perceber que
recusa aos conflitos, mas porque simplesmente se precisava deles para que a
aponta ser essa tolerância de poderosos traço tradicional já há muito inscrito na cultura
política nacional. Porém, ato contínuo, Motta nos traz as evidências não culturalistas
conforme nos explica o mesmo Motta, devemos interpretar esse expediente mais terrena
40
“Pela ótica do Estado, como se mostrou, a explicação era sobretudo o interesse em aproveitar pessoas
competentes, e em segundo plano a estratégia fomentada por alguns líderes do governo de reduzir a
oposição dos intelectuais”. Idem. Ibidem, p. 322.
41
“Pode-se dizer que essa prática [manter intelectuais de esquerda nos empregos] já possuía tradição no
país e estava inscrita em certos traços de sua cultura política. A tolerância pode ser atribuída a puro
pragmatismo, ou seja, era vantajoso manter nos cargos essas pessoas por sua competência profissional.
Mais ainda: em certas áreas acadêmicas, nos anos 1970, sobretudo nas ciências sociais e humanas, era
difícil encontrar profissionais sem algum tipo de registro politicamente comprometedor, fosse militância
efetiva em grupos de esquerda, fosse participação em protestos e passeatas. E isso parecia mais
verdadeiro no estrato de intelectuais mais talentosos e competentes. Por outro lado, essas decisões eram
tomadas com base em arranjos que colocavam o compromisso pessoal acima das ideias e dos valores
políticos (tema a ser retomado no próximo capítulo). Naturalmente, o compromisso tácito só funcionava
enquanto o “comunista” em questão mantivesse atuação discreta, sem chamar atenção para suas ideias
e em especial sem questionar o chefe, sob pena de perder a proteção.” Idem. Ibidem. p. 269.
28
legitimidade e dosar a ação repressiva era não uma forma de suspender o domínio, mas
algo essencial para efetivá-lo: não seria sustentável ao poder ditatorial a multiplicação
de casos como os da UNB em que 80% do seu corpo docente (223 professores) pediram
docentes do curso foram expulsos, com outros dois tendo pedido demissão 44. Por parte
dos próprios agentes da coerção havia a leitura de que muita repressão seria
42
“Em meio a esse quadro [de rebelião estudantil, por conta de uma certa situação na USP], a reitoria
encaminhou abertura de inquérito para aplicação do Decreto 477 contra três estudantes. Entretanto,
como houvesse possibilidade da eclosão de protestos estudantis ainda mais intensos em defesa dos três
líderes, o reitor decidiu utilizar dispositivos do regimento interno como forma de punição.” Idem.
Ibidem. p. 163.
43
Idem. Ibidem. p. 38-43.
44
PEREIRA, Ludmila. Nenhuma ilha....
45
Idem. Ibidem. p. 299.
46
Idem. Ibidem. p.299.
29
que se recorre quando não se observa a repressão: “autoridades optaram por atos
parágrafo supracitado, entretanto, Motta deixa claro que suspender algum ato de
violência não poderia significar, e é notável que isto apareça em um nível consciente
dos agentes históricos, evitar e o escamotear de conflitos, como deveria ser o sentido do
comportamento dos supostamente guiados pela tal cultura política brasileira 48.
UFF estudado por Pereira e em muitos outros, a repressão não se assumia formalmente
como tal, muito embora tivesse todo o aparato legal para fazê-lo. Antes, justificava suas
política de se aplacar as críticas foi também expressa pelo General Golbery do Couto e
universidade, como, por exemplo a instituição do regime integral para os professores 50.
gramsciana51 - mas eles não tomam lugar quando o autor se dedica a discorrer
47
Idem. Ibidem. p. 293.
48
Idem. Ibidem. p. 292.
49
PEREIRA, Ludmila. Nenhuma ilha....p. 239-41.
50
MOTTA, Rodrigo. As universidades....p. 102.
51
Por exemplo, “A Lei n.5.540 [da reforma universitária de 1968], portanto, foi o resultado das ações e
dos projetos de forças díspares, que se aliaram e/ou se enfrentaram ao longo dos anos 1960, com
destaque para estudantes, professores, cientistas, militares e técnicos da área econômica [e burgueses,
acrescentaríamos nós]. O poder militar fez apropriação seletiva de demandas e propostas apresentadas
em anos anteriores, às vezes provenientes do ideário de seus inimigos políticos. Combinando em graus
diversos negociação, cooptação e imposição à força, o comando militar apostou em medidas
modernizadoras necessárias a seu projeto econômico e úteis para reduzir a oposição nos meios
universitários. Os estudantes foram o grupo com menor acesso às instâncias decisórias, e sua proposta
de universidade popular e critica certamente foi derrotada. Não obstante, de maneira paradoxal, o
movimento estudantil teve influência apreciável no processo, exercendo uma espécie de “poder de veto”
implícito. Assim, por temor dos protestos, parte dos acordos com a Usaid foi bloqueada, assim como
30
teoricamente ou quando coloca - por exemplo, no subtítulo de seu trabalho - qual seria o
política”, na obra de Motta, é menos categoria de análise que uma etiqueta a que se
recorre quando simplesmente se observa que o arbítrio e a violência não foram tudo o
que houve (e como poderiam ter sido?), pois sempre haveria o quinhão da relação social
nacional52.
Bourdieu nos informa sobre um certo “universo intermediário” a ser considerado para
nosso objeto:
cobrança de mensalidades. Sobretudo, a pressão estudantil serviu de estímulo político para que a
arrastada discussão sobre reformas no ensino superior saísse dos planos e se tornasse realidade.” Idem.
Ibidem. p. 108.
52
Há um outro elemento negativo na interpretação de Motta, tratado aqui em nota de rodapé porque não
concerne diretamente ao nosso objeto: trata-se da suposição, fartamente trabalhada pelo autor, de que há
um paradoxo entre a modernização e a repressão. Ou seja, expandir os campi, criar programas de pós-
graduação, aumentar vagas, instituir departamentos seriam, para Motta, de alguma forma contraditórios
com as ações arbitrárias e coercitivas. Rafael Vieira critica esta compreensão de Motta, argumentando
longamente que modernização e violência, longe de serem fatores de naturezas distintas que porventura se
tocariam, fazem parte de um mesmo processo orgânico, de relação estrutural. Não caberia, assim, alegar
dicotomia entre esses diferentes elementos. VIERA, Rafael. “Monumento de cultura – monumento de
barbárie: Uma crítica da leitura de Rodrigo Motta sobre as políticas para a universidade no Brasil durante
a ditadura empresarial-militar (1964-1985)” IN: Anais do Colóquio Internacional Marx e o Marxismo
2017 De O capital à Revolução de Outubro (1867 – 1917). http://www.niepmarx.blog.br.
53
BOURDIEU, Pierra. Os usos....
31
interesses, estão em luta e são marcados por uma distribuição desigual de poder
dinâmicas diferentes:
sob o risco de uma visão acrítica ou até ingênua. Antes, na história das ideias científicas
concorrerão tendências que remetem ao exercício de poder dos agentes em suas facetas
“temporal” e “específica”. Dessa forma, toda ação intelectual é uma ação de poder
dentro do campo e todo conflito intelectual é um conflito de poder interno 55. Entretanto,
sobredeterminadas”57
Não será a nossa intenção formular uma história do Programa de Mestrado como
campo científico ou acadêmico. Muito embora não pretendamos mergulhar nas lógicas
internas do campo e dos agentes, a conceituação que trazemos nos serve para balizar o
questão de recorte - ou de capacidade - nosso objeto não será o homo academicus, mas a
produção intelectual. É por isso que dispensamos a conceituação de “habitus”, que diz
respeito tanto à interiorização de normas quanto às capacidades de agência por parte dos
intelectuais. Essencial à nossa análise, entretanto, há uma outra dimensão que trata do
Muito longe de supor que esse “universo intermediário” é algo como o mais
determinante das atividades intelectuais, Bourdieu nos encaminha a uma análise que o
integre em relação ao exterior que lhe pesa, com intensidades variadas, tanto com
distribuição interna de capital. Essa invariável relação do campo com poderes externos
não significa que a produção científica será meramente a encomenda para interesses
gestados alhures, ou que os seus meios de produção sejam exclusivamente operados por
gente de fora:
56
Bourdieu, Pierre. Para uma sociologia da ciência. Lisboa: Edições 70, 2004a. Ver principalmente
capítulo 1, em que Bourdieu analisa propostas de sociologia da ciência “encantadas” e “ingenuamente
maquiavélicas”.
57
BOURDIEU, Pierre. “O campo científico”...
33
campo, sendo mediatizadas pela sua lógica interna (o que como resultado pode dar,
É com base nessas noções que encaminhamos as questões deste capítulo, atentos
1.2 Controle
58
BOURDIEU, Pierre. Os usos.... p. 22.
59
Idem. p. 32
34
quo. Essa atuação estatal com uma lógica estranha ao funcionamento específico do
campo científico foi marcada por expulsões, prisões, vetos para contratação e ocupação
trata de atuação de poder político diferente daquele das hierarquias temporais (cátedras,
instituição niteroiense, mas também as de outras regiões, já que havia fluxo dos
intelectuais entre elas. E também a ação sobre outras áreas do conhecimento, seja
porque a História tem relação intelectual próxima com algumas delas, como também
1970; e que uma estrutura de controle e vigilância pesava sobre eles e afetava seu
desenvolvimento científico.
Universidade do Distrito Federal (UDF)60 é capaz não apenas de ilustrar a relação entre
criada em abril de 1935 por iniciativa do então prefeito do Rio de Janeiro, Pedro
60
Para a UDF, salvo quando indicado diferentemente, nossa fonte é FERREIRA, Marieta. A História
como ofício. A Constituição de um campo disciplinar. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2013.
35
duas personagens que sofriam cargas por parte dos setores mais reacionários de então. A
UDF tinha propostas estatutárias bastante originais, inclinada para a produção do saber
ministradas revelavam que não deixava de haver uma preocupação com a formação de
e História Moderna possivelmente tinha relação com o fato de serem as áreas de dois
estudo de História do Brasil guarda relação com o contexto internacional: por conta do
difundir uma política pacifista de convivência entre as nações. Segundo Ferreira, “essa
histórias nacionais, marcadas pela excessiva valorização do político e pelo culto dos
grandes heróis, em favor de uma história das civilizações voltada para o estudo das
sociedades.”61. Essa orientação já havia encontrado forte eco no Brasil em 1931 quando
no ensino secundário “História do Brasil' foi substituída por “História das Civilizações”,
Carvalho e Luiz Camillo, e lembrando também que Gilberto Freyre foi professor da
UDF e que Sérgio Buarque atuou ali como assistente de Henri Hauser, pode-se notar
historiográfico, apesar de ser difícil, como sublinha Ferreira, verificar até que ponto
foram implementadas essas propostas do curso ou seu impacto sobre a única turma de
no Brasil a partir de 1935. Desde sua fundação, a UDF, e o governo de Pedro Ernesto de
forma geral, vinham sofrendo pressões. Entre elas, a de grupos católicos que acusavam
Filosofia (FNFi) da UB, com longeva consequência, uma outra que lhe era afinada
tarde seria o Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS) da UFRJ - nos interessa
por conta da sua grande relevância política e intelectual nos anos 1960 62 e porque foi
grande o número de estudantes e professores que teve em comum com a UFF. Entre os
mestrandos que estudamos, a UB/UFRJ foi a segunda instituição que mais forneceu
62
Idem. Ibidem. p. 73.
37
docentes, nos dois lados da Baía63. Assim, para compor a História do mestrado que
estudamos, não nos parece que a trajetória do curso de graduação na FNFi seja menos
Criada em 1939, a FNFi era parte explícita de um projeto do Estado Novo para a
primeiros docentes teve direta ingerência do governo (os primeiros concursos são de
1945), marcando uma política clientelista.64 Na FNFi, o curso de História foi agregado
ao de Geografia (ao contrário daquilo que era a proposta da UDF). Seus conteúdos
vieram para a FNFi diferiam dos que haviam se dirigido para UDF, tendo forte
carga horária de História do Brasil aumentou. Uma das expressões mais fortes do
sala: “...em classe, se um aluno levantasse um dedo, ele mandava baixar. A aula era
com a formação da nacionalidade brasileira e de um poder central 68. Não nos parece
profissionais da FNFi e o Estado Novo, temos ainda que Vianna, nome escolhido para a
cátedra de História do Brasil em 1939, fora funcionário do DIP 70, e que Sílvio Júlio,
autores como Fernandes e Fávero72, não significou uma real autonomia intelectual frente
de questões de ensino, pesquisa, finanças, entre outras, evidente também pelo controle
66
Se houver espaço para indiscrição em uma tese, corria boato na FNFi de que Vianna inclusive
participava de cerimônias de beija-mão em Petrópolis (Entrevista de Falcon em FERREIRA, Marieta. A
História.... p. 278).
67
Entrevista de Linhares a Ferreira em FERREIRA, Marieta. A História.... p.229-0.
68
Idem. Ibidem. p. 43-4.
69
Entrevistas de Falcon, Falci e Lobo. Idem. Ibidem. pp. 246; 277; 319.
70
Idem. Ibidem. p. 140.
71
Idem. Ibidem p. 140-1; 149.
72
Apud. PEREIRA, Ludmila. O historiador.....
39
1962, “Os catedráticos decidiam sobre carreiras de outras pessoas porque se eles não
convidassem a pessoa para trabalhar não tinha como entrar nessas cátedras. Havia a
catedráticos como Vianna: “Quando foi extinta a cátedra, em 1967, montei meu
programa de pesquisa. Hélio Vianna foi contra, e eu disse: “Dr. Hélio Vianna, acabou
a cátedra. O senhor não manda mais na História do Brasil.”" 74 Sobre o papel negativo
catedráticos Silvio Julio (de América) e Hélio Vianna (de Brasil) exerciam sobre os
sofreria abalos a partir de finais da década de 1950, no bojo de uma alta politização do
73
Idem. Ibidem. p. 51. Entrevista de Ciro Cardoso a Pereira.
74
Entrevista de Linhares em FERREIRA, Marieta. A História....p. 237. No ano de 1967 a que se refere
Linhares houve mudança legislativa que reduziu bastante as prerrogativas da cátedra. No entanto, foi
apenas em 1968 que a cátedra foi de fato extinta. Ver FÁVERO, Maria Lourdes de Albuquerque. “Da
cátedra universitária ao departamento: subsídios para discussão.” Disponível em
http://23reuniao.anped.org.br/textos/1118t.PDF Acessado em janeiro de 2018.
75
“Quanto aos assistentes, tínhamos uma dificuldade enorme de produzir, porque os catedráticos, muitas
vezes, não estimulavam (…) Fui assistente do Sílvio Júlio. Ele tentou me inibir, mas não conseguiu”
(Depoimento de Eulália Lobo IN FÁVERO (coord.). Faculdade Nacional de Filosofia: Depoimentos. Rio
de Janeiro, Editora UFRJ, 1989, p. 214. Apud. PEREIRA, Ludmila. O historiador....p. 28-9.) “[Hélio
Vianna] Admitiu, sim [Manoel Maurício de Albuquerque como Professor Assistente], mas o obrigava a
assistir sentado às suas aulas, sem abrir a boca. E dizia, alto e bom som, que era para ele aprender.”
(Entrevista de Falci em FERREIRA, Marieta. A História.... p. 320) “[Professor] Assistente do Hélio
Vianna tinha que estar lá, sentadinho. Fazia a chamada e ficava assistindo à aula.” (Entrevista de Falcon
em FERREIRA, Marieta. A História.... p. 278).
40
crítico76.
História naquele ano. Criado em 1956 como órgão do Ministério da Educação e Cultura,
o ISEB, discutindo questões nacionais, viveu ao longo dos anos forte tensão política.
a lhe cortar verbas78. No ano de 1961, chegou a ser retirado do orçamento do Ministério,
o que forçou seus profissionais a redobrar seus esforços para manter a instituição
funcionando.
Sodré. Houve grande repercussão na imprensa: só o Estado de São Paulo lhe dedicou
cinco editoriais de ataque. O “História Nova” também foi motivo de comentário na TV,
onde foi apresentado como material subversivo. No dia 1° de abril de 1964, primeiro dia
76
Ver PEREIRA, Ludmila. O historiador....
77
Nossa referência para as informações sobre o ISEB é, salvo quando indicado diferentemente, SODRÉ,
Nelson Werneck. História da História Nova. Petrópolis: Vozes, 1986.
78
MOTTA, Rodrigo. As universidades.... p. 115.
79
PEREIRA, Ludmila. O historiador...p.66. Segundo um dos autores, Joel Rufino dos Santos, a “História
Nova” foi escrita no ISEB, mas “o espírito que nos possuía era o da FNFi”. (SILVA, José Luiz Werneck
da. A deformação da História ou Para não esquecer. Rio de Janeiro. Jorge Zahar Editor, 1985. p. 62). A
frase de Santos refere-se ao grande engajamento contestatório que havia naquela faculdade desde finais
dos anos 1950. Sublinhando a FNFi como um dos espaços – ainda que informalmente - de formulação da
obra, ver LOURENÇO, Eliane. “História Nova do Brasil: revisitando uma obra polêmica” IN: Revista
Brasileira de História. São Paulo, v. 28, nº 56, p. 385-406 – 2008.
41
Câmara, a extinção do ISEB foi o primeiro ato oficial do pós golpe. Entre os autores do
livro, afora os exilados, Maurício Martins de Mello, Pedro de Alcantara Figueira e Joel
Rufino dos Santos foram sequestrados e torturados. Parte das semanas em que estiveram
presos passou-se sem que suas famílias soubessem de seus paradeiros. Nelson Werneck
Sodré ficou 60 dias preso. Também o foram Caio Prado Júnior e seu filho, diretores da
editora Brasiliense que viria a publicar já sob ditadura outros números da coleção
História Nova. Ênio da Silveira, que não era editor do História Nova, foi detido como
tal.
Há uma discussão sobre o conteúdo do livro que passa, por exemplo, se era ou
não de inspiração marxista (segundo Sodré, não – apesar de todos os seus autores serem
do PCB80). Não nos interessa aqui uma caracterização exata sobre a obra (aliás, ignorada
por repressores até no nível factual: pensando que se tratava de Ligas Camponesas,
CGT e temas então atuais, não sabiam que seu recorte ia até o século XIX). O que nos
Voltando-nos agora às universidades, temos que o regime de 1964 logo fez delas,
depois dos sindicatos e das organizações de trabalhadores rurais, alvos prioritários das
momento do golpe, mas há uma estimativa de que o número total de vítimas (ou seja,
Verdade estima entre 800 e 1000 o número de acadêmicos perseguidos entre 1964 e
198582, mas estes números parecem pequenos diante das evidências trazidas por estudos
neste número só estão incluídos os afetados direta e formalmente (uma estratégia para
se conseguir o expurgo por meio indireto era o processo administrativo por abandono de
outros tantos abandonaram seus estudos por conta do clima de repressão. Os ministros
do MEC deixavam clara sua intenção de fazer uma “limpeza” no meio acadêmico
brasileiro e ela repercutia com uma onda de denúncias internas entre os que trabalhavam
tiveram grande peso para gerar um clima de medo e instabilidade geral (há ainda um
caso de reitor preso, o da URRJ, futura UFRRJ). Foi notável nesse sentido que 80% do
corpo docente da UNB (223 professores) tenham pedido demissão em 1965 84. A
(IPMs), que muito embora não tivessem o poder de condenar ou demitir, instalaram
ansiedade e angústia entre os profissionais, além de criar condições para que sofressem
81
MOTTA, Rodrigo. As universidades. p. 23-5.
82
“Violações de direitos humanos nas universidades” IN: Comissão Nacional da Verdade. Relatório.
Volume II. Eixos Temáticos. Abril de 2014: http://www.cnv.gov.br/images/pdf/relatorio/Volume
%202%20-%20Texto%206.pdf (Acessado em fevereiro de 2017). O portal Ciência na Ditadura reúne
grande material sobre perseguição contra cientistas na ditadura:
http://www.mast.br/ciencia_na_ditadura/index.html (acessado em fevereiro de 2017).
83
MOTTA, Rodrigo. As universidades....p. 26-7; 57.
84
Idem. Ibidem. p. 38-43.
43
contra a universidade. Como consequência, houve nos anos seguintes uma “evasão de
cérebros” para outros países e uma tentativa por parte do governo para que estes
A partir do AI-5, uma nova onda repressiva se abateu sobre os campi. Em 1969,
perseguição, mas apenas os que foram formalmente atingidos. Não constam deste total,
contratos). Como forma de efetuar sua “limpeza” ideológica, o governo baixou um ato
Por conta da grande agitação e do seu alunado, que fazia da FNFi um dos
política mesmo antes do golpe, com vigilância, além do movimento estudantil, sobre
professores como Maria Yedda Leite Linhares88, que tinha notável engajamento na
presença pública como diretora da rádio MEC. Consumado o golpe, os ataques contra
invadiu a Radio MEC para destituir a então presidente Maria Yedda Linhares e tomar-
lhe o cargo – tendo logrado sucesso posteriormente 90. Logo após o golpe, alguns
85
Idem. Ibidem. p. 83-5.
86
Idem. Ibidem. p. 173.
87
FERREIRA, Marieta. A História....p. 73.
88
PEREIRA, Ludmila. O historiador.... p. 94.
89
MOTTA, Rodrigo. As universidades.... p. 31.
90
PEREIRA, Ludmila. O historiador.... p. 100.
44
História Moderna e Contemporânea, que veio a ser presa 3 vezes ao longo de 1969 e
liberada sob a condição de ir para o exterior 92), Eulália Lobo (catedrática da cadeira de
História da América desde o ano anterior, e que viria também a ser presa); Guy de
Holanda (não se sabe o motivo da expulsão desse professor, já que ele não era de
depois a ser preso e torturado). Outros professores que continuaram atuando sofreram
de documentos de órgãos de repressão, como o DOPS, que mostram que vários desses
professores foram investigados e vigiados até a década de 1980, evidenciando mais uma
vivia um forte clima de tensão com ameaças de grupos como o Comando de Caça aos
interior do curso e no instituto Eremildo Viana, que veio a ser largamente reconhecido
e as que haviam estavam dispersas ou trancadas em cômodos 98. Passaram a fazer parte
do cotidiano espiões em sala de aula e corredores, além de pessoas armadas nas portas
perpetrado por sua reitoria100. Sobre cursos abertos de História promovidos no Rio de
Cardoso, Paula Beiguelman, Paul Singer, Emília Viotti da Costa (esta do curso de
contra o regime vigente. É importante olhar para a USP e para seu departamento de
História porque este era o que tinha a maior tradição em pesquisa histórica no país com
alguns dos docentes que atuaram no mestrado da UFF na década de 1970 102 Como efeito
que o curso “se enfraqueceu não só em razão das saídas das pessoas, mas o
fundamental é o clima pesado que foi criado”, onde havia colegas denunciando
colegas103. Laura de Mello Souza, que se tornou aluna do curso em 1972, também
recorda que o ambiente era marcado pelo medo do debate, pelo histórico de
perseguições a cadeiras (o que teria produzido um curso fraco), pelas “muitas prisões” e
A partir de 1968, também recrudesceu o ataque aos estudantes, que teve como
uma de suas expressões o decreto 477, que previa exclusão de alunos, intervenções em
DCEs, DAs, etc.. Este impacto na vida estudantil também repercute e determina o
desenvolvimento científico, uma vez que estudantes da década de 1960 constituíam uma
tom dos debates, influindo na definição dos programas curriculares e sabotando as aulas
algo também lembrado por Paulo Arantes que destaca a importância naquele curso da
102
Entre os doutores pela USP que atuaram na UFF até 1979 estão Nícea Luz, Aydil de Carvalho Preis
(coordenadora), Ismênia de Lima Martins e Victor Vincent Valla.. Depois de 1970, tivemos Afonso
Marques dos Santos, Berenice Cavalcanti, Dylva Moliterno, Luiz Werneck Vianna e Sônia Bayão Vianna.
UFF. Memória... p 16-18.
103
MORAES, José Geraldo Vinci de & REGO, José Márcio. Conversas com historiadores brasileiros.
São Paulo: Ed. 34, 2002., p. 122.
104
Idem. p. 367: “ingressei em 1972, um momento muito difícil, o curso era fraco – mas ainda com
alguns grandes professores -, sobretudo por ter sofrido muito com as perseguições. Hoje em dia, quando
vejo alunos se queixando do curso atual, fico recordando o curso que fiz e a diferença positiva que há.
Havia umas cadeiras muito fracas, impossíveis de cursar, havia as que tinham sido atingidas, e,
sobretudo, o medo incrível de se debater certos assuntos, pois ocorreram casos de delação entre alunos –
para não falar no caso extremo, o de Emilia Viotti, ocorrido entre os professores – e muitas prisões.”
105
MOTTA, Rodrigo. As universidades.... p. 98.
47
exigência estudantil por leituras de Lenin, Rosa Luxemburgo, Mao Tse Tung, etc.. 106 É
ideia de que docentes faziam a cabeça dos estudantes, várias fontes mostram que muitas
imparcialidade, além de seus artigos serem críticos à estrutura da universidade 108. Essa
entrada em cena dos estudantes acirrou as disputas intelectuais e políticas entre docentes
que estava liquidada. Como de fato ocorreu: fui acusada de usar os alunos, de ser
usada por eles, etc.”109. Cabe lembrar que com Bourdieu entendemos que a luta por
acadêmico e científico.
106
ARANTES, Paulo. Um departamento francês de Ultramar. Estudos sobre a formação da cultura
filosófica uspiana. (Uma experiência nos anos 60). Rio de Janeiro. Paz e Terra, 1994. p. 55-6.
107
MOTTA, Rodrigo. As universidades.... p. 62.
108
Sobre o Boletim, PEREIRA, Daniel Mesquita. Boletim de História: uma experiência de vanguarda na
Faculdade Nacional de Filosofia - 1958-1963. Dissertação (Mestrado) - Departamento de História,
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. 1998.
109
Entrevista em FERREIRA, Marieta. A História... p. 228.
48
nos rumos científicos com, por exemplo, a pressão que faziam para que os professores
que de fato acabou influenciando a cadeira. 111 Ainda considerando a FNFi, Neyde
alunado em torno do marxismo, mas adicionando seu ponto de vista de que tinham
porque estava em jogo a disputa por uma cátedra com o professor Evaristo de Moraes
Filho, que viria a ser aposentado pelo AI-5. Em 1968, Torok saiu da sala de aula para
Weimar Penna que pediu exoneração do cargo em setembro de 1968 alegando não haver
condições de lecionar no IFCS por conta das pressões estudantis. Ambos os casos foram
não coibir a rebeldia estudantil. Essa foi justificativa de pedido de aposentadoria contra
repressivas terem se abatido sobre os campi no Brasil (1964 e 1968/9), a ditadura monta
uma estrutura mais organizada de vigilância e controle 118. Ela contava com órgãos
(ASIs). Com essa estrutura, se pode ter maior controle sobre a contratação de
professores, de quem eram exigidos “nada constas” expedidos por órgãos policiais. Para
um dos primeiros passos é destacar que existe a ideia de que seus cursos não sofreram
chega-se a dizer que a UFF foi uma “ilha da liberdade” 121. Tal visão é provavelmente
fomentada pelo fato de a UFRJ (antes, Universidade do Brasil) ter sido mais ferozmente
atacada. Mas dois estudos publicados em 2016122 reduzem à esfera da ilusão a noção de
que a UFF fora em algum nível poupada, demonstrando a ampla presença em Niterói de
contado por Claudio de Moura e Castro, que assumiu em seu lugar (p.102). Os vetos ideológicos não
eram assumidos, configurando o que se chama “cassação branca” (p.103). Um dos procedimentos é
relatado por uma assessora da CAPES: “Apesar de seu ar tranqüilo, seu governo [Médici] foi o pior de
todos, inclusive com sacrifício de vidas. Quando voltei a CAPES, como Assessora de Programas, o
agente do SNI não era mais aquele professor do período inicial, mas um militar (...). Para mostrar
eficiência [o agente do SNI em 1970], fez um questionário: tínhamos que preencher o nome do bolsista,
sua proveniência, seus compromissos com a CAPES. Depois, para serem respondidas pelo bolsista,
vinham umas perguntinhas, entre as quais uma totalmente risível: ‘Gosta de música? Quais são seus
autores preferidos?' Obviamente, se fosse comunista de verdade, só responderia Mozart Beethoven,
porque era escolado, mas se não fosse e escrevesse Geraldo Vandré, estaria perdido. Como baixou o
nível, que coisa incrível!” (p.103).
120
Veja-se, por exemplo, o caso de Fernando Santa Cruz que fora aluno da UFF. Sobre ele, três dias antes
de seu sequestro e desaparecimento em fevereiro de 1974, houve pedido de informações à universidade
por parte de órgão de informação. Em 3 de junho, o chefe da ASI/UFF envia ao DSI/MEC fotografia e
endereço de Fernando. (Ver PEREIRA, Ludmila. Nenhuma ilha...) Santa Cruz segue até hoje como
desaparecido e dá nome ao DCE da UFF.
121
Tal caracterização está em BARBOSA, Angela Coelho; OLIVEIRA Jr, Antonio Ribeiro & KOCHER.
A UFF nos anos de chumbo. Memórias de resistência na vida acadêmica do ICHF (1968-1978).Relatório
de pesquisa preliminar do Laboratório de História Oral e Iconografia (LABHOI) do Departamento de
História da UFF. Niterói, desembro de 1990. Apud PEREIRA, Ludmila. Nenhuma ilha...
122
PEREIRA, Ludmila. Nenhuma ilha... E ADUFF-SSind. Ditadura e resistências. A rebeldia dos
professores da UFF. Do golpe de Estado à formação da ADUFF-SSind. Niterói, 2016.
51
do país; atuação para prisão de docentes e discentes; vetos para contratos e cargos de
direção nas universidades; colaboração com órgãos externos de repressão, etc.. Na lista
ideológicas – número que provavelmente foi maior, mas não pode ser precisado dado o
política na cidade e mesmo a nível nacional na primeira metade dos anos 1960, como já
apontamos. É possível afirmar que o nível de tensão em Niterói foi menor, desde que
marxistas. O tema exige maiores pesquisas, mas, de acordo com o que trouxeram nossos
década de 1960, o curso era marcado pelo factualismo tradicional: para Almir Chaiban
El-Kareh, estudante da graduação em História da UFF nos anos 1960 e professor ainda
nessa década, “Ninguém falava em conceitos. No curso de História, história são fatos,
não se falava em conceitos. Não havia teoria era só fatos.”125. Para Ismênia Martins,
que também foi aluna na década de 1960, a “erudição” era uma forte marca do curso
início dos anos 1970: “Como eu sempre brinco, toda minha geração foi alfabetizada no
marxismo. No curso de história da graduação (não tanto na pós, muito pelo contrário –
[...]), todo mundo era marxista. Tirando algumas exceções […]” 127. Para El-Kareh, se
ter sido majoritariamente como aquele ministrado por El-Kareh, distante de polêmicas
124
FALCON, Francisco. “História e memória: origens e desenvolvimento do programa de pós-graduação
em História da Universidade Federal Fluminense” História da historiografia. n. 11. Ouro Preto, 2013
p.27.
125
Entrevista Almir El-Kareh ao autor. 26/02/2015
126
Entrevista de Ismênia Martins ao autor 13 e 22/07 de 2015
127
Entrevista de Sonia Mendonça ao autor. 28/04/2013 e 3/10/2013.
128
Entrevista de Almir El-Kareh ao autor.
53
pela timidez131, não deixa de ser significativo que um pensamento associado à subversão
tenha progredido. Por outro lado, é significativo também que o engajamento militante
não tenha tido a mesma intensidade daquele que ocorria na FNFi dos anos 1960. O
professor ser comunista, desde que não fizesse propaganda132. A frase é cínica, já que a
perseguição política estava a pleno vapor, mas ela retrata que havia alguma concessão
ao mesmo tempo em que uma imposição de limites. Já nos referimos aos aportes
teóricos capazes de nos fazer entender esse tipo de situação nos seios das instituições
sob batuta ditatorial. Nesse sentido, nos auxilia ponto trazido por Ismênia Martins de
importância do que se passasse na cidade 133. Assim, tão importante quanto evidenciar a
1970 e mestranda e docente logo após, “Cansamos de sair com corredor polonês de
129
“Mas eu fazia questão de sempre em sala dizer que eu não era de nenhum partido (e não era mesmo –
eu sempre procurei ser independente). E discutíamos marxistas franceses que criticavam os marxistas
stalinistas russos. Ficava muito claro no meu curso que eu não fazia apologia da URSS nem do Partido
Comunista. Por uma questão de opção intelectual e para deixar claro que eu não estava envolvido com
nenhum partido.” Entrevista de Almir El-Kareh ao autor.
130
Alguns de nossos entrevistados apontam que Althusser, no início dos anos 70, era a principal referência
teórica do marxismo em Niterói. Entrevista de Pedro Demo [docente do mestrado nos primeiros anos do
curso] ao autor 5/5/2014 . Entrevista de Sonia Mendonça ao autor. Entrevista de Rachel Sohiet ao autor.
4/7/2 2013.
131
Para Falcon, docente na graduação na década de 70, seus cursos tinham orientação marxista, embora
discretamente “como mandava o tempo”. Em relação ao curso, “É, de fato se pode dizer que tinha uma
forte tendência marxista, mas não de bandeira asteada. Eu diria subliminar.” Entrevista de Francisco
Falcon ao autor em agosto 2013.
132
MOTTA, Rodrigo. As universidades...p. 244.
133
Entrevista ao autor.
54
professor da graduação desde os anos 60, cita que foi ameaçado com a abertura de um
formal veio minutos antes da palestra, que acabou não acontecendo 136. Como parte do
clima em que vivia a universidade, El-Kareh foi uma vez comunicado de que haveria
um processo contra ele por parte de órgãos de segurança, e que colegas o consideravam
de que teria entrado no radar na vigilância 137. Falcon, docente talvez desde a década de
1950, chegou a ter desconfiança de colegas: “E a gente não sabe ao certo quantos
daqueles nossos colegas, deviam ser pouquíssimos, eram agentes duplos. Tinha lá uns
dois que eu desconfiava que eles levavam mensagens, até onde eu não sei.”138
fontes e menos ainda de uma narrativa bem ordenada: colhemos os dados a partir do
publicado por Pereira (2016) e ADUFF (2016), ou do levantado por nós nas pastas
134
Entrevista ao autor.
135
Entrevista de Sonia Mendonça ao autor.
136
Entrevista ao autor.
137
“Mais tarde, essa Ana Maria de quem eu falei pra vocês (não me lembro o sobrenome), essa Ana
Maria que havia sido namorada do Ivan [Mota Dias, aluno do curso de História e desaparecido. Ver
PEREIRA, Ludmila. “Nenhuma ilha....” p. 275], ela me telefona e diz: “Professor, tome cuidado”. O
irmão dela era amigo de um dos rapazes que havia sequestrado o embaixador dos EUA. E na casa dele,
haviam pego documentos e algum documento falava de mim, mas falava como professor – eu não tinha
envolvimento com a guerrilha. “O sr. Toma cuidado porque eu já fui chamada e o seu nome faz parte da
lista.” Mas eu não fui chamado. Eu recebi também um telefonema da irmã do Ciro dizendo que no
Cenimar tem um processo muito grosso sobre você. Eu pensei: então são todas as minhas apostilas, que
eles pegaram e levaram para lá. Só podia ser isso.” Entrevista ao autor.
138
Entrevista ao autor.
139
Sobre o destino desses arquivos, ver MOTTA, Rodrigo. As univerisdades...
55
também porque não buscamos por estudantes, nem conhecemos o nome de todos os
principalmente da graduação, mas também da pós, aos quais sinalizaremos quando for o
caso.
História da América. No mesmo ano, vigilância sobre Acyr de Paula Lobo que havia
sido auxiliar de História da América 141. Considerando também anos posteriores, Acyr
das investigações sobre Vera Wrobel e Liszt Benjamim Vieira, estudantes e militantes, o
Exército pede para que a universidade “convide” para depor Acyr de Paula Lobo e Luiz
140
Aduff, Ditadura e... p. 60.
141
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 9.
142
PEREIRA, Ludmila. Nenhuma ilha.. p. 272.
143
Idem. p. 99.
56
programa de curso do professor Jorge Miguel e prometeu sua demissão, o que foi
efetivado através da não renovação do seu contrato e mesmo depois de ter ela própria
ideológica144. Haveria também investigação sobre que leituras Jorge Miguel indicava
aos estudantes145.
Ângela Maria de Castro Gomes146, que havia concluído sua graduação em História em
1969 e que mais tarde seria docente da pós-graduação. Esse é um dos casos em que não
confidencial sobre Maria Bárbara Levy por parte da ARSI/MEC. A UFF responde
dizendo que a professora tinha contrato até o final de 1971, mas rescendido porque ela
se ausentou do país em outubro e deixou de ter ligação com a universidade 147. Em 1973,
ARSI/GB entra em contato para saber sobre Marcos Waldemar 148. O mesmo a respeito
de Ilmar Mattos. A UFF, além de passar dados como filiação e endereço, responde
dizendo que observa este professor com cuidado por conta de sua possível ligação com
Francisco Falcon149. De acordo com ofício do ano de 1973, a universidade não renovou
144
Idem. p. 227-9.
145
Idem. p. 234.
146
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 5.
147
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 8.
148
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 5;
149
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 5.
57
informações pesando questionamento sobre sua conduta moral e suas ligações com
professor (inclusive recente falecimento de esposa), dizendo que ele não manifesta
opinião sobre assunto políticos, que discorda de agitadores na universidade, que não há
restrição à sua conduta moral, e que é estimado por parte colegas 153. No mesmo ano,
História que teria sido autor de um documento que denunciava a repressão no IACS e
para curso de doutorado no Texas em 1976, por parte da professora Vânia Fróes, de
Medieval, que fora mestre da primeira geração 155. Ainda nos arquivos da ASI/UFF,
localizamos, de 1977, um nada consta de Gizlene Neder quando cogitada para ocupar o
dizendo preocupada com conflito de horários de Ilmar Mattos, Francisco Falcon e José
150
Aduff, Ditadura e... p. 59-60.
151
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 6.
152
Conta Ismênia Martins que quando foi criado o curso de História, não sabemos se na FFF ou já sob
federalização, Bittencourt, que era um juiz, iria se inscrever como aluno por conta de seu gosto pela área.
Antes disso, recebeu convite para se tornar docente de Antiga e Medieval. “Ele contava isso rindo”
Entrevista de Ismênia ao autor,.
153
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 19.
154
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 19.
155
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 10.
156
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 15.
58
para ser realizado nas dependências da UFF em de 1979 157. Depois, os órgãos de
informação guardaram relatório (“moção”) feito por Francisco Falcon sobre o evento.
Silva, que fora mestrando do programa, por parte da ASI da DEMEC-RJ em que se
crivo dos órgãos de informação Hildiberto Ramos Cavalcante Albuquerque Júnior (que
157
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 7.
158
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 5.
159
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 3.
160
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 13. Aydil
de Carvalho Preis foi formada pela Faculdade Fluminense de Filosofia (FFF) – que posteriormente seria
parte da UFF- e professora da graduação desde 1957.
161
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 13.
Marcos Waldemar foi formado pela FFF em 57, professor assistente de 58 a 80, e se tornou professor
adjunto em 81.
59
na pós, depois)); assim como Marcos Waldemar e Francisco Falcon, quando concorriam
História, não havendo registro de veto. Célio Pereira da Silva 164, Marcos Waldemar e
como democrata (ou seja, não sendo um comunista ou esquerdista ou um “sem posição
atividade subversiva. Marcos Waldemar, por sua vez, foi registrado como “democrata”,
sobre o qual não havia conclusão sobre posição em relação à “revolução” de 1964 ou
temporal” do campo, apesar de nos faltar base empírica para pensar o que se passou na
UFF, temos colocações de Motta de que muito embora houvesse certa margem para a
162
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 25.
163
Segundo nos informado por Ismênia. Entrevista ao autor.
164
Formado pela FFF em 64. Assistente desde 65 até 78 pelo menos.
165
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 20.
60
docente da graduação que foi da primeira turma do mestrado: uma das acusações contra
de História que teriam apoiado o Manifesto de Paulistas, que não sabemos do que trata.
Mencionando apenas os que passaram pela pós, alguns depois do período que
estudamos, temos: José Honório Rodrigues, Francisco Falcon, Nilson Lage, José Nilo
Tavares, Berenice Brandão, Célio Pereira da Silva, Luiz César Bittencourt Silva, José
166
MOTTA, Rodrigo. As universidades...p. 308-9.
167
PEREIRA, Ludmila. Nenhuma ilha.., p. 278. Sem data.
61
Luiz Werneck da Silva, Luiz Carlos Soares, Maria Teresa Toubio (na grafia correta,
Toribio), Maria Yedda Linhares, Vânia Fróes, Victor Valla, Ana Maria Bastos, Sonia
Mendonça, Francis Morton, Gizlene Neder, Gérson Moura, Maria Bárbara Levy e
Carlos Daniel Valcarcel Esparza e Victor Valla169 uma ficha. Do professor Stanley
DSI do MEC pedido de informações sobre sua atividade profissional e sobre que
conceito lhe teria a reitoria da UFF. Em função desse pedido, a ASI/UFF informa ao
reitor, anexando cópia do relatório de trabalho do Hilton, que ele atende ao que lhe foi
solicitado. Não sabemos o que teria motivado o pedido de informações 170. Em 1974, a
Leslie Bethell e Francisco de Solano cogitados para trabalhar com História da América
como alguém que amortecia as investidas arbitrárias175. Mas é importante perceber que
168
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 26.
169
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 9.
170
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 8.
171
O documento pede informações sobre professores estrangeiros em 1975. Seção de Arquivo Permanente
da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa10
172
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 21
173
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF. Caixa 21
174
Nesse sentido, há referências a Arthur Cézar Ferreiras Reis, um dos principais docentes do mestrado
na década de 1970, e Luiz César Bittencourt, professor da graduação. Ver FALCON, Francisco. História
e... p.27.
175
“Ela sempre se comportou de maneira muito coerente. Nunca denunciou ninguém. Sempre protegeu as
62
ela também colaborou com o controle político das atividades universitárias: participou
mestrado, as lutas políticas e as mudanças na configuração estatal. Por volta do ano que
haviam feito alvo anteriormente. Que a volta dos “exilados”, como às vezes são
aqueles que advogam diferentes interpretações sobre o que foi o curso nos seus
agentes tendo como pando de fundo o debate, iniciado ainda na década de 70, sobre a
organização do curso,
pós-1979, tarefa de que não nos ocuparemos. De qualquer forma, muito embora não
possamos avançar na definição do que teria sido o impacto desses professores que
pesquisa mais extensa e cuidadosa poderia refletir melhor sobre os impactos das
respeito do que se abateu sobre a UFF, é importante destacar que ela atua em um cenário
180
Entrevista ao autor.
181
Estes expedientes não são exclusivos de ditaduras, mas também fazem parte das chamadas
democracias. Na Inglaterra, por exemplo, Eric Hobsbawn, Rodney Hilton, Cristopher Hill e E. P.
Thompson tiveram correspondências e ligações telefônicas violadas, microfones instalados em seus locais
de reunião, além da espionagem atingir também familiares e amigos, havendo assim não apenas interesse
em atividades públicas, mas também em questões íntimas. A atuação do MI5 foi também determinante
para que Hobsbawn não conseguisse uma posição em Cambridge. Thompson também teve sua carreira
afetada desligando-se de Warwick em 1971 depois de denunciar espionagem sobre o professor David
Montgomery, descoberta por estudantes nos arquivos da universidade que estavam ocupando. Ver
FORTES, Alexandre, NEGRO, Antonio & FONTES, Paulo. “Peculiaridades de E.P. Thompson” IN:
THOMPSON, E. P. As peculiaridades dos ingleses e outros artigos. Campinas: Editora Unicamp, 2001. p.
29; NORTON-TAYLOR, Richard. “MI5 spied on leading British historians for decades, secret files
reveal” IN: The Guardian. 24 de outubro de 2014. https://www.theguardian.com/world/2014/oct/24/mi5-
spied-historians-eric-hobsbawm-christopher-hill-secret-files. Acessado em janeiro de 2019; COBAIN,
Ian. “Historian EP Thompson denounced Communist party chiefs, files show” IN: The Guardian. 26 de
setembro de 2016. https://www.theguardian.com/uk-news/2016/sep/28/historian-ep-thompson-
denounced-communist-party-chiefs-files-show. Acessado em janeiro de 2019. A manchete desta matéria
pode conduzir a erro. O fato a que ela se refere é que Thompson fazia críticas internas ao caráter ditatorial
da liderança do Partido Comunista Inglês.
Assim como a CIA observava o trabalho de intelectuais (entre eles historiadores) no Brasil, ela
também o fez em outros países. Em documento da agência produzido na segunda metade dos anos 1980 e
liberado recentemente, agentes fazem um balanço do cenário intelectual francês, que àquele momento
estava sendo julgado como relativamente positivo pois estaria havendo uma “deserção” de intelectuais de
esquerda em relação ao marxismo, ao socialismo e ao governo de François Miterrand.
https://www.cia.gov/library/readingroom/docs/CIA-RDP86S00588R000300380001-5.PDF Acessado em
junho de 2017. Nos EUA, os expurgos do macartismo dos anos 1950 chegaram próximos de eliminar o
marxismo e os marxistas da universidade, ao mesmo tempo que se acentuava sua ligação com o complexo
militar-industrial e as políticas de governo. HELLER, Henry. The capitalist university. The
transformations of higher education in the United States, 1945-2016. Londres: Pluto Press, 2016. p. ix
65
já devastado: a principal carga já se havia dado nos anos 60, quando foram agredidos e
1971 - elas já não contariam com uma parte da intelectualidade, expulsa ou acuada –
mãos de pessoas que atendiam aos ditames ditatoriais em níveis variados: de capatazes
entusiastas àqueles que, mesmo com pudores, tendo introjetado as normas excluíam
“naturalmente” do seu horizonte aquilo que poderia contrariar o status quo. No caso da
História no Rio de Janeiro, todo esse processo havia se iniciado na UB/UFRJ, uma das
no sentido de continuidade e ruptura entre o acontecido nos dois lados da Baía, nos
parece correta a comentário de Ferreira de que uma pós fluminense de História tenha se
de História (ou, para alguns, a UFF de uma forma geral) esteve à parte de turbulências e
ingerências mais diretas: para Rachel Soihet (mestre em 1974), na graduação foram
Nesse mesmo sentido, Sonia Mendonça coloca que nunca percebeu censura no período
em que cursou o mestrado (1974-1977) (apesar de sublinhar que havia diferenças entre
relação à censura na graduação, mas na pós “isso era mais distendido. Porque como as
182
FERREIRA, Marieta. A História... p. 436
183
Entrevista ao autor.
184
Entrevista ao autor.
66
turmas eram pequenas não tinha muita militância na pós-graduação.” 185 Para Ubiratan
Rocha (mestre em 1979), a repressão “afetava o contexto” mas “não era uma coisa
pode viver progressos no seu conhecimento histórico (maior atenção a questões teóricas
e conceituais, abertura para maior senso crítico), a pós – e isso se verá quando
uma produção que não encontrou repercussão social, o mestrado em História era menos
1.3 Construção
185
Entrevista ao autor.
186
Entrevista ao autor, 9 de julho de 2013.
67
notemos por ora que, na reforma universitária, as ciências sociais, apesar de sua grande
expansão, cresceram por terem algo como pego uma carona. Para Ismênia Martins,
alguns setores do regime militar190. Sua expansão cumpria também uma função de
187
BOURDIEU, Pierre. O campo...
188
Idem.
189
Entrevista de Martins a Côrrea em CORRÊA, Maria Amelia Ayd. De que lugares fala essa história?
As matrizes teórico-metodológicas da produção discente do programa de Pós-Graduação Stricto Sensu
em História da UFF (1989-1996). Dissertação de Mestrado em História Social. Rio de Janeiro. UFRJ,
2001.
190
MOTTA, Rodrigo. As universidades..., p. 272
191
Idem. p. 282
68
sociais é, em 1978, 10,5%193 - o que não significa a mesma proporção de recursos já que
se trata de uma formação muito mais barata que a de outras áreas. Analisando dados da
feio” da política de bolsas194. Não apenas as ciências sociais, mas também as ciências
“puras” foram preteridas porque sua produção não teria utilização econômica imediata.
Porém, apesar de o grosso dos financiamentos irem para as áreas estratégicas e centros
de pesquisa tecnológica, os recursos eram de tal ordem que houve disponibilidade aos
universitário, havia postulado a indissociabilidade entre ensino e pesquisa. Ela anula lei
a uma carreira docente universitária (o mesmo não valia para os que já se encontrassem
nos cargos): a partir de 1968, haveria um prazo máximo de 6 anos para que se cobrasse
o título de mestre dos candidatos a Professor Assistente 198. E mesmo para os Professores
Auxiliares, que eram temporários contratados por dois anos renováveis, passou a haver
data da lei, por conta da falta de clareza do texto), o Auxiliar de Ensino deveria obter
Essa situação pesou para vários jovens professores da graduação da UFF que
atender a esses problemas, Aydil de Carvalho Preis, docente de História e então diretora
mesmo da interdependência dessas duas ordens de funções, e das diferenças de seus significados e
importância práticos para a coletividade, deverá existir – tanto no corpo de ensino, quanto no da
pesquisa – especialistas de níveis intermediários exclusivamente voltados para um mister básico, de
ensino ou de pesquisa.” FERNANDES, Florestan. Universidade brasileira: reforma ou revolução? São
Paulo: Alfa e Ômega, 1975. p. 239
198
Decreto-Lei n. 465, de 11 de fevereiro de 1969. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-
Lei/Del0465.htm#art10art3
199
Lei número 5.539 de 27 de novembro de 1968 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-
1969/L5539.htm.
200
Entrevista de Aydil Preis a Côrrea, 2001, p. 172.
70
superior...”201
cultivado por docentes e estudantes da FNFi na década de 1960 que tinham ampla
Seus olhares estavam para o livro didático e o ensino secundário. Veja-se por exemplo o
impactante “História Nova do Brasil” que, como mencionado, apesar de ser feito no
ISEB sob liderança de Sodré, tinha o “espírito da FNFi” dos seus demais autores, nas
nas escolas e propunha um ensino atento às questões do presente 203. Para Maria Yedda
Leite Linhares, catedrática engajada nesse movimento, foi justamente essa dedicação ao
ensino que teria levado a FNFi a ser “erradicada de forma tão brutal e definitiva”204. Se
pensar a educação básica era algo já traçado no perfil institucional da FNFi, também
encontrava sua razão de ser na alta politização vivida na faculdade – e no país – que via
201
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE. Regulamento do curso de pós-graduação em História
do Departamento de História. Sem data. Do arquivo pessoal de Aydil Preis.
202
SILVA, Luiz. A deformação... 1985; LOURENÇO, Eliane. História nova....
203
PEREIRA, Daniel. Boletim de História...
204
SILVA, José. A deformação... p. 91
205
Inclusive, diria Linhares em comparação com a USP que “A grande diferença entre os colegas
paulistas e nós do Rio residia na maneira de encarar o papel que cabia à Universidade no tocante à
História. Aqui, pensávamos que tínhamos algo a fazer quanto à formação do professor de História para
o Ensino Médio.” LINHARES, Maria Yedda Leite. “40 anos da ANPUH – Balanço de uma professora.”
IN: SILVA, Francisco Carlos Teixeira da; MATTOS, Hebe Maria; FRAGOSO, João (org.). Escritos sobre
história e educação – Homenagem à Maria Yedda Leite Linhares. Rio de Janeiro: Mauad; FAPERJ, 2001.
Com efeito, Maria Janotti, professora de História da USP, referindo-se à graduação paulista, menciona
que sua concepção é a de “...formador de professores especialistas e pesquisadores de alto nível.”
(intento que, entretanto, estaria sendo frustrado na década de 1970 por conta de uma queda de qualidade.)
JANOTTI, Maria. “Alguns problemas do curso de pós-graduação em História na Universidade de São
Paulo.” IN: Revista de História da USP, N. 110, Segundo semestre de 1977. p. 422.
71
dos vários cursos ambições distintas de desenvolvimento. Ou, antes disso, caberia
perguntar se haveria mesmo um volume de investimento tão grande para uma pós-
graduação se esta não fosse necessidade colocada por instância externa às faculdades:
não seriam também os recursos aplicados no que chamamos hoje projetos de extensão
movimentos sociais, centros de alfabetização, tal como feito no ISEB 206? Também não é
todo um processo de debate e propostas sobre História foi interrompido com o golpe de
centralizada.
pós-graduação que temos hoje, criação na ditadura, menos ainda como uma evolução
tornado dominante no país, não teria sido o único possível, e aqui podemos lembrar,
206
Sobre essa característica do ISEB, ver LOURENÇO, Eliane. História nova.... p. 390-1
207
FALCON, Francisco. História e... . FERREIRA, Marieta. “O ensino da história, a formação de
professores e a Pós-Graduação” IN: Anos 90, Porto Alegre, v. 23, n. 44, p. 21-49, dez. 2016. p. 27.
208
“Na concepção dos historiadores metódicos, o ensino primário e secundário não é só um lugar de
difusão dos saberes amadurecidos da Sorbonne, mas uma preocupação constante e fundamental.
Abundam as menções a esse vínculo íntimo entre a universidade e o sistema escolar. Os dois apêndices
da Introduction aux études historiques são consagrados um ao ensino secundário (Seignobos) e o outro
ao ensino superior (Langlois). A maioria dos historiadores reconhecidos participa da Revue
Internationale de l'Eiseignement […]. Em 1907, conta Monod que ele mesmo escreveu 37 artigos
referentes ao ensino nas colunas de Revue Historique. Um sinal desse investimento é o comprometimento
72
realidade, uma certa forma de pesquisa - passou a ter papel dominante em detrimento da
relação aos profissionais do ensino básico, e podemos observá-lo na USP. Sua clientela
de volume muito superior aos dos outros programas 210 era, na década de 1970, composta
não engendravam progresso profissional e sem apoio material, era muito grande o
amparados por suas instituições de origem e pela CAPES, cuja modalidade principal de
Capacitação dos Docentes (PICD)212. Janotti observa assim que a pós da USP absorvia
encontravam nelas e não buscava contato com aqueles que não almejassem a carreira
universitária. No caso da UFF, mais da metade dos formados que estudamos eram
primeira turma composta principalmente por professores da casa 215 buscando se adequar
uma prova de seleção216, mas quando isto foi a debate no departamento de História 217,
Falcon coloca que esta foi uma decisão “lógica”. Em outro momento, entretanto, foi
mais crítico:
212
BARBOSA, Caio. Ciência em transe... p. 76.
213
Para Janotti, a desigualdade de condições materiais para o curso teria como consequência que,
dificilmente, a pós graduação seria “obtida exclusivamente pelos mais habilitados intelectualmente”
JANOTTI, Maria. “Alguns problemas...” p. 425. Para a reversão desse quadro, propõe maior política de
bolsas e valorização por parte das secretarias estaduais dos titulados que atuam no ensino secundário.
214
Fichas cadastrais, na Secretaria da Pós-graduação em História da UFF. Dos 51 mestres que analisamos,
29 trabalhavam em instituições de ensino superior.
215
O perfil dos discentes será abordado melhor no próximo capítulo.
216
Universidade Federal Fluminense. Comissão de Pós-Graduação. Curso de Mestrado – Projeto
Preliminar. Sem data. Do arquivo pessoal de Aydil Preis.
217
Universidade Federal Fluminense. Ata da reunião do Departamento de História de 25 de agosto de
1971. Do arquivo pessoal de Aydil Preis.
74
era o foco dos que se graduavam então219. O curso de mestrado, que lhes apareceu
imposto de cima pelo governo, significava uma prática profissional quase inteiramente
nova. Várias referências apontam para uma inexperiência dos estudantes nos domínios
218
Entrevista de Falcon a Côrrea, De que lugares... p. 166
219
Entrevista de Aydil Preis a Côrrea, p. 172. Entrevista de Richard Graham à Revista de História da
Biblioteca Nacional. http://www.revistadehistoria.com.br/secao/entrevista/richard-graham Acessado em
fevereiro de 2015.
75
geração e docente na graduação desde os anos 1960, que nos revela, além do caráter
pesquisa:
220
Entrevista ao autor, 25/02/2014. Sobre sua primeira turma de mestrandos, ver também entrevista de
Richard Graham à Revista de História da Biblioteca Nacional.
http://www.revistadehistoria.com.br/secao/entrevista/richard-graham Acessado em fevereiro de 2015.
221
Entrevista de El-Kareh ao autor.
76
acontecimento determinante para este apoio foi uma capa da revista Veja que, em tom
de denúncia, dizia que a História do Brasil estava sendo escrita por historiadores
americanos e que fontes documentais importantes estavam sendo levadas para os EUA:
receber[recursos].”224
atividades do curso se iniciaram com a docência de Nícia Vilela Luz, que veio da USP.
Entre 1971 e 1974, além da UFF, seriam feitos mestrados em História na USP,
1979, apareceriam cursos de mestrado também na UFSC, UnB, UNICAMP e UFRJ 228.
Esses cursos fazem parte da reforma universitária aplicada a partir de 1968 e não devem
ser confundidos com os que existiam antes: “O chamado “antigo regime” da Pós
instituição universitária que promovia pesquisa em volume considerável era a USP, com
titulação que motivou suas criações231. Além de bibliotecas e outras instalações básicas,
vigente ou com notório saber, como era o caso dos antigos catedráticos” 233. A maior
parte dos doutores brasileiros que poderiam se tornar docentes na pós-graduação foram
formados pela USP, mas era difícil atraí-los para Niterói, tanto pela dificuldade de
constante translado quanto por questões salariais 234: discutindo o problema ainda
persistente em 1976, José Honório Rodrigues sublinha que o salário pago pela USP,
então a única universidade do Brasil que tinha tradição em formar pesquisadores, era
muito maior que o oferecido pelas federais - segundo estimativa, três ou quatro vezes
pelo fato de que, apesar de a USP ter formado 83 doutores no “antigo regime”, o seu
230
FERNANDES, Florestan. Universidade brasileira...p. 227.
231
BARBOSA, Caio. Ciência em transe.... p. 92. No pós-79, o grande debate na CAPES era sobre
massificação da pós-graduação, que teria acontecido em detrimento da qualidade. Nesse momento, a
política da agência será mais restritiva (p.90-6).
232
Entrevista de Aydil Preis ao autor, 7/11/2013. Universidade Federal Fluminense. Regulamento do
curso de pós-graduação em História do Departamento de História. Sem data. Do arquivo pessoal de
Aydil Preis.
233
Entrevista de Ismênia Martins a CÔRREA, Maria. De que lugares... p. 177. Enquando na UFF o
requisito era o doutorado, temos registros de alguns mestres atuando em pós-graduações em História
brasileiras (8 em um total de 95, em 1976) ver WESTPHALEN, Cecília. “Situação da pós...”p. 416.
234
Entrevista de Preis a CÔRREA, Maria. De que lugares... p. 174. Entrevista de Falcon a CÔRREA,
Maria. De que lugares... p. 165
235
RODRIGUES, José Honório. “Os estudos brasileiros e os brazilianists” IN: (Separata da) Revista de
História, n 107. São Paulo, 1976. p. 192..
79
semestre do mesmo ano com professores convidados (um para ministrar curso, outros
quatro para seminários mensais) e contava-se com uma estabilização apenas no segundo
semestre de 1972, quando se estaria “a esta altura com 3 ou quatro professores [do
departamento da UFF] com o título de Mestre e um ou dois com o título do Doutor” 240
236
WESTPHALEN, Cecília. “Situação da pós...”
237
Há outras justificativas. Uma das criadoras do curso, Lena Freitas, coloca que tinha como intenção
fazer com que jovens não se envolvessem com política: “E também porque eu sentia como alguém que
tinha sido convocada para um determinado papel. E esse papel era o seguinte: fazer com que aqueles
moços que estavam ali dentro tivessem um ensino de boa qualidade, estivessem motivados para o
trabalho intelectual e o menos possível eles se envolvessem na política, porque eu entendi que aquele
momento desafiar a política resultava perdas para o sujeito mais fraco. Então, nós temos um certo
sentido histórico, o meu fio histórico me dizia que naquele momento histórico era o de “baixar a bola” e
esperar a hora de reivindicar mudanças.” Como lembra Borges, autora de estudo sobre cursos de
História em Goiás, desviar jovens da política para outras atividades foi também intenção do governo
ditatorial, cujo principal empreendimento nesse sentido foi o “Projeto Rondon”. BORGES, Simone. Os
cursos de História da Universidade Católica de Goiás e da Universidade Federal de Goiás: um olhar
histórico Dissertação. Faculdade de Educação. Universidade Federal de Goiás, 2006. p 206. Sobre o
Projeto Rondon, ver MOTTA, Rodrigo. As universidades...
238
BORGES, Simone. Os cursos de História...p. 207.
239
Idem. p. 211. O que, para uma das criadoras do mestrado goiano, teria outras intencionalidades que
demonstram as tensões políticas na universidade: “Na verdade, falta de recursos e alegadas
preocupações didático–pedagógicas camuflavam a intenção de determinados setores da Universidade,
no sentido de apagar realizações que pudessem ser atribuídas a indivíduos ou grupos que não
privilegiavam a política partidária no meio acadêmico.” SALLES, Gilka V. F. de ; FREITAS, Lena C. B.
de. “O Mestrado em História das Sociedades Agrárias: uma abordagem histórica (1972–1995)”. IN:
História Revista – Revista do Departamento de História da UFG, Goiânia, vol. 1, 1-18. 1996.p. 9–10.
240
Universidade Federal Fluminense. Ofício 15/71 de 15 de janeiro de 1971, do Arquivo pessoal da
Professora Aydil Preis.
80
Planejamento mais modesto foi posto pelo Projeto Preliminar escrito pela Comissão de
Graduação dizia:
Com efeito, o quadro docente dos primeiros anos acabou sendo marcado por
241
Citado por Aydil Preis em entrevista a CÔRREA, Maria. De que lugares... p. 173-4
81
adesão da professora Nicea Villela Luz243, que já era aposentada pela USP. Em
novembro, Luz ministra uma disciplina que concluirá em fevereiro de 1972. Essa
disciplina inicia-se apenas algumas semanas após a aprovação do projeto de curso pela
COMPEG, e ela provavelmente já havia sido iniciada quando a reitoria da UFF passa a
apoiar a criação do mestrado em História por estar, segundo Preis, sensibilizada com a
da diretora do ICHF, a mesma Aydil Preis, que estaria à frente do mestrado em História
até 1983.
polêmicas que também foram expressas em registros posteriores sobre o curso e são
profissionais estrangeiros para preencher as vagas, uma questão que perpassa Graham e
Hilton e se estende a toda a década de 1970 haja vista o grande número de profissionais
de fora do país que atuaram em Niterói. Eles serão uma das principais marcas – ou a
principal – pela qual o curso será conhecido. Abra-se um parêntese para sublinhar que a
maior parte das referências sobre o tema, ao se referir ao conjunto de estrangeiros, usa o
243
Entrevista de Preis a CÔRREA, Maria. De que lugares... p. 173-4
244
Ver Resolução número 130/62 da Universidade do Estado da Guanabara que classifica o pessoal da
instituição. http://www.boluerj.uerj.br/pdf/re_01301962_31051962.pdf
245
Entrevista de Aydil Preis ao autor.
246
UFF. Memória... p. 17.
83
termo “brasilianistas”, sem perceber que nem todos os professores estrangeiros que
sobre outros países da América Latina: esse é o caso de Richard Morse, Michael Morris,
Francis Morton, Roy Glasgow e Carlos Esparza. Ignora-se também que cerca de 1/3 não
presença estava associada à muito mal vista atuação geral dos historiadores
americana para a escrita da História do Brasil nas décadas de 1960 e 1970. Isso incluía
melhor acesso aos arquivos brasileiros, translado para os EUA de bibliotecas e fontes,
tinham uma leitura muito negativa sobre os brasilianistas, abordando sua presença na
visão só teria arrefecido na década de 1980. 248 Cabe salientar que a crítica à presença de
247
RODRIGUES, José Honório. “Os estudos brasileiros
248
MASSI, Fernanda Peixoto. “Brasilianismos, “brazilianists”, e discursos brasileiros” IN: Revista
Estudos Históricos. v.3, n. 5, 1990.
84
os outros que vieram ao longo da década de 1970, não foram uma escolha da
coordenação do curso, mas sim uma oferta da CAPES, que lhes pagava o salário. Se por
um lado Preis nos informa de que esteve à parte na seleção dos profissionais, por outro,
também que nenhum nome lhe foi imposto, e que o currículo dos professores era
com certeza, havia margem para escolha de docentes por parte da coordenadora, e não
coordenadora explica que tem contato com o diretor da CAPES para a (segunda) vinda
de Graham253. De acordo com Ismênia Martins, Francis Morton, que atuou em tal
momento, se juntou ao curso não por conta da ação de algum convênio internacional,
mas por estar disponível no Brasil, onde atuava como diretor de uma empresa
oportunidade de trabalhar no curso, ele cita seu “bom relacionamento com a Aydil”255
Ou seja, não se confirma a imagem de uma agência externa ditando os nomes dos
Por outro lado, também fica evidente o poder de definição da CAPES na escolha
dos nomes, o que aponta para o caráter heterônomo do processo de contratação. O ponto
tem especial relevo quando lembramos que a grande presença de professores norte-
251
Entrevista de Aydil Carvalho ao autor.
252
Carta de Aydil de Carvalho Preis a Richard Graham de 22 de agosto de 1974. Do arquivo pessoal de
Richard Graham.
253
Carta de Aydil de Carvalho Preis a Richard Graham de 1 de novembro de 1976. Do arquivo pessoal de
Richard Graham.
254
Entrevista de Ismênia Martins ao autor.
255
“Porque era professor no departamento de sociologia e tinha bom relacionamento com a Aydil, além
de ter doutorado (era condição rara ainda)” Entrevista de Pedro Demo ao autor. 5 de março de 2014.
86
americanos nas diversas áreas das universidades brasileiras tem ligação direta com a
Entretanto, seria um grosseiro equívoco, como já alertou Motta 259, partir desses
dados para tachar politicamente os docentes trazidos de fora, em especial dos EUA.
Ademais, é fundamental perceber que a vinda desses professores também está ligada à
reconhecido por Falcon, forte crítico dos brasilianistas (por uma questão mais
256
Ver o capítulo “A Usaid e a influência norte-americana” em MOTTA, Rodrigo. As universidades...
257
Idem, p. 113-4.
258
Idem, p. 274-5.
259
Idem, p. 275.
87
intelectual do que propriamente política)260. Temos assim que a vinda dos estrangeiros
não obedece a uma única circunstância. E, se era uma a intenção que governava os
esforços institucionais centrais, seus efeitos só podem ser deduzidos a partir do exame
estrangeiros. Temos que eles são 17 dos 35 que atuaram no curso até 1979, ou seja,
cerca de metade:
Mas a melhor forma de avaliar numericamente suas atuações, uma vez que
260
FALCON, Francisco. História e memória....
261
UFF. Memória.... p. 16-18; e CÔRREA, Maria. De que lugares.... p. 127-133
88
disciplinas262.
262
Para a contagem, nossa fonte foi UFF. Memória...
263
Fonte: UFF. Memória....
89
até 1979, ano que, segundo vimos, marca uma mudança importante no curso. Chegamos
docentes. De um total de 138 ministradas até 1979, 36% (50) estiveram sob sua
professores “de fora”. Ao mesmo tempo, eles servem para relativizar a leitura de
longo da década de 1970. Escrevendo em 1985265, Falcon periodiza o curso nos anos
264
Fonte: UFF. Memória....
265
O texto de UFF. Memória.... é de sua autoria.
90
“...este foi o período em que acabou o domínio dos brasilianistas”266). Seu texto sugere
que é comprometida pelos dados expostos. Não apenas quantitativa, mas também
Graham e Hilton) diz respeito à definição das áreas de concentração (a.cs.) do curso e
foi levantada por Falcon que participou das primeiras formulações sobre a criação do
definidas como História Econômica e Social e História Política e Social 267. Mas com a
chegada de Graham e Hilton, em 1972, elas passariam a ser História do Brasil e História
da América, o que para Falcon se deveu certamente à influência desses brasilianistas 268.
recém-chegados269 (e aqui cabe notar suas palavras de que Hilton vinha ao Brasil
266
Entrevista de Falcon a CÔRREA, Maria. De que lugares.... p. 167-8.
267
UFF, 1986. p. 11-2.
268
Entrevista de Falcon a CÔRREA, Maria. De que lugares...., p. 164
269
FALCON, Francisco. História e memória...p. 26
270
Entrevista de Falcon a CÔRREA, Maria. De que lugares...., p. 165.
91
Segundo ainda coloca, foi inclusive este quadro que, não lhe parecendo
América como mais tradicional frente à primeira alternativa tida como renovadora, de
271
Entrevista de Falcon a CÔRREA, Maria. De que lugares.... p. 165
272
Idem. Ibidem.
273
FALCON, Francisco. História e memória..., p. 26.
274
Idem. p.28. Entrevista de Falcon a CÔRREA, Maria. De que lugares.... O professor pontua que uma
possível exceção entre os brasilianistas seria Robert Slenes, que veio anos mais tarde (entrevista a
CÔRREA, Maria. De que lugares.... p. 166). Em entrevista ao autor, coloca também que não se
considerava à época o americano Victor Valla como parte dos brasilianistas.
275
Entrevista ao autor.
276
FALCON, Francisco. História e memória... p. 26
277
Entrevista de Vânia Fróes (mestre em 74) a Correa, p. 152. Entevista de Aydil ao autor. Entrevista de
Ismênia Martins a CÔRREA, Maria. De que lugares...., p. 177.
92
historiográficas, mas procurando equilibrar seus valores, Richard Graham assim aprecia
a questão:
278
Entrevista de Fróes a CÔRREA, Maria. De que lugares.... p. 153 ; Entrevista de Sohiet ao autor.
279
Entrevista ao autor.
93
Primeiro porque, se os brasilianistas não são “modernos”, tampouco o eram dois dos
historiadores “tradicionais” nos moldes dos que foram criticados, com incorreta
próximo capítulo.
um outro ponto sobre as a.cs: há uma contradição factual entre o relato de Francisco
280
Entrevista a CÔRREA, Maria. De que lugares.... p. 152
281
Entrevista ao autor.
282
Ver os dados sobre orientações e disciplinas oferecidas.
283
Discutiremos a obra desses autores no próximo capítulo da tese.
284
DELACROIX, Christian; DOSSE, François; GARCIA, Patrick. “O momento metódico”...
94
Falcon e o de Aydil de Carvalho Preis, para quem a escolha por História do Brasil e
História da América havia sido feita antes da chegada dos brasilianistas 285 e obedecendo
“Se você fizer uma avaliação, vai ver que naquela época
as Áreas de Concentração no Brasil eram mais voltadas para o
econômico-social e o político-social. Mas as áreas geográficas
nos pareceram importantes na ocasião. Eu fui uma das pessoas
que pensou assim, Pedro Ribeiro pensou assim. Nós achamos
que deveria ter História do Brasil. Mas há divergências nas
opiniões. Por exemplo, a tendência era realmente você
denominar as Áreas de Concentração como o padrão que
seguia as outras universidades, como Campinas que era
Econômico-Social. Principalmente, a área econômica era
bastante privilegiada e prestigiada. O Pedro Ribeiro era
professor titular de História da América. Ele foi o primeiro
professor dentro do Departamento de História que tinha
titulação, os outros não tinham. Porque precisava ser professor
titular doutor para poder ministrar aulas de pós-graduação.
Então, se ele era o orientador ele iria levar os alunos dele para
fazer pesquisa dentro da área que ele conhecia melhor. Em
compensação, Dona Nicea Villela Luz era professora de
História Econômica do Brasil. Então, foi feita uma
combinação: quem fez História do Brasil estudava mais história
econômica, e quem fez História da América estudava mais
história política,que era a área de pesquisa e estudo do
professor Pedro Ribeiro. Não foi diferente disso, a ideia foi
essa.
Depois, quando saiu aquela revista [reportagem da Veja
de 1971 denunciando a atuação dos brasilianistas na
historiografia brasileira], nós achamos que realmente
precisávamos falar de História do Brasil. Depois, outra coisa
importante: nós não conhecíamos o continente latino-
americano. Não se conhecia bem a literatura e a história latino-
americanas. Então, a gente começou a considerar isso como
uma necessidade. Mas isso não foi uma coisa discutida com
uma comissão, foi uma coisa mais contingencial.”286
285
Entrevista de Aydil Preis a CÔRREA, Maria. De que lugares.... p. 175
286
Entrevista de Aydil Preis ao autor.
95
interpretação de Falcon, isto é, a de que a definição das a.cs. foi uma decisão de Graham
Veja-se que essa questão nos suscita reflexões importantes à medida em que
versa tanto sobre a dinâmica de poder no interior do curso quanto sobre a memória dos
atores, para quem ela ecoa ainda hoje com muito significado desde aquele início dos
anos 1970: Falcon entende ter sido sua proposta historiográfica rejeitada pelas figuras
dos primeiros norte-americanos (batalha que, de acordo com sua narrativa, embora
perdida em 1972, seria vitoriosa a partir de 1979 com o retorno dos “exilados”). Aydil
Preis, por sua vez, advoga a correção do proceder que levou à definição das a.cs e a
qualidade do que foi produzido naquela década em que tantos estrangeiros atuaram em
Niterói. Essa querela nos é, por um lado, insolúvel, dada a carência de documentação
que permita cotejamento e alguma independência frente aos relatos orais mais recentes
(as primeiras atas dispostas na secretaria do programa são de 1977); e por outro lado, ela
nos é de importância reduzida pois as definições que o curso de mestrado tomará, bem
como os significados das áreas de concentração junto aos discentes, não dependerão de
que ultrapassa a presença dos professores Graham e Hilton (que atuaram apenas até
1974, com Graham retornando em 1977). Por isso, discordamos do peso que Falcon
atribui à decisão pelas áreas de concentração para a definição do – a seu ver, ruim -
seguinte conclusão:
287
Entrevista ao autor.
96
(ec.soc – pol.soc. ou Brasil – América) estaria de fato valendo nos diferentes momentos
efetivo dos rumos historiográficos vividos em Niterói são necessários uma ampliação
dos dados e análises mais detidas sobre, por exemplo, o perfil dos professores e das
disciplinas. Por esse mesmo motivo, não se pode fazer uma comparação entre os cursos
concentração. Saber quais elas eram em 1976, entretanto, não nos fará nenhum mal:
288
CÔRREA, Maria. De que lugares.... p. 36
97
passou a dar frutos em 1977, não produziu, pelo menos até 1984, nenhuma dissertação
de Assis, criado em 1980292, só terá, passados dez anos, uma única dissertação que cuida
289
WESTPHALEN, Cecília. “Situação da pós...”...p. 411.
290
Cecilia Westphalen (“Situação da pós...”), não contabiliza o programa de mestrado da UFG por não
considerá-lo autônomo ao da USP. Salles e Freitas, que participaram dos esforços de criação do curso, nos
falam que ele se tornou autônomo em 1974. Segundo essas autoras, o curso definia-se como História do
Brasil, sem que tivesse área de concentração. SALLES, Gilka. & FREITAS, Lena. “O Mestrado...”... p.
10.
291
CÔRREA, Carlos Humberto org.. Catálogo das dissertações e teses dos Cursos de Pós-graduação em
História. 1973-1958. Florianópolis. Editora da UFSC, 1987.
292
CORRÊA, Anna Maria Martinez. “Curso de Pós-Graduação de História da América Latina” IN:
98
da América Latina não brasileira293. Será bem diferente o quadro em Niterói: das 56
dissertações produzidas até 1979, 21 (37,5%) são com esse recorte. 294 A nosso ver, essa é
a principal especificidade do curso em seus primeiros anos, o que se revela também pelo
Tanto interesse nesse recorte geográfico não veio espontaneamente dos discentes nem é
tributário de sua formação prévia: o ritmo numérico das dissertações que trabalham com
período: Pedro Freire Ribeiro, especialista em História da América foi um dos poucos
professores que atuaram por toda a década de 1970, se não ministrando disciplinas,
brasilianistas, fez também com que América fosse altamente valorizada em disciplinas e
orientações. É esse tipo de condição que vigorou pela década que nos permite explicar o
quem está falando, em 1971 ou 1972 sobre quais seriam as a.cs.. Ou seja, conforme
aulas e orientações, que promoveram várias das características dos trabalhos discentes,
historiografia. Ela aponta para o fato de que a dinâmica de contratação dos profissionais
(para cujo conhecimento, infelizmente, esse tese muito pouco poderá contribuir) foi, aí
Brasileiros (EPB) tanto na graduação quanto na pós. Ela seria a versão para o ensino
que os conteúdos da disciplina estavam sendo subvertidos e entendeu que o expurgo ali
não havia sido suficiente.297 Em Niterói, em 1971, chegava uma circular do MEC
plano para que EPB fosse ministrada de acordo com as intenções pré-determinadas. Em
Nós não temos uma lista completa dos professores de EPB que atuaram no
Letras, foi coordenador da matéria na década que estudamos. Em 1974, como vimos, o
297
MOTTA, Rodrigo. As universidades... p. 191
298
Seção de Arquivo Permanente da Universidade Federal Fluminense. Acervo ASI-UFF.
100
talvez como parte da formação para a tarefa que assumiu 299. Outros dois professores que
atuaram na pós de História com EPB foram Nilo Bernardes, geógrafo de significativa
lembrado como alguém que, mesmo não sendo de esquerda, lutava contra o arbítrio na
universidade301.
Apesar dos esforços e da pressão de órgãos, em alguns locais a EPB teve pouco
impacto302. Esse foi o caso no mestrado em História da UFF. No histórico dos discentes
consta suas participações nos cursos, mas, ao que tudo indica, não se tratou de uma
experiência significativa:
Os valores que a ditadura quis veicular com EPB não tiveram grandes
repercussões na produção científica dos mestrandos, e nem foram maiores seus esforços
para dirigir ideologicamente os conteúdos das pesquisas. Isso não significa, para voltar à
colocação de Bourdieu com que iniciamos essa seção, desprezo dos dominantes sobre o
nacional, onde realizou um projeto de grande magnitude: Fonseca nos fala de uma
1.4 Conclusão
“Deus lhe pague”
(Chico Buarque)
dos cursos de História não é muito volumoso305, apesar de crescente. Com o apoio de
poucas fontes secundárias para o nosso objeto, temos de lidar com assuntos pouco
passa pela série de dificuldades metodológicas típicas da História Oral. Por exemplo,
nossa busca por contato com as personagens não deixou de ser marcada por recusas, e
de docentes e discentes que passaram pelo mestrado. Assim, ao longo do texto, tivemos
o cuidado de que hipóteses importantes não tivessem como sustentáculo apenas uma ou
outra declaração. Não obstante, maiores confrontos com o que disseram se fazem
necessários, e nós detectamos vários erros factuais em suas falas. Procuramos também
continuamente apontar os limites das nossas inferências, muito embora isto fosse
304
FONSECA, Selva Guimarães. “Revisitando a história da disciplina” IN: Didática e prática de ensino
de História. Experiências, reflexões e aprendizados.Campinas: Papirus, 2012.
305
FERREIRA, Marieta. A História...p. 12-3.
102
deve escapar da análise crítica, e em relação a ela também é necessária uma ampliação
das referências.
lado há características salientes das quais procuramos dar conta nesse capítulo.
ensino superior como um todo, chegou de cima para baixo cega para as especificidades
306
SCHWARZ, Roberto. “Cultura e política, 1964-1969.” IN: Cultura e política. São Paulo: Paz e Terra,
2009.
307
Ver FERNANDES, Florestan. Universidade brasileira.... E BARBOSA, Caio. Ciência em transe....
Por exemplo, “A responsabilidade no processo avaliativo dos cursos de pós-graduação vai tornar a
Capes não só uma agência de fomento, mas uma espécie de agência reguladora. O contexto elaboração
do I PNPG, possibilitou pela primeira vez que houvesse uma unificação, ou melhor, um reconhecimento
de um método avaliativo que deveria ficar sobre a responsabilidade da Capes.” (p.70).
103
308
FERNANDES, Florestan. Universidade brasileira... p. 229.
309
Idem. p. 257.
104
História da UFF. Vamos expor cada trabalho discente, identificando principalmente seus
momento do nosso estudo, a intenção não é realizar uma crítica das dissertações, mas
termos com os quais os próprios discentes apresentaram seus trabalhos. Então, se toda
historiografia tem uma teoria, uma metodologia e hipóteses, nós nos ocuparemos
significa lidar com dados de fácil localização e exposição. O nosso objeto não pode
configurar no nosso estudo, por mais ideal que isto fosse, independentemente da nossa
deve envolver uma leitura mais detida e uma escolha de nossa parte para uma
classificação de fins quantitativos. Os exemplos que aqui temos em mente são uma
Uruguai.
discussões é astronômica. Esse objetivo de classificação deve nos fazer considerar não
várias tradições intelectuais, a cultura tem significados de poder no meio social, ou se,
poderia ser algo diferente de política ou como poderia haver um estudo do político que
trabalhos como “social”, podemos notar o quanto a mera mobilização dos termos nos
remete a muitas referências com as quais dialogar. Com prejuízo de reflexões mais
profundas, mas com consciência dos limites que isso acarreta, vamos lidar com sentidos
abordagem suficiente para o reconhecimento dos escritos dos mestrandos, que serão
aprofundados, e com eles a nossa própria leitura, em momento posterior desta tese. As
dificuldades que nos restam são de menor expressão: os estudos que apresentam de
310
WOOD, Ellen. “A separação entre o “político” e o “econômico” no capitalismo” IN: Democracia
contra capitalismo. A renovação do materialismo histórico. São Paulo. Boitempo: 2003.
106
no estudo que tem duas metades bem definidas e desconectadas, uma sobre
nosso texto. Os objetivos e as hipóteses principais das dissertações nem sempre estão
expostos com clareza nas primeiras páginas. Há casos extremos de redação muito
confusa, com vários assuntos trazidos seguidamente sem que muitas vezes se consiga
uma dissertação, vimos até mesmo o tema de certa seção não condizer com seu
dissertação, discordar da própria descrição que os autores fazem sobre seus trabalhos:
há um autor que entende “fugir à polêmica” sobre um ditador uruguaio e diz nos
estadista não agia por interesses particulares, mas visando o bem da nação.
soluções que venham a ser sugeridas por tais problemas 311. Como apontamos, uma
311
CARDOSO, Ciro. Uma Introdução à História. São Paulo. Brasiliense, 1981. p. 13, 23, 57.
107
reflexões. Tratam-se de poucos: era um momento em que havia, pelo menos entre os
nossa leitura e consequente exposição de uma dissertação podem conter uma avaliação
crítica e teórica da nossa parte. Por exemplo, ao nos referirmos a dois trabalhos que se
debruçam sobre dinâmicas econômicas dos municípios tendo como objeto principal o
agentes sociais (muito embora não estejam de todo ausentes) – o que aponta para um
dicotomia entre uma parte da abordagem que seria “objetiva” (a de apresentação dos
trabalhos) e outra “subjetiva” (de interpretação sobre eles), apesar do nosso esforço em
aprofundar a leitura das dissertações em momento posterior, deixando para este uma
Por isso também neste capítulo discorreremos sobre cada uma das dissertações,
inclusive, na maior parte dos casos, considerando o trabalhado em cada capítulo delas.
leitor maiores dimensões dos trabalhos e construir ele próprio entendimentos outros,
diferentes dos trazidos por nós – o que seria mais difícil com exposições demasiado
sucintas ou com uma que apenas evocasse o texto analisado em função do argumento
dissertações varia bastante e guarda relação com o quanto elas discutiram os elementos
108
que são pertinentes à discussão que propomos. O leitor menos ocioso poderá ignorar as
conclusões”.
turmas de alunos (que definiremos melhor abaixo). Depois, consideramos para a ordem
vezes, em uma subseção do capítulo juntamos mais de uma dissertação que tem alguma
numérico desses elementos. Esses dados – como, por exemplo, os sobre referências
bibliográficas - devem sempre vir acompanhados de uma análise qualitativa, sob o risco
de não termos identificado dos trabalhos as características que buscávamos neles. Essas
eventuais falhas, entretanto, não comprometerão a nossa análise, pois ela não se fia em
ideal seria recuperar o cotidiano de suas aulas e orientações, que são suas interações
com os discentes, mas essas são experiências intelectuais que não deixam registro
escrito. Elas ficam nas memórias dos atores, mas, além das inúmeras dificuldades
básicas que tem aqueles que recorrem a qualquer relato oral sobre o passado, tem-se
também que uma análise equilibrada a partir de entrevistas deveria lidar com uma
tempo de pesquisa de que dispomos. Ter como base principal as poucas entrevistas que
várias falas e às grandes contradições entre elas. Dessa forma, para compor um perfil
momento em que lecionaram e que tratava dos temas explorados em seus cursos e
dissertações.
110
2.1 Discentes
primeiro semestre de 1974. Tal é o que define o comum de experiências que tiveram 312.
Graduação, contém, além de dados pessoais como idade e endereço, espaço para as
desses espaços não foram preenchidos e principalmente algumas referências a datas não
estão claras. Entretanto, com aquilo que temos e buscando referências complementares
mulheres: os homens são apenas um pouco mais de ¼. No começo do curso, a idade dos
alunos, que vai de 23 a 41, tem uma média de 31 anos. Apenas 4 não são naturais do
Rio de Janeiro, mas todos têm residência no Estado. Quanto à residência, apenas 4 não
eram de Niterói: três do Rio de Janeiro e um de São Gonçalo. Dos que moravam no lado
312
Há a exceção de 3 discentes que chegaram a cursar algumas disciplinas no segundo semestre de 1974 e
em 1975.
313
As datas em que as dissertações foram finalizadas, e que constam em suas capas, não necessariamente
coincidem com o ano de suas defesas.
314
Universidade Federal Fluminense. Memória dos Cursos de Pós-Graduação. Perfil do Mestrado em
História e sinopse das dissertações apresentadas para a obtenção do grau de Mestre em História.
Niterói. Eduff, 1986. Universidade Federal Fluminense. Programa de Pós-Graduação em História.
Catálogo de Teses e Dissertações, 1974-1995/ Vânia Leite Fróes, coordenação geral. Niterói: UFF;
Brasília: CNPQ, 1996.
111
Estado da Guanabara (não por mera coincidência, ambas residentes na cidade do Rio de
Janeiro). Como a maioria tem residência em Niterói, podemos supor, para aqueles de
quem não dispomos os dados completos, que se formaram na UFF 315 (há alguns casos
assistentes: Sônia Viana (História da América), Vânia Fróes (História Medieval), Almir
El-Kareh (Introdução aos Estudos Históricos), Célio Silva (História do Brasil), Geraldo
assistentes): Berenice Brandão, Ana Maria dos Santos e Dylva Moliterno. Fora da UFF,
Kareh em livro não especificado e, de autoria de Rachel Sohiet, uma contribuição sobre
Em suma, o que temos como perfil médio dessa mestranda da primeira geração,
residente em Niterói316, formada em História pela UFF nos anos 1960, com experiência
Não se pode recuperar com precisão quais eram as principais referências teóricas
falas apontam para que o marxismo e influências “francesas” tinham grande prestígio
História parecia estar passando por uma transição entre uma ênfase no factualismo para
uma maior reflexão conceitual. Técnicas de pesquisa, entretanto, eram ainda bastante
ignoradas e, segundo Pedro Demo, sociólogo que se juntou ao corpo docente logo em
disciplinas que cursariam significariam para esses discentes uma nova formação, a ser
316
E possivelmente tendo essa mesma cidade como origem, quando somamos o dado, confirmado em
alguns, de terem concluído a graduação na UFF.
317
Entrevista de Demo ao autor (05/03/2014). Entrevista de Aydil a Correa. Entrevista de Fróes a
CÔRREA, Maria. De que lugares....
318
Entrevista ao autor (05/03/2014)
113
1971 a fevereiro de 1972. Aposentada pela USP quando veio à Niterói, era especialista
ministraria uma outra disciplina. Os cursos da professora Luz foram importantes para
que alguns alunos iniciassem e definissem suas pesquisas sobre áreas do Recôncavo da
Guanabara319.
Foi nesse período o segundo em número de orientações (11) e está entre os quatro
professores que mais ofertaram cursos (9). Lecionou de 1972 até 1975, retornando em
1979 para dar uma disciplina. Teve atividades de orientação nos anos de 1976, 1977 e
1978, ou seja, sua presença estende-se por toda a década. Os cursos oferecidos foram
todos sobre América Latina do período de independência até o início do século XX. Não
descrições genéricas.
estando, pelo menos desde 1962, entre aqueles professores de maior classificação na
Seu livro fruto de maior pesquisa e que guarda relação com o conteúdo das aulas
História da USP, trabalhos de sua autoria na década de 1970, o que seria melhor
independência não deve ser explicado apenas por fatores isolados324. Uma de suas
nacionais325, o que significa uma exposição de como, em cada país, o processo que
distintas.
322
Entrevista de Aydil Preis ao autor
323
UFF. Memórias...p. 17
324
RIBEIRO, Pedro Freire. Raízes do pensamento político na América Espanhola (1780-1826). EdUFF.
Niterói, 1995.p. XI e 1.
325
Idem. P XVIII
115
solução, que ao fim seria a independência (ou “revolução”). Boa parte do estudo de
Ribeiro é dedicada mostrar como essa “consciência” vai surgindo e evoluindo em vários
sentido do processo histórico são os crioulos líderes 326. Assumindo como problema
histórico o projeto de nação (ou como diríamos nós, “de poder”) dos líderes crioulos,
contemplando conflitos sociais classistas e querelas internas, entende que estes devem
inteiramente populares” poderiam trazer ruína, já que certas qualidades não existiam
forma, assim comenta um discurso de San Martín que se inicia com a frase “O gênio do
Pedro Freire Ribeiro se encaixa bem naquelas características clássicas com que
nacional com o protagonismo dos grandes homens toma mesmo feições psicologizantes
(como pode ser visto pela citação acima), além de acríticas e positivadas. Começa assim
uma citação de Bartolomé Mitre sobre Francisco Miranda, que para Ribeiro é a melhor
Stanley Hilton. Richard Graham é ainda hoje um estudioso do século XIX brasileiro,
Vargas. Ambos estiveram no programa entre 1972 e 1974 (Graham retornaria em 1977).
orientados.
328
Idem. p. 137-8
329
Idem. p. 48
117
“Britain and the onset of modernization in Brazil 1850-1914” 330. O tema do livro foi
inglês no Brasil”. Neste estudo, uma das primeiras questões de Graham é tentar definir
modernização tenha acontecido em 1930, 1914 ou 1889, o autor prefere situar o seu
início em 1850, ainda que a data, como reconhece, seja discutível. A sua definição de
Outro texto que utilizamos para conhecer o perfil desse historiador foi o livro
lançado em 1979 pela editora Perspectiva, que consta de uma série de ensaios que
330
GRAHAM, Richard. Britain and the onset of modernization in Brazil 1850-1914. Cambridge
University Press, 1972.
331
GRAHAM, Richard. Escravidão, reforma e imperialismo. São Paulo. Editora Perspectiva, 1979.
118
internacional332
Emília Viotti da Costa e Paula Biguelmann, expondo seus principais argumentos. Para
à tradição deste país em que “as obras históricas não foram cuidadosamente
Jr., cuja trabalho poderia apoiar asserções dogmáticas sobre a escravidão 333. Graham não
explica que a economia colonial persista até hoje, ao passo que a escravidão acabou
no século XIX?”334 Graham também lança críticas que ele próprio circunscreve a uma
questão de estilo. Nesse sentido, Cardoso é afoito, imaginoso e mais teórico; enquanto
nas tensões sociais e políticas então contemporâneas, como o debate sobre reforma
agrária dos anos 1950 e 1960, observando como a abolição foi insuficiente para a
332
Idem, p. 9
333
Idem, p. 19
334
Idem, p. 23
335
Idem, p. 19
336
Idem, p. 15
119
política, em outro artigo aponta que a implementação do sistema republicano teria posto
fim ao sonho de reforma agrária, “como outros golpes puseram fim a outros sonhos”337.
paternalismo.
entendimento das forças que levaram à abolição são: a ascensão das exportações de café
e a expansão das novas regiões cafeeiras; e o crescimento das cidades 340. Sobre a
primeira, diz o autor que a região cafeeira de São Paulo ergueu-se com empresários
rurais de espírito inovador que, por exigências mais modernas, precisavam de uma mão-
de-obra mais abundante e flexível que aquela que a escravatura poderia oferecer341.
Sobre a última, defende que o mundo urbano propiciou uma mentalidade contrária à
Graham soma outros fatores como a pressão inglesa fomentada não por interesses
capitalistas, mas pelos valores da classe média britânica que tendiam a dominar a
337
Idem, p. 11
338
Idem, p. 15
339
Idem, p.60
340
Idem, p.62
341
Idem, p.63
120
Podemos concluir que sua compreensão não é marcada pela “falta de relações
causais”, como uma vez Sodré classificou os trabalhos dos brasilianistas 343, e como
estes são reconhecidos de forma geral. Por outro lado, realmente não há nenhuma
delas com seus temas e perspectivas mais específicas. Trata-se também de um autor que
contemporâneos.
que ele, como outros brasilianistas, foram fundamentais para o aprendizado do trabalho
com fontes primárias, de que os professores do Rio de Janeiro e Niterói careciam muito.
Aqui não falamos, do que já foi referido, da veiculação de uma visão “empirista” que
fez contraponto ao “teoricismo” que estaria em voga entre os estudantes; mas do próprio
trabalho empírico que faz parte da atividade básica do historiador. Como mencionado
no capítulo anterior com as próprias palavras de Richard Graham, o trabalho com fontes
Stanley Hilton, que chegou com Richard Graham, teve uma importante presença
entre os alunos da primeira geração do curso entre 1972 e 1974. Foi orientador de 3
século XX (época Vargas)” (Primeira Parte e Segunda Parte), “História diplomática dos
342
Idem, p. 71
343
SODRÉ, Nelson Werneck. História e materialismo histórico no Brasil. São Paulo. Global, 1987. p. 27
121
De acordo com as ementas, vários desses cursos procuravam estimular o trabalho com
fontes primárias.
inclusive foi aluno de José Honório Rodrigues em 1963. Desde o mestrado, concluído
governo de Vargas. Entre 1966 e 1971, empreendeu pesquisa de fôlego que geraria “O
1939”344. Este livro foi lançado primeiramente em inglês em 1975, ganhando uma
edição nacional dois anos depois pela Civilização Brasileira com tradução de Carlos
Seu objeto de estudo foi, como define, a forma de defesa que tomaram os
internacionais importante em uma época de Guerra Fria e não parece por acaso que
Fellowship Program346. Como coloca, “Em certo sentido, este livro é um estudo sobre o
estrategistas do New Deal”347 Segundo José Honório Rodrigues, que prefaciou o livro,
O trabalho com fontes foi vastíssimo e, segundo o próprio Hilton, ele pode
344
HILTON, Stanley. O Brasil e as Grandes Potências. Os aspectos políticos da rivalidade comercial.
1930-1939. Rio de Janeiro. Civilização Brasileira, 1977.
345
Idem. p. 11
346
Idem. Ibidem.
347
Idem. p. 27.
348
Idem. p. 14.
122
“brasilianista” de amplo trabalho com fontes. Seu trabalho de pesquisador lhe fez ter
contatos próximos com pessoas de poder como Alzira Vargas, General Pantaleão Pessoa
expresse simpatia pelos brasileiros responsáveis pela defesa dos interesses nacionais 351.
Também, Hilton coloca que, ao invés de trabalhar com categorias genéricas, procurou
agentes também é considerada pelo autor, que entende o “personalismo” como um traço
Para a abordagem da década de 1930, o autor tem como uma das hipóteses
internacional num mundo que se dirigia para a catástrofe, a essência desse realismo, o
349
Idem. p. 21. Pelas listas de agradecimento e prefácios, a relação de Hilton com muitos atores históricos
ou seus familiares foi próxima. Em artigo de 2009, Tiago Losso teve essa questão como objeto
observando como categorias elaboradas por ideólogos do Estado Novo adentraram na historiografia,
levando em conta a relação, também pessoal, de descendentes de personagens históricos e de
historiadores biógrafos. Uns dos pontos de atenção do autor é atuação de Alzira Vargas e o livro de
Stanely Hilton lançado em 1994, “Oswaldo Aranha – uma biografia”, que para Losso tem continuidade
com o discurso oficial sobre o período. LOSSO, Tiago. “Um olhar estrangeiro na História do Brasil: a
influência das pesquisas norte-americanas na historiografia sobre o Brasil” IN: ANPUH – XXV
SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA – Fortaleza, 2009. http://anpuh.org/anais/wp-
content/uploads/mp/pdf/ANPUH.S25.1501.pdf
350
HILTON, Stanley. O Brasil e as.... p. 17-20.
351
Idem. p. 11-2
352
Idem. p. 27
353
Idem. p. 75
123
na era Vargas. Além de ter sido tema de uma de suas disciplinas, também o foi de duas
1975 (edição nacional de 1977)355, temos uma abordagem do autor para o período de
primárias e secundárias, que são usadas para construir um quadro geral da dinâmica da
economia brasileira. Seu grande ponto, entretanto, é analisar, como em outros temas de
e quais são suas propostas. Procura então principalmente demonstrar (e nisso entra em
industrialização como um objetivo central mesmo antes do Estado Novo. O autor vai
construindo o seu texto mostrando, então, como essas ideias eram formuladas, seus
econômica” de Hilton, se assim quisermos chamá-la, tem como horizonte ser uma
354
Idem. p. 38
355
HILTON, Stanley. “Vargas e o desenvolvimento econômico brasileiro, 1930-1945: uma reavaliaçãode
sua posição sobre industrialização e planejamento.” IN: O Brasil e a crise internacional (1930-1945). Rio
de Janeiro. Civilização Brasileira, 1977.
124
aprendizado do trabalho com fontes356, dando sequência ao que foi iniciado com a
professora Luz.
Atuando de 1973 a 1975, Pedro Demo foi um dos três professores que mais
lecionou disciplinas na pós de História até 1979, um total de 10. As principais matérias
ementas, buscava fornecer uma visão geral de metodologia em ciências sociais e dar
uma matéria instrumental, “a saber, serve [que sirva] à pesquisa, juntamente com as
Bastide, Popper, Dahrendorf, além de textos próprios. As outras duas disciplinas, que
capitalismo e América Latina. Para a segunda, Giddens, Dahrendorf, Lukacs, além dos
Saarbrucken (1967-1971), com uma tese premiada e publicada em alemão em 1973 que
versava sobre Marcuse. Retornou ao Brasil em 1971 e trabalhou no Centro João XXIII
356
Entrevista de Vânia Fróes a CÔRREA, Maria. De que lugares... p. 153. Entrevista de Rachel Sohiet ao
autor.
125
governamentais.
professor, mas sem que este se considerasse, segundo suas palavras em entrevista que
357
http://pedrodemo.blogspot.com.br/p/curriculum-vitae.html
126
dado o seu caráter inerente à dinâmica social, discute as suas formas de “regulação”.
Sua obra de maior relevância para nós, pois trata do tema de aulas que ministrou
contra dogmas e ao caráter aberto da ciência: “só pode ser respeitado como científico
Assim, o conhecimento estaria marcado por uma qualidade formal e por uma
questão dos fins, dos conteúdos e da prática histórica. Ela aponta para a dimensão do
cientista social como cidadão, como ator político, que inevitavelmente influencia e é
estrutural, “...que nos parece a mais consentânea com a realidade histórica, porque
364
Idem, p. 19
365
Idem, p. 21
366
Idem, p. 25
367
Idem, p. 84
368
Idem, p. 84
128
equilibra a contento o jogo das condições objetivas e subjetivas”369. Ou seja, sua visão
dos alunos da primeira geração concluiu suas disciplinas, ainda teve um curso sobre
Brasil Colonial do professor Bailley Diffie, o único que este ministrou no programa.
Contaria também com o primeiro curso da professora Ismênia Martins, a quem nos
369
Idem, p. 88
370
Idem, p. 89
371
Idem, p. 95
129
seguinte:
Ribeiro.
outras 3). Outras duas disciplinas referem-se ao “período colonial”, mas em suas
“político”, com muitas disciplinas abordando ambas as esferas. Não podemos ter maior
130
defenderam seus trabalhos até agosto de 1974, isto é, que concluíram seus mestrados em
pouco mais de 2,5 anos372. Com o fim de seus contratos, os dois norte-americanos
deixaram o curso e alguns alunos que haviam iniciado trabalhos sob suas orientações
subsequentes.
professor que não ministrou disciplinas para a primeira geração mas que se tornaria
discutiremos posteriormente.
372
O encurtamento do tempo de curso de mestrado, que à época tinha 4 anos como padrão, pode ter se
dado por conta da urgente necessidade de título para aqueles que pretendiam prestar concurso a professor
assistente na graduação (Entrevista de El-Kareh ao autor – 26/02/2015). De qualquer forma, os já citados
planejamentos do curso previam que ele poderia ser concluído entre 2 e 4 anos
373
Universidade Federal Fluminense. Memória dos Cursos de Pós-Graduação. Perfil do Mestrado em
História e sinopse das dissertações apresentadas para a obtenção do grau de Mestre em História.
Niterói. Eduff, 1986., p. 12
374
A importância de salientar a palavra “numericamente” está no fato de que o volume das atividades de
lecionar, orientar ou publicar de um profissional pode não corresponder ao seus prestígio e influência
intelectuais.
131
2.3 Dissertações
crédito entre 1930 e 1944 e sua importância para a transferência de recursos para o setor
crescente de crédito por parte do setor da produção voltado para o mercado interno. A
importância desse crédito bancário se deu pela pouca possibilidade dos industriais de
obterem recursos tanto através de venda de ações como através de recepção de capitais
estrangeiros.
que, ao contrário do que alguns colocam, a evolução do sistema bancário fez parte da
prática política de Vargas, assim como seu estímulo para a industrialização. Além disso,
Oliveira demonstra que desde o Governo Provisório havia a consciência por parte de
375
OLIVEIRA, Geraldo de Beauclair Mendes de. A evolução do sistema financeiro na época Vargas.
Dissertação de Mestrado em História. UFF, 1974. 67p. Orientado por Stanley Hilton.
376
p. 17
133
dos setores da produção industrial. Outra medida seria a Caixa de Mobilização Bancária
que assegurava aos bancos maior capacidade de mobilizar seus ativos para fazer face a
necessidades gerais da economia. Pode-se concluir portanto contra a tese advogada por
Boris Fausto, em “A Revolução de 1930”, de que o Governo Provisório tinha uma linha
contrária aos interesses industriais, opinião que se possibilita apenas pela limitação da
análise à política cambial377. Neste primeiro capítulo, a Celso Furtado o autor também
coloca suas críticas, essas mais pontuais, sobre a dinâmica das importações e o
interno. É contestada a tese de Furtado que põe ênfase “quase exclusiva” nos capitais
do setor do café se dirigiram para a produção de algodão. O autor segue então para
377
p. 20 e 34.
378
p. 35-6.
379
Idem. p. 4
134
documentos oficiais como relatórios e decretos e faz pouco recurso a fontes secundárias,
parte das quais são alvo de críticas do autor. Assim, a dissertação apresenta-se como
econômico na época Vargas, 1930-1939”381 (1m) coloca que seu “objetivo é, com base
em vasto material empírico, mostrar que Vargas, de plena consciência, exerceu uma
unicamente com as expressões do estadista, mas a cada capítulo vai explorar alguma
380
Idem. p. 60
381
MAGALHÃES, Marize Arcuri. O desenvolvimento econômico na época Vargas. Dissertação de
Mestrado em História. UFF, 1974. 67p. Orientado por Stanley Hinton
382
Idem. p. 4
135
Industrial de 1936, até então só citado, de leve, por Humberto Bastos e colocado em
sua devida importância por Stanley Hilton” 383. No terceiro, trata das discussões da
defendem que “...até o fim da década dos trinta, inexistia no país uma ideologia
econômico no Brasil”) que, “embora reconhecendo uma fase nova nas relações entre o
Estado e o sistema político-econômico, nega que isso tenha sido resultado de um plano
alfandegárias, etc.. (sem contudo discutir o aspecto trazido pelo seu colega Oliveira, da
383
Idem. p. 4
384
Idem, p. 6
385
Idem, p. 53
386
Idem, p. 18
136
Participariam do inquérito órgãos estatais e privados nos diferentes estados e havia uma
produção, tipos e qualidades da produção, preços dos produtos, impostos e cargos, etc..
Magalhães registra que houve problemas tanto pelo atraso da entrega dos relatórios
consumo de produtos nacionais, etc.. De São Paulo, veio o relatório mais completo,
capitaneado pela FIESP que, entre outras coisas, ressentia-se dos encargos trabalhistas.
A conclusão da autora é que “boa parte das reivindicações contidas no inquérito sobre
para sua execução e as discussões sobre diferentes propostas (como por exemplo a
387
Idem, p. 32
137
realização efetiva.”388
(6m), pela eleição de um espaço como objeto, poderia ter sido defendido também em
da localidade. Aqui o incluímos como “história econômica” dada a atenção por aspectos
para o local estudado391. Assim, o trabalho foi feito com bastante recurso a fontes
século XIX. Isso permitiu à autora a construção de mapas e tabelas estatísticas sobre
seguinte, que nos parece o principal do trabalho, “Estrela, uma comunidade urbana em
construção da Estrada de Ferro D. Pedro II, etc.. Não é trazido a primeiro plano, em
especificidade, os agentes sociais, muito embora não estejam de todo ausentes 392. O
objeto é o próprio espaço e como ele sofre e repercute ações econômicas e materiais,
tendo como pano de fundo a evolução do momento de sua maior importância para o
de Estrela (que compreendia áreas hoje pertencentes a Caxias, Nova Iguaçu, Petrópolis
e Magé):
amplo de declínio do café fluminense, muito embora entenda que a explicação depende
392
Ver, por exemplo, p. 39.
393
Idem p. 83.
139
entanto, não vincula a ideia de mercado apenas à existência do grande comércio como
Pirenne o faz.”396 Weber também envolveria mais elementos para caracterizar uma
partir disso estabelece subtipos de acordo com o traço dominante em cada cidade 397.
A partir dos dados levantados, conclui que, tomando décadas diferentes, Estrela
Conclui também dizendo que a explicação dos fenômenos históricos depende das
premissas, que no caso são os conceitos de urbanização, sem indicar predileção por
econômicas. Aqui também não toma relevância os agentes humanos e suas atuações
plano a especificidade da dinâmica interna do município para que esta não esteja
demonstrará que havia certa diversificação na economia de Itaboraí, inclusive com certo
mercado interno, e, por não ser tão estruturada a partir de produção monocultora para
mercado externo (café), ela pode ser mais resistente aos fatores conjunturais que
400
Idem p. 93-5.
401
SANTOS, Ana Maria dos. Vida econômica de Itaboraí no século XIX. Dissertação de Mestrado. UFF,
1974. 124p. Orientada por Richard Graham.
402
Idem. p. IX
141
crescimento403. Santos mobilizou uma quantidade grande de fontes, boa parte delas
cartórios, etc.. Seu valor historiográfico foi, além de procurar fornecer uma
algumas das leituras generalistas sobre o Recôncavo, seu trabalho é quase que
município com seus efeitos de sua decadência, posto que a dependência exclusiva da
etc.. Santos coloca que a importância da cana para o município é que ela o permitiu
maior estabilidade de rendas e, ao lado do café, significou uma diversificação que lhe
403
Idem. p. 4
404
Idem. p. 38
405
Idem. p. 60
142
seu trabalho um caráter mais “social”: a escravidão e o trabalho livre aparecem como
diferença que a primeira busca conceituações sobre o urbano. Que tipo de significado e
limitação tem essas dissertações nas quais os municípios, e não os homens, plantam,
406
Idem.p. 76
143
Bayão Rodrigues Viana, elege como objeto principal uma unidade produtiva. Seus
o sistema colonial com a emergência do capitalismo industrial” 408 Isso significa que a
administração da Fazenda de Santa Cruz, que antes fora jesuíta e que depois passou a
ser propriedade real, seria um exemplo de iniciativa da Coroa Portuguesa para superar
outras culturas cujos sucessos e reveses nos são apresentados no capítulo II. A autora
investimentos, as discussões sobre se seria melhor ou não a venda de Santa Cruz para
algum particular, etc., trazendo assim uma história das questões administrativas da
unidade. Como exemplo, sobre a questão de sua possível venda no começo do XIX, a
autora são, por exemplo, a consideração de que sua alienação tornaria mais fácil uma
407
VIANA, Sônia Bayão Rodrigues. A Fazenda de Santa Cruz e as transformações da política real e
imperial em relação ao desenvolvimento brasileiro 1790-1850”. Dissertação de Mestrado. UFF, 1974.
104 p. Orientada por Richard Graham.
408
Idem, p.1
409
Idem. Ibidem
144
invasão estrangeira410.
uma unidade exportadora (além de tantos outros como a não instalação de uma
urbana do Rio de Janeiro, em especial de carne verde: “Desta forma, embora por meios
indiretos, Santa Cruz relacionava-se com a economia internacional uma vez que a
cidade do Rio de Janeiro crescia em função de sua relação com aquela economia”412 O
do Brasil e na fazenda de Santa Cruz. Nesta última parte, nos são relatados então suas
características geográficas, seu histórico de servir de pasto para boiadas vindas de fora,
o fato de que a produção pecuária exigia menos investimento de capital que a produção
importância como receita do arrendamento de pastos, etc.. Ainda neste capítulo, a autora
problemas que a Coroa procurou resolver não só em relação ao país em geral como
410
Idem. p. 29
411
Idem. p. 63-4
412
Idem. p.37
145
independência, a Fazenda de Santa Cruz passou a fazer parte dos bens pessoais de D.
Pedro I. O imperador fez uma nova delimitação das terras, concluída em 1827, que
gerou muitos protestos de particulares que viram partes de suas propriedades incluídas
nos terrenos daquele patrimônio real. Em 1839, D. Pedro I recuaria com uma resolução
sob o prisma administrativo e produtivo, como com a consideração de que após 1790
havia uma preocupação para que houvesse uma utilização mais racional dos escravos,
como: uma divisão de tarefas, melhor escolha dos lugares de construção das senzalas
fazenda, Viana traz que o regime concedia uma margem a uma parcela de cativos para
que tivessem uma produção própria, visando assim minimizar os custos de manutenção
por parte dos proprietários. Essa prática, entretanto, não era vantajosa pois deixava o
ordem de Pedro II para que fosse eliminada 415. O item seguinte é “Comunicações e
413
Idem. p. 74
414
Idem. p. 78
415
Idem. p.81
146
industrial”, etc., eles não são objeto específico de reflexão da autora. O mesmo pode-se
dizer das fontes secundárias, com as quais não se trava discussão historiográfica, antes
contexto histórico. Assim como outras dissertações, como as acima sobre municípios,
Viana justifica seu objeto específico como parte de um processo mais amplo: “Pois o
medida em que pode ser relacionado com a análise da estrutura brasileira em geral da
qual ela é apenas uma pequena parte.” 416. Trata-se mais propriamente de um exercício
uma empresa nos seus dez primeiros anos (enquanto foi privada pois logo passaria a ser
416
Idem. p. II
417
EL-KAREH, Almir Chaiban. “Atividades capitalistas em sociedade escravista. Estudo de um caso: A
Companhia da Estrada de Ferro de D. Pedro II de 1855 a 1865.”. Dissertação de Mestrado. UFF, 1976.
191p. Orientado por Arthur Cézar Ferreira Reis.
147
fiscalizações, prestações de conta, dinâmicas acionárias, etc.. Esses são assuntos de que
Pedro II de 1855 a 1865.”, que é mais de dois terços das páginas de texto da
produção capitalista. Essa relação tem duas facetas: por um lado, ela estava subordinada
escravismo418:
deve, até por uma questão de sobrevivência como senhor de escravos 420, reagir
Brasil422. Concluirá o autor que no interior do Brasil, “fora não só possível a união
capitalista.”426 “A Companhia da Estrada de Ferro D. Pedro II foi, por isso mesmo, por
principal empresário, ao mesmo tempo em que marcado por ser um instrumento dos
autor, poderíamos dizer que ela compreende uma cadeia: os escravistas dominam o
Estado que domina a Companhia, de onde conclui-se que a empresa capitalista está
visando sempre uma síntese econômica e política sobre o Brasil do século XIX. E o faz
sem se descuidar do trabalho com fontes, sem dúvida o principal estofo da dissertação,
onde dá relevo tanto a agentes quanto a estatísticas. Aborda uma miríade de questões
426
Idem. p. 36
427
Idem p. 26
428
Idem p. 137-8
429
Idem. p. 146
150
(formulado por Ciro Cardoso) e “formação econômica e social” (empregado por Roger
430
Idem. p. 57
431
Idem. p. 64
432
Idem p. 85
433
Idem p. 2 e p. 18-20.
151
Lutz e a ascensão social da mulher (1919-1937)”435. Ela está dividida em três capítulos.
1930”, aborda esta década considerada um marco para a efetivação de muitos direitos
Sohiet nos fala das principais ideias de Bertha Lutz sobre temas como sua concepção de
portanto, à própria mulher empreender todos os esforços e sacrifícios para que sua
434
Idem p 1-2.
435
SOHIET, Rachel. Bertha Lutz e a ascensão social da mulher, 1919-1937. Dissertação de Mestrado.
UFF, 1974. 88p. Orientada por Stanley Hilton.
436
Idem. p.7
437
Idem. p. 8
152
(FBPF) e mais tarde a Aliança Brasileira pelo Sufrágio Feminino. Em sua atuação em
êxito dessa vez440. Para as várias dessas questões nas quais Lutz se envolveu (educação,
feminina.
438
Idem. p. 9
439
Idem. p. 9-10.
440
Idem. p. 24
153
algumas das quais não envolviam o feminismo. A dissertação termina nos dizendo que a
liderado por Bertha, a autora aponta criticamente o apelo feito para o “cavalheirismo
441
p. 49
442
Idem. p. 54
443
Idem. p. 56
154
menção à sexualidade feminina”. Conclui também que, mesmo com essas limitações, e,
“em que pese alguns laivos de liberalismo romântico”, foram importantes as ideias
reformistas de Bertha.
Esta dissertação trabalhou muito com fontes primárias. São bem poucos os
títulos da bibliografia que versam sobre a mulher e o feminismo, e nenhum deles aborda
diretamente Bertha Lutz (a julgar pelos títulos). A autora fez uso de arquivos, inclusive
o arquivo privado de Bertha Lutz com quem pode se encontrar 444 (sem entretanto, citar
apenas na penúltima nota de rodapé, que fala sobre a conceituação de Juliet Mitchell,
principalmente na introdução.
444
Idem. p. IV
445
Idem. p. 75
446
ALBUQUERQUE JÚNIOR, Hildiberto Ramos Cavalcanti. O republicanismo fluminense: 1887-1891.
Dissertação de Mestrado. UFF, 1974. 114p. Orientada por Richard Graham.
155
Janeiro é um assunto pouco estudado e que as poucas referências sobre o tema limitam-
se a afirmar que o movimento foi fraco e mal orientado na região. O autor, então,
procura demonstrar que, na verdade, a província fluminense não teria sido refratária às
novas ideias. Suas fontes primárias principais são os jornais partidários e os anais da
Assembleia Fluminense447. Trata-se de uma história política com ênfase nas ideias,
Conclui então que o movimento republicano foi “regular” antes da Abolição, tendo
vai demostrando elementos como “De um modo geral, até a promulgação da lei da
447
Idem. p. III e IV
448
Idem. p. 21-22
449
Idem. p. 25
156
imediata.”450; e “Em regra geral, não se concebia nessa Província, antes de 1888, a
diferente em São Paulo, onde “nunca se julgará essencial a condição para ser
autor avalia a força desses políticos através de menções à existência de clubes, jornais e
“Republicanos no poder” tem uma diferença em relação aos demais pois privilegia a
abordagem das alianças e estratégias políticas, das eleições e de outros tipos de disputas
450
Idem. p. 27
451
Idem. p. 31
452
Idem. p. 59
453
Idem. p. 76
454
Idem. p. 81
157
partidárias, com a especial atenção do autor voltada para Francisco Portella. Entende
por fim que após o golpe houve uma marginalização do Partido Republicano455.
A outra dissertação que trata do republicanismo foi escrita por Maria de Nazareh
estudo de suas formas e conteúdo ideológico)” 456 (10m). Em grande parte, esta
Igreja, e estratégias para o fim da monarquia. Sobre a federação, mostra que ela era o
efetivá-la, etc.; sobre o trabalho escravo (ou “trabalho servil”) entende que as
classes sociais que se expressavam nos periódicos. Concluirá que “os setores ligados à
queria atingir seus objetivos de forma pacífica “pela educação, pela evolução, pela
transição”, mas que alguns pregavam a ação direta, como Silva Jardim e a maioria do
455
Idem. p. 137
456
AZEVEDO, Maria Nazareth Capiberibe. Imprensa republicana antes de 15 de novembro (Introdução
ao estudo de suas formas e conteúdo ideológico). Dissertação de mestrado. UFF, 1976. 127p. Orientado
por Arthur Cézar Ferreira Reis.
457
Idem, p. 70
458
Idem. p. 117
459
Idem. p. 112
158
condições econômicas e políticas que geraram a ideia republicana e influíram para que
e setores sociais diante da campanha e como esta posição se refletia no apoio aos
órgãos que difundiam suas proposições e suas ideias.”463 A autora sublinha que
460
Idem. p. 1
461
Idem. p. 24-5
462
Idem. p. 25
463
Idem. p. 1
464
Idem. p. 29
159
primárias, os jornais (que além de fonte, figuram também como objeto). A bibliografia
conceitual mais ampla. A dissertação de Azevedo, contudo, procura ancorar seu objeto
1823: uma interpretação”470. Em seu prefácio, a autora faz uma consideração teórica:
coloca que, muito embora os fatores econômicos tenham uma posição marcante e até
“porque eles são capazes de esclarecer pontos essenciais que não ficariam totalmente
deputados) fazendo apenas uma breve referência ao contexto econômico da ruptura com
atenção em quatro tópicos: a tensão criada pelo debate sobre a união ou separação em
relação a Portugal; as forças centralizadoras dentro do Brasil e seu choque com as forças
províncias em relação ao poder central, dando um clima das agitações nos diferentes
opinião quanto à independência em relação a Portugal quando esta ocorreu, mas uma
objetivo dar uma visão geral da Assembleia, concluir sobre a existência ou não de
472
Idem. p. 14-6
473
Idem. p. 28
474
Idem. p. 44
161
começa afirmando que sobre o tema existe um grande desencontro de opiniões entre os
Assembleia porque “tanto os deputados tidos como liberais quanto os admitidos como
participações.”476
e profissão” dos deputados, a autora discute que a partir desses elementos não existe
historiadores que argumentam que a origem da dissolução está nas rixas entre
475
Idem. p. 45-6
476
Idem. p. 62
477
Idem. p. 106
162
coloca que a Assembleia foi “uma voz livre conclamando contra o autoritarismo”,
muito embora este assunto não tenha dado o tom ao longo da tese478.
O trabalho de Dylva Moliterno tem como uma de suas características algo que
não é comum entre as dissertações vistas até aqui, uma contínua apreciação de
Alguns dos principais citados são: Tobias Monteiro, Américo Jacobina Lacombe,
leigo no Brasil (as relações entre Igreja e Estado – 1930/1937)” (9m), de Berenice
que a Igreja é uma instituição integrante da sociedade, não sendo possível desvinculá-la
do processo socio-político, sobre o qual, ao mesmo tempo em que age, recebe influxos.
católicos interpretaram aquela época e que tipo de influência tiveram. Também estuda a
Entre suas fontes, estão artigos de revistas católicas e depoimentos pessoais colhidos
478
Idem.
479
BRANDÃO, Berenice Cavalcante. “O movimento católico leigo no Brasil (as relações entre Igreja e
Estado – 1930/1937)” Dissertação de Mestrado. UFF, 1975. 157p. Orientado por Arthur Cézar Ferreira
Reis.
480
Idem. p. 4
163
pela própria autora. Ela lamenta não ter tido acesso a certa documentação referente a
Católicos481.
final482, como o demonstra sua relação com o fascismo europeu. Referindo-se ao plano
vida pública483. Ela observará essas questões principalmente através de duas lideranças,
alvo do movimento católico, que combatia aquilo que fazia oposição às oligarquias
com base na tese de Bóris Fausto e de Edgar Carone, como um momento de mudanças,
Igreja “algumas vezes, numa atitude que refletia ambiguidade, assumia uma posição
conciliatória para com o novo regime. Contudo predominou, durante o ano de 1931, a
481
Idem. p. 5,6.
482
Idem. p. 24
483
Idem. p. 26
484
Idem. p. 27
485
Idem. p. 35
486
Idem. p. 16; p. 46-51
164
teorias sobre as formas de poder.”487 Duas de suas questões básicas foram o problema
do laicicismo (que não deixava de estar ligado ao da “questão social” pois incutia nos
atuação católica nesse momento era pensada para se dar na imprensa e nos debates no
Congresso.
partir da década de 30490, e pode ser definida como uma oposição sistemática às ideias
comunistas491. Algumas das organizações através das quais a Igreja procurou gerar
capítulo inteiro) e a Liga Eleitoral Católica. Esta última construiu uma expressiva
colaboração recíproca entre Estado e Igreja. Brandão coloca que neste momento,
487
Idem. p. 51
488
Idem. p. 53-4
489
Idem. p. 52
490
Idem. p. 66
491
Idem. p. 75
165
mostrou o grau de mobilização a que chegaram os católicos e deu uma medida de suas
tocante à “Questão Social”, a Igreja aumentará sua ligação política com o Estado:
dos trabalhadores; qual a atitude para com a política trabalhista no período Vargas e
entendendo, como Carone, que a política de Vargas para com os operários tinha duas
posturas básicas: uma tendência conciliatória e outra repressora 495. A forma com que o
governo conduziu sua política com os trabalhadores foi, nos primeiros momentos da
década de 1930, inquietante para a Igreja496 pois ela não o teria compreendido bem ao
movimento sindicalista por ela despertado”” como fatores responsáveis pela “ruína” e
“anarquia” que se instalara no país. “Não foram capazes de perceber, na ocasião, o real
organização básica era controlada pela cúpula). A Igreja atuava junto aos operários
terrenos) e lazer. A autora observa que os operários dos “círculos” não compactuaram
católico optou pelas nomeações de comissões que negociavam com patrões. Não parece
também que o circulismo tenha marcado intensamente o meio social, sendo restrito ao
e do sindicalismo498).
periodização da autora apontando, entre outros marcos, que o ano de 1934 foi um
Igreja Católica. Consegue atender plenamente sua intenção de situar seu objeto política
498
Idem. p. 131
499
Idem. p. 136-7
167
de Maria Célia Freire de Carvalho500 (13m). Dentro de cada tópico em que a dissertação
médio urbano que tentava o afastamento das oligarquias do poder (ou os “políticos” que
há muito dominavam a máquina partidária e estatal) 503. Dois dos pontos básicos da
Clube 3 de Outubro nada realiza de concreto para deter a normalização do país”, pois
lhe faltaria penetração na opinião pública. Seria derrotado em um momento que passam
comunistas505.
como “os tenentes foram usados pelo políticos como único grupo preparado para,
através da Revolução [de 1930], como grupo treinado nas lutas, realizar as mudanças
“era defender a Revolução”, o que “consistia no isolamento dos políticos, cheios dos
vícios do regime deposto” e dessa forma atraindo os interesses da classe média, onde
Carvalho diz que “o ponto mais evidente da ligação Getúlio/Tenentes foi, sem dúvida, a
superiores” sobre o Clube, onde mostra a reação dos oficiais contra o outubrismo por
uma atenção especial às ligações de Goés Monteiro com o Clube, para quem era uma
507
Idem. p. 11
508
Idem. p. 19
509
Idem. p. 25
169
favorável pois lhe significava uma possibilidade de pacificação do país 511. Essa também
Woodrow Wilson pensava diferente pois Huerta teria chegado ao poder de forma
violenta512, e essa posição era seguida pelo próprio Itamarati. Teixeira vai mostrando o
Oliveira intermediou com muito sucesso junto aos zapatistas uma entrada pacífica e
como sua a conquista de uma indenização por parte do governo mexicano a uma viúva
que teve seu marido estado-unidense assassinado por uma “orda” zapatista517. Este
terceiro capítulo termina com a retirada de Cardoso de Oliveira para os EUA em 1915
porque seu trabalho havia atraído para si “toda fúria anti-americanista de Carranza e
seus partidários”518.
conjunta com os Estados Unidos, a Argentina e o Chile antes de tomar qualquer atitude
mas tem enfoque no governo de Alessandri nos anos 1920. A análise política de
517
Idem. p. 79
518
Idem. p. 81
519
Idem. p. 110
520
KORTCHMAR, Nair Klinger.. “A evolução política no Chile: seu significado (1879-1925)”.
Dissertação de Mestrado. UFF, 1976. Orientada por Pedro Freire Ribeiro.
171
cambismo521, e que essa filosofia econômica tem relação com influência do capitalismo
inglês sobre o país522. Houve uma reação nacionalista através do governo de Balmaceda,
no final do XIX, mas este foi derrotado523. No plano político, Kortchmar aborda ainda a
apresenta perfis de diferentes partidos e suas ligações com setores de classe sociais: por
exemplo, enquanto o Partido Conservador era formado por antigos proprietários de terra
particular, mas na prática eram os protetores dos interesses dos proprietários de uvas, do
521
Idem. p. 14-8
522
Idem. p. 23
523
Idem. p. 40-3
524
Idem. p. 55-9
525
Idem. p. 69-72
172
dissertação mostra os temas de sua campanha para a presidência (que atraía as pautas
oriundas dessa classe nos cargos do governo. Por fim, a dissertação se dedica ao exame
estabelecimento do sufrágio universal e da eleição direta para presidente; que ali tinham
separação entre Igreja e Estado, entre outros530. A autora sublinha na conclusão que o
526
Idem. p. 77-87
527
Idem. p. 87-91
528
Idem. p. 110
529
Idem. p. 128
530
Idem. p. 132
531
Idem. p. 137
532
Idem. p. 138-9
173
e ideológicas (o liberalismo).
fundamental a se fazer sobre este trabalho é que sua redação é muito confusa e mesmo
seguidamente, vários assuntos e referências sem que muitas vezes se consiga observar
Silva, sendo difícil até mesmo a assimilação de fatos básicos da história colombiana,
Esse estudo de história política tem como foco disputas no interior do Estado. O
constituição fluida. O autor traz ainda para a análise demonstrações sobre influências
teórico, destacamos, além da discussão sobre partido já aludida, uma consideração sobre
533
SILVA, Célio Pereira da. A experiência liberal na Colômbia 1848-1886. Dissertação de mestrado. UFF,
1977. p. 137. Orientado por Pedro Freire Ribeiro.
534
Os termos são do autor. p. 1
174
ideias ou problemas externos não são adequados para se pensar a história colombiana,
Novo (1937/1945)”536 (12m) é a única que trata de um tema que podemos classificar
Silva coloca que, muito embora a época de Getúlio Vargas tenha recebido muitos
como expoentes dessa elite Lourenço Filho, Anísio Teixeira e Fernando de Azevedo538.
535
Idem.P . 118
536
SILVA, Marinete dos Santos. A educação brasileira no Estado Novo (1937/1945). Dissertação de
Mestrado. UFF, 1976. 73p. Orientado por Arthur Cézar Ferreira Reis.
537
Idem. p.1
538
Idem. p. 1-2
175
determinada. Significa também considerar que a escola tem um papel na reprodução das
sociedade de classes não existe, portanto, educação neutra ou isenta. Os valores por
ela transmitidos às gerações mais novas são sempre valores da classe dominante. Sua
Saúde, artigos de periódicos sobre educação e sobre o regime e jornais. A autora entende
mas segundo a autora esse objetivo não logrou êxito. A ideologia educacional do Estado
Novo terá franca inspiração fascista, como o demonstra, além de outros elementos, a
Foi com a Reforma Capanema, de 1942, que o Estado Novo pode concretizar
539
Idem.p.2
540
Idem. p.2-3
541
Idem. p. 18-21
176
populares542. A autora apresenta, como parte desta Reforma, a Lei Orgânica do Ensino
dos Industriários (SENAI) (que tinha também contribuição de indústrias). Para a autora,
que esse tipo de ensino a perpetuava em uma posição subordinada543. A Reforma tem
máxima”544
Primeiramente, fala dos educadores em geral: “O fato de que a maior parte dos
Lourenço Filho, depois de mostrar a concordância que este tinha em relação ao regime,
pontua que a razão para sua adesão foi a incapacidade de refletir sobre os problemas
educação546. Sobre o Fernando de Azevedo, mostra que este também foi um apoiador do
542
Idem. p. 27
543
Idem. p. 32
544
Idem. p. 37
545
Idem. p. 39
546
Idem. p. 42
177
regime mas que parece haver um paradoxo em seu pensamento pois ao mesmo tempo
educacionais do Estado Novo inspiradas no fascismo547. Por fim, a autora entende que
Anísio Teixeira não esteve em concordância porque não foi encontrado nenhum escrito
de sua autoria durante a vigência do Estado Novo, mas uma definição mais exata de sua
que é falsa a ideia de que a educação cresceu muito durante o Estado Novo (coisa que é
propagada pelo discurso oficial)549; e que “Das quatro modalidades de ensino [primário,
secundário, superior e industrial], foi o industrial o único que talvez tenha conseguido
de Aprendizagem Industrial”550.
Na conclusão, Silva anota que a ideologia oficial não teve êxito ideológico
Segunda Guerra Mundial, em que o Brasil se juntou aos aliados, funcionou como um
XX com bastante equilíbrio: o primeiro lhe teve dedicadas 8/16 dissertações; o segundo,
7/16; e ambos os períodos foram perpassados por uma outra dissertação. Entre os
547
Idem. p. 44
548
Idem. p. 45-6
549
Idem. p. 51
550
Idem. p. 55
551
Idem. p. 66
178
história regional552. Registre-se também que houve um estudo sobre o Chile, outro sobre
política (9/16). Dois deles abordam o Estado e limitam-se ao estudo de seus agentes,
(13m) (que tem uma narrativa linear sobre esse grupo), e “Bertha Lutz...” (3m) (que
mais elementos em suas explicações: “Imprensa republicana...” (10m) que tem como
objeto a imprensa republicana, reflete sobre sua relação com o contexto sócio-
tem verticalidade empírica por conta do recorte amplo, mas traz para a análise muitos
daquele país; “A experiência liberal...” (16m), por fim, também traz muitos elementos,
552
Como expressão dessa “identidade” que já na primeira geração se formava, temos a publicação de
ensaios dos discentes em livro feito através de parceria entre a UFF e o Arquivo Nacional: GRAHAM,
Hilton (org.) Ensaios sobre a política e a economia fluminense no século XIX. Rio de Janeiro. Arquivo
Nacional, 1974.
179
pensam a atuação estatal na economia (em particular, uma certa intenção estatal), com a
produtivas” do século XIX (a primeira, uma fazenda e a segunda, uma empresa) com
A única dissertação sobre cultura é "A educação brasileira..." (12m), que estuda
o trabalho com as fontes primárias é muito maior que o realizado com as fontes
historiografia.
sistema..." (2m), que contraria vários autores ao demonstrar, entre outros pontos, a
pelo desenvolvimentismo; "A Constituinte de 1823..." (4m), que procede através de uma
apresentam quais seriam suas contribuições face a outros trabalhos produzidos. Segue
(1m) e "A evolução do sistema..." (2m), como dito, veem a necessidade de revelar a
última também entende que o tema do crédito como pouco explorado; “Município de
Estrela...” (6m) coloca que há poucos trabalhos sobre urbanização no século XIX, a
– o que faz de seu estudo “sob todos os aspectos novo”554; “Vida econômica de
553
"Município de Estrela..." (6m), p. 81-3.
554
"Município de Estrela..." (6m), p III
181
Itaboraí para que esta não seja confundida com as linhas de explicação generalizantes
(8m) queixa-se que o republicanismo na cidade do Rio de Janeiro foi pouco estudado,
com trabalhos que limitam-se a colocar que ele foi fraco e mal orientado na província
(leitura que o autor questionará); para "O desenvolvimento econômico..." (1m), pouco
quase completa de trabalhos sobre empresas; "A educação brasileira..." (12m) aponta
que a grande maioria dos trabalhos sobre a era Vargas aborda questões políticas e
econômicas, deixando a educação sem uma devida análise historiográfica. Note-se que a
maioria dos trabalhos, ao comentar a historiografia, fala de lacunas empíricas (que eles
parte das dissertações quase ou completamente ausente. Os dois trabalhos que tem o
maior volume de reflexão teórica e conceitual são: "Município de Estrela..." (6m), que
social” (Roger Bartra). Vale citar ainda "A educação brasileira..." (12m), que invoca
das relações de produção e dominação classistas, usando também como conceito “elites
educadoras”.
182
deve ser compreendido em um contexto mais amplo. Isso está presente em "A
(6m) e "Vida econômica de Itaboraí...", que abordam suas cidades como parte de um
sistema comercial abrangente555, como menção, por esta última, a uma divisão
político influencia a dinâmica das ideias. Vale, por fim, o registro de uma colocação de
próprias fontes. As expressões mais comuns são uma descrição breve, que aparece
sobretudo nas introduções, das fontes utilizadas, dos arquivos em que se encontram,
suas condições de acesso, sua incompletude e os limites informativos que tal acarreta.
Isso está presente em 7/16 dissertações. Temos, assim, que mais da metade das
significa, necessariamente, baixo rigor metodológico nem muito menos uma “falta de
metodologia”, mas tão somente uma ausência de discussão explícita nesse campo.
sua conclusão diz que, com base em Léon-E Halkin, que o trabalho do historiador,
fonte mais presente são os jornais, que são as fontes mais importantes de 2 dissertações
7.
foram centrais para "Bertha Lutz..." (3m) (arquivo pessoal de Bertha Lutz e de
a militância ligada a ela) e 13m (sobre o Clube 3 de Outubro). Vale ainda menção às
(13m)); e o recurso a entrevistas originais, em dois trabalhos ("Bertha Lutz..." (3m) e "O
O autor mais presente nas bibliografias foi Celso Furtado: 8/16. Em segundo
184
lugar, Caio Prado Jr., 7/16. Livros de Edgar Carone, Hélio Silva, Nelson Werneck Sodré
Apesar de ser o autor que mais aparece nas bibliografias, a importância de Celso
Furtado não pode ser superestimada. Ele simplesmente não consta em nenhuma nota de
rodapé de 6 das 8556 dissertações que o listam na bibliografia – isto é, sem nenhuma
importância direta para o texto. Seu estudo aparece citado em "Município de Estrela..."
(6m), que usa uma consideração sobre a economia de exportação brasileira no início do
XIX557. E encontra maior presença apenas em "A evolução do sistema..." (2m), onde há
Caio Prado Jr., por sua vez, não consta em nenhuma nota de rodapé de 5
forma semelhante estão Hélio Silva e Nelson Werneck Sodré, cujas contribuições
diretas nos textos das dissertações são pontuais: o primeiro é fonte de informação ou
Aparece uma vez como referência sobre política econômica564 e sobre crise política na
para "Clube 3 de Outubro" (13m) que estuda o tenentismo. Para "O movimento
católico..." (9m), Carone terá uma importância de outra dimensão: suas teses foram
utilizadas para a definição das posições e da ideologia das classes sociais brasileiras na
a caracterização da política de Vargas para com os operários (que teria uma face
trabalhadores568.
Boris Fausto é criticado por "A evolução do sistema..." (2m) por considerar que
o desenvolvimento industrial não era um objetivo de Vargas 569; serviu como base para
"O movimento católico..." (9m) sobre a “Revolução de 30”570; e para "A educação
561
Cf. "A evolução do sistema..." (2m), p. 10; "O movimento católico..." (9m), p. 15, 42, 88, 93. Em "O
desenvolvimento econômico..." (1m), "Bertha Lutz..." (3m) e "A Constituinte de 1823..." (4m), Hélio
Silva não aparece em nenhuma nota de rodapé. Em "A educação brasileira..." (12m), apenas é dito que o
autor fez um estudo recente sobre Vargas. (p. 12)
562
Cf. "Imprensa republicana..." (10m), p. 4-5, 30,33 e 43; e "A educação brasileira..." (12m), p. 47. Sodré
não consta no rodapé de "O desenvolvimento econômico..." (1m),"A evolução do sistema..." (2m),"Bertha
Lutz..." (3m) e "Município de Estrela..." (6m).
563
As outras dissertações que tem Carone na bibliografia mas que não o citam são: "Bertha Lutz..." (3m),
"O republicanismo..." (8m) e "Imprensa republicana..." (10m)
564
"O desenvolvimento econômico..." (1m), p. 14 e 24
565
"Clube 3 de Outubro" (13m), p. 3 e 4
566
"O movimento católico..." (9m), p. 46-51
567
"O movimento católico..." (9m), p. 103-105
568
"O movimento católico..." (9m), p. 14 e 121.
569
"A evolução do sistema..." (2m), p. 34
570
"O movimento católico..." (9m), p. 16
186
ideologia do Estado Novo572. Em outros três trabalhos, o autor não consta diretamente
no texto573.
referência sobre política e economia na época regencial e sobre a pressão inglesa para a
comentário sobre a falta de uma nítida divisão social na composição partidária 574; em "A
evolução política no Chile..." (15m), sobre produção e mercado externo 575 e sobre classe
e economia no pós Primeira Guerra 576; consta ainda uma nota de Cardoso em "Vida
econômica de Itaboraí...", mas que não foi localizada no corpo do texto 577. O americano
Stanley Stein foi fonte sobre indústria têxtil ("O desenvolvimento econômico..." (1m)),
Faoro foi base para a ideia de que movimentos políticos de países atrasados tem
(4m))580.
571
"A educação brasileira..." (12m), p. 6
572
"A educação brasileira..." (12m), p. 16
573
"O desenvolvimento econômico..." (1m), "Bertha Lutz..." (3m) e "Clube 3 de Outubro" (13m)
574
"A experiência liberal na Colômbia..." (16m), p.116
575
"A evolução política no Chile..." (15m), p. 26
576
"A evolução política no Chile..." (15m), p. 97
577
A outra dissertação que contém Cardoso na bibliografia é "Município de Estrela..." (6m).
578
Buscar as páginas. Stein consta ainda em "O republicanismo..." (8m) e "Atividades capitalistas..."
(11m).
579
"Bertha Lutz..." (3m), p. 58
580
"A Constituinte de 1823..." (4m), p. 53. Faoro consta ainda em "O desenvolvimento econômico..."
(1m), "O republicanismo..." (8m) e "Clube 3 de Outubro" (13m).
187
eles são referência para algum quadro interpretativo e de contextualização maior (como
é o caso de Carone para "O movimento católico..." (9m)) ou objeto de reflexão (como é
o caso de vários autores para "A evolução do sistema..." (2m)581). Se pudermos dizer
dessa forma, eles são mais “usados” do que debatidos. Reafirma-se então a
Por fim, merece menção que teóricos centrais do marxismo aparecem, cada um,
(12m), e Frederich Engels em "Bertha Lutz..." (3m). Max Weber também está presente
apenas em uma, "Bertha Lutz..." (3m). Outros nomes das ciências humanas brasileiras
viriam a trabalhar (repetindo, de forma geral) com aquilo que seus professores
581
Há o curioso de que certa parte da discussão historiográfica de "A evolução do sistema..." (2m) é feita
em notas de rodapé, o que indica, mesmo para esse caso, seu menor significado se comparada à
exploração empírica.
188
divisão equilibrada entre os séculos XIX e XX; ênfase e divisão equilibrada entre o
Mas se de forma geral o que era ofertado pelo Programa refletia-se nas
dissertações, por outro lado, havia alguma diversidade em seus conteúdos e de forma
alguma se pode supor que os professores foram sempre decisivos nas escolhas dos
Bertha Lutz, motivado pelas preocupações feministas da autora Rachel Sohiet 583. Outros
temas como o papel político da Igreja Católica ("O movimento católico..." (9m)),
(6m), "O movimento católico..." (9m), "Atividades capitalistas..." (11m), "A educação
único que não era historiador no corpo docente. Como vimos acima, essas reflexões,
que já não faziam parte da formação acadêmica prévia dos discentes de forma
582
Estamos aqui contando "A diplomacia brasileira..." (14m) como História da América, posto que o
espaço em que se movem os agentes estudados é o México, mas este estudo também envolve política
brasileira.
583
Segundo Sohiet, o tema foi bem recebido à época, mas não faltaram aqueles que consideraram a
temática secundária. Ver entrevista ao autor (04/07/2013).
189
pelos americanos teria sido importante, então, como contrabalanço de uma formação
cotidiano do curso não parece ter sido marcado por algo como disputa entre paradigmas
e, mais importante para nós, também não há nenhum reflexo dessa questão nas
dissertações.
sistema..." (2m), dissertações orientadas por Stanley Hilton e que vão ao encontro de
preocupação factual de que Vargas e seu governo tinham planos e atuações pró-indústria
(2m) e Hilton também consideram que dizê-lo é uma necessária revisão historiográfica,
para superar aquilo que o brasilianista inclusive chama de mitos da história econômica
brasileira586. Como representantes desse erro, Hilton aponta para Warren Dean e John D.
Wirth, a que os autores brasileiros somam Boris Fausto e Otávio Ianni. Os trabalhos de
584
Entrevista de Richard Graham ao autor (25/02/2014). Entrevista de Rachel Sohiet ao autor
(04/07/2013). Entrevista de Vânia a Correa, p. 153.
585
HILTON, Stanley. “Vargas e o desenvolvimento econômico brasileiro, 1930-1945: uma reavaliação de
sua posição sobre industrialização e planejamento.” IN: O Brasil e a crise internacional (1930-1945). Rio
de Janeiro. Civilização Brasileira, 1977. Neste artigo, Hilton cita o estudo de Oliveira.
586
Idem. p. 94
190
“transformação estrutural” para por fim demonstrar, no seu último capítulo, os triunfos
da indústria; e Oliveira mergulha com mais detalhe nos mecanismos capitalistas para
entender as formas que puderam concretizar essa modernização. Ao passo que, para
sobre a opção pela industrialização teriam sua relevância pois ela era considerada, para
Vargas e seus conselheiros, “uma condição sine qua non para a realização de seus
historiográficas.
587
HILTON, Stanley. “Vargas e o desenvolvimento....” p. 94.
191
3.1 Discentes
Como não houve entrada de novos estudantes em 1973, provavelmente por conta
da fragilidade material do curso, a segunda geração é aquela que iniciou em 1974 e que
cursou disciplinas neste ano e no seguinte, salvo algumas exceções588. A maior parte
desses alunos defendeu suas dissertações em 1978, mas alguns deles o fizeram um ano
antes ou um ano depois. Nos catálogos589 em que nos referenciamos, se tratam das
historiadores, número do qual se exclui os que entraram em 1974 mas que ou não
mulheres eram cerca de 75%, agora há praticamente equilíbrio numérico: dez mulheres
e oito homens.
Outra diferença é que a idade média desses alunos na época do início do curso é
bem maior: 39 anos (contra 31 da anterior), com o mais velho tendo 47 anos no
segunda são uma minoria (quatro) junto com um morador de Nilópolis: todos os demais
588
Alguns cursaram uma parte das disciplinas em 1976 ou 1977. Novamente, essas informações são
baseadas na “Ficha Cadastral” e no histórico dos alunos.
589
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE. Memória dos Cursos de Pós-Graduação. Perfil do
Mestrado em História e sinopse das dissertações apresentadas para a obtenção do grau de Mestre em
História. Niterói. Eduff, 1986. UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE. Programa de Pós-
Graduação em História. Catálogo de Teses e Dissertações, 1974-1995/ Vânia Leite Fróes, coordenação
geral. Niterói: UFF; Brasília: CNPQ, 1996.
590
Há descontinuidade nos números porque alguns alunos da terceira e mesmo da quarta turma puderam
defender suas dissertações antes de alguns da segunda.
192
do Estado da Guanabara (UEG)591, cinco pela FNFi/IFCS da UB/UFRJ; e seis pela UFF.
Dois são formados em Ciências Sociais pela UEG, e para outros dois não temos
informação. Repare-se que UEG, UB/UFRJ e UFF aparecem com números pouco
pela UFF cai bastante, ressalvando-se que para essa segunda turma temos menos dados
nas fichas.
proporção menor que a apresentada na primeira turma. São eles: Marieta Ferreira
591
A UEG passará a se chamar Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) em 1975, por conta da
fusão entre os Estados da Guanabara e Rio de Janeiro. http://www.uerj.br/institucional/decada_1970.php
(acessado em maio de 2017).
193
Salta aos olhos que se na primeira geração quase todos os professores universitários
atuavam na UFF, agora estes são uma minoria (dois), com faculdades particulares
Na “Ficha Cadastral” desses alunos, consta que apenas um deles tinha produção
dois alunos apresentavam publicação – o que evidencia que esse tipo de atividade
história dos cursos de graduação em que se formaram, muito embora haja um número
sabemos em que momento o discente se graduou, o que seria um dado relevante uma
vez que em intervalo relativamente curto houve mudanças significativas pelo menos na
afirmar que também essa geração não era íntima do trabalho de pesquisa. Pelo textos de
Cada aluno desta segunda geração fez entre 8 e 10 cursos592. No período, foram
592
Lembramos novamente que está excluída dessa contagem Estudos de Problemas Brasileiros (EPB).
194
Diffie, Ismênia Martins, Victor Vincent Valla e Arthur Cézar Ferreira Reis. Todos
professora versaram um sobre escravidão e tráfico e os outros três sobre teoria e prática
citado sobre imperialismo inglês no Brasil 594. Diffie, sobre o Brasil colonial (não há
Ribeiro (4), Michael Morris (1), Richard Morse (1) e Carlos Esparza (1). Morse ensinou
sobre urbanização na América Latina. Morris, sobre direito internacional com ênfase
dos EUA com a América Latina. O curso de Carlos Esparza foi sobre a história do Peru,
Latina, a que já fizemos referência no outro capítulo, vão desde a situação colonial,
593
A relação das disciplinas foi obtida através de arquivo eletrônico do PPGH-UFF.
594
Estamos considerando uma interseção entre o momento da primeira e da segunda gerações. Ou seja,
alunos da primeira e da segunda turma fizeram cursos no primeiro semestre de 1974.
195
século XX.
Foucault e Manheim.
promovida por Hilton, mas não há registro de ementa e de bibliografia. Outras duas
Rodrigues era sobre questões regionais do Brasil. A do segundo curso era propriamente
Por fim, foram oferecidos dois cursos sobre geografia, ambos de Lysia
Cavalcanti Bernardes. Eles abordam uma série de problemas, como bases naturais,
podemos ser precisos em relação ao período que abarcam. Podemos, entretanto, com
segurança, inferir que o século XIX foi o mais trabalhado, estando presente em pelo
menos sete matérias. O período que sem maiores precisões é chamado em nossas fontes
comparação com o recorte cronológico das disciplinas cursadas pela primeira turma, há
(7) que em “economia” (4), havendo também interseção entre elas. Não há registro de
Abaixo temos a lista dos docentes que lecionaram para a segunda geração
Freire Ribeiro e Ismênia Martins frente a todos os outros docentes, que ofertaram
foram contratados apenas para oferecer um curso em Niterói. Outros iniciantes nesse
período 74/75, Ismênia Martins, José Honório Rodrigues, Victor Valla e Arthur Cézar
Ferreira Reis, fizeram parte do quadro estável de professores que perdurou até pelo
menos 1979. Graham e Hilton, que contabilizam apenas 1 disciplina no período (74-75)
estavam ao final de seus contratos que haviam sido iniciados em 1972. Ribeiro e Demo
geração:
América, que perpassam por temas, países e orientações políticas variadas. Arthur Cézar
Ferreira Reis orientou dois trabalhos sobre o “civilismo” no Peru. Sua atividade de
orientação, muito embora agora menor, acumula um total de oito. Seus números já
justificariam que fizéssemos uma análise desse historiador nesta seção, mas o
deixaremos para a seguinte quando sua contribuição numérica como orientador se torna
ainda maior.
Ismênia Martins, que não atuou no curso antes de 1974, agora se mostra uma
analisados na seção anterior, nos cabe agora apenas um olhar mais detido sobre esta que
História da UFF. Logo depois, antes mesmo de se tornar professora de ensino superior,
iniciou seu doutoramento pela USP, ainda nos marcos do “antigo regime” da pós-
597
No presente momento, 2018, a professora continua suas atividades na pós-graduação em História.
200
Martins se dedica ao estudo da lavoura fluminense que, segundo a mesma, não é tratada
são Caio Prado Jr. e Celso Furtado. No capítulo seguinte, onde se desenvolve seu
que a abolição do tráfico era vista como um terrível desastre por todos os que se
achavam ligados aos interesses da grande lavoura: mesmo aqueles que sugerem
vital para a lavoura, os argumentos em defesa do tráfico serão fortes para mantê-lo
No terceiro capítulo, sobre o contrabando de 1831 a 1850, nos diz que a luta para
exterminar o tráfico foi renhida, e que ela tem sido bastante omitida nas análises. Sobre
econômicas; que cada tratado feito, cada lei anti escravista promulgada trazem a partir
anulação de seus termos jurídicos sob o aspecto da atuação na validade prática, ficando
598
MARTINS, Ismênia. “Problemas da extinção do tráfico africano na província do Rio de Janeiro. Uma
tentativa de análise das dificuldades de reposição de mão de obra na grande lavoura fluminense” Tese
de doutorado. USP, 1972.
599
p. 47-8
201
Por fim, no último capítulo, faz uma análise da reposição de mão de obra nas
três décadas posteriores à abolição do tráfico. Aqui perpassa temas como as dificuldades
contrabando (que teria sido grande, mas sem configurar uma solução para o problema);
preparar para transformações estruturais, das quais a mais importante seria a introdução
do trabalho livre, apenas procurou se ajustar à nova situação que o término do tráfico
provocou, tornando irregular o abastecimento de escravos. Dessa forma, o que fez foi
protelar a crise por 4 décadas. A prosperidade existiu por algum tempo mas os esforços
feitos para mantê-la com o trabalho escravo levaram a grande lavoura fluminense a um
com os dados e a falta de rigor dos levantamentos e estimativas por parte de autores;
informações nas fontes; e entende que algumas fontes querem justificar ou glorificar
alguma posição ou medida política. Defende, entretanto, que em alguns casos se pode
trabalhar com grande margem de certeza. Ao final da tese, apresenta um grande número
202
de gráficos e tabelas. Adverte que os números não podem ser tomados com exatidão,
que nos concedeu, lembra que em suas aulas valorizava o marxismo e o trabalho
3.3. Dissertações
600
Entrevista ao autor. Julho de 2017.
203
do café e sua vinculação com a economia agrícola do Estado do Rio de Janeiro” 601
(17m), tem como recorte o período de 1890 a 1914, compreende a “área cafeeira
601
MENDONÇA, Sonia Regina de. A primeira política de valorização do café e sua vinculação com a
economia agrícola do Estado do Rio de Janeiro. Dissertação de Mestrado em História. UFF, 1977.
Orientada por Ismênia Martins.
204
Valorização do Café, apesar de ser um tema bem discutido, não foi esclarecido
autor sobre o tema, mas observa que, em trabalhos de estudiosos como Celso Furtado,
Villela e Susigan, Delfim Neto, Carlos Manuel Peláez e Antônio Barros de Castro, há
restrição de dados a São Paulo. A dissertação tem então como valor historiográfico
abordar uma região não privilegiada pela historiografia pois “as conclusões
cafeicultura, tão explorada pelos que trataram do período imperial – deixou de motivar
objeto de estudo, segundo parece”602 A crítica à generalização das conclusões para todo
602
p. 1
603
p. 3
604
p. 5
205
cada ano pelas fontes oficiais, “implicando num trabalho redobrado, quase que de
montagem para se compor uma série mesmo pequena.” 605; a restrição de dados sobre
exportação ao café, açúcar, aguardente e madeiras para os anos anteriores a 1903; entre
outras. “Nossas conclusões serão, face a esse problema, indicativos do que deve ter
que demonstra a leva a concluir que o Rio de Janeiro é uma zona mais especialmente
afetada pela crise, onde tendências críticas se fizeram mais graves610. Em seguida,
observa que, como reação à crise do café, houve uma tendência à diversificação agrícola
no Estado. Mendonça observa a atuação do governo nesse sentido e faz uma análise
Estado.
fontes primárias, e baseando-se também nas análises de vários autores para construir sua
leitura da crise e das políticas para o café. Construiu sua argumentação principalmente
trabalhou bastante com discursos de políticos, colhendo suas fontes em registros oficiais
Marieta de Moraes Ferreira, “A crise dos comissários de café do Rio de Janeiro” 612
(18m). Os comissários, cujas funções mudavam com o tempo, eram responsáveis por
bibliografia brasileira sobre café no século XIX estudos sobre os mecanismos de crédito
responsáveis pela venda de café. Sua análise restringe-se aos comissários fluminenses,
Ali, expõe a dinâmica dos registros dos contratos das firmas comissárias, justificando
das firmas que foram estudadas; reflete sobre a representatividade das informações
coletadas; e mostra os cálculos que fez para lidar com a variação do preço da moeda e a
deflação617.
Considerando também o período anterior ao que estuda, Ferreira explica que papéis
feitos tendo por base relações pessoais, mais à frente eles foram ficando mais formais e
passaram a recorrer.
analisando legislação, a atuação dos bancos (com atenção à política de bancos ingleses),
dos cafeicultores e dos comissários. Tal como faz a autora, é importante sublinhar que o
alto comércio comissário estava nas mãos dos grandes fazendeiros: “Na realidade, o
616
p. 4
617
p. 112-7
209
agrícolas e comerciais, o que lhes permitia exercer uma exploração sobre seus
aos comissários, concluindo que a prática dos comissários do Rio de Janeiro promovia
que é exposta pela autora com detalhe de dados. A crise dos comissários se intensificou
com a extinção do trabalho escravo, já que os escravos eram a principal garantia para a
tinha intenção de reprimir “rebeldias” dos escravos 621. O outro órgão, estudado no
influenciar a vida econômica do país, discutindo uma série de questões como tarifas de
estradas de ferro, tratados de comércio com outros países, etc., detalhadamente expostas
por Ferreira. Em relação às mudanças nas condutas econômicas dos comissários por
618
p. 45
619
p. 50
620
p.55-63
621
p. 65
210
suas funções e lidando mais diretamente com os produtores de café. Isso foi possível
relação de seu objeto com o quadro geral da economia, trazendo leituras sobre o estado
entre “capital comercial” e esfera produtiva, que para a autora tem a ver com a
Maurice Dobb, Ciro Cardoso, João Manoel Cardoso de Mello, Karl Marx, Paul Sweezy
e Francisco Falcon.
O trabalho com fontes de detsa dissertação foi extenso, com grande dedicação a
vários aspectos específicos da prática comissária (para citar mais um, o regime de
trabalho dentro das firmas). Sua principal fonte foram os livros de registros de contratos
de firmas da Junta Comercial do Rio de Janeiro, mas muitas outras foram trabalhadas,
como aquelas sobre as associações políticas dos comissários. Há também grande apoio
em fontes secundárias, tanto para uma compreensão das estruturas sociais quanto para
622
p. 99
623
p. 55
624
p. 81-2
211
as especificidades do objeto.
interno foi uma alternativa para a crise da cafeicultura fluminense e fruto de uma
política dos governos fluminenses. Segundo Padilha, para a definição de seu tema duas
por outros autores, diz que mais do que a criação do gado, outras lavouras
quantitativos, dada a carência das informações que não permitiam armar sequências
625
FERNANDES, Sylvia Padilha. “Da monocultura à diversificação econômica. Um estudo de caso:
Vassouras, 1880-1930”. Dissertação de Mestrado. UFF, 1978. Orientada por Ismênia de Lima Martins.
626
Ver o sumário.
212
atuação do governo do estado (ou província), 31m verificou que não havia “medidas
acidentais” visando a diversificação, mas uma política bastante orientada nesse sentido,
o que aconteceu mesmo em momentos em que o café estava em alta 628. Observa-se as
concepções dos presidentes, que vão na direção de uma crescente consciência de que a
etc..630 Um dado trazido são as receitas do Estado, onde se compara aquelas trazidas
grande demanda por produtos (cuja importação em certos momentos ficava prejudicada,
627
p. 1-6
628
p. 18
629
Ver, por exemplo, p. 23
630
p. 12, 22.
213
abrindo margem para a produção interna). Nesse capítulo, Padilha faz um histórico da
evolução da indústria na cidade, observa sua qualidade de entreposto, e faz uma análise
produção de café, à ampliação que esta foi sofrendo, e até os anos trinta quando
cidade (e que era comum a outras do Rio do Janeiro), cujos principais componentes
trabalho escravo. Padilha pontua sobre alguns fatores que permitiram ao município
631
p. 40.
214
Vassouras evidenciaria seu sucesso também pela sua notável capacidade de receita 632.
país tinha “sua produção condicionada pelas necessidades dos países capitalistas”.633
encontrar sua solução na diversificação das atividades produtivas, e que tal não ocorreu
ao acaso ou sendo apenas fruto de eventuais circunstâncias locais, mas foi possível a
é o trabalho de Luiza Maria Magalhães Saraiva. Seu recorte justifica-se pelo período do
legislação, contrato entre empresas e Estado, etc.. Isso resulta em um trabalho muito
recheado de informação. Cabe salientar que essas fontes, largamente expostas no texto,
632
p. 66- 71
633
p. 77
634
p. 81
635
SARAIVA, Luiza Maria Magalhães. O petróleo venezuelano na época de Juan Vicente Gómez (1908-
1935). Dissertação de Mestrado em História. UFF, 1977. Orientada por Pedro Freire Ribeiro.
215
arquivo venezuelano. Ainda em relação às fontes, a autora comenta que, por conta de
estudar um período ditatorial, elas estão muito marcadas por silenciamentos ou elogios a
Goméz636. A compreensão de Saraiva sobre seus objetos também está muito baseadas
É perceptível que a autora faz vários juízos políticos sobre a situação histórica
povo estivesse satisfeito não teria havido movimentos armados, visando derrubá-lo do
poderem gozar de tal paz”.638 Por várias vezes, a autora faz referências a analistas
(geralmente não citados) que são defensores de Goméz, e os procura rebater com
argumentos: aos que colocam que Goméz criou paz na Venezuela, a autora relembra
episódios de repressão; aos que apontam que seu governo criou muitas rodovias, a
dissertação ressalta que foram caras e só beneficiaram poucas áreas do país639; etc..
etc..640
importância do petróleo: foi ele que deu sustentação à “sólida posição” de Gómez, que o
outros autores), que o permitiu montar um exército forte para construir sua ditadura, e
636
637
p. 138
638
Idem
639
p. 139-0.
640
Ver p.59, 64-5
216
principalmente a ideia de que Goméz, e não seu antecessor, foi quem criou as melhores
impostos, diminui o valor dos royalties, concede isenção de taxas sobre importação de
máquinas, etc.. Aqui analisa contratos firmados com diferentes empresas. O capítulo
diferentes agentes sobre ela. Ao final, sentencia que “em nenhum outro lugar foram as
salários mais altos como os ligados ao petróleo. Conclui que Goméz favoreceu com
terras seus aliados e empresas petrolíferas, ao mesmo tempo em que prejudicou antigos
senhores de terra642. O capítulo 5 afirma que a indústria petrolífera fez surgir uma nova
classe social, o proletariado. Expõe dados sobre demografia, migração (ressaltando que
641
p. 51
642
p. 79
217
venezuelano”, que figura no título deste capítulo 5, pouco figura no seu texto. O último
contratos com empresas para defender a tese de que Gomez atendia aos interesses de
Mauá & Cia em território uruguaio, período que vai de 1857 a 1878. O objetivo é
disputas internas de poder, etc., mas tudo de forma pouco sistemática, em que o texto
atuação no país “...foi sempre norteada no sentido de demonstrar seus esforços pela
paz e progresso, bem como seus financiamentos, tudo voltado para a causa
643
p. 120-1.
644
RIBEIRO, Waldir de Vita. O Banco Mauá no Uruguai. Dissertação de Mestrado. UFF, 1978. Orientada
por Pedro Freire Ribeiro.
645
p. 1-2
646
p. 2
218
que não havia empresa útil em que seu gênio não se envolvia647, que na história política
e na prosperidade econômica do Uruguai nunca se apagará o nome de Mauá 648, que sua
sofrido por certas causas expostas no parágrafo abaixo que apresenta a principal
conclusão do trabalho:
apresenta a situação econômica geral do país, dados sobre bancos, capitais ingleses,
governos e sua relação com a política bancária e outros. Como fontes, usa
647
p. 5
648
p. 12-3
649
p. 120
650
p. 118
219
Itabira Iron, desde sua fundação até a suspensão definitiva do seu contrato, período de
três décadas no qual a empresa liderada por Percival Farquhar tentou, por todos os
Gerais, tida como das mais ricas reservas mundiais”652 Os acontecimentos que aborda
A autora avisa que não vai “apresentar um trabalho de nível teórico”, o que para ela
deixa em aberto certas questões. A dissertação se justifica pelo fato de que não há na
bibliografia brasileira trabalho sobre Itabira, à exceção de dois que não são elucidativos:
na Itabira Company e a reação nacionalista que se lhe opôs. Elementos relevantes nessa
651
CHIARIZIA, Martha. Itabira Iron Ore Company. Dissertação de Mestrado. UFF, 1979. Orientada por
José Honório Rodrigues.
652
p. 1
653
p.1-3
220
controlar, além das jazidas, o transporte pelo Vale do Rio Doce; o temor por parte de
Itabira Company por parte do governo brasileiro que executou o contrato estabelecido
1930 por conta de instabilidades políticas no Brasil; por último, destacamos a profunda
alteração na relação do governo brasileiro com a empresa a partir de 1930 com uma
"Itabira Iron Ore..." (44m) recorre a muitas fontes secundárias e primárias. Entre
654
MONTEIRO, Adilson Pinto. Argentina: economia e sociedade (1890/1922). Dissertação de Mestrado.
UFF, 1978. Orientada por Francis Morton.
221
metade do seu trabalho poderia assim ser atendida, já que a primeira se dedica à
economia. Muito embora classificado aqui por nós como “história econômica”, o estudo
tem claramente duas faces independentes e bem delineadas, uma política e outra
econômica. São dois os assuntos de que trata: a economia argentina em termos gerais
politização). A opção temática pela Argentina é justificada pelo caráter forte de seu
movimento trabalhista-sindical.
argentina que o autor começa a discussão sobre conceitos. O primeiro deles é o “modelo
América, e que tem como seu principal nome Robert Baldwin. O modelo serve para
econômico: “...um produto básico como setor exportador é a célula nuclear das
conclusão desses autores é que “seria melhor nunca estas áreas terem exportado
setor exportador não se integra ao setor de subsistência e isto não promove melhoria nas
segundo o autor deriva do anterior. A partir da leitura desse modelo, o relevante para a
655
p. 81
656
p. 2
657
p. 4
222
ilimitada do trabalho como obstrução da demanda final, vinculada aos fatores internos.
mas não resulta na mudança das condições gerais desta estrutura da produção.”658
autor se utiliza de fontes secundárias e faz um contínuo paralelo com a brasileira. Traz
trabalho, destaca os altos salários no setor rural e urbano – o que também diferencia o
implicações políticas com observações sobre classes sociais, como por exemplo, a
658
p. 8-9
659
p. 29
660
p. 31
661
p. 41
223
da dissertação.
citações de autores. A primeira parte, “grêmios e artesãos” nos traz afirmações como a
de que no século XIX o trabalhador era tratado como propriedade do patrão, que no
informações com observações sobre estrutura econômica. Na parte sobre a elite, temos
salários, desemprego, moradia, etc.. A análise nos soa inconsistente, faltando um nexo
forte entre as diversas informações trazidas ao longo do texto, algo que é comum a
socialismo, o papel das associações mutuais, algumas posições dos sindicatos ao longo
do tempo, etc.. O autor pretende enfatizar que havia forte politização entre o operariado
operária.
de qualquer nova contribuição empírica. A análise dos dados também não nos levou a
Cepal) pouco comum nas dissertações observadas até aqui. Aparecem ao longo do texto
significados na análise.
maçonaria platina com a brasileira”662 (20m), Marcus Vinicius Telles justifica seu tema
pelo fato de que teria sido clara a participação da maçonaria nos movimentos
o movimento de independência eram as Lojas Maçônicas.” 664 e que seria possível “...
tiveram o mesmo foco de irradiação, que foi a maçonaria estabelecida na Inglaterra” 665
políticas que haviam entre maçons. Aponta, entre outras coisas, que os criollos e
brasileiros que iam para a Europa se irmanavam pela maçonaria; que a maçonaria
especificidades internas das entidades que estuda tem mais relevo que o contexto em
que elas estão inseridas, muito embora haja no texto uma caracterização econômica,
maçonaria (como Tupac Amaru). Sobre as sociedades secretas, pergunta-se sobre quem
fundou e quando foram fundadas, debate a própria existência de algumas, quem fazia
parte delas, quantos membros havia, quais eram seus codinomes, etc.. Sobre San Martin,
que tem relevo no capítulo, defende que era, sim, da maçonaria, e que não era
monarquista, posto que era maçom e a maçonaria defendia ideais republicanos 666. Sobre
a Loja Lautaro, depois de discutir se era realmente maçônica, aponta que “..foi o motor
consolidação da Libertação e a mola mestra para tornar o Prata emancipado.” 668 Põe
666
p. 75-6
667
p. 87
668
p. 3
226
No capítulo sobre o clero na maçonaria, defende que a maçonaria não pode ser
acusada de anti religiosa porque muitos clérigos participaram dela 670. O capítulo
impulsiona nessa parte é se houve contato entre os maçons dessas diferentes regiões.
Consegue confirmar que sim, e isso é apresentado como um triunfo da pesquisa. Aqui,
observa aspectos da permanência dessas pessoas na região, que trocavam cartas, que
metodológico há quando o autor considera que a maçonaria é algo secreto, sendo suas
estadista equatoriano. O autor acredita na “análise imparcial das fontes históricas” para
garcianismo que suprimem seus defeitos, ocultam seus erros e atribuem-lhe qualidades
669
p. 3-4
670
p. 72-3
671
p. 4
672
OLIVEIRA, Almir da Silva. O civilismo equatoriano no período de 1860-1875: o garcianismo.
Dissertação de Mestrado em História. UFF, 1978. Orientada por Arthur Cézar Ferreira Reis.
227
de uma visão e atuação preclaras. Sua obra revela como traço característico essencial:
a vontade férrea, que o fazia seguir o caminho traçado, sem recuo nem desânimo.” 674.
Sempre levando em conta o indivíduo, afirma, por exemplo, que a conquista do apoio
do clero não foi fruto de uma beatice dissimulada de Garcia Moreno para conquistar o
poder, mas foi apenas quando este já estava no poder que teria criado um clero vigoroso.
Seu catolicismo, pelo contrário, o teria privado de receber adesões fáceis e lhe impôs
Para o autor, o problema máximo vivido pelo Equador naqueles tempos era o da
“harmonização da ordem com a liberdade, do dever com o direito” 676.. Diante dessa
cidadão”, Garcia Moreno teria encaminhado uma solução que era um regime
autoritário, entendido pelo autor, entretanto, como um “mal menor, uma necessidade
Garcia realizou seu programa com – e diante da necessidade histórica nacional não há
tanto pudor do autor em dizê-lo - “energia implacável e por meios cruéis, passando por
673
Ver “resumo”
674
p. 159
675
159-160
676
p. 160
677
p. 161
678
p. 161
228
cima da lei”679.
Quanto aos erros de Garcia Moreno, o primeiro que o autor destaca é que o
cruel, lembramos). Outro erro de Garcia Moreno foi ter dependido muito de si mesmo,
“sem ter plena confiança em ninguém” e não ter educado civicamente o povo
equatoriano de forma suficiente para que este não voltasse a cair em erro depois que
saísse do cenário nacional681. É claro que “cair em erro” significa eleger pessoa de
característica diferente de Garcia Moreno, problema que existia também porque “morto
Garcia Moreno, faltou aos seus partidários o homem bem dotado, capaz de continuar o
programa.”682
Outra questão relevante para o autor é que, mesmo Garcia Moreno tendo sido
um rigoroso católico não teria entrado em luta contra as luzes do século, nem impedido
Garcia Moreno não foi um tirano sem doutrina, sendo estoico, justo, organizador e
criador. Este estudo é uma história política factual com forte ênfase em um indivíduo,
Garcia Moreno, a quem são dedicados 2 capítulos, inclusive fazendo incursões sobre
679
p. 162
680
p.162-3
681
p. 164
682
p. 165
683
p. 165
229
sua vida privada. No plano da política equatoriana, observa a disputa entre militares e
civis pelo controle do Estado, levando em conta também a atuação política da Igreja e
Trabalha basicamente com fontes secundárias, mas também faz referências a primárias
diz reconhecer a validade de ambas, mas que o mais importante seria localizar a figura
que, depois de afirmar que o estadista, por transgredir a constituição, havia se tornado
um ditador, o reabilita por este seguir não interesses particulares, mas os elevados
interesses da nação, ao contrário de seus opositores que “se apoiavam senão numa
Balmaceda, mas justifica o homem através de colocações como a de que não tinha a real
intenção de se perpetuar no poder, etc.. O autor também coloca que consegue chegar a
uma leitura equilibrada sobre Balmaceda por não ser movido por paixão na análise689.
Sobre os 10 anos que Balmaceda esteve ao poder, o autor destaca, com dados,
seu “pulso firme” na defesa dos interesses nacionais e seu sucesso em reduzir a dívida
pública; suas obras públicas, em que “a paz e o conforto da sociedade foram buscados
ainda que Balmaceda não conseguia contentar a todos da elite liberal, gerando muita
outro dedicado à guerra civil de 1891 e algumas consequências dela para o país (“as
(muito embora o autor tenha recorrido a algumas fontes primárias) e referente a ações
688
p. 78
689
Ver 79-80
690
p. 31
691
p. 48-9;
231
Estado Nacional de fato. É um trabalho de história política que leva em conta não
estudo que, apesar de suas poucas páginas (85), mobiliza vários fatores como
descrição da debilidade estatal no país entre 1830 e 1872, devida às lutas entre
novas como Associação Rural e Bolsa de Comércio, estas com maior integração ao
692
WEYRAUCH, Cleia Schiavo. O processo de consolidação do Estado uruguaio (1830-1890).
Dissertação de Mestrado. UFF, 1977. Orientada por Pero Freire Ribeiro.
693
p. 7
232
financeira favorável aos interesses do alto comércio e aliados ingleses: “Na realidade, o
exército nada mais foi do que um instrumento das classes favorecidas economicamente,
dissertação escrita por Abner Simões Baptista Júnior. O principal de sua análise é a
fazendo uso das rendas geradas pela venda do guano (substituído mais tarde e com
civis no Estado e dividiam com eles, ainda que de forma desigual, a renda gerada pelo
guano. Mais tarde, porém, a oligarquia civil reagiu contra a apropriação do poder
político e das rendas do guano por parte dos militares e se organizou em um movimento
chamado civilismo cujo principal órgão era o Partido Civil. A disputa entre a oligarquia
civil e os militares fez a Inglaterra ficar mais forte e por isso 22m “pretende ser um
694
p. 74-5
695
BAPTISTA Júnior, Abner Simões. O guano e o salitre (o surgimento do civilismo no Perú).
Dissertação de Mestrado em História. UFF, 1978. Orientada por Arthur Cézar Ferreira Reis.
696
p. 1
233
muita informação sobre a administração estatal sobre o guano, além de páginas sobre
sobre o país.
participou da história nacional nos dez anos posteriores à guerra, mostrar suas ações e
etc.). Entretanto, estuda também o período anterior, em que o Paraguai esteve marcado
por regimes autoritários (ao passo que o resto do continente estaria sendo influenciado
pelo liberalismo). Seu primeiro capítulo é dedicado à estrutura política das ditaduras
observa o controle político sobre militares, a relação com o congresso, com a Igreja, a
697
BARROS, Orlando de. Paraguai: a transição política e suas bases. Dissertação de Mestrado em
História. UFF, 1978. Orientada por Pedro Freire Ribeiro.
698
p. 7
234
(julgamentos sumários, execuções, terror699) etc.. Barros discute seu caráter autoritário
trazendo autores que afirmam que as ações de Francia ocorriam em função do perigo da
anarquia e da ameaça externa, e outros que negam que sua atitude tenha a ver com
Francia, mas não o faz de forma absoluta. Com os ditadores que assumiram
Uma das questões que atravessa essas páginas é se os emigrados estariam sendo
relações com os aliados, considerando o Prata uma região sensível, por exemplo, em
apesar de mutilado no seu território, conseguiu ter vitórias diplomáticas e salvar sua
personalistas; e teria marcado para o Paraguai uma elite mais madura. Para o período de
1870 a 1880, tema do último capítulo, o autor entende que houve uma luta permanente
699
p. 27
700
p. 20
701
p. 28
702
p. 44-6
703
p. 72-3
235
apesar da “tentação autoritária” constante. Neste seu último capítulo, centra a análise na
diplomáticas que tiveram grande peso naquele momento da história paraguaia. Utilizou
paraguaios.
primeira metade do século XX”704 (26m), nos apresenta uma história geral do Peru com
ênfase na opressão contra os indígenas e em sua resistência, que vai do período incaico
até o século XX. É uma dissertação muito extensa abordando temas como relações de
deixando de registrar reações indígenas, onde pontua que teriam limites de organização
entende que ela piora quando comparada a do período colonial (por exemplo, em função
704
BARBOSA, Marilena Ramos. O problema indigenista peruano na primeira metade do século XX.
Dissertação de Mestrado em História. UFF, 1978. Orientada por Arthur Cézar Ferreira Reis.
705
p. 11
236
diversos intelectuais que denunciam a situação daquele povo. No capítulo 3, a autora faz
trabalho com indígenas, etc.. Aqui também traz as reações dos oprimidos à situação que
com massacres. Para a autora, a situação conflituosa levou à legislação que trazia alguns
Nos dois capítulos seguintes, temos uma análise sobre a legislação sobre
comunidades indígenas, que diz respeito à posse da terra e conflitos sobre isso; e uma
capítulo anterior, teria lugar ainda em outro momento da dissertação quando discute o
706
p. 23-5
707
p. 83
237
são as fontes secundárias, entre elas José Mariátegui, que abordam desde o século XVI
Lana Lage de Gama Lima se afasta do que considera duas tendências historiográficas
sobre o negro: uma que o vê o negro como dócil e positiva sua escravização; e outra que
romantiza a sua rebeldia lhe imputando heroísmo. O melhor seria abordar a rebeldia
abolicionista, a que criticará apontando que este tem como intenção manter o negro
produção permeada pela violência, e que, com toda essa degradação sobre o escravo,
este assume sua condição humana apenas ao rebelar-se (através da fuga, formação de
rebeldia escrava, que não toma uma forma revolucionária. Isso se daria pela dificuldade
material do escravo para se rebelar (se organizar, se armar, etc.); e por dificuldades
subjetivas, já que o escravo não atinge uma conscientização profunda do sistema em que
está inserido, ora se entendendo como coisa do senhor, ora sofrendo dissimulação pelas
708
LIMA, Lana Lage da Gama. A rebeldia negra em Campos na última década da escravidão.
Dissertação de Mestrado. UFF, 1978. Orientada por Ismênia Martins.
709
p. 58
238
relação com a estrutura de produção brasileira: uma vez que o escravismo estava
dono da capital (“É preciso não esquecer que trabalhador livre significa
conceber como pessoa, adquirindo uma identidade que o permite se pensar fora do
sistema escravista. Aqui, os malês e sua revolta são o exemplo. O segundo fator é que o
Paraguai, a guerra farroupilha, etc., a luta negra conseguiu maior amplitude política 712.
O movimento abolicionista seria um desses momentos que “vai abrir para o negro
horizonte.
710
p. 66-8
711
p. 64
712
p. 74
713
p. 155
239
argumento de que o abolicionismo impõe sérios limites à rebeldia negra porque, apesar
de lutar contra a escravidão, não procurará modificar “o lugar ocupado pelo negro no
mostra que se esperará que o negro se discipline enquanto mão de obra livre. O jornal
Vinte e Cinco de Março que fora abolicionista passa a investir discursivamente contra
são informadas por Karl Marx, a principal referência teórica da autora (sublinhe-se que
abolicionista). Suas fontes primárias, das quais lamenta-se a autora por não lhe
permitirem a colocar em contato mais direto com o escravo, são diversas: relatório e
abolicionistas.
714
p. 155
715
CAMPOS, Reynaldo Pompeu. O Tribunal de Segurança Nacional: 1936-1945. Dissertação de
Mestrado em História. UFF, 1979. Orientada por José Honório Rodrigues.
240
neste estudo é narrar de forma cronológica a história do Tribunal, ressaltando por que
foi criado, modo de agir e transformações, evidenciando que era instrumento do grupo
que mantinha o poder. A narrativa é organizada pelos ciclos de alvos que teve o Tribunal
de que o uso da toga nem sempre transmite em quem a usa equilíbrio e ponderação” 716
O TSN não teria sido criado para ministrar justiça, mas para distribuir condenações,
mostrar o caráter de perseguição política do Tribunal ao, por exemplo, trazer que juízes
agiam contra a evidência dos autos. Suas fontes principais são os processos judiciais
localizados no Arquivo Nacional, mas trabalha também com outras referências extraídas
especial um colhido pelo próprio autor, o de Sobral Pinto “que foi e continua sendo o
da cronologia.
716
p. 93
717
p.3
718
p.79
241
etc.) sobre punição. Ao olhar para as discussões que aconteciam no parlamento, o autor,
que apresenta seus juízos políticos ao longo da tese, elogia os parlamentares que lutaram
que acabou criando o Tribunal, destaca seu caráter autoritário e o cerceamento das
comunistas. A própria criação do Tribunal havia sido justificada contra esses alvos 721. A
defesa, etc.. Destaca que juízes fazem ali uso de “livre convicção”, o que significa que
na prática o juiz pode desprezar as provas dos autos. Apresenta aqui também sua ideia
capítulo, o autor também enfoca a situação das torturas nas prisões e a mobilização para
aponta erro factual em trabalho de Hélio Silva, que erroneamente indicou que Berger e
obtuso e vulgar”722.
Boa parte deste capítulo e sua conclusão se dedicam a algo que não tem a ver
719
p. 19
720
p.36
721
p. 54
722
p. 121
242
argumento de que não há registro nas condenações do Tribunal sobre isso, sendo o
único condenado por crime de morte do levante do Rio ter sido contra alguém
desarmado, mas acordado (o que coloca salientando que não pretende justificar a ação
dos revoltosos)723.
por comunistas de 1935, discute a intenção dos verdes em matar Vargas. Nega
de defesa dos integralistas e expõe suas sentenças. Como houve penas relativamente
pequenas e algumas absolvições, discute a ideia de que teria havido suborno. Apesar de
não ser conclusivo nesse ponto, faz pesar as palavras de Sobral Pinto, também advogado
de integralistas, que nega ter havido pagamento de dinheiro a juízes724. Ainda neste
capítulo aborda o assassinato da jovem conhecida como “menina” por parte de membros
pessoas que entende como “sem nenhuma coloração política”725 (isto é, nem
comunistas, nem integralistas) atingidas pelo tribunal, como foi o caso de Gilberto
723
p. 56-66
724
p. 78-86
725
p. 98
243
Freyre, sustentando novamente ideia de que o Tribunal era instrumento para atacar
sem réus por conta do medo que a ditadura foi gerando. Nesse momento, passa a
DIP (de que iria investir contra tubarões que lesam o povo brasileiro), o Tribunal
pão sem peso, manteiga rançosa, etc., sendo os processos contra grandes empresas em
Tribunal se inicia a partir do momento em que o país declarou guerra ao Eixo, e também
processos, 2 ex-integralistas pegaram 30 anos de prisão. Sobre esse ponto, Campos faz
uma crítica historiográfica a Stanley Hilton porque este infere que os 2 ex-integralistas
contra o Eixo. Campos acusa Hilton de omitir dados sobre o julgamento de forma a
justificar a atuação do Tribunal (“Hilton não cita as alegações da defesa uma úncia vez,
o que transforma essa parte do seu livro numa simples versão policial dos
antes da adesão brasileira aos Aliados. Nesse capítulo, outros casos nos são
apresentados como os dos lavradores japoneses que tentavam impedir, com ameaças e
depredações, que compatriotas plantassem amoreiras para que não houvesse a produção
726
p. 109
727
p. 112
244
fascista. Diz que não pode comparar as legislações por falta de conhecimento jurídico,
mas que há semelhanças na forma e nos objetivos, sendo um tribunal como este típico
de um país “totalitário”728.
“O índio na literatura peruana: José Maria Arguedas” 729 (27m), de Stela Maria
Damiani, aborda vários literatos peruanos para demonstrar como a “realidade peruana”,
em especial sobre os índios, foi por eles retratada. Parte do princípio de que os
razão dessa dissertação é examinar o valor histórico das obras de José Maria
Arguedas e de que maneira a denúncia feita por ele foi importante para promover
começa com autores do século XIX, onde haveria maiores denúncias da realidade dos
indígenas que antes. Essa produção literária, entretanto, teria torcido a figura do índio 732
728
p. 121-2
729
DAMIANI, Stela Maria. O índio na literatura peruana: José Maria Arguedas. Dissertação de
Mestrado em História. UFF, 1978. Orientada por Pedro Freire Ribeiro.
730
p. 1-2
731
p. 5
732
p. 24
245
Esse é o caso do escritor Rosada, que via a situação do índio de forma amena, tranquila,
se esquecendo dos problemas sociais. Por sua vez, Manuel Gonzalez Prada já
do peruano expostos no livro “Sete ensaios sobre a realidade peruana”, que tem a
ênfase de que a raiz do problema indígena era econômico (a terra) 733 e contribui para se
ver a figura do índio “de forma mais real”. 734 Outros autores trabalhados são Cesar
Vallejo e Ciro Alegria, literatos que também trataram o tema indígena. Esses dois, por
momento em que a vida cultural peruana estaria muito influenciada pelo marxismo. Era
vista como centro do problema também era a terra e sua a posse 736. Em sua obra,
para tal era a falta de conscientização dos problemas. Para Damiani, Arguedas seria um
desses autores que não idealiza o índio, mas o descreve como “realmente é”737
Nos livros de Arguedas trabalha-se ideias como a de que “aquele que se revolta
novela “El sexto” que narra a vida numa prisão onde há presos políticos. Para Arguedas,
do que outros grupos741 No que a autora considera o principal romance de Arguedas por
retratar melhor a realidade social peruana, “Todas las sangres”, vê-se opressão indígena
estrangeiro no Peru e como este causa impacto na vida do índio, ressaltando também a
A autora por fim destaca em um tópico o que Arguedas considera como solução
dos problemas indígenas em sua literatura, onde um dos principais seria os índios
agindo como um todo. Destaca também que Arguedas, no final de sua vida renega o
socialismo não seria o mesmo que haveria tido na sociedade incaica, mas um adaptado à
economia moderna.
escritores peruanos. Essas ficções, além de objetos, são também fontes porque a autora
741
p. 60
742
p. 77
743
p. 80.
247
referências à “nação” em publicações de políticos e jornalistas, ver até que ponto houve
história das ideias. A autora não investiga apenas a “elite”, mas também os jornais de
maior circulação. Com isso, pretende preencher uma lacuna historiográfica, já que os
A autora tem o cuidado de, em várias páginas, explicar a documentação com que
periodismo na corte apontando que esta teria diversas camadas sociais se expressando
burocratas, liberais, etc.. Considera a imprensa livre, talvez o único lugar em que o
liberal746.
anacronismo atribuindo aos contemporâneos visões que hoje se tem daquele passado,
fontes primárias, no sentido de tentar extrair delas o seu conteúdo ideológico, muitas
vezes encoberto pelas causas ou pelos objetivos mais próximos que geram as
744
MENANDRO, Heloisa Fesch. A ideia de nação e o pensamento nacionalista na imprensa da Corte
1840-1860. Dissertação de Mestrado. UFF, 1978. Orientada por Ismênia Martins.
745
p. 1-5
746
p. 7-9
248
fazem emergir.”748 Dessa forma, poderia realizar a sua análise que consiste em associar
no século XIX, entendendo que essas expressões tem conexões classistas: “As
xenofobia anti-inglesa já que este país combatia o tráfico de escravos e assim afetava
seu poder político e econômico. Seu nacionalismo era cioso de resguardar sua posição
não privilegiadas”, ou de classe média, era orientado para maior igualdade social, e
manifestar também de forma xenófoba (ou “defensiva”, como prefere a autora) quando,
eram concorrentes.
coloca: “Assim como nos contextos capitalistas, as nações [de economia periférica] são
formadas por várias classes sociais lideradas pela burguesia (…) A unidade nacional é
justamente essa coalizão de classes, que embora artificial, vê sua unidade na ideia de
nação.” E trata-se de uma coalizão de classes “sob a égide de um Estado instituído por
uma delas – que lhe dá o conteúdo”749. Note-se que ao sistematizar seu conceito de
747
p. 11
748
p. 11
749
p. 52-3
249
nação neste trecho, a autora não inclui propriamente o que expomos no parágrafo acima
(que classes diferentes tem expressões de nacionalismo diferentes) – não ficando claro
como a ideia de nação de classes não dominantes se relaciona com a efetiva constituição
histórica da nação. De qualquer forma, o principal é que a autora tem uma percepção de
Helio Jaguaribe, Emília Viotti da Costa e Nicia Vilela Luz) seria imprecisa
conceitualmente. Muitos autores são apresentados sem que haja apreciações críticas da
autora. Esse é o caso por exemplo de Marx, Engels, Lenin e Stálin, cujas ideias foram
autora entende estar adotando ou que juízo faz dele. Mas vê-se que é próximo daquele
premissas fundamentais do trabalho, afirma que a unidade nacional é marcada por uma
Os outros três capítulos que compõem sua dissertação são todos muito marcados
750
p. 28-32
751
p. 52-3
250
por extenso uso de fontes e pelo esforço anunciado de associar as ideias às situações
Império vai se dar por conta da ameaça externa de recolonização portuguesa. Por isso, a
(e suas reivindicações contra concorrência estrangeira), etc.. 754 Como parte do mergulho
intenso nas fontes jornalísticas, a autora explora a discussão sobre o tráfico, como eram
que aqui chegavam755. As camadas sociais mais baixas vão ter também diferentes
Nação que tinham, onde aparecem críticas ao Estado imperial, que, mensagem
752
p.75
753
p. 118
754
Ver capítulo 4.
755
p. 113-5
756
p. 216
251
mais atenção (9/18) que o Brasil (7/18). Outras duas dissertações abordaram
Estado do Rio de Janeiro foi o espaço considerado em dois trabalhos e as cidades do Rio
Alguns desses trabalhos de História Política tem foco bastante restrito em ações
morais e subjetivas, fazendo disso o objeto da análise: este é o caso de "O sentido do
contexto político, "Paraguai: a transição..." (28m) vai abordar a elite paraguaia trazendo
vez, "O processo de consolidação uruguaio..." (21m) e "O guano e o salitre..." (22m)
países.
"O Banco Mauá no Uruguai" (24m) e "Itabira Iron Ore..." (44m) abordam
contra ela;
dedica ao operariado.
peruana..." (27m) aborda vários literatos peruanos para demonstrar como a “realidade
peruana”, em especial sobre os índios, foi por eles retratada, procedendo dessa forma a
uma história social do país através da literatura; e "A ideia de nação..." (32m) que estuda
socioeconômicas e políticas.
fontes primárias que não haviam sido trabalhadas anteriormente) era uma marca de
desbravamento empírico que era perceptível nos textos da primeira turma, de forma
alguma isso significa que as fontes primárias não estejam sendo mobilizadas. O que
acontece agora é que elas majoritariamente são extraídas de outros estudos ou a partir de
757
"A primeira política de valorização..." (17m),"A crise dos comissários..." (18m),"A rebeldia negra..."
(30m), "Da monocultura à diversificação..." (31m),"A ideia de nação..." (32m), "Itabira Iron Ore..." (44m)
e "O Tribunal de Segurança..." (45m)
254
publicações de documentos.
menos 3/18758 trabalhos. Em muitas outras, divide com as primárias a referência das
principal destaque é "A ideia de nação..." (32m) que dedica um capítulo inteiro à
escala até então inédita nas dissertações do curso. Temos ainda: "A primeira política de
conclusões generalizantes presentes em autores que ignoram aspectos das regiões que as
dissertações estudam; "O sentido do governo Balmaceda..." (29m) entende que há duas
correntes historiográficas sobre seu tema, uma procurando explicar o período através de
em ambas, mas afirma que o mais importante seria enfatizar a figura de Balmaceda;
negra..." (30m) afirma que há aquela que entende o negro como dócil e positiva sua
escravização, e outra que romantiza a sua rebeldia lhe imputando heroísmo, sendo o
758
"O civilismo equatoriano..." (23m), "O problema indigenista..." (26m) e "O sentido do governo
Balmaceda..." (29m).
255
(25m), "Da monocultura à diversificação..." (31m), "Itabira Iron Ore..." (44m) e "O
Gómez; "O civilismo equatoriano..." (23m) que pretende (sem lográ-lo) ter um postura
Segurança..." (45m) que critica Thomas Skidmore sobre motivação de Vargas em certo
episódio, Stanley Hilton por omitir dados e justificar ação do TSN em certo caso, e
4/18 dissertações: "A crise dos comissários..." (18m), que se ocupa em momentos do
Robert Baldwin, e o “modelo Furtado-Cepal”; "A rebeldia negra..." (30m), que entende
que a consciência política e atos rebeldes de escravos tem profundos limites pois a
principal relação de produção no momento abordado não seria mais a que envolve
senhor e escravo; e "A ideia de nação..." (32m), que tem um longo esforço de mostrar os
a história dessa forma muito relacionadas. Vale lembrar também "Itabira Iron Ore..."
(44m) que colocou que não realizaria trabalho teórico, e entendeu que isto traria limite à
sua análise.
comissários..." (18m) e "A ideia de nação..." (32m). A primeira, além de pontuar com
base em Caio Prado Jr. que a quantificação deve ter caráter de complementariedade em
relação à análise qualitativa, tem um longo texto onde justifica uso de fontes,
período, justifica sua escolha face ao objetivo do estudo e diz que o conteúdo ideológico
que se procura nelas pode estar encoberto por interesses imediatistas e subjetivos.
Também comenta suas fontes "A primeira política de valorização..." (17m), para quem
influência da maçonaria..." (20m) (por seu objeto de estudo, a maçonaria, ser algo
secreto) e "A rebeldia negra..." (30m) (por as fontes não a colocarem em contato direto
com o escravo). Sobre seu procedimento metodológico, "Itabira Iron Ore..." (44m) se
limita a colocar que fará “observação rigorosa”. E "O Tribunal de Segurança..." (45m)
257
das dissertações não faz nem um mínimo de referência, problematizadora ou não, sobre
equatoriano..." (23m) e "O sentido do governo Balmaceda..." (29m) que dizem fazer
análise imparcial e não movida a paixões; e "A ideia de nação..." (32m), que afirma ter o
pelo Estado: relatórios, leis, atas, comunicações diplomáticas, etc.. Eles estão presentes
segurança pode-se dizer que são os principais documentos dos historiadores. Somando
em 6 trabalhos762.
759
"A primeira política de valorização..." (17m), "A crise dos comissários..." (18m),, "O petróleo
venezuelano..." (19m), "O processo de consolidação uruguaio..." (21m), "O guano e o salitre..." (22m),
24m, "O problema indigenista..." (26m), "Paraguai: a transição..." (28m), "A rebeldia negra..." (30m), "Da
monocultura à diversificação..." (31m) "A ideia de nação..." (32m), "Itabira Iron Ore..." (44m) e "O
Tribunal de Segurança..." (45m).
760
"A primeira política de valorização..." (17m), "A influência da maçonaria..." (20m), "O processo de
consolidação uruguaio..." (21m), "O civilismo equatoriano..." (23m), 24m, "O sentido do governo
Balmaceda..." (29m), "A rebeldia negra..." (30m), "A ideia de nação..." (32m), "O Tribunal de
Segurança..." (45m)
761
"A primeira política de valorização..." (17m), "A crise dos comissários..." (18m), 24m, "A rebeldia
negra..." (30m), "A ideia de nação..." (32m), "Itabira Iron Ore..." (44m), "O Tribunal de Segurança..."
(45m)
762
"A primeira política de valorização..." (17m), "A crise dos comissários..." (18m), "O petróleo
venezuelano..." (19m), "O processo de consolidação uruguaio..." (21m) (bem diminuto aqui), "Da
monocultura à diversificação..." (31m), "Itabira Iron Ore..." (44m).
258
José Belmonte 6
Ricardo Levene 5
Fernando Henrique 5
Cardoso
Edgar Carone 5
Paula Beiguelman 5
Wilson Suzigan 5
formação jurídica que foram fontes para os que estudaram História da América 763.
Podemos dizer que não há outros nomes recorrentemente citados da historiografia sobre
“liderança” de Celso Furtado e Caio Prado Jr., além das presenças de Cardoso e Carone.
Apesar do restante desta lista ser diferente daquela da primeira, tratam-se de nomes bem
comuns nos estudos dos mestrandos que passaram pelas duas turmas.
763
Sobre José Belmonte, notícia sobre seu falecimento: RODRIGUEZ, F. J.. “Fallece en Vizcaya el
historiador abulense José Belmonte Díaz” IN http://www.diariodeavila.es/noticia/Z008E578A-D085-
05B7-95486B68B739210C/20150825/fallece/vizcaya/historiador/abulense/jose/belmonte/diaz . 25 de
agosto de 2015 (acessado em maio de 2017). Sobre Ricardo Levene, uma pequena biografia
http://www.unlp.edu.ar/articulo/2012/9/6/vidas_y_retratos_ricardo_levene. (acessado em maio de 2017).
259
nas dissertações como fontes de informações pontuais ou, de forma menos comum, para
mesmo estão em nenhuma nota de rodapé das dissertações que os tem como referência.
(31m)) apontando que Suzigan é um dos que se opõe à tese de Prado Jr. e Luz de que a
negra..." (30m)) lembrando que Cardoso faz parte de uma tendência de estudos que
Raymundo Faoro foi leitura para duas dissertações e Sérgio Buarque de Hollanda e
Gilberto Freyre, para apenas uma. Max Weber foi totalmente ignorado nos trabalhos.
Entre os marxistas, Karl Marx constou como referência para apenas dois autores, "A
crise dos comissários..." (18m) e "A rebeldia negra..." (30m), mas com relevância
teórica, e José Carlos Mariatégui foi importante como fonte e objeto para 3 dissertações
A média de páginas é 155, mas é importante novamente lembrar que não havia
padrão para a formatação dos textos, sendo grande a variedade com que eram
apresentados.
docente se repetiram nas dissertações - influência que, obviamente, não se deu de forma
total, nem com perfeita correspondência numérica. O mais notável é o aumento das
com este recorte geográfico. Considerando que não podemos supor que interesse tão
grande por história americana – que na segunda geração supera inclusive o por história
mestrado, fica óbvio que é o curso que promove, e com grande força, essa temática.
pode-se dizer dos “eixos temáticos”: maior atenção ao “político” que ao “econômico” e
professora Ismênia Martins que, entretanto, não deve ter tido um grande impacto na
expressivos relativamente, mas não são grandes comparados ao total. 765 De qualquer
forma, entre as dissertações reparamos que há algum aumento das que valorizam a
católica entre operários), e, em escala bem menor, "A evolução política no Chile..."
(15m) (que conta a história do Chile). Na segunda geração, temos principalmente "A
764
As complicações com a definição de marxismo e sua presença nas dissertações serão estudados com
mais detalhe posteriormente nesta tese. Uma leitura do marxismo em quase todas as dissertações escritas
pela primeira e pela segunda gerações pode ser encontrado em CARVALHO, Wesley Rodrigues de. “O
marxismo (ou o “marxismo”) no curso de mestrado em história da Universidade Federal Fluminense
(1974-1978)” IN: Anais do Colóquio Internacional Marx e marxismo 2017. De O Capital à Revolução de
Outubro 1867-1967). http://www.niepmarx.blog.br/MM2017/anais2017.htm
765
Ver os quadros na seção 2.2
261
Segurança..." (45m), mas também "O índio na literatura peruana..." (27m) e "Argentina:
menor atenção ao conteúdo empírico da História, que continua sendo a tônica principal
766
Além da temática da opressão e da resistência, há outras duas que poderiam ser consideradas como
marxistas: a que associa ideias a classes sociais ("Imprensa republicana..." (10m), "A educação
brasileira..." (12m) e "A ideia de nação..." (32m)) e a que discute modo de produção ("Atividades
capitalistas..." (11m) e "A crise dos comissários..." (18m). Aqui, entretanto, não há grande variação entre
uma geração e outra. Ver Carvalho, 2017, op. cit..
262
4.1 Discentes
São 17 os mestres desta terceira turma. Todos iniciaram suas aulas no segundo
1977. Esse é o período de aulas que consideraremos, apesar de outros terem chegado
defenderam dissertações depois de 1980). Nos catálogos em que nos referenciamos, são
anos. A pessoa mais velha tinha 43 anos quando ingressou no curso. A mais nova, 23.
Pela primeira vez, o curso será concluído por pessoas formadas fora do estado
do Rio: duas foram graduadas pela UFG, uma pela UFPA, uma pela UFSE. A UFRJ (ou
UB)767 e a UFF são as que mais geraram alunos, 5 cada. UEG, PUC/RJ e Faculdade de
Filosofia de Campo Grande deram um aluno cada para o mestrado. O local principal de
Cinco se inscreveram como residentes em Niterói, uma em Barra do Piraí (RJ) e outra
em Sergipe.
anterior: Geraldo Coelho na UFPA, Ledonias Franco na UFG, Lenalda Santos na UFSE,
Educação. Não temos certeza onde José Luiz Werneck da Silva atuava quando ingressou
Historiografia, que tem formalmente esse nome, foram 4. Outras agrupamos como
disciplinas que tem a história como foco. Entretanto, seguramente, “política” é o eixo
“Economia” não vem muito atrás (7). Assim como para as turmas anteriores, não temos
cronológico, o século XIX (14) tem o dobro de referências do século XX (7), sendo em
alguns casos ambos os períodos abordados no mesmo curso. Em menor número, temos
julgar pela ementa e bibliografia, em dois cursos o conteúdo também era de questões de
teoria e método. Arthur Cézar Ferreira Reis (4) se dedicou à Amazônia e a questões
disciplinas, uma como foco no primeiro, a outra no segundo reinado. Note-se com isso
turma para turma ao longo da década: primeiro, Graham e Hilton; depois, Ismênia
sobre o período colonial e sobre o século XIX em duas oportunidades. Pedro Freire
Ribeiro deu um curso do período que compreende como o de “regimes oligárquicos” até
265
o da “ascensão das classes médias”. Na turma anterior, este professor era o que mais
tinha ensinado América. Na primeira turma, havia sido superado por Reis e nesta
terceira, por Morton. Assim como para História do Brasil, as três turmas têm
e escravocratas no século XIX. Outras duas disciplinas que trabalharam o Brasil junto
com outros países da América foram as que Francis Morton ministrou sobre
industrialização.
Luiz de Castro Faria reservou um período para trabalhar Pierre Bourdieu. Em outro
Ciência. Victor Valla, entre disciplinas mais propriamente instrumentais e outras em que
este conteúdo era repartido com o de Brasil, trouxe Louis Althusser, Lucien Goldman,
Fernand Braudel, Patrick Gardiner (com um livro sobre teorias da história), Max Weber,
José Honório Rodrigues aparece com bibliografia sobre historiografia italiana, inglesa e
Como se vê pelas tabelas acima, Arthur Cézar Ferreira Reis novamente é um dos
docentes mais expressivos do curso. Até 1979, ele orientou 16 dissertações, sendo o
ser tão destacado. Nascido no Amazonas em 1906, Artur Cézar atuou como jornalista no
Jornal do Comércio amazonense, que era propriedade de sua família, e foi professor de
História em Manaus. Parte de sua formação se deu no Rio de Janeiro, onde inclusive
teve Capistrano de Abreu como preceptor. Quando dos eventos de 1930, participou da
Histórico-Geográfico Brasileiro. Nos anos 1940 e 1950, teve vários cargos estatais: no
comissão técnica que, por determinação do presidente Getúlio Vargas, estudou em 1951
cargo que desempenhou até junho de 1958. Em 1961 dirigiu o Departamento de História
em 1964. Nesse mesmo ano, foi indicado pelo ditador Humberto Castelo Branco - e
até janeiro de 1967. De acordo com nossas referências, sua gestão foi marcada por
Território do Amapá, perfil histórico (1948), Monte Alegre, aspectos de sua formação
da história do Brasil769. É interessante que Reis tenha sido o segundo autor que mais
768
LOBATO, Sidnei. “Estado, nação e região na obra de Arthur Cézar Ferreira Reis”. IN: Diálogos,
DHI/PPH/UEM, v. 13, n. 3, p. 625-642, 2009. “Reis, Artur César Ferreira.” IN: ABREU, Alzira de Alves
(coord.). Dicionário Histórico-Biográfico Brasil. http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-
biografico/reis-artur-cesar-ferreira (acessado em fevereiro de 2018). A considerar todas as referências, o
Dicionário citado grafou errado os primeiros nomes de Ferreira Reis.
769
Sidnei Lobato. “Estado, nação...”.
269
Segundo o pesquisador Sidnei da Silva Lobato, a obra de Reis tem uma primeira
do Pará, e uma segunda fase em que não se registra conhecimento empírico novo. Ainda
segundo Lobato, o trabalho de Reis chama a atenção para a importância de uma ação
grupos étnicos”, argumentos esses aplaudidos por Gilberto Freyre 771. De acordo com a
Sua obra estaria marcada também pela compreensão de que raça e meio
770
VENÂNCIO, Giselle; FURTADO, André Carlos. “Brasiliana & História Geral da Civilização
Brasileira: escrita da História, disputas editoriais e processos de especialização acadêmica (1956-1972)”
IN: Revista Tempo e Argumento, Florianópolis, v. 5, n.9, jan./jun. 2013. p. 05 - 23.
771
Lobato, 2009.
772
PACHECO, Alexandre. “A narrativa heroico-nacionalista de Arthur Reis na representação da defesa da
Amazônia pelos portugueses e luso-brasileiros em A Amazônia e a cobiça internacional - anos de 1960”
IN: História da historiografia. Ouro Preto, número 10, dezembro de 2012.
270
que, tendo trânsito entre militares, atuava no sentido de proteger alguns perseguidos 773.
Como orientador, há relatos positivos774, mas há também aqueles que apontam que o
curso na década de 1970. Apesar de ter orientado apenas duas dissertações até 1979,
ofertou dez disciplinas, sendo um dos três docentes que assim mais trabalharam. No
período que consideramos para a terceira turma (e para a segunda), sua presença não é
tão volumosa, mas justifica o olhar mais detido sobre esse historiador.
e entre 1939 e 1944 trabalhou com Sérgio Buarque de Holanda no Instituto Nacional do
Livro e por essa época já publicava textos de História. Com bolsas da Fundação
EUA. Atuando como Diretor de Obras Raras da Biblioteca Nacional entre 1946 e 1958,
Instituto Rio Branco, dando aulas de formação para o pessoal do Itamarati. Também
773
“Mas também gosto de citar o falecido professor Arthur Cézar Ferreira Reis, que sempre apostou em
mim embora soubesse que nossas idéias não se conjugavam. Mas foi um professor que sempre esteve a
disposição para intervir junto aos militares em favor de algumas pessoas, pois era muito respeitado. Eu e
o José Luís Werneck costumávamos dizer “Olha se nós escapamos foi sem dúvida graças ao Ferreira
Reis”. E foi ele também que me auxiliou em minha primeira viagem para Lisboa.. Eu me lembro que o
Ferreira Reis às vezes dava carona para mim e outras pessoas lá da PUC para o Centro, e no início de
dezembro de 68, uns dez dias antes do AI-5, ele disse “Olha, vocês tomem cuidado, vocês estão
cutucando a onça com vara curta, não sabem o que vem por aí, vocês se protejam porque eu não vou
poder salvar todo mundo não”. Uns dez dias depois não deu outra coisa: era o AI-5. Quando fizeram as
cassações de 69 o Ferreira Reis estava presente, e provavelmente, graças a ele os nomes de algumas
pessoas foram retirados.”
774
Entrevista de Ubiratan Rocha ao autor.
775
Entrevista de Almir El-Kareh ao autor. Entrevista de Francisco Falcon ao autor.
271
trabalhou no arquivo do Ministério das Relações Exteriores. Entre 1958 e 1964, foi
que para ele era regida fortemente pelo amadorismo, pelo autodidatismo e por um
desenvolvimento do país. As cátedras dos cursos de História estariam marcadas por esse
métodos, filosofias da história e “história da história” eram para esse historiador, desde
Para citar uma de suas obras do período em que atuou em Niterói, temos
perfazendo quase 1500 páginas em que, com um trabalho empírico extenso e abordando
teria perdido a oportunidade de fundar o país sob bases populares e liberais. Segundo o
776
FREIXO, André de Lemos. “Um ‘arquiteto’ da historiografia brasileira: história e historiadores em
José Honório Rodrigues” IN: Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 31, nº 62, p. 143-172 - 2011
272
nacionalista e atento aos interesses estrangeiros no país, Rodrigues também tinha a ideia
posição importante: foi um dos professores que mais lecionou na década de 1970, e
nascido em 1937 em uma família fortemente religiosa, chegou ao Brasil em 1964 para
resistência à ditadura. Fez seu mestrado em História na USP, concluído em 1969, com a
período de transição, 1904-1928”. Também em São Paulo, fez seu doutorado com a
em 1972 sob a orientação de Nícea Villela Luz. Depois de uma temporada na Bahia
fazendo trabalho político de base junto à igreja, passou a ser professor na UFF e
também em favelas do Rio. Nesse momento, esteve articulado com a Ação Popular,
assessorar a população na luta por direitos. Valla teve uma grande contribuição teórica e
777
IGLÉSIAS, Francisco. “José Honório Rodrigues e a historiografia brasileira” IN: Estudos Históricos.
Rio de Janeiro, n. I, 1988 p. 55-78.
273
que chegaram aqui nos anos 1960 e 1970, fez com que alguns não o considerassem um
ou nobre emulação?”780, que saiu em 1978 em coleção editorial coordenada por José
UFF.
dois tipos de abordagem: uma tendo como base a diplomacia e envolvendo contatos e
cooperação e amizade eram centrais. Uma preocupação básica do texto de Valla seriam
economias “cêntricas”. Ainda segundo Silva, Valla mobiliza dados e fontes sem ser
“neo-positivista”.
Valla compreende com base em Edward Carr e José Honório Rodrigues que o
construção do conhecimento histórico. Consoante com a ideia de que o que deve mover
o cientista social são problemas de sua sociedade, a escolha do tópico de estudo se daria
pela influência preponderante dos EUA na vida brasileira no momento então atual. Seu
torno do café e da borracha. Para o autor, ainda que nos últimos anos do século XIX a
balança comercial entre os dois países favorecesse o Brasil, a maior força e as vantagens
a longo prazo estariam com os EUA que, na condição de principal mercado para o café
posteriormente, de capitais. Na análise de Valla, a Primeira Guerra deu aos EUA uma
na região. Nesse quadro, o autor observa o Brasil como uma nação em situação de
integrado aos EUA a ponto de se formar, como diz o título de um de seus capítulos,
“Enfim, uma aliança com benefícios quase unilaterais” - acentuada quando os EUA
Por fim, tratemos do professor Francis Morton, que na década de setenta foi
orientador de três dissertações no programa, além de, como vimos, ter sido o maior
responsável por disciplinas sobre História da América nessa terceira turma. Morton
artigo publicado em 1975 no Journal of Latin American Studies, “The military and
society in Bahia, 1800-1821”782, temos uma parte daquilo que foi seu objeto no
781
Há informações biográficas em MORTON, Francis William Orde. “Brazil's emergence on the world
stage” IN: International Journal.Vol. 37, No. 1, Latin America (Winter, 1981/1982). E também no site da
loja Amazon, em página de divulgação de livro sobre o Rio de Janeiro lançado em 2015:
https://www.amazon.com/Orde-Morton/e/B00VRXC2QY/ref=sr_ntt_srch_lnk_2?
qid=1537140210&sr=1-2
782
MORTON, Francis William Orde. “The military and society in Bahia, 1800-1821” IN: Jorunal of
Latin American Studies. Vol. 7, N.2 (Nov. 1975)
276
Portugal, motivo de sua lealdade à Coroa. O estudo, de amplo mergulho empírico sobre
influência dos proprietários de terra sobre a corporação, o que teria sido decisivo no
instituição militar entre a Coroa portuguesa e as elites locais é algo sublinhado pelo
autor, que também se interessa pelo fato de o formato do exército constituído na colônia
década de 1970, depois de ter tido no pós-guerra o mais rápido crescimento entre os
embora o alinhamento principal seja com os EUA (o que teria sido reforçado no pós-
1964), os contatos com o exterior (Canadá, países da África, do Oriente Médio, etc.)
estariam se expandindo. O artigo também se dedica à relação que o Brasil tem com os
EUA em diversas matérias (questões nucleares, direitos humanos, etc.). Com algumas
economia tem de petróleo importado, etc.), o artigo é uma espécie de introdução para
atores de relações internacionais. Mencionemos por fim artigo de Morton com co-
autoria de Ron Seckinger (que também foi docente do mestrado da UFF) sobre
Humanas e Filosofia da UFF, informa que possui 17 mil volumes, e que seria uma
coleção fraca apesar de a instituição estar comprando livros num ritmo rápido784.
4.3 Dissertações
784
MORTON, Francis William Orde & SECKINGER, Ron. “Social Science Libraries in Greater Rio de
Janeiro. IN: Latin American Research Review. Vol. 14, N. 3 (1979).
278
Ferreira Reis.
46M MUNIZ, Celia. Os donos da terra: um estudo sobre a estrutura fundiária no
Vale do Paraíba fluminense (século XIX). Dissertação de mestrado em História.
UFF, 1979. Orientada por Victor Vincent Valla.
47M El-JAICK, Sérgio. O pensamento político de Simón Bolívar. Dissertação de
mestrado em História. UFF, 1979. Orientada por Arthur Cézar Ferreira Reis.
48M PEÇANHA, Jorge. A abertura do Paraguai: raiz de uma guerra. Dissertação
de Mestrado em História. UFF, 1979. Orientada por Arthur Cézar Ferreira Reis.
49M PEDROSA, Ulianov. O problema indígena na Argentina na segunda metade do
século XIX. Dissertação de Mestrado em História. UFF, 1979. Orientada por
Arthur Cézar Ferreira Reis.
50M SADLER, Daniel Vieira. O pensamento de Sarmiento. Dissertação de Mestrado
em História. UFF, 1979. Orientada por Arthur Cézar Ferreira Reis.
51M SEREJO, Tereza Cirstina Leal de. Coronéis sem patente: a modernização
conservadora no sertão pernambucano. Dissertação de Mestrado em História.
UFF, 1979. Orientada por Francisco Falcon.
53M GOMES, Francisco José da Silva. O sistema de cristandade colonial. O reino
de Deus rebaixado a Colônia. Dissertação de mestrado em História. UFF, 1979.
Orientada por Victor Vincent Valla.
54M SANTOS, Lenalda Andrade. A oligarquia açucareira e a crise: Sergipe 1855-
1890. Dissertação de mestrado em História. UFF, 1979. Orientada por Victor
Vincent Valla.
55M SILVA, José Luiz Werneck da. Isto é o que me parece. A Sociedade Auxiliadora
da Indústria Nacional (1827-1904) na formação social brasileira: a conjuntura
de 1871 a 1877. Dissertação de mestrado em História. UFF, 1979. Orientada por
Victor Vincent Valla.785
785
A primeira frase do título da dissertação não consta nos catálogos da UFF em que nos referenciamos.
786
TORIBIO, Maria Teresa. O café no contexto econômico da Colômbia e a atuação da Federação
Nacional dos Cafeicultores (1927-1962). Dissertação de mestrado em História. UFF, 1978. Orientada por
Francis Morton
279
aqui as áreas de altitude e o fato de o café colombiano ter duas colheitas anuais. O
década de 1960. Aqui se ressalta que só o café conseguiu assegurar à Colômbia “o seu
lugar no contexto econômico mundial”, já que foram sem êxito as tentativas de ampliar
entre os anos 1920 e 1950. Escreve sobre a evolução das culturas de tabaco, anil e quina
política econômica do país para o mesmo período com base principalmente em fonte
tratamento do grão pós-colheita etc.. Expõe também dados sobre comércio exterior para
atestar a importância do grão, fala de seus destinos, problemas que havia com o
explica pelo fato de que sua principal atividade colonial fora a mineração. Nota-se
também que essas propriedades tinham uma tendência a se fragmentar ainda mais
por leis sobre taxação, acordos internacionais sobre preços, importação de máquinas,
censos e pesquisas para melhorar a cultura. Trata-se de organização poderosa que era
alimentada pelo governo com os impostos colhidos pelo próprio Estado. A Federação
estipulava quais deveriam ser exportados, impedindo assim a venda de certos grãos. O
capítulo ainda expõe dados sobre sua organização interna (eleições, congressos,
comitês, etc.).
atuação da Federação.
Rio de Janeiro. Um estudo de caso: o ramo Peixoto de Lacerda Werneck, 1850-1900” 788
transição para novas formas de trabalho. É um estudo de caso sobre uma família,
políticas, econômicas e sociais no Brasil do século XIX. A família Werneck foi uma das
1900, Silva espera contribuir para que se faça generalizações a partir de casos concretos.
Como aponta, a preocupação principal que norteia sua pesquisa é a crise do escravismo
teoricamente, uma vez que dados em si nada significam se não postos em contexto
advogam que o momento colonial já é capitalista. Silva então critica esta segunda
como um ramo dessa visão eurocêntrica estaria o etapismo de Sodré, que o faria
associar o escravismo brasileiro ao escravismo antigo, o que seria uma anomalia. Silva
ainda critica autores que entendem a escravidão como algo não central, “circunstancial”,
788
SILVA, Eduardo da. “O cancro roedor do Império do Brasil. Barões do café e crise da estrutura
escravista no Rio de Janeiro. Um estudo de caso: o ramo Peixoto de Lacerda Werneck, 1850-1900”.
Dissertação de Mestrado. UFF, 1979. Orientada por Victor Valla.
282
escravismo colonial como formação específica, tendo como base para sua reflexão
escravo ter sido reduzido à “coisa”, a independência não ter alterado a estrutura de
senhores são “classe para si”. Os escravos, embrutecidos pela sua condição, “não
religião, raça, honra, etc., afirma que elementos socioculturais seriam importantes, mas
Oswaldo Sunkel.
anteriores ao século XIX. Informa sobre a ocupação do Vale do Paraíba por pioneiros
789
p. 30
790
p. 59
791
p. 61
283
terras. Além de fontes secundárias, Silva faz uso de memórias familiares e outros
bastante fluido e embasado em fontes, com muitas citações, é construído o retrato dessa
deles como diretor da Companhia Estrada de Ferro Pedro II e cônsul. Temos o trabalho
formulam planos sobre imigração, criação de núcleo colonial, reforma fiscal que incluía
que políticos eram apoiados pela família, e o que pensavam da situação econômica e
política de distintas regiões do país. Silva repara que a família vai assumindo “valores
igrejas), comenta que não seriam “improdutivos” como dizem alguns autores, mas,
284
informados das características das diferentes fazendas desses barões, suas colheitas e
bens possuídos. Como elementos da crise, temos as considerações dos barões sobre o
questão das fugas, doenças e mortes (sobre isso, por exemplo, Silva expõe
correspondência entre o cafeicultor e comissário, onde aquele anseia para que logo
chegue encomenda de cobertores para aplacar o frio que os escravos sentiam, o que
poderia comprometer sua saúde, logo, sua capacidade de trabalho). O capítulo mostra
contatos dos escravocratas para trazer cativos que haviam fugido e que se encontravam
presos; ordens para castigá-los; expressões de temor da violência reativa dos escravos;
estratégia de usar a religião (ouvir missa, confessar-se) para disciplina, fazendo-o ter
Werneck, está também a de que nem sempre o escravo é inimigo do senhor, que não se
deve tratá-lo nem com muita frouxidão, nem com severidade excessiva. A carestia nas
fazendas também ocupou muitos escritos dos barões, entre a expectativa de se ter tudo
para compras). Pragas e dívidas são outros dois assuntos que ocuparam bastante os
285
barões da família em seus escritos. Neste capitulo, chama a atenção que Silva formula
novamente a ideia de que escravo é “coisa”, embrutecido pela violência que sofre, pelo
tratamento que dispensa a animais na produção, e pela violência com que reage.
gerações da família Werneck, o autor os combina com dados extraídos de outras fontes,
trabalho na grande lavoura). Entre a produção intelectual da família Werneck, está uma
aumento demográfico, o cafeicultor Luiz Werneck aponta como causas, além de outras,
o monopólio da terra e a hipertrofia do setor exportador da economia. Uma vez que isso
substituta da escravidão, mas como uma garantidora: ela produziria alimentos que
Outro ponto importante, diz Silva, é que, à medida em que se aprofunda a crise
bem para o africano e passa a considerá-lo um mal inegável, mas que deve ser mantido
sociais. As discussões sobre mão de obra nesse contexto de crise do escravismo passam
ainda sobre que povo deveria vir ao Brasil. André Werneck se põe contra a imigração
na Europa para atrair germânicos. Vivendo no final do século XIX, André Werneck
demagógica. Também,
proletariado brasileiro. É enfático ao considerar que essa educação não deveria tratar de
como um que se esforça por discussões conceituais e trabalho com fontes, afirma que
teoria sem empiria é ensaísmo, que pode ser brilhante, mas não está embasado na
realidade concreta. Por outro lado, a empiria sem teoria acumula fatos sem lhes revelar
o sentido profundo. Por fim, são mencionados mitos da historiografia (sem, entretanto,
que os autores responsáveis por eles sejam identificados): que a cafeicultura fluminense
abolição; que a abolição foi uma outorga imperial ou de fazendeiros; que o fazendeiro
conjunto grande de fontes: vários livros publicados por membros da família, artigos de
De Rosas em 1979, sob a orientação de Arthur Cézar Ferreira Reis. 794 Declara que seu
pecuária. “Dissemos uma “visão porque vinte anos de governo é um período extenso e
para uma análise de maior profundidade precisaria de mais tempo para pesquisa.” 795
relação do governo central com as províncias) também tomam relevo nesse curto
Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Mas suas fontes principais são secundárias.
Avaliando essa bibliografia diz que “Difícil foi realizar tal tarefa, porque a maior parte
794
CARDOSO, Zenaide. Política econômica de Juan M. De Rosas. Dissertação de mestrado em História.
UFF, 1979. Orientada por Arthur Cézar Ferreira Reis.
795
p. 1
288
Vicente Fidel lopes, a figura de Rosas. Daí a dificuldade para se separar o fato, a
medidas desses dois partidos: “Foi livre cambista até certo ponto, monopolista em
defesa da primazia portenha, fechou rios e interveio nas Províncias. Era a realização
interior e do litoral. Seu governo, entretanto, é marcado por forte tensão entre a
campanhas de imprensa799.
796
p.1
797
p. 13
798
p. 73
799
p. 65-70.
289
O trabalho de Celia Maria Loureiro Muniz, “Os donos da terra: um estudo sobre
limitando-se a citá-la800. Por ter identificado nas fontes cartoriais um grande número de
colocará em contraponto a essa tendência historiográfica uma vez que estudar apenas o
existência da pequena propriedade. Para a autora, uma das origens do erro é que
atenção à real medida das terras. Em Vassouras, por exemplo, poucas fazendas teriam
grande extensão.
Para Muniz, pensar assim significa “transpor uma realidade europeia”. Seria
demandas entre fazendeiros e posseiros serão estudadas não como luta de classes mas
como questões surgidas entre dois proprietários de terras que, como tal, possuíam
colonial”, tendo como base principalmente Ciro Cardoso. Entre os elementos que o
800
MUNIZ, Celia. “Os donos da terra: um estudo sobre a estrutura fundiária no Vale do Paraíba
fluminense (século XIX). Dissertação de mestrado em História. UFF, 1979. Orientada por victor vincent
Valla. p.1
801
p.7
290
Valença. Documentos legislativos também são analisados por Muniz. Seu recorte, 1801-
as leis brasileiras possuíam aspectos feudais por ter sua origem na metrópole. A autora
classificação legal dos bens e a contagem de árvores. Explora ainda a legislação sobre
(sesmarias vendidas sem que se começasse a fazer plantações; fraudes em que pessoas
1822) foi uma das origens das propriedades no Brasil junto com a “posse “mansa e
pacífica””. A posse, como define Muniz, é o uso da terra sem um direito anterior que a
ocupação do solo. Atenta nesse capítulo aos aspectos legais da questão, nos informa que
entre 1822 (ano em que se proíbem as sesmarias) e a Lei de Terras de 1850, a situação
jurídica é muito confusa. Dedicando-se a esta lei que é um marco na questão, aponta
nos informando sobre as diferentes posições e os artigos. Entende que esta lei de 1850
802
p. 31
291
beneficiou o posseiro que tem bens para medi-las e registrá-las. Para Muniz, conquanto
região do café (Minas, São Paulo e Rio de Janeiro), onde todas as terras já se achavam
Suas fontes aqui são principalmente relatos de viajantes, de onde extrai informações
O terceiro capítulo se dedica ao início das fazendas de café da região, que tem
pertencerem a índios e os reclamos por elas. Também observa nas fontes cartoriais de
mais de perto três deles, em que posseiros contrataram advogados para se defender. Em
um desses processos, cujo desfecho não é conhecido, alegando má-fé dos posseiros em
se instalar na terra, o sesmeiro pretendia se apoderar de todos os seus bens (uma das
divergências do litígio era sobre quais bens tinham os posseiros) sem dar indenização.
foreiros (o domínio continua com o sesmeiro, mas a posse é dos sitiantes), porque eles
provaram estar no local antes de iniciada medição ou cultura ali. Para a autora, quando
em 1850 foi promulgada a Lei de Terras todas as terras estavam ocupadas na região. Foi
propriedade: situação, sítio ou sorte de terras; como eram habitações nos sítios, seus
o grande fazendeiro, salientando que em 1850 estavam findos os litígios pelo domínio
de terra no Vale do Paraíba, com o posseiro tendo garantida sua pequena propriedade. A
relação entre fazendeiro e sitiante a partir de então seria “cordial”, marcada (essa
casos de perda de propriedade por conta de dívida e, pondo de forma diferente do que
havia posto páginas atrás, observa assim que era grande o domínio que o grande
fazendeiro exercia sobre o sitiante805. Também com base em Maria Sylvia de Carvalho
Franco aponta que o grande proprietário, por conta do voto, “dependia” do pequeno.
se observa conflitos (Muniz aponta que entre dois grandes fazendeiros a situação era
804
p. 87
805
p. 119-22
293
resolvida de forma mais cordial que entre fazendeiro e posseiro). Explorando as fontes
cartoriais, a dissertação nos mostra processos de compra de sítios menores; cita vários
que havia ali ou as casas). Para Muniz, essas fazendas não poderiam ser muito grandes
porque seria difícil nesse caso controlar os escravos. Esse capítulo também estuda a
questão do crédito, onde nos informa sobre uma família, Teixeira Leite, que emprestava
em troca de hipoteca. Comenta a legislação sobre o tema que, antes de 1850, protegia o
devedor contra a perda de propriedade – dessa forma ela tinha fundo patrimonialista e
aponta que a partir de 1850 com a Lei de Terras e de 1864 com a Lei Hipotecária a
colonial com o modo de produção capitalista. Por fim, nos mostra que fazendeiros
tinham necessidade muito grande de crédito, ao mesmo tempo que seus bens se
desvalorizavam. A última temática trabalhada, sempre tendo como fonte principal o que
encontrou nos cartórios de Valença, é a da herança. Muniz informa que até 1835 a Lei
dos Morgados, de origem feudal, prescrevia que toda herança seria do primogênito. Em
1835, a Lei de Partilhas apontava a divisão entre vários herdeiros. Muniz, então, depois,
de perceber essa divisão da propriedade pela herança, com base em Lucilla Hermann,
aponta que isso fragiliza a situação dos pequenos e aumenta a pressão dos grandes obre
eles. Mostra também que alguns cafeicultores formaram companhias para administrar o
pós-guerra, onde se observa uma queda da participação de países da América Latina nas
ONU, o FMI, a OEA e a CEPAL. Ela também é tema do capítulo 3 que, também
fundamentado em fontes secundárias, nos traz dados sobre o comércio exterior latino-
Montevidéu, que prevê a formação de uma zona de livre comércio que pudesse formar
diz respeito à também a situação interna dos países americanos. Situa o surgimento de
806
ROCHA, Ubiratan. A ALALC e a integração econômica da América Latina. Dissertação de mestrado
em História. UFF, 1979. Orientada por Arthur Cézar Ferreira Reis.
295
Andrade Santos quis estudar os antecedentes no século XIX do conflito de classes que
marcava o momento em que a dissertação foi escrita (1979). Consultando fontes (“em
entende não existir clara delimitação entre oligarquia latifundiária, Estado e igreja.
coesão entre esses – algo necessário para se fortalecer ante o antagonismo de classes.
Em suma,
807
p.97-8
808
SANTOS, Lenalda Andrade. A oligarquia açucareira e a crise: Sergipe 1855-1890. Dissertação de
mestrado em História. UFF, 1979. Orientada por Victor Vincent Valla.
296
referências bibliográficas sobre o Estado, mas sua principal base são fontes primárias,
com muita contribuição original, gerando um estudo denso e cheio de dados. Para sua
Perpassa temas como as relações de trabalho dentro dos engenhos, mas sua atenção
dependência porque havia influência baiana sobre seus preços, por de lá vir capitais, por
ser intermediária com os centros capitalistas e pelo transporte ser monopolizado por
companhia baiana. A autora traz também que através da acusação de que era na
dependência de Sergipe ao comércio da Bahia que residia a causa fundamental das suas
povo - impedindo assim que fossem vistos de forma mais complexa, contemplando a
809
p.3
297
província, discursos de políticos e artigos de jornal, entende que a elite operava para se
beneficiar nessa situação de crise, apontando que suas soluções passavam por beneficiar
enorme venda de escravos para o sul do país, e na intenção de reter essa força de
trabalho no Sergipe, foi aumentado o valor do imposto de transação. A ação não deu
campanha antiabolicionista de jornais era uma outra forma de atuação sobre a questão.
incentivar o trabalho livre. Dessa forma, os discursos apontam para criação de leis
intervenções nesse sentido. Sobre a questão dos capitais, a segunda destacada pela
autora, a elite reage com reclamo contra as formas de empréstimo à lavoura, discute leis
hipotecárias e expressa que a culpa pela decadência do açúcar estaria nas casas
elite, seu trabalho traz um volume grande de dados sobre os assuntos que aborda.
autora optou por abordar no último capítulo, o quarto. Para Santos, “Impossibilitada de
autora então perpassa as colocações da elite sobre cada um desses temas. Sobre o
desejava que houvesse uma mudança de mentalidade no campo, para que fossem
verificação das formulações da oligarquia sobre cada tema, Santos observa a temática
imprensa.
elite sobre os temas, aponta que “Tudo o que de ruim acontecia na província –
emancipação” que a partir de suas fontes de receita acumulava para comprar alforrias.
810
p.74
299
critérios que eram usados para determinar que escravo teria prioridade no direito à
valor das indenizações estabelecidas pelos próprios senhores estes geravam altos lucros.
Ainda neste terceiro capítulo, mostra que a oligarquia pretendia criar lei que obrigasse
Como conclusão, a autora destaca que, uma vez que no final do período
Nordeste”811.
(489 páginas) estudo de José Luiz Werneck da Silva. O primeiro esforço do autor, na
introdução, é explicar seu interesse sobre o tema. Silva coloca que era parte de uma
USP, onde o autor se guiava pela Escola dos Annales. Logo, mudou sua posição lendo
Marx (o que o fez “abandonar” Althusser). Aqui não há clareza sobre o que essas
Silva. Para o autor, não faz sentido opor fato à estrutura – pode-se chegar à essência do
real sem se ater à aparência. A estrutura não seria estática, e para essa compreensão o
ativo que tem o historiador na construção da história, bem como a importância de situar
este sofre tentativa de cooptação por parte da burguesia. Ela pode agir sobre o
proletariado. Nesse seu primeiro capítulo, as principais referências que aparecem nas
notas são Lucien Goldmann, Marx e Engels e Leo Kofler. Mas há muitos outros autores
Júnior, Karl Manheim, Carlos Nelson Coutinho, entre outros. Apesar de não constar nas
notas desse capítulo, se nota que Silva usa bastante o léxico gramsciano.
813
p.31
301
da Indústria Nacional, que será explorada através de seus estatutos e de seu principal
nos avisa que atuará no “nível da aparência”, ou seja, deixará, nas suas palavras, o
objeto produzir seu próprio discurso, para só depois problematizar em torno dele. Ao
final do capítulo, dirá que esse capítulo não reforça um positivismo sacralizador dos
fatos, posto que há consciência de que foi o próprio autor que os selecionou 814. O
volume de informações trazidas pela dissertação é enorme, o que se nota também pelo
grande número de citações diretas das fontes. Nesse capítulo são contadas as iniciativas
final do século XIX traz mudanças para a Sociedade que vai perdendo presença junto ao
Império. Em 1892, subsídios do governo lhe são cortados e industriais que faziam parte
considerando para responder suas questões sobre a história brasileira (estudos com
fonte primária: para Silva este seria até mesmo mais importante que a revista do IHGB
referência diminuta à Sociedade e a seu periódico, Silva tece comentários que lamentam
deveria consultar os registros da Sociedade porque uma série de políticos que debateram
colocações laterais. Por exemplo, quando trava uma reflexão sobre o Visconde de Rio
elogia Nicea Vilela Luz por levar em consideração o pensamento econômico brasileiro
pensamento fisiocrata, entre outros. A discussão tarifária era uma que, para Silva,
aponta que a modernização proposta pela Sociedade Auxiliadora não era revolucionária,
estrangeiro. Critica também o nacionalismo como uma ideologia que favoreceria apenas
o grupo dominante.
303
imperial como instrumento de coerção das frações hegemônicas que constituíam o bloco
enquanto sua ação atendeu às frações hegemônicas da classe dominante. Sua principal
e do Senado.
Maciel (39m)815. Esse estudo se utilizou de atas que estão no arquivo do ministério das
resultantes. A dissertação está bem dividida em duas partes: uma primeira que apresenta
versa sobre guerras de independência e à política internacional junto aos novos Estados
da América com ênfase na política europeia (que não fez ação efetiva para recolonizar a
815
MACIEL, Dulce. Congresso do Panamá de 1826. Dissertação de Mestrado em História. UFF, 1979.
Orientada por Arthur Cézar Ferreira Reis
304
América), dos Estados Unidos (que teve uma política dúbia que refletia divergências de
como referências principais estudos publicados tendo destaque Pierre Chaunu, Celso
estudo factualista de muito detalhe, indo às minúcias dos assuntos que levanta, como se
nenhuma informação de que dispunha nas fontes primárias pudesse ficar de fora. Os
subtemas dos capítulos são “A iniciativa: gestão de Bolívar”, onde traça um histórico
das ideias de criação de uma confederação de estados americanos; “Reação dos Estados
Bretanha que, segundo a autora, se posicionou para que fossem garantidos a autonomia
diplomáticos dos Estados Unidos e da Inglaterra para manter os dois países como
esforços iniciados no Congresso do Panamá não tiveram boa continuidade, já que “...os
Dulce Maciel salienta que lutas e rivalidades entre países, marcados pelo estreito
plano que unificasse as novas nações. O próprio Bolívar, que animava a ideia, vai
Jaick orientado por Arthur Cézar Ferreira Reis818. Justifica seu tema por ser a
personagem pouco conhecida dos brasileiros. Centrado nas ações individuais, tem como
utilizada foi a de crítica histórica interna dos documentos. Sempre que possível
deixamos o próprio Libertador falar através dos seus escritos, numa tentativa de
também explora fontes primárias que são três compilações de textos de Bolívar. Em
meio aos vários escritos originais do “Libertador”, justifica sua atenção maior a alguns
817
p. 8-9.
818
El-JAICK, Sérgio. O pensamento político de Simón Bolívar. Dissertação de mestrado em História.
UFF, 1979. Orientada por Arthur Cézar Ferreira Reis.
819
Ver “Resumo”
820
Idem. p. 5
306
outros “...que parecem contradizer ideias anteriormente defendidas por ele, podem[ndo]
para educação, política indígena, entre outros. El-Jaick tece avaliações que ressaltam a
conclusão afirma que Bolívar deixou intactas as estruturas econômicas que produziam
mudança social, motivo pelo qual ele não conseguiu atingir os seus ideais mais
elevados.”824
explorados suas “origens familiares”, “os mestres”, “as viagens” e “as leituras”.
Como evidência de que trata de elementos individuais, temos frases como “Como
821
Idem. p.55
822
Idem. p. 60
823
Idem. p. 88
824
Idem. p.94
307
das últimas páginas dessa dissertação é a organização de cronologia e mapas. Por fim,
notemos que há um menção à leitura de Marx sobre Bolívar, conhecida pelo autor de
forma indireta e julgada como marcada por falhas históricas 827. Há também uma citação
de onde se extrai somente que não se deve estudar o pensamento político de uma
uma guerra”828 (48m), de Luiz Carlos Jorge Peçanha. Trata-se de um estudo bem curto,
825
Idem. p. 11
826
Idem. p. 49
827
Idem.p. 2
828
PEÇANHA, Jorge. A abertura do Paraguai: raiz de uma guerra. Dissertação de Mestrado em História.
UFF, 1979. Orientada por Arthur Cézar Ferreira Reis.
308
com um total de setenta páginas. Faz uma divisão em 3 capítulos, onde o primeiro se
Estado estaria a serviço das classes menos favorecidas que eram sua sustentação
política. O governo também foi marcado pela prática da perseguição e do terror, sendo
tirânico, cruel, despótico e totalitário. Avisando que não pretende justificar o governo
duro de Francia, Peçanha pontua que as nações em volta do Paraguai estavam aplicando
guerra. Sobre isso, o autor, com ênfase sobre relações diplomáticas, explora disputas
Outra dissertação com foco em um estadista foi escrita por Daniel Vieira Sadler.
sobre o indivíduo em que, por exemplo, a própria história política da Argentina aparece
apenas como figurante na dissertação, quando não é ignorada. A sua redação é marcada
algumas das vezes sem conexão direta com o seguinte do texto. Nesse pequeno estudo
de 84 páginas, Sadler afirma que as fontes principais estão mais nos livros que nos
colocando que a principal fonte para estudar Sarmiento é ele próprio através de suas
obras completas, partes das quais publicada em vida 830. Das referências de pesquisa,
apenas duas não são trabalhos diretamente sobre ou escritos por Sarmiento. O texto está
de sua vida privada – por exemplo, visitas que fez quando esteve no Rio de Janeiro.
de Sarmiento, mas está presente na obra inteira: “Não ama as ideias por elas mesmas,
homens”831; da Argentina, foi um dos “mais brilhantes filhos”; “Foi gênio...”; “Foi o
notas, apesar de o autor indicar para cada capítulo qual bibliografia utilizou. Muito
embora seu título indique a Argentina no século XIX, sua dissertação trata de um
espectro muito mais amplo de regiões (América do Norte e outros países da América
Latina) e tempos (desde o século XVI). Este estudo de Pedrosa é um apanhado sobre
proletariado rural. Pedrosa também traz informações sobre o histórico dos índios
Sobre os índios borogas, traz sua relação com caudilhos locais e com membros do
Pedrosa afirma que pretende que seu estudo contribua para que não haja mais violência,
833
PEDROSA, Ulianov. O problema indígena na Argentina na segunda metade do século XIX.
Dissertação de mestrado. UFF, 1979. Orientada por Arthur Cézar Ferreira Reis.
311
ocorridos no Pará, que é definido como um levante de parte dos distintos segmentos
Seu trabalho tem ampla base em fontes primárias que são narrativas de períodos
Apesar da exploração factual, seu texto é bastante interpretativo, não raro com tom
concentradas em seu primeiro capítulo mas que também aparecem ao longo da obra.
Entende que os dados empíricos não falam por si mesmos, mas dependem de
história, ou seja, a historiografia, não seria mais “o que realmente aconteceu”. Com base
em E. H. Carr, entende que há uma relação entre passado e presente, e é a partir desse
do empírico sobre o teórico, do factual sobre o analítico, o que faz com que ela não
positivo, pois estaria “revitalizada”, deixando o positivismo para trás, e entendendo que
834
COELHO, Geraldo Martins. Ação e reação na província do Pará: o conflito político-social de 1823.
Dissertação de Mestrado em História. UFF, 1978. Orientada por Arthur Cézar Ferreira Reis.Geraldo
Martires Coelho.
835
p. 16
312
empírico, sem que um esteja em detrimento do outro. Procurando apoio em Paul Veyne
questões teóricas, não prescinde do factual: “os fatos não falam independentes dos
é importante, mas não se pode menosprezar a história política e militar e que, portanto,
perceber um modo de produção definido no Pará, assim como não estaria ali
1823 através de esquemas como o da luta de classes” 839. Dessa forma, o termo “grupo
que é uma classe social?”. O conceito de inspiração marxista não serviria a Coelho
836
p. 13
837
p. 14
838
p. 68-9
839
p. 5
313
porque os componentes dos grupos em luta no Pará não tinham “identidade na posição
Em certo momento, nos informa que vai pensar a história sem dogmatismos
geradores de fanatismo840. Nessa passagem, não temos certo ao que se refere, mas
entretanto que
formal841. Como exemplo da qualidade dessa corrente, coloca que para teóricos como
faz parte de um todo composto pelo político, cultural, social e ideológico.” 842 Coelho
840
p. 10
841
p. 20
842
p. 18
314
também cita Ciro Cardoso pra colocar que não se deve usar os esquemas de Marx como
uma verdade transcendental. O caráter europeu do marxismo o faria impróprio para ser
central da historiografia844.
paraense vê o fato em si mesmo, sem procurar pensar o Império. Assim, acabou-se por
“mais por traduzir a ação do governo do que a essência do próprio movimento.” 845 A
outras significações. Outro ponto é que a tradição historiográfica viu o problema mais
sob o prisma do grupo dominante que sob o prisma do povo. No Pará e no restante do
Brasil os levantes eram entendidos como um mal das massas na ânsia de perturbar a
tranquilidade e o bem estar da sociedade. Ao longo do seu texto, Coelho faz crítica à
843
Idem.
844
p. 20
845
p. 35
846
p. 64
847
p. 162-3
315
sua vez, a tradição historiográfica nacional teria atribuído uma dimensão elástica ao fato
Coelho, essas são duas leituras extremas que devem ser evitadas: a do economicismo
foi apenas uma ruptura formal e - com base em textos de Florestan Fernandes, Caio
Prado Jr., Celso Furtado, Emília Viotti da Costa – esteve marcado pelo conservadorismo
movimentos de caráter popular que sucederam a 1822, salienta que não tinham um
programa político definido nem contaram com doutrina clara. O denominador comum
repressão a esses movimentos gerava aliança entre poder imperial e grupos regionais
político; o contexto de crise de mão de obra escrava, que para o autor é parte do
848
p. 46-9
849
p. 41
850
p. 56-8
316
colonial:
levante ocorrido em 1823. A Cabanagem, que ocorreria em 1835, seria uma outra
Aponta ter havido aliança, ainda que não formal, entre os brasileiros do grupo
líder,
851
p.97
852
p. 174
853
p. 118
317
colonial.”854
Na conclusão, diz que 1823 não tem a ver apenas com Pará, mas com a história
líderes da revolta (por exemplo, o medo face à mobilização negra); sobre a circulação
também como essa oligarquia se utiliza da política desenvolvimentista para reforçar seu
poder contando para isto com ajuda dos poderes estadual e federal. Assim, o recorte
toma maior volume) e vai até 1976 (quando é empossado um novo governo municipal)
A autora inicia o texto com uma longa “introdução metodológica”, em que nos
fornece vários dados sobre a execução do trabalho. Serejo fez 4 viagens ao Nordeste e
acompanhou de perto o período eleitoral. Nascida na cidade que estuda (seria graduada
pela UFRJ), teve familiares e amigos a ajudando na coleta dados. Seu parentesco,
entretanto, lhe causou problema em um cartório eleitoral onde um funcionário lhe negou
documentos – que foram conseguidos apenas depois de um juiz ter ido pessoalmente ao
local. Como também parte desse ambiente truncado em que se desenvolveu a pesquisa,
Serejo menciona pessoas que tiveram medo de sofrer represálias por fornecer
Econômico de São Francisco também foram utilizados. Esse trabalho empírico também
319
dissertação, a História Oral cumpre papel primordial. A autora também nos informa que
dominante tem controle sobre forças produtivas, mas não de forma tão decisiva quanto a
eleitorais e está sob controle direto de uma camada superior. A clientela em potencial,
que pode ser o caso das camadas médias, escapa a esse controle direto. Outros termos
territoriais (cuja dinâmica teria a ver principalmente com movimentos revoltosos), entre
320
outras. As origens de Petrolina enquanto cidade também são definidas. Descrições sobre
autora, que para tanto se utiliza de trabalho empírico original e volumoso, além de
A seção que trata da “estrutura social” de Petrolina é aquela que servirá melhor
de base para a reflexão que a autora empreende sobre coronelismo entre as décadas de
1950 e 1970. Sobre estrutura fundiária, com base em dados do INCRA e do IBGE, nos
estabelecimentos entre 1950 e 1960, poderíamos supor, num primeiro momento, uma
errônea, tendo em vista a diferença da área recenseada nas duas décadas”858 Aqui
financiamento rural, e o fato de posseiros não saberem exatamente a terra que lhes
relação de parceira, ela apresentou entrevista realizada com um parceiro sem carteira
pagar a vaqueiros um bezerro a cada quatro nascidos no ano). Serejo analisa que
vaqueiro. Para destacar o caráter de exploração das relações, a autora recheia o texto
com informações como a de que esse vaqueiro deixou de receber indenização a que
tinha direito e teve seu cavalo possivelmente morto por envenenamento. Nesse mesmo
sentido, informa que a classe patronal petrolinense atua para impedir a construção e
que poucos empregados tem de fato direito à carteira assinada, com a competitividade
por ela promovendo uma associação com os patrões, o que favorece o controle desses
últimos860. Relevante no quadro que Serejo fornece sobre o campo em Petrolina é que:
dizeres de que a empresa é uma família, e que ali se trabalhava com gosto). Anota que a
força industrial local não tem sindicato, Tribunal da Justiça do Trabalho, “nem qualquer
associação que reúna e defenda os interesses da classe”862. Por conta de sua origem
859
p. 68-9.
860
p.72
861
p. 70.
862
p. 73
322
trabalho é a alta rotatividade, que se dá por conta da volta para o campo, da emigração
para São Paulo e de baixos salários. Há tentativas das empresas em reter mão de obra
entre outros.
explora concepções de vários estudiosos sobre o tema (Victor Nunes Leal, Edgar
Carone, Maria Isaura Pereira de Queiroz estão entre os principais). Serejo insiste que o
coronel não deve ser pensado apenas em associação com a grande propriedade
crianças. Para conseguir o voto, o coronel faz uso de opressão e de presentes. Outro
elemento fundamental da leitura construída nesta dissertação é que verbas estaduais são
anos dez ao final dos anos quarenta) àquele que é o principal recorte do estudo. Salienta
abrigavam quais pessoas, relações com interventores, morte de cabos eleitorais, assédio
perdeu sua posição depois que de seu grupo um coronel, o mais abastado, se mudou
para Salvador, e um outro teve problemas de saúde. Um novo prefeito, o coronel João
323
Barracão, na falta de base política na Câmara dos Vereadores e sem apoio do governo
estadual, tirou recursos de seu próprio bolso para fazer obras públicas. Nesse momento,
uma nova família, os Coelho, foram se firmando e criando grandes empresas como a
Construtora Coelho S/A e as Indústrias Coelho S/A. Para esses relatos, as principais
fontes são as entrevistas, o que faz a História Oral a principal base do seu trabalho. Em
patrimonialismo.
novo coronelismo é situado entre os anos 1955 e 1976, e está relacionado com a política
urbanização, entre outros. Cita projetos originariamente voltados para colonos, mas
o executivo municipal.
324
filhos do coronel Quelé. A autora investe em dados biográficos sobre eles, que empresas
parentela, aquele que presta as informações” 863. Assim como no capítulo anterior, nos
traz um denso quadro factual tendo como base principal as numerosas entrevistas que
fez. Para essa família que dominava a prefeitura municipal de 1955 até os “dias atuais”
(finais da década de 1970, quando a dissertação é escrita), temos um longo histórico das
alianças eleitorais com a esfera estadual e nacional (às vezes, por exemplo, irmãos se
manifestava como concorrência política por conta dos “favores oficiais” que podem
pessoas de baixa classe média mas que procuram frequentar os espaços e adotar os
coronelista, Serejo cita entrevista que realizou com uma empregada doméstica: ali é
para que votasse. Como exemplar das relações coronelistas com a clientela, temos
também um coronel que deu condições para uma trabalhadora comprar uma máquina de
comenta a então tímida penetração que o MDB estava tendo na cidade, avaliando que o
citações e leituras realizadas a partir de “O Capital” de Karl Marx, de onde a autora traz
864
p. 207
865
p. 209
866
p. 243
326
Conjuração de 1789” (41m)867 foi escrito por Valdir de Oliveira Calixto. O primeiro
capítulo, antecipando o objeto principal de sua análise, versa sobre clero secular em
Portugal do século XVIII, procurando trazer suas características básicas. Mostra dados
O segundo capítulo, este voltado para a região das minas, nos traz uma
organização de freguesias, etc.. Com maior atenção ao bispado de Mariana, nos mostra
medicina, fazenda de gado e engenho de açúcar. Destaca as posses auríferas desse clero,
fazendo uso de muitos dados expostos em gráficos e tabelas. Esse clero é então
Capitania.”868 Parte das rendas do clero eram as côngruas pagas pela monarquia que,
segundo o autor demonstra com dados comparativos, eram de pouco valor. Outras
867
CALIXTO, Valdir de Oliveira. O clero secular em Minas Gerais (1745-1792). Sua participação na
Conjuração de 1789. Dissertação de Mestrado em História. UFF, 1979. Orientada por Arthur Cézar
Ferreira Reis.
868
p. 34
327
fontes de renda são destacadas: em Mariana, por exemplo, cada pessoa livre que
dízimos, o autor nos traz documentos que falam da obrigatoriedade de seu pagamento
em tabelas e gráficos, afirma que variações brutas dos rendimentos dos dízimos
dos setores produtivos na Capitania de Minas Gerais...” 869 Sublinha o autor que o clero
Seminário de Mariana, o autor se pergunta que teologia e que filosofia eram ali
ensinadas e aponta que elas estavam afinadas com as reformas processadas por Portugal
desde a expulsão dos jesuítas (abordada no primeiro capítulo). Para o autor, nesse
população. Sobre a relação entre clérigos e autoridades de foro civil, coleta fontes que
“Os Bispos e membros do Cabido eram admoestados pelo soberano, ou pela Mesa de
Consciência e Ordem, às vezes em tom que não deixava dúvidas sobre quem deveria
cumprir ordens.”871
A partir de seu terceiro capítulo, o autor passa a pensar o clero secular e seu
869
p. 42
870
p.45
871
Idem
872
p. 48
328
conjuratório com a igreja, utiliza a categorização deste último historiador a respeito dos
“três níveis de apoio” que teriam havido em relação ao movimento de 1789: “ativistas”,
que trata da defesa dos réus eclesiásticos, destaca que esses não tinham privilégio de
foro; e que a linha de defesa dos advogados foi enaltecer o Estado e a rainha e afirmar
que os réus teriam agido por impulsos psicológicos isolados. O fato de o julgamento dos
clérigos ter sido secreto foi interpretado por Calixto como uma tentativa de resguardar a
imagem da igreja em sua relação com o Estado. Por fim, analisa posturas ideológicas
posições ideológicas dos clérigos réus do movimento de 1789 são a inspiração vinda da
por dois deles. Havia diversidade de opinião entre esses cinco clérigos. Enquanto um
projetava instalar a corte no Brasil, outro queria a morte de todos os europeus. Alguns
padres seriam mais moderados, e Calixto o afirma com base na presença de livros em
sua biblioteca. A maioria deles era favorável à liberdade de culto. Calixto procura
definir que tipo de Igreja esses clérigos pretendiam fundar caso fosse erguida uma
873
p. 61-2
329
tiveram uma contribuição direta para o texto. Dados quantitativos foram organizados
com atenção pelo autor. Sobressai uma postura crítica ao clero, “desvirtuado de suas
introdução, coloca que historiografia da década então atual estava buscando uma
interpretação a partir dos oprimidos. O autor valoriza uma reflexão que procure associar
a conexão entre igreja e as relações escravistas de produção, questão para a qual seu
registre-se que, em uma nota de rodapé, cita conceito de ideologia de Marx e Engels
cristandade colonial. O reino de Deus rebaixado a Colônia (53m), trabalho escrito por
Francisco José Silva Gomes875. Nesse estudo extenso de 349 páginas, metade versa
religião desde os primórdios sob o Império Romano até a época contemporânea. Como
874
p. 70
875
GOMES, Francisco José da Silva. O sistema de cristandade colonial. O reino de Deus rebaixado a
Colônia. Dissertação de mestrado em História. UFF, 1979. Orientada por Victor Vincent Valla.
330
o próprio autor afirma, ele não se dedicou a fontes primárias para trazer dados novos 876,
efeito, sua dissertação investe muito na discussão conceitual e abstrata. No geral, seu
tom é ensaístico e filosófico, com pouca atenção aos aspectos factuais do seu objeto.
outra parte seria realizada por historiadores que se contentam apenas com a
desmistificação ideológica da instituição877. O autor pretende não seguir esses dois tipos
melhor sobre a religião no contexto em que amplos setores da Igreja Católica passam a
se identificar mais com os pobres. Assim, Gomes pretende fazer uma releitura do
passado eclesial “...que dê aos cristãos uma consciência histórica para empreenderem
vai contribuir pra Igreja ser pensada de forma científica, “...e não meramente como
adversário a liquidar.”. Essa sua postura está ligada, como o autor faz questão de deixar
teórico-metodológicos”) diz respeito não apenas ao seu objeto específico de estudo, mas
estudada não é o mesmo que a própria coisa, não havendo portanto uma objetividade
absoluta; afirma que toda escrita da história tem uma teoria, que dá a estrutura do
876
p. 38
877
p. 11
878
p. 11-3
331
história), com paixão por aquilo que se faz...”879; Por fim, entende que nas ciências
tem a ver com harmonia e pertence às classes dominantes. A outra é própria da visão das
classes dominadas880. Enquanto, intelectual, Gomes põe que faz parte da super-estrutura
ideológica, mas como assalariado está na infraestrutura econômica, vivendo assim uma
contradição. Ainda sobre sua posição intelectual, diz ser parte de uma fração dominada
da classe dominante. Em termos mais concretos, nos faz saber que tem engajamento
com comunidades cristãs e que é católico 881. Voltando a comentar sobre historiografia,
entende que desde os anos 1930 se processa no Brasil uma perspectiva crítica que se
refletindo sobre o que significa ter fé em um mundo científico; o que um cristão deve
compreender ser um Reino de Deus: (o projeto escatológico (o Reino de Deus) deve ser
um projeto histórico); e elogia a teologia da libertação pelo seu trabalho junto aos
principais Louis Althusser e Michel de Certeau, mas também passa por outros autores
como Pierre Bourdieu, H. F. Japiassu, Lucien Goldmann, Pedro Demo, Clodovis Boff,
entre outros.
879
p. 32
880
p. 21- 35
881
p.39
332
que marca “...a passagem de uma comunidade eclesial mais fundada na autoridade do
mistério para uma comunidade eclesial mais fundada no poder da Instituição.” 882 Para
Para Gomes, a instituição do padroado foi responsável por deixar as igrejas dependentes
que tem a ver com colonizadores, guerra contra índios e contra “hereges” franceses e
terra dos sesmeiros e para combater os indígenas. Sobre a igreja teria havido a
aprofundado da escritura. Esse catolicismo seria marcado pelo medo da repressão, pelo
expulsão dos jesuítas do Brasil no fim do século XVIII. Essa crise, no entanto, será em
parte revertida a partir de 1822 com a associação da Igreja com o império – mantendo-
se, portanto, o “sistema de cristandade” que se define pela relação da Igreja com o
Estado
882
p. 137
333
da obra) como bloco histórico e hegemonia. Para o autor, a Igreja Católica é intelectual
orgânico que quer cimentar a hegemonia ideológica da classe dominante. Aponta que
Gramsci sublinha o peso da superestrutura (onde deve ser localizada a Igreja pelo seu
das tentativas da educação pública, mas sem que houvesse ocasionado mudanças
883
GARCIA, Ledonias. Sociedade e educação na Bolívia Liberal (1899-1920). Dissertação de Mestrado
em História. UFF, 1978. Orientada por Francis Morton.
884
p. 15-6
334
educação formal885.
Entende como básico na análise da sociedade boliviana que há dois grupos: uma
vezes conflitos no interior da própria oligarquia branca. Sua visão panorâmica sobre a
boom da prata e o surgimento de uma nova oligarquia no oitocentos 888; a atuação dos
partidos conservador e liberal, com o domínio deste último a partir do final do século
885
p. 3-4
886
p. 10
887
p. 35-6
888
p. 39
335
Menciona a tensão de projetos republicanos com a Igreja católica. Critica que o governo
tenha feito universidade ao invés de investir mais em ensino básico. Dessa forma,
haveria universidade para os ricos e falta de escola para a massa. (aqui, novamente,
aparece como central para o autor a questão do acesso às instituições escolares). Como
marca de uma nova fase pós 1845, há mais criação de escolas. Seriam, entretanto,
medidas isoladas. Ainda assim, um marco desse momento é que o Estado boliviano
cargo de esforços particulares. Ainda sobre o século XIX, Garcia também releva as
assume o poder, nas primeiras décadas do século XX. Para o autor, isso significa avanço
marcadas pelas relações entre Igreja e Estado, lei do divórcio e liberdades públicas. Há
tensão envolvendo o federalismo. Sua mensagem nesse capítulo, assim como em outros,
primeira vez era dada ênfase à educação popular, às escolas rurais e à educação do
índio. Garcia menciona a criação das escolas, o pensamento de alguns agentes estatais
meninos e meninas juntos pela primeira vez, o que despertava reação de conservadores.
Esses esforços do Partido Liberal na educação básica teriam fim com a deposição do
superiores. Aqui Garcia também retoma a reflexão de que a educação deve ser pensada
Bolívia tinham interesse em desenvolver ensino profissional que seria coerente com o
espírito capitalista892. Não é desenvolvida, para além disso, a reflexão sobre a relação
entre essa postura dos grupos dominantes para a educação e o quadro de dependência (a
internacional. Um último comentário do autor é que, muito embora o índio não tenha
sido favorecido com o ensino superior, dessas instituições saíram pensadores que se
dedicaram às causas dos oprimidos. Assim, o autor introduz seu último capítulo, que
não guarda relação direta com o restante de seu estudo. Trata de intelectuais
indigenistas, que passaram a combater ideias racistas e a veicular uma imagem positiva
890
p. 109
891
p. 117
892
p. 114
337
presidenciais.
(11/17). Outros dois abordaram o oitocentos em conjunto com outros períodos. Apenas
Pará. Dois se dedicam ao Rio de Janeiro, e outros dois tem temas de amplitude nacional.
Essa atenção geograficamente mais dispersa nos estudos de História do Brasil é uma
ações de estadistas, com ênfase em ações diplomáticas, sendo estudos factualistas e com
338
contextos, onde são levados em conta questões como estrutura e dinâmica econômica,
econômico e à estrutura das relações sociais no país. O mesmo se pode dizer do estudo
de Calixto sobre a Igreja em Minas ("O clero secular..." (41m)), que o autor entende
dominados.
paralelo entre essa dissertação e outras duas. O trabalho escrito por Ubiratan Rocha ("A
Por sua vez, o estudo de Célia Muniz sobre estrutura fundiária ("Os donos da
XIX.
Por fim, são dois os estudos cuja temática principal é cultura. O escrito por
empírico (que entendemos aqui como a mobilização de fontes primárias que não
segunda, mas bem inferior ao da primeira. Isso está ligado à proporção de estudos de
História da América, que sem deixar de se valer de fontes primárias, as tem a partir de
inferimos: nesta terceira turma, assim como na segunda, as fontes secundárias parecem
aqui é fazer o contraste com as dissertações produzidas pela primeira turma, em que
temos o de Célia Muniz ("Os donos da terra..." (46m)) que, para conhecer a região de
Vassouras, se inspira mantendo grande diálogo com uma nova historiografia sobre o
(55m)) tem um extenso capítulo dedicado a uma varredura sobre como seu objeto
893
"O café no contexto..." (33m), Ação e reação..." (38m), "Congresso do Panamá.." (39m), "O clero
secular..." (41m), "O cancro roedor..." (42m), "Os donos da terra..." ("Os donos da terra..." (46m)),
"Coronéis sem patente..." (51m), "A oligarquia açucareira..." (54m), "Isto é o que parece..." (55m),
341
limitaria ao nível factual, sem explorar contextos mais amplos, marcados pelas
pela predominância do empírico sobre o teórico, do factual sobre o analítico. Não seria
positivo, pois o positivismo estaria sendo deixado para trás. Especificamente sobre os
escravista brasileiro. Ao longo do seu trabalho, também, sem entrar em detalhes, faz
como outorga; e o fazendeiro como uma pessoa isolada em sua propriedade. Queixa-se
também de existir pouco debate historiográfico. Serejo, em seu trabalho sobre coronéis
crítica historiográfica de menor monta: Valdir Calixto ("O clero secular..." (41m)) se
cristandade..." (53m)) faz menção a uma historiografia triunfalista sobre a Igreja, e outra
nenhuma das duas. Gomes também coloca que a historiografia brasileira estaria vivendo
342
Célia Muniz ("Os donos da terra..." (46m)), sobre que modo-de-produção vigoraria no
Brasil do século XIX (escravista colonial, de acordo com a autora, em oposição aos que
advogavam ser o Brasil o país ainda feudal naquele momento). Geraldo Coelho ("Ação
que estes não se aplicam à realidade paraense do século XIX, sendo “grupo social”
termo mais adequado. Tereza Serejo ("Coronéis sem patente..." (51m)) observa como a
substantivo no debate conceitual, temos a breve menção de Valdir Calixto ("O clero
alguns casos lhes tendo capítulos inteiros dedicados. Foram extensas as reflexões de
Coelho ("Ação e reação..." (38m)), destacando que os dados não falam por si próprios,
mas dependem dos historiadores, coloca que no estudo histórico não se trata do que
“realmente aconteceu”. Com base em E.H. Carr, salienta a conexão entre presente e
que ela indicaria que a economia faz parte de um todo com os aspectos político,
ideológico; que o historiador é influenciado pela sua sociedade, mas que tem autonomia,
apesar de ser reflexo da estrutura; que o intelectual é uma fração dominada da classe
dominante; que toda historiografia tem uma teoria; que há as teorias harmônicas e as
conflituosas; que há simbiose entre Igreja e Estado; que a superestrutura tem peso
Brasil e a problemática das classes sociais. Critica concepções como a de Nelson Sodré
Cardoso, apontando que não seria eurocêntrica, mas afinada com as especificidades
brasileiras. Refletindo sobre classes sociais, conceitua a oligarquia como “classe para
si”, enquanto defende que a estrutura reduz escravos a “coisas” comprometendo suas
Como reflexão de fundo epistemológico, coloca que um estudo não deve ser
empiricista, por um lado, ou ensaísta sem base concreta, por outro, devendo os dados
344
Estado e Igreja, que atuam juntos em seus interesses de classe. Também, Dulce Maciel
("Congresso do Panamá..") comenta que o historiador seleciona os dados com que atua,
coronéis em Petrolina ("Coronéis sem patente..." (51m)) é o que mais se dedica a expor
metodologia de forma apenas pontual, e esse é o caso mesmo entre aquelas que se
dedicaram bastante a conceito e teoria. Toríbio ("O café no contexto..." (33m)) apenas
anota que foi crítica com a documentação e que tratou os dados com precisão. Zenaide
Cardoso ("Política econômica de Juan M. Rosas" (39m)) aponta “...a dificuldade para
Werrneck da Silva ("Isto é o que parece..." (55m)), o autor planeja que seu texto em um
primeiro momento atue no “nível da aparência”, para depois aprofundar a análise. Dulce
Maciel, que estudou o Congresso do Panamá (39m), ressaltou que a análise dos
político..." (47m)), que estou Bolívar, trouxe que os escritos do estadista são a melhor
894
CARDOSO, Zenaide. Política econômica...p.1
345
fonte já que é por elas “...deixamos o próprio Libertador falar...”895 Esse autor justifica
sua atenção maior a alguns escritos dizendo que há os documentos essenciais para o
e transitórias...”896 Diz também que para conhecer uma personagem, não se deve
estudar os fragmentos de sua obra, mas ela como um todo. Na dissertação de Daniel
Sadler ("O pensamento de Sarmiento" (50m)), temos que a principal fonte para estudar
Sarmiento é ele próprio através de suas obras completas. Francisco Gomes ("O sistema
de cristandade..." (53m)) coloca que não se dedicou a fontes primárias para trazer dados
principais para os estudos, estando presentes em 13 das 17 dissertações 897 São registros
do mestrado dessa época, foram explorados também processos judiciais ("Os donos da
para o estudo de Célia Muniz sobre propriedade fundiária ("Os donos da terra..."
Relatos de viagem foram trabalhados por Muniz ("Os donos da terra..." (46m)) e Silva
("O cancro roedor..." (42m)). Para este historiador foram centrais também livros de
que dezenas de entrevistas foram utilizadas também por Tereza Serejo ("Coronéis sem
patente..." (51m)).
Comparando essa lista de autores à da segunda turma, não temos mais a projeção
de autores dedicados à América. Por outro lado, mantém-se Furtado, Prado Jr. e Cardoso
Ainda que essa turma tenha se engajado mais em debates com autores, temos
que os dois intelectuais que encabeçam a lista aparecem, novamente, mais como fonte
de informações do que como inspiração teórica. Porém, não é tanto o caso com
Fernando Henrique Cardoso, já que sua teoria da dependência teve algumas menções,
899
"O café no contexto..." (33m), "Ação e reação..." (38m), "O clero secular..." (41m), "Coronéis sem
patente..." (51m), "A oligarquia açucareira..." (54m),
347
como vimos.
Para citar alguns clássicos autores nacionais, Raymundo Faoro e Sérgio Buarque
de Hollanda foram fontes para 4 trabalhos cada. Gilberto Freyre, para 2. Entre o cânone
sociológico, Max Weber e Émile Durkheim não constam em nenhuma bibliografia. Karl
Althusser em 2.
exemplo, o século XX, proporcionalmente, recebeu mais atenção dos docentes nas
ementas de seus cursos que dos discentes no momento da escolha de seus assuntos de
promovidos por docentes serão aqueles também desenvolvidos por estudantes, a saber,
seus professores.
2) Dos estudos que podemos chamar de “regionais” (6), uma minoria (2) se
dedica a espaços do Rio de Janeiro. Entre os outros 4, a escolha pelo recorte geográfico
348
com essas marcas, mas também há muito mais densidade e volume nos autores que se
aumentar o critério para a contagem significa se ver às voltas com classificar o que seria
progressividade com que as turmas que são nosso objeto vão se ocupando das
teria 4 ("A crise dos comissários..." (18m), "Argentina: economia e sociedade..." (25m),
"A rebeldia negra..." (30m) e "A ideia de nação..." (32m)) e a terceira, 6 ("Ação e
reação..." (38m), "O cancro roedor..." (42m), "Os donos da terra..." (46m), "Coronéis
sem patente..." (51m), "O sistema de cristandade..." (53m), e "Isto é o que parece..."
(55m)) – com a diferença que nesse último grupo o número de páginas dedicadas é
difícil precisar a que isso se deve, porque ignoramos a trajetória de formação da maior
parte dos estudantes, bem como o clima intelectual de que participavam fora do curso. É
349
de se salientar, porém, que o professor Victor Valla parece ter sido um interlocutor ou
estimulador dos que mais se projetavam em debates, visto que foi orientador da maior
Por outro lado, note-se que se trata ainda de uma minoria (6 entre 17). A maior
e cientificidade são alguns de seus temas, enquadrados em uma perspectiva de que uma
segunda turma, formulações com volume embasadas nos referenciais marxistas são
nação..." (32m)). Nesta terceira turma, em 6 ("Ação e reação..." (38m), "O cancro
roedor..." (42m), "Os donos da terra..." (46m), "Coronéis sem patente..." (51m), "O
de Ismênia Martins, Victor Valla deve ter desenvolvido essa perspectiva entre os
estudantes.
350
de disputa no campo:
classificar dessa forma uma oposição parece assumir acriticamente a narrativa do lado
François Dosse já citados nessa tese que mostram justamente que o discurso de
acentuar a ruptura intelectual que estariam promovendo, acabaram, por exemplo, por
encobrir que elementos “novos” já poderiam ser encontrado nos historiadores “antigos”.
Marc Bloch e Lucien Febvre não a invenção de ideias, mas a mobilização delas em um
projeto de luta e conquista institucionais901. Outro problema de operar com termos que
1970.
Uma importante fonte para se entender as tensões dos intelectuais dos cursos de
onde foram dados os primeiros passos para a construção da futura Associação Nacional
currículos dos cursos de História. Várias vozes se colocaram demandando uma inovação
das características do que era ensinado. Professores como Cecília Westphalen, Maria
901
DOSSE, F. A História em migalhas...; DELACROIX, C., GARCIA, P.; DOSSE, F.. Correntes
históricas....
352
Yedda Linhares, Francisco Falcon, José Olegário de Castro, entre outros, falaram da
uma História que primasse pela veiculação de informações. Em seu lugar, deveria se
ciência ainda se encontrava na “infância” pois estaria “apenas transpondo a sua fase
902
SIMPÓSIO DE PROFESSÔRES DE HISTÓRIA DO ENSINO SUPERIOR, 1961, Marília. Anais São
Paulo: 1962. 89-90; 98;138.
903
Idem. Ibidem. p.112
904
Idem. Ibidem. p. 104
905
Idem. Ibidem. p. 145
906
Idem. Ibidem. p. 121
353
quantitativas.907
Em oposição a esses que demandavam novas abordagens nos cursos, temos, por
explicação e a interpretação – devem fazer parte da História. Por sua vez, Olga
Pantaleão, questiona a integração da História com outras Ciências Humanas tal como
proposto por “...certas correntes existentes entre nós, que querem modificar-lhe a
professores cujas manifestações foram registradas nos anais. Eduardo França apontou
que pesquisas sobre o passado são suscitadas por questões da atualidade, de forma que a
sentido se posicionou Francisco Iglésias909. Maria Yedda Linhares seria mais enfática na
“justiça social”:
deve servir para explicações sobre os momentos atuais do Brasil: “No tocante a esta
questão, devemos ensinar a História como uma ciência independente, sem pensar na
de propostas. O professor e padre Emilio Silva colocaria que “São as ideias que
refletiram com diferentes posições sobre a presença nos currículos de cursos como Tupi,
Introdução aos Estudos Históricos e outros. Ponto de debate também foi o papel dos
historiador”914
Como colocou Olga Pantaleão neste simpósio de 1961, o sentimento geral era o
de que ninguém estava satisfeito com os cursos, sendo inclusive esta uma motivação
seja, não havia consenso sobre o que seria cientificamente válido, superior, correto (o
912
Idem. Ibidem. p. 129.
913
Idem. Ibidem. p. 207, 209, 215, 235.
914
Idem. Ibidem.p. 302-3.
915
Idem. Ibidem.p. 220-1.
355
campo das ciências – talvez mais especialmente o das humanas – verifica-se sempre
divergências entre os agentes, o que se nos apresenta nesse início da década de 1960 nos
parece uma especial situação. Isto não porque se versava sobre as características mais
uma certa produção científica, procurando estabelecer a autoridade das referências que
Estudando não apenas este primeiro simpósio de professores, mas tendo como
objeto a APUH/ANPUH nas décadas de 1960 e 1970, uma das questões do trabalho de
Paulo da Silva é justamente a problemática que aqui levantamos, onde procura entender
Para o autor, os primeiros anos da instituição estão divididos entre os que defendem e os
modernização que “...evidencia-se nas propostas e discussões relatadas nos Anais dos
916
Essa é a tônica da já citada dissertação de Pereira (“O historiador...”) que se debruça sobre a FNFi e
também aborda este encontro de Marília. Como observado na tese de doutorado de Paulo da Silva, o
registro de Francisco Falcon sobre os simpósios, se comparado com a frieza dos anais, apresenta com
mais cores as tensões presentes nos dois primeiros encontros nacionais. Não é o caso de dizer que o relato
de Falcon é mais fiel ao que realmente aconteceu, mas que ele põe melhor em evidência a existência de
disputas e desconforto no meio acadêmico. Ver SILVA, Paulo. A Associação Nacional dos Professores
Universitários de História: espaço de identificação profissional e legitimação do saber (1961–1977).
Tese de doutorado. UNB, 2014.
917
Idem. Ibidem. p. 10
918
Idem. Ibidem. p. 10
356
Apesar de certa diversidade de significados, de maneira geral essa História “nova” era
compreendida por estar sintonizada com o tempo presente, com estímulo à prática da
III Simpósio passam a dominar a entidade professores de São Paulo (os do Rio foram
mais diretamente atingidos pelo golpe de 1964) influenciados pelos franceses ligados às
científico922. Pronunciando-se por ocasião dos dez anos da Associação, Alice Canabrava
aponta que o “amadorismo”, outro elemento dos “antigos”, preocupado com nomes e
datas, e presente nos anos 1960, estaria desaparecendo no início da nova década 923.
presidente da ANPUH até 1977, quando de seu falecimento. Como demonstra Silva, a
retórica do antigo versus novo, tradicional versus moderno, foi fundamento na definição
919
Idem. Ibidem. p. 15
920
Idem. Ibidem. p. 16
921
Idem. Ibidem. p. 217
922
Idem. Ibidem. p. 288
923
Idem. Ibidem. p. 285
357
da USP924.
historiadores que tenham um discurso de vanguarda, mas que produzam uma História
“tradicional”. O nosso ponto é evidenciar que havia balizas para que os intelectuais se
situassem simbolicamente.
Outra fonte importante para nós é o livro Métodos da História, escrito por Ciro
Cardoso e Héctor Brignoli no início dos anos 1970 (e publicado em 1976) 925. Como
vimos em nosso primeiro capítulo, a chegada de Ciro Cardoso à Niterói em 1979 seria
uma das marcas de uma mudança dos rumos científicos no curso. Tendo se formado na
tornado historiador de influência mesmo antes de sua volta ao Brasil, a visão de Ciro
Para Cardoso e seu co-autor, Brignoli, se em muitos lugares não faria mais
trata da evolução então recente da História, onde resume que o caminho percorrido tem
seu início na História linear dos fatos singulares até chegar na História das estruturas,
924
Idem. Ibidem. p. 315.
925
CARDOSO, Ciro & BRIGNOLI, Héctor. Os métodos da História. Rio de Janeiro: Graal, 2002.
926
Idem. Ibidem. p. 15.
358
lapidar, temos que “Um certo número de termos resume o essencial da nova
problemática e metodologia que a história veio adotando nos últimos quarenta anos:
tem grande significado nesse movimento que vai “Do acontecimento à estrutura; da
epistemológico, uma vez que os historiadores tem exposto suas hipóteses antes
Com o que trazemos de referências, não estamos supondo que essa tensão
Rebeca Gontijo, Fábio Franzini e Maria Glória de Oliveira, vemos que outros debates
eram feitos pelos pesquisadores e docentes enfatizando o caráter ideológico dos estudos,
927
Idem. Ibidem p. 25.
928
Idem. Ibidem. p. 29.
929
Existe uma controvérsia em classificar a história “tradicional” como positivista, já que um traço forte
dos que assim foram reconhecidos era supor a existência de leis sociais objetivas, algo não
necessariamente encontrável nos metódicos franceses, por exemplo.
930
CARDOSO, C. & BRIGNOLI, H. Os métodos..... p. 44
359
outros931. Contudo, nos registros sobressai a ideia de que estaria ou deveria estar em
docente, um real progresso sobre aquilo considerado atrasado, e sua forma é uma réplica
do século XX. Como vimos em nosso primeiro capítulo, essa tensão “antigo” e “novo”
foi pano de fundo de uma disputa científica (também necessariamente uma disputa
1970 e foi docente a partir de 1977, por conta dos “brasilianistas” o mestrado foi
“brasilianistas” (mais correto seria identificá-los como estrangeiros), muito embora sua
presença tenha sido mesmo expressiva. Aqui, nos cabe uma outra reflexão. Se estiver
mediavam o discurso legitimador de uma certa prática científica, como essa tensão teria
UFF nos anos 1970 e as disputas intelectuais vividas no curso de História da FNFi de
931
OLIVEIRA, Maria da Glória de & GONTIJO, Rebeca. Sobre a História da Historiografia brasileira:
um breve panorama. R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 177 (472):13-37, jul./set. 2016. FRANZINI, Fábio &
GONTIJO, Rebeca. “Memória e História da historiografia no Brasil: a invenção de uma moderna
tradição, anos 1940-1960.” IN: SOHIET, Rachel; ALMEIDA, Maria Regina Celestino; AZEVEDO,
Cecília & GONTIJO, Rebeca. Mitos, projetos e práticas políticas: memória e historiografia. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2009.
932
Esses conceitos são apresentados em nosso capítulo 1.
360
primeiro capítulo, esse curso de História da cidade Rio de Janeiro é fundamental para a
uma postura que podemos identificar como vanguardista, renovadora. Pautavam-se por
didático construído nos escritórios do ISEB, mas com a participação de formados pela
FNFi (e membros do PCB). Como parte de uma juventude daquele período que
projetava o futuro com anseios de mudanças sociais profundas, suas leituras sobre a
nacional. Esse movimento foi dissipado pelo golpe de 1964 e seria de bem menor
agitação contestatória o ambiente onde nasceu o curso de mestrado da UFF. Isso não
1970 não projetassem evoluções científicas, mas que, no Rio de Janeiro, o principal
ditadura.
361
fontes secundárias e também porque junto com a UFF respondem por mais de 70% da
outras regiões do país nos subsidiará para melhor definir e compreender a evolução
Não conhecemos ainda muitas histórias dos cursos de História que contemplem
as diversas regiões do país e, muito menos, uma síntese embasada que abarque a
nossas questões na pesquisa realizada por Daiane Machado. Em 1938, Curitiba recebeu
933
CÔRREA, C. Catálogo...
934
Idem. A Unicamp e a UFRJ iniciaram suas defesas em 1980. A UNESP de Franca, em 1983 e a UNESP
de Assis em 1985.
363
o terceiro curso de História e Geografia criado no Brasil (os primeiros foram em São
Paulo e no Rio de Janeiro). As definições científicas que veio a ter esse curso tem como
dessa historiadora, um dedicado ao Paraná outro a Carlos V, tem preocupação com fatos
com fontes como parte de sua formação. Em 1972, a pós-graduação da UFPR foi
que se originaram em 1959, de forma que o mestrado pode ser compreendido como
inclusive contava com uso de computador IBM. Um slogan mobilizado por Westphalen
era “pas des chiffres, pas d'histoire” (sem cifras, sem história)938.
935
MACHADO, Daiane. “Modo de ser historiadora: Cecília Westphalen no campo historiográfico
brasileiro da segunda metade do século XX” IN: História da historiografia. Ouro Preto, n. 22. Dezembro
de 2016.
936
MACHADO, Daiane. POR UMA “CIÊNCIA HISTÓRICA”:o percurso intelectual de Cecília
Westphalen, 1950 – 1998. Tese de Doutorado. Universidade Estadual Paulista. Assis, 2016. p. 157
937
Idem. p. 158 e 169.
938
Idem. p. 159
364
relação ao seu corpo docente quanto à sua produção discente, foi muito mais
homogêneo e coeso intelectualmente que aquele da UFF. Até 1979, período em que se
encerra nosso recorte, a UFPR produziu 33 trabalhos dos quais apenas 4 docentes foram
torno dos Annales e das proposições de Braudel 940, e ao longo da década de 1970,
quantitativo e serial que tinham relações com Westphalen e seu grupo. Os títulos das
com projeto científico de fôlego e com entrada e contatos com órgãos governamentais
939
Idem. p. 160 e 164.
940
Idem. p. 170
941
MACHADO, D. “Modo de ser...” p. 140
365
enquanto que o da UFF era marcado bastante por improviso e casuísmo, como
também na biografia de Westphalen que se deslocou de uma forma para outra – temos
que a tensão foi resolvida categoricamente em Curitiba, já nos anos 1960. A década
das perspectivas francesas. Local onde se primeiro criou um curso de História no país e
volume, a principal porta de entrada da inovadora escola dos Annales no Brasil. Desde a
década de 1930, quando de sua criação, ela teve em seus quadros professores que
faziam parte do círculo da influente revista francesa, como Emile Coornaert, Fernand
Braudel, Jean Gajé, Emile Leonard e Jean Glénisson. Em seus cursos, esses
Paula, Pedro Moacir Campos, Eduardo d'Oliveira França, Alice Canabrava, Astrogildo
Rodrigues de Mello e Olga Pantaleão942. Para os pesquisadores Diogo Roiz e Jonas dos
Santos, a USP abalaria o domínio dos Institutos Históricos e Geográficos afinados pela
criação da Revista de História em 1950, pensada por uspianos para ser uma versão
942
CAPELATO, M. et all. “A escola uspiana...”
943
ROIZ, Diogo & SANTOS, Jonas. As transferências culturais na historiografia brasileira. Leituras e
apropriação do movimento dos Annales no Brasil. Jundiaí: Paco Editorial, 2012. p. 143.
366
que eram identificados como “tradicionais” como Afonso Taunay e Alfredo Ellis Jr.. A
(porém, e como sinal de que não resiste à análise supor que o “tradicional” comporte
algumas atribuições fixas, temos que Ellis Jr. pautava a determinação econômica - traço
faculdade paulista que, junto à tradição dos Annales, havia uma outra “nacional” e
desequilíbrio no ano de 1956 quando Ellis Jr. é substituído por Sérgio Buarque de
Hollanda na cátedra de História da Civilização Brasileira 947. É notável que apesar de ter
feito parte de sua formação na Alemanha onde teve influência weberiana, Hollanda
Manhã em que elogia o livro póstumo de Marc Bloch. Em outra ocasião, em 1973, o a
essa altura pai do Chico publicou texto para O Estado de São Paulo chamado Sobre uma
doença infantil da historiografia, onde disse que “Em nossos dias parece
que existem fatos “puros”, isolados das condições tantas vezes complexas em que se
situam.”948
944
Idem. 181-6.
945
ROIZ, Diogo. Os caminhos (da escrita da História e os descaminhos de seu ensino: a
institucionalização do ensino universitário de História da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da
Universidade de São Paulo (1934-1968) Curitiba: Appris, 2012. p. 120
946
Idem. p. 133-4
947
ROIZ, D. & SANTOS, J. As transferências... p. 166-7
948
HOLANDA, Sérgio Buarque. Para uma nova história. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo,
2004. Apud. ROIZ, D. & SANTOS, J. As transferências...p. 177.
367
desde 1939 as teses da USP já eram uma reação contra a História tradicional que se
fazia nos Institutos Históricos949. Se nos fiarmos à síntese que fizeram Capelato, Glezer
temos a que a influência dos Annales foi “persistente”, havendo também uma
Mansor D'Allessio, que teve como corpo documental de seu artigo todos os trabalhos
acadêmicos entre 1930 e 1970 realizados na USP e na PUC/SP. Nos informa D'Alessio
que nos primeiros anos da década de 60, enquanto a referência a Marx é pequena,
Marc Bloch, Lucien Febvre, Fernand Braudel, Ernest Labrousse e Pierre Vilar,
ocupam centralidade, em Niterói elas são menos que residuais. Frederic Mauro aparece
Robert Mandrou, em apenas uma. Marc Bloch e Lucien Febvre em nenhuma. Quem tem
949
MESGRAVIS, Laima. “O curso de pós-graduação do departamento de História da Faculdade de
Filosofia Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo” IN: Revista brasileira de História.
São Paulo. Março de 1983.
950
Capelato et all. “A escola...” p. 20.
951
D'ALESSIO, Marcia. “Os Annales no Brasil. Algumas reflexões” IN: Anos 90. Porto Alegre, 1994.
Registre-se que nenhum desses dois artigos citados traz evidenciação empírica compatível com o volume
de fontes sobre as quais dissertam. A contagem das autoras tanto em relação à bibliografia quanto em
relação aos perfis historiográficos dos trabalhos pode ter sido realizada de diversas maneiras (por
amostragem, por exemplo) e, na falta da explicitação de seus métodos, é prudente a dúvida em relação a
suas conclusões.
368
seus profissionais, entre 1950 e 1977, foram resenhados 46 livros franceses. Dos
Estados Unidos, que chegou a ser o principal centro de produção historiográfica sobre
sob influência do discurso dos Annales, seria identificada como “tradicional”: foco nos
apontam para o objetivismo, isto é, não entendendo que o historiador tenha um papel
Sarmiento" (50m) explicitam que seu método é deixar suas personagens falarem sem
modelo de historiografia “antiga” que, como vimos, uma parte substantiva dos
expressa por Hebe Castro, conforme já reparado por Paulo da Silva 953, de que “...a
debate sobre as disputas entre uma historiografia tradicional a ser superada e uma outra
nova a se afirmar. Em entrevista a Corrêa, Vânia Leite Fróes, que foi da primeira turma
Isto indica que estudantes podiam pensar nestes termos, mas a rigor, apenas duas
(53m)). Apesar disso, como vimos, um certo grupo em especial da terceira turma nos
passa uma ideia de avanço historiográfico principalmente com suas reflexões contra o
953
SILVA, P. A Associação Nacional...
954
CASTRO, Hebe.”História social” IN: CARDOSO, Ciro & VAINFAS, Ronaldo. Domínios da História.
Ensaios de teoria e metodologia. Rio de Janeiro: Campus, 1997.
955
CORRÊA, Maria. De que lugares...p.52
370
maior escopo.
de Niterói, durante os anos 1970, não estava resolvida a tensão científica verificada em
FNFi entre finais da década de 1950 e início dos anos 1960. Ou seja, não havia ainda o
vimos no capítulo 1, vai acontecer a partir de 1979 com o retorno dos “exilados”
período que estudamos, quando lembramos que os docentes Arthur Cézar Ferreira Reis
Annales tinham nas pós-graduações de Curitiba e de São Paulo não será verificada em
Niterói. A UFF ainda levará um tempo para, na construção de uma memória disciplinar,
(muito embora possamos perceber semelhanças em algumas dissertações com o que era
956
Ver, por exemplo, MUNIZ, Célia. Os donos da terra...(46m), BRAGANÇA, Vânia. "Município de
Estrela..." (6m) e SANTOS, Ana Maria. "Vida econômica de Itaboraí..." (7m).
371
tiveram passagem pela França (Ciro Cardoso, Maria Yedda Leite Linhares e Maria
Bárbara Levy) e pelo conjunto de profissionais do Rio de Janeiro que farão doutorado
espaços. Para a UnB, “...não há como não associar à vocação primeira do programa
vinculado como uma nova renovação historiográfica, Fico e Polito trouxeram que
As duas perspectivas estariam presentes nas dissertações e teses de História da USP 959.
historiografia dos Annales, como o diálogo com outras ciências sociais e a discussão
sobre estrutura e acontecimento. Não foi, entretanto, a bibliografia francesa que deu o
957
MUNIZ, Diva & SALES, Eric de. “Cultura historiográfica e história: a produção acad^mica do
Programa de Pós-Graduação em História da Universidad de Brasília (1976-2006)” IN: Textos de História.
Vol. 15, n° 1/2 2007.
958
FICO, Carlos & POLITO, Ronald. A História no Brasil...p. 161-2
959
CAPELATO et all. “A escola uspiana...”
372
conjunto dos trabalhos – conforme vimos anteriormente. Foi com referências marxistas
que uma parte dos mestrandos da UFF pensou a história com recursos conceituais e para
essas referências terem uma presença quantitativa significativa, elas não foram
profundidade.
uma outra dificuldade quando lembramos de profundas divergências entre aqueles que
se referenciam em Marx. Para citar algo que envolve dois dos mais influentes marxistas
do século XX, temos o trabalho de E. P. Thompson contra Louis Althusser 960 em que o
inglês faz uma crítica radical que chega a por em xeque a própria identificação do
filósofo francês como um materialista histórico (além de indicar que sua teoria era
Henrique Cardoso “afronta” Florestan Fernandes, de quem fora pupilo, por não o
de estudo de “O Capital”, do qual fez parte entre 1958 e 1964) a autoridade da definição
sobre marxismo961.
960
THOMPSON, E. P. A miséria da teoria ou um planetário de erros. Edição de Cap. Swing e os Ludistas
Sensuais, 2009 (copyleft).
961
RODRIGUES, Lidiane Soares. “Leitores e leituras acadêmicas de Karl Marx (São Paulo, 1958-1964)”
IN: Intelligere. Revista de História Intelectual. São Paulo, v.2, n.1.2016. Relevante também é que,
segundo a autora, uma das marcas do “marxismo universitário” desenvolvido no “seminário” seria o
fechamento a membros politizados e ativistas partidários, mantendo uma feição “scholar”, profissional,
373
de que juízos se possa fazer sobre eles e das diferenças teóricas dentro dos que se
entendem ou são entendidos como marxistas. Assim, qualquer menção a, por exemplo,
“modo de produção” seria registrada por nós como marxista, bem como alguma citação
de, digamos, Mao Tse Tung. Em adição a isso, estaremos atentos também às
classistas, ainda que não trabalhem com o termo “luta de classes” de forma explícita, ou
não envolvam conceitos ou autores identificados com o marxismo. Aqui assumimos que
a utilização de algum conceito marxista não necessariamente faz a análise ser marcada
por alguma ideia de conflito social, assim como uma análise que supõe conflito não
definições existente.
(49m) nos contam sobre a opressão, a exclusão e a resistência dos povos indígenas da
urbano e conflito social” (1976), de Bóris Fausto. Mas é apenas na década de 1980 que
o tema ganhará maior expressão no meio acadêmico de uma forma geral e também entre
sociedade..." (25m) e "A evolução política no Chile..." (15m), ao mesmo tempo em que
962
BATALHA, Claudio. “A historiografia da classe operária no Brasil: trajetórias e tendências” IN:
FREITAS, Marcos Cezar (org.) Historiografia brasileira em perspectiva. São Paulo, Contexto, 2001.
375
limites de acesso à documentação que não seja a oficial e publicada, não trazem
para a discussão.
reação na província do Pará...” (38m). Voltando o olhar para grupos subalternos, esses
(30m), de Lana Lage, estuda a violência sobre o negro, suas várias formas de rebeldia,
“Ação e reação...” (38m), de Geraldo Coelho é sobre revolta no século XIX, que,
conquanto critique o marxismo por supô-lo um modelo não apropriado para sociedades
não europeias, e rejeite o conceito de “classe” para a realidade que aborda, é um estudo
“Coronéis sem patente...” (51m), dentre os muitos assuntos que aborda, traz vários
Petrolina. Mesmo tendo como foco de seu estudo os coronéis, a autora deste trabalho
não deixa de nos apresentar a classe trabalhadora da região: seus locais de labuta, suas
relações de trabalho, sua capacidade de agência política, suas rendas e posses, etc..
que, tendo como foco o pensamento e a ação de uma família oligárquica, observa sua
operários e sua ligação com a burguesia, Vargas e a defesa do capitalismo de uma forma
geral. Neste trabalho, a classe operária aparece principalmente como objeto da ação
obra, atividades financeiras, repressão) diante de vários elementos de sua crise. Com
menos ênfase nos aspectos da luta e da dominação, temos mais três trabalhos: “O
diversos assuntos do Brasil do século XIX. Por sua vez, Valdir Calixto, em “O clero
secular” (41m) caracteriza a igreja católica como proprietária e, portanto, parte da classe
dominante.
Há outros dois estudos os quais não cabe agrupar com outros: “Os donos da
e repressivo dessas instituição principalmente contra comunistas, ainda que não trabalhe
377
A segunda reflexão que destacamos é aquela que associa ideias a classes sociais.
Isso está em “A educação brasileira no Estado Novo” (12m), que, fazendo referência ao
destacando seu papel para a reprodução das pessoas em certa relação de produção e sua
sujeição à ideologia dominante (no caso, marcada pela ditadura do Estado Novo). Outro
classistas, sendo assim expresso diferentemente pela camada dominante e pela camada
não privilegiada de acordo com seus diferentes interesses sociais. É notável que a
Gramsci, que não lhe era conhecido. Em “Imprensa republicana...” (10m) (este um
estudo de história política mais que história das ideias), quando entende que as
c) modos de produção
os modos de produção sob uma perspectiva etapista (esse seria o caso de Sodré), bem
como os que destacam o caráter feudal do passado brasileiro. Silva defende então uma
tendo como base para sua reflexão escritos de Ciro Cardoso. Ressalta se tratar de uma
de Marieta Ferreira, defenderá que um modo de produção deve ser determinado a partir
da esfera da produção, e não da circulação, de onde se deve concluir que não houve no
Brasil o modo de produção capitalista no momento que estuda, ou, como dirá em outro
comissários..." (18m), “Os donos da terra...” (46m), de Célia Muniz, entende que mais
A temática dos modos de produção ocupou papel pequeno nas dissertações sobre
principais questões teóricas da esquerda revolucionária entre 1950 e 1970. Era parte das
elucubrações do PCB e tinha entres seus debatedores principais Ignácio Rangel, Nelson
379
Werneck Sodré, Caio Prado Jr. e Celso Furtado (ainda que este não seja um marxista 963).
das dissertações, mas não estão no centro do debate sobre modo de produção. Essa
posição é ocupada por Ciro Cardoso e seu conceito de “modo de produção escravista
Kareh, autor de "Atividades capitalistas..." (11m), diz que passou a conhecer o conceito
de modo de produção através de contato epistolar com Ciro Cardoso (que estava entre a
Europa e a América Central), ainda na década de 1960. Segundo El-Kareh foi ele
teoria marxista nunca encontraram lugar...”965 Nas teses de História da USP, autores
D'Alessio, enquanto autores dos Annales já figuravam na década anterior 966. Não temos
uma comparação entre o marxismo presente na UFF e aquele nas publicações editoriais
963
MANTEGA, Guido. “Marxismo na economia brasileira” IN: MORAES, João Quartim de. História do
marxismo no Brasil. Os influxos teóricos. Editora da Unicamp, 2007.
964
Entrevista ao autor.
965
FRANZINI, Fábio. “Interpretações do Brasil, marxismo e coleções brasilianas: quando a ausência diz
muito (1931-1959)” IN: Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH • São Paulo, julho
2011.
966
D'ALESSIO, Márcia. “Os Annales....”
380
que enumeramos acima, num total de 51 que formam o nosso objeto, temos que autores
trabalhos.
programa de pós-graduação em História da UFF. Ainda que o objeto desta autora sejam
que há um declínio dessa perspectiva até 1982, o que se teria se acentuado depois de
empíricas que acompanhem a sua abrangência. O período a que elas se reportam, 1974-
parece ter dado conta de número tão grande, com número pouco significativo de
nosso objeto, observamos que são marxistas (ou “marxistas”) menos da metade – cifra
distante portanto daquela que diz “quase toda produção”. Por fim, e nos arriscando em
hipóteses para além do escopo de nossa pesquisa, não nos parece correta a suposição
nos capítulos anteriores em que separamos a análise das dissertações por turmas, vimos
tempo. Mudanças no corpo docente a partir de 1979, período que não compreende nosso
recorte, nos indicam que o marxismo teria sido mais estimulado a partir de então.
Mesmo que seja temerário julgar dissertações apenas pelos seus títulos, não podemos
deixar de notar que temos nos primeiros anos da década de 1980 um volume maior de
967
CÔRREA, Maria. De que lugares....p.66
381
estudos sobre “história do trabalho” e temas que valorizam o conflito social. Assim,
salta aos olhos a diferença entre este momento e o que pesquisamos, a década de 1970,
ganhando força, sendo pelo menos a primeira metade da década de 1980 não o
uma suposição que precisa ser trabalhada à luz de uma maior pesquisa.
Das oito dissertações que tem Marx na bibliografia, apenas uma delas se apoia
no mestre alemão com maior densidade: o estudo de Lana Lage, “A rebeldia negra...”
dois estudos mobilizam conceitos tendo por base Marx: “A crise dos comissários...”
capital”. Nas demais dissertações que tem Marx em sua bibliografia, conceitos são
desse léxico mais importantes para o trabalho “bloco histórico”, “intelectual orgânico” e
Francisco Gomes, também é influenciada por Gramsci. Em sua conclusão, aponta que a
classe dominante. Como o próprio autor da dissertação coloca, foi importante em seu
estudo o “peso” da superestrutura (onde deve ser localizada a Igreja pelo seu caráter
dissertação temos uma influência direta de Gramsci no texto: trata-se do texto de Sérgio
El-Jaick ("O pensamento político..." (47m)) sobre Simón Bolívar. Apesar de se tratar de
fragmentos, mas da obra como um todo. Vê-se que El-Jaick traz um elemento que não
teórica com a qual o italiano contribuiu originalmente. Por sua vez, o marxista latino-
americano José Carlos Mariátegui figura no texto de apenas duas das cinco dissertações,
onde consta como fonte de informação para a história peruana e com a indicação de que
Ainda que consideremos que alguns mestrandos tenham tido algum nível de
fundamentos, ou o fizeram para além de um nível superficial. Esse quadro não muda se
considerarmos os autores que mais serviram como fontes para os estudos nas
A maior parte dos autores acima são ou marxistas ou tem em sua produção
influência do marxismo. Uma leitura apressada poderia ver no quadro uma evidência de
uma forte presença do marxismo nos textos das dissertações. Entretanto, como
384
demonstramos ao longo dos últimos três capítulos, esses autores são utilizados
social no Império. Aparece como objeto da crítica de Geraldo Beauclair ("A evolução
industrial do Brasil. Na maior parte dos estudos, entretanto, Furtado nem mesmo
contribui direta ou explicitamente nos textos. Nesse sentido, Ciro Cardoso, que foi fonte
para apenas 7 trabalhos, foi uma influência mais decisiva através de sua discussão sobre
modos de produção. O colocado para Celso Furtado vale para os demais autores da lista,
enumerados, diríamos que, em síntese, suas contribuições são de uma noção difusa de
presença importante nas 51 dissertações das três primeiras turmas. Está longe,
metade dos trabalhos. Seu desenvolvimento teórico, com exceções, foi também bastante
classes sociais e seus conflitos. Com menor monta, engendrou reflexão sobre modo de
produção e ideologia.
Ainda que nesse grupo tenhamos trabalhos que poderíamos abordar como
dissertações de “política” aquelas voltados a figuras de Estado e seus grupos, não raro
supondo que eles se encerram sob essa alcunha: neles ocasionalmente também estão
uma mesma dissertação nos impede de etiquetá-la sob o risco de reduzi-la. De qualquer
forma, salientamos que essas dissertações são diferentes dos estudos acadêmicos de
diversas universidades brasileiras produzidos entre 1985 e 1994 que artigo de D'Alessio
essas 556 teses e dissertações, abordadas através de suas ementas, exploram a esfera do
e Janotti não sejam estranhos às pesquisas da UFF, salientamos que estas, como
apontamos nos capítulos anteriores, tendem a ser mais restritas ao “político” e com
análises menos complexas do que o sugerido pelas autoras sobre a produção da segunda
Ainda segundo essas autoras, os estudos políticos que envolvem classes sociais
“História oficial” pouco definida, mas que seria marcada por uma perspectiva de direita
anterior deste capítulo que esses elementos, apesar de não serem dominantes no
conjunto das dissertações da UFF, são salientes e caracterizam alguns trabalhos tanto de
História do Brasil (resistência negra ("A rebeldia negra..." (30m)), conflitos sociais no
1970, mesmo tendo dado alguns passos nesse sentido, ainda está longe do sólido quadro
que se apresentará em diversas universidades nos anos 1980, com estudos que, tendo
968
As autoras estudaram um total 886 trabalhos, entre dissertações e teses. D'ALESSIO & JANOTTI “A
esfera do político na produção acadêmica dos programas de pós-graduação (1985-1994)” IN: Estudos
históricos.Vol. 9 N. 17. 1996.
387
não se detém em análises estéticas, mas tem a dominação como grande tema, e a
verificado nas 5 dissertações que classificamos como História Cultural, marcada pela
associação de ideias a classes sociais (como vimos no item anterior), pela educação
literatura peruana..." (27m)). Nada parecido aqui com algumas características que são
episódicos.
apresentada por João Fragoso e Manolo Florentino que, muito embora utilize dados
corretos, induz a erro. No influente livro “Domínios da História”, os autores nos trazem
que, considerando os anos de 1980 e 1981, a UFF e a UFRJ produziram 60% de suas
da UFF entre 1980 e 1985, chegamos a número bem próximo ao que esta apresentava
nos anos 1970: cerca de 35% (a UFRJ, que dá seus primeiros frutos em 1980, tem
momento de uma História econômica forte, dominante (60%), que estaria perdendo
força já na primeira metade dos anos 1980 (cerca de 35%), até atingir um patamar
UFF produziu no geral mais que o dobro de trabalhos que a UFRJ. Em segundo lugar, e
conclusão, já que o número de defesas é muito variável de ano para ano: em 1980/1, em
no biênio anterior, 1978/9, foram 37 (aliás, biênio que chegue perto desse número a
predominante, e manteve seu peso relativo estável até o meio da década de 1980. Ou
seja, com um escopo apenas um pouco maior de dados, temos assim não a inclinação
negativa íngreme sugerida por Fragoso e Florentino (60%-35%), mas uma linha
fazendo opções diante dos diferentes ramos de produção do país ("Política econômica
("A crise dos comissários..." (18m)), banco ("O Banco Mauá no Uruguai" (24m)),
empresa mineradora ("Itabira Iron Ore..." (44m)). Temos aqui reflexões sobre a inserção
escravista e capitalista.
dados numéricos expostas ao longo do texto ou como apêndices. Alguns deles são frutos
contagens, entretanto, não aparecem como sendo o fim das pesquisas (como parece ser
Salta aos olhos as poucas pesquisas sobre período colonial, tanto de Brasil
quanto América, o que guarda relação com o recorte cronológico promovido pelos
diferente o que vemos entre pesquisadores que visitaram o Arquivo Nacional entre
1970-1979: muito embora o registro dos dados tenha sido problemático, o período
colonial é 5 vezes mais visitado (20%). Nas teses de doutoramento da USP frutos da
pesquisas970. De 1973 a 1979, esse número na USP cairia para 13%, ainda assim uma
com muita “cerimônia”971. José Lapa referindo-se ao espaço acadêmico da História usa
consequências uma ausência de crítica aos poderes vigentes)972. Esse quadro sofreria
970
LAPA, José. História e historiografia Brasil pós 64. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985. p. 72-3
971
Entrevista ao autor.
972
LAPA, José. Historiografia brasileira contemporânea. A História em Questão. Petrópolis: Vozes,
1981. p. 40-1.
391
década de 1980, Carlos Fico e Ronald Polito anotam que o interesse pelo Brasil
década de 1980973. Para Lapa, esse crescimento teria a ver com a influência de outras
áreas das Ciências Humanas, que se lançaram a estudos de temas contemporâneos antes
da visão sobre o passado que incorpora o presente como objeto 974. Esses elementos nos
que estudamos deve também ser tributada, conforme demonstramos nos capítulos
recorte mais contemporâneo de suas pesquisas e de suas aulas. Em relação aos estudos
de Brasil contemporâneo nas universidades dos anos 80, temos que a maior parte deles
973
FICO, Carlos & POLITO, Ronald. A História no Brasil....p.52-4.
974
LAPA, José. Historiografia...p. 52
975
FICO, Carlos & POLITO, Ronald. A História no Brasil....p.52-4.
392
marcado por alta rotatividade (ver quadro 1); e a opção pela contratação de professores
trabalhos dedicados à América Latina terá uma diminuição drástica: representam apenas
3% nos 16 anos posteriores ao nosso recorte. Quase todos os estudos de América Latina
estudos que classificamos como “outras regiões brasileiras” são referentes ao Pará,
Minas Gerais, Pernambuco e Sergipe. Pelo menos três deles são a região de origem ou
historiográficas consigo, não sendo todas elas propostas pelo próprio curso (como é o
reflexão das dissertações, esta tenha tido relações estreitas com o Estado. Nesse grupo,
produções agrícolas.
preços. Para esses dois casos, não seria difícil estabelecer um perfil historiográfico do
apontar que História foi a contada pelos pós-graduandos de Niterói da década de 1970.
mestrado em História da UFF nos anos 1970: uma história política de países da América
em temáticas diversas.
394
Estado, construindo uma historiografia nacional calcada nos fatos singulares e na curta
que tem dois terços de sua produção dedicadas à História Econômica, e promovem
como fontes primárias, na maior parte dos casos, conjuntos de documentos publicados,
e repisando a temática mais explorada pela historiografia oficial, não foram, no geral,
contribuição relevante.
voltadas à História Econômica (5m, 6m, 7m, 8m, 17m, 18m 30m, 31m, 42m e 46m).
976
BEIRED, José Luis Bendicho. “A pesquisa de História da América no Brasil durante as últimas
décadas” IN: Revista Eletrônica da ANPHLAC, Dossiê Especial, p.50-72, jan. Jun. 2013
395
própria província do Rio de Janeiro. Elemento que aparece nas análises é também a
podemos observar diferenças: enquanto os estudos sobre Estrela (6m) e Itaboraí (7m)
estudos como o de Sonia Mendonça sobre política de valorização do café ("A primeira
política de valorização..." (17m)), de Marieta Ferreira sobre comissários ("A crise dos
Graham, Ismênia Martins e Victor Valla foram os orientadores desse grupo. Essa
História regional não tem relação com os “Estudos Fluminenses”, curso de extensão da
posteriormente seria federalizada no que se tornou a UFF): aqui, a História tinha uma
econômica fluminense977.
O número médio de páginas das dissertações é 154. Essa média foi crescendo
977
FERNANDES, Rui. ““Estudos fluminenses”: a Faculdade Fluminense de Filosofia e sua identidade
regional” IN: NEVES, Lúcia; GUIMARÃES, Lúcia; GONÇALVES, Márcia; GONTIJO, Rebeca.
Estudos de historiografia brasileira. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2011.
396
pesquisadores da primeira turma terem concluído seus trabalhos em 2,5 anos (tempo
assim curto provavelmente por terem prazos para serem titulados e permanecerem como
dissertação foi de pouco menos de 4 anos. Entre 1980 e 1989, no âmbito nacional,
5.4 Política
tem com o presente do historiador. Haveria uma não dissociação, de cujos termos mais
presente, de forma que não haveria algum refúgio de neutralidade de onde se pudesse
dissertar sobre o primeiro sem que isso não fosse também, de alguma forma, dissertar
as ciências sociais, Bourdieu formulou que o que está em jogo em sua produção
científica é o mesmo o que está em jogo entre as classes na política: produzir e difundir
quando este reflete sobre o grupo de intelectuais de que fez parte. Justamente por ter
fascismo, realizou uma autocrítica não apenas pela interpretação de história que tinham,
mas também uma de sentido ético, esperando por isso que seus “herdeiros” pudessem
978
Ver nosso primeiro capítulo.
979
FICO, Carlos & POLITO, Ronald. A História no Brasil....
980
BOURDIEU, Pierre. O campo científico....
981
DOSSE, François. A História em migalhas...p.96.
397
Um primeiro passo de nossa análise pode ser observar que temas políticos de
conexão com suas épocas nossos autores formularam explicitamente. Duas dissertações
capitais estrangeiros e influência dos EUA na América Latina no pós-guerra fazem parte
poderia inclusive fortalecê-la, uma vez que poderia significar uma alternativa ao
mantivesse os tradicionais privilégios das elites dominantes. Muito embora sejam bem
poucas as páginas dessa dissertação voltadas à temática da ditadura, vemos que o objeto
de estudo é justificado pela consequência ou contexto político de que faz parte, com
estudo que reflete sobre a contemporaneidade foi o escrito por Teresa Serejo sobre
coronelismo em Petrolina (“Coronéis sem patente...” (51m)), que tem como recorte
cronológico 1950-1976. Serejo não apresenta sua dissertação como um estudo sobre a
crítico da vida política e econômica nacional, apesar do olhar fixo sobre uma cidade do
398
interior.
abordam, a partir de outros tempos e lugares, seu traços mais destacados. “O petróleo
pela emigração e a morte à vida sob o regime. A autora dialoga com defensores do
regime de Gómez enfatizando os limites de suas realizações (por exemplo, sobre infra-
tem uma conexão direta com uma das características mais significativas da ditadura
que a Justiça foi instrumentalizada pelo poder ditatorial, e mirou sobretudo pessoas de
arremate de seu texto, afirma que Bolívar deixou intactas as estruturas econômicas que
como um dos pontos principais de seu texto que o exército foi um canal através do qual
quando trata do governo de Francia, o aponta como marcado pela perseguição e pelo
terror, sendo tirânico, cruel, despótico e totalitário. O autor quando traz elementos que
identifica como positivos nesse governo (atenção às classes pobres, aumento do nível de
vida, modernização) – o que contrastaria com o liberalismo que apenas atendia à classe
dominante e aos caudilhos - não deixa de afirmar que não pretende com isso de forma
brasileiro” dos anos 1970 que, mesmo não tendo significado uma política de atenção a
pobres, como foi identificado pelo autor no caso paraguaio, se tratou de crescimento
Argentina, que registra esta personagem se tratar de um tirano que se equilibra entre
equatoriano...” (23m), nos é dito que García Moreno, sendo homem honesto e justo,
construiu seu regime autoritário tendo por objetivo a pacificação, o progresso material e
a reconstrução moral. O autor, Almir da Silva Oliveira, não nos oculta que houve
400
“energia implacável”, “meios cruéis”, censura e que Garcia Moreno passou por cima da
lei, mas positiva a ação desse estadista diante de um ambiente nacional de “intriga”,
“mal menor”. Apesar de não ser tão incisivo quanto Oliveira, Pinto Filho em “O sentido
transgrediu a Constituição se tornando um ditador, mas isso não teria sido motivado por
interesses particulares, já que sua intenção não era se perpetuar no poder. Seu “pulso
com dois deles defendendo formas ditatoriais de governo. Há outros estudos que
Guerra Fria, o alinhamento a potências internacionais era assunto muito visitado, com
nacional. E para citar outra questão que envolve o universo intelectual de que tratamos,
a mídia de uma forma geral via com maus olhos o fato de tantos historiadores norte-
para seu país de origem)982. Por setores da esquerda as relações internacionais eram
econômica e influência ideológica principalmente por parte dos EUA em tempos mais
nações “centrais” aparece em várias das nossas dissertações, mas por vezes se restringe
“Argentina: economia...” (25m). Existe nelas uma ideia de que há desigualdade nas
relações econômicas internacionais em que a parte mais fraca está marcada pela
nesta seção, tem tom mais incisivo ao associar ditadura na Venezuela e poder de
estejam difundidas em outros trabalhos – algo do qual, entretanto, não teríamos tomado
nota dada a sua localização marginal nos textos. Com mais dedicação sobre este ponto
de capital monopolista. Mas são em outras cinco dissertações que o assunto tem
então atual de entrada de recursos estrangeiros e influência dos EUA, o que faria parte
rico que tem como mote a disputa entre interesses monopolísticos de capitais
(14m). A sua pesquisa abarca a revolução mexicana do início do século XX, o conflito
nesse contexto (um deles bem favorável aos EUA). Apesar de seu objeto guardar
relação com pontos candentes da política dos anos 1970, o texto nos é apresentado sem
colorações políticas não sendo óbvia a localização do autor nos debates que aconteciam
na época em que escreveu. O mesmo vale para o estudo de Dulce Maciel sobre o
Por fim, citemos outros dois estudos cujos objetos tem fortes pontos de contato
com vivido nos anos 1970: “O guano e o salitre...” (22m) enfoca disputas entre civis e
economia do guano e do salitre gera renda que sustenta o poder dos governos. O que
nos interessa aqui é a questão civil versus militar do estudo que, por motivo óbvio, tem
paralelismo com o cenário brasileiro de então. O texto de Abner Baptista Júnior conduz
sua análise sem que se possa remeter diretamente os episódios da história peruana à
Há uma colocação do autor, entretanto, que faz emergir sua leitura política e sua
intenção de que sua dissertação seja uma lição para o presente: uma vez que a disputa
entre a oligarquia civil e os militares no Peru teria apenas fortalecido a Inglaterra, seu
que em última instância só servem ao dominador alienígena (qualquer que seja sua
403
dos interesses nacionais frente a uma potência estrangeira (o que não chega a ser objeto
em sua narrativa da história peruana), tendo a moderação como horizonte positivo para
grupos internos em disputa. Nos parece que há aqui uma desvalorização dos
significados políticos graves do governo brasileiro dos anos 1970, bem como das
XIX, “A ideia de nação...” (32m). A propaganda ufanista foi uma grande marca do
entendendo também que o Estado é dominado por uma classe em especial, promove
supõe abarcar em um mesmo projeto grupos sociais diversos que formariam coesamente
o Brasil.
análise dos temas das dissertações que poderiam encontrar paralelos com os assuntos
em evidência no contexto dos anos 1970 em que viviam os mestrandos. Para um esforço
1970 não deve supor que seus significados estejam contidos apenas nela própria,
bastando que nós os revelássemos como se tivéssemos descoberto a essência das obras.
portanto, também a nossa política. Outro cuidado teórico e metodológico é aquele a que
983
BAPTISTA JÙNIOR, Abner. O guano e o salitre... p. 1
404
risco de eventuais deslizes nossos ao não computar algum elemento das dissertações, ou
fazê-lo equivocadamente. Por outro lado, só podemos conhecê-las – caso seja de fato
que temos classificado as dissertações, sem que isso signifique suas reduções a “tipos”.
banco Mauá...” (24m), que afirma que os financiamentos realizados por esta
personagem no século XIX, descrita como gloriosa, tenaz e audaz, foram norteados pela
paz, pelo progresso e pela causa uruguaia. O estudo de Daniel Sadler, “O pensamento de
observa políticos que teriam feito parte dela como agentes de ideais elevados. Seria
proveitoso comparar com mais detalhe esses estudos com aqueles produzidos na UnB
984
BORGES, Jorge Luís. 'Funes, o memorioso” IN: Ficções. Rio de Janeiro: Companhia das Letras, 2007.
405
política, que muitas vezes são análises agudas e originais. No geral, não deixam de
contemplar o conflito, por exemplo, entre partidos em torno do Estado, entre centralistas
quando não é o caso, não raro, de totalmente ignorarem as ignorarem. Nesse grupo,
1826” (39m).
Por fim, o último grupo é daqueles que incluem noções de domínio, exploração e
parte destas dissertações (aquelas que trabalhavam com o conceito de classe social) em
nossa seção sobre marxismo. Outra parte foi citada aqui, como aquelas que tematizam a
ditadura ou temas candentes da época em que foram escritas. A exceção é “Bertha Lutz
985
MUNIZ, Diva & SALES, Eric. “Cultura historiográfica...”
406
e a ascensão social da mulher (1919-1937)”, estudo que se destaca não apenas por
temática ganharia força apenas na década seguinte, e nos anos 2000 a pós-graduação da
autora Rachel Sohiet nos informa que quando escreveu o trabalho, houve quem
considerasse a temática secundária, mas no geral a recepção foi positiva sendo ela
convidada para muitas palestras986. Na conclusão de seu estudo, Sohiet faz alguns juízos
políticos sobre o feminismo de Bertha Lutz: sua falta de olhar sobre a questão do
Poderíamos indicar então, como uma síntese, que pouco mais da metade dos
trabalhos apresentam uma visão crítica que indica principalmente a repressão de Estado;
de um segundo conjunto, que são em torno de 30%, não trazem a mesma mensagem
crítica, muito embora a maior parte observe outros tipos de disputas políticas e
repressão do Estado.
Desta classificação política que fizemos das dissertações, obviamente não deve
986
Entrevista ao autor.
407
derivar automaticamente uma outra que ajuíze sobre o pensamento político de seus
autores. Geraldo Beauclair, por exemplo, que foi docente da graduação e mestrando da
UFF987, mas em sua produção, sobre crédito no governo Vargas, não há juízo de
marxistas, mas procurava deixar claro em sala de aula que não tinha ligação
suas vidas seria sem dúvida profícuo nesse sentido de entender a prática historiográfica
sociologicamente (além de aspectos como origem familiar, renda, cor da pele, etc.). Mas
este é um terreno em que esta tese não pode avançar muito. No arquivo da vigilância
política da UFF que citamos no capítulo 1, temos docentes e discentes observados como
Por outro lado, em entrevistas a este trabalho, pelo menos dois estrangeiros foram
citados como possíveis informantes989, além de termos como um dos docentes mais
atuantes do curso alguém que fora, poucos anos antes, feito governador de Estado pelo
processo ditatorial, Arthur Reis, e outro, Pedro Ribeiro, alguém com visão francamente
posições universitárias, o que não deixa de refletir, também como diversidade, nas
987
Ver nosso capítulo 1.
988
Entrevista ao autor.
989
A espionagem norte-americana sobre intelectuais brasileiros, inclusive historiadores, é inclusive
anterior a 1964. Ver nosso capítulo 1.
990
Ver capítulos 2 e 4.
408
Essa é uma questão difícil de responder, porque há pouca bibliografia com a qual
tensos não apenas por conta das questões historiográficas que comentamos no início
deste capítulo, mas também pelas discussões sobre reforma universitária e reforma
presentes, havia aqueles que pretendiam dar centralidade a esse debate. Outros o
APUH, que definiu a associação como uma que não tomaria parte em manifestações
por discussões fortes. Ela havia se definido, como indica o estudo de Paulo Silva,
991
SILVA, Paulo. A Associação Nacional dos Professores...p.210. Relatando os debates em 1963,
Francisco Falcon dividiu os simposistas entre progressistas e alienados. Deve-se ter cuidado a não
associar como politicamente progressistas aqueles que reivindicavam maior destaque a estudos de
História do Brasil e sobre o presente. Eremildo Viana e Cecilia Westphalen manifestaram posição
historiográfica “moderna” no encontro da APUH de 1962, mas foram dois notórios associados dos
governos militares que se instalaram em 1964. É claro que pode ser o caso de ter havido uma mutação
política de um momento para outro (com efeito, Viana fora um aliado de estudantes de esquerda no início
dos anos 1960). De qualquer forma, fica a ressalva para que não pensemos as personagens através de
automatismos entre suas posições científicas e políticas. Sobre Eremildo Viana e Cecilia Westphalen, ver,
respectivamente, PEREIRA, Ludmila. O agente da História..., e MACHADO, Daiane. “Modos de ser...”
409
participação, apesar de ter incentivado com o decurso dos anos suas presenças como
docentes do ensino básico e estudantes para que pudessem ter papel ativo nas sessões, e
na produção acadêmica de História: afirmam que a partir de metade dos anos 1970, ou
Oliveira, em referência aos anos de 1975 a 1979, sugere haver tido entre os
sujeitos” (trabalhadores rurais e urbanos)994. José Lapa comentou “um processo de lenta
992
MACHADO, Daiane. “Modos de ser...”
993
Um grupo fundou então uma nova entidade, a Sociedade Brasileira de Pesquisa Histórica (SBPH) que
definiu pela rejeição a manifestações de caráter político, tal como era antes a ANPUH. Idem. p. 14-4.
Embates similares na ANPUH continuariam. Fico e Polito nos contam que em 1991 havia uma tensão -
que, entretanto, não chegou a “explodir” no encontro nacional – envolvendo grupo que proporia “...a
configuração da entidade nos moldes da ANPOCS, com uma postura apolítica, visando organizar
pesquisadores e carrear recursos, em detrimento da participação de professores de primeiro e segundo
graus que, com suas questões relacionadas à rotina massacrante do ensino no Brasil, estariam
bloqueando aqueles destinos “mais nobres” da pesquisa. Como se vê, um confronto entre
“pesquisadores elitistas” e “profissionais socialmente engajados”” FICO, Carlos & POLITO, Ronald. A
História no Brasil... p.87-8. Para os autores deste livro publicado em 1992, poderia ser vista na ANPUH
uma típica “...ojeriza nacional de nossas elites à explicitação das diferenças e de sua tendência à
conciliação a todo custo.” Idem. p. 87.
994
OLIVEIRA, Rodrigo. “O engajamento político e historiográfico no ofício dos historiadores brasileiros:
uma reflexão sobre a fundação da historiografia brasileira contemporânea (1975-1979)” IN: História da
historiografia.
995
LAPA, José. História e historiogafia...p.69
410
desta autora, assinado com Janotti, onde estudam 886 produções acadêmicas de pós-
do Estado, das classes ou das elites, tem como objetivo perseguir, excluir enganar.”997.
correspondente a esse quadro geral o que observamos nos escritos da UFF. No entanto,
eles também nos revelam a existência de outras características políticas que impedem
democráticas.
a tradicional divisão binária, houve nas três primeiras turmas mais mulheres que
homens entre discentes: 27 x 24. Essa porcentagem não é distante da observada por Fico
e Polito nos anos 1970 e 1980, cerca de 60% de autoria feminina em trabalhos de pós
docente: de 35 professores que passaram pelo curso da UFF até 1979 (nenhum por
996
D'ALESSIO, Marcia. “Os Annales no Brasil...”
997
D'ALESSIO & JANOTTI “A esfera do político...” p. 148
998
Dados de 2016, entretanto, apontam uma pequena maioria masculina entre mestres e doutores de
História. ALMEIDA, Rodolfo & ZANLORENSSI, Gabriel. “Qual o gênero e idade dos mestres e
doutores” IN Nexo Jornal.https://www.nexojornal.com.br/grafico/2018/05/23/Qual-o-g%C3%AAnero-e-
a-idade-de-mestres-e-doutores-no-Brasil Publicado em 23 de maio de 2018 e atualizado em 26 de julho
de 2018. Acessado em janeiro de 2019.
411
período, há apenas uma mulher, Ismênia Martins, também a única que se destaca entre
dos 9 autores que mais constam em bibliografia, 3 são mulheres, localizadas na parte
mais baixa da lista. Apesar de a coordenação do curso ter ficado, em todo o período que
estudamos, a cargo de uma mulher, Aydil Preis, e de serem mulheres a maioria discente,
Dentro e fora da universidade lhe foi colocado que ou seria melhor socialmente que ela
se restringisse aos papéis de mãe e esposa, ou que esses papéis seriam limitadores do
gênero sua não aprovação para cátedra de História da América, mesmo depois de ter
tido a média mais alta que seus concorrentes nas provas1000. Estudando também a USP,
Roiz aponta que a maioria das pessoas que se formavam eram mulheres, mas não eram
Na produção da UFF que estudamos, vimos que há uma solitária dissertação sobre o
tema da desigualdade de gênero, que, no entanto, ganharia força nos anos seguintes.
999
Ver tabelas 2 e 3. Em relação a orientadores (isto é, sem referência ao conjunto total de professores), a
situação na UFF melhoraria muito, pois de 1980 a 1989 o número de homens e mulheres é praticamente
igual, enquanto o quadro brasileiro, nesse mesmo período, aponta uma predominância masculina de 58%.
UFF. Catálogo...; FICO, Carlos & POLITO, Ronald. A História no Brasil...p.50.
1000
SILVA, Paulo. A Associação...p.232
1001
ROIZ, Diogo. Os caminhos (da escrita)....p.177
1002
OLIVEIRA, Maria da Glória. “Os sons do silêncio: interpelações feministas decoloniais à história da
historiografia.” IN: História da historiografia. v. 11, n.28 set-dez 2018.
412
5.5 Conclusão
UFF, entretanto, os Annales não tiveram contribuição de relevo para os textos das
acadêmica brasileira deve ser considerada a partir das especificidades dos diferentes
conflito. Avaliamos que essa presença não resultou, salvo exceções, em maior
encontro do que colocaram Almir El-Kareh e Francisco Falcon: o marxismo não teria
importante, contudo, a ressalva de que o que foi registrado nas dissertações não
condensa tudo o que pensavam e liam aqueles novos historiadores de Niterói. A partir
identificavam como marxistas sem que, entretanto, essa perspectiva fosse desenvolvida
nos textos de suas pesquisas. As razões para tal podem ser apenas especuladas: algum
significavam àquele momento não uma mera continuação de suas formações, mas algo
foi trabalhada ao longo de toda a tese. Essa influência (nunca de forma exclusiva, claro
século XIX foi o recorte mais trabalhado, o que deve ser tributado à atuação de Pedro
geográfica foi outra marca das dissertações - ela também, em grande parte, um reflexo
Uma análise das visões políticas das dissertações nos indicou que cerca de
momento vivido na época da escrita. Essa postura crítica, entretanto, não parece ter sido
tão frequente quanto seria na historiografia brasileira a partir dos anos 1980: de acordo
com nossas fontes secundárias, houve uma politização dos intelectuais que se
dominação. Além disso, nas dissertações que estudamos, posições políticas à direita,
espaço e tempo específicos, o curso de mestrado em História da UFF dos anos 1970.
mais elementos à análise. Por exemplo, um estudo sobre a historiografia certamente não
deve estar restrito aos identificados institucionalmente como cursos de História, mas
outros que não apenas construíram conhecimento sobre o passado, mas também se
produziram.
transformações rápidas aconteceram tanto no Rio quanto em Niterói entre os anos 1960
informações sobre as datas das conclusões das graduações, não é possível estipular que
tipo de formação tiveram: se, por exemplo, marcada pelo factualismo (e inclusive pela
presente, e se não é o caso de reconstruir a história tal como ela realmente foi, mas de a
Company: mesmo realizando um rico estudo factual, a autora lamenta não ter
Considerações finais
quem escrevem a História, mas não sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas
com que se defrontam, legadas do passado. Esse estudo procurou definir as forças que
verificamos que temas e recortes promovidos por docentes em suas disciplinas eram, em
grande medida, aqueles também desenvolvidos pelos mestrandos. Assim, por exemplo,
as dissertações tiveram como seu assunto mais trabalhado a política de países latino-
quase não foi visitado. Em um momento em que fontes primárias da história brasileira
tenham sido os primeiros objetos do interesse dos que pretendiam avançar na vida
acadêmica. Tal, entretanto, não é o que resume o curso: os docentes foram muitos, 23
1004
Como vimos, USP e UFPR seriam exceções. O curso de História da FNFi, apesar dos esforços de
alguns docentes e discentes, permaneceu no período que estudamos sem uma cultura relevante de
pesquisa. Sobre o curso de graduação em História de Niterói, nos contou Ismênia Martins que, quando
aluna nos anos 1960, se aproximou de um professor lhe comunicando sua intenção de pesquisar sobre
escravidão tendo recebido como resposta que tal não seria possível posto que Rui Barbosa havia destruído
os documentos. Entrevista ao autor.
417
Parece-nos que a questão do poder e da influência docentes merece a atenção dos que se
rechaçado e lhes havia uma crítica de base política realizada não apenas por setores da
profissionais a Niterói. São unânimes em considerar que o recurso a eles se deu num
período de carência de diplomados. Nossa tese não avançou muito empiricamente sobre
esse assunto, mas o suficiente para relativizar o argumento em tela. Por conta das
agências financiadoras externas ao programa, diz-se, teria sido mais fácil trazer
como docentes pessoal da USP. O curso da UFPR, por sua vez, recorreu a estrangeiros,
1005
Com os referenciais de Bourdieu, Clóvis de Barros Filho, professor da Escola de Comunicações e
Artes (ECA) da USP, trata da questão enfatizando as restrições científicas que docentes e programas de
pós-graduação impõem a pesquisas que não lhes geram lucro simbólico, bem como formas de controle na
seleção de pós-graduandos. Ver:
https://www.facebook.com/causaliberdade/videos/1430155027020152/UzpfSTEwMDAwMTgzODQwNj
gyOTpWSzoxNzE2MDg5NTIxNzgyNzY5/?epa=SEARCH_BOX Acessado em fevereiro de 2019.
418
mas não americanos, e sim franceses que faziam parte do círculo de contatos de
coordenação escolher o pessoal que trabalharia no mestrado, alargada também pelo fato
Mesmo com a política repressiva por parte do governo, com amplo controle
professores e estudantes que tinham uma leitura (e, em alguns casos, uma militância)
contrária à ditadura. Em uma visão com que polemizamos, isso se deveria à “cultura
política” brasileira que estaria aberta a conciliações e a abrigar opositores. Para nós,
restrição ideológica total, que poderia gerar reações políticas indesejáveis, sendo,
mobilizamos nos permitem compreender a relativa diversidade política que teve o curso,
mesmo marcado pelo autoritarismo, era disputado por diferentes grupos e forças, pôde-
se também ter a presença daqueles com mensagens opositoras aos que estavam no
também a relação entre o campo acadêmico e a configuração estatal, temos que uma
científicas do mestrado.
objetivo principal de formação de quadros para o ensino superior, tendo em seu impulso
compreensão histórica sobre esse momento levar em conta que ficaram à margem outros
destinos possíveis da expansão institucional da História (dos quais, por exemplo, a FNFi
pré-ditadura estava prenhe) e refletir sobre como essa forma de ser acadêmico
conhecimento sobre elas nos possibilitará ações mais conscientes e livres 1007. E essas
transformadas por ele em um sentido que fomente uma historiografia distinta daquela
denunciada pelo Nietzsche epigrafado por Benjamim, de historiadores que passeiam nos
jardins da ciência, mas uma em que se possa tematizar nosso sofrimento e nossas
dominação, eles quase não lêem sociologia e, em todo caso, não podem pagar por ela. No fundo, a
sociologia é uma ciência sem base social [...]”BOURDIEU, Pierre. “Pontos de referência” IN: Coisas
ditas.São Paulo: Brasiliense, 2004. p. 68.
1007
“Mas, contrariando as aparências, é elevando o grau de necessidade percebida e dando um melhor
conhecimento das leis do mundo social que a ciência social dá mais liberdade. Todo o progresso no
conhecimento da necessidade é um progresso na liberdade possível. Enquanto o desconhecimento da
necessidade encerra uma forma de reconhecimento da necessidade, e sem dúvida a mais absoluta, a mais
total, uma vez que se ignora como tal, o conhecimento da necessidade não implica de maneira nenhuma
a necessidade desse reconhecimento. Pelo contrário, faz aparecer a possibilidade de escolha que está
inscrita em toda relação do tipo se temos isto, então teremos aquilo: a liberdade que consiste em
escolher aceitar o se ou recusá-lo é desprovida de sentido enquanto se ignorar a relação que o une a um
então. O expor à luz do dia as leis que supõem o laisser-faire (quer dizer a aceitação inconsciente das
condições de realização dos efeitos previstos) estende o domínio da liberdade. Uma lei ignorada é uma
natureza, um destino (é o caso da relação entre o capital cultural herdado e os sistema escolar); uma lei
conhecida aparece como a possibilidade de uma liberdade.” BOURDIEU, Pierre. “O sociólogo em
questão” IN: Questões de sociologia.... p.49
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Dissertações1008:
1M
2M
3M
4M
5M
6M
1008
As dissertações que fogem à nossa sequência, pois não pertencentes às três primeiras turmas, são as de
número 35,36, 37 e 52.
439
7M
SANTOS, Ana Maria dos. Vida econômica de Itaboraí no século XIX. Dissertação de
8M
9M
10M
11M
12M
13M
14M
15M
16M
17M
18M
19M
20M
UFF, 1978.
21M
22M
23M
24M
UFF, 1978.
442
25M
26M
27M
28M
29M
30M
31M
32M
33M
34M
38M
social de 1823. Dissertação de Mestrado em História. UFF, 1978. Orientada por Arthur
39M
40M
mestrado em História. UFF, 1979. Orientada por Arthur Cézar Ferreira Reis.
41M
42M
SILVA, Eduardo da. O cancro roedor do Império do Brasil. Barões do café e crise da
Werneck, 1850-1900. Dissertação de Mestrado. UFF, 1979. Orientada por Victor Valla.
43M
de mestrado em História. UFF, 1979. Orientada por Arthur Cézar Ferreira Reis.
44M
CHIARIZIA, Martha. Itabira Iron Ore Company. Dissertação de Mestrado. UFF, 1979
45M
46M
47M
48M
Mestrado em História. UFF, 1979. Orientada por Arthur Cézar Ferreira Reis.
49M
XIX. Dissertação de Mestrado em História. UFF, 1979. Orientada por Arthur Cézar
Ferreira Reis.
50M
51M
SEREJO, Tereza Cirstina Leal de. Coronéis sem patente: a modernização conservadora
53M
54M
Dissertação de mestrado em História. UFF, 1979. Orientada por Victor Vincent Valla.
55M
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Entrevistas ao autor:
Vídeo:
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