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AULA 4

GESTÃO EM SAÚDE APLICADA


À HUMANIZAÇÃO

Profª Mariana Richter Reis


TEMA 1 – HUMANIZAÇÃO E O AMBIENTE FÍSICO HOSPITALAR

A humanização nas instituições de saúde tem uma diretriz transversal e


constitui um conjunto de ações das diversas práticas de prestação dos serviços
de saúde. Desta maneira, a construção coletiva entre os profissionais de saúde,
pacientes e familiares se dá quando todos podem contribuir para o cuidado em
saúde holístico e humanizado.
O Ministério da Saúde, por meio da Política Nacional de Humanização –
PNH, reconhece a humanização como uma das estratégias para alcançar a
qualificação da atenção e gestão nas organizações de saúde, bem como
corresponsabiliza e qualifica o trabalho interdisciplinar.
Além dos requisitos de acolhimento e cuidado humanizado, se preconiza
ainda que as instituições adequem sua estrutura física em prol de um melhor
acolhimento, da percepção do paciente com relação às instalações, higienização,
odor, utilização de cores e conforto higrotérmico.
Devido à complexidade de atividades nas instituições hospitalares, a
criação de espaço físico acolhedor e a definição de uma estrutura arquitetônica
planejada, que favoreça segurança e conforto, exigem das organizações
investimentos em manutenção, infraestrutura, equipamentos e aumento dos
custos operacionais, isto é, gastos financeiros nem sempre dentro do orçamento.
Desta maneira, questiona-se frequentemente como os gestores podem
melhorar as condições estruturais e físicas, para que o ambiente hospitalar possa
favorecer a recuperação e o bem-estar dos doentes e familiares. Em muitas
organizações de saúde, as estruturas são precárias ou antigas, impossibilitando
adequações modernas, que tragam mais luminosidade, acolhimento e sensação
de cuidado humanizado.
Os profissionais da área de arquitetura e paisagismo estão encontrando
nos hospitais nichos para aperfeiçoamento e desenvolvimento, buscando alinhar
a escolha das cores e texturas, garantindo limpeza e controle de infecção, bem
como jardins e áreas com visão externa para que o paciente possa perceber as
oscilações de tempo e clima. O mesmo vem ocorrendo nas especialidades
pediátricas, visando a adequar e transformar os ambientes hospitalares em
espaços semelhantes aos das escolas ou da própria casa da criança. Isso permite
que ali haja aprendizado, brincadeiras e desenvolvimento enquanto a criança está
em tratamento, trazendo conforto ao paciente e sua família.

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Outras áreas como a de diagnósticos médicos também têm usado da
arquitetura e do paisagismo para amenizar o medo sentido por pacientes que
realizam exames como ressonância magnética, no qual muitos relatam
claustrofobia. Assim, o uso de imagens de paisagens, florestas, cachoeiras,
plotadas ou pintadas no teto e nas paredes, pode atenuar o medo do exame e
evitar o uso de anestésicos para realizá-lo. Sendo assim, percebe-se que não há
limites para a imaginação dos paisagistas e arquitetos em saúde, que, com apoio
e envolvimento dos profissionais da assistência, podem fazer dos ambientes de
dor um espaço mais leve e acolhedor.
Além dos riscos assistenciais aos quais o paciente está exposto, riscos
físicos, ergonômicos, biológicos, ruídos, barulho, altas ou baixas temperaturas,
entre outros, podem tornar o ambiente hospitalar ainda mais desumano.
Uma pessoa está confortável em um ambiente, quando sente neutralidade
em relação a ele; portanto, os edifícios hospitalares podem possuir uma
arquitetura terapêutica se contribuírem para o bem-estar físico do paciente, por
meio da criação de espaços que acompanhem o avanço da tecnologia e
desenvolvam condições de convívio mais humanas (Corbella, 2003).
Sendo assim, o desconforto com o ambiente nos hospitais não pode ser
um problema a mais além de todos os problemas clínicos, de sofrimento e
estresse emocional que o paciente já apresenta.

TEMA 2 – A ILUMINAÇÃO NO AMBIENTE HOSPITALAR

A iluminação artificial é indispensável no ambiente hospitalar, visto que a


necessidade de visibilidade para a realização de procedimentos é de extrema
importância. Contudo, ela afeta o equilíbrio do indivíduo de maneira fisiológica e
psicológica.
Por conta disso, o emprego da luz natural é altamente recomendado, a fim
de trazer mais luminosidade e energia aos ambientes, para, aí sim, definir escolha
de cores de acordo com o projeto arquitetônico. Um paciente internado precisa
perceber a variação do dia e da noite, preservando seu ritmo de vida ao dormir,
acordar, alimentar-se e realizar outras atividades enquanto internado.
Deve-se considerar a qualidade e a quantidade de iluminação:

 Quantidade – a percepção do indivíduo varia segundo os locais e a


atividade, se ocorre de forma contínua ou intermitente;

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 Qualidade – depende do índice de expressões e temperatura da cor; ex.: a
luz branca natural possui um índice de expressão de cores igual a 100.

Outros aspectos básicos devem ser analisados sobre a iluminação:

 Níveis de iluminação de acordo com as exigências do conforto humano;


 Sistemas de iluminação que podem ser diretos, indiretos ou mistos;
 Tipo de fonte de luz;
 Eficiência luminosa;
 Reprodução da cor.

Nos hospitais, os diferentes tipos de pacientes e as diversas atividades


requerem estudos específicos para proporcionarem bem-estar visual (Miquelin,
1992). A luz natural pode ser melhor aproveitada no interior dos hospitais, já que
ela traz maiores benefícios à saúde devido à sensação psicológica do tempo, dia
e noite, sol, nublado e chuva. A luz artificial deve complementar a natural,
contribuindo para a segurança dos procedimentos e atendimento ao paciente.
Estes aspectos relativos ao uso da luz natural têm sido amplamente
trabalhados e defendidos pelos profissionais de Unidades e Terapia Intensiva,
pois neste ambiente frequentemente os pacientes apresentam perda da memória
ou dificuldade em se localizar no tempo e espaço. Desta forma, manter em cada
leito hospitalar uma janela que permita ao paciente visualizar e perceber o passar
do tempo e das mudanças climáticas pode inclusive evitar o uso de medicações
e o prolongamento da internação.

TEMA 3 – AS CORES, O ESPAÇO E O RELEVO

A escolha das cores no ambiente hospitalar é tão importante quanto a


definição dos espaços arquitetônicos para a percepção dos objetos e a sensação
de acolhimento e bem-estar. As cores azul e verde aumentam os espaços e as
cores vermelho, amarelo e laranja os diminuem e estreitam.
As cores podem unificar e dividir espaços:

 Unificar – a aplicação de uma única cor em ambientes com muita assimetria


evita que o olho seja atraído por essas deformidades;
 Dividir – quando se tem duas partes em um único ambiente, a aplicação de
cores alternadas pode provocar a sensação de dois ambientes num mesmo
espaço.

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Cores fortes como o vermelho, laranja e amarelo também podem provocar
o aumento do relevo de obstáculos a se evitar, enquanto o roxo, azul e verde
esfumaçado provocam o achatamento de objetos.
A harmonização das cores evita o cansaço dos olhos e a desconcentração
dos profissionais. Cores como o azul ou verde claro são utilizadas nos uniformes
cirúrgicos e campos operatórios, pois proporcionam conforto visual à percepção
de sangue pelos profissionais. Da mesma forma, a escolha do azul e verde-claro
para as paredes e teto proporciona ao paciente a sensação de acolhimento e
aproximação. Sendo assim, cabe aos hospitais a definição de projetos que
alinhem a escolha das cores às necessidades dos pacientes e profissionais em
cada ambiente físico.
As cores também são utilizadas para transformar ambientes hospitalares
pediátricos. As pinturas, por vezes realizadas pelos próprios pacientes, trazem
alegria, conforto e aconchego a eles e seus familiares. No caso de doenças graves
e/ou crônicas, estes permanecem por longo tempo em tratamento clínico,
transformando o espaço hospitalar em sua segunda casa. Os familiares de uma
criança internada relatam que o fator humano de atendimento e a estrutura física
acolhedora e alegre possibilitaram a eles uma aceitação mais fácil do momento
vivido.
Este é um exemplo de como o uso da pintura e das cores nas paredes pode
alegrar e amenizar os momentos de dor e angústia em um hospital infantil:

Figura 1 – Imagem do Hospital Alberto Urquiza Wanderley, Unidade de Oncologia-


Unimed de João Pessoa

Fonte: G1, 2016.

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O Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de São Paulo também
investiu e apostou nas pinturas infantis para melhorar o acolhimento, a ambiência
e a humanização dos pequenos pacientes e suas famílias:

Figura 2 – “Casa do Tarzan” na enfermaria pediátrica do HCFMUSP

Fonte: Rede Humaniza SUS, 2013.

Estes dois exemplos nos mostram que é possível melhorar e propiciar


humanização e acolhimento com o uso das cores e objetos, especialmente no
cuidado com as crianças. Estes bons exemplos, ambos nacionais, em instituição
privada e pública, evidenciam que o investimento proporciona alegria e ameniza
momentos de dor e angústia ali vividos.

TEMA 4 – CONFORTO HIGROTÉRMICO

É a sensação experimentada pelo organismo quando em condições


ambientais de temperatura e umidade, relacionada com fatores de idade, sexo,
vestimentas e atividade, em que a temperatura esteja na faixa dos 36,5ºC.
A sensação de conforto higrotérmico pode variar nas regiões do país, bem
como a capacidade do indivíduo de adaptar-se às condições climáticas da região
onde se encontra. Este conforto está relacionado às variáveis: temperatura,
umidade relativa e velocidade do ar, e os projetos arquitetônicos devem
considerar os seguintes princípios:

 Controle do acúmulo de calor;


 Equilíbrio de energia térmica no interior do edifício;
 Retirada de toda umidade em excesso e promoção de movimento do ar;
 Preferência pela iluminação natural;
 Controle das fontes de ruído (Corbella, 2003).
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Para as equipes assistenciais, é de extrema importância a preocupação
com os momentos de higiene corporal ou realização de procedimentos que
possam expor o corpo do paciente, de maneira que ele sinta frio e tenha sua
privacidade invadida. Deve-se, então, buscar executar estes procedimentos de
maneira rápida e cuidadosa, no menor tempo possível.
Um paciente hospitalizado pode ter as sensações de frio e calor alteradas
em decorrência de seu tratamento, mas também por estar em um ambiente pouco
acolhedor e com pessoas estranhas ao seu convívio, o que traz a sensação de
pouca humanização e carinho quando da realização dos cuidados básicos.
Equilibrar estes fatores ao clima da região é uma decisão que deve ser
tomada pela arquitetura hospitalar, ou seja, a escolha da utilização em larga
escala da energia passiva para a obtenção de conforto é uma decisão que deve
ser avaliada em determinadas regiões, com extremos de frio ou calor.

TEMA 5 – RELACIONANDO HUMANIZAÇÃO E AMBIENTAÇÃO HOSPITALAR

Os aspectos emocionais influenciam o indivíduo enfermo e sua melhora de


acordo com o cuidado e a atenção que os profissionais de saúde dedicam a eles.
Não há dúvida que os aspectos ambientais têm grande influência nas ações
curativas, por meio de espaços físicos que propiciem conforto e bem-estar. Um
projeto arquitetônico hospitalar também pode diminuir o estresse do paciente,
seus familiares e profissionais que ali atuam.
O conceito de humanização sendo aplicado à concepção dos projetos
hospitalares e a preocupação com a qualidade do ambiente hospitalar não são
recentes. Florence Nightingale, precursora da enfermagem moderna, em seu livro
Notes on nursing and notes on hospitals (1859), já enfatizava a importância de
atributos como ventilação adequada, saneamento, controle do ruído e da luz para
a qualidade do ambiente. Segundo a autora, o primeiro requisito de um hospital
era que seu ambiente não fizesse mal aos pacientes (Malkin, 1991).
Apesar da valorização pela tecnologia e tratamentos de alta complexidade
da época, Florence já evidenciava e mostrava aos profissionais que, ao
atenderem os requisitos de cuidado humanizado, além do clínico-médico,
favorecem a cura e a recuperação do doente hospitalizado.
Pode-se transpor a visão de Florence aos dias atuais quando se afirma que
o objetivo central de um hospital é oferecer aos pacientes ambientes que auxiliem
a recuperação e tragam benefícios físicos e psicológicos, além dos clínicos.

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Os gestores hospitalares têm percebido que a imagem clássica de um
hospital, de cores brancas, frio, com cadeiras em salas de espera, longas filas
para atendimento, entre outros paradigmas ultrapassados, vem sido substituída
por ambientes acolhedores, coloridos, com presença de plantas e obras de arte,
música e terapias com animais em prol da melhoria da humanização hospitalar.
Algumas instituições também investem em espaços ecumênicos, lojas, cafeterias,
restaurantes, jardins internos e mudança no mobiliário, tudo para propiciar uma
experiência diferenciada aos pacientes e familiares.
Desta forma, a busca pela alta tecnologia não é mais o único diferencial
competitivo das instituições de saúde, mas sim o olhar holístico e integral para o
ser humano doente, compreendendo que os aspectos biológicos, psicológicos,
sociais e espirituais estão interligados na busca pela recuperação.
Escolha das cores, luminosidade e sensação de diminuição do calor ou frio
excessivo podem contribuir para a melhoria dos aspectos de humanização. Ainda,
pode-se considerar outros atributos para uma melhor ambientação, tais como:

 Escolha dos objetos;


 Mobiliários;
 Artigos religiosos;
 Quadros;
 Jardinagem;
 Permissão ao paciente para utilizar seus objetos pessoais e deixá-los em
seu leito, aproximando-o do ambiente domiciliar.

Outro aspecto importante para a humanização é relacionado ao barulho e


eco nos ambientes hospitalares. O conforto acústico deve ser considerado quando
da instalação dos ambientes de permanência dos pacientes. Ruídos externos,
como buzinas e sirenes de ambulância aumentam o estresse sofrido e deverão
ser amenizadas com a escolha de janelas e estruturas que os minimizem.
Os profissionais também devem preocupar-se com os ruídos de suas
atividades, tais como barulho de sapatos, carrinhos, portas batendo e conversas
altas, que podem atrapalhar e desumanizar o cuidado prestado, mesmo quando
estas ações forem em decorrência da rotina diária.

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REFERÊNCIAS

CORBELLA, O. Em busca de arquitetura sustentável para os trópicos –


conforto ambiental. Rio de Janeiro: Revan, 2003.

MALKIN, J. Hospital interior architecture creating healing environments for


special patient populations. New York: John Wiley & Sons, 1991.

MARTINS, V. P. A humanização e o ambiente físico hospitalar. I CONGRESSO


NACIONAL DA ABDEH; IV SEMINÁRIO DE ENGENHARIA CLÍNICA, Anais...,
2004. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/humanizacao_
ambiente_fisico.pdf>. Acesso em: 28 abr. 2019.

MIQUELIN, L. C. Anatomia dos edifícios hospitalares. São Paulo: CEDAS,


1992.

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