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Figurações do romance e da
narrativa breve e lendária no
século XIX
Caderno de Resumos
Reitor
Sandro Roberto Valentini
Vice-reitor
Sergio Roberto Nobre
Pró-Reitora de Graduação
Profa. Dra. Gladis Massini-Cagliari
Pró-Reitora de Pós-Graduação
Profa. Dra. Telma Teresinha Berchielli
Pró-Reitora de Pesquisa
Prof. Dr. Carlos Frederico de Oliveira Graeff
Pró-Reitora de Extensão Universitária e Cultura
Profa. Dra. Cleopatra da Silva Planeta
Pró-Reitor de Planejamento Estratégico e Gestão
Prof. Dr. Leonardo Theodoro Büll
Diretor
Prof. Dr. Julio Cesar Torres
Vice-Diretor
Prof. Dr. Fernando Barbosa Noll
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circulação, no ambiente oitocentista, de lendas, muitas delas baseadas em eventos
históricos que ao sabor da transmissão se integraram intimamente à imaginativa
popular. Possivelmente, ao descortinarem o lastro histórico das curiosas narrativas
difundidas pela voz popular, as lendas foram valorizadas pelos pensadores do XIX
como depositárias das tradições do povo e manifestação de práticas e costumes que
traduzissem a identidade nacional.
A despeito de terem oferecido espaço oportuno às solicitações do imaginário, as
narrativas breves não se eximiram do compromisso com a realidade circundante, tendo
se aproximado também da experiência comum. Nas formas da crônica e do conto, essas
narrativas emolduram aspectos da vida cotidiana. O conto, por sua vez, oferece-se como
gênero particularmente flexível em relação ao modo de enfocar a experiência humana,
comportando desde o registro anedótico do fato curioso, até a exposição da psicologia
profunda que envolve as motivações e gestos corriqueiros.
Considerando, pois, a relevância conferida pelo ambiente letrado do século XIX
à ficcão em prosa, espaço que se coloca como peça fundamental nos debates acerca das
relações entre criação literária e investigação da história e sociedade, o simpósio
proposto visa promover discussão dos diversos desdobramentos do romance e da
narrativa breve.
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PROGRAMAÇÃO GERAL
19h-21h: Mesa-redonda:
“As promessas do realismo e os caminhos da ficção no Brasil do século
XIX” – Prof. Dr. Jefferson Cano (UNICAMP)
“Literatura e magia: E.T.A. Hoffmann e outros românticos sem reflexo no
espelho” – Profa. Dra. Karin Volobuef (UNESP)
19h-21h: Mesa-redonda:
“A poética da lenda em Alfarrábios, de José de Alencar: representações do
elemento popular e do maravilhoso no imaginário romântico sobre o
passado colonial” – Profa. Dra. Rafaela Sanches (UNESP)
“A forma livre de um Lamb: Charles Lamb nas Memórias Póstumas de
Brás Cubas” – Prof. Dr. Daniel Lago Monteiro (UNICAMP)
“Da epopeia ao romance, do mundo da comunidade ao homem socialmente
desenraizado” – Prof. Dr. Márcio Scheel (UNESP)
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Nota explicativa
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COMUNICAÇÕES
(Em ordem alfabética por sobrenome do autor)
Esta comunicação tem como objetivo apresentar um estudo sobre as relações entre texto
e imagem na obra Peter Pan, do escritor escocês James Matthews Barrie (1860-1937).
A história foi apresentada primeiramente como peça teatral de título Peter Pan, or The
Boy Who Wouldn’t Grow Up, em 1904, e publicada em prosa sob o título Peter and
Wendy, em 1911. A narrativa de Berrie é ambientada em dois mundos: o real,
representado pelo sobrado de Mr. & Mrs. Darling, localizado nas proximidades de
Kensington Gardens, em Londres; e o fantástico, representado por Neverland, a Terra
do Nunca, cenário repleto de aventuras e de personagens fantásticos. Na primeira
edição, publicada em 1911, as ilustrações foram feitas pelo britânico Francis Donkin
Bedford (1864-1954), também artista de algumas obras de Charles Dickens, tais como A
Christmas Carol (1923) e The Cricket on the Hearth (1927). Na obra do estudo em
questão, foram inseridas quatorze ilustrações de Bedford, que retratou algumas cenas
marcantes de Peter Pan, como sua chegada a Londres, a viagem das crianças rumo a um
lugar desconhecido, suas aventuras em Neverland e o duelo entre ele e Hook. As
representações visuais realizadas por Bedford, todas em preto e branco, delineadas por
traços finos, compõem a ambientação das cenas e caracterização das personagens,
conferindo um tom de dramaticidade à obra. Tendo em vista a importância da
concatenação da linguagem verbal e da linguagem visual na composição das narrativas,
principalmente, em obras juvenis, como é o caso de Peter Pan, serão abordados os
pressupostos teóricos da Teoria da Imagem, a partir dos estudos de Nodelman (1988) e
Nikolajeva & Scott (2011), que consideram as relações intersemióticas entre texto e
imagem como constituintes elementares para o compreensão expansiva por parte dos
pequenos leitores.
Palavras-chave: Francis Donkin Bedford. James Matthews Barrie. Peter Pan. Texto e
imagem.
A mulher, como personagem literária, esteve por muitos anos, observando-se poucas
exceções, atrelada à ideia de sensibilidade, doçura e fraqueza; qualidades atribuídas ao
feminino e à subserviência frente à imagem masculina. Aos poucos, autoras começam a
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mostrar a força da mulher, principalmente a partir dos movimentos feministas iniciados
no século XIX. O empoderamento de personagens não fica restrito a autoras, tendo cada
vez mais a participação de autores homens representado a mulher enquanto senhora de
si e detentora de uma poderosa voz de comando frente à sociedade e, em especial, à
figura masculina. É o que encontramos em muitas das obras do escritor e roteirista
britânico Neil Gaiman. Em suas narrativas gráficas, Gaiman explora personagens
femininas com vozes poderosas frente a sociedade patriarcal e que, geralmente,
sobressaem frente ao ser masculino. Suas personagens femininas deixam-se dominar
quando lhes convém, mas mantêm a certeza, mesmo que inconscientemente, de que sua
submissão é escolha própria, nunca um imposição da entidade masculina. A partir
dessas considerações, e por meio da análise das personagens femininas da narrativa
gráfica The Doll's House (1991), gostaríamos de direcionar um olhar mais atento ao
modo como a feminilidade e a masculinidade são expressas no universo criado por
Gaiman. Dessa forma, à luz de algumas ideias de Butler (1990) e de Kolontai (2000),
acerca do papel que a mulher exerce na sociedade e de como esse papel lhe é atribuído e
cobrado; e de Spivak (2010) sobre as relações de poder entre o dominador e o
dominado; temos por objetivo analisar o modo como o feminino interage com o
masculino na obra de Gaiman, bem como a forma como o feminino é sublinhado
enquanto elemento dominador dessa relação.
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de debater a questão da educação feminina dentro da sociedade burguesa no século
XIX, embasados nos estudos de Butler (2016), Miskolci (2016), Louro (2014) e Shieh
(2010), pretendemos igualmente resgatar e dar maior visibilidade à originalidade na
obra de Júlia Lopes de Almeida em seu tempo.
A literatura para crianças começou a ser difundida na França, século XVII, graças a
intenção do rei absolutista em promover uma literatura direcionada ao público infantil.
Assim nomes como La Fontaine, Charles Perrault (Contos da mamãe gansa) e Mme.
D’Aulnoy foram responsáveis por obras primorosas de fábulas e contos de fadas
repletas de magia (COELHO, 2010). Em momento posterior, século XIX, os Irmãos
Jacob e Wilhelm Grimm publicaram Contos maravilhosos para o lar e as crianças
possuindo histórias feitas a partir de registros orais, uma forma de conferir valor à
cultura alemã. Os contos de fadas logo conquistaram o imaginário de crianças e
adolescentes, fazendo inúmeros personagens perpassarem gerações, ganhando inúmeras
traduções, releituras, séries, filmes e histórias em quadrinhos. As histórias das
personagens Cinderela, Branca de Neve, Rapunzel, Bela Adormecida, por exemplo, são
reconhecidas nos contos tradicionais e algumas releituras como donzelas indefesas,
delicadas e tão frágeis ao ponto de precisarem não só de serem salvas dos perigos, mas
também se realizarem por meio do casamento com o príncipe ou resolução de conflito
do herói. Essa visão clássica das princesas, nas últimas décadas, ganhou novas
interpretações com o intuito de contestar esses padrões impostos (MARTINS, 2015).
Dessa maneira, o intuito deste trabalho é comparar as versões clássicas dos contos
“Cinderela”, “Bela Adormecida” e “Rapunzel” escritos pelos Irmãos Grimm e as
versões homônimas presentes no livro Lute como uma princesa, da autora Vita Murrow,
publicado em 2019. Os elementos analisados serão a estrutura dos contos clássicos e
modernos e principalmente as mudanças sofridas pelas personagens femininas como
reflexo de uma sociedade moderna que anseia pela continuidade de transformação e
quebra de estereótipos. Dessa forma, serão utilizados os autores Diana e Mário Corso
(2006), Propp (2002), Martins (2015) e Estés (2018).
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TRADUÇÃO LITERÁRIA NO SÉCULO XIX: UMA ANÁLISE DO CORVO
MACHADIANO
Neste trabalho pretendemos analisar a tradução feita de “The Raven”, de Edgar Allan
Poe, realizada por Machado de Assis. Tal análise abarcará todo um posicionamento do
ato de tradutor realizado na obra, alinhando assim, o papel do mesmo com a criação de
uma identidade nacional, e, principalmente mostrando como o conceito de “adaptação”
pode ser encontrado durante a leitura do poema em Língua Portuguesa. Como
referencial teórico serão utilizados conceitos sobre tradução e adaptação, além de
trechos retirados do poema original para o confronto com a Língua Portuguesa.
Machado de Assis foi fortemente influenciado pela escrita de Poe, como é possível ao
observar em diversos contos com características da literatura fantástica e de mistério. O
que cabe, aqui, é observar a forma pela qual o poema do Poe foi transposto para a língua
materna de Machado, já que será perceptível verificar como carregada pelo olhar atento
do contista brasileiro e permeado de um tom de intensidade que, em alguns momentos,
foge a proposta de Poe, colocando o poema perante a conceitos da adaptação, a qual
está fortemente ligada ao ato da tradução, embora não possamos dizer que são ações
sinônimas. O autor brasileiro que fazemos referência foi fortemente ligado a literaturas
estrangeiras, porém, quando nos é posto seu papel como tradutor, Machado de Assis
estabelecerá uma ligação fortemente marcada pelo nacionalismo brasileiro, ou seja, em
muitas de suas obras, estão a presença de fatos culturais característicos pertencentes ao
Brasil, os quais servirão de modelo para o entendimento da obra traduzida.
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características. Além disso, destacar a importância de narrativas de resistência como
Tutti i nostri ieri, ontem, hoje e sempre.
A obra de juventude do escritor irlandês James Joyce compreende sua produção literária
anterior a Ulysses, publicado em 1922. Dentre essa produção, destacam-se o romance de
teor autobiográfico Um retrato do artista quando jovem bem como sua versão
embrionária Stephen herói, publicados respectivamente em 1916 e 1944 (edição
póstuma), nos quais é narrado o período de formação de Stephen Dedalus da infância
até o início da maturidade. A descoberta da arte herética e do desejo sexual culminam
na apostasia religiosa do jovem artista, evidenciando a íntima ligação que se estabelece
no romance entre experiência estética e erótica. Tais experiências levam Stephen a
identificar-se com a figura de Lúcifer na revolta e insubordinação contra a moral
religiosa e na busca de liberdade para se expressar artisticamente. A presença desses
elementos permite aproximar a obra de juventude de Joyce com preceitos das estéticas
finisseculares de extração simbolista-decadentista. Objetivamos, portanto, demonstrar as
confluências entre Um retrato do artista quando jovem/Stephen herói e as estéticas do
fim de século, tanto em razão dos recursos formais mobilizados pelo romancista – a
exemplo da linguagem voluptuosa, vitalista e sinestésica –, quanto dos motivos
artísticos fundados na artificialidade, no erotismo e na subversão moral, incluindo ainda
a teoria estética elaborada por Stephen – principalmente em Stephen herói – em torno
do conceito joyceano de epifania.
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que se tem produzido entre direito e literatura universal, em que vêm imediatamente à
mente obras como O Processo, de Franz Kafka, Crime e Castigo, de Dostoiévski ou
mesmo O Estrangeiro, de Albert Camus. A questão nessas obras são sempre crimes e
criminosos, então consideramos que a expressão mais genuína da intersecção entre
direito e literatura está nas ciências criminais. Como argumento de autoridade para esta
abordagem tomamos o Prof. Roberto Lyra, que pontuou no livro Direito Penal
científico, que Euclides da Cunha, com Os Sertões, foi quem realmente fundou no país a
sociologia criminal. A base metodológica se dará a partir de Sidney Chalhoub (A
História contada), pelo qual pretendemos justificar como memórias e testemunhos,
mesclados com ficção, podem servir para uma construção da história social. Em
capítulo próprio, também pretendemos buscar um esteio na literatura universal de Franz
Kafka, analisando as repercussões kafkianas de cárcere e de escrita a partir das obras O
Artista da Fome e Na Colônia Penal: pela primeira, a própria escrita de Graciliano
como corpo esquálido na e após a prisão, pela segunda, o estigma da sentença penal no
criminoso. Por fim, buscaremos como que a experiência carcerária de Graciliano no
contexto histórico do Estado Novo brasileiro e da ascensão dos fascismos no mundo,
fundado em um nacionalismo exacerbado e na eliminação de opositores políticos,
poderia ser atualizada para nos servir ao contexto brasileiro contemporâneo de escalada
de discursos punitivistas e autoritários.
Larissa de Assumpção
UNICAMP
larissadeassumpcao@gmail.com
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Palavras-chave: Família Imperial Brasileira. Leitura. Romance. Século XIX. Walter
Scott.
Conan Doyle teve seu nome reconhecido após a publicação de Um estudo em vermelho
(1887), evento impulsionado pela recorrente contribuição na revista mensal The Strand
Magazine. Desde então as histórias, assim como seu personagem principal, Sherlock
Holmes, têm causado imenso interesse sobre o gênero policial e aspectos que o fazem
cair no gosto de um grande número de leitores. Para Franco Moretti (2000), a
racionalidade ocupa função importante na narrativa policial. Sendo inserida na estrutura
narrativa por meio do elemento formal das pistas, esta permite estudo sobre o gênero
além do aspecto formal, visto ser responsável pela criação de uma ligação entre leitor e
obra. De acordo com Saler (2003), o período passava por uma valorização da razão, e o
gênero, estando de acordo com as tendências da época, institui o detetive como símbolo
desse ideal. A partir do vínculo entre ideais e demandas populares, as narrativas
correspondiam literariamente as demandas da época, permitindo o que o autor chama de
“re-encantamento da modernidade”, posto apresentarem desfecho surpreendente
segundo método lógico. Para o autor, Sherlock Holmes se revela como a representação
dos valores modernos, exemplificando um complexo de ideias que interage com a
insatisfação e esperanças dos adultos, refletindo a sociedade simultaneamente em que
incita a imaginação infantil. Com base nisso, propõe-se a análise da produção da
primeira fase da personagem no periódico londrino, compreendida entre 1891 e 1893,
atentando para o desenvolvimento da racionalidade dentro das narrativas como objetivo
central, posto que também fundamenta as teorias da casa vazia e a ciência da dedução,
além da representação dos demais valores modernos, identificados por Saler (a saber,
urbanismo, consumismo e secularismo), pela personagem. A apresentação dos métodos
do detetive ao público permite ao público aplicá-las ao cotidiano, formando novo
vínculo entre obra e público através de paridade intelectual entre si.
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humor, como a sátira e a ironia, em diferentes níveis, fazendo, ao nosso ver, uma
dessacralização do texto-fonte, uma vez sagrado para os povos gregos, racionalizando
em sua interpretação, trazendo-a para o tempo contemporâneo e também apresentando
discussões e abordagens da obra extraídas de estudos feitos por Luciano em sua carreira
como divulgador da mitologia. O objetivo principal da comunicação é apresentar de
maneira expositiva o movimento que sai do maravilhoso mitológico, e sagrado, para o
mundo prosaico e contemporâneo. Para isso, serão relacionado os conceitos de
intertextualidade, encontrados na obra Intertextualidade (2002), de Tiphaine Samoyault,
e de ironia e humorismo, retirados dos estudos de Pirandello, em L’umorismo (1993),
Muecke, em A Ironia e o Irônico (1982), Brait,em Ironia em perspectiva polifônica
(1996) e Paiva, em Contribuição para uma estilística da ironia (1961), que são
utilizados para fazer com que a obra homérica apresente um novo significado através da
narração de De Crescenzo, apresentando não só uma inovação em seu conteúdo,
inserindo um novo final para a obra, mas também uma visão nova sobre o herói Ulisses
em relação ao texto-fonte.
Osnir Branco
UEL
osnir_branco@hotmail.com
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XAVIER DE CARVALHO: UM AGENTE DAS TRANSFERÊNCIAS
CULTURAIS
Esse trabalho tem o objetivo de desenvolver um estudo reflexivo sobre a história dos
movimentos trabalhistas na Colômbia, do século XX, como ensejos fundamentais para a
criação literária de Gabriel García Márquez, no romance Cem Anos de Solidão (1967).
Neste estudo leva-se em consideração as influências externas sobre o texto, ao colocar
no centro da abordagem aspectos do contexto social, do tempo e do lugar em foi
produzida no processo de criação da narrativa. Busca-se referências da manifestação
grevista dos funcionários da Companhia United Fruit Company que possibilitem a
recuperação da memória coletiva e individual de fatos históricos, culturais e pessoais do
autor, de um povo e de um continente dentro da literatura garcimarquiana. Trata-se de
uma pesquisa de cunho bibliográfico e de análise literária, com ênfase no aparato
teórico dos estudos de Antonio Candido, que defende o sentido da crítica dialética
(texto e contexto), no qual analisa os elementos externos como parte integrante da
estrutura de obras literárias. Assim, busca demonstrar a literatura não como um reflexo
puro do real, mas como uma interpretação subjetiva do meio, cujo fim é o de revelar o
conjunto social e construir mecanismos de debate entre a literatura e os movimentos
sociais latino-americanos.
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Palavras-chave: América Latina. Anti-imperialismo. Literatura. Movimentos
trabalhistas.
No século XIX, Literatura e Jornalismo não estabeleciam uma fronteira rígida. Ambas
as práticas se confundiam e, por essa razão, as notícias podiam trazer elementos
ficcionais e os poemas, abordar fatos deveras ocorridos. Nesse período, a crônica era
um gênero estimado do leitor e produzido em grande quantidade por colaboradores que
contavam os acontecimentos ocorridos de forma leve e divertida. Gênero híbrido,
mistura de realidade e ficção, a crônica é rica e despretensiosa, colada ao tempo e
eterna, satírica e poética. Ela parte de um fato real, mas não é notícia; constitui-se por
meio da paródia e da sátira, mas não é conto, nem romance. O jornal do século XIX
acolhe todos esses gêneros democraticamente, criando uma “literalização ambìgua”.
Machado de Assis foi um grande cronista e descreveu episódios vividos pela sociedade
fluminense oitocentista, contando anedotas políticas, criticando comportamentos que
julgava inaceitáveis, sempre com humor e ironia. Pretende-se analisar, nesta
comunicação, a presença do clássico Boileau na crônica machadiana que trata do uso
polêmico de anquinhas. Para se compreender a presença do elemento clássico na
crônica machadiana, recorreu-se aos estudos de Thérenty (2007) e Kalifa (2011), pois
esses teóricos auxiliam no entendimento da porosidade da crônica.
Objetivamos realizar, nesta intervenção, uma leitura comparada entre o romance O pai
Goriot (1835), de Honoré de Balzac, e o conto “O mandarim” (1880), de Eça de
Queirós. As duas narrativas apresentam versões do motivo literário, bastante utilizado
ao longo do século XIX, conhecido como “mandarim assassinado” ou “paradoxo do
mandarim” que, resumidamente, consiste na seguinte alegoria: o homem cometeria um
crime se tivesse a certeza da impunidade? Almejamos comparar como esse tema é
representado nos dois textos, apoiando-nos nas considerações críticas de António
Coimbra Martins (1963-1964), Pedro Luzes (1978), Beatriz Berrini (1992) e Carlo
Ginzburg (2001). Decidimos analisar o romance balzaquiano juntamente com o conto
queirosiano, pois são duas narrativas escritas em períodos distintos do século XIX por
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escritores de nacionalidades diferentes. Intrigados com as convergências e as
divergências entre a trajetória dos personagens Eugène de Rastignac do rormance de
Balzac e Teodoro do conto de Eça de Queirós, acreditamos ser pertinente revisitar essas
duas obras, por intermédio do paradoxo do mandarim, para uma melhor compreensão
das ações desses dois personagens. Apesar dos diferentes tratamentos dados ao motivo
do mandarim assassinado, concluímos que os dois escritores inserem esse tema para
abordar, entre outras coisas, sobre a ambição social de Rastignac e de Teodoro.
O presente trabalho busca realizar uma investigação acerca do caráter “inútil” do herói
Macunaíma, personagem central da rapsódia Macunaíma: o herói sem nenhum caráter
de Mário de Andrade, publicada em 1928 e considerada a prosa basilar do primeiro
modernismo (CAMPOS, 1978). A pesquisa toma como ponto de partida dois pontos
principais, a saber: a formação e a transformação da consciência do herói. Para isso,
serão analisados três momentos decisivos da narrativa:a circunstância de iniciação de
Macunaíma em seu mundo de origem, a circunstância de punição radical representada
pela viagem à cidade de São Paulo – e as consequências em relação à transformação da
consciência do herói que essa viagem proporciona –, e a circunstância do retorno do
herói ao seu mundo de origem, o “fundo do Mato-Virgem”. A perspectiva é a de
apresentar as facetas do herói andradiano que, ao se transformar, também transforma
seu modo de existir afirmando-se como um “herói inútil”. Ao assumir tal “inutilidade”,
Macunaíma reforça não só uma opção individual de um personagem em derrocada, mas
sobretudo assume uma posição indispensável de recusa à reificação de si e do seu
mundo. Com isso, portanto, Macunaíma é capaz de instaurar a dialética da consciência
mítica face à consciência retificada.
Por muito tempo o ensino de Literatura nas escolas serviu como aparato ou para o
ensino de língua ou para a formação de leitor. Segundo Cosson (2012), o ensino da
escola tem um duplo pressuposto: de um lado se pretende ensinar o cidadão a ler e
escrever, por outro lado se busca formar o indivíduo culturalmente. O interesse em
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promover um ensino de literatura atendendo essencialmente as peculiaridades de um
texto literário tem sido bastante abordado entre autores da área. Por muito tempo houve
a escolarização da literatura de modo a descaracterizá-la, reduzí-la, silenciá-la. O que se
discute não é a escolarização e sim essa descaracterização que não atende à real
necessidade do estudo do texto literário. Com base nesses aspectos, este trabalho
apresenta uma proposta de atividade com o poema “Balada de amor através das idades”
de Carlos Drummond de Andrade, baseada na sequência expandida postulada por
Cosson (2012). O principal objetivo é o de contribuir para o ensino de literatura que
promova a sensibilidade às minúcias e entrelinhas do texto literário, bem como a
construção de um sujeito crítico capaz de experienciar as situações do texto, conhecer
outras formas de enxergar o mundo e inferir posicionamento crítico sobre isso, seja para
concordar ou não com o texto. Assim, o trabalho direcionado com a literatura deve ser o
compromisso de todo o professor de língua portuguesa, pois as dificuldades já
mencionadas precisam ser sanadas ou contribuirmos para a formação de um leitor raso e
um indivíduo sem argumentos.
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A PRESENÇA DOS CONTOS DE MACHADO DE ASSIS NAS FOLHAS
PÚBLICAS BRASILEIRAS
Nenhum autor teve um vínculo mais íntimo com os jornais do que Machado de Assis:
além de poesias, contos, romances, críticas, peças teatrais e crônicas publicados nas
páginas impressas, o escritor participava de problemas de xadrez, comentava
publicações recém lançadas e escrevia cartas a pedido. A análise da presença do
eminente autor nas folhas públicas revela o quanto, ao longo dos anos, ele foi
dominando a imprensa do país, como destacam os biógrafos Jean Michel Massa (1971)
e Raimundo Magalhães Júnior (1981). Essa consagração dá-se graças à valorosa pena
do escritor e ao contato com os editores, com quem Machado sempre teve excelentes
relações, como Paula Brito, Faustino Xavier de Novaes e Baptiste Louis Garnier, por
isso Bourdieu (1992) ao afirmar que no século XIX o campo literário se solidifica,
assinala que antes da consagração pelos leitores há a entronização pelos seus pares, e o
escritor carioca nasceu no mundo da imprensa. Com esses contatos e graças aos navios
a vapor, que percorriam aceleradamente pelos portos do país, as obras machadianas
eram reproduzidas em jornais de diferentes estados. Assim, o objetivo deste trabalho é
analisar a reprodução dos contos do autor em impressos distantes do eixo Rio-São
Paulo, desde a década de 1860, quando começam as publicações regulares no luxuoso
Jornal das Famílias, até 1908, quando o escritor falece, a fim de elucidar o quanto os
jornais brasileiros reproduziram as narrativas breves machadianas, tornando Machado
de Assis uma das maiores personalidades literárias no Brasil oitocentista.
Théophile Gautier (1811 - 1872), antes de se tornar um autor cujos textos preparariam o
Parnasse Contemporaine e fomentariam a ideia de “Arte pela Arte”, foi um dos Jeunes-
France que, ao lado de Victor Hugo, defendeu os pressupostos do movimento romântico
nas primeiras décadas do século XIX. Nesse contexto, além de produzir toda uma série
de estudos acerca de autores antes esquecidos pelo antigo cânone, também escreveu
narrativas fantásticas e destacou artistas plásticos que eram descuidados pela então
estética vigente neoclássica, que se encantava o com o Renascimento Italiano e com o
espírito apolíneo clássico, mas que subestimava a arte de Albrecht Dürer (1471 – 1528)
e a dos pintores rococós, a exemplo de Jean-Antoine Watteau (1684 – 1721). Nesse
sentido, não raro, nas narrativas e nos poemas de Gautier, as obras desses artistas
negligenciados foram evocadas graças a procedimentos de experimentação e de
hibridização, o que foi chamado, sobretudo na segunda metade do século XIX, de
“transposição”. Dado isso, valendo-nos da teoria de Genette (2010) acerca dos
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procedimentos transtextuais, o objetivo deste trabalho é destacar como Gautier remete a
algumas obras de Dürer em seu conto “Le Chevalier double”, publicado em 1840, além
de analisar as possíveis implicações de efeito desses procedimentos.
21
A POÉTICA DA DESTERRITORIALIZAÇÃO EM MANUEL BANDEIRA
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cinco contos de Poe que exploram, de diferentes maneiras, os aspectos do fantástico e
do grotesco. De modo similar, elegemos mais de uma dezena de contos dos Grimm que
deverão ser analisados e subsidiarão nossas comparações. Sendo assim, nosso problema
de pesquisa consiste em compreender de que modo os contos de Poe preservam certos
traços característicos dos contos de fadas tais quais os irmãos Grimm publicaram, mas
acentuando a atmosfera romântica, muitas vezes mórbida e perturbadora, por meio das
situações e representações grotescas.
Na fortuna crítica de Sense and Sensibility (1811), primeiro romance publicado de Jane
Austen, frequentemente tomou-se por certo que os termos do título compõem uma
oposição entre razão e emoção, que seria incorporada pelas irmãs protagonistas da
narrativa, Elinor e Marianne. Críticos do século XX interpretaram o comportamento de
Marianne como expressão de uma individualidade espontânea e apaixonada e
condenaram o decoro de Elinor como hipocrisia, embora a conduta desta última seja
claramente representada, na narrativa, como exemplar. Desgostosos com o enredo, tais
críticos pronunciaram a inferioridade de Sense and Sensibility no conjunto da obra de
Austen. Pretendo argumentar que essa avaliação negativa do romance está associada a
uma mudança histórica no sentido dos termos do título, que, se ainda guardavam uma
ambiguidade notável no início do século XIX, já se haviam cristalizado como uma
antítese no século seguinte. Em conjunto com a leitura do romance, o recurso a
documentos históricos como resenhas de periódicos, dicionários contemporâneos e
textos da filosofia moral britânica permite recuperar uma relação entre a faculdade
racional e as emoções que não é de conflito, mas de subordinação, em que os
sentimentos mais nobres de um indivíduo são prerrogativa da sua racionalidade, da qual
se origina a consciência moral. A reconstituição dessa perspectiva histórica do início do
século XIX evidencia que o romance sustenta uma análise rigorosa tanto no nível do
enredo quanto de sua forma e pode ser entendido não como uma defesa da primazia da
racionalidade sobre a emoção, mas como um elogio da virtude da moderação orientada
à promoção de um bem individual que só se efetiva num bem comum; Elinor, assim,
pode ser lida como uma personagem exemplar da medida virtuosa tanto de “sense”
quanto de “sensibility”, enquanto Marianne seria caracterizada por um excesso algo
histriônico que resulta em uma insensibilidade egoísta.
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DESPERTAR E AMADURECER: AS PRINCESAS ADORMECIDAS DOS
IRMÃOS GRIMM
Karina Espúrio
UNESP/Ibilce
karina.espurio@unesp.br
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Marcel Proust, nesse sentido, leva essa ideia da composição artística romanesca ao seu
ápice. As características dessa construção literária estão pormenorizadas em A teoria do
romance de Georg Lúkacs e também em O romance está morrendo de Ference Fehér.
Tendo isso em mente, a presente comunicação tem o objetivo de discutir aspectos da
criação da narrativa proustiana relacionando-a às ideias da composição romancesca de
Lúkacs e Fehér. A partir disso, pretende-se analisar como a narrativa proustiana
reverbera as imperfeições e as roturas do personagem principal no contexto histórico e
social em que ele vive.
Ao longo da história do teatro um tipo de personagem vem chamando a atenção por sua
irreverência, criticidade e deboche: o bobo da corte, ou truão. Sua relação com o riso e
com figuras detentoras do poder o autorizava a expor as mazelas sociais de tal forma
que, ou ele era considerado ingênuo ou era desacreditado pela maioria das pessoas que o
escutavam. No entanto, ao ouvi-lo atentamente, era possível perceber seu grau de
racionalidade diante das relações humanas. Dentre tantos personagens famosos de peças
conhecidas mundialmente, dois histriões chamam, particularmente, a atenção: o bufão
de Rei Lear, Fool, e Guarin, de O prodígio do Amarante, de Antônio José da Silva. Fool
denunciava o abuso, respectivamente, dos filhos que abandonam os idosos de sua
família – no caso, Lear – e os denominam loucos. Já o bobo, ou gracioso, de Antônio
José irá criticar a Igreja Católica, o fanatismo religioso e a Inquisição. Para Bakhtin
(1987), o bobo da corte seria aquele que retira a máscara das elites e expõe as mazelas
sociais, como acontece com o personagem Fool, de Rei Lear, que diz verdades ao rei. Já
Paulo Pereira (2007) comenta que, no “teatro do Judeu, o gracioso é o fio condutor das
ações, representa a consciência social e serve para pôr a ridículo os poderosos do
tempo”. Assim, pretende-se evidenciar que o bufão apresenta uma dupla função:
conseguia fazer com que as pessoas rissem, ao mesmo tempo em que denunciava a
tirania e falhas de caráter de autoridades que se portavam como intocáveis no que diz
respeito a questionamentos, tal como a figura dos monarcas, por exemplo. A
fundamentação teórica compreenderá as contribuições de Mikhail Bakhtin referentes à
carnavalização e à função cômica dos graciosos e de Henri Bergson e Paulo Pereira no
que diz respeito ao riso.
25
O ESPAÇO EM VIDAS SECAS E CONVERSAZIONE IN SICILIA: DENÚNCIA
E RESISTÊNCIA
Este texto discute alguns aspectos abordados no Ensino de Literatura no Brasil e aponta
algumas maneiras de como a Literatura deve ser trabalhada em sala de aula, em turmas
do Ensino Médio, para que haja a compreensão do aluno-leitor. Nesse sentido, coloca-se
em pauta aspectos históricos, sociais e culturais que estão presentes nos textos literários
e que são pleiteados pelo professor-mediador para o entendimento e gosto pela leitura
deleite, por parte do aluno. Assim, a pesquisa fundamenta-se em aportes teóricos
propostos por Candido (2006) que apresenta modos e conceitos sobre o estilo como o
texto literário é compreendido, através do olhar investigativo do aluno. Nesse sentido,
elucida acerca da contextualização e estilização do texto, por meio da mediação do(a)
professor(a). Conta-se também com a contribuição da autora Malard (1985) que revela
algumas razões para a aprendizagem da Literatura através da leitura crítica sobre os
textos. Nessa consonância, a metodologia utilizada nesse texto baseia-se na pesquisa
bibliográfica. Quanto aos resultados desse estudo, conclui-se que a melhor maneira de
trabalhar os textos literários para o entendimento e gosto pela leitura do aluno faz-se
pela individualização do leitor, em sala de aula, com análise, crítica, adequação,
intervenção e contextualização expressa pelo professor mediador.
26
Palavras-chave: Contextualização. Ensino de Literatura. Metodologia.
27
meados do século XVIII, por ser um influente místico, recebe na narrativa de Dumas
um papel muito destacado na condução desse importante episódio histórico, sendo
apresentado como seu idealizador. Sabe-se, pelo relato de historiadores, que faltam
indícios sobre o papel real que teve José Bálsamo-Cagliostro na Revolução. Dumas, no
entanto, como um escritor romântico, envolto pelas crenças de sua época, utiliza temas
como o mesmerismo e o poder de forças místicas para apresentar figurativamente a
Revolução em seu romance, como conclui Fizaine (1976). Para Rosenfeld e Guinsburg
(1993), o Romantismo propõe uma espécie de teosofia, fundada a partir de pensamentos
como: o idealismo, o orientalismo e o misticismo de Swedenborg. Assim, ao apresentar
a influência de sociedades secretas e de místicos como José Bálsamo-Cagliostro, Dumas
dialoga com o pensamento de sua época e interpreta, a seu modo, a Revolução Francesa.
É essa interpretação do escritor, embasada por uma espécie de romantismo místico, que
se pretende analisar a partir da leitura do romance José Bálsamo.
Palavras-chave: Artes plásticas. Costura. Literatura e outras artes. Rosana Paulino. Sue
Monk Kidd.
28
A POSTURA OSCILANTE DO NARRADOR DA ILÍADA: ENTRE OMISSÕES
E EXCESSO DE INFORMAÇÃO
O estudo em questão tem como seu corpus a Trilogia do adeus (2017), de João
Anzanello Carrascoza. Esta que é composta por Caderno de um ausente, Menina
escrevendo com pai e A pele da terra. Todas as respectivas obras têm narradores
distintos, entretanto, são membros de uma mesma família, sendo pai, filha e filho, um
ciclo familiar na escrita de diários. Em cada uma das obras supracitadas podemos
encontrar características de uma escrita diária, repleta de acontecimentos cotidianos. Os
personagens de cada narrativa buscam a realização de suas motivações por intermédio
da escrita, seja para tentar não cair no esquecimento, como o narrador de Caderno,
desabafar após a perda de um ente querido, como no caso da segunda obra, ou até
mesmo conservar as memórias afetivas entre pai e filho em uma viagem, como na
terceira e última obra que compõe a trilogia. Mantém-se um diário para ser como um
29
confidente e amigo do diarista. Neste estudo, pretendemos apontar as principais
características encontradas nas obras que nos remetem a diários íntimos, seja pela
finalidade que a escrita surge, o suporte utilizado, etc. Pretendemos mostrar também
como esses diários se encerram após cumprirem seu propósito inicial de escrita. Para
isso, utilizaremos textos de Lejeune (2014) como base para os apontamentos feitos,
entre outros.
30
OS DESDOBRAMENTOS DO ALEGÓRICO E DO FANTÁSTICO NA
CONTÍSTICA DE CAIO FERNANDO ABREU
No presente trabalho propomos a análise do conto “O ovo”, parte de seu livro de contos
Inventário do irremediável. Trabalharemos com uma perspectiva dúplice para a análise
do texto: a perspectiva da leitura alegórica, retomando o conceito de alegoria de Walter
Benjamin (1996, p. 132), no qual o texto faria alusão a aspectos do mundo extraliterário
por meio de recursos estéticos; e também levando em conta a leitura a partir do modo
fantástico e seus desdobramentos, o maravilhoso e o estranho, como os conceitua o
autor italiano Remo Ceserani (2006, p. 56). O objetivo da comunicação é traçar uma
linha a respeito de duas possibilidades de leitura: uma na qual o texto é lido como uma
situação insólita e impossível, e outra em que o conto representa uma crítica ao regime
militar brasileiro e sua consequente repressão. Objetiva-se, assim, estabelecer um
panorama crítico de leitura a partir do qual podemos chegar a conclusões a respeito do
uso da Literatura Fantástica no Brasil como possível ferramenta crítica que se dá de
forma velada.
31
A RECEPÇÃO HUGOANA NA SEGUNDA GERAÇÃO ROMÂNTICA
BRASILEIRA: A TEORIA DOS CONTRASTES E O GÊNERO DA BALADA
A pesquisa tem como objetivo analisar a recepção das Ballades hugoanas na segunda
geração romântica brasileira. O corpus se concentra na obra Odes et Ballades (1826) de
Victor Hugo em correlação às poesias de Bernardo Guimarães em Poesias completas
(1865), e Álvares de Azevedo em Lira dos Vinte Anos (1853). O gênero da Balada,
como hìbrido, flexìvel e de origem medieval (D’ONOFRIO, 1995) ressurge no
romantismo francês como um modo de contestação à poesia neoclássica. A teoria dos
contrastes presente em “Do grotesco e do Sublime” (1826) de Hugo é contemporânea ao
lançamento das Ballades, anunciando total rompimento com o modelo clássico vigente
da época. No que permite ao autor abandonar a lógica aristotélica por ousar a
construção rítmica e sonora culminando em um universo atmosférico e fantástico. A
circulação das ideias hugoanas no Brasil são oriundas de suas primeiras obras: Odes et
Ballades (1826) e sua teoria Do Grotesco e do Sublime (1843). A mediação da
inspiração moderna é feita pelos periódicos portugueses que circulavam no Brasil no
século XIX e são parte fundamental neste estudo de recepção. Em principal, o jornal O
Panorama (1837) dirigido por Alexandre Herculano, trazia ideais novos e românticos
aos estudantes da Universidade de São Paulo. Os resultados se concentraram nos
experimentalismos dos autores brasileiros com o gênero da balada retomado por Hugo.
Com Álvares de Azevedo, em Lira dos Vinte Anos (1853), com a binômia da obra
dividida por Antonio Candido como Ariel e Caliban (CANDIDO, 1981). E Bernardo
Guimarães com a balada “A Orgia dos Duendes” em que realiza um máximo
experimentalismo do gênero ao combinar cultura popular medieval, elementos da fauna
e flora brasileira e ressonâncias da Ballade de Hugo “La ronde du Sabat”.
32
sereia e sua vinculação com a morte. Nesta comunicação, abordaremos a disseminação
da narrativa Inuíte sobre Sedna ao redor do Ártico e extremo norte da Europa, suas
relações com personagens lendárias como Rusalka e seus reflexos em A Sereiazinha, de
Hans Christian Andersen. Ainda que superficialmente, procuraremos distingui-las de
outras, de origens diversas, como as sereias gregas, Melusina e as mouras portuguesas
em cavernas com serpentes. Deixaremos, por enquanto, de aprofundar elementos
relativos à difusão dessa mesma narrativa ao longo das Américas até seu extremo sul, na
Terra do Fogo, em mitos do povo Selk-nam, por envolverem diferentes processos de
disseminação, especialmente a fusão e a divisão. Procuramos conjugar diversas teorias
sobre estruturas narrativas (Propp, Barthes, Bowra), bem como teorias antropológicas
aplicáveis às narrativas (Dumézil, Eliade, Lévi-Strauss, entre outros), além da aplicação
de elementos de semiótica (principalmente sobre imagens, mas não somente elas), a fim
de elaborar um aporte teórico que nos permitisse, não situar as narrativas num tempo
cronológico, mas ao menos auferir a anterioridade de umas em relação a outras,
basicamente por meio de oposições como “humano X divino”, “natural X sobrenatural”,
“xamanismo X religião de Estado”, aplicadas a personagens.
33
Palavras-chave: Autoficção. Eu. Günter Grass. Literatura alemã. Narrativa.
Produzindo críticas literárias e teatrais com a mesma grande frequência com que
escreveu contos e poemas, o escritor norte-americano Edgar Allan Poe (1809-1849) não
apenas cumpria importante papel, dividido com outros jornalistas de seu tempo, de
difusor das produções nacionais, como também se comprometia com a defesa de uma
nova estética para a literatura produzida nos Estados Unidos. Nesse exercício crítico,
sua defesa de uma específica forma dramática para o teatro nacional encontraria
consonância com suas próprias concepções para a criação literária. Reconhecendo a
relevância do teatro para o desenvolvimento sociocultural de um país, Poe defenderia,
em importantes ensaios como “O drama americano” (POE, 1984) e “A filosofia da
composição” (POE, 1999), ambos publicados em 1845, uma estética mais realista e
mais ligada ao referencial da vida americana, além de práticas “menos corruptas” por
parte dos críticos de teatro. Numa tentativa de integrar o conjunto de sua obra teórica, o
objetivo desta comunicação é pôr em diálogo os mencionados ensaios. Como resultado,
observamos que o conceito de “unidade de efeito” – princípio axiológico norteador dos
procedimentos trabalhados em uma obra literária defendido por Poe para a escrita de
seus contos e poemas – exerceu grande importância em suas ideias sobre a definição do
drama. De fato, a noção de “situação teatral” (PAVIS, 2011), sobretudo em seu sentido
unificador de temas e efeitos, tem lugar na interpretação de alguns importantes
conceitos da obra crìtica do escritor, por ser análoga à “unidade de efeito”. A busca do
tom, da atmosfera, por fim, de um efeito generalizado, a partir de elementos cênicos
específicos é fundamental ao estabelecimento do clima teatral na forma dramática,
sobretudo, dentro da concepção poeiana de formação de um teatro nacional.
34
escritor alemão, o poder que ela exerce sobre a personagem de Fausto e também sobre o
cenário, que é um elemento importante na criação de Goethe. O conceito atrelado à
presença da “mater gloriosa” será de extrema importância para a análise da cena final de
Fausto, juntamente com a impossibilidade de vivenciar a experiência do amor após o
acordo feito com Mefistófeles nas primeiras cenas do Fausto I. A religião, que ocupa
lugar importante na construção do cenário, será enfocada como elemento importante
para a tecitura do enredo goetheano, uma vez que ao apresentar uma abordagem
cirúrgica a respeito do assunto, traz em cena inúmeras contradições que afligem a alma
dos personagens.
Considerado o chefe da prosa brasileira romântica de ficção, José de Alencar foi, além
de ficcionista, jornalista e político, um escritor em constante inquietação sobre questões
de teoria e crítica literária. Em 1846, ainda estudante de Direito, ajudou a fundar a
revista Ensaios Literários, onde, em 1850, publica “O Estilo na Literatura Brasileira”.
Embora pouco estudado pela fortuna crítica, é nesse ensaio incompleto que o jovem de
21 anos começa a desenvolver sua reflexão teórico-crítica em torno do estilo na
literatura brasileira. No artigo, Alencar traça um programa para o futuro desdobramento
de sua atividade literária, discutindo, entre outros aspectos, as implicações dos estilos
clássico e moderno na composição da literatura nacional. Seis anos depois, após
passagem pelo Correio Mercantil e já na condição de redator-chefe do Diário do Rio de
Janeiro, o escritor retoma a discussão, vendo na publicação de A Confederação dos
Tamoios, de Gonçalves de Magalhães, a grande oportunidade de exercer o seu espírito
crítico e inscrever-se definitivamente no quadro das letras do país. De folhetinista
desconhecido, Alencar passa a principal desafeto do já consagrado autor de Suspiros
Poéticos e Saudades e de seu patrocinador, o imperador Dom Pedro II. Embora não
pretendesse escrever propriamente um juìzo crìtico, mas apenas registrar “impressões de
leitura”, a reação de Alencar ao poema de Magalhães vai figurar como “a maior
polêmica literária do romantismo” (MARTINS, 2003, p. 99) e, ainda, como um dos
textos de natureza crítica mais importantes da época. Assim, tomando por base o ensaio
O Estilo na Literatura Brasileira e As cartas sobre A Confederação dos Tamoios, o
objetivo desta comunicação é discutir como Alencar pensou os diferentes gêneros e
estilos em voga, contribuindo, como crítico e teorizador, para o processo de renovação
estética da literatura brasileira da qual era, senão precursor, um de seus principais
iniciadores.
35
IDENTIDADE E AUTO AFIRMAÇÃO NO HERÓI PROBLEMÁTICO DE DOM
CASMURRO DE MACHADO DE ASSIS
36
traços da identidade do país anfitrião, observando-se os elementos da identidade cultural
estadunidense assimilados por pessoas de identidade cultural diferente que buscam o
sonho americano, sem recursos financeiros, sem educação formal adequada e sem
proficiência em inglês, em um momento histórico, marcado pela crise hipotecária de
2007 e eleição de Barack Obama em 2008. Será observada a relação entre os aspectos
formais e interpretativos, a construção dos personagens e de suas identidades
amalgamadas. Para elementos envolvidos na representação de uma identidade cultural
dos Estados Unidos da América, bem como a assimilação destes por parte dos
personagens imigrantes, são utilizados Karnal (2010), Harari (2018) e De Masi (2013),
a tese de liquidez e de identidades includente e excludente de Bauman (2001; 2005),
Figueiredo e Noronha (2005), Evangelista (2006) e Jameson (1996). Observa-se que
existe uma transformação na identidade desses imigrantes, que não conseguem
simplesmente apagar as marcas genéticas e históricas de sua cultura de origem, e
tampouco conseguem fluir de maneira natural, desempenhando o comportamento dos
estadunidenses nativos. Esses “neoamericanos” encontram-se em um lugar identitário
fronteiriço, entre o que eles eram e o que eles querem ser.
37
Utilizaremos, como base teórica, os trabalhos de Meyer (1996), Wyler (2003),
Simionato (2009), Godoi (2010) e Silva-Reis (2012, 2015).
Alexandre Marroni
UNESP/FCL
alexandremarroni@hotmail.com
38
inúmeros escritores respeitados, recebendo destaque o jovem Machado de Assis. Tal
fato é evidenciado a partir da leitura da obra A trajetória de Machado de Assis: do
Jornal das Famílias aos contos e histórias em livros, também de Sílvia Azevedo. Com
efeito, O Jornal das Famílias serviu de suporte para o conto “Virginius: narrativa de um
advogado”, de Machado, o qual foi publicado pela primeira vez em 1864. A leitura do
periódico através do site da Biblioteca Nacional (Hemeroteca Digital) é de suma
importância para o conhecimento na íntegra da primeira aparição do conto. Este, por sua
vez, ilustra a irreverência e a coragem do escritor, à medida que abordou a questão da
escravatura em plena escravidão no Brasil. Abordar a escravidão no Brasil sempre foi
muito comum nas obras machadianas e John Gledson, em Machado de Assis: ficção e
história, evidencia esta postura do escritor. Por isso, é necessário apresentar um breve
resumo do enredo, a fim de que o leitor consiga se ambientar com a história e
compreender o objetivo principal do artigo: evidenciar a ironia utilizada pelo autor no
referido conto ao abordar a temática da escravidão.
Palavras-chave: O morro dos ventos uivantes. Século XIX. Século XX. Tradução.
39
NARRADOR E FOCO NARRATIVO: TEORIA E APLICAÇÕES NO
ROMANCE AS VISITAS QUE HOJE ESTAMOS, DE ANTONIO GERALDO
FIGUEIREDO FERREIRA
A pesquisa visa estudar o narrador e o foco narrativo, desenvolvendo uma análise acerca
de suas características, suas funções e seus efeitos, aplicada, especificamente, à obra As
visitas que hoje estamos (2012), de Antonio Geraldo Figueiredo Ferreira. A base da
pesquisa se dá nas concepções de Norman Friedman (2002), Gérard Genette (1972) e
Jean Pouillon (1974), principalmente, sobre as funções do narrador e do foco narrativo
no romance. Investigaremos as características do narrador e da focalização, seus efeitos,
funções e possibilidades de perspectivação a partir da análise do romance "As visitas
que hoje estamos" (2012), que é rico em possibilidades de perspectivação narratológica
e focalização narrativa, principalmente no que diz respeito à sua forma fragmentada e às
múltiplas vozes que o compõem. A metodologia escolhida para este trabalho será a da
abordagem imanentista do texto, que se dá no processo analítico-descritivo do romance.
É claro que, a partir do texto, uma série de relações extratexto se apresentam como
possibilidades férteis de leitura do romance. Sendo assim, a abordagem imanentista é,
de fato, um norte e um comportamento diante do texto literário, porém, entendo a
necessidade de que, uma vez que o texto tenha sido estudado e todas as possibilidades
de leitura a partir das relações externas a ele tenham sido verificadas, tais relações
externas só fazem enriquecer a leitura e o papel do texto literário.
A presente comunicação tem como objetivo apresentar uma rápida análise de como as
personagens Eugene de Rastignac e Lucien de Rubempré, durante suas trajetórias nos
romances os quais são personagens centrais, se aproximam e ao mesmo se distanciam
da figura do dândi apresentada por Charles Baudelaire no ensaio “O pintor da vida”:
homens que não tem outra ocupação a não ser a de cultivar o belo em sua pessoa, de
satisfazer às suas paixões, desse modo o dândi dispõe, a seu bel-prazer de grande
quantidade de tempo e dinheiro, sem os quais, sua fantasia seria reduzida a apenas um
devaneio, sem a possibilidade de pô-la em ação; o dandismo seria uma espécie de culto
de si mesmo, capaz mesmo de sobreviver à busca pela felicidade a ser encontrada em
outrem. Tendo essa definição em mente, seria possível, ao observar o enredo dos
romances que protagonizam, traçar certos traços da personalidade e atitudes tomadas
tanto por Rastignac quanto Rubempré que podem ou não ser enquadradas na concepção
40
de dandismo apontada pelo poeta francês. Para esse objetivo serão levados em
consideração as trajetórias e o comportamento de ambas personagens, de modo a
verificar de que maneira se aproximam e se distanciam da definição que Baudelaire faz
em seu ensaio, levando em conta principalmente a questão do dinheiro e da ascensão
social que permeia essas obras, e de como isso afeta diretamente o modo como essas
personagens interagem com as outras personagens e o mundo social que as cercam.
Reconhecido por seus inúmeros contos de fadas, alguns adaptados outros originais, é
fato que Hans Christian Andersen tenha um estilo próprio, marcado pela estética
romântica alemã e pelos preceitos cristãos, acrescidos, por outro lado, de elementos da
cultura popular em um amálgama do folclore nórdico, ou seja, o imaginário cristão
entrelaça-se ao maravilhoso pagão, ambos embebidos, conforme aponta Nelly Novaes
Coelho (1991), em uns “húmus humanìstico que energiza sua criação novelesca”. Um
bom exemplo de tão hìbrido estilo é o conto “A Rainha da Neve” (Snedronningen, The
Snow Queen, 1844), uma narrativa de formação de tessitura complexa e instigante que
se revela um rito de passagem da infância para a vida adulta, em uma analogia para os
primeiros contatos com a sexualidade. Essa obra, além de dialogar com narrativas
míticas e inspirar um variado leque de releituras e adaptações, tanto literárias quanto
audiovisuais, ainda, em um processo intratextual, referencia outros contos andersianos,
como “Sapatinhos vermelhos”, “A donzela de gelo”, “Jardim do Éden”, “A menina que
pisou o pão” e “O companheiro de viagem”. Propomos, nesta comunicação, analisar,
por meio dos estudos comparados, os diferentes diálogos intertextuais e intratextuais
dos contos andersianos a partir do conto “A Rainha da Neve”, como parte de nossa
pesquisa de pós-doutorado “Releituras do maravilhoso: A Rainha da Neve, de Hans
Christian Andersen, suas figurações e múltiplos diálogos”, finda em 2020.
41
um final reticente, uma estrutura temporal alinear, um enfoque maior no acontecimento
narrativo, além de se dedicar aos enredos que tratam da vida cotidiana e de se debruçar
sobre a sondagem psicológica do personagem a partir da reverberação que a vivência do
acontecimento narrado provoca no íntimo, sobretudo, do protagonista. Tais reflexões
interiores são tão intensas e profundas que, muitas vezes, a narrativa parece não
prosseguir, no entanto tal escolha advém da preferência do escritor em produzir contos
que se desenvolvam de maneira vertical, ou seja, que se concentrem nas percepções e
reflexão das personagens, não buscando desenvolver narrativas que se projetem
horizontalmente por meio de uma sequência de ações executadas. Além dessas novas
perspectivas assimiladas pelo escritor em questão, na sua produção literária contística
também se nota a presença da hibridez literária, na medida em que Tchekhov borra os
limites entre os gêneros literários e propicia uma narrativa poética que se consolida pelo
uso de uma linguagem figurada, pela criação de certas imagens poéticas e pelo trabalho
com a linguagem na revelação dos afetos, impressões e percepções do protagonista.
Neste conto, por exemplo, o lirismo está na construção da linguagem e da própria
paisagem que compõe o cenário e interfere na atmosfera textual. O embasamento
teórico desse trabalho será: Bachelar (1989), Freedman (1971), Moisés (1968), Ogliari
(2014) entre outros.
42
conjuntura sócio-histórica brasileira do século XIX, demarcada pelas teorias em torno
do alcoolismo, da loucura consequente e pelas campanhas de modernização e
higienização social, especialmente no ambiente da cidade do Rio de Janeiro.
43
TRAÇOS DO MARAVILHOSO EM JOGOS VORAZES, DE SUZANNE
COLLINS
É possível que obras literárias contemporâneas, como Jogos vorazes, conservem traços
do maravilhoso? Nas histórias desse universo, tal como teorizado por Todorov (1969;
1975), para quem o maravilhoso é um gênero literário vizinho do fantástico e do
estranho, acontecimentos e seres sobrenaturais são aceitos desde o princípio como
normais pelos personagens e pelo(s) leitor(es), visto que estão integrados à realidade do
mundo diegético, regido por leis diferentes das nossas. Com isso, podemos dizer que o
maravilhoso possui uma lógica própria, uma vez que o sobrenatural é parte integrante e
essencial da ordem interna de cada história. Em suma, esse gênero se caracteriza “pela
existência de feitos sobrenaturais, sem implicar a reação que provocam nos
personagens” (TODOROV, 1975, p. 53). Marinho (2009), em expandindo esse
conceito, considera o maravilhoso como um gênero narrativo, que, além de possuir uma
lógica própria, configura um modo específico de narrar, neste caso, a estrutura
identificada por Propp (2010, p. 90) em seus estudos a respeito do conto maravilhoso:
“todo desenvolvimento narrativo que, partindo de um dano (A) ou uma carência (a) e
passando por funções intermediárias, termina com o casamento (W0) ou outras funções
utilizadas como desenlace”. Enfim, o maravilhoso surgiu primeiro nos mitos. Em
seguida, floresceu nos contos de fadas, desdobrando-se em outras formas literárias,
como a ficção científica, com o passar dos séculos. Por essa razão, esse gênero pode ser
visto como um repositório que reúne em si diferentes fenômenos literários (e até mesmo
cinematográficos). Com efeito, conto de fadas e ficção científica compartilham diversas
afinidades, como a presença do sobrenatural aceito, da indeterminação temporal e
espacial e do modo único de contar histórias, singularizado pelas funções proppianas.
Nesta apresentação, objetivamos mostrar como esses elementos são recuperados e/ou
atualizados, por Suzanne Collins, no plano narrativo do romance Jogos vorazes.
44
oportunidades oferecidas por este gênero, sobretudo o uso obrigatório da ironia,
parecem estar na raiz da formação do estilo de futuros romancistas como Camilo
Castelo Branco e Machado de Assis, que, em seus anos de juventude, escreveram
poemas herói-cômicos, respectivamente “A Murraça” e “O Almada”. A autoconsciência
metalinguística, tão importante para a poesia de corte herói-cômico sobrevive nas obras
posteriores desses autores. Da mesma forma, a enorme quantidade de poemas herói-
cômicos em língua portuguesa já catalogados e ainda por identificar, revela um
ambiente de receptividade em certa medida “elitista” que pode ajudar a reavaliar a
maneira como se entende a evolução da narrativa oitocentista no universo da língua
portuguesa, assim como de suas práticas de leitura.
45
O PECADO ORIGINAL E A QUEDA SOB A ÓTICA DE DOSTOIÉVSKI EM
“O SONHO DE UM HOMEM RIDÍCULO”
Dostoiévski é mais conhecido pelos grandes romances, mas também se aventurou, com
sucesso na narrativa curta e fantástica, a última uma inspiração assumida para autores
como Kafka. Um bom exemplar dessa vertente “O sonho de um homem ridìculo”,
publicado em 1877 no Diário de um Escritor. Nesta obra, o escritor russo nos brinda
com uma interpretação pessoal de dois motivos recorrentes da mitologia cristã: o
Pecado Original e a Queda, questões que possuem relação direta com as recorrentes
críticas do autor à Modernidade e às utopias racional e científica, que configuram uma
postura de humanismo ridículo, que, não raro, vai desembocar no niilismo e na ideia do
suicídio lógico. Usando como ferramenta de apoio as reflexões críticas do filósofo
existencialista Léon Chestov, no livro As Revelações da Morte, o objetivo da presente
comunicação é associar o arcabouço mitológico que estrutura o conto com a crítica
filosófica e religiosa aos hábitos de uma sociedade corrompida pelo orgulho e a
autossuficiência, fruto de um projeto de dessacralização e autodeificação, que se afigura
como uma segunda e constante Queda. O protagonista do conto, denominado
simplesmente como “Homem Ridìculo”, passa do desespero da condição de cético para
a de portador de uma revelação que lhe foi concedida por meio de um sonho misterioso,
cuja mensagem pode levar a humanidade tanto à salvação quanto à perdição definitiva.
Este trabalho pretende, por meio de uma leitura do texto crítico “A filosofia da
composição”, de Edgar Allan Poe (1809-1849), analisar três contos desse autor:
“Berenice”, “Ligeia” e “Morella”. Nesses contos, as personagens femininas são
componentes fulcrais da narrativa. Considerar-se-á, também, à luz do texto teórico, o
modo como Poe compôs essas obras. Além de, é claro, comentarmos a poética do autor
e a maneira como as personagens femininas aparecem inseridas nela. Edgar Allan Poe,
por meio do pleno domínio de suas proposições teóricas, faz de seus contos um
laboratório para a experimentação de novas técnicas e para a construção de efeitos de
sentido. Além disso, frisa-se a reiteração dos recursos preferidos do autor, como a
repetição, as epígrafes retomadas no interior da narrativa por meio de diálogos e
digressões narrativas, bem como a simbologia de nomes. O autor elabora em detalhe
seus contos, fazendo com que esses seres de papel, poliédricos e especulares, possam
ser lidos como facetas do próprio artífice atormentado. Poe constrói arquitetonicamente
seus contos, enlaçando suas personagens num enredo cuidadosamente construído. Desta
46
forma, essas personagens, por meio de suas atormentadas histórias, revelam-se
extremamente complexas; são mulheres que, ao mesmo tempo, sofrem agruras pelas
mãos de seus amados e empunham a maça com a qual os fustigam – nem sempre do
além-túmulo. Berenice, Morella e Ligeia apresentam-se, pois, como personagens
enigmáticas e especulares, exatamente da maneira pela qual viria a ser conhecido o
atormentado e sensível Poe.
47
A RELAÇÃO ENTRE A LITERATURA E O MAL EM “A MORTE DE
BALDASSARE SILVANDE, VISCONDE DE SYLVANIE” (1894), DE MARCEL
PROUST
A relação do homem com o mal encontra na literatura um subterfúgio para que possa
expressar-se livremente, sem o pré-julgamento dos conceitos, da razão ou do
empirismo. Em uma carta a seu amigo, da entrega de seu livro de contos, o escritor
francês, Marcel Proust, nos revela que a inspiração para a vida não seria de ordem da fé
ou do gênio, mas sim seria a própria morte. A presente comunicação tem como objetivo
analisar o conto “A morte de Baldassare Silvande, visconde de Sylvanie”, de outubro de
1894, com o intuito de analisar a relação do homem com o mal diante da sensação da
aproximação da morte e da experiência mística. O conto inaugura o livro Os prazeres e
os dias, coletânea de narrativas breves que Proust publicou em 1896, e conta a história
de um homem que se encontra em face com o próprio anúncio de sua morte e que
começa a ponderar sobre o tema, inebriado por uma febre intensa e uma decepção
amorosa, e em consonância com o conteúdo da carta citada, questiona a necessidade do
Mal para o Bem. A esse respeito, serão utilizadas as considerações de George Bataille
acerca da relação entre a literatura e o mal, mais especificamente, como a literatura é o
campo da expressão da experiência mística, folha em branco na qual o ser humano é
capaz de esgotar suas ponderações existenciais. Temos então contato os caminhos que
Proust já começava a percorrer antes da escrita da sua obra monumental, já mostrando
sua crítica à sociedade da época e seus questionamentos acerca da vida.
48
intertextualidade com o texto de Brontë, sabemos que trata-se de Rochester. Nesta
comunicação, propomos uma leitura crítica do romance, sob a perspectiva do
isolamento físico e psicológico que a protagonista é submetida, como também abordar
questões como o exílio e o sentimento complexo da “procura por um lar e um lugar ao
qual pertencer”, como aponta Eleani Savory, em Cambridge Studies in African and
Caribbean Literature – Jean Rhys (1999), reforçando tal sentimento como uma das
facetas da cultura caribenha que Rhys reflete em sua protagonista. Além disso,
pretendemos pontuar como a personagem, apesar de reforçar e imprimir uma nova
forma de representação feminina, ainda acaba por ser silenciada ao final da narrativa, e
dialogar com a leitura crítica de Savory do romance de Rhys.
L’Écume des jours é uma obra em prosa do escritor, cantor e artista francês Boris Vian,
publicada em 1947, e considerada pela crítica como sua obra prima, que conta a história
de amor entre dois jovens – Colin e Chloé. Esta adoece após o casamento – descobre-se
que tem um nenúfar no pulmão. Após o conhecimento deste fato, Colin volta todos os
seus esforços – e sua fortuna – para tentar curá-la, contudo, em vão. Para Bens (1963),
as invenções do autor nada mais são do que tentativas de mostrar que a língua não passa
de uma convenção, a qual funciona com o mesmo tanto de opacidade que suas próprias
invenções. Ressalta o caráter absurdo da linguagem do autor francês e coloca em
questão não somente o problema do convencional na linguagem, mas demonstra,
através da realização de exercícios verbais, a sociedade tal qual é concebida pelos
homens, isto é, com virtudes e vícios de linguagem. Tadié (1994) apresenta as
características das narrativas ditas poéticas, as quais, como o nome já evidencia, trazem
aspectos estruturais da prosa e, também, da poesia. Isto se deve ao fato de que este tipo
de narrativa possui a ficção proveniente do romance; no entanto, ao mesmo tempo, os
processos narrativos remetem à poesia, seus efeitos e modos de ação. É especificamente
no trabalho com a linguagem que o caráter poético da narrativa é revelado. Demonstrar-
se-á, aqui, de forma breve, de que maneira isto pode ser verificado na prosa de Vian,
isto é, por meio do aparecimento de sucessivas imagens, da musicalidade e do ritmo,
assemelhando-a a um longo poema em prosa. Nela, a função poética volta a atenção
para a mensagem e, como ocorre no poema, os eventos mencionados são esvaziados de
sentido, uma vez que o foco está no trabalho com a própria linguagem.
49
QUESTÕES CONCEITUAIS ACERCA DO ESPAÇO NO ROMANCE
HISTÓRICO BRASILEIRO
50
sentido essa incorporação resulta, interessa-nos, nesta comunicação, investigar como o
diálogo com o cinema não se encerra no romance brasileiro na década de 1930, de
maneira a identificar como ele se manifesta, particularmente, no romance Caminhos
Cruzados, de Erico Verissimo. A construção de Caminhos Cruzados remete a aspectos
de uma linguagem cinematográfica, com uma narrativa sincopada e fragmentária. Além
disso, constitui-se de frases que revelam uma escassez de conjunções, o que se traduz
em construções justapostas e em paralelo – aos moldes da montagem do cinema. A
partir disso, procuraremos demonstrar como a constituição formal do romance revela
traços de experimentalismo linguístico, unido à incorporação de procedimentos da
linguagem cinematográfica, para problematizar o fator social.
A relação entre Literatura e Dança está presente nas falas de alguns teóricos da
Literatura. Um desses exemplos é Paul Valéry: segundo o poeta e crítico francês (2011),
a dança não consiste em um entretenimento frívolo ou algo apenas limitado a algumas
performances para a diversão das pessoas que a contemplam ou que dela participam;
mais do que isso, é poesia da ação geral dos seres vivos, pois ela desenvolve
características essenciais dessa ação, transformando o corpo dançante em objeto.
Octavio Paz (2014) também estabelece aproximação entre essas duas linguagens
artísticas, afirmando que a relação entre ritmo e palavra poética não é diferente da
existente entre dança e ritmo musical. Dessa maneira, a partir da noção da dança como
atividade rítmica e parte da cultura corporal dos sujeitos, conforme expressam os
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) de Educação Física (2009), a proposta deste
trabalho é discutir de que forma as disciplinas de Literatura e Educação Física podem
estabelecer relações dialógicas para pensar questões como ritmo, corpo e linguagem
poética dentro de suas práticas pedagógicas para o Ensino Médio, além de possibilitar o
despertar de interesse dos alunos pela Literatura. O diálogo entre as disciplinas de
Educação Física e Língua Portuguesa se relacionam, pois, ainda de acordo com os
PCNs (2009), a grande área de Linguagens se compõe das disciplinas de Artes,
Educação Física, Língua Portuguesa e Língua Estrangeira. Assim, o objetivo deste
trabalho é apresentar uma possibilidade de atividade didático-pedagógica para
professores, considerando como público-alvo o segundo ano do Ensino Médio. Para
fundamentar nossa proposta didática, utilizaremos referenciais teóricos que aproximam
a dança do fazer literário, tais como Valéry (2011) e Paz (2014), além dos PCNs (2009)
de Língua Portuguesa e Educação Física, documentos norteadores oficiais que servem
de apoio ao planejamento de aulas e ao desenvolvimento do currículo escolar.
51
ÁLVARES DE AZEVEDO E AS IMAGENS UTÓPICA E DISTÓPICA NOS
SONETOS “UM MANCEBO NO JOGO SE DESCORA” E “AO SOL DO MEIO-
DIA EU VI DORMINDO”
A utopia traduz-se por uma imagem de um lugar perfeito, recriado por Thomas More
(2015) em seu livro cujo título é A Utopia, e onde o mesmo autor assume que o
significado da palavra utopia está na ausência de um espaço físico na realidade. De
qualquer maneira, a ideia de perfeição, seja enquanto espaço, seja enquanto tempo, seja
enquanto imagem, permeia o desejo humano de viver algo melhor do que a realidade
permite. Durante o Romantismo no Brasil, a utopia parece encontrar eco livre para a
criação e a propagação de sua imagem perfeita, sendo os poetas ultrarromânticos um
indicativo de que a procura pela utopia fazia sentido diante de um mundo que a negava.
Beatriz Berrini (1997) já tratava da utopia romântica como forma de expressão e de
busca dos poetas, uma vez que eles procuravam ora no retorno à infância, ora na morte
o encontro do universo perfeito. No entanto, como fala Russel Jacoby (2007), em livro
que não trata do Romantismo, a utopia não pode existir sem a distopia, não porque essa
é seu contrário, mas porque há uma espécie de dependência entre ambas. E nós
acrescentamos que a distopia e a utopia estão em constante diálogo, posto que a distopia
responde pelo tempo e pelo espaço imperfeitos. Quando os ultrarromânticos pensam a
utopia em seus poemas, se abrem para a representação da distopia enquanto um real no
qual sobrevivem. Refletindo sobre a distopia no ultrarromantismo, o presente texto tenta
entender como a imperfeição é recriada em dois sonetos de Álvares de Azevedo (2011),
no livro Lira dos vinte anos: “Um mancebo no jogo se descora” e “Ao sol do meio-dia
eu vi dormindo”.
Partindo da leitura de O morro dos ventos uivantes, costurado por uma perspectiva
marxista, o trabalho ressalta a estética narrativa vanguardista de Emily Brontë e seus
reflexos no resultado literário do romance. Para tanto, como objetivo geral, buscou
estudar a forma literária do romance do século XIX, analisando o espaço e a
mentalidade social em que a obra foi gestada. Também, visou confrontar os tempos do
enunciador e o da enunciação como estratégias para o desdobramento da narrativa, sob a
forma de memórias, apontando elementos estéticos como demarcadores das relações de
poder, tanto refletidos na linguagem, quanto na estrutura do romance, demonstrando,
assim, o uso da memória como meio de captação de tempo e espaço específicos e o
modo como as relações de classe são experienciadas, legitimadas e perpetuadas. As
escolhas metodológicas valeram-se de ampla pesquisa bibliográfica relativa ao tema,
52
reportando-se a outras obras literárias como contraponto, sob o crivo do pensamento
marxista como também de autores posteriores que se vincularam a Marx, através de
desdobramentos de suas teorizações. Como resultado, a título de contribuição
acadêmica, apresenta uma visão sobre a propriedade privada como constituinte de
identidades e propõe um conceito-chave, o de empoderamento narrativo, que se estende
para qualquer obra literária que tenha sido produzida em contextos históricos nos quais
há silenciamento de falas; nos quais há luta pela igualdade civil; ou nos quais se vive
em regimes opostos ao Estado democrático de direito. Eagleton, Marx, Engels, Federici,
entre outros, proporcionaram o embasamento deste trabalho.
Esta comunicação tem como objetivo abordar as relações entre a cultura presente na
literatura oral, registrada por Luís da Câmara Cascudo, e o registro das produções orais
na obra Macunaíma, de Mário de Andrade. O livro, publicado pela primeira vez em
1928, em um Brasil que aspirava pelos ideais modernistas, que utiliza do folclore para
lançar seus rompantes artísticos, traça sérias críticas e profundas reflexões sobre o povo
brasileiro e o cenário nacional. Em sua narrativa, Mário de Andrade traz, por meio de
mitos e símbolos presentes, diversos conceitos sobre o folclore brasileiro, compilados
por Câmara Cascudo em seus trabalhos sobre a cultura nacional, embasados em
pesquisa séria a profunda dos usos e dos costumes, num entendimento da importância
do registro do folclore e de sua relevância para as práticas sociais. O diálogo entre obras
e autores, estabelecido por esta investigação, propõe uma reflexão acerca da
materialização dos saberes populares aplicados nos estudos e observações de caráter
mais erudito. Ainda nesse eixo de considerações, há um profundo interesse em discutir a
diversidade cultural brasileira através da personagem Macunaíma, que, ao ser destituída
de caráter, acaba apresentando várias possibilidades que parecem personificar a
miscigenação, os regionalismos e a pluralidade de costumes presentes no cenário
nacional. Compreendemos que a obra de Mário de Andrade, ao tratar de elementos
folclóricos, estabelece ligação com os registros realizados por Luís da Câmara Cascudo,
mostrando-se fundamental para a demonstração da identidade nacional e para o registro
histórico e comportamental da sociedade brasileira.
53
UTILIZAÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL HISTÓRIAS EM QUADRINHOS
COMO SUPORTE PEDAGÓGICO
54
presentes na obra do século XIX e que não reaparecem na do século XX. A conclusão
foi que a sociedade, sobretudo os adultos, são parte do processo de formação
balzaquiano e o fim do processo significa justamente a capacidade de bem viver na
sociedade. Entretanto, as mudanças dos problemas mundiais de um século para o outro
exigiram narrativas distintas. Isso explica o porquê de Um Retrato do Artista quando
Jovem não compartilhar as características do Bildungsroman, como a transformação da
criança em um adulto, mas ter características do Künstleroman, com a transformação do
jovem em um artista. Dessa forma, O Pai Goriot¸ de Balzac, é representante do século
em que a árvore Bildungsroman ainda possuía galhos vivos enquanto Um Retrato do
Artista quando Jovem, ao lado de outros romances do mesmo período, são galhos
mortos dessa árvore centenária.
55
A PERSONAGEM EMÍLIA E SEU AUTOR: UM ESTUDO DOS VÍNCULOS
EXPRESSOS
A presente apresentação tem como objetivo tecer uma análise de lances marcantes da
obra Leite do peito, de Geni Mariano Guimarães, primeira escritora negra
contemporânea a publicar um livro individual, com esta investigação será possível
evidenciar a importância da narrativa memorialística na literatura negra. Para tal feitura
foram selecionados três episódios que marcam o livro, são estes; “Primeiras
lembranças”, “Fim dos meus natais de macarronada” e “Força flutuantes”, que se
destacam ao revelar a aguda consciência de sua negritude que a menina Geni tinha ainda
com poucos anos. Com tal seleção é possível observar o amadurecimento da
personagem, em uma espécie de romance de formação, escolhendo instantes
significativos, que perpassam do primeiro contato com o preconceito – mesmo que não
direcionado diretamente a ela - até seu amadurecimento físico e sentimental, ao relatar o
ingresso como professora. Para contextualizar essa pequena jornada pela obra será feito
também algumas ponderações sobre a cultura brasileira e o local do negro na literatura
brasileira, seja assumindo a função de autor ou de personagem. Assim, para construção
desta apresentação será fundamental como baliza teóricas textos de Conceição Evaristo,
56
“Literatura negra: uma poética de nossa afrobrasilidade” e “Escrevivência da Afro-
brasilidade: história e memória”, além de composições voltadas para fortuna crítica de
Geni Guimarães, como textos de Omar da Silva Lima, como “O feminino negro em
Leite do Peito”.
Para Bakhtin (2011), o grande tempo da literatura é um todo composto por pluralidades
de cosmovisões temporais, as quais orientam o espaço e a cultura. Na prática, o conceito
ampara a análise das relações dialógicas existentes entre textos produzidos em
diferentes cronotopos. À luz dessa acepção, objetiva-se verificar a presença do erotismo
libertino em “Memórias de um leque”, de Júlia Lopes de Almeida (1862-1934),
pertencente à coletânea Corpo descoberto: contos eróticos brasileiros – 1852-1922
(MORAES, 2018). O conto foi escolhido por apresentar interdiscursividade ligada à
estética literária libertina, com os romances O sofá ([1742] 2011), do francês Crébillon
Fils; e A autobiografia de uma pulga ([1885] 1991), do inglês Stanislas de Rhodes. Em
ambos, a narrativa é contada por vozes inusitadas: um sofá e uma pulga. Já no conto
brasileiro, o narrador é um leque. Vale ressaltar que, na época em que o conto foi
escrito, era raríssima a presença de uma mulher nas letras nacionais. Desse modo,
apesar do reaproveitamento do mote, nota-se uma subversão do cânone libertino quanto
à assinatura feminina. Ademais, em função da adequação à austeridade moral do fim
dos oitocentos – enfaticamente quanto às mulheres –, o erotismo se dá por alusão, como
ocorre com o leque, em analogia ao falo. Logo, a associação é tácita e construída nas
entrelinhas, as quais sussurram o que não pode ser dito. Assim, no questionamento ao
cânone, entrevê-se uma busca pela emancipação feminina na literatura brasileira do
século XIX. Sobre o arcabouço, serão utilizadas as reflexões de Bakhtin (2011) e os
estudos de Maingueneau (2010). Quanto à abordagem, a metodologia é exploratória,
qualitativa e bibliográfica. Ao final, espera-se ter observado como a potencialidade
artística atemporal da literatura, dada pelo grande tempo, permite o renascimento de
obras produzidas em diferentes cronotopos para que possam ser lidas em quaisquer
contextos históricos.
57
A SIMBOLOGIA DOS ANIMAIS E O MARAVILHOSO NOS CONTOS
“FORTUNIO” E “A PRINCESA SISUDA”: DE STRAPAROLA A CÂMARA
CASCUDO
58
não tem história, pois ele chama sobrevivência o que é de fato apenas um combate
estéril e estagnado.” (PARÉ, 1994, p.21). Além desses, fruto de décadas de experiência
do estudioso canadense, outros temas são tratados com profundidade, como as
estruturas da exclusão que ocorrem nos contextos minoritários francófonos do Canadá,
mas que podem ser observadas em qualquer lugar do mundo, com também “o
julgamento peremptório, a ignorância, a falsa indiferença, a censura” que fazem parte
do funcionamento interno das literaturas minorizadas (PARÉ, 1994, p.42). Tamanha é a
importância de sua obra crítica que acaba de ser publicado Le défi de la fragilité: Autour
de François Paré, uma homenagem e um testemunho dos estudos que influenciaram
várias gerações de pesquisadores envolvidos nos estudos das minorias no Canadá e no
exterior. Vemos, desta forma, confirmada a importância das propostas de Paré para os
estudos sobre literaturas minoritárias, sendo nosso objetivo, nesse trabalho, apresentar e
analisar os pontos mais importantes do ensaio citado.
59
LETRAMENTO LITERÁRIO – O CORDEL NO DESENVOLVIMENTO DA
ORALIDADE EM SALA DE AULA
A presente proposta de comunicação oral tem como tema o modo de narrar empregado
por Edgar Allan Poe em uma de suas narrativas. O objetivo é examinar de que maneira
o autor arranja recursos expressivos em um conto que, para muitos, é considerado o
marco zero do romance policial. Assim, escolhemos como objeto de análise
“Assassinatos na Rua Morgue”, de 1841. Trata-se de uma história em que a
investigação de um crime brutal é conduzida por C. A. Dupin, indivíduo que, mesmo
não pertencendo à força policial, desvenda o mistério como se resolvesse um problema
60
matemático. Vale destacar que a mesma personagem seria o protótipo de detetives como
Sherlock Holmes e Hercule Poirot. Dessa maneira, o percurso metodológico se vale da
apropriação seletiva de ensaios sobre aspectos das narrativas em geral e de textos que
tratam de características dos contos escritos a partir do fim da primeira metade do
século XIX. Vale destacar que também será fundamental, no corpus selecionado, a
investigação da figura do narrador (quem fala) e do focalizador (quem vê). Portanto,
tomamos como apoio teórico textos críticos e analíticos de estudiosos como Gérard
Genette (2017), Ricardo Piglia (2004), Jorge Luis Borges (2011), Nádia Batella Gotlib
(1985), Charles Kiefer (2011) e Júlio Pimentel Pinto (2019). Ao final, espera-se
identificar como Edgar Allan Poe organiza seu texto em favor do efeito de surpresa
buscado pela narrativa e de que maneira esse trabalho reflete o tipo de obras de ficção
que eram produzidas naquele período.
Com a invenção dos modernos navios a vapor o Brasil se tornou mais próximo do
Velho Mundo, essa aproximação fez com que as novidades europeias chegassem
rapidamente na capital da Província do Pará no século XIX, dessas novidades
destacamos a publicação da prosa ficcional em jornais, técnica adotada por inúmeros
periódicos dentre os quais frisamos A Província do Pará, jornal político e de enorme
força cultural. Dos autores que tiveram seus escritos propalados na folha supracitada,
sublinhamos os franceses Guy de Maupassant (1850-1893) e o Emile Zola (1840-1902)
para este estudo. Tendo em vista o postulado, assinalamos que o objetivo principal deste
trabalho é apresentar os contos de autoria de Maupassant e Zola publicados n’A
Província do Pará nas últimas décadas do século XIX. Em relação ao aporte teórico,
utilizamos os estudos de Sarges (2002) e Rocque (1976) para tratarmos do periódico,
Romero (1978) para pautarmos a fundamentação sobre Zola, e Neves (2012) para
abordarmos Maupassant. Em relação aos resultados alcançados até o presente momento,
verificamos seis contos de autoria de Guy de Maupassant e cinco contos de autoria de
Emile Zola. Avaliamos a pertinência de nossa pesquisa pautada na importância de que
os autores supracitados representam a literatura ocidental, além de ser importante frisar
que estamos passando por um momento histórico conturbado, que tem em si uma
grande necessidade de compreensão pelo imaginário (SERRA, 2012, p. 12), aonde se
regulariza as incertezas advindas com um dia-a-dia estressante e repleto de dúvidas, que
é próprio de uma situação de caos, sendo assim, esperamos que o estudo do nosso
passado auxilie, ainda que em pequena medida, a compreensão da nossa atualidade.
61
O NOVO ROMANCE HISTÓRICO BRASILEIRO: UMA LEITURA DE
DESMUNDO, DE ANA MIRANDA
Este trabalho tem como objetivo apresentar uma leitura acerca do novo romance
histórico na literatura brasileira a partir do romance Desmundo (1996), da autora
cearense Ana Miranda. Neste tipo de narrativa, há uma evidente intenção de reescrever
os fatos históricos numa perspectiva de contrapelo ao discurso oficial, moldando uma
constituição identitária que considera, a partir de então, traços culturais, sociais e
antropológicos, visando desconstruir e retificar a versão oficializada da história por
meio de mecanismos discursivos como a paródia e o pastiche. Assim, estes romances
comprovam o quanto o discurso histórico pode ser dominado pela falta de neutralidade,
além da maneira com que os fenômenos podem ser alterados ou mesmo falsificados por
meio da linguagem. Através destas narrativas, vozes outrora silenciadas por versões
historiográficas amplamente difundidas e conhecidas passam a se inscrever na história
como parte ativa e significante dela, num processo de revisão em que eventos históricos
começam a ser relidos e reordenados dentro de padrões despidos de convenções arcaicas
e segregacionistas. Desta forma, a partir dos estudos como os de Aínsa (1991), Menton
(1993) e Hutcheon (1991), analise-se de que modo Ana Miranda, no romance
Desmundo, constrói uma revisitação ao passado colonial brasileiro, numa postura de
crítica e contraponto, para recontar aspectos importantes das relações sociais no Brasil
Colônia, especialmente relacionados à presença feminina e suas funções na sociedade.
Camila Sabino
UNESP/FCLAr
ccamila.sabino@gmail.com
Fernando Pessoa, assim como todo poeta de gênio, acreditava que tinha uma missão a
cumprir e a sua seria, portanto, a de reconstruir a grandeza de Portugal. De fato,
Portugal é a grande personagem de sua principal obra ortônima: Mensagem. O livro foi
o único volume de versos portugueses organizado e publicado pelo poeta e é dividido
em três partes, constituindo a interpretação corrente e óbvia da história portuguesa:
ascensão, apogeu e declìnio. A primeira parte, intitulada “Brasão” contém 19 poemas e
se subdivide em cinco seções; a segunda, “Mar Português” possui 12 poemas e a
terceira “O Encoberto” é composta por 13 poemas. A parte do “O Encoberto” fixa-se na
figura de Dom Sebastião e na ideia messiânica do Quinto Império, referindo-se assim ao
longo período de decadência e de incertezas, que se estende até o tempo do poeta. A
ideia do Quinto Império é uma promessa antiga e se manifesta principalmente nos
momentos históricos em que é forte a sensação de descrença, mesclando dialeticamente
a exaltação patriótica e a confiança de um futuro de glória. O livro Mensagem foi
publicado apenas em 1934, porém o projeto do livro data, pelo menos, de 1913, quando
62
Pessoa escreveu o poema Gládio, que depois foi incluído em Mensagem com o título D.
Fernando, Infante de Portugal. É desse mesmo perìodo os artigos sobre “A Nova Poesia
Portuguesa”, publicados na revista A Águia, que afirmam para muito breve o
aparecimento do poeta que abriria caminho, por meio da criação literária, para a
modernização de que o país tanto precisava. Portanto, a presente comunicação tem por
objetivo analisar a relação do Quinto Império com os artigos sobre “A Nova Poesia
Portuguesa” e o surgimento do Supra-Camões.
O autor francês Patrick Modiano não viveu a Segunda Guerra Mundial, mas aborda esse
tema misturando ao sabor das narrativas metaficcionais pós-modernas personagens
históricos e fictícios, com protagonistas sem identidade, ou de identidade duvidosa,
sempre em busca de suas origens. O livro em questão apresenta um protagonista
narrando seus traumas do período da Ocupação da França no divã do Dr Freud. Judeu
perspicaz, irônico e até sarcástico, Raphael, ao narrar suas peripécias, deixa o leitor
intrigado, porque instaura a problematização a noção de História e de representação a
partir da arte. Acreditamos poder provar que o autor se utiliza dessas técnicas de criação
com o propósito de conhecer a história da qual se sente fruto - ele mesmo o diz em
entrevistas - e portanto, conhecer-se. Utilizando-se de teorias da narrativa que tratam do
testemunho, do tempo, e da arte pós-moderna, pretendemos mostrar a possibilidade de
que Modiano procura resolver suas questões relacionadas ao período da Guerra a partir
da narrativa, pois conforme diz o filósofo Paul Ricoeur somente a narrativa pode
solucionar as aporias do tempo, bem como por extensão as questões da memória e do
apagamento da memória.
63
poema supracitado, a figura feminina ganha formas a partir da retomada da narrativa
mítica da Fênix, o pássaro que renasce das cinzas. Fraga, em sua elaboração poética, dá
vida a uma mulher que decide mudar sua condição e, para tanto, elege elementos que,
culturalmente, foram impostos como parte da vida cotidiana da mulher no ambiente
doméstico, como os pratos, rasurando o cenário. A personagem decide quebrar pratos e
cristais e reinventar-se. Ao fazer isso, torna-se uma mulher que desconstrói a redoma
em que foi colocada, bem como a imagem de fragilidade que também lhe foi atribuída.
Ao longo da análise proposta, foi possível perceber que, ao ressignificar o mito da fênix,
Fraga segue como uma poeta que demonstra preocupação com a condição feminina e
investe na produção de contradiscursos. O nosso estudo envolve a leitura do poema;
pesquisa e leitura de bibliografia voltada para questões de gênero, recorrendo, entre
outras, às obras de Guacira Lopes Louro; Cláudia Nigro; Judith Butler; no que se refere
a lugar de fala, dialogamos com as reflexões de Djamila Ribeiro; sobre discurso,
encontramos amparo em Michel Foucault e para discutirmos a presença do mito no
poema selecionado, citamos Poesia e Memória: A poética de Myriam Fraga.
64
NARRATIVAS MITOLENDÁRIAS: MITO, LENDA E PROCESSO DE
HIBRIDIZAÇÃO
Este trabalho, parte da dissertação da pesquisadora, é um recorte feito com base em uma
inquietação que surgiu durante a pesquisa: como diferenciar claramente mito e lenda aos
alunos, se nas narrativas orais que constituem o acervo da comunidade em que os
discentes estão inseridos, essa distinção não é perceptível? Desta pergunta surgiu a
seguinte hipótese: essas narrativas são, na verdade, a manifestação da ocorrência de uma
hibridização entre mito e lenda. Para verificar esta hipótese, foi traçado o seguinte
objetivo geral: analisar a ocorrência de um processo de hibridização dos gêneros lenda e
mito em narrativas orais que povoam o imaginário popular maranhense. Para isso,
foram elencados os seguintes objetivos específicos: (i) confrontar as características
distintivas entre mito e lenda, na literatura disponível; (ii) verificar aspectos sociais e
históricos que conduziram a formação do acervo de narrativas orais maranhenses e
influenciam em sua categorização literária; (iii) evidenciar a ocorrência da hibridização
entre mito e lenda, com base nos dados coletados no levantamento bibliográfico e suas
observâncias nas narrativas estudadas. Para concretizar os objetivos, procedeu-se com
um estudo bibliográfico, de campo, descritivo, de cunho qualiquantitativo, tomando-se
por base teórica principalmente os estudos realizados pelos seguintes autores: Cascudo
(2006), Coutinho (2003), Cândido (2000), Passarelli (2012), Eliade (2004), Cassirer
(2003), Weitzel (1995), Halbwachs (1990), Calvet (2011) e Benjamin (1987). Como
resultado, percebeu-se que a hipótese inicial do estudo foi confirmada, possibilitando a
legitimação da nomenclatura “narrativa mitolendária”, proposta pela pesquisadora.
65
se que, no livro, conhecemos pouco da personagem Macabéa, pois grande parte das
informações do seu aspecto físico e emocional é revelado mediante os enunciados do
narrador Rodrigo S.M., ou seja, em quase toda a narrativa entramos em contato com as
fantasias do narrador (uma não-pessoa, ao ser apenas o tema do enunciado - um ele,
conforme a teoria do linguista Benveniste). Em vista disso, destaca-se que são poucos
os momentos nos quais Macabéa enuncia, mas nestes é possível notar o quão a
personagem segue seus passos no ímpeto da simbolização e, ao mesmo tempo, é um
sujeito maquinal, sobretudo porque apenas reproduz os enunciados da Rádio Relógio,
não sabe ler e escrever com proficiência, não tem conhecimentos científicos, bem como
se torna invisível na capital do Rio de Janeiro.
Propomos, nesta comunicação, a análise do conto “L’ugel bel verde”, um dos setenta e
quatro contos entrelaçados pela narrativa moldura, obra-prima do autor, intitulada “Le
piacevoli notti” (1550-1553), de Giovan Francesco Straparola. Nossa proposta é
66
analisar a simbologia das personagens maravilhosas do conto: a água dançante, o pomo
que canta e o pássaro Belverde. Todos eles com simbologias próprias, mas que, além
disso, se entrelaçam com a simbologia do número três que perpassa toda a narrativa em
seus diversos elementos como, por exemplo, o espaço, o tempo, as personagens e o
próprio enredo. São três auxiliares mágicos, dentro de toda essa estrutura gerada pelo
número três, que auxiliarão os três filhos no reencontro com o pai e na reconciliação
com a mãe injustiçada. Tudo isso corroborandocom a ideia defendida por Sperber
(2009, p.184) de que “Os contos de fadas tratam de vida e de morte, isto é, do ciclo vital
que inclui o tema da volta” neles há uma restauração que se dá por meio de uma
construção que ela dividiu em três tópicos, sendo o primeiro deles os três universos
(mundo anterior à provação, mundo da provação e o mundo posterior à provação); o
segundo o caráter mítico da temporalidade e da espacialidade dos contos e, por fim, o
terceiro: o começo (“era uma vez” ou algo do tipo) e o final dos contos (“e foram felizes
para sempre” ou algo parecido). Desse modo, teremos como base dos nossos estudos,
principalmente, os trabalhos de Sperber (2009), de Volobuef (1993) e Chevalier (2015).
Ao final da análise, pretendemos apontar e repetir sobre os principais elementos
maravilhosos presentes na narrativa curta estudada.
Quando o rei se depara com o sofrimento de sua filha que deseja ter uma amiga para
brincar e com quem estabelecer verdadeiros laços de amizade, a solução que ele
encontra é presenteá-la com o maior espelho do castelo, que traz à princesa o mundo de
sua imaginação. Nesta moldura de ilusões ela se depara e se encanta com sua própria
imagem refletida, acreditando ser o outro que tanto buscava, fazendo referência
interdiscursiva ao mito de Narciso. A partir daqui a princesa enfrentará dificuldades ao
longo de sua jornada em busca do autoconhecimento até que, pela última vez, depara-se
com seu reflexo, então, no lago. Este trabalho de análise literária do conto “A primeira
só”, da escritora Marina Colasanti, embasa-se na teoria sobre molduras, comumente
empregada em estudos sobre artes visuais, mas que recentemente tem sido abordada
também na literatura. Tal teoria aqui se justifica, pois o mundo imaginário de felicidade
e brincadeiras da menina é delimitado primeiramente pelo espelho e, posteriormente,
pelas margens do lago onde ela vê seu reflexo pela última vez e que já não mais
representa sua imaginação, mas sim, seu eu interior. Para tanto, serão utilizados Ortega
y Gasset, em Meditación del marco, como também Pere Ballart, na obra El contorno del
poema. Os fundamentos acerca da intertextualidade, significativa no conto em razão do
diálogo com o mito de Narciso, de Ovídio, apoiar-se-ão no livro Intertextualidade de
Tiphaine Samoyault.
67
O PIO ENEIAS EM EPHEMERIS BELLI TROIANI
Dom Macedo Costa (1830 – 1891), bispo ultramontanto, intentou implementar seu
projeto romanizador em Belém do Pará, durante o período em que comandou a Diocese
da cidade, enfatizando preceitos cristãos-católicos, de claras intenções moralizantes e
prescritivas. Um dos temas discutidos e de grande preocupação ao Bispo foram as
práticas de leituras da época, as quais o romance protagonizava devido a sua
popularização e circulação em jornais e revistas. Devido ao seu projeto voltar-se para as
questões literárias, A Boa Nova (1871 – 1883), periódico gerenciado pelo Bispo do
Pará, foi palco de posicionamentos relativos à leitura do novo gênero e, dessa forma, o
presente trabalho objetiva analisar a presença da crítica ao romance no impresso
religioso, de forma a vincular o projeto civilizatório e romanizador de Dom Macedo
Costa para com as práticas de leitura da época, analisando quais as possíveis finalidades
e preocupações para prevenção dos escritos considerados ímpios e subversivos. Dessa
forma, compreenderemos seu projeto a partir dos estudos de Karla Denise Martins
(2002) e Fernando Arthur Neves (2015) e, acerca do posicionamento quanto à prosa de
68
ficção, a partir das pesquisas de Anne-Marie Chartier (1995), Walter Siti (2009) e
Márcia Abreu (2003), na tentativa de resgatar a crítica ao romance, inserindo-a em seu
contexto histórico-social e doutrinário, pertencente ao Bispo e à folha periódica de sua
direção.
Palavras-chave: A Boa Nova. Crítica ao romance. Dom Macedo Costa. Século XIX.
69
A CONSTRUÇÃO CRONOTÓPICA DOS “CADERNOS DE MANUELA” NO
ROMANCE HISTÓRICO UM FAROL NO PAMPA (2004), DE LETICIA
WIERZCHOWSKI
70
“Ação”, e não o “Verbo”, que estava junto a Deus e era Deus. Eis que o sujeito fáustico
é genial e engenhoso, mas vaidoso e, é claro, individualista, colocando-se, a exemplo do
diabo e com a ajuda dele, acima de Deus. Este trabalho, enfim, pretende contrapor,
contra a chave dogmática de João 1:1, três posturas fáusticas presentes em Fausto, uma
tragédia, de Goethe (2017), Doutor Fausto, de Thomas Mann (2015), e Grande sertão:
veredas, de Guimarães Rosa (2019); uma vez que, se Goethe, no século XIX, propõe,
com certo otimismo, a Ação ao Verbo, vê-se que, nas duas outras obras do século XX, a
Ação é realocada, em Mann, pela Destruição e, em Rosa, de maneira quase antifáustica,
pela reafirmação do Verbo.
71
A PERSONAGEM FEMININA NA LITERATURA FANTÁSTICA: UMA
ANÁLISE DE “BÁRBARA”, DE MURILO RUBIÃO, E “TIGRELA”, DE LYGIA
FAGUNDES TELLES
Esta comunicação tem como objetivo central discutir a imagem da mulher na literatura
fantástica em geral e mais especificamente a caracterização e ficcionalização da
personagem feminina nos contos “Bárbara”, de Murilo Rubião, e “Tigrela”, de Lygia
Fagundes Telles – autores de expressiva importância para a literatura fantástica no
Brasil. Os contos estão presente, respectivamente, nas coletâneas Contos reunidos
(2005) e Mistérios (1998) e foram publicados na segunda metade do século XX. Para
pensar a figuração da mulher na literatura fantástica contaremos principalmente com as
ideias de Paula Júnior (2011). O autor promove um estudo visando demonstrar como o
fantástico, que conta com um cânone essencialmente androcêntrico, ou seja, sob a
perspectiva masculina de autoria, tem tratado a figura feminina em sua composição. O
autor ainda propõe três categorias para pensar o lugar da mulher na literatura fantástica:
a mulher como objeto, como sujeito e como autora. Sob esta perspectiva, podemos
pensar a caracterização das personagens femininas nos contos indicados. Assim
podemos propor que Murilo Rubião, no conto “Bárbara”, apresenta a personagem
feminina mais próxima da categoria objeto e Lygia Fagundes Telles, no conto “Tigrela”,
apresenta a personagem mais alinhada à categoria sujeito. Além disso, para pensar a
condição da mulher autora, no caso de Lygia Fagundes Telles, contaremos com as
ideias de Coelho (1991) sobre a “nova mulher” e seu amadurecimento crìtico. E, por
meio de uma análise crítica comparativa dos contos, discutiremos essa questão. Ainda,
para um entendimento geral da literatura fantástica e sua configuração, contaremos com
ideias de Todorov (2014) e Bessière (2012).
72
incolor, para entreter o leitor, ou leitora, desejosa de intriga ou mistério na composição
do romance” (MOISÉS, 1961, p. 48-49). Discordando do apontamento feito pelo
estudioso brasileiro, compreende-se que a relação entre Mateus e Adriana não é apenas
um pano de fundo romântico, mas um ponto de subversão para ambos, pois a
personagem feminina tem papel decisivo no transcorrer e finalização do romance
quando, com lábios frios, beija Mateus em uma tentativa consciente de impedir o
atentado bombista organizado pelo amante. Assim, com esta comunicação, procura-se
demonstrar a intrigante apropriação que o autor português faz da representação da
mulher romântica “recodificada pela estética decadentista” (SANTANA, 2007, p. 206),
não restringindo a descrição, tão pouco as ações, de Adriana a uma única percepção
estética.
O romance Tudo o que é sólido pode derreter, escrito por Rafael Gomes, em 2013, é
uma versão romanceada do seriado televisivo homônimo produzido em 2009 pela TV
Cultura, em parceria com a Ioiô Filmes. A obra apresenta um interessante diálogo com
obras canônicas em língua portuguesa, e observa-se as diferenças entre os dois suportes
(vídeo e livro). A protagonista Thereza, aluna do Ensino Médio, mantém estreita relação
com as obras apresentadas pelo professor de literatura, tentando ler atentamente todas e,
de certa forma, incorpora-as no seu cotidiano, pois há ligação intensa e significativa
entre o estado emocional da personagem e as histórias lidas. O capìtulo três, “Os
lusìadas”, torna-se expressivo objeto de análise devido à forma como é estabelecido o
diálogo com a epopeia de Camões, a temática da identidade e a experiência da garota no
centro de São Paulo, além de sua singular estruturação, pois o capítulo é composto em
forma de diário, pormenorizando os momentos do dia da personagem em sua
empreitada. Além da referência explícita ao poema de Camões e a versos da obra e de
importantes episódios, a estrutura do capítulo é peculiar, configurando mais um diário.
Aliás, as anotações seguem o esquema de um diário de bordo, realmente como se a
protagonista (narradora do texto, ou seja, quem conta a história, produz o discurso)
estivesse registrando uma viagem. Há, portanto, um jogo intertextual com a obra de
Camões, o qual fica explícito devido ao caráter didático que assume o romance escrito
por Rafael Gomes. O enunciatário não precisa ter um conhecimento amplo da obra
portuguesa para perceber o diálogo que se estabelece, pois o próprio enunciador aponta
os aspectos em contato e reflete a respeito, deixando em dúvida se é apenas imaginação
ou realidade, ficando a cabo do enunciatário preencher tal lacuna.
73
UM DOUTOR “POR FORÇA”: ASPECTOS DA SÁTIRA EM LIMA BARRETO
Nas primeiras décadas do século XX, o escritor Lima Barreto (1881-1922) atuou na
imprensa, escrevendo principalmente crônicas e contos para periódicos como Careta,
Fon-Fon!, Correio da Noite, A.B.C., entre outros. Em seus escritos, o autor de Triste fim
de Policarpo Quaresma traça um amplo perfil da sociedade de sua época, e utiliza com
frequência as estratégias próprias da sátira para empreender uma crítica severa a todos
os grupos sociais, em especial aqueles responsáveis pela falácia do projeto “civilizador”
e pela disseminação de práticas como o apadrinhamento e a ascensão social pela via
política. Em sua acepção moderna, a sátira está ligada à denúncia e correção de
condutas e à desconstrução de ideias cristalizadas. Na obra de Lima Barreto, o gênero
adquire tal importância que Carlos Erivany Fantinati (2012) aponta para uma verdadeira
dominância satírica, além de definir o escritor como um autêntico satirista.
Considerando a função pragmática exercida pela sátira na obra limabarretiana e os
estudos sobre o gênero empreendidos por Matthew Hodgart (1969) e Fantinati (2012),
nosso objetivo é analisar a crônica “Por força”, publicada na revista Careta em abril de
1915. Nesse texto, escrevendo sob pseudônimo, Lima Barreto alude a uma personagem
da obra L’Ingénu (1767), do escritor e filósofo francês Voltaire (1694-1778), para tratar
satiricamente da prática conhecida como “doutoromania”, que consistia no uso irrestrito
do tìtulo de “doutor” por muitos indivìduos tanto como marcador de status como meio
de ascensão social.
74
histórias, sempre em busca de tornar-se digno de sua dama, obedecendo ao código do
amor cortês. Ainda que não apareça fisicamente na obra, será reinventada não apenas
pelo seu fiel cavaleiro, mas também por outras personagens, desencadeando uma
multiplicidade de imagens cômicas. Ainda que sejam de naturezas distintas, essas
damas são fundamentais para se compreender os protagonistas, pois Orlando
enlouquece porque se apaixonou por Angelica, e Dulcinea faz parte da loucura
quixotesca. Baseando-se nos trabalhos de Mario Santoro, Yves Bonnefoy, Italo Calvino,
Carlos Mata Induráin, Mariapia Zanardi Lamberti, e Gonzalo Torrente Ballester, esse
trabalho pretende apontar o modo como Angelica e Dulcinea movimentam essas
histórias, provando que são elementos fundamentais dessas obras.
Caracterizada como fallen woman, a mulher que perde a virgindade antes do casamento
já foi tema de muitos romances ingleses. Esther Waters (1894), de George Moore,
inclui-se nessa tradição. Após engravidar de William, colega de trabalho por quem era
apaixonada, Esther é abandonada e tem de criar o filho sozinha. As adversidades que
enfrenta são imensas, afinal, a moralidade vitoriana não permitia que houvesse distinção
entre a prostituta e a jovem que errou uma vez. Para George Watt (1984), no entanto, o
lugar das fallen women passou a ser reivindicado quando elas ganharam espaço no
romance. No caso de Esther Waters, a avaliação de Watt parece estar correta, pois o
livro foi elogiado pelos críticos. Parte dessa recepção pode ser atribuída aos princípios
éticos da personagem. A despeito de ter violado uma norma social, Esther era uma mãe
dedicada e uma trabalhadora honesta. Todavia, ainda que a protagonista precisasse ser
virtuosa para ter uma boa aceitação entre o público, sua conduta não foi condenada no
romance. Diferentemente da representação usual da fallen woman, Moore não retrata
sua personagem como inocente. Ao contrário, enfatiza sua sexualidade. Esther cedeu a
William porque sentia-se atraída por ele. Como forma de registrar o desejo sexual
feminino na ficção, Moore adota o discurso indireto livre, possibilitando, assim, que sua
heroína ganhasse voz. Por essa perspectiva, este trabalho visa analisar o uso dessa
técnica narrativa a fim de explorar como Esther Waters apresenta novas subjetividades
no campo do romance (FEDERICO, 1993). Para além de ser uma fallen woman, Esther
era uma criada analfabeta. Embora quisesse compartilhar sua desdita, muitas vezes não
conseguia articular seu raciocínio de maneira clara. Com o discurso indireto livre, a
fallen woman pôde enfim contar sua história. Ao mostrar seu ponto de vista,
compadeceu a crítica vitoriana.
75
A CENA DO SLAM DE POESIA NO BRASIL E NA ARGENTINA: DIÁLOGOS
A PARTIR DOS POEMAS “LEMBRA”, DE LUZ RIBEIRO, E “ACOSO
CALLEJERO”, DE MARIANA BUGALLO
Este trabalho tem como objetivo indicar traços característicos da cena do slam de poesia
no Brasil e na Argentina, uma corrente artístico-literária que vem movimentando
circuitos culturais de ambos os paìses. Por meio da análise dos poemas “Lembra”, da
slammer brasileira Luz Ribeiro, e “Acoso callejero”, da argentina Mariana Bugallo,
apresentados em batalhas poéticas de slam, pretende-se estabelecer um diálogo entre os
dois contextos, chamando a atenção para o fato de que a inquietação sobre uma mesma
temática surge em lugares distintos e é abordada em performances orais também
bastante diferentes. A escolha dessas poetas se deve pela relevância que cada uma tem
para a constituição do que são hoje as competições de poesia falada em seus respectivos
países, conforme tem sido possível perceber em uma pesquisa, ainda em
desenvolvimento, que tem como propósito compreender os rumos do poetry slam em
cada caso, tendo como base os diversos torneios brasileiros e argentinos ao longo dos
últimos anos. Ademais, pode-se afirmar que, embora cada slammer tenha um modo
único de explorar seu corpo e sua voz ao oralizar seus textos, Luz Ribeiro e Mariana
Bugallo o fazem de uma forma semelhante ao que se percebe como predominante em
cada cena. Além das obras que serviram de base para conhecer a história desse gênero
híbrido e acessível que surge na década de 1980, no subúrbio de Chicago, nos Estados
Unidos, orientaram este estudo considerações de Ruth Finnegan, Paul Zumthor, Peggy
Phelan e Martina Pfeiler sobre oralidade, poesia oral e performance, entre outros.
76
cidade de Camorr. Cada um destes dois tipos diferentes de interlúdio dá ao leitor
informações que serão imediatamente importantes para a compreensão da trama. É com
esta ilusão de simplicidade e interdependência temporal que o narrador adiciona
profundidade à narrativa. Além das informações dadas pelos interlúdios que serão
utilizadas imediatamente pela narrativa primeira, há detalhes menos essenciais que virão
a ser retomados vários capítulos mais tarde, bem como há interlúdios que parecem
dirigir o leitor para uma determinada direção mas quebram esta expectativa ao levá-lo à
direção oposta tão logo retorna a narrativa primeira. Além disso, a própria tessitura
temporal da narrativa trabalha com simultaneidades que são o alicerce para a aura de
genialidade que paira ao redor dos elaborados golpes de Locke. Esta comunicação, em
suma, terá como embasamento teórico as ideias de James Wood (2009) e Gérard
Genette (2017) para compreender como os efeitos de sentido são criados a partir da
representação e da subversão da temporalidade na obra.
77
OS MARGINALIZADOS ACOLHIDOS POR CRISTO NOS CONTOS DE
DOSTOIÉVSKI
Fiódor Dostoiévski (1821-1881) é mais conhecido por seus grandes romances, como
Crime e castigo (1866) e Os irmãos Karamázov (1880). Contudo, tendo sido uma figura
ativa nos jornais russos do século XIX, desenvolveu também vários trabalhos em
diversos outros gêneros, como crônicas, contos e ensaios, que foram recentemente
compilados no Brasil no volume Contos reunidos, de 2017. O objetivo dessa pesquisa é
observar como Dostoiévski traz para o centro de suas narrativas curtas figuras
marginalizadas pela sociedade – alcoólatras, ladrões, hereges, mendigos e suicidas – e
demonstrar como essas personagens encontram algum conforto em Cristo, figura
marcante nas obras do autor. Nessa comunicação, serão expostos e analisados os textos
“Mujique Marei” e “Um menino na festa de Natal de Cristo” (ambos de 1876), à luz dos
embates teóricos entre racionalismo e religião, modernização e tradição, efervescentes
no século XIX russo. Para compreender esse cenário, serão utilizados textos de Bakhtin,
Joseph Frank, Robert Louis Jackson, Luiz Felipe Pondé e Priscila Glehn. Em “Mujique
Marei”, observamos as memórias de Dostoiévski sobre um camponês russo que lhe
ensina ainda quando criança a importância de acolher ao próximo; anos depois, preso
por crimes políticos junto a ladrões e assassinos grosseiros, o autor aprende a colocar
em prática o amor ao próximo ensinado por Cristo e relembrado na figura do mujique.
“Um menino na festa de Natal de Cristo” mostra a miséria das crianças russas excluìdas
da modernização das cidades, mas que são engrandecidas depois da morte, na festa de
Jesus para os humilhados. Essas representações em seus contos são fruto de um intenso
embate de pensamentos presente em sua época, que contrapunha os valores
“ultrapassados” do povo aos novos ideais de sociedade trazidos da Europa pela
intelligentsia russa.
Hélio Guimarães, em Machado de Assis, o escritor que nos lê, explica como em Dom
Casmurro há referências ao romance Manon Lescaut, de Antoine Prévost, que
identificam Bentinho ao puro e bom Des Grieux e Capitu à libertina Manon Lescaut.
Segundo Guimarães, essa visão dos amantes avançou na crítica machadiana até Helen
Caldwell mudar o paradigma de análise de Manon para Otelo. O objetivo deste trabalho
é apresentar uma leitura renovada de Dom Casmurro, partindo das referências à obra
Manon Lescaut suscitadas pelo narrador Bento Santiago. Baseio este estudo na
perspectiva de Santiago como um “mau leitor”, apresentada por Hélio Guimarães, em
Leitores de Machado de Assis, que destaca como Santiago ilustra seus ciúmes fazendo
leituras tendenciosas de Otelo e Manon Lescaut. Analiso, na apresentação, que
78
Santiago, enquanto um “mau leitor”, sugere a aproximação de si com Des Grieux e
Capitu de Manon, porém, essa sugestão interpretativa poderia suscitar no leitor uma
abordagem mais detida dessas obras, o que poderia aguçar o sentido do leitor para
algumas questões, tais como: a história em Manon Lescaut ser contada da perspectiva
de Des Grieux; Des Grieux se qualificar e ser qualificado como “ingênuo”, “inocente”,
“naturalmente dócil” e “tìmido”, só que a história conta aventuras em que ele se mostra
ladrão, corrupto, dissimulado, mentiroso, pecador, violento e homicida; haver na
narrativa a condenação dos vícios dele e da amante. Essas questões poderiam fazer com
que o leitor analisasse Dom Casmurro com olhar renovado, transformando a sugestão
interpretativa de Santiago em um Cavalo de Troia, apontando sua parcialidade enquanto
narrador, sua falta de autoavaliação e questionando a visão do narrador de si mesmo
como ingênuo, puro e verdadeiro, pois ao narrar sua história mostra ocasiões em que
mente, engana, quebra juramentos, peca, tem pensamentos e ações violentas e dissimula
diversas vezes.
79
O LUGAR DO ROMANCE TRADICIONAL NOS DEBATES SOBRE GÊNERO
LITERÁRIO NO SÉCULO XIX
A análise do objeto de estudo – Olga – será realizado através de uma pesquisa sobre o
conceito de representação na Literatura e suas diversas teorias para, em seguida, iniciar
uma análise da configuração entre história e Literatura em uma obra biográfica, ou
como, em teoria, deveria se apresentar, para então realizar uma análise da obra
escolhida e de como ela articula sua estrutura literária para desenvolver um personagem
histórico. Esta pesquisa justifica-se pela necessidade de uma reflexão sobre como uma
obra biográfica pode ser caracterizada como ficção, enfatizando o personagem histórico:
até que ponto ainda se trata de realidade ou no decorrer da narrativa ele se torna um
80
personagem fictício. Não é que a vida de um personagem histórico não possa ser
contada, mas que nem sempre ela teria ocorrido exatamente como na obra, pois há o que
o autor imaginou que aquela pessoa teria vivido, ou como teria agido em determinada
situação. Afinal, em muitos casos, até mesmo no estudo da História atual, as fronteiras
estabelecidas no diálogo entre ficção e História tornam-se imprecisas. A ficção se insere
na realidade exterior, pois contém elementos produzidos por uma situação real da qual
eles dependem e na qual se projetam. Para uma análise a respeito desses laços entre a
ficção e a História, utilizaremos o método interdisciplinar de fundamentação teórica e
de pesquisa bibliográfica, partindo para a compreensão das relações entre literatura e
história na obra biográfica Olga, para assim identificar o processo de criação do autor e
identificar se ele desenvolveu um texto literário como uma fonte a serviço da História,
ou utilizou a História como objeto para a Literatura.
81
A REPERCUSSÃO CRÍTICA DO DRAMA FANTÁSTICO “O BOM ANJO DA
MEIA NOITE”, DE FURTADO COELHO
Gustavo Zambrano
UNESP/Ibilce
guzambrano@hotmail.com
82
PAINÉIS
(Em ordem alfabética por sobrenome do autor)
O século XVIII, segundo Cassirer (1992), foi intitulado como “Século da filosofia”
pelos seus próprios iluministas. Esse período viveu um grande florescimento intelectual
em que os pensadores se dedicavam ardentemente a novas descobertas e revelações.
Mesmo assim, o Iluminismo não é um período responsável por criar novos
entendimentos filosóficos, mas, sim, por reexaminar a herança intelectual e apropriar-se
dela. Dentre esses espíritos animosos do Setecentos, Denis Diderot (Langres, 1713 –
Paris, 1784) foi o homem mais rico de ideias do seu tempo (AUERBACH, 1972), cujo
vasto e multifacetado conjunto de produções compreende diversas obras que ainda são
muito importantes para diversas áreas das ciências humanas, como para a filosofia, para
a estética e, não menos importante, para os estudos literários. Neste painel, exporemos
um estudo sobre o romance Jacques le fataliste et son maître (DIDEROT, 1962). A
narrativa conta as aventuras de Jacques, um servo adepto do espinosismo, que viaja com
o seu amo para um lugar indeterminado. Durante o percurso, eles dialogam
constantemente sobre questões filosóficas e, muitas vezes, retomam questionamentos
semelhantes aos que Espinosa desenvolve em sua Ética (1960). Entretanto, o romance
não é só uma ferramenta de exposição das ideias do geômetra. A narrativa retoma as
ideias desse filósofo do Seiscentos satiricamente, isto é, expõe comicamente as
proposições espionosanas para que, enquanto rimos delas, possamos perceber o caráter
falho do sistema filosófico. O que propomos é realizar um percurso por Jacques, a fim
de identificamos de que modo a arte romanesca desenvolve questionamentos filosóficos
de Espinosa. Faremos isso a partir de um exame dos artifícios formais que contribuem
para a construção da sátira e do conteúdo filosófico que se manifestam no romance.
Para essa discussão, servir-nos-emos, no que cerne aos aspectos literários, de Bahktin
(2002) e de Bergson (1960). Quanto às questões filosóficas, servir-nos-emos de
Espinosa (1960).
83
SILÊNCIO E PERDA DA IDENTIDADE: UM ESTUDO SOBRE DIÁRIO DA
QUEDA
Segundo Seligmann Silva (2008, p. 66), as chamadas narrativas impossíveis advêm das
experiências indizíveis que precisam ser ditas, pois do testemunho destas depende a
sobrevida do indivíduo após um evento traumático, formando com isso um paradoxo. É,
então, através de tais relatos que nasce o estilo literário denominado como literatura de
testemunho, em que tal indivíduo se vale do discurso literário para representar o
irrepresentável, dando tridimensionalidade às suas experiências em um jogo entre o real
e o fictício. Em análise da obra Diário da Queda (2011), escrita por Michel Laub,
procuramos compreender o caráter literário das narrativas impossíveis, da construção da
memória dialogando com os estilos literários, da persistência do silêncio diante do
discurso seletivo enquanto fuga da experiência, além de analisar dentro do quadro
composto por Laub a construção da identidade, ou a perda desta, diante da inviabilidade
da experiência humana e o valor da literatura de testemunho contida na obra, que faz
ponte direta com o livro É isto um homem? (1988), de Primo Levi, pioneiro em tal
gênero literário. Tendo em vista a afirmação de Seligmann Silva (2009) de que a
literatura de testemunho talvez seja uma das maiores contribuições que o século XX
deixará para a história dos gêneros literários, nosso interesse é buscar uma maior
compreensão da contribuição literária que Laub faz ao modelo de narrativa de memórias
contemporâneo, explorando a reconstrução da memória do narrador junto à experiência
de vida do pai e do avô, fazendo um ponto de distinção entre eles dentro daquilo que o
autor denomina como inviabilidade da experiência humana, desenvolvendo um trabalho
tanto crítico quanto analítico da literatura como forma de expressão do indivíduo
remetendo à anterior prática oral de transferência de experiência.
84
abordado sob o aspecto psicológico por seu espetáculo trágico. Concluímos que a
grandeza trágica desse sentimento amoroso estava no desejo de Inês em sacrificar tudo
pela plenitude de um amor, e esse foi o seu galardão, a sua aliança com D. Pedro que se
perpetua na história e nos versos até os dias atuais.
Dee Mercês
UEFS
deesmerces@gmail.com
85
conceito de cultura está ligado aos saberes eruditos, aos letrados, às pessoas que
possuem determinados conhecimentos que abrangem os domínios humanos. Tal visão
cria um abismo entre os saberes acadêmicos e saberes de cultura popular, ou seja, do
Povo - esse grupo de pessoas que têm costumes, histórias, tradições, uma cultura em
comum. Nosso objetivo central é investigar a história de vida e repertórios de mestres e
mestras de tradição, isto é, de contadores de histórias de cidades do interior da Bahia,
por meio de entrevistas narrativas, a fim de estreitar os laços entre a Universidade e
esses agentes. A partir dessa aproximação, sistematizaremos as suas memórias em um
acervo digital de livre acesso, por meio da criação de um website, em que estarão
hospedados as entrevistas narrativas estruturadas pela equipe de pesquisa em seus
registros audiovisuais. Assim, preservaremos o repertório investigado de contos de
tradição oral. A pesquisa está baseada na metodologia (auto) biográfica, pois as
narrativas dos mestres e mestras de tradição são os instrumentos utilizados para
investigar suas histórias de vida, e fundamentada em bibliografia específica: Roque de
Barros Laraia (1986); Belmira Oliveira Bueno (2002); Marco Haurélio (2011); Matthew
MacDonald (2013); Luciene Souza Santos & Keu Apoema (2018).
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Palavras-chave: Álvares de Azevedo. Literatura comparada. Negatividade.
Romantismo. Victor Hugo.
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contos, literário e cinematográfico, iniciando-se com a organização da base teórica e,
posteriormente, a leitura e análise crítico-descritiva do conto “A Rainha da Neve”, de
Hans Christian Andersen, seguida da leitura e análise crítico-descritiva do conto
cinematográfico Frozen: Uma aventura congelante. Dá-se em seguida a análise dos
temas presentes nas duas narrativas para construir a análise crítico-comparativa e,
enfim, a concluir o trabalho. A partir das análises e comparações das obras, notamos
que as temáticas trabalhadas em ambas as narrativas, tão afastadas uma da outra por sua
época de publicação e lançamento, apresentam pontos em comum como seus principais
temas: a exaltação do altruísmo e abnegação em nome do amor fraternal, que, em ambos
os universos ficcionais, é mostrado como a forma mais pura e poderosa de amor
verdadeiro.
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