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DISCUTINDO ASTRONOMIA

GRUPO DE ASTRONOMIA SPUTNIK


“Não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na
ação-reflexão.”
Paulo Freire

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Carta ao Educador e ao Estudante

Este material foi criado como apoio principal do curso. Forneceremos


à educador e estudantes. Tem o objetivo sugestões de como guiar o debate, mas
de auxiliar na discussão de temas cabe ao educador e os estudantes
importantes da área de astronomia e que adaptarem estas sugestões a sua
podem ser tratados na sala de aula. realidade local, levando em conta o
O título “Discutindo Astronomia” interesse e os conhecimentos prévios.
mostra que não pretendemos apenas Para complementar o material
transmitir conceitos, mas sim discutir escrito foi desenvolvida uma pagina na
alguns assuntos, fornecendo internet:
embasamento para que o educador (aprendendoastronomia.blogspot.com).
possa tornar estas discussões mais ricas Ela serve de apoio para educadores e
em sala de aula. estudantes. Nesta página também podem
Na primeira parte do material ser encontradas, simulações, vídeos,
abordamos a observação do céu, tanto a textos para aulas entre outros recursos
olho nu como por um programa de que podem ser utilizados para tornar as
computador que nos auxilia na sala de aulas mais atraentes.
aula, durante o dia ou com o céu Esperamos que este material seja
nublado. útil no desenvolvimento das discussões
Na segunda parte encontramos a que serão realizadas entre educadores e
discussão da Terra plana x Terra estudantes.
esférica, e as possibilidades de
aprendizado a partir deste tema.
Em seguida vem uma discussão a
respeito, principalmente, da transição da
visão de mundo de uma Terra parada, no
centro do Universo, para a idéia de que a
Terra é um planeta, que gira ao redor do
Sol. Esta questão é proposta como eixo Os autores

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APRESENTAÇÃO

A primeira coisa que os antigos povos viram ao olhar para o alto foi o céu. Começaram a
observar tudo o que havia e acontecia nele: parecia uma grande cúpula que encobria a Terra
plana; parte do tempo era negra, outra parte era azul e nas transições ficava amarelada, laranja
e vermelha. Incrustadas nessa cúpula havia alguns pontos brilhantes aparentemente fixos. Às
vezes aparecia também um disco claro que mudava de forma sempre que escurecia: o disco ia
ficando oval, depois com formato de foice e afinava até sumir. Em contrapartida, uma bola
muito brilhante era sempre vista quando a cúpula estava clara: parecia até que era essa bola
que a tornava clara e iluminava tudo, permitindo atividades que necessitam de iluminação,
como a caça.
Mas o céu era enorme, abraçava, agarrava tudo, não se podia escapar dele. A terra
firme desaparecia diante da contemplação da imensidão azul que parecia ter o poder de fazer
tudo sumir: quando a bola amarela ia embora, levava com ela as cores e o calor, trazia sons
estranhos e animais diferentes, perigosos, além daqueles incontáveis pontos brilhantes que lhe
vigiavam e o faziam sentir pequeno, pouco, indefeso perante o que parecia não acabar.
Então o homem começou a explicar esta entidade. Enquanto as religiões surgiam no
mundo, o céu ganhava atenção especial seja como portal para a vida eterna ou como pai de
tudo que há. A compreensão de céu passou então a ter um sentido construído pelo homem
muitas vezes motivado pelo encanto ou ate mesmo pelo mistério. Aquelas coisas estranhas,
que eram observadas anteriormente agora passaram a ter um significado e um sentido mais
amplo. O homem antigo de acordo com suas vivências sociais, históricas e culturais iniciou um
relacionamento com o céu. A partir de suas construções de significado, criou uma relação com
os pontos que via no céu. Através de uma combinação desses pontos, formando imagens
familiares, associou as tarefas do seu cotidiano, criando assim as primeiras constelações. É
instigante que varias civilizações, com valores diferentes, atribuíram diversas imagens aos
mesmos conjuntos de pontos, que estavam pautadas sempre nas construções sociais.
Essa construção foi muito importante para que o homem pudesse então ter como marcar
suas atividades apenas olhando para o céu. Então aquela junção de pontos que eles viam em
certa posição significava, por exemplo, que estavam na época de colheita, ou outra
configuração significava que estavam na época de plantio, mas cada representação que eles
criaram estava sempre amarrada com as necessidades da manutenção das atividades de
trabalho ou atividades religiosas.
Hoje já explicamos bastante sobre essa cúpula que chamamos de céu. Sabemos, por
exemplo, que não há nada de cúpula no céu e que aqueles pontos luminosos que chamamos
de estrelas, para as quais já temos explicações razoáveis, estão a diferentes distâncias de nós.
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Através do conhecimento do céu, fomos capazes de dizer muito também sobre a nossa Terra:
que não é plana, por exemplo, como veremos a seguir.

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CAPÍTULO 1 - OLHANDO PARA O CÉU

Para fazermos observações do céu um primeiro passo é nos localizarmos no espaço, ou


seja, nos orientarmos encontrando os pontos cardeais, norte (N), sul (S), leste (L) e oeste (O).
Esses pontos são muito importantes para que possamos nos situar. Vale apena apontar que
não é estritamente necessário saber os pontos cardeais para fazer observações, porem eles
nos auxiliam muito para nessa tarefa.
Bom, uma forma para encontrar os pontos cardeais é utilizar os próprios elementos que
encontramos no céu. Um deles é o Sol. A região onde o Sol nasce fica o ponto cardeal Leste e
conseqüentemente o lado oposto, onde ele se põe, o Oeste.
Com os pontos Leste e Oeste já determinados podemos agora facilmente localizar os
outros dois pontos que nos interessa, no caso, Norte e Sul. Para isso basta esticar o braço
esquerdo e apontá-lo para o Leste, lembre-se a região onde nasce o Sol, e conseqüentemente
o braço direito ficara aponto para o lado oposto, Oeste. Com isso feito a região Sul ficará na
sua frente e a região Norte estará atrás de você.

Atividade 1
Faça um pequeno desenho de suas casas localizando as direções Norte-Sul e Leste-Oeste a
partir da posição do nascer e pôr do sol.

Imaginamos que uma das melhores estratégias para se aprender e/ou ensinar Astronomia é
olhando para o céu! Isso é pelo fato de desde os primórdios o homem se encanta ao observar
o céu hoje em dia não é muito diferente.
No céu estão algumas das mais belas paisagens que a natureza criou. Vamos olhar para
alguns objetos interessantes e fáceis de localizar no céu, o educador poderá mostrar aos seus
alunos como se orientar e conhecer um pouco mais sobre esse gigante que vive em cima de
nossas cabeças. O céu.
O movimento do Sol durante o dia termina, no fim da tarde, para os lados do Oeste.
Um belo dia, em sua casinha no sítio, você decide olhar para o céu, e ver como ele funciona.
Usaremos um programa (STELLARIUM) de céu virtual, que mostra o céu visto de
qualquer lugar do planeta em diferentes momentos do dia e do ano. Neste caso simulamos o
céu do mês de Junho.

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No final da tarde o Sol se põe, até aí não podemos ver mais nenhum objeto no céu. Uma hora
depois, no finalzinho da tarde podemos perceber que o céu fica um pouco mais escuro e o Sol
mais baixo.

Olhando agora para o Sul, você terá o Oeste a sua direita e o Leste a sua esquerda.
Perceba que o lado Leste está mais escuro que o lado Oeste. Perceba também que as
primeiras estrelas, as mais brilhantes, começam a aparecer.
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Mais alguns minutos passam e mais estrelas vão aparecendo no céu. Começamos a
reconhecer algumas constelações.
Constelação é uma região no céu onde um grupo de estrelas estão aparentemente
ligadas. Isso ocorre pela grande distância que estamos das estrelas, dando a falsa impressão
que todas estão a uma mesma distância, num plano de fundo.

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Atividade 2
Veja a Tirinha abaixo:

Como você explicaria para o Níquel Nausea e seu amigo o movimento que “o Sol faz” todo dia?

Na imagem acima podemos perceber para os lados do Oeste as famosas Três Marias,
são três estrelas bem azuis e que fazem parte da constelação do Órion, o caçador. Nesta
época do ano a constelação de Órion se põe logo no começo da noite. Traçando uma linha
pelas Três Marias, para cima, encontramos a estrela mais brilhante do céu, Sírius. Embora
quando olhamos para Sírius vejamos apenas uma estrela, esta constitui um sistema binário,
duas estrelas orbitando uma a outra. A companheira de Sírius, Sírius B é uma estrela anã muito

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apagada e para vê-la precisaríamos de grandes telescópios.
Olhando ainda para esta região do céu, percebemos uma estrela bem brilhante abaixo
das Três Marias, ela recebe o nome de Rigel, o pé do Órion. Rigel, Sírius e Canopus formam
um grande triângulo.
Neste mês do ano, olhando para os lados do Sul e para cima, podemos encontrar outra
constelação famosa, o Cruzeiro do Sul. Esta constelação ajudou muito os navegadores
europeus nos mares do Sul. Isso por que no hemisfério Norte, existe uma estrela muito
brilhante (Estrela Polar) que indica a direção Norte. Aqui no hemisfério Sul, não existe uma
estrela no Pólo Sul, porém o Cruzeiro do Sul pode dar esta indicação.
Na imagem seguinte podemos ver com um pouco mais de detalhes as estrelas da constelação
do Órion, Cão Maior (onde se encontra a estrela Sírius) e Gêmeo.

De fato, é difícil ver no céu um Caçador, um Cão (Maior ou Menor), Gêmeos, etc., neste
caso os programas de céu virtual podem nos ajudar e colocar algumas linhas entre as estrelas
de uma mesma constelação e dando uma forcinha para nossa imaginação.

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Conseguem ver o Cão Maior agora?
No momento em que a bela constelação do Caçador (Órion) se põe para os lados do
Oeste, outra bela constelação nasce para os lados do Leste, a constelação do Escorpião.

A constelação do Escorpião é uma das mais belas e fáceis de ser encontrada no céu,
além disso, é uma das poucas que se parece com o objeto de sua representação. A estrela

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Antares é a mais brilhante desta constelação e tem uma pequena história curiosa. Devido a sua
cor, avermelhada, ela é facilmente confundida com o planeta Marte, Ares o deus grego da
Guerra, para evitar confusões os antigos a nomearam de “aquela que não é Ares” ou “anti-
Ares” de onde resultou “Antares”.
Como podemos perceber, no momento em que a constelação de Órion se põe a
constelação do Escorpião nasce do outro lado. Conta a mitologia, que uma deusa enciumada
enviou um escorpião para picar o calcanhar do gigante caçador, porém este escorpião nunca
alcançou seu objetivo e eles passaram a figurar no céu uma grande perseguição, quando um
aparece no céu noturno o outro se põe e eles nunca se encontram.
Passado algum tempo podemos perceber, na imagem seguinte, que a constelação do
Escorpião estará mais alta no céu, de fato, no decorrer da noite ela percorrerá seu caminho
pelo céu até se pôr para os lados do Oeste. É importante o educador perceber que a rotação
da Terra é que dá essa impressão de movimento noturno e diurno aos astros celestes.
Falaremos sobre a Rotação da Terra nos próximos capítulos.

Para dar uma força ainda maior à imaginação, podemos sobrepor os desenhos das
constelações desta região do céu.
Perceba que ao lado do Escorpião estão constelações que ao menos de nome são bem
conhecidas, como a Balança (Libra) ou o Sagitário.

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CAPÍTULO 2 – A TERRA É ESFÉRICA. MAS... POR QUE PARECE PLANA?

Quando olhamos a nossa volta, parece que estamos vivendo um mundo plano! Não é
simples acreditar que andamos sobre uma grande esfera.

Figura 1: Horizonte aparentemente plano.

O filósofo grego Tales de Mileto (que viveu no século VI a. C.) acreditava que a Terra
era, na verdade, um grande disco chato num universo infinito de água.

Figura 2: Terra “plana” na concepção de Tales.

Atividade 3 – Terra Plana

Separar a turma em grupos pequenos (sugestão: de 3 a 5 alunos) e discutir e


representarem o dia e a noite numa Terra Plana .

Tales tinha um discípulo, chamado Anaximandro, que pensou em um formato diferente


para a Terra: ele considerava que a Terra tinha o formato de um cilindro, circundado por rodas
cósmicas cheias de fogo. O Sol era um furo, numa dessas rodas, que deixava o fogo escapar.

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Figura 3: A Terra de Anaximandro

Pitágoras, um matemático e filósofo que viveu na Grécia entre os anos de 570 a.C. e
496 a.C., propôs a idéia inovadora de que a Terra seria esférica. O interesse de Pitágoras por
números contribuiu para a percepção de uma ordem no Universo e de sua beleza. Essa visão
incluía perfeição da esfera para o formato da Terra – pois as observações mostravam astros
redondos. Além disso, a alternância entre dia e noite poderia ser explicada por esse modelo.

Figura 4: Idéia de Terra redonda.

Além disso, acreditava que os planetas, o Sol, e a Lua eram transportados por esferas
separadas da que carregava as estrelas.

Atividade 4 – Terra Redonda

Escrevam uma carta para Anaximandro, tentando convencê-lo de que a Terra é esférica.

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CAPÍTULO 3 - UM POUCO DE HISTÓRIA

Platão foi um filósofo que viveu em Atenas, no século IV a.C. Dentre as diversas
concepções filosóficas, ele criou a Teoria das Formas: Platão acreditava que o mundo das
formas contém exemplares de entidades matemáticas e geométricas como números e o círculo
perfeito. Os círculos imperfeitos que encontramos no mundo físico são cópias do círculo
perfeito e eterno que conhecemos através das nossas mentes.

Figura 5: O filósofo Platão, representado aqui


pelo pintor italiano Rafael Sanzio.

Aristóteles foi discípulo de Platão (e tutor de Alexandre Magno da Macedônia), mas no


fim da vida desenvolveu seu trabalho em direções menos espirituais que as de seu mestre.
Aristóteles acreditava que o Universo era esférico e finito, composto por quatro elementos
básicos: água, terra, fogo e ar. A Terra, esférica, ocupava a posição central e era imóvel.
Cada elemento tende a se agrupar com seus semelhantes, tomando a forma esférica,
que é a forma mais simétrica e perfeita. E isto ocorre segundo o peso de cada um, ou seja, a
tendência que cada corpo tem de se aproximar do centro do universo; e que é maior ou menor
em cada corpo, segundo a substância que o compõe. Assim, o elemento mais pesado é a terra,
que sempre se move para baixo. Ele é seguido pela água. Já o ar é ainda mais leve, formando
uma camada acima da água, e o fogo, o mais leve de todos, sempre se move para cima.
Assim, o centro do universo estaria ocupado pela Terra esférica.

Os dois textos a seguir tratam da forma e dos movimentos dos corpos celestes. Que tipo
de movimento eles descrevem?
No século IV a.C. Platão lançou a concepção de um mundo esférico em que os
movimentos dos corpos celestes deviam ser realizados em círculos perfeitos e com velocidade
uniforme.

Na citação seguinte ele introduz a concepção de Terra esférica e de movimento circular:


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“Para a forma (o criador) deu-lhe a que lhe convinha e que tinha afinidades com
ele. Ora, a forma que convinha ao animal que devia conter todos os animais é a que
encerra todas as outras formas. Por isso o deus deu ao mundo a forma esférica, cujas
extremidades estão todas a igual distância do centro, sendo esta forma circular a mais
perfeita de todas a e a mais semelhante a si mesma.
Atribuiu-lhe um movimento ao seu corpo. Consequentemente, fê-lo girar unifor-
memente sobre si mesmo no mesmo lugar e impôs-lhe o movimento circular. Como não
eram preciso pés para esta rotação, criou-o sem pernas e sem pés.”

Já Aristóteles apresentou uma concepção de esfericidade da Terra muito mais


sofisticada que aquela apresentada por Platão. Na citação seguinte ele descreve o movimento
natural da queda dos corpos:

“...este mundo é único e solitário. É claro que não há nada, nem lugar, nem vácuo,
além dos céus. O movimento natural da Terra como um todo, como de todas as suas
partes, está dirigido para o centro do Universo; esta é a razão de porque ela está no
centro.
Assim, a Terra e o Universo têm o mesmo centro. Os corpos pesados movem-se
para o centro da Terra apenas incidentalmente, pois seu centro está no centro do
Universo. Assim, a Terra não se move.
A razão para essa imobilidade é clara: é da natureza da Terra mover-se de todos os
lados para o centro (como as observações mostram). Sua forma deve ser esférica, pois
partes iguais são condicionadas em todas as partes, a extremidade deve estar a uma
distância constante do centro. Tal forma só pode ser esférica...”

Atividade 5

Em equipes de 5 alunos, elaborem um texto que aborde as respostas das seguintes perguntas:
- Quais são as principais semelhanças entre os textos? E as principais diferenças?
Justifiquem.
- Vocês concordam com alguma dessas idéias? Qual seria a mais adequada, em sua
opinião?

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Após essa atividade, espera-se que os alunos tenham ficado motivados em conhecer
mais a respeito dos modelos que procuram explicar o formato da Terra. Assim, o professor
pode oferecer argumentos observacionais que evidenciem a esfericidade terrestre:
- Um navio se afastando: quando uma pessoa vê um navio se afastar, ela vê o
casco sumir no horizonte antes do mastro. Isso pode ser explicado através do formato plano
para a Terra?
- O fenômeno do eclipse lunar: a projeção da sombra da Terra na Lua é
arredondada. Essa forma poderia ser explicada para uma Terra plana com um formato de
disco? E por uma Terra redonda?
- O Sol não nasce na mesma hora em todos os lugares: eram relatados
mudanças no comprimento do dia no verão, os dias eram mais “longos” nas regiões mais ao
norte.
- Observadores distantes observam estrelas em diferentes distribuições –
enxergam constelações diferentes: A noção de esfericidade provavelmente surgiu a partir dos
relatos de viajantes que descreviam estrelas visíveis no Sul (Egito, por exemplo) mas invisíveis
na Grécia como a brilhante Canopus (declinação ≈ −52◦42) ou estrelas que se tornam
circumpolares quando viajamos para o norte.

Figura 6: Sistema geocêntrico formulado por Aristóteles

Vimos que Aristóteles defendia a esfericidade da Terra, de acordo com o argumento de


que o elemento terra tinha a tendência natural de ir em direção ao centro de tudo. Logo, para
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ele, a Terra estava no centro do Universo. Vários estudiosos contribuíram para a formulação
deste modelo, desde os primeiros filósofos do século VI a.C., os chamados pré-socráticos, até
Claudio Ptolomeu, no século II d.C., organizou todo o
conhecimento de astronomia acumulado pelos gregos nestes oito séculos e projetou um
sistema astronômico geocêntrico detalhado que especificava as órbitas da lua, do Sol e de
todos os planetas.
“Os objetos e as esferas celestes não podem ser feitos das mesmas substâncias que o
mundo material; todos eles são compostos por um quinto elemento, translúcido: o éter, cuja
propensão natural é o movimento circular em torno do Centro (e não a queda em direção a
ele), onde está a Esfera Terrestre. Por isso, no céu, todo o éter se organizou em esferas que
estão em movimento circular perpétuo e imutável.”

Para Aristóteles, as estrelas estavam afixadas em uma esfera mais externa no limite do
universo, a esfera das “Estrelas Fixas”. Abaixo delas, outras sete esferas, em cada uma das
quais havia corpos que se movimentavam diferentemente das estrelas de fundo, os chamados
planetas, pontuais como as estrelas, são: Mercúrio, o mais rápido no céu; Vênus, o mais
brilhante; Marte, o planeta vermelho; Júpiter, também muito brilhante; e Saturno, com uma cor
sólida e de movimento muito lento. Do mais interno para o mais externo, são: Lua, Mercúrio,
Vênus, Sol, Marte, Júpiter e Saturno.

Esse é o sistema de mundo proposto por Aristóteles, numericamente formulado por


Ptolomeu, continuamente refinado por filósofos e astrônomos europeus e árabes, ao longo de
toda a Idade Média. Portanto, se esse modelo parece tão estranho a nós, não é porque ele é
“pior” ou “menos certo” que o nosso; é somente porque não é o nosso. Desde muito pequenos,
repetiam muitas vezes para nós que o movimento dos céus é aparente, que é reflexo do
movimento da Terra; que existem muitos outros planetas iguais à Terra, e que é o Sol que fica
parado, e os planetas se movem em torno dele. Todos fomos longamente educados segundo
os padrões do NOSSO modelo, e isso foi tão forte que, diante de um modelo muito mais
intuitivo, o achamos ainda estranho e errado. Não que devamos abandonar nossa visão de
mundo atual, claro que não; mas precisamos saber reconhecer outras, quando elas existem.
Esse é um bom ponto de partida.

O Universo aristótélico se dividia em duas regiões distintas: a região sublunar, que ia


desde o centro da Terra até a órbita da Lua; e a região sobrelunar, que era o restante do
universo finito, estendendo-se da órbita lunar até a esfera das estrelas. Todos os corpos na
região sobrelunar eram formados por uma substância chamada éter. O éter tinha uma
propensão natural a se mover em círculos perfeitos ao redor do centro do universo. Porém,

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com o tempo, esse sistema foi sofrendo modificações, para poder explicar as posições dos
planetas que eram observadas.

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CAPÍTULO 4 - QUEM ESTÁ NO CENTRO DO UNIVERSO?

“Todos os olhos na Terra se voltarão para o céu”. É com esta bela frase que o Trailler
de apresentação do Ano Internacional da Astronomia (2009) começava. Era exatamente isso
que se pretendia: que no ano de 2009 todas as pessoas levassem seus olhos para os céus e
pudessem observar o que foi observado por um personagem famoso na ciência, 400 anos
atrás.
O ano de 2009 tinha sido escolhido em comemoração aos 400 anos desde que Galileu
Galilei (1564-1642) publicou seu livro Sidereus Nuncius (Mensagem dos Astros), em que ele
descreve as primeiras observações astronômicas feitas com telescópio. Mas a comemoração
não é apenas em virtude do feito de Galileu ou pelo telescópio, mas porque a época dele foi
uma época de mudanças radicais na visão de mundo das pessoas, muito motivadas por
mudanças nas idéias astronômicas. São essas mudanças que discutiremos neste capítulo.

Figura 7 – Capa do livro de Galileu.

Na época de Galileu, o modelo Geocêntrico, discutido no capítulo anterior, era o mais


aceito. Ele foi um modelo muito importante na história da humanidade, por que foi desenvolvido
por muitos estudiosos (como Aristóteles na Grécia Antiga no século IV a. C. e Ptolomeu no

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século II d.C) se consolidou e foi aceito por muito tempo. Durante a Idade Média foi o modelo
mais aceito na Europa, em particular pela Igreja.
Já na Grécia Antiga Aristarco de Samos propôs um modelo diferente: a Terra está em
movimento, e gira ao redor do Sol. Este modelo ficou conhecido como modelo Heliocêntrico.
Esta idéia não ganhou muitos adeptos na época, e só passou a ser novamente defendida muito
tempo depois, principalmente com a repercussão dos trabalhos de Nicolau Copérnico, no
século XVI.

Atividade: Faça um desenho representando os sistemas Geocêntrico e Heliocêntrico, e


explique o seu desenho com as suas palavras.

Atividade 6 - Um debate entre dois Sistemas de Mundo

Sugerimos que sejam formados pequenos grupos de alunos (3 ou 4) para que sejam
discutidos os dois sistemas de Mundo: Geocêntrico e Heliocêntrico. Será que a Terra está
parada, no centro do Universo, como defendiam Aristóteles e Ptolomeu? Ou a Terra se move, e
gira ao redor do Sol?

Galileu escreveu um livro sobre este embate entre o Helocentrismo e o Geocentrismo,


intitulado Diálogo Relativo aos Dois Grandes Sistemas dos Mundos - Ptolomaico e
Copernicano. Neste, os dois sistemas são debatidos numa série de discussões entre três
personagens: Salviati, Sagredo e Simplicio. Salviati é um bem articulado defensor do
Heliocentrismo, Sagredo é um ouvinte inteligente, a princípio neutro e curioso sobre o assunto,
enquanto Simplicio era um teimoso Aristotélico. No site selecionamos alguns trechos do
Diálogo, que podem ser lidos ou encenados em sala de aula, de forma a estimular os alunos a
se engajar neste debate.
É interessante nesta discussão considerar o conhecimento de física da época de Galileu
(final do século XVI). Lembrando que Newton nasceu no ano em que Galileu morreu, portanto
não havia até então leis de Newton para a mecânica e gravitação. Assim sugerimos que sejam
evitados no debate argumentos envolvendo o conhecimento científico criado depois da época
de Galileu, como a partir de fotos tiradas por satélites, viagens espaciais, etc.

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CAPÍTULO 5 - CONDUZINDO O DEBATE

O debate pode se estender por várias aulas. A princípio, ele pode ser útil tanto para
identificar os conhecimentos prévios dos alunos quanto para motivá-los para o estudo do
assunto. Nas aulas seguintes, vamos sugerir alguns assuntos que podem ser discutidos,
fornecendo argumentos para ambos os grupos. O educador pode também pedir para que os
alunos pesquisem sobre o assunto, orientando-os de forma enriquecer o debate.
A idéia é evitar dois extremos: o mito cientificista e a total desvalorização da ciência. Por
um lado, é importante mostrar que o Heliocentrismo não é uma verdade absoluta,
inquestionável, que foi provada. O conhecimento científico tem um caráter provisório. As teorias
são aceitas como verdadeiras temporariamente, de forma que sempre existe a possibilidade de
que qualquer teoria seja descartada no futuro, caso surja uma teoria rival melhor embasada.
Por outro lado, não devemos achar que como as teorias científicas não são verdades
absolutas elas não são confiáveis. Em cada época, os cientistas usam diversos tipos de
argumentos para sustentar suas teorias, produzindo resultados valiosos e duráveis, mesmo
que não definitivos.

O conhecimento científico é provisório, durável e se auto corrige.

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ARGUMENTOS A FAVOR DO HELIOCENTRISMO

A) AS LUAS DE JÚPITER

Galileu olhou para o céu com seu pequeno instrumento (figura abaixo) e viu o já
conhecido planeta Júpiter. Em sucessivas observações ele notou algo estranho: apareciam
certos “pontos brilhantes” em volta do planeta, que ele chamou de estrelas, e esses “pontos
brilhantes” mudavam de configuração com o passar do tempo.

Figura 8 – Luneta de Galileu

Palavras de Galileu com relação à sua observação:

“(...) no dia sete de janeiro do presente ano de 1610, à primeira hora da madrugada,
enquanto contemplava com o telescópio os astros celestes, apareceu Júpiter (...) percebi (...)
que o acompanhavam três pequenas estrelas, pequenas sim, mas em verdade claríssimas; (...)
Sua disposição mutua com relação a Júpiter era:

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“(...) tendo voltado a contemplá-las no dia oito, não sei porque razão, observei uma
disposição diferente (...)”

“(...) no décimo dia de janeiro as estrelas apareceram nesta disposição com relação a
Júpiter:”

Atividade 7

Analisando as observações de Galileu, o que você concluiria? O que são estes pontos
brilhantes, e por que eles têm este movimento.

Galileu interpretou que estas “estrelas” eram corpos girando ao redor de Júpiter, eu seja,
satélites, como a nossa Lua.

B) MERCÚRIO E VÊNUS PERTO DO SOL

Copérnico já havia defendido o sistema Heliocêntrico antes de Galileu, em 1543. Seu


principal argumento era a maneira concisa pela qual sua teoria explicava diversas
características do movimento planetário, que só poderiam ser explicadas pela teoria rival de
Ptolomeu de um modo prolixo e artificial.
O fato observado era de que, diferentemente dos outros planetas, Mercúrio e Vênus
permanecem sempre na proximidade do Sol. . Este dois planetas só podem ser vistos no céu
poucas horas depois do Sol se por e poucas horas antes de ele nascer. Vênus, muito brilhante,
é por isso conhecida como Estrela D’Alva, Estrela da Manhã, ou outros nomes similares.
Esta é uma conseqüência natural do sistema Heliocêntrico uma vez que fica
estabelecido que as órbitas de Mercúrio e Vênus estão no interior da órbita da Terra. No
sistema Geocêntrico, as órbitas do Sol, Mercúrio e Vênus têm que ser artificialmente ligadas

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para que se alcance o resultado desejado.

Figura 9 - Explicação heliocêntrica de por que Vênus e Mercúrio estão sempre próximos ao Sol.

No site, disponibilizamos um texto com algumas figuras e simulações, que permitem


entender como se explicava o movimento aparente dos planetas no céu utilizando o sistema
geocêntrico. A explicação é um tanto complicada, mas foi satisfatória na época de Ptolomeu.

C) CRATERAS NA LUA

Galileu fez outras observações importantes e que marcaram o desenvolvimento da


ciência a partir daquele ponto. Ele apontou o instrumento para a Lua e percebeu que esta não
era tão perfeita como se imaginava até então.
A velha e conhecida Lua, vista através de uma pequena luneta ganha formas que
emociona qualquer observador, experiente ou iniciante, amador ou profissional, revela vales e
montanhas, sombras e crateras até ausência de São Jorge.

Atividade 8
Observe o céu a olho nu. Se possível consiga um telescópio também para ver as
crateras da Lua. Façam desenhos do que observaram e comparem com os desenhos de
Thomas Harriot e Galileu disponíveis no site.

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D) MANCHAS SOLARES

Com o telescópio, Galileu fez uma série de observações das manchas que o Sol parecia
apresentar em sua superfície. Projetando a imagem do Sol sobre uma superfície clara, ele fez
registros e elaborou vários desenhos que mostravam o tamanho e a posição das manchas
encontradas.
Seus desenhos foram publicados em 1612 e ilustravam a evolução e o deslocamento das
manchas solares, pois Galileu fez uma seqüência de imagens obtidas através de observações
em dias consecutivos. A Figura 1 apresenta um magnífico desenho feito por ele:

Figura 10 - Manchas solares, desenhadas por Galileu Galilei

Essa descoberta pode sustentar a teria Heliocêntrica proposta por Copérnico pois, ao
contrário do que se pensava, o Sol não apresenta uma superfície esférica perfeitamente plana.
O modelo aristotélico para os astros era o de uma esfera sem imperfeições, mas Galileu
observou que o Sol também possui defeitos, como a Terra.

Atividade 9 - O que são as manchas solares?

A explicação mais aceita atualmente para as manchas solares é bastante complicada.


Envolve a interação do campo magnético do Sol em sua superfície que gera certa queda de
temperatura localizada. Estes conteúdos são muito complicados para serem ensinados no
ensino médio. Porém, esta é uma boa oportunidade para exercitar a criatividade. Proponham
teorias para explicar a manchas, e pensem em formas de verificar suas teorias.
ARGUMENTOS A FAVOR DO GEOCENTRISMO
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A) OBSERVAÇÃO COTIDIANA

Nós já estudamos que o Sol se move no céu, nascendo todos os dias no lado leste,
subindo no céu até atingir seu ponto mais alto próximo ao meio-dia, e então passa a descer, se
pondo no lado oeste. Os povos antigos que observavam isso, propunham o que parece mais
natural: a Terra está parada e Sol em movimento, pois gira ao redor da Terra.
De fato, a Terra não parece se mover. Quando estamos em movimento, numa bicicleta,
carro ou ônibus, por exemplo, é comum sentir o vento batendo em nossos cabelos, empurrões
quando fazemos curvas ou freamos bruscamente. Quando estamos na Terra não sentimos
ventos fortes sempre na mesma direção, nem somos arremessados para fora.

Atividade 10

Uma pessoa chega para você hoje e diz: “O Sol nasce, passa por cima de nossas
cabeças e se põe, todos os dias. É óbvio que a Terra está no centro e o Sol girando ao redor.”
Como você diria para essa pessoa que o que acontece é o contrário? Que argumentos você
usaria?

B) A ROTAÇÃO DA TERRA E O ARGUMENTO DA TORRE

Quando jogamos uma pedra exatamente para cima, ela cai em cima de nós, certo? Mas
quando propuseram que a Terra girava, não foi o que disseram. Os críticos da rotação da Terra
diziam que, enquanto a pedra estivesse no ar, a Terra giraria um pouco, de forma que, quando
voltasse ao chão, a pedra estaria um pouco mais atrás (ou à frente) de quem jogou. Mas isso
não é o que acontece!
Se a Terra gira sobre seu eixo e gira ao redor do Sol, como supunha Copérnico, então
qualquer ponto da superfície da Terra vai deslocar-se uma distância considerável em um
segundo. Se uma pedra é jogada do alto de uma torre construída sobre a Terra em movimento,
ela vai executar seu movimento natural e cair em direção ao centro da Terra.
Enquanto ela estiver fazendo isso a torre estará partilhando do movimento da Terra,
devido à sua rotação e translação. Conseqüentemente, quando a pedra alcançar a superfície
da Terra a torre terá se afastado da posição que ocupava no começo. Esta deverá, portanto,
atingir o solo a alguma distância do pé da torre. Mas isso não acontece na prática. A pedra
atinge o solo na base da torre. Isso não nos mostra que a Terra não pode girar ?

28
Como os aristotélicos afirmam que todo movimento pode ser observado, então, solta-se
uma pedra do alto de uma torre, ela cai, a cada momento, sempre paralela à torre até cair no
chão, ao lado da torre. Ou seja, não se consegue perceber nenhum outro movimento, a não ser
o movimento vertical da pedra. Como os aristotélicos afirmam que todo movimento pode ser
observado, a Terra só pode estar parada; se a Terra estivesse se movimentando, perceber-se-
ia algum outro movimento da pedra, e não só o movimento vertical.
O que Galileu propõe é o seguinte: a Terra se move. Mas como é que se mostra isso?
Ele usa o argumento dos aristotélicos da queda dos corpos, que a princípio mostrava que a
Terra não pode se mover, para sustentar a idéia oposta!
Tanto a pedra, como o sujeito, a torre, a Terra, todos estão fazendo um mesmo
movimento. Quando a pedra foi largada, ela já estava girando junto com a Terra. Mas como ele
poderia sustentar este argumento?

Para sustentar sua idéia ousada, de que a Terra está em movimento, Galileu propôs
outra idéia igualmente duvidosa para a época, que hoje identificamos como a lei da inércia.
“Ah! Mas acontece que todo corpo tende a permanecer no seu estado de movimento, todo
corpo não é capaz de, por si só, mudar o seu estado de movimento.”
Porém a lei da inércia como conhecemos hoje, só foi formulada posteriormente por
Newton. Galileu começou a formular as bases de uma nova física, diferente da que era
predominante na época, a física Aristotélica.

Figura 11 – Argumento da torre

Atividade 11
29
Desenhe e explique a queda de uma bolinha atirada do alto de uma torre do ponto de
vista de um aristotélico. Mostre que se a Terra estiver parada, a pedra deve cair no pé da torre.
Já se a Terra girar, a pedra deve cair a certa distância do pé da Torre.

Atividade 12

Se já tiverem estudado cinemática, pode-se explorar nesta aula alguns aspectos


qualitativos. Se não tiverem estudado cinemática, pode-se adaptar o curso de astronomia para
incluir também os estudos de Galileu sobre a queda dos corpos. Pode-se calcular a velocidade
de rotação da Terra ao redor de seu eixo, que é de aproximadamente 1600 km/h. (Raio da
Terra = 6400km).
Sendo assim, ao se jogar uma pedra de uma torre de 20m de altura, a que distância do
pé da Torre ela deveria cair?

Atividade 13

Outro argumento contra a heliocentrismo envolvendo o argumento da torre é o seguinte


Se a Terra gira, por que tudo que está na superfície da Terra não é arremessado para fora? E
se a Terra se move em torno do Sol, por que ela não deixa a Lua para trás?
Hoje explicamos isto usando a idéia de gravidade. Mas a forma da gravitação que
conhecemos atualmente ainda não tinha sido desenvolvida por Newton. Portanto este é mais
um bom argumento que Galileu não poderia refutar em sua época.

Atividade 14

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Veja a tirinha:

Como seriam as coisas aqui na Terra se ela só tivesse rotação? E como seriam se a
Terra não girasse em torno de si mesma, mas somente em torno do Sol?
Esta é uma boa oportunidade para abordar os conceitos de Dia e Noite e Estações do
Ano. Oriente os alunos a dar respostas bem abrangentes, explicando e desenhando como
seria o clima e as estações do ano em ambos os casos.

CAPÍTULO 7 - ESTÁ ANOITECENDO NO BRASIL

Como é que se passa do dia claro para a noite escura? Durante a noite, alguma coisa
cobre o Sol? O Sol se esconde de nós?
As discussões anteriores serviram para nos dar uma noção melhor de como funciona a
Terra, como são seus movimentos. O educador deve conduzir as discussões com seus alunos
neste sentido. Pretendemos propor agora uma imagem e uma música para melhorar as noções
dos alunos sobre a rotação da Terra.
A figura abaixo é bastante ilustrativa nesse aspecto. Pretendemos deixar o educador
livre para trabalhar com ela, para propor aos seus alunos uma atividade que a envolva.
O desenho no canto superior direito indica com uma regrinha simples o sentido de
rotação da Terra. Esticando o polegar na direção do eixo da Terra e fechando a mão, teremos o
sentido. Fazendo esse movimento a Terra vai girar no sentido que apontam os dedos. A seta
vermelha no desenho indica o movimento da sombra.
Se divirta com os alunos. Em qual cidade a anoitece primeiro? Diga uma cidade que
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ainda está de dia. O que são os pontos luminosos na parte escura da figura? Em que outro
país está anoitecendo neste momento (momento da figura)? Pergunte aos alunos se, enquanto
eles estiverem fazendo a atividade, em algum lugar do planeta está anoitecendo.

Figura 13 – Anoitecer no Brasil

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E SE PUDESSEMOS TER A VELOCIDADE PARA VER TUDO?

Uma proposta interessante para trabalhar os conceitos apresentados é através de uma


música. A música Enquanto Isso (Marisa Monte/Nando Reis) pode ser usada neste sentido.
Ouça a música e com a letra em mãos descreva com as próprias palavras o que os
autores queriam passar.

ENQUANTO ISSO
(Marisa Monte/Nando Reis)

Enquanto isso
anoitece em certas regiões

E se pudéssemos
ter a velocidade para ver tudo,
assistiríamos tudo

A madrugada perto
da noite escurecendo
ao lado do entardecer
a tarde inteira
logo após o almoço

O meio-dia acontecendo em pleno sol


seguido da manhã que correu
desde muito cedo
e que só viram
os que levantaram para trabalhar
no alvorecer que foi surgindo

C) PODEMOS CONFIAR NOS TELESCÓPIOS?

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Vamos voltar a falar de argumentos contra o heliocentrismo. O uso do telescópio era
bastante controverso. Galileu precisava convencê-los de que as observações com o novo
instrumento eram confiáveis, e melhores que as observações a olho nu, ou seja, os seus rivais
precisavam aprender a “ver” com o telescópio. No entanto, ainda não havia uma teoria óptica
da formação de imagens nos telescópios. Além disso, existem muitas aberrações nas imagens
de telescópios refratores como os utilizados por Galileu. Quando se vê algo conhecido, na
Terra, é fácil diferenciar o que é aberração do que não é. Porém, quando se observa corpos
celestes, que nunca foram vistos antes, isso não é simples. Tanto que em seus desenhos de
suas observações da Lua, há algumas crateras que não existem.

D) A PARALAXE.

Em Astronomia, os objetos de estudo estão sempre muito distantes. Quase sempre os


astrônomos precisam obter informações sobre os astros sem poder tocá-los ou colher
amostras para realizar experimentos, o que tem sido feito de forma limitada somente muito
recentemente em corpos relativamente próximos como a Lua e Marte. Há ainda a possibilidade
de análise de meteoritos caídos na Terra. Mas isto é muito pouco! Os astrônomos conseguiram
desenvolver muitos métodos para obter informações sobre os corpos celestes, analisando a luz
que recebemos deles. Alguns exemplos de grandezas que podem ser obtidas desta forma são:
velocidade, distância, temperatura, massa, idade, a presença de elementos químicos e suas
respectivas quantidades, e outras mais.
Uma das informações mais importantes que se pode obter sobre um corpo é a distância
a que ele está da Terra. Há vários métodos para fazer isso. Um deles, talvez o mais simples, é
através da medida do ângulo de paralaxe. Para entendê-lo, você pode fazer uma experiência
simples, aí mesmo onde está agora, sentado na sala de aula. Talvez a pessoa que está
aplicando a prova ache um pouco estranho, mas tudo bem. Não tenha vergonha, você está
fazendo uma experiência que vai ajudá-lo a entender como se sabe a distância das estrelas! E
afinal, todo mundo na sala vai acabar fazendo a experiência também. O examinador vai acabar
se acostumando, caso ele não tenha lido a prova antes.
Então vamos lá! Levante o dedo indicador, e estique o braço. Feche um olho, e observe
o seu dedo, e note o fundo atrás dele (provavelmente a parede da sala de aula). Agora feche o
olho que estava aberto, e abra o outro, sem mover o braço. Você notou que o seu dedo parece
andar em relação ao fundo?

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Figura 14 – Paralaxe.

O método da paralaxe consiste em fazer esse mesmo tipo de observação. Para medir
distâncias, ao invés do dedo se utiliza uma estrela e ao invés do piscar de olhos se utiliza o
movimento da Terra em sua órbita.
Quando olhamos para o céu, em seu conjunto, a distância das estrelas é tão grande que
perdemos a noção de profundidade, num primeiro momento. Todas as estrelas parecem então
estar à mesma distância, coladas numa grande esfera, a Esfera Celeste. Mas, na verdade,
sabemos que elas não estão à mesma distância, sendo o método de paralaxe usado para
medir algumas destas distâncias. Para entendê-lo, olhe a figura ao lado. Quando a Terra está
na posição A, na figura da esquerda, vemos uma estrela que está relativamente próxima, se
considerarmos as demais (bem mais distantes, formando um “fundo” de estrelas).
Já na posição B, algum tempo depois, a Terra está em outra posição, e vemos a estrela
em outra posição em relação às estrelas de fundo. Ela parece se mover, assim como o seu
dedo pareceu se mover quando você trocou o olho aberto.
Na prática, através da observação da estrela nas posições A e B, os astrônomos são
capazes de medir o ângulo mostrado na figura, que se chama paralaxe. Com esse ângulo e
trigonometria, pode-se determinar a distância da estrela.

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Atividade 15

Quanto tempo a Terra levou para se mover da posição A para a posição B, na figura acima?
Justifique.
Imagine agora que temos duas estrelas: uma está a uma certa distância D, e a outra
está a uma distância 2D. Para qual das estrelas a paralaxe medida será maior? Calcule de
quanto será a diferença. Dica: Teste isso experimentalmente com o seu dedo.

Com o método da paralaxe podemos encontrar a distância de qualquer estrela?


Justifique.

Em qual sistema, heliocêntrico ou geocêntrico, seria mais fácil observar as paralaxes?


Por quê?
Pense na sua resposta da questão acima. Como você elaboraria um argumento
relacionado à paralaxe que possa ter contribuído para que o Sistema Geocêntrico fosse
preferido pelos gregos e mesmo por muitos da época de Galileu e Copérnico?

36
CAPÍTULO 8 – O JULGAMENTO DE GALILEU

Figura 15 – O julgamento de Galileu

Após a realização do debate entre Geocentrismo e Heliocentrismo em diversas aulas, o


educador pode contar aos alunos que o que fizeram em sala de aula foi uma reconstrução de
um debate que de fato ocorreu com Galileu. Um bom desfecho para a questão pode ser contar
um pouco da história do julgamento de Galileu pela Inquisição.
Muitas obras já foram escritas analisando o significado do julgamento de Galileu Galilei e
há muitas visões diferentes sobre o assunto. Este conflito é freqüentemente visto como uma
controvérsia entre a Ciência e a Religião. Ainda é muito comum idéia de que Galileu teria sido
uma vítima, injustiçado por motivos puramente religiosos. Os dez cardeais que participaram de
seu julgamento teriam sido teimosos em não aceitar os argumentos científicos de Galileu,
embasados por suas descobertas utilizando o telescópio.
No dia 22 de junho de 1933, Galileu foi levado a julgamento no quartel general da
Inquisição em Roma. Ele tinha 69 anos, e em sua defesa se referiu a seu “lastimável estado de
mal-estar físico”. Sob a ameaça de tortura, encarceramento e mesmo morte na fogueira, ele foi
forçado de joelhos a “abjurar, amaldiçoar e detestar” toda uma vida brilhante e devotado labor
intelectual. Confrontado com uma “veemente suspeita de heresia”, ele teve de renunciar, “com
um coração sincero e fé genuína” à sua crença de que o Sol, e não a Terra, é o centro do
universo, e que a Terra move-se em torno do Sol, e não vice-versa. (Hellman 1999, p.21).
Galileu teve mais sorte que outros, como Giordano Bruno, que defendia a idéia de que o

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universo é infinito e que há muitos outros mundos. Ele acabou sendo condenado a morte, mas
não por causa de suas teorias científicas, mas por também argumentar contra a idéia de que
Maria, a mãe de Jesus, era virgem.
Galileu foi condenado a prisão domiciliar e seu livro Diálogo sobre os grandes sistemas
de mundo, ptolomaico e copernicano foi proibido e só foi retirado do Index em 1822. Somente
em 1992 o Papa João Paulo II, após 12 anos de revisões dos documentos sobre o caso,
decidiu absolver Galileu.
Na verdade, os oponentes de Galileu eram acadêmicos, defensores da teoria
aristotélica. Já estudamos aqui muitos dos seus bons argumentos contra o heliocentrismo.
Sendo assim fica claro de que a visão de que Galileu seria um símbolo da defesa da Verdade
científica contra a intolerância religiosa é bastante ingênua. Por outro lado, há autores que
propõe a visão oposta: a de que os cardeais teriam sido “as primeiras vítimas estarrecidas da
era científica”. Há também os que acham que a hostilidade entre ciência e religião tem sido
exagerada, e que fatores políticos (como o fato de Galileu ter ridicularizado o Papa em um de
seus livros) e científicos tenham sido mais relevantes que os religiosos para o desfecho do
julgamento.
Os professores de ciência não devem evitar controvérsias complexas como esta em
suas aulas. É comum a visão de que “religião não se discute”, já que no final não “não se
chega a lugar nenhum”. Na verdade estas discussões podem ser muito ricas para expor
melhor as visões dos alunos sobre a ciência, permitindo que os alunos sejam capazes de
perceber as diferenças entre o conhecimento científico e as outras formas de ver o mundo,
como as religiões. Isso permitirá um maior embasamento para tomar decisões conscientes, em
especial em relação a questões éticas, morais e religiosas. Este é um dos principais objetivos
da educação científica, já que nas sociedades democráticas, os cidadãos participam
ativamente (ou deveriam participar) na tomada de decisões públicas, como o financiamento das
instituições de pesquisa e a ética na pesquisa científica. Muitas das decisões ilógicas ou não
razoáveis são causadas por uma visão inadequada da ciência.

Atividade 16

Escreva uma carta para a Inquisição dando sua opinião sobre o caso de Galileu. Ele
deveria ser condenado?

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CAPÍTULO 9 - O FINAL DA HISTÓRIA

No século XVII, grandes cientistas como Galileu e Kepler defenderam o Heliocentrismo


numa época em que a Igreja era muito poderosa, e o Geocentrismo era a teoria mais aceita.
Hoje em dia a idéia de que a Terra gira em torno do Sol é amplamente aceita.
Essa foi uma mudança de visão de mundo muito importante, em que a Terra deixou de ser
considerada o centro do universo e passou a ser vista como apenas mais um planeta, que gira
como os outros ao redor do Sol. Tanto que essa passagem da teoria geocêntrica para a
heliocêntrica é assunto em muitos livros, revistas e obras de arte.
Porém, muitas vezes, essa história é contada de uma maneira pouco cuidadosa. Contamos a
chamada “história dos vencedores”, olhando para o passado com os olhos do presente,
valorizando apenas as teorias que “deram certo”, e subestimando as teorias que hoje são
consideradas inadequadas.
Uma Versão equivocada da transição do Geocentrismo para o Heliocentrismo, muito
comum em livros de divulgação científica seria algo assim:
Nos tempos antigos, os homens eram estúpidos e acreditavam que a Terra era plana e
estava no Centro do Universo. Mas depois chegou a ciência que iluminou nossas mentes:
finalmente descobrimos a Verdade: que a terra gira em torno de si e do Sol, que é atraída pela
gravidade do Sol. Grandes foram aqueles homens como Copérnico, Galileu e Newton, que
foram capazes de superar o misticismo e a repressão da igreja no mundo em que viviam e,
olhando por cima dos ombros dos gigantes, conseguiram enxergar a Verdade.

Atividade 17

- Você concorda com esse trecho?


- Por que você acha que a teoria Heliocêntrica, proposta por Aristarco no século III a. C levou
tanto tempo para ser aceita?
- Como você convenceria uma criança de que a Terra está em movimento?
Como será que Copérnico, Galileu e Kepler convenceram os defensores do Geocentrismo de
que a Terra não está parada?

39
Abaixo indicamos algumas instituições que oferecem passeios didáticos sobre astronomia.

Parque de Ciência e Tecnologia da USP - CIENTEC

Avenida Miguel Stéfano, 4200, Água Funda - São Paulo - SP

http://www.parquecientec.usp.br/index.htm

CATAVENTO – cultural e educacional

Catavento está situado no interior do Parque D. Pedro II, no centro da cidade de S. Paulo.

http://www.cataventocultural.org.br/home.asp

OBSERVATÓRIO "ABRAHÃO DE MORAES"

Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas - IAG-USP

Estrada Municipal s/nº - Morro dos Macacos - Vinhedo - SP

http://www.iag.usp.br/

40
PLANETÁRIO E ESCOLA MUNICIPAL DE ASTROFÍSICA

Planetário "Prof. Aristóteles Orsini"

Parque Ibirapuera - Av. Pedro Alvares Cabral - Portão 10

04094-000 - São Paulo - SP


http://portal.prefeitura.sp.gov.br/secretarias/meio_ambiente/planetarios

OBSERVATÓRIO MUNICIPAL DE CAMPINAS

O Observatório fica no Monte Urânia, Serra das Cabras, Distrito de Joaquim Egídio. É
comumente chamado de Pico das Cabras e dista 32Km do centro de Campinas.

http://www.campinas.sp.gov.br/observatorio/observatorio.htm

41
OBSERVE...

42
BIBLIOGRAFIA

Curso épsilon de Astronomia Geral elaborado pelo Comitê Científico e Didático da Olimpíada Brasileira
de Astronomia e Astronáutica, cujos autores são citados em:
http://www.oba.org.br/site/index.php?p=conteudo&idcat=8&pag=conteudo&m=s

Apresentações dos monitores do Centro de Divulgação da Astronomia, o observatório astronômico do


campus da USP-São Carlos
www.cdcc.sc.usp.br/cda

BAGDONAS, Alexandre; ANDRADE Victória F. e SILVA, Cibelle Celestino. Discutindo a natureza da


ciência a partir de episódios da história da cosmologia: O Grande Debate. In: Atas do XVIII Simpósio
Nacional de Ensino de Física- SNEF. Vitória, ES. 2009

CHALMERS, Alan F. O Que é ciência afinal? São Paulo: Brasiliense, 1995

EL-HANI, Charbel N. Notas sobre o ensino de história e filosofia da ciência na educação científica de
nível superior. In: SILVA, Cibelle.C. (Org.) Estudos de história e filosofia das ciências: subsídios para
aplicação no ensino, p. 3-21. São Paulo: Editora Livraria da Física, 2006.

FEYERABEND, P. Contra o Método, Livraria Francisco Alves, Rio de Janeiro. 1985.

McCOMAS, W. F. Seeking historical examples to illustrate key aspects of the nature of science. Science
& Education 17: 249-263, 2008.

FARES, Érika Akel; MARTINS, Karla Pessoa; ARAUJO, Lidiane Maciel; Filho, Michel Sauma Ounicerso
das sociedades numa perspectiva relativa: exercícios de etnoastronomia- Revista Latino-Americana de
Educação em Astronomia – RELEA – n.1. p 77-85. 2004

MATTHEWS, Michael. R. Science teaching – the role of history and philosophy of science. New York:
Routledge, 1995

AROCA, Silvia Calbo. Ensino de física solar em um espaço não formal de educação. 2008. 0 f. Tese
(Doutorado em Física) - Universidade de São Paulo, Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico
e Tecnológico. Orientador: Cibelle Celestino Silva.

GRAEF livro do aluno disponível em lhttp://www.if.usp.br/profis/gref_leituras.html

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