Nesse texto, presente na obra “A ralé Brasileira: quem é e como vive?”
de Jessé Souza, a autora Patrícia Mattos (Professora do departamento de Ciências Sociais, e do Programa de pós Graduação de História, UFSJ) expõe a realidade de garotas de programa do Rio de Janeiro (RJ) entre os anos de 2006 a 2008, através de uma pesquisa de campo. Assim, por meio de relatos e estudos dirigidos, ela apresenta a construção social de uma prostituta, “em que condições sociais e modos de vida produzem e reproduzem um tipo humano excluído e estigmatizado.” (MATTOS, 2009) trazendo no texto as congruências existentes nas histórias de diferentes mulheres da ralé (conjunto de indivíduos que pertence a uma classe marginalizada) brasileira, que recorrem a ideia de Pierre Bourdieu da “escolha pré-escolhida”, que se refere a uma certa predestinação, devido a vulnerabilidade e precariedade no universo familiar e social.
A autora faz referência ao pensador G. Simmel (séc. XIX) por meio de
uma analogia com a atual realidade brasileira, traz a ideia de uma desvalorização derivada do preconceito racial, e uma diferença de remuneração entre diferentes classes de prostitutas, dando um enfoque principal, como dito anteriormente a classe mais desfavorecida. Mesmo dentre esse grupo social há uma distinção relacionada aos papeis de gênero, sendo homens delinquentes vistos como corajosos e destemidos (Agente Ativo) e as mulheres delinquentes são intituladas “de vida fácil” (Agente Passivo).
Durante a leitura é notável perceber como a vida dessas mulheres é
marcada por um tipo de socialização familiar disruptivo, no qual as relações instrumentais são vistas como naturais, por isso há impedimento da transmissão de afeto e valores como disciplina, autocontrole, e perspectiva futura. A autora traz no texto relatos de duas mulheres que pertencem a essa realidade, Flavia e Marluce, que servem de reflexo de tudo que a autora decide transparecer através do texto, algo que de certa forma, se perde dentro do estigma social, todas as suas dores, traumas, entre outras situações.
A autora finaliza o texto fazendo uma crítica aos pesquisadores de
abordagens dentro da ciência social ditas “politicamente corretas”. O termo é utilizado entre aspas, pois o intuito dessas abordagens é, na verdade, a manutenção dos estigmas e mecanismos de dominação social sobre, tanto a prostitua em si, quanto a própria ralé. O “politicamente correto” tem como bases a relativização de realidades compartilhadas – que gera uma ideia falsa de “escolhas” durante a vida -, apagamento das condições precárias que formam esses indivíduos e a apropriação do autoengano para o manter da estrutura social como se encontra atualmente – invisibilizando, explorando e condenando a reprodução da miséria os corpos da ralé.