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Direito Penal II

2020/2021
3.º Ano

A omissão

1- C e D, amigos de curta data, combinaram ir praticar montanhismo para a Arrábida.


Antes de iniciarem uma escalada livre, C inalou uma dose considerável de cocaína; por
isso, ficou num estado extremo de entusiasmo e começou a escalada em grande velocidade,
apesar dos protestos de D, que não conseguia acompanhá-lo. A certa altura da escalada, D
deu um passo em falso, perdeu o equilíbrio e caiu numa ravina, sofrendo, em consequência
disso, ferimentos graves que lhe provocaram uma intensa hemorragia. C, que já ia bastante
mais acima, apercebeu-se da queda de D mas, no seu estado de euforia, decidiu prosseguir a
escalada e acudir à amiga apenas quando descesse. Quando, no regresso, se aproximou de D,
era já tarde demais: D morrera em consequência da hemorragia.
Pode C ser responsabilizado penalmente? Por que crime?
(Caso elaborado pela Professora Doutora Helena Morão)

2- Carlos está a afogar-se em alto-mar. Abel lança uma boia a Carlos. Quando a boia ia a
meio do caminho, Bento, a pedido de Abel, retira-a e Carlos morre afogado.
(Caso elaborado pelo Professor Doutor Francisco Aguilar)

3- Abel está a afogar-se. Bento, apercebendo-se dessa situação, resolve esconder o seu barco
para que este não venha a ser utilizado por terceiro. De imediato surge na praia Carlos que,
desesperado, não consegue acudir a Abel em tempo útil.
(Caso elaborado pelo Professor Doutor Francisco Aguilar)

4- A, de 83 anos, está acamada e impossibilitada de se mexer. A vive com o filho B, de cerca


de 50 anos. A certa altura B deixa a mãe sozinha em casa durante, pelo menos, 12 dias
consecutivos, deixando-lhe uns pacotes de leite com chocolate e uma sandes de queijo.
Quinze dias depois, a mãe, A, é encontrada morte na sua cama, por inanição. A tem mais
dois filhos que residem em casas próprias no mesmo conselho.
(Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de Julho de 2003)

5- Por volta das 2 horas da manhã, A, com intenção de matar, desfere vários golpes de
machado contra B, nas pernas e nos braços e, pelo menos, uma na zona da cabeça, num local
ermo. Após a agressão, A deixa B gravemente ferido e inconsciente no chão. Na manhã
seguinte, B é encontrado e transportado para o hospital, onde recebe tratamento, tendo
ficado num estado de coma vegetativo irreversível.
(Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Outubro de 2009)
6- A passeia com o seu cão (de grande porte) numa zona de passagem pública. No momento
em que B, transeunte, passa por A, é subitamente mordido pelo cão.
(Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 26 de Julho de 2007; Acórdão do Tribunal
da Relação do Porto de 9 de Abril de 2008 e Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de
10 de Outubro de 2007)

7- A circula por uma passagem de nível automática, com as cancelas levantadas e sem sinais
de aviso quando é abalroado por um comboio, vindo a falecer em consequência do acidente.
A passagem encontrava-se fora de funcionamento devido a um corte prolongado (há 2
dias) de energia na zona, responsabilidade da EDP. Por causa do corte de energia, um
funcionário, B, foi colocado na passagem para sinalizar, sempre que avisado via rádio, a
passagem do comboio. Contudo, por volta das 5 da manhã, a bateria do rádio do funcionário
falhou e este não recebeu qualquer aviso. A falha da bateria foi comunicada ao posto de
controlo de Palmela, a cerca de 1 km de distância, mas não foram tomadas providências. A
passagem possuía um telefone, também avariado por causa da falha de energia, o qual deveria
ter sido imediatamente substituído, mas a avaria não foi comunicada ao posto de controlo
de Setúbal (responsável pela substituição).
(Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 7 de Março de 2006)

8- A adquire um esquentador para uma pastelaria de que é proprietário, o qual é instalado


por técnicos da loja onde foi adquirido.
Passados 14 anos, durante a limpeza da pastelaria, efetuada por B e C (mãe e filha, ambas
contratadas por B), entre as 20h30 e as 23h, o gás libertado pelo esquentador – o qual não
possuía saída de fumos nem ventilação adequadas – veio a provocar-lhes a morte por
intoxicação.
(Tribunal da Relação de Lisboa de 15 de Maio de 2007 e Acórdão do Tribunal da
Relação de Évora de 6 de Dezembro de 2005)

Bibliografia:
- DIAS, Jorge de Figueiredo, Direito Penal – Parte Geral, tomo I (Questões fundamentais – A doutrina
geral do crime), 3.ª ed., Coimbra, 2019;
- PALMA, Maria Fernanda, Direito Penal – Parte Geral (A Teoria Geral da Infração como Teoria da
Decisão Penal), 5.ª ed., Lisboa, 2020.
- ROXIN, Claus, “Do limite entre comissão e omissão”, tradução de Ana Paula
Natscheradetz, in Problemas Fundamentais de Direito Penal, 3.ª ed., Lisboa, 1998, pp. 169-195;

Catarina Abegão Alves, março de 2021

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