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CIÊNCIAS HUMANAS
ABORDAGENS NAS
PARADIGMAS E PERSPECTIVAS
CONTEMPORÂNEAS
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FONTES, MÉTODOS E
ABORDAGENS NAS
CIÊNCIAS HUMANAS
Paradigmas e perspectivas contemporâneas
(Página Intencionalmente deixada em branco)
Amanda Basilio Santos
Elisabete da Costa Leal
Juliana Porto Machado
Ronaldo Bernardino Colvero
(Org.)
FONTES, MÉTODOS E
ABORDAGENS NAS
CIÊNCIAS HUMANAS
Paradigmas e perspectivas contemporâneas
1ª Edição
Pelotas
BasiBooks
2019
© 2019, BASIBOOKS
.
Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 5988 de 14/12/73. Nenhuma parte deste livro,
sem autorização previa por escrito da editora, poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais
forem os meios empregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos, gravação ou quaisquer outros.
ISBN 978-85-54082-03-1
A484
Fontes, Métodos e Abordagens nas Ciências Humanas [livro
eletrônico]: paradigmas e perspectivas contemporâneas /
Amanda Basilio Santos; Elisabete da Costa Leal; Juliana
Porto Machado; Ronaldo Bernardino Colvero
(Organizadores). 1. ed.– Pelotas: BasiBooks, 2019.
1379p.
PDF – EBOOK
ISBN: 978-85-54082-03-1
CDU 303
CDD 300
Realização:
Instituto Conexão Sociocultural (CONEX); Centro Latino-americano de Estudos em Cultura
(CLAEC)
Apoio:
Universidade Federal de Pelotas (UFPel)
Financiamento:
FAPERGS
Comissão Organizadora:
Dr.ª Elisabete da Costa Leal (ICH – Universidade Federal de Pelotas)
Mestra Amanda Basílio Santos (ICH – Universidade Federal do Rio Grande do Sul)
Mestra Juliana Porto Machado (ICH – Universidade Federal de Pelotas)
SOBRENOME, Nome. Título. In: SANTOS, A. B. et al. Fontes, Métodos e Abordagens nas
Ciências Humanas: paradigmas e perspectivas contemporâneas. Pelotas: BasiBooks, 2019, p. x-x.
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO......................................................................................................................01
TRANSCRIAÇÃO
Lucila Tragtenberg.....................................................................................................................1281
APRESENTAÇÃO
Nesta segunda edição do Encontro Internacional de Pesquisa em Ciências Humanas, o foco
de nossa discussão se desenvolveu em torno dos métodos, as fontes e as abordagens utilizadas nas
pesquisas contemporâneas na área das humanidades. O II Encontro Internacional de Pesquisa
em Ciências Humanas (II EIPCH), teve como objetivo principal promover o intercâmbio de
pesquisas da área das Ciências Humanas e das Humanidades, valorizando os processos, métodos,
abordagens e temáticas contemporâneas de variados campos de pesquisa. Embora a
interdisciplinaridade se coloque como essencial ao campo das humanidades, poucos eventos se
colocam como espaço de intercâmbio efetivo entre as variadas disciplinas. Deste modo, tendo
consciência desta necessidade crescente por diálogo entre pesquisadores, buscamos proporcionar,
por meio do evento, uma oportunidade que permita ampliar e aprofundar as noções que cercam
este tema, focando especialmente nas problemáticas de metodologia e abordagens de pesquisa.
Desta forma, busca-se identificar elementos capazes de permitir o aprofundamento metodológico
da reflexão do entendimento dos aspectos que envolvem as pesquisas em humanidades, por meio
da exposição e debate de pesquisas empíricas que se coloquem na interface de variadas áreas do
saber.
Para que fosse possível executar este evento, mesmo dentro de todos os cortes
orçamentários e dos apoios institucionais de cada vez mais difícil acesso, contamos com a equipe
do Instituto Conexão Sócio Cultural, com o CLAEC e com a parceria da Universidade Federal de
Pelotas. Deste modo, gostaría de estender nossos agradecimentos às instituições supracitadas, e ao
Centro de Artes e ao Instituto de Ciências Humanas, especialmente ao Prof. Dr. Sidney Gonçalves
Vieira, que sempre com muita presteza nos concede o espaço para a execução do EIPCH. Também
agradecemos a Coordenação de Comunicação Social, que sempre nos auxilia na estruturação dos
espaços, assim como a PROPLAN, em especial a Suelen, por sua gentileza e dedicação junto ao
evento. Agradecemos a Prefeitura Municipal de Pelotas pelo fornecimento de material turístico e
divulgação, em especial ao secretario de cultura Giorgio Ronna. E por fim, gostaríamos de
expressar nossa profunda gratidão a FAPERGS, pelo seu apoio financeiro junto ao evento, e que
por apostarem em nossa proposta, tornou o evento possível, assim como todos os momentos nele
vividos.
Em nome de toda a Equipe, agradecemos a todos os autores que compuseram esta edição
conosco, e desejamos uma ótima leitura deste que é um produto proporcionado pela qualidade e
dedicação de tantos pesquisadores.
Abraços de toda a equipe EIPCH, com estimados votos para um belo 2019.
Esperamos nos encontrar novamente, em nossa próxima edição.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo trazer algumas reflexões sobre os desafios enfrentados pelas
pesquisas sobre o pós-abolição, em especial, os estudos que versam sobre a inserção social e
econômica dos libertos no mundo do trabalho. Estes desafios se referem especificamente em relação
às esparsas fontes disponíveis para as pesquisas sobre o período citado. Propõe-se evidenciar algumas
alternativas a esta problemática, amparadas principalmente em pesquisas historiográficas recentes e
ressaltando a importância da perspectiva da Micro-história. Esta, permite o cruzamento de variadas
fontes e possibilita seguir indícios importantes que podem ser úteis para analisar as vivências que a
população liberta percorreu, ao inserir-se em um contexto de nova configuração das relações de
trabalho. Nesse sentido, situa-se a pesquisa de doutorado em andamento sobre a inserção da
população liberta e seus descendentes no trabalho livre em Cachoeira/RS.
Palavras chave: Fontes, pós-abolição, trabalho, historiografia.
ABSTRACT
Este trabajo tiene como objetivo traer algunas reflexiones sobre los desafíos enfrentados por las
investigaciones sobre la post-abolición, en especial, los estudios que versan sobre la inserción social
y económica de los liberados en el mundo del trabajo. Estos desafíos se refieren específicamente a
las escasas fuentes disponibles para las investigaciones sobre el período citado. Se propone evidenciar
algunas alternativas a esta problemática, amparadas principalmente en investigaciones
historiográficas recientes y resaltando la importancia de la perspectiva de la Micro-historia. Esta,
permite el cruce de variadas fuentes y posibilita seguir indicios importantes que pueden ser útiles para
analizar las vivencias que la población liberada recorrió, al insertarse en un contexto de nueva
configuración de las relaciones de trabajo. En ese sentido, se sitúa la investigación de doctorado en
marcha sobre la inserción de la población liberada y sus descendientes en el trabajo libre en
Cachoeira/RS, Brasil.
Keywords: Fuentes, post-abolición, trabajo, historiografía.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
Bahia (1870-1910) [7], como produção não deixando espaço para externar conflitos e
historiográfica dos anos 2000. preconceitos de cor e raça.
As fontes de pesquisa utilizadas
majoritariamente por Fernandes foram dados
A historiografia do pós-abolição: análise
censitários da cidade e da província de São
sobre as fontes utilizadas
Paulo, escritos de abolicionistas e depoimentos
Na década de 1960, a Escola Sociológica de fazendeiros expressos nos jornais da época,
Paulista, trouxe uma perspectiva que relatos de viajantes estrangeiros no período e
denunciou as agruras do cativeiro e a forma relatos orais. Em relação a utilização desta
como estas marcaram a vida da população última fonte, convém esclarecer que seu uso no
egressa da escravidão. A inserção social e period em que a obra foi produzida ainda era
econômica dos negros foi regida por essa incipiente e carecia de um tratamento
herança do cativeiro, que sempre os deixou em metodológico mais adequado, considerando
desvantagem em relação aos imigrantes e a especialmente, a importância dos depoimentos
população branca em geral. Nesta perspectiva, de pessoas que viveram no período da
o sujeito que foi vítima da escravidão escravidão que o autor teve a oportunidade de
continuava sendo vítima, uma posição que lhe ter contato [9]. Florestan Fernandes verificou
negligenciava qualquer responsabilidade por através destas fontes, principalmente, as
suas escolhas. Essa incapacidade do egresso da preocupações dos senhores no período,
escravidão em adequar-se ao novo contexto de sobretudo em relação a questão indenizatória e
trabalho livre, marcaria a tônica deste discurso, a crise da mão-de-obra na lavoura que a
relegando aos libertos, um rótulo de abolição poderia levar.
passividade e animosidade. Questiona-se
Para o autor, a revolução abolicionista teve a
assim, quais fontes se utilizaram estes estudos,
participação intensa e decisiva dos negros,
assim como o tratamento metodológico
porém destacou a falta de consciência dos ex-
adotado para chegar a estas conclusões.
cativos em reivindicar ações além da
A obra de Florestan Fernandes em A liberdade. Florestan Fernandes coloca que o
integração do negro na sociedade de classes liberto acabava por ser reabsorvido no sistema
foi elaborada como tese para a cátedra de de produção com condições análogas ao
Sociologia I, na Faculdade de Filosofia, regime da escravidão ou passava a incorporar
Ciências e Letras da Universidade de São a massa de desocupados ou semi-ocupados da
Paulo, em 1964. O autor introduz o texto economia de subsistência da região [10].
colocando que o liberto viu-se, abruptamente Interessante esta passagem para pensar que o
autor desconsidera uma economia nos moldes
camponeses que pode ter sido uma alternativa
senhor de sim mesmo, tornando-se responsável
a inserção social e econômica dos libertos. A
por sua pessoa e por seus dependentes, embora
não dispusesse de meios materiais e morais para perspectiva se foca fundamentalmente em uma
realizar essa proeza nos quadros de uma integração aos moldes capitalistas de
economia competitiva [8]. produção, na relação patrão-empregado,
trabalho-salário. Henrique Espada Lima
iluminou muito bem esta questão,
Para o autor, os senhores foram eximidos de argumentando que o fim da escravidão não
orientar seus ex-escravizados neste novo evoluiu automaticamente para um mercado de
contexto, sendo que nem o Estado, a Igreja ou trabalho livre e quanto esta perspectiva
outra instituição cobraram a responsabilidade enriqueceu mais recentemente os estudos do
dos ex-escravistas. É importante destacar que pós-abolição [11].
esta perspectiva dialogava criticamente com as
obras de Gilberto Freyre que evidenciavam o O término do regime escravista significou o
caráter paternal da escravidão no Brasil e que fim da possibilidade de se ter a posse de um ser
este caráter teria se perpetuado nas relações humano enquanto propriedade. Esta visão de
sociais entre brancos e negros no pós-abolição, transição para o trabalho livre acaba por
desconsiderar os arranjos econômicos e sociais
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
mão-de-obra de forma a assegurar maior Este mito não nasceu de um momento para outro.
competitividade com os ex-escravizados: Ele germinou longamente, aparecendo em todas
as avaliações que pintavam o jugo escravo como
contendo “muito pouco fel”’ e sendo suave, doce
e cristãmente humano. Todavia, tal mito não
Os fazendeiros paulistas tiveram habilidade de possuiria sentido na sociedade escravocrata e
converter uma transformação violenta e senhorial. (...) Com a Abolição e a implantação
profunda, suscetível de tornar-se uma “catástrofe da República, desapareceram as razões psico-
econômica”, numa política oficial empenhada sociais, legais e morais que impediam
em solucionar a questão da mão-de-obra agrícola objetivação de semelhante ideia. Então operou-
de acordo com os interesses e as conveniências se uma reelaboração interpretativa de velhas
da grande lavoura de café – a transplantação racionalizações, que foram fundidas e
maciça de trabalhadores europeus [16]. generalizadas em um sistema de referência
consistente com o regime republicano[20].
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
Pesquisa que gerou a sua primeira publicação (...) em cada caso tentei considerar,
em 1995. Esta, foi elaborada em um contexto primeiramente, as evidências culturais
produzidas por este olhar, padronizado pelo
historiográfico em que já se sentia “a discurso jurídico, bem como suas ambigüidades
necessidade da pesquisa empírica em pequena e dilemas específicos ao processo de construção
escala, para poder pensar o movimento dos de um direito e de um Estado de matriz liberal
grandes sistemas econômicos”, o que Robert (...) por outro lado, enfatizei especialmente as
Slenes entendeu que era o início da influência possibilidades abertas à compreensão das
relações sociais no período e de sua dinâmica
teorico-metodológica da Micro-história no específica, a partir da valorização desses
Brasil [22]. Portanto, ela também é resultado fragmento de vida como eixo central da análise
de um contexto que os historiadores já [26].
possuem uma caminhada de fortalecimento do
“território do historiador” no aporte teórico-
metodológico no uso das fontes [23]. Através da análise das testemunhas arroladas,
em relação a qualificação socioprofissional,
Dentre as importantes reflexões deste homens livres eram identificados como
trabalho, destaca-se a percepção da autora “viviam de alguma coisa”, seja “de suas
sobre a questão do registro da designação cor lavouras”, “de suas agências” ou “de seu ofício
nas diversas fontes analisadas, da forma como de carpinteiro”, por exemplo. No caso dos
foi gradativamente omitida ou silenciada no escravos, estes estavam sempre associados a
decorrer do século XIX, até que com os anos algum tipo de serviço, a servir alguém,
subseqüentes à abolição da escravidão, ela “serviço de roça”, por exemplo. Hebe Mattos
praticamente inexiste. A autora problematiza coloca que
este silenciamento a partir da perspectiva
dialética, pois verifica que ao mesmo tempo
que se tinha intuito de silenciar a cor “de cima ser livre numa ordem escravista seria
para baixo”, através de práticas de registro basicamente não trabalhar ou, mais
judiciárias, cartoriais ou religiosas, esse especificamente, viver de rendas. A liberdade é
pensada idealmente, portanto, como um atributo
silenciamento também refletia um do homem branco e potencializadora do não
comportamento da própria população trabalho [27].
afrodescendente. Isto porque a cor
representava o distanciamento ou aproximação
de um lugar social. Enquanto a cor negra Essa perspectiva se estende no decorrer do
estaria ligada um passado cativo, a cor parda século XIX para marcar esta oposição à
marcaria um distanciamento deste [24]. Antes escravidão e também explica os receios do
de um processo cultural de branqueamento, “o pós-abolição, onde o receio dos antigos
sumiço da cor refere-se a uma crescente senhores em não possuir pessoas dispostas a
absorção de negros e mestiços no mundo dos estar a seu serviço.
livres, que não é mais monopólio dos brancos” Para a autora, a identidade enquanto homens
[25]. livres, era construída, um primeiro momento,
Nesta obra, Hebe Mattos trabalhou o em oposição ao escravo (mobilidade) e,
conjunto de fontes a partir de dois métodos: a posteriormente, enquanto identificação com os
partir de uma perspectiva qualitativa, através senhores (propriedade). A partir de 1850, com
das falas dos sujeitos nas fontes documentais, o acesso a terra sendo restrito, pela Lei de
ela consegue perceber suas experiências Terras, essa identificação não é mais possível,
naquele contexto, assim como, a partir das iniciando-se “a construção de uma identidade
mesmas fontes, retira dados para tratar serial e própria, que se fazia apenas em oposição ao
quantitativamente, em uma espécie de escravo” [28]. A mobilidade, a possibilidade
recenseamento para compreender quais eram de assumer trabalhos temporários e a
as relações dos grupos sociais envolvidos, no permanência junto a família eram valores que
caso, escravos, senhores, livres e libertos. eram caros a autonomia destes trabalhadores
Através de inventários, processos cíveis e A partir das qualificações das testemunhas
processos criminais, a autora coloca: arroladas nos processos, Hebe Mattos pode
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
[12] FERNANDES, Florestan. A integração [26] MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio:
do negro na sociedade de classes. São Paulo: os significados da liberdade no Sudeste
Dominus, 1965, p.8. escravista (Brasil, século XIX). São Paulo:
Editora da Unicamp, 2013, p.32.
[13] FERNANDES, Florestan. A integração
do negro na sociedade de classes. São Paulo: [27] MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio:
Dominus, 1965, p.10. os significados da liberdade no Sudeste
escravista (Brasil, século XIX). São Paulo:
[14] FERNANDES, Florestan. A integração
Editora da Unicamp, 2013, p. 44.
do negro na sociedade de classes. São Paulo:
Dominus, 1965, p.10. [28] MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio:
os significados da liberdade no Sudeste
[15] LUCA, Tania Regina de. História dos, nos
escravista (Brasil, século XIX). São Paulo:
e por meio dos periódicos. In: PINSKY, Carla
Editora da Unicamp, 2013, p.107.
B.(Org). Fontes históricas. São Paulo:
Contexto, 2008. [29] MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio:
os significados da liberdade no Sudeste
[16] FERNANDES, Florestan. A integração
escravista (Brasil, século XIX). São Paulo:
do negro na sociedade de classes. São Paulo:
Editora da Unicamp, 2013, p.53.
Dominus, 1965, p.24.
[30] MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio:
[17] FERNANDES, Florestan. A integração
do negro na sociedade de classes. São Paulo: os significados da liberdade no Sudeste
escravista (Brasil, século XIX). São Paulo:
Dominus, 1965, p.42.
Editora da Unicamp, 2013, p.62.
[18] FERNANDES, Florestan. A integração
[31] MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio:
do negro na sociedade de classes. São Paulo:
os significados da liberdade no Sudeste
Dominus, 1965, p.80-81.
escravista (Brasil, século XIX). São Paulo:
[19] CHALHOUB, Sidney; SILVA, Fernando Editora da Unicamp, 2013, p.99.
Teixeira da. Sujeitos no imaginário acadêmico:
[32] MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio:
escravos e trabalhadores na historiografia
os significados da liberdade no Sudeste
brasileira desde os anos 1980. Cadernos AEL,
escravista (Brasil, século XIX). São Paulo:
v. 4, n.26, 2009 p.19.
Editora da Unicamp, 2013, p.33.
[20] FERNANDES, Florestan. A integração
[33] MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio:
do negro na sociedade de classes. São Paulo:
os significados da liberdade no Sudeste
Dominus, 1965, p.197-198.
escravista (Brasil, século XIX). São Paulo:
[21] LARA, Silvia Hunold. “Blowin in the Editora da Unicamp, 2013, p.212.
Wind: E. P. Thompson e a experiência negra
[34] MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio:
no Brasil”. Projeto História, n. 12, out. 1995,
os significados da liberdade no Sudeste
p. 45-56.
escravista (Brasil, século XIX). São Paulo:
[22] SLENES, Robert. Apresentação ao livro Editora da Unicamp, 2013, p.219.
de Hebe Mattos (op. cit.), p.19.
[35] MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio:
[23] GRESPAN, Jorge. Considerações sobre o os significados da liberdade no Sudeste
método. In: PINSKY, Carla B(Org). Fontes escravista (Brasil, século XIX). São Paulo:
históricas. São Paulo: Contexto, 2008, p.291. Editora da Unicamp, 2013, p.214.
[24] MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio: [36] MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio:
os significados da liberdade no Sudeste os significados da liberdade no Sudeste
escravista (Brasil, século XIX). São Paulo: escravista (Brasil, século XIX). São Paulo:
Editora da Unicamp, 2013, p.42. Editora da Unicamp, 2013, p.218.
[25] MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio: [37] MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio:
os significados da liberdade no Sudeste os significados da liberdade no Sudeste
escravista (Brasil, século XIX). São Paulo: escravista (Brasil, século XIX). São Paulo:
Editora da Unicamp, 2013, p.107. Editora da Unicamp, 2013, p.269.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
[38] MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio: [48] LEVI, Giovani. A Herança Imaterial.
os significados da liberdade no Sudeste Trajetória de um exorcista no Piemonte do
escravista (Brasil, século XIX). São Paulo: século XII. Rio de janeiro: Civilização
Editora da Unicamp, 2013, p.286. brasileira, 2000, p.46.
[39] MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio: [49] FARINATTI, Luís A. E. A Construção de
os significados da liberdade no Sudeste séries e micro-análise: notas sobre o
escravista (Brasil, século XIX). São Paulo: tratamento de fontes para a história social.
Editora da Unicamp, 2013, p.291. Anos 90, v. 15, 2008.
[40] MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio: [50] PINSKY, Carla B. (Org). Fontes
os significados da liberdade no Sudeste históricas. São Paulo: Contexto, 2008, p.7.
escravista (Brasil, século XIX). São Paulo:
Editora da Unicamp, 2013, p.305.
[41] MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio:
os significados da liberdade no Sudeste
escravista (Brasil, século XIX). São Paulo:
Editora da Unicamp, 2013, p.306.
[42] MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio:
os significados da liberdade no Sudeste
escravista (Brasil, século XIX). São Paulo:
Editora da Unicamp, 2013, p.324.
[43] FILHO, Walter Fraga. Encruzilhadas da
liberdade. História de escravos e libertos na
Bahia (1870-1910). Campinas: Editora da
Unicamp, 2006, p.233.
[44] FILHO, Walter Fraga. Encruzilhadas da
liberdade. História de escravos e libertos na
Bahia (1870-1910). Campinas: Editora da
Unicamp, 2006, p.239.
[45] FILHO, Walter Fraga. Encruzilhadas da
liberdade. História de escravos e libertos na
Bahia (1870-1910). Campinas: Editora da
Unicamp, 2006, p.256.
[46] FILHO, Walter Fraga. Encruzilhadas da
liberdade. História de escravos e libertos na
Bahia (1870-1910). Campinas: Editora da
Unicamp, 2006, p. 328.
[47] LEVI, Giovani. A Herança Imaterial.
Trajetória de um exorcista no Piemonte do
século XII. Rio de janeiro: Civilização
brasileira, 2000. GINZBURG, Carlo. O queijo
e os vermes: o cotidiano e as ideias de um
moleiro perseguido pela inquisição. São Paulo:
Companhia das Letras, 2006.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
RESUMO
Neste artigo apresentamos resultados parciais de investigações realizadas junto aos Projetos de
Pesquisa intitulados “Memória Digital - Digitalização da coleção completa do Jornal Diário Popular
de Pelotas” e “Diário Popular de Pelotas-RS: a forma gráfica de um projeto editorial”, nos quais
tomamos o jornal Diário Popular (DP) como objeto de estudo e como fonte de consulta para
investigar o perfil editorial e gráfico do impresso, bem como a memória gráfica de Pelotas-RS. O DP
circula de forma praticamente ininterrupta desde 1890 e tem seu acervo quase completo acessível ao
público – e, no âmbito das pesquisas citadas, pôde ser reproduzido graças à parceria firmada com a
Bibliotheca Pública Pelotense. A intenção aqui é apresentar as metodologias de trabalho
empreendidas nos primeiros anos de pesquisa expondo, em especial, como se estabeleceu o registro
fotográfico, a organização do acervo digital constituído e a sistematização dos dados levantados até
então. Ao longo do estudo buscamos por técnicas e instrumentos que permitissem investigar o jornal
Diário Popular como uma fonte e um suporte de investigação – em especial pela dificuldade em
lidarmos com um corpus tão grande e que por vezes se apresentou deteriorado. Assim optamos por
um modelo desenvolvido no âmbito da história do design a partir de materiais impressos. Destacamos,
ainda, que as pesquisas com perfil histórico impõem a necessidade de gerir distintas equipes alteradas
com o tempo, o que exige uma sistematização do trabalho, o que também debatemos neste artigo.
Palavras-chave: Fontes Históricas; Memória Gráfica; Cultura Visual; Design Editorial; Diário
Popular.
ABSTRACT
This paper presents the partial results of the researches carried out by the Research Projects entitled
“Memória Digital - Digitalização da coleção completa do Jornal Diário Popular de Pelotas”
and“Diário Popular de Pelotas-RS: a forma gráfica de um projeto editorial”, which took the Diário
Popular (DP) newspaper as object of study and as a source to investigate the editorial and graphic
profile of the paper, as well as the graphic memory of Pelotas-RS. DP newspaper has circulated
practically uninterrupted since 1890 and has its almost complete collection available to the public –
and, in the scope of the cited researches, was successfully reproduced in a partnership signed with
Bibliotheca Pública Pelotense. The intention here is to present the methodologies of work undertaken
in the first years of research, exposing, in particular, how to make the photographic reproduction, the
organization of the digital collection and the systematization of the data raised until then. Throughout
the study, we searched for techniques and tools that allowed us to investigate the Diário Popular
newspaper as a source and a research support - especially for the difficulty in dealing with such a
large and sometimes deteriorated corpus. So we chose a model developed in the scope of the history
of design from printed materials. We also emphasize that the researches with a historical profile
imposes the need to manage different teams that have changed over time, which requires a
systematization of work, which is also discussed in this paper.
Keywords: Historical sources; Graphic Memory; Visual Culture; Newspaper design; Diário Popular.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
1
“Diário” ou simplesmente “DP” serão variações
empregadas como sinônimos para evitar repetições do
mesmo termo.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
hoje é um dos mais antigos diários com dos Diários do Interior do RS (ADI) que busca
circulação praticamente ininterrupta no país, e mapear os hábitos dos leitores de jornal em
iniciou, a partir de 2016, uma quarta fase, com Pelotas e mostram que, em 20143, dentre os
sua inserção de forma mais estruturada em leitores de jornais na cidade, 88% deles
múltiplas plataformas. As três primeiras fases costumavam ler, com maior frequência, o
são apontadas pela própria publicação em pelo Diário Popular, enquanto 18,3% liam o Diário
menos duas edições especiais. Primeiro, na da Manhã (jornal também produzido
Edição Documento (DIÁRIO POPULAR, 15 e localmente), seguidos por 17,7% que
16/11/1980), o jornal destacou sua primeira afirmavam preferir a Zero Hora e 3,7% que
fase, como órgão republicano, de sua fundação liam principalmente o Correio do Povo
até o ano de 1938. E a partir de então, sua (METHODUS, 2014). Essa preferência
condição de “órgão de interesses gerais”. Já a expressiva dos leitores da cidade pelos jornais
Edição Centenária (DIÁRIO POPULAR, locais, especialmente pelo Diário Popular,
25/08/1990), que circulou dez anos depois, somada à trajetória histórica do veículo,
identificou três fases distintas, com uma também evidencia sua relevância como objeto
pequena divergência quanto à edição anterior: e fonte de estudo. Todavia, ainda que a maioria
em 1990, o jornal considerou encerrada a dos leitores prefira, segundo a pesquisa
primeira fase, não em 1938, mas em 1937, Methodus (2014), acessar o jornal a partir de
quando mesmo mantendo sua circulação, sua versão impressa (87,8% dos
deixou de identificar-se como órgão entrevistados), é crescente o número de
republicano (BANDEIRA, 2018). A segunda leitores que acessa o jornal a partir da internet
fase manteve-se até o ano de 1984, quando se (de 12,9% dos entrevistados, em julho de 2012,
iniciou a terceira fase nominada pelo próprio passou para 28,6% em 2014). Outro dado a ser
jornal como de “atualização tecnológica”. destacado diz respeito aos meios de
Consideramos, nesta pesquisa, que tal etapa se comunicação considerados mais confiáveis.
manteve até junho de 2016, e foi dividida em Enquanto 32,3% dos entrevistados consideram
dois momentos: o primeiro de 1984 até 2009, a internet o meio mais confiável na busca por
quando foi lançado novo projeto gráfico e informações, 30,7% confiam na TV
editorial, contemplando também um novo site, prioritariamente, seguidos por 24% que
perfis nas redes sociais e a formação de uma apostam no jornal como meio mais confiável
equipe exclusiva para web, e um segundo, a (METHODUS, 2014).
partir de agosto de 2009, que culminou com Tais dados justificam o esforço do veículo em
novas mudanças editoriais e gráficas que ampliar sua inserção no meio digital. Em 2009,
deram início à quarta e última fase, não apenas a edição impressa, mas também o
“multiplataforma”, que apresenta, para além site passou por profunda reformulação, com a
do redesign do site e do jornal impresso, o formação de uma equipe espec. Desde o
lançamento de um aplicativo para dispositivos lançamento do primeiro endereço eletrônico
móveis, disponível desde junho de 2016 do Diário, o que se tinha era basicamente a
(BANDEIRA, 2018). replicação da edição impressa em meio digital.
Segundo dados do Censo (IBGE, 2010), Ao formar uma equipe específica para garantir
Pelotas possui 341.648 habitantes2, dos quais atualizações mais constantes e conteúdo
82.069 (25%) alegam não serem leitores de exclusivo, isso se alterou. Desde então, passou
jornal impresso, enquanto 246.206 afirmam a se fazer presente também nas redes sociais,
manter o hábito, ainda que esporadicamente
(METHODUS, 2014). Tais dados compõem
uma pesquisa encomendada pela Associação
2 3
De acordo com dados do IBGE, a população estimada Cabe considerar que, dadas as mudanças cada vez mais
de Pelotas, em 2018, é de 344.385 pessoas. Disponível rápidas em relação aos hábitos de leitura e formas de
em: https://bit.ly/2DuJd3p. Acesso em: 13 nov. 2018. acesso às notícias, tal quadro pode ter sofrido mudanças
nos últimos quatro anos.
16
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
com páginas no Facebook4, no Twitter5 e canal pano de fundo (no qual nossos projetos de
no Youtube6. Tal inserção, como apontamos, pesquisa poderiam talvez se encaixar). Um
marca o começo da transição para a quarta fase terceiro grupo de estudos envolve os meios de
do jornal, que se concretizou em junho de comunicação a partir de uma perspectiva
2016, momento em que se encerra a política e ideológica. O quarto grupo foca
sistematização do acervo empreendida até exatamente no contexto histórico em que se
agora. insere o periódico, desconsiderando a
dimensão interna do meio e, portanto, os
Ao tomar como objeto empírico o Diário
aspectos técnicos e profissionais. Por fim, um
Popular, tendo em vista o seu caráter local
quinto grupo de trabalhos enxerga a história
regional e a configuração de sua identidade
como processo, e a imprensa a partir de seu
gráfica, os esforços de pesquisa aqui
vínculo com o contexto social em que se
sistematizados têm como um de seus focos
insere, como integrante do processo
teóricos articular o papel da forma material do
comunicacional. É nesta perspectiva que
jornal em relação ao contrato de leitura
inserem-se nossos estudos, uma vez que tal
estabelecido e dinamicamente renovado entre
grupo
o periódico e o seu público. Em um momento
em que o mercado de jornais atravessa
mudanças significativas relacionadas aos Procura destacar, também, a dimensão histórica
processos de convergência (SALAVERRÍA, de um mundo pleno de significados, no qual se
localizam os meios de comunicação. Portanto, a
AVILÉS, MASIP, 2010; JENKINS, 2009), dimensão interna e externa são contempladas
justifica-se o resgate e o registro da trajetória nestas abordagens. Estas pesquisas visualizam a
editorial e gráfica de um jornal que é um dos história a partir de perguntas subjetivas e do
mais antigos em circulação com edições olhar, igualmente subjetivo, que se pode lançar
diárias no estado do Rio Grande do Sul como ao passado (BARBOSA, 2007, p. 13).
relevância para as pesquisas empreendidas. Ao
termos como cenário prioritário o século XX, Consideramos, ainda, que esta pode ser uma
quando ocorrem significativas alterações nas contribuição tanto para a área da Comunicação
práticas jornalísticas e mudanças tecnológicas – com a apresentação de um objeto peculiar,
importantes que afetam a produção impressa, mas que, ao mesmo tempo, carrega muito da
buscamos também contribuir para o estudo da história regional e estadual da imprensa –,
história da imprensa, a partir da experiência de quanto para a área do Design Gráfico, a partir
publicação de caráter local colocada em de uma explicitação das relações
diálogo com o que se desenvolve ou institucionais, projetuais e de produção, bem
desenvolveu nacionalmente. como do contexto que as perpassa. Por fim,
entendemos que as informações levantadas
Ao mapear o conjunto de estudos já
podem também servir de referência para
empreendidos acerca da história da imprensa
pesquisas de outras áreas do conhecimento que
no Brasil, Barbosa (2007) divide-os em cinco
venham a utilizar o jornal também como uma
grupos. Um primeiro, e mais expressivo em
fonte documental.
número, esforça-se em mapear o aparecimento
e desaparecimento de periódicos ao longo do
tempo, a partir de uma perspectiva factual. Um Metodologias de trabalho empreendidas
segundo dedica-se às modificações para investigar o Diário Popular
empreendidas internamente pelos jornais, e na
maior parte das vezes tem um caráter Uma das primeiras aproximações mais
monográfico em que a história surge como sistemáticas empreendidas em relação ao
4 6
Disponível em: https://bit.ly/1tfK8GN. Acesso em 13 Disponível em https://bit.ly/2DICVOA. Acesso em
nov. 2018. 13 nov. 2018.
5
Disponível em https://bit.ly/2OSIbjU. Acesso em 13
nov. 2018.
17
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
objeto de pesquisa7 foi iniciada em 2014 e sendo dispostas em uma tabela desenvolvida
estendeu-se até o início do ano de 2015. para este primeiro mapeamento. Em tal
Durante esse período, por meio de convênio instrumento (BANDEIRA, 2018, p. 257-260),
estabelecido pela Universidade Federal de além de indicarmos o número da edição
Pelotas (UFPel) com a Bibliotheca Pública de consultada, ficava evidenciado o nome do(s)
Pelotas (BPP), através do então projeto de pesquisador(es) que havia feito a
pesquisa Memória Gráfica de Pelotas8, foi observação/coleta dos dados, o nome dos
possível ter acesso ao acervo do Diário responsáveis pela reprodução da edição em
Popular disponível no Centro de questão e, finalmente, alguns detalhes ou
Documentação e Obras Valiosas (CDOV) palavras-chave que determinassem o motivo
daquela instituição. Optou-se naquele da seleção de tal edição. Como já salientado,
momento por uma leitura flutuante, que por vezes tal escolha se dava por questões
percorreu da primeira edição disponível no formais (como a primeira edição a circular em
acervo da BPP até o final de setembro de 1992. formato standard, em 02/01/1891), em outras
O objetivo de tal observação era familiarização eram levantados aspectos editoriais (como a
com o objeto e a busca por inovações tanto publicação do suplemento especial referente à
editoriais quanto gráficas que pudessem ser 1ª Fenadoce9, que circulou em 15/01/1986).
percebidas a partir de suas páginas impressas, Dentre os elementos observados nesta etapa
tais como alterações de formato, número de preliminar que merecem registro estão (1) a
páginas, diagramação das páginas, uso de cor, constatação de que as inovações empreendidas
de fotografias, ilustrações, grafismos, criação e aconteciam geralmente por razão do
extinção de editoriais, cadernos, suplementos aniversário do jornal; (2) a percepção de que,
etc. Cabe salientar que o acervo da Biblioteca com o passar do tempo, ganhou corpo a
começa no dia 28 de agosto 1890, dia seguinte presença de anúncios de congratulações ao
à fundação. E tanto este como os exemplares
jornal por parte dos principais anunciantes
subsequentes encontram-se bastante locais pela passagem de cada aniversário ou
avariados. Os jornais estão acondicionados na mudança significativa – o que levou inclusive
BPP em tomos encadernados, ora por à elaboração de cadernos especiais em que tais
semestre, ora por ano, ora por trimestre, divulgações ganharam ainda mais destaque em
dependendo do volume de páginas. A primeira maiores proporções; (3) a verificação de que
edição efetivamente manuseável, com todas as existem grandes períodos de tempo sem
páginas completas, é a de 04 de setembro de maiores modificações, tanto gráficas quanto
1890. Ao longo das pesquisas de campo os editoriais. Há mudanças significativas em
projetos de pesquisa contaram e ainda determinados momentos – como a ênfase
usufruem do apoio de alunos de graduação fotográfica a partir do retorno da circulação,
bolsistas e voluntários para avaliar, até agora em 1939, as grandes manchetes na época da
pouco mais de cem anos iniciais do jornal, Segunda Grande Guerra, o projeto de Aníbal
percebendo diversas alterações, que foram Bendati em 198910, o redesign do jornal em
18
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
planejamento gráfico e redesign de diversos jornais. Em novo planejamento gráfico do DP (DIÁRIO POPULAR,
1989, aos 58 anos, passou quatro anos envolvido no 27/08/1989).
19
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
11
O trabalho, nesse sentido, encontra convergências antes da reformulação empreendida por Amílcar de
metodológicas com a produção de Fonseca (2008) que Castro, opta por montar seu corpus de análise a partir de
em sua dissertação de mestrado sobre o Jornal do Brasil edições de aniversário daquele periódico.
20
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
12
revertida à União em 1964. Porém, apenas em 1966
A empresa selecionada foi distribuidora de energia
encerrou suas atividades e a Companhia Pelotense de
elétrica em Pelotas por mais de 50 anos no século XX.
Eletricidade, uma subsidiária da Eletrobrás, assumiu as
Registrada em Londres em 1912, foi responsável pela
instalações (AXT, 1995).
iluminação pública pelotense a partir de 1914 e pelo
13
fornecimento de energia aos bondes da cidade no ano Estes são os anos em que atualmente se encontra o
seguinte (DE LEÓN, 2012). Foi adquirida pela levantamento longitudinal.
American & Foreign Power Company em 1930 e
22
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
por parte do público e, muitas vezes, fazendo pretendemos analisar com mais profundidade
com que o leitor quisesse fazer parte daquela (MATHEUS; NEVES, s/a, s/d14).
narrativa apresentada. Além disso, No que se refere ao DP como objeto de
acreditamos que o próprio desenvolvimento estudo destacamos alguns exemplos da
técnico do DP como um produto gráfico, sistematização dos dados já empreendida,
associado ao desenvolvimento da propaganda especialmente a partir da tese desenvolvida por
como técnica de persuasão, ajudaram a uma das autoras (BANDEIRA, 2018) que
construir um cenário moderno para o podem ser visualizados a seguir. Uma delas diz
consumidor pelotense. Tudo isso fazia com respeito às pequenas variações sofridas pela
que a Light and Power se destacasse dos marca/nome do jornal entre 1931 e 1980 (ver
demais anunciantes, buscando atingir o Fig. 1), o que demonstra que, no mínimo, por
público com um marcante discurso de mais de 50 anos, o jornal manteve uma
modernidade.
identidade visual consistente e perene, uma
Ainda em termos de design, levando em medida que pode ser considerada pertinente na
consideração a diagramação e o layout, é manutenção da relação do jornal com seu
possível, nesta etapa da investigação, defender público.
que existia um padrão gráfico nas peças da
empresa já analisadas. Com relação ao espaço
negativo, por exemplo, há valorização da área
de respiro, tornando a leitura mais agradável e
auxiliando no balanceamento de elementos. Já
a preocupação com a hierarquia informacional
é constatada a partir da existência de chamadas
maiores no topo do anúncio (MATHEUS;
NEVES, 2017). Outro aspecto muito
importante a ser destacado é que ao
compararmos os anúncios dessa empresa com
outros da mesma época – divulgados no Diário Figura 1:Leves alterações da marca entre 1931 e
Popular, fica evidente a qualidade e a riqueza 1980
da composição dessas peças. Acreditamos que Fonte: Bandeira (2018)
isso acontecia, pois verificamos que tais Já na edição de 27/08/2000 (Fig. 2),
propagandas também eram divulgadas em percebemos uma ampliação nas famílias
outras partes do Brasil e, portanto, esses tipográficas utilizadas na diagramação do
anúncios e clichês não deveriam ser criados na jornal o que denotava uma certa inconsistência
cidade de Pelotas. Tal aspecto merece uma visual do periódico. Considerando que tal
melhor investigação e discussão, mas se trata proliferação tipográfica destoa dos esforços
de uma hipótese que vem sendo construída a anteriores empreendidos especialmente a partir
partir desses primeiros anúncios encontrados. do projeto gráfico de 1989, cabe um
Essa sensação é reforçada quando verificamos aprofundamento da identificação dos
que muitos deles são construídos no formato momentos e motivos que levaram a tais
de histórias em quadrinhos – muito recorrentes alterações. Provavelmente de ordem prática
nesse período nos EUA, país de origem de tal nas conduções da diagramação das páginas e
empresa. Outro aspecto a se considerar, por de pequenas mudanças editoriais
fim, é que as composições nesse período em empreendidas ao longo do tempo, tal
Pelotas tinham muito influência da França, observação e sistematização pode ampliar o
como nos estilos Art Nouveau e Art Déco. entendimento das rotinas jornalísticas adotadas
Nessa empresa, contudo, esse estilo figurativo pelo jornal.
era completamente diferente – como
14
O artigo está no prelo.
23
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
Conclusões
É importante destacar que as metodologias de
trabalho aqui apresentadas foram pautadas em
socializar o conhecimento que estava sendo
produzido. Foi então a partir da sistematização
Figura 2: Variações tipográficas encontradas ao longo do trabalho exposto aqui, e por meio da
da edição de 2000. Fonte: Bandeira (2018)
organização da equipe, dos documentos
digitalizados e posteriormente de muitas horas
No que tange ao uso de imagens, destaca-se
de coleta de dados – ocorridas diretamente no
de maneira exemplar na edição de 1931 um
acervo da BPP – que os primeiros frutos
grande anúncio de página inteira, ilustrado, da
começaram a ser colhidos. Em especial com a
Tabacaria “A Melindrosa” (Fig. 3), algo
conclusão da tese de uma das autoras deste
inusitado para os padrões do jornal à época,
artigo, já mencionada e intitulada “Diário
quando o uso de imagens de grande proporção
Popular de Pelotas-RS: a forma gráfica de um
ainda não era algo corriqueiro na montagem
projeto editorial (1890-2016)”. Além disso, os
das páginas e muito menos nos anúncios
bolsistas e acadêmicos voluntários produziram
comerciais de então.
até agora, sob orientação das coordenadoras
dos projetos, um total de 19 artigos
apresentados em eventos de pesquisa e
também publicados em livros. Em linhas
gerais, até este momento, esses foram os
passos para mapear e investigar a história
gráfica do jornal Diário Popular.
Por fim, no que se refere à digitalização do
impresso, cabe destacar que a BPP vem
empreendendo esforços para equipar seu
acervo com máquinário mais adequados para a
digitalização do jornal e para o resguardo do
acervo digital. Já com relação a utilizar o DP
como uma fonte de consulta e como um objeto
de pesquisa as investigações estão longe de
serem concluídas, uma vez que variados e
potentes enfoques e objetos de estudo
vinculados ao campo do Design serão ainda
fruto de distintas investigações.
Em relação às investigações que tomam o DP
Figura 3: Aplicação de ilustração em anúncio de
como uma fonte de consulta para investigar a
página inteira de 1931 Fonte: Bandeira (2018) história gráfica em Pelotas, nas etapas futuras,
pretendemos ainda:
De forma bastante resumida, esses foram os - Propiciar a busca por informações acerca da
procedimentos metodológicos adotados até memória e da identidade visual local,
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
ABSTRACT
This text objected to point out the challenges and opportunities on the use of the case study, together
with the documentary research and content analysis (BARDIN, 2011), which constituted a
dissertation researchpresented at Programa de Pós-Graduação em Education of the Federal University
of Santa Maria in August 2017. The dissertation intended at understanding along the trajectory of a
student with intellectual disabilities, currently in high school, which is in the public school in a
municipality of the fourth Colony, interior of the RS. The case study was characterized as a unique
case study using multiple units of analysis (YIN, 2001). It counted on descriptive documents as
analysis papers and interviews with teachers in order to understand the trajectory of the student. As
challenges point: the existence/choice of documents that are sufficient to form a consistent study; the
preparation of a roadmap of interview to respond to the objectives of the research; understanding and
using the stages of content analysis; connect all the data collected for the study in depth, how do you
propose to be the case study. It is concluded that the Case Study the single case study is important
search method when combined with instruments and techniques which allow a full analysis of the
case thus enabling a more thorough and complete understanding of it.
Keywords : methodology, case study, documentary research, content analysis
27
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
Introdução
Este texto objetivou apontar os desafios e as Essa lógica refletirá os resultados do estudo
possibilidades sobre o uso do Estudo de Caso bem como, ajudará a reforçar sua validade.
aliado à pesquisa documental e análise de Antes dos primeiros contatos com o local de
conteúdo (BARDIN, 2011), os quais coleta de dados, foram selecionados materiais
constituíram os caminhos investigativos de que versassem sobre a temática da
uma pesquisa de Dissertação de Mestrado investigação (deficiência intelectual e
apresentada ao Programa de Pós-Graduação formação de conceitos científicos) para leitura
em Educação da Universidade Federal de exploratória, a fim de reconhecer e identificar
Santa Maria em Agosto de 2017. A dissertação o que posteriormente poderia estruturar as
intitulou-se: “Sistema Educacional Inclusivo”: bases teóricas do estudo.
um olhar para a formação de conceitos em Como metodologia de pesquisa, a princípio,
estudantes com deficiência intelectual. Nessa pensou-se na realização de um estudo de caso
pesquisa, buscou-se compreender, institucional em uma escola, que possui 560
longitudinalmente, a trajetória de um estudante alunos matriculados, localizada em um
com deficiência intelectual que estava município do interior do Rio Grande do Sul na
cursando o ensino médio em uma escola da região da Quarta Colônia, onde reside a
rede estadual de um município da Quarta pesquisadora. Após a seleção da instituição foi
Colônia, interior do RS. Teve como aporte realizado o contato com a direção da escola
teórico a Teoria Histórico Cultural e como com vistas a elencar os sujeitos que atendiam
autor principal Vygotsky que concebe a escola o seguinte requisito: ser aluno de ensino médio
como local que visa o compartilhar de e possuir deficiência intelectual. Assim, três
conhecimentos histórica e culturalmente estudantes foram os sujeitos indicados para
adquiridos pela humanidade. Para tal, usando compor a pesquisa, pois apenas estes três
de uma abordagem qualitativa, e a partir de um estavam matriculados no ensino médio. No
estudo de caso, coletaram-se dados através de entanto, como o objetivo era realizar a análise
entrevistas abertas e pesquisa documental. A longitudinal da escolarização desses sujeitos,
interpretação dos dados considerou a análise dois deles não puderam fazer parte da
de conteúdo (BARDIN, 2011). Frente a isso, pesquisa, uma vez que, ambos haviam sido
neste texto objetiva-se apontar os desafios e as transferidos de outras escolas e nestas não
possibilidades da utilização do Estudo de Caso havia arquivos com documentos relativos a sua
aliado à pesquisa documental e análise de vida escolar. Uma das escolas não utilizava
conteúdo (BARDIN, 2011). parecer pedagógico quando o estudante
frequentou-a e na outra, estavam arquivados
Pesquisa qualitativa: o estudo de caso e a apenas pareceres do quarto e quinto ano do
coleta de dados ensino fundamental.
Além disso, por opção das famílias, ambos
Para atingir aos objetivos propostos durante estudantes não recebiam Atendimento
a pesquisa, fez-se uso de uma abordagem Educacional Especializado -AEE. Com isso,
qualitativa, pois como afirma Yin (2016), uma apenas um dos sujeitos tinha todos os
das características da pesquisa qualitativa é pareceres arquivados na escola de origem e
“esforçar-se por usar múltiplas fontes de frequentava no período da pesquisa o AEE
evidência ao invés de se basear em uma única como público alvo da Educação Especial e por
fonte” (grifo do autor, p.07). isso, optou-se por realizar o estudo de caso
Sendo assim, toda pesquisa segue um único com esse estudante, descartando-se o
delineamento através de um modelo lógico, estudo de caso institucional.
isto é, Assim, passou-se a realização de um estudo
de caso único que é definido como
“a lógica envolve as ligações entre as questões de
pesquisa, os dados a serem coletados e as uma investigação empírica de um fenômeno
estratégias para analisar os dados” (YIN, 2016, contemporâneo dentro de um contexto da vida
p.68). real, sendo que os limites entre o fenômeno e o
28
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
contexto não estão claramente definido” (YIN, diferentes autores sobre um determinado tema,
p.32, 2001) observando fontes secundárias. Já a pesquisa
documental, recorre a materiais que ainda não
A partir disso, buscou-se realizar uma receberam algum tratamento analítico, isto é,
compreensão mais profunda dos fatos e as fontes primárias. No entanto, chamamos a
fenômenos. Como ressalta Yin (2001), uma atenção para o fato de que
das vantagens do estudo de caso é poder “lidar
com uma ampla variedade de evidências – na pesquisa documental, o trabalho do
documentos, artefatos, entrevistas e pesquisador(a) requer uma análise mais
observações” (YIN, 2001, p.27). Dentre as cuidadosa, visto que os documentos não
passaram antes por nenhum tratamento
possibilidades de estudo de caso apresentadas científico. (OLIVEIRA, 2007, p. 70).
por Yin (2001), elencou-se o estudo de caso
único incorporado por utilizar-se de unidades Para compor o estudo de caso, além da
múltiplas de análise em um único caso, ou seja, pesquisa documental, foi realizada,
a utilização dos pareceres e entrevistas. posteriormente, uma entrevista contendo
Por utilizar-se dos pareceres pedagógicos, perguntas abertas com os professores das
caracterizamos a pesquisa como sendo do tipo disciplinas de Língua Portuguesa e de
documental, pois os utiliza como fonte de Matemática que atuavam com o estudante com
coleta de dados. Nessa perspectiva, entende-se DI e com a educadora especial. Estas
o parecer descritivo como um documento entrevistas buscaram verificar a concepção de
escrito (comunicação escrita compartilhada aprendizagem que os embasa no ensino e na
por um grupo) no qual é registrado pelos avaliação do estudante. Justifica-se, ainda, que
professores o percurso escolar individual do a opção por entrevistar apenas os professores
estudante, evidenciando os aspectos relativos à de Língua Portuguesa, matemática e de
sua aprendizagem, sendo entregue uma cópia Educação Especial deveu-se ao fato de que são
aos seus responsáveis e outra arquivada na as disciplinas em que o acompanhamento do
instituição escolar. Por isso, considera-se percurso escolar do acadêmico está mais
documento de análise para a pesquisa já que, evidente por serem os primeiros anos de
de acordo com Santos (2015), escolarização. Além disso, são os aspectos e
conhecimentos desenvolvidos nestas
“são fontes documentais tabelas estatísticas;
relatórios de empresas; documentos informativos
disciplinas que servem como base para as
arquivados em repartições públicas [...]; obras demais.
originais de qualquer natureza [...]”.
29
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
e percebeu-se que para ela, seria todo estudante Transtorno Misto das habilidades escolares. A
que necessitasse de apoio especializado. partir disso, inúmeros questionamentos foram
De posse dos pareceres pedagógicos, levantados sobre os rumos da pesquisa, mas
realizaram-se as entrevistas com os optou-se por manter o estudo de caso uma vez
professores de língua portuguesa, matemática que, para o censo escolar o estudante estava
e educação especial, que estavam trabalhando definido como sujeito com deficiência
com o estudante no período da pesquisa. intelectual.
As entrevistas seguiram um protocolo de Na etapa de exploração do material, passou-
questões abertas que estavam diretamente se a análise dos pareceres pedagógicos e
relacionadas aos objetivos da pesquisa, mas entrevistas e essas categorias tiveram que ser
que possibilitavam ao participante falar modificadas, pois os achados apontaram outros
livremente sobre a temática de forma aspectos recorrentes e passíveis de análise os
conversacional. quais deveriam ser observados. Importante
Com os dados coletados, deu-se início a salientar que essa etapa consiste na codificação
análise de conteúdo. A etapa de pré-análise do material coletado, ou seja, fazer recortes de
contou com a organização do material a ser unidades de registro e definir as regras de
analisado (pareceres pedagógicos) e durante classificação e agregação das informações em
essa organização elaborou-se quatro categorias categorias (BARDIN, 2011). Frente a isso, as
a priori, entendendo que estas seriam categorias elencadas nessa etapa acabaram
suficientes para abarcar a análise como um modificando aquelas que surgiram durante a
todo. São elas: pré-análise, sendo elas:
1.Aprendizagem e sua concepção: Nessa 1.Aprendizagem formal: Função da escola na
categoria foram agrupados os aspectos que aprendizagem dos estudantes com NEE
envolviam a concepção de aprendizagem para 2.Identificação de estudantes com DI
a análise dos pareceres e entrevistas com as 3.“Sistema Educacional Inclusivo”: A escola
professoras. e os conceitos científicos
2.Evolução dos conceitos científicos: Nessa Posteriormente, realizou-se a etapa de
categoria os aspectos que envolvem operações tratamento dos dados, inferência e
matemáticas, equações, trigonometria, interpretação buscando captar os conteúdos
unidades de medida, classe de palavras, latentes contidos em todo material realizado o
conjugação verbal, sinônimos e antônimos, que resultou na escrita dos resultados da
dentre outros que são considerados conceitos pesquisa.
científicos foram elencados para observação
nos pareceres e entrevistas. Alguns breves resultados da pesquisa
3.Avaliação da aprendizagem: Com essa Ao realizar as análises dos pareceres e das
categoria os aspectos relacionados à avaliação entrevistas realizadas com vistas a observar a
da aprendizagem do estudante sujeito da evolução das aprendizagens do estudante
pesquisa foram observadas nos pareceres sujeito da pesquisa, pode-se notar a
descritivos e nas entrevistas. importância que a abordagem do ensino e o
4.Relação “sistema educacional inclusivo x modo de avaliar têm no percurso escolar.
formação de conceitos”: Com essa categoria Assim, perceberam-se grandes progressos na
pretendeu-se observar como estabelecidas pelo aprendizagem da estudante, principalmente
estudante, sujeito da pesquisa, na escola nos anos em que os pareceres pedagógicos
regular contribuíram para a formação de traziam mais evoluções do que dificuldades,
conceitos. buscando valorizar os pequenos avanços da
Desse modo, ao iniciar as análises, percebeu- estudante.
se que, quando o estudante frequentava a Alguns aspectos foram elucidados para que a
quinta série do ensino fundamental, foi análise dos pareceres fosse realizada de forma
elaborado um parecer neurológico a contemplar os objetivos da pesquisa. Para
classificando-o como possuidor do Transtorno isso, foi elaborada uma tabela com os itens a
de Déficit de Atenção e Hiperatividade e serem analisados em cada parecer verificando
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
para todos, uma escola que cumpra com sua toda documentação, outras não possuem
função social, uma escola que possibilite, para registros sobre estes estudantes. E, ainda: não
além da socialização, a efetivação da há padronização quanto ao uso de parecer
aprendizagem para que o sujeito se pedagógico para o informe da avaliação destes
desenvolva, torna-se necessário a estudantes. Enquanto algumas escolas avaliam
compreensão de como ocorre a aprendizagem. por notas e ao final elaboram um parecer,
Assim, a aprendizagem visa à mudança outras apenas atribuem notas relativas ao
cognitiva, que só é possível quando o ensino desenvolvimento global do estudante da
fornece meios para que os estudantes possam escola, mas sem algum registro sobre suas
desenvolver-se através de mediações que evoluções. Isso dificulta compreender o
proporcionem o acesso aos conhecimentos já desenvolvimento e aprendizagem do sujeito.
construídos modificando-os e adaptando-os a Há ainda, falta de comunicação entre algumas
sua realidade. escolas quando o estudante com deficiência é
Nessa perspectiva, a educação inclusiva tem transferido.
sido proposta com o objetivo de inserir a todos A partir do conteúdo analisado (entrevistas e
no sistema educacional reduzindo gastos com pareceres), percebe-se que a Política Nacional
instituições especializadas e ainda, de Educação Especial na Perspectiva da
delimitando o público alvo para que menos Educação Inclusiva (BRASIL, 2008) garantiu
investimentos fossem necessários. Como o acesso a escola regular e proporcionou
afirmam Michels e Garcia (2014) melhorias nas instituições à medida que
organizou o sistema para receber os estudantes
observa-se, portanto, que as políticas delimitados como público alvo da educação
educacionais “inclusivas” estão orientadas por especial.
dois pilares: distribuição de renda e ampliação do
número de alunos regularmente matriculados no
No entanto, os dados encontrados nesta
sistema educacional. (p.123) pesquisa apontam que, em relação à
aprendizagem formal e a aquisição de
Com isso, as escolas passaram a receber um conceitos científicos, poucas mudanças foram
contingente de estudantes para serem alcançadas. Apesar de várias aprendizagens
“incluídos” nas salas de aula regulares. No terem sido desenvolvidas pela estudante no seu
entanto, com as mudanças nas políticas percurso escolar, até o presente momento, as
voltadas para a educação inclusiva, a educação evoluções caminharam apenas até o nível de
especial deixou de ter como público os alunos pensamento por complexos, não atingindo o
que apresentavam necessidades especiais nível de pensamento por conceitos que exige
(dificuldades ou transtornos de aprendizagem) abstração e generalização, fato que,
para ser serviço exclusivo de estudantes com provavelmente revela o “desenvolvimento
deficiências. incompleto de suas funções psicológicas
Percebeu-se com a pesquisa, a grande superiores”. (Vygotski, 1993).
dificuldade dos gestores em compreender Ainda, observa-se que, embora todos os
quais sujeitos enquadravam-se no público alvo sistemas educacionais sejam orientados por
da educação especial e, principalmente, as uma Política que vise à inclusão de estudantes
questões referentes à legislação atinente a essa delimitados como público alvo da educação
área. Isso causa, muitas vezes, confusão e especial no ensino regular, há fragilidades,
identificação errônea de estudantes como principalmente em relação às escolas do
pertencentes a uma classificação que não lhe é campo, uma vez que, a primeira escola
cabível. freqüentada pelo estudante sujeito da pesquisa,
Por isso, as primeiras considerações nunca contou com Professor de Educação
realizadas são a respeito da documentação dos Especial, nem mesmo para orientações. O
estudantes com deficiência nas escolas estudante foi encaminhado para atendimento
regulares, pois não há uma padronização da com neurologista pelos próprios professores
documentação relacionada a vida escolar por perceberem acentuadas dificuldades, mas
destes. Enquanto algumas escolas guardam nunca passou por avaliação no AEE, pois este
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REFERÊNCIAS
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Tradução Luís Antero Reto, Augusto Pinheiro.
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técnica: Dirceu da Silva. Porto Alegre: Penso,
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[3] YIN, R. K. Estudo de caso. Planejamento e
métodos. 2 ed. Porto Alegre: Bookman, 2001.
[4] SANTOS, A. R. Metodologia Científica: a
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Rio de Janeiro: Lamparina, 2015.
[5] OLIVEIRA, M. M. Como fazer pesquisa
qualitativa. Petrópolis, Vozes, 2007.
[6] LURIA, A.R. Desenvolvimento cognitivo:
seus fundamentos culturais e sociais.
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RESUMEN
La identidad suele considerarse estática e inmutable, construida a partir de la relación entre las imposiciones
sociales y las elecciones individuales. En función de ella las personas en su vínculo con lo político se vuelven
creadoras de cultura material, dan cuenta de su forma de ver el mundo y dan significado a su entorno. Muchas
de estas materialidades son consideradas y designadas como patrimonio porque supuestamente se remiten a
una historia compartida, a un pasado común entre los miembros de un grupo. A partir del caso de la estancia
de Anacarsis Lanusse, comerciante argentino que se instaló durante la primera mitad del siglo XIX en el actual
partido de Lanús y, desde una visión alternativa sobre identidad en la cual la misma es vista como dinámica y
transformativa, porque se construye y transforma dentro de marcos sociales de la memoria que pueden
modificarse por acontecimientos históricos; la propuesta de esta investigación es indagar en la práctica
patrimonial con el fin de discutir su gestión y su vínculo con la identidad. Se concluye que en función del
dinamismo y de la mutabilidad identitaria se produce una resignificación de la materialidad y de los entornos
que influye en la relación entre el poder político y la sociedad para determinar que rasgos materiales se
mantienen, cuales se modifican y cuales desaparecen.
ABSTRACT
Identity is usually considered static and immutable, constructed from the relationship between social constrains
and individual choices. According to it, people in their connection with the political aspect become creators of
material culture, they realize their way of seeing the world and give meaning to their environment. Many of
these materialities are considered and designated as heritage because they supposedly refer to a shared history,
to a common past among the members of a group. From the case of the residence of Anacarsis Lanusse,
Argentine trader who settled during the first half of the nineteenth century in the current town of Lanús, and
from an alternative vision of identity in which it is seen as dynamic and transformative, because it is
constructed and transformed within social frames of memory that can be modified by historical events; the
purpose of this paper is to do research on in the patrimonial practice with the aim to discuss its management
and its connection with identity. It is concluded that depending on the dynamism and identity mutability there
is a resignification of the materiality and environments that influence the relationship between political power
and society to determine what material features are kept, which are modified and which disappear.
15
El presente trabajo fue realizado con apoyo de la Coordenação de Aperfeiçonamento de Pessoal de Nivel Superior-
Brasil (CAPES). Asimismo, forma parte de mi proyecto de maestría con permiso de investigación, registro Nº 2018-3-A-
214-1, otorgado por la Dirección Provincial de Museos y Preservación Patrimonial de la Provincia de Buenos Aires.
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Rosas, no obstante obtuvo mayor prosperidad (...) Que al dictarse el Decreto Nº 3.321/944, se
tras la conformación del Estado de Buenos impuso el nombre que recordaba un
acontecimiento que se había producido apena un
Aires, luego de brindarle su apoyo a Bartolomé año, lo que le restaba en absoluto la relevancia
Mitre y tras su financiación a las fuerzas histórica que debe fundamentar la denominación
militares durante la Campaña del Desierto, de lugares y ciudades públicos.
ocurrida en 1879 (DI CESARE et.al., 1996; Que en aquella misma oportunidad no se pudo
DALPONTE, 2015). anular el valor adquirido a través de la tradición
por el pueblo de Lanús, al que debió consagrarse
como cabecera del partido cuyo nombre resulta
totalmente extemporáneo.
Que se impone con carácter impostergable la
devolución a ese pueblo laborioso de la
valorización simbólica resumida en el nombre de
Lanús, dándole esa denominación a todo el
distrito (…) (DECRETO Nº 461, 1955)
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intendente municipal para ese entonces, el Sr. leyes que protejan la identidad y pluralidad
Manuel Quindimil, y quien prometió restaurar cultural, la libre creación y circulación de las
los restos de la casa y donarlos al club para que obras del autor; el patrimonio artístico y los
allí se construyera la sede social de la espacios culturales y audiovisuales” (Art. 75.
institución. Acción que nunca fue concretada. Inc 19). Junto a ello también se menciona que
corresponde a la nación crear las normas
Esta última información fue confirmada por
generales para la protección del patrimonio y a
un funcionario de la secretaría de cultura quien
las provincias crear aquellas reglamentaciones
sostuvo que, en parte la desidia ocurrida con
complementarias (ENDERE Y RONALDI,
los restos de la estancia, se deben a que existen
2008; GARCÍA et.al., 2016). En función de lo
problemas legales referidos a la escritura de la
mencionado, para la provincia de Buenos
propiedad, lo cual dificulta concretar su
Aires se cuenta con lo establecido en el Art. 44
patrimonialización, además de su restauración.
de la Constitución de dicha provincia, en el
El mismo funcionario, sostuvo que muchos de
cual se especifica: “La provincia preserva,
los vecinos, vinculan a la propiedad con la
enriquece y difunde su patrimonio cultural,
familia Martínez de Hoz, quienes fueron sus
histórico, arquitectónico, arqueológico y
dueños entre 1911 y 1927, momento en el cual
urbanístico, y protege sus instituciones”.
entra en remate y comienza a ser loteada
Además de mencionar el desarrollo de
(MENSURA 263, 1911; BOREJKO et.al.
políticas de rescate, investigación y difusión de
1989).
las manifestaciones culturales por medio de la
Legislación patrimonial en Argentina participación comunitaria. De manera similar,
Durante casi cien años la principal ley de en el Art. 27 Inc. 3 de la Ley Orgánica de las
protección patrimonial de Argentina fue la Municipalidades Nº 6769/1958 se cita que es
conocida Ley Nº 9.080 promulgada en el año función de los municipios reglamentar “La
1913. La misma hacía principal hincapié en las conservación de monumentos, paisajes y
ruinas y yacimientos arqueológicos. Junto con valores locales de interés tradicional, turístico
esto una serie de convenciones internacionales e histórico”.
a las cuales la República Argentina adhería, En base a la breve reseña de la legislación
formaban parte del repertorio legal para la mencionada18, en función de la preservación,
preservación y conservación del patrimonio tratamiento y conservación del patrimonio
arqueológico y paleontológico del país. A arqueológico dentro de la provincia de Buenos
pesar de una serie de intentos de modificación Aires se cuenta con lo mencionado en la Ley
para mejorar dicha legislación, va a ser recién Nacional Nº 25.743 del 2003 y su
con la reforma de la constitución en el año reglamentación 1.022 del 2004, lo establecido
1994, que se logrará introducir algunos por la Constitución de la Provincia y lo
cambios que favorecen a la creación de la mencionado en la Ley Orgánica de las
nueva Ley Nacional de sitios arqueológicos y Municipalidades. Además de estas
paleontológicos Nº 25.743 que entrará en disposiciones legales, así como la provincia y
vigencia en el año 2003 y a su decreto el municipio tiene la potestad para crear una
reglamentario 1.022/2004 (Ley 9.080/13 y ley específica para preservar un patrimonio,
ENDERE Y RONALDI, 2008). también lo puede hacer la nación, por medio de
La reforma constitucional del ’94 en su Art. leyes y decretos específicos que serán
41 alude a la preservación del patrimonio designados como patrimonio por la Comisión
cultural y natural y agrega en el Art. 75. Inc. 17 Nacional de Monumentos, de Lugares y de
el reconocimiento a la preexistencia étnica y Bienes Históricos.
cultural, y en el inc. 19 establece que A pesar de la existencia de estas
corresponde al Congreso Nacional “Dictar reglamentaciones, los restos arqueológicos de
18
Para mayor de detalle de las reglamentaciones,
intentos de modificación y acuerdos específicos a los
cuales adhiere Argentina ver Endere y Ronaldi 2008.
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
Esto último se refleja en la aparente no sintonía con las otorgadas a los demás lugares
vinculación identitaria de los vecinos con la asociados a la familia Lanusse?.
familia Lanusse. No obstante, sus recuerdos de
Consideraciones Finales
otros sectores de la estancia, muestran la
presencia de memorias incluidas dentro de En esta primera aproximación al estudio de
marcos sociales (sensu HALBWACHS 2004) los restos de la estancia que perteneciera a la
que si bien, hubo hechos que impactaron sobre familia Lanusse y posteriormente a los
ellos y activaron el diálogo entre memoria y Martínez de Hoz, se observa que la
olvido, la formatización que ejercen esos combinación de fuentes escritas, mapas y el
marcos, da cuenta de que a pesar del trabajo etnográfico, aportan a la comprensión
dinamismo identitario se produce una de la relación entre la identidad y el patrimonio
convivencia de esas múltiples narrativas. y sobre todo permiten aproximarse a entender
las transformaciones urbanas que llevan a
Las transformaciones sociales que exponer restos arqueológicos a la venta. A su
ocurrieron, impactaron sobre la materialidad vez, el informe realizado por BOREJKO et.al
de la estancia, provocando que sus restos no (1989), permite delimitar el lugar en el cual se
sean vistos como referentes patrimoniales en la emplazaba la estancia, acercarnos a las
actualidad, porque por un lado, al ser sistemas características que tenía la misma e identificar
simbólicos que se encuentran constantemente la presencia de restos materiales originales de
en movimiento, sus restos dan cuenta de la estancia y, las modificaciones ocurridas en
aspectos que refieren a identidades de aquellos el área que ocupaba hasta llegar a la
que los han construido y, por otro lado, dichos urbanización que se observa en la actualidad.
sistemas impactaron sobre los colectivos
humanos creando nuevas narrativas, que no De las primeras conversaciones realizadas
están asociadas a los aspectos con los cuales se con algunos vecinos se observa que perduran
sienten identificados actualmente los vecinos. diferentes recuerdos acerca de distintos
sectores y momentos históricos de la estancia,
Por lo tanto, si bien la legislación patrimonial que pueden ser recuperados y comparados con
argentina, en algún punto actúa como la documentación histórica y geográfica. Esto
herramienta jurídica que otorga fundamentos nos acerca a pensar en la identidad como un
para que esos lugares sean patrimonializados, relato dinámico que, en suma con la
no son suficientes para la patrimonialización modificación urbana ocurrida sobre el área de
porque, el no sentimiento de identificación, o estudio, muestra la convivencia de diferentes
mejor dicho, el quizás representar otra versión narrativas; que en su relación con la no
identitaria que no responde o no se ajusta a un patrimonialización de los restos materiales de
sentimiento de pertenencia actual, ya sea desde la estancia, conducen a pensar en el patrimonio
el poder político como desde los vecinos, se como una herramienta jurídica que no es
vuelven centrales y de mayor relevancia para estática y que no siempre responde al
la no patrimonialización de los restos de la sentimiento de identidad de los barrios, e
estancia. No obstante, sus restos si responden incluso tampoco al de los poderes políticos en
a la ley nacional de sitios arqueológicos y curso. Es decir, si el patrimonio se encuentra
paleontológicos y, por lo tanto, bajo esta asociado a la identidad, éste es dinámico y
legislación lo que queda de la estancia no actúa como un símbolo sujeto a múltiples
puede ser vendido y debe ser resguardado y interpretaciones.
restaurado para evitar su derrumbe.
Si bien, en el barrio existen memorias sobre
Por último, en función de lo enunciado en la la estancia, los sectores que ocupaban sus
legislación patrimonial argentina y, junto con distintas edificaciones y, sobre sus diferentes
la no identificación como referente por parte dueños; es necesario profundizar con nuevas y
de los vecinos y del poder político, vale más conversaciones con los vecinos, para
preguntarse como reflexión: ¿Es necesario identificar qué recuerdos son compartidos y
otorgar a los restos de la estancia alguna cuáles no, para distinguir si esas memorias se
declaratoria patrimonial que se encuentre en relacionan más con la familia Martínez de Hoz
o con los Lanusse y, para profundizar en esa
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
relación entre los referentes patrimoniales y [4] DALPONTE, Omar. Retazos históricos.
sus distintas versiones de la identidad. Historia de Lanús. Ed. Prosa y poesía
Amerian, Buenos Aires, 2015.
De estas conversaciones también se llega a
una primera interpretación vinculada a la no [5] DI CESARE, Ana María; BORRAJO,
patrimonialización de los restos de la estancia, Mario; CAMPOS, Luís María; PAROLI,
los cuales, si bien podrían estar relacionados a Margarita; STÁBILE, Cora; DI PASQUALE,
problemas legales sobre la escritura, también Graciela; BLASCO, Diana; BERCEBAL, Ana
parecen estar más relacionados a un olvido María y FREDA, María Teresa. Anacarsis
tanto institucional como de los vecinos, por su entre Boedo y Lanús. II Congreso de Historia
no relación con la familia Lanusse. Sin del barrio de Boedo. Disponible en:
embargo, para tener información más certera http://lasandanzasdeclio.blogspot.com/2011/0
es pertinente ahondar en otros registros, que 9/anacarsis-entre-boedo-y-lanus.html. Acceso
permitan dar con el propietario actual y en: 10.08.2017.
descartar otros tipos de variables que también [6] GARCIA, Analía. Arqueología de la
podrían estar vinculadas a su no Supermodernidad en Lanús: acontecimientos
patrimonialización. No obstante, siguiendo la históricos e identidad como formadores de
Ley Nacional Nº 25.743, sus restos son paisajes, el caso de una chacra del siglo XIX
arqueológicos y por lo tanto no pueden ser apodada “El Castillo de Caraza”. Revista
vendidos y deben ser conservados y Fragmentos del Pasado. Fundación de
restaurados. Historia Natural Félix de Azara. En prensa,
2018.
Agradecimientos [7] DECRETO LEY Nº 461, 1955. Disponible:
http://www.gob.gba.gov.ar/legislacion/legisla
Agradezco a mi orientador el Dr. Lúcio
cion/l-55-461.html, acceso: 15.07.2018.
Menezes Ferreira por sus comentarios críticos
y aportes, tanto para este escrito como para el [8] LEY Nº 10.643, 1988. Disponible:
desarrollo de futuras investigaciones. http://www.gob.gba.gov.ar/dijl/#/DIJL_busca
Asimismo quiero agradecer al Dr. Marcelo dor.php?tipo=01, acceso: 15.07.2018.
Weissel, por su colaboración en cuanto al uso [9] ORDENANZA MUNICIPAL Nº
de las legislaciones patrimoniales de Lanús. 8.066/1995.
También agradezco a los vecinos del barrio y a
la inmobiliaria Gómez Lama, por su [10] RIVOLTA, María Clara;
predisposición, colaboración y solidaridad MONTENEGRO, Mónica; MENEZES
para el desarrollo de este estudio. FERREIRA, Lúcio; NASTRI, Javier.
Multivocalidad y activaciones patrimoniales
en arqueología: perspectivas desde
REFERENCIAS sudamérica. Fundación de Historia Natural
Félix de Azara, Buenos Aires, 2014.
[1] MARTINEZ DE HOZ, Federico. Mensura
Nº 263. Dirección de Geodesia de la província [11] HAMILAKIS, Yannis. Archaeological
de Buenos Aires, Buenos Aires, 1911. Ethnography: A Multitemporal Meeting
Ground for Archaeology and Anthropology.
[2] GONZÁLEZ, Carlos. Lanús Municipio.
Annual Review of Anthropology, 40: 399-414,
Argumentos para la autonomía comunal de
2011.
Lanús, la municipalidad de Avellaneda hasta
el 4 de Junio, organización de la nueva [12] BOREJKO, Diana; ESPINOSA, Gloria;
municipalidad, la urbanización de la avenida YAÑEZ, Leonor. Lanús: de rural a urbano.
Pavón. Pueblo Argentino, 1944. Sociedad de Arquitectos de Lanús
[3] DE PAULA, Alberto; GUTIÉRREZ, Subcomisión de Preservación, Buenos Aires,
Ramón. y VIÑUALES, Graciela. Del Pago del 1989.
Riachuelo al partido de Lanús 1536-1944. Ed. [13] LEY NACIONAL DE RUINAS Y
Archivo Histórico de la Provincia de Buenos YACIMIENTOS ARQUEOLÓGICOS Nº
Aires “Ricardo Levene”, Buenos Aires, 1974.
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b
Departamento de Artes Visuais/Universidade Federal de Santa Maria/reinilda.minuzzi@gmail.com
RESUMO
Este artigo busca pensar sobre o que envolve e como se dá uma pesquisa em Arte, analisando o
método da Poiética. A escrita se desdobra partindo da abordagem de Sandra Rey (1996, 2002) para
uma análise da Poiética em um trabalho de dissertação de mestrado. A pesquisa em Arte tem suas
singularidades, divergindo de algumas pesquisas com estruturas mais rígidas. No que se refere a
metodologias, desenvolve-se com maior maleabilidade; Muitas vezes, no entanto, essa abertura acaba
sendo muito questionada e encarada como uma pesquisa que “tudo pode”. O método da Poiética
permite que o próprio pesquisador construa a sua metodologia, cujos caminhos surgem no decorrer
do processo de pesquisa, porém cada um encontrará sua maneira de realizar seu trabalho, da forma
mais produtiva e coerente com a proposta de cada um. Percebe-se que a Poiética se constitui em um
método eficaz na pesquisa em Arte, porém é necessário comprometimento, seguindo os pontos
sugeridos por Rey (1996, 2002), bem como perceber dentro da listagem dos instrumentos quais são
mais eficazes e dialogam de melhor forma com a pesquisa pessoal, como no caso da dissertação
analisada.
Palavras chave: Pesquisa em Arte, Metodologia, Poiética.
RESUMEN
Este artículo busca pensar sobre lo que envuelve y cómo se da una investigación en Arte, analizando
el método de la Poiética. La escritura se desdobla partiendo del abordaje de Sandra Rey (1996, 2002)
para un análisis de la Poiética en un trabajo de disertación de maestría. La investigación en Arte tiene
sus singularidades, ella diverge de algunas investigaciones con estructuras más rígidas. En cuestión
de métodos, se desarrolla con mayor maleabilidad. Muchas veces esa apertura acaba siendo muy
cuestionada y encarada como una investigación que "todo puede". El método de la Poiética permite
que el propio investigador construya su metodología, cuyos caminos surgen en el curso del proceso
de investigación, pero cada uno encontrará su manera de realizar su trabajo, de la forma más
productiva y coherente con la propuesta de cada uno. Se percibe que la Poiética se constituye en un
método eficaz en la investigación en Arte, pero es necesario comprometimiento, siguiendo los puntos
sugeridos por Rey (1996, 2002), así como percibir dentro del listado de los instrumentos cuáles son
más eficaces y dialogan de mejor forma con la investigación personal, como en el caso del trabajo de
disertación analizado.
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Research, dirigiu o Instituto de Estética da Universidade
Sandra Rey, artista, professora e pesquisadora,
Paris I- Pasthéon Sorbonne.
crítica de arte, curadora, entre outros, discute sobre os
21
métodos de criação artística entre teoria e prática e Artista Visual, graduada em Artes Visuais-
metodologia de pesquisa em artes visuais (Fonte: REY, Bacharelado pela Universidade Federal de Santa Maria
Sandra, Currículo Lattes, 2018). e Mestre em Artes Visuais pelo Programa de Pós –
20 Graduação em artes visuais pela mesma universidade.
Doutor em filosofia, pintor, historiador de arte
especialista em surrealismo, co-diretor da revista Poietic
49
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
sobre arte vem discutir e criar teorias sobre resultados se fazem abertos ao contato e ao
essas obras já instauradas. diálogo com o sujeito espectador.
A pesquisa em arte vai encontrar respaldo teórico A arte tem um caráter pessoal de interpretação,
na poiética, que propõe-se como uma ciência e que se diferencia da ciência, pelo fato de haver
filosofia da criação, levando em conta as diferentes linguagens artísticas em nosso meio
condutas que instauram a obra.(REY, 1996, p. que, consequentemente, produzem diversas
83) formas de interpretações por parte do
interlocutor, interpretações essas subjetivas.
(REY, 2002, p.123).
Como já colocado anteriormente, uma
pesquisa em arte abrange vários caminhos
A arte trabalha em encontro com o outro, com
possíveis para seguir durante esse processo de
o pensamento, e interação de um outro sujeito.
instauração. A pesquisa no campo da arte, por
A arte diáloga e se faz viva nesses espaços de
não possuir uma metodologia fechada,
transição, onde se atravessam novos olhares,
dificilmente possui regras pré-estabelecidas,
outras percepções, assim, o trabalho se
por vezes, em razão desta abertura, acaba
expande, não se mantém fechado e nem
sendo pouco valorizada, entendida como uma
finalizado, mesmo após o término da obra.
pesquisa “onde tudo pode”. Nesse sentido, Rey
Nesta perspectiva, a produção artística
(2002) questiona:
continua a existir em processo nessas relações
que se estabelecem a partir de diferentes
Na ausência de um conjunto de regras válidas e interpretações.
consensualmente aceitas que possam balizar a
A arte e a ciência trabalham de maneira
produção artística ante o “tudo pode” e os
comentários, muitas vezes apressados, sobre diferente uma da outra, uma por um viés mais
“falta de critério” das manifestações artísticas, subjetivo, sensível e aberto, outra mais fechada
nas quais o artista buscará subsídios e encontrará e seguindo regras pré-estabelecidas. Nesta
respaldo para o seu fazer? (REY, 2002, p.123). direção, tendo em vista o pensamento entre
arte e ciência e também refletindo sobre o que
pode uma pesquisa em arte, Rey (1996) coloca:
Segundo a autora, a pesquisa em arte, focada
na produção em poéticas visuais, é carregada,
por vezes, de incertezas, onde só o processo, o Falar de pesquisa, nos induz imediatamente a
experienciar, que irá trazer respostas acerca dos pensar em parâmetros científicos. Talvez então,
métodos utilizados. O artista vai descobrindo inicialmente, fosse oportuno lembrar que a
durante o fazer, qual as formas mais adequadas grande diferenciação a fazer entre arte e ciência,
é a de que arte remete ao mundo dos valores e
e potentes para se trabalhar. Inicialmente, não diretamente ao dos feitos como a ciência.
muitas vezes, ter essa abertura, esse espaço de (REY, 1996, p.83).
liberdade, pode fazer surgir o sentimento de se
estar perdido e sem saber exatamente por onde
seguir. A pesquisa em arte possibilita ao pesquisador
uma autonomia, fazendo suas próprias
A Poiética tende dar apoio durante esse
escolhas, e construindo seu próprio caminho,
processo inicial de pesquisa, onde se realizam
relacionando assim a prática e a teoria,
as primeiras descobertas em torno do objeto de
envolvendo conhecimento a partir de um
estudo.
mundo dos valores, que busca exatemente
É perceptível que a pesquisa em arte tenha questionar, fazer pensar e olhar além do que se
suas singularidades, visto que, possui um vê. A ciência por sua vez, busca encontrar
caráter sensível e subjetivo. A arte difere de resultados, comprovar algo.
uma ciência dura, pois é reflexiva, faz pensar,
A pesquisa em arte pode mudar de rumo,
questiona, desterritorializa. Não visa
direcionando-se a outros caminhos a partir de
resultados prontos e fechados. E, por vezes, os
uma conversa, um filme, um novo referencial,
porque possui esse caráter de movimento, é
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
aberta a modificações. As mudanças, o novo, teoria que se faz pertinente para a pesquisa em
a incerteza fazem parte do processo de arte. Rey (1996, p.81-95) apresenta três
pesquisa. Segundo Rey: parâmetros que compõem a Poiética: a
liberdade (expressão da singularidade), a
errabilidade (direito de se enganar) e a
[...] o projeto na pesquisa em artes visuais, eficaciedade (se errou, tem que reconhecer que
equivaleria a um projétil, algo que é lançado
como uma mira. Mas o caminho exato que irá
errou, e corrigir o erro).
percorrer nunca sabemos. (REY, 1996, p.84) A autora coloca que é preciso, nesse sentido,
ser honesto com a pesquisa, buscar ser o mais
transparente possível com o processo, sendo
Nas artes visuais, a prática e a teoria devem que os erros, às vezes, fazem parte desse
caminhar juntas, uma potencializando a outra, caminho, portanto é necessário ser sincero e
dando suporte para o pensar e o fazer, em um reconhecê-los, buscando, a partir deles,
trabalho concomitante. Assim segundo Rey: evolver o processo da pesquisa. A Poiética
permite construir o próprio percurso dentro da
A pesquisa em artes visuais implica em um pesquisa, por meio do processo de criação; em
trânsito ininterrupto entre prática e teoria. Os contraponto, ela também exige
conceitos extraídos dos procedimentos práticos comprometimento, verdade e transparência na
são investigados pelo viés da teoria e novamente forma em que a pesquisa for avançando. É um
testados em experimentações práticas (REY,
2002, p.123).
trabalho que exige equilíbrio entre a liberdade
e o comprometimento.
Rey (2002, p. 123-140) também fala da
Uma pesquisa em poéticas visuais, parte de
importância de buscar por esse equilíbrio na
sua prática para, a partir do seu modo de fazer,
pesquisa em arte, entre o sensível e o racional.
descobrir quais conceitos que operam no
Não se pode deixar que a pesquisa alimente-se
trabalho. Normalmente ao se deparar com os
apenas do sensível a ponto de ser algo
teóricos, pensadores a respeito dos conceitos
totalmente subjetivo. Como também não se
trabalhados, acaba-se movimentando a
pode trabalhar a arte apenas de forma racional.
pesquisa e, por vezes, a própria prática. Alguns
É interessante deixar o lado sensível permear,
questionamentos nesse processo podem surgir,
para não vir a ser apenas uma produção
como: O que estou fazendo? De que outra
realizada a partir de normas e parâmetros
forma posso trabalhar o objeto de pesquisa?
fechados.
Por que optei fazer dessa maneira e não de
outra? Tudo precisa fazer sentido, ter um A autora apresenta pontos que servem como
porquê, nada pode ser tão vago e insignificante instrumentos para o artista-pesquisador não se
em uma pesquisa. perder em meio a pesquisa que tem um caráter
mais livre. Isso pode constituir uma base forte
Questionar o próprio trabalho, acredita-se ser
e potente para analisar e pensar a pesquisa em
uma forma adequada para perceber onde estão
arte:
os pontos frágeis da pesquisa. É necessário
pensar e observar o que se está fazendo. “A a)Verbalizar – é importante falar sobre sua
teoria busca respostas para o porquê de fazer pesquisa, explicar o que está fazendo. Permitir
isto ou aquilo, especula sobre as implicações que a pesquisa saia da esfera apenas do
daquilo que estou fazendo com o que já foi pensamento, explicando-a.
feito” (REY, 1996, p.81-95). É necessário
autoavaliar o trabalho, buscar um afastamento
a fim de desenvolver um outro olhar sobre sua b) Criar estratégias – uma das estratégias
pesquisa e, assim, questioná-la e dinamizá-la. importantes é o diário de anotações, onde
pode-se escrever todos os seus pensamentos,
A Poiética é um corpus teórico que leva a sem censura, uma espécie de diário secreto. É
pensar a pesquisa em arte partindo do fazer interessante fazer fichas de anotações sobre o
artístico, da criação do objeto. Constitui um trabalho poético, e também fichar conceitos
estudo voltado para essa relação entre prática e que possam vir a dialogar com sua pesquisa.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
In:https://repositorio.ufsm.br/bitstream/handle/1/5240/
AREND%2C%20ALINE.pdf?sequence=1&isAllowed
=y.
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
[2] Babelio. Disponível em: < [5] REY, Sandra. Por uma abordagem
https://www.babelio.com/auteur/Rene- metodológica da pesquisa em artes visuais. In
Passeron/119947>. Acesso em 19 de nov. de BRITES, Blanca; TESSLER, Elida (Org.) O
2018. meio como ponto zero: metodologia da
pesquisa em artes plásticas. Porto Alegre:
[3]AREND, Aline. Currículo lattes.
Editora da Universidade/UFRGS, 2002, p.123-
Disponível em: <
140, p.123.
http://lattes.cnpq.br/4191700235194206 >.
Acesso em 19 de nov. de 2018. [6] AREND, Aline. Memórias de infância:
Pesquisa Poética em Artes Visuais. Dissertação
[4] REY, Sandra. Da teoria à prática: três
(mestrado). Universidade Federal de Santa
instâncias metodológicas sobre a pesquisa em
Maria, Centro de Artes e Letras, Programa de
artes visuais. In: Porto Alegre: Ed.
Pós-Graduação em Artes Visuais, RS, 2016.
Universidade/UFRGS, 1996. V.7, n.13, p. 81-
95, p.83;
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
RESUMO
Este trabalho buscou apresentar a trajetória da família Porto Alegre, formada pelos irmãos Lucio,
Aquilles, Apolinário e Apelles Porto Alegre. Os irmãos Porto Alegre, como eram conhecidos,
nasceram na cidade de Rio Grande e mudaram para a cidade de Porto Alegre, filhos de Antônio José
Gomes Porto Alegre e Delfina da Costa Campelo. Os irmãos se destacaram como docentes e na
criação de instituições educacionais e culturais no final do século XIX e início do XX, além de,
participarem da movimentação política do período. Esta pesquisa tem como metodologia a análise
documental, amparada pelos autores Cellard (2010) e Stephanou (1998). E para a construção teórica
recorreu-se aos trabalhos de Arriada (2011), Candau (2014), Certeau (2013), Gomes e Hansen (2016),
Le Goff (2013), Nora (1993), Nóvoa (2013) e Prost (2008). Apoiando-se em Gomes e Hansen (2016)
identificou-se nos irmãos Porto Alegre a figura de intelectuais mediadores do seu tempo, pois eles
estavam envolvidos com a comunidade, sendo nos campos educacionais, políticos e culturais. Apelles
Porto Alegre fundou o colégio Rio-grandense e o jornal A Imprensa, e atuou em várias instituições
como docente. Apolinário e Aquilles tiveram uma vasta produção literária. Lucio apesar de menos
citado, esteve envolvido na criação de várias instituições auxiliando assim seus irmãos.
Palavras chave: Educação, Porto Alegre, intelectuais mediadores.
ABSTRACT
Ce travail a cherché de présenter la trajectoire de la famille Porto Alegre, formé par les frères Lucio,
Aquilles, Apolinário et Apelles Porto Alegre. Les frères Porto Alegre, comme étaient connus, sont
nés dans la ville de Rio Grande et ils ont déménangé à la ville de Porto Alegre. Fils d'Antônio José
Gomes Porto Alegre et de Delfina da Costa Campelo. Les frères ils se sont détachés en tant
qu'enseignants et dans la création d'institutions éducatifs et culturels à la fin du siècle XXI et au début
du XX e siècle, au-delà de participer de la mouvementation politique de cette période. Cette recherche
a pour méthodologie l'analyse documentaire, soutenue par les auteurs Cellard (2010) et Stephanou
(1998). Pour la construction théorique, ont été utilisée aus travails de Candida (2014), Certeau (2013),
Gomes et Hansen (2016), Le Goff (2013), Nora (1993), Nóvoa (2013) et Prost (2008). Sur la base de
Gomes et Hansen (2016), ont identifié les frères Porto Alegre la figure des intellectuels de médiateur
de son temps, puis ils étaient engagés dans la communauté, dans les champs éducatif, politique et
culturel. Apelles Porto Alegre a fondé l’ecóle Rio-Grandense et le journal A Imprensa et a agi en
plusieurs institutions comme enseignant. Apolinario et Aquilles ont eu une vaste production littéraire.
Lucio, bien que moins mentionné, a été engagé dans la création de plusieurs institutions, aidant ainsi
ses frères.
Mots-clés: Education, Porto Alegre, intellectuels médiateurs.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
Dados retirados da genealogia da família Martins http://www.martinscosta.org/pgv/individual.php?pid=I
Costa: visualizado em: 288 acessado em 29/10/2017.
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
irmãos se une e assim sua pesquisa se torna informações, o que muitas vezes forma lacunas
mais ampla. que não poderão ser compreendidas (PROST,
2008).
O trabalho de Barbosa e Ott (2013) buscou as
origens da contabilidade no Rio Grande do Sul Sobre esse aspecto, vale ressaltar que o
e frente a este tema se destacou o Colégio Rio- historiador utiliza o mesmo modo de narrar
Grandense. O Colégio Rio-Grandense fundado uma história que uma pessoa comum, mas ele
em 1876, pelo professor Apelles Porto Alegre precisa de comprovações e usa métodos para
que tinha na época 26 anos (BARBOSA e legitimar o que está afirmando (PROST,
OTT, 2013). “[...] Apelles desfrutava de 2008). Os fatos devem ser avaliados com rigor
prestígio político e cultural no estado do Rio crítico, pois são carregados de
Grande do Sul” (BARBOSA e OTT, 2013). intencionalidade e significações. É
fundamental para o profissional de história
Conforme Barbosa e Ott (2013), o professor
tentar se aproximar ao máximo da “verdade”,
Apelles participou da primeira banca
apesar de possuir a certeza que isto será apenas
examinadora de português, dos formandos do
uma pretensão não atingida (LE GOFF, 2013).
curso de guarda-livros do Colégio Mauá em
1901, além de ministrar a disciplina de
português do mesmo colégio. O professor
Os irmãos Porto Alegre
Apelles foi quem proferiu o discurso oficial no
dia da entrega dos diplomas aos formandos Os irmãos Porto Alegre tiveram um papel
(BARBOSA e OTT, 2013). importante na vida cultural da cidade de Porto
Alegre influenciando historicamente o restante
Em outro momento, Barbosa e Ott (2013) do estado com suas participações, políticas e
apontam a evolução do estudo da contabilidade investimentos educacionais. A seguir se tratará
no estado do Rio Grande do Sul e para isso de cada irmão individualmente.
dividem em três períodos, uma disciplina no
ensino secundário, a abertura de um colégio A partir do levantamento realizado
especializado e posteriormente a faculdade de identificou-se que o mais conhecido e
ciências econômicas. pesquisado dos quatro irmãos Porto Alegre até
o momento é Apolinário José Gomes Porto
Perin (2017) escreve em sua dissertação de Alegre, que nasceu em 29 de agosto de 1844
mestrado para o curso de história sobre a visão na cidade de Rio Grande, e ainda na
do jornalista Roque Callage sobre Porto Alegre adolescência muda-se com sua família para a
e suas desigualdades sociais. E por fim, Torres cidade de Porto Alegre. Em 1861 matricula-se
(2014) abordou em seu artigo a Guerra do na faculdade de Direito de São Paulo, contudo,
Paraguai na visão do jornal literário Arcádia, com a morte de seu pai retorna para Porto
editado na cidade de Rio Grande. Alegre onde inicia sua docência para ajudar a
Se hoje a história destes homens de seu sustentar a família (AGUIAR, 2011).
tempo, pode ser contada é porque existe Ele deixou uma vasta produção textual que
registros de suas trajetórias, que foram pode ser dividida entre contos, historiografia,
preservados, assim como vestígios que poesia, romance, teatro, estudos críticos e
permitem construí-las Estes vestígios foram
biográficos e outros, entre eles estão cento e
preservados por orgãos públicos, mas também dezessete poemas, seis livros e diversas peças
por pessoas conscientes do papel que esta de teatro publicada em vários jornais e revistas
família exerceu na sociedade. (AGUIAR, 2011, PÔRTO ALEGRE, 1954). A
Os vestígios que permanecem do passado seguir, apresenta-se uma imagem de
devem ser indagados para que se tornem Apolinário:
fontes. As fontes não falam sem que o
historiador as interrogue. No entanto, parte do
tempo, temos que trabalhar com a carência de
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
Figura 1: Imagem de Apolinario Porto Alegre. Figura 2: Imagem de Aquiles Porto Alegre
Visualizado em: Visualizado:
http://www.paginadogaucho.com.br/escr/apa.htm http://www.webpoa.com/cms/memória/personagens/20
acessado em: 10/11/18. 3-aquiles-porto-alegre.html acessado: 10/11/18.
O professor Aquiles Porto Alegre nasceu na
cidade de Rio Grande em 1848, e mudou-se
O Caçula dos quatro irmãos Apelles Porto
para Porto Alegre juntamente com sua família.
Alegre, nasceu na cidade de Rio Grande, em
Estudou no Colégio Gomes e na Escola Militar
24 de outubro de 1850 e faleceu em 6 de julho
(FERRER, 2015).
de 1917, na cidade de Porto Alegre.
Trabalhou como funcionário público, foi o
O professor Apelles “além da direção do
fundador e dirigiu o Jornal do Comércio
Colégio Rio-Grandense, foi professor dos
(1884/1888) e a Notícia (1869) de Porto
Colégios ‘Instituto Brasileiro’, ‘Souza Lobo’ e
Alegre (FERRER, 2015). Escreveu inúmeros
‘Luis Kraemer’. Jornalista, educador e
contos e crônicas. Além disso, “pertenceu ao
contista. Integrante do Partenon Literário
‘Clube Abolicionista’ de Porto Alegre; foi
publicou diversos artigos” (ARRIADA, 2011,
membro fundador da Academia Rio-
p.102).
Grandense de Letras (1901), da Academia de
Letras do Rio Grande do Sul (1910) e sócio No ano de “1890, [...] Apeles Porto Alegre
efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do foi nomeado diretor da Instrução Pública e da
Rio Grande do Sul” (PÔRTO ALEGRE, 1917, Escola Normal” (PÔRTO ALEGRE, 1917,
p.9). p.196). Fundou o jornal A Imprensa, que
circulou na cidade de Porto Alegre no início da
Juntamente com os irmãos e outros
década de 1880, o qual, possivelmente tenha
companheiros fundou o Partenon Literário, do
sido o primeiro jornal republicado do estado. A
qual em 1879 foi eleito presidente (FERRER,
seguir, também é exposta uma imagem do
2015). Em sua vasta publicação bibliográfica
professor:
Aquiles privilegiava a escrita de crônicas sobre
a cidade de Porto Alegre, além de escrever
sobre homens ilustres e populares
(ANTONIOLLI, 2011).
Conforme Arriada (2011), Aquiles Porto
Alegre, escreveu e editou poesias, crônicas,
livros didáticos, relatos históricos e biografias.
Seus escritos reforçam o olhar cuidadoso e
perspicaz sobre as modificações ocorridas na
cidade de Porto Alegre. Abaixo, é apresentada
uma imagem deste professor:
Figura 3: Imagem de Apelles Porto Alegre (Foto:
Candace Bauer/CMPA) Disponível em:
http://camarapoa.rs.gov.br/noticias/apeles-porto-alegre-
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
e-luciana-de-abreu-sao-lembrados acessado em
28/04/2018.
[...] a memória como suporte dos processos de
identidade e reivindicações respectivas está na
ordem do dia... Palavras-chaves são ‘resgate’,
Lucio Porto Alegre apesar de menos citado, ‘recuperação’ e ‘preservação’ – todas
auxiliou na fundação de instituições pressupondo uma essência frágil que necessita de
educacionais e associações, foi sócio do cuidados especiais para não se deteriorar ou
Parthenon Literário. Até o momento não se perder uma substância preexistente. A
comunicação de massa e o mercado
tem conhecimento de ter exercido a docência e (antiquariato, moda) reforçam esta reificação
não possui nenhuma imagem, em algumas (1999, p. 12).
pesquisas realizadas sobre os irmãos ele não
chega a ser mencionado.
A família Porto Alegre se orgulhava de sua Ainda referente à memória, Le Goff (2013)
tradição com a educação e a política, conforme salienta que esta é fundamental para a
Alvaro Pôrto Alegre, Apolinário deixou um construção da identidade seja ela coletiva ou
manuscrito assim relatando: “À minha família individual. Neste mesmo sentido, Candau
cabe a glória de ter sido a inspiradora da reação afirma que na ânsia de não perder nada, na
atual em favor da liberdade. Fomos os mestres preocupação de conservar a memória,
da mocidade rio-grandense. Filhos de farrapos, acabamos por guardar tudo, e é esta memória
não interrompemos jamais a evolução guardada que origina as identidades do
tradicional” (PÔRTO ALEGRE, 1954, p.7). passado (CANDAU, 2014).
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
passado e a qualquer momento ela pode ser Literário e pela fundação do Colégio Rio-
modificada, caso surja um novo fato que estava Grandense.
oculto, ou seja, desenvolvendo uma nova Estes homens que hoje afirmamos serem
interpretação. Desse modo, a história é uma intelectuais em seu tempo não necessariamente
construção dos vestígios deixados pelo foram reconhecidos como tais no período, mas
passado. O presente interfere na história, pois estiveram incluídos na sociedade em questão,
o passado precisa ser observado no presente, foram atores de seu tempo, participaram
assim, o passado sofre a alteração do presente. efetivamente da comunidade em que viveram.
Essa discussão pode ser exemplificada por Para Gomes e Hansen também se pode dizer
meio de um dado identificado por Arriada que os intelectuais mediadores,
(2011), uma vez que esse autor encontrou um
anúncio do Colégio Rio-Grandense, com
pequeno histórico que poderá auxiliar nas [...] são homens da produção do conhecimento e
comunicação de ideias, direta ou indiretamente
pesquisas dos irmãos Porto Alegre, pois esses vinculados à intervenção político-social. Sendo
indícios apresentam informações que, muitas assim, tais sujeitos podem e devem ser tratados
vezes, não são localizados em outros como atores estratégicos nas áreas da cultura e da
documentos. política que se entrelaçam, não sem tensões, mas
com distinções, ainda que historicamente
Para além da questão da memória, é ocupem posição de reconhecimento variável na
importante ressaltar apoiando-se em Gomes e vida social (GOMES e HANSEN, 2016, p.10) .
Hansen, que podemos afirmar que Apolinário,
Lucio, Aquiles e Apelles são “intelectuais
mediadores”. Sobre esse conceito, Gomes e A família Porto Alegre teve uma vasta
Hansen argumentam: publicação de seus textos em jornais, até o
momento, este levantamento ainda não foi
completamente realizado. Contudo, já se sabe
[...] estes sujeitos serão aqui nomeados como que além de textos publicados em jornais da
intelectuais mediadores ou, simplesmente, capital, também houveram publicações em
mediadores culturais [...] as práticas de mediação
cidades do interior como, por exemplo, o
cultural podem ser exercidas por um conjunto
diversificado de atores, cuja presença e jornal Arcádia que circulava na cidade de Rio
importância nas várias sociedades e culturas têm Grande/RS.
grande relevância, porém, nem sempre
reconhecimento. [...] Outros mediadores Desse modo, salienta-se que os periódicos
culturais podem ser identificados nos leitores, jornalísticos também se configuram como
contadores de histórias, guias de instituições, documentos escritos, e segundo Zicman (1985)
pais e outros agentes educadores encarregados da e Martins e Luca (2006) auxiliam na pesquisa
socialização de crianças e jovens em diversas histórica Martins e de Luca.
situações. Tais mediadores, de enorme
relevância na construção de identidades culturais A pesquisa em arquivos e a busca por
de indivíduos e comunidades, geralmente não periódicos podem ser realizadas nos arquivos
são identificados e não se identificam pela
categoria de intelectual (GOMES E HANSEN,
da capital, onde os irmãos moraram grande
2016, p. 9). parte de suas vidas, e também no interior,
devido a grande rede de amizade que os
circundavam. Assim como no Instituto
É possível, então, afirmar que os irmãos Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul
Porto Alegre foram intelectuais mediadores, o qual possui ampla documentação do período
não apenas pelas profissões que exerceram em analisado.
diversas escolas, mas também pelo seu Seguindo as ideias de Farge (2009) “o sabor
envolvimento com a comunidade, na criação do arquivo” está nos pequenos momentos da
de jornais e associações como o Parthenon pesquisa, quando se encontra o documento
procurado ou mesmo no simples fato de mexer
63
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
naqueles documentos que há anos estão A partir de 1968 iniciou-se o que chamamos
imóveis à espera de um pesquisador. da terceira geração dos Annales este foi um
período de maior abertura, com novos temas,
novas influências, as mulheres foram incluídas
Verão ou inverno, é sempre gelado; os dedos se (BURKE, 1997). E por sua vez, a história
entorpecem ao decifrá-lo ao mesmo tempo em
que se tingem de poeira fria no contato com seu
cultural buscou uma aproximação
papel pergaminho ou chiffon. É pouco legível a principalmente com a antropologia deixando
olhos mal exercitados ainda que às vezes venha de lado o objeto e valorizando o método.
revestido de uma escrita minuciosa e regular.
Encontra-se sobre a mesa de leitura, geralmente A História Cultural procura reconstruir o
em pilha, amarrado ou cintado, em suma, em passado pela interpretação das culturas dos
forma de feixe, os cantos carcomidos pelo tempo povos, das nações, das sociedades e dos
ou pelos roedores; precioso (infinitamente) e indivíduos, “[...] mais do que um campo
danificado, manipula-se com toda delicadeza por específico do conhecimento histórico, a
medo de que um anódino princípio de
deterioração se torne definitivo. Ao primeiro História cultural revela-se como uma maneira
olhar, é possível saber se já foi ou não de se conceber e de se fazer a própria História”
consultado, uma única vez que seja, desde sua (ENGEL, 1993, p.36). Nesta perspectiva, a
conservação (FARGE, 2009, p. 9). análise da memória é feita no sentido de
perceber a construção de sentidos e
identidades.
Sobre a imprensa, vale destacar que foi entre
os anos de estudos desta pesquisa que ela se Cabe destacar, que a história da educação
desenvolveu. Conforme, apontado por Martins desde 1960 vem assumindo um novo papel, no
e de Luca: qual influencia outras disciplinas. Este
reconhecimento vem depois de anos de
exclusão, em que consideravam a pedagogia
[...] pela ordem política republicana, com uma disciplina menor, diversas outras áreas e
programas de alfabetização e remodelação das principalmente na história, os historiadores
cidades; pela agilidade introduzida pelos novos
não avaliavam a prática pedagógica como
meios de comunicação; pelo aperfeiçoamento
tipográfico e avanços na ilustração, enquanto as relevante para se entender a História da
máquinas impressoras atingiam velocidades Educação (LOPES e GALVÃO, 2001).
nunca vistas.
Ainda conforme Lopes e Galvão (2001), a
A imprensa mais profissionalizada passou a História da Educação vem buscando cada vez
figurar como segmento econômico polivalente,
mais seu espaço com a ampliação de suas
de influência na melhoria dos demais, visto que
informações, propaganda e publicidade nela pesquisas e fontes, assim como a realização de
estampadas influenciavam outros circuitos, eventos específicos sobre as temáticas.
dependentes do impresso em suas variadas Atualmente, se faz necessário cada vez mais
formas. O jornal, a revista e o cartaz – veículos entendermos como se deu a construção
da palavra impressa – potencializavam consumo
histórica da educação no Brasil.
de toda ordem (MARTINS e LUCA, 2006, p.37-
38)
Conclusões
Apesar desta profissionalização da imprensa O presente trabalho teve como objetivo
e das maiores tiragens, o jornal se popularizou apresentar um resgate histórico acerca dos
para a história como uma fonte menor, irmãos Porto Alegre, os quais tiveram um
inferiorizada, foi apenas na terceira geração da papel importante em seu tempo no que tange
Escola dos Annales com os “novos temas e as ao contexto social, político e educacional. Para
novas abordagens” que esta ideia começa a se tanto, foram utilizados distintos materiais
modificar (LUCA, 2006, p.112) salvaguardados em um arquivo privado e as
bibliografias localizadas no estado da arte.
64
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
Sobre a atuação desses quatros irmãos, vale História Educação [Online], Porto Alegre,
salientar que estes homens que hoje afirmamos v.18, n.43, p.145-161, maio/ago. 2014.
serem intelectuais em seu tempo não Disponível em:
necessariamente foram reconhecidos como tais http://www.scielo.br/pdf/heduc/v18n43/09.pd
em seu tempo, mas estiveram incluídos em f. Acessado em: 18 set. 2015.
vários projetos da sociedade de Porto Alegre; [2] AGUIAR, Laísa Teixeira de. A poesia de
foram atores de seu tempo e participaram Apolinário José Gomes Porto Alegre:
efetivamente da comunidade em que viveram. recuperação e estabelecimento de texto. Maria
Os irmãos Porto Alegre participaram do Eunice Moreira, orientadora e Alice
ensino, da política e da cultura do estado, Therezinha Campos Moreira, co-orientadora.
sendo assim considerados intelectuais Porto Alegre, 2011. Visualizado em:
mediadores de uma época. http://meriva.pucrs.br:8080/dspace/handle/10
Sem dúvida, a busca por outros indícios para 923/4004 acessado em: 28/10/2017.
resgatar essa história ainda se faz necessária, [3] PÔRTO ALEGRE, Alvaro. Apolinário
uma vez que essa busca é sempre um desafio
Pôrto Alegre. Pôrto Alegre: Editora
para toda a pesquisa. Pode-se comparar o Thurmann, 1954.
historiador a um investigador, que procura as
pistas deixadas no passsado, para a montagem [4] FERRER, Francisca Carla Santos. Ao
de uma história. Para aqueles que apreciam o “Rés-do chão”: Análise das crônicas de
arquivo tem um sabor especial e a cada Aquiles Porto Alegre. Periódico Científico
descoberta, é um prêmio ao esforço, assim Outras Plavras. v.11, n.1, junho 2015, p.46-
como não encontrar é um incentivo a 51.
continuar. [5] PÔRTO ALEGRE, Aquiles. Homens
Conforme Lopes e Galvão (2001), a História Ilustres do Rio Grande do Sul. Porto Alegre:
da Educação vem buscando cada vez mais seu Erus, 1917.
espaço com a ampliação de suas pesquisas e [6] ANTONIOLLI, Juliano Francesco.
fontes, assim como a realização de eventos “Através do Passado”: crônica, biografia e
específicos sobre as temáticas. Atualmente, se memória na série de Achylles Porto Alegre
faz necessário cada vez mais entendermos pedagógica (1916-1920). Maria Cristina de
como se deu a construção histórica da Matos Rodrigues, orientadora. Porto Alegre,
educação no Brasil. 2011.
E assim, esta pesquisa pode ser uma [7] ARRIADA, Eduardo. A Educação
contribuição importante para a história da Secundária na Província de São Pedro do Rio
educação sul-riograndese, pois busca Grande do Sul: a desoficialização do ensino
investigar uma família de intelectuais público. Jundiaí: Paco Editorial, 2011.
mediadores que trouxeram significativos
subsídios para o campo da educação no Rio [8] MENESES, Ulpiano T. Bezerra. A crise da
Grande do Sul no final do século XIX e início Memória, História e Documento: reflexões
do século XX, momento este em que o Estado para um tempo de transformações. In: SILVA,
estava resignificando e reestruturando o seu Zélia Lopes da (org.). Arquivos, patrimônio e
sistema de ensino, questões essas que ainda memória: trajetória e perspectivas. São Paulo:
precisam ser melhor aprofundadas. Editora UNESP: FAPESP, 1999, p.11-29.
[9] LE GOFF, Jacques. História e Memória.
Campinas: Editora da Unicamp, 2013.
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Fazer História da Educação: pensando a
operação historiográfica em temas regionais. [11] SILVEIRA, CÁSSIA DAIANE
MACEDO DA. Dois pra lá, dois pra cá: o
65
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
Parthenon Litterario e as trocas entre [17] NORA, Pierre. Entre Memória e História:
literatura e política na Porto Alegre do século a problemática dos lugares. Projeto História:
XIX. Benito Bisso Schmidt, orientador. Porto Revista do Programa de Estudos Pós-
Alegre, 2008, 189f. Graduação em História e do Departamento de
História da PUC-SP, São Paulo, n.10, p.7-28,
[12] BARBOSA, Marco Aurélio Gomes; OTT, dez.1993.
Ernani. A origem da contabilidade no Rio [18] CELLARD, André. A análise
Grande do Sul: primeiras evidências, documental. In: A pesquisa qualitativa:
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Regional de Contabilidade do Rio Grande do Petrópolis: Editora Vozes, 2010.
Sul: Porto Alegre, 2013. Visualizado em:
http://www.repositorio.furg.br/bitstream/hand [19] GOMES, Angela Maria de Castro e
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ade%20no%20Rio%20Grande%20do%20Sul Mediadores: práticas culturais e ação política.
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[13] PERIN, Henrique. Roque Callage e os
esquecidos d'a cidade: a exclusão social em [21] MARTINS, Ana Luiza; LUCA, Tania
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[15] PROST, Antoine. Doze lições sobre a Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1997.
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[16] STEPHANOU, Maria. Problematizações Niterói, v.1, n.1, p.30-38, 1993.
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66
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
b
Profª Associada/Dpto de Fundamentos da Educação/UniversidadeFederal de Santa Maria,fabicostas@gmail.com
RESUMO
O trabalho aqui apresentado é o recorte de uma pesquisa de dissertação realizada junto ao Programa
de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Maria. A pesquisa investigou as
consequências da interação entre crianças com deficiência e crianças com desenvolvimento típico
para a constituição dessas últimas como sujeito sob a ótica da Teoria Histórico-Cultural. O estudo
verificou que tal interação tornou as crianças com desenvolvimento típico mais sensíveis/suscetíveis
à inclusão. Neste texto, evidencia-se a adaptação do material intitulado “Index para a inclusão”
elaborado por Booth e Ainscow (2011) para auxiliar as instituições educacionais a tornarem seu
sistema inclusivo. Tal adaptação surgiu da necessidade da pesquisadora em afirmar que a instituição
de educação infantil escolhida como lócus da investigação de fato tinha um caráter inclusivo. O
material foi adaptado no formato de questionário para três públicos distintos: os professores da
instituição, as crianças participantes da pesquisa e seus respectivos pais. Apresenta-se aqui o material
adaptado bem como a análise das respostas obtidas pelos sujeitos que participaram da pesquisa
evidenciando a relevância das diferentes etapas, procedimentos investigativos e utilização do
formulário Google e seus recursos digitais para qualificar a pesquisa.
Palavras chave: pesquisa em educação; adaptação de material investigativo; formulário Google.
ABSTRACT
The paper presented here is the cut of a dissertation research carried out with the Graduate Program
in Education of the Federal University of Santa Maria. The research investigated the consequences
of the interaction between children with disabilities and children with typical development for the
constitution of the latter as subject from the perspective of Historical-Cultural Theory. The study
found that such interaction made children with typical development more susceptible / susceptible to
inclusion. In this text, we highlight the adaptation of the material entitled "Index for Inclusion"
developed by Booth and Ainscow (2011) to help educational institutions to make their system
inclusive. This adaptation arose from the researcher's need to affirm that the child education
institution chosen as the locus of the research was indeed inclusive. The material was adapted in the
form of a questionnaire for three different audiences: the teachers of the institution, the children
participating in the research and their respective parents. We present the adapted material as well as
the analysis of the answers obtained by the subjects who participated in the research, highlighting the
relevance of the different steps, investigative procedures and use of the Google form and its digital
resources to qualify the research.
Keywords: research in education; adaptation of investigative material; Google form.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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A pesquisa foi autorizada pela direção da instituição.
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
Ele pode ser usado de várias maneiras. Ele pode Para que fique mais evidente a riqueza,
ajudar a clarear o pensamento e a preparar a ação complexidade e extensão desse material
individual e coletiva, bem como a estruturar o
desenvolvimento da escola inteira e da
observem o seguinte: apenas na primeira
comunidade educacional. Ele pode ser usado dimensão (Dimensão A: Criando culturas
individualmente por professores, por inclusivas), há dois indicadores; sendo que
profissionais não docentes e por cada indicador, subdivide-se em 10 e 11 outros
pais/responsáveis. Ele pode incitar novos indicadores, respectivamente, e cada item tem
diálogos sobre o que as crianças podem aprender
na escola. (BOOTH; AINSCOW, 2011, p.10).
em torno de vinte questões. Logo, em cada
dimensão têm-se em média quatrocentas
questões para orientar as reflexões.
De forma sucinta, pode-se dizer que o Index Obviamente, seria praticamente inviável que
para a inclusão é um material com indicadores os participantes respondessem a um volume
de inclusão elaborado no intuito de auxiliar a tão grande de questões.
escola, professores, enfim, comunidade A Parte 5 traz a estrutura de planejamento e
escolar a pensar/repensar sua escola de modo os questionários. São quatro questionários
que seja possível a inclusão. utilizando a Escala de Likert (Gil, 2010) sendo
Neste material os autores levam o leitor a um questionário para os professores, gestão,
refletir sobre valores inclusivos e de forma funcionários, equipe diretiva (70 questões), um
bastante didática orienta como deve ser o questionário destinado aos pais e/ou
desenvolvimento das ações para que a responsáveis pelas crianças (56 questões), um
comunidade/escola se torne inclusiva. questionário para as crianças e jovens
denominado ‘Minha escola’ (63 questões) e o
O Index está dividido em cinco partes. Na quarto questionário, uma adaptação deste
parte 1 os autores trazem um panorama geral último para ser respondido por crianças
sobre o que é tal documento. Nas partes dois e pequenas (24 questões).
três, abordam as questões de inclusão sob uma
perspectiva mais teórica, trazendo reflexões Tais questionários foram elaborados em
sobre o processo de inclusão, questões Escala Likert (Gil, 2010) de três níveis
relacionadas ao currículo e a forma como (concordo, concordo parcialmente, discordo) e
organizar um plano em conjunto em prol da cada um deles apresenta frases afirmativas
inclusão. voltadas à vivência e valores inclusivos de
acordo com as três dimensões mencionadas
Na parte 4, apresentam os indicadores e anteriormente.
questões para a inclusão. Esta parte está
estruturada a partir de três dimensões: culturas, Conforme mencionado, considerou-se que
políticas e práticas inclusivas, sendo que cada esses questionários não atenderiam a demanda
uma delas se divide em duas seções conforme da pesquisa se aplicados da maneira como
figura 1. estão propostos no Index. Assim, nos
questionários para os professores e para os
pais/responsáveis elencaram-se as questões
consideradas mais representativas dos valores
inclusivos.
Na sequência, apresenta-se a listagem das
frases apresentadas no questionário destinado
aos profissionais da instituição. Para que o
texto não se torne cansativo ao leitor, optou-se
por apresentar as frases de apenas um dos
questionários a fim de ilustrar o trabalho que
foi desenvolvido pela pesquisadora.
Listagem das frases utilizadas no
questionário adaptado para os profissionais
Figura 1: Booth; Ainscow, 2011, p.14. da instituição (Freitas, 2015)
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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Este recorte temporal justifica-se por ser este o
período em que haviam mais crianças incluídas.
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
RESUMO
O objetivo desse trabalho não é ser laudatório referente aos autores e sim é fazer uma discussão
historiográfica e metodológica demonstrando a importância que com suas ideias tiveram para
historiografia, são esses seguintes teóricos: Marc Bloch, Carlo Ginzburg e Carla Bassanezi Pinsky
(org), também será feita algumas breves reflexões de Eric Hobsbawn entre outros no qual
debateremos como o arcabouço doutrinário da multidisciplinaridade da Escola dos Annales com
intuito de nos dá uma clara ideia que o ofício do historiador se tornou importante na capacidade de
analisar os documentos e fontes trabalhadas de maneira bastante concisa no fazer História.
Discutiremos de forma separada cada autor supracitado, a forma e a ideia como eles passam para o
leitor a maneira em que devemos ter de investigar suas práticas de trabalho, indícios e como devemos
nos posicionar com as fontes enquanto pesquisadores, seus objetivos específicos e com isso definir
que o historiador sendo homem de ofício deve entender a História não como disciplina e sim como
própria ciência..
Palavras chave: Históriografia, Reflexões, Indícios, Ofício
ABSTRACT
The aim of this work is not to be a laudatory one referring to the authors, but rather to make a
historiographic and methodological discussion demonstrating the importance that his ideas had for
historiography, these are the following theoreticians: Marc Bloch, Carlo Ginzburg and Carla
Bassanezi Pinsky (org), also will be made some brief reflections of Eric Hobsbawn among others in
which we will discuss how the doctrinal framework of the multidisciplinarity of the School of the
Annales in order to give us a clear idea that the office of the historian has become important in the
ability to analyze the documents and sources worked in a way Pretty concise not to do History. We
will discuss separately each author mentioned above, the form and the idea as they pass on to the
reader the way in which we should have to investigate their work practices, clues and how we should
position ourselves with the sources as researchers, their specific objectives and with that to define
that the historian being a man of craft must understand History not as a discipline but as a science
itself.
Keywords: History, Reflections, Clues, Craft
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
A história não se configura somente como o autor nos direciona a motivação inicial para
ciência, mas sim como uma disciplina seu livro, apresentando também a
acadêmica amparada pelo humanismo. Marc característica crucial ao se enveredar nas
Bloch é emblemática nesse sentido: “[...] o práticas da produção historiográfica a história
objeto da história é, por natureza, o homem” como problema. (BLOCH, 2001).
(BLOCH, 2001, p.54-55). Na minha Esse livro de certa forma dá boas vindas aos
concepção de historiador corroboro com cursos e em especial para os visitantes,
Benjamin (1985a) quando diz que: “a história também para aqueles que estão avançados no
é objeto de uma construção cujo lugar não é o mundo acadêmico, vão ter como avaliar ideias
tempo homogêneo e vazio, mas um tempo e estabelecer vários diálogos com outras áreas
saturado de agora”. e outros textos muitos importantes como a
Indo mais além, numa crítica mais Sociedades feudal e Reis Taumaturgos, por
conservadora, remetendo para uma corrente exemplo. O aluno do primeiro semestre
mais marxista, mesmo para os padrões quando ler sua obra se sente acolhido e
modestos das ciências humanas e sociais do entrando para família dos historiadores como
século XIX, a história era portanto, uma uma corporação de ofício, ele mostra que a
“disciplina extremamente – poder-se-ia quase história não é somente um amontoado de
dizer deliberadamente – retrógrada” pressupostos teóricos e sim parte da vida do
(HOBSBAWN, 2005, p.156). historiador.
Marc Bloch parece que procurou discorrer, Muitas pessoas se situam na Escola dos
em seus últimos momentos de vida, certa Annales que é composto por vários
legitimidade de um ofício na qual ele abarca historiadores como Bloch, Lucien Febvrer, Le
em suas reflexões acerca dos elementos Goff que de certa forma mudaram a maneira de
constitutivos do trabalho do historiador; o fazer história. Entretanto, a segunda geração
recorte, a concepção de história ao lidar com que veio por meio de Blaudel como
os documentos como vestígios, fontes, a interlocutores direto do Marxismo tiveram em
análise propriamente histórica, método crítico algum momento que dialogar com algumas
e a necessidade da interdisciplinaridade. Seu correntes do marxismo. Febvrer e Bloch
discurso também corrobora com Carla Pinsky travavam uma batalha contra o positivismo
na questão de uma nova tendência de alguns pela inclusão do sujeito na história pela
autores formados pela academia: inclusão de um paradigma que não se restrinja
a fatos, datas e heróis por um estudo da
sociedade dentro da história, dentro do
[...] têm como referência o rigor na análise, as indivíduo e da sociedade e por isso que a obra
críticas propostas pela Nova História ao
cientificismo, a necessidade da
em geral de Bloch é tão interessante.
interdisciplinaridade para ampliar as A própria história de vida de Bloch permitiu
interpretações, posturas não dogmáticas, atenção
que est ampliasse oeleque temático da sua
à condições materiais da produção das fontes,
quase ausência do viés sociológico na própria pesquisa historiográfica, o que é um
linguagem, bibliografia atualizada, preocupação aspectos admiráveis no trabalho de um grande
com a clareza da exposição. (JANOTTI In: historiador. Parece que alguns dos
PINSKY, 2005, p.17-18) pressupostos do Bloch se sustentam até hoje,
por exemplo,a ideia de que a história é a
Destarte há uma preocupação com o ciência dos homens no tempo. Essa é uma ideia
surgimento de uma nova corrente de extremamente elegante! A ideia de que o
historiadores de outras áreas das ciências homem sofre a ação do tempo redimensiona
humanas se fundirem para trabalhar juntos em uma série de outras ideias do que é essa
uma hermenêutica não muito rigorosa no história, e isso, apesar de parece e um contra
momento de manusear e entender as senso, não é.
características dos textos e das “fontes”[1] na
hora correta para compor as obras. Logo no Na ótica de Bloch, ciência não se define pelos
começo da introdução de Apologia a Historia seus objetos, que a Escola dos Annales e todos
os integrantes dessa tendência da história nova
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b
Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Santa Maria – j-quevedo@uol.com.br
RESUMO
O presente artigo busca estabelecer diálogos e problemáticas nas relações entre a História enquanto
ciência e a utilização da memória como recurso para obtenção de dados a respeito de um recorte
temporal/espacial específico e elemento norteador de identidades indígenas. Apresenta-se para fins
introdutórios e de maneira breve algumas características gerais referentes à estas duas formas de
pensarmos o tempo passado, percebendo semelhanças e diferenças, colocando as mesmas enquanto
não estáticas, sob as possibilidades de transformação a partir das experiências dos sujeitos entre si e
com seu meio no tempo presente. Destaca-se a utilização de métodos enquanto diferenciador principal
entre História e memória, abordando a busca pela redução da taxa de incerteza a partir de
regulamentos estabelecidos e aceitos pela comunidade científica que se compõe pela
intersubjetividade do conhecimento histórico. Busca-se apresentar as possibilidades do emprego das
memórias no que se refere ao estudo do passado dos indígenas Kaingang, que passam a fixar
residência na cidade de Santa Maria a partir da década de 1990, na tentativa de problematizar as
concepções apresentadas em historiografia convencional e nas fontes escritas e oficiais enquanto
forma de acessar o passado.
Palavras chave: Historiografia, Método, Memória, História Indígena.
ABSTRACT
The present article seeks to establish dialogues and problems in the relations between History as a
science and the use of memory as a resource for obtaining data regarding a specific temporal/spatial
clipping and guiding element of indigenous identities. Presents for introductory and brief purposes
some general characteristics regarding these two ways of thinking the past time, perceiving
similarities and differences, placing them as non-static, under the possibilities of transformation from
the experiences of the subjects between them and with your means in the present time. It’s important
to highlight the use of methods as the main way of difference between History and memory,
addressing the search for the reduction of the uncertainty rate from regulations established and
accepted by the scientific community that is composed by the intersubjectivity of historical
knowledge. We search to present the possibilities of the use of memories in the study of the past of
the Kaingang natives, who began to settle in the city of Santa Maria in the 1990s, in an attempt to
problematize the concepts presented in conventional historiography and in written and official
sources as a way of accessing the past.
Keywords: Historiography, Method, Memory, Indigenous History.
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
necessariamente com sucesso, mas era este o atenção nos trabalhos de História,
objetivo. possibilitando a abordagem dos pontos de vista
do dito “colonizado”, contribuindo para a
Como se pode notar na obra de Jorge Salis
quebra do silenciamento imposto pela
Goulart (1985) ao falar da formação do Rio
historiografia convencional às populações
Grande do Sul assinala que “ao índio, se
ditas subalternas.
deparava um meio de vida completamente
adequado à sua índole ativa e indolente”,
assim como, “o elemento aborígene é entre nós O novo Indigenismo, emergente, encontrou
desde seu início forte aliado no meio
inferior ao do extremo norte [...]”[3], o que é antropológico, que passou a basear suas
tido como fundamento para a defesa da ideia pesquisas e estudos não somente nos interesses
de um Rio Grande do Sul supostamente acadêmicos, mas também na necessidade de
superior, uma vez que a “raça” branca conhecer e oferecer suporte para as lutas e
representava maioria em relação à negra e reivindicações dos indígenas. [5]
indígena.
Outra literatura semelhante à obra A partir desta reformulação dos parâmetros
supramencionada é o livro intitulado “História da escrita da História é que são elaboradas
do Rio Grande do Sul” de Emílio de Souza algumas críticas sobre as formas de perceber
Docca (1954), no qual são apresentados os indígenas, como também do uso de certas
diversos trechos que tem o entendimento dos terminologias até então adotadas em ampla
indígenas a partir deste ideal escala pelos historiadores, passando a atuar
branco/eurocêntrico. Ao referenciar os Tapes, significativamente na luta pela transformação
o autor faz as seguintes descrições, social.
A Nova História Indígena se caracteriza pelo
[...] temperamento dócil e por isso se reconhecimento da diversidade dos povos
submeteram com facilidade à catequese dos indígenas, assim como, pelo protagonismo
jesuítas e foram, dos habitantes primitivos do Rio exercido por estes sujeitos históricos na
Grande do Sul, os primeiros que saíram, em sua sociedade colonial até a atualidade. Neste
totalidade, do estado selvagem. [4]
sentido
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
protagonistas e que resistem no novo meio que Laroque (2007) [6] contribui positivamente,
é constituído a partir da chegada dos ibéricos. principalmente no que tange à formação dos
primeiros aldeamentos a partir de 1846, sendo
estes, Guarita, Nonoai e Campo do Meio. A
Resultados e discussão questão da formação de aldeamentos não é
Como mencionado anteriormente, busca-se uma prática isolada, mas imersa em um
através do presente trabalho abordar as contexto de ampliação das terras para
considerações sobre como são vistos os exploração econômica através da alocação de
indígenas a partir das perspectivas imigrantes que são reconhecidos como os
historiográficas convencional e da Nova trabalhadores nacionais.
História Indígena, destacando pontos válidos Diversos são os relatos apresentados na
referente ao viés teórico e metodológico para a historiografia que falam dos confrontos entre
pesquisa a ser desenvolvida com os indígenas colonizadores e indígenas, sendo os mais
da etnia Kaingang que se fixaram na cidade de conhecidos, as chamadas “correrias”, nas quais
Santa Maria a partir de 1990. os Kaingang se organizavam, invadiam
propriedades e saqueavam os colonos.
Buscando criar uma barreira entre estes dois
grupos, o Estado vai criar esses aldeamentos,
ou seja, vai restringir a área de ocupação
indígena, estabelecendo os limites entre o que
é dos Kaingang e o que é dos colonos. Neste
momento, grandes porções que eram
tradicionalmente ocupadas são remanejadas
em nome do expansionismo agrário e do
aproveitamento agrícola, deixando os
indígenas em situações cada vez mais difíceis
para manter os elementos tradicionais de sua
cultura, uma vez que a sobrevivência do modo
Figura 1 - Vista parcial da Aldeia Kaingang Três de ser Kaingang está diretamente relacionada à
Soitas em Santa Maria terra.
Os Kaingang no Rio Grande do Sul passaram Para a etnia que é foco da pesquisa, as
historicamente por um processo bastante relações com o meio se dão de uma forma
complexo, do qual resultaram diversas diferente daquela percebida por uma sociedade
transformações na organização social e capitalista. Os Kaingang não têm na terra
econômica, principalmente no que tange às somente uma forma de subsistência, um meio
relações com a terra. pelo qual se extrai aquilo que é necessário para
A expropriação das terras, principalmente na viver ou ascender economicamente, mas
região Norte do Rio Grande do Sul – área mais também, é esta relação com a terra, os animais
densamente ocupada por esta etnia – foi na e as plantas que determina e que representa o
maior parte do tempo, justificada pelo próprio modo de ser destes indivíduos. O indígena
Estado, que defendia um ideal produtivo Kaingang é resultado não somente de si, mas
capitalista da propriedade, assentando da sua localização e convivência com o meio.
trabalhadores imigrantes, italianos e alemães Desta forma, a expropriação de terras
(em sua maioria), a fim de que contribuíssem tradicionalmente ocupadas, representou uma
para a diversificação do mercado interno. Uma imensa perda, interferindo de forma negativa
das políticas adotadas pelo Estado foi o na sua organização social vigente no período
aldeamento, ou seja, a restrição da circulação e anterior ao contato.
ocupação por parte dos indígenas em áreas Em 1910 é criado o SPI (Serviço de Proteção
oficialmente demarcadas, com o objetivo de ao Índio) tendo caráter tutelar sobre os povos
evitar conflitos entre os colonos e os Kaingang. indígenas, atuando de acordo com os interesses
do Estado da época, com o objetivo de guiar
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
estes sujeitos para a sua assimilação pela atribuíam os lugares de fala para os diferentes
sociedade brasileira, transformando-os em atores que não se encaixavam dentro destes
trabalhadores nacionais. Sendo assim, é padrões. Estas condições se aplicam,
possível afirmar que o objetivo era de assimilar principalmente, pelo fato de o conceito de
os indígenas para o sistema de produção ciência e História ter sido criado a partir dos
capitalista, enquanto contribuintes ao parâmetros europeus, instituindo uma
desenvolvimento econômico do país. A partir concepção do tempo linear e sucessiva, cuja
deste momento são distribuídos para os ponta mais avançada se encontrava na Europa,
indígenas, ferramentas agrícolas, sementes e ficando todos os demais povos para trás nessa
outros utensílios para a prática da agricultura, corrida para o progresso. Neste sentido, os
visando incentivar a produção. Apesar de ser adjetivos “atrasados”, “selvagens”,
criado empunhando a bandeira de “defesa” dos “primitivos” e “bárbaros” eram
interesses dos indígenas, o SPI acabava por frequentemente empregados para referir os
buscar uma inserção dos Kaingang no modo de indígenas.
produção capitalista e ainda, interferia na Uma das dificuldades principais para
administração das terras demarcadas, reivindicar os lugares de fala em um contexto
aprovando à exploração por arrendatários e no qual vigorava os valores europeus, era a
também por madeireiras, excluindo os condição ágrafa dos povos indígenas, ou seja,
indígenas na distribuição dos benefícios pelo simples fato da seleção de fontes primar
econômicos provenientes destas práticas e pela escrita para a obtenção de dados e
destruindo o meio natural ainda restante. informações sobre o antes do agora, sob uma
Podemos concluir que a situação de vida suposta imutabilidade de informações, as
destes sujeitos sofreu fortes impactos, concepções e pontos de vista dos indígenas
principalmente no que se refere à manutenção acabavam ficando relegadas a um segundo
de elementos culturais tradicionais. A respeito plano ou até sendo esquecidas na memória
de todo este processo, vários autores buscaram nacional. A construção de heróis nos
escrever, trazendo em suas interpretações parâmetros europeus encontrava tanto nas
várias características subjetivas. artes da pintura, como na produção literária
historiográfica as bases para a consolidação de
Partindo do pressuposto da subjetividade do
indivíduos tidos como representantes do
historiador, percebemos que não existe a
passado glorioso, enquanto os “de baixo” não
neutralidade tão defendida pelos positivistas.
recebiam menção.
Os documentos ou fontes das quais utilizamos
para obter informações sobre o tempo passado Com o surgimento da Nova História Indígena
também carregam em si os interesses e pontos a partir da década de 1990, além de diferentes
de vista de seus produtores. Desta forma, a as interpretações, também foi ampliada a
ideia da construção de uma ciência histórica noção do que seria considerado como fonte
estática e finda jamais poderia ser alcançada, histórica. Sendo assim, ganhavam espaço
pois, como demonstrado anteriormente, também as ditas memórias subterrâneas que
utilizando como exemplo o caso dos povos traziam em suas narrativas diversas estratégias
indígenas, as formas de ver e escrever sobre os adotadas pelos sujeitos subalternos para não
atores históricos sofre transformações no caírem no esquecimento.
decorrer do tempo. Sendo assim, a pertinência do estudo da
As mesmas transformações podem ser História dos Kaingang a partir de sua memória
encontradas quando se trata das fontes se mostra bastante promissora, por possibilitar
históricas. No caso dos indígenas, durante o acesso à situações históricas que através de
muito tempo, eram utilizados somente documentos oficiais ou da mídia com
documentos escritos de origem oficial, ou seja, interesses particulares, dificilmente são
de instituições que desempenhavam grande encontradas. A memória pode atuar como
influência política, econômica e social, e que suporte para a historiografia. Elizabeth Jelin
eram ocupadas na maior parte dos casos por (2002) em seu livro intitulado “Los trabajos de
indivíduos de elite, brancos e católicos que la memoria” traz considerações importantes
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
para pensar as relações que a memória pode como científicos através da crítica. Sendo
estabelecer com a História. A autora destaca assim, a História se utiliza da memória como
três pontos principais: uma fonte de informações que são tornadas
históricas a partir de sua localização no tempo
e do processo de busca pela fidedignidade dos
[...] en primer lugar, la memoria como recurso elementos apresentados.
para la investigación, en el proceso de obtener y
construir “datos” sobre el pasado; en segundo A problemática sobre a influência subjetiva
lugar, el papel que la investigación histórica tanto na memória, quanto na própria História,
puede tener para “corregir” memorias cria questionamentos a respeito da validade
equivocadas o falsas; finalmente, la memoria destas narrativas, principalmente da História
como objeto de estudio o de investigación. [7]
enquanto ciência, produtora de saberes válidos
e aceitos. Tais dúvidas podem ser sanadas pela
busca de confiabilidade através de diferentes
Neste sentido, opta-se pela utilização da
ferramentas. A História enquanto uma
memória para o estudo do processo de fixação
interpretação do passado através de vestígios
dos indígenas Kaingang em Santa Maria, a
no presente pode pender à formas de pensar e
partir das possibilidades do primeiro e terceiro
julgar de acordo com a realidade experienciada
aspecto abordados pela autora
por cada pessoa. O ser humano, indivíduo
supramencionada. A memória como forma de
consciente e ativo em suas ações cotidianas,
obtenção de dados se faz pertinente, uma vez
constrói-se e modifica-se diariamente a partir
que, as sociedades chamadas ágrafas ou que
de sua dinâmica desenvolvida no tempo e no
fazem uso restrito da escrita, encontram na
espaço. A construção do conhecimento em
memória um suporte importante para o registro
História, por se tratar de uma prática
de acontecimentos. A história oral, a partir da
intersubjetiva, encontra diversas influências
realização de entrevistas pode perceber pontos
que direcionam as interpretações que são
de vista que divergem daqueles apresentados
constituídas no decorrer da pesquisa histórica.
na documentação oficial ou aqueles
Estevão Martins (2017) defende a concepção
constituídos e conservados pela população
de uma “rede fatorial”, ou seja, um conjunto de
não-indígena tanto em registros documentais
diferentes circunstâncias que estabelecem as
como em obras historiográficas do passado
possibilidades e vieses daquele que busca
mais distante.
compreender a humanidade no tempo.
A memória, assim como a História, se trata
de uma narrativa sobre o tempo passado. Ela
localiza eventos e indivíduos em um espaço Tem-se, pois, três instâncias de referência
físico e temporal, atribuindo diferentes graus fatorial que se articulam para produzir o
conhecimento histórico. A primeira instância é o
de importância ou hierarquia entre os sujeitos agente. A segunda, o tempo em que a ação é
participantes. Porém, é válido destacar que efetivada. A terceira, os espaços em que a ação
estas contêm algumas diferenças se insere: o espaço físico e o ‘espaço’ social. [8]
fundamentais, com destaque para aquelas que
diferenciam a História enquanto ciência e a
memória enquanto construção de narrativas Para o pesquisador em História, não é
com caráter subjetivo e emocional bastante qualquer afirmação que se aceita enquanto
presente. Desta forma, a História enquanto verdade (cairíamos em um total relativismo),
ciência se constitui principalmente pela pois existe uma comunidade de indivíduos
utilização de métodos, ou seja, mecanismos que, de certa forma, julgam essas
que balizam o objeto de pesquisa e que busca interpretações, tornando a história enquanto
dar profundidade à eventos passados, conhecimento reconhecido pela
recorrendo a parâmetros que visam reduzir a intersubjetividade. O conhecimento histórico
taxa de incerteza e que são constituídos e para garantir aceitação como científico deve
estabelecidos por uma comunidade científica corresponder a três expectativas básicas. A
própria para cada área do conhecimento. O verossimilhança trata-se da busca pelo mais
método controla os dados, caracterizando-os próximo possível da verdade, daquilo que
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
realmente aconteceu (não defendemos aqui, o mais ativos na luta por direitos ou para aqueles
encontro da realidade, pois, não existe a que se encaixem melhor no objeto da pesquisa
possibilidade de acessar o passado em sua (caso seja um estudo que trate de mulheres, é
totalidade, somente fragmentos no tempo fundamental entrevistar pessoas deste gênero).
presente). O segundo quesito é ser controlável, A história oral, enquanto forma de obter
que se dá através da aplicação de um conjunto dados a partir de entrevistas segue algumas
de métodos que visam garantir o primeiro item, orientações, tendo em Alberti (2005) um dos
na busca pela redução da taxa de incerteza. Por expoentes na temática, defendendo o
fim, a História se faz comunicável, posicionamento de que
constituindo narrativas (geralmente em
formato textual) que garantem a transmissão e
[...] a escolha dos entrevistados não deve ser
compartilhamento de conhecimentos predominantemente orientada por critérios
construídos. Desta forma, no que se refere à quantitativos, por uma preocupação com
plausibilidade, Estevão Martins pontua três amostragens, e sim a partir da posição do
elementos básicos avaliados pela comunidade entrevistado no grupo, do significado de sua
acadêmica para fins de reconhecimento experiência”[9]
científico. O primeiro quesito é a “qualidade
dos dados” utilizados, ou seja, estes devem É constituinte do caminhar dos agentes
abordar as situações presentas na delimitação históricos, selecionar, guardar, descartar e/ou
do tema de pesquisa (espaço, tempo e transmitir elementos que têm graus variados de
situação). Outro princípio são os “padrões pertinência ou que servem ou não para guiar e
metódicos”, na viabilidade de coerência na dar sentido ao que se encontra em determinado
análise a partir dos dados. Por fim, a contexto do presente. Sendo assim, quando se
“qualidade discursiva” representada por um aborda a memória enquanto referência ao
texto bem escrito, uma vez que a História se passado, é importante salientar que esta não é
faz comunicável. [8] completa, não traz a verdade pura sobre o antes
A prática mnêmica somente se torna possível do agora, mas atua como elemento norteador
dentro de certas possibilidades. Uma delas é a na identidade e nas ações a serem tomadas no
condição biológica. A outra se refere à cotidiano. Considerando a existência do par
participação do indivíduo no momento a ser memória/esquecimento, surgem lacunas no
lembrado, que pode ser tanto de forma direta processo de lembrar, que podem vir a ser
(atuando como protagonista em um completadas, em muitos casos, com situações
determinado evento) como indireta (como imaginadas, na tentativa de garantir certa
expectador ou com papel secundário). A coerência nos atos de reivindicar o passado.
tendência é que quanto maior a participação do Tendo como base o debate sobre o que se
agente que lembra ou quanto mais significativo lembra e o que se esquece, entra em pauta a
for determinado acontecimento para a sua subjetividade. Tudo o que se pensa ou reflete
vida, maior a facilidade em lembrar. Não sobre o passado na memória é diretamente
devemos desconsiderar a questão do trauma ligado ao indivíduo que desta capacidade faz
que, apesar de interferir significativamente, as uso. O que é considerado importante para “x”,
vezes, se torna aquilo que não se quer lembrar, pode não ser para “y”. Neste ínterim, encontra-
mas não aprofundaremos sobre isto no se um campo que permite o desenvolver de
presente texto. disputas acerca da legitimidade da memória, já
Levando em consideração estas premissas que existem diferentes versões sobre um
que interferem no momento de lembrar determinado fato ou conjuntura histórica que
determinados eventos, podemos concluir que acabam se contrapondo e trazendo em seu seio,
ao entrevistarmos um determinado sujeito, este divergências políticas, sociais e culturais. A
deve ser selecionado a partir de seu grau de partir desta característica, a memória pode
participação na coletividade e no contexto. Ou atuar enquanto geradora de um sentimento de
seja, entre os indígenas Kaingang, dar-se-á pertencimento, pois, traz em seu âmbito,
preferência para as lideranças ou indivíduos relações entre o indivíduo com o meio e
também com seus pares, criando diferentes
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
RESUMO
O propósito deste trabalho é apresentar os dados parciais de uma pesquisa em desenvolvimento, que
tem como objetivo conhecer e entender as práticas de letramento vivenciadas pelas crianças da
Agropecuária Canoa Mirim, zona rural do município de Santa Vitória do Palmar- RS, que participam
de um grupo de estudos bíblicos pentecostal. As práticas de letramento em um contexto não escolar
possibilitam destacar o sentido da escrita e da leitura no cotidiano das crianças, identificando quais
estratégias elas desenvolvem a partir de diferentes modos de interação bem como as representações
que realizam para compreender algo novo. A investigação segue os pressupostos da metodologia
qualitativa de cunho etnográfico, (AMEIGEIRAS, 2007; GIALDINO, 2007, GHASARIAN, 2008,
OLIVEIRA, 2006), considerando as especificidades de pesquisa com crianças (GRAUE e WALSH).
Ao escolher essa metodologia, o pesquisador realiza seu trabalho de forma interacional, buscando a
compreensão do contexto e das pessoas envolvidas, privilegiando um processo minucioso de
observação deste grupo de estudos bíblicos para conhecer seus frequentadores, sua realidade e sua
cultura. Os dados são registrados por meio da observação participante, fotografias, filmagens, e
escrita no diário de campo. As diferentes formas de produção dos dados da pesquisa são revisitadas
e o cruzamento de dados das diferentes fontes é realizado a fim de compreender o significado das
práticas de letramentos para esse grupo.
Palavras chave: Pesquisa Etnográfica, Crianças, Praticas de Letramento, Agropecuária Canoa
Mirim.
RESUMEN
El propósito de este trabajo es presentar los datos parciales de una investigación en desarrollo, que
tiene como objetivo conocer y entender las prácticas de letramento vivenciadas por los niños de la
Agropecuaria Canoa Mirim, zona rural del municipio de Santa Vitória del Palmar - RS, que participan
del grupo de estudios bíblicos pentecostales. Las prácticas de letramento en un contexto no escolar
posibilitan destacar el sentido de la escritura y de la lectura en el cotidiano de los niños, identificando
cuáles estrategias ellas desarrollan a partir de diferentes modos de interacción así como las
representaciones que realizan para comprender algo nuevo. La investigación sigue los presupuestos
de la metodología cualitativa de cuño etnográfico, (AMEIGEIRAS, 2007, GIALDINO, 2007,
GHASARIAN, 2008, OLIVEIRA, 2006), considerando las especificidades de investigación con
niños (GRAUE y WALSH).Al escoger esa metodología, el investigador realiza su trabajo de forma
interactiva, buscando la comprensión del contexto y de las personas involucradas, privilegiando un
proceso minucioso de observación de este grupo de estudios bíblicos para conocer a sus asistentes,
su realidad y su cultura. Los datos se registran a través de la observación participante, fotografías,
filmaciones, y escrita en el diario de campo. Las diferentes formas de producción de los datos de la
investigación se revisan y el cruce de datos de las diferentes fuentes se realiza para comprender el
significado de las prácticas de letra para ese grupo
Palabras clave: Investigación Etnográfica, Niños, Prácticas de Letramento, Agropecuaria Canoa
Mirim.
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
pesquisado. Segundo Gialdino, (2007, p. 26) de busca do conhecimento, [...] sempre “levamos
[4]: o gabinete” conosco quando realizamos a
pesquisa de Campo, bem como “trazemos o
campo” conosco quando voltamos ao nosso lugar
La fuerza particular de la investigación de trabalho
cualitativa es su habilidad para centrase en la
práctica real in situ, observando cómo las
interacciones son realizadas rutinariamente. Sin
Assim, o trabalho de campo envolve muito
embargo, el análisis de cómo las personas ven los mais do que o tempo gasto no campo, pois
cosas no puede ignorar la importancia de cómo continua em casa com as tarefas de leitura das
hacen las cosas. anotações, ressignificando e reconstruindo as
cenas vivenciadas dentro do contexto, para que
Dentro desta perspectiva, a etnografia possa ser obtida uma leitura fiel da realidade
aparece como a metodologia adequada para a (GHASARIAN, 2008).
investigação, uma vez que se refere ao estudo
de uma cultura mais ou menos compartilhada
Desenvolvimento
por um determinado grupo de indivíduos
(GHASARIAN, 2008) [5]. Para realizar a pesquisa etnográfica das
práticas de letramento vivenciadas pelas
Entendo assim, que ao escolher essa crianças em um grupo de estudos bíblicos no
metodologia, o trabalho será realizado de contexto rural da Agropecuária Canoa Mirim,
forma interacional, buscando a compreensão realizei inicialmente um trabalho exploratório
do meio e das pessoas, e que para obter êxito de conhecimento deste espaço, caracterizando
neste processo é necessária atenção especial a comunidade, analisando seu dialeto, sua
para as análises dos dados produzidos, com forma de desenvolver cultura e o contato que
observações atentas, relatos, escritas, releituras as crianças têm com materiais de leitura e
e reflexão. Concordando com (GRAUE, escrita, observando que este meio tem
WALSH, 2003, P. 72)[6]: características próprias e jamais poderá ser
considerado como “uma extensão, um quintal
Teoria e a observação trabalharam de mãos da cidade” (ARROYO, 2007, p. 159) [8].
dadas para me ajudar: As teorias alargaram a
minha visão do que deve ser observado, e as A Agropecuária Canoa Mirim é também
observações levaram-me a procurar teorias que conhecida como Granja do Salso, está
me ajudassem a compreender o que vejo localizada na zona rural, quarto distrito do
município de Santa Vitória do Palmar, Rio
Por conseguinte, o período de campo é um Grande do Sul. A localidade está distante 60
momento especial onde acontece um km da zona urbana, sendo 18 km de estrada de
envolvimento com os sujeitos pesquisados, chão. É uma propriedade privada que foi
utilizando diferentes estratégias para a fundada no ano de 1967.
produção dos dados, aprendendo sobre as
pessoas e eventualmente ainda modificando
questões de acordo com a reflexão da leitura
dos dados.
Durante o processo da pesquisa há um
envolvimento com o meio pesquisado, porém
é de absoluta importância problematizar as
informações com coerência e olhar reflexivo,
fazendo sempre um estudo com as diferentes
formas de produção dos dados e referenciais
teóricos. De acordo com Oliveira (2006, p. 66)
[7]
Figura1- Vista aérea da Agropecuária Canoa Mirim,
O certo é que tanto o estar no campo como o estar fonte: agropecuária Canoa Mirim.
no gabinete fazem parte de um mesmo processo
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
iniciais de acordo com a reflexão da leitura dos elucidando o tema da investigação e ainda
dados. explicando que seria apresentado retorno sobre
o trabalho para o grupo pesquisado, estando
eles a vontade para solicitar informações
Resultados ediscussão sempre que julgarem necessário, as crianças
também foram consultadas, pedindo e
destacando a importância de sua colaboração
Considero importante destacar a atuação da na pesquisa.
igreja Evangélica na Agropecuária Canoa
Mirim, sendo que até meados dos anos 90 a No começo das observações participantes
religião dominante nesta comunidade era a junto ao grupo de estudos bíblicos, o
Católica, tendo um número bem expressivo de sentimento de vivenciar práticas religiosas
pessoas atuando como lideranças e motivando diferentes daquelas que estava acostumada na
a participação de moradores em todas as religião católica, causou-me um pouco de
atividades, como grupo de jovens, missas, estranhamento e desconforto e fiquei na
procissões e grupo de orações. Neste período a posição de mera expectadora. Porém,
religião evangélica também tinha participação refletindo e entendendo que em uma pesquisa
na comunidade, com cultos e grupo de estudos, etnográfica para compreender o contexto
porém era pouco divulgada e também havia pesquisado é necessário ter a sensibilidade de
muito preconceito com os rituais realizados olhar, ouvir e aprender a cultura do outro,
pelos pastores e com o estereótipo relacionado procurei realizar uma aproximação,
ao “crente”, problematizando sua maneira de pesquisando, participando e interagindo com
vestir e o rigor referente à conduta e costumes. as atividades realizadas no grupo. De acordo
com minhas escritas durante a observação:
Contudo, com o passar dos anos, esta
situação foi se revertendo, a Igreja Católica aos
Resolvi tomar algumas atitudes para que não
poucos foi perdendo as lideranças, o espaço e fosse considerada como alguém que estivesse
a potência na localidade, assim avançou a estrangeira daquele espaço, pois entendi que ser
representatividade dos Evangélicos. aceita é principalmente ser vista como integrante
Atualmente, um grupo de representantes da daquele grupo. Assim, eu pesquisei hinos que
Igreja Pentecostal Casa de Oração, formado eles costumavam cantar e comecei a cantar e orar
junto, o resultado foi imediato, no momento que
por aproximadamente 60 pessoas entre adultos a evangelizadora lia a Palavra de Deus, como eu
e crianças, são responsáveis pelas ações da não possuía Bíblia na mão para acompanhar, uma
comunidade evangélica na Agropecuária senhora procurou o salmo que estava sendo lido
Canoa Mirim. O grupo organiza suas e me entregou sua Bíblia aberta. Neste momento
atividades com encontros quinzenais, sendo os eu percebi que estava começando a ser inserida
como uma integrante do grupo. (Diário de
domingos para prática de cultos na Campo, 06/04/ 2018)
comunidade e nos sábados, os fiéis que moram
na Agropecuária Canoa Mirim são conduzidos
para a Igreja sede na cidade de Santa Vitória Esta interação com o grupo pesquisado, foi
do Palmar onde são realizados cultos e estudos aos poucos oportunizando um aprendizado
Bíblicos. sobre as pessoas, entendendo seus olhares,
expressões faciais, repetição de palavras,
A inserção neste grupo como pesquisadora posição corporal, entre outros que falam da
sobre as práticas de letramento foi realizada cultura e do letramento realizado neste
por meio de um contato inicial com a contexto. No entanto, também considerei
missionária, solicitando permissão para necessário o constante exercício de
realizar as atividades de pesquisa com as aproximação, distanciamento e reflexão
crianças pentecostais da Agropecuária Canoa destacando a importância do cuidado para que
Mirim, esclarecendo o tema da pesquisa e o envolvimento com o meio pesquisado não
explicando como seria realizado o trabalho, interferisse na leitura dos dados, conforme
além da missionária, procurei os responsáveis indica Oliveira (2006, p. 14)
pelas crianças solicitando permissão para
fotografias, filmagens e entrevistas,
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
[...] estranhando suficientemente tudo aquilo que crianças, entretanto, é necessário também estar
nos é próximo, de maneira que possa alcançar atenta que as crianças são imaginativas e
uma distância mínima que nos habilite ao
questionamento típico do olhar etnográfico.
espontâneas, sendo assim, muitas vezes
preciso abandonar teorias e concepções para
refletir sobre as interações das crianças. A
Também, destaco a importância de minha partir desse entendimento, Souza e Castro
entrada no campo empírico ter sido (2008, p. 53) [14] salientam:
concomitante com os estudos do campo teórico
sobre etnografia e letramento, pois desta forma
A primeira definição que se impõe diz respeito à
realizo a todo o momento uma articulação com compreensão do lugar social que a criança
os dados que são produzidos, considerando assume na interação com o adulto no contexto da
que pesquisa. Na medida em que a criança não é vista
apenas como um objeto a ser conhecido, mas
como sujeito com um saber que deve ser
[...], el proceso de análisis no debe considerarse reconhecido e legitimado, a relação que se
una etapa diferente de la investigación sino una estabelece com ela, no contexto da pesquisa,
actividad reflexiva que influya en toda la começa a ser orientada e organizada a partir
recolección de los dados, la redacción, la dessa visão.
recolección adicional, etc (COFFEY E
ATKINSON, 2003, p.7) [13].
Deste modo, em uma etnográfica com
crianças, é imprescindível a compreensão de
Dentro desta perspectiva, as anotações no
nossa condição de adultos e que elas nos
diário de campo também são aliadas, já que
reconhecem como diferente, assim a
possibilitam uma reflexão, retomando os
proximidade não é tarefa fácil, considerando
registros e reavaliação junto com minha
ainda que:
orientadora, dos rumos da pesquisa e minhas
atitudes no contexto pesquisado. Se as crianças vêem a pesquisadora como aquela
que sabe de tudo, pode ser difícil estabelecer uma
As crianças são protagonistas desta relação direta e franca, em que elas sintam-se à
investigação, portanto tem voz e poder, e são vontade para expressar seus sentimentos e
entendidas não como submissas e dependentes, pensamentos. (PIRES, 2007, p, 244) [15].
mas como sujeitos que participam de forma
ativa, intervindo no processo de pesquisa e
possuindo possibilidades de posicionamentos Pensando nestes aspectos, e considerando as
e reflexões. especificidades deste contexto, Graue e Walsh
Porém, conhecer precisamente o ponto de (2003, p. 76-77), comentam sobre a
vista das crianças é um grande desafio, mas, importância do respeito e dos acordos para
amparada na metodologia, procuro estabelecer obter aceitação no mundo das crianças,
estratégias que permitam transcrever e destacando que:
interpretar com fidelidade a concepção das
crianças. Graue e Walsh (2003, p. 56) Entrar na vida das outras pessoas é ser-se um
advertem que: intruso. É necessário obter permissão, permissão
essa que vai além da que é dada sob formas de
consentimento. É a permissão que permeia
Por mais aliciante que a frase “através dos olhos qualquer relação de respeito entre as pessoas. Na
das crianças” possa ser, jamais veremos o mundo vida quotidiana as pessoas estão constantemente
através dos olhos de outra pessoa, a negociar essa permissão com os outros, mas só
particularmente dos olhos de uma criança. Pelo raramente os adultos o fazem com as crianças.
contrário, veremos sempre o mundo através de Nas relações entre adultos e crianças, os adultos
uma multiplicidade de camadas de experiência, são, a maior parte das vezes, aqueles que detêm
das crianças e nossas, e de uma multiplicidade de o saber, dão a permissão e fixam as regras. Na
camadas de teorias. investigação com crianças são as crianças que
detêm o saber, dão a permissão e fixam as regras-
para os adultos.
Portanto, o aprofundamento do referencial
teórico dos estudos da infância é importante
para todos que se aventuram na pesquisa com
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
Conclusões
Com relação aos dados iniciais, analisando e
refletindo atentamente sobre o material que foi
produzido durante as observações, assistindo
diversas vezes os vídeos, revendo fotos, Figura 3 – Atividades de leitura da Bíblia. Fonte:
ouvindo gravações de voz e considerando que: Própria autora
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
Ao filmar as crianças cantando percebo que Logo, essa investigação também esta
muitas ainda não estão alfabetizadas, porém este propiciando que tenha uma postura de
fator não era impedimento para que soubessem aprendiz, com humildade para reconstruir
entoar o louvor que era repleto de palavras
difíceis.
conceitos sempre que necessário:
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
http://www.cedes.unicamp.br, acesso em
Em vista disso, a experiência empírica outubro de 2018.
articulada com o estudo teórico, reflexões e [9] GRAZZIOTIN, Luciane Sgarbi Santos,
reconstruções esta representando grandes SOUZA, José Edimar de- Para ler, escrever e
possibilidades para alcançar as respostas para contar: Modos de ser professora no cotidiano
a questão de pesquisa. escolar de Lomba Grande/ RS - Revista
Reflexão e Ação, Santa Cruz do Sul, v.22, n.2,
p.347-370, jul./dez.2014
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dex
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1ª Ed. São Paulo: Parábola Editorial, 2014. as crianças? Algumas questões para um
Tradução Marcos Bagno. debate científico multidisciplinar. In: CRUZ,
[2] MACEDO, Maria do Socorro Alencar Silvia Helena Vieira (Org.). A criança fala: a
Nunes. Interações nas práticas de letramento: escuta de crianças em pesquisas. São Paulo:
o uso do livro didático e da metodologia de Cortez, 2008. p. 43-51.
projetos. São Paulo: Martins Fontes, 2005. [12] BUSSAB, Vera Silvia R.; SANTOS, Ana
P.37-281 Karina. Reflexões sobre a observação
etnográfica: a cultura de pares em ação. In:
[3] AMEIGEIRAS, Aldo Rubén.
MULLER, Fernanda; CARVALHO, Ana
Elabordajeetnográfico en la
Maria Almeida (Orgs.). Teoria e Prática na
investigaciónsocial. In: GIALDINO, Irene
pesquisa com crianças: diálogos com William
Vasilachis (Org.). Estratégias de
Corsaro. – São Paulo: Cortez, 2009.
investigaçãocualitativa. Buenos Aires:
[13]ATKINSON, Paul, COFFEY, Amanda.
Gedisa, 2007.
Encontrar el sentido a los datos cualitativos.
[4] GIALDINO, Irene Vasilachis de, (coord.),
Colômbia. Editora Sage, 2003.
AMEIGEIRAS, Aldo R., CHERNOBILSKY,
[14] SOUZA, Solange Jobim e; CASTRO,
Lilia B., BÉLIVEAU, Verónica Giménez,
Lucia Rabello de. Pesquisando com crianças:
MALLIMACI, Fortunato, MENDIZÁBAL,
subjetividade infantil, dialogismo e gênero
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S.A. 2007. p.26-55
[15] PIRES, Flavia. Ser adulta e pesquisar
[5] GHASARIAN, Chistian. De la etnografía
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USP, 2007, V. 50 nº 1
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[16] KLEIMAN, Ângela B. Modelos de
dirigido por Adolfo Colombres.-1ª.ed.-
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[6] GRAUE, Elizabeh e WALSH, Daniel.
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Investigação etnográfica com crianças:
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Campinas: Mercado de Letras, 1995, p. 15 -
Calouste Gulbenkian, 2003.
64.
[7] OLIVEIRA, Ricardo Cardoso de, O
[17] MARINHO, Marildes. Letramento: a
trabalho do antropólogo, 3.ed./Brasília:
criação de um neologismo e a construção de
Paralelo15; São Paulo: Editora Unesp, 2006
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[8] ARROYO, Miguel G.Políticas de
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2010. P. 33 – 53.
maio/ago. 2007. Disponível em
105
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
24 25
Classe que vive do trabalho é a expressão usada por [5] (p.25), esclarece o que é a realidade, à qual a
[1] para referir-se à classe trabalhadora que, com a pesquisadora se refere: “Realidade são todas as
reestruturação produtiva do capital, tornou-se mais dimensões que compõem nossa forma de viver e o
complexa, fragmentada e heterogênea, perdendo, de espaço que a cerca. Em nosso caso, realidades sociais,
certa forma, aquela identidade materializada no circunscrevem-se às dimensões sociais, tanto àquelas
proletariado estável de mão de obra manual. Esse autor que estão em nós quanto àquelas que nos circundam.
argumenta que há uma ampliação da classe Fazem parte delas igualmente nossas ideologias, nossas
trabalhadora, que é constituída de “trabalhadores representações mentais, nossos símbolos, nossas
produtivos”, “trabalhadores improdutivos” e crenças e valores, bem como nosso comportamento
“trabalhadores hifenizados”. Assim, para dar conta externo e os condicionamentos circundantes de ordem
dessa metamorfose, tem-se a denominação classe que social”.
vive do trabalho.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
26
A Revista Competência, Revista da Educação produções textuais. Os textos são entendidos como
Superior do SENAC/RS, ISSN 1984-2880 - Qualis B4, produções lingüísticas, referentes a determinado
nas áreas de Educação e Interdisciplinar e ISSN 2177- fenômeno e originadas em um determinado tempo e
4986 versão on-line - Qualis B3, nas áreas de contexto. São vistos como produções que expressam
Administração, Ciências Contábeis e Turismo. É uma discursos sobre diferentes fenômenos e que podem ser
publicação de periodicidade semestral e, conforme seu lidos, descritos e interpretados, correspondendo a uma
foco e escopo tem como objetivo promover e divulgar multiplicidade de sentidos que a partir deles podem ser
artigos e resenhas, inéditos, que contribuam para o construídos. Os documentos textuais da análise
desenvolvimento de áreas multidisciplinares. constituem significantes a partir dos quais são
27
Conforme [6] (p.16) “O ‘corpus’ da análise textual, construídos significados relativos aos fenômenos
sua matéria-prima, é constituído essencialmente de investigados.”
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
realidade está em constante transformação, homem, como sujeito social, é real, vive numa
tendo em vista sua perspectiva histórica. realidade objetiva e concreta, material e tem
sua historicidade, que é processual, construída,
As contribuições de [9], nesse sentido, são
objetivada. O objeto do conhecimento é a
pertinentes já que o referido autor afirma que:
realidade do sujeito, é o espaço material no
qual está inserido.
Propor-se falar da dialética como método de
investigação é, ao mesmo tempo, abordar um A contradição é o princípio básico do
tema cadente e relevante política, ideológica e movimento, trata-se de uma categoria
teoricamente, e, contraditoriamente, expor-se a determinada por Marx, como própria da
um conjunto de riscos dos quais o fundamental é
o da banalização ou simplificação. (p.71). realidade, como dimensão concreta da sua
totalidade. Não se pode imaginar o real sem
seu permanente movimento de construção do
Por ser complexo o materialismo histórico e
novo, de autoconstrução e de superação. O
dialético, quando abordado superficialmente,
novo só pode ser vislumbrado a partir do
pode ser banalizado ou simplificado, portanto
velho, numa relação de contradição. Um nega
é necessário ter a compreensão de onde se
o outro e nessa negação, tanto ocorre uma
parte e aonde se quer chegar. Diante disso, [9]
ruptura quanto uma continuidade.
sustenta que, para a dialética ser materialista e
histórica, é imprescindível que se tenha É pertinente discorrer sobre as leis da
compreensão das categorias que a compõem: a dialética. Assim, de acordo com [8] a primeira
materialidade, a totalidade, a historicidade e a lei refere-se ao princípio da totalidade, no qual
contradição, construídas historicamente. Outro tudo se relaciona, uma vez que os objetos e os
autor que contribui para o entendimento da fenômenos estão conectados, e a dialética
dialética é [5], que afirma: busca a compreensão em sua totalidade
concreta. A segunda lei trata do princípio do
O que a dialética faz de diferente é captar as movimento, no qual tudo se transforma, já que
estruturas da dinâmica social, não da estática. a dialética considera que a sociedade, a
Não é, pois um instrumental de resfriamento da natureza, os homens são inacabados, estando,
história, tornando-a mera repetição estanque de assim, em constante construção. A terceira lei
esquemas rígidos e já não reconhecendo
conteúdos variados e novos, mas um
aborda a questão da mudança qualitativa, em
instrumental que exalta o dinamismo dos que tais modificações somente acontecem com
conteúdos novos, mesmo que se reconheça não o acúmulo de unidades quantitativas que, em
haver o novo total. (p.89). determinado instante, produz o
qualitativamente novo. E, por fim, a quarta lei
Assim sendo, a categoria materialidade versa sobre o princípio da contradição, ou seja,
consiste em considerar o homem a partir da sua a luta dos contrários, sendo a lei essencial à
realidade concreta; por sua vez, o método dialética, dado que transformar só é possível
materialista histórico e dialético se ocupa de porque há ideias, conceitos opostos que, ao
pesquisar e analisar os fenômenos reais. Parte mesmo tempo em que se unem também se
do homem que realmente atua e, considerando confrontam.
seu processo de vida real, expõe também o A contradição é a essência da dialética está
desenvolvimento dos reflexos ideológicos e os presente nas mais diversas relações que o ser
ecos desses processos de vida. A categoria humano estabelece. O indivíduo faz parte de
totalidade se refere à necessidade de um determinado grupo, tecendo,
compreender os fenômenos em sua totalidade, compartilhando as mesmas teorias, conceitos e
os quais fazem parte de um “todo”, que é ideias. Sendo assim, cabe a cada indivíduo
constituído por diversas relações complexas, posicionar-se criticamente, tendo consciência
que se inter-relacionam. Para que o indivíduo de si mesmo. [10].
compreenda a realidade em sua totalidade,
precisa também descobrir os emaranhados que Nesse sentido, a pesquisa, baseada no
a constituem. A categoria historicidade é Materialismo Histórico Dialético, como
inerente à constituição da vida humana, pois o pressuposto filosófico e metodológico, intenta
a compreensão do universo do qual faz parte o
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
Resultados Obtidos com os métodos MHD e Na tabela abaixo, pode ser observado o
ATD levantamento holístico dos artigos publicados
na Revista Competência do ano de 2008 ao ano
Para obter os resultados da presente
de 2016.
investigação, conforme mencionado
previamente, foi utilizado os dois métodos
explanados nas seções anteriores, o
Materialismo Histórico Dialético e a Análise
Textual Discursiva. Esse processo se deu de
forma teórica e em um segundo momento
passou-se então para a análise em si.
O primeiro movimento realizado para a
construção do corpus da pesquisa foi reunir
todos os resumos dos artigos publicados nos
volumes que compreendem os anos de 2012 ao Gráfico 1 – Artigos Publicados na Revista
ano de 2016. Sendo um periódico semestral Competência do ano de 2008 ao ano de 2016.
entendeu-se que, dentro desse período, se Fonte: elaborado pela pesquisadora.
conseguiria fazer um recorte significativo,
Apreende-se que, dos artigos publicados que
formando, o corpus da presente investigação.
versam sobre Eduação em torno de 17% são
Totalizando noventa e sete (97) artigos
sobre o tema Educação no Ensino Superior e a
publicados, a Revista Competência, versa
Formação Docente, que aparece em 10
sobre as mais diversas áreas do conhecimento,
volumes publicados pela Revista Competência
nas línguas portuguesa, inglesa e espanhola.
num total de 17 volumes existentes. Dessa
Com esse total de artigos, surgiu o segundo forma, demonstra-se que é um assunto
movimento, no qual foram selecionados os que recorrente no periódico em análise, fazendo
tratavam do tema Educação, somando um total com que seja possível, de alguma maneira, ser
de quarenta e três (43) artigos. Esse total importante à formação permanente dos
apresentou-se como um número elevado para educadores atuantes na Faculdade de
compor o corpus da pesquisa. Desse modo, Tecnologia SENAC Pelotas.
realizou-se um terceiro movimento, no qual se
objetivou uma nova análise, levando em
consideração os artigos que versassem sobre a
formação docente e sobre o ensino superior,
totalizando nove (9) artigos selecionados.
Após essa construção, compreendeu-se que,
pelo número reduzido de artigos encontrados,
fazia-se possível ampliar o período de análise.
Então, realizou-se uma busca por todos os
volumes publicados pela Revista
Competência, totalizando cento e sessenta e
sete (167) artigos publicados, verificando-se Gráfico 2 – Relação das Áreas dos Artigos Publicados
que, desse total, setenta e sete (77) artigos na Revista Competência do ano de 2008 ao ano de
discorriam sobre educação. Dos setenta e sete 2016.
(77) artigos que abordam o tema Educação, Fonte: elaborado pela pesquisadora.
treze (13) artigos referem-se à formação Com o gráfico acima, percebe-se que a
docente e ao ensino superior. Educação como tema, abordada nas mais
Uma vez possuindo a listagem, o conteúdo diversas formas, corresponde a um total de
foi acessado edição por edição, fazendo o 46% do total de artigos publicados que
levantamento do número de artigos que compreendem todos os anos em que a Revista
versavam sobre Educação e sobre as demais Competência publicou seus volumes, ou seja,
áreas que a Revista Competência compreende. do período que abrangem do ano de 2008 ao de
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
2016. Apreende-se, então, que 8% dos artigos estruturas que o compõem, conseguiria
publicados pela Revista Competência que apreender a sociedade de forma real e
versam sobre Educação abarcam Educação no compreender a complexidade das ideologias
Ensino Superior e a Formação Docente. dominantes exercidas. Entendendo as relações
complexas que formam o modelo civilizatório,
Os artigos possuem as mais diversas
poder-se-á pensar em uma possível mudança
concepções de mundo. Alguns, no início das
social. O pensador italiano reflete, ainda, sobre
publicações, fazem críticas ao sistema
a finalidade de um periódico, acreditando que:
capitalista, ao modelo de educação tecnicista,
englobando desde a educação básica ao ensino
superior, contemplando também reflexões Uma revista, como um jornal, como um livro,
como qualquer outro modo de expressão didática
sobre a pós-graduação. que seja planejado tendo em vista uma
Logo, 54% representam as demais áreas, determinada média de leitores, de ouvintes, etc.,
de público, não pode contentar a todos na mesma
sendo elas: Moda, Gestão e Negócios, medida, ser igualmente útil a todos, etc.: o
Comunicação e Informação, Hospitalidade e importante é que seja um estímulo para todos,
Lazer. Assim, constata-se que o tema pois nenhuma publicação pode substituir o
Educação possui uma relevância nos volumes cérebro pensante ou determinar ex novo
publicados, embora o número de artigos interesses intelectuais e científicos onde só exista
interesse pelos bate papos de botequim ou se
variem de edição para edição pense que o objetivo da vida é divertir-se e passar
É pertinente o que [13] problematiza, ao bem. Por isso, não é preciso ficar perturbado com
propor que, se um estudo fosse realizado com a multiplicidade de críticas: a multiplicidade de
críticas, ao contrário, é a prova de que se está no
foco na estrutura ideológica de uma bom caminho; quando, porém, o motivo da
determinada classe dominante, seria de suma crítica for um só, então deve-se refletir: 1) porque
importância, porque “[...] a organização pode tratar-se de uma deficiência real; 2) porque
material voltada para manter, defender e pode estar-se enganado a respeito da ‘média’ dos
desenvolver a ‘frente’ teórica ou ideológica.” leitores aos quais se destina a publicação e,
portanto, pode estar se trabalhando no vazio,
O pensador italiano ainda reforça que, na ‘para a eternidade’.” ([13], p.242).
organização material do conhecimento, a
relação mais forte e eficaz é realizada pelas
Com as percepções do pensador italiano,
editoras:
entende-se que qualquer tipo de publicação,
nesse caso um periódico, não consegue
[...] (que têm um programa implícito e explícito
e se apoiam numa determinada corrente), jornais
satisfazer a intelectualidade de todos os
políticos, revistas de todo tipo, científicas, leitores em todas as publicações. Mas que sua
literárias, filológicas, de divulgação, etc., relevância sirva como uma espécie de
periódicos diversos até os boletins paroquiais. provocação para que seja utilizada nas mais
(p.78). diversas formas de pensar, auxiliando em um
posicionamento crítico-reflexivo.
Tal afirmativa evidencia a importância da
A Educação como tema, abordada nas mais
investigação, já que o objeto analisado, são os
diversas formas, corresponde a um total de
artigos de um periódico vinculado a uma
46% do total de artigos publicados que
instituição que, foi criada para assegurar a
compreendem todos os anos em que a Revista
manutenção do modelo civilizatório vigente.
Competência publicou seus volumes, ou seja,
[13], destaca, também, que:
do período que abrangem do ano de 2008 ao de
2016. Pode-se apreender, então, que 8% dos
Um editor-chefe de um cotidiano deveria ter este artigos publicados pela Revista Competência
estudo como índice geral para seu trabalho; ou,
melhor, deveria refazê-lo por conta própria: versavam sobre Educação abarcavam
quantos belíssimos artigos se poderiam escrever Educação no Ensino Superior e a Formação
sobre a questão! (p.78). Docente.
Dessa forma, foi retomado o processo
Portanto, para Gramsci, um estudo realizado dialético levando em conta a proposição de
sobre o modelo civilizatório vigente e as [14], no qual diz que:
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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O termo conclusão é utilizado em contraposição ao as mulheres e homens educáveis, mas a consciência de
termo inacabamento, que segundo a concepção de [16]: sua inconclusão é que gerou a educabilidade. É também
“E na inconclusão do ser, que se sabe como tal, que se na inconclusão de que nos tornamos conscientes e que
funda a educação como processo permanente. Mulheres nos inserta no movimento permanente de procura que se
e homens se tornam educáveis na medida em que se alicerça a esperança.” (p.58).
reconheceram inacabados. Não foi a educação que fez
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
RESUMO
O presente artigo visa discutir a aplicação do método de Estudo de Caso, proposto por Robert Yin
(2001), voltado a ciência histórica, mais especificamente em pesquisas da história ambiental. Para
realização desta tarefa, este trabalho irá evidenciar a forma como esta metodologia está sendo aplicada
em uma pesquisa ainda em andamento de um estudo de caso sobre o Movimento “Fora Celulose”
corrido no município de Rio Grande no final dos anos 1980. A partir de três fontes diferenciadas,
como propõe Yin, sendo elas a entrevista semiestruturada, jornais da época e documentos oficiais a
pesquisa objetiva compreender as ações educativas e o modo de operação que fizeram com que este
movimento ambientalista obtivesse sucesso em uma época que a crise econômica sobrepunha os
interesses econômico sobre os ambientais. Seguindo a proposta do autor em que se baseia a
metodologia, a pesquisa parte da hipótese de que a atuação do corpo acadêmico da Universidade
Federal do Rio Grande teve papel decisivo para o sucesso do movimento, uma vez que partiu da
academia os relatórios que comprovavam os malefícios que uma indústria de celulose causaria ao
ecossistema estuarino na cidade. A pesquisa ainda não possui resultados concluídos por ainda estar
em andamento, mas indica o acerto da hipótese em questão.
Palavras chave: Estudo de Caso, História Ambiental, Metodologia
ABSTRACT
This article aims to discuss the application of the Case Study method as proposed by Robert Yin,
applied in historical science, specifically in the field of Environmental History. This work will show
how this methodology is being currently applied in ongoing research surrounding the "Fora Celulose"
movement, which took place in the municipality of Rio Grande during late 1980s. This work also
aims to understand the educational actions and the mode of operation that made this environmental
movement successful during a time in which economic crisis pushed economic interests over
environmental ones. Following the proposed method of the aforementioned author, this research starts
from the hypothesis that the work performed by the academic body of the Federal University of Rio
Grande was key in the success of the movement, since they were the ones who generated the reports
that proved the harms that a pulp industry would cause to the estuarine ecosystems of the city. The
results shown here are only partial as this work remains in progress, however there are strong
indications of the preciseness of the initial hypothesis.
Keywords: Case Study, Environmental History, Method
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
Desenvolvimento
Neste capítulo é extosto inicialmente como é A história ambiental é, portanto, um campo que
compreendida a História Ambiental por seus sintetiza muitas contribuições e cuja prática é
inerentemente interdisciplinar. A sua
principais teóricos e posteriormente será originalidade está na sua disposição explícita de
apresentado como Yin propões estruturar um “colocar a sociedade na natureza” e no equilíbrio
estudo de caso. com que busca a interação, a influência mútua
entre sociedade e natureza.
A História Ambiental (DRUMMOND,1991, p. 8).
O escopo teórico que referencia este artigo
Pode-se depreender, a partir deste trecho, que
parte, inicialmente, da compreensão de
a História Ambiental se propõe a estudar a
Enrique Leff (2005) sobre sua percepção a
influência do homem sobre a natureza e vice e
respeito do campo da História Ambiental.
versa, bem como a maneira que esta interação
Defende-se aqui essa abordagem por entender
influencia diretamente na história e cultura
que as associações que Leff faz entre a
humana. Tal afirmação é assentada nos
pesquisa Histórica e a Educação ambiental
escritos de Pádua quando cita Castro:
encaixam perfeitamente na proposta desta
pesquisa que, nada mais é, do que uma É nesse ambiente teórico renovado, na virada do
pesquisa historiográfica dentro do campo da século XX para o XXI, que a história ambiental
EA. procura repensar, na definição de Elinor Melville
A perspectiva de Leff sobre História e Guillermo Castro, “as interações entre os
ambiental não a resume simplesmente em um sistemas sociais e os sistemas naturais, e as
consequências dessas interações para ambas as
estudo sobre as interações entre seres humanos partes, ao longo do tempo” (PÁDUA, 2010, p.
e a natureza, mas sim de mudança 91).
paradigmática, onde se percebe os homens e as
mulheres como sendo a própria natureza. Aqui Isso posto, vê-se que a História Ambiental
se propõe que a História Ambiental, mais do não se resume, tão somente, ao estudo das
que um estudo do passado, seja um fator de mudanças naturais, mas tende a ser um campo
transformação da sociedade, a partir do resgate muito mais amplo, com diversas linhas de
de formas de resistência ao que se chama de pesquisa, métodos analíticos e que, em
racionalidade econômica. hipótese alguma, pode negligenciar o estudo
das sociedades humanas em seus trabalhos.
Se a história ambiental é entendida como o devir Concluída esta primeira tarefa de delinear, de
espaço-temporal em que ocorrem
transformações do meio pela ação do homem
forma brevíssima, a História Ambiental, faz-se
(pelas racionalidades econômico-culturais de necessário situar o presente trabalho nos
apropriação da natureza), seu campo estará moldes de análise da teoria em questão, assim
definido segundo a delimitação territorial, como as principais premissas analíticas do
cultural e temporal de cada estudo. Nesta referido campo da História.
perspectiva, se estabeleceria o propósito de
recuperar formas sustentáveis de manejo do meio
para aplicá-las a estratégias atuais de exploração A história ambiental apresenta-se hoje como um
e manejo da natureza. (LEFF, 2005, p15) campo vasto e diversificado de pesquisa.
Diferentes aspectos das interações entre sistemas
sociais e sistema naturais são esquadrinhados
Importante salientar que não se pretende aqui anualmente por milhares de pesquisadores. A
analisar detalhadamente o conceito de História produção atual engloba tanto realidades
Ambiental, nem suas pretensões. Não obstante, florestais e rurais quanto urbanas e industriais,
é de extrema importância que se entenda dialogando com inúmeras questões econômicas,
alguns conceitos-chave deste domínio políticas, sociais e culturais. No andamento
concreto dessas pesquisas, vários problemas
interdisciplinar e o modo como este trabalho se teóricos de micro, médio e longo alcances
insere em seu campo de atuação. Por este costumam aparecer (PÁDUA, 2010, p. 96).
motivo, é oportuno transcrever uma síntese da
definição de História Ambiental, formulada Dentre as muitas direções temáticas presentes
por José Augusto Drummond, um dos nos estudos de Drummond, as seguintes se
expoentes desta área no Brasil. Senão vejamos: mostram predominantes:
118
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
criou-se um acervo digital29 onde podem ser caso é fazer uma profunda e detalhada revisão
encontradas as fontes empíricas explicitadas bibliográfica sobre os trabalhos semelhantes
no decorrer deste trabalho. ao que o pesquisador deseja realizar. Será desta
Buscando definir de forma mais efetiva o que tarefa que se descobrirá as melhores
é um caso, Yin aponta que: perspectivas teóricas e questões de pesquisa
para o trabalho à ser realizado.
O estudo de caso é uma investigação empírica Esta tarefa na pesquisa aqui detalhada, foi
que investiga um fenômeno contemporâneo (o estruturada na forma de um estado do
“caso”) em profundidade e em seu contexto de
mundo real, especialmente quando os limites
conhecimento, onde se buscou teses e
entre o fenômeno não puderem ser claramente dissertações que abordassem movimentos de
evidentes(YIN,2015,p 1) resistência socioambiental que foram efetivos
em resistir em conflitos ambientais. Ao fim do
Sendo assim, todo estudo de caso deve ser processo de seleção foram analisadas cinco
sempre seguido de um trabalho contextual e dissertações e duas teses.
necessariamente deve trabalhar com fontes Destas obras, notou-se que cinco delas
empíricas para estruturar o caso e não trabalhavam com os mesmos autores teóricos.
necessariamente o contexto. Desta maneira, a pesquisa em questão passou a
A primeira discussão feita por Yin é sobre as ser operada dentro do paradigma da ecologia
potencialidades e limites de um estudo de caso política que trabalha teoricamente com a
assim como os pressupostos necessários que história ambiental quando aborda pesquisas de
fazem esta forma de pesquisa a mais adequada. cunho histórico.
Sendo assim, o autor aponta que esta Buscando preencher as lacunas deixadas
metodologia é a mais adequada quando a: pelas questões de pesquisa dos trabalhos
analisados, assim como tentando aprofundar
As principais questões de pesquisa são “como” ainda mais o conhecimento sobre esta
ou “ por quê”; o pesquisador tem pouco ou temática, a questão de pesquisa estruturada
nenhum controle sobre os eventos
comportamentais; o foco do estudo é um
para este estudo de caso foi “ Por quê o
fenômeno contemporâneo.(YIN.2015,p 15). movimento fora celulose foi efetivo em resistir
ao mega empreendimento em uma conjuntura
Tendo em vista o contexto apresentado de totalmente desfavorável aos movimentos
onde se situa o objeto de pesquisa em conjunto ambientalistas?”
com esta citação acima, a pergunta problema Foi também através desta perspectiva teórica
da pesquisa aqui exposta é buscar o “porquê” que se estruturou a hipótese a ser testada.
o movimento “Fora celulose” foi efetivo em Destaca-se aqui que o estudo de caso proposto
resistir assim e buscar as formas de “como” por Yin deve preferencialmente trabalhar com
conseguiu resistir. teorias a priori assim e como o teste de
Ainda tratando da citação anterior, apesar hipóteses.
deste trabalho se tratar de uma investigação Desta forma, é suposto que a atuação do
histórica, trata-se de uma história muito corpo acadêmico da Universidade Federal do
recente em que boa parte das fontes de para Rio Grande restou indispensável para o
pesquisa advém da memória dos participantes, sucesso do movimento, uma vez que partiu da
resgatadas através da oralidade. Desta forma, academia os relatórios que comprovem os
este trabalho se caracteriza como uma pesquisa malefícios que uma indústria de celulose
histórica, mas contemporânea pois seus causaria ao ecossistema estuarino na cidade
desdobramentos ainda reverberam na Para comprovar ou mesmo descartar essa
sociedade e a grande maioria das pessoas que hipótese, um dos objetivos da pesquisa, ao qual
presenciaram do evento ainda estão vivas. será exposto de forma sucinta aqui, é fazer uma
Seguindo com as instruções, a primeira tarefa análise do conteúdo de um folheto distribuído
do pesquisador que deseja estruturar um bom na praia do Cassino pelos ativistas do Fora
29
https://mega.nz/fm/T7JG2Y6R
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isso, far-se-á uma breve descrição sobre esta Essa narrativa leva à introdução da afirmação
fonte para que se possa compreender de forma de que a instalação da fábrica de celulose
mais clara o seu conteúdo. agravaria essa crise ambiental, bem como
O documento se caracteriza inicialmente pioraria os problemas socioeconômicos
como uma folha A4, com um texto divididos vividos pela cidade e pela metade sul no
em 8 tópicos separados, redigido por uma estado. É apontado neste início que tal
máquina de escrever, destacando dois empreendimento não passa de um falso
carimbos ao fim da folha, um do Grêmio do progresso para cidade.
Colégio Técnico Industrial (CTI)30 e outra da Visando dar sustentação às afirmações feitas,
associação dos professores da FURG: o documento faz uma relação entre o número
de empregos ofertados pela fábrica em
contraponto aos que poderiam ser perdidos
com a instalação do complexo. As informações
do documento atacam diretamente as
argumentações dos defensores do
empreendimento de que a aumentaria o
número de pessoas empregadas em Rio
Grande.
Aqui é interessante observar que o tópico em
que estas afirmações são feitas, denominado de
“EMPREGOS” é constituído por um trecho
com dados idênticos aos encontrado no
relatório denominado “Consequências
socioeconômicas para Rio Grande com a
instalação de uma fábrica de celulose”
produzido por Marcelo Domingues.
Em outro subtítulo do documento
denominado de “INFRAESTRUTURA”, o
documento aponta que a implementação da
fábrica causaria um inchaço da periferia local,
pois os empregados trazidos pelas empreiteiras
para a construção da indústria ficariam
desempregados logo após a conclusão da obra
e isso causaria problemas de infraestrutura e
déficit habitacional. Esta argumentação é a
Figura 1: Folheto distribuído na praia do mesma do relatório citado anteriormente.
Cassino Entende-se, assim, que existe uma evidente e
Fonte: (Acervo digital do autor) concreta relação entre o relatório acadêmico
produzido por Domingues e o documento
Em primeira análise, nota-se a clara relação analisado. O fator primordial que indica como
do documento e a universidade. Analisando de real essa ligação é o fato de o professor em
forma sucinta esse documento, nota-se questão ter sido um dos tantos ativistas do
inicialmente uma narrativa que visa quebrar a movimento “Fora Celulose”.
dualidade entre seres humanos e natureza. Seguindo, o documento passa a investir na
Aponta-se o caráter finito dos recursos narrativa que o mal cheiro causado pelas
naturais, assim como o risco a todas as formas fábricas de celulose ocasionaria problemas
de vida que a poluição antrópica pode para o turismo e veraneio no balneário
acarretar. O texto associa a poluição a uma Cassino. O documento expõe os mesmos
bomba atômica em forma de conta-gotas. dados e argumentos encontrados no relatório
30
Atualmente Instituto Federal do Rio Grande do Sul-
IFRS
122
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
produzido por Renato Carvalho, onde se alega setor pesqueiro poderia vir a sofrer, caso o
que o regime de ventos predominantes, o empreendimento fosse instalado, uma vez que
nordeste, levaria toda a poluição aérea os efluentes da celulose provavelmente
diretamente para a Praia do Cassino. aumentariam a mortalidade destes animais.
O discurso segue no sentido de que o odor Nesta parte fica clara e evidente a ligação
poderia afastar os cerca de 200 mil turistas que entre este documento e o relatório denominado
visitavam a praia, anualmente. Além disso, “Principais aspectos na pesca do camarão Rosa
este fator comprometeria os cerca de 800 Penaeus Paulensis na Lagoa dos Patos”. Tanto
empregos que eram gerados todos os verões. em um quanto no outro, os mesmos dados e
Embora Carvalho não conste como professor conclusões são tirados a respeito, tanto do
da FURG, mas sim como técnico do Núcleo de camarão, quanto das consequências ao setor
Estudos e Monitoramento Ambiental (NEMA) pesqueiro da cidade.
na relação de trabalhos produzidos pela Como mensagem final, o documento se
Universidade, entende-se que tal relatório encerra em uma frase solitária ao fim da
denominado de “Turismo” possui caráter página, declarando que a celulose traria muito
acadêmico por conta da histórica parceria entre dinheiro para alguns e muitos problemas
NEMA e a Universidade Federal do Rio econômicos, sociais e ambientais para a
Grande. maioria dos moradores do município. A qual
Por fim, o documento aponta os perigos que reproduzimos aqui: “A fábrica de celulose
os efluentes poderiam causar à saúde da daria muito dinheiro a alguns …. E muitos
população e na atividade pesqueira no problemas (ambientais, econômicos e sociais)
município. A narrativa passa a destacar o para grande maioria da população de nosso
potencial cancerígeno dos efluentes município”.
produzidos pelas fábricas de celulose e dos
problemas respiratórios que a fumaça, oriunda Resultados
do processo de produção de celulose, poderia É importante ressaltar que os resultados aqui
causar. expostos possuem um caráter profundamente
Diversos relatórios tratam da questão tóxica preliminar, visto que ainda não foi concluída a
e cancerígena dos rejeitos da celulose, mas coleta de todos os dados pretendidos e somente
aqui, destaca-se o “Parecer médico provisório foram analisados 40% de todo o material já
sobre a instalação desta indústria” produzido coletado. Desta forma afirmar o acerto da
por Cesar Chiafftelli, na época professor e hipótese é uma atitude precipitada e perigosa.
diretor do serviço de oncologia da Santa Casa Entretanto, os dados indicam até o momento,
de Rio Grande, que articula de forma clara os que se a FURG não teve papel decisivo, no
perigos à saúde humana dos rejeitos tóxicos da mínimo teve um papel deveras importante para
fábrica, dando ênfase da questão cancerígena e o sucesso do movimento. Muitas questões
dos problemas respiratórios. sobre como funcionava a dinâmica das ações
Presume-se aqui que o relatório de Chiafftelli socioambientais e os fundamentos teóricos do
tenha sido uma das principais referências para “fora celulose” ainda precisam ser respondidas
o documento, pois o tópico sobre saúde fala para que o estudo possuam resultados mais
sobre problemas cancerígenos e respiratórios concisos, mas o caminho que vem sendo feito
assim como no documento disponibilizado até o momento se mostra satisfatório.
para os veranistas. Os resultados mais importantes, que serão
Ao fim do relatório, há a associação da generalizados no futuro, ainda estão muito
ingestão de pescado contaminado pelos distantes de serem concretizados, entretanto,
resíduos da celulose com possíveis danos à fica claro que possuir material bem embasado
saúde, em especial à possibilidade do cientificamente pode ser uma arma importante
desenvolvimento de câncer pela população. para estruturar ações de resistência
Apesar das observações contidas no socioambiental.
documento em relação à saúde da população, o Em relação a união entre o método de estudo
foco em que é tratada a pesca no documento se de caso e os preceitos teóricos da História
detém a demonstrar a perda econômica que o Ambiental, entende-se que estes podem sim
123
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
RESUMO
Esta pesquisa foi desenvolvida em nível de mestrado, cursado no Programa de Pós-Graduação em
Educação da Universidade Federal de Pelotas, com objetivo geral ‘compreender se e como as práticas
pedagógicas de ensino de Ciências organizadas por professoras alfabetizadoras contemplam aspectos
da Alfabetização Científica’. Metodologicamente, aproximamo-nos aos casos de ensino, (NONO,
2005; NONO e MIZUKAMI, 2005; DARLING-HAMMOND et al., 2005; SHULMAN, 2005), cujas
características, possibilitam organização e análise dos dados, e aliamo-nos à filmagem que possibilita
ver a complexidade da prática pedagógica (LOIZO, 2008; GARCES, DUARTE e EIZENBERG,
2011). No caso de ensino sobre a prática da professora do segundo ano, dos cinco aspectos elegidos
como importantes no ensino de Ciências na perspectiva da Alfabetização Científica (MORAES, 1995;
LORENZETTI e DELIZOICOV, 2001; SASSERON e CARVALHO, 2011; KINDEL, 2012),
análise, relação, observação, inferência e levantamento de hipóteses, somente três foram capturados
de sua prática; análise, relação e inferência. A professora possui compromisso com a aprendizagem
das crianças de modo a inseri-las no mundo científico (SASSERON e CARVALHO, 2008);
atentemos a necessidade de inclusão dos demais aspectos, para qualificação do desenvolvimento dos
conhecimentos científicos e ampliação daqueles trabalhados, cuja complexidade foi aligeirada,
tomando como foco conhecimentos mais em nível de atitudes, excluindo a construção de conceitos
científicos.
Palavras chave: Ensino de Ciências. Alfabetização Científica. Prática Pedagógica. Ciclo de
Alfabetização.
ABSTRACT
This research was develop dat the master's level, enrolled in the Postgraduate Program in Education,
Federal University of Pelotas. It aimed to understand if and how the pedagogical practices of science
teaching organized by literacy teachers contemplate aspects of Scientific Literacy. Methodologically,
it approaches the teaching cases, (NONO, 2005; NONO and MIZUKAMI, 2005; SHULMAN, 2005),
whose characteristics make possible the organization and analysis of the data. With the use of filming,
it was possible o see and analyze the complexity of the pedagogical practice (LOIZO, 2008;
GARCES, DUARTE and EIZENBERG, 2011). In the case of teaching about the first-year teacher's
practice, of the five aspects chosen as important in teaching science, from the perspective of Scientific
Literacy (MORAES, 1995; LORENZETTI and DELIZOICOV, 2001; SASSERON and
CARVALHO, 2011; KINDEL, 2012) - analysis, relation, observation, inference and hypothesis –
three were observed in their practice: the analysis, the relation and the inference. The teacher is
committed to the children's learning in order to insert them in the scientific world (SASSERON and
CARVALHO, 2008). The study shows that it is necessary to consider the inclusion of the other
aspects, aiming at the qualification of the development of scientific knowledge and the extension of
those worked, whose complexity was lightened, focusing on knowledge more at the level attitudes,
excluding the construction of scientific concepts.
Keywords: Science Teaching. Scientific Literacy. Pedagogical Practice. Literacy Cycle.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
Metodologicamente, esta pesquisa está ensino [1], [2], [3], [13] que ainda é pouco
inserida na abordagem qualitativa. A pesquisa, conhecida e utilizada no Brasil.
sob a ótica da abordagem qualitativa, é No Brasil, os estudos e a aplicação dos
entendida “como um processo de reflexão e conhecimentos sobre os casos de ensino foram
análise da realidade através da utilização de iniciados pela Profa. Dra. Maria das Graças
métodos e técnicas para compreensão Nicolleti Mizukami, que também apontou o
detalhada do objeto de estudo [...]” [11]. A potencial do uso dos casos de ensino para a
autora explica, ainda, que a pesquisa de aprendizagem da docência [13]. Tal potencial
abordagem qualitativa “pode ser caracterizada é retomado com esse trabalho, ao perceber que
como sendo uma tentativa de se explicar com as filmagens, quando empregadas para dar
profundidade o significado e as características fôlego às práticas das professoras, no sentido
do resultado das informações obtidas [...] sem de perceberem suas ações em sala de aula,
a mensuração quantitativa de características ou podendo proporcionar aprendizagens
comportamento” [11].
significativas sobre o seu trabalho, sua ação
Assim, desenvolver conhecimentos em pedagógica e os conceitos/conhecimentos de
educação traduz-se pelo esforço teórico do Ciências desenvolvidos com as crianças.
pesquisador de organizar, demonstrar, mostrar Grupos de pesquisadores do exterior [14],
porque entendeu daquela forma os dados [15], também apontam a importância dos casos
apresentados. Ainda, que depende do olhar do de ensino quando o foco é a formação de
pesquisador, pois quando olho os dados, professores. Para os autores, os casos de ensino
observo com lentes que foram sendo são especialmente pertinentes porque
trabalhadas e desenvolvidas a partir das proporcionam o trabalho com casos reais de
vivências, experiências, leituras, conversas, ensino, ou seja, a prática pedagógica de
escolhas pedagógicas e epistemológicas. professores que são observadas e analisadas no
Dessa forma, apresentar em um trabalho os intuito de apreensão de conhecimentos.
dados coletados, discutidos, analisados,
trabalhados, interpretados é um trabalho de A experiência relatada sobre uma “escola
exaustão, no sentido de tentar esgotar, a partir médica”, na qual os casos de ensino se
das lentes que possui o pesquisador, apresentaram de forma a ampliar os
interpretações possíveis. conhecimentos dos médicos envolvidos [15],
conta que o professor-médico mostrava a um
Os conjuntos de materiais que compõem os grupo de médicos-estudantes um paciente; o
dados coletados sobre o trabalho pedagógico paciente tornava-se um caso, pois os médicos
de cada professora, participante da pesquisa, iniciantes pensavam, analisavam, observavam
principalmente as filmagens, foco da e organizavam como iriam proceder. Os
organização dos casos pedagógicos, possui médicos iniciantes apresentavam suas ideias
multiplicidades e especificidades que ao professor-médico e cabia a ele a função de
impedem um trabalho de análise conjunto. A mediador, contestando as ações para que os
análise foi realizada individualmente, ou seja, médicos estudantes pudessem pensar sobre a
para cada uma das turmas em que as forma como pretendiam agir. Ao final do
professoras atuavam, um caso pedagógico foi plantão, os médicos terminavam sua aula in
produzido. Assim, uma maior riqueza de locus, contemplando os problemas da saúde e
detalhes foi favorecida, assim como uma maior do hospital e de que forma poderiam contribuir
força de argumentos e apreciação sobre as para melhorar a saúde de forma ampla.
situações analisadas foi produzida.
Nessa experiência o autor aponta que tal
Acredito, portanto, que a escolha da processo necessita ser desenvolvido nas
metodologia que melhor se adapta à riqueza do práticas de formação de professores, tanto
material coletado proporcionará um melhor inicial quanto continuada, pois, este é um
aproveitamento e refinamento dos dados. momento de formação, pois há contemplação
Dessa maneira, a análise dos dados foi de não só um aspecto, mas de todos que são
organizada, inspirando-se na metodologia de inerentes à formação, naquele caso, dos
ensino e investigação conhecida como casos de médicos.
127
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
Dessa forma, apresentar as características dos Por que existe tal entendimento? Porque
casos para, de fato, serem casos, se faz são...
extremamente importante para que este ... situações de ensino reais, onde há o
processo seja amplamente desenvolvido, trabalho conjunto entre professora e alunos;
especialmente quando o foco é a formação de
professores. Dentre as diversas exigências ou ... casos que acontecem em contextos
características apresentadas, [1], [2] e [13], específicos de ensino, a sala de aula;
para que um caso de ensino seja realmente um ... situações que merecem o devido cuidado
caso e não uma ocorrência, apresento aquelas porque tratam do ensino de Ciências na
que, neste contexto, explicam a decisão em perspectiva da Alfabetização Científica no
basear a pesquisa nos casos de ensino como ciclo de alfabetização;
metodologia de organização e análise dos
dados. ... momentos utilizados para apreciação
analisados e interpretados pelo pesquisador
Os casos de ensino têm como características que também é professor e que possui vivências
apresentarem episódios escolares, sejam reais em relação a teorias pedagógicas e formação
ou fictícios, a partir de situações que já específica na área das Ciências Biológicas;
aconteceram ou que são, agora, retomadas,
podem ser utilizados em diferentes etapas da ... narrativas audiovisuais produzidas pelas
formação inicial ou continuada, contemplem professoras, tendo em vista que as professoras
diversos contextos: a escola, a gestão, a sala de elegeram quais atividades seriam filmadas de
aula; retratam situações de conflitos que modo a narrarem para o pesquisador suas
podem ser entre os pares avaliadas, discutidas; práticas pedagógicas de ensino de Ciências
trazem questões e/ou comentários que ajudam com as crianças.
a direcionar a discussão e a tomada de decisão Os dados da pesquisa foram organizados em
sobre a continuidade da ação [2], [13]. casos pedagógicos e desenvolveram uma
Outra característica dos casos de ensino, [1], dimensão marcada pela relação entre o texto
[2], [13] é a necessidade de serem narrativas audiovisual, de autoria das professoras
escritas pelos próprios professores, nas quais participantes da pesquisa, e o texto narrativo
não se apresenta, apenas, a narração, mas a descritivo-analítico, de autoria deste
discussão do fato. A discussão necessita ser pesquisador, no qual aspectos de tensão foram
fundamentada teoricamente para que, assim, o explicitados e elementos que caracterizam o
professor possa, a partir dos conhecimentos caso pedagógico de cada professora, no que se
que já possui, aprofundá-los ou desenvolver refere a sua prática pedagógica no ensino de
outros na perspectiva do desenvolvimento ciências foram apresentados. Na organização e
profissional docente. descrição analítica dos dados, sou o narrador
dos momentos pedagógicos dos quais as
Na pesquisa, não há a apresentação de casos professoras foram as protagonistas. Como
de ensino esquematicamente prontos, narrador e pesquisador, também farei as
discutidos pelo grupo de professoras interpretações das situações, trazendo para a
participantes da pesquisa. Por isso, se diz que reflexão as teorias epistemológicas e os
há uma aproximação à metodologia dos casos conteúdos de Ciências, as teorias sobre
de ensino porque, neste trabalho, organizo os formação de professores e os elementos que
dados a partir das filmagens das aulas que as caracterizam a prática pedagógica das
professoras produziram e apresento os professoras colaboradoras da pesquisa.
resultados das discussões. Observando as
características necessárias para que os casos Entendo ser essa outra forma de apresentação
sejam, de fato, casos. Entendo que esta dos casos de ensino. Por isso, casos
investigação permite descrever três casos pedagógicos, que reiteram a importância dos
pedagógicos, um para cada ano/ciclo de casos quando eles possibilitam não só a visita
alfabetização, que, por sua vez, também ou a revisita por parte daqueles que os
apresenta casos de ensino produzidos por cada produziram, os que foram os autores
uma das professoras. principais, mas também por seus pares [1], [2],
128
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
[13] que, neste caso, posso ser eu que, infiéis porque não conseguimos nos lembrar de
enquanto professor e pesquisador, estuda sobre tudo e de todos os processos que aconteceram.
a prática pedagógica de professoras dos anos Por isso, ao voltarmos as nossas observações,
iniciais para o ensino de Ciências. parece que existem quebras, “buracos”, ainda
mais quando a realidade sobre a qual se
Ao pensar sobre os casos de ensino, penso
escreve ou se fala são salas de aula dos anos
que a nomeação adequada é casos
iniciais do ensino fundamental, espaço onde o
pedagógicos, pois trata de uma organização
foco de atuação das professoras são crianças,
feita por mim, pesquisador, mas que possui nas
inquietas por natureza, falantes, imaginativas,
professoras a autoria. Assim, minha intenção é
indagadoras.
favorecer a qualificação da prática pedagógica
das professoras dos anos iniciais, contribuindo Ao observar os momentos escolhidos pelas
com elementos relativos aos processos professoras para serem videogravados, parece
metodológicos para formação de professores, e que a quebra identificada nas observações não
para o ensino de Ciências na perspectiva da existe, ainda mais quando o momento
Alfabetização Científica. escolhido tem um começo, um meio e o fim.
Resultados e discussão Nas filmagens, principalmente naquelas em
que a professora aparece explicando a tarefa ou
Enquanto pesquisador me inseri num
que ela direciona a tarefa, logo em seguida há
ambiente, tornando-me parte dele e, portanto,
consegui manter contato direto com os o desenvolvimento da mesma e, por fim, a
apresentação dos resultados. Tudo pode ser
participantes da pesquisa, fato de extrema
observado: todas as falas, todas as
importância quando o processo que se pretende
inquietações, todas as ações, todas as
como pesquisador é a observação do ambiente
mediações; percebe-se, portanto, o contexto.
“real” [11].
Nas observações, parece muitas vezes que esse
Já no caso da filmagem, compreendi-a como contexto está ausente.
meio de organizar discussões sobre casos reais
Dessa forma, a partir das exposições
de ensino, cujo foco é o trabalho pedagógico
apresentadas, compreendo que apresentar no
conduzido pela professora e a sua qualificação
conjunto das discussões materiais onde o
docente. Ao participar e vivenciar esses dois
pesquisador pode perceber o processo de
processos de coleta de dados, percebo as
desenvolvimento das ações pedagógicas
nuances de cada um.
organizadas pelas professoras, indica uma
Na observação, registrava em meu diário de força de compreensão sobre as práticas
campo o que acontecia na sala, do início ao pedagógicas nos anos iniciais, especialmente
final das aulas. Quando retomava as quando o que se pretende é analisar a prática
observações, compostas pelas anotações dos de ensino de Ciências conduzidas pelas
diálogos, dos modos como estava organizada a professoras alfabetizadoras.
sala, as crianças e quais eram as sistemáticas
Diante do exposto, percebe-se que no estudo,
utilizadas pelas professoras, as aulas pareciam
as filmagens tornaram-se potentes, pois
ter cortes e ausência de segmento, sem uma
puderam mostrar especificidades, nuanças,
relação entre as atividades.
processos, e diálogos com riqueza de detalhes
Essa quebra parece ocorrer porque quando que não foram jamais detalhadas nas
escrevemos, mesmo que tenhamos a vontade observações.
de que haja uma riqueza de detalhes, existem
Assim, com o uso da filmadora pude
momentos em que essa possibilidade inexiste.
recuperar a ação das professoras em sala de
Ao pensar e fazer pesquisa com/na realidade,
aula de maneira bastante específica. Além
os acontecimentos vão passando e o
disso, pude compilar as filmagens, após
pesquisador, muitas vezes, não consegue
escutá-las e transcrevê-las, de forma que os
relatá-los da forma ou na ordem que
leitores conseguem vivenciar os
aconteceram. E, mesmo que o pesquisador
acontecimentos, por isso, também,
relembre as situações observadas nossos
denominamos casos pedagógicos.
cérebros não são máquinas e, portanto, são
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
inferência está ligado à relação e está, também, em uma sequência das mesmas, aliada a nova
diretamente ligado a um conhecimento base. escuta das filmagens.
Ou seja, há necessidade de conhecer para Com o caso pedagógico organizado, o
poder inferir e interpretar. Houve interpretação pesquisador inicia o processo de análise.
porque a criança necessitou desenvolver uma Acredito que o processo de análise possa ser
condição de pensar sobre a ação de Pedro e feito de formas diversas e sob diferentes focos.
sobre o que tal ação proporcionaria.
Evidentemente, a inferência fica centrada na Foi possível perceber que nos excertos do
indicação de uma atitude relativa a um caso pedagógico apresentado, a professora
procedimento feito por Pedro, elevando-se à propõe inúmeras apreensões de conhecimentos
dimensão conceitual em que economizar água sobre as Ciências que se aproximam do ensino
é a atitude esperada. de Ciências na perspectiva da Alfabetização
Científica. Porém, não os aprofunda com
Parte do caso pedagógico apresentado informações científicas, ou seja, em sua prática
demonstra o quão potente é, tanto para prevalece o cuidado em escutar as crianças; a
compreensão do processo de pesquisa, como escuta é tomada como imperativo a partir do
para proporcionar processos formativos às qual a professora toma base para o
professoras dos anos iniciais. O foco da desenvolvimento de um assunto específico das
pesquisa esteve sob o ensino de Ciências, e por Ciências.
isso, as análises recaem sob como as
professoras desenvolvem o Ensino de Ciências Apresenta-se também, a necessidade
nos anos iniciais, porém, é perceptível a aprendizado dos conteúdos de Ciências na
potência que possuem para desenvolver perspectiva da Alfabetização Científica,
pesquisa sobre a formação do professor de reconhecendo a necessidade de conhecimento
forma global, ou seja, em todos os aspectos de base [14] e a internalização dos conceitos
pedagógicos31 de uma sala de aula. [16], o que indica que é preciso aliar o
conhecimento sobre o saber científico com a
sua história de produção, o que implica saber o
Conclusões porquê e como determinados conteúdos foram
construídos. Pensar formas de construir
Com este trabalho, percebe-se que os casos
situações que permitam às crianças internalizar
pedagógicos são potentes para coleta,
conceitos, entre eles, os conceitos científicos,
organização e análises dos dados de pesquisa.
torna-se atividade laboral central das
Também é potente como processo formativo,
professoras de anos iniciais. Para isso, as
quando o foco é o desenvolvimento dos
professoras precisam propor estratégias
docentes.
relevantes que permitam às crianças
Nos casos pedagógicos, as situações das desenvolver conhecimentos sobre as Ciências.
práticas de sala de aula são pensadas e E, para desenvolver conhecimentos de
executadas por professoras/es, filmadas e Ciências, entendo ser necessário que as
analisadas a luz da teoria pedagógica, tanto professoras conheçam o conteúdo específico
com foco nos processos pedagógicos quanto sobre o qual ensinam. Esse é o ponto chave da
nos ensino de alguma matéria em específico, atuação das professoras em relação à
no caso deste trabalho, as Ciências. organização da prática pedagógica na
Assim, percebe-se e defende-se os casos perspectiva da alfabetização científica.
pedagógicos que tomam corpo a partir das E é possível, a partir do processo
filmagens das práticas pedagógicas de metodológico aqui apresentado, nomeado
professores. Estruturam-se a partir da escuta e como casos pedagógicos, propor que
da transcrição das filmagens e da organização professoras observem, analisem e reorganizem
31
Deste processo de filmagem e estruturação do caso de pedagógica para promoção da colaboração em sala de
ensino, outra pesquisa em nível de mestrado foi aula.
desenvolvida, cujo foco circunscrevia a ação
132
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
suas práticas para, neste caso, o Ensino de 1, p. 1-17, 2001. Disponível em:
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formacióndelprofesorado, Espanha, v. 9, n.
Pesquisa em Educação em Ciências, v. 03, n.
2, p. 1-30, 2005. Disponível em:
133
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
b
Departamento de Artes Visuais/Universidade Federal de Santa Maria/reinilda.minuzzi@gmail.com
RESUMO
O artigo aborda a prática na pesquisa em artes visuais, segundo a Cartografia e a Poiética que servem
como aporte teórico para a criação de um método de trabalho próprio. Assim, nas duas situações
encontram-se alguns critérios e elementos para o desenvolvimento de uma investigação na área. Por
sua vez, estes não são complementares, porém é possível que se construa uma metodologia própria
de pesquisa a partir desta relação. A Poiética é analisada segundo as considerações de Sandra Rey
(2002), e a Cartografia é abordada a partir de Gilles Deleuze e Félix Guattari (1995a), quando se
apontam alguns princípios sobre rizoma. Igualmente, com base nos estudos de Virgínia Kastrup
(2009) são relacionadas oito pistas para apontar procedimentos para a pesquisa. Como objetivo,
busca-se analisar as formas que possibilitam o uso e as contribuições de cada abordagem para a
pesquisa em poéticas visuais. A partir de um estudo de caso, em uma dada pesquisa que faz uso dos
dois aportes, possibilitando a atuação de ambas, pretende-se verificar, sob uma análise qualitativa,
como é possível potencializar o fazer poético em artes visuais. Para tal, alguns apontamentos são
estabelecidos, no que tange à abordagem da Cartografia e da Poiética, pensando de que forma podem
atuar paralelamente em investigações neste campo.
Palavras-chave: Artes Visuais, Metodologia, Cartografia, Poiética.
RESUME
El artículo aborda la práctica en la investigación en artes visuales, según la Cartografía y la Poiética
que sirven como aporte teórico para la creación de un método de trabajo propio. Así, en las dos
situaciones se encuentran algunos criterios y elementos para el desarrollo de una investigación en el
área. Por su parte, estos no son complementarios, pero es posible que se construya una metodología
propia de investigación a partir de esta relación. La Poiética es analizada según las consideraciones
de Sandra Rey (2002), y la Cartografía es abordada a partir de Gilles Deleuze y Félix Guattari (1995a),
cuando se apuntan algunos principios sobre rizoma. Igualmente, con base en los estudios de Virginia
Kastrup (2009) se relacionan ocho pistas para apuntar procedimientos para la investigación. Como
objetivo, se busca analizar las formas que posibilitan el uso y las contribuciones de cada abordaje
para la investigación en poéticas visuales. A partir de un estudio de caso, en una determinada
investigación que hace uso de los dos aportes, posibilitando la actuación de ambas, se pretende
verificar, bajo un análisis cualitativo, cómo es posible potenciar el hacer poético en artes visuales.
Para ello, algunos apuntes son establecidos, en lo que se refiere al abordaje de la Cartografía y de la
Poiética, pensando de qué forma pueden actuar paralelamente en investigaciones en este campo.
Palabras clave: Artes Visuales. Metodología, Cartografía, Poiética
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32
Sandra Rey, artista, professora, pesquisadora, crítica
Gilles Deleuze, filósofo francês, nascido em 1925 e
de arte e curadora, entre outros, discute sobre os
falecido em 1995 (LECHTE, 2002, p. 120); Félix
métodos de criação artística entre teoria e prática e
Guattari, filósofo francês, nascido em 1930 e falecido
metodologia de pesquisa em artes visuais (Fonte: REY,
em 1992 (FAROFA FILOSÓFICA, 2018).
Sandra, Currículo Lattes, 2018).
33
Graduada em Psicologia pela Universidade Federal
do Rio de Janeiro em 1979. Atualmente é professora da
Universidade Federal do Rio de Janeiro. (Fonte:
KASTRUP, Virginia, Currículo Lattes, 2018).
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ou seja, é desenvolvida na qualidade de fractais transformam em linhas sendo que essas linhas
conectivos tanto na discussão da modernidade não servem para ligar pontos e sim o rizoma se
como na própria forma de apresentá-los[...]
(MAROSO, p. 1316, 2015)
constitui delas, rizoma não é forma — é linha.
Cartografar seria então percorrer, construir
caminhos a serem trilhados, porém não
A Cartografia desenha seus próprios propõem segurança e nem estabilidade, pois
caminhos, construindo-se a partir da ideia de apontar um caminho com segurança seria o
mapas que se cruzam e se entrelaçam, mesmo de perder a potencialidade dele, o
desfazem-se de algumas partes e seguem por seguro não deixa pensar no processo e
outras, sendo que, se necessário, podem perceber detalhes, por ser algo de nosso
abandonar um caminho e seguir por outros, conhecimento como também saber o que se dar
abrir novas visões e expandir conhecimentos. no final e não conseguir aproveitar o “entre”,
Nesse sentido, o rizoma é lembrado, pois a os acontecimentos e encontros intermediários
cartografia está apontada nos parâmetros que ao começo e o fim, assim não sentindo a
delimitam o rizoma, mais especificamente o intensidade que o processo pode proporcionar.
quinto e o sexto de seus princípios. Assim, a
perspectiva rizomática é pensada fora de A cartografia é pensada a partir do conceito
hierarquias e, sim, em linhas que se de invenção, segundo Kastrup (2009) é
entrecruzam, fazendo movimentos. inventar problemas e não encontrar soluções
para eles, se diferindo assim, do conceito de
criatividade. O inventar deve estar presente
5º e 6º- Princípio de cartografia e de todos os dias, mas sem ter regras predefinidas.
decalcomania: um rizoma não pode ser Um método que apontam pistas, sem um
justificado por nenhum modelo estrutural ou caminho a ser percorrido e podem ser lidas sem
gerativo. Ele é estranho a qualquer idéia de eixo
genético ou de estrutura profunda. Um eixo
uma ordem, elas se entrelaçam, transpassam se
genético é como uma unidade pivotante objetiva misturam e se afastam, assim sendo, aponto
sobre a qual se organizam estados sucessivos; apenas algumas como à invenção, habitar
uma estrutura profunda é, antes, como que uma territórios e as movimentações.
seqüência de base decomponível em
constituintes imediatos, enquanto que a unidade Cartografar demanda tempo e disposição do
do produto se apresenta numa outra dimensão, pesquisador a estar a todo tempo em
transformacional e subjetiva. (DELEUZE E movimento, pois a pesquisa se encontra sob
GUATTARI, 1995, p.20) movimentação a todo o instante, assim,
Pensar sobre rizoma como também na [...] é preciso que o próprio cartógrafo esteja em
cartografia essas linhas potenciais que não tem movimento, afetando e sendo afetado por aquilo
um ponto inicial como também não tem um que cartografa. O cartógrafo cartografa sempre o
termino, mas que atua pelo meio, pela processo, nunca o fim. Até porque o fim nunca é
velocidade e intensidade. Rizoma não atua na realidade o fim. O que chamamos de final é
sempre um fim para algo que continua de uma
pelo principio de “eixo genético” ou por uma outra forma. Se não conseguimos enxergar
estrutura hierárquica. Opera pelo viés da movimento é porque alguma coisa está
multiplicidade, desconsiderando assim a impedindo, e lançar o olhar para isto é também
unicidade, pois o “uno” conduz a uma forma função do cartógrafo. A cartografia é, desde o
fechada, enquanto o pensamento rizomático e começo, puro movimento e variação contínua.
(COSTA, 2009, p.17)
cartográfico flui para diversas direções e se
utiliza das rupturas para potencializar os seus
processos. Então esse estar em movimento em territórios
Linhas que não são dirigidas por uma implica mapeá-los, mas também não é apenas
linearidade, porém que conduzem encontros estar em movimento, é também conseguir lidar
que se atravessa e transbordam, não possuem com algo que não está parado e estanque em
um ponto e sim linhas, esses “pontos” que um lugar, a pesquisa está em mutação a todo o
pelas suas velocidades de fluxo se instante, assim segundo pensamento de Costa
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Psicólogo, doutor em Educação e docente da Faculdade de Visuais no Programa de Pós-Graduação em Artes
Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. (COSTA,
2014) Visuais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS). Cursou Mestrado em Artes Visuais,
36
Elias Edmundo Maroso atualmente desenvolve Especialização em Design de Superfície como
pesquisa em Poéticas Visuais no Doutorado em Artes graduação em Artes Visuais, pela UFSM, com
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A partir de pesquisas baseadas na Poiética (as TESSELER, Elida (Orgs.). Porto Alegre:
questões da obra se fazendo) e na Cartografia Editora UFRGS, 2002.
(nas experimentações das movimentações que [4] MAROSO, Elias Edmundo. Contágios
são geradas), é possível apontar momentos de
Poéticos no espaço: por ações no contexto
aproximações entres as duas, dando vazão para urbano. Santa Maria, Ufsm, 2014. Disponível
criar um modo ou processo próprio de em:<
produção, criando suas próprias regras a partir https://repositorio.ufsm.br/handle/1/5222>.
de pistas que são evocadas nos dando a Acesso em: 14 de jul. de 2018.
possibilidade de uma multiplicidade de
conexões podendo tramar experiências e [5] LECHTE, John. Cinquenta pensadores
inventar articulações. contemporâneos essenciais: do
estruturalismo à pós-modernidade. Tradução
Contudo, a partir da perspectiva pessoal de Fabio Fernandes. Rio de Janeiro: DIFEL,
como atuante na pesquisa em Artes Visuais, 2002.
criar o seu próprio método de trabalho seria
uma forma eficaz para a produção, mas não [6] KASTRUP. Virginia. Currículo lattes.
seria apenas criar e, sim, é no processo de fazer Disponível em: <
que se origina e se constitui esse método; é no http://lattes.cnpq.br/0516666558156215>.
fazer, é o trabalho que anuncia os conceitos Acesso em 10 de nov. de 2018.
operatórios da pesquisa, pois estes são parte [7] REY, Sandra. Currículo lattes. Disponível
daquilo que está exposto pela obra, o que está em: < http://lattes.cnpq.br/1304040199380156
visível. >. Acesso em 08 de jul. de 2018.
[8] MAROSO, Elias. Planos de Ação: sobre a
poiética e a cartografia. In: 24º Encontro da
REFERÊNCIAS: Associação Nacional de Pesquisadores em Artes
Plásticas - ANPAP, Santa Maria, 2015.
[1] DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix.
Mil platôs: Capitalismo e Esquizofrenia, Vol. [9] COSTA, Luciano, Bedin. Cartografia:
1.Tradução de Aurélio Guerra e Célia Pinto uma outra forma de pesquisar. Disponível
Costa. Rio de Janeiro: Editora 34, 1995. em:
<https://periodicos.ufsm.br/index.php/revislav
[2] KASTRUP. Virginia. PASSOS, Eduardo. /article/view/15111 >. Acesso em 15 de jul.
ESCÓSSIA, Liliana. Pistas do método da 2018. Revista Digital do LAV - Santa Maria -
cartografia: pesquisa-intervenção e vol. 7, n.2, p. 66-77 - mai./ago. 2014.
produção de subjetividade. Porto Alegre:
Editora Sulina, 2009. [10] MAROSO, Elias. Currículo lattes.
Disponível em:
[3] REY, Sandra. Por uma abordagem <http://lattes.cnpq.br/2618017740331582>.
metodológica da pesquisa em artes visuais. In: Acesso em 20 de jul. de 2018
O meio como ponto zero: metodologia de
pesquisa em artes. BRITES, Blanca;
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
jomara.duarte@acad.pucrs.br
RESUMO
Este trabalho parte da noção de gênero do discurso, sob o enfoque da teoria bakhtiniana (BAKHTIN,
2016). Em seguida, abordaremos o conceito de gêneros pelo olhar da Linguística Textual
(MARCUSCHI, 2003, 2008; KOCH, BENTES E CAVALCANTE, 2012) que, influenciada pelas
reflexões do teórico russo, entende-os como práticas sócio-históricas. Por conseguinte, compreende
que para atender as necessidades comunicativas, os gêneros podem se constituir mediante
configurações intergenéricas, ou seja, a associação de características estruturais de um determinado
gênero, mas com a função de outro. Nosso objetivo é corroborar a ideia de que, ainda que os gêneros
tenham certa estabilidade, por serem plásticos, se imbricam e interpenetram, favorecendo a ocorrência
do fenômeno da intergenericidade. Assim, após apresentar nossa fundamentação teórica, traremos
uma proposta de análise de charge, exemplo que demonstra em uma situação concreta a mescla entre
gêneros. Para tanto, enfocaremos as características híbridas deste gênero como seu traço constitutivo
e uma forma estratégica de construção do sentido do enunciado. Identificamos que, embora os
gêneros sejam práticas discursivas socialmente estabilizadas, seus traços preditivos não criam para
eles uma identificação determinista. Em outras palavras, ainda que exista uma forma que pode ser
reveladora para a identificação do gênero, ele será determinado basicamente por seu propósito e,
consequentemente, da esfera de circulação, e não por sua forma.
Palavras chave: Gêneros, Linguística Textual, Intergenericidade.TRACT
ABSTRACT
This work starts from the notion of discourse genre, under the focus of the bakhtinian theory
(BAKHTIN, 2016). We will then approach the concept of genres by the look of Textual Linguistics
(MARCUSCHI, 2003, 2008; KOCH, BENTES AND CAVALCANTE, 2012), which is influenced
by the reflections of the russian theorist, understood as socio-historical practices. Therefore, it
understands that to meet the communicative needs, the genres can be constituted by intergeneric
configurations, that is, the association of structural characteristics of a certain genre, but with the
function of another. Our objective is to corroborate the idea that, although the genres have some
stability, because they are plastic, they interlock and interpenetrate, favoring the occurrence of the
phenomenon of intergenericity. Thus, after presenting our theoretical basis, we will present a proposal
for a cartoon analysis, an example that demonstrates in a concrete situation the intergenerational mix.
Therefore, we will focus on the hybrid characteristics of this genre as its constitutive trait and a
strategic form of construction of the sense of the statement. We have identified that although genres
are socially stabilized discursive practices, their predictive traits do not create a deterministic
identification for them. In other words, even if there is a form that can be revealing for the
identification of the genre, it will be determined basically by its purpose and consequently of the
sphere of circulation, and not by its form.
Keywords: Genres, Textual Linguistics, Intergenericity.
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O dialogismo é um princípio que constitui as reflexões O conceito de gênero textual acabou sendo um desdobramento da
bakhtinianas, sobretudo relacionadas à linguagem. noção de gêneros discursivos, de Bakhtin.
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
escritos) concretos e únicos [...].” Ainda está ligado pela identidade da esfera de
segundo Bakhtin (2016, p. 33): comunicação discursiva. Todo enunciado deve
ser visto antes de tudo como uma resposta aos
enunciados precedentes de um determinado
campo [...]: ela os rejeita, confirma, completa,
Não se intercambiam orações como se
baseia-se neles, subentende-os como conhecidos,
intercambiam palavras (em rigoroso sentido
de certo modo os leva em conta. Porque o
linguístico) e grupos de palavras; intercambiam-
enunciado ocupa uma posição definida em uma
se enunciados que são construídos com o auxílio
dada esfera da comunicação, em uma dada
das unidades da língua: palavras, combinações
questão, em um dado assunto, etc. É impossível
de palavras, orações; ademais, o enunciado pode
alguém definir sua posição sem correlacioná-la
ser construído a partir de uma oração, de uma
com outras posições. (BAKHTIN, 2016, P. 57,
palavra, por assim dizer, de uma unidade do
grifo do autor)
discurso (predominantemente de uma réplica do
diálogo), mas isso não leva uma unidade da
língua a transformar-se em unidade da
comunicação discursiva. Podemos perceber que as relações dialógicas
não são nem lógicas e nem linguísticas; são
relações em que se assume uma posição (de
Um dos temas de maior prestígio que provém aceitação, por exemplo) em vez de outra(s) (de
do legado do filósofo russo é decerto o recusa, por exemplo) e que só são possíveis
dialogismo, que para Bakhtin (2000) “entre enunciados integrais de diferentes
corresponde ao princípio constitutivo de todo sujeitos do discurso [...].” (BAKHTIN, 2016,
enunciado e a condição do sentido do discurso. p. 91)
Dito de outro modo, todo dizer pressupõe
Adverte-se, entretanto, que essa natureza
outros dizeres, ou seja, qualquer enunciado
dialógica não está relacionada às trocas de
proferido por mim é uma reação-resposta a
palavras entre falantes, mas a uma
outros enunciados anteriores e também incita a
dialogização inerente ao discurso. Assim,
realização de outros enunciados que virão
vemos também que a língua em sua plenitude
posteriormente. As relações dialógicas entre
é concreta, viva (consequentemente, vista
textos são, então, inerentes à linguagem.
como discurso), noção que vai de encontro às
Esse postulado dialógico da linguagem se concepções estritamente formalistas. Deve-se
justifica, pois os indivíduos não conseguem ter esclarecer também que embora este exercício
acesso direto ao mundo, a não ser através de acadêmico se atenha ao dialogismo como
signos construídos pela linguagem. Por sua condição inerente à linguagem verbal, ele não
vez, esses signos são construções semióticas se restringia apenas a ela: as relações
originadas pela relação do meu discurso com dialógicas se fazem presentes na gênese da
outros discursos, ou seja, da interação de pelo existência humana, uma vez que a alteridade
menos dois interlocutores (seres sociais). (interdependência do eu-outro) é condição sine
Afirma Bakhtin (2016, p.54): qua non para nos definirmos como seres
humanos.
É interessante salientar que a atenção dada ao
Nosso discurso, isto é, todos os nossos
enunciado, já vinha sendo desenvolvida por
enunciados (inclusive as obras criadas) é pleno
de palavras dos outros, de um grau vário de Volóchinov (1929/2017) em diversas
alteridade ou de assimilabilidade, de um grau passagens de Marxismo e Filosofia da
vário de aperceptibilidade e de relevância. Linguagem, evidenciando a própria
proximidade teórica dos intelectuais no que
concerne ao conceito de linguagem. Entre tais
Também declara em diversas passagens de passagens, podemos trazer em especial a que
seus escritos que: está localizada no capítulo A interação
discursiva, no qual Volóchinov (2017, p. 221)
afirma que “os enunciados são as unidades
Todo enunciado concreto é um elo na cadeia da
comunicação discursiva de um determinado reais do fluxo da linguagem”, de modo que
campo. [...]. Todo enunciado é pleno de ecos e para “estudar as formas dessa unidade real, não
ressonâncias de outros enunciados com os quais
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Marcuschi (2008) trabalha com o conceito de discursivo, posicionamento que não será aprofundado
gênero textual como intercambiável ao gênero neste artigo.
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intergenericidade. Determinado a representar a escolhas que não podem ser totalmente livres
este fenômeno da linguagem, o autor propôs o nem aleatórias, seja sob o ponto de vista do
léxico, grau de formalidade ou natureza dos
seguinte diagrama, no qual traz como exemplo temas. (MARCUSCHI, 2008, P. 156).
uma publicidade no formato de uma bula de
remédio:
Retomando as postulações bakhtinianas,
Função do gênero A
Marcuschi (2008, p. 159) salienta o papel
preponderante do propósito do gênero e,
publicidade
consequentemente, da esfera de circulação,
no formato isto é, ainda que exista uma forma que pode ser
de uma bula
publicidade de remédio reveladora para a identificação do gênero, ele
Forma do gênero A Forma do gênero B será determinado basicamente por sua função
bula de remédio e não por sua forma. De acordo com o autor,
“[a]s distinções entre um gênero e outro não
são predominantemente linguísticas e sim
Função do gênero B
funcionais.”.
Dito isso, abaixo trazemos um exemplo de
Figura 1: Diagrama – publicidade no formato de uma charge seguido de uma proposta de análise dos
bula de remédio. Fonte: Marcuschi (2008, p. 166). aspectos constitutivos e sociocognitivo deste
Tendo como base as discussões teóricas gênero do discursivo que foi publicado em 20
realizadas, na próxima seção apresentaremos de abril de 2001 no jornal Folha de São Paulo.
uma proposta de análise de uma charge, É interessante reparar como o sentido se
particularmente interessados em verificar constrói, em especial, pela construção híbrida
como o contato entre gêneros atua no conteúdo que foi utilizada.
temático, no estilo e na composição do
enunciado.
CONFIGURAÇÕES HÍBRIDAS DE
GÊNEROS: UM EXEMPLO DE
ANÁLISE DE CHARGE
O estudo dos gêneros (textuais ou
discursivos) inevitavelmente nos leva a pensar
em exemplos do nosso dia a dia, visto ser a
própria linguagem em funcionamento,
articulada às atividades culturais e sociais.
Conforme pudemos notar, os gêneros podem
ser reconhecidos por partilharem
características sociocomunicativas comuns -
construção composicional, estilo, composição
temática e propriedades funcionais - visto que
tais elementos formam a sua estrutura básica Figura 2: Charge “A flora brasiliense”. Fonte: Angeli
específica, que auxilia em sua caracterização. (2001 apud Koch, Bentes e Cavalcante, 2012, p 67).
No entanto, longe de fazer com que se tornem Nesse exemplo, o locutor (chargista Angeli)
estruturas rígidas, tais características tendem a se utiliza tanto da linguagem não verbal,
auxiliar nossa interação discursiva de modo quanto da verbal. A seguir, explicamos melhor
que tais traços criam uma identidade que nos cada uma delas.
condiciona
Quanto à linguagem não verbal, em primeiro
plano, ao centro da imagem, vemos uma
árvore, cujo caule é formado por vários
políticos (chegamos à conclusão de que são
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Textuais & Ensino. Rio de Janeiro: Editora University of Texas Press, 1993. Tradução de
Lucerna, 2003. Carlos Alberto Faraco e Cristovão Tezza.
[4] MARCUSCHI, Luís Antônio. Produção [12] SOBRAL, Adair. Gêneros discursivos,
Textual, análise de gêneros e compreensão. posição enunciativa e dilemas da transposição
São Paulo: Parábola Editorial, 2008. 296 p. didática: novas reflexões. Letras de Hoje,
(Série educação linguística; 2). Porto Alegre, v. 46, n. 1, p. 37-45, jan./mar.
2011.
[5] BAKHTIN, Mikhail. Estética da Criação
Verbal. Tradução Maria Ermantina Galvão
Gomes Pereira. 3ª ed. São Paulo: Martins [13] KOCH, Ingedore G. Villaça. Parâmetros
Fontes, 2000. (Coleção ensino superior). curriculares nacionais, linguística textual e
[6] VOLÓCHINOV, Valentin. Marxismo e ensino de línguas. Revista GELNE, Fortaleza,
Filosofia da Linguagem: problemas v. 4, n.1, p. 1-12, 23 fev. 2016. Disponível em:
fundamentais do método sociológico na
<https://periodicos.ufrn.br/gelne/article/view/
ciência da linguagem. Tradução, notas e 9110/6464> Acesso em 22 de out. 2018.
glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova
Américo. São Paulo: Editora 34, 2017. (1ª
edição). 376 p.
[7] FARACO, Carlos Alberto. Linguagem &
diálogo: as ideias linguísticas do círculo de
Bakhtin. São Paulo: Parábola Editorial, 2009.
168 p.
[8] BAKHTIN, Mikhail. O problema do
conteúdo, do material e da forma na criação
literária. In: Questões de literatura e de
estética: A teoria do romance. Trad. Aurora
Fornoni Bernardini et al. 4. ed. São Paulo:
Unesp/ Hucitec, 1998. p. 13-70.
[9] GRILLO, S. V. C. Épistémologie et genres
du discours dans le cercle de Bakhtine. Linx,
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[10] MEDVIÉDEV, Pável Nikoláievitch. O
método formal nos estudos literários:
introdução crítica a uma poética sociológica.
São Paulo: Contexto, 2012. 269 p.
[11] BAKHTIN, M. M. Para uma filosofia do
ato. Texto completo da edição americana:
Toward a Philosophy of the Act. Austin:
154
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Instituto de Filosofia, Sociologia e Política (IFISP), Universidade Federal de
Pelotas(UFPel),pedrohsdeoliveira27@gmail.com
RESUMO
O discurso hegemônico da modernidade se apresenta como fala universal e neutra, e, em última instância,
como única forma de racionalidade inteligível. Tais pretensões são legitimadas pelo cânone eurocêntrico
ao hierarquizar a produção de conhecimento, situando o Ocidente como referencial. A reivindicação
do universalismo é basilar para a criação dessa narrativa totalizante, supostamente desprovida de locus
geográfico originário, e com isso eclipsa a importância da geopolítica para a constituição de seu sujeito.
Ao ocultar o “ser” e seu contexto, tal perspectiva teórica apresenta seu próprio conceito de modernidade
como objetivo natural, trabalhando o progresso através de uma noção etapista que estabelece a civilização
ocidental como meta, propósito da evolução social.Em sua argumentação meta-teórica o cânone de matriz
liberal legitima a realização de um processo de alinhamento de verdades e conhecimentos locais atrasados
e inerentemente inferiores - com seus supostos valores universais, racionais e modernos. Esse processo
se inicia com o advento da colonização, mas é reproduzido via determinadas dinâmicas até a atualidade.O
presente artigo oferece uma crítica à estrutura internacional de conhecimento eurocêntrica sob uma ótica
latino americana. Realiza-se uma análise sobre suas origens e mecanismos de subordinação. Propõe-se,
assim, uma crítica geolocalizada ao conceito de desenvolvimento, o que, por si só, se estabelece como
prática teórica contra hegemônica.
Palavras-Chave: Teoria Descolonial, Teoria Latino-americana, Desenvolvimento, Geopolítica do
conhecimento, Colonialidade do Poder, do Saber e do Ser.
ABSTRACT
The hegemonic discourse of modernity presents itself as universal and neutral, and, ultimately, as the only
form of intelligible rationality. Such pretensions are legitimized by the Eurocentric canon and hierarchizes
the production of knowledge, wich culminates in the situation of the West as the ultimate referencial. The
claim of universalism is a cardinal creation of this totalizing narrative, that is supposedly devoid of original
geographical locus, and thereby eclipses the importance of geopolitics for the constitution of its subject.
By concealing the "Being" and its context, this theoretical perspective presents its own concept of
modernity as a natural goal, through an etapist notion that establishes Western civilization as the logical
objetive of social evolution.In its meta-theoretical argumentation, the western canon legitimates the
realization of a process of alignment of belated and inherently inferior truths and local knowledge - with
its supposed universal, rational, and modern values. This process begins with the advent of colonization,
but is reproduced through certain dynamics until the very present times.The article offers a critique of the
international structure of Eurocentric knowledge from a Latin American perspective. An analysis is made
of its origins and mechanisms of subordination. Thus, a geo-idealized critique of the concept of
development is proposed, which establishes itself as a theoretical practice against western hegemony.
Keywords: Descolonial Theory, Latin-american Theory, Devolopment, geopolitics of knowledge,
Coloniality of power, do knowledge and Being
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último fosse uma espécie de tubo de ensaio conhecimento europeia, mais precisamente
social. Immanuel Kant (1784), buscou equalizar
“racionalidade” como conceito, através da
Na finalidade de explorar assertivas até então
máxima europeia inaugurada no iluminismo.
destrinchadas, se fará uma abordagem acerca
da estrutura internacional de produção e Pode se recorrer a Foucault (1984) e seu
reprodução de conhecimento. Parte-se do entendimento sobre a justificativa kantiana
pressuposto de que há certa hierarquização tradicional: o autor alemão compreende o
entre diferentes localidades geopolíticas, iluminismo para além de um movimento, mas
imbuída em definir tal dinâmica. Reconhece- como um dever, uma obrigação. A
se o colonialismo como evento determinante modernidade, grande projeto de narrativas
para a formação de binarismos classificatórios universalizantes, é apresentado no cânone
de ordem geográfica, a notar “West and Rest”, ocidental como uma tentativa de superação de
e de ordem social, diferenciando os sujeitos certa “imaturidade” epistemológica, onde a
entre: colonizado vs colonizador; sem alma/ existente relação entre autoridade, razão e
pecaminoso vs salvo; selvagem vs civilizado; desejo é reformulada. Essa tentativa de
primitivo vs moderno; nécio vs racional. maturação se encontra pautada na
racionalidade humana, compreendendo a razão
Assim, a partir de diversos eventos, se forma
um fim em si mesma, e para tal, a relação entre
uma complexa estrutura. Entretanto, as
razão e universalidade se encontram
relações entre sociedades das mais diferentes
intimamente conectados.
trajetórias históricas são padronizadas devido
a imperialidade colonial. Comércio, conquista,
genocídio e escravidão são acontecimentos “O Iluminismo, portanto, não é apenas o
recorrentes na humanidade. Todavia, na processo pelo qual os indivíduos veriam sua
metade do milênio passado era criado um liberdade pessoal de pensamento garantida.
instrumento que justificaria a utilização da [...]os usos universais, livres e públicos da razão
violência indiscriminada: o racismo. Para são sobrepostos uns sobre os outros”
(FOUCAULT, 1984, p. 4-5, tradução nossa).
alguns autores, que serão abordados a diante,
surge esse fator discriminatório, que faz mão
de características fenótipas para se justificar. Em vias de analisar tais perspectivas,
Também serão apercebidas outras Maldonado Torres (2008) argumenta sobre a
diferenciações e hierarquizações, através de importância da busca por raízes no pensamento
variadas correntes teóricas, que servem para a europeu. Em consonância, Walter Mignolo
formação de todo um tecido social. (2002) pontua que, devido à necessidade de se
Nesse esquema, o âmbito do conhecimento situar no centro da história. a civilização
possui um papel fulcral. Ao se classificar as ocidental realiza uma leitura incorreta acerca
sociedades, o poder de fazer-se inteligível fica de sua própria condição, traçando sua origem
retido aos autoproclamados superiores. Dessa histórica da Grécia Antiga ao século XVIII,
forma, infinitas perspectivas cosmológicas, quando, na realidade, a modernidade “remete
engendradas por múltiplas geolocalidades, mais a uma articulação espacial do poder que a
ficam subjugadas a uma única percepção, que uma sucessão linear de acontecimentos”
é, em última instância, fruto de um específico (MIGNOLO, 2002, p.03).
contexto paroquial. Concatenando as obras de Dussel (2002) e
Para compreender tal processo, Mignolo (2002), se demonstra que a origem do
primeiramente é necessário abordar a sistema mundial moderno, de fato, está no
formulação histórica da atual conjuntura século XV, propriamente devido sua
estrutural. Henrique Dussel (2002) situa a vinculação com o capitalismo e a
modernidade como fator constitutivo do papel colonialidade. Dussel (2002) pontua que
“central” da Europa na história mundial, o que anterior à 1492, data de fundação do Sistema
desloca as demais regiões à condição Mundo atual, não havia uma grande narrativa
“periférica”. O autor demonstra que para a que contava a História Mundial, muito pelo
hegemonização de tal narrativa, a produção de
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contrario, era vigente uma coexistência entre os como “racionais”. Tal revelamento
diversos sistemas culturais. demonstra que uma preocupação
epistemológica da manutenção do projeto de
Dessa forma, a relação entre a colonialidade
civilização europeu permeia o cânone
e a modernidade é extremamente íntima, e,
ocidental tradicional (TORRES, 2008).
apesar da colonialidade penetrar todas as
Mesmo os teóricos que o criticam, dificilmente
facetas da modernidade, pouco se aborda a
questionam a importância do espaço
importância na constituição mútua desses
geográfico para a conceitualização da
processos. Para ilustrar tal questão, Mignolo
modernidade.
(2002) utiliza a figura de linguagem da
“sombra”, retratando, a colonialidade como Essa suposta ausência de espacialidade faz
lado não visto, obscuro, da modernidade. com que haja um alinhamento teórico ao
discurso universalista, e até mesmo trabalhos
Este obscurecimento é nomeado por Torres
que analisam a ontologia do pensamento não o
(2008) como Esquecimento da Colonialidade.
rompe completamente tal condição. Para
Fator constitutivo do processo é a super
exemplificar Torres (2008) fala de Lévinas. O
valorização do ocidente sobre si mesmo, que
autor judaico - ao fazer sua crítica a Heidegger
busca naturalizar sua visão de racionalidade.
- nunca disputa a ideia do autor alemão de que
O autor discorre sobre a relação da
a civilização40 teve origem na Grécia, mas
colonialidade com a exaltação das conquistas
busca uma conciliação, na medida que exalta a
teóricas e/ou culturais da Europa, onde as
influência judia no pensamento ocidental.
mesmas se encontram como excepcionais e até
indispensáveis dentro da narrativa vigente. No âmbito da metafisica ocidental,
Heidegger apresenta sua visão ontológica do
Portanto pode-se compreender o
Ser, enquanto Lévinas pontua o Ser como uma
colonialismo não como produto da
existência dialógica. Mignolo (2001) em sua
modernidade, mas a colonialidade como
obra discorre sobre a insuficiência de ambos
elemento constitutivo da mesma (MIGNOLO,
autores, caracterizando a desconstrução da
2002). Enquanto se considera que o
metafísica como algo necessário, porém árduo
colonialismo formal teria acabado nas primeira
devido ao mantenimento oculto da
e segunda ondas de descolonização a
Colonialidade do Ser.
colonialidade se mantém no regime vigente,
ainda que de forma diversa ao seu passado. Em seu trabalho, Torres (2008) disserta sobre
essa aversão epistemológica a rupturas com o
Grande força desse movimento – de
discurso ocidental como um resultado da
esquecimento da colonialidade -- está na
colonialidade do Ser. Para o autor, o “ser” é, na
apresentação universalista de narrativa,
verdade, o Centro, e o “pensamento”, um
ocultando seu locus geográfico originário.
Pensamento Central. Tudo aquilo que desvia
Assim, a ampla disceminação de ideais, que
dessa concepção se torna o ente, ou como
em seu âmago são eurocêntricas, mas se
veremos a seguir, o subdesenvolvido, o
apresentam como neutras, concretiza uma das
periférico. A própria dicotomia inerente dessa
facetas mais importantes da colonialidade.
relação existe porque o “outro” só é
Vital, inclusive, para cementar a concepção da
reconhecido quando o Centro – o sujeito - o
Modernidade (TORRES, 2008).
faz.
Essa argumentação universalista serve um
Durante seu trabalho Torres (2008)
propósito, a tentativa de eliminar qualquer
argumenta que a Colonialidade do Ser sugere
importância da localização geográfica na
que ele contrarie sua própria existência. Ou
constituição do sujeito. A realização de tal
seja, em sua concepção o Ser é compreendido
movimento permite um alinhamento de
como algo opressivo, mas não de maneira
verdades locais com os supostos valores
igualitária, já que a lógica colonial possui uma
universais (MIGNOLO, 2002) naturalizando-
40
Por “civilização” Torres (2008) se refere a produção de
conhecimento filosófico-cientifica.
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Mignolo (2001) rastrea as classificações de regiões do globo é dividido em três partes, relacionando essas miticamente aos três
vigentes até o cristianismo, no período pós cruzadas, quando filhos de nóe.
Jerusalém faz-se referência central para classificar o cristão entre
Ocidentais, de um lado, e Orientais, de outro. E também que o globo
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de outros modos de vida, para tornar seus foi tomada com plena ciência de suas
territórios funcionais às lógicas do capital.” limitações epistemológicas. Por fim, buscou-
(LANG, Apud DILGER, LANG e PEREIRA
FILHO; 2016; p. 28).
se demonstrar a eficiência da teorização
Latino-americana a respeito de sua condição
global, e acredita-se que o experimento
A partir da abordagem teórica aqui delineada, proposto teve exito em sua elaboração e
se percebem as múltiplas contribuições execução.
teóricas produzidas no âmbito da América-
Latina a respeito do conceito de
desenvolvimento. Mesmo assim, limitada é a REFERERÊNCIAS
abordagem à essas, conjuntamente. [1] DUSSEL, Enrique. Europa, modernidade e
Reconhece-se que há uma multiplicidade eurocentrismo. En libro: A colonialidade do
ímpar, o que pode gerar contradições entre as saber: eurocentrismo e ciências sociais.
mesmas. Como por exemplo, a crítica feita por Perspectivas latino-americanas. Edgardo
Grosfoguel (2013) à teoria dependentista, Lander (org). Colección Sur Sur, CLACSO,
notando que nessa continua presente a Ciudad Autónoma de Buenos Aires,
contradição teórica de que a organização Argentina. setembro 2005. p.55-70.
racional no âmbito do Estado-nação era via de
[2] KANT, Immanuel An answer to the
superação para a condição dos países
question: ‘What is Enlightenment?’. (tr.:
perifericos. Ainda que houvesse o consenso de
Mary Gregor). Em: KANT. Practical
que as relações estruturais no sistema mundo
philosophy. (Org. Mary GREGOR).
capitalista eram as principais causadoras de tal
Cambridge: Cambridge U.P.,1996. [1784].
circunstância. Ainda, tais abordagens
subestimam as hierarquias coloniais e raciais [3] FOUCAULT, Michael. What is
na América Latina (GROSFOGUEL, 2013), Enlightenment? In Rabinow(P.) éd. The
não abordando as multifacetadas formas de Foucault Reader. New York. Pantheon Books.
controle que as elites brancas crioulas 1984. p.32-50.
mantiveram, ainda que o controle jurídico e [4] TORRES, Nelson Maldonado. A topologia
militar da metrópole houvesse terminado do Ser e a geopolítica do conhecimento:
formalmente. Modernidade, império e colonialidade. Revista
Conclusão Crítica de Ciências Sociais, [S.l.], n. 80, p. 71-
114, jan. 2008. Disponível em:
O presente artigo demonstrou a elaboração de
<https://journals.openedition.org/rccs/695>.
uma discussão a respeito da entrada do
Acesso em: 31 ago. 2018.
discurso de desenvolvimento sob uma
perspectiva teórica exclusivamente Latino- [5] MIGNOLO, Walter. “Geopolítica del
americana. Para tal, primeiramente, se fez uso conocimiento y diferencia colonial”
da literatura decolonial no intuito de Traducción del articulo Geopolitics of
contextualizar as estruturas regentes do knowledge and colonial difference (The South
conhecimento mundial. Pautado Atlantic Quarterly 101 (2): 57-96, 2002).
principalmente em Torres, Mignolo, Quijano e [6] MIGNOLO, Walter. Introducion. In:
Dussel a primeira seção buscou conceituar a ULISSES, Barrera; MIGNOLO, Walter
colonialidade e todas suas narrativas (Org.). Capitalismo y Geopolitica del
constituintes Na segunda seção foi trazido as Conocimiento: El Eurocentrismo y La
contribuições latino americanas críticas a Filosofia de La Liberacion En El Debate
universalidade, e se fazendo uso desse Intelectual Contemporaneo. 1. ed. [S.l.]:
arcabouço teórico, buscou conceituar e Ediciones Del Signo Ediciones Del Signo,
analisar a entrada do discurso do 2001. cap. 1, p. 9-54. v. 1.
desenvolvimento na agenda latino americana.
Ainda que a arguição pudesse ter sido [7] GROSFOGUEL, Ramón.
amplamente expandida com a contribuição Desenvolvimento, Modernidade e Teoria da
fora do eixo geográfico escolhido, essa decisão
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RESUMO
O artigo apresenta resultados parciais da pesquisa de doutorado em andamento, intitulado “Territórios
e representações sociais em tensão na orla da Laguna dos Patos, Pelotas-RS”, cujo objetivo é
compreender as apropriações, usos e representações sociais que desencadeiam conflitos territoriais
no lugar. O estudo é embasado nas contribuições de Lefebvre (2013) através dos conceitos de espaço
social e da teoria da produção do espaço, nas tríades espaços concebido, percebido e vivido. Cada
uma destas dimensões corresponde a um tipo de espaço, os quais se afetam mutuamente e se traduzem
no método regressivo-progressivo. Para refletir sobre as contradições do espaço foram fundamentais
os conceitos de território, territorialidade, vínculos territoriais e representações sociais no diálogo
com autores como Sack (1986) Haesbaert (2004), Heidrich (2006) e Hall (2016). A orientação teórica
enlaça metodologias qualitativas, com uso de entrevistas semiestruturadas, com os atores sociais
territorializados Guy Di Méo & Buleón (2007). A leitura das entrevistas e dos documentos é apoiada
nas unidades de significação de Michelat (1987). A pesquisa revela que a geografia vivenciada no
Balneário dos Prazeres é de conflitos territoriais, injustiças ambientais, lutas sociais e de
transformação. A natureza nesse balneário está aos poucos deixando de fornecer valores de uso para
ser dominada e fetichizada como mercadoria e valor de troca.
Palavras chave: Teoria espacial, território, representações sociais, Balneário dos Prazeres, atores
sociais
RESUMEN
El artículo presenta resultados parciales de la pesquisa de doctorado en proceso, intitulado
“Territorios y representaciones sociales en tensión en la orla de la Laguna de los Patos”, Pelotas-RS,
cuyo objetivo es comprender las apropiaciones, usos y representaciones sociales que provocan
conflictos territoriales en la localidad. El estudio es basado en contribuciones de Lefebvre (2013) a
través de conceptos de espacio social y de la teoría de producción del espacio, en las tríades espacios
concebido, percibido y vivido. Cada una de estas dimensiones corresponde a uno tipo de esos
espacios, los cuales se afectan mutuamente y se traducen en el método regresivo-progresivo. Para
reflexionar sobre las contradicciones del espacio fueron fundamentales los conceptos de Territorio,
territorialidad, vínculos territoriales y representaciones sociales en el diálogo con autores como Sack
(1986) Haesbaert (1995, 2004), Heidrich (2006) y Hall (2016). La orientación teórica une
metodologías cualitativas, con el uso de entrevistas semiestructuradas, con los actores sociales
territorializados Guy Di Méo & Buleón (2007). La lectura de las entrevistas y de los documentos es
apoyada en las unidades de significación de Michelat (1987). La pesquisa revela que la geografía
vivenciada en el “Balneario de los Placeres” es de conflictos territoriales, injusticias ambientales,
luchas sociales y de transformación. La naturaleza en esta playa está a los pocos dejando de fornecer
valores de uso para ser dominada y fetichizada como mercadoría y valor de cambio.
Keywords: Teoría espacial, territorio, representaciones sociales, Balneario de los Placeres, actores
sociales.
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usos da praia estão se tornando mais “Du rural à l ‘urbain” (1960) e também consta
complexos e renovados em Martins (1996, 2017).
Conforme José de Souza Martins, Lefebvre
frequentados no verão e depois no inverno, de dia ao realizar uma releitura da obra de Marx,
e de noite vestidos ou despidos, com receita retoma o que este usou para dar conta das
médica e prazer, seja qual for o continente a
prática de praia urbana e periurbana faz dela um
sedimentações dos momentos da história
território do lazer, de práticas esportivas, mas humana e descobre que:
também de sociabilidade.
[...] as relações sociais não são uniformes nem
Tal pressão antrópica sobre ambientes tem a mesma idade. Na realidade coexistem
relações sociais que tem datas diferentes e que
bastante frágeis do ponto de vista ambiental, estão, numa relação de descompaço e
requer que as análises ultrapassem as desencontro. Nem todas as relações sociais tem a
metodologias da geografia física e geologia mesma origem. Todas sobrevivem de diferentes
costeira para explicar a complexidade das momentos e circunstâncias históricas
apropriações territoriais efêmeras ou perenes (MARTINS, 1996, p. 9).
que a praia gera. Tarefa, um tanto complexa,
por envolver a força do imaginário dos atores Conforme Martins (1996, p.14) Lefebvre
e suas representações. retoma a coexistência dos tempos históricos da
noção de formação social e econômica de
Método regressivo-progressivo Marx e o “sentido de que nessa coexistência se
Espaço para Lefebvre não é apenas recorte encerram não o passado e o presente, mas
geográfico, mas é também capital, é valor de também o futuro, o possível”.
uso e valor de troca. Para ele, é nesse espaço De acordo com Martins (2017, p. 97) o
que os interesses se chocam e é onde o vivido método regressivo-progressivo é uma técnica
se estabelece cotidianamente, materializado no que busca juntar os fragmentos nas
modo de vida, na sociabilidade, na linguagem. temporalidades da história, dando sentido ao
A concepção de história do espaço em residual. A primeira etapa parte de uma
Lefebvre é uma leitura dialética, por isso, o identificação e descrição da coexistência das
espaço adquire caráter relacional e conecta o relações sociais e elementos conotados e
macro e o micro, pela apropriação do espaço denotados da paisagem, o que Lefebvre
pelo corpo, sendo possível a sua apreensão chamou de complexidade horizontal da vida
pela análise dos momentos do espaço social. Nessa pesquisa o vivido foi aprendido
(concebido, vivido e percebido). Para Lefebvre com o olhar dos conceitos de representações
a práxis é processual e a disputa que nela existe sociais, paisagem, território e lugar. O segundo
induz o despontar de novas lutas, seja no momento – analítico-regressivo, é quando os
cotidiano, seja nos campos de decisão fenômenos são datados, procuramos no
efetivamente dominados pela burguesia. passado os contextos de suas formações: as
Na perspectiva da teoria social do espaço subjetividades, práticas espaciais,
proposta por Lefebvre, o espaço é produzido representações e significações. O terceiro
em cada lugar, pois ela se traduz numa relação momento – regressivo-progressivo, realiza a
entre o espaço vivido, o espaço percebido e o volta fenomênica do passado, trazendo à tona
espaço concebido, podendo ser desvelado pelo temporalidades desencontradas e coexistentes,
método regressivo-progressivo. Tal método revelando o quanto as contradições sociais são
parte de uma teorização sobre o espaço, históricas e não se reduzem a confrontos de
possibilitando a compreensão da construção interesse entre os atores sociais, traz à tona os
histórica das paisagens. O método regressivo- resíduos das práticas sociais e das intervenções
progressivo de Henri Lefebvre (1970) foi políticas do Estado. Nesta etapa o pesquisador
elaborado para a sua tese de doutorado em apreende as modificações desta ou daquela
sociologia rural (1963) onde este estudou a estrutura que foi previamente datada.
realidade social do mundo rural dos Pirineus Do ponto de vista teórico, este método
franceses. O método está explicitado na obra permitiu uma compreensão de como o
desencontro de temporalidades ligadas ao
tradicional e ao moderno concorre para a
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africanas, vindo a ser estigmatizado com somente dois recebem as atenções do pode
diversos termos preconceituosos dentre esses público (CORREIO DO POVO, 31, JUN 1979).
destaco: “praia dos pobres", "dos farofeiros”,
“praia dos negros”, “planeta dos macacos”, A produção do espaço é tanto material como
além de outros estigmas. ideológica, assim de um lado os atores são
Todavia, cabe ressaltar que, os discursos dos associados aos espaços concebidos e de outro,
atores sociais, sobre o espaço Balneário dos aos espaços vividos. Os atores sociais
Prazeres não deriva das próprias coisas, são expressam suas histórias de vida com essa
construções sociais e históricas e como tais, praia, revelam espacialidades em trechos
passiveis de contestações (HALL, 1997). especificos da orla, acontecimentos e
Nos anos 1990 a procura social desta praia se sentimentos exigindo do pesquisador extrair
intensificou e com ela os problemas dos discursos passagens representativas do
decorrentes da inexistência de infraestrutura contexto de sua investigação. Dessa forma, o
foram se agravando. A falta de ordenamento e próximo item apresenta algumas das principais
gestão da praia, levou ao uso indiscriminado ações dos atores sociais territorializados,
do espaço-praia, onde todos se permitiam, apresenta as representações do espaço pelos
moradores, veranistas, afro-religiosos e o atores exógenos e os espaços de representações
poder público ao não agir. Deste fato ou vividos pelos atores endógenos e
resultaram a compactação do solo, corte de transitórios.
galhos da mata, extração de bromélias, queima
das raízes das figueiras centenárias que foram Representações do Espaço: atores exógenos
usadas como churrasqueiras e gruta para velas, - poder público
além do descarte irregular de lixo doméstico, Nos termos de Lefebvre (2013) é o espaço
acúmulo de oferendas religiosas e ocupações dominante numa sociedade capitalista,
permanentes em áreas de Preservação associado ás relações de produção. É o espaço
Ambiental (APPS) algumas em situações de do poder, da ideologia, da mídia, associado ao
risco. Os conflitos decorrem das sobreposições ordenamento conceituado por cientistas
desses usos e da ausência de um setor de planejadores tecnocratas que se impõe e visa
projetos de educação ambiental na Secretaria prescrever formas de usar o espaço. Juntos eles
de Qualidade Ambiental do Município de compõem as representações do espaço. Na
Pelotas, que opera apenas com parcerias presente pesquisa a ênfase é dada na figura do
público-privadas. O poder executivo não Estado representado na instância do poder
aplica nenhum investimento na proteção local, pois, este é o ator exógeno de maior
ambiental, sendo este o vácuo da deterioração influência no espaço pesquisado. O ator
do ambiente costeiro lagunar e dos conflitos exógeno ocupa uma posição distanciada
territoriais. corporalmente e afetiva do lugar de suas ações.
Os moradores começaram a observar os Normalmente possuem um olhar mais frio,
processos de erosão costeira já nos anos 1980 utilitarista e especulativo. Ao gerar políticas,
e conforme a análise da documentação cedida interferirem no território alheio. Esse, muitas
pelos atores sociais endógenos, estes sempre vezes, cooptado pelo capital na intenção de
foram ativos em defesa da praia e matas atender as necessidades dos setores
adjacentes. Foram décadas de reivindicações econômicos, impactam o equilíbrio do
no entanto, o poder público mostrou-se sempre universo cotidiano do local. Em situações que
negligente com o bairro tratando-o como uma envolvem o fechamento do território, como
periferia pobre qualquer da cidade, estratégia de preservação da natureza,
implicam no deslocamento de populações
Seja por preconceito de classe e de cor, seja pela locais (HEIDRICH, 2009).
concentração de pessoas de classe média-alta que No Balneário dos Prazeres o poder público
representa o Santo Antônio e o Valverde, o fato invisibilizou as territorialidades locais ao
é que o poder público local simplesmente não longo do tempo, potencializaram a praia dos
olha para esse balneário de igual forma que os
outros dois. Isso só pode ser descaso, o Laranjal
“ricos” em detrimento da praia dos “pobres”,
como praia é composto pelos três balneários e produzindo espaços residuais (físico e
simbólico). O primeiro tem registro na
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nos tirando daqui que é o que está acontecendo. vulneráveis, a responsabilização dos danos
(Entrevista com Marilene Janes realizada em ambientais e gerando a fragilização de seus
22/06/2016)
vínculos territoriais com o espaço-praia.
Considerações finais
REFERÊNCIAS
De quem são os prazeres da praia do Barro
Duro é um questionamento que fizemos desde [1]Sack, Robert David. Human territoriality:
o início da pesquisa e devemos fazer a todo o its theory and history. Cambridge:
espaço costeiro, quando vemos um cenário Cambridge University, 1986.
político conservador com governos silenciosos
diante dos direitos do acesso à natureza e ao [2]Costa, Rogerio Haesbaert da. O mito da
lazer dos mais pobres e na liberdade ao culto desterritorialização: do "fim dos
religioso dos afro-brasileiros. territórios" à multiterritorialidade. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil, 2004.
As questões que trouxemos neste ensaio
revelam diversas relações residuais que [3]Michelat, G. (1987). Sobre a utilização da
permanecem no subterrâneo da vida social da entrevista não-diretiva. In M. Thiollent (Ed.).
cidade tais como: o preconceito racial e contra Crítica metodológica, investigação social e
o pobre e as perseguições aos afro-religiosos. enquete operária (pp. 191-212). São Paulo:
O modelo de expansão urbana que criou os Polis.
espaços de lazer na praia lagunar foi pautado
na segregação e na desigualdade de acesso a [4]LEFEBVRE, H. La produción del espacio.
infraestrutura urbana e de lazer, Paris: Antrophos, 2013.
comprometendo a reprodução das funções
socioambientais e culturais do Balneário dos [5]SCHMID, Christian. A teoria da produção
Prazeres. Recaindo sobre os grupos do espaço d e Henri Lefebvre: em direção a
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
RESUMO
Este trabalho é o recorte de uma pesquisa realizada entre 2016 e 2018, sobre a coexistência das
Línguas Crioula cabo-verdiana e Portuguesa em uma escola de Ensino Básico em Cabo Verde e tem
por objetivo apresentar e discutir sobre os aspectos metodológicos realizados ao longo da
investigação. Para tanto, apresento e discuto pressupostos da pesquisa qualitativa e pesquisa
documental, problematizando a questão de objeto e fonte de pesquisa, destacando os documentos
coletados na escola investigada em Cabo Verde, sendo eles: cadernos escolares dos alunos dos 1 os e
2os anos do início da escolarização; livros didáticos, documentos digitais e impressos, como
documentos oficiais de Cabo Verde, teses, dissertações, livros, jornais, revistas online, e-books e
livros. Dentre os documentos produzidos, destacamos um diário de campo; 360 fotografias, 560
minutos de filmagem das práticas desenvolvidas em sala de aula e no pátio; 4 entrevistas, individuais,
com as professoras das respectivas turmas observadas e com a gestora da escola. Além desses,
documentos produzidos no Brasil, como a entrevista coletiva realizada com três estudantes cabo-
verdianos da Universidade Federal do Rio Grande – FURG. A abordagem metodológica adotada
nessa pesquisa, permitiu o cruzamento de dados e demonstrou que a língua materna exerce um papel
secundário no ensino da escola observada e que a língua valorizada, oficializada e que possibilita a
alfabetização das crianças é a Língua Portuguesa.
Palavras chave: Metodologia, Fontes de investigação, Cabo Verde, Línguas materna e oficial.
RESUMEN
Este trabajo es el recorte de una investigación realizada entre 2016 y 2018, sobre la coexistencia de
las lenguas criolla cabo-verdiana y portuguesa en una escuela de educación básica en Cabo Verde.
Tiene por objetivo presentar y discutir los aspectos metodológicos desarrollados a lo largo de la
misma. Para eso presento y discuto los presupuestos de la investigación cualitativa y de la
investigación documental, problematizando la cuestión de los objetivos y las fuentes. Destacamos los
documentos recolectados en la escuela estudiada, como cuadernos de clase de alumnos en el 1° y 2°
año de escolarización; libros didácticos; documentos digitales e impresos; textos oficiales; teses de
maestría y doctorado; libros y publicaciones periódicas físicas y virtuales. Entre los documentos
producidos destacamos un diario de campo con 360 fotografías; 560 minutos de filmación de las
prácticas pedagógicas en los salones de clase y el patio de recreo; 4 entrevistas individuales con
maestras de los grupos observados y con la directora de la institución. Además de otros documentos
producidos en Brasil como una entrevista colectiva realizada con tres estudiantes originarios de Cabo
Verde y alumnos de la Universidade Federal do Rio Grande – FURG. El abordaje metodológico
adoptado en este trabajo, permite el entrecruzamiento de datos y demostró que la lengua materna,
criolla cabo-verdiana, ejerce un papel secundario en la escuela y que la única lengua valorada es el
portugués, idioma oficial del país y único utilizado para alfabetizar a los alumnos.
Palabras clave: metodología, fuentes de investigación, Cabo Verde, lengua materna, lengua oficial.
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BRASIL
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
Pelo ponto de vista adotado, a pesquisa caderno de anotações, o qual, após o término
documental é apropriada para a abordagem de cada observação, era revisto para que
metodológica desta investigação. Godoy pudesse suscitar reflexões sobre as questões
(1995) destaca que os documentos podem ser registradas, constituindo-se, assim, em um
definidos como de ordem primária, com a diário de campo. Em relação ao registro, Guber
produção realizada pelo sujeito que participou (2014) destaca que:
do evento investigado e secundária, quando
coletado ou produzido por pessoa que não [...] Es una especie de cristalización de la
vivenciou o evento estudado. Bogdan e Biklen relación vista desde el ángulo de quien hace las
anotaciones o fija el teleobjetivo de la cámara.
(1994) acrescentam que: Pero este ángulo no es equiparable a ‘la realidad
registrada’, en primer lugar porque un registro no
Os dados são simultaneamente as provas e as puede dar cuenta de todo sino que implica un
pistas. Coligidos cuidadosamente, servem como recorte de lo que el investigador supone relevante
factos inegáveis que protegem a escrita que possa y significativo. Los criterios de significatividad y
ser feita de uma especulação não fundamentada. relevancia, a su vez, responden al grado de
Os dados ligam-nos ao mundo empírico e, apertura de la mirada del investigador en esa
quando sistemática e rigorosamente recolhidos, etapa de su trabajo de campo (GUBER, 2014, p.
ligam a investigação qualitativa a outras formas 94).
de ciência. Os dados incluem os elementos
necessários para pensar de forma adequada e Nesse sentido, é preciso que o investigador
profunda acerca dos aspectos da vida que
pretendemos explorar (BOGDAN e BIKLEN
tenha cautela ao produzir os dados, sejam eles
(1994, p. 149). por meio do diário ou caderno de campo,
câmeras fotográficas ou vídeos, pois a análise
feita a partir dessas ferramentas são
Pautada pelo que foi exposto acima, justifico interpretações realizadas pela ótica do próprio
a utilização das diferentes fontes de pesquisa, pesquisador. Foi pensando nisso que o caderno
por ampliarem a possibilidade de dados e utilizado durante as observações era limitado a
assim qualificarem a análise. Sobre isso, anotações e, após o término do dia observado,
Bogdan e Biklen (1994, p. 149) afirmam que era revisto e complementado por minhas
“Embora discutamos diferentes tipos de dados interpretações e reflexões referentes às práticas
separadamente, é importante salientar que eles consideradas relevantes na pesquisa. Em
raramente se encontram isolados na pesquisa”, relação às fotografias, Bogdan e Biklen (1994,
fator determinante no modo como a análise se p. 183) ressaltam que:
configura. A seguir, apresento e discuto a
produção dos dados e a forma como foram Alguns defendem que a fotografia é quase inútil
operados. como um meio de conhecimento objetivo [...].
Outros contrapõe com a noção de que
Produção e levantamento dos dados representam um significativo avanço na
pesquisa, dado que permite que os investigadores
Na escola observada foi coletada e produzida compreendam e estudem aspectos da vida que
a maior parte dos dados para a análise. não podem ser investigados através de outras
Primeiramente, fui apresentada aos abordagens.
profissionais da escola; depois, iniciei as
observações, que foram realizadas no período Para esta pesquisa, as fotografias, quando
de 11 a 31 de março de 2015 em duas turmas associadas a outras fontes de investigação,
de 1º ano e uma turma de 2º ano. Foram possibilitaram a percepção de alguns dados e,
quatorze dias de observações, realizadas até mesmo, a legitimação de outros, tornando
conforme a disponibilidade das professoras. possível lembrar detalhes, descrever lugares
Ao todo, foram observadas sete aulas na turma que, às vezes, somente por meio da observação
de 1º ano da professora (A), quatro aulas na não eram percebidos. Foram produzidas 360
turma de 1º ano da professora (B) e três aulas imagens durante o período de observação na
na turma de 2º ano da professora (C). escola investigada, que registraram momentos
no pátio, no recreio, as conversas entre as
No decorrer das observações, foi possível crianças, os cartazes dispostos pelas salas, os
fazer alguns apontamentos descritivos em um diferentes espaços físicos da escola e as
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certos conjuntos de dados como sendo de valor mapeamento foi realizado por meio de
duvidoso e quando os manter. BOGDAN e quadros, conforme o número de livros
BIKLEN (1994, p. 200)
analisados, ou seja, um quadro para o livro de
Língua Portuguesa do 1º ano e um quadro para
Nesse sentido, compreendendo a relevância o livro de Língua Portuguesa do 2º ano, tendo
dos dados coletados e produzidos, realizei o em vista que somente esses foram utilizados
mapeamento dos mesmos, levando em como fonte de pesquisa. Os referidos quadros
consideração a afirmação destacada acima por identificam o número de atividades em língua
Bogdan e Biklen (1994) no que se refere tanto portuguesa e em língua crioula cabo-verdiana,
ao seu potencial quanto a sua irrelevância para individualmente e de forma articulada.
a pesquisa. Por isso, um número menor de
Da mesma forma procedi com os cadernos
livros didáticos foi utilizado como fonte de
escolares; atribuí, contudo, fichas digitalizadas
pesquisa: no conjunto de seis livros, analisei
que possibilitaram observar, quantificar e
somente os dois livros de língua portuguesa.
interpretar os dados contidos nos cadernos,
Para realizar o levantamento dos dados, além de permitir criar grupos de atividades
refleti sobre a melhor forma de organizá-los, já com objetivos em comuns. Em se tratando das
que os mesmos não estão prontos, fotos produzidas no contexto da escola,
necessitando serem observados e organizados também foram mapeadas e observadas, e as
para produzir sentido. Então, o primeiro imagens passíveis de observação, introduzidas
movimento que realizei foi de reaproximação na interpretação dos dados e análise, conforme
dos documentos que possuo. Dessa forma, já anunciado.
ouvi e transcrevi as entrevistas, observei os
No diário de campo foram destacadas as
vídeos e as fotos, reli o diário de campo e
reflexões consideradas pertinentes à discussão.
percebi a necessidade de organizar o material,
Cabe destacar que, caso encontrasse, nos
pois, segundo Bogdan e Biklen (1994, p. 232):
materiais para análise, questões que não
Deve-se organizá-los de modo a ser capaz de ler
fossem específicas sobre a língua crioula cabo-
e recuperar os dados à medida a que se apercebe verdiana e a língua portuguesa, mas que
do seu potencial de informação e do que pretende estivessem ligadas a elas, as mesmas também
escrever. As técnicas de trabalhar seriam contempladas na discussão.
mecanicamente com os dados são inestimáveis
porque dão uma direção aos seus esforços [...] e, Nesse sentido, a organização das fontes da
por isso, tornam manejável algo de pesquisa buscou facilitar o levantamento dos
potencialmente complexo. Ter um esquema é dados que foram interpretados com base nos
crucial; não importa o esquema particular que
objetivos da investigação, a fim de responder a
escolher.
questão de pesquisa. Entretanto, não
desconsiderei a possibilidade do cruzamento
Considerando a quantidade de dados de que de fontes, uma vez que as compreendo como
disponho, optei por ordená-los de acordo com contributos para a veracidade da pesquisa.
as técnicas de recolha, ou seja, com os
materiais digitalizados criei pastas específicas Destaco que, para responder a questão da
para cada um (dois cadernos, fotos, vídeos) e pesquisa, optei por não defender um único
posteriormente descrevi aspectos que julguei ponto de vista, mas compreendê-los para
relevantes de cada um desses materiais. O mostrar que eventos podem ser interpretados a
mesmo procedimento foi utilizado para as partir de diferentes perspectivas. Sendo assim,
entrevistas (transcritas) e para os materiais para analisar os dados, organizei as fontes,
bibliográficos, como teses, dissertações, interpretadas com base nos objetivos
documentos oficiais e artigos de jornais e específicos da pesquisa, pois permitiram
revistas online. selecionar as fontes adequadas para responder
cada objetivo. Além disso, utilizei as diferentes
Em relação aos livros didáticos, digitalizei as fontes anunciadas anteriormente de forma
imagens relevantes à pesquisa e mapeei o concomitante, ou seja, minha opção foi pensar
número de atividades relacionadas à língua que o entrecruzamento das diferentes fontes
crioula cabo-verdiana e à língua portuguesa. O potencializa a análise e a compreensão dos
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
a
Programa de Pós-Graduação em Educação Ambiental,Universidade Federal do Rio Grande - FURG,
lory.lorenasantos@gmail.com
b
Instituto de Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação Ambiental e Programa de Pós-Graduação
Educação em Ciências, Universidade Federal do Rio Grande - FURG, paula.c.henning@gmail.com
RESUMO
Este trabalho tem o objetivo de apresentar caminhos metodológicos e teóricos factíveis para se pensar
a formação discursiva da Educação Ambiental. Ampara-se nas ferramentas analíticas de
problematização, documentos vistos como monumentos e suposição de que os universais não
existem, presentes nos estudos de Michel Foucault. Utiliza como material empírico trinta e nove
produções científicas publicadas, entre os anos de 2003 a 2015, nos anais do Grupo de Trabalho
22/GT 22 da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação/ANPEd, e dedicadas
aos fundamentos filosóficos e epistemológicos da Educação Ambiental. Essas produções científicas
dividem-se nas duas perspectivas teóricas quantitativamente mais recorrentes entre os trabalhos
selecionados: vinte e seis críticas e treze pós-críticas. A aposta está em um pensamento
problematizador das verdades legítimas e necessárias à construção de uma formação discursiva que
se potencializa na diferença filosófica e epistemológica. Este olhar analítico posiciona-se na
contramão da negação ou exaltação de qualquer uma das perspectivas teóricas, permeando a
produtividade do encontro e dos múltiplos pensamentos que se distanciam conceitualmente
vislumbrando o mesmo desejo de pensar outras Educações Ambientais possíveis.
Palavras chave: Educação Ambiental; Problematização; Diferença; Michel Foucault.
RESUMEN
Este trabajo tiene el objetivo de presentar caminos metodológicos y teóricos factibles para pensar la
formación discursiva de la Educación Ambiental. Se ampara en las herramientas analíticas de
problematización, documentos vistos como monumentos y suposición de que los universales no
existen, presentes en los estudios de Michel Foucault. Utiliza como material empírico treinta y nueve
producciones científicas publicadas entre los años 2003 a 2015 en los anales del Grupo de Trabajo
22 / GT 22 de la Asociación Nacional de Postgrado e Investigación en Educación / ANPEd, y
dedicadas a los fundamentos filosóficos y epistemológicos de la Educación Ambiental. Estas
producciones científicas se dividen en las dos perspectivas teóricas cuantitativamente más recurrentes
entre los trabajos seleccionados: veinticuatro críticas y trece post-críticas. La apuesta está en un
pensamiento problematizador de las verdades legítimas y necesarias para la construcción de una
formación discursiva que se potencia en la diferencia filosófica y epistemológica. Esta mirada
analítica se posiciona en contra de la negación o exaltación de cualquiera de las perspectivas teóricas,
permeando la productividad del encuentro y de los múltiples pensamientos que se distancian
conceptualmente vislumbrando el mismo deseo de pensar otras Educaciones Ambientales posibles.
Palabras clave: Educación Ambiental; Cuestionamiento; Diferencia; Michel Foucault.
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imposições do mesmo; um pensamento que não As produções científicas que se embasam nas
obedece ao sistema escolar (que truque a resposta perspectivas pós-críticas apresentam um outro
pronta), mas que se dedica a insolúveis
problemas: ou seja, a uma multiplicidade de
viés de análise aos fundamentos filosóficos e
pontos notáveis que se desloca à medida que se epistemológicos do campo de saber da
distinguem as suas condições e que insiste, Educação Ambiental. Os conceitos se chocam
subsiste em um jogo de repetições entre as duas perspectivas educacionais
[FOUCAULT, 2013, p. 256] [Acréscimo do produzindo defasagens que fabricam
autor]
diferentes olhares para esse campo. No clivo
de teorias não lidamos com uma competição,
O que nos propomos foi sobretudo pensar lutamos por uma mesma concepção, a
sobre o que é dito entre educadores e politização da Educação Ambiental.
pesquisadores ambientais, dentro das reuniões O que ambas as perspectivas procuram é
científicas da ANPEd, que se filiam a correntes colocar em evidência a complexidade que
teóricas recorrentes no campo de saber da constitui a Educação Ambiental, alertando
Educação Ambiental. Partimos do para a despolitização desse campo de saber em
entendimento de que os diferentes conjuntos mudanças de condutas que não cedem espaço
de enunciações dão conta de fabricar, de ao pensamento. Unicamente prescrevem o que
maneira diversa discursos que não tem, fazer e como fazer para manter um meio
estritamente, por obrigatoriedade abrigar ambiente saudável. Ignorar tais prescrições,
apenas um único olhar, mas também visões que ditam comportamentos corretos para uma
diversas, disparatadas e dispersas. vida sustentável, não é a questão que
Abordar o conceito de diferença, ancora-se desacomoda a ambas teorizações, mas sim a
na vontade de mostrar que o trabalho realizado preocupação em mostrar que no cerne das
não buscou criar taxionomias que se dirijam a atitudes sustentáveis precisamos nos entender
negação de uma teoria, para a exaltação de como sujeitos desse meio ambiente, nem
outra, tampouco procura achar laços de destruidores, nem salvadores, mas parte
igualdade que universalizem o campo de saber integrante de um sistema de relações sociais,
da Educação Ambiental. Partimos do culturais, históricas, ecológicas e ambientais
entendimento de que: que não se findam.
Adentramos em uma problemática de cunho
[...] a descrição do nível enunciativo não epistemológico e filosófico que distinguem os
pode ser feita nem por uma análise enunciados de uma mesma formação
formal, nem por uma investigação discursiva, lidamos como três eixos
semântica, nem por uma verificação, mas discursivos mais recorrentes em cada
pela análise das relações entre o abordagem teórica. Nos trabalhos que
enunciado e os espaços de diferenciação,
em que ele mesmo faz aparecer as assumem embasarem-se em perspectivas
diferenças [FOUCAULT, 2015, p.111]. críticas, são acionados os conceitos de
interdisciplinaridade, emancipação e
transformação, e em perspectivas pós-críticas,
Diante disso, trata-se de fazer aparecer os discurso, poder e resistência. É partir desses
espaços de diferenças entre as perspectivas eixos enunciativos que realizamos nossas
críticas e pós-críticas que procuram pensar análises. Primeiramente trataremos de mostrar
sobre um mesmo objeto de estudo. Por meio de a potência de cada um desses conceitos nos
estratégias de análises, conceitos e discussões trabalhos selecionados.
vimos sendo produzido modos distintos de A aproximação das condições
compreender o campo de saber da Educação interdisciplinares e transdisciplinares da
Ambiental. Educação Ambiental são expostas nas
pesquisas científicas como parte eminente de
um projeto político e educacional, pautado na
As perspectivas críticas e pós-críticas no GT
fomentação da aproximação de diferentes
22 da ANPEd
áreas do conhecimento científico com saberes
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educacionais [DELUIZ & NOVICKI, 2004, p. que dão corpo ao que tem se entendido por
12]. [Acréscimo dos autores] [Grifo nosso] Educação Ambiental nas linhas teóricas
críticas.
A coexistência de posições heterogêneas no
Distinguimos a Educação Ambiental como
crítica preenchendo-a de sentido político;
campo da Educação Ambiental é um caminho
como uma ação política de transformação das possível para que esse campo de saber se
relações dos homens entre si e deles com o fortaleça, enquanto contestador e
ambiente, no sentido histórico. Para subsidiar problematizador das formas de nos
este tipo de prática acreditamos na contribuição relacionarmos conosco, com os outros e com o
do referencial baseado na Teoria Crítica, com
forte influência teórico-prática no pensamento meio ambiente. As problematizações políticas
marxista; ou seja, no materialismo histórico que são acionadas em diferentes trabalhos do
dialético. O método dialético busca a construção GT 22, com diferentes modos de olhar os
de uma visão integradora de ciência e filosofia, problemas ambientais, as relações humano-
informando uma atuação transformadora das natureza me parecem extremamente
relações sociais [OLIVEIRA, 2011, p.5]. [Grifo
nosso] necessárias para potencializar o campo e
subverter os modos enfraquecidos com que a
Educação Ambiental é hoje posicionada em
Os excertos demonstram que a ideia de diferentes políticas públicas, sejam nacionais
transformação dos meios de produção foi ou internacionais. É pensado na potencialidade
sendo articulada a outras transformações, tais criativa do diferente que passamos a apresentar
como: Transformação das relações entre ser as estratégias analíticas e conceituais dos três
humano e natureza, das desigualdades sociais, eixos enunciativos mais recorrentes - discurso,
da crise ambiental, da abordagem poder e resistência - entre os trabalhos
epistemológica, filosófica e pedagógica da fundamentados em perspectivas pós-críticas.
educação, assim como, dos valores éticos e As pesquisas se debruçam sobre o conceito
morais. Transformações essas, igualmente de discurso embasado no pensamento
vistas como necessárias a uma Educação foucaultiano, recusando a busca pela
Ambiental crítica. Tudo isso, sem veracidade obscurecida pelo discurso. O
desconsiderar a indispensabilidade de discurso é analisado naquilo que está dito,
transformar o sistema econômico. detém-se ao nível da existência das palavras
Essa articulação não supõe que as compreendendo que não há uma correlação
enunciações referentes à transformação direta entre as palavras e as coisas. Michel
tenham perdido seu valor, aliás, justo o Foucault [2015, p. 59] afirma que com a
contrário! Como nos ensinou Foucault [2015], Análise do discurso:
as formações discursivas não são estanques, ou
seja, estão em conformidade com outros
[...] gostaria de mostrar que os "discursos", tais
sistemas de formação que exigem a presença como podemos ouvi-los, tais como podemos lê-
de outros enunciados para dar conta de novas los sob a forma de texto, não são, como se
problemáticas que vêm sendo aderidas ao poderia esperar, um puro e simples
campo de saber da Educação Ambiental. entrecruzamento de coisas e de palavras: trama
obscura das coisas, cadeia manifesta, visível e
De um modo geral, entre os três eixos de colorida das palavras; gostaria de mostrar que o
análise - interdisciplinaridade, emancipação e discurso não é uma estreita superfície de contato,
transformação - há uma confluência ou de confronto, entre uma realidade e uma
língua, o intrincamento entre um léxico e uma
enunciativa em diferentes temas dos trabalhos experiência; gostaria de mostrar, por meio de
selecionados, quais sejam: institucionalização exemplos precisos, que, analisando os próprios
escolar, risco ambiental, aproximações com discursos, vemos se desfazerem os laços
Paulo Freire, alfabetização de jovens e adultos aparentemente tão fortes entre as palavras e as
em uma cooperativa de resíduos sólidos, coisas, e destacar-se um conjunto de regras,
próprias da prática discursiva.
filmes, práxis pedagógica, natureza, mudanças
climáticas. Tais temas são tomados como
escopo dos estudos, trazendo conceituações
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
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Para o bem ou para o mal, tais discursos Nos trabalhos mapeados, as relações de poder
reverberam cotidianamente na mídia e em outros
espaços em que a vida se coloca como questão são entendidas como fundamentais na
central para continuidade do futuro do planeta. fabricação dos ditos ambientais, na seleção dos
Com isso, a Educação Ambiental toma força e saberes, na produção da necessidade de
vem se constituindo num campo de visibilidades educar-se ambientalmente. A legitimidade
diante da preocupante devastação do meio científica torna-se uma condição importante
ambiente. [...] O que queremos colocar em
evidência, no entanto, são os discursos da para alertar sobre os reveses que ocorrem no
periculosidade e a política do medo que meio ambiente e afetam a todos os seres vivos
muitas vezes a mídia ajuda a propagar, que habitam esse Planeta. No excerto do
intensificando uma atitude individualista, corpus empírico abaixo é possível perceber a
tanto de culpabilização pelo problema (Você é potência das relações de poder na emergência
o culpado!), quanto de redenção solitária
frente à crise (Salve sua própria pele enquanto da Educação Ambiental.
há tempo!) [RATTO & HENNING, 2012, p. 6].
[Grifo nosso] [Acréscimo dos autores]
O dispositivo da EA ganha suas condições de
existência a partir do momento em que é
O que os autores colocam em questão no preciso criar todo um conjunto de regras, de
excerto acima não é a materialidade da qual o normas, de saberes e de práticas que possam
discurso se debruça. A ênfase está na forma ser gerenciadas e controladas. Surgem, por
com que a crise ambiental é produzida na consequência, vários movimentos nas décadas de
mídia, acionando práticas individualistas 70, que irão desencadear na necessidade de uma
perante as questões ambientais. A produção do regulamentação da EA. Entretanto, sua potência
discurso que reafirma o perigo eminente das se dá um pouco mais tarde, nas décadas seguintes
catástrofes ambientais e do próprio fim do [GARRÉ & HENNING, 2015, p.12]. [Grifo
Planeta são muito mais do que conjunto de nosso]
palavras, são saberes legitimados para
evidenciar a indispensabilidade de mudança Para além do julgamento do bem e do mal, as
em nosso comportamento. relações de poder são vistas também por sua
O foco dos trabalhos, que se amparam na positividade, produzem saberes, verdades e
noção foucaultiana de discurso, é mapear, nossa vida em sociedade. Sua fluidez está em
compreender e discutir as formas com que vão todo o tecido social, nossa liberdade está
sendo fabricados modos de entender nossa atrelada às relações de poder. “Isso significa
relação com o meio ambiente, seus que, nas relações de poder, há necessariamente
desdobramentos, na constituição de saberes possibilidade de resistência, pois se não
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RESUMO
O presente artigo faz parte de uma pesquisa mais ampla e em andamento que pretende compreender
os discursos elaborados e veiculados nas páginas do Correio da Manhã (RJ) entre os anos de 1955 e
1958. Aqui utilizaremos como tema das notícias a realidade política da Argentina entre Junho de 1955
e Setembro de 1955; entre estes meses ocorre uma série de enfrentamentos e tentativas de golpe de
Estado na Argentina governada pelo presidente Juan Domingo Perón. Em 16 de Setembro de 1955
as forças da Marinha, Aeronáutica e boa parte das lideranças do Exército conseguem, com auxílio de
grupos civis, destituir o presidente e Instaurar a autodenominada Revolução Libertadora, que
governará o país até as eleições de 1958. No Brasil o período compreende as disputas pré-campanha
eleitoral, o debate sobre Cédula Oficial para as eleições, a carta Brandi, entre outros debates. Este
artigo procura evidenciar, através de uma abordagem teórica interdisciplinar, como os acontecimentos
na Argentina foram elaborados como "acontecimentos" noticiáveis por parte da Imprensa, bem como
a forma que estas representações estão inseridas em uma discussão nacional sobre democracia,
legalidade e verdade. Para isso, utilizamos alguns apontamentos da Análise do Discuso proposta por
Patrick Charaudeau (2009, 2016a, 2016b), como também recorremos aos conceitos de representação,
habitus linguístico e mercado linguístico - ajustados pelas disputas pelo poder simbólico - propostos
por Pierre Bourdieu (1989, 2003).
Palavras chave: Imprensa, Discurso, Argentina
RESUMEN
El presente artículo está relacionado a una investigación más amplia y en marcha que pretende
comprender los discursos elaborados y vehiculados en las páginas del Correio da Manhã (RJ) entre
los años 1955 y 1958. Aquí utilizaremos como temática la realidad política de Argentina entre junio
de 1955 y septiembre de 1955; entre estos meses se produce una serie de enfrentamientos e intentos
de golpe de Estado en la Argentina gobernada por el presidente Juan Domingo Perón. En el 16 de
septiembre de 1955 las fuerzas de la Marina, Aeronáutica y buena parte de los liderazgos del Ejército
logran, con ayuda de grupos civiles, destituir al presidente e instaurar la autodenominada Revolución
Libertadora, que gobernará el país hasta las elecciones de mayo de 1958. En Brasil, el período
comprende las disputas pre-campaña electoral para presidente, el debate acerca la Cédula Oficial para
las elecciones, la carta Brandi, entre otros debates. Este artículo busca evidenciar, tras un enfoque
teórico multidisciplinario, las maneras que estos acontecimientos en Argentina se hacen elaboraron
como "acontecimientos" noticiables por parte de la prensa brasileña, así como la forma en que estas
representaciones están insertadas en una discusión nacional sobre democracia, legalidad y verdad.
Para ello, utilizamos algunos apuntes del Análisis del Discurso propuesto por Patrick Charaudeau
(2009, 2016a, 2016b), como también recurrimos a los conceptos de representación, habitus lingüístico
y mercado lingüístico - ajustados por las disputas del poder simbólico -, proposiciones de Pierre
Bourdieu (1989, 2003).
Palabras clave: Prensa, Discurso, Argentina
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veiculadas as primeiras notícias a respeito do permitirá que os governos não façam da aventura
possível envolvimento entre Jango e um de governar uma desarvorada viagem.
(CORREIO DA MANHÃ, 18/09/1955; p. 6)
deputado peronista em 1953, sempre com tom
de incerteza e imprecisão. Embora o Correio Nos deparamos com uma ambiguidade: se
da Manhã sempre tenha manifestado oposição por um lado o Correio defende o cumprimento
a candidatura de Jango, bem como salientado da legalidade, repudia qualquer forma de golpe
os riscos de sua nomeação para qualquer naquelas eleições, por que se posiciona de
ministério, encontramos no cruzamento dos forma explícita e implícita – na seleção das
editoriais do dia 22 e 25, talvez, a justificativa palavras e matérias das agências internacionais
para diminuta cobertura do “escândalo”. Se no – pela legitimidade do golpe na Argentina?
dia 22 o Correio ressalta a mudança estratégica Obviamente, o Correio estava atento as
de Jango ao utilizar o perfil de vítima como fragilidades e contradições do governo
trampolim para sua eleição, solicitando que o provisório instalado no dia 21 de setembro na
candidato da UDN a vice-presidência, Milton Argentina, quando critica o recuo do
Campos, não utiliza-se dessa estratégia para presidente Eduardo Lonardi na devolução do
atacar o candidato do PTB, o editorial do dia jornal La Prensa ao seu antigo dono – jornal
25 salienta o caráter golpista do escândalo: apreendido pelo governo peronista e entregue
Nessa matéria ninguém nos tira uma prioridade
à CGT (cf. CORREIO DA MANHÃ,
valorizada pelo fato de havermos denunciado à 28/09/1955). Como dito anteriormente, tanto
nação o peronismo janguista quando se achava os golpistas argentinos como os legalistas
no poder, como superministro, o sr. João Goulart brasileiros estavam posicionados por
e era presidente da república um homem dócil às concepções de democracia, por relações
suas aspirações políticas. O til da questão, para
nós, está na circunstância em que foi apresentada
econômicas e sociais pelas quais se colocavam
a carta à nação, com um indisfarçável intuito de como representantes e guardiões – por
transformá-la em novo obstáculo à realização das exemplo, o jornalismo como porta-voz do
eleições em 3 de outubro. (CORREIO DA povo, defensor da verdade e liberdade – que
MANHÃ, 25/09/1955; p. 6) configuram-se através de uma disputa pela
representação do real, a partir de significações
Como dissemos, ao longo da campanha
do passado e do presente, que estruturam um
eleitoral de 1955, o Correio não manifestou-se
complexo quadro de interesses, repúdios,
pelo apoio a candidatura de Juscelino, embora
agentes permeados por discursos e relações de
diversas vezes destaca-se seu perfil
poder. Para a intenção deste artigo e o objeto
desenvolvimentista, contrabalanceando
que ele procura problematizar, basta
insinuações de apoio comunista e de “velha
afirmarmos que: a impossibilidade de serem os
política” diante da votação da Cédula Oficial.
jornais e jornalistas veículos da verdade está
Porém, o jornal carioca sempre salientou seu
menos na fragilidade deste conceito - no
dever de defender a legalidade e a posse dos
processo ignorado de seleção, posicionamento
eleitos, condenando veementemente o
no momento da interpretação, na transposição
golpismo de Lacerda, e de qualquer candidato
de um enunciado sem perda ou alteração de seu
que de alguma forma acionasse essa fórmula,
sentido para outro idioma ou sistema
como foi o caso de Joares Távora. Um exemplo
linguístico – do que na estrutura interna dessas
desse comprometimento é sua consideração
empresas jornalísticas, diretamente associadas
sobre o aniversário da constituição brasileira
a problemática de representação e significação
de 1946 em que o Correio salienta que
do mundo, mas que descreve relações de poder
Sem dúvida nenhuma, todos os países, e não específicas, interesses econômicos cada vez
apenas o Brasil, conhecem as incertezas dos mais determinantes, estratégias para a
próximos anos. Isto, no entanto, longe de ascensão política ou criação de um estado das
aconselhar medidas extremas de força ou relações sociais e econômicas que atenda a sua
regimes de emergência, nos quais o governo
arrebata e centraliza todos os poderes, serve de
concepção/naturalização do mundo. Do ponto
advertência em sentido contrário: é preciso saber de vista das práticas jornalísticas que
preservar os princípios em que acreditamos, em coordenam a escrita do jornal do período,
que o povo acredita. E somente esta força moral democracia e liberdade são conceitos
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
RESUMO
O artigo tem por objetivo refletir sobre a utilização da análise de conteúdo em pesquisas de caráter
interdisciplinar que tenham materiais cinematográficos como objeto de estudo. Embora
tradicionalmente concebida para análise quantitativa de materiais textuais, a análise de conteúdo pode
ser também aplicada a imagens e sons, bem como trabalhada em sua vertente qualitativa. Assim
sendo, o texto toma como referência ilustrativa os resultados da pesquisa de mestrado, realizada no
âmbito do Programa de Pós-Graduação em Jornalismo (PPGJOR), da Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC), na qual a análise de conteúdo foi utilizada em sua abordagem qualitativa para
analisar a representação do jornalismo no cinema hollywoodiano do século XX, com vistas a
aprofundar a reflexão sobre as contribuições do método na compreensão da narrativa fílmica, tanto
em suas dimensões técnica e simbólica, quanto em associação direta com eixos teóricos previamente
selecionados. Compreendendo que a função cultural desempenhada pelo cinema, por meio de suas
narrativas, vai além da fruição, perpassando, sobretudo, contextos socioculturais, o artigo busca
destacar as potencialidades do método para análise dos filmes, seus enredos e personagens, no âmbito
de percursos com os quais o cinema dialogue e componha interfaces.
Palavras-Chave: Análise de conteúdo; cinema; pesquisa interdisciplinar; abordagem qualitativa;
jornalismo.
RESUMEN
El artículo tiene por objetivo reflexionar sobre la utilización del análisis de contenido en
investigaciones de carácter interdisciplinar que tengan materiales cinematográficos como objeto de
estudio. Aunque tradicionalmente concebido para el análisis cuantitativo de materiales textuales, el
análisis de contenido puede aplicarse también a imágenes y sonidos, así como trabajado en su aspecto
cualitativo. En este sentido, el texto toma como referencia ilustrativa los resultados de la investigación
de maestría, realizada en el ámbito del Programa de Postgrado en Periodismo (PPGJOR), de la
Universidad Federal de Santa Catarina (UFSC), en la cual el análisis de contenido fue utilizado en su
enfoque cualitativo para analizar la representación del periodismo en el cine hollywoodiano del siglo
XX, objetivando profundizar la reflexión sobre las contribuciones del método en la comprensión de
la narrativa fílmica, tanto en sus dimensiones técnica y simbólica, como en asociación directa con
ejes teóricos previamente seleccionados. El artículo busca destacar las potencialidades del método
para el análisis de las películas, sus enredos y personajes, en el ámbito de recorridos con los cuales el
cine mantenga diálogos y componga interfaces.
Palabras-clave: Análisis de contenido; cine; investigación interdisciplinaria; enfoque cualitativo;
periodismo.
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
destinada a formular, a partir de certos dados, apelos que se dão através desses contextos. E
inferências reproduzíveis e válidas que podem explica que a reconstrução das representações
ser aplicadas em seu contexto”. Nesse sentido, feitas pela AC se dá principalmente nas
Fonseca Júnior (2006, p.284) ressalta que ao dimensões sintática, se o foco do estudo estiver
direcionar o foco da pesquisa também para os voltado para “os transmissores de sinais e suas
elementos implícitos no material em análise, a inter-relações”, e semântica, se estiver
inferência contribuiu para “amenizar o direcionado para a “relação entre os sinais e os
impacto da herança positivista” na técnica, e seus sentidos”, quer sejam eles denotativos
destaca que, atualmente, a AC tem sido usada e/ou conotativos.
tanto pelo viés quantitativo quanto pelo
qualitativo, buscando atender, dessa maneira, a
requisitos e especificidades de cada estudo. Especificidades da análise de conteúdo
Quando se opta pela análise qualitativa do De acordo com Sylvia Vergara (2010, p.11),
conteúdo, o pesquisador dispõe-se a os métodos e técnicas qualitativos de pesquisa
compreender não somente a mensagem, mas destinados à análise textual buscam identificar
também o seu contexto de produção. E desde singularidades entre os elementos, bem como
que observado os requisitos de sistematicidade as relações que estabelecem entre si,
e etapas de organização, requeridos pelo enfocando tanto o que ganha destaque como
método, como apresenta Bardin (2016), o aquilo que está ausente no texto. Isso pode ser
pesquisador pode adentrar a esfera da feito, segundo a autora, por comparação,
subjetividade apoiado em um instrumental que associando os resultados obtidos com o
lhe permite desenvolver o trabalho com rigor referencial teórico escolhido pelo pesquisador,
crítico e analítico e, quando necessário, em ou relacionando categorias com vistas a tecer
associação também a outros métodos e uma explicação para o objeto em análise.
técnicas de investigação, além do uso Ambas as possibilidades encontram-se
conjugado com softwares específicos. presente nas dinâmicas de trabalho
Atualmente, segundo Fonseca Júnior (2006, características da análise de conteúdo que, em
p.286), a análise de conteúdo apresenta três suas especificidades, busca compreender as
características fundamentais: mensagens para além do que apresentam e de
como se apresentam. Adequando-se tanto à
abordagem qualitativa quanto a estudos
a) orientação fundamentalmente empírica, quantitativos ou quali-quantitativos, a AC
exploratória vinculada a fenômenos reais e de caracteriza-se, segundo Gonçalves (2016,
finalidade preditiva; b) transcendência das
noções normais de conteúdo, envolvendo as
p.293-294), por uma estratégia de investigação
ideias de mensagem, canal, comunicação e que “adota o procedimento de codificar um
sistema; c) metodologia própria, que permite ao determinado material empírico, com objetivo
investigador programar, comunicar, e avaliar de categorizar ou desenvolver uma teoria”.
criticamente um projeto de pesquisa com
independência de resultados. Bauer (2012, p. 191-194) atesta que a análise
de conteúdo pode levar à reconstrução de
“mapas de conhecimento”, a partir da tessitura
Para Bauer (2012, p.192-203), a AC é uma de redes e relações entre elementos e contextos
construção social que, possui “um discurso em estudo, já que a linguagem é utilizada para
elaborado sobre qualidade, sendo suas “representar o mundo como conhecimento e
preocupações-chave a fidedignidade e a autoconhecimento”. E defende que, “no
validade”, e acrescenta “coerência e divisor quantidade/qualidade das Ciências
transparência como dois critérios a mais para a Sociais, a análise de conteúdo é uma técnica
avaliação de uma boa prática” da técnica. híbrida que pode mediar essa improdutiva
Fundamentado em Buehller (1934), ele aponta discussão sobre virtudes e métodos”.
como objetivos centrais da análise de
Nesse sentido, cabe destacar que a
conteúdo, a inferência acerca da expressão dos
possibilidade de construir um referencial
contextos, e a avaliação/interpretação dos
metodológico híbrido é outra característica
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
importante da pesquisa qualitativa. Tendo em Nascimento e Menandro (2006), por sua vez,
vista a dimensão subjetiva da realidade a ser fazem uma análise comparativa do uso da AC
analisada, faz-se, muitas vezes, necessário e do ALCESTE, um software destinado a
compor uma associação entre algumas técnicas mapear co-ocorrência de palavras em
de análise para se alcançar os objetivos segmentos de texto, e descrevem a sua
pretendidos. Alves-Mazzotti e aplicabilidade com o objetivo de ressaltar as
Gewandsznajder (2002, p.173), quando falam contribuições e limitações de cada um, quando
dos critérios relativos à credibilidade da usados separadamente, e quanto o uso
pesquisa qualitativa, destacam, entre outros conjugado de ambos permite uma análise e
fatores, a triangulação, apontando que ela pode compreensão mais aprofundada dos dados.
ser feita pela combinação tanto de fontes e Segundo eles, enquanto o ALCESTE oferece
teorias, como também de técnicas e métodos. segurança estatística para mapear grande
De acordo com Flick (2009, p.362), embora quantidade de textos, inclusive com muita
tenha surgido como uma estratégia para validar rapidez, e busca relacionar o contexto
resultados alcançados a partir da aplicabilidade linguístico com sua representação coletiva, a
de métodos individuais de pesquisa, a AC permite a estruturação da pesquisa em
triangulação vem sendo vista e utilizada como categorias mais gerais, bem como a
uma possibilidade de enriquecer a investigação identificação da variedade de temas presente
de natureza qualitativa, potencializando o no corpus, além da reconstrução de mapas de
conhecimento que dela deriva. conhecimento, o que, segundo Bauer (2012),
dimensiona a análise para além dos elementos
Para Bardin (2016), a análise de conteúdo,
textuais, considerando também as relações que
por permear a esfera da subjetividade, não se
os envolvem, como apontado anteriormente.
apresenta com um modelo único, colocando-se
aberta a adequações requeridas tanto pelo Outro software que vem sendo utilizado em
objeto quanto pelos objetivos pretendidos pela pesquisas de análise de conteúdo com textos é
pesquisa, tendo em vista que cada material o IRaMuTeQ. De acordo com Camargo e Justo
analisado deve fazer surgir um novo sentido, (2013), além de gratuito, ele possibilita a
suplementar ao já conhecido. Dessa forma, a realização de diferentes tipos análises lexicais,
aplicação da AC em associação a outras de maneira simples e muito compreensível, e
técnicas e instrumentos, bem como à utilização pela forma como cruza e apresenta os dados,
integrada com softwares específicos, como o potencializa uma análise mais qualitativa.
NUD*IT e o Atlas/ti, entre outros, contribui Os autores ressaltam também a contribuição
para alcançar resultados mais completos e que o uso desses softwares traz para pesquisas
precisos. de análise de conteúdo textual, e destacam que
eles podem/devem ser utilizados como um
suporte para melhor tabular e categorizar
Uso de softwares
grandes quantidades de dados, contribuindo
Fonseca Júnior (2006, p.300, grifos do autor) para uma importante integração quali-
destaca que a utilização de programas de quantitativa.
computador em pesquisas de AC remonta ao
final da década de 1950, e que, atualmente, o
uso desses recursos visa atender a três Resultados e Discussões
demandas principais: “auxílio nos estudos e
Análise de conteúdo e cinema
descobertas”, quando se objetiva traçar uma
análise mais panorâmica do conteúdo presente No que se refere a pesquisas qualitativas que
em uma grande quantidade de material textual; tenham materiais audiovisuais como objetos
“análise de conteúdo pelo computador com de estudo, a análise de conteúdo pode ser
objetivo de representar algum aspecto do utilizada em associação a técnicas de análise
contexto social dos dados”, além das “análises de imagem. De acordo com a pesquisadora
estatísticas”. Iluska Coutinho (2006, p.332), ao tomar
materiais de natureza imagética e/ou
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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A pesquisa foi desenvolvida entre os anos de 2007 Edições UESB, editora da Universidade Estadual do
e 2009, no Programa de Pós-Graduação em Jornalismo Sudoeste da Bahia.
da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), 43
cujos resultados encontram-se na dissertação intitulada Nesse texto, publicado em 2015, a autora descreve
Um Olhar sobre o Jornalismo: Análise da todo o processo de desenvolvimento da pesquisa e
Representação do Jornalismo no Cinema reflete sobre a potencialidade da associação
Hollywoodiano, de 1930 a 2000, disponível no banco de metodológica entre análise de conteúdo e análise fílmica
dados do Programa, no site: para pesquisas que tenham filmes como objeto de
http://ppgjor.posgrad.ufsc.br/. Esse trabalho foi estudo.
publicado posteriormente, no ano de 2014, pelas
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
RESUMO
Esse estudo trata do futebol enquanto um potente dispositivo de interpelação em que dedicamos
atenção à cidade de Pelotas, situada no interior sul do estado do Rio Grande do Sul (RS),
especificamente aos dois clubes predominantes que compõem o clássico futebolístico, nominados
Esporte Clube Pelotas e Grêmio Esportivo Brasil. O arquivo da pesquisa abrange depoimentos de
sujeitos tatuados torcedores, homens e mulheres, a respeito da sua relação com seu time, e também,
de sua relação com o time adversário, somado a fotografias de tatuagens alusivas a um dos dois times
em questão que tais sujeitos materializaram em seus corpos. Trabalhamos com a língua e com o corpo
como formas materiais do discurso, ou seja, entendemos que se o sujeito se identifica com a língua
para poder dizer, ele também se identifica com o seu corpo para significar no espaço em que vive. A
problemática que fomenta esta investigação é a seguinte: como a (re)produção de determinados
discursos acerca de dois clubes futebolísticos é capaz de instaurar efeitos de sentido de superioridade
e de inferioridade, de inclusão e de exclusão, incitando a violência num espaço social comum?
Entendendo pertinente tal problema, nosso objetivo é analisar os processos de subjetivação (pela
língua e pela tatuagem) desses sujeitos torcedores na busca de compreendermos o funcionamento da
ideologia e do inconsciente no contexto futebolístico.
Palavras chave: Futebol, Ideologia, Língua, Corpo, Sentidos.
ABSTRACT
This study refers to soccer as a powerful interpellation device, we dedicate more attention to the city
of Pelotas, located in the southern interior of the state of Rio Grande do Sul (RS), specifically the two
predominant clubs that make up the classic, nominated Esporte Clube Pelotas and Grêmio Esportivo
Brasil. The research's archive includes interviews of male and female soccer fans, regarding their
relationship with their team, and also their relationship with the opposing team, along with
photographs of allusive tattoos to one of the two teams in question that such subjects materialized in
their bodies. We work with the language and with the body as material forms of discourse, that is, we
understand that if the subject identifies with the language to be able to say, his/her also identifies with
his/her body to mean in the space in which his/her lives. The problem that foment this research is:
how (re) production of certain discourses about two football clubs is able of install effects of
superiority and inferiority, inclusion and exclusion, inciting the violence in a common social space?
Understanding how pertinent this problem, our objective is to analyze the processes of subjectivation
(by the language and by the tattoo) of these soccer fans in an attempt to understand the functioning
of the ideology and the unconscious in the soccer context.
Keywords: Soccer, Ideology, Languagem, Body, Sense.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
Introdução
O presente texto refere-se às primeiras Nesse sentido, a constatação é simples: “o
reflexões da tese de doutorado, em fase de futebol é bastante jogado e insuficientemente
amadurecimento do projeto de pesquisa, que pensado” (FRANCO JÚNIOR, 2007, p. 11).
fazem parte de um processo de escrita que teve Afirmação essa também utilizada por Rohden,
orientação da Professora Doutora Ercília Ana Azevedo e Azambuja (2012, p. 08), quando
Cazarin, no período entre fevereiro de 2015 a anunciavam a importância de estudos que
março de 2018, quando o Programa de Pós- contemplem a temática futebolística frente a
Graduação em Letras: Linguística Aplicada precariedade de reflexões realizadas já que,
estava vinculado à Universidade Católica de desde que o futebol chegou a solo brasileiro,
Pelotas (UCPEL). E na continuidade, após este considera-se o “país a terra desse esporte”.
período, a tese é orientada pela Professora Sobre o modo de interpelação, então, nesse
Doutora Aracy Graça Ernst, com o Programa início de trabalho, a leitura das crônicas de
de Pós-Graduação já transferido para a Veríssimo (2010) sobre o futebol, no livro
Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). Em Time dos Sonhos: paixão, poesia e futebol, já
fase de transições e mudanças, o trabalho foi nos fez pensar nessa força ideológica que
submetido a uma (re)avaliação e está em perpassa este esporte. Em uma delas, chamada
constante (re)construção no decorrer de seu Infantilidades, o cronista destaca o seguinte:
desenvolvimento.
O interesse pela temática do estudo que se
Só o futebol permite que você sinta aos 60 anos
segue nesta etapa acadêmica diz respeito ao exatamente o que sentia aos 6. Todas as outras
incômodo gerado pela representação do paixões infantis ou ficam sérias ou desaparecem,
futebol no Brasil, em que questionamos de mas não há uma maneira adulta de ser
modo ainda incipiente seu funcionamento em apaixonado por futebol. Adulto seria largar a
nossa sociedade, sua engrenagem ideológica e paixão e deixar para trás essas criancices: a
devoção a um clube e às suas cores como se fosse
seu papel na (re)produção de determinados a nossa outra nação, o desconsolo ou a fúria
sentidos e estereótipos, somado ao interesse de assassina quando o time perde, a exultação
compreender o modo como ele interpela certos guerreira com a vitória. Você pode racionalizar a
sujeitos. paixão, e fazer teses sobre a bola, e observações
sociológicas sobre a massa ou poesia sobre o
De maneira geral, salientamos a queixa de passe, mas é sempre fingimento. É só
alguns autores quanto à receptividade negativa camuflagem. Dentro do mais teórico e distante
de seus estudos no meio científico, e de certo analista e do mais engravatado cartola
modo, estes apontamentos aliviaram nosso aproveitador existe um guri pulando na
arquibancada (VERÍSSIMO, 2010, p. 25).
sentimento de angústia quanto ao nosso
próprio trabalho, pois estudar o futebol parece,
a olhares outros, como perda de tempo já que O futebol, nesse sentido, tem assumido um
“não se precisa entendê-lo, basta senti-lo”, papel que vai além de uma modalidade
enunciado este naturalizado socialmente, que esportiva, simples e modesta, configurando-se
penetra as grades da universidade, e por isso, de uma maneira que precisa ser analisada, pois
acreditamos em sua força ideológica que acreditamos que ele nos fornece subsídios para
opacifica o olhar de muitos sujeitos. o entendimento das relações sociais que
Nas palavras de Franco Júnior (2007), permeiam a sociedade brasileira. Ainda em
Veríssimo (2010), outra crônica, esta chamada
Ninguém nega, sem dúvida, o lugar de destaque Para que serve o futebol, nos provocou
que o futebol ocupa no mundo contemporâneo.
Nos cinco continentes ele mobiliza
reflexão, na medida em que o autor dá voz a
profissionalmente, de forma direta e indireta, um alienígena que ao visitar a Terra, reconhece
dezenas de milhões de pessoas. Mais que o futebol existe em nosso país para
significativo, mobiliza emocionalmente várias representar o desperdício nacional em todas as
centenas de milhões de indivíduos. Entretanto, as esferas, econômica, política e cultural.
razões da força desse fenômeno têm recebido
explicações apenas parciais, quando não
superficiais (FRANCO JÚNIOR, 2007, p. 14).
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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Utilizamo-nos desta proposição parafraseando a partir de um viés discursivo, observando o
Vinhas (2017), quando intitula seu texto Precisamos funcionamento da ideologia e do inconsciente tanto na
falar sobre Temer: o estranhamento na voz. O gesto construção histórica desse campo quanto na constituição
político empreendido pela autora nos fez pensar sobre o dos sujeitos que dele fazem parte.
futebol, precisamente quando buscamos compreendê-lo
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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Lembramos que o sujeito, nessa perspectiva teórica, que “qualquer pessoa é interpelada a ocupar um lugar
não é nem dono nem fonte daquilo que diz, pois se determinado no sistema de produção” (HENRY, 2010
encontra submetido à ordem do inconsciente e da [1990], p. 31). Orlandi (2012a, p. 49), autora renomada
ideologia, sendo a subjetividade mera ilusão. Numa na AD em nosso país, destaca que não há uma forma de
teoria não subjetiva da subjetividade, como a AD, subjetividade, “‘mas um lugar’ que o sujeito ocupa para
trabalha-se, então, com a noção de um sujeito dividido, ser sujeito do que diz: é a posição que deve e pode
uma vez que sua inscrição numa formação discursiva se ocupar todo indivíduo para ser sujeito do que diz” [grifo
faz imaginariamente através de uma posição. da autora].
Recorrendo ao legado pecheuxtiano, compreendemos
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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Este trabalho respeita os termos de pesquisa da base na metodologia de transcrição de conversas
Plataforma Brasil, cuja aprovação para sua realização é proposta pelo professor Luiz Antônio Marcuschi (1998).
de número CAAE: 56773316.9.0000.5339. De posse
das entrevistas, os depoimentos foram transcritos com
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desse aporte teórico e metodológico, é possível [10] PAVEAU, Marie-Anne. Uma enunciação
inscrevê-lo no lugar da incompletude, da sem comunicação: As tatuagens escriturais.
opacidade, da contradição. Precisamos atentar Revista Rua [online]. Campinas, SP. v. 1, n.
em cada gesto de leitura empreendido, que o 16, jun., 2010. p. 05-41.
futebol nos constitui enquanto sujeitos, e nos [11] PÊCHEUX, Michel. Sobre os Conceitos
afeta, e isso não é de agora. Epistemológicos da Análise de Discurso. In:
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
[19] ______. Para que serve o futebol. In: Time Linguístico, Florianópolis, v. 14, número
dos sonhos: paixão, poesia e futebol. Rio de especial, nov. 2017. p. 2482-2491.
Janeiro, RJ: Objetiva, 2010. p. 19-20.
[20] VINHAS, Luciana. Precisamos falar
sobre Temer: o estranhamento na voz. Fórum
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
b
Docente da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Doutora pela Pontífica Universidade Católica do Rio
Grande do Sul
RESUMO
Nos Estudos da Tradução, a discussão sobre tradução literal versus tradução livre é antiga. Nos
últimos anos, essa polarização tem sido abandonada em favor de uma visão que foca os diferentes
graus de divergência entre o texto de partida e o de chegada, como um continuum de literalidade.
Apesar dos avanços teóricos, ainda são poucas as maneiras de medir o grau de literalidade de
traduções. O presente estudo teve como objetivo fazer uma revisão dos trabalhos nacionais e
internacionais que medem a literalidade de traduções, a fim de apontar os avanços em termos de
metodologia e suas possíveis vantagens e perspectivas. Nossa expectativa era de que a maioria dos
trabalhos atuais de análise tradutória ainda utilizasse medidas subjetivas de literalidade ou não
apresentasse claramente como é feita a operacionalização e medição da literalidade. Nossos
resultados preliminares mostram que os primeiros trabalhos a propor uma metodologia objetiva para
a medição da literalidade foram publicados nos últimos cinco anos e que sua aplicação ainda está
restrita aos seus proponentes. Além desses estudos, há modelos de procedimentos da tradução, que
foram desenvolvidos com outros propósitos, mas que poderiam ser utilizados em análises de
literalidade. O presente estudo faz parte de uma pesquisa mais ampla de mestrado, que investiga a
relação entre funções executivas e literalidade na traduções.
Palavras chave: literalidade na tradução, medição de literalidade, procedimentos de tradução,
Estudos da Tradução.
ABSTRACT
In Translation Studies, the debate over literal translation versus free translation has existed for
thousands of years. In the last decades, there has been a decline in this polarization in favor of a
literality continuum, in which different degrees of divergence between the source text and the target
text are proposed. Despite theoretical advances, only very few models to measure literality in
translation have been proposed. The goal of this study is to provide a review of the literature on
national and international models for measuring literality, in order to identify methodological
advances, as well as advantages and perspectives. Our expectation was that most of the current studies
that analyze translations still use subjective literality measures or do not clearly explain how literality
is operationalized and measured. Preliminary results suggest that the first studies to apply an objective
methodology to measure translation literality were published in the last 5 years, and the
implementation of these methodologies is still limited to their proponents. In addition to these models,
there are translation procedures and modalities models, which were developed for other purposes, but
that may be used to analyze literality. The current study is part of a more comprehensive Master’s
research study which investigates the relationship between executive functions and translation
literality.
Keywords: translation literality, measuring literality, translation modalities, Translation Studies.
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reflexões históricas acerca da literalidade, fins de comparação, ou seja, para avaliar o grau
revisaremos algumas das definições mais de literalidade em duas ou mais traduções.
importantes desse conceito e analisaremos três Essa avaliação levaria em conta a semelhança
métodos de medição de literalidade. formal, ou de estrutura, entre o texto-fonte e o
texto-alvo. Ou seja, de acordo com o teórico,
não podemos dizer que uma tradução é literal;
Referencial teórico em vez disso, podemos comparar diferentes
A forma de conceber o que é tradução muda traduções de um mesmo texto e dizer que uma
de uma época para outra e de um teórico para tradução é formalmente mais próxima do texto-
outro (ALBIR, 2011)[6]. Em algumas épocas, fonte que outra.
a tradução literal é considerada mais adequada, Partindo da contribuição de Chesterman
já em outras, a tradução livre recebe maior (2011), podemos dizer que os extremos da
prestígio. O debate sobre tradução literal dicotomia entre tradução literal versus livre
versus livre iniciou com Cícero há dois mil estão sendo substituídos por uma ideia de
anos, e perdura até hoje (ALBIR, 2011). continuum de literalidade, ou seja, os textos
Segundo a autora, Cícero defendia que a podem ter diferentes graus de literalidade, não
tradução não deveria ser feita verbum pro precisam ser totalmente literais nem
verbo, ou seja, palavra por palavra, mas sim totalmente livres. É preciso, então, ter um
sensum pro sensum, ou seja, com foco no método de medição do grau de literalidade em
sentido. Podemos dizer que Cícero pendia para textos traduzidos.
o extremo da tradução livre. Algumas centenas
Certamente existem diversos fatores que
de anos depois, no século XVI, Erasmo de
contribuem para a preferência pela tradução
Roterdã, ao refletir sobre a tradução de
literal ou livre. Acreditamos que um dos
escrituras sagradas, afirmou que preferia pecar
fatores importantes é o fato de que a definição
por minúcia em excesso do que por licença em
de literalidade também não é única e estanque.
excesso, demonstrando uma preferência pela
Se o termo “tradução literal” significa coisas
tradução literal (CHESTERMAN, 2016)[7].
diferentes para pessoas diferentes em épocas
No Renascimento, a tradução passou a ser
diferentes, parece natural que o prestígio dessa
considerada como interpretação de texto, e os
forma de traduzir também oscile. Na próxima
tradutores pensavam mais nas necessidades e
seção, retomaremos algumas das definições
gostos dos leitores (CHESTERMAN, 2016).
mais citadas até hoje nos Estudos da Tradução.
Chesterman explica que:
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produto e, posteriormente, os dados obtidos tradução, sendo que traduções mais literais
são relacionados aos dados do processo, ou demandam menos esforço para serem
seja, medidas obtidas com tecnologias como o produzidas” (p. 102).
rastreamento ocular, que rastreia os
movimentos e as fixações oculares realizados
pelo participante durante a tarefa de tradução. Resultados e discussão
Na primeira etapa, as traduções produzidas Como vimos na retomada histórica da
pelos participantes nas pesquisas de Carl e dicotomia da tradução literal versus tradução
Schaeffer passam por um processo manual de livre, a preferência por uma ou outra forma de
alinhamento. Os pesquisadores comparam as traduzir esteve sempre em um dos dois
frases no texto-fonte com as frases traduzidas extremos durante quase dois mil anos. Hoje, a
e registram os deslocamentos por meio de visão predominante é a de que existe espaço
números. Veja o exemplo a seguir, retirado do para as duas formas de traduzir, inclusive no
trabalho publicado pelos autores. mesmo texto.
Para conseguir refletir e discorrer sobre a
aplicabilidade de cada uma dessas formas de
traduzir e sobre como medir o grau de
literalidade em determinado texto, é essencial
definir o conceito de tradução primeiro. O
conceito que se tem de tradução influencia o
Figura 2. Exemplo de alinhamento inglês–espanhol método de medição da literalidade escolhido
retirado de Carl e Schaeffer (2017) (adaptado).
em cada pesquisa.
Os deslocamentos são registrados de acordo Dentre as definições retomadas, na maioria
com a quantidade de progressões ou regressões das vezes a tradução literal é vista por um viés
que a palavra sofreu na tradução. Por exemplo,
sintático, no qual a tradução é produzida
na Figura 1, o pronome “He” foi traduzido
palavra por palavra. Uma das diferenças entre
como “le” e foi deslocado em duas unidades de
as definições é quanto à gramaticalidade das
progressão, ou seja, duas palavras para a
traduções literais: há autores que consideram
direita. Já “was” foi traduzido como “Se”, e,
que a tradução literal é aquela que mantém a
em vez de ser posicionado após o pronome,
mesma ordem das palavras do texto-fonte,
houve uma inversão, na qual a tradução “Se”
mesmo que essa ordem desrespeite as regras
foi deslocada em duas unidades de regressão,
sintáticas da língua-alvo, e há autores que
ou seja, duas palavras para a esquerda. Esses
admitem que a tradução literal prevê a
números demonstram a reorganização sintática
adequação às regras sintáticas da língua-alvo.
necessária na tradução. Quanto maior é o
Ainda assim, os pesquisadores mais
deslocamento da palavra, menos literal é a
importantes da área, revisados aqui, parecem
tradução, de acordo com o primeiro critério de
concordar com o segundo conceito, no qual a
Carl e Schaeffer. Ou seja, a literalidade como
tradução literal produz textos gramaticais.
medida no método de Carl e Schaeffer, é útil
Considerando essa distinção, entendemos que
para a observação do comportamento do
a definição do conceito de tradução literal afeta
tradutor ao traduzir cada palavra, mas não
o prestígio (ou desprestígio) desse método:
oferece uma medida de literalidade global para
parece óbvio que se o conceito de tradução
o texto.
literal envolver violações das regras sintáticas
Os números (ou fatores) obtidos após o da língua-alvo, a tradução literal não será
alinhamento das traduções podem ser usados aceita como uma forma adequada de traduzir.
para investigar a relação com traços de esforço
Além de definir o conceito de tradução
cognitivo durante o processo de tradução,
literal, um estudo que se proponha a medir a
como fixações oculares. Segundo Carl e
literalidade na tradução precisa pensar em
Schaeffer, os resultados de suas pesquisas
outros traços de sua pesquisa antes de definir o
sugerem que seu método de medição de
melhor método de medição, sendo um deles o
literalidade “tem correlação com o esforço de
foco da pesquisa: produto ou processo? Em
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
RESUMO
Este trabalho está fundamentado na perpectiva dialógica da linguagem e tem como objetivo analisar o
WhatsApp como um gênero discursivo emergente do ambiente digital. Os gêneros textuais são eventos
comunicativos que sofrem mudanças de acordo com as necessidades comunicativas. Os gêneros digitais, por
sua vez, surgem exatamente desse contexto de relações comunicativas que emergem dos avanços tecnológicos.
Desse modo, é necessário que os estudos referentes a gêneros levem em conta também os gêneros emergentes,
uma vez que estes estão ganhando destaque nas relações sociais atualmente. Dessa forma, para atender ao
objetivo desse estudo, inicialmente apresentamos algumas considerações teóricas a respeito dos gêneros
discursivos. Em seguida, abordamos os gêneros digitais e as diferenças encontradas nesses gêneros em relação
aos tradicionais, em função do ambiente virtual no qual circulam. Após, apresentamos a análise do WhatsApp,
defendendo a hipótese de que este pode ser considerado como um gênero discursivo digital. Na sequência,
discorremos brevemente sobre a importância do estudo de diferentes gêneros no ambiente escolar. Por fim,
apresentamos as considerações finais e os resultados do estudo, concluindo que o WhatsApp corresponde a
um gênero digital que pode ser objeto de estudo nas aulas de Língua Portuguesa. Procura-se, dessa maneira,
contribuir para os estudos linguísticos relacionados aos gêneros do discurso e também aos uso desses como
objetos de ensino.
Palavras-chave: Gêneros Discursivos, Gêneros Digitais, WhatsApp.
ABSTRACT
This work is based on the dialogic perspective of language and aims to analyze the WhatsApp as a
discursive genre emerging from the digital environment. The textual genres are communicative events
that undergo changes according to communicative needs. Digital genres, in turn, arise precisely from
this context of communicative relations that emerge from technological advances. Thus, gender
studies need to take into account emerging genres as they are gaining prominence in social relations
today. Thus, to meet the objective of this study, we initially present some theoretical considerations
regarding the discursive genres. Then, we approach the digital genres and the differences found in
these genres in relation to the traditional ones, due to the virtual environment in which they circulate.
Then, we present the analysis of the WhatsApp, defending the hypothesis that this can be considered
as a digital discursive genre. Following, we briefly discuss the importance of the study of different
genres in the school environment. Finally, we present the final considerations and the results of the
study, concluding that WhatsApp corresponds to a digital genre that can be object of study in the
Portuguese Language classes. In this way, the aim is to contribute to linguistic studies related to the
genres of discourse and also to their use as teaching objects.
Keywords: Discourse Genres, Digital Genres, WhatsApp.
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As expressões gêneros emergentes, gêneros digitais trabalho e utilizadas para referir os gêneros emergentes
e gêneros virtuais são tomadas como sinônimos neste do contexto tecnológico.
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outros gêneros, como a tradicional conversa arquivos pelo WhatsApp, como fotos, vídeos,
face a face ou as modernas salas de bate-papo documentos, apresentações de slides, folders,
como o chat. Para corroborar essa ideia, na entre outros.
sequência são destacadas algumas A partir da descrição apresentada podemos
características do WhatsApp, relacionadas à perceber que a principal característica
intenção comunicativa, ao conteúdo, ao estilo destacada por Bakhtin[1] em relação aos
e à composição desse gênero, que orientam gêneros do discurso, a sua intenção
para que este seja concebido como um gênero comunicativa, é bem determinada nesse
digital. gênero: troca de mensagens entre locutor(es) e
interlocutor(es). Para Marcuschi[6], por serem
definidos como verdadeiras ferramentas do
WhatsApp: um gênero digital
agir com a linguagem, os gêneros podem ser
De acordo com o site “WhatsApp.com”[5], o identificados tanto em relação as suas
WhatsApp Messenger é um aplicativo gratuito características estruturais, quanto pelo
de troca de mensagens que funciona a partir de propósito comunicativo, de acorco com sua
uma conexão com a internet, sem cobranças de situação de produção e circulação. Nesse
taxas, ao contrário das mensagens de texto sentido, o WhatsApp aproxima-se de outros
tradicionais. Em geral, esse aplicativo é gêneros como, por exemplo, o diálogo face a
utilizado no celular, mas também pode ser face ou o telefonema, que também possuem
acessado pelo tablet ou computador. A uma função relacionada à troca de mensagens.
interação nesse gênero pode ocorrer tanto de Porém, esse gênero digital apresenta outras
forma interpessoal, quanto hiperpessoal, com a características, destacadas a seguir, que o
possibilidade de conversas em grupos, nas diferencia dos gêneros tradicionais menciados,
quais podem participar até 256 pessoas. Além principalmente em decorrência do meio em
disso, a comunicação por esse gênero pode que circula: a internet.
ocorrer de forma oral (mensagem de voz) ou
Em relação à interação, destacada por
escrita (mensagem de texto) e é possível a
Marcuschi[2] [3] como uma importante
utilização de diversos recursos semióticos,
característica dos gêneros digitais, é possível
como fotos, vídeos e emoticons. Alguns desses
perceber que o envio de mensagens pode
recursos podem ser anexados da memória do
ocorrer simultaneamente de forma oral ou
aparelho utilizado ou gerados diretamente na
escrita, sem a necessidade de outro suporte
câmera do aplicativo, que permite a captura
instantânea de fotos e criação de vídeos. para que haja essa mudança de modalidade.
Enquanto no telefonema e no diálogo face a
Outro recurso presente nesse gênero é a face a comunicação ocorre necessariamente
chamada de voz, em que é possível conversar por meio da oralidade, no WhatsApp é possível
com os interlocutores de forma oral e síncrona, mesclar duas modalidades no mesmo gênero.
porém estando em locais diferentes, como no Além disso, esse gênero proporcina aos
telefonema. Também é possível realizar participantes do discurso a opção de conversa
chamadas de vídeo, em que a conversa ocorre interpessoal ou em grupo, com a possibilidade
de forma oral, síncrona e à distância, mas de interação entre diversas pessoas ao mesmo
simulando o contato face a face, como no tempo. Nessa questão o WhatsApp assemelha-
diálogo. Os recursos de chamada de voz e de se ao chat, porém aqui há a identificação dos
vídeo também são possíveis por meio de sujeitos, sendo os destinatários, na maioria das
conexão com a internet, sem necessidade de vezes, conhecidos pelo locutor.
planos telefônicos ou de tarifas para efetuar
Outra característica relaciona a esse gênero
chamadas. Outra característica interessante é
é a viabilidade de interação tanto síncrona
que as mensagens trocadas por meio do
como asíncrona. Desse modo, caso um dos
WhatsApp possuem criptografia de segurança,
participantes não esteja online na ocasião de
recurso que permite sigilo total aos
envio da mensagem, poderá responder ao seu
participantes da interação comunicativa,
locutor em outro momento, sem que a
impedindo que outras pessoas possam acessá-
comunicação seja prejudicada. Ademais, a
las. Ademais, é possível o envio de diferentes
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Departamento de Filosofia/UFPel
soniaschio@hotmail.com
RESUMO
Elaborar uma ideia ou ter um excelente assunto para investigar não é suficiente para que haja uma
pesquisa satisfatória. Após o surgimento do assunto, ele terá que ser delimitado. E isso poderá ocorrer
por meio do desenvolvimento do tema ou da elaboração de um problema. A hipótese a ser
desenvolvida é a de que a pesquisa, tanto nas Ciências quanto na Filosofia, deve iniciar pela
elaboração do problema, cada um com duas variáveis (uma conhecida e uma desconhecida), acrescido
das definições de tempo, espaço. O projeto, com suas partes distintas, mas orgânicas, é indispensável
porque auxilia o pesquisador no decorrer da investigação. Após, elaboram-se as hipóteses específicas,
também com duas variáveis. A definição do método (de abordagem, de procedimento e a
metodologia) são imprescindíveis para que o trabalho possua objetividade, coerência e, com isso,
maior confiabilidade em seus resultados. A investigação, de cunho bibliográfico e empírico, ou
somente do primeiro tipo, deve conter dados explícitos, isto é, do "como" ela será efetivada. Em
contrapartida, quanto mais dúvidas ela gerar, em especial com relação à formulação do projeto, menor
será a credibilidade, assim como a aceitação dela na comunidade científica (critério pragmático). Para
esta demonstração será utilizado o Método Analítico: descrevem-se os componentes básicos de uma
pesquisa, a delimitação do problema, o projeto de pesquisa, o método e a metodologia.
Palavras chave:Pesquisa, problema, tema, hipóteses, método.
RÉSUMÉ
Avoir une idée interessante ou un excellent sujet à étudier ne suffit pas pour faire une bonne recherche.
Il faut choissir le sujet, et le délimiter. Pour cela il faut ou être sûr sur le sujet à recherecher ou faire
une élaboration exacte du problème. L'hypothèse à être développé ici est ce que la recherche, en
Science ou en Philosophie, doit commencer par l'élaboration du problème à rechercher, et cella avec
deux variables (une connue et l'autre inconnue), et aussi la définition du données (temps et l'espace).
Le projet, comme un tout, organique, est indispensable parce qu'il aide le chercheur au cours de
l'enquête. Ensuite, les hypothèses spécifiques doivent être élaborées (avec ses deux variables). Aussi,
choissir la méthode (du connaître, du faire et de la méthodologie) est essentiel pour que le travail soit
objectif, cohérent et confiable. Les recherches bibliographiques et empiriques, ou seulement de la
primière façon, doivent contenir les données explicites, c'est-à-dire le "comment" ils seront obtenus.
D'autre part, si il y a de doutes sur la façon de faire la recherche, autrement dit, sur le projet, il n'est
pas bon et confiable, même s'il avait la acceptation de la communauté scientifique. Pour cette
démonstration, alors, on utilisera la méthode analytique: les fundaments théoriques de la recherche,
la délimitation du sujet de la recherche, le projet, la méthode et la méthodologie.
Mots-clés: Recherche, problème, sujet, hypothèse, méthode.
48
Professora do Departamento e do Programa de Pós-Graduação em Filosofia da UFPel. Coordenadora do GEHAr -
Grupo de Estudos Hannah Arendt da UFPel e do PIBID/Filosofia. Lattes: http://lattes.cnpq.br/5614697219000826.
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VC + VD O Projeto de Pesquisa
Figura 2. A elaboração do problema. Autoria própria. Método Científico
Problema • 5.1. Método de Abordagem
• 1.1. Hipótese Geral • 5.2. Métodos de
• 1.2. Hipóteses Específicas Procedimento
Pode-se afirmar inclusive, que há a • 5.3. Metodologia
possibilidade de sugerir que sejam seguidas Objetivos Cronograma
algumas etapas em sua elaboração: (i) • 2.1. Objetivo Geral
explicitar o tema (ou assunto), ou seja, • 2.2. Objetivos Específicos Orçamento
escrevê-lo em poucas palavras, permitindo
Referências Bibliográficas
que ele possa ser questionado de forma breve Justificativa
* Se for
e sucinta; (ii) a partir deste, preparar uma necessário, esse item poderá
conte, também, as “metas”.
pergunta que o englobe; (iii) organizar uma Referencial Teórico
resposta simples, ou seja, que o investigador
consiga distinguir a variável conhecida e a Figura 3. Componentes do Projeto de Pesquisa.
Autoria própria.
desconhecida facilmente. Nesse momento, a
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
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Cap. 1 - METODOLOGIA, TEORIA E FONTES: tripés da pesquisa contemporânea
b
Programa de Pós-Graduação em Processos de Ensino Gestão e Inovação/Universidade de Araraquara - UNIARA
beplatzer@yahoo.com.br
RESUMO
Parte-se do princípio de que pesquisas em ciências humanas que envolvem estudos qualitativos têm
como objeto a realidade contextualizada, se caracterizam pela predominância descritiva dos dados,
ancoradas na flexibilidade no processo de condução da investigação, assumindo maior relevância
perante os próprios resultados, bem como na compreensão do pesquisador como fundamental no
processo de pesquisa. Propomo-nos a analisar as fontes de coleta de dados de três teses de doutorado,
configuradas como estudo de caso, acerca de temáticas da educação, a saber, práticas sociais de leitura
de crianças escolarizadas, prática docente e diversidade e processos de escolarização e subjetivação
de egressos da classe especial. Verificamos que as principais fontes de coleta de dados utilizadas
foram a análise documental, a observação e a entrevista. Nesta análise discutimos sobre o uso da
entrevista nas pesquisas qualitativas em educação, enfatizando os aspectos relacionais que cabem ao
pesquisador/entrevistador e ao entrevistado, para além do protocolo pergunta e resposta. Permite-se
atribuir significado ao silêncio e à ausência de resposta à pergunta prevista, bem como se reflete sobre
a escuta para além das falas. Consideramos a clareza teórica e metodológica sustentam o
desenvolvimento da pesquisa, de forma que as fontes de coleta de dados, no caso a entrevista, somente
se justificam se estiverem a serviço do objetivo proposto.
Palavras chave: Pesquisa qualitativa, Entrevista, Educação.
ABSTRACT
It is assumed that Human Science Researches for qualitative studies aim at the reality in its context,
characterized by the descriptive prevalence of data, based on the flexibility in the guiding
investigation process, along with the fact that it becomes more relevant face to the results, as well as
the understanding of the researcher which is extremely important in the process of research. We
analyzed the sources of data collection in three different PhD theses, configured as case studies
regarding education, such as social reading practices for school children, teaching practice and
diversity of education processes, and subjectivation of egresses from special class. We have verified
that the main sources of data collection we used were the documental analysis, the observation and
the interview. We have discussed about the use of interviews in education qualitative research to
highlight the interpersonal aspects on behalf of the researcher/interviewer and of the interviewee,
beyond the standard model – question and answer. It allows us to attribute significance to the silence
and to the absence of answer, as well as it may reflect on the listening beyond the words. We consider
that the transparency of theory and methodology support the development of the research so that the
sources of data collection, in the case of the interview, are only justified if they operate to achieve the
intended purpose.
Keywords: Qualitative Research, Interview, Education.
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oposição dos contrários; isto é, toda realidade por não ter meios de ultrapassar a condição
social gera por dinâmica interna própria o seu histórica de ser uma das possíveis versões dela.
contrário, ou seja, as condições objetivas e É fundamental, que toda prática deva se voltar
subjetivas para sua superação. à teoria, de maneira crítica, oferecendo
O esquema básico da dialética é a trilogia: condições de realizar a autocrítica diante da
tese/antítese/síntese. A realidade social tendência exclusivista própria do conteúdo
historicamente contextualizada é tomada como ideológico nela embutido.
tese, reconhecida pelos contornos e conteúdos Destaca-se que Frigotto [21] ao analisar a
próprios de determinadas fases e resulta no possibilidade de se pesquisar dialeticamente,
processo de institucionalização. Desenvolve- sinaliza no plano da prática estratégias de
se através do processo dinâmico o contrário condução de pesquisa que norteiam a
dentro de si, a antítese, que é mola propulsora discussão proposta. A estratégia contém cinco
da superação. A outra fase é a síntese, que momentos fundamentais:
reinventa e revive os contrários, os 1º. É feito um recorte dentro de uma
antagonismos sem repetir a tese de onde se totalidade em que se reconhece uma
originou. É um processo dinâmico e contínuo, problemática e não um problema. A
que Demo [17] diz ser na realidade uma problemática eleita não está situada num
duologia, pois toda síntese é a próxima tese. patamar de ‘zero’ conhecimento, pois uma
Nesse foco, a explicação é sempre entendida prática anterior, do próprio pesquisador ou de
como uma simplificação da realidade. outros, é que pode suscitar a problemática
A realidade concreta é sempre uma totalidade escolhida.
dinâmica de múltiplos condicionamentos, onde a 2º. Na investigação é feito um levantamento
polarização dentro do todo lhe é constitutiva. Por teórico de toda a produção de conhecimento
isso, indivíduo em si não é realidade social, acerca da problemática. Tem-se como intuito
porque é gerado em sociedade, educado em resgatar as diferentes perspectivas de análise,
sociedade, socializado em sociedade. Isolar é
artifício ou patologia. É possível, por artifício as conclusões do conhecimento produzido e a
metodológico, isolar um componente, para vê-lo identificação de premissas para o avanço do
em si, desde que não se perca a perspectiva de conhecimento proposto.
que ‘o todo é maior que a soma das partes’.
(DEMO) [18] . Definido o embate no plano teórico-
metodológico, partindo do conhecimento já
O autor, também reconhece a importância do existente, começa a pesquisa dos múltiplos
encontro entre prática e teoria, sendo que a elementos e dimensões do problema que se está
querendo desvendar. É importante ressaltar que
primeira é a condição da historicidade, e a quem conduz a investigação é o investigador e
segunda a maneira de ver e não de ser. São não os dados, sejam primários ou secundários. É
reconhecidas dentro de suas importâncias e o pesquisador que estrutura as questões e sua
espaços: significação para conduzir a análise dos fatos,
dos documentos etc. Com isso está-se afirmando
A prática é um critério de verdade. A teoria social que o investigador vai à realidade com uma
necessita de prática, mas a prática não a faz postura teórica desde o início. A questão crucial
necessariamente verdadeira, pois da mesma é estabelecer o inventário crítico desta postura
teoria, pode se chegar a várias práticas, até em face do objeto que está investigando, e não
mesmo contraditórias. (DEMO) [19] abstratamente. [22]
A vinculação entre teoria e prática é essencial 3º. Após o levantamento dos dados, é preciso
para a dialética, pois o estudo e o definir um método de exposição e de análise.
enfrentamento de problemas sociais caminham Identificar quais são as questões prioritárias
conjuntamente. Através da crítica teórica e da que orientarão a análise e interpretação dos
prática é que se constituem as condições dados. Os referenciais teóricos, já colocados,
fundamentais para a transformação da história. reaparecem na produção de movimentação dos
Atrás de toda prática, existe uma opção teórica dados coletados. O movimento no plano
e, consequentemente ideológica, que a define, teórico é o desafio ao pensamento em dar conta
pois é um traço concreto, mas não do movimento no plano do real, histórico.
generalizante como a teoria. Demo [20] 4º. Na análise dos dados o pesquisador busca
.chega a afirmar que toda prática trai a teoria, reconhecer e identificar as “conexões,
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mediações e contradições dos fatos que que permite, segundo Lüdke e André [28] , que
constituem a problemática pesquisada” [23] É o entrevistador faça as necessárias adaptações.
possível então, através da análise, produzir o Realizadas em uma perspectiva de
conhecimento apreendido da realidade. investigação qualitativa as entrevistas são
5º. O último momento da pesquisa é a síntese: utilizadas, conforme destacam Bogdan e
“exposição orgânica, coerente, concisa das
‘múltiplas determinações’ que explicam a Biklen [29], para recolher dados descritos na
problemática investigada” [24] Surgem as linguagem do próprio sujeito, oportunizando
novas descobertas, as contribuições ao ao investigador desenvolver intuitivamente
conhecimento anterior, abrem-se novas uma ideia em relação ao modo como os
questões e redefinem-se alguns aspectos da sujeitos interpretam aspectos do mundo.
problemática. Ao longo da entrevista, além de o
Repõe-se aqui, o ciclo da práxis, onde o entrevistador atentar-se para a linguagem
conhecimento ampliado permite ou deveria verbal estabelecida ao longo da interação, há
permitir uma ação mais consequente, avançada, ainda, conforme apontam Lüdke e André [30]
que por sua vez vai tornando o conhecimento
“[...] uma gama de gestos, expressões,
ampliado base para uma nova ampliação. [25]
entonações, sinais não-verbais, hesitações,
Afirma o autor que essas não são etapas alterações de ritmo, enfim, toda uma
rígidas e estáticas da pesquisa, dependendo do comunicação não verbal cuja captação é muito
momento do estudo há uma ênfase em importante para a compreensão e a validação
determinada etapa. do que foi efetivamente dito”. Esses aspectos
da interação verbal foram observados e
trouxeram contribuições para a análise dos
A Entrevista dados das três pesquisas desenvolvidas.
Abordando especificamente a entrevista, Leite [31] ao relatar em seu trabalho, aponta
fonte de coleta de dados que ocupa lugar como um dos grandes desafios nas pesquisas
central nas pesquisas, novamente recorremos qualitativas que utilizam entrevista refere-se
aos estudos de Lüdke e André [26], quando ao: “[...] estar atenta, com olhos e ouvidos
afirmam que a entrevista representa um dos abertos para ler, ver e escutar tudo, para captar
instrumentos básicos para a coleta de dados na os não-ditos, as múltiplas vozes [...]”.
perspectiva da pesquisa qualitativa. Nesta Busca-se a percepção das diversas
situação, a relação que se cria é a de interação, manifestações presentes no contexto
permitindo uma atmosfera de influência pesquisado, captando o significado das ações
recíproca entre aquele que pergunta e aquele dos sujeitos, ao interagir, dialogar, levando em
que responde. conta os caminhos do pensamento verbalizado
Segundo Triviños [27] : e não verbalizado.
[...] Já expressamos que, no enfoque qualitativo, Essa postura [...] remetia a um entendimento da
podemos usar a entrevista estruturada, ou realidade como polifacética, e não como algo
fechada, a semiestruturada e a entrevista livre ou pronto ou dado, que pudesse ser simplesmente
aberta. Estas duas últimas são mais importantes retratado (como dados estáticos disponíveis para
para esta classe de enfoque. Não obstante isso, serem coletados); ela tinha que ser penetrada
apesar de reconhecer o valor da entrevista aberta para que pudesse ser percebida, compreendida –
ou livre, que não deve ser confundida com a e compreensão pressupõe subjetividade. Cabe
entrevista não-diretiva, queremos privilegiar a aqui deixar claro que essa posição não implicou
entrevista semiestruturada porque esta, ao – ao contrário! - abrir mão do rigor necessário à
mesmo tempo valoriza a presença do construção do conhecimento; essa postura [...]
investigador, oferece todas as perspectivas fez abdicar da rigidez, do aprisionamento
possíveis para que o informante alcance a (LEITE) [32]
liberdade e a espontaneidade necessárias,
enriquecendo a investigação. Bosi [33] afirma que a preparação para as
entrevistas é uma garantia de elaboração de
A entrevista semiestruturada adotada nas três perguntas interessantes que trazem no seu bojo
teses se desenrola a partir de um esquema o cerne da interpretação final, não obstante o
básico, mas não aplicado de forma rígida, o
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respaldam-se na ética exigida pela pesquisa Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
científico/acadêmica. -PUC/SP, São Paulo.
Ao pesquisador é fundamental o escutar, [3] AMARAL, T. P. do. Deficiência Mental
atendando-se continuamente ao dizer do Leve: processos de escolarização e de
entrevistado. Nesse sentido, verificamos subjetivação. 2004, Tese (Doutorado) -
atenção aos diversos elementos presentes na Instituto de Psicologia, Universidade de São
linguagem verbal e, ainda, pontuamos o olhar Paulo - USP, São Paulo.
atendo do pesquisador para a linguagem não- [4] LÜDKE, M., ANDRÉ, M. E. D. Pesquisa
verbal daquele que está sendo entrevistado. em educação: abordagens qualitativas. São
As reflexões apresentadas revelam que a Paulo: EPU, 1986.
entrevista “recorrente” é uma aliada [5] BOGDAN, R. C., BIKLEN, S. K.
importante no processo de pesquisa, Investigação qualitativa em educação: uma
possibilitando uma interação produtiva entre introdução à teoria e aos métodos. Portugal:
pesquisador e pesquisado. Porto, 1994.
O silenciar configura-se como um momento [6] BASSEY, M. Case Study Research in
bastante instigante no processo da entrevista, Educational Settings. Maidenhead: Open
podendo enriquecer os dados de pesquisa, University Press, 2003.
visto que é revelador de inúmeros sentidos. [7] YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e
Ainda, é preciso atenção a notas e diários de métodos. Trad. Daniel Grassi. 2ª ed. Porto
campo, uma vez que se constituem valiosos no Alegre: Bookman. 2001.
processo de coleta e na análise dos dados. [8] YIN, 2001, 105
Fica evidente que o uso da entrevista requer [9] BASSEY, 2003.
continuamente do pesquisador conhecimento, [10] BAVARESCO, 2010.
habilidade, competência e sensibilidade para [11] LÜDKE; ANDRÉ, 1986, 17.
que, dessa forma, possa alcançar os objetivos [12] LÜDKE; ANDRÉ, 1986.
propostos em sua pesquisa. A coleta de dados [13] BOSI, 2003. BOSI, E. O tempo vivo da
por meio da entrevista exige também uma memória: ensaios de Psicologia Social. São
análise criteriosa e rigorosa. Paulo: Ateliê Editorial. 2003.
A ação de entrevistar exige do pesquisador a [14] BOSI, 2003, 50
clareza em seus questionamentos e o [15] DEMO, P. Metodologia científica em
acompanhamento da linguagem do ciências sociais. São Paulo, Huitec, 1995.
entrevistado para, assim, a existência da [16] DEMO, 1995.
interação e da construção de sentido acerca da [17] DEMO, 1995.
temática que se propõe a investigar. [18] DEMO, 1995, 93
Alicerçado em uma postura dialógica, o [19] DEMO, 1995, 101
entrevistador irá tecendo sua pesquisa [20] DEMO, 1995
científica e contribuindo para estudos no [21] FRIGOTTO, G. O enfoque da dialética
campo, no presente caso, da educação. materialista histórica na pesquisa educacional.
In: FAZENDA, I. org. Metodologia da
pesquisa educacional. São Paulo, Cortez,
REFERÊNCIAS 1994. Cap. 6, p. 69-90.
[1] PLATZER, M. B. Crianças leitoras entre [22] FRIGOTTO, 1994, 88
práticas de leitura. 2009, Tese (Doutorado) - [23] FRIGOTTO, 1994, 88
Faculdade de Educação, Universidade [24] FRIGOTTO, 1994, 89
Estadual de Campinas - UNICAMP, [25] FRIGOTTO, 1994, 89
Campinas-SP. [26] LUDKE; ANDRÉ, 1986
[2] BAVARESCO, M.R.C. O Uso da [27] TRIVIÑOS, A. N. S. Introdução à
Metacognição na Atividade Docente: uma pesquisa em ciências sociais: a pesquisa
trilha fértil na formação de professores para o qualitativa em educação. São Paulo: Atlas,
ensino à diversidade. 2010, Tese (Doutorado 1992.
em Educação: Psicologia da Educação). [28] LUDKE; ANDRÉ, 1986.
[29] BOGDAN, R. C., BIKLEN, 1994.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
RESUMO
Apresentam-se o projeto Cirandar: Rodas de Investigação desde a Escola realizado na Universidade
Federal do Rio Grande. Trata-se de um projeto de extensão desenvolvido anulamente, sendo sua
primeira edição no ano de 2012, com a participação de professores da rede de educação básica,
professores da universidade e acadêmicos dos cursos de Licenciatura. Aposta-se nas Rodas de
Formação em Rede de professores, fomentado pela escrita narrativa por meio dos relatos de
experiência docente, na leitura entre pares e na reescrita a partir das contribuições do leitor parceiro.
Busca-se traçar as experiências docentes narradas pelo coletivo de professores participantes do
projeto, a partir dos pressupostos teóricos metodológicos da pesquisa narrativa, como um modo de
realizar processos formativos na escola e em outros espaços, garantindo a liberdade de expressão, o
exercício da escuta e o compartilhar de saberes. Sustentado pela abordagem sociocultural o projeto
Cirandar tem como argumento fundamental que a formação deve ser desenvolvida com diálogo
intenso sobre questões de interesse para os participantes. Nesse sentido a sala de aula de cada
professor é seu objeto de interesse, assim o processo de formação no Cirandar oportuniza que cada
participante possa documentar suas experiências, compreendendo sua sala de aula como artefato da
formação e foco de investigação.
Palavras chave: formação de professores, escrita narrativa, experiência docente.
ABSTRACT
Se presentan el proyecto Cirandar: Ruedas de Investigación desde la Escuela realizado en la
Universidad Federal de Rio Grande. Se trata de un proyecto de extensión desarrollado anulamente,
siendo su primera edición en el año 2012, con la participación de profesores de la red de educación
básica, profesores de la universidad y académicos de los cursos de Licenciatura. Se apuesta en las
Ruedas de Formación en Red de profesores, fomentado por la escritura narrativa por medio de los
relatos de experiencia docente, en la lectura entre pares y en la reescritura a partir de las
contribuciones del lector socio. Se busca trazar las experiencias docentes narradas por el colectivo de
profesores participantes del proyecto, a partir de los presupuestos teóricos metodológicos de la
investigación narrativa, como un modo de realizar procesos formativos en la escuela y en otros
espacios, garantizando la libertad de expresión, el ejercicio de la escucha y el compartir de saberes.
Sostenido por el enfoque sociocultural el proyecto Cirandar tiene como argumento fundamental que
la formación debe ser desarrollada con diálogo intenso sobre cuestiones de interés para los
participantes. En este sentido la sala de clases de cada profesor es su objeto de interés, así el proceso
de formación en el Cirandar oportuniza que cada participante pueda documentar sus experiencias,
comprendiendo su aula como artefacto de la formación y foco de investigación.
Keywords: formación de profesores, escritura narrativa, experiencia docente.
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
Nessa perspectiva, seria preciso considerar o ação grupal e passa a ser a própria diretriz de
contexto escolar com suas características uma experiência didática centrada no suposto
próprias, o currículo desenvolvido, as de que aprender é aprender a “dizer a sua
dificuldades laborais, as expectativas, anseios palavra”. (FREIRE, 2010, p. 69)
e, principalmente, a disposição interna do Outra aposta do projeto está nas Rodas de
professor para a mudança. Formação em Rede (WARSCHAUER, 2001;
Normalmente, a Universidade toma para si a SOUZA, 2010) como um modo de realizar
responsabilidade deste papel de formação que processos formativos na escola e em outros
lhe cabe por seu caráter eminentemente espaços, garantindo a liberdade de expressão,
pedagógico. Na maior parte das vezes, é o exercício da escuta e o compartilhar de
protagonista do planejamento de ações saberes.
formativas desenvolvidas, juntos aos As Rodas de Formação em Rede são
professores, com menor participação dos articuladas pelos pressupostos teóricos-
professores da rede de educação básica na metodológicos da investigação narrativa como
definição de objetivos e da tomada de decisões caminho de documentação da experiência
na formação. pedagógica em sala de aula (DORNELES,
No Cirandar, parte-se do pressuposto que a 2016; CLANDININ; CONNELLY, 2011).
melhor formação é aquela desenvolvida
conjuntamente com os professores da rede de
educação básica e com professores A inspiração concreta em uma longa
universitários, razão pela qual na estruturação trajetória
do projeto as discussões consideraram o O Cirandar foi inspirado em experiências
exposto no item 393 do documento-referência anteriores de constituição de redes,
da CONAE 2014, o qual explicita que: especialmente na forma de projetos de
A formação inicial e continuada, entendida formação de professores de Ciências entre as
como processo permanente, que articule as universidades UNIJUÍ, PUCRS e FURG. Essa
instituições de educação básica e superior, parceria foi institucionalizada em 1981 pela
requer um debate mais aprofundado, no âmbito política pública CAPES/PADCT de formação
do planejamento e da Política de Formação de de ‘Redes’ quando surgiu a Rede ACOMECIN
Profissionais da Educação Básica. Esta - Ação Conjunta para a Melhoria do Ensino de
política, delineada no Decreto no 6.755/2009, Ciências e Matemática no Rio Grande do Sul -
cujos princípios evidenciam uma concepção de em que universidades gaúchas articularam-se
formação que considera os profissionais da em torno de ações conjuntas. Desde então,
educação básica como portadores de reforçam-se as Redes por meio de projetos
conhecimentos, experiências, habilidades e conjuntos, como foi o projeto Articulação
possibilidades, os credencia a integrar os entre desenvolvimento curricular e formação
programas das universidades e demais de professores, a partir de edital aprovado em
instituições formadoras, exercendo um papel 2006.
fundamental nos processos formativos. Neste último, a ideia de Rede se concretizou
(BRASIL, 2014, p. 75) em interações a partir de produções escritas.
O projeto Cirandar está embasado na teoria Esta Rede partiu do pressuposto de que a partir
freireana, tendo em vista que o saber do desafio da produção escrita que vai se
pedagógico está sendo construído qualificando pela interação dialógica com o
coletivamente, num processo de ensinar e outro, envolvendo temas da formação e da
aprender compartilhado e dialógico. Assim docência, é que os participantes podem se
como no Círculo de Cultura, os participantes envolver em formação acadêmico-
do projeto tem sua voz ouvida e respeitada por profissional, assumindo-se como
seus pares. pesquisadores e produtores de um tipo
específico de conhecimento, conhecimento de
No círculo de cultura o diálogo deixa de ser professor. Assim as autorias se constituem,
uma simples metodologia ou uma técnica de com crescimento de todos a partir da interação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
entre pares. A Roda de Leitura constitui um mútua, espaço o qual se acredita que os
espaço para a leitura do relato do colega e a participantes passam a compreender a
escrita do parecer do leitor, de modo a importância do cuidado com a escrita do outro
construir a ideia de parceria com o colega, de tanto no sentido de acolhimento como no de
problematizar o individualismo e a sugestões para sua reescrita.
especificidade na escola, promovendo a
construção da ideia de parceria.
- Roda de apresentação dos relatos
A escrita do parecer foi mediada em edições
anteriores a partir de orientação enviada aos Trata-se do encontro presencial, geralmente
participantes com os seguintes em novembro, em que cada participante expõe
questionamentos: - o contexto do relato e se encontra com os colegas com quem
apresenta detalhamento do lugar, do tempo e interagiu presencialmente ou a distância no
com quem foi desenvolvida a atividade?; - as processo de formação. Ele integra e articula as
propostas de investigação e as formas como experiências na pós-graduação que estudaram
foram desenvolvidas estão expressas ao longo o processo formativo com estas características
do texto?; - a atividade encontra-se descrita de e projetos realizados nas escolas com
forma que possa ser claramente exposição de trabalhos pelos professores e
compreendida?; -a análise e a discussão são pelos alunos da educação básica.
coerentes com os objetivos propostos e as
conclusões descritas? Deste processo de formação já foram
publicados dois livros com os relatos de
Reescrita e reenvio do relato professores, relatos esses selecionados
coletivamente por participantes do Cirandar
A partir da leitura (a distância) de um colega (GALIAZZI et al, 2013; 2014). O ato de tornar
o Cirandar segue de modo a que o autor do público os relatos de experiências constitui o
relato ao receber a leitura de um colega possa momento em que os docentes narradores se
a partir da contribuição da leitura do colega convertem em autores de documentos
refletir sobre sua sala de aula à luz das teorias pedagógicos e, através deles, seus saberes e
estudadas durante o processo de formação e experiências alcançam maior grau de
com isso reescrever e reenviar o relato para o objetividade e de estranhamento (SUÁREZ,
site do projeto. 2011).
- Roda de Leitura dos relatos Diferentemente dos anos anteriores, em
2015, o Cirandar estendeu a participação a
Acontece um mês antes do encontro
todos os professores e licenciandos
presencial que finaliza o projeto a cada ano de
interessados, extrapolando a sua proposição
modo a intensificar o compromisso com o
inicial, como jádestacado anteriormente.
pertencimento à formação, ao grupo com
entendimento de outras salas de aula de outros Atualmente o Cirandar envolve projeto de
níveis e modalidades de ensino, contribuindo extensão (atividades em ambiente virtual de
para que ele perceba sua sala de aula em um aprendizagem e encontro presencial), projeto
sistema educativo. Os relatos são de aperfeiçoamento (com encontros semanais
disponibilizados no site do projeto, na Universidade e atividades a distância), duas
organizados por salas e cada autor lê os relatos disciplinas semestrais ofertadas no Programa
de todos os participantes daquela sala. de Pós-Graduação em Educação em Ciências
da FURG.
Como aprendido dos projetos anteriores, o
envolvimento intenso em leituras e produções Pela análise da proposta formativa em
escritas está muito intimamente relacionado ao disciplina desenvolvida na pós-graduação, ano
exercício de uma leitura atenta e 2014, em que se discutiu o papel da mediação
compromissada. Por meio dela se efetivam as da escrita na formação de professores,
melhorias dos textos, ocorrem transformações acordou-se de que seria feita uma mediação
e aprendizagens dos participantes, mais intensa dessa escrita e para isso decidiu-
estabelecendo-se um relacionamento de ajuda se escrever cartas semanais aos participantes.
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
docente. In: Revista del iice, Nº 30. Buenos [13] GALIAZZI, Maria do Carmo. et al.
Aires: Instituto de Ciencias de la Educación, Cirandar: rodas de investigação desde a
Facultad de Filosofía y Letras, Universidad de escola. São Leopoldo: Ed. OIKOS, 2014.
Buenos Aires (pp. 17-32), 2011.
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
b
Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação Ambiental da Universidade Federal do Rio Grande –
FURG. Doutora em Educação Ambiental. Orientadora, claudiacousin@furg.br
RESUMO
Apresenta-se neste resumo uma pesquisa desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Educação
Ambiental, da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), em nível de Mestrado. Buscou-se
compreender que processos de ensino e aprendizagem são providos pelo Estudo do Meio, a partir da
compreensão do sentido do lugar e a leitura de mundo expressa nos discursos das crianças que
permitem entrelaçar o ensino de Geografia com a Educação Ambiental. O estudo embasou-se na
pesquisa participante (Demo, 2000). Investigou-se: Qual a contribuição do Estudo do Meio para
explicar o sentido do lugar e entrelaçar a Educação Ambiental com noções de Geografia no currículo
dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental? Partiu-se da hipótese, que o estudo do lugar enquanto
espaço cotidiano é basilar para entrelaçar o ensino de Geografia e a Educação Ambiental. A pesquisa
foi realizada com alunos dos Anos Inicias de uma escola municipal do Rio Grande/RS. Os dados
foram produzidos a partir do conjunto de atividades planejadas para compor o Estudo do Meio.
Utilizou-se o Discurso do Sujeito Coletivo – DSC (Lefevre e Lefevre, 2005) como ferramenta de
análise dos dados. Os resultados da pesquisa sinalizaram para o Estudo do Meio como uma
possibilidade de entrelaçar o ensino de Geografia com a Educação Ambiental nos Anos Iniciais, pois
permite pensar o currículo, o fazer docente, o processo de ensinar e aprender, o diálogo, a partilha de
saberes, entre outros aspectos.
Palavras chave: Anos Iniciais, Educação Ambiental, Ensino de Geografia, Estudo do Meio, Lugar.
ABSTRACT
In this abstract, a research developed in the Graduate Program in Environmental Education of the
Federal University of Rio Grande-FURG, at the master's level, is presented. It was sought to
understand that teaching and learning processes are provided by the Study of the Environment, from
the understanding of the sense of place and the world comprehension expressed in the children's
discourses that allow to connect the teaching of Geography with Environmental Education. The study
was based on participant research (Demo, 2000). It was investigated: What is the contribution of the
Study of the Environment to explain the meaning of the place and to interweave Environmental
Education with notions of Geography in the curriculum of the initial years of Elementary Education?
The starting point was the hypothesis that the study of place as a daily space is basic to interweave
the teaching of Geography and Environmental Education. The research was carried out with students
from the early years of a municipal school in Rio Grande - RS. The data were produced from the set
of activities planned to compose the Study of the Environment. The Collective Subject Discourse -
DSC (Lefevre and Lefevre, 2005) was used as a data analysis tool. The results of the research pointed
to the Study of the Environment as a possibility to connect the teaching of Geography with
Environmental Education in the initial years, since it allows to think about the curriculum, the
teaching, the process of teaching and learning, the dialogue, the sharing of knowledge, among other
aspects.
Keywords: Early Years, Environmental Education, Geography Teaching, Environmental Studies,
Place.
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PPGE/UFPel,maristaniz@hotmail.com
RESUMO
Neste trabalho constam estudos referentes à pesquisa: Experiências estéticas na Educação Infantil -
Práticas pedagógicas desenhadas pela arte, que tem como objetivo analisar e problematizar a prática
docente dos professores de Educação Infantil do município de Pelotas no que se referem às
experiências estéticas. Aqui, a intenção é abordar a importância de propostas que visem favorecer a
ocorrência de experiências estéticas desde a infância. Estas experiências configuram-se singulares a
cada um de nós, possível a todos, e não se referem somente ao campo das artes. A experiência estética
permite um encontro com o sentir, com o mundo das sensações, no qual não só o aparentemente belo
tem sentido ou importância, mas todas as experiências que nos causam estranhamento, assombro,
beleza, que afloraram nossos sentidos. Privilegiar desde a infância o contato com situações que
permitam um encontro com os sentidos, seja por meio da arte, ou da apreciação do mar, do cheiro das
flores e etc. é de extrema importância, visto que estimula um encontro sensível com o mundo, o
exercício da criatividade, da observação, do afeto, da criticidade, permite ações mais sensíveis numa
sociedade que tem primado pelo aumento constante da produção de bens e consumos em detrimento
das habilidades sensíveis.
Palavras-chave: Estética, Experiência estética, Educação Infantil.
ABSTRACTO
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Introdução Desenvolvimento
No cotidiano da Educação Infantil
frequentemente cantamos, dançamos, A palavra estética, que vem do grego
desenhamos, pintamos, modelamos, ou aisthesis, refere-se à capacidade de sentir, a
propomos que as crianças executem propostas uma compreensão pelos sentidos, a uma
voltadas as artes. O ideal é participarmos de percepção totalizante, à “beleza/arte”.
todas estas propostas com elas, mas há quem
somente proponha. Segundo Perissé (2014), o deleite estético
Este cotidiano infantil costuma ser muito
[...] pressupõe e provoca a inteligência, a
artístico e isso desencadeia uma íntima memória, a imaginação. Não se trata de algo que
aproximação do professor de educação afete apenas nossos sentidos externos, mas todo
infantil, que é pedagogo por formação, com as o nosso corpo e toda a nossa interioridade.
linguagens artísticas. Entretanto, ainda não é Consideramos algo belo porque nossa visão
comum se falar em Arte dentro do curso de assim o capta e porque nossa visão interior o
reconhece igualmente! A palavra no texto grego
Pedagogia, nem todo professor se interessa por de Diógenes Laércio para indicar o cego de que
esta área do conhecimento, tem contato com fala Aristóteles é tuflou , remetendo
experiências artísticas ou tem clara a figurativamente à pessoa que, mesmo tendo
importância de se contemplar todo o potencial visão saudável, mostra-se insensível, torna-se
das artes, onde destaco aqui um dos principais: vítima de uma espessa neblina (ou de uma
tempestade, um tufão... há relações etimológicas
possibilitar experiências estéticas. entre o tufão e essa cegueira) a encobrir-lhe os
Desta forma, destaco a necessidade de olhos da mente, sem abertura de espírito para
compreendermos o quanto o professor da área reconhecer e acolher a beleza (PERISSÉ, 2014,
p. 26).
da Pedagogia trabalha e vivencia a Arte no seu
dia-a-dia com as crianças. Cabe refletir sobre
as experiências que os professores tem
E esta beleza a qual devemos estar dispostos
propiciado. Estão promovendo tempos e
a perceber, de alma despida e olhos abertos,
espaços que propiciam a ocorrência de
não se refere a uma beleza predeterminada por
experiências estéticas?
padrões, simetrias, conceitos, está enlaçada ao
A pesquisa: Experiências estéticas na sentir.
Educação Infantil - Práticas pedagógicas
desenhadas pela arte, objetiva analisar e “A propósito, segundo o biógrafo Diógenes
problematizar a prática docente dos Laércio, indagaram certa vez a Aristóteles: “por
professores de Educação Infantil do município que preferimos conversar durante mais tempo
de Pelotas no que se referem às experiências com as pessoas belas?” E o filósofo teria
respondido: “somente um cego faria esse tipo de
estéticas. Por isso, optou-se por desenvolvê-la pergunta” (Vidas e doutrinas dos filósofos
através de uma pesquisa descritiva com ilustres, v. 20 apud PERISSÉ, 2010, p.25).
abordagem qualitativa, que incluiu a
participação de três professores que trabalham
Cego, neste sentido, seria aquele incapaz de
em uma escola conhecida por valorizar o
perceber a beleza através da dupla conexão,
contato das crianças com a Arte, foram
que inclui o que nossa visão capta e o que a
realizadas 12 observações em duas turmas,
nossa visão interior o reconhece também belo.
estas entrevistas encontram-se em andamento.
A beleza, longe do que se supõe, não se
O presente trabalho apresenta considerações
configura de maneira universal, não se refere à
importantes sobre as experiências estéticas e a
capacidade de reconhecer algo belo
relevância de pensarmos tempos e espaços que
unicamente por sua aparência, até porque nisto
busquem favorecer a ocorrência de
entra o quesito do gosto, está na capacidade de
experiências estéticas.
sentir, de perceber o mundo por meio dos
nossos sentidos. Algo é belo, porque nos toca
de forma especial. Portanto, antes de
querermos enquadrar o que vemos a conceitos
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e normas, é preciso de fato ver/sentir; perceber tem se perdido. Percebo que preocupado com
a beleza pressupõe uma disposição, uma a pressa com que as coisas se passam e com a
abertura a perceber as coisas do mundo, esta intenção de falar sobre o valor da experiência,
mesma abertura é a que vai se assombrar, se Larrosa (2002) trouxe importante contribuição
entristecer, que vai provocar um movimento de ao ligar o conceito de experiência a uma
diálogo com o mundo, e não uma atitude de abertura ao acontecimento, a habilidade de
completa passividade e apatia. sentir.
Duarte Júnior (2012, p. 363), expõe que: Segundo o autor, o excesso de informação, de
“nosso encontro corporal, sensível com o opinião, a falta de tempo e o excesso de
mundo, é também estético”. É possível com trabalho nos impedem que de fato algo nos
isso, inferir que a entrega em perceber as coisas toque, nos aconteça. Estamos tão preocupados
do mundo por meio dos sentidos, é resultante em ter o controle das nossas ações que nisso
de uma experiência estética, de um movimento queremos controlar também os nossos
que envolve natureza, corpo e sensação. sentidos, o que sentimos, o que nos toca, o que
nos atravessa, como se isso fosse possível.
O autor supracitado ressalta a importância de
uma educação do sensível, nesse sentido, O que sentimos, o que nos impacta, o que nos
argumenta que acontece, revela um pouco de nós, por isso,
nem sempre, o que emociona um, emociona
[...] a educação do sensível não prescinde da arte outro. O sentir está intimamente ligado aos
– pelo contrário -, mas deve atuar num nível aspectos culturais e históricos de cada um. No
anterior ao da simbolização estética. Mais do que entanto, algumas culturas e histórias de vida,
nunca, é preciso possibilitar ao educando a são marcadas pela privação do sentir, pela
descoberta de cores, formas, sabores, texturas,
odores, etc. diversos daqueles que a vida repressão. Talvez porque saibam o poder
moderna lhes proporciona. Ou, com mais libertador do sentir, da abertura a uma
propriedade, é preciso educar o seu olhar, a sua experiência, e, sujeitos tão ligados aos sentidos
audição, seu tato, paladar e olfato para e a experiências fugiriam do controle daqueles
perceberem de modo acurado a realidade em que acreditam ter poder.
volta e aquelas outras não acessíveis em seu
cotidiano (DUARTE JÚNIOR, 2000, p. 29). Não é incomum que na educação das crianças
pequenas sejam privilegiados o ensino de
O que segundo ele, é possível de diferentes técnicas, de modos de fazer, mais do que a
formas, desde a prática de coisas simples como experimentação de materiais, de
caminhadas por trilhas e bosques, apreciação possibilidades, de conexão com os sentimentos
de perfumes e cheiros, ao contato com obras de e com a própria capacidade criadora que
arte. Chamo atenção frente ao exposto, o possuem. A consequência da primazia do
quanto temos nos acostumado, e educado ensino de técnicas sob a valorização dos
nossas crianças a desejar conceitos, sentimentos tem preparado humanos
racionalizando muitas vezes o que não foi desprovidos de paixão. A técnica não é
sentido. dispensável, mas ela não deve ocorrer de forma
isolada, apreendida por necessidade
Duarte Jr, diz que:
imperceptível aos sentidos.
O sensível (o estésico), veio deixando de ser A propósito, diz Paulo Freire (2007) que
considerado um saber no desenrolar da ensinar exige estética e ética. “Decência e
modernidade, a qual já se afirmou estar boniteza”.
caracterizada por um processo de crescente
abstração, com o conceito (o conhecer
intelectivo) tendo sido elevado à categoria do Não é possível pensar os seres humanos longe,
único conhecimento digno do nome (DUARTE sequer, da ética, quanto mais fora dela. Estar
JÚNIOR, 2000, p. 147). longe, ou pior, fora da ética, entre nós, mulheres
e homens, é uma transgressão. É por isso que
transformar a experiência educativa em puro
No anseio pela abstração de conceitos, pela treinamento técnico é amesquinhar o que há de
informação; o valor do sentir e da experiência fundamentalmente humano no exercício
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educativo: o seu caráter formador (FREIRE, da sua poesia” (p. 5). Ostetto ainda destaca a
1996, p.33). importância de o professor colocar-se como
um “interlocutor privilegiado”, permitindo a
E se ensinar não é transferir conhecimento, socialização dos bens culturais produzidos
mas criar possibilidades para sua própria pela humanidade. Segundo ela, muitas vezes
produção ou construção, como diz Freire, é os professores com receio de desconsiderar o
necessário compreender que ensinar exige o gosto que as crianças trazem de casa, abrem
reconhecimento do ser condicionado, “sei que mão de seu papel que implica entre outros:
sou um ser condicionado mas, consciente do promover encontros de busca, de
inacabamento, sei que posso ir mais além dele” encorajamento à experimentação, a
(p.53). Educar esteticamente é educar alguém aproximação de diferentes códigos estéticos.
para ir além, partindo do que vê, do que
A expressão, a criação, a percepção, a fruição
percebe, é provocar alguém para um processo
devem ser fundamentos de propostas que
de busca, de encontro com os sentidos. Freire
promovam uma diversificada gama de
nos diz que cientes da nossa natureza de
vivências e experiências e necessitam ser
inacabados devemos nos inscrever num
privilegiados pelos professores. Com isto, é
permanente movimento de busca.
significativo refletir que propostas são
oportunizadas na prática cotidiana com as
Na verdade, seria uma contradição se, inacabado crianças que se voltem a possibilidades de
e consciente do inacabamento, o ser humano não
se inserisse em tal movimento. É neste sentido experimentação, de uma educação antes de
que, para mulheres e homens, estar no mundo tudo estética, marcada pela beleza do sentir.
necessariamente significa estar com o mundo e
com os outros. Estar no mundo sem fazer
Ao escrever sobre educação estética,
história, sem por ela ser feito, sem fazer cultura, Vigotsky (2010) destaca a importância de não
sem “tratar” sua própria presença no mundo, sem se atribuir à estética funções alheias, que
sonhar, sem cantar, sem musicar, sem pintar, sem serviriam como recurso para educar o
cuidar da terra, das águas, sem usar as mãos, sem conhecimento, o sentimento ou a vontade
esculpir, sem filosofar, sem fazer ciência, ou
teologia, sem assombro em face do mistério, sem
moral. Segundo as palavras do autor “[...] é
aprender, sem ensinar, sem ideias de formação, indispensável abrir mão da concepção segundo
sem politizar não é possível (FREIRE, 1996, p. a qual as emoções estéticas têm alguma relação
58). direta com as morais e toda obra de arte encerra
uma espécie de impulso moral para o
A infância é uma etapa do desenvolvimento comportamento moral” (VIGOTSKY, 2010, p.
humano marcada pela curiosidade, pelo desejo 325), pois assim, há a substituição de um
de descobrir, pela necessidade e vontade de sentimento estético por um momento moral.
ampliar conhecimentos e conectar-se com o Outro equívoco apontado pelo autor refere-se
mundo, sabendo disso, Ostetto (2011) diz que à imposição de problemas e objetivos de
ordem social e cognitiva, como se a arte e a
[a] presença da arte na educação infantil será estética não tivessem finalidades em si
tanto mais importante, quanto puder contribuir
mesmas, mas em fazer uma leitura do real, das
para ampliar o olhar da criança sobre o mundo, a
natureza e a cultura, diversificando e organizações sociais, com isso, descreve
enriquecendo suas experiências sensíveis- Vigotsky que “[...] arriscamos não só a ficar
estéticas, por isso, vitais (OSTETTO, 2011, p. 5). com uma concepção falsa da realidade como
também excluir os momentos puramente
Nesta direção, a autora aponta para a estéticos do ensino” (VIGOTSKY, 2010, p.
necessidade de se ter clara a importância de 330).
mobilizar os sentidos, para isso, “[...] é Um último equivoco apresentado, refere-se à
essencial o enriquecimento de experiências, redução da estética ao que é agradável, ao
promovendo encontros com diferentes trabalho com obras de arte que são capazes de
linguagens, alimentando a imaginação para suscitar alegria e prazer, segundo Vigostky a
que meninos e meninas possam aventurar-se a arte não deve ser vista tão simplesmente como
ir além do habitual, à procura da própria voz, meio para despertar reações hedonísticas.
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Veja em:
2
Os “Minions” são personagens do filme Meu https://meumalvadofavorito.com.br/filmes/meu-
Malvado Favorito, são seres amarelos, pequenos, que malvado-favorito/
servem ao seu estimado vilão e possuem um idioma
muito próprio e engraçado, frutos de pura ficção,
fizeram tanto sucesso em Meu Malvado Favorito que
ganharam um filme só seu: “Minions”.
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interação com as crianças, com os adultos. provocador de afetos. O afeto é o primeiro sinal
Portanto, não é necessário instaurar uma de que o professor está se dando bem ou mal com
o que faz ou com quem se propõe a fazer, porque
norma às produções das crianças, indicar é um mapa sensível do que acontece em aula,
cores, traços e linhas, é necessário sim, com o que chega e sai dela, transmutado em valor
participar do processo de descoberta, para a vida pessoal e social (MEIRA E
promovendo novas formas de criar, ver e PILLOTTO, 2010, p. 11).
perceber o mundo.
A conexão que se dá pela via afetiva
Parece que o adulto “não aguenta” o processo da desencadeia determinadas relações nas
criança, suas experimentações, seu práticas educativas, implica em determinados
desordenamento, seus rabiscos... Em tudo, o modos de criação. É de fato o mapa sensível,
adulto quer colocar ordem – a sua ordem –
nomear, enquadrar, e, então, acaba por interferir
que pode guiar práticas pedagógicas de
indevidamente nas produções das crianças. qualidade. As autoras destacam que “se faz
Acaba por silenciar a voz da criança, restringindo educação com afeto, ética e estética,
seu processo de criação (OSTETTO, 2011, p. articuladas as diversas áreas do conhecimento
11). e as múltiplas possibilidades de perceber e de
sentir o contexto no qual estamos inseridos
Se não interfere no processo querendo como protagonistas na construção de muitas
nomear os desenhos, ditando modos de fazer, histórias” (p. 23). Tão importante quanto isto,
insiste em por legenda. Como sugere Ostetto é saber que o os processos de criação e o afeto,
(2011), seria então mais interessante que o estão relacionados à sensibilidade e que esta
adulto procurasse conhecer a história daquele não é privilégio somente de artistas, mas
desenho do que identificar figuras. Isto porque capacidade inerente a todos os seres humanos.
a pergunta: “qual a história do seu desenho?”
A criança frequenta diferentes ambientes e é
pode levar a criança a organizar seu
influenciada afetivamente por eles. Através
pensamento e expressá-lo. Entretanto, como
das imagens que observa, dos sons que ouve,
diz a autora, que isto não se torne uma
das relações que observa. Tudo que chega a ela
atividade didática.
envolve um caminho de percepção. Às artes
É preciso compreender como marca única de elas não estão imunes, mas mais envolvidas,
um momento da criança a produção que portanto é necessária uma educação que inicie
realiza, o modo como faz, a resistência ao as crianças ao mundo das sensações, a um
fazer, as preferências. Nem todos apreciam as universo estético.
mesmas obras, as mesmas manifestações
Santini e Vasconcellos usam o termo
artísticas, entretanto, cabe ao professor
alfabetização estética e assim pontuam:
considerar as sensações frente às propostas, o
que manifestam as crianças, o foco deve estar
no processo e nas sensações que vão sendo A alfabetização estética, artística e visual no
ensino de arte se inicia nos primeiros anos
vivenciadas. É necessário estar disposto a fazer escolares e a construção do conhecimento,
uso de uma percepção sensível que permeia dependerá das concepções de arte do professor e
todo o ato pedagógico, quando trabalha com a de suas escolhas epistemológicas e
arte, mas não só quando esta é contemplada, as metodológicas (SANTINI; VASCONCELLOS,
sensações são nossas primeiras respostas ao 2011, p. 545 – 546).
que nos acontecem e merecem ser
privilegiadas na educação, ainda mais quando O professor, que um dia já foi criança, tem
se deseja que a educação prime pelo valor impressas situações em que as artes se fizeram
estético, pelo valor do sensível. presentes em sua trajetória. Enquanto ser
experiente em situações de vida que lhe
Sobre arte, afeto e educação, Meira e Pillotto formaram ou “deformaram”, tem condições de
afirmam: dialogar com a teoria e fundar a prática em
experiências que potencializem o ser criativo,
O professor, como artista, ou como o artista- expressivo, crítico e apreciador de cada
professor, é um mostrador de afetos, um criança.
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entre as crianças, entre elas e o professor, entre É importante destacar o papel do professor na
elas e o objeto de interação. organização destes espaços, e que não se
encerra como mero organizador, vai além! É
Os tempos são marcados pela qualidade das
aquele que pensa espaços para as crianças, com
vivências e pelo espaço em que ocorrem, creio
as crianças, que ouve, que brinca, que percebe
que por isso, costumeiramente ao falar sobre
as emoções envolvidas, que as considera. Por
tempos na educação infantil se fala também em
isso é preciso tempo, um tempo organizado,
espaço.
bem pensado e de entrega sensível, já que o
tempo não é feito de um percurso no relógio,
Quando me refiro ao espaço, penso nele de intervalos cronometrados, é feito dos
enquanto estrutura física e estética, que sentidos que preenchem momentos que
acomoda estas crianças no âmbito das transcorrem as nossas vidas. O tempo se
instituições de educação infantil. É o concretiza pelo significado das nossas
espaço abrigo, que cotidianamente experiências, pela maneira como nos toca, se
permite a relação entre crianças, crianças não é o mero tempo perdido. Nem na infância
e adultos, e que é pensado para acolher e nem em qualquer outra faixa etária temos
crianças que estão em contato com um tempo a perder.
mundo repleto de possibilidades, o A organização do tempo é fundamental, mas
mundo do conhecimento. organizá-lo não significa aprisioná-lo. Os
tempos não devem transcorrer sem uma
preocupação estética. No que consiste então
Barbieri diz que o espaço tem intenção e um tempo permeado por esta tal preocupação
orienta a ação, ela destaca que o espaço estética?
convida, suscita ritmos, transparece segurança,
conforto. Há por isso espaços que permitem Consiste em um tempo em que são
que nos sintamos valorizados e à vontade, que observadas as interações entre as crianças, o
nos impulsionam à criação. A autora traz que lhes agrada, descontenta, o que causa
algumas questões que suscitam a reflexão das euforia, indignação, nisto o professor não é um
práticas docentes quanto à organização dos mero observador, ele observa com o propósito
materiais e dos espaços na sala de aula: “Como da ação, com o objetivo de propor alternativas
você os organiza em sua sala? Sempre da de uso do tempo, de criação de espaços, de
mesma maneira, ou de formas variadas? mundos de faz-de-conta, de experiências do
Sempre os mesmos ou inventa novas mundo real. A marca de um tempo permeado
possibilidades?” (BARBIERI, 2012, p. 52). por uma preocupação estética se faz pela
atenção às emoções ocorridas nos espaços,
É gratificante perceber as experiências que pela ação que propõe um conhecimento
somos capazes de proporcionar às crianças sensível das relações e dos conhecimentos
através de uma prática que contempla a acumulados pela humanidade.
organização dos espaços de forma a suscitar o
olhar curioso, o toque, a escuta, a descoberta.
Um pano que delimita um espaço na sala, uma Conclusões
caixa, um painel para pintura, um móvel, um
Falar em experiência estética é um desafio e
lugar para exposição de criações, um lugar
perguntas surgem: como perceber o que é uma
para criações e tantos outros, pois no espaço da
experiência estética?
sala cabem tantos outros espaços. Para isto, é
necessário pensar propostas que busquem a Dado seu aspecto singular costuma-se supor
promoção de experiências estéticas, onde o que ela não será perceptível, no entanto,
professor é promotor, mediador e percebe-se que é com o avanço da idade que se
potencializador de experiências que suscitam passa a esconder as emoções e sentimentos.
os sentidos. Ele observa, entra em cena, Quando somo crianças, somos puro
constrói histórias, canta, desenha, dança, se faz
sentimento! Nossos encontros sensíveis com o
ser brincante e artista. mundo costumam ser narrados, ou expressos
294
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
através do olho que brilha, da qualidade de [4] FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia:
entrega a uma experiência. saberes necessários à prática educativa. 35.
ed. São Paulo: Paz e Terra, 2007, 148 p.
Por isso, por mais desafiador que seja falar de
[5] OSTETTO, Luciana Esmeralda. Educação
experiências tão singulares como as
Infantil e Arte: Sentidos e Práticas Possíveis.
experiências estéticas, é necessário, é urgente
Acervo Digital da UNESP, 2011. Disponível
e imprescindível.
em:
Valorizar as habilidades sensíveis desde a <http://acervodigital.unesp.br/handle/1234567
infância, exercer a habilidade de favorecer 89/320>. Acesso em: 31 mar. 2018.
tempos e espaços onde experiências estéticas [6] VIGOTSKI, Lev. Semenovich. Psicologia
possam ocorrer é uma responsabilidade de Pedagógica. 3. ed. São Paulo: Editora WMF
caráter ético e estético. No entanto, o professor Martins Fontes, 2010, 561 p.
não delimita tempos e espaços e sai de cena, [7] MEIRA, Marly Ribeiro; PILLOTO, Silvia
ora ele está em cena como observador, ora Sell Duarte. Arte, afeto e educação: a
como brincante e experimentador de ações sensibilidade na ação pedagógica. Porto
também. Ele cria, observa, brinca, experimenta Alegre: Mediação, 2010, 139 p.
materiais, espaços, se aproxima com tempo e [8] SANTINI, Jacyara Batista.
nos diferentes espaços do cotidiano infantil. VASCONCELLOS, Sônia Tramujas.
Educação estética como percepção de si, do
outro e da arte na educação infantil. X
REFERÊNCIAS Congresso Nacional de Educação. EDUCERE
[1] PERISSÉ, Gabriel. Estética e Educação. <http://educere.bruc.com.br/CD2011/pdf/433
2. Ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 8_2390.pdf>. Acesso em 17 mai. 2018.
2014, 100 p. [9] ZAMPERETTI. Maristani Polidori. O Eu e
[2] DUARTE JUNIOR. João Francisco. O o Outro na sala de aula – ocultando e
sentido dos sentidos: a educação (do) sensível. revelando máscaras. 2007. 130 f. Dissertação
2000. 233 p. Tese (doutorado) – Universidade (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-
Estadual de Campinas, Faculdade de Graduação em Educação, Universidade
Educação, Campinas, SP. Disponível em: Federal de Pelotas, Pelotas.
<http://repositorio.unicamp.br/bitstream/REP [10] DEWEY. John. Experiência e Educação.
OSIP/253464/1/DuarteJunior_JoaoFrancisco_ 2.ed. Petrópolis; RJ: Vozes, 2011.
D.pdf>. Acesso em: 16 mar. 2018. [11] CUNHA. Stela. Interações: onde está a
[3] LARROSA, Jorge. Notas sobre a arte na infância? São Paulo: Blucher, 2012.
experiência e o saber da experiência. Revista
Brasileira de Educação. N. 19, p. 20-28,
jan./fev./mar./abr. 2002b.
295
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
a
Sociedade Independente Cultural – SIC; Jaguarão, Rio Grande do Sul, Brasil; cjmaninho@gmail.com.
b
LaboratórioCurso de Turismo da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA/ campus Jaguarão), Rio Grande do
Sul, Brasil;angetur.ribeiro8@gmail.com
RESUMO
A primeira década do século XXI no Brasil vai protagonizar uma série de políticas públicas para a
educação voltadas para a formação inicial, entre elas surge o PIBID (Programa Institucional de Bolsas
de Iniciação à Docência). Partindo do entendimento de que é na formação inicial do professor que
começa a qualidade da educação, e considerando a falta de oportunidades de interação dos alunos das
licenciaturas, de forma geral, nos primeiros semestres dos cursos, com as Instituições de Ensino,
trabalhamos com a ideia de propiciar atividades interdisciplinares através do PIBID, que além de
enriquecer a experiência destes alunos, contribui também para com os professores e alunos nas
escolas trabalhadas. Os autores deste artigo se encontraram e participaram ativamente do Pibid
oriundo do Edital 2011, com alunos do Curso de História da Unipampa. Trabalhou-se no sentido de
possibilitar atividades interacionistas destes alunos, alguns do segundo semestre do curso de história,
com a Educação Básica. Pensar dialeticamente é objeto a ser tratado neste artigo, considerando todas
as experiências de ações e vivencias de forma a estabelecer possibilidades de compreensão da
dinâmica social. Busca-se com o PIBID analisar a continuidade do programa, as possibilidades que
ele possa mostrar e o que nele pode e deve melhorar.
Palavras chave: Educação continuada, PIBID,Interdisciplinaridade.
RESUMEN
La primera década del siglo XXI en Brasil va a protagonizar una serie de políticas públicas para la
educación dirigidas a la formación inicial, entre ellas surge el PIBID (Programa Institucional de Becas
de Iniciación a la Docencia). A partir del entendimiento de que es en la formación inicial del profesor
que comienza la calidad de la educación, y considerando la falta de oportunidades de interacción de
los alumnos de las licenciaturas, de forma general, en los primeros semestres de los cursos, con las
Instituciones de Enseñanza, trabajamos con la idea de propiciar actividades interdisciplinarias a través
del PIBID, que además de enriquecer la experiencia de estos alumnos, contribuye también con los
profesores y alumnos en las escuelas trabajadas. Los autores de este artículo se encontraron y
participaron activamente del Pibid oriundo del Edital 2011, con alumnos del Curso de Historia de la
Unipampa. Se trabajó en el sentido de posibilitar actividades interactivas de estos alumnos, algunos
del segundo semestre del curso de historia, con la Educación Básica. Pensar dialécticamente es objeto
a ser tratado en este artículo, considerando todas las experiencias de acciones y vivencias de forma a
establecer posibilidades de comprensión de la dinámica social. Se busca con el PIBID analizar la
continuidad del programa, las posibilidades que él pueda mostrar y lo que en él puede y debe mejorar.
Palabras clave: Educación continuada, PIBID, Interdisciplinariedad.
296
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
1Pela especificidade dos cursos de Pedagogia Séries Iniciais, convênios com as Redes de Ensino e ou ainda a existência de
nestes, este problema vem sendo equacionado através de uma Escola de Aplicação.
297
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
Normal (antigo Magistério) do Instituto mais claro o foco de sua missão, conforme a
Estadual de Educação Espírito Santo da cidade CAPES7 (Coordenação de Aperfeiçoamento
de Jaguarão/RS (IEEES), que enquanto de Pessoal de Nível Superior), promover ações
professor e diretor desta escola [4] por alguns voltadas para a valorização do magistério por
anos, fora possível acompanhar a formação meio da formação de professores.
inicial daqueles futuros professores, na Escola Em 2013, a DEB buscou fortalecer seus
de Aplicação e depois nas Escolas da Rede principais programas, com o propósito de
onde havia o convênio com o Estado do RS, da organizá-los a partir de eixos comuns, de forma
qual a escola fazia parte [5]. Posteriormente, já que o conjunto concretize uma política de Estado
com estes cursos extintos, nos foi possível voltada à formação inicial e continuada. [...]. Os
eixos comuns a essa política são (a) a busca da
coordenar e supervisionar[6] uma turma de excelência e da equidade na formação de
acadêmicos (2011-2013) da Unipampa, professores; (b) a integração entre instituições
campus Jaguarão, no PIBID, onde trabalhamos formadoras, escolas públicas de educação básica
no sentido de propiciar um bom contato e e programas de pós-graduação e (c) a produção e
atividades destes alunos, alguns do segundo disseminação do conhecimento produzido. [...].
Os princípios estruturantes da formação de
semestre do curso de história, com a educação professores induzida e fomentada pela DEB são:
básica na Escola conveniada. A partir desta conexão entre teoria e prática; integração entre
experiência, perceber que este, inicialmente instituições formadoras, escolas e programas de
projeto, poderia se ampliar e suprir com louvor pós-graduação; equilíbrio entre conhecimento,
a deficiência ora apresentada acima bem como competências, atitudes e ética; articulação entre
ensino, pesquisa e extensão. Esses princípios
ser um futuro programa de Estado (o que se básicos respeitam a autonomia das instituições
tornou a partir de 2013) para preparar de forma formadoras e das redes de ensino e, ainda, as
mais qualificada os acadêmicos das características locais e regionais, mas, ao serem
Licenciaturas para os desafios que os esperam intencionalmente traduzidos nos projetos
na Educação básica. No entanto ainda seria pedagógicos de cada instituição parceira,
produzem uma dinâmica capaz de renovar e
necessário ampliar o programa, talvez inovar a formação dos professores do País
dividindo em duas partes, uma para os (Relatorio de Gestao PIBID, 2013, p. 5).
primeiros semestres e outra para os últimos
(antes do estágio), tema que também será
abordado, porém não esgotado, neste trabalho. A DEB, a partir do entendimento da
importância da formação inicial, fomenta três
programas importantes. O Plano Nacional de
O PIBID Formação de Professores da Educação Básica
A DEB (Diretoria de Educação Básica – Parfor, que destina-se a professores que já
Presencial) foi criada em 2007, através da Lei atuam na rede pública, porém, sem a formação
11.502, de 11 de julho de 2007, com o intuito superior exigida pela Lei de Diretrizes e Bases
de induzir e fomentar a formação inicial e da Educação Nacional – LDB; o Programa
continuada de profissionais da educação básica Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência
além de estimular a valorização do magistério – Pibid, foco deste trabalho, alcança alunos de
em todos os níveis e modalidades de ensino. licenciaturas – professores ainda em formação;
Em 2012, o Decreto nº 7.692, de 2 de março, e o Programa de Consolidação das
alterou o nome para Diretoria de Formação de Licenciaturas – Prodocência, que busca
Professores da Educação Básica, mantendo-se promover a melhoria e a inovação nas
a sigla DEB. Esta mudança revelou de modo licenciaturas, inclusive incentivando a
4
Aqui referimo-nos especificamente a Carlos José de exceção aos estágios, geralmente nos últimos semestres
Azevedo Machado. destes cursos.
6
Respectivamente, Ângela Mara Bento Ribeiro pela
5 Unipampa, campus Jaguarão e Carlos José de Azevedo
Cabe ressaltar aqui, que neste curso a formação era Machado, pelo IEEES.
apenas para professores das séries iniciais e pré–escola,
7
que foram substituídos pelos Cursos de Pedagogia séries Relatorio de Gestao PIBID, 2013.
iniciais. A situação de formação e vivência prática em
escolas para as demais formações (de nível superior) não
possuíam esta experiência, ao menos de forma geral,
298
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
8
Fonte: Disponível em: _e_comiss%C3%A3o_block.pdf>. Acessoem
<http://www.capes.gov.br/images/stories/download/av 26/05/2018.
aliacaotrienal/Docs_de_area/Interdisciplinar_doc_area
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
primeira, com alunos nos primeiros semestres, defendemos e propomos que o Pibid deva ter
com atividades de observação e projetos prosseguimento e que, através das avaliações
aplicados, e numa segunda etapa do mesmo, deve aprimorar e ajustar suas
(continuidade) já nos últimos semestres. Nos ações, no sentido de manter a interação entre o
dois últimos seria importante permitir o educando e as escolas, bem como a
envolvimento dos alunos mais especificamente Universidade e seus Cursos de Licenciaturas,
com os estágios, onde neste momento, os envolvidos diretamente nas Instituições de
mesmos já terão passado pela experiência Ensino, não só através da pesquisa, mas
pibidiana, junto as Instituições de Ensino. também da extensão e do ensino, e que o Pibid
pode proporcionar de forma bem eficiente, por
Como fora colocado a metodologia
se tratar de um programa que se processa além
aplicada levará sempre a um resultado, porém
da universidade. É um programa que provoca
se não tomarmos cuidado com o caminho, este
e faz com que a Universidade esteja e seja vista
resultado poderá ser bem ruim. Fundamental
de fato, como uma parceira da comunidade
que as primeiras atividades sejam de formação
onde está inserida.
e aprofundamento teórico entre os professores
e alunos envolvidos, seminários internos para
em seguida, aplicação e análise teórico-prática
REFERÊNCIAS
do que se pensou.
ANDRADE, Rosamaria Calaes. 2005. Artigo
A formação na qual estamos frisando, disponível em:
caminha no sentido de exercitar a dialética, de http://www.ufpa.br/ensinofts/interdisci.html,
pensar o concreto, a realidade onde se está acessoem 26/05/2018.
trabalhando e suas relações.
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda&
Atualmente vivemos um momento bem MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando
preocupante frente às políticas públicas para a Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna,
educação, sobretudo programas como o Pibid,
1986.
que, a princípio, foram desenvolvidos no
sentido de uma Escola Crítica e não uma BRASIL, Constituição da República
Escola Não Crítica ou ingênua (para não dizer Federativa do Brasil. Art. 205 e 206, em:
neutra, uma vez que não existe neutralidade na http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9
vida concreta) como a chamada “Escola Sem 394.htm
Partido” apresentada no Congresso Nacional e BRASIL: Lei de Diretrizes e Bases da
defendida pelo presidente eleito no sufrágio de Educação Nacional: Lei nº 9394/96, em:
2018. A ideia do Pibid caminha no sentido http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L
oposto desta proposta, pois vai, justamente no 9394.htm
sentido de respeitar as diretrizes e princípios de
BRASIL, PARECER CNE/CP Nº 8/2009, disponível
nossa Constituição Federal e LDB, buscando
em:
atuar com enfoque na liberdade de aprender, http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/pcp00
ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o 8_09.pdf
pensamento, a arte e o saber. Onde o
pluralismo de idéias e de concepções CAPES, Documeto de área e Comissão da
pedagógicas, o respeito à liberdade e apreço à Trienal 2013.
tolerância são fundamentais para avançarmos Fonedisponívelem:<http://www.capes.gov.br/
no caminho do conhecimento e images/stories/download/avaliacaotrienal/Doc
desenvolvimento social. Embora pareça um s_de_area/Interdisciplinar_doc_area_e_comis
paradoxo, não seria a primeira vez que nossa s%C3%A3o_block.pdf>. Acessoem
Constituição vire letra morta, ou mesmo, 22/05/2018.
construa-se uma nova, retrocedendo todos HARTMANN, Ângela Maria (org.). Redes
estes princípios hoje basilares em nossa que tecem saberes: vivências e práticas da
legislação. iniciação à docência. São Leopoldo: Oikos,
Atentos a este processo vigente, mas firmes 2014.
na defesa de uma educação progressista,
304
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
b
Doutorando em Educação./Faculdade de Educação/Universidade Federal de Pelotas, lihtnov@gmail.com
RESUMO
O objetivo deste trabalho é analisar o tema geografia em livros escolares produzidos para o ensino da
geografia no final do século XIX e início do XX. Essas obras circularam e foram fornecidas pelas
autoridades do Rio Grande do Sul às escolas públicas primárias e atualmente são salvaguardadas pelo
Grupo de Pesquisa História da Alfabetização, Leitura, Escrita e dos Livros Escolares (Hisales) da
Universidade Federal de Pelotas. A análise do conteúdo dos livros didáticos se mostra um importante
caminho para elucidar as orientações e convicções ideológicas manifestadas na sociedade e postas ao
espaço escolar a partir da utilização deste recurso didático. Considerando, ainda, a relevância que
esse objeto teve nos diferentes contextos educacionais e que o livro didático é importante na
constituição e na manutenção da cultura material escolar buscamos investigar a transformação do
pensamento geográfico de modo a interpretar as correntes e tendências presentes nestes livros
escolares para o ensino da geografia. Assim, partindo do pressuposto de que em determinada época e
lugar são gerados paradigmas do conhecimento, se investiga como estes paradigmas aparecem nos
livros escolares usados nas escolas gaúchas no final do século XIX e no início do XX para o ensino
da geografia. Desse modo, as análises realizadas nesta operação historiográfica (CERTEAU, 2015)
foram pautadas nos estudos de Choppin (2004; 2009), Batista (2000), Munakata (1997) e Bittencourt
(1993).
Palavras chave: geografia, livros escolares, Rio Grande do Sul, século XIX e XX.
ABSTRACT
The objective of this work is to analyze the theme geography in school textbooks produced for the
teaching of geography in the late nineteenth and early twentieth centuries. These works circulated
and were provided by the authorities of Rio Grande do Sul to primary public schools and are currently
safeguarded by the Research Group History of Literacy, Reading, Writing and School Books
(Hisales) of the Federal University of Pelotas. The analysis of the content of textbooks is an important
way to elucidate the orientations and ideological convictions manifested in society and put into the
school space from the use of this didactic resource. Considering also the relevance of this object in
the different educational contexts and that the textbook is important in the constitution and
maintenance of the school material culture, we seek to investigate the transformation of the
geographic thought in order to interpret the currents and tendencies present in these school books to
the teaching of geography. Thus, based on the assumption that paradigms of knowledge are generated
at a given time and place, one investigates how these paradigms appear in the textbooks used in
Gaucho schools at the end of the 19th century and at the beginning of the 20th century for the teaching
of geography. Thus, the analyzes carried out in this historiographical operation (Certeau, 2015) were
based on the studies of Choppin (2004, 2009), Batista (2000), Munakata (1997) and Bittencourt
(1993).
Keywords: geography, school books, Rio Grande do Sul, 19th and 20th century.
306
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
9
O Hisales - História da Alfabetização, Leitura, O Hisales, atualmente, possui seis principais acervos,
Escrita e dos Livros Escolares - é um centro de memória entre outros complementares: a) caderno de alunos
e de pesquisa vinculado ao Programa de Pós-Graduação (ciclo de alfabetização e outros); b) cadernos de
em Educação (PPGE) da Faculdade de Educação (FaE) planejamento (diários de classe) de professoras; c) livros
da Universidade Federal de Pelotas (UFPel). para o ensino inicial da leitura e da escrita nacionais e
Coordenado pelas professoras Eliane Peres e Vania estrangeiros; d) livros didáticos produzidos no Rio
Grim Thies, reúne pesquisadores da UFPel e de outras Grande do Sul entre 1940 e 1980; e) materiais didático-
instituições de ensino da região sul, contando com a pedagógicos; f) escritas pessoais e familiares. Mais
participação de alunos de pós-graduação (mestrado e informações a respeito do Hisales, dos acervos e
doutorado) e de graduação. O grupo tem procurado projetos podem ser vistas via internet
estabelecer uma política de recolha, tratamento e guarda no site (http://www.ufpel.edu.br/fae/hisales/) e no perfil
de objetos da cultura escolar, constituindo, assim, na rede social Facebook (Hisales).
importantes acervos para a manutenção da história e da
memória da alfabetização e para a pesquisa educacional.
307
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
objeto variável e instável, como afirma Batista conhecido como Antiguidade Clássica foi
(2000), sua produção e circulação e seus usos caracterizado pela a-sistematização do
revelam aspectos de projetos políticos e conhecimento geográfico: houve uma
sociais, de práticas e concepções pedagógicas, diversidade no entendimento das concepções
assim como do campo editorial. Desse modo, do que se entendia por geografia. Uma grande
investigá-los requer compreender tanto sua variedade de conteúdos foi contemplada sob o
relação com o contexto histórico, político e mesmo rótulo: astronômicos, matemáticos,
social, bem como com a organização históricos, ecológicos e regionais. Deste modo,
educacional de cada período e com as questões nem sempre foi possível definir com clareza
gráfico-editoriais (BITTENCOURT, 1993; aquilo que era próprio da geografia, filosofia,
MUNAKATA, 1997; FRADE, 2010). história ou da matemática. Este período,
fundamentado na observação e descrição,
Nesse sentido, a análise dos livros didáticos e
estendeu-se até a queda do Império Romano,
de seus conteúdos se mostra um importante
em 476 d.C., quando se iniciará um novo
caminho para elucidar as orientações e
paradigma epistemológico regido pela
convicções ideológicas manifestadas na
“vontade de Deus”.
sociedade e postas ao espaço escolar a partir da
utilização deste recurso didático. Ao procurar respostas de ordem religiosa, o
ser humano abandonou a ciência e o
Considerando essas ressalvas, a análise
pensamento geográfico sendo levado à
exposta neste texto está organizada em três
interpretação bíblica, fato que acarretou uma
seções. Na primeira, contextualizam-se as
série de retrocessos com relação ao
compreensões que o pensamento geográfico
conhecimento já elaborado. Este poder da
foi assumindo no decorrer dos tempos; na
Igreja viria a se fortalecer durante a Idade
segunda, a constituição do tema geografia
Média. Para a geografia, será o
enquanto disciplina escolar no âmbito do
desenvolvimento das grandes navegações que
território brasileiro, e por fim, na terceira,
trará ao pensamento geográfico, a partir da
analisam-se as informações acerca dos livros
cartografia, ideias mais realistas.
didáticos pesquisados, as quais envolvem a
autoria, a apresentação gráfica e a utilização do Se até então a geografia era uma ciência
livro nas aulas públicas do Rio Grande do Sul. confusa, sem identidade, ela renascerá no final
do século XIX com a sistematização da
ciência geográfica.
Dualidades da Geografia: Pensamento
Esta nova geografia que emerge ao longo do
Geográfico e Científico; Tradicional e
século XX analisará o espaço geográfico sob
Critica
diferentes enfoques: primeiramente, a partir da
O saber geográfico não é recente. O que hoje lógica determinista, em que o espaço é
chamamos de geografia é um conhecimento entendido como a causa da organização social;
elaborado desde a antiguidade. No início de a possibilista, em que o ser humano tem
sua existência, os seres humanos construíram possibilidades de transformação do espaço a
seus conhecimentos a partir das práticas partir do seu desenvolvimento técnico; e a
espaciais. Estes saberes, oriundos das práxis no racionalista, que se propõe a explicar por que e
trato com o espaço, propiciou a primeira leitura em que se diferem as porções da superfície
do mundo que os cercava: o conhecimento terrestre. O espaço, nesta concepção, é
enquanto sinônimo de vivência. entendido apenas como um palco onde
Na antiguidade, os povos (mesopotâmios, ocorrem as ações do ser humano. Esta será a
fenícios, egípcios e chineses) procuravam base metodológica da chamada Geografia
conservar informações sobre os caminhos Tradicional, fundamentada na observação,
percorridos, em sua grande maioria a procura descrição e classificação das paisagens e
de melhores condições de subsistência. Desta regiões.
prática, surgiram os primeiros esboços Um novo paradigma começa a ser escrito a
representando a superfície terrestre. Neste partir das profundas transformações ocorridas
sentido, pode-se dizer que o período histórico na sociedade global após o período das duas
308
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
Ainda, abaixo destas informações, constam o estrutura didática que se repete e faz uso de três
nome do autor, ano de publicação e editora, elementos centrais: a) Imagem; b) Texto; c)
com um leve destaque para a indicação do Lição Central. Na figura 2, por exemplo, é
autor. possível observar a utilização de uma
paisagem, seguida de um texto utilizado como
Quanto à ilustração presente na capa, vale
recurso didático para o ensino de um conceito
salientar que ela remete a uma paisagem
geográfico.
composta predominante de elementos naturais
(rochas, árvores, rio e pássaros), tendo em De um modo geral, a análise dos conteúdos
destaque dois homens, com cavalos e trajes revela um direcionamento à Geografia Física
típicos do Rio Grande do Sul, observando ao ou Sistemática, com especializações tópicas
fundo uma cidade em expansão sob a natureza. (Geografia do Clima, Geografia do Relevo,
A figura é impressa na mesma tonalidade da Geografia da Geografia Econômica, etc.),
capa, trazendo alguns elementos na cor sendo utilizado o recurso do mapa ao final de
vermelha (a capa de um dos cavaleiros), bem cada seção como elemento sintetizador do
como o telhado das casas que aparecem ao conhecimento (Figura 3).
fundo da ilustração (Figura 1).
No que tange à folha de rosto do livro,
destaca-se que ela apresenta o nome do autor
seguido do título da obra com destaque para a
palavra “Geographia” em tamanho maior,
tendo logo abaixo a indicação do recorte do
tema, o “Estado do Rio Grande do Sul”.
Uma curiosidade presente na folha de rosto,
que merece ser ressaltada, diz respeito à
menção de a obra ser aprovada, em 1911, pelo
Conselho de Instrucção Publica, e adotada em Figura 3. Mapa Hidrográfico do Rio Grande do Sul -
todos os estabelecimentos de “instrucção”, o Noções de Geographia – 1929, s/ed. Fonte: Dos
que sem dúvida demonstra o grau de autores.
reconhecimento da obra por parte do estado.
É interessante destacar ainda que, mesmo
Com relação à estrutura da obra, ela está sendo aprovado no ano de 1911, a edição
dividida em duas partes: Na primeira, há o localizada é datada de 1929, o que,
estudo do estado do Rio Grande do Sul, e na provavelmente, indica a circulação e uso deste
segunda o estudo da geografia física do Brasil livro por um longo período nas aulas públicas
e do globo terrestre. do estado, mais buscas a esse respeito vêm
sendo realizadas na pesquisa.
b)Geografia Elementar (1933 – 14ª ed.)
Publicado pela Livraria do Globo sob autoria
de José Teodoro de Souza Lobo, o livro
didático possui medidas de 13x18 cm,
contendo 214 páginas. Assim como a obra
anterior, é utilizado o preto para os textos,
sendo utilizadas algumas tonalidades de cores
para a impressão de alguns mapas que se
apresentam ao longo da obra.
Quanto à capa da publicação, esta apresenta
uma coloração azul suave, não contendo
Figura 2. Conteúdo do Livro Noções de Geographia – nenhuma ilustração estampada, apenas uma
1929, s/ed. Fonte: Dos autores. forma geométrica circular onde está inserido,
Ao longo da obra é possível identificar uma em destaque, o título e a edição da obra. Acima
311
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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12 Arithmeticas
9 História do Rio Grande do Sul, Stella Dantas
10 Historia do Rio Grande do Sul, João Maia Figura 8. Folha de Rosto do Livro Nosso Estado (s/ano
- 6ª ed.). Fonte: Dos autores.
12 Historia do Brazil, Lacerda
5 Geographias, de H. Martins Com relação à estrutura do livro, este se
divide em dez seções, contemplando,
2 Geographias, de Souza Lobo
exclusivamente, a Geografia do Estado do Rio
2 Geographias, de Guerreiro Lima Grande do Sul: Divisão Regional; Limites,
35 Taboadas Methodica Rios e Serras; Ilhas, Portos e Lagôas; Cidades
Principais; Estradas de Ferros-Transportes; A
Quadro 1. Exemplos de livros fornecidos e/ou Vida na Cidade, na Zona Agrícola, na Serra, na
existentes nas aulas públicas no ano de 1913. Fonte: Campanha e no Litoral; Estradas de Rodagem-
Quadro elaborado pelos autores a partir dos dados Comunicações; Agricultura, Criação, Indústria
coletados.
e Comércio; Produções do Estado do Rio
c)O Nosso Estado (s/ano – 6ª ed.) Grande do Sul; Situação do Estado do Rio
Publicado pela Editora Tabajara, a obra tem Grande do Sul.
a autoria de Lucia Zoehler. Com medidas de No que tange à abordagem metodológica,
22x18cm, esse livro didático contém 32 verifica-se uma estrutura didática que se
páginas e está impresso em preto e branco. repete, a utilização, a cada página (lição), de
Possui ilustrações, mapas e fotografias que um tópico e um mapa para ilustrar o tema
acompanham os textos e as atividades. abordado. A Figura 9 demonstra esse processo:
Diferentemente das obras anteriores, o livro
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presença de uma obra didática produzida por BATISTA, Antônio Augusto Gomes &
uma mulher entre as obras analisadas, uma GALVÃO, Ana Maria de Oliveira (org.).
tendência que viria a crescer e se consolidar no Livros Escolares e de Leitura no Brasil:
Estado do Rio Grande do Sul entre as décadas Elementos Para Uma História. Campinas:
de 1940 e 1980, incentivadas pela atuação do Mercado de Letras, 2009, p.41-76.
CPOE - Centro de Pesquisa e Orientações [5] BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes.
Educacionais. O CPOE teve um papel Livro didático e conhecimento histórico: uma
marcante nos rumos do ensino sul-rio- história do saber escolar. 369f. 1993. Tese
grandense orientando, fiscalizando e (Doutorado). Departamento de História da
controlando projetos e práticas pedagógicas Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da
para as escolas primárias. Dentre as Universidade de São Paulo, USP, São Paulo,
imposições pedagógicas mais marcantes 1993.
estavam as relacionadas ao currículo escolar e
à produção dos livros didáticos. [6] MUNAKATA, Kazumi. Produzindo livros
didáticos e paradidáticos. 223f. 1997. Tese
Em síntese, essas análises indicam a (Doutorado). Pontifícia Universidade Católica
predominância da corrente epistemológica de São Paulo, PUC-SP, São Paulo, 1997.
denominada de Geografia Tradicional, que
emerge ao longo do século XIX e analisa o [7] FRADE, Isabel. Uma genealogia dos
espaço geográfico a partir da lógica de que o impressos para o ensino da escrita no Brasil no
ser humano tem possibilidades de século XIX. Revista Brasileira de Educação.
transformação do espaço a partir do seu v. 15, n. 44, p. 264-281, Maio/ago. 2010a.
desenvolvimento técnico. Assim, a principal [8] VERSENTINI, José William. Geografia,
preocupação didática do ensino de geografia Natureza e Sociedade. São Paulo: Contexto,
compreendia em descrever, classificar e 1989.
caracterizar o espaço geográfico e as diferentes
porções do planeta Terra. Atualmente, este [9] PERES, Eliane; MICHEL, Caroline.
entendimento epistemológico foi ultrapassado, Circulação e fornecimento de livros escolares
de forma que se entende o espaço geográfico no Rio Grande do Sul no final do século XIX
como meio e fim, condição e resultado do e início do século XX (1873-1921) In: PERES,
processo de (re)produção do espaço a partir da Eliane; RAMIL, Chris de Azevedo (Orgs.)
relação entre seres humanos e o meio natural. Produção e circulação de livros didáticos no
Rio Grande do Sul nos séculos XIX e XX.
Curitiba: Editora Appris, 2018.
REFERÊNCIAS
[1] CHOPPIN, Alain. História dos livros e das
edições didáticas: sobre o estado da arte.
Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 30, n. 3, p.
549-566, set./dez, 2004.
[2] CERTEAU, Michel de. A Operação
Histórica. In: LE GOFF, Jaques & NORRA,
Pierre. História, Novos Problemas. Rio de
Janeiro: FGV, 2015.
[3] LE GOFF, J. Documento/Monumento. In:
LE GOFF, Jacques. História e Memória.
Campinas, SP: Editora da Unicamp, 1990,
p.535-549.
[4] BATISTA, Antônio Augusto Gomes. O
Conceito de “Livros Didáticos”. In:
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b
PPGGEO/Programa de Pós-Graduação em Geografia-Universidade Federal de Santa Maria,e-mail
wermakwer@gmail.com
C
PPGGEO/Programa de Pós-Graduação em Geografia-Universidade Federal de Santa Maria,e-mail
tuanytel@hotmail.com
RESUMO
A educação em solos busca conscientizar as pessoas da importância do solo em sua vida. Nesse processo
educativo, o solo é entendido como componente essencial do meio ambiente, essencial à vida, que deve
ser conservado e protegido da degradação. Assim, o objetivo da pesquisa foi envolver os educandos da
turma 61 da Escola Municipal de Ensino Fundamental Euclides da Cunha, situada na área urbana do
município de Santa Maria, RS, para aperfeiçoar a aprendizagem acerca do tema e desenvolver a percepção
da importância do estudo do solo dentro do sistema ambiental. Para isso, foram conduzidos experimentos
a partir das características morfológicas do solo e de temas relacionados à erosão hídrica destacando-se
as formas características de ocorrência, o transporte das partículas do solo sob a ação da água chuva e do
escoamento superficial face a distribuição granulométrica. Os conceitos foram desenvolvidos através de
ensaios em laboratório (demonstrados em sala de aula) a partir de diferentes texturas de solo (areia, silte
e argilosa) ilustrando as diferenças de coesão entre os agregados e os efeitos que estão associados. Os
educandos, que inicialmente não demonstraram conhecimento do tema, mostraram-se curiosos e
participativos realizando questionamentos ao longo dos ensaios. Ao avaliar as atividades desenvolvidas,
conclui-se que houve êxito, atingindo-se o objetivo proposto que foi envolver os educandos com o tema
solos como componente do meio ambiente.
Palavras chave: Sistema solo. Meio ambiente. Educação em solos.
ABSTRACT
Soil education seeks to make people aware of the importance of soil in their lives. In this educational
process, soil is understood as an essential component of the environment, essential to life, which must be
preserved and protected from degradation. Thus, the objective of the research was to involve the students
of class 61 of the Municipal School of Euclides da Cunha, located in the urban area of the municipality
of Santa Maria, RS, to improve learning about the subject and to develop the perception of the importance
of the study of the soil within the environmental system. For this, experiments were carried out from the
soil morphological characteristics and themes related to water erosion, highlighting the characteristic
forms of occurrence, the transport of the soil particles under the action of rainwater and surface runoff
versus the granulometric distribution. The concepts were developed through laboratory tests
(demonstrated in the classroom) from different soil textures (sand, silt and clayey) showing the differences
in cohesion between the aggregates and the associated effects. The students, who initially did not
demonstrate knowledge of the subject, showed themselves to be curious and participative, questioning the
essays. In evaluating the activities developed, it was concluded that there was success, reaching the
proposed objective that was to involve students with the theme solos as a component of the environment.
Keywords: System Soil. Environment. Soil education
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Resultados e discussão
Para desenvolver os experimentos foi
realizado um levantamento dos anos que
abordam o tema Solos nos livros didáticos e
compreendeu-se que o tema é trabalhado no
sextos anos do Ensino Fundamental.
A pesquisa foi realizada com a turma 62, da
E. M. E. F Euclides da Cunha, no mês de
agosto de 2018. Devido ao tempo
Figura 3: Educandos respondendo ao questionário.
disponibilizado pela direção da escola, tivemos
duas aulas de 50 minutos, a primeira aula foi Fonte: Do Autor.
teórica e dialogada onde foi trabalhado
conceitos referents ao tema erosão hídrica e Os ensaios em sala de aula, ocorreram de
morfologia do solo. forma similar aos ensaios desenvolvidos em
Diante da concessão da direção escolar para laboratório, dessa forma, os experimentos
execução do projeto e dos ensaios iniciou-se ocorreram de forma organizada onde os
com uma conversa apresentando o projeto aos educandos desenvolveram e participaram do
educandos, sujeitos da pesquisa e a direção ensaio. A figura 4 ilustra os educandos
escolar. A breve apresentação buscou informar manuseando as amostras e identificando
os temas abordadas durante a aula expositiva e alguns aspectos morfológico perceptíveis a
posteriormente os ensaios desenvolvidos em olho nu, como: Cor, textura, consistência e
sala de aula. porosidade, esses irão influenciar no processo
erosivo e darão subsídios aos educandos para
Os experimentos foram realizadas nas duas
entender o que ocorre com cada agregado
primeiras aulas, uma aula teórica e outra
durante os ensaios apresentados em sala de
expositiva onde foi realizada abordagem sobre
aula.
alguns conceitos básicos sobre a erosão hídrica
e transporte de materiais do solo e movimentos
de massas do solo, ação da chuva do
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Conclusões
Diante dos resultados obtidos, a partir do
desenvolvimento da experimentoteca com os
alunos do 6º ano da turma 62 da Escola
Municipal de Ensino Fundamental Euclides da
Figura 6. Demonstração da erosão hídrica após cinco
Cunha, Santa Maria, RS conclui-se que a
minutos. oficina pedagógica alcançou o objetivo e
corrobora com as palavras de Piaget (1974, p.
Fonte: Dos autores.
35) “[...] falar em educação é, em primeiro
A figura 6 mostra como ocorreu o processo lugar, reconhecer o papel indispensável dos
de erosão hídrica nas amostras de diferentes fatores sociais na própria formação do
horizontes devido a sua composição por indivíduo”. Para ele, a escola é o local no qual
agregados e minerais, diferentemente da figura o educando deve encontrar possibilidades de
4 essa imagem possui uma amostra a mais que construir seu conhecimento, formando
foi colocada em seguida para fazermos o indivíduos com autonomia intelectual e moral,
experimento, a mostra 4 é o horizonte C, com respeitando a autonomia dos outros.
alto teor de argila. Pode-se observar que a utilização de recursos
Com esse experimento os educandos didáticos selecionados adequadamente, surge
conseguiram compreender como ocorre o efeito positivo no processo de ensino-
processo de erosão hídrica em cada tipo de aprendizagem. Trata-se de experimentos
horizontes e a importância do solo apresentar simples que ressaltam conceitos como erosão e
cobertura vegetal, pois dessa forma o solo a importância do solo.
exposto tende a ficar suceptível ao Portanto, a proposta apresentada e
intemperismo químico. desenvolvida pretende promover nos alunos o
Os educandos compreenderam que o ser despertar a construir seu conhecimento e a
humano pode transformar e conter os vinculá-lo às experiências vividas por eles. É
processos naturais através do preparo do um desafio que culmina no objetivo maior da
cultivo, quais as técnicas para combater a educação: formar cidadãos ativos e
erosão, manejo da água, etc. E o professor de comprometidos, a pesquisa atingiu seus
geografia deve afirmar a importância da objetivos.
cobertura vegetal, como as florestas que Dessa forma pode-se avaliar que os
formam uma barreira contra os ventos e a educandos de um modo geral, tiveram uma boa
queda direta da água da chuva, e esclarecer compreensão do conteúdo abordado,
que além deste e outros fatores, a erosão está indicando que foi positiva a discussão dos
conceitos previstos durante a oficina.
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RESUMO
Este trabalho objetivou avaliar os efeitos de uma intervenção pedagógica sobre o desenvolvimento
da tomada de consciência e da capacidade de controle da escrita e sobre o emprego de funções
psicológicas superiores, relacionadas a essa atividade, em um grupo de estudantes de um Curso de
Licenciatura em Pedagogia. O estudo foi amparado pelos preceitos da abordagem psicológica
Histórico-Cultural e da Linguística Textual, tomando como base o paradigma de pesquisa qualitativa.
A avaliação da intervenção ocorreu mediante a produção de textos escritos, pertencentes ao gênero
resumo; um questionário, aplicado pós-intervenção e entrevistas, realizadas antes e após a
intervenção. Os resultados encontrados apontam que a intervenção pedagógica realizada propiciou
aos acadêmicos que dela participaram a tomada de consciência acerca de elementos necessários à
produção de textos escritos, bem como o desenvolvimento do controle sobre alguns desses aspectos.
Os achados também revelam que as práticas de escrita desenvolvidas na intervenção pedagógica
potencializaram o emprego de funções psicológicas superiores. Portanto, os resultados deste estudo
sugerem que o ensino da produção de textos escritos, mediado pelos processos interpsicológicos e
pela abordagem processual de texto, possibilita aos estudantes tornarem-se escritores mais
proficientes.
Palavras chave: Escrita, Intervenção, Processos Interpsicológicos, Teoria Histórico-Cultural
ABSTRACT
This work aimed to evaluate the effects of a pedagogical intervention on the development of
awareness and the ability to control writing and about the use of higher psychological functions,
related to this activity, in a group of students of a Pedagogy Degree. The study was supported by the
precepts of Historical-Cultural and Textual Linguistic psychological approach, being based on the
qualitative research paradigm (ALVES-MAZZOTTI and GEWANDSNAJDER, 2001; FLICK,
2004). The intervention evaluation occurred through the production of written texts of the summary
genre; a questionnaire, applied after intervention and interviews, which were performed before and
after the intervention. The results found point out that the pedagogical intervention provided to
academics who participated, the awareness about elements necessary for the production of written
texts, as well as the development of control over some of these aspects. The findings also reveal that
writing practices developed in the pedagogical intervention potentialized the use of higher
psychological functions. Therefore, the results of this study suggest that teaching the production of
written texts, mediated by interpsychological processes and the procedural text approach, enables
students to become more proficient writers.
Keywords: Writing, Intervention, Interpsychological Processes, Historical-Cultural Theory
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produzir avanços em tais processos, avanços Flower et al. (1986)[11] também defendem
esses avaliados ao término das ações que o estudante que está lendo com o objetivo
interventivas. Esse tipo de pesquisa foi de compreender, realiza um raciocínio
denominado por nosso grupo como pesquisa diferente daquele que está lendo com o
do tipo intervenção pedagógica, pois envolve objetivo de revisar um texto. Esclarecem que
intervenções para maximizar os processos de os alunos que leem com o objetivo de revisar
aprendizagem de determinados sujeitos adotam uma atitude mais ativa em relação ao
(DAMIANI et al. 2013[3]). texto, pois a atenção deles está direcionada à
busca e à solução de problemas.
O estudo intervencionista aqui apresentado
foi amparado pelos preceitos da abordagem Considerando a dificuldade que grande parte
psicológica Histórico-Cultural, da Linguística dos indivíduos revela para redigir e buscando
Textual, tomando como base o paradigma de entender os processos cognitivos que estão
pesquisa qualitativa (ALVES-MAZZOTTI e presentes na produção de um texto, Flower
GEWANDSNAJDER, 2001)[7]. (1981)[12] propõe uma diferença de significado
entre as palavras expressão e comunicação,
A avaliação da intervenção ocorreu mediante
que contribui para o entendimento dos
a produção de textos escritos, pertencentes ao
processos cognitivos presentes na escrita.
gênero resumo; um questionário, aplicado pós-
Segundo a autora, o plano da expressão está
intervenção e entrevistas, realizadas antes e
relacionado com o texto que o escritor redigiu
após a intervenção.
para si, sem se preocupar com a compreensão
por parte do leitor. Já no plano da
Desenvolvimento comunicação, o texto deve ser compreensível
por si, atendendo às exigências formais da
A abordagem de escrita com foco na interação escrita. Partindo da distinção de significado
é a que embasa este estudo, porque entende-se entre expressão e comunicação, Flower
que nela, tanto o escritor como o leitor são peças (1981)[12] apresenta dois tipos de prosa: a prosa
motrizes na organização e no desenvolvimento do escritor e a prosa de leitor. Para a autora,
da trama textual. Se a intenção é provocar, em ambas as prosas podem desempenhar função
nossos estudantes, a tomada de consciência importante no processo de escrita. Entretanto,
acerca de seus problemas de escrita e, a prosa de leitor é a que garante uma
posteriormente, levá-los a desenvolver controle comunicação bem-sucedida entre escritor e
sobre esses problemas, compreende-se que o leitor. Segundo Flower (1981)[12], o melhor
ato de escrever dever ser norteado por uma processo de composição é aquele que, desde o
concepção de escrita interativa (Koch e Elias, início, trabalha com a prosa de leitor, pois
2010)[8]. demanda que o redator desenvolva o texto de
Kato (2005, p.134)[9] argumenta que a acordo com seu leitor, em um processo
dificuldade que o escritor enfrenta para redigir interativo e social.
um texto claro, coeso e coerente “decorre do Flower (1981)[12] explica que a compreensão
fato de a redação exigir dele habilidades não só das duas prosas, tanto por parte dos aprendizes
de produtor como também de interpretador”. A como por parte dos professores, pode trazer
autora esclarece que há diferentes operações contribuições importantes para os processos de
intelectuais envolvidas no processo de ensino e aprendizagem da produção de textos
expressão, por parte do produtor do texto; e de escritos, porque esse conhecimento permite
compreensão de ideias, por parte do leitor, o desenvolver estratégias que vão ao encontro
que torna difícil, muitas vezes, ao escritor, a das necessidades existentes em cada momento
alternância de papéis de produtor para leitor. de expressão escrita.
Cassany (1999)[10] corrobora as ideias de Kato,
ratificando que os papéis de produtor e de Segundo a autora, se o indivíduo ao redigir um
interpretador são difíceis de serem texto, observar a imagem do interlocutor e as
desempenhados por parte de quem escreve. estruturas micro e macrotextuais, seu escrito
torna-se compreensível, independente de seu
contexto. Ao escrevê-lo, o redator está
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empregando a prosa de leitor e o texto está no cognitivas dos sujeitos, modelo da socialização
plano da comunicação. Cassany (1999, p.139)[10] e modelo dos letramentos acadêmicos. O
argumenta que sujeitos alfabetizados sabem modelo das habilidades cognitivas parte do
empregar a prosa de escritor, mas somente os pressuposto de que o conhecimento das regras
bons escritores sabem usar a prosa de leitor. O gramaticais e sintáticas da língua e o domínio
autor alega que “saber escrever quer dizer saber da pontuação e da ortografia são suficientes
transformar a prosa de escritor na de leitor”. para um bom desempenho escrito do
Todavia, sabe-se que essa transformação não é acadêmico. O modelo de socialização parte da
tarefa simples para a maioria dos escritores. premissa de que os acadêmicos devem ser
Normalmente, eles necessitam de ajuda externa “aculturados nos discursos e gêneros” (p.545),
a fim de realizar essa transformação de forma de acordo com cada disciplina, para tornarem-
adequada. Quanto à ajuda externa na produção se bons escritores. E o modelo dos letramentos
de textos, Damiani et al. (2011)[13] defendem que acadêmicos tem por foco a escrita como
o professor ou um colega mais desenvolvido prática social, considerando que a produção
podem contribuir com a melhoria do escrito, escrita dos estudantes universitários varia de
servindo como espelhos que refletem os acordo com o contexto e o gênero em foco.
problemas de comunicação dos textos. Tal Esse modelo também leva em conta os
perspectiva é importante porque, muitas vezes, significados que os sujeitos atribuem à escrita,
os estudantes não percebem que seus escritos bem como a história de letramento que
não estão de acordo com o desejado; outras vivenciaram nos contextos dos quais
vezes, têm essa percepção, mas não sabem como participaram.
proceder para adequar suas escritas à situação Segundo Street (2010)[20], os três modelos
comunicativa a que se destinam. Ao não devem ser entendidos como mutuamente
escrevermos, necessitamos organizar o exclusivos, mas complementares entre si.
pensamento para expressá-lo com clareza ao Nesse sentido, Jones, Turner e Street (1999)[21]
nosso interlocutor, atividade que exige exercício destacam que não é adequado aderir somente
de reflexão sobre o que estamos escrevendo. um modelo para tratar dos prováveis
Nesse sentido, Damiani et al. (2011)[13] problemas na produção escrita dos estudantes,
menciona que tais práticas reflexivas parecem pois o ensino da escrita acadêmica é muito
não ser prioritárias em nossas escolas e mais que abordar os problemas superficiais
universidades. presentes nos textos dos alunos. A escrita não
Outro aspecto que merece atenção, é apenas uma habilidade que o universitário
relacionado às dificuldades que os estudantes necessita aprender e desenvolver mediante
apresentam para redigir seus textos, socialização promovida pelo professor; ela é
especialmente no contexto acadêmico, é a também e, principalmente, uma forma de
história pregressa de letramento desses construir valores e crenças culturais; uma
estudantes. Os estudos (FIAD, 2011[14]; forma de realizar uma prática social.
FISCHER, 2007[15]; KLEIMAN, 2009[16];
O letramento acadêmico, na concepção de
OLIVEIRA, 2011[17]; SILVA e PEREIRA, Street (1984)[22] é um fenômeno de caráter
2013[18]) desenvolvidos no Brasil sobre social e cultural. Assim, a apropriação da
letramento acadêmico revelam que os alunos escrita e o uso que os sujeitos fazem dessa
que ingressam na universidade revelam sérias escrita são influenciados pelas condições
dificuldades para produzir gêneros recorrentes sociais e culturais das comunidades em que se
nessa esfera educacional. inscrevem, o que gera a existência de múltiplas
Mediante pesquisa, Lea e Street (1998)[19], práticas de letramentos. Para Street (1984)[22],
constatam que há lacunas na maneira como as práticas de letramento são práticas culturais
estudantes e professores compreendem a discursivas, que definem a produção e
produção textual no contexto acadêmico e interpretação de textos orais e escritos, em
propõem três modelos a partir dos quais a contextos específicos. O autor defende que há
escrita é compreendida e ensinada na dois modelos de letramento: o autônomo e o
universidade: modelo das habilidades ideológico. No primeiro, a escrita está
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autora, o resumo é uma forma reduzida de pedagógica vem ao encontro das ideias de
mencionarmos uma informação, procedente de Lillis (1999[25]; 2001[30]). A autora defende que
um processo mental de compreensão. Além não é suficiente oportunizar aos estudantes
disso, esclarece que “[...] o ato de resumir é atividades que, supostamente, possam
resultante de uma capacidade e constitui uma propiciar a eles o aperfeiçoamento das
habilidade mental própria do ser humano, competências linguísticas e capacidades
acionada para o armazenamento de discursivas escritas, necessárias à redação de
informação" (2006, p.11) [grifos da autora]. textos coerentes e adequados às situações
Portanto, compreende-se que resumir implica comunicativas presentes na universidade. Para
atividades de leitura, de compreensão, de que os acadêmicos possam adquirir domínio
seleção e de expressão de informações. dos recursos linguístico-discursivos
proporcionados pela própria língua, de forma a
Método de avaliação da intervenção
conduzi-los à construção de efeitos de sentido
•A análise documental presente neste estudo adequados às diversas circunstâncias nas quais
foi constituída pela primeira versão e pela são convocados a agir por meio da linguagem,
reescrita de um texto pertencente ao gênero eles precisam ter voz. O estudante necessita ter
resumo. contato com o professor a fim de negociar e
•Uma entrevista semiestruturada para avaliar renegociar as especificidades da tarefa
como as alunos procediam ao produzirem seus solicitada pelo professor; explicitar suas
textos. dúvidas e explorar quais são as expectativas que
os professores têm em relação a sua escrita
•Questionário, cujo objetivo foi avaliar a (LILLIS, 1999[25]; 2001[30]). Esses momentos,
intervenção pedagógica implementada. tão necessários aos nossos estudantes, muitas
•Uma entrevista semiestruturada pós- vezes não são observados por parte de quem
intervenção. ensina.
Os registros orais e escritos das estudantes Outro fator mencionado pelas acadêmicas
deixam transparecer a premissa vygotskiana de que contribuiu para a melhoria de suas
que a mediação e os processos produções escritas foram as atividades de
interpsicológicos influenciam, revisão e de reescrita dos textos que redigiam.
significativamente, no desenvolvimento do Os depoimentos confirmam a importância de o
sujeito, principalmente quando os afetam de professor abordar a escrita como uma atividade
maneira positiva. Como afirma Vygotski recursiva, bem como conceber o ato de
(2009, p.481)[28] “[a] compreensão efetiva e escrever como um ato individual e coletivo.
plena do pensamento alheio só se torna Individual no sentido de que o aluno-escritor
possível quando descobrimos a sua eficaz tem de aprender a fazer as escolhas linguísticas
causa profunda afetivo-volitiva. e semânticas de acordo com o repertório de que
dispõe e com suas intenções comunicativas; e
As verbalizações das acadêmicas confirmam coletivo, porque a escrita pressupõe, na
a importância de o professor trabalhar voltado maioria das vezes, uma reflexão conjunta com
aos conhecimentos e habilidades que se outros sujeitos aptos a intervir em nossas
encontram na ZDP, tanto individual como escritas a fim de melhorá-las. Concorda-se com
coletiva. Também ratificam o papel mediador Russel (2009, p.241)[31] ao defender que “a
que o professor desempenha na melhoria da escrita não é uma habilidade generalizável que
produção escrita de seus estudantes e se aprende de uma vez por todas, mas uma
confirmam a relevância de serem conquista ou feito que pode ser desenvolvido,
desenvolvidas atividades que propiciem aos que requer muita prática” e que cabe ao
alunos-escritores pensar e refletir sobre o que professor “refletir sobre as habilidades que
escrevem. deseja auxiliar os alunos a desenvolver e
Uma das estudantes, ao registrar que a explicitar-lhes os objetivos das atividades”.
“disponibilidade da professora em nos ouvir” Portanto, para que o professor possa atingir tais
foi um dos aspectos que contribuiu com sua objetivos, compreende-se a necessidade de o
aprendizagem durante a intervenção ensino da produção de textos escritos ser
333
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
abordado como uma atividade processual, por apresentado melhorias, estão distantes dos que
meio de ações interativas e reflexivas, mediante se deseja, especialmente, na esfera acadêmica.
a revisão e a reescrita oportunizando, assim, o As alunas revelaram que conhecem pouco das
“caminho de duas vias” entre os conceitos regras de produção de textos que circulam
científicos e espontâneos preconizado por nessa esfera, além de apresentarem vários
Vygotski (1982)[32]. problemas de desorganização global das
informações em seus textos. Os textos aqui
analisados estão mais próximos da prosa do
Conclusões escritor do que da prosa de leitor (FLOWER,
Os achados deste estudo sugerem que a 1981)[12]. Concordamos com Borba (2004,
intervenção do professor na produção escrita p.169)[33] ao afirmar que
do estudante é fundamental para a tomada de
consciência e para o desenvolvimento do [...] mesmo que as universidades não consigam
controle sobre tal produção. As acadêmicas ainda dar conta de preparar seus alunos para a
expressaram em vários momentos que a complexidade do mundo contemporâneo em
atenção individual, a atenção particular todos os modos sociais e intelectuais requeridos,
dispensada pela pesquisadora foi muito bem como prepará-los para demandas
específicas de suas esferas de atividades, uma das
importante na qualificação de suas escritas, coisas que a universidade pode fazer é ajudar os
salientando a importância de serem alunos a aprenderem a aprender. Isto é, devem
positivamente afetadas pelo professor no promover a ampliação da competência
processo pedagógico. Portanto, acredita-se que discursiva, que envolve habilidade de interpretar
a atuação do educador, tendo como ferramenta e avaliar criticamente uma larga variedade de
textos orais e escritos.
mediadora, também os conteúdos da disciplina
associada à revisão e à reescrita foram fatores
determinantes para atingirmos o objetivo de Procurou-se desenvolver este estudo
nossa investigação. Os resultados de nosso
considerando o contexto o mais próximo
estudo reafirmam os pressupostos possível de uma situação real de ensino sobre
vygotskianos sobre a importância dos a produção de textos nas licenciaturas. Por
processos interpsicológicos relacionados aos meio dos resultados desta investigação,
conceitos científicos em jogo no processo defende-se a ideia de que é possível, mesmo
pedagógico, da imitação e do trabalho na ZDP, em um semestre, aprimorar as habilidades de
mediados pela linguagem, na promoção do escrita de nossos estudantes. Os achados
desenvolvimento mental do educando. revelaram que os alunos, ao perceberem que o
Quanto à tomada de consciência por parte das professor está disposto a investir na melhoria
estudantes, constatou-se que não houve de suas escritas, também se mostram
somente em relação aos problemas que seus interessados em vencer suas dificuldades,
textos apresentavam, mas também sobre a corroborando a necessidade de que os cursos,
abordagem processual do texto e outros especialmente os de licenciatura, abram espaço
elementos da textualidade. Compreende-se em sua matriz curricular para o ensino da
que a tomada de consciência sobre essa produção de textos, mesmo que seja ofertado
abordagem de texto representa uma em um único semestre.
contribuição fundamental desta intervenção Defende-se que a universidade, além de
pedagógica para a atuação profissional das considerar a história de letramento de seus
participantes, futuras professores, já que, estudantes, deve chamar para si a
provavelmente, irão implementar o ensino da responsabilidade de sanar os sérios problemas
produção de textos escritos. Tendo percebido a de produção escrita que os alunos apresentam
importância dessa abordagem processual, ao ingressar na academia, se deseja formar
parece válido pensar que a adotarão em suas professores capazes de propiciar atividades a
atividades pedagógicas. seus alunos, focalizando a escrita como prática
Este estudo revelou que, embora os textos social. Considera-se preocupante constatar
produzidos pelas estudantes tenham acadêmicos que não são mais ingressantes,
334
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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336
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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escrita são tarefas da escola e não só do
337
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
b
Universidade Federal e Pelotas/claudiabsousa@hotmail.com
RESUMO
O PELLE - Projeto de Extensão Leitura Literária na Escola, desenvolvido pelo grupo de estudos em
leitura literária (GELL) com o apoio do PET Educação oportunizou, em 2017, experiências através
das páginas de muitos livros a um grupo de crianças entre seis e doze anos que frequentaram o Centro
de Referência de Assistência Social (CRAS), na região central da cidade de Pelotas. O projeto foi
realizado através de leituras literárias de obras previamente escolhidas pelo seu caráter lúdico e
inteligente – todas elas inseridas no acervo da sala de leitura Erico Verissimo – o próximo passo foi
a criação de expectativa e o convite para ouvir. A seguir, a realização de um diálogo, pautado em
conhecimentos sobre o livro (capa, autoria, tema, desfecho, basicamente). Entre as observações e
apontamentos no caderno de campo, destaco expressões das crianças relacionadas às leituras
realizadas e a todo o aprendizado adquirido. Percebi a ampliação do vocabulário, incentivo à
criticidade e o desenvolvimento da oralidade. Meu papel, como mediadora em leitura literária, foi
oferecer o encantamento através do texto literário. Pretendi que as crianças desenvolvessem pela
leitura, o interesse e o hábito. Almejei que aprendessem a pensar e a fazer uma leitura criativa e
interativa. Como avaliação, ainda, busquei ouvir as professoras que acompanharam as crianças.
Palavras chave: Mediador literário; leitura; criança.
RESUMEN
El PELLE - Proyecto de Extensión Lectura Literaria en Escola, desarrollado por el Grupo de Estudios
en Lectura Literaria (GELL) con el apoyo de PET Educação organizaron, en 2017, experiencias a
través de las páginas de muchos libros a un grupo de niños entre seis y doce años que asistían al
Centro de Referencia de Asistencia Social (CRAS), en la región central de la ciudad de Pelotas. El
proyecto fue realizado a través de las lecturas literarias previamente elegidas por su carácter lúdico e
inteligente – todas ellas de la colección de la sala – la próxima acción fue la creación de expectativa
y la invitación a oírlas. Después, la realización de un diálogo sobre el libro (tapa, autoría, tema,
desfecho, básicamente). Entre las observaciones y apuntamientos en el cuaderno de investigación,
destaco expresiones de los niños relacionadas a las lecturas realizadas y a todo el aprendizaje
adquirido. Percibí la ampliación del vocabulario, incentivo a la crítica y el desarrollo de la oralidad.
Mi papel como mediadora de lectura literaria fue ofrecer el encantamiento a través del texto literario.
Pretendí que los niños hallan desarrollado por la lectura, el interés y el hábito. Busqué que aprendiesen
a pensar y a hacer una lectura creativa e interactiva. Como evaluación, todavía, busqué oír a las
profesoras que acompañaron los niños.
Palabras-clave: Mediador literario; lectura; niños.
338
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
encontro não espontâneo com o livro deve ser texto e até temas que podem desencadear
preparado. Informar ao bebê que o livro vai indagações e diálogos acalorados.
estar sempre ali, aguardando, é fundamental. Os critérios clássicos para escolher uma obra
A criança deve conhecer essa condição – a literária infantil são a atemporalidade ou
espera – e esperar pelo momento de abrir longevidade, a linguagem (expressão inusitada
novamente o livro. E deve ser apresentado a e/ou metafórica), a inesgotabilidade
um lugar – onde o livro espera – para ter a (diferenciadas e infindáveis leituras de uma
certeza do encontro. Poder recorrer a ele na mesma narrativa), o valor histórico e
ausência do mediador, esperando para ser documental, a magia, o vínculo com a
aberto novamente e em um lugar a ele ancestralidade e a capacidade de “fazer
reservado é condição de pertencimento ao pensar”. Essas características integram o grupo
tornar-se leitor. Esse lugar definido, também de critérios defendidos por Italo Calvino na
ele cultuado, deve ser levado em consideração obra "Por que ler os Clássicos". Editada em
e mesmo uma caixa de papelão pode exercer o 1993 pela Companhia das Letras, é um marco
papel de guardador do livro. A atitude do leitor sobre critérios de escolha de um livro a ser
é que atribui valor ao lugar (estante, caixa, lido. Nele, uma frase de Calvino: “Um clássico
mesa), que passa a ter importância quando é um livro que nunca terminou de dizer aquilo
instituído. que tinha para dizer".
A arte literária para a infância tem o
compromisso, por arte, de unir o lúdico (jogo
Desenvolvimento:
de deleitar-se) com o útil (jogo de posicionar-
O Projeto de Extensão Leitura Literária na se). Como humanos, espécie que através da
Escola – PELLE, desenvolvido em 2017 pelo linguagem se representa, temos essa premência
GELL - Grupo de Estudos em Leitura Literária que é simbolizar. Nas palavras de Bagno
contou com o apoio do Programa de Educação (2014), a linguagem é uma faculdade cognitiva
Tutorial – PET Educação. Isso significou o
trabalho de duas bolsistas mas a professora “[...] exclusiva da espécie humana que permite a
orientadora, além do acervo disponibilizado cada indivíduo representar e expressar
pela Sala de Leitura Erico Verissimo. simbolicamente sua experiência de vida, assim
como adquirir, processar, produzir e transmitir
As experiências através das páginas de conhecimento. Nós somos seres muito
muitos livros foi o título escolhido para indicar particulares, porque temos precisamente essa
que muitos livros e procedimentos de leitura capacidade admirável de significar, isto é,
foram disponibilizados, uma vez que não de produzir sentido por meio de símbolos, sinais,
apenas foram apresentados obras às crianças, signos, ícones etc. Nenhum gesto humano é
neutro, ingênuo, vazio de sentido: muito pelo
mas, também, um contato mais intenso com a contrário, ele é sempre carregado de sentido, nos
leitura e a escolha de obras. mais variados graus, e cabe justamente à nossa
capacidade de linguagem interpretar o sentido
O grupo de crianças entre seis e doze anos implicado em cada manifestação dos outros
que frequentavam o Centro de Referência de membros da nossa espécie" (BAGNO, 2014).
Assistência Social (CRAS), na região central
da cidade de Pelotas, esteve nas dependências
O grupo de obras escolhidas – todas elas
da Faculdade de Educação para integrar e
inseridas no acervo da sala de leitura Erico
participar do projeto. Metodologicamente, se
Verissimo – foram previamente lidas pelos
constituiu de leituras literárias de obras
mediadores.
previamente escolhidas pelos estudantes
mediadores, orientados pela docente O próximo passo foi a criação de expectativa
coordenadora. e o convite para ouvir, ou seja, as crianças fora
instigadas a olhar, imaginar, intuir e externar
Ao definirmos as obras a serem lidas para as
julgamentos sobre as possibilidades contidas
crianças, um grupo considerável de critérios
em um ou mais livros.
precisam ser considerados, entre eles, autoria,
gênero, ilustrador, quantidade e qualidade do A seguir, as mediadoras organizaram e
340
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
desenvolvam o pensar crítico e a imaginação, que vai ler para seus ouvintes, o poder da
fundindo os sonhos e a vida prática, o que se escrita e da linguagem do autor e as possíveis
imagina com o real. Para HUNT (2010), a questões que podem surgir durante a
literatura, “[...] por inquietante que seja, pode leitura/audição. Para melhor aproveitamento, o
ser definida como: livros lidos por; mediador deverá iniciar com leitura de textos
especialmente adequados para; ou pequenos e que promovam o prazer em ouvir e
especialmente satisfatórios para membros do o desejo de conhecer sobre o autor apresentado
grupo hoje definido como crianças”. A além de outras obras escritas por ele. Não
literatura para crianças, uma vez que parte existe técnica que garanta a leitura literária. O
considerável é escrita por adultos para as mediador precisa ser sensível, e considerar que
infâncias, tem sua linguagem específica e, nem todos seus ouvintes têm um repertório
como objetivo, expressar uma determinada literário.
experiência humana. Para a estudiosa, é
preciso ter conhecimento das formas como
cada época história descreveu esse fenômeno. Mediação Literária: a metodologia
Em suas palavras: A experimentação – leitura, registro e
avaliação – do processo de leitura literária
ofertada ao grupo de crianças entre seis e doze
Cada época compreendeu e produziu literatura a
seu modo. Conhecer esse modo é, sem dúvida, anos que frequentaram o Centro de Referência
conhecer a singularidade de cada momento da de Assistência Social (CRAS), na região
longa marcha da humanidade em sua constante central da cidade de Pelotas ocorreu durante os
evolução (COELHO, 2000. p. 27). meses de março a outubro de 2017, às sextas-
feiras, entre as 9 e as 10 horas e 30 minutos. O
local – a Sala de Leitura Erico Verissimo – é
Alfabetização Literária: Processo
um espaço acadêmico de formação do leitor
deliberado, organizado, criterioso e frequente
literário que se localiza no ICSH/UFPel.
de apresentação do “mundo da literatura”, seus
Criada para promover a leitura literária e
atributos e ritos a todas as crianças desde que
receber crianças, estudiosos e pesquisadores, a
iniciam sua vida escolar, para Rosa (2018), a
sala tem um acervo integrado por livros sobre
alfabetização literária é fundada na certeza de
a literatura e seu ensino, literatura universal,
que essa é uma habilidade referencial à vida
literatura para crianças e literatura infanto
dos humanos em sociedade, além de integrar
juvenil além de gibis e uma coleção de banners
os saberes docentes, qualificar o processo de
que atestam a história do GELL – Grupo de
aquisição da linguagem oral e inserir as
Estudos em Leitura Literária.
crianças pequenas na cultura escrita.
Pesquisadores interessados no tema como A preparação das estudantes para ler ocorreu
Bartolomeu Campos de Queiros (2009), na disciplina Literatura Infantil I, ofertada na
Beatriz Cardoso (2014), Lígia Cademartori modalidade optativa à Licenciatura em
(2014), Ana Maria Machado (2002), Graça Pedagogia da FaE/UFPel pela professora Drª.
Paulino (2014), Regina Zilberman (2003) e Cristina Maria Rosa. Teve como objetivo
Tzvetan Todorov (2012), são unânimes em “conhecer e ampliar estudos a respeito da
atribuir à escola o poder e o dever de ensinar a Literatura na Escola, suas fontes, autores,
amar a literatura. De acordo com Reyes história e práticas”.
(2014), para alfabetizar literariamente, é Foram selecionadas para a leitura ao grupo de
preponderante a atitude de um mediador - uma crianças as seis obras do autor Erico
pessoa que “estende pontes entre os livros e os Verissimo. Nascido no Rio Grande do Sul em
leitores”. 1905, este escritor possui uma interessante
Mediador Literário: entendido como um obra infantojuvenil que foi, inicialmente,
sujeito “entre”, o papel do mediador literário é publicada nos anos 30 e 40 do Século XX.
oferecer vínculos através do encantamento que Como argumento para a escolha, sua obra, ser
o texto literário oportuniza. É papel do presente nas bibliotecas, ser pouco lido e ter
mediador literário, conhecer e dominar o texto narrativas ricas repletas de interação autor
342
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
transformar o gosto em hábito e fiel [6] MACHADO, Ana Maria. Como e por que
companheiro da aquisição progressiva e ler os Clássicos Universais desde cedo. Rio
constante de saberes? de Janeiro: Objetiva, 2002.
[7] MEDIADORES DE LEITURA. In:
Como avaliação, além do observável em
REYES, Yolanda. Glossário Ceale: Termos
encontros semanais com esse grupo de
de alfabetização, leitura e escrita para
crianças nos quais o gosto foi sendo ampliado
educadores. Tradução de Elizabeth Guzzo de
e as escolhas cada vez mais criteriosas,
Almeida. Belo Horizonte: UFMG/Faculdade
buscou-se ouvir as professoras que as
de Educação. Disponível em:
acompanhavam. Essas, em seus relatos,
<http://ceale.fae.ufmg.br/app/webroot/glossar
indicaram que meninas e meninos
ioceale/verbetes/mediadores-de-leitura>.
participantes do projeto, em outros locais e
Acesso em Acesso em: 18 de set. 2017.
mesmo na escola, passaram a demonstrar
[8] PAULINO, Graça. Leitura Literária.
interesse pela leitura através, também de uma
Glossário CEALE, 2014. Disponível
espera ansiosa por mais uma interação.
em:http://ceale.fae.ufmg.br/app/webroot/gloss
Assim, como conclusão final acredita-se que arioceale/verbetes/leitura-literaria
a leitura pode e deve ser ofertada: com [9] ROSA, Cristina Maria. Alfabetização
critérios, com desenvoltura e com o desejo de Literária. Disponível em:
formar, a cada dia, um novo leitor. http://crisalfabetoaparte.blogspot.com/2015/0
6/alfabetizacao-literaria-o-que-e.html. Acesso
em: 08 de set. 2017.
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[1] ABRAMOVICH, Fanny. Literatura Leitura. Disponível em:
infantil: gostosuras e bobices. São Paulo: <http://crisalfabetoaparte.blogspot.com/2018/
Scipione, 1997. 11/pequeno-glossario-leitura.html> Acesso
[2] ANTUNES, Celso. A leitura como paixão em: 20 de novembro de 2018.
– Como estimular a leitura infantil. São [11] ROSA, Cristina. Critérios de escolha:
Paulo: Editora IMEPH, 2011. um passinho de cada vez. Alfabeto à Parte, 26
[3] BAGNO, Marcos. Linguagem. Glossário de março de 2015. Disponível em:
CEALE, 2014. Disponível <http://crisalfabetoaparte.blogspot.com/2017/
em:http://ceale.fae.ufmg.br/app/webroot/gloss 07/criterios-de-escolha-e-de-relevancia-
arioceale/verbetes/linguagem). de.html>. Acesso em: 11 de outubro de 2018.
[4] COELHO, Maria Betty. Contar Histórias: [12] SERRA, Elizabeth. Literatura nas escolas
Uma arte sem idade. São Paulo: Ática, 1999. públicas: conquista da Educação que não deve
[5] LUFT, Lya. Por que a gente devia ler. ser interrompida. Carta. FNLIJ, 2015.
Jornal Zero Hora. Coluna de Luis Fernando Disponível em:
Verissimo (p. 04) - Interina. Porto Alegre: ZH, http://biblioo.cartacapital.com.br/fnlij-sai-em-
05/10/2017. defesa-do-programa-nacional-biblioteca-na-
escola/ Acesso em: 19 de outubro de 2018.
346
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
RESUMO
Este trabalho é um recorte da pesquisa de doutorado em andamento intitulada: A formação continuada
de Professores por meio dos Núcleos de Tecnologia na Educação - NTE/RS: Ensinando com TIC na
Sociedade da Informação e Comunicação e objetiva apresentar as contribuições do pensamento
complexo como uma opção teórica para subsidiar as propostas de formação continuada de
professores. Parte-se da ideia de que a sociedade da informação e comunicação necessita de
professores com uma formação que transcenda ao ensino tradicional, no qual os conteúdos são
transmitidos e ensinados como verdades absolutas, fragmentados e descontextualizados. Para Morin
(2011) esta fragmentação impede a percepção das conexões existentes entre as disciplinas e o
contexto, sujeito e objeto. Em oposição ao ensino tradicional, o autor propõe o Pensamento Complexo
como forma de religar os saberes fragmentados pelo ensino tradicional. Metodologicamente valeu-
se de alguns pressupostos do levantamento bibliográfico com base em Morin (2000; 2003; 2011),
Moraes (1997; 2004, 2007) e Kenski (2013). A partir do referencial consultado, pode-se afirmar que
a sociedade da informação e comunicação necessita de professores que primem pela formação de
sujeitos conscientes da transitoriedade do conhecimento, e capazes de perceber a
multidimensionalidade dos fatos e as conexões entre as partes e o todo, ou seja, um indivíduo apto a
perceber-se como parte integrante de uma sociedade em constante transformação.
Palavras chave: Pensamento Complexo, Formação Continuada de Professores, Sociedade da
Informação e Comunicação.
ABSTRACT
This work is an excerpt from the doctoral research in progress titled: The Continuing Education of
teachers through the centers of technology in education-NTE/RS: Teaching with ICT in the
information and communication society and aims to present the Contributions of complex thought as
a theoretical option to subsidize the proposals for continuing teacher education. It is based on the idea
that the information and communication society needs teachers with a formation that transcensts
traditional teaching, in which the contents are transmitted and taught as absolute, fragmented and
decontextualized truths. For Morin (2000; 2003; 2011), Moraes (1997; 2004, 2007) e Kenski (2013).
This fragmentation prevents the perception of the existing connections between the disciplines and
the context, subject and object. As opposed to traditional teaching, the author proposes complex
thinking as a way to reconnect knowledge fragmented by traditional teaching. Methodologically It
was worth some assumptions of the bibliographical survey based on Morin (2000; 2003; 2011). From
the referential reference, it can be affirmed that the information society needs teachers who press for
the formation of subjects conscious of the transience of knowledge, and able to perceive the
multidimensionality of the facts and the connections Between the parties and the whole, that is, an
individual able to perceive himself as an integral part of a society in constant transformation..
Keywords: Complex thinking, continuing teacher training, information society and communication.
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
10
Autopoiese ou autopoiesis (do grego auto "próprio", seres vivos de produzirem a si próprios (MATURANA
poiesis "criação") é um termo criado na década de 1970 E VARELA, 2001)[12].
pelos biólogos e filósofos chilenos Francisco Varela e
Humberto Maturana para designar a capacidade dos
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
apenas a parte está no todo, como também o inesperado, imprevisto, consciência de derivas e
todo está inserido na parte. Para Morin (2003, transformações”.
p. 94)[13]: Dessa forma, quando se empreende uma ação
esta passa a escapar da intenção do seu autor
ao entrar no universo social de interações e
“Cada célula é uma parte de um todo –do
será o meio ambiente que se apossará dela,
organismo global – mas também o todo está na
parte – o patrimônio genético está presente em podendo contrariar a intenção inicial. Esta
cada célula individual”. ação pode sofrer retroações e voltar-se contra
seu autor, obrigando-o a corrigir ou até mesmo
abandoná-la, caso não se torne possível sua
Este princípio permite entender que o ser correção.
humano, enquanto organismo é um sistema
complexo, pois é constituído por sistemas Quanto ao Princípio do Circuito Recursivo,
físicos, biológicos, químicos e psicológicos. Morin (2003)[18] diz que este princípio vai
No entanto, esse organismo também está além da noção de regulação, unindo-se as de
inserido num sistema maior que é a sociedade, autoprodução e auto-organização. Assemelha-
sendo uma parte desta. Da mesma forma a se a um circuito gerador em que os produtos e
sociedade está presente neste organismo, os efeitos são, ao mesmo tempo, produtores e
transmitindo-lhe as normas de seu sistema causadores daquilo que os produz. Este
social através da linguagem, da cultura e dos princípio pode ser explicado tomando-se,
valores morais. como exemplo, o homem ao reproduzir o
sistema social no qual se insere, sendo também
O Princípio do Circuito Retroativo (Morin, produtor deste, uma vez que, através da
2003)[14] foi introduzido por Norbert Wiener reprodução, produzirá descendentes que irão
e está mais ligado aos conceitos de regulação e dar continuidade a este sistema social.
controle, muito utilizado nos sistemas
automatizados, ou seja, aplicado no Os autores Marqueti e Sá (2017, p. 16)[19],
funcionamento de máquinas. Por este falam desse princípio, ao defenderem a
princípio, originado da Cibernética, a causa integração e a apropriação das tecnologias e
age sobre o efeito, e o efeito age sobre a causa. mídias digitais pelo professor:
Este princípio permite perceber que os
sistemas sociais também apresentam inúmeras [...] O princípio sistêmico organizacional é o que
retroações. Para explicá-lo melhor, o autor liga o conhecimento das partes ao conhecimento
utiliza o conceito de Homeostasia, cuja origem do todo. A tríade utilização, integração e
está na Teoria dos Sistemas. Homeostasia é um apropriação é multidimensional, pois configura-
conjunto de processos reguladores baseados se a partir de uma multiplicidade de fatores
(partes) que se organizam como um sistema todo
em múltiplas retroações que podem ser interligado, interdependente e interconectado. O
negativas, quando o círculo de retroação (ou princípio da recursividade é a ideia que traduz os
feedback) permite reduzir o desvio e assim conceitos de autoprodução e auto-organização. O
estabilizar o sistema, ou positiva quando o movimento dinâmico da tríade se faz recursivo
feedback é um mecanismo amplificador que por sua característica geradora, na qual seus
produtos e os seus efeitos são eles próprios
potencializa os efeitos. Morin (2003)[15] causadores do que os gera e produz.
afirma que estas retroações são incontáveis nos
fenômenos econômicos, sociais, políticos ou
psicológicos. Este princípio, também é Assim como a retroação pode contribuir de
exemplificado por Morin (2011)[16] ao falar forma positiva, também pode contribuir de
de ecologia da ação, mais precisamente das forma negativa, o que pode ser observado com
implicações desta no contexto social. Para as práticas escolares, por exemplo. A escola
Morin (2000, p.87)[17]: continua influenciada pelo paradigma
“A ecologia da ação é, em suma, levar em cartesiano-newtoniano, o que pode ser notado
consideração a complexidade que ela supõe, ou quando pauta suas ações reproduzindo as
seja, o aleatório, acaso, iniciativa, decisão, normas e sanções sociais. As avaliações,
normalmente previstas no calendário letivo,
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
têm sempre um caráter classificatório. Estas [...] a partir de uma agitação calorífica
são realizadas através de instrumentos, os (desordem), onde, em certas condições
(encontros aleatórios), princípios de ordem vão
quais priorizam a memorização e reprodução permitir a constituição de núcleos, átomos,
do que foi ensinado em um período de tempo galáxias e estrelas. Sob as mais diversas formas,
fragmentado (bimestres, trimestres, a dialógica entre a ordem, a desordem e a
semestres). Este modelo de organização exclui organização via inúmeras inter-retroações, [que]
a subjetividade, centrando-se na objetividade e está constantemente em ação nos mundos físico,
biológico e humano.
racionalidade contribuindo assim, para a
reprodução do sistema social.
O Princípio da autonomia/dependência (auto- Neste viés, é pelo dialogo que podemos
organização): este princípio liga-se à assumir racionalmente a inseparabilidade de
capacidade de auto-organização e noções contraditórias, para conceber um
autoprodução biológica, física, química, mesmo fenômeno complexo, como por
histórica e cultural. Para manter estes exemplo, a proposição de Niels Bohr quanto à
processos, os seres vivos despendem energia natureza dual das partículas físicas que se
que consequentemente deve produzir uma comportam como corpúsculos e ondas,
reposta ao meio ambiente. Se considerarmos a simultaneamente. Este princípio nos faz
espécie humana, esta precisa, também, de perceber que os indivíduos, na medida em que
informação e organização para poder manter desaparecem são como corpúsculos
sua autonomia. Dessa forma, a autonomia é autônomos; de outro ponto de vista – dentro
inseparável dessa dependência do meio das duas continuidades que são a espécie e a
ambiente – o que Morin (2003)[20] denomina sociedade –, o indivíduo desaparece quando se
auto-eco-organização. O princípio da auto- consideram a espécie e a sociedade; e a espécie
eco-organização vale, especialmente, para os e a sociedade desaparecem quando se
humanos – que desenvolvem sua autonomia na considera o indivíduo. Para tanto, resta ao
dependência do meio ambiente –, pois pensamento complexo assumir dialogicamente
necessitam deste para absorver e trocar energia os dois termos que tendem a excluir um ao
que os manterá vivos, mas também precisam outro, mas que carregam em si a essência da
da sociedade para dela obter as informações complementariedade.
que irão permitir-lhes adquirir a cultura. Finalizando os princípios, Morin (2003) [23]
Morin (2003, p. 95) [21] ainda chama atenção apresenta o Princípio da Reintrodução do
a outro aspecto chave da auto-eco-organização Conhecimento em todo conhecimento: para
viva, qual seja a da “[...] capacidade de se melhor entender este princípio parte-se da
regenerar permanentemente a partir da morte crítica ao paradigma cartesiano-newtoniano,
de suas células”. Para tanto, recorda a fórmula no qual as ciências possibilitaram ao ser
de Heráclito, “viver de morte, morrer de vida”. humano muitas certezas, mas, ao longo do
Assim morte e vida, por exemplo, são ideias século XX, tais certezas foram fortemente
complementares e antagônicas. Morin defende abaladas por inúmeras incertezas, já
ainda que, a complexidade serve para discutidas, anteriormente, neste artigo. Assim
aproximar, distinguir e religar princípios que como a indissocialidade da essência humana,
aparentemente parecem antagônicos, mas que pois o ser humano é, a um só tempo, físico,
na realidade são complementares, o que é biológico, psíquico, cultural, social e histórico.
explicado com o princípio dialógico. Esta unidade complexa da natureza humana é
totalmente desintegrada na educação por meio
O Princípio Dialógico une dois princípios ou das disciplinas, tendo-se tornado impossível
noções que deveriam excluir-se aprender o que significa ser humano. É preciso
reciprocamente, mas que são indissociáveis em restaurá-la, de modo que cada um, onde quer
uma mesma realidade. De acordo com Morin que se encontre, tome conhecimento e
(2003, p. 96) [22] há uma dialógica consciência, ao mesmo tempo, de sua
ordem/desordem/organização, desde o identidade complexa e de sua identidade
nascimento do Universo: comum a todos os outros humanos (MORIN,
2011)[24].
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Entende-se a prática educativa como uma forma de se ocorre, não só, mas essencialmente nas instituições de
intervir na realidade social, por meio da educação que ensino (PIMENTA; LIMA, 2005)[30].
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A transdisciplinaridade, como o prefixo “trans” imperativos é a unidade do conhecimento
indica, diz respeito àquilo que está ao mesmo tempo (NICOLESCU, 1999, p.11)[42].
entre as disciplinas, através das diferentes disciplinas e
além de qualquer disciplina. Seu objetivo é a
compreensão do mundo presente, para o qual um dos
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
b
Doutora em Educação Ambiental. Professora do Programa de Pós-graduação em Educação Ambiental da
Universidade Federal do Rio Grande (FURG). E-mail. profaclaudiacousin@gmail.com
RESUMO
Este trabalho apresenta uma pesquisa de doutorado em desenvolvimento no Programa de Pós-
Graduação em Educação Ambiental – PPGEA da Universidade Federal do Rio Grande – FURG. Tem
como objetivo compreender os processos de Ambientalização dos Estágios Curriculares
Supervisionados - ECS nas escolas de Educação Básica. Embasa-se na pesquisa qualitativa com
abordagem fenomenológica-hermenêutica, tendo o seguinte problema: o que é isso que se mostra de
Ambientalização nos Estágios Curriculares Supervisionados da FURG nas escolas de Educação
Básica? Tem a seguinte hipótese: para que ocorra processos de Ambientalização dos ECS, é
indispensável o reconhecimento das escolas enquanto lugar de produção de conhecimento da
profissão docente, compreensão que requer fortalecer a relação interinstitucional entre escola e
universidade. Como produção de dados, aposta-se na Entrevista Narrativa com professores e
coordenadores pedagógicos das escolas e na análise dos Planos de Ensino das disciplinas de ECS dos
cursos de licenciatura da FURG. A metodologia de análise é a Análise Textual Discursiva- ATD.
Como resultado preliminar destaca-se a análise dos Planos de Ensino, a qual mostra a escola como
lugar de pesquisa do contexto educativo.
Palavras chave: Ambientalização, Educação Ambiental, Estágio Curricular Supervisionado,
Formação de professores.
ABSTRACT
This work presents a PhD research in development at the Postgraduate Program in Environmental
Education - PPGEA of the Federal University of Rio Grande - FURG. It aims to comprehend the
processes of Ambientalization of Supervised Curricular Internships - ECS in Elementary Education
schools. It is based on qualitative research with a phenomenological-hermeneutic approach, having
the following problem: what is this about Ambientalization in the FURG Supervised Curricular
Internships in Elementary Education schools? It has the following hypothesis: in order for the ECS
to be environmentally aware, it is indispensable to recognize schools as a place of production of
knowledge for the teaching profession, an understanding that requires strengthening the
interinstitutional relationship between school and university. As data production, the Narrative
Interview with teachers and pedagogical coordinators of the schools is used, as is the analysis of the
Teaching Plans of the ECS disciplines of the FURG undergraduate courses. The methodology of
analysis is the Discursive Textual Analysis – ATD. As a preliminary result, we highlight the analysis
of the Teaching Plans, which shows the school as a place of research in the educational context.
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aspirações, das crenças, dos valores e das dados (Gil, 2017). As análises documentais
atitudes” (MINAYO, 2012, p.21). dos Planos de Ensino foram realizadas com
Bicudo (2011), alerta que ao assumirmos intuito de complementar os entendimentos,
uma pesquisa qualitativa com abordagem que estão sendo construídos por meio das
fenomenológica é indispensável apresentar o narrativas de professores e coordenadores
que compreendemos sobre esse método pedagógicos das escolas de Educação Básica.
filosófico, para ela esse fenômeno é definido e Podendo mostrar novos aspectos que
contextualizado. A partir do que diz a autora, contribuirão para o desenvolvimento da
entendemos que a pesquisa qualitativa pesquisa, e até mesmo ratificar informações
fenomenológica fomenta interrogações que elaboradas por outro instrumento de coleta de
direcionam nosso olhar para o fenômeno. dados (LÜDKE; ANDRÉ, 2013).
Assim, a abordagem fenomenológica- Na próxima seção apresentamos a análise dos
hermenêutica para esta pesquisa possibilitará a Planos de Ensino a partir do destaque
compreensão e a interpretação do fenômeno Unidades de Significado (Bicudo, 2011, grifos
investigado. Pois, buscamos em Flickinger da autora), e posteriormente a categorização
(2010) aproximações de aspectos centrais da por aproximação do que se mostrou sobre as
hermenêutica filosófica de Hans-Georg escolas de Educação Básica. Para
Gadamer. Flickinger (2010), ao propor compreensão dos achados da pesquisa,
reflexões sobre a hermenêutica e a Educação dialogamos com referenciais teóricos que
Ambiental, problematiza a realidade a partir contribuem para compreensão do fenômeno
das características da epistemologia investigado.
hermenêutica pelo processo interpretativo,
sem a pretensão de chegar a verdades absolutas
A escola de Educação Básica nos Planos de
e indiscutíveis. Em oposição ao método
Ensino
explicativo, a hermenêutica busca a
compreensão por meio da interpretação dos A Ambientalização dos ECS que defendemos
fatos. aposta na relação interinstitucional entre
Nessa perspectiva teórica, para conhecer escola e universidade. Para tanto, o objetivo da
como o fenômeno da Ambientalização nos análise documental foi identificar o que se
ECS é vivenciado, investigamos o que se mostra sobre as escolas de Educação Básica
mostra sobre as escolas de Educação Básica nos treze Planos de Ensino das disciplinas de
nos Planos de Ensino das disciplinas de ECS ECS. Os Planos de Ensino foram analisados
dos cursos de licenciatura da FURG. O partindo da leitura dos elementos que os
interesse na pesquisa justifica-se pelas constituem, a saber: ementa, objetivos,
experiências das pesquisadoras advindas da conteúdos, metodologia, avaliação e conteúdos
profissão docente no contexto das escolas de adicionais. Posteriormente, foi realizada uma
Educação Básica, bem como na orientação dos análise com mais detalhamento das ementas
Estágios Curriculares Supervisionados (ECS), das disciplinas de ECS dos cursos de
nos cursos de licenciatura da FURG. Tais licenciatura de interesse da pesquisa: Artes
vivências ampliaram a compreensão da escola Visuais, Geografia, Pedagogia e Química.
como formadora da identidade profissional Com objetivo, de compreender como o
docente, como destaca Nóvoa (2001). Além da contexto escolar é considerado ou
emergência de compreender as escolas de contemplado nos Planos de Ensino realizamos
Educação Básica como um lugar de construção a leitura atenta das produções, com o olhar
dos conhecimentos constituintes na formação direcionado para o objeto de investigação e,
de professores. posteriormente, a organização dos achados, a
Nesse trabalho apresentamos a pesquisa de partir do destaque das unidades de análise,
análise documental dos Planos de Ensino, por também denominadas Unidades de
entendermos que esse tipo de estudo Significado (BICUDO, 2011, grifos da autora).
proporciona uma melhor visão sobre o As Unidades de Significado, “se constituem
problema investigado, e as informações pontos de partida das análises, busquem elas
analisadas constituem fonte rica e estável de pela estrutura do fenômeno, busquem pelo dito
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b
Doutora e professora do departamento de Geociências/Universidade Federal de Santa Maria/ meribezzi@yahoo.com
RESUMO
O estudo da cultura é relevante para o processo de ensino e aprendizagem de Geografia, pois a partir
da compreensão de conceitos relacionados à cultura é que os educandos constroem seu pensamento
reflexivo sobre o espaço e as relações sociais que nele ocorrem, destacando as singularidades locais.
A partir do entendimento sobre Geografia Cultural pode-se compreender como estas relações
ocorrem, como elas interferem e modificam o espaço e como cada cultura estabelece seu modo de
vida. Logo, o docente de Geografia, ao trabalhar com cultura, em sala de aula, proporciona, ao
educando, o resgate a valorização cultural de seu município, estado ou país. Neste sentido, buscou-se
trabalhar no ensino de Geografia, a cultura. Para isso foi realizado uma atividade com a turma de 8º
ano da Escola Municipal de Ensino Fundamental Rodrigues Alves, do município de Paraíso do Sul/
RS, que proporcionasse o entendimento da importância de se estudar e resgatar a cultura local. Como
objetivos específicos tem-se: (a) conhecer o processo de formação do município; (b) identificar os
grupos étnicos que influenciaram a formação étnico-social local e (c) contribuir para a formação do
conhecimento dos educandos sobre a cultura de seu município. A atividade contribuiu para a
valorização do lugar, resgate de costumes e para compreender como a cultura influência a sociedade
e a organização espacial.
Palavras chave: Cultura. Educação. Geografia.
ABSTRACT
The study of culture is relevant to the process of teaching and learning Geography, because from the
understanding of concepts related to culture is that learners construct their reflective thinking about
space and the social relationships that occur in it, highlighting the local singularities. From the
understanding of cultural geography one can understand how these relations occur, how they interfere
and modify space, how each culture establishes its way of life. Therefore, the geography teacher,
when working with culture in the classroom, provides the student with the rescue of the cultural value
of their city, state or country. In this sense, we sought to work in the teaching of Geography, culture.
For that, activities were carried out with the 8th grade class of the Municipal School of Elementary
School Rodrigues Alves, in the municipality of Paraíso do Sul / RS, which provided an understanding
of the importance of studying the local culture. Specific objectives are: (a) to know the process of
formation of the municipality; (b) identify the ethnic groups that influenced the ethnic-social
formation and (c) contribute to the formation of the students' knowledge about the culture of their
municipality. The activity contributed to the valorization of the place, recovery of customs and to
understand how culture influences society and spatial organization.
Keywords: Culture. Education. Geography.
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locais, fazendo com que eles tenham envolve o homem e que é adquirido e
capacidade para entender a identidade local. significado por ele ao longo de sua vida a partir
Os resultados da pesquisa mostram a da relação com a sociedade”.
importância de se trabalhar o conteúdo de A Geografia Cultural tem interesse nas
cultura em sala de aula. Buscou-se levar aos características e singularidades dos grupos
educandos informações que contribuíssem humanos. Sendo que cada grupo social,
para a formação tanto do conhecimento como expressa estas características a partir de sua
da cidadania, pois ao conhecer o seu local, eles cultura local. Desta forma, pode-se entender
estarão aptos a refletir sobre a maneira que se que a Geografia Cultural se interessa pelas
organiza sua cultura e como são estabelecidas obras humanas que se inscrevem no espaço a
as relações sociais. Neste contexto, os qual habitam, imprimindo uma expressão
educandos estarão aptos a desenvolver sua característica representada pela cultura de
criticidade entendendo como a cultura determinado local. Para Vesentini (2003,
influencia o seu cotidiano. p.14), cultura é: “[...] um conceito que abrange
não apenas conhecimento, ideias, valores, mas
igualmente práticas e construções do ser
A cultura no ensino de Geografia
humano”.
A Geografia Cultural está diretamente Neste sentido, se faz necessário trabalhar no
relacionada com os aspectos da realidade ensino de Geografia a cultura, seus
social, a partir das relações existentes entre significados, seus símbolos, suas marcas
uma sociedade em classe. São nestas relações, deixadas de herança ao longo das gerações. A
de certa forma, que a política cultural e partir do entendimento de como cada grupo
expressão cultural estão associadas. Logo, social se manifesta, através de sua cultura, se
cultura nos remete a tudo aquilo que pode compreender as relações existentes entre
caracteriza a existência de um povo ou nação sociedade e natureza. Sendo que cada cultura
(SANTOS 1994). se manifesta conforme seus valores e
Através da Geografia Cultural pode-se ideologias, construídas ao longo de sua
perceber como cada etnia se manifesta no formação passadas de geração em geração.
espaço, sendo ela representada pelas formas e Cabe salientar também que a cultura, no
expressões que se produzem e se reproduzem processo educativo, está prevista na legislação.
em determinado local, sendo transmitidas por O art.26 da Lei 12796/2013 alterando a Lei de
gerações, percebidas através de características Diretrizes e Bases da educação Nacional (LDB
distintas. Conforme Sauer (2003, p.22-23) “a 9394/96) evidencia a cultura como algo
Geografia Cultural se interessa, portanto, pelas necessário e obrigatório no processo
obras humanas que se inscrevem na superfície educativo.
terrestre e imprimem uma expressão Logo, estudar a cultura em sala de aula é
característica”. Ainda de acordo com Sauer fundamental para que os educandos possam
(apud CORRÊA; ROSENDAHL, 2003, p.22 e conhecer as características dos diversos grupos
23): sociais, possibilitando assimilar o que cada
grupo expressa com suas características
A Geografia Cultural se interessa pelas próprias. Neste sentido, pode-se construir o
especificidades humanas, suas singularidades e
características. Sendo que cada sociedade
respeito à diversidade e pluralidade étnica
expressa estas características a partir de sua existente nas distintas unidades territoriais.
cultura local. Interessa-se, portanto, pelas obras Conhecer a cultura de seu país, do município
humanas que se inscrevem na superfície terrestre onde se está inserido é essencial para formação
e imprimem uma expressão característica. da valorização e do sentimento de
pertencimento a este lugar, bem como ao
Além de toda produção atribuída à cultura, respeito as diversas formas de manifestações
sendo ela reconhecida no espaço, na formação culturais. De acordo com os Parâmetros
da paisagem, com elementos materiais, ela Curriculares Nacionais do Ensino
refere-se segundo Lopes, Mende e Faria (2005, Fundamental, Brasil (1998, p. 7):
p.13) às “teias de significados tecida pelo
homem ao longo de sua existência. Tudo o que
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Pode-se dizer então que através do estudo da se sentir parte da comunidade, pois é somente
cultura é que se tem a perpetuação das assim que se valoriza e se perpetua a cultura.
tradições e valores atribuídos a cultura local, Desta forma, a cultura no processo de ensino
bem como, a construção do respeito à aprendizagem em Geografia é essencial para
diversidade étnica da sociedade, preparando- levar até os educandos a compreensão de como
os para se tornarem adultos conscientes e tudo está interligado, que é partir da
reflexivos. A percepção da importância da compreensão da sua cultura local que poderão
cultura se faz presente no cotidiano dos compreender o espaço, partindo do local para
educandos e da comunidade de modo geral, o global. É na valorização de sua cultura local
pois os hábitos e costumes ainda são que podem compreender como sua
vivenciados, mesmo que a transmissão destes comunidade se organiza, como as relações são
valores tenha se enfraquecido ou se estabelecidas, possibilita resgatar os valores,
hibridizado no decorrer do tempo. Muito crenças e ideologias as quais serão
lembrado foram as danças, o dialeto, os hábitos transmitidas as futuras gerações
alimentares, a horta, o quintal.
Desta forma, ao evidenciar a cultura local, em
sala de aula, pode-se diagnosticar a presença REFERÊNCIAS
de costumes que haviam sido esquecidos, e BRASIL. Secretaria de Educação
construir nas trocas de saberes, o Fundamental. Parâmetros curriculares
conhecimento sobre a cultura no município de nacionais: terceiro e quarto ciclos:
Paraíso do Sul-RS. Em sua maioria os apresentação dos temas transversais /
educandos percebem a cultura como Secretaria de Educação Fundamental. –
primordial para o conhecimento de seus Brasília: MEC/SEF, 1998.
antepassados e para se valorizar os costumes e _____. Secretaria de Educação Fundamental.
valores deixados pelos imigrantes, ou seja, a Parâmetros curriculares nacionais:
diversidade de códigos culturais geografia / Secretaria de Educação
materializados na paisagem local. Fundamental. Brasília: MEC/ SEF, 1998.
Outro aspecto importante a se salientar é que BRUM NETO, Helena. Regiões Culturais: a
Paraíso do Sul, está localizado na região construção de identidades culturais no Rio
formada por descendentes de alemães, os Grande do Sul e sua manifestação na paisagem
teuto-brasileiros e receberam como herança a gaúcha. 2007. Dissertação (Mestrado em
terra e os padrões culturais, mantendo a relação Geografia) Universidade Federal de Santa
homem-meio que tornou essa porção do Maria, Santa Maria, 2007.
território gaúcho tipicamente “germânica”. CORRÊA, Roberto Lobato; ROSENDAHL,
Tem suas marcas culturais simbolizadas pela Zeny. (orgs.). Introdução a Geografia
cultura alemã, ainda encontrada em sua Cultural. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
paisagem. (BRUM NETO, 2007). Sua 2003.
colonização ocorreu por volta do ano de 1860, FREIRE, Paulo. Educação e mudança.
com a chegada dos primeiros imigrantes na (Trad.) Moacir Gadotti e Lillian Lopes
Antiga Colônia Santo Ângelo. As marcas Martins. 23. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
deixadas pelos imigrantes ainda se encontram 1979.
percebidas na paisagem local do município. ______. Pedagogia da Autonomia - saberes
Neste sentido, é de grande relevância estudar necessários à prática educativa. São Paulo: Paz
o lugar e sua cultura, pois é através do e Terra, 1996.
entendimento sobre cultura que o indivíduo se INSTITUTO BRASILEIRO DE
torna apto para compreender as relações GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. IBGE
existentes em seu cotidiano. A cultura está CIDADES. Disponível em:
atrelada a formação coletiva e individual da <http://www.cidades.ibge.gov.br>. Acesso
sociedade, pois é a partir dela que são em: 23 nov. 2017.
estabelecidas as relações sociais com o meio a LIBANÊO, José Carlos. Organização e
qual pertencem. Portanto, o sentimento de gestão da escola: teoria e prática. São Paulo:
pertencer ao lugar é evidenciado, é necessário Alternativa, 2004.
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
RESUMO
No Brasil, as reformas educacionais implementadas a partir da década de 1990, orientadas por
agências internacionais, principalmente pelo Banco Mundial, revelam-se como um modelo
ultrapassado de práticas pedagógicas voltadas ao assistencialismo. A disseminação de um consenso
ideológico congruentes à dinâmica econômica internacional neoliberal aparece como pano de fundo
dessas políticas, cuja a análise econômica tornou-se a principal metodologia para a definição de
políticas educativas. O que se verifica na implementação das politicas educacionais em nosso país
são ações focalizadas no acolhimento social para os pobres (como base educacional) em detrimento
ao desenvolvimento do conhecimento, cultura e capacidades (LIBÂNEO, 2012) como estratégias que
promovam a emancipação e a cidadania. O presente artigo busca revelar a influência das orientações
de organismos internacionais nas políticas educacionais brasileiras voltadas ao ensino superior, em
um contexto de políticas neoliberais, que se perpetuam na contemporaneidade. Parte-se da hipótese
de que, apesar das mudanças políticas e econômicas ocorridas em nosso país desde a década de 1990,
as políticas educacionais estabelecidas nunca romperam com a agenda imposta pelo capital
internacional.
Palavras-chave: políticas educacionais, ensino superior, neoliberalismo
ABSTRACT
In Brazil, educational reforms implemented since the 1990s, guided by international agencies, mainly
by the World Bank, prove to be an outdated model of pedagogical practices focused on welfare. The
dissemination of an ideological consensus congruent to the neoliberal international economic
dynamics appears as the background of these policies, whose economic analysis has become the main
methodology for the definition of educational policies. The present article seeks to reveal the
influence of international organizations' orientations on Brazilian educational policies geared towards
higher education, in the context of neoliberal policies that perpetuate themselves in contemporary
times. It is hypothesized that, despite the political and economic changes that have taken place in our
country since the 1990s, established educational policies have never broken the agenda imposed by
international capital.
Keywords: educational policies, higher education, neoliberalism
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foram políticas educacionais que não Como crítica a essas ações tem-se que a
romperam com o imperativo elitista de seu maioria destes benefícios eram desenvolvidos
antecessor, conservando e mantendo a herança como “programas especiais e políticas
deixada. temporárias, sem configurarem-se como
Nas palavras de Oliveira (2009, p.197) “o políticas regulares.” (OLIVEIRA, 2009,
primeiro mandato do presidente Lula foi p.204)
marcado, no campo educacional, muito mais Alguns anos mais tarde, o governo Lula
por permanências que rupturas em relação ao institui o Plano de Desenvolvimento da
governo anterior”. Isso se deve pela ausência Educação (PDE). Este plano reúne vários
de políticas firmes em contraponto ao programas e ações que compreendem a
movimento de reformas iniciado no governo educação básica, ensino médio e a educação
anterior, que muito contribuiu para a superior. Contudo, por meio de parcerias com
estagnação do sistema educacional público os municípios, a prioridade é o
brasileiro. desenvolvimento prioritário da educação
O novo governo instituído “não só está básica.
mantendo os pilares do modelo capitalista Como forma de medir a qualidade do ensino,
neoliberal dependente, como está o governo criou em 2007, o Índice de
aprofundando alguns aspectos desse modelo” Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB),
[20](BOITO JÚNIOR, 2003, p.1) que se tornou uma referência desenvolvida
Durante o primeiro mandato do Presidente nesse governo para servir de indicador de
Lula, o que se observou foram ações qualidade na educação. Esta medida, criada
focalizadas e tentativas esparsas de impulso ao pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
ensino. Seu mandato caracterizou-se por “uma Educacionais Anísio Teixeira (INEP/MEC)
grande diversidade de programas especiais, em avalia as condições de ensino no Brasil em
sua maioria dirigidos a um público focalizado uma escala de notas de zero a dez.
entre os mais vulneráveis.” (OLIVEIRA, 2009, Sobre o ensino superior, em análise neste
p.198). A intenção era a redução da pobreza e artigo, o governo Lula, em outubro de 2003
das desigualdades sociais por meio de políticas designou via decreto a composição de um
de transferência de renda, que mesmo sofrendo grupo de trabalho para diagnosticar a situação
fortes críticas por parte da população mais das Instituições Federais de Ensino Superior –
abastada, retirou um número considerável de IFES. A principal atribuição deste grupo era
brasileiros da extrema miséria. apresentar um plano de ação para a
Neste sentido, o campo educacional foi reestruturação, desenvolvimento e
também utilizado como uma fonte articuladora democratização das IFES, para enfrentamento
de distribuição de benefícios. Inúmeros da crise herdada do governo anterior.
programas, além do Bolsa-Família, buscavam (AGUIAR, 2016)
impulsionar um número maior de indivíduos Este plano previa a tão esperada reforma do
ao ambiente escolar, como: o Programa ensino superior. Nesta perspectiva, o governo
Nacional de Inclusões de Jovens – ProJovem previa dobrar o número de vagas das IFES e
(instiuído pela Lei n° 11.129/2005 – o foco era direcionar recursos para sua modernização e
a elevação do grau de escolaridade visando à capacitação docente.
conclusão do ensino fundamental por jovens De acordo com Aguiar (2016) durante a
brasileiros) e o Primeiro Emprego (criado pela gestão de Tarso Genro (nomeado Ministro da
Lei n° 10.748/2003) como forma de redução da Educação em 2004) as principais iniciativas do
pobreza por meio do acesso à educação e ao Ministério da Educação para o Ensino Superior
mercado de trabalho. estão concentradas em três áreas: 1- a
Toda esta articulação só foi possível pelas apresentação ao Congresso Nacional de um
parcerias firmadas entre a União com Estados projeto de reforma universitária; 2- a
e Municípios, para que assim os programas formulação de um novo modelo de avaliação
fossem executados em um nível local, o que em substituição ao Provão (Sistema Nacional
permitiria também um melhor controle e de Avaliação da Educação Superior - SINAES)
acompanhamento dos beneficiários. e 3- um modelo de inclusão de estudantes
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Da mesma forma que no governo Lula, as Outros Ministérios também foram instintos:
políticas educacionais instituídas por Dilma Ministério da Igualdade Social, dos Direitos
assumiam a perspectiva da equidade social das Mulheres e da Juventude. Submeteu o
articulada com a concepção de Ministério de Direitos Humanos ao Ministério
desenvolvimento econômico, da capacitação da Justiça e “ o Ministério de Ciência e
de mão de obra e da elevação da Tecnologia foi “acoplado” ao Ministério de
empregabilidade da população. As políticas de Comunicações, reduzindo um e outro e, ao
ações compensatórias também ganharam mesmo tempo, privando a sociedade da
destaque com os programas do ProUni e da responsabilidade do Estado com a pesquisa e
Universidade Aberta do Brasil (FERREIRA, projetos nacionais de inovação, indispensáveis
2012). para o desenvolvimento da Nação.”(PINO e
Por outro lado, uma considerável atuação de ALMEIDA,2016, p.330)
grupos estrangeiros no campo educacional nos As políticas de educação, de modo geral,
permite afirmar que a mercantilização do passam por um amplo processo de mudanças,
sistema educacional, vista no governo FHC, se visualizadas a partir da implementação do
perpetua também no governo de Lula e Novo Ensino Médio (baseado na simplificação
perpassa à sua sucessora Dilma Rousseff . Este e flexibilização do currículo e em uma
cenário, nos permite afirmar também que as vinculação mais estreita ao mercado de
políticas educacionais do ensino superior trabalho). As reformas propostas para
brasileiro, apesar de avanços positivos em mudanças também no ensino básico e superior,
algumas áreas específicas, se integram às em ampla discussão pelo Congresso Nacional,
demandas da reestruturação produtiva do vislumbram a constituição de saberes mínimos
capital. do sujeito e contrariam a promoção da ciência
Na atual conjuntura das políticas sociais em e do conhecimento, principalmente neste
nosso país, e contida nessas as políticas último nível, em consonância às políticas
educacionais, após o afastamento de Dilma neoliberais instituídas por organismos
Rousseff da presidência do Brasil e ao assumir internacionais. Diante desse quadro de
Michel Temer em 2016, tem-se um quadro de retrocesso e austeridade, torna-se bastante
instabilidade econômica-administrativa das preocupante as perspectivas para o futuro da
instituições públicas, através de um processo educação em nosso país.
de cortes e desmantelamento dos direitos 1. Conclusões
sociais. Nas palavras de [22] Pino e Almeida A presente pesquisa buscou revelar a
(2016, p.329): Michel Temer, com seu influência das orientações de organismos
ministério constituído apenas por homens internacionais nas políticas educacionais
brancos e ricos, vem tomando medidas que brasileiras voltadas ao ensino superior,
comprometem as conquistas civilizatórias implementadas a partir da década de 1990, em
presentes na Constituição de 1988, e tudo isso um contexto de políticas neoliberais, que se
com uma velocidade que só a ruptura perpetua na contemporaneidade.
democrática possibilita. Com o argumento da A hipótese de pesquisa apresentada neste
necessidade de equilibrar as contas federais, artigo se confirma, tendo em vista as políticas
Temer se apressou em fazer uma reforma educacionais aqui expostas, as quais se
administrativa, que extinguiu pastas e fundiu revelam como insuficientes para o
áreas do governo. desenvolvimento científico e humano,
Uma das primeiras articulações, que formadoras de um sujeito mínimo e, apesar das
promoveu um processo de descontinuidade das mudanças políticas e econômicas ocorridas em
políticas educacionais de expansão do governo nosso país desde a década de 1990, nunca
Lula e Dilma foi a tentativa de extinção do romperam com a agenda imposta pelo capital
Ministério da Cultura. O que não foi possível internacional. Ou seja, as articulações políticas
pela forte pressão e resistência dos e educacionais seguem vinculadas ás
movimentos populares de cultura, de artistas e orientações neoliberais das agências
de intelectuais de nosso país. internacionais, sobretudo do Banco Mundial,
doutrinadas por princípios econômicos.
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b
Enfermeira, formada pela Anhengura Rio Grande. Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas Em Enfermagem e
Saúde da Criança e Adolescente da FURG.
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo conhecer as produções científicas acerca das atitudes de
enfermeiros(as) e sentimentos frente à morte . Foi realizada uma revisão de literatura de caráter
qualitativo, do tipo Narrativa. A coleta de dados foi realizada em julho de 2018, na base de dados:
Literatura Latino Americana (LILACS), com os seguintes descritores: “Morte” and “Enfermagem”,
and “Atitudes Frente à Morte” previamente testado nos Descritores em Ciências da Saúde (Decs),
foram localizadas 07 produções. Os dados extraídos foram agrupados resultando em dados relevantes
onde analisou-se os seguintes itens: tipo de estudo, sub áreas de conhecimento, sujeitos envolvidos
nas pesquisas, tipo de abordagem metodológica, caracterizando-os a fim de alcançar os objetivos
propostos. Com esse levantamento, organização e leitura das produções, emergiram as seguintes
categorias: Atitudes e sentimentos dos enfermeiros frente à morte e ao proceso de morrer; A formação
acadêmica e a influência para o enfrentamento da morte. Conclui-se que os cuidados de enfermagem
ao paciente que está morrendo exige habilidades e preparo do profissional enfermeiro(a), estes devem
dispensar tanto o cuidado adequado, e ainda atender aos familiares, pois estes se encontram
fragilizados com a perda. A realização deste estudo permitiu identificar a necessidade do fornecer
subsídios desde a graduação para que favoreça o desenvolvimento cognitivo e emocional nos
enfermeiros(as) para o desenvolvimento dessas habilidades para lidar com a morte.
Descritores: : Enfermagem; Morte; Atitudes Frente à Morte.
ABSTRACT
This work aims to know the scientific productions about nurses' attitudes towards death and the
process of dying. A qualitative literature review of the Narrative type was carried out. Data collection
was done in July 2018, in the database: Latin American Literature (LILACS), with the following
descriptors: "Death" and "Nursing", and "Attitudes towards Death" previously tested in the
Descriptors in Sciences of the (Decs), seven productions were located. The extracted data were
grouped resulting in relevant data where the following items were analyzed: type of study, sub-areas
of knowledge, subjects involved in the research, type of methodological approach, characterizing
them in order to reach the proposed objectives. With this survey, organization and reading of
productions, the following categories emerged: Nurses' attitudes and feelings towards death and the
process of dying; Academic training and influence to face death. It is concluded that the nursing care
of the dying patient requires skills and preparation of the nurse professional, they must dispense both
the adequate care and the family, as they are fragile with the loss. The accomplishment of this study
allowed to identify the necessity of providing subsidies from the graduation to that favors the
cognitive and emotional development in the nurses to the development of these abilities to deal with
the death.
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científicos, serão capazes de ajudar a refletir sobre esta temática pode auxiliar os
proporcionar a cura do paciente6. enfermeiros para um melhor enfrentamento do
processo de morte e morrer de seus pacientes,
Faz-se necessário rever a concepção de morte
além de contribuir na compreensão desta
nas universidades, pois a morte não é uma
vivência. Para que este processo seja
doença e não deve ser tratada como um
experienciado de maneira equilibrada,
insucesso terapêutico. Deve ser compreendida
fortalecendo-os para cuidar do paciente e de
como processo, pois se o paciente terminal for
seus familiares, minimizando seu próprio
considerado como um ser social e histórico,
sofrimento.
com crenças e valores próprios, que está
inserido em um contexto familiar e social, Sendo assim, este trabalho tem como objetivo
cuidá-lo, no momento da morte, é buscar a partir das as produções científicas conhecer
entendê-lo, ouvi-lo, respeitá-lo7. as atitutes de enfermeiros(as) frente à morte.
No meio acadêmico, a temática da morte e
sua vivência são, de certa forma, relegadas ou
Desenvolvimento
excluídas não havendo uma disciplina
específica sobre o tema, potencializando assim Foi realizada uma revisão de literatura de
a sensação de que somente o restabelecimento caráter qualitativo, do tipo Narrativa. A coleta
da saúde faz parte de uma boa assistência9. de dados foi realizada em julho de 2018, na
Nota-se que a formação está centrada na base de dados: Literatura Latino Americana
preservação da vida, voltando-se para a cura da (LILACS), com os seguintes descritores:
doença, e ao se deparem com situações de “Morte” and “Enfermagem”, and “Atitudes
morte é compreensível que sintam-se frente à morte” previamente testado nos
despreparados e que tentem afastar-se dela. Descritores em Ciências da Saúde (Decs). Não
ressalta-se a importância de estudos que foi delimitado recorte temporal, pois o objetivo
oportunizem a reflexão do cuidado ao paciente foi realizar um levantamento das produções
que vivenciam o processo de morte e morrer, acerca da temática. Foram localizadas 06
assim como dos desafios enfrentados pelos produções, utilizou-se como critérios de
profissionais de saúde nesse processo, inclusão: publicações latino-americanas
ressaltando a atuação do enfermeiro enquanto existentes na base de dados LILACS; resumos
gerente do cuidado nas diversas fases do disponíveis e completos, publicados na língua
processo de viver, ser saudável, adoecer e portuguesa ou espanhola.
morrer objetivando que esse processo aconteça Foram excluídos: as produções que não eram
de forma humanizada e integral2,5,6. artigos como: teses, dissertações, livros,
Estudos mostram a necessidade de rever a monografias, conferências, projetos; as
oncepção de morte nas universidades, pois a produções que ao fazer a leitura dos títulos e
morte não é uma doença e não deve ser tratada resumos não atenderam ao tema proposto e os
como um insucesso terapêutico. Deve ser que não possuíam resumo. Assim, foram
compreendida como processo, pois se o selecionados para compor a análise 05 artigos,
paciente terminal for considerado como um ser de posse dos resumos, os dados dos mesmos
social e histórico, com crenças e valores foram inseridos em quadro de extração de
próprios, que está inserido em um contexto dados composto por: código da base, objetivo,
familiar e social, cuidá-lo, nestes momentos método, tipo, instrumento, análise, cenário,
críticos, é buscar entendê-lo, ouvi-lo, respeitá- sujeitos, resultados, conclusão e tradução Para
lo7. análise dos dados, utilizou-se a Análise de
Conteúdo Temática de Minayo (2010)11.
Neste sentido, tendo em vista a complexidade
da temática surge a inquietação em conhecer as Nesse momento, os dados extraídos foram
atitudes de enfermeiros frente à morte e ao agrupados resultando em dados relevantes
morrer5,4,2,1. Disto surge a questão norteadora onde analisou-se os seguintes itens: tipo de
da presente pesquisa: Quais são as atitudes e estudo, sub áreas de conhecimento, sujeitos
sentimentos dos enfermeiros(as) frente ao envolvidos nas pesquisas, tipo de abordagem
processo morte/ morrer? Entende-se que metodológica, caracterizando-os a fim de
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alcançar os objetivos propostos. Com esse prestada ao cliente em fase terminal e seus
levantamento, organização e leitura das familiares. A concepção da morte como um
produções, emergiram as seguintes categorias: fracasso, vem da própria formação do
Atitudes e sentimentos dos enfermeiros(as) enfermeiro quando deixam de abordar e
frente à morte; A formação acadêmica e a promover discussões relacionadas às atitudes
influência para o enfrentamento da morte. frente à morte3,12,11.
Ainda que a morte esteja presente nas
práticas diarias enfermeiro há déficit de
Resultados e discussão
instrumentalização no processo de ensino-
Dentre os artigos analisados, verificou-se que aprendizagem o que dificulta o cuidado à
as únicas regiões do brasileiras com produções pessoa que está morrendo. A ausência de um
nesta área foi a Nordeste e a região Sudeste. espaço onde o enfermeiro possa discutir e
A revista que mais teve publicação foi a refletir sobre a morte provoca sentimentos de
Revista da Revista da Rede de Enfermagem do fracasso e frustação no processo de manter a
Nordeste - Rev Rene, com 03 publicações, vida, quando este defronta-se com a finitude13.
seguida das revista: Revista da Faculdade de Nota-se que ensinar sobre o cuidado de
Enfermagem da UERJ com 01 publicação, enfermagem diante da morte envolve muito
revista Latino -Americana em enfermagem da mais que simplesmente conhecimento técnico,
USP com 01 publicação e a revista Revista de o enfermeiro que lida diretamente com a morte
Estudos de Psicologia, PUC-Campinas com 01 e o morrer deve ter conhecimento de como ela
publicação. ocorre para prestar uma assistência de
qualidade e humanizada11,15.
Quanto ao tipo das pesquisas analisadas 02
pesquisas foram caráter qualitativo, 01 de Percebe-se que a morte provoca diversos
caráter etnometodologico, 01 analise reflexiva, sentimentos, até mesmo quando os estudantes
01 revisão bibliográfica da literatura. são levados apenas a refletir sobre a mesma.
Santos (2009), fala que a mente humana tem a
Todos os estudos analisados foram realizados capacidade de transformar sensações e
com acadêmicos(as) brasileiros(as), portanto vivências em fatos mentais que podem ser
quando comparados com estudos registrados, representados, simbolizados,
internacionais poderá haver diferenças já que a constituindo o pensamento, porém ela não tem
cultura de cada povo e as experiências vividas condições de representar e pensar sobre o que
influenciam na compreensão da morte e não existe15,6.
processo de morrer.
A grande dificuldade em lidar com a morte
Sales (2013) reforça que a subjetividade das advém do fato de que não se sabe, realmente,
definições do processo morte-morrer emerge o que ela significa. A tendência quando não
do contexto sociocultural e da história de vida sabemos enfrentar determinada situação, é a de
de cada pessoa, podendo representar o fim da nos afastarmos dela, a fim de, nos precavermos
vida, uma passagem ou o início de uma nova de sentimentos como o receio, a culpa e até
vida, encontrando na fé e na religião subsídios mesmo a sensação de fracasso por não termos
para torná-lo mais aceitável e compreensível8. conseguido fazer nada mais para evitar tal
desfecho14.
Atitudes e sentimentos de enfermeiros O entendimento sobre a morte é feita de
frente à morte: maneira muito rápida superficial, durante a
formação dos enfermeiros(as), a morte é
Nessa categoria evidenciou-se que a grande abordada de maneira negativa, ou seja, estão
dificuldade dos enfermeiros em lidar com a preparados para a manutenção do corpo
morte, foi notória a diversidade dos vivo13,11. Todo esse contexto resulta numa
sentimentos enfrentados por eles os quais contradição para os profissionais enfermeiros
merecem destaque a ansiedade, medo, que cuidam de pessoas que estão enfrentando
impotência, estresse, fracasso, tristeza o que a morte, pois há necessidade de manter a
influenciam de maneira negativa na assistência pessoa viva a todo custo, e ao mesmo tempo,
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de ajudá-la a morrer da maneira mais tranquila se lutar pela vida e em troca receber a morte,
e digna possível12. provocando-lhe angústia e indignação12,14.
A sensação de fracasso não é atribuída apenas Solum (2017) e Gois e Abraão (2015)
ao insucesso dos cuidados empreendidos, mas remetem em seus estudos uma estratégia de
a uma derrota diante da morte e da missão enfrentamento deste processo apontando que a
implícita das profissões de saúde: salvar o aproximação com a religiosidade do paciente,
indivíduo, diminuir sua dor e sofrimento, faz com que o enfermeiro ao cuidar o paciente
manter-lhe a vida8. que está morrendo, enfrente menos problemas.
Tornando-se assim menos propenso à
A vivência frente à situação irreversível: a
prevalência de doenças psicossomáticas e à
perda, a sensação de impotência de não poder
depressão, uso de drogas ilícitas e abuso de
‘reprimir a morte’ surge em consequência da
drogas lícitas como o álcool e o tabaco e
própria formação direcionada a recuperar a
também a menor incidência de suicídio, pois
vida. A perda do controle da situação, a
possuem índices mais elevados de qualidade
iminência da morte, apesar de todos os
de vida. Assim, a religiosidade também pode
recursos tecnológicos, faz com que os
ser suporte para os enfermeiros(as) que a sua
profissionais se defrontem com suas
rotina vivenciam situações semelhantes3,16.
limitações. É como se a habilidade profissional
estivesse sendo testada, como se a manutenção Moro (2010) ressalva que é possível que o
da vida dependesse da competência dos sentimento de pesar e angústia sejam oriundos
estudantes que ali prestam sua assistência ao da impotência, diante do fato inevitável de que
paciente3,15. a morte conduz à um sentimento de vazio e a
outras reações, e pode até chegar à tristeza pela
Negar a morte é uma das formas de não entrar
perda de uma convivência prolongada e de um
em contato com experiências dolorosas, essa
envolvimento prazeroso entre o cuidador e o
negação pode dar ideia de força e controle,
ser cuidado11. Esta percepção de vazio
entretanto, uma perda mal elaborada que não
existencial revela o fim como impedimento à
se permite a expressão da tristeza e da dor, ou
continuidade de seus cuidados e causam
mesmo, dos medos. Pode acarretar em graves
frustração, aumentando a dificuldade dos
consequências para os estudantes que assistem
estudantes de enfermagem em lidar com o
a pessoa em processo de morte11.
processo morte-morrer dos pacientes assistidos
O sentimento de tristeza e impotência variam em estágio12,15.
de acordo com as estratégias de cuidado que
Vale ressaltar que alguns estudos mostram
são utilizadas. Aqueles que se envolveram
que os enfermeiros(as) não sabem como agir e
mais com o paciente, após maior convivência,
abordar às famílias, tanto de doentes terminais,
revelam um profundo sentimento de tristeza e
quanto de pacientes que morreram,
angústia ligado a esse cuidado. Sentimento de
demonstrando dificuldades em lidar com o
frustração e impotência nesse cuidado ineficaz,
processo de morte/morrer dos indivíduos
que acaba no momento da morte do paciente7.
assistidos. Isto denota a dificuldade encontrada
Assim como, a própria percepção do
por eles em lidar com os sentimentos
despreparo técnico e incapacidade de lidar com
suscitados diante da morte e preferem não se
os próprios sentimentos são relatados tanto por
envolver com os familiares, dedicando-se
estudantes como por profissionais de
exclusivamente aos cuidados técnicos e
enfermagem.
burocráticos, fugindo assim de uma
O cuidar do ser humano que está morrendo aproximação3.
remete a refletir sobre a fragilidade da vida e,
Esse afastamento acontece por não saberem
muitas vezes, coloca aquele que cuida frente às
como trabalhar com sua própria dor e não
suas impotências, ocasionando prejuízos nos
terem um suporte adequado para lidar com
aspectos psicológicos e emocionais. A
concepção sobre a finitude desperta no seus medos e angústias. Essa dificuldade
encontrada, em confortar e realizar o
estudante a sensação de injustiça, pelo fato de
acolhimento a família que perde um familiar
pode desencadear um luto mal elaborado pelos
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Docente no Programa dePós-Graduação em Educação Ambiental – PPGEA, Univesridade Federal do Rio Grande –
FURG, e-mail:profaclaudiacousin@gmail.com
RESUMO
Este texto apresenta uma pesquisa em desenvolvimento, no Programa de Pós-Graduação em Educação
Ambiental – PPGEA, da Universidade Federal do Rio Grande – FURG. Dialoga sobre a importância da
participação dos Movimentos Sociais nos processos formativos das Instituições de Ensino Superior, tendo
como fenômeno estudado, o convênio da turma de Pedagogia da Universidade Estadual do Rio Grande
do Sul – UERGS com a Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar – FETRAF-SUL/CUT.
Traz a seguinte questão de pesquisa: como a participação e o diálogo entre a FETRAF-SUL/CUT e a
UERGS, materializados no convênio da turma de Pedagogia (2003-2007), potencializou a formação de
educadores na perspectiva da Educação Ambiental Crítica e Transformadora? O objetivo geral é
compreender como a participação e o diálogo dos Movimentos Sociais nas Instituições de Ensino Superior
potencializam a construção de uma Educação Ambiental Crítica e Transformadora na formação de
educadores. A pesquisa é de cunho qualitativo e o método está embasado na Perspectiva Crítica. A
produção das informações dar-se-á por meio de pesquisa documental e de entrevistas semiestruturadas e
a metodologia de análise será a Análise Textual Discursiva. Espera-se que a pesquisa potencialize a
integração da práxis da Educação Ambiental nos espaços de Educação Formal e, também, possibilite o
diálogo e a ação conjunta entre Instituições de Ensino Superior e Movimentos Sociais.
Palavras chave: Educação Ambiental, Formação de Educadores, Movimentos Sociais, Agricultura
Familiar.
RESUMEN
Este texto presenta una investigación en desarrollo, en el Programa de Postgrado en Educación Ambiental
- PPGEA, de la Universidad Federal de Rio Grande - FURG. Dialoga sobre la importancia de la
participación de los Movimientos Sociales en los procesos formativos de las Instituciones de Enseñanza
Superior, teniendo como fenómeno estudiado, el convenio de la clase de Pedagogía de la Universidad
Estadual de Rio Grande do Sul - UERGS con la Federación de los Trabajadores en la Agricultura Familiar
- FETRAF-SUL / CUT. Trae la siguiente cuestión de investigación: como la participación y el diálogo
entre la FETRAF-SUL / CUT y la UERGS, materializados en el convenio de la clase de Pedagogía (2003-
2007), potenció la formación de educadores en la perspectiva de la Educación Ambiental Crítica y
Transformadora? El objetivo general es comprender cómo la participación y el diálogo de los
Movimientos Sociales en las Instituciones de Enseñanza Superior potencian la construcción de una
Educación Ambiental Crítica y Transformadora en la formación de educadores. La investigación es de
cuño cualitativo y el método está fundamentado en la Perspectiva Crítica. La producción de las
informaciones se dará por medio de investigación documental y de entrevistas semiestructuradas y la
metodología de análisis será la Análisis Textual Discursiva. Se espera que la investigación potencie la
integración de la praxis de la Educación Ambiental en los espacios de Educación Formal y, también,
posibilite el diálogo y la acción conjunta entre Instituciones de Enseñanza Superior y Movimientos
Sociales.
Palabras clave: Educación Ambiental, Formación de Educadores, Movimientos Sociales, Agricultura
Familiar.
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
13 15
Realizado no período de 2003 a 2007. A pesquisa de mestrado defendida em março de 2015
14
Membro ativo de uma causa; que se posiciona de uma é intitulada “A Educação Ambiental na formação de
forma similar aquela ideologia, trabalho, profissão, educadores do Projeto Consórcio Social da Juventude
causa, envolvido diretamente, ativamente e se identifica Rural – Sementes na Terra” e buscou responder o
através de sua postura pessoal seguinte problema de pesquisa: “Quais princípios da
[http://www.dicionarioinformal.com.br/militante/]. Educação Ambiental emergiram no processo de
Pessoa que milita; quem defende uma causa ou busca formação de educadores do Projeto Consórcio Social da
transformar a sociedade através da ação [...] Juventude Rural-Sementes na Terra – CSJR, promovido
[https://www.dicio.com.br/militante/]. pela Federação dos Trabalhadores na Agricultura
Familiar da Região Sul – FETRAF-SUL/CUT?”.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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www.uergs.rs.gov.br
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
conta diversas dimensões que apontem para como uma das formas de intervenção no
uma outra globalização [SANTOS, 2006]. mundo:
Assim, considerando o modelo de educação
atual e remetendo a discussão da Educação Outro saber de que não posso duvidar um
Ambiental para o campo da Educação Formal, momento sequer na minha prática educativo-
compartilha-se a ideia proposta pelas crítica, é o de que, como experiência
Diretrizes Curriculares Nacionais – DCNEA , especificamente humana, a educação é uma
quando destaca a importância da necessidade forma de intervenção no mundo. Intervenção que
além do conhecimento dos conteúdos bem ou
de pensar a Educação Ambiental numa mal ensinados e/ou aprendidos implica tanto o
perspectiva transversal, perpassando o esforço de reprodução da ideologia dominante
currículo. E para propor um currículo em que quanto o seu desmascaramento [FREIRE, 1996,
a Educação Ambiental seja trabalhada como p. 98, grifo do autor].
tema transversal, entende-se de extrema
importância discutir a Formação de
Desta forma, compreende-se a importância
Educadores Ambientais e a participação dos
da educação para a transformação da sociedade
Movimentos Sociais – temas que serão
e, por conseguinte, a formação de educadores
discutidos a seguir.
torna-se imprescindível: seres humanos são
inacabados e a sociedade está em constante
Formação de Educadores Ambientais mudança, externando cada vez mais a
necessidade de formação contínua e
A formação de educadores ambientais é uma permanente. Neste sentido, Guimarães atenta
temática que vem sendo muito debatida nos para a necessidade e importância do papel das
últimos anos. Isso se deve à tomada de instituições que formam os educadores,
consciência sobre a importância do papel do enfatizando que a formação vai para além do
educador como desencadeador de processos conhecimento da disciplina e da mediação do
educativos críticos, promotores de processo ensino-aprendizagem:
transformação social e, também, a importância
da educação enquanto ato político. Porém, a
estrutura atual do Estado é organizada de uma [...] é urgente que as instituições que formam o
forma que fragiliza a atuação dos educadores, professor se deem conta da complexidade da
formação e da atuação consequentes desse
usando-os apenas como instrumentos de profissional. Além do conhecimento seguro da
trabalho. Vindo ao encontro dessa discussão, disciplina que ensina, da compreensão e de certa
Mészáros salienta que: segurança para lidar com a mediação do processo
ensino-aprendizagem, das concepções a serem
desenvolvidas em relação ao caráter ético-
É por isso, que hoje o sentido da mudança valorativo da sua atividade docente, vão se
educacional radical não pode ser senão o rasgar agregando outras habilidades afirmadas como
da camisa de força da lógica incorrigível do necessárias ao desenvolvimento adequado da sua
sistema: perseguir de modo planejado e atividade profissional [GUIMARÃES, 2004, p.
consistente uma estratégia de rompimento do 18].
controle exercido pelo capital, com todos os
meios disponíveis, bem como com todos os
meios ainda a ser inventados, e que tenham o Porém, novamente depara-se com a
mesmo espírito [MÉSZÁROS, 2008, p. 35]. contradição entre a necessidade e a
possibilidade de participar de formação, sendo
que a jornada real de trabalho da maioria dos
Apesar da contradição entre o que se entende
educadores não é correspondente à jornada
por educador e o que, de fato, é possível, a
formal. Nesse sentido, o tempo/trabalho é um
prática dos educadores incide diretamente na
dos fatores que pode dificultar ou até
formação dos educandos e, em consequência,
inviabilizar o processo formativo. Além disso,
em intervenções na sociedade. Para isso, Freire
é muito importante a valorização dos
ressalta que ensinar exige entender a educação
educadores, com condições financeiras dignas
403
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pesquisa qualitativa nos têm ensinado que, em [5] FEDERAÇÃO DOS TRABALHADORES
geral, o processo da entrevista semiestruturada NA AGRICULTURA FAMILIAR DA
dá melhores resultados se trabalha com REGIÃO SUL – FETRAF-SUL/CUT.
diferentes grupos de pessoas [...]”. Resoluções do I Congresso da FETRAF-
SUL/CUT. Consolidando a organização,
A metodologia utilizada para analisar as
fortalecendo a agricultura familiar e
informações será a Análise Textual Discursiva
alimentando o Brasil. Chapecó, SC: [s.n.],
– ATD, que é uma ferramenta de análise
2004. Resolução digitada.
textual que se propõe a interpretar os
fenômenos pesquisados, de maneira criteriosa [6] UNIVERSIDADE ESTADUAL DO RIO
e rigorosa. Tem como pretensão, testar GRANDE DO SUL – UERGS. Decreto nº
hipóteses para comprová-las ou refutá-las, 43.240, de 15 de julho de 2004. Porto Alegre:
baseando-se na compreensão e reconstrução de [s.n.], 2004.
fenômenos já existentes [MORAES; [7] UNIVERSIDADE ESTADUAL DO RIO
GALIAZZI, 2007]. GRANDE DO SUL – UERGS. Convênio nº
Neste momento, a pesquisa encontra-se na 009, de 28 de março de 2002. Porto Alegre:
fase da coleta das informações (entrevistas) e [s.n.], 2002.
análise destas. [8] TONET, Ivo. Educação contra o capital. 2.
ed. São Paulo: Instituto Lukács, 2012.
Resultados esperados [9] MÉSZÁROS, Isteván. A educação para
além do capital. 2. ed. São Paulo: Boitempo,
Os resultados esperados são que esta
2008.
pesquisa possibilite propor alternativas para
potencializem formas de participação e o [10] SANTOS, Milton. Por uma outra
diálogo com os Movimentos Sociais nas globalização: do pensamento único à
Instituições de Ensino Superior como consciência universal. Rio de Janeiro: Record,
estratégia para a construção de uma Educação 2006.
Ambiental Crítica e Transformadora na [11] FREIRE, Paulo. Pedagogia da
formação de educadores. Além disto, autonomia: saberes necessários à prática
potencializar a inserção da práxis da Educação educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
Ambiental nos espaços de Educação Formal e,
também, possibilitar o diálogo e a ação [12] GUIMARÃES, Mauro. A formação de
conjunta entre Universidades e Movimentos educadores ambientais. 3. ed. Campinas, SP.:
Sociais, contribuindo, assim, com os sujeitos e Papirus, 2004.
atores sociais envolvidos nesta pesquisa. [13] FREIRE, Paulo. Professora sim, tia não:
cartas a quem ousa ensinar. 24. ed. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 2013.
REFERÊNCIAS
[14] FEDERAÇÃO DOS
[1] LOUREIRO, Carlos Frederico Bernardo. TRABALHADORES NA AGRICULTURA
Trajetória e fundamentos da Educação FAMILIAR DA REGIÃO SUL – FETRAF-
Ambiental. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2012. SUL/CUT. Tese do II Congresso FETRAF-
[2] FREIRE, Paulo. Pedagogia da Esperança: SUL/CUT. A ousadia na luta e na organização
um reencontro com a pedagogia do oprimido. construindo um novo desenvolvimento.
17. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2011. Francisco Beltrão, PR: [s.n.], 2007.
[3] TRIVIÑOS, Augusto Nibaldo Silva. [15] GOHN, Maria da Glória. 500 ANOS DE
Introdução à pesquisa em ciências sociais: a LUTAS SOCIAIS NO BRASIL: movimentos
pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: sociais, ONGS e terceiro setor. Revistas
Atlas, 1987. Mediações, Londrina, v.5, n. 1, p. 11-40, jan/
jun. 2000.
[4] MORAES, Roque; GALIAZZI, Maria do
Carmo. Análise textual discursiva. Ijuí: Ed. [16] GOHN, Maria da Glória. Movimentos
Unijuí, 2007. sociais e redes de mobilizações civis no Brasil
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
b
Doutor em Ciências da Comunicação, professor titular – Universidade Feevale, sanfeliceg@feevale.br
RESUMO
Ao final da década de 80 o termo cidadania entrou na ordem do dia, incorporando também os
documentos oficiais do governo, tomando como base a Constituição de 1988. Não obstante, os
documentos que regem a educação nacional apontam no mesmo sentido, buscando tematizar a
cidadania no contexto escolar. Deste modo, esse estudo teve como objetivo investigar os
desdobramentos da cidadania na escola a partir dos Projetos Político Pedagógico. Caracteriza-se
como qualitativo descritivo e interpretativo. Teve como contexto uma escola da rede de ensino
pública e uma privada de uma cidade do Vale dos Sinos/RS, tendo como critério de escolha as escolas
com maior número de alunos matriculados no Ensino Médio no ano de 2018. Para a coleta de dados
foram utilizados documentos (PPP das escolas), observações, diários de campo e entrevistas. Os
cenários estudados desenvolvem a cidadania de formas distintas. A escola privada apresenta um
discurso e prática mais baseada no coletivo, através do perfil do egresso (aluno que seja capaz de
questionar, analisar e se posicionar criticamente no mundo, buscando solucionar problemas de forma
criativa e inovadora). A escola pública também cita em seu PPP a formação de um sujeito crítico, que
saiba lidar com desafios e que seja atuante na sociedade, mas não há uma fala comum entre os
entrevistados e as práticas observadas mostraram essa formação promovida por parte de alguns
docentes, mas não como um buscar de todos.
Palavras chave: cidadania, cidadão, escola, aluno, formação.
RESUMEN
A finales de la década de los 80 el término ciudadanía entró en el orden del día, incorporando también
los documentos oficiales del gobierno, tomando como base la Constitución de 1988. No obstante, los
documentos que rigen la educación nacional apuntan en el mismo sentido, buscando tematizar la
ciudadanía en el contexto escolar. De este modo, ese estudio tuvo como objetivo investigar los
desdoblamientos de la ciudadanía en la escuela a partir de los Proyectos Político Pedagógico. Se
caracteriza como cualitativo descriptivo e interpretativo. Tuvo como contexto una escuela de la red
de enseñanza pública y una privada de una ciudad del Valle de los Sinos/RS, teniendo como criterio
de elección las escuelas con mayor número de alumnos matriculados en la Enseñanza Media en el
año 2018. Para la recolección de datos, se utilizaron documentos (PPP de las escuelas), observaciones,
diarios de campo y entrevistas. Los escenarios estudiados desarrollan la ciudadanía de formas
distintas. La escuela privada presenta un discurso y práctica más basada en el colectivo, a través del
perfil del egresado (alumno que sea capaz de cuestionar, analizar y posicionarse críticamente en el
mundo, buscando solucionar problemas de forma creativa e innovadora). La escuela pública también
cita en su PPP la formación de un sujeto crítico, que sepa lidiar con desafíos y que sea actuante en la
sociedad, pero no hay un habla común entre los entrevistados y las prácticas observadas mostraron
esa formación promovida por parte de algunos docentes, pero no como un buscar de todos.
Palabras clave: ciudadanía, ciudadano, escuela, alumno, formación.
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
matriculados no Ensino Médio no ano de 2018, ocorreu através da triangulação por fontes,
presumindo-se, assim, que essas são as escolas teórica e reflexiva (CAUDURO, 2004).
mais procuradas e com maior alcance
quantitativo na formação dos alunos da
Resultados e discussão
respectiva cidade, atuais/futuros cidadãos.
Tendo como objetivo investigar os
Para a coleta de dados foram utilizados desdobramentos da cidadania na escola a partir
documentos, observações, diários de campo e dos Projetos Político Pedagógico, o presente
entrevistas. Tratando-se, portanto, de uma estudo faz uma análise dos PPP’s das duas
pesquisa documental, os documentos escolas participantes do estudo, buscando
analisados foram os Projetos Político entender como a cidadania está colocada
Pedagógico (PPP) das escolas participantes do nesses contextos: uma escola pública e uma
estudo para, assim, analisar e perceber o privada de uma cidade do Vale dos Sinos/RS.
projeto de escola como um todo, sem Como mencionado na metodologia, os PPP’s
fragmentar. A partir da análise dos PPP’s os são tensionados também com as observações e
dados foram confrontados com as observações entrevistas realizadas nessas escolas.
das escolas em turno de aula (escola pública:
de 13 de março à 13 de junho; escola privada: Faz-se necessário aqui descrever um pouco
de 21 de março à 14 de junho de 2018) e dos contextos investigados. A partir do critério
entrevistas realizadas com equipe diretiva e de escolha (maior número de alunos
docentes. Para a construção deste texto foram matriculados no ensino médio no ano de 2018),
utilizadas as entrevistas dos seguintes sujeitos, as escolas pesquisadas possuem características
conforme tabela 1: bem distintas e marcantes. A escola pública -
estadual, pois na cidade o ensino médio
Tabela 1 – entrevistados escola pública público é apenas provido pelo estado - é
Função Pseudônimo Data considerada pela comunidade como a melhor
Supervisora Julia17
12/07/2018 desta rede de ensino na cidade, pois atende
padrões de qualidade relacionando-se à
Professora Eliza 10/07/2018
organização num geral e ensino18, fazendo
Professora Celia 10/07/2018 com que as vagas sejam muito disputadas.
Fonte: elaborado pelos autores Embasada num ensino tradicional e, em geral,
Tabela 2 – entrevistados escola privada conteudista, rígido, onde as regras devem ser
seguidas a risca. Já a escola privada nesse ano
Função Pseudônimo Data de 2018 decidiu implementar um novo método
Supervisora Lorena 9/07/2018 de ensino baseado em metodologias ativas e
Professora Leonel 9/07/2018 colaborativas, flexibilizando regras (não há
sinal de entrada, saída e troca de períodos, por
Professora Edvaldo 9/08/2018
exemplo) e trabalhando na autonomia do aluno
Fonte: elaborado pelos autores
(os alunos vão até os professores, podendo
A presente pesquisa segue os parâmetros escolher em qual aula querem iniciar e o tempo
éticos conforme Resolução 510/2016 do que precisam ficar com cada professor). A
Conselho Nacional de Saúde, ciente sobre as escola trabalha por projetos, promovendo a
obrigações éticas, preservando o respeito às interdisciplinaridade, onde os professores são
pessoas. Foi aprovada pelo Comitê de Ética em facilitadores dos conteúdos e informações, não
Pesquisa da universidade Feevale, sob o tendo uma estrutura fixa de disciplinas e
número 81015617.1.0000.5348. períodos. Trabalham numa perspectiva de
Para a análise e interpretação dos dados, resolução de conflitos, colocando o aluno
utilizou-se a triangulação que, neste estudo, como central no processo, permeado por muito
diálogo entre alunos, docentes e coordenação.
18
17
Supervisora não quis que a entrevista fosse gravada, Conforme falas da direção, professores e alguns
portanto, somente anotei as respostas. alunos durante as observações.
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
Diante desse cenário, já é possível perceber a enquanto foram realizadas as observações, não
riqueza que temos em termos da diversidade foram presenciados essas ocasiões.
das realidades investigadas. A escola privada não tinha o documento
Antes da análise dos PPP’s, vale ressaltar a publicitado e finalizado, pois estava em
dificuldade em acessar esse documento em processo de construção. Nesse sentido, o
ambas as escolas. Na escola pública, só pude mesmo ainda não estava devidamente
ler o PPP no formato impresso, dentro da sala aprovado para domínio público, portanto,
da supervisão, já que ele não pode sair do local. nota-se que a escola acabou por cometer esse
A versão disponível é de agosto de 2017 e está equívoco, já que a proposta foi implantada
com algumas modificações assinaladas, mas nesse ano e comunicada aos alunos e aos pais
não tem carimbo da CRE (Coordenadoria no começo das aulas. Ou seja, não houve uma
Regional de Educação). Já a escola privada construção e diálogo preliminar com a
tem sua versão do PPP em seu site, no entanto, comunidade escolar sobre o PPP. O professor
essa versão é de 2007 e não está atualizada, Leonel (9/07/2018) comenta: “ali no inicio o
principalmente porque a escola modificou toda pessoal do terceiro ano estava super resistente
sua metodologia e, por orientação da direção assim, e com razão, talvez pudesse ter sido
da escola, esse PPP deve ser desconsiderado, conduzido de outra forma.” Apesar disso,
já que o novo está sendo construído e não pôde conforme conversa com o secretário da escola,
ser fornecido, pois não é de domínio público. muitas dúvidas surgiram ao longo do processo
Dessa forma, fui orientada a utilizar o que está e os pais e alunos podiam agendar para
no guia do aluno e no site. Nesse sentido, conversar com a coordenação sobre isso, já que
percebe-se uma falha de ambas as escolas, já professores, alunos e pais estavam em
que o Projeto Político Pedagógico deveria estar processo de adaptação com essa nova
atualizado e disponível para consulta da proposta. Esses espaços de diálogos foram
comunidade. observados e eram recorrentes, tanto entre
alunos-alunos, alunos-professores,
O Projeto Político Pedagógico da escola
professores-professores, alunos-coordenação e
pública aponta como finalidade do documento
professores-coordenação, sejam em momentos
a orientação das atividades diárias de maneira
formais ou informais. Logo no início das
“sistemática, científica, consciente,
observações a coordenação do Ensino Médio
participativa, democrática, enfatizando os seus
chamava alguns grupos de alunos para
princípios norteadores”, sendo “construído e
conversar sobre esse novo sistema de ensino,
reconstruído sistematicamente com a
os alunos se posicionavam, trazendo pontos
participação de toda a comunidade escolar”
positivos e pontos a serem melhorados,
(PPP escola pública, 2017). Propiciando, desta
principalmente no que diz respeito ao
forma, “a vivência democrática necessária para
aproveitamento das aulas e relações entre
a participação de todos os membros da
alunos e professores. Ao final de uma das
comunidade escolar e o exercício da
conversas, uma aluna apontou para sua
cidadania”, ou seja, “trata-se de uma relação
preocupação com a preparação para o
recíproca entre a dimensão política e a
vestibular e a coordenadora exemplificou com
dimensão pedagógica da escola” (VEIGA,
o Enem, no qual as perguntas não são "soltas"
2008, p. 13). Como a inserção na escola através
por áreas, mas sim integradas e
das observações foi relativamente rápida (de
contextualizadas, assim como a nova proposta
março a junho), duas manhãs por semana, não
da escola.
foi possível observar e presenciar estes
momentos de construção com a comunidade Diante dessas observações, percebemos
escolar e verificamos que o próprio diálogo proximidades com o que Trevisan (2009, p.
com o aluno é restrito. O PPP é seguido, as 102) traz sobre o contexto escolar pesquisado
regras também devem ser, mas acreditamos que contribuem para as práticas voltadas à
que esse diálogo deve ocorrer em momentos formação da cidadania: uma organização
específicos fora do horário de aula, já que institucional onde foram possibilitadas
condições de institucionais e de ensino que
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Enfermeira, formada pela Anhanguera Rio Grande, E- mail. Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas Em
Enfermagem e Saúde da Criança e Adolescente da FURG.
Enfermeira, formada pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões- Campus Santiago, Email
francinemartins30@hotmail.com. Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas em Enfermagem e Saúde da Criança E
Adolescente da FURG.
RESUMO
A Unidade de Terapia Intensiva Neonatal se apresenta como um ambiente bem diferente do útero
materno, pois na tentativa de melhorar seu estado clinico, o RNPT é internado, submetido a diversos
procedimentos invasivos e dolorosos, causando assim o estresse neonatal, evidenciando assim fatores
que o RNPT fica exposto durante sua hospitalização. O presente estudo trata-se de uma revisão
bibliográfica com o objetivo de conhecer os efeitos fisiológicos causados pelo estresse neonatal no
organismo do recém-nascido, identificar o conhecimento dos enfermeiros em relação ás medidas de
controle quanto ao estresse no RN e pesquisar medidas de controle que possam reduzir efeitos nocivos
no organismo. Evidenciamos que as medidas de alivio e redução de danos são importantíssimas no
controle de estresse neonatal, e de forma complexa irá refletir na vida do neonato, essas medidas
podem melhorar a qualidade de vida e sua recuperação, isso se dará pela implementação de uma
prática assistencial da enfermagem, com embasamento técnico e científico, refletindo um cuidado
adequado e humanizado.
ABSTRACT
The Neonatal Intensive Care Unit presents itself as a very different environment from the maternal
uterus, because in an attempt to improve its clinical state, the PTNB is hospitalized, and subjected to
several invasive and painful procedures, thus causing neonatal stress, thus evidencing factors that the
RNPT is exposed during their hospitalization. The present study is a bibliographical review aiming
to know the physiological effects caused by neonatal stress in the newborn's organism, to identify
nurses' knowledge regarding control measures regarding NB stress and to investigate control
measures which may reduce harmful effects on the NB body. It is evident that the measures of relief
and harm reduction are very important in neonatal stress management, and in a complex way will
reflect on the life of the neonate, these measures can improve the quality of life and its recovery, this
will be given by the implementation of a care practice of nursing, with technical and scientific
background, reflecting an adequate and humanized care.
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Quais os fatores estressores que o RNPT está procedimentos dolorosos. Essas condições são
exposto durante a hospitalização em Unidade fonte de estresse que complicam o estado do
de Terapia Intensiva Neonatal? prematuro e prejudicam sua maturação.
Será realizada a leitura na íntegra dos artigos Atualmente o estresse psicológico é visto
científicos selecionados, sendo os mesmos como uma das principais causas das alterações
analisados de forma sistemática, com o intuito do estado de saúde da população mundial,
de descrever e classificar os resultados, apresentando-se por meios de alterações
evidenciando o conhecimento produzido sobre fisiológicas, cognitivas e comportamentais,
o tema proposto, realizando a análise e sendo capaz de levar o indivíduo a doenças e
categorização das temáticas. até a morte. A compreensão do estresse como
um processo psicofisiológico do organismo e é
Resultados e discussão importante, pois possibilita identificar
respostas de maneira como os estímulos são
Há algumas décadas acreditava-se que o recebidos.
neonato não estava ciente de seu ambiente e
que seria incapaz de participar de uma A assistência ao recém-nascido está muito
interação significativa, incapaz de ouvir, ver, avançada, surgem a cada dia novos recursos e
distinguir os odores e sentir sabores. Nos tratamentos, isso tem seu lado positivo, à
últimos 10 e 20 anos, as pesquisas demostram medida que se beneficia a melhora do estado
que os recém-nascidos a termo são capazes sim clínico do recém-nascido, por outro lado a
de perceber seu ambiente e interagir com ele UTIN se torna um ambiente
por meio de comportamentos específicos. O estranho/diferente, com diversos
ambiente da unidade de terapia intensiva equipamentos e tecnologias, que muitas vezes
neonatal, no entanto, proporciona a esses provocam ruídos fortes e iluminação
prematuros um espaço bem diferente do excessiva. Nesse sentido conceituamos
mundo intrauterino. agentes estressores como um conjunto de
É considerado um ambiente repleto de respostas orgânicas, em nível psicológico,
equipamentos, com rica tecnologia, dinâmico mental ou comportamental, provocada por
e sobre carregado de contínuos movimentos e qualquer estimulo capaz de perturbar o
intervenções, por diversos tipos de equilíbrio interno, levando o neonato ao
profissionais e pelos familiares do RN que são estresse.
responsáveis e participantes do cuidar. O RN A luminosidade em excesso pode originar
internado na UTIN receberá cuidados urgentes efeitos lesivos nas estruturas óticas, podendo
na tentativa de melhorar seu estado clinico e haver piora no prognóstico de retinopatia. A
auxiliá-lo a viver, fazendo com que, muitas contínua exposição à luz desordena todo o
vezes, seja entubado, ventilado, perfurado ritmo circadiano e hormonal. A utilização da
durante um período longo, caracterizando um luz cíclica, que é a redução da luminosidade
processo de excessivos episódios de manuseio, durante a noite, auxilia o neonato á distinguir
cerca de 50 a 134 vezes em 24 horas, durante a o dia e a noite. A UTIN é um espaço
fase mais crítica, tanto por procedimentos extremamente iluminado, com uma
dolorosos tanta para cuidados de rotina. diversidade de luzes artificiais e naturais,
ficando os recém-nascidos expostos a essas
Durante a vida intrauterina o feto dorme na luzes 24 horas por dia.
maior parte do tempo. O ambiente tem a
temperatura ideal, não há barulho, é escuro e As normas técnicas relacionadas a
ninguém o perturba, por isso o organismo se iluminância (NRB 5413) estabelece que os
desenvolve rapidamente. Na UTIN o RNPT valores de iluminação artificial em berçários
encontra várias intervenções como: a não devem ultrapassar 100 lux.
manipulação excessiva sem agrupamentos de Algumas modificações podem ser
procedimentos que acontecem de acordo com implementadas na UTI neonatal e os seus
a rotina da unidade, o ruído a luminosidade prováveis benefícios incluem: Aumento da
intensos e ainda é submetido a múltiplos
422
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
aleitamento materno). Realizar controle de Os sinais de estresse sugerem dar uma pausa
infecção, estimular o RN, educar os pais, ao cuidado ou até cancelar, até que o bebê
estimular visitas familiares, elaborar e manter possa demostrar mais sinais para continuar o
um plano educacional, organizar, administrar e procedimento, desta forma podemos impedir
coordenar a assistência de enfermagem ao RN que o bebê alcance o sinal de híper alerta, com
e a mãe, desenvolver atividades olhos bem aberto e olhar de pânico e uma
multidisciplinares, orientar o ensino e fixação, é um estímulo difícil a ser controlado.
supervisionar os cuidados de enfermagem A experiência dolorosa no período neonatal
prestados, entre outras atividades. .(Silva, podem causar efeitos fisiológicos,
2008). comportamentais ou até alterações no
desenvolvimento do sistema nervoso.
Os sinais indicam a necessidade de uma Ocorrências de dor podem levar a alterações
pausa até que o próprio RN de um sinal para cardiovasculares e respiratórias, metabólicas e
continuar o procedimento ou até mesmo endócrinas, no sistema imunológico e na
suspender. coagulação.
Frente á esses diversos estímulos que o Frente a tantos resultados danosos a dor no
neonato está exposto durante sua internação na neonato faz-se essencial a sua avaliação
UTIN, algumas medidas de alívio e controle do adequada. Para isso devemos levar em
estresse devem ser tomadas pela equipe, sendo consideração os diferentes tipos de dor:
utilizadas para que haja redução dos agentes fisiológica, inflamatória e neuropática. No
estressores. Medidas de redução de manuseio da dor, a prevenção sempre oferece
luminosidade, redução de níveis de ruído, um alívio mais eficaz, algumas das estratégias
redução de manipulação e redução da dor. não farmacológicas podem ser utilizadas, que
objetiva diminuir a carga total de estímulos
Alguns cuidados para o RNPT. negativos, diminuindo assim o gasto
energético, minimizando assim a exaustão,
O usual nas UTIN é o uso de cuidados de diminuindo estímulos táteis e luminosos,
rotina, onde são usados protocolos de cuidados diminuindo ruídos e manuseios, acalmar o
para todos os bebês, sem um planejamento bebê, organizar cuidados, organizar o sono,
prévio, o cuidar do neonato de uma forma utilizar cuidados contingentes.
burocrática. Os cuidados contingentes ainda Adequar procedimentos técnicos: Planejar e
não usados de forma rotineira são aquelas as organizar os procedimentos, usar acesso
quais se exigem uma observação antecipada, venoso profundo, usar mínimo de fitas
análise da real necessidade daquele adesivas, remove-las gentilmente, realizar
procedimento e a realização no período mais procedimentos pelo profissional mais
adequado do bebê de acordo com suas experiente, e tentar manter sempre o mesmo
respostas. Ao final da rotina de cuidados será profissional no manejo dos cuidados.
deixado calmo e tranquilo. Logo o aspecto
chave do cuidado é observar as pistas dadas Frente a esses diversos estímulos que o
pelo RNPT , onde podemos identificar os neonato está exposto durante sua internação na
sinais de aproximação e retraimento frente a UTIN, algumas medidas de alívio e controle do
um dado estímulo estressor. Por meio desses estresse devem ser tomadas pela equipe, sendo
sinais podemos analisar a disponibilidade de utilizadas para que haja redução dos agentes
energia para o funcionamento de acordo com a estressores. Medidas de redução de
manutenção de seu equilíbrio homeostático. luminosidade, redução de níveis de ruído,
O bebê dá sinais e expressa sua prontidão, redução de manipulação, redução da dor.
para se conduzir ao estímulo ou para evitá-lo, (TAMEZ, 2016).
como regra geral a extensão e comportamentos Na UTIN o manuseio e as atividades
difusos representam estresse, e desenvolvidas podem chegar desde 80db
comportamentos auto regulados demostram (fechamento de porta das incubadoras), 60db
competência auto regulatória. (conversas da equipe), 60db a 70db (alarmes,
425
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
4
comportamento dos neonatos e na qualidade de MAGALHÃES, J. F.; et al. Respostas
vida desses neonatos na pós internação, fisiológicas e comportamentais de recém-
entende-se que a equipe está a cada vez mais nascidos durante o manuseio em unidade de
em busca de conhecimento, afim de melhorar Terapia Intensiva Neonatal. Fortaleza:
a qualidade assistencial do serviço. Revista da rede de Enfermagem do Nordeste,
O alivio desses agentes estressores é 2011
reponsabilidade da equipe, pois a esta deve
5
conhecer cada um desses fatores com a RESENDE, M. A.; FERNANDES M. J.
finalidade assim de diminui-los. Intervenção mínima: Um cuidado essencial
ao recém-nascido em Unidade de Terapia
Intensiva Neonatal.
É muito importante que a equipe esteja
preparada, reconhecendo os sinais através do 6
JORDÃO, R. K et tal. Possíveis fatores
RN. Devem-se observar as mudanças de estressantes na Unidade de Terapia
comportamento, expressões faciais, choro Neonatal em Hospital Universitário. Revista
movimentos corporais e também as alterações Brasileira de Terapia Intensiva, vol 28 no 3.:
fisiológicas. Diante desses estímulos São Paulo July/sept. 2016.
estressores se torna necessário medidas de
controle e alívio do estresse do RN. (TAMEZ, 7
PINTO, E. F.; SILVA, I. L.; CARDOSO, F.;
2016) BERESFORD, H. O estresse no neonato pre-
termo: uma reflexão axialógica a cerca de
Frente a esses diversos estímulos que o possíveis influências sensório-ambientais
neonato está exposto durante sua internação na em unidade de terapia intensiva neonatal.
UTIN, algumas medidas de alivio e controle do Fit Perf J. 2008 Set-Out; 7(5):345.
estresse devem ser tomadas pela equipe, sendo
utilizadas para que haja redução dos agentes 8
SOUZA, M. M.; SILVEIRA, B. L.;
estressores. Medidas de redução de MACHADO, L. C. S.; SANTANA, M. C. C.
luminosidade, redução de níveis de ruído, P.; FLORES, N. G. C.; Variabilidade na
redução de manipulação, redução da dor. frequência cardíaca dos recém-nascidos de
(TAMEZ, 2016). alto risco na presença de ruídos. Speech
Language Hearing Sciences and Education
Journal (Rev. CEFAC).2014 jan-fev;1.6(1)-
99-4.
REFERÊNCIAS
9
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TAMEZ, R.N. Enfermagem na UTI
Neonatal: Assistência ao recém-nascido de termo colocados em rede de balanço em
alto risco. “5. Ed“Koogan, 2016 (ISBN 978- unidade de terapia intensiva neonatal:
85-277-2212- Rio de Janeiro: Guanabara 4) Estudo clinico experimental com avaliador
2 cego. Disponível em:
ROLIM, C. M. K. O discurso e a pratica do
http://bases.bireme.br/cgi-
cuiado ao recém-nascido de risco: refletindo
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Americana de Enfermagem. 2006. Jane-
14(1)
3
OTONI, A. C. S.; GRAVE, M. T. Q.
Avaliação dos sinais neurocomportamentais
de bebês pré-termo internados em Unidade
de Terapia Intensiva Neonatal. Revista de
Terapia Ocupacional da Universidade de São
Paulo: 2014.
428
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
b
Departamento de Ciências da Comunicação, Universidade Federal de Santa Maria, rafasterorama@gmail.com
c
Departamento de Ciências da Comunicação, Universidade Federal de Santa Maria, thomasdtownsend@gmail.com
RESUMO
Este trabalho é um estudo de caso de uma metodologia criada a fim de desenvolver a leitura e a escrita
criativa na escola. Alcunhada por nós de Baralho de Personagens, esta prática pedagógica foi
implementada experimentalmente em 2017, durante oficinas de criação coletiva de roteiros,
ministradas para alunos de três turmas do 3º ano do Ensino Médio de uma escola pública de Santa
Maria-RS. Ela consiste em três etapas: 1) a criação individual de uma personagem original,
descrevendo características físicas, psicológicas, gostos, atitudes e manias; 2) a proposição de
situações adversas a serem enfrentadas pelas personagens; 3) o sorteio de três personagens a fim de
realizar uma tempestade de ideias para a criação coletiva de um enredo que contenha obrigatoriamente
as escolhidas. A culminância da proposta em 2017 foi a roteirização em grupo da narrativa escolhida
em cada turma e, posteriormente, sua gravação como um curta-metragem. Embora a metodologia
tenha sido elaborada para oficinas de cinema, ela mostra-se aplicável em qualquer prática de criação
de narrativas (seja na literatura, no teatro, etc.). O Baralho de Personagens, neste caso, foi efetivo ao
desenvolver, além da leitura e da escrita, habilidades como o trabalho em grupo, a alteridade, a
criatividade e a sensibilização artística. Outrossim, essa metodologia possibilitou aos alunos
exercícios de resoluções de problemas – concretos e abstratos – que podem se estender a outras áreas
do conhecimento.
Palavras-chave: Metodologia, Narrativa, Escrita Criativa, Educação, Escola Pública.
ABSTRACT
This article is a case study of a methodology created to develop reading and creative writing in school.
This pedagogical practice has been implemented experimentally in 2017, during cinema workshops
taught to three groups of 3rd year high school students in a public school located in Santa Maria-RS.
It is composed of three stages: 1) the individual creation of an original character, describing physical
and psychological aspects, tastes, habits and attitudes; 2) the proposition of adverse situations to be
faced by the characters; 3) after drawing three of the created characters, the collective creation of a
plot, necessarily containing the chosen ones. The culmination of this proposal was the scripting of a
narrative chosen in each group and, later, the shooting of the short-movies. Although this
methodology has been developed for cinema workshops, the Deck of Characters can also be
applicable in any practice of creating narratives (whether in literature, drama, visual arts, etc). The
Deck of Characters, in this case, has been effective in order to develop, besides reading and writing,
skills such as group work, alterity, creativity, and artistic literacy. Moreover, this methodology has
allowed students to solve concrete and abstract problems that can be extended to other areas of
knowledge.
Keywords: Methodology, Narrative, Creative Writing, Education, Public School.
429
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
de maio de 2017 e janeiro de 2018, durante qual a leitura seja um meio de criatividade e de
oficinas extraclasse de criação coletiva de prazer, mas sim o espaço no qual leitura e escrita
se associam a tarefa obrigatória e chata.
roteiro para cinema, ministradas para alunos de Castradora, inclusive. [2]
três turmas do 3º ano do Ensino Médio do
Instituto Estadual de Educação Olavo Bilac,
escola localizada na cidade de Santa Maria, A escola deve ser um espaço oposto a isso.
Rio Grande do Sul. Ela deve ser acolhedora, inclusiva, plural,
criativa e compreensiva. Um dos modos de se
Os objetivos dessa metodologia são produzir fazer isso é priorizar o ensino de diferentes
narrativas com etapas individual e coletiva, modalidades artísticas que despertem
instigando os alunos a refletirem sobre suas potências criativas nos alunos.
escritas; fazer com que eles inter-relacionem
saberes de diferentes ordens para construir No sistema atual, todavia, isso não acontece.
narrativas criativas; desenvolver novos saberes Dentre todas as disciplinas, aquelas
éticos e estéticos durante o desenvolvimento relacionadas às artes, à comunicação e à
de suas narrativas; praticar a alteridade ao criatividade são preteridas, quando
pensar como outros personagens; e exercitar a comparadas àquelas dos saberes exatos. Basta
resolução de problemas, posto que essa é uma vermos a quantidade de períodos semanais
qualidade inerente à criação. dedicados às artes e quantos dedicados à
matemática e à física, por exemplo. A própria
estruturação do sistema educacional deixa
Em busca do tempo e espaço perdidos da claro que os saberes exatos valem mais que os
arte na educação básica estéticos e criativos.
Melhorar a educação: frase presente no Na sociedade da informação, as pessoas têm
discurso de qualquer político demagogo. facilidade em buscar saberes em outras
Contudo, quem, de fato, desenvolve propostas instâncias e talvez desvalorize a escola. Isso é
para se melhorar a qualidade do ensino? sintomático. Contudo, com os inúmeros e
fragmentados saberes que existem, a escola
A maioria das pessoas parece ser especialista
deveria ser o lugar para conseguir relacioná-
em pedagogia: é comum vermos na mídia
los. Lembramos aqui que informação é bem
advogados, políticos, administradores e
diferente de conhecimento.
empresários escreverem ou falarem sobre em
educação, dando sugestões para as práticas de
sala de aula e criticando modelos tradicionais. A escola deixou de ser o único lugar de
legitimação do saber, pois existe uma
É muito fácil criticar o sistema educacional, multiplicidade de saberes que circulam por
mas, o mesmo não pode ser dito com a outros canais, difusos e descentralizados. Essa
proposição de ações concretas. Nesse dilema, diversificação e difusão do saber, fora da escola,
parece que a educação está cada vez mais se é um dos desafios mais fortes que o mundo da
comunicação apresenta ao sistema educacional.
desvalorizando (isso que nem entramos na
[3]
questão da precariedade dos recursos humanos
e materiais da escola, sobretudo na escola
pública). A desvalorização social torna-se Ainda quando se tenta adentrar no ensino das
particular quando os alunos corroboram esse artes, este é limitado a algumas modalidades.
pensamento. As aulas de artes geralmente se restringem à
A escola por si só é tida um ambiente similar pintura e à escultura, trabalhando com técnicas
a prisão, visto que é, estruturalmente, repleta de reprodução, que pouco valorizam o
de grades e muros, além de manter obrigações empenho criativo.
rotineiras. Esse arquétipo escolar de pronto já
torna a escola como uma instituição Em geral, os centros educativos tendem a
castradora. considerar as atividades realizadas com a
imaginação como tarefas restritas ao campo das
artes e, quando algum professor arrisca
Nossas escolas não estão sendo um espaço no ‘imaginar’ em suas aulas sobre outros temas, isso
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
é considerado como ‘tempo perdido’. Em busca O pesquisador Celso Favareto pondera sobre
desse ‘tempo perdido’ é que conseguimos ganhar os benefícios de inserir o cinema na educação
outro tempo, cuja potência criativa nos aproxima
de outros modos do saber, da descoberta e da
formal:
invenção. [4]
Tomar o cinema como instância educativa
implica redirecionar as tradicionais questões
Ainda no que tange ao ensino de sobre as relações entre pensamento e
sensibilidade, entre juízos de gosto e prazer da
comunicação e arte na escola, temos uma fantasia, entre experiência reflexiva e consumo
modalidade que é ignorada por muitas vezes: o de experiências. Tratando-se de cinema e, mais
cinema. São poucas as instituições que extensamente, de todas as novas tecnologias das
preveem em seus componentes curriculares o imagens, pergunta-se se o que estaria em questão
ensino de práticas, técnicas, apreciação ou na escola não seria a constituição de verdadeiros
laboratórios experimentais da sensibilidade e do
sensibilização cinematográfica. pensamento visual. [6]
Acreditamos que o cinema é uma modalidade
muito completa, pois considera na mesma É através da arte que a educação consegue
produção música, artes cênicas, pintura, ganhar um pouco de fôlego. A escola é a
escultura, arquitetura e poética. Diz-se que o instituição que, em certo ponto, foge da lógica
cinema é a sétima arte por ter o poder de aliar capitalista, no sentido de ter liberdade de
essas seis formas de expressividade. propor atividades de diferentes áreas e
Reiteramos a importância do ensino de promover o pluralismo de opiniões sem
cinema na escola quando pensamos que muitos recompensas materiais e imediatas. O mesmo
dos alunos de hoje em dia já nascem num acontece com a arte, que ainda representa uma
mundo permeado pela linguagem audiovisual. resistência a esse sistema econômico. A arte
Basta pegar o celular no bolso e os alunos revigora a educação
podem assistir a um filme lançado há uma hora
atrás, ou um clássico do século passado.
Quando a educação – tão velha quanto a
Inclusive, alunos até produzem cinema e suas humanidade mesma, ressecada e cheia de fendas
próprias narrativas com as ferramentas – se encontra com as artes e se deixa alagar por
elas, especialmente pela poética do cinema –
tecnológicas. Alguns deles já são praticamente jovem de pouco mais de cem anos -, renova sua
youtubers: mantêm canais online e os fertilidade, impregnando-se de imagens e
alimentam com vídeos feitos e editados por sons.[7]
eles mesmos, sem ter qualquer incentivo
escolar.
Com cinema, o mesmo acontece. Ensinar
Outros produzem cinema de forma cinema na escola é apresentar um processo
inconsciente. A famigerada funcionalidade ensino-aprendizagem de resistência. Por isso
“história” (em que se pode postar fotos ou que entendemos que através do cinema temos
vídeos que duram até 24 horas na internet), um imenso potencial para desenvolver o
presente em redes sociais como Instagram, ensino de análise e criação de narrativas.
Facebook ou Snapchat são narrativas
audiovisuais diárias que os alunos consomem
e produzem em grande volume. O cinema tem Com o cinema como parceiro, a educação se
um apelo bem positivo entre os jovens e é ideal inspira, se sacode, provoca as práticas
pedagógicas esquecidas da magia que significa
que educadores atuais saibam como trabalhar aprender, quando o ‘faz de conta’ e a imaginação
com essa modalidade artística. ocupam lugar privilegiado na produção sensível
e intelectual do conhecimento. [8]
A pedagogia do cinema é caracterizada pelo
modo de aproximação ao objeto. Essa A imaginação que, através do cinema ocupa
aproximação deverá priorizar sempre um modo esse lugar privilegiado no imaginário e na
criativo, dado que o cinema se trata de um objeto produção do saber é o que chamamos de
vivaz e indócil. [5] criatividade. Essa habilidade nada mais é que
a inter-relação de saberes postos em prática.
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
Já as outras duas realizaram uma votação para incomodado, o candidato procura Siqueira
selecionar a melhor ideia e, em seguida, para expor as tendências neonazista de Pablo.
desenvolvê-la. De repente, o gato de Siqueira, Mário, aparece
morto. No fim, Daniel se elege prefeito da
As três histórias, quando prontas, foram
cidade e Pablo vai preso. Enquanto o candidato
intituladas de Linhas Tortas, O Candidato e
comemora o resultado, sua namorada Clara
Tudo pela Vingança.
descobre na casa dele um frasco usado de
Em Linhas Tortas, as três personagens veneno, dando a entender que o próprio Daniel
escolhidas foram, resumidamente, Lucas, um matou Mário.
camelô que sonhava em conseguir dinheiro
A terceira narrativa, Tudo pela Vingança,
para gravar canções de RAP; Francisco, um
contemplou Gonçalo, um cigano vidente
professor de literatura de escola pública casado
asiático que parou no Brasil por engano
com um policial; e Caco, um jovem que
quando criança; Ashley Smith, uma policial
participa de uma gangue de assalto a bancos. A
que durante a noite é uma assassina em série; e
narrativa sintetizada foi esta: um camelô
Barbosa, a pipa feliz. Tudo pela Vingança é um
chamado Lucas passa por dificuldades
thriller policial e conta a história de Ashley
financeiras e não consegue dinheiro para
Smith, uma policial que vive com seu filho
realizar seu sonho de gravar uma música. Seu
Lucas, que adora brincar com sua pipa. Eis que
amigo Caco, então, lhe faz uma proposta para
um dia Lucas demora a voltar para casa e
melhorar de vida: assaltar um banco e
Ashley vai procura-lo na praça da cidade.
conseguir dinheiro para ele gravar suas
Chegando lá, ela testemunha o assassinato de
músicas. Hesitante, Lucas aceita roubar o
seu próprio filho, morto à sangue frio, crime
banco. Quando os dois estão saindo com o
feito por Gonçalo, um cigano vidente querido
dinheiro, dois policiais entram em cena e
pela comunidade. Como é a única testemunha
atrapalham os planos dos amigos. No meio a
do assassinato, nenhum dos colegas de
ameaças, um dos policiais acerta um tiro em
trabalho acredita em Ashley, o que a leva a
Lucas. Nesse momento, um dos clientes do
querer fazer justiça com as próprias mãos.
banco identifica Lucas como seu ex-aluno.
Sozinha, invade a tenda de Gonçalo e descobre
Caco aproveita a confusão para fugir com o
muito dinheiro e armas. Ao sair de lá, Gonçalo
resto da gangue, que o espera em um carro do
dá um tiro em Ashely. À noite, quando
lado de fora do banco. Como ele saiu de lá de
Gonçalo chega em casa para descansar, Ashley
mãos vazias, os capangas o matam. Lucas, por
surge para matar o vidente, finalmente
seu lado, é preso e recebe incentivo de seu
vingando Lucas.
antigo professor para não desistir de seu sonho
de se tornar um músico. Como a nossa proposta era uma oficina de
produção cinematográfica, a culminância do
Já em O Candidato, a história é um drama
Baralho de Personagens foi a roteirização da
político com os seguintes personagens: Daniel,
narrativa escolhida. Para tanto, estudamos um
um político que luta pelos direitos humanos,
pouco das características desse gênero. Abaixo
reabilitação dos presos e movimentos sociais;
segue parte do roteiro de O Candidato,
Pablo, um caçador que tem problemas
produzido pelos próprios alunos:
psicológicos e idolatra o fascismo; e Antônio
Siqueira, jornalista metódico de esquerda que
costuma denunciar ações autoritárias em seu
jornal. Antônio mora com seu gato chamado
Mário. O Candidato é a história de Daniel,
candidato a prefeito pelo Partido Defensor, que
mantém um discurso em prol dos movimentos
sociais. Em sua campanha, ele alia-se a
Antônio Siqueira, influente jornalista da
cidade. Contudo, durante a candidatura, Daniel
entra em conflito com Pablo, seu sogro
admirador do nazismo. Sentindo-se
435
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
Posteriormente, cada turma, a partir de sua Figura 2. (Cartaz do filme Linhas Tortas)
narrativa, gravou um curta-metragem. Os
alunos dividiram-se em funções de roteiristas,
diretores, atores e produtores. As três
produções finalizadas estão disponíveis no
YouTube: Linhas Tortas, O Candidato e Tudo
pela Vingança.
Resultados e discussão
O Baralho de Personagens mostrou-se uma
experiência metodológica efetiva ao
desenvolver, além da leitura e da escrita,
habilidades como o trabalho em grupo, a Figura 3. (Cartaz do filme O Candidato)
alteridade, a criatividade e a sensibilização
artística. Outrossim, essa metodologia
possibilitou aos alunos exercícios de
resoluções de problemas – concretos ou
abstratos.
Após realizada essa atividade, os alunos
propuseram organizar um evento para exibição
exibição com suas produções, aberto à
comunidade santa-mariense. Esse festival de
cinema foi chamado de FEBIC (Festival
Bilaquiano de Curtas).
Simplesmente por manifestarem interesse em
436
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
Conclusões
Tendo em vista todos os resultados positivos
que o Baralho de Personagens teve,
concluímos, de fato que a habilidade de criar
narrativas é imprescindível para a formação
dos alunos.
Embora ainda temos muito a evoluir na
educação artística e comunicativa no ambiente
escolar, os resultados dessa experiência
Figura 5. (Festival Bilaquiano de Curtas – os alunos apontam para um ensino mais criativo, a fim
participantes do projeto e alguns dos professores da de a escolar formar o que propõe: alunos mais
escola)
criativos, proativos e autônomos. Os saberes
com os quais os alunos trabalharam não
Para pesquisar o impacto dessa atividade, ficaram restritos àqueles das artes, tiveram
conduzimos entrevistas (após a dinamização reflexos em outras áreas do conhecimento.
437
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
Que essa experiência – mesmo que [8] A. Fresquet, Cinema e Educação: reflexões
experimental – possa servir como inspiração e experiências com professores e estudantes da
para outros professores que desejam trabalhar educação básica, dentro e “fora” da escola.
com narrativas ou escrita criativa, ou artes em Belo Horizonte, Autêntica, 2017, 20.
sala de aula. A educação é sempre o melhor [9] C. Castoriadis, A Instituição Imaginária da
caminho para nos transformarmos e Sociedade, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1982,
transformarmos o mundo. É talvez o campo em 177.
indivíduo tenha mais liberdade, e, ao mesmo
tempo, a maior responsabilidade, visto que o [10] J. Libâneo, Didática, São Paulo, Cortez,
processo de educação é auto-reflexivo e tem 1994, 37.
impacto prático na sociedade. [11] P. Freire, Pedagogia da Autonomia, São
Paulo, Paz e Terra, 2011, 34.
REFERÊNCIAS
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Narrativa, Petrópolis, Vozes, 2001, 19-20.
[2] J. Martín-Barbero, Desafios Culturais: da
comunicação à educomunicação. In: A. Citteli.
M. Costa (Eds.), Educomunicação:
construindo uma nova área de conhecimento,
São Paulo, Paulinas, 2011, 128.
[3] J. Martín-Barbero, Desafios Culturais: da
comunicação à educomunicação. In: A.
Citteli. M. Costa (Eds.), Educomunicação:
construindo uma nova área de conhecimento,
São Paulo, Paulinas, 2011, 116.
[4] A. Fresquet, Cinema e Educação: reflexões
e experiências com professores e estudantes da
educação básica, dentro e “fora” da escola.
Belo Horizonte, Autêntica, 2017, 29-30.
[5] A. Fresquet, Cinema e Educação: reflexões
e experiências com professores e estudantes da
educação básica, dentro e “fora” da escola.
Belo Horizonte, Autêntica, 2017, 56.
[6] C. Favaretto, Prefácio. In: M. Setton, A
Cultura da Mídia na escola: ensaios sobre
cinema e educação. São Paulo, Annablume,
2004, 13.
[7] A. Fresquet, Cinema e Educação: reflexões
e experiências com professores e estudantes da
educação básica, dentro e “fora” da escola.
Belo Horizonte, Autêntica, 2017, 19.
438
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
b
Mestranda em Educação/Universidade Federal de Pelotas, luizaksouto@gmail.com
c
Graduanda em Pedagogia/Universidade Federal de Pelotas, deborahartwig@gmail.com
RESUMO
Este trabalho apresenta e discute as estratégias formativas desenvolvidas em contextos de formação
continuada. Ocupa-se com dois contextos formativos: a nível macro, com a formação continuada do
Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa, coordenado pela Universidade Federal de Pelotas;
e a nível micro, com encontros formativos de extensão realizados em uma escola pública de Pelotas.
Os encontros de extensão são planejados e realizados por um grupo de professores e estudantes
também vinculados a Universidade Federal de Pelotas, tendo um caráter de continuidade das ações
realizadas pelo Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa, utilizando-se de material produzido
a partir dessas formações. O estudo sobre as estratégias formativas é um dos eixos da pesquisa em
andamento, que tem como objetivo analisar quais são e como acontecem os movimentos
transformativos que geram desenvolvimento profissional. Para isso, são analisados planejamentos e
relatórios anuais escritos pelas formadoras do Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa e
também os planos e registros realizados para e a partir da formação na escola, utilizando o método
interpretativo. As ações realizadas são compreendidas como estratégias formativas em processo, pois
são re-criadas nos e a partir dos encontros entre os sujeitos envolvidos, especialmente quando estes
se engajam ou quando resistem à formação que lhes é proposta.
Palavras chave: Estratégias formativas, formação continuada, PNAIC.
ABSTRACT
This paper presents and discusses formative strategies developed in-service teacher education
contexts. There are two formative contexts observed: in macro level, an in-service teacher education
program named National Pact for Literacy in the Right Age (PNAIC), coordinated by Federal
University of Pelotas; and in a micro level, an in-service teacher education course linked to an
extension project which occurs in a public school of the city of Pelotas/Brazil. The extension course
it is planned and developed by a group of teachers and students from the Federal University of Pelotas
and intend to deepen contents approached by the in-service teacher education program PNAIC, using
materials produced in the program’s scope. The study about formative strategies it is one of the axes
of a research in progress, which aims to analyze how happens the transformative movements that
generate professional development. For this purpose, plans and reports written in context of in-service
teacher education were analyzed with interpretative method. The actions carried out are understood
as formative strategies in process, as they are re-created in and from the encounters between the
subjects involved, especially when they engage or when they resist the training that is proposed to
them.
Keywords: Formative strategies; in-service teacher education, PNAIC.
439
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
processo começava com reuniões de estudo A equipe do PNAIC desta IES buscava
entre a equipe da coordenação geral e a promover espaços que propiciassem aos
supervisão da instituição de ensino superior professores “pensar, analisar, interpretar,
(IES). Nesses momentos eram especificados questionar e ampliar a sua ação pedagógica de
aspectos conceituais a serem contemplados em forma sistemática e reflexiva” [FERREIRA,
cada encontro das formadoras com as 2018a, p. 64], com o apoio das teorias
Orientadoras de Estudo, indicando leituras que estudadas. A proposta sustenta a noção de que
seriam realizadas nos cadernos de formação do a formação continuada não pode sanar todos os
PNAIC, assim como artigos, livros e vídeos a problemas da profissão docente, mas pode
serem usados para ampliar as discussões. oferecer e ser capaz de propiciar melhorias
Também eram sugeridas formas de significativas nas ações pedagógicas, através
sistematização das leituras e oficinas que de estratégias formativas que priorizem a
privilegiavam o debate sobre as temáticas que reflexão, o registro e a autoavaliação do
eram foco de estudo [FERREIRA, 2018a]. trabalho docente. Cabe ainda dizer que a
equipe do PNAIC teve como premissa a
Em um segundo momento, os supervisores
docência como trabalho intelectual para
apresentavam a proposta da formação para os
planejar as ações formativas. Assim, a
formadores, que a discutiam e a modificavam,
formação buscava valorizar o cotidiano
re-criando as estratégias formativas. Os
pedagógico e discutir a importância das
formadores se reuniam, conforme seus polos
de atuação, para estudar os textos dos cadernos práticas de ensino para formação docente com
apoio de estudos teóricos [FERREIRA,
de formação e os materiais de apoio teórico-
2018a].
metodológico. Os estudos e as discussões
tinham como foco aspectos conceituais que Na formação continuada que acontece no
seriam abordados nas formações e a análise contexto da Escola, no âmbito do projeto de
dos relatos de experiência. Caso houvesse extensão, participam da equipe 6 professores-
necessidade de aprofundamentos, as pesquisadores vinculados à Faculdade de
formadoras contavam com o apoio das Educação, 9 alunos do Programa de Pós-
supervisoras da IES [FERREIRA, 2018a]. No Graduação em Educação e 3 alunos do curso
caso da instituição investigada, constituiu-se de Pedagogia. Como professoras cursistas, há
como um princípio importante para o processo aproximadamente 10 professoras de educação
formativo a busca constante por tornar mais básica envolvidas.
intrínseca a relação entre os conteúdos O objetivo do projeto de extensão é realizar
estudados e a prática cotidiana da sala de aula. formação teórico-prática, com foco na
Estabeleceram-se algumas práticas para que organização do trabalho pedagógico, a partir
a formação tivesse uma linha condutora das necessidades formativas indicadas pelas
comum: a leitura, a escrita, a socialização e a próprias professoras. Para isso, uma ação
análise das práticas de ensino e a discussão em central dos encontros formativos é ouvir e
grupos. Por isso, definiu-se que em todos os questionar as professoras quanto as suas
encontros seriam realizadas algumas formas de organização e pensamento
estratégias formativas, tais como: a leitura pedagógico, abrindo espaço para que mostrem
deleite, o contrato didático, o relato de práticas, como organizam seus planejamentos. O grupo
a mostra de trabalho, a escrita da caderneta de do Obeduc-Pacto entende que essa seria uma
metacognição, a leitura e sistematização dos possibilidade de compreender como as
estudos, as oficinas. Essas estratégias tinham o professoras estão concebendo e fazendo a ação
objetivo de favorecer espaços de compartilhar educativa, para assim construir os encontros
saberes, dúvidas e inquietações. As estratégias formativos a partir das razões pedagógicas
formativas adotadas incidiam na formação dos [SHULMAN, 2014] das professoras,
professores e, também, poderiam ser adotadas favorecendo a sua ampliação ou reconstrução
na formação conduzida com as professoras e qualificando o processo formativo.
alfabetizadoras e no planejamento das
Este trabalho apresenta dados da etapa
atividades de ensino no ciclo de alfabetização. inicial de pesquisa em andamento, abarcando a
441
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
análise documental, que fornecerá subsídios 2009, 2011] que sustentam nosso ponto de
para a realização de entrevistas com as vista analítico.
professoras participantes do PNAIC, além de
dar início à sistematização do processo de
formação continuada que ocorre no âmbito do Desenvolvimento
projeto de extensão. Nessa etapa inicial, no As estratégias formativas são ações em
contexto do PNAIC, foram analisados 4 contexto de formação de professores que
relatórios descritivo-reflexivos sobre os colocam em movimento o desenvolvimento
encontros de formação do ano de 2013. São profissional. O planejamento e o
relatórios escritos ao final de cada ano de desenvolvimento de estratégias formativas
formação. Também foram lidos os estão vinculados à concepção e aos objetivos
planejamentos que eram realizados para cada previstos para a formação de professores.
encontro, totalizando 4 encontros de 24 horas
durante o ano de 2013. No ano de 2013, os Uma formação continuada na perspectiva da
conteúdos de formação do PNAIC priorizavam racionalidade técnica possui caráter de
os conhecimentos relativos à Alfabetização e atualização, é composta por atividades de
ao ensino da Língua Portuguesa. Já no “reciclagem” e “capacitação” [CANDAU,
contexto formativo do projeto de extensão que 1996] que possuem caráter eventual e
acontece na Escola, foram lidos os frequentemente não abarcam as necessidades
planejamentos e registros feitos pelo grupo formativas dos professores [DINIZ-
referentes a 4 encontros de aproximadamente PEREIRA, 2010]. Esse modelo de formação
1h30min a 2 horas de duração. dicotomiza teoria e prática: à Universidade
cabe o papel de produzir teorias e aos
A pesquisa é qualitativa e utiliza o método professores a sua aplicação e transposição
interpretativo [GRAUE, 2003]. Nessa didática [CANDAU, 1996]. Esse modelo de
perspectiva, os relatórios e planejamentos formação é sustentado pela lógica da
foram lidos e a análise consistiu em descrever racionalidade técnica, a qual toma o professor
e analisar as estratégias formativas adotadas e como aplicador da teoria e técnica científica,
recriadas pelos formadores no contexto da ignorando a complexidade dos fenômenos
formação continuada do PNAIC e no projeto educativos que são únicos e irrepetíveis. Dessa
de extensão. Para descrição e análise das forma, compreendemos que essa modalidade
estratégias formativas do PNAIC-UFPEL foi de formação pouco colabora para que os
utilizado também como parte do corpus professores pensem a ação de ensino, pois não
documental a obra “O planejamento e a prática há uma única teoria que abranja a
do registro em contexto de formação imprevisibilidade dos encontros educativos.
continuada” [NÖRNBERG et al, 2018], que Por isso, assumimos a professora como
sistematiza as estratégias formativas. intelectual que através da reflexão sobre, para
A leitura deleite ganha destaque entre as e a partir da ação pedagógica e por meio da
estratégias, pois é a mais mencionada nos interconexão com estudos teóricos e diálogos
relatórios das formadoras. Já as estratégias entre pares constrói seu conhecimento
formativas do projeto de extensão ainda estão profissional.
em processo de construção e sistematização, Outro modelo de formação, que surge como
visto que foram realizados somente quatro contraponto à divisão entre formação inicial e
encontros formativos. Após a descrição das continuada, é a aposta na formação como
estratégias, refletimos sobre os tipos de continuum [DINIZ-PEREIRA, 2010]. Esta
espaços que são criados a partir das estratégias concepção se ampara no paradigma da
formativas. racionalidade prática e sustenta a formação
Na seção a seguir, desenvolvemos as como modelo reflexivo. Toma como base a
concepções de modelos formativos construção do conhecimento profissional de
[CANDAU, 1996; DINIZ-PEREIRA, 2010; forma processual, na relação com a realidade
MIZUKAMI et al., 2002; NÓVOA, 2007, que o professor se defronta. Desse modo, o
professor incorpora e transcende o
442
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
que aprendi? Como aprendi? O que não do PNAIC, apesar de dizerem da importância
aprendi?”. Essa estratégia metacognitiva da leitura, não aprofundam aspectos teórico-
permitia que as formadoras acompanhassem o metodológicos de como apresentar a leitura.
pensamento das Orientadoras de Estudo sobre Assim, a equipe do PNAIC-UFPEL buscou,
seu processo de aprendizagem durante a através das atividades formativas, estimular os
formação por meio da escrita e da leitura em professores a pensarem diversas possibilidades
grupo. A caderneta fornecia informações para de práticas de leitura que pudessem ampliar
que as formadoras pudessem replanejar a seu fazer cotidiano [FERREIRA, 2018b]. O
formação conforme as necessidades estímulo à leitura é um aspecto fundamental no
identificadas. Uma das formadoras destaca que processo da alfabetização na perspectiva do
chamava a atenção para o que as Orientadoras letramento para que se avance na
de Estudos diziam e como diziam, compreensão, interpretação e construção de
proporcionando uma discussão sobre os níveis sentidos para os textos. Contudo, no que tange
descritivo e reflexivo das escritas a leitura como deleite, os relatórios e
[RELATÓRIO FORMADORA A, 2013, s/p.]. planejamentos de formação não detalham
Outra formadora destaca que apesar da escrita aspectos relacionados ao avanço de práticas de
ser assumida como um desafio, as professoras leitura como forma de estabelecer sentido para
Orientadoras de Estudo a valorizavam o lido. Os documentos pedagógicos analisados
[RELATÓRIO FORMADORA B, 2013, s/p.]. evidenciam as diversificadas formas de ler e
A partir das intervenções das formadoras, com definem os momentos de leitura deleite como
questionamentos e problematizações, muitas de “descontração” e “lazer” [RELATÓRIO
Orientadoras de Estudo avançaram no FORMADORA B, C, 2013, s/p.].
processo de reflexão sobre seu percurso O investimento de estratégias de leitura como
formativo, sendo considerada uma importante deleite é importante aspecto a ser considerado
estratégia para entender o que e como as para a formação pessoal e profissional dos
professoras estavam pensando e, assim, professores, assim como da formação das
replanejar as formações [FERREIRA, 2018a; crianças como leitoras. O que parece não ter
LIMA, PINHEIRO, 2018]. sido abarcado no PNAIC-UFPEL e que
A leitura deleite, atividade permanente na poderia ser foco da formação continuada é o
formação continuada do PNAIC-UFPEL, teve avanço da leitura como forma de compreender
como objetivo demonstrar às crianças que e estabelecer sentidos.
lemos com várias finalidades, entre elas, a A leitura deleite foi uma das estratégias
leitura entendida como deleite, o ler por prazer. formativas que parece ter gerado repercussões
A equipe investiu na formação pessoal e significativas tanto na prática formativa entre
profissional das professoras enquanto leitoras as professoras, quanto na prática de
e mediadoras da leitura. O intuito era de que as alfabetização com as crianças. Nos 4 relatórios
Orientadoras de Estudos levassem essa analisados [RELATÓRIO FORMADORA A,
estratégia formativa para a formação
B, C, D, 2013, , s/p.], elas abordam sobre a
conduzida com as alfabetizadoras, fomentando literatura referindo sobre o seu “poder curativo
a prática de leitura nas salas de alfabetização. e transformador”, a definindo como uma
Para isso, a equipe de formação possibilitou o “grande invenção humana” [RELATÓRIO
acesso a diferentes textos e autores literários e FORMADORA C, 2013, s/p.]. Pode-se inferir
também estimulou a realização da leitura de que os repertórios literários de professoras e
forma engajada e “sedutora” para que as crianças foram ampliados com a leitura de
crianças despertassem para e/ou diferentes gêneros textuais e metodologias de
desenvolvessem o hábito de ler [FERREIRA, leitura diversificadas, descritas como
2018b]. Com esse objetivo foram momentos de “fruição e descontração”
desenvolvidas diversas estratégias de leitura [RELATÓRIO FORMADORA D, 2013, s/p.],
deleite: o varal poético; a árvore literária; o tanto na formação continuada como nas
Mar de Vinícius. escolas públicas. Parece que de alguma forma
Cabe destacar que os cadernos de formação essa estratégia formativa, a leitura deleite,
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RESUMO
Ancorado num apanhado histórico que explicita as reinvenções do extensionismo em sua condição
polissêmica, este trabalho objetiva averiguar a relação entre o saber popular e o conhecimento
científico; busca também demonstrar a relevância da questão metodológica do trabalho de Extensão
Rural, bem como examinar a atribuição aos construtos freireanos; nas reinterpretações sociais. O foco
analítico deste artigo se baseia na especificidade da observação da realidade campesina as quais seus
autores estão vinculados como pesquisadores. Da observação surge à necessidade de compreensão
do sentido da Extensão Rural no contexto brasileiro que prioriza as possibilidades para a análise desta
realidade; buscando o aprofundamento teórico da Extensão e suas implicações práticas quanto à
dialogicidade na visão crítica de Paulo Freire. Visando desenvolver/trabalhar as contradições que se
apresentam diante do tema em questão tornou-se-se necessário dar relevo ao suposto caráter educativo
da extensão no campo, sendo para tanto; de fundamental importância aprofundar a dialogicidade e a
comunicação, que envolvem o extensionismo rural.
Palavras chave: Extensão, Educação, Comunicação, Rural, Paulo Freire.
RESUMEN
Anclado en una collectanea histórica que explicita las reinvenciones del extensionismo en su
condición polisémica, este trabajo objetiva averiguar la relación entre el saber popular y el
conocimiento científico; busca también demostrar la relevancia de la cuestión metodológica del
trabajo de Extensión Rural, así como examinar la atribución a los constructos freireanos; en las
reinterpretaciones sociales. El enfoque analítico de este artículo se basa en la especificidad de la
observación de la realidad campesina a la que sus autores están vinculados como investigadores. De
la observación surge la necesidad de comprensión del sentido de la Extensión Rural en el contexto
brasileño que prioriza las posibilidades para el análisis de esta realidad; buscando la profundización
teórica de la Extensión y sus implicaciones prácticas en cuanto a la dialogicidad en la visión crítica
de Paulo Freire. Con el fin de desarrollar / trabajar las contradicciones que se presentan ante el tema
en cuestión se ha vuelto necesario dar relieve al supuesto carácter educativo de la extensión en el
campo, siendo para tanto; de fundamental importancia profundizar la dialogicidad y la comunicación,
que envuelven el extensionismo rural.
Palabras clave: Extensión, Educación, Comunicación, Rural, Paulo Freire.
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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A questão inicial do artigo de Angelo B. F. Callou 'estender' algo a alguém no meio rural" (CALLOU,
(2006) é uma revisão de posição em relação aos diversos 2006: p. 1). Esta indeterminação seria prejudicial,
significados atribuídos à extensão rural. Durante vários fazendo deste campo científico uma "terra de todos e de
anos ele considerou que esta "polissemia" da extensão ninguém". Apesar dos perigos inevitáveis indicados, o
rural envolvia dificuldades de ordem teórica e de ação autor reconsidera sua posição anterior. Esta polissemia,
prática. "Sempre considerei que a 'indeterminação' desse segundo ele, permitiu que a atividade de extensão rural
campo de desempenho das Ciências Agrárias goza de se renovasse constantemente, ao longo do tempo,
popularidade entre pesquisadores, profissionais e resistindo às diversas crises sócio-econômicas e
estudantes, na medida em que todos opinam sobre o políticas.
assunto e se sentem capazes de alguma maneira, de
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Importante atentar para a conotação transmissiva tudo,..., vai, não só vai receber uma orientação técnica,
que presumi a concepção educativa exposta aqui. mas ele vai entender mais os processos de
21 desenvolvimento das prática agrícolas,...vai precisar
Trechos de uma entrevista em que um técnico da entender, saber exatamente as conseqüências, os
área agrícola faz a distinção entre Extensão Rural e resultados...”
Assistência Técnica “...há uma diferença muito grande.
A assistência Técnica é uma simples transferência de 22
O tratamento dado por Timmer ao ato de educar na
tecnologia, onde nós vamos apresentar pros produtores;
dados, relacionar dados técnicos...nós vamos extensão é o mesmo proposto na Avaliação da ACAR-
recomendar ao produtor a adotar uma determinada MG, em 1952, e será motivo de uma crítica fulminante
prática agrícola...o agricultor vai receber do Técnico a de Paulo Freire, muitos anos depois (CALLOU, 2006,
orientação de como executar uma determinada prática
agrícola...e Extensão Rural; aí ela é Educação; é nós p. 8).
educar, é Educação informal, onde o produtor vai saber
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Referência na disseminação dos arcabouços teórico-científicos
do difusionismo pela América Latina.
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Terminologia usada por CALLOU. Organizações não-governamentais.
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Para um maior aprofundamento no tema sugere-se: Mercosul; principalmente em sua programação paralela:
SANTOS, Boaventura de Souza. Os processos da Reunião Técnica de Comunicação em Pesquisa e
globalização. In; A globalização e as Ciências Sociais. Extensão. (www..ucpel,tche.br/regiocom).
São Paulo: Cortez, 2005 e IANNI, Octávio. Teoria da 28
globalização. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, Formados nas décadas de 80 e 90 nos programas de
2004. Mestrado em Extensão Rural da UFV e UFSM; de
Administração Rural e Comunicação Rural da UFRPE e
27
Evento sugestivo confirmando esse movimento pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências da
descrito pelo autor ocorreu em Pelotas em novembro de Comunicação da Escola de Comunicação e Artes da
2008 (REGIOCOM) com o tema central: Comunicação USP.
Local e Desenvolvimento Regional: as Experiências do
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Extensão..........................Transmissão
Extensão..........................Sujeito ativo (o
que estende)
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“Há um problema angustiante que nos desafia ..., Como dialogar em torno de assuntos técnicos?
que é o aumento da produção; como, então, perder um ....sobre uma técnica que não conhecem? (FREIRE, p.
tempo tão grande, procurando adequar nossa ação às 45).
condições culturais dos camponeses? Como perder tanto
tempo dialogando com êles?
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
pensamento exige uma dupla função, a Esta é a razão pela qual, se alguém,
cognoscitiva e a comunicativa envolvendo juntamente com outros, busca realmente
necessariamente o sujeito que pensa, o objeto conhecer, o que significa sua inserção nesta
pensado que mediatiza a relação e a dialogicidade dos sujeitos em torno do
objeto cognoscível, não faz extensão,
comunicação entre ambos que se estabelece
enquanto que, se faz extensão, não
através dos signos lingüísticos.
proporciona, na verdade, as condições para
O que de fato é possível extrair do pensamento o conhecimento, uma vez que sua ação não
freireano, é que a educação constitui uma é outra senão a de estender um
natureza, que é propriamente uma forma “conhecimento” elaborado aos que ainda
específica de se comunicar, uma comunicação não o tem, matando, dêste modo, a
capacidade crítica para tê-lo.
que deve ser essencialmente dialógica, isto é,
que privilegia o diálogo ao invés do discurso. No processo de extensão, observado do
Este diálogo que é diálogo comunicativo, de ponto de vista gnosiológico, o máximo que
comunicar comunicando-se constitui uma se pode fazer é mostrar, sem revelar ou
relação fundamental e indispensável ao desvelar, aos indivíduos, uma presença
conhecimento uma vez que a dialogicidade é nova: a presença dos conteúdos estendidos
incompatível com a invasão cultural, não (FREIRE, 1983, p. 28).
podendo haver manipulação nem conquista
dialógica, já que os termos se excluem
mutuamente. Assim, “a educação é É importante lembrar que Barros (1994)
comunicação, é diálogo; na medida em que não possui uma postura bastante crítica quanto ao
é transferência de saber, mas um encontro de modelo extencionista de desenvolvimento
sujeitos interlocutores que buscam a implantado no Brasil e neste sentido concorda
significação dos significados (FREIRE, 1983, com Freire.
p. 69). No entanto, na Pedagogia do Oprimido,
Freire já mencionava que temerosos da
liberdade, “nem todos temos a coragem deste No nosso modo de entender, o Serviço de
Extensão cresceu quantitativamente no Brasil,
encontro e nos enrijecemos no desencontro, no mas não evoluiu qualitativamente, porque os
qual transformamos os outros em puros modelos implantados, desde o início, estiveram
objetos” (p. 150). Segundo Bollnow, divorciados de nossa realidade. E os poucos
frutos que ele tem produzido, na verdade, são
inicialmente o homem se assusta diante dele decorrência do afastamento desses modelos
(do encontro) buscando esquivar-se e implantados, graças à sensibilidade de alguns de
seus dirigentes e, até mesmo, à acuidade de
permanecer na sua anterior indiferença. E alguns extensionistas que tem procurado
acrescenta a necessidade de que o mesmo seja “caminhos novos”, no campo, em contato com o
aceito pela pessoa almejada, assumindo-o na nosso homem rural e com a sua cultura,
impregnada de comportamentos mágicos, como
liberdade e exigindo seu próprio engajamento. disse FREIRE (1983) ao tratar do assunto no seu
De acordo com o autor, cremos que o termo livro: “Extensão ou Comunicação” (BARROS,
encontro tornou-se uma palavra chave de 1994, p. 672).
459
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
[4] IANNI, Octávio. Teoria da globalização. [8] PORTO, Victor Hugo et al (editores)
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004 “Agricultor familiar: sujeito de um novo
método de pesquisa, o participativo”. RS:
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Princípios de Ciências Sociais para extensão (editores) “Agricultor familiar: sujeito de um
rural. Viçosa: UFV, 1994. novo método de pesquisa, o participativo”.
[7] BOLLNOW, Otto. Pedagogia e Filosofia RS: EMBRAPA Clima Temperado, 2004.
da existência. 2ª edição, trad. Hermógenes
Harada, Ed. Vozes, 1974.
462
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
RESUMO
Neste trabalho é realizado uma reflexão acerca do atual modelo de ensino a partir da experiência da
autora enquanto educadora de uma turma do terceiro ano do ensino médio, referente ao seu estágio
docente, realizado no Colégio Estadual Cassiano do Nascimento, localizado na cidade de Pelotas-Rio
Grande do Sul. Durante o desenvolvimento das aulas de sociologia a autora vivenciou um espaço de
ensino formado a partir de uma perspectiva de superação da relação dicotômica entre estudante e
professor, a possibilidade da superação desta relação no decorrer das aulas desenvolvidas foi possível
tanto pela perspectiva de ensino adotada pela educadora quanto pelo engajamento político dos
estudantes e vivência de espaços de ensino para além da sala de aula. No entanto, foram diversos os
entraves e limites vivenciados nesse percurso os quais direcionam ao problema desta pesquisa: qual
o potencial de transformação do espaço de ensino? Tendo o espaço de ensino enquanto referencial
para reflexão acerca da educação pública. Compreende-se a necessidade de construção de um projeto
de educação que se coloque em sincronia com um projeto de sociedade, sendo criadora de novas
relações sociais. Nesta perspectiva, é intenção da autora nesta pesquisa contribuir com a reflexão já
existente acerca de um projeto de educação classista e emancipador, apontando para a perspectiva de
construção de uma Educação Popular.
Palavras chave: Educação Popular; espaço de ensino; emancipação humana.
SOMMAIRE
Dans ce travail est menée une réflexion sur le modèle d'enseignement actuel, de l'expérience de
l'auteur en tant qu'éducateur d'une classe de troisième année de lycée se référant à son stage
d'enseignement, tenu au « Cassiano do Nascimento » State College, situé dans la ville de Pelotas-Rio
Grande do Sul. Au cours du développement des cours de sociologie, l'auteur vécu un espace
d'enseignement qui s'est formé dans une perspective de surmonter le relation dichotomique entre
l'étudiant et l'enseignant, la possibilité de surmonter cette relation au cours des classes développées
était possible à la fois par la perspective d'enseignement adoptée par l'éducateur ainsi que
l'engagement politique des étudiants et l'expérience des espaces d'enseignement au-delà de la salle de
classe. Cependant, il y avait plusieurs obstacles et limites rencontrés dans ce cours qui abordent le
problème de cette recherche: quel est le potentiel de la transformation de l'espace
d'enseignement?Avoir l'espace d'enseignement comme référence pour la réflexion sur l'éducation
publique. Il est entendu la nécessité de construire un projet d'éducation qui est synchronisé avec un
projet de société, créant de nouvelles relations sociales. Dans cette perspective, l'intention de l'auteur
dans cette recherche est de contribuer à la réflexion existante à propos d'un projet d'éducation classiste
et émancipatrice, pointant vers la perspective de la construction d'une éducation populaire.
Mots-clés: Éducation populaire; espace d'enseignement; émancipation humaine.
463
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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A Base Nacional Comum Curricular, traçada em sua as escolas ocupadas, um número que chega a 1197
primeira versão no ano de 2015, elucida o projeto para escolas. Disponível em: <http://ubes.org.br/2016/ubes-
educação, instrumental e mercadológico assumido pelo divulga-lista-de-escolas-ocupadas-e-pautas-das-
governo, o qual significa um enorme declínio político e mobilizacoes/> Acesso em 08 dez. 2017.
científico à educação.
31
No dia 28 de outubro de 2016 a União Brasileira dos
Estudantes Secundaristas (UBES) lança uma lista com
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aprendeu sem tempo de tirar do saber do estudo Sendo claro os desafios dispostos ao longo
o proveito que torne dignos o trabalho e a vida. desse processo, a própria disciplina tão
(BRANDÃO, 2006 p. 26)
naturalizada ao estudante e perceptiva em
todos os espaços da escola, impõe-se quando
Assumindo neste sentido os limites de pensar ocorre a tentativa de romper com um formato
uma prática emancipatória em um contexto anteriormente vivenciado. Em decorrência
que reforça condições materiais que retiram do desta, torna-se visível o estranhamento dos
indivíduo qualquer condição de uma formação estudantes que tem enquanto referência de
que não seja ditada pelo encargo que o espaço de ensino o espaço formal da sala de
mercado lhe prevê. aula.
Ainda assim, é apenas a partir destas práticas, Durante as aulas desenvolvidas ao ocorrer
quando atreladas a um princípio crítico, que é tentativas de romper com esse formato
possível visualizar um novo homem com uma hierarquizado presente na sala de aula, dois
projeção de sociedade radicalmente diferente. momentos foram perceptíveis. Primeiro, o
Cabe à educação um papel central nessa estranhamento do estudante, colocando-se em
formulação, na medida em que é esta uma postura de indagação sobre essa tentativa.
instituição crucial ao processo de socialização E em um segundo momento, percebe-se um
do indivíduo. processo de compreensão do estudante
enquanto sujeito daquele espaço, para além do
Reforçando aqui, a necessidade de estranhamento, algumas marcas do processo
articulação de uma educação que se coloque de ocupação ficam claras. O estudante ao
para além da perpetuação de uma lógica romper com o processo de disciplina
mercadológica e tenha enquanto tarefa uma vivenciado no cotidiano, tomando a escola
mudança estrutural da sociedade, essa para si, coloca-se enquanto sujeito daquele
transformação só é possível a partir da espaço, em contraposição ao cotidiano
construção de espaços de ensino que se vivenciado anteriormente, pautando a
articulem em contraposição à ideologia construção de outro modelo de ensino.
dominante. Segundo Mészáros (2008, p.65) a
educação assume um papel soberano à tarefa E o próprio processo de aprendizagem da
de criar uma ordem social radicalmente educadora é perceptível, sendo este o primeiro
diferente. contato mais profundo com a dinâmica escolar,
é a partir desta construção cotidiana que
Sendo, a partir da elaboração de estratégias demonstram-se as possibilidades de
que busquem mudar as condições objetivas de estruturação de um espaço de aprendizagem
reprodução do sistema e, também a partir da que se coloque em contraposição ao modelo de
mudança consciente do próprio indivíduo. ensino imposto.
Levantada a educação a tarefa de ser
formadora de uma consciência crítica, por ser A partir dessa vivência que é possível pautar
este espaço representativo na socialização do de forma mais clara a precarização do ensino
indivíduo. público, assim como, o descaso com a
formação de educadores em um modelo
neoliberal de ensino. É a partir do seu contato
Conclusões cotidiano com a escola que torna-se clara a
urgência da construção de outro modelo de
O estudante secundarista ao colocar-se
ensino, pensado a partir do protagonismo das
enquanto sujeito da reformulação do espaço
lutas sociais no campo da educação.
escolar, aponta para o diálogo estabelecido
com outros sujeitos presentes neste espaço. Sendo inviável pensar esta construção de
Significando principalmente um diálogo entre forma isolada, correndo o risco de restringir-se
educador e educandos, que vise romper com a a uma reflexão pontual, sem pautar a escola
estrutura hierarquizada de ensino. enquanto um espaço de reprodução da
Propendendo assim, um necessário ideologia dominante. Da mesma forma, não é
rompimento com a contradição desta relação. possível pensar uma transformação da
sociedade sem um projeto de educação.
470
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
b
Doutora em Educação. Professora Titular da Universidade Federal do Rio Grande – FURG. E-mail:
elisabethschmidt@furg.br
RESUMO
Este trabalho está circunscrito à pesquisa de mestrado, em andamento, que tem como objetivo
compreender como ocorre o processo de (re)significação docente por meio das experiências
registradas nos diários dos participantes do Projeto Cirandar: rodas de investigação desde a escola.
De abordagem qualitativa, e com a utilização da metodologia de Análise Textual Discursiva (ATD),
proposta por Moraes e Galiazzi, a pesquisa está orientada pela seguinte questão: como se mostra a
(re)significação da docência no âmbito do Projeto Cirandar?. A intenção é aprofundar o entendimento
sobre a formação docente embasada nas narrativas dos/as professores/as e estudantes de licenciatura
que escreveram os diários propostos pelo Projeto entre os anos de 2013 e 2017. Os diários que fazem
parte do corpus de análise foram selecionados com base em critérios, tais como: número de
participações no Projeto Cirandar; narrativas de práticas realizadas na rede básica e pública de ensino;
e tempo de docência. A hipótese formulada é a de que nas escritas reflexivas contidas nos diários
emergem novas (re)significações a respeito da docência, visto que o processo de escrita possibilita
reviver a experiência e compreendê-la sob um viés diverso. A primeira etapa da pesquisa resultou na
seleção de 46 diários, os quais serão submetidos, novamente, a outros critérios para que o corpus seja
compatível com a metodologia de análise de dados definida para a pesquisa.
Palavras chave: Docência, (re)significação, Projeto Cirandar, experiências, diários.
ABSTRACT
This work is circumscribed in a master research that is in progress and that has as a goal, understand
how the teaching redetermination process ocurred through the experience registered in the daily
participants of the Cirandar Project: round of conversation since the school. Of qualitative approach
and using analysis methodology textual discursive (ATD) proposed by Moraes and Galiazzi. The
research is oriented for this mainly question: how the reframe of teaching in Cirandar Project scope
seem? The intention is deepen the understanding about trained education based in teachers and
students narratives from licentiate degree that was written theirs daily ones between 2013 and 2017
years and that was proposed by the Project. The analyzing corpus daily was based in a careful
selection such as: participants numbers of Cirandar Project, narratives from practice performed in
basic and public network; time and teaching. The formulated hypotheses is that in reflexive written
that are contained in theirs daily ones emerge a new reframe about the meaning of teaching since the
written process enabled relive the experience and understand it in a different slant . The first stage
of the research resulted in 46 daily that will be submited again but in another criteria for what the
corpus of it be compatible with the analyze methodology of the data that were defined in the research
before.
Keywords: Teaching, redetermination, Projeto Cirandar, experiences, daily.
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Teve início no ano de 2012, em parceria com a 18º Após, a proposta foi ampliada, sendo atualmente
Coordenadoria Regional de Educação (CRE), na estendida para graduados, pesquisadores e licenciandos
intenção de reestruturar o currículo do Ensino Médio, que tenham interesse em refletir sobre suas práticas de
focando nas experiências dos Seminários Integrados. sala de aula.
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experiências de sala de aula; rodas de escrita, inscritos no projeto Cirandar são a prova
onde são desenvolvidos os relatos dessas dessas experiências, a constatação de que a
experiências; rodas de leitura crítica, etapa em sala de aula está sendo vivida, sentida,
que existe a troca de relatos e elaboração de experimentada e não constitui apenas um
parecer sobre a escrita do colega; reescrita e acontecimento que simplesmente “passa”
reenvio (pelo sistema da universidade – (LARROSA, 2015).
Sinsc/FURG); leitura dos relatos que farão Tais fatos corroboram a importância de
parte das salas de apresentação no encontro articular escola e universidade, proposta
final presencial e a apresentação dos relatos no formativa do projeto, que visa a compartilhar
projeto Cirandar. Os objetivos elencados responsabilidades entre essas instituições, no
constituem também as fases do Projeto, sendo que tange à formação inicial e continuada dos
que atualmente34 existem dois encontros profissionais da educação, enfatizando a
presenciais: um durante o processo e outro no relevância dos saberes teóricos nas realidades
encerramento, onde são entregues os diários
escolares e não apenas o exercício de repetição
desenvolvidos durante o semestre. As demais de técnicas, métodos e estratégias de pouco
etapas são realizadas a distância, como efeito transformador que se repetem. Por esse
mencionado acima, por meio do sistema de viés, Pimenta (2010) defende que:
inscrições da FURG.
O referido projeto, a partir dessa perspectiva,
torna-se uma tentativa de compreender a [...] o papel da teoria é oferecer aos professores
perspectivas de análise para compreender os
construção da docência para além da formação contextos históricos, sociais, culturais,
acadêmica, pois transpassa os corredores e organizacionais, e de si mesmos como
paredes das universidades e perpassa pelas profissionais, nos quais se dá sua atividade
salas de aula públicas e privadas, pelo dia a dia docente, para neles intervir, transformando-os.
escolar, levando em consideração mais que (p.49)
práticas, metodologias e perspectivas
pedagógicas, pois possibilita “o exercício da
escuta e o compartilhar dos saberes”, Essas perspectivas de análise são
produzindo “junto aos participantes do projeto, materializadas nas escritas desenvolvidas nos
uma atmosfera que remeta ao sentido de diários, trazendo a elas o tom de reflexão,
pertencimento a um país, à própria escola e à distanciando do que Freire (2016) define como
formação de professores [...]” (SCHMIDT E amesquinhar o caráter formador do exercício
GALIAZZI, 2013, p.14 e 15). educativo. Nas palavras do autor: “É por isso
que transformar a experiência educativa em
Em vista disso, levar em consideração os puro treinamento técnico é amesquinhar o que
pressupostos teóricos do projeto, como a aula há de fundamentalmente humano no exercício
de cada professor para pensar a formação; a educativo: o seu caráter formador” (2016, p.
escrita das experiências de sala de aula como 34). Portanto, as experiências relatadas nos
foco coletivo e ferramenta cultural; a diários, escritos durante o projeto Cirandar, são
aprendizagem dialógica e coletiva; e a leitura fonte rica de experiências que transpassam o
entre pares, intensifica a formação e o simples “fazer educativo”, valorizando a
entendimento sobre a (re)significação da prática profissional como “momento de
docência. Ratificando, esse processo de construção de conhecimento por meio de
formação acadêmico-profissional proporciona reflexão, análise e problematização”
uma diversidade de entendimentos e uma gama (PIMENTA, 2010, p.48).
de maneiras de analisar, compreender e obter
resultados positivos sobre o desenvolvimento Da mesma forma, a leitura entre pares motiva
profissional dos docentes; o que inclui aquilo a enxergar a própria prática refletida no olhar
que os toca e os modifica, visto que os relatos do outro. Não o olhar de análise e julgamento,
mas aquele que compartilha da aprendizagem
34
O último processo teve seu encerramento em março
de 2018, referente ao ano de 2017.
474
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Os relatos são escritas mais sucintas sobre as Atualmente, fazem parte do processo e são objetos da
experiências escolhidas para serem refletidas. etapa de leitura entre pares.
475
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esclarece que as narrativas das experiências, Sem pormenorizar a nomenclatura que cada
relatadas nos diários, fazem com que narrador autor oferece ao instrumento diário, mas
e interlocutor estabeleçam diálogo, considerando sua importância, é possível
expressando seus múltiplos “eus”. Da mesma esclarecer a ampla abrangência que o hábito da
forma, Zabalza (2004) manifesta que escrever escrita tem em relação ao processo de
sobre si (suas experiências) auxilia a (re)significação docente. Para Cunha e Chaigar
racionalizar a vivência e reconstruir a (2009), “a escrita é a forma principal de
experiência (p.18). Portanto, refletir acerca do comunicação humana, e seu domínio é parte
vivido, encaminha ao processo de fundamental da condição educativa dos
(re)significação, visto que proporciona sujeitos” (p.120), sua importância é consenso
questionar-se, reavaliar-se e conhecer-se como que permeia por diferentes “espaços e lugares
docente em constante formação. onde se produz conhecimentos sobre essa
questão” (p.120).
Tais conceituações vêm ao encontro do que a
pesquisa se propõe, em outras palavras, os Nesse viés, o contexto do projeto Cirandar
diários como objeto de pesquisa são fontes torna-se um espaço estimulador da escrita
para refletir sobre esses diversos “eus” que narrativa em diários, propiciando ao professor
surgem das experiências docentes. Conforme a sensação de pertencimento a seu campo de
defendem Freitas, Machado e Souza (2017), os atuação (COUSIN, 2010). Isso faz o
diários são instrumento de apoio às práticas profissional compreender a importância
crítico-reflexivas. Ademais, essas mesmas prática do seu papel na transformação das
experiências transformam as práticas e, por realidades educacionais que vive
consequência, o ambiente no qual o docente cotidianamente, tanto nos contextos da
em transformação está inserido, sendo assim, educação formal quanto não formal, pois,
pensar a respeito da prática é fundamental. como assegura Freire (2016), a educação é a
Contudo, escrever acerca dessas reflexões, maneira de transformar o mundo, o
torna-se uma contribuição importante a outros instrumento que o professor utiliza para
professores, quando compartilhada entre pares. intervir positivamente na sociedade. Sendo
assim, explanar sobre a docência e seus
Devido a essa circularidade positiva é que
atravessamentos é condição precípua na
procuramos, na pesquisa, compreender melhor
tentativa de compreender melhor o fenômeno
o desenvolvimento de processos acadêmico-
de pesquisa.
profissionais, como o projeto Cirandar, e de
que modo eles propiciam a (re)significação Na intenção de tornar visível o processo
docente. Sendo assim, enfatizamos a experenciado pelos participantes do projeto
importância do processo de escrita sobre a Cirandar, compartilhamos a imagem (Figura 2)
prática, pois entendemos que os diários se de uma síntese36 desenvolvida por um dos
tornam instrumentos básicos para esse tipo de grupos, no encontro presencial da edição de
interpretação. Segundo Hess (2006), os diários 2017. A criação da síntese tem por objetivo
são utilizados para guardar os momentos, agregar as percepções do grupo frente ao
portanto, o autor o nomeia como diário dos processo que foi vivido, desde o início,
momentos, ao passo que Zabalza (2004) culminando no compartilhamento das
denomina de diários de registro, sendo esse um experiências em grupo. Fato que não pode ser
“espaço de narrativa dos pensamentos dos considerado o ponto final, visto que o
professores” (p.41), onde é possível explorar a movimento de reflexão continua, mesmo com
“versão que o professor dá de sua própria a finalização do projeto.
atuação [...] e da perspectiva pessoal da qual a
enfrenta” (p.41).
36
Ao final de cada encontro presencial, a equipe uma síntese, que pode ser em forma de escrita, poema,
organizadora convida os participantes de cada sala para música, teatro, entre outras que a criatividade permitir.
manifestarem sua compreensão e aprendizagens, em
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querer levar até aposentar-se, pois percebe na [10] HESS, Remi. Momento do diário e diário
escrita uma forma de refletir sobre a própria dos momentos. In.: Tempos, narrativas e
prática. ficções: uma invenção de Si. Org. Elizeu
Clementino de Souza, Maria Helena Menna
Barreto Abrahão. Porto Alegre: EDIPUCRS;
REFERÊNCIAS Salvador: EDUNEB, 2016. 626 p.
[1] MORAES, Roque. GALIAZZI, Maria do [11] CUNHA, Maria Isabel da. CHAIGAR,
C. Análise textual discursiva. 2. ed. rev. Ijuí: Vânia A. M. A dimensão da escrita e da
Ed. Unijuí, 2011. 224 p. memória na formação reflexiva de
[2] LARROSA, Jorge. Tremores: escritos professores: dois estudos em diálogo. In.:
sobre a experiência. Tradução Cristina Memórias docentes: abordagens teórico-
Antunes, João Wanderley Geraldi. 1. Ed.; 1. metodológicas e experiências de investigação.
Reimp. Belo Horizonte: Autêntica Editora, Organizadoras: Márcia Ondina Vieira Ferreira,
2015. Beatriz T. Daudt Fischer, Lúcia Maria Vaz
Peres. São Leopoldo: Oikos; Brasília: Liber
[3] GALIAZZI, Maria do Carmo. SCHMIDT, Livro, 2009. 144 p.
Elisabeth B. et al. Cirandar: rumo a
comunidades aprendentes na formação [12] COUSIN, Claudia da Silva. Pertencer ao
acadêmico-profissional em roda. In.: navegar, agir e narrar: a formação de
CIRANDAR: rodas de investigação desde a educadores ambientais. 2010. 207 f. Tese
escola. Organizado por Maria do Carmo (Doutorado) - Curso de Educação Ambiental,
Galiazzi. São Leopoldo: Oikos, 2013. 168 p. Universidade Federal do Rio Grande - Furg,
Rio Grande, 2010.
[4] PIMENTA, Selma G. LIMA, Maria
Socorro L (org.). Estágio e Docência. 5 ed. São [13] CUNHA, Maria Isabel da. O bom
Paulo: Cortez, 2010. professor e sua prática. ed. 20. Campinas, SP.
Papirus. 1989.
[5] FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia:
saberes necessários à prática educativa. 54. [14] VASCONCELLOS, Celso dos Santos.
ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2016. Planejamento: projeto de ensino-
aprendizagem e Projeto Político Pedagógico –
[6] GALIAZZI, Maria do Carmo. SCHMIDT, elementos metodológicos para elaboração e
Elisabeth B. Cirandar 2014: rodas de realização. 25. ed. São Paulo: Libertad Editora,
investigação desde a escola. In.: Cirandar: 2015.
rodas de investigação desde a escola, volume
3/ Maria do Carmo Galiazzi, Org.; Grupo de [15] GASPAR, Mônica Maria Gadêlha.
Pesquisa CEAMECIM – Comunidades PEREIRA, Fátima. PASSEGGI, Maria da
Aprendentes em Educação Ambiental, Conceição. As narrativas autobiográficas e a
Ciências e Matemática. Rio Grande: Ed. da formação de Professores: uma reflexão sobre o
FURG, 2016. 180 p. diário de Acompanhamento. In.: Anais do V
Congresso Internacional de Pesquisas
[7] LARROSA, Jorge. Pedagogia profana: Autobiográficas – CIPA. Rio Grande do Sul,
danças, piruetas e mascaradas. Porto Alegre: 2012.
Contrabando, 1998.
[16] SILVEIRA, Denise T. CÓRDOVA,
[8] ZABALZA, Miguel. Diários de aula: um Fernanda P. A pesquisa científica. In.:
instrumento de pesquisa e de desenvolvimento Métodos de pesquisa. Organizado por Tatiana
profissional. Tradução: Ernani Rosa. Porto Engel Gerhardt e Denise Tolfo Silveira;
Alegre: Artmed, 2004. coordenado pela Universidade Aberta do
[9] FREITAS, Ana Lúcia Souza de; Brasil – UAB/UFRGS e pelo Curso de
MACHADO, Maria Elisabete; SOUZA, Graduação Tecnológica – Planejamento e
Micheli Silveira de. O diário de registros como Gestão para o Desenvolvimento Rural da
instrumento de (trans)formação docente. SEAD/UFRGS. – Porto Alegre: Editora da
Revista Ambiente & Educação. v. 22, n.2, p. 6- UFRGS, 2009. 120 p.
27, 2017.
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RESUMO
O presente trabalho que tem por título “A formação do cidadão, a Constituição Federal e o Ensino de
História”, é fruto do projeto realizado com bolsa PROLICEN/UFSM, o qual visou possibilitar a
relação ensino superior e ensino básico, no que tange ao ensino e extensão, por meio do diálogo com
professores que ministram a disciplina de história no ensino básico, partindo-se da forma em que os
mesmos trabalham ou não no conteúdo programático de história do Brasil a temática que se refere ao
conhecimento da Constituição Federal. Para tanto, partiuse para a análise de livros didáticos
produzidos utilizados em sala de aula para fins de verificar se estes tratam em alguma parte a
Constituição Federal, aplicação de questionários para averiguar qual a visão que os mesmos observam
sobre o ensino da Constituição e a avaliação que fazem das medidas propostas pelos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCNs). A defesa que ocorra o ensino de alguns preceitos da Constituição
Federal, ao ministrar a disciplina de história, não pretende retornar ao ensino tradicional da disciplina
moral e cívica, mas para que possa ser um instrumento de compreensão crítica da formação política
básica do cidadão brasileiro, de quais são os principais direitos e deveres enquanto cidadãos. Assim,
por meio deste estudo tentamos construir uma proposta didática onde se articulam o ensino de história
os conhecimentos básicos sobre a Constituição Brasileira e a relação destes com a formação do
cidadão.
Palavras-chave: Cidadania, Educação, Constituição Federal, Direitos, Deveres.
ABSTRACT
The present work entitled "The formation of the citizen, the Federal Constitution and the Teaching of
History", is the result of the project carried out with the PROLICEN / UFSM scholarship, which
aimed to make possible the relation between higher education and basic education, teaching and
extension, by means of the dialogue with teachers who teach the discipline of history in basic
education, starting from the way in which they work or not in the programmatic content of history of
Brazil the subject that refers to the knowledge of the Federal Constitution. In order to do so, it was
used the analysis of didactic books produced used in the classroom to verify if they treat the Federal
Constitution in some part, the application of questionnaires to ascertain the vision that they observe
about the teaching of the Constitution and the evaluation which make the measures proposed by the
National Curricular Parameters (NCPs). The defense of the teaching of certain precepts of the Federal
Constitution, in ministering the discipline of history, does not intend to return to the traditional
teaching of moral and civic discipline, but so that it can be an instrument of critical understanding of
the basic political formation of the Brazilian citizen, of which are the main rights and duties as
citizens. Thus, through this study we try to construct a didactic proposal where history teaching
articulates the basic knowledge about the Brazilian Constitution and the relation of these with the
formation of the citizen.
Keywords: Citizenship, Education, Federal Constitution, Rights, Duties
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Desenvolvimento
[..] para uma viagem pelos caminhos tortuosos
O projeto se dividiu em duas fases, onde que a cidadania tem seguido no Brasil. Seguindo-
primeiramente foi realizado um laboratório em lhe o percurso, o eventual companheiro ou
sala de aula com o uso da Constituição Federal companheira de jornada poderá desenvolver
dentro do conteúdo da disciplina de História e visão própria do problema. Ao fazê-lo, estará
análise dos livros usados pelos mesmos, para exercendo sua cidadania. (2002, p.13).
assim contemplar o objetivo de uma
construção de proposta de trabalho a fim de
auxiliar o ensino de História vinculado à Para entender sobre a construção da
Constituição Federal 1988. cidadania no Brasil o livro de José Murilo de
Carvalho é esclarecedor acerca do percurso
que esta tomou desde o nascimento de nosso
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
15 anos ou mais caiu de 25,40/0 em 1980 para Entendemos então, que a cidadania é uma
14,7% em 1996.” ( CARVALHO, 2002, p.2 0 5 ) palavra ampla e há abrangente significado
durante o percurso histórico e, hoje geralmente
No que s e r efe re à ed uca ção, a associada apenas ao seu viés político, tendo o
ausência de uma população educada se mostra cidadão o direito de votar e ser votado, no
em todos os períodos históricos constitucionais entanto, José Murilo acredita que apenas a
como um dos principais obstáculos a representação política não funciona para
construção da cidadania civil e política. resolver o problema dos cidadãos, sendo
A Constituição de 1988 ainda inovou prejudicado por um “efeito dominó” de trocas
definindo o racismo como crime inafiançável de favores e descrédito na política hoje em dia:
e imprescritível e a tortura como crime
inafiançável e não anistiável. O papel dos legisladores reduz-se, para a
Outra questão latente para o exercício da maioria dos votantes, ao de intermediários de
cidadania é a falta dos conhecimentos dos favores pessoais perante o Executivo. O
direitos e deveres, tendo aqui o ponto chave eleitor vota no deputado em troca de
promessas de favores pessoais; O deputado
deste trabalho, que pretende usar com apoia o governo em troca de cargos e verbas
ferramenta a Constituição Federal de 1988 no para distribuir entre seus eleitores. Cria-se uma
ensino de História, para que se possa fazer o esquizofrenia política: os eleitores desprezam
aluno desde cedo despertar para a reflexão de os políticos, mas continuam votando neles na
seus direitos e deveres. O estudo de José esperança de benefícios pessoais.
(CARVALHO, 2002, p.223-224)
Murilo de Carvalho nos traz uma triste
realidade a qual mostra que poucos são os
brasileiros que conhecem algum direito:
Se ainda buscamos soluções de problemas
[...] pode-se dizer que, dos direitos que sociais, sobretudo nas áreas de educação e
compõem a cidadania, no Brasil são ainda os direitos civis, não esquecendo que a cidadania
civis que apresentam as maiores deficiências preza a ideia de igualdade contra a
em termos de seu conhecimento, extensão e desigualdade econômica e social, o Estado,
garantias. A precariedade do conhecimento
dos direitos civis, e também dos políticos e
como o órgão que resguarda este documento,
sociais, é demonstrada por pesquisa feita na temos o anseio que este cumpra com o dever
região metropolitana do Rio de Janeiro em de prestar as bases de sustentação para
1997. A pesquisa mostrou que 57% dos cidadania efetiva e plena. José Murilo
pesquisados não sabiam mencionar um só apresenta uma passagem no final de seu estudo
direito e só 12% mencionaram algum direito
civil. Quase a metade achava que era legal a
sobre a cidadania no Brasil que retrata um
prisão por simples suspeita. A pesquisa mostrou pouco desse anseio:
que o fator mais importante no que se refere ao
conhecimento dos direitos é a educação. O
desconhecimento dos direitos caía de 64% As duas experiências favorecem, a cultura do
entre os entrevistados que tinham até a 4a consumo dificulta o desatamento do nó que
série para 30% entre os que tinham o terceiro torna tão lenta a marcha da cidadania entre nós,
grau, mesmo que incompleto. Os dados qual seja, a incapacidade do sistema
revelam ainda que educação é o fator que mais representativo de produzir resultados que
bem explica o comportamento das pessoas no impliquem a redução da desigualdade e o fim
que se refere ao exercício dos direitos civis e da divisão dos brasileiros em castas separadas
políticos. Os mais educados se filiam mais a pela educação, pela renda, pela cor. José
sindicatos, a órgãos de classe, a partidos Bonifácio afirmou, em representação enviada à
políticos. (CARVALHO, 2002, p. 210) Assembleia Constituinte de 1823, que a
escravidão era um câncer que corroía nossa
Dentre o acesso à justiça, que acaba por ser vida cívica e impedia a construção da nação.
limitado a uma pequena parcela da população, A desigualdade é a escravidão de hoje, o
novo câncer que impede a constituição de
torna o direito à cidadania muito prejudicado
uma sociedade democrática. A escravidão foi
do panorama de desconhecimento de direitos e abolida 65 anos após a advertência de José
deveres. Bonifácio. A precária democracia de hoje não
sobreviveria a espera tão longa para extirpar o
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
câncer da desigualdade. (CARVALHO, 2002, trazendo “uma história pronta”, onde a criança
p.229). não se insere dentro da realidade que está
estudando, acaba fazendo com que este não
Os PCNs deixam claras as ideias de seja instigado por uma reflexão social:
desenvolvimento de uma postura que objetive
inserir o aluno em sua própria realidade,
buscando a reflexão, consciência, criticidade e Após a adoção do guia e dos PCNs, tendeu-se,
via de regra, a uniformizar os conteúdos e a
o exercício da prática de cidadania:
linguagem utilizadas nos livros, que deveriam
preencher certos requisitos considerados
fundamentais (teórico-metodológicos,
Muitas vezes no ensino fundamental, em curriculares, de competências a serem
particular na escola primária, a História tem desenvolvidas) (FERREIRA; FRANCO, 2008,
permanecido distante dos interesses do aluno, p.81).
presa às fórmulas prontas do discurso dos livros
didáticos ou relegada a práticas esporádicas
determinadas pelo calendário cívico. Reafirmar
sua importância no currículo não se prende Ferreira (2008) critica o não interesse da
somente a uma preocupação com a identidade academia na produção de materiais
nacional, mas sobretudo no que a disciplina pode atualizados:
dar como contribuição específica ao
desenvolvimento dos alunos como sujeitos
conscientes, capazes de entender a História como A produção de materiais “atualizados” requer,
conhecimento, como experiência e prática de por outro lado, programas de atualização dos
cidadania. (PCNs, 1997, p.25) professores para sua eficaz utilização. Esse
diálogo entre academia e produção de materiais
didáticos precisa ser bem estreitado, sob pena de
Pensamos que a presença da Constituição reproduzirmos uma espécie de divórcio que se
Federal no ensino de história dentro no delineia entre dois setores de uma mesma matriz
universo da criança pode lhe dar bases para do conhecimento: o da história dita “científica” e
uma consciência critica de sua realidade; esta o da história dos manuais escolares. O
desinteresse da academia pela produção e a
perspectiva de reflexão social é encontrada nos incúria de grande parte dos que tradicionalmente
PCNs, a qual considera: se encarregam dessa tarefa reafirmam o quadro
preocupante. (2008, p.83)
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
Aula 3
Comentar e explicar o artigo 5º da
Constituição Federal de 1988.
- Distribuir individualmente um Inciso para
cada aluno levar para casa e escrever um
pequeno texto e trazer figuras do mesmo.
Aula 4
Recolher os materiais feitos pelos alunos e
distribuir entre eles buscando uma dinâmica de
grupo em queq cada Inciso seja novamente
apresentado agora na óptica entendia por eles.
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Figura 5. Trabalho 1.
Figura 7. Trabalho 3
Figura 6. Trabalho 2.
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
a
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências/Universidade Federal do Rio Grande - FURG,
(lianeserra@bol.com.br)
b
Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências/Universidade Federal do Rio Grande - FURG,
(luismackedanz@furg.br)
RESUMO
O presente estudo pretende investigar como a Formação Continuada pode ser vista como uma
estratégia para Inovação no Ensino de Ciências. A pesquisa foi desenvolvida com os professores de
Ciências das Séries Finais do Ensino Fundamental, que lecionam do 6º ao 9º ano, na rede municipal
de ensino de Rio Grande/RS. Evidentemente, os professores de Ciências passam por constantes
desafios, os quais incluem acompanhar as descobertas científicas e tecnológicas e ter disponibilidade
de tempo para preparação e organização de aulas teóricas e práticas. Além disso, muitos ainda
precisam conciliar uma dura jornada semanal de trabalho e superar a falta de recursos materiais e a
carência de espaço físico adequado nas escolas, para propor aulas diferenciadas aos estudantes. Diante
desta questão, muitos educadores buscam os programas de Pós-graduação ofertados pelas
Universidades, para se qualificar. O trabalho pretende verificar os professores de Ciências que atuam
nas Séries Finais do Ensino Fundamental e que estão em processo de Formação Continuada (ou que
já concluíram) na modalidade Stricto Sensu; bem como pontuar os dados que os professores sinalizam
como estratégia para a Inovação no Ensino de Ciências. A partir da Análise Temática, elencamos
elementos do discurso dos professores, coletado em questionário de questões abertas com todos os
docentes que se enquadram no perfil desta pesquisa.
Palavras chave: Professores de Ciências, Análise Temática, Inovação Pedagógica.
ABSTRACT
The present study intends to investigate how Continued Formation can be seen as an Innovation
strategy in Science Teaching. The research was carried out with Science teachers of Primary
Education Final Series, who teach from the 6th to the 9th grade, in the municipal school network of
Rio Grande/RS. Evidently, science teachers go through constant challenges, which include following
the scientific and technological discoveries and having time available for preparation and
organization of theoretical and practical classes. In addition, many still need to reconcile a hard week's
work and overcome the lack of material resources and the lack of adequate physical space in schools
to offer differentiated classes to students. Faced with this issue, many educators seek the graduate
programs offered by universities, to qualify themselves. This work intends to verify Science teachers
that act in Primary Education Final Series and who are (or have already concluded) in the process of
Continuing Education, considering only the modality Stricto Sensu, as well as to punctuate data that
these teachers flag as innovation strategies in Science Teaching. From Thematic Analysis, we
discriminate teacher’s speech elements, collected from an open questionnaire for all teachers that are
surveyed in this research.
Keywords: Science Teachers, Thematic Analysis, Pedagogical innovation.
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
aplicar a pesquisa apenas nas 24 escolas de número de horas de aula que precisam cumprir
perímetro urbano. O passo seguinte consistiu em uma (ou várias) escola(s). Atrelado a este
em conferir, de acordo com a listagem, os fator, outro aspecto observado, foi o fato de
professores que se encontravam lecionando a que não é comum, no espaço escolar, a
disciplina de Ciências. Esta etapa foi disponibilização de espaços reservados para o
fundamental para assegurar com exatidão os professor, o que dificultaria a dinâmica por
dados da pesquisa, uma vez que os entrevistas, uma vez que os espaços que se têm
profissionais podem passar por situações de são aqueles utilizados de forma coletiva. Como
remanejo, licença prêmio, licença médica, etc., último contraponto, destacamos que a dupla
ou estar lecionando fora de sua área de jornada da professora-pesquisadora, também
concurso. Este processo preliminar realizou seria um limitador para esta questão.
uma triagem, procurando verificar com Como metodologia para análise dos dados
precisão o número real de professores que coletados pelos questionários, escolhemos a
integram o Ensino de Ciências na rede
Análise Temática de Braun e Clarkea (2006).
municipal de ensino básico. Um dos benefícios deste tipo de análise é a sua
A triagem ocorreu como um importante flexibilização, pois “através da sua liberdade
instrumento para o trabalho, pois foi a partir teórica, a análise temática fornece uma
dela que se estabeleceu um contato inicial com ferramenta de pesquisa flexível e útil, que pode
as escolas. Nesta mesma ocasião, foram potencialmente fornecer um conjunto rico e
apresentadas as intenções da pesquisa aos detalhado, ainda que complexo de dados”
professores, procurando identificar os que se (BRAUN; CLARKE, 2006, p. 3, tradução
enquadravam no perfil da pesquisa. nossa).
O estudo encontrou 51 professores que Nesse sentido, Braun e Clarke (2006)
lecionam a disciplina de Ciências. Logo, foram apontam que ela consiste no primeiro método
convidados a participar todos os professores de qualitativo de análise que os pesquisadores
Ciências, formados ou em processo de precisam aprender, pois contém habilidades
formação em cursos de Pós-graduação Stricto centrais que são essenciais para a realização de
Sensu. Nesta etapa foram identificados 17 muitas outras formas de análise qualitativa. As
professores, que passaram a compor o corpus pesquisadoras destacam que uma análise
da pesquisa. temática devidamente nomeada e reconhecida
não exige que os pesquisadores tenham que
O próximo passo contou com a aplicação de
um questionário de pesquisa a todos os subscrever os compromissos teóricos
implícitos da teoria fundamentada, se o
professores que contemplaram os pré-
objetivo não for uma análise totalmente
requisitos já mencionados, e que manifestaram
trabalhada na questão da fundamentação.
interesse em participar da pesquisa. Esta etapa
contou antes com a elaboração do termo de Portanto, a análise temática envolve a busca
consentimento da pesquisa e do questionário, a partir de um conjunto de dados, quer seja
consistindo de questões abertas, possibilitando (entrevistas, grupos de foco ou uma série de
que o professor tivesse a liberdade de se textos) a fim de encontrar os padrões repetidos
expressar de forma autônoma sobre suas de significado. Braun e Clarke (2006)
impressões da Formação Continuada e sua descrevem que a análise envolve um
prática escolar. Após a elaboração do _____________________________________
instrumento de pesquisa, passamos à etapa de a
O artigo original não foi obtido, e sim uma cópia
agendamentos, procurando atender a (transcrição) que não seguiu a paginação do artigo
disponibilidade de horário dos professores original. Em virtude disso, as páginas referentes às
para a entrega e retirada dos questionários da citações que utilizamos seguem a de nossa tradução, que
foi disponibilizada para consulta em
pesquisa.
https://www.academia.edu/29999208/Tradu%C3%A7
A opção pela aplicação de questionários, e %C3%A3o_do_artigo_Using_thematic_analysis_in_ps
não de entrevistas, foi uma escolha onde se ychology_.
ponderou também o tempo disponível para os
professores, que é escasso em função do
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
constante movimento para frente e para trás reforma da estrutura e do currículo do Sistema
pelo conjunto de dados, ou seja, pelo o que se Educativo e sua inovação quantitativa e
está analisando dos extratos codificados ou já qualitativa requer o apoio e atitude do
produzindo a partir da análise. Assim, a escrita professor para capacitar-se nas mudanças,
surge como uma parte integral da análise, não sobretudo no âmbito qualitativo. Segundo
como algo deixado apenas para o fim, como Imbernón (2009), o professor necessita
ocorre com as análises estatísticas. perceber um aperfeiçoamento não só na
formação dos seus alunos e do Sistema
Educativo em geral, como também deve
Resultados e discussão alcançar um benefício profissional que
Pensar no papel que a Formação Continuada contribua com sua formação pessoal e
assume nos contextos sociais desta época, é principalmente com seu desenvolvimento
sem dúvida, um grande desafio tanto para o profissional.
professor quanto para a instituição promotora. Talvez nos falte, como diz Nóvoa (2007),
Os aspectos que tangem hoje esta formação investir nos movimentos pedagógicos, nas
estão fortemente imbricados por conflitos de comunidades de prática, num espaço pensado
ordem econômica, tecnológica e globalizada e construído por um grupo de educadores
que desembarca com grande força sobre a comprometidos com a pesquisa e a inovação.
cultura, o que inicia o surgimento de uma crise Assim, os próprios professores apropriam-se
da profissão de ensinar (IMBERNÓN, 2009). dos processos de mudança, corroborando para
Neste cenário, convém destacar que o ofício práticas concretas de intervenção.
da docência está entre as profissões que Indubitavelmente, para qualquer processo
favorecem o isolamento, e continua sendo que pretenda uma inovação real, o papel do
legítimo trabalhar de forma individual, em um professor é primordial, para que ocorra a
espaço protegido contra toda a ingerência execução destas propostas, pois são estes que
(GATHER THURLER, 2001). O exercem o ofício da sua profissão, em escolas
individualismo faz parte da identidade concretas, segundo suas necessidades e
profissional, e a realidade que se tem presente problemáticas específicas. Talvez por esta
na maior parte das escolas de Ensino questão, muitos ainda se posicionem contrários
Fundamental, são estruturas que funcionam à reforma ou aos programas de formação, por
como caixas, ou seja, salas de aula segregadas, isso mais do que garantir condições de salário
que protegem os professores uns dos outros, dignas, é preciso rever as relações de trabalho
impedindo também de verem e em geral.
compreenderem o que fazem os seus colegas
O professor só se abre ao novo programa
de trabalho.
formativo ou às possíveis mudanças da prática
Atrelado a isto, grande parte dos programas quando estas repercutem de forma
de Formação Continuada que são ofertados em significativa na aprendizagem de seus alunos,
nosso país “tem-se revelado de grande e consequentemente, mudam suas crenças e
inutilidade, servindo apenas para complicar atitudes diante do exercício da docência, pois
um quotidiano docente já de si fortemente “abre-se a forma de ver a formação não tanto
exigente” (NÓVOA, 2007, p. 9). O autor como uma “agressão” externa, mas como um
ressalva que os professores devem investir na benefício individual e coletivo” (IMBERNÓN,
construção de redes de trabalho coletivo, 2009, p. 27). Portanto, apoiar os professores
priorizando por uma formação voltada para em suas aulas, de modo que tenham o apoio
partilha e o diálogo profissional. Neste ponto, dos colegas ou por meio de um assessor
é importante ressaltar que um ambiente de externo, parece fundamental para levar certas
trabalho acolhedor e aberto ao diálogo, torna o formas de trabalho para a classe.
professor mais receptível, ao ponto de querer
investir em ações que venham a repercutir em Entretanto, Imbernón (2009) salienta que se
esta formação não vier acompanhada de
sua prática diária.
mudanças contextuais, trabalhistas, de
Consequentemente, contemplar qualquer carreira, de premiação salarial, corre-se o risco
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
no coletivo, faça parte da cultura profissional e Fonte: (GATHER THURLER, 2001, p. 11).
se unifique aos processos educativos, de modo
De fato, os efeitos produzidos por estas
que, os professores possam participar do
características favoráveis, podem de certo
processo, ou seja, “vai assumindo que não é
modo, levar aos educadores há um
um técnico que desenvolve ou implementa
rompimento de suas crenças, de suas
inovações prescritas por outros como muitas
representações da profissão, gerando efeitos
vezes o habituaram, mas sim que pode
notáveis para os estudantes. Segundo Gather
participar ativa e criticamente, a partir e no
Thurler (2001) esse tipo de transformação
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
continua raro, visto que, muitas destas trabalho, sua especialização, não prevalece
condições são reunidas apenas uma relação de cooperativismo, o que se têm
excepcionalmente. Todavia, percebe-se que a instituído é uma condição de sobrevivência
maior parte dos estabelecimentos escolares profissional. De modo que, “a cultura tem
ocupa posições intermediárias, e estão longe importância apenas porque embasa o
de serem escolas eficientes quanto à inovação. funcionamento do estabelecimento escolar
como sistema de ação coletiva e organizada”
Portanto, a cultura de um estabelecimento
(GATHER THURLER, 2001, p. 102).
escolar “é ativamente construída pelos atores,
mesmo que essa construção permaneça, em É importante que o estabelecimento escolar
grande parte, inconsciente” (GATHER seja um lugar de construção do sentido das
THURLER, 2001, p. 90). Nota-se, que tanto na práticas profissionais e de suas eventuais
escola como nas organizações, a mudança não modificações. Para Gather Thurler (2001) a
é vista como um fenômeno extraordinário, cultura, a dinâmica, o clima e o funcionamento
sendo assim: de um estabelecimento escolar têm grande
influência na maneira como o educador
constrói o sentido da mudança. Os projetos de
É uma categoria básica – mesmo que
frequentemente imprecisa - do pensamento de
mudança fazem parte da nossa relação com o
cada um. Até os professores mais mundo, com os outros, desse modo:
“conservadores” formam, às vezes, projetos de
mudança e não se opõem a ideia de que seja
necessário fazer as práticas evoluírem: eles Ela supõe novas aprendizagens, riscos de
simplesmente perseguem outros objetivos, outras fracasso, uma perda provisória de rotinas e de
prioridades. E mesmo os que se protegem o mais referências, o luto de certo hábitos, uma fase de
possível não podem fugir totalmente das mínima eficiência. Às vezes, os riscos são ainda
mudanças que seu ambiente lhes propõe ou maiores: nova identidade, nova inserção social,
impõe. A maneira como cada um pensa a obrigação de encontrar novas marcas (GATHER
mudança, avaliando-a possível, necessária ou THURLER, 2001, p. 18).
urgente, ou, ao contrário, perigosa ou
impensável, funda-se em uma história pessoal e
na integração a diversos agrupamentos (...). Em Por essa razão, a autora atribui que os
virtude da diversidade de seus itinerários, os estabelecimentos escolares inovadores não são
profissionais que trabalham no mesmo apenas aqueles cuja cultura favorece a
estabelecimento escolar não tem razão alguma
para terem a mesma relação com a mudança. mudança, mas sim aqueles, cuja mudança “é,
Todavia, a cultura inerente ao estabelecimento de certa forma, fonte de identidade, fator de
contribui também para influenciar cada um coesão, motor, modo de vida, e não apenas
(GATHER THURLER, 2001, p. 91). uma resultante involuntária da ação coletiva”
(GATHER THURLER, 2001, p. 102).
Neste aspecto, a pesquisadora destaca ainda Considerando que há aspectos essenciais para
que existem numerosas dimensões da cultura que ocorra a inovação pedagógica, um estudo
que os estabelecimentos escolares podem realizado por Cardoso (1992), com cinco
exercer. Existe, por exemplo, a cultura que não Escolas Superiores de Educação de Portugal,
valoriza a Formação Continuada, podendo procurou testar três hipóteses para validar se os
levar os professores que buscam por esta professores se tornariam mais receptivos à
formação, fazê-lo a o mais discretamente inovação: a primeira contemplava os
possível, para não atrair zombaria dos colegas, professores com maior número de anos de
do mesmo modo, que outra cultura poderá serviço, a segunda os professores que se
promover o incentivo para que todos os sentiam mais limitados em termos de liberdade
professores priorizem por esta formação. de ação, e por último os professores com maior
nível de formação. O estudo comprovou que as
Na prática, percebemos que a maioria das
duas primeiras hipóteses não demonstraram
culturas dos estabelecimentos escolares é
uma correlação significativa quanto às atitudes
centrada em uma organização de trabalho
dos professores a inovação. Enquanto que, a
rígida, pautada no individualismo, onde cada
formação pedagógica profissional demonstrou
professor é responsável pelo seu locus de
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
uma pequena receptividade quanto à inovação Contribuindo com esta questão, Resende e
dos professores. Nesse contraponto, a autora Fortes (2005) nos apresenta os dados de um
nos chama a atenção ao dizer que “possuir um estudo, que investigou a Formação Continuada
maior número de formações pedagógicas de uma instituição privada de Brasília/DF,
específicas pode não significar um acréscimo entre o período de 1995 a 2004, com
assimilável nas atitudes favoráveis à inovação” professores do Ensino Fundamental, de
(CARDOSO, 1992, p. 35). diferentes áreas de conhecimento e tempo de
atuação. Nesta pesquisa, os autores
Com relação a esta questão, vale destacar que
comprovaram que:
a formação complementar “não se constrói por
acumulação (de cursos, de conhecimentos ou
de técnicas), mas sim através de um trabalho Os professores pesquisados percebem as
de reflexividade crítica sobre as práticas e de inovações como necessárias, no entanto,
(re)construção permanente de uma identidade raramente propõem ações ou projetos
pessoal” (NÓVOA, 1992, p. 13). Razão pela inovadores, mesmo havendo abertura para tal.
Poderíamos relacionar o comportamento retraído
qual é tão importante investir na pessoa e dar dos professores na proposição de ações
um estatuto ao saber das suas experiências, inovadoras ao receio apontado por eles quando
vivências pessoais. Em virtude disso: da implantação e implementação de processos
dessa natureza, tais como: insegurança diante do
novo, falta de domínio de princípios
Ora é forçoso reconhecer que a pedagógicos, resistência dos professores a
profissionalização do saber na área das Ciências mudança, falta de tempo e ausência de modelos.
da Educação tem contribuído para desvalorizar Fatores como os apresentados, associados às
os saberes experienciais e as práticas dos restrições de natureza curricular e administrativa
professores. A pedagogia científica tende a colocam-se como dificuldades para a
legitimar a razão instrumental: os esforços de implementação de processos inovadores na
racionalização do ensino não se concretizam a escola (RESENDE; FORTES, 2005, p. 14).
partir de uma valorização dos saberes de que os
professores são portadores, mas sim através de
um esforço para impor novos saberes ditos Esta postura retraída dos professores com
“científicos”. A lógica da racionalidade técnica relação a processos inovadores na escola é
opõe-se sempre ao desenvolvimento de uma
questionável, pois mesmo as condições sendo
práxis reflexiva (NÓVOA, 1992, p. 16).
favoráveis, o medo do novo é algo que causa
certa instabilidade, por isso é fundamental o
Do mesmo modo, Nóvoa (1992) nos alerta envolvimento da instituição escolar, no sentido
que as escolas não são capazes de mudar se não de, construir no coletivo todas as ações que são
houver o envolvimento dos professores, e que necessárias.
estes não podem mudar sem uma Corroborando nesta perspectiva, a tese de
transformação das instituições que trabalham. doutoramento de Oliveira e Silva (2012) traz
Entretanto, Gather Thurler (2001) adverte que uma investigação sobre a possibilidade de os
“a maioria dos sistemas escolares atuais aplica- professores de Ciências inovarem
se em reformas que incitam os professores a pedagogicamente a partir de uma proposta de
cooperarem mais, - ou mesmo obrigando-os a Formação Continuada. Neste trabalho, os
isso” (p. 60). Logo, investir apenas na professores definiram o que entendem por
formação do professorado pode gerar inovação pedagógica, os quais responderam
indivíduos “superdesenvolvidos” em que “inovar estaria relacionado a uma
organizações “subdesenvolvidas”. aplicação de novos métodos de ensino”
Na verdade, o empenho profissional dos (OLIVEIRA & SILVA, 2012, p. 8). Este fato
professores depende desta articulação com as demonstra que os professores têm suas
escolas e seus projetos, por isso nenhuma concepções amparadas no princípio da
inovação, pode ficar atrelada apenas ao nível racionalidade técnica, e estão desprovidos de
das organizações escolares, portanto, falar de uma formação crítica, reflexiva e inovadora.
formação do professorado é primar por um Portanto, a inovação deve ser vista como um
investimento educativo dos projetos da escola. elemento central do próprio processo de
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b
FORPPE/IMEF/Universidade Federal do Rio Grande (FURG)/Jessicadacruz0614@gmail.com
RESUMO
Este trabalho foi realizado com o intuito de facilitar a compreensão dos alunos sobre os conceitos
básicos estatísticos e conscientizar a presença da estatística no cotidiano. Esta proposta foi
desenvolvida por acadêmicas do curso de matemática licenciatura da Universidade Federal do Rio
Grande (FURG), em uma turma do 7º ano do Ensino Fundamental de uma escola municipal na mesma
cidade. Participaram desta atividade 20 alunos de idade entre 11 e 13 anos. Para a realização desta
atividade, a turma foi dividida em cinco grupos. Cada grupo sugeriu uma pergunta temática de acordo
com o interesse dos estudantes referente a fim de coletar informações sobre a opinião dos demais
colegas sobre o assunto. Com os dados coletados, cada grupo analisou e construiu tabelas e gráficos.
Esta atividade possibilitou além de abordar conceitos estatísticos, instigar o pensamento lógico e
crítico dos estudantes ao analisarem dos resultados das pesquisas. Conforme foram avançando em
suas análises, foi-se introduzindo alguns conceitos, e levantado algumas indagações de acordo com o
andamento do que foi sugerido. Durante o processo de interpretação e discussão dos resultados
obtidos foi possível realizar uma proposta dinâmica e significativa, apresentando a educação
estatística no cotidiano destes alunos ao refletirem e analisarem o que eles próprios construíram,
permitindo com que estes não sejam meros espectadores do aprendizado e sim o protagonista da
construção de seu conhecimento.
Palavras chave: Construção de Gráficos e Tabelas, Ensino de Estatística, Ensino Fundamental.
ABSTRACT
This work was carried out with the purpose of facilitating students' understanding of basic statistical
concepts and raising awareness of the presence of statistics in daily life. This proposal was developed
by the undergraduate mathematics undergraduate students of the Federal University of Rio Grande
(FURG), in a class of the 7th year of Elementary School of a municipal school in the same city.
Twenty students aged between 11 and 13 participated in this activity. For this activity, the class was
divided into five groups. Each group suggested a thematic question in the interest of the students in
order to gather information on the opinions of other colleagues on the subject. With the data collected,
each group analyzed and constructed tables and graphs. This activity also made it possible to approach
statistical concepts, to instigate the students' logical and critical thinking in analyzing the research
results. As they advanced their analyzes, some concepts were introduced, and some questions were
raised according to the progress of what was suggested. During the process of interpretation and
discussion of the obtained results it was possible to make a dynamic and significant proposal,
presenting the statistical education in the daily life of these students as they reflect and analyze what
they themselves have built, allowing them not to be mere spectators of learning, protagonist of the
construction of his knowledge.
Keywords: Construction of Graphs and Tables, Statistics Teaching, Elementary School
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
Desenvolvimento
Após um momento deveras agitado por conta
da escolha do assunto, os seis grupos
trouxeram suas propostas a serem
trabalhadas.
O grupo 1 escolheu a pergunta “O que você
mais gosta de fazer?”. A turma, inicialmente,
começou um pouco introvertida, com poucas
falas, porém aos poucos começaram a
Figura 2: Gráfico (Grupo 1)
participar, deixando de se sentirem
constrangidos. Conforme os alunos da turma Fonte: Autoria própria
foram colocando suas opiniões para serem
dados para a pesquisa do grupo 1, eles Após debate, o grupo optou por separar o
constataram que as meninas gostavam de gráfico por gênero, em seguida a construção
atividades mais sedentárias do que os apresentaram o gráfico a turma, o qual gerou
meninos. Isso foi um momento bem um debate interessante, pois ao fazerem a
interessante da atividade, pois eles mesmos análise, o aluno B levantou a observação de
começaram a levantar o questionamento. que: “a maioria da turma, dorme, joga online
Neste grupo, alguns integrantes, durante o ou joga bola”, e concluíram que a maioria dos
início do ano, pareciam não estarem alunos tendem a ser sedentários.
interessados nas aulas da matemática, sendo Já o grupo 2 escolheu questionar sobre
dois alunos deste grupo repetentes. Com o “comidas preferidas da turma”. Este grupo
tempo, atividades dinâmicas como está comentou que “nunca havia feito gráficos e
aplicada, resgataram esses alunos, sendo tabelas”, porém estavam empenhados em
atualmente os que mais interagem e saber a opinião da turma.
participam das atividades propostas
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
Dez alunos mostraram não saber o que apesar de toda a confusão entre os
querem se tornar, os outros resultados foram componentes do grupo, resultou em que no
bem dispersos. Os resultados referentes a final ao perceberem que só faltava o grupo
professora foram nossos e da professora deles para acabar a construção do gráfico a da
regente. Percebe-se que a influência dos pais tabela, todos pegaram junto e finalizaram
ainda reflete nas escolhas dos alunos, o aluno com rapidez.
E disse: “meu pai é professor de física, e eu Os alunos integrantes do grupo 5 escolhem
quero ser engenheiro mecânico, pois tem o assunto “Qual a sua matéria preferida?”. Já
bastante física”. Já a aluna F disse: “eu gosto na escolha da pesquisa mostra algo bem
de ciências, eu quero ser medica e a minha marcante neste grupo, o aluno G e o aluno H
mãe é técnica de enfermagem, acho legal o deste grupo tiveram a oportunidades
que ela faz”. expressar que seus pais são professores, onde
um deles é professor de física e o outro o pai
é professor de História. Este grupo estava
empolgado com a proposta, sendo um dos
primeiros também a começar a pesquisa.
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
epistemológicos e políticos. São Paulo, Jaime José Zitkoski (orgs.). – 2. Ed., rev. amp.
Cortez: Instituto Paulo Freire, 2006. 1. Reimp. – Belo Horizonte: Autêntica Editora,
2010, 129.
[4] ROSSATO, Ricardo. Dicionário Paulo
Freire. Danilo R. Streck. Euclides Redin,
510
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
b
Docente do Instituto de Matemática, Estatística e Física/ Universidade Federal do Rio Grande – FURG,
tanisenovello@furg.br)
RESUMO
A docência é uma das categorias profissionais que manifesta ter maior vulnerabilidade para desenvolver
sintomas de estresse laboral, devido a excessiva demanda de trabalho, situações conflituosas com alunos,
pais e colegas, e a desvalorização da profissão. O mal-estar docente é compreendido como o adoecimento
devido a constante exposição a fatores estressores, causando condutas de insatisfação com a profissão,
como falta de comprometimento, excesso de faltas, e até mesmo vontade de abandonar a docência. Assim,
esta escrita tem como objetivo mapear e analisar artigos que abordem o tema de mal-estar e estresse
docente. Para tanto, primeiramente, realizou-se uma busca na Plataforma Sucupira para selecionar revistas
de Qualis A1 e A2 nas áreas de Ensino e Educação, posteriormente realizou-se uma busca nessas revistas
para encontrar artigos que abordassem o tema deste estudo. Após refinamento da busca, foram
selecionados 33 artigos, que posteriormente foram analisados através da Análise de Conteúdo. Do
processo de análise emergiram quatro categorias: Fatores e sintomas do estresse docente; Patologias e
estratégias de enfrentamento do estresse e do mal-estar docente; Mal-estar docente relacionado ao gênero
masculino; Estresse em professores portugueses. Porém, nesta escrita será abordada somente a categoria:
Patologias e estratégias de enfrentamento do estresse e do mal-estar docente. Através desta pesquisa,
constatou-se que embora haja pesquisas sobre esse tema e entenda-se a importância de atentar para da
saúde dos professores, o número de publicações ainda é pequeno.
Palavras chave: Estresse, Mal-estar, Professores, Síndrome de Burnout.
ABSTRACT
La docencia es una de las categorías profesionales que manifiesta tener mayor vulnerabilidad para
desarrollar síntomas de estrés laboral, debido a la excesiva demanda de trabajo, situaciones conflictivas
con alumnos, padres y colegas, y la devaluación de la profesión. El malestar docente es comprendido
como el enfermo debido a la constante exposición a factores estresores, causando conductas de
insatisfacción con la profesión, como falta de compromiso, exceso de faltas, e incluso voluntad de
abandonar la docencia. Así, esta escritura tiene como objetivo mapear y analizar artículos que aborden el
tema de malestar y estrés docente. Para ello, primero, se realizó una búsqueda en la Plataforma Sucupira
para seleccionar revistas de Qualis A1 y A2 en las áreas de Enseñanza y Educación, posteriormente se
realizó una búsqueda en esas revistas para encontrar artículos que abordasen el tema de este estudio.
Después de refinamiento de la búsqueda, fueron seleccionados 33 artículos, que posteriormente fueron
analizados a través del Análisis de Contenido. Del proceso de análisis surgieron cuatro categorías:
Factores y síntomas del estrés docente; Patologías y estrategias de enfrentamiento del estrés y del malestar
docente; Malestar docente relacionado al género masculino; El estrés en profesores de portugués. Sin
embargo, en esta escritura se abordará solamente la categoría: Patologías y estrategias de enfrentamiento
del estrés y del malestar docente. A través de esta investigación, se constató que aunque hay
investigaciones sobre ese tema y se entiende la importancia de atentar para la salud de los profesores, el
número de publicaciones todavía es pequeño.
Palabras clave: Estrés, Malestar, Profesores, Síndrome de Burnout.
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
estresse e mais técnicas de enfrentamento com desempenhado” (LIPP, 2012, p.64), ainda de
base na emoção. Contudo, os professores que acordo com Lipp, o
possuem menos estratégias de controle e que
evitam ficar de frente aos estressores também Burnout é uma erosão gradual, e frequentemente
podem manifestar maior vulnerabilidade ao imperceptível no início, de energia e disposição,
como consequência de um stress crônico e
estresse (POCINHO; CAPELO, 2009). prolongado, ou melhor, de uma incapacidade
O estresse é composto por três fases: a crônica para controlar o stress. Não acontece
primeira é o alarme, nesta fase o indivíduo como resultado de eventos traumáticos isolados.
entra em contato com o agente estressor e está O Burnout não ocorre de repente; é um processo
mais atento, produtivo e motivado; a segunda cumulativo, começando com pequenos sinais de
alerta, que, quando não são percebidos, podem
é a resistência, esta fase é composta pelo levar o professor a uma sensação de quase terror
período de adaptação do corpo à nova situação diante da ideia de ter que ir à escola (LIPP, 2012,
e; a terceira fase é o esgotamento ou exaustão, p. 65).
que é quando termina a fase da resistência
(ANDRADE; CARDOSO, 2012; A palavra Burnout tem como tradução literal
BENEVIDES-PEREIRA; YAMASHITA; a expressão “consumir em chamas” (LIPP,
TAKAHASHI, 2010). Cabe salientar que em 2012). Ainda de acordo com a autora, os
um processo de estresse pode não acontecer docentes possuem condições ideais para o
essas três fases, pois se houver uma desenvolvimento da Síndrome de Burnout,
recuperação do indivíduo, o processo pode devido ao intenso contato interpessoal que os
regredir ou retornar a fase anterior. professores vivenciam nesta profissão. A
(BENEVIDES-PEREIRA; YAMASHITA; autora também salienta que o Burnout pode ser
TAKAHASHI, 2010). desenvolvido em cinco fases: Idealismo,
Alguns professores acumulam uma carga Realismo, Estagnação e Frustação, ou Quase
diária excessiva de tarefas, têm preocupações Burnout, apatia e Burnout total e o fenômeno
com o salário, carreira e valorização, sofrem fênix.
com o tempo reduzido para se qualificar e Benevides-Pereira, Yamashita e Takahashi
esses fatores comprometem seu crescimento e (2010, p. 153) conceituam o Burnout como
realização profissional, deste modo, fica sendo um
evidente que na carreira docente existem
diversos fatores estressores, que se persistirem “processo multidimensional, proveniente da
podem levar a ocorrência da Síndrome de cronificação do estresse laboral e caracterizado
por elevada exaustão emocional (EE), níveis
Burnout (ANDRADE; CARDOSO, 2012). altos de desumanização (DE despersonalização
Maslach e Schaufeli (1993) afirmam que o para alguns autores) e reduzida realização
Burnout é como um prolongamento do estresse pessoal nas atividades laborais (RRP)
profissional, sendo ele o topo de um processo
que durou um período considerável de tempo. De acordo com esses autores o Burnout
Nessa situação, o indivíduo não acredita mais também apresenta sintomas característicos de
que pode enfrentar os entraves de sua situação estresse, (como cefaleias, problemas gastro
profissional. De acordo com Pocinho e intestinais, transtorno do sono, alterações de
Perestrelo (2011, p. 516) memorias, entre outros), maior quantidade de
consumo de substâncias (como álcool, cigarro,
o indivíduo com Burnout pode até mesmo café, tranquilizantes, entre outros), depressão e
vivenciar, ao nível pessoal e social, experiências suicídio.
enriquecedoras e gratificantes, mas não o
consegue fazer ao nível profissional.
Andrade e Cardoso (2012, p. 133) afirmam
que a Síndrome de Burnout também possui
Lipp (2012) afirma que a Síndrome de sinais de
Burnout é entendida como sendo um tipo
ceticismo, insensibilidade, despreocupação,
especial de estresse ocupacional, que é desconforto, ansiedade e até mesmo do
caracterizado “por profundo sentimento de sentimento de divisão que um indivíduo sente
frustação e exaustão em relação ao trabalho entre o que pode fazer e o que efetivamente
consegue fazer com outras pessoas.
516
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
Isso porque esses sintomas são defensivos, de é consensual que a procura de conselhos, vista
modo que a insensibilidade com as pessoas, os como estratégia de gestão do estresse, e a ação
direta em face dos estressores relacionam-se com
comportamentos cínicos e irônicos, mantem níveis de mal-estar mais baixos.
um afastamento emocional das pessoas ao seu
redor. (BENEVIDES-PEREIRA; Um instrumento que pode ser importante
YAMASHITA; TAKAHASHI, 2010). para a realização dos professores e para
Heijmans (2005, p. 213) ainda complementam melhorar a qualidade da educação escolar é o
que a Síndrome de Burnout está relacionada trabalho em equipe, pois deste modo eles
com problemas de autoconfiança, baixa aprendem com o conhecimento dos colegas
autoestima ou até mesmo doenças físicas, (JESUS, 2014), mas é importante sempre estar
como distúrbios cardíacos, endócrinos e atento aos sinais de estresse dos professores,
digestivos. sendo que um dos fatores que serve de alerta
Viera e Oliveira (2013) afirmam que de de que o professor não está bem é o absentismo
acordo com uma pesquisa realizada por Dohm, (POCINHO; PERESTRELO, 2011). Desta
os fatores que mais geram estresse são: falta de forma a formação continuada pode ser usada
relacionamento com os familiares dos alunos; como uma ferramenta, tanto para o
falta de recursos materiais; desobediência dos aprimoramento do docente como educador,
alunos; muitas exigências burocráticas; quanto para criar e fortalecer vínculos com
jornada de trabalho, além da carga horária; outros professores.
desvalorização salarial e profissional;
dificuldade em atender alunos com
necessidades especiais; avaliações Conclusão
sistemáticas direcionadas aos estudantes. Já, Percebe-se através dos dados suscitados por
por outro lado, as estratégias que podem meio desse mapeamento, que embora tenha-se
diminuir o mal-estar giram em torno de: encontrado um número regular de artigos sobre
relações saudáveis com os alunos; apoio de o tema, nesta categoria encontrou-se apenas
colegas e do sindicato; refletir sobre o papel do três trabalhos publicados nos últimos cinco
educador; desfrutar das férias escolares; anos, ou seja, apesar desse tema ser atual está
realizar planejamento antecipado das havendo poucas publicações sobre esse
atividades; manejar sistematicamente o tempo; assunto.
ter hobby e passatempos; ter apoio da família e Ressalta-se também que a maior parte dos
dos amigos. trabalhos que foram analisados nesse artigo
Não há uma fórmula eficaz para resolver os são de cunho teórico, ou seja, os autores não
problemas relacionados ao estresse, mas um estavam inserindo nos ambientes escolares,
dos caminhos é formação continuada, de modo salienta-se ainda que o ato de inserção nas
que o profissional adquira autoconfiança, escolas é muito importante, pois apenas
satisfação com o trabalho e desenvolvimento conhecendo a realidade em que esses
pessoal e interpessoal (JESUS, 2014). Ainda professores estão inseridos que é possível
de acordo com Jesus (2014, p.17) desenvolver estratégias para o enfrentamento e
a diminuição dos sintomas de mal-estar e
os professores deveriam ser treinados em estresse nesses docentes.
competências que permitissem uma melhor
gestão do imprevisível ou do espaço de incerteza Acredita-se que, em parte, o mal-estar dos
que é atualmente a sala de aula, nomeadamente professores pode estar vinculado a
em aptidões sociais e assertividade. desvalorização que a profissão docente vem
sofrendo ao longo dos anos, pois o professor
Silveira et al (2014, p. 26) relatam que os não receba a mesma valorização social de
“professores que possuem mais auto eficácia tempos atrás nem a remuneração adequada
dão mais atenção às oportunidades que pela realização de seu trabalho, mas ele ainda
facilitam o coping frente ao estresse”. Além é o principal agente de transformação da
disso Pocinho e Perestrelo (2011, p. 123) sociedade, pois cabe a ele ser o mediador no
afirma que processo de ensinar e aprender, Larocca e
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
Girardi (2011) afirmam que a satisfação e a docente, quanto para adotar medidas que
motivação são condições indispensáveis, não evitem o agravamento dele.
somente para o bem-estar do docente, mas para
a qualidade do seu trabalho.
REFERÊNCIAS
Romão (2007, p.17), afirma que “um
educador massacrado pelo mal-estar docente ANDRADE, P. S.; CARDOSO, T. A. O.
jamais conseguirá fazer bem a quem quer que Prazer e Dor na Docência: revisão
seja, porque não está bem consigo mesmo”, bibliográfica sobre a Síndrome de Burnout.
logo, entende-se que para se ter uma educação Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 21, n. 1,
com qualidade é necessário que os docentes p.129-140, 2012. Disponível em:
estejam bem em todos os aspectos, tanto <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_a
fisicamente, quanto emocionalmente, o autor rttext&pid=S0104-
ainda complemente ao afirmar que um 12902012000100013&lng=pt&nrm=iso>.
professor Acesso em: 16 fev. 2018.
BARDIN, L. Análise de Conteúdo. São Paulo:
“não consegue ajudar quem quer que seja a se Edições 70, 2011.
auto-educar, se não demonstra ser uma pessoa BARRETO, N. Brasileiro é o 2º mais
educada, ou seja, equilibrada, estável, capaz de estressado do mundo. Atribuna, Vitória, p6, 30
amar, capaz de amar a si mesma” (ROMÃO,
2007, p.17). abr. 2015. Disponível em:
<http://www.ismabrasil.com.br/img/estresse5
Com base na análise dos artigos selecionados 2.pdf>. Acesso em: 07 mai. 2017.
percebe-se que um número cada vez mais BENEVIDES-PEREIRA, A. M. T.;
significativo de professores sofre de doenças YAMASHITA, D.; TAKAHASHI, R. M. E os
emocionais, e são muitas as causas, mas as que educadores, como estão? REMPEC - Ensino,
mais se destacam são: a baixa remuneração Saúde e Ambiente, São Paulo, v. 3, n. 3, p.151-
salarial, a falta de valorização da docência, e a 170, dez. 2010. Disponível em:
jornada de trabalho, pois esses fatores fazem <http://ensinosaudeambiente.uff.br/index.php/
com que o professor se sobrecarregue e tenha ensinosaudeambiente/article/view/135/133>.
menos qualidade de vida, o que por Acesso em: 12 fev. 2018.
consequência impede que ele exerça sua ESTEVE, J. M. O Mal-estar docente. Lisboa:
função de modo satisfatório e adequado. Escher, 1992.
Nota-se que não há uma única fórmula para GOMES, A. R.; PEIXOTO, A.; SILVA, R. P.
diminuir ou eliminar os efeitos do mal-estar, M. Stress ocupacional e alteração do Estatuto
porém, acredita-se que, algumas possibilidades da Carreira Docente português. Educação e
podem amenizar, como por exemplo, as Pesquisa, São Paulo, v. 2, n. 34, p.357-371,
formações continuadas para os professores, abr./jun. 2012. Disponível em:
que de acordo com Miceli (2017) torna os <http://www.scielo.br/pdf/ep/v38n2/aopep519
professores mais capacitados sobre os aspectos .pdf>. Acesso em: 12 fev. 2018.
pedagógicos, além de os incentivar a descobrir GOMES, R. M. S.; PEREIRA, A. M. S.
outras estratégias para as dificuldades Estratégias de coping em educadores de
encontradas no dia a dia, e com isso, tentar infância portugueses. Psicologia Escolar e
realizar mudanças na comunidade escolar. Educacional, Campinas, v. 12, n. 2, p. 319-
Uma vez que a formação continuada oferece 326, 2008.
ao docente a oportunidade de refletir e GONÇALVES, J. P. O mal-estar docente
repensar sua prática profissional, além de segundo a percepção de coordenadores
possibilitar a descoberta de novos saberes. pedagógicos da rede pública de cascavel. In:
Outras possibilidades são o incentivo ao VIII Congresso Nacional De Educação, 2008.
trabalho em equipe com os colegas e também Anais. 2008. p. 4596 - 4606. Disponível em:
o incentivo aos professores a recorrerem a http://www.pucpr.br/eventos/educere/educere
acompanhamento psicológico, tanto para tratar 2008/anais/pdf/830_607.pdf. Acesso em: 13
os transtornos relacionados ao mal-estar mar. 2017.
518
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
b
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e-mail de contato:rsaballa@terra.com.br
RESUMO
Este trabalho busca questionar alguns pressupostos relacionados ao uso de entrevistas como forma de
produção de dados em uma pesquisa de pós-doutoramento. Essa discussão ocorre no contexto de uma
investigação que versa sobre a Pedagogia da Infância e a docência a partir das narrativas de
professoras/es atuantes na Educação Infantil. Partindo de entendimentos conceituais sobre a
entrevista como possibilidade de estabelecer um espaço dialógico, as reflexões deste artigo buscam
apontar os desafios, as possibilidades e os limites do uso da entrevista na pesquisa em Educação.
Nesta pesquisa, em específico, a entrevista é utilizada para que emerjam os princípios fundantes, as
práticas pedagógicas, as características específicas do trabalho, da rotina e do cotidiano com crianças
na Educação Infantil. Dessa forma, foram realizadas dez entrevistas com professoras/es da rede
pública e outras dez entrevistas na rede privada atuantes na Educação Infantil. As primeiras
entrevistas revelaram certa insegurança das professoras ao tratar de temas que demandariam, no
entendimento das mesmas, certo conhecimento teórico — como, por exemplo, currículo,
planejamento e didática. Outra questão evidenciada pelas entrevistas é uma tendência das
entrevistadas em dar mais foco à prática em detrimento de questões teóricas quando refletem sobre a
sua formação e atuação cotidiana.
Palavras chave: Educação Infantil, Entrevista, Práticas Pedagógicas, Docência.
ABSTRACT
This work seeks to question some assumptions related to the use of interviews as a form of data
production in a postdoctoral research. This discussion occurs in the context of an investigation that
deals with Pedagogy of Childhood and teaching from the narratives of teachers who are active in
Early Childhood Education. Starting from conceptual understandings about the interview as a
possibility to establish a dialogical space, the reflections of this article seek to point out the challenges,
the possibilities and the limits of the interview use in Education research. In this research, in
particular, the interview is used to emerge the founding principles, pedagogical practices, the specific
characteristics of work, routine and daily life with children in Early Childhood Education. Thus, ten
interviews were conducted with teachers from the public network and ten other interviews in the
private network working in Early Childhood Education. The first interviews revealed a certain
insecurity of the teachers when dealing with subjects that would require, in their understanding, some
theoretical knowledge - such as curriculum, planning and didactics. Another issue highlighted by the
interviews is a tendency of the interviewees to give more focus to the practice to the detriment of
theoretical questions when they reflect on their daily training and performance.
Keywords: Child education, Interview, Pedagogical practices, Teaching.
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
tratar os dados produzidos. Para além disso, Tal grupo, estava constituído por docentes, que
desde os primeiros contatos para fazer as reconhecem a incompletude da formação
entrevistas para a pesquisa, nos deparamos inicial e escolhem intencionalmente cursos de
com questionamentos que seguem essa mesma extensão e de pós-graduação para continuar os
linha: “E se eu não souber responder?, “E se eu estudos e as reflexões sobre a ação docene na
der a resposta errada?”. Frente a tais Educação Infantil.
questionamentos, o nosso papel foi o de deixar A partir do exposto, ressaltamos que neste
as(os) professoras(es) participantes trabalho, buscamos refletir sobre o uso da
tranquilas(os) e seguras(os) para realizar a entrevista na produção de dados nas pesquisas
entrevista, pois entendemos que os dados são da área da educação. Estamos tratando a
produzidos a partir de uma interlocução entrevista em um contexto de pesquisa de
dialógica entre entrevistador e entrevistados. abordagem qualitativa, no campo da
Dessa forma, também acreditamos que não Educação. Assim, entendemos que seja
existem informações prontas a espera de uma fundamental que o pesquisador defina um
suposta e neutra "coleta" de dados, conforme é roteiro de entrevista constituído por questões
defendido por metodologias de pesquisas que permitam ao entrevistado discorrer sobre o
canônicas no campo da educação. Nesse assunto em pauta, possibilitando com que que
sentido, salientamos, por exemplo, que em as respostas possam, posteriormente,
uma das escolas nas quais entrevistamos as contribuir com as reflexões no campo de
professoras, fomos solicitados a enviar o estudos no qual se sustenta-se a investigação
roteiro de entrevista antecipadamente para a proposta. Neste contexto, nosso roteiro de
direção da escola ter clareza das questões que entrevista foi definido a partir de vinte e quatro
seriam abordadas. Tal exemplo, comprova que questões divididas em seis blocos: a) dados
a insegurança faz parte do processo de profissionais dos professores; b) formação de
entrevista, em especial, nas questões relativas professores; c) pedagogia e cotidiano na
a conceitos próprios da educação e pedagogia. Educação Infantil; d) planejamento na
Nessa perspectiva, nos deparamos com certa Educação Infantil; e) infâncias; f) didática na
relutância dos entrevistados em responder Educação Infantil. A organização temática do
sobre questões relacionadas ao seu roteiro de entrevista, nos possibilitou focalizar
planejamento, avaliação, didática e currículo, as questões de interesse sobre a ação
como temas específicos da Educação Infantil. pedagógica docente na Educação Infantil, além
Pelo fato, dos referidos conceitos encontrarem- de situar melhor as(os) professoras(es)
se em processo de construção no campo da participantes da pesquisa durante a realização
Pedagogia da Infância, acreditamos isso gere das entrevistas. Além disso, realizamos uma
certa insegurança na elaboração de respostas entrevista piloto com uma das professoras
por parte dos/as professores/as. Além disso, as participantes para identificar aspectos que
formações iniciais precárias e cada vez mais deveriam ser qualificados no roteiro de
aceleradas nos cursos de licenciatura questões. Durante a realização da entrevista
Pedagogia em nosso país e a quase inexistência piloto percebemos a dificuldade da
de disciplinas que discutam especificamente a participante em responder questões sobre
Educação Infantil nos currículos de graduação, currículo, planejamento, avaliação e didática
colaboram indefectivelmente para que os na Educação Infantil. A partir de nossas
docentes não reconheçam os aspectos centrais observações, procuramos tornar as questões
do trabalho docente com as crianças. Desse mais claras e contextualizadas em relação ao
modo, percebemos durante o decorrer do contexto de trabalho dos/as professoras.
processo investigativo, que algunas Embora tenhamos tornado mais objetivas as
professoras(os) relutavam em responder questões, entendemos que as mesmas
questões relativas aos conceitos anteriormente deveriam ser mantidas, em função de serem
referidos. Por outro lado, também percebemos centrais no fazer pedagógico docente com as
que um grupo menor de professores/as, crianças na Educação Infantil.
demonstrou segurança e apropriação A partir da apresentação inicial,
conceitual, ao responder as questões propostas. esclarecemos que o trabalho esta organizado
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caráter mais acolhedor. Nos trechos ARNOLDI, 2006, p. 94). No trecho a seguir
selecionados das entrevistas do professor aparece de forma bastante clara a insegurança
Dênis e da professora Débora evidencia que a da professora Mariana ao responder sobre a
entrevista assume um caráter semiestruturado, formação de professores:
permitindo a flexibilidade necessária, para
uma maior e mais intensa interlocução. Nos Entrevistador: Como a tua formação como
excertos transcritos são evidenciadas algumas professora acontece? Como ela se dá no teu
entendimento?
questões que não estavam presentes no roteiro Mariana: Acho que a primeira coisa que tem que
original, mas que emergiram na ocasião da ter é – como é... não sei a palavra assim - tato,
entrevista pela própria natureza da conversa empatia, acho que saber – não sei explicar em
desenvolvida. palavras – mas acho que saber o que a criança
Nesse sentido, para Arfuch (1995), a precisa naquele momento. Acho que estar atenta
a isso, porque depois o resto a gente vai
entrevista é uma verdadeira invenção conseguindo dentro do trabalho dentro sala de
dialógica, no momento que deixa claro os aula. A gente vai conhecendo a criança. Saber
jogos de poder, tendo em vista que o como a gente conhece a criança. Saber como
entrevistador assume um papel que não pode chegar na criança... esse tato assim.
ser intercambiado com o entrevistado. A Entrevistador: E tu aprendeu isso ou foi uma
coisa mais do dia a dia?
entrevista estabelece um lugar de autenticidade Mariana: Na faculdade, eu acho que a
das vozes, de legitimidade do que é dito e de universidade trabalhou mais isso mesmo, não
permanência do que é dito. “Conhecer o lembro muito da coisa teórica, eu lembro muito
sujeito, ‘desagrega-lo’ da uniformidade, dos desse cuidado, o jeito como lidar, para depois a
coletivos de identificação (‘sociedade’, ‘povo’, gente entrar com a parte mais teórica, mais
pedagógica. (Transcrição da entrevista com a
‘massa’, ‘cidadania’) deixar que conte “como professora Mariana da rede privada, em abril de
é” e como são suas relações com os outros” 2018)
(ARFUCH, 1995, p. 153, tradução nossa), faz
parte de todo o processo investigativo. Como pode ser perceber a partir da leitura, a
Prosseguindo a discussão, a próxima seção, professora, ao mesmo tempo, que constrói uma
apresentamos os desafios referentes a resposta autoral – a formação se dá na prática
produção dos dados da pesquisa por meio da e são as crianças que sinalizam o que o
realização de entrevistas. professor necessita e para tanto ele precisa
estar atento e aberto – busca termos que sejam
do jargão da pedagogia. Na mesma resposta, a
Obstáculos na produção de dados por meio professora Mariana divide o conhecimento
da entrevista decorrente da prática, até mesmo aquele que
Nem sempre nas entrevistas acontece o foi produzido na universidade, do
esperado, aquilo que planejamos e conhecimento teórico. Pelas respostas,
antecipamos. Neste conjunto de excertos de podemos inferir que a professora procura
entrevistas apresentadas no decorrer do maior fundamentação teórica. Em tal
trabalho, em especial, nossas dificuldades perspectiva, Couto e Arnoldi (2006) afirmam
foram nas respostas que diziam respeito aos que a solução nesses casos de insegurança é
saberes pedagógicos – formação de incluir outras pessoas no momento da
professores; planejamento, registro e reflexão entrevista que possam trazer maior confiança
sobre a prática; currículo na Educação Infantil no momento de responder. Entretanto, neste
e didática. A esse respeito, Couto e Arnoldi caso, acreditamos que a insegurança se deu em
(2006) elaboram uma lista de limitações da função do termo “formação de professores”,
entrevista, tornando-a, segundo as autoras, não especificamente com relação à hierarquia
“inviável”. Uma das inviabilidades tratadas na relação entrevistado – entrevistador. Em
pelas autoras versa sobre a insegurança tanto outras perguntas relativas à prática, a
do entrevistado quanto do entrevistador. A professora não demonstrou tal insegurança.
insegurança depende, neste caso, “da relação e Da mesma forma, Couto e Arnoldi (2006, p.
do status do entrevistado: superioridade, 95) apontam que muitos entrevistadores
inferioridade e mesmo igualdade” (COUTO; utilizam vocabulário técnico,
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existe e que isso seria responsabilidade da resposta sobre o seu entendimento sobre
escola. Desse forma, a seguir apresentamos currículo. A professora Teresa parece, pela
outra transcrição de excerto de entrevista que resposta, que está dividida entre o que ela
ilustra a discussão apresentada: estava acostumada a fazer – projetos e datas
comemorativas – e às novas propostas da
Entrevistador: Qual o teu entendimento sobre o direção e coordenação pedagógica. Tanto no
currículo na Educação Infantil? currículo fundado nas datas comemorativas
Teresa: Especifica melhor a tua pergunta
Entrevistador: Existe um currículo na educação
quanto na nova proposta em que não se
infantil? Se ele existe, de que ele é composto? comemoram as datas e os projetos devem
Teresa: A gente tem trabalhado nas nossas emergir da curiosidade e do interesse das
formações os campos de experiência. Então, eu crianças, a responsabilidade por dizer o que é
acredito que vai abrir mais a questão de trabalhado e como deve ser trabalhado é da
currículo, assim. A gente não tem mais
trabalhado a questão das datas comemorativas,
coordenação. Ratificando o argumento, Gray
que antes fazia parte do nosso currículo e que (2012, p. 311) também contribui para essas
também nós parávamos as nossas propostas, reflexões quanto afirma que entrevistar no
nossos projetos para trabalhar aquele momento local de trabalho tem maior potencial para
com as crianças e, às vezes, pra mim houve uma dificuldades, “pois as pessoas podem relutar
quebra de como a gente trabalhava com as
crianças anteriormente. (Transcrição da
muito a responder perguntas relacionadas com
entrevista com a professoraTeresa, da rede suas responsabilidades por se sentirem
pública, em maio de 2018) vulneráveis”. A entrevista com a professora
Teresa aconteceu na escola em que ela trabalha
A partir da leitura, em princípio parece haver durante o tempo em que as crianças estavam
uma falta de compreensão da pergunta sobre em aula especializada. Voltamos a ressaltar
currículo, entretanto parece que é mais uma que as perguntas fazem parte dos saberes
forma de se esquivar da palavra necessários ao fazer cotidiano do professor.
“entendimento”. A continuação, a professora Prosseguindo a discussão, na próxima seção,
Teresa repassa a responsabilidade para a apresentaremos as reflexões finais do trabalho.
coordenação e a direção da escola, que estão
trabalhando com as professoras a Base
Nacional Comum Curricular (2017). Além de Considerações Finais
uma resposta evasiva, a professora nomeia os Ao apresentarmos as reflexões expostas
responsáveis pela mundança de currículo – a durante o decorrer do trabalho sobre as
BNCC e a coordenação – que bane o trabalho entrevistas como uma forma de produção de
baseado em datas comemorativas. Bogdan e dados para nossa pesquisa, percebemos que é
Biklen (2003) apontam que, mesmo não hajam possível estabelecer uma relação dialógica,
regras que sejam aplicadas às situações de como propõe Arfuch (1995), entendendo que
entrevista, o entrevistador deve ter como seu existe uma processo de "co-produção dos
objetivo principal entender como o dados" (SAMPAIO, 2005) entre entrevistador
entrevistado pensa. Em outros momentos da e entrevistado. Por meio do diálogo,
entrevista aparece também a responsabilidade defendemos que é possível evidenciarmos os
da instância superior sobre decisões do pensamentos, as práticas dos professores de
planejamento e organização. Aparece também Educação Infantil que foram entrevistados em
na fala certo ressentimento em não trabalhar as nossa investigação. Ao estabelecer um vínculo
datas comemorativas e que isso é uma decisão de confiança, a conversa flui de forma mais
superior que não deve ser contestada. agradável para ambos, como aconteceu com as
A esse respeito, Gray (2012, p. 312), ao entrevistas dos professores realizadas com os
estabelecer o que não deve ser feito em uma professores Débora e Dênis. Por outro lado, a
entrevista, afirma que se deve evitar “criar a entrevista com a professora Tatiana apesar de
impressão de que preferiria alguns tipos de ter sido desafiadora pelo fato da professora ter
resposta a outros”. Neste caso, mesmo que a se colocado em uma posição de defesa,
entrevistada não tenha respondido à pergunta, buscando identificar um responsável externo
não foi prudente insistir na busca de uma sobre as suas próprias práticas – direção,
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Professora Doutora do Programa de Pós-Graduação em Educação Ambiental da Universidade Federal do Rio
Grande (FURG), Pesquisadora do Laboratório de Ensino e Pesquisa em Geografia (LAPEG), e-mail:
profaclaudiacousin@gmail.com
RESUMO
Este trabalho apresenta uma pesquisa que busca compreender como o cinema, enquanto artefato
cultural permite transversalizar a Educação Ambiental, no ensino de Geografia na Educação Básica.
Trata-se de uma pesquisa que será desenvolvida com os professores dos Anos Finais do Ensino
Fundamental, da rede municipal do Rio Grande/ RS. Tem como hipótese a compreensão de que o
ensino de Geografia, através do uso do cinema, possibilitará a instrumentalização dos professores,
promovendo um diálogo com o intuito de compreender a Educação Ambiental crítica e
transformadora e seu papel no currículo da Geografia. O objetivo geral da pesquisa é compreender
como a Educação Ambiental pode transversalizar o currículo do ensino de Geografia, através do
cinema. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, a qual se propõe a trabalhar com os professores a partir
de oficinas, produzindo e fornecendo-lhes instrumentos que possibilitarão refletir e planejar formas
de transversalizar a Educação Ambiental, no ensino de Geografia, levando-os a significar a realidade
vivida e o contexto social no qual estão inseridos.
Palavras chave: Educação Ambiental; Formação de Educadores; Ensino; Cinema.
ABSTRACT
This work presents a research that seeks to comprehend how cinema, as a cultural artifact, allows to
mainstream Environmental Education in the teaching of Geography in elementary education. It is a
research that will be developed with teachers from the final years of elementary school, of the
Municipal Network of Rio Grande – RS. Its hypothesis is the comprehension that the teaching of
Geography, through the use of cinema, will enable the instrumentalisation of the teachers, promoting
a dialogue with the purpose of comprehending the critical and transformative Environmental
Education and its role in the Geography curriculum. The general goal of the research is to comprehend
how Environmental Education can mainstream the curriculum of Geography teaching, through
cinema. It is a qualitative research that proposes to work with the teachers through workshops,
producing and supplying them with tools that will enable them to reflect and plan ways to mainstream
the Environmental Education in the teaching of Geography, leading them to mean the lived reality
and the social context in which they are inserted.
Keywords: Environmental Education, Teacher Training, Teaching, Cinema.
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ênfase as três principais leis que abordam este sobre a Educação Ambiental em sala de aula
tema, entre as quais: os PCNs, a lei sobre a abre espaço, para saberes extraescolares que
Política Nacional de Educação Ambiental são fundamentais para a formação do aluno.
(PNEA) e as Diretrizes Nacionais para a Assim, entendemos que a Educação
Educação Ambiental (DCNEAS). Ambiental dialoga com as áreas do
Em 1998, foi aprovado pelo Conselho conhecimento de Ciências Humanas (EF) e
Nacional de Educação, os Parâmetros Ciências Humanas e Sociais Aplicadas (EM),
Curriculares Nacionais (PCNs) que se e por isso cabe aos professores das disciplinas
constituem como um referencial para orientar que compõem estas áreas do conhecimento
a educação escolar. Os PCNs, além das fazerem um trabalho contínuo e permanente
disciplinas escolares, dão ênfase a temas que com seus alunos, abordando as questões
estão diretamente relacionados com o socioambientais, com o intuito de
exercício da cidadania, os chamados temas transversalizar a Educação Ambiental no
transversais, que são: Meio Ambiente, Saúde, currículo. Para tal, consideramos que o
Pluralidade Cultural, ética e Orientação trabalho e o planejamento docente usando o
Sexual. Os PCNs propõem que estes temas se cinema como recurso poderá estabelecer
integrem as disciplinas escolares, estando discussões e reflexões sobre as questões
presentes em todas elas, relacionando-as com socioambientais apresentadas e possibilitará
as questões da atualidade. Assim, os PCNs uma aprendizagem que tenha significado para
optam por integrá-las no currículo através do com a realidade dos professores e dos alunos.
que se chama de transversalidade. De acordo Nos anos 90, uma política pública específica
com os PCNs: para a Educação Ambiental, é criada a Lei
9.795, de 27 de abril de 1999, a qual estabelece
A transversalidade diz respeito à possibilidade de a Política Nacional de Educação Ambiental
se estabelecer, na prática educativa, uma relação (PNEA), caracterizada pela consolidação dos
entre aprender na realidade e da realidade de
conhecimentos teoricamente sistematizados
espaços de atuação da Educação Ambiental, no
(aprender sobre a realidade) e as questões da vida ensino formal e não formal. Segundo a PNEA:
real (aprender na realidade e da realidade)
(BRASIL, 2000, p. 40). Art. 1º: Entendem-se por educação ambiental os
processos por meio dos quais o indivíduo e a
Assim, a Educação Ambiental, considerada coletividade constroem valores sociais,
como um tema transversal a partir do eixo conhecimentos, habilidades, atitudes e
competências voltadas para a conservação do
Meio Ambiente deve ser trabalhada segundo meio ambiente, bem de uso comum do povo,
esses parâmetros, a partir da realidade e do essencial à sadia qualidade de vida e sua
contexto social dos professores e alunos, sustentabilidade.
ressaltando o uso do cinema como prática Art. 2º: A educação ambiental é um componente
educativa que pode estabelecer esta relação. essencial e permanente da educação nacional,
devendo estar presente, de forma articulada, em
Fazendo com que os professores e alunos, se todos os níveis e modalidades do processo
percebam como parte fundamental do educativo, em caráter formal e não-formal.
ambiente em que vivem, tornando-os cidadãos Art. 8º: As atividades vinculadas à Política
conscientes e que se compreendam Nacional de Educação Ambiental devem ser
pertencentes deste contexto. desenvolvidas na educação em geral e na
educação escolar [...].
A Educação Ambiental deve atravessar as § 3º As ações de estudos, pesquisas e
diferentes áreas do conhecimento, fazendo experimentações voltar-se-ão para:
relação com as questões atuais em todos os I - o desenvolvimento de instrumentos e
níveis e modalidades da Educação Básica, pois metodologias, visando à incorporação da
esta aprendizagem é um processo contínuo que dimensão ambiental, de forma interdisciplinar,
nos diferentes níveis e modalidades de ensino;
vai permanecer no decorrer de toda a [...] (PRONEA, 2014).
escolaridade do aluno. Segundo os PCNs
(2000, p.38) “[...] a perspectiva transversal Com esta política, a Educação Ambiental
aponta uma transformação da prática passou a ser pensada de forma individual e
pedagógica, [...] e a responsabilidade com a coletiva, visando trabalhar a Educação
formação dos alunos.” A inclusão da discussão
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Doutor em História pela UNISINOS. Docente do PPGDR das Faculdades Integradas de Taquara (FACCAT),
danielgevehr@faccat.br. Taquara, RS.
RESUMO
O presente estudo, trata-se de uma revisão sistemática, com o objetivo de analisar e identificar os desafios
que permeiam os acadêmicos de Enfermagem, acerca de suas ações e iniciativas empreendedoras no
ensino. Para a sua realização se utilizou as bases de dados, SciELO, LILACS, Medline e PubMed, no
período de junho a julho de 2018, a busca sucedeu-se pelos descritores “ensino de Enfermagem”;
“Enfermagem”; “liderança” e “organização e administração”, com o conector booleano and. Os critérios
de inclusão seguiram de artigos com até cinco anos de publicação (2012-2017) e que mostrassem os
termos “desafios”; “ações empreendedoras” e “acadêmicos de enfermagem”, no título e resumo. Aos
critérios de exclusão, presumiu-se na literatura cinzenta. Dessa forma, foram selecionados 18 artigos. Os
estudos evidenciaram que mesmo diante dos desafios, o acadêmico, consegue dar conta das demandas,
nesse momento, de contradições e conflitos no enfrentamento de obstáculos ganham sentido e o
aprendizado acontece, também as pesquisas apresentavam traços característicos do empreendedorismo,
como, a necessidade de romper com as práticas de subordinação e de não se limitarem às zonas de
confortos. Com tudo, é notável que os desafios (i)mobilizam as ações e iniciativas dos “futuros
enfermeiros”, nesse ínterim se ressalta a capacidade de desenvolver competências empreendedoras, a fim
de promover situações inovadoras, favorecer métodos e técnicas diferenciadas no processo de ensino
desses acadêmicos.
ABSTRACT
The present study is a systematic review with the objective of analyzing and identifying the challenges
that permeate Nursing students about their actions and entrepreneurial initiatives in teaching. For its
accomplishment the databases, SciELO, LILACS, Medline and PubMed were used, from June to July of
2018, the search was succeeded by the descriptors "teaching of Nursing"; "Nursing"; "Leadership" and
"organization and administration" with the Boolean connector and. The inclusion criteria followed articles
up to five years of publication (2012-2017) and that show the terms "challenges"; "Entrepreneurial
actions" and "nursing academics" in the title and abstract. Exclusion criteria were presumed in the gray
literature. Thus, 18 articles were selected. The studies showed that even in the face of the challenges, the
academic can handle the demands of contradictions and conflicts in the face of obstacles and make sense
and learning happens, also the researches presented features characteristic of entrepreneurship, such as
the need to to break with the practices of subordination and not to confine themselves to areas of comfort.
However, it is notable that the challenges (i) mobilize the actions and initiatives of "future nurses", in the
meantime, the ability to develop entrepreneurial skills to promote innovative situations, favor different
methods and techniques in the teaching process of these academics.
Keywords: Entrepreneurship in Teaching; Nursing Academics; Nursing; Actions and Initiatives;
Challenges of Nursing Education.
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em uma guerra cruenta, ter uma “mãe” Portanto se ressalta que todas as enfermeiras
enfermeira, melhora muito a situação do citadas foram precursoras de sua profissão, o
Brasil, em termos de simpatia e aceitação que demonstra estarem a frente do seu tempo,
popular (CARDOSO; MIRANDA, 1999). desenvolvendo ações e características
Então, Nery, mostrou que para ser enfermeira empreendedoras. O mais interessante é que
naquela época não era necessário ser uma irmã todos os preceitos, tanto de Nightingale
de caridade, mas que de alguma forma a (Teoria Ambientalista), Nery (primeira
Enfermagem era mais um ato de afeto e enfermeira do Brasil) e Horta (Teoria das
compaixão, mas sim uma ciência. Necessidades Humanas Básicas) são
empregadas no currículo dos atuais cursos de
A terceira e última personalidade, n estudo de
Enfermagem, demonstrando ainda mais a sua
Pires, Méier e Danski (2015), realizou-se uma
relevância.
pesquisa de cunho histórico, em que foi
abordada a vida de Wanda Cardoso de Aguiar,
comumente conhecida por Wanda Aguiar
O empreendedorismo em Enfermagem
Horta, brasileira e filha de militar. O estudo
revelou que desde pequena Wanda, O empreendedorismo não é novo, e não é
demonstrava muita dedicação aos estudos, e, modismo. Nova é a sua percepção da sua
após anos de estudo na Enfermagem, importância. Jean Baptiste Say, 200 anos atrás,
estabelece a teoria de enfermagem, “Teoria das por achar que a teoria econômica deve ver a
necessidades humanas básicas”, onde teve o mudança como um fato normal e saudável,
reconhecimento mundial de sua teoria e até criou o termo entrepreneur para descrever
hoje é aplicada e estudada por acadêmicos e alguém que perturba e desorganiza.
enfermeiras. Schumpeter (1934), apoiando-se em Say,
Wanda teve o primeiro artigo publicado na rompeu com a economia tradicional
Revista Brasileira de Enfermagem (REBEn) postulando que a norma de uma economia
(uma das revistas de maior relevância da sadia, o cerne de uma teoria econômica, é “o
atualidade brasileira na Enfermagem) sobre desequilíbrio dinâmico provocado pelo
sistematização da assistência de enfermagem, empreendedor inovador, e não o equilíbrio e a
no período proposto, intitulado otimização”. Ainda o economista australiano
“Considerações sobre o diagnóstico de criou a expressão “destruição criativa” para
Enfermagem”, de 1967. Esse fato confirma a descrever a tarefa do empreendedor, em que o
autora como precursora da aplicação da novo (produto, serviço) destrói o velho
metodologia científica no Brasil e a forte (SCHUMPETER, 1934).
influência dela durante as décadas seguintes Portanto, somente a partir da década de 1970
(HORTA, 1967). que é ressurgido o conceito de
Para ela diagnosticar era uma forma de empreendedorismo, através de Joseph
aplicar o método científico utilizando na busca Schumpeter que vincula o termo
da verdade ou na sua exposição. Horta define empreendedor, definitivamente, a inovação. A
neste artigo que, diagnosticar é, em síntese, partir dessa época Joseph advertiu sobre a
aplicar o método científico, isto é, a utilização importância do empreendedor na economia
dos processos lógicos pelo pensamento, na como agente de inovação, passaram de
busca da verdade ou na sua exposição. Os coadjuvantes a autores centrais
processos gerais de pensamento são utilizados (SCHUMPETER, 1934; DOLABELA, 2009).
de modo sistemático e refletido na procura do Com isso, o empreendedorismo tem sido
diagnóstico. O novo conceito de Wanda Horta definido pela capacidade de desenvolver e de
trazia: sistematizar o pensamento, o raciocínio, criar soluções que busquem inovações no
para levantar os problemas do paciente, âmbito laboral. A pessoa empreendedora tende
elaboração que as enfermeiras já realizavam, a ser visionária, pois tem a capacidade de
porém, de forma intuitiva e sem registros enxergar o que outros ainda não viram, além
(HORTA, 1967). de atuar como catalisadora de ideias,
disseminando inovações e instigando outros a
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destes objetivos, competências que remetem à gestão: Ciclo 6; Eucléa Gomes Vale (org.).
figura de um enfermeiro empreendedor. Porto Alegre: Artmed, 2016.
[2] ANDRADE, A. C.; DAL BEN, L. W.;
SANNA, M. Empreendedorismo na
Conclusões Enfermagem: panorama das empresas no
O presente estudo teve como objetivo Estado de São Paulo. Revista Brasileira de
analisar e identificar os desafios que permeiam Enfermagem, v. 68, n. 1, p. 40-44, 2015.
os acadêmicos de Enfermagem, acerca de suas Disponível em:
ações e iniciativas empreendedoras no Ensino. https://www.ingentaconnect.com/content/doaj
Com tudo, é notável que os desafios /00347167/2018/00000068/00000001/art0000
(i)mobilizam as ações e iniciativas dos 7 Acesso em: 01 nov. 2018.
“futuros enfermeiros”, nesse ínterim se ressalta [3] BACKES, D. S.; ERDMANN, A. L.
a capacidade de desenvolver competências Empreendedorismo na enfermagem:
empreendedoras, a fim de promover situações concepções teóricas e práticas. In: Programa
inovadoras, favorecer métodos e técnicas de atualização em enfermagem (PROENF)
diferenciadas no processo de ensino desses gestão: Ciclo 1; Eucléa Gomes Vale (org.).
acadêmicos. Porto Alegre: Artmed, 2011.
[4] BACKES, D. S., ERDMANN, A. L,
Nesse contexto, compreende-se que o BUSCHER, A. Nursing care as an enterprising
desenvolvimento desse estudo, admitindo social practice: opportunities and possibilities.
como pressuposto os acadêmicos de Acta Paul Enferm, v. 23, n. 3, p. 341-47, 2010.
Enfermagem, propóe a refleção acerca da Disponível em:
potência do empreendedorismo como futuros http://www.scielo.br/pdf/ape/v23n3/v23n3a05
profissionais nos serviços de saúde. Visto que .pdf Acesso em: 24 jul. 2018.
a prática do empreendedorismo no ensino pode [5] BRASIL. Ministério da Educação.
exercer grande contribuição para a cultura Resolução cne/ces nº 3, de 7 de novembro de
empreendedora dos futuros enfermeiros 2001. Brasília, 2001. Disponível em:
(gestores) da saúde. Além disso, o escasso http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CE
número de publicações em relação ao S03.pdf Acesso em: 15 jul. 2018.
empreendedorismo no ensino em [6] CARDOSO, M. M. V. N.; MIRANDA, C.
Enfermagem, especialmente considerando ela M. L. Anna Justina Ferreira Nery: um marco
como uma fomentadora dessa cultura, elenca a na história da enfermagem brasileira. Revista
necessidade de publicações nessa área, com a Brasileira de Enfermagem, v. 52, n. 3, p. 339-
finalidade de aprimorar e enriquecer o 348, 1999. Disponível em:
conhecimento nesse âmbito. http://www.scielo.br/pdf/reben/v52n3/v52n3a
Em suma, a expectativa desse estudo é que 03.pdf Acesso em: 30 abr. 2018.
ele possa contribuir para a reflexão e [7] DOLABELA, F. Oficina do
disseminação da cultura empreendedora nos Empreendedor. Rio de Janeiro: Sextante, 2009.
espaços de desenvolvimento da Enfermagem e [8] FERREIRA, G. E. et al. Características
no ensino, induzindo mudanças na visão dos empreendedoras do futuro enfermeiro.
futuros profissionais, e despertando nestes o Cogitare enferm, v. 18, n. 4, p. 688-94, 2013.
desejo de desenvolver iniciativas e ações, as Disponível em:
quais se traduzem em benefícios nos diversos http://revistas.ufpr.br/cogitare/article/viewFile
âmbitos e que é possível empreender no ensino /34921/21675 Acesso em: 28 jun. 2018.
em Enfermagem. [9] FERREIRA, G. E.; DALL'AGNOL, C. M.;
PORTO, A. R. Repercussões da proatividade
no gerenciamento do cuidado: Percepções de
REFERÊNCIAS enfermeiros. Escola Anna Nery, v. 20, n. 3,
2016.
[1] ALMEIDA FILHO, A. J. et al. A história
Disponível em:
do gerenciamento em Enfermagem e sua
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_art
influência na prática atual. In: Programa de
atualização em enfermagem (PROENF)
548
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
b
Doutor em História, Professor no PPGDR das Faculdades Integradas de Taquara. danielgevehr@hotmail.com
RESUMO
O presente estudo tem por objetivo elucidar e compreender a relação entre pesquisa e docência,
consequentemente problematizar o papel da universidade nesse processo. Dessa forma, a questão a
ser estudada esboça reflexões sobre pesquisa e docência no processo de formação. Enquanto
abordagem metodológica, inicialmente, o estudo se caracteriza pelos moldes de pesquisa qualitativa,
buscando dar esclarecimento ao tema que se remete as ações de ensinar pela pesquisa durante o
processo de formação dos professores, como instigação não só de inovação pedagógica, mas na
consolidação desse processo em nível de formação. Com referências à educação, conclui-se que a
universidade proporciona conhecimentos e condições para que a pesquisa aconteça, porém, necessita
reorganiza seu currículo a favor do conhecimento e formação profissional, levando em consideração
o ensino, pesquisa e extensão como recursos inseparáveis.
Palavras chave: Universidade; Currículo; Pesquisa; Formação docente.
ABSTRACT
The purpose of this study is to elucidate and understand the relationship between research and
teaching, thus problematizing the role of the university in this process. Thus, the question to be studied
outlines research and teaching reflections in the training process. As a methodological approach, the
study is characterized by qualitative research models, seeking to clarify the theme that refers to the
actions of teaching through research during the teacher training process, as an instigation not only of
pedagogical innovation, but also in the consolidation of this process at the training level. With
references to education, it is concluded that the university provides knowledge and conditions for
research to happen, but needs to reorganize its curriculum in favor of professional knowledge and
training, taking into account teaching, research and extension as inseparable resources.
Keywords: University; Curriculum; Research; Teacher training.
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
exerce a função de ensino que deve ser Estamos nos aproximando de uma sociedade
produzido com o sentido voltado à formação, pautada por desafios imensuráveis. A
estabelecendo vínculos sobre os saberes ideologia apontada no currículo analisa as
necessários ao exercício da profissão docente. relações estruturais, que demonstram ser um
Por esse motivo, a proposta curricular para a dos instrumentos de distribuição social, com
contemporaneidade desperta elementos e saberes sistematizado, os quais
possibilidades para (re) criar o próprio modo necessariamente implicam em identificar os
de fazer e pensar cada profissão. significados que fazem os conteúdos, ao
proporcionarem realmente o conhecimento.
A capacidade de pensamento crítico, nessa
De acordo com essa proposta, Horn e
mesma linha de raciocínio, vem da
Germinari (2006) – que nos permitem melhor
reconstrução da própria origem do
compreender a dinâmica da formação dos
conhecimento, das teorias e da prática
docentes nas Ciências Humanas – consideram
agregadas a valores fundamentados pelo
o currículo uma sistematização com
desenvolvimento de competências e
perspectivas de transformar uma sociedade.
habilidades em pesquisar, redimensionando
tanto a prática em si quanto a teoria, Seu comprometimento é dar suporte para que
proporcionando movimento dialógico e os alunos desenvolvam o mecanismo de
circulatório. reflexão critica, desmistificando o processo
conteudista tradicional, partindo do processo
de formação do conhecimento educacional
Repensando o espaço acadêmico e seu adquirido à distribuição e manutenção das
currículo na formação dos professores diferenças existentes. Sobre esse raciocínio a
Através do diálogo sobre a teorização de composição curricular é considerada por
currículo, busca-se a discussão sobre a Bernstein (1998) como: campo de
renovação do significado da aprendizagem. As conhecimento e discurso produzido pelos
teorizações que buscam – pela pesquisa a pesquisadores, campo pedagogizado que volta
contribuição para enriquecer a prática – – se aos discursos filosóficos, científicos e
promove aprendizagem. Porém, no entender culturais em que o conhecimento produzido
de Garcia e Moraes (2003) acontece à divisão passa por construções e transformações dentro
entre a teoria e a prática, o processo do processo pedagógico.
desqualificado vem abscindir à possibilidade Os conhecimentos do profissional docente
criativa de todo processo de conhecimento servem de sustentação para o ensino entre
emudecido. Ao reconstruir o significado de diferentes origens, tais como: a formação
conhecimento pode-se dizer que é acadêmica inicial e continuada, o currículo e a
transformado para o estudante o processo de dimensão da competência das disciplinas a
conhecimento sistematizado, fazendo as serem ensinadas, isto é, a importância da
relações entre o procedimento e o resultado. pesquisa como alternativa para o diálogo
No contexto contemporâneo, demanda-se epistemológico como possibilidade de
um currículo que estimule a capacidade do consolidação de processos partilhados de
pensamento criativo, da reflexão e da produção de conhecimento (TARDIF, 2002).
reconstrução da origem histórica do currículo. O ato de desafio da universidade hoje é
Por isso, tanto o currículo quanto seus instituir aos indivíduos a capacidade de buscar
fundamentos pertencem a períodos históricos e os conhecimentos e de saber utilizá-los. Ao
críticos. Desenvolver, sistematicamente, as contrário do acontecido anteriormente -
habilidades de pesquisar de acordo com a quando o importante era desbravar o
própria prática, e confrontá-la com as reflexões conhecimento - hoje o importante é "dominar
teóricas – reconstitui tanto a prática em si o desconhecimento", ou melhor, diante de um
quanto a teoria num movimento dialógico e problema para o qual ele não se encontra a
contínuo – sobre o qual se produz a consciente resposta pronta, o profissional ao buscar o
(GESSER e RANGHETTI, 2011). conhecimento o pertinente e, quando não
disponível, saber encontra-lo, ele próprio com
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
b
Departamento de Educação Matemática/Universidade Federal de Pelotas, alves.antoniomauricio@gmail.com
RESUMO
O presente trabalho refere-se à pesquisa de Mestrado em desenvolvimento junto ao Programa de Pós-
Graduação em Educação Matemática da Universidade Federal de Pelotas, cujo objetivo geral é
identificar os reflexos nos saberes docentes de matemática de professoras polivalentes que
participaram da formação do Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) de 2014,
cujo tema central foi a alfabetização Matemática. Os sujeitos da pesquisa compõem um grupo de
professoras dos anos iniciais de uma escola pública da rede estadual. A fim de atender ao objetivo
apresentado propôs-se uma pesquisa de cunho qualitativo, do tipo estudo de caso, que iniciou pela
exploração de documentos referentes ao PNAIC de 2014, contemplando ainda como essa formação
ocorreu no âmbito da Universidade Federal de Pelotas. O estudo ainda contemplou, até esse momento,
uma discussão sobre os saberes docentes de Matemática necessários para o trabalho nos anos iniciais
do ensino fundamental, bem como a formação matemática desses sujeitos. Os dados estão sendo
produzidos por meio de entrevistas e análise documental de materiais produzidos pelas professoras
nas formações e serão posteriormente analisados considerando como metodologia a Análise Textual
Discursiva. Espera-se com essa pesquisa contribuir com a reflexão sobre os impactos desse
importante programa de formação continuada, nos saberes mobilizados pelas professoras ao ensinar
matemática para as crianças.
Palavras chave: PNAIC, Formação de professores, Saberes docentes.
ABSTRACT
The present work refers to the research of Master in development with the Program of Post-
Graduation in Mathematical Education of the Federal University of Pelotas, whose general objective
is to identify the reflexes in the mathematical teaching knowledge of polyvalent teachers who
participated in the formation of the National Pact by the Literacy in the Right Age (PNAIC) of 2014,
whose central theme was Mathematics literacy. The research subjects make up a group of teachers
from the initial years of a state school public school. In order to meet the objective presented, a
qualitative research, of the type of case study, was initiated, which began with the exploration of
documents related to the 2014 PNAIC, also considering how this training took place within the scope
of the Federal University of Pelotas. Until that moment, the study contemplated a discussion about
the mathematical teacher knowledge required for the work in the initial years of elementary school,
as well as the mathematical training of these subjects. The data are being produced through interviews
and documentary analysis of materials produced by the teachers in the formations and will be later
analyzed considering as methodology the Discursive Textual Analysis. It is hoped that this research
will contribute to the reflection on the impacts of this important program of continuous formation, in
the knowledge mobilized by the teachers when teaching mathematics for the children.
Keywords: PNAIC, Teacher training, Teachers' knowledge.
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redação dada pela Lei nº 9.131/95, no art. 32 operações; Pensamento Algébrico; Espaço e
da Lei nº 9.394/96, na Lei nº 11.274/2006, e forma; Grandezas e Medidas e Tratamento da
com fundamento no Parecer CNE/CEB nº informação. Essa organização apresentava
11/2010 uma primeira mudança na proposta oficial para
o ensino de Matemática nos anos iniciais,
Para alcançar esses objetivos, as ações do
constante nos Parâmetros Curriculares
PNAIC foram pensadas em quatro eixos de
Nacionais, nos quais a Matemática era
atuação: formação continuada; materiais
apresentada em quatro blocos de conteúdos,
didáticos; avaliações; e gestão, controle e
sendo a mudança mais significativa, a
mobilização social.
proposição do eixo sobre o pensamento
A proposta do MEC era criar uma rede de algébrico.
formação de professores, onde a produção e
O material distribuído para os supervisores,
fornecimento do material ficaria ao seu
formadores, orientadores e professores
encargo. Esses Cadernos de Formação eram
alfabetizadores, a fim de subsidiar a discussão
enviados às Instituições de Ensino Superior
sobre Alfabetização Matemática, totalizaram
(IES) que tinham uma equipe composta por
12 cadernos, sendo eles o Caderno de
Coordenador Geral, Supervisores e
Apresentação, Educação Matemática do
Formadores de Ensino. Os Supervisores
Campo, Educação Inclusiva, Organização do
orientavam os Formadores no planejamento
Trabalho Pedagógico (caderno 1),
das formações presenciais que fariam com os
Quantificação, Registros e Agrupamentos
Orientadores de Ensino, que por sua vez
(caderno 2), Construção do Sistema de
planejavam e executavam as formações com os
Numeração Decimal (caderno 3), Operações
Professores Alfabetizadores. Todo este
na Resolução de Problemas (caderno 4),
trabalho era voltado para que ao receber a
Geometria (caderno 5),Grandezas e Medidas
formação continuada os professores pudessem
(caderno 6), Educação Estatística (caderno 7),
refletir sobre as teorias para melhorar sua
Saberes Matemáticos e outros campos do saber
prática a fim de que os objetivos de
(caderno 8) e Jogos na Alfabetização
Alfabetização dos alunos em Língua
Matemática, além de um livro com encarte de
Portuguesa e Matemática fossem alcançados.
jogos para serem utilizados com os alunos.
O MEC distribuiu ainda, para as escolas que
Com a adesão da UFPel ao PNAIC, no ano
aderiram ao Programa, obras pedagógicas
de 2013, foi constituída uma equipe nessa
complementares aos livros didáticos
fornecidos pelo Plano Nacional do Livro universidade, responsável pelas formações,
sendo redefinida para 2014, quando a temática
Didático (PNLD), jogos pedagógicos e obras
da formação foi a Alfabetização Matemática.
de literatura para uso em sala de aula.
Nesse momento assumi como coordenador
As ações do PNAIC deveriam ser geral da equipe que, para atender dezenove
monitoradas pelo coordenador local e a turmas, passou a contar com dois
avaliação do Programa se daria pela prova coordenadores adjuntos, cinco supervisores,
ANA (Avaliação Nacional da Alfabetização) uma equipe mista de formadores com 19
realizada ao final do Ciclo de Alfabetização. professores da área de linguagem e 13 da área
O programa foi pensado para que no ano de de Matemática e aproximadamente
2013, primeiro ano de implantação, fosse dado quatrocentos e sessenta orientadores de
ênfase na área das linguagens e no ano de estudos, que deveriam atender a formação de
2014, segundo ano de formação, o tema aproximadamente nove mil professores
abordado fosse a Alfabetização Matemática. alfabetizadores, dos quais foram certificados
Para isso, a rede colaborativa de formação 7804 cursistas (os demais não atingiram o
continuou sendo a mesma, porém foram mínimo de frequência ou aproveitamento no
lançados novos cadernos de formação para dar curso de formação).
conta do tema. A partir das manifestações de muitos
Esses cadernos apresentavam a Matemática formadores das IES, ainda em 2013, de que
estruturada sobre 5 eixos: Números e não se sentiam capacitados para trabalhar as
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
foi que, a partir das leituras sobre os direitos de metacognição, citadas anteriormente.
aprendizagem e os eixos estruturantes da
Em um primeiro momento, pelo
Matemática, eles refletissem sobre seus acompanhamento dos registros disponíveis, é
conhecimentos e práticas nessa área. As possível afirmar que já se percebem
experiências por eles descritas deveriam ser modificações nos planejamentos das
substituídas pelos conhecimentos que professoras alfabetizadoras, relatadas pelos
julgavam dominar e aqueles sobre os quais orientadores de estudos. Também se verifica
precisariam aprofundar os estudos, pois uma maior apropriação dos professores do
apresentavam deficiências, que foram conhecimento matemático, revelada a partir
diagnosticadas num processo de autorreflexão das práticas propostas às crianças, bem como
a partir das leituras realizadas. A atividade das propostas pedagógicas apresentadas aos
mostrou-se promissora uma vez que, ao evocar orientadores de estudos.
suas memórias, os professores perceberam que
os acontecimentos positivos muitas vezes Verificou-se, ainda, um destaque para a
estavam ligados a questões afetivas necessidade de mais cursos de formação
envolvendo o professor e que os aspectos continuada contemplando os conteúdos de
negativos normalmente tinham a ver com a Matemática, verificada pelos próprios
falta de compreensão do conteúdo, tendo isso professores, pois apesar dos avanços
causado lacunas ainda presentes em seu verificados, muito ainda há de se fazer em
conhecimento matemático, mas que poderiam termos de formação, principalmente numa área
ser preenchidas pelos estudos realizados na reconhecidamente ainda tão inacessível a
formação. Já na segunda atividade, através da muitos.
linha do numeramento, foi proposto aos
cursistas que realizassem a retomada das
experiências com os usos dos números, das Saberes matemáticos das professoras
operações, das medidas e de seus registros alfabetizadoras para o trabalho com os anos
matemáticos desde a primeira infância à vida iniciais
adulta, com discussão e trabalho em grupos, Os saberes matemáticos são o foco do
com registro em papel pardo e posterior trabalho de pesquisa em desenvolvimento, e
apresentação coletiva. Essa atividade permitiu serão identificados nas próximas etapas do
o resgate das experiências pessoais que estudo, dessa forma não há dados ainda que
revelaram a importância e a presença constante possam ser apresentados que revelem quais
da matemática em nosso cotidiano, desses saberes as professoras alfabetizadoras
experiências essas que ocorrem desde que apresentam.
nascemos e só se encerram quando morremos,
à semelhança das práticas de letramento A próxima etapa da pesquisa irá buscar
(estudadas em 2013 na formação). Os elementos que possam caracterizar esses
professores puderam perceber com essa saberes.
atividade que não é somente na escola que Entretanto um saber que foi desenvolvido nas
estamos em interação com os usos da formações do PNAIC refere-se ao conceito de
matemática; ela está presente em muitas alfabetização matemática.
situações cotidianas, mesmo que não a
O PNAIC apresentava entre seus objetivos o
percebamos. Por meio dessa reflexão, os
desenvolvimento da alfabetização de modo
professores ficaram sensibilizados sobre a
integrado com as demais áreas do
importância de um trabalho com a matemática
conhecimento, dentre as quais a Matemática
nos anos iniciais voltado às práticas da
ocupa um importante papel. Essa aproximação
alfabetização, integrado com a alfabetização
da Matemática às práticas de alfabetização já
linguística e as práticas de letramento. Os
foi problematizada por diferentes autores, os
outros dois recursos utilizados na formação
quais afirmam que os elementos constituintes
tinham caráter permanente, sendo empregados
dos dois sistemas fundamentais para a
ao longo dos encontros durante todo o período
representação da realidade – o alfabeto e os
do curso: o livro da vida e a caderneta de
números – são apreendidos conjuntamente
566
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
pelas pessoas em geral, mesmo antes de articulados, que potencializem sua atuação na
chegarem à escola, sem distinções rígidas de vida cidadã. Dessa forma a Matemática
fronteiras entre disciplinas ou entre aspectos adquire uma nova dimensão, entendida na
qualitativos e quantitativos da realidade. A perspectiva do letramento, ou melhor, como
aproximação entre alfabetização e Matemática Alfabetização Matemática, compreendendo o
proposta pelo autor, nos exige um esforço de conjunto das contribuições da Educação
entendermos o termo Alfabetização de forma Matemática no Ciclo de Alfabetização, de
mais abrangente. Esse termo pode ser forma que se promova a apropriação pelos
entendido em dois sentidos principais: sentido estudantes de práticas sociais de leitura e
stricto e sentido lato. No primeiro sentido a escrita de diversos tipos de textos, práticas de
“alfabetização seria o processo de apropriação leitura e escrita do mundo, não se limitando ao
do sistema de escrita alfabético”, porém em um ensino do sistema de numeração e das quatro
sentido mais abrangente, ou num sentido lato, operações aritméticas fundamentais. Ou seja,
se “supõe não somente a aprendizagem do amplia-se o conceito de Matemática, o qual
sistema de escrita, mas também, os passa a contemplar as diferentes práticas de
conhecimentos sobre as práticas, usos e leitura e escrita desenvolvidas pelas crianças,
funções da leitura e da escrita, o que implica o tanto no contexto escolar quanto fora dele,
trabalho com todas as áreas curriculares e em considerando também as relações com o
todo o processo do Ciclo de Alfabetização” espaço e as formas, os processos de medição,
como encontramos nos cadernos do PNAIC. registro e uso das medidas, como também as
Nesse sentido lato de alfabetização, um “novo” estratégias de produção, reunião, organização,
conceito se apresenta: o de Alfabetização registro, divulgação, leitura e análise de
Matemática. “Novo” porque praticamente é informações, o tratamento da informação,
desconhecido no meio educacional, porém, promovendo a articulação de procedimentos
apesar de ainda pouco debatido, o conceito de de identificação e isolamento de atributos na
alfabetização Matemática tem sido recorrente resolução de conjuntos, bem como de
nos discursos em educação, e tem estreita comparação, classificação e ordenação,
relação com os atos de ler e escrever a operações mentais básicas para o
linguagem Matemática usada nos anos iniciais. desenvolvimento pleno dos conceitos
Na sociedade letrada e “numerada” em que matemáticos.
vivemos, onde as informações escritas e Percebe-se, então, que o ensino de
numéricas cada vez mais ocupam significativo Matemática não pode ficar restrito aos
lugar, é consenso que o domínio da números e às operações aritméticas, visto que
Matemática tem papel fundamental no as demais estruturas matemáticas e do
exercício da cidadania. Dessa forma, investir pensamento devem ser mobilizadas desde os
na alfabetização das crianças também em anos iniciais. Assim, a alfabetização
Matemática, permitindo-lhes dominar os matemática deve ser entendida para além do
números e as informações numéricas domínio dos números e suas operações. Desde
disponíveis no dia a dia, é uma forma de o início da escolaridade a criança deve
contribuir com sua formação enquanto construir as primeiras noções de espaço, forma
cidadãos que têm a capacidade de leitura e e suas representações, bem como devem lhe
interpretação de dados quantitativos, ser oferecidas condições para que as ideias
habilidades cada vez mais exigidas nas tarefas iniciais de grandezas, como comprimento e
do cotidiano. O PNAIC traz o conceito de tempo, por exemplo, possam ser organizadas,
Alfabetização Matemática como um dos afim de que a Matemática exerça sua função
pilares do ensino dessa matéria nos anos social.
iniciais, apresentando-o aos professores
alfabetizadores como o processo de Ao falar em função social da Matemática se
organização dos saberes que a criança traz de amplia o sentido de Alfabetização Matemática.
suas vivências anteriores ao ingresso no Ciclo Para dar conta dessa ampliação, o Caderno de
de Alfabetização, de forma a levá-la a construir Apresentação de Matemática do PNAIC 2014
um corpo de conhecimentos matemáticos apresenta referência ao letramento
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
matemático. Entretanto, o referido caderno não escola também faz parte desse mundo real,
apresenta um conceito ou mesmo o que se estando nela presentes, além de conhecimentos
entende pela expressão letramento a serem ensinados e aprendidos, jogos e
matemático, sendo necessária a busca em brincadeiras, que fazem parte do mundo
outras fontes de uma definição ou conceito que infantil.
possa contribuir nesse debate. Tal como o De acordo com o Caderno de Apresentação
conceito de letramento que está relacionado às entender a Alfabetização Matemática na
práticas sociais de leitura e escrita, a expressão perspectiva do letramento impõe o constante
letramento matemático está associada aos diálogo com outras áreas do conhecimento e,
processos de uso de conceitos matemáticos em principalmente, com as práticas sociais, sejam
diversificadas práticas sociais, aproximando- elas do mundo da criança, como os jogos e
se do conceito de numeramento, termo do brincadeiras, sejam elas do mundo adulto e de
campo da educação Matemática, surgido em perspectivas diferenciadas, como aquelas das
função das demandas sociais. Ao buscar
diversas comunidades que formam o campo
atender às demandas sociais, a Educação brasileiro. Ações de formação continuada de
Matemática contribui significativamente com professores em um projeto de extensão:
a inserção dos estudantes nesta sociedade. É PNAIC Matemática – UFPEL Coleção
sabido que a Matemática tem sido um dos Extensão e Socidade - Infância Cidadã - nº 1 -
grandes fatores de exclusão escolar, gerando ano 2018 154 Portanto, devemos compreender
também uma exclusão social ao impedir que a Matemática escolar deve estar atrelada às
muitos alunos de concluírem seus estudos. Por práticas sociais do mundo da criança, fazendo
meio de uma formação balizada na perspectiva parte de suas vidas, uma vez que, muitas vezes,
da Alfabetização Matemática, os professores as crianças passam mais tempo na escola do
desenvolvem uma visão crítica quanto ao que fora dela, desenvolvendo todo momento
desenvolvimento da disciplina, sendo assim habilidades matemáticas em outros espaços,
fundamental uma discussão que envolva essa além dos limites da sala de aula. Entende-se
matéria de ensino e suas contribuições para por “habilidades matemáticas” a capacidade de
uma infância cidadã. Mais recente que o uso do mobilização de conhecimentos associados à
termo letramento, chegado ao Brasil em quantificação, ordenação, operações,
meados da década de 80 o termo numeramento realização de tarefas ou resoluções de
foi, conforme Toledo (2004, p.93), problemas relativos à Matemática, tendo
apresentado à Faculdade de Educação da sempre como referência tarefas e situações
Universidade de São Paulo em abril de 2003. cotidianas. Assim, lidar com números,
O misto de habilidades essenciais, tanto da compreender tabelas e gráficos, trabalhar com
Matemática como do letramento, caracteriza noções de escala, régua e proporção, são
então o conceito de numeramento como: um exemplos de habilidades que realizamos e que
agregado de habilidades, conhecimentos, influenciam a nossa compreensão e
crenças e hábitos da mente, bem como as comunicação. É reconhecido que
habilidades de comunicação e resolução de anteriormente à escola as crianças:
problemas, que os indivíduos precisam para • participam de uma série de situações
efetivamente manejar as situações do mundo envolvendo números, relações entre
real ou para interpretar elementos matemáticos quantidades, noções sobre espaço;
ou quantificáveis envolvidos em tarefas
(CUMMING, GAL, GINSBURG, 1998, p.2, • recorrem à contagem e operações para
apud TOLEDO, 2004, p.94). A expressão resolver problemas cotidianos;
mundo real, grifada na citação acima, não pode • observam e atuam no espaço ao seu redor;
ser reduzida ao cotidiano do aluno fora da
escola. • identificam posições e comparam distâncias
e massas.
Muitas vezes quando falamos em “vida real”
queremos nos referir aos acontecimentos Assim, cabe à escola articular essas
extraescolares e nos esquecemos de que a experiências extraescolares, assistemáticas
(experiências que não são organizadas nem
568
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
seguem uma sequência didática elaborada) e atualmente são por essas professoras
heterogêneas (cada criança terá desenvolvido mobilizados, para ensinar matemática aos seus
diferentes habilidades de acordo com os alunos.
estímulos aos quais é exposta) com os
conhecimentos matemáticos socialmente
construídos, por meio de situações que Conclusões
desafiem os conhecimentos iniciais das Como o trabalho encontra-se em construção,
crianças, ampliando-os e sistematizando-os. não há ainda conclusões definitivas, porém
Encontramos em Moretti e Souza (2015) que algumas questões já se apresentam de forma
apesar de os termos “alfabetização conclusiva.
Matemática”, “numeramento” e “letramento Até o presente momento foram realizadas
matemático” aparecerem em diferentes leituras sobre formação de professores, ensino
documentos e publicação, tanto seu uso quanto de Matemática nos anos iniciais, sobre
sentido não é consenso, mas com certeza há alfabetização matemática e o PNAIC.
presente nos últimos dois uma preocupação
com a função social da Matemática. As leituras realizadas indicam para a
fundamental importância da formação
matemática do professor que irá atuar nos anos
Resultados e discussão iniciais, bem como evidenciam o baixo
investimento dos cursos de formação inicial,
Através do PNAIC se propiciou um decorrendo daí a necessidade de formação
importante momento de formação continuada continuada para esses sujeitos. Espera-se com
aos professores dos anos iniciais que, embora a pesquisa contribuir nesse debate tão
sem formação em Matemática, são professores importante.
que ensinam Matemática e, portanto, precisam
de um aprofundamento tanto teórico quanto
metodológico nesse campo que normalmente é REFERÊNCIAS
trabalhado de maneira superficial nos cursos
de Pedagogia. [1] MORAES, Roque e GALIAZZI, Maria do
Carmo. Análise textual discursiva: processo
Entre os elementos que pautaram as reconstrutivo de múltiplas faces. In Ciência &
discussões sobre o ensino de Matemática nos Educação, v. 12, n. 1, p. 117-128, 2006.
anos iniciais, foi pano de fundo para as [2] CURI, Edda. A Matemática e os
discussões o conceito de Alfabetização Professores dos anos iniciais. São Paulo: Musa
Matemática, sempre na insistência de que essa Editora, 2005.
matéria de ensino não se resume à contagem e [3] TOLEDO, Maria Elena Roman de Oliveira.
operações, mas contempla muitas outras áreas Numeramento e escolarização: o papel da
dessa ciência, por vezes apresentada aos escola no enfrentamento das demandas
estudantes de forma fechada e pronta, sem que Matemáticas cotidianas. In: FONSECA, Maria
qualquer construção conceitual possa ser da Conceição. Letramento no Brasil:
desenvolvida. Habilidades Matemáticas. São Paulo: Global:
Essa abordagem tem, de nosso ponto de vista, Ação Educativa Assessoria, pesquisa e
estreita relação com os saberes matemáticos Informação: Instituto Paulo Montenegro,
das professoras alfabetizadoras. Entendemos 2004.
que na perspectiva da Alfabetização [4] MORETTI, Vanessa Dias e SOUZA,
Matemática se tem uma concepção de ensino Neusa Maria Marques de. Educação
em que se problematiza uma exploração Matemática nos anos iniciais do ensino
baseada na resolução de problemas e na busca fundamental: princípios e práticas
da construção efetiva do conhecimento. pedagógicas. São Paulo: Cortez, 2015.
[5] SHULMAN, Lee. Those who understand:
A pesquisa em andamento pretende knowledge growth in teaching. Educacional
investigar junto às professoras polivalentes Research, 1986.
quais saberes o PNAIC produziu e que
569
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
b
Programa de Pós-Graduação em História - PPGH /Universidade Federal do Rio Grande- FURG,
furggeo@gmail.com
c
Instituto de Matemática, Estatística e Física - IMEF/ Universidade Federal do Rio Grande - FURG,
elainepereira@prolic.furg.br
RESUMO
As origens deste trabalho estão articuladas às atividades desenvolvidas no grupo de pesquisa intitulado:
Formação de Professores e Práticas Educativas – FORPPE, que por sua vez está ligado à Universidade
Federal do Rio Grande – FURG. A partir disso, vale à pena mencionar que o referido grupo de pesquisa
está fundamentado numa perspectiva interdisciplinar que considera a multiplicidade de olhares e a
pluralidade de perspectivas. Nesse contexto, tendo em vista que os primeiros contatos da criança com os
conhecimentos sistematizados próprios da escola são mediados, sobretudo, por um docente e, portanto, é
evidente que nessa realidade há uma potencial perspectiva interdisciplinar latente. Nessa vertente,
algumas de nossas intensões estão ligadas à formação de professores para a atuação nos anos iniciais da
Educação Básica. Portanto, esse artigo pretende apresentar os alcances de uma ação desenvolvida com
estudantes do curso de Pedagogia da FURG. Nessa perspectiva, buscamos, a partir das memórias escolares
de determinado grupo de licenciandos, traçar paralelos e mobilizar uma consciência interdisciplinar capaz
de articular de maneira coerente os conhecimentos curriculares previstos para os anos iniciais da Educação
Básica. Com isso acreditamos estar buscando caminhos alternativos e em direção contrária aos obsoletos
rumos pretendidos por um paradigma cuja principal marca é a fragmentação do conhecimento.
Palavras chave: Interdisciplinaridade, Memórias, Formação de Professores, Educação Básica.
ABSTRACT
The origins of this work are articulated to the activities developed in the research group entitled: Teacher
Training and Educational Practices - FORPPE, which in turn is connected to the Federal University of
Rio Grande - FURG. From this, it is worth mentioning that this research group is based on an
interdisciplinary perspective that considers the multiplicity of perspectives and the plurality of
perspectives. In this context, given that the first contacts of the child with the systematized knowledge of
the school are mainly mediated by a teacher and, therefore, it is evident that in this reality there is a
potential latent interdisciplinary perspective. In this area, some of our intentions are related to the training
of teachers for the performance in the initial years of Basic Education. Therefore, this article intends to
present the scope of an action developed with students of the course of Pedagogy of FURG. In this
perspective, we seek, from the school memories of a certain group of graduates, to draw parallels and
mobilize an interdisciplinary awareness capable of coherently articulating the curricular knowledge
foreseen for the initial years of Basic Education. With this we believe we are seeking alternative paths
and in the opposite direction to the obsolete paths intended by a paradigm whose main brand is the
fragmentation of knowledge.
Keywords: Interdisciplinarity, Memories, Teacher Training, Basic Education.
570
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
572
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
finalizarmos esta etapa da ação, solicitamos repete, há infinitas combinações, assim como, a
aos participantes que se distribuissem em cinco cada presente, ressignificamos nossa vida. esse
ressignificar consiste em nossos atos de lembrar
grupos a fim de elaborarem uma atividade para e esquecer, pois é isso a Memória, os atos de
ser implementada com os demais colegas no lembrar e esquecer a partir das evocações do
encontro seguinte. Cada grupo ficou presente (STEPHANOU; BASTOS, 2005,
responsável em elaborar uma proposta p.420)[7].
pedagógica com a perspectiva interdisciplinar
que pudesse ser desenvolvida com alunos da Nessa vertente nos chama atenção um
Educação Básica – Séries Iniciais. fragmento da carta 1:
Nos terceiro e quarto encontros, os grupos
Durante meu processo de escolarização tenho
desenvolveram suas propostas, cada grupo boas lembranças, tanto nas relações aluno-aluno
teve um tempo de 30 minutos para quanto nas que envolvem aluno e professor. Tive
implementar as atividades e ao final das professoras que sempre me incentivaram e me
dinâmicas nos reunimos no grande grupo afim auxiliaram, inclusive muitas delas permaneciam
de compartilharmos as experiências comigo após o término das aulas. Além de
estudar na escola eu refazia os processos em
vivenciadas no decorrer das ações propostas. casa. Não posso esquecer que o apoio que tive na
Reconhecemos que os resultados desta ação escola e em casa ajudaram na minha escolha pela
demandam muitas discussões e por isso, nesse pedagogia. Isso de fato foi muito importante para
artigo apresentaremos algumas compreensões mim, por isso, eu gostaria de transmitir essas
que emergiram a partir da leitura de 12 cartas boas experiências para outras pessoas (CARTA
1).
elaboradas pelos estudantes de Pedagogia
Licenciatura, participantes da ação. Em função
Seguindo por essa via, se por um lado a
das cartas serem anônimas, ou seja, não
Memória se constitui a partir dos atos de
possuirem nenhum tipo de identificação sobre
lembrar e esquecer e se relaciona diretamente
quem as escreveu, estabelecemos uma
com o presente, por outro, o simbólico
cotidificação numérica de 1 a 12. Portanto
(BOURDIEU, 2003)[8] exerce uma força sutil
quando formos utilizar os fragmentos
e, em boa medida, dá a tônica sobre o que deve
discursivos contidos nas referidas cartas
ser lembrado e esquecido. Assim, é cada vez
faremos referência ao número atribuído à
mais difícil desconsiderar a subjetividade
respectiva carta.
inerente a existência humana, para González
Rey [9],
Resultados e Discussão
Após o momento de leitura das 12 cartas e [...] a subjetividade não se internaliza, não é algo
socialização das produções escritas nos que vem de “fora” e que aparece “dentro”, o que
seria uma forma de manter a dualidade em outros
desbruçamos com olhar de pesquisadores(as) termos. Em minha opinião, trata-se de
para o material discursivo, com o intuito de compreender que a subjetividade não é algo que
responder ao nosso objetivo inicial. Então a aparece somente no nível individual, mas que a
partir das memórias escolares, registradas nas própria cultura dentro da qual se constitui o
cartas, buscamos traçar paralelos e verificar se sujeito individual, e da qual é também
constituinte, representa um sistema subjetivo,
foi possível mobilizar, num primeiro gerador de subjetividade (2003, p. 78)[9].
momento, uma consciência interdisciplinar
mesmo se tratando de um tema ainda não tão Além disso, percebemos nesse contexto uma
explorado pelos(as) futuros(as) relação de indissociabilidade entre Memória e
pedagogos(as). Por esses caminhos subjetividade, afinal:
entendemos que:
A memória é o ponto de partida e chegada; ela
A memória é uma espécie de caleidoscópio nos enche de sentido. Recriamos o legado de
composto por vivências, espaços e lugares, gerações e de tantas contribuições significativas
tempos, pessoas, sentimentos, ao conhecimento humano, com os olhos e os
percepções/sensações, objetos, sons e silêncios, filtros de hoje. Neste processo, contracenam o
aromas e sabores, texturas e formas. Movemos individual e o coletivo, o antigo diante do novo
tudo isso incessantemente e a cada movimento e, ao apropriar-se do que ainda é desconhecido,
do caleidoscópio a imagem é diversa, não se revelamos contrastes, semelhanças e diferenças.
573
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
574
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
ainda não se tem um conceito único que defina respeitando e aceitando o tempo e os limites
interdisciplinaridade. dos sujeitos envolvidos. Sendo assim, a
Alguns estudiosos defendem que sejam proposta em desenvolver estratégias
recusadas quaisquer iniciativas que demandem interdisciplinares, poderá suprir as
uma conceituação única para necessidades dos estudantes em aprender o que
interdisciplinaridade por se tratar de uma faça sentido e que de alguma maneira esteja
proposta que inevitavelmente está sendo inserido no contexto da vida. Algo que amplie
construída a partir das culturas disciplinares. sua visão de mundo, visão esta não mais
Além disso, determinar o limite objetivo de sua fragmentada, mas ampla, no sentido de
abrangência conceitual significa conceber a totalidade. Portanto, mais do que formular um
interdisciplinaridade sobre uma ótica também conceito para interdisciplinaridade, buscamos
disciplinar. Desse modo, “a tarefa de procurar compreender seu papel e suas implicações nos
definições finais para a interdisciplinaridade processos de interação e ensino, no âmbito da
não seria algo propriamente interdisciplinar, formação docente.
senão disciplinar”( LEIS, 2005, p.5)[12]. Diante dos desafios de integrar e buscar uma
Pelo fato de não existir uma definição única, articulação dentre a teoria e a prática, é
mas outras possíveis, conforme as experiências necessário um desacomodar de modo que, ao
interdisciplinares vivenciadas no campo do nos inserirmos numa prática interdisciplinar,
conhecimento, acreditamos que a busca por tenhamos a clareza que as dificuldades
definições abstratas deve ser evitada (LEIS, encontradas no caminho da construção do
2005)[12]. No entanto, para o trabalho coletivo exigem uma atitude no
desenvolvimento da proposta apresentada, nos enfretamento de novos desafios.
alicerçamos em alguns conceitos pertinentes A partir das leituras das cartas, percebemos
para o trabalho desenvolvido com docentes em que os participantes, além de dicorrerem sobre
formação inicial e continuada. suas memórias escolares, também comentaram
Nesse sentido, a interdisciplinaridade, sobre o primeiro encontro. Foi notório o
segundo Japiassú (1976, p.74)[13], envolvimento dos participantes com a
“caracteriza-se pela intensidade das trocas discussão sobre interdisciplinaridade,
entre os especialistas e pelo grau de interação conforme pode ser constado no fragmento
real das disciplinas no interior de um mesmo seguinte:
projeto de pesquisa”. Para o autor a
interdisciplinaridade não exclui as disciplinas, […] na aula anterior observamos a importância e
mas as integra possibilitando que os docentes também as dificuldades na interdisciplinaridade,
e o pensar em conjunto, no quanto uma atividade
desenvolvam parcerias com seus colegas de bem elaborada pode ser significativa para os
profissão, em um movimento de diálogo de nossos alunos (CARTA 8).
maneira a estabelecer outras relações aos
conteúdos discutidos em sala de aula. Ainda Nessa perspectivia acreditamos que o pensar
nesse sentido, Fazenda[14] afirma que: interdisciplinar “[...] parte da premissa de que
nenhuma forma de conhecimento é em si
Se definirmos Interdisciplinaridade como junção mesma exaustiva (FAZENDA, 2002,
de disciplinas, cabe pensar currículo apenas na
formatação de sua grade. Porém se definirmos
p.15)[15]. Por isso, a busca por investigar
Interdisciplinaridade como atitude de ousadia e outras fontes do saber colabora no processo de
busca frente ao conhecimento, cabe pensar ensino e aprendizagem, tanto para o professor
aspectos que envolvem a cultura do lugar onde se quanto para o aluno. Logo, ao considerarmos a
formam professores (FAZENDA, 2009, p. história do sujeito e o papel dos docentes na
24)[14].
proposição de situações que favoreçam a
Dessa maneira, o trabalho interdisciplinar vai aprendizagem contextualizada e que o aluno
além do conversar entre as disciplinas, pois, aprende a partir do que é parte de sua realidade,
possibilita diferentes olhares para o mesmo a abordagem interdisciplinar possibilita
contexto, proporcionando que os sujeitos olharmos em diferentes perspectivas,
inseridos nesse espaço tenham a oportunidade promovendo a busca de soluções não mais por
de repensar as propostas dos seus pares um único caminho, mas por outras direções
575
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
chama a atenção o fato de que os sujeitos são, consideramos a importância dos espaços
em boa medida, orientados pelos significados acadêmicos que têm se ocupado em pensar a
que dão aos momentos que vivenciam. escola a partir de concepções que privilegiam
Nesse contexto, diante da riqueza das debates amplos, democráticos e despidos da
conexões exploradas, avistamos promissoras temida insolênica intelectual.
possibilidades a serem desenvolvidas no Certamente, ao congregar e mobilizar
contexto da formação de professores. Nessa reflexões sobre a interdisciplinaridade na
perspectiva acreditamos que as memórias são educação básica, as distâncias entre
reveladoras das cosntruções subjetivas dos universidade e escola são encurtadas e a
indivíduos, a recuperação de eventos nos ciência ganha novo vigor em uma dinâmica
fornecem valiosas pistas sobre a complexidade que busca permanentemente a reinvenção dos
dos elementos que integram personalidades. sentidos. Nessa direção temos acreditado que
Nessa dimensão, o conjunto de convicções e nas discussões interdisciplinares reside a
de comportamentos assumidos pelos potencialidade de conglutinar a multiplicidade
futuros(as) pedagogos(as) têm ligação direta da ciência.
com experiências pretéritas por eles(as) Nessa concepção e a partir das leituras e
vivenciadas. Uma das convicções que emerge análise do material discursivo fornecido nas
ao lermos as cartas é de que a escolha pela cartas, percebemos que mesmo já existinto
docência, na grande maioria dos casos, esteve muitas pesquisas desenvolvidas na área da
ligada às memórias escolares dos sujeitos. interdisciplinaridade e sendo este assunto
Seguindo na trilha de nossas compreensões, bastante discutido, ainda é necessário uma
sobre o foco deste trabalho, foi possível formação docente que possibilite um
perceber a fecundidade da abertura de vias de aprendizado com foco na interdisciplinaridade.
diálogos. Esses por sua vez, foram capazes de Assim, acreditamos estar buscando caminhos
reunir a multiplicidade de olhares e estabelecer alternativos e em direção contrária aos
conexões entre diferentes perspectivas para obsoletos rumos pretendidos por um
pensar interdisciplinaridade no âmbito da paradigma cuja principal marca é a
Educação Básica-Séries Iniciais. fragmentação do conhecimento.
Em relação à interdisciplinaridade foi No entanto, consideramos ser necessário que
possível perceber ao longo das escritas que ao os(as) futuros(as) pedagogos(as) busquem ser
convidarmos os participantes a relembrarem profissionais capazes de desenvolver uma
suas memórias relacionadas ao cotidiano visão sistêmica da realidade, sabendo que
escolar, alguns deles encontraram entre suas apenas o conhecimento de sua área de
lembranças experiências que divergiam de um formação não é suficiente para responder às
paradgma predominante e fragmentador. necessidades da contemporaneidade, relativas
Justamente nesses casos que as memórias de ao processo de ensino e aprendizagem. Desse
boas experiências estavam relacionadas com modo, é necessário estarmos dispostos a
práticas interdisciplinares. Portanto, foram vencer desafios em busca de uma constante
justamente os momentos significativos formação.
vivenciados pelos participantes que vieram a Por esses rumos, temos entendido que pensar
tona nas discussões e escrita das cartas. Assim, interdisciplinaridade passa pela constituição,
pensamos que práticas interdisciplinares manutenção e aperfeiçoamento de canais de
estiveram relacionadas com experiências diálogo entre diferentes campos disciplinares.
positivas que, por sua vez, constituiram-se Além disso, entendemos que a possibilidade de
significativas no processo de ensino e aprimorar, redimensionar e ampliar saberes
aprendizagem, bem como na escolha pela não pode estar contida numa dinâmica que de
Pedagogia Licenciatura. certa forma fraciona e limita o aprendizado.
Nesse viés é inegável a contribuição que os Desse modo, precisamos estar atentos a velha
estudos interdisciplinares têm prestado para tendência de separar o discurso da prática, ou
seguirmos ampliando a rede de cinergias que seja, não basta colher e propor renovações para
se originam das aproximações horizontais o ensino no campo das ideias, muito embora
entre escolas e universidades. Portanto, seja nessa direção que despontem os
577
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
b
Doutora em Educação/Centro de Artes/Universidade Federal de Pelotas, maristaniz@hotmail.com
RESUMO
O presente trabalho é parte integrante da pesquisa de dissertação de Mestrado em Educação pela
Universidade Federal de Pelotas e tem o objetivo de discutir as diversas possibilidades que as
tecnologias digitais possibilitam à prática docente. O procedimento metodológico para esta
investigação se baseou no estudo de caso, e analisou um grupo da rede social Facebook, formado por
alunos e professores de uma turma de ensino médio, a fim de averiguar se o meio digital é um espaço
possível de desenvolver novas práticas docentes. Nas últimas décadas a sociedade em rede construiu
uma linguagem que originou relacionamentos através das redes de computação, formando o
ciberespaço, que compreende um espaço de comunicação virtual constituído pelas chamadas
comunidades virtuais. Desta forma, um novo tipo de comunidade emerge da sociedade informatizada,
unindo sujeitos que, mesmo em estando em diferentes territórios geográficos, reúnem-se e interagem
no espaço eletrônico, o ciberespaço, através de conferências permeadas pelas tecnologias digitais. A
partir deste viés, foi possível averiguar que a comunicação realizada através de ambientes virtuais
pode ser amplamente utilizada, constituindo-se um meio colaborativo e inovador para a educação.
Palavras chave: Educação, Facebook, Prática Docente, Tecnologias Digitais.
ABSTRACT
The present work is an integral part of the dissertation research of Master in Education by the Federal
University of Pelotas and aims to discuss the various possibilities that digital technologies make
possible to the teaching practice. The methodological procedure for this research was based on the
case study, and analyzed a group of the social network Facebook, formed by students and teachers of
a high school class, in order to ascertain if the digital medium is a possible space to develop new
practices teachers In the last decades the network society has built a language that originated
relationships through the computer networks, forming the cyberspace, which comprises a virtual
communication space constituted by the so-called virtual communities. In this way, a new type of
community emerges from the computerized society, uniting subjects that, even when they are in
different geographic territories meet and interact in the electronic space, cyberspace, through
conferences permeated by digital technologies. From this bias, it was possible to verify that
communication through virtual environments can be widely used, constituting a collaborative and
innovative means for education.
Keywords: Education, Facebook, Teaching Practice, Digital Technologies.
579
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
rigidez do sistema, ajuda a abrir a mente, pois através das TIC configura-se pelo enfoque
as crianças podem aprender, com um método pedagógico que reproduz e reitera conteúdos,
mais rápido e igualmente eficiente em que o professor repassa aos alunos o
[FUNDACIÓN TELEFÓNICA, 2014]. conhecimento adquirido da mesma forma que
recebeu, e o aluno, por sua vez, recebe as
A partir disto surge o questionamento se os
informações para memorizá-las, realizar
professores podem ser substituídos pela
tarefas e trabalhos reproduzindo o que viu em
máquina, pois nas regiões visitadas pelo
sala de aula [ALVES, 2014].
pesquisador não existem professores
capacitados tecnologicamente. Para Mitra, o No ensino através da comunicação com as
ato de colocar uma criança na frente de um TIC, o mesmo se dá pelo diálogo do professor
computador não irá resolver os problemas de com seus alunos, neste processo, o uso das
aprendizagem, mas irá melhorar diversas tecnologias se dão não apenas pelos recursos
situações. E quanto à figura dos professores ela do ambiente escolar, mas também através dos
ainda é essencial, pois é este profissional que meios que os estudantes têm acesso.
estimulará a curiosidade das crianças, com Um desses meios de ensino comunicacional
perguntas, mediando e aglutinando o resultado com as TIC seria o uso do site de rede social
das pesquisas dos estudantes, apresentando-as Facebook como ferramenta pedagógica.
de forma mais clara.
Alves [2014] considera que os professores,
Em virtude disto, corroborando com esta através desse meio, conseguem estabelecer um
ideia de estímulo presente no trabalho docente, bom processo comunicacional para amplificar
Alves [2014], em sua tese de doutorado, a comunicação no tempo e no espaço entre
analisou a prática de professores que usam as professor e alunos.
TIC38 em sala de aula de cursos superiores na
Universidade Federal de Pelotas. A autora Bezerra e Brito [2013, p. 4] destacam que:
destaca que utilizar as tecnologias no ensino O Facebook ajuda professores a se conectarem
presencial classifica a prática em três com seus alunos, enviando tarefas referentes às
situações: ensino tradicional com TIC, ensino aulas pela rede, criando eventos, postando links
comunicacional com TIC, e ensino em úteis e outras atividades fora da sala de aula. Os
alunos podem usar Facebook para entrar em
ambiente colaborativo com TIC. contato com colegas sobre questões relativas a
A simples inserção de tecnologias no ensino, exercícios de classe ou provas, bem como
colaborar em tarefas e projetos de grupo em um
não garante benefícios na aprendizagem, pois ambiente online.
é preciso estabelecer uma comunicação dentro
destes ambientes para que o ensino seja Outra situação da prática pedagógica com o
efetivo. uso das TIC é o ensino em ambientes
colaborativos que possibilitem a troca entre os
Borba [2009] afirma que simplesmente indivíduos com vistas à construção do
adotar o uso das TIC como vídeos didáticos, conhecimento.
laboratórios de Informática e de projetores
multimídias, em sala de aula configura-se A formação em ambientes colaborativos,
apenas uma ferramenta e não o ensino através segundo Porto [2003], proporciona elementos
das mesmas. Assim, estes aparatos: importantes para novas práticas e formas de se
relacionar, estimulando vivências
São utilizados somente como ferramentas, não
sendo explorados como elementos integrados ao diversificadas.
processo de ensino e aprendizagem. A restrição Neste sentido, observa-se que aprendizagem
do uso apenas como meros equipamentos não
permite que sejam utilizados para ajudar a
é mais significativa quando valoriza a
transformar a educação, para inovar [BORBA, proposição de conteúdos de forma
2009, p.167]. diferenciada, altera as concepções tradicionais
de ensino que privilegiam a memorização e
Dentro deste contexto, o ensino tradicional
38
Tecnologias da Informação e Comunicação
581
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
Resultados e discussão
Para este recorte de investigação, serão
apresentadas as considerações feitas em
relação ao objeto observado, sendo o grupo da
rede social Facebook intitulado “Meio
Ambiente – 107”. O grupo foi formado pelos
22 alunos da turma de primeiro ano do ensino
médio técnico, que se articularam entre si para
promover a comunicação entre eles mesmos e
ter um contato com os 14 professores quando
fosse necessário.
Como docente desta turma foi possível
perceber que a interação dentro deste
ambiente se dava além de uma comunicação
de recados e informações, sendo que o meio
era usado de forma muito mais intensa e com
trocas que iam além de meros recados e
informações sobre datas de provas, por
Figura 1. Convite para evento ligado ao Meio
exemplo. Ambiente. Fonte: www.facebook.com/groups, 2015.
Assim, as observações das postagens A postagem abaixo, com data de 22 de
ocorreram no período de janeiro a agosto de fevereiro de 2015, mostra uma das mais
2015, resultando em uma coleta de 33 print recorrentes formas de utilização, com o aviso
screens39, escolhidos para análise de um total sobre provas e trabalhos a serem entregues.
de 55 postagens dentro do grupo neste Consegue-se visualizar que, dos 36 membros
período. do grupo, 34 viram a mensagem. Não houve
Os prints salvos como fotos formaram os comentários na postagem.
arquivos que, após uma análise, apresentam de
39
O Print Screen é uma tecla comum nos teclados de Microsoft Paint, que já vem instalado no Windows, ou
computador. No Windows, quando a tecla é em outros programas, como o Microsoft PowerPoint
pressionada, captura em forma de imagem tudo o que (licenciado pela Microsoft). Se quiser capturar somente
está presente na tela (exceto o ponteiro do mouse e a tela do programa ativo utilize simultaneamente o "Alt
vídeos) e copia para a Área de Transferência. Para salvar + Print Screen".
seu conteúdo, basta abrir algum programa que suporte
imagens e pressionar "Ctrl + V"(colar), como o
582
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
583
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
A imagem 5 destaca duas postagens nas quais A figura 7 mostra uma postagem com um link
são compartilhados vídeos do YouTube40 com em que consta uma carta escrita em 2070, de
aulas dos conteúdos de química e física que forma ficcional, publicada em abril de 2002 na
uma/um colega, postou destacando o caráter revista "Crônicas de Los Tiempos", na qual o
explicativo e possibilitando o acesso aos autor da carta conta como estaria o mundo
interessados no assunto. naquele ano. Nesta carta, está o destaque para
o cuidado com o meio ambiente negligenciado
A postagem contabilizou 34 visualizações,
pela humanidade. A postagem, destaca a
cinco comentários com inserção de outros
preocupação que os alunos demonstram com o
vídeos em relação ao assunto destacado.
meio ambiente e o interesse pelo curso técnico
Reflete-se aqui uma das várias formas que o
escolhido. Ainda na mesma imagem, mais uma
espaço virtual possibilita na interação e troca
postagem com material e conteúdo para a
de informações e também de aprendizagem
prova, postado por um professor/professora da
dos membros do grupo.
turma.
40
YouTube é um site de compartilhamento de vídeos “youtube” poderia ser “você transmite” ou “canal feito
enviados pelos usuários através da internet. O termo por você”.
vem do Inglês “you” que significa “você” e “tube” que
significa “tubo” ou “canal”, mas é usado na gíria para
designar “televisão”. Portanto, o significado do termo
584
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
41
muitos inesgotáveis. Nesse evento, que ficou conhecido
O Dia Mundial da Água foi criado pela ONU como Conferência de Estocolmo, iniciou-se uma
(Organização das Nações Unidas) no dia 22 de março de mudança no modo de ver as questões ambientais ao
1992, divulgando também a Declaração Universal dos redor do mundo, além se serem estabelecidos princípios
Direitos da Água. Este dia é destinado à discussão sobre para orientar a política ambiental em todo o planeta.
os diversos temas relacionadas deste importante bem
natural, tendo como objetivo conscientizar a população 42
Consciência Coletiva: Forma padronizada de
mundial sobre o cuidado que se deve ter, elaborando
conduta e pensamento, é o conjunto de crenças e dos
medidas para diminuir a ação predatória do homem com
sentimentos comuns dos membros de uma mesma
a poluição e despertar a consciência ecológica da
sociedade, forma um sistema determinado com vida
sociedade. Outro fato importante ocorreu durante a
própria (COSTA, 2005).
Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente,
em 1972, em Estocolmo, onde a ONU instituiu o Dia 43
Émile Dürkheim (1858-1917) Nasceu em Epinal,
Mundial do Meio Ambiente, que passou a ser na Alsácia – França, considerado um dos autores da
comemorado em 05 de junho. Tendo como objetivo Sociologia Clássica.
chamar a atenção da população para os problemas
ambientais e para a importância da preservação dos
recursos naturais, até que então eram considerados, por
585
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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como professores. Além disso, tutoriais do possa ter clareza sobre o objeto a que se dispôs
YouTube para auxílio na aprendizagem de a observar e entrevistar.
conteúdos foram frequentes. Assim, o Diante desta perspectiva qualitativa para o
ambiente virtual é bastante utilizado para presente trabalho, a forma metodológica
recados entre os próprios alunos e professores, utilizada para o estudo deste problema de
constituindo um meio de compartilhamento de pesquisa foi o estudo de caso. Apesar de
material de conteúdos vistos e trabalhados em existirem contestações sobre a rigorosidade do
aula assim como também material método de estudo de caso, é uma maneira de
complementar das disciplinas. pesquisa bastante utilizada nas ciências sociais
e humanas, assim como também em educação
(YIN, 2005).
Metodologia de Pesquisa
Em educação, os estudos de caso
Fragoso, Recuero e Amaral (2015, p. 115- aparecem em manuais de metodologia de
116) destacam que estudos baseados em pesquisa das décadas de 60 e 70, mas com
Análise de Redes Sociais (ARS) partem de um sentido muito estrito: estudo
princípios que estudam as estruturas descritivo de uma unidade seja ela uma
escola, um professor, um grupo de alunos,
decorrentes das ações e interações entre os uma sala de aula (ANDRÉ, 2008, p.14).
atores sociais, sendo possível compreender
elementos e generalizações a respeito desses O estudo de caso, conforme sua denominação
grupos. Desse modo, os estudos das redes propõe, é uma forma de pesquisar uma
sociais são retomados quando surgem os situação específica, um fenômeno particular,
SRS. Além disso, essas interações sociais para a compreensão de uma determinada
características da Internet geram novas relação de causa e efeito. “Um caso é sempre
possibilidades de estudo desses grupos sociais. uma unidade individual: pode ser uma pessoa,
um grupo, ou uma situação específica. Trata-
O site de rede social Facebook proporciona se de uma estratégia adequada quando o
aos seus usuários uma forma de participação e fenômeno de estudo relaciona-se a uma
formação de comunidades em grupos, e a partir situação cotidiana comum (MALHEIROS,
desta característica, uma das turmas do 2011, p. 94).
primeiro ano do Ensino Médio do curso
técnico, formou um grupo no qual participam Essa forma de pesquisa possui suas
todos os alunos e os professores. características próprias, e uma delas, a
descrição, que significa o detalhamento
A partir de uma pesquisa exploratória e completo e exato da circunstância investigada.
bibliográfica em relação ao tema proposto, “A heurística significa que os estudos de caso
como pesquisas, artigos e livros pertinentes ao iluminam a compreensão do leitor sobre o
tema de estudo, buscou-se um método de fenômeno estudado, podem revelar a
pesquisa para este problema. descoberta de novos significados, estender a
Para Fragoso, Recuero e Amaral (2015) ao experiência do leitor ou confirmar o já
analisar um site de rede social é preciso conhecido” (ANDRÉ, 2008, p.18).
selecionar os atores, que podem ser indivíduos, Quanto a coleta de dados, é importante
instituições ou grupos. destacar que os dados que foram apresentados
Desta forma, classificação desta pesquisa foi neste trabalho são uma amostragem de todas as
do tipo básica, pois não buscou uma solução postagens analisadas, para que assim seja
para problemas práticos, pelo contrário, poderá possível entender a amplitude do que foi
ser usada como fonte de geração de novos analisado.
conhecimentos. Malheiros (2011) destaca que a coleta de
Para este estudo foi usado o método dados é um processo que pressupõe precisão
qualitativo de pesquisa, por ser um método no trabalho do pesquisador.
que, ao utilizar a observação e a entrevista para
a coleta de dados, possibilita que o pesquisador
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RESUMO
O estudo tem como foco a obrigatoriedade do artigo 26-A da LDB, especialmente nos currículos das
Licenciaturas da UFPel e da Unipampa à luz de uma Pedagogia Triangular. A primeira parte traça o
mapa dos Projetos Pedagógicos dos Cursos (PPCs) e dos Componentes Curriculares de diversos
Cursos de Licenciaturas. No caso, os resultados iniciais salientam que, nos PPCs, só existe um
comentário, um tanto vago, a respeito da obrigatoriedade desse conteúdo relacionado à história e às
culturas afro-brasileira e indígena. Na verdade, não existe qualquer análise indicadora da fecundidade
em relação ao tema, considerando que nem todos os cursos possuem disciplinas sobre a cultura
africana ou indígena. No caso da UFPel, há cursos que oferecem a disciplina como obrigatória. O
segundo aspecto remete a um aspecto epistemológico da questão, ultrapassando os limites da simples
legalidade. Ou seja, apesar do âmbito legal da LDB, a prática exige um horizonte teórico capaz de
justificar o tema. Frente a isso, acredita-se que a noção de uma Pedagogia Triangular pode suprir essa
lacuna. Nesse sentido, os cursos podem organizar seus Componentes Curriculares comtemplando a
história e cultura afro-brasileira e indígena, concebida no horizonte das originalidades de uma
triangularidade afro-ibérica e ameríndia.
Palavras chave: Currículo, Licenciaturas, LDB, Pedagogia Triangular.
ABSTRACT
The study focuses on the obligation of article 26-A of the LDB: Law of directives and bases of the
national education, especially in the curricula of the degrees if universities: UFPel and Unipampa on
the light of a Triangular Pedagogy. The first part traces the map of the Pedagogical Projects of the
Courses (PPCs) and the Curricular Components of several Courses to Teacher`s Formation. In the
case, the initial results point out, at in the PPCs, there is only a somewhat vague comment about the
obligatory nature of this content related to Afro-Brazilian and indigenous history and cultures. In fact,
there is no analysis of fecundity in relation to the subject, considering that not all courses have subjects
on African or indigenous culture. In the case of the UFPel, there are courses that offer the discipline
as compulsory part of the academic curriculum. The second aspect refers to an epistemological aspect
of the question, extrapolating limits of mere legality. That is, despite the legal scope in the LDB, the
practice requires a theoretical horizon capable of justifying the theme. Against this, it is believed that
the notion of Triangular Pedagogy can fill this vacuum. In this sense, the university courses can
organize their Curricular Components by examining afro-brazilian and indigenous history and
culture, idealized in the horizon of the originalities of Afro-Iberian and Amerindian triangularity.
Keywords: Curriculum, Degrees, LDB, Triangular Pedgogy.
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Nessa concepção, para este trabalho, foi [...] conteúdos específicos da respectiva área do
realizado uma análise documental em conhecimento ou interdisciplinares, seus
fundamentos e metodologias, bem como
diferentes Diretrizes Curriculares: para conteúdos relacionados aos fundamentos da
Formação de Professores da Educação Básica, educação, formação na área de políticas públicas
para a Educação das Relações Étnico-Raciais e e gestão da educação, seus fundamentos e
para o Ensino de História e Cultura Afro- metodologias, direitos humanos, diversidades
Brasileira e Africana e as Diretrizes das étnico-racial, de gênero, sexual, religiosa, de
faixa geracional, Língua Brasileira de Sinais
Licenciaturas em História, Letras – Português (Libras), educação especial e direitos
e Pedagogia. Tal investigação é para saber educacionais de adolescentes e jovens em
como estas diretrizes tratam a obrigatoriedade cumprimento de medidas socioeducativas
do estudo da história e cultura afro-brasileira e (BRASIL, 2015).
indígena.
As Diretrizes Curriculares Nacionais É possível destacar que os professores
instituem princípios, fundamentos e precisam conhecer muitas temáticas e
procedimentos a serem observados nas dificilmente consegue trabalhar com tantas
políticas, na gestão e no programa dos cursos questões. Entretanto, desenvolver no currículo
de graduação. Como também, no as diversidades étnico-racial, é um desafio para
planejamento, nos processos de avaliação e na aproximar histórias e culturas que fazem parte
regulação das instituições (BRASIL, 2015). do Brasil. Em vista disso, a LDB, em seu inciso
Em virtude dessas diretrizes, percebe-se que 1º do Art. 26-A determina que no conteúdo
na Resolução Nº 2, que constitui as Diretrizes programático inclua:
Curriculares Nacionais para a formação inicial
em nível superior e para a formação
[...] diversos aspectos da história e da cultura que
continuada, aplicam-se à formação de caracterizam a formação da população brasileira,
professores para o exercício da docência, em [...], tais como o estudo da história da África e
seu Art. 2, os professores estarão habilitados: dos africanos, a luta dos negros e dos povos
indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena
brasileira e o negro e o índio na formação da
[...] na educação infantil, no ensino fundamental, sociedade nacional, resgatando a suas
no ensino médio e nas respectivas modalidades contribuições nas áreas sociais, econômicas e
de educação (Educação de Jovens e Adultos, políticas, pertencentes à história do Brasil
Educação Especial, Educação Profissional e (BRASIL, 1996).
Tecnológica, Educação do Campo, Educação
Escolar Indígena, Educação a Distância e
Educação Escolar Quilombola) (BRASIL, Estas deliberações foram sancionadas pela
2015). Lei nº 10.639/03 que altera a LDB. Tal Lei
instituiu a obrigatoriedade do ensino da
História da África e dos africanos no currículo
Valendo-se dessas especificidades, essa
escolar do ensino fundamental e médio
Resolução apresenta os princípios que
(BRASIL, 2003). Tomando-se como base essa
norteiam a formação inicial e continuada dos
Lei, foi designado a Resolução Nº 1 em 2004,
docentes. Entretanto, ao analisar os artigos,
a qual constitui as Diretrizes Curriculares
incisos e itens, quando se trata da educação da
Nacionais para a Educação das Relações
diversidade étnico-racial ou das culturas
Étnico-Raciais e para o Ensino de História e
indígenas e quilombolas, são colocados de
Cultura Afro-Brasileira e Africana.
forma geral. Os temas não contemplam muitas
explicações ou referências. Desse jeito, as diretrizes são consideradas
dimensões normativas, reguladoras de
Em termos de estrutura e currículo para
caminhos. Essas diretrizes não visam ações
formação inicial do magistério da Educação
uniformes, mas objetivam oferecer referências
Básica, o inciso 2 do Art. 13 resolve o que os
e critérios para que se possam tornarem-se em
cursos deverão garantir nos currículos:
práticas pedagógicas (BRASIL, 2004). Dessa
maneira, essa Resolução pode, por exemplo,
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
orientar as licenciaturas para organizarem em História. A única menção é que se deveria estar
seu Componentes Curriculares, disciplinas que mais presente a História da África Negra
abordem a história e cultura afro-brasileira. (BRASIL, 2001). Entretanto, na Resolução
Assim como determina o inciso 1º do Art. 1 da CNE/CP Nº1, de 15 de maio de 2006, que
Resolução Nº 1 de 2004: institui as Diretrizes Curriculares Nacionais
para o Curso de Graduação em Pedagogia,
licenciatura, o estudo da história e cultura afro-
As Instituições de Ensino Superior incluirão nos brasileira e indígena está presente no decorrer
conteúdos de disciplinas e atividades curriculares
dos cursos que ministram, a Educação das
da Resolução.
Relações Étnico-Raciais, bem como o tratamento Nesta Resolução, o inciso 2º do Art. 2 destaca
de questões e temáticas que dizem respeito aos que a docência se compreende como ação
afrodescendentes.
educativa e processo pedagógico metódico e
intencional, construído em relações sociais,
Esta determinação faz parte da Lei Nº 11.645, étnico-raciais e produtivas, as quais
de 10 de março de 2008, que altera a LDB ao influenciam conceitos, princípios e objetivos
incluir a obrigatoriedade do estudo, além da da Pedagogia. O egresso do curso de
história e cultura afro-brasileira, o estudo da Pedagogia deve:
história e cultura indígena. Assim como,
institui que:
[...] identificar problemas socioculturais e
educacionais com postura investigativa,
integrativa e propositiva em face de realidades
Os conteúdos referentes à história e a cultura
complexas, com vistas a contribuir para
afro-brasileira e dos povos indígenas brasileiros
superação de exclusões sociais, étnico-raciais,
serão ministrados no âmbito de todo o currículo econômicas, culturais, religiosas, políticas, e
escolar, em especial nas áreas de educação outras (BRASIL, 2006).
artística e de literatura e história brasileiras
(BRASIL, 2008).
Desse modo, como está escrito neste excerto,
Valendo-se das alterações contidas na Lei de a Resolução aborda as questões do estudo da
Diretrizes e Bases, este trabalho teve por história e cultura afro-brasileira e indígena. No
finalidade averiguar como as diretrizes entanto, os itens explicam de forma geral. Não
curriculares tratam a obrigatoriedade do estudo há artigos ou incisos específicos que tratem a
da história e cultura afro-brasileira e indígena. obrigatoriedade do Art. 26-A da LDB.
Em vista disso, foram analisados também as Nessa concepção, a teoria da Pedagogia
Diretrizes Curriculares das Licenciaturas em Triangular pode indicar possibilidades para os
História, Letras e Pedagogia. Componentes Curriculares das licenciaturas,
Ao estudar os documentos, compreende-se contribuindo para uma geo e
que, por exemplo, nas Diretrizes Curriculares interculturalidade. Assim, sugerir o
para o curso de Letras, não existe um artigo desenvolvimento de práticas pedagógicas que
especifico tratando sobre a temática do estudo estejam abertas para a diversidade. Dessa
da história e cultura afro-brasileira e indígena. maneira, na continuação, será desenvolvida a
Também tem que ser considerado que o estrutura conceitual da Pedagogia Triangular.
Parecer é do ano de 2001, antes das alterações
da LDB. No Parecer, há somente uma
deliberação de que “os cursos de licenciaturas Pedagogia triangular
deverão ser orientados também pelas O presente artigo teve como objetivo estudar
Diretrizes para a Formação Inicial de a obrigatoriedade inerente ao Artigo 26-A da
Professores da Educação Básica em cursos de LDB no horizonte dos currículos das
nível superior” (BRASIL, 2001). licenciaturas da UFPel e da Unipampa à luz de
uma Pedagogia Triangular. Em vista das
Neste mesmo Parecer, é definido as
concepções das Dirterizes Curriculares
Diretrizes Curriculares para o curso de
Nacionais no que se referem ao estudo da
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RESUMO
Os estudos acerca da avaliação da aprendizagem têm contemplado diversos aspectos e fatores que
incidem na atividade docente. Objetivando investigar e compreender os elementos associados à
questão da avaliação praticada na escola, examinamos a produção científica relacionada à base de
dados do SciELO sobre a avaliação da aprendizagem, manuseando como procedimento metodológico
o estudo do Estado da Arte. Este tipo de pesquisa tem um caráter bibliográfico, que tem como desafio
mapear e discutir as produções acadêmicas, como dissertações de mestrado, teses de doutorado,
publicações em periódicos e comunicações em anais de congressos e de seminários, de diferentes
campos do conhecimento, tendo como objetivo tentar responder que aspectos e dimensões vêm sendo
destacados e privilegiados, em diferentes épocas e lugares e de que formas e condições elas são
produzidas. Essa metodologia nos permite analisar que produções foram realizadas acerca da
avaliação educacional em relação à aprendizagem do aluno, pois potencializa a compreensão do
problema não pela via da fragmentação, mas da reintegração dos saberes. Ou seja, aproxima-se de
uma visão complexa da avaliação da aprendizagem, institucional e educacional, na interação da
avaliação com os sujeitos do processo avaliativo.
Palavras chave: avaliação, estado da arte, professor, aluno
RESUMEN
Los estudios sobre la evaluación del aprendizaje han contemplado diversos aspectos y factores que
inciden en la actividad docente. Con el objetivo de investigar y comprender los elementos asociados
a la cuestión de la evaluación practicada en la escuela, examinamos la producción científica
relacionada a la base de datos del SciELO sobre la evaluación del aprendizaje, manejando como
procedimiento metodológico el estudio del Estado del Arte. Este análisis permite analizar la
evaluación del aprendizaje en relación al aprendizaje del alumno, pues ésta desarolla la comprensión
del problema no por la vía de la fragmentación, sino de la reintegración de los saberes. Es decir que,
se aproxima a una visión compleja de la evaluación del aprendizaje, institucional y educacional, en
la interacción de la evaluación con los sujetos del proceso evaluativo.
Palabras-clave: evaluación, estado del arte, alumno, profesor
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assim, foram escolhidos para leitura 09 artigos, diferentes entendimentos sobre avaliação da
que traziam nas palavras-chave termos aprendizagem, avaliação escolar, a prática
relacionados aos descritores selecionados para avaliativa do professor e a avaliação praticada
analise. na escola.
Tabela 2. Artigos lidos na íntegra
Título Autor Ano Concepções de Avaliação (Aprendizagem,
O Futuro Das Políticas De Nikel Brooke 2006 Escolar e Institucional) na Prática Docente
Responsabilização Educacional No
Brasil. A origem da palavra avaliar é originária do
Qual Pedagogia Para Aos Alunos Em Marcel Crahay 2007
Dificuldade Escolar latim e provém da composição a - valere, que
Da Avaliação Da Aprendizagem À Mara Regina 2009 significa “dar valor a...” [LUCKESI, 2000].
Avaliação Institucional: Lemes Sordi e
Aprendizagens Necessárias. Menga Ludke, Sob o olhar educativo, avaliar se refere a
A Avaliação Da Aprendizagem Como Ana Lúcia Gomes 2009
Um Ato Amoroso: O Que O Professor Cavalcanti; “[…] processos de construção de sentidos e
Pratica?. Aquino Neto e conhecimentos sobre sujeitos, objetos ou
Josefa De Lima
Fernandes coisas, atividades e instituições, colocados em
Avaliação Do Aprendizado Discente: Wagner Bandeira 2012 relação educativa ou profissional durante
Estudo Com Professores De Escolas Andriola
Públicas. determinado período de tempo.” [LEITE apud
Avaliação Educacional E Modelos De Maria Eugénia 2012 MOROSINI, 2006, p.461]
Valor Acrescentado: Tópicos De Ferrao
Reflexão. A avaliação da aprendizagem como processo
Sistema Nacional De Educação Básica: Carlos Augusto 2002
Nó Da Avaliação? Abicalil deve buscar a inclusão e não a exclusão dos
Da Avaliação Da Aprendizagem À Mara Regina 2015 educandos. Portanto, o professor ao avaliar o
Avaliação Institucional: Lemes Sordi e
Aprendizagens Necessárias. Menga Ludke aluno, deve levantar dados, analisá-los e
Avaliação do ensino: modelo de análise
Arnaldo Lemos 2016 sintetizá-los, de forma objetiva, possibilitando
Filho
da série histórica de resultados o diagnóstico dos fatores que interferem no
b
Fonte: Elaborada pela Autora
resultado da aprendizagem [LIBÂNEO, 1994].
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possibilitem ajudar o aluno a prosseguir individuais. Ele afirma que essas avaliações
sempre [HOFFMANN, 1993]. são preocupadas exclusivamente com o
aumento de índices, estruturadas por
Portanto [Luckesi,2005] com base no que
metodologias aplicadas para produção de
caracteriza a avaliação da aprendizagem e na
medidas, desenvolvidas a partir de provas e
observação do que acontece nos nossos
testes padrões, com o único objetivo de medir
sistemas escolares, podemos considerar que, o
e classificar o desempenho de alguém ou de
que se pratica não é avaliação e sim exames,
alguma instituição.
uma vez que as dificuldades apresentadas
pelos alunos não são diagnosticadas para Partindo destas políticas neoliberais as
subsidiar uma intervenção adequada, mas são avaliações externas geram inúmeros relatórios
classificadas, tendo em vista a aprovação ou a e estatísticas que informam sobre a eficácia das
reprovação. Para o autor, “a prática do exame, escolas. Um conjunto de medidas [quase
devido a operar com os recursos de sempre ligadas ao desempenho dos alunos] é
aprovação/reprovação, obrigatoriamente produzido com a pretensão de informar, de
conduz à política da reprovação, que tem se modo comparativo e classificatório, como se
manifestado como o mais consistente álibi para distribuem as escolas no cenário educacional e,
o fracasso escolar” [LUCKESI, 2005, p. 19]. a partir destes dados, o processo de definição
de políticas públicas acontece e informa a
A avaliação influencia diretamente a
sociedade e o mercado concentram as ilhas de
aprendizagem do aluno sempre que for
excelência educacional
colocada com o intuito de classificar, julgar e
excluir. Avaliar não é somente constatar ou Os autores do artigo observaram que os
examinar, mas, sim analisar, interpretar, tomar resultados das avaliações externas têm
decisões e reorganizar o ensino [Silva, 2002] definido políticas públicas e as prioridades no
sempre com caráter continuo, buscando processo de alocação de verbas, via ranque
identificar e diagnosticar as dificuldades amento de escolas, professores, alunos, de
encontradas pelos alunos proporcionando ao forma descontextualizada. Tendem a ser
professor situações para que estas dificuldades reforçadores da cultura da “avaliação-medida”
sejam superadas. centrada e sujeita a recompensas e punições.
Isso reforça a postura defensiva frente à
O artigo de Dias [2017] trás para discussão
avaliação, pois os professores ressentem-se
aspectos da avaliação educacional e sua
dos resultados que, direta ou indiretamente,
preocupação com as avaliações externas.
Avaliação educacional: refere-se a objetivos apontam-nos como responsáveis pelo fraco
desempenho dos alunos nos exames de
educacionais e como eles são efetivamente
proficiência .
atingidos. A avaliação indica o grau que as
tarefas e metas traçadas foram atingidas, Os estudos de Sordi e Ludke [2009] tecem
levando em conta todo o processo, e qual uma análise da avaliação como um dos saberes
impacto o resultado obteve, associando o essenciais para a prática docente conceituando
sucesso ou insucesso dos resultados avaliação institucional participativa e
alcançados [DIAS, 2017]. avaliação da aprendizagem.
A avaliação educacional apresenta duas A avaliação é uma categoria construtiva do
realidades: a primeira é que ela acontece num trabalho pedagógico, desvendar seu modo
contexto político, pois tem como objetivo dentro e fora da sala de aula e da escola é um
emitir um parecer dos resultados, para uma mal necessário. Ela pode ser classificada em:
possível tomada de decisão, podendo ou não, institucional, educacional e da aprendizagem
legitimar programas ou produções; e a A avaliação institucional esta ligada a fatores
segunda, implica na melhoria do processo que vão além dos muros escolares, que não
educacional. podem ser esquecidos, como os processos de
Portanto Dias [2017] percebe um grande aprendizagem dos alunos, a partir do momento
aumento das avaliações externas nos últimos que trás para discussão situações
anos, tanto as institucionais como as problematizadoras da sala de aula,
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AIP – Avaliação Institucional Participativa
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
Avaliar é julgar algo ou alguém quanto ao seu memorização dos conteúdos, pelo uso
valor. Avalia-se a ação por tudo que a excessivo do livro didático, pelo
concretiza – as ideias e conceitos, os meios, os desenvolvimento dos conteúdos extremamente
instrumentos, os programas, os desempenhos e teóricos, pela utilização descontextualizada e
os resultados. Não é mera ação executora, mas estereotipada dos instrumentos de avaliação e
uma nova reflexão sobre a ação para reordenar que tem como objetivo conferir se os alunos
o processo. Por isso as dinâmicas avaliativas foram capazes de reproduzir o que foi dado em
pertencem muito mais ao durante do que ao sala de aula [RABELO, 2010].
após. A concepção tradicional de educação esta
Avançamos, passo a passo é fato, mas neste diretamente ligada à avaliação classificatória,
caminhar obtivemos conquistas importantes, que avalia todos os alunos de uma mesma
como a redução da repetência e da evasão forma, igualmente, como se todos os
escolar nos últimos anos. Relatos de escolas e envolvidos no processo pensassem e se
professores que tem apostado em ensaios da comportassem da mesma forma,
avaliação mediadora, que acabam gerando desconsiderando o desenvolvimento integral
reflexões, ações e mudanças que contribuem dos estudantes e de suas habilidades. Esta
para uma educação de qualidade pratica tem como propósito excluir, classificar,
[HOFFMANN, 2014]. aprovar ou reprovar o aluno, que “são
consequências do êxito ou do fracasso escolar”
Entretanto, apesar dos avanços, [Hoffman,
[PERRENOUD, 1999, p. 27]. “As práticas
2014] as polêmicas em torno da avaliação
avaliativas classificatórias fundamentam-se na
continuam, por vários motivos, entre estes a
competição e no individualismo, no poder e na
publicação da nova LDBEN - 9.394/9645, [lei
arbitrariedade presentes nas relações entre
que rege os sistemas de ensino] que trouxe na
professores e alunos” [HOFFMANN, 2014, p.
sua regulamentação a questão da promoção
19].
dos estudantes, este item sugestiona a extinção
das condutas classificatórias e excludentes do A avaliação da aprendizagem é uma prática
sistema educacional. Diante dessas possíveis contínua e dinâmica que faz parte do processo
reformulações do ensino, a sociedade e os de ensino-aprendizagem. Seu papel é de
educadores apresentaram certa inquietação, diagnosticar e acompanhar a evolução e as
sobretudo, nas mudanças que se referiram à hipóteses dos alunos na questão da
avaliação, pois ameaçavam a estrutura da aprendizagem, ou seja, ela contribui e estimula
escola brasileira, fundamentada nos princípios: o educando para superar as dificuldades
elitistas, excludentes e classificatórios. Esse encontradas ao longo do processo. Avaliar é
frenesi da “sociedade excludente” fez surgir buscar compreender as necessidades dos
diversos pareceres e resoluções políticas para alunos, para favorecer o seu desenvolvimento
complementarem a LDBEN/96, ocasionando [LUCKESI, 1998]
assim, várias e confusas interpretações da A partir da reflexão e do entendimento dos
legislação. “Sem dúvida, uma prática autores entende-se que uma prática educativa
avaliativa classificatória e eliminatória na voltada para construção do saber e na
escola pública continua sendo uma das maiores correlação do processo ensino e aprendizagem
responsáveis, no país, pela exclusão social e está imbricada diretamente as concepções
manutenção das desigualdades sociais” educacionais do sistema escolar e da prática
[HOFFMANN, 2014, p. 68]. pedagógica do professor, e que essa postura
Fica claro então que a avaliação da acabam refletindo no processo de avaliar. Com
aprendizagem predominante, na maioria das certeza é preciso mudar as práticas avaliativas
nossas escolas, ainda é fundamentada no classificatórias, porém para que realmente a
ensino das práticas tradicionais, marcado pela transformação aconteça, todo sistema
45
art. 24, parag. II alínea b e c e parag. V, alínea a,
b, c, d, e
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
b Unidade de Educação Infantil Ipê Amarelo, Universidade Federal de Santa Maria, e-mail:
dalianaufsm@yahoo.com.br
RESUMO
A pesquisa “A escuta dos bebês e das crianças pequenas na Unidade de Educação Infantil Ipê Amarelo” tem
como objetivo compreender como vem sendo desenvolvido e observado o processo de escuta de bebês e
crianças pequenas na referida escola e surgiu a partir da necessidade de valorizar as práticas educativas com
bebês e crianças pequenas, rompendo com ausência desse grupo social nas pesquisas (PEREIRA, 2015 E
SILVA, 2014). A mesma está sendo desenvolvida na UEIIA, a qual possui duas turmas exclusivamente de
bebês e crianças pequenas, com idades entre cinco meses e um ano e onze meses, e as outras cinco turmas
organizadas com grupo de crianças a partir de um ano e onze meses até os seis anos de idade, que chamamos
de turmas multi-idade. Considerando que a estruturação de turmas de berçário é recente no contexto da UEIIA,
e que a escuta das crianças é um dos princípios orientadores da prática educativa desenvolvida na instituição,
tornou-se pertinente investigar como vem ocorrendo o processo de escuta dos bebês e crianças pequenas na
Unidade. Uma das partes da pesquisa consistiu em um levantamento sobre a produção acadêmica que teve a
UEIIA como lócus de pesquisa. A pesquisa documental evidenciou que a escuta de bebês e crianças pequenas
está presente no cotidiano e nas práticas desenvolvidas na UEIIA, mas a mesma ocorre de uma maneira sutil
no dia-a-dia da escola. A escuta está presente em momentos em que as pessoas adultas observam, refletem e
pensam na necessidade da criança ser protagonista do seu processo de ensino/aprendizagem.
Palavras-chaves: Escuta, bebês, crianças pequenas, prática educativa.
ABSTRACT
La investigación "La escucha de los bebés y de los niños pequeños en la Unidad de Educación Infantil Ipê
Amarillo" tiene como objetivo comprender cómo se está desarrollando y observando el proceso de escucha de
bebés y niños pequeños en la referida escuela y surgió a partir de la necesidad de valorar las las prácticas
educativas con bebés y niños pequeños, rompiendo con ausencia de ese grupo social en las encuestas
(PEREIRA, 2015 Y SILVA, 2014). La misma está siendo desarrollada en la UEIIA, la cual tiene dos clases
exclusivamente de bebés y niños pequeños, con edades entre cinco meses y un año y once meses, y las otras
cinco clases organizadas con grupo de niños a partir de un año y once meses hasta los seis años de edad, que
llamamos clases multi edad. Considerando que la estructuración de las clases de bebés es reciente en el
contexto de la UEIIA y que la escucha de los niños es uno de los princípios de la práctica educativa desarrollada
en la institución, se ha vuelto pertinente investigar cómo se está produciendo el proceso de escucha de los
bebés y los niños pequeños en la Unidad. Una de las partes de la investigación consistió en un levantamiento
sobre la producción académica que tuvo la UEIIA como locus de investigación. La investigación documental
evidenció que la escucha de bebés y niños pequeños está presente en el cotidiano y en las prácticas
desarrolladas en la UEIIA, pero la misma ocurre de una manera sutil en el día a día de la escuela. La escucha
está presente en momentos en que las personas adultas observan, reflejan y piensan en la necesidad del niño
de ser protagonista de su proceso de enseñanza / aprendizaje.
Palavras-claves: Escucha, bebés, niños pequeños, práctica
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As idades são consideradas na data base de 31 de
março do ano corrente.
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constituído, para isso o objetivo da pesquisa é Nacionais para Educação Infantil (DCNEI) -
investigar a construção, ao longo do tempo, do Resolução nº 5, de 17 de Dezembro de 2009
processo de escuta desses sujeitos na UEIIA. (BRASIL, 2009), destacamos três aspectos,
Nesse sentido, o texto que segue apresenta uma imprescindíveis nas propostas para a educação
breve reflexão sobre o conceito de escuta dos bebês em espaços de vida coletiva: o
(RINALDI, 2012, SARMENTO, 2011) e primeiro é a compreensão dos bebês como
posteriormente a etapa de pesquisa documental sujeitos da história e de direitos; o segundo é a
(GIL, 2008) do projeto, na qual evidenciamos defesa de uma sociedade que reconheça,
que os espaços e práticas de escutar as crianças valorize e respeite a diversidade social e
acontecem de modo sútil no cotidiano da cultural, nas oportunidades educacionais entre
instituição. as crianças e afirmando a ruptura com relações
de dominação, seja ela etária, de gênero,
A partir da pesquisa documental, elencamos
socioeconômica, regional, linguística e
uma temática de estudo que vem sendo
religiosa e combatendo o racismo; e por
aprofundada em encontros de estudos, com
terceiro, a valorização das relações
professoras, bolsistas, estagiárias e psicóloga
interpessoais, na convivência entre as crianças
da Unidade. Por fim, apresentamos algumas
e com os adultos (BARBOSA, 2010).
reflexões que vem sendo construídas no
interior do grupo, relacionando a temática Neste sentido, se apresenta uma proposta
estudada com os desafios de escutar bebês e pautada no respeito aos bebês e as crianças
crianças pequenas. pequenas e necessidade de escuta, que vai para
além de ouvir o que está sendo dito por meio
de palavras, mas considerar que essa expressão
Sobre escutar os bebês e as crianças se dá por múltiplas línguas no cotidiano
pequenas compartilhado com outros bebês e crianças e
Atualmente pesquisas e estudos têm com os adultos. Corroborando, Sarmento
mostrado o quão ativos e potentes os bebês são explica o paradoxo da expressão “ouvir a voz
em suas ações (GOBATTO, 2011 e PEREIRA, das crianças”
2015), o que tem permitido romper com lugar
social historicamente marcado pela [..] resida não apenas no fato de que ouvir não
fragilidade, incapacidade e imaturidade de significa necessariamente escutar, mas no fato
bebês e crianças pequenas (BARBOSA, 2010). que essa “voz” se exprime frequentemente no
Com base nessas compreensões, atuar em silêncio, encontra canais e meios de
turmas de bebês e crianças pequenas, têm sido comunicação que se colocam fora da expressão
verbal, sendo, aliás, infrutíferos os esforços para
um desafio que nos move constantemente a configurar no interior das palavras infantis aquilo
estudar e refletir sobre a ação docente, que é sentido das vontades e das ideias das
procurando compreender como este espaço crianças. Mas, essas ideias e vontades fazem-se
vem se constituindo na UEIIA para qualifica- “ouvir” nas múltiplas outras linguagens com que
lo enquanto espaço de ensino, pesquisa e as crianças comunicam. Ouvir a voz é, assim,
mais do que a expressão literal de um acto de
extensão. auscultação verbal (que, aliás, não deixa também
A educação de bebês em contextos de vida de ser), uma metonímia que remete para um
coletivos significa em primeiro lugar sentido mais geral de comunicação dialógica
com as crianças, colhendo suas diversificadas
reconhecer que os bebês utilizam diferentes formas de expressão (SARMENTO, 2011, p. 28).
linguagens para se expressar, mais do que as
crianças que utilizam a fala para se comunicar.
Pressupõe uma abertura para acolher os Desenvolver um processo de escuta dos
pensamentos, desejos, desconfortos que são bebês e crianças pequenas demandas
expressos por sensações, olhares, movimentos, comprometimento e disposição de todos os
lágrimas, entre outras formas que evidenciam responsáveis pela educação dessas crianças,
os bebês e as crianças pequenas enquanto pois, tratando dessa especificidade, essa tarefa
sujeitos potentes. de ‘escuta’ requer muita sensibilidade e olhar
atento, pois nesse caso, cabe realizar de modo
Considerando as Diretrizes Curriculares
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
mais intenso uma escuta que não se dá apenas levantamento foram analisados a partir dos
com os ouvidos, mas com todos os sentidos princípios da análise documental, que na
(RINALDI, 2012), sendo este, portanto, um perspectiva de Ludke; André (1986) e
desafio quando se trata da docência em turmas Pimentel (2001) seguem os três passos
de berçário. listados para a realização da análise: o primeiro
deles se refere a identificação das fontes:
Nesse sentido, a pesquisa trata-se de uma
sendo possível a partir de uma catalogação em
investigação da experiência47 educativa que
arquivos físicos e/ou digitais, dos materiais
na perspectiva de CONTRERAS Y LARA
encontrados; o segundo passo aspectos a serem
(2010) implica em estar próximo do que se
abordados no documento: serão definidos a
vive, pois independente do foco da
posteriori, dependendo do tipo de documentos
investigação, ele somente poderá ser
encontrados; e terceiro passo se refere as
compreendido se for percebido, antes de tudo
leituras e fichamentos: após a definição dos
como “vida vivida, como experiência
aspectos a serem abordados.
vivida”48, colocando em primeiro plano as
múltiplas faces das vivências que compõem a A análise desses documentos teve o
experiência educativa. Para os autores, propósito de resgatar e sistematizar a história
compreender a educação enquanto experiência referente a construção das turmas de berçário,
e investiga-la, permite questionar aspectos bem como o processo de escuta dessas crianças
relacionados a realidade educativa investigada. desde a configuração das primeiras turmas,
Neste caso, a pergunta que se faz a realidade sendo que, ao final da pesquisa, esse material
investigada é: como foi construído, ao longo poderá ser utilizado para qualificar a Proposta
do tempo, o processo de escuta dos bebês na Pedagógica da escola no que se refere ao
Unidade de Educação Infantil Ipê Amarelo? trabalho com bebês e crianças pequenas.
Neste caso, a investigação é uma
oportunidade para refletir pedagogicamente
O processo de análise documental
sobre a construção do processo de escuta dos
bebês e crianças pequenas na UEIIA. O processo de análise documental teve início
Contreras y Lara (2010) pontuam que na no segundo semestre de 2017 com o primeiro
investigação da experiência educativa passo deste tipo de pesquisa, o levantamento
“investigamos como educadores”, primeiro, do material. Para isso foi realizada uma busca
conforme os autores, não somos investigadores dos trabalhos acadêmicos, que tiveram como
que observam a vida, mas que a ocupam e essa lócus de pesquisa a UEIIA, nos arquivos
condição traz consigo a possibilidade de físicos da instituição. Nesta busca foram
autorreflexão sobre a experiência educativa. encontrados um total de quatorze (14)
trabalhos entre Trabalhos de Conclusão de
Para responder ao problema proposto, num Curso (TCCs), Monografias, Dissertações e
primeiro momento, foi realizado um Teses. Destacamos que pelo fato de a UEIIA
“levantamento documental” inspirado na atender ao tripé ensino, pesquisa e extensão
técnica de pesquisa documental. Segundo Gil constitui-se em um espaço de estágios e de
(2008) a pesquisa documental tem como fonte pesquisa para os cursos de graduação e pós-
de dados documentos que ainda não receberam graduação, o que viabiliza a produção de uma
um trato analítico ou aqueles que já foram série de estágios e pesquisas, por isso julgamos
analisados, podendo receber outras pertinente realizar uma análise documental
interpretações. No caso desta pesquisa os deste tipo de trabalhos. A primeira constatação
materiais consultados foram os trabalhos feita neste período de busca foi de que alguns
acadêmicos desenvolvidos dentro da UEIIA e trabalhos não têm sua versão final arquivada
que poderiam estar discutindo a temática em na escola, e acabam se perdendo, visto que na
questão. Os documentos oriundos desse
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que ainda não dominem a habilidade da fala”. atuam com bebês e crianças pequenas,
destacando que nos cursos de graduação em
A partir desses aspectos, é possível agrupar
Pedagogia pouco são os estudos e pesquisas
estes trabalhos analisados dentro de uma
aprofundados sobre esse público alvo.
questão comum: o papel do professor. Dessa
Entende-se que o processo de escuta de bebês
maneira, a temática que emerge dessa análise
e crianças pequenas é uma compreensão
documental apresenta a importância de
construída por parte dos professores ao longo
refletirmos sobre o papel do professor com
de sua docência através de estudos e pesquisas
bebês e crianças pequenas.
sobre essa temática que evidenciam a
necessidade de ações pedagógicas respeitosas
Evidências da análise: a escuta de bebês e e humanizadoras.
crianças pequenas o papel do professor O processo de escuta atenta do professor
A partir dos trabalhos analisados é possível permite elencar elementos que passa a servir
perceber que eles refletem sobre o cotidiano da de suporte para planejar e pensar o cotidiano
UEIIA, e dentro dos temas proposto para cada de acordo com o interesse da criança. A esse
trabalho nos trazem elementos que ajudam a respeito, Holzschuh (2011) menciona em sua
pensar sobre o processo de escuta destas monografia a necessidade do educador
crianças ao longo da história. A Dissertação de compreender que a criança deve fazer parte da
Silva (2011), que possuí um caráter mais construção do planejamento, já que a mesma é
histórico da UEIIA expõe um processo a protagonista desse processo. E assim,
percorrido pela Educação Infantil em nosso disserta sobre, “o quanto é importante o
país, que inicia com um viés assistencialista e educador dar voz e vez de todas crianças
a medida em que os estudos vão avançando participarem das atividades e que as mesmas
este espaço começa a ser entendido como um sejam planejadas de acordo com o interesse
direito da criança, que precisa ser respeitada e das mesmas” (HOLZSCHUH, 2011, p.51).
ouvida. A autora descreve que a creche era um Sabe-se que para o educador pensar dessa
ambiente percebido como uma conquista para maneira há um processo. O professor para
os adultos, e não como um direito da criança, pensar e compreender sobre o seu papel com
mas com a mudança da equipe esse olhar foi bebês e crianças pequenas ele deve estar
mudando. Em sua Tese Lima (2010, p. 198) sempre buscando refletir sobre a criança como
corrobora ao sugerir que “Pensar uma sujeito de direitos.
concepção de trabalho pedagógico levando em Em nossas discussões destacamos que o
conta a educação de crianças ainda muito princípio apresentado pela autora representa
pequenas requer um olhar diferenciado para a um avanço quanto a compreensão da
infância”. necessidade de escuta, entre tanto a expressão
Entende-se que para pensarmos o processo de “dar voz” vem sendo superada a medida em
escuta é preciso também refletir sobre a que avançamos nas reflexões e nos damos
concepção de infância compreendendo suas conta que a ação de “dar” implica uma
diferenciações de acordo com os tempos e os autoridade adulta que permite ou não as
espaços, já que suas realidades são muito distas crianças expressarem-se, desta forma, em
de acordo com o contexto sócio cultural em nossos registros temo procurado utilizar a ideia
que se encontram. A Educação Infantil iniciou de acolher as diferentes expressões dos bebês
com o assistencialismo dos abandonados e teve e crianças pequenas, pautando as relações pelo
grande visibilidade com a ascensão da mulher respeito e pela humanização das ações na
no mundo do trabalho, e aos poucos tem escola da infância.
ganhado lugar de direito das crianças, muito
Compreende-se que para pensarmos o
embora está não seja uma ideia superada em
processo de escuta temos que possuir um
nossa sociedade.
entendimento sobre infância, e também saber
Percebe-se que os documentos analisados que essa compreensão vem sofrendo mudanças
refletem as práticas pedagógicas e como ao longo dos anos. À medida em que as
ocorrem as formações dos profissionais que pesquisas avançam, mostrando as
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potencialidades das crianças e em especial dos 2004), "Os bebês, as professoras e um modo de
bebês, muda-se também a forma como o viver a vida na creche" (FILHO E MARTINS,
compreendemos. Por muitos anos as 2016) e “A constituição da linguagem dos
instituições de Educação Infantil foram vistas bebês e entre os bebês" (CASTRO, 2016)49.
como espaços assistenciais (KUHLMANN Jr, Esses autores têm possibilitado ampliar a
2007), em que o trabalho com bebês era compreensão sobre o quanto à docência com
pautado nos cuidados essenciais de os bebês e as crianças é marcada por situações
alimentação e higiene. Hoje, a partir das novas simples, mas que nem por isso são
compreensões sobre os bebês e as crianças, os insignificantes. Tristão (2004) ao trazer a
documentos legais expressam o trabalho “sutileza” como uma das marcas dessa
pedagógico de uma outra perspectiva, pautada docência nos desafia a nos alfabetizarmos nas
pelo respeito às crianças, pela linguagens dos bebês, uma linguagem que não
indissociabilidade do cuidar educar e pelas é a da oralidade, mas é a linguagem do corpo,
brincadeiras e interações como eixos do olhar, do choro, dos movimentos, das coisas
norteadores de tal trabalho (BRASIL, 2009). nojentas (vômitos, secreção do nariz...) e que
nem sempre fazem parte dos nossos processos
Acompanhando essas mudanças, pelo que
formativos. Isso mostrou-se um grande desafio
vivemos enquanto profissionais da educação e
para todas as participantes do encontro de
também pelo que aprendemos no processo de
estudos, pois exige que tenhamos uma postura
análise documental, entendemos a maneira
como os professores se colocam na relação atenta e sutil em relação as crianças, uma
atitude observadora muito mais do que da
com as crianças definem o modo como os
ação; conforme as crianças, até mesmo as
princípios expressos nos documentos legais
ações precisam ser sutis, pois um toque um
acontecem no cotidiano da escola infantil. Por
pouco mais apressado ou uma palavra evocada
essa razão, paralelo às atividades de pesquisa,
de forma mais ríspida, assusta, machuca. Com
no decorrer do segundo semestre 2018,
bebês e crianças pequenas as ações mais do
estamos desenvolvendo um grupo de estudo
que nunca precisam ser dialógicas, mas um
leituras, reflexões e discussões sobre o papel
diálogo que escuta muito mais do que fala.
do professor com bebês e crianças pequenas.
Filho e Martins (2016) nos convidam a
Percebemos que os encontros de estudo tem
refletir sobre uma série de elementos presentes
sido um espaço para dialogarmos e refletirmos
na nossa docência, em especial sobre o educar
sobre os desafios da docência com bebês e
como uma forma de legitimar a profissão de
crianças pequenas, principalmente no que se
ser professora de bebês. A partir disso, o grupo
refere a concretização de processos de escuta
compartilhou e problematizou um conjunto de
desse grupo social. Pelo fato de o grupo ser
experiências que, no seu entendimento,
composto por pessoas que vivenciam
legitimam no nosso trabalho com bebês e
diferentes momentos formativos (formação
crianças pequenas. Essas experiências
inicial, pós-graduação ou formação
variavam desde situações em que a escola
continuada), a troca das experiências tem
compartilha com as famílias e orienta sobre
revelado que a discussão sobre bebês e
como proceder em determinadas situações
crianças pequenas está ausente ou aparece de
para que a educação das crianças seja fruto de
forma superficial em tais processos
uma relação compartilhada entre escola e
formativos.
família, situações em que as nossas ações são
A partir das evidências apresentadas na questionadas pelas famílias e pelos próprios
análise documental, elencamos alguns textos colegas de trabalho e precisamos nos utilizar
que têm subsidiado as nossas discussões com de argumentos pedagógicos para justificar as
o grupo: “Ser professora de bebês: uma nossas escolhas até mesmo situações diretas
profissão marcada pela sutileza” (TRISTÃO, com as crianças em que o diálogo é a
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
investigadores que observam a vida, e que [7] BARBOSA, Maria Carmem Silveira. As
também a ocupam, fazemos valer a tríade especificidades da ação pedagógica com os
ensino-pesquisa-extensão como uma bebês. Brasília: MEC/SEB, 2010. Disponível
possibilidade de autorreflexão sobre a em: <
experiência educativa. Entendemos que ao http://portal.mec.gov.br/docman/dezembro-
falar da escuta de bebês e crianças pequenas, 2010-pdf/7154-2-2-artigo-mec-acao-
não estamos falando de uma escuta qualquer, pedagogica-bebes-m-carmem/file>. Acesso
mas a escuta de uma voz que sempre se em: nov. 2018.
apresentou socialmente, mas que recentemente
tem sida ouvida e acolhida pelos adultos.
Falamos de uma escuta capaz de contribuir [8] BRASIL. Conselho Nacional de Educação.
para qualificar as nossas ações docentes, uma Parecer CNE/CEB nº 20/2009. Brasília:
escuta comprometida em fazer da escola MEC/CNE/CEB, 2009.
infantil um espaço agradável e acolhedor para
todos, principalmente para as crianças.
[9] CONTRERAS, José D.; LARA, Nuria P.
de (comps.). Investigar la experiencia
REFERÊNCIAS educativa. Madrid: Morata, 2010.
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Universidade de Brasília, 2014.
[2] RINALDI, Carla. Diálogos com Régio
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bibliográfica. Cadernos de Pesquisa, n.° 114,
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a infância: os desenhos das crianças como
produções simbólicas. In: FILHO, Altino J.
Martins; PRADO, Patrícia D. (Orgs.) Das [12] MICHLELAT, G. Sobre a utilização
Pesquisas com crianças à complexidade da da entrevista não-diretiva em sociologia. In:
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2011. investigação social e enquete operária. São
[4] GIL, Antonio Carlos. Como elaborar Paulo: Polis, 1982.
projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, [13] LIMA, Graziela Escandiel de. Cotidiano
2008. e trabalho pedagógico na educação de
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por todos os espaços! ” Um estudo sobre a para a formação de pedagogos.
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Tese de Doutorado. Universidade Federal do Rio 2014.
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b
Docente/ Área de Cultura Linguística e Literária / Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (IFSUL) –
campus Pelotas – Visconde da Graça (CaVG), kriskabespanhol@gmail.com
RESUMO
Este artigo apresenta uma vivência do projeto de extensão “Quem lê um conto, costura um ponto:
uma proposta dialógica entre disciplinas técnicas e propedêuticas no Curso Técnico em Vestuário”,
desenvolvida em 2013, objetivando a interlocução entre a área técnica do Curso e as disciplinas de
Língua Portuguesa, Espanhol e suas literaturas. O projeto teve, também, como finalidade despertar o
interesse pela literatura entre os aprendentes do sexto ano da escola adjacente ao Campus; além de
aprimorar os conhecimentos técnicos dos aprendentes voluntárias e bolsista e introduzi-las no
universo literário das línguas materna e estrangeira. A metodologia considerou a leitura e análise dos
contos e o uso de técnicas de contação de histórias. Os resultados demonstraram que o trabalho
interdisciplinar desenvolvido oportunizou uma relação mais holística entre os conteúdos técnicos e
os das disciplinas envolvidas no projeto. Observou-se que as atividades mediadas pela literatura
converteram a recepção dos contos em um processo lúdico que possibilitou aos aprendentes
expressarem o seu entendimento dos textos. Concluiu-se que os projetos interdisciplinares podem
otimizar a aprendizagem, ao eliminar fronteiras entre as áreas de conhecimento. Ademais, a
transversalidade da literatura incrementa as habilidades de compreensão escrita, ao criar espaços onde
os recursos linguísticos e estéticos possibilitam ao leitor apropriar-se do texto.
Palavras chave: Integração curricular, literatura, interdisciplinaridade, extensão.
RESUMEN
Este artículo presenta una vivencia del Proyecto de Extensión “Quién lee un cuento, costura un punto:
una propuesta dialógica entre las disciplinas técnicas y propedéuticas en el Curso Técnico de
Vestuario, desarrollada en 2013, objetivando la interlocución entre el área técnica del Curso y las
asignaturas de Lengua Portuguesa, Español y sus Literaturas. El proyecto tuvo, también, como
finalidad despertar el interés por la literatura entre los alumnos del sexto año de una escuela cercana
al Campus; además de mejorar los conocimientos técnicos de las alumnas becaria y voluntarias e
introducirlas en el universo literario de las lenguas materna y extranjera. La metodología consideró
la lectura y análisis de los cuentos y el uso de técnicas de narración de historias. Los resultados
demostraron que el trabajo interdisciplinar desarrollado promocionó una relación más holística entre
los contenidos técnicos y los de las disciplinas involucradas en el proyecto. Se observó que las
actividades mediadas por la literatura convirtieron la recepción de los cuentos en un proceso lúdico
que posibilitó a los alumnos expresar su comprensión de los textos. Se concluyó que los proyectos
interdisciplinares pueden optimizar el aprendizaje, eliminando fronteras entre las áreas de
conocimiento. Además, la transversalidad de la literatura mejora las habilidades de comprensión
escrita, creando espacios donde los recursos lingüísticos y estéticos propician al lector apropiarse del
texto.
Palabras clave: Integración curricular, literatura, interdisciplinariedad, extensión.
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
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Cap. 2- MÉTODOS, SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: Pesquisa, Ensino e Extensão na Educação
Nesse mesmo sentido, pode-se afirmar que a A principal descoberta da leitura é que, na
medida em que lemos, aumentamos nosso campo
literatura oportuniza aos educandos e de compreensão do mundo. A leitura permite o
educandas suporte investigativo e criativo, desenvolvimento de nosso senso critico, pois
propiciando espaços que vão além das exige, dentre outros processos, a análise, a
fronteiras de cada disciplina, valorizando os comparação e a associação de ideias atreladas
seus saberes, oportunizando um processo de aos nossos conhecimentos prévios, assim como o
contato com novas informações que se
aprendizagem mútuo, que se dá, ao mesmo transformarão em conhecimento na medida em
tempo de forma lúdica e com aplicação prática que lemos (TEIXEIRA, 2010, p. 17).
de fundamentos técnicos.
Desse modo, o texto literário, clássico ou O campo literário aborda uma imensidão de
contemporâneo, colabora para o trabalho possibilidades que estimulam a reflexão do
interdisciplinar, à medida em que permite que jovem educando.
os educandos e educandas encontrem espaços Para Paulo Freire (2006, p.20) “a leitura do
libertadores do pensamento, projetando a sua mundo precede a leitura da palavra”,
imaginação a lugares diversos; relacionando o demonstrando que o processo de ensino e de
texto ao seu cotidiano e a suas vivências, que o aprendizagem é dinâmico e que o educando é
conduzem a uma dimensão lúdica a qual sujeito de sua própria educação. Por isso a
desperta o seu senso investigativo, criativo e educação tem caráter permanente, onde o saber
reflexivo, contribuindo para a formação do seu de educandos(as) e educadores(as) se
conhecimento pessoal, através do articulam constantemente (FREIRE, 2011,
compartilhamento coletivo de novas realidades p.35).
experienciadas pelo ato de ler e ouvir. Assim, educandos e educandas, sujeitos
A literatura, como um aporte para a desse processo, podem ser provocados pela
imaginação e criação intelectual dos literatura a realizar reflexões e interpretações
educandos e das educandas, amplia a interação entorno de si e do mundo, desenvolvendo uma
do seu mundo interior com o exterior, através percepção crítica da importância do ato de ler,
das associações originadas pela relação leitor- de ouvir e participar do texto.
texto, subsidiando associações significativas É importante ressaltar, também, que a
para sua aprendizagem. Literatura é a Cultura com maiúscula, o que
significa entender que os textos de ficção
Corrobora nesse sentido, Fernandes (2009, p. oferecem uma interpretação da sociedade da
36) quando indica que época e a que a ela se referem, tal como as
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Os rostos foram ocultados para preservar a imagem
dos educandos e educandas da EEEF Arco Íris.
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b
Doutora.IFSULKriskabespanhol@gmail.com
RESUMO
O presente trabalho tem como temática a conscientização sobre o uso de preservativos realizado a
partir de intervenção docente sobre o tema e teve como sujeitos de pesquisa estudantes da turma do
7° ano do ensino fundamental, da disciplina de ciências da natureza, de uma escola da rede pública
estadual da cidade de Pelotas/RS, em que buscou refletir sobre a percepção dos alunos, partindo de
seus conhecimentos prévios, sobre o uso de preservativos (camisinhas) na prevenção de doenças
sexualmente transmissíveis (DSTs), mais especificamente a AIDS na adolescência. Sendo assim, o
objetivo desse trabalho foi o de refletir sobre a importância da conscientização, no âmbito escolar,
sobre o uso de preservativos como método de prevenção diante as DSTs na fase da adolescência. A
pesquisa teve como instrumento de coleta de dados aplicação de um questionário exploratório,
semiaberto, no segundo encontro, com intuito de verificar quais os conhecimentos prévios dos alunos
sobre a prevenção diante as DSTs na adolescência levando a conscientização da importância do uso
do preservativo nessa faixa etária. O estudo demonstrou que os alunos não possuíam conhecimentos
prévios acerca das DSTs no geral, mas que em relação à AIDS esses eram bem-informados, sabendo
sobre a doença através da mídia em geral, através de familiares e amigos, em postos de saúde, mas
pouco lhes chegava de tal informação pela via da escola.
Palavras chave : conhecimentos prévios, conscientização, adolescência.
ABSTRACT
The present work has as its subject-matter the awareness about the use of condoms made from a
teaching intervention on the question and had as subjects of research students of the 7th grade
elementary school class, the nature science discipline, a school of the a public network in the city of
Pelotas, RS, Brazil, in which it sought to reflect on students' perceptions of the use of condoms in the
prevention of sexually transmitted diseases (STDs), but specifically AIDS in adolescence. Therefore,
the objective of this work was to reflect on the importance of awareness in the school context about
the use of condoms as a method of prevention against STDs during adolescence. The research had as
instrument of data collection the application of an exploratory questionnaire, semi-open, in the second
meeting, in order to verify the students' previous knowledge about the prevention of STDs in
adolescence, leading to awareness of the importance of condom use in this range age. The study
showed that students did not have prior knowledge about STDs overall, but that in relation to AIDS
they were well-informed, knowing about the disease through the media in general, through family
and friends, in health posts, but little did they get this information by way of school.
Keywords: previous knowledge, awareness, adolescence
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SIDA: SÍNDROME DE IMUNODEFICIÊNCIA
ADQUIRIDA (AIDS – SIGLA EM INGLÊS).
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SECRETARIA NACIONAL DE justica/2014/07/juventude-marca-presenca-no-
JUVENTUDE/GOVERNO FEDERAL. Juventude marca enfrentamento-global-do-hiv-aids. Acesso: 14/04/217 as
presença no enfrentamento global do HIV/AIDS. 14h25min.
Publicado: 17/07/2014 18h19, no Portal Brasil, Última
modificação: 17/07/2014 53
http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/boletim-epidemiologico-
18h19.Disponível:http://www.brasil.gov.br/cidadania-e- hivaids-2017 Acesso em 25/04/2018.
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1980, sobretudo nas pesquisas sobre NETO, Otávio Cruz. O trabalho de Campo
juventude.” (2006, p.246) porque “a utilização como descoberta e criação. In: Pesquisa
de grupos de discussão como método em que Social: Teoria, método e criatividade. Maria
os jovens conduzem a entrevista e o Cecília de Souza Minayo (Org), 18º edição.
entrevistador busca intervir o mínimo possível, Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 2001
assim como o princípio da análise comparativa [2] Lima.Edenilse Batista. DST e Sexualidade:
constante são possibilidades que permitem Concepções Dos Adolescentes. III Fórum
uma inserção do pesquisador no universo dos Identidades e Alteridades, 2009. Disponível
sujeitos e que, de certa forma, reduz os riscos em: :
de interpretações equivocadas”. http://200.17.141.110/forumidentidades/IIIfor
um/textos/Edenilse_Batista_Lima_texto_
O instrumento de coleta de dados foi um
2.pdf.
questionário com perguntas semiabertas,
constituído por 8 (oito) questões que [3]ALMEIDA, Sandra Aparecida.Concepções
abarcavam indagações acerca dos de Jovéns Sobre o HIV/AIDS e o Uso de
conhecimentos prévios dos alunos sobre as Preservativos nas Relações Sexuais.2014
DSTs. Disponível em:
http://seer.ufrgs.br/index.php/RevistaGauchad
eEnfermagem/article/view/37074 Acesso em:
Considerações Finais 31/03/2018.
Primeiramente, verificamos ao final da [4] SILVA,Rafaela Martins da.Orientação de
pesquisa com a turma de sujeitos em questão, alunos quanto a prevenção de doenças
que os pesquisados possuem os conhecimentos sexualmente transmissíveis.. 2011.
prévios sobre prevenção, a saber: uso de Monografia de Especialização em Saúde para
preservativos, muito embora desconheçam as Professores do Ensino Médio e Fundamental.
demais DSTs citadas nesse trabalho, dando Universidade Federal do Paraná (UFPR).
ênfase somente para AIDS. Disponível em :
Ressaltamos, ainda, que o grupo tem como https://acervodigital.ufpr.br/handle/1884/3546
conhecimento prévio a importância do uso de 4 Acesso em 31/03 /2018.
preservativo (camisinha) nos dias atuais, já que [5] FILLMANN, Henrique. Prevenção das
a AIDS pode estar mascarada no sujeito, por Doenças Sexualmente Transmissíveis
uma aparência enganosamente saudável. (DST) .Disponível:
Evidenciamos, ainda, a partir dos resultados http://portaldacoloproctologia.com.br/sua-
da pesquisa a identificação de ideias advindas saude/prevencao-das-doencas-sexualmente-
dos informantes que possam ser levadas em transmissiveis-dsts/, acesso: 09/04/2017
consideração para construção de projetos
[6] BRASIL, GOVERNO FEDERAL. A
pedagógicos voltados à realidade/necessidade
dos mesmos, contribuindo com a elaboração epidemia entre jovens é destaque no
de ferramentas metodológicas, com incentivo Congresso de HIV e Hepatites das
à prevenção de DSTs e de gravidez precoce, e Américas: HIV afeta
auxiliando de forma qualitativa, a didática dos desproporcionalmente pessoas com idade
entre 18 e 29 anos. Disponível:
professores da área de Ciências da natureza da
http://www.aids.gov.br/pt-
rede pública da cidade de Pelotas/RS.
br/pub/2017/boletim-epidemiologico-
hivaids-2017. Abril 7, 2017 - 15h27min.
REFERÊNCIAS Acesso: 14/04/217
[1] MOREIRA, Marco Antonio. Teorias de [7] WELLER, W. Grupos de discussão na
Aprendizagem 1999. Disponível em: pesquisa com adolescentes e jovens:
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/2012307/ aportes teórico-metodológicos e análise de
mod_resource/content/1/Teorias%20de%20Aprendi uma experiência com o método.Educação e
zagem%20Marco%20Antnio%20Moreira.pdf. Pesquisa, São Paulo, v.32, n.2, p. 241-260,
Acesso em: 22 de Abril de 2018 maio/ago. 2006.
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
a
Discente do Mestrado em Educação e Tecnologia no IFSUL/câmpus Pelotas, Rio Grande do Sul/RS, Brasil. E-mail:
alezandramessias@gmail.com, Pedagogia Educação Infantil pela FURG (Universidade Federal de Rio Grande), Pós-
Graduação em Ludo Pedagogia, Leitura e Literatura FACEL (Faculdade de Administração, Ciências, Educação e
Letras)
b
Professora do IFSUL/Câmpus Pelotas, atuando no MPET/IFSUL, linha de pesquisa “Educação, Cultura e Trabalho”.
Doutora em Educação pela UFMG e Mestre em Educação pela UFPel. E-mail: adriana.adrileon@gmail.com
RESUMO
Este artigo tem por objetivo analisar a gênese do Lar da Criança Santo Estevão, localizado na cidade
de Bagé/RS. O lar foi criado no ano de 1970 com o intuito de atender crianças em situação de
vulnerabilidade social, considerando que no período em questão existiam poucas creches no
município e uma demanda reprimida com esse perfil. O Lar foi idealizado por pessoas que faziam
parte da comunidade bajeense e contava com a participação e contribuição financeira da comunidade
com um todo, realizava diversas campanhas com intuito de arrecadar fundo para manter a instituição.
Para coleta de dados forma utilizados diversos instrumentos, dentre eles destaca-se a entrevistas com
pessoas que participaram do cotidiano do lar; extratos de jornais que tratavam do lar e foram
publicados nos jornais que circulavam no município e o livro de atas da instituição. Conclui-se, com
a análise documental, que a comunidade assume para si a preocupação em manter o lar nas décadas
de 1970 a 1980 e vai deixando de fazê-lo quando as políticas municipais começam a estabelecer
iniciativas consistentes para infância.
Palavras chave: Infância, políticas públicas, história da infância
ABSTRACT
This article aims to analyze the genesis of the Lar da Criança Santo Estevão, located in the city of
Bagé/RS. The home was created in the year 1970 with the intention of attending children in situation
of social vulnerability, considering that during the period in question there were few creches in the
county and a repressed demand with this profile. The Home was conceived by people who were part
of the community and had the participation and financial contribution of the community with a whole,
carried out several campaigns with the intention of raising funds to maintain the institution. In order
to collect data, a variety of instruments were used, among them the interviews with people who
participated in the daily life of the home; extracts from newspapers that dealt with the home and were
published in newspapers that circulated in the municipality and the minutes book of the institution. It
is concluded with documentary analysis that the community assumes the concern to maintain the
home in the decades of 1970 to 1980 and stops doing it when municipal politics begin to establish
consistent initiatives for childhood.
Keywords: Childhood, Public Politics, childhood stories
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
Revolução Industrial é um divisor de águas na história e dos fundadores do socialismo e do cooperativismo foi
quase todos os aspectos da vida cotidiana da época um dos mais importantes socialistas utópicos.
foram influenciados de alguma forma por esse processo.
4Friedrich Fröebel (1782-1852) foi um pedagogo e
2 Fonte de informação: Andrade, Lucimary Bernabé pedagogista alemão com raízes Pestalozzi, sendo um
Pedrosa de. dos primeiros educadores a considerar o inicio da
infância como uma fase de importância decisiva na
http://books.scielo.org/id/h8pyf/pdf/andrade-
formação das pessoas.
9788579830853-08.pdf acesso em 20 dez.2017.
3 Robert Owen (14 de maio de 1771- 17 de novembro
de 1858) foi um reformista social galês, considerado um
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
objetivo de recuperá-las (as crianças) através O caráter de baixa qualidade dos serviços
da disciplinarização do caráter, deixando prestados era um meio para não torná-lo atraente
e alvo de reivindicações generalizadas. Quem
transparecer a pedagogia do trabalho como quisesse o atendimento precisaria expor sua vida
principal recurso para a regeneração. privada ao escrutínio dos que ofereciam.
(KUHLMANN JÚNIOR, 2001, p.67).
Outro lugar que atendia a infância era à roda
dos expostos que, no início, tinha o objetivo de
esconder os filhos abandonados por mães Conforme Kramer (1988, p.20), os discursos
solteiras, ocultando as suas identidades. Para do ex-presidente Getúlio Vargas e de seus
Roman & Steyer, (2001, p. 16) “com o passar seguidores, na época de seu governo,
do tempo, as rodas foram disponibilizadas para deixavam bem claro que tinham que existir
camadas de famílias populares”. Tanto no cuidados com as crianças, pois elas eram os
Brasil, como em outros países, a “Roda” cidadãos do futuro. A partir da década de 60 e
passou a ser utilizada por diversas famílias 70 ocorre uma valorização dos direitos
para abandonarem os seus filhos pelo fato de trabalhistas e um investimento na educação das
não terem meios materiais para criá-los. crianças em prol do nacionalismo. No ano de
No Rio de Janeiro, em 1899, foi criado o 1970, no município de São Paulo, aconteceu o
Instituto de Proteção e Assistência à Infância 1º Congresso da Mulher Paulistana,
do Brasil. Segundo Kramer (2011), os oficializando o Movimento de luta por creches.
objetivos do Instituto eram: O ex-presidente Getúlio Vargas prognosticou
a legislação trabalhista onde mencionava que
deveria haver creches em todos os
Atender os menores de oito anos, elaborar leis estabelecimentos que trabalhassem acima de
que regulassem a vida e saúde dos recém- trinta mulheres.
nascidos, regulamentar o serviço das amas de
leite, velar pelos menores trabalhadores e
criminosos; atender as crianças pobres, doentes,
defeituosas, maltratadas e moralmente Uma breve abordagem sobre a Educação
abandonadas; criar maternidades, creches e Infantil no Brasil
jardins de infância. (KRAMER, 2011, p.52). A análise sobre a história da educação infantil
reflete sobre o que alguns autores apontaram
como sendo o signo da modernidade. De
As creches no Brasil surgem para minimizar
acordo com SÁ (2007, p.40), “a infância e sua
problemas sociais decorrentes do estado de
educação estão presentes nas Exposições
miséria, diferentemente dos países europeus,
Universais5, que ocorreram em diferentes
que a necessidade do atendimento em creches
países desde 1851 até os primórdios do Século
para as crianças surgia em razão de suas mães
XX”. No entanto, com o surgimento da
estarem atendimento em creches para as
implementação de instituições de educação
crianças surgia em razão de suas mães estarem
pré-escolar no Brasil, a sociedade ficou
trabalhando nas fábricas. A partir da década
dividida entre os jardins de infância para as
de 1950 muitas das creches brasileiras eram,
crianças da elite, as creches e as escolas
na sua grande maioria, de responsabilidade de
maternais para a classe popular. Com isso,
entidades filantrópicas, laicas e muitas delas
houve alguns confrontos entre as classes
de cunho religioso, cujo objetivo era
sociais, uma vez que a creche era vista como
minimizar as carências da pobreza.
uma instituição assistencialista que atendia
Conforme Kuhlmann Júnior (2001): crianças até dois anos e a escola maternal
atendia dos três aos seis anos de idade. Por sua
vez, o jardim de infância era visto como um
5Exposições Universais condensaram o que o século baseado na ideia de que o conhecimento humano e a
XIX entendeu como modernidade: o progresso produção seriam transnacionais, objetivos sem limites.
construído sobre a ciência e a indústria, a liberdade
entendida como livre comercio; o cosmopolitismo
640
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
espaço que atendia a elite e propiciava uma A inspetora-geral da escola, Maria Ernestina
educação ampla e diversa. Varella, junto com a também inspetora Zalina
Rolim e a professora de trabalhos manuais,
Também no Rio de janeiro foi criado, em
traduziram e adaptaram algumas obras
1875, no Colégio Menezes Vieira, um jardim
estrangeiras que serviriam de orientação. Tudo
de infância de caráter privado chamado de
foi organizado didaticamente para que o jardim
“Jardim de Crianças”, idealizado por Menezes
de infância funcionasse em três períodos,
Vieira, médico e educador. A sua metodologia
sendo distribuídos em: horas dedicadas a
de trabalho era embasada em pensadores,
cantos, as marchas, aos exercícios de
como Pestalozzi6, Friedrich Froebel e Mme.
linguagem e o intervalo para o lanche
Pape-Carpentier.
(MONARCHA, 2001, p. 83-4).
Apesar de a elite ver esse movimento de De acordo com Oliveira (2005, p.97 apud
instrução como algo positivo surgiam, ao ANDRADE, 2010, p.136), em 1923 houve a
mesmo tempo, reclamações por parte de primeira regulamentação sobre o trabalho da
alguns membros da sociedade. Conforme mulher, com o intuito de instalar creches e
Bastos (2001, p.63), em documentos da salas de amamentação próximas aos locais de
Primeira Exposição Pedagógica, um dos trabalho. A partir desse período, nos locais de
membros da sociedade, conhecido como Sr. moradia ou nos locais de trabalho, as creches
Junqueira, citou o seguinte: apresentavam uma função de guarda das
[...] o jardim de infância não tem nada com crianças, tendo como referência um modelo
instrução, é uma instituição de caridade para hospitalar, geralmente sob os cuidados de
meninos desvalidos, que serve para mãe ou pai, profissionais da área da saúde.
sendo minimamente pobres, quando vão ao
trabalho, entreguem seus filhos àqueles asilos Também em 1925 foi promulgado um
como já se faz entre nós e até na Bahia, em decreto no Estado de São Paulo
algumas casas dirigidas pelas irmãs de caridade. regulamentando as escolas maternais e, em
Mas aqui era preciso dar esse nome pomposo [...] 1935, foram instituídos os parques infantis nos
(DOCUMENTOS “PRIMEIRA EXPOSIÇÃO
PEDAGÓGICA”, 1884, apud BASTOS, 2001, bairros operários, sob a direção de Mário de
p.63). Andrade8. Os parques infantis atendiam
crianças de diferentes idades em horário
Com isso, a escola para elite ia crescendo e, contrário ao da escola para atividades
foi assim que, no estado de São Paulo, recreativas.
instalou-se a Escola Americana, no ano de Contudo, as políticas públicas, no início da
1877, um jardim de infância sob a orientação década de 1930, foram resultantes de
de norte-americanos com o intuito de interesses distintos, fazendo com que o poder
escolarizar e dar a atenção aos que não tinham público fosse chamado cada vez mais a
cuidado em seus lares. Em 1888, no Rio de regulamentar a questão do atendimento à
Janeiro, a professora Guilhermina fundou o infância. Na esfera federal, a partir de 1930, o
Kindergarten Modelo. Com o advento da Estado, com a criação do Ministério da
República foi possível instalar o primeiro Educação e Saúde, assumiu oficialmente a
Jardim de Infância7 estadual no Rio de Janeiro responsabilidade pelo atendimento à infância,
criado pelo decreto nº 342, de 3 de março de embora continuasse a convocar a contribuição
1896, anexo a Escola Normal Caetano de das instituições particulares.
Campos, que, mais tarde, serviria de local de
estágio para futuros professores. De acordo com Kuhlmann Júnior (2001), o
assistencialismo presente nas creches
641
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
brasileiras tinha como objetivo atender às A ideia era criar um espaço para as crianças
crianças empobrecidas: pertencentes às famílias de baixa renda,
começou a ser rejeitado na década 1980
quando outras preocupações começaram a
A pedagogia das instituições educacionais para
os pobres é uma pedagogia da submissão, uma
ganhar espaço no debate sobre infância.
educação assistencialista marcada pela
arrogância que humilha para depois oferecer o
atendimento como dádiva, como favor aos A crítica à recreação também tinha um sentido
poucos selecionados para receber. oposto a este, quando se referia à proposta dos
(KUHLMANN JÚNIOR, 2001, p. 182). jardins-de-infância. Agora, aquele modelo, que
estabelecia padrões de qualidade, era
considerado uma proposta pedagógica elitista,
distante da nossa realidade. (KUHLMANN
As décadas de 1930 e 1940 foram JÚNIOR. 2000, p. 17)
caracterizadas como “fase da assistência
social” no que se refere ao atendimento à
infância no Brasil. Essas décadas foram
marcadas por programas que priorizavam a Conforme Kramer, as políticas públicas para
alimentação e a higiene das mulheres a infância brasileira, do século XIX até as
trabalhadoras e de seus filhos. primeiras décadas do século XX, foram
marcadas por ações e por programas de cunho
As preocupações com a educação infantil médico-sanitário, alimentar e assistencial,
foram espalhando-se por todo o país e, com predominando uma concepção psicológica e
isso, foi ganhando o apoio de outros estados. patológica de criança, inexistindo um
Em Porto Alegre, na década 19409, surgem os compromisso com o desenvolvimento infantil
primeiros jardins de infância, inspirados no e com os direitos fundamentais da infância:
modelo de Froebel. Estes eram situados em
praças públicas, para atendimento de crianças
de 4 a 6 anos, funcionando apenas em meio [...] voltadas, quando muito, para a liberação das
mulheres para o mercado de trabalho ou
turno. Segundo Froebel, o brinquedo e as
direcionar a uma suposta melhoria do rendimento
atividades ao ar livre seguiam a sua evolução escolar posterior, essas ações partem também de
natural e ele defendia que as escolas deveriam uma concepção de infância que desconsiderava a
desenvolver as atividades desde o nascimento sua cidadania e desprezava os direitos sociais
até cada fase da vida infantil Essa proposta fundamentais capazes de proporcionar e ás
crianças brasileiras condições mais dignas de
surgiu com o envolvimento de secretários
vida. (KRAMER, 1988, p.199)
educacionais, conselheiros educacionais e
pedagogos daquela época e, com o passar do
tempo, foi ganhando força. Também na década de oitenta observou-se
um avanço em relação à Educação Infantil,
Conforme Kuhlmann Júnior (2000), onde foram produzidos estudos e pesquisas
que discutiam e buscavam definir a função da
creche e pré-escola. A ideia de que a educação
A recreação, marca da trajetória dos parques
infantis no município paulistano, foi utilizada da criança pequena é importante para o futuro
para nomear a proposta dos Centros de da sociedade ganhou espaço.
Recreação, difundida a partir do Plano de Com tudo isso foram surgindo apoiadores
Assistência ao Pré-Escolar, do Departamento que potencializaram a legalização dos direitos
Nacional da Criança, em 1967. (KUHLMANN das crianças na Constituição de 1988, que
JÚNIOR, 2000, p. 16).
define a creche e a pré-escola como um direito
da família e um dever do estado; o Estatuto da
Criança e do Adolescente de 1990 e a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei
642
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
10
Guerra Cisplatina: entre 1825 a 1828 ocorreu um Antônio de Souza Netto, embate deu-se nos campos
dos Meneses, cruzando o arroio Seival.
conflito entre o Império do Brasil e as Províncias
13
Unidas do Rio da Prata, pela posse da Província da Revolução Federalista: foi uma guerra civil que
Cisplatina, região da atual República Oriental do ocorreu no sul do Brasil logo após a Proclamação da
Uruguai. República, instada pela crise política gerada pelos
11 federalistas, grupo opositor que pretendia liberar o
Revolução ou Guerra Farroupilha de caráter
Rio Grande do Sul da governança de Júlio de
republicano contra o governo imperial do Brasil na
Castilhos, então presidente do estado, e também
então província de São Pedro do Rio Grande do Sul
conquistar uma maior autonomia e descentralizar o
e resultou na declaração da independência da
poder da então recém-proclamada República.
província como estado republicano dando origem à
14
República Rio-Grandense que se estendeu de 20 de Harry Rotermund. História de Bagé do Século
Passado. Uma edição da Academia Bageense de Letras,
setembro de 1835 a 1 de março de 1845. 1981.
12
Batalha do Seival foi um conflito militar que ensejou
a Proclamação da República Rio-Grandense por
644
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
“Sujeito histórico e de direitos que, nas Nos dias atuais a educação infantil deixou de
interações, relações e práticas cotidianas que ser meramente assistencialista para ser uma
vivencia, constrói sua identidade pessoal e educação com finalidades no desenvolvimento
coletiva, brinca, imagina, fantasia, deseja, integral da criança em seus aspectos físicos,
aprende, observa, experimenta, narra, questiona psicológicos, intelectual e social que complete
e constrói sentidos sobre a natureza e a
sociedade, produzindo cultura”. (BRASIL, 2009, a ação da família e da comunidade. Os
p.12). educadores, pesquisadores, governantes
precisam conscientizar-se que eles têm um
papel de vigilantes na luta para esses direitos
Esses documentos corroboram com os adquiridos que ainda não são razoáveis muito
direitos das crianças permitindo que a ainda precisa ser feito, mas é preciso garantir o
capacidade cognitiva, emocional, intelectual que esta assegurado no papel, torne realidade.
desenvolva-se de maneira lúdica e em
sociedade criando espaços atrativos para esses
sujeitos que formam parte de um futuro de uma REFERÊNCIAS
nação.
[1] CAMPOS. M. M. ROSEMBERG. F.
FERREIRA. I.M. Creches e pré-escolas no
Conclusões Brasil. São Paulo: Cortez, 1994.
645
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Chagas, São Paulo, 2000. Disponível em:
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<http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n14/n14a02
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MONARCHA, Carlos. Educação da Infância
brasileira 1875-1983. São Paulo: Autores
Associados, 2001.
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
RESUMO
Neste artigo procura-se esclarecer duas das principais abordagens que permeiam os estudos sobre o
Judiciário e a relação deste com a política: a Judicialização da Política e o Ativismo Judicial.
Desenvolve-se uma análise da literatura que aborda as duas teorias, evidenciando suas principais
vertentes, conceitos e os distintos olhares que buscam esclarecer as motivações para a crescente
atuação do Judiciário na arena política. Ainda, procura-se evidenciar a diferença entre os dois focos
de análises, as críticas, ambiguidades e imprecisões dos termos, ressaltando os limites para utilização
destes como métodos teórico-explicativos para uma análise mais profunda acerca da atuação do
Judiciário no contexto político.
Palavras chave: Judicialização da política, ativismo judicial, métodos teóricos-explicativos.
RESUMEN
En este artículo se pretende esclarecer dos de los principales abordajes que permean los estudios sobre
el Judicario y la relación de éste con la política: la Judicialización de la Política y el Activismo
Judicial. Se desarrolla un análisis de la literatura que aborda las dos teorías, evidenciando sus
principales vertientes, conceptos y las distintas miradas que buscan esclarecer las motivaciones para
la creciente actuación del Poder Judicial en la arena política. En este sentido, se pretende evidenciar
la diferencia entre los dos focos de análisis, las críticas, ambigüedades e imprecisiones de los
términos, resaltando los límites para su utilización como métodos teórico-explicativos para un análisis
más profundo acerca de la actuación del Poder Judicial en el contexto político.
Palabras clave: Judicialización de la política, activismo judicial, métodos teóricos-explicativos.
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
15
Tradução livre realizada pelos autores. No original: politicians and/or the administrators, that is, the transfer
“to the infusion of judicial decision-making and of decision-making rights from the legislature, the
courtlike procedures into political arenas where they did cabinet, or the civil service to the courts or, at least, (2)
not previously reside”. the spread of judicial-making methods outside the
16
A formulação literal, traduzida livremente pelos judicial province proper. In summing up we might say that
autores, é: “thus the judicialization of politics should judicialization essencially involves turning something into a
normally mean either: (1) the expansion of the province form of judicial process”.
of the courts or the judges at the expense of the
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quanto mais ampla for concebida a função e cria o direito por meio da interpretação de
jurisdicional, mais estreita será, por decorrência princípios constitucionais abstratos. É
lógica, a definição de ativismo judicial (visto que
menor será o espaço para acusação de excessos).
relevante esclarecer que os princípios são
concebidos como logicamente distintos das
regras. Ambos são conjuntos de padrões que
Neste ponto se verifica que, como sintetiza apontam para decisões particulares acerca da
Leal (2008, p. 17), a expressão “ativismo obrigação jurídica em circunstâncias
judicial” está sempre associada à ideia de específicas, mas distinguem-se quanto à
excesso ou exorbitância de competências por natureza da orientação que oferecem, como
parte do Poder Judiciário ao exercer função pondera Dworkin (2002, p. 39). As regras “são
jurisdicional. É o que se confere no núcleo normas que ordenam, proíbem ou permitem
comum presente em várias tentativas de algo definitivamente ou autorizam a algo
definição, como aquela apresentada por Ramos definitivamente. Elas contêm um dever
(2010, p. 129): definitivo” e se aplicam automaticamente
quando cumpridas na realidade as condições
que elas estabelecem (ALEXY, 2011, p. 37).
o exercício da função jurisdicional para além dos Os princípios, no entanto, possuem alto grau
limites impostos pelo próprio ordenamento que
de generalidade e de indeterminação, pois são
incumbe, institucionalmente, ao Poder Judiciário
fazer atuar, resolvendo litígios de feições normas "que ordenam que algo seja realizado
subjetivas (conflitos de interesses) e em uma medida tão alta quanto possível
controvérsias jurídicas de natureza objetiva relativamente às possibilidades fáticas e
(conflitos normativos). jurídicas", sendo, "por conseguinte,
mandamentos de otimização’ (ALEXY, 2011,
p. 64). Por isso, quando se fala em princípios,
Igualmente, Campos (2013, p. 542) lembra
já não é mais possível a fórmula ‘tudo’ ou
que, de um modo geral, sua ideia está "sempre
‘nada’, como nas regras, pois eles admitem
ligada ao exercício expansivo e vigoroso de
graus diversos de cumprimento, entre um
autoridade pelo Poder Judiciário frente aos
extremo e outro. Mas o objetivo será sempre
demais atores institucionais", seja "impondo-
buscar a aplicação do princípio na maior
lhes obrigações, seja atuando em espaços
medida possível, pois são ‘mandamentos de
tradicionalmente ocupados pelos mesmos”.
otimização” (MOREIRA, 2012, p. 29).
Soares (2010, p. 12), por sua vez, entende o
ativismo indica como um avanço do juiz para O juiz ativista seria, portanto, aquele que
além do campo hermenêutico, "invadindo assume e se utiliza da discricionariedade,
esferas de competência de outros poderes, decide por conta própria, serve-se do
inclusive com o estabelecimento de novas arcabouço jurídico tão somente para dar
condutas não previstas na legislação em aparência de legitimidade às suas preferências
vigor”. No mesmo diapasão, para Machado e que claramente abandona a perspectiva moral
(2008, p. 60), “quando uma jurisdição e principiológica contida nos ensinamentos de
constitucional atua concentrando em si a autores pós-positivistas. Obviamente, o
realização de uma moralidade política, ativismo é condenado por tal corrente. Para
exorbita a sua função” e tem-se o ativismo Dworkin (1999, p. 451-452), ele é uma forma
judicial; e para Nunes Júnior (2014, p. 34), virulenta de pragmatismo jurídico, pois um
“expressa um modo criativo e expansivo de juiz ativista ignoraria o texto da Constituição,
interpretar o direito, potencializando o sentido a história de sua promulgação, as decisões
e o alcance de suas normas, para ir além da precedentes que buscaram interpretá-la,
simples interpretação”. ignoraria tudo isso para impor a outros poderes
o seu próprio ponto de vista sobre o que a
Para parte dos autores que abordam o tema, o
justiça exige.
“ativismo judicial” poderia ser encontrado
quando o Judiciário toma decisões baseadas Na mesma medida, a interpretação da norma
unicamente em princípios e valores baseada em princípios e valores seria
constitucionais, extrapola as regras positivadas consequência natural da interpretação
652
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
constitucional, diferenciando-se assim da disposições dele, que podem ser exercidas com
criação legislativa. razoável grau de discricionariedade. Assim,
De qualquer forma, mesmo nos países de sistema os juízes ativistas, que não acreditam muito nos
continental, os textos constitucionais, ao textos, acham que o Direito fornece uma moldura
incorporar princípios, viabilizam o espaço dentro da qual muitos resultados diferentes são
necessário para interpretações construtivistas, possíveis, e que há escolha entre vários resultados
especialmente por parte da jurisdição possíveis, ou, no mínimo, compatíveis com a
constitucional, já sendo até mesmo possível falar moldura do Direito. Isto não é muito diferente, por
em um ‘direito judicial’. No Brasil, do mesmo exemplo, do que Hans Kelsen escreveu na Teoria
modo, também se observa uma ampliação do Pura do Direito. Essa escolha entre resultados
controle normativo do Poder Judiciário, possíveis (justificáveis, em tese, diante do direito
favorecida pela Constituição de 1988, que, ao posto), não se daria, ademais, de modo
incorporar direitos e princípios fundamentais, exclusivamente interno ao próprio direito, ou
configurar um Estado Democrático de Direito e exclusivamente com base em técnicas de
estabelecer princípios e fundamentos do Estado, interpretação. Ela seria, em larga medida, uma
viabiliza uma ação judicial que recorre a escolha política e teria que ser orientada também
procedimentos interpretativos de legitimação de por critérios políticos e de resultados. Esses
aspirações sociais (CITTADINO, 2004, p. 1). critérios não são externos ou estranhos à aplicação
do direito: eles são inerentes à própria aplicação do
direito. Em outras palavras, a aplicação do direito
Outro ponto comum aos modos de definir não se resumiria a um processo puramente lógico.
Ela envolveria escolhas políticas, ou seja, entre
e/ou de aplicar o “ativismo judicial” se centra resultados mais desejáveis e resultados menos
no fato de tomá-lo como fenômeno desejáveis socialmente (VERÍSSIMO, 2013, p. 56-
comportamental de juízes ou tribunais. Ele 57).
está, portanto, intimamente vinculado à
“vontade”. Pode-se encontrar uma boa síntese
dessa tendência no modo como Barroso Deste modo, para haver o ativismo judicial
caracteriza o ativismo judicial. Para o agora seria necessário “a presença de uma intenção
ministro do STF, ele é criativa, e não apenas de uma interpretação um
pouco mais extravagante do texto normativo”
(LIMA, 2011, p. 34). É certo que a linha que
uma atitude, a escolha de um modo específico e separa a interpretação da criação normativa é
proativo de interpretar a Constituição, tênue, contudo, para haver um ativismo
expandindo o seu sentido e alcance.
Normalmente ele se instala em situações de
judiciário é necessária uma intenção ativa em
retração do Poder Legislativo, de um certo agir de forma a extrapolar a mera interpretação
descolamento entre a classe política e a legal.
sociedade civil, impedindo que as demandas
sociais sejam atendidas de maneira efetiva. A Neste viés, torna-se necessário entender onde
ideia de ativismo judicial está associada a uma estariam os limites da função jurisdicional
participação mais ampla e intensa do Judiciário para, então, compreender quando o agir
na concretização dos valores e fins volitivo do juiz estaria exacerbando suas
constitucionais, com maior interferência no competências interpretativas. Assim, em uma
espaço de atuação dos outros dois Poderes
(BARROSO, 2009, p. 6). legislação aberta e com diversas normas
principiológicas, como se configura a Carta
Constitucional brasileira, abre-se margem para
Veríssimo (2013, p. 56-57) destaca que o uma maior interpretação do judiciário de forma
“ativismo judicial” se insere na perspectiva do a adequar a legislação ao caso concreto.
realismo judicial, corrente segundo a qual a Contudo, não se pode confundir esta
decisão não está vinculada à interpretação da interpretação mais abrangente com criação
norma geral ou, ainda, à inserção dos casos normativa. Da mesma forma, não se pode
particulares ao conjunto limitado de denominar essa interpretação como ativismo
possibilidades que a lei oferece, e sim à judiciário sem que se considere a vontade do
vontade do juiz, às preferências e as juiz ao agir, ou seja, sem considerar a intenção
volitiva do agente e os limites da atuação deste,
653
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
não se pode determinar se a atitude será são analisados a partir da qualidade que é
considerada ativismo judicial ou não. associada a esses atos, seguindo critérios mais
ou menos objetivos, sem preservar a
Portanto, para que se considere um ato como
deferência ao legislador19. O segundo implica
ativismo judicial este deve ser exercido de
decidir sem observar os precedentes (stare
forma pró-ativa, devendo o juiz agir com a
decicis20) ou os padrões de julgamento
intenção de efetuar uma tarefa para o qual não
aplicados anteriormente, e preferir não apenas
teria a competência.
inovar, mas o fazer baseado em critérios
Vale (2009), ao mencionar as causas de uma próprios, de conveniência ou interesse. É
maior intervenção judicial na esfera política, importante frisar que a inovação e a revogação
fala sobre a amplitude que a Constituição dos precedentes estão previstas na “ortodoxia”
Federal trouxe a atuação do Poder Judiciário: ao julgar um caso particular, porém a questão
indica aqui é fazê-lo deliberadamente e,
aparentemente, sem justificativa, a não ser a
Com a revolta contra o formalismo, os juízes
própria disposição do juiz. O terceiro afirma a
conquistaram espaço para uma maior liberdade
de condições (discricionariedade) e, criação judicial do Direito, situação em que, ao
consequentemente, criatividade, porque quanto julgar um caso, ocorre a criação de direitos e a
mais vaga a lei, e mais imprecisos os elementos inovação legislativa. Como pontua
do direito se demonstravam, mais amplo se Continentino (2012, p. 143) as Cortes ativistas
tornava o espaço deixado à discricionariedade
seriam aquelas que, "ao desprezarem os limites
nas decisões judiciárias (VALE, 2009, p. 34).
de suas próprias atribuições e o princípio da
separação de poderes, criam direito novo, a
Pode-se destacar mais uma vez, então, a pretexto de interpretá-lo”. Nesses casos, o
contribuição de Kmiec (2004, p. 1463-1476), judiciário deixa de atuar como “legislador
na qual ele procura sistematizar os diferentes negativo”, que determina a
sentidos – e tipos – de “ativismo judicial” e, inconstitucionalidade das leis, para
assim, precisar ou delimitar o conceito. O desenvolver atividade legislativa propriamente
primeiro é invalidar atos presumivelmente dita. O quarto sentido é o abandono da
constitucionais dos outros poderes, pois eles metodologia de interpretação corrente e a
adoção da “interpretação criativa”. Por fim, o
19
Uma situação ocorrida no Brasil pós-1988 em torno demonstram em relação ao legislador,
do STF, referenciada por Vieira (2008, p. 452), democraticamente eleito. O que não significa omissão,
exemplifica esta tendência: a “naturalidade com que o mas, sim, o estabelecimento de claros parâmetros de
Supremo se colocou para avaliar a escolha política separação de poderes, em que o judiciário sabe que a ele
substantiva, no caso, com ampla repercussão moral, não foi conferido um poder de inovar na ordem jurídica.
previamente realizada pelo legislador ordinário. Esta Embora o Supremo tenha desde muito cedo em sua
questão foi suscitada da tribuna, de forma expressa, por história tido uma postura de se permitir substituir
Luiz Roberto Barroso, advogado em um dos amici. Para decisões do legislador, especialmente quando estas
o ilustre professor, o Tribunal deveria levar em afrontam direitos, o fato é que não costumava eliminar
consideração o fato de que a lei [de pesquisa com de forma tão radical argumentos que tomassem em
células-tronco] havia sido aprovada por uma consideração a necessidade de uma conduta deferente.
esmagadora maioria do Congresso Nacional, após um O que ficou claro é que o Supremo não se vê apenas
amplo processo de consultas e debates, inclusive com a como uma instituição que pode vetar decisões
realização de audiências públicas, em que foram ouvidas parlamentares claramente inconstitucionais, mas que
as diversas posições da sociedade brasileira. Não pode comparar a qualidade constitucional das decisões
havendo inconstitucionalidade flagrante, mas apenas parlamentares com as soluções que a própria Corte
ponderação legislativa legítima, o Tribunal deveria venha a imaginar, substituindo as decisões do
abster-se de substituir a decisão do legislador pela sua. parlamento caso entenda que as suas são melhores”.
Antes de iniciar o seu voto, a Ministra Carmem Lúcia 20
A expressão latina significa "ficar com as coisas
afastou com veemência este argumento, sendo decididas" e indica, no universo do commom law que,
explicitamente acompanhada pelo Ministro Marco por regra, um caso equivalente deve ser julgado da
Aurélio. Logo, não se abriu qualquer espaço para uma mesma forma, logo, as decisões judiciais criam
discussão sobre deferência, muito comum em outros precedentes e vinculam aquelas que serão emitidas no
tribunais constitucionais ao redor do mundo. Entendida futuro.
por deferência a postura respeitosa que muitos tribunais
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
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O artigo 103 da Constituição estabelece quem são os Federal; o Governador de Estado ou do Distrito
legitimados para propor junto ao STF a ação direta de Federal; o Procurador-Geral da República; o Conselho
inconstitucionalidade, quais sejam: o Presidente da Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; partido
República; a Mesa do Senado Federal; a Mesa da político com representação no Congresso Nacional; e
Câmara dos Deputados; a Mesa de Assembleia confederação sindical ou entidade de classe de âmbito
Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito nacional.
656
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
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657
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b
Programa de Pós Graduação em Memória Social e Patrimônio Cultural da Universidade Federal de Pelotas, email:
julianeserres@gmail.com
RESUMO
A preservação do patrimônio histórico brasileiro, atua como um propulsor do desenvolvimento social
e econômico e fortalece a cultura ao reafirmar a própria identidade nacional, bem como as identidades
locais. As cidades históricas, ao se tornarem centro dos programas federais, passaram a receber
incentivos públicos para a sua funcionalização e revitalização. O Programa de Cidades Históricas, foi
o primeiro programa federal que investiu recursos para a recuperação do patrimônio urbano. Na
segunda metade da década de 90, surgiu o Programa de Preservação do Patrimônio Histórico Urbano,
o Programa Monumenta, implementado a partir do ano 2000 que atuou em 26 cidades históricas do
Brasil, entre elas, a cidade de Pelotas, tendo iniciado suas ações em 2001. Em 2009 surgiu o Programa
de Aceleração do Crescimento, que abrange ações de promoção visando divulgar sítios históricos,
monumentos e espaços públicos brasileiros. Este estudo objetivou revisar as políticas públicas de
preservação ao patrimônio no Brasil, descrever os principais programas federais de preservação e a
analisar o investimento público dos programas Monumenta e PAC-CH na cidade de Pelotas. Conclui-
se que a preservação do Patrimônio edificado via investimento público, juntamente com a gestão dos
patrimônios, provoca a utilização e manutenção do bem, gera empregos, aumenta a atratividade
turística local, bem como promove equilíbrio financeiro.
Palavras-chaves: Patrimônio, Turismo, Preservação.
ABSTRACT
The preservation of the Brazilian historical heritage acts as a driver of social and economic
development and strengthens the culture to reaffirmation of the own national identity, as well as the
local identities. Since the historic cities become the center of federal programs, they started to receive
public incentives for its functionalization and revitalization. The program of Historic Cities was the
first federal program that has invested resources for recovery of urban heritage. In the second half of
the decade of 90, the Program of preservation of the Urban Historical Heritage arised, called
“Monumenta Program”, implemented in the year 2000, which starred in 26 historic cities of Brazil,
among them, the city of Pelotas, having started its activities in 2001. In 2009 came the Growth
Acceleration Program, which covers promotional actions aiming to disclose historical sites,
monuments and public spaces. This study aimed to reviewing the public policies of preserving the
heritage in Brazil, describe the key federal programs of preservation and to analyze the public
investment of the Monumenta programs and PAC-CH in the city of Pelotas. In conclusion, the
preservation of patrimony built by public investment, along with the management of assets, causes
the utilization and maintenance of the property, generates jobs, increases the local tourist
attractiveness, as well as promotes financial equilibrium.
Key words: Heritage, Tourism, Preservation.
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gerou um maior contato com os programas foram lançadas questões conceituais relevantes
nacionais de desenvolvimento e do IPHAN. sobre a preservação dos núcleos históricos,
Além das restaurações empreendidas, foram como o peso que as atividades voltadas para o
executados projetos de desenvolvimento de turismo devem exercer; a permanência de usos
atividades econômicas, de qualificação e populações tradicionais; a articulação com
profissional em restauro e conservação e de outras políticas urbanas e sociais e o papel do
criação de núcleos de educação profissional Estado e do mercado na proteção do
em cidades históricas em 12 dos 17 Estados: patrimônio (MONUMENTA, 2010).
Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Goiás,
Maranhão, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, O Monumenta trabalhou com sítios
Pará, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio históricos e grupos urbanos, levando em
Grande do Sul, Sergipe, Santa Catarina, São consideração a especificidade de cada caso e
Paulo e Tocantins, o que demonstra a situação. A integração de projetos relacionados
abrangência de atuação em relação ao universo a preservação, necessitam de continuidade no
de locais abrangidos e assinala a compreensão desenvolvimento de propostas sustentadas ao
do programa com relação aos elementos e longo do tempo para que não estejam limitados
ações que circulam e ultrapassam a restauração a declarações isoladas, atuando com propostas
do monumento em si (DUARTE JÚNIOR, de intervenções específicas. Como política
2010). pública de preservação patrimonial, o
programa definiu um amplo quadro de ação e
O programa teve como meta a auto estabeleceu a base para projetos futuros na área
sustentabilidade das diferentes regiões no que de intervenção.
se refere à preservação do patrimônio cultural
e o apoio à reabilitação de centros históricos se O MinC convidava os Municípios elegíveis,
deu pelos ideais de sustentabilidade da que tivessem; sítio tombado em nível federal,
preservação do patrimônio histórico e artístico FUMPACH, UEP, que os sítios históricos
nos núcleos urbanos em conjunto com o fossem no perímetro urbano e que a cidade
desenvolvimento de atividades econômicas, tivesse representatividade histórica, cultural e
principalmente o turismo, garantindo assim a arquitetônica à nível nacional e apresentava o
manutenção do patrimônio (BONDUKI, projeto e após a aprovação desta, iniciava-se
2010). estudos de viabilidade. Posteriormente a
aprovação desses estudos, assinava-se o
O financiamento para a recuperação dos convênio de financiamento com o MinC e o
imóveis privados surgiu como o principal contrato de repasse com a CEF, para execução
instrumento do Monumenta, para intervir de do projeto e respectivas prestações de contas.
forma abrangente nos centros históricos e em Cada Município deveria criar uma UEP
consonância com os objetivos expostos. Essa vinculada no mínimo a uma secretaria de
ação exigiu muito esforço para se efetivar, pois governo e dirigida por um secretário
representava a possibilidade de atuação para executivo, cabendo a ele a coordenação dos
além dos conjuntos protegidos e dos espaços projetos, apresentação de relatórios e pedidos
públicos, atingindo diretamente as de desembolso à CEF. Nesta etapa, esperava-
comunidades, melhorando a vida das pessoas se que no prazo de cinco anos, não houvesse
que realmente fazem os centros históricos e mais necessidade de recursos federais para a
isto exigiu uma parceria entre todos os manutenção de bens restaurados
envolvidos. (GIANNECHINI, 2014).
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As ações priorizadas pelo programa, foram monumento com a cidade, contribui para
selecionadas nos Municípios que tivessem ganhar força e espaço, principalmente no
finalizado, a primeira etapa denominada pelo IPHAN (CARMO, 2017).
IPHAN de Plano de ação das cidades Esse programa que têm início, meio e fim,
históricas, que possuíssem bens com promovendo a retomada do planejamento e
tombamento federal concluído, que estivessem execução de grandes obras de infraestrutura
inscritos na lista do patrimônio Mundial da social, urbana, logística e energética do país,
Unesco, que fossem conjuntos urbanos macros contribuindo para o seu desenvolvimento
na ocupação territorial, e/ou apresentassem acelerado e sustentável. Idealizado como um
urgência na salvaguarda de seu patrimônio. Os plano estratégico de resgate do planejamento e
programas federais de preservação, trouxeram de retomada dos investimentos em setores
uma cultura da preservação que foi se estruturantes do país, o PAC-CH foi
solidificando e ganhando mais adeptos no país importante para o aumento da oferta de
e acabaram estabelecendo diretrizes de ação
empregos e na geração de renda, e elevou o
por todo o país e estimulou à criação de órgãos investimento público e privado em obras
e instituições de preservação nas outras esferas fundamentais (MINISTÉRIO DA CULTURA,
de governo. 2012). Em 2011, o PAC entrou em sua segunda
A reflexão sobre a ampliação do patrimônio fase, tendo o mesmo pensamento estratégico,
no Brasil, a intensificação das discussões entre porém aprimorados pelos anos de experiência
gestores, técnicos e pesquisadores da área, o da fase anterior contando com mais recursos e
aumento da ênfase em outros aspectos da parcerias com Estados e Municípios com a
cultura (como o patrimônio imaterial), a principal finalidade de melhora na qualidade
reflexão sobre concentração de historicidade de vida nas cidades brasileiras. A segunda fase
nos monumentos alvos dos programas, e a do programa, contempla ações
incorporação do discurso da relação do intergovernamentais articuladas com a
monumento com a cidade, foi ganhando força sociedade para a preservação do patrimônio
e espaço, principalmente no IPHAN, à medida brasileiro, valorizando a cultura e promovendo
que os programas se estenderam, a partir das o desenvolvimento econômico e social, com
críticas, dificuldades de implementação, dos sustentabilidade e qualidade de vida para os
sucessos obtidos em cada ação e das cidadãos (MINISTÉRIO DA CULTURA,
discussões internacionais proporcionadas 2012).
pelos encontros dos profissionais da área e a O PAC-CH objetivava ampliar a abrangência
difusão das resoluções através das cartas da estratégia do desenvolvimento conservando
patrimoniais, declarações, compromissos, imóveis tombados, recuperando as edificações
normas, recomendações, convenções e destinadas a atividades que favoreçam os sítios
tratados (POZZER, 2011). históricos, posicionando o patrimônio como
A partir das ideias e práticas concebidas pelo eixo estruturante e indutor. Inicialmente atou
PAC-CH, é possível dizer que uma cultura da em 44 cidades de 20 Estados da Federação,
preservação foi se solidificando e ganhando dispondo de um total de 1,9 bilhões de reais até
adeptos no Brasil inteiro. E isto, estabeleceu o ano de 2015. Sendo R$ 1,6 bilhões para as
diretrizes de ação em quase todo o território obras públicas e R$ 300 milhões para uma
nacional e impulsionou a criação de órgãos e linha de crédito para proprietários de imóveis
instituições de preservação a nível estadual e de cidades tombadas pelo IPHAN. Este
municipal. A reflexão sobre a ampliação do programa busca a promoção do patrimônio
campo do patrimônio no Brasil, seja nas cultural, o desenvolvimento econômico social,
discussões entre gestores, técnicos e valorizando as cadeias produtivas locais, a
pesquisadores da área, no aumento da ênfase restauração de monumentos protegidos e a
em outros aspectos da cultura, na reflexão recuperação e revitalização das cidades. O
sobre concentração de historicidade nos PAC-CH tem sido executado de modo diverso
monumentos alvos dos programas, e na e tem repetido, alguns erros dos programas
incorporação do discurso da relação do anteriores, uma vez que ao cortar o
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realizaram atividades de capacitação de mão In: Anais do Museu Paulista. São Paulo. v. 24.
de obra, resgatando técnicas construtivas n. 1. p. 15-57. jan-abr. 2016.
tradicionais do Patrimônio Arquitetônico da CUNHA. Cláudia dos Reis. Restauração:
região, buscaram experientes artífices a fim de diálogos entre a teoria e prática no Brasil nas
transmitirem seus conhecimentos e, assim, experiências do IPHAN. Tese (Doutorado em
capacitaram trabalhadores da construção civil Arquitetura e Urbanismo) – Faculdade de
de Pelotas. Conclui-se que a preservação do Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São
Patrimônio edificado via investimento público, Paulo, São Paulo, 2010.
juntamente com a gestão dos patrimônios,
provoca a utilização e manutenção do bem, DUARTE JUNIOR. Romeu. Programa
gera empregos, aumenta a atratividade turística MONUMENTA: Uma Experiência em
local, bem como promove equilíbrio Preservação Urbana no Brasil. In: Revista
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RESUMO
Este estudo é o recorte de uma proposta de tese, em andamento, para o doutoramento em Educação.
A temática consta da discussão acerca das implicações da regulamentação da profissão de Educação
Física (Lei 9.696/98) e consequente reforma curricular. Objetiva analisar as implicações dos discursos
da Lei 9.696/98 e dos respectivos Conselhos Federal e Regionais de Educação Física (Confef/Cref’s)
acerca das identidades da Educação Física, a partir de então. Inicialmente foi realizado um Estado do
Conhecimento com o intuito de verificar o que se publicou acerca do tema. Constatou-se que a
regulamentação foi resultado de intensos debates e disputas na área e que a reforma se deu de maneira
aligeirada e insegura, resultando em currículos praticamente iguais. Também, de acordo com os
estudos, constatou-se a atuação marcante e decisiva do Confef/Cref’s. O estudo justifica-se, somado
ao que se averiguou no Estado do Conhecimento, devido a um significativo número de processos
judiciais, resultantes das interpretações da Lei9.696/98, das atuações e dos discursos dos conselhos
Confef/ Cref’s acerca dos espaços que devem ser ocupados pelos profissionais da área. A partir da
hipótese de que está ocorrendo certo esmaecimento ou deslizamento de identidades profissionais. Em
especial, reduzindo-se o bacharelado ao ramo das atividades físicas com um viés restrito e
apequenado, em virtude da Lei 9.696/98. Como ferramenta de análise propõe-se utilizar-se da Análise
de Discurso em Foucault.
Palavras chave: Confef/Cref’s, Regulamentação da Educação Física, Identidades.
ABSTRACT
This study is the clipping of a thesis proposal, in progress, for a PhD degree in Education. The theme
focuses on the discussion concerning the implications of the regulation of the profession of Physical
Education (Law 9.696/98) and consequent curriculum reform. It aims at analyzing the implications
of the discourses of the Law 9.696/98 and the respective Federal and Regional Physical Education
Councils (Confef/Cref’s) about the identities of Physical Education, since then. Initially a Knowledge
State was carried out and then it was possible to notice that the regulation was a result of intense
debates and disputes in the field and the reform occurred in a lightened and uncertain way, resulting
in virtually equal curricula. Also, according to the studies, it was possible to notice a remarkable
performance from the Confef/Cref’s Councils. The study is justified, added to what was investigated
in the Knowledge State, due to a significant number of court cases, resulting from interpretations of
the Law 9.696/98, and the discourses of the Confef/ Cref Councils. Based on the hypothesis that there
is some weakening of some professional identities, specially the one concerning the bachelor degree
in the field of physical activities with a limited and belittled bias, due to the Law 9.696/98. There is
the intention of using Foucault’s Discourse Analysis as analysis tool.
Keywords: Confef/Cref’s, Regulation of Physical Education, Identities.
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A data foi criada pelo Confef. A parcela favorável à Física, independentemente da formação, comemorando
regulamentação e separação na formação comemora a seu dia em 15 de outubro, o dia do professor.
data. Paralelamente, há um movimento contra a
regulamentação que se considera professor de Educação
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Valter Bracht na obra intitulada “Educação Física e permeiam seu debate. O autor tensiona a busca da área
ciência: cenas de um casamento (in) feliz”, estabelece a um Status de ciência, na dificuldade de atribuírem-se
um diálogo acerca dos questionamentos dos campos e contornos à área e na reflexão quanto ao objeto da
da epistemologia da Educação Física, ao longo de sua Educação Física.
história. Questões como: “Educação Física é ciência?”,
“A Educação Física está a reboque de outras ciências?”,
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De acordo com Finoqueto (2012) a resolução foi o disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a
golpe final para a reforma. Sua redação causou confusão
e interpretações equivocadas com os termos graduados prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse
e licenciados. A tese da autora é de que, pelo fato, da público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos
resolução alternar os termos, somado, ao movimento costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao
tecnicista de parcela da área, consequentemente, a partir
desta, a reforma curricular em Educação Física exercício de atividades econômicas dependentes de
consolidou-se em todo o pais. concessão ou autorização do Poder Público, à
29
CTN: Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos
direitos individuais ou coletivos. (BRASIL, 1966).
da administração pública que, limitando ou
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30 31
Contato realizado por mim com o Mec a partir do Para mais ver:
serviço de ouvidorias ao cidadão : http://www.stj.jus.br/repetitivos/temas_repetitivos/pesq
http://portal.mec.gov.br/ . A resposta de Protocolo uisa.jsp?&l=1&i=647&tt=T. Acesso: 16/11/2018.
23546.025774/2018-19 foi enviada por e-mail.
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fiscalizar e determinar as atuações dos acordo com o que foi assentado pelo Tribunal a
profissionais. quo, os profissionais indevidamente autuados
desempenham atividades que tem por escopo
Como mais um modelo para análise acerca principal não atividade física em si, mas a
das implicações da Lei 9.696/98 e dos expressão cultural, espiritual e etc. (BRASIL,
discursos e investidas do Confef/Cref, no site 2016).
do Superior Tribunal de Justiça (BRASIL,
2015) há 2 informativos de jurisprudência, Somando-se a questão, corre desde 2007 um
quanto a não necessidade de profissionais da projeto de Lei 1.371/2007 (BRASIL, 2007)
dança, yoga, artes marciais, capoeira e que vem sendo arquivado e reaberto diversas
Pilates32, serem filiados ao Confef, liberando- vezes, atualmente reaberto por Alice Portugal
os para o livre exercício de suas funções, em do (PCdoB/BA) propondo acrescentar
virtude de várias ações movidas pelo conselho. parágrafo único à Lei de regulamentação da
De acordo com as decisões jurídicas, observa- Educação Física 9.696/98 ao artigo 2º.
se uma compreensão muito restrita à Determinando que não estão sujeitos à
identidade do meio face às interpretações da fiscalização dos Conselhos os profissionais da
Lei 9.696/98. Dança, Yoga, Artes Marciais, Pilates, Capoeira
Em suas justificativas, os “árbitros” associam (seus instrutores e academias). Tendo-se como
à Educação Física somente a performance e o último movimento em 2017 sido o projeto
alto rendimento, pois segundo estes não há apensado a outros projetos de lei, aguardando
como depreender da Lei 9.696/98 o que cabe a tramitação.
especificamente à área. Quando se referem à Embora tenha sido apresentado acima a
expressão corporal – no caso da dança – ou decisão final do STF, considera-se este fato um
manifestação cultural – como para a capoeira potente dado de análise acerca dos discursos
–, não contemplam a Educação Física, em suas produzidos a partir da Regulamentação e
interpretações. A exemplo na decisão judicial, separação da profissão. A Fisioterapia, graças
considerada como recurso para jurisprudência ao método Pilates, tem abarcado grande
o Recurso Especial Nº 1.568.434 - SC parcela do mercado, inclusive como uma
(2015/0294145-1) (BRASIL, 2016) quando espécie de Personal Training, uma das únicas
cita a Lei 9.696/98 como base para suas atuações restantes à área do bacharelado, de
decisões: acordo com o que pretende -se discutir neste
estudo. Como justificativa para o projeto de
Os regramentos assim transcritos se limitam a lei, Alice Portugal cita:
definir os requisitos para a inscrição nos
Conselhos Regionais (art. 2º) e a dispor sobre as A despeito de considerar a profissão de Educação
atribuições a cargo dos profissionais de educação Física uma atividade necessária e importante,
física (art. 3º), sem explicitar, com maior clareza, reconhecida internacionalmente pelas
quais seriam as possíveis atividades abarcáveis contribuições que dá à sociedade, acredito que
no espectro dos afazeres físicos e do desporto, esta profissão tem suas especificidades próprias
próprios dos profissionais de educação física. que diferem das demais manifestações culturais
Assim vê-se que não é possível extrair dos e artísticas, ofícios e expressões corporais que se
artigos transcritos comando normativo que aperfeiçoaram ao longo dos séculos, muitas delas
obrigue a inscrição dos professores e mestres de se transformando em atividades profissionais,
danças, ioga e artes marciais nos Conselhos de outras em tradições culturais dos povos.
Educação Física. (BRASIL, 2016). (BRASIL, 2007).
32
Método criado pelo Alemão Joseph Hubertus Pilates variados com fins de condicionamento físico e
no início do século XX. Utiliza-se molas e exercícios reabilitação.
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corporal, dentre outros, tão caros à área, são Licenciaturas em Dança, este último, alega ser
rechaçados. a dança uma área do conhecimento das Artes e
que deva ser desenvolvido por seus
Apesar da intrínseca ligação entre a técnica de profissionais, já que para estes esta é uma
Pilates e a Dança, é preciso destacar que o expressão cultural do movimento. Dentre as
Método Pilates trabalha com conceitos
multidisciplinares, uma vez que propõe a
justificativas é de que para a Educação Física a
interação consciente entre corpo e mente através dança seria associada à performance e ganho
da concentração dirigida aos movimentos de massa muscular, apenas.
executados, buscando com isso ampliar a O Confef/Cref’s a partir de 2010, começou a
consciência corporal, reeducar movimentos que elaborar resoluções com o intuito de afirmação
se encontram mecanicamente desorganizados,
treinar o corpo para realização de movimentos
do que compete à Educação Física. Em virtude
variados, promover bem-estar físico e mental destas e de outras demandas. Cada área de
entre outros. (BRASIL, 2007). atuação é explicada à exaustão por parte do
conselho, no intuito de ratificar os espaços de
Ao longo do texto a propositora demonstra atuação de seus filiados, como o Pilates, a
desinformação quanto às históricas conquistas Capoeira, o treinamento desportivo, o
da Educação Física, e às relações da yoga, artes treinamento funcional33, dentre outros.
marciais e capoeira com a Educação Física, Demarcando territórios e marcas identitárias.
reforçando o ideário simplista que tem sido Outro exemplo, está no Conselho Federal de
associado às identidades deste âmbito, em Fisioterapia e Terapia Ocupacional (Coffito).
especial ao trecho de seu discurso, quanto De acordo com a Resolução 413 de 2012
ratifica a promoção do bem-estar físico e (Coffito, 2018) o Treinamento Funcional faz
mental apartados da Educação Física. parte das competências profissionais dos
Após as análises dos discursos oficiais, bem Fisioterapeutas. Assim como o Pilates, o
como, das interpretações jurídicas e diversas Treinamento Funcional faz parte das
compreensões acerca das identidades e ferramentas de trabalho da Educação Física.
espaços associados à Educação Física, Este “embate em campo” evidencia os espaços
apresenta-se algumas disputas entre áreas. e identidades atribuídos e disputados pelas
duas áreas. Objetivando-se aqui apresentar
possíveis dados de análise, quanto ao que vem
As posses de bola ocorrendo no âmbito. Apresenta-se a seguir
Em sua última versão a Base Nacional algumas breves considerações finais.
Comum Curricular (BNCC) Brasil (2018),
contempla a dança, e as lutas, entre outras Considerações finais
unidades temáticas, entre os conteúdos da O que se pretende neste texto é apresentar
Educação Física escolar. Em março de 2016 alguns indícios acerca do que vem ocorrendo
ocorreu nas dependências do MEC uma no âmbito da Educação Física nestes 20 anos
reunião com representantes da área da Arte de regulamentação da profissão. Um recorte
(especificamente da Licenciatura em Dança e acerca de como apresenta-se o cenário da área,
professores de Educação Física, convidados para analisar as implicações dos discursos da
pelo Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte Lei 9.696/98 e dos respectivos Conselhos
(CBCE). Federal e Regionais de Educação Física
A pauta da reunião foi o impasse, entre as (Confef/Cref’s) acerca das identidades da
áreas, acerca do conteúdo de dança. Educação Física, com uma proposta de Análise
Historicamente a dança é um conteúdo da do Discurso em Foucault. Nos discursos que
Educação Física, com o surgimento das
33
Modalidade que se utiliza de movimentos básicos com de suas ferramentas de trabalho, com o Parecer n.
a mobilização do corpo todo com os mais diversos 002/2016. Os fisioterapeutas estão atuando como
objetivos. No ano de 2016 o Conselho Federal de personais trainings com os métodos Treinamento
Fisioterapia e Terapia Ocupacional da quarta região Funcional e Pilates.
(Crefito-4) conseguiu incluir a modalidade como uma
681
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
circulam e fazem circular, que produzem e são Professores da Educação Básica, em nível
produzidos, na posse de bola em disputa. superior, curso de Licenciatura, de
graduação plena. Brasília/DF, 2002.
Observam-se deslizamentos identitários e
que indicam a não garantia de atuação apenas [6] BRASIL. Conselho Nacional de
à Educação Física, conforme aspirou-se na Educação/Conselho Pleno. Resolução n.2, de
efetivação da regulamentação e da reforma
19 de
curricular. São as verdades sendo produzidas
fevereiro de 2002. Institui a duração e a
a partir de discursos e produzindo
carga horária dos cursos de Licenciatura,
subjetividades que interessam para a futura
de graduação plena, de formação de
proposta. Que subjetividades profissionais
professores da Educação Básica em nível
estão sendo produzidas com tais discursos? superior. Brasília/DF, 2002
Discursos que falam acerca de identidades34,
produzindo verdades e subjetividades. [7] BRASIL, Conselho Nacional de
Considerando-se o futebol como um discurso Educação/Câmara de Educação Superior.
mais potente que o próprio esporte, em um Resolução n.07 de 31 de março de 2004.
conjunto de leis, instituições e representações Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para
do que o “conjunto futebol” venha a ser os Cursos de Graduação em Educação Física,
“chamado” enquanto verdades. A Educação em nível superior de graduação plena, 2004.
Física, suas instituições, legislações e
compreensões acerca de si, também [8] BRASIL, Câmara dos Deputados. Projeto
compreendidas neste sentido. A Educação de Lei 1.371/2007 (Dança, Artes Marciais,
Física e suas regras oficiais como produção de Capoeira e Pilates ), 2007.
subjetividades.
[9] BRASIL, Ministério da Educação,
REFERÊNCIAS Conselho Nacional de Educação/Câmara de
Educação Superior. Resolução n. 274/2011,
[1] BRACHT, Valter. Educação Física & 2011.
ciência: cenas de um casamento (in)feliz. 2.ed.
[10] BRASIL, Ministério da Educação,
Ijuí/RS: Unijuí, 2003. 160p. (Coleção
Conselho Nacional de Educação/Câmara de
Educação Física).
Educação Superior. Resolução n. 255/2012,
[2] BRASIL, Código Tributário Nacional.
2012.
Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e
institui normas gerais de direito tributário [11] BRASIL, Ministério da Educação,
aplicáveis à União, Estados e Municípios, Coordenação Geral de Legislação e Normas de
1966. Regulação da Educação Superior/Secretaria de
[3] BRASIL, Lei de Diretrizes e Bases, 1996. Regulação e Supervisão da Educação Superior
(CGLNRES/ SERES). Nota Técnica Nº 392
[4] BRASIL, Lei 9.696. Dispõe sobre a
Atuação dos Conselhos Profissionais, 2013.
regulamentação da Profissão de Educação
Disponível em:
Física e cria os respectivos Conselho Federal e
http://portal.mec.gov.br/component/content/ar
Conselhos Regionais de Educação Física,
ticle/400-secretarias-112877938/seres-
1998.
regulacao-e-supervisao-da-educacao-superio-
[5] BRASIL. Conselho Nacional de 1288707557/18540-perguntas-frequentes-
Educação/Conselho Pleno. Resolução n,1, de seres . Acesso: 28/05/2018.
18 de
fevereiro de 2002, Institui Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Formação de
34
Algo não fixo, mas como discursos e práticas que produzem subjetividades e os constroem como sujeitos.
interpelam, convocam sujeitos sociais de discursos (HALL. 2000).
particulares a ocuparem espaços, processos aos quais
682
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
b
Instituto de Educação/Universidade Federal do Rio Grande, gabynogueira@me.com
RESUMO
O presente trabalho trata de uma pesquisa qualitativa com base nos pressupostos de Bogdan e Biklen
(1994), e utiliza da análise documental (CELLARD, 2016) para investigar as concepções de leitura e
escrita que vêm sendo propostas para Educação Infantil a partir dos documentos oficiais nacionais.
Nela analisamos os documentos normativos e orientadores para Educação Infantil publicados a partir
da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB em 1996 até a publicação
do documento orientador Pacto Nacional para Alfabetização na Idade Certa – PNAIC 2017. Dentre
os documentos estão as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil – DCNEI, os
Referenciais Curriculares Nacionais para Educação Infantil – RCNEI e a Coleção Leitura e Escrita
na Educação Infantil. Seguimos os referenciais teóricos de autores como Soares (1998), Ferreiro e
Teberosky (1999) e Galvão (2016) para discutir as questões pertinentes à temática em estudo. Dos
resultados, identificamos diferentes termos que designam as propostas para a leitura e a escrita na
Educação Infantil, entre eles estão letramento e cultura escrita. Portanto, os documentos apresentam
diferentes perspectivas que ora convergem com as especificidades no trabalho com a leitura e a escrita
na Educação Infantil ora divergem representando rupturas conceituais.
Palavras chave: Educação Infantil, leitura, escrita.
RESUMEN
El presente trabajo trata de una investigación cualitativa con base en el presupuesto de Bogdan y
Biklen (1994), y utiliza del analice documental (CELLARD, 2016) para investigar las concepciones
de la lectura y escritura que ven siendo propuesta para Educación Inicial a partir de los documentos
oficiales nacionales. Analizamos el documentos normativos y orientadores para Educación Inicial
publicados a partir de la promoción de la “Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional para a
Educação Nacional – LDB” en 1996 hasta la publicación del documento orientador “Pacto Nacional
para Alfabetização na Idade Certa – PNAIC 2017”. Entre los documentos están las “Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação Infantil – DCNEI”, los “Referenciais Curriculares Nacionais
para Educação Infantil – RCNEI” y la “Coleção Leitura e Escrita na Educação Infantil”. Seguimos
los referenciales teóricos del autores como Soares (1998), Ferreiro y Teberosky (1999) y Galvão
(2016) para discutir las cuestiones pertinentes la temática en estudio. De los resultados, identificamos
diferentes termos que designan las propuestas para la lectura y la escritura en la Educación Infantil,
entre ellos están letramento y cultura escrita. Por tanto, los documentos presentan diferentes
perspectivas que ora convergen con las especificidades en el trabajo con la lectura y la escritura en la
Educación Inicial ora divergen representando rupturas conceptuales.
Palabras clave: Educación Inicial, lectura, escritura.
684
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
35“Educação Infantil no Brasil” (1994), “Por uma e Pré-escolas que respeite os Direitos Fundamentais das
Política de Formação do Profissional da Educação Crianças” (1995) e Proposta Pedagógica e Currículo
Infantil” (1994), “Educação Infantil no Brasil: Situação para Educação Infantil (1996).
Atual” (1994), “Critérios para Atendimento em Creches
685
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
Com base nos resultados, realizamos um escola, passou a atender as crianças dos 4 aos
panorama contendo algumas orientações sobre 5 anos de idade. Além das legislações que
o desenvolvimento do trabalho com a leitura e estabelecem a obrigatoriedade da oferta pré-
a escrita na Educação Infantil a partir dos escolar, o Plano Nacional de Educação – PNE
documentos normativos que são os Pareceres (BRASIL, 2014) também reforça esta ação
que tratam das DCNEI (1998) e DCNEI traçando como meta a universalização desta
(2009); e dos documentos orientadores RCNEI etapa escolar até o ano de 2016. Ao
(1998) e a Coleção Leitura e Escrita na analisarmos as políticas nacionais para
Educação Infantil (2016). Estes documentos Educação Infantil percebemos que as
passam a ser corpus dessa pesquisa, pois mudanças nas legislações implicaram na
apresentam orientações mais específicas para o elaboração e implementação de documentos
trabalho com a leitura e escrita na Educação normativos e orientares destinados a essa etapa
Infantil e serão discutidos neste artigo. escolar.
No que se refere aos documentos normativos,
o Parecer nº 22/98 que estabelece as DCNEI
Resultados e discussão
(1998) é um documento de caráter mandatório
Para dar início a discussão destacamos alguns que emerge após a LDB e tem como base o
movimentos da legislação que reorganizaram a cuidado aliado a intencionalidade educativa.
Educação Infantil nestas últimas décadas. A Este documento enfatiza propostas
começar pela LDB, que em 1996 determinou a pedagógicas para esta etapa escolar, e com
Educação Infantil às crianças com faixa etária relação à leitura e escrita utiliza o termo
de 0 a 6 anos de idade, no entanto, a linguagens no sentido de comunicação e
promulgação da Lei nº 11.114 de 2005 e a Lei expressão manifestadas pelas próprias
nº 11.274 de 2006 provocaram alterações na crianças:
LDB. A primeira definiu como obrigatória a
matrícula das crianças com 6 anos de idade no
Ensino Fundamental. A segunda estabeleceu a […] nos primeiros cinco a seis anos de vida dos
ampliação do Ensino Fundamental para nove seres humanos, que incapazes de falar,
locomover-se e organizar-se, ao relacionar-se
anos, reafirmando a obrigatoriedade do com o mundo a seu redor, de maneira
ingresso das crianças aos 6 anos de idade nesta construtiva, receptiva, positiva, passam a mover-
etapa escolar. Através destas legislações a se, comunicar-se através de várias linguagens,
Educação Infantil passou a compreender a criando, transformando e afetando suas próprias
faixa etária do 0 aos 5 anos de idade. circunstâncias de interação com pessoas, eventos
e lugares (BRASIL, 1998a, p. 6-7).
Posteriormente, a Emenda Constitucional nº
59 publicada em 2009 e a Lei nº 12.796 no ano
de 2013 provocaram alterações significativas Nas DCNEI (1998) as linguagens são
no que se refere à Educação Infantil, dentre reconhecidas como meio de desenvolvimento
elas: a educação gratuita e a obrigatória dos 4 e de aprendizado às crianças. Embora o
aos 17 anos de idade; a Educação Infantil documento não evidencie o termo linguagem
gratuita às crianças de até 5 anos de idade; escrita, enfatiza que ação pedagógica é
creches às crianças de até 3 anos e pré-escola inerente a esta etapa escolar. Sobre a
às crianças de 4 e 5 anos. Com isso, ficou linguagem na Educação Infantil Mello (2005,
estabelecido a obrigatoriedade da oferta pelo p. 32-33) argumenta que:
poder público e a matrícula, pelos responsáveis
das crianças de 4 e 5 anos na pré-escola.
[…] a informação vai ser apropriada apenas se a
Com base nessas mudanças, é possível criança puder interpretá-la e expressá-la na forma
compreender que nos documentos oficiais até de uma linguagem – que pode ser fala, um texto
o ano de 2006 a Educação Infantil era escrito, um desenho uma maquete, uma
escultura, um jogo de faz-de-conta, uma dança –
destinada às crianças de 0 a 6 anos de idade, e que torne objetiva a sua compreensão.
posteriormente, passou a corresponder o
período de 0 aos 5 anos. No que se refere a pré-
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
Na discussão acerca do que deve ser ensinado trabalho com a escrita na Educação Infantil,
na Educação Infantil, Mello (2005) destaca as afirmando que:
linguagens como forma de expressão das
crianças. Esta perspectiva vai ao encontro dos
princípios das DCNEI (1998). Tratando da […] a língua escrita com crianças pequenas não
pode decididamente ser uma prática mecânica
escrita, a autora sugere que: desprovida de sentido e centrada na
decodificação do escrito. Sua apropriação pela
criança se faz no reconhecimento, compreensão
[…] começamos não por propor atividades de e fruição da linguagem que se usa para escrever,
escrita para as crianças, mas por estimular e mediada pela professora e pelo professor,
exercitar seu desejo expressão. Fazemos isso fazendo-se presente em atividades prazerosas de
quando deixamos contar suas histórias de vida e contato com diferentes gêneros escritos, como a
de imaginação para o grupo – e também contando leitura diária de livros pelo professor, a
histórias para ela, histórias que ela recontar possibilidade da criança desde cedo manusear
depois. […] quando estimulamos sua livros e revistas e produzir narrativas e “textos”,
observação, quando solicitamos rotineiramente mesmo sem saber ler e escrever (BRASIL,
sua participação na solução de problemas e na 2009a, p. 15-16).
discussão de temas apresentados em aula […]
(MELLO, 2005, p. 37).
Analisando este excerto, o documento
denuncia e repudia uma prática de leitura e
Contrapondo às atividades de treino para a
escrita que muitas vezes, se encontra presente
escrita para Educação Infantil, a autora propõe
na Educação Infantil, pois se refere à prática
práticas que estimulam a expressão e
mecânica de decodificação do escrito. Soares
possibilitam a introdução adequada ao mundo
(1998, p. 33) define este processo como
da linguagem escrita.
alfabetização: “[…] enquanto habilidade de
Seguindo a mesma perspectiva de currículo decodificação e codificação do sistema de
para Educação Infantil, no Parecer nº 20/09 escrita […]”. No entanto, a autora ressalva que
referente a Revisão das DCNEI a linguagem é preciso “[…] sobretudo, fazer uso real e
escrita aparece claramente ao longo do adequado da escrita com todas as funções
documento. […]” (SOARES,1998, p. 33).
Com base nesse entendimento é possível
É importante lembrar que dentre os bens afirmar que o documento apresenta uma crítica
culturais que crianças têm o direito a ter acesso a práticas que se assemelham a alfabetização,
está a linguagem verbal, que inclui a linguagem porém a alfabetização definida por Soares
oral e a escrita […] (BRASIL, 2009a, p. 15). (1998) está para além da codificação e
decodificação, pois compreende também ao
uso da escrita atribuído as suas funções.
Além disso, reconhece a escrita inerente ao
cotidiano das crianças. Explorando os Pareceres que estabelecem as
DCNEI nos anos de 1998 e 2009 foi possível
identificar propostas que seguem a mesma
Também a linguagem escrita é objeto de perspectiva pois orientam o trabalho na
interesse pelas crianças. Vivendo em um mundo Educação Infantil através das linguagens, no
onde a língua escrita está cada vez mais presente,
as crianças começam a se interessar pela escrita entanto, a revisão das DCNEI em 2009
muito antes que os professores a apresentem acrescenta a linguagem verbal constituída pela
formalmente (BRASIL, 2009a, p. 15). oralidade e escrita. Além disso, estes materiais
criticam o trabalho mecânico de codificação e
decodificação do sistema de escrita. Entre o
Neste documento normativo há um período de publicação das primeiras DCNEI
reconhecimento explícito da presença da em 1998 à sua revisão em 2009, há um salto
linguagem escrita na sociedade, pois a criança pois aparecem orientações mais específicas
vive em um contexto letrado. No entanto, para o trabalho com a leitura e a escrita
ressalta a falta de entendimento sobre o reconhecendo-as inerentes ao cotidiano das
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
identificamos que os RCNEI estão de acordo realidade das escolas, dos profissionais e nem
com o que afirma Soares (1998). Apesar de das famílias das crianças da Educação Infantil.
abordar o letramento, os RCNEI retomam o Entre as críticas ao documento está a
processo sistemático de aprendizagem da linguagem utilizada: “[…] à constatação de
escrita. problemas de redação, gramaticais e
ortográfico, sérios problemas de coerência
interna e conceituais”(CERISARA, 1999, p.
No processo de construção dessa aprendizagem 24). De acordo com a autora, a estrutura
as crianças cometem “erros”. Os erros, nessa
perspectiva, não são vistos como faltas ou
complexa com excesso e repetição de tópicos,
equívocos, eles são esperados, pois se referem a além da indefinição do leitor, dificulta a
um momento evolutivo no processo de compreensão por parte dos profissionais da
aprendizagem das crianças. Eles têm um Educação Infantil.
importante papel no processo de ensino, porque
informam o adulto sobre o modo próprio de as De acordo com Palhares e Marinez (1999,)
crianças pensarem naquele momento. E escrever, este material representava um desvio de rota
mesmo com esses “erros”, permite às crianças com relação aos cadernos produzidos
avançarem, uma vez que só escrevendo é anteriormente pela COEDI36. Enquanto o
possível enfrentar certas contradições (BRASIL,
1998b, p. 128). COEDI pretendia apoiar as escolas na
elaboração das suas propostas pedagógicas
para a Educação Infantil, o MEC tinha como
Esta reflexão sobre os significados da escrita objetivo a criação de parâmetros para toda
nos remete aos estudos de Emília Ferreiro e Educação Básica tendo como proposta os
Ana Teberosky, os quais deram origem à teoria RCNEI, que surgem no mesmo movimento
da psicogênese da língua escrita na década de dos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN.
80. Estes estudos revelam que as crianças Kramer (2005) discute sobre este
formulam hipóteses a respeito do código tensionamento que marcou as intenções da
escrito. Além disso, Ferreiro e Teberosky COEDI e MEC para Educação Infantil. Como
(1999) apresentam uma concepção para o resultado deste conflito houve a troca de
significado do “erro” na aprendizagem da liderança do COEDI, que contribuiu para
escrita, embora os RCNEI não façam publicação dos RCNEI. Apesar de tantas
referência às autoras, esta perspectiva é controvérsias o RCNEI passou a ser o
apontada no documento. No que se refere ao documento oficial para Educação Infantil, este
“erro”, Ferreiro e Teberosky (1999) destacam material serviu de orientação para a prática
que erros são construtivos na escrita, de certa pedagógica durante muitos anos nesta etapa
forma, isso também é citado nos RCNEI, no escolar.
entanto, a orientação para o ensino sistemático
da escrita se contrapõe ao que apontam os Após os RCNEI o material pedagógico
estudos sobre o currículo da Educação Infantil, produzido para formação dos professores da
e principalmente, aos princípios das DCNEI Educação Infantil é a coleção Leitura e Escrita
(1998), documento mandatório em vigor na na Educação Infantil. Este material foi
ocasião. publicado em 2016, mas se tornou parte das
políticas nacionais em 2017 ao ser proposto
Por conta de diversas divergências os RCNEI pelo Governo Federal através do documento
foram alvos de muitas críticas realizadas por orientador do PNAIC que consistia em
pesquisadores da Educação Infantil. Cerisara desenvolver:
(1999) analisou os pareceres produzidos
acerca da versão preliminar do documento
RCNEI e constatou que, tanto a forma como o […] uma perspectiva ampliada de
conteúdo do material não se articulavam à alfabetização, trabalhando a Alfabetização na
36 No início da década de 90, a COEDI produziu uma está Propostas Pedagógicas e Currículo na Educação
série de cadernos caracterizado pelos rostinhos de Infantil (1996).
crianças nas capas. Estes materiais foram resultado de
ampla discussão realizadas por pesquisadores, entre eles
690
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
Idade Certa, a melhoria da aprendizagem em […] II – favoreçam a imersão das crianças nas
Língua Portuguesa e Matemática no Ensino diferentes linguagens e o progressivo domínio
Fundamental, bem como a inclusão da Educação por elas de vários gêneros e formas de expressão:
Infantil garantindo as perspectivas e as gestual, verbal, plástica, dramática e musical; III
especificidades do trabalho de leitura e escrita – possibilitem às crianças experiências de
com as crianças (BRASIL, 2017, p. 5, grifo do narrativas, de apreciação e interação com a
autor). linguagem oral e escrita, e convívio com
diferentes suportes e gêneros textuais orais e
escritos; […] (BRASIL, 2009b, p. 21).
Por se tratar de um programa de formação de
professores para alfabetização, ao dar destaque
à “perspectiva ampliada de alfabetização”, o Com isso, percebemos que a coleção utiliza
documento pode estabelecer uma relação entre como referência as orientações das DCNEI
alfabetização e Educação Infantil, mais expressando que dentre as linguagens, a escrita
especificamente, a pré-escola, etapa que foi também está inerente às experiências
incluída neste programa. No entanto, leva em necessárias para o desenvolvimento infantil.
consideração as perspectivas e as Por essa razão, neste trabalho apresentamos as
especificidades do trabalho com a leitura e concepções de leitura e escrita a partir do
escrita nesta etapa escolar, este detalhe é de caderno 3, titulado “Linguagem oral e
suma relevância aos professores da Educação linguagem escrita: práticas e interações”, cujo
Infantil, para que não haja confusão entre o foco é a temática em estudo.
processo de alfabetização e o trabalho com a No que se refere à forma deste material, tem
leitura e escrita. uma apresentação visual atraente, com
Outro fator importante é que a inclusão da desenhos e pinturas coloridas de animais,
Educação Infantil no PNAIC ocorre no crianças e situações que correspondem ao
contexto em que a oferta da pré-escola passa a conteúdo em discussão. Com relação à
ser obrigatória, esta política demanda a linguagem, é direcionada explicitamente à
formação dos professores para orientar as professora, tendo em vista que a maioria dos
práticas pedagógicas desta etapa. profissionais da Educação Infantil são do
gênero feminino.
A coleção Leitura e Escrita na Educação
Infantil proposta pelo PNAIC para a formação Com a preocupação de dialogar com a
dos professores da Educação Infantil é professora, o conteúdo é organizado com a
composta por nove cadernos, e tem como seguinte estrutura: Iniciando o diálogo;
princípios norteadores as DCNEI (2009), Quadro teórico; Compartilhando experiências;
enfatizando que: Reflexão e ação; Aprofundando o tema; e
Ampliando o diálogo. A partir dessa
organização é possível perceber que a proposta
As propostas curriculares da Educação Infantil inicia com o diálogo direcionado para a
devem garantir que as crianças tenham professora, depois apresenta o quadro teórico
experiências variadas com as diversas justificando o trabalho com a temática,
linguagens, reconhecendo que o mundo no qual
estão inseridas, por força da própria cultura, é
posteriormente há uma exibição das
amplamente marcado por imagens, sons, falas e experiências já realizadas, na seção Reflexão e
escritas. Nesse processo, é preciso valorizar o ação são atividades para serem desenvolvidas
lúdico, as brincadeiras e as culturas infantis pela professora e na Ampliando o diálogo são
(BRASIL, 2009a, p. 15). sugestões de livros, filmes e materiais como
aporte para a professora qualificar sua
formação e prática pedagógica.
Corroborando com estes princípios, também
destaca a Resolução nº 05/09 que Fixa as Com relação às discussões sobre a linguagem
DCNEI, a qual tem como base os eixos oral e escrita o material propõe a cultura do
norteadores interações e brincadeiras, e escrito, as concepções e inter-relações da
estabelece em seu Art. 9º experiências que: linguagem oral e escrita e os seus modos de
apropriação. Tratando da cultura do escrito
Galvão (2016, p. 25) afirma que:
691
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
[…] a escrita é apenas uma das linguagens com agenda. Além das atividades com exploração
as quais a criança se relaciona, na maior parte dos da oralidade e argumentação, como roda de
lugares da sociedade contemporânea, desde que
nasce.
conversa, cantar e ouvir histórias, possibilitar
às crianças recontar histórias e fatos
permitindo a (re) construção de significados e
A autora reconhece a escrita presente no envolvimento com a oralidade.
cotidiano da criança, no entanto acrescenta a
perspectiva escolar sobre o uso da escrita:
A oralidade e a escrita são duas modalidades da
linguagem verbal, que se organizam em palavras
e textos, constituindo-nos como pessoas,
[…] que existem muitos modos de se relacionar individual e socialmente (GOULART; MATA,
com o escrito nas sociedades contemporâneas e 2016, p. 45).
que a escola tende a privilegiar apenas um deles,
temos a oportunidade de incorporar essa
pluralidade de modos em nosso trabalho
pedagógico, valorizando-os (e não apenas Para as autoras, através da linguagem as
criticando-os). Para que isso ocorra, é necessário, crianças vão atribuindo significados e se
antes de tudo, conhecer essas culturas escritas constituindo dentro da sua cultura. Por isso a
(GALVÃO, 2016, p. 27). linguagem é fundamental para apropriação da
cultura, por meio dela as crianças interagem
com os outros e aprendem sobre o mundo.
A autora evidencia a pluralidade de modos de
se relacionar com o escrito na sociedade Com base nesta perspectiva, cabe ao docente
contemporânea, e propõe à escola ampliar o da Educação Infantil proporcionar e ampliar
modo de trabalhar com a escrita, mas para isso conhecimentos de mundo que são
é preciso reconhecer os diferentes modos que internalizados pelas crianças por meio da
as crianças se relacionam com a escrita. linguagem. Neste sentido, deve promover o
Explicitando este assunto Galvão (2016) contato com as variadas formas linguísticas
destaca que a cultura do escrito pode ocorrer (não apenas a norma culta) e o trabalho com as
através da linguagem oral: como as narrativas diversas formas de expressão, entre elas
de histórias orais com rima, verso ou Goulart e Mata (2016, p. 55) destacam que:
informativas; e das interações das crianças
com os livros em outros contextos, como por
A escrita também pode ser considerada no
exemplo, com a leitura da bíblia.
conjunto de formas de expressão do mundo
É importante que o trabalho pedagógico simbólico que crianças, jovens e adultos habitam,
valorize as diferentes interações, cabe destacar em sociedades letradas (desenhar, gesticular,
pintar, dançar e outras).
que seguindo os princípios das DCNEI (2009)
as interações e brincadeiras são citadas no
caderno. Neste conjunto de formas de expressão o ler
e o escrever ganham sentido e representação,
É no contexto das interações e interlocuções, nos
desse modo o docente pode criar condições
espaços lúdicos das brincadeiras, dos jogos de para inserir as crianças no mundo da cultura
linguagem, das cantigas e dos poemas, das escrita possibilitando que compreendam os
histórias e dos relatos que as culturas do escrito usos e as funções sociais da linguagem escrita.
são vividas pelas crianças (GALVÃO, 2016, p. De acordo com as informações dispostas no
26).
caderno, o docente pode envolver no diálogo
com as crianças portadores de textos como
As interações e as brincadeiras são indicadas jornais, livros, correspondências, anotações na
como meio de se relacionar com a escrita. Para agenda, entre outros materiais.
isso, apresenta algumas propostas que exigem No entanto, é importante salientar que as
o registro escrito realizado pelo docente por atividades envolvendo os textos escritos não
meio da interação com os alunos entre elas a são para alfabetizar as crianças, mas sim para
chamadinha, o registro da rotina, o diário e a que percebam os meandros da cultura escrita.
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Verificamos que essa coleção bem como os [5] CELLARD, André. A análise documental,
demais documentos analisados, são in POUPART, Jean. et al. A pesquisa
atravessados por decisões políticas que qualitativa: enfoques epistemológicos e
consequentemente afetaram sua finalidade. As metodológicos. Petrópolis, Vozes, 2016.
concepções de leitura e escrita expressas nestes
[6] TRIVIÑOS, Augusto Nibaldo da Silva.
materiais estão permeadas de Introdução à pesquisa em ciências sociais: a
intencionalidades, pois em determinado pesquisa qualitativa em educação, São Paulo,
momento são direcionadas para um trabalho Atlas, 2009.
sistemático com a escrita visando o processo
de alfabetização, como o caso dos RCNEI. [7] BRASIL. Lei nº 11.114, Altera os arts.6º,
Enquanto em outros a perspectiva é voltada às 30, 32 e 87 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro
linguagens, valorizando a cultura escrita e o de 1996, com o objetivo de tornar obrigatório
envolvimento da criança com a leitura e a o início do ensino fundamental aos seis anos
escrita a partir das interações e brincadeiras, de idade, Brasília, 2005.
como as DCNEI e a coleção Leitura e Escrita [8] BRASIL. Lei nº 11.274, Altera a redação
na Educação Infantil. dos arts. 29, 30, 32 e 87 da Lei no 9.394, de 20
Atualmente o documento normativo que rege de dezembro de 1996, que estabelece as
a Educação Infantil são as DCNEI (2009) e o diretrizes e bases da educação nacional,
orientador é a Coleção Leitura e Escrita na dispondo sobre a duração de 9 (nove) anos
Educação Infantil. Ambos documentos não para o ensino fundamental, com matrícula
vislumbram o processo de alfabetização, muito obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade,
pelo contrário, criticam a antecipação das Brasília, 2006.
práticas do Ensino Fundamental. No entanto, [9] BRASIL. Emenda Constitucional nº 59, in
em virtude da conjuntura política nacional, a Constituição da República Federativa do
Coleção Leitura e Escrita na Educação Infantil Brasil de 1988, Brasília, 2009.
foi vinculada a um programa de formação em
alfabetização, o PNAIC. Este fato nos convida [10] BRASIL. Lei nº 12.796, Altera a Lei no
a refletir se esta política pode causar equívocos 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que
quanto a direcionamento do trabalho com a estabelece as diretrizes e bases da educação
leitura e escrita na Educação Infantil. nacional, para dispor sobre a formação dos
profissionais da educação e dar outras
providências, Brasília, 2013.
[11] BRASIL. Lei nº 13.005, Aprova o Plano
REFERÊNCIAS Nacional de Educação – PNE e dá outras
providências, Brasília, 2014.
[1] BRASIL. Lei nº 9.394, Estabelece as
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, [12] BRASIL. Parecer nº 22/98, Diretrizes
Brasília, 1996. Curriculares Nacionais para a Educação
Infantil, Brasília, 1998a.
[2] BRASIL. Pacto Nacional pela
Alfabetização na Idade Certa – PNAIC, [13] MELLO, Suelly Amaral. O processo de
Documento orientador – 2017, Brasília, 2017. aquisição da escrita na educação infantil, in
FARIAS, Ana Lúcia de, MELLO. Suelly
[3] ROSEMBERG, Fúlvia. Panorama da
(orgs), Linguagens infantis, São Paulo,
educação infantil brasileira contemporânea, in
Autores Associados, 2005.
Simpósio Educação Infantil: construindo o
presente. Brasília. Anais. UNESCO – Brasil, [14] BRASIL. Parecer nº 20/09, Diretrizes
2003. Curriculares Nacionais para a Educação
Infantil, Brasília, 2009a.
[4] BOGDAN, Robert; BINLEN, Sari.
Investigação qualitativa em educação: uma [15] SOARES, Magda. Letramento: um tema
introdução à teoria e aos métodos, Porto, Porto três gêneros, Belo Horizonte, Autêntica, 1998.
Editora, 1994.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
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a
Programa de Pós-Graduação em Educação Ambiental/Universidade Federal do Rio Grande PPGEA FURG/ DS-
CAPES/ emaildagis@gmail.com .
b
Programa de Pós-Graduação em Educação Ambiental/Universidade Federal do Rio Grande PPGEA FURG/ DS-
CAPES/ rachelhidalgo@ribombo.com.
a,
*Programa de Pós-Graduação em Educação Ambiental/Universidade Federal do Rio Grande PPGEA FURG
docdione@furg.br
RESUMO
Este trabalho busca apresentar reflexões sobre uma sociedade construída em uma concepção de
mundo focada em dualismos, capazes de produzir contradições observadas no mundo moderno. Tal
reducionismo gera divisões cognitivas no imaginário social, culminando na construção de hierarquias
que se projetam em quase todos, senão todos, os aspectos da vida dos indivíduos: político, social,
econômico, cultural, etc. Esta perspectiva se faz presente na construção de um modelo de
desenvolvimento e de sociedade, nas tomadas de decisões coletivas e formulações de políticas.
Assim, noções como riqueza e pobreza, ser humano e natureza, mente e corpo, desenvolvimento ou
a falta dele, permeiam a realidade, muitas vezes, de formas contraditórias, aprofundando a crise
socioambiental. Dessa forma, surgem problemáticas a serem discutidas, no sentido de repensar o
paradigma epistemológico contemporâneo. Para explorar esta temática, abordamos alguns exemplos
de contrariedades do mundo moderno, que se baseiam na visão de um mundo hierarquizante das
relações humanas. A partir delas, ampliamos o debate, discutindo possíveis superações com base nas
Epistemologias Ecológicas [CARVALHO, 2014], destacando produções de conhecimento que já
apresentam uma visão mais alargada no âmbito da pesquisa.
Palavras chave: crise socioambiental, sociedades, epistemologia, paradigmas
ABSTRACT
This study seeks to present reflections about a society built on a world conception focused on dualisms
capable of producing contradictions observed in the modern world. Such reductionism generates
cognitive divisions in the social imaginary, culminating in the construction of hierarchies that project
in almost all, if not all, aspects of individuals' lives: political, social, economic and cultural. This
perspective is present in the construction of development and society models, in collective decisions
and policies’ formulation. Thus, notions such as wealth, poverty, human beings, nature, mind, body
and development, permeate reality, often in contradictory ways, deepening the socio-environmental
crisis. Therefore, questions arise to be discussed, in the sense of rethinking the contemporary
epistemological paradigm. To explore this theme, we address some examples of setbacks of the
modern world, which are based on the vision of a hierarchical world of human relations. From these,
we broadened the debate, discussing possible overcomes based on Ecological Epistemologies
[CARVALHO, 2014], highlighting studies that already present a broader view within the scope of
the research.
Keywords: social and environmental crisis, societies, epistemology, paradigms
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Sendo assim, ao contrário do sistema norte- autoridades. Se, por um lado, os investimentos
americano, no sistema brasileiro infringir as públicos são priorizados para as classes de
leis se torna um ato naturalizado, uma vez que maior influência e poder, as classes de menor
a compreensão do sistema existente é escassa influência se encontram expostas à má
e condiciona o surgimento de estratégias de distribuição destes recursos. O papel do Estado
comportamento que só encontram o limite por de garantir as condições de saneamento,
meio da proibição. Não há, portanto, uma moradia, educação e saúde se torna falho,
avaliação prévia do sujeito sobre o significado fazendo com que determinados grupos entrem
de suas ações para o coletivo. em um sistema de falta de recursos associados
à alienação sobre seus direitos e exposição ao
Além disso, a interpretação das leis também risco ambiental.
passa por um processo excludente. Há uma
apropriação particular da verdade, em que os Tal processo pode ser observado nas decisões
atores privilegiados têm o poder de definir, em relação à exploração de recursos naturais,
com base em sua própria perspectiva, o que é às políticas e estratégias para lidar com os
ou não correto. Abre-se, portanto, brechas para riscos de empreendimentos ambientalmente
utilizar este sistema buscando a obtenção de nocivos. O que se percebe neste contexto são
ainda mais privilégios. Além dos que já são tomadas de decisões que sacrificam parte da
reconhecidos oficialmente, existem ainda mais população em prol de uma dinâmica de
possibilidades que se expressam na prática, e exploração de recursos desigual e injusta, em
aprofundam ainda mais as condições de que os benefícios de uma exploração
desigualdade social predatória são distribuídos para uma parte
pequena e seleta da população, enquanto os
riscos são distribuídos para camadas tidas
Discussão como menos importantes.
A apropriação dos benefícios urbanos e dos Os setores mais poderosos da comunidade,
recursos ambientais, além da distribuição dos por outro lado, podem usar de seus privilégios
danos ambientais demonstram a lógica para se blindar dos impactos ambientais do
contraditória que abordamos neste artigo. A sistema de produção. Eles são os próprios
compreensão limitada dos sujeitos sobre o donos de empreendimentos poluidores, que
papel do Estado e formas de garantir seus podem escolher a sua localização ou
direitos, além do seu próprio papel simplesmente comprar terrenos e moradias em
participativo, dá origem a diversos regiões seguras. O que se observa na prática é
desdobramentos que auxiliam no uma distribuição de riscos ambientais gerados
aprofundamento da desigualdade social e da pela produção de mercadorias e serviços em
crise ambiental. Acselrad [2006] levanta esse regiões carentes de investimentos, onde se
questionamento quando trabalha a noção de localizam as camadas sociais inferiores.
que o maior poder social e político, Dentre estes riscos estão a contaminação da
diretamente ligado a melhores condições água, solo e ar por efluentes industriais
socioeconômicas, assegura às classes tóxicos, o lixo, poluição visual, auditiva, etc.
privilegiadas vantagens na disputa pela Esses privilégios encontram eco na forma
distribuição de investimentos públicos. Atores dualista de pensar, pois a existência de um
pertencentes ou próximos das autoridades se superior e um inferior legitimam tais
fazem ouvir com mais facilidade e, portanto, contradições, que são vistas como um aspecto
gozam de melhores condições de vida. natural da organização da sociedade e, muitas
vezes, aceitas sem protestos.
Há, nesse sentido, uma desigual distribuição
de benefícios que se correlaciona com as Mesmo com a imediata e fácil identificação
condições econômicas dos diferentes estratos dos riscos ambientais provenientes de
sociais. É possível notar que a precarização das empreendimentos (como a simples
condições de vida de outros grupos é inerente visualização da presença de lixo e mudança de
a tal desigualdade, por se encontrarem coloração e cheiro de rios, por exemplo) a
distantes política e economicamente das precária compreensão sobre as leis e direitos
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ganhou força, sendo utilizado nas mais planeta. A exploração, destruição e injustiça
diferentes esferas de conflitos sociais. Neste geram um desconforto questionador sobre o
sentido é possível identificar duas tendências sentido do funcionamento da sociedade. Ao
de uso do discurso ambiental nas estratégias buscar tais explicações, a ciência, no
das empresas: a de deslegitimar e desmoralizar paradigma positivista, passa a ser insuficiente.
ou a de se apropriar dele. Ao reconhecer os efeitos sensíveis dos danos
ambientais, os sujeitos buscam entender a
Com a explosão das questões ambientais a proximidade entre o ser humano e a natureza,
partir dos acontecimentos do início dos anos e as condições que criaram tal divisão
70, os países em desenvolvimento ontológica [CARVALHO; STEIL, 2014]. A
demonstraram receio em relação a este ideologia científica tem a sua força cada vez
movimento, por ele possivelmente significar mais reconhecida em seus efeitos na
uma desaceleração na produção industrial e no organização política das instituições e na
crescimento econômico. Além disso, tais produção da nossa consciência, gerando,
questões eram recentes e levantavam previsões portanto, uma demanda de novas formas de
catastróficas, o que abriu um espaço de produzir o conhecimento.
questionamento da veracidade das
informações, ora justificado, ora oportunista. Adams [2000], em seu texto sobre as
Isso ocorre com a desmoralização das comunidades caiçaras já mencionado neste
denúncias dos danos ambientais por parte de artigo, também levantou a necessidade de uma
setores menos providos de poder, como abordagem ecológica séria e com o devido
sindicatos e moradores locais. embasamento empírico. Como ela, outros
autores como Bateson [apud CARVALHO;
Outra tendência é a apropriação do discurso STEIL 2014] já incluem o termo ecologia nos
ambiental, em que empreendedores usam as campos da antropologia e psicologia, em uma
críticas a seu favor e vendem, por meio de crítica aos limites do método científico que
propagandas bem elaboradas, a ideia de trata como indispensável a externalidade do
modernização tecnológica ambientalmente observador, propondo uma abertura da noção
correta ou produtos “verdes”, “amigos” do de mente como algo que é contínuo e sempre
meio ambiente. São apenas novas formas da permeado pelo ambiente, se tornando uma
busca de lucro a qualquer custo, que muitas mediação relacional com o mundo.
vezes ainda apresentam práticas socialmente
irresponsáveis. Neste contexto, Carvalho e Steil [2014]
mostram pontos de convergência entre autores
que vem contribuindo com esse movimento
Conclusões epistemológico. Dentre eles estão a crítica ao
objetivismo e neutralidade do pesquisador, que
A apropriação dos discursos trabalhados se coloca como externo ao objeto que estuda.
neste artigo evidencia um movimento no Não se busca, então, por metodologias que
sentido que questionar o modelo de sociedade garantam uma não contaminação por emoções,
e construção do conhecimento. Segundo desejos e ideologias.
Carvalho e Steil [2014] existe uma
disseminação crescente de uma ética Outro ponto é a desmitificação da ciência
ecológica, que surge para formar nova como único reduto da verdade. Ela passa a
consciência nos sujeitos contemporâneos. Eles ocupar, junto de diversas outras produções
passam, assim, a associar a contradições da sociais, um espaço instável e impermanente de
crise ético-socioambiental nas bases validação do conhecimento. Enfim deixa de ter
epistemológicas que fundamentam a ciência um lugar privilegiado e inquestionável e torna-
moderna da maneira como foi construída até se humana e ecológica.
hoje. A superação das dualidades, presentes neste
Isso ocorre porque a realidade assim movimento plural de produção de
configurada começa a levantar perguntas sobre conhecimento, conduz à uma retirada das
o lugar e o destino do ser humano neste hierarquias antes tidas como naturais, que
foram a base da construção da consciência dos
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
indivíduos na sociedade que se apresenta hoje. públicos abrem espaço para um ciclo de
Essas características podem ter influenciado o retroalimentação destas condições que
pensamento moderno ao ponto de gerar as aprofundam ainda mais a crise socioambiental.
contradições mencionadas, culminando na O sistema jurídico brasileiro autoritário e
crise epistemológica atual. Frente a tantas elitista que aliena as camadas menos
problemáticas, os sujeitos começam a desprovidas de poder, as expõem à injustiças
questionar a superioridade humana frente a ambientais e ao risco ambiental,
outros organismos, repensando seu lugar no potencializado pelo discurso oportunista que
mundo, recolocando o ser humano como parte ganhou forma com o processo de
de um sistema complexo de relações. Cria-se, ambientalização dos conflitos. Este, por sua
assim, a noção de simetria em detrimento da vez, apresenta ao mesmo tempo um grande
hierarquia, em que os sentimentos e a potencial de fortalecimento das lutas, já que
corporalidade têm sua importância permitiu uma maior organização da sociedade
reconhecida diante da razão. e institucionalização da discussão sobre o meio
ambiente.
Os seres humanos passam a ser uma parte de
um conjunto de seres, vivos ou não, mas todos A reflexão sobre o lugar do ser humano no
em mútua influência, afetando e sendo mundo e o seu papel na produção do
afetados a todo tempo. Carvalho e Steil [2014] conhecimento ganha espaço na busca por
mencionam que há um processo de superação entender e viabilizar a formulação de respostas
do construtivismo filosófico, que tomava o sobre a crise socioambiental que nos
conhecimento como uma construção encontramos. Tal reflexão é evidenciada e
predominantemente mental, e do idealismo, toma força através das Epistemologias
que considera o conhecimento como uma Ecológicas.
representação do real que demanda uma
abstração. A simetria passa a existir para
reconhecer como legítimas as mais diferentes REFERÊNCIAS
realidades e perspectivas na produção de [1] CARVALHO. Isabel Cristina de Moura,
sentidos sobre os fenômenos do mundo. Neste STEIL. Carlos Alberto, in: Mana, vol. 20. n. 1,
ínterim, o antropocentrismo é questionado, Rio de Janeiro, 2014. 163
como constatações humanas sobre o que é real
ou não no mundo, a partir do que os próprios [2] OLIVEIRA, Flávia de Paiva Medeiros de.
humanos podem ou não observar. GUIMARÃES. Flávio Romero, in: Direito,
Meio Ambiente e Cidadania: uma abordagem
Essa reflexão é fundamental para amadurecer interdisciplinar, São Paulo, Madras, 2004. 81
o debate sobre o funcionamento da sociedade,
a constante construção das formas de pensar e [3] LIMA. Roberto Kant de, in: Revista de
os caminhos que são traçados sob essas Sociologia e Política, Curitiba, 13, 1999. 23
configurações. Temos hoje um desajuste sobre [4]ACSELRAD. Henri, in: Horizontes
a realidade produzida até então, com Antropológicos: Antropologia e Meio
contradições que se relacionam com a Ambiente, Porto Alegre, n. 25, 2006. 117
epistemologia tradicional, configurando as
formas de pensar, as instituições, as decisões [5] ZHOURI. Andréa, OLIVEIRA. Raquel, in:
políticas. Uma visão homogeneizante e Ambiente e Sociedade, Campinas, n.2, 2007.
hierárquica das culturas fomenta e serve de 119
argumento para o licenciamento e implantação [6] ACOSTA. A, in: Descolonizar o
de empreendimentos ambientalmente imaginário: debates sobre alternativas pós-
degradantes, que silenciam povos e minam extrativismo e alternativas ao
culturas, sendo socialmente injustos sob a desenvolvimento, DILGER. Gerhard, LANG.
justificativa de trazer desenvolvimento e Miriam, FILHO. Jorge Pereira, (Orgs), São
modernidade. Paulo: Fundação Rosa Luxemburgo, 2016. 46
Como vimos, a desigualdade social e má [7] ADAMS. Cristina, in: Revista de
distribuição dos recursos e investimentos Antropologia, v.43, n.2, São Paulo, 2000. 145
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b
Departamento de Ensino, Pesquisa e Extensão/ Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-rio-
grandense – IFSul, neijunior@ifsul.edu.br)
RESUMO
A questão central para esta pesquisa foi refletir sobre o que a mídia veicula como principais
expectativas para a Educação Escolar Básica brasileira de qualidade. A metodologia consistiu na
Análise Textual Discursiva de aproximadamente 1000 artigos publicados durante um ano, em jornais,
revistas, rádio, televisão, sites de notícias e de movimentos sociais ligados à educação; e resultou na
produção de três categorias de análise: Socioeconômica; Avaliações externas; Direito à
aprendizagem. Neste estudo, apresenta-se o metatexto e as proposições para a categoria
“Socioeconômica”. O que se observou é que a autoria dos artigos é bastante diversa, envolve
jornalistas, economistas, lideranças empresariais e políticas, gestores, professores da educação básica
e superior, enfim, diversos formadores de opinião. Professores de escola têm tido pouca representação
no debate educacional veiculado na mídia. Não por acaso, termos mencionados para se referir à
educação escolar são confundidos com termos do campo da economia, pela especialidade dos autores
considerados referência em educação. Quem seriam as autoridades no assunto Educação Escolar
Básica? Educação Escolar Básica de Qualidade é muito mais que um instrumento de desenvolvimento
econômico, não condiz com a exclusão social e cultural corroboradas por princípios meritocráticos.
Palavras chave: Educação Básica; escola; inclusão social e cultural.
ABSTRACT
The central question for this research was to reflect on what the media conveys as the main
expectations for quality Brazilian Basic School Education. The methodology consisted of the
Discursive Textual Analysis of approximately 1000 articles published during one year in newspapers,
magazines, radio, television, news sites and social movements linked to education; and resulted in
the production of three categories of analysis: Socioeconomic; External evaluations; Right to learn.
In this study, the metatext and the propositions for the "Socioeconomic" category are presented. It
has been noted that the authorship of the articles is quite diverse, involving journalists, economists,
business and political leaders, managers, teachers of basic and higher education, and various opinion
makers. School teachers have had little representation in the educational debate conveyed in the
media. Not by chance, we have mentioned terms to refer to school education are confused with terms
of the field of economics, by the specialty of the authors considered reference in education. Who
would be the authorities in the subject Basic School Education? Basic School Education of Quality
is much more than an instrument of economic development, does not match with social and cultural
exclusion corroborated by meritocratic principles.
Keywords: Basic Education; school; social and cultural inclusion.
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busca do site, denominado índice, pelo termo (Andi) e o Ministério da Educação (MEC)
“qualidade”, durante um ano. Foram obtidos realizaram uma pesquisa por meio da análise
aproximadamente 1000 artigos para esse de mais de 5.000 textos jornalísticos
termo, que foram analisados por Análise publicados por 57 jornais brasileiros. A
Textual Discursiva – ATD [10]. Conforme conclusão corrobora com os resultados desta
essa metodologia, o material analisado, pesquisa, mas que neste caso, não foram
constituído essencialmente de produções quantificados. Os convidados a pautar na
textuais, denomina-se o corpus da análise mídia o debate educacional são organizações
textual. Esse material passou por: a) da sociedade civil, pesquisadores ou fontes
fragmentação em Unidades de Significado; b) oficiais (como o próprio MEC, o Ministério
agrupamento em categorias de análise c) Público e os conselhos de Educação). Apenas
elaboração de textos descritivos e 5,9% das fontes ouvidas eram professores das
interpretativos (metatextos) acerca das etapas básicas de ensino [11].
categorias produzidas. Em algumas áreas como medicina ou
engenharia, os profissionais são consultados,
A forma de organização das Unidades de
independentemente de serem pesquisadores ou
Significado para os artigos foi feita em tabela
representantes da categoria, enquanto que no
do Microsoft Excel e os textos arquivados em
caso dos professores eles não são considerados
Microsoft Word. A forma de citar os textos
especialistas, mesmo quando o assunto em
segue as normas da ABNT, quando não há
autor, é citada a primeira palavra do título, foco seja a sua realidade profissional. A
“afonia” dos professores é atribuída à mídia, ao
seguida do ano da publicação, sem paginação,
governo, à legislação e aos próprios
uma vez que os textos não estão numerados na
professores [11]. O artigo denota reflexões
internet. Apenas uma parcela dos artigos
sobre o papel da mídia em reforçar a
selecionados possui Unidades de Significado
desvalorização social da docência e a abertura
no texto que segue, essa seleção baseou-se na
a profissionais de outras áreas no debate
tentativa de apresentar apenas Unidades de
educacional, o que pode ser interessante, para
Significado que possuíam um conteúdo inédito
trazer posições de outros segmentos da
em relação às outras.
sociedade sobre os rumos da instituição
Foram produzidas três categorias de análise:
escolar. Por outro lado, essa participação
Socioeconômica; Avaliações externas; Direito
diversificada torna-se um problema na medida
à aprendizagem. Neste estudo, apresenta-se o
em que substitui a escuta aos professores, que
metatexto e as proposições para a categoria
têm formação para pensar sua práxis e
“Socioeconômica”. A categoria
conhecem a realidade das escolas como
“Socioeconômica” contempla expectativas
nenhum membro externo.
que relacionam a Educação Escolar Básica de
A questão fica ainda mais delicada pela
Qualidade com as condições sociais e
ênfase dada à opinião sobre educação de
econômicas dos cidadãos e do país.
economistas, que ocupam o espaço de
professores da educação básica e do ensino
Desenvolvimento superior. O artigo da revista cita a dissertação
de Fernanda Campagnucci, a qual argumenta
A autoria dos artigos é bastante diversa, que os professores acabam interiorizando a
envolve jornalistas, economistas, lideranças percepção social negativa, fruto de décadas de
empresariais e políticas, gestores, professores desvalorização. Em tempos em que os
da educação básica e superior, enfim, professores nem sequer recebem em dia pelo
formadores de opinião que têm suas ideias trabalho que fazem, fica difícil produzir uma
publicadas em jornais, revistas, rádio, identidade social de valorização. Até mesmo
televisão, sites de notícias e movimentos os professores passam a assumir uma
sociais ligados à educação. De acordo com identidade depreciada, de maneira que não se
artigo publicado na Revista Nova Escola [11], consideram referências no assunto e preferem
os professores de escola têm tido pouca relegar a opinião em educação para os
representação no debate educacional. A "especialistas" [11]. Os professores não seriam
Agência de Notícias dos Direitos da Infância
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
autoridades no assunto Educação Escolar presente neste trabalho pela própria atuação
Básica? profissional e pelas trocas com colegas no
As próprias instituições escolares e os cotidiano escolar, em conversas informais, do
sistemas de educação, por vezes, requerem dos que pela produção de material empírico
professores a autorização de um dirigente para específico, visto que a voz dos professores tem
falar com a imprensa, uma vez que proíbem ou sido pouco contemplada pelo discurso da
induzem o silenciamento de críticas aos órgãos mídia.
onde os profissionais atuam, sobretudo, em O governo federal, empossado em 2015,
situações de greve ou denúncias. Além dos defendeu a educação como prioridade ao
casos de recomendação direta, “muitos definir como lema: “Brasil, Pátria Educadora”.
professores vivenciam o temor de represálias O desejo por uma Educação Escolar Básica de
por parte da escola ou da rede” [11]. Essa qualidade não é recente, já em 1988 a
articulação de fatores faz com que os Constituição Federal Brasileira preconizava
professores de escola participem como um dos princípios básicos para o ensino
modestamente do debate educacional, seja pela a “garantia de padrão de qualidade”[1]. O que
desvalorização do seu posicionamento ou do chama a atenção é que nos dias de hoje a
perfil de incapaz que passam a ocupar. Para temática Educação Escolar Básica de
recuperar a voz dos professores é importante Qualidade está presente em muitos contextos e
convencê-los de “que o embate vale a pena, a tem sido pensada e problematizada sob
começar pela defesa da liberdade de opinião e diferentes enfoques e diferentes níveis de
expressão e da livre manifestação do aprofundamento. De forma que “não raros são
pensamento (...). Um debate público os momentos em que a palavra ‘qualidade’
diversificado é essencial para a democracia. E assume significados diferentes, por vezes,
o professor pode contribuir.” [11]. opostos – indicando múltiplas formas de
A profissionalização do trabalho docente e a defini-la e, consecutivamente, alcançá-la.” [7].
sua valorização social são necessárias para que Embora cada escola tenha suas
os rumos da escola não sejam conduzidos por especificidades, alguns sentidos são comuns a
leigos no assunto, políticos que propõe todas. Lidar com a sua unidade e com as
projetos mais intencionados em sua promoção, expectativas de um público tão diverso, como
antes mesmo de se inteirar das pesquisas indígenas, classe trabalhadora, elite,
educacionais e da história da educação integrantes dos diferentes movimentos sociais,
brasileira, ou por profissionais de outras áreas, torna a tarefa da escola bastante desafiadora e
que desconhecem a realidade escolar e não controversa. A ampliação e, consequente,
possuem a formação necessária para deliberar indefinição das atribuições dessa instituição
sobre o lócus de trabalho dos professores [12]. caracteriza uma crise de sua função social, o
A condução das políticas públicas que Peregrino denomina de “desescolarização
educacionais carece de interrelação com os da escola”, atribuindo novos sentidos a esse
resultados de décadas de pesquisa sobre a velho termo. Não mais na direção de extinguir
Educação Escolar Básica e participação essa instituição, mas de afastamento da sua
intensa de professores que atuam nas escolas e identidade pelo prejuízo em suas funções
universidades. Isso é o que a sociedade precisa devido à ampliação do seu papel na sociedade
exigir: um projeto educacional de Estado, [13].
debatido e construído coletivamente pelos O movimento de desescolarização da escola,
profissionais e sociedade civil, realmente iniciado no final da década de 70 e
interessado em educar as próximas gerações intensificado a partir dos anos 90, tem sido
com qualidade, tendo em vista a inserção marcado pelo esvaziamento e aligeiramento
cultural e a justiça social. Aso professores é dos conteúdos escolares, precarização dos
preciso avançar nas lutas para reclamar a sua espaços físicos escolares, e das formas de
participação, para que o futuro das escolas não trabalho que envolvem os processos de
fique nas mãos de amadores, governos ou escolarização (assim como da formação de
interesses que se distanciam do bem comum. seus profissionais) e universalização de acesso
A opinião dos professores está muito mais [13]. A autora chama a atenção para a
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
fragilização estrutural e social por que passa ano, um aumento na massa salarial desses
essa instituição ao se tornar um lugar mais alunos de quase 500 000 dólares ao longo da
voltado para a contenção do que para a vida deles” [17]. Não que uma boa educação
instrução dos sujeitos. não possa refletir em melhorias na economia,
Dessa forma, o direito à educação não é mas não há que se esperar uma relação tão
contemplado, uma vez que a universalização direta entre as duas áreas. O problema está em
se opõe às promessas da modernidade, tornar o crivo econômico uma condição para
universaliza-se não o ‘saber escolar’, mas sua efetivar políticas públicas educacionais, de
escassez no interior da própria escola [13]. forma que a escola e o indivíduo passam a ser
Universalizar o conhecimento da educação pensados, primordialmente, como
básica é tarefa bem mais complexa do que instrumentos de desenvolvimento econômico
ampliar o acesso à escola. [11].
O aumento da produtividade do país e das
empresas passa, nesse contexto ideológico, a
Resultados e discussão ser uma atribuição da educação escolar,
Por vezes, os termos mencionados para a quando se entende que “é certo o que as
educação escolar se confundem com termos do pesquisas apontam: sem inovação tecnológica
campo da economia, inclusive, alguns e sem Educação para aumentar a
especialistas que discutem a educação e sua produtividade, o crescimento não se sustenta.”
qualidade são economistas e profissionais de [18]. Mais que um instrumento econômico,
áreas afins. A própria utilização do termo como pressupõe os artigos citados, deseja-se
qualidade na educação tem origem em teorias que a educação se constitua como um
administrativas, proveniente da expressão instrumento de desenvolvimento social e
qualidade total, relacionado à eficiência e a cultural para todos, tendo em vista a
padrões de produtividade [14]. Não são raras “adequação aos interesses da maioria da
as situações em que a escola é associada à população”, o que não acontece no ramo
economia e que a opinião sobre educação é empresarial [19].
dada por economistas [15]. O cenário passa a A aposta na educação para transformar a
se tornar perigoso na medida em que os novos sociedade é vista ora com maior, ora com
atores que passam a discutir os rumos das menor potencial. Como alertava Paulo Freire,
políticas educacionais utilizam de estatísticas e a transformação social não se efetiva de forma
rankings sob medida para virar manchete [11]. imediata, mas por meio da constituição e
Discussões do campo da sociologia modificação do humano, que integra a
produziram críticas à vinculação do papel da sociedade [20]. Recordando o posicionamento
educação escolar com as demandas do de Bernstein ao afirmar que “a educação não
mercado de trabalho, além da noção de pode compensar a sociedade”, de forma que as
qualidade total, “considerada um escolas são limitadas para reduzir as
reducionismo técnico voltado apenas para a desigualdades sociais e educacionais, cujas
objetividade da competição e a aquisição de origens estão fora do sistema educacional, nas
habilidades e competências reduzidas a estruturas econômicas e sociais [21]. Araújo
saberes instrumentais.” [16]. Também são alvo corrobora com essa perspectiva ao destacar em
de críticas, soluções pontuais e técnicas da área sua dissertação que a “educação, por si só, não
empresarial que acabam sendo transpostas se constitui como elemento decisivo e central
para a educação, como o emprego de de mudança da sociedade, seja em termos de
tecnologias para resolver problemas de ensino economia, de trabalho ou de relações sociais.”
e de aprendizagem, com maior atribuição de [22]. Para este autor, não há convergência na
valor para a ferramenta do que para os próprios concepção e direção da educação escolar
sujeitos. almejada no âmbito de sindicatos, Governo e
Gustavo Ioschpe cita um estudo realizado em empresários. Dentre as tendências sobre a
Stanford, segundo o qual “um Professor que noção de qualidade da educação encontra-se o
esteja entre os 25% do topo da categoria e que conflito e a possibilidade de diálogo entre as
tenha uma turma de trinta alunos gera, a cada dimensões quantitativa e qualitativa ou
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
devemos analisar qual é a finalidade e o papel universitário federal, esse posicionamento tem
das mesmas em uma nação que pretende se gerado conflito e acusações de preconceito
inserir num mundo globalizado e competitivo” com estudantes cotistas, pela cor e, sobretudo,
[33]. Isso significa que as cotas não trariam pelas diferenças nas condições sociais e
inclusão social, mas diminuiriam a qualidade econômicas. Aloizio Mercadante fora
da educação ofertada e o nível de perguntado sobre a razão de os mais ricos e
competitividade dos egressos da universidade, estudados serem os mais contrários às cotas,
além de suprimir o mérito, devido a em entrevista para o jornal Estado de S. Paulo.
movimentos sociais, como é o caso dos Ele entende que seja porque “47% dos mais
“racialistas”, conforme está sendo defendido ricos têm curso superior e entre os mais pobres,
nas seguintes Unidades de Significado dos só 4%. Estamos mexendo em estruturas
jornais O Globo e A Gazeta do Acre, antigas e poderosas. Mas temos a preocupação
respectivamente: de garantir a excelência.” [36].
Histórica e culturalmente está naturalizada a
Para salvar o mérito. (...) Refratárias, com razão, sucessão familiar dominante de determinados
à aplicação da cota como desejavam os espaços profissionais, como da saúde, em que
movimentos racialistas, poderosos dentro do
governo e no Congresso - mais fortes ainda
gerações trabalham com o mesmo ramo.
depois do respaldo recebido no Supremo -, USP, Mudar essa sequência lógica traz
Unicamp e Unesp, entre outras, forçadas por lei, descontentamentos. Ainda mais quando os
devem começar a adotar cotas este ano, de dados indicam que a diferença média entre as
maneira progressiva. Porém, de forma a atenuar notas de corte de cotistas e não cotistas,
a desimportância do mérito Escolar como critério
de seleção de cotistas para o ingresso no Ensino
inscritos para cursos de Medicina em
superior gratuito. (...) É feita, então, toda uma universidades federais, foi de apenas 5,3%
acrobacia administrativa para aplicar a lei com [37]. Ou seja, os cotistas, como é o caso de
filtros, a fim de impedir, o máximo possível, a estudantes de escolas públicas, não apenas
contaminação da qualidade do Ensino superior estão ocupando vagas que há tempos seriam
pelo ingresso de estudantes mal preparados - não
por culpa deles, mas da má qualidade do Ensino
destinadas quase que exclusivamente a
público básico. [34]. estudantes brancos provenientes de escolas
privadas, mas eles têm demonstrado um
Se o sistema é meritocracia, porque as cotas? Por desempenho na seleção e no decorrer dos
que não criar mais Escolas de Ensino médio de cursos, que os torna competitivos no mercado
excelência? Atraindo os melhores Alunos das
Escolas públicas? Por que no sistema no Ensino
de trabalho.
médio não há mais esforço para garantir A insatisfação, e até preconceito, não se
qualidade, haja visto a dificuldade na formação justifica somente pela ocupação de vagas, mas
da massa dos estudantes? Questões sociais e pela possível perda da hegemonia profissional
políticas levaram a massificação ao acesso das em algumas áreas para classes sociais com
crianças na Escola, mas isso não garantiu a
qualidade. O papel do governo é garantir essa
condições menos favorecidas. A
formação básica, de forma atraente e efetiva, representatividade das mulheres, dos negros e
necessária para o ingresso no mercado de das pessoas de origem socioeconômica mais
trabalho. Se isso fosse feito, não haveria baixa não tem sido efetivada nas instituições
necessidade de políticas de cotas: melhores educativas públicas e de trabalho, portanto,
Alunos acessam as melhores Escolas [35].
entendo que é função do Estado e de cada
brasileiro compensar tamanha desigualdade,
A Educação Escolar Básica de Qualidade
trata-se de um direito histórico. A insatisfação
passa a ser compreendida como prêmio para
também é com os movimentos sociais, com a
aqueles que alcançam mérito escolar e são os
avaliação das escolas privadas, a falta de
melhores alunos, os quais historicamente têm
reconhecimento de que a qualidade da
condições sociais e econômicas mínimas para
educação é alcançada pela privatização das
galgar as melhores vagas. Essas condições não
escolas, portanto, deve haver menos
são foco dessas discussões, a preocupação está
intervenção Estatal, para que as elites sigam
em não contaminar a educação com estudantes
sendo bem formadas para se ter prestígio social
mal preparados, devido à qualidade da
e espaço no campo educacional, conforme é
Educação Escolar Básica pública. No contexto
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
inferido das Unidades de Significado extraídas Ensino médio” [40], conforme publicação do
a partir dos jornais Folha de S. Paulo e Diário Correio Braziliense. A Educação Escolar
de Cuiabá, respectivamente: Básica pública e gratuita teve avanços
significativos em termos de qualidade com as
Movimentos sociais (...) vêm seguidamente instituições federais, agora há que se priorizar
invadindo a liberdade de ensinar do povo a equidade. Além disso, de acordo com o
brasileiro. Por um lado, insatisfeitos por não
conseguirem a tão propalada educação pública e
Diário do Pará, o desempenho em avaliações
gratuita de qualidade e, por outro, vendo o de larga escala, como o Ideb, indicam que as
avanço da escola privada no número de alunos. escolas particulares “obtiveram média de
Enquanto a escola pública perdeu 2% dos alunos desempenho abaixo da meta estabelecida para
em 2011, comparado com 2010, a escola privada 2011” e que “as notas deixam evidente que, ao
cresceu 20%. Uma ofensa para os burocratas do
MEC, já que evidencia o reconhecimento da
contrário do que muita gente pensa, Escola
eficiência, da boa gestão e da diversidade da privada não é exatamente um sinônimo de
escola privada no Brasil, pois basta melhorar um Ensino de qualidade” [41].
pouco a renda que o primeiro investimento da
família é na educação dos filhos. E educação de A Educação Escolar Básica de Qualidade,
qualidade é na escola privada, que se tornou o conforme perspectiva publicada em O Povo,
sonho de consumo da sociedade. Pelo artigo 209 do Ceará, vai mais ao encontro da formação de
da Constituição brasileira, a educação "é livre à “leitores cidadãos”, que diferente de uma
iniciativa privada", devendo ser autorizada e
perspectiva mais instrumental e funcional,
podendo ser avaliada pelo poder público. Nos
últimos dez anos, o MEC e seus burocratas circulam por dimensões culturais e subjetivas
emitiram milhares de portarias, enviaram grande que permitem “mirar o mundo de maneira mais
número de projetos de lei ao Congresso Nacional autônoma, crítica e inventiva” [42]. Uma
e alteraram outras tantas, sempre com a desculpa escola de qualidade é aquela que não apenas
de que a escola privada precisa ser avaliada. Na
amplia o acesso e a aprendizagem dos
prática, vêm invadindo a liberdade da escola
privada e anulando o direito dos brasileiros de conhecimentos das ciências, mas que produz
terem uma opção que não seja a escola única e uma formação crítica, que permite entender e
una, ou seja, a escola pública [38]. pensar as notícias dos jornais e da televisão e
sensibiliza os estudantes a disponibilizar sua
A sociedade do século XXI demanda novas
formação para contribuir com a sociedade em
gerações mais bem preparadas, sob todos os
pontos de vista, e a Escola particular tem um que vivem. A escola carece de ressignificação
papel fundamental na formação de elites. quando a excelência não tem relação com a
Descuidar dessa posição é um erro estratégico e coletividade e o cuidado com o outro.
o preço a se pagar pode ser a futura perda de
prestígio social e de espaço no mercado
educacional [39].
Algumas Considerações
A crítica está na estatização da escola, uma De um lado têm-se expectativas muito
vez que compreendem que a qualidade da restritas, em que a educação serve de
educação pública e gratuita é inferior a de instrumento de desenvolvimento econômico:
escolas privadas. Tal posicionamento não concepção instrumental e utilitarista do
condiz com a análise do desempenho em conhecimento e valores da vida; adequação ao
avaliações em larga escala, como o PISA, em mundo capital, voltado para padrões de
que os melhores estudantes são de escolas excelência, mais direcionado ao mundo
públicas, federais e gratuitas [27]. Além disso, produtivo do que para o bem comum e garantia
na seleção para o ensino superior, as notas de de condições mínimas de dignidade às pessoas;
corte dos que optaram pelas cotas e de quem foco no desenvolvimento da capacidade
participa da ampla concorrência tem sido cada competitiva dos sujeitos, independente do
vez mais próximas, visto que o “‘top da Escola cuidado e sensibilidade com o outro;
pública é muito bom, o desempenho é bem produtividade, lucro e o desempenho
superior à média do Ensino privado’, o que não individual se sobrepõem a coletividade. De
pode levar à acomodação, pois é preciso outro lado, há expectativas muito amplas, que
enfrentar o desafio da baixa qualidade do limitam a construção de meios para sua
viabilização: a educação é responsabilizada
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
pela redução das desigualdades sociais e [7] QUALIDADE da Educação: o que está em
econômicas, melhoria das condições de vida e jogo? Portal Aprendiz, UOL, 13 jan. 2014.
formação de cidadãos melhores. Na medida Disponível em:
em que sua função é muito ampla, sua http://www.todospelaeducacao.org.br/educaca
especificidade acaba sendo dissolvida. o-na-midia/indice/29293/qualidade-da-
educacao-o-que-esta-em-jogo/?pag=17.
O estudo permitiu elaborar como proposição
Acesso em: 20 de dezembro de 2014.
que a Educação Escolar Básica de Qualidade é
[8] BRASIL. Ministério da Educação (MEC),
muito mais que um instrumento de
Secretaria da Educação Básica. Orientações
desenvolvimento econômico, não condiz com
Curriculares Nacionais. Brasília, 2006. vol. 2.
a exclusão social e cultural corroboradas por
[9] TODOS PELA EDUCAÇÃO. Relatório de
princípios meritocráticos; prioriza a dignidade
atividades 2013. Coordenação editorial:
humana e conhecimentos que permitem pensar
Camilla Salmazi. TPE, 2013.
e recriar as formas de viver e ver o mundo,
[10] MORAES, Roque; GALIAZZI, Maria do
sem, contudo, ser a única responsável pela
Carmo. Análise Textual Discursiva. Ijuí:
redução das desigualdades sociais e
UNIJUÍ, 2007.
econômicas, melhoria das condições de vida e
[11] FALA que eu não te escuto. Nova Escola,
formação de cidadãos mais atuantes e capazes;
Ed. 280, março de 2015. Disponível em:
a escola participa ativamente na consolidação
http://novaescola.org.br/politicas-
do projeto de Nação, mas é apenas uma das
instituições que constituem a sociedade. publicas/fala-eu-nao-te-escuto-professor-
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
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comemora-nota-de-corte-de-cotistas/. Acesso
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[38] A ESTATIZAÇÃO da escola privada. O
Estado de S. Paulo, São Paulo, 01 jan. 2013.
Disponível em:
http://www.todospelaeducacao.org.br/educaca
717
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
b
Nucogs (Núcleo de Pesquisas em Ecologias e Políticas Cognitivas)/Universidade Federal do Rio Grande do Sul
cleci.maraschin@gmail.com
RESUMO
A ocupação, foco desta pesquisa, aconteceu em Canguçu (RS), em maio de 2016, e permaneceu por
um mês, com aproximadamente 30 estudantes. Além das pautas estaduais e nacionais, que dispararam
ocupações que aconteceram entre 2015 e 2016, havia pautas locais relacionadas à merenda e
transporte escolar. A problemática deste estudo relaciona-se às reverberações dessa experiência, e à
extensão de práticas inventadas durante a ocupação às vivências posteriores na escola. Foram
realizadas três entrevistas, uma individual e duas coletivas, destas uma com uma professora e uma
estudante e outra com quatro estudantes. A forma como se organizaram as entrevistas, priorizando os
encontros coletivos se deu a partir do acoplamento com eles na pesquisa, de viés cartográfico. A
condução destas foi aberta, atentando à experiência presente de reformulação do acontecimento da
ocupação, mais do que a uma suposta coleta de informações a respeito dele, de modo que a
perspectiva cartográfica alia-se à abordagem enativa. Como resultado da pesquisa, encontramos pistas
no que se refere ao fazer ético na escola, uma vez que os processos autogestionários inaugurados
durante a ocupação produzem reverberações na normatividade que organiza a comunidade escolar.
A metodologia foi compondo-se na relação com os sujeitos, dialogando com a perspectiva ética
enativa, compreendida como o reconhecimento da virtualidade de si mesmo.
Palavras-chave: enação, ocupação, ética, escola.
RESUMEN
La ocupación, foco de esta investigación, tuvo lugar en Canguçu (RS), en mayo de 2016, y
permaneció por un mes, con aproximadamente 30 estudiantes. Además de las pautas del estado y
nacionales, que dispararon ocupaciones que ocurrieron entre 2015 y 2016, había pautas locales
relacionadas a la merienda y transporte escolar. La problemática de este estudio se relaciona con las
reverberaciones de esa experiencia, y la extensión de prácticas inventadas durante la ocupación a las
vivencias posteriores en la escuela. Se realizaron tres entrevistas, una individual y dos colectivas, de
éstas una con una profesora y una estudiante y otra con cuatro estudiantes. La forma en que se
organizaron las entrevistas, priorizando los encuentros colectivos se dio a partir del acoplamiento con
ellos en la investigación, de sesgo cartográfico. La conducción de estas fue abierta, atentando a la
experiencia presente de reformulación del acontecimiento de la ocupación, más que a una supuesta
recolección de informaciones acerca de él, de modo que la perspectiva cartográfica se alía al enfoque
enativo. Como resultado de la investigación, encontramos pistas en lo que se refiere al hacer ético en
la escuela, una vez que los procesos autogestionarios inaugurados durante la ocupación producen
reverberaciones en la normatividad que organiza la comunidad escolar. La metodología se fue
componiendo en la relación con los sujetos, dialogando con la perspectiva ética enativa, comprendida
como el reconocimiento de la virtualidad de sí mismo.
Palabras clave: enación, ocupación, ética, escuela.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
37 39
O movimento iniciou-se como reivindicação pela Espaço deliberativo aberto pelo poder público e
gratuidade do exame para admissão nas universidades e articulado com a sociedade civil com o intuito de
do vale-transporte estudantil e pela melhoria da merenda apresentar propostas que subsidiam o PNE (Plano
escolar, avançando posteriormente para o protesto Nacional de Educação).
40
contra a subvenção pública de escola privadas e a Os dados sobre a escola foram retirados do site da
possibilidade de cobrar mensalidade na educação básica mesma, podendo ser acessados em
também em escolas públicas. (ZIBAS, 2008). https://www.escolaetec.com.br/.
38
Acabou a paz, Isto aqui vai virar o Chile! Escolas
Ocupadas em SP - de Carlos Pronzato, disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=LK9Ri2prfNw.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
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41
Quando somos expostos a uma situação diferente da ou colapso, que desestabiliza os modos habituais de
familiar, ou seja, temos uma perturbação macroscópica responder às situações imediatas.
720
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
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42
O que chamamos aqui de acoplamento, ou respectivas estruturas. Assim, o que determina quais
acoplamento estrutural, é um dos conceitos- mudanças são possíveis para o ser vivo é a sua estrutura
chave da teoria da autopoiese (MATURANA & atual, e o acoplamento só se mantém quando as
VARELA, 1995) [7], uma das bases teóricas perturbações não são destrutivas, de modo a
fundamentais da teoria da enação, para explicitar a descaracterizar a organização autopoiética, o que
forma como ser vivo e meio se co-produzem. Cada ser ocasionaria sua morte. As modificações estruturais
vivo, de acordo com sua estrutura atual, é sensível a uma decorrentes da convivência, segundo essa abordagem,
gama de fenômenos que são sentidos como constituem o processo de aprendizagem, de modo que
perturbações. As perturbações relativamente recorrentes o conhecimento, resultante dela, tem uma base biológica
entre um ser vivo e seu meio, incluindo outros seres no sentido que se realiza em acoplamento do sujeito
vivos, produzem mudanças estruturais em ambos, mas com sua circunstância (MORAES, 2003) [8].
não as determinam, pois as mudanças dependem de suas
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tirou o ponto43 e aí ficaram professores resultado, e isto nos preocupa porque, dizemos,
parados, sentados ali na sala dos professores os hábitos são difíceis de modificar. (p.60) [12].
falando mal da ocupação” (extrato 6, entrevista
2). Também sobre os efeitos posteriores ao fim
da ocupação são citados casos de desagrado Certamente que no ensino médio, a partir de
dos pais com o movimento: “aconteceu de uma história de escolarização de vários anos,
depois que acabou a ocupação os pais os estudantes têm uma relação com a escola
mudarem seus filhos de escola, mudarem pro bastante diferente da que possui uma criança
João de Deus [outra escola de Ensino Médio recém chegada. No entanto, o contraste
que fica ao lado] porque lá não tinha greve, apontado por Maturana (2002) [12] se
mas acho que foi uma ou duas pessoas” mantém: a produção, sempre presente, do
(extrato 7, entrevista 2). Tanto os professores corpo nas interações que se dão de modos
que, segundo os secundaristas, “ficavam ali diferentes em escolas diferentes. No caso da
falando mal da ocupação”, quanto os pais que ocupação, há mais agência do que possui a
trocaram os filhos de escola e até mesmo os criança que é “colocada” em uma determinada
estudantes que consideravam relevante a escola, porque há a efetiva produção de uma
execução do calendário escolar conforme outra forma de habitar a escola, ainda que em
havia sido planejado anteriormente, mostram um caráter temporário.
que há múltiplas formas de se relacionar com A palavra temporário não significa menos
o movimento. Há tantas outras emoções e intenso, pois a duração de um acontecimento
percepções que se produzem na escola, e não segue o tempo cronológico. Se a ocupação
também desenham as linhas de força que a pode ser considerada um acontecimento, como
compõem, relacionadas ao acontecimento da aqui argumentamos, ela pode ter efeitos tanto
ocupação, que não estavam necessariamente no passado, como memória, por exemplo,
presentes nas entrevistas realizadas, mas que como no futuro da escola e nas pessoas
também produzem as reverberações possíveis envolvidas. Pelbart (2016) [4] escreve um
no presente, na escola. Todas essas linhas vão texto intitulado “Tudo o que muda com os
produzindo, na escola, experiências éticas e secundaristas”, fazendo uma leitura das
mesmo configurações escolares e os modos de ocupações como um acontecimento que
convivência nela implicados. destampa a imaginação política no país, um
acontecimento a partir do qual aquilo que era
Maturana (2002) ilustra bem os efeitos que inimaginável se torna possível, e aquilo que era
uma ou outra composição escolar podem ter, trivial se torna inaceitável, tal como a estrutura
citando a relação da criança com a escola: hierárquica da escola e a mercantilização da
educação. Nossa pesquisa segue essa pista,
uma vez que estamos discutindo o que não é
Tomemos o caso de uma criança que está mais o mesmo, mas atualizado em uma escola
crescendo. Colocamos a criança numa escola e
específica.
ela cresce de uma determinada maneira que
podemos ver por certas habilidades, que Ao falarem das mudanças que a ocupação
dizemos que ela adquiriu. Se a colocamos numa produziu e daquilo que ainda reverbera, em
outra escola, ela cresce de outra maneira, com alguns momentos os estudantes demonstram
outras habilidades. Falamos em aprender, mas, certo pessimismo ou desânimo, porque
de fato, o que fazemos ao colocar uma criança
gostariam que o acontecimento fosse mais
num colégio é introduzi-la num certo âmbito de
interações, no qual o curso de mudanças lembrado, tanto na comunidade externa à
estruturais que se estão produzindo nele ou nela escola quanto dentro dela por aqueles que não
seja este e não aquele. De maneira que todos participaram tão ativamente, sejam professores
sabemos que viver de uma forma ou de outra, ir ou estudantes.
a um colégio ou outro não tem o mesmo
43
O que os estudantes referem como não tirar o ponto presença, para fins de comprovação dos dias
significa permitir que os professores e funcionários da trabalhados.
escola comparecessem a ela e registrassem essa
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Enatuar é fazer emergir a partir de ações concretas,
de modo que sujeito e mundo existem em coemergência.
(VARELA, 1992.)
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compreender os processos de aprendizado, que presente através das emoções e dos fazeres que
se relacionam ao que Maturana (2001) [6] passaram a ser possíveis com eles [4]. Nesse
discute como sendo uma valorização sentido, o acontecimento dialoga com a
exacerbada ao que é entendido comumente concepção de ética de Varela (1992), que se
como sendo a razão. Para o autor, a emoção é efetiva em um saber-fazer imediato [3]. Para
um conjunto de estados ou disposições Varela (1992), a competência ética consiste no
corporais que especifica um domínio de ação. reconhecimento progressivo da virtualidade do
Ela não se opõe à racionalidade, mas constitui “si mesmo”, uma certa disposição às
junto com a mesma um certo imbricamento. Os transformações que acontecem em um
sistemas racionais, como as práticas que constante acoplamento com o mundo e ao
sustentam a escola existem baseados em mesmo tempo determinadas pela estrutura e
premissas negociadas a priori, a partir de uma capacidades sensório-motoras dos sujeitos [3].
certa emoção. As ações que podemos fazer Ou seja, a proposta enativa de ética, como
nesses sistemas, por sua vez, se dão a partir de abertura à virtualidade de si mesmo, tem a ver
uma ou outra emoção. com uma certa atenção às emoções que se
modificam, as passagens que acontecem entre
Tomando as emoções como aquilo que
elas. A ética, nesse sentido, não passa pela
habilita um conjunto de ações possíveis que
compreensão de uma racionalidade
podemos evocar a cada situação, entendemos
desencarnada e dissociada da emoção.
que a ocupação reconfigura, para os estudantes
e professores, que participaram ou não do A forma pela qual compreendemos o
acontecimento, que aponta para a participação
movimento, este repertório. Enfatizamos que
de outros movimentos sociais na história e que
isto não se modifica apenas para aqueles que
escapa aos muros da escola do pequeno
participaram da experiência porque a narrativa
município gaúcho, mas também participa de
dos estudantes mostra que a ocupação teve
um movimento nacional, aponta sim para um
reverberações emocionais na escola, não
campo aberto de possibilidades no futuro. Essa
necessariamente agradáveis. Quando a
virtualidade que não se esgota nos resultados
estudante, citada no extrato 8, diz que “o resto
práticos da ocupação, embora eles existam e
dos alunos eu acho que só tem o medo mesmo
devam ser lembrados, não necessariamente
que aconteça de novo e fiquem sem aula”, ela
precisa ser um pretexto para que a escola, em
está dizendo que o medo, por parte de uma
suas práticas institucionais, não tenha um
parcela de estudantes contrários à ideia de
papel ativo de responsabilidade -response-
ocupar a escola, é uma emoção que passa a
ability como propõe Haraway (2016) [15], de
poder ser explicitada a partir do acontecimento
retomar aquilo que a ocupação propiciou de
da ocupação.
aprendizado. Responsabilizar-se é, nesse
O elemento emocional, fundamental sentido, assumir coletivamente, de forma
quando pensamos nos processos humanos e atenta, a tarefa de retomar a experiência, as
sociais e, portanto, também os processos discussões realizadas durante ela, e de permitir
educativos, é o ponto crucial que conecta o que novos repertórios de ação que se tornaram
acontecimento àquilo que se pode produzir no possíveis a partir das emoções relacionadas ao
presente imediato. As emoções, produzidas a acontecimento da ocupação encontrem
partir dos acoplamentos engendrados durante a condições de retomada. Essa habilidade de
ocupação, não necessariamente estão responsabilizar-se não precisa estar
disponíveis somente aos que participaram dela, circunscrita à equipe da escola, mas pode
porque, conforme discutimos com Deleuze envolver a cidade, as pessoas implicadas em
(1974) [14] os acontecimentos não são as pensar educação e políticas públicas, os pais,
misturas entre os corpos, mas aquilo que se todos aqueles que, de alguma forma, se
produz e decorre delas. Não se pode dizer do relacionam com o fazer educativo, e também
movimento de ocupações, que conforme com os movimentos sociais.
Pelbart (2016) destampou a imaginação Os estudantes citam ganhos práticos da
política do país efêmeros ou apenas com ocupação, na relação com o Estado e a
efeitos imediatos, mas eles se atualizam no liberação de recursos financeiros, como
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RESUMO
O planejamento de segurança pública Pacificação, conjunto de operações policiais iniciadas em 2008
pelo governo do Rio de Janeiro, foi, nos últimos anos, tema de estudos de diferentes áreas das Ciências
Sociais. Entre narrativas de salvação e de um fracasso inevitável, o planejamento se sustentou em
contradições que ainda hoje faz circular promessas do Estado para as favelas, atualizadas na
intervenção militar ocorrida no início deste ano. Em nossa pesquisa de doutorado, investigamos a
natureza discursiva da Pacificação, especificamente, a promessa nela engendrada. Para isso,
dispomos, como arcabouço teórico, a Análise de Discurso materialista, com base em seu fundador
M. Pêcheux e nos desdobramentos teóricos realizados por E. Orlandi e S. Lagazzi. Nosso objetivo,
então, é trazer uma parte dos resultados da análise da “Diretriz Ministerial para a Força de
Pacificação”, parte do corpus da pesquisa que explora as pretensões pacificadoras relacionadas ao
ideal “aproximativo” da ação policial. A pesquisa busca ainda avançar os limites que reservaram a
promessa aos estudos da Pragmática, propondo dar visibilidade ao processo histórico que produziu a
favela como esse espaço carente de intervenção do Estado para a garantia de seus direitos.
Concluímos, provisoriamente, que a promessa da Pacificação parte de concepções idealistas na
construção de referências que tentam apagar o político na história, ou seja, as relações de poder que
se organizam em termos de divisão dos sentidos.
Palavras chave: Pacificação, discurso, promessa, favela.
ABSTRACT
The Public Safety Planning Pacification, a range of police operations initiated in 2008 by the
government of Rio de Janeiro, has been the subject of studies in different areas of Social Sciences in
recent years. Between salvation narratives and an inevitable failure, the planning was based on
contradictions that still circulate State promises to the favelas. These promises were updated in the
military intervention occurred at the beginning of this year. In our PhD research, we investigate the
Pacification discursive nature, in particular the promise present on it. For this purpose, we have the
materialist Discourse Analysis as a theoretical framework, based on the discussions of its founder M.
Pêcheux and on the theoretical developments of E. Orlandi and S. Lagazzi. Therefore, we aim to
bring some of the analysis results of the “Ministerial Guidance to the Pacification Force”. This is part
of the research corpus that explores the pacifying pretensions related to the “approximate” ideal of
police action. The research also intends to advance the limits that reserved promise to the Pragmatics
studies. Hence, we propose to give visibility to the historical process that created the favela as this
space with the lack of State intervention to the guarantee of its rights. We temporarily conclude that
the Pacification promise emerges from idealistic conceptions in the construction of references which
try to erase the political in history. That is, the power relations organized in terms of meanings
division.
Keyword: Pacification, discourse, promise, favela.
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É no espaço dessa brecha deixada por Pêcheux, por um hiato entre a favela e a cidade. Uma
lugar de desconstrução desse sujeito que tensão que se assinala no atraso com o qual a
promete em sua não coincidência consigo favela entrou na agenda das políticas públicas,
mesmo, que procuramos, no âmbito de nossa a despeito de sua existência que remonta ao
pesquisa, achar espaço para outras século XIX. Como um espaço de disputas –
desconstruções, outras dissimetrias. Quando a com significados nem sempre já
figura de quem promete é o Estado, coloca-se sobredeterminados pela violência – a favela
no centro da questão a legitimidade de suas inscreveu-se na história do Brasil dividida
ações destinadas a uma favela passiva, quando entre sentidos que a enquadraram ora como
não silenciada, partindo de uma instância de problema de saúde pública, ora como um gueto
poder que se apoia no papel de organizador dos cultural com reminiscências escravistas, antro
espaços na cidade (na favela), apagando “as de mazelas morais ou, ainda, espaço de
diferenças que são próprias às práticas reais do habitações irregulares.
espaço urbano em condições de produção
Se o nosso objetivo passa por uma reflexão
históricas concretas” [24]. em torno da relação do Estado com a favela, e
assim o é, mobilizamos, inicialmente, uma
leitura sobre a favela a partir de suas condições
A memória da favela sócio-históricas. Condições que não deixam
Partindo de nosso objeto de análise, o escapar um passado escravagista e, em virtude
discurso, procuramos pelos efeitos de sentidos disso, uma composição étnica de uma maioria
que se processam na relação entre sujeitos, a de negros concentrados em espaços
fim de atravessar o efeito de transparência demarcados por esquecimentos e violências,
promovido pelo mecanismo ideológico, traços de um racismo brasileiro estrutural.
através do qual os sentidos aparecem como Tendo isso em vista, tomamos como ponto de
sempre evidentes e, como naturalizadas, as partida uma sugestão de periodização elencada
produções resultantes da relação do histórico e pela socióloga Lícia do Prado Valladares
do simbólico. Para isso, é de nosso interesse [25]45 composta pelas seguintes etapas:
compreender a relação da língua, sempre
equívoca, com a discursividade, a inscrição
1ª) anos 1930 — início do processo de
dos efeitos linguísticos materiais na história. favelização do Rio de Janeiro e reconhecimento
Por tais razões, reservamos a presente seção da existência da favela pelo Código de Obras de
para tratar dos aspectos históricos relevantes à 1937; 2ª) anos 1940 — a primeira proposta de
intervenção pública corresponde à criação dos
produção de sentidos no/do material analisado. parques proletários durante o período Vargas; 3ª)
Antes de prosseguir, porém, uma observação anos 1950 e início dos anos 1960 — expansão
faz-se necessária: nosso gesto de remissão à descontrolada das favelas sob a égide do
história não se dá em uma relação causa-efeito. populismo; 4ª) de meados dos anos 1960 até o
Nosso investimento passa pela compreensão final dos anos 1970 — eliminação das favelas e
sua remoção durante o regime autoritário; 5ª)
do processo discursivo, ou seja, do modo como anos 1980 — urbanização das favelas pelo BNH
o texto funciona enquanto objeto simbólico, (Banco Nacional da Habitação) e pelas agências
em sua relação com a memória do dizer; do de serviço público após o retorno à democracia;
modo como a materialidade do texto organiza 6ª) anos 1990 — urbanização das favelas pela
a relação da língua com a história. política municipal da cidade do Rio de Janeiro,
com o Programa Favela-Bairro.
Sendo a memória discursiva um conceito
relacionado aos modos de designar as redes de
filiação histórica que organizam o dizer, Por nossa perspectiva discursiva, não
podemos compreender o passado da favela por seguiremos uma leitura de uma história tomada
esse conceito. Assim, chegaremos a uma a termo a termo, mas partimos de uma
memória da urbanização brasileira marcada compreensão sobre a história das favelas que
45
Apesar de optar por não seguir o aspecto cronológico consagrada, a autora não a descarta totalmente valendo-
dessa periodização adotada pela historiografia se de sua importância para os estudos sobre a favela.
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Segundo Burgos, aos parques proletários instalados valorização imobiliária dos bairros, até hoje detentores
nos bairros da Gávea, do Caju e na Praia do Pinto, de prestígio na capital fluminense.
próxima ao Leblon, foram transferidas 4 mil pessoas
47
A “cidadania regulada”, assim chamada pelo
sociólogo Wanderley Guilherme dos Santos (1979),
com a promessa de que poderiam retornar para as áreas traduzia uma realidade política em que a cidadania
próximas àquelas nas quais viviam, assim que encontrava-se associada à ocupação profissional.
estivessem urbanizadas. Mas, ao contrário do esperado, Assim, eram “pré-cidadãos” os trabalhadores rurais,
além dos tipos característicos das situações
os moradores acabaram permanecendo muito tempo ocupacionais dos moradores da favela, os
nesses parques, sendo expulsos de lá quando da desempregados, subempregados e empregados
instáveis.
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48
Dados do Relatório das UPPs (2012)
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Entre o que dizem os sites oficiais do governo Vejamos um excerto da Diretriz Ministerial:
e a Diretriz Ministerial nº 15 de 2010, uma
grande distância existe. O documento tem
como objetivo estabelecer os conceitos As regras para a utilização do armamento, em seu
basilares da operação e autoriza medidas de subitme, emprego das armas letais, ficam
demonstras as seguintes regras: As regras de
“ação” cabíveis aos policiais. O dispositivo engajamento não deverão tolher o direito do
legal explora o equívoco presente nas integrante da Força de Pacificação de proteger
pretensões pacificadoras relacionadas ao ideal sua vida com força letal, quando necessário;
“aproximativo” ou “comunitário” da ação Quando for inevitável o emprego de armas,
policial com previsões de combate nas zonas sejam letais ou não letais, o integrante da Força
de Pacificação deverá considerar três grupos de
de conflito. O próprio nome da diretriz serve pessoas, sob o enfoque da segurança e
para ilustrar, metonimicamente, os paradoxos preservação, na seguinte ordem decrescente de
que se colocam ao longo de todo o projeto da prioridade: a população em geral; a sua pessoa e
Secretaria de Segurança Pública do Rio de a sua tropa; e a força adversa; A Força de
Janeiro. Pacificação não poderá representar mais riscos
para a população do que as forças adversas.[28]
Força de Pacificação diz, pois, da relação
imediata entre força e paz colocada pelo
enunciado. A relação de contiguidade entre A oposição entre força de pacificação e
força (meio) e pacificação (finalidade), se forças adversas é sintomática. Ela aponta para
coloca também como uma relação do todo com a produção de um conflito histórico anterior
a parte: a força faria então parte da que culmina na construção de um dispositivo
pacificação, orientando os sentidos para uma estatal formal que é a então diretriz ministerial.
relação orgânica entre elas. A paz só seria Pelas regras de utilização do armamento, tem-
possível pela força, mas não qualquer uma. se o resumo da violência no espaço da favela
Uma força própria desse plano de segurança encenado em de lados rivais, policiais versus
pública inaugurando uma relação improvável bandidos, através dessas duas formulações que
entre paz e violência. Um lugar possível de guardam semelhanças equívocas.
realização de um pré-construído49 que admite Pelo procedimento de paráfrase, podemos
a possibilidade da paz, objeto da promessa, então descrever o funcionamento desse par, a
somente pela figura da polícia, aparelho fim de realçar a dinâmica discursiva dos
repressivo do Estado. enunciados, e, por conseguinte, o equívoco na
Nesse ponto, destacamos a importância das evidente equivalência de ambas. Colocamos
formulações linguísticas na construção da uma formulação em contraponto a outra a
discursividade em questão. Visto que, no partir da observação de sua estrutura:
processo de análise, a descrição e a
interpretação estão interrelacionadas, faz parte Força de pacificação Força adversa
de nossa tarefa descrever as regularidades Força dela (da paz) Força contrária
presentes no material. Desse modo, os Força sobre/do Força oposta
enunciados introduzidos por “de”, Estado
tradicionalmente denominados como
genitivos, produzem efeitos de sentidos que Pela compreensão das construções genitivas,
são incontornáveis. O modo como esses às quais nos limitamos nesse trabalho, os
enunciados se estruturam remetem a sentidos sentidos orientam-se à posse (alienável ou
de agente ou possuidor e contribuem para a não), às construções de relação e às de parte-
construção da evidência de um consenso a todo. Note-se que é na qualificação das forças
respeito de quem agencia a paz na favela. policiais que a diretriz lança mão da
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[6] E. Orlandi. “Segmentar ou recortar?”. In: [18] S. Possenti. Teoria do discurso: um caso
Lingüística: questões e controvérsias. Série de múltiplas rupturas. In: Mussalim, F. e
Integradas de Uberaba, 1984. Bentes. A. C. (Orgs.). Introdução à
Linguística: fundamentos epistemológicos.
[7] E. Orlandi. Discurso em análise: sujeito,
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2012a. [19] J. L. Austin. How to do things with words.
Oxford: Oxford University Press, 1962.
[8] E. Orlandi. Interpretação: autoria, leitura e
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Campinas: Pontes, 2012b Vogt. Coimbra: Almedina, 1987.
[9] E. Orlandi. Dircurso e Texto: formulação e
circulação dos sentidos. Campinas, SP: Pontes, [21] Benveniste, Émile. Problemas de
2001a. linguística geral II. 4 ed. Tradução de Eduardo
Guimarães; Marco Antônio Escobar; Rosa
[10] E. Orlandi. Cidade atravessada. Os Attié Figueira; Vandersi Sant’Ana Castro;
sentidos públicos no espaço urbano. João Wanderlei Geraldi; e Ingedore G. Villaça
Campinas, Pontes, 2001b. Koch. Campinas: Pontes. 1989.
[11] Orlandi, E. P. N/O limiar da cidade. In:
Rua, Campinas, número especial: 7-19, 1999b. [22] S. Felman. Le scandale du corps parlant:
Don Juan avec Austin ou la séduction en deux
[12] S. Lagazzi. A imagem do corpo no foco langues. Paris: Seuil, 1980.
da metáfora e da metonímia. In: REDISCO
V.2. n.1, jan./jun. Vitória da Conquista: [23] M. Pêcheux. Sobre a (des)construção das
Edições UESB, 2013b. p.104-110. teorias linguisticas. In: Línguas e Instrumentos
lingüísticos. Tradução brasileira de Celene M.
[13] S. Lagazzi. A Prática do Confronto com a Cruz e Clémence Jouët-Pastré. Campinas:
Materialidade Discursiva: Um Desafio. In: Pontes, [1982] 1999.
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discurso na contingência da história. In: F.
[14] S. Lagazzi. A autoria no enlace equívoco Indursky; M. Leandro Ferreira; S. Mittmann,.
das posições de sujeito. Revista Reflexão e (Orgs.). O discurso na contemporaneidade:
Ação. Santa Cruz do Sul, v. 23, n.1, p. 238-250, materialidades e fronteiras. São Carlos:
jan./jun. 2015. Claraluz, 2009. p. 53-64.
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Pêcheux. São Carlos: Pedro & João Editores, Especiais Criminais, Sistema Judicial e
2013a. p. 311-332. Sociedade no Brasil. Niterói: Editora
Intertexto, 2003.
[16] S. Lagazzi. S. O recorte significante da
memória. In: F. indursky; C. Leandro Ferreira; [27] P. Henry. Os fundamentos teóricos da
S. Mittmann, (Orgs.). O discurso na “Análise Automática do Discurso” de Michel
contemporaneidade: materialidades e Pêcheux. Tradução de Bethania Mariani. In: F.
fronteiras. São Carlos: Claraluz. 2009. p. 57- Gadet; T. Hak.
67.
[28] Ministério da Defesa. Diretriz Ministerial
[17] J. Couritine. A noção de “condições de nº 15, de 04 de dezembro de 2001. Regras de
produção do discurso”. In: COURTINE, Jean- engajamento para a força de pacificação,
Jacques. Análise do discurso político: o Brasília, DF, dez 2010. Disponível em: <
discurso comunista endereçado aos cristãos. https://www.defesa.gov.br>. Acesso em: 05
São Carlos: EDUFSCAR, 2009. p. 45-68. jan. 2017.
737
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b
Mestre em Direito e Justiça Social da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), e-mail: lusottili@hotmail.com.
c
Bacharel em Ciências jurídicas pela Faculdade Anhanguera - Rio Grande, e-mail:rodrigo.sjn@gmail.com.
RESUMO
As questões que envolvem a deficiência estão intimamente atreladas aos direitos humanos, neste
sentido tendo em conta que todo ser humano tem direito a uma vida digna sem ser submetido a
qualquer tipo de discriminação. Porém, a realidade diária das pessoas com deficiência é cercada de
dificuldades que envolvem desde barreiras ambientais de todos os tipos, chegando até as questões
sociais e econômicas, reproduzindo todo o estigma a que são submetidas a maioria destes indivíduos
durante toda a sua vida impossibilitando sua inclusão como cidadãos ativos da sociedade em que
vivem. Com relação ao trabalho, este proporciona, “além da realização pessoal, o atendimento das
necessidades básicas e a visão de si mesmo como agente de transformação social [que] possibilita
meios para a inclusão da pessoa com deficiência” (NASCIMENTO e MIRANDA, 2008:01).
Pensando nisto, o presente estudo tem como objeto a inclusão no mercado de trabalho das pessoas
com deficiência no Brasil, objetivando analisar as razões pela qual, mesmo com a Lei 8.213, de 1991
(apelidada de lei das cotas), já com 27 anos de existência, as pessoas com deficiência ainda participam
de forma tímida do mercado de trabalho e grande parte das vagas disponibilizadas a este segmento
social se encontram ociosas. Por esta referida lei, as empresas com cem ou mais colaboradores devem
realizar a reserva compulsória de 2% a 5% de suas vagas para as pessoas com deficiência (BRASIL,
1991).
Palavras chave: Políticas Públicas; Pessoas com deficiência; Política Educacional; Mercado de
Trabalho.
ABSTRACT
Issues involving disability are closely linked to human rights, bearing in mind that every human being
has the right to a dignified life without being subjected to any form of discrimination. But the daily
reality of people with disabilities is surrounded by difficulties involving everything from
environmental barriers of all kinds, reaching the social and economic issues, reproducing all the
stigma that are subjected to most of these individuals throughout their life making it impossible to
inclusion as active citizens of the society in which they live. With regard to work, this provides, "in
addition to personal fulfillment, the fulfillment of basic needs and the vision of himself as agent of
social transformation [that] provides means for the inclusion of people with disabilities"
(NASCIMENTO, MIRANDA, 2008:01). With this in mind, the present study has the purpose of
inclusion in the labor market of people with disabilities in Brazil, aiming to analyze the reasons why,
even with the Law 8213 of 1991 (dubbed the law of quotas), since 27 years disabled people still
participate timidly in the labor market and most of the vacancies made available to this social segment
are idle. Under this law, companies with one hundred or more employees must make a compulsory
reserve of 2% to 5% of their vacancies for people with disabilities (BRASIL, 1991).
Keywords: Public policy; Disabled people; Educational politics; Job market.
739
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
50
pela RAIS constituem expressivos insumos para
Relatório Anual de Informações Sociais: um atendimento das necessidades: da legislação da
importante instrumento de coleta de dados “Instituída nacionalização do trabalho; de controle dos registros
pelo Decreto nº 76.900, de 23/12/75, a RAIS tem por do FGTS; dos Sistemas de Arrecadação e de Concessão
objetivo: o suprimento às necessidades de controle da e Benefícios Previdenciários; de estudos técnicos de
atividade trabalhista no País, o provimento de dados natureza estatística e atuarial; de identificação do
para a elaboração de estatísticas do trabalho, a trabalhador com direito ao abono salarial PIS/PASEP”
disponibilização de informações do mercado de trabalho (MINISTÉRIO DO TRABALHO, 2017).
às entidades governamentais. Os dados coletados
740
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
Todavia a RAIS do ano de 2016 […] série histórica 2010/16 sinaliza uma
(MINISTÈRIO DO TRABALHO, 2017) tendência de baixa participação das pessoas com
deficiência no mercado de trabalho formal. Em
indica que apenas 418.521 pessoas com 2010 havia 306 mil PCD empregados,
deficiência estão trabalhando em empregos equivalente a 0,7% do estoque total de empregos
formais, ou seja, apenas aproximadamente formais. Em 2016, a participação […]
1,28% do total de pessoas com deficiência em [corresponde] a 0,9% do estoque total. Em seis
idade economicamente ativa estão anos, a participação dos PCD na força de
trabalho empregada estabilizou-se abaixo do
participando do mercado de trabalho patamar de 1% do estoque de emprego formal
(MINISTÉRIO DO TRABALHO, 2017). (MINISTÉRIO DO TRABALHO, 2017, p. 17).
Ademais, estes pouco mais de 1% de pessoas
A RAIS contempla empregadores da
com deficiência inseridos no mercado de
iniciativa privada, empresas públicas diretas e
trabalho, o estão, em sua grande maioria
indiretas e órgãos públicos (MINISTÉRIO DO
devido a uma política de cotas inserida na Lei
TRABALHO, 2017).
sobre os Planos de Benefícios da Previdência
Social, a qual se analisa a seguir. O contraponto é que de acordo com Clemente
e Shimono (2015):
A política de cotas para pessoas com […] as maiores companhias do País, que
deficiência deveriam ter no mínimo 5% de seus postos de
emprego ocupados por pessoas com deficiência,
A Lei 8.213 de 24 de julho de 1991 dispõe só têm 1,5% das vagas preenchidas regularmente
sobre os Planos de Benefícios da Previdência (CLEMENTE; SHIMONO, 2015, p. 6).
Social, sendo conhecida popularmente como
Lei de Cotas51 (BRASIL, 1991). Dentre as As empresas “alegam que não possuem vagas
questões de regência da Previdência Social, a adequadas a esses trabalhadores, já que muitos
lei estabelece em seu artigo 93, a reserva deles possuem limitações físicas ou
compulsória de vagas para pessoas com intelectuais que dificultariam sua inclusão”
deficiência nas empresas privadas que (BRASIL, 2016). E justificam o não
apresentam em seu quadro a partir de 100 cumprimento das cotas, a quatro razões:
funcionários, respeitando os seguintes
percentuais: 1) um número insuficiente de pessoas com
deficiência para atender a lei;
I - até 200 empregados.......................2%; 2) falta de capacitação profissional;
II - de 201 a 500..................................3%; 3) pessoas com deficiência não querem trabalhar
III - de 501 a 1.000.............................4%; porque têm medo de perder o Benefício de
IV - de 1.001 em diante. .....................5%. Prestação Continuada (BPC);
(BRASIL, 1991) 4) restrição de postos de trabalho devido ao risco
que representam para as pessoas com deficiência
(CLEMENTE; SHIMONO, 2015, p. 7).
Segundo o iSocial (2011) a política de cotas
se apresenta como principal instrumento de Contudo, no mercado de trabalho, o estigma
inclusão das pessoas com deficiência no pode ser um grande impedimento, não
mercado de trabalho. Contudo, existe uma externalizado pelos dirigentes, mas que faz
lacuna neste dispositivo, uma vez que o artigo parte da realidade das pessoas com deficiência
93 não estabelece em seus parágrafos a em todos os setores sociais.
distribuição proporcional entre os setores da
empresa, sendo encarada pelo empregador
apenas como uma obrigatoriedade. O Estigma
Em 2016 o Relatório Anual de Informações O estigma é uma construção social. Ele se
Sociais (RAIS) demonstrou que a: relaciona a determinadas características ou
51
Alguns autores referem-se a Lei 8.213/1991 como portanto, resumi-la ao entendimento de um único
a Lei de Cotas, contudo a referida lei trata de toda a dispositivo legal. (Nota dos autores)
regência da Previdência Social, não sendo adequado,
741
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
52
Atualmente utiliza-se o termo educação inclusiva.
742
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
ensino, para educandos portadores de siglas, que ficam, na maioria das vezes, só no
necessidades especiais”53 (BRASIL, 1996, s/p) papel. Programas similares e simultâneos são
lançados em duas ou três pastas, sem que haja
Sobre o ensino às pessoas com deficiência o integração de objetivos e metas entre eles
artigo 59 da mesma lei assegura: (MACIEL, 2000, p. 53).
53
Leia-se pessoa com deficiência.
743
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
Contudo, esta possibilidade não se faz tão […] outras coisas, pelo descrédito em relação à
fácil, e muitas pessoas que tentaram utilizar capacidade para o exercício das funções a eles
atribuídas, configurando uma barreira atitudinal
desta alternativa, ainda se encontram em que dificulta muito a inclusão (NEVES-SILVA,
disputas jurídicas para reavê-las após perder o PRAIS; SILVEIRA, 2015, s/p).
emprego ou deixar de ser empreendedor.
Esta falta de segurança jurídica aliada às A este estigma de falta de capacidade no
poucas oportunidades presentes no mercado de exercício das atividades laborais existe o pré-
trabalho acaba por dificultar sobremaneira a julgamento de que as deficiências ocasionam a
inserção das pessoas com deficiência no restrição de postos de trabalho devido ao risco
mercado de trabalho. que representam para as pessoas com
744
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
No entanto, nas empresas privadas, ainda não A CIF deixa claro que a incapacidade está
é possível contratar as pessoas com visão relacionada com o ambiente no qual a pessoa
monocular para ocupar as vagas reservadas. com deficiência está inserida, podendo haver
Sendo assim, estas pessoas têm, ainda mais, uma limitação no exercício das atividades
dificuldade de inclusão laboral, precisando laborativas caso o ambiente não possua
lidar com o estigma de que a deficiência está artifícios para suprir suas limitações, sejam
relacionada com uma incapacidade para o elas físicas, psíquicas, ambientais ou sociais.
exercício da atividade profissional e ao mesmo Portanto, a inclusão da pessoa com
tempo lidar com as dificuldades em trabalhar deficiência de forma digna no mercado de
nas mesmas condições de uma pessoa com trabalho, depende do uso de ferramentas que a
visão binocular. possibilitem executar as atividades laborais de
Desde a década de 70 a Organização Mundial forma independente.
da Saúde tem se manifestado com uma nova
visão acerca do que é deficiência, culminando
com a elaboração da Classificação
Internacional de Funcionalidade, Incapacidade
746
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
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Conforme informações do sítio eletrônico http://www.deficienteonline.com.br/lei-de-cotas-8213-
DEFICIENTE ONLINE.COM.BR disponível no site: 91-valores-das-multas-para-2018_news_323.html
747
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
<https://isocial.com.br/download/contratacao <http://www.pessoacomdeficiencia.gov.br/ap
dedeficientes_deficiencia_relatorio-2011.pdf> p/viversemlimite>.
[14] [15] [17] [31] [32] CLEMENTE, C.A.; [28] [31] [40] BRASIL. Lei nº 13.146, de 6 de
SHIMONO S.O. Trabalho de pessoas com julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de
deficiência e lei de cotas: invisibilidade, Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto
resistência e qualidade da inclusão. São da Pessoa com Deficiência). Diário Oficial da
Paulo: Edição dos Autores, 2015. Disponível União. Brasília, 07 jul. 2015, Seção 1, p. 2.
em: [30] BRASIL. Lei nº 12.470 de 2011. Dispõe sobre
<http://www.sinicesp.org.br/inclusao/noticias/ o Plano de Custeio da Previdência Social, para
2015_055.pdf>. estabelecer alíquota diferenciada de
[16] BRASIL. Lei de cotas para pessoas com contribuição para o microempreendedor
deficiência completa 25 anos. 2016. individual e do segurado facultativo sem renda
Disponível em: própria que se dedique exclusivamente ao
<http://www.brasil.gov.br/economia-e- trabalho doméstico no âmbito de sua
emprego/2016/07/lei-de-cotas-para-pessoas- residência, desde que pertencente a família de
com-deficiencia-completa-25-anos> baixa renda; altera os arts. 16, 72 e 77 da Lei
no 8.213, de 24 de julho de 1991, que dispõe
[18] OLIVER, M. The Politics of Disablement.
sobre o Plano de Benefícios da Previdência
Palgrave Macmillan. Nova Iorque, 1990.
Social, para incluir o filho ou o irmão que
[19] AMARAL, L A. Espelho convexo: o tenha deficiência intelectual ou mental como
corpo desviante no imaginário coletivo, pela dependente e determinar o pagamento do
voz da Literatura Infanto-Juvenil. São Paulo, salário-maternidade devido à empregada do
1992. 106 p. Tese (Doutorado em Psicologia microempreendedor individual diretamente
Social) - Instituto de Psicologia da USP, 1992. pela Previdência Social. 2011. Disponível em:
[20] [28] BORGES, M.L. A nova <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2
conceituação de pessoa com deficiência e sua 011-2014/2011/Lei/L12470.htm>.
importância na concessão do Benefício de [34] NEVES-SILVA, P.; PRAIS, F.G.;
Prestação Continuada (BPC) no Brasil. 9º SILVEIRA, A.M. Inclusão da pessoa com
Congresso Latino-Americano de Ciência deficiência no mercado de trabalho em Belo
Política. Montevideo, 2017. Disponível em: Horizonte, Brasil: cenário e perspectiva.
<http://www.congresoalacip2017.org/arquivo/ Ciênc. saúde coletiva vol.20 no.8 Rio de
downloadpublic2?q=ytoyontzojy6inbhcmftcyi Janeiro Aug. 2015
7czozntoiytoxontzojewoijjrf9bulfvsvzpijtzojq
[35] [36] [37] INSTITUTO ETHOS. Perfil
6ije4oteio30io3m6mtoiaci7czozmjoiyjljm2q3
social, racial e de gênero das 500 maiores
ota1mmq2ztvjztnizthmyte5mtu1m2rinjaio30
empresas do Brasil e suas ações afirmativas.
%3d>
Banco Interamericano de Desenvolvimento,
[21] [22] [23] BRASIL. Lei 9.394 de 20 de 2016. Disponível em:
dezembro de 1996 (Lei ordinária). Estabelece <http://www.onumulheres.org.br/wp-content/
as diretrizes e bases da educação nacional. uploads/2016/04/Perfil_social_racial_genero_
1996 500empresas.pdf>.
[24] NASCIMENTO, R.P. Preparando [35] [39] ABDVM - Associação Brasileira dos
professores para promover a inclusão de Deficientes com Visão Monocular. S/D.
alunos com necessidades educacionais Disponível em:
especiais. Londrina, 2009. Disponível em: http://www.visaomonocular.org/.
<http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portal
[38] BRASIL. Decreto nº 3.298, de 20 de
s/pde/arquivos/2496-8.pdf>.
dezembro de 1999. Regulamenta a Lei
[26] [27] SEDPD - Secretaria Especial dos no 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe
Direitos da Pessoa com Deficiência. Um plano sobre a Política Nacional para a Integração da
para todo o Brasil. S/D. Disponível em: Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as
normas de proteção, e dá outras providências.
748
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
RESUMO
O presente trabalho busca investigar de que maneira o ethos midiatizado do pastor e deputado federal
Marco Feliciano reproduz discursos sobre o controle do ethos privado. A partir de interseção mídia-
biopolítica-religião, construímos um percurso teórico a fim de identificar a dimensão institucional
desse sujeito. Caracterizando as marcas institucionais religiosas e políticas na perspectiva de
transformações modernas e em curso na sociedade ocidental, percebemos uma atenção estrutural às
condutas privadas e, principalmente, acerca da sexualidade humana. No intuito de destacar a atuação
discursiva de Feliciano, descrevemos suas relações e movimentos segundo a formação de um ethos
próprio, ambientado pela interpelação política, religiosa e midiática. Procuramos, por meio da análise
do discurso, verificar como a manifestação de Feliciano em suas mídias sociais aciona discursos de
controle sobre condutas privadas. Com uma primeira sistematização realizada por observação
exploratória das principais mídias (Facebook, Twitter, Instagram e YouTube), ressaltamos as temáticas
mais recorrentes compartilhadas pelo pastor e sua Assessoria. Destacamos o olhar em torno do canal
no YouTube por constatarmos maior incidência discursiva do objeto em estudo. Resumidamente, os
conteúdos apresentam elementos que inserem a devoção do pastor à Deus e à bíblia enquanto
premissas "de bem" para denunciar e combater a "imoralidade" e "inversão de valores" vistas hoje na
sociedade brasileira.
Palavras chave: Midiatização, Biopolítica, Religião, Ethos, Marco Feliciano.
ABSTRACT
The present work seeks to investigate how the mediated ethos of the pastor and federal deputy Marco
Feliciano reproduces speeches about the control of the private ethos. From the media-biopolitical-
religion intersection, we construct a theoretical path in order to identify the institutional dimension of
this subject. Characterizing the institutional and religious marks and policies in the perspective of
modern and ongoing transformations in Western society, we perceive structural attention to private
conduct and, above all, to human sexuality. In order to emphasize the discursive performance of
Feliciano, we describe his relations and movements according to the formation of a proper ethos,
acclimated by political, religious and mediatic interpellation. Through the analysis of the discourse,
we seek to verify how Feliciano's manifestation in his social media triggers discourses of control over
private conduct. With a first systematization carried out by exploratory observation of the main media
(Facebook, Twitter, Instagram and YouTube), we highlight the most recurrent themes shared by the
pastor and his Advisor. We highlight the look around the YouTube channel for finding a higher
discursive incidence of the object being studied. Briefly, the contents present elements that insert the
pastor's devotion to God and the bible as "good" premises to denounce and combat the "immorality"
and "inversion of values" seen today in Brazilian society.
Keywords: Mediatization, Biopolitcs, Religion, Ethos, Marco Feliciano.
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
Com a exposição feita, delineamos nossos situações podem se reunir sob pré-definições.
objetivos: ao reconhecermos a atual força de A tomada de perspectiva individual – e
mobilização política empregada nas redes coletiva por meio das relações entre indivíduos
sociais, o principal intuito deste artigo é – desse processo precede a institucionalização.
demonstrar de que maneira o ethos midiatizado Começamos a entender, portanto, a origem
de Marco Feliciano movimenta discursos de das instituições desde uma repetição
controle sobre o ethos privado. Os conceitos aparentemente simplória de atividades, mas
acionados para esta investigação se encontram que assume uma noção ampla ao enxergamos
numa perspectiva sociológica, apresentada sob os indivíduos que constituem as esferas sociais
as transformações de discursos e práticas e consequentes construções significativas do
institucionais em relação às mudanças também próprio desenvolvimento dessas atividades.
experimentadas pelo processo comunicacional Nesse estudo, os autores observam como o
em curso na sociedade. processo institucionalizado se dá a partir de
Dessa forma, o exercício empírico trazido uma tipificação recíproca de ações habituais
para este recorte busca analisar por tipos de atores.
discursivamente dois dos vídeos publicados
por Marco Feliciano em seu canal na rede
YouTube. Chegamos a essa singularidade O que deve ser acentuado é a reciprocidade das
tipificações institucionais e o caráter típico não
depois de realizar uma observação exploratória somente das ações, mas também dos atores nas
das contas oficiais do pastor e deputado nas instituições. [...] As instituições implicam, além
principais mídias sociais conhecidas disso, a historicidade e o controle. As tipificações
atualmente (Facebook, Instagram, Twitter e recíprocas das ações são construídas no curso de
YouTube). A compilação de resultados deste uma história compartilhada. Não podem ser
criadas instantaneamente. As instituições têm
primeiro estudo – executado por doze meses sempre uma história, da qual são produtos. É
(abril/2017 até abril/2018) – será abordada no impossível compreender adequadamente uma
decorrer do texto, ao trazermos nossas instituição sem entender o processo histórico em
discussões teóricas e escolhas metodológicas que foi produzida. As instituições, também, pelo
oferecidas para respondermos à questão simples fato de existirem, controlam a conduta
humana estabelecendo padrões previamente
central. definidos de conduta, que a canalizam em uma
Ressaltamos, para tanto, que a Análise do direção por oposição às muitas outras direções
Discurso proposta neste trabalho incrementa que seriam teoricamente possíveis. [BERGER,
parte de um Protocolo de Análise formulado, P.; LUCKMANN, T., 2004, pp. 79-80]
especificamente, para a pesquisa de mestrado
em andamento. Pretendemos, assim, distinguir Com esta caracterização, podemos inferir que
o desenho metodológico que ancora a os discursos construídos por essas tipificações
responsabilidade deste artigo com os demais assumem formatos padronizados, capazes de
trabalhos que seguem em desenvolvimento e interpelar nossas experiências pelo singelo fato
testagens empíricas para a dissertação. de "já existirem assim" – normatizados e
criados pelas instituições. Aqui, partindo de
Relações entre institucionalização e uma análise da divisão de trabalho entre dois
biopolítica indivíduos, os autores delineiam como
Na obra de Peter Berger e Thomas Luckmann acontece a formação de novos hábitos e a
(2004), entendemos que as origens da expansão do "terreno comum a ambos
institucionalização surgem com a ligação de indivíduos". Consequentemente, na visão de
atividades humanas ao hábito. O hábito, de um mundo social, ele sempre estará em
acordo com os autores, fornece a direção e a construção e irá conter raízes de uma "ordem
especialização da atividade que faltam no institucional em expansão".
equipamento biológico do homem, aliviando o Os pontos antropológicos e sociológicos
acúmulo de tensões resultantes do impulso explorados por Berger e Luckmann pretendem
não-dirigido. Descrevem, com exemplos explicitar passagens e construções da realidade
práticos, o processo de formação dos hábitos e da “vida cotidiana”. Para isso, tomam a
de que maneira uma multiplicidade de consciência humana enquanto fato material e
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
A retomada feita nos permite enxergar as obter a sujeição dos corpos e o controle das
relações entre "poder-saber", denominadas a populações. Este biopoder tornou-se
fim de apresentar sistemas de ações existentes indispensável para o capitalismo, uma vez que
no Estado moderno e nas próprias relações reforçou a inserção controlada dos corpos nas
humanas, que legitimam a "normalidade" das esferas de produção, ao mesmo tempo em que
coisas e dos comportamentos. A partir da conseguiu, por meio dessas instituições,
ascensão de dispositivos de controle e, sujeitá-los a técnicas de poder que agiram
consequentemente, das práticas de vigilância e desde a manutenção econômica até à operação
cobrança disciplinar, os sujeitos se vêem de hierarquias sociais, relações de dominação
biologicamente inscritos nas lógicas com as e efeitos de hegemonia. [FOUCAULT, M.,
quais os Estados e seus representantes pensam 1988].
as políticas públicas – ou para a "população", Nosso interesse em demarcar essa concepção
como Foucault denomina. Lembrando da teórica passa por acreditar que, atualmente,
reflexão de Berger e Luckmann, visivelmente estamos vivenciando por completo a
podemos relacionar esta vigilância – intrínseca experiência biopolítica, acentuada também
ao poder e seus dispositivos – àquela vigília pelos dispositivos e lógicas midiatizadas
construída individual e pessoalmente sobre (aprofundadas adiante, no próximo tópico). As
nossas condutas na experiência da vida expressões discursivas que caracterizam a
cotidiana. presença deste biopoder no atual estágio do
Ao adentrar em questões específicas das sistema capitalista, porém, ainda são pouco
relações humanas com os dispositivos exploradas no universo da análise do discurso.
coercitivos institucionais, Foucault explica que Mais um ponto importante, que também
esse poder sobre a vida é desenvolvido em justifica esse movimento, é sobre nosso recorte
duas formas principais: a do corpo-máquina, temático: a caracterização do ethos
pensado justamente no contexto de midiatizado de Marco Feliciano não pode se
adestramento, ampliação das forças e desvincular das formações institucionais que o
necessária docilidade para a integração aos construíram enquanto liderança evangélica e
sistemas de controle (assegurados por política.
procedimentos que caracterizam a anátomo-
política do corpo humano); e a do corpo-
espécie que transpassa mecanismos do ser vivo O ethos midiatizado e tensionamentos
e suporta processos biológicos, como os
nascimentos, a mortalidade, o nível de saúde e teórico-empíricos
a longevidade. Tais processos, de acordo com
o autor: Ao falarmos do conceito de ethos é
importante situarmos de onde vêm nossas
referências e aportes para construirmos a
São assumidos mediante toda uma série de presente discussão. O termo “ethos” é
intervenções e controles reguladores: uma originário das contribuições aristotélicas na
biopolítica da população. As disciplinas do corpo
obra Retórica, em que o filósofo grego também
e as regulações da população constituem dois
pólos em torno dos quais se desenvolveu a apresenta os conceitos de “logos” e “pathos”
organização do poder sobre a vida. (...) A velha no intuito de demonstrar a eficácia de um
potência da morte em que se simbolizava o poder discurso. Numa longa e profunda elaboração
soberano é agora, cuidadosamente, recoberta acerca das razões e emoções constitutivas do
pela administração dos corpos e pela gestão
ato discursivo, Aristóteles articula essas
calculista da vida. [FOUCAULT, M., 1988, p.
131]. instâncias no sentido de observar as qualidades
do orador – e de sua oratória – no momento em
que se expressa ao ouvinte, às plateias.
Dessa forma, todas as disciplinas que Resumidamente, trazemos para nossa leitura
permeiam a sociedade ocidental, sejam em a definição dessas três principais categorias,
escolas, universidades, práticas políticas, adentrando aos pontos específicos que
econômicas e questões de saúde pública são destacam a formulação conceitual de ethos que
interceptadas por diversas técnicas para se
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
buscamos explorar em nosso artigo. Assim, que compõe o universo público e privado
com algumas sínteses realizadas, retomamos a envolvido pela complexidade do fenômeno
uma descrição primária em que temos: ethos religioso nas sociedades modernas, o autor
enquanto uma prova de caráter [o orador]; detalha seus caminhos conceituais levantados
pathos como a instância emotiva sentida no ato para discussão a partir de quatro pontos
discursivo, e logos na qualidade de inferência principais. Nestes, Duarte ressalta a existência
ao discurso em si. Estas dimensões de um ethos privado não confessional
fundamentam, em princípio, a capacidade de generalizado no que tange à adesão e
persuasão intrínseca ao ato discursivo, pertencimento a experiências “religiosas” nas
desenhando a importância dada às enunciações sociedades modernas. O percurso é discorrido
desde os mais remotos tempos da sociedade por meio da articulação teórico-empírica em
ocidental. que o autor destaca os valores do
Em convergência à vasta possibilidade de individualismo, assim como outros aspectos da
explorar os apontamentos da retórica, o “cosmologia individualista” em incorporação
“ethos” é utilizado em diferentes tipos de nas doutrinas cristãs e nos diversos segmentos
expressões e, nas palavras de Muniz Sodré, da sociedade brasileira. [DUARTE, 2005, p.
constitui "a consciência atuante e objetivada de 139].
um grupo social – onde se manifesta a Baseado em anteriores trabalhos de campo
compreensão histórica do sentido da realizados, Duarte explora uma discussão
existência, onde têm lugar as interpretações teórica definindo pontos de entrelaçamento
simbólicas do mundo – e, portanto, a instância que também se mostram em nossa
de regulação das identidades individuais e investigação. Ao compreendermos a
coletivas." [SODRÉ, M., 2010, p. 45]. A esta atualidade dos processos modernos em contato
definição, agregamos o estudo do antropólogo com a construção de atores sociais e a
Luiz Fernando Duarte (2005) que salienta a consequente manutenção do “mundo
transformação do ethos privado em contato institucional”, buscamos localizar a inserção
com a religiosidade e com as mudanças em do sujeito Marco Feliciano neste contexto de
curso da chamada “cosmologia moderna”. operações e lógicas que imprimem novos
O autor apresenta sua tese a partir da formatos e discursos aos atores evangélicos,
preocupação explícita entre as regiões da assim como seu contato com a mobilização
religião e da sexualidade, também a política e midiatizada.
caracterizando enquanto específica da “visão Ao elaborarmos este exercício, articulamos
de mundo ocidental moderno”. Duarte se as leituras de Eliseo Verón, José Luiz Braga,
utiliza da categoria de “ethos privado” para Magali Cunha a fim de apresentar a
compreender “todos os valores, sentidos e complexificação experimentada pelo processo
comportamentos relacionados ao prazer de midiatização no contato com as demais
corporal, à satisfação moral, à reprodução esferas sociais, aqui especificadas nas
sexual e à conjugalidade – donde também a instâncias religiosa e política. A partir do
própria constituição da vida familiar.”. Esquema para a análise da midiatização
[DUARTE, 2005, p.138]. (1997), Verón desenha uma possível
Os estudos desenvolvidos neste trabalho representação simplificada dos fenômenos
buscam mostrar uma análise da constituição do midiatizados. Essa configuração não
ethos privado na sociedade brasileira demonstra nenhum processo linear,
contemporânea em sua possível relação com o principalmente marcados entre uma "causa" e
pertencimento ou adesão a religiões. (Ibidem). um "efeito"; ao contrário, a proposta se coloca
As hipóteses argumentativas levantadas por como um emaranhado de circuitos de
Duarte compilam pontos importantes que se "feedback". Ou seja, entre as instâncias que
alinham a nossa observação empírica no Verón denomina "instituições", "meios" e
tangente à expressividade que Marco Feliciano "atores individuais" ocorrem associações e
representa hoje nos âmbitos (político, religioso interpelações que originam construções
e midiático) trazidos para nossa pesquisa. coletivas. Dessa forma, sua análise explicita
Ao acreditar numa modificação de processos operações por quais os grupos são construídos:
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55 Disponível em: <http://www.eleicoes2014.com.br/marco- optamos por realizar este recorte a fim de compreender as
feliciano/>. Acesso em 10 out. 2016. linhas de análise do discurso baseadas em elementos textuais.
56 Disponível em: <https://noticias.gospelmais.com.br/400-
mil-votos-marco-feliciano-reeleito-deputado-federal- 58Outras
71685.html> Acesso em 2 jul. 2018 evidências demonstradas no texto de qualificação
foram estratégias de Feliciano voltadas para o segmento
57Cabe ressaltar que nossa observação centrou-se nas familiar "tradicional" (defendido por ele enquanto a união de
expressões verbais utilizadas nas postagens. Ao não pai, mãe e filhos) que estaria ameaçado pela doutrinação e
alienação ideológica da "esquerda". Além disso, o
incluirmos uma análise imagística, não estamos ignorando sua reconhecimento que este ator social confere às suas ações está
importância para a compreensão destes fenômenos, mas diretamente ligado a sua presença na igreja evangélica e no
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
sobressaltam sua imagem particular atrelada impor sua pessoa de sujeito falante ao outro
ao compromisso divino, expresso pela figura (problemática do ethos); como tocar o outro
de Deus e, principalmente, manifestada pelo (problemática do pathos) e, finalmente, como
compartilhamento de passagens bíblicas organizar a descrição do mundo que
específicas. Com algumas nuances já propomos/impomos ao outro (problemática da
ressaltadas por esse mapeamento, racionalização, ou do logos). A partir dessas
identificamos como a pauta “defesa da inferências, o autor apresenta uma figura que
família” é protagonizada por Marco Feliciano representa a “posição do sujeito falante
em suas expressões nas mídias sociais. colocado entre as restrições da situação de
Ao considerarmos as obras de Patrick comunicação na qual se encontra e o processo
Charaudeau (2006, 2007) como princípio que operacionaliza.” [CHARAUDEAU, 2007,
elucidativo e classificador de discursos p. 4].
políticos, o autor constrói em sua proposição
de análise quatro princípios acerca dessa
problemática: da alteridade, da influência, da
regulação e da pertinência. Para formular sua
proposição, o autor também comenta que esses
princípios agem simultaneamente, colocando
ao sujeito enunciador alguns problemas a
serem resolvidos para “haver a troca com o
outro”. O que é descrito acerca desse “contato
com o outro”, sempre pelo viés de um processo
enunciativo, consiste em:
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b
Laboratório Interinstitucional de Estudos e Pesquisas em Psicologia Escolar (LIEPPE /Instituto de
Psicologia/Universidade de São Paulo (USP), marileneproenca@gmail.com
RESUMO
No campo das políticas educacionais, a Psicologia Escolar e Educacional, busca aproximar-se daqueles
que interpretam, desenvolvem e implantam políticas de educação para compreender o contexto histórico
e cultural desta produção. Este trabalho apresenta o diagnóstico do Conselho Municipal de São Paulo
(CME), quanto a caraterização do espaço físico, formação continuada destinada a conselheiros municipais
de educação, perfil, constituição, composição, estrutura do órgão colegiado, funções e atribuições
desenvolvidas pelos conselheiros municipais de educação, no período de 2007 a 2015 para o
desenvolvimento de uma proposta de formação continuada para conselheiros municipais de educação, na
perspectiva histórico-cultural. Metodologicamente, trata-se de uma pesquisa qualitativa, de caráter
documental, que selecionou como fontes de pesquisa, os documentos oficiais para consumo público, no
site do Conselho Municipal de Educação (CME), visitas in loco na sede do CME, levantamento histórico
dos decretos de nomeação, regimentos internos e atos normativos. A seleção, a coleta e análises dos dados
fundamentam-se em Bogdan; Biklen (1994) e Rockwell (2009). Os resultados desta pesquisa oferecem
novas contribuições e desafios que ainda se impõe, para uma atuação crítica e transformadora de atores
sociais que decidem destinos educacionais, quando implantam e implementação políticas públicas, na
melhoria da qualidade da Educação Básica.
Palavras chave: Psicologia Escolar e Educacional, Políticas Públicas Educacionais, Pesquisa Qualitativa,
Conselho Municipal de Educação.
ABSTRACT
In the sphere of the education policies, the School and Education Psychology aims to bring closer the
parties which interpret, develop and implant the policies thereof to understand the historical and cultural
contexts of this production. The present study presents the diagnosis from the São Paulo Education District
Council (CME) regarding the physical space characterization, the continuous training dedicated to the
municipal councillors of education, the profile, the formation and the structure of the collegiate body, the
functions and duties of the municipal councillors of education from 2007 to 2015, in order to develop a
proposal on continuous training for municipal councillors of education, focused on a historical and
cultural perspective. In terms of methodology, it is a qualitative and documentary research, which selected
several sources: public official documents, the São Paulo Education District Council (CME) website,
visits to CME headoffice, historical survey of appointment decrees, internal regulations and normative
acts. The selection, collection and analysis of information were substantiated in Bogdan; Biklen (1994)
and Rockell (2009). The results bring new valuable contributions and challenges which are still on the top
and aiming a more critical and transforming approach by the social actors which are responsible for the
educational destination through the implantation and development of public policies to improve the
quality of Basic Education.
Keywords: School and Educational Psychology. Public Policies of Education. Qualitative Research. São
Paulo Education District Council.
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deixam claro que uma formação voltada (UNCME) e deixam de participar de outros
exclusivamente aos conselheiros, torna-se eventos sempre nas situações em que não há
praticamente não exequível, pelo perfil que divulgação.
possuem e pela disponibilidade necessária para
participar de um curso.
História: Criação e Instalação
Como estratégias de formação, costumam
valorizar e identificar como um tipo de O Conselho começou a funcionar,
formação não formal, as trocas de principalmente, como órgão de assessoria do
experiências, as discussões realizadas entre os Poder Executivo, antes de 1988, no município
conselheiros, que são de áreas diferentes, as de SP. Os mandatos dos conselheiros desta
quais representam momentos de aprendizado, época foram vencendo respectivamente e para
de estudo, de debate e que têm contribuído para cada mandato vencido, não eram nomeados
conhecimento de outras áreas, antes não novos conselheiros, razão pela qual, o
dominadas, considerando que até valem por Conselho funcionou de forma esporádica e
uma Pós-Graduação. Embora não consideram descontínua até 1989, quando paralisou suas
viável um Programa de Formação Continuada atividades temporariamente. Com a
somente para eles, demonstram interesse ao promulgação de uma nova Constituição
destacar a necessidade de se considerar em Federal (CF), no ano de 1988, os municípios
uma proposta de formação para conselheiros, o passaram a compor a República Federativa do
conhecimento do ordenamento jurídico, no que Brasil na condição de ente federativo, com
se refere à hierarquia das leis e normas, tendo atribuições e competências próprias,
maior clareza do que cada uma representa na especialmente, na educação e no ensino. Como
elaboração de atos normativos do CME. desdobramentos, nasce os Sistemas
Os conselheiros municipais de educação de Municipais de Ensino previsto no art. 211 da
São Paulo participam de Seminários Constituição e os Conselhos tem origem como
promovidos pelo próprio Conselho e de órgão do Sistema Municipal de Ensino. As leis
Congressos e outros eventos externos, municipais passaram a definir o Regime de
inclusive como palestrantes. É de iniciativa do Colaboração para a criação e o funcionamento
CME promover Ciclo de Debates em que dos Sistemas de Ensino.
buscam palestrantes de acordo com as Neste contexto é que o CME de São Paulo
temáticas que precisam para elaborar/aprovar foi criado pela Lei Municipal nº 10.429, de 24
os atos normativos. de fevereiro de 1988 conforme disposto no §
Nesse sentido, cita-se como exemplo a 2º do artigo 200 da Lei Orgânica do Município
questão da formação indígena para os (LOM), promulgada em 1990, com a seguinte
professores que lecionam em três aldeias redação: “Fica criado o Conselho Municipal de
indígenas na cidade de São Paulo, cujas Educação, órgão normativo e deliberativo,
escolas devem ter professores indígenas; a com estrutura colegiada, composto por
questão da “escola sem partido”; o tema da representantes do Poder Público, trabalhadores
inclusão. Para isso são chamadas em suas da educação e da comunidade, segundo lei que
reuniões, pessoas ligadas às áreas respectivas, definirá igualmente suas atribuições”.
para discutir com os conselheiros, Após a criação do CME em lei própria, o
contribuindo para ampliar a visão sobre os conselho que já existia como órgão de
temas. No ano de 2012 chegaram a aderir ao assessoria ao Poder Executivo e que estava
Programa de Formação Continuada de com suas atividades paralisadas desde 1989,
Conselheiros Municipais de Educação do Pró- retomou suas atividades com uma nova
Conselho/MEC, tendo realizado duas composição, estrutura e funcionamento que
inscrições, que não chegaram a se efetivar pela foram aprovadas no Decreto Municipal nº
falta de retorno do MEC, tendo recebido 33.892, de 16 de dezembro de 1993, nos
apenas os Cadernos de Formação pelo correio. termos do disposto no parágrafo 2º, do artigo
Os conselheiros também participam de 200, da Lei Orgânica do Município de São
Encontros Nacionais da União Nacional de Paulo e nos termos da nova ordem
Conselheiros Municipais de Educação constitucional, de 1988.
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SCRIPTA, volume III, contendo legislação e conselheiros de São Paulo, apesar de contarem
normas educacionais federais e municipais de com as condições ideais de trabalho para a
2003 e 2004; realização de um serviço de relevância pública
SCRIPTA, volume IV, contendo legislação na garantia da educação como direito e com
qualidade na educação básica, não conseguem
e normas educacionais federais e municipais
atender a demanda de alunos da Rede Pública
de 2005 e 2006.
Municipal de Ensino do ensino fundamental,
SCRIPTA, volume V, contendo legislação e pelo fato de contarem com um número
normas educacionais federais e municipais de limitado a nove conselheiros titulares e nove
2007 (encontra-se em processo de licitação conselheiros suplentes. Por outro lado, os
para fins de publicação). conselheiros conseguem empreender seus
SCRIPTA X (contendo legislação e normas esforços com as Escolas de Educação
educacionais federais e municipais de Profissionalizante de Nível Médio e as Escolas
RELATÓRIOS DAS ATIVIDADES DO Técnicas, que são de responsabilidade do CEE.
CONSELHO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO De acordo com a divisão de
dos anos 2011, 2012, 2013, 2014 e 2015. responsabilidade delegadas ao CME, compete
ao órgão atuar com prioridade na etapa da
Anualmente, compete ao Presidente do educação infantil do município e no ensino
Conselho enviar às autoridades competentes o fundamental, dividindo responsabilidades com
Relatório, previamente apreciado pelos CEE, na autorização, credenciamento e
Conselheiros e dar publicidade às atividades acompanhamento do controle social e de
do Conselho no Portal da Prefeitura e no fiscalização das escolas da Rede Pública. As
próprio site. A partir de 2016, as normas, divisões de responsabilidades dos entes
Deliberações, Indicações, Pareceres foram federados pela oferta da educação escolar estão
colocadas à disposição do magistério e dos asseguradas no artigo 211 e nos parágrafos da
interessados na internet, para consultas e Constituição Federal (Brasil, 1988) e nas
pesquisas. alterações promovidas pelas Emendas
As contribuições de Souza, Bavaresco e Constitucionais nº 14/1996 e nº 53/2006 do
Oliveira [18] oferecem pistas para identificar artigo 11, reafirmados nos artigos de 8º a 11 da
que os conselheiros municipais de educação LDB [19]
interpretam as políticas públicas nas O Diagnóstico do CME de São Paulo
Indicações, que antecede o momento da apresentado é revelador de que o Conselho foi
concretização das políticas públicas criado em lei no ano de 1988, com atividades
educacionais que repercutirão na melhoria da suspensas de 1989 a 2003, quando retomou
qualidade da educação básica, por meio das suas atividades, com a composição de nove
Deliberações. conselheiros titulares. O CME possui
Regimento Interno criado e aprovado em 1994,
Considerações Finais sem atualizações até a presente data. As
funções desempenhadas são de caráter
Após conhecer a realidade atual do CME e deliberativo e normativo em uma relação de
resgatar a sua história de criação, instalação foi assessoria à SME, que possui poderes
possível analisar de que forma historicamente assegurados em Lei, para validar suas
o conselho tem se organizado, desde a sua atividades e atribuições que são de
criação e instalação, identificar quais foram as competência do CME. Historicamente, os
formações continuadas que participaram, para conselheiros participam de formações
compreender o contexto atual e o momento continuadas, como representantes ou
histórico de suas conquistas, retrocessos e palestrantes e atualmente não possuem um
desafios que colaborar para analisar as Programa de Formação Continuada, em que
repercussões para a melhoria da qualidade da todos participem. Pode-se concluir que o
educação básica, no município de SP. modelo adotado é o da autoformação
Em uma primeira consideração, a partir da (GARCIA) [20].
realidade do CME, percebe-se que os
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*Universidade Federal de Pelotas (UFPel) – Instituto de Ciências Humanas (ICH) – Curso de Bacharelado em
História. Contato: sagrav1986@gmail.com
RESUMO
O Brasil nos anos da década de 1990 passava por um momento de turbulência em vários setores da
esfera pública, tanto na área econômica quanto política e social. O disco Usuário, lançado em 1995
pela banda Planet Hemp, traz o reflexo dos acontecimentos políticos e econômicos que sucederam
sua produção. Nas músicas do álbum, mostram-se presentes as demandas sobre violência policial e
do tráfico, falta de serviços básicos como saneamento, saúde e educação, desemprego e contestações
da parcela da população mais atingida por esses problemas, os pobres, fazendo assim emergir na
sociedade a voz da periferia. Objetivou buscar as relações entre as letras do álbum e a situação das
regiões periféricas do país nesse período através de matérias publicadas em jornais e revistas. Assim,
foi possível perceber que as músicas não tratavam apenas de uma forma de entretenimento, mas, de
um eco daquilo que vinha acontecendo nas áreas periféricas com o intuito de conscientizar e alertar
a sociedade e, principalmente os governantes, sobre a situação. Esse engajamento artístico abre
espaço para a defesa de que a música pode ter um vínculo com a política que não deve ser
desconsiderado. O álbum abriu espaço no cenário artístico para o consumo desse gênero musical,
porém, as autoridades e os governantes não atenderam a demanda de suas letras, ao contrário,
procuraram desqualificar aqueles que eram os porta-vozes pelo fato de reivindicarem nas músicas a
legalização da maconha.
Palavras-chave: música, Brasil, maconha, sociedade, Planet Hemp.
ABSTRACT
The Brazil in the 1990s was experiencing turbulence in various sectors of the public sphere, in the
economic, political, and social spheres to. The disc Usuário, released in 1995 by the band Planet
Hemp, reflects the political and economic events that followed his production. In the songs of the
album, the demands on police and trafficking violence, lack of basic services such as sanitation, health
and education, unemployment and contestations of the portion of the population most affected by
these problems, the poor, are shown to be present, thus making them emerge in society the voice of
the periphery. It aimed to search the relations between the lyrics of the album and the situation of the
peripheral regions of the country in this period through articles published in newspapers and
magazines. Thus, it was possible to perceive that the songs were not only a form of entertainment,
but an echo of what was happening in the peripheral areas with the purpose of raising awareness and
alerting society and, especially, the rulers, about the situation. This artistic engagement opens space
for the defense that music can have a link with politics that should not be disregarded. The album
opened space in the artistic scene for the consumption of this musical genre, however, the authorities
and the rulers did not meet the demand of their lyrics, on the contrary, they tried to disqualify those
who were the spokesmen for the fact to claim in the songs the legalization of the marijuana.
Keywords: music, Brazil, marijuana, society, Planet Hemp.
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Piti Vieira, editor da revista MTV – Discoteca MTV:
Usuário - Planet Hemp. 2007.
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peculiar acentuando o humor ou a sátira, a geral e quase 20 milhões não possuíam a coleta
denúncia política ou o romantismo. (SPÓSITO, por rede geral de esgoto (SAIANI, 2010.). O
1994. Pg. 168.).
déficit de atendimento nos serviços básicos
apresenta diferenças de acordo com a região e
Observamos no disco a presença da “os mais pobres têm menor probabilidade de
influência do rap e do rock, dois gêneros que obter acesso a um nível adequado de serviços
possuem historicamente um forte senso do que o restante da população” (MEJIA,
combativo trazendo consigo, ou 2003. Pg. 3.), além de possuir intima relação
desenvolvendo a partir de então, um ao
posicionamento sobre fatos ou temáticas
específicas. Esse engajamento artístico abre perfil de renda dos consumidores – capacidade
espaço para a defesa de que a “música pode ter de pagamento (tarifas) – e à existência de
um vínculo com a política que não deve ser economias de escala e de densidade no setor –
desconsiderado” (MUNDIM, 2004. Pg.53.). maior facilidade de ofertar os serviços em
grandes concentrações populacionais [...] os
investimentos realizados ao longo do tempo no
setor foram motivados mais pela possibilidade de
A contextualização das músicas. retorno econômico do que pelo grande retorno
A década 1990 foi marcada por social que tais serviços podem gerar.” (SAIANI,
2010. Pg. 81.).
transformações na economia brasileira que
buscava uma forma de reestruturação para
superar a superinflação e valorizar a moeda, o Já a questão da educação, ou melhor a falta
que só aconteceu a partir de 1994 com a dela, é outro tema abordado no disco de forma
aplicação do Plano Real. direta. As letras de A Culpa é de Quem?,
Até a criação do Plano Real a inflação no país Futuro do País, Fazendo a Cabeça e Não
atingia níveis inconcebíveis. Em 1990 o índice compre, plante!, apresentam a demanda por
era de 81% passando para 20% em 1993, educação feita pela periferia ao dizer,
porém, a hiperinflação que sucedeu no período respectivamente que:
anterior a aplicação do novo plano econômico
e a constante variação da moeda fez com que a
média inflacionária anual na década fosse de se o pobre começa a pensar parece que incomoda
alguém [...] escondem nossa cultura referência
278%. Essa inflação desenfreada é apontada ninguém tem;
como o fator principal do estrangulamento
economia brasileira afetando os investimentos
e a geração de empregos (DE CAMARGOS, mas dar uma esmola não é a solução eles
2002.). precisam de cultura e boa alimentação porque um
povo sem cultura me dá insônia qualquer dia
As tentativas frustradas de combate a desses voltaremos a ser colônia;
inflação foram os maiores problemas da
economia brasileira, levando a uma gradativa
concentração de renda e consequentemente Pra você poder sobreviver, cê tem que ter boa
educação. Boa educação que eu tô falando não
aprofundando desigualdades sociais gerando a são boas maneiras, é saber distinguir, o pó da
desconfiança da sociedade. Na música poeira;
Legalize Já o trecho “Eles vivem numa boa e o
povo no esgoto”, a expressão “esgoto” pode ter
sido utilizada como figura de linguagem, afim o pobre que não pediu isso foi quem pagou
pedem que façam paz, mas sem conveniência
de expressar a diferença de condições de vida, ensinam as crianças somente a violência aí cresce
mas, “o povo no esgoto”, também faz sentido um cidadão sem ter o que comer sem nem um
se analisarmos a questão do saneamento básico pouco de cultura pra poder sobreviver.
no Brasil.
Aproximadamente 10 milhões de domicílios
Se analisarmos os dados sobre alfabetização
não possuíam abastecimento de água por rede no Brasil no período da década de 1990,
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Outro caso que chamava a atenção da mídia, porcos da lei são todos marginais
e também recebeu uma citação na música matam pessoas inocentes e continuam em paz
despreparados, incompetentes agem acima da
Futuro do País, era o da chacina. No ano de
razão
1993 ocorreu a “chacina de Vigário Geral” que ao invés de impor a segurança apavoram a
levou a óbito 21 pessoas que não possuíam população
ligação com o tráfico de drogas. O massacre são ensinados a proteger uma minoria rica
foi efetuado por 50 homens armados, a maioria da maioria pobre que paga com a vida
e se você é um trabalhador você tem o padrão
policiais militares que buscavam retaliação
ideal
contra Flávio Negão, chefe do tráfico na pra cair na malha do esquadrão da morte oficial
região. A vingança teria origem na morte de 04 porcos fardados pensam que são homens,
policiais militares assassinados por um mas na verdade não honram nem o seu
desentendimento durante o pagamento de sobrenome
propina (O Globo, 04/07/13). bezerra eu peço licença para falar em seu nome
Nessa condição o disco Usuário delata a "você com o revólver na mão é um bicho feroz,
perspectiva do morador periférico que é sem ele anda rebolando e até muda de voz"
enquadrado como delinquente baseado no dizem que ela taí pra proteger é,
preconceito e sua condição social, cumprir a lei e os marginais prender
questionando a legitimidade da forma de mas na verdade ela só que te fuder
botam um x9 pra você ser dedurado
atuação da polícia. E não só a mercê de porcos fardados seus dias estão contados...
policiais e traficantes estão sujeitas as
invadem sua casa sem um mandado oficial
comunidades periféricas, as ações de levam o pouco que você tem te chamam de
milicianos, que são grupos formados por: marginal
faça um favor pra humanidade pow pow policial
os porcos fingem querer te ajudar
policiais e ex-policiais (principalmente militares), uns poucos mas se você ficar de costas eles vão te matar
bombeiros e uns poucos agentes penitenciários, todos com
treinamento militar e pertencentes a instituições do Estado,
não tem integridade, são uns covardes matam
que tomam para si a função de proteger e dar “segurança” em sem piedade (pow pow pow)
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A censura está viva e ensaia sua volta em grande High Times, uma das mais renomadas no
estilo. As vítimas mais recentes são o rap-fumaça segmento da cultura canábica.61
do Planet Hemp, as baladas de heroína do filme
inglês ‘Trainspotting – Sem Limites’ e a ‘nega’ Se deparar com o termo “cultura canábica”
do palhaço Tiririca. Os velhos censores pode parecer estranho. Isso se deve a forte
aplaudem.” (Folha de São Paulo, 01/08/1996).
campanha para a demonização da planta
incitada a partir das primeiras décadas do
século XX e a colocação do uso da Cannabis
Apesar do período da ditadura militar já estar
na ilegalidade. Mas, creio ser um erro associar
extinto e com ela a censura, pelo menos
a cultura em torno da Cannabis com o conceito
teoricamente, esses fatos não condiziam com o
de “cultura da droga”62 de Howard Becker
governo democrático ao qual o Brasil estava
como feita por MUNDIM (2004), pelo
inserido na década de 1990. Esse momento fez
pressuposto que a relação entre sociedade e a
com que houvessem diversas manifestações
planta é milenar, íntima e complexa, não uma
em defesa da liberdade de expressão que
simples cultura ritualística de uso,
mobilizou desde a classe artística até os
comportamento e ideologia afim de justificar o
políticos em prol da efetivação dos direitos
consumo de substanciais psicotrópicas.
civis ao qual propunha-se a constituição
nacional. A falta de conhecimento é abordada no disco
Usuário, onde é feito o questionamento sobre
Em declaração ao Jornal do Brasil em 1997 o
diretor da Polícia Federal Vicente Chelotti as leis vigentes criminalizando o uso da planta,
a manipulação de informações e o preconceito
disse que:
ao qual está submetido o usuário.
As letras de Não compre, plante!, Legalize
Não estamos censurando previamente nenhum Já, Phunky Buddha, A culpa é de quem?, Dig
artista. Mas não podemos ficar de braços
cruzados quando vemos músicos estimulando o
Dig Dig (hempa) e Mantenha o Respeito são as
uso de maconha nos rádios. (Jornal do Brasil, que trazem o questionamento da situação atual
15/11/1997). à tona. Em Não compre, plante! é dito: “quem
é você pra falar do meu comportamento
cumpadi, você não tem base nem
Assim, buscaremos a seguir debater a conhecimento”. Bem como em Legalize Já
acusação de apologia, identificando nas letras quando falam: “É muito fácil criticar sem se
das músicas as demandas que são apresentadas informar, se informe antes de falar e legalize
em relação ao uso e ao usuário. Como dito por já”. Essa falta de informação e conhecimento
Marcelo D2 ao ser questionado se fazia citados se referem a relação da Cannabis na
apologia ao uso de drogas: sociedade.
A Cannabis tem relação com a sociedade
de jeito nenhum. Não quero que as pessoas humana há séculos. Por se tratar de um
fumem maconha. [...], a principal bandeira da elemento orgânico, portanto, de fácil
gente é que as pessoas possam fumar ou não, sem decomposição, é difícil precisar a quanto
sofrer com isso. (Folha de São Paulo, tempo a planta está presente no meio social.
05/08/1996).
Porém, o registro mais antigo são vasos feitos
com cordas de Cannabis e barro, datado em 12
O principal tema abordado pelo Planet Hemp mil anos. A planta é citada na farmacopeia
em suas canções é a Cannabis. O nome Planet mais antiga existente (Pen’Tsao Ching, entre
Hemp foi inspirado pela revista Americana séculos I e II a.C.), além de ter sido
61
Termo utilizado para abranger os diversos temas cujo 62
O termo cultura da droga “se caracteriza por ideias ou
o qual tenham a Cannabis como inspiração ou crenças que indivíduos ou grupos (que Becker chamou
influência, como por exemplo música, literatura, de rede de relações de uso de drogas) têm sobre uma
religião, artes, costumes, etc. droga qualquer, lícita ou ilícita, e que sejam passíveis de
serem compartilhadas. (MUNDIM, 2004. Pg. 12.)
780
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
63
(1892-1975) foi comissário do Departamento Federal de Narcóticos área farmacêutica e de celulose. Foi representante democrata na
dos EUA (FBN). Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, eleito duas vezes.
64
Hearst inclusive foi o inspirador do “Cidadão Kane” de Orson Welles.
Criador da noção de impressa marrom de notícias sensacionalistas e
65
origem duvidosa, chegando a controlar uma rede de cerca de 30 jornais Dono da Gulf Oil, embaixador dos EUA no Reino Unido (até 1937)
e revistas, cujos quais, foram utilizados para fazer lobby em defesa de e Secretário do Tesouro dos EUA
interesses de seus financiadores, esses por sua vez eram empresas da
781
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
66
NUTT, D.J.; KING, L.A.; PHILIPS, L.D., 2010.
782
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
Outro fato importante é que aceitação [10] DE SOUZA, Renata Mara. Analfabetismo
comercial do disco acarretou uma maior no Brasil. FAPAM, TCC Pedagogia, Pará de
abertura do mercado fonográfico para o gênero Minas. 35f. 2015.
rap, o que possibilitaria uma expansão das [11] HENRIQUES, Ricardo. Desigualdade
vozes da periferia. racial no Brasil: evolução das condições de
Com esse artigo procurei, mesmo que de vida na década de 90. 2001.
forma sucinta, realizar o exercício de [12] HARTAMANN, Julio Cesar Facina.
contextualização da música e sua perspectiva Crime Organizado no Brasil. IMESA, TCC
social com o período histórico ao qual está Direito, Assis. 59pg. 2011.
inserida, com o intuito de valorizar esse
segmento midiático que pode representar para [13] O GLOBO. Chacina de vigário geral
a sociedade mais do que apenas um modo de deixa 21 mortos. 04/07/2013.
entretenimento. [14] ZALUAR, Alba; CONCEIÇÃO, Isabel
Siqueira. Favelas sob o controle das milícias
no Rio de Janeiro. São Paulo em Perspectiva,
REFERÊNCIAS v. 21, n. 2. 2007.
[1] PLANET HEMP – Usuário. SuperDemo, [15] RAMOS, Silvia. Criminalidade,
Sony Music/CHAOS. 1995. segurança pública e respostas brasileiras à
[2] DISCOTECA MTV: Planet Hemp – violência. Parcerias estratégicas, v. 20, n. 1, p.
Usuário. MTV Brasil. 2007. 519-537, 2005.
[3] SPÓSITO, Marília Pontes. A sociabilidade [16] FOLHA DE SÃO PAULO. Planet Hemp
juvenil e a rua: novos conflitos e ação coletiva é preso por apologia da droga. 10/11/1997.
na cidade. In: Tempo Social, São Paulo, v.5, [17] FOLHA DE SÃO PAULO. Censura nas
n.1-2, p.161-178, 1994. artes ensaia volta. 01/08/96.
[4] MUNDIM, Pedro Santos. Das rodas de [18] JORNAL DO BRASIL. Na mira dos
fumo à esfera pública: o discurso de federais. 15/11/1997.
legalização da maconha nas músicas do
Planet Hemp. 2004. [19] FOLHA DE SÃO PAULO. Planet quer
baixar fumaça. 05/08/1996.
[5] DE CAMARGOS, Marcos Antônio.
Reflexões sobre o cenário econômico [20] VARGAS JUNIOR, Paulo. A Cannabis
brasileiro na década de 90. 2002. no Brasil: Origens e disseminação da
proibição. 2015. 44f. Trabalho de Conclusão
[6] SAIANI, Carlos César Santejo et al. de Curso (Licenciatura Plena em História) –
Evolução do acesso a serviços de saneamento Instituto de Ciências Humanas, Universidade
básico no Brasil (1970 a 2004). Economia e Federal de Pelotas. Pelotas. 2015.
Sociedade, v. 19, n. 1, p. 79-106, 2010.
[21] BURGIERMAN, D. R.; NUNES, A. A
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desenvolvimento sustentável. Banco Mundial, Superinteressante, São Paulo, ed. 179, 2002.
2003.
[22] NUTT, D.J.; KING, L.A.; PHILIPS, L.D..
[8] IBGE. Centro Demográfico 2000. Rio de Drug Harms in the UK: a Multicriteria
Janeiro, 2000. Decision analysis. The Lancet, 376: 2010.
[9] PNUD – PROGRAMA DAS NAÇÕES [23] KELLNER, Douglas. A cultura da mídia:
UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO. estudos culturais: identidade e política entre o
Atlas do desenvolvimento humano no Brasil. moderno e o pós-moderno. EDUSC, 2001.
Disponível em: < www.atlasbrasil.org.br > ,
acesso em: 15/10/2017.
783
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
RESUMO
O método dialético consiste em avaliar, descrever e relacionar conceitos. A concepção de República
em Hannah Arendt pode ser um deles. E ele pode ser investigado nas obras da autora ou em sua
historicidade, como por exemplo, em teóricos como Platão, Aristóteles, Cícero, Maquiavel,
Rousseau, Montesquieu Kant, Hegel. Isso porque a elaboração da presente investigação decorre da
pergunta sobre a melhor forma de governo. Para Arendt, é a república a proposta de organização da
sociedade que não permitiria “a dominação total” dos indivíduos, como ocorreu no Nazismo (1933-
1945), por exemplo, constituindo, em oposição, uma vida autenticamente política. O isolamento,
destrutivo da possibilidade de uma vida pública, requer a ação conjunta com outros seres humanos,
visando à utilização de um espaço público para o encontro, a discussão e a decisão, sobre temas de
interesse de uma comunidade política. Para demonstrar a dialeticidade do conceito de república, serão
utilizadas, em especial algumas obras da autora, tais como: Origens do Totalitarismo, A Condição
Humana, Sobre a Revolução, aliadas a comentadores brasileiros e outros, pois o estudo deste tema
será realizado de forma bibliográfica, buscando o pensamento arenditiano, explicando e
exemplificando seus conceitos.
Palavras chave: Arendt, República, Política, Método Dialético.
ABSTRACT
The dialectical method consists in evaluating, describing and relating concepts. The conception of
Republic in Hannah Arendt, may be one of them. And it can be investigated in the works of the author
or in his historicity, as for example in the theorists as Plato, Aristotle, Cicero, Machiavelli, Rousseau,
Montesquieu Kant, Hegel. This is because the elaboration of the present investigation stems from the
question on the best form of government. For Arendt, it is the republic's proposal of organization of
society that would not allow "total domination" of individuals, as in Nazism (1933-1945), for
example, constituting, in opposition, an authentically political life. The isolation, destructive of the
possibility of a public life, requires the joint action with other human beings, aiming at the use of a
public space for the encounter, the discussion and the decision on subjects of collective interest, which
occurs through a community politics. In order to demonstrate the dialectic of the concept of republic,
in particular, some works by the author, such as: Origins of Totalitarianism, The Human Condition,
On the Revolution, allied with Brazilian commentators and others, will be used. bibliographical,
searching the Arenditian thought, explaining and exemplifying its concepts.
Keywords: Arendt, Republic, Politics, Dialectic Method.
784
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
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A liberdade política a que se refere Arendt é a 68
A “igualdade”, em Arendt, significa a possibilidade
liberdade política ligada à ação, á pluralidade humana do cidadão se expressar, mas também concordar,
em um espaço público, aberto à palavra, à doxa, e a sua discordar, contestar em conjunto com seus semelhantes.
discussão, na qual o “eu posso” a capacidade de atuar se Em outros termos, a liberdade, nesta autora, apenas
torna efetiva (SCHIO, 2012, p.150). existe na esfera pública, na vida política (Idem,
2012,p.151).
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
direito de tornar-se “um participante da gestão estado “puro”, devendo ser conciliadas numa
governamental”, ou seja, o direito de ser visto república, porque o serviço da república e da
pátria é um “estado de espírito” que assegura da
em ação. Segundo Arendt ( 1990, p. 104): parte dos governos e dos governados, a qualidade
das Constituições. Se as leis mudam, todo
cidadão verdadeiramente virtuoso nem por isso
A tirania, conforme as revoluções rapidamente deve deixar de seguir e observar as regras da
vieram concebê-la, era uma forma de governo no eterna justiça, em lugar de uma justiça
qual o soberano, embora governando segundo as convencional, posto que dar a cada um o seu
leis do reino, havia assumido o monopólio do direito é próprio do homem bom e justo.
direito de ação, banido os cidadãos da esfera
pública para a privacidade de seus lares, e
exigido deles que cuidassem apenas de seus Para Cícero, o público diz respeito ao bem
próprios negócios.
do povo, que não é uma multidão dispersa de
seres humanos, mas sim, numa República, um
O termo República tem, entre seus grupo numeroso de pessoas associadas pela
significados, o sentido amplo de comunidade adesão a um mesmo direito e voltadas para o
política organizada. O título do livro de bem de todos pertencentes a uma mesma
Hannah Arendt, Crises da República(1972), comunidade. A dedicação ao bem comum está
aponta para esse sentido amplo de comunidade na raiz do princípio da moralidade da
política, mas ao mesmo tempo indica que a administração pública.
crise dos EUA (Guerra do Vietnã 1959-1975), Hannah Arendt ao se referir à democracia,
naquela ocasião, era muito utilizado o uso da demonstra a sua preferência pela democracia
mentira e da glorificação da violência. participativa em detrimento da democracia
Na perspectiva mais específica de formas representativa, tendo em vista que a primeira
de governo, a República contrapõe-se à inclui a participação dos cidadãos,
Monarquia. Assinala a diferença entre o poder demonstrando o interesse deles pelas questões
exercido em função de direitos hereditários e o políticas, bem como, tornando-os ativos nesse
poder eleito, direta ou indiretamente, pelo espaço, no qual é exercido o poder de liberdade
povo. Nesse sentido, a República tem política. O poder segundo Arendt, não é
afinidades com democracia e aponta para a sinônimo de opressão, mas da possibilidade de
igualdade. viver na pluralidade, onde os homens estão
reunidos na esfera pública relacionando-se por
A contraposição Monarquia/República meio do diálogo. A legitimidade do poder
remonta aos romanos, que depois da exclusão resulta do agir humano, em conjunto, por meio
dos reis substituíram o governo de um só pelo da associação, da discussão, em busca de
governo de um corpo coletivo (510 a.C – 27 resoluções de problemas e dificuldades em
a.C). Na elaboração do conceito de República comum, visando ao interesse de uma mesma
teve grande peso a reflexão de Cícero 106 a.C comunidade.
-43 a.C), que diferenciava a res-pública - a
coisa pública - da privada, doméstica, familiar, Hannah Arendt ao se referir à ação, destaca
estabelecendo, assim, a distinção entre o a participação dos cidadãos na política em uma
privado, o particular a alguns, e o público, o esfera pública, tornando-os ativos nesse
comum a todos, que por isso deve ser do espaço, no qual é exercido o poder de liberdade
conhecimento de todos. Inspirado em Platão política, assim como ocorre em uma
(428/427-348/347 a.C) e no estóico Crisipo democracia. Ressalva-se que o poder segundo
(279 a.C – 206 a.C), Cícero declara que as leis Arendt, não é sinônimo de opressão, mas da
são necessariamente inerentes a toda a possibilidade de viver na pluralidade, onde os
sociedade e o legislador deverá levar em conta homens estão reunidos na esfera pública
o ideal e as realidades, segundo Cícero (2011, relacionando-se por meio do diálogo. A
p.37): legitimidade do poder resulta do agir humano,
em conjunto, por meio da associação, da
discussão, em busca de resoluções de
As três formas de governo: monárquica, problemas e dificuldades em comum, visando
aristocrática e democrática são más em seu
786
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
ao interesse de uma mesma comunidade. bem de todos e não pelo bem próprio e é o que
Segundo Lafer (1988, p.205): sustenta e define um Estado democrático. No
Direito existem alguns problemas enfrentados
em relação à natureza dessa ligação entre o
O poder fala a linguagem da persuasão, dando povo e o representante, entre o eleitor e o
Hannah Arendt realce na sua análise, ao processo eleito. De acordo com Ferreira Filho (1993, p.
de geração de poder. É por isso que ela contesta
73):
a relação entre governantes e governados que
cuida apenas do emprego e manutenção do poder
– o que para ela, é um erro conceitual, pois o
Na verdade, a representação, esse vínculo entre
poder pode ser atualizado ex parte populi.
governados e governantes pelo qual estes agem
em nome daqueles e devem trabalhar pelo bem
de todos representantes e não pelo próprio. Tal
No Brasil, a participação dos cidadãos, representação é muito anterior a democracia
ocorre por meio de uma democracia moderna, nas assembléias medievais, os
representativa, ou seja, o cidadão participa representantes eram meros porta-vozes das
comunidades que os designavam.
politicamente por meio do voto, porém, desta
forma, ele não se envolve totalmente nas
questões políticas. Arendt critica este tipo de Existem algumas classificações de
democracia, para ela, cria-se um hiato entre democracia mencionadas no direito, porém
governantes e governados, existem grupos de cabe ressaltar os dois mais importantes
representantes dos cidadãos, os quais conceitos de democracia utilizados pelos
governam transformando o exercício da juristas são a democracia direta e a democracia
política em trabalho. Segundo Schio (2012, p. indireta. O modelo clássico de democracia
197): indireta é a chamada de Democracia
Representativa, provém do governo
Ocorre, assim, um distanciamento entre representativo que as Revoluções Liberais
governante e os governados, acarretando o começaram a implantar pelo mundo, a partir do
desaparecimento do público, que é substituído século XVIII. A base teórica fundamental para
pela burocracia, pelo conjunto de funcionários a representação é a ideia exposta por
responsáveis pelo controle e manutenção do Montesquieu em O Espírito da Leis (1748) de
Estado, momento em que o político se perde,
cedendo lugar ao administrativo. que os homens, de um modo geral, não têm
necessariamente total capacidade para apreciar
e para decidir todos os problemas políticos,
De acordo com Arendt, quando a burocracia sendo preciso que essas decisões sejam
se sobrepõe ao espaço público, o cidadão tem confiadas aos representantes do povo.
sua participação nele restringida, não De acordo com a Constituição Brasileira de
conseguindo adentrar e resolver os problemas 1988, ainda, no que diz respeito à
mais básicos. Para ela, a participação política, representação em uma democracia, é
preserva a política autêntica e o espaço importante mencionar que esta ocorre por meio
público, onde cada cidadão ocupa seu lugar no de eleição, ou seja, uma atribuição de
mundo humano, participando das decisões e competência, por meio do voto. Nada vincula
responsabilizando-se por elas, e desta forma o juridicamente ao seu eleitorado, pois a questão
governo não deixa de ser exercido, por isso a é apenas política, ou seja, predomina a vontade
necessidade da existência de uma esfera de uma maioria dos eleitores. Para que
pública, pois seria o espaço onde ocorreria uma ocorram eleições, é necessária a existência de
proximidade entre os governantes e
governados.
No Brasil, a democracia sem representação
não existe, pois é por meio este vínculo, entre
governantes e governados, pelo qual estes
agem em nome daqueles e devem agir pelo
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
partidos políticos69. Para Barbosa (1994, p. governantes e governados de forma mais direta
100): , existe a possibilidade de ditaduras e regimes
totalitários ocorrer.
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
ou mortos, não se preocupam ter vivido ou resultados como a ausência de leis fixas e
nunca ter nascido. conhecidas, fazendo com que ninguém
estivesse seguro, as pessoas não sabiam o que
lhes era permitido ou proibido fazer. A lei72,
Com a desvalorização do humano, de sua que tem por objetivo garantir, a segurança
vida, de sua opinião e de sua participação, jurídica, não mais ocorrera no Regime
deixou de prevalecer às regras existentes e Totalitário Nazista, como Schio (2012, p. 47)
outras foram impostas, apenas havendo argumenta:
obediência ou a exclusão, não existiam direitos
conhecidos e garantidos, apenas terror e medo,
cujo objetivo era impor e aplicar por exemplo, A legislação não foi aniquilada, em
verdade, foi simplesmente esquecida pelo
as leis do Código de Nuremberg. Segundo Totalitarismo e substituída pela vontade
Arendt, o pensamento político vigente na suprema e imutável do governante. Este
Europa Ocidental é oriundo dos gregos e dos não respeita normas jurídicas, sejam
romanos. Daqueles surgiu a preocupação com oriundas de costumes, seja das leis
a polis, a forma de organizá-la e dirigi-la, escritas que tiveram origem em tempos
quase imemoriais.
legando os conceitos referentes à política. No
Regime Totalitário deixou de ocorrer à livre
iniciativa dos indivíduos, pois passou a existir Segundo a Constituição Federal Brasileira
a vigilância sobre a vida dos cidadãos, eles (1988), a República se inspira em dois valores:
perderam a autonomia que tinham nas esferas a igualdade e a liberdade, em relação à
pública71 e privada, eles foram considerados concepção de igualdade, esta interessa quando
supérfluos, pois, passaram a ser discriminados tratar de igualdade jurídica, perante a lei e
e exterminados, fatos que não ocorrem em uma política.
República. Ainda, de acordo com Arendt na
obra Origens do Totalitarismo (1951), os É necessário que a liberdade, a qual se
indivíduos perderam a igualdade em direitos e presume na democracia, seja pública, a qual é
em dignidade relativa ao simples fato de serem condição necessária para o bem comum de
humanos. Para Lafer (1998, p. 256): uma nação por isso a necessidade de regras, de
um ordenamento jurídico e este apenas pode
ser eficaz quando elaborado e cumprido com a
O ser humano, privado de seu estatuto participação dos cidadãos, mas isso somente é
político, na medida em que é apenas um possível com a utilização da liberdade política.
ser humano, perde suas qualidades Em outros termos, sendo o ordenamento
substanciais, ou seja, a possibilidade de considerado legítimo e legalmente
ser tratado pelos outros como um reconhecido, levando, além da participação, à
semelhante, num mundo compartilhado.
responsabilização de seus agentes, os
cidadãos, para tanto é preciso compreender a
Dessa forma, segundo Lafer, a ruptura acepção de Arendt sobre a liberdade.
totalitária, por meio do isolamento, obteve
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
Na obra A vida do Espírito (1975), a autora aparecem quando existe um espaço público que
trata da questão do pensar73, do querer e do enseja, pela liberdade da participação na coisa
pública, o diálogo no plural, que permite a
julgar, a obra restou inacabada devido ao fato palavra viva e a ação vivida, numa unidade
da autora ter falecido poucos dias após criativa e criadora.
terminar o segundo volume, o qual trata do
querer. A vontade, para Arendt, é considerada
uma faculdade autônoma do espírito humano, Existem concepções diferentes e divergentes
pois, ela torna o mundo interno, público. Isto em relação à liberdade de acordo com o
é, ela está relacionada à liberdade e à política, pensamento de Arendt. No sentido de
assim, é por meio dela que surge o impulso liberdade relacionada à política, ela não está
(provocando o movimento, o querer e o poder ligada à vontade, mas à vida em comunidade
unidos) de gerar algo ao mundo exterior, por (é uma liberdade positiva, e não negativa como
meio da ação. O querer tem como objeto a dos liberais, que é a da não interferência
projetos, pois a vontade transforma o desejo externa, por exemplo, do Estado, do
em uma intenção, que decide o que será feito. empregado), aos interesses comuns desta, com
a possibilidade de agir, discordar, falar, ouvir.
Nesse contexto, o julgar é a faculdade pela De acordo com Adeodato (1989, p. 168):
qual se juntam o geral e o particular, por
tratarem com particulares: a questão a ser
Muito embora Arendt não tenha podido
resolvida, a ação a ser feita. Assim sendo, à desenvolver seu pensamento e resolver o
vontade e o juízo estão mais próximos do impasse, ou abismo, da liberdade, podemos ter
mundo das aparências do que o pensar. presente que nem o princípio da causalidade,
Segundo Lafer (2003, p. 86): nem os objetivos e intenções da ação ou
tampouco a liberdade filosófica – a liberdade da
vontade – podem explicar a existência do ato
Existe segundo Arendt, um conflito importante livre.
entre as experiências do eu pensante e do eu
volitivo. O eu pensante, não tem como escapar do
princípio da não contradição. Por isso choca-se Conforme Arendt, a verdade não persuade,
com a maior liberdade que o eu volitivo mas compele a opinião contrária por meio da
experimenta. evidência. Ainda na obra A vida do espírito, a
autora classifica a liberdade em interna e
A liberdade política, por seu turno, é externa, devido ao fato dela apresentar
necessária para fins de que seja mantida a questões divergentes entre o pensamento e a
harmonia em uma comunidade, ela permite a ação, bem como, entre a política e a filosofia.
participação do cidadão, juntamente com seus
semelhantes em um espaço público. A
O método dialético e a concepção de
liberdade, nesse caso, está ligada às ações
república
humanas, ou seja, após o surgimento da
vontade ocorre a sua manifestação em forma O método, em uma pesquisa, é um dos
de agir, segundo Lafer (2003, p. 97): componentes básicos para a obtenção do
conhecimento. Faz-se necessária a utilização
dele para expor e delimitar as etapas que a
A liberdade política, que é a do cidadão e não a investigação utilizará em a sua execução. O
do homem enquanto tal, é uma quantidade do “eu
método, então, é um instrumento básico, é o
posso” da ação. Ela só se manifesta em
comunidades que regularam, através das leis, a fator de segurança e de economia de tempo e
interação da pluralidade. Através da distinção recursos para a pesquisa, facilitando a
Hannah Arendt reafirma a sua posição sobre a
relação entre a política e liberdade. Ambas só
73 “O pensar é uma atividade solitária, mas o seu situação em que eu me faço companhia”. (LAFER,
estado não é o da solidão, pois trata-se de uma 2003, p. 83).
790
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
localização de possíveis erros. Neste sentido o Assy, entre outros, posto que são pensadores
método é: brasileiros, os quais reúnem questões jurídicas
e filosóficas em suas obras, tendo como base,
em muitas delas, as obras de Arendt. Além
o conjunto das atividades sistemáticas e racionais desses, serão utilizados comentadores
que, com maior segurança e economia, permite
alcançar o objetivo - conhecimentos válidos e
estrangeiros como: Richard Bernstain, Birulés,
[pretensamente] verdadeiros, traçando o obras de outros filósofos, que tratem de
caminho a ser seguido, detectando erros e temáticas que complementem e suplementem
auxiliando as decisões do cientista.” as questões investigadas. Os pensadores
(LAKATOS, 2003, p. 83) clássicos também são contemplados na
pesquisa, A República (Politeia), de Platão; A
Política, de Aristóteles; A República e Os
O método utilizado para a realização deste deveres, de Cícero, Kant em suas obras a
trabalho é o dialético. Este método foi usado Crítica do Juízo (1790), À Paz Perpétua
pela primeira vez por Platão, também (1795), a Metafísica dos Costumes (1798),
conhecido por um método conceitual. O entre outros.
conceito de dialética varia de acordo com a Origens do totalitarismo, Sobre a Revolução
corrente filosófica, possuindo varias e A Condição humana, como obras base para a
definições dentre elas, a platônica, a hegeliana, elaboração da presente investigação decorre da
a marxista, entre outras. Para Platão, a dialética proposta de organização da sociedade que
é um método de aproximação entre as ideias teme a dominação total dos indivíduos em
particulares e as universais, é a técnica de oposição a uma vida autenticamente política,
perguntar, pensar e responder, onde a definição como ocorrera em momentos históricos, tais
de um conceito utilizado possa dar origem a como: as ditaduras e os totalitarismos. O
outro conceito e assim sucessivamente. De isolamento, destrutivo da possibilidade de uma
acordo com Lakatos: vida pública, requer a ação conjunta com
outros seres humanos, visando à utilização do
espaço público para o encontro, a conversa, a
Para a dialética, as coisas não são analisadas na
qualidade dos objetos fixos, mas em movimento:
discussão e a decisão sobre os temas de
nenhuma coisa está “acabada” , encontrando-se interesse da sociedade da massa, o que ocorre
sempre em vias de se transformar , desenvolver, por meio de uma comunidade política.
o fim de um processo é sempre um começo de
outro. (Lakatos, 2003, p.101).
Conclusão
A partir da presente pesquisa, a forma de É necessário que a liberdade apregoada pela
atribuir o método dialético, está em analisar autora, que se encontra em uma democracia,
conceitos, descrever e relacionar a concepção seja pública, a qual é condição necessária para
da autora de República, dentre outros autores, o bem comum de uma nação, por isso a
com o intuito de descrever e demonstrar a necessidade de regras, leis, que sejam eficazes
possibilidade da existência de um espaço quando elaboradas e cumpridas com a
público, tendo como base a concepção de participação dos cidadãos,levando, além da
República da autora. participação, à responsabilização de seus
agentes, para tanto é preciso compreender a
A metodologia vem a complementar os
acepção de Arendt sobre a República , a partir
métodos acima mencionados indicando regras,
do método dialético, sendo aquela a base para
técnicas e procedimentos para a pesquisa. Ela
a existência de uma esfera pública, a qual possa
esclarece quais são as formas de estudo que
cada indivíduo exercer o que Arendt descreve
serão utilizadas na pesquisa.
como ação política.
Serão utilizados comentários de obras
escritas por João Mauricio Leitão Adeodato,
Celso Lafer, Adriano Correia, André Duarte,
Rodrigo Ribeiro, Sônia Maria Schio, Betânia
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
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b
Aluno de mestrtado do Programa de Pós-graduação em Históriacda Universidade Federal de Santa Maria, e-mail de
contato brunosmcacequi@gmail.com.
RESUMO
As primeiras mudanças modernizadoras e disciplinadoras em Santa Maria deram-se na segunda metade
do século XIX, quando ocorreu em todo o país um conjunto de transformações econômico-sociais que
acabaram por modificar as relações de produção, as estruturas sócio-político-administrativas que
inseriram concepções ideológicas adequadas a instalação de uma ordem burguesa no Brasil. Em 1960 a
cidade teve um grande crescimento populacional, vinculados principalmente ao êxodo rural, a fundação
da UFSM. Este aumento demográfico trouxe consigo uma expansão desordenada e os problemas sociais
passaram a se avolumar. O avanço da urbanização, aumentou os conflitos pela posse da terra urbana,
complexificando as relações estabelecidas entre os agentes sociais envolvidos nesses conflitos. Entre 1950
e 1990, a população urbana de Santa Maria cresceu impressionantes 410% modificando sua estrutura. Dos
quase 250 mil habitantes da cidade, mais de setenta mil viviam em áreas de invasão ou loteamentos
irregulares. Além dessas ocupações, espontâneas ou organizadas, outras áreas foram formadas a partir do
desalojamento de famílias, pela Prefeitura Municipal, para outras mais periféricas em função de uma
política de embelezamento da cidade. Neste artigo procuramos resgatar esse processo através das pessoas
que vivenciaram este processo, dando visibilidade a memórias silenciadas por um discurso com base em
diferentes saberes (Medicina, Direito, Engenharia, etc.), que legitimaram essa política.
Palavras-chave: Política pública, Reordenação urbana, Relatos orais.
RESUMEN
Los primeros cambios modernizadores y disciplinadores en Santa Maria se dieron en la segunda mitad
del siglo XIX, cuando ocurrió en todo el país un conjunto de transformaciones económico-sociales que
acabaron por modificar las relaciones de producción, las estructuras socio-político-administrativas que
inserta concepciones ideológicas adecuadas a la instalación de un orden burgués en Brasil. En 1960 la
ciudad tuvo un gran crecimiento poblacional, vinculados principalmente al éxodo rural, la fundación de
la UFSM. Este aumento demográfico trajo consigo una expansión desordenada y los problemas sociales
pasaron a volverse. El avance de la urbanización, aumentó los conflictos por la posesión de la tierra
urbana, complejizando las relaciones establecidas entre los agentes sociales involucrados en esos
conflictos. Entre 1950 y 1990, la población urbana de Santa Maria creció impresionantes 410%
modificando su estructura. De los casi 250 mil habitantes de la ciudad, más de setenta mil vivían en áreas
de invasión o loteamientos irregulares. Además de esas ocupaciones, espontáneas u organizadas, otras
áreas fueron formadas a partir del desalojo de familias, por el Ayuntamiento Municipal, para otras más
periféricas en función de una política de embellecimiento de la ciudad. En este artículo tratamos de
rescatar ese proceso a través de las personas que vivenció este proceso, dando visibilidad a memorias
silenciadas por un discurso basado en diferentes saberes (Medicina, Derecho, Ingeniería, etc.), que
legitimaron esa política.
Palabras-clave: Política pública, Reordenación urbana, Relatos orales.
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Nasceu em Santa Maria em 13 de março de 1942, é vice-prefeito no governo do prefeito Cezar Schirmer,
médico formado pela UFSM, sendo até 1998 professor voltando a ser prefeito no final do ano de 2016 quando
desta instituição federal. Em 1968 foi eleito vereador Schirmer renunciou para assumir a Secretaria Estadual de
ficando no cargo até 1972. Foi vice-prefeito de 1973 a Segurança.
1976, prefeito por dois mandatos, de 1983 a 1988 e de 1992
a 1996. Atuou como deputado estadual, ocupando o cargo
de 1999 a 2002 e de 2003 a 2006. No ano de 2008 se tornou
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recomeço para os moradores, sendo assim dessas casas já não existem mais.
passou-se a nominar: Renascença.
Considerações finais:
Foi feito o reassentamento, mas para isso
acontecer houve um trabalho muito grande da Santa Maria ao longo de sua história cresceu
comunidade, a comunidade se organizou para horizontalmente e verticalmente, buscando
conseguir esse espaço. Uma mobilização através novos espaços para comportar a sua crescente
da associação comunitário, naquele tempo o
população. Há nela, muitas desigualdades
movimento comunitário era forte. Através desse
trabalho social de mobilização das pessoas, que a espaciais e socioeconômicas dentro do seu
gente conseguiu tirar as pessoas da via pública e espaço urbano, resultado do desenvolvimento
trazer para o loteamento, que hoje tem tudo, não capitalista. A valorização dos espaços
falta nada: temos água, temos luz, temos ônibus, urbanos, principalmente da área central,
telefone (SOUZA, 2018).
ocasionou o afastamento da população de
baixa renda para zona periféricas e ociosas.
Através de reuniões organizadas pela Aqui buscamos destacar dois processos de
prefeitura e pela associação comunitária, modernização na cidade, o primeiro do final do
ocorridas na escola São Luís, davam-se as século XIX, progresso advindo através da
informações de como seriam os tramites para o ferrovia e o outro da segunda metade do século
processo de realocação. Os terrenos que a XX, principal objeto de estudo para esta
prefeitura loteou, eram vendidos por um preço pesquisa.
acessível para aquelas famílias, podendo serem
pagos em várias prestações. Esses terrenos As Vilas Lídia, Arco-íris e Renascença,
ficariam inicialmente apenas no nome da tiveram sua origem na década de 1980, no
mulheres. governo Farret. A partir da realocação de
famílias, receberam famílias realocadas de
zonas que deram espaços a uma reforma
Aqui era no nome das mulheres não era no nome urbanística, como a construção de avenidas
dos homens, por causa dos filhos. Não era pra (Lídia e Arco-íris) e a reorganização da
vender nem pra trocar, era um terreno pra gente rodovia 287(Renascença). Para empreender
viver ali. Aqui era um campo tinha barreira, eles
aterraram. A prefeitura comprou dos Carnelosso esse projeto foi necessário fazer a realocação
pra poder lotear pra nós. Era vendido, mas não de famílias de baixa renda que viviam nessas
muito caro (MARINHO, 2018). áreas modernizadas e embelezadas. Apesar de
parecer perverso a ideia de realocação, as
pessoas viram nesse processo uma
Diferentemente do que ocorreu nas Vilas oportunidade de vida mais digna, diante da
Lídia e Arco-íris, na Vila Renascença os situação na qual se encontravam
moradores não receberam uma casa, eles por anteriormente.
conta própria construíram suas residências,
que com muitas dificuldade foram O protagonismo da populaçãopela busca de
melhorando-a ao longo do tempo. melhorias dos novos locias de moradia, fica
evidente nos depoimentos aqui apresentados.
Ainda em seu processo inicial, a comunidade Foi através da mobilização das lideranças,
recebeu muitas famílias provenientes de outras diante de muita luta que conseguiram construir
áreas, inclusive cidades próximas como é o melhorar as condições de infraestrutura nessas
caso do senhor Emar Rosa oriundo de São essas localidades. Nem todos os processos de
Sepé-RS e o senhor Amadeu Proença de São realocação que se deram durante o governo
Gabriel-RS. Em sua maioria os moradores Farret se deram da mesma forma e pelos
eram fruto das áreas irregulares. Apesar de mesmos motivos.
existem os lotes, muitas casas foram
construídas ao longo das margens do Arroio Cabe diferenciar que na Vila Lídia e Arco-íris
Cadena, que banha a Vila, estas alicerceadas a realocação foi por inciativa da prefeitura, que
em áreas de risco, desmoronaram ao longo dos tinha o escopo de realocar as famílias que
anos devido ao processo de erosão. Muitas viviam no entorno do Cemitério Municipal,
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RESUMO
Nos últimos anos tem-se notado o surgimento de um fenômeno de tendências globais associado à
ascensão de discursos populistas xenofóbicos, particularmente ligados à partidos e movimentos de
direita, que tem assumido um protagonismo crescente em diversos países, como Estados Unidos,
Reino Unido, França e Brasil. Esse fenômeno aparece como crescente na medida em que encontra
amparo em uma parcela considerável do eleitorado, em um momento em que o declínio econômico é
sentido até mesmo em países altamente industrializados. Essa narrativa leva muitos autores, ainda
que sob perspectivas distintas, a associarem esse contexto a um processo de colapso da democracia
liberal no mundo. Na contramão dessa interpretação, no entanto, Ronald Inglehart (2018), não vê
indícios de colapso democrático. Nesse sentido, o objetivo deste paper é, com base no último livro
publicado por Ronald Inglehart (2018), Cultural Evolution, analisar criticamente a perspectiva teórica
do autor no que se refere ao papel da ascensão de movimentos e partidos xenofóbicos populistas nas
democracias liberais. Para tanto, o trabalho foi desenvolvido em 3 (três) momentos: primeiro,
apresentam-se linhas gerais da discussão contemporânea sobre a ascensão do discurso populista
xenofóbico; após, delineia-se o conceito de “Reflexo Autoritário”, desenvolvido por Inglehart (2018)
para explicar a onda autoritária nas democracias ocidentais; e, por fim, argumenta-se que a explicação
do autor tem como propósito corroborar a teoria que desenvolve desde a década 1970, cujo
pressuposto central foi confrontado pela realidade dos últimos anos.
Palavras chave: democracia, Reflexo Autoritário, teoria do desenvolvimento humano.
ABSTRACT
The last years were seen as having a growth movement, with emphasis on the rise of xenophobic
populist discourses, especially subordinated to the movement of parties, having assumed a leading
role at the national level, such as the United States, United Kingdom, France and Brazil. higher than
the level that is found in a considerable portion of the electoral element, at a time when the economic
decline is made for the same in highly industrialized countries. This narrative led many authors, albeit
from the perspective of distinct ones, to associate with the context of a process of collapse of liberal
democracy in the world. Contrary to this interpretation, however, Ronald Inglehart (2018), are not
signs of democratic collapse. This book, based on the last book published by Ronald Inglehart (2018),
Cultural Evolution, and the critically a perspective of author in the Democratic airways. For that, the
work was developed in 3 (three) moments: first, presenting the general lines of the discussion on the
rise of populist xenophobic discourse; afterwards, the concept of "Authoritarian Reflection",
developed by Inglehart (2018) for the edition of an authoritarian possibility in the western
democracies, is delineated; and, finally, to argue that the author's edition is intended to corroborate
the theory of the 1970s, whose central objective is confronted with the reality of the last year.
Keywords: democracy, Authoritarian Reflex, human development theory
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Neste ano, Ronald Inglehart (2018) publicou igualdade de gênero, da tolerância a outros
um novo livro: “Cultural Evolution: people’s grupos, da autonomia individual e da proteção
motivations are changing, and reshaping the do meio ambiente, por exemplo. No entanto, o
world”. Logo na introdução é possível crescimento econômico, antes contínuo,
perceber que a linha teórica seguida por alcançou seu ponto máximo e estabilizou nos
Inglehart não se distancia muito daquela últimos anos nas sociedades de alta renda. A
presente em textos anteriores seus. O autor maioria da população, principalmente os
narra como a sobrevivência foi precária por menos educados, sentiram esse processo como
muitos séculos para a humanidade – a maioria declínio da segurança existencial e passaram a
das pessoas viviam abaixo da linha da fome – dar suporte a movimentos xenofóbicos
o que definia a estratégia de vida dos seres autoritários, tais como o Brexit, no Reino
humanos. No entanto, após a Segunda Guerra Unido, a Frente Nacional Francesa, na França,
Mundial, a maioria das pessoas teria visto e a vitória de Donald Trump, nos Estados
crescer o acesso à sobrevivência devido ao Unidos. A estabilização da economia agregada
crescimento econômico de países da Europa à imigração em massa teria dado força a
Ocidental e dos Estados Unidos e à emergência movimentos xenofóbicos autoritários
das políticas de bem-estar social. Esse (INGLEHART, 2018).
processo de crescimento econômico aliado à Nesse sentido, de acordo com Inglehart
segurança física teria levado a uma mudança (2018) o que chama de “Reflexo Autoritário”
cultural intergeracional, que remodelara é uma reação do materialismo – ou dos
valores e visões de mundo, conduzindo a uma materialistas, em geral, setores mais idosos e
mudança de valores materialistas para pós- menos seguros da sociedade – às mudanças
materialistas (INGLEHART, 2018). culturais que trouxeram abertura à diversidade
Como o autor sempre defendeu o papel e valorizaram a autonomia individual. Assim,
positivo do desenvolvimento econômico para o próprio pós-materialismo teria causado algo
o florescimento e o progresso da democracia, como uma reação adversa. A atenção às
o avanço de movimentos e partidos autoritários questões culturais ligadas à livre expressão
nos últimos anos justamente em países de alta teria feito declinar o voto de classe, minando
renda precisou ser explicado. Segundo partidos de esquerda orientados para a classe
Inglehart (2018, p. 173, tradução nossa) duas trabalhadora, que implementavam políticas de
são as questões preementes: redistribuição. Além disso, as novas questões
não-econômicas teriam sobreposto a clássica
discussão direita-esquerda, o que teria aberto o
1)) O que motiva as pessoas a apoiarem caminho para o crescimento da desigualdade
movimentos xenofóbicos autoritários em países
de alta renda? 2) Por que o voto xenofóbico
(INGLEHART, 2018).
nesses países é muito mais alto agora do que há Segundo a teoria, os pós-materialistas estão
décadas atrás?
concentrados entre aqueles estratos mais
seguros e educados da sociedade e são
Inglehart (2018) afirma que a segurança favoráveis a mudança social. Por isso,
existencial faz as pessoas mais tolerantes, Inglehart (2018) argumenta que, muito
enquanto a insegurança conduz ao oposto. embora, tradicionalmente, os estratos mais
Assim, pessoas que não enfatizam mais a seguros e melhor educados apoiem partidos
segurança física e econômica tendem a ser conservadores, com a mudança cultural eles
menos conformistas, mais abertos a novas acabaram migrando para partidos mais
ideias, menos autoritários e mais tolerantes conectados com temas culturais e políticos. Ao
com outros grupos sociais e culturais. Segundo mesmo tempo, os pós-materialistas de
o seu argumento, as três décadas de segurança esquerda, ainda que tenham se mantido
existencial e econômica que seguiram a II comprometidos com a constituição de uma
Guerra Mundial teriam fomentado a mudança classe média, passaram também a
cultural e a difusão da democracia pelo mundo, interessarem-se por mudança cultural e, por
proporcionando a ascensão do apoio à isso, acabaram, frequentemente, distanciando-
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Inglehart (2018), nesse sentido, reconhece a neoliberal está nos fazendo entrar na era pós-
existência de desigualdade social intensa nos democrática” (BROWN, 2015; DARDOT;
países de alta renda. de acordo com o autor, LAVAL, 2016).
apesar do crescimento do ramo tecnológico, os De acordo com essa literatura, esse processo
empregos nessa área não estão crescendo, pois leva ao esvaziamento da democracia de sua
as companhias que trabalham com inteligência substância sem a extinguir formalmente. Para
artificial conseguem obter lucros altos com além da questão cultural, Dardot e Laval
poucos funcionários. Ao mesmo tempo, (2016) afirmam que o neoliberalismo, antes de
pondera, tem-se a impressão de que a ser uma ideologia ou uma política econômica,
inteligência artificial não produz desemprego, é uma racionalidade, que estrutura e organiza a
mas isso é porque muitas pessoas, ação dos governantes e a conduta dos
desanimadas, acabam desistindo do trabalho governados, tornando-se a razão do
formal. A estratégia dos CEOs de substituir a capitalismo contemporâneo (DARDOT;
sua força de trabalho por trabalhadores
LAVAL, 2016).
eventuais ou até mesmo por robôs maximiza os
lucros das corporações contra competidores. Sob outra perspectiva, Castells (2018, p. 8)
Assim, a fase da inteligência artificial implica vê a crise da democracia liberal em termos de
uma economia de ‘o ganhador leva tudo’, que ruptura da relação entre governantes e
faz aumentar a desigualdade (INGLEHART, governados:
2018).
No entanto, para o autor, esse problema tem Trata-se do colapso gradual de um modelo
solução: a intervenção governamental imediata político de representação e governança: a
contra a concentração de renda, afirma democracia liberal que se havia consolidado nos
Inglehart (2018), para quem os governos dois últimos séculos, à custa de lágrimas, suor e
sangue, contra os Estados autoritários e o arbítrio
precisam criar empregos que fomentem a institucional.
qualidade de vida das pessoas e as faça sentir-
se com autoestima. Ou seja, para o autor, a
ênfase na redistribuição de renda precisa ser Uma vez crescente a rejeição às formas
retomada, por exemplo, por meio da institucionais de representação, surgem
implantação da progressão de impostos para lideranças políticas que negam esses
grandes fortunas. Se isso não ocorrer, a elementos e encontram, assim, apoio em
abertura cultural advinda do pós-guerra pode parcela da população, interpreta Castells
ser degradada (INGLEHART, 2018). (2018). Nesse sentido, o autor (2018, p. 8)
assevera que “Trump, Brexit, Le pen, Macron
(coveiro dos partidos) são expressões
Resultados e discussão significativas de uma ordem (ou de um caos)
Ao mesmo tempo em que considera pós-liberal” (CASTELLS, 2018).
equivocada a previsão de muitos autores sobre Enquanto Inglehart (2018) interpreta o caso
o colapso da democracia ocidental, Inglehart da China como tendente à democratização, na
(2018) anuncia páginas depois a possibilidade medida em que o desenvolvimento econômico
de a democracia ocidental ser minada na fase por lá continua crescente, Castells (2018)
da inteligência artificial (o faz nos capítulos 9 enxerga na China a consolidação de um
e 10). Ocorre que um número importante de governo autoritário, assim como na Rússia. O
autores de Teoria e Ciência Política tem caso da Rússia, aliás, é um bom exemplo do
analisado o período atual como de estagnação que Miguel (2014) chamou de “democracia
e consequente queda da democracia em adjetiva”, isto é, um governo autoritário que se
diversos países. Brown (2015) trata a questão consolida ao travestir-se de democrático. No
em termos de “desdemocratização”, um mesmo sentido, enquanto em Inglehart (1971,
processo por meio do qual a democracia é 1977, 1988, 2018) e Inglehart e Welzel (2009,
esvaziada de “demos” em prol de uma agenda 2012) vemos todos os casos que não
neoliberal, e é acompanhada por Dardot e comprovam a teoria do desenvolvimento
Laval (2016, p 8), que afirmam que “O sistema
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RESUMO
Esta pesquisa analisa o contexto político-histórico da Inglaterra e da legitimação da dinastia Tudor, e
o retrato feito por Shakespeare de Ricardo III. Ricardo III é uma das peças que marcaram o arquétipo
de um rei vilão em sua essência: não apenas comete crimes por um propósito desvirtuado, mas um
ser que é de modo imanente malevolente e insidioso. Essa é uma peça cujo foco se dá em uma
personagem histórica real: o rei Ricardo III da Inglaterra, que reinou de 1483 a 1485, sendo o último
rei inglês a morrer em batalha. A usurpação de seu trono por Henrique Tudor (Henrique VII),
acarretou em uma verdadeira campanha de reescrita histórica, retratando Ricardo como uma criatura
que precisava ser destronada pelo bem da Inglaterra. Os cronistas, em especial Thomas More, foram
responsáveis por retratar Ricardo III como uma figura monstruosa e maléfica, onde o próprio corpo
do rei, a “personificação do Estado”, materializa-se em algo corrupto física e mentalmente.
Shakespeare usou esta figura “histórica” como base para a caracterização de Ricardo III, perpetuando
e petrificando a vilania de Ricardo III como uma criatura tão maligna que nem crianças ou sua própria
família são imunes à sua malevolência. Ele figura, então, como uma figura maquiavélica, tanto na
ficção histórica de Shakespeare, quanto na “não-ficção” dos cronistas históricos; uma verdadeira
distorção da imagem de um monarca no final do período medieval, para a legitimação política da
dinastia que tomou seu poder.
Palavras chave: William Shakespeare, Ricardo III, History Plays, Legitimação.
ABSTRACT
This research analyses the English historical-political context of Renaissance Britain, the legitimation
of the Tudor dynasty and the portrait of Richard III depicted by Shakespeare. Richard III is one the
plays which set the villain king archetype in its essence: not only does he commit heinous crimes, his
very being is immanently malignant and insidious. The focus of the play on a historical figure: king
Richard III, who reigned from 1483 through 1485, being the last English king to die in battle. The
usurpation of his throne by Henry Tudor (Henry VII) led to a true historical rewriting campaign,
depicting Richard as a creature who needed to be dethroned for the good of England. The historical
chroniclers, especially Thomas More, were responsible for picturing Richard III as a monstrous and
evil figure, in which the very body of the king, the “embodiment of the State”, materialized itself in
something physically and mentally corrupt. Shakespeare used such “historical figure” as a basis for
the character of Richard III, perpetuating and solidifying Richard’s villainy as something so
malevolent that neither children, nor his own family are immune from. He is characterized as a
Machiavellian figure, both in Shakespeare’s fiction, and historical “non-fiction” from the chroniclers;
a true distortion of the image of a late medieval monarch, for the political legitimation of the dynasty
that took his power.
Keywords: William Shakespeare, Richard III, History Plays, Legitimation.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
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Heminges e Condell foram atores na companhia de
teatro The King’s Men, na qual Shakespeare escreveu a
maior parte de suas peças.
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histórico não era exclusivo de Shakespeare, sinete da casa era uma rosa branca, e de
outros dramaturgos de sua época também Lancaster, cujo sinete era uma rosa vermelha.
escreviam, como Christopher Marlowe, que Os cronistas eram entendidos, em sua época,
junto com Shakespeare, escreveram Edward como hoje consideramos historiadores. Eram
II. “Ricardo III” também não era um tema eles que faziam a pesquisa de campo e
exclusivo seu, pois na década anterior (c.1584) documental para escrever sobre os eventos
havia uma peça acadêmica em latim intitulada correntes, e eventos do passado. Eles iam até
Ricardus Tertius, de Thomas Legge, que os locais, entrevistavam testemunhas, anciãos
também retratava Ricardo como um vilão e figuras que possam saber algo sobre o objeto
tirânico. Apesar disso, discutivelmente, de pesquisa, inclusive descendentes de
Shakespeare foi o maior contribuinte para o testemunhas, ou até descendentes de pessoas
gênero, sendo um dos autores que mais que conheceram testemunhas. Seu objetivo era
escreveu peças históricas (HOENSELAARS catalogar as narrativas sobre os fatos—
in: HATTAWAY, 2001).
narrativas pessoais, lendas e até folclore—para
Em 1597 foi publicada a primeira edição então juntar essas narrativas em uma história
Quarto76 da Tragédia de Ricardo III, de coesa sobre o evento. É importante ressaltar
William Shakespeare. Ela foi, muito que, diferentemente de historiadores atuais, os
provavelmente, escrita e representada entre cronistas não possuiam uma “metodologia”
1593 e 1594, durante o reino de Elizabeth I, a específica, não tinham “código de ética” e
última rainha Tudor. Essa peça mostra a também não se negavam a misturar lenda e
acessão e morte de Ricardo de Gloucester ao história como fatos. Segundo Hattaway (2001,
trono da Inglaterra, que assassinando irmão, p. 11), os cronistas não faziam distinção entre
sobrinhos, e através de esquemas e complôs, personagens históricos e fictícios, enquanto
sendo o último na linha de sucessão direta, para um público moderno, é esperado que a
torna-se rei. A peça retrata uma ficção onde “verdade histórica” seja derivada de
vilania e sobrenatural se aliam para dar um fim documentos escritos, testemunhos e análise
“justo” a um rei maligno, que seria o último de estatística, qualquer coisa diversa disso seria
uma linhagem ilegítima da família real inglesa inaceitável. Mas para eles, criar uma narrativa
do séc XIV. fictícia era tão normal na sua produção, que os
próprios cronistas acrescentavam discursos
Essas peças eram construídas baseando-se
que as figuras históricas em certas ocasiões
em eventos históricos e personagens reais, para
poderiam, ou deveriam ter feito, discursos
fazer isso, o dramaturgo precisava de pesquisa
poéticos ou não, de acordo com o tipo ou
histórica. “Shakespeare não podia criar ex
“personalidade” da figura histórica, dentro de
nihilo” (HUNTER, G. K. in: HATTAWAY,
certas ocasiões. Outra nota de extrema
2001, p. 25), do nada, então suas peças
relevância se deve fazer sobre o financiamento
históricas não são invenções puramente
deles: cronistas não faziam seu trabalho
ficcionais. Elas foram inspiradas e
gratuitamente; geralmente eram financiados ou
influenciadas pelos escritos e crônicas
patrocinados por aristocratas, para que a
históricas. O verdadeiro rei Ricardo III foi o
narrativa histórica incluísse feitos seus, ou de
último rei da casa de York, sendo a batalha
seus antepassados, para assim elevar ou
final entre Ricardo III e Henrique de
legitimar o status da família, e do patrono, até
Richmond (Henrique VII) em Bosworth
mesmo alterando fatos para apoiar
considerada, tipicamente, como o marco do
perspectivas “partidárias” (GOY-
final da “Guerra das Rosas”, uma série de
BLANQUET, in: HATTAWAY, 2001, p. 61).
conflitos bélicos entre as casas de York, cujo
Aquilo que é escrito como “história”, as
76
Quarto é uma versão impressa da peça, de baixo não é mais encenada, assim, era costumeiro editarem
custo, vendida após o término das encenações no teatro. uma versão impressa para venda comercial. Ricardo III
O processo de escrita até a última encenação de uma teve oito publicações diferentes em versão Quarto, entre
peça levava cerca de dois meses, após esse período, a 1597 e 1622.
companhia não poderia lucrar com uma peça antiga que
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
crônicas históricas, é influenciado pela política feudais”, onde todo o caos da política medieval
daqueles que a escrevem (HATTAWAY, está materializado em um conflito nacional
2001, p. 4). Em Ricardo III há um exemplo causado por famílias rivais.
desse tipo de alteração histórica, não para O principal arquétipo de Ricardo III (tanto da
encaixar poeticamente ou artisticamente na peça quanto das crônicas históricas) é que o
trama da peça, mas para agradar ou influenciar homem Ricardo era uma criatura fisicamente e
o patrono. Stanley, personagem da peça, se mentalmente monstruosa. A maior e principal
mostra um servidor leal, entretanto, ele se fonte histórica a respeito de Ricardo III até
mostra em conflito: sua lealdade ao rei, e a então é a crônica de Thomas More, The History
tirania vilânica (e injusta) de Ricardo III, então of King Richard III, escrita entre 1513 e 1519,
ele apoia Henrique a derrubar o rei. O da qual Edward Hall usou como fonte principal
verdadeiro Thomas Stanley foi uma para desenhar Ricardo III como não apenas um
personagem de “pouca relevância” nos eventos vilão tirânico, mas um monstro, defeituoso,
históricos entre 1483–1485, entretanto, na
uma aberração da natureza, cuja própria
peça, sua atuação é pivotal na derrocada de essência é maligna.
Ricardo III e ascensão de Henrique VII. Como
a peça provavelmente foi escrita entre 1593–
1594, acredita-se que Shakespeare já fosse little of stature, ill-featured of limbs, crook-
membro da companhia de teatro Lord backed, his left shoulder much higher than his
Strange’s Men, Lord Strange era Ferdinado right, hard-favored of visage, and such as is in
Stanley, descendente de Thomas Stanley. A states called warly,70 in other men otherwise. He
was malicious, wrathful, envious, and, from
maior probabilidade é que Shakespeare tenha afore his birth, ever froward. It is for truth
aumentado a importância de Stanley na peça reported that the duchess his mother had so much
como uma homenagem ao seu patrono, Lord ado in her travail that she could not be delivered
Strange. Nem mesmo as peças eram imunes às of him uncut, and that he came into the world
políticas do contexto na qual foram with the feet forward (as men be borne outward)
and, as the fame runneth, also not untoothed—
produzidas. whether men, of hatred, report above the truth, or
Os cronistas e historiadores Tudor colocaram else that nature changed her course in his
beginning which in the course of his life many
Ricardo II e Ricardo III nas duas extremidades things unnaturally committed. […] He was close
da Guerra das Rosas: no início e fim, and secret, a deep dissimuler: lowly of
respectivamente (SAUL, 2005, p. 10)[3], countenance, arrogant of heart; outwardly
iniciando este período em 1399, com a companable where he inwardly hated; (MORE,
deposição de Ricardo II, e encerrando-o em 2005, pp. 9–11)[5]
1485, com a morte de Ricardo III. A Guerra
das Rosas foi a maior guerra civil da Inglaterra,
e o período mais conflituoso é entre os anos de A descrição dada por More é de uma criatura
1455 e 148577. O conceito de “Guerra das que não nasceu naturalmente, que precisou ser
Rosas” foi formulado por Edward Hall em sua cortada do útero (parto Cesária), nasceu com
crônica The Union of the Two Noble and os pés primeiro, ao invés de sair com a cabeça,
Illustre Families of Lancastre and Yorke, e já nasceu com dentes. É uma pessoa de baixa
publicado em 1548. Nesta crônica, a Guerra estatura, ombros tortos, corcunda,
das Rosas é entendida como um período de naturalmente inclinado à dissimulação,
disputas e pecuinhas senhoriais, “brigas mentira, arrogância e manipulação.78 A própria
77 78
Para os propósitos deste estudo, o conflito principal é É importante ressaltar aqui que, de fato, Ricardo III
considerado neste período, por ser o utilizado pelos sofria de uma condição fisiológica aparente: ele tinha
Tudors para legitimar sua dinastia, entretanto, houveram escoliose grave, o que provavelmente lhe forçava a
conflitos subsequentes, por outros pretendentes à coroa manter a parte superior do torso inclinada, problemas
que ocorreram até 1525, mas a última disputa comprovados após análise do esqueleto de Ricardo III,
preocupante para Henry VII foi em 1497 (HICKS, descoberto em 2012 (APPLEBY, J.; BUCKLEY, R.;
2003)[4]. Assim, o conflito todo pode ser entendido FOXHALL, L. et al, 2012)[6].
como o período entre 1399–1525.
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
vinda ao mundo de Ricardo III teria sido algo nos escritos de Thomas More. Raphael
anormal, e essa pessoa teria uma índole tão Holinshed é considerado como a principal
malévola que todos os seus sentimentos eram fonte de Shakespeare para todas as suas
negativos, praticamente vícios da alma. E há histórias, e muitos elementos presentes em
uma relação muito forte entre os vícios: vícios Holinshed aparecem, de forma ou outra, em
eram personagens do teatro medieval, em Ricardo III. Entretanto, ele não usou
especial das moralidades79 (que ainda eram exatamente tudo que foi descrito por More,
populares no tempo de Shakespeare), e eles detalhes mais fantásticos ou incríveis dados
eram personificações dos vícios da alma, por Hall e More foram ignorados por
apresentados na arbor virtiorum—a árvore dos Holinshed, como por exemplo a gestação de
vícios, uma representação gráfica dos sete Ricardo III ter durado cerca de dois anos.
vícios capitais (genericamente compreendidos Mesmo assim, ele manteve a caricatura de
como os pecados capitais hoje), e os sete vícios alguém deformado fisicamente, com
menores de cada vício capital. Na malevolência, considerando-o a Lúcifer, por
representação religiosa, esses vícios eram ser cruel e cobiçoso (HOLINSHED, 2014, p.
comportamentos indesejados, que levariam à 408)[8].
perdição, e eram diretamente opostos pelas
virtudes apresentadas na arbor virtutum—a
árvore das virtudes, onde são representadas as Resultados e discussão
sete virtudes capitais, e suas virtudes menores, As crônicas históricas usadas por
comportamentos desejados e necessários para Shakespeare foram todas escritas durante o
uma vida de piedade religiosa (TUCKER, reinado Tudor: More e Hall durante o reinado
2015)[7]. Ricardo III, em Shakespeare, parece de Henrique VIII, Holinshed durante o reinado
inspirado nos vícios teatrais, tanto que a de Elizabeth I. Inegavelmente, são produtos de
propria personagem menciona "Thus, like the um período e um contexto no qual não poderia
formal Vice Iniquity, I moralize two meanings haver dissidência do discurso oficial do
in one word” (Richard III, III.i.82–83, in Estado. Os cronistas precisavam manter um
JOWETT, 2001, p. 236). Ricardo III se discurso que fosse legitimador para o domínio
compara a um vício do teatro, capaz de Tudor, e isso incluía as caracterizações
moralizar dois significados em uma palavra. horrendas de figuras rivais dos Tudor, ou
Entretanto, ele não é um vício, pois não é uma elevação de atos e pessoas da dinastia.
personagem estanque, reproduzível e
estereotípica. As personagens de Shakespeare,
mesmo que superficialmente, apresentam Holinshed’s chronicle offers stories, but also
profundidade, apresentam tipos de colors the narrative of events with set speeches
consciências diferentes entre si. Ainda assim, and reflections upon the course of action, judging
and reviewing the events. (HATTAWAY, 2001,
Ricardo III apresenta capacidades negativas, p. 14)
como vários vícios em uma única personagem.
Em 1577, foi publicada a crônica histórica de
Raphael Holinshed, Chronicles of England, Como Hattaway menciona, as crônicas
Scotland and Ireland, um trabalho históricas de Holinshed não apenas trazem os
colaborativo, em vários volumes, que fatos, as histórias, mas dão cores a elas.
apresenta uma história das ilhas da Bretanha, Holinshed floreia e até cria discursos,
do período pré-saxão até a era Tudor. Neste apresenta reflexões sobre as sucessões dos
trabalho, Holinshed usa muito de Hall na fatos, e julgamentos sobre os eventos e sobre
descrição de Ricardo III, assim como reflexões ações de figuras históricas. Quando esses
79
Moralidade é um gênero teatral alegórico, onde as geralmente é “Todomundo” (Everyman). Essas peças
personagens são representações dos vícios e virtudes, são uma alegoria da luta entre o bem e o mal pela alma
como Ira e Luxúria, Honra e Misericórdia. Esses da humanidade, uma disputa entre a salvação e a
personagens tentam convencer um humano, que é uma perdição.
alegoria para a humanidade como um todo, e cujo nome
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I that am rudely stamped, and want love’s Richmond. Henrique não só marcha contra
majesty Ricardo III, mas, na peça, luta fisicamente
To strut before a wanton-ambling nymph,
I that am curtailed of this fair proportion,
contra ele e o mata; o novo escolhido por Deus
Cheated of feature by dissembling nature, elimina o antigo, como se fosse uma provação,
Deformed, unfinished, sent before my time uma tribulação divina. E com essa vitória, o
Into this breathing world scarce half made up, reinado de Henrique VII é apresentado como
And that so lamely and unfashionable justo, piedoso, dentro de todos os conformes
That dogs bark at me as I halt by them:
Why, I in this weak-piping time of peace
divinos, legais e morais. Segundo a narrativa
Have no delight to pass away the time, apresentada por Edward Hall, Ricardo III teria
Unless to spy my shadow in the sun sido o último vilão do mundo pré-Tudor, e sua
And descant on mine own deformity. derrota trouxe o fim da era caótica da Guerra
(Richard III, I.i.14–27, in: JOWETT, 2001, pp. das Rosas, uma interpretação que justifica
148–149)
qualquer atitude dos Tudor antes e depois de
aceder ao trono. Toda a guerra seria uma
Ricardo se estende no solilóquio, provação que a Inglaterra precisara sofrer para
demonstrando sua própria percepção de si merecer a paz, para alcançar um governo justo.
como um ser deformado, que foi abortado, A monstruosidade física de Ricardo III é
mandado ao mundo antes de estar completo. apenas uma das dimensões da representação
Alguém que não foi feito para esses tempos de que trabalham a maldade da personagem, a
prazer e festança. Tão “torto” que cães latem mais visível, porém, existe uma dimensão
quando para perto deles. Então, nesses tempos ainda mais insidiosa, que se extende por todo
de paz, seu único deleite é ficar observando a o enredo da peça, e culmina em sua coroação:
própria sombra, e ficar falando (e sofrendo) ele é uma personagem maquiavélica. Ricardo
sobre sua deformidade. III, assim como as crônicas históricas, seguem
O inverno da nação cedeu ao Sol de York. E o modelo do arquétipo maquiavélico. Uma
assim que a guerra acaba, Ricardo, ainda distorção dos conceitos introduzidos na teoria
Duque de Gloucester, já põe em ação complôs, política por Nicollò Machiavelli. Maquiavel,
planejados antes do começo da própria peça. em O Príncipe, trabalha com uma noção não
Conforme os esquemas de Ricardo vão de “os fins justificam os meios”, mas sim como
ganhando forma e força, o rei(nado) começa a “os meios são necessários para alcançar os
adoecer. Após Ricardo assassinar o irmão, o fins”, semelhante à providência divina de
rei morre de doente, e Ricardo põe em prática sucessão de fatos, de provações
seus estratagemas para tornar-se regente, e, (MACHIAVELLI; CARUCCIO-
logo, o próprio rei. Quando Ricardo III é CAPORALE, 2013)[13]. Entretanto, esse
coroado, seu corpo é uma representação do conceito é distorcido em algo que significa “o
estado atual da própria Inglaterra: algo vil se resultado justifica qualquer ação”, onde
apoderou do Estado, maligno, ao mesmo qualquer atitude, qualquer ato é justificado, se
tempo que é algo deformado, corrupto. levar ao resultado almejado. Essa é a essência
Diferentemente de Iago, em Otelo, que é são da categoria “maquiavélica”, e é isso que é
de corpo, mas corrupto na mente, Ricardo III é implantado nas crônicas históricas sobre
totalmente corrompido—corpo e mente—de Ricardo III, e, principalmente, em
forma tão absoluta que muitas interpretações Shakespeare, onde o próprio personagem
do personagem mostram-no com desconforto, promete superá-lo:
uma dor física perceptível na atuação
(JOWETT, 2000; CARTELLI, 2009)[12], I'll drown more sailors than the mermaid shall;
mostrando a inadequação total dessa criatura, I'll slay more gazers than the basilisk;
desse corpo, com o próprio mundo; até mesmo I'll play the orator as well as Nestor,
viver é doloroso para ele. Nesse momento, a Deceive more slily than Ulysses could,
única salvação é a completa eliminação de And, like a Sinon, take another Troy.
I can add colours to the chameleon,
Ricardo III, sendo substituido por algo novo, Change shapes with Proteus for advantages,
são, e a única pessoa capaz disso é Henrique de And set the murderous Machiavel to school.
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conhecimento comum não pode ser negada. são conferidos pelo soberano, não são
Esse modelo de poder coloca o poder (militar herditários, e geralmente não têm mais uma
e político) nas mãos dos donos de terras, os ligação forte com as terras; o rei mantém o
suseranos, que são donos de parcelas de terras controle sobre as terras, sobre as tropas, e todos
e têm a lealdade das pessoas que moram nessas os seus representantes e membros do Estado
terras, ou ao menos podem usar os homens são apontados como ministros “temporários”,
armados sob sua suserania. Nesse modelo de ao invés de receberem o controle total das
Estado, o poder político e militar é dividido terras e dos títulos. Assim, o Estado
entre aqueles que têm o maior numero de terras Absolutista Inglês começa, sem grandes
diretamente, portanto, o rei não passa de mais ameaças internas à sua integridade,
um senhor, que só está acima dos duques e propiciando, de fato, um período de
senhores de títulos inferiores pela legitimação prosperidade, pois há poucos competidores
divina de sua coroação (ele é o representante pelas terras e pela coroa, e eles têm pouco, se
de Deus, seu ungido para governar), não em algum, poder político e militar significante.
poder real. Isso significa que os soldados e A imagem retratada ao final de Ricardo III é
cavaleiros, e a população, tendem a ser mais exatamente isto: a acessão de Henrique VII
leais ao seu senhor, seu suserano direto—o significa uma paz, estabilidade ao reino, sem
conde do condado onde moram, ou o duque do possibilidade de contestação por algum outro
ducado a qual servem—que ao próprio rei, grande senhor. E isso é o mesmo trazido pelos
sendo ele uma figura muito distante, cronistas históricos Tudor, a ideia de que o
inalcançável, praticamente intocável. Isso Estado Medieval era instável, caótico,
confere ao Estado um tipo de monarquia enquanto o Estado Absoluto Tudor goza de
“eletiva”, onde só torna-se rei aquele prosperidade, estabilidade e paz interna.
aristocrata que tiver o apoio de todos os outros
aristocratas (EREIRA; JONES, 2006)[16].
Pelos cronistas Tudor, isso é percebido como Conclusões
um estado de instabilidade política do reino,
onde um soberano não pode manter o controle, Ricardo III é um reflexo daquilo que a
é entendido como a causa de ter feito a historiografia contemporânea de Shakespeare
Inglaterra sangrar por quase um século. precisava expor. Não podemos afirmar que
Henrique VII teve uma grande vantagem Todas essas crônicas, versões da história,
política na sua acessão: durante todo o período eram perspectivas que concordavam
da “Guerra das Rosas”, as grandes famílias, as veementemente com a dinastia dominante.
grandes casas, as dinastias que competiam pelo Como vimos, elas não são um produto da
trono, e os aristocratas com direito à coroa “verdade histórica”, não são uma “verdade nua
foram mortos. A beligerância senhorial do país e crua”, mas sim, como toda narrativa
no século XV possibilitou aos Tudor uma histórica, apresentam versões parciais sobre
oportunidade rara: um quasi-monopólio do eventos. Elas retratam o período anterior como
Estado, oportunidade essa, que na Inglaterra, um período de extrema instabilidade política,
só teve semelhante em 1066, com a invasão e guerras constantes; um país arrasado pelo caos,
conquista de William I (Guilherme I, o e o período contemporâneo como um período
Conquistador). Henrique VII não precisava de paz nunca antes visto, cuja estabilidade e
mais aplacar os grandes senhores de terra, a prosperidade são frutos de exímia
aristocracia controlava pouco poder político e administração, claramente um reinado
militar. Ele conseguiu montar o “Principado abençoado por Deus, e reforçaram a ideia de
Hereditário Absoluto” descrito por que a solução era o poder Absoluto do
Machiavelli, onde o soberano não tem que monarca. Cria-se uma tradição historiográfica
competir com outros detentores de poder, mas de manchar o passado, retratar cada soberano
ele pode conferir ou remover o poder político anterior como um “tirano, cujo poder servia
(ou militar) de qualquer um de seus súditos: os apenas a si mesmo, que precisava ser domado
títulos são dados através de favores, e podem ou derrubado”. Cada monarca anterior é
ser removidos. Esses títulos e cargos políticos retratado como injusto, ou fraco, ou tirânico;
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Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
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Não se pode interpretar literalmente as peças de romances polifônicos seriam não um nó que prende e
Shakespeare como indivíduos independentes, eles têm usa as personagens para se desdobrar, para chegar ao
elementos individualizantes, mas não consistem em desfecho, mas seriam então uma “feliz coincidência”,
consciências autossuficientes em si. A produção poética onde os caminhos e atos individuais de cada personagem
de personagens como indivíduos capazes por si só apenas se encontram, ou até se chocam, mas que seriam
começou a ser desenvolvido a partir do século XVI, com independentes de si. Mesmo assim, a produção de
Shakespeare, Cervantes e outros, e, segundo Bakhtin Shakespeare ainda é muito inicial nesse sentido, então
(1984, pp. 33–37)[17], culmina com a criação do não se pode considerar todas as personagens de suas
romance polifônico por Fyodor Dostoyevsky, onde cada peças como pessoas totalmente conscientes e
personagem é tratado como uma pessoa integral, capaz autossuficientes. Elas ainda são usadas para o desenrolar
de raciocínio próprio, não agindo e existindo apenas da trama, ou da política, ao exemplo supracitado da
para o desenrolar da trama, mas como um “indivíduo”, personagem Stanley.
agindo de acordo com seus interesses, pensando de
acordo com suas opiniões e ideologias. As tramas dos
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 3 - PESQUISA E CONTEXTO: Política e conjunturas sociais e seu impacto na Pesquisa
para a interpretação, mas, ao mesmo tempo, [9] Uma história do corpo na Idade Média. LE
mostra uma figura vil, quase tão cruel quanto GOFF, J.; TRUONG, N. Rio de Janeiro,
algumas narrativas históricas, mais cruel que Civilização Brasileira, 2006.
outras. Assim como qualquer interpretação [10] The King's Two Bodies a Study In
histórica de uma figura literária, deve-se fazer Mediaeval Political Theology.
o máximo para distinguir o que é invenção do KANTOROWICZ, E. F. New Jersey,
que é plausível, mantendo em mente sempre a Princeton University Press, 1997.
verossimilhança como essência da arte:
convencer o leitor, o público, mostrando o [11] The Oxford Shakespeare Richard III.
plausível, o possível, mesmo que nunca tenha JOWETT, J. New York, Oxford University
acontecido, ou nunca vá acontecer, essa é a Press, 2001.
mimese Aristotélica (ARISTÓTELES in: [12] Richard III A Norton Critical Edition.
ARISTÓTELES; HORÁCIO; LONGINO, CARTELLI, T. New York, Norton &
2014)[18] que, junto com o elemento Company, 2009.
histórico, ainda cativa e mantém relevante as
obras de Shakespeare. [13] O Príncipe. MACHIAVELLI, N.;
CARUCCIO-CAPORALE, A. Tradução de
Antônio Caruccio-Caporale. São Paulo,
REFERÊNCIAS L&PM Editores, 2013.
[1] The Cambridge Companion to [14] The Birth of Europe: 400–1500. LE
Shakespeare’s History Plays. HATTAWAY, GOFF, J. Traduzido por J. Lloyd (Inglês),
M. New York, Cambridge University Press, Oxford, Blackwell Publishing, 2005.
2001. [15] O Homem Medieval. LE GOFF, J. (Org.).
[2] The Complete Works of Shakespeare. Traduzido por M. J. V. de Figueiredo, Lisboa,
SHAKESPEARE, W. New York, Barnes & Editorial Presënça, 1989.
Noble, 2015. [16] Terry Jones’ Medieval Lives. EREIRA,
[3] The Three Richards. SAUL, N. London, A.; JONES, T. G. P. London, BBC Books,
Hambledon Continuum, 2005. 2006.
[4] The Wars of the Roses. HICKS, M. Osprey [17] Problems of Dostoyevsky’s Poetics.
Publishing, 2003. BAKHTIN, M. M. London, University of
Minessota Press, 1989.
[5] The History of King Richard the Third: A
Reading Edition. MORE, T.; LOGAN, G. M. [18] A Poética Clássica. ARISTÓTELES;
(Editor). Bloomington, Indiana University HORÁCIO; LONGINO. Traduzido por J.
Press, 2005. Bruna. São Paulo, Cultrix, 2014.
[6] APPLEBY, J.; BUCKLEY, R.;
FOXHALL, L. et al. 'The king in the car park’:
new light on the death and burial of Richard
III in the Greyfriars church, Leicester, in 1485.
In: Antiquity, 2012, 87.
[7] The Virtues and Vices in the Arts: A
Sourcebook. TUCKER, S. R. Cascade Books,
2015.
[8] Chronicles of England, Scotland and
Ireland (3 of 6): England (6 of 9) Richard the
Third, Third Sonne to Richard Duke of Yorke,
and Uncle to Edward the Fift. HOLINSHED,
R. Project Gutenberg, 2014.
825
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
ᵇ Docente e Pesquisador do Programa em Linguagens, Mídia e Arte da Pontifícia Universidade Católica de Campinas
SP cesarpereira@puc-campinas.edu.br
RESUMO
O presente trabalho contempla nossa pesquisa de Mestrado sobre o desenvolvimento do pensamento
científico Pós-Moderno ocidental, em relação às Ciências da Vida, especialmente os modos como
estão sendo circulados e significados o corpo, a saúde e as doenças nomeadas raras, nas mídias
sociais. Entre os objetivos, estão as observações do sujeito constituído por suas práticas subjetivas e,
como isso ocorre na contextualização das relações sociais, do tempo e do espaço, do público e do
privado, além, da saúde e da doença. A partir dessas premissas, pretendemos buscar em uma base de
dados mundial, artigos de caráter científico, cuja categoria de excelência enquadre-se no conceito A1:
quais áreas do conhecimento humano estejam produzindo estudos que contenham as palavras chave:
“doenças raras” e “mídias sociais”. Feito tal levantamento por um método cartográfico, faremos uma
análise quali-quantitativa do material encontrado e evidenciaremos os resultados através de
ferramentas apropriadas para demonstrar como tem ocorrido tais discursos. Desse modo, concluímos,
provisoriamente em referenciais teóricos, apoiados em Foucault e Bauman, como a Ciência têm se
articulado para pensar as práticas do sujeito na vida Pós-Moderna e, a partir delas, refletir quais as
possibilidades que seus pensamentos apontam para o futuro das Ciências Humanas.
Palavras chave: Doenças Raras, Mídias Sociais, Ciências.
ABSTRACT
This work is part of our Master research about the development of Western Postmodern scientific
thought, in relation with Life Sciences, specially the ways in which the body, health and rare diseases
are being circulated and signified in social media. The main aims are the observations of the subject
formed by his subjective practices and how this occurs in the contextualization of the social relations,
of time and space, of public and private, as well as health and disease. Based on this, we intend to
research in worldwide database scientific articles classified into the excellence category A1: which
areas of the human knowledge are producing studies with the key-words "rare diseases" and "social
media". After this survey conducted by a cartographic method, we will do a qualitative and
quantitative analysis of the material. Finally, using appropriated tools, we will evidence the results in
order to demonstrate how such discourses happen. Therefore, based on theoretical references of
Foucault and Bauman, we temporarily conclude how the Science has been articulated to think the
practices of the subjects in the Postmodern life. Through these practices, we are able to think about
the possibilities for the future in the Human Sciences.
Key-words: Rare Diseases, Social media, Sciences.
826
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
Introdução Indivíduo
A História ilustra que os paradigmas da O século XX conteve relevantes eventos que
humanidade se modificam no espaço/tempo, marcaram a humanidade por práticas de
geralmente iniciando de forma local e depois subjetivação, onde a própria ordem econômica
tornando-se global e através do passou a produzir bens pouco duráveis e
poder/experiência (CASTELLS, 2018, p. 59). passíveis de provocar uma alteração no
Da Idade Média, no século XV, com suas consumo, passando de necessário para um
especificidades, chegamos ao século XXI, com querer efêmero e, com isso, desencadeando
eventos inéditos em quase todas as suas áreas: uma ramificação de comportamentos e práticas
das duas grandes Guerras Mundiais à comportamentais imediatistas.
descoberta de outros planetas, do Holocausto Enquanto o pensamento de FOUCAULT
ao sequenciamento total do DNA humano, da (2015, p. 41) busca nas raízes (passado),
organização das informações em redes e seu informações para sempre pensar outros modos,
compartilhamento imediato, à disseminação o que não significa pensar qualquer coisa e
do ódio e desabafo pessoal nas mídias sociais. muito menos buscar qualquer resposta, vemos
Em decorrência dessa construção, é oportuno em Touraine (Apud, FURLIN, 2012. p. 276-
destacar que um conjunto de fatores sociais e 277), um raciocínio desenvolvido para tentar
históricos, conduziram os meios de buscar soluções ou, ao menos, possíveis
comunicação a se desenvolveram para, entre compreensões às grandes problemáticas
outros objetivos, tornar o poder centralizador sociais, contudo, em ambos, também
visível (THOMPSON, 2002, p. 66-67). Esse observamos a convergência de valores em
objetivo não foi apenas alcançado no século relação ao indivíduo que se forma a partir de
XX, mas também contribuiu para a criação de suas práticas discursivas, quando dizem que
novos processos de interação social que ela surge a partir de uma relação consigo
culminaram na dinâmica vida humana nos mesmo e que geralmente isso ocorre com que
últimos anos com a inserção das mídias sociais lhe é mais próximo, ou seja, seu corpo.
associadas às práticas de consumo, Os estudos realizados por Foucault pela
constituição de normas, convivência pessoal e perspectiva genealógica, permitem analisar os
até mesmo em atividades científicas. saberes e as estratégias de poder e como estas
A partir de concepções como estas, tão operam em todas as esferas sociais, sob a
intrínsecas ao indivíduo pós-moderno e de insígnia do bem-estar da população.
temáticas das sociedades de projeto, procurou- No exercício das práticas sociais, o autor
se compreender como o fluxo de interação pontua que essas forças dominantes e
social e de comunicação (BARRETO, 1999, p. detentoras de poder não somente advêm do
4-6), a partir das mídias sociais, têm-se Estado, via regras políticas, mas também pelas
constituído no meio científico e nas mais regras de direitos que institucionalizam
variadas formas de conhecimento. discursos do que é verdade. Ademais, afirma
Esta pesquisa se dedica a demonstrar, que o poder é exercido não apenas pelo Estado
portanto, sob a ótica de artigos científicos, como também por outros interlocutores,
como a ciência tem-se comportado no uso de chamados de “micropoderes”, que utilizarão
mídias sociais para a compreensão de espaços tecnologias e normativas, conforme lhe forem
identitários, como o das doenças raras2. mais convenientes.
Em seu livro Vigiar e Punir (FOUCAULT,
1987), enfatiza essas relações de poder e as
relaciona diretamente ao corpo, construindo
827
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
um panorama dos modos como essa coerção desaguaram anseios por processos de inovação
ocorre através de um esquadrinhamento, seja e tecnologias, advindos por questões também
via seus membros (controle, gestual, força), do políticas, econômicas e culturais, em ebulição
espaço (através da necessidade da realização ao longo de décadas, culminando no
de exames para medir sua capacidade surgimento da internet e o compartilhamento
intelectual como na escola) e do tempo de informações em rede. Nesse sentido,
(construindo sentidos que o tempo útil deva ser CASTELLS (2012), acrescenta a observação
preenchido com tarefas úteis, das quais os que o foco dessa mesma sociedade do final do
corpos necessariamente sadios, precisam século XX passou de
executar tarefas), conduzindo à uma Comercial/Industrial/Financeira, para agora,
normalização e consequente individualização, Informacional e explica que tal conceito é o
porém, já a partir da exclusão. conteúdo proveniente das mídias tecnológicas
digitais, que acaba nos constituindo, nos
Uma vez institucionalizado um conceito
consumindo e que resulta diretamente no que
como algo positivo, contudo, mascarado em
produzimos, ou seja, gera lucro, algo
um poder de vigilância onde o modelo de um
completamente inusitado frente ao que
determinado corpo e suas particularidades
tínhamos como referência na primeira metade
deva corresponder a critérios estabelecidos
daquele mesmo século.
para ser aceito, torna-se mais fácil disseminar
uma cultura baseada nesses discursos como Ainda segundo Bauman, a tarefa diária do
verdades, excluindo e apagando todos os homem pós-moderno são suas práticas de
demais da participação social. tornar-se único. Diferentemente de outras Eras
da História, onde, o indivíduo uma vez nascido
Ainda que em menor número e
em uma determinada posição social, os
consequentemente força, grupos identitários
chamados “Estamentos”, que por uma questão
dessas minorias de indivíduos “não aceitos em
de atribuição/hereditariedade, não lhe era
relação às normas”, paralelamente, se
permitido alterar sua situação social, esses
identificam, seja com o seu próprio corpo ou
lugares atualmente, são mais dinâmicos, dando
com experiências ocorridas em corpos
ao indivíduo ao menos, a possibilidade de
próximos, unem-se para buscar formas de
tentar alcançar um outro modo de vida do que
reivindicação desses lugares de resistência, um
aquele de origem.
engajamento e assim, pleitear direitos
almejados. Entretanto, o que autor pontua que esse
Os movimentos no comportamento social dinamismo e fluidez trazem consigo o desafio
de uma vez ter chegado a tal lugar desejado, é
que afetam diretamente nosso cotidiano e
possível que o indivíduo precise dar conta de
foram nomeados como Sociedade da
um vazio existencial interno, próprio desse
modernidade fluida (BAUMAN, 2014, p. 34),
modo de convivência e aceleração. E isso se
tiveram seu apogeu ao final da década de 1960
torna ainda mais severo quando se tenta
e conceituam-se como sendo uma sociedade
conciliar com o convívio em sociedade.
que não mais conserva padrões
comportamentais tido como sólidos, ao
contrário, fluem com mais facilidade pois
Mídias Sociais
questionam mais e não aceitam tudo em sua
integralidade sólida. Os principais pilares onde Atualmente há no Brasil, 250 milhões de
essas mudanças são observadas estão na usuários inscritos em mídias sociais: 117
família (alterando a formação histórica e milhões pelo Facebook, 50 milhões pelo
religiosa, que só concedia legitimidade da Instagram e 82 milhões no YouTube
união de um homem e de uma mulher através (GOMES, 2018, p. 2). Há que se pontuar que
de casamento e o reconhecimento dos filhos tal soma alcança um número maior até que a
que naturalmente dali fossem concebidos),
além da classe social e do bairro.
Desses lugares de poder, comportamentos,
modos de interação, saberes e circunstâncias,
828
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
3
População brasileira passa de 208,4 milhões de 08/populacao-brasileira-passa-de-2084-milhoes-de-
pessoas, mostra IBGE. (Disponível em: pessoas-mostra-ibge. Último acesso em 14/11/2018)
http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2018-
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
significados que cada qual indivíduo decide de ideias e conceitos diferentes daqueles
como sendo valores dos quais prioriza em si, praticados, porém, segundo o autor, com base
em seus pares e de alguma forma pautam sua em exemplos étnicos e religiosos, essas
vida. organizações se caracterizam pela resistência e
alienação do que efetivamente a construção
O autor deixa bastante evidente o sentido que
prática discursiva capaz de alterar a realidade.
a Identidade sempre é construída pelo
indivíduo e pode ser resignificada a partir de Identidade de Projeto: terceira e mais
momentos e experiências ao longo de sua dinâmica, essa organização segundo o autor,
existência, desde que o façam dar um sentido produz sujeitos.
simbólico a algo que outrora desconhecia ou Sendo assim, a Identidade de Projeto é aquela
não era tido como algo essencial a seus valores. que possivelmente vive em uma Identidade
Ainda em relação a Identidade, o autor Legitimadora, mas ao contrário da Identidade
conceitua como sendo a constituição de de Resistência onde resiste sem inovar, esta se
processos de identificação originados no caracteriza por trazer sujeitos, como sendo
próprio indivíduo, a partir de referências e uma extensão coletiva daquelas identidades
experiências que obteve a partir de uma primitivas, com o objetivo de transformar o
matéria-prima primitiva fornecida por cenário inóspito (com preconceitos, imposição
compostos históricos, aparatos de poder, de classes dominantes, diferenciação de
aspectos biológicos, de memória coletiva, por gênero, ente outros), para um espaço/tempo
normas religiosas e outros, mas que só após onde o convívio coletivo seja possível com
serem reorganizados sob o contexto cultural e suas mais variadas diferenças, sem a sua
sob o aspecto temporal e espacial, esse omissão ou exclusão.
indivíduo as significará e se autodefinirá, Já em se tratando de Papéis Sociais, o autor
criando assim, uma identificação simbólica define como sendo aquelas normas
com ideais, pessoas e movimentos. institucionais que nos são atribuídas pelas
Ademais, como produto dessa construção instituições de poder, pelas organizações
individual simbólica, a partir do momento que sociais, ou seja, basicamente os poderes que
surge o compartilhamento informacional em organizam as funções de um grupo social,
rede, emergem os atores sociais que se como um indivíduo pode exercer vários
organizam em torno de uma identidade funções. O que vai determinar a importância
primária, que se auto sustentará ao longo de um dessa intercambialidade é como esses
espaço e tempo. indivíduos se relacionarão com essas
instituições.
Partindo do pressuposto que essa construção
de identidade pós-moderna, somente ocorrerá
em locais onde exista relações de poder, o
Metodologia
autor evidencia três grupos de identidades que
acredita compor o cenário atual: Trata-se de pesquisa de caráter exploratório e
de abordagem quali-quantitativa. Para tanto,
Identidade Legitimadora: são as buscou-se na base de dados Web of Science
organizações ou os atores sociais estruturados, artigos publicados em revistas científicas sobre
que, embora haja discordância entre si, a temática de mídias sociais e doenças raras.
reproduzem e dão continuidade a dominação
estrutural padrão, tal qual projetada. Entre os Foram utilizadas palavras-chave traduzidas
exemplos mais conhecidos, cita as para o idioma inglês: “mídia social”; “doenças
organizações estatais, as civis, as entidades raras”. Houve realização de busca a partir da
cívicas, as cooperativas, os sindicatos e as lógica booleana (palavras combinadas por
igrejas. AND e OR) e/ou operadores de truncagem
(palavras combinadas por “?” ou “*”,
Identidade de Resistência: formada por atores utilizados para recuperar palavras a partir dos
sociais que discordam dos valores contrários
prefixos ou sufixos). Foi considerado todo o
impostos pelo sistema dominante, que período temporal coberto pela base.
acreditam na possibilidade de mudança a partir
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
Foram considerados e incluídos todos os Tabela 1. Distribuição dos títulos de periódicos com
artigos publicados, independentemente do artigos publicados sobre doenças raras e mídias sociais,
Web of Science, 1945-2018.
idioma, entre 1945-2018. Posteriormente,
utilizou-se da análise de conteúdo (BARDIN,
2004), método de tratamento da informação
contida nas mensagens, para a seleção dos
artigos publicados. Para a identificação dos
estudos sobre a temática foram respeitadas as
indicações realizadas pelos próprios
autores/pesquisadores no âmbito das palavras-
chave, ou mesmo no âmbito dos títulos,
resumos ou corpo do texto. Em suma, artigos
publicados sobre a temática de doenças raras e
mídias sociais. Finalmente, todos os registros
informacionais foram analisados
quantitativamente à luz da cientometria, estudo Fonte: elaboração dos autores.
métrico da informação empregado na análise
da produção científica e tecnológica.
Todos os periódicos identificados possuem
Visando identificar os aspectos temporal e relação direta com a área da saúde. Neste caso,
temático que pudessem subsidiar a os periódicos “Internist” e “Journal of Medical
compreensão dos estudos produzidos sobre a Internet Research” representam a maior
pesquisa, foram realizadas, novamente, a concentração de artigos publicados, com 22%
análise de conteúdo, para a demarcação dos do total. Do mais, destaca-se a dispersão de
domínios de conhecimento e objetos teóricos títulos de periódicos com publicação sobre a
abordados. temática de doenças raras e mídias sociais.
A evolução histórica da produção científica
Resultados sobre doenças raras e mídias sociais, por outro
lado, permitiu a identificação de 6 anos de
Foram recuperados na base Web of Science o produtividade sobre a temática (Gráfico 1).
total de 19 artigos científicos relacionados às
Gráfico 1. Evolução histórica da produção científica
doenças raras e mídias sociais. A partir deste sobre doenças raras e mídias sociais na base de dados
levantamento, foi verificada, à luz da análise Web of Science, 1945-2018.
de conteúdo, a abordagem temática dos
artigos, visando a comprovação dos conteúdos
frente às doenças raras e mídias sociais.
Todos os 19 artigos recuperados
apresentavam relação com a temática. A partir
de análise quanti-qualitativa foram gerados
quatro indicadores: distribuição dos artigos
publicados por periódicos; evolução histórica
Fonte: Web of Science
da produção; distribuição dos artigos por áreas
de conhecimento; análise do conteúdo
temático dos artigos. No ano de 2011 foi publicado o primeiro
A distribuição dos artigos publicados por artigo sobre a temática em periódicos
periódicos evidenciou a dispersão da produção indexados na base Web of Science.
científica sobre a temática de doenças raras e Posteriormente, em anos subsequentes,
mídias sociais. Os 19 artigos recuperados verificou-se aumento do número de artigos
foram publicados em 17 títulos de periódicos publicados, com grande destaque ao ano de
(Tabela 1). 2018, com 6 artigos. Embora recente, o uso de
mídias sociais vinculadas às doenças raras tem
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
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834
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
b
Departamento de Filosofia da Universidade Federal de Pelotas, e-mail de contato: harbaud@gmail.com
RESUMO
Ao longo da tradição, termos como “gênero” e “sexo biológico” foram interligados por meio do pré
conceito popular. Atualmente, vemos estes termos distintos serem abordados de diferentes formas. O
gênero que antes era visto como consequência determinada do nascimento, agora é visto como uma
escolha. Havendo a possibilidade de sermos postos no mundo com o sexo feminino, por exemplo,
mas nos definirmos livre e racionalmente através do gênero masculino, precisamos dialogar agora
com concepções filosóficas que permitam tal ato de liberdade. Para tal, trazemos a seguir a moral da
ambiguidade de Simone de Beauvoir, que permitirá que entendamos a situação humana e demais
problemáticas.
ABSTRACT
Throughout tradition, terms like "gender" and "biological sex" have been interwoven through the
popular concepts. Now we see these distinct terms being approached in different ways. The genre
that was previously seen as a determinate consequence of birth is now seen as a choice. With the
possibility of being placed in the world with the female sex, for example, but defining ourselves freely
and rationally through the male gender, we must now dialogue with philosophical conceptions that
allow such an act of freedom. To this end, we follow the moral of the ambiguity of Simone de
Beauvoir, which will allow us to understand the human situation and other problems.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
resultado, nesta perspectiva, de diversos erros sinto-os nascer atrás de minha cabeça... Se eu
e acertos naturais que sem valor algum cedo, virão para a frente, aqui entre meus olhos –
e sempre cedo, o pensamento cresce, cresce e fica
garantiram nossa realidade. Desta forma, o Ser imenso, me enchendo por inteiro e renovando
não nasce com essência alguma. Homens e minha existência [SARTRE, 2015, p. 115 – 116].
mulheres aqui não são naturalmente bons ou
mals, como defenderiam autores
contratualistas como Hobbes ou Rousseau.
Demonstramos até o momento as razões
Pelo contrário, é a existência que precede a
pelas quais nossos autores aqui trabalhados
essência:
encaixam-se na doutrina do existencialismo
filosófico. Assim o são chamados autores que
O homem é, não apenas como é concebido, mas colocam no centro de suas investigações e
como ele se quer, e como se concebe a partir da fundamentações teóricas, a situação concreta
existência, como se quer a partir desse elã de
existir, o homem nada é além do que ele se faz. do homem e da mulher no seio da sociedade. E
Esse é o primeiro princípio do existencialismo. É além disso, são existencialistas humanistas,
isso também o que se denomina subjetividade, e pois é através do homem ou do conjunto de
esse é o termo pelo qual nos criticam. Porém, o homens e mulheres (de forma neutra podemos
que entendemos, na verdade, com isso, senão que chamá-los de “Seres”), que os valores morais e
o homem tem mais dignidade que uma pedra ou
uma mesa? Pois queremos dizer que o homem éticos são criados.
existe antes de tudo, ou seja, que o homem é,
antes de tudo, aquilo que projeta vir a ser, e
aquilo que tem consciência de projetar vir a ser Dostoievsky escrevera: “Se Deus não existisse,
[SARTRE, 2010, p. 26]. tudo seria permitido”. É este o ponto de partida
do existencialismo. Com efeito, tudo é permitido
se Deus não existe, consequentemente, o homem
Sendo o Ser totalmente livre, ele recai – encontra-se desamparado, pois não encontra nem
dentro nem fora de si mesmo uma possibilidade
segundo Sartre – em três estados: o da de agarrar-se a algo. Sobretudo, ele não tem mais
angústia, do desamparo e do desespero. Estes escusas. Se, com efeito, a existência precede a
três conceitos podem parecer surgir no sujeito essência, nunca se poderá recorrer a uma
em alguma ordem lógica, mas pelo contrário, natureza humana dada e definida para explicar
eles caminham juntos no consciente humano. alguma coisa; dizendo de outro modo, não existe
determinismo, o homem é livre, o homem é
Ao tornar-se consciente do que iremos chamar liberdade. Por outro lado, se Deus não existe, não
aqui de “a morte de deus” o homem passa encontraremos à nossa disposição valores ou
automaticamente a sentir-se desamparado ordens que legitimem nosso comportamento.
frente ao mundo. Isto porque, não há respaldo Assim, nem atrás de nós, nem à nossa frente, ou
algum de valores determinados e objetivos no domínio numinoso dos valores, dispomos de
justificativas ou escusas. É o que exprimirei
como bem e mal presentes no mundo. É dizendo que o homem está condenado a ser livre
responsabilidade do conjunto dos homens [SARTRE, 2010, p. 32 – 33].
fazer esta definição. Automaticamente, o
sujeito passa a sentir-se desesperado por esta
realidade, e mesmo que o desespero dure por Nesta perspectiva, a defesa do
um tempo curto, a angústia parece lhe seguir a existencialismo humanista sartriano, tem como
longo prazo. As próprias obras literárias de centro a defesa da Liberdade. Por tal motivo,
Sartre descrevem tal processo, como A apesar de soar pessimista perante suas
Náusea: considerações caóticas do universo, o filósofo
em questão chama a si mesmo de otimista. Para
Meu pensamento sou eu: eis por que não posso ele, uma vida sem escolhas, onde a tradição
parar. Existo porque penso... e não posso me apenas repete-se de geração para geração, não
impedir de pensar. Nesse exato momento – é é uma vida autêntica que valha a pena ser
terrível – se existo é porque tenho horror a vivida. Infelizmente, por mais que o autor
existir. Sou eu, sou eu que me extraio do nada a
pareça descrever um modelo de vida prático,
que aspiro: o ódio, a repugnância de existir são
outras tantas maneiras de me fazer existir, de me ele permanece no âmbito de justificação
embrenhar na existência. Os pensamentos teórica. O principal motivo disto, é que Sartre
nascem por trás de mim como uma vertigem, finaliza a obra O Ser e o Nada, prometendo aos
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
contemporâneos que certas noções ainda não Na considerada por alguns utopia de
foram superadas. Muito se pensou que com o Beauvoir, as pessoas ao invés de caírem em um
anúncio da morte de deus, com as perspectivas processo de depressão após a descoberta do
humanistas e libertárias haveria um espaço caos do universo – e do convívio diário com
para o progresso humano. Progresso no sentido os sentimentos já citados de angústia,
de não nascermos mais sendo cobrados de desamparo e desespero, que são normais –
banalidades próprias do senso comum. Mas é deveriam enxergar nisso uma oportunidade
claro, não foi o que aconteceu, e a filósofa já positiva. De nada adianta lamentar nossas
prevendo esta atitude buscou diagnosticar a origens e nossas situações no universo. De
origem deste problema. De acordo com ela, nada adianta chorarmos ou lamentarmos por
conforme a citação acima, o subhomem é vivermos de acordo com um pensamento ateu
fracassado. Inserido no contexto situacional de que prevê a vida, nada mais, nada menos, do
tradições, preconceitos e impulsos próprios do que um curto espaço de luz entre um profundo
senso comum, este “homem” é incapaz de sono eterno. Ao invés disso, a autora
apreender o fundamento da existência humana, juntamente com Sartre nos faz um convite
a própria Liberdade. Aqui vemos, como que de promissor: o convite de sermos o que
forma implícita, a autora faz um julgamento à quisermos ser. Um convite para que as pessoas
aquelas pessoas que com o advento de novas em geral sejam vistas apenas como pessoas, e
descobertas, ainda prendiam-se a dogmas não como duas classes distintas: o homem e a
universais: mulher. Vejamos um exemplo negativo destas
Compreende-se facilmente porque, de todas as determinações:
atitudes inautênticas, essa é a mais frequente: é
que todo homem foi inicialmente uma criança;
depois de ter vivido sob o olhar dos deuses, tendo Os costumes, as modas são muitas vezes
prometido a si mesmo a divindade, não aceita de utilizados para separar o corpo feminino da
bom grado voltar a ser, na inquietude e na dúvida, transcendência: a chinesa de pés enfaixados mal
simplesmente um homem. (...) após uma crise pode andar; as garras vermelhas da estrela de
mais ou menos longa, volta-se para o mundo de Hollywood privam-na de suas mãos; os saltos
seus pais e de seus senhores, ou então a valores altos, os coletes, as anquinhas, as crinolinas
novos, mas que lhe parecem também seguros. destinavam-se menos a acentuar a linha arqueada
Em lugar se assumir uma afetividade que o do corpo feminino do que a aumentar-lhe a
lançaria perigosamente adiante de si mesmo, ele impotência. Amolecido pela gordura, ou ao
a repele. A liquidação sob a forma clássica – contrário tão diáfano que qualquer esforço lhe é
transferência, sublimação – é uma passagem do proibido, paralisado por vestidos incômodos e
afetivo para o sério na sombra propícia da má-fé pelos ritos da boa educação, é então que esse
(...) a forma vazia e absurda de liberdade de corpo se apresenta ao homem como sua coisa. A
indiferença (BEAUVOIR, 1970, p. 39 – 40). maquilagem e as joias também servem para a
petrificação do corpo e do rosto. A função do
adorno é muito complexa: possui entre certos
primitivos um caráter sagrado; mas seu papel
Mas pior do que isso – os subhomens – são mais habitual é completar a metamorfose da
aquelas pessoas que não só são incapazes de mulher em ídolo [BEAUVOIR, 2009, p. 230 –
conviver em um mundo definido por suas 231].
próprias escolhas, mas são incapazes também
de respeitar as escolhas alheias que
diferenciam-se das suas. Aqui, como exemplo, Beauvoir é muito clara em seus escritos,
poderíamos encaixar problemas políticos, mesmo os de Filosofia existencial; a filósofa
econômicos, pessoais, acadêmicos e assim por demonstra claramente como as
diante. Mas convido a todos a pensarem pelo responsabilidades e papéis impostos aos
âmbito daqueles que são oprimidos pela gêneros, aqui especificamente ao sexo
sociedade de acordo com o seu gênero. feminino, lhe causam danos permanentes para
uma vida toda. E todo aquele contexto
sartriano de que a existência precede a
essência, aqui nos permite renegar estas
O Segundo Sexo e suas contribuições para
imposições sociais em busca da libertação dos
as discussões de gênero
indivíduos rumo ao que eles realmente querem
839
FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
para si. Beauvoir foi criticada pelas mulheres próprias mãos para alimentar nossa prole, e
desconhecidas de seu tempo, por exemplo, por temos conhecimento tecnológico o suficiente
ter feito esta crítica impactante às vestimentas para que não tenhamos de crêr em mitos
que aprisionam e mesmo assim, no dia a dia, bíblicos. E dentre todas as soluções
fazer uso de maquiagens e utilizar roupas apresentadas pela filósofa e aqui descritas, a
consideradas feminilizadas. Mas vejam, o que única renegada por ela foi a de considerar que
está em discussão aqui, é justamente a a libertação sexual se daria em um modelo
Liberdade por ela mesma: não sejamos socialista. Isto porque, após presenciar o
determinados por nada, muito menos pelas movimento marxista que ocorria em vários
ideologias que libertem! outros países, e depois de fazer parte de
movimentos de esquerda, a autora percebeu
Depois de elaborar toda uma crítica ao
que os homens tradicionalistas, conservadores
determinismo imposto aos gêrenos, através de
e preconceituosos, não abririam mão de seus
sua genealogia do sexo feminino, Beauvoir
prestígios. Para tal, a revolução deveria
traz também soluções aos problemas ali
começar dentro de cada um de nós, e por isso
detectados. Especificamente para o caso das
vinte anos mais tarde da escrita de O Segundo
mulheres, a curto prazo, a libertação de suas
Sexo, a autora não só abriu sua casa para que
situações opressores poderiam – naquela época
abortos clandestinos fossem executados, como
– se dar de três formas: ao não ter filhos, não
também foi às ruas praticar o feminismo
se casar e por fim, trabalhar para gerar o
próprio sustento. Infelizmente, ou até mesmo teórico que anos antes lhe atribuíram tantas
críticas e tantos elogios.
felizmente, a filósofa conseguiu ter esta visão
realista do mundo e do contexto de sua época.
Porém, ela também pensava em soluções a Legisladores, sacerdotes, filósofos, escritores e
longo prazo, e entre elas podemos citar a sábios empenharam-se em demonstrar que a
educação de jovens conscientes do mundo condição subordinada da mulher era desejada no
ambíguo e livre, a mudança de um sistema céu e proveitosa à Terra. As religiões forjadas
pelos homens refletem essa vontade de domínio:
econômico de capitalista para socialista, e a buscaram argumentos nas lendas de Eva, de
sociedade mencionada por ela apenas uma vez, Pandora, puseram a filosofia e a teologia a
intitulada de sociedade andrógena: serviço de seus desígnios, como vimos pelas
frases citadas de Aristóteles e São Tomás. [...] É
Se desde a primeira infância a menina fosse impressionante que no século XVI, a fim de
educada com as mesmas exigências, as mesmas manter a mulher casada sob tutela, apele-se para
honras, as mesmas severidades e as mesmas a autoridade de Santo Agostinho, declarando que
licenças que seus irmãos, participando dos “a mulher é um animal que não é nem firme nem
mesmos estudos, dos mesmos jogos, prometida a estável”, enquanto à celibatária se reconhece o
um mesmo futuro, cercada de mulheres e de direito de gerir seus bens [BEAUVOIR, 2009, pg
homens que se lhe afigurassem iguais sem 23‒24].
equívoco, o sentido do “complexo de castração”
e do “complexo de Édipo” seria profundamente
modificado. Assumindo, da mesma maneira que Como podemos acompanhar desde o início
o pai, a responsabilidade material e moral do da obra, Beauvoir ressalta sempre a forma com
casal, a mãe gozaria do mesmo prestígio
duradouro; a criança sentiria em torno de si um
que as mulheres foram tratadas ao longo da
mundo andrógino e não um mundo masculino literatura, psicanálise, filosofia, teologia e até
(...) ela não se orientaria para a passividade mesmo em outros meios estéticos como a
[BEAUVOIR, 2009, p. 929]. pintura e a música. Colocada no mundo desde
o nascimento determinada a desempenhar o
papel de dona de casa incapaz de transcender,
A sociedade andrógena aqui defendida por como fazem os homens, a mulher nunca pôde
Beauvoir, como consequência necessária do definir a si mesma. Porém, vale dizer que por
modelo de educação descrito na citação em mais que a filósofa sempre pergunte a si
questão, é a simples mistura entre indivíduos. mesma e ao leitor “o que é ser mulher?”, ela
É a assimilação de que não moramos mais em sabe desde o início que tal indagação não
cavernas, não matamos animais com nossas possui uma só resposta. Da mesma forma, não
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
é possível falarmos aqui sobre o que é ser um Com efeito, somente pelo fato de ter consciência
homem. dos motivos que solicitam minha ação, tais
motivos já constituem objetos transcendentes
Pode parecer confusa tal teoria, e para para minha consciência, já estão lá fora; em vão
esclarecer isto, recorreremos a Nietzsche, buscaria recobrá-los: deles escapo por minha
própria existência. Estou condenado a existir
filósofo que transitou pelo periodo moderno e para sempre Para-além de minha essência, Para-
contemporâneo. É de conhecimento geral de além dos móbeis e dos motivos de meu ato: estou
que o filósofo marcou uma geração com o condenado a ser livre. Significa que não se
anúncio da morte de Deus. Com este anúncio, poderia encontrar outros limites à minha
Nietzsche não só retirou a metafísica dos liberdade além da própria liberdade, ou, se
preferirmos, que não somos livres para deixar de
escritos filosóficos, como também possibilitou ser livres (SARTRE, 2016, p. 543-544).
autores como Sartre e Beauvoir, a adotarem
uma perspectiva humanista e existencial onde
os indivíduos de uma sociedade podem e Em outras palavras, a própria liberdade de
devem criar os valores de “bem” e “mal” que agir, é inerente à racionalidade humana. Nisto
antes eram dados a priori. reside a solução para problemas, como aqui
Estando isto claro, agora parece mais fácil estamos utilizando para dialogar com os
entender o grande plano de fundo e ideal dos gêneros feminino e masculino; como também
filósofos aqui abordados. E da mesma forma é um problema, na medida em que termos
que os valores de uma sociedade aqui são como “ambiguidade” podem levar as pessoas a
postos em dúvida, assim também o são alguns pensarem em um relativismo moral. Mas pelo
conceitos filosóficos utilizados contrário, quando temos uma sociedade de
frequentemente. Um destes conceitos, que indivíduos livres e não pré concebidos, temos
agora adquire um novo significado a partir de conosco a enorme responsabilidade de tomar
Sartre, é o que viemos discutindo até agora: a cuidado para não ferir a liberdade do outro, da
Liberdade. Vejam que Liberdade aqui está mesma forma que não queremos que a nossa
posta com letras grandes, como a Liberdade seja ferida. Neste sentido, aproximando-se
ontológica, e não mais como a liberdade mais de uma perspectiva de estado de natureza
positive de uma sociedade. de Rousseau do que de Hobbes, temos a noção
de que a vida social é própria dos seres
humanos. E sendo essa vida em comunidade
A liberdade faz-se ato, e geralmente a necessária para o progresso da humanidade,
alcançamos através do ato que ela organiza com não só devemos compreender bem a proposta
os motivos, os móbeis e os fins que esse ato
encerra. Mas, precisamente porque este ato tem
da liberdade abordada pela perspectiva
uma essência, aparece-nos como constituído; se existencialista e humanista, como também
quisermos remontar à potência constitutiva, e temos de lidar com o peso de nossas ações.
assim infinitamente. Então, como descrever uma
existência que se faz perpetuamente e se nega a
ser confinada em uma definição? A própria O bem de um indivíduo ou de um grupo de
denominação de “liberdade” é perigosa, caso indivíduos merece ser tomado como um fim
subentendamos que a palavra remete a um absoluto de nossa ação. Mas não somos
conceito, como as palavras habitualmente fazem. autorizados a decidir a priori sobre esse bem.
Indefinível e inominável, a liberdade será Para dizer a verdade, não somos jamais
também indescritível? (SARTRE, 2016, p. 541- autorizados, em princípio, a adotar alguma
542). conduta; uma das consequências concretas da
moral existencialista é a recusa de todas as
justificações prévias que se poderiam tirar da
Tanto para Beauvoir, quanto para Sartre, civilização, da idade, da cultura – é a recusa de
Liberdade é sinônimo de consciência, qualquer princípio de autoridade. Positivamente,
o preceito será tratar o outro (...) como uma
racionalidade e Ser. Mais a fundo, a Liberdade liberdade a fim de sua própria liberdade
é a textura do Ser. Com essa afirmação, temos (BEAUVOIR, 1970, p. 121).
como fim a noção de que não só os seres
humanos nascem sem essencialidades, mas
também que agir humano é sempre livre, Desta forma, parece ficar claro que somos
independentemente da situação. responsáveis enquanto agentes humanos por
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
não ferir a liberdade de outrem; como também fundamentável: a ausência de verdade. Por
a afirmação de que neste mundo de pessoas, mais paradoxal que isto pareça, não parece
não podemos rotular de forma pré conceituosa haver outra saída para as sociedades em geral,
estas pessoas de acordo com o sexo que do que em aceitar que cada indivíduo nasce, se
carregam. Quando dizemos isso, não estamos coloca no mundo e define a si mesmo em suas
biologicamente negando as diferenças entre o diversas características, não só sexuais e de
que Beauvoir chama de “seres humanos gênero; e que o Estado deve garantir com seu
fêmeas” e “seres humanos machos”. Apenas poder de coerção que as liberdades individuais
estamos trazendo pra análise, que o Ser e suas sejam respeitadas, sejam elas negativas,
ramificações abordadas não só no tratado de positivas, ou enquanto perspectiva ontológica
fenomenologia e ontologia de Sartre, mas que define o Ser.
também em suas demais obras e em Beauvoir,
é muito mais complexo do que esta perspectiva
binária. Neste sentido, de uma pluralidade Resultados e discussão
quase que universal de possibilidades para Nosso objetivo central aqui, que acreditamos
sermos e nos tornarmos no mundo dos ter alcançado, foi não só de mostrar a
fenômenos, cabe a cada indivíduo valorar sua importância da filosofia existencialista,
vida, sem precisar valorar, descrever ou definir humanista e ateia como ponto de partida para a
a vida do Outro, pois isso seria também ferir a liberdade de gêneros. Foi mostrar que existem
Liberdade do Outro Ser. coisas óbvias que precisam ser reafirmadas,
porque já foram ditas e esquecidas. Queremos,
com este artigo, dar um pouco mais de
Admintindo-se que qualquer abordagem que
possamos apresentar dos aspectos físicos oxigênio àqueles que já estão cansados de ler
“naturais” da existência será nos jornais sobre estupros, sobre homicídio de
necessariamentemarcado ideologicamente, o transgêneros, sobre a agressão contra as
pós-modernismo oferece o insight de que não há mulheres, e até mesmo, sobre o assassinato de
um modelo diretamente causal entre sexo e
meninos que abriram seus corações às suas
gênero. Com efeito, algumas retóricas feministas
têm argumentado que mais do que propor uma famílias desde cedo, pensando poder afirmar
relação causal entre sexo e gênero, nós sua homossexualidade, e acabaram sendo
revertamos o raciocínio causal, afirmando, em assassinados pelos próprios pais por não serem
vez dele, que o gênero precede o sexo. Tal masculinos o suficiente.
argumento aponta para o fato de se ter, em
primeiro lugar, separado o gênero do sexo, O maior resultado de nossa pesquisa, além de
estabelecendo, assim, uma “localização elevar os textos que antes não eram mais
estratégica” a partir da qual se pode pôr em abordados na nossa cidade de forma
questão a ideia de que o sexo é estável, imutável
ou fixo (CHANTER, 2011, p. 11). contemporânea e até mesmo polêmica, foi o de
conseguir vincular a discussão de gênero com
autores que vieram ao mundo antes do próprio
Concordamos com Chanter de que apesar das conceito “gênero”; mas que já observavam em
características naturais de ser humano fêmea e seu tempo o elemento negativo de existirem
ser humano macho serem vistas pelo senso pessoas que interferem na vida de outras
comum como imutáveis (dizemos isso levando pessoas objetivamente, tentando elaborar
em consideração os avanços da medicina que definições de vidas alheias que consideramos
possibilitam também, caso for a vontade do banalizáveis e de senso comum.
indivíduo, a mudança do sexo biológico), que
a questão do gênero não só é muito anterior,
como também é muito mais complexa. Seria Considerações finais
um erro pressupor que seres humanos nasçam Concluímos que deva existir em temas
determinados a ser algo, independente do que polêmicos, como o da discussão de gênero, a
for. É por essa razão que toda construção união entre sair às ruas em atos públicos, mas
ontológica e fenomenológica de Sartre, e toda também vemos como necessário realizar estes
moral ambígua de Beauvoir, nos servem muito estudos de fundamentação. De fato Beauvoir
bem para estabelecer a única verdade
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
estava certa ao prever uma mudança de longo preconceitos no mundo, nossas palavras – um
prazo, e de que as sociedades, filosofias, dia – também terão o poder de salvar as
literaturas e afins levariam muito tempo para pessoas de determinismos e mudar esse mundo
não só aceitar, mas propagar suas ideias. Há dominado pelo que os filósofos trabalhados
cerca de vinte anos a homossexualidade ainda intitulariam de subhomens. É inegável,
era considerada um crime no Brasil. Com tal conforme já foi dito, que homens e mulheres
problemática, não só devemos rever nossa nascem com essa titulação vinculada a uma
“crença” na ciência enquanto verdade distinção puramente biológica. Mas muito bem
imutável, mas também devemos rever tudo sabemos que pessoas não são motivadas
aquilo que tomamos como certo e imutável apenas por móbeis biológicos. Precisa-se
através da criação. discutir acerca da influência da cultura, da
educação e também da própria formação psico-
De fato precisamos pouco a pouco ir atrás de
química dos indivíduos. Se afirmássemos que
nossas liberdades individuais e coletivas; mas
homens e mulheres assim o são puramente por
que também precisamos ter paciência tanto
dados biológicos, estaríamos subestimando a
para esperar, quanto para estudarmos estes
importância acerca do que é ser um Ser
fenômenos de forma a educar a sociedade
humano.
corrompida pela irracionalidade.
Se em algun países a homossexualidade
ainda é considerada crime, se as mulheres em REFERÊNCIAS
algumas localidades ainda sofrem com a [1] SARTRE, Jean-Paul. O Existencialismo é
mutilação genital para ausência de prazer um Humanismo. Apresentação e notas de
sexual em vista de um casamento dócil, ou que Arlette Elkaim-Sartre. Tradução de João
exista em algumas localidades – como o nosso Batista Kreuch. Petrópolis, RJ: Editora Vozes,
caso – a cultura do estupro; como podemos 2010.
defender com unhas e dentes quaisquer tipos [2] ____. A Naúsea. Tradução de Rita Braga.
de fundamentações universais acerca do que é Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006.
ser homem e o que é ser mulher?! Foi isso que [3] BEAUVOIR, Simone. Moral da
Simone de Beauvoir já no século XX tentou Ambiguidade. Tradução de Anamaria de
fazer ao escrever a obra O Segundo Sexo, Vasconcellos. Rio de Janeiro: Editora Paz e
demonstrando os erros de todas as classes do Terra, 1970.
saber acerca das caracterizações femininas; [4] ____.Simone. O Segundo Sexo. Tradução
mas indo mais além, tentando demonstrar que de Sérgio Milliet. 2ª ed. Rio de Janeiro: Nova
a palavra “mulher” refere-se a uma construção, Fronteira, 2009.
e não um modelo pronto universal de mulher [5] SARTRE, Jean-Paul. O Ser e o Nada:
que deva ser reproduzido, defendido e Ensaio e Ontologia Fenomenológica.
aceitado. Tradução de Paulo Perdigão. Petrópolis, RJ:
Esperamos que este artigo auxilie os futuros Editora Vozes, 1997.
pesquisadores do tema (ou até mesmo os [6] CHANTER, Tina. Gênero: Conceiros-
curiosos) para que juntos não façamos com chave em Filosofia. Tradução de Vinicius-
violência a quebra de verdades absolutas Figueira. Porto Alegre: Editora Artmed, 2011.
impostas pela sociedade, que não retiremos as
liberdades alheias como pretendem Bolsonaros
da vida com, por exemplo, o seu projeto de
castração química. Que façamos isso
modificando a cultura, respeitando as
subjetividades e pluralidades do mundo. Se as
palavras escritas em uma bíblia podem
fundamentar tantas desigualdades e
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
RESUMO
Este estudo investiga o modo como o biopoder circunscreve o corpo tendo o gênero como marcador
social, cultural, econômico, político e, principalmente, de poder. Os estudos de Michel Foucault
(1926-1984) acerca do biopoder, compreendido como o poder que gere a vida, contribuíram na
compreensão dos modos de condução do comportamento. Ao incluir a questão do gênero, entretanto,
será preciso ampliar a perspectiva de análise, abrangendo as considerações de Beauvoir, Scott,
Nicholson, Vigarello, Preciado e Louro, que estabelecem correlações com o gênero, pois as
discussões que envolvem a articulação entre esses três conceitos – corpo, poder, gênero – extrapolam
os estudos realizados por Foucault. Nesta perspectiva, pode-se elencar as seguintes hipóteses: (1) o
biopoder se fundamenta em mecanismos de poder que distinguem os corpos em masculinos e
femininos, determinados pela genitália que cada indivíduo possui ao nascer; (2) o biopoder orienta o
comportamento dos indivíduos de acordo com a distinção por gênero; e (3) o entendimento que os
corpos são bissexuados originou as concepções de masculino e feminino sustentadas pela ideia de
que somente existem esses dois modos de ser no mundo. Assim, o problema da correlação entre
corpo-sexo-gênero consiste em relações que são constituídas a partir de discursos que variam
conforme a época, o lugar, o contexto social, a política, dentre outros fatores relevantes, destacando-
se a necessidade de análises que considerem as variáveis circunstanciais.
Palavras chave: Foucault, corpo, poder, gênero, biopoder.
RÉSUMÉ
Ce article examine la manière par lequele le biopouvoir circonscrit le corps ayant le genre comme
signe social, culturel, économique, politique et, aussi, de pouvoir. Les études de Michel Foucault
(1926-1984) sur le biopouvoir (compris le pouvoir comme ce qui administre la vie) ont contribué à
la compréhension de les façons de conduire le comportement humain. Cependant, la question du
genre torne nécessaire d’élargir la perspective de l’analyse. Autrement dit, à considérer les pensées
de Beauvoir, Scott, Nicholson, Vigarello, Preciado et Louro, parce qu'ils ont établis des corrélations
avec le genre avec des discussions qui impliquent l’articulation entre les trois concepts – corps,
pouvoir, genre. Ça veut dire, au-delà de les études de Foucault. Dans ce sens, les hypothèses sont: (1)
le biopouvoir est fondé sur des mécanismes de pouvoir qui distinguent les corps comme masculin ou
féminin, déterminés par les génitaux de chaque individu depuis sa naissance; (2) le biopouvoir impose
le comportement des individus en fonction de la distinction du genre; et (3) la compréhension du fait
que les corps sont bisexuels: ou masculin ou féminin. Cette notion est soutenue par l'idée qu'il y a
seulement ces deux modes d'être au monde. De cette façon, le problème est cella de la corrélation
corps-sexe-genre. Autrement dit, il consiste aux relations qui sont constitués de discours qui varient
selon le context, la place, la culture, la politique, etc. En ce sens, il faut en analyser ces variables
circonstancielles.
Mots-clés: Foucault, corps, pouvoir, genre, biopouvoir.
4
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior-Brasil (CAPES), Código de
Financiamento 001.
844
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
5
Os “sujeitos” são entendidos como aqueles indivíduos que não estão
exercendo o poder, isto é, que estão submetidos aos seus dispositivos
e estratégias.
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
6 7
Vigarello (2003) apresenta três fases da existência do Malala Yousafzai é uma mulher paquistanesa que luta
corpo, utilizando como exemplo para sua análise as pelo direito à educação de meninas e mulheres em seu
qualidades físicas do corpo, que vão se modificando ao país. Ela ficou conhecida mundialmente em 2012,
longo do tempo, conforme as necessidades da época: o quando foi atacada no ônibus a caminho da escola e
cavalheiro, necessário durante as guerras, possui uma atingida por tiros na cabeça, por homens do talibã (grupo
determinada relação com seu corpo, relacionada à força fundamentalista islâmico). Malala ficou em estado
e à destreza. Com o fim das guerras, em substituição ao grave, mas se recuperou bem e, em 2014, ela recebeu o
cavalheiro surge o cortesão: as práticas corporais prêmio Nobel da Paz por sua luta pelo direito à
tornam-se repetidas para que sejam assimiladas, pois educação. Atualmente ela é ativista dos direitos das
estão ancoradas em determinadas virtudes morais. É mulheres paquistanesas e continua lutando o acesso à
uma sociedade do gesto, do requinte, do refinamento. educação para todos os paquistaneses.
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(SCOTT, 1995, p. 82). Desta forma, o discurso discurso executa uma função estratégica neste
acerca do gênero tende a reproduzir esse sistema: ele “opera através do discurso”
conflito: os homens são estimulados a (FOUCAULT, 2006, p. 253), produzindo
desenvolver determinadas características que determinadas verdades que sustentam as
são promulgadas como masculinas ao mesmo relações de poder, ao mesmo tempo em que
tempo em que devem reprimir tudo aquilo que funcionam para que elas se reproduzam.
pode ser compreendido como feminino ou Nesse contexto, é imprescindível para a
“coisa de mulher”. Sublinha-se que a análise sobre as formas como o gênero se
expressão “coisa de mulher” é largamente constitui nas sociedades a contextualização
utilizada na linguagem cotidiana como forma dos discursos que estão sendo engendrados.
de inferiorizar determinadas atitudes e Isso porque o discurso circula em todos os
menosprezá-las, acentuando a existência de níveis de relações entre os sujeitos. Todos os
uma forte distinção entre os gêneros. atos, os desejos, as vontades, as formas de ser
Afirma Vigarello (2003) que o corpo “fala” e de agir são elaborados a partir de verdades
sobre o mundo, apresentando características da produzidas pelo discurso vigente.
sociedade no qual está inserido, revelando os Não é possível aceitar a premissa de que os
modos de ser e de viver de cada época. O autor corpos são divididos apenas entre homem-
afirma também que essas definições quanto ao masculino e mulher-feminino, pois, deste
corpo mudam com o passar do tempo, podendo modo, dever-se-ia concordar que todos os
transformar-se completamente de um período indivíduos do mesmo sexo participam do
a outro e ser diferentes entre culturas ou mesmo modo nas relações de poder, e disso
religiões distintas. pode-se discordar porque, embora
Por esta razão, o problema da correlação biologicamente compostos por organismos
entre corpo-sexo-gênero consiste em relações semelhantes, o “ser mulher” e o “ser homem”
que são constituídas a partir de discursos que é variável conforme a época e o lugar.
igualmente variam conforme a época, o lugar, Por vezes, o discurso sobre o gênero situa
o contexto social, a política, dentre outros homens e mulheres em oposição, justificando,
fatores. Neste sentido, destaca-se a por meio da biologia, uma hierarquização
necessidade de análises que considerem essas “natural” dos indivíduos (NICHOLSON;
variáveis circunstanciais. SCOTT). Contudo, existem múltiplas formas
dos indivíduos viverem a sua feminilidade e
masculinidade. Por exemplo, movendo o olhar
Apontamentos e considerações
para os indivíduos transexuais e transgêneros,
A partir da perspectiva de Foucault, a pode-se compreender de modo mais nítido os
articulação do biopoder com o corpo auxilia a limites impostos por esta maneira binária de
compreender de que modo os dispositivos de dispor os indivíduos, pois mesmo
poder atuam nas relações, “marcando” os apresentando um corpo masculino, por
sujeitos a partir de distinções assentadas na exemplo, o indivíduo constitui sua identidade
diferenciação binária dos gêneros. Assim, a também a partir de características consideradas
partir da análise das hipóteses é possível femininas.
elaborar algumas considerações:
Em outros termos, o gênero não é uma
O biopoder se alicerça em discursos que espécie de caixa que comporta um conjunto de
produzem determinadas verdades, e são essas elementos determinados conforme o sexo do
que fundamentam os mecanismos de poder. corpo. Tão pouco consiste em um manual
Ao rejeitar essa noção de fixidez dos gêneros, sobre “como ser mulher” ou “como ser
incluindo-se no estudo a análise dos sistemas homem”. Um indivíduo transgênero não irá se
de poder, o discurso se apresenta como um identificar com aquilo que está dito como
importante elemento para uma compreensão “natural” para seu sexo. Assim, sua identidade
mais elaborada acerca das relações entre poder se constitui por meio de conflitos e de
e gênero. Isso porque, conforme Foucault, o enfrentamentos devido a entendimentos que
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RESUMO
O presente trabalho busca fazer uma analise sobre a representação feminina através de três capas da
revista Redbook publicadas entre os anos de 1965 e 1976. Utilizando-se da teoria sobre as imagens
de Mitchell e Rancière vamos buscar padrões e mudanças nestas representações. Percebendo que o
período que abrange 1965-1976 nos Estados Unidos foi de grande turbilhão tanto no que diz respeito
ao desenvolvimento econômico, como um choque por melhores realidades sociais. Para as mulheres
há uma luta constante por espaço no mundo público e visibilidade social. Neste período temos o
lançamento de diversos livros sobre sexualidade que foram importantes na eclosão da segunda onda
feminina. Por este motivo este recorte foi escolhido pois temos capas de antes da segunda onda, de
durante e uma de seu pós.
Palavras chave: Imagem, Gênero , Redbook
ABSTRACT
The present work seeks to make an analysis on the female representation through three covers of
Redbook magazine published between the years of 1965 and 1976. Using the theory about the images
of Mitchell and Rancière we will look for patterns and changes in these representations. Realizing
that the period 1965-1976 in the United States was a major whirlwind both in terms of economic
development and a clash with better social realities. For women there is a constant struggle for space
in the public world and social visibility. In this period we have the launch of several books on
sexuality that were important in the outbreak of the second female wave. For this reason this cut was
chosen because we have covers before the second wave, during and one of its post.
Keywords: Image, Gender, Redbook
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8 O autor toma como alargada aquelas antigas mesmo teto, enquanto a nuclear reduzia-se
famílias que reuniam gerações e linhagens sob um apenas a pais e filhos.
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O autor toma como Alargada aquelas antigas famílias que reunião
gerações e linhagens sob um mesmo teto. Enquanto a nuclear reduzia-
se apenas pais e filhos.
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existe um fabricante da imagem e que a mesma ficcionais de verão” por Paul Gallico,
é o meio de representação. Devemos ter em conhecido escritor americano. Seus contos
mente que elas serão a maneira transmissão de estamparam as páginas de diversas revistas
algo que o produtor sabe e quer passar, ou americanas. “““ Em seguida por “Como os
mesmo como ele pensa e se relaciona com o homens fazem as mulheres se sentirem
que quer passar. (BECKER, 1999, p.137) De amadas”;” Três cozinha invejáveis” ; “Roupas
maneira que essa representação social será infantis maravilhosas” e “Novos caminhos
sempre parcial, pois uma parte da para uma grande pelo no rosto”. A capa possui
compreensão da mesma virá do produtor e um fundo branco destacando a atriz.
outra do observador que geralmente não são Ao pensar nesta capa podemos perceber que
iguais, pois o conhecimento de ambos são o inicio de revolução sexual não mudou os
diferentes. Por isso quando fizermos a analise padrões quanto à representação feminina.
de uma imagem devemos passar por diversas Ainda é estampada na capa a figura de uma
etapas, desnudando-a até chegar a uma mulher com expressão serena enquanto a
possível realidade. (BECKER, 1999, p.141) discussão segue sob os mesmos padrões,
A partir de então podemos começar a analisar filhos, casa e corpo. As revistas destinadas ao
nossas capas partindo destes pressupostos. público feminino vão se dirigir constantemente
às suas leitoras como pessoas individuais e
diversas vezes solicitam sua
Redbook- Agosto de 1967
participa(HIGONETE,1991,p.417).É possível
perceber isto nesta capa, a chamada das
matérias soa como uma conversa com uma
amiga.
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b
Mestrando do Programa de Pós-graduação em Geografia – Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Email:
diego_rgnunes@yahoo.com.br
RESUMO
O presente trabalho destina-se a apresentar um relato da aplicação de um minicurso, ministrado por
mestrandos/as do Programa de Pós-graduação em Geografia, voltado à acadêmicos/as, dos cursos de
geografia da Universidade Federal do Rio Grande. O minicurso objetivou, a partir de abordagens das
geografias feministas, provocar uma discussão fundamental não somente na geografia, mas em todas
as esferas da ciência. A partir dessa ótica podemos problematizar conceitos e desconstruir
pensamentos, assim contribuindo para uma sociedade mais justa. Compreendemos que os minicursos
são espaços de diálogos potentes, que fomentam a discussão de temas importantes às diversas
ciências, em especial a geografia. Metodologicamente, os caminhos foram traçados a partir de quatro
momentos: resgate dos movimentos feministas;contextualização das geografias feministas e
apresentação das principais geógrafas brasileiras; atividade prática sobre a promoção da igualdade de
gênero; e, por fim, reflexão crítica sobre as diferenças entre homens e mulheres. Entende-se que os
passos metodológicos, nos dimensionam a pensar sobre os atravessamentos que cada um/a está
interpelado, seja pelo cotidiano e/ou pela vida acadêmica. Por fim, aferimos que os estudos das
geografias feministas se tornam relevantes para compreender as dinâmicas sociais, mas acima de
tudo, para minimizar as desigualdades sócio-político-espaciais.
Palavras chave: Geografia; Gênero; Feminismo.
ABSTRACT
This paper aims to present a report of the application of a mini-course, taught by students of the
Postgraduate Program in Geography, geared towards academics, of the geography courses of the
Federal University of Rio Grande. The mini-course aimed, from approaches of the feminist
geographies, to provoke a fundamental discussion not only in geography, but in all spheres of science.
From this perspective we can problematize concepts and deconstruct thoughts, thus contributing to a
fairer society. We understand that mini-courses are spaces for powerful dialogues that encourage the
discussion of important topics in the various sciences, especially geography. Methodologically, the
paths were traced from four moments: rescue of the feminist movements, contextualization of the
feminist geographies and presentation of the main Brazilian geographers; practical activity on the
promotion of gender equality; and finally, critical reflection on the differences between men and
women. It is understood that the methodological steps, dimension us to think about the crossings that
each one is questioned, whether by the daily life and / or the academic life. Finally, we note that the
studies of feminist geographies become relevant to understand social dynamics, but above all, to
minimize socio-political-spatial inequalities.
Keywords: Geography; Gender; Feminism.
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diferente? Como pensam que poderão mudar como algo rígido, movido apenas pela
esses aspectos? compreensão dos conceitos chaves da
geografia.
Após 10 minutos de discussão cada grupo
escreveu na folha de cartolina as suas
conclusões. E afixamos as folhas de cartolina
Resultados e discussão
em local visível. Pedindo a cada grupo que
apresentasse os resultados do seu trabalho e Os resultados deste trabalho são múltiplos,
dinamizando um debate. por entender que a temática de gênero
despertou nos/as acadêmicos/as da Geografia
Deste modo, utilizamos algumas questões diversos sentimentos e possibilidades. A
norteadoras para a discussão: qual a origem ciência geográfica tem se preocupado ao longo
das expectativas identificadas? Até que ponto dos anos, a compreender o espaço geográfico
é que um homem ou uma mulher poderá atravessado pelos marcadores sociais e, assim,
preencher na totalidade estas expectativas? O minimizar as desigualdades socioespaciais.
que ganha com isso? E o que perde? Quem
contribui e reforça estas expectativas? Como é Inicialmente entendemos que as geografias
que nós próprios poderemos contribuir para as feministas já era uma temática conhecida por
alterar? parte do grupo, uma vez que está já havia feito
a disciplina de Geografia e Gênero, ofertada
em 2017. Outra parte do grupo, discutia com
propriedade as questões de gênero, por um viés
da militância, o que também foi interessante
para o momento. No entando, nos
preocupamos em unir os discursos e
contextualizar no campo da Geografia, por
entender que estes, em breve, serão
profissionais da área.
Acreditamos que a própria procura por um
minicurso de Geografia e Gênero já aguça a
Figura 3. Participando das atividades. vontade de alguns/as acadêmicos/as pela área.
Fonte: Arquivo pessoal do/a autor/a. Com isso, estimulando-os/as a pensar sobre as
diferentes pesquisas que podem ser realizadas
neste campo disciplinar.
Ao apresentar os/as geógrafos/as que
discutem as temáticas de gênero e
sexualidades, percebemos que o grupo não
conhecia os/as pesquisadores/as, mesmo estes
já tendo uma ampla trajetória na área. Podemos
levar em consideração o próprio Quadro de
Sequência Lógicas (QSL) dos cursos de
Geografia, onde aparece as temáticas de
gênero transversais em algumas disciplinas, e
Figura 4. Pariticipanto das atividades. outra parte do grupo ainda não haviam passado
Fonte: Arquivo pessoal do/a autor/a. por estas.
É importante destacar que estas atividades Frente a isso, entemos que contextualizar e
foram pensadas para estudantes de graduação dinamizar as discussões foram essenciais para
que em algum momento estarão em contato a melhor compreensão da temática. A qual foi
com diferentes sujeitos e marcadores. Assim, mediada pelos/as mestrandos/as e
problematizar as questões de gênero na potencializada por dinâmicas visando um
geografia se torna potente, uma vez que o melhor entendimento da proposta do
campo disciplinar, por muitos anos, foi tido minicurso.
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parceiros on-line. Belo Horizonte: Autêntica, Computador e Redes Sociais na Internet. Porto
2017. Alegre: Sulina, 2012.
[11] RECUERO, Raquel. Redes sociais na [13] FOUCAULT, M. Tecnologia del yo y
internet. Porto Alegre: Sulina, 2010. otros textos afines. Barcelona: Paidós Ibérica,
1990.
[12] RECUERO, Raquel. A conversação em
Rede. Comunicação Mediada pelo
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RESUMO
A pesquisa investiga os lugares de memória da imigração alemã no Vale dos Sinos (RS) a partir das
narrativas produzidas nos museus de imigração - por meio de sua expografia - e também dos
monumentos, buscando contar a história da imigração alemã no sul do Brasil. Atentamos
especialmente para o processo que envolve a produção de narrativas visuais sobre o espaço que rodeia
a imigração alemã e, em particular, no que diz respeito às representações culturais produzidos em
mulheres de origem germânica - e sua relação com o ambiente natural e cultural do sul do Brasil.
Partimos da leitura crítica dos museus de imigração e dos monumentos difundidos no espaço urbano,
buscando entender os diferentes mecanismos utilizados na criação de diferentes cenários e
ambiências, bem como a criação de imagens e representações que buscam retratar uma história sobre
as mulheres imigrantes, que chegaram à região a partir de 1824. Neste sentido, a análise crítica que
nos propomos é baseada na discussão dos elementos simbólicos presentes nesses lugares de memória
imigração, relacionando-os com os conceitos de representação, patrimônio cultural e identidade
étnica e de gênero.
Palavras chave: Museus da Imigração Alemã, Espaço, Monumentos, Gênero, Identidade Étnica.
ABSTRACT
The research investigates the German immigration memory places in the Vale dos Sinos (RS) from
the narratives produced in the museums of immigration - through its expography - and also of the
monuments, seeking telling of the history of German immigration in the south of Brazil. We pay
attention especially to the process that involves the production of visual narratives about the space
that surrounds the German immigration and in particular with regard to cultural representations
produced on women of Germanic origin - and its relationship to the natural and cultural environment
of the southern Brazil. We favor the critical reading of the museums of immigration and monuments
spread in the urban space, trying to understand the different mechanisms used in the creation of
different settings and ambiances, and the creation of images and representations that seek to portray
a certain story about immigrant women, who arrived in the region from 1824. in this sense, the critical
analysis that we propose is based on the discussion of the symbolic elements present in these places
of immigration memory, relating them to the concepts of representation, cultural heritage and ethnic
identity and of gender.
Keywords: Museums of German immigration, Space, Monuments, Gende, Ethnic identity.
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Buscando realizar uma leitura crítica desses Nessa relação de forças, o imaginário
espaços, atentamos ainda para Chartier (2002), (BACZKO: s/d) tem como um de seus pontos
que se refere às inúmeras possibilidades de de referência – e de lembrança – os lugares de
leitura de um símbolo, afirmando que este memória, na expressão de Nora, para quem “a
nunca é “lido” de uma única maneira. Segundo memória pendura-se em lugares assim como a
Chartier, existem diferentes formas de história em acontecimentos” (1993: 25).
interpretação de um símbolo, sendo que sua Já sobre a questão que envolve a lembrança,
leitura está diretamente vinculada ao contexto Le Goff (2003: 419) aponta para o fato de que
no qual o observador está inserido, bem como a memória requer um exercício constante de
ao olhar que este lança sobre o objeto em atualização – processo que envolve
questão. diretamente a criação e manipulação dos
Compreendemos os museus de imigração espaços e dos objetos que constituem os
como lugares de memória, na acepção de museus da imigração na região. As exposições
Pierre Nora (1993: 21), para quem “são nesses lugares de memória contribuem para a
lugares, com efeito, nos três sentidos da manutenção e atualização de uma memória
palavra, material, simbólico e funcional, sobre o próprio grupo que a produziu e a
simultaneamente, somente em graus diversos.” preserva.
Para Nora, a “memória pendura-se em lugares Atentamos ainda para a relação existente
como a história em acontecimentos” (Ibidem: entre esses conceitos – que fundamentam
25), logo os lugares de memória – como são os nossa compreensão sobre os museus de
museus de imigração alemã – além de serem imigração – e as discussões sobre identidade,
socialmente construídos, consistem-se em comprrendida nesse estudo como “uma
mecanismos de perpetuação da memória construção social, de certa maneira sempre
(HALBWACHS, 2004). acontecendo no quadro de uma relação
Halbwachs (2004) mostra-nos como os dialógica com o Outro” (CANDAU, 2012: 09).
lugares desempenham um papel fundamental Para o antropólogo a memória – elemento
na construção da memória coletiva. Para ele, indispensável da construção da identidade de
os lugares que percorremos nos fazem lembrar uma comunidade – é “uma construção
de fatos ocorridos no passado e, assim, continuamente atualizada do passado, mais do
contribuem para a construção da memória, que uma construção fiel do mesmo” (Ibidem,
evocando o passado. Quando uma comunidade p.09).
elege seus lugares de memória, como a A criação e organização de um museu de
construção de um museu e a seleção das peças história, são entendidas como um fenômeno
que o compõe, com forte presença de social, no qual o passado da comunidade é
elementos étnicos – que passam a representá- redefinido, de acordo com os interesses do
la – pode-se perceber os condicionantes que presente, que nesse caso, nos parece estar
estão envolvidos. diretamente associado à preocupação com a
Já para Pollack (1989), os lugares de preservação dos traços identitários, que nesse
memória somente se constituem em espaço de caso, nos remetem a pensar nas questões da
preservação de uma memória se assim a etnicidade – elemento que aparece como traço
comunidade os reconhece. Soma-se a isso a identitário fundamental nos museus dessas
constatação de que, no caso dos museus de comunidades.
imigração, a criação desses lugares se associa Os museus – vale lembrar – através de suas
diretamente ao período em que essas narrativas, reafirmam os papéis sociais
comunidades passam por transformações, atribuídos às mulheres, no contexto da
como a chegada de migrantes de outras regiões imigração. Procuram evidenciar “as profissões
do Rio Grande do Sul e o fenômeno da de mulheres” e que eram consideradas como
industrailização, impulsionado na região a “boas para um mulher” (PERROT, 2005,
partir da década de 1970. p.251).
Esses museus constituíram-se enquanto Como também nos ensina PERROT (2005,
espaços de salvaguarda de uma memória p.257) “há, de fato, as próprias mulheres, suas
imigrante que não se queria “perder no tempo.” aspirações e suas representações,
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pela comunidade que os produzem – fenômeno devem gerar a melhoria da qualidade de vida
que se torna evidente no processo de criação e da comunidade que administra esse
eleição daquilo que irá constituir os museus da patrimônio.
imigração alemã na região do Vale dos Sinos. Percebemos que os museus de imigração
Também Choay (2006, p.11), apresenta uma alemã da região, se articulam diretamente
clara definição sobre o patrimônio, que pode como espaços de potencialidade turística. Esse
ser compreendido como “um bem destinado ao elemento faz com que os museus –
usufruto de uma comunidade que se ampliou a compreendidos como parte de seu Patrimônio
dimensões planetárias, constituído pela Cultural – sejam percebidos pelas próprias
acumulação contínua de uma diversidade de comunidades como espaços de
objetos que se congregam por seu passado desenvolvimento local e regional (VARINE,
comum”. Podemos considerar o patrimônio 2013), na medida em que podem atrair
cultural como fruto da identidade de uma visitantes de diversos lugares, contribuindo
comunidade. Este representa, em última com isso para a promoção do desenvolvimento
análise, aquilo que deve ser preservado, ou econômico dos municípios.
seja, o que não deve ser esquecido, ainda que, Ao mesmo tempo, esses lugares de memória
na maioria das vezes, atendendo aos interesses da comunidade são espaço de preservação de
de determinados grupos que o manipula. sua identidade e também espaços em potencial
O museu – compreendido como expressão do para “se mostrar” parte das tradições herdadas
patrimônio – engloba, ainda, saberes, lugares dos imigrantes alemães que colonizaram a
e modos de fazer, que comunicam algo sobre a região e que são, em grande parte, ainda
identidade de quem as produz, e que por sua, compreendidos como uma espécie de guia das
vez, são transmitidos através das gerações. suas ações no presente. Nessa perspectiva,
Decorre daí que os hábitos e as tradições de observa-se que as tradições (HOBSBAWN,
uma comunidade nos dizem e revelam parte da 2008) herdadas dos imigrantes alemães fazem
sua cultura. Ainda, para Veloso (2006), o parte do cotidiano dessas comunidades.
conceito de referência cultural ressalta o Esses elementos podem ser percebidos na
processo de produção e reprodução de um medida em que encontramos uma forte
determinado grupo social e aponta para a preocupação em manter viva a fala da língua
existência de um universo simbólico alemã, através do Hunsrik, que é praticado
compartilhado. cotidianamente e da preservação de diferentes
Consideramos fundamental que “a questão da usos e costumes (THOMPSON, 2013), como
memória, da busca identitária e da apreensão as comidas, as músicas, a religiosidade e as
do passado como patrimônio memorialístico festas, deixados pelos alemães que fundaram
apresenta-se como uma rica fronteira entre a as comunidades no século XIX. A
História e o Turismo” (MENESES, 2004, preocupação com a manutenção dos elementos
p.15). Assim “a construção/invenção do étnicos, ligados à herança germânica na região,
passado como atrativo para quem viaja, parte aparece como um elemento identitário que dá
de interpretações que são instrumentalmente sentido e perpetua, através das gerações, o
inseridas no método da História, mas, também, sentimento de pertencimento ao grupo étnico
por construções de caráter popular, lendário e que deu origem às comunidades.
mitológico” (Ibidem, p.15). Os museus, que acabam muitas vezes,
Devemos considerar ainda que, de acordo espetacularizando (LLOSA, 2013), através de
com Meneses (2004, p.75) o museu é um lugar sua expografia, uma narrativa sobre a
que toma como base três valores imigração alemã no sul do Brasil, atuam como
indissociáveis: O valor identitário, que difusores de uma representação/imagem sobre
considera o patrimônio como gerador esse imigrante, que permite a (re)atualização
constante de construção de imagens, da memória através da manipulação do
significados e identidades; o valor econômico, imaginário, que por sua vez, contribui de
que toma o patrimônio como gerador de forma decisiva na manutenção dos traços
oportunidades econômicas; e o valor social, identitários atribuídos aos imigrantes alemães
que defende que os projetos interpretativos e seus descendentes.
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alemã do Rio Grande do Sul. O espaço da Na área externa do museu, encontramos uma
venda representa – vale lembrar – parte do réplica da estrada de ferro, inaugurada em
universo essencialmente masculino e público, 1903 e que ligava Sapiranga a Porto Alegre. A
no qual as mulheres praticamente não são presença da estada de ferro é uma
representadas. compreendida pela comunidade como uma
Já a casa do imigrante é representada pela forma de representar o desenvolvimento
cozinha e pelo quarto do casal, que mostram econômico da localidade no final do século
parte do mobiliário e dos objetos de uso XIX, logo após o desfecho do conflito do
cotidiano desses imigrantes – retratando a Mucker, que encerrou em 1868, com a vitória
evolução dos objetos ao longo do tempo – das forças imperiais sobre o grupo liderado por
constituindo um conjunto de artefatos de Jacobina nas imediações do morro Ferrabraz.
diferentes épocas e contextos da história de Os trilhos do trem procuram simbolizar o
Sapiranga. Neles as “coisas de mulheres” progresso alcançado pelos alemães.
ganham, mais uma vez relevo, na perspectiva
de contar a história das mulheres na zona de Aproximando os contextos da pesquisa
imigração alemã. Percorrer os caminhos que compõe a
A mesa da cozinha e o banco onde todos se produção das narrativas visuais sobre as
sentavam para fazer as refeições mulheres nos museus da imigração alemã nos
coletivamente, os utensílios domésticos, os faz pensar sobre a complexidade que envolve
panos de parede com dizeres em alemão – e de a manipulação da memória e sobre os
grande apelo religioso – e o mobiliário que diferentes elementos que estão envolvidos
constituía o quarto do casal são exemplos do nesse jogo de poder, que procura estabelecer
patrimônio cultural da comunidade. Esses, por uma representação sobre o passado – em
sua vez, remetem os visitantes, a lembrarem do espacial sobre as questões de étnicas e de
tempo dos imigrantes alemães e de suas gênero. A análise desses lugares de memória
dificuldades frente ao novo ambiente da da imigração no Vale dos Sinos nos permitiu
América. melhor compreender sobre os processos que
Objetos como formas para confecção de operam nessa tentativa de registro do passado.
bolachas, doces em compotas, moedor de café Torna-se clara a intenção, por parte daqueles
e outros vários utensílios do cotidiano são que produziram esses lugares de memória, de
colocados em relevo na exposição da casa, que imprimir, através do tempo, uma memória, que
demonstra também a preocupação com a faz lembrar a rusticidade desse passado
organização das tarefas e a limpeza com o imigrante em suas comunidades, ao mesmo
espaço da casa, que cabia principalmente à tempo em que acabaram dando certa
mulher. visibilidade às mulheres, muitas vezes
Percebe-se a vinculação do espaço doméstico negligenciada pela historiografia considerada
da casa a presença da mulher, que além de tradicional e que exalta apenas o trabalho
cuidar da família, de ajudar seu marido nas masculino na zona de imigração.
atividades do campo, cuidava muito bem da A lembrança dos tempos difíceis – que
casa – como uma forma de representação dos marcaram os primórdios da imigração alemã –
usos e costumes dessa germanidade. A cozinha e a valorização de elementos simbólicos,
e o quarto, nesse contexto, reproduzem formas materializados através dos objetos dos museus,
de pensar e sentir as questões de gênero. ligados à família, ao trabalho, à religiosidade e
Em Sapiranga aparece a preocupação com a a busca do ideal de prosperidade, se mostraram
representação do trabalho, que é apresentado evidentes nas narrativas analisadas. As
ao visitante através da exposição que mostra a mulheres desempenharam diferentes papéis,
evolução do trabalho, desde os tempos da nesse contexto, na medida em que são
Colônia até o apogeu do calçado – elemento de representadas especialmente no espaço
destaque na evolução econômica do município doméstico, ou seja, desempenhando atividades
e que se constitui a principal atividade fundamentais para o provento da família, da
econômica desenvolvida atualmente. criação dos filhos, do cuidado com a casa e da
exaltação de seus saberes e afazeres. Estes
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RESUMO
O presente artigo reflete sobre o reconhecimento de si e do outro, através do conceito grego de anagnórise e
de perspectivas identitárias pós-colonialistas presentes na peça radiofônica As Trevas Risíveis (2015), do
dramaturgo alemão Wolfram Lotz (1981-), e sua consequente adaptação para o teatro pelo Grupojogo de
Experimentação Cênica, sob o título As Trevas Ridículas (2017), dirigida por Alexandre Dill. A obra de Lotz
é baseada no romance O Coração das Trevas (1899), do escritor britânico Joseph Conrad (1857-1924), e no
longa-metragem Apocalypse Now (1979), do diretor estadunidense Francis Ford Coppola (1939-). A obra
dramatúrgica de Lotz conta a história de um pirata somali que, diante do tribunal distrital alemão, pede
compreensão pelo ataque ao navio de carga MS Taipan e lamenta pela perda de seu amigo Tofdau.
Paralelamente, o sargento Pellner e o militar Dorsch estão em um barco de patrulha nas florestas tropicais do
Afeganistão em busca do extermínio de um tenente coronel enlouquecido. A encenação do Grupojogo utiliza
a narrativa afim de uma reflexão sobre um mundo proliferando emaranhados e indissociáveis questionamentos
da história colonial masculina e branca em busca da construção de mais diálogos à realidade pós-colonial.
Palavras chave: As Trevas Risíveis, As Trevas Ridículas, Pós-colonialismo, Grupojogo de
Experimentação Cênica, Anagnórise.
ABSTRACT
This article reflects on the recognition of self and the other, through the Greek concept of anagnorisis
and perspectives of post-colonialism identities present in the radio play "As Trevas Risíveis" (2015),
by the German playwright Wolfram Lotz (1981-), and its consequent adaptation for the theater by
Grupojogo de Experimentação Cênica, under the title “As Trevas ridículas” (2017), directed by
Alexandre Dill. Lotz's play is based on the novel "The Heart of Darkness" (1899) by British writer
Joseph Conrad (1857-1924), and the feature film “Apocalypse Now” (1979) by American director
Francis Ford Coppola (1939-). Lotz's play tells the story of a Somali pirate who, in front of the
German district court, asks for understanding on the attack of the cargo ship MS Taipan and regrets
the loss of his friend Tofdau. At the same time, Sergeant Pellner and military man Dorsch are on a
patrol boat in the rainforests of Afghanistan in search of the extermination of a mad colonel. The
mise-en-scène by Grupojogo uses the narrative in order to reflect on a world proliferating entangled
and inseparable questions of the colonial white and masculine history in search of a construction of
more dialogues to the postcolonial reality.
Key words: : As Trevas Risíveis, As Trevas Ridículas, Post-colonalism, Grupojogo de
Experimentação Cênica, Anagnorisis.
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de um pedaço de chapa ondulada sobre quatro conseguia separar o desejo de assaltar o navio e
estacas (...) Tofdau me contou “(...) logo meu o de nos salvar [15].
dinheiro foi acabando e eu não consegui
encontrar um serviço de uma hora para outra. Aí, Por todos estes aspectos, Último sabe que,
naquela situação de necessidade, comecei a
deixar enfiarem objetos no meu rabo por dinheiro
apesar de ter assaltado o navio, a sua vida,
(...) o que é que se pode fazer, que é que se pode crenças e valores morais – ou seja, a sua
fazer neste mundo maldito?” [12]. cultura - estavam postos em jogo. E desta
forma, identifica a dificuldade de
Em outra passagem, que precede a fuga de entendimento sobre a sua versão, pela simples
Tofdau, Último conta que ele costumava dizer: diferença de culturas. Como alguém de uma
cultura pode ser julgada por outra? Tendo isto
ÚLTIMO – Tofdau dizia: “Quando a gente olha em vista, ele pede repetida e constantemente
da periferia da cidade para o mar, dá pra enxergar por compreensão:
lá adiante vários navios coloridos. Há navios
ingleses, holandeses, japoneses, indianos,
americanos, alemães e chineses, e eles estão lá ÚLTIMO - Para facilitar eu vou falar aqui em
porque o mar da Somália é rico em peixes alemão, peço sua compreensão para esse fato,
maravilhosos, assim como o céu é rico em isso torna tudo mais fácil, eu acho (...) Tenho,
estrelas. Nós só precisamos sair para o mar e nos porém, o direito de contar como cheguei a este
servimos dessa riqueza” [13]. delito, porque quero apelar por sua compreensão
para a nossa situação, que nos obriga a isso,
mesmo que nossas circunstâncias de vida possam
Assim, pode-se perceber que Lotz mostra de soar estranhas, absolutamente incompreensíveis,
forma irônica a exploração da costa somali por para um europeu ocidental (...) se qualquer coisa
parte dos países desenvolvidos, porém, para não parecer convincente, podem perguntar (...)
eles, a “pirataria” por parte da população local na nossa cultura, amizade é muito importante
(isso é uma coisa que se precisa saber para nos
é vista como ilegal. compreender) (...) Peço que o senhor acredite em
Além da percepção de sua identidade, o mim. Eu sei que a minha realidade pode ser
pirata reconhece também ter cometido o delito estranha e incompreensível para o senhor, como
do qual está sendo julgado, o assalto à europeu ocidental, mas eu lhe peço que me
embarcação holandesa, porém introduz um compreenda e que acredite em mim, na medida
do possível. Eu sei que estes elementos de prova
novo lado da história: podem parecer risíveis, mas não disponho de
outros [16]. Também sei que minha história
ÚLTIMO - É do meu conhecimento que estou possa parecer risível, porque tudo parece
aqui, perante o Tribunal Regional de Hamburgo, extravagante, incomum, mas eu lhe peço
sob a acusação de pirataria. Está correto que sou compreensão [17]. Peço a sua compreensão! É
um pirata. Também reconheço ter cometido o minha única chance [18].
delito de que sou acusado, o assalto ao navio de
carga MS Taipan. Tenho, porém, o direito de
chegar como cheguei a este delito [14]
Ao contar sua história de vida, Último realiza
tentativas de aproximar a sua formação ética e
Portanto, para contextualizar a sua versão do cultural para os senhores do júri presentes, que
acontecimento, Último precisou retomar toda a carregam diferentes costumes, hábitos, leis e
sua história de vida, da infância até o visões do mundo; com o objetivo de que eles
acontecimento, para situar e explicitar a todos adentrem à estes prismas e compreendam o
que a ação foi inevitável: contexto da situação [19]. E o compreender,
neste sentido, é o apelo da empatia de se
ÚLTIMO - Lá estava, de repente, um navio colocar no lugar do outro e pelo
grande vindo bem na direção do nosso reconhecimento, por parte dos “europeus
barquinho. Por descuido, nós simplesmente não ocidentais”, dos privilégios de suas realidades.
o tínhamos visto se aproximar no lusco-fusco do
entardecer. Já era tarde demais para desviar,
nossa única chance era abordar o navio. Eu A viagem pelo rio
reconheço que não posso dizer que só abordei o A segunda narrativa, denominada “A viagem
navio para nos salvar, eu tive ao mesmo tempo a pelo rio”, é composta pela missão do Primeiro-
ideia de assaltar o cargueiro, mas também não foi Sargento, Oliver Pellner, e do Suboficial
assim que eu só queria abordar o navio para Stefan Dorsch, do exército alemão, em busca
assaltá-lo, e sim, nesse momento, eu não
do Primeiro-Tenente Karl Deutinger.
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embarcação, ele se depara com Tofdau, o surpreendeu quase que mais ainda é que isso é
amigo de Último. Desta forma, é uma cena de assim e eu nem sequer percebo.
Bad Rippoldsau, 3/9/2012. Hoje de manhã eu
intersecção entre o a primeira e segunda parte fugi outra vez de escrever. Sempre me volta a
da história, independentes até então. Pellner, sensação de que não consigo escrever sobre as
teimoso, tenta expulsá-lo de seu barco, e por coisas porque não as conheço. Mas é justamente
mais que Tofdau tenta se explicar, ele não dá essa a questão, essa relação. De algum jeito eu
ouvidos: sempre fico em dúvida se não falta veemência
para a pessoa se ela tiver a tarefa de escrever
sobre alguma coisa que lhe é "estranha". Então,
PELLNER - Você não tem nada que fazer aqui! hoje eu fugi outra vez. Ao invés de escrever, fui
Fora daqui! ajudar meu pai a fazer a comida, a cortar os
TOFDAU - E para onde o senhor quer que eu vá? legumes. Eu recém tinha cortado um pepino e
Esta também é a nossa, também é minha história! retirado as suas sementes com uma espátula,
PELLNER - Besteira! Eu não vou deixar você quando tive a ideia de fazer pontas numa tira.
me deter! Ficou parecendo uma canoa. Mostrei ao meu pai.
TOFDAU - Eu tenho o direito de aparecer aqui. Aí ele também pegou um pepino e esculpiu,
Senão, quem mais vai me ouvir? Onde eu vou muito rápido, um avião com asas, turbinas,
poder contar de mim, senão aqui? [32]. rampas de emergência e tudo o mais. Eu também
peguei outro pepino e tinha começado a esculpir
A justificativa de Tordau beira a um tom uma velha maria-fumaça, quando meu pai já
metatextual: ele, ao tentar explicar como gritava: "Olhe aqui! Um trambolho gigante!"
chegou até ali, argumenta que tem o direito Meu pai tinha feito com o pepino uma piroca
gigante e começou a agitá-la pelo ar e a fazer
deste espaço na história. Desta forma, no ruídos como se se tratasse também de um avião
embate entre o alemão e o nativo, Tofdau ou coisa parecida. (...) [33].
reivindica um espaço que muitas vezes é
silenciado ou omitido por parte do poder das A decisão de incluir o relato destes momentos
hegemonia. Este ponto é concretizado a seguir, específicos, criando uma quebra no fluxo da
quando o seu relato é sucedido por passagens narrativa e adicionando sua visão pessoal
sem nexo, cuja incompreensão de Pellner ao como autor, vem de encontro com a questão
seu discurso ocasiona na morte de Tofdau. central da obra: o reconhecimento. No excerto,
Além da história em si, é importante destacar Lotz expressa seu processo em direção à
que o texto é interrompido subitamente, em anagnórise, que se assemelha ao conceito
determinado momento, por duas páginas de aristotélico: o momento em que há a
texto marcadas por uma fonte diferente da descoberta por parte de alguém, de dados
dramaturgia. Os trechos são de autoria do essenciais de sua identidade, formando uma
autor, e contém um tom que assemelha-se à ideia mais exata de si e daquilo que o rodeia.
notas em um diário: Podemos testemunhar que o dramaturgo
alemão, ao contar para a mãe sobre a história
Bad Rippoldsau, 2/9/2012. Hoje não vou mais do seu novo trabalho, é questionado por ela
continuar a escrever esta peça radiofônica. Meus
pais passam o dia inteiro sentados lá embaixo, na
pela ausência de personagens mulheres na
frente de casa (na verdade, o tempo nem precisa peça. A dúvida da sua mãe, ao não se
estar bonito e eles fazem isso igual), e eu fico um reconhecer na peça, catalisou para o filho um
pouco aqui e um pouco lá embaixo, numa processo de olhar para si e, desta forma, ele “se
atividade sem muito rumo. Há pouco, no almoço, dá conta”, ou seja, se conscientiza e transfere o
eu contei sobre a trama da peça para a minha mãe
e do que se trata. De repente, ela me pergunta
debate para si próprio sobre a problemática.
(entre outras coisas): "Não tem nenhuma Lotz traz a indagação sobre sua própria visão
mulher?" E é a primeira vez em que me dou conta sobre o mundo e as coisas ao também se
de verdade disso! Como é louco (e deprimente) perguntar porque estivera montando
isso de eu montar outra vez uma história e todos novamente um enredo onde todos que são,
os que atuam, todos os que falam são homens e
as mulheres têm que ficar caladas ou nem mesmo
falam e atuam são homens, com a inexistência
aparecem. Isso diz alguma coisa sobre como a de mulheres. Consequentemente, ele conclui é
gente, afinal, é limitado no pensar e também limitado no pensamento – e inclui todos nós no
sobre a imagem que se tem do mundo e da seu raciocínio - pois há muita coisa que a gente
sociedade, embora a gente acredite que escreve não sabe ou se pensa sobre, há uma vasta rede
na contramão dessa imagem. Mas o que me
que não exploramos; e também na imagem se
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
tem do mundo e da sociedade, pois há muitas pensamento a encenação do texto de Lotz pelo
pessoas, países e culturas que se desconhece Grupojogo é marcada.
porque não nos permitimos se informar,
relacionar e compreender. Desta forma, ele se O reconhecimento em “As Trevas
pergunta sobre a capacidade de escrever sobre Ridículas”
algo que não conhece, que lhe é estranho. Ao Ao se deparar com o texto, encontramos
mesmo tempo, porém, ele próprio se elucida diferentes questionamentos acerca da realidade
que é justamente sob a perspectiva desta pós-colonial. As discussões acerca do processo
relação, do reconhecimento desta dos efeitos políticos, econômicos, culturais e
impossibilidade, que é possível ele redigir a identitários contemporâneos herdados tanto
obra. em países colonizados quanto colonizadores
A segunda passagem toca em outra vêm sendo cada vez mais problematizados a
problemática, mas também se relaciona partir da segunda metade do século XX. O
diretamente com a primeira: a masculinidade. desenvolvimento e os seus consequentes
Ao ajudar o pai a fazer uma refeição, ele tem a debates a respeito de decursos como
ideia de desenhar nos legumes. O pai entra na Descolonização, consolidação da União
brincadeira, entretanto, sexualiza o contexto e Europeia, Revolução Digital, Guerra ao
cria figuras fálicas. O autor provavelmente Terror, Primavera Árabe, Crise Migratória e
deixaria o momento passar em branco, porém, Globalização são os aspectos que marcam a
mostra que, a partir dos questionamentos do história da recente era contemporânea. No
dia anterior, começa a perceber e reconhecer mundo atual em conexão, esses movimentos
sinais que poderiam ajudá-lo a responder afetam todos os quatro cantos do planeta, e o
porque concebe somente papéis masculinos e, Brasil, recentemente, tem sido um dos
portanto seus próprios pré-conceitos. Aqui, ele principais abrigadores desses debates.
nota, em sua cultura, a dominação do homem e A universalidade e atualidade da obra não se
a educação que associa-o ao forte, viril e mostram simplesmente como assuntos
heroico. Consequentemente, ao idealizar uma pertinentes e em voga no hoje, mas também
narrativa que abarca guerra, militares e como no ontem e no amanhã. As temáticas
dominação, ele projeta naturalmente somente principais que o autor se utiliza, em um texto
personagens homens. Como conclusão, a ácido cheio de metáforas que refletem sobre a
soberania do homem naturalmente traz civilização, abrangem um grande resumo das
políticas de exclusão. questões políticas, econômicas e sociais da
A principal questão, para o autor, é a falta de humanidade; que após uma análise, podemos
percepção em relação à esta controvérsia, pois concluir que o fator humano que envolve e
por mais que achamos que estamos sendo unifica o detrás dos conflitos é a busca pelo
“politicamente corretos”, há muitos pontos que poder.
deixamos passar. Lotz reconhece e aceita que Em As Trevas Risíveis, a relação entre
isto faz parte da experiência de viver e da dominador e dominado é apresentada
criação, pois não há a possiblidade de constantemente, seja em macro ou
sabermos de tudo, entretanto, há o caminho de micropolíticas, como numa guerra entre
reconhecer tais situações no âmbito da nações ou no questionamento do próprio
epistemologia, justamente a passagem da indivíduo motivado pelo medo do
“ignorância ao conhecimento”. A exposição e desconhecido. Enquanto que no prólogo
o compartilhamento da postura crítica do autor vemos o lado do oprimido, o se segue na
reflete sobre os próprios preconceitos e viagem pelo rio é o lado do opressor: os
hipocrisias, que ele conclui que somos todos aspectos dominantes, violentos, egoístas e
assim, mesmo sem consciência, assim como individualistas de Pellner, Dorsch, Lodetti,
seus pais que “ficavam sentados o dia todo”: as Carter e Deutinger. Desta forma, é uma obra de
nossas culturas e educação seguem tendências denúncia sobre a dominação histórica do
políticas, sociais e ideológicas que por vezes só homem branco nas diferentes teias culturais, e
percebemos quando saímos dela, ou seja, nos como o mundo permanece regido por discursos
encaramos com a diferença. E é sob este a partir desta ótica.
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Dessa maneira, a concepção da adaptação “Cinco homens brancos no palco. O que isso
cênica pelo Grupojogo teve como enfoque o tem a dizer?” se pergunta Rolim [36]. Desta
reconhecimento desta conjuntura. Para o tanto, forma, a encenação se direcionava a não
o diretor, Alexandre Dill, convidou cinco reafirmar estereótipos e sim, questioná-los e
atores para encenarem colaborativamente a tensioná-los não só para o público, mas para si
obra dramatúrgica de Wolfram Lotz. O mesmos: “Se eu colocasse uma mulher, todo o
processo de criação se deu na sala 309 do elenco teria de ser feminino. No caso de escalar
centro cultural da Usina do Gasômetro, em um negro, todos os atores deveriam ser negros,
Porto Alegre, entre outubro de 2016 e maio de porque senão eu estaria usando de um clichê
2018. A sala, com vista para o rio Guaíba, para tentar criticar um clichê, daí não faz muito
ofereceu muitas imagens como inspiração. sentido”, Dill explica. Montar o espetáculo
indo em direção a montagem original de ser
composto por somente homens é colocar-se
também - além de já estar num alto lugar de
discussão, o do teatro – fora da zona de
confortabilidade e de reconhecimento do seu
próprio lugar. Desta forma, o autor exprime
metaforicamente que, ao longo que se insere na
imensidão da floresta e seu desconhecido, se
adentra mais nas estranhas de si mesmo. E a
encenação opta por substituir o “risíveis” por
“ridículas” por reconhecer o ridículo do
homem branco: “os homens é que fazem a
guerra, em qualquer âmbito. Negros, mulheres
e oprimidos levantam guerras de resistência,
Figura 2. Imagem da janela da sala 309 do centro homens brancos héteros levantam guerras de
cultural Usina do Gasômetro, local que abrigava a sede dominação”.
do Grupojogo durante o período de criação do Sobre esta questão, a assessora de textos,
espetáculo. [34].
Giorgia Fiorini, pontualmente expõe:
O processo de criação foi acompanhado pela
“(...) Por se tratar da minha urgente realidade,
jornalista e crítica teatral Michele Rolim, no meu foco sempre foi o feminismo e aquelas
qual ela publicou um relato no site porto- questões referentes à materialidade do corpo da
alegrense Agora Crítica Teatral [35]. Em uma mulher em uma sociedade patriarcal, misógina e
das passagens, Dill conta que a indagação “Por falocêntrica. Há bastante tempo eu penso, porém,
que eu quero montar essa peça? Será que eu na importância de um olhar atento às
masculinidades. Penso no quão pouco se fala
mesmo me reconheço?” sempre esteve muito sobre isso, no quanto os homens que se
presente no processo. Desta forma, a questão pretendem preocupados com as questões de
se estendeu aos atores, todos homens, gênero procuram falar de temas que não lhes
brasileiros e brancos. A composição do competem e do tão pouco que eles refletem sobre
espetáculo se uniu ao reconhecimento do lugar aqueles signos que têm a ver com a constituição
das suas próprias personalidades e vidas, tanto de
de fala de cada um: os ensaios serviram para forma individual quanto coletiva e histórica. O
reconhecer as condições de homens brancos texto das As Trevas Ridículas de Wolfram Lotz
machistas e racistas que, assim como autor, são é um material precioso no que diz respeito a isso.
parte das identidades “mesmo sem saber”. Isto No palco, vemos cinco atores que ocupam aquele
se deu através de exercícios que aliavam a lugar confortável, que é privilegiado há eras: o de
homem branco de classe média. No entanto, não
discussão pós-colonialista à arte: dinâmicas conheço outro texto que possa desconfortar tanto
como contar piadas preconceituosas, a eles mesmos (e aos espectadores homens
reconhecer a carga discriminatória de palavras brancos de classe média). A peça As Trevas
e expressões do cotidiano e populares, e Ridículas abriga muitos temas tangentes, muitas
também discussões teóricas. Estas traziam vezes dando aquele tradicional nó na cabeça do
espectador, mas não podemos deixar de perceber
constrangimento e reflexão sobre as próprias o tema principal: a “ridiculeza” do
naturezas e realidades. Homem. Negar ou omitir o rastro de sangue, a
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arrogância ocidental, uma cultura diferente, mudança não resulta nem da peripécia, nem do
um povo diferente e por fim a si mesmo. reconhecimento - como quando Medeia
resolve matar os filhos, sabendo que são seus
filhos.
REFERÊNCIAS [11] Lotz, Wolfram. As Trevas Risíveis.
[1] O Workshop Presentation Performing Luciana Waquil (Trad). Porto Alegre, Goethe
Knowledge – Across Race, Gender and Institut, 2015, 2-9.
Postcolonialism aconteceu em 19 de maio de [12] Idem.
2016, ministrado pela artista interdisciplinar [13] Idem.
portuguesa Grada Kilomba e os diretores [14] Idem.
alemães Regine Dura e Hans-Werner [15] Idem.
Kroesinger. Presente em: [16] O autor brinca com o fato de que pouco se
<https://www.berlinerfestspiele.de/en/aktuell/ sabia de fato sobre os dez somalis que
festivals/theatertreffen/archiv_tt/archiv_tt16/tt enfrentaram o tribunal, o que dificultou todo o
16_programm/tt16_programm_gesamt/tt16_v processo de julgamento, que em seus dois anos
eranstaltungsdetail_165280.php>. foi um dos mais longos da história pós-guerra
[2] O exemplar foi traduzido para a língua alemã. Muitos se declaravam pescadores, mas
portuguesa por Luciana Dabdab Waquil, com poucos nem mesmo sabiam a data exata de seu
revisão de Herta Elbern e com patrocínio do nascimento: “eu nasci debaixo de uma árvore”,
Goethe Institut, em 2015. um deles respondeu. Fonte:
[3] Disponível em: <http://www.spiegel.de/international/germany
<https://www.dw.com/en/first-pirate-trial-in- /hamburg-court-hands-down-somali-pirate-
germany-in-400-years-opens-in-hamburg/a- sentences-a-862350.html>.
6254326>. [17] A compreensão, em torno da realidade
[4] Disponível em: somali, foi defendida, como parte da defesa,
<http://www.spiegel.de/international/world/ca pelo grupo de 20 advogados. Eles
ught-red-handed-first-trial-of-somali-pirates- conjuntamente apelaram ao júri levar em
poses-headache-for-germany-a-689745.html> consideração as circunstâncias do país, como
[5] A montagem foi financiada pelo Instituto um “país sem leis” atravessado por duas
Goethe de Porto Alegre (integrando a primeira décadas de guerra civil, onde a vida é marcada
edição do projeto TRANSIT, que oportuniza a por fome, terror e falta de medicamentos.
montagem de um texto alemão contemporâneo Fonte: <https://www.dw.com/en/first-pirate-
à dois diretores gaúchos simultaneamente) e trial-in-germany-in-400-years-opens-in-
apoiada pelo SESC/RS, cuja estreia ocorreu na hamburg/a-6254326>.
edição anual gaúcha do Festival Palco [18] Lotz, Wolfram. As Trevas Risíveis.
Giratório, em 2017. Luciana Waquil (Trad). Porto Alegre, Goethe
[6] Aristóteles. Poetik. Griechisch/Deutsch. Institut, 2015, 2-9.
Fuhrmann, Manfred (Ed). Stuttgart, Reclam, [19] Apesar de a pirataria ser ilegal na maior
1982, 35. parte do mundo, não é esta a questão que o
[7] Anagnórise, verbete do Wikipédia. autor parece problematizar: o somali nos
Disponível em: oferece as diferenças de perspectivas culturais
<https://pt.wikipedia.org/wiki/Anagn%C3%B que se embatem em suas compreensões e os
3rise>. fluxos migratórios correntes na Europa.
[8] Sófocles. Édipo Rei. Disponível em: [20] O Coltan é um minério composto por
<http://www.dominiopublico.gov.br/downloa outros dois minerais (columbita e tantalita),
d/texto/cv000024.pdf>. que em sua extração obtém-se metais de alta
[9] Lehmann, Hans-Thies. Das Crianças, do resistência térmica, eletromagnética,
Teatro, do Não-compreender. In Revista supercondutoras e corrosivas; por tais
Brasileira de Estudos da Presença. Porto capacidades foram e continuam sendo
Alegre, v.1, n.2, 2011, 276. fundamentais para toda a tecnologia
[10] Nas ações simples, o desenvolvimento da relacionada a equipamentos eletrônicos
tragédia permanece uno e contínuo, no qual a (celulares, notebooks, computadores
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Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política/Instituto de Filosofia Sociologia e
Política/Universidade Federal de Pelotas,yndiracsoares@gmail.com
RESUMO
O movimento da Marcha das Vadias (MV) começou em 2011 no Canadá e disseminou-se por diversos
países em protesto a uma onda de abusos sexuais em que as vítimas eram consideradas, de certa
forma, responsáveis pelas ocorrências de agressão. A principal pauta reivindicada por essas mulheres
é a liberdade: direito de ser quem são, de andar e de se vestir sem sentir o medo constante da violência.
Apesar de haver uma luta em comum que une o(s) movimento(s), em cada país (e cidade) há uma
especificidade única, uma pauta referente aos problemas enfrentados. A organização da Marcha das
Vadias na capital do país foi constituída por membros do Coletivo Marcha das Vadias/DF e não
contou com o suporte de instituições ou órgãos, sendo, portanto, uma organização que possui relações
horizontais e que atua de forma autônoma. O presente trabalho tem como objeto de análise a MV de
Brasília (MV-DF). Tal escolha justifica-se pelo fato de que esse movimento está localizado na capital
do país, foco de debates e decisões políticas; além disso, a marcha contou com uma campanha
fotográfica que chamou atenção das mídias e de simpatizantes do movimento, reunindo um número
significativo de manifestantes; ademais, juntamente com a MV de São Paulo, o movimento em
Brasília foi pioneiro nas marchas brasileiras.
Palavras-chave:Feminismo, Marcha das Vadias, Representatividade.
ABSTRACT
The SlutWalk Movement began in 2011 in Canada and spread out throughout several counties as a
protest againts a wave of sexual violence in which the victims were, in a certain way, blamed for the
aggressions they suffered.The main agenda claimed by these women is freedom: the right to be who
they are, to walk and dress without constant fear of violence. Although there is a common fight that
unites the movement(s), in each country (and city) there is a unique specificity, an agenda that refers
to the problems being faced. The organization of the SlutWalk in the capital of the country was
constituted by members of the SlutWalk Collective/DF, and didn't rely with the support of institutions
or offices. Therefore, it's an organization that possesses horizontal relations and performs
autonomously. The present paper aims to analyze the Brasília SlutWalk (MV-DF). This choice is
justified by the fact that this movement is locates in capital of the country, a focal place for debates
and political decisions. Furthermore, the Walk counted with a photography campaign that raised
awareness of the media and sympathizers of the movement, gathering a significant number of
protesters. In addition, along with the São Paulo MV, the movement in Brasília pioneered the
Brazilian walks.
Keywords: Feminism, SlutWalk, Representativeness
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Introdução marchas.
O movimento da Marcha das Vadias (MV) O presente trabalho tem como objeto de
começou em 2011, em Toronto, no Canadá. análise a MV de Brasília (MV-DF). Tal
Especificamente, no dia 24 de janeiro de 2011, escolha justifica-se pelo fato de que esse
o policial Michael Sanguinetti, ao palestrar movimento está localizado na capital do país,
sobre a prevenção ao crime, fez uma foco de debates e decisões políticas; além
observação às mulheres, dizendo que disso, a marcha contou com uma campanha
“evitassem se vestir como vadias para não fotográfica que chamou atenção das mídias e
serem vítimas” [1]. Diante disso, em abril do de simpatizantes do movimento, reunindo um
mesmo ano, o movimento originalmente número significativo de manifestantes;
conhecido como “SlutWalk”, reuniu ademais, juntamente com a MV de São Paulo,
aproximadamente três mil manifestantes que o movimento em Brasília foi pioneiro nas
protestaram contra a crença de que as próprias marchas brasileiras.
vítimas teriam provocado a violência por A primeira MV-DF foi idealizada por meio
usarem roupas provocativas; por esse motivo, das redes sociais, mais precisamente, por
grande parte das manifestantes vestiu-se intermédio do Facebook. Através deste,
livremente para desafiar a ação do policial. O meninas e mulheres conversaram-se entre si,
movimento disseminou-se por diversos países convocaram mais amigas que possivelmente
em protesto a uma onda de abusos sexuais em estariam interessadas nesse movimento e,
que as vítimas eram consideradas, de certa assim, a MV foi tomando forma. A
forma, responsáveis pelas ocorrências de organização da Marcha das Vadias na capital
agressão. do país é constituída por membros do Coletivo
A culpabilização da vítima - presente no Marcha das Vadias/DF e não conta com o
discurso do policial em Toronto - é sentida por suporte de instituições ou órgãos, sendo,
mulheres de diferentes localidades. Assim, o portanto, uma organização que possui relações
movimento que teve seu ponto de partida no horizontais e que atua de forma autônoma.
Canadá ganhou visibilidade e repercussão Nesse sentido, busca-se, a partir da análise do
através das mídias sociais, espalhando-se para aporte teórico feminista, responder a seguinte
países como Honduras, Nova Zelândia, Suécia, problemática: como a questão da
Estados Unidos, México, Argentina e Brasil. representatividade foi inserida na Marcha das
A principal pauta reivindicada por essas Vadias de Brasília e quais foram seus efeitos
mulheres é a liberdade: direito de ser quem na prática?
são; de andar e de se vestir sem sentir o medo Diante disso, o presente artigo pretende trazer
constante da violência. Apesar de haver uma à tona a questão da representatividade dentro
luta em comum que une o(s) movimento(s), em do movimento brasiliense. Tendo em vista um
cada país (e cidade) há uma especificidade cenário mais amplo, muitas feministas –
única, uma pauta referente aos problemas principalmente as feministas da “velha
enfrentados. guarda” e mulheres do movimento negro – não
O papel da internet e, consequentemente, das se sentiram confortáveis diante do modo de
redes sociais, foi fundamental para favorecer ação da MV. A utilização da nudez como
uma dinâmica inovadora para os movimentos forma de protesto, a incorporação do termo
feministas. A partir da substituição dos “vadias” para as manifestantes como sinônimo
clássicos flyers e panfletos, a organização via de liberdade e a (falta de) interseccionalidade
internet proporcionou um novo perfil ao entre gênero/raça/classe são exemplos de
movimento, possibilitando uma troca de ideias tópicos que geraram muita discussão entre os
mais rápida e eficaz entre as marchas movimentos feministas de modo geral.
espalhadas pelo mundo. Segundo Ferreira [2], Assim, reavivando o debate crítico sobre os
a possibilidade de autonomia para a produção limites de um feminismo singular e pouco
e para a divulgação de ideias feministas na rede heterogêneo, moldado nos preceitos clássicos
incitou uma grande quantidade de debates que do feminismo liberal, busca-se,
discutiram sobre as principais pautas e táticas primordialmente, analisar se houve progresso
reivindicadas e realizadas pelas diversas no que tange à representatividade dentro da
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
MV-DF. Para tal, persegue-se os seguintes esse período foi conhecido pela
objetivos específicos: a) identificar quais institucionalização do movimento, definido
foram as principais demandas da MV pelo adentramento das mulheres feministas em
brasiliense; e, b) examinar se houve ruptura ou organizações não-governamentais, nos
continuidade em relação aos preceitos do partidos políticos, em organizações
feminismo liberal. internacionais e, até mesmo, no próprio
Para tanto, faz-se necessário o uso de fontes Estado, dando a impressão de que o
secundárias como reportagens, depoimentos, movimento feminista estava estagnado (Ibid).
artigos de periódicos, dissertações e teses. O O contexto no qual a Marcha das Vadias no
aporte teórico utilizado nesta produção Brasil se insere é o da chamada terceira onda
consiste nas contribuições da(s) teoria(s) feminista, esta, para Alvarez (2014), é marcada
feminista(s), desde as clássicas até as mais pelo uso da internet como meio de agregação
contemporâneas, nesse sentido, fazer-se-à o ao movimento, pela busca da autonomia
uso de contribuições teóricas de autoras como através da criatividade na forma de luta, pelo
Joan Scott (1989), Betty Friedan (1971), discurso plural e tentativa de descentramento
Angela Davis (2016), María Lugones (2014), dentro do(s)movimento(s).
Deepika Bahri (2013), Sônia Alvarez (2014), Sendo assim, compondo os movimentos da
entre outras. terceira onda feminista no Brasil, a primeira
Por conta da limitação de tempo e espaço, o MV ocorreu em São Paulo, em 2011. No
seguinte artigo será dividido em duas partes. mesmo ano, deu-se início a organização da
Em um primeiro momento, abordar-se-á a MV de Brasília. De acordo com o blog
composição da MV de Brasília, identificando, “Marcha das Vadias Distrito Federal”, em
a partir disso, quais foram suas principais 2011, duas mil pessoas marcharam em prol de
demandas e características da marcha como uma sociedade sem violência contra a
um todo. Enquanto isso, a segunda sessão será mulher.De acordo com o Manifesto de 2011
de cunho mais analítico, já que ao buscar [4], duas das principaismotivações da primeira
relacionar a teoria com a prática, visa MV-DF consistem em:
responder a problemática proposta e, ainda,
identificar se houve rupturas ou continuidades “Em Brasília, marchamos porque apenas nos
primeiros cinco meses, desse ano, foram 283
tendo em vista os princípios do clássico casos registrados de mulheres estupradas, uma
feminismo liberal. média de duas mulheres estupradas por dia, e
sabemos que ainda há várias mulheres e meninas
Desenvolvimento abusadas cujos casos desconhecemos;
Meu corpo, minhas regras”: entendendo as marchamos porque muitas de nós dependemos
nuances da Marcha das Vadias do precário sistema de transporte público do
Distrito Federal, que nos obriga a andar longas
O movimento feminista no Brasil teve o seu distâncias sem qualquer segurança ou iluminação
início na década de 1960, aqui, as mulheres se para proteger as várias mulheres que são
violentadas ao longo desses caminhos.”
opunham à ditadura militar através de (MANIFESTO MARCHA DAS VADIAS DE
coletivos autônomos e da luta armada. Esta BRASÍLIA, 2011).
primeira onda foi duramente criticada por
apresentar um recorte de classe, raça e Além da divulgação de textos, manifestos e
heteronormatividade, apesar de se afirmarem chamadas para os protestos nas ruas, a Marcha
neutras, esses grupos de mulheres eram das Vadias de Brasília, em sua segunda edição,
constituídos por acadêmicas brancas e utilizou-se também de uma campanha
heterossexuais. Posto isso, no final dos anos fotográfica para difundir os seus propósitos
1970, mulheres do movimento negro buscaram numa tentativa clara de aproximar e incorporar
entender a conexão entre ser mulher, ser mais mulheres. As fotos demonstram certo
feminista e ser negra [3]. objetivo do movimento em desmistificar o
A partir da redemocratização e do estereótipo do "ser feminista", trazendo à luz
neoliberalismo vividos entre 1980 e 1990, situações cotidianas vivenciadas por muitas
percebe-se uma diversificação dos mulheres.
feminismos. Segundo Sônia Alvarez (2014), Nesse sentido, ao analisar o Manifesto (2012)
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
10
A expressão foi cunhada em 2016 pela revista Veja ao Perspectiva estadunidense dos anos 1950 e 60 onde há o
caracterizar de forma elogiosa Marcela Temer, atual chamado “baby boom”, buscando entender como este
primeira dama. Segundo a matéria, Marcela é um fato se insere no cotidiano de mulheres casadas, solteiras
exemplo que deve ser seguido: o de uma mulher que e universitárias. O livro recebeu algumas críticas,
deve ser discreta, agradável, zelosa pelo marido e principalmente por ter um claro recorte de análise:
esteticamente graciosa. mulheres brancas dos Estados Unidos da América.
11
O contexto no qual a autora escreveu a obra é
importante para entendê-la, Friedan escreve diante da
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
autora, a sociedade espera que as mulheres novas formas de legitimação (Ibid). Apesar da
reproduzam papéis diretamente ligados a sua MV não ter sido um movimento de massa, sua
natureza delicada, zelosa e sem desejos, sendo articulação e disseminação por diversas
uma boa esposa e mãe [9]. A mística cidades do mundo, contribuiu para muitas
feminina12 tem um caráter sutil, mas que pessoas repensarem o papel das representações
resulta numa consequência grave, a redução do de gênero e poder, assim como a importância
que é ser mulher, confinando-as em padrões do próprio feminismo.
socialmente aceitáveis. 1.2 A Marcha das Vadias na prática: avanços e
A partir disso, faz-se necessário abordar a limites em termos de representatividade
ligação entre as representações de gênero e as
relações de poder. Nesse sentido, Joan Scott A MV-DF passou por um momento
(1989) contribui com essa discussão ao específico que é interessante para nossa
salientar que “as relações de poder entre análise. No protesto de junho de 2013, um
nações e a posição dos sujeitos coloniais têm homem negro, usuário de muletas e,
sido compreendidas - e então legitimadas - em possivelmente, um morador de rua sob efeito
termos das relações entre homem e mulher” de alguma substância psicoativa, gerou
[10]. Assim, admite-se que o fundamental na agitação entre as manifestantes por ter feito
análise da autora consiste em entender como os gestos e dito palavras obscenas. Tal situação
significados culturais são construídos para gerou muita discussão, principalmente entre
representar as diferenças entre os corpos integrantes do movimento negro e
sexuados. De acordo com Scott (1989): participantes da MV-DF. Optou-se, aqui, por
trazer como exemplo de crítica à MV-DF, o
“Para proteger o poder político, a referência deve posicionamentopublicado no site “Blogueiras
parecer certa e fixa,fora de toda construção Negras13”, escrito por Ana Flávia Magalhães
humana, parte da ordem natural ou divina. Desta Pinto (2013) [11].
maneira, a oposição binária e o processo social
das relações degênero tornam-se parte do próprio Ana Flávia Pinto faz uma série de
significado de poder; pôr em questãoou alterar questionamentos e críticas sobre organizações
qualquer de seus aspectos ameaça o sistema feministas de maioria branca, nessa ocasião,
inteiro.” (SCOTT, 1989, p. 92). principalmente à MV. Nesse sentido, ao
analisar o posicionamento da autora e
A partir do resgate da contribuição de Scott depoimentos de outras ativistas, apresentados
(1989), faz-se necessário relembrar o primeiro na matéria, tem-se a impressão de que os
episódio que culminou na MV. Quando o assuntos que abordam a interseccionalidade de
policial canadense, Michael Sanguinetti, raça nesses movimentos - compostos por uma
declarou que as mulheres evitassem se vestir maioria branca - ficam relegados sempre a um
como “vadias” para não serem vítimas de segundo plano. Ademais, parte do movimento
violência sexual, o mesmo tentou – de modo negro, local e internacionalmente, criticou
consciente ou não – enquadrar a categoria de diretamente a adoção do termo “vadia” para as
mulher a um padrão comportamental fixo manifestantes, atestando que a experiência de
imposto pela sociedade patriarcal. Segundo ser tratada negativamente como vadia é algo
Scott (1989), uma das possibilidades de que as mulheres negras precisam enfrentar em
mudança nas significações de gênero e de seu cotidiano.
poder é a partir das revoltas políticas de massa A crítica da autora e de outros movimentos
que lançam velhas ordens no caos, podendo negros, sobre a incorporação do termo
revisar os termos do gênero na sua busca de “vadias”, encontra fundamento no mito da
12
A mística feminina é uma ferramenta utilizada como espaço para outros objetivos de vida;preocupações
forma de dominação, baseia-se na construção superficiais e estéticas; e, um anonimato, sendo
dicotômica que diferencia mulheres de homens. Aqui, a retratada como um mero objeto de posse.
mulher é retratada como um ser com instinto maternal 13
Ana Flávia Magalhães Pinto responde pelo blog “Por
inerente, vivendo somente à serviço do lar, marido e falar em liberdade”, doutora e mestre em História,
filhos, o seu confinamento à esfera doméstica é ativista do Movimento Negro.
acompanhado de uma conduta retraída, onde não há
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
mulher negra super sexuada que assombra Aproximadamente dois anos depois - quando a
nossa sociedade desde o período escravista. MV-DF já estava fragmentada e fragilizada
Nesta época, tanto as escravas como as demais para dar continuidade nas mobilizações
senhoras, tinham a obrigação de servir ao –, a organização postou uma nota explicativa
homem; ambas eram consideradas [13] em sua página oficial do Facebook,
propriedades e, não, pessoas portadoras de considerando suas limitações na inclusão de
direitos. pautas fundamentais do movimento negro e de
outras minorias. A organização atesta que:
Os dogmas religiosos do período, os quais
estabeleciam que o sexo só deveria ser feito
depois do casamento, culminaram na "Desde a fundação da Marcha em Brasília,
exploração dos corpos das mulheres negras alguns coletivos de mulheresnegras já haviam se
para a satisfação dos desejos sexuais dos posicionado quanto ao nome ‘Vadia’
senhores, seus filhos e capatazes. Assim nãorepresentá-las, pois elas não tomavam esse
começou o processo de construção da nome como algoempoderador e sim como um
nome que era há muito, usado contra elascomo
hipersexualização do corpo da mulher uma humilhação comum dirigida as mulheres e
negra,possibilitando que a “culpa cristã” meninas negras;infelizmente esse debate não
recaísse sobre as mesmas, justificando o ato avançou e a Marcha continuou com o‘Vadias’
“inevitável” dos senhores e, ainda, provocando em seu ‘sobrenome’.Já não bastasse esse
a fúria das mulheres brancas.De acordo com começo, a MDV-DFcontinuou apresentando
erros, falta de tato e de espaço, não só com
Angela Davis (2016) [12]: asmulheres negras, mas também com as
mulheres das cidades satélites eentorno e faltou
“Como fêmeas, as mulheres escravas estavam o olhar para diversidade ainda maior, além de
inerentemente vulneráveis a todas as formas de brancas enegras, como ciganas, indígenas, trans,
coação sexual. Se a mais violenta punição dos soropositivas, prostitutas e umainfinidade muito
homens consistia nos castigos e mutilações, as mais ampla para diálogo."
mulheres eram castigadas e mutiladas, bem
como violadas. A violação, de facto, era uma A partir disso, de acordo com Gomes e Sorj
expressão demonstrada pelo domínio (2014), esse evento mostra que a identidade
econômico dos donos de escravos e pelo
controle do capataz sobre as mulheres negras
raça/cor pode ser construída de diferentes
como trabalhadoras.” (DAVIS, 2016, p. 11). formas em sua relação com o feminismo [14].
E, ainda, acrescenta que:
A partir disso, é necessário salientar um “A política de identidades opera, assim, um
trecho da matéria escrita por Ana Flávia Pinto duplo movimento: aoconstruir divisões, opondo
(2013), a qual traz diretamente a questão da ‘mulheres brancas’ à ‘mulheres negras’,promove
defesa do homem negro. Ela diz: também aproximações, na medida em que essa
oposição écontestado por mulheres negras que se
sentem representadas pela
“Uma coisa que dificilmente entra na cabeça de Marcha das Vadias.”
nossas interlocutoras é a necessidade que nós,
mulheres negras, temos de defender a existência
dos homens negros. Não falamos apenas do pai Ao abordar sobre identidade, faz-se
opressor. Pela nossa história, convivemos necessário trazer as contribuições das teóricas
também com nossos registros do avô escravizado feministas pós-coloniais, nesse sentido, estas
do pai encarcerado, do irmão desempregado, do buscam explicar a identidade relacionando-a
filho executado, todos pagando o preço o preço
de ser tidos como vadios.”
com o contexto histórico bem como as suas
especificidades e trazendo o gênero como uma
categoria importante para análise (BAHRI,
Logo depois do ocorrido, a MV-DF prestou 2013) [15]. Para as teóricas, a construção de
uma nota de esclarecimento em seu site oficial. divisões dicotômicas e hierárquicas foi
As organizadoras apresentam uma retratação, fundamental para a constituição do
afirmando a dificuldade em desconstruir “pensamento capitalista e colonial sobre raça,
privilégios; contudo, ao mesmo tempo, elas gênero e sexualidade” (LUGONES, 2014)
lamentavam a deslegitimação da marcha em [16].
alguns posicionamentos críticos. Para Lugones (2014), ao fazermos a
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Bahri (2013) explica que os indivíduos que possuem o representação acaba sendo um instrumento de poder que
poder de representar e caracterizar o outro são também gera intensa disputa entre os atores.
15
capazes de exercer poder sobre a imagem destes, As organizadoras do movimento admitem as falhas
podendo resultar na criação e perpetuação de cometidas pela Marcha das Vadias de Brasília e que
estereótipos e, consequentemente, da sua mesmo sendo idealizada para combater desigualdades,
marginalização. Nesse sentido, a autora traz que a acabou reproduzindo discursos que perpetuam
preconceitos.
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b
Doutoranda em Estudos Literários na Universidade Federal de Santa Maria/RS, larissa-garay@hotmail.com
RESUMO
Clarice Lispector, um dos principais nomes da Literatura Brasileira, introduz em suas histórias uma
forma de narrar muito peculiar. Portadora de uma escrita inovadora que desafia a crítica, as teorias e
o próprio ato da escrita, Lispector deixa como uma de suas grandes heranças a obra A hora da Estrela,
publicada em 1977, mesmo ano de sua morte. A imigrante nordestina Macabéa é o ponto central da
história, que se desenvolve através da perspectiva do narrador/autor, Rodrigo S.M., este que, além
contar/escrever a história da imigrante, fala também dos seus anseios e desafios diante do processo
de produção literária. O leitor encontra-se na presença de um processo de construção repleto de
inovações, contradições e ironias que, além de desconcertarem a expectativa, desestruturam
concepções moldadas que impregnam a definição do gênero narrativo. Assim, o presente estudo tem
como proposta identificar o processo de construção da voz narrativa – Narrador/Escritor/Autor – e os
efeitos para o leitor, bem como o modo com que ela organiza as informações e instâncias,
fragmentadas, mas que se constituem em algo inseparável.
Palavras chave: Voz narrativa, Narrador/autor, Narrativa Metadiegética, Clarice Lispector.
ABSTRACT
Clarice Lispector, one of the leading names in our Brazilian Literature, introduces in her stories a
very peculiar form of narrating. Lispector’s innovative writing challenges the literary criticism, theory
and the act of writing itself; as one of her greatest inheritances to our culture is A Hora da Estrela,
published in 1977, same year of her death. The northeasterner immigrant Macabéa is the main point
of the story, that is developed through the perspective of the narrator/writer Rodrigo S.M, who besides
talking about the immigrant’s story also talks about the writing process itself and its mishaps. The
reader is faced with a process of construction of the narrative voice that is full of innovations,
contradictions and irony, which deconstructs the regular expectations regarding the definition of the
narrative genre. In this sense, the present study aims at identifying some points of the construction of
this narrative voice – narrator/writer/author – and its effects to the reader, as well as the way in which
it organizes the fragmentated – but inseparable – information within the text.
Keywords: Narrative voice, Narrator/author, Metadiegetical Narrative, Clarice Lispector.
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participativo e deve, também, preencher as escrevo? Verifico que escrevo de ouvido assim
lacunas deixadas pela excêntrica voz narrativa. como aprendi inglês e francês de ouvido?
Antecedentes meus do escrever? (LISPECTOR,
Assim, as contradições em relação ao que 1993, p. 33).
será contado/escrito por ele, começam antes
mesmo de se iniciar o processo de escrita (a Muitas vezes, o monólogo interior interrompe
história de Macabéa): a narrativa de Macabéa, que é contada em
terceira pessoa, e torna mais fragmentada
Será essa história um dia o meu coágulo? Que sei
eu. Se há veracidade nela – e é claro que a
ainda essa Voz que conduz a narrativa de
história é verdadeira embora inventada – que Clarice:
cada um a reconheça em si mesmo porque todos
nós somos um e quem não tem pobreza de Quando Olímpico lhe dissera que terminaria
dinheiro tem pobreza de espírito ou saudade por deputado pelo Estado da Paraíba, ela ficou
lhe faltar coisa mais preciosa que ouro – existe a boquiaberta e pensou: quando nos casarmos
quem falte o delicado essencial (LISPECTOR, então serei uma deputada? Não queria, pois
1993, p. 26). deputada parecia nome feio. (Como eu disse,
essa não é uma história de pensamentos. Depois
provavelmente voltarei para as inominadas
Ele declara a história verdadeira e inventada, sensações, até sensações de Deus. Mas a história
mesmo após afirmar sua veracidade, e de Macabéa tem que sair senão eu estouro)
relaciona a autenticidade do relato com a (LISPECTOR, 1993, p. 63).
identificação pessoal de cada leitor, pois a
partir da concepção pessoal de cada um, O narrador transita entre os diferentes planos
considerar-se-á, ou não, o que se conta da história, e isso se torna claro, especialmente
verídico. A história é acompanhada por uma pelas mudanças bruscas nos enunciados, e nas
dor dentes, porém, a história da própria formas como ele retira sua projeção da
Macabéa revela que uma dor dente também nordestina e reflete sobre sua ação. Há
pode ser inventada: modificações na instância narrativa que
permitem as alterações nos níveis que se
Pois não é que quis descansar as costas por um apresentam ao longo da história, ora projetados
dia? Sabia que se falasse isso ao chefe ele não na narrativa primeira, ora projetados na
acreditaria que lhe doíam as costelas. Então,
valeu-se de uma mentira que convence mais que
narrativa segunda (ambas consideradas em
a verdade: disse ao chefe que no dia seguinte não relação a Rodrigo S. M.).
poderia trabalhar porque arrancar um dente era Embora ocorram distinções entre os três
muito perigoso. E a mentira pegou. Às vezes só níveis de narração, sabemos que a história de
a mentira salva (LISPECTOR, 1993, p. 57). Rodrigo S.M. não é possível sem Macabéa, tão
pouco sem a palavra. Assim como a de
A história da nordestina surge em segundo
Macabéa é inexistente sem Rodrigo e a escrita.
plano, narrada em terceira pessoa, permeada
Da mesma forma que a palavra só existe
por interrupções que derivam da preocupação
concretizada na história pela vitalidade de
de Rodrigo S. M., ora com sua condição como
ambos. A dependência e unificação entre o
escritor, ora com o processo de escrita. Desta
narrador e sua personagem, é evidenciada
forma, é possível perceber que a narrativa é
através de uma explicação dada por um
construída por três histórias interdependentes:
mecanismo metadiegético presente na
a história de Rodrigo S.M., a história de
narrativa, que acaba tornando-se, de certa
Macabéa e a história da palavra. As três
forma, uma metáfora para a condição em que
constituem o todo e são indissociáveis,
se encontra o narrador:
dependentes uma da outra.
Entre as alternâncias de histórias, é possível Quando eu era menino li a história de um velho
observar as modificações que ocorrem na voz que estava com medo de atravessar um rio. E foi
narrativa. Quando Rodrigo fala sobre o ato de quando apareceu um homem jovem que também
produção da sua literatura, ele o faz em queria passar para a outra margem. O velho
aproveitou e disse:
primeira pessoa: – Me leva também?
O moço consentiu e passada a travessia avisou-
E eis que fiquei agora receoso quando pus lhe:
palavras sobre a nordestina. A pergunta é: como – Já chegamos, agora pode descer.
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Mas aí o velho respondeu muito sonso e sabido: que tange a apresentação de Macabéa: “Pareço
– Ah, essa não! É bom estar aqui montado como conhecer nos menores detalhes essa
estou que nunca mais vou sair de você!
Pois a datilógrafa não quer mais sair dos meus
nordestina, pois se vivo com ela.”
ombros. (LISPECTOR, 1993, p. 36). (LISPECTOR, 1993, p. 36), que parecem
suscitar questões de confiabilidade ao leitor,
Além do fragmento citado acima, podemos há, por outro, um narrador ambíguo, permeado
considerar também um mecanismo de contradições e extremamente irônico.
metadiegético à história de Macabéa, pois a Essa organização formal por Clarice
instância narrativa primeira de A Hora da Lispector projeta um leitor participativo na
estrela é a história de Rodrigo S.M. em relação história porque é necessário atentar às questões
à história que escreve, parece estar em segundo inerentes ao caráter metadiegético do texto.
plano na narrativa. Portanto, é extradiegética à Ainda, a voz narrativa é permeada por
história que se encontra em processo de hesitações que, frequentemente, são
produção. Neste caso, o narrador se mostra
representadas através de perguntas feitas ao
como parte da obra literária dentro da diegese leitor, como em momentos em que a voz
em relação à narrativa primeira e fora dela, em narrativa questiona suas escolhas: “E eis que
relação à história de Macabéa. Assim, a fiquei agora receoso quando pus palavras sobre
história da nordestina funciona como um a nordestina. A pergunta é: como escrevo?”
procedimento explicativo para a narrativa (LISPECTOR, 1993, p. 33).
primeira, ou seja, através dos seus aspectos e
formas, o narrador consegue demonstrar e Esse jogo com o leitor implícito é, na
expressar os problemas encontrados no verdade, uma das principais características
percurso de criação literária. inovadoras da obra da autora. Ao colocar o
leitor frente ao que, à primeira vista, é o
próprio autor: “É claro que, como todo
Resultados e discussão escritor, tenho a tentação de usar termos
suculentos: conheço adjetivos esplendorosos”
Em nossa discussão, atentamos para a
(LISPECTOR, 1993, p. 28) há uma quebra na
construção da voz narrativa e seus efeitos para
expectativa comumente relacionada aos textos
o leitor. Cabe ressaltar que o leitor ao qual nos
ficcionais. Ou seja, raramente espera-se que o
referimos, aqui, é o projetado pela própria
escritor admita que pretende fazer usos de
narrativa, ou, como descrito por Wolfgang
virtuosismos estilísticos para fins estéticos.
Iser, um leitor implítico. Segundo Iser,
Nesse sentido, é necessário atentar duplamente
ao modo como se estrutura a voz narrativa e ao
o leitor implícito não se funda em um substrato
empírico, mas sim na estrutura do texto. Se daí
assunto narrado.
inferirmos que os textos só adquirem sua A respeito da estruturação inovadora na voz
realidade ao serem lidos, isso significa que as
narrativa, é possível retomar, também, o
condições de atualização do texto se inscrevem
na própria construção do texto, que permitem renomado ensaio de Theodor Adorno sobre o
constituir o sentido do texto na consciência assunto. Em famigerado texto de crítica
receptiva do leitor. (ISER, 1996, p. 73) literária sobre o narrador, intitulado Posição
do narrador no romance contemporâneo,
Adorno reflete sobre as mudanças ocorridas,
No caso de A Hora da Estrela, a organização ao longo do tempo, nessa importante instância
formal feita por Clarice Lispector é curiosa e literária.
intrigante: este narrador, que transita entre os
diferentes planos da história – fato percebido, Para tanto, Adorno (2012) retoma questões
por exemplo, nas mudanças repentinas no tom relacionadas ao que ele chama de narrador de
do que está sendo narrado – pode ser romances tradicionais. Segundo Adorno
compreendido como um narrador bastante (2012, p. 60), o romance tradicional podia ser
complexo e multifacetado. Se, por um lado, a comparado ao palco de um teatro burguês, cujo
história de Rodrigo S.M é apresentada de papel destinado ao leitor era
modo direto, com frases curtas e simples no predominantemente passivo, porque o objetivo
principal era acompanhar as ações como se
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Por fim, a partir das breves observações texto. A Literatura funciona como um
realizadas acima, podemos dizer que a voz organismo vivo, sustentado pela estrutura e
narrativa da obra é multifacetada e vitalizado pela imersão histórica e social.
multifuncional, pois não demonstra constância Quem lhe dá vida? A palavra. Tudo começa e
e estabilidade e utiliza-se das contradições, finda com um “sim”.
ironias e mediações entre uma instância
narrativa e outra, para causar o efeito de forma
fragmentada e indefinível. É como se o texto REFERÊNCIAS
ficcional em questão tivesse a necessidade de [1] ADORNO, Theodor. Posição do narrador
prova que a literatura pode ser todas as coisas no romance contemporâneo. Tradução Jorge
ao mesmo tempo e também pode ser uma só. de Almeida. In: ___ Notas de Literatura I. 2.
Pode ser tudo em sua totalidade e nada em sua ed. São Paulo: Duas Cidades, 2012. pp. 55 –
definição. 63.
As variações estão presentes em todos os
níveis da narrativa e desafiam não apenas o [2] GENETTE, Gérard. Discurso da narrativa.
leitor, mas também a crítica, a tradição, os Tradução Fernando Cabral Martins. 3. Ed.
autores, as infindáveis tentativas de definir o Lisboa: Vega, 1995.
objeto e até a própria Literatura. É como se o
[3] ISER, W. O Ato da Leitura. Uma Teoria
problema de definição do gênero fosse
do Efeito Estético. Tradução de Johannes
personificado pela obra, pois ela possui
Kretschmer. São Paulo: Editora 34, 1996. 1 v.
musicalidade, poesia, figuras de linguagem,
discurso direto, discurso indireto, monólogo [4] LISPECTOR, Clarice. A Hora da Estrela.
interior, trata sobre temas sociais, filosóficos, 21. ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1993.
políticos, entre tantas outras singularidades
características da obra de Clarice. Não é um
narrador que conduz o relato, é como se a
história norteasse o discurso, como se tivesse
vontade própria cedida pelos mecanismos da
voz que media os elementos constituintes do
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
b
UFPEL, paulaglima@gmail.com
RESUMO
O feminismo e as questões de gênero, sexo e sexualidade tiveram suas bandeiras levantadas em
diversos movimentos ao redor do mundo, pressionando e questionando a vida política, social e
estruturas de comportamento ao longo do tempo. Muitas dessas lutas lideradas por mulheres,
buscaram no design gráfico uma ferramenta para se fazerem escutar e contestar a sociedade.
Encontraram na expressão gráfica, armas à serviço da luta pela causa. O presente artigo, sendo um
recorte de uma pesquisa maior vinculada à Pós Graduação em Artes Visuais da UFPEL, pretende a
análise do material gráfico militante resultante destas manifestações, através de uma análise
documental, abarcando desde os aspectos das sufragistas no século passado até as movimentações em
2018, não existindo assim um recorte de tempo e lugar específico. O objetivo é perceber, através das
peças de design de ativismo, as motivações ideológicas do movimento feminista de acordo com cada
contexto histórico, observando o modo estratégico como o design foi e é utilizado para mobilização
social, entendendo o valor e diversidade das soluções gráficas empregadas no desafio da defesa da
mulher.
Palavras chave: Design, Ativismo, Feminismos.
ABSTRACT
Feminism and issues of gender, sex and sexuality have been flagged in various movements around
the world, pressing and questioning political, social and behavioral life structures over time. Many of
these struggles led by women have sought in graphic design as a tool to make them listen and
challenge society. They found in the graphic expression, weapons in the service of the struggle for
the cause. The present article, being a cut of a larger larger research linked to the Postgraduate in
Visual Arts of UFPEL, intends the analysis of the militant graphic material resulting from these
manifestations, through a documentary analysis, ranging from the aspects of the suffragists in the last
century to the movements in 2018, so there is no specific time and place cut. The objective is to
perceive, through the pieces of activism design, the ideological motivations of the feminist movement
according to each historical context, observing the strategic mode as the design was and is used for
social mobilization, understanding the value and diversity of the graphical solutions employed in the
defense of women.
Keywords: Design, Activism, Feminisms.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
1
DUFRENNE, Mikel. Art et Politique. Paris: Union Générale
d’Edition, 1974, apud RIBEIRO, 1995.
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
consciência a partir de suas conquistas, lutas e liberais, vale dizer, pautadas em ideais de
o nosso lugar dentro dele. Deixar que as liberdade individual e igualitarismo. Esse
próprias imagens criem voz, sem pretender, liberalismo era, no entanto, marcado pelo
evidentemente, esgotar o sentido de uma patriarcalismo. Nessa época, mulheres
experiência tão plural quanto polissêmica, orquestradas por representantes dos EUA e do
dependendo do ângulo a partir do qual se olhe Reino Unido, brancas, de classe média,
o feminismo. mostravam-se insatisfeitas com o seu estado de
submissão e opressão.
Os conteúdos e formas de protesto,
principalmente dentro do movimento As sufragistas reivindicavam igualdade
feminista, são contextuais e relacionais, isto é, jurídica e política, e utilizavam fortemente as
são modelados pelas condições políticas, manifestações nas ruas como via de acesso.
culturais, organizacionais da ação coletiva. Eram expoentes em termos de criatividade,
Assim, são desenhadas as fronteiras – que se inventando constantemente novas maneiras de
misturam espontaneamente e não pontes, chamar a atenção dos políticos e do público.
ligações artificiais - entre as gerações de As integrantes do movimento contavam com
ativistas do feminismo. Ao longo desta campanhas publicitárias e a força de uma
pesquisa, é possível constatar que o recorte de mensagem central potente. Muitas vezes
raça, gênero e classe social, enquanto misturando o humor com incitações à raiva, as
reinvindicações contra-hegemônicas, são sufragistas conseguiram mostrar que ambos
recentes e não ganha amplo espaço nos são necessários.
materiais gráficos das primeiras manifestações Os pôsteres acompanhavam o que havia de
públicas. Nos registros fotográficos e mais inovador nas técnicas gráficas da
documentais essa interseccionalidade imprensa da época e a produção de materiais
intercepta de forma categórica o movimento impressos era um dos pontos centrais da
feminista somente ao longo de sua evolução. campanha sufragista, lembrando sempre que
Ainda assim, esta pesquisa pretende colaborar
por tratar-se de um feminismo de classe média
ao máximo para negação dessa universalização e alta, contribuía para disponibilidade de
da mulher. Como aponta Djamila Ribeiro [5] recursos financeiros e intelectuais. Imitavam a
(2017), a figura feminina é um mosaico que só estética de tabloides sensacionalistas, com
pode ser entendido em sua grandes títulos e desenhos ou fotos chamativas
multidimensionalidade. Afinal “a experiência em primeiro plano. A máquina publicitária das
de ser mulher se dá de forma social e sufragistas funcionava como uma engenharia
historicamente determinadas” (RIBEIRO, muito bem organizada. Segundo Delap [7]
2017, p.70) (2018), o movimento produzia folhetos, faixas,
A metodologia científica utilizada nesta cartazes diários anunciando que naquele
investigação se baseia em Gil [6] (1994), que a mesmo dia aconteceriam reuniões noturnas,
nomeia enquanto pesquisa básica, que objetiva por exemplo. Na Figura 1, convocação para
gerar conhecimentos novos sem aplicação reunião das mulheres em torno do seu direito
prática. Para além, é uma pesquisa qualitativa, ao voto e na Figura 2 frases sobre
cujas relações e os dados são analisados reivindicação do direito ao voto pelas
intuitivamente. Trata-se, também, de uma francesas, ambos utilizam a diferenciação do
pesquisa bibliográfica que busca entender tamanho das tipografias, em caixa alta, como
através de livros, artigos e demais publicações, recurso para atrair a atenção dos leitores. O
conceitos de violência e discriminação, assim uso de tipografias diferentes se torna
como o eixo político das imagens. exagerado provavelmente em função da falta
de outros recursos para diferenciação dos
conteúdos.
Resultados e discussões
Na passagem do século XIX para o século
XX, as sociedades ocidentais eram
notadamente influenciadas por correntes
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desenvolve sua tese de doutorado, Problemas instruções de como e onde aplica-las. Há casos
de gênero (1990), o que lançaria as sementes de gráficas que se disponibilizam a fazer
da teoria queer, que rompe a relação sexo e impressão de forma gratuita.
gênero e aposta em performance e
performatividade do gênero.
Nos últimos vinte anos, o feminismo mundial
foi marcado principalmente pelo uso maciço
das redes sociais para organização,
conscientização e propagação dos ideais
feministas. Pautas como aborto, cultura do
estupro, representação política, violência
contra mulher aparecem em alta nessa jornada
aparentemente incoesa, mas demasiadamente
coerente.
Tratam-se de mobilizações sem lideranças e
com democracia de demandas. A exemplo,
temos as marchas de 2013 no Brasil. Ao
observar os registros do material de ativismo
dessas manifestações (figura 10) é possível
concluir que trata-se de questionamentos de
várias frentes: liberdade de expressão, aborto,
sororidade, entre outros.
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
Para entendermos melhor o momento em que [8] DICENZO, Maria. Gutter politics: women
estamos, para avançarmos e aprofundamos as newsies and the suffrage press, Women’
lutas presentes e futuras, nada mais sábio que History Review, 2003, 12:1, 15-33. Disponível
retomarmos as trajetórias, os motivos e a forma em: Acesso em: 5/8/2018.
com que milhares de mulheres se [9] CONSOLIM, Verônica. Segunda onda
movimentarem e romperam suas amarras por feminista: desigualdade, discriminação e
um outro tipo de sociedade ao longo da política das mulheres. 2017. Disponível em:
história. Acesso em: 2/8/2018.
Através dessas histórias, adquirimos uma
posição privilegiada para rever acertos e erros,
sobretudo para lembramos que o protagonismo
das mulheres está relacionado a um processo
histórico e de que antes de nós, outras mulheres
compreenderam que a organização coletiva é o
método fundamental para a conquista de
direitos.
REFERÊNCIAS
[1] RIBEIRO, Marília Andrés. Arte e política
no Brasil: a atuação das neovanguardas nos
anos 60. In: FABRIS, Annateresa (Org.).
(1998). Arte e política: algumas possibilidades
de leitura. São Paulo: FAPESP; Belo
Horizonte: C/ Arte.
[2] MIYASHIRO, Rafael. Com design, além
do design: os dois lados de um design gráfico
com preocupações sociais. In: BRAGA,
Marcos Cobra (Org.). O papel social do design
gráfico: história, conceitos & atuação. São
Paulo: Senac, 2011, p. 65-85.
[3] BROWN, Tim et al. Design thinking: uma
metodologia poderosa para decretar o fim das
velhas ideias. Rio de Janeiro: Elsiever, 2010.
[4] FUAD-LUKE, Alastair. Design Activism:
Beautiful Strangeness for a Sustainable Wolrd.
Londres, Earthscan, 2009.
[5] RIBEIRO, Djamila. O que é lugar de
fala. Minas Gerais: Letramento/Justificando,
2017, 112p.
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
b
Dpto de Psicologia Social e Institucional./Instituto de Psicologia/Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
machadops@gmail.com
RESUMO
A proposta desse trabalho é trazer a perspectiva de duas autoras feministas no âmbito da virada
material e suas possíveis contribuições para as pesquisas nas humanidades. É importante situar tal
viés mediante crítica ao antropocentrismo assim como à divisão entre o aspecto discursivo e material
da realidade. Considerando que algumas dualidades (tais como cultura/natureza, mente/corpo,
subjetivo/objetivo, racional/emocional) já haviam sido contestadas no âmbito da nomeada virada
linguística, essa nova perspectiva passa a não separar a matéria da linguagem. Nessa nova
compreensão, questões fundamentais sobre ontologia, epistemologia, ética e política tomam novos
contornos, colocando dilemas sobre o que é o “real” e o que suscitam relações entre natural, humano
e não humano. Debruço-me sobre as considerações de “material-discursivo” de Donna Haraway,
assim como seus argumentos sobre conhecimento situado e suas implicações. Na interface entre o
científico, o tecnológico, o político e o humano de Karen Barad, introduzo o conceito de intra-ação,
no âmbito do realismo agencial, assim como o conceito de difração, proposto por Donna Haraway e
desenvolvido também por Karen Barad. Por fim, posiciono tais entendimentos como parte do viés
teórico de uma pesquisa de mestrado em psicologia social, na área de sexualidade, ainda em fase
inicial, sobre a produção de dores no BDSM (cujo acrônimo significa Bondage/Disciplina,
Dominação/Submissão e Sadismo/Masoquismo).
Palavras chave: Donna Haraway, Karen Barad, feminismo materialista, BDSM, dor.
ABSTRACT
The proposal of this work is to bring the perspective of two feminist authors within the scope of the
material turn and their possible contributions to research in the field of Humanities. It is important to
situate such a paradigm through the critiques to anthropocentrism as well as the division between the
discursive and material aspect of reality. Considering that some dualities (such as culture / nature,
mind / body, subjective / objective, rational / emotional) had already been challenged within the so-
called linguistic turn, this new perspective does not separate the matter from language. In this new
understanding, fundamental questions about ontology, epistemology, ethics, and politics take on new
shapes, bringing dilemmas about what is "real" and what arouses natural, human, and nonhuman
relations. I pay attention to Donna Haraway's "material-discursive" considerations, as well as her
arguments about situated knowledge and its implications. In the interface between scientific,
technological, political and human of Karen Barad, I introduce the concept of intra-action in the
scope of agential realism, as well as the concept of diffraction, proposed by Donna Haraway and
developed by Karen Barad as well. Finally, I place these understandings as part of the theoretical
research as gradute student in social psychology, in the area of sexuality, still in its initial stages,
about the production of pain in BDSM (whose acronym stands for Bondage / Discipline, Domination
/ Submission and Sadism /Masochism).
Keywords: Donna Haraway, Karen Barad, material feminism, BDSM, pain.
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
Talvez devido à sua centralidade no pensamento Sara Ahmed (2008) evidencia questões
modernista, os pós-modernos estão muito importantes que Judith Butler traz, destacando
desconfortáveis com o conceito de real ou o como as histórias se sedimentam no modo pelo
material. Enquanto que a epistemologia do qual o corpo se materializa, ganhando
modernismo está fundamentada no acesso entendimento nesse processo dinâmico de
objetivo ao mundo real/natural, os pós-
modernistas argumentam que o real/material é materialização. É uma compreensão do sexo
inteiramente constituído pela linguagem; que o conectada com a sedimentação das normas
que nós chamamos de real é um produto da corporais através do tempo, fazendo referência
linguagem e tem a sua realidade apenas na a Michel Foucault.
924
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
O diálogo com o autor é digno de atenção ou ocupar a categoria de Humano, o que tem
na medida que atenta para modo como o poder efeitos materiais reais. (Hird; Roberts, 2011)
regulador, muito mais que agir sobre um A discussão pode ser bem ilustrada na
sujeito pré-existente, delimita e forma o sujeito figura do ciborgue de Donna Haraway (2000).
no processo de sujeição que produz gênero, ou É um ser que transgride fronteiras, sendo
seja, tornar-se sujeito de uma regulação híbrido entre máquina e organismo, criatura de
equivale a ser assujeitado por ela. ficção ao mesmo tempo que assume realidade
Michel Foucault também é apontado como social. Feito ilusão de ótica, metáfora preferida
referência nos estudos feministas, tendo seus da autora, é ele mesmo uma ontologia:
conceitos e ideias retomados, desenvolvidos e realidade material condensada da imaginação e
criticados por diversas autoras, incluindo as comprometido com a parcialidade, a ironia e a
duas escolhidas para este trabalho. Karen parcialidade. Potência política estratégica, sua
Barad (2003), o referencia em suas mistura do orgânico e do técnico é inacabada
considerações sobre poder e linguagem, e com o propósito de provocar novos sentidos,
Donna Haraway (2000), amplia a noção ainda que não perca sua historicidade.
foucaultiana de biopolítica e implosão do A complexidade dessa figura coloca a
poder pela metáfora do ciborgue. descentralização da figura humana como
decisiva para a compreensão do mundo, sendo
uma das características comuns a produções
A matéria humana e não humana
desse paradigma, de modo que as
Conforme nos contam Myra Hird e Celia contribuições no campo científico estendem-se
Roberts (2011), historicamente a associação da para diversas áreas do conhecimento, indo
mulher com a natureza marcou o discurso desde a física, biologia e humanidades e tendo
patriarcal heteronormativo. Este discurso encadeamentos específicos em cada caso. Ao
primeiramente distanciou o homem da trazer entrelaçamentos disciplinas e
natureza, associando então a mulher com a desenvolver teorias que definem o humano, o
natureza. Em resposta, as feministas ocidentais não humano, o tecnológico e o natural como
desfizeram tal associação. O próprio processo agentes, as teorias que dão peso à
de exclusão instanciou, no entanto, a inevitável materialidade demonstram que os enfoques
relação entre sexo/gênero e natureza. Desde sobre interações entre a matéria humana e não
então estão presentes nessa discussão humana tem implicações capazes de aumentar
categorias do velho ocidente inauguradas por o alcance do lugar da mulher e de outros neste
Kant, que afirmam a superioridade humana mundo. (ALAIMO; HEKMAN, 2008).
sobre a natureza – uma manobra que é política,
Tais entrelaçamentos, que podem ser lidos
social e econômica. Por isso a importância de
como ‘emaranhamentos’ por Karen Barad,
delinear o humano e o não humano,
provocam sobre a relacionalidade como sendo
diferenciando-os. (Hird, Roberts, 2011)
imanente e intra-ativa, conceitos que explicarei
Em vários sentidos, a teoria feminista tem com mais profundidade no tópico adiante. Isso
lutado com a caída dessa manobra politica, significa dizer que o espaço e o tempo se
social e econômica desde então. E ainda que a reconfiguram conforme os fenômenos
descentralização do humano possa dar a continuamente ocorrem. Sendo assim, as
impressão da reiteração de uma nova fronteiras nunca são pré-existentes. Então a
dualidade, humanos e não humanos, o divisão se desfaz e refaz a cada instante, seres
argumento traz a proposta de uma humanos já fazem parte de fenômenos não
relacionalidade profunda. Por isso, reconhecer humanos: o humano emerge em relação ao
o traço de não humano em toda figuração do não-humano. (Barad, 2003)
humano também significa ser conhecedor da
Friso aqui que abordagem de Karen Barad,
exclusiva e excludente economia de discursos
que ousa transitar entre disciplinas como a
relacionando ao que significa ser, viver, atuar
física (campo no qual tem vasta trajetória,
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
o que é a mesma coisa, sua determinação final importantes para Judith Butler (enquanto
ou única do que pode contar como reiteração iterativa no processo de
conhecimento objetivo de um corpo biológico materialização dos corpos, aqui estendido
em uma conjuntura histórica particular. também à matéria não humana) e Michel
(Haraway, 1992) Foucault (à medida que mostra
implementações de poder diretamente
Há outras autoras vinculadas a virada
conectadas com o corpo, entre funções
cultural que também tem e comum a ampliação
corporais, processos fisiológicos, sensações e
do conceito de agência e poder para a natureza
prazeres, numa análise complexa em que
não humana. Mais que isso, entram na questão
aspectos históricos e biológicos se entrelaçam
das fronteiras materiais da interação entre
ao desenvolvimento de modernas tecnologias
humanos e não humanos, de modo que nenhum
de poder).
tipo de objeto, como corpos, máquinas e
mesmo os instrumentos que mediam as Na ontologia epistemológica do realismo
relações, pré-existem. Seguindo esse agencial há uma inseparabilidade ontológica.
raciocínio, o conceito de intra-ação é crucial no Do mesmo modo que tempo e espaço não são
entendimento do processo de materialização, anteriores aos fenômenos em suas
chamado de fenômeno por Karen Barad. Intra- reconfigurações iterativas intra-ativas em
ação se contrapõe ao conceito de interação por constante curso. A separação entre micro e
rejeitar que qualquer existência preceda as macro é, então, ilusória, ou, contingencial, por
relações que as constituem. É um termo que isso as críticas à sua teoria sobre o salto de
bagunça o senso de causalidade, que presume escala caem perante tal aspecto.
que indivíduos produzam ou sejam anteriores Em um relato realista agencial, é mais uma
a um efeito. Indivíduos materializam-se na vez possível reconhecer a natureza, o corpo e a
intra-ação. Isso não quer dizer que não existam materialidade na plenitude de seu devir, sem
anteriormente, mas que a existência não é recorrer à ótica da transparência ou da
previamente determinada. opacidade, às geometrias de exterioridade ou
Assim, é através das intra-ações agenciais interioridade absoluta e à teorização do
específicas que as fronteiras e propriedades de humano como causa pura ou efeito puro,
indivíduos internos ao fenômeno tornam-se permanecendo, ao mesmo tempo,
determinados e articulações materiais resolutamente responsável pelo papel que
particulares do mundo tornam-se inteligíveis. “nós” desempenhamos nas práticas
entrelaçadas de conhecer e se tornar.
Pode-se pensar que as forças materiais que
constituem a reiteração iterativa do “eu”, Fabíola Rohden (2018) utiliza as noções de
colocam em questão as forças políticas, e a Karen Barad no que se refere aos processos de
noção potente da ação das forças neoliberais. materialização, que produzem diferenças à
Tal leitura, quando borra fronteiras medida que produzem interferências sendo
disciplinares entre a filosofia e a física (numa constitutivos do próprio fenômeno nas práticas
leitura que a própria autora chama de discursivo-materiais. Ao seguir as redes
difrativa), seguindo o viés de Niehls Bohr, articuladas nas transformações corporais pelo
mostra a importância da noção de aparato para uso de recursos biomédicos, especialmente
os fenômenos. A materialidade do aparato é através de médicos/as e consumidores/as
constitutiva do fenômeno, sendo seu envolvidos em tratamentos hormonais, seguir
detalhamento importante. Por esse motivo os a perspectiva do realismo agencial confere a
conceitos são materialmente instanciados pelo possibilidade de uma perspectiva que
aparato e possuem configurações materiais privilegia os processos de materialização
específicas. Não se trata de uma mera simetria implicados na pesquisa. Tais processos
entre a matéria humana e não humana. É envolvem padrões de difração.
justamente nesse sentido que o entendimento A difração, nesse sentido, não registra onde
de performatividade, agência e poder são as diferenças aparecem, ao invés disso,
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assinala onde os efeitos dessas diferenças brevemente pelo acrônimo com os pares
aparecem. O termo é utilizado por Karen Bondage/ Disciplina, Dominação/ Submissão
Barad, tendo sido desenvolvido originalmente e Sadismo/ Masoquismo, é um pouco mais
por Donna Haraway, emprestado da ótica, complexo que isso, mas não pelos diferentes
criticando a noção de reflexão e refração, que entendimentos que as preocupações com
mapeiam o igual deslocado. Desse modo, saúde, sanidade e consensualidade possuem
colabora para um fazer científico que quebre o entre praticantes, ou pelos constantes debates
prisma representacionalista de reprodução, sobre os limites de representação dos perfis de
questionando a lógica da cópia em favor do bottoms, Tops e switchers17. Isso se deve ao
que possa multiplicar e proporcionar fato de que discussões fazem parte de um
articulações inusitadas. Desse modo, o social grupo específico, à parte de muitas pessoas que
e o científico podem se aproximar, numa vivenciam algo que poderia ser assim nomeado
relação de exterioridade interna. Ao invés da em suas intimidades sexuais, o que dificultaria
ilusão da fixidez e da essencialização, essa o acesso aos praticantes e a definição da sigla,
‘ótica’ sugere o treino de uma visão mais sutil. especialmente depois que um público bem
amplo começou a acessar a obra 50 Tons de
Cinza que recentemente fez sucesso, ao
[...] um fenômeno material-discursivo que contrário de outras tantas outras literaturas
desafia a suposta separabilidade inerente de
sujeito e objeto, natureza e cultura, fato e valor,
brasileiras e internacionais que permanecem
humano e não humano, orgânico e inorgânico, ainda não descobertas pela mesma quantidade
epistemologia e ontologia, materialidade e de pessoas (Eu, Dommenique, de Dommenique
discursividade. A difração marca os limites da Luxor, Tormentos Deliciosos e A Vênus de
determinação e permanência das fronteiras. Cetim, de Vilma Azevedo, 120 Dias de
(BARAD, 1997, p. 381):
Sodoma, do Marquês de Sade, A Vênus das
Peles, de Sacher Masoch, apenas para citar
São questões de relacionalidade e fronteiras algumas de uma lista bem maior). Em parte por
(performadas, mas não constitutivas) sobre as este motivo, mas também por anteriormente já
quais convergem e difratam Karen Barad e conhecer algumas comunidades de praticantes
Donna Haraway, em suas particularidades de que frequentam lugares específicos como
estudos. festas, reuniões e grupos em redes sociais,
optei por estes espaços comunitários para
executar minha pesquisa. Ali pretendo
viabilizar o estudo, consciente de que a
Conclusão – as contribuições de Karen convivência coletiva proporciona a
Barad e Donna Haraway para uma pesquisa possibilidade de observar as práticas
sobre dores no BDSM acontecendo, materializando-se, tornando-se
mais interessante para o objetivo de estudar a
produção da dor.
Para explicar sobre a contribuição das
referidas autoras da virada material para a Enfatizo que mesmo havendo uma
minha pesquisa, primeiramente, vou quantidade considerável de pesquisas
apresentar rapidamente o estudo que acadêmicas sobre BDSM18, o assunto ainda
proponho. BDSM, que costumo apresentar não teve abordagem que priorizasse os agentes
17
Top é a pessoa que controla a situação e bottom assumir uma ou outra posição, negociando conforme a
quem recebe e se submete, nesse contexto. São circunstância e pessoa.
expressões em inglês que oferecem a possibilidade de 18
não estabelecer a correlação com um gênero (na As pesquisas acadêmicas brasileiras sobre BDSM
linguagem) ou um par específico do acrônimo, como contam com Maria Filomena Gregori, Regina Facchini,
Bondagista, Dominador/a, submisso/a, Sádico/a, Jorge Leite Jr, Bruno Zili, Sarah Rosseti Machado,
masoquista, etc, relacionando somente quem está acima Fátima Almeida de Freitas e Marília Melo. Se
e abaixo na relação hierárquica. Tal diferença é ampliarmos para as universidades internacionais, a lista
reforçada através da escrita, com maiúscula para se alcança Gayle Rubin, Charles Moser, Robin Bauer,
referir a papéis que estão na posição de Top e minúscula Margot Weiss, Ariane Cruz e Staci Newmahr.
para papel de bottom. Switcher é a pessoa que pode
928
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
não humanos que performam o BDSM em sua que não podem ser consideradas
contínua materialização, e que tal perspectiva separadamente.
pode trazer uma nova visão a respeito do tema, A escolha de articular a pesquisa em diálogo
lembrando que a metáfora da visão, para com um viés feminista situa as (re)
Donna Haraway, inscreve o corpo em uma configurações de epistemologia, ontologia e
posição, de modo que a objetividade se torne ética na responsabilidade de um
habilmente corporificada. posicionamento responsável e ético.
Como sou adepta das práticas que compõem Acrescento que a escolha de falar sobre
o universo BDSM, meu engajamento é “dor” sugere uma possibilidade de diálogo
decisivo enquanto evidência da inevitável crítico com o saber biomédico, assim como a
parcialidade que toda pesquisador/a possui na proposta que Rodrigo Toniol (2010) realizou
produção do conhecimento, questão já na antropologia, mesmo apresentando um
discutida em Donna Haraway. Se por um lado escopo diferente, de uma dor que deve ser
há o reconhecimento como praticante nas diagnosticada e tratada e em cujo tratamento as
comunidades de adeptos do BDSM nas quais controvérsias mostram instabilidades
já interagi, esta proximidade com significativas para a pesquisa.
determinados saberes e prévia aceitação entre
praticantes, envolve desafios, como já ter Assim, somente na observação das práticas
saberes internalizados que necessitam um com uma visão que proponho ser difrativa,
grande esforço de detalhamento e explicação pode-se articular uma epistemologia que
no encadeamento da pesquisa. Estudar como considere a complexa dinâmica entre
podem ser produzidas as dores no âmbito do significado e matéria, permitindo uma
BDSM, enquanto prática sexual que merece investigação na qual as fronteiras entre as
reconhecimento no âmbito dos direitos categorias humano e não humano possam
sexuais, diz respeito a minha localização, a emergir e continuamente se (re) organizar e
agentes humanos e não humanos e situações (des)estabilizar.
REFERÊNCIAS
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FONTES, MÉTODOS E ABORDAGENS NAS CIÊNCIAS HUMANAS: paradigmas e perspectivas contemporâneas
Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
Culture and Society, Chicago, v. 28, n. 3, p. Karen Barad. Kvinder, Køn & Forskning, Vol.
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Intra-active Entanglements – an interview with
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Cap. 4- ESTUDOS DE GÊNERO: aportes teóricos, metodológicos e fontes de pesquisa
RESUMO
Independente de pertencer à adolescência ou não, esporadicamente surgem fenômenos sociais aos
quais algumas adolescentes aderem, como o funk, caracterizado pela irreverência e criticidade de suas
letras, sensualidade e erotismo de suas coreografias. Outro fenômeno social é o fato de algumas destas
adolescentes encontrarem-se fora do setor produtivo e da escola, conhecidas como “nem-nens".
Partindo da postura baseada na “lógica do se dar bem” comum entre jovens na sociedade
contemporânea pergunta-se até que ponto o funk seria uma manifestação cultural que contribui para
a compreensão desses comportamentos? O objetivo deste estudo é compreender os comportamentos
de adolescentes mulheres entre 14 e 19 anos, que aderem ao movimento Funk, provavelmente
diversos daqueles de suas mães e avós quanto a projetos de vida, valores pessoais, familiares e sociais.
Trata-se de uma pesquisa em andamento composta de multimetodos, envolvendo a metodologia
quantitativa e qualitativa, com a utilização de questionário do tipo Survey, utilizado em pesquisas em
Ciências Humanas e Sociais e a entrevista por pautas, que será inter-relacionada, versando sobre
questões de trabalho, aspirações profissionais, estudo, carreira, cursos superior ou profissionalizante,
também sobre o comportamento das adolescentes na atualidade, incluindo as relações familiares,
além da análise de letras de músicas, vídeos e documentários.
Palavras-chave: Adolescência feminina, Nem-nens, Funk, Manifestações socioculturais, Relações
familiares.
ABSTRACT
Regardless whether they belong to adolescence or not, social phenomenons sporadically emerge to
which some adolescents adhere, such as Funk, characterized by the irreverence and criticism of their
lyrics, sensuality and eroticism of their choreography. Another social phenomenon is the fact that
some of these adolescents find themselves outside both the productive sector and the school, known
as "neither-nor". Starting on the posture based on the "logic of doing well", common among young
people in contemporary society, we ask to what extent funk would be a cultural manifestation that
contributes to the understanding of these behaviors? The objective of this study is to understand the
females adolescent’s conduct between 14 and 19 years old who adhere to the Funk movement,
probably different from those of their mothers and grandmothers time about life projects, personal,
family and social values. This is a research that has been carried out for several months, involving
quantitative and qualitative methodology, using a Survey questionnaire, used in researches in Human
and Social Sciences and the interview by guidelines, which will be interrelated, dealing with questions
of work, professional aspirations, study, career, higher or vocational courses, as well as on
adolescents’ behavior nowadays, including family relations, besides the lyrics’ analysis of songs,
videos and documentaries.
Keywords: Female Adolescence, Neither-nor, Funk, Sociocultural manifestations, Family
relationships.
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19 O funk é um estilo musical que surgiu a partir da sincopado, a densa linha de baixo, uma seção de metais
música negra norte-americana no final da década de forte e rítmica, além de uma percussão (batida) marcante
1960. Na verdade, o funk originou-se a partir da soul e dançante. Disponível em:
music, tendo uma batida mais pronunciada e algumas <http://www.brasilescola.com/artes/funk.htm>. Acesso
influências do rock e da música psicodélica. De fato, as em: 21 nov. 2017.
características desse estilo musical são: ritmo
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brasileira, tendo em vista a imagem construída posse de um carro de luxo que trafega nas
socialmente em relação a ela e a imagem que grandes avenidas da cidade.
ela tem de si mesma. Assim, ao se pensar sob esta perspectiva, o
Ainda em acordo como os estudos de que inspira os moradores das periferias
Amorim (2009), no espaço discursivo do funk, brasileiras é a aspiração de ascender
a sexualidade e a sensualidade da mulher socialmente e ter acesso a bons serviços e a
recebem um tratamento específico, bastante uma vida confortável, haja vista a forma como
peculiar, inscrito no modo como ela se veste e se expressam em letras de música.
como expõe seu corpo, na coreografia que Prosseguindo em suas reflexões, Gombata
executa em bailes e shows, nos dizeres que (2013) acredita que a ostentação é uma forma
profere e nas posições discursivas que assume: agressiva do jovem sentir-se inserido numa
ora ela se apresenta como dominadora da cena sociedade de consumo preconceituosa, que dá
instaurada por meio da música e dita o que mais valor ao que a pessoa tem, do que ao que
espera de seu parceiro, ora se deixa dominar ela realmente é. Em sua opinião, esse estilo só
por ele. Esse jogo discursivo irá perder força na cultura artística depois de
(dominadora/dominada) induz a uma relação perder força na sociedade, uma vez que é,
conflituosa e, aparentemente, contraditória da sobretudo entre os jovens da periferia, segundo
mulher deste universo (AMORIM, 2009). informação da Revista Veja, publicada em
Uma vez constituído um panorama geral 25/04/2014, que ele (o funk) tem a ressonância
sobre como algumas de nossas adolescentes se de uma Marselhesa: um hino de cidadania e
expressam, pensou-se também na necessidade identidade para os jovens das classes C, D e E.
de que se explicitar o contexto social em que (VEJA, 2014)
se inserem. Para esta matéria, a pedido desta mesma
Gombata (2013), em sua coluna na revista revista, o Data Popular, instituto especializado
Carta Capital, aponta que um som um pouco em pesquisas de opinião nos estratos
menos crítico, que abre mão da crítica social, emergentes do país, apontou que em 2014 a
como é o caso do rap, cede terreno para as “comunidade funk” congregava 10 milhões de
letras e coreografias ousadas e acintosas que brasileiros com mais de 16 anos, a maioria
marcam o funk, ao mesmo tempo em que das classes C e D, sendo que 77% deles
enfrenta um patrulhamento ideológico que escutavam funk todos os dias e 50% iam a
reprime este tipo de baile em vias públicas. um baile funk pelo menos uma vez por mês.
Em meio a toda esta onda do estilo de música Esse público dividia-se quando perguntado
funk, uma de suas novidades foi o “funk sobre o sentido que a música tinha em sua vida:
ostentação”, que hoje já perdeu espaço para o 22% consideravam que o funk é apenas
“funk ousadia”20, e sua ligação com a nova diversão, um ritmo bom de dançar. Mas 26%
classe média brasileira, enfatizando que o acreditavam que os MCs convidam a ambições
orgulho da periferia encontra-se muito atrelado que não cabem na pista de dança: o funk seria,
ao consumo, haja vista na música na qual portanto, uma forma de superação.
MC21Guimê além da apologia ao país do Mais recentemente, uma pesquisa realizada
futebol, em um dos versos “De nave do ano, tô pela consultoria JLeiva Cultura & Esporte,
na passarela” faz uma explicita alusão à sua sobre “Cultura nas Capitais” com participação
do Datafolha (2017), ouviu 10.630 pessoas
20
Surgido em 2013, em suas letras, saem as 21
MC é um acrônimo de Mestre de Cerimônias, que
referências a uma vida luxuosa e entram trocadilhos se pronuncia "eme ci". Um MC pode ser um artista que
sexuais. É algo ao estilo 5ª série, com piadas com o tom atua no universo musical, ou pode ser
boboca típico da turma do fundão em canções batizadas o apresentador de um determinado evento que não
com nomes como Trampolim. Disponível em: esteja necessariamente ligado a uma manifestação
<http://vejasp.abril.com.br/materia/funk-ousadia- musical. Disponível em:
ostentacao-livinho-pedrinho-bin-laden> Acesso em 08 <www.significados.com.br/mc>. Acesso em: 09 Nov.
nov. 2018. 2018.
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com idade a partir de 12 anos, perguntando cultural juvenil como o funk, que traz à
sobre os gêneros musicais de sua preferência. reboque o conceito de empoderamento.
Essa pesquisa registrou que o sertanejo aparece Para Foucault (1994), o poder não se dá como
como o gênero musical de maior popularidade, algo rígido, não está num espaço pré-
mas o impressionante domínio do funk entre os determinado, mas funciona em rede de modo
adolescentes significa que, em poucos anos, o que seu exercício, por menor que seja,
funk pode assumir a liderança nacional. Na encontra apoio em outros pontos da rede,
faixa etária de 12 a 15 anos, o gênero é podendo se potencializar e potencializar outros
apontado como favorito por 55% dos poderes. Assim, a forma como os sujeitos
entrevistados. Entre os entrevistados com fazem suas escolhas não tem estreita relação
idades de 16 a 24 anos, o funk é citado por somente com a capacidade de participação,
28%. mas também com a distribuição do poder
Ao se pensar em modos de superação, o estilo nesses espaços.
funk constitui um espaço e um tempo nos quais Neste sentido é preciso recriar formas de se
esses jovens podem afirmar a experiência da lidar com o instituído se o objetivo for
condição juvenil. É por meio desses estilos que transformar relações de poder autoritárias em
constroem determinados modos de ser jovem. relações mais horizontais, e que levem ao
Nesta construção colocam em questão as empoderamento das pessoas, o que
imagens, ou certo “modelo” de juventude. demandaria tornar as relações mais flexíveis.
Uma primeira imagem que questionam é a Foucault vislumbra essa possibilidade, pois
juventude vista em sua dimensão de entende que uma relação de poder se articula
transitoriedade, o que pode suscitar uma sobre dois elementos que lhe são
questão de poder. indispensáveis. O primeiro relacionado ao fato
Sobre o tema do poder, Foucault assim se de que o outro (aquele sobre o qual a relação
expressa: de poder se exerce) seja inteiramente
reconhecido e mantido até o fim como sujeito
[...] parece-me que se deve compreender o poder, de ação, e o segundo, que se abra diante da
primeiro, como a multiplicidade de correlações relação de poder todo um campo de respostas,
de forças imanentes ao domínio onde se exercem
e constitutivas da sua organização; o jogo que,
reações, efeitos, invenções possíveis
através de lutas e afrontamentos incessantes as (FOUCAULT, 1995).
transforma, reforça, inverte; os apoios que tais
correlações de força encontram umas nas outras, Os variados fatores que desencadeiam o
formando cadeias ou sistemas ou ao contrário, as fenômeno
defasagens e contradições que as isolam entre si;
enfim, as estratégias em que se originam e cujo
São vários os motivos que levam os jovens a
esboço geral ou cristalização institucional toma não estudarem e nem a trabalharem. Uma das
corpo nos aparelhos estatais, na formulação da causas mais prováveis para que as adolescentes
lei, nas hegemonias sociais. (FOUCAULT, abandonem o estudo, e em decorrência sequer
1993a, p. 88-89). tenham condição de pleitear um emprego que
exija maior qualificação, deve ser a falta de
Como se pode observar, a questão do poder
alternativa ou estímulo do próprio governo
para Foucault vai além de tomá-lo
para tal situação. Faltam creches, por exemplo.
simplesmente como um conjunto de
Obviamente, diante deste quadro, as mulheres
instituições e aparelhos que garantem a
mais pobres acabam por ficar em casa,
sujeição dos cidadãos num determinado
sobrevivendo com o benefício do Programa
estado. Seus estudos abordam sobre como se
Bolsa Família.
estruturam as relações de poder entre as
Uma das hipóteses que tenta explicar o
pessoas ou grupos, de modo a se tornarem
abandono dos estudos e a consequente falta de
aceitas, requeridas e não contestáveis,
oportunidade no mercado de trabalho, no caso
contendo ao mesmo tempo a possibilidade de
das mulheres, ocorre ou porque as
que sejam tocadas e modificadas. Por este
adolescentes engravidam, ou porque tiveram
motivo, sua compreensão torna-se importante
de ficar cuidando da casa por motivos diversos.
ao se lidar com estas jovens, especialmente
quando esta provém de uma manifestação
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22
Jurista e criador do Movimento Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
#QueroUmBrasilÉtico. Diretor-presidente do Instituto Disponível em:
de Mediação Luiz Flávio Gomes. Doutor em Direito
Penal pela Faculdade de Direito da Universidade <https://professorlfg.jusbrasil.com.br/artigos/113727
Complutense de Madri. Mestre em Direito Penal pela 367/geracao-nem-nem-uma-bomba-relogio> Acesso
em 07 Nov. 2018.
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crônicos do desenvolvimento no Brasil, tende versaram, entre outras questões, sobre: a opção
a se acentuar, a não ser que haja uma virada de frequentar o funk, número de filhos, família,
drástica e imediata no sistema educacional, de apoio financeiro para frequentar o fluxo,
modo a atrair novamente essa massa de jovens escolarização, aspirações profissionais,
para os estudos e a especialização, fazendo-os atividades domésticas, e expectativas de
perceber que a educação pode significar um futuro. Nessas entrevistas investigou-se
futuro melhor. também o comportamento das adolescentes na
atualidade, incluindo as relações familiares. A
Enfim, não se pode esquecer de que, no
metodologia multimétodos também está sendo
Brasil, a modernização educacional que
complementada pela análise de letras de
influencia tanto a vida destes jovens não é
músicas, vídeos e documentários.
acompanhada de uma modernização social.
Assim, se a cultura se apresenta como um
espaço mais aberto, capaz de abraçar a “nem- Perfil das participantes e instrumentos
nens”, a funkeiros, e a “nem-nens” funkeiros, Adolescentes femininas, que se encontram na
é porque os outros espaços sociais estão faixa etária de 14 a 19 anos, com ou sem filhos,
fechados para eles. No entanto, procurou-se que não trabalham, não estudam, que se
não assumir uma postura ingênua de mobilizam ou não diante da questão do
supervalorização do mundo educacional e da trabalho doméstico, e ainda que sejam adeptas
cultura como apanágio para todos os do estilo musical “funk”.
problemas e desafios enfrentados por estes Foram aplicados 180 questionários
jovens. No contexto em que vivem, com a quantitativos e entrevistadas doze adolescentes
sabida desaceleração da economia nacional, qualitativamente, sendo que de início foram
qualquer instituição, por si só, seja a escola, o levantados seus dados sócio demográficos; sua
trabalho ou até mesmo aquelas atreladas à dinâmica familiar, levando-se em
cultura, pouco podem fazer se não estiverem consideração sua condição de membro familiar
acompanhadas de uma rede de sustentação
sem atividade produtiva, sem frequentar
mais ampla, com políticas públicas que nenhuma instituição escolar, e possuindo
garantam espaços e tempos para que os jovens filho(s). Por sua vez, no questionário, cada
possam se colocar, de fato, como sujeitos e participante respondeu a 15 questões fechadas
cidadãos, com direito a viver plenamente a versando sobre os mesmos temas.
juventude.
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a
Centro de Artes./UFPel,ursularsilva@gmail.com
b
Centro de Artes./UFPel,alecrins@uol.com.br
RESUMO
O projeto de pesquisa Caixa de Pandora: mulheres artistas e mulheres pensadoras surgiu em 2008,
junto ao Centro de Artes da UFPel, a partir da demanda das questões de gênero na universidade.
Desde sua origem o projeto conta com a participação de professores e alunos de vários cursos da
UFPel. O grupo tem suas pesquisas com foco interdisciplinar, envolvendo áreas das ciências
humanas, artes e ciências sociais aplicadas em torno do tema de gênero, da diversidade, das
invisibilidades de grupos sociais tradicionalmente colocados à margem, das transgressões e das
polifonias de expressão na contemporaneidade destes. Ao longo de dez anos o projeto Caixa de
Pandora tem produzido pesquisas, publicações e ações extensionistas para propagação destes estudos,
como o Simpósio Internacional Gênero, Arte e Memória, que é um encontro que tem trazido ao
Estado do RS profissionais nacionais e internacionais que são referência nesta temática. Além disso,
o evento tem possibilitado ampliar convênios, intercâmbios e pesquisa em gênero da UFPel com
instituições internacionais.
Palavras-Chaves: mulheres artistas, mulheres pensadoras, gênero
RÉSUMÉ
Le projet de recherche “Boîte de Pandore: les femmes artistes et les femmes penseurs” a surgi en
2008, au Centre des arts UFPel, de la demande des questions de genre à l'Université. Depuis son
origine, le projet compte avec la participation des enseignants et des étudiants de divers cours de
UFPel. Le groupe a ses travaux de recherche avec une focalisation interdisciplinaire, impliquant des
domaines des sciences humaines, des arts et de la science sociale appliqués autour du thème du genre,
de la diversité, de l'invisibilité des groupes sociaux traditionnellement placés en marge,
Transgressions et la polyphonie de l'expression à la simultanéité de ceux-ci. Au cours de dix ans, le
projet Boîte de Pandore a produit des recherches, des publications et des actions pour diffuser ces
études, telles que le Symposium International genre, art et mémoire, qui est une réunion qui a porté à
l'état du RS de professionnels qui sont références nationales et internationales dans ce thème. En
outre, l'événement a permis d'étendre les alliances, les échanges et la recherche sur le genre de l´UFPel
avec les institutions internationales.
Mots-clés: femmes artistes, femmes penseuses, genre.
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Figura 2. Hora do Chá de Nathália Grill, 2016. Figura 3. Revisitando a ceia de Judy Chicago,2016.
Fonte: Autoras Fonte: Autoras.
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para a brincadeira de fazer arte e sermos parte Arlinda Nunes, que rompeu com a tradição
da sua pesquisa nas poéticas do cotidiano acadêmica e impulsionou a arte na cidade,
(Figura 5). também se faz presente; em uma figuração que
remete a técnica que ela mesma nos ensinou.
Muitas artistas já foram selecionadas e vão
adentrar essa coleção, encartada em caixa box,
nossa Caixa de Pandora (Figura 6).
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os EUA após sua fuga da Alemanha nazista pensado e vivido, María Zambrano faz um
(Arendt era judia). Por criticar a tradição específico comentário desse autor e dessa
filosófica, Arendt prefere não ser chamada de forma introduz o foco de seu pensamento no
filósofa, assim, referimos à sua produção no meio mais convencional da filosofia. Quanto
campo da filosofia política como “o ao "El hombre y lo divino", ela faz traça um
pensamento político” de Hannah Arendt. O esboço da relação entre o que é humano e o que
primeiro objetivo foi o de destacar os é divino sob vários aspectos. Na esfera
principais conceitos do projeto político da histórica, Zambrano reconstitui a relação
autora, que com a publicação de seu primeiro mitológica entre homens e deuses,
trabalho acerca da política, em 1951, traz à luz característica da Grécia antiga, e pontua essa
novas questões, como uma política voltada relação no pensamento cristão, sobretudo no
para práxis e construída “dentro” e a partir do que diz respeito ao conceito de logos. A razão
contexto e não de forma idealizada, como poética é a condição de possibilidade, o
diriam os autores comunitaristas, aparato humano que possibilita o toque na
influenciados por ela, deve-se pensar a política divindade e a escuta da palavra sagrada.
“dentro da caverna” e não no eidos. A Outra pensadora sobre a qual
produção de Arendt pode-se dizer que é bem desenvolvemos estudos foi Edith Stein. Edith
ampla, como por exemplo: Origens do Stein (1891-1942) - filha de família judia, mas
totalitarismo (1951), A condição humana se tornou uma religiosa da Ordem Carmelita
(1958), Entre o passado e o futuro (1961), Descalça, com o nome de Teresa Benedita da
Responsabilidade e julgamento (1965 - 1975), Cruz, dedicou-se ao trabalho religioso de 1933
A dignidade da política (1946/1975), O que é a agosto de 1942, quando foi asfixiada, numa
política? (1950/1969). câmara de gás, no campo de concentração de
Os principais conceitos que estão sendo Auschwitz (Polônia). Pelo seu heroísmo
trabalhados são: totalitarismo, anti-semitismo, cristão, foi canonizada, em 1998, sob o nome
público e privado, natalidade, labor, trabalho, de Santa Teresa Benedita da Cruz. Foi
ação, pluralidade, a banalidade do mal, deveres proclamada co-padroeira da Europa por seu
morais, deveres políticos, responsabilidade, contributo cristão que outorgou não só à Igreja
dignidade, poder e violência, guerra, política e Católica, mas também por seu pensamento
liberdade. A partir do entendimento do que é a filosófico. Em 1916 Husserl a escolheu para
política em Arendt, que em termos gerais é a ser sua assistente de cadeira na Universidade
liberdade, própria razão de viver, significados de Freiburg e declarou que ela era a melhor
que a autora retoma da pólis grega, juntamente estudante de doutorado que tinha tido,
com o conceito de pluralidade (política inclusive foi mais capaz que Heidegger que
remetendo-se às diferenças), pode se trazer ao também foi seu assistente na mesma época.
debate problemas acerca da filosofia política Neste mesmo ano, defendeu sua tese e obteve
que nos são mais próximos, contextualizando- o Doutorado em Filosofia (O Problema da
os e discutindo-os. Empatia) com o grau de summa cum laude.
Além dela, a pensadora Maria Zambrano Neste trabalho Edith Stein define o Eu
despertou interesse nesta pesquisa por sua individual ou indivíduo, ou seja, o indivíduo
concepção de razão poética, que tenta ir além é um sujeito unitário, no qual a unidade da
da racionalidade objetiva da filosofia. consciência de um Eu e um corpo físico se
Zambrano (1904-1991) desenvolve em suas conjuga indissoluvelmente. Assim, cada um
obras a noção de “razão poética” a partir da desses dois elementos (corpo físico e
qual trata de diversos temas (violência e consciência) assume um caráter novo: o corpo
historia, pessoa e democracia, o sagrado e o se apresenta como corpo próprio, enquanto a
divino, os sonhos, poesia e filosofia, o exílio, consciência se apresenta como anima do
os gêneros literários, etc.). indivíduo unitário. A empatia é condição de
Na obra "El pensamiento vivo de Seneca", possibilidade da constituição do indivíduo
próprio e de sua relação com o Outro.
delimitando seu conceito de filosofia como
O fio condutor da atuação de Edith Stein, em
prática constante e coerente entre o que é dito,
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todos os âmbitos, seja com o pensamento seja egendra e evidencia. Trazemos as proposições
com a ação, parece ter sido a e rupturas encenadas pelas mulheres artistas
intersubjetividade, Einfühlung, a empatia, a porque implicam em outros modos de ver, de
comunhão com o outro, com o estranho, com o ver a nós mesmas, e de nos vermos refletidas
diferente. em nossas irmãs. Porque é preciso avançar e
construir uma história mais íntegra e cidadã.
Considerações
De forma expansiva e integradora o Grupo de REFERÊNCIAS
Pesquisa Caixa de Pandora vivencia
experiências e constrói conhecimentos acerca
do protagonismo feminino nas artes. É nossa [1] SCHMIDT, Rita T. A Ficção de Clarice.
intenção dar visibilidade para as mulheres Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 2003, 178.
artistas, filósofas e educadoras “silenciadas” [2] SCAVONE, Lucila - Estudos de gênero:
pela história, ou relegadas ao esquecimento. uma sociologia feminista?, out./2007.
Para além do “resgate” das trajetórias nos Disponível em:
interessa destacar os processos criativos, os http://www.scielo.br/pdf/ref/v16n1/a18v16n1.
desafios enfrentados, as práticas e os discursos pdf
que romperam com as representações
dominantes sobre a condição das mulheres ao [3] SCAVONE, op. cit., 2008, p.174.
longo do tempo. [4] BARBOSA, A. M. (org.) Inquietações e
Há muito a ser feito, são muitas as mudanças no ensino da arte. São Paulo:
representantes que merecem ser estudadas e Cortez, 2012, 89.
conhecidas. Somos herdeiras de suas
conquistas e graças a elas podemos avançar e
atuar profissionalmente em um campo, que, se
por um lado exaltou nossa imagem como
representação, por outro nos empurrou ao
anonimato, amadorismo ou artesania. Essa é
uma história plural, atravessada por juízos
religiosos, econômicos e políticos que resistem
e insistem na manutenção de posições
hegemônicas. Se conseguimos produzir certos
deslocamentos, também temos visto
retrocessos com efeitos agravantes sobre as já
tensas relações entre os sexos, entre os de
outra cor, outra etnia, outra cultura; enfim,
tudo aquilo que caracteriza o Outro.
Contudo, é o confronto com o diferente que
nos possibilita compreensão, rever posições e
reinventar outras relações com o mundo.
Enfrentar a problemática significa adotar
outros modos de pensar, menos restritivos e
mais inclusivos, fundamentados no princípio
da coletividade e no respeito aos direitos
humanos.
Como artistas, educadoras e pesquisadoras
temos que acionar o diálogo entre as partes,
percorrer as tensões e acolher os sentidos
múltiplos implicados nos processos, perceber
o contexto relacional e os intertícios que a Arte
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Cap. 5- MÍDIA, GAMES E CENÁRIOS DIGITAIS: suportes e fontes da pesquisa contemporânea
RESUMO
Este artigo tem por objetivo examinar os desafios da inserção dos documentos digitais como fontes de
pesquisas históricas, face às configurações e refigurações do contexto cultural. Sendo que, o conceito de
documento digital, utilizado neste trabalho abrange o nato digital (originalmente digital) e o digitalizado
(reprodução digital de documento analógico). Nesse sentido, entende-se o documento digital como fonte
intermediadora ativa na relação do historiador com os eventos passados. Além disso, tais desafios resultam
dos novos tipos de perguntas sobre o passado que implicam em novos tipos de fontes para suplementar as
pesquisas históricas, e que podem ser resumidos nos seguintes eixos: pouca discussão sobre fontes digitais, o
excesso de informação, o problema da instabilidade das tecnologias, a manipulação indiscriminada dos
documentos digitais, por fim, a publicação/divulgação de informações inverídicas. Portanto, serão expostas
algumas das considerações fundamentais para compreender esses desafios, dialogando brevemente com
autores que abordaram criticamente os aspectos da reflexão proposta.
Palavras chave: Documentos digitais, Fontes, Pesquisas Históricas.
ABSTRACT
This article aims to examine the challenges of inserting digital documents as sources of historical
research, in the face of cultural context configurations and refigurations. The concept of digital
document, used in this work, includes digital born (originally digital) and digitalized (digital
reproduction of analog document). In this sense, the digital document is understood as an active
intermediary source in the relation of the historian to past events. In addition, these challenges stem
from new types of questions about the past that imply new types of sources to supplement historical
research, and which can be summarized on the following axes: little discussion of digital sources,
excessive information, instability of technologies, the indiscriminate manipulation of digital
documents, and finally the publication / disclosure of untruthful information. Therefore, some of the
fundamental considerations will be exposed to understand these challenges, briefly discussing with
authors that critically approached the aspects of the proposed reflection.
Keywords: Digital Documents, Sources, Historical Research.
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Já por fontes históricas, conforme Barros, No Brasil, o uso das novas tecnologias pelos
compreende-se: “tudo aquilo que, produzido historiadores foi contemplado em
pelo homem ou trazendo vestígios de sua comunicações, palestras e oficinas, como as
interferência, pode nos proporcionar um oferecidas no I Simpósio Internacional de
acesso à compreensão do passado humano.”[5] História Pública , realizado na Universidade de
Por isso, são construções que expressam as São Paulo (USP), em 2012.
intenções de quem as produz, tanto de maneira Nesse mesmo ano, foi lançado o livro “Novos
consciente como inconscientemente. domínios da história”, que dedicou um
Assim, nem toda fonte histórica é digital ou capítulo completo ao diálogo entre a história e
pode ser digitalizada, por óbvio. Entretanto, a informática, escrito por Célia Cristina da
fontes digitais são um tipo de fonte histórica, Silva Tavares, no qual ela aborda que: “é
pois, também pode-se entender elas como: imprescindível saber se conduzir
minimamente nesse cipoal de informações
escritas, visuais e auditivas, oferecidas em
[...] a construção do historiador e suas abundância para todos, ou quase todos, nas
perguntas, sem deixar de lado a crítica
documental, pois questionar o documento não
práticas correntes do oficio do historiador ”.[8]
era apenas construir interpretações sobre Outro evento relevante, foi o I Congresso
eles, mas também conhecer sua origem, sua Internacional em Humanidades Digitais ,
relação com a sociedade que o produziu.[6]
realizado na Fundação Getulio Vargas, em
2018. Este, possibilitou a apresentação de
Sendo que, para os historiadores as fontes pesquisas e a reflexão, entre outros temas,
digitais apresentam inúmeras contribuições sobre o impacto das tecnologias de
como: facilidade de acesso, novas informação, das redes de comunicação e da
possibilidades de atuação, de reflexão, de digitalização de acervos e dos processos na
conhecimento, contato com maiores volumes vida cotidiana dos indivíduos e dos seus efeitos
documentais, entre outros. nas instituições e sociedades.
Por conseguinte, ultimamente, ocorre o Já nos encontros regionais de história,
desenvolvimento de trabalhos relacionados realizados pela Associação Nacional de
com a pesquisa histórica e a produção de História (ANPUH), foi possível perceber
documentos digitais, são artigos, também o destaque que o tema vem ganhando,
comunicações, livros, teses e dissertações, caso do simpósio temático “A história online:
entre outros, que trabalham principalmente produção e divulgação do conhecimento
com ensino de história e a pesquisa histórico na internet”, que teve lugar no XIX
historiográfica à luz das mídias digitais. Encontro Regional de História da
ANPUH/MG , na Universidade Federal de Juiz
Neste sentido, Vieira revela que este “fator de Fora (UFJF), em julho de 2014.
tem motivado a troca direta de experiências e
discussões dos problemas e vantagens Em nível internacional, o debate está
ocasionados por esta ferramenta dentro da concentrado na história digital e, nesse âmbito,
comunidade de estudiosos, abrindo um novo foi lançado, em 2006, por Daniel J.Cohen e
cenário de discussões sobre sua utilização ou Roy Rosenzweig, o livro intitulado “Digital
não no ofício do historiador” . [7] history: a guide to gathering, preserving, and
presenting the past on the Web”, onde eles
De acordo com Vieira, a não utilização se abordam que a ascensão da história digital é,
daria por consequencia dos seguintes em geral, percebida como a fase definida pela
problemas: a falta de materialidade do democratização da tecnologia de
documento digital como fonte; a dificuldade de computadores pessoais, aplicações de rede e o
preservação; suportes frágeis. E ele encerra desenvolvimento de software de fonte aberta.
dizendo que “caberá ao historiador decidir se Esse livro apresenta um olhar mais conceitual
ele irá utilizar a internet e sua documentação de como a era digital está afetando o campo da
digital como fonte de pesquisa”. história para estudiosos e estudantes, os quais
necessitam considerar seriamente alguns dos
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Sendo que, para uma análise completa, de que se fala, o a propósito de que é o discurso
depende-se do conhecimento de palavras- histórico”.[24]
chave ou acessar portais que podem não ser As colocações de Ricouer, ainda ,
facilmente discernidos pelos pesquisadores, possibilitam uma contribuição relativa a
visto que, uma narrativa on-line pode conter reflexão sobre as quatro maneiras de
imagens, áudio, vídeo e hiperlink, ou seja, essa interrogar: “quem fala? quem age? quem se
interatividade pode não estar disponível para narra? e quem é o sujeito moral da
todos os leitores, o que irá dificultar uma imputação?”, [25] as quais precisam ser
exploração e interpretação histórica, observadas durante a problematização da
ocasionando repercussões na transmissão do discussão sobre o trabalho historiográfico, no
conhecimento. qual ocorreram mobilidades, deslocamentos e
diásporas internas e externas, relativas a
A leitura feita em meio digital, diante da tela inserção dos documentos digitais.
(seja em um web site, artigo em um periódico ou
trecho de um livro digital), pode ser
Conforme relatam, Rolland e Bawden, “a
problemática, pois, geralmente, é descontínua e procedência manterá ou até aumentará sua
costuma engendrar uma fragmentação da própria importância, mas poderá ser cada vez mais
obra, documento ou meio através do qual são difícil de resolver: habilidades de arqueologia
veiculados. Leitura que muitas vezes é feita digital serão necessárias ”.[26]
apenas através da busca de palavras‐chave
específicas, que não atenta para a identidade e Além do mais, Bochi diz que “o que se
coerência textual daquilo que se está lendo. É de observa é que, em geral, o historiador se
fundamental importância que essas dimensões
apropria, de maneira acrítica, dos resultados
não sejam esquecidas pelo historiador que lê em
meio digital, sob o risco de que sua compreensão assim estabelecidos” e que “a sua passividade
do material analisado acabe sendo prejudicada ou ou mesmo a sua ingenuidade frente ao
fique incompleta.[22] processamento das informações pelas novas
tecnologias tem grave implicação na
metodologia e na epistemologia do
Nessa perspectiva, Luchesi relata que “a conhecimento que dali emana” .
durabilidade (baixa) seria o lado B da
flexibilidade que comentamos anteriormente. Essa manipulação dos documentos digitais
Ao mesmo tempo em que se tem uma possibilita, ainda, ao historiador, o
multiplicidade de mídias disponíveis, desenvolvimento de buscas automáticas em
caminha-se sobre o fio da navalha de uma meio aos grandes bancos de dados de textos,
perda incontornável de tudo”. [23] imagens, sons e filmes, mas também pode
agilizar operações de deformação dos dados,
Se manter o contexto de produção de uma problemas de qualidade e de autenticidade, o
fonte fornece evidência sobre as atividades e a que se configura como mais um desafio para
perspectiva de seu criador, bem como a sua utilização dos documentos digitais como
referencialidade e a garantia de sua posterior fontes das pesquisas históricas. Em
verificabilidade, o ato de intervir, como por conformidade com Luchesi, “ os meios, ainda
exemplo, a digitalização ou download, pode que não façam história por eles mesmos,
ocasionar a perda do mesmo e se configura condicionam a pesquisa e a comunicação
como mais um desafio para o historiador, visto histórica” . [27]
que, ocorrem muitos projetos de digitalização
sem conhecimento cientifico, ou seja, ainda
pouco conscientes da importância de se manter A memória, seja de uma nação ou uma pequena
o vínculo entre fontes e contextos para a comunidade, contribui para a constituição de sua
pesquisa histórica. identidade cultural e testemunha um passado que
representa uma etapa da sua vida social. A
De acordo com Ricouer, “seria essa perpetuação dessa etapa possibilitará mudanças,
referencialidade que permitiria separar o fato permitindo a evolução cultural contínua daquela
nação ou comunidade. [28]
enquanto a coisa dita, o que do discurso
histórico, do acontecimento enquanto a coisa
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Quando foi feito (data e período)? Por que foi Mas, não se trata, aqui, de ignorar, que os
feito (intenção)?[37] problemas de equívocos das informações
históricas são tão passíveis de acontecerem na
rede como em outros ambientes, como por
Isto posto, a crítica externa refere-se a análise
exemplo, um documento impresso pode ser
da forma do documento em si, ou seja,
falso. Sendo que, muitas incertezas estão
contempla a verificação da autenticidade, no
postas para o ofício do historiador, com as
sentido de determinar se é verdadeiro ou falso,
implicações da produção de fontes digitais
e, da proveniência do documento, analisando
cada vez mais hipertextuais, ou seja, cada dia
dados como local, autoria, data de produção,
se colocam mais impasses de ordem prática e
entre outros.
teórica.
Já, a crítica interna refere-se à interpretação
Nesse contexto, os resultados de este artigo
do conteúdo, como por exemplo, o que o autor
devem funcionar como um ponto de partida
queria transmitir e qual o contexto desse
para a discussão de métodos, pois, nessa
documento, entre outros. A crítica para o ofício
investigação inicial mostrou-se apenas
do historiador significa que não se deve confiar
algumas nuances dos desafios.
em qualquer evidência sem a comprovação da
sua veracidade. Visto que, na inserção dos documentos
digitais, como fontes nas pesquisas históricas,
Existem vários relatos de falsificação na
é possível abordagens computacionais que
história, na qual foram solucionados graças às
envolvem múltiplos tipos de análise,
habilidades e sensibilidades dos
inferências sutis, interpretação e interpolação.
pesquisadores, que colocaram à prova os
vestígios encontrados. As escritas, o tipo de Portanto, é necessário que os historiadores
papel, os suportes dos materiais utilizados, possam reconhecer esses desafios, para assim
dentre outros, são formas de identificação da desenvolver novas problematizações para os
autenticidade dos elementos encontrados. novos tipos de fontes.
Bloch complementa “a crítica do testemunho Os insights deste estudo, em última análise,
será sempre uma arte repleta de sutilezas, pretendem chamar a atenção dos historiadores,
porque funciona embasada em realidades os quais não devem subestimar o desafio na
psíquicas. No entanto, é também uma arte utilização de fontes digitais no
racional que repousa na prática metódica de desenvolvimento de pesquisas históricas.
algumas grandes operações da mente” .[38]
Então, além da realização da crítica externa e REFERÊNCIAS
interna, será necessário que os historiadores
aprimorem seus conhecimentos relativos a [1] NORA, Pierre. Entre a memória e a
possíveis soluções para utilização das fontes história: a problemática dos lugares. Projeto
digitais nas pesquisas históricas. História, PUC-SP, 1993, 21.
[2] ASSMANN, Aleida. Espaços da
recordação: formas e transformações da
Conclusões memória cultural. Campinas, SP: Editora da
Unicamp, 2011, 34.
A partir disso, salienta-se que, para a seleção
[3] HUYSSEN, Andreas. Culturas do
de fontes digitais ,deve-se ter alguns cuidados
passado-presente: modernismos, artes visuais,
como: analisar se o conteúdo corresponde a
políticas da memória. Rio de Janeiro:
uma fonte integral ou se foi retirado
Contraponto: Museus de Arte do Rio, 2014,
parcialmente de outra; testar as informações
16.
contidas com outras fontes; observar se possui
algum respaldo das informações em alguma [4] CONSELHO NACIONAL DE
instituição acadêmica, por exemplo na ARQUIVOS. Modelo de Requisitos para
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal Sistemas Informatizados de Gestão
de Nível Superior. Arquivística de Documentos: e-ARQ Brasil.
Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2011,16.
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b
/ Universidade Federal de Pelotas – maristaniz@hotmail.com
RESUMO
Este estudo analisa a possibilidade do professor, ao construir uma WebQuest, torne-se o protagonista
da própria formação continuada fomentando um perfil pesquisador. Essa metodologia de pesquisa
na Internet, voltada para o processo educacional, estimulando a pesquisa e o pensamento crítico,
requer recursos cognitivos do aluno para realizar atividades em nível de “conhecimento e
compreensão”. Para o professor é mais complexo. Além de saber e compreender, ele precisa guiar os
alunos na rede, tirando-os do modelo conteudista e incorporando as possibilidades que as tecnologias
digitais trazem. Devido à complexidade da construção deste instrumento, e a necessidade de pesquisa
para a sua elaboração, pensou-se na possibilidade de este se tornar um instrumento que desenvolverá
um perfil pesquisador. O objetivo é compreender como o professor trabalhará frente à construção de
uma WebQuest de acordo com o tema que ele proporá. Para essa compreensão, oferecer-se-á um
curso para um grupo de professores da rede Municipal de Pelotas. Para dar suporte à pesquisa, buscar-
se-á apoio em Selma Garrido, Morin, Lévy, Kenski entre outros. Portanto, se comprovado a eficiência
dessa metodologia na fomentação do perfil pesquisador do professor, poderá pensar-se concretamente
nesta recomendação.
Palavras Chaves: WebQuest. Formação continuada. Tecnologia
ABSTRACT
This study analyzes the possibility of the teacher, when constructing a WebQuest, become the
protagonist of the continuous formation itself, fomenting a researcher profile. This methodology of
research on the Internet, focused on the educational process, stimulating research and critical
thinking, requires the student's cognitive resources to perform activities at the level of "knowledge
and understanding". For the teacher is more complex. In addition to knowing and understanding, he
needs to guide the students in the network, taking them from the content model and incorporating the
possibilities that digital technologies bring. Due to the complexity of the construction of this
instrument, and the need for research for its elaboration, it was thought that it could become an
instrument that will develop a research profile. The objective is to understand how the teacher will
work in the construction of a WebQuest according to the theme he will propose. For this
understanding, a course will be offered for a group of teachers of the Pelotas Municipal network. To
support the research, support will be sought in Selma Garrido, Morin, Lévy, Kenski and others.
Therefore, if the efficiency of this methodology in the promotion of the researcher profile of the
teacher is proven, this recommendation can be concretely thought.
Keywords: WebQuest. Continuing education. Technology
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