Você está na página 1de 78

1

CURSOS DE GRADUAÇÃO – EAD

Filosofia nas Américas – Prof. Dr. Edson Renato Nardi

Olá! Meu nome é Edson Renato Nardi. Sou professor de Filosofia e educador físico, com Mestrado e
Doutorado em Educação pela Universidade do Estado de São Paulo, campus Araraquara. Atualmente,
sou coordenador da Graduação em Filosofia nas modalidades EaD e presencial do Claretiano – Centro
Universitário e do curso de Pós-Graduação em Ensino de Filosofia. Atuo, também, na rede pública de
ensino do estado de São Paulo, a cerca de 25 anos, nas disciplinas de Educação Física e Filosofia. Por
meio desta obra, espero poder contribuir com sua formação e instigá-lo a investigar, com profundi-
dade e de modo autônomo, os temas e filósofos aqui apresentados!

2
Edson Renato Nardi

Batatais

Claretiano

2018

3
© Ação Educacional Claretiana, 2018 – Batatais (SP)
Trabalho realizado pelo Claretiano – Centro Universitário

Cursos: Graduação
Disciplina: Filosofia nas Américas
Versão: fev./2018
(Original do Autor)

Reitor: Prof. Dr. Pe. Sérgio Ibanor Piva


Vice-Reitor: Prof. Dr. Pe. Cláudio Roberto Fontana Bastos
Pró-Reitor Administrativo: Pe. Luiz Claudemir Botteon
Pró-Reitor de Extensão e Ação Comunitária: Prof. Dr. Pe. Cláudio Roberto Fontana Bastos
Pró-Reitor Acadêmico: Prof. Ms. Luís Cláudio de Almeida

Coordenador Geral de EaD: Prof. Ms. Evandro Luís Ribeiro


Coordenador de Material Didático Mediacional: J. Alves
Corpo Técnico Editorial do Material Didático Mediacional

Preparação Revisão
Aline de Fátima Guedes Eduardo Henrique Marinheiro
Camila Maria Nardi Matos Filipi Andrade de Deus Silveira
Carolina de Andrade Baviera Rafael Antonio Morotti
Cátia Aparecida Ribeiro Rodrigo Ferreira Daverni
Elaine Aparecida de Lima Moraes Vanessa Vergani Machado
Josiane Marchiori Martins
Projeto gráfico, diagramação e capa
Lidiane Maria Magalini
Bruno do Carmo Bulgarelli
Luciana A. Mani Adami
Joice Cristina Micai
Luciana dos Santos Sançana de Melo
Lúcia Maria de Sousa Ferrão
Patrícia Alves Veronez Montera
Luis Antônio Guimarães Toloi
Raquel Baptista Meneses Frata
Raphael Fantacini de Oliveira
Simone Rodrigues de Oliveira
Tamires Botta Murakami
Videoaula
André Luís Menari Pereira
Bruna Giovanaz
Marilene Baviera
Renan de Omote Cardoso

Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução, a transmissão total ou parcial por qualquer forma e/ou qualquer meio (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia,
gravação e distribuição na web), ou o arquivamento em qualquer sistema de banco de dados sem a permissão por escrito do autor e da Ação Educacional Claretiana.

Claretiano - Centro Universitário


Rua Dom Bosco, 466 – Bairro: Castelo
Batatais/SP – CEP 14.300-000
cead@claretiano.edu.br
Fone: (16) 3660-1777 – Fax: (16) 3660-1780 – 0800 941 0006
www.claretianobt.com.br

4
SUMÁRIO
CONTEÚDO INTRODUTÓRIO ....................................................................................................................................... 7
1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................................ 10
2. GLOSSÁRIO DE CONCEITOS ................................................................................................................................... 12
3. ESQUEMA DOS CONCEITOS-CHAVE ...................................................................................................................... 13
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................................................................. 13

UNIDADE 1 – Filosofia Política nas Américas ............................................................................................................ 14


1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................................ 15
2. CONTEÚDO BÁSICO DE REFERÊNCIA .................................................................................................................... 15
2. 1. SOB O VÉU DA IGNORÂNCIA DE JON RAWLS ............................................................................................... 15
2. 2. O ESTADO MÍNIMO DE ROBERT NOZICK ...................................................................................................... 17
2. 3. A FILOSOFIA DA LIBERTAÇÃO DE LEOPOLDO ZEA ........................................................................................ 20
2. 4. AS VINTE TESES SOBRE A POLÍTICA DE ENRIQUE DUSSEL ............................................................................ 22
3. CONTEÚDO DIGITAL INTEGRADOR ....................................................................................................................... 25
3. 1. ANTECEDENTES DA FILOSOFIA POLÍTICA NORTE-AMERICANA .................................................................... 25
3. 2. ANARCOCAPITALISMO ................................................................................................................................. 25
3. 3. FILOSOFIA DA LIBERTAÇÃO .......................................................................................................................... 26
4. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS ............................................................................................................................. 26
5. CONSIDERAÇÕES ................................................................................................................................................... 29
6. E-REFERÊNCIAS ..................................................................................................................................................... 29
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................................................................. 30

UNIDADE 2 – Ética nas Américas .............................................................................................................................. 31


1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................................ 32
2. CONTEÚDO BÁSICO DE REFERÊNCIA .................................................................................................................... 32
2. 1. HENRY DAVID THOREAU .............................................................................................................................. 32
2. 2. AYN RAND E O EGOÍSMO ÉTICO ................................................................................................................... 35
2. 3. JOSÉ INGENIEROS E O HOMEM MEDIOCRE ................................................................................................. 37
2. 4. ALEJANDRO KORN ........................................................................................................................................ 40
3. CONTEÚDO DIGITAL INTEGRADOR ....................................................................................................................... 42
3. 1. DA DEFESA DA NATUREZA À DEFESA DOS ANIMAIS: A ÉTICA DE PETER SINGER ......................................... 42
3. 2. AS CRÍTICAS DE AYN RAND AO COLETIVISMO .............................................................................................. 42
3. 3. FILOSOFIA ARGENTINA ................................................................................................................................. 43
4. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS ............................................................................................................................. 43
5. CONSIDERAÇÕES ................................................................................................................................................... 45
6. E.REFERÊNCIAS...................................................................................................................................................... 45
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................................................................. 46

UNIDADE 3 – Epistemologia nas Américas ............................................................................................................... 47


1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................................ 48
2. CONTEÚDO BÁSICO DE REFERÊNCIA .................................................................................................................... 48
2. 1. A AUTOPOIESIS DE MATURANA E VARELLA ................................................................................................. 48
2. 2. MARIO BUNGE E A FILOSOFIA DA CIÊNCIA .................................................................................................. 52
2. 3. A HERMENÊUTICA ANALÓGICA DE MAURICIO BEUCHOT ............................................................................ 54
2. 4. O PRAGMATISMO DE CHARLES SANDER PEIRCE .......................................................................................... 56
3. CONTEÚDO DIGITAL INTEGRADOR ....................................................................................................................... 58
3. 1. A AUTOPOIESIS DE MATURANA E VARELLA ................................................................................................. 58
3. 2. A EPISTEMOLOGIA DE MARIO BUNGE ......................................................................................................... 59
3. 3. O PRAGMATISMO DE PEIRCE ....................................................................................................................... 59
4. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS ............................................................................................................................. 59
5. CONSIDERAÇÕES ................................................................................................................................................... 62
6. E-REFERÊNCIAS ..................................................................................................................................................... 62
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................................................................. 62

5
UNIDADE 4 – Paideia e Estética nas Américas .......................................................................................................... 63
1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................................ 64
2. CONTEÚDO BÁSICO DE REFERÊNCIA .................................................................................................................... 64
2. 1. PAULO FREIRE .............................................................................................................................................. 64
2. 2. A FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO DE JOHN DEWEY ............................................................................................. 67
2. 3. O SENSO DE BELEZA SEGUNDO GEORGE SANTAYANA ................................................................................ 70
2. 4. O CONCEITO DE ARTE DE ARTHUR DANTO .................................................................................................. 71
3. CONTEÚDO DIGITAL INTEGRADOR ....................................................................................................................... 73
3. 1. VIDA E IDEIAS DE PAULO FREIRE .................................................................................................................. 74
3. 2. AS CONTRIBUIÇÕES DE JOHN DEWEY .......................................................................................................... 74
3. 3. QUESTÕES SOBRE ARTE E BELEZA ................................................................................................................ 74
4. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS ............................................................................................................................. 74
5. CONSIDERAÇÕES ................................................................................................................................................... 77
6. E-REFERÊNCIAS ..................................................................................................................................................... 77
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................................................................. 78

6
CONTEÚDO INTRODUTÓRIO

Conteúdo
A Filosofia nas Américas: aproximações e diferenciações. A Filosofia na América do Norte: John Dewey; Jon Rawls; Charles
Sanders Pierce; Henry David Thoureau; George Santayana; Ayn Rand; Robert Nozick; Arthur Danto. A Filosofia na América Latina:
Paulo Freire, Enrique Dussel, Humberto Maturana, Leopoldo Zea, Mario Bunge, Alejandro Korn, Mauricio Beuchot, José Ingenieros.
.

Bibliografia Básica
FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. Disponível em:
<http://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/paulofreire/paulo_freire_pedagogia_do_oprimido.pdf>. Acesso em: 31/01/2018.
NOZICK, R. Anarquia, Estado e utopia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1991.
RAWLS, J. Uma teoria da justiça. Brasília: Ed. Universidade de Brasília, 1981. (Coleção Pensamento Político, n. 50).

Bibliografia Complementar
AMERICAN HISTORY. Transcendentalism, an american philosophy. Disponível em: <http://www.ushistory.org/us/26f.asp>. Acesso em:
22 jun. 2018
ARCHIE, L.; ARCHIE, J. G. Readings in the History of Aesthetics – an open-source reader. 2006. Disponível em:
<philosophy.lander.edu/intro/artbook.pdf>. Acesso em: 26 jun. 2018.
ATKINS, A. Charles Sanders Peirce: Pragmatism. Internet Encyclopedia of Philosophy. Disponível em:
https://www.iep.utm.edu/peircepr/. Acesso em: 25 jun. 2018.
BEUCHOT, M. Exposición sucinta de la Hermenéutica Analógica. Solar, Lima, n. 3, ano 3, p. 67-77, 2007.
BUNGE, M. Filosofías y fobosofías: parteras e institutrices, porteras y carceleras, engañadas y mercenarias, escapistas y ambivalentes.
Exégesis, Humacao, Porto Rico, p. 97-104, 2010. Disponível em: http://revistas.uigv.edu.pe/index.php/exegesis/article/view/158/167.
Acesso: 25 jun. 2018.
______. La ciencia: su método y su filosofia. Disponível em: <https://users.dcc.uchile.cl/~cgutierr/cursos/INV/bunge_ciencia.pdf>.
Acesso em: 25 jun. 2018.
CAFARO, P. Thoreau, Leopold, and Carson: toward an environmental virtue ethics. Environmental Ethics, v. 3, n. 1, p. 3-17, 2001.
DANTO, A. The artworld. The Journal of Philosophy, v. 61, n. 19, p. 571-584, 1964. Disponível em:
<HTTPS://IS.MUNI.CZ/EL/1421/JARO2014/IM088/DANTO__1_.PDF>. Acesso em: 26 jun. 2018.
DUSSEL, E. 20 tesis de Política. Mexico: Siglo XXI; Centro de Cooperación Regional para la Educación de Adultos en América Latina y
Caribe, 2006. Fonte: <http://enriquedussel.com/txt/Textos_Libros/56.20_Tesis_de_politica.pdf>. Acesso: 21 jun. 2018.
ENGLISH, A. John Dewey's Democracy and Education: questions for education today.In: ANNUAL CONFERENCE OF THE PHILOSOPHY
OF EDUCATION SOCIETY OF GREAT BRITAIN, Oxford, 2016. Disponível em: <http://www.philosophy-of-
education.org/dotAsset/a1445ae8-b10c-4de6-bd0d-f4329891c42a.pdf>. Acesso em: 26 jun. 2018.
FURTAK, R. A. Henry David Thoreau. The Stanford Encyclopedia of Philosophy. 2017. Disponível em:
<https://plato.stanford.edu/archives/fall2017/entries/thoreau/>. Acesso em: 22 jun. 2018.
GIROUX, H. Lessons from Paulo Freire. The Chronicle of Higher Education, 2010.

7
INGENIEROS, J. El hombre medíocre. 2000. Disponível em: <http://www.mediafire.com/file/7rucf7vir71u1ap/INGENIEROS-El-hombre-
mediocre.pdf>. Acesso em: 22 jun. 2018.
______. Hacia una moral sin dogmas. 2. ed. Buenos Aires: Talleres, 1919. Disponível em:
<https://archive.org/stream/haciaunamoralsin00inge/haciaunamoralsin00inge_djvu.txt>. Acesso em: 22 jun. 2018.
KANT, I. Crítica da Razão Prática. São Paulo: São Paulo: Edições e Publicações Brasil Editora S.A., 1959. Disponível em:
<https://www.marxists.org/portugues/kant/1788/mes/pratica.pdf>. Acesso: 21 jun. 2018.
KORN, A. La libertad criadora. Buenos Aires: Editorial Losada, 1944. Disponível em: <https://documentslide.org/the-philosophy-of-
money.html?utm_source=korn-la-libertad-creadora-pdf&utm_campaign=download>. Acesso em: 22 jun. 2018.
LIU, K. D. Conscientization and the cultivation of conscience. Tese (Doutorado em Filosofia da Educação) – University of Canterbury,
Christchurch, 2012. Disponível em:
<https://ir.canterbury.ac.nz/bitstream/handle/10092/7129/FinalcopyforConscientizationandtheCultivationofConscienceinaPDFforma
t.pdf?sequence=1>. Acesso em: 26 jun. 2018.
MAILHE, A. “El labirinto de la soledade” del genio, o las paradojas de El hombre medíocre. Varia historia, Belo Horizonte, v. 29 n. 49,
jan./abr. 2013. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-87752013000100010>. Acesso em: 22
jun. 2018.
MENDIETA, E. Philosophy of Liberation. 2016. Disponível em: <https://plato.stanford.edu/cgi-
bin/encyclopedia/archinfo.cgi?entry=liberation>. Acesso: 9 abr. 2018.
MORENO, I. La posibilidad de una teoría unificadora y el problema de la valoración del arte. Revista Actio, n. 16, p. 1-30, dez. 2014.
Disponível em: <http://www.academia.edu/9822233/Moreno_-
_La_posibilidad_de_una_teor%C3%ADa_unificadora_y_el_problema_de_la_valoraci%C3%B3n_del_arte>. Acesso em: 26 jun. 2018.
MORRESI, S. D. Robert Nozick e o liberalismo fora de esquadro. Lua Nova, São Paulo, v. 55-56, p. 285-296, 2002. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/ln/n55-56/a14n5556.pdf>. Acesso em: 21 jun. 2018.
MURRAY, D. Robert Nozick: Political Philosophy. Internet Encycolpedia of Philosophy. Disponível em: <http://www.iep.utm.edu/noz-
poli/#SH3a>. Acesso: 21 jun. 2018.
NERVI, J. R. José Ingenieros y las perspectivas filosóficas del Positivismo argentino. Praxis, n. 11, p. 145-149, 2007. Disponível em:
<http://www.redalyc.org/html/1531/153112899013/>. Acesso em: 22 jun. 2018.
RAND, A. A virtude do egoísmo. 2016. Disponível em: <http://lelivros.me/book/baixarlivro-a-virtude-do-egoismo-ayn-rand-em-pdf-
epub-e-mobi-ou-ler-online/>. Acesso em: 5 mar. 2018.
RAWLS, J. Justiça como eqüidade: uma reformulação. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
RICHARDSON, H. S. John Rawls (1921-2002). Internet Encycolpedia of Philosophy. Disponível em: <https://www.iep.utm.edu/rawls/>.
Acesso: 21 jun. 2018.
ROBERTS, P. Education, literacy, and humanization: exploring the work of Paulo Freire. London: Bergin & Garvey, 2000.
SANTAYANA, G. The life of reason. New York: Dover Publication, 1980. Disponível em:
<https://www.wikipremed.com/reading/philosophy/The_Life_of_Reason.pdf>. Acesso em: 26 jun. 2018.
______. The sense of beauty. 2008. Disponível em <https://www.gutenberg.org/files/26842/26842-h/26842-h.htm>. Acesso em: 26
jun. 2018.
SANTOS, V. R. O homem e sua circunstância: introdução à filosofia de Ortega y Gasset. Metavnoia, São João del-Rei, n. 1, p. 61-64, jul.
1998/1999. Disponível em: <https://www.ufsj.edu.br/portal-repositorio/File/revistalable/numero1/vilson6.pdf>. Acesso em: 10 abr.
2018.
SILVEIRA, C. O mundo e os mundos da arte de Arthur C. Danto: uma teoria filosófica em dois tempos. Ars, ano 12, n. 23, p. 52-79,
2014. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ars/v12n23/1678-5320-ars-12-23-00052.pdf>. Acesso em: 26 jun. 2018.
STATEUNIVERSITY.COM. Paulo Freire (1921–1997) – Conceptual tools, philosophy of education, criticism. Disponível em:
<http://education.stateuniversity.com/pages/1998/Freire-Paulo-1921-1997.html>. Acesso em: 26 jun. 2018.
THOMSON, K. J. M. The art museum at the end of art – Arthur C. Danto’s philosophy of art and its implications for the posthistorical
museum. Dissertação (Mestrado em Artes) – Queen´s University, Ontario, Canada, 1998. Disponível em:
<https://www.collectionscanada.gc.ca/obj/s4/f2/dsk2/tape15/PQDD_0010/MQ31259.pdf>. Acesso em: 26 jun. 2018.
THOREAU, H. D. Caminhada. São Paulo: Dracaena, 2011.
______. Walden ou A vida nos bosques. São Paulo: Ground, 2007.
TORRES, C. A. Education and archaeology of consciousness: Freire and Hegel. Educational Theory, v. 4, p. 429-445, 1994.
VALLENTYNE, P. Robert Nozick: Anarchy, State, and Utopia. In: SHAND, J. (Ed). Central Works of Philosophy: The Twentieth Century:
Quine and After. Chesham: Acumen Publishing Limited, 2006. Disponível em:
<https://danwin1210.me/uploads/F3thinker%20%21%20-
%20Tell%20ME%20the%20TRUTH%20%21./Central%20Works%20of%20Philosophy%205.pdf#page=109>. Acesso: 26 jan. 2018.
ZEA, L. A Filosofia latino-americana como Filosofia da Libertação. 1973. Disponível em: <https://mural-2.com/_files/200003973-
33b1934ab8/FilosofiaLatinoamericana-Leopoldo%20Zea.pdf>. Acesso em: 21 jun. 2018.
______. En torno a una filosofia americana. 2003. Disponível em: <http://www.biblioteca.org.ar/libros/1294.pdf>. Acessoem: 21 jun.
2018.

8
Palavras-chave _________________________________________________________________
Filosofia nas Américas, Filosofia norte-americana, Filosofia na América Latina
_______________________________________________________________________________

É importante saber: ______________________________________________________________


Esta obra está dividida, para fins didáticos, em duas partes:
Conteúdo Básico de Referência (CBR): é o referencial teórico e prático que deverá ser assimilado para aquisição das
competências, habilidades e atitudes necessárias à prática profissional. Portanto, no CBR, estão condensados os princi-
pais conceitos, os princípios, os postulados, as teses, as regras, os procedimentos e o fundamento ontológico (o que é?) e
etiológico (qual sua origem?) referentes a um campo de saber.
Conteúdo Digital Integrador (CDI): são conteúdos preexistentes, previamente selecionados nas Bibliotecas Virtuais
Universitárias conveniadas ou disponibilizados em sites acadêmicos confiáveis. São chamados “Conteúdo Digital Integra-
dor” porque são imprescindíveis para o aprofundamento do Conteúdo Básico de Referência. Juntos, não apenas privile-
giam a convergência de mídias (vídeos complementares) e a leitura de "navegação" (hipertexto), como também garantem
a abrangência, a densidade e a profundidade dos temas estudados. Portanto, são conteúdos de estudo obrigatórios, para
efeito de avaliação.
_______________________________________________________________________________

9
1. INTRODUÇÃO
A possibilidade da criação desta obra se mostrou necessária tão logo se começou a aventar a
criação do Bacharelado em Filosofia no Claretiano – Centro Universitário. Essa necessidade se mani-
festava, sobretudo, devido à estruturação das disciplinas já existentes na modalidade Licenciatura e
que seriam também contempladas no Bacharelado e a algumas particularidades político-filosóficas
que existiam naquele momento em nosso país e no mundo.
Especificamente, quanto às disciplinas já existentes na Licenciatura, foi possível perceber que,
em sua organização curricular, a seleção de filósofos e suas respectivas filosofias prestigiavam por
demais a produção filosófica europeia e, mais especificamente, a Filosofia Continental; e por sua
vez, havia poucas referências às produções filosóficas realizadas nas Américas e, tampouco, à Filoso-
fia Analítica produzida aqui e seus desdobramentos posteriores.
Dessa constatação, resguardada a importância das produções filosóficas oriundas do velho
continente, consideramos necessário investigar as produções filosóficas realizadas na América em
suas mais variadas áreas, a originalidade dos temas produzidos e como estes poderiam suprir as
lacunas já apontadas, de modo a ampliar o leque de referenciais filosóficos para a formação ade-
quada do bacharel em Filosofia.
No que tange ao segundo aspecto, das particularidades político-filosóficas do momento, hou-
ve uma polarização político-ideológica em nosso país e no mundo, vivenciada no momento em que
se iniciou a produção desta obra e que, em nossa análise, se mostrava danosa tanto para o fomento
da cultura e da pesquisa quanto para a Filosofia.
Essa polarização política gerou posicionamentos radicais, quer seja de grupos autoproclama-
dos representantes da esquerda, quer seja de outros grupos que faziam também uma autoprocla-
mação como representantes do pensamento político da direita. Tal fenômeno ocasionou a demoni-
zação de qualquer produção cultural ou filosófica que não se encaixasse nas opções políticas de de-
terminados grupos.
Desse modo, se o interlocutor adotasse um posicionamento político à direita, ficava definiti-
vamente proibida a leitura de filósofos tais como Karl Marx, Michel Foucault, Antonio Gramsci e
outros tantos filósofos que representassem a ideologia “nefasta” da esquerda. Em contrapartida, se
o indivíduo adotasse posicionamento político à esquerda, seria considerado nonsense ou eventual
falta de capacidade intelectual todo aquele que ousasse fazer uso dos argumentos de Friedrich Au-
gust von Hayek, Robert Nozick e outros tantos filósofos que colocassem em xeque os cânones e pa-
radigmas que sustentam o pensamento da esquerda.
Com isso, a exclusão a priori do contraditório, da ideia divergente, além de expurgar o exercí-
cio da autocrítica, elemento essencial do fazer filosófico, provocava também o surgimento de atitu-
des dogmáticas, intransigentes e, muitas vezes, avessas à busca do rigor e da isenção necessários ao
espírito investigativo filosófico.
Mais ainda, em meados de 2016, aparecia também no cenário mundial o conceito de pós-
verdade (post-truth), conceito utilizado para se referir a posicionamentos adotados por indivíduos
quando os fatos objetivos são menos influentes na formação da opinião pública do que argumentos
que atraiam a emoção e a crença pessoal.
Com isso, encontrávamo-nos em um ambiente tóxico para o exercício filosófico, visto que essa
radicalização política começou a produzir indivíduos avessos a teorias filosóficas que viessem a
questionar o posicionamento político/cultural que o indivíduo adotava e, por sua vez, a investigação
rigorosa e comprometida com o levantamento de perguntas foi substituída pelo apelo à emoção,
que, muitas vezes, ocasionava, inclusive, a abdicação da reflexão cuidadosa pelo uso contumaz de
palavrões, impropérios e ameaças.

10
Em tal condição, como bem o sabemos, a partir das reflexões sobre esse tema realizadas em
momentos anteriores, se o indivíduo já possui uma visão paradigmática cristalizada do mundo, pos-
sui certezas em detrimento de dúvidas ou, ainda, troca o exercício árduo da construção racional
pela catarse emocional reincidente, encontramo-nos em um cenário potencialmente danoso à Filo-
sofia e a outras áreas do conhecimento que se fundamentam no rigor e na investigação.
Nesse contexto, ao aventar a possibilidade de construção desta obra, frente a esse momento
em que nos encontrávamos, adveio a necessidade da opção pela apresentação do pluralismo de
ideias, pela apresentação de posicionamentos filosóficos conflitantes, de modo a suscitar em você a
necessidade de perceber que, na Filosofia, o estabelecimento prévio de uma verdade incontestável
é condição certa para o enfraquecimento e, até mesmo, o fim da Filosofia.
Confessamos que o posicionamento adotado nesta se inspira em um artigo produzido pelo fi-
losofo inglês Bertrand Russel, publicado no ano de 1951 no jornal The New York Times. Nele o filóso-
fo buscou apresentar uma proposta de atitude/ação frente ao fanatismo e que foi sintetizado por
meio da construção de um decálogo que tomamos a liberdade de reproduzir na íntegra:
Talvez a essência da perspectiva liberal possa ser resumida em um novo decálogo, não destinado a substituir
o antigo, mas apenas a complementá-lo. Os Dez Mandamentos que, como professor, eu gostaria de promul-
gar, podem ser apresentados da seguinte forma: não fique absolutamente certo de nada. Não pense que
vale a pena prosseguir ocultando evidências, pois a evidência certamente virá à luz. Nunca tente desencora-
jar o pensamento para você ter certeza de ter sucesso. Quando você se encontra com a oposição, mesmo
que seja do seu marido ou de seus filhos, esforce-se por vencê-lo por meio de argumentos e não por autori-
dade, pois uma vitória dependente da autoridade é irreal e ilusória. Não respeite a autoridade dos outros,
pois sempre há autoridades contrárias a serem encontradas. Não use o poder para suprimir as opiniões que
você acha perniciosas, pois, se você o fizer, as opiniões o suprimirão. Não tenha medo de ser excêntrico em
opinião, pois todas as opiniões agora aceitas já foram excêntricas. Encontre mais prazer na dissidência inteli-
gente do que no acordo passivo, pois, se você valorizar a inteligência como deveria, o primeiro implica um
acordo mais profundo do que o último. Seja escrupulosamente verdadeiro, mesmo que a verdade seja in-
conveniente, pois é mais inconveniente tentar esconder isso. Não sinta inveja da felicidade daqueles que vi-
vem no paraíso dos tolos, pois só um idiota pensará que é felicidade (RUSSEL, 2009, p. 533-534, tradução
nossa).

Há de se dizer que Russel, dada a sua conduta autocrítica tal exposta na citação, criou inimigos
de ambos os lados do radicalismo político e intelectual, ora recebendo adjetivos nada elogiosos por
ser considerado de esquerda ou, devido a alguns de seus posicionamentos liberais, recebendo ata-
ques semelhantes de movimentos da esquerda.
Com o exposto até este momento, estabelecemos que já existem condições suficientes para
avançarmos nesta introdução e tratarmos do modelo escolhido para sistematizar a organização des-
ta obra. O primeiro aspecto a ser esclarecido é que este material não tem por pretensão investigar
aspectos históricos das escolas filosóficas existentes nas Américas e suas particularidades específi-
cas. Consideramos que esse tema – mesmo sendo, sem dúvidas, relevante –, devido às restrições
editoriais existentes, não poderia ser contemplado, mas isso certamente não o impedirá de realizar
essa investigação.
Em vez disso, optei por uma organização temática dos filósofos a serem abordados. É certo
que sempre faltará este ou aquele pensador que, em sua opinião, poderia ser contemplado nesta
obra; no entanto, ressaltamos que buscamos selecionar filósofos das correntes mais variadas e,
também, áreas diversas da Filosofia, de modo a poder lhe apresentar um panorama múltiplo das
contribuições filosóficas realizadas.

11
2. GLOSSÁRIO DE CONCEITOS
O Glossário de Conceitos permite uma consulta rápida e precisa das definições conceituais,
possibilitando um bom domínio dos termos técnico-científicos utilizados na área de conhecimento
dos temas tratados.
1) Autopoiesis: neologismo proposto em 1971 pelos biólogos chilenos Humberto
Maturana e Francisco Varela para designar a organização dos sistemas vivos. Uma
breve descrição seria dizer que a autopoiesis é a condição de existência dos seres vivos
na produção contínua de si mesmos.
2) Egoísmo ético: o sistema moral em que uma ação é moralmente necessária se
promove as melhores consequências para o agente.
3) Filosofia da Libertação: conjunto de propostas filosóficas originadas na América Latina
que buscam apresentar uma filosofia própria fundamentada na circunstância específica
dos povos latinos e que busca libertar-se de fundamentos filosóficos e ideologias
colonizadoras.
4) Fobosofia: ódio ou medo ao saber e ao ato de conhecer.
5) Historicismo: termo que possui inúmeras interpretações e, especificamente nesta
obra, representa o conjunto de ideias que afirma que cada período da história tem
suas próprias crenças e valores, inaplicáveis a qualquer outro, de modo que nada possa
ser entendido independentemente de seu contexto histórico.
6) Libertarianismo: filosofia política cujos fundamentos se baseiam no princípio da não
agressão, defendendo que as pessoas devam ter a permissão de viver e fazer suas
próprias escolhas sem a interferência do governo ou de outros, desde que essas
escolhas não envolvam o início do uso de força ou fraude contra outros. Grosso modo,
poderia ser sintetizada no dito: “sê livre e deixe viver”.
7) Minarquismo: caracteriza-se por manifestar uma filosofia política que defende a
redução das funções do governo para um escopo mínimo, fornecendo às pessoas
apenas serviços básicos, como lei e segurança. É considerado uma forma de
libertarianismo, porque encontra algum papel útil para o Estado. Os minarquistas
defendem que o estado funcione como night-watchman state, que, literalmente, seria
um Estado “guarda noturno" e que não seria responsável por educação, assistência
médica, emprego ou transporte de seus cidadãos, tampouco pelo uso dos recursos
naturais em seu território. Todos esses itens citados seriam mantidos em particular ou
publicamente, mas nunca seriam suscetíveis de sofrer qualquer interferência do
Estado, sua lei ou seus representantes.
8) Ontogenese: termo oriundo do grego (“ontos”: ser, “gênese”: origem), utilizado para
descrever o processo em que um organismo evolui por meio das alterações biológicas
que ocorrem em um indivíduo, iniciando-se em seu nascimento e indo até o seu
desenvolvimento final. Esse conceito se contrapõe ao de filogênese (“filos”: raça
“gênese”: origem), porque, enquanto o conceito de ontogênese refere-se a indivíduo,
o de filogênese refere-se a raça/espécie.
9) Pragmatismo: movimento filosófico que inclui aqueles que afirmam que uma ideologia
ou proposição é verdadeira se funcionar satisfatoriamente, que o significado de uma
proposição deve ser encontrado nas consequências práticas de aceitá-la, e que ideias
não práticas devem ser rejeitadas.
10) Teologia da Libertação: proposta de cunho teológico cristão que teve como principais
representantes intelectuais e religiosos oriundos da Igreja Católica na América Latina

12
em meados da década de 50. Dentre alguns de seus principais representantes,
destacam-se Leonardo Boff no Brasil, Gustavo Gutiérrez no Peru e Juan Luis Segundo
no Uruguai. De modo geral, essa teoria busca defender a relevância da libertação do
oprimido e, consequentemente, esse posicionamento ficou marcado como sendo uma
opção pelos pobres.

3. ESQUEMA DOS CONCEITOS-CHAVE


O Esquema a seguir possibilita uma visão geral dos conceitos mais importantes deste estudo.

Figura 1 Esquema dos Conceitos-chave de Filosofia nas Américas.

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
RUSSEL, B. Autobiography. Londres: Routledge Classics, 2009.

13
UNIDADE 1

Objetivo
 Apresentar algumas das principais contribuições filosóficas das Américas no tocante à Filosofia Política.

Conteúdos
 O Anarcocapitalismo de Robert Nozick.
 John Rawls e o Véu da Ignorância.
 Leopoldo Zea e a Filosofia da Libertação.
 Enrique Dussel e as vinte teses sobre a Política.

Orientações para o estudo da unidade


Antes de iniciar o estudo desta unidade, leia as orientações a seguir:
1) Para que você possa ter uma trajetória de sucesso ao longo dessa disciplina. Apresento abaixo alguns aspectos
centrais que deverão compor seu plano de estudos:
 Verifique quais são os conteúdos presentes nesta unidade de que você deverá se apropriar ao longo de seu período
de estudos.
 Estabeleça um cronograma de estudos para cada um dos tópicos previstos, considerando o tempo de que fará uso
para ler os textos propostos e as pesquisas extras que se tornarem necessárias.
 Após ter lido os conteúdos propostos, faça uma revisão do que foi lido.
 Caso detecte algum problema ou dificuldade em algum assunto, solicite ajuda/esclarecimento de seu tutor ou do
setor administrativo.
 Após ter realizado os procedimentos anteriores, faça uma revisão da unidade e realize anotações a respeito dos
temas e conceitos centrais apresentados na obra.

14
Unidade 1 – Filosofia Política nas Américas

1. INTRODUÇÃO
Nesta primeira unidade, elegemos como tema central a Política, devido aos desafios contem-
porâneos que temos no tocante a esse tema, quer sejam em nosso país, quer em outras nações, e à
necessidade de ampliarmos as possibilidades de leitura dos fenômenos políticos.
Para isso, optamos por apresentar dois ilustres representantes da filosofia norte-americana,
os filósofos Jon Rawls e Robert Nozick. O primeiro sacudiu as reflexões sobre esse tema ao produzir
uma teoria que trouxe elementos inusuais sobre o fenômeno político baseados essencialmente no
contratualismo. Já Nozick também inova ao colocar o indivíduo no centro da discussão política e
destacar a importância de repensarmos a necessidade e os limites do Estado.
Optamos também por trazer à baila dois grandes filósofos latino-americanos, o argentino En-
rique Dussel e o mexicano Leopoldo Zea. Ambos inauguram a chamada Filosofia da Libertação, mo-
vimento filosófico que buscou trazer uma autêntica filosofia latino-americana libertada das amarras
de fundamentos filosóficos oriundos de outras culturas e, notadamente, da cultura europeia.
Com essas escolhas, esperamos apresentar a você abordagens distintas e relevantes que mos-
tram formas diferentes de se pensar o Estado e a necessidade de que produzamos uma filosofia que
se fundamente na realidade em que se encontra inserida.
_______________________________________________________________________________
Antes de iniciarmos de fato nosso estudo pelos filósofos americanos, recomendamos que você
acesse o Tópico 3.1, que contém indicações de textos dedicados às ideias e filosofias americanas
anteriores ao século 20. Eles certamente servirão para contextualizar os estudos que se seguirão.
_______________________________________________________________________________

2. CONTEÚDO BÁSICO DE REFERÊNCIA


O Conteúdo Básico de Referência apresenta, de forma sucinta, os temas abordados nesta uni-
dade. Para sua compreensão integral, é necessário o aprofundamento pelo estudo do Conteúdo
Digital Integrador.

2. 1. SOB O VÉU DA IGNORÂNCIA DE JON RAWLS


Começaremos agora a nossa caminhada e, inicialmente, convidamos você a analisar as pro-
postas políticas do filósofo norte americano Jon Rawls, considerado por alguns autores o autor mais
importante de Filosofia Política no século 20 (RICHARDSON, 2018).

Figura 1 Jon Rawls.

15
Unidade 1 – Filosofia Política nas Américas

Inicialmente, convém situar o filósofo em relação à corrente político-filosófica originária que


forneceu elementos para sua proposta e, neste caso, ela é a chamada corrente contratualista.
E o que seria essa corrente? Vejamos, a seguir, uma definição sintética a esse respeito propos-
ta por Nicola Abbagnano:
Doutrina que reconhece como origem ou fundamento do Estado (ou, em geral, da comunidade civil) uma
convenção ou estipulação (contrato) entre seus membros. [...] Hoje, com o uso que as ciências e a filosofia
fazem de conceitos como convenção, acordo, compromisso, a noção de contrato talvez pudesse ser retoma-
da para a análise da estrutura das comunidades humanas, com base na noção da reciprocidade de compro-
missos e do caráter condicional dos acordos dos quais se originam direitos e deveres (ABBAGNANO, 2007, p.
205-206).

Ainda que existam referências a essa interpretação da sociedade política na Filosofia clássica
grega, é no período moderno e, mais especificamente, com os filósofos contratualistas John Locke,
Thomas Hobbes e Jean-Jacques Rousseau, que o contratualismo adquire os contornos que temos na
atualidade. Rawls se insere nesse rol de pensadores ao estabelecer também que o Estado surge de
modo a favorecer a melhor relação entre os homens.
As principais ideias propostas por Rawls foram apresentadas em sua grande obra Uma teoria
da justiça (1971), a qual se tornou referência nas discussões contemporâneas sobre a existência do
Estado e sua função.
O primeiro aspecto a salientar é a definição de Rawls a respeito da justiça. Costumeiramente,
consideramos que a justiça deve se basear na igualdade, ou seja, deve-se tratar de modo idêntico as
pessoas, no entanto, na equidade, as pessoas são vistas como diferentes – logo, algumas necessitam
de mais que outras.
Para Rawls, o Estado deve se pautar por esse princípio de justiça, porque, na medida em que
temos uma sociedade justa, teremos, consequentemente, uma sociedade equitativa.
Para que isso ocorra, o filósofo propõe que se estabeleça uma justiça distributiva, na qual
ocorreria uma distribuição justa de bens sociais primários, tais como riquezas, liberdade, oportuni-
dades, autorrespeito etc. Vejamos como o filósofo se manifesta a respeito desse princípio:
(a) cada pessoa tem o mesmo direito irrevogável a um esquema plenamente adequado de direitos e de li-
berdades básicas iguais, que seja compatível com o mesmo esquema de liberdades para todos; e (b) as desi-
gualdades sociais e econômicas devem satisfazer duas condições: primeiro, devem estar vinculadas a cargos
e a posições acessíveis a todos, em condições de igualdade equitativa de oportunidades, e, segundo, têm de
beneficiar ao máximo os membros menos favorecidos da sociedade (o princípio de diferença) (RAWLS, 2003,
p. 60).

Subjacente a esse princípio, vejamos como outros princípios (alguns deles já apontados no
texto anterior) se manifestam:
 Princípio da liberdade:
Na teoria da justiça como eqüidade, as liberdades básicas iguais para todos são as mesmas para cada cida-
dão; e a questão relativa à maneira pela qual se pode compensar uma liberdade menor não se apresenta
(RAWLS, 2003, p. 117).

 Princípio da diferença:
O segundo princípio insiste que cada pessoa se beneficie das desigualdades permissíveis na estrutura básica.
Isso significa que cada homem representativo definido por essa estrutura, quando a observa como um em-
preendimento em curso, deve achar razoável preferir as suas perspectivas atuais às suas perspectivas sem
ela (RAWLS, 2003, p. 69)
Note que também se encontra também imiscuído na argumentação de Rawls um terceiro
princípio:
 Igualdade de oportunidades:

16
Unidade 1 – Filosofia Política nas Américas

Em todos os setores da sociedade, deveria haver, de forma geral, iguais oportunidades de cultura e de reali-
zação para todos os que são dotados e motivados de forma semelhante. As expectativas daqueles com as
mesmas habilidades e aspirações não devem ser afetadas por sua classe social (RAWLS, 2003, p. 77)

Quando da existência de conflito entre esses princípios, o princípio da igualdade deve ser con-
siderado primeiramente e, logo depois, a igualdade de oportunidades deve anteceder o princípio da
diferença.
Quanto ao princípio de diferença, esta poderia ser alcançada por meio da taxação dos indiví-
duos por meio de impostos e, com dela, seria possível realizar uma redistribuição da riqueza – no
entanto, essa taxação não poderia ser excessiva e, tampouco, muito pequena. No primeiro caso, os
menos favorecidos seriam penalizados e, no segundo, não haveria condições para a ascensão dos
desfavorecidos.
No entanto, para o filósofo, a adesão a essa sociedade justa e a respectiva aplicação desses
princípios não se faria de modo fácil. Isso porque temos uma propensão a agir em nome de nossos
interesses e habilidades. Em razão de tal condição, Rawls inova ao trazer à baila o conceito de véu
da ignorância, como mecanismo que permite a adesão do indivíduo a essa sociedade.
Nessa condição, caberia aos indivíduos estabelecer as regras básicas da sociedade, no entanto,
ao realizar essa escolha, os indivíduos não saberiam quais seriam os talentos/habilidades que pos-
suiriam e, tampouco, qual seria a sua posição social nessa mesma sociedade.
Diante dessa condição, seria possível estabelecer uma sociedade justa, nos moldes da propos-
ta produzida por Rawls, posto que todos deveriam viver por meio da escolha que realizaram.
Desse modo, a sociedade justa se dá por meio da decisão racional de indivíduos que possuem
interesses próprios; no entanto, todas as pessoas adeririam a essa sociedade por meio do uso do
véu de ignorância. Assim se manifesta o filósofo a esse respeito:
A ideia da posição original consiste em estabelecer um procedimento equitativo, de modo que sejam justos
quaisquer que venham a ser os princípios acordados. O objetivo é usar a noção de pura justiça processual
como uma base da teoria – de algum modo precisamos anular os efeitos das contingências específicas que
embaraçam os seres humanos e os tentam a explorar circunstâncias sociais e naturais em vantagem própria.
Então, a fim de fazê-lo, presumo que as partes se situem atrás de um véu de ignorância. Não sabem como as
várias alternativas afetarão seu caso particular e são obrigadas a avaliar os princípios tão só a base de consi-
derações gerais (RAWLS, 1981, p. 119).

Note que, com esse posicionamento, Rawls se insere no contratualismo apontado logo no iní-
cio, visto que, ao realizarmos um contrato social, decidimos a estrutura básica da sociedade, nos
apresentamos como seres racionais capazes de realizar escolhas e é necessário que essas escolhas
ocorram por meio da adoção do véu de ignorância. Esse procedimento é chamado por Rawls de po-
sição original na qual são estabelecidos os alicerces da sociedade justa.
Dessa posição original inicia-se uma proposta de ação distributiva de renda, segundo a qual
cabe ao Estado distribuir de modo equitativo a renda auferida pelos indivíduos.
Por fim, é digno de nota que essa ênfase dada pelo filósofo no direito à igualdade insere o
pensador no que intitulamos de pensamento liberal à esquerda, porque é marca distintiva desse
pensamento a ênfase na igualdade em detrimento da ênfase na liberdade.

2. 2. O ESTADO MÍNIMO DE ROBERT NOZICK


Trataremos agora de um dos filósofos citados em nossa introdução, o filósofo político Robert
Nozick. Conforme havia sido apontado anteriormente, esse filósofo tem trazido para si uma legião
de admiradores e, em contrapartida, uma legião de inimigos, porque sua filosofia aponta uma nova
possibilidade de estruturação política, a qual recebeu o nome de minarquismo.
Antes de nos dedicarmos a esse conceito, vejamos um pouco de sua trajetória/proposta:

17
Unidade 1 – Filosofia Política nas Américas

Figura 2 Robert Nozick.

Filosofia Moderna________________________________________________________________
Antes de prosseguirmos, é importante destacar que o chamado período moderno na Filosofia se refere às filosofias que
difundidas no século 18 e que tiveram como elemento catalisador o Iluminismo e a crença na razão humana como guia
para a melhoria da sociedade
_______________________________________________________________________________
A obra que rende notoriedade o autor e que expõe a originalidade de sua filosofia é Anarquia,
Estado e Utopia, publicada em 1972. De modo geral, nessa obra o pensador realiza uma defesa do
capitalismo, adota um posicionamento contrário às ideias do também filósofo americano Jon Rawls
e defende a existência de um Estado mínimo. Vejamos uma síntese das ideias centrais dessa obra e
que foi proposta por Vallentyne:
No núcleo do livro de Nozick estão dois argumentos. Um deles é que um Estado vigia noturno (que proteja
apenas contra violência, roubo, fraude e violação de contrato) pode ser legítimo, mesmo sem o consenti-
mento de todos aqueles a serem governados. O outro é que nada mais extenso do que o Estado vigia notur-
no é legítimo, exceto com o consentimento de todos (VALLENTYNE, 2006, p. 86, tradução nossa).

Comecemos então pela metáfora utilizada por Vallentyne ao se referir ao Estado como uma
espécie de “vigia noturno”. Como sabemos, aquele que exerce essa função atua no término do dia,
de modo a evitar que se cometa algum delito e, se os indivíduos se portarem adequadamente, cabe
a eles seguir com sua vida.
Ao defender a existência desse Estado mínimo, essas posições adotadas por Nozick se diferen-
ciam de outra corrente contemporânea: o anarcocapitalismo, corrente que advoga a eliminação
completa do Estado.
Vejamos no texto do próprio filósofo como ele se posiciona a esse respeito:
Nossa principal conclusão sobre o Estado é que um Estado mínimo, limitado às funções restritas de proteção
contra a força, o roubo, a fraude, de fiscalização do cumprimento de contratos e assim por diante justifica-se;
que o Estado mais amplo violará os direitos das pessoas de não serem forçadas a fazer certas coisas, e que
não se justifica; e que o Estado mínimo é tanto inspirador quanto certo. Duas implicações dignas de nota são
que o Estado não pode usar sua máquina coercitiva para obrigar certos cidadãos a ajudarem a outros ou para
proibir atividades a pessoas que desejam realizá-las para seu próprio bem ou proteção (NOZICK, 1991, p. 10).

Do trecho citado, destaca-se a ênfase nos direitos individuais da pessoa humana e a defesa da
individualidade e sua respectiva liberdade. Subjacente a esse posicionamento, há a marca indelével
de Kant e seu célebre imperativo categórico “de que o homem (e com ele todo o ser racional) seja
um fim em si mesmo” (KANT, 1959, p. 101). Há também no texto citado uma referência à impossibi-
lidade do Estado obrigar as pessoas a ajudar outras e esse posicionamento será analisado mais à
frente, quando formos analisar a discordância do pensador frente à teoria da justiça de Jon Rawls.
A partir desses posicionamentos políticos, Nozick passou a ser considerado um filosofo que
compõe o rol daqueles que defenderiam o libertarianismo. Nesse grupo, inserem-se os filósofos

18
Unidade 1 – Filosofia Política nas Américas

políticos que advogam a defesa da propriedade, da liberdade e da vida como um elemento central a
ser levado em conta nas organizações políticas.
Libertarianismo e seus posicionamentos ____________________________________________
O libertarianismo propõe uma série de posicionamentos frente a temas contundentes que vivemos na sociedade, tendo
como pressuposto o direito à liberdade. Veja a seguir alguns desses posicionamentos:
1) Aborto: nenhum governo tem legitimidade para dispender fundos públicos, fornecendo ou proibindo o aborto.
2) Oração nas escolas públicas: o governo não deve interferir na realização de orações nas escolas públicas
3) Controle de armas: as pessoas têm o direito de manter e carregar armas. Oposição ao julgamento de indivíduos
pelo exercício de seus direitos de autodefesa.
Oposição a todas as leis, em qualquer nível de governo, que requeiram registro, restrição ou transferência ou
venda de armas de fogo ou munições.
4) Censura: deve haver a liberdade da livre expressão.
5) Ações afirmativas: não acreditando na tese de discriminação, não deve haver as ações afirmativas.
6) Pena de morte: a máxima realização do poder do Estado, deve ser abolida.
7) Legalização das drogas: o uso de drogas deve ser descriminalizado porque não está prejudicando ninguém
além do usuário, sendo uma escolha pessoal.
8) Eutanasia: se é consenso entre médico e paciente, deve ser permitida.
9) Violência na mídia: deve ser permitida visto que sua proibição fere a liberdade de expressão.
10) Casamento homossexual: deve ser permitido, o governo não deve intervir.
11) Jogo: deve ser permitido, visto que é uma decisão do indivíduo apostar ou não.
12) Imigração: deve ser permitida, as políticas de imigração são interferência do governo.
_______________________________________________________________________________
Para contextualizar o significado desse conceito e sua relação histórica com outros filósofos,
cumpre informar que é nas produções do filósofo inglês John Locke e, mais propriamente no seu
direito a propriedade, que se apresenta a pedra angular desse posicionamento político. Vejamos o
texto emblemático que Locke produziu sobre esse tema:
Embora a terra e todas as criaturas inferiores sejam comuns a todos os homens, cada homem tem uma pro-
priedade em sua própria pessoa; a esta ninguém tem qualquer direito senão ele mesmo. O trabalho de seu
corpo e a obra das suas mãos, pode dizer-se, são propriedades dele. Seja o que for que ele retire do estado
em que a natureza lhe forneceu e no qual o deixou, fica-lhe misturado ao próprio trabalho, juntando-se-lhe a
algo que lhe pertence, e, por isso mesmo, tornando-o propriedade dele. Retirando-o do estado comum em
que a natureza o colocou, anexou-lhe por esse trabalho algo que exclui do direito comum de outros homens.
Desde que esse trabalho é propriedade exclusiva do trabalhador, nenhum outro homem pode ter direito ao
que se juntou, pelo menos quando houver bastante e igualmente de boa qualidade em comum para tercei-
ros (LOCKE, 1973, p. 27).

Tendo como ponto de partida essa defesa da propriedade e as justificativas morais que a am-
param, o libertarianista estabelece a liberdade do indivíduo como preponderante na organização da
sociedade e, assim, a manifestação do governo deve ser mínima, voltada tão somente à existência
de um exército que defenda sua nação, de um corpo policial que defenda os indivíduos da violência
e de tribunais que impeçam abusos frente às liberdades individuais.
Note-se que essa ênfase no direito à liberdade insere o pensador no que intitulamos de pen-
samento liberal à direita, sendo marca distintiva desse pensamento a ênfase na liberdade em de-
trimento da ênfase na igualdade.
A partir do exposto, cumpre agora nos dedicarmos a analisar a afirmação apresentada logo no
início do texto, a respeito da discordância de Nozick frente ao contratualismo proposto por John
Rawls.

A divergência existente entre Nozick e Rawls


De imediato, é possível afirmar que a primeira grande divergência que Nozick apresenta frente
a Jon Rawls refere-se à hierarquia de direitos. Como vimos, na proposta de Rawls, está presente a

19
Unidade 1 – Filosofia Política nas Américas

ideia de justiça como igualdade/equidade e, em Nozick, o direito à propriedade e liberdade compõe


o seu ideário de justiça.
Desse modo, Nozick considera que o direito à liberdade deve permitir ao seu portador decidir
se quer ou não ajudar outra pessoa, essa decisão deve ser pessoal, sem qualquer tipo de coerção
estatal, quer ela seja por meio de impostos ou campanhas.
Desse posicionamento depreende-se que, se algum empresário desejar contribuir de algum
modo, ele poderá fazê-lo; no entanto, não deveria ser obrigado a tanto.
Outra divergência marcante refere-se ao contratualismo de Jon Rawls. Nozick discorda dessa
noção de contrato e introduz em sua obra o conceito de mão invisível:
Seu ponto de partida ainda era um estado de natureza (tal como era para Locke, Hobbes e Rousseau), en-
tendida como a condição em que as pessoas se encontram quando nenhuma autoridade política existe. No-
zick começou com a questão de saber se existem métodos de administração eficiente da justiça no estado da
natureza. Uma de suas contribuições originais para o debate sobre essa questão foi oferecer uma descrição
de como esse método poderia surgir. Na verdade, Nozick pensou que o método inevitavelmente resultará na
criação de um Estado, apesar do fato de que ninguém pretende criar um. Isso é conhecido como uma justifi-
cação de mão invisível do Estado. Nozick propôs que os indivíduos, simplesmente por meio de sua busca pela
melhoria de suas próprias condições, realizarão ações que levem a um Estado mínimo. Novamente, esse re-
sultado vem sem que ninguém pretenda achar (ou talvez até conceber) um. Além disso, e talvez mais impor-
tante, Nozick argumentou que tal conclusão poderia ser alcançada sem violação dos direitos de propriedade
de ninguém (MURRAY, 2018, tradução nossa).

Cabe ressaltar que Nozick realiza uma crítica a modelos de Estado que, em sua análise, são pa-
ternalistas: “são aqueles em que a distribuição das explorações é considerada apenas quando existe
algum propósito ou objetivo alcançado” (MURRAY, 2018, tradução nossa).
Contrapondo-se a esse modelo, propõe um modelo retributivo que ficou muito conhecido
como Nozick/Chamberlain:
Nozick convida-nos a propor um esquema D0 que consideremos justo (nosso padrão de justiça, por exemplo:
a cada um segundo seu trabalho, ou a cada pessoa a mesma renda, a cada qual segundo suas necessidades).
Neste mundo hipotético existe um excelente jogador de basquete, Wilt Chamberlain, que assina um contrato
com seu clube, de acordo com o qual 25 centavos de cada ingresso vendido nas partidas locais vão parar di-
retamente em seu bolso. As pessoas podem escolher ver uma partida de basquete, comprar caramelos ou
comprar uma revista... Suponhamos que voluntariamente um milhão de pessoas decidam assistir à primeira
partida local onde Wilt Chamberlain exibirá seus dotes; então, Wilt Chamberlain é agora (D1) 250 mil dólares
mais rico por vontade dos pagantes. Agora, se supúnhamos que D0 era justa e, consequentemente, aceita-
mos que as pessoas tinham direito a dispor de suas porções em D0, e não havendo engano, chantagem ou
roubo em meio ao processo descrito, resulta que D1 também é justa (MORRESI, 2002, p. 292).

Com o exposto, esperamos ter demonstrado o quanto dois pensadores (tidos tipicamente co-
mo pensadores liberais) possuem propostas sólidas e interessantes a respeito de como devem-se
organizar o Estado e a sociedade e, além disso, o profundo contraste existente entre ambos os posi-
cionamentos.
_______________________________________________________________________________
Antes de prosseguir para o próximo tópico, recomendamos que você consulte o Tópico 3.2, e
acesse o texto e o vídeo indicados, que ampliarão seu conhecimento sobre o anarcocapitalismo.
_______________________________________________________________________________

2. 3. A FILOSOFIA DA LIBERTAÇÃO DE LEOPOLDO ZEA


Veremos agora uma faceta da Filosofia Política que demarcou histórica e filosoficamente al-
gumas abordagens próprias e originais sobre esse tema ocorridas na América Latina e que permitiu
afirmar que houve uma contribuição original para a Filosofia. Estamos nos referindo ao movimento
filosófico intitulado como Filosofia da Libertação. Especificamente nesta obra, trataremos de dois

20
Unidade 1 – Filosofia Política nas Américas

dos grandes representantes desse movimento: o filósofo mexicano Leopoldo Zea e o filósofo argen-
tino Enrique Dussel. Antes de iniciarmos uma análise a respeito desses filósofos, convém que apre-
sentemos a você uma definição geral do significado dado ao conceito de Filosofia da Libertação:
A Filosofia da Libertação visa pensar o distinto caráter histórico mundial da América Latina, usando o que se
afirma serem recursos intelectuais autóctones, a partir de uma situação de dependência econômica, cultural
e política. Tem um objetivo prático: libertação. Em termos muito gerais, a filosofia da libertação se define
como um discurso contra-filosófico, seja como crítica ao colonialismo, imperialismo, globalização, racismo e
sexismo, que é articulado a partir da experiência de exploração, destituição, alienação e reificação, em nome
dos projetos de libertação, autonomia e autenticidade. Ou seja, a filosofia da libertação se apresenta como
uma “ruptura epistêmica” que visa criticar e desafiar não apenas pressupostos e temas básicos da filosofia
euro-americana, mas também tornar a filosofia mais responsável pela situação sociopolítica em que sempre
se encontra. [...] A Filosofia da Libertação é, portanto, entre outras coisas, uma visão sobre o que conta como
Filosofia e como ela deve ser buscada (MENDIETA, 2016, tradução nossa).

Após essa conceituação, vejamos agora como se realiza essa proposta por meio do filósofo
mexicano Leopoldo Zea. Esse filósofo, ainda segundo Mendieta, iniciou essa abordagem quando, na
década de 60 do século passado, iniciou um debate com o também filósofo Salazar Bondy a respeito
da possibilidade da existência de uma Filosofia na América Latina.

Figura 3 Leopoldo Zea Aguilar.

O primeiro aspecto que apresentamos é a ênfase que Zea apresenta quanto à importância da
História. Segundo o filósofo, a História necessariamente precisa de conceitos para se manifestar e,
por sua vez, a Filosofia necessariamente se origina a partir de um certo contexto histórico:
Em outras palavras, cada história possui sua própria filosofia, seu esquema conceitual próprio, e de modo in-
verso, cada filosofia tem uma história, ou seja, uma realidade que é particular em si. A intepretação histórica
é essencial para um entendimento das causas subjacentes a formação de concepções filosóficas (LIPP, 1980,
p. 63, tradução nossa).

A partir dessa concepção, Zea se inserirá na Filosofia da Libertação com uma abordagem que
os especialistas intitularão de abordagem historicista, ou seja, há a ênfase na História de cada povo
na formação de seu pensamento filosófico e, com isso, há de se investigar a respectiva história des-
sas ideias. Um conceito-chave que Zea oferece é o que intitula de circunstância, ou seja, cada povo
possui sua própria história, que lhe apresenta desafios específicos que o torna único e, na medida
em que faz uso de outras filosofias, cujas circunstâncias são diferentes, nunca conseguirá realizar
adequadamente uma adequação das ideias à realidade, porque, ao fazê-lo, “se coloca um traje que
não lhe acomoda” (ZEA, 2003, p. 2, tradução nossa).
Há que se dizer que essa abordagem historicista e a ênfase na circunstância nas ideias de Leo-
poldo Zea provavelmente adveio do trabalho do filósofo espanhol Ortega y Gasset. É possível notar

21
Unidade 1 – Filosofia Política nas Américas

a similaridade do posicionamento de ambos os pensadores por meio de uma síntese das ideias de
Ortega y Gasset sobre esse tema e que foi produzida por Santos:
Em Ortega, portanto, o homem não vive separado do espaço-tempo em que se situa. No "Eu sou eu e minha
circunstância", o ser, situado no espaço-tempo, circundado de coisas, faz-se e se define, tomando-os como
partes constitutivas de si. Portanto, no fulcro da ontologia orteguiana do homem, encontramos um modo de
ser essencialmente devedor do seu espaço e de seu tempo. Assim, para pensar o ser do homem, Ortega su-
gere que comecemos pela realidade mesma que o envolve (SANTOS, 1998-1999, p. 63).

Para Zea, incorremos em um grande erro ao tentarmos tomar a História das ideias europeias
como nossa e fazermos uso dos valores europeus na América Latina. Em tal circunstância, ocorre em
nós um sentimento de inferioridade, visto que nossa particularidade histórico-filosófica é diferente
e não damos a ela o seu devido valor. Ainda que sejamos herdeiros dessa cultura europeia, criamos
a partir dela nossa cultura própria e ela deve ser valorizada.
Além disso, ainda segundo Zea, devemos fazer uso da filosofia para lidar com os problemas
que nos são próprios, oriundos de nossas circunstância e somente nós seremos capazes de resolvê-
los (ZEA, 1973, p. 4).
Disso se depreende que, para o filósofo, a Filosofia Moderna, de origem europeia, não seria
capaz de lidar adequadamente com os problemas que são eminentemente nossos e, como tal, seria
inautêntica, visto que “não nasce das nossas necessidades” (ZEA, 1973, p. 5).
Há, diante disso, o desafio da criação de uma Filosofia da Libertação, filosofia essa que não
troque tão somente os dominadores, mas que possa abolir o dominador e o dominado, ou seja, uma
filosofia que, para Zea, seja analógica, capaz de perceber no outro uma semelhança; mais ainda,
afirma que essa nova filosofia não deve ser uma filosofia especial:
[...] que acabe sendo como as filosofias anteriores da libertação. Isto é, filosofias próprias do homem que as
refletiu, disposto sempre a marginalizar qualquer reflexão que não encaixasse na estrutura de suas reflexões.
É assim que surgiram filosofias, não analógicas, capazes de justificar genocídios de homens e povos em nome
da liberdade e para sua suposta defesa (ZEA, 1973, p. 7).

Perceba que, para o filósofo, a libertação não deve ocorrer somente para comigo mesmo, mas
para todos que se encontram em uma situação de dominação, colonizados por outras culturas e
incapazes de produzir sua própria cultura dada essa estrutura existente.
A partir desses elementos, convidamos você a investigar mais a fundo as nuances e os deta-
lhes da proposta política de Leopoldo Zea e que, por meio dessa investigação, você possa se sentir
provocado a produzir uma filosofia legitimamente latino-americana.

2. 4. AS VINTE TESES SOBRE A POLÍTICA DE ENRIQUE DUSSEL


Veremos agora um novo desdobramento da Filosofia da Libertação, que se assenta nas pro-
postas políticas do filósofo argentino, radicado no México, Enrique Dussel.

Figura 4 Enrique Dussel.

22
Unidade 1 – Filosofia Política nas Américas

Algo que será comum ao nos referirmos a outros filósofos ao longo desta obra, é preciso des-
tacar o amplo leque de produções filósoficas de Dussel e, em razão disso, é necessário que se diga
que, ainda que abordemos aqui algumas facetas de sua proposta política, o filósofo tem contribui-
ções relevantes em inúmeras áreas da Filosofia e que merecerão sua investigação e, dentre elas,
destacamos a influência recente que realizou na Teologia, por meio daquilo que se convencionou
chamar de Teologia da Libertação.
Cabe dizer ainda que, devido à proposta introdutória desta obra, não trataremos das nuances
do pensamento de Dussel, assentadas no marxismo e, em especial, nos conceitos produzidos por
Antonio Gramsci; tampouco discutiremos o diálogo que realizou com outros autores, dentre eles,
Habermas e Apel. Convidamos você a se sentir desafiado a ler o texto original na íntegra, para que
possa se apropriar adequadamente de todas essas nuances.
Inicialmente, convém distinguir Dussel de Zea e, nesse sentido, é preciso dizer que, enquanto
Zea adota um posicionamento historicista, já apontado anteriormente, Dussel inclui-se no grupo dos
filósofos da libertação da corrente intitulada analética, a qual:
[...] apresenta-se como uma crítica ao eurocentrismo e ao neocolonialismo norte-americano. Apresenta-se
como uma crítica da modernidade, concebida como uma ideologia colonial e imperial que deixou "encubier-
to" ou ocultou o que é distintamente latino-americano. Mais geralmente, porém, a corrente analética se ar-
ticula como uma crítica metafísica da totalidade do pensamento, de tudo o que é pensado em termos de ser,
o todo postulado como o verdadeiro. Ao mesmo tempo, argumenta que a filosofia deve "partir" ou "locali-
zar-se" com referência tanto ao sujeito quanto ao objeto do filosofar. Este sujeito e objeto é também "el pu-
eblo" ou o povo (MENDIETA, 2016, tradução nossa).

Especificamente em relação ao nosso tema, abordaremos o posicionamento político de Dussel


por meio de uma obra que produziu em 2006, intitulada 20 teses sobre Política, obra em que o filó-
sofo busca fazer uma síntese sobre esse tema e que se baseou, em especial, em sua obra Filosofia
da Libertação, publicada em 1977 e que foi considerada canônica para os filósofos que participaram
desse movimento.
Comecemos, então, pela primeira tese: nela o filósofo busca tratar do fundamento da política
manifestada no ideal grego da polis. Para Dussel, esse fundamento se sustenta na soberania popular
e ocorreria uma inversão dessa soberania quando o representante incorre na fetichização do poder
e, em tal condição, ocorreria uma corrupção de sua função originária e nela:
A corrupção é dupla: do governante que se crê sede soberana do poder e da comunidade política que se lhe
permite, que o consente, que se torna servil em vez de ser autora da construção do político (DUSSEL, 2006,
p. 14, tradução nossa).

Já nas tese 02 e 03, Dussel resgata dois termos latinos, o de potentia, ao vincular o poder à
comunidade e é última instância daquilo que é político (DUSSEL, 2006, p. 27), e o de potestas, ao se
referir ao poder organizado manifesto em suas instituições e nas ações políticas. Para Dussel, se
pensarmos metaforicamente em termos aristotélicos, a potentia seria uma semente com potencial
natural para germinação e, por sua vez, a potestas seria a manifestação concreta dessa potenciali-
dade, manifestada no florescimento de uma árvore (DUSSEL, 2006, p. 29).
Para Dussel, quando o político exercita adequadamente a potencialidade política, em nome da
soberania popular, temos a manifestação do poder obediencial (tese 04) e, em contrapartida, quan-
do o indivíduo se deixa seduzir pelas suas ambições pessoais, da sua vontade de poder, temos o que
o filósofo intitula de fetichização do poder (tese 05). Vejamos a síntese das cinco primeiras teses no
quadro a seguir, proposto por Dussel:

23
Unidade 1 – Filosofia Política nas Américas

Fonte: adaptada de Dussel (2006, p. 27).


Figura 5 Potentia e potestas.

No campo político, segundo o filósofo, há variadas relações de força e é preciso que se aja po-
liticamente para a criação de um bloco popular apto a lutar pelos oprimidos por meio de ações cole-
tivas e estas comporão o que o filósofo intitula como ações políticas estratégicas (tese 06).
Logo a seguir, o filósofo propõe, em sua tese 07, que as instituições políticas devam satisfazer
as necessidades advindas de outros campos (cultural, ecológico, econômico, etc.), advindas das de-
mandas produzidas pelos seus respectivos atores sociais.
Já em sua oitava tese, apoiando-se em propostas éticas fundamentadas na prática discursiva
de Habermas e Apel, o filósofo propõe que haja participação simétrica dos cidadãos e, para tanto,
existe a necessidade da existência de condições empíricas simétricas para a efetiva participação.
Logo depois, o filósofo se dedica a analisar a ética na política e, ao fazê-lo, propõe o conceito
de similitude, conceito este que apregoa que os princípios éticos venham a coincidir com outros
princípios, conforme a Figura 6:

Fonte: Dussel (2006, p. 70).


Figura 6 Conceito de similitude.

Para o filósofo, em sua décima tese, o princípio democrático é um princípio normativo e deve
buscar consensos legítimos entre seus membros, sempre haverá minorias decisórias e há de se ter
respeito por elas e, além disso, devemos agir de modo a considerar as instituições como possibilida-
des factíveis (tese 10).
Em sua décima primeira tese, o autor se dedica a analisar etmologicamente o significado de
“povo” e a importância desse coletivo na luta pelas suas reivindicações. Quando há um choque en-
tre a vontade de poder dos dominantes e a vontade de viver do povo, este último deve se organizar
enquanto hiperpotência, produzindo um estado de rebelião, de modo a superar o eventual modelo
dominador, produzindo uma nova potestas (tese 12). Há de se criar um princípio político que ampa-
re essa rebelião e esse princípio, chamado pelo filósofo de liberação (tese 13), se manifesta quando
ocorrer a negação de acesso à vida e a geração de opressão voltada ao povo.

24
Unidade 1 – Filosofia Política nas Américas

Dussel, nas teses 14, 15 e 16, intitula de princípio crítico de transformação libertadora a possi-
bilidade de participação simétrica dos oprimidos, realizando o que intitula de práxis anti-
hegemônicas por meio de coações legítimas que venham suscitar uma nova hegemonia, associada à
defesa do povo e dos oprimidos.
Por fim, nas últimas teses, o filósofo nos convida a agir de modo a transformarmos as institui-
ções políticas, com o intuito de produzirmos um reino de liberdade, que produziria uma paz perpé-
tua, com mudanças que promovam e ampliem a vida humana.

_______________________________________________________________________________
Antes de prosseguir para as Questões Autoavaliativas do Tópico 4, recomendamos que você
consulte o Tópico 3.3, que contém indicações de vídeos que expandirão seu conhecimento sobre a
Filosofia da Libertação.
_______________________________________________________________________________

3. CONTEÚDO DIGITAL INTEGRADOR


O Conteúdo Digital Integrador representa uma condição necessária e indispensável para você
compreender integralmente os conteúdos apresentados nesta unidade.

3. 1. ANTECEDENTES DA FILOSOFIA POLÍTICA NORTE-AMERICANA


Para que você possa conhecer algumas das particularidades históricas que originaram algumas
das práticas políticas norte-americanas, sugerimos que leia os documentos produzidos pelos cha-
mados “pais fundadores” da constituição americana. Eles receberam o título de Federalist papers e
são uma coletânea de artigos, escritos pelos principais líderes políticos naquela época, para serem
publicados no estado de Nova Iorque, devido à importância política desse estado à época. Apresen-
tam uma série de considerações sobre o regime democrático republicano proposto pelos seus auto-
res:
 HAMILTON, A.; MADISON, J.; JAY, J. Textos de “O federalista”. Disponível em:
<https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4097578/mod_resource/content/1/Os%20C
lassicos%20da%20Politica%20-%20Cole%20-%20Francisco%20C.%20Weffort-195-
216.pdf>. Acesso em: 21 jun. 2018.
Alexis de Tocqueville foi um dos primeiros teóricos a levantar a originalidade da proposta polí-
tica norte-americana e, também, seus riscos, na medida em que apontou a possibilidade de que o
regime democrático criasse uma “ditadura da maioria”. Sua grande obra Democracia na América
pode ser acessada no endereço a seguir:
 TOCQUEVILLE, A. Democracia na América. São Paulo: Martins Fontes, 2005. Disponível
em: <https://direitasja.files.wordpress.com/2012/05/a-democracia-na-amc3a9rica-vol-
i-alexis-de-tocqueville.pdf >. Acesso em: 21 jun. 2018.

3. 2. ANARCOCAPITALISMO
Vimos que Nozick contribui em suas ideias para o movimento chamado anarcocapitalista. Atu-
almente muitas são as produções que tratam desse tema e, dentre elas, gostaríamos de convidar
você a analisar duas produções: na primeira delas, apresenta-se um dos fundadores desse movi-
mento – Murray N. Rothbard. A segunda é um vídeo produzido pelo canal Ideias Radicais e nele são
apresentados alguns esclarecimentos básicos sobre esse conceito e os conceitos adjacentes a ele.

25
Unidade 1 – Filosofia Política nas Américas

 BASTOS, M. A. Murray N. Rothbard – os fundamentos do anarcocapitalismo. Bruxelas:


European Liberal Forum, 2012. Disponível em:
<http://www.liberalforum.eu/en/publications.html?file=tl_files%2fuserdata%2fdownlo
ads%2fpublications%2f2012%2frothbard-pt.pdf>. Acesso em: 21 jun. 2018.
 LIMA, R. O que é anarcocapitalismo/anarquismo/libertarianismo? 2015. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=0oRGiD9Birs>. Acesso em: 21 jun. 2018.

3. 3. FILOSOFIA DA LIBERTAÇÃO
A Filosofia da Libertação marcou sobremaneira a história do pensamento filosófico latino-
americano. Nela temos a proposta de uma filosofia que se assente, de fato, nas particularidades que
definem os povos que habitam essa região e que possa servir como mecanismo de libertação frente
a outras filosofias ou movimentos colonizadores. Para que você possa conhecer um pouco mais so-
bre esse movimento e as particularidades existentes na filosofia realizada na América Latina, convi-
damos você a analisar os dois vídeos indicados a seguir:
 CANAL ENCUENTRO. La Filosofia latino-americana. Filosofia Aquí & Ahora II. 2009. Dis-
ponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=bp1esfjhrky>.
 UNIVERSIDAD NACIONAL AUTÓNOMA DE MÉXICO; INSTITUTO DE PENSAMIENTO Y
CULTURA DE AMÉRICA LATINA. Enrique Dussel: Pensar el mundo desde la Filosofia de
la Liberación. 2005. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=ZJgoZKAe4rg>. Acesso em: 21 jun. 2018.

4. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
A autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para você testar o seu desempenho. Se
encontrar dificuldades em responder as questões a seguir, você deverá revisar os conteúdos estu-
dados para sanar as suas dúvidas.
1) De acordo com a teoria do Direito de Nozick, o Estado se justifica na tributação dos cidadãos para protegê-los
de danos ou perda de propriedade. Essa justificativa do Estado é a resposta de Nozick à demanda anarquista de
que não haja nenhum governo porque, para Nozick:

a) Mesmo uma sociedade anárquica teria algum governo, leis civis e políticas sociais sobre assuntos diferentes
dos que tratam unicamente de proteção (por exemplo, estradas, escolas, segurança social).

b) Em uma sociedade anárquica, as pessoas contratariam outros para proteger seus direitos, e a agência de
proteção mais forte para emergir entre os concorrentes seria o Estado de qualquer forma.

c) A ausência de leis em uma anarquia seria uma guerra de "todos contra todos" em que o simples ato de
cobrar impostos envolveria danos.

d) Sem impostos, o governo não poderá fornecer proteção nem bens e serviços como estradas, escolas ou
segurança social.

e) O homem necessita realizar contratos de modo a se afastar de seu estado de natureza.

2) De acordo com Rawls, todos os membros de uma sociedade têm uma reivindicação legítima e esta é ter uma
parte da riqueza de uma sociedade. Quando os indivíduos são sistematicamente desprotegidos de sua parcela
justa (e, portanto, não têm a oportunidade de competir igualmente por uma parcela dessa riqueza), é
responsabilidade do governo:

a) Proteger a propriedade privada daqueles que trabalharam para obter o que possuem ou que herdaram
propriedade legalmente.

26
Unidade 1 – Filosofia Política nas Américas

b) Certificar-se de que ninguém tenha permissão para ter uma porção maior dessa riqueza do que qualquer
outra pessoa.

c) Redistribuir recursos com base nas habilidades naturais dos cidadãos e não nas suas necessidades.

d) Corrigir essas desigualdades, redistribuindo apenas recursos suficientes dos ricos para os pobres para
permitir que eles possam competir igualmente.

3) De acordo com Rawls, uma teoria da justiça não exige necessariamente que todos na sociedade tenham igual
riqueza e poder, desde que tais desigualdades:

a) Trabalhem em benefício de todos, e todos possam ter acesso aos privilégios de riqueza e poder.

b) Não resultem em algumas pessoas com mais riqueza ou poder do que outros membros da sociedade.

c) Não garantam que o governo ofereça a todos um padrão de vida mínimo.

d) Permitam que as pessoas consigam posições de riqueza e poder que justifiquem que sejam consideradas
simplesmente melhores do que outras.

e) Não impeçam que se realize o direito à propriedade e à liberdade.

4) (SÓ FILOSOFIA, 2018) Em 1971, o filósofo estadunidense John Rawls publica A Theory of Justice, obra na qual
apresenta sua teoria da justiça como equidade. A década de 1980 ambientou o surgimento da corrente do
comunitarismo, que se contrapôs à perspectiva de orientação liberal de Rawls. Leia o texto a seguir:
"Para os comunitaristas, os liberais (universalistas) estariam simplesmente preocupados com a questão de co-
mo estabelecer princípios de justiça que poderiam determinar a submissão voluntária de todos os indivíduos racio-
nais, mesmo de pessoas com visões diferentes sobre a vida boa. O que se estabelece como crítica é que, para os
comunitaristas, os princípios morais só podem ser tematizados a partir de sociedades reais, a partir das práticas
que prevalecem nas sociedades reais. Para eles, em John Rawls, encontram-se premissas abstratas de base como a
liberdade e a igualdade que orientam (ou devem orientar) as práticas legítimas. A questão colocada é que, na in-
terpretação comunitarista, a prática tem precedência sobre a teoria, e não seria plausível que pessoas que vivem
em sociedades reais identifiquem princípios abstratos para sua existência. A crítica comunitarista aponta como in-
suficiente a tentativa de identificar princípios abstratos de moralidade através dos quais sejam avaliadas as socie-
dades existentes. A questão-chave é a negação de princípios universais de justiça que possam ser descobertos pela
razão, pois, em sua avaliação, as bases da moral não são encontradas na filosofia, e, sim, na política". (SILVEIRA,
Denis Coitinho. "TEORIA DA JUSTIÇA DE JOHN RAWLS: ENTRE O LIBERALISMO E O COMUNITARISMO".
In:Trans/Form/Ação, São Paulo, 30(1): 169-190, 2007).
De acordo com o texto e com seus conhecimentos, assinale a alternativa que NÃO corresponde à crítica comu-
nitarista à teoria da justiça de Rawls:

a) Opera com uma concepção abstrata de pessoa que é consequência do modelo de representação da posição
original sob o véu da ignorância.

b) Utiliza princípios universais (deontológicos) com a pretensão de aplicação em todas as sociedades, criando
uma supremacia dos direitos individuais em relação aos direitos coletivos.

c) Utiliza a ideia de um Estado neutro em relação aos valores morais, garantindo apenas a autonomia privada
(liberdade dos modernos) e não a autonomia pública (liberdade dos antigos), estando circunscrita a um
subjetivismo ético liberal.

d) Rawls, embora liberal, aproxima-se do marxismo, tendo apenas nas suas obras mais maduras uma veia
materialista que olha para as comunidades reais.

27
Unidade 1 – Filosofia Política nas Américas

e) É uma teoria deontológica e procedimental, que utiliza uma concepção ética antiperfeccionista,
estabelecendo uma prioridade absoluta do justo em relação ao bem.

5) De acordo com o libertarianismo, uma ação é livre:

a) Desde que seja causada por nossa vontade.

b) Somente se tivermos controle sobre nossa vontade.

c) Enquanto nossas escolhas forem volições de segunda ordem.

d) Enquanto acreditarmos que a ação é livre.

e) Se atender à vontade geral.

6) Se nos deparamos com um político eleito pelo seu povo com a pretensão de que viesse a defender os
interesses públicos e, tão logo se inicia na vida política pública, passa a fazer uso de seu cargo para beneficiar a
si próprio, podemos afirmar, baseados nas ideias de Enrique Dussel, que esse indivíduo foi vítima de:

a) Potestas.

b) Potentia.

c) Fetichismo do poder.

d) Ambições totalizantes do ego.

e) Mecanismos colonizadores do eu.

7) Das afirmações a seguir, selecione aquela que não possui relação com a Filosofia da Libertação:

a) Surge na América Latina.

b) Busca ser um foco de resistência.

c) Ampara-se em elementos da filosofia europeia.

d) Há uma busca pela libertação, autonomia e autenticidade.

e) A interpretação histórica é condição importante para sua realização.

8) Das alternativas a seguir, selecione aquela que apresenta adequadamente o entendimento de Dussel a respeito
do poder obediencial:

a) Refere-se a uma conduta em que o indivíduo adota uma posição passiva de obediência.

b) Caracteriza-se pela afirmação de que devemos respeitar as autoridades em suas funções específicas.

c) Advoga a possibilidade de que a autoridade possui um poder específico que gera obediência.

d) Considera que nele o indivíduo se mantém fiel ao interesse público.

e) Estabelece os limites do poder por meio da obediência.

Gabarito
Confira, a seguir, as respostas corretas para as questões autoavaliativas propostas:
1) b.
2) d.
3) a.
4) d.

28
Unidade 1 – Filosofia Política nas Américas

5) b.
6) c.
7) c.
8) d.

5. CONSIDERAÇÕES
Terminamos nossa primeira unidade e nela você analisou alguns dos principais filósofos que
realizaram contribuições importantes à Filosofia Política nas Américas. Como você pôde perceber,
temos, nas ideias apresentadas, manifestações variadas a respeito do entendimento do que seja a
função do Estado, da conduta que devemos adotar frente a ele e da possibilidade de que criemos
políticos que atendam às circunstâncias próprias de cada povo, tal como revelam as reflexões da
Filosofia da Libertação.
Enfatizamos a você a abordagem inusual e, por que não, radical e ousada do libertarianismo,
que erige como princípio básico as liberdades individuais em detrimento de qualquer tentativa de
coação externa realizada por indivíduos ou pelo Estado como uma das propostas que fizeram com
que no século 20 a Filosofia Política pudesse novamente respirar novas possibilidades de entendi-
mento a respeito do Estado e dos indivíduos.

6. E-REFERÊNCIAS

Lista de figuras
Figura 1 Jon Rawls. Disponível em: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/en/3/3d/John_Rawls.jpg>. Acesso em: 21 jun. 2018.
Figura 2 Robert Nozick. Disponível em: <http://romantokarczyk.pl/pics/uczel/14.jpg>. Acesso em: 21 jun. 2018.
Figura 3 Leopoldo Zea Aguilar. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Leopoldo_Zea#/media/File:LZea.jpg>. Acesso em: 21
jun. 2018.
Figura 4 Enrique Dussel. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Enrique_Dussel#/media/File:EnriqueDussel.jpg>. Acesso em:
21 jun. 2018

Sites pesquisados
DUSSEL, E. 20 tesis de Política. Mexico: Siglo XXI; Centro de Cooperación Regional para la Educación de Adultos en América Latina y
Caribe, 2006. Fonte: <http://enriquedussel.com/txt/textos_libros/56.20_tesis_de_politica.pdf>. Acesso: 21 jun. 2018.
KANT, I. Crítica da Razão Prática. São Paulo: São Paulo: Edições e Publicações Brasil Editora S.A., 1959. Disponível em:
<https://www.marxists.org/portugues/kant/1788/mes/pratica.pdf>. Acesso: 21 jun. 2018.
MENDIETA, E. Philosophy of Liberation. 2016. Disponível em: <https://plato.stanford.edu/cgi-
bin/encyclopedia/archinfo.cgi?entry=liberation>. Acesso: 9 abr. 2018.
MORRESI, S. D. Robert Nozick e o liberalismo fora de esquadro. Lua Nova, São Paulo, v. 55-56, p. 285-296, 2002. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/ln/n55-56/a14n5556.pdf>. Acesso em: 21 jun. 2018.
MURRAY, D. Robert Nozick: Political Philosophy. Internet Encycolpedia of Philosophy. Disponível em: <http://www.iep.utm.edu/noz-
poli/#SH3a>. Acesso: 21 jun. 2018.
RICHARDSON, H. S. John Rawls (1921-2002). Internet Encycolpedia of Philosophy. Disponível em: <https://www.iep.utm.edu/rawls/>.
Acesso: 21 jun. 2018.
SANTOS, V. R. O homem e sua circunstância: introdução à filosofia de Ortega y Gasset. Metavnoia, São João del-Rei, n. 1, p. 61-64, jul.
1998/1999. Disponível em: <https://www.ufsj.edu.br/portal-repositorio/File/revistalable/numero1/vilson6.pdf>. Acesso em: 10 abr.
2018.
SÓ FILOSOFIA. Provas de concursos e do vestibular. Disponível em: <http://www.filosofia.com.br/vi_prova.php?id=99>. Acesso em: 21
jun. 2018.
VALLENTYNE, P. Robert Nozick: Anarchy, State, and Utopia. In: SHAND, J. (Ed). Central Works of Philosophy: The Twentieth Century:
Quine and After. Chesham: Acumen Publishing Limited, 2006. Disponível em:
<https://danwin1210.me/uploads/f3thinker%20%21%20-
%20tell%20me%20the%20truth%20%21./central%20works%20of%20philosophy%205.pdf#page=109>. Acesso: 26 jan. 2018.

29
Unidade 1 – Filosofia Política nas Américas

ZEA, L. A Filosofia latino-americana como Filosofia da Libertação. 1973. Disponível em: <https://mural-2.com/_files/200003973-
33b1934ab8/FilosofiaLatinoamericana-Leopoldo%20Zea.pdf>. Acesso em: 21 jun. 2018.
______. En torno a una filosofia americana. 2003. Disponível em: <http://www.biblioteca.org.ar/libros/1294.pdf>. Acessoem: 21 jun.
2018.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABBAGNANO, N. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
LIPP, S. Leopoldo Zea: from Mexicanidad to a philosophy of history. Waterloo: Wilfrid Laurier University Press, 1980.
LOCKE, J. Segundo tratado sobre o governo. Trad. E. Jacy Monteiro. São Paulo: Abril Cultural, 1973. (Coleção “Os Pensadores”).
NOZICK, R. Anarquia, Estado e utopia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1991.
RAWLS, J. Justiça como eqüidade: uma reformulação. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
______. Uma teoria da justiça. Brasília: Ed. Universidade de Brasília, 1981. (Coleção Pensamento Político, n. 50).

30
UNIDADE 2
Ética nas Américas

Objetivo
 Apresentar algumas das principais contribuições filosóficas nas Américas que versam sobre Ética.

Conteúdos
 A ética ambientalista de Henry David Thoreau.
 O egoísmo ético de Ayn Rand.
 O homem medíocre de José Ingenieros.
 Liberdade, necessidade e autarquia em Alejandro Korn.

Orientações para o estudo da unidade


Antes de iniciar o estudo desta unidade, leia as orientações a seguir:
1) Não se limite a este conteúdo; busque outras informações em sites confiáveis e/ou nas referências bibliográficas,
apresentadas ao final de cada unidade. Lembre-se de que, na modalidade EaD, o engajamento pessoal é um fator
determinante para o seu crescimento intelectual.
2) Busque identificar os principais conceitos apresentados; siga a linha gradativa dos assuntos até poder observar a
evolução do estudo das contribuições filosóficas das Américas ao tema da Ética.
3) Não deixe de recorrer aos materiais complementares descritos no Conteúdo Digital Integrador.

31
UNIDADE 2 – Ética nas Américas

1. INTRODUÇÃO
Nesta segunda unidade, você conhecerá produções filosóficas nas Américas que versaram so-
bre a Ética. Como você bem sabe, essa área da Filosofia tem recebido muita atenção nos tempos
atuais, especialmente quando se busca tratar da política e das relações que mantemos com outros
seres humanos.
Para a escolha dos pensadores, optamos por apresentar duas abordagens que costumeira-
mente não se apresentam nos cursos de Filosofia: o egoísmo ético e a ética do meio ambiente,
abordagens que apontam a necessidade de cuidarmos de nossas necessidades ou deixarmos de tra-
tar somente do ser humano em nossas questões e propostas éticas.
No que tange à Filosofia na América Latina, você lidará com filósofos que, cada qual a seu mo-
do, souberam dar um tratamento próprio às questões já abordadas por outros pensadores.
Torcemos para que essas abordagens possam trazer novos questionamentos em suas indaga-
ções éticas e animem você a exercitar essas novas possibilidades éticas em seu cotidiano.

2. CONTEÚDO BÁSICO DE REFERÊNCIA


O Conteúdo Básico de Referência apresenta, de forma sucinta, os temas abordados nesta uni-
dade. Para sua compreensão integral, é necessário o aprofundamento pelo estudo do Conteúdo
Digital Integrador.

2. 1. HENRY DAVID THOREAU


Começaremos nossa jornada por algumas das principais produções filosóficas que versaram
sobre a Ética construídas nas Américas por meio da análise da obra de Henry David Thoreau. Embo-
ra explicitemos aqui as suas considerações filosóficas, é preciso dizer que Thoreau se destacou em
inúmeras outras áreas, como ensaísta, poeta, abolicionista, cientista ambiental e outras mais.

Figura 1 Henry David Thoreau.

Thoreau faleceu em 1862, no entanto é surpreendente verificar as considerações que ele fez a
respeito da sociedade, dos problemas do consumo desenfreado e da importância do contato do ser
humano com natureza, porque muitas dessas considerações que se faz no tocante a esses temas na
atualidade já ecoavam de forma premonitória nas considerações do filósofo.
No aspecto político, Thoreau se tornou conhecido por propor a desobediência civil, ou seja, o
ato consciente e autônomo de recusa à obediência a certas leis como mecanismo legítimo de resis-
tência frente a um Estado opressor, o que veio a influenciar a defesa dessa postura pelo filósofo

32
UNIDADE 2 – Ética nas Américas

Leon Tolstói e, além disso, ocasionou ações concretas inspiradas em seus dizeres pelos grandes líde-
res políticos Mahatma Gandhi e Martin Luther King.
Nas análises que estão sendo feitas nesta obra, temos nos dedicado a tecer traços biográficos
dos filósofos analisados, dados os limites previstos para este material; no entanto, a história pessoal
de Thoreau carrega consigo fatos tão singulares, que nos impelem conscientemente quebrar essa
regra geral, baseando-nos em uma publicação produzida pelo The Philosophers Mail (2018) a respei-
to do filósofo.
Dentre esses fatos, citamos que, quando terminou seus estudos, Thoreau iniciou-se na carrei-
ra de professor, mas pouco depois a abandonou por não suportar infringir castigos físicos aos seus
alunos.
Thoreau também foi discípulo de Ralph Waldo Emerson e, nessa condição, tornou-se defensor
do transcendentalismo, movimento filosófico que divide o mundo em duas realidades, a material e
a espiritual, e da primazia da necessidade do cultivo desta última para que possamos ter uma vida
plena.
Ao construir a obra Walden ou A Vida nos Bosques, publicada em 1854 e que lhe garantiria a
notoriedade e exporia sua originalidade (inclusive a sua inserção nesta obra), Thoreau viveu afasta-
do de toda a sociedade, por cerca de dois anos, em uma pequena cabana na floresta, que media
aproximadamente 3,5 por 4,5 m e que fora construída pelas mãos de Thoreau em terras que per-
tenciam a Emerson em Walden Pond. Nessa cabana existiam tão somente três cadeiras e, ao se re-
ferir a elas, o filósofo fez uma afirmação peculiar e interessante: uma seria para a solidão, duas seri-
am para os amigos e três seriam para a sociedade.

Figura 2 Visão interna da cabana de Thoreau.

Feita essa contextualização, convém inicialmente dizer que Thoreau busca em sua ética “revi-
ver uma concepção de filosofia como um modo de vida, não somente um modo de pensamento
reflexivo e discurso” (FURTAK, 2017, tradução nossa).
E qual seria o seu tema central? De imediato, faz-se necessário tratar da já citada relação de
Thoreau com o transcendentalismo de Emerson, visto que essa relação impactará sua produção
ética. Portanto, vejamos o que seria esse movimento:
Transcendentalismo é uma palavra muito formal que descreve uma ideia muito simples. Pessoas, homens e
mulheres igualmente têm conhecimento sobre si mesmos e sobre o mundo ao seu redor que "transcende"
ou vai além do que eles podem ver, ouvir, provar, tocar ou sentir. Esse conhecimento vem da intuição e da
imaginação, não da lógica ou dos sentidos. As pessoas podem confiar em si mesmas como sua própria auto-
ridade sobre o que é certo. Um transcendentalista é uma pessoa que aceita essas ideias não como crenças
religiosas, mas como uma maneira de entender as relações de vida (AMERICAN HISTORY, 2018, tradução
nossa).

Furtak (2017) intitulará a ética de Thoreau como sendo uma ética da percepção, visto que nela
se depreende um convite à apreciação consciente do que se encontra ao nosso redor. Porém, con-
sideramos que uma terminologia mais apropriada seria a produzida por Cafaro, que definiu a pro-

33
UNIDADE 2 – Ética nas Américas

posta ética de Thoreau como sendo uma “ética de virtude ambiental” (CAFARO, 2001, p. 3, tradução
nossa). Vejamos agora uma definição sobre essa abordagem ética:
A ética ambiental é o estudo das relações éticas entre os seres humanos e o ambiente natural, incluindo os
indivíduos não humanos que a povoam e constituem. Envolve o desenvolvimento de uma compreensão
adequada da relação homem-natureza, identificando os bens e valores que fazem parte ou emergem desse
relacionamento, determinando as normas (regras/princípios) que esses bens e valores justificam e aplicam
essas normas para gerar orientação sobre as questões e interações ambientais (SANDLER, 2013, p. 1, tradu-
ção nossa).

De modo geral, um aspecto costumeiramente presente nessa abordagem ética é a de que de-
vemos buscar simplicidade e moderação para que tenhamos uma vida boa e, ainda segundo
Sandler, essa opção não deve ser vista como um sacrifício. Temos como desafio nos afastarmos das
necessidades materiais não fundamentais e, além disso, cuidarmos da natureza. Há nessa conduta o
pressuposto de que o florescimento da vida humana e o ambiente são coincidentes, estão interliga-
dos (SANDLER, 2013, p. 7).
Uma das grandes influências no pensamento de Thoreau se encontra no estoicismo e, em nos-
sa análise, nas propostas do filósofo romano Lúcio Aneu Sêneca. Para que se possa constatar no
filósofo romano um exemplo dessa relação de moderação e simplicidade, abdicação do supérfluo e
realização no contato com a natureza, apresentamos o trecho a seguir:
Acanhada é a alma que as coisas terrenas deleitam; e é preciso arrancá-la dessas e levá-la para as que em to-
da parte aparecem igualmente e igualmente resplandecem. Devemos refletir que estes bens terrenos são
obstáculos aos verdadeiros bens por causa das opiniões falsas e mentirosas: quanto mais compridos pórticos
se constroem, quanto mais altas torres se levantam; quanto mais amplos caminhos se abrem, quanto mais
profundas se escavam as grutas estivas; quanto mais monumentais se erguem os tetos das salas de jantar,
tanto mais todas estas coisas nos escondem o céu (SÊNECA, 1973, p. 197).

Perceba que, no trecho citado, o filósofo nos apresenta a possibilidade de, ao nos dedicarmos
ao supérfluo, na imoderação, não nos apercebermos que os bens valiosos se encontram ao nosso
redor e, nesse trecho específico, na experiência transformadora do contato com a natureza.
Com o que foi apresentado até este momento, estamos prontos para lidar com as considera-
ções emitidas diretamente por Thoreau. Comecemos então pela importância que o filósofo confere
à moderação:
A maioria dos luxos e muitos dos chamados confortos da vida, não só são dispensáveis como constituem até
obstáculos à elevação da humanidade. No que diz respeito a luxos e confortos, os mais sábios sempre vive-
ram de modo mais simples e despojado que os pobres. Os antigos filósofos chineses, indianos, persas e gre-
gos eram uma classe que se notabilizava pela extrema pobreza de bens exteriores, em contraste com a ri-
queza interior. Não sabemos muito sobre eles, admira, porém, que saibamos tanto quanto sabemos. O
mesmo acontece com reformadores e benfeitores mais recentes da nacionalidade deles. Ninguém pode ser
um observador imparcial e sábio da raça humana, a não ser da posição vantajosa que chamaríamos de po-
breza voluntária (THOREAU, 2007, p. 6).

Note que o filósofo realiza uma crítica à posse de bens materiais, e ressalta a sabedoria de
aderirmos voluntariamente a uma vida recheada de simplicidade. Especificamente em relação à
natureza, o filósofo teceu inúmeras considerações a respeito de sua defesa; vejamos uma delas:
Desejo dizer uma palavra em nome da Natureza, da liberdade absoluta e da vida selvagem, em contraste
com a liberdade e a cultura meramente civis – para considerar o homem como um habitante, ou parte e
parcela da Natureza, ao invés de um elemento da sociedade. Desejo fazer uma declaração extrema, supon-
do que assim a farei enfática, pois há defensores da civilização o bastante (THOREAU, 2011, p. 9, grifo nosso).

Veja que, no trecho citado, Thoreau nos admoesta em relação a sermos parte da natureza, ou
seja, ela não é um elemento externo e diferenciado de nós; fazemos parte dela. Reitera, ainda, a
necessidade da defesa dessa mesma natureza e a crítica implícita à excessiva defesa da civilização
em detrimento da natureza.

34
UNIDADE 2 – Ética nas Américas

Mencionamos ainda outro aspecto interessante de suas ideias, como que antecipando consi-
derações posteriores a respeito da objetificação do homem no trabalho, na medida em que esse
homem deixa de lado a possibilidade de saborear as experiências que a vida oferece, pode ser vista
no trecho abaixo:
Por simples ignorância e equívoco, muita gente, mesmo neste país relativamente livre, se deixa absorver de
tal modo por preocupações artificiais e tarefas superfluamente ásperas, que não pode colher os frutos mais
saborosos da vida. A excessiva lida torna-lhe os dedos demasiado trêmulos e desajeitados para isso. Na reali-
dade, o trabalhador não dispõe de lazer para uma genuína integridade dia a dia, nem se pode permitir a ma-
nutenção de relações mais humanas com outros homens, pois seu trabalho seria depreciado no mercado.
Não há condições para que seja outra coisa senão uma máquina (THOREAU, 2007, p. 2).

Desses elementos, esperamos ter incentivado você a conhecer mais sobre as obras desse pen-
sador e verificar o quanto seus apontamentos críticos são atuais frente à situação atual em que vi-
vemos.
_______________________________________________________________________________
Antes de prosseguir para o próximo tópcio, sugerimos que você realize a leitura proposta no
Tópico 3.1, para expandir seu conhecimento sobre um outro filósofo que produz uma crítica às ati-
tudes antropocêntricas, seguindo o caminho de Thoreau.
_______________________________________________________________________________

2. 2. AYN RAND E O EGOÍSMO ÉTICO

Figura 3 Ayn Rand

Uma filósofa ainda um tanto quanto desconhecida no Brasil e que traz contribuições relevan-
tes para a Ética é a pensadora russo-americana Ayn Rand. Ela se tornou notória ao apresentar uma
proposta ética que, para alguns interessados sobre esse tema, é considerada verdadeiro tabu. Refe-
rimo-nos à defesa do egoísmo ético enquanto uma proposta sólida para a construção de nosso
ethos. Para apresentar as contribuições dessa pensadora, inserimos a seguir alguns trechos de um
texto já publicado anteriormente e que teve por objetivo apresentar as teorias normativas éticas
para futuros pedagogos.
Começaremos inicialmente tratando do conceito de egoísmo. Costumeiramente, quando li-
damos com esse conceito e, mais especificamente, quando o aplicamos à questão ética, entende-
mos que se trata do indivíduo tão somente preocupado consigo mesmo, que busca fazer tudo que
for necessário para atingir seus interesses próprios. Vejamos como Ayn Rand realiza novo entendi-
mento a respeito dessa interpretação:
No uso popular, a palavra “egoísmo” é um sinônimo de maldade; a imagem que invoca é de um brutamontes
homicida que pisa sobre pilhas de cadáveres para alcançar seu próprio objetivo, que não se importa com ne-

35
UNIDADE 2 – Ética nas Américas

nhum ser vivo e persegue apenas a recompensa de caprichos inconsequentes do momento imediato. Porém,
o significado exato e a definição do dicionário para a palavra “egoísmo” é: preocupação com nossos próprios
interesses. Este conceito não inclui avaliação moral; não nos diz se a preocupação com os nossos próprios in-
teresses é boa ou má, nem nos diz o que constituem os interesses reais do homem. É tarefa da ética respon-
der a tais questões. A ética do altruísmo criou a imagem do brutamontes, como sua resposta, a fim de fazer
os homens aceitarem dois princípios desumanos: (a) que qualquer preocupação com nossos próprios inte-
resses é nociva, não importando o que estes interesses possam representar, e (b) que as atividades do bru-
tamontes são, na verdade, a favor dos nossos próprios interesses (que o altruísmo impõe ao homem renun-
ciar pelo bem de seus vizinhos) (RAND, 2016, p. 10-11).

Esse egoísmo, portanto, possui a característica de defesa dos interesses individuais da pessoa
envolvida e pode se manifestar nos seguintes modos:
 Egoísmo ético pessoal: “eu vou agir somente no meu interesse próprio e os outros de-
vem fazer o que quer que eles queiram”.
 Egoísmo ético individual: “todos devem agir em meu interesse”.
 Egoísmo ético universal: “cada indivíduo deveria agir em prol de seu próprio interes-
se”.
O predecessor de Ayn Rand quanto à proposta da realização do egoísmo ético foi o pensador
alemão Friedrich Nietzsche. Para esse filósofo, o posicionamento ético contrário ao egoísmo seria
humilhante, pois teria como significado que um indivíduo afirma que outra pessoa é mais importan-
te que ele próprio. Nietzsche afirmou que isso denegriria a nós mesmos na medida em que nos co-
locava abaixo dos outros:
Estejamos de acordo, neste nosso tempo, em que benevolência e beneficência constituem o homem bom;
vamos somente acrescentar: “pressupondo que ele antes seja benevolente e beneficente consigo mesmo!”
Pois sem isso ele foge de si, odeia a si, prejudica a si mesmo – ele certamente não é um bom homem. Então
ele apenas salva-se de si mesmo nos outros: que esses outros cuidem para que não fiquem mal, por mais
bem que ele aparentemente lhes queira! – Mas precisamente isto: fugir do ego e odiá-lo, e viver no outro,
para o outro – foi até agora considerado, de forma irrefletida e muito confiante, “altruísta” e, portanto,
“bom” (NIETZSCHE, 2004, n.p.).

Ayn Rand (2016), por sua vez, posiciona-se contra o altruísmo porque, segundo ela, essa con-
duta faz com que abandonemos a construção e busca de nosso ethos pessoal em prol de religiões e
da sociedade, que vivamos para os outros e, com isso, o indivíduo sempre se anula em prol dessas
outras pessoas, o que o tornaria uma pessoa descartável, visto que o todo é mais importante que as
partes que o compõem.
Vejamos na Figura 4 como normalmente interpretamos o egoísmo ético:

Figura 4 Egoísmo.

Muitos de nós, quando analisamos a possibilidade de as pessoas deverem buscar a felicidade


para si próprias, acreditamos que aconteceria a situação da Figura 4, ou seja, que buscaríamos obter
o que é do outro para nosso benefício próprio, inclusive por meios violentos. Rand (2016) busca
dizer que esse raciocínio é equivocado e, para tanto, apresenta como contraponto a esse posicio-
namento aquilo que intitula como ética objetivista:

36
UNIDADE 2 – Ética nas Américas

A ética Objetivista orgulhosamente advoga e defende o egoísmo racional — que significa: os valores exigidos
pela sobrevivência do homem enquanto homem — ou seja, os valores exigidos pela vida humana — não são
os valores produzidos pelos desejos, emoções e “aspirações”. Os sentimentos, os caprichos ou as necessida-
des de brutamontes irracionais, que nunca superaram a prática primordial dos sacrifícios humanos, que nun-
ca descobriram uma sociedade industrial e não podem conceber nenhum autointeresse, exceto aquele de
aproveitar-se do saque da ocasião, são valores destrutivos à sobrevivência do homem. A ética objetivista sus-
tenta que o bem humano não requer sacrifício e não pode ser alcançado pelo sacrifício de ninguém; sustenta
que os interesses racionais dos homens não se chocam – que não há conflito de interesses entre homens que
não desejam o imerecido, que não fazem sacrifícios, nem os aceitam, que se tratam entre si como comerci-
antes, trocando valor por valor (RAND, 2016, p. 35).
Rand propõe que nossos valores sejam obtidos por meio do exercício da razão, único elemen-
to que nos separa dos animais e permite a nós armazenar informações e transformar a natureza
para que consigamos sobreviver. Mediante o uso da razão, estabelecemos um propósito para nos-
sas vidas, o qual se contrapõe aos nossos desejos e emoções, pois se trata de um propósito racional
de autoaperfeiçoamento e, ao fazermos esse exercício, criamos uma autoestima, ou seja, um valor
positivo a respeito de nós mesmos. Quem faz uso dessa ética proposta por Rand passa a ter as vir-
tudes cultivadas de racionalidade, produtividade e orgulho.
E como seria a relação entre as pessoas que começam a fazer uso desse exercício ético? Rand
propõe que elas passariam a realizar trocas, porque:
O princípio da troca é o único princípio ético racional para todos os relacionamentos humanos, pessoais e so-
ciais, particulares e públicos, espirituais e materiais. É o princípio de justiça (RAND, 2016, p. 35).

Para exemplificar essa proposta de troca, tomemos como exemplo o amor. Para Rand, em
uma entrevista realizada em 1950, cada realização negocial de troca possui sua própria moeda e,
especificamente no amor, não amamos as pessoas pelo que fazemos por elas ou pelo que elas fa-
zem por nós, mas as amamos pelas virtudes próprias que conseguiram e que forjaram em seu cará-
ter.
Desses elementos apresentados, perceba como um conceito comum presente em nosso dia a
dia, o egoísmo ético, que aparentemente soaria aos nossos ouvidos como possuidor de um caráter
valorativo negativo, ao ser escrutinado por meio da Filosofia, pode vir a ser interpretado com outras
possibilidades e interpretações e isso torna a Filosofia fascinante, na medida em que ela não se res-
tringe a aceitar o já dado, mas o problematiza, questiona e, por que não, reinventa.
_______________________________________________________________________________
Antes de prosseguir para o próximo tópico, recomendamos que você consulte o Tópico 3.2,
que contém indicações de entrevistas de Ayn Rand, as quais vão expandir seu conhecimento sobre
as ideias da filósofa.
_______________________________________________________________________________

2. 3. JOSÉ INGENIEROS E O HOMEM MEDIOCRE


Iremos lidar agora com a produção do filósofo e sociólogo ítalo-argentino José Ingenieros
(1877-1925).

37
UNIDADE 2 – Ética nas Américas

Figura 5 José Ingenieros.

José Ingenieros foi discípulo de outro grande filósofo argentino, chamado Ramos Mejía, e foi
tido como um dos grandes defensores do positivismo e do cientificismo/laicismo na Argentina. De
modo introdutório, pode-se dizer que Ingenieros lidou com vários temas dada a sua formação varia-
da, formação esta que pode ser detectada nas próprias considerações desse pensador a seu respei-
to:
Na Universidade cursei simultaneamente duas carreiras, que me permitiram adquirir noções das ciências físi-
co-naturais e das ciências médico-biológicas; vocacionalmente cultivei as ciências sociais a não fui indiferente
às letras. Especializei logo meus estudos em patologia nervosa e mental vinculando-me a seu ensino na Fa-
culdade de Medicina (1900-1905); passei, naturalmente, à cátedra de Psicologia na Faculdade de Filosofia e
Letras (1904-1911), estendendo meus programas a ética, lógica e estética, que sempre considerei como “ci-
ências psicológicas”. Desde 1911 tenho procurado entender a história da filosofia; somente em 1918, atrevi-
me a emitir uma opinião sobre assuntos filosóficos (INGENIEROS apud NERVI, 2007, p. 146-147, tradução
nossa).

Quanto à sua filosofia, optamos por apresentar as contribuições que realizou para a Ética, vis-
to que nessa área produziu obras muito interessantes e singulares. Segundo o próprio filósofo, sua
produção ética se manifestaria em três obras. A primeira delas seria a obra O homem mediocre, pu-
blicada originalmente em 1914 e nela teríamos uma crítica da moralidade.
Sua segunda obra seria Para uma moral sem dogmas, publicada originalmente em 1917 e na
qual, segundo Ingenieros, teríamos sua teoria da moralidade e, por fim, em sua obra As forças mo-
rais, teríamos uma deontologia da moral. Trataremos aqui de sua segunda obra. Nela o filósofo pro-
põe que nos afastemos dos dogmas quando nos propomos a lidar com a Ética. Para o filósofo, “um
dogma é uma opinião imutável e imperfectível imposta aos homens por uma autoridade anterior a
sua própria experiência” (INGENIEROS, 1919, p. 12, tradução nossa).
Segundo Ingenieros, há sempre a manifestação do poder e autoridade quando nos deparamos
com manifestações morais dogmáticas. Contudo, se costumeiramente consideramos que os dogmas
estejam associados a manifestações religiosas no âmbito da moral, o filósofo nos alerta que eles
também estão presentes no âmbito filosófico, porque, enquanto na igreja os dogmas se manifestam
na autoridade do teólogo e da igreja, no âmbito filosófico, o dogma se manifesta nos filósofos e seus
respectivos seguidores:
Parte de uma premissa transcendental: a existência de uma razão perfeita ou pura, anterior a experiência in-
dividual ou social. Essa razão tem leis que permitem estabelecer a priori princípios fundamentais de moral,
anteriores à moralidade efetiva dos homens; estes devem ser morais, imperativamente, e devem sê-lo ajus-
tando-se aos princípios eternos e imutáveis da razão (INGENIEROS, 1919, p. 20, tradução nossa).
Dessa condição, para Ingenieros, temos a troca de um fundamentalismo religioso por outro de
fundamento racional e que poderia ser percebido em pensadores tais como Descartes e, em especi-
al, Kant.

38
UNIDADE 2 – Ética nas Américas

Segundo Ingeniero, a Ética possui uma dimensão eminentemente social, porque “toda ética
efetiva é um resultado natural da experiência”. (INGENIEROS, 1919, p. 147, tradução nossa).
Desse posicionamento se depreende que, para Ingenieros, a moralidade possui um caráter re-
lativo e isso pode ser percebido na consideração a seguir:
Aplique essas ideias à experiência moral e compreenderá exatamente o que significará a moral sem dogmas
do porvir: não somente sem dogmas religiosos, mas também sem dogmas racionais. Suponha que essa expe-
riência é distinta em cada sociedade humana e em cada momento de sua evolução e compreenderá a inevi-
tável variação dos ideais de perfeição moral que os homens construíram hipotética sobre sua experiência in-
cessantemente renovada (INGENIEROS, 1919, p. 163, tradução nossa).

Desses elementos, percebe-se o relativismo já apontado, visto que a moral possui dimensão
social, tem um caráter eminentemente humano e é construída historicamente.
Apresentadas essas considerações, sigamos agora, com sua obra O homem medíocre. vejamos
a seguir como Mailhe (2013) a caracteriza:
Em O Homem Mediocre, Ingenieros adverte que o ideal é patrimônio de uma seleta minoria esclarecida que
impõe seu esforços “às gerações seguintes”. Integrando – não sem conflitos – os vocabulários do positivismo
e do espiritualismo, assinala que os ideais são “faróis” e “heraldos” que guiam ao homem em sua “peregrina-
ção” evolutiva. Rechaçando o idealismo dogmático dos metafísicos em favor de um idealismo experimental,
insiste que o idealismo não é incompatível com a ciência porque a imaginação do futuro completa a experi-
ência do presente (MAILHE, 2013, n.p., tradução nossa).

Para a autora, Ingenieros tem em sua proposta um caráter científico evolutivo, ou seja, tería-
mos aquele que representaria a evolução, manifestado no homem ideal e, por sua vez, aqueles que
não teriam essa condição evolutiva, representados pelo homem medíocre e o homem inferior. Ve-
jamos como Ingenieros caracteriza o homem inferior:
O homem inferior é um animal humano; em sua mentalidade assenhoram-se as tendências instintivas con-
densadas pela herança e que constituem a “alma da espécie”. Sua inaptidão para a imitação o impede de
adaptar-se ao meio social em que vive; sua personalidade não se desenvolve até o nível corrente, vivendo
debaixo da moral ou da cultura dominantes, e em muitos casos fora da legalidade. Essa insuficiente adapta-
ção determina sua incapacidade para pensar como os demais e compartilhar suas rotinas comuns (INGENIE-
ROS, 2000, p. 39, tradução nossa).
Por sua vez, o homem medíocre, segundo Ingenieros, seria uma mediania entre o homem in-
ferior e o homem ideal:
Seu traço característico, absolutamente inequívoco, é sua deferência pela opinião dos demais. Não fala nun-
ca; repete sempre. Julga os homens como você os houve julgar. Reverenciará a seu mais cruel adversário, se
este se eleva; desdenhara de seu melhor amigo se ninguém o elogia. Seu critério carece de iniciativas. Suas
admirações são prudentes. Seus entusiasmos são oficiais (INGERIEROS, 2000, p. 36, tradução nossa).

Muitos serão, ao longo de sua obra, os adjetivos nada elogiosos produzidos por Ingenieros pa-
ra definir o medíocre; no entanto, devido às limitações introdutórias desta obra, vejamos como nos-
so filosofo caracteriza o homem ideal ou superior, tendo como contraponto o homem medíocre:
O predomínio da variação determina a originalidade. Variar é ser alguém, diferenciar-se é ter um caráter
próprio, um penacho, grande ou pequeno: emblema, enfim, de que não se vive como simples reflexo dos
demais. A função capital do homem medíocre é a paciência imitativa; a do homem superior é a imaginação
criadora. O medíocre aspira a confundir-se com os que os rodeiam; o original tende a diferenciar-se deles. Ao
passo que um se concretiza a pensar com a cabeça da sociedade, o outro aspira a pensar com a própria. Nele
se sustenta a desconfiança que somente rodeia os caracteres originais: nada parece tão perigoso como um
homem que aspira a pensar com sua cabeça (INGENIEROS, 2000, p. 38, tradução nossa).

Chamamos sua atenção para a ênfase que Ingenieros dá ao homem superior como sendo
aquele que está à frente de seu tempo. Tais características remetem a um pensador que Ingenieros
apreciou muito em sua juventude, Nietzsche, e que, de modo geral, deu especial ênfase a esse ho-
mem à frente do momento em que vivia.

39
UNIDADE 2 – Ética nas Américas

Por meio dessas breves análises de ambas as obras, esperamos ter incentivado você a conhe-
cer esse pensador. Caso se dedique a fazê-lo, você descobrirá que ele produziu também frases me-
moráveis a respeito de assuntos diversos e que certamente ampliarão suas referências.

2. 4. ALEJANDRO KORN
Outro grande filósofo argentino e que seguiu caminho oposto ao de Ingenieros, ao adotar po-
sicionamentos diversos dos representados pelo positivismo, foi Alejandro Korn.

Figura 6 Alejandro Korn.

Tal como Ingenieros, esse filosofo produziu contribuições valiosas para a Filosofia em várias
áreas, destacando-se nas áreas de Epistemologia, Gnoseologia, Metafísica e Axiologia. Especifica-
mente para fins didáticos e temáticos, optamos também por abordar sua contribuição para a teoria
dos valores para que você possa perceber algumas diferenças marcantes entre esse pensador e José
Ingenieros quanto às questões axiológicas/éticas.
Inicialmente convidamos você a analisar a seguir como Pró (1967, p. 36, tradução nossa) apre-
senta algumas conclusões gerais a respeito dos posicionamentos do filósofo sobre esse tema:
O domínio próprio da Filosofia, segundo Korn, é o mundo subjetivo, o do eu, suas atividades e suas valora-
ções. A filosofia é, pois, axiologia. O eu, o sujeito, realiza valorações de conhecimento, e é Gnoseologia; de
beleza, e é Estética; de utilidade, e é Economia; de bondade, e é Ética, de justiça, e é Direito, de santidade, e
é religião. Korn considera um erro cartesiano pretender que o eu é eminentemente racional, “une chose qui
pense”. O microcosmos é muito mais rico do que supõe o racionalismo moderno.

Veja que essa dimensão valorativa que possuímos, essa capacidade que temos de dar valor às
coisas, segundo a leitura de Pró, é marca distintiva do pensamento de Korn.
Ainda segundo Pró, essa dimensão valorativa eminentemente humana proposta por Korn é
essencialmente subjetiva, ou seja, advém da consciência do indivíduo frente a um fato objetivo; é
voluntarista, na medida em que realizamos nossos atos valorativos sempre amparados pela nossa
vontade e essa seria a força motriz que movimenta a nossa inteligência. Por fim, nossos atos valora-
tivos possuem um caráter relativista, ou seja “as valorações são relativas ao indivíduo (relativismo
individualista), às épocas (historicista), aos lugares (geográfico), às comunidades (social)” (PRÓ,
1967, p. 39, tradução nossa).
Um aspecto interessante citado por Pró e que nos levou a investigar com mais atenção, foi
uma produção que Korn realizou buscando classificar nossos valores em uma escala. Essa classifica-
ção, originalmente apresentada na obra Apuntes Filosóficos, produzida em 1943, é a que se segue:

40
UNIDADE 2 – Ética nas Américas

Figura 7 Classificação dos valores segundo Korn.

Consideramos importante salientar que a classificação da Figura 7 não possui um caráter hie-
rarquizado, ou seja, com alguns valores acima de outros; isto porque, conforme vimos, eles possu-
em um caráter relativo e subjetivo. Para Korn, quando, por meio de nossa vontade, estabelecemos o
que queremos ou não, ou seja, quando valoramos algo, buscamos preservar a nós mesmos, preser-
var a nossa espécie e, por fim, realizar a nossa convivência social.
Para encerrar esta breve apresentação do filósofo, trataremos em detalhe de um conceito
central em sua axiologia: o conceito de liberdade criadora, que se refere à nossa condição de liber-
dade e que seria “a condição sine qua non de toda Ética” (KORN, 1944, p. 13, tradução nossa).
Para Korn, nossa liberdade se manifesta quando queremos algo e não quando fazemos algo,
porque, nas palavras do filósofo, somos autônomos, mas não somos soberanos, posto que a reali-
dade apresenta mecanismos coercitivos de necessidade e estes não permitem uma ação arbitrária
ilimitada nossa (KORN, 1944, p. 36).
Esses mecanismos coercitivos nos impõem limites e é mediante a ação sobre eles que temos a
realização de nossa liberdade. Tomemos como exemplo a condição material externa a nós e que se
manifesta na natureza. A condição material pode vir a nos aprisionar, no entanto o simples ato de
fazermos uso de uma pedra para quebrarmos um coco denota nossa liberdade econômica frente ao
mundo objetivo e, por meio dela, construímos ferramentas que fazem frente a esse mesmo mundo.
Dito de outro modo, a necessidade nos apresenta a pedra e o coco e nossa liberdade permitiu
que construíssemos um martelo e, em tal condição, adquirimos domínio sobre o mundo objetivo.
O mesmo ocorre no tocante às nossas condições intrínsecas: somos seres afetados por impul-
sos e afetos e, na medida em que os dominamos, apresenta-se a autarquia, o governo de nós mes-
mos, posto que controlamos nossa vontade por meio de uma ação controladora oriunda dessa
mesma vontade e, nessa condição, manifesta-se a nossa liberdade ética, ou seja, o domínio de nós
mesmos (KORN, 1944, p. 37).
Quando nos deparamos com algo que favorece nossa liberdade econômica, segundo o filóso-
fo, nos deparamos com o que é útil e, por sua vez, quando nos deparamos com algo que favorece a
nossa liberdade ética, estamos diante de algo que é bom.
Um alerta importante que o filósofo nos apresenta é para evitarmos a confusão entre a liber-
dade econômica e ética e as considerarmos como essencialmente iguais e convergentes ou, ainda,
colocarmos uma acima da outra; isto porque:
Tomar o útil pelo bom é o pecado de toda moral utilitária e erro próprio dos sistemas que tendem a negar a
personalidade autônoma. Insistir somente no conceito ético é desconhecer que a plena expansão da perso-
nalidade somente é possível em um mundo submetido. A falta da liberdade econômica conduz a alienar a li-
berdade ética pelo prato de lentilhas e a ausência da liberdade ética nos entrega ao domínio dos instintos e

41
UNIDADE 2 – Ética nas Américas

dos dogmas. A falta de ambas nos submete a poderes estranhos, aniquila nossa personalidade, nos impede
de viver a vida própria (KORN, 1944, p. 41).

Essa interpretação que Korn apresenta tem muitos elementos em comum com a proposta éti-
ca do filósofo Baruch Espinoza e, necessariamente, caso queira se aprofundar sobre essa aborda-
gem, valeria muito a pena você também investigar a abordagem ética produzida por esse pensador
holandês.
Com o exposto, salientamos aqui a possibilidade de começar a analisar a manifestação da li-
berdade tal como proposta por esse pensador e como você tem agido frente às restrições materiais
externas e internas que possui: você está se submetendo a elas ou as está utilizando como ponto de
partida para a manifestação de sua liberdade?

_______________________________________________________________________________
Antes de prosseguir para as Questões Autoavaliativas do Tópico 4, recomendamos que você
acesse o texto indicado no Tópico 3. 3, para expandir seu conhecimento sobre a filosofia produzida
na Argentina.
_______________________________________________________________________________

3. CONTEÚDO DIGITAL INTEGRADOR


O Conteúdo Digital Integrador representa uma condição necessária e indispensável para você
compreender integralmente os conteúdos apresentados nesta unidade.

3. 1. DA DEFESA DA NATUREZA À DEFESA DOS ANIMAIS: A ÉTICA DE PETER SINGER


Vimos, em nossa análise de Thoreau, que o pensador faz uma crítica às condutas antropocên-
tricas, na medida em que elas criam uma relação assimétrica do homem frente aos demais seres e à
natureza.
Caminho semelhante (e, por que não, mais radical), foi seguido pelo filósofo australiano Peter
Singer, que realiza uma crítica severa ao que ele intitula de especismo, quer seja, a ênfase em uma
espécie em detrimento das outras. O filósofo defende um novo paradigma ético ao apontar também
os animais como depositários de nossos cuidados.
Para que você possa conhecer algumas de suas ideias, convidamos você a analisar o artigo
produzido por Singer intitulado “Ética más allá de los límites de la espécie” e que pode ser acessado
no endereço a seguir. Para concretizar o acesso a ele, basta se cadastrar na plataforma JSTOR; ele é
gratuito e te permitirá acesso a esta e outras obras:
 SINGER, P. Ética más allá de los limites de la especie. Teorema: revista internacional de
Filosofia, v. 18, n. 3, p. 5-16, 1999. Disponível em:
<http://www.jstor.org/stable/43047317>. Acesso em: 22 jun. 2018.

3. 2. AS CRÍTICAS DE AYN RAND AO COLETIVISMO


Para que você possa conhecer um pouco mais sobre a personalidade marcante da filósofa Ayn
Rand, convidamos você a assistir a algumas entrevistas contundentes que produziu ao longo do
tempo e que podem ser visualizadas nos endereços a seguir:
 LIBERTYPEN. Ayn Rand – em defesa do capitalismo. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=gp8moc9_axs>. Acesso em: 22 jun. 2018.

42
UNIDADE 2 – Ética nas Américas

 AMARAL, C. Ayn Rand – individualismo vs. Altruísmo. 2012. Disponível em:


<https://www.youtube.com/watch?v=asczvc01j4s>. Acesso em: 22 jun. 2018.
 NBC. Entrevista inédita de Ayn Rand. The tonight show starring Johnny Carson. Dispo-
nível em: <https://www.youtube.com/watch?v=4EfcgTOv_rM>. Acesso em: 22 jun.
2018.

3. 3. FILOSOFIA ARGENTINA
Como você pode notar, a filosofia argentina produziu contribuições originais e importantes.
Caso você tenha interesse em conhecer um pouco mais sobre esse universo, convidamos você a
analisar a produção de Martín Orensanz a seguir. Nela se apresenta um verdadeiro compêndio his-
tórico e filosófico dessa tradição latina específica de se fazer filosofia:
 ORENSANZ, M. Recorridos por la filosofía argentina. Mar del Plata: Eudem, 2017. Dis-
ponível em:
<http://www.mdp.edu.ar/attachments/article/281/recorridos%20por%20la%20filosofi
a%20argentina.pdf>. Acesso em: 22 jun. 2018.

4. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
A autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para você testar o seu desempenho. Se
encontrar dificuldades em responder às questões a seguir, você deverá revisar os conteúdos estu-
dados para sanar as suas dúvidas.
1) Que palavra é utilizada pelos intelectuais para substituir Deus, segundo Ayn Rand?

a) Sociedade.

b) Igreja.

c) Povo.

d) Satan.

e) Indivíduo.

2) Como Rand define "sociedade" em um sentido básico?

a) Uma coleção de indivíduos.

b) A queda do indivíduo.

c) Um grupo governado por um governo.

d) O modo mais eficiente de governar a Terra.

e) Uma organização coletiva.

3) Em seu ensaio A Desobediência Civil, Henry David Thoreau afirmou que um indivíduo deveria:

a) Não pagar impostos utilizados em pesquisa.

b) Recusar-se a obedecer a leis injustas.

c) Viver de forma isolada e tão simples quanto possível.

d) Rejeitar as restrições artificiais do governo.

e) Abraçar um interesse excessivo pela obtenção do conforto material.

43
UNIDADE 2 – Ética nas Américas

4) “O homem mais rico é aquele cujos prazeres são mais baratos” – Henry David Thoreau.
Por meio da citação anterior e fazendo uso de seus conhecimentos a respeito de Henry David Thoreau, pode-
mos afirmar que:

a) Nessa frase, o filósofo realiza uma alusão à necessidade de produtividade para obtenção de riqueza.

b) Thoreau demonstra traços hedonistas, nos convidando a selecionar adequadamente os prazeres.

c) O filósofo demonstra que a sociedade é dividida entre opressores e oprimidos.

d) A frase ilustra as propostas de Thoreau a respeito de simplicidade e moderação.

e) Há uma atitude contrária ao estoicismo e à vida preconizada por esse movimento filosófico.

5) A respeito da análise que Ingenieros produziu sobre as propostas morais de Kant e Descartes, é possível
concluir que:

a) Ambos os pensadores contribuíram de modo significativo para uma moral autônoma.

b) Representam os ideais éticos propostos por Ingenieros.

c) Salientam a importância de que o homem não se submeta à autoridade moral.

d) São exemplos de morais dogmáticas.

e) Favorecem as decisões individuais e autônomas que tomamos frente às questões éticas.

6) Segundo Ingenieros, se o indivíduo ousa pensar por meio de suas ideias próprias, temos a manifestação do:

a) Homem medíocre.

b) Homem evolutivo.

c) Homem ideal.

d) Homem inferior.

e) Homem assertivo.

7) O conceito de autarquia, apresentado por Alejandro Korn, nos remete à ideia de que:

a) Há a promoção dos princípios da coletividade.

b) Há uma defesa dos interesses coletivos frentes aos interesses pessoais.

c) Há uma ênfase nos controles externos intergrupais.

d) Se assevera a possibilidade do indivíduo se autorregular e se autogovernar.

e) Se institui a possibilidade de que indivíduo e sociedade formam um todo indissociável.

8) Sobre a relação entre liberdade econômica e ética apresentada por Alejandro Korn, é correto apresentar o que
se segue EXCETO:

a) A falta de liberdade econômica pode fazer com que o indivíduo submeta sua liberdade ética para o
atendimento a algumas necessidades básicas (alimentos etc.).

b) Para que a ética possa ocorrer, é necessário um mundo submetido.

c) Sem liberdade econômica e ética, temos aniquilada a nossa liberdade.

44
UNIDADE 2 – Ética nas Américas

d) O útil e o bom não são necessariamente a mesma coisa.

e) Os instintos se manifestam por meio da realização de nossas liberdades éticas.

Gabarito
Confira, a seguir, as respostas corretas para as questões autoavaliativas propostas:
1) a.
2) a.
3) b.
4) d.
5) d.
6) c.
7) d.
8) e.

5. CONSIDERAÇÕES
Terminada esta unidade, convidamos você a analisar como os filósofos apresentados trataram
de nossas liberdades individuais e o quanto estas são necessárias para que possamos exercitar ade-
quadamente nossas opções éticas. Vimos também que a possibilidade de nossas escolhas éticas
refletirem determinado tempo histórico e cultural, ou seja, não terem um caráter cristalizado e imu-
tável, é um tema a ser levado em consideração. Por fim, fomos convidados por Henry David Thoreau
a não ficarmos centrados somente em nossas necessidades e desejos humanos e começarmos a ter
também como fonte de nossas preocupações a natureza que se encontra ao nosso redor.
Por meio desses temas, notam-se as múltiplas possibilidades de reflexão ética existentes e
como elas podem nos estimular a pensar novas formas de vermos a importância de nossa liberdade
e nossa relação com o mundo, as estruturas políticas e as condições externas existentes.

6. E.REFERÊNCIAS

Lista de figuras
Figura 1 Henry David Thoreau. Disponível em: <http://thephilosophersmail.com/wp-content/uploads/2014/10/672px-
Benjamin_D._Maxham_-_Henry_David_Thoreau_-_Restored.jpg>. Acesso em: 22 jun. 2018.
Figura 2 Visão interna da cabana de Thoreau. Disponível em: <http://thephilosophersmail.com/wp-content/uploads/2014/10/640px-
Thoreaus_cabin_inside.jpg >. Acesso em: 22 jun. 2018.
Figura 3 Ayn Rand. Disponível em: <https://usercontent2.hubstatic.com/13063113.jpg>. Acesso em: 22 jun. 2018.
Figura 4 Egoísmo. Adaptado da figura disponível em: <https://sdavisethics.files.wordpress.com/2013/09/ethical-egoism.jpg>. Acesso
em: 22 jun. 2018.
Figura 5 José Ingenieros. Disponível em: <https://www.biografiasyvidas.com/biografia/i/ingenieros.htm>. Acesso em: 22 jun. 2018.
Figura 6 Alejandro Korn. Disponível em: <https://es.wikipedia.org/wiki/Alejandro_Korn#/media/File:Alejandro_Korn-ca1935-
ensucasaLPL-Av60.jpg>. Acesso em: 22 jun. 2018.
Figura 7 Classificação dos valores segundo Korn. Adaptado da figura disponível em:
<http://biblio3.url.edu.gt/Libros/2012/Hombre/04/02.pdf>. Acesso em: 22 jun. 2018.

Sites pesquisados
AMERICAN HISTORY. Transcendentalism, an american philosophy. Disponível em: <http://www.ushistory.org/us/26f.asp>. Acesso em:
22 jun. 2018.
FURTAK, R. A. Henry David Thoreau. The Stanford Encyclopedia of Philosophy. 2017. Disponível em:
<https://plato.stanford.edu/archives/fall2017/entries/thoreau/>. Acesso em: 22 jun. 2018.

45
UNIDADE 2 – Ética nas Américas

INGENIEROS, J. El hombre medíocre. 2000. Disponível em: <http://www.mediafire.com/file/7rucf7vir71u1ap/ingenieros-el-hombre-


mediocre.pdf>. Acesso em: 22 jun. 2018.
______. Hacia una moral sin dogmas. 2. ed. Buenos Aires: Talleres, 1919. Disponível em:
<https://archive.org/stream/haciaunamoralsin00inge/haciaunamoralsin00inge_djvu.txt>. Acesso em: 22 jun. 2018.
KORN, A. La libertad criadora. Buenos Aires: Editorial Losada, 1944. Disponível em: <https://documentslide.org/the-philosophy-of-
money.html?utm_source=korn-la-libertad-creadora-pdf&utm_campaign=download>. Acesso em: 22 jun. 2018.
MAILHE, A. “El labirinto de la soledade” del genio, o las paradojas de El hombre medíocre. Varia historia, Belo Horizonte, v. 29 n. 49,
jan./abr. 2013. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-87752013000100010>. Acesso em: 22
jun. 2018.
NERVI, J. R. José Ingenieros y las perspectivas filosóficas del Positivismo argentino. Praxis, n. 11, p. 145-149, 2007. Disponível em:
<http://www.redalyc.org/html/1531/153112899013/>. Acesso em: 22 jun. 2018.
PRÓ, D. F. Alejandro Korn y sus ideas filosóficas. Revista Cuyo, v. 3, p. 21-42, 1967. Disponível em:
<http://www.bdigital.uncu.edu.ar/objetos_digitales/4225/23-cuyo-1967-tomo-03.pdf>. Acesso em: 22 jun. 2018.
RAND, A. A virtude do egoísmo. 2016. Disponível em: <http://lelivros.me/book/baixarlivro-a-virtude-do-egoismo-ayn-rand-em-pdf-
epub-e-mobi-ou-ler-online/>. Acesso em: 5 mar. 2018.
SANDLER, R. L. Environmental Virtue Ethics. In: LaFOLLETTE, H. (Ed.). The international encyclopedia of Ethics. Nova Jersey: Blackwell
Publishing, 2013. p. 1-10. Disponível em: <https://onlinelibrary.wiley.com/doi/pdf/10.1002/9781444367072.wbiee090>. Acesso em:
22 jun. 2018.
THE PHILOPHERS’ MAIL. The great philosophers: Henry David Thoreau. Disponível em: <http://thephilosophersmail.com/utopia/the-
great-philosophers-henry-david-thoreau/>. Acesso em: 22 jun. 2018.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CAFARO, P. Thoreau, Leopold, and Carson: toward an environmental virtue ethics. Environmental Ethics, v. 3, n. 1, p. 3-17, 2001.
NIETZSCHE, F. Aurora: reflexões sobre os preceitos morais. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
SÊNECA, L. A. Consolação à minha mãe Hélvia. São Paulo: Nova Cultural, 1973. (Coleção “Os pensadores”).
THOREAU, H. D. Caminhada. São Paulo: Dracaena, 2011.
______. Walden ou A vida nos bosques. São Paulo: Ground, 2007.

46
UNIDADE 3
Epistemologia nas Américas

Objetivo
 Apresentar algumas das principais contribuições filosóficas nas Américas que versam sobre Epistemologia e Filosofia
da Ciência.

Conteúdos
 A autopoiesis de Maturana e Varella.
 Mario Bunge e a Filosofia da Ciência.
 A hermenêutica analógica de Mauricio Beuchot.
 O pragmatismo de Charles Sanders Peirce.

Orientações para o estudo da unidade


Antes de iniciar o estudo desta unidade, leia as orientações a seguir:
1) Não se limite a este conteúdo; busque outras informações em sites confiáveis e/ou nas referências bibliográficas,
apresentadas ao final de cada unidade. Lembre-se de que, na modalidade EaD, o engajamento pessoal é um fator
determinante para o seu crescimento intelectual.
2) Busque identificar os principais conceitos apresentados; siga a linha gradativa dos assuntos até poder observar a
evolução do estudo da Epistemologia nas Américas.
3) Não deixe de recorrer aos materiais complementares descritos no Conteúdo Digital Integrador.

47
UNIDADE 3 – Epistemologia nas Américas

1. INTRODUÇÃO
Nesta unidade, você terá contato com várias produções que versaram sobre Epistemologia e
um desdobramento dela, a Filosofia da Ciência. Se tivéssemos que definir essa área de modo sucin-
to, diríamos que ela busca investigar conhecimento e as crenças justificadas que criamos. Dentre
alguns de seus questionamentos, reiteramos os seguintes: Quais são as condições de conhecimento
necessárias e suficientes? Quais são suas fontes? Qual é a sua estrutura e quais são seus limites?
Como o estudo da crença justificada, a Epistemologia visa responder questões como: como
devemos entender o conceito de justificação? O que justifica crenças justificadas? A justificação é
interna ou externa à própria mente? Entendida de maneira mais ampla, a Epistemologia trata de
questões relacionadas à criação e disseminação de conhecimento em áreas específicas de
investigação.
Para dar conta de algumas dessas questões, será apresentada a você uma série de abordagens
inusuais – algumas delas, inclusive, recentemente começam a inquietar e provocar reflexões filosó-
ficas a respeito de seus desdobramentos –, as quais esperamos que possam animá-lo a investigar
possíveis outras abordagens advindas de seus questionamentos.

2. CONTEÚDO BÁSICO DE REFERÊNCIA


O Conteúdo Básico de Referência apresenta, de forma sucinta, os temas abordados nesta uni-
dade. Para sua compreensão integral, é necessário o aprofundamento pelo estudo do Conteúdo
Digital Integrador.

2. 1. A AUTOPOIESIS DE MATURANA E VARELLA


Uma contribuição palpitante que temos recentemente para a teoria do conhecimento pode
ser percebida nos trabalhos dos biólogos chilenos Humberto Maturana e Francisco Varella.

Figura 1 Humberto Maturana e Francisco Varela.

Tudo começou em 1972, quando ambos cunharam o conceito de autopoiesis. Nele temos a
junção das palavras gregas “autós” (auto) e “poiesis” (criação). Inicialmente suas considerações bus-
cavam tratar de questões biológicas a respeito de capacidade de reprodução e automanutenção de
um sistema presente em uma célula, mas, ao longo do tempo, essa teoria teve reverberações nas
áreas de Filosofia (Filosofia da cognição), Educação, Sociologia e muitas outras.
Vejamos, a seguir, como Zeleny efetua uma síntese a respeito dessa definição:
Autopoiesis significa literalmente "autoprodução". Devemos ter cuidado com a variedade de expressões com
conotação semelhante: auto-organização, renovação, criação, geração, manutenção, perpetuação, e simila-

48
UNIDADE 3 – Epistemologia nas Américas

res. Da mesma forma, existem também termos como biopioiesis, heteropoiesis e allopoiesis que caracteri-
zam diferentes aspectos dos processos de produção. [...] "Autopoiesis" não é uma tradução, mas um rótulo
para uma interpretação particular e claramente definida de "autoprodução". Observamos os fenômenos de
autoprodução intuitivamente nos sistemas vivos. [...] A célula, por exemplo, é um sistema de produção com-
plexo [...] Esta manutenção da unidade e da totalidade, enquanto os próprios componentes estão sendo con-
tinuamente ou periodicamente desmontados e reconstruídos, criados e dizimados, produzidos e consumi-
dos, é chamado de "autopoiesis" (ZELENY, 1981, p. 1, tradução nossa).

Um dos desdobramentos dessa teoria ocorre nas explicações que fornecemos a respeito de
como ocorre a processo cognitivo, ou seja, de como adquirimos conhecimento. Na teoria de Matu-
rana, temos a compreensão do ser humano como sendo sendo um ser vivo, que possui um sistema
biológico, e nele temos um observador e unidades observadas que interagem em um sistema fe-
chado – este último sendo o nosso sistema nervoso. Esse sistema atua de modo a realizar sua auto-
manutenção, autorreconstrução e auto-organização e todo esse processo se dá mediante as rela-
ções que temos com nosso ambiente externo.
Dessas considerações, estabelecem-se uma série de conceitos básicos que, segundo Zeleny
(1981, p. 1 e 2) são necessários para que tenhamos um entendimento adequado dessa definição.
Confira-os no Quadro 1:
Quadro 1 Conceitos importantes para a autopoiesis.
Uma entidade distinguida de seu pano de fundo pelo observa-
dor, seja como "um todo, sem referir-se ao seu componente"
Unidade
(unidade simples), ou identificando seus componentes (unidade
composta).
Qualquer processo de síntese, transformação ou destruição
Processo de realizado no espaço dos componentes. Por exemplo, a desinte-
produção gração de macrocomponentes "produz" substrato no qual outros
processos de produção podem "agir".
Um complexo de relações entre componentes e processos pro-
dutores de componentes que devem permanecer invariantes a
Organização
fim de constituir uma unidade distinguível dentro de sua classe
de identidade.
Um arranjo espaçotemporal particular de componentes particu-
lares por meio dos quais a organização subjacente é realizada
Estrutura
em um determinado espaço e em um determinado ponto no
tempo.
Uma organização particular (circular) de processos que depen-
dem recursivamente uns dos outros para sua manutenção e
Organização
realização; eles formam um fechamento recursivo. Compare-se
Fechada
com cadeias lineares ou seriais ou "árvores" de processos, for-
mando uma organização aberta.
Uma unidade distinta (ou descrita) como uma unidade composta
integrando seus componentes. Uma unidade não autônoma
Unidade (controlada) é então distinguida como uma unidade simples (isto
Autônoma é, como um componente de um sistema maior dentro do qual
ela opera). O modo de descrição da autonomia ou controle
depende da preferência cognitiva do observador.

Conceitos complexos, não? Dos desdobramentos que essa teoria gerou e que citamos há pou-
co, consideramos importante apresentar a você, dada as inter-relações mantidas com a Filosofia, os
produzidos pelo sociólogo e filósofo Niklas Luhmann (1927-1998).

49
UNIDADE 3 – Epistemologia nas Américas

Figura 2 Niklas Luhmann.

Luhmann apresenta contribuição original ao trazer a autopoiesis para o campo da sociedade,


ao propor que os diversos elementos que compõem a sociedade (política, arte, economia, família,
religião, esportes etc.) são sistemas sociais.
Bem, e o que seriam esses sistemas sociais? Inicialmente há de se dizer que, para Luhmann,
um sistema seria uma unidade autônoma que se gera e evolui de modo autorreferencial, ou seja,
ele é autopoiético.
Disso se depreende que a grande novidade de Luhmann é, diferentemente de Maturana e Va-
rella, aplicar o conceito de autopoiesis ao sistema social e afirmar que este, tal como os elementos
autopoiéticos biológicos, compõe um todo independente. Para o sociólogo alemão, os sistemas pos-
suem vida própria, sendo capazes de criar uma identidade e, portanto, de se distinguir do meio am-
biente e, por meio de processos como o de automanutenção, adaptam-se ao ambiente de modo
otimizado; já por meio de sua autorreconstrução, redefinem-se com interações internas dentro do
sistema e externas, advindas das relações com outros sistemas.
Luhmann aplica sua leitura do conceito de autopoiesis em especial ao Direito e, mais especifi-
camente, no que se refere às leis. Vejamos, a seguir, qual é compreensão que Luhmann realiza a
esse respeito:
1) Por meio da lei, a sociedade se estabiliza autorrefencialmente, ou seja, de modo
autopoiético.
2) Se entendermos a sociedade como um sistema social total, a lei se insere como um
subsistema dentro dessa mesma sociedade.
3) Os sistemas legais existentes na sociedade se regeneram de modo autopoiético e,
nesse processo de autorregulação, os indivíduos são funções presentes nesses
sistemas.
4) A lei possui como aspecto funcional a aplicação e legitimação das decisões oriundas da
esfera política e, além disso, absorve os conflitos sociais que surgem no sistema social
geral.
Interessante, não? Esperamos que esses elementos tenham incentivado você a querer conhe-
cer com mais profundidade esse tema; no entanto, resta uma pergunta: como a autopoiesis impacta
a Filosofia?
Para respondê-la, apresentaremos uma das múltiplas facetas do impacto dessa teoria e ela se
dá na teoria do conhecimento e, mais especificamente, na Fenomenologia. Para isso, faremos uso
do artigo produzido por Claudia Castro de Andrade (2012) e nele é dado esse encaminhamento.
Inicialmente, a autora advoga que a teoria autopoiética confere uma primazia ontogenética
ao processo de desenvolvimento humano, ou seja, ainda que o meio interfira em nosso desenvolvi-
mento, a centralidade está nas mudanças internas ocorridas em nós. Ainda que tenhamos uma es-

50
UNIDADE 3 – Epistemologia nas Américas

trutura biológica determinada, ela não impede nossa autonomia, porque, segunda a autora, “Viver é
interagir, e interagir é conhecer, por extensão, viver é conhecer” (ANDRADE, 2012, p. 100).
Outro aspecto interessante apontado pela autora é o de que o conhecimento se origina de
uma correlação interna que realizamos; não é uma mera adaptação à realidade externa. Essa reali-
dade necessariamente depende um observador para que exista (ANDRADE, 2012, p. 100). Dessa
consideração, a princípio, poderíamos aventar que a construção do conhecimento seria um proces-
so subjetivo, no entanto:
Nesse aspecto, a defesa de uma correlação interna não exclui a participação e a influência do meio sobre
nós, apenas ressalta que essa correlação, feita a partir de nossas distinções, relaciona-se ao modo pelo qual
interpretamos as coisas e atribuímos sentidos a elas. A realidade objetiva só não pode ser exaltada pelo fato
de que nossa percepção é imperativa na apreensão das coisas, destacando-se, ao mesmo tempo, que a ma-
neira pela qual percebemos e interpretamos a realidade, sendo feita através de nossas distinções, não ocorre
da mesma forma em todos nós (ANDRADE, 2012, p. 101).

Mais ainda, segundo a autora, a partir dos desdobramentos da teoria autopoiética, não é pos-
sível aventar a hipótese de que possamos nos afastar de nós mesmos e nos observarmos; isto por-
que somos parte do fenômeno no qual estamos envolvidos, ou seja, não é possível que saiamos dele
como se fôssemos observadores externos de nós mesmos. Desse modo, não é possível ao cientista
pretender se afastar do ambiente no qual se encontra inserido ao fazer ciência, pois ele também se
encontra nessa circularidade mantida entre ambiente e indivíduo e, também, não é possível que
criemos um verdade transcendental, que pretensamente busque apresentar um conhecimento que
se pretenda ultrapassar essa relação circular.
Um exemplo interessante citado pela autora, e que é representado graficamente na Figura 3,
ajuda a ilustrar esse posicionamento de que nós e os cientistas costumeiramente fazemos uso. No
primeiro deles, temos uma relação triangular, na qual o cientista se posiciona acima do observado,
de modo a emitir um julgamento a respeito do observado, quer seja, da relação mantida entre um
macaco e seu ambiente. Nela temos a pretensão do afastamento do cientista/indivíduo frente ao
fenômeno. Em contrapartida, na outra imagem, temos uma outra possibilidade: nela o conhecimen-
to é circular e o indivíduo/cientista se encontra no centro do círculo, observando e fazendo parte
desse mesmo círculo.

Figura 3 Dois esquemas da relação com o cientista e seu objeto de estudo.

A partir desses elementos, a autora se dedica a realizar relações entre a teoria autopoiética e
a Fenomenologia, movimento filosófico que, segundo ela, possui similaridades com essa teoria, a
qual esperamos que você confira por si mesmo, lidando integralmente com esse texto.

51
UNIDADE 3 – Epistemologia nas Américas

_______________________________________________________________________________
Antes de prosseguir para o próximo tópico, recomendamos que você consulte o Tópico 3.1,
que contém indicações de vídeos sobre a autopoiesis, as quais vão expandir seu conhecimento so-
bre as ideias da filósofa.
_______________________________________________________________________________

2. 2. MARIO BUNGE E A FILOSOFIA DA CIÊNCIA


Tratarei agora de um tema novo: a Filosofia da Ciência, e com isso teremos novamente um fi-
lósofo argentino: Mario Bunge. Diferente dos dois filósofos anteriores, que produziram considera-
ções filosóficas sobre temas variados, Mario Bunge teve a maior parte de sua obra voltada para um
único tema: Filosofia da Ciência/Epistemologia (embora também tenha se notabilizado por suas
contribuições para a área da Ética, sendo tido como um dos grandes humanistas ainda vivos). Nessa
área, o filósofo produziu inúmeras obras e construiu uma produção sólida e relevante, conseguindo
grande destaque em nível internacional.

Figura 4 Mario Bunge.

Para apresentar sua obra, optamos por ilustrar alguns aspectos gerais a respeito da compre-
ensão que o filósofo possui da ciência, sua característica e método para, logo depois, apresentarmos
também algumas críticas que o filósofo construiu a respeito de outras formulações filosóficas.
Comecemos então pela definição que o filósofo cunhou para a ciência:
O conhecimento científico é claro e preciso: seus problemas são distintos, seus resultados são claros. O co-
nhecimento ordinário, em contrapartida, usualmente é vago e inexato; na vida diária nos preocupamos pou-
co com definições precisas, descrições exatas, ou medições afinadas: se estas nos preocupassem demasia-
damente, não lograríamos marchar no ritmo da vida. A ciência torna impreciso o que o sentido comum co-
nhece de maneira nebulosa; porém, desde já a ciência é muito mais que sentido comum organizado: ainda
que provenha do sentido comum, a ciência constitui uma rebelião contra sua imprecisão e superficialidade.
O conhecimento científico procura a precisão; nunca está inteiramente livre de imprecisões, porém as admi-
nistra para melhorar a exatidão; nunca está livre de todo o erro, porém possui uma técnica única para encon-
trar erros e para tirar proveito deles (BUNGE, 2018, p. 13-14, tradução nossa).

Como se percebe, para o filósofo, o conhecimento científico não possui a pretensão da preci-
são indiscutível sobre algo; no entanto, essa eventual imprecisão é combustível para o aprimora-
mento da própria ciência. Dessa caracterização que realiza, Bunge divide a ciência em duas ramifica-
ções, sendo elas:

52
UNIDADE 3 – Epistemologia nas Américas

Ciência formal: manifesta-se por meio de ciências como Matemática e Lógica. Caracte-
rizam-se por serem sistemáticas, racionais e verificáveis, contudo, segundo o filósofo
“não nos dão informações acerca da realidade: simplesmente não se ocupam dos fa-
tos. A Lógica e a Matemática tratam de entes ideais; esses entes, tanto os abstratos
como os interpretados, somente existem na mente humana (BUNGE, 2018, p. 6, tradu-
ção nossa).
 Ciência fática: tem como grande característica o fato de se basear em fatos e constan-
temente voltar a eles, quer seja para descartá-los, quer seja para transcendê-los. É
analítica, especializada, clara e precisa, posto que “seus problemas são distintos, seus
resultados são claros. O conhecimento ordinário, por outro lado, é vago e inexato [...]
A ciência torna impreciso o que o sentido comum conhece de maneira nebulosa; po-
rém, desde já a ciência é muito mais que sentido comum organizado: ainda que prove-
nha de sentido comum, a ciência constitui uma rebelião contra sua vagueza e superfi-
cialidade” (BUNGE, 2018 p. 13, tradução nossa).
Ainda segundo o filósofo, a ciência é clara e precisa, é comunicável na medida em que é públi-
ca, verificável, visto que pode ser colocada à prova da experiência; é metódica na medida em que
possui planejamento; é sistemática, pois não é uma coletânea de informações desconexas; é legal,
posto que postula leis, sejam a respeito da natureza e cultura; é explicativa, visto que explica os fa-
tos por meio dessas leis; é aberta, na medida em que não reconhece barreiras e, por fim, é útil, ao
produzir ferramentas e estas poderem ser utilizadas ainda que para o bem ou para o mal (BUNGE,
2018).
Bunge atribui a sua proposta epistemológica o conceito de realismo científico, e o exprime
conforme se segue:
O Realismo científico não é uma fantasia inventada por filósofos desconectados da realidade. Pelo contrário,
é a Epistemologia inerente à investigação científica e técnica. De fato, consiste em estudar e modificar o
mundo real, não em criar mundos imaginários (BUNGE, 1985, p. 55, tradução nossa).

A partir dessa última consideração, faz-se importante apresentar aqui as várias críticas que
Bunge realizou a várias correntes filosóficas e filósofos que, em sua análise, atuaram de modo a
“obstruir a exploração da realidade” (BUNGE, 2010, p. 97, tradução nossa). A essas, Bunge conce-
deu-lhes o título de misosofias, ou seja, filosofias que desprezam, temem ou odeiam o saber. Veja,
na Figura 5, algumas delas conforme apontadas pelo filósofo:

Figura 5 Lista de misosofias, segundo Bunge.

53
UNIDADE 3 – Epistemologia nas Américas

Vejamos um exemplo de como o filósofo realiza suas considerações críticas a respeito de al-
gumas delas:
Todo investigador sério, em qualquer terreno, procura raciocinar corretamente, ou seja, com claridade e co-
erência. Para tanto, as filosofias racionalistas favorecem a investigação. Em contrapartida, as piruetas verbais
dos Heidegger, Sartre, Derrida, Deleuze, Vattimo, Kristeva e Irigaray são, absurdas, triviais. Como dissera Go-
ya, “o sonho da razão produz monstros” Em todo caso, o pós-modernismo, em particular o existencialismo e
o “pensamento débil”, são contrários ao progresso das ciências, porque entorpecem o raciocínio e fazem
com que os estudantes se limitem a memorizar fórmulas que tomam por profundas porque não as enten-
dem (BUNGE, 2010, p. 97, tradução nossa).

Considerações fortes não? Os posicionamentos de Bunge a respeito dessas abordagens filosó-


ficas se sustentam tanto pela sua defesa do realismo, que fundamenta suas teorias filosóficas, quan-
to pelo fato de que possui profundos vínculos com a chamada Filosofia Analítica, a qual, dada sua
estruturação epistemológica, possui uma compreensão própria do que seja a filosofia, sendo anta-
gônica a algumas das abordagens citadas por Bunge.
Com isso, encerramos esta apresentação do filósofo e convidamos você a investigar as muitas
publicações que realizou e que estão disponíveis para acesso on-line.

_______________________________________________________________________________
Antes de prosseguir para o próximo tópico, recomendamos que você consulte o Tópico 3.2,
que contém uma indicação de texto que vai expandir seu conhecimento sobre a Hermenêutica de
Bunge.
_______________________________________________________________________________

2. 3. A HERMENÊUTICA ANALÓGICA DE MAURICIO BEUCHOT


Trataremos agora do filósofo mexicano contemporâneo (e ainda vivo) Hardie Beuchot Mauri-
cio Puente ou, simplesmente, Mauricio Beuchot (1950). Embora tenha, em seus escritos, tratado de
outros temas, destaca-se sobremaneira a contribuição que realizou para a Hermenêutica. Atualmen-
te, é considerado como o fundador de uma nova proposta hermenêutica, intitulada pelo filósofo de
Hermenêutica Analógica.

Figura 6 Maurício Beuchot.

Antes de nos dedicarmos à sua proposta, convém, neste momento, realizar uma pequena di-
gressão sobre ao conceito de Hermenêutica. Para Abbagnano, o termo refere-se a “Qualquer técni-
ca de interpretação. Essa palavra é frequentemente usada para indicar a técnica de interpretação da
Bíblia (ABBAGANANO, 2007, p. 497). Especificamente na Filosofia, esse termo ganhou contornos

54
UNIDADE 3 – Epistemologia nas Américas

próprios na atualidade, porque “Contemporaneamente a hermenêutica constitui uma reflexão filo-


sófica interpretativa ou compreensiva sobre os símbolos e os mitos em geral” (JAPIASSU, 2001, p.
92). Aquele que se apropria da hermenêutica passa a ter nela uma virtude, porque:
[...] como toda atividade humana, a interpretação pode chegar a constituir no homem um hábito, uma virtu-
de. É a virtude hermenêutica, a interpretação qualificada, que se forma pela experiência e pelo estudo, so-
bretudo pela prática interpretativa de muitos textos. É uma virtude mista, quer dizer, em parte teórica e em
parte prática, teórico-prática (BEUCHOT, 2007, p. 70, tradução nossa).

Em nosso século, nomes como os do filósofo Hans Georg Gadamer (1900-2002) ou, ainda, do
filósofo Paul Ricoeur (1913-2005) se destacam nessa área de investigação filosófica. O primeiro, se-
gundo Millán (2015), contribui de modo que a hermenêutica deixe tão somente de lidar com a in-
terpretação de textos e “se converte em uma teoria filosófica que sustenta que o exercício do en-
tendimento envolve interpretação e tenta construir uma fenomenologia da compreensão” (MILLÁN,
2015, p. 155-156, tradução nossa).
Mais recentemente, Beuchot se apresenta também com uma proposta também promissora e,
segundo Millán, realiza um diálogo com a hermenêutica de Gadamer. Comecemos, então, pela ori-
ginalidade que o filósofo mexicano atribui a sua proposta.
Segundo Beuchot, sua abordagem busca se contrapor a duas abordagens extremas e que esta-
riam presentes na Hermenêutica, sendo elas as que se seguem:
A hermenêutica univocista busca uma interpretação única de cada texto, não deixando espaço para os ou-
tros, que descem ao posto de completamente falsos. Por sua vez, a hermenêutica equivocista supõe que a
maioria das interpretações de um texto (e às vezes todas) são válidas, com as quais a própria interpretação é
banalizada e a hermenêutica se torna impossível por ser inútil (BEUCHOT, 2007, p. 68, tradução nossa).

A primeira, segundo Beuchot (apud MILLÁN, 2015, p. 157), se assenta nas propostas do filóso-
fo John Stuart Mill e do Positivismo Lógico e nela há o sonho de que as interpretações sejam unívo-
cas, puramente extensões da realidade e, segundo o filósofo, se de fato ocorressem, não existiria
mais a Hermenêutica, visto que não haveria mais necessidade de interpretação. Quanto à segunda,
pode ter suas raízes verificadas nas obras de filósofos tais como Friedrich Nietzsche e Jacques Derri-
da e nela está presente a concepção de que existem múltiplas interpretações da realidade e do tex-
to.
Ao longo da história cultural humana, para Beuchot, existiram épocas em que prevaleceram
momentos unívocos, equívocos e analógicos. Vejamos uma síntese deles:
Quadro 2 Momentos da Hermenêutica em diferentes épocas.
Épocas Hermenêutica
Época Clássica Grega Unívoca
Alta Idade Média Equívoca
Idade Média Madura Analógica
Baixa Idade Média Equívoca
Renascimento Unívoca
Barroco Analógica
Ilustração Unívoca
Romantismo Equivoca e analógica
Positivismo Intensamente unívoca

Fonte: adaptado de Beuchot (2007).

E o que seria a analogia? Para Beuchot, ela se originou com os filósofos gregos pitagóricos, ao
fazerem uso do termo “kat’analogían”, ou seja, aquilo que tem proporção, e teve em Platão e, mais

55
UNIDADE 3 – Epistemologia nas Américas

especialmente, Aristóteles, grandes representantes dessa técnica interpretativa e que teria como
característica o que se segue:
[...] a analogia é o que tem diferença e, no entanto, igualdade ou semelhança, é o claro-escuro. Teria até que
se dizer que o análogo é preponderantemente diferente, já que é simplesmente a diferença, mas sujeito de
alguma forma à semelhança, já que não à plena igualdade ou identidade. Além disso, a analogia tem dois
modos principais: proporcionalidade e atribuição. A analogia já é a proporcionalidade, a saber, relação de re-
lações ou proporções. A é para B como C para D. Isto é, o que me serviu no caso de uma pessoa que estava
em uma determinada situação será capaz de me servir no caso de outra pessoa que está em uma situação
semelhante. Somente tem que se fazer todos os ajustes, atender ao contexto, salvar as diferenças, precisa-
mente ressaltar as diferenças, apesar da semelhança dos casos (BEUCHOT, 2007, p. 73, tradução nossa).

Do exposto na citação, há de se verificar como o filósofo estabeleceria uma leitura hermenêu-


tica a partir de sua proposta. Antes de tudo, para interpretar, necessito obter informações sobre o
autor, para verificar qual a intenção realizada quando da produção do texto, necessito analisar o
tipo de texto e o significado que nele se encerra e se veicula, e também o leitor, que busca agir de
modo a decifrar o que é dito e, também, contribui com algum significado ou matiz, visto que sua
particularidade humana também se apresentará quando da leitura do texto.
Para que possamos contextualizar um texto e compreendê-lo adequadamente, há de se reali-
zar várias perguntas, dentre elas: o que esse texto diz a mim? A quem se dirige esse texto? Qual é o
significado que se apresenta no texto? O que esse texto diz a mim neste momento? O que se quer
dizer por meio desse texto?
Ao fazermos esses procedimentos propostos por Beuchot, teremos a realização do ato her-
menêutico e este seria, conforme o pensador:
No ato hermenêutico há um texto, um autor e um intérprete. O texto pode ser de vários tipos: escrito, falado
e representado (ou incorporado em outros materiais, e foi até tomado como texto o pensamento puramen-
te). Precisamente a subtileza interpretativa ou hermenêutica consiste em captar a intencionalidade significa-
tiva do autor, apesar da interferência da intencionalidade do intérprete. O intérprete coloca em jogo um pro-
cesso que começa com a questão interpretativa na frente do texto; continua com o julgamento interpretati-
vo do intérprete, um juízo que geralmente é, primeiro, hipotético e, depois, categórico; e vai do hipotético ao
categórico por meio de um argumento que segue uma inferência hipotético-dedutiva, ou retrodutiva, ou ab-
dutiva. Em qualquer caso, o argumento interpretativo serve para convencer os outros membros da comuni-
dade ou tradição hermenêutica sobre a interpretação que foi feita (BEUCHOT, 2000, n.p., tradução nossa).

Desses elementos apresentados, convidamos você a analisar os textos que originaram essa
breve digressão sobre o filósofo e, também, a compará-lo seus pensamentos aos de outros formu-
ladores da teoria hermenêutica.

2. 4. O PRAGMATISMO DE CHARLES SANDER PEIRCE


Trataremos agora de nosso último filósofo a ser abordado em Epistemologia: o norte-
americano Charles Sander Peirce. Esse filósofo, em conjunto com os também americanos William
James e James Dewey, inaugurou nos Estados Unidos uma abordagem original e ousada a respeito
do conhecimento humano, o Pragmatismo. Essa abordagem a respeito do conhecimento gerou tan-
tos desdobramentos e filósofos que seria possível construir uma obra tão somente para tratar desse
tema.

56
UNIDADE 3 – Epistemologia nas Américas

Figura 7 Charles Sanders Peirce.

É preciso dizer ainda que, especificamente em relação à obra de Peirce, se acaso se optasse
por lidar com outra área de investigação filosófica, a Filosofia da Linguagem, esse filósofo também
seria uma figura canônica, porque sua abordagem filosófica inaugura um novo ramo de pesquisa a
respeito do significado: a Semiótica.
Para iniciar nossa análise a respeito do filósofo, convém que se comece com uma breve defini-
ção do pragmatismo produzida por Japiassu e, segundo o autor, o pragmatismo atua:
defendendo o empirismo no campo da teoria do conhecimento e o utilitarismo no campo da moral. O prag-
matismo valoriza a prática mais do que a teoria e considera que devemos dar mais importância às conse-
qüências e efeitos da ação do que a seus princípios e pressupostos. A teoria pragmática da verdade mantém
que o critério de verdade deve ser encontrado nos efeitos e conseqüências de uma idéia, em sua eficácia, em
seu sucesso. A validade de uma idéia está na concretização dos resultados que se propõe a obter (2001, p.
154).

Para Atkins (2018), as contribuições de Peirce para essa ocorrente ocorreram ao longo de toda
sua vida. Inicialmente, surgiram em uma publicação produzida em 1878, intitulada How to make our
ideas clear (“Como tornar suas ideias claras”). Essas contribuições chegaram até William James e
este apontou que o texto de Peirce possui contribuições seminais para o Pragmatismo. Após isso,
Peirce reformulou e aprofundou suas propostas iniciais ao longo de toda sua vida. Abordaremos
neste espaço alguns dos aspectos iniciais de sua contribuição e, por fim, suas últimas contribuições.
Tudo se inicia com questão referente à clareza: segundo Atkins, Peirce apresenta três aspectos
a serem considerados. O primeiro ocorreria quando tenho contato de modo irrefletido com um con-
ceito em nossa experiência cotidiana. O segundo está ligado à nossa capacidade de formular um
conceito, livre de experiências particulares, ou seja, ele deve possuir um caráter geral, que vai além
do uso irrefletido do conceito (ATKINS, 2018).
Já o terceiro aspecto agrega algo fundante para o pragmatismo:
Considere quais efeitos, que podem ter uma orientação prática, concebemos que o objeto de nossa con-
cepção tem. Então, toda a nossa concepção desses efeitos é toda a nossa concepção do objeto (PEIRCE
1878/1992 apud ATKINS, 2018, destaque e tradução nossos).

Dessa máxima produzida por Peirce ocorreriam alguns desdobramentos; um deles é que ela
permite verificar como esses conceitos impactam nossas vidas, permite que foquemos nossa inves-
tigação. Além disso, a máxima pragmática permite que nos afastemos da metafísica e suas respecti-
vas distrações, porque as afirmações a priori não possuem significados práticos e isso as torna sem
sentido (ATKINS, 2018).
Além disso, por meio dessa máxima pragmática, seria possível, segundo Peirce, evitar o risco
de nos envolvermos em confusões conceituais e, para que isso ocorresse, bastaria que nós equacio-
nássemos o significado dos conceitos por meio das consequências práticas ou operacionais a respei-
to daquilo que o conceito buscava tratar.

57
UNIDADE 3 – Epistemologia nas Américas

Dito de outro modo, podemos verificar o quanto um conceito é significativo por meio da apli-
cação desse conceito na realidade e, por meio dessa aplicação, seria possível ocasionar uma mudan-
ça observável em alguma coisa.
A partir desses elementos, como poderíamos afirmar que uma teoria tem uma possibilidade
maior de se aproximar da verdade? Se aplicarmos a máxima pragmática, ela será tanto mais verda-
deira quanto melhor puder predizer determinado evento ou controlar os desdobramentos desses
mesmos eventos no mundo.
Outro aspecto interessante advindo da teoria proposta pelo filósofo ficou conhecido pelo ter-
mo “falibilismo”, o qual foi investigado com profundidade por filósofos da ciência no século 20. Nele
se apresenta a ideia seminal de que uma verdade científica, ainda que comprovada em determinado
momento e baseada em fatos, será sempre provisória, ou seja, nunca poderá ser considerada como
certa, mas sempre como provável.
Na ciência, enquanto esta ou aquela teoria funcionar, poderemos fazer uso dela, no entanto,
se surgirem dificuldades as quais essa teoria não ofereça condições adequadas para resolver, deve-
remos estar preparados para abandoná-la.
Para encerrar essas considerações introdutórias sobre o pragmatismo, tomamos a liberdade
de apresentar o quanto essa abordagem está presente em nossas vidas, e muitas vezes sequer nos
apercebemos disso. Para isso, tomemos como exemplo uma questão ética: o uso de embriões hu-
manos em pesquisas. Se for possível demonstrar um resultado prático que beneficie diretamente as
pessoas, deveria ser realizado; contudo, se o contrário ocorresse, e não gerasse nenhum resultado
prático, deveria ser deixada de lado.
_______________________________________________________________________________
Antes de prosseguir para as Questões Autoavaliativas do Tópico 4, recomendamos que você
acesse o texto indicado no Tópico 3.3, para expandir seu conhecimento sobre o Pragmatismo de
Peirce.
_______________________________________________________________________________

3. CONTEÚDO DIGITAL INTEGRADOR


O Conteúdo Digital Integrador representa uma condição necessária e indispensável para você
compreender integralmente os conteúdos apresentados nesta unidade.

3. 1. A AUTOPOIESIS DE MATURANA E VARELLA


Muitas são as produções em vídeo de que você pode fazer uso para conhecer um pouco mais
sobre a autopoiesis. Escolhemos dois vídeos que versam sobre ela e que poderão contribuir para sua
formação. O primeiro deles é um vídeo curto e que busca sintetizar, de modo criativo, o conceito de
autopoiesis. Já o segundo é uma palestra de Humberto Maturana e nela ele fala a respeito da ori-
gem da vida.
 RAMOS, G. V. Autopoiesis final. 2015. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=o3xqbkyymde>. Acesso em: 25 jun. 2018.
 MATURANA, H. El origen de la vida. In: CONGRESO FUTURO, 2017. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=k67ll2aavrw>. Acesso em: 25 jun. 2018.

58
UNIDADE 3 – Epistemologia nas Américas

3. 2. A EPISTEMOLOGIA DE MARIO BUNGE


Dentre os muitos artigos a respeito da Epistemologia proposta por Mario Bunge, destacamos
um texto de Murilo Westphal e Thais Cristine Pinheiro, produzido em 2004. Nele são abordadas a
importância e as características da Epistemologia de Bunge e como ela pode favorecer o ensino de
Ciências.
 WESTPHAL, M.; PINHEIRO, T. C. Epistemologia de Mario Bunge e sua contribuição para
o ensino de Ciências. Ciência & Educação, Bauru, v. 10, n. 3, p. 585-596, 2004. Disponí-
vel em: <http://www.scielo.br/pdf/ciedu/v10n3/19.pdf>. Acesso em: 25 jun. 2018.

3. 3. O PRAGMATISMO DE PEIRCE
A abordagem que apresentamos a respeito das ideias de Peirce tem um caráter eminente-
mente introdutório. Para que você possa conhecer mais algumas nuances sobre suas ideias e o
Pragmatismo, convidamos você a ler o artigo cujo link se encontra a seguir e que foi produzido por
Maria Virgínia Machado Dazzani:
 DAZZANI, M. V. M. O Pragmatismo de Peirce como teoria do conhecimento e da
aprendizagem. Caderno Seminal Digital, ano 14, v. 10, n. 10, p. 283-311, jul./dez. 2008.
Disponível em: <http://www.e-
publicacoes.uerj.br/index.php/cadernoseminal/article/viewFile/12693/9848>. Acesso
em: 25 jun. 2018.

4. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
A autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para você testar o seu desempenho. Se
encontrar dificuldades em responder às questões a seguir, você deverá revisar os conteúdos estu-
dados para sanar as suas dúvidas.
1) A respeito do processo de evolução do ser humano, segundo a teoria da autopoiesis, é correto afirmar o que se
segue:

a) A ênfase se dá no ambiente, visto que recebemos seus estímulos e os armazenamos.

b) Há uma ênfase na filogênese, porque nossa condição de espécie determina nossa relação com o mundo.

c) Há uma ênfase na ontogênese, porque, ainda que nos relacionemos com o ambiente, as construções são de
ordem biológica e internas.

d) É possível que sejamos observadores de nós mesmos dadas as nossas características transcendentais.

e) O homem é o único ser capaz de se colocar “de fora” de seu contexto e observar externamente os
fenômenos.

2) Um dos muitos desdobramentos advindos da teoria da autopoiesis, proposta por Maturana e Varella, ocorreu
na teoria social produzida por Luhmann. A esse respeito, selecione a alternativa que apresenta uma afirmação
equivocada a respeito da teoria proposta por Luhmann:

a) Os sistemas sociais possuem vida própria.

b) Na proposta de Luhmann, os sistemas sociais são capazes de se distinguir do ambiente.

c) Por meio da automanutenção, é possível a adaptação do sistema social ao ambiente em que se encontra.

d) A autorreconstrução é um mecanismo que permite ao sistema se reconstruir a partir das interações


externas com o meio ambiente.

59
UNIDADE 3 – Epistemologia nas Américas

e) Os sistemas realizam interações internas e externas, permitindo sua autorreconstrução.

3) Analise as afirmações a seguir, produzidas por Mario Bunge, que tratam das diferenças do conhecimento
científico. Em seguida, selecione a alternativa que apresenta as afirmações corretas:
I. O conhecimento científico se distingue por sua clareza e precisão.
II. Costumeiramente buscamos, em nosso dia a dia, definições precisas e descrições exatas.
III. Podemos entender que a ciência é sentido comum organizado.
IV. A imprecisão e superficialidade geram uma reação da ciência.
V. Por meio da ciência, é possível nos afastarmos do erro.

a) Estão corretas as afirmações I, III e V.

b) Estão corretas as afirmações I, II, IV e V.

c) Estão corretas as afirmações I e IV.

d) Estão corretas as afirmações II e V.

e) Estão corretas as afirmações II, III e IV.

4) A respeito da distinção proposta por Bunge sobre a ciência fática e ciência formal, podemos afirmar que:

a) A primeira se baseia em exercícios racionais e a segunda, em fatos.

b) A primeira é verificável e a segunda, hipotética.

c) A primeira busca os fatos e a segunda não é sistemática.

d) A primeira dá ênfase ao empírico (fatos), a segunda é racional e verificável.

e) A distinção é somente semântica, visto que os fundamentos são os mesmos.

5) A respeito da proposta hermenêutica de Mauricio Beuchot, podemos afirmar que ela se assenta no uso do
recurso de:

a) Semiótica.

b) Comparação hierárquica textual.

c) Paralogismos.

d) Analogia.

e) Metáfora exemplificativa.

6) Na proposta hermenêutica de Beuchot, temos que o leitor:

a) Busca captar passivamente o sentido de um texto.

b) Assimila as ideias produzidas pelo autor.

c) Não intervém nos sentidos produzidos pela obra original.

d) Estabelece uma relação de tutoramento advindo do que se encontra no texto analisado.

e) Contribui com significados ao texto advindos de sua particularidade.

60
UNIDADE 3 – Epistemologia nas Américas

7) (UEM -2012) “O pragmatismo opõe-se ao intelectualismo e a todas as formas de pensamento da totalidade,


buscando dar atenção aos fatos observáveis e às suas consequências. É um método de esclarecimento das
diferenças significativas entre ideias, que se assenta na antecipação das consequências futuras que essas ideias
possam ter.”
(ARANHA, M. L.; MARTINS, M. H. P. Temas de Filosofia. 3. ed. rev. São Paulo: Moderna, 2005, p. 118).
Com base no excerto citado e nos seus conhecimentos sobre o pragmatismo, assinale o que for correto:

A) Segundo o pragmatismo, o concretamente experienciável é indispensável para julgar a pertinência das


ideias.

B) O pragmatismo requer o conhecimento de verdades inatas.

C) Princípios da teoria evolucionista, que considera a continuidade de um ser vivo ligada à capacidade de
adaptação ao mundo, estão em conformidade com o pragmatismo.

D) Ao criticar o intelectualismo, o pragmatismo pretende liberar a metafísica de conceitos vagos e dar lugar a
uma filosofia purificada, científica e realista.

E) Segundo o pragmatismo, o significado de uma ideia não é dado por si mesmo, mas em seu valor de uso e
nas suas consequências.

8) (UEM, 2016) “Para o pragmatismo, a experiência é substancialmente abertura para o futuro (…). Desse ponto
de vista, uma ‘verdade’ não existe porque pode ser confrontada com os dados acumulados da experiência
passada, mas por ser suscetível de qualquer uso na experiência futura. Nesse sentido, a tese fundamental do
pragmatismo é a de que toda a verdade é uma regra de ação, uma norma para a conduta futura.”
(ABBAGNANO, N. História de filosofia. In: ARANHA, M. L. A. Filosofar com textos: temas e história da filosofia.
São Paulo: Moderna, 2012, p. 487).
Sobre o pragmatismo, assinale o que for correto:

a) O fundamento filosófico do pragmatismo é a crença racional justificada pelo alcance teórico dos conceitos.

b) O pragmatismo está associado à fenomenologia, pois visa aos conteúdos intencionais da consciência.

c) A função da experiência é a possibilidade de formar instrumentos capazes de orientar a ação.

d) Ao recusar um fundamento filosófico fundacionalista, o pragmatismo é relativista.

e) Segundo o pragmatismo, não há verdade absoluta, mas construção do conhecimento através do diálogo e
do intercâmbio de experiências.

Gabarito
Confira, a seguir, as respostas corretas para as questões autoavaliativas propostas:
1) c.
2) d.
3) c.
4) d.
5) d.
6) e.
7) a; c; d; e.
8) c; e.

61
UNIDADE 3 – Epistemologia nas Américas

5. CONSIDERAÇÕES
Encerramos nosso pequeno passeio sobre a Epistemologia e alguns de seus desdobramentos:
a Filosofia da Ciência e a Hermenêutica. Por meio dele, buscamos apresentar a você posicionamen-
tos diversos a respeito desse tema e que podem, certamente, ampliar suas indagações a respeito de
como podemos lidar com o conhecimento, interpretar os discursos e analisar a nossa relação com o
mundo mediante o exercício investigativo. Como as respostas são múltiplas e diversas, convidamos
você a enveredar por elas e construir o seu próprio arcabouço teórico sobre esses temas.

6. E-REFERÊNCIAS

Lista de figuras
Figura 1 Humberto Maturana e Francisco Varela. Disponível em: <http://www.rc.unesp.br/biosferas/Art0022.html>. Acesso em: 25
jun. 2018.
Figura 2 Niklas Luhmann. Disponível em: <http://institutoconceito.com/?p=187>. Acesso em: 25 jun. 2018.
Figura 4 Mario Bunge. Disponível em: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/2/28/MarioBungesmall.jpg>. Acesso em:
25 jun. 2018.
Figura 5 Lista de misosofias, segundo Bunge. Disponível em: <http://revistas.uigv.edu.pe/index.php/exegesis/article/view/158/167>.
Acesso em: 25 jun. 2018.
Figura 6 Mauricio Beuchot. Disponível em: <http://www.academia.org.mx/academicos-2017/item/mauricio-beuchot>. Acesso em: 25
jun. 2018.
Figura 7 Charles Sanders Peirce. Disponível em: <http://www.iep.utm.edu/wp-content/media/peirce.jpg>. Acesso em: 25 jun. 2018.

Sites consultados
ATKINS, A. Charles Sanders Peirce: Pragmatism. Internet Encyclopedia of Philosophy. Disponível em:
https://www.iep.utm.edu/peircepr/. Acesso em: 25 jun. 2018.
BEUCHOT, M. Perfiles esenciales de la Hermenéutica: Hermenéutica Analógica. 2000. Disponível em:
<https://www.ensayistas.org/critica/teoria/beuchot/>. Acesso em: 25 jun. 2018.
BUNGE, M. Filosofías y fobosofías: parteras e institutrices, porteras y carceleras, engañadas y mercenarias, escapistas y ambivalentes.
Exégesis, Humacao, Porto Rico, p. 97-104, 2010. Disponível em: http://revistas.uigv.edu.pe/index.php/exegesis/article/view/158/167.
Acesso: 25 jun. 2018.
______. La ciencia: su método y su filosofia. Disponível em: <https://users.dcc.uchile.cl/~cgutierr/cursos/INV/bunge_ciencia.pdf>.
Acesso em: 25 jun. 2018.
MILLÁN, G. O. Hermenéutica analógica, verdad y método. Diánoia, México, v. 60, n. 74, maio 2015. Disponível em:
<http://www.scielo.org.mx/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0185-24502015000100008>. Acesso em: 25 jun. 2018.
ZELENY, M. What Is Autopoiesis? In: ______. (Ed.) Autopoiesis: a theory of living organization. New York: Elsevier, 1981. Disponível
em: http://www.univie.ac.at/constructivism/archive/fulltexts/1194.pdf. Acesso: 25 jun. 2018.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABBAGNANO, N. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
ANDRADE, C. D. A Fenomenologia da Percepção a partir da autopoiesis de Humberto Maturana e Francisco Varela. Griot – Revista de
Filosofia, Amargosa, v. 6, n. 2, dez. 2012.
BEUCHOT, M. Exposición sucinta de la Hermenéutica Analógica. Solar, Lima, n. 3, ano 3, p. 67-77, 2007.
BUNGE, M. Racionalidad y realismo. Madrid: Alianza, 1985.
JAPIASSU, D. Dicionário de Filosofia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.

62
UNIDADE 4
Paideia e Estética nas Américas

Objetivo
 Apresentar algumas das principais contribuições filosóficas nas Américas que versam sobre a Paideia (educação) e
Estética.

Conteúdos
 A Pedagogia Crítica de Paulo Freire.
 A aprendizagem baseada na experiência de John Dewey
 A estética subjetiva de George Santayana.
 O fim da arte segundo Arthur Danto.

Orientações para o estudo da unidade


Antes de iniciar o estudo desta unidade, leia as orientações a seguir:
1) Não se limite a este conteúdo; busque outras informações em sites confiáveis e/ou nas referências bibliográficas,
apresentadas ao final de cada unidade. Lembre-se de que, na modalidade EaD, o engajamento pessoal é um fator
determinante para o seu crescimento intelectual.
2) Busque identificar os principais conceitos apresentados; siga a linha gradativa dos assuntos até poder observar a
evolução do estudo das contribuições americanas à Paideia e à Estética.
3) Não deixe de recorrer aos materiais complementares descritos no Conteúdo Digital Integrador.

63
UNIDADE 4 - Paideia e Estética nas Américas

1. INTRODUÇÃO
Estamos agora diante do último desafio desta obra. Para dar conta dele, selecionamos cuida-
dosamente dois temas que suscitam as paixões mais acaloradas. O primeiro se refere aos caminhos
que devemos adotar para a educação ou, como diriam os gregos do período clássico, qual proposta
de Paideia pode animar a sociedade e fazer com que se realize um ideal pleno de educação.
O Brasil tem se caracterizado por índices alarmantes quanto à realização de uma educação efi-
ciente, que, de fato, oportunize às pessoas acesso, aquisição e produção de conhecimento sistema-
tizado e, desse modo, esse tema se reveste de importância e a Filosofia tem contribuições impor-
tantes a esse respeito. Por isso, apresentaremos a você, em linhas gerais, as propostas elaboradas
pelo educador brasileiro Paulo Freire e pelo educador norte-americano William James. Ambos, a seu
modo, sacudiram as costumeiras visões que temos a respeito da educação e apresentaram propos-
tas não usuais para que o ideal educativo se realize adequadamente.
Por fim, em nosso último tema, teremos as questões estéticas e o desafio contemporâneo de
investigar a arte e seus fundamentos. Essa questão tem gerado os posicionamentos mais variados,
quer seja de grupos defendendo as múltiplas manifestações artísticas, quer seja de grupos que
questionam a chamada arte contemporânea.
Para oferecer novas possibilidades de análise sobre essa questão, apresentaremos as conside-
rações de George Santayana e Arthur Danto. Com isso, encerramos esta obra e resta expressar nos-
so desejo de que os temas aqui apontados possam inspirar você a se aprofundar neles e ampliar o
seu leque de indagações e inquietações filosóficas.

2. CONTEÚDO BÁSICO DE REFERÊNCIA


O Conteúdo Básico de Referência apresenta, de forma sucinta, os temas abordados nesta uni-
dade. Para sua compreensão integral, é necessário o aprofundamento pelo estudo do Conteúdo
Digital Integrador.

2. 1. PAULO FREIRE
Trataremos agora do representante brasileiro em nossa investigação sobre a Filosofia nas
Américas. Certamente alguns ficarão surpresos com essa escolha, vindo a considerar que o escolhi-
do talvez não represente, de fato, a Filosofia brasileira e outros, talvez devido à escolha devido às
restrições político-partidárias já apontadas em nossa introdução, venham a tecer inúmeros adjetivos
negativos para se referir a Paulo Freire e esses adjetivos ocorrerão, tão somente, em razão de que,
segundo o imaginário de seus críticos, esse pensador se fundamenta em posicionamento filosófico
considerado inadequado.

Figura 1 Paulo Freire.

64
UNIDADE 4 - Paideia e Estética nas Américas

Para esses últimos críticos, convém ressaltar o que havíamos apontado anteriormente: na Fi-
losofia, não temos um “lado” definido aprioristicamente, não se nega a realização da análise da rea-
lidade a partir de múltiplos olhares, e tampouco existem temas tabus com os quais a investigação
filosófica não dialogue. Se o investigador da Filosofia pretende realizar sua investigação sem que
com ela sejam problematizados ou questionados seus posicionamentos prévios, ele certamente não
deveria estar fazendo Filosofia.
Dito isso, vamos agora explicitar a razão da escolha de Paulo Freire. Ao tratarmos da educação
nesta unidade, convém informar que Freire é tido como um dos grandes filósofos da educação no
século 20 e, se não bastasse isso, se você realizar pesquisas internacionais voltadas a esse tema,
verá que ele se insere ao lado de figuras como John Dewey ou William James. Desse modo, é possí-
vel afirmar que Paulo Freire foi o pensador brasileiro que teve maior impacto internacional na área
em que realizou suas investigações.
Estranhamente, devido às questões ideológico partidárias já apontadas no início deste texto,
no Brasil, muitas vezes, seu nome sequer consta nas obras que tratam desse tema.
Dito isso, vejamos como a obra de Freire recebeu inúmeros questionamentos dada a sua ori-
ginalidade/ousadia:
A obra de Freire recebeu inúmeras críticas ao longo dos anos. Aqueles que consideravam a educação como
um processo neutro ou técnico reclamavam que a abordagem freiriana “politizava” o ensino e aprendiza-
gem. A recusa de Freire em prover “pacotes” irritou aqueles que procuravam soluções metodológicas claras
para os problemas educacionais. O uso do pronome masculino em Pedagogia do Oprimido e outros textos
iniciais foi atacado. A notação de promoção de uma consciência de modo crítico foi questionada. O foco de
Freire na classe social (à custa de gênero e etnicidade) em suas primeiras análises da opressão tornou-se
problemática por um número de teóricos da educação contemporâneos. Outros sugeriram que Freire deve-
ria ter devotado mais espaço em seus livros para a teoria de classe. Alguns críticos argumentaram que a pe-
dagogia freiriana, contrária aos seus objetivos professados, constitui uma forma de invasão cultural. Final-
mente, como as ideias pós-modernas têm obtido grande ênfase nos tempos recentes, as premissas universa-
listas na Ética, Epistemologia e Pedagogia de Freire foram atacadas (ROBERTS, 2000, p. 2, tradução nossa).

Do exposto, percebe-se quanto seu trabalho gerou paixões, críticas e, em contrapartida, inú-
meros reconhecimentos pela sua originalidade visto que é um autor cuja
teoria pedagógica influenciou os movimentos educacionais e sociais em todo o mundo e cujos escritos filosó-
ficos influenciaram as disciplinas acadêmicas que incluem Teologia, Sociologia, Antropologia, Linguística Apli-
cada, Pedagogia e Estudos Culturais (STATEUNIVERSITY.COM, 2018, tradução nossa).

Bem, e quem foi Paulo Freire? De modo geral, é possível afirmar que Freire teve na educação
de adultos seu foco central. Em 1964, após o golpe militar ocorrido em nosso país, Freire foi preso e
exilado devido à interpretação realizada pelo governo militar vigente de que sua proposta educativa
viria a ser subversiva e ameaçaria o status quo político vigente em nosso país naquele período.
Há que se destacar que, ao longo do tempo passado na prisão, Freire produziu seu primeiro li-
vro, Educação como prática da liberdade e, em 1968, publicou aquela que é considerada sua obra
mais importante, a Pedagogia do oprimido.
Nessa obra, está presente a ideia seminal de que qualquer ser humano, não importando o
quão "ignorante" seja – ou que porventura esteja naquilo que Freire chama de cultura do silêncio
(FREIRE, 1987, p. 34) –, torna-se capaz de exercitar um olhar crítico por meio de um encontro dialó-
gico com os outros.
Considerando o exposto, convém apresentar a filiação filosófica de Freire. Costumeiramente,
a obra de Freire se insere naquilo que se intitula Pedagogia Crítica. Nela temos a junção de uma filo-
sofia de educação e movimento social que combina educação com teoria crítica.
Um dos teóricos que se inspiraram nas ideias de Freire, o norte americano Henry Giroux, a de-
fine como um:

65
UNIDADE 4 - Paideia e Estética nas Américas

movimento educacional, orientado pela paixão e, principalmente, para ajudar os alunos a desenvolver a
consciência da liberdade, reconhecer tendências autoritárias e conectar o conhecimento ao poder e à capa-
cidade de realizar ações construtivas (GIROUX, 2010, p. 67, tradução nossa).

Ainda que Freire tenha como elementos centrais em sua proposta filosófica práxis, dialogici-
dade com outros, categorias relevantes presentes no marxismo, não podemos tão somente caracte-
riza-lo como um filósofo de fundamentação marxista e, tampouco filiado à chamada Teologia da
Libertação, porque:
é importante notar que a construção da teoria de libertação de Freire inclui outras tradições intelectuais,
como o liberalismo, a fenomenologia, o existencialismo e certos aspectos do pensamento pós-moderno e
pós-estruturalista (LIU, 2012, p. 21, tradução nossa).
Na proposta de Paulo Freire, temos algumas categorias essenciais a serem consideradas,
quando nos dedicamos a analisar o que ocorre no espaço educativo. Vejamos algumas delas em
detalhe.

Educação bancária
Sobre essa categoria, vejamos o que expressa Freire:
Em lugar de comunicar-se, o educador faz “comunicados” e depósitos que os educandos, meras incidências,
recebem pacientemente, memorizam e repetem. Eis aí a concepção “bancária” da educação, em que a única
margem de ação que se oferece aos educandos é a de receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los.
Margem para serem colecionadores ou fichadores das coisas que arquivam. [...] Na visão “bancária da edu-
cação, o “saber” é uma doação dos que se julgam sábios aos que julgam nada saber. Doação que se funda
numa das manifestações instrumentais da ideologia da opressão – a absolutização da ignorância, que consti-
tui o que chamamos de alienação da ignorância, segundo a qual esta se encontra sempre no outro (FREIRE,
1987, p. 33).
Do texto citado, depreende-se que o professor tem um papel ativo e o aluno, um papel passi-
vo. No ato de depositar informação sobre seus alunos, o professor atende à necessidade dos opres-
sores e, em tal condição, o aluno tem anulado a sua condição ativa e criativa, sujeitando-se ao que o
opressor deseja.

Desumanização
Sobre desumanização, afirma Freire:
A desumanização, que não se verifica, apenas, nos que têm sua humanidade roubada, mas também, ainda
que de forma diferente, nos que a roubam, é distorção da vocação do ser mais. [...] A luta pela humanização,
pelo trabalho livre, pela desalienação, pela afirmação dos homens como pessoas, como “seres para si”, não
teria significação. Esta somente é possível porque a desumanização, mesmo que um fato concreto na histó-
ria, não é porém, destino dado, mas resultado de uma “ordem” injusta que gera a violência dos opressores e
esta, o ser menos (FREIRE, 1987, p. 16).

Nesse trecho, temos que a desumanização é um desdobramento natural advindo da opressão


e, mediante o ato opressor, o indivíduo perde paulatinamente sua humanidade.

Consciência crítica
Passemos agora à ideia de consciência crítica:
Esta reflexão sobre a situacionalidade é um pensar a própria condição de existir. Um pensar crítico através do
qual os homens se descobrem em “situação”. Só na medida em que esta deixa de parecer-lhes uma realida-
de espessa que os envolve, algo mais ou menos nublado em que e sob que se acham, um beco sem saída que
os angustia e a captam como a situação objetivo-problemática em que estão, é que existe o engajamento. Da
imersão em que se achavam, emergem, capacitando-se para inserir-se na realidade que se vai desvelando.
Desta maneira, a inserção é um estado maior que a emersão e resulta da conscientização da situação. É a
própria consciência histórica. Daí que seja a conscientização o aprofundamento da tomada de consciência,
característica, por sua vez, de toda emersão (FREIRE, 1987, p. 58).

66
UNIDADE 4 - Paideia e Estética nas Américas

Do trecho citado, salientamos que, para Freire, há profunda relação entre conscientização e
outras dimensões humanas, tais como a educação e, também, a dimensão política, na medida em
que o indivíduo se apercebe da sua condição política na qual se encontra e de sua respectiva relação
de domínio/opressão.

Diálogo
Vejamos, a seguir, como o pensador concebe o diálogo:
[...] o diálogo é uma exigência existencial. E, se ele é o encontro em que se solidariza o refletir e o agir de
seus sujeitos endereçados ao mundo a ser transformado e humanizado, não pode reduzir-se a um ato de de-
positar idéias de um sujeito no outro, nem tampouco tornar-se simples troca de ideias a serem consumidas
pelos permutantes. [...] é encontro de homens que pronunciam o mundo, não deve ser doação do pronunci-
ar de uns a outros. É um ato de criação. Daí que não possa ser manhoso instrumento de que lance mão um
sujeito para a conquista do outro. A conquista implícita no diálogo é a do mundo pelos sujeitos dialógicos,
não a de um pelo outro. Conquista do mundo para libertação dos homens (FREIRE, 1987, p. 45).

Um aspecto essencial nesse trecho é o entendimento do diálogo como respeito; há um com-


promisso de doação e aquisição de ideias em detrimento de uma usurpação de um indivíduo pelo
outro. O convite é para que realizemos um diálogo amparados em uma dimensão de reflexão e
ação.

Práxis
Por fim, vamos conferir como o pensador concebe a práxis:
A diferença entre os dois, entre o animal, de cuja atividade, porque não constitui “atos-limites”, não resulta
uma produção mais além de si e os homens que, através de sua ação sobre o mundo, criam o domínio da
cultura e da história, está em que somente estes são seres da práxis. Somente estes são práxis. Práxis que,
sendo reflexão e ação verdadeiramente transformadora da realidade, é fonte de conhecimento reflexivo e
criação. Com efeito, enquanto a atividade animal, realizada sem práxis, não implica em criação, a transfor-
mação exercida pelos homens a implica (FREIRE, 1987, p. 52).

Consideramos que essa categoria é a que possui maiores relações com a teoria marxista, vol-
tada a um ativismo calcado para a mudança da sociedade por meio da relação entre teoria e prática.
_______________________________________________________________________________
Antes de prosseguir para o próximo assunto, recomendamos que você assista ao vídeo indica-
do no Tópico 3.1, para expandir seu conhecimento sobre a vida e obra de Paulo Freire.
_______________________________________________________________________________

2. 2. A FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO DE JOHN DEWEY


Veremos agora as contribuições para a Filosofia da Educação produzidas pelo filósofo norte-
americano John Dewey (1859-1952), importante filósofo que contribuiu para sedimentar o pragma-
tismo nos Estados Unidos e que também se notabilizou como psicólogo, educador, ativista político e
crítico social.
Dentre as muitas iniciativas de Dewey tendo como tema a educação, destacamos o fato de
que, em 1896, na cidade de Chigago, produziu a primeira escola experimental, chamada University
Elementary School. Nela realizou as primeiras pesquisa empíricas a respeito da aplicação dos fun-
damentos pragmáticos na educação.
Especificamente para nossa finalidade, tal como fizemos ao analisar Paulo Freire, usaremos
como base dois textos emblemáticos produzido por John Dewey: o primeiro deles, redigido em ja-
neiro de 1897, é intitulado My pedagogic creed. Nele o pensador apresenta algumas de suas ideias

67
UNIDADE 4 - Paideia e Estética nas Américas

seminais a respeito da educação e que lhe deram notoriedade. Já ao segundo é intitulado Demo-
cracy and education e foi publicado inicialmente no ano de 1917.
O primeiro deles se assenta na necessidade de que, segundo o filósofo, eduquemos as crian-
ças para os desafios que a vida nos apresenta no presente:
Com o advento da democracia e das condições industriais modernas, é impossível prever definitivamente
qual será a civilização daqui a vinte anos. Por isso, é impossível preparar a criança para qualquer conjunto
preciso de condições. Prepará-la para a vida futura significa dar-lhe o comando de si mesma (DEWEY, 1897,
tradução nossa).

Esse indivíduo que, para Dewey, deve ser capaz de adquirir autonomia para si mesmo, é ne-
cessariamente um indivíduo social e, mais que fazer com que ele adquira conhecimentos, temos que
fazer com que ele aprenda a pensar, existe a necessidade de que a criança adquira a capacidade de
refletir e exercitar seu pensamento crítico, ou seja, a criança tem um papel ativo na busca e produ-
ção do conhecimento:
Acredito que grande parte da educação atual fracasse porque negligencia esse princípio fundamental da es-
cola como uma forma de vida comunitária. Concebe a escola como um lugar onde certas informações devem
ser dadas, onde certas lições devem ser ganhas, ou onde certos hábitos devam ser formados. O valor destes
é concebido como amplamente depositado em um futuro remoto; a criança deve fazer essas coisas por cau-
sa de outra coisa que ela deve fazer; elas são mera preparação. Como resultado, elas não se tornam parte da
experiência de vida da criança e, portanto, não são verdadeiramente educativas (DEWEY, 1897, tradução
nossa).

Essa ênfase na experiência tem profundas relações com o pragmatismo em que se assentam
as ideias de Dewey, ou seja, a educação deve, de fato, produzir resultados práticos na vida do edu-
cando:
Um grama de experiência é melhor do que uma tonelada de teoria simplesmente porque é apenas na expe-
riência que qualquer teoria tem significado vital e verificável. Uma experiência, uma muito humilde experi-
ência, é capaz de gerar e carregar qualquer quantidade de teoria (ou conteúdo intelectual), mas uma teoria à
parte de uma experiência não pode ser definitivamente compreendida como teoria. Ele tende a se tornar
uma mera fórmula verbal, um conjunto de palavras de ordem usadas para tornar o pensamento, ou a genuí-
na teorização, desnecessários e impossíveis (DEWEY, 1985, 144, tradução nossa).

Essa relação que o filósofo apresenta entre conhecimento e prática oriunda da experiência
nos leva a um outro aspecto também muito importante, referente à necessidade de que a educação
possua relação com a comunidade em que o aluno se encontra, ou seja, que possua relação com sua
vida social e seu respectivo ambiente social democrático e:
Acredito que também seja uma necessidade social, porque o lar é a forma de vida social em que a criança foi
nutrida e em conexão com a qual ele teve seu treinamento moral. A ocupação da escola é aprofundar e am-
pliar seu senso dos valores ligados à sua vida doméstica (DEWEY, 1897, tradução nossa)

Essa última consideração se reveste de importância visto que costumeiramente lidamos com
discursos que separam o universo da escola da realidade social em que se encontra o aluno, como
se a escola fosse um santuário isolado do contexto em que ela se encontra e isso, para Dewey, é
certamente um equívoco, porque, para o filósofo, a escola é eminentemente uma instituição social.
Vejamos a seguir um gráfico em que se apresentam esses aspectos iniciais:

68
UNIDADE 4 - Paideia e Estética nas Américas

Figura 2 Gráfico da concepção do papel da escola na sociedade, segundo Dewey.

Referente ao professor, para Dewey, este se reveste de uma função importante, a manuten-
ção do ordenamento social democrático e o crescimento da sociedade. Além disso, cabe ao profes-
sor criar condições para que as crianças possam criar ideias por si próprias, ficando atento aos inte-
resses e às necessidades das crianças.
Outro termo instituído por Dewey refere-se à educação como vocação e esse termo, segundo
Andrea English (2016) é entendido na obra de Dewey de três modos distintos. O primeiro deles seria
a utilização do termo “vocação” para a realização de uma Beruf, termo alemão que remete ao uso
da educação para que o indivíduo possa inserir-se em uma atividade de emprego e, além disso, co-
mo “os atributos de know-how, caráter e conhecimento necessários para praticar essa atividade e
também um marcador de identidade social” (ENGLISH, 2016, p. 3, tradução nossa). Essa interpreta-
ção está associada também ao termo alemão “allgemeine Menschenbildung” e ele se refere à edu-
cação como meio para o desenvolvimento da cidadania.
Quanto à segunda interpretação, esta se dá por meio do entendimento da vocação como me-
canismo para a realização da autonomia do indivíduo; e, quanto a terceira possibilidade, esta se
refere à preparação de indivíduos para negócios ou tarefas específicas (ENGLISH, 2016, p. 4).
Para finalizar, cumpre apontar um aspecto muito importante apresentado por Andrea English,
o qual se refere às considerações de Dewey a respeito da Filosofia em sua obra Educação e demo-
cracia. Segundo a autora:
A filosofia não é em si um sistema de pensamento (como um "idealismo" ou "empirismo"), que é indepen-
dente do pensamento educacional, mas depois aplicado a ele como uma espécie de enriquecimento. Em vez
disso, como ele afirma misteriosamente, a definição mais penetrante de filosofia que pode ser dada é, então,
que esta é a teoria da educação em suas fases mais gerais. [...] Portanto, a filosofia não é apenas mais uma
disciplina intelectual ao lado da sociologia e da psicologia, que lança luz sobre a educação e enriquece a teo-
ria. De fato, parece ser um equívoco até falarmos de filosofia da educação. Ao contrário, é a própria ativida-
de de pensar, envolvida de forma sistemática e séria, sobre as atividades e os compromissos que constituem
uma atividade educacional (ENGLISH, 2016, p. 5-6, tradução nossa).

Desses elementos, consideramos que temos condições suficientes para traçar alguns aspectos
da proposta educativa de Dewey e, dentre eles, destaco três elementos centrais: o primeiro é de
que a aprendizagem deve ser ativa, ou seja, o aluno não deve assumir um papel passivo frente ao
conhecimento.
O segundo deles refere-se à autonomia a ser propiciada pela educação: o aluno será capaz de
buscar conhecimento por si próprio; por fim, o terceiro e último aspecto é que a aprendizagem se
dá por meio da realização de investigações ativas produzidas pela criança, e temos a necessidade de
que sejam propiciadas experiências a elas, nas quais seja necessário que se dediquem a lidar com
problemas, os quais demandarão investigações. O fruto dessas investigações produzirá reflexões e,

69
UNIDADE 4 - Paideia e Estética nas Américas

por fim, por meio da realização de todo esse processo, haverá um crescimento efetivo no conheci-
mento da criança.
_______________________________________________________________________________
Antes de prosseguir para o próximo assunto, recomendamos que você assista ao vídeo indica-
do no Tópico 3.2, para expandir seu conhecimento sobre o pensamento de John Dewey.
_______________________________________________________________________________

2. 3. O SENSO DE BELEZA SEGUNDO GEORGE SANTAYANA


Lidaremos agora com uma nova faceta da Filosofia produzida nas Américas: a sua faceta esté-
tica. Para esse fim, apresentaremos a você o filósofo hispano-americano George Santayana, pseu-
dônimo de Jorge Agustín Nicolás Ruiz de Santayana y Borrás. Embora tenha nascido na Espanha,
Santayana mudou-se para os Estados Unidos quando tinha apenas 8 anos e nesse país construiu
suas obras mais expressivas. Um aspecto interessante sobre sua biografia é o de que Santayana foi
aluno do filósofo William James na Universidade de Harvard e, por coincidência, este último será
abordado também nesta obra.

Figura 3 George Santayana.

Outro aspecto inicial interessante a se apresentar a respeito de Santayana foi a prodigalidade


de aforismos que produziu. Alguns deles são utilizados fartamente em produções e textos dos mais
variados e em abordagens muitas vezes antagônicas. Dentre esses aforismos, merece destaque o
que segue:
O progresso, longe de consistir em mudança, depende da retenção. Quando a mudança é absoluta, não resta
nenhum ser para melhorar e nenhuma direção é definida para uma possível melhora: e quando a experiência
não é mantida, como entre os selvagens, a infância é perpétua. Aqueles que não conseguem lembrar o pas-
sado estão condenados a repeti-lo (SANTAYANA, 1980, p. 92, tradução e destaque nossos).
Interessante, não? Este e outros aforismos produzidos por Santayana têm sido vistos costu-
meiramente em discussões as mais variadas e certamente você poderia conhecê-los em seus res-
pectivos contextos. Dito isso, vamos agora lidar com um aspecto específico da produção do filósofo:
a contribuição que realizou tendo como tema a Estética. Cabe dizer, de modo introdutório, que suas
principais contribuições ocorreram quando da publicação de sua primeira obra, The sense of beauty,
de 1896.
Inicialmente, convém dizer que, para Santayana a palavra “estética” “está relacionada à per-
cepção de valores” (SANTAYANA, 2008, tradução nossa). Na Estética, temos um elemento crítico, na
medida em que realizamos julgamentos ou apreciações, estes são instintivos e imediatos, relaciona-
dos a prazeres e sofrimentos advindos dos objetos.
Dessas apreciações e julgamentos realizados na Estética, destaca-se aqueles advindo do belo,
porque, para o filósofo:

70
UNIDADE 4 - Paideia e Estética nas Américas

O senso de beleza tem um lugar mais importante na vida do que a teoria estética alguma vez tenha adotado
na filosofia. As artes plásticas, com poesia e música, são os monumentos mais evidentes desse interesse hu-
mano, porque apelam apenas para a contemplação, e ainda atraíram ao seu serviço, em todas as eras civili-
zadas, uma quantidade de esforço, genialidade e honra pouco inferior àquela dada a indústria, guerra ou re-
ligião. As belas artes, no entanto, em que o sentimento estético parece quase puro, não são, de modo algum,
a única esfera em que os homens demonstram sua suscetibilidade à beleza. Em todos os produtos da indús-
tria humana, notamos a agudeza com que o olhar é atraído para a simples aparência das coisas: grandes sa-
crifícios de tempo e trabalho são dedicados a ela nas manufaturas mais vulgares; tampouco o homem seleci-
ona sua morada, suas roupas ou seus companheiros sem fazer referência a seu efeito em seus sentidos esté-
ticos (SANTAYANA, 2008, tradução nossa).
No texto citado, está manifesta a ideia do quanto somos suscetíveis à beleza e de como ela
impacta vários aspectos da nossa vida. Dessa constatação emitida pelo filósofo, há de se pensar de
onde viria essa beleza: do sujeito ou do objeto? Vejamos como Santayana responderia a essa inda-
gação:
Podemos, portanto, afirmar imediatamente este axioma, importante para toda filosofia moral e fatal para
certas incoerências teimosas do pensamento, que não há valor além de alguma apreciação dele, e nenhum
bem além de alguma preferência dele antes de sua ausência ou seu oposto. Na apreciação, de preferência,
está a raiz e a essência de toda excelência. Ou, como Spinoza claramente expressa, não desejamos nada
porque é bom, mas é bom apenas porque o desejamos (SANTAYANA, 2008, tradução e destaque nossos).

Note que a beleza não se encontra no objeto em si, mas na apreciação subjetiva realizada por
um indivíduo, e essa apreciação, para o filósofo, é irracional, pois não experimentamos a beleza de
um pôr do sol por meio de análises críticas: “Se nos aproximamos da obra de arte ou da natureza
cientificamente, por causa de suas conexões históricas ou classificação apropriada, não nos aproxi-
maremos esteticamente” (SANTAYANA , 2008, tradução nossa). Nesse sentido, vejamos como Ar-
chie e Archie (2006) sintetizam esse posicionamento:
A beleza para Santayana é uma qualidade de experiência que se origina do interesse emocional intrínseco na
percepção e não é uma qualidade derivada do processo perceptivo. As condições de beleza são do material
(sensação) ou da forma (medida) ou da expressão (associação). Em suma, Santayana descreve a beleza como
"prazer objetivado" ou, como talvez melhor a expresse, a beleza é "prazer considerado como a qualidade de
uma coisa". Santayana procurou explicar a teoria estética como um tipo de investigação psicológica da natu-
reza humana de um ponto de vista biológico. A estética, por si só, envolve um tipo de percepção crítica, pois
a beleza não existe independentemente da nossa percepção do mundo (ARCHIE; ARCHIE, 2006, p. 366, tra-
dução nossa).

Dessas considerações é possível concluir que, em Santayana, há uma profunda relação entre a
beleza e o prazer, no entanto esse prazer não seria oriundo de experiências prazerosas; elas adviri-
am de nossa ação emocional diante de um objeto e das características intrínsecas que esse possui.

2. 4. O CONCEITO DE ARTE DE ARTHUR DANTO


Iremos lidar agora com o nosso último, e não menos importante, filósofo a ser abordado nesta
obra. Como o tema proposto para este momento é a Estética, convém abordar as considerações
emitidas sobre esse tema pelo crítico de arte e filósofo norte-americano Arthur Danto.
A escolha por esse filósofo ocorreu devido ao fato de ele ter se dedicado a analisar um tema
muito controverso na atualidade e que tem gerado debates acalorados, sobretudo realizados por
grupos políticos mais radicais à direita ou à esquerda: o que é arte?
Ao lidar com essa pergunta, imaginamos uma série de possibilidades que vieram à sua mente,
indo desde as produções que considera relevantes e importantes para exemplificar a produção ar-
tística, até produções que talvez você questione se, de fato, poderiam ser consideradas como arte. É
exatamente nesse universo que se imiscui a figura de Danto.

71
UNIDADE 4 - Paideia e Estética nas Américas

Figura 4 Arthur Danto.

Inicialmente, convém informar que Danto se tornou mundialmente conhecido a partir das
considerações críticas que produziu a respeito da arte por meio de suas crônicas publicadas em uma
revista norte-americana intitulada The Nation.
De modo geral, segundo Adajian (2016), Danto contribuiu por meio de suas considerações a
uma corrente da Filosofia da Arte intitulada institucionalista, termo cunhado pelo filósofo norte-
americano George Dickie. Essa abordagem:
sustenta que é somente a rede de relações que envolvem o objeto artístico o que lhe outorga seu status de
“obra de arte”. Uma “caixa de sabão” é uma obra de arte no museu; no depósito de um supermercado é um
objeto de uso, que se distingam nenhum elemento estético-perceptivo (MORENO, 2014, p. 11-12, tradução
nossa).

Ao produzir essa proposta sobre a arte, Dickie se inspirou em um artigo produzido por Danto
em 1964, intitulado Artworld (“O mundo da Arte”) e nele o filósofo afirma que, para que algo possa
vir a ser considerado arte, necessariamente é necessário uma teoria que sustente essa possibilidade
e, com isso, objetos que aparentemente seriam idênticos tornam-se diferentes na medida em que
uma teoria os diferencia uns dos outros, ou seja, a qualidade artística do objeto não advém de sua
característica intrínseca. Assim, o filósofo se expressa a esse respeito: “Ver algo como arte requer
algo que o olho não pode decifrar – uma atmosfera de teoria artística, um conhecimento da história
da arte: um mundo da arte” (DANTO, 1964, p. 581, tradução nossa).
Para que você possa verificar o impacto dessa teoria, tomemos como exemplo uma célebre
produção do artista contemporâneo Andy Warhol, intitulada “Brillo Box”:

Figura 5 Brillo Box, de Andy Warhol.

Como se percebe, nela temos aparentemente a apresentação de um típico produto para lim-
peza, no entanto ele necessita estar envolvido em uma atmosfera teórica que permita a ele alçar-se
à condição de objeto artístico.
Para Danto, a intuição provida pelas Brillo Boxes de Warhol era de que se candidatar à catego-
ria de obra de arte significava necessariamente, para um artefato, estar de tal maneira imbricado na
atmosfera teórica em virtude da qual ele se fez possível como arte que, destacado desse contexto,
dificilmente o constituiríamos como uma obra de arte (SILVEIRA, 2014, p. 57).
Essas considerações demonstram uma profunda reformulação de um senso comum existente
a respeito da arte e de sua associação à ideia de beleza.
Para Danto, ao longo da história humana, a arte realizou um papel histórico e que ocasionou o
surgimento de uma filosofia da arte caracterizada pelo paulatino afastamento do mundo dos obje-

72
UNIDADE 4 - Paideia e Estética nas Américas

tos em direção ao escrutínio da teoria e das ideias referentes à arte. Pouco a pouco, a arte vai se
baseando em uma teoria e, por fim, a arte se torna teoria. E de onde surgiria essa teoria para Dan-
to? Segundo Silveira, ela se origina do que se segue:
As teorias artísticas, embora possam também ser alimentadas por teorias filosóficas no sentido forte, desen-
volvem-se nos círculos de atuação do artista – no ateliê, nas associações, na crítica, nas publicações sobre ar-
te como as conhecemos na atualidade, ou nas corporações de ofício e na obra tratadística de outros tempos,
apenas para nomear alguns exemplos (SILVEIRA, 2014, p. 60).

A partir desses elementos, podemos avançar um pouco mais e tratar de um outro tema tam-
bém muito importante discutido por Danto: a ocorrência do fim da arte. Danto discutiu esse tema,
que deu título a um artigo que produziu em 1984 e que havia se inspirado em Hegel, o filósofo ale-
mão que havia prenunciado, no século anterior, o sobrepujamento da arte por outras manifestações
do espírito. Aparentemente, poderíamos considerar, a princípio, que teria ocorrido a morte da arte;
no entanto, isso não ocorreu.
Para Danto, a era da arte caracterizou-se por apresentar grandes narrativas a respeito de qual
estilo artístico deveria prevalecer sobre os outros, oferecendo, com isso, uma organização do que
seria arte e sua respectiva história. Ao longo da história, essas narrativas dividiram-se em entender a
arte como mimesis (ênfase nos aspectos visuais) e a arte como abstração (ênfase em aspectos for-
mais, como cor, plano, temas etc.).
Segundo Danto, por meio das obras de pintores como Van Gogh e Gauguin, inicia-se o proces-
so de descontinuidade da produção artística e suas respectivas narrativas e, paulatinamente, há a
morte das narrativas que estabelecem diretrizes para a obra de arte.
Dessa condição surge a arte contemporânea e nela, segundo Danto, nos aproximamos da li-
berdade, visto que não há algo que seja mais falso ou verdadeiro; surge a ambiguidade, a experi-
mentação, há um desvirtuamento da novidade e, nessa condição, para Danto, segundo Thomson
(1998), ocorreria uma transfiguração:
Danto descreve obras de arte como representações transfigurativas. Com isso, ele quer dizer que uma obra
de arte transfigura, em vez de transformar seu assunto, pois o assunto da obra de arte não é transformado
em outra coisa a ponto de sua contrapartida no mundo real estar perdida. Em vez disso, a identidade original
do tema permanece e o autor imbui-lhe atributos que indicam uma maneira particular de ver o assunto e o
mundo em geral. Essa transfiguração pode ser explicada examinando a estrutura metafórica das obras de ar-
te (THOMSON, 1998, p. 46-47, tradução nossa).

Para que possamos lidar com essa produção transfigurativa, passa então ser necessário que
estejamos de posse de conhecimento e filosofia para que possamos apreciar adequadamente uma
obra de arte.
_______________________________________________________________________________
Antes de prosseguir para as Questões Autoavaliativas do Tópico 4, recomendamos que você
assista aos vídeos indicados no Tópico 3.3, para expandir seu conhecimento sobre as discussões
contemporâneas sobre a arte e a beleza.
_______________________________________________________________________________

3. CONTEÚDO DIGITAL INTEGRADOR


O Conteúdo Digital Integrador representa uma condição necessária e indispensável para você
compreender integralmente os conteúdos apresentados nesta unidade.

73
UNIDADE 4 - Paideia e Estética nas Américas

3. 1. VIDA E IDEIAS DE PAULO FREIRE


Para que você possa conhecer um pouco mais sobre a vida e as ideias de Paulo Freire, convi-
damos você a assistir ao documentário indicado a seguir. Nele são apresentados aspectos biográfi-
cos, filosóficos e pedagógicos sobre o educador/filósofo:
 TV ESCOLA. Paulo Freire contemporâneo. 2007. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=5y9kmq6g8l8>. Acesso em: 26 jun. 2018.

3. 2. AS CONTRIBUIÇÕES DE JOHN DEWEY


Para poder conhecer um pouco mais sobre as múltiplas contribuições de John Dewey, apre-
sentamos a você um vídeo de produção espanhola que aborda as várias facetas desse pensador.
 CANAL ENCUENTRO. John Dewey. La aventura del pensamiento, episódio 19. Disponí-
vel em: <https://www.youtube.com/watch?v=jmbuw9mepg8>. Acesso em: 26 jun.
2018

3. 3. QUESTÕES SOBRE ARTE E BELEZA


Tanto ao abordarmos George Santayana quanto Arthur Danto, estavam presentes a importân-
cia da arte e o desafio de tentar classificar o que seria essa produção cultural humana, bem como,
nos tempos atuais, o desafio de classificar a arte contemporânea. Para alimentar essa discussão,
convidamos você a analisar três produções sobre esse tema: a primeira busca realizar uma definição
da arte contemporânea; a segunda, dividida em duas partes, aborda a dimensão interpretativa ne-
cessária para o entendimento da arte contemporânea; e a última é uma produção sobre o filósofo
inglês Roger Scruton e uma crítica que esse filósofo realiza a respeito dessa arte:
 ARTIKIN. Arte contemporânea: Isso é arte? 2016. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=c7wabsninuq>. Acesso em: 26 jun. 2018.
 McNABB, D. Del arte moderno al posmoderno. Parte 1. 2012. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=h9gayj7rtj4>. Acesso em: 26 jun. 2018.
 ______. Del arte moderno al posmoderno. Parte 2. 2012. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=ytmbiik_vdu>. Acesso em: 26 jun. 2018.
 BBC SCOTLAND. Why beauty matters. 2009. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=bhw4mmenmpc>. Acesso em: 26 jun. 2018.

4. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
A autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para você testar o seu desempenho. Se
encontrar dificuldades em responder às questões a seguir, você deverá revisar os conteúdos estu-
dados para sanar as suas dúvidas.
1) (Enade – 2008) O pensamento pedagógico de Paulo Freire parte de alguns princípios que marcam, de forma
clara e objetiva, o seu modo de entender o ato educativo. Considerando as características do pensamento
desse autor, analise as afirmações que se seguem.
VI. Ensinar é um ato que envolve a reflexão sobre a própria prática.
VII. Modificar a cultura originária é parte do processo educativo.
VIII. Superar a consciência ingênua é tarefa da ação educativa.
IX. Educar é um ato que acontece em todos os espaços da vida.
X. Educar é transmitir o conhecimento erudito e universalmente reconhecido.
Estão de acordo com o pensamento de Paulo Freire APENAS as afirmações:

74
UNIDADE 4 - Paideia e Estética nas Américas

a) I e II.

b) II e V.

c) I, III e IV.

d) I, IV e V.

e) I, II, III e IV.

2) (UFPR – 2014) Dentre os pensadores da educação brasileira, Paulo Freire se destaca por suas contribuições e
reflexões ainda muito atuais. Sobre o pensamento do autor, considere as seguintes afirmativas:
I. O método educacional mais eficaz e mais justo é, sem dúvida, aderir à meritocracia.
II. Por mais importante que seja melhorar a educação para o futuro de nosso país, ela não é uma
panaceia, uma solução mágica para todos os nossos males.
III. Ninguém ignora tudo. Ninguém sabe tudo. Todos nós sabemos alguma coisa. Todos nós ignora-
mos alguma coisa. Por isso aprendemos sempre.
IV. Se a educação sozinha não pode transformar a sociedade, tampouco sem ela a sociedade muda.
Estão corretas com as ideias de Paulo Freire as afirmativas:

a) I apenas.

b) I e II apenas.

c) II e III apenas.

d) III e IV apenas.

e) II, III e IV apenas.

3) John Dewey, um célebre filósofo e educador norte-americano, considerou que a aprendizagem deveria ocorrer,
sobretudo:

a) Pela exploração do ambiente.

b) Pela resolução de problemas.

c) Pelo ato de escuta do professor.

d) Pelo acompanhamento da herança cultural da sociedade.

e) Pela dialética entre professor e aluno.

4) Confira a afirmação de John Dewey:


“A educação não é preparação para a vida; a educação é a própria vida”.
A partir dela e dos conhecimentos que adquiridos a respeito de John Dewey, podemos afirmar que a educação
experiencial proposta por esse pensador/educador é:

a) Uma filosofia educacional baseada na ideia de que a aprendizagem ocorre por meio da experiência.

b) Um tipo de experimento científico.

c) Uma atitude que se caracteriza pela realização de reflexões diárias.

d) Uma experiência educacional em sala de aula.

e) Aquela que ocorre quando temos uma experiência significativa com outras pessoas.

75
UNIDADE 4 - Paideia e Estética nas Américas

5) Segundo George Santayana, para termos uma experiência estética e nos aproximarmos da beleza, é necessário
que:

a) Realizemos uma análise racional do objeto.

b) Efetuemos comparações com avaliações lógicas.

c) Comparemos grandezas e estruturas.

d) Apreciemos subjetivamente o objeto.

e) Delineemos suas singularidades e expressões.

6) Ao definir a relação que temos com o objeto estético e a beleza como prazer objetivado, podemos afirmar que,
para George Santayana:

a) O prazer é intrínseco ao objeto.

b) Somente o objeto provoca o prazer.

c) Ocorre a objetificação do sujeito.

d) Se estabelece uma relação de troca entre sujeito e objeto.

e) Há uma experiência de prazer advinda do contato do sujeito com o objeto.

7) (UFSC) “O que faz a diferença entre uma obra de arte e algo que não é uma obra de arte quando não se tem
nenhuma diferença perceptual interessante entre elas?” Essa pergunta foi elaborada por Arthur Danto a partir
de uma exposição.
Assinale a alternativa que apresenta CORRETAMENTE o nome da obra e do artista que provocaram essa refle-
xão.

a) Fonte, de Marcel Duchamp.

b) Ferro vermelho, de Man Ray.

c) Spiral jet, de Robert Smithson.

d) Cama, de Rauschenberg.

e) Brillo Box, de Andy Warhol.

8) Da proposta filosófica de Arthur Danto a respeito da arte é possível afirmar que:

a) Por meio da arte contemporânea, ocorreria a manifestação das ambiguidades e o surgimento da liberdade.

b) Sempre se caracteriza pela apresentação de narrativas, quer seja no passado, quer seja no presente.

c) Como Hegel, Danto estabeleceu o fim da arte.

d) Com Van Gogh e Gauguin há a apresentação de novas narrativas.

e) Ora ela se apresentou enquanto narrativa hegemônica como mimesis (aspectos visuais), ora como
abstração (aspectos formais).

Gabarito
Confira, a seguir, as respostas corretas para as questões autoavaliativas propostas:
1) c.
2) d.

76
UNIDADE 4 - Paideia e Estética nas Américas

3) b.
4) a.
5) d.
6) e.
7) e.
8) a.

5. CONSIDERAÇÕES
Encerramos nossa quarta e última unidade. Por meio dela, procuramos apresentar a você
elementos para discussão a respeito dos caminhos a serem seguidos para que tenhamos uma edu-
cação de qualidade ou de como lidar com algumas das possibilidades da arte contemporânea. Me-
lhor que optar por essa ou aquela proposta, convidamos você a aventar a possibilidade de que as
respostas apresentadas não esgotam as questões que buscam resolver e que cada uma delas, a par-
tir de uma faceta filosófica específica, busca dar uma resposta a partir dessa mesma faceta. Seu de-
safio é se munir dessas respostas e fazer uso dela para problematizar as questões com as quais lida-
rá a respeito desses e outros temas.

6. E-REFERÊNCIAS

Lista de figuras
Figura 1 Paulo Freire. Disponível em: <http://www.historiadocinemabrasileiro.com.br/paulo-freire/>. Acesso em: 25 jun. 2018.
Figura 2 Gráfico da concepção do papel da escola na sociedade, segundo Dewey. Adaptado da imagem disponível em:
<https://4h.tennessee.edu/Pages/experientiallearning.aspx>. Acesso em: 25 jun. 2018.
Figura 3 George Santayana. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/George_Santayana#/media/File:George_Santayana.jpg>.
Acesso em: 25 jun. 2018.
Figura 4 Arthur Danto. Disponível em: <https://alchetron.com/Arthur-Danto>. Acesso em: 25 jun. 2018.
Figura 5 Brillo Box, de Andy Warhol. Disponível em: <https://akronartmuseum.org/collection/Obj2368?sid=1&x=59897&port=205>.
Acesso em: 25 jun. 2018.

Sites consultados
ARCHIE, L.; ARCHIE, J. G. Readings in the History of Aesthetics – an open-source reader. 2006. Disponível em:
<philosophy.lander.edu/intro/artbook.pdf>. Acesso em: 26 jun. 2018.
DANTO, A. The artworld. The Journal of Philosophy, v. 61, n. 19, p. 571-584, 1964. Disponível em:
<https://is.muni.cz/el/1421/jaro2014/im088/danto__1_.pdf>. Acesso em: 26 jun. 2018.
DEWEY, J. My pedagogic creed. School Journal, v. 64, p. 77-80, jan. 1897. Disponível em: <http://dewey.pragmatism.org/creed.htm>.
Acesso em: 26 jun. 2018.
ENGLISH, A. John Dewey's Democracy and Education: questions for education today.In: ANNUAL CONFERENCE OF THE PHILOSOPHY
OF EDUCATION SOCIETY OF GREAT BRITAIN, Oxford, 2016. Disponível em: <http://www.philosophy-of-
education.org/dotasset/a1445ae8-b10c-4de6-bd0d-f4329891c42a.pdf>. acesso em: 26 jun. 2018.
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. (O mundo, hoje, v. 21). Disponível em:
<http://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/paulofreire/paulo_freire_pedagogia_do_oprimido.pdf>. Acesso: 26 jun. 2018.
LIU, K. D. Conscientization and the cultivation of conscience. Tese (Doutorado em Filosofia da Educação) – University of Canterbury,
Christchurch, 2012. Disponível em:
<https://ir.canterbury.ac.nz/bitstream/handle/10092/7129/finalcopyforconscientizationandthecultivationofconscienceinapdfformat.
pdf?sequence=1>. Acesso em: 26 jun. 2018.
MORENO, I. La posibilidad de una teoría unificadora y el problema de la valoración del arte. Revista Actio, n. 16, p. 1-30, dez. 2014.
Disponível em: <http://www.academia.edu/9822233/Moreno_-
_La_posibilidad_de_una_teor%C3%ADa_unificadora_y_el_problema_de_la_valoraci%C3%B3n_del_arte>. Acesso em: 26 jun. 2018.
SANTAYANA, G. The life of reason. New York: Dover Publication, 1980. Disponível em:
<https://www.wikipremed.com/reading/philosophy/the_life_of_reason.pdf>. Acesso em: 26 jun. 2018.
______. The sense of beauty. 2008. Disponível em <https://www.gutenberg.org/files/26842/26842-h/26842-h.htm>. Acesso em: 26
jun. 2018.

77
UNIDADE 4 - Paideia e Estética nas Américas

SILVEIRA, C. O mundo e os mundos da arte de Arthur C. Danto: uma teoria filosófica em dois tempos. Ars, ano 12, n. 23, p. 52-79,
2014. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ars/v12n23/1678-5320-ars-12-23-00052.pdf>. Acesso em: 26 jun. 2018.
STATEUNIVERSITY.COM. Paulo Freire (1921–1997) – Conceptual tools, philosophy of education, criticism. Disponível em:
<http://education.stateuniversity.com/pages/1998/freire-paulo-1921-1997.html>. Acesso em: 26 jun. 2018.
THOMSON, K. J. M. The art museum at the end of art – Arthur C. Danto’s philosophy of art and its implications for the posthistorical
museum. Dissertação (Mestrado em Artes) – Queen´s University, Ontario, Canada, 1998. Disponível em:
<https://www.collectionscanada.gc.ca/obj/s4/f2/dsk2/tape15/pqdd_0010/mq31259.pdf>. Acesso em: 26 jun. 2018.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DEWEY, J. Democracy and education. Indiana: Southern Illinois UP, 1985.
GIROUX, H. Lessons from Paulo Freire. The Chronicle of Higher Education, 2010.
ROBERTS, P. Education, literacy, and humanization: exploring the work of Paulo Freire. London: Bergin & Garvey, 2000.
TORRES, C. A. Education and archaeology of consciousness: Freire and Hegel. Educational Theory, v. 4, p. 429-445, 1994.

78

Você também pode gostar