Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Ijuí
2008
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
2
MESTRADO EM DESENVOLVIMENTO
Ijuí (RS)
2008
3
elaborada por
Banca Examinadora:
AGRADECIMENTOS
RESUMO
ABSTRACT
The focuses of analysis in this investigation are the worker’s learning and the creation
of individual knowledge in the organizational universe. The study has features of the
analytical approach and intends to provoke thinking and questionings around the managing
practices, on what regards people and learning. To understand the individual learning process
in the working space, in the perspective of human development, verifying people who
contribute to this development managing policies and practices is the main objective of this
research. The investigation is inserted in the interpretativist approach and has been oriented
by the phenomenological method. The problem has been developed in the qualitative
dimension once the Social Sciences’ object is essentially qualitative, and is considered of
having applied nature. On what regards the objectives, it fits as being of exploratory and
descriptive. The only case study has been performed in a familiar company running the
business in the retail market in the southern region of Brazil. The research subjects correspond
to managers and managed ones in the company. The data has been collected mainly through
non-participating observations and semi-structured interviews for those are the most
frequently used procedures in the qualitative researches. The content analysis was the
technique used for the treatment of those. The investigation proved that the people managing
practices adopted by the company, by the processes of movement and valorisation that
promote workers, above all the ones of permanent education, to explain the presence of the
paradigm focused on learning, of corporate education and of social dimension. Thus, in spite
of the limits and paradoxes inherent to all organizations, the company promotes adequate
practices to its workers’ development. On what regards the learning process (what, how, when
and what they learn for) the formal and informal moments of interaction, discussion, reading
and experience sharing, appropriately satisfy the “when”. The way of learning, however, is
limited due to not provoking the subject’s thinking and, ultimately, the experience
transformation. The content of learning when restricted, most of times, to technical and
operational knowledge with the aim of (what for) performing a task with efficiency and
efficacy, inhibits the knowledge creation and its dissemination; thereby, the development in
the professional area is more visible to personal and social. Thus, in organizations, as well as
in the analysed one, even though the greater apprehension around the worker’s development
is shown, practically speaking the systems-control managing system prevails in detriment to
the process-relational. This managing style is characteristic of taylorist-fordist logic, which
hinders the double and triple loop learning, the knowledge managing, the human development
and, consequently, organizational learning. Therefore, an appropriate environment to human
development extrapolates the context of instrumental rationality and the conventional training
paradigm, indicating the need of practices of managing based upon the process-relational style
and the emergency of the paradigm focused on learning, on the communicative action and in
substantive reason.
Key words: Individual and organizational learning. Human development. People managing.
Familiar company.
9
LISTA DE QUADROS
capacitacional ........................................................................................ 92
LISTA DE FIGURAS
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 14
3 METODOLOGIA.............................................................................................................. 102
3.1 Pressupostos Filosóficos............................................................................................... 102
3.2 Classificação da Pesquisa ............................................................................................. 104
3.3 Definição da Organização Objeto de Estudo................................................................ 105
3.4 Sujeitos da Pesquisa ..................................................................................................... 106
3.5 Coleta de Dados............................................................................................................ 106
3.6 Análise e Interpretação dos Dados ............................................................................... 109
INTRODUÇÃO
1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO ESTUDO
problemática comparando empresas que fracassam jovens das longevas. Na opinião do autor,
empresas falecem jovens porque suas políticas e práticas baseiam-se exclusivamente no
pensamento e linguagem da economia, enquanto as longevas ou vivas têm uma personalidade
harmoniosa que as permitem conciliar o econômico e o social.
A educação no espaço organizacional, no posicionamento de Moscovici (1999),
fornece condições de aperfeiçoamento no trabalho e permite a atualização de potencialidades
não exploradas por tarefas rotineiras, levando ao desenvolvimento integral do indivíduo.
Garcia (1999, p. 235) corrobora indicando que o desenvolvimento da capacidade infinita do
homem, assim como a integração das necessidade individuais e organizações “é o caminho
que, cada vez mais, as empresas estão percorrendo para a conquista sustentada da excelência”.
Por acreditar, entretanto, no desenvolvimento do indivíduo a partir das relações,
práticas e experiências que ocorrem no ambiente de trabalho humanizado e, com isso,
contribuir para o desenvolvimento da organização e da sociedade, formula-se a seguinte
questão de estudo: como ocorrem os processos de aprendizagem dos trabalhadores no
universo organizacional e que políticas e práticas de gestão contribuem para o
desenvolvimento humano?
1.3 Objetivos
1.3.1 Geral
1.3.2 Específicos
1.4 Justificativa
empresa” (MANUAL, s.d., p. 33). Considerou-se, então, esse ambiente propício para a
realização desse estudo.
O banco de trabalhos de conclusão do curso de Administração da Universidade de
Passo Fundo aponta que a referida empresa tem sido objeto de análise, principalmente nos
últimos dez anos, em estudos relacionados aos temas de clima organizacional,
desenvolvimento gerencial, estratégia, marketing e finanças. A temática da aprendizagem
organizacional e da gestão do conhecimento, sobretudo da aprendizagem individual do
trabalhador, vem preencher uma lacuna teórico-empírica. O presente estudo, então,
proporciona à empresa uma nova e importante reflexão em torno de suas práticas de gestão de
pessoas e poderá promover uma conscientização maior da importância da aprendizagem para
o desenvolvimento pessoal, organizacional e social.
Em contrapartida, em âmbito nacional e internacional, existem alguns estudos
científicos focados na aprendizagem e educação no universo organizacional, identificando
oportunidades e limites na promoção do desenvolvimento dos trabalhadores no espaço de
trabalho, tais como: Lifelines: Patterns of Work, Love, and Learning in Adulthood
(MERRIAM; CLARK, 1991), Empresa humanizada: a organização necessária e possível
(VERGARA; BRANCO, 2001), As práticas de gestão de pessoas e o processo de
aprendizagem nas organizações (ESTIVALETE, 2002), Aprendizado e formação continuada
em organizações familiares e intensivas em conhecimento: a força das relações de parentesco
por consideração (DAVEL; SOUZA, 2004), O autodesenvolvimento e a perspectiva da
aprendizagem organizacional (ANTONELLO, 2004), Educação continuada corporativa:
aprendizagem e desenvolvimento humano no setor metal-mecânico (TEIXEIRA, 2005),
Educação no trabalho: uma proposição teórica (DANELI, 2005), entre outros.
A aprendizagem organizacional tem sido estudada com dois enfoques principais, na
concepção de Antonello (2005): como um processo técnico (prescritivo ou incremental) ou
como um processo social (descritivo ou analítico). O primeiro interessa-se pela maneira que
as organizações deveriam aprender e o segundo em entender como elas aprendem. Este estudo
preocupa-se em entender a aprendizagem individual no contexto de uma empresa, a partir da
descrição e análise do seu cotidiano.
Cabe destacar, ainda, que o fenômeno da aprendizagem no âmbito das organizações é
tema de estudos e investigações do Grupo de Estudos e Pesquisas em Organizações, Gestão e
Aprendizagem (GEPOG), o qual está vinculado ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu
em Desenvolvimento da Unijuí, especialmente na Linha de Pesquisa “Gestão de Organizações
e do Desenvolvimento”. O estudo realizado traz sua contribuição específica ao investigar,
25
Os principais termos são apresentados e definidos com o intuito de esclarecer com que
significados serão empregados no presente estudo. Essas definições são aprofundadas no
decorrer da revisão teórica.
Educação: consiste na formação do homem de caráter. Visa levar o ser humano a realizar as
suas potencialidades físicas, morais, espirituais e intelectuais. Abrange o homem integral, em
todos os aspectos de seu corpo e de sua alma, e está presente ao longo de toda a vida
(FREIRE, 1983; BRANDÃO, 1986; DELORS, 1999).
Gestão: concebida como uma arte e uma prática social visando a geração de condições de
trabalho aos atores organizacionais. Compreende um conjunto de processos dentre eles,
planejamento, organização, liderança, motivação, controle, comunicação, decisão e
negociação. A gestão e seus sinônimos Administração e management, então, significam
práticas e processos de gerenciamento (CHANLAT, 2000; MOTTA, 2004).
Organização: esse termo é utilizado com dois sentidos. Ora representando um sistema aberto
e adaptativo, em que um conjunto de relações sociais ocorrem a fim de atingir objetivos que
justificam a sua existência e, portanto, sinônimo de instituição e empresa (SCOTT, 1964;
ETZIONI, 1984; HALL, 2004), ora referindo-se ao ato de sistematizar ações, atividades e
informações (FAYOL, 1981).
suas vidas como prisioneiros das suas próprias histórias pessoais” (MORGAN, 1996, p. 210),
o que leva alguns psicanalistas a afirmar que a liberdade individual depende da
conscientização de como o presente é influenciado pelo passado por meio do seu
inconsciente.
A liberdade do sujeito é relativa e o irracional é tão presente a ponto de
Com a Psicanálise, Freud apresenta a idéia de que não somos “senhores em nossa
própria casa”, e acrescenta mais uma “ferida narcísica”: “a consciência não é o centro de
nosso psiquismo, não reina soberana sobre a nossa vontade” (KUPFER, 1995, p. 52).
Morin (2001, p. 59) descreve a complexidade do ser humano como sujeito racional e
irracional,
Da mesma forma, é a partir das relações estabelecidas pelo indivíduo que seu ego e
sua identidade se constroem, se atualizam; e essas interações mobilizam os processos
psíquicos. “Estes processos que se situam na origem do desenvolvimento cognitivo e afetivo
do ser humano representam a parte imersa da interação [...], processos que subentendem e
acompanham toda palavra, todo discurso e toda ação” (CHANLAT, 1996, p. 39).
Para Chanlat (1996, p. 35), o indivíduo é por definição um ser biopsicossocial -
biológico, psicológico e social -, o que lhe confere uma complexidade singular. Um aspecto
influencia o outro, de modo que nenhum pode ser ignorado. “O eu é indissociável da própria
história, da própria experiência e das vivências”.
As organizações, os ambientes de trabalho são, por excelência, locais de interações
humanas, e para lá os sujeitos tendem a transferir muitos de seus desejos, angústias, afetos
inconscientes, transformando o ambiente de trabalho em lugar de conflitos (positivos e
negativos), de construção de identidade, de constituição do sujeito, de aprendizagens.
O ser humano, contudo, é uno e múltiplo. “É a unidade humana que traz em si os
princípios de suas múltiplas diversidades. Compreender o humano é compreender sua unidade
na diversidade, sua diversidade na unidade”, explica Morin (2001, p. 55). No âmbito
individual, há unidade/diversidade cerebral, mental, intelectual, afetiva, e assim por diante; no
âmbito social, há unidade/diversidade de línguas, culturas e organizações sociais (MORIN,
2001).
2.1.2 A educação
Brandão (1986) compactua com Freire (1983, p. 27) no entendimento de que a educação está
presente ao longo de toda a vida (DELORS, 1999) e se constitui numa realidade, ao
considerar que o ser humano “é um ser na busca constante de ser mais e, com o fazer esta
auto-reflexão, pode descobrir-se como um ser inacabado, que está em constante busca”.
31
educação formal, continuada e ao longo da vida em seu interior, por meio das Universidades
Corporativas (MEISTER, 1999; EBOLI, 2004).
sobre a ação e reflexão na ação. O sujeito aprende a partir da descoberta e busca de solução
para problemas e com o questionamento e experimentação dessas soluções.
Kolb (1984, 1997), Schön (2000) e Mezirow (1990) entendem que o processo de
aprendizagem nos adultos inicia a partir da reflexão das experiências. No ambiente de
trabalho, as pessoas acumulam experiências da função, das rotinas, das atividades, das
diversas situações que ocorrem no dia-a-dia; no entanto algumas têm condições e/ou
oportunidades de refletir sobre o seu fazer, outras não. Acredita-se que isso depende da
formação e perfil de cada sujeito, bem como da natureza da sua atividade e da cultura
organizacional.
Na aprendizagem autodirecionada, “os aprendizes têm a primeira responsabilidade por
planejar, desenvolver e avaliar suas próprias experiências de aprendizado” (MERRIAM;
CAFFARELLA, 1999, p. 41). A idéia é que o sujeito assuma o controle do seu aprendizado,
decidindo os objetivos, recursos, métodos, etc., o que parece ser comum nas organizações
contemporâneas, uma vez que elas preferem trabalhadores “prontos”, tendo o sujeito que
assumir o seu desenvolvimento.
Knowles (1975, p. 18) explica que a aprendizagem autodirecionada “é o processo no
qual indivíduos tomam a iniciativa, com ou sem a ajuda de outros, em diagnosticar suas
necessidades de aprendizagem”, formulando metas, identificando recursos humanos e
materiais, escolhendo e implementando estratégias apropriadas e avaliando os resultados de
sua aprendizagem.
Por fim, a aprendizagem transformadora, é concebida como um “processo social de
construção e apropriação de novas ou revisadas interpretações de sentidos da experiência de
alguém como um guia de ação” (MEZIROW, 1994, p. 234). A reflexão aqui é na linha crítica,
comparando as interpretações – anteriores e atuais –, no sentido de uma compreensão mais
aprimorada da experiência, transformando a realidade e o próprio sujeito. Essa corrente foi
influenciada por Freire (1983) e Habermas (1989), principalmente nas idéias de
transformação e humanização da realidade, na construção de um processo emancipatório e na
concepção de reflexão crítica.
Freire (1983, p. 33) argumenta que
dimensão relativa ao trabalho, partindo do postulado que há uma ligação intrínseca entre os
acontecimentos marcantes associados à dimensão do trabalho ou a da afetividade e
determinados tipos de aprendizagem característicos do adulto.
Categoria Análise
Escolha das Domínio da Psicologia do desenvolvimento (Merriam; Clark; Adair; Billington; Pronovost)
disciplinas e dos Domínio da Filosofia da educação (Canan)
domínios de
pesquisa
Perspectivas do Desenvolvimento pessoal como a atualização do potencial do adulto (Merriam; Clark;
desenvolvimento Canan; Pronovost; Billington; Adair)
pessoal
Tipos de Desenvolvimento profissional, afetivo, moral e cognitivo (Merriam; Clark)
desenvolvimento Desenvolvimento cognitivo, profissional e moral (Canan)
pessoal Desenvolvimento cognitivo, moral e afetivo (Billington)
Desenvolvimento afetivo e moral (Pronovost; Adair)
Tipos de Aprendizagem fundada na noção de significação (Merriam; Clark)
aprendizagem Aprendizagem fundada na noção de intencionalidade (Canan)
Papel da O papel da experiência no processo de aprendizagem dos adultos é interpretado de
experiência diferentes formas.
Experiência como um produto, englobando o conjunto de percepções, emoções e
conhecimentos acumulados no decurso da vida do aprendiz. Assim, a experiência de vida
constituiria o conteúdo de toda a aprendizagem, podendo favorecer o desenvolvimento do
adulto (Merriam; Clark; Adair; Billington).
Experiência como um processo pelo qual o adulto submete ao exame da realidade o
conteúdo de aprendizagem particular, que ele deseja integrar (Canan).
Operações que Merriam; Clark – cinco operações – atenção, reflexão, ligação dos acontecimentos ao
caracterizam os sistema de significação, assimilação ou rejeição, ação no sistema de significação.
processos de Canan – três operações – aquisição de um novo conteúdo de aprendizagem, compreensão
aprendizagem desse, tomada de consciência.
Produtos dos Produção de conhecimentos particulares tanto para Merriam e Clark como para Canan.
processos de Principais tipos de conhecimentos ligados a competências e aptidões relacionadas com a
aprendizagem especialização, uma integração de diversas dimensões psicológicas ligadas à própria
identidade da pessoa, bem como um aprofundamento de natureza religiosa, filosófica ou
científica ligado a uma compreensão pessoal do sentido da vida humana.
Papel da reflexão É analisado por Merriam e Clark e por Canan, os quais a interpretam de forma diferente.
Para Merriam e Clark a reflexão permite o aprendiz filtrar as informações correspondendo
a acontecimentos vividos à luz do seu próprio sistema de significação e, em alguns casos,
modificar o sistema após uma tomada de consciência, rejeitando certas crenças, valores,
normas ou expectativas pessoais. Assim, a reflexão permite questionar de forma crítica o
seu próprio quadro de referências, o que seria o diferencial da aprendizagem de adultos das
demais.
Para Canan a reflexão permite ao aprendiz perceber o sentido de conteúdos precisos de
forma a poder aplicar esses conteúdos. A reflexão é situada no centro dos processos
cognitivos e metacognitivos.
Papel da Para Merriam e Clark a autonomia assume característica fundamental na constituição da
autonomia identidade do adulto. Essa autonomia está relacionada ao crescimento e transformação dos
conhecimentos que resultam das aprendizagens significantes realizadas.
Para Canan a autonomia representa condição essencial, que no plano cognitivo, subentende
todo o ato de aprendizagem intencional.
Abordagem Todos os autores analisados utilizaram a abordagem qualitativa de pesquisa.
metodológica Abordagem descritiva foi utilizada por Merriam e Clark, Billington e Pronovost.
Abordagem hermenêutica foi utilizada por Adair e a fenomenológica por Canan.
Quadro 3 – Processos de aprendizagem dos adultos na perspectiva do desenvolvimento
Fonte: adaptado de Danis (1998, p. 21-93)
39
um processo que quer atenção e reflexão por parte do adulto relativamente a uma
experiência determinada e que conduz a uma transformação, nesse adulto, em
relação aos seus comportamentos, atitudes, aptidões ou ainda em relação aos seus
conhecimentos ou as suas próprias convicções (apud DANIS, 1998, p. 35).
40
Se, por um lado, a escola ainda é a forma soberana de educação na sociedade, por
outro surge nos dias atuais um discurso que tende a afirmar que a educação escolar já não é
mais a única forma de educação e, sequer, a principal. Educa-se por meio de múltiplas
organizações, não apenas pela escola. Educa-se, por exemplo, pelos sindicatos, associações,
partidos, clubes recreativos, grupos voluntários. “Educa-se através do trabalho, através da
convivialidade do relacionamento informal das pessoas entre si” (SAVIANI, 1994, p. 158).
Salientando os processos pedagógicos vividos a partir das relações sociais que
ocorrem inclusive no ambiente de trabalho, Brandão (1986, p. 9) enfatiza que não existe um
modelo único de educação, tampouco um único lugar onde ela acontece (referindo-se a
41
escola). Também para Frigotto (1998, p. 147) a escola não é o único espaço de formação e de
aprendizado, enfatizando que “o fenômeno educativo acontece em outros espaços e tempos
sociais, em outras instituições, nas fábricas, nas igrejas e terreiros, nas famílias e empresas, na
rua e nos tempos de lazer, de celebração e comemoração, no trabalho”.
Num sentido amplo, a educação “abrange o conjunto das influências do meio natural e
social que afetam o desenvolvimento do homem na sua relação ativa com o meio social”
(LIBÂNEO, 2002, p. 87). Nas relações sociais de trabalho, isto é, na troca de experiências,
reflexão na e sobre a prática, busca dos objetivos comuns, trabalho em equipe, ajuda mútua,
compartilhamento de informações e conhecimentos, observação, entre outras, as pessoas se
educam e se desenvolvem. Transformando a realidade que o circunda, transforma-se por meio
dela. A transformação e o desenvolvimento do ser humano que ocorrem mediante práticas
produtivas, então, podem ser entendidas, num conceito ampliado de educação, como práticas
pedagógicas.
Somado a isso, o fato do homem “agir sobre a natureza, adaptando-a às necessidades
humanas, é o que conhecemos pelo nome de trabalho. Por isso podemos dizer que o trabalho
define a essência humana” (SAVIANI, 1994, p. 152).
Na busca de transformar a natureza, o homem utilizou e utiliza vários instrumentos.
Antes a força física, depois a máquina e, mais recentemente, o cérebro; em cada momento
necessitando de uma forma específica de formação, de educação. Em função disso, Saviani
(1994, p. 165) afirma que o trabalho “foi, é e continuará sendo o princípio educativo do
sistema de ensino em seu conjunto. Determinou o seu surgimento sobre a base da escola
primária, o seu desenvolvimento e diversificação e tende a determinar, no contexto das
tecnologias avançadas, a sua unificação”.
O trabalho como princípio educativo e sua centralidade na constituição humana
também são assumidos por Arroyo (1998, p. 152). Para o autor,
O trabalho pode ter, para algumas pessoas, a condição de neutralidade e, para outras,
de centralidade na identidade pessoal e social (MORIN; TONELLI; PLIOPAS, 2003). Para a
maioria, o trabalho é a atividade principal, superior a atividades religiosas, familiares, de
lazer. O homem chegou a ser considerado produto do seu trabalho (PINTO, 2003, p. 79). “O
trabalho é uma atividade central na história humana, em seu processo de sociabilidade e
mesmo para a sua emancipação” (ANTUNES, 2004, p. 10). O trabalho “é a condição básica e
fundamental de toda a vida humana. É em tal grau que, até certo ponto, podemos afirmar que
o trabalho criou o próprio homem” (ENGELS, 2004, p. 13). Na opinião de Kosik citado por
Frigotto (1998, p. 29), o trabalho “é um processo que permeia todo o ser do homem e
constitui a sua especificidade”.
O trabalhador faz-se e se transforma em sua atividade produtiva.
passado, sua memória) e registro sincrônico (contexto material, social e histórico das relações
de trabalho). Dessa análise se concebe o homem concreto, vivo, reativo e sofredor, animado
por uma subjetividade. Essa concepção é diferente da do homem abstrato, ideal, normalmente
caracterizado pelas Ciências Administrativas (TENÓRIO, 2000).
O trabalho é a ocasião de transportar o cenário original do sofrimento para a realidade
social. A diferença é que, nesse caso, os parceiros do cenário são outros trabalhadores que
possuem os mesmos objetivos: os do campo da produção. “Pela intermediação do trabalho, o
sujeito engaja-se nas relações sociais, para onde ele transfere as questões herdadas de seu
passado e de sua história afetiva” (DEJOURS, 1996, p. 157).
Na verdade, na relação com o trabalho o ser humano busca mais que sua sobrevivência
e o status que este pode lhe proporcionar. “O trabalho é uma grande fonte de referência para a
construção social dos homens e de sua autoestima, o que significa dizer que essa relação passa
pelo afetivo e pelo psicológico” (FREITAS, 2000, p. 42).
Dejours (1996, p. 160) chega a afirmar que “o prazer no trabalho é um produto
derivado do sofrimento”, motivo por que não é interessante eliminar o sofrimento do trabalho.
Nesta concepção, “o prazer no trabalho, fundamental para manutenção da saúde e da
normalidade, decorre da transformação do sofrimento em criações reconhecidas no espaço
público, seja ele na própria organização ou na sociedade” (MORIN; TONELLI; PLIOPAS,
2003, p. 4). Nesse caso, o problema a ser enfrentado pelas Ciências Administrativas é dar
condições para o próprio trabalhador gerir seus sofrimentos, em proveito da sua saúde e da
produtividade.
Somado a isso, sabe-se que o positivismo nasce no intuito de validar o objeto
positivado, que passa a estar no lugar da verdade. Por isso, atualmente o sujeito está
dependente do valor simbólico atribuído ao objeto. “O objeto se torna persecutório quando,
em lugar de se manter na posição de causador do desejo se constitui em máquina de sua
satisfação” (JERUSALINSKY, 2000, p. 39). Essa satisfação se dá, seja por possuir o objeto,
“seja por fabricá-lo, seja por dominá-lo ou por usufruí-lo, eis como o sujeito encontra seu
valor” (p. 37).
Jerusalinsky (2000, p. 40) chama a atenção para o fato que, “na nossa sociedade, a
ciência propõe-nos a promessa de que, mais cedo ou mais tarde, ela será capaz de produzir o
objeto completamente adequado a nossa satisfação”. Isso quer dizer que nessa sociedade não
há lugar para o sujeito do desejo, apenas para o objeto da realização. Nessa mesma direção,
entende que o discurso social atual pode ser analisado segundo três eixos:
44
uma prevalência do lugar, da posição do objeto como fonte de saber sobre o sujeito;
uma ruptura de transmissão entre as gerações com a conseqüente ruptura dos
mecanismos de amortecimento dos processos de transformação econômico-sociais;
e uma quebra dos sistemas de valor nas equivalências do trabalho
(JERUSALINSKY, 2000, p. 46).
No que concerne aos valores do trabalho, objetivo deste item, Jerusalinsky (2000)
corrobora com os autores anteriormente citados a respeito da divergência e fragilidade dos
valores atribuídos ao trabalho. Nesse sentido, aponta-se para a necessidade da sociedade pós-
industrial repensar o papel do trabalho na vida das pessoas.
Entre outros pesquisadores, esta discussão tem sido feita por Morin, Tonelli e Pliopas
(2003) que apresentam uma síntese das idéias dos principais pesquisadores que estudam os
sentidos do trabalho (Quadro 4).
Caffarella (1999) que ocorre especialmente no adulto, mediante sua reflexão, iniciativa,
diagnóstico, intenção e controle.
Ao ter consciência de suas fragilidades e possibilidades, o sujeito delineará objetivos
de desenvolvimento e direcionará energias em prol do ideal desejado. O hiato entre a
percepção da realidade e a visão de onde poderá chegar, no ponto de vista de Senge (1990), é
uma fonte de energia, intitulada de tensão criativa, que levará o sujeito a agir ativamente
diante dos desafios que se apresentarem, ao invés de apenas reagir. A tensão criativa é
definida por Antonello (2004, p. 61) como “uma força resultante da tendência natural do
indivíduo de buscar uma solução para as tensões encontradas, que surgem em função da
discrepância entre a realidade percebida e a realidade desejada”. A reflexão é primordial
também nesse processo, capacidade que permitirá ao sujeito perceber seus pressupostos,
traçar propósitos e ampliar seus modelos mentais.
Senge (1990) também explica que a tensão criativa pode provocar sentimentos ou
emoções ligadas a ansiedade, tristeza, desestímulo e preocupações, os quais o autor intitula de
tensão emocional. A tendência é aliviar a tensão emocional ajustando a tensão criativa – a
visão – tornando as metas mais próximas da realidade, mas essa atitude poderá ser uma
solução sintomática e temporária. O desafio é o indivíduo aprender a cultivar e a equilibrar a
tensão entre realidade e visão, deste modo, ampliará sua capacidade de escolha e alcançará
resultados mais próximos aos escolhidos. O autodesenvolvimento, assim, “é uma atitude
adquirida, de interesse e esforço com relação a dificuldades, desafios e oportunidades”
(ANTONELLO, 2004, p. 64).
O processo de autodesenvolvimento gera uma mentalidade de transformação por
incentivar o ser humano a buscar e nutrir mudanças em si próprio, por isso estimula a criação
e a construção, afastando-se da adaptação e reação ao meio em que está inserido. Antonello
argumenta que o autodesenvolvimento, especialmente nas organizações de aprendizagem,
Chanlat (2000, p. 48) explica que quanto à razão instrumental “o ser humano aparece
na maior parte do tempo como um ser abstrato, um objeto econômico e um indivíduo sem
afeto, sem história e sem cultura. Ele inscreve-se em um projeto instrumental que confere
todas as virtudes a [...] lógica técnica”.
A racionalização do trabalho foi o momento em que a produção manual deu lugar à
produção em massa, mas também que o humanismo cedeu ao racionalismo (WOOD JR.,
1992), consolidando a organização mecanizada (MORGAN, 1996). “Essa visão ordenada de
meios e fins não passa de um enfoque ideal-funcionalista que fere mortalmente a realidade
social de determinada sociedade” (TENÓRIO, 2004, p. 25). Mühl (2003, p. 136) corrobora
com Tenório, afirmando que a “razão – que havia surgido como o recurso capaz de solucionar
os problemas humanos – transformou-se num mecanismo de destruição da humanidade”.
Tenório (2004) argumenta ainda que a ação racional administrativa tende a evitar a
reflexão do sujeito e a sua compreensão dos meios utilizados na prática gerencial, tornando a
razão instrumental auto-suficiente e inclusive distorcida da realidade.
A “evolução” do sistema administrativo ocorreu com Taylor (1911), mediante o
aperfeiçoamento das regras e estruturas internas da organização e com Fayol (1925), o qual
definiu a clássica divisão das funções do administrador em planejar, organizar, coordenar,
55
o toyotismo, em essência, não seria mais que uma evolução do fordismo. Este ponto
de vista encontra respaldo na análise do seu surgimento e equivale a dizer que o
sistema estaria exposto as mesmas contradições básicas do seu antecessor. Sua
vantagem competitiva, na comparação com o fordismo, seria uma maior
adaptabilidade às condições ambientais. Mas mesmo esta adaptabilidade talvez
esteja se aproximando de um limite de ruptura (WOOD JR., 1992, p. 15).
O termo organização tem origem na palavra grega organon e significa uma ferramenta
ou instrumento. Para Etzioni (1984, p. 3), “as organizações são unidades sociais (ou
agrupamentos humanos) intencionalmente construídas, a fim de atingir objetivos específicos”.
O autor caracteriza as organizações por: (1) divisões de trabalho, poder e responsabilidade de
comunicação; (2) a presença de um ou mais centros de poder que controlam os esforços
combinados da organização e os dirigem para seus objetivos; (3) substituição do pessoal.
Scott (1964) conceitua organização como coletividade, estabelecida para a
concretização de objetivos relativamente específicos e de forma mais ou menos contínua. Hall
(2004, p. 27) faz referência a Max Weber, conhecido por suas análises da burocracia e da
autoridade, o qual conceitua organização como “padrões de interação legítimos entre os
membros organizacionais, a medida que procuram atingir as metas e se dedicam às
atividades”.
Adotando um foco diferente, apesar de concordar em alguns aspectos com Weber,
Barnard (apud HALL, 2004, p. 27-28), também autor tradicional da área organizacional,
conceitua organização como “um sistema de atividade ou forças coordenadas
conscientemente, envolvendo duas ou mais pessoas”. Nota-se que enquanto Weber enfatiza o
sistema, Barnard se preocupa com os membros que compõem o sistema (HALL, 2004).
A partir da análise de vários conceitos, entre eles o de Weber e o de Barnard, Hall
(2004, p. 30) elaborou o seu conceito de organização:
ódio, mas também salvar vidas e, talvez, almas. Elas podem provocar a guerra, mas também
trazer a paz. Esses impactos podem ser intencionais ou não-intencionais, reconhecidos ou
não” (MERTON apud HALL, 2004, p. 3). Elas podem ser surpreendentes (HALL, 2004). Ao
mesmo tempo em que não se pode ignorar a postura de algumas de promover guerras e
desigualdades, não se pode ser pessimista, mas acreditar que as organizações são o único
meio de atingir a paz, a prosperidade, a justiça social (ETZIONI, 1984), embora essa
concepção pareça estar cada vez mais distante.
O que é certo é que todas as organizações geram impactos em seu contexto. Elas
exercem impactos significativos e diretos nos indivíduos, na comunidade local em que atuam,
e na sociedade, em sentido mais amplo, ou no ambiente do qual faz parte. Por outro lado, elas
também são influenciadas pelos indivíduos e pela sociedade. Assim caracterizam-se como
participantes ativas no processo de mudança social (HALL, 2004).
A postura epistemológica positivada, a qual critica a constituição da realidade
organizacional mediante a interação dos seus membros, tende a explicar que as organizações
possuem uma existência própria, que independe do comportamento dos indivíduos. Elas
permanecem ao longo do tempo e seus membros são substituídos sem causar grandes
impactos ou a morte da organização. Os trabalhadores ingressam numa empresa e se deparam
com uma estrutura social e padrões de interação próprios, os quais deverão ser seguidos e
respeitados. Hall (2004, p. 33) entende que “não importa quem são os indivíduos; a
organização estabeleceu um sistema de normas e expectativas a ser seguidas
independentemente de quem compõe o seu quadro pessoal e continua a existir apesar da
rotatividade da mão-de-obra”.
Ao contrário dessa postura epistemológica, compactua-se com Davel e Alcadipani
(2003) quando argumentam que as organizações são construções histórico-sociais complexas,
sendo importante compreendê-las a partir de suas formações, consolidações e transformações.
Por essas razões, ao tipificá-las pode-se incorrer em erros e numa análise incompleta.
Algumas semelhanças ou diferenças como, por exemplo, orientadas ao lucro ou sem
fins lucrativos, em determinadas ocasiões são úteis para tipificar as organizações, mas em
outras não. Assim como a classificação da população por sexo feminino e masculino, em
certos momentos é suficiente. Uma tipologia utilizada é de acordo com o setor da economia
em que pertence a organização, mas, embora seja comum, não esclarece suficientemente. Por
essa razão, a abordagem multifacetada de Mintzberg representa a tipologia mais adequada
(HALL, 2004).
60
Mintzberg (1995) propõe a classificação das organizações de acordo com o modo pelo
qual são estruturadas para enfrentar as contingências que se apresentam, resultando em cinco
configurações. Trata-se de um esquema complexo, cujo agrupamento deve ocorrer a partir de
observações das características e comportamentos da própria organização. O Quadro 7
apresenta um resumo das características de cada configuração.
Configurações
Características Estrutura Burocracia Burocracia Forma Adhocracia
simples mecanizada profissional divisionalizada
Principal Supervisão Padronização Padronização de Padronização de Ajustamento
mecanismo de direta dos processos habilidades resultados mútuo
coordenação de trabalho
Parte chave da Cúpula Tecnoestrutura Núcleo Linha Assessoria de
organização estratégica operacional intermediária apoio
Principais Centralização Formalização Treinamento, Agrupamento Instrumentos de
parâmetros para estrutura do especialização por mercado, interligação,
delinear orgânica comportamento, do trabalho sistema de estrutura
especialização horizontal, controle do orgânica,
do trabalho descentralização desempenho, descentralização
vertical e vertical e descentralização seletiva
horizontal, horizontal vertical limitada horizontal,
agrupamento treinamento,
por função agrupamento
por produto
Fatores Pequena e Madura e Ambiente Mercados Ambiente
situacionais jovem, sistema grande, sistema estável e diversificados, complexo e
técnico sem técnico complexo, com idade e dinâmico,
sofisticação, regulado e não- sistema técnico grande porte, jovem, sistema
ambiente automatizado, não-regulado e gerentes da técnico
dinâmico, ambiente não-sofisticado, linha sofisticado e
grande simples e acompanha a intermediária automatizado,
necessidade de estável, moda necessitam segue a moda
poder do controle poder,
gerente do externo, não acompanha a
topo; não seguidora de moda
acompanha a modas
moda
Sugestão de Revendedora Um serviço Universidades, Setor privado da Órgão espacial,
organizações de automóveis, nacional de hospitais de economia empresa de
loja varejista correio, uma clínicas, industrial, filme avant
de médio agência de sistemas de instituições com garde, fábrica
porte, seguros, uma escolas, firmas vários campus; manufaturando
corporação siderúrgica, de auditorias, sistemas protótipos
dirigida poruma prisão de órgãos sociais hospitalares complexos,
um custódia, uma do trabalho e companhia
empreendedor empresa de empresas de integrada de
agressivo, um aviação, uma produção produtos
sistema escolar gigantesca artesanal petroquímicos.
em crise. montadora de
automóveis.
Quadro 7 – Configurações das organizações
Fonte: adaptado de Mintzberg (1995, p. 158 - 278)
61
As organizações não são apenas lugares onde o trabalho é executado. São também
lugares onde sonhos coexistem com pesadelos, onde o desejo e as aspirações
podem encontrar espaço de realização, onde a excitação e o prazer da conquista
convivem com a angústia do fracasso. As organizações, em particular as empresas,
não são o império da racionalidade por natureza. Elas são alimentadas pela emoção,
pela fantasia, pelos fantasmas que cada ser humano abriga em si (p. 42).
Uma organização tipo máquina, concebida para atingir objetivos específicos, pode
ser simultaneamente o seguinte: uma espécie de organismo que é capaz de
sobreviver em determinados ambientes, mas não em outros; um sistema de
processamento de informações que se revela especializado para certos tipos de
aprendizagens, mas não para outros; um meio cultural caracterizado por valores,
crenças e práticas sociais distintos; um sistema político no qual as pessoas colidem
para garantir seus próprios fins; uma arena onde várias lutas subconscientes ou
ideológicas tem lugar; um símbolo ou manifestação de um processo mais profundo
de mudança social; um instrumento usado por um grupo de pessoas para explorar
ou dominar outros, e assim por diante (MORGAN, 1996, p. 327).
desenvolvimento de um conjunto de ações, visando atingir o que foi planejado. Para isso, é
necessário distribuir tarefas, delegar funções, autoridades e responsabilidades e gerenciar os
recursos internos (materiais, financeiros, humanos). A liderança é o processo de designar
pessoas, dirigir seus esforços, motivá-las, influenciá-las no comprometimento dos objetivos
comuns. O controle diz respeito ao processo de acompanhar e avaliar o progresso rumo às
metas definidas no planejamento, identificando possíveis desvios a tempo de rever as ações.
Chanlat (2000, p. 33) explica que “como a natureza do management é, antes de tudo,
uma prática social que visa ao bom funcionamento de uma organização, suas exigências são
marcadas com o selo da eficácia”. A eficácia da empresa é comprovada por indicadores, a
maioria deles quantitativos e financeiros, o que também representa que o social está
subordinado à eficácia.
A visão tradicional de gestão fazia e faz crer que o gestor atua como um decisor
racional, planejador sistemático e coordenador eficiente das atividades organizacionais. Numa
dimensão menos ordenada, entretanto, esse profissional é concebido como um “desbravador
de caminhos, encontrando soluções e tomando decisões com base em informações
incompletas, coletadas esparsamente em meio a um processo gerencial fragmentado e
descontínuo” (MOTTA, 2004, p. 42).
Na prática gerencial, os imprevistos, interrupções, trabalhos administrativos intensos,
descontínuos e de natureza variada, são mais comuns a procedimentos e atividades
padronizadas e predefinidas. As decisões são tomadas mediante “interações diversas, ações
isoladas e opiniões manifestadas esparsamente [...]. Aproximam-se dos problemas à medida
que estes vão surgindo, na busca de soluções baseadas em informações parciais, imperfeitas e
de primeira mão, quase sempre envoltas por grandes incertezas” (MOTTA, 2004, p. 20). Isso
reflete a fragmentação, a dualidade e a imprecisão das atividades de gestão.
A gestão refere-se ao processo ativo de determinação e orientação do caminho a ser
seguido por uma organização de trabalho para a realização de seus objetivos, compreendendo
um conjunto de análises, decisões, comunicação, liderança, motivação, avaliação, controle,
entre outras atividades próprias da administração; ou seja, é o processo de gerenciar as
demandas do ambiente ante os recursos disponíveis na organização (ROMANIO; DAZZI,
2002).
No posicionamento de Motta (2004, p. 26), a gestão é uma arte. Uma “arte de pensar,
de decidir e de agir; é a arte de fazer acontecer, de obter resultados, resultados que podem ser
definidos, previstos, analisados e avaliados, mas que têm de ser alcançados através das
pessoas e numa interação humana constante”.
65
irá desenvolver a atividade com maior precisão, agilidade e eficiência. Em outras palavras,
nos dois primeiros modelos as preocupações da gestão giram em torno da produtividade e da
maximização dos lucros, desconsiderando totalmente a dimensão humana e, para isso, os
gestores atuam de forma centralizada e unicamente racional. Esse modelo é próprio do
taylorismo-fordismo.
A abordagem do modelo de relações humanas parece voltar-se ao ser humano, aos
trabalhadores, suas necessidades, desejos e expectativas. Pesquisas realizadas por Elton Mayo
e seus colegas na década de 1920 e 1930 comprovaram que fatores de caráter interno ao ser
humano, como suas relações com os colegas, seus problemas pessoais, etc., estavam ligados à
produção do trabalhador. Com essa visão, algumas organizações, pelo menos no discurso,
passaram a se preocupar mais com a motivação, satisfação, sonhos, qualidade de vida,
interação, autonomia, etc. dos funcionários, levando a um modelo de gestão. Sob esse enfoque
também se constituíram as teorias motivacionais de Maslow, Herzberg, McGregor, Likert. Na
visão humanista, o principal papel do gestor é facilitar os processos de trabalho. Tenório
(2004, p. 23) alerta, entretanto, para o fato dessa abordagem ser apenas uma “visão
paradisíaca das possibilidades de melhorar o processo produtivo”.
No modelo de sistemas abertos a ênfase está na busca da flexibilidade e de apoios
externos, porém o ser humano não é desconsiderado, e, sim, visto como parte do sistema.
Presume-se que a origem desse modelo de gestão está na Teoria Geral dos Sistemas (TGS),
desenvolvida por Boulding e Bertalanffy por volta da década de 60, buscando responder às
novas demandas da sociedade. Os pesquisadores agruparam e hierarquizaram os sistemas de
acordo com suas complexidades, obtendo o total de oito. O ser humano faz parte do sétimo
sistema e as organizações sociais, do oitavo, o que justifica a grandeza da complexidade
encontrada em ambos. Assim, o que encontramos nas organizações são dois sistemas, o ser
humano e a organização social, que interagem entre si e que dependem um do outro, com um
influenciando o outro. Nesta abordagem o gestor assume o papel de inovar, negociar e mediar.
Em outro direcionamento, a atividade de gestão lida com o imprevisto, a
imparcialidade, a dualidade e, nesse contexto, definir a atuação do gestor para um
determinado período, assim como Quinn (2004) o fez, torna-se impróprio e ressalta a visão
tradicional da gestão.
No final do século 20, a maior preocupação dos executivos girava em torno da
necessidade de atingir a flexibilidade e a eficácia organizacional num ambiente
profundamente dinâmico, global e competitivo, fato que se estende até os dias de hoje. De
acordo com Quinn (2004) nenhum dos modelos conhecidos até o momento respondia a essa
68
necessidade de maneira satisfatória. Foi necessário, assim, visualizar os quatro modelos juntos
(metas racionais, processos internos, relações humanas, sistemas abertos) com a convicção de
que, em determinados momentos, seria necessária a utilização de um modelo específico e, em
outro momento, a utilização de dois ou três modelos ao mesmo tempo, de forma que um
complementasse o outro. Em outras palavras, em certas circunstâncias o gestor necessita
centralizar a decisão e, noutras, decidir juntamente com a equipe. Essa visão de integração ou
complementaridade está mais alinhada com a natureza da gestão, e seria uma forma de lidar
com sua fragmentação e imprecisão.
Apesar do mundo da gestão priorizar a ação, a racionalidade instrumental, a
tecnocracia, o mecanicismo, o distanciamento das pessoas, esse mundo é repleto de
sentimentos, desejos, emoções, angústias, incertezas, fragilidades e espontaneidade. “Ao
mundo sério e racional das obras e dos discursos do management opõe-se o mundo real e
concreto do vivido” (CHANLAT, 2000, p. 67). Isso indica a necessidade e urgência do
pensamento administrativo avançar efetivamente, tanto na prática quanto na teoria, inclusive
buscando subsídios em outras áreas do conhecimento, o que não significa aumentar a
fragmentação.
Sob esse enfoque, Chanlat (2000) desafia as organizações e, por sua vez, quem ocupa
cargos de gestão e liderança, a ampliar os horizontes na tentativa de resolver o problema da
fragmentação social, da alienação, da exclusão, da dicotomia e, por conseqüência, da eficácia,
no século 21. Essa ampliação, na opinião do autor, é possível com a inserção das
contribuições das Ciências Humanas à gestão, a partir da afirmação e do retorno de dimensões
esquecidas no ambiente organizacional, como a valorização da afetividade, experiência,
simbolismo, história, ética, sobretudo, com a incorporação da lógica emancipatória.
A lógica emancipatória visa colocar um fim aos sofrimentos inúteis provocados por
determinadas práticas sociais. Em vez de considerar os fenômenos observados
como dados próprios sem levar em conta seus aspectos políticos, essa lógica
procura revelar como os modelos de conduta e significações que lhes podem ser
atribuídas estão enraizados nas estruturas de dominação. [...]. Sua presença é
indispensável para evitar que, principalmente, a lógica técnica se imponha sem
nenhuma reflexão crítica e desemboque em novas formas de dominação ou em uma
civilização inconsciente (CHANLAT, 2000, p. 49).
ainda que esperada e exprimida, é sempre um ato de violência para ambos. Nesse
momento, o filho reafirma ao pai seu nascimento e a possibilidade de superá-lo,
assinalando seu envelhecimento e a proximidade da morte. Simultaneamente, o
filho vive a angústia das situações de imposição e submissão ao pai, confrontadas
com os atrativos conscientes e inconscientes da sua opção pela empresa do pai
(CAMPOS; MAZZILLI, 1998, p. 8).
Gestor
Projetista, regente, professor e servidor
Vergara (2001) identifica algumas mudanças na natureza do trabalho que afetam a gestão de
pessoas (Quadro 10).
“significa que as pessoas estão em ação e em permanente interação, dotadas de vida interior e
que expressam sua subjetividade por meio de palavras e de comportamentos não-verbais”. A
proposta dos autores é sintetizada no Quadro 12.
PRINCÍPIO Nº 2:
PERPETUIDADE
“Entender a educação não apenas
como um processo de
desenvolvimento e realização do
potencial existente em cada
colaborador, mas também como
PRINCÍPIO Nº 7: um processo de transmissão da PRINCÍPIO Nº 3:
SUSTENTABILIDADE herança cultural, a fim de CONECTIVIDADE
“Ser um centro gerador de perpetuar a existência da “Privilegiar a construção
resultados para a empresa, empresa”. social do conhecimento
procurando sempre agregar valor estabelecendo conexões e
ao negócio. Pode significar PRINCÍPIO Nº 1: intensificando a
também buscar fontes alternativas COMPETITIVIDADE comunicação e interação.
de recursos que permitam um “Valorizar a educação como Objetiva ampliar a
orçamento próprio e auto- forma de desenvolver o capital quantidade e a qualidade da
sustentável”. intelectual dos colaboradores, rede de relacionamentos
transformando-os efetivamente com o público interno e
em fator de diferenciação da externo”.
empresa diante dos concorrentes,
ampliando assim sua capacidade
de competir. Significa buscar
PRINCÍPIO Nº 6: continuamente elevar o patamar PRINCÍPIO Nº 4:
PARCERIA de competitividade empresarial DISPONIBILIDADE
“Entender que desenvolver por meio da implantação, “Oferecer e disponibilizar
continuamente as competências desenvolvimento e consolidação atividades e recursos
dos colaboradores é uma tarefa das competências críticas educacionais de fácil uso e
complexa, exigindo que se empresariais e humanas”. acesso, propiciando
estabeleçam parcerias internas condições favoráveis para
(com líderes e gestores) e que os colaboradores
externas (instituições de nível PRINCÍPIO Nº 5: realizem a aprendizagem a
superior)”. CIDADANIA qualquer hora e em
“Estimular o exercício da cidadania qualquer lugar”.
individual e corporativa, formando
atores sociais, ou seja, sujeitos
capazes de refletir criticamente
sobre a realidade organizacional, de
construí-la e modificá-la e de atuar
pautados por postura ética e
socialmente responsável”.
Tendência Descrição
Gerenciar a própria Uso de programas como ensino a distância, aprendendo a aprender, comunidades
aprendizagem de aprendizagem e auto-gerenciamento da aprendizagem
Igualdade e oportunidade Grupos com mulheres, negros e minoria étnicas
no trabalho
Desenvolvimento de Sessões de auto-avaliação, planejamento de carreira, atividades com biografia,
carreira etc.
Companhia de Uso de programas como avaliação dos efeitos organizacionais dos grupos de
aprendizagem autodesenvolvimento, qualidade na organização e desenvolvimento de pequenos
negócios
Quadro 15 – Tendências de aplicação do autodesenvolvimento nas organizações
Fonte: Antonello (2004, p. 70)
transportados para o campo da Administração, haja vista a forte ligação entre aprendizagem e
prática de trabalho.
Fleury (1997) explica que duas vertentes teóricas sustentam os principais modelos de
aprendizagem: behaviorista e cognitiva. O primeiro enfatiza o comportamento, que é de fácil
observação e mensuração e pressupõe uma relação entre evento, resposta, conseqüências. O
segundo, pretende explicar melhor fenômenos mais complexos, como a aprendizagem de
conceitos e solução de problemas. Trabalha com representações e com o processo de
informações pelo indivíduo. A autora afirma que as discussões em torno da aprendizagem
organizacional enraizaram-se mais na abordagem cognitiva, porém enfatizando as mudanças
comportamentais observáveis.
No âmbito organizacional, o processo de aprendizagem pode ocorrer em três níveis:
individual, grupal e organizacional, em que o autodesenvolvimento é um dos sustentáculos do
processo (ANTONELLO, 2004), como ilustra a Figura 3.
3 Aprendizagem Organizacional
2 Aprendizagem Grupal
1 Aprendizagem Individual
Autodesenvolvimento
FLEURY, 2004). Na prática, entretanto, essa separação é mais complexa. Huysman (2001)
alerta que a principal controvérsia no campo de Aprendizagem Organizacional é a diferença
entre aprendizagem individual e organizacional. O foco desse estudo é a aprendizagem
individual do sujeito no contexto organizacional.
Assim como Fleury e Fleury (2004), Kim (1998) entende que a aprendizagem inicia
no nível individual e, portanto, se os trabalhadores não aprenderem a organização não
aprenderá. “Na realidade, em última instância, as organizações aprendem através de seus
membros individuais” (KIM, 1998, p. 61).
Nonaka e Takeuchi (1997) corroboram ao afirmarem que o conhecimento somente é
criado pelos indivíduos, tendo a organização a função de proporcionar contextos propícios
para tal. Por extensão, deduz-se que a aprendizagem ocorre nos indivíduos, ou seja, a
organização não aprende se os trabalhadores não aprenderem primeiro. A aprendizagem
organizacional, no entanto, não é totalmente dependente da individual e é algo mais do que a
soma do que os membros organizacionais sabem (BOYETT; BOYETT, 1999).
conduz a uma transformação, nesse adulto, em relação aos seus comportamentos, atitudes,
aptidões ou ainda em relação aos seus conhecimentos ou as suas próprias convicções”.
Danis e Solar (1998, p. 294) argumentam que a aprendizagem desempenha um papel
fundamental na construção da pessoa, da sua identidade e no seu desenvolvimento. “Se a
aprendizagem alimenta o desenvolvimento, essencialmente pessoal, cognitivo e
metacognitivo, o desenvolvimento, por sua vez, fomenta a aprendizagem”.
Os dois conceitos abordados por Merriam e Clark (1991) - Aprendizagem e
experiência de vida do adulto e Aprendizagem e significado atribuído à experiência vivida
pelo adulto – (discutidos no item 2.1.3) englobam os demais autores (CANAN, 1991; KOLB,
1997; SCHÖN, 2000; MEZIROW, 1990; MERRIAM, CAFARELLA, 1999) que acreditam
na ocorrência de aprendizagens por meio da experiência e da reflexão desta, além de
colaborarem no entendimento desses fenômenos nas organizações.
Da mesma forma, o Ciclo de Aprendizagem – experiência, observação, reflexão, ação
– promovendo a transformação da experiência (KOLB, 1997), a interpretação e generalização
das experiências vividas para a formação de estruturas mentais (MEZIROW, 1990), a reflexão
sobre a ação e a reflexão na ação (SCHÖN, 2000), discutidos anteriormente na abordagem da
educação de adultos (tópico 2.1.3), são essenciais para compreender a aprendizagem
individual que ocorre no ambiente de trabalho.
Os acontecimentos marcantes vivenciados no trabalho e os significados atribuídos a
esses acontecimentos, mediante a reflexão, contudo, são fontes de aprendizagem do
trabalhador. Essas aprendizagens conduzem ao desenvolvimento pessoal do mesmo, que
normalmente demanda uma nova aprendizagem, fazendo com que a relação aprendizagem e
desenvolvimento dos adultos seja dinâmica (DANIS; SOLAR, 1998).
Schuck (1997), discutindo a aprendizagem do operário em um ambiente de trabalho
informatizado, ressalta a importância de uma Pedagogia que contribua com o
desenvolvimento da habilidade intelectual. Baseada em Vygotsky, psicólogo educacional,
Schuck propõe uma Pedagogia voltada para significado, a qual envolve “a reconceituação do
local de trabalho como um ambiente de aprendizado e a redefinição do papel do gerente no
processo de aprendizado” (p. 246). Para a autora, o treinamento dos funcionários precisa
ultrapassar da visão de aprendizagem sobre objetos e ações para o desenvolvimento
intelectual. Justifica que “somente através da aplicação da habilidade intelectual é que as
pessoas percebem o significado dos dados e fazem escolhas conscientes e inteligentes para
resolver problemas ou identificar caminhos mais eficientes ou eficazes a tomar no trabalho”
(p. 241). Explica, ainda, que o aprendizado passa a ser uma mediação social.
86
Sob esse enfoque, as teorias de Mezirow (1981, 1990) e de Kolb (1984, 1997) são
pertinentes para o campo organizacional. Baseados nesses autores, Boyett e Boyett (1999),
estudiosos dos gurus da Administração, acreditam que o aprendizado mais eficaz para adultos
resulta de um ciclo de experiência no próprio local de trabalho, combinando vivência de
experiências concretas, reflexão sobre essas experiências, formação de conceitos abstratos e
generalizações, testagem desses conceitos e generalizações por meio de novas experiências.
Esse ciclo (experimentar – refletir – formar conceitos – testar conceitos) é contínuo e foi
intitulado pelos autores como “a roda do aprendizado” (Figura 4).
Após realizar um intenso estudo na literatura disponível sobre o tema, Prange (2001)
aponta três direcionamentos da teoria de aprendizagem organizacional: (1) carece de
integração teórica e a pesquisa não é cumulativa; (2) não proporciona conhecimento “útil”
para os profissionais; (3) é usada principalmente com um sentido analógico e/ou metafórico.
Nesse contexto, a orientação de DiBella e Nevis (1999) de que a aprendizagem
organizacional pode ser estudada sob três perspectivas: normativa, desenvolvimental e
capacitacional, torna-se útil (Quadro 18).
Características Perspectiva
Normativa Desenvolvimental Capacitacional
Aprendizagem A AO apenas acontece dentro A organização aprendiz A aprendizagem é um dom
Organizacional de condições absolutamente representa o último estágio do inato em qualquer organização,
(AO) exclusivas. Ela não acontece desenvolvimento como sistema social. É sua
por acaso, mas resulta do organizacional, que é atingido própria identidade e há muitas
desenvolvimento e do por meio da experiência maneiras de ela aprender.
emprego de habilidades adquirida em seus ciclos de
específicas. Há uma vida.
intervenção disciplinada.
Principais Garratt (1990), Garvin Argyris e Schön (1978), Jelinek (1979), Mckee (1992),
expoentes (1993), Lessem (1991), Mayo Dechant e Marsick (1991), Nevis, DiBella e Gould (1993),
e Rick (1993), McGill, Kimberly (1979), Kimberly e Srivastra (1983), Stata (1989),
Slocum e Lei (1992), Senge Miles (1980), Meyers (1990), Tomassini (1991), Wenger
(1990) e outros Torbert (1994, 1987). (1996).
Orientação Futura Longitudinal Presente
temporal
Fonte Ação estratégica Evolução, adaptação Existência
Estilo de Único, rígido Adaptado ao estágio de Múltiplo, relativo
aprendizagem desenvolvimento
organizacional
Relação entre Dependência Evoluções paralelas Intrínseca
aprendizagem e
cultura
Foco gerencial Aprendizagem Histórico organizacional Capacidades atuais
Quadro 18 – Comparação entre as perspectivas normativa, desenvolvimental e capacitacional
Fonte: adaptado de DiBella e Nevis (1999)
92
Sob a perspectiva capacitacional, Kim (1998, p. 61) afirma que “todas as organizações
aprendem, tenham elas escolhido isso conscientemente ou não - é um requisito fundamental
para sua existência sustentada”. Assim, o que diferencia as organizações é o fato de algumas
promoverem a aprendizagem organizacional e outras não focalizam esforço algum nesse
aspecto.
Levando em consideração que a organização aprende por meio de seus membros
individuais e, em função disso, o fator crucial da aprendizagem organizacional é o processo
de transferência da aprendizagem individual para a memória e estrutura da organização, Kim
(1998) propõe um modelo integrado para a aprendizagem organizacional – OADI-SMM -,
que corresponde a observar, avaliar, projetar e implementar modelos mentais compartilhados
(Figura 5).
3 METODOLOGIA
SUBJETIVO OBJETIVO
Nominalista Paradigma interpretativista Paradigma funcionalista Realista
Construtivista Behaviorismo, Positivista
Voluntarista Pluralismo determinismo e Determinista
Ideográfica empiricismo abstrato Nomotética
Hermenêutica
Estrutura
Etnometodologia e interacionismo Teoria dos
de referência
Simbólico fenomenológico sistemas sociais
da ação
SOCIOLOGIA DA REGULAÇÃO
Figura 7 – Paradigmas sociológicos
Fonte: adaptado de Morgan (2005, p. 61)
O estudo de caso único foi desenvolvido numa empresa de capital aberto, do ramo
varejista, fundada em 1950 na cidade de Passo Fundo/RS. A mesma é de base familiar e
encontra-se em processo de sucessão da segunda para a terceira geração. Sua razão social foi
mantida no anonimato por solicitação dos dirigentes.
A empresa é composta por cinco redes de produtos, denominadas nesse estudo Rede
A, B, C, D e E, e 221 pontos de venda distribuídos em 118 cidades da Região Sul do país,
bem como 1.772 funcionários efetivos (dez. 2006). A pesquisa, entretanto, restringiu-se à
cidade de Passo Fundo/RS, por ser o local de fundação e atual sede, bem como por
proximidade e acessibilidade da pesquisadora.
A opção por estudar essa empresa é justificada pela influência que a mesma exerce na
economia da região em que atua, principalmente em termos de geração de emprego e renda e
pela sua longevidade (56 anos em 2006). A importância do ramo de varejo e das empresas
familiares na região e no país também foram critérios utilizados.
A escolha desse caso investigado justifica-se, sobretudo, pelo fato de a empresa ter
recebido prêmios de melhor Empresa Varejista do Brasil (em 2000 e 2001) pelo Jornal Valor
Econômico e pela Revista Forbes, e de melhor na gestão de pessoas (nos anos 2003, 2004,
2005, 2006 e 2007) pelo Jornal Valor Econômico, entre outros prêmios. A gestão de pessoas e
106
3.5.1 Observações
3.5.2 Entrevistas
A técnica de entrevista foi utilizada com todos os sujeitos da pesquisa (ANEXO A), de
forma individual ou grupal, esta última com funcionários do nível operacional do Setor
Administrativo. Elaborou-se, para tanto, dois roteiros semi-estruturados para orientar o
pesquisador nas entrevistas com os gestores – nível tático e estratégico – (ANEXO B) e com
os geridos – nível operacional – (ANEXO C). Ambos os roteiros foram testados e
aperfeiçoados a partir das constatações.
As entrevistas individuais (total de 17) primeiramente foram agendadas com o auxílio
do setor de Treinamento e Desenvolvimento da Empresa, e nas datas marcadas a pesquisadora
se deslocou até o local de trabalho do sujeito, com o roteiro de entrevista semi-estruturada,
para realizá-la. Cada entrevista teve a duração, em média, de cinqüenta minutos e foi gravada
com o objetivo de garantir a qualidade dos dados e auxiliar na interpretação dos mesmos.
Essas entrevistas foram realizadas durante os meses de julho e agosto de 2007, conforme a
disponibilidade dos sujeitos.
Uma entrevista grupal foi realizada (grupo de foco) com 11 participantes do Setor
Administrativo e com duração de duas horas, conforme recomendam Roesch (1996) e
Vergara (2005). Essa técnica foi utilizada por permitir e incentivar o debate no grupo. Os
participantes foram selecionados aleatoriamente pela pesquisadora juntamente com o setor de
Treinamento e Desenvolvimento da empresa, buscando contemplar os diferentes setores
administrativos. A entrevista foi agendada pelo referido setor no dia de maior disponibilidade
dos sujeitos (dia 15/8/2007) e em local de fácil acesso a todos (sala de treinamento da
empresa). As cadeiras foram organizadas em círculo e foi distribuído papel e caneta para
anotações. Inicialmente o moderador (pesquisadora) deu boas-vindas ao grupo, deixando
claro o objetivo do encontro e agradecendo as contribuições de cada um. Na seqüência foram
apresentados os temas, assegurando que todos os tópicos do roteiro (ANEXO C) fossem
debatidos e que todos os sujeitos participassem da discussão, além de controlar o tempo. O
grupo foi tecendo comentários e relatando experiências em torno dos temas. As opiniões, na
109
3.5.3 Documental
A análise dos dados, entendida como fase de descrição e interpretação dos mesmos,
para Gomes (1994, p. 69), possui três finalidades: “estabelecer uma compreensão dos dados
coletados, confirmar ou não os pressupostos da pesquisa e/ou responder às questões
formuladas, e ampliar o conhecimento sobre o assunto pesquisado, articulando ao contexto
cultural da qual faz parte”.
A análise de conteúdo foi a técnica utilizada para a compreensão dos dados
levantados, a qual, para Bardin (1977), tem três etapas: pré-análise, exploração e análise do
material e interpretação. Na pré-análise, as transcrições literais das entrevistas e as notas de
campo foram lidas e organizadas a partir de similaridades que foram aparecendo. Trechos
dessas entrevistas são utilizados na apresentação e interpretação dos resultados para ilustrar a
110
opinião dos atores sociais, os quais foram mantidos no anonimato. Em seguida, os dados
foram codificados, que é a primeira fase da exploração e análise do material, por meio de
unidades de registro, em que se adotou o tema como unidade, por ser o mais utilizado nos
estudos organizacionais e pelo interesse em identificar o sentido que o sujeito desejava dar à
mensagem (DELLAGNELLO; SILVA, 2005). Partiu-se dos temas definidos no projeto de
pesquisa, entretanto outros surgiram dos dados empíricos, exigindo a redefinição dos mesmos,
o que é próprio de pesquisas qualitativas com grade mista de análise (VERGARA, 2005).
Ao utilizar grade mista para análise de dados,
A categorização dos dados foi a fase seguinte. As categorias são classes ou séries que
reúnem um conjunto de elementos com características comuns ou que se relacionam entre si,
por isso trabalhar com categorias representa unir elementos, idéias ou expressões em torno de
um conceito que os abrange (BARDIN, 1977; GOMES, 1994). Assim como os temas, as
categorias foram pré-definidas no projeto de pesquisa, mas a partir dos dados levantados
foram redefinidas.
Dessa forma, a matriz de análise constituiu-se de oito unidades principais,
representadas por temas, os quais se desdobram em categorias de análise (Quadro 22).
Bibliográfica
Estudo de
Caso Único
Aplicada Observação
Exploratória METODOLOGIA Entrevista
Descritiva Perspectiva Ideográfica Documental
Qualitativa
Análise de
Conteúdo
4 A REALIDADE ORGANIZACIONAL:
UMA EMPRESA DO VAREJO E DE BASE FAMILIAR
A gente sabe que o sucesso da empresa está dentro da empresa. O segredo está
aqui, não lá fora. As vezes algumas coisas lá fora podem nos ajudar, mas as
pessoas, o conhecimento dos funcionários é uma alavanca competitiva fundamental
para nós (Gestor D).
A empresa acredita e valoriza as pessoas porque é somente por meio delas que a
empresa vai ter melhores resultados. Ter as melhores pessoas significa ter os
melhores desempenhos (Gestor C).
114
O ramo do comércio, assim como os demais ramos, foi prejudicado no início dos anos
1990 em razão da instabilidade da moeda na economia e da oscilação da inflação. Mesmo
assim, a empresa continuou seu processo de expansão e de crescimento e fez investimentos
em outros ramos, como no agropecuário. A esse respeito o fundador contou com um
ensinamento popular recebido da família: “nunca se deve colocar todos os ovos na mesma
cesta” (Gestor B). Essa decisão indica, igualmente, o perfil da empresa de focalizar novas
118
Período Fatos/Mudanças
1950 – 1969 Fundação, crescimento e diversificação de produtos
1970 – 1979 Consolidação da imagem e abertura de filiais
1980 – 1988 Mudança de foco e constituição de redes
1989 – 1995 Investimento em outras áreas
1996 – 2006 Sucessão e expansão acelerada
Quadro 25 – Fatos e mudanças marcantes no percurso da empresa
Na década de 1980, período em que a empresa mudou seu foco e constituiu redes
específicas de produtos, o aumento de pontos de venda atingiu 150%. No período 1989-1995
girou em torno de 60% e, no último período (1996-2006), incorporou mais pontos de venda
do que a quantidade acumulada em todos os períodos anteriores. Nesse último período,
somente a Rede C inaugurou 73 novas lojas e, para 2007, a previsão é abrir outras 30. Esta
rede está direcionada às classes sociais mais baixas, atingindo parcela considerável da
população da região, por isso tem melhor desempenho quando comparada às demais redes do
grupo, razão que levou a empresa a inaugurar maior número de lojas. Esses números indicam
também a consolidação da empresa no mercado e o aumento de sua abrangência na Região
Sul.
A tentativa de novas experiências de negócios e redirecionamento de outros, o
crescimento e a continuidade do estilo de gestão, não obstante a morte do fundador, apontam
a existência de uma cultura construída ao longo da história da empresa e da família de solidez
e comprometimento com o empreendimento, um comportamento que é fruto da aculturação e
socialização de valores que vêm sendo construído e disseminado há várias gerações,
essencialmente a partir da década de 1950.
A existência desse tipo de cultura também indica a presença dos pressupostos da
Escola Cultural e, nesse caso, a formação de estratégia é explicada mais por “um processo de
interação social, baseado nas crenças e nas interpretações comuns dos membros [...], em
conseqüência disso, a estratégia assume a forma de uma perspectiva, acima de tudo, enraizada
em intenções coletivas” (MINTZBERG; AHLSTRAND; LAMPEL, 2000, p. 196). A cultura
interna reforça valores, impõe uma identidade de conduta aos funcionários e cria uma imagem
positiva no mercado.
A abordagem da trajetória da organização colabora na compreensão de que as
empresas familiares originam-se do espírito empreendedor da família, sobretudo dos seus
fundadores, e continuam a se desenvolver a partir de um processo de aculturação de certos
valores e princípios trabalhados no ambiente organizacional, que encontram sustentação nos
preceitos das escolas empreendedora e aprendizado (MINTZBERG; AHLSTRAND;
121
Década de 1970
Com o início da expansão da empresa, nos anos 1970, foi criado um setor específico
de RH – Divisão de RH –, com departamentos de pessoal, responsável pelo pagamento dos
funcionários e dos encargos sociais, e de seleção, uma vez surgida a necessidade de selecionar
funcionários para as novas lojas. A abordagem departamental dos Recursos Humanos passa a
se fazer presente na empresa nesse período.
Em torno de 1975 foi criado o departamento de treinamento, com gerente e instrutores.
Os instrutores eram vendedores das lojas, com boas experiências em vendas. Os mesmos
treinavam os funcionários no centro administrativo e nas lojas. Instituiu-se o treinamento
programado a distância (TPD), normalmente sobre produtos que a empresa vendia. O setor de
treinamento organizava material informativo sobre o produto, o qual deveria ser estudado pelo
funcionário que, posteriormente, respondia perguntas, semelhante a uma prova, para que o
setor pudesse avaliar se houve ou não aprendizado. Desde então os TPDs foram muito
comentados e dinâmicos. Em 1978 o setor funcionava com oito instrutores e o gerente.
Divisão
de RH
Década de 1980
A departamentalização da área de Recursos Humanos teve continuidade no percurso
dos anos 80. A estrutura de cargos e salários foi instituída no início da década, a partir da
contratação dos serviços de um consultor externo, a qual passou a fazer parte do departamento
de recrutamento e seleção. A descrição e avaliação dos cargos foram feitas e a tabela salarial
foi criada.
123
Diretoria
de RH
Década de 1990
Assim como nas duas décadas anteriores, nos anos 90, adaptações e mudanças foram
feitas na estrutura da área de gestão de pessoas. Os cargos e salários deixaram de ser um
departamento e passaram a ser um setor vinculado ao Departamento de Pessoal. Esse
departamento, nesse momento, era gerenciado por um membro da terceira geração da família,
o qual, posteriormente, assumiu a Diretoria de RH e, atualmente, é vice-presidente. Nessa
década também o recrutamento e seleção passou a ser desenvolvido pelo Departamento de
Treinamento.
O enfoque comportamental e estratégico de gestão de pessoas é ressaltado nesse
período. Os processos de treinamento contam com uma inserção mais efetiva dos
departamentos e diretorias da empresa, em que cada um deles passou a ter um determinado
tempo para conversar e/ou informar sobre sua área aos participantes dos treinamentos, com o
124
Diretoria
de RH
Departamento Departamento
Pessoal Treinamento e
Desenvolvimento
Diretoria
de RH
contribui para a organização estar entre as melhores na gestão de pessoas. A empresa recebeu
premiação do Jornal Valor Econômico como uma das melhores em gestão de pessoas, nos
últimos cinco anos, e nos anos 2004, 2005, 2006 e 2007 foi considerada a melhor nesse
quesito, o que também indica que os funcionários estão satisfeitos com as políticas e
estratégias de gestão adotadas pela mesma, uma vez que são eles que as avaliam em pesquisas
dessa natureza.
O papel da área de gestão de pessoas na empresa é enfatizado sempre que possível
como, por exemplo, nos processos de treinamento e desenvolvimento oferecidos aos
funcionários. Para o diretor de Recursos Humanos o trabalho dessa área é descobrir novos
talentos e cuidar das pessoas, melhorar os seus benefícios, desenvolvê-las, insistindo que os
líderes de fato exerçam a liderança e instigando a leitura, entre outros.
10% do nosso trabalho é para corrigir as distorções e 90% para que vocês tenham
um ambiente agradável de trabalho por que a empresa descobriu a bastante tempo
que para crescer ela precisa ter mais do que um departamento pessoal. O
departamento pessoal admite, demite e faz documentos, nós temos um setor que faz
isso, mas nossa área e a empresa faz muito mais do que isso (Gestor C).
ocorrer somente depois de ter sido realizado esse acompanhamento. A esse respeito, o diretor
de Recursos Humanos destacou:
o gerente não pode simplesmente demitir. Ele tem que nos dizer por que ele prefere
a tua demissão, o que ele fez para isso não acontecer. A empresa faz isso para que
todos tenham a mesma oportunidade, para proteger, para que vocês tenham um bom
ambiente de trabalho.
vagas para esses cargos, a empresa as preenche com integrantes desse grupo. Atualmente, em
torno de seis vagas por mês são disponibilizadas para esses cargos e, no ano de 2006, 200
promoções foram efetivadas, reforçando, para o presidente, a política de valorização do
pessoal interno. Esses procedimentos englobam a classificação feita por Dutra (2006) de
movimentação, desenvolvimento e valorização das pessoas,
Os planos de cargos e salários estão organizados por Rede que compõem a empresa.
Assim, cada Rede possui sua hierarquia em termos de funções, embora alguns cargos sejam
os mesmos nas diversas Redes, assim como a remuneração. As funções existentes nas lojas
são as descritas no Quadro 27.
Com exceção da Rede A, que possui seis funções, as demais restringem-se a três, o
que pode ser considerada uma estrutura concisa. Os pontos de venda que compõem a Rede
são classificados em quatro níveis: A, B, C e D. Essa classificação é realizada a partir do
faturamento a ser efetuado pela loja com base nos critérios estabelecidos pelo grupo, como
número de habitantes na região ou cidade, entre outros. Dessa forma, os cargos de gerência
são acrescidos da classificação da loja como, por exemplo, gerente de loja A da Rede C. A
remuneração dos cargos de gerência, então, varia de acordo com a classificação da loja,
independentemente da Rede pertencente, indicando a valorização e reconhecimento do
trabalho em termos de remuneração diferenciada (DUTRA, 2006).
Na ocorrência de promoções a hierarquia das funções nas lojas (Quadro 27) e no setor
administrativo deve ser observada. O funcionário pode candidatar-se a uma vaga desde que o
salário oferecido seja igual ou superior ao seu atual. A preferência da empresa é mantê-los na
mesma Rede de vínculo, mas o remanejo entre elas também ocorre em alguns casos, bem
como com o setor administrativo.
129
4.3.2.3 Benefícios
(continuação)
Grupo de Desenvolver aspectos O grupo é composto por funcionários indicados
Desenvolvimento e comportamentais e profissionais nos pela chefia imediata e passam por um processo
Aperfeiçoamento colaboradores potenciais para se de seleção (laudo psicológico). Se aprovados
(GDA) tornarem gerentes. nessa fase, passam três meses em formação de
gerente. Nessa formação estão incluídos parte
teórica (300h) e estágio prático (360h) na área
em que atuará, com acompanhamento e
desenvolvimento dos princípios básicos da
gerência. Em 2006, 44 gerentes foram
formados.
G-10 Procura desenvolver os funcionários, São pequenos grupos que se encontram
fazendo com que eles se tornem quinzenalmente, sob a liderança de um dos
atuantes na busca de melhorias para membros. Durante os encontros são analisadas
seu trabalho e para a empresa em dificuldades presentes no trabalho e estudadas
geral, e responsáveis na identificação melhorias, as quais são encaminhadas à
de problemas, apontando as possíveis gerência. Também são estudados e discutidos
soluções e criando estratégias com materiais encaminhados pelo setor de
vistas a otimizar os resultados. treinamento e desenvolvimento.
Grupo de Leitura Visa a proporcionar o crescimento e O grupo é formado por funcionários indicados
o desenvolvimento dos colaboradores pela sua chefia imediata. Cada funcionário
por meio de leituras. recebe livros com temas diversificados para
fazer a leitura, sistematizá-la e discuti-la com os
colegas.
Encontro de Desenvolver aspectos que ampliem o São realizados encontros bimestrais com os
Gerentes de Loja conhecimento do ser humano, para gerentes das lojas (por rede), em que são
que tenha maior visão de si. discutidos temas diversificados. Ao término do
encontro cada gerente tem a responsabilidade
de repassar o treinamento a sua equipe de
trabalho, para que todos tenham os mesmos
conhecimentos e informações.
Encontro de Proporcionar uma integração entre os São convidados colaboradores de diferentes
Colaboradores colaboradores das lojas com a funções, cidades e redes para que se conheçam
administração central, enfatizando a e compartilhem experiências. Dentre a
importância das ações individuais de programação do encontro está prevista a fala de
cada colaborador dentro da empresa. dirigentes e a visita aos setores do centro
administrativo.
Grupo de Minimizar dificuldades específicas O gestor, ao apresentar dificuldades no ato de
Desenvolvimento de gestores. gerir, inscreve-se ou é convidado pela sua
Gerencial chefia a participar desse grupo, quando tem
oportunidade de compartilhar suas experiências
e dificuldades. De acordo com a natureza da(s)
dificuldade(s), é oferecido treinamento,
desenvolvimento, atividades, acompanhamentos
especializados visando a eliminar ou minimizar
as dificuldades apresentadas.
Quadro 28 – Processos de Treinamento e Desenvolvimento
Turno Programação/Atividades
23/7/2007 - Recepção dos participantes por diretores e presidência.
Manhã - Verificação das metas e discussão de estratégias de divulgação.
- Lançamento da coleção verão.
- Participação de colegas de outras redes, apresentando como utilizam o rádio para divulgar os
produtos e a empresa.
23/7/2007 - Avaliação do primeiro semestre e planejamento do seguinte.
Tarde - Análise dos indicadores de desempenho por regional, apontando índices abaixo e acima da
média.
- Levantamento de sugestões para melhorar os desempenhos.
24/7/2007 - Discussão de um texto da área comportamental, que foi lido pelos participantes com
Manhã antecedência.
- Gestão do conhecimento, em que as experiências relatadas pelos colegas no dia anterior sobre
a utilização do rádio na divulgação da empresa, foram lembradas como exemplos da
disseminação do conhecimento desta.
- Competências necessárias para a gestão do conhecimento foram apresentadas, trabalhadas e
discutidas por meio de textos, dinâmicas e vídeos.
24/7/2007 - Assuntos diversos: pagamento do PIS 2006, normas do FGTS, assédio moral, vale transporte,
Tarde leis do fundo de investimento do FGTS.
- Procedimentos referentes a crédito e cobrança do cliente foram lembrados e atualizados.
- Avaliação do encontro, por meio do preenchimento de um questionário, com perguntas
abertas.
Quadro 29 – Programação do encontro de gerentes
a gente convidou pessoas de diferentes níveis, das diferentes redes. Existe uma
mistura de funções aqui. O que a empresa quer dizer com isso? Que embora a
empresa tenha uma descrição de cargos diferenciados, mas o resultado só é atingido
quando todos trabalham bem, independente da função, por isso que aqui vem a
diretoria, a presidência, todos vem aqui conversar com vocês, todos se juntam. A
descrição serve para dizer essa é minha responsabilidade e essa é tua, mas em nível
de importância a gente é igual, se eu não fizer bem o meu trabalho eu comprometo
o de vocês, e vice-versa. Na verdade nós temos equipe. [...]. Espero que vocês
tenham tido essa percepção também.
Venho mais para ouvir do que para falar. Gostaria que vocês me falassem sobre o
que pensam da empresa. Eu preciso entender as expectativas de vocês, sobre o que
a empresa está proporcionando para vocês, principalmente àqueles que estão vindo
pela primeira vez (Gestor C).
Muito daquilo que eu sei, eu aprendi por meio da leitura. Eu sei que é difícil, [...]
mas tem que tentar. Tem livros mais leves, mais pesados, é importante fazer essa
alternância porque a gente não vive só de auto-ajuda. Um livro bem lido serve para
o resto de nossa vida. E façam comentários sobre as leituras, comentem com os
colegas, discutam, até no G10, é importante.
Movimentação
Modelo Estratégico Recrutamento e Seleção
Abordagem Funcionalista Promoção Interna
Gestão de pessoas
Valorização Desenvolvimento
Cargos e salários Treinamentos,
Benefícios, SESMT desenvolvimento e educação
Cada uma das unidades de análise é discutida na seqüência, por meio de inferências
dos atores sociais, as quais são interpretadas pela literatura revisada, com o intuito de
abranger os objetivos delineados nessa pesquisa.
Sobrevivência: para pagar os estudos, ajudar em casa, a família, dar uma vida
melhor aos filhos. [...] Realização: nos permite a realização pessoal, profissional, o
desenvolvimento e aprendizagens. É uma escola. Nos relacionamos com pessoas
diferentes, fizemos amigos (Gerido F).
141
Tu pode começar hoje como colaborador, como auxiliar de loja, mas amanhã você
pode tá na gerência de uma das lojas, na gerência de uma equipe, e eu vejo assim,
que é uma empresa que valoriza bastante o seu colaborador, e uma das causas que
me motivou a procurar até a empresa, porque eu não vou procurar uma empresa
onde eu não possa crescer, onde eu não possa me desenvolver, onde eu seja
simplesmente só o colaborador e pronto (Gerido O).
Quem conhece a empresa sabe que é uma boa opção de trabalho [...]. Em Passo
Fundo sinceramente é uma das melhores empresas (Gerido A).
feliz em trabalhar na [...]” (Gerido B); “eu me sinto realizada, aqui é a minha família” (Gerido
G); “eu me emociono quando falo da empresa, meu sentimento é de um grande carinho”
(Gerido J). A motivação em permanecer na empresa é proveniente, especialmente, das
oportunidades de crescimento. O desejo de permanecer na empresa e crescer
profissionalmente é unânime, da mesma forma em que acreditam que terão oportunidades
para tal.
Constatações semelhantes foram obtidas em estudo realizado por Teixeira (2005) no
espaço de uma empresa industrial do setor metal-mecânico e por Oliveira et al (2004) em
investigação com estudantes de Pós-Graduação, em termos da conotação positiva do trabalho,
da centralidade do mesmo na vida das pessoas e da aprendizagem, crescimento profissional,
valorização e reconhecimento serem elementos que tornam a atividade produtiva significativa.
Um dos gestores contou que ao passar em frente a uma das lojas da empresa sonhava
em um dia trabalhar nela. “Será que um dia eu vou ter cacife, uma palavra usada na época, pra
ser gerente de uma loja como essa, ficava imaginando” (Gestor L). Declarou que fez uma
ficha de emprego numa agência e recebeu um telefonema do gerente da loja, oferecendo
trabalho. “Eu não acreditei, era o meu sonho se realizando, eu olhei assim, só agradeci a Deus.
E continuo aqui” (Gestor L). Outros atores demonstram satisfação semelhante pela empresa.
Sou grata pela empresa. Ela mudou a minha vida. Sou a filha mais bem-sucedida.
Trabalhar aqui é uma paixão. Tudo é transparente, eles são humildes. Quando canto
o hino da empresa, me emociono e agradeço a Deus por esse trabalho. Meu filho
tem 14 anos e me pergunta quando que ele vai poder trabalhar aqui (Gestor G).
Sob outro ponto de vista, um entrevistado revela que a sua permanência na empresa se
dá pela razão exclusivamente financeira, o que também é gerador de satisfação para Morin,
Tonelli e Pliopas (2003). “Não tem salário melhor para trabalho de seis horas. Hoje me sinto
bem, sou útil. Não sei se gosto do trabalho ou me acostumei. Acho que aqui não conseguirei
crescer” (Gerido L). A possibilidade de crescimento profissional na loja em que se encontra
trabalhando é duvidosa, bem como ser um trabalho satisfatório ou alienante. O fato de suprir a
necessidade financeira não constitui um trabalho significativo, mas pode contribuir na
satisfação e atender as necessidades básicas.
Dessa forma, os funcionários buscam nessa relação profissional suas necessidades,
sejam fisiológicas, de segurança, sociais, de auto-estima e/ou de auto-realização (MASLOW,
2000) e acreditam que a empresa atende suas faltas e possibilita um ambiente adequado para
tal, o que os leva a perceber o trabalho como significativo e fonte de realização pessoal e
profissional. O ambiente de trabalho é ponto de discussão na seqüência.
Eu estou tentando crescer profissionalmente [...]. As pessoas têm que ter vontade de
crescer, eu tenho e aqui eu estou conseguindo. As meninas todas estão me ajudando
e eu tento [...]. Com a gerente eu sugo tudo, tudo o que ela puder me ensinar, que
ela aprendeu e eu não sei, a gente aprende. É legal, esse ambiente a gente tem, eu
tenho a liberdade de dizer que não sei, e ela me ensina (Gerido Q).
Ela passa assim como uma empresa familiar, [...] a gente tem livre acesso ao
presidente da empresa. A gente chega lá sem nenhuma restrição. Tem empresas que
você não consegue chegar. Então a gente tem, é muito aberto e eu procuro transferir
isso pra dentro da minha loja também, fazendo com que fique um ambiente
familiar, um ambiente de amizade (Gestor H).
Da mesma forma em que os gestores prezam por uma relação aberta, em que todos
possam ouvir e falar e de parceria, para que uns ajudem aos outros, sobretudo para que todos
145
participem, salientam que existe também uma hierarquia a ser respeitada para que cada um
tenha clareza de seus direitos, deveres e suas responsabilidades. No ponto de vista deles é uma
forma de organizar a equipe, sem autoritarismo, uma vez que a participação do funcionário é
importante, e uma forma de cada um se sentir envolvido e necessário para a empresa. Na
medida do possível, cada funcionário tem uma responsabilidade específica perante a equipe,
como abrir o caixa, fechar a loja com o gerente, liderar o grupo G-10, participar do grupo de
leitura, fazer os pedidos, fazer as cobranças e assim por diante. Essa forma de organizar a
equipe contribui para a satisfação dos funcionários e ressalta a importância deles à empresa,
fato que é corroborado teoricamente por Morin, Tonelli e Pliopas (2003) como elemento
gerador de um trabalho significativo.
As decisões também estimulam a participação da equipe. Sempre que possível os
gerentes preferem reunir o grupo para tomar decisões para que todos possam contribuir e ao
mesmo tempo se comprometer com o processo. Para os geridos, essas atitudes facilitam as
relações e criam um ambiente agradável de trabalho. “Eu sinto que não sou mais um, mas que
o meu trabalho é importante, a minha contribuição é importante”, salienta o Gerido E.
A presidência e diretores visitam sistematicamente os pontos de venda e fazem-se
presentes nos treinamentos oferecidos pela empresa. Em ambos os momentos, solicitam
feedback, sugestões, opiniões, colocam-se à disposição para esclarecimentos e
questionamentos, entretanto os funcionários nada ou pouco falam na presença deles e têm a
iniciativa de opinar quando a presidência está ausente. Nessa relação aberta, familiar e de
amizade, contudo, também há receios e inseguranças. Em relação a isso, o consenso
constituído na entrevista grupal, foi de que
a empresa é bem aberta para perguntas, sugestões, mesmo assim pessoas têm medo
de perguntar. Os colaboradores têm receio dos diretores e presidentes,
principalmente dos vinculados à família, mas isso deve ser cultural, pois eles são
abertos, possibilitam o diálogo, são acessíveis, conversam de igual para igual,
andam entre a gente, cumprimentam, perguntam como vão as coisas. [...] As
pessoas tem experiências de outros trabalhos com chefias autoritárias e pensam que
aqui também é assim.
Eu me sinto à vontade de falar o que acho certo e errado. Se eu acho que não ta
certo tal coisa eu chego e converso com a gerente, eu acho que não tá bom, poderia
ser diferente, ela sempre aceita nossas opiniões, nossas críticas, ela pensa e vê daí
(Gerido P).
aqui tem muita aprendizagem e muita oportunidade, porque aqui eles dão muitas
oportunidades de conhecimento e de vontade de crescer, de sempre querer mais.
Perceber os nossos limites, o que a gente pode, o que a gente não pode. É tipo um
desafio, você tem que aprender até onde você pode ir, do que você é capaz. [...] a
gente aprende muita coisa e aprende mesmo, é uma lição (Gerido A).
A área de gestão de pessoas, por entender que a relação informal entre os membros, o
respeito e a valorização às pessoas geram um ambiente de trabalho agradável e harmonioso e
são importantes para a satisfação e desenvolvimento das pessoas, cultiva esses valores e
estimula a existência deles nos setores e lojas. Esses valores são percebidos pelos
funcionários, independentemente da função que exercem, os quais criam laços afetivos com a
empresa e com os colegas, comprometem-se com os objetivos organizacionais e demonstram
orgulho de fazer parte da empresa. Bandeira, Marques e Veiga (1999) verificaram que
determinadas práticas de gestão de pessoas ampliam o comprometimento normativo e afetivo
dos funcionários, como é o caso na empresa investigada. O normativo reflete um conjunto de
pensamentos, no qual são reconhecidos obrigações e deveres morais para com a organização,
enquanto o afetivo resulta de um vínculo afetuoso em relação à organização, em que o sujeito
identifica-se e envolve-se com ela. O pensamento do Gestor D é de que “essa comunicação,
essa percepção da interação entre as pessoas sem formalidades é onde se cria um ambiente em
que as pessoas possam aprender. Já está na cultura da empresa”.
Um ambiente propício à aprendizagem é discutido por Fleury (1997), para quem o
tempo, o espaço e as pessoas devem ser considerados na constituição desse ambiente. No
tocante ao tempo, os entrevistados informaram existir momentos para conversas e discussões
como, por exemplo, os encontros de G-10. Em se tratando da flexibilidade da estrutura
organizacional (espaço) para integração e interação, o fato dos entrevistados relatarem ser
uma empresa aberta a sugestões e discussões, com acesso facilitado aos gestores mas com
níveis hierárquicos claros, pressupõem-se que esse espaço exista, porém não é acessível a
148
TAKEUCHI, 1997). Habilidades e características pessoais também foram citadas por alguns
gestores como necessárias para o funcionário desempenhar bem a função, tendo em vista que
“a parte técnica é muito fácil de aprender” (Gestor G). São elas: gostar de gente e de vender,
ter simpatia, vontade, responsabilidade, dinamicidade e bom relacionamento interpessoal e ser
comunicativo.
Esses conhecimentos – produto, venda e administrativo – todos os funcionários
precisam ter, independentemente da função, no entanto referem-se a conhecimentos
operacionais da realização de uma rotina de trabalho, também chamados de know-how. O
conhecimento conceitual – know-why – que implica em perguntar o porquê da natureza ou
existência de determinadas condições ou procedimentos, induzindo à construção de novos
quadros de referência e a aprendizagem, parece não se fazer presente nesse ambiente. A
aprendizagem de conhecimentos operacionais pode promover mudanças nas rotinas, contudo
o conhecimento conceitual é fundamental para o desenvolvimento do trabalhador (KIM,
1998).
Na realização do trabalho, os funcionários devem seguir as diretrizes e orientações da
empresa, constantes nos manuais, circulares e outros documentos, o que mais uma vez indica
que os conteúdos das aprendizagens são conhecimentos operacionais e explícitos, porém a
criatividade é estimulada no sentido de identificar outras formas do fazer que leve a um
resultado melhor, mais rápido, com menor custo, etc. Os atores sociais sentem que possuem
liberdade para realizar o trabalho de outras formas, desde que as normas sejam respeitadas.
“A gente tem total liberdade, com limites, é claro [...]. A gente tem as nossas idéias, eles
permitem bastante” (Gerido N).
Além de serem convidados a pensar a respeito do trabalho, os funcionários são
orientados a socializarem as novas idéias com os colegas e superiores. O consenso construído
entre os participantes do grupo de foco é de que
as pessoas tem abertura para fazer o trabalho como consideram melhor, de outra
forma, desde que não prejudiquem os princípios da empresa. A criatividade é
estimulada constantemente; ao criar algo, é necessário repassar aos demais.
eu fui abordar um cliente na vitrine, ele entrou e levou R$1.400,00. Claro que eles
[referindo aos gestores] não nos mandam “vão pra vitrine”, só que eu achei
interessante. A mulher tava olhando, olhando, ia até a vitrine e voltava. Eles
adoraram, tanto que agora eles falam que se o cliente tiver muito na frente é pra
chamá-lo. Eles mandaram e-mail para todos os funcionários dizendo que se o
cliente tiver na vitrine pode chamar, porque deu resultado. Foi uma iniciativa
minha. Em Porto Alegre adotaram essa estratégia e tá dando certo (Gerido P).
alternativas de inovações no trabalho, justificando ser uma rotina com procedimentos claros.
Revela um dos atores: “cada um sabe o que tem que fazer, a gente procura fazer o melhor, [...]
mas nunca percebi uma forma nova de fazer” (Gerido N). O fato de o gestor dar liberdade
para sugestões, idéias, novas formas de desenvolver o trabalho, não motiva os geridos a usar a
criatividade e criar novos conhecimentos, o que é essencial para a competitividade
organizacional e o desenvolvimento do trabalhador. Ao contrário disso, eles referem-se às
normas e procedimentos da empresa, o que aponta que a preocupação deles é muito mais com
o cumprimento dos mesmos a iniciativas próprias.
Dessa forma, a sistemática da empresa em torno das normas e procedimentos padrões
inibem o pensamento criativo e inovações nos processos. Ao inibir a criatividade impede a
transformação da experiência, as quais passam a ser simplesmente reproduzidas pelos
diferentes atores. A atuação do trabalhador, assim, é passiva, comprometendo sobremaneira a
sua aprendizagem e conseqüentemente o seu desenvolvimento, pois é a evolução do
pensamento que permite a integração das novas aprendizagens (SOLAR; DANIS, 1998). Ao
mesmo tempo, as normas e procedimentos padrões dificultam o desenvolvimento da empresa
e sua competitividade, pois Motta (2004) alerta que na atualidade o gerenciamento estratégico
implica em questionar constantemente as crenças existentes, introduzindo elementos novos de
análise dos fenômenos. Em outras palavras, as práticas e processos devem ser constantemente
construídos e desconstruídos para que o aprendizado seja contínuo.
O aprendizado pode ser estimulado ou inibido pela cultura organizacional
prevalecente, no entendimento de Schein citado por Boyett e Boyett (1999). Para os autores a
concentração no sistema, a liderança controladora, a resolução de problemas de forma
compartimentalizada e a abertura para mudanças somente quando necessário, entre outros
fatores, inibem o aprendizado pessoal e organizacional, como é o caso na empresa objeto do
estudo.
Na busca de estimular a reflexão e a construção de modelos mentais da sua equipe, um
gestor adota a seguinte sistemática de trabalho:
eu oriento, quando eles estão vindo em minha direção para me trazer algo, que eles
parem, pensem se não conseguem resolver sozinhos. Oriento que eles sejam
autônomos. E junto com os problemas eles tem que me trazer alternativas de
solução (Gestor D).
Para este gestor essa é uma forma de desenvolver a criatividade dos funcionários, o
que é corroborado pela literatura. O fato de o sujeito pensar e, sobretudo, refletir em relação à
152
situação, permite que ele tome consciência, estabeleça relações com outras experiências e
questione os seus próprios postulados, desenvolvendo seu pensamento e aprendendo
(MERRIAM; CLARK, 1991).
Nessa direção, experiências da rotina de trabalho em que a criatividade fez-se
necessária foram compartilhadas. Um sujeito lembrou da exposição de produtos na sua loja,
em que a norma da empresa é de os produtos serem expostos a partir do preço mais baixo,
entretanto havia chegado uma mercadoria diferente que, no seu ponto de vista, merecia
destaque, porém tinha um preço mais elevado, não podendo ficar na entrada da loja. Neste
caso conversou com o gerente e justificou a importância do produto estar bem visível ao
cliente e sua sugestão foi aceita. Para esse funcionário, com conversa e diálogo é possível
fazer adaptações e mudanças para além dos procedimentos padrões da empresa, mas é
necessário ter a iniciativa de expor a idéia.
Essas experiências levam os funcionários a sentirem-se colaboradores de
conhecimento à empresa. Nas palavras do Gerido P: “aqui não é só a vendedora, como todas
as empresas assim, aqui a gente é uma colaboradora mesmo. A gente colabora com opiniões,
com conhecimento”. Os conhecimentos gerados, adquiridos ou apreendidos, contudo, são
relacionados a competências e aptidões técnicas do funcionamento do negócio e das
atividades específicas da função e, na maioria das vezes, são operacionais e explícitos,
distanciando-se especialmente do plano social. Os trabalhadores, apesar de os conhecimentos
restringirem-se ao âmbito profissional e, por isso, pouco contribuir à integração das diversas
dimensões da identidade humana e à compreensão pessoal do sentido da vida e do mundo,
sentem-se aprendizes.
Em relação a isso, DiBella e Nevis (1999) argumentam que o essencial é o que os
empregados são capazes de aprender e como aprendem. Meister (1999) e Eboli (2004)
alertam que as organizações, no século 21, devem privilegiar o desenvolvimento de
competências amplas e não somente a aquisição ou atualização de conhecimentos técnicos e
instrumentais destinados ao saber fazer. A Pedagogia voltada ao significado, postulada por
Schunck (1997), aponta, por conseguinte, que o primeiro enfrentamento das organizações está
em repensar os programas tradicionais de treinamento para se afastar da aprendizagem sobre
objetos e ações e avançar no desenvolvimento intelectual, pois é somente por meio da
competência intelectual que o sujeito adquire condições de fazer escolhas conscientes e
inteligentes. As organizações, portanto, são desafiadas a organizar seus processos de
formação continuada em torno de quatro aprendizagens que são os pilares da educação no
153
século 21: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser
(DELORS, 1999).
Torna-se necessário, contudo, compreender os significados e significâncias que as
aprendizagens têm aos atores sociais, o que se busca no próximo tópico.
Aqui no grupo que a gente chama de G10, que seria dez pessoas que se reúnem pra
trocar idéias, resolver problemas e é bem interessante isso. [...] A gente faz uma
reuniãozinha, debate aquele assunto, sempre acha idéia, sugestões, nem todo mundo
tem a mesma idéia, nem todo mundo recebe da mesma maneira, às vezes dá
divergência e é nesse trocar de idéias que a gente cresce (Gerido N).
Eu não gostava muito de ler e como a gerente me colocou num grupo de leitura eu
fiquei meio assim “te que ficar lendo, já terminei meu tempo de colégio, não sei se
eu quero mais”, mas eles ensinam a gente a ler [...] e eu achei bem interessante.
Gosto, hoje até sinto falta, hoje estou com um livro aqui na bolsa pra entregar.
Antes eu não tinha tempo pra ler, agora eu acho um tempo (Gerido P).
Eu costumo analisar se o erro foi voluntário, foi por falta de conhecimento [...],
chamo a atenção “ó, a forma certa de fazer é desse jeito, procura não errar
novamente, procura não repetir”. Quando o erro é repetido você já tem que tomar
uma atitude. Nunca vou cobrar ninguém de um erro que foi a primeira vez [...] ou
de forma voluntária [..]. A gente pune quando os erros são sucessivos (Gestor I).
a gente fica meio pra baixo, fica triste, meio nervosa, mas a gente consegue, eu
procuro motivar a equipe, hoje de manhã eu disse “oh meninas falta R$2.700,00 pra
conseguir nosso objetivo, vamos lá”, e elas me disseram “mas não é muito, a gente
consegue” (Gestor I).
Sob outro ponto de vista, um gerente declarou que prefere exigir dos funcionários um
atendimento diferenciado ao cliente, pois ele acredita que com um bom atendimento as
vendas se efetivam. A orientação é de o funcionário mostrar os produtos, lembrar as
promoções, oferecer produtos ligados ao solicitado, o que é chamado de venda adicional. Nas
palavras do Gestor I:
As normas são necessárias. Tem que ter alguém com pulso firme para dizer, indicar
onde ir senão vira uma baderna. Mesmo assim às vezes acontece alguma coisa,
imagina se não tivesse. Uma empresa desse tamanho se não tiver normas vira uma
bagunça. [..] Entrei sabendo das normas e tento cumpri-las (Gestor H).
Quanto melhor se trabalhar, se aprender, você vai ter uma oportunidade na própria
empresa, eu acho que essa é a parte da disciplina sabe, você mesmo se
autodisciplina, você mesmo vai querer buscar o conhecimento, não vai querer fazer
nada errado, vai querer digamos assim, ser o melhor pra poder futuramente ser
indicado pra uma gerência, que é o que muitos procuram (Gerido O).
sua realização. Complementando essa idéia, Morgan (1996, p. 279), ao abordar a organização
como instrumento de dominação, destaca: “nossas organizações estão nos matando”. O autor
chama a atenção de que quase sempre existe um elemento de dominação em todas as
organizações, no sentido de maximizar os interesses institucionais às custas dos interesses
individuais. Um exemplo de dominação é o fato daqueles que tem poder de mando se
sentirem no direito de ditar as normas, enquanto os submetidos a tais regras têm o dever de
obedecer.
Indícios da dominação do trabalhador é percebida no discurso do presidente ao
abordar a necessidade de uma das Redes dobrar a quantidade de vendas. O mesmo justificou
que a Rede está preparada e adequada em termos de modelo e organização, produtos,
qualidade e preço, além da tradição da empresa e do quadro funcional. Dessa forma, a
estratégia a ser adotada é a divulgação dos produtos no rádio, para atingir parcela maior da
população, o que deve ser feito pelos gerentes de cada loja na sua cidade específica. A partir
dessas justificativas, solicitou que os gerentes opinassem sobre a possibilidade de dobrar as
vendas, sugerindo que o aumento ocorresse em dois ou, no máximo, três anos. Nas palavras
do presidente: “Então, queria ouvir a opinião de vocês: é possível, não é possível? Vamos
experimentar, vamos tentar? Quem está de acordo, quem não está? [...] Eu quero ouvir vocês
sobre isso. Depois nós vamos cobrar, nós vamos cobrar”.
Dos 35 gerentes presentes no encontro, em torno de 15 pronunciaram-se, concordando
com a proposta e acreditando que o uso do rádio auxiliaria bastante na popularização da Rede.
Assim, comprometeram-se com o acréscimo das vendas no prazo sugerido, o qual será
exigido como ficou claro ao final da fala. Esse comprometimento é característico do vínculo
normativo e de obrigação do funcionário (MEYER; ALLEN, 1991).
Os enfoques propostos por Watson (2005) em torno das características da gestão
organizacional colaboram na compreensão do estilo de gestão praticado na empresa em
estudo. Para o autor, as realidades gerenciais representam a forma sistêmico-controladora ou a
processual-relacional. Nesse sentido, o estilo sistêmico-controlador predomina no caso
investigado, apesar de os funcionários ressaltarem as relações e interações estabelecidas no
seu interior, justamente porque essas interações configuram-se como mecanismos de
dominação do trabalhador (MORGAN, 1996).
A gestão sistêmico-controladora inibe e dificulta a aprendizagem individual e
organizacional na medida em que o gestor assume o papel de decisor racional, planejador
sistemático, supervisor, tecnocrata (MOTTA, 2004). O ato de gerir é muito mais uma prática
social (CHANLAT, 2000), uma arte (MOTTA, 2004), que lida com o imprevisto, a
164
É que a empresa é familiar, eles tratam bem as pessoas, eles se preocupam com a
pessoa, se preocupam não só com os números, porque tem empresa que se preocupa
só com os números e eles fazem o desenvolvimento das pessoas (Gestor M).
É uma empresa familiar, então ela vê o bem-estar das pessoas. Na semana passada,
a venda estava boa, a empresa deu um aumento de salário para todos. Todo mundo
ficou realizado, era uma coisa que ela não tinha necessidade de fazer. O
pensamento é “nós estamos bem, vamos fazer eles se sentir um pouco melhor
também” (Gestor H).
A empresa tem calor humano. Você participa. Eles valorizam, cobram, elogiam. Ela
poderia ser diferente: mais autoritária. Eles sabem que o trabalhador motivado e
valorizado produz mais (Gerido Q).
Aqui parece que eles enxergam nós mais, é como se eu não fosse só mais uma
pessoa. Eles trabalham muito pra deixar nós confiantes, à vontade e se desenvolver,
eles deixam nós bem a vontade pra ver até onde somos capaz (Gerido P).
Acho que como parte de um todo, cada um é um tijolinho, cada um tem a sua parte
a cumprir. Como uma corrente, acho que ela considera cada um como um membro
importante. Eles cuidam do funcionário (Gerido N).
Eles cuidam do funcionário, como o refeitório, é uma preocupação que eles têm.
[...] Nós temos um plano de saúde bom, muito bom, realmente, acho que isso
auxilia bastante, tem dentista, a gente tem desconto nas lojas da empresa, então eu
acho que eles valorizam bastante, é bom isso (Gerido N).
Hoje em dia você ter uma empresa que te dá um plano de saúde, te dá uma carga
horária boa pra ti trabalhar, uma empresa que te assina o contrato, com todos os
teus direitos, que te faz valer por isso, é meio difícil tu encontrar no mercado de
trabalho hoje, uma empresa que proporciona esse crescimento aos seus
colaboradores, eu acho isso uma valorização do colaborador (Gerido O).
posturas e habilidades pessoais (SCHUNCK, 1997; JORDAN et al, 1997; EBOLI, 2004). “A
educação não é um processo de adaptação do indivíduo à sociedade. O homem deve
transformar a realidade para ser mais” (FREIRE, 1983, p. 31). Diante disso, as organizações
são desafiadas a substituírem o paradigma do treinamento pelo da aprendizagem (JORDAN et
al, 1997; MEISTER, 1999), especialmente visualizando a possibilidade do desenvolvimento
do ser humano, sua autonomia e sua emancipação.
Sob a orientação do desenvolvimento, a sugestão levantada é de a empresa auxiliar
financeiramente os funcionários interessados em cursar o Ensino Superior, o que justificaria,
para eles, o fato de a empresa ser uma das melhores em gestão de pessoas pelo Jornal Valor
Econômico, bem como primar pelo crescimento e desenvolvimento dos trabalhadores. A esse
respeito, é importante lembrar que apenas 4% dos funcionários têm Ensino Superior completo
e 10% estão com o curso em andamento (Quadro 23). Esse auxílio não ocorre em razão de a
empresa preferir “formar as pessoas dentro da sua Filosofia” (Gerido F), que, como já
discutido, pressupõe comportamentos padrões em torno das normas e metas institucionais e da
transferência e aquisição de conhecimentos técnicos e instrumentais.
Merriam e Clark (1991), entre outros autores, discutem que a aprendizagem de
conhecimentos emancipadores desenvolve humanamente o sujeito, tornando-o senhor do seu
destino, enquanto a aprendizagem destrutiva, relacionada a conhecimentos e saberes
alienantes, criam uma identidade de dominado. Torna-se, então, relevante lembrar dos
mecanismos de dominação utilizados pelas organizações em prol de seus objetivos
(MORGAN, 1996) e das práticas opressivas na busca da performance organizacional
(DAVEL; ALCADIPANI, 2003), relegando o humano à eficiência, à eficácia e à
lucratividade (CHANLAT, 2000). Em contrapartida, a construção de relações mais
democráticas e justas no interior das organizações é possível, a quem Vergara e Branco
(2001) intitulam de empresa humanizada, bem como a conciliação do econômico e do social
(CHANLAT, 2000).
A empresa humanizada preocupa-se, entre outros fatores, com o autodesenvolvimento
e o desenvolvimento do ser humano em suas múltiplas dimensões. Sen (2000) traz a
concepção do desenvolvimento como liberdade, que consiste em eliminar as privações de
liberdade que limitam as escolhas e as oportunidades das pessoas de exercer sua condição de
agente no processo. A partir daí, os Estudos Críticos em Administração (ECAs) defendem a
autonomia e a responsabilidade do sujeito no ambiente de trabalho, pois é fundamental para o
seu processo de emancipação e, por isso, não compactuam com iniciativas que ressaltam a
alienação do sujeito.
170
Eu já conheço a empresa, eu sei que eles não vão fazer nada pra prejudicar o
colaborador, sabe, então eu fico bem tranqüila, a gente fica ansioso, porque não
sabe pra que cidade vai ter que mudar, não sabe o que espera o futuro, mas ao
mesmo tempo eu fico tranqüila, porque eu sei que o meu emprego tá garantido,
jamais eles vão demitir uma pessoa só porque fechou uma rede.[...] assim como
eles confiam em mim eu confio neles (Gestor M).
Estou tranqüila mesmo pela rede estar fechando. Sei que a empresa vai ter um
emprego para mim; para alguma outra rede é certo que a gente vai, não tem essa
questão de demissão. [...] estou tranqüila, fazendo meu trabalho, a gente tem muito
apoio dos superiores, dos colegas (Gerido Q).
Eu não sei o que vai acontecer comigo, mas, [...] a empresa é muito especial pra
mim e a decisão que eles tomarem eu vou acatar (Gestor L).
Num momento tão crítico e que implica em mudanças dos funcionários e, muitas
vezes de suas famílias, a empresa consegue tranqüilizá-los e fazer com que eles confiem na
sua atitude. Dentre os princípios da empresa está a confiança recíproca, explicitada nas falas e
que auxilia na compreensão da situação, e é corroborada teoricamente por Davel e Souza
(2004), para quem a confiança e a lealdade são mais intensas nas relações que se estabelecem
nas empresas familiares. A confiança também é oriunda da política da empresa de, num
primeiro momento, direcionar os funcionários a outras redes do grupo.
A demissão de funcionários ocorre somente se não existir alternativa. No fechamento
de rede procura-se remanejá-los às demais redes e lojas do grupo, mas, nesses casos,
normalmente eles precisam mudar de cidade, o que dificulta para algumas pessoas. Quando o
funcionário apresenta problemas, antes de desligá-lo, procura-se recuperá-lo por meio de
trabalhos direcionados as suas dificuldades. Nesse sentido, o diretor de Recursos Humanos
informou:
A demissão não pode ser feita por livre e espontânea vontade do gerente para evitar
que os funcionários proponham acordos de desligamento com a empresa e porque com a troca
171
constante dos funcionários, principalmente vendedores, que são a maioria, é mais difícil de
criar vínculo com o cliente e constituir uma equipe consistente, explica um gerente. O desejo
de fazer acordos não é comum, ao contrário, a grande maioria dos funcionários não se vê
numa outra empresa, o que é destacado no testemunho seguinte:
Tem treinamentos em que você é obrigado a fazer, porque você tem que estudar,
emitir relatórios e mandar pra lá, se você não fizer isso você vai ser descontado,
penalizado. Então já te obriga, só o fato de você ter que fazer, mesmo sem vontade
já vai adquirir o conhecimento, vai goela a baixo. [...] A empresa disponibiliza e
cobra, cobra muito que você se desenvolva (Gestor H).
como destacado no relato anterior, para serem indicados por suas chefias a participar das
seleções para gerente. Os conhecimentos acumulados, como discutido no tópico 5.3, dizem
respeito aos produtos, venda e administrativo, ou seja, são conhecimentos técnico-
profissionais e instrumentais, distanciando-se da proposta de desenvolvimento humano.
Em contrapartida, se o funcionário tiver a iniciativa e o hábito de refletir sobre sua
prática e as relações que estabelece com a empresa, os colegas e superiores, ampliará o seu
pensamento e agregará outros conhecimentos além dos técnicos, promovendo seu
autodesenvolvimento. O mesmo poderá ter dificuldades de transformar suas atividades, tendo
em vista as políticas da empresa em torno de procedimentos, normas e comportamentos
padronizados, mas será capaz de modificar suas relações, principalmente as afetivas, com o
outro, com os familiares, com os amigos e com a empresa, aprendendo a conhecer, a viver
junto e a ser (DELORS, 1999).
Ao analisar os significados das aprendizagens aos sujeitos da pesquisa, identifica-se o
desenvolvimento nos âmbitos pessoal e social, além do profissional (Quadro 31).
Âmbito Desenvolvimento
Humildade, paciência, confiança e auto-estima
Administração financeira e do tempo
Pessoal Comunicação
Batalhar pelos objetivos
Enfrentar problemas e desafios
Atendimento qualificado ao cliente
Comportamentos na relação com o cliente
Profissional Gerenciamento de pessoas e/ou processos
Liderança
Organização do setor e da loja
Divulgação da empresa
Amizade
Conviver com pessoas diferentes
Social Respeitar o outro
Tratar as pessoas com educação e atenção
Quadro 31 – Desenvolvimento pessoal, profissional e social dos funcionários
emancipatória. Com essa abordagem, Vergara e Branco (2001, p. 37) intitulam de empresa
humanizada aquela que “voltada para seus funcionários e/ou para o ambiente, agrega outros
valores que não somente a maximização do retorno para os acionistas”. Dentre esses valores
está o desenvolvimento das pessoas (físico, emocional, intelectual, espiritual), que
diretamente perpassa pela aprendizagem, objeto desse estudo.
A satisfação dos funcionários é oriunda da valorização que a empresa dispensa aos
mesmos e ao crescimento profissional que ela promove, o qual, na maioria das vezes, é
confundido com desenvolvimento. Visando identificar se os atores sociais têm alguma
percepção dos objetivos organizacionais que a levam a gerar essa satisfação, foram
questionados: Porque a empresa dá esse tratamento aos funcionários e produz essa satisfação?
O discurso recorrente é de que a empresa valoriza o trabalhador com a intenção de
melhorar a capacidade de cada um. Ela desafia as pessoas a crescerem, se desenvolverem,
para com isso produzirem mais. Quanto mais o pessoal tiver preparado, mais ela vai se
sobressair ao concorrente e melhorar o seu desempenho, inclusive financeiro, pois a empresa
se destaca, pelo desempenho dos seus funcionários. Nas palavras de um ator social: “ela visa
[...] o teu crescimento, mas acima de tudo o crescimento dela, da própria empresa, como
lucro” (Gerido G). Essa postura está voltada ao autodesenvolvimento do trabalhador e visa a
desencadear no funcionário sua percepção da situação atual e em que patamar poderá chegar,
logo, tem a finalidade de gerar a tensão criativa e a ampliação do domínio pessoal do
trabalhador.
Os gestores são orientados a valorizarem o trabalho da sua equipe, ressaltando os
aspectos positivos aos negativos, conduzindo-os aos objetivos organizacionais. O testemunho
de um dos diretores expressa esse posicionamento:
A geração de satisfação nos funcionários é uma estratégia da empresa para que eles
sintam-se bem, valorizados, criem tensões criativas e, por conseguinte, tenham um bom
desempenho em prol dos objetivos organizacionais. As pessoas estando motivadas buscam
cada vez mais conhecimentos e o autodesenvolvimento, e com isso melhoram no trabalho e
contribuem para a competitividade da empresa, intimamente ligada à tensão criativa. “Qual é
a empresa que tem crescimento se a pessoa não tá se sentindo valorizada? O segredo da
178
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ser Humano
uno, multidi-
mensional e
Trabalho inacabado Educação
decente e ao longo da
significativo vida
Aprender a
conhecer,
Conciliação fazer, viver
do econômico juntos e ser
e do social
Desenvolvimento
Lógica
Humano Experiência
observação
emancipatória no Âmbito reflexão
Organizacional ação
Cultura,
ambiente e
Gestão do
estratégias de Paradigma de conhecimento
aprendizado aprendizagem,
Educação
corporativa
metodologia adotada contempla o aspecto prático além do teórico, e esses processos terem
como meta a melhora no desempenho profissional do aprendiz. A empresa, portanto,
demonstra traços de organização tradicional e de organização aprendente.
O G-10, o grupo de leitura, o grupo de desenvolvimento e aperfeiçoamento (GDA), os
encontros de gerentes e de colaboradores, configuram-se como espaços de aprendizagens e de
educação permanente dos funcionários. Esses processos estão ligados à concepção de
Educação Corporativa e ao paradigma da aprendizagem. A empresa, dessa forma, evidencia
preocupações e iniciativas com práticas mais humanizadoras, em que os funcionários possam
exercer o papel de agentes e sujeitos do processo. O fato de ela assumir a formação dos
trabalhadores indica sua apreensão com o aspecto social, além do econômico. Em
contrapartida, os encontros e leituras são orientados pela área de gestão de pessoas e
freqüentemente focados nos objetivos exclusivamente organizacionais, induzindo a atuação
passiva e reativa dos participantes e prejudicando o processo reflexivo dos mesmos. A
reflexão, no entanto, deve ser estimulada, pois é a desencadeadora da aprendizagem, da
geração de conhecimentos, do autodesenvolvimento e do desenvolvimento humano. É ela que
fomentará a atribuição de significado à experiência, a abstração da experiência, a
identificação de novos patamares de conhecimento e de desenvolvimento a serem trilhados,
sobretudo o questionamento de seus modelos mentais.
Em se tratando do conteúdo da aprendizagem, os conhecimentos estão voltados aos
produtos, venda e procedimentos administrativo-burocráticos, e dizem respeito a
competências e aptidões técnicas do funcionamento do negócio e das atividades específicas da
função e, na maioria das vezes, são operacionais (know-how) e explícitos. O conhecimento
conceitual (know-why), que implica na aprendizagem, foi identificado a partir do
desenvolvimento no âmbito pessoal, profissional e social, promovido pela mesma, embora de
forma tímida. A aprendizagem de conhecimentos operacionais contribui para mudanças nas
rotinas, contudo o conhecimento conceitual é essencial para o desenvolvimento humano. Os
trabalhadores, apesar da grande maioria dos conhecimentos referirem-se ao âmbito
profissional e, por isso, pouco contribuir à integração das diversas dimensões da identidade
humana e à compreensão pessoal do sentido da vida e do mundo, sentem-se aprendizes. O
conteúdo da aprendizagem, deste modo, parece ser o principal desafio da empresa a fim de
avançar no paradigma da aprendizagem.
Iniciativas da gestão do conhecimento, por meio da socialização de conhecimentos
tácitos, foram identificadas, essencialmente, em processos de treinamento e desenvolvimento.
A empresa tem estimulado a criatividade e a introdução de novas idéias e práticas, no entanto
188
a cultura em torno de normas, procedimentos padrões, disciplinas, entre outros elementos, tem
inibido o surgimento de novos conhecimentos. Como o trabalho é rotineiro, na maioria das
vezes, os conhecimentos são objetivos, explícitos e já formalizados nos documentos
institucionais e os funcionários dedicam-se a absorver esses conhecimentos.
A aprendizagem exclusiva de laço simples é revelada por meio de ações corretivas em
que os atores sociais estão submetidos. O circuito duplo, de caráter cognitivo, não se expressa
na prática dos sujeitos da pesquisa, bem como a aprendizagem de ciclo triplo que envolve
aprender como aprender. Por outro lado, a empresa é vista pelos funcionários como uma
“escola”, ressaltando que as aprendizagens oportunizadas são para a vida e no sentido de
torná-los melhores, o que pressupõe que as experiências vivenciadas sejam emancipatórias e
extrapolem o ambiente profissional.
O desenvolvimento humano, entretanto, na maioria das vezes, foi confundido com
crescimento, em termos de acúmulo de conhecimentos operacionais e/ou ascensão
profissional na carreira da empresa. O desenvolvimento propiciado pela empresa contempla
os planos pessoal, profissional e social, embora seja mais visível no âmbito profissional. Em
razão de os funcionários estarem comprometidos, inclusive afetivamente com a empresa,
relacionam suas experiências profissionais com desenvolvimento, atribuindo significados
libertadores às aprendizagens vivenciadas. As políticas de gestão de pessoas contribuem
intensamente na geração dessa imagem da empresa e representam uma estratégia de gestão,
pois, apesar de algumas práticas propiciarem a alienação, os atores sociais não as percebem
como tal, porque estão envolvidos com os objetivos organizacionais.
O fato de o indivíduo aprender conhecimentos construtivos de forma contínua
desenvolve-o em suas múltiplas dimensões. Relação intrínseca e extrínseca entre processos de
aprendizagem e desenvolvimento pessoal do adulto apontada pela literatura, parece estar
fragilizada no caso estudado, uma vez que o desenvolvimento humano consiste na
transformação do adulto em relação aos seus pensamentos, comportamentos, atitudes,
aptidões, conhecimentos ou convicções. É a transformação da forma de pensar, agir e
aprender do sujeito, em que a experiência, a reflexão e a autonomia desempenham papéis
cruciais e esses elementos não são suficientemente visíveis nos atores sociais.
A partir dessa base, o estudo permite inferir que a aprendizagem individual, na
perspectiva do desenvolvimento humano na empresa investigada, encontra-se prejudicada
pela predominância do estilo de gestão sistêmico-controlador e da abordagem tradicional e
comportamental de educação, bem como pela cultura organizacional em torno de normas e
procedimentos padronizados, pois essas práticas priorizam a atuação corretiva e adaptativa
189
SUGESTÕES
REFERÊNCIAS
ANTUNES, Ricardo (Org.). A dialética do trabalho – escritos de Marx e Engels. São Paulo:
Expressão Popular, 2004.
BAUER, R. Gestão da mudança: caos e complexidade nas organizações. São Paulo: Atlas,
1999.
DAVEL, E.; VERGARA, S. C. Gestão com pessoas e subjetividade. São Paulo: Atlas,
2001.
DEJOURS, C. Uma nova visão do sofrimento humano nas organizações. In: CHANLAT, J. F.
(Coord.). O indivíduo na organização: dimensões esquecidas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1996.
Vol. 1.
EBOLI, M. Educação corporativa no Brasil: mitos e verdades. São Paulo: Gente, 2004.
______. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e
Terra, 1996.
GERSICK, K. E. et al. De geração para geração: ciclos de vida das empresas familiares.
São Paulo: Negócio, 1997.
GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 4. ed. São Paulo: Atlas: 1994.
GOLEMAN, D. Trabalhar com inteligência emocional. Lisboa: Temas & Debates, 1998.
HACKMAN, J. R.; OLDHAM, G. R. Motivation thorough the design of work: tes ot a theory.
Organizational Behavior and Humana Performance, v. 16, p. 250-279, 1976.
JERUSALINSKY, A. Papai não trabalha mais. In: O valor simbólico do trabalho e o sujeito
contemporâneo. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 2000.
KUHN, T. S. A estrutura das revoluções científicas. 5. ed. São Paulo: Perspectiva, 1998.
LAMPEL, J. Rumo à organização que aprende. In: MINTZBERG, H.; AHLSTRAND, B.;
LAMPEL, J. Safári de estratégia: um roteiro pela selava do planejamento estratégico. Porto
Alegre: Bookman, 2000.
LIBÂNEO, J. C. Pedagogia e pedagogos, para quê? 5. ed. São Paulo: Cortez, 2002.
MEZIROW, J. A critical Theory of Adult Learning and Education. Adult Education, v. 32,
n. 1, p. 3-24, 1981.
200
MEZIROW, J. How critical reflection triggers transformative learning. In: ______ (Org.).
Fostering critical reflection in adulthood: a guide to transformative and emancipatory
learning. San Francisco: Jossey-Bass, 1990.
MORIN, E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 3. ed. São Paulo: Cortez;
Unesco, 2001.
MOTTA, P. R. Gestão contemporânea: a ciência e a arte de ser dirigente. 15. ed. São Paulo:
Record, 2004.
201
NONAKA, I.; KONNO, N. The concept of “Ba”: buildinf a foundation for knowledge
creation. California Management Review, v. 40, n. 3, Spring, 1998.
PINTO, A. V. Sete lições sobre educação de adultos. 13. ed. São Paulo: Cortez, 2003.
SAVIANI, D. O trabalho como princípio educativo In: FERRETI, C. J. et al. (Orgs.). Novas
tecnologias, trabalho e educação: um debate multidisciplinar. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994.
SEN, A. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
TAYLOR, F. W. The principles of scientific management. Nova York: WW. Norton & Co
Inc., 1911.
YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e métodos. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2001.
205
ANEXOS
ANEXO A: Perfil dos Sujeitos da Pesquisa
1. O que motivou você a trabalhar nessa empresa? E, hoje, o que lhe motiva a permanecer
trabalhando aqui?
2. Fale-me sobre seu trabalho, suas atividades.
3. Em sua opinião que papéis um gestor tem perante a empresa e os seus colaboradores?
4. Como você se relaciona com seus subordinados? Como avalia essa relação?
5. Qual a sua opinião sobre o desenvolvimento humano por meio do trabalho?
6. O que você considera um ambiente adequado para aprendizagens e desenvolvimento
humano?
7. Que aprendizagens e conhecimentos são importantes que seus subordinados tenham e/ou
adquiram?
8. Os conhecimentos necessários para o pleno desenvolvimento do trabalho estão com quem
realiza o trabalho, com o gerente, com a diretoria, com a empresa, etc? Como avalia isso?
9. Ao perceber um erro ou problema, como costuma reagir? E seus subordinados?
10. Que princípios norteiam as políticas de gestão de pessoas da empresa? Essas políticas
objetivam o desenvolvimento dos trabalhadores ou a competitividade/lucratividade
empresarial? É possível conciliar ambos os objetivos? De que forma?
208
Trabalho
1. Quais os significados que o trabalho tem para você?
2. O que motivou você a trabalhar nessa empresa? E, hoje, o que lhe motiva a permanecer
trabalhando aqui? O que significa trabalhar nessa empresa?
Aprendizagem
3. Esse ambiente de trabalho lhe possibilita o que?
4. O que você normalmente aprende aqui? Como? Para que?
5. A empresa facilita que você interaja, dialogue, compartilhe experiências com colegas e
superiores durante o trabalho?
6. O que você aprende no trabalho modifica o seu comportamento como pessoa e como
profissional? Poderia relatar alguma experiência?
7. Você tem oportunidades de participar de treinamentos e eventos oferecidos pela empresa?
O que você aprende neles? Essas aprendizagens são importantes para que?
Conhecimento
8. Você conhece os procedimentos/normas da empresa para realizar seu trabalho? Onde eles
podem ser encontrados? Como é transferido o conhecimento individual e disponibilizado
o organizacional?
9. Você pode desenvolver as atividades da forma como considera melhor ou deve seguir a
risca a forma determinada pela empresa, mesmo que o resultado seja o mesmo?
10. Ao perceber um erro ou problema, como costuma reagir?
Desenvolvimento humano
11. Em sua opinião o trabalhador desenvolve-se no espaço de trabalho?
12. A empresa oportuniza o desenvolvimento de seus colaboradores? Que desenvolvimento
você adquiriu aqui? De que forma?
Gestão
13. Qual sua opinião sobre o tratamento que a empresa dispensa aos trabalhadores e sobre as
ações de formação e capacitação que ela oferece?
14. As políticas e práticas de gestão de pessoas que existem na empresa estimulam o
desenvolvimento pessoal e profissional dos trabalhadores e/ou a vantagem competitiva
para a empresa?
209
Promoção de aprendizagem