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OITAVA CÂMARA CRIMINAL


APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0011839-86.2018.8.19.0066
RELATORA: DES. ELIZABETE ALVES DE AGUIAR
APELANTES: 1- JOÃO BATISTA CHABUDEY
2- JOSUÉ DA SILVA AROUCA
APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO

APELAÇÃO. CRIME DE ROUBO QUALIFICADO


PELO EMPREGO DE ARMA E CONCURSO DE
AGENTES. RECURSO DEFENSIVO. SÓLIDO
CADERNO DE PROVAS, COLIGIDO AOS AUTOS,
APTO A CORROBORAR O ÉDITO CONDENATÓRIO,
COM A PRESENÇA DE AMBAS AS CAUSAS DE
AUMENTO. REVISÃO DA DOSIMETRIA PENAL.
EXCLUSÃO DA REPARAÇÃO CIVIL. RECURSO
CONHECIDO E, NO MÉRITO, PARCIALMENTE
PROVIDO.
Os apelantes, João e Josué, foram condenados pela prática
do crime previsto no artigo 157, § 2º, I e II do Código
Penal.
Ao réu João foram aplicadas as penas finais de 09 anos e
04 meses de reclusão, em regime de cumprimento,
inicialmente, fechado e 22 dias-multa, à razão mínima, já
ao réu Josué as sanções finais resultaram estabelecidas em
06 anos, 01 mês e 10 dias de reclusão, em regime de
cumprimento, inicialmente, fechado e 13 dias-multa, à
razão mínima.
Da atenta leitura dos elementos produzidos durante a
instrução criminal, verifica-se que, a autoria e
materialidade do crime de roubo resultaram plenamente
demonstradas, nos termos da exordial acusatória
oferecida, em razão do seguro e coeso conjunto probatório
trazido aos autos, com destaque à inquestionável palavra
da vítima, sendo esta corroborada pelos demais elementos
de convicção carreados aos autos, produzidos em sedes
policial e judicial, no sentido de que o recorrente Josué,
em plena divisão de tarefas, e desígnios criminosos em
comum com o réu João, abordou a ofendida, em via
pública, exigindo-lhe seu aparelho celular. Em razão da
negativa desta, Josué utilizou de força física, puxando o
referido aparelho, tendo em seguida, arrastado a vítima
por um muro, lesionando os braços e pernas destas, a qual

Assinado em 11/09/2019 18:10:37


ELIZABETE ALVES DE AGUIAR:14561 Local: GAB. DES(A). ELIZABETE ALVES DE AGUIAR
veio a cair no chão, ocasião em que o referido réu (Josué) 429
entrou em luta corporal com a mesma, conseguindo,
finalmente, retirar o aparelho de suas mãos, uma vez que
esta não mais conseguia respirar, em razão das agressões
sofridas. Ato contínuo, em posse da res furtivae, Josué
entrou em um veículo azul, dirigido pelo corréu João, que
lhe estava dando cobertura, partindo ambos em fuga.
Nunca é despiciendo ressaltar que, como pacificado na
jurisprudência, em sede de crimes patrimoniais, a palavra
da ofendida é vital quanto à narrativa dos fatos delituosos,
sendo que, in casu, a mesma, embora com pequenas
divergências quando à dinâmica criminosa (que, em nada,
retiram a certeza quanto aos fatos narrados na denúncia),
narrou, com segurança, em Juízo, o fato delituoso, bem
como reconheceu o réu Josué, extreme de dúvidas, como
um de seus autores, não tendo, por outro lado, trazido a
Defesa qualquer substrato fático, incidente à hipótese, em
concreto, que pudesse botar em dúvida o conteúdo de seu
relato, produzido, ressalte-se, sob os crivos constitucionais
do contraditório e da ampla defesa. Precedentes.
O réu, Josué, em seu interrogatório, embora tenha
admitido a prática delitiva, buscou eximir de culpa seu
comparsa, João, aduzindo que este apenas estaria
passando de carro, naquele exato momento, razão pela
qual lhe pediu uma carona.
Neste mesmo sentido, pronunciou-se, também em sede de
interrogatório, o réu João.
Assim, sustenta a Defesa a tese da fragilidade probatória,
em relação ao réu João (quanto a Josué, réu confesso, não
houve irresignação defensiva, neste ponto), uma vez que
não estaria comprovado o liame subjetivo entre ambos –
João e Josué - durante empreitada criminosa.
No entanto, observa-se que tal argumentação defensiva
não apresenta o menor respaldo no conjunto probatório
dos autos, eis que, narrou a lesada, em sede judicial, que
ao ser abordada por Josué, já havia um carro azul parado,
bem próximo a eles, tanto que, durante a empreitada
criminosa, chegou a pedir ajuda ao motorista do veículo,
que se encontrava com a porta aberta.
Ou seja, da prova dos autos vislumbra-se que, o réu João
já se encontrava no local quando se iniciou a ação delitiva,
tendo este, inclusive, observado todo o seu
desenvolvimento, situação que afasta, de forma
inquestionável, a alegação defensiva, no sentido de que o
mesmo, casualmente, passou de carro, ao final do roubo, e 430
deu uma carona ao réu Josué.
Como se não bastasse, é oportuno citar, ainda, que, ao
contrário do que tenta fazer crer a Defesa, não há dúvidas
no sentido de que o réu João era o motorista do referido
carro azul – fato admitido pelo mesmo em diversos
momentos de seu interrogatório – sendo que, por outro
lado, não se pode deixar de constatar incompatibilidades
no bojo da narrativa realizada pelo mesmo, em Juízo, ao
buscar distanciar-se da responsabilidade sobre a ação
criminosa.
Confira-se: “quando aceitou dar a carona, não sabia que
Josué havia furtado um celular, o que só veio a descobrir
quando ele desceu do seu carro e disse que iria vender um
celular que estava consigo, tendo o depoente se assustado e
ido embora. Indagado, disse que Josué lhe ofereceu vinte
reais de combustível para que o levasse em casa, mas,
quando o réu desceu do carro no bairro Getúlio Vargas, ele
retornou com droga e não com dinheiro, não tendo o
depoente aceitado a droga” (grifos nossos). Afinal, ao
supostamente saber do roubo do celular, o réu João foi
embora de imediato ou esperou Josué retornar com as
drogas e, só então, saiu do local?
Assim, ante toda a prova colhida, não se vislumbram
quaisquer incertezas de que os recorrentes praticaram
crime de roubo, em concurso de pessoas, eis que, como
visto, o claro relato prestado pela lesada indica que, a
subtração da res furtivae se deu por efetivo emprego de
violência contra a mesma, bem como por meio de divisão
de tarefas entre aqueles, visando o desígnio criminoso
comum.
Nesse contexto, conclui-se que, o pleito defensivo
absolutório, quanto ao réu João, mostra-se inviável aos
olhos da Teoria Monista, adotada pelo nosso Estatuto
Repressivo pátrio em seu artigo 29, segundo a qual o
crime, ainda que praticado por várias pessoas, em
colaboração, continua sendo uno e indivisível.
Por certo, a dinâmica delitiva justifica a presença da
majorante inserta no inciso II do parágrafo 2º do artigo
157, do CP, a qualificar o crime de roubo, em razão do
maior desvalor da conduta dos agentes, os quais se
aproveitaram da superioridade numérica, com vias a
concluírem a subtração almejada, buscando, assim, a
garantia de sucesso em seu intento delituoso. Precedentes.
Destarte, evidenciado que a Defesa não se desincumbiu de 431
comprovar o que alegou em sede recursal, ônus que lhe
cabia, encontrando-se a negativa da autoria delitiva,
sustentada pelo réu, João, isolada do caderno probatório,
impõe-se a mantença da condenação do mesmo e do
corréu, Josué, nas penas do crime de roubo, majorado
pelo concurso de agentes, nos termos da sentença
monocrática proferida em 1º grau de jurisdição,
afastando-se, por conseguinte, o pleito subsidiário
consistente na reclassificação típica da conduta para o
delito de furto.
A dosimetria das penas, porém, merece reparos.
Observa-se que, parte da pena-base do crime de roubo foi
majorada, em relação a ambos os réus, em razão da maior
reprovabilidade da conduta (emprego efetivo de
violência), bem como das consequências do crime, uma vez
que o aparelho de telefone celular não foi recuperado pela
vítima.
Inicialmente, há de se constatar que, as circunstâncias do
caso em concreto demonstram, efetivamente, a maior
reprovabilidade da ação criminosa, isto porque, resultou
comprovado o emprego de violência exorbitante àquela
que possa ser considerada “normal ao tipo”, considerando
que, além de o réu, Josué, ter arrastado a vítima contra
um muro, causando-lhe lesões, houve, ainda, a ocorrência
de luta corporal entre o mesmo, um jovem de vinte anos
de idade, e a ofendida, uma senhora de quase 60 anos,
tendo a violência se protraído no tempo, eis que esta
chegou perder a respiração.
Já que no que tange à negativação das consequências do
crime de roubo, cabe ser dito que, em se tratando de delito
consumado, o qual o legislador já previu maior gravidade,
a implicar, por conseguinte, o exasperamento
sancionatório em relação ao crime tentado, não há se falar
em consequências mais gravosas à vítima, cabendo
destacar-se, ainda, que possíveis prejuízos materiais
sofridos por esta, advindos da ação criminosa, podem ser
objeto de eventual reparação, por meio de ação própria na
seara cível, se cabível.
Especificamente quanto ao réu João, o Juiz primevo
elevou as sanções basilares considerando ainda, que o
mesmo é “portador de péssimos antecedentes, com
personalidade reprovável e conduta social voltada para a
marginalidade”.
Com efeito, o réu João apresenta maus antecedentes, 432
conforme se depreende da anotação nº 02 de sua FAC,
resultando acertada a exacerbação penal quanto a este
aspecto.
Porém, pode-se verificar que, o Magistrado sentenciante
considerou anotações da referida FAC do réu João, as
quais não apresentam condenação ou, se apresentam, não
registram trânsito em julgado, a fim negativar as
circunstâncias judicias referentes à personalidade e à
conduta social do mesmo, o que fere o princípio
constitucional da presunção de inocência, ante a
inobservância ao verbete nº 444 da Súmula do STJ,
devendo portanto, tais justificativas serem alijadas do
cálculo sancionatório.
Neste contexto, considerando o afastamento de algumas
das circunstâncias judiciais da dosagem das penas na
primeira fase, importa observar que “A lei confere ao
julgador certo grau de discricionariedade na análise das
circunstâncias judiciais, sendo assim, o que deve ser
avaliado é se a fundamentação exposta é proporcional e
autoriza a fixação da pena-base no patamar escolhido”
(STJ. HC nº 219226/MS).
Assim, remanescendo ao réu Josué apenas uma
circunstância judicial negativa (circunstâncias do crime),
cabível o ajuste do aumento penal no patamar de 1/6, o
que encaminha a acomodação da pena-base do delito de
roubo praticado pelo mesmo, em 04 anos e 08 meses de
reclusão e pagamento de 11 dias-multa. Quanto ao réu
João, presentes as circunstâncias judiciais, negativas,
referentes às circunstâncias do crime e aos maus
antecedentes, exacerba-se sua pena-base na proporção de
1/5, alcançando a mesma 04 anos, 09 meses e 18 dias de
reclusão, e 12 dias-multa, respeitados, destarte, em ambos
os casos, os princípios da proporcionalidade e da
individualização das penas.
Na segunda fase dosimétrica, observa-se que a presença
das duas minorantes, relativas à confissão espontânea e a
menoridade do réu Josué, permitem o retorno das penas
ao piso mínimo cominado, quanto ao mesmo, resultando
assim, as sanções assentadas, por ora, em 04 anos de
reclusão e 10 dias-multa.
Já na etapa intermediária, referente às penas do réu João,
observa-se que a reincidência do mesmo – acertadamente
verificada na anotação nº 01 de sua FAC – justifica a
elevação sancionatória no patamar de 1/6, conforme o
assente entendimento jurisprudencial, observados o 433
princípio da razoabilidade, a resultar as penas em 05 anos,
07 meses e 06 dias de reclusão, e 14 dias-multa.
Oportuno esclarecer, neste momento, que tanto o
reconhecimento dos maus antecedentes do réu João,
quanto sua condição de reincidente (com os consequentes
desdobramentos negativos na quantificação das penas
privativas de liberdade, bem como no recrudescimento da
forma de cumprimento das mesmas), além de constituírem
inequívoca previsão legal, não representam, de forma
alguma, o alegado bis in idem, eis que ressurgem da estrita
observância ao princípio da individualização das penas,
tendo sido a questão, quanto a este último (reincidência)
tema de repercussão geral no STF, na qual foi reconhecida
a constitucionalidade do art. 61, I do C.P. (RE nº
453.000/RS).
Incabível, ainda, a redução das penas do réu João, ante o
pleito de incidência do parágrafo 1º do artigo 29 do CP.
De fato, sob o enfoque da teoria do domínio funcional do
fato, revela-se cristalina a unicidade das condutas
apuradas durante a instrução criminal, sendo certo que,
além da mera aquiescência ou previsibilidade quanto ao
risco criado pelo fato sub examen, vislumbra-se,
facilmente, a efetiva prática da mesma conduta típica
pelos réus, de forma que suas atuações, mostraram-se
indissociáveis no âmbito da ação criminosa, fazendo
transparecer a plena convergência de vontades, dirigida
ao resultado almejado pela decisão comum, a qual formou
o liame subjetivo entre os respectivos sujeitos ativos, não
havendo falar-se, validamente, em participação de menor
importância do réu João à hipótese vertente.
Assim, na derradeira fase da dosagem penal, mantida a
exasperação na fração de 1/3, tal como aplicada na
sentença de piso, resultam as sanções definitivamente
acomodadas nos patamares de 05 anos e 04 meses de
reclusão, e 13 dias-multa para o réu Josué, e de 06 anos, 06
meses e 12 dias reclusão, e 16 dias-multa para o réu João.
Os regimes iniciais de cumprimento das penas privativas
de liberdade devem ser estabelecidos em fechado, em
observância ao conteúdo do artigo 33, § 3º do Código
Penal, bem como, em relação ao réu João, à condição de
reincidente do mesmo, respeitados, assim, os princípios da
adequação e da razoabilidade, conforme os escopos de
prevenção e ressocialização das sanções penais.
Em razão do amplo espectro devolutivo do recurso ora 434
interposto, o qual remete à esta instância revisora toda a
matéria julgada, verifica-se incabível a fixação, nestes
autos, de valor reparatório, a ser pago pelos réus ao
ofendido, eis que a referida reparação, introduzida por
força do inciso IV do art. 387 do Código de Processo
Penal, deve ser vista com ressalvas e não, simplesmente,
como consequência civil automática da condenação.
Isto porque, a quantificação desta possível reparação
merece ser objeto de ampla discussão entre as partes,
devendo ser observados os princípios constitucionais da
ampla defesa e do contraditório, o que não ocorreu na
esfera penal, considerando que, em tese, tanto o lesado
como o réu, poderão discutir a questão com maior
elastério se o pleito de reparação for objeto de ação civil
autônoma à luz do devido processo legal e respeitado o
mandamento da ampla produção de provas.
Neste contexto, oportuno citar que, não consta dos autos
quaisquer comprovações seguras sobre o valor da res
furtivae, tendo a ofendida durante seu depoimento, em
Juízo, declarado, apenas, que o aparelho celular “havia
custado cerca de 900 reais” (fls. 248).
Ressalte-se, ademais, que conforme o entendimento
jurisprudencial, a imediata reparação civil, a ser arbitrada
pelo Juiz monocrático, sem que ocorra prévio e adequado
requerimento expresso realizado pela Acusação ou pelo
Assistente vai de encontro ao princípio da correlação entre
o pedido, formulado na exordial acusatória, e a sentença.
Cediço é que, os incisos II e LV do artigo 5º¹ da CRFB/1988
estabelecem como direitos e garantias fundamentais,
respectivamente, a legalidade estrita, o contraditório e a
ampla defesa. Seguindo a mesma orientação das normas
constitucionais indicadas, o artigo 4º da LIND (Dec. Lei nº
4657, de 04.09.1942), preconiza que “Ninguém se escusa de
cumprir a lei alegando que não a conhece”.
Em cumprimento às normas constitucionais e
infraconstitucionais indicadas, é curial que, a norma
expressa no inciso IV do artigo 387 do CPP, a qual dispõe
sobre a fixação, na sentença condenatória, de valor mínimo
de reparação dos danos causados pela infração,
considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido, exige, nos
termos do artigo 2º do CPC/2015 pedido prévio e expresso,
na peça inaugural (denúncia ou queixa-crime) ou na
petição de assistência (da Acusação), pedido este que está
adstrito à observância dos artigos 319 e incisos; 322 e 324
do CPC/2015, devendo ser formulado, de modo435
pormenorizado, com as especificações próprias dos fatos e
danos alegados (classe e espécie), ser certo e determinado,
não se apresentando abstrato ou genérico, haja vista o
princípio da igualdade (formal e material) de tratamento
insculpido no artigo 5º, caput da CRFB/1988, secundado
pelo artigo 329, I do CPC/2015.
Outrossim, para que seja possível a fixação na sentença
condenatória de aludido valor mínimo como efeito da
condenação (CP, artigo 91, I), o qual ostenta a natureza de
responsabilidade/reparação civil, faz-se necessário que o
postulante da mesma forneça dados, informações e
elementos concretos (v.g., documentos, laudos, situação
sócio-econômica e financeira do ofensor e do ofendido, e,
etc), para que se possa mensurar a intensidade e extensão
do dano e fixar-se/arbitrar-se o valor mínimo da
reparação, o qual deve ser objeto de posterior execução por
quantia certa (CPC/2015, artigos 824 a 909), no juízo cível
(CPP, artigos 63 e 64), pelo sujeito ativo da relação jurídica
de direito material (credor), não podendo promove-la o
órgão ministerial (no caso de pedido expresso na denúncia)
haja vista a norma jurídica de direito público e cogente,
exposta no artigo 18 do CPC/2015.
No que tange à alegação de prequestionamento, para fins
de interposição eventual de recursos extraordinário ou
especial, a mesma não merece conhecimento e tampouco
provimento eis que não se vislumbra a incidência de
quaisquer das hipóteses itemizadas no inciso III, letras
“a”, “b”, “c” e “d” do art. 102 e inciso III, letras “a”, “b” e
“c” do art. 105 da C.R.F.B. e por consequência nenhuma
contrariedade/negativa de vigência, nem demonstração de
violação de normas constitucionais ou infraconstitucionais,
de caráter abstrato e geral.
Face ao exposto, vota-se pelo CONHECIMENTO e
PARCIAL PROVIMENTO do apelo defensivo interposto,
com vias a acomodarem-se as penais finais, aplicadas ao
réu, Josué, em 05 anos e 04 meses de reclusão, em regime
de cumprimento, inicialmente, fechado, e pagamento de 13
dias-multa, à razão mínima, e quanto ao réu João Batista,
em 06 anos, 06 meses e 12 dias reclusão, em regime de
cumprimento, inicialmente, fechado, e pagamento de 16
dias-multa, à razão mínima, bem como afastar-se a
imposição, arbitrada pelo Juiz a quo, em relação a ambos
os recorrentes, do pagamento de reparação civil ao lesado,
mantendo-se, no mais, a sentença monocrática vergastada.
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VISTOS, relatados e discutidos estes autos da Apelação


Criminal nº 0011839-86.2018.8.19.0066, em que são apelante João batista
Chabudey e Josué da Silva Arouca e o Ministério Público e apelados os mesmos,

ACORDAM os Desembargadores da Oitava Câmara


Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade, no
sentido de CONHECER os recursos interpostos e, no mérito, PROVER
PARCIALMENTE os mesmos, nos termos do voto da Des. Relatora.

VOTO

Trata-se de recurso de Apelação interposto pela Defesa dos


réus, João Batista Chabudey e Josué da Silva Arouca, uma vez que o Juiz de
Direito da 2ª Vara Criminal da Comarca de Macaé proferiu sentença (fls. 242/283)
condenando os mesmos, ante a prática delituosa prevista no artigo 157, parágrafo
2º, inciso II do Código Penal, sendo o primeiro (João Batista) na forma do artigo
29 do Código Penal.

Ao réu João Batista foram aplicadas as penas finais de 09


anos e 04 meses de reclusão, em regime de cumprimento, inicialmente, fechado e
22 dias-multa, à razão mínima. Já ao réu Josué, as sanções finais resultaram
estabelecidas em 06 anos, 01 mês e 10 dias de reclusão, em regime de
cumprimento, inicialmente, fechado e 13 dias-multa, à razão mínima. Ambos os
réus foram condenados, também, ao pagamento das custas processuais.

Os réus, João Batista e Josué, inconformados com o decisum


monocrático, recorreram do mesmo, apresentando a Defesa destes as razões
recursais às fls. 298/324, nas quais pleiteiam: 1) a absolvição do réu João Batista,
ao argumento da fragilidade probatória, a qual não se encontraria apta a corroborar
sua condenação, eis que teria resultado comprovado o liame subjetivo com a ação
perpetrada pelo corréu Josué. Subsidiariamente, requerem; 2) a desclassificação da
conduta para o delito de furto simples; 3) a exclusão da causa especial de aumento
de pena, referente ao concurso de agentes; 4) quanto à dosimetria da pena imposta
ao réu Josué: 4.1) a redução do quantum de aumento utilizado na pena-base; 4.2)
maior redução das sanções aplicadas na 2ª fase, em razão do reconhecimento das
minorantes referentes à menoridade e à confissão; 4.3) o estabelecimento do
regime prisional em, incialmente, semiaberto; 5) quanto à dosimetria da pena
imposta ao réu João Batista: 5.1) a redução do quantum de aumento utilizado na
pena-base; 5.2) a aplicação da causa de diminuição prevista no § 1º do artigo 29 do
Código Penal. Ao fim, prequestiona a matéria, com vias à eventual interposição de
Recurso Especial e/ou Extraordinário.
Presentes os requisitos de admissibilidade do apelo 437

interposto, que possibilita o conhecimento do mesmo, passa-se à análise meritória,


ante os argumentos acima expostos.

Da atenta leitura dos elementos produzidos durante a


instrução criminal, verifica-se que, a autoria e materialidade do crime de roubo
resultaram plenamente demonstradas, nos termos da exordial acusatória oferecida,
em razão do seguro e coeso conjunto probatório trazido aos autos, com destaque à
inquestionável palavra da vítima, Marli Dias de Oliveira, sendo esta corroborada
pelos demais elementos de convicção carreados aos autos, produzidos em sedes
policial e judicial, no sentido de que o recorrente Josué, em plena divisão de
tarefas, e desígnios criminosos em comum com o réu João, abordou a ofendida, em
via pública, exigindo-lhe seu aparelho celular. Em razão da negativa desta, Josué
utilizou de força física, puxando o referido aparelho, tendo em seguida, arrastado a
vítima por um muro, lesionando os braços e pernas destas, a qual veio a cair no
chão, ocasião em que o referido réu (Josué) entrou em luta corporal com a mesma,
conseguindo, finalmente, retirar o aparelho de suas mãos, uma vez que esta não
mais conseguia respirar, em razão das agressões sofridas. Ato contínuo, em posse
da res furtivae, Josué entrou em um veículo azul, dirigido pelo corréu João, que lhe
estava dando cobertura, partindo ambos em fuga.

A vítima Marli, narrou, em sede judicial, o fato criminoso


nos seguintes termos, in verbis: “(...) que estava caminhando pela rua, quando o
réu Josué lhe abordou e disse: ´me dá o celular´. Afirmou que verificou que ele
não estava armado e, por isso, não entregou o aparelho, mas o réu começou a
fazer força, tentando puxá-lo de sua mão. Prosseguiu contando que tentou jogar o
aparelho por cima do muro do vizinho, mas o réu lhe arrastou pelo muro,
arranhando seu braço e sua perna, tendo caído no chão, enquanto o acusado ficou
lutando consigo. Disse que percebeu a presença de um carro azul e pensou que
fosse alguém que tivesse parado para ver o que estava acontecendo, momento em
que a depoente pediu ajuda, mas, na verdade, era o comparsa do denunciado.
Explicou que, quando estava caída no chão e já não conseguia mais respirar, o
réu conseguiu tirar o aparelho de sua mão e entrou no carro, tendo a depoente se
levantado e olhado a placa do automóvel. Esclareceu que o referido veículo estava
parado bem próximo, no meio da rua, e que o seu telefone celular, da marca
Motorola, modelo G4, que havia custado cerca de 900 reais, não foi recuperado.
Indagada, esclareceu que, quando estava caminhando na rua e o réu lhe abordou,
o referido veículo estava parado na praça e, quando a depoente já estava caída no
chão, percebeu que o mesmo carro estava parado próximo a si, com a porta
aberta. Por fim, afirmou, seguramente, que não teve a menor dúvida em
reconhecer o autor do roubo em sede policial (...)” (depoimento prestado por meio
do sistema de audiovisual deste Tribunal de Justiça e transcrito na sentença
monocrática, fls. 247/248. Grifos nossos).
Nunca é despiciendo ressaltar que, como pacificado 438 na
jurisprudência, em sede de crimes patrimoniais, a palavra da ofendida é vital
quanto à narrativa dos fatos delituosos, sendo que, in casu, a mesma, embora com
pequenas divergências quando à dinâmica criminosa (que, em nada, retiram a
certeza quanto aos fatos narrados na denúncia), narrou, com segurança, em Juízo,
o fato delituoso, bem como reconheceu o réu Josué, extreme de dúvidas, como um
de seus autores, não tendo, por outro lado, trazido a Defesa qualquer substrato
fático, incidente à hipótese, em concreto, que pudesse botar em dúvida o conteúdo
de seu relato, produzido, ressalte-se, sob os crivos constitucionais do contraditório
e da ampla defesa.

Neste sentido, há farta jurisprudência, podendo ser citados os


seguintes julgados:

“PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS


SUBSTITUTIVO. ROUBO. PALAVRA DA VÍTIMA.
POSSIBILIDADE. DECISÃO FUNDAMENTADA. REEXAME DE
PROVAS. IMPOSSIBILIDADE.
1. Ressalvada pessoal compreensão diversa, uniformizou o Superior
Tribunal de Justiça ser inadequado o writ em substituição a recursos
especial e ordinário, ou de revisão criminal, admitindo-se, de ofício, a
concessão da ordem ante a constatação de ilegalidade flagrante, abuso
de poder ou teratologia.
2. Além de possível a condenação com valoração especial do
depoimento das vítimas, traz o acórdão claro exame de outras provas
dos autos, para justificar a condenação, de modo que a revisão dos
critérios de prova se torna descabida na via do habeas corpus.
3. Habeas corpus não conhecido.”
STJ. Sexta Turma. HC 199185 / SP. Relator Min. Nefi Cordeiro. DJe
01/07/205. Grifos nossos.

“HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO ORIGINÁRIA.


SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO ORDINÁRIO.
IMPOSSIBILIDADE. ROUBO. CONDENAÇÃO. PENA
CORPORAL FIXADA EM 04 ANOS DE RECLUSÃO.
SUBSTITUIÇÃO. INVIABILIDADE. NÃO PREENCHIMENTO
DOS REQUISITOS DO ART. 44 DO CÓDIGO PENAL. COAÇÃO
ILEGAL NÃO DEMONSTRADA.
1. O Superior Tribunal de Justiça, seguindo o entendimento firmado
pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, não tem admitido
a impetração de habeas corpus em substituição ao recurso próprio,
prestigiando o sistema recursal ao tempo que preserva a importância e
a utilidade do habeas corpus, visto permitir a concessão da ordem, de
ofício, nos casos de flagrante ilegalidade.
2. Pela leitura do art. 44, I, do Código Penal, observa-se que o
legislador exigiu, para a substituição da pena privativa de liberdade
por penas restritivas de direitos, não só que a pena corporal seja de até
quatro anos, mas também determinou que o crime não tenha sido
cometido com violência ou grave ameaça à pessoa.
3.No caso, a defesa sustenta que a vítima sofreu, no máximo, vias de
fato, mera contravenção penal. Todavia, pela leitura do depoimento da
vítima, transcrito na sentença, observa-se que houve violência real439
empregada pelo paciente, o qual derrubou a vítima no chão e a chutou
por diversas vezes.
4. Vale destacar que a palavra da vítima, em se tratando de delitos
praticados sem a presença de testemunhas, possui especial relevância,
sendo forte o seu valor probatório (Precedentes).
5. Evidenciada, portanto, a violência empregada pelo agente quando
da consumação do delito de roubo, inviável a substituição da pena
privativa de liberdade por penas restritivas de direitos, ante o óbice
legal previsto no inciso I do art. 44 do Código Penal.
6. Habeas Corpus não conhecido.”
STJ. Quinta Turma. HC 311331 / MS. Relator Min. Leopoldo de
Arruda Raposo. DJe 08/04/2015. Grifo nosso.

“(...) Não é demais reprisar que em delitos patrimoniais, a palavra da


vítima assume importância de relevo. Em hipóteses assim retratadas, a
jurisprudência tem-se orientado no sentido de que esses elementos de
prova devem prevalecer, frente à negativa isolada do acusado. (...)”
TJRJ. Oitava Câmara Criminal. Apelação nº 0073915-
26.2013.8.19.0001. Relator. Des. Gilmar Augusto Teixeira.
Julgamento em 27/11/2013.

O réu, Josué, em seu interrogatório, embora tenha admitido a


prática delitiva, buscou eximir de culpa seu comparsa, João, aduzindo que este
apenas estaria passando de carro, naquele exato momento, razão pela qual lhe
pediu uma carona.

Neste mesmo sentido, pronunciou-se, também em sede de


interrogatório, o réu João.

Assim, sustenta a Defesa a tese da fragilidade probatória, em


relação ao réu João (quanto a Josué, réu confesso, não houve irresignação
defensiva, neste ponto), uma vez que não estaria comprovado o liame subjetivo
entre ambos – João e Josué - durante empreitada criminosa.

No entanto, observa-se que tal argumentação defensiva não


apresenta o menor respaldo no conjunto probatório dos autos, eis que, narrou a
lesada, em sede judicial, que ao ser abordada por Josué, já havia um carro azul
parado, bem próximo a eles, tanto que, durante a empreitada criminosa, chegou a
pedir ajuda ao motorista do veículo, que se encontrava com a porta aberta.

Ou seja, da prova dos autos vislumbra-se que, o réu João já


se encontrava no local quando se iniciou a ação delitiva, tendo este, inclusive,
observado todo o seu desenvolvimento, situação que afasta, de forma
inquestionável, a alegação defensiva, no sentido de que o mesmo, casualmente,
passou de carro, ao final do roubo, e deu uma carona ao réu Josué.
Como se não bastasse, é oportuno citar, ainda, que, 440 ao
contrário do que tenta fazer crer a Defesa, não há dúvidas no sentido de que o réu
João era o motorista do referido carro azul – fato admitido pelo mesmo em
diversos momentos de seu interrogatório – sendo que, por outro lado, não se pode
deixar de constatar incompatibilidades no bojo da narrativa realizada pelo mesmo,
em Juízo, ao buscar distanciar-se da responsabilidade sobre a ação criminosa.

Confira-se: “quando aceitou dar a carona, não sabia que


Josué havia furtado um celular, o que só veio a descobrir quando ele desceu do
seu carro e disse que iria vender um celular que estava consigo, tendo o depoente
se assustado e ido embora. Indagado, disse que Josué lhe ofereceu vinte reais de
combustível para que o levasse em casa, mas, quando o réu desceu do carro no
bairro Getúlio Vargas, ele retornou com droga e não com dinheiro, não tendo o
depoente aceitado a droga” (grifos nossos). Afinal, ao supostamente saber do
roubo do celular, o réu João foi embora de imediato ou esperou Josué retornar com
as drogas e, só então, saiu do local?

Assim, ante toda a prova colhida, não se vislumbram


quaisquer incertezas de que os recorrentes praticaram crime de roubo, em concurso
de pessoas, eis que, como visto, a subtração da res furtivae se deu por efetivo
emprego de violência contra a ofendida, bem como por meio de separação de
tarefas entre aqueles, visando o desígnio criminoso em comum.

Logo, tem-se que, dentro do conceito de divisão de tarefas,


traduzido na fragmentação operacional da atividade comum, em sendo patente o
domínio funcional de ambos os réus recorrentes sobre a ação que lhes coube na
empreitada delituosa, conforme a imputação da exordial, em evidente forma de
coautoria, segundo explicitado no caput do art. 29, § 1º, do Código Penal. Confira-
se:

“Art. 29 - Quem, de qualquer modo, concorre para o crime


incide nas penas a este cominadas, na medida de sua
culpabilidade” (grifo nosso).

Nesse tocante, já preceituava Hans Welzel, na condição de


fundador da teoria do domínio do fato, posteriormente trabalhada por Claus Roxin,
até se alcançar o conceito de domínio funcional do fato: “a coautoria é autoria;
sua particularidade consiste em que o domínio do fato unitário é comum a várias
pessoas. Coautor é quem, possuindo as qualidades pessoais de autor, é portador
da decisão comum a respeito do fato e, em virtude disso, toma parte na execução
do delito” (in, Derecho penal alemán. Tradução de Juan Bustos Ramirez e Sergio
Yafíes Peréz. Chile: Jurídica de Chile, 1987, p. 129, grifos nossos).

Profícua é a lição, no ponto, deixada pelo mestre Nelson


Hungria: “No concursus delinquentium, todas as ações são dirigidas à produção
de um mesmo evento final, não de modo autônomo (como na autoria colateral), 441

mas em tal relação de reciprocidade objetiva, de interdependência causal ou de


coeficácia, de solidariedade ou adesão de vontades, de identidade ou conexidade
de interesses, que constituem, no seu conjunto, uma só operação, a vincular,
lógica e necessariamente, sub specie causae e sub specie juris, todas elas e cada
uma delas pela totalidade do crime único e indivisível” (in, Comentários ao
Código Penal: v.1/t.2 – 3ª ed. – Rio de Janeiro: Forense, 1955, p. 402, realçamos).

A propósito, leciona Juarez Cirino: “A autoria coletiva (ou


coautoria) é definida pelo domínio comum do tipo de injusto mediante divisão do
trabalho entre os coautores: a) subjetivamente, decisão comum de realizar (com
consciência e vontade) tipo de injusto determinado, que fundamenta a
responsabilidade de cada coautor pelo fato típico comum integral; b)
objetivamente, realização comum do tipo de injusto, mediante contribuições
parciais no domínio comum do fato típico”, de modo que, “a decisão comum
desencadeia a distribuição de tarefas individuais necessárias à produção do
resultado comum”, enquanto as “contribuições objetivas para o fato comum podem
consistir na realização integral das características do tipo de injusto” ou “na
realização parcial dessas características” (in, Direito penal: parte geral I. – 6ª ed.,
ampl. e atual. – Curitiba/PR: ICPC, 2014, p. 356/358, grifamos).

Na mesma abordagem, inclusive, é o escólio de Nilo Batista:


“A ideia de divisão de trabalho, que alguns autores, como Antolisei, situam como
reitora geral de qualquer forma de concurso de agentes, encontra na coautoria
sua adequação máxima. Aqui, com clareza, se percebe a fragmentação
operacional de uma atividade comum, com vistas a mais seguro e satisfatório
desempenho de tal atividade. Por isso os autores afirmam que a coautoria se
baseia no princípio da divisão de trabalho” (in, Concurso de agentes – 2ª ed. – Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 76, grifos nossos).

Comungando dessa exegese, discorre Rogério Greco: “A teoria


do domínio do fato fica mais evidente quando diversas pessoas, unidas pelo
vínculo subjetivo, resolvem praticar uma mesma infração penal”. Explica-se: “Se
autor é aquele que possui o domínio do fato, é o senhor de suas decisões,
coautores serão aqueles que tem o domínio funcional dos fatos, ou seja, dentro do
conceito de divisão de tarefas, serão coautores todos os que tiverem uma
participação importante e necessária ao cometimento da infração”. Logo, conclui-
se que: “Em última palavra, podemos falar em coautoria quando houver a reunião
de vários autores, cada qual com o domínio das funções que lhe foram atribuídas
para a consecução final do fato, de acordo com o critério de divisão de tarefas”
(in, Curso de Direito Penal: parte especial, volume IV. – 11ª ed. – Niterói, RJ:
Impetus, 2015, p. 488/489, destacamos).

Traz-se a lume, por fim, a compreensão de Rogério Sanches


acerca da coautoria: “Verifica-se a coautoria nas hipóteses em que dois ou mais
indivíduos, ligados subjetivamente, praticam a conduta (comissiva ou omissiva) 442

que caracteriza o delito. A coautoria, em última instância, é a própria autoria


delineada por vários indivíduos. (...) A relação entre os agentes na coautoria não é
de acessoriedade, pois a função desenvolvida por cada um deles é determinante
para a obtenção do resultado”. (in, Manual de Direito Penal: parte geral. – 3ª ed.
rev., ampl. e atual. – Salvador: Editora Juspodivm, 2015, p. 368, realçamos).

Tal é o entendimento consolidado, há muito, pelo Superior


Tribunal de Justiça, verbi gratia:

“CO-AUTORIA. HOMICÍDIO CULPOSO. DOLO. Alega-se que houve


a imputação de um só homicídio ao paciente e ao co-réu, ao fundamento
de que agiram de forma conjunta, sem que se pudesse distinguir a
conduta de um ou outro. Porém o júri condenou o primeiro por homicídio
simples e o segundo, por culposo. Já o Tribunal de Justiça, ao apreciar a
apelação do MP, anulou o julgamento do co-réu e determinou que se
submetesse a outro, ao antever, também, sua conduta dolosa. Diante
disso, a Turma, ao prosseguir o julgamento, entendeu que não há como
analisar o conjunto probatório de forma a atestar que o julgamento do
paciente foi contrário à prova dos autos, pois isso demandaria
aprofundado exame de provas, sabidamente incabível na via eleita,
quanto mais se qualquer contradição entre as condenações do paciente e
do co-réu só poderá ser alegada após concluído o novo julgamento. HC
42.627-SP, Rel. Min. Nilson Naves, julgado em 28/3/2006” (STJ,
Informativo n.º 279, Sexta Turma, Período de 27 a 31 de março de 2006,
grifos nossos).

“RECURSO ESPECIAL. PENAL. ACUSAÇÃO QUE IMPUTOU A


AMBOS OS RÉUS, EM COAUTORIA, A PRÁTICA DO CRIME DE
HOMICÍDIO DOLOSO. PARTICIPAÇÃO EM DISPUTA
AUTOMOBILÍSTICA ILÍCITA ("PEGA"), COM VELOCIDADE
EXCESSIVA E MANOBRAS ARRISCADAS, QUE OCASIONOU A
MORTE DA VÍTIMA. CARACTERIZAÇÃO DO DOLO EVENTUAL.
TRIBUNAL DO JÚRI. CONSELHO DE SENTENÇA QUE
RECONHECEU, NA LINHA DA TESE DEFENSIVA, A
INEXISTÊNCIA DO CHAMADO "PEGA". CONDENAÇÃO DE UM
RÉU POR HOMICÍDIO CULPOSO (CTB, ART. 302) E O OUTRO
POR HOMICÍDIO DOLOSO (CP, ART. 121). IMPOSSIBILIDADE.
FATO ÚNICO. CRIME PRATICADO EM CONCURSO DE PESSOAS.
AUTORIA COLATERAL. NÃO OCORRÊNCIA. VIOLAÇÃO À
TEORIA MONISTA. ART. 29 DO CÓDIGO PENAL. EXTENSÃO DA
DECISÃO QUE CONDENOU O CORRÉU POR HOMICÍDIO
CULPOSO AO RECORRENTE. RECURSO NÃO CONHECIDO.
HABEAS CORPUS CONCEDIDO DE OFÍCIO.
1. Hipótese em que o Ministério Público denunciou o recorrente e outro
corréu como incursos nos arts. 121, § 2º, inciso I, e 129, caput, na forma
dos arts. 29 e 70, todos do Código Penal, porque, ao realizarem disputa
automobilística ilícita, vulgarmente conhecida como "pega" ou "racha",
causaram a morte de uma vítima e lesão corporal em outra, concluindo a
acusação pela presença do dolo eventual, porquanto ambos assumiram o
risco de causar o resultado. Esses fatos foram ratificados na sentença443
de
pronúncia, no acórdão confirmatório, bem como no libelo acusatório.
2. Na sessão plenária do Tribunal do Júri, o Conselho de Sentença, na
linha do que sustentara a defesa desde o inquérito policial, entendeu que
os réus não participavam, por ocasião dos fatos delituosos, de nenhuma
corrida ilícita, como deduzido pela acusação. Todavia, mesmo
entendendo dessa forma, desclassificou o crime apenas em relação ao
corréu Bruno, sendo condenado por homicídio culposo na direção de
veículo automotor (CTB, art. 302), concluindo quanto ao recorrente
Thiago que este assumiu o risco de produzir o resultado morte na vítima,
ou seja, que agiu com dolo eventual.
3. Tratando-se de crime praticado em concurso de pessoas, o nosso
Código Penal, inspirado na legislação italiana, adotou, como regra, a
Teoria Monista ou Unitária, ou seja, havendo pluralidade de agentes, com
diversidade de condutas, mas provocando um só resultado, existe um só
delito.
4. Assim, denunciados em coautoria delitiva, e não sendo as hipóteses de
participação de menor importância ou cooperação dolosamente distinta,
ambos os réus teriam que receber rigorosamente a mesma condenação,
objetiva e subjetivamente, seja por crime doloso, seja por crime culposo,
não sendo possível cindir o delito no tocante à homogeneidade do
elemento subjetivo, requisito do concurso de pessoas, sob pena de
violação à teoria monista, razão pela qual mostra-se evidente o
constrangimento ilegal perpetrado.
5. Diante da formação da coisa julgada em relação ao corréu e
considerando a necessidade de aplicação da mesma solução jurídica para
o recorrente, em obediência à teoria monista, o princípio da soberania dos
veredictos deve, no caso concreto, ser aplicado justamente para preservar
a decisão do Tribunal do Júri já transitada em julgado, não havendo,
portanto, a necessidade de submissão do recorrente a novo julgamento.
6. Recurso especial não conhecido. Habeas corpus concedido de ofício
para, cassando o acórdão recorrido, determinar a extensão ao recorrente
do que ficou decidido para o corréu Bruno Albuquerque de Miranda,
reconhecendo-se a caracterização do crime de homicídio culposo na ação
penal de que aqui se cuida, cabendo ao Juízo sentenciante fixar a nova
pena, de acordo com os critérios legais”
(STJ, Quinta Turma, REsp 1.306.731/RJ, Rel. Min. MARCO AURÉLIO
BELLIZZE, Julgado em: 22/10/2013, DJe 04/11/2013, destaques
nossos).

“AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PENAL.


TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO. PORTE ILEGAL DE
ARMA DE FOGO. PRONÚNCIA. INDÍCIOS SUFICIENTES DE
AUTORIA. INAPTIDÃO DA ARMA UTILIZADA NO DELITO QUE
NÃO AFASTA A POSSIBILIDADE DE CONCLUSÃO NO SENTIDO
DO ENVOLVIMENTO DO AGENTE. AUSÊNCIA DE VÍNCULO
SUBJETIVO. REEXAME DE PROVA. SÚMULA N. 7 DO STJ.
PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO
JÚRI.
1. Como se sabe, a decisão de pronúncia encerra simples juízo de
admissibilidade da pretensão acusatória, não sendo exigida certeza
quanto à autoria do fato criminoso.
2. O Tribunal a quo afirmou a existência de indícios suficientes 444 no
tocante ao envolvimento do acusado no fato em julgamento, destacando,
ademais, que para o reconhecimento da coautoria é irrelevante que o
agente tenha, pessoalmente, desferido tiros contra as vítimas, bastando
que se evidencie o liame subjetivo entre os participantes da tentativa de
homicídio.
3. A revisão de tal entendimento, de modo a afirmar a ausência de
indícios suficientes de autoria, exige o reexame do conjunto fático-
probatório dos autos, medida vedada na via especial.
4. O exame acerca da incidência do princípio da consunção do delito de
porte de arma pelo de tentativa de homicídio encontra impedimento na
competência absoluta do Tribunal do Júri para julgar os crimes dolosos
contra a vida e os a eles conexos, nos termos da jurisprudência
sedimentada do STJ.
5. Agravo regimental a que se nega provimento”
(STJ, Quinta Turma, AgRg no REsp 1.364.364/RS, Rel. Min. JORGE
MUSSI, Julgado em: 23/09/2014, DJe 30/09/2014, grifos nossos).

“RECURSO ESPECIAL. PENAL. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. (...)


CO-AUTORIA E PARTICIPAÇÃO. CONFIGURAÇÃO DE CO-
AUTORIA. PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA.
INOCORRÊNCIA. (...)
2. O Código Penal adota, como regra, a teoria monista, pela qual todos os
que concorrem para a realização do crime incidem nas penas a ele
cominadas, ressalvando, contudo, a diferenciação entre coautor e
partícipe, expressa na parte final do art. 29 e seus parágrafos.
3. No caso, constata-se a ocorrência de coautoria em relação aos ora
Recorrentes e o réu Eduardo, mesmo não tendo aqueles praticado a
conduta descrita pelo verbo do tipo penal, mas por possuírem o domínio
do fato.
4. Não há falar em participação de menor importância dos Recorrentes na
prática delitiva, não lhes sendo aplicável a causa de redução de pena
prevista no art. 29, § 1º, do Código Penal, pois, tendo o domínio do fato,
praticaram o crime de roubo circunstanciado em coautoria.”
(STJ, Quinta Turma, REsp 1.266.758/PE, Rel. Min. LAURITA VAZ,
Julgado em: 06/12/2011, DJe 19/12/2011, realçamos).

“HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO E TENTATIVA


DE ROUBO CIRCUNSTANCIADO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO.
EXAME DE PROVA. IMPOSSIBILIDADE. PARTICIPAÇÃO DE
MENOR IMPORTÂNCIA. IMPROCEDÊNCIA. TEORIA DO
DOMÍNIO DO FATO. PENA-BASE FUNDAMENTADA.
CONTINUIDADE DELITIVA. RECONHECIMENTO. (...)
2. Inviável, outrossim, é o reconhecimento do instituto da participação de
menor importância, porquanto o acórdão, de maneira motivada, afastou o
benefício legal, demonstrando que as ações do paciente, a saber, a
locação de imóvel para acomodação dos comparsas, bem como o auxílio
por ele prestado até o local dos fatos tiveram proeminente relevância
causal.
3. Cumpre ressaltar, por relevante, que, em tema de concurso de agentes,
a autoria pode se revelar de diversas maneiras, não se restringindo à
prática do verbo contido no tipo penal. Assim, é possível, por exemplo,
que um dos agentes seja o responsável pela idealização da empreitada
445
criminosa; outro, pela arregimentação de comparsas; outro, pela obtenção
dos instrumentos e meios para a prática da infração; e, outro, pela
execução propriamente dita. Assim, desde cada um deles – ajustados
e voltados dolosamente para o mesmo fim criminoso – exerça domínio
sobre o fato, responderá na medida de sua culpabilidade.”
(STJ, Sexta Turma, HC 191.444/PB, Rel. Min. OG FERNANDES,
Julgado em: 06/09/2011, DJe 19/09/2011, realçamos).

Cita-se, também, o julgamento da Apelação nº 0010141-


48.2015.8.19.0002, ocorrido em 30/11/2017, de lavra desta Relatoria, in litteris:

“APELAÇÃO. ART. 121, § 2º, INC. V, C/C ART. 14, INC. II (DUAS
VEZES), N/F ART. 70 (JORGE ELIAS), E ART. 329 (LUIZ
GUSTAVO), TODOS DO CÓDIGO PENAL, E ART. 33, CAPUT, C/C
ART. 40, INCS. IV e VI, E ART. 35, CAPUT, TODOS DA LEI N.º
11.343/2006 (AMBOS OS RÉUS). RECURSO MINISTERIAL
PUGNANDO: 1) SEJA O RÉU LUIZ GUSTAVO SUBMETIDO A
NOVO JULGAMENTO, AO ARGUMENTO DE TER SIDO
MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS A
DESCLASSIFICAÇÃO DAS TENTATIVAS DE HOMICÍDIO
IMPUTADAS PARA O CRIME DE RESISTÊNCIA.
SUBSIDIARIAMENTE, POSTULA: 2) A EXASPERAÇÃO DAS
PENAS-BASES APLICADAS A AMBOS OS RÉUS; 3) A REDUÇÃO
DA FRAÇÃO DE DIMINUIÇÃO UTILIZADA POR FORÇA DA
TENTATIVA, NO CRIME DE HOMICÍDIO (JORGE); 4) O
RECONHECIMENTO DO CONCURSO MATERIAL OU FORMAL
IMPRÓPRIO ENTRE AS DUAS TENTATIVAS DE HOMICÍDIO
(JORGE); 5) A ELEVAÇÃO DA FRAÇÃO DE AUMENTO
ADOTADA PARA AS MAJORANTES DO TRÁFICO DE DROGAS;
6) A INCIDÊNCIA CONCOMITANTE DE TAIS MAJORANTES
IGUALMENTE SOBRE O CRIME DE ASSOCIAÇÃO PARA O
TRÁFICO. RECURSO DEFENSIVO DO RÉU JORGE ELIAS
BUSCANDO: 1) SEJA DESIGNADO NOVO JÚRI, SOB O
ARGUMENTO DE MANIFESTA CONTRARIEDADE DO DECISUM
CONDENATÓRIO EM RELAÇÃO À PROVA DOS AUTOS.
SUBSIDIARIAMENTE, PLEITEIA: 2) A REDUÇÃO DAS PENAS-
BASES DOS CRIMES DE HOMICÍDIO TENTADO; 3) UMA MAIOR
REDUÇÃO DAS PENAS DOS DELITOS DE HOMICÍDIO, EM
RAZÃO DA TENTATIVA; 4) O RECONHECIMENTO DA
CONTINUIDADE DELITIVA ENTRE TAIS CRIMES, UTILIZANDO-
SE A FRAÇÃO MÍNIMA DE AUMENTO; 5) O AFASTAMENTO
DAS MAJORANTES DO ART. 40, INCS. IV E VI, DA LEI N.º
11.343/2006. APELO DEFENSIVO DO RÉU LUIZ GUSTAVO
POSTULANDO: 1) A ABSOLVIÇÃO DO ACUSADO, COM BASE
NO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO. SUBSIDIARIAMENTE,
BUSCA: 2) A EXCLUSÃO DAS CAUSAS DE AUMENTO DO
TRÁFICO DE DROGAS; 3) A APLICAÇÃO DO REDUTOR DO § 4º
DO ART. 33 DA LEI ANTIDROGAS. CONHECIMENTO DE TODOS
OS RECURSOS, COM O DESPROVIMENTO DO APELO
DEFENSIVO DO RÉU LUIZ GUSTAVO, DANDO-SE PROVIMENTO
AOS RECURSOS MINISTERIAL E DEFENSIVO DO ACUSADO
JORGE ELIAS.
Ab initio, é de se registrar que não se desconhece ter a Constituição446da
República consagrado, em seu artigo 5º, inciso XXXVIII, no Título “Dos
Direitos e Garantias Fundamentais”, a instituição do Tribunal do Júri,
atribuindo-lhe a competência para o julgamento dos crimes dolosos
contra a vida e garantindo-lhe a soberania dos veredictos decorrentes. Por
isso que, em tese, revela-se impossível a identificação de quais provas
foram sopesadas, pelo Conselho de Sentença, com vias a se concluir pela
condenação ou pela absolvição dos acusados e, consequentemente, torna-
se inviável aferir se a decisão dos Jurados se baseou, exclusivamente, em
elementos coletados durante a investigação criminal, ou se foram
aquilatadas, também, as provas produzidas em Juízo.
No entanto, após a acurada análise do conjunto probatório, conclui-se
que assiste razão tanto ao membro do Parquet quanto à Defesa do réu
Jorge Elias, quando sustentam que a decisão proferida pelo Conselho de
Sentença merece ser desconstituída, por se afigurar manifestamente
contrária às provas amealhadas durante a instrução criminal.
No caso, verifica-se que a imputação veiculada na exordial acusatória,
devidamente confirmada e estabilizada em sede de pronúncia, descreve
fatos penais que se amoldam à prática, em tese, de dois crimes de
tentativa de homicídio qualificado, um delito de tráfico de drogas
majorado e uma associação para o tráfico igualmente majorada, sendo
certo que, mesmo se considerarmos que tal adequação típica estaria
sujeita a alteração por parte do Corpo de Jurados, enquanto Juízes
naturais da causa, soberanos para atribuir definição jurídica diversa ao
fatos narrados na denúncia, não se vê, por certo, compreendida na
competência constitucional do Júri o poder de fracionar a homogeneidade
subjetiva das imputações que se lhe apresentam, tendo em vista que todas
as condutas imputadas aos acusados, no caso concreto, assim o foram
segundo a perfeita comunhão e unidade de ações e desígnios,
característica do concurso de agentes retratado na peça inicial.
Com efeito, não se vislumbra nos autos elemento algum de prova que
pudesse amparar a conclusão alcançada pelos Jurados – sendo, inclusive,
difícil de imaginar tal conjuntura, diga-se de passagem –, no sentido de
que, em meio aos disparos de arma de fogo que restaram efetuados por
ambos os acusados (bem como pelo menor infrator, T. S. dos S.) contra
os policiais militares ofendidos, Alex Carneiro da Silva e Alexandre de
Oliveira Moreira, somente o réu Jorge Elias é que estaria imbuído do
animus necandi, elementar ao crime de homicídio, enquanto o corréu,
Luiz Gustavo, encontrar-se-ia movido simplesmente pela intenção de
resistir à sua prisão em flagrante, assim como à de seus comparsas.
Nesse diapasão, é de se mencionar que ambos os brigadianos nominados,
ao prestarem suas declarações em Plenário, na qualidade de vítimas das
tentativas de homicídio, em tese, e testemunhas dos delitos de tráfico e
associação para o tráfico, foram firmes e uníssonos em relatar que,
durante operação policial na Comunidade do Caramujo, foi efetuado um
cerco tático, no qual a viatura blindada adentrou por um lado, enquanto
os ofendidos incursionaram com uma guarnição a pé pelo outro lado,
oportunidade em que se depararam com os acusados, Jorge Elias e Luiz
Gustavo, e o adolescente, T. S. dos S., os quais estavam empreendendo
fuga da viatura e, ao darem de frente com os brigadianos que vinham em
sentido contrário, passaram a efetuar inúmeros disparos de arma de fogo
contra esta guarnição, dando início a uma breve troca de tiros, a qual
cessou tão logo os réus perceberam que estavam cercados e em grande
desvantagem numérica, ocasião em que restaram presos em flagrante, 447
tendo sido apreendido, em poder do réu Jorge Elias, um revólver calibre
.38, com capacidade para oito munições, contendo três cartuchos
deflagrados e cinco íntegros, enquanto, na mão do corréu, Luiz Gustavo,
foi arrecadada uma pistola calibre 9mm, com capacidade para quinze
munições, contendo nove cartuchos intactos, evidenciando, assim, que
Luiz Gustavo teria efetuado, contra os policiais, o dobro de disparos
(seis) que Jorge Elias (três), além de terem sido encontradas com o
menor, T., uma segunda pistola calibre 9mm, com capacidade para trinta
cartuchos, contendo quatorze munições não deflagradas, e uma mochila,
contendo uma balança de precisão, 174 (cento e setenta e quatro) sacolés
de maconha e 227 (duzentos e vinte e sete) unidades de cocaína.
Como dito alhures, os depoimentos dos brigadianos são contundentes e
coesos, inexistindo nos autos dados seguros que autorizem deles descrer-
se, encontrando-se respaldados por outras provas do processo, pelo que
há de se tomá-los como verdadeiros, fazendo por incidir o enunciado 70
da súmula deste Egrégio Tribunal de Justiça. Precedentes do S.T.F., do
S.T.J. e desta Egrégia Câmara.
De outra parte, tendo os acusados, em sede de interrogatório, se
reservado no direito constitucional ao silêncio, conquanto tal estratégia
defensiva não possa ser interpretada em desfavor dos mesmos, não se
pode olvidar que os réus optaram por abrir mão do direito à autodefesa,
enquanto corolário do contraditório e ampla defesa, de tal sorte que não
foram capazes de agregar aos autos elemento algum que fosse apto a
infirmar a versão dos fatos entoada, em uníssono, pelos policiais
militares, no sentido da unicidade do elemento subjetivo do tipo
verificado entre os agentes.
Diante dessa realidade, não obstante a desclassificação operada pelos
Jurados, o que se percebe do quadro fático que exsurge dos autos, e ora
se descortina aos olhos desta Relatoria, é que estamos diante de clássica
modalidade de coautoria, na qual se mostra irrelevante conhecermos o
ânimo daqueles que atiraram contra os policiais, considerando-se que, no
conjunto da obra, ambos os agentes (e o menor) envolvidos nesse fato
específico se prestaram, em verdade, a corporificar os muitos braços da
máquina que se engendrou para a consecução de uma única espécie
delitiva, seja a resistência ou as tentativas de homicídio.
De fato, sob o enfoque da teoria do domínio funcional do fato, revela-se
cristalina a coautoria dos acusados, tanto na prática dos crimes de tráfico
de drogas e associação para o tráfico quanto para aquele consistente nos
disparos realizados contra os brigadianos (só o Júri poderá dizer se foi
um crime de resistência ou dois homicídios tentados, porém jamais os
dois tipos penais juntos), porquanto, além da mera aquiescência ou
previsibilidade de ambos os réus quanto ao risco criado pelo fato sub
examen, vislumbra-se, facilmente, a mais, a efetiva prática da mesma
conduta típica pelos agentes, de forma que suas atuações – consistentes
em efetuar disparos de arma de fogo contra os policiais – mostraram-se
indissociáveis no âmbito da ação criminosa, fazendo transparecer a plena
convergência de vontades, dirigida ao resultado almejado pela decisão
comum, a qual formou o liame subjetivo entre os respectivos sujeitos
ativos.
Nesse contexto, conclui-se que a decisão proferida pelo Conselho de
Sentença mostra-se inteiramente inviável aos olhos da Teoria Monista,
adotada pelo nosso Estatuto Repressivo pátrio, conforme consagrada em
seu artigo 29, segundo a qual o crime, ainda que praticado por várias 448
pessoas, em colaboração, continua sendo uno e indivisível.
Nessa senda, embora não se olvide do princípio constitucional da
soberania dos vereditos, este só deverá prevalecer quando a decisão
prolatada estiver apoiada em uma das versões resultantes da prova
produzida em Juízo, situação esta que não se vislumbra nos autos, uma
vez que não há o mínimo de lastro probatório a amparar a tese
reconhecida pelo Conselho de Sentença, no sentido de que restaria
cindido o liame subjetivo que uniu, a priori, os acusados sob uma mesma
imputação.
(...)
Pelo exposto, é de se determinar a submissão de ambos os acusados,
Jorge Elias Carmo da Silva e Luiz Gustavo Ribeiro, a novo julgamento
pelo Tribunal do Júri, devolvendo-se ao Juiz natural da causa toda a
matéria originalmente tratada na decisão de pronúncia, devendo a
Magistrada de piso atentar para a correta quesitação relativa aos crimes
da Lei Antidrogas, fazendo-se incidir as majorantes do art. 40, incs. IV e
VI, da Lei n.º 11.343/2006 sobre ambos os delitos (tráfico e associação
para o tráfico), restando, assim, prejudicados todos os demais pleitos
recursais, ora veiculados pelas partes.
CONHECIMENTO DE TODOS OS RECURSOS, COM O
DESPROVIMENTO DO APELO DO RÉU LUIZ GUSTAVO, E O
PROVIMENTO DOS RECURSOS MINISTERIAL E DO ACUSADO
JORGE ELIAS.”

Neste contexto, conclui-se que, o pleito defensivo absolutório,


quanto ao réu João, mostra-se inviável aos olhos da Teoria Monista, adotada pelo
nosso Estatuto Repressivo pátrio em seu artigo 29, segundo a qual o crime, ainda
que praticado por várias pessoas, em colaboração, continua sendo uno e
indivisível.

Assim nos ensina a doutrina de Rogério Greco: “A teoria


monista, também conhecida como unitária, adotada pelo nosso Código Penal,
aduz que todos aqueles que concorrem para o crime incidem nas penas a este
cominadas, na medida de sua culpabilidade. Para a teoria monista existe um
crime único, atribuído a todos aqueles que para ele concorreram, autores ou
partícipes. Embora o crime seja praticado por diversas pessoas, permanece único
e indivisível” (in, Curso de Direito Penal: parte geral, volume I. – 17ª ed. – Niterói,
RJ: Impetus, 2015, p. 482, grifos nossos).

Fazendo coro, traz-se à baila o escólio de Guilherme de Souza


Nucci: “teoria unitária (monista): havendo pluralidade de agentes, com
diversidade de condutas, mas provocando apenas um resultado, há somente um
delito. Nesse caso, portanto, todos os que tomam parte na infração penal cometem
idêntico crime. É a teoria adotada, como regra, pelo Código Penal (Exposição de
Motivos, item 25)” (in, Código penal comentado – 17ª ed. rev., atual. e ampl. – Rio
de Janeiro: Forense, 2017, p. 202, destacamos).
Por certo, a dinâmica delitiva justifica a presença 449 da
majorante inserta no inciso II do parágrafo 2º do artigo 157, do CP, a qualificar o
crime de roubo, em razão do maior desvalor da conduta dos agentes, os quais se
aproveitaram da superioridade numérica, com vias a concluírem a subtração
almejada, buscando, assim, a garantia de sucesso em seu intento delituoso.

Partilhando do entendimento de que a multiplicidade de


agentes dá ensejo à causa de aumento referente ao concurso de pessoas (artigo 157,
§ 2º, II do CP), posiciona-se a doutrina pátria, in litteris: “O concurso de duas ou
mais pessoas também qualifica o roubo dada a maior periculosidade dos agentes,
que se unem para a prática do crime, dificultando a defesa da vítima, sendo
irrelevante a missão desempenhada por um ou outro sujeito.” (in, Mirabete, Julio
Fabbrini. Código Penal Interpretado, 8. ed. São Paulo : Atlas, 2012. Pág. 1170.
Grifo nosso).

Destarte, evidenciado que a Defesa não se desincumbiu de


comprovar o que alegou em sede recursal, encontra-se a negativa da autoria
delitiva, sustentada pelo réu, João, isolada do caderno probatório.

Por certo, o ônus probatório fica a cargo da Defesa, quanto


ao que alega, vez que o art. 156 do CPP se aplica a ambas as partes, no processo
penal. Tal vem explicitado, também, no artigo 373, incisos I e II do novel CPC.

Na mesma esteira, a jurisprudência pátria, ad colorandum:

“(...) “A prova da alegação – ensina MAGALHÃES NORONHA –


incumbe a quem a fizer, é o princípio dominante em nosso Código.
Oferecida a denúncia, cabe ao Ministério Público a prova do fato e da
autoria; compete-lhe documentar a existência concreta do tipo (nullum
crimen sine typo) e de sua realização pelo acusado. Este também tem a
seu cargo o ônus probandi. Com efeito, se ele invoca uma causa
excludente da antijuridicidade (legítima defesa, p. ex.) ou da
culpabilidade (v. g. erro de fato), incumbe-lhe prová-la. Não apenas
isso: a ele cabe ainda o ônus se alega não estar provada a existência do
fato. o STF já teve oportunidade de decidir nesse sentido no Hc
68.964-7 –SP, rel. MIN. CELSO DE MELLO, DJU 22.4.94, cuja
ementa tem o seguinte teor: ‘o álibi, enquanto elemento de defesa,
deve ser comprovado, no processo penal condenatório, pelo réu a
quem seu reconhecimento aproveita (Curso de Direito Penal, p. 97/98,
Ed. Saraiva, 1969)”. (TACRIM SP – AP.1.407.329-8 - REL. Juiz
Luis Ganzerla – 12ª C. – J. 9.2.2004 – Un. Grifos nossos.)

“(...) assim se apresenta a lição de Hélio Tornaghi: ‘Portanto, o sentido


do art. 156 deve ser esse: ressalvadas as presunções que invertem o
ônus da prova, as alegações relativas ao fato constitutivo da pretensão
punitiva têm de ser provadas pelo acusador e as referentes a fatos
impeditivos ou extintivos devem ser provadas pelo réu’ (Instituições
de Processo Penal, v. 4/226).” (TJRJ – Ap. – 1.316/88 – rel. Des.
Synésio de Aquino – 1ª C. crim. – J. 17.10.1989 – Un.) (RT 649/303).
450
Grifos nossos.

“É ônus do réu em provar as alegações feitas em sua defesa, sob pena


de nenhum valor probatório se revestir a simples negativa de autoria.”
(TJPR - Apelação Crime: ACR 2815963 PR Apelação Crime -
0281596-3)

Destaca-se, ainda, o conceito de prova e o posicionamento


doutrinário a respeito: “ (...) é o conjunto de atos praticados pelas partes, pelo
juiz (CPP, art. 156, 2, parte, 209 e 234) e por terceiros (p. ex., peritos), destinados
a levar ao magistrado a convicção acerca da existência ou inexistência de um
fato, da falsidade ou veracidade de uma afirmação.” (in, CAPEZ, Fernando.
Curso de Processo Penal. 10ª Ed. Saraiva: São Paulo, 2003, p. 243).

Destarte, resultando evidenciado que a Defesa não trouxe a


esta instância argumentos contundentes, capazes de modificar o decreto
condenatório, prolatado pelo Juiz de piso, fica mantida a condenação imposta aos
apelantes, João Batista Chabudey e Josué da Silva Arouca, pela prática delituosa
prevista no artigo 157, § 2º, II do Código Penal, afastando-se, por conseguinte, o
pleito subsidiário consistente na reclassificação típica da conduta para o delito de
furto.

A dosimetria das penas merece reparos.

Observa-se do cálculo sancionatório que, parte da pena-base


do crime de roubo foi majorada, em relação a ambos os réus, em razão da maior
reprovabilidade da conduta (emprego efetivo de violência), bem como das
consequências do crime, uma vez que o aparelho de telefone celular não foi
recuperado pela vítima.

Inicialmente, há de se constatar que, as circunstâncias do


caso em concreto demonstram, efetivamente, a maior reprovabilidade da ação
criminosa, isto porque, resultou comprovado o emprego de violência exorbitante
àquela que possa ser considerada “normal ao tipo”, considerando que, além de o
réu, Josué, ter arrastado a vítima contra um muro, causando-lhe lesões, houve,
ainda, a ocorrência de luta corporal entre o mesmo, um jovem de vinte anos de
idade, e a ofendida, uma senhora de quase 60 anos, tendo a violência se protraído
no tempo, eis que esta chegou perder a respiração.

Já que no que tange à negativação das consequências do


crime de roubo, cabe ser dito que, em se tratando de delito consumado, o qual o
legislador já previu maior gravidade, a implicar, por conseguinte, o exasperamento
sancionatório em relação ao crime tentado, não há se falar em consequências mais
gravosas à vítima, cabendo destacar-se, ainda, que possíveis prejuízos materiais
sofridos por esta, advindos da ação criminosa, podem ser objeto de eventual
reparação, por meio de ação própria na seara cível, se cabível.
451

Especificamente quanto ao réu João, o Juiz primevo elevou


as sanções basilares considerando ainda, que o mesmo é “portador de péssimos
antecedentes, com personalidade reprovável e conduta social voltada para a
marginalidade”.

Com efeito, o réu João apresenta maus antecedentes,


conforme se depreende da anotação nº 02 de sua Folha de Antecedentes Criminais
(fls. 205/209v), resultando acertada a exacerbação penal quanto a este aspecto.

Porém, pode-se verificar que, o Magistrado sentenciante


considerou anotações da referida FAC do réu João, as quais não apresentam
condenação ou, se apresentam, não registram trânsito em julgado, a fim negativar
as circunstâncias judicias referentes à personalidade e à conduta social do mesmo,
o que fere o princípio constitucional da presunção de inocência, ante a
inobservância ao verbete nº 444 da Súmula do STJ (“É vedada a utilização de
inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base”), devendo
portanto, tais justificativas serem alijadas do cálculo sancionatório.

Neste contexto, considerando o afastamento de algumas das


circunstâncias judiciais da dosagem das penas na primeira fase, importa observar
que “A lei confere ao julgador certo grau de discricionariedade na análise das
circunstâncias judiciais, sendo assim, o que deve ser avaliado é se a
fundamentação exposta é proporcional e autoriza a fixação da pena-base no
patamar escolhido” (STJ. HC nº 219226/MS).

Assim, remanescendo ao réu Josué apenas uma circunstância


judicial negativa (circunstâncias do crime), cabível o ajuste do aumento penal no
patamar de 1/6, o que encaminha a acomodação da pena-base do delito de roubo
praticado pelo mesmo, em 04 anos e 08 meses de reclusão e pagamento de 11 dias-
multa. Quanto ao réu João, presentes as circunstâncias judiciais, negativas,
referentes às circunstâncias do crime e aos maus antecedentes, exacerba-se sua
pena-base na proporção de 1/5, alcançando a mesma 04 anos, 09 meses e 18 dias
de reclusão, e 12 dias-multa, respeitados, destarte, em ambos os casos, os
princípios da proporcionalidade e da individualização das penas.

Na segunda fase dosimétrica, observa-se que a presença das


duas minorantes, relativas à confissão espontânea e a menoridade do réu Josué,
permitem o retorno das penas ao piso mínimo cominado, quanto ao mesmo,
resultando assim, as sanções assentadas, por ora, em 04 anos de reclusão e 10 dias-
multa.

Já na etapa intermediária, referente às penas do réu João,


observa-se que a reincidência do mesmo – acertadamente verificada na anotação nº
01 de sua FAC – justifica a elevação sancionatória no patamar de 1/6, conforme o
assente entendimento jurisprudencial, observados o princípio da razoabilidade,452
a
resultar as penas em 05 anos, 07 meses e 06 dias de reclusão, e 14 dias-multa.

Oportuno esclarecer, neste momento, que tanto o


reconhecimento dos maus antecedentes do réu João, quanto sua condição de
reincidente (com os consequentes desdobramentos negativos na quantificação das
penas privativas de liberdade, bem como no recrudescimento da forma de
cumprimento das mesmas), além de constituírem inequívoca previsão legal, não
representam, de forma alguma, o alegado bis in idem, eis que ressurgem da estrita
observância ao princípio da individualização das penas, tendo sido a questão,
quanto a este último (reincidência) tema de repercussão geral no STF, na qual foi
reconhecida a constitucionalidade do art. 61, I do C.P. (RE nº 453.000/RS).

Confira-se:
“Habeas corpus. Roubo. Condenação. 2. Pedido de afastamento da
reincidência, ao argumento de inconstitucionalidade. Bis in idem. 3.
Reconhecida a constitucionalidade da reincidência como agravante da
pena (RE 453.000/RS). 4. O aumento pela reincidência está de acordo
com o princípio da individualização da pena. Maior reprovabilidade ao
agente que reitera na prática delitiva. 5. Ordem denegada.”
STF: Tribunal Pleno. HC 93815/RS. Relator Min. Gilmar Mendes. DJe
083, publ.06.05.2013.

Incabível, ainda, a redução das penas do réu João, ante o


pleito de incidência do parágrafo 1º do artigo 29 do CP.

De fato, sob o enfoque da teoria do domínio funcional do


fato, revela-se cristalina, como visto alhures, a unicidade das condutas apuradas
durante a instrução criminal, sendo certo que, além da mera aquiescência ou
previsibilidade quanto ao risco criado pelo fato sub examen, vislumbra-se,
facilmente, a efetiva prática da mesma conduta típica pelos réus, de forma que suas
atuações, mostraram-se indissociáveis no âmbito da ação criminosa, fazendo
transparecer a plena convergência de vontades, dirigida ao resultado almejado pela
decisão comum, a qual formou o liame subjetivo entre os respectivos sujeitos
ativos, não havendo falar-se, validamente, em participação de menor importância
do réu João à hipótese vertente.

Assim, na derradeira fase da dosagem penal, mantida a


exasperação na fração de 1/3, tal como aplicada na sentença de piso, resultam as
sanções definitivamente acomodadas nos patamares de 05 anos e 04 meses de
reclusão, e 13 dias-multa para o réu Josué, e de 06 anos, 06 meses e 12 dias
reclusão, e 16 dias-multa para o réu João.

Os regimes iniciais de cumprimento das penas privativas de


liberdade devem ser estabelecidos em fechado, em observância ao conteúdo do
artigo 33, § 3º do Código Penal, bem como, em relação ao réu João, à condição de
reincidente do mesmo, respeitados, assim, os princípios da adequação e da
453
razoabilidade, conforme os escopos de prevenção e ressocialização das sanções
penais.

Em razão do amplo espectro devolutivo do recurso ora


interposto, o qual remete à esta instância revisora toda a matéria julgada, verifica-
se incabível a fixação, nestes autos, de valor reparatório, a ser pago pelo réu ao
ofendido, eis que a referida reparação, introduzida por força do inciso IV do art.
387 do Código de Processo Penal, deve ser vista com ressalvas e não,
simplesmente, como consequência civil automática da condenação, devendo se
distinguir o dano moral, decorrente de ofensa aos direitos da personalidade (v.g.
honra, nome, imagem, abalo de crédito, e etc.) do dano material (p. ex.: danos
emergentes, lucros cessantes, despesas e etc.).

A princípio, o ilícito penal constitui, também, ilícito civil e,


por vezes, ilícito administrativo, isto porque há ocorrência de dano, apurando-se a
responsabilidade de natureza penal no juízo criminal e, concomitantemente, a
responsabilidade civil no juízo cível, sendo que, em ambos os juízos, existem
decisões a respeito do mesmo fato, podendo as mesmas serem contraditórias,
como, por exemplo, uma reconhecendo a existência do fato ou da autoria, e outra
os negando, e, ainda, uma reconhecendo a licitude da conduta do agente, e outra a
ilicitude.

Para evitar tais contradições, o legislador estabeleceu normas


que consagram a separação e a independência relativa entre a responsabilidade
criminal e a civil, regras estas estabelecidas nos artigos 935 do atual Diploma Civil
Brasileiro; artigo 91, inciso I, do Código Penal nacional; artigos 63 a 68 e 386 e
incisos do Código dos Ritos Penais pátrio.

Com efeito, o dano sofrido por aquele que é atingido em um


bem jurídico, pode ser o mesmo patrimonial ou material, quando atinge a pessoa
ou a coisa objetivamente, causando-lhe prejuízos de ordem econômica, e moral ou
pessoal, quando atinge a pessoa ou a coisa pelo viés subjetivo, no que diz respeito
à personalidade ou o lado afetivo que a coisa possa representar, abrangendo o
abalo dos sentimentos e a lesão a todos e quaisquer bens ou interesses pessoais,
com exceção dos econômicos, enquadrando-se, também, no dano pessoal, o
chamado dano estético, desde que cause humilhação e desgosto de molde a
originar uma dor moral.

No tocante a validade da norma inserta no inciso IV do art.


387 do CPP, de previsão de arbitramento na sentença condenatória, de valor
mínimo de atinente a reparação de danos causados pela prática de infração penal,
explana o processualista EUGÊNIO PACELLI, ad litteram:
“Algumas objeções foram levantadas quanto à validade 454
da
aludida inserção – imposição de valor mínimo na condenação – fundadas, boa
parte delas, em ponderáveis considerações.

A primeira diz respeito à necessidade, ou não, de pedido


expresso na denúncia ou queixa, para obtenção do título quanto à parcela mínima.

A segunda, mais radical, questiona a legitimidade do


Ministério Público para promover a recomposição patrimonial da vítima, na
medida em que vedado, constitucionalmente, o exercício da advocacia pelos seus
membros (art. 129, IX, CF), além da existência de órgão público destinado à
defesa dos inúmeros necessitados nacionais (a Defensoria Pública).

A terceira, por fim, aponta para a impossibilidade de se


discutir os prejuízos causados à vítima, sem prejuízo da ação penal. É dizer: a
abertura de instrução probatória para a fixação da parcela mínima atrasaria o
andamento da ação, tumultuando a persecução penal.

Naturalmente, não se trata de fixação do valor total da


recomposição patrimonial. Aqui, atenta-se apenas para o valor mínimo que se
revele suficiente para recompor os prejuízos já evidenciados na ação penal.
Eventuais acréscimos da responsabilidade civil, sob a rubrica dos lucros cessantes
e eventuais danos morais, serão fixados na instância cível.

(...)

Pensamos que somente como efeito secundário da sentença


penal se poderá aceitar a regra do art. 387, IV, do CPP, nos termos, aliás, em
que se acha disposto no art. 91, I, do Código Penal, a reconhecer a certeza e a
obrigação de indenização do dano causado pelo crime. (negritamos).

Com efeito, ainda que sem pedido ou participação da vítima


no processo, o citado dispositivo legal sempre autorizou a formação de título
executivo no juízo cível, já afirmada a obrigação de indenização do dano pela
prolação da sentença penal condenatória. No cível, portanto, restaria apenas a
liquidação do valor devido.

A nosso aviso, a lei deve ser entendida nestes estritos termos,


impedindo o alargamento da instrução criminal para a discussão acerca dos
possíveis desdobramentos da responsabilidade civil. Não se há de pretender
discutir, por exemplo, o dever de reparação do dano moral ou mesmo dos danos
materiais. Não se trata de cumulação de instâncias (cível e penal), mas
simplesmente da especificação de valor mínimo, devido e cabalmente demonstrado
no desenvolvimento da ação penal, sobretudo quando resultante da própria
imputação.
455

(...)

Mas, de outro lado, é imperioso observar que nem sempre


tal ocorrerá. Muitas vezes, se o juiz fixar a parcela mínima sem quaisquer debates
anteriores acerca da existência do dano e de sua extensão, impor-se-á a nulidade
absoluta da sentença, nesse particular.

Por isso, o valor que entendemos possível à sua fixação


desde logo na sentença penal condenatória será: (a) aquele que tiver sido objeto
de discussão ao longo do processo, prescindindo, porém, de pedido expresso na
inicial; (b) aquele relativo aos prejuízos materiais efetivamente comprovados, ou
seja, em que haja certeza e liquidez quanto à sua natureza. (negritos nossos).

(...)

Assim, observadas as condições antes mencionadas,


relativamente à exigência de contraditório e de ampla defesa, não questionamos a
validade da aludida norma. De notar-se que o Supremo Tribunal Federal não tem
feito objeções à validade da citada norma, senão em julgamento específico da
matéria, pelo menos em obiter dictum, conforme se vê no julgamento da AP 396 e
na AP 470.” (in, Curso de Processo Penal. 21ª ed., São Paulo: Atlas, 2017. pág.
302/303).

À toda evidência, a quantificação desta possível reparação


merece ser objeto de ampla discussão entre as partes, devendo ser observados os
princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, o que não ocorreu na
esfera penal, considerando que, em tese, tanto o lesado como o réu, poderão
discutir a questão com maior elastério se o pleito de reparação for objeto de ação
civil autônoma à luz do devido processo legal e respeitado o mandamento da ampla
produção de provas.

Neste contexto, oportuno citar que, não consta dos autos


quaisquer comprovações seguras sobre o valor da res furtivae, tendo a ofendida
durante seu depoimento, em Juízo, declarado, apenas, que o aparelho celular
“havia custado cerca de 900 reais” (fls. 248).

Ressalte-se, ademais, que conforme o entendimento


jurisprudencial, a imediata reparação civil, a ser arbitrada pelo Juiz monocrático,
sem que ocorra prévio e adequado requerimento expresso realizado pela Acusação
ou pelo Assistente vai de encontro ao princípio da correlação entre o pedido,
formulado na exordial acusatória, e a sentença.

Cediço é que, os incisos II e LV do artigo 5º¹ da CRFB/1988


estabelecem como direitos e garantias fundamentais, respectivamente, a legalidade
456
estrita, o contraditório e a ampla defesa. Seguindo a mesma orientação das normas
constitucionais indicadas, o artigo 4º da LIND (Dec. Lei nº 4657, de 04.09.1942),
preconiza que “Ninguém se escusa de cumprir a lei alegando que não a conhece”.

Em cumprimento às normas constitucionais e


infraconstitucionais indicadas, é curial que, a norma expressa no inciso IV do
artigo 387 do CPP, a qual dispõe sobre a fixação, na sentença condenatória, de
valor mínimo de reparação dos danos causados pela infração, considerando os
prejuízos sofridos pelo ofendido, exige, nos termos do artigo 2º do CPC/2015
pedido prévio e expresso, na peça inaugural (denúncia ou queixa-crime) ou na
petição de assistência (da Acusação), pedido este que está adstrito à observância
dos artigos 319 e incisos; 322 e 324 do CPC/2015, devendo ser formulado, de
modo pormenorizado, com as especificações próprias dos fatos e danos alegados
(classe e espécie), ser certo e determinado, não se apresentando abstrato ou
genérico, haja vista o princípio da igualdade (formal e material) de tratamento
insculpido no artigo 5º, caput da CRFB/1988, secundado pelo artigo 329, I do
CPC/2015.

Outrossim, para que seja possível a fixação na sentença


condenatória de aludido valor mínimo como efeito da condenação (CP, artigo 91,
I), o qual ostenta a natureza de responsabilidade/reparação civil, faz-se necessário
que o postulante da mesma forneça dados, informações e elementos concretos
(v.g., documentos, laudos, situação sócio-econômica e financeira do ofensor e do
ofendido, e, etc), para que se possa mensurar a intensidade e extensão do dano e
fixar-se/arbitrar-se o valor mínimo da reparação, o qual deve ser objeto de
posterior execução por quantia certa (CPC/2015, artigos 824 a 909), no juízo cível
(CPP, artigos 63 e 64), pelo sujeito ativo da relação jurídica de direito material
(credor), não podendo promove-la o órgão ministerial (no caso de pedido expresso
na denúncia) haja vista a norma jurídica de direito público e cogente, exposta no
artigo 18 do CPC/2015.

A propósito, os seguintes arestos do STJ, no sentido de que faz-


se necessária a observância de pedido expresso, formulado pelo Ministério
Público, Assistente, ou Querelante, com vias a garantir o princípio do contraditório
e da ampla defesa e, ainda, a existência de dados/elementos suficientes para o
arbitramento do dano. Confira-se:

“AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO


AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ROUBO. APLICAÇÃO DO
ART. 91, I, DO CP. EFEITO EXTRAPENAL. ART. 387, INCISO IV, DO
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - CPP. POSSIBILIDADE DE
FIXAÇÃO DE VALOR MÍNIMO PARA REPARAÇÃO CIVIL DOS
DANOS SOFRIDOS PELO OFENDIDO. NECESSIDADE DE PEDIDO
EXPRESSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. AGRAVO REGIMENTAL
DESPROVIDO.
1. Consoante dispõe o art. 91, I, do Código Penal: "são efeitos da
condenação: I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo
crime". Referido dispositivo trata do efeito extrapenal genérico 457 da
condenação, de efeito automático, pois não necessita ser expressamente
pronunciado pelo juiz na sentença condenatória para se tornar título
executivo judicial a embasar eventual propositura da ação civil ex delicto.
2. Com a alteração instituída pela Lei Federal n. 11.719/08, o inciso IV do
art. 387 do Código de Processo Penal - CPP possibilitou que o juiz, ao
proferir a sentença condenatória, fixe valor mínimo para reparação dos
danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo
ofendido. Assim, o aludido dispositivo apenas permitiu a antecipação do
momento processual para fixação de um valor mínimo para reparação de
danos causados por uma infração penal.
3. Esta Corte Superior de Justiça entende que "a aplicação do instituto
disposto no art. 387, IV, do CPP, referente à reparação de natureza cível,
na prolação da sentença condenatória, requer a dedução de um pedido
expresso do querelante ou do Ministério Público, em respeito às garantias
do contraditório e da ampla defesa" (AgRg no AREsp 1309078/PI, Rel.
Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em
23/10/2018, DJe 16/11/2018).
4. Agravo regimental desprovido.
(AgRg nos EDcl no AREsp 1296627/PR, Rel. Ministro JOEL ILAN
PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 13/12/2018, DJe
01/02/2019) Grifos nossos.

“PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO ESPECIAL. FURTO


QUALIFICADO PELO ABUSO DE CONFIANÇA E CONCURSO DE
AGENTES. REPARAÇÃO CIVIL MÍNIMA. NECESSIDADE DE
PEDIDO EXPRESSO NA INICIAL.
1. De acordo com reiterados julgados deste Superior Tribunal de Justiça,
para que haja a fixação na sentença do valor mínimo devido a título de
indenização civil pelos danos causados à vítima, nos termos do artigo 387,
IV, do Código de Processo Penal, é necessário pedido expresso na inicial
acusatória, sob pena de afronta à ampla defesa e ao contraditório.
2. Agravo regimental improvido.
(AgRg no REsp 1671240/PR, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE
ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 22/05/2018, DJe
04/06/2018) Grifos nossos.

"AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PENAL E


PROCESSUAL PENAL. ROUBO MAJORADO. ARTS. 226 E 228 DO
CPP. REPARAÇÃO CIVIL MÍNIMA. ART. 387, IV, DO CPP.
PEDIDO DO OFENDIDO OU DO ÓRGÃO MINISTERIAL.
LEGALIDADE. MINISTÉRIO PÚBLICO PLEITEOU A FIXAÇÃO
DE VALOR PARA A REPARAÇÃO DO DANO NA DENÚNCIA.
POSSIBILIDADE. RESPEITADA A OPORTUNIDADE DE DEFESA
AO RÉU. REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA
83/STJ.
1. A mais significativa inovação legislativa introduzida pela Lei n.
11.719/2008, que alterou a redação do inciso IV do art. 387 do Código
de Processo Penal, possibilitou que na sentença fosse fixado valor
mínimo para a reparação dos prejuízos sofridos pelo ofendido em
razão da infração, a contemplar, portanto, norma de direito material mais
rigorosa ao réu.
2. Para que seja fixado na sentença o início da reparação civil, com base458
no
art. 387, IV, do Código de Processo Penal, deve haver pedido expresso do
ofendido ou do Ministério Público e ser possibilitado o contraditório ao
réu, sob pena de violação do princípio da ampla defesa.
3. O acórdão a quo considerou suficientes as provas acerca da
identificação dos acusados e determinou, fundamentadamente, a autoria
da conduta delituosa. A alteração de tal entendimento implica
revolvimento fático-probatório, a atrair a incidência da Súmula 7/STJ.
4. Incidência da Súmula 83/STJ.
5. O agravo regimental não merece prosperar, porquanto as
razões reunidas na insurgência são incapazes de infirmar o
entendimento assentado na decisão agravada.
6. Agravo regimental improvido. ”
(STJ – 6ª Turma - AgRg no REsp 1383261 / DF - AGRAVO
REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL 2013/0163456-0 -
Relator(a) Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR - Data do
Julgamento 17/10/2013 - Data da Publicação/Fonte DJe 14/11/2013)

"PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO ESPECIAL. ROUBO.


REPARAÇÃO CIVIL POR DANOS MORAIS. VALOR MÍNIMO
FIXADO PELA SENTENÇA CONDENATÓRIA. POSSIBILIDADE.
INSTRUÇÃO PROBATÓRIA ESPECÍFICA. DESNECESSÁRIA.
RECURSO ESPECIAL PROVIDO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA.
DEFERIMENTO.
1. Admite-se a fixação de valor mínimo para reparação de danos
morais, nos termos do art. 387, IV, do Código de Processo Penal, desde
que haja pedido expresso do Ministério Público na denúncia.
[...]
3. Recurso especial provido e execução provisória da pena
deferida." (REsp 1739851/DF, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO,
SEXTA TURMA, julgado em 16/10/2018, DJe de 06/11/2018; sem grifos
no original.)

"PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO


ESPECIAL. REPARAÇÃO CIVIL DOS DANOS SOFRIDOS PELA
VÍTIMA. ILÍCITO PENAL. DANO MORAL. POSSIBILIDADE DE
ARBITRAMENTO DE VALOR MÍNIMO. SÚMULA 7/STJ.
INAPLICABILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. Esta Corte Superior tem admitido que o Juiz, com base no art.
387, IV, do Código de Processo Penal, estabeleça a reparação por danos
morais, quando requerido, existindo elementos suficientes para o seu
arbitramento, como ocorreu na hipótese.
[...]
3. Agravo regimental desprovido."
(AgRg no REsp 1616705/DF, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK,
QUINTA TURMA, julgado em 27/02/2018,
DJe de 09/03/2018.)

Neste sentido encontra-se a jurisprudência deste Tribunal de


Justiça:
“Do afastamento da indenização à vítima. Melhor sorte assiste à defesa 459
técnica, ao pleitear o afastamento da condenação por danos, estabelecida a
indenização, pelo Magistrado a quo, na quantia de R$ 2.000,00 (dois mil
reais), não tendo especificado, o nobre Juiz, se são materiais ou morais.
Contudo, o artigo 387, IV, do Código de Processo Penal, ao dispor que o
Juízo fixará o valor mínimo de reparação de danos causados pela infração,
considerando os prejuízos sofridos pela ofendida, impõe a comprovação do
efetivo dano patrimonial existente, a justificar a incidência da reparação.
Ademais, não há, nos presentes autos, pedido expresso do órgão
ministerial ou da ofendida, quanto à indenização, e tampouco a denúncia
descreve ter havido perdas patrimoniais, sendo certo que sua concessão,
pelo Magistrado, neste caso, viola os princípios da ampla defesa e do
contraditório, não havendo correlação com a exordial. Precedentes”
(Apelação nº 0019542-44.2015.8.19.0011. Oitava Câmara Criminal.
Relator Des. Claudio Tavares de O. Junior. Julgamento em 16/08/2017.

“Assim, para a fixação da indenização civil, faz-se necessário o pedido


formal e o contraditório, oportunizando ao réu a discussão sobre o
quantum.”
(Apelação Criminal nº 0337702-21.2008.8.19.0001. Oitava Câmara
Criminal. Relatora Des. Eunice Ferreira Caldas. Julgamento em
13/12/2011.)

“(...) Deve ser excluída a fixação de valor indenizatório, como forma de


reparação do dano, embora haja previsão legal, contida no inciso IV do art.
387 do CPP. Há que se considerar a sentença, neste ponto, como
incongruente, pois o juiz criminal não pode fixar valor indenizatório sem
que haja um pedido.”
(Apelação Criminal nº 0030691-97.2008.8.19.0038. Oitava Câmara
Criminal. Relator Des. Gilmar Augusto Teixeira. Julgamento em
30/11/2011.)

“(...) no que tange ao dano moral, seu arbitramento requer análise mais
complexa das consequências do crime para o ofendido e seus familiares,
para tanto se fazendo necessário processo cognitivo, na esfera cível.”
(Apelação criminal nº. 2009.050.03873. Quinta Câmara Criminal. Relatora
Des. Leony Maria Grivet Pinho. Julgamento em 02/08/2010.)

“A fixação de indenização por danos materiais e morais viola frontalmente


o princípio do devido processo legal nas vertentes do contraditório e da
ampla defesa (...)”
(Apelação criminal nº 5762/2009. Primeira Câmara Criminal. Relator Des.
Ricardo Bustamante. Julgamento em 07/06/2010)

Cita-se, ainda, o julgamento por esta Oitava Câmara Criminal,


da Apelação nº 0082165-78.2016.8.19.0054, ocorrido 04/07/2018, de lavra desta
Relatoria.

Esse também é o posicionamento encontrado na doutrina pátria:


“Parece-nos razoável, segundo entendimento que tem sido sufragado por um setor
da doutrina que a fixação do valor mínimo de indenização seja precedida de
pedido expresso do autor, da denúncia ou queixa-crime, ou, ainda, que conste de
460
requerimento elaborado pelo assistente de acusação, sob a forma de aditamento
da denúncia.” (Damásio de Jesus, in Código de Processo Penal Anotado, 24ª
edição, 2010, São Paulo : Editora Saraiva, p.232).

E ainda: “Procedimento para a fixação da indenização civil:


admitindo-se que o Magistrado possa fixar o valor mínimo para a reparação dos
danos causados pela infração penal, é fundamental haver, durante a instrução
criminal, um pedido formal para que se apure o montante civilmente devido. Esse
pedido deve partir do ofendido, por seu advogado (assistente de acusação), ou do
Ministério Público. A parte que o fizer precisa indicar valores e provas suficientes
a sustentá-los. A partir daí, deve-se proporcionar ao réu a possibilidade de se
defender e produzir contraprova, de modo a apontar que inexistiu prejuízo
material ou moral a ser reparado. Se não houver formal pedido e instrução
específica para apurar o valor mínimo para o dano, é defeso ao julgador optar
por qualquer cifra, pois seria nítida infringência ao princípio da ampla defesa.”
(Guilherme de Souza Nucci, in Código de Processo Penal Comentado, 2008, São
Paulo : Revista dos Tribunais, p. 691).

Por fim, quanto à alegação de prequestionamento, para fins de


interposição eventual de recursos extraordinário ou especial, a mesma não merece
conhecimento e tampouco provimento eis que não se vislumbra a incidência de
quaisquer das hipóteses itemizadas no inciso III, letras “a”, “b”, “c” e “d” do art.
102 e inciso III, letras “a”, “b” e “c” do art. 105 da C.R.F.B. e por consequência
nenhuma contrariedade/negativa de vigência, nem demonstração de violação de
normas constitucionais ou infraconstitucionais, de caráter abstrato e geral.

Recurso Extraordinário- Súmulas

Súmula nº 279
Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário.

Súmula nº 280
Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário.

Súmula nº 281
É inadmissível o recurso extraordinário, quando couber na justiça
de origem, recurso ordinário da decisão impugnada.

Súmula nº 282
É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na
decisão recorrida, a questão federal suscitada.

Súmula nº 283
461
É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida
assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles.

Súmula nº 284
É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua
fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia.

Súmula nº 286
Não se conhece do recurso extraordinário fundado em divergência
jurisprudencial, quando a orientação do plenário do Supremo Tribunal Federal já
se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida.

Súmula nº 322
Não terá seguimento pedido ou recurso dirigido ao supremo
tribunal federal, quando manifestamente incabível, ou apresentado fora do prazo,
ou quando for evidente a incompetência do tribunal.

Súmula nº 399
Não cabe recurso extraordinário, por violação de lei federal, quando
a ofensa alegada for a regimento de tribunal.

Súmula nº 400
Decisão que deu razoável interpretação à lei, ainda que não seja a
melhor, não autoriza recurso extraordinário pela letra "a" do art. 101, III, da
Constituição Federal.

Súmula nº 735
Não cabe recurso extraordinário contra acórdão que defere medida
liminar.

E, ainda os seguintes arestos:

“EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO.


MATÉRIA CRIMINAL. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DO ART. 59 DO
CÓDIGO PENAL. FUNDAMENTAÇÃO. OFENSA REFLEXA. AUSÊNCIA
DE REPERCUSSÃO GERAL. Discussão constitucional levantada pelo
agravante que, para ser analisada, necessita de apreciação prévia de norma
infraconstitucional. Caracterização de ofensa reflexa ou indireta à Constituição
Federal. Precedentes. O Supremo Tribunal Federal já reconheceu a ausência de
repercussão geral da matéria ora debatida, o que inviabiliza o recurso
extraordinário por falta de requisito para seu regular processamento. Agravo
regimental a que se nega provimento.” (STF, AI 740235 AgR-segundo, 462
Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em
07/06/2011, DJe-121 DIVULG 24-06-2011 PUBLIC 27-06-2011 EMENT
VOL-02551-02 PP-00326)
EMENTA: - Recurso extraordinário inadmitido. 2. Não cabe ver ofensa, por
via reflexa, a normas constitucionais, aos fins do recurso extraordinário. 3. Se,
para dar pela vulneração de regra constitucional, mister se faz, por primeiro,
verificar da negativa de vigência de norma infraconstitucional, esta última é o
que conta, para os efeitos do art. 102, III, a, da Lei Maior. 4. Falta de
prequestionamento do dispositivo constitucional tido como violado. 5. Agravo
regimental desprovido.” (AI 251784 AgR, Relator(a): Min. NÉRI DA
SILVEIRA, Segunda Turma, julgado em 21/03/2000, DJ 07-04-2000 PP-
00056 EMENT VOL-01986-08 PP-01679)
“E M E N T A: Recurso extraordinário: ofensa reflexa a Constituição:
descabimento. O recurso extraordinário e incabível, quando, para apurar-se a
contrariedade a dispositivo constitucional que ele denúncia, seja necessário
proceder ao exame da legislação ordinária.”
(AI 154815 AgR, Relator: Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma,
julgado em 20/09/1994, DJ 02-06/1999 EMENT VOL-01789-02 PP-00399)

“CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO


EXTRAORDINÁRIO: CABIMENTO. OFENSA A CONSTITUIÇÃO:
OFENSA DIRETA. I. - A ofensa a Constituição, que autoriza o recurso
extraordinário, e a ofensa frontal e direta. Se, para provar a contrariedade a
Constituição, tem-se, antes, de demonstrar a ofensa a lei ordinaria, e esta que
conta para a admissibilidade do recurso. II. - R.E. não conhecido.”
(RE 119236, Relator: Min. CARLOS VELLOSO, Segunda Turma, julgado em
09/02/1993, DJ 05-03-1993 EMENT VOL-01694-03 PP-00505)
“PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE DE RECURSOS DA
COMPETÊNCIA DE OUTROS TRIBUNAIS. MATÉRIA
INFRACONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. A
questão alusiva ao cabimento de recursos da competência de outros Tribunais
se restringe ao âmbito infraconstitucional. Precedentes. Não havendo, em rigor,
questão constitucional a ser apreciada por esta nossa Corte, falta ao caso
“elemento de configuração da própria repercussão geral”, conforme salientou a
ministra Ellen Gracie, no julgamento da Repercussão Geral no RE 584.608.”
(RE 598365, Relator Min. Ayres Britto, julgado em 14/08/2009, DJe-055
EMENT VOL-02395-06 PP-01480)

Recurso Especial – Súmulas

Súmula nº 7
A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso
especial.
Súmula nº 83 463

Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a


orientação do tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida.

Súmula nº 126
É inadmissível recurso especial, quando o acordão recorrido assenta
em fundamentos constitucional e infraconstitucional, qualquer deles suficiente, por
si só, para mantê-lo, e a parte vencida não manifesta recurso extraordinário.

Súmula nº 187
É deserto o recurso interposto para o superior tribunal de justiça,
quando o recorrente não recolhe, na origem, a importância das despesas de remessa
e retorno dos autos.

Súmula nº 203
Não cabe recurso especial contra decisão proferida por órgão de
segundo grau dos Juizados Especiais.

Súmula nº 211
Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da
oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo Tribunal a quo.

E, ainda os seguintes julgados:

“RECURSO ESPECIAL. JULGAMENTO. NÃO DEMONSTRADA, PELO


RECORRENTE, A CONTRARIEDADE OU NEGATIVA DE VIGÊNCIA,
NEM DEMONSTRADO, COMO RECOMENDA O TEXTO REGIMENTAL,
O DISSIDIO, NÃO SE CONHECE DO RECURSO. RECURSO ESPECIAL
NÃO CONHECIDO.” (REsp 2.088/RS, Rel. Ministro NILSON NAVES,
TERCEIRA TURMA, julgado em 13/03/1990, DJ 02/04/1990, p. 2457)

“RECURSO. CONTRARIEDADE E NEGATIVA DE VIGÊNCIA A LEI.


CONCEITO. NÃO CONHECIMENTO. DÁ-SE CONTRARIEDADE OU
NEGATIVA DE VIGÊNCIA A LEI, NO CASO CONCRETO, QUANDO, NA
APLICAÇÃO DA NORMA AO FATO, ESSA E DESVIRTUADA OU NÃO
E INFLIGIDA. RECURSO NÃO CONHECIDO.” (REsp 4.859/SP, Rel. MIN.
CLÁUDIO SANTOS, TERCEIRA TURMA, julgado em 25/09/1990, DJ
22/10/1990, p. 11667)

“PROCESSO CIVIL - RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO, PORQUE


INEXISTENTE A NEGATIVA DE VIGÊNCIA DE LEI ALEGADA,
DETERMINANDO-SE O RETORNO DOS AUTOS AO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL, CONTUDO, PARA EXAME DE ARGUIÇÃO DE 464
CONTRARIEDADE, NO JULGAMENTO RECORRIDO, A TEXTO
CONSTITUCIONAL.” (REsp 1.188/RJ, Rel. Ministro ARMANDO
ROLEMBERG, PRIMEIRA TURMA, julgado em 22/11/1989, DJ 18/12/1989,
p. 18465)

Face ao exposto, vota-se pelo CONHECIMENTO e PARCIAL


PROVIMENTO do apelo defensivo interposto, com vias a acomodarem-se as
penais finais, aplicadas ao réu, Josué da Silva Arouca, em 05 anos e 04 meses de
reclusão, em regime de cumprimento, inicialmente, fechado, e pagamento de 13
dias-multa, à razão mínima, e quanto ao réu João Batista Chabudey, em 06 anos,
06 meses e 12 dias reclusão, em regime de cumprimento, inicialmente, fechado, e
pagamento de 16 dias-multa, à razão mínima, bem como afastar-se a imposição,
arbitrada pelo Juiz a quo, em relação a ambos os recorrentes, do pagamento de
reparação civil ao lesado, mantendo-se, no mais, a sentença monocrática
vergastada.

Rio de Janeiro, 11 de setembro de 2019.

Des. ELIZABETE ALVES DE AGUIAR


RELATORA

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